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Direito Penal

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Rua Henrique Schaumann 270 Cerqueira César São Paulo SP CEP 05413909 PABX 11 3613 3000 SACJUR 0800 055 7688 De 2ª a 6ª das 830 às 1930 Email saraivajureditorasaraivacombr Acesse wwwsaraivajurcombr FILIAIS AMAZONASRONDÔNIARORAIMAACRE Rua Costa Azevedo 56 Centro Fone 92 36334227 Fax 92 36334782 Manaus BAHIASERGIPE Rua Agripino Dórea 23 Brotas Fone 71 33815854 33815895 Fax 71 33810959 Salvador BAURU SÃO PAULO Rua Monsenhor Claro 255257 Centro Fone 14 32345643 Fax 14 32347401 Bauru CEARÁPIAUÍMARANHÃO Av Filomeno Gomes 670 Jacarecanga Fone 85 32382323 32381384 Fax 85 32381331 Fortaleza DISTRITO FEDERAL SIASUL Trecho 2 Lote 850 Setor de Indústria e Abastecimento Fone 61 33442920 3344 2951 Fax 61 33441709 Brasília GOIÁSTOCANTINS Av Independência 5330 Setor Aeroporto Fone 62 32252882 32122806 Fax 62 3224 3016 Goiânia MATO GROSSO DO SULMATO GROSSO Rua 14 de Julho 3148 Centro Fone 67 33823682 Fax 67 33820112 Campo Grande MINAS GERAIS Rua Além Paraíba 449 Lagoinha Fone 31 34298300 Fax 31 34298310 Belo Horizonte PARÁAMAPÁ Travessa Apinagés 186 Batista Campos Fone 91 32229034 32249038 Fax 91 3241 0499 Belém PARANÁSANTA CATARINA Rua Conselheiro Laurindo 2895 Prado Velho FoneFax 41 33324894 Curitiba PERNAMBUCOPARAÍBAR G DO NORTEALAGOAS Rua Corredor do Bispo 185 Boa Vista Fone 81 34214246 Fax 81 34214510 Recife RIBEIRÃO PRETO SÃO PAULO Av Francisco Junqueira 1255 Centro Fone 16 36105843 Fax 16 36108284 Ribeirão Preto RIO DE JANEIROESPÍRITO SANTO Rua Visconde de Santa Isabel 113 a 119 Vila Isabel Fone 21 25779494 Fax 21 25778867 25779565 Rio de Janeiro RIO GRANDE DO SUL Av A J Renner 231 Farrapos FoneFax 51 33714001 33711467 33711567 Porto Alegre SÃO PAULO Av Antártica 92 Barra Funda Fone PABX 11 36163666 São Paulo ISBN 9788502173538 Bitencourt Cezar Roberto Código penal comentado Cezar Roberto Bitencourt 7 ed São Paulo Saraiva 2012 1 Direito penal Legislação I Título 1014020 CDU3438109446 Índice para catálogo sistemático 1 Brasil Código penal comentado 3438109446 2 Código penal Comentários Brasil 3438109446 Diretor editorial Luiz Roberto Curia Gerente de produção editorial Lígia Alves Editora Thaís de Camargo Rodrigues Assistente editorial Aline Darcy Flôr de Souza Produtora editorial Clarissa Boraschi Maria Preparação de originais Ana Cristina Garcia Maria Izabel Barreiros Bitencourt Bressan Liana Ganiko Brito Catenacci Pesquisa e atualização de jurisprudência Thaís de Camargo Rodrigues Arte e diagramação Cristina Aparecida Agudo de Freitas Revisão de provas Rita de Cássia Queiroz Gorgati Amélia Kassis Ward Serviços editoriais Camila Artioli Loureiro Maria Cecília Coutinho Martins Capa Guilherme P Pinto Produção gráfica Marli Rampim Produção eletrônica Ro Comunicação Data de fechamento da edição 242012 Dúvidas Acesse wwwsaraivajurcombr Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida por qualquer meio ou forma sem a prévia autorização da Editora Saraiva A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na Lei n 961098 e punido pelo artigo 184 do Código Penal PUBLICAÇÕES DO AUTOR Tratado de direito penal parte geral 17 ed São Paulo Saraiva 2012 v 1 Tratado de direito penal parte especial 12 ed São Paulo Saraiva 2012 v 2 Tratado de direito penal parte especial 8 ed São Paulo Saraiva 2012 v 3 Tratado de direito penal parte especial 6 ed São Paulo Saraiva 2012 v 4 Tratado de direito penal parte especial 6 ed São Paulo Saraiva 2012 v 5 Código Penal comentado 7 ed São Paulo Saraiva 2012 Falência da pena de prisão causas e alternativas 4 ed São Paulo Saraiva 2011 Crimes contra o sistema financeiro nacional e contra o mercado de capitais em coautoria com Juliano Breda 2 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2011 Reforma Penal material de 2009 crimes sexuais sequestro relâmpago Rio de Janeiro Lumen Juris 2010 Erro de tipo e erro de proibição 5 ed São Paulo Saraiva 2010 Crimes contra as finanças públicas e crimes de responsabilidade de prefeitos 2 ed São Paulo Saraiva 2009 Teoria Geral do Delito uma visão panorâmica da dogmática penal brasileira Coimbra Almedina Editora 2007 Novas penas alternativas 3 ed São Paulo Saraiva 2006 Juizados Especiais Criminais Federais análise comparativa das Leis 909995 e 102592001 2 ed São Paulo Saraiva 2005 Direito Penal Econômico Aplicado em coautoria com Andrei Z Schmidt Rio de Janeiro Lumen Juris 2004 Lições de Direito Penal 3 ed Porto Alegre Livraria do Advogado Ed 1995 esgotado Elementos de Direito Penal parte geral em coautoria com Luiz R Prado São Paulo Revista dos Tribunais 1995 esgotado Elementos de Direito Penal parte especial em coautoria com Luiz R Prado São Paulo Revista dos Tribunais 1996 esgotado Juizados Especiais Criminais e alternativas à pena de prisão 3 ed Porto Alegre Livraria do Advogado Ed 1997 esgotado Teoria geral do delito São Paulo Revista dos Tribunais 1997 esgotado Código Penal anotado 2 ed em coautoria com Luiz R Prado São Paulo Revista dos Tribunais 1999 esgotado Teoria geral do delito bilíngue em coautoria com Francisco Muñoz Conde 2 ed São Paulo Saraiva 2004 Ao saudoso Ministro FRANCISCO DE ASSIS TOLEDO penalista invulgar magistrado exemplar e condutor da renovação do Direito Penal brasileiro na segunda metade do século XX INDICADOR GERAL Nota de Agradecimentos Abreviaturas Índice Sistemático do Código Penal Índice dos Verbetes Código Penal Decretolei n 2848 de 7 de dezembro de 1940 Súmulas do Supremo Tribunal Federal Súmulas Vinculantes Súmulas do Superior Tribunal de Justiça NOTA DE AGRADECIMENTOS Os agradecimentos a Thaís de Camargo Rodrigues responsável pela pesquisa jurisprudencial cujo empenho foi decisivo para a conclusão de nosso trabalho ABREVIATURAS AC Apelação Criminal ACv Apelação Civil ADIn Ação Direta de Inconstitucionalidade Ag Agravo AI Agravo de Instrumento Ajuris Revista da Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul AMJ Revista Arquivos do Ministério da Justiça Ap Apelação AR Agravo Regimental Art artigo BMJ Boletim Mensal de Jurisprudência do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo Bol AASP Boletim da Associação dos Advogados de São Paulo Bol IBCCrim Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais Bol TJSP Boletim de Jurisprudência da Biblioteca do Tribunal de Justiça de São Paulo CC Código Civil CComp Conflito de Competência cc combinado com CCom Código Comercial CE Código Eleitoral CF Constituição Federal cf conferir CFl Código Florestal cit citadoa CJ Ciência Jurídica CJ Conflito de Jurisdição CLT Consolidação das Leis do Trabalho COC Centro de Observação Criminológica CParc Correição Parcial CP Código Penal CPC Código de Processo Civil CPI Código de Propriedade Industrial CPM Código Penal Militar CPP Código de Processo Penal Crim Criminal CT Carta Testemunhável CTN Código Tributário Nacional Dec Decreto Den Denúncia Des Desembargador DJU Diário da Justiça da União DOU Diário Oficial da União DP Direito Penal ECA Estatuto da Criança e do Adolescente ED Embargos Declaratórios EI Embargos Infringentes EJR Ementário de Jurisprudência Recente do Tribunal de Justiça de São Paulo EJTJRJ Ementário de Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro EOAB Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil ESD Enciclopédia Saraiva do Direito EV Exceção da Verdade Ex Incomp Exceção de Incompetência Extr Extradição FCP Fascículos de Ciências Penais HC Habeas Corpus HSE Homologação de Sentença Estrangeira IBCCrim Instituto Brasileiro de Ciências Criminais Inq Inquérito Policial IOB Repertório IOB de Jurisprudência IP Inquérito Policial j julgado em JC Jurisprudência Catarinense JEC Juizados Especiais Criminais JM Jurisprudência Mineira JSTF Lex Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal JSTJ Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça JTACrimSP Julgados do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo Jurispenal Revista de Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal Justitia Revista da ProcuradoriaGeral de Justiça do Estado de São Paulo e Associação Paulista do Ministério Público JUTARS Julgados do Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul LCH Lei de Crimes Hediondos LCP Lei das Contravenções Penais LEP Lei de Execução Penal LF Lei de Falências LICP Lei de Introdução ao Código Penal LICPP Lei de Introdução ao Código de Processo Penal LINDB Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro LOMN Lei Orgânica da Magistratura Nacional LONMP Lei Orgânica Nacional do Ministério Público MI Mandado de Injunção Min Ministro MP Ministério Público MS Mandado de Segurança m v maioria de votos n número OAB Ordem dos Advogados do Brasil ob obra op opúsculo p página PC Processo Criminal PE Parte Especial Pet Petição PExtr Pedido de Extradição PG Parte Geral PI Petição Inicial PJ Paraná Judiciário Proc Comp Orig Procedimento de Competência Originária QC QueixaCrime RA Recurso de Agravo RBCCrim Revista Brasileira de Ciências Criminais RBCDP Revista Brasileira de Criminologia e Direito Penal RC Reclamação RDA Revista de Direito Administrativo RDP Revista de Direito Público RDPenal Revista de Direito Penal RE Recurso Extraordinário Rec Recurso Recl Reclamação REDB Repertório Enciclopédico do Direito Brasileiro Rel Relator REO Recurso Ex Officio RES Recurso em Sentido Estrito Res Resolução REsp Recurso Especial Rev Revisão Criminal RF Revista Forense RHC Recurso de Habeas Corpus RIL Revista de Informação Legislativa RISTF Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal RJ Revista Jurídica RJDTACrim Revista de Jurisprudência e Doutrina do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo RJTAMG Revista de Julgados do Tribunal de Alçada de Minas Gerais RJTJ Revista de Jurisprudência do Tribunal de Justiça RJTJRJ Revista de Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro RJTJRS Revista de Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul RJTJSP Revista de Jurisprudência do Tribunal de Justiça de São Paulo RMPRS Revista do Ministério Público do Rio Grande do Sul RMS Revogação de Medida de Segurança RO Recurso de Ofício ROAB Revista da Ordem dos Advogados do Brasil RSTJ Revista do Superior Tribunal de Justiça RT Revista dos Tribunais RTJ Revista Trimestral de Jurisprudência RTJE Revista Trimestral de Jurisprudência dos Estados RTJRJ Revista do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro S Súmula s seguintes s d sem data STF Supremo Tribunal Federal STJ Superior Tribunal de Justiça TA Tribunal de Alçada TACrim Tribunal de Alçada Criminal TACrimSP Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo TAMG Tribunal de Alçada de Minas Gerais TAPR Tribunal de Alçada do Paraná TARJ Tribunal de Alçada do Rio de Janeiro TARS Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul TFR Tribunal Federal de Recursos TJMG Tribunal de Justiça de Minas Gerais TJPR Tribunal de Justiça do Paraná TJRJ Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro TJRS Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul TJSC Tribunal de Justiça de Santa Catarina TJSP Tribunal de Justiça de São Paulo TJ Tribunal de Justiça TP Tribunal Pleno TRF Tribunal Regional Federal VCP Verificação de Cessação de Periculosidade vol volume v v voto vencido ÍNDICE SISTEMÁTICO DO CÓDIGO PENAL DECRETOLEI N 2848 DE 7121940 PARTE GERAL Título I DA APLICAÇÃO DA LEI PENAL Arts 1º a 12 Título II DO CRIME Arts 13 a 25 Título III DA IMPUTABILIDADE PENAL Arts 26 a 28 Título IV DO CONCURSO DE PESSOAS Arts 29 a 31 Título V DAS PENAS Capítulo I Das espécies de pena arts 32 a 52 Seção I Das penas privativas de liberdade arts 33 a 42 Seção II Das penas restritivas de direitos arts 43 a 48 Seção III Da pena de multa arts 49 a 52 Capítulo II Da cominação das penas arts 53 a 58 Capítulo III Da aplicação da pena arts 59 a 76 Capítulo IV Da suspensão condicional da pena arts 77 a 82 Capítulo V Do livramento condicional arts 83 a 90 Capítulo VI Dos efeitos da condenação arts 91 e 92 Capítulo VII Da reabilitação arts 93 a 95 Título VI DAS MEDIDAS DE SEGURANÇA Arts 96 a 99 Título VII DA AÇÃO PENAL Arts 100 a 106 Título VIII DA EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE Arts 107 a 120 PARTE ESPECIAL Título I DOS CRIMES CONTRA A PESSOA Capítulo I Dos crimes contra a vida arts 121 a 128 Capítulo II Das lesões corporais art 129 Capítulo III Da periclitação da vida e da saúde arts 130 a 136 Capítulo IV Da rixa art 137 Capítulo V Dos crimes contra a honra arts 138 a 145 Capítulo VI Dos crimes contra a liberdade individual arts 146 a 154 Seção I Dos crimes contra a liberdade pessoal arts 146 a 149 Seção II Dos crimes contra a inviolabilidade do domicílio art 150 Seção III Dos crimes contra a inviolabilidade de correspondência arts 151 e 152 Seção IV Dos crimes contra a inviolabilidade dos segredos arts 153 e 154 Título II DOS CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO Capítulo I Do furto arts 155 e 156 Capítulo II Do roubo e da extorsão arts 157 a 160 Capítulo III Da usurpação arts 161 e 162 Capítulo IV Do dano arts 163 a 167 Capítulo V Da apropriação indébita arts 168 a 170 Capítulo VI Do estelionato e outras fraudes arts 171 a 179 Capítulo VII Da receptação art 180 Capítulo VIII Disposições gerais arts 181 a 183 Título III DOS CRIMES CONTRA A PROPRIEDADE IMATERIAL Capítulo I Dos crimes contra a propriedade intelectual arts 184 a 186 Capítulo II Dos crimes contra o privilégio de invenção arts 187 a 191 Capítulo III Dos crimes contra as marcas de indústria e comércio arts 192 a 195 Capítulo IV Dos crimes de concorrência desleal art 196 Título IV DOS CRIMES CONTRA A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO Arts 197 a 207 Título V DOS CRIMES CONTRA O SENTIMENTO RELIGIOSO E CONTRA O RESPEITO AOS MORTOS Capítulo I Dos crimes contra o sentimento religioso art 208 Capítulo II Dos crimes contra o respeito aos mortos arts 209 a 212 Título VI DOS CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL Capítulo I Dos crimes contra a liberdade sexual arts 213 a 216A Capítulo II Dos crimes sexuais contra vulnerável arts 217 e 218B Capítulo III Do rapto arts 219 a 222 Capítulo IV Disposições gerais arts 223 a 226 Capítulo V Do lenocínio e do tráfico de pessoa para fim de prostituição ou outra forma de exploração sexual arts 227 a 232 Capítulo VI Do ultraje público ao pudor arts 233 e 234 Capítulo VII Disposições gerais arts 234A a 234C Título VII DOS CRIMES CONTRA A FAMÍLIA Capítulo I Dos crimes contra o casamento arts 235 a 240 Capítulo II Dos crimes contra o estado de filiação arts 241 a 243 Capítulo III Dos crimes contra a assistência familiar arts 244 a 247 Capítulo IV Dos crimes contra o pátrio poder tutela ou curatela arts 248 e 249 Título VIII DOS CRIMES CONTRA A INCOLUMIDADE PÚBLICA Capítulo I Dos crimes de perigo comum arts 250 a 259 Capítulo II Dos crimes contra a segurança dos meios de comunicação e transporte e outros serviços públicos arts 260 a 266 Capítulo III Dos crimes contra a saúde pública arts 267 a 285 Título IX DOS CRIMES CONTRA A PAZ PÚBLICA Arts 286 a 288 Título X DOS CRIMES CONTRA A FÉ PÚBLICA Capítulo I Da moeda falsa arts 289 a 292 Capítulo II Da falsidade de títulos e outros papéis públicos arts 293 a 295 Capítulo III Da falsidade documental arts 296 a 305 Capítulo IV De outras falsidades arts 306 a 311 Capítulo V Das fraudes em certames de interesse público art 311A Título XI DOS CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA Capítulo I Dos crimes praticados por funcionário público contra a administração em geral arts 312 a 327 Capítulo II Dos crimes praticados por particular contra a administração em geral arts 328 a 337A Capítulo IIA Dos crimes praticados por particular contra a Administração Pública estrangeira arts 337B a 337D Capítulo III Dos crimes contra a administração da Justiça arts 338 a 359 Capítulo IV Dos crimes contra as finanças públicas arts 359A a 359H DISPOSIÇÕES FINAIS arts 360 e 361 ÍNDICE DOS VERBETES PARTE GERAL Título I DA APLICAÇÃO DA LEI PENAL Art 1º Anterioridade da lei 1 Considerações introdutórias 2 Princípio da legalidade ou da reserva legal 21 Competência legislativa corolário da reserva legal 22 Nullum crimen nulla poena sine lege 3 Princípio da irretroatividade da lei penal 31 Origem do princípio da irretroatividade 32 Retroatividade da lei mais benigna 4 Princípio da intervenção mínima 41 Fundamento político da ultima ratio 42 Deturpação da função do Direito Penal 43 Criminalização e penalização políticas populistas 5 Princípio da fragmentariedade 51 Seletividade em razão da importância do bem jurídico 52 Aspectos da fragmentariedade do Direito Penal 6 Princípio de culpabilidade 61 Culpabilidade como fundamento da pena 62 Culpabilidade como elemento da determinação ou medição da pena 63 Culpabilidade como conceito contrário à responsabilidade objetiva 64 Consequências do princípio de culpabilidade 7 Princípio de humanidade 71 Função do Direito Penal Justiça distributiva 72 Proscrição da pena de morte e da prisão perpétua 8 Princípio da adequação social 81 Função seletiva do tipo penal 82 Tipicidade desvalor da ação e desvalor do resultado 83 Consequências da adequação social imprecisão inicial 84 Nosso entendimento princípio geral de interpretação 9 Princípio de insignificância 91 Princípio da insignificância grau de intensidade da ofensa 92 Consequência da insignificância afasta a tipicidade Art 2º Lei penal no tempo Art 3º Lei excepcional ou temporária 1 Eficácia da lei penal no tempo 2 Irretroatividade da lei penal 3 Retroatividade da lei mais benigna 31 Abolitio criminis 311 Abolitio criminis abrangência 32 Novatio legis incriminadora 33 Novatio legis in pejus 34 Novatio legis in mellius 4 Crimes permanentes e continuados 5 Lei intermediária dupla extraatividade 6 Conjugação de leis aspectos mais favoráveis 7 Leis excepcionais e temporárias 71 Tipicidade elemento temporal 8 Retroatividade e leis penais em branco 81 Normas penais em branco disciplina tradicional 9 Retroatividade e lei processual 91 Lei processual imprópria Art 4º Tempo do crime 1 Teoria da atividade 2 Há algumas exceções à teoria da atividade Art 5º Territorialidade 1 Princípios dominantes 2 Princípio da territorialidade 21 Fundamento do princípio da territorialidade 3 Princípio real de defesa ou de proteção 4 Princípio da nacionalidade ou da personalidade 5 Princípio da universalidade ou cosmopolita 6 Princípio da representação ou da bandeira 7 Princípios adotados pelo Código Penal brasileiro 8 Conceito de território nacional 81 Delimitação do território nacional 82 Lago ou lagoa mesmos critérios 83 Rio indiviso 84 Mar territorial 12 milhas 85 Navios públicos ou privados 86 Tratamento dos navios públicos 87 Tratamento dos navios privados 9 Espaço aéreo 91 Teoria adotada pelo CBA 92 Aeronaves públicas e privadas Art 6º Lugar do crime 1 Dificuldades para apurar o lugar do crime 2 Teoria da ação ou da atividade 3 Teoria do resultado ou do evento 4 Teoria da intenção 5 Teoria do efeito intermédio ou do efeito mais próximo 6 Teoria da ação a distância ou da longa mão 7 Teoria limitada da ubiquidade 8 Teoria pura da ubiquidade mista ou unitária 81 Solução dos conflitos negativos 82 Duplicidade de julgamentos 83 Lacuna parte do resultado Art 7º Extraterritorialidade 1 Extraterritorialidade 11 Extraterritorialidade incondicionada 12 O injustificável e odioso bis in idem 13 Provimento jurisdicional ignorado 14 Extraterritorialidade condicionada 15 Cooperação penal internacional 16 Crimes praticados por brasileiros no exterior 17 Aeronaves e embarcações mercantes 18 Praticado por estrangeiro contra brasileiro 19 Condições para aplicação da lei brasileira 2 Lei penal em relação às pessoas 21 Imunidade diplomática 211 Natureza jurídica causa pessoal de exclusão de pena 212 Extensão da imunidade todos os agentes diplomáticos e familiares 213 Exclusão agentes consulares 22 Imunidade parlamentar 221 Espécies de imunidades parlamentares 222 Imunidade do parlamentar estadual 223 Imunidade do vereador 3 Da imunidade parlamentar a partir da EC n 352001 31 Inviolabilidade civil criação pretoriana 311 Ampliação da inviolabilidade âmbito administrativo 32 Nexo funcional pressuposto básico 33 Âmbito espacial exclusão do licenciado 34 A imunidade processual e prisional 4 Sustação de processo em andamento 41 Imunidade prisional 5 Extradição 51 Conceito de extradição 52 Espécies de extradição 53 Princípios da extradição 54 Condições para a extradição 55 Limitações à extradição 56 Requisitos para a concessão de extradição 57 Cláusulas limitadoras da extradição 58 Vinculação ao fato motivador da extradição 59 Pressupostos ou requisitos negativos da extradição 6 Procedimento do processo de extradição 61 Limitação da defesa do extraditando 62 Obrigatoriedade da extradição 7 Deportação e expulsão 71 Causas que levam à expulsão 72 Outros fundamentos para a expulsão 73 Natureza jurídica da expulsão Art 8º Pena cumprida no estrangeiro Art 9º Eficácia de sentença estrangeira 1 Limites dos efeitos de sentença estrangeira 2 Efeitos que dependem de homologação do STJ 3 Efeitos que não dependem de homologação do STJ 4 Competência para a homologação Art 10 Contagem de prazo 1 Prazos do Código Penal 2 Prazos previstos em dois códigos 3 Contagem do prazo da perempção 4 Calendário comum gregoriano Art 11 Frações não computáveis da pena 1 Alteração legislativa 2 Frações das penas temporais 3 Frações das penas pecuniárias Art 12 Legislação especial 1 Aplicação das regras gerais abrangência 2 Regras gerais Parte Geral e Parte Especial Título II DO CRIME Art 13 Relação de causalidade 1º Superveniência de causa independente 2º Relevância da omissão 1 Considerações gerais 2 Crime ação e resultado 3 Ação e resultado nexo causal 4 Teoria da imputação objetiva 41 Fundamento da teoria da imputação objetiva 5 Teoria da equivalência das condições ou conditio sine qua non 51 Conteúdo e definição da teoria da equivalência das condições 52 Desvantagem da teoria da equivalência das condições 53 Necessidade de limitar o alcance da teoria 6 Limitações do alcance da teoria da conditio sine qua non 61 Dolo e culpa na ação limitadores da teoria da equivalência 62 Caso fortuito ou força maior 63 Causas concausas absolutamente independentes 64 Causas relativamente independentes 65 Superveniência de causa relativamente independente 7 Exemplo de causa superveniente que produz por si só o resultado 8 A relevância causal da omissão 81 Crimes omissivos próprios 82 Crimes omissivos impróprios 83 Causalidade jurídica omissão relevante 84 Cadeia causal figura do garantidor 85 Nexo de não impedimento 86 Nexo causal limitase à imputação física Art 14 I Crime consumado II Tentativa Parágrafo único Pena de tentativa 1 Crime consumado 11 Consumação e exaurimento 12 Consumação no crime omissivo 2 Tentativa 3 Iter criminis fases 4 Natureza e tipicidade da tentativa 41 Tipicidade conjugação de normas penais 5 Elementos da tentativa 6 Espécies ou formas de tentativas 61 Tentativa imperfeita 62 Tentativa perfeita 7 Punibilidade da tentativa Art 15 Desistência voluntária e arrependimento eficaz 1 Desistência voluntária 2 Voluntária e espontânea distinção 3 Arrependimento eficaz 31 Necessidade da eficácia do arrependimento 32 Atos já praticados tentativa qualificada 4 Natureza jurídica da desistência voluntária e do arrependimento eficaz Art 16 Arrependimento posterior 1 Natureza jurídica e fundamento 2 Requisitos necessários Art 17 Crime impossível 1 Crime impossível ou tentativa inidônea 11 Punibilidade do crime impossível 2 Crime putativo 3 Crime provocado 31 Flagrante preparado 32 Flagrante provocado 33 Flagrante forjado Art 18 I Crime doloso II Crime culposo 1 Tipo objetivo 11 O autor da ação 12 Ação ou omissão 13 Resultado 14 Nexo causal 2 Tipo subjetivo 3 Elemento subjetivo geral dolo 4 Teorias do dolo 5 Elementos do dolo 6 Dolo direto ou imediato 61 Dolo direto de primeiro grau 62 Dolo direto de segundo grau 7 Dolo eventual 71 Elementos do dolo eventual consciência e vontade 72 Dolo eventual e mera esperança da ocorrência do resultado 73 Dolo direto e dolo eventual distinção 8 Elemento subjetivo especial do tipo 81 Concretização desnecessária 82 Delitos de intenção 83 Delitos de tendência 84 Especiais motivos de agir 85 Momentos especiais de ânimo 9 Tipo de injusto culposo 10 A finalidade no crime culposo 11 A tipicidade no crime culposo 12 Excludente de criminalidade 13 Culpabilidade no crime culposo 131 Inexigibilidade de outra conduta 132 Erro de proibição no crime culposo 14 Elementos do tipo de injusto culposo 141 Inobservância do cuidado objetivo devido 142 Produção de um resultado 143 Relação de causa e efeito 1431 Inevitabilidade do resultado exclui tipicidade 144 Previsibilidade objetiva do resultado 145 Conexão interna entre desvalor da ação e desvalor do resultado 15 Modalidades de culpa 151 Imprudência 152 Negligência 153 Imperícia 1531 Imperícia e erro profissional distinção 16 Espécies de culpa 161 Culpa consciente 162 Culpa inconsciente 163 Culpa imprópria 17 Dolo eventual e culpa consciente 171 Distinção entre dolo eventual e culpa consciente 172 Teorias diferenciadoras dolo eventual e culpa consciente 18 Concorrência e compensação de culpas 181 Concorrência de culpas 182 Não há compensação de culpas 183 Excepcionalidade do crime culposo 19 Crime preterdoloso e crime qualificado pelo resultado 191 Crime preterdoloso ou preterintencional 192 Crime preterdoloso e crime qualificado pelo resultado Art 19 Agravação pelo resultado 1 Agravação pelo resultado 2 Requisitos necessários 3 Limites e extensão do arrependimento posterior 4 Exclusão das qualificadoras majorantes e agravantes Art 20 Erro sobre elementos do tipo 1º Descriminantes putativas 2º Erro determinado por terceiro 3º Erro sobre a pessoa Art 21 Erro sobre a ilicitude do fato 1 Erro de tipo e erro de proibição 2 Ausência de conhecimento da ilicitude e ignorância da lei 3 Ignorância da antijuridicidade e ignorância da lei distinção 4 Teoria dos elementos negativos do tipo 41 Conteúdo da teoria dos elementos negativos 5 Erro de tipo e erro de proibição 51 Erro de tipo essencial exclusão da tipicidade 52 Erro de tipo no crime de calúnia 53 Erro de tipo e desacato 54 Erro de tipo nos crimes omissivos 55 Erro sobre a relação causal 6 Erro de proibição 61 Erro de proibição exclusão da culpabilidade 62 Jurisprudência alemã sentença de 1831952 63 Erro de proibição em crimes culposos 7 Elementos normativos especiais da ilicitude 71 Erro sobre elementos normativos especiais da ilicitude 72 Revelação de segredo profissional erro de tipo 73 Revelação de segredo profissional erro de proibição 8 Erro de tipo permissivo erro eclético 81 Erro de tipo permissivo não afasta o dolo 82 Erro de tipo permissivo e erro de permissão diferença 83 Erro no estado de necessidade sobre a evitabilidade 84 Erro de tipo permissivo solução do CP 85 Erro de tipo permissivo um erro suigeneris 86 Erro de tipo permissivo consequência 87 Erro de tipo permissivo afasta a culpabilidade 88 Erro sui generis misto de erro de tipo e erro de proibição 9 Erro culposo não se confunde com crime culposo 91 Erro culposo e crime culposo distinção 92 Escusabilidade ou inescusabilidade da culpa no erro 93 Erro culposo e crime doloso 10 Erro de tipo incriminador e erro de tipo permissivo 11 Modalidades de erro sobre a ilicitude 111 Erro de proibição direto 112 Erro mandamental 113 Erro de proibição indireto 12 Erro sobre excludentes de culpabilidade Art 22 Coação irresistível e obediência hierárquica 1 Inexigibilidade de comportamento diverso previsão expressa 2 Coação irresistível 3 Coação física irresistível não há ação 4 Coação moral existe ação 5 Irresistibilidade da coação 6 Ameaças vagas e imprecisas 7 Iminência do mal ameaçado 8 Ameaça de mal a terceiro possibilidade 9 Irresistibilidade da coação afasta concurso de pessoas 10 Coação resistível diminuição da reprovabilidade 11 Punibilidade do coator sempre 12 Obediência hierárquica relação de direito público 121 Ordem não manifestamente ilegal 122 Cumprir ordem ilegal exclui culpabilidade 123 Cumprimento de ordem legal não há ilicitude 124 Ordem manifestamente ilegal ambos respondem 125 Funcionário civil conveniência e oportunidade 13 A obediência hierárquica no Código Penal Militar 131 Ordem manifestamente criminosa deve recusarse 132 Ordem manifestamente criminosa e coação irresistível possibilidade 14 Coação irresistível beneficia militar e civil 15 Subordinado se excede na execução ambos respondem Art 23 Exclusão da ilicitude Parágrafo único Excesso punível 1 Excludentes de antijuridicidade ou causas de justificação 2 Elementos objetivos e subjetivos das causas de justificação 21 Animus vingativo afasta a excludente 3 Causas supralegais de justificação 4 Consentimento do ofendido 41 Requisitos do consentimento justificante 5 Excesso nas causas de justificação 51 Pressuposto do excesso nas causas justificantes 52 Excesso doloso crime doloso 53 Excesso culposo tipificação residual 54 Excepcionalidade do crime culposo 55 Excesso uso imoderado ou desnecessário do meio 6 Cumprimento de dever legal e exercício de direito 7 Estrito cumprimento de dever legal 71 Requisitos necessários 72 Limites da permissão a autoridades 73 Resistência a atos de autoridades 74 Destinatários agentes públicos e cidadãos comuns 75 Direito correcional está superado 76 Excesso nas causas de justificação Reforma Penal de 1984 77 Limites do estritamente legal excesso e abuso 78 Estrito cumprimento legal e o excesso compatibilidade 79 Estrito cumprimento de dever legal punição do excesso 710 Estrito cumprimento de dever legal excesso doloso ou culposo 8 Exercício regular de direito 81 Exercício regular de acordo com a lei 82 Intervenções médicas e cirúrgicas 83 Violência esportiva 9 Ofendículos 91 Ofendículos e defesas mecânicas predispostas 92 Natureza jurídica das ofendículas 93 Exercício regular de direito e legítima defesa Art 24 Estado de necessidade 1 Estado de necessidade definição 2 Exemplo dos dois náufragos 3 Postura do Estado política criminal 4 Estado de necessidade e legítima defesa 5 Estado de necessidade direito ou faculdade 6 Estado de necessidade excludente 7 Estado de necessidade justificante e estado de necessidade exculpante 8 Estado de necessidade no direito alemão 9 Estado de necessidade teoria diferenciadora 10 Estado de necessidade exculpante dificuldade 11 Ponderação de bens e culpabilidade diminuída 12 Estado de necessidade e colisão de deveres 121 Dever de agir e dever de omitir preferência 13 Requisitos do estado de necessidade 131 Existência de perigo atual e inevitável 132 Não provocação voluntária do perigo 133 Inevitabilidade do perigo por outro meio 134 Inexigibilidade de sacrifício do bem ameaçado 135 Direito próprio ou alheio 136 Estado de necessidade de terceiro 137 Elemento subjetivo finalidade de salvar o bem do perigo 138 Ausência de dever legal de enfrentar o perigo 14 Causa de diminuição de pena minorante Art 25 Legítima defesa 1 Considerações gerais 2 Fundamento da legítima defesa 3 Natureza jurídica da legítima defesa 4 Requisitos da legítima defesa 41 Agressão injusta atual ou iminente 42 A direito próprio ou alheio 43 Meios necessários usados moderadamente 44 Elemento subjetivo animus defendendi 5 Legítima defesa real ou própria 6 Legítima defesa putativa hipótese de erro arts 20 1º e 21 do CP 61 Consequência do erro afeta a culpabilidade 7 Legítima defesa sucessiva possibilidade 8 Legítima defesa recíproca 9 Legítima defesa e estado de necessidade 10 Legítima defesa contra dirimente de culpabilidade 11 Questões especiais Título III DA IMPUTABILIDADE PENAL Art 26 Inimputáveis Parágrafo único Redução de pena Art 27 Menores de dezoito anos 1 Inimputabilidade e culpabilidade diminuída 11 Imputabilidade e responsabilidade 12 Inimputabilidade 121 Menoridade 122 Doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado 13 Culpabilidade diminuída 14 Consequências jurídicopenais Art 28 I Emoção e paixão II Embriaguez 1 Emoção e paixão definição 11 Emoção e paixão diferença 12 Emoção e paixão semelhança 13 Emoção e paixão tratamento legal 2 Requisitos legais necessários 3 Estados emocionais e doença mental 4 Trauma emocional e surto psicótico 5 Embriaguez completa e acidental 6 Adoção da actio libera in causa 61 Inexistência de relação causal decisão de embriagarse 62 Actio libera in causa natureza da responsabilidade 63 Vontade do ébrio vontade livre política criminal 7 Embriaguez não acidental análise casuística 8 Formas ou modalidades de embriaguez 9 Embriaguez não acidental voluntária ou culposa 91 Actio libera in causa necessidade de previsibilidade 92 Actio libera in causa e imprevisibilidade 93 Postura equivocada dos tribunais brasileiros 10 Embriaguez acidental caso fortuito ou força maior 101 Embriaguez acidental e completa 102 Embriaguez completa e acidental consequência psíquica 103 Embriaguez acidental e medida de segurança 104 Embriaguez acidental inimputabilidade e redução de pena 105 Embriaguez acidental raridade 11 Embriaguez preordenada 12 Embriaguez habitual e patológica 13 Consequências dos diversos tipos de embriaguez 14 Caso fortuito e força maior Título IV DO CONCURSO DE PESSOAS Art 29 1 Concurso eventual de pessoas 2 Terminologia do Código Penal 3 Teorias sobre o concurso de pessoas 31 Pluralística 32 Dualística 33 Monística ou unitária 4 Requisitos do concurso de pessoas 5 Autoria 51 Conceito restritivo de autor 52 Conceito extensivo de autor 53 Teoria do domínio do fato 6 Autoria mediata 61 Autoria mediata e domínio do fato 62 Algumas hipóteses de autoria mediata 63 Pressupostos de punibilidade 7 Coautoria 71 Fundamento da coautoria 72 Inexistência de relação de acessoriedade 8 Participação em sentido estrito 81 Ampliação da punibilidade 82 Natureza secundária da participação 83 Espécies de participação 84 Requisitos da participação em sentido estrito 85 Fundamento da punibilidade da participação 86 Princípio da acessoriedade da participação 87 Provocação de aparente excludente 9 Concurso em crime culposo 91 Doutrina alemã 92 Doutrina espanhola 93 Doutrina brasileira 94 A melhor doutrina espanhola 10 Concurso em crimes omissivos 101 Participação em crime omissivo e participação por omissão 11 Autoria colateral 111 Limites subjetivos da responsabilidade 112 Autoria incerta e autoria desconhecida 12 Multidão delinquente 121 Individualização da conduta 122 Influência de multidão em tumulto atenuante 13 Punibilidade do concurso de pessoas 131 Participação de menor importância 132 Cooperação dolosamente distinta Art 30 Circunstâncias incomunicáveis 1 Comunicabilidade das circunstâncias condições e elementares 2 Circunstâncias objetivas e subjetivas 3 Condições de caráter pessoal 4 Comunicabilidade das elementares 5 Síntese da comunicabilidade e incomunicabilidade 6 Comunicabilidade nos limites da culpabilidade Art 31 Casos de impunibilidade 1 Participação impunível 2 Formas de participação impuníveis 3 Tentativa de participação impunível 4 Se constituir crime em si mesmo Título V DAS PENAS Capítulo I Das espécies de pena Art 32 1 Sanção penal 2 Espécies de pena 3 Princípios da sanção penal 4 Penas proscritas pela Constituição Seção I Das penas privativas de liberdade Art 33 Reclusão e detenção 1 Reclusão e detenção 2 Consequências distintas entre reclusão e detenção 3 Regimes penais ou prisionais 31 Regime disciplinar diferenciado 4 Regime inicial 5 Critérios e regra geral do regime inicial 51 Os critérios do 2º 511 Condenado não reincidente 52 Regime inicial para detenção 521 Reincidente condenado à detenção 53 Regime inicial para reclusão 54 Influência do fator reincidência 55 Condenação anterior à multa 6 Progressão condicionada à reparação de dano 61 Irretroatividade da obrigação de reparar o dano Art 34 Regras do regime fechado 1 Regime fechado 2 Serviço externo e cursos de instrução 3 Exame criminológico no início da execução 4 Regras do regime disciplinar diferenciado 41 Limite de duração do regime disciplinar diferenciado Art 35 Regras do regime semiaberto 1 Regime semiaberto 2 Serviço externo desde o início da pena 3 Exame criminológico no regime semiaberto Art 36 Regras do regime aberto 1 Regime aberto 2 Consentimento do condenado 3 Perda do regime aberto 4 Prisão civil 5 Prisão domiciliar 6 Falta de casa de albergado 7 Progressão e regressão 71 Progressão 72 Progressão para o regime aberto 73 A progressão nos crimes hediondos 731 Progressão no crime de tortura hediondo 732 Crime de tortura aplicação extensiva e retroativa 733 Tratamento desuniforme conserto hermenêutico 734 Exclusão do parecer da CTC e do exame criminológico 74 Regressão 741 Regressão de condenação em regime aberto 742 Necessidade de audiência do condenado 75 Requisitos da progressão 76 STF progressão nos crimes hediondos 77 Dois aspectos fundamentais adotados pelo STF 78 Efeito erga omnes da decisão do STF 79 Eficácia erga omnes e efeito ex nunc 710 Eficácia erga omnes torna inócua declaração do Senado 8 Exame criminológico 81 Fase processual para realização do exame 82 Local de realização do exame criminológico 83 Esvaziamento das funções da CTC e do COC Art 37 Regime especial 1 Regime especial feminino Art 38 Direitos do preso 1 Direitos assegurados ao condenado 2 Direitos e deveres 3 Regime Disciplinar Diferenciado direito penal de autor 31 Hipóteses de aplicação do Regime Disciplinar Diferenciado 311 Absoluta necessidade do Regime Disciplinar Diferenciado 312 O que é subversão da ordem ou disciplina internas 313 Sanção degradante e desumana Art 39 Trabalho do preso 1 Trabalho prisional 2 Destino da remuneração obtida 3 Previdência social 4 Presos políticos e provisórios 5 Remição pelo trabalho 51 Remição pelo estudo Lei n 124332011 52 A remição abrange regime aberto e liberdade condicional 53 Conclusão do ensino fundamental majoração do tempo remido 54 Disciplina e abrangência da remição pelo estudo 55 Comunicação do tempo remido anualidade 56 Natureza da remição tempo de pena cumprido 57 Inadmissibilidade da remição sem trabalho efetivo 58 Falta grave pode revogar a remição de até um terço 13 da remição 59 Prescrição da perda dos dias remidos Art 40 Legislação especial Art 41 Superveniência de doença mental 1 Contagem de tempo 2 Duração dessa medida de segurança Art 42 Detração 1 Detração penal 2 Podem ser objeto de detração 3 Detração e penas restritivas de direitos 4 Detração e nexo processual Seção II Das penas restritivas de direitos Art 43 Penas restritivas de direitos 1 Penas restritivas de direitos 2 Classificação e espécies 21 Modalidades e definições 3 Fase processual da substituição 4 Caráter substitutivo 41 Penas alternativas ou restritivas de direitos 42 Exceção à insubstituibilidade dessas penas 5 Penas alternativas na reforma penal de 1984 6 Retroatividade das novas penas 61 Retroatividade e requisitos da substituição 62 Limites da retroatividade 63 Retroatividade e processos nos tribunais 64 Retroatividade e ausência dos requisitos 65 Reincidência dolosa e processo em grau recursal 66 Retroatividade e reincidência específica Art 44 1 Requisitos necessários à substituição 11 Prudência na análise desses requisitos 12 Substituição nos crimes culposos 13 Substituição e aplicação cumulativa 14 Substituição nas penas de até um ano de prisão 15 Substituição nas penas de até seis meses de prisão 2 Obrigatoriedade da substituição 3 Reincidência dolosa inciso II e 3º 31 Relatividade dos efeitos da reincidência 32 Substituição socialmente recomendável 4 Conversão das penas restritivas de direitos 41 Coercibilidade da conversão 42 Limite temporal da conversão 43 Conversão e detração penal 44 Ressalva quantum mínimo de conversão 45 Conversão exclusão das penas pecuniárias 46 Prisão simples impossibilidade de conversão 5 Causas gerais de conversão 51 Nova condenação com pena substituída ou suspensa 52 Causas especiais de conversão 6 Outras questões apresentadas pela Lei n 971498 61 Os crimes hediondos e a Lei n 971498 62 Crimes hediondos e violência ficta 63 Multa substitutiva e outras penas pecuniárias 64 Equívoca previsão da aplicação das penas pecuniárias 65 Penas pecuniárias travestidas de restritivas de direitos 66 Aplicação da Lei n 9714 nos crimes de tóxicos 67 Conflito das Leis n 971498 e 909995 671 Lesão corporal leve dolosa 672 Crimes de ameaça art 147 e constrangimento ilegal art 146 68 Incoerência da política criminal brasileira 69 Gancho para novas exasperações de penas Art 45 Conversão das penas restritivas de direitos 1 Nova redação 2 Nomen iuris equivocado 3 Definições legais 31 Prestação pecuniária 311 Duvidosa constitucionalidade 312 Definição falaciosa da prestação pecuniária 313 Destinatários da prestação pecuniária 314 Exclusão dos sucessores 315 Limites da prestação pecuniária 316 Limitação da compensação condenação em ação reparatória 317 Extensão da compensação às conciliações cíveis 318 A prestação pecuniária e a Lei n 909995 32 Prestação de outra natureza inominada art 45 2º 321 Prestação de outra natureza exclusão das penas pecuniárias 322 Pena inominada constitucionalidade duvidosa 323 Natureza consensual dessa conversão 324 Quem é o beneficiário art 45 2º 325 Competência para aplicação da pena inominada 326 Conversão somente da prestação pecuniária fundamento 33 Perda de bens e valores 331 Confisco de bens e valores 332 Perda de valores inconstitucionalidade 333 Destinação e objeto do confisco 334 Distinção entre confiscopena e confiscoefeito da condenação 335 Limites do confisco 336 Ressalva legislação especial com destinação diversa 337 Inconversibilidade das sanções pecuniárias em pena de prisão 338 Recolhimento domiciliar vetado 4 Descumprimento injustificado e a Lei n 909995 conversão Art 46 Prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas 1 Prestação de serviços à comunidade 2 Respeito às aptidões pessoais do condenado 3 Locais de cumprimento desta pena 4 Horários de cumprimento 5 Início e horário de cumprimento 51 Novo parâmetro de conversão uma hora de tarefa por dia de condenação 52 Cumprimento em menor tempo 4º 53 Cumprimento superior a oito horas semanais 54 Injustiça da limitação do cumprimento antecipado 55 Exclusão das outras penas restritivas 56 Para pena superior a seis meses limitação equivocada 57 Pena superior a seis meses e a Lei n 909995 58 Novidade ou a entidades públicas 6 Finalidades da sanção penal 7 Características do trabalho comunitário 8 Juízo competente 9 Ausência de casa de albergado 91 Ausência de casa de albergado inconveniência do sursis Art 47 Interdição temporária de direitos 1 Interdição temporária de direitos 2 Efeito pedagógico das interdições 3 Prevenção especial 4 Distinção referente aos efeitos da condenação 5 Espécies de interdições 51 Relação do crime com a atividade exercida 52 Crime praticado por funcionário público 6 Início da execução da pena 7 Efeitos administrativos da interdição 8 Interdição de mandato eletivo 9 Suspensão da habilitação de motorista 91 Fundamento políticocriminal 92 Uso de veículo na prática de crime doloso 93 Infrator habilitado na data do crime Art 48 Limitação de fim de semana 1 Limitação de fim de semana 2 Finalidades da prisão descontínua 3 Início e horário da execução 4 Local de cumprimento 5 Descaso oficial com as penas alternativas 6 Inaplicabilidade da limitação de fim de semana 7 Novas penas alternativas 8 Ausência de casa de albergado 81 Inadmissibilidade de conversão em prisão domiciliar 9 Juízo competente 10 Penas restritivas como incidente de execução 101 Quem pode beneficiarse dessa conversão 102 Requisitos para essa conversão 11 Consentimento do condenado Seção III Da pena de multa Art 49 Multa 1 Pena de multa 2 Cominação da pena de multa 3 Características da multa penal 4 Caráter personalíssimo da pena de multa 5 O sistema diasmulta 6 Limites da pena de multa 7 Situação econômica e gravidade da infração 8 Cálculo da pena de multa 81 Fundamentação obrigatória 9 Multa substitutiva 91 Compulsoriedade da substituição 92 A multa substitutiva nas leis especiais 93 Jurisprudência sobre a multa substitutiva 10 Aplicação na legislação extravagante 101 Inaplicabilidade em determinadas leis 11 Abrangência do sistema diasmulta Art 50 Pagamento da multa 1 Prazo para o pagamento da multa 2 Pagamento voluntário e pagamento compulsório 3 Formas de pagamento da multa 4 Prazo para pedir parcelamento 41 Revogação do parcelamento da multa 5 Hipóteses de desconto da multa em folha 51 Limite permitido de desconto em folha 52 Responsabilidade do empregador Art 51 Conversão da multa e revogação 1 Dívida de valor 2 Dívida ativa não tributária 3 Impossibilidade de conversão da multa 4 Competência para a execução da pena de multa 41 Dívida de valor e natureza criminal da multa penal 42 Multa penal herdeiros e sucessores 43 Fundo Penitenciário Nacional 44 Fazenda Pública destinação inconstitucional 45 Competência concorrente União e Estado 46 Destinação do produto da multa criminal 47 Malversação de verbas públicas 48 Competência União ou Estado 49 Inscrição em dívida ativa impossibilidade jurídica 410 Atribuição para inscrever em dívida ativa 5 Prescrição da multa e causas modificadoras 51 A inevitável prescrição durante a execução 6 Finalidades da citação prevista no art 164 da LEP 7 Atualização monetária da pena de multa 8 Dosagem da multa na tentativa Art 52 Suspensão da execução da multa 1 Efeito de doença mental 2 Duração da suspensão por doença mental Capítulo II Da cominação das penas Art 53 Penas privativas de liberdade Art 54 Penas restritivas de direitos 1 Novo sistema de cominação 2 Penas autônomas e substitutivas 3 Momento de aplicação Art 55 1 Limite de duração das penas restritivas de direitos 2 Cumprimento em menor tempo Art 56 1 Aplicação obrigatória das penas de interdição 2 Pressupostos necessários 3 Execução das interdições 4 Inobservância da interdição Art 57 1 Suspensão da habilitação de motorista 2 Confronto com efeitos da condenação 3 Inobservância da interdição Art 58 Pena de multa 1 Limites equivocados da multa 2 Cominação da multa substitutiva 3 Cominação abstrata da multa Capítulo III Da aplicação da pena Art 59 Fixação da pena 1 Individualização da pena 2 Finalidade da pena 3 Circunstâncias e elementares do crime 31 Distinção entre elementar e circunstância 4 Circunstâncias judiciais 41 Culpabilidade 42 Antecedentes 43 Conduta social 44 Personalidade 45 Os motivos do crime 46 As circunstâncias 47 As consequências do crime 48 Comportamento da vítima 5 Inadmissível non bis in idem 6 Circunstâncias judiciais nos denominados crimes societários 7 Pena aquém do mínimo impossibilidade interpretação equivocada 8 Pena aquém do mínimo uma garantia constitucional 9 Aplicação obrigatória do art 65 direito subjetivo 10 Súmula 231 do STJ carência de fundamento jurídico 11 Limites temporais dos efeitos dos maus antecedentes Art 60 1º Critérios especiais da pena de multa 2º Multa substitutiva 1 Critérios especiais da pena de multa 2 Multa substitutiva e triplicação da pena 3 Cumulação de penas de multa 4 Substituição em tentativa Limite da redução 5 Conversão da pena de multa não paga 6 Prescrição da pena de multa 7 Da pretensão punitiva e da pretensão executória 8 Causas suspensivas e interruptivas da prescrição Art 61 Circunstâncias agravantes 1 Agravantes genéricas 2 Limite do agravamento 3 Aplicação das agravantes nos crimes culposos 4 Elenco das agravantes Art 62 Agravantes no caso de concurso de pessoas Art 63 Reincidência 1 Reincidência 2 Contravenção anterior 3 Primário e reincidente 4 Reincidência e condenação à multa Art 64 1 Temporariedade dos efeitos da reincidência 2 Cômputo do livramento condicional e do sursis Art 65 Circunstâncias atenuantes 1 Atenuantes genéricas 2 Limite do agravamento 3 Elenco das atenuantes Art 66 1 Circunstâncias inominadas 2 Atenuantes incompletas 3 Omissão legislativa Art 67 Concurso de circunstâncias agravantes e atenuantes 1 Circunstâncias preponderantes no concurso de agravantes e atenuantes 2 Motivos preponderantes Art 68 Cálculo da pena 1 Dosimetria da pena 2 Limites da dosagem de pena 3 Fases do cálculo da pena 4 Penabase 5 Circunstâncias favoráveis 6 Nulidade pela falta de fundamentação 7 Fixação no limite mínimo fundamentação necessária 8 Pena provisória 9 Atenuantes e limite mínimo cominado 10 Crimes com duas qualificadoras 11 Pena definitiva 12 Causas de aumento e de diminuição 13 Distinção entre majorantes e qualificadoras 14 Cálculo em forma de cascata 15 Concurso de majorantesminorantes da Parte Especial 16 Ausência de causas modificadoras da pena 17 Dosimetria no concurso de crimes 18 Fixação do regime inicial 19 Possibilidade de substituição ou suspensão da pena Art 69 Concurso material 1 Concurso de crimes 2 Sistemas de aplicação da pena 3 Sistemas adotados no Brasil 4 Espécies de concurso de crimes 5 Concurso material 6 Extinção da punibilidade 7 Cumprimento das penas 8 Substituição de penas 9 Execução de penas restritivas 10 Individualização das penas Art 70 Concurso formal 1 Concurso formal 11 Concurso formal próprio 12 Concurso formal impróprio 2 Desígnios autônomos 3 Sistemas de aplicação de pena 4 Parâmetro para o aumento de pena 5 Concurso material benéfico 6 Concorrência de concurso formal e crime continuado Art 71 Crime continuado 1 Origem histórica 2 Definição do crime continuado 3 Natureza jurídica do crime continuado 4 Teoria adotada pelo nosso Código 5 Teorias do crime continuado 6 Requisitos do crime continuado 7 Avaliação das circunstâncias objetivas 8 Valoração criteriosa das circunstâncias 9 Crime continuado específico 10 Requisitos do crime continuado específico 11 Crime continuado contra bens pessoais 12 Reiteração criminosa 13 Crimes consumados e tentados Art 72 Multas no concurso de crimes 1 A multa no concurso de crimes 2 Multa substitutiva 3 Crime continuado Art 73 Erro na execução 1 Aberratio ictus 2 Erro com resultado único 3 Erro com resultado duplo 4 Erro na execução com dolo eventual 5 Qualidades da vítima Art 74 Resultado diverso do pretendido 1 Aberratio delicti 2 Ocorrência de resultado duplo Art 75 Limite das penas 1 Limite de cumprimento da pena de prisão 2 Unificação de penas superiores a 30 anos 3 Exclusão dos benefícios penitenciários 4 Unificação por fato posterior 5 Sugestão de Basileu Garcia Art 76 Concurso de infrações 1 Concurso de penas 2 Cumulação de penas de multa 3 Cumulação de penas Súmula 171 do STJ 4 Jurisprudência questionável 5 Súmula derrogada 6 Limites dos efeitos da unificação de penas Capítulo IV Da suspensão condicional da pena Art 77 Requisitos da suspensão da pena 1 Suspensão condicional da pena 2 Natureza jurídica 3 Penas passíveis de receberem sursis 4 Revelia e sursis 5 Requisitos necessários 51 A condenação no estrangeiro 52 Condenação anterior à pena de multa 53 Condenação há mais de cinco anos 54 Sursis e penas restritivas 541 Incompatibilidade do inciso III do art 77 542 Limites do Sursis e limites das penas restritivas 543 Esvaziamento do regime aberto 544 Desarmonia no sistema penal e omissão legislativa 55 Dois Sursis simultâneos 56 Sursis sucessivo 57 Perdão judicial e Sursis 58 Valoração das circunstâncias favoráveis 59 Necessidade de fundamentação 6 Espécies de suspensão condicional 7 Requisitos do Sursis etário 71 Setenta anos na data da condenação 72 Razões de saúde que justifiquem a suspensão 8 Requisitos do Sursis especial Art 78 1 Condições legais do Sursis simples 2 Condições do Sursis etário 3 Condições do Sursis especial 4 Aplicação cumulativa Art 79 1 Condições judiciais 2 Natureza e conteúdo das condições 3 Fiscalização do cumprimento das condições Art 80 Art 81 Revogação obrigatória 1º Revogação facultativa 2º e 3º Prorrogação do período de prova 1 Causas de revogação obrigatória 11 Efeito contraditório de condenação 12 Nova condenação durante a fase recursal 13 A condenação à pena pecuniária 14 Nova condenação no estrangeiro 2 Revogação facultativa 1º 21 Alternativa à prorrogação facultativa 22 Causas de revogação facultativa 23 Como unificar Sursis com nova condenação 3 O período de prova 31 Limites do período de prova 32 Prorrogação facultativa 33 Prorrogação obrigatória e automática 34 Efeitos da prorrogação automática 35 Nova condenação com prazo prorrogado Art 82 Cumprimento das condições 1 Extinção da pena privativa de liberdade 2 Descoberta tardia de causas impeditivas do Sursis 3 Ônus da recusa do Sursis 4 Início do cumprimento do Sursis 5 Audiência admonitória Capítulo V Do livramento condicional Art 83 Requisitos do livramento condicional 1 Livramento condicional 11 Condições do livramento condicional 12 Natureza jurídica 13 Duração do livramento condicional 14 Cabimento do livramento condicional 15 Elenco de alternativas à prisão 2 Requisitos necessários 21 Requisitos objetivos 211 Questões diversas 22 Requisitos subjetivos 23 Requisito específico 231 Possibilidade de exame pericial 232 Intolerável restrição à prova Art 84 Soma de penas 1 Soma de penas Art 85 Especificações das condições 1 Condições do livramento condicional 11 Condições de imposição obrigatória 12 Condições de imposição facultativa 13 Possibilidade de modificação da condições 14 Necessidade de aceitação das condições impostas Art 86 Revogação do livramento 1 Causas de revogação do livramento condicional 11 Causas de revogação obrigatória Art 87 Revogação facultativa 1 Causas de revogação facultativa 11 Questões diversas 2 Suspensão do livramento condicional 21 Novo crime e extinção do período de prova 22 Condição judicial de não delinquir Art 88 Efeitos da revogação 1 Efeitos de nova condenação 11 Fundamento político da revogação Arts 89 e 90 Extinção 1 Prorrogação do livramento e extinção da pena 2 Prorrogação do período de prova 3 Crime anterior e extinção do livramento 4 Não prorrogação das condições 5 Marco da extinção da pena Capítulo VI Dos efeitos da condenação Art 91 Efeitos genéricos e específicos 1 Efeitos gerais 2 Finalidade dos efeitos da condenação 3 Efeitos genéricos 4 Independência das jurisdições 5 Transmitese até os limites da herança 6 Limites subjetivos da coisa julgada 61 Legitimidade do Ministério Público 7 Extinção da punibilidade e reparação do dano 71 Prescrição da pretensão punitiva 72 Absolvição criminal e ação reparatória 8 Confisco e contravenção penal 81 Confisco de objetos lícitos 82 Finalidade do confisco 83 Confisco prescrição e Sursis 84 Confisco lesado e terceiro de boafé Art 92 1 Efeitos específicos 11 Crime contra a Administração Pública I a 111 Requisitos necessários I a 112 Correlação entre crime e atividade exercida 113 Reabilitação e reintegração na situação anterior 114 Crimes comuns condenação superior a quatro anos 115 Irretroatividade da nova previsão 12 Incapacidade para o exercício de pátrio poder tutela ou curatela II 121 Incapacidade presumida 122 Requisitos necessários à inaptidão 123 Crimes contra a assistência familiar 124 Incapacidade e reabilitação 13 Inabilitação para dirigir veículo utilizado em crime doloso III 131 Penas acessórias em crimes falimentares 132 Efeitos da condenação nos crimes falimentares Capítulo VII Da reabilitação Art 93 Reabilitação 1 Efeitos práticos do instituto 2 Definição doutrinária 3 Reiteração do pedido Art 94 1 Requisitos necessários 2 Reabilitação de reincidente 3 Domicílio no País exigência de duvidosa constitucionalidade 4 Atualização monetária da reparação 5 Reparação do dano nos crimes de sedução 6 Crimes sem dano a reparar 7 Finalidades da reabilitação 8 Efeitos da reabilitação 81 Efeitos inócuos da reabilitação 9 Fontes do sigilo dos registros criminais Art 95 1 Revogação da reabilitação 11 Requisitos para a revogação 12 Consequências da revogação 2 Competência para conhecer do pedido 3 Recurso cabível Título VI DAS MEDIDAS DE SEGURANÇA Art 96 Espécies de medidas de segurança 1 Abandono do duplo binário 2 Fundamentos da pena e da medida de segurança 3 Sistema vicariante 4 Aplicação ao semiimputável 5 Diferenças entre pena e medida de segurança 6 Princípio da legalidade 7 Aplicabilidade dos princípios limitadores do poder punitivo 8 Pressupostos para aplicação de medida de segurança 81 Prática de fato típico punível 82 Periculosidade do agente 821 Tipos de periculosidade 83 Ausência de imputabilidade plena 9 Imputabilidade e inimputabilidade 10 Espécies de medidas de segurança 11 Tratamento ambulatorial possibilidade 12 Alternativas para o semiimputável 13 Tipos de estabelecimentos 131 Locais de tratamento 14 Prescrição e extinção da punibilidade 141 Peculiaridades da prescrição nas medidas de segurança 142 Prescrição e semiimputabilidade 15 Impossibilidade de aplicação direta de medida de segurança ao semiimputável 16 Limite da medida de segurança 17 Prescrição e medidas de segurança Art 97 Imposição da medida de segurança para inimputável 1º Prazo 2º Perícia médica 3º e 4º Desinternação ou liberação condicional 1 Natureza da pena versus natureza da medida de segurança 2 Conversibilidade do tratamento ambulatorial em internação 3 Prazo de duração da medida de segurança 4 Execução suspensão e extinção da medida de segurança 41 Término da medida de segurança 42 Persistência de periculosidade 43 Suspensão condicional da medida de segurança Art 98 Substituição da pena por medida de segurança para o semiimputável 1 Substituição da pena por medida de segurança 11 Hipótese de substituição de pena por medida de segurança 12 Para semiimputável somente medida de segurança substitutiva 2 Superveniência de doença mental do condenado 3 Duração da medida de segurança substitutiva 4 Verificação da cessação da periculosidade 41 Repetição do exame ex officio 42 Exame requerido pelo Ministério Público 5 Contratação de médico particular 6 Assistente técnico na verificação da cessação de periculosidade Art 99 Direitos do internado Título VII DA AÇÃO PENAL Art 100 Ação pública e de iniciativa privada 1 Ação penal 2 Limitação do poder punitivo estatal 3 Espécies de ação penal 4 Ação penal pública 41 Ação pública incondicionada 42 Ação pública condicionada 5 Conflito de interesses públicos e particulares 6 Requisição do Ministro da Justiça juízo político 7 Vigência do art 141 I do CP 8 Ação penal privada 81 Exclusivamente privada e subsidiária da pública 811 Decadência na ação privada subsidiária 82 Ação privada personalíssima 9 Ação penal na Lei n 909995 10 Sucessão do direito de queixa Art 101 A ação penal no crime complexo 1 Crime complexo 11 Crime complexo nos crimes contra os costumes 12 Crime complexo e concurso de crimes 13 Violência presumida Art 102 Irretratabilidade da representação 1 Representação criminal 11 Informalidade da representação 12 Irretratabilidade da representação 13 Retratação da retratação 2 Requisição do Ministro da Justiça Art 103 Decadência do direito de queixa ou de representação 1 Decadência 11 Natureza do prazo decadencial 12 Lapso de duração do prazo decadencial 13 Prazo decadencial na Lei n 909995 14 Intimação da vítima somente para fatos anteriores 2 Crimes contra a propriedade imaterial 3 Dupla titularidade do direito de ação Art 104 Renúncia expressa ou tácita do direito de queixa 1 Renúncia 11 Fase processual para a renúncia 12 Modalidades de renúncia 2 Perdão e perempção 3 Omissão da queixa e indivisibilidade da ação penal 4 Extensão da renúncia 5 A renúncia nos Juizados Especiais Criminais 51 Reparação do dano e renúncia 52 Ausência de conflito de normas Art 105 Perdão do ofendido 1 Perdão do ofendido 2 Formalidade do perdão Art 106 1 Perdão expresso ou tácito 2 Limites do perdão 3 Vários querelantes 4 Bilateralidade do perdão 5 Incondicionalidade do perdão 6 Limites temporais do perdão e da renúncia 7 Perdão e a coisa julgada 8 Distinções entre perdão e renúncia Título VIII DA EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE Art 107 Extinção da punibilidade 1 A punibilidade e sua extinção 2 Causas extintivas da punibilidade 3 Morte do agente I 31 Morte do agente e dano ex delicto 32 Falsa morte do agente 4 Anistia graça e indulto II 41 Comutação de penas 42 Exclusão constitucional 43 Competência legislativa 5 Abolitio criminis III 6 Prescrição decadência e perempção IV 7 Renúncia e perdão aceito V 8 Retratação do agente VI 9 Casamento do agente com a vítima VII 91 Casamento para evitar pena criminal art 1520 do CC 10 Casamento da vítima com terceiro VIII 11 Perdão judicial IX 111 Alguns casos especiais de perdão judicial 112 Natureza da sentença concessiva do perdão judicial Art 108 1 Alcance das causas extintivas de punibilidade 2 A incomunicabilidade nos crimes conexos Art 109 Prescrição antes de transitar em julgado a sentença Parágrafo único Prescrição das penas restritivas de direito 1 Limitação do poder punitivo 2 Definição de prescrição 3 Retrocesso da Constituição cidadã 4 Natureza jurídica da prescrição 5 Natureza publicística da prescrição 6 Ius puniendi e ius punitionis 61 Distinção entre ius puniendi e ius punitionis 7 Prescrição da pretensão punitiva 71 Termo inicial da prescrição da pretensão punitiva 72 Modalidades de prescrição da pretensão punitiva 721 Prescrição da pretensão punitiva abstrata 722 Parâmetro regulador da prescrição abstrata 723 Como encontrar o prazo prescricional abstrato Art 110 Prescrição depois de transitar em julgado sentença final condenatória 1 Três modalidades de prescrição 2 Prescrição da pretensão executória 21 Efeitos da prescrição da pretensão executória 22 Pressupostos da prescrição da pretensão executória 23 Como encontrar o prazo prescricional 3 Prescrição da pretensão punitiva retroativa 31 Marco da prescrição retroativa 32 Pressupostos da prescrição retroativa 33 Como encontrar o prazo prescricional 34 Prescrição retroativa hipotética 4 Prescrição da pretensão punitiva intercorrente ou subsequente 41 Marco temporal da prescrição intercorrente 42 Pressupostos da prescrição intercorrente 43 Como encontrar o prazo prescricional 5 Supressão de parcela da prescrição retroativa inconstitucionalidade manifesta 51 A prescritibilidade das infrações penais com duas exceções 52 Oficializado o engavetamento de investigações preliminares 53 Ausência de parâmetros para a prescrição in concreto 54 Irrazoável demora do processo fere a dignidade da pessoa humana 6 Supressão de parcela do lapso prescricional e violação do princípio da proporcionalidade 61 A culpabildiade é a medida da pena e esta a medida da prescrição 62 Evolução e abrangência do princípio da proporcionalidade 63 Abrangência do princípio da proporcionalidade os três Poderes 64 Excessos do Parlamento controle jurisdicional de constitucionalidade 7 Violação da garantia constitucional da duração razoável do processo 71 Efeitos criminógenos do processo e a dignidade humana 72 Lapso prescricional como marco do prazo razoável arts 109 e 110 73 A multiplicação dos prazos prescricionais causas interruptivas 74 Carta branca às autoridades repressoras violação do prazo razoável 75 A Lei n 122342010 viola o princípio da duração razoável do processo 76 Inconstitucionalidade da supressão de parcela do lapso prescricional Art 111 Termo inicial da prescrição antes de transitar em julgado a sentença final 1 Termo inicial da prescrição da pretensão punitiva 11 Teoria da ação e teoria do resultado Art 112 Termo inicial da prescrição após a sentença condenatória irrecorrível 1 Termo inicial da prescrição da pretensão executória 11 Pressuposto básico da prescrição executória Art 113 Prescrição no caso de evasão do condenado ou de revogação do livramento condicional Art 114 Prescrição da multa 1 Prescrição da multa disciplinada pela Lei n 720984 2 Prescrição da multa disciplinada pela Lei n 926896 21 Trouxe uma novidade 22 Prescrição bienal 23 Causas interruptivas e suspensivas da prescrição da pena de multa 24 Irretroatividade Art 115 Redução dos prazos de prescrição 1 Menoridade e velhice 2 Menor emancipado 3 Incomunicabilidade das causas redutoras do art 115 Art 116 Causas impeditivas da prescrição 1 Causas modificadoras do curso prescricional 2 Suspensão do prazo prescricional 21 Causas suspensivas da prescrição da pretensão punitiva 211 Imunidade parlamentar prescrição 22 Causa suspensiva da prescrição da pretensão executória 23 Novas causas suspensivas da prescrição 3 Suspensão condicional do processo 31 Fundamento político da previsão do art 89 6º da Lei n 909995 4 Citação por edital sem comparecimento ou constituição de defensor 41 Requisitos necessários 42 Defensor constituído na fase policial 43 Recomeço do curso prescricional 44 Suspensão automática e irretroatividade 45 Suspensão da prescrição sem suspensão do processo 46 Retroatividade parcial ou tempus regit actum 47 Suspensão da prescrição nos termos do art 366 do CPP acerto da Súmula 415 do STJ 471 Limite temporal do prazo da suspensão da prescrição 472 Orientação do STF viola a duração razoável do processo 5 Citação mediante rogatória 51 Citação por edital no estrangeiro Art 117 Causas interruptivas da prescrição 1 Interrupção do prazo prescricional 2 Causas interruptivas da prescrição 3 Prescrição em crimes conexos 4 Causas interruptivas no Tribunal do Júri 5 Nova redação do art 117 Lei n 926896 51 Obrigatoriedade da nova redação Art 118 Art 119 Art 120 Perdão judicial PARTE ESPECIAL Título I DOS CRIMES CONTRA A PESSOA Capítulo I Dos crimes contra a vida Art 121 Homicídio simples 1º Caso de diminuição de pena 2º Homicídio qualificado 3º Homicídio culposo 4º e 5º Aumento de pena 1 Homicídio simples 2 Homicídio privilegiado 3 Homicídio qualificado 4 Homicídio culposo 41 Homicídio culposo no trânsito 42 Constitucionalidade de maior reprovação 5 Majorantes do homicídio 51 No homicídio culposo 4º 1ª parte 52 No homicídio doloso 4º 2ª parte 53 Proteção do idoso maior de sessenta anos 54 Isenção de pena ou perdão judicial 6 Questões especiais Art 122 Induzimento instigação ou auxílio a suicídio Parágrafo único I e II Aumento de pena Art 123 Infanticídio Art 124 Aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento Arts 125 e 126 Aborto provocado por terceiro Arts 127 e 128 Forma qualificada I Aborto necessário II Aborto no caso de gravidez resultante de estupro 1 Figuras típicas de aborto 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo 32 Sujeito passivo 33 Dupla subjetividade passiva 4 Tipo objetivo adequação típica 5 Espécies de aborto criminoso 51 Aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento 52 Aborto provocado sem consentimento da gestante 53 Aborto provocado com consentimento da gestante 6 Tipo subjetivo adequação típica 7 Consumação e tentativa 71 Consumação 72 Tentativa de aborto 73 Tentativa de autoaborto 8 Classificação doutrinária 9 Figuras qualificadas de aborto 10 Excludentes especiais da ilicitude 101 Aborto necessário e aborto humanitário 102 Aborto necessário ou terapêutico 103 Aborto humanitário ou ético 104 Extensão da excludente violência ficta 105 Aborto necessário ou humanitário praticados por enfermeira 11 Ação penal e sanção penal 111 Ação penal 112 Sanção penal 12 Questões especiais Capítulo II Das lesões corporais Art 129 Lesão corporal 1º e 2º Lesão corporal de natureza grave 3º Lesão corporal seguida de morte 4º Diminuição de pena 5º Substituição da pena 6º Lesão corporal culposa 7º e 8º Aumento de pena 9º 10 e 11 Violência doméstica 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo 22 Sujeito passivo 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Lesão corporal leve ou simples 8 Lesão corporal grave 81 Incapacidade para as ocupações habituais por mais de trinta dias 82 Perigo de vida 83 Debilidade permanente de membro sentido ou função 84 Aceleração de parto 9 Lesão gravíssima 2º 91 Incapacidade permanente para o trabalho 92 Enfermidade incurável 93 Perda ou inutilização de membro sentido ou função 94 Deformidade permanente 95 Aborto 10 Lesão seguida de morte 3º 11 Lesões majoradas 12 Figuras privilegiadas 13 Formas privilegiadas 4º e 5º 131 Diminuição de pena 4º 132 Substituição de pena 5º 14 Lesão corporal culposa 15 Isenção de pena ou perdão judicial 151 Natureza jurídica do perdão judicial 16 Concurso de crimes 17 Majorantes da lesão corporal 7º 18 Violência doméstica 9º adequação típica 181 Fundamentos políticosociais da neocriminalização 182 Equivocada manutenção da natureza da ação penal 183 Violência doméstica gravidade da ofensa 184 Violência doméstica bem jurídico tutelado 185 Violência doméstica impropriedade técnica 186 Lesão corporal e vias de fato distinção 187 Violência doméstica deficiência e insuficiência da tipificação 188 Relativa importância do local da violência doméstica 189 Prevalecendose das relações domésticas de coabitação etc 1810 Violência doméstica e relação empregatícia 1811 Violência e lesão corporal distinção 1812 Contra pessoa portadora de deficiecia 1813 Natureza da ação penal no crime de violência doméstica 19 Causa de aumento de pena 10 191 Pessoa portadora de deficiência majoração de pena 20 Pena e ação penal 21 Questões especiais Capítulo III Da periclitação da vida e da saúde Art 130 Perigo de contágio venéreo 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo 22 Sujeito passivo 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Tipo penal aberto e norma penal em branco 4 Tipo subjetivo adequação típica 41 Espécies de dolo direto e eventual 42 Dolo eventual deve saber que está contaminado 5 Qualificadora e elemento subjetivo especial do tipo 6 Consumação e tentativa 7 Crime impossível 8 Classificação doutrinária 9 Formas qualificadas 10 Pena e ação penal 101 Pena 102 Ação penal 11 Questões especiais Art 131 Perigo de contágio de moléstia grave 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo 22 Sujeito passivo 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 41 Dolo geral elemento subjetivo geral 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 71 Lesão corporal gravíssima 72 Morte da vítima preterdolo 73 Elemento subjetivo e resultado 74 Concurso formal contágio e epidemia 75 Desclassificação dificuldade 8 Pena e ação penal Art 132 Perigo para a vida ou saúde de outrem 1 Crime subsidiário 2 Bem jurídico tutelado 21 Vida e saúde crime de perigo 3 Sujeitos do crime 31 Requisitos especiais ausência 32 Inexistência de relação jurídica 33 Dever de enfrentar o perigo atividades especiais 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Perigo futuro e incerto 42 Perigo intolerável 43 Desnecessidade de dano 44 Concurso de crimes possibilidade 45 Concurso com outros crimes possibilidade 46 Consentimento da vítima irrelevância 47 Perigo para a vida ou para a saúde 48 Vida ou saúde dosimetria penal 49 Crimes de abandono e maustratos 410 Perigo de vida e crimes de perigo comum 411 Subsidiariedade 5 Tipo subjetivo adequação típica 51 Elemento subjetivo não inclui dolo de dano 52 Dolo de dano crime de dano 53 Dolo eventual admissibilidade 6 Exclusão do crime 61 Atividades perigosas limites 62 Dever e poder agir 7 Consumação e tentativa 71 Consumação 72 Tentativa admissibilidade 8 Classificação doutrinária 9 Forma culposa 10 Lesão corporal seguida de morte 11 Figura majorada 111 Transporte de pessoas para estabelecimentos 112 Estabelecimento de qualquer natureza 113 Transportes com outra destinação 12 Pena e ação penal 121 Pena 122 Ação penal 13 Questões especiais Art 133 1º e 2º Abandono de incapaz 3º Aumento de pena 1 Abandono de incapaz e de recémnascido 2 Bem jurídico tutelado 21 Irrelevância do consentimento do ofendido 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo 32 Sujeito passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Cuidado guarda vigilância e autoridade 42 Abandono do dever e abandono da pessoa 43 Abandono temporário 44 Incapazes de fato 45 Dever de assistência pressuposto fático 46 Fontes da relação de dever 47 Elementares do crime de abandono 5 Tipo subjetivo adequação típica 51 Dolo de dano e dolo de perigo 52 Especial fim de agir inexistência 6 Consumação e tentativa 61 Consumação 62 Tentativa admissível 63 Desistência voluntária e arrependimento eficaz 7 Classificação doutrinária 8 Formas qualificadas 81 Majoração de pena 82 Causa de aumento assegurada pelo Estatuto do Idoso 9 Forma culposa 10 Pena e ação penal 101 Pena cominada 102 Ação penal 11 Questões especiais Art 134 Exposição ou abandono de recémnascido 1 Bem jurídico tutelado 11 Periclitação da vida e da saúde 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo 22 Sujeito passivo 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 51 Consumação 52 Tentativa admissibilidade 6 Classificação doutrinária 7 Formas qualificadas 8 Forma culposa 9 Pena e ação penal 91 Pena cominada 92 Ação penal 10 Questões especiais Art 135 Omissão de socorro 1 Crime omissivo definição 2 Bem jurídico tutelado 21 Fonte dever geral 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo 32 Sujeito passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Deixar de prestar assistência 42 Não pedir socorro à autoridade pública 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Concurso de pessoas nos crimes omissivos 7 Consumação e tentativa 8 Classificação doutrinária 9 Formas qualificadas 10 Figuras majoradas 101 Relação de causalidade 11 Forma culposa 12 Pena e ação penal 13 Questões especiais Art 136 Maustratos 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo 22 Sujeito passivo 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 51 Consumação 52 Tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Formas qualificadas 8 Figura majorada menor de quatorze anos 9 Forma culposa 10 Pena e ação penal 101 Penas cominadas 102 Ação penal 11 Questões especiais Capítulo IV Da rixa Art 137 Rixa 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo 22 Sujeito passivo 3 Participantes da rixa 4 Tipo objetivo adequação típica 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Classificação doutrinária 8 Figuras qualificadas 9 Forma culposa 10 Pena e ação penal 101 Pena cominada 102 Natureza da ação penal 11 Questões especiais Capítulo V Dos crimes contra a honra Art 138 1º e 2º Calúnia 3º Exceção da verdade 1 Bem jurídico tutelado 11 Consentimento do ofendido como excludente de tipicidade 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo 22 Sujeito passivo 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Imputar falsamente fato definido como crime 32 Propalação da calúnia 4 Elemento normativo do tipo falsamente 5 Calúnia contra os mortos 6 Tipo subjetivo adequação típica 7 Consumação e tentativa 71 Consumação 72 Tentativa punível 8 Classificação doutrinária 9 Exceção da verdade 10 Consequência da exceptio veritatis 11 Exceção da verdade e foro privilegiado competência 12 Imputação verdadeira de fato criminoso exceção proibida 13 Consequências da proibição da exceção da verdade 14 Calúnia e denunciação caluniosa 15 Crime de calúnia e exercício da advocacia incompatibilidade 16 Retratação 17 Pena e ação penal 171 Pena cominada 172 Natureza da ação penal 18 Questões especiais Art 139 Difamação Parágrafo único Exceção da verdade 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo 22 Sujeito passivo 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 51 Consumação 52 Tentativa admissibilidade 6 Classificação doutrinária 7 Figuras majoradas 8 Forma culposa 9 Retratação 10 Exceção da verdade impossibilidade em tese 11 Exceção da notoriedade 12 Pena e ação penal 121 Pena cominada 122 Natureza da ação penal 13 Questões especiais Art 140 Injúria 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 51 Consumação 52 Tentativa admissibilidade restrita 6 Classificação doutrinária 7 Exceção da verdade inadmissibilidade 8 Perdão judicial definição 9 Provocação reprovável e retorsão imediata 91 Provocação reprovável e provocação justa 92 Retorsão imediata presença dos protagonistas 10 Compensação de injúrias 11 Injúria real qualificada 12 Violência e lesões corporais distinção 13 Injúria preconceituosa qualificada 131 Condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência 14 Dolo e elemento subjetivo especial do tipo 15 Pena e ação penal 151 Pena cominada 152 Natureza da ação penal 16 Pena e ação penal da injúria por preconceito 161 Pena cominada 162 Natureza da ação penal iniciativa privada 17 Questões especiais Art 141 Disposições comuns Art 142 Exclusão do crime Arts 143 a 145 Retratação 1 Formas majoradas dos crimes contra a honra 2 Presidente da República ou chefe de governo estrangeiro 3 Contra funcionário público em razão de suas funções 4 Na presença de várias pessoas 5 Meio que facilita a divulgação da ofensa 6 Condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência 7 Mediante paga ou promessa de recompensa 8 Consentimento do ofendido afasta a tipicidade 9 Renúncia e perdão excluem a punibilidade 10 Causas especiais de exclusão de crimes 101 Natureza jurídica das excludentes especiais 102 Nossa posição exclusão de crime 103 Natureza constitutiva da previsão do art 142 104 Excludentes especiais e elemento subjetivo 105 Consciência e vontade de agir corretamente 11 Espécies de excludentes especiais 111 Ofensa irrogada em juízo I imunidade judiciária 112 Crítica literária artística ou científica II 113 Conceito desfavorável emitido por funcionário público III 12 Exclusão do crime de calúnia 13 Retratação definição 131 Falsa perícia e falso testemunho 132 Efeitos da retratação 133 Forma conteúdo e momento processual da retratação 14 Retratação nos crimes de ação pública condicionada possibilidade 15 Pedido de explicações em juízo interpelação judicial 16 Ação penal nos crimes contra a honra 161 Fase preliminar da ação penal 162 Início da ação penal 163 Regra geral ação de exclusiva iniciativa privada 164 Primeira exceção pública condicionada 165 Segunda exceção pública incondicionada 166 Influência do art 88 da Lei n 909995 Capítulo VI Dos crimes contra a liberdade individual Seção I Dos crimes contra a liberdade pessoal Art 146 Constrangimento ilegal 1º a 3º Aumento de pena 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo 22 Sujeito passivo 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Formas ou meios de execução 32 Crime de constrangimento ilegal e crime de tortura 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 51 Consumação 52 Tentativa 53 Desistência voluntária e arrependimento eficaz 6 Concurso com crimes praticados com violência 7 Classificação doutrinária 8 Formas majoradas 1º 81 Reunião de mais de três pessoas 82 Emprego de armas 9 Natureza subsidiária 10 Exclusão de tipicidade 11 Pena e ação penal 111 Penas cominadas 112 Natureza da ação penal 12 Questões especiais Art 147 Ameaça 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo 22 Sujeito passivo 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 51 Consumação 52 Tentativa dificuldade 6 Classificação doutrinária 7 Natureza subsidiária da ameaça 8 Pena e ação penal 81 Cominada 82 Natureza da ação penal Art 148 Sequestro e cárcere privado 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo 22 Sujeito passivo 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 51 Consumação 52 Tentativa admissibilidade 6 Classificação doutrinária 61 Cárcere privado no interior da prisão possibilidade 7 Formas qualificadas 71 Se a vítima é ascendente descendente cônjuge ou companheiro do agente 72 Se o crime é praticado mediante internação da vítima em casa de saúde ou hospital 1º II 73 Se a privação da liberdade dura mais de quinze dias 1º III 74 Se resulta à vítima em razão de maustratos ou da natureza da detenção grave sofrimento físico ou moral 2º 75 Vítima menor de dezoito anos 76 Se a finalidade for libidinosa 8 Concurso entre os crimes de sequestro e de roubo 81 Majorante especial 82 Concurso material roubo e sequestro 83 Ausência de bis in idem fatos e subjetividades distintas 9 Pena e ação penal 91 Penas cominadas 92 Natureza da ação penal 10 Questões especiais Art 149 Redução a condição análoga à de escravo 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo 22 Sujeito passivo 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação 6 Tentativa 7 Classificação doutrinária 8 Redução a condição análoga à de escravo e crimes afins 9 Pena e ação penal 91 Pena cominada 92 Natureza da ação penal 10 Inovações da Lei n 108032003 101 Limitações consagradas mesmo não desejadas 102 Como evitar o equívoco legislativo 103 Sujeito passivo especial da novel figura Seção II Dos crimes contra a inviolabilidade do domicílio Art 150 Violação de domicílio 1 Bem jurídico tutelado 11 Definição jurídicopenal de domicílio 12 Definição jurídicopenal de casa 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo 22 Sujeito passivo 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Formas de entrada ou permanência francas astuciosas ou clandestinas 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 51 Consumação 52 Tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Formas qualificadas tipos derivados 71 Durante a noite 72 Lugar ermo 73 Emprego de violência 74 Emprego de arma 75 Duas ou mais pessoas 8 Formas majoradas causas de aumento 9 Causas de exclusão da antijuridicidade 10 Pena e ação penal 101 Pena cominada 102 Natureza da ação penal Seção III Dos crimes contra a inviolabilidade de correspondência Art 151 Violação de correspondência 1º I Sonegação ou destruição de correspondência II a IV e 2º a 4º Violação de comunicação telegráfica radioelétrica ou telefônica 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo 22 Sujeito passivo 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Violação de correspondência 32 Elemento normativo do tipo indevidamente Inconstitucionalidade das exceções legais 33 Apossamento de correspondência 4 Violação de comunicação telegráfica radioelétrica ou telefônica 5 Interceptação de comunicação telefônica exceção constitucional 6 Impedimento de comunicação ou conversação 7 Instalação ou utilização ilegal de estação ou aparelho radioelétrico 71 Instalar e utilizar ilegalmente 72 Elemento normativo sem a devida licença 8 Tipo subjetivo adequação típica 9 Consumação e tentativa 91 Consumação 92 Tentativa 10 Classificação doutrinária 11 Cônjuge do destinatário ilegitimidade da devassa 12 Formas majoradas e qualificadas 121 Majorante especial 122 Qualificadora abuso de função 13 Subsidiariedade fim em si mesmo 14 Exclusão da ilicitude abrangência 15 Pena e ação penal 151 Pena cominada 152 Natureza da ação penal 16 Questões especiais Art 152 Correspondência comercial 1 Considerações preliminares 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo 32 Sujeito passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 61 Consumação 62 Tentativa 7 Classificação doutrinária 8 Pena e ação penal 81 Pena cominada 82 Natureza da ação penal 9 Questões especiais Seção IV Dos crimes contra a inviolabilidade dos segredos Art 153 Divulgação de segredo 1 Considerações preliminares 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo 32 Sujeito passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Documento particular ou correspondência confidencial 42 Elemento normativo do tipo sem justa causa 43 Natureza do segredo tutelado tipo aberto 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 61 Consumação 62 Tentativa 7 Classificação doutrinária 8 Divulgação de informações sigilosas ou reservadas 81 Bem jurídico protegido 82 Informações sigilosas ou reservadas definidas em lei 9 Pena e ação penal 91 Pena cominada 92 Natureza da ação penal 10 Questões especiais Art 154 Violação do segredo profissional 1 Considerações preliminares 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo 32 Sujeito passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 61 Consumação 62 Tentativa 7 Elemento normativo da descrição típica sem justa causa 8 Classificação doutrinária 9 Pena e ação penal 91 Pena cominada 92 Natureza da ação penal 10 Questões especiais Título II DOS CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO Capítulo I Do furto Art 155 1º a 3º Furto 4º e 5º Furto qualificado 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 21 Não podem ser objeto de furto 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Objeto material do crime de furto 42 Elemento normativo coisa alheia 43 Proprietário que subtrai coisa da qual não tem a posse atipicidade 44 Lesão patrimonial bem economicamente apreciável 45 Irrelevância da motivação do crime de furto 46 Coisa perdida abandonada e coisa comum 5 Natureza e efeito do consentimento da vítima no crime de furto 6 Tipo subjetivo adequação típica 7 Consumação e tentativa 71 Consumação 72 Tentativa 721 Questões controvertidas 73 Furtos em supermercados tentativa ou crime impossível 8 Furto durante o repouso noturno 81 Lugar habitado e com pessoas repousando 82 Lugar desabitado e ausência dos moradores 83 Inaplicabilidade à hipótese de furto qualificado 9 Furto de pequeno valor aplicase ao furto qualificado 91 Primariedade reincidentes e não reincidentes 92 Coisa de pequeno valor 93 Aplicabilidade das privilegiadoras no furto qualificado 94 Pequeno valor e pequeno prejuízo distinção 10 Furto qualificado tipo derivado 101 Com destruição ou rompimento de obstáculo I 1011 O tempo da prática da violência 102 Com abuso de confiança ou mediante fraude escalada ou destreza II 1021 Incomunicabilidade do abuso de confiança 1022 Abuso de confiança e apropriação indébita 1023 Furto mediante fraude 1024 Furto mediante escalada 1025 Furto praticado com destreza 103 Com emprego de chave falsa III 1031 Modus operandi e simples posse de chave falsa 104 Mediante concurso de duas ou mais pessoas IV 11 Concursus delinquentium e concurso de duas ou mais pessoas 111 Teoria monística temperada pelo conceito restritivo de autor 112 O ajuste e a determinação são em tese impuníveis 113 Coautoria e participação em sentido estrito 1131 Participação em sentido estrito 1132 Causalidade física e psíquica elemento objetivosubjetivo 114 Participação impunível impede a configuração da qualificadora 115 Autoria colateral atipicidade da qualificadora do concurso de pessoas 12 Autoria mediata impossibilidade da qualificadora de concurso de pessoas 13 Comunicabilidade ou incomunicabilidade da qualificadora desvio subjetivo de condutas 14 Punibilidade desproporcional da qualificadora do concurso de pessoas 15 Furto de veículo automotor qualificadora especial 151 Dois momentos consumativos distintos 152 Furto de veículo automotor para uso e de componentes de veículo atipicidade 153 Furto de uso intenção de restituir 1531 Restituição in integro do objeto furtado para uso 154 Subtração de veículo para fuga de perseguição policial 16 Furto de energia equiparação a coisa móvel 161 Uso indevido de energia furto ou estelionato 162 Equiparação aberta qualquer energia que tenha valor econômico 163 Natureza da subtração de energia permanente ou instantânea 164 Furto de energia e furto de sinal de TV a cabo 17 Pena e ação penal Art 156 Furto de coisa comum 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Sócio que furta da própria sociedade 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 61 Consumação de furto de coisa comum 62 Tentativa de furto de coisa comum 7 Causa especial de exclusão da antijuridicidade 8 Pena e ação penal Capítulo II Do roubo e da extorsão Art 157 Roubo 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Irrelevância de motivação distinta da finalidade de apossamento da res 5 Modus operandi mediante violência ou grave ameaça ou qualquer outro meio 51 Violência física vis corporalis 52 Grave ameaça vis compulsiva 521 Idoneidade da grave ameaça 522 Simulação de arma e arma de brinquedo 53 Qualquer outro meio de redução da resistência 531 A individualização de outros meios na legislação estrangeira 54 Violência ou grave ameaça para fugir sem a coisa 541 Violência para assegurar a fuga não tipifica crime de roubo 6 Espécies de roubo próprio e impróprio 61 Roubo próprio 62 Roubo impróprio 621 A tipificação do roubo impróprio não admite a hipótese de qualquer outro meio 622 Limites temporais do roubo impróprio 623 Marcos temporais delimitadores do roubo impróprio 63 Roubo próprio e impróprio distinção 7 Objeto material do crime de roubo 8 Tipo subjetivo adequação típica 81 Duplicidade de elementos subjetivos especiais 9 Roubo majorado qualificado 2º 91 Se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma I 911 Inidoneidade lesiva de arma de brinquedo ou descarregada 912 O emprego de arma de brinquedo e a velha doutrina clássica 913 O emprego de arma de brinquedo e a Súmula 174 do STJ 92 Se há concurso de duas ou mais pessoas II 93 Em serviço de transporte de valores e o agente conhece essa circunstância III 94 Roubo de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior IV 95 Roubo de veículo automotor com sequestro da vítima V 951 Sequestro cometido como meio de execução do roubo ou contra ação policial 952 Sequestro relâmpago extorsão mediante sequestro 96 Elevação da pena mínima no roubo qualificado 10 Eventual presença de duas causas de aumento 11 Consumação e tentativa 111 Consumação do crime de roubo 1111 Crime complexo consumase com a realização das infrações que o integram 112 Tentativa do crime de roubo 12 Roubo qualificado pelo resultado lesão grave ou morte 121 Afastamento da responsabilidade objetiva nos resultados agravadores 122 Latrocínio crime hediondo 123 Pela lesão corporal grave 124 Pelo resultado morte latrocínio 125 Erro crasso do legislador equiparação de dolo e culpa 126 Resultado morte decorrente de grave ameaça não tipifica latrocínio 127 Morte de comparsa inocorrência de latrocínio 13 Tentativa de latrocínio pluralidade de alternativas 14 Latrocínio com pluralidade de vítimas 15 Concurso do crime de roubo com o de quadrilha 16 Pena ação penal e competência 161 Inconstitucionalidade da proibição de progressão de regime nos crimes hediondos 162 Eficácia erga omnes e efeito ex nunc 163 Nova disciplina da progressão de regimes nos crimes hediondos Art 158 Extorsão 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Meios e formas de execução da extorsão violência física e grave ameaça 42 A extorsão mediante grave ameaça e o crime de ameaça do art 147 43 Obtenção de indevida vantagem econômica 44 Ato juridicamente nulo e a tipificação da extorsão 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Extorsão majorada coautoria e emprego de armas 61 Se a extorsão é cometida por duas ou mais pessoas 62 Com emprego de arma 7 Omissão da Lei n 942696 majorantes relativas a veículo automotor 8 Extorsão qualificada lesão grave ou morte 9 Roubo e extorsão semelhanças e dessemelhanças 91 Roubo e extorsão são crimes da mesma espécie 92 Roubo e extorsão constrangimento mediante violência ou grave ameaça 10 Crimes de extorsão e de constrangimento ilegal conflito aparente de normas A inconstitucionalidade da nova tipificação do crime de sequestro relâmpago 11 Extorsão mediante restrição de liberdade 111 Nova tipificação extorsão especial 112 Extorsão mediante restrição da liberdade 113 Interpretação conglobada caput e 3º 114 Elementar típica restrição da liberdade 115 Indispensabilidade da restrição da liberdade 116 Excepcionalmente pode retroagir 12 Sequestrorelâmpago qualificado pelo resultado 121 Não caracteriza crime hediondo não há previsão legal 13 A gravidade da semelhança entre roubo e extorsão especial 131 Roubo e extorsão faculdade de escolha 132 Irrelevância de eventual ato da vítima 14 Equivocada exasperação punitiva 141 A desproporcional cominação de penas entre roubo e extorsão especial 15 Violação da proporcionalidade e inconstitucionalidade 151 Abrangência do princípio da proporcionalidade 152 Controle de constitucionalidade pelo Poder Judiciário 153 Equilíbrio da proporcionalidade em matéria penal 16 Consumação e tentativa 161 Consumação 162 Tentativa 17 Pena e ação penal Art 159 Extorsão mediante sequestro 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Finalidade do sequestro obter qualquer vantagem como condição ou preço 42 Irrelevância da natureza ou espécie da vantagem visada 421 Abrangência da elementar normativa qualquer vantagem 422 Natureza pluriofensiva da extorsão mediante sequestro 43 Vantagem devida seria outra tipificação 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Extorsão qualificada modus operandi 61 Duração do sequestro superior a vinte e quatro horas 62 A idade da vítima menor de dezoito anos ou maior de sessenta 63 Cometido por bando ou quadrilha 7 Extorsão mediante sequestro qualificada pelo resultado lesão grave ou morte 71 Se resulta lesão corporal de natureza grave 72 Se resulta a morte 73 Extorsão mediante sequestro como crime hediondo 8 Delação premiada favor legal antiético 81 A condenável proliferação da denominada delação premiada 82 Premiação do traidordelator Estado imoral estimula a falta de ética e a imoralidade 83 Modus operandi da delação premiada omissão legislativa imperdoável 84 A definição do quanto a reduzir necessidade de critérios objetivos 9 Crime hediondo 10 Consumação e tentativa 11 Pena e ação penal Art 160 Extorsão indireta 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 O fundamento ou a razão de ser da dívida inteiramente irrelevante 42 A existência da dívida ou sua legitimidade não exclui o crime 43 Documento confessando a prática de crime existente ou não 44 Recebimento de cheque sem fundos não caracteriza extorsão indireta 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Capítulo III Da usurpação Art 161 1º Alteração de limites I Usurpação de águas II 2º e 3º Esbulho possessório 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 31 A impossibilidade de o condômino ser sujeito ativo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Formas ou aspectos dos diferentes sinais divisórios 42 Atipicidade da conduta de acrescer outros sinais divisórios 43 Peculiaridades especiais do crime de usurpação 5 Tipo subjetivo adequação típica 51 Elemento subjetivo especial para apropriarse de coisa móvel alheia 511 Objeto do fim especial somente imóvel por natureza 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Usurpação de águas I 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 O objeto material da proteção penal são as águas 42 Águas represadas e águas correntes 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Esbulho possessório II 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Violência à pessoa ou grave ameaça 42 Esbulho mediante concurso de mais de duas pessoas 43 Esbulho civil e esbulho penal 44 Esbulho de imóvel do SFH 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Usurpação em concurso com violência 8 Pena e ação penal Art 162 Supressão ou alteração de marca em animais 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Somente em animais já marcados 42 Concurso com outros crimes 43 Elementares típiconormativas indevidamente e alheio 44 Significado e limite das locuções gado ou rebanho 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Capítulo IV Do dano Art 163 Dano Parágrafo único Dano qualificado 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Natureza do dano diminuição da utilidade da coisa 42 Melhoria da coisa alheia decorrente da ação do agente 43 Fazer desaparecer lacuna na descrição típica 44 Desaparecimento e fazer desaparecer significados distintos 5 Tipo subjetivo adequação típica 51 Especial fim de agir pode configurar crime distinto 6 Dano qualificado 61 Concurso de qualificadoras e sua comunicabilidade 62 Com violência à pessoa ou grave ameaça 63 Equiparação de violência e grave ameaça uma praxe do legislador de 1940 64 Graduação do mal ameaçado dano ou perigo 65 Dano praticado com violência concurso material de crimes ou cúmulo material de penas 66 Com emprego de substância inflamável ou explosiva se o fato não constitui crime mais grave 67 Contra o patrimônio da União Estado Município empresa concessionária de serviços públicos ou sociedade de economia mista 68 Por motivo egoístico ou com prejuízo considerável para a vítima 681 Por motivo egoístico 682 Com prejuízo considerável 7 Consumação e tentativa 8 Pena e ação penal Art 164 Introdução ou abandono de animais em propriedade alheia 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Introduzir animais em propriedade alheia 42 Deixar animais em propriedade alheia 43 Sem consentimento de quem de direito 431 As possíveis funções dogmáticas do consentimento do ofendido 432 Função dogmática do consentimento na introdução ou abandono de animais em propriedade alheia 44 A ocorrência efetiva de prejuízo 45 Prejuízo condição objetiva da punibilidade ou elementar típica 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 61 Tentativa entendimento ultrapassado da doutrina clássica 62 Aspectos caracterizadores da tentativa 63 Aporias do passado e falácia de autoridade 7 Questões especiais abrangência da locução animais 8 Pena e ação penal Art 165 Dano em coisa de valor artístico arqueológico ou histórico 1 Considerações especiais Art 166 Alteração de local especialmente protegido 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Classificação doutrinária 8 Questões especiais 9 Pena e ação penal Art 167 Ação penal Capítulo V Da apropriação indébita Art 168 Apropriação indébita 1º Aumento de pena 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Pressuposto da apropriação indébita 5 Tipo objetivo adequação típica 51 Elemento subjetivo transformador da natureza da posse 6 Tipo subjetivo adequação típica 61 Inversão do título ou natureza da posse 62 Real sentido da locução dolo subsequente 7 Consumação e tentativa 71 A consumação 72 A tentativa 8 Formas majoradas de apropriação indébita 81 Coisa recebida em depósito necessário 811 Depósito necessário legal ou miserável 812 Depósito originário de hospedagem 82 Qualidade pessoal do agente tutor curador síndico liquidatário inventariante testamenteiro ou depositário judicial 83 Em razão de ofício emprego ou profissão 9 Apropriação furto e estelionato 10 Apropriação indébita e relação mandantemandatário 101 Necessidade de prova cabal sobre o animus de inversão da natureza da posse 11 Pena e ação penal 12 Algumas questões especiais Art 168A Apropriação indébita previdenciária 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos ativo e passivo 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Pressuposto contribuições recolhidas 32 Prazo e forma legal ou convencional norma penal em branco 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Figuras do caput e do 1º distinção 6 Deixar de recolher no prazo legal 1º I 61 Pressuposto que tenha sido descontado de pagamento efetuado 62 Antiga figura do art 95 d 7 Deixar de recolher contribuições devidas 1º II 71 Despesas contábeis ou custos relativos a produtos e serviços 72 Pressuposto que tenham integrado os custos 8 Deixar de pagar benefício devido 1º III 81 Pressuposto reembolso realizado 9 Consumação e tentativa 10 Causa extintiva da punibilidade 101 Início da ação fiscal antes 102 Requisitos para extinção da punibilidade 103 Aplicação do art 34 da Lei n 924995 11 Irretroatividade da lei nova n 99832000 12 Perdão judicial ou pena de multa 121 Valor de pouca monta inocuidade 122 Princípio da insignificância configurado 123 Requisitos necessários ao perdão judicial ou multa 13 Crimes praticados após a Lei n 99832000 efeitos práticos 14 Pena e ação penal Art 169 Apropriação de coisa havida por erro caso fortuito ou força da natureza I Apropriação de tesouro II Apropriação de coisa achada 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 5 Apropriação de tesouro 51 A definição de tesouro 6 Apropriação de coisa achada 61 Coisa perdida 611 O Código Civil impõe a obrigação de devolver coisa achada 62 Elemento temporal quinze dias 7 Tipo subjetivo adequação típica 8 Consumação e tentativa 9 Minorante do pequeno valor nos crimes de apropriação indébita 91 Pequeno valor definição doutrináriojurisprudencial 92 Pequeno valor da coisa alheia e pequeno prejuízo 10 Pena e ação penal Art 170 Capítulo VI Do estelionato e outras fraudes Art 171 1º e 2º Estelionato I Disposição de coisa alheia como própria II Alienação ou oneração fraudulenta de coisa própria III Defraudação de penhor IV Fraude na entrega de coisa V Fraude para recebimento de indenização ou valor de seguro VI e 3º Fraude no pagamento por meio de cheque 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 31 Criança e débil mental impossibilidade 4 Fraude civil e fraude penal ontologicamente iguais 41 Atos maliciosos de comércio não se confundem com a burla fraudulenta 42 Critérios para distinguir fraude civil e fraude penal 43 Teorias explicativas da distinção entre fraude civil e penal 5 Tipo objetivo adequação típica 51 Emprego de artifício ardil ou qualquer outro meio fraudulento 52 Induzimento ou manutenção da vítima em erro 53 Obtenção de vantagem ilícita em prejuízo alheio elemento normativo 54 À vantagem ilícita deve corresponder um prejuízo alheio 6 Vantagem ilícita irrelevância da natureza econômica 61 Nosso entendimento irrelevância da natureza da vantagem 62 O prejuízo alheio além de patrimonial deve ser concreto 63 A vantagem deve ser injusta embora não precise ser econômica 7 Tipo subjetivo adequação típica 71 Elemento subjetivo especial obter vantagem ilícita 8 Consumação e tentativa 81 Consumação do estelionato 82 Tentativa de estelionato 9 Estelionato e falsidade 10 Estelionato privilegiado minorante de aplicação obrigatória 11 Figuras especiais de estelionato 111 Disposição de coisa alheia como própria I 112 Alienação ou oneração fraudulenta de coisa própria II 113 Defraudação de penhor III 114 Fraude na entrega de coisa IV 115 Fraude para o recebimento de indenização ou valor de seguro V 116 Fraude no pagamento por meio de cheque VI 1161 Cheque pósdatado e cheque especial 1162 Sujeitos ativo e passivo do crime 12 Majorante especial do crime de estelionato 13 Arrependimento posterior e as Súmulas 246 e 554 131 Reparação de danos e as Súmulas 246 e 554 14 Algumas questões especiais 15 Pena e ação penal 16 Transcrição das principais súmulas relativas ao estelionato 161 Súmulas do Supremo Tribunal Federal 162 Súmulas do Superior Tribunal de Justiça Art 172 Duplicata simulada 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Falsificação ou adulteração do livro de registro de duplicatas 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 173 Abuso de incapazes 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Necessidade paixão ou inexperiência do menor 42 Ato suscetível de produzir efeito jurídico 43 Natureza do proveito ou vantagem 5 Tipo subjetivo adequação típica 51 Dolo eventual Elemento subjetivo especial 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 174 Induzimento à especulação 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 175 Fraude no comércio 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 A possível revogação pelo Código de Defesa do Consumidor 42 Fraude no comércio de metais ou pedras preciosas 1º 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 176 Outras fraudes 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 177 Fraudes e abusos na fundação ou administração de sociedade por ações 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Fraude na fundação de sociedade por ações crime subsidiário 42 Conflito aparente de normas 43 Princípios da subsidiariedade e da especialidade 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Fraude sobre as condições econômicas de sociedade por ações 1º I 71 Bem jurídico tutelado 72 Sujeitos ativo e passivo 73 Tipo objetivo adequação típica 74 Consumação e tentativa 8 Falsa cotação de ações ou título de sociedade 1º II 81 Sujeitos ativo e passivo 82 Tipo objetivo adequação típica 83 Consumação e tentativa 9 Empréstimo ou uso indevido de bens ou haveres lº III 91 Sujeitos ativo e passivo 92 Tipo objetivo adequação típica 93 Consumação e tentativa 10 Compra e venda de ações da sociedade lº IV 101 Sujeitos ativo e passivo 102 Tipo objetivo adequação típica 103 Consumação e tentativa 11 Caução de ações da sociedade lº V 111 Sujeitos ativo e passivo 112 Tipo objetivo adequação típica 113 Consumação e tentativa 12 Distribuição de lucros ou dividendos fictícios 1º VI 121 Sujeitos ativo e passivo 122 Tipo objetivo adequação típica 123 Consumação e tentativa 13 Aprovação fraudulenta de conta ou parecer lº VII 131 Sujeitos ativo e passivo 132 Tipo objetivo adequação típica 133 Consumação e tentativa 14 Crimes de liquidante 1º VIII 15 Crimes do representante da sociedade estrangeira lº IX 151 Sujeitos ativo e passivo 16 Crime de acionista negociação de voto 2º 161 Sujeitos ativo e passivo 162 Tipo objetivo adequação típica 17 Pena e ação penal Art 178 Emissão irregular de conhecimento de depósito ou warrant 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Conhecimento de depósito e warrant 5 Tipo objetivo adequação típica 51 Elemento normativo em desacordo com disposição legal 6 Tipo subjetivo adequação típica 7 Consumação e tentativa 8 Pena e ação penal Art 179 Fraude à execução 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Pressuposto do crime de fraude à execução 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Capítulo VII Da receptação Art 180 Receptação 1º a 6º Receptação qualificada 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 21 O ser humano vivo não pode ser objeto de receptação 22 Os direitos reais ou pessoais não podem ser objeto de receptação 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica receptação simples 41 Modalidades de receptação própria 42 Receptação imprópria influência sob terceiro 421 Influência como atividade nuclear da conduta típica 422 Omissão do legislador de 1996 43 Um tipo misto alternativo e ao mesmo tempo cumulativo 5 Novas figuras da Lei n 942696 receptação ou favorecimento 51 Distinção entre favorecimento e receptação 52 Receptação de receptação possibilidade 6 Significado dogmático das elementares sabe e deve saber 61 Síntese dos postulados fundamentais das teorias do dolo e da culpabilidade 62 Sentido e função das elementares sabe e deve saber na definição do crime de receptação 63 Reelaboração de Welzel do conceito de consciência de ilicitude 64 Sabe e deve saber como simples elementares normativas do tipo penal 7 Consumação e tentativa 8 Receptação qualificada tipo autônomo ou derivado 81 A qualificadora constitui tipo derivado 82 Adequação típica receptação qualificada 821 Ter em depósito 822 Desmontar 823 Montar 824 Remontar 825 Vender ou expor à venda 826 Utilizar de qualquer forma 9 Receptação simples receptação qualificada e princípio da proporcionalidade 91 Criar via interpretação um terceiro tipo penal de receptação 92 Nosso entendimento divergente não há inconstitucionalidade 93 Política de combate ao comércio clandestino de veículos 94 Outras características subjetivas que podem integrar os tipos penais 95 Elemento normativo da receptação qualificada no exercício de atividade comercial ou industrial 10 Tipo subjetivo adequação típica dolo direto 101 Em relação ao fim proposto e aos meios escolhidos 102 Elemento subjetivo especial do injusto em proveito próprio ou alheio 11 Receptação culposa metodologia diferenciada 111 Devemse observar os postulados fundamentais do crime culposo 112 Indícios de natureza objetiva que exigem observação criteriosa 12 Autonomia da receptação independência relativa 121 Crime acessório como autonomia relativa 13 Autor de crime a culpabilidade não é mero pressuposto da pena 131 Fundamento dessa política criminal do Código Penal de 1940 14 Perdão judicial 5º 1ª parte 141 Direito público subjetivo de liberdade 15 Receptação privilegiada 5º 2ª parte 151 Primariedade do acusado 152 Coisa de pequeno valor 16 Receptação majorada 6º 17 Pena e ação penal Capítulo VIII Disposições gerais Art 181 Art 182 Art 183 1 Considerações introdutórias 2 Repercussão do Estatuto do Idoso nos crimes patrimoniais 21 Ampliação das imunidades relativas aos crimes patrimoniais 3 Imunidade penal absoluta 31 As escusas absolutórias não excluem o crime impedem a aplicação da pena 4 Imunidade relativa condição de procedibilidade 41 Hipóteses de imunidades relativas 5 Exclusão de imunidade ou privilégio 51 Concurso eventual de estranhos coautoria ou participação Título III DOS CRIMES CONTRA A PROPRIEDADE IMATERIAL Capítulo I Dos crimes contra a propriedade intelectual Art 184 Violação de direito autoral 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Inovações da Lei n 106952003 5 Figuras qualificadas majoração penal 51 Intuito de lucro é o fundamento da majoração penal 52 Combate à indústria do xerox 53 Elemento normativo do tipo sem autorização 6 Repressão da cyberpirataria 7 Tipo subjetivo adequação típica 8 Consumação e tentativa 9 Classificação doutrinária 10 Pena e ação penal 11 Algumas questões especiais Art 185 Usurpação de nome ou pseudônimo alheio 1 Considerações especiais Art 186 1 Considerações introdutórias 2 Natureza da ação penal 3 Prazo decadencial geral ou especial 4 Prova do direito de ação art 526 do CPP préconstituída Capítulo II Dos crimes contra o privilégio de invenção Arts 187 a 191 Revogados pela Lei n 9279 de 1451996 Capítulo III Dos crimes contra as marcas de indústria e comércio Arts 192 a 195 Revogados pela Lei n 9279 de 1451996 Capítulo IV Dos crimes de concorrência desleal Art 196 Revogado pela Lei n 9279 de 1451996 Título IV DOS CRIMES CONTRA A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO Art 197 Atentado contra a liberdade de trabalho 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 31 Pessoa jurídica impossibilidade 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Modalidades do constrangimento 42 Tïpifïcação quando se tratar de greve ilegal 43 Formas ou meios de execução mediante violência ou grave ameaça 44 Ameaça de mal futuro imediato e determinado 5 Tipo subjetivo adequação típica 51 Elemento subjetivo especial do tipo 6 Consumação e tentativa 61 Possibilidade de tentativa 7 Pena e ação penal Art 198 Atentado contra a liberdade de contrato de trabalho e boicotagem violenta 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Atentado contra a liberdade de contrato de trabalho 42 Boicotagem violenta na área do comércioindústria 43 Formas ou meios de execução mediante violência ou grave ameaça 5 Tipo subjetivo adequação típica 51 Impossibilidade da modalidade culposa 6 Consumação e tentativa 7 Concurso de crimes violência tipificada 8 Pena e ação penal Art 199 Atentado contra a liberdade de associação 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Trabalho individual e crime contra a organização do trabalho 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 200 Paralisação de trabalho seguida de violência ou perturbação da ordem 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 A incriminação alcança todos os participantes 42 Abandono coletivo e suspensão do trabalho 43 Violência contra pessoa ou coisa 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 201 Paralisação de trabalho de interesse coletivo 1 Considerações introdutórias 11 A possível revogação do dispositivo em exame 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 5 Tipo subjetivo adequação típica 51 Tipicidade de greve pacífica excepcionalmente 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 202 Invasão de estabelecimento industrial comercial ou agrícola Sabotagem 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal 8 Questões especiais Art 203 Frustração de direito assegurado por lei trabalhista 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Novos tipos assemelhados 8 Penas e ação penal 81 Sanções cominadas 82 Natureza da ação penal 9 Questões especiais 10 Competência para processar e julgar Art 204 Frustração de lei sobre a nacionalização do trabalho 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Meios executórios normativos mediante fraude ou violência 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Penas e ação penal Art 205 Exercício de atividade com infração de decisão administrativa 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Emanação de órgão administrativo competente 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 206 Aliciamento para o fim de emigração 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Punibilidade da emigração fraudulenta 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 207 Aliciamento de trabalhadores de um local para outro do território nacional 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Novo tipo penal 1º 8 Pena e ação penal 9 Leis n 909995 e 971498 fundamentos para exasperação penal Título V DOS CRIMES CONTRA O SENTIMENTO RELIGIOSO E CONTRA O RESPEITO AOS MORTOS Capítulo I Dos crimes contra o sentimento religioso Art 208 Ultraje a culto e impedimento ou perturbação de ato a ele relativo 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 31 A orientação que adotamos 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Escárnio por motivo de religião 42 Impedimento ou perturbação de culto religioso 43 Vilipêndio público de ato ou objeto obsceno 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Majorante especial com violência 8 Pena e ação penal Capítulo II Dos crimes contra o respeito aos mortos Art 209 Impedimento ou perturbação de cerimônia funerária 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Contra enterro ou cerimônia fúnebre 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Figura majorada 8 Pena e ação penal Art 210 Violação de sepultura 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Furto em sepultura tipificação 8 Pena e ação penal Art 211 Destruição subtração ou ocultação de cadáver 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Objeto material do crime cadáver 42 O corpo do natimorto e o feto como objeto material 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 212 Vilipêndio a cadáver 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Título VI DOS CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL 1 Crimes contra a liberdade e a dignidade sexual 2 Alterações da Lei n 111062005 3 Impropriedade do título Dos crimes contra os costumes 4 Adequação do bem jurídico tutelado 41 Pluralidade de bens jurídicos tutelados 42 Liberdade sexual faculdade de escolha 5 Moral sexual não é o bem jurídico tutelado 6 Abrangência do Título VI Capítulo I Dos crimes contra a liberdade sexual Art 213 Estupro 1 Considerações preliminares 2 Rigores dos povos antigos 3 Unificação dos crimes sexuais violentos 4 Bem jurídico tutelado 41 Liberdade sexual feminina 42 Limitações eticamente toleráveis 5 Sujeitos ativo e passivo 51 Sujeito ativo de estupro 511 Prostituta vítima e autora de estupro 512 Qualquer dos cônjuges pode ser autor 52 Sujeito passivo de estupro 521 Homem sujeito passivo de estupro 6 Tipo objetivo adequação típica 61 Um conceito abrangente de estupro 62 Primeira modalidade constranger à conjunção carnal 621 Introdução de dedos na vagina 622 Atos preliminares são absorvidos pela ação principal 63 Segunda modalidade constranger à prática de outro ato libidinoso 631 Lacuna na forma de permitir 632 Atos de libidinagem in genere 64 Modus operandi violência ou grave ameaça 641 Grave ameaça violência moral 642 Irrelevância da injustiça do mal prometido 643 Dissenso da vítima nível de resistência do ofendido 7 Importunação ofensiva ao pudor e o princípio da proporcionalidade 71 Desproporcionalidade dos respectivos desvalores 8 Beijo lascivo e regiões pudendas 9 Estupro qualificado pelo resultado lesão grave ou morte da vítima 91 Tratamento semelhante à lesão seguida de morte 92 Resultado doloso não há concurso de crimes 93 Abrangência da lesão corporal grave 94 Estupro e morte da vítima equiparação equivocada 10 Tipo subjetivo adequação típica 101 Fim de satisfazer a própria lascívia desnecessidade 11 Consumação do crime de estupro 12 Admissibilidade da tentativa 13 Classificação doutrinária 14 Pena e ação penal 141 Aplicação de majorantes especiais 142 Natureza da ação penal Art 214 Revogado pela Lei n 12015 de 782009 Art 215 Violação sexual mediante fraude 1 Considerações preliminares 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeito ativo 4 Sujeito passivo 5 Tipo objetivo adequação típica 51 Ter conjunção carnal com alguém 511 Necessidade típica vítima ludibriada 512 Mulher honesta discriminação superada 52 Praticar outro ato libidinoso com alguém 521 Semelhança atentado ao pudor mediante fraude 522 Desígnios autônomos 53 Meios ou formas de execução das modalidades de violação sexual 531 Mediante fraude 5311 Idoneidade da fraude indispensabilidade 5312 Estelionato sexual difícil caracterização 532 Outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação da vontade da vítima 5321 Previsão analógica similitude ao paradigma 5322 Mulher desonesta erro de tipo e erro de proibição 6 Tipo subjetivo adequação típica 61 Elemento intelectual do dolo 62 Elemento volitivo 63 Elemento subjetivo especial do injusto crime de tendência 631 Crimes de tendência 7 Consumação da violação fraudulenta 71 Admissibilidade da tentativa 8 Classificação doutrinária 9 Pena e ação penal Art 216 Revogado pela Lei n 12015 de 782009 Art 216A Assédio sexual 1 Considerações preliminares 11 Princípio da intervenção mínima 12 Assédio sexual significado jurídico 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeito ativo do assédio sexual 4 Sujeito passivo do assédio sexual 5 Tipo objetivo adequação típica 51 Dificuldade interpretativa equivocada construção frasal 52 Solução da dificuldade linguística 53 Crime de ação livre 54 Taxatividade da tipicidade 55 Dano ou prejuízo à vítima 56 Desnecessidade da prática de atos libidinosos 57 Prática de ameaça grave excesso retórico 58 Condição especial relação de hierarquia ou ascendência 581 Relação superiorsubalterno 582 Vantagem ou favorecimento sexual 6 Patrão e empregado doméstico abrangência da tipificação brasileira 61 Professores e alunos atipicidade de eventual assédio 62 Atipicidade da relação incestuosa 7 Tipo subjetivo adequação típica 8 Consumação e tentativa 9 Classificação doutrinária 10 Onus probandi extensão e limites 11 Absoluta insuficiência de indícios 12 Importunação ofensiva ao pudor e assédio sexual 13 Constrangimento ilegal e assédio sexual 14 Assédio sexual e assédio moral 15 Causas de aumento de pena 16 Veto do parágrafo único 161 Fundamentos do veto presidencial 17 Pena e natureza da ação penal 171 Pena cominada 172 Correção na previsão da majorante até um terço 173 Engessamento do julgador desrecomendável 174 Natureza da ação penal Capítulo II Dos crimes sexuais contra vulnerável Art 217 Revogado pela Lei n 11106 de 2832005 Art 217A Estupro de vulnerável 1 Considerações preliminares 2 Menor vulnerável e o tratamento do ECA 3 A verdade real e a vitimização secundária 4 Vitimização primária e vitimização secundária 5 Abuso sexual intrafamiliar 6 Menor sujeito de direitos e não apenas objeto 7 Produção de prova sem revitimizar 8 Proteção do menor sem revitimizálo 9 Bem jurídico tutelado 91 Não há autonomia suficiente para falarse em liberdade 10 Sujeito ativo 11 Sujeito passivo 12 Vulnerabilidade e a violência presumida 121 Concepções distintas de vulnerabilidade 122 Dissimulação da violência presumida 123 Tentativa de impedir orientação do STF 13 Tipo objetivo adequação típica 131 Fundamento da punição presumida incapacidade 132 Misto de estupro antigo e atentado violento ao pudor 133 Prática de conjunção carnal com menor de 14 anos 134 Prática de outro ato libidinoso com alguém 135 Dissenso da vítima nível de resistência do ofendido 136 Inexistência de grau de resistência 14 Tipo subjetivo adequação típica 141 Elementos do dolo consciência e vontade 142 Elemento subjetivo especial do injusto crime de tendência 143 Crimes de tendência 144 Especial fim fundamenta a ilicitude 145 Resultado lesão grave ou morte da vítima 15 Consumação do estupro de vulnerável 16 Admissibilidade da tentativa 17 Classificação doutrinária 18 Pena e ação penal Art 218 Lenocínio 1 Considerações preliminares 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeito ativo 4 Sujeito passivo 5 Tipo objetivo adequação típica 51 Fim do induzimento satisfazer a lascívia de outrem 52 Tipificação necessidade de contato físico 53 Distinguese da nova previsão do art 218 54 Punição do partícipe em crime de estupro de vulnerável 55 Limites da abrangência do art 218 56 A previsão do art 218 não exige contato físico 57 Induzimento e instigação 58 Instigação e princípio da taxatividade 6 Tipo subjetivo adequação típica 7 Consumação e tentativa 8 Classificação doutrinária 9 Pena e ação penal Art 218A Satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente 1 Considerações preliminares 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Interferência na liberdade de vontade 42 Meio executivo do crime 43 Não há participação direta da vítima 44 Na presença de alguém menor de quatorze anos 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Fim especial satisfazer a própria lascívia 7 Consumação do crime 71 Figura tentada 8 Classificação doutrinária 9 Majoração de pena 10 Pena e ação penal Art 218B Favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual de vulnerável 1 Considerações preliminares 11 Inovação terminológica 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Condutas que seduzem para o crime 42 Condutas que visam impedir o abandono 43 Meios morais visando impedimento do abandono 44 Não há necessidade de finalidade lucrativa 45 Revogação do art 244A do ECA 5 Menor de dezoito anos e extensão do conceito de vulnerável 51 Duas espécies de vulnerabilidade 52 Fórmulas de equiparação das menoridades 53 Ampliação do conceito de vulnerabilidade 54 Confusão entre moral e direito 55 Necessidade de comprovar a vulnerabilidade 6 Prática de libidinagem com vítima vulnerável de favorecimento da prostituição 61 Menor em condição de ser explorado sexualmente 62 Atipicidade da conduta do cliente ocasional 63 Inovação criminalizadora do legislador 64 Elementar normativa condição de vulnerável 65 Possível erro de tipo 7 Lacuna do inciso I do 2º do art 218B 71 Lacuna que não pode ser colmatada 8 Prática de ato libidinoso com menor de catorze anos 9 Responsabilidade penal objetiva proprietário ou responsável pelo local 91 Violação do princípio da legalidade 92 Inexistência de verbo nuclear 93 Tipo penal aberto 94 Direito penal de autor 95 Ausência de conduta descrita 10 Tipo subjetivo adequação típica 101 Erro de tipo desconhecimento de elementar típica 11 Consumação e tentativa 12 Classificação doutrinária 13 Pena e ação penal Capítulo III Do rapto Art 219 Rapto violento ou mediante fraude Revogado pela Lei n 11106 de 2632005 Art 220 Rapto consensual Revogado pela Lei n 11106 de 263 2005 Art 221 Diminuição de pena Revogado pela Lei n 11106 de 2632005 Art 222 Concurso de rapto e outro crime Revogado pela Lei n 11106 de 2632005 Capítulo IV Disposições gerais Art 223 Revogado pela Lei n 12015 de 782009 Art 224 Revogado pela Lei n 12015 de 782009 Art 225 Ação penal 1 Considerações preliminares previsão anterior 2 A ação penal nos crimes previstos nos capítulos I e II do Título VI 3 A ação penal nos crimes contra vítima vulnerável 31 Paradoxo restringe o exercício da liberdade sexual 32 Interpretação sistemática 33 Irrelevância da mens legislatoris erro crasso 34 A interpretação mais favorável ação pública condicionada 4 Violação do exercício da liberdade sexual 41 Imperativo de foro íntimo 42 Obrigatoriedade da ação inibirá denúncia de muitas vítimas 5 Inconstitucionalidade da publicização da ação penal 6 Injustificável polêmica sobre a vigência da Súmula 608 do STF 7 Estupro qualificado pelo resultado crime complexo 71 A especialidade da previsão constante do art 101 72 Prevalência da natureza dos fatos que compõem o crime complexo 73 Desnecessidade da Ação Direta de Inconstitucionalidade n 4301 8 Síntese sobre a definição de ação penal Art 226 Aumento da pena 1 A majoração da pena nos crimes sexuais 11 A inclusão de novos dados 12 Inalteração do art 226 2 Concurso de duas ou mais pessoas e concursus delincuencium 21 Coautoria e participação 22 Orientação do STF participação efetiva 23 Autoria e participação distinção legal 24 Impunibilidade do ajuste e determinação 3 Violação dos princípios moraisfamiliares 31 Abuso de autoridade 32 Relações domésticas de coabitação ou hospitalidade 33 Qualquer outro meio interpretação analógica 34 Maior censurabilidade 35 Concurso de causas de aumento 4 Parcelas de aumento Capítulo V Do lenocínio e do tráfico de pessoa para fim de prostituição ou outra forma de exploração sexual Art 227 Mediação para servir a lascívia de outrem 1 Considerações preliminares 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Desnecessidade de habitualidade ou venalidade 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Classificação doutrinária 8 Formas qualificadas 9 Concurso com crimes praticados com violência 91 Sistema do cúmulo material de penas 92 Possibilidade e concurso material 10 Pena e ação penal Art 228 Favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual 1 Considerações preliminares 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeito ativo 4 Sujeito passivo 41 Homossexual como sujeito passivo 5 Tipo objetivo adequação típica 51 Condutas incriminadas 52 Condutas sedutoras 53 Impedir o abandono da prostituição 54 Questionável punição do impedimento 55 Desnecessidade de fim de lucro 6 Tipo subjetivo adequação típica 61 Desnecessidade de elemento subjetivo especial do tipo 7 Consumação e tentativa 8 Classificação doutrinária 9 Redefinição das formas qualificadas 91 Manutenção da qualificadora relativa à violência 10 Pena e ação penal 101 Punição das figuras qualificadas Art 229 Casa de prostituição 1 Considerações preliminares 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeito ativo 4 Sujeito passivo 41 A coletividade não é sujeito passivo desta infração penal 5 Casa de prostituição 6 Tipo objetivo adequação típica 61 Exploração sexual sentido e alcance 62 Crime habitual 63 A tolerância das autoridades 7 Natureza e finalidade do estabelecimento 71 Migração dos prostíbulos para a zona urbana 72 Finalidade específica do local exploração sexual 73 Hotéis e motéis de alta rotatividade inadequação típica 74 Manutenção de hotéis e motéis inadequação típica 75 Bar e ginástica inadequação típica 8 Consentimento do ofendido e exclusão da antijuridicidade 81 Tolerância da sociedade com o exercício da prostituição 82 Local adequado para o exercício da prostituição 83 Prostituição exercício de atividade lícita 84 Efeitos do consentimento da ofendida 9 Tipo subjetivo adequação típica 10 Consumação do crime 11 Figura tentada 12 Classificação doutrinária 13 Pena e ação penal Art 230 Rufianismo 1 Considerações preliminares 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeito ativo 4 Sujeito passivo 5 Tipo objetivo adequação típica 51 Somente a prostituição alheia 52 Consentimento da vítima 53 Necessidade da característica da habitualidade 6 Tipo subjetivo adequação típica 7 Consumação do crime habitual 71 Figura tentada 8 Classificação doutrinária 9 Formas qualificadas 91 Nova definição de concurso material de crimes 92 Sistema de cumulação material de crime 10 Pena e ação penal Art 231 Tráfico internacional de pessoa para fim de exploração sexual 1 Considerações preliminares 2 Início da modernização da legislação 3 Inclusão de finalidade especial do tipo 4 Destinatários países de terceiro mundo 5 Bem jurídico tutelado 6 Sujeito ativo 7 Sujeito passivo 8 Tipo objetivo adequação típica 9 A finalidade de lucro 10 Figuras equiparadas 11 Irretroatividade das novas condutas 12 Consciência de que se trata de pessoa traficada 13 Omissão da conduta vender 14 Tipo subjetivo adequação típica 15 Consumação e tentativa 16 Classificação doutrinária 17 Pena e ação penal Art 231A Tráfico interno de pessoa para fim de exploração sexual 1 Considerações preliminares 2 Bem jurídico tutelado 21 Bem jurídico genérico 3 Sujeitos ativo e passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Alterações introduzidas pela Lei n 120152009 42 A proibição limitase ao território nacional 43 Descriminalização de condutas 5 Figuras equiparadas 51 Consciência da condição de pessoa traficada 6 Tipo subjetivo adequação típica 61 Polêmica sobre o elemento subjetivo do tipo 62 Que venha exercer a prostituição 63 O resultado deve ser abrangido pelo dolo 64 Consequências das distintas redações 65 Consumação e tentativa 7 Classificação doutrinária 8 Pena e ação penal Art 232 Revogado pela Lei n 12015 de 782009 Capítulo VI Do ultraje público ao pudor Art 233 Ato obsceno 1 Considerações preliminares 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Exemplos clássicos de ato obsceno 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Classificação doutrinária 8 Pena e ação penal Art 234 Escrito ou objeto obsceno 1 Considerações preliminares 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 A inevitável descriminalização 42 Crime de ação múltipla fim especial 43 Descriminalização relativa a obras artísticas literárias e científicas 5 Tipo subjetivo adequação típica 51 O fim especial do tipo 6 Consumação e tentativa 7 Classificação doutrinária 8 Pena e ação penal Capítulo VII Disposições gerais Art 234A Aumento da pena 1 Disposições gerais acrescidas pela Lei n 120152009 11 Se do crime resultar gravidez 12 Resultando gravidez da infratora 13 Ofensora sem direito 14 Contaminação da vítima com doença sexualmente transmissível 141 Conhecimento de sua situação pessoal Art 234B Processos que devem tramitar em segredo de justiça Art 234C Vetado Título VII DOS CRIMES CONTRA A FAMÍLIA Capítulo I Dos crimes contra o casamento Art 235 Bigamia 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Bigamia e falsidade documental 8 Bigamia pluralidade de crimes 9 Questões especiais 10 Pena e ação penal Art 236 Induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Condição de procedibilidade 8 Prescrição termo inicial 9 Questões especiais 10 Pena e ação penal Art 237 Conhecimento prévio de impedimento 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Art 238 Simulação de autoridade para celebração de casamento 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Convalidação do ato e tipicidade 8 Questões especiais 9 Pena e ação penal Art 239 Simulação de casamento 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Elemento normativo do tipo 32 Crime subsidiário 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Art 240 Adultério Revogado pela Lei n 11106 de 2832005 Capítulo II Dos crimes contra o estado de filiação Art 241 Registro de nascimento inexistente 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Art 242 Parto suposto Supressão ou alteração de direito inerente ao estado civil de recémnascido 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Forma privilegiada 8 Falsidade ideológica absorção 9 Questões especiais 10 Pena e ação penal Art 243 Sonegação de estado de filiação 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Abandono em outro local 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Limitação à liberdade de prova penal 9 Pena e ação penal Capítulo III Dos crimes contra a assistência familiar Art 244 Abandono material 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Ascendente maior de sessenta anos 32 Crime cumulativo misto 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Art 245 Entrega de filho menor a pessoa inidônea 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Forma qualificada 1º 8 Questões especiais 9 Pena e ação penal Art 246 Abandono intelectual 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Art 247 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Habitualidade 32 Pessoa viciosa ou de má vida 33 Espetáculo capaz de perverter ou ofender o pudor 34 Mendigo que excita a comiseração pública 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Capítulo IV Dos crimes contra o pátrio poder tutela ou curatela Art 248 Induzimento a fuga entrega arbitrária ou sonegação de incapazes 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Art 249 Subtração de incapazes 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Meios ou formas de execução 32 Crime subsidiário 33 Fuga do menor atipicidade 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Subtração de incapazes e outros crimes 8 Perdão judicial 9 Questões especiais 10 Pena e ação penal Título VIII DOS CRIMES CONTRA A INCOLUMIDADE PÚBLICA Capítulo I Dos crimes de perigo comum Art 250 Incêndio 1º Aumento de pena 2º Incêndio culposo 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Fogo ou incêndio não perigoso 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Perigo a pessoa certa e determinada 6 Consumação e tentativa 7 Classificação doutrinária 8 Formas qualificadas 9 Forma culposa 10 Concurso com o crime de homicídio 11 Incêndio em mata ou floresta 12 Incêndio em lavoura ou pastagem 13 Poluição atmosférica decorrente de incêndio 14 Questões especiais 15 Pena e ação penal Art 251 1º Explosão 2º Aumento de pena 3º Modalidade culposa 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Forma privilegiada 8 Formas majoradas 9 Forma culposa 10 Dano qualificado 11 Questões especiais 12 Pena e ação penal Art 252 Uso de gás tóxico ou asfixiante Parágrafo único Modalidade culposa 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Toxicidade do gás potencialidade lesiva 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Forma culposa 8 Letalidade do gás irrelevância 9 Questões especiais 10 Pena e ação penal Art 253 Fabrico fornecimento aquisição posse ou transporte de explosivos ou gás tóxico ou asfixiante 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Elemento normativo sem licença da autoridade 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Art 254 Inundação 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Forma culposa 8 Inundação e perigo de inundação 9 Questões especiais 10 Pena e ação penal Art 255 Perigo de inundação 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Questões especiais 7 Pena e ação penal Art 256 Desabamento ou desmoronamento Parágrafo único Modalidade culposa 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Forma culposa 8 Questões especiais 9 Pena e ação penal Art 257 Subtração ocultação ou inutilização de material de salvamento 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Art 258 Formas qualificadas de crime de perigo comum 1 Crime qualificado pelo resultado 2 Majoração da pena 3 Concurso de crimes Art 259 Difusão de doença ou praga Parágrafo único Modalidade culposa 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Forma culposa 8 Questões especiais 9 Pena e ação penal Capítulo II Dos crimes contra a segurança dos meios de comunicação e transporte e outros serviços públicos Art 260 Perigo de desastre ferroviário 1º a 3º Desastre ferroviário 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Forma qualificada 8 Forma culposa 9 Atividade de cunho político 10 Questões especiais 11 Pena e ação penal Art 261 Atentado contra a segurança de transporte marítimo fluvial ou aéreo 1º Sinistro em transporte marítimo fluvial ou aéreo 2º Prática do crime com o fim de lucro 3º Modalidade culposa 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Forma qualificada 8 Forma culposa 9 Questões especiais 10 Pena e ação penal Art 262 Atentado contra a segurança de outro meio de transporte 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Forma qualificada 7 Forma culposa 8 Questões especiais 9 Pena e ação penal Art 263 Forma qualificada Art 264 Arremesso de projétil 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Forma qualificada 8 Questões especiais 9 Pena e ação penal Art 265 Atentado contra a segurança de serviço de utilidade pública 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Espécies de serviços públicos 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Forma majorada 8 Questões especiais 9 Pena e ação penal Art 266 Interrupção ou perturbação de serviço telegráfico ou telefônico 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Abrangência do tipo penal 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Forma majorada 8 Questões especiais 9 Pena e ação penal Capítulo III Dos crimes contra a saúde pública Art 267 Epidemia 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Forma qualificada 8 Forma culposa 9 Questões especiais 10 Pena e ação penal Art 268 Infração de medida sanitária preventiva 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Forma majorada 8 Questões especiais 9 Pena e ação penal Art 269 Omissão de notificação de doença 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Art 270 1º Envenenamento de água potável ou de substância alimentícia ou medicinal 2º Modalidade culposa 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Forma culposa 8 Pena e ação penal Art 271 Corrupção ou poluição de água potável Parágrafo único Modalidade culposa 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Forma culposa 8 Questões especiais 9 Pena e ação penal Art 272 1º A e 1º Falsificação corrupção adulteração ou alteração de substância ou produtos alimentícios 2º Modalidade culposa 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Ampliação de crimes hediondos 32 Proteção a bebidas crime hediondo 4 Potencialidade lesiva das ações 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Classificação doutrinária 8 Forma culposa 9 Questões especiais 10 Pena e ação penal Art 273 1º a 1º B Falsificação corrupção adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais 2º Modalidade culposa 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Objeto material do crime 32 Inclusão de novos objetos materiais 33 Produtos destinados a fins terapêuticos ou medicinais 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Crime hediondo 6 Consumação e tentativa 7 Classificação doutrinária 8 Forma culposa 9 Questões especiais 10 Pena e ação penal Art 274 Emprego de processo proibido ou de substância não permitida 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Revestimento 32 Gaseificação artificial 33 Substância corante aromática ou antisséptica 34 Qualquer outra substância não permitida 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Art 275 Invólucro ou recipiente com falsa indicação 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Art 276 Produto ou substância nas condições dos dois artigos anteriores 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Concurso de crimes 8 Questões especiais 9 Pena e ação penal Art 277 Substância destinada à falsificação 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Substância destinada à falsificação 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Art 278 Outras substâncias nocivas à saúde pública Parágrafo único Modalidade culposa 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Crime subsidiário e alternativo 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Forma culposa 8 Questões especiais 9 Pena e ação penal Art 279 Substância avariada Revogado pela Lei n 8137 de 27 121990 Art 280 Medicamento em desacordo com receita médica Parágrafo único Modalidade culposa 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Forma culposa parágrafo único 8 Questões especiais 9 Pena e ação penal Art 281 Revogado pela Lei n 6368 de 21101976 Art 282 Exercício ilegal da medicina arte dentária ou farmacêutica 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Forma qualificada 8 Exercício ilegal de outras profissões 9 Questões especiais 10 Pena e ação penal Art 283 Charlatanismo 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Art 284 Curandeirismo 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Forma qualificada 8 Concurso com outros crimes 9 Questões especiais 10 Pena e ação penal Art 285 Forma qualificada Título IX DOS CRIMES CONTRA A PAZ PÚBLICA Art 286 Incitação ao crime 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Art 287 Apologia de crime ou criminoso 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Art 288 Quadrilha ou bando 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Forma qualificada 8 Quadrilha ou bando e concurso de pessoas 9 Questões especiais 10 Pena e ação penal Título X DOS CRIMES CONTRA A FÉ PÚBLICA Capítulo I Da moeda falsa Art 289 Moeda falsa 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Classificação doutrinária 6 Falsificação grosseira atipicidade 7 Questões especiais 8 Figura do 1º crime subsequente à falsificação 9 Figura privilegiada crime subsequente 10 Figura qualificada 3º 101 Desviar e fazer circular moeda não autorizada 4º 11 Concurso de crimes 12 Questões especiais 13 Pena e ação penal Art 290 Crimes assimilados ao de moeda falsa 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Forma qualificada 8 Questões especiais 9 Pena e ação penal Art 291 Petrechos para falsificação de moeda 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Art 292 Emissão de título ao portador sem permissão legal 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Capítulo II Da falsidade de títulos e outros papéis públicos Art 293 Falsificação de papéis públicos 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Inovações da Lei n 110352004 32 Post factum impunível e exaurimento do crime 33 Selo falsificado destinado a controle tributário 34 Crime especial quanto ao autor 35 Responsabilidade penal dos camelôs 5º 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Forma privilegiada 8 Questões especiais 9 Pena e ação penal Art 294 Petrechos de falsificação 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Art 295 Capítulo III Da falsidade documental Art 296 Falsificação do selo ou sinal público 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Forma majorada 71 Prevalecendose do cargo 8 Questões especiais 9 Pena e ação penal Art 297 Falsificação de documento público 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Documento público 4 Folha de pagamento ou documento de informações 3º I 41 Carteira de Trabalho e Previdência Social do empregado II 42 Documento contábil ou qualquer outro documento III 5 Falsidade ideológica confundida com falsidade material 6 Tipo subjetivo adequação típica 7 Consumação e tentativa 8 Classificação doutrinária 9 Figura majorada 10 Falsificação grosseira estelionato 11 Falsificação e sonegação fiscal absorção 12 Falsificação total ou parcial irrelevância 13 Questões especiais 14 Pena e ação penal Art 298 Falsificação de documento particular 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Art 299 Falsidade ideológica 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Falsidade ideológica e falsidade material distinção 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Forma qualificada 8 Falsidade e simulação fraudulenta 9 Folha assinada em branco 10 Questões especiais 11 Pena e ação penal Art 300 Falso reconhecimento de firma ou letra 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Firma ou letra definições 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Art 301 Certidão ou atestado ideologicamente falso 1º e 2º Falsidade material de atestado ou certidão 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo subjetivo adequação típica 4 Consumação e tentativa 5 Classificação doutrinária 6 Figura majorada 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Art 302 Falsidade de atestado médico 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Forma qualificada 8 Questões especiais 9 Pena e ação penal Art 303 Reprodução ou adulteração de selo ou peça filatélica 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Art 304 Uso de documento falso 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Apresentação espontânea ou solicitação de autoridade 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Art 305 Supressão de documento 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Documento original 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Supressão de documento e crime de dano 8 Questões especiais 9 Pena e ação penal Capítulo IV De outras falsidades Art 306 Falsificação do sinal empregado no contraste de metal precioso ou na fiscalização alfandegária ou para outros fins 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Art 307 Falsa identidade 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Art 308 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Como próprio 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Art 309 Fraude de lei sobre estrangeiros 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Atribuir falsa qualidade 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Questões especiais 8 Pena e ação penal Art 310 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Norma penal em branco 8 Questões especiais 9 Pena e ação penal Art 311 Adulteração de sinal identificador de veículo automotor 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Contribuição de funcionário público 32 Qualquer sinal identificador 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 6 Classificação doutrinária 7 Figura majorada 8 Questões especiais 9 Pena e ação penal Capítulo V Das fraudes em certames de interesse público Art 311A Fraudes em certames de interesse público 1 Considerações preliminares 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Abrangência da divulgação e conteúdo do objeto sigiloso 42 Elemento normativo do tipo indevidamente 5 Permissão ou facilitação de acesso a conteúdo sigiloso referido no caput 6 Tipo subjetivo adequação típica 7 Consumação e tentativa 8 Figura majorada fato cometido por funcionário público 9 Pena e ação penal Título XI DOS CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA Capítulo I Dos crimes praticados por funcionário público contra a administração em geral Art 312 1º Peculato 2º e 3º Peculato culposo 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 21 Dupla ofensividade 22 Pluriofensividade do peculato 23 Crime funcional 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo 32 Sujeito passivo 321 Estado como sujeito passivo direto 4 Pressuposto do crime de peculato 41 Insuficiência da posse prévia em razão de cargo 42 Em razão do cargo relação objetiva 5 Tipo objetivo adequação típica 51 Peculatoapropriação objeto material 1ª parte 511 Objeto material dinheiro ou qualquer bem móvel 512 Objeto fungível e infungível 513 Mistura de dinheiro atipicidade 514 Prestação de serviço atipicidade 52 Peculatodesvio 2ª parte 521 Natureza do proveito exigido 522 Posse viciada inadmissibilidade 53 Peculatofurto 531 Posse momentânea atipicidade 54 Peculato culposo 541 Participação culposa em crime doloso impossibilidade 542 Reparação de dano extinção da punibilidade 6 Tipo subjetivo adequação típica 61 Atualidade do dolo 7 Consumação e tentativa 71 Consumação 72 Tentativa 8 Comunicabilidade da condição de funcionário público 9 Sonegação de tributo incidente sobre produto de crime impossibilidade moral e jurídica 91 Delimitação do tema 92 Disponibilidade econômica ou jurídica versus confisco 921 Disponibilidade econômica ou jurídica 922 Disponibilidade de valores de origem criminosa 93 Ofensa ao princípio da capacidade contributiva 931 Capacidade contributiva e efeitos da condenação penal 932 Confisco penal e isonomia tributária 94 Ofensa ao princípio da moralidade administrativa 941 Imoralidade na tributação de produto de crime 10 Pena e ação penal Art 313 Peculato mediante erro de outrem 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 21 Objeto material 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo 32 Sujeitos passivos 4 Ausência do pressuposto do crime de peculato posse prévia da res 41 No exercício de cargo público 5 Tipo objetivo adequação típica 51 Máfé subsequente 52 Erro de outrem não provocado 53 Objeto material dinheiro ou qualquer outra utilidade 54 Equiparação com estelionato impropriedade 55 Recusa de devolução da coisa havida por erro 56 O erro como elementar típica 561 Irrelevância da causa do erro 6 Tipo subjetivo adequação típica 7 Consumação e tentativa 71 Consumação 72 Tentativa 8 Pena e ação penal Art 313A Inserção de dados falsos em sistema de informações 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 21 Objeto material dados verdadeiros dos sistemas informatizados 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo 32 Sujeito passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Facilitar sua inserção 42 Alterar ou excluir dados corretos 43 Somente alteração ou exclusão indevidas 44 Obtenção de vantagem indevida elemento normativo 45 Natureza da vantagem indevida 5 Inserção de dados falsos em sistemas de informações e estelionato 51 Equiparações desautorizadas 52 Dessemelhanças com o estelionato 53 Natureza da finalidade especial 6 Tipo subjetivo adequação típica 7 Consumação e tentativa 8 Pena e ação penal Art 313B Modificação ou alteração não autorizada de sistema de informações 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 21 Objeto material sistema de informações e de informatização 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo 32 Sujeito passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Objeto material 42 Elemento normativo especial sem autorização ou solicitação de autoridade competente 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Classificação doutrinária 7 Consumação e tentativa 8 Causa de aumento produção de dano 9 Pena e ação penal Art 314 Extravio sonegação ou inutilização de livro ou documento 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo 32 Sujeitos passivos 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Entendimento doutrinário clássico 42 Entendimento doutrinário recente 43 Nossa interpretação sobre extraviar 431 Extraviar natureza omissiva 432 Reforma Penal de 1984 figura do garantidor 433 Pressupostos do crime omissivo impróprio 434 Modalidade culposa do Código argentino 5 Sonegar e inutilizar 51 Em razão do cargo 52 Livro oficial ou qualquer documento 53 Violação do dever funcional 6 Subsidiariedade expressa se não constituir crime mais grave 7 Tipo subjetivo adequação típica 8 Consumação e tentativa 9 Subsidiariedade expressa crimes residuais 10 Pena e ação penal Art 315 Emprego irregular de verbas ou rendas públicas 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo 311 Ordenador de despesas 32 Sujeito passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Necessidade de leis orçamentárias 42 Aplicação diversa da estabelecida em lei e despesa não autorizada por lei 43 Despesa justificada embora não autorizada por lei 44 Inexigibilidade de conduta diversa 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 61 Consumação 62 Tentativa 7 Pena e ação penal Art 316 Concussão 1º e 2º Excesso de exação 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo 32 Sujeito passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Necessidade da elementar normativa vantagem indevida 42 Natureza da vantagem indevida 43 Corrupção passiva e concussão na dúvida a menos grave 44 Exigência de vantagem indevida para o órgão público excesso de exação 441 Destinatário do produto da concussão particular ou ente público 5 Tipo subjetivo adequação típica 51 Elemento subjetivo especial para si ou para outrem 6 Consumação e tentativa 61 Consumação 62 Tentativa inadmissibilidade 7 Excesso de exação 71 Tipo objetivo adequação típica 72 Tarifas emolumentos e custas atipicidade 73 Sujeitos do crime de excesso de exação 74 Tipo subjetivo adequação típica 8 Desvio de produto recebido indevidamente 9 Consumação e tentativa 10 Pena e ação penal Art 317 Corrupção passiva 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo 32 Sujeito passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Elemento normativo especial da ilicitude vantagem indevida 42 Corrupção antecedente e consequente irrelevância 421 Inaplicabilidade na corrupção ativa 43 Vantagem indevida e os princípios da adequação social e da insignificância 44 Reembolso de despesas indenizáveis atipicidade 45 Natureza da vantagem indevida patrimonial e extrapatrimonial 46 A indispensável bilateralidade residual no crime de corrupção 461 Modalidade sui generis de autoria colateral 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 61 Consumação 62 Tentativa 7 Figura majorada parágrafo único 8 Figura privilegiada pedido ou influência 9 Pena e ação penal Art 318 Facilitação de contrabando ou descaminho 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Competência da Justiça Federal 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 319 Prevaricação 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo 32 Sujeito passivo 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Ação de retardar 42 Ação de deixar de praticar 421 Ausência de prazo dificuldade na sua caracterização 422 Elementar normativa indevidamente 43 Praticar ato de ofício contra disposição legal 431 Proporcionalidade ignorada 44 Ato de ofício próprio da função ou cargo 45 Satisfação de interesse ou sentimento pessoal 5 A prevaricação praticada por juiz no exercício da função jurisdicional ou administrativa 51 Prevaricação judicial no Código Penal espanhol 52 Motivação similar nos dois diplomas legais 6 Tipo subjetivo adequação típica 61 Satisfação de interesse ou sentimento pessoal 62 Satisfação de interesse ou sentimento de terceiro 7 Consumação e tentativa 8 Pena e ação penal Art 319A Prevaricação imprópria 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Impropriedade dessa criminalização 4 Sujeitos do crime 41 Sujeito ativo 42 Sujeito passivo 5 Tipo objetivo adequação típica 51 Crime omissivo próprio deixar de vedar 52 A ação do diretor afasta a tipicidade 53 Abrangência do elemento subjetivo 54 Ato de ofício deixar de cumprir dever de vedar acesso 6 Pressupostos fundamentais do crime omissivo 7 Tipo subjetivo adequação típica 8 Consumação e tentativa 81 Consumação 82 Tentativa impossibilidade 9 Pena e ação penal Art 320 Condescendência criminosa 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Criminalização desnecessária 5 Tipo subjetivo adequação típica 51 Especial motivo de agir por indulgência 6 Consumação e tentativa 7 Classificação doutrinária 8 Pena e ação penal Art 321 Advocacia administrativa 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Objeto material interesse privado 42 Patrocínio direto ou indireto 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Forma qualificada 8 Causa de aumento de pena 9 Questões especiais derrogação 10 Pena e ação penal Art 322 Violência arbitrária 1 Considerações introdutórias 11 Entendimento do Supremo Tribunal Federal 12 Entendimento do TACRIMSP 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Violência praticada no exercício da função ou a pretexto de exercêla 42 Violência arbitrária crime de policiais 43 Violência arbitrária em concurso com violência 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 323 Abandono de função 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Abandono sem afastamento do cargo 42 Abandono temporário de função pública 43 Desnecessidade da ocorrência de prejuízo 44 Acefalia do cargo necessidade 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Formas qualificadas prejuízo público e faixa de fronteira 71 O prejuízo não pode ser representado pelo próprio abandono 72 Abandono em local de fronteira 8 Pedido de aposentadoria ou demissão 9 Pena e ação penal Art 324 Exercício funcional ilegalmente antecipado ou prolongado 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Entrar no exercício de função e continuar a exercêla 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 325 Violação de sigilo funcional 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Ausência de notoriedade e dever funcional 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Novas figuras penais acrescentadas pela Lei n 99832000 61 Violação do sigilo através do sistema informatizado da Administração Pública 62 Utilização indevida de acesso restrito 7 Consumação e tentativa 8 Forma qualificada 9 Pena e ação penal Art 326 Violação do sigilo de proposta de concorrência 1 Considerações especiais Art 327 Funcionário público 1 Conceituação penal de funcionário público 2 Conceito de funcionário público mesma amplitude para sujeitos ativo e passivo 3 Equiparação do conceito de funcionário público irretroatividade 31 Ampliação vigente a partir de julho de 2000 não há repristinação de jurisprudência pretérita 4 Atividade típica de Administração Pública 5 Causa especial genérica de aumento Capítulo II Dos crimes praticados por particular contra a administração em geral Art 328 Usurpação de função pública 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Prática de ato de ofício da função usurpada 42 Usurpação e abuso de poder 43 Exercício de função por delegação 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Forma qualificada auferimento de vantagem 71 Obtenção de vantagem fundamento da reprovação 8 Contravenções penais 9 Pena e ação penal Art 329 Resistência 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Oposição ativa mediante violência ou ameaça 411 Violência física ou ameaça 412 Atualidade da prática do ato de ofício 413 Violência contra o funcionário ou seu auxiliar 42 A qualidade ou condição de funcionário competente do sujeito passivo 43 A legalidade do ato a ser executado 431 Direito de resistência ao abuso da autoridade 432 Ilegalidade do ato legitima oposição 433 Resistência contra ato legal taxatividade 434 Ilegalidade e injustiça do ato distinção 44 Elemento subjetivo informador da conduta 441 Elemento subjetivo especial do tipo 5 Consumação e tentativa 6 Forma qualificada não realização do ato 7 Resistência e concurso com outro crime violento cúmulo material de penas 71 Violência crime autônomo 72 Lesões corporais ou morte 8 Resistência desacato e desobediência 9 Pena e ação penal Art 330 Desobediência 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Desobediência praticada por funcionário público 411 Desobediência à ordem judicial 42 Desobediência e cominação de sanções civis ou administrativas atipicidade 421 Orientação jurisprudencial 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 331 Desacato 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Desacato e resistência 411 Ofensa praticada na presença do ofendido 42 No exercício da função ou em razão dela 421 Relação causal no exercício da função ou em razão dela 422 Desacato e resistência 423 Desacato ambiente hostil e seus fundamentos políticos 424 Desacato forçado pela ação da autoridade 425 Crítica sem propósito de ofender atipicidade 426 Embriaguez e desacato incompatibilidade 5 Tipo subjetivo adequação típica 51 Elemento subjetivo especial do injusto 6 Consumação e tentativa 61 Tentativa e absorção de infrações menores 7 Pena e ação penal Art 332 Tráfico de influência 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Tráfico de influência e exploração de prestígio 42 Obtenção de vantagem a pretexto de influir 43 Absorção do crime de estelionato 44 Objeto material vantagem ou promessa dela 5 Responsabilidade penal do beneficiáriovítima do tráfico de influência 51 A pretexto de influir duplo sentido 52 Gozar de influência ou pretextar gozála 53 Relação triangular entre sujeito ativo funcionário público e beneficiário da influência 531 Entendimento da doutrina tradicional 54 Responsabilidade do beneficiário do tráfico 55 Outros equívocos da doutrina tradicional 56 Lobistas neologismo dos exploradores de prestígio 57 A impunibilidade do pseudocrime putativo erro jurídicopenal 571 A discutível escusabilidade de determinados erros punibilidade do pagador da influência 6 Tipo subjetivo adequação típica 7 Consumação e tentativa 71 Recebimento da vantagem prometida exaurimento 8 Forma majorada 9 Pena e ação penal Art 333 Corrupção ativa 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 21 A moralidade da Administração Pública e o princípio da insignificância 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Oferecer vantagem indevida 42 A funcionário público 43 Para determinálo a praticar ato de ofício 5 Tipo subjetivo adequação típica 51 Elemento subjetivo especial do tipo 6 Consumação e tentativa 7 Figura majorada parágrafo único 8 Pena e ação penal Art 334 Contrabando ou descaminho 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Contrabando natureza e forma 42 Descaminho natureza e forma 5 Crimes equiparados a contrabando ou descaminho 51 Prática de navegação de cabotagem fora dos casos permitidos em lei 52 Prática de fato assemelhado em lei especial a contrabando ou descaminho 53 Uso comercial ou industrial de mercadoria importada clandestina ou fraudulentamente ou que sabe ser produto de contrabando ou descaminho 531 Vendedores ambulantes possíveis sujeitos ativos 532 Conflito aparente de normas 54 Elemento normativo no exercício de atividade comercial ou industrial 55 Receptação de produto de contrabando ou descaminho 6 Contrabando e descaminho distinção fática e semelhança jurídica 61 Distinção entre contrabando ou descaminho e crimes contra a ordem tributária 7 Aplicação analógica do art 34 da Lei n 924995 no crime de descaminho 71 Extinção da punibilidade do descaminho pelo pagamento do tributo devido 72 Analogia in bonam partem e tratamento isonômico 721 Irrelevância da diversidade de bens jurídicos 8 Tipo subjetivo adequação típica 81 Erro de tipo escusável ou inescusável 9 Consumação e tentativa 10 Figura majorada contrabando em transporte aéreo 11 Descaminho limite fiscal e princípio da insignificância 12 Pena e ação penal Art 335 Impedimento perturbação ou fraude de concorrência 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Concorrência ou venda em hasta pública distinção 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 336 Inutilização de edital ou de sinal 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Local de afixação do edital 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 337 Subtração ou inutilização de livro ou documento 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Objeto material livro oficial processo ou documento 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 337A Sonegação de contribuição previdenciária 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Omissão em folha de pagamento ou outro documento previdenciário 42 Omissão de lançamentos de outros descontos previdenciários 43 Omissão de receitas lucros ou remunerações pagas ou creditadas 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Causas extintivas da punibilidade com ou sem pagamento 71 Causa extintiva de punibilidade sem pagamento dos tributos devidos 72 Perdão judicial ou aplicação alternativa da pena de multa 8 Aplicação do art 34 da Lei n 934995 analogia in bonam partem 81 Isonomia no tratamento penal tributário 9 Causa de diminuição de pena 10 Pena e ação penal Capítulo IIA Dos crimes praticados por particular contra a administração pública estrangeira Art 337B Corrupção ativa em transação comercial internacional 1 Considerações introdutórias e fundamentos políticoconstitucionais 2 Novo crime antecedente ao de lavagem de dinheiro 3 Bem jurídico protegido 4 Sujeitos do crime 5 Tipo objetivo adequação típica 51 Ato de ofício relacionado à transação comercial internacional 6 Tipo subjetivo adequação típica 7 Consumação e tentativa 8 Causa de aumento de pena 9 Pena e ação penal Art 337C Tráfico de influência em transação comecial internacional 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Objeto material vantagem ou promessa dela 42 Postular vantagem a pretexto de influir 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Causa de aumento de pena 8 Pena e ação penal 9 Conceituação penal de funcionário público caput 10 Equiparação e causa de aumento de pena Art 337D Funcionário público estrangeiro 1 Conceituação penal de funcionário público caput 2 Equiparação e causa de aumento de pena Capítulo III Dos crimes contra a administração da justiça Art 338 Reingresso de estrangeiro expulso 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Só reingressa quem saiu do território 42 Expulsão de estrangeiro pressuposto do crime de reingresso 421 Natureza da expulsão pena ou medida preventiva 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 339 Denunciação caluniosa 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Direito de petição exercício regular de direito 41 A verdade subjetiva é suficiente para afastar o dolo 42 Abuso de autoridade e abuso de poder distinção 5 Tipo objetivo adequação típica 51 Fato definido como crime 52 Indispensabilidade da inocência do sujeito ativo 53 Espontaneidade da denunciação caluniosa 6 Novidades da Lei n 100282000 investigação administrativa inquérito civil ou ação de improbidade administrativa 61 Conflito aparente de leis 62 Improbidade administrativa e princípio da fragmentariedade 63 Lacuna legal comissão parlamentar de inquérito 7 Tipo subjetivo adequação típica 71 Admissibilidade de dolo eventual 72 Elemento normativo de que o sabe inocente 8 Consumação e tentativa 9 Figura majorada 1º 10 Forma privilegiada ou minorada 2º 11 Concurso de crimes e conflito aparente de normas 111 Denunciação caluniosa e calúnia 112 Denunciação caluniosa e crimes contra a honra 12 Pena e ação penal Art 340 Comunicação falsa de crime ou de contravenção 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Pretendese evitar a máfé 42 Irrelevância dos motivos determinantes 43 Comunicação falsa de infração penal e denunciação caluniosa 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 341 Autoacusação falsa 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Autoacusação perante a autoridade 5 Tipo subjetivo adequação típica 51 Irrelevância da motivação da autoacusação 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 342 Falso testemunho ou falsa perícia 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Recusarse a responder e recusarse a prestar depoimento 42 Modalidades de falso testemunho positiva negativa e omissiva 43 Limites do depoimento testemunhal 44 Falsidade sobre fato juridicamente relevante 45 Teorias sobre conteúdo e essência da falsidade 46 Falsidade sobre a qualificação pessoal atipicidade da conduta 47 Inverdades na qualificação pessoal da testemunha 48 A paradoxal condição de imputado travestida na de testemunha 49 Falsidade da conduta da autoridade altamente censurável 410 Limite espacial do falso testemunho judicial e extrajudicial 5 Compromisso legal de dizer a verdade testemunha não compromissada 51 Falso testemunho independe do compromisso de falar a verdade 52 Sem compromisso não há crime de falso testemunho 521 A melhor orientação doutrinária 53 Testemunha versus declarante ou informante 54 Vítima não é testemunha é parte interessada 55 Entendimento contraditório de Hungria 6 Tipo subjetivo adequação típica 7 Consumação e tentativa 8 Substituição de qualificadora por majorantes 9 Retratação do falso testemunho ou falsa perícia 91 Limites dos efeitos decorrentes da retratação 92 Não exigência formal para a retratação 93 Incomunicabilidade da retratação 10 Pena e ação penal Art 343 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Objeto material dinheiro ou qualquer outra vantagem 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Figura majorada qualificadora versus majorante 8 Lei n 102682001 irretroatividade ultratividade e inconstitucionalidade 9 Pena e ação penal Art 344 Coação no curso do processo 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Violência força física 42 Grave ameaça ou vis compulsiva 43 Desnecessidade de resistência efetiva 44 Coação objetivando pretensão legítima 5 Tipo subjetivo adequação típica 51 Elemento subjetivo especial interesse próprio ou alheio 6 Consumação e tentativa 7 Concurso com crimes praticados com violência 71 Sistema de aplicação de penas cúmulo material 72 Dupla criminalização da violência 8 Pena e ação penal Art 345 Exercício arbitrário das próprias razões 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Necessidade da existência de uma pretensão 42 Natureza do direito objeto da pretensão 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Concurso com crime resultante de violência sistema do cúmulo material 8 Pena e ação penal Art 346 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Objeto material coisa própria 42 Furto de coisa própria ou modalidade especial de exercício arbitrário das próprias razões desinteligência histórica a ser superada dogmaticamente 43 Furto de coisa própria heresia técnicojurídica 44 Atipicidade do furto de coisa própria 45 Elementares típicas e anatomia do Código definidoras da objetividade jurídica 46 Tipo penal que não exige elemento subjetivo especial 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 347 Fraude processual 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Inovação artificiosa versus inovação fraudulenta 42 Limites interpretativos de inovação artificiosa 43 Interpretação restritiva limites do arbítrio judicial 44 Inovação artificiosa idoneidade indispensável 5 Elementar normativa na pendência de processo civil ou administrativo 51 Inovação antes de iniciado o processo penal 52 Induzimento do juiz ou perito em erro 6 Tipo subjetivo adequação típica 7 Consumação e tentativa 8 Figura majorada 9 Pena e ação penal Art 348 Favorecimento pessoal 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Pressupostos do favorecimento e punibilidade do crime precedente 41 Punibilidade do crime precedente 42 Autoridade pública abrangência 5 Tipo objetivo adequação típica 51 Auxiliar ou verbo núcleo do tipo 52 Crime de forma livre qualquer meio ou forma de execução 53 Favorecimento pessoal mediante omissão imprópria 6 Tipo subjetivo adequação típica 7 Consumação e tentativa 8 Escusa absolutória sua extensão 2º 81 Equiparação constitucional do parentesco 9 Autor de crime a culpabilidade não é mero pressuposto da pena 10 Pena e ação penal Art 349 Favorecimento real 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Objeto material produto ou proveito de crime 4 Sujeitos do crime 5 Tipo objetivo adequação típica 51 A condenação do crime precedente 52 Natureza dos crimes precedentes 53 Elementar negativa do tipo fora dos casos de coautoria ou de receptação 54 Receptação similitude com o favorecimento real 6 Tipo subjetivo adequação típica 61 Ausência de previsão da modalidade culposa 7 Consumação e tentativa 8 Pena e ação penal Art 349A 1 Considerações preliminares 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 A real conotação do verbo auxiliar 42 Eficácia causal e consciência de auxiliar 43 Atipicidade das condutas de usar e portar 44 Participação do detento ou recluso 45 Elementar normativa sem autorização legal 46 Existência de autorização legal 5 Tipo subjetivo adequação típica 51 Elemento subjetivo especial 52 Finalidade especial implícita 53 Não há previsão de modalidade culposa 6 Consumação e tentativa 7 Classificação doutrinária 8 Pena e ação penal Art 350 Exercício arbitrário ou abuso de poder 1 Considerações especiais Art 351 Fuga de pessoa presa ou submetida a medida de segurança 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Promoção ou facilitação de fuga e favorecimento pessoal 42 Facilitar fuga de pessoa legalmente presa 43 Liberdade de meios formas ou modos de condutas incriminadas 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Formas qualificadas à mão armada pluralidade de pessoas ou mediante arrombamento 71 Graduação do injusto penal e reprovabilidade 72 Se o crime é praticado à mão armada 73 Se o crime é praticado por mais de uma pessoa 731 Diferenças entre a qualificadora e o concurso de pessoas 74 Se o crime é praticado mediante arrombamento 75 Com violação de dever funcional encarregado de custódia ou guarda de preso ou interno 751 Incomunicabilidade de qualificadora de caráter pessoal 8 Forma culposa negligência no exercício de dever funcional 9 Pena e ação penal Art 352 Evasão mediante violência contra a pessoa 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Fuga extramuros tipicidade 42 Crime de resistência e evasão de presídio 43 Legalidade da prisão ou medida de segurança 44 Punição cumulativa da elementar típica violência bis in idem 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 353 Arrebatamento de preso 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Irrelevância da natureza da prisão criminal civil ou administrativa 42 Lacuna arrebatamento de pessoa submetida à medida de segurança 5 Tipo subjetivo adequação típica 51 Relevância da motivação da conduta finalidade especial 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 354 Motim de presos 1 Considerações introdutórias 2 Aspectos políticocriminais da conflitivida de carcerária 21 A clássica prisão de segurança máxima 22 As graves deficiências do regime penitenciário 3 Bem jurídico tutelado 4 Sujeitos do crime 5 Tipo objetivo adequação típica 51 A natureza militante da violência contra funcionários e agentes públicos 6 Tipo subjetivo adequação típica 7 Consumação e tentativa 8 Pena e ação penal Art 355 Patrocínio infiel Parágrafo único Patrocínio simultâneo ou tergiversação 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Defesa de interesses de partes contrárias 42 Limites do patrocínio infiel somente em relação a interesse legítimo 43 Somente em relação à causa judicial independentemente de sua natureza 44 Consequência do consentimento do interessado 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 356 Sonegação de papel ou objeto de valor probatório 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Objeto material autos documento ou objeto de valor probatório 42 Extravio sonegação ou inutilização de livro ou documento art 314 43 Supressão de documento art 305 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 357 Exploração de prestígio 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Tráfico de influência e exploração de prestígio 42 Modalidade sui generis de estelionato 43 Dinheiro ou outra utilidade solicitados a pretexto de influir 44 Exploração de prestígio ou corrupção 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Figura majorada 8 Pena e ação penal Art 358 Violência ou fraude em arrematação judicial 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Tipo objetivo adequação típica 41 Impedimento da arrematação judicial 42 Afastamento do concorrente ou licitante 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 7 Pena e ação penal Art 359 Desobediência a decisão judicial sobre perda ou suspensão de direito 1 Considerações introdutórias 2 Bem jurídico tutelado 3 Sujeitos do crime 4 Objeto da proteção legal penas acessórias ou efeitos da condenação 41 Dispositivo revogado pela Reforma Penal Lei n 720984 42 Inaplicabilidade nas penas restritivas de direitos 43 Discutível aplicabilidade nos efeitos específicos da condenação penal 431 Efeitos extrapenais da condenação 5 Tipo objetivo adequação típica 6 Tipo subjetivo adequação típica 7 Consumação e tentativa 8 Pena e ação penal Capítulo IV Dos crimes contra as finanças públicas 1 Pressuposto dos crimes contra as finanças 2 Fundamentos constitucionais 3 Criminalização de infrações administrativas 4 Bem jurídico e injusto penal 5 Responsabilidade fiscal e improbidade administrativa crimes 6 Sanções decorrentes de improbidade administrativa 7 Cumulação de sanções e bis in idem inconstitucionalidade 8 Abrangência do disposto no art 63 do CPP 9 Penas alternativas na Lei n 100282000 10 Pena de multa 11 Efeitos da condenação art 92 I a do CP 12 Efeitos da condenação art 92 I b do CP 13 Coisa julgada extensão 14 Efeitos extrapenais da condenação 15 Excessiva punição dos agentes públicos 16 Ausência de modalidade culposa 17 Leis penais em branco 18 Novatio legis criminalizadora irretroatividade 19 Suspensão condicional do processo Art 359A Contratação de operação de crédito 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo 22 Sujeito passivo 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Sem prévia autorização legislativa 32 Autorização legislativa e autorização legal 33 Operação de crédito 34 Interno ou externo elementar típica 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 51 Consumação 52 Tentativa 6 Operação de crédito além do limite 61 Inobservância do limite condição ou montante 62 Inobservância do limite da dívida consolidada 63 Definição legal de dívida consolidada Art 359B Inscrição de despesas não empenhadas em restos a pagar 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo 22 Sujeito passivo 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Despesa não empenhada previamente 32 Que exceda limite estabelecido em lei 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 51 Consumação 52 Tentativa 6 Distinção do crime anterior 61 Interpretação garantista 7 Desistência voluntária 8 Conflito aparente de normas 81 Exceção à teoria monística 9 Pena e ação penal Art 359C Assunção de obrigação no último ano do mandato ou legislatura 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo 22 Sujeito passivo 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Despesa não paga no mesmo exercício financeiro 32 Indisponibilidade de caixa para o exercício seguinte 33 Contrapartida suficiente de disponibilidade de caixa 4 Assunção de obrigação antes dos dois últimos quadrimestres 41 Mandato ou legislatura 5 Tipo subjetivo adequação típica 51 Erro de tipo irrelevância da evitabilidade 6 Consumação e tentativa 61 Consumação 62 Tentativa 7 Pena e ação penal Art 359D Ordenação de despesa não autorizada 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo 22 Sujeito passivo 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Despesa não autorizada por lei 32 Despesa justificada embora não autorizada por lei 4 Tipo subjetivo adequação típica 5 Consumação e tentativa 51 Consumação 52 Tentativa 6 Pena e ação penal Art 359E Prestação de garantia graciosa 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo 22 Sujeito passivo 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Concessão de garantia de operação de crédito 32 Contragarantia de operação de crédito 33 De valor igual ou superior 34 Na forma da lei 35 Contragarantia exigida por ente federativo superior 36 Ausência de garantia dispensa contra garantia 4 Garantia sem condicionar à adimplência atipicidade 5 Tipo subjetivo adequação típica 6 Consumação e tentativa 61 Consumação 62 Tentativa 7 Pena e ação penal Art 359F Não cancelamento de restos a pagar 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo 22 Sujeito passivo 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Deixar de ordenar 32 Deixar de autorizar 33 Deixar de promover 4 Inscrição não superior ao limite permitido atipicidade 5 Tipo subjetivo adequação típica 51 Erro de tipo e erro de proibição 6 Consumação e tentativa 7 Conflito aparente de normas 71 Exceção à teoria monística 8 Pena e ação penal Art 359G Aumento de despesa total com pessoal no último ano de mandato ou legislatura 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo 22 Sujeito passivo 3 Tipo objetivo adequação típica 31 Despesa total com pessoal 32 Elementar temporal 33 Executar obediência hierárquica 4 Tipo subjetivo adequação típica 41 Erro de tipo 5 Consumação e tentativa 51 Consumação 52 Tentativa 6 Semelhanças e diferenças com o disposto no art 359C 7 Pena e ação penal Art 359H Oferta pública ou colocação de títulos no mercado 1 Bem jurídico tutelado 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo 22 Sujeito passivo 3 Tipo objetivo adequação típica 4 Controle jurídico ou legislativo 5 Tipo subjetivo adequação típica 51 Erro de tipo 52 Erro de proibição 6 Consumação e tentativa 61 Consumação 62 Tentativa 7 Pena e ação penal DISPOSIÇÕES FINAIS Arts 360 e 361 DECRETOLEI N 2848 DE 7 DE DEZEMBRO DE 19401 O Presidente da República usando da atribuição que lhe confere o art 180 da Constituição decreta a seguinte Lei V art 22 I da CF PARTE GERAL Título I Da aplicação da lei penal Anterioridade da lei Art 1º Não há crime sem lei anterior que o defina Não há pena sem prévia cominação legal V art 5º XXXIX e XL da CF V arts 2º e 3º do CPP V art 1º do Declei n 391441 Lei de Introdução ao Código Penal e LCP V art 61 da Lei n 909995 Juizados Especiais D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias As ideias de igualdade e de liberdade apanágios do Iluminismo deram ao Direito Penal um caráter formal menos cruel do que aquele que predominou durante o Estado Absolutista impondo limites à intervenção estatal nas liberdades individuais Muitos desses princípios limitadores passaram a integrar os Códigos Penais dos países democráticos e afinal receberam assento constitucional como garantia máxima de respeito aos direitos fundamentais do cidadão 2 Princípio da legalidade ou da reserva legal O princípio da legalidade ou da reserva legal constitui efetiva limitação ao poder punitivo estatal Feuerbach no início do século XIX consagrou o princípio da reserva legal por meio da fórmula latina nullum crimen nulla poena sine lege O princípio da reserva legal é um imperativo que não admite desvios nem exceções e representa uma conquista da consciência jurídica que obedece a exigências de justiça somente os regimes totalitários o têm negado 21 Competência legislativa corolário da reserva legal Pelo princípio da legalidade a elaboração de normas incriminadoras é função exclusiva da lei isto é nenhum fato pode ser considerado crime e nenhuma pena criminal pode ser aplicada sem que antes da ocorrência desse fato exista uma lei definindoo como crime e cominandolhe a sanção correspondente A lei deve definir com precisão e de forma cristalina a conduta proibida 22 Nullum crimen nulla poena sine lege Seguindo a orientação moderna a Constituição brasileira de 1988 ao proteger os direitos e garantias fundamentais em seu art 5º XXXIX determina que não haverá crime sem lei anterior que o defina nem pena sem prévia cominação legal 3 Princípio da irretroatividade da lei penal Há uma regra dominante em termos de conflito de leis penais no tempo É a da irretroatividade da lei penal sem a qual não haveria nem segurança nem liberdade na sociedade em flagrante desrespeito ao princípio da legalidade e da anterioridade da lei consagrado no art 1º do CP e no art 5º XXXIX da CF 31 Origem do princípio da irretroatividade A irretroatividade como princípio geral do Direito Penal moderno embora de origem mais antiga é consequência das ideias consagradas pelo Iluminismo insculpida na Declaração Francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 Embora conceitualmente distinto o princípio da irretroatividade ficou desde então incluído no princípio da legalidade constante também da Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948 32 Retroatividade da lei mais benigna Contudo o princípio da irretroatividade vige somente em relação à lei mais severa Admitese no direito intertemporal a aplicação retroativa da lei mais favorável art 5º XL da CF Assim podese resumir a questão no seguinte princípio o da retroatividade da lei penal mais benigna A lei nova que for mais favorável ao réu sempre retroage 4 Princípio da intervenção mínima O princípio da intervenção mínima também conhecido como ultima ratio orienta e limita o poder incriminador do Estado preconizando que a criminalização de uma conduta só se legitima se constituir meio necessário para a proteção de determinado bem jurídico Se outras formas de sanção ou outros meios de controle social revelaremse suficientes para a tutela desse bem a sua criminalização é inadequada e não recomendável Se para o restabelecimento da ordem jurídica violada forem suficientes medidas civis ou administrativas são estas que devem ser empregadas e não as penais Por isso o Direito Penal deve ser a ultima ratio isto é deve atuar somente quando os demais ramos do Direito revelaremse incapazes de dar a tutela devida a bens relevantes na vida do indivíduo e da própria sociedade 41 Fundamento político da ultima ratio A razão deste princípio afirma Claus Roxin radica em que o castigo penal coloca em perigo a existência social do afetado se o situa à margem da sociedade e com isso produz também um dano social Por isso antes de recorrer ao Direito Penal devese esgotar todos os meios extrapenais de controle social 42 Deturpação da função do Direito Penal Apesar de o princípio da intervenção mínima ter sido consagrado pelo Iluminismo a partir da Revolução Francesa a verdade é que a partir da segunda década do século XIX as normas penais incriminadoras cresceram desmedidamente a ponto de alarmar os penalistas dos mais diferentes parâmetros culturais 43 Criminalização e penalização políticas populistas Os legisladores contemporâneos tanto de primeiro como de terceiro mundo têm abusado da criminalização e da penalização em franca contradição com o princípio em exame levando ao descrédito não apenas o Direito Penal mas a sanção criminal que acaba perdendo sua força intimidativa diante da inflação legislativa reinante nos ordenamentos positivos 5 Princípio da fragmentariedade Resumindo caráter fragmentário do Direito Penal significa que o Direito Penal não deve sancionar todas as condutas lesivas dos bens jurídicos mas tão somente aquelas condutas mais graves e mais perigosas praticadas contra bens mais relevantes 51 Seletividade em razão da importância do bem jurídico O Direito Penal limitase a castigar as ações mais graves praticadas contra os bens jurídicos mais importantes decorrendo daí o seu caráter fragmentário uma vez que se ocupa somente de uma parte dos bens jurídicos protegidos pela ordem jurídica Fazse uma tutela seletiva do bem jurídico limitada àquela tipologia agressiva que se revela dotada de indiscutível relevância quanto à gravidade e intensidade da ofensa Luiz R Prado 52 Aspectos da fragmentariedade do Direito Penal 1º defende o bem jurídico somente contra ataques de especial gravidade exigindo determinadas intenções e tendências excluindo a punibilidade da prática imprudente de alguns casos 2º tipifica somente parte das condutas que outros ramos do Direito consideram antijurídicas 3º deixa em princípio sem punir ações meramente imorais como a homossexualidade ou a mentira 6 Princípio de culpabilidade Segundo Muñoz Conde a culpabilidade não é uma categoria abstrata ou ahistórica à margem ou contrária às finalidades preventivas do Direito Penal mas a culminação de todo um processo de elaboração conceitual destinado a explicar por que e para que em um determinado momento histórico recorrese a um meio defensivo da sociedade tão grave como a pena e em que medida se deve fazer uso desse meio 61 Culpabilidade como fundamento da pena Referese nesta acepção ao fato de ser possível ou não a aplicação de uma pena ao autor de um fato típico e antijurídico isto é proibido pela lei penal Para isso exigese a presença de uma série de requisitos capacidade de culpabilidade consciência da ilicitude e exigibilidade da conduta que constituem os elementos positivos específicos do conceito dogmático de culpabilidade A ausência de qualquer desses elementos é suficiente para impedir a aplicação de uma sanção penal 62 Culpabilidade como elemento da determinação ou medição da pena Nesta acepção a culpabilidade funciona não como fundamento da pena mas como limite desta impedindo que a pena seja imposta aquém ou além da medida prevista pela própria ideia de culpabilidade aliada é claro a outros critérios como importância do bem jurídico fins preventivos etc 63 Culpabilidade como conceito contrário à responsabilidade objetiva Nesta acepção o princípio de culpabilidade impede a atribuição da responsabilidade objetiva Ninguém responderá por um resultado absolutamente imprevisível se não houver obrado pelo menos com dolo ou culpa Nullum crimen nulla poena sine culpa 64 Consequências do princípio de culpabilidade Pelo princípio em exame não há pena sem culpabilidade decorrendo daí três consequências materiais a não há responsabilidade objetiva pelo simples resultado b a responsabilidade penal é pelo fato e não pelo autor c a culpabilidade é a medida da pena 7 Princípio de humanidade A proscrição de penas cruéis e infamantes a proibição de tortura e maustratos nos interrogatórios policiais e a obrigação imposta ao Estado de dotar sua infraestrutura carcerária de meios e recursos que impeçam a degradação e a dessocialização dos condenados são corolários do princípio de humanidade Este princípio determina a inconstitucionalidade de qualquer pena ou consequência do delito que crie uma deficiência física morte amputação castração ou esterilização intervenção neurológica etc como também qualquer consequência jurídica inapagável do delito Zaffaroni 71 Função do Direito Penal Justiça distributiva Contudo não se pode olvidar que o Direito Penal não é necessariamente assistencial e visa primeiramente à Justiça distributiva responsabilizando o delinquente pela violação da ordem jurídica Dentro dessas fronteiras impostas pela natureza de sua missão todas as relações humanas reguladas pelo Direito Penal devem ser presididas pelo princípio de humanidade 72 Proscrição da pena de morte e da prisão perpétua O princípio de humanidade do Direito Penal é o maior entrave para a adoção da pena capital e da prisão perpétua Este princípio sustenta que o poder punitivo estatal não pode aplicar sanções que atinjam a dignidade da pessoa humana ou que lesionem a constituição físico psíquica dos condenados 8 Princípio da adequação social Segundo Welzel o Direito Penal tipifica somente condutas que tenham certa relevância social caso contrário não poderiam ser crimes Deduzse consequentemente que há condutas que por sua adequação social não podem ser consideradas criminosas e por isso não se revestem de tipicidade 81 Função seletiva do tipo penal O tipo penal implica uma seleção de comportamentos e ao mesmo tempo uma valoração o típico já é penalmente relevante Contudo também é verdade certos comportamentos em si mesmos típicos carecem de relevância por serem correntes no meio social pois muitas vezes há um descompasso entre as normas penais incriminadoras e o socialmente permitido ou tolerado Por isso segundo Stratenwerth é incompatível criminalizar uma conduta só porque se opõe à concepção da maioria ou ao padrão médio de comportamento 82 Tipicidade desvalor da ação e desvalor do resultado A tipicidade de um comportamento proibido é enriquecida pelo desvalor da ação e pelo desvalor do resultado lesando efetivamente o bem juridicamente protegido constituindo o que se chama de tipicidade material Donde se conclui que o comportamento que se amolda a determinada descrição típica formal porém materialmente irrelevante adequandose ao socialmente permitido ou tolerado não realiza materialmente a descrição típica 83 Consequências da adequação social imprecisão inicial Discutese se afastaria a tipicidade ou simplesmente eliminaria a antijuridicidade de determinadas condutas típicas O próprio Welzel seu mais destacado defensor vacilou sobre seus efeitos admitindoa inicialmente como excludente da tipicidade depois como causa de justificação e finalmente outra vez como excludente da tipicidade Por último conforme anota Jescheck Welzel acabou aceitando o princípio da adequação social somente como princípio geral de interpretação entendimento até hoje seguido por respeitáveis penalistas 84 Nosso entendimento princípio geral de interpretação Como princípio geral de interpretação não só da norma mas também da própria conduta contextualizada é possível chegar a resultados fascinantes por exemplo no caso do famigerado jogo do bicho podese afastar sua aplicação em relação ao apontador por política criminal mantendose a norma plenamente válida para punir o banqueiro cuja ação e resultados desvaliosos merecem a censura jurídica 9 Princípio de insignificância A tipicidade penal exige ofensa de alguma gravidade aos bens jurídicos protegidos pois nem sempre qualquer ofensa a esses bens ou interesses é suficiente para configurar o injusto típico Segundo este princípio é imperativa uma efetiva proporcionalidade entre a gravidade da conduta que se pretende punir e a drasticidade da intervenção estatal Amiúde condutas que se amoldam a determinado tipo penal sob o ponto de vista formal não apresentam nenhuma relevância material Nessas circunstâncias podese afastar liminarmente a tipicidade penal porque em verdade o bem jurídico não chegou a ser lesado 91 Princípio da insignificância grau de intensidade da ofensa Assim a irrelevância ou insignificância de determinada conduta deve ser aferida não apenas em relação à importância do bem juridicamente atingido mas especialmente em relação ao grau de sua intensidade isto é pela extensão da lesão produzida 92 Consequência da insignificância afasta a tipicidade Concluindo a insignificância da ofensa afasta a tipicidade Mas essa insignificância só pode ser valorada por meio da consideração global da ordem jurídica Como afirma Zaffaroni a insignificância só pode surgir à luz da função geral que dá sentido à ordem normativa e consequentemente a norma em particular e que nos indica que esses pressupostos estão excluídos de seu âmbito de proibição o que resulta impossível de se estabelecer à simples luz de sua consideração isolada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A O sistema não permite analogia em desfavor do réu Princípio da reserva legal TJRS Agravo 70022739718 Rel Ivan Leomar Bruxel j 2022008 No âmbito do direito penal em que vige de forma soberana o princípio da legalidade ou da reserva legal consagrado no art 5º XXXIX da CF88 e no art 1º do CP a aplicação da analogia somente é admissível in bonam parte e ainda assim quando se evidenciar uma lacuna acidental da lei TJRS Apelação 70018595850 Rel Fabianne Breton Baisch j 1322008 O reconhecimento do princípio da insignificância não se limita apenas à análise da expressão monetária do objeto receptado mas também e principalmente à desvaloração do resultado elemento material do tipo teoria constitucionalista do delito onde se aferem as consequências do crime No caso concreto considerando que os cosméticos furtados condicionador e ativador de cachos de cabelo são de valor irrisório R 1330 e que em razão do flagrante restaram restituídos à drogaria proprietária inexistindo pois efetivo dano ao bem jurídico tutelado patrimônio da pessoa jurídica é de se considerar que o ocorrido não teve repercussão alguma na esfera penal aplicandose na hipótese o princípio da insignificância STJ HC 89113RJ Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 11122007 O princípio da insignificância que deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal examinada na perspectiva de seu caráter material Doutrina Tal postulado que considera necessária na aferição do relevo material da tipicidade penal a presença de certos vetores tais como a a mínima ofensividade da conduta do agente b a nenhuma periculosidade social da ação c o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e d a inexpressividade da lesão jurídica provocada apoiouse em seu processo de formulação teórica no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe em função dos próprios objetivos por ele visados a intervenção mínima do Poder Público O postulado da insignificância e a função do direito penal de minimis non curat praetor O sistema jurídico há de considerar a relevantíssima circunstância de que a privação da liberdade e a restrição de direitos do indivíduo somente se justificam quando estritamente necessárias à própria proteção das pessoas da sociedade e de outros bens jurídicos que lhes sejam essenciais notadamente naqueles casos em que os valores penalmente tutelados se exponham a dano efetivo ou potencial impregnado de significativa lesividade O direito penal não se deve ocupar de condutas que produzam resultado cujo desvalor por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes não represente por isso mesmo prejuízo importante seja ao titular do bem jurídico tutelado seja à integridade da própria ordem social STF HC 92463RS Rel Min Celso de Mello j 16102007 A diferença de tratamento legal entre os crimes comuns e os crimes militares mesmo em se tratando de crimes militares impróprios não revela inconstitucionalidade pois o Código Penal Militar não institui privilégios Ao contrário em muitos pontos o tratamento dispensado ao autor de um delito é mais gravoso do que aquele do Código Penal comum RE 115770RJ O que se pretende neste habeas é a aplicação do Código Penal Militar apenas na parte que interessa ao paciente Entretanto isto representaria a criação de uma norma híbrida em parte composta pelo Código Penal Militar e em outra parte pelo Código Penal comum Isto evidentemente violaria o princípio da reserva legal e o próprio princípio da separação de poderes STF HC 86459RJ Rel Min Joaquim Barbosa j 512 2006 O fato de o agente haver sido surpreendido com pequena quantidade de droga três gramas não leva à observação do princípio da insignificância prevalecendo as circunstâncias da atuação delituosa introdução da droga em penitenciária para venda a detentos STF HC 87319PE Rel Min Marco Aurélio j 7112006 Viola o princípio da legalidade a aplicação da majorante do crime de roubo resultante do concurso de pessoas ao crime de furto qualificado pela mesma circunstância STJ REsp 798319RS Rel Min Gilson Dipp j 1432006 Não se pode olvidar o caráter fragmentário de que se reveste o direito penal que só deve ser acionado quando os outros ramos do direito não sejam suficientes para a proteção dos bens jurídicos envolvidos STF HC 86553SC Rel Min Joaquim Barbosa j 732006 A Medida Provisória não é o instrumento normativo apropriado para dispor sobre Direito Penal que exige sua regulamentação através de Lei em sentido estrito como consequência do princípio da legalidade STJ REsp 329164RS Rel Min Gilson Dipp j 592002 O princípio do nullun crimen nulla poena sine praevia lege inscrito no art 5º XXXIX da Carta Magna e no art 1º do Código Penal consubstancia uma das colunas centrais do Direito Penal dos países democráticos não se admitindo qualquer tolerância sob o argumento de que o fato imputado ao denunciado pode eventualmente ser enquadrado em outra regra penal Se ao réu imputase um fato que somente em lei posterior veio a ser definido como crime a denúncia não tem vitalidade por ferir o princípio da anterioridade impondose o trancamento da ação penal STJ RHC 8171CE Rel Min Vicente Leal j 231999 O direito penal moderno é direito penal da culpa Não se prescinde do elemento subjetivo Intoleráveis a responsabilidade objetiva e a responsabilidade pelo fato de outrem A sanção medida políticojurídica de resposta ao delinquente deve ajustar se à conduta delituosa Conduta é fenômeno ocorrente no plano da experiência É fato Fato não se presume Existe ou não existe O direito penal da culpa é inconciliável com presunções de fato Não se pode entretanto punir alguém por crime não cometido O princípio da legalidade fornece a forma e princípio da personalidade sentido atual da doutrina a substância da conduta delituosa Inconstitucionalidade de qualquer lei penal que despreze a responsabilidade subjetiva STJ REsp 46424RO Rel Min Luiz Vicente Cernicchiaro j 1461994 Lei penal no tempo Art 2º Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória V art 5º XL da CF V arts 91 92 e 107 III do CP V art 2º do CPP V art 66 I da Lei n 721084 Lei de Execução Penal Parágrafo único A lei posterior que de qualquer modo favorecer o agente aplicase aos fatos anteriores ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado V art 5º XXXVI LIII e LIV da CF V Súmula 611 do STF Lei excepcional ou temporária Art 3º A lei excepcional ou temporária embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a determinaram aplicase ao fato praticado durante a sua vigência V art 2º do CPP D O U T R I N A 1 Eficácia da lei penal no tempo Desde que uma lei entra em vigor rege todos os atos abrangidos por sua destinação até que cesse a sua vigência Não alcança os fatos ocorridos antes ou depois dos dois limites extremos não retroage nem tem ultraatividade como regra 2 Irretroatividade da lei penal Há uma regra dominante em termos de conflito de leis penais no tempo É a da irretroatividade da lei penal sem a qual não haveria nem segurança nem liberdade na sociedade num flagrante desrespeito ao princípio da legalidade e da anterioridade da lei arts 1º do CP e 5º XXXIX da CF 3 Retroatividade da lei mais benigna O princípio da irretroatividade vige entretanto somente em relação à lei mais severa Admitese no direito transitório a aplicação retroativa da lei mais benigna Somente o exame acurado de cada caso concreto poderá demonstrar a maior benignidade de uma lei 31 Abolitio criminis Ocorre abolitio criminis quando a lei nova deixa de considerar crime fato anteriormente tipificado como ilícito penal A lei nova retira a característica de ilicitude penal de uma conduta precedentemente incriminada art 2º do CP 311 Abolitio criminis abrangência A abolitio criminis configura uma situação de lei penal posterior mais benigna que deve atingir inclusive fatos definitivamente julgados mesmo em fase de execução A abolitio criminis faz desaparecer todos os efeitos penais permanecendo os civis 32 Novatio legis incriminadora Ao contrário da abolitio criminis considera crime fato anteriormente não incriminado A novatio legis incriminadora é irretroativa e não pode ser aplicada a fatos praticados antes da sua vigência segundo o velho aforisma nullum crimen sine praevia lege hoje erigido em dogma constitucional art 5º XXXIX da CF 33 Novatio legis in pejus Lei posterior que de qualquer modo agravar a situação do sujeito não retroagirá art 5º XL da CF Se houver um conflito entre duas leis a anterior mais benigna e a posterior mais severa aplicarseá a mais benigna a anterior será ultraativa por sua benignidade e a posterior será irretroativa por sua severidade 34 Novatio legis in mellius Pode ocorrer que a lei nova mesmo sem descriminalizar dê tratamento mais favorável ao sujeito Mesmo que a sentença condenatória se encontre em fase de execução prevalece a lex mitior que de qualquer modo favorecer o agente nos estritos termos do parágrafo único do art 2º do CP O dispositivo citado deixa claro que a irretroatividade é incondicional 4 Crimes permanentes e continuados Nos crimes permanentes ou continuados aplicarseá a lei posterior em vigor desde que ainda perdure a permanência ou a continuidade mas resultam impuníveis a continuidade dos atos precedentes à entrada em vigor da lei 5 Lei intermediária dupla extraatividade De acordo com os princípios gerais do Direito Penal intertemporal devese aplicar a lei mais favorável Se a lei intermediária for a mais favorável deverá ser aplicada Assim a lei posterior mais rigorosa não pode ser aplicada pelo princípio geral da irretroatividade como também não pode ser aplicada a lei da época do fato mais rigorosa Por princípio excepcional só poderá ser aplicada a lei intermediária que é a mais favorável Nessa hipótese a lei intermediária tem dupla extraatividade é ao mesmo tempo retroativa e ultraativa 6 Conjugação de leis aspectos mais favoráveis Admitimos essa possibilidade se é permitido escolher o todo para garantir tratamento mais favorável ao réu nada impede que se possa selecionar parte de um todo e parte de outro para atender a uma regra constitucional que deve estar acima de pruridos de lógica formal Devese aplicar sempre os dispositivos mais benéficos 7 Leis excepcionais e temporárias São leis que vigem por período predeterminado pois nascem com a finalidade de regular circunstâncias transitórias especiais que em situação normal seriam desnecessárias Leis temporárias são aquelas cuja vigência vem previamente fixada pelo legislador e são leis excepcionais as que vigem durante situações de emergência 71 Tipicidade elemento temporal As leis temporárias e excepcionais têm ultraatividade A circunstância de o fato ter sido praticado durante o prazo fixado pelo legislador temporária ou durante a situação de emergência excepcional constitui elemento temporal do próprio fato típico 8 Retroatividade e leis penais em branco Leis penais em branco são as de conteúdo incompleto vago lacunoso que necessitam ser complementadas por outras normas jurídicas geralmente de natureza extrapenal 81 Normas penais em branco disciplina tradicional Aplicamse as regras gerais que disciplinam a sucessão de leis no tempo irretroatividade da lei mais severa e retroatividade da lei mais benigna Contudo quando a norma penal em branco tem por objetivo assegurar o efeito do elemento temporal aplicase o critério da ultra atividade 9 Retroatividade e lei processual A lei processual não tem efeito retroativo É bom frisar que o princípio tempus regit actum aplicase sem exceção tão somente às normas que regem a realização dos atos processuais isto é às que se destinam a regular a formalização processual e a organização judiciária lato sensu 91 Lei processual imprópria Em qualquer caso em que uma lei dita processual posterior à prática do crime determine a diminuição de garantias ou de direitos fundamentais ou implique qualquer forma de restrição da liberdade não terá vigência o princípio tempus regit actum aplicandose nessas hipóteses a legislação vigente na época do crime Isso pode ocorrer v g em matéria de prescrição prisão preventiva prisão provisória etc J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Art 2º Súmula 611 do STF Transitada em julgado a sentença condenatória compete ao juízo das execuções a aplicação da lei mais benigna Crime praticado sob a égide da Lei n 636876 A causa de aumento de pena referente à associação eventual para o tráfico de drogas deve ser decotada da condenação da paciente eis que a Lei n 113432006 não a trouxe no rol taxativo de seu art 40 tratandose portanto de novatio legis in mellius cuja retroatividade decorre de imperativo constitucional STJ HC 88971SP Rel Jane Silva j 1312 2007 Embora possua características eminentemente processuais a suspensão condicional do processo prevista no art 89 da Lei n 909995 é medida de caráter despenalizador enquadrandose no conceito de lex mitior aplicável portanto aos crimes cometidos antes de sua vigência Tratandose de norma de caráter processual e material vedada sua aplicação apenas em parte cindindo seu conteúdo sob pena de esvaziar a efetividade do instituto STJ HC 72537SP Rel Min Laurita Vaz j 13122007 Esta Corte Superior já sedimentou o entendimento de que a exigência do cumprimento do lapso temporal previsto na Lei n 1146407 somente se aplica como requisito objetivo para a progressão de regime aos crimes cometidos após sua vigência em obediência ao princípio da irretroatividade da lei penal mais gravosa STJ HC 88387MS Rel Min Napoleão Nunes Maia Filho j 28112007 O art 290 do Código Penal Militar não sofreu alteração pela superveniência da Lei n 1134306 por não ser o critério adotado na espécie o da retroatividade da lei penal mais benéfica mas sim o da especialidade O fundamento constitucional do crime militar é o art 124 parágrafo único da Constituição da República tratamento diferenciado do crime militar de posse de entorpecente definido no art 290 do Código Penal Militar Jurisprudência predominante do Supremo Tribunal Federal reverencia a especialidade da legislação penal militar e da justiça castrense sem a submissão à legislação penal comum do crime militar devidamente caracterizado Precedentes STF HC 92462RS Rel Min Cármen Lúcia j 23102007 A Lei n 1146407 no ponto em que disciplinou a progressão de regime trouxe critérios mais rígidos do que os anteriormente estabelecidos na Lei de Execução Penal vigente à época do fato Não se aplica o cumprimento da pena imposta pelos critérios da Lei n 1146407 o que significaria afronta ao princípio da irretroatividade da lei penal mais gravosa art 5º XL da Constituição da República e art 2º do Código Penal STF HC 91631SP Rel Min Cármen Lúcia j 16102007 A lei penal mais benéfica deve retroagir aos fatos anteriores à sua vigência de acordo com o art 5º inciso XL da Constituição e art 2º parágrafo único do Código Penal STJ HC 79011RJ Rel Min Carlos Fernando Mathias j 16102007 A Lei n 108262003 em seus arts 30 a 32 estipulou um prazo para que os possuidores de arma de fogo regularizassem sua situação ou entregassem a arma para a Polícia Federal Dessa maneira até que findasse tal prazo que se iniciou em 23122003 e que teve seu termo final prorrogado até 23102005 cf Medida Provisória n 2532005 convertida na Lei n 111912005 ninguém poderia ser processado por possuir arma de fogo A nova lei ao menos no que tange aos prazos dos artigos 30 a 32 que a doutrina chama de abolitio criminis temporária ou de vacatio legis indireta ou até mesmo de anistia deve retroagir uma vez que mais benéfica para o réu APn n 394RN Corte Especial Rel Min José Delgado j 153 2006 STJ REsp 804830PA Rel Min Félix Fischer j 1782006 Lei penal no tempo incidência da norma intermediária mais favorável Dada a garantia constitucional de retroatividade da lei penal mais benéfica ao réu é consensual na doutrina que prevalece a norma mais favorável que tenha tido vigência entre a data do fato e a da sentença o contrário implicaria retroação da lei nova mais severa de modo a afastar a incidência da lei intermediária cuja prevalência sobre a do tempo do fato o princípio da retroatividade in melius já determinara STF RE 418876MT Rel Min Sepúlveda Pertence j 3032004 Continuidade delitiva Se a conduta delituosa permanece sendo reiterada na vigência da lei nova lex gravior aplicase esta a toda série delitiva sem que isso constitua ofensa aos princípios da legalidade ou da ultraatividade da lex mitior Precedentes desta Corte e do Colendo Supremo Tribunal Federal STJ HC 18605SP Rel Min Félix Fischer j 1º102002 Se a lei nova entra em vigor no decorrer do processo agravando a pena de quem praticara conduta delituosa descrita no anterior diploma legal inexiste abolitio criminis mas novatio legis in pejus conflito de leis penais no tempo que se resolve pela aplicação da lei mais benéfica vigente ao tempo dos fatos em obediência ao princípio tempus regit actum STJ HC 12370RS Rel Min Fernando Gonçalves j 1322001 Art 3º Norma penal em branco Inaplicável à hipótese o constante no art 3º do Código Penal se a norma integrativa veio simplesmente alterar os limites de dispensa e inexigibilidade de licitação previstos na Lei n 866693 como complemento desta e sem alterar o tipo penal ali descrito uma vez que o fato continua sendo punível exatamente como era ao tempo de sua prática Precedentes As modificações operadas pela Lei n 964898 à Lei n 866693 já no curso do procedimento licitatório em questão sendo de caráter puramente complementar isto é sem qualquer alteração da figura abstrata descrita no tipo penal não podem retroagir de forma a beneficiar os réus descriminalizando suas condutas que continuam típicas uma vez que tentaram em tese realizar contrato público sem prévia licitação STJ REsp 474989RS Rel Min Gilson Dipp j 1062003 Trancamento da ação penal Sonegação praticada quando vigente a obrigatoriedade do recolhimento do tributo Não caracterização da abolitio criminis A ação penal não deve ser trancada seja porque não houve abolitio criminis em relação à sonegação de tributos seja porque se interprete o art 4º da EC93 como dispositivo legal excepcional ou temporário Dessa forma havendo a descrição de conduta típica indícios de autoria e materialidade do delito como in casu a ação merece continuidade STJ RHC 8433MG Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 451999 Em princípio o art 3º do Código Penal se aplica a norma penal em branco na hipótese de o ato normativo que a integra ser revogado ou substituído por outro mais benéfico ao infrator não se dando portanto a retroatividade Essa aplicação só não se faz quando a norma que complementa o preceito penal em branco importa real modificação da figura abstrata nele prevista ou se assenta em motivo permanente insusceptível de modificarse por circunstâncias temporárias ou excepcionais como sucede quando do elenco de doenças contagiosas se retira uma por se haver demonstrado que não tem ela tal característica STF HC 73168SP Rel Min Moreira Alves j 21111995 Tempo do crime Art 4º Considerase praticado o crime no momento da ação ou omissão ainda que outro seja o momento do resultado V arts 13 111 e s do CP D O U T R I N A 1 Teoria da atividade Adotase a teoria da atividade uma vez que é nesse momento que o indivíduo exterioriza a sua vontade violando o preceito proibitivo Isso evita o absurdo de uma conduta praticada licitamente sob o império de uma lei poder ser considerada crime em razão de o resultado vir a produzirse sob o império de outra 2 Há algumas exceções à teoria da atividade O Código adota implicitamente algumas exceções à teoria da atividade como por exemplo o marco inicial da prescrição abstrata começa a partir do dia em que o crime se consuma nos crimes permanentes do dia em que cessa a permanência e nos de bigamia de falsificação e alteração de assentamento do registro civil da data em que o fato se torna conhecido art 111 J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Conflito de leis penais no tempo cuidandose de crime permanente qual o delito militar de deserção aplicaselhe a lei vigente ao tempo em que cessou a permanência ainda que mais severa que a anterior vigente ao tempo do seu início STF HC 80540AM Rel Min Sepúlveda Pertence j 28112000 Territorialidade Art 5º Aplicase a lei brasileira sem prejuízo de convenções tratados e regras de direito internacional ao crime cometido no território nacional V arts 4º 5º LII e 2º e 84 VIII da CF V arts 1º e 70 do CPP 1º Para os efeitos penais consideramse como extensão do território nacional as embarcações e aeronaves brasileiras de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem bem como as aeronaves e as embarcações brasileiras mercantes ou de propriedade privada que se achem respectivamente no espaço aéreo correspondente ou em altomar V art 20 VI da CF 2º É também aplicável a lei brasileira aos crimes praticados a bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de propriedade privada achandose aquelas em pouso no território nacional ou em voo no espaço aéreo correspondente e estas em porto ou mar territorial do Brasil V arts 89 e 90 do CPP V art 2º do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais V arts 76 a 94 da Lei n 681580 Estatuto do Estrangeiro D O U T R I N A 1 Princípios dominantes A lei penal em decorrência do princípio de soberania vige em todo o território de um Estado politicamente organizado No entanto pode ocorrer em certos casos para um combate eficaz à criminalidade a necessidade de que os efeitos da lei penal ultrapassem os limites territoriais para regular fatos ocorridos além de sua soberania ou então a ocorrência de determinada infração penal pode afetar a ordem jurídica de dois ou mais Estados soberanos Surge assim a necessidade de limitar a eficácia espacial da lei penal disciplinando qual lei deve ser aplicada em tais hipóteses 2 Princípio da territorialidade Por este princípio aplicase a lei penal brasileira aos fatos puníveis praticados no território nacional independentemente da nacionalidade do agente da vítima ou do bem jurídico lesado É a principal forma de delimitação do âmbito de vigência da lei penal O CP brasileiro adota essa diretriz como regra geral ainda que de forma atenuada ou temperada art 5º caput do CP uma vez que ressalva a validade de convenções tratados e regras internacionais 21 Fundamento do princípio da territorialidade O fundamento deste princípio é a soberania política do Estado que segundo Juarez Cirino dos Santos apresenta três caracteres a plenitude como totalidade de competências sobre questões da vida social a autonomia como rejeição de influências externas nas decisões sobre essas questões e a exclusividade como monopólio do poder nos limites de seu território 3 Princípio real de defesa ou de proteção Este princípio permite a extensão da jurisdição penal do Estado titular do bem jurídico lesado para além dos seus limites territoriais fundamentado na nacionalidade do bem jurídico lesado art 7º I do CP independentemente do local em que o crime foi praticado ou da nacionalidade do agente infrator Protegemse assim determinados bens jurídicos que o Estado considera fundamentais 4 Princípio da nacionalidade ou da personalidade Aplicase a lei penal da nacionalidade do agente pouco importando o local em que o crime foi praticado O Estado tem o direito de exigir que o seu nacional no estrangeiro tenha determinado comportamento Este princípio pode apresentarse sob duas formas personalidade ativa caso em que se considera somente a nacionalidade do autor do delito art 7º II b do CP personalidade passiva nesta hipótese importa somente se a vítima do delito é nacional art 7º 3º do CP Visa impedir a impunidade de nacionais por crimes praticados em outros países que não sejam abrangidos pelo critério da territorialidade 5 Princípio da universalidade ou cosmopolita As leis penais devem ser aplicadas a todos os homens onde quer que se encontrem Este princípio é característico da cooperação penal internacional porque permite a punição por todos os Estados de todos os crimes que forem objeto de tratados e de convenções internacionais Aplicase a lei nacional a todos os fatos puníveis sem levar em conta o lugar do delito a nacionalidade de seu autor ou do bem jurídico lesado ex art 7º II a do CP 6 Princípio da representação ou da bandeira Tratase de um princípio subsidiário e quando houver deficiência legislativa ou desinteresse de quem deveria reprimir aplicase a lei do Estado em que está registrada a embarcação ou a aeronave ou cuja bandeira ostenta aos delitos praticados em seu interior art 7º II c do CP 7 Princípios adotados pelo Código Penal brasileiro O Código Penal brasileiro adotou como regra o princípio da territorialidade e como exceção os seguintes princípios a real ou de proteção art 7º I e 3º b universal ou cosmopolita art 7º II a c nacionalidade ativa art 7º II b d nacionalidade passiva art 7º 3º e representação art 7º II c 8 Conceito de território nacional O conceito de território nacional em sentido jurídico deve ser entendido como âmbito espacial sujeito ao poder soberano do Estado O território nacional efetivo ou real compreende a superfície terrestre solo e subsolo as águas territoriais fluviais lacustres e marítimas e o espaço aéreo correspondente Entendese ainda como sendo território nacional por extensão ou flutuante as embarcações e as aeronaves por força de uma ficção jurídica Em sentido estrito território abrange solo e subsolo contínuo e com limites reconhecidos águas interiores mar territorial plataforma continental e respectivo espaço aéreo 81 Delimitação do território nacional Quando os limites são fixados por montanhas dois critérios podem ser utilizados o da linha das cumeadas e o do divisor de águas Quando os limites fronteiriços entre dois países forem fixados por um rio no caso internacional podem ocorrer as seguintes situações a quando o rio pertencer a um dos Estados a fronteira passará pela margem oposta b quando o rio pertencer aos dois Estados há duas soluções possíveis 1 a divisa pode ser uma linha mediana do leito do rio determinada pela equidistância das margens 2 a divisa acompanhará a linha de maior profundidade do rio conhecida como talvegue 82 Lago ou lagoa mesmos critérios Em princípio os mesmos critérios que acabamos de enunciar são aplicáveis quando os limites territoriais ocorrerem através de lago ou lagoa Normalmente o divisor é determinado por uma linha imaginária equidistante das margens 83 Rio indiviso Nada impede que um rio limítrofe de dois Estados seja comum aos dois países Nesse caso o rio será indiviso cada Estado exercendo normalmente sua soberania sobre ele 84 Mar territorial 12 milhas O mar territorial constituise da faixa ao longo da costa incluindo o leito e o subsolo respectivos que formam a plataforma continental Os governos militares ignorando os limites do alcance de seu arbítrio estabeleceram os limites do mar territorial brasileiro em 200 milhas a partir da baixamar do litoral continental e insular Decretolei n 109870 De modo geral os demais países nunca chegaram a admiti las As 12 milhas acabaram sendo fixadas pela Lei n 8617 de 4 de janeiro de 1993 85 Navios públicos ou privados Os navios podem ser públicos ou privados Navios públicos são os de guerra os em serviços militares em serviços públicos polícia marítima alfândega etc e aqueles que são colocados a serviço de Chefes de Estado ou representantes diplomáticos Navios privados por sua vez são os mercantes de turismo etc 86 Tratamento dos navios públicos Os navios públicos independentemente de onde se encontrem são considerados território nacional Por isso qualquer crime cometido dentro de um desses navios deverá ser julgado pela Justiça brasileira art 5º 1º 1ª parte Pela mesma razão os crimes praticados em navios públicos estrangeiros em águas territoriais brasileiras serão julgados de acordo com a lei da sua bandeira No entanto marinheiro de navio público que descer em porto estrangeiro e lá cometer crime será processado de acordo com a lei local e não segundo a lei do Estado a que pertence seu navio 87 Tratamento dos navios privados Os navios privados têm outro tratamento a quando em altomar seguem a lei da bandeira que ostentam b quando estiverem em portos ou mares territoriais estrangeiros seguem a lei do país em que se encontrem art 5º 1º 2ª parte 9 Espaço aéreo O espaço aéreo é definido por três teorias a absoluta liberdade do ar nenhum Estado domina o ar sendo permitido a qualquer Estado utilizar o espaço aéreo sem restrições b soberania limitada ao alcance das baterias antiaéreas representaria concretamente os limites do domínio do Estado c soberania sobre a coluna atmosférica o país subjacente teria domínio total sobre seu espaço aéreo limitado por linhas imaginárias perpendiculares incluindo o mar territorial 91 Teoria adotada pelo CBA O Código Brasileiro do Ar Declei n 3266 com as modificações do Decreto n 3467 adota a teoria da soberania sobre a coluna atmosférica 92 Aeronaves públicas e privadas As aeronaves a exemplo dos navios também podem ser públicas e privadas E a elas se aplicam os mesmos princípios examinados quanto aos navios art 5º 1º e 2º J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Consoante entendimento do Pretório Excelso HC 807305MS Rel Min Nelson Jobim 2ª Turma DJU de 14122001 o crime de tráfico internacional via aérea consumase no momento em que a aeronave decola do país de origem no caso em tela Paraguai Assim o ingresso da aeronave no espaço aéreo nacional firma a competência da Justiça Federal brasileira não se devendo confundir o momento da consumação do delito com o da apreensão da droga O crime portanto cometido a bordo de aeronave enseja a competência da Justiça Federal nos termos do art 109 inciso IX da CF Precedentes do STF e do STJ STJ HC 35143PR Rel Min Félix Fischer j 1º32005 Conflito de competência Juízos federal e estadual Art 155 Delito praticado dentro do navio República de Venezuela no Cais do Porto na cidade do Rio de Janeiro Existindo sentença de mérito condenatória prolatada pelo juízo monocrático impende que o Tribunal ao analisar o recurso de apelação interposto antes de suscitar o conflito anule a respectiva decisão STJ Conflito de competência 41109RJ Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 2652004 Lugar do crime Art 6º Considerase praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão no todo ou em parte bem como onde se produziu ou deveria produzirse o resultado V arts 22 70 e 71 do CPP V art 63 da Lei n 909995 Juizados Especiais D O U T R I N A 1 Dificuldades para apurar o lugar do crime Nem sempre será fácil apurar o lugar do crime tarefa importante para possibilitar a adoção do princípio da territorialidade suas exceções e definir enfim os demais princípios reguladores de competência e jurisdição Várias teorias procuram definir o lugar do crime 2 Teoria da ação ou da atividade Lugar do delito é aquele em que se realizou a conduta típica O defeito desta teoria reside na exclusão da atuação do Estado em que o bem jurídico tutelado foi atingido e à evidência onde o delito acabou produzindo os seus maiores efeitos nocivos 3 Teoria do resultado ou do evento Lugar do crime é aquele em que ocorreu o evento ou o resultado isto é onde o crime se consumou pouco importando a ação ou intenção do agente A crítica a esta teoria reside na exclusão da atuação do Estado onde a ação se realizou que tem justificado interesse na repressão do fato 4 Teoria da intenção Lugar do delito é aquele em que segundo a intenção do agente devia ocorrer o resultado A insuficiência desta teoria manifestase nos crimes culposos e preterdolosos 5 Teoria do efeito intermédio ou do efeito mais próximo Lugar do delito é aquele em que a energia movimentada pela atuação do agente alcança a vítima ou o bem jurídico 6 Teoria da ação a distância ou da longa mão Lugar do delito é aquele em que se verificou o ato executivo 7 Teoria limitada da ubiquidade Lugar do delito tanto pode ser o da ação como o do resultado 8 Teoria pura da ubiquidade mista ou unitária Lugar do crime tanto pode ser o da ação como o do resultado ou ainda o lugar do bem jurídico atingido Esta é a teoria adotada pelo Direito brasileiro Considerase praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou a omissão no todo ou em parte bem como onde se produziu ou deveria produzirse o resultado art 6º do CP 81 Solução dos conflitos negativos Com a doutrina mista evitase o inconveniente dos conflitos negativos de jurisdição o Estado em que ocorreu o resultado adota a teoria da ação e viceversa e solucionase a questão do crime a distância em que a ação e o resultado realizamse em lugares diversos 82 Duplicidade de julgamentos A eventual duplicidade de julgamento é superada pela regra constante do art 8º do Código Penal que estabelece a compensação de penas uma modalidade especial de detração penal 83 Lacuna parte do resultado A definição do lugar do crime contida no referido art 6º deixa uma possível lacuna quando por exemplo se produzir no território brasileiro parte do resultado e a ação ou omissão tenha sido praticada fora do território nacional e o agente não tenha pretendido que o resultado aqui se produzisse Ocorre que o texto legal referese a parte da ação ou omissão mas não faz o mesmo em relação ao resultado e parte do resultado não pode confundir com todo este J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A O legislador de 1984 ao fixar a competência pelo lugar da infração manifestou nitidamente sua preferência pela teoria da ubiquidade ao considerar praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou a omissão no todo ou em parte bem como onde se produziu o resultado Os atos executórios do estelionato iniciaramse em Torres vindo o delito se consumar em Cachoeirinha quando a vítima passou o numerário aos meliantes Logo o lugar do crime tanto pode ser tido como Torres ou Cachoeirinha pelo que dispõe o art 6º do CP TJRS Conflito de Competência 70018917815 Rel Marlene Landvoigt j 2542007 Extraterritorialidade Art 7º Ficam sujeitos à lei brasileira embora cometidos no estrangeiro V arts 1º 70 e 88 do CPP V art 40 I da Lei n 113432006 I os crimes a contra a vida ou a liberdade do Presidente da República V art 5º XLIV da CF b contra o patrimônio ou a fé pública da União do Distrito Federal de Estado de Território de Município de empresa pública sociedade de economia mista autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público V art 109 IV da CF c contra a administração pública por quem está a seu serviço d de genocídio quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil V art 6º da Lei n 288956 crime de genocídio V art 1º parágrafo único da Lei n 807290 crimes hediondos II os crimes V art 2º do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais a que por tratado ou convenção o Brasil se obrigou a reprimir V art 109 V da CF b praticados por brasileiro V art 12 da CF c praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras mercantes ou de propriedade privada quando em território estrangeiro e aí não sejam julgados V art 261 do CP 1º Nos casos do inciso I o agente é punido segundo a lei brasileira ainda que absolvido ou condenado no estrangeiro 2º Nos casos do inciso II a aplicação da lei brasileira depende do concurso das seguintes condições a entrar o agente no território nacional b ser o fato punível também no país em que foi praticado c estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição V art 77 da Lei n 681580 Estatuto do Estrangeiro d não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena e não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou por outro motivo não estar extinta a punibilidade segundo a lei mais favorável V arts 107 a 120 do CP 3º A lei brasileira aplicase também ao crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil se reunidas as condições previstas no parágrafo anterior a não foi pedida ou foi negada a extradição b houve requisição do Ministro da Justiça V arts 5º 2º e 116 II do CP D O U T R I N A 1 Extraterritorialidade As situações de aplicação extraterritorial da lei penal brasileira estão previstas no art 7º e constituem exceções ao princípio geral da territorialidade art 5º As hipóteses são as seguintes a extraterritorialidade incondicionada b extraterritorialidade condicionada 11 Extraterritorialidade incondicionada Aplicase a lei brasileira sem qualquer condicionante art 7º I do CP na hipótese de crimes praticados fora do território nacional ainda que o agente tenha sido julgado no estrangeiro art 7º I do CP com fundamento nos princípios de defesa art 7º I a b e c do CP e da universalidade art 7º I d do CP Os casos de extraterritorialidade incondicional referemse a crimes a contra a vida ou a liberdade do Presidente da República b contra o patrimônio ou a fé pública da União do Distrito Federal de Estado Território Município empresa pública sociedade de economia mista autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público c contra a Administração Pública por quem está a seu serviço d de genocídio quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil 12 O injustificável e odioso bis in idem A circunstância de o fato ser lícito no país onde foi praticado ou se encontrar extinta a punibilidade será irrelevante A excessiva preocupação do Direito brasileiro com a punição das infrações relacionadas no inciso I do art 7º levou à consagração de um injustificável e odioso bis in idem nos termos do 1º do mesmo dispositivo que dispõe Nos casos do inciso I o agente é punido segundo a lei brasileira ainda que absolvido ou condenado no estrangeiro 13 Provimento jurisdicional ignorado Nenhum Estado Democrático de Direito pode ignorar o provimento jurisdicional de outro Estado Democrático de Direito devendo no mínimo compensar a sanção aplicada no estrangeiro mesmo que de natureza diversa Menos mal que o disposto no art 8º corrige de certa forma essa anomalia prevendo a compensação da pena cumprida no estrangeiro 14 Extraterritorialidade condicionada Aplicase a lei brasileira quando satisfeitos certos requisitos art 7º II e 2º e 3º do CP com base nos princípios da universalidade art 7º II a do CP da personalidade art 7º II b do CP da bandeira art 7º II c do CP e da defesa art 7º 3º do CP As hipóteses de extraterritorialidade condicionada referemse a crimes a que por tratado ou convenção o Brasil obrigouse a reprimir b praticados por brasileiros c praticados em aeronaves ou em embarcações brasileiras mercantes ou de propriedade privada quando em território estrangeiro e aí não sejam julgados d praticados por estrangeiros contra brasileiro fora do Brasil 15 Cooperação penal internacional A primeira hipótese de extraterritorialidade condicionada referese à cooperação penal internacional que deve existir entre os povos para prevenir e reprimir aquelas infrações penais que interessam a toda a comunidade internacional Os tratados e convenções internacionais firmados pelo Brasil e homologados pelo Congresso Nacional ganham status de legislação interna e são de aplicação obrigatória 16 Crimes praticados por brasileiros no exterior A segunda hipótese de extraterritorialidade condicionada refere se a crimes praticados por brasileiros no exterior Como vimos pelo princípio da nacionalidade ou personalidade o Estado tem o direito de exigir que o seu nacional no estrangeiro tenha comportamento de acordo com seu ordenamento jurídico Pelo mesmo princípio aplicase a lei brasileira sendo indiferente que o crime tenha sido praticado no estrangeiro Por outro lado em hipótese alguma o Brasil concede extradição de brasileiro nato Assim para evitar eventual impunidade não se concedendo extradição é absolutamente correto que se aplique a lei brasileira 17 Aeronaves e embarcações mercantes O terceiro caso referese a crimes praticados em aeronaves e embarcações brasileiras mercantes ou privadas quando no estrangeiro e aí não tenham sido julgados art 7º c Neste caso na verdade o agente está sujeito à soberania do Estado onde o crime foi praticado No entanto se referido Estado não aplicar sua lei é natural que o Brasil o faça para evitar a impunidade Essa orientação fundamentase no princípio da representação e aplicase subsidiariamente somente quando houver deficiência legislativa lacuna ou desinteresse de quem deveria reprimir 18 Praticado por estrangeiro contra brasileiro Aplicarseá a lei brasileira ainda quando o crime praticado por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil reunir além das condições já referidas mais as seguintes a não tiver sido pedida ou tiver sido negada a extradição b houver requisição do Ministro da Justiça art 7º 3º 19 Condições para aplicação da lei brasileira São as seguintes a entrada do agente no território nacional b o fato ser punível também no país em que foi praticado c estar o crime incluído entre aqueles em que a lei brasileira autoriza a extradição d o agente não ter sido absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena e não ter sido perdoado no estrangeiro ou por outro motivo não estar extinta a punibilidade segundo a lei mais favorável art 7º 2º 2 Lei penal em relação às pessoas O princípio da territorialidade como vimos faz ressalvas aos tratados convenções e regras de Direito internacional dando origem às imunidades diplomáticas Há igualmente exceções decorrentes de normas de Direito público interno que originam as imunidades parlamentares As imunidades diplomáticas e parlamentares não estão vinculadas à pessoa autora de infrações penais mas às funções eventualmente por ela exercidas 21 Imunidade diplomática A imunidade diplomática impõe limitação ao princípio temperado da territorialidade art 5º do CP Tratase de privilégios outorgados aos representantes diplomáticos estrangeiros observando sempre o princípio da mais estrita reciprocidade A Convenção de Viena promulgada no Brasil pelo Decreto n 5643565 estabelece para o diplomata imunidade de jurisdição penal ficando sujeito à jurisdição do Estado a que representa art 31 211 Natureza jurídica causa pessoal de exclusão de pena A natureza jurídica desse privilégio no âmbito do Direito Penal constitui causa pessoal de exclusão de pena No entanto essa imunidade pode ser renunciada pelo Estado acreditante e não pelo agente diplomático em razão da própria natureza do instituto 212 Extensão da imunidade todos os agentes diplomáticos e familiares A imunidade se estende a todos os agentes diplomáticos e funcionários das organizações internacionais ONU OEA etc quando em serviço incluindo os familiares Estão excluídos desse privilégio os empregados particulares dos agentes diplomáticos 213 Exclusão agentes consulares Os cônsules agentes administrativos que representam interesses de pessoas físicas ou jurídicas estrangeiras não têm imunidade diplomática têm apenas imunidade de jurisdição administrativa e judiciária pelos atos realizados no exercício das funções consulares Nada impede porém que tratado bilateral estabeleça imunidade diplomática 22 Imunidade parlamentar Para que o Poder Legislativo possa exercer seu múnus público com liberdade e independência a Constituição asseguralhe algumas prerrogativas dentre as quais se destacam as imunidades A imunidade por não ser um direito do parlamentar mas do próprio Parlamento é irrenunciável A imunidade parlamentar é um privilégio ou prerrogativa de Direito público interno e de cunho personalíssimo decorrente da função exercida 221 Espécies de imunidades parlamentares a Imunidade material assegurase a imunidade material que também é denominada imunidade absoluta penal civil disciplinar e política e referese à inviolabilidade do parlamentar senador deputado federal estadual vereador no exercício do mandato por suas opiniões palavras e votos arts 53 caput 27 1º e 29 VIII da CF A inviolabilidade pela manifestação do pensamento é considerada elementar nos regimes democráticos e inerente ao exercício do mandato b Imunidade formal também denominada imunidade relativa ou processual referese à prisão ao processo a prerrogativas de foro arts 53 4º e 102 I b isto é referese ao processo e julgamento art 53 1º e 3º da CF O termo inicial da imunidade material e formal ocorre com a diplomação do parlamentar art 53 1º da CF e encerrase com o término do mandato 222 Imunidade do parlamentar estadual A imunidade material e formal foi estendida ao deputado estadual art 27 1º da CF Contudo segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal as imunidades e prerrogativas concedidas aos deputados estaduais limitamse às autoridades judiciárias dos respectivos Estadosmembros dispondo na Súmula 3 o seguinte A imunidade concedida a Deputado Estadual é restrita à Justiça do Estadomembro 223 Imunidade do vereador Os vereadores também são invioláveis por suas opiniões palavras e votos mas somente no exercício do mandato e na circunscrição do Município art 29 VIII da CF Porém os vereadores não têm imunidade processual nem gozam de foro privilegiado 3 Da imunidade parlamentar a partir da EC n 352001 Antes da vigência da Emenda Constitucional n 352001 a imunidade parlamentar limitavase na verdade à inviolabilidade penal Essa Emenda deu ao caput do art 53 da Constituição Federal a seguinte redação Os Deputados e Senadores são invioláveis civil e penalmente por quaisquer de suas opiniões palavras e votos Com essa redação a Emenda n 35 estendeu expressamente a inviolabilidade para o campo civil razão pela qual os parlamentares também passam a não responder pelos danos materiais e morais decorrentes de suas manifestações representadas por palavras opiniões e votos Em outros termos o pedido de reparação civil por danos materiais ou morais decorrentes de opiniões palavras e votos passa a ser juridicamente impossível 31 Inviolabilidade civil criação pretoriana A bem da verdade antes mesmo da vigência da Emenda n 35 o Superior Tribunal de Justiça já havia reconhecido a favor dos parlamentares a inviolabilidade civil uma vez que embora não fosse expressamente previsto no Texto Constitucional não havia por outro lado qualquer proibição em sentido contrário 311 Ampliação da inviolabilidade âmbito administrativo A despeito de o Texto Constitucional emendado referirse apenas à inviolabilidade penal e civil acreditamos que não há nenhum óbice para estendêla ao âmbito administrativo e político na medida em que a nova redação constitucional referese a quaisquer de suas opiniões palavras e votos ao contrário do texto anterior que se limitava a opiniões palavras e votos 32 Nexo funcional pressuposto básico Por outro lado embora a locução quaisquer de suas opiniões possa sugerir que todas as manifestações do parlamentar estariam acolhidas pela inviolabilidade penal inclusive quando proferidas fora do exercício funcional não se pode atribuirlhe tamanha abrangência conflitaria com efeito com os princípios éticos orientadores de um Estado Democrático de Direito no qual a igualdade assume o status de princípio dos princípios além de divorciarse de sua verdadeira finalidade qual seja a de assegurar o exercício pleno e independente da função parlamentar Assim conquanto o nexo funcional não se encontre expresso quer nos parecer que se trata de pressuposto básico legitimador da inviolabilidade parlamentar cuja ausência transformaria a inviolabilidade em privilégio odioso Na realidade o interesse em preservar e assegurar a liberdade e independência do parlamentar não pode institucionalizar arbitrariedades e abusos manifestos 33 Âmbito espacial exclusão do licenciado Contudo é indiferente que as manifestações sejam praticadas dentro ou fora do Congresso Nacional desde que haja nexo funcional inclusive para aquelas manifestações proferidas através da mídia No entanto o parlamentar que se licencia afastase do parlamento para ocupar algum cargo na Administração Pública não está acobertado pela imunidade parlamentar embora mantenha o foro especial por prerrogativa de função Nesse sentido foi cancelada a Súmula 4 do STF que tinha a seguinte redação Não perde a imunidade parlamentar o congressista nomeado Ministro de Estado 34 A imunidade processual e prisional Antes da vigência da EC n 352001 com um controle legislativo prévio a imunidade processual impedia que o parlamentar desde a expedição do diploma pudesse ser processado criminalmente sem prévia licença da Casa de origem Câmara ou Senado Tratavase de um ato vinculado e unilateral O pedido de licença era encaminhado pelo STF depois de oferecida a denúncia ou queixa A licença do Parlamento constituía em outros termos uma condição de procedibilidade Com a EC n 352001 o controle legislativo passou a ser a posteriori mudando toda a sistemática O STF não mais depende de autorização para iniciar processo criminal contra todo e qualquer parlamentar autor de infração criminal agora ao contrário para trancálo o Senado ou a Câmara terão necessariamente de agir para sustálo Voltase a ter praticamente o mesmo sistema que fora implantado pela EC n 2282 4 Sustação de processo em andamento Resumindo a imunidade processual parlamentar limitase à possibilidade de sustar processo criminal em andamento e não impedir que determinado processo seja instaurado A imunidade processual não constitui obstáculo para qualquer ato investigatório investigação administrativa ou criminal que era e é presidido por ministro pertencente ao STF STF Recl 511PB Celso de Mello DJU 15 fev 1995 Em outros termos o Parlamento não pode suspender qualquer tipo de investigação criminal mas somente por maioria sustar processo criminal instaurado 41 Imunidade prisional A EC n 352001 passou a assegurar também a imunidade prisional nos seguintes termos Desde a expedição do diploma os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos salvo em flagrante de crime inafiançável Neste caso os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva para que pelo voto da maioria de seus membros resolva sobre a prisão Constatase de plano que por crimes afiançáveis jamais o parlamentar poderá ser preso Contudo deverá ser processado normalmente na medida em que não existe imunidade material absoluta desde que o fato não tenha conexão com o exercício do mandato 5 Extradição Segundo o Congresso Internacional de Direito Comparado de Haia 1932 a extradição é uma obrigação resultante da solidariedade internacional na luta contra o crime 51 Conceito de extradição Extraditar significa entregar a outro país um indivíduo que se encontra refugiado para fins de ser julgado ou cumprir a pena que lhe foi imposta Em outros termos extradição é o ato pelo qual um Estado entrega um indivíduo acusado de fato delituoso ou já condenado como criminoso à justiça de outro Estado competente para julgálo e punilo 52 Espécies de extradição A extradição pode ser a ativa em relação ao Estado que a reclama b passiva em relação ao Estado que a concede c voluntária quando há anuência do extraditando d imposta quando há oposição do extraditando e reextradição ocorre quando o Estado que obteve a extradição requerente tornase requerido por um terceiro Estado que solicita a entrega da pessoa extraditada 53 Princípios da extradição I Quanto ao delito a princípio da legalidade art 91 I da Lei n 681580 EE por este princípio não haverá extradição se o crime imputado ao extraditando não estiver especificado em tratado ou convenção internacional b princípio da especialidade significa que o extraditado não poderá ser julgado por fato diverso daquele que motivou a extradição c princípio da identidade da norma art 77 II do EE o fato que origina o pedido de extradição deve consistir em crime também no país ao qual a extradição foi solicitada II Quanto à pena e à ação penal a princípio da comutação art 91 III da EE como corolário do princípio de humanidade a extradição concedida pelo Brasil é condicionada à não aplicação de pena de morte ou pena corporal Se o país que a requerer tiver a cominação de tais penas para o delito imputado terá de comutálas em pena privativa de liberdade b princípio da jurisdicionalidade art 77 VIII do EE pretende impedir que o extraditando seja julgado no país requerente por Tribunal ou Juízo de exceção Implicitamente procura garantir o princípio do juiz natural c princípio non bis in idem arts 77 III e 91 II do EE há dois aspectos a considerar em primeiro lugar um conflito positivo de competência que impede a concessão da extradição quando o Brasil for igualmente competente para julgar o caso em segundo lugar a necessidade de assumir a obrigação de comutar o tempo de prisão que foi imposta no Brasil em decorrência do pedido de extradição art 91 II do EE d princípio da reciprocidade art 76 do EE a extradição institui se basicamente sobre o princípio da reciprocidade que convém a dois Estados soberanos especialmente por dois aspectos de um lado porque o delito deve ser punido na comunidade onde foi praticado e de outro lado porque expulsa do território nacional um delinquente naturalmente indesejável que um Estado estrangeiro deseja julgar e punir 54 Condições para a extradição As condições para a concessão da extradição vêm enumeradas no art 77 condições negativas e no art 78 condições positivas do Estatuto do Estrangeiro 55 Limitações à extradição a brasileiro nato a principal limitação em relação à pessoa é a da não extradição de nacionais o brasileiro nato não pode ser extraditado em nenhuma hipótese b brasileiro naturalizado poderá ser extraditado por crime comum praticado antes da naturalização ou por envolvimento comprovado em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins art 5º LI da CF e art 77 I do EE O nacional não extraditado responde perante a Justiça brasileira art 7º II e 2º do CP c alguns crimes especiais ambiguidade em relação aos crimes religiosos fiscais e puramente militares a lei brasileira não é precisa Na verdade estabelece um regime facultativo embora a doutrina e a jurisprudência dominantes se manifestem no sentido de não se conceder a extradição por tais infrações O mesmo não ocorre com o crime político ou de opinião em que a proibição constitucional é expressa arts 5º LII da CF e 77 VII do EE Ver nosso Manual sobre crimes políticos 56 Requisitos para a concessão de extradição São indispensáveis os seguintes requisitos para a concessão da extradição 1º exame prévio pelo Supremo Tribunal Federal CF art 102 I g 2º existência de convenção ou tratado firmado com o Brasil ou na sua falta o oferecimento de reciprocidade 3º existência de sentença final condenatória ou decreto de prisão cautelar 4º ser o extraditando estrangeiro 5º o fato imputado deve constituir crime perante o estado brasileiro e o estado requerente 57 Cláusulas limitadoras da extradição a Não ser preso ou processado por fatos anteriores ao pedido b aplicar o princípio da detração descontar na prisão ou medida de segurança o tempo de prisão provisória ou administrativa que teve no Brasil c não aplicar pena de morte salvo em caso de guerra como permite o Brasil e de prisão perpétua d não entregar o extraditando a outro país salvo se houver a concordância do Brasil e não agravar a pena do extraditando por motivo político 58 Vinculação ao fato motivador da extradição A imposição das cláusulas limitadoras demonstra a preocupação brasileira com as garantias e os direitos fundamentais tais cláusulas decorrem do princípio de especialidade Por esse princípio o extraditando somente poderá ser processado no país requerente pelos fatos autorizados no próprio processo de extradição 59 Pressupostos ou requisitos negativos da extradição a A pena máxima para o crime imputado ao extraditando deve ser superior a um ano pela legislação brasileira b o crime imputado ao extraditando não pode ser político ou de opinião c o extraditando não pode estar sendo processado nem pode ter sido condenado ou absolvido no Brasil pelo mesmo fato em que se fundar o pedido d o Brasil deve ser incompetente para julgar a infração segundo as suas leis e o estado requerente tem de provar a sua competência e o extraditando no exterior não pode ser submetido a tribunal de exceção 6 Procedimento do processo de extradição Quando se inicia o processo de extradição o extraditando deve ser preso e colocado à disposição do STF art 81 do EE e art 208 do RISTF O entendimento nesses casos é de não admitir prisão domiciliar liberdade vigiada prisão albergue nem mesmo as chamadas medidas alternativas Na realidade o STF tem considerado como uma espécie de prisão preventiva embora seja de natureza obrigatória Afora essa prisão obrigatória que para alguns tem natureza administrativa o Estado estrangeiro pode postular cautelarmente a prisão preventiva do extraditando e nesse caso terá 90 dias para formalizar o pedido de extradição a não ser que tratado bilateral estabeleça prazo diverso entre Brasil e Argentina esse prazo é fixado em 45 dias 61 Limitação da defesa do extraditando A tramitação do processo de extradição tem prioridade no Supremo Tribunal Federal podendo ser precedido somente por habeas corpus que é a prioridade número um A defesa do extraditando é limitada e circunscrevese fundamentalmente em três aspectos a erro quanto à identidade da pessoa extraditanda b defeito formal dos documentos apresentados pelo Estado estrangeiro e c ilegalidade do pedido de extradição 62 Obrigatoriedade da extradição Finalmente estando satisfeitos os princípios os requisitos e as demais condições legais previstas nas legislações ordinário constitucionais de cada país nos tratados e convenções ou se for o caso na adoção do princípio de reciprocidade a extradição de estrangeiro não pode ser negada 7 Deportação e expulsão A deportação e a expulsão são medidas administrativas de polícia com a finalidade comum de obrigar o estrangeiro a deixar o território nacional A primeira consiste na saída compulsória do estrangeiro para o país de sua nacionalidade ou procedência ou para outro que consinta em recebêlo art 58 do EE Verificase a deportação nos casos de entrada ou estada irregular de estrangeiro art 57 do EE O deportado pode reingressar no território nacional sob certas condições art 64 71 Causas que levam à expulsão Ocorre a expulsão quando o estrangeiro atentar de qualquer forma contra a segurança nacional a ordem política ou social a tranquilidade ou moralidade pública e a economia popular ou cujo procedimento o torne nocivo à conveniência e aos interesses nacionais 72 Outros fundamentos para a expulsão É passível também de expulsão o estrangeiro que a praticar fraude a fim de obter a sua entrada ou permanência no Brasil b havendo entrado no território nacional com infração à lei dele não se retirar no prazo que lhe for determinado para fazêlo não sendo aconselhável a deportação c entregarse à vadiagem ou à mendicância ou d desrespeitar proibição especialmente prevista em lei para estrangeiro art 65 do EE 73 Natureza jurídica da expulsão A expulsão não é pena mas medida preventiva de polícia Constitui medida administrativa adotada pelo Estado com suporte no poder político e fundamentada no legítimo direito de defesa da soberania nacional Cabe ao Presidente da República deliberar sobre a conveniência e a oportunidade da expulsão art 66 do EE O art 75 do Estatuto do Estrangeiro arrola as causas impeditivas da expulsão O Decreto n 98961 de 15 de fevereiro de 1990 dispõe sobre a expulsão de estrangeiro condenado por tráfico de entorpecentes e drogas afins J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 1 do STF É vedada a expulsão de estrangeiro casado com brasileira ou que tenha filho brasileiro dependente da economia paterna Súmula 245 do STF A imunidade parlamentar não se estende ao corréu sem essa prerrogativa Súmula 421 do STF Não impede a extradição a circunstância de ser o extraditando casado com brasileira ou ter filho brasileiro a Extraterritorialidade Se a atividade tida como ilícita não ocorreu no Brasil o paciente como gerente de banco não está sujeito às leis brasileiras visto que os contratos foram assinados no Uruguai art 7º I e II do CP TRF1ª região HC 200701000421750 Rel Tourinho Neto j 22102007 Crime perpetrado no exterior Autoria imputada a brasileiro Possibilidade de persecução penal no Brasil Nos termos do art 7º II b e 2º do CP é possível a persecução penal no Brasil contra cidadão brasileiro acusado de prática de crime no estrangeiro a despeito de já haver processo em curso no país onde ocorreu o delito STJ AgRg na CR 571EX 200500205482 Rel Min Barros Monteiro j 662007 Homicídio cuja execução se iniciou no Brasil e o resultado se ultimou no exterior Princípio da extraterritorialidade O crime cometido no estrangeiro contra brasileiro ou por brasileiro é da competência da Justiça Brasileira e nesta da Justiça Federal a teor da norma inserta no inciso IV do artigo 109 da Constituição Federal por força dos princípios da personalidade e da defesa que ao lado do princípio da justiça universal informam a extraterritorialidade da lei penal brasileira Código Penal art 7º II b e 3º e são em ultima ratio expressões da necessidade do Estado de proteger e tutelar de modo especial certos bens e interesses STJ HC 18307MT Rel Min Hamilton Carvalhido j 1842002 b Imunidades Imunidade parlamentar material CF art 53 incidência As declarações proferidas pelo querelado na qualidade de Presidente da Comissão de Direitos Humanos do Senado Federal alusivas a denúncias de tortura sob investigação do Ministério Público são palavras absolutamente ligadas ao exercício do mandato donde estarem cobertas pela imunidade parlamentar material Não é cabível indagar sobre nenhuma qualificação penal do fato objetivo se ele está compreendido na área da inviolabilidade parlamentar STF Inq 2282DF Rel Min Sepúlveda Pertence j 30 62006 A prerrogativa indisponível da imunidade material que constitui garantia inerente ao desempenho da função parlamentar não traduzindo por isso mesmo qualquer privilégio de ordem pessoal não se estende a palavras nem a manifestações do congressista que se revelem estranhas ao exercício por ele do mandato legislativo A situação registrada nos presentes autos indica que a data da suposta prática delituosa ocorreu em momento no qual o ora denunciado ainda não se encontrava investido na titularidade de mandato legislativo Consequente inaplicabilidade a ele da garantia da imunidade parlamentar material STF InqQO 1024PR Rel Min Celso de Mello j 21112002 Prisão preventiva Acusado que exercia as funções de Cônsul de Israel no Rio de Janeiro Crime previsto no art 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente Lei n 806990 Inexistência de obstáculo à prisão preventiva nos termos do que dispõe o art 41 da Convenção de Viena sobre relações consulares Atos imputados ao paciente que não guardam pertinência com o desempenho de funções consulares Necessidade da prisão preventiva para garantir a aplicação da lei penal STF HC 81158RJ Rel Min Ilmar Galvão j 1452002 c Extradição e expulsão A concordância do extraditando com o deferimento do pedido é juridicamente irrelevante vez que não afasta o controle de legalidade conferido ao STF STF Extr 1052 Rel Min Eros Grau j 2792006 Uma vez configurada a prescrição de acordo com a regência do Direito brasileiro cumpre limitar o deferimento do pedido de extradição STF Extr 975 Rel Min Marco Aurélio j 3062006 Pode ser extraditado o brasileiro naturalizado que adquiriu a nacionalidade após a prática do crime comum que fundamenta o pedido de extradição STF HC 87219DF Rel Min Cezar Peluso j 1462006 O Supremo Tribunal Federal em recente revisão da jurisprudência firmou a orientação de que o Estado requerente deve emitir prévio compromisso em comutar a pena de prisão perpétua prevista pela legislação argentina para a pena privativa de liberdade com o prazo máximo de trinta anos Esse entendimento baseiase na garantia individual fundamental prevista pelo art 5º XLVII b da Constituição Federal do Brasil STF Extr 985 Rel Min Joaquim Barbosa j 642006 Pedido extradicional que atende às exigências formais da Lei n 681580 A ausência de tratado bilateral não impede a concessão de pedido extradicional desde que o Estado requerente formalize promessa de reciprocidade passível de fiel cumprimento STF Extr 971 Rel Min Carlos Britto j 2332006 O postulado da dupla tipicidade por constituir requisito essencial ao atendimento do pedido de extradição impõe que o ilícito penal atribuído ao extraditando seja juridicamente qualificado como crime tanto no Brasil quanto no Estado requerente O que realmente importa na aferição do postulado da dupla tipicidade é a presença dos elementos estruturantes do tipo penal essentialia delicti tais como definidos nos preceitos primários de incriminação constantes da legislação brasileira e vigentes no ordenamento positivo do Estado requerente independentemente da designação formal por eles atribuída aos fatos delituosos STF Extr 953 Rel Min Celso de Mello j 2892005 Na linha da jurisprudência desta egrégia Corte o Tratado de extradição superveniente ao pedido é imediatamente aplicável seja em benefício seja em prejuízo do extraditando STF Extr 937 Rel Min Carlos Britto j 332005 Filha brasileira Reconhecimento ulterior à expedição do Decreto de expulsão Inexistência ademais dos requisitos simultâneos da guarda e da dependência econômica Não ocorrência de causa impeditiva STF HC 82893 Rel Min Cezar Peluso j 17122004 Esta Corte firmou o entendimento no sentido de impossibilitar o pleito de extradição após a solene entrega do certificado de naturalização pelo juiz salvo comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins na forma da lei A norma inserta no artigo 5º LI da Constituição do Brasil não é regra de eficácia plena nem de aplicabilidade imediata STF Extr 934 Rel Min Eros Grau j 992004 O repúdio ao terrorismo um compromisso éticojurídico assumido pelo Brasil quer em face de sua própria Constituição quer perante a comunidade internacional A cláusula de proteção constante do art 5º LII da Constituição da República que veda a extradição de estrangeiro por crime político ou de opinião não se estende por tal razão ao autor de atos delituosos de natureza terrorista STF Extr 855 Rel Min Celso de Mello j 2682004 Se a extradição não puder ser concedida por inadmissível em face de a pessoa reclamada ostentar a condição de brasileira nata legitimarseá a possibilidade de o Estado brasileiro mediante aplicação extraterritorial de sua própria lei penal CP art 7º II b e respectivo 2º e considerando ainda o que dispõe o Tratado de Extradição BrasilPortugal art IV fazer instaurar perante órgão judiciário nacional competente CPP art 88 a concernente persecutio criminis em ordem a impedir por razões de caráter éticojurídico que práticas delituosas supostamente cometidas no exterior por brasileiros natos ou naturalizados fiquem impunes Doutrina Jurisprudência STF HC 83113DF Rel Min Celso de Mello j 2662003 Tratado bilateral no Brasil tem hierarquia de lei ordinária e natureza de lei especial que afasta a incidência da lei geral de extradição STF Extr 795 Rel Min Sepúlveda Pertence j 822001 Pena cumprida no estrangeiro Art 8º A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime quando diversas ou nela é computada quando idênticas V art 42 do CP V arts 787 a 790 do CPP D O U T R I N A Quando a pena aplicada no exterior for diversa pelo mesmo crime será atenuada a pena aplicável no Brasil quando se tratar de pena idêntica haverá dedução da pena a cumprir uma espécie de detração penal Tratase na verdade de um reconhecimento do democrático e universal princípio ne bis in idem J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Crime iniciado em território nacional 1 Aplicase a lei brasileira ao caso tendo em vista o princípio da territorialidade e a teoria da ubiquidade consagrados na lei penal 4 Não existe qualquer óbice legal para a eventual duplicidade de julgamento pelas autoridades judiciárias brasileira e paraguaia tendo em vista a regra constante do art 8º do Código Penal STJ HC 41892SP Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 262005 Eficácia de sentença estrangeira Art 9º A sentença estrangeira quando a aplicação da lei brasileira produz na espécie as mesmas consequências pode ser homologada no Brasil para V art 105 I i da CF V arts 780 a 790 do CPP I obrigar o condenado à reparação do dano a restituições e a outros efeitos civis V arts 63 a 68 do CPP II sujeitálo a medida de segurança V arts 96 a 99 do CP V arts 171 a 179 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal Parágrafo único A homologação depende a para os efeitos previstos no inciso I de pedido da parte interessada b para os outros efeitos da existência de tratado de extradição com o país de cuja autoridade judiciária emanou a sentença ou na falta de tratado de requisição do Ministro da Justiça D O U T R I N A 1 Limites dos efeitos de sentença estrangeira A execução de pena é ato de soberania por isso os efeitos de sentença estrangeira no Brasil são limitadíssimos resumemse a dois pouco usuais inclusive Assim como não se aplicam aqui as leis estrangeiras seus julgados tampouco podem ser executados 2 Efeitos que dependem de homologação do STJ Os efeitos que sentença penal estrangeira produz no País são a aplicação de medida de segurança b ressarcimento do dano ou restituição civil necessitando para tanto da homologação do Superior Tribunal de Justiça art 105 I i da CF arts 787 a 790 do CPP Esses efeitos ainda dependem da satisfação das condições exigidas no parágrafo único 3 Efeitos que não dependem de homologação do STJ a reconhecimento da reincidência art 63 b requisito para a extraterritorialidade art 7º 2º d e e do CP Para esses efeitos não é necessária a homologação sendo suficiente a comprovação legal da existência da condenação 4 Competência para a homologação É atribuição do Superior Tribunal de Justiça examinar sentença estrangeira e se for o caso homologála art 105 I i da CF e arts 787 a 790 do CPP J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 420 do STF Não se homologa sentença proferida no estrangeiro sem prova de trânsito em julgado Sentença penal estrangeira Decretação da prisão de pessoa domiciliada no Brasil Impossibilidade de homologação pelo STF sob pena de ofensa à soberania nacional O ordenamento positivo brasileiro tratandose de sentença penal estrangeira admite a possibilidade de sua homologação desde que esse ato sentencial tenha por estrita finalidade a obrigar o condenado à reparação civil ex delicto RTJ 8257 ou b sujeitálo quando inimputável ou semiimputável à execução de medida de segurança CP art 9º Não pode ser homologada no Brasil sentença penal estrangeira que tenha decretado a prisão de pessoa com domicílio em território brasileiro STF SE 5705EUA Pres Min Celso de Mello j 1731998 Contagem de prazo Art 10 O dia do começo incluise no cômputo do prazo Contamse os dias os meses e os anos pelo calendário comum V art 798 1º do CPP D O U T R I N A 1 Prazos do Código Penal O prazo processual desconsidera o dia inicial começando no primeiro dia útil seguinte e considera o termo final art 798 1º do CPP No prazo penal material ao contrário computase o primeiro dia e se exclui o último Os prazos penais não se interrompem nem se suspendem por férias domingos ou feriados Essa disciplina prazal aplicase a todos os prazos materiais execução de penas sursis prescrição livramento condicional decadência etc Assim por exemplo o prazo de dez dias iniciado no dia cinco encerrase no dia 14 às 24 horas 2 Prazos previstos em dois códigos Quando o mesmo prazo estiver previsto em dois códigos CP e CPP v g aplicase a contagem que for mais favorável ao acusado Isso ocorre por exemplo na prescrição decadência etc 3 Contagem do prazo da perempção A perempção é instituto de direito material é causa de extinção da punibilidade assumindo caráter e natureza material Não comungamos da opinião dominante segundo a qual deveria ser adotado o prazo processual 4 Calendário comum gregoriano Calendário comum é o gregoriano de maneira que os meses e os anos têm sempre seu número real de dias com um ano bissexto a cada quatro anos A contagem do lapso temporal é feita a partir do termo inicial ao dia correspondente do próximo mês ou seja de maneira direta ou corrida sem levar em conta as horas frações do dia Assim o prazo de um ano iniciandose a qualquer hora do dia 15 de setembro terminará às 24 horas do dia 14 de setembro do ano seguinte É irrelevante que o dia do início seja domingo ou feriado e que o ano seja ou não bissexto A hora do início tampouco é relevante computandose por inteiro o dia do começo do prazo J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A O prazo de prescrição é prazo de natureza penal expresso em anos contandose na forma preconizada no art 10 do Código Penal na linha do calendário comum o que significa dizer que o prazo de um ano tem início em determinado dia e termina na véspera do mesmo dia do mês e ano subsequentes Os meses e anos são contados não ex numero mas ex numeratione dierum seja não se atribui 30 dias para o mês nem 365 dias para o ano sendo irrelevante o número de dias do mês 28 29 30 e 31 mas o espaço entre duas datas idênticas de meses consecutivos STJ REsp 188681SC Rel Min Vicente Leal j 592000 Sendo a decadência causa extintiva de punibilidade o prazo respectivo tem caráter penal e deve ser contado nos termos do art 10 do Código Penal computandose o dies a quo que é o dia da ciência da autoria do fato pelo querelante e encerrandose na véspera do mesmo dia do mês subsequente obedecendose o calendário comum gregoriano STJ REsp 103231SP Rel Min Vicente Leal j 1641999 A legislação penal sufragou o calendário gregoriano para o cômputo do prazo O período do dia começa a zero hora e se completa às 24 horas Incluise o dia do começo A idade é mencionada por ano Não se leva em conta a hora do nascimento O dia do começo normativamente independe do instante da ocorrência do nascimento Termina às 24 horas Assim a pessoa nascida ao meiodia completa o primeiro dia de vida à meianoite STJ REsp 16849SP Rel Min Luiz Vicente Cernicchiaro j 2991992 Frações não computáveis da pena Art 11 Desprezamse nas penas privativas de liberdade e nas restritivas de direitos as frações de dia e na pena de multa as frações de cruzeiro D O U T R I N A 1 Alteração legislativa O Decretolei n 228486 instituiu o cruzado a Lei n 773089 criou o cruzado novo mantendo o centavo a Lei n 802490 voltou a adotar o cruzeiro mantendo novamente o centavo a Lei n 869793 criou o cruzeiro real finalmente a Lei n 888094 instituiu o real mantendo o centavo 2 Frações das penas temporais Não são computadas nas penas privativas de liberdade e nas restritivas de direitos as frações de dias isto é as horas e minutos dessas penas não podem ser desprezadas porém as frações de mês e ano As frações de mês devem ser reduzidas a dias e as frações de ano a meses 3 Frações das penas pecuniárias Nas penas pecuniárias não são computadas as frações da unidade da moeda nacional ontem o cruzeiro hoje o real amanhã o que houver etc Adotamos esse raciocínio por extensão à prestação pecuniária e à perda de bens e valores cuja natureza também é pecuniária a despeito da ficção legal J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Fixação da pena Considerandose a continuidade delitiva reconhecida em primeira e segunda instâncias art 71 do CP com o aumento da pena estabelecido em 16 um sexto e na ausência de outras causas de aumento ou diminuição fica a pena definitivamente fixada em 1 um ano 6 seis meses e 19 dezenove dias desprezandose as frações de dia de acordo com o art 11 do Código Penal STJ HC 31289RS Rel Min Paulo Medina j 21102004 São desprezáveis as frações de diamulta e as frações de real ou seja os centavos As frações de diamulta CP art 49 podem não ser computadas por força do princípio que manda desprezar as frações de dia TJMG Apelação 200000042136610001 Rel Eduardo Brum j 3122003 Legislação especial Art 12 As regras gerais deste Código aplicamse aos fatos incriminados por lei especial se esta não dispuser de modo diverso V art 1º do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais V art 287 da Lei n 473765 Código Eleitoral D O U T R I N A 1 Aplicação das regras gerais abrangência O sistema penal brasileiro é composto pelos Códigos Penal e de Processo Penal e pelas leis extravagantes As regras gerais do Código Penal são aplicáveis à legislação especial quando não houver disposição expressa em sentido contrário Assim a regra é a aplicação a exceção será a não aplicação 2 Regras gerais Parte Geral e Parte Especial O Código Penal também contém regras gerais insertas na Parte Geral como por exemplo conceito de funcionário público art 327 J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Tratandose de dispositivos legais que tipificam uma única conduta homicídio culposo evidenciando o conflito aparente de normas impõese a observância do princípio da especialidade devendo prevalecer a norma especial no caso o Código de Trânsito Brasileiro que no art 302 prevê a prática de homicídio culposo na direção de veículo automotor não sendo de falar em violação dos princípios da proporcionalidade ou da isonomia STJ HC 13779BA Rel Min Paulo Gallotti j 1782006 Título II DO CRIME Relação de causalidade Art 13 O resultado de que depende a existência do crime somente é imputável a quem lhe deu causa Considerase causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido V arts 69 a 71 do CP V art 19 do CP Superveniência de causa independente 1º A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando por si só produziu o resultado os fatos anteriores entretanto imputamse a quem os praticou Relevância da omissão 2º A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado O dever de agir incumbe a quem a tenha por lei obrigação de cuidado proteção ou vigilância b de outra forma assumiu a responsabilidade de impedir o resultado c com seu comportamento anterior criou o risco da ocorrência do resultado D O U T R I N A 1 Considerações gerais O Direito Penal limitase a regular a atividade humana parte dela uma vez que os demais processos naturais não podem ser objeto de regulação pelo Direito porque são forças ou energias cegas enquanto a atividade humana é uma energia inteligente 2 Crime ação e resultado No CP há previsão de infrações chamadas de crimes de mera atividade ou de mera conduta os quais se consumam com a simples realização de um comportamento comissivo ou omissivo não se dando importância às suas eventuais consequências Outras vezes ao contrário o Código engloba na sua descrição a conduta humana e a consequência por ela produzida isto é o resultado de tal forma que só haverá crime consumado quando esse resultado se concretizar 3 Ação e resultado nexo causal Em razão da integração na descrição típica de ação e resultado surge a necessidade de identificarse um terceiro elemento que é a relação causal entre aqueles dois Essa relação causal enquanto categoria geral é elemento da ação visto que toda ação se utiliza do processo causal de natureza ôntica 4 Teoria da imputação objetiva Fruto da teoria da relevância típica desenvolvida por Mezger vem a ser um critério normativorestritivo da causalidade natural Sobre esta incide o juízo de imputação objetiva do resultado já que nem todo resultado causado é imputável à ação do agente Não é a teoria consagrada pelo nosso Código Penal art 13 caput 41 Fundamento da teoria da imputação objetiva Fundamentase no incremento do risco e no fim de proteção da norma A causação de um resultado típico só realizará o tipo objetivo delitivo se o agente criou um perigo juridicamente desaprovado que se consubstanciou naquele Não se imputa objetivamente o resultado nas hipóteses de diminuição do risco para o bem jurídico ausência de um risco juridicamente desaprovado resultado fora do âmbito de proteção da norma e comportamento alternativo conforme o direito em sede de crime culposo Essa teoria objetiva garantir a prevalência de um conceito jurídico sobre um conceito natural préjurídico de ação Luiz Regis Prado 5 Teoria da equivalência das condições ou conditio sine qua non A primeira parte do caput do art 13 afirma que a relação de causalidade limitase aos crimes de resultado materiais a segunda parte por sua vez consagra expressamente a adoção da teoria da equivalência das condições também conhecida como teoria da conditio sine qua non para determinar a relação de causalidade Em nosso CP não é uma questão doutrinária ou científica mas uma questão legal 51 Conteúdo e definição da teoria da equivalência das condições Não há nenhuma base científica para distinguir causa e condição É uma teoria que não distingue como prevalente ou preponderante nenhum dos diversos antecedentes de determinado resultado Todo fator seja ou não atividade humana que contribui de alguma forma para a ocorrência do evento é causa desse evento Causa para essa teoria é a soma de todas as condições consideradas no seu conjunto produtoras de um resultado 52 Desvantagem da teoria da equivalência das condições Tem a desvantagem de levar ad infinitum a pesquisa do que seja causa todos os agentes das condições anteriores em tese responderiam pelo crime Na verdade se remontarmos todo o processo causal vamos descobrir que uma série de antecedentes bastante remotos foi condição indispensável à ocorrência do resultado 53 Necessidade de limitar o alcance da teoria Procurouse limitar o alcance desta teoria utilizando outros institutos do estudo dogmáticopenal como por exemplo a localização do dolo e da culpa no tipo penal as concausas absolutamente independentes além da superveniência de causas relativamente independentes Na verdade a concepção puramente naturalística funcionará somente como limite do nexo causal e não como único critério da imputação física Assim a exclusão da causalidade física impedirá o reconhecimento de um vínculo causal normativo 6 Limitações do alcance da teoria da conditio sine qua non A relação de causalidade entre a conduta humana e o resultado é uma relação valorada que deve ser aferida conjuntamente com o vínculo subjetivo do agente Causalidade relevante para o Direito Penal é aquela que pode ser prevista isto é aquela que é previsível que pode ser mentalmente antecipada pelo agente Em outros termos a cadeia causal aparentemente infinita sob a ótica puramente naturalística será sempre limitada pelo dolo ou pela culpa 61 Dolo e culpa na ação limitadores da teoria da equivalência Pode ser que alguém dê causa a um resultado mas sem agir com dolo ou com culpa E fora do dolo ou da culpa entramos na órbita do acidental portanto fora dos limites do Direito Penal Com efeito uma pessoa pode ter dado causa a determinado resultado e não ser possível imputarselhe a responsabilidade por esse fato por não ter agido nem dolosa nem culposamente isto é não ter agido tipicamente Essa atividade permanece fora da esfera do Direito Penal sendo impossível imputála a alguém pela falta de dolo ou culpa constituindo a primeira limitação à teoria da conditio sine qua non 62 Caso fortuito ou força maior Toda conduta que não for orientada pelo dolo ou pela culpa estará na seara do acidental do fortuito ou da força maior onde não poderá configurar crime portanto fora do âmbito do Direito Penal 63 Causas concausas absolutamente independentes Qualquer que seja a concausa preexistente concomitante ou superveniente poderá produzir o resultado de forma absolutamente independente do comportamento que examinamos Nessas circunstâncias a causalidade da conduta é excluída pela própria disposição do art 13 caput do CP 64 Causas relativamente independentes Quaisquer que sejam as concausas preexistente concomitante ou superveniente é possível no entanto que elas atuem de tal forma que poderíamos dizer auxiliam ou reforçam o processo causal iniciado com o comportamento do sujeito Há portanto aquilo que se diria uma soma de esforços uma soma de energias que produz o resultado 65 Superveniência de causa relativamente independente Quando alguém coloca em andamento determinado processo causal pode ocorrer que sobrevenha no decurso deste uma nova condição produzida por uma atividade humana ou por um acontecer natural que em vez de se inserir no fulcro aberto pela conduta anterior provoca um novo nexo de causalidade Nesse caso o perigo criado pelo comportamento do sujeito não chega ao dano final porque uma causa superveniente determina o surgimento de um novo perigo de modo a determinar o dano final Essa concausa superveniente por si só ocasiona o resultado excluindo então a imputação inicial Tal situação então se enquadraria na previsão do 1º do art 13 7 Exemplo de causa superveniente que produz por si só o resultado Uma pessoa que foi ferida por A é levada ao hospital para ser medicada mas a ambulância que a conduz envolvese em um acidente de trânsito projetando a vítima que bate a cabeça no meiofio e morre Neste caso excluindose a conduta do ferimento teria ocorrido o resultado morte Se a vítima não tivesse sido ferida teria morrido naquele local e daquela maneira Não nem estaria na ambulância não teria sido projetada e muito menos batido com a cabeça Não se pode dizer que a conduta anterior não foi condição indispensável para a ocorrência do resultado subsequente Foi Mas houve também uma causa superveniente o acidente que projetou a vítima para fora da ambulância Assim temos de perguntar se essa causa superveniente aliouse ao ferimento somando energias na produção do resultado morte ou se a vítima morreu exclusivamente em virtude da segunda causa Evidentemente que ela morreu de comoção cerebral de maneira portanto inusitada anormal imprevisível em relação à conduta primitiva Nesta hipótese não houve portanto soma de energias entre as causas anterior e posterior A segunda causa superveniente e relativamente independente produziu por si só o resultado morte 8 A relevância causal da omissão 81 Crimes omissivos próprios Os crimes omissivos próprios consistem simplesmente numa desobediência a norma mandamental norma esta que determina a prática de uma conduta que não é realizada Há somente a omissão de um dever de agir imposto normativamente pois via de regra os delitos omissivos próprios dispensam a investigação sobre a relação de causalidade porque são delitos de mera atividade ou melhor inatividade 82 Crimes omissivos impróprios Nestes crimes o dever de agir é para evitar um resultado concreto O agente deve agir com a finalidade de impedir a ocorrência de determinado evento Nos crimes comissivos por omissão omissivos impróprios há na verdade um crime material isto é um crime de resultado exigindo consequentemente a presença de um nexo causal entre a ação omitida esperada e o resultado 83 Causalidade jurídica omissão relevante Na doutrina predomina o entendimento de que na omissão não existe causalidade considerada sob o aspecto naturalístico Como já afirmava Sauer sob o ponto de vista científico natural e lógico do nada não pode vir nada No entanto o próprio Sauer admitia a causalidade na omissão concluindo que a omissão é causal quando a ação esperada sociologicamente provavelmente teria evitado o resultado Na verdade existe tão somente um vínculo jurídico diante da equiparação entre omissão e ação 84 Cadeia causal figura do garantidor Na omissão ocorre o desenrolar de uma cadeia causal que não foi determinada pelo sujeito que se desenvolve de maneira estranha a ele da qual é mero observador Acontece que a lei lhe determina a obrigação de intervir nesse processo impedindo que produza o resultado que se quer evitar Surge aí a figura do garantidor daquele que deve interromper a cadeia causal 85 Nexo de não impedimento Na verdade o sujeito não o causou mas como não o impediu é equiparado ao verdadeiro causador do resultado Portanto na omissão não há o nexo de causalidade há o nexo de não impedimento A omissão relacionase com o resultado pelo seu não impedimento e não pela sua causação E esse não impedimento é erigido pelo Direito a condição de causa isto é como se fosse a causa real Dessa forma determinase a imputação objetiva do fato 86 Nexo causal limitase à imputação física Determinado o nexo de causalidade e por extensão a autoria de um fato típico necessitamos ainda para responsabilizar alguém analisar a ilicitude e a culpabilidade logicamente Assim o nexo de causalidade é o primeiro passo na indagação da existência de uma infração penal que finalmente para poder ser atribuída a alguém precisa satisfazer os requisitos da tipicidade da antijuridicidade e da culpabilidade J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Ficou demonstrado que a ré agiu de forma imprudente ao manobrar seu veículo sem o cuidado necessário exigido de quem cruza via pública o que acarretou o atropelamento da vítima que ficou gravemente ferida e em consequência do trauma sofrido faleceu O atropelamento da vítima tem indissociável nexo de causalidade com o evento morte da mesma não se podendo falar na presença de causa absolutamente independente ou ainda em causa relativamente independente que por si só ocasionou o resultado TJRS Apelação 70021711528 Rel Marco Antônio Ribeiro de Oliveira j 5122007 Golpes de faca contra examásia encaminhamento ao hospital atendimento hospitalar supostamente negligente morte da vítima ausência de exclusão do nexo de causalidade teoria da equivalência de condições morte que teria ocorrido independentemente da suposta negligência do médico conduta que se soma à ação anterior inexistência de superveniência de causa relativamente independente que por si só produzisse o resultado alcançado presença de animus necandi TJPR Apelação 03800079 Rel Luiz Osório Moraes Panza j 2862007 De acordo com a Teoria Geral da Imputação Objetiva o resultado não pode ser imputado ao agente quando decorrer da prática de um risco permitido ou de uma ação que visa a diminuir um risco não permitido o risco permitido não realize o resultado concreto e o resultado se encontre fora da esfera de proteção da norma O risco permitido deve ser verificado dentro das regras do ordenamento social para o qual existe uma carga de tolerância genérica É o risco inerente ao convívio social e portanto tolerável STJ REsp 822517DF Rel Min Gilson Dipp j 1262007 Homicídio culposo Morte por afogamento na piscina Comissão de formatura Narrando a denúncia que a vítima afogouse em virtude da ingestão de substâncias psicotrópicas o que caracteriza uma autocolocação em risco excludente da responsabilidade criminal ausente o nexo causal Ainda que se admita a existência de relação de causalidade entre a conduta dos acusados e a morte da vítima à luz da teoria da imputação objetiva necessária é a demonstração da criação pelos agentes de uma situação de risco não permitido não ocorrente na hipótese porquanto é inviável exigir de uma Comissão de Formatura um rigor na fiscalização das substâncias ingeridas por todos os participantes de uma festa STJ HC 46525MT Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 2132006 O nexo causal que resulta da omissão é de natureza normativa e não naturalística de sorte que a omissão é erigida pelo Direito como causa do resultado porque quem tem o dever legal de evitálo não o faz STJ HC 23362RJ Rel Min Paulo Medina j 1º62004 O Código Penal ao adotar a conditio sine qua non Teoria dos antecedentes causais para a aferição entre o comportamento do agente e o resultado o fez limitando sua amplitude pelo exame do elemento subjetivo somente assume relevo a causalidade dirigida pela manifestação da vontade do agente culposa ou dolosamente STJ HC 29894SP Rel Min Jorge Scartezzini j 1º42004 Nexo de causalidade Sendo incerta a relação de causalidade entre a conduta do recorrente e o furto do qual foi condenado não pode ele ser responsabilizado por crime porque inadmissível no direito penal a culpa presumida ou a responsabilidade objetiva STJ REsp 224709MG Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 1812 2003 A lâmina atingiu órgãos vitais da vítima pulmão esquerdo coração fígado com transfixação e veia suprahepática esquerda acarretando hemotórax esquerdo e hemopericárdio que foram a sua causa mortis Observese que a indisponibilidade de estoque de sangue no momento para a transfusão não elimina não afasta essa correlação entre as lesões e a morte pois o que importa à luz do art 13 do CP é o estabelecimento da facada desferida pelo agente como causa da hemorragia fatal TJMG RESE 100000020953210001 Rel Gomes Lima j 1922002 O sistema criminal brasileiro como ensina a unanimidade da doutrina adota a teoria da equivalência dos antecedentes ou da condictio sine qua non René Ariel Dotti não distinguindo entre condição e causa considerada esta como toda ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido Aníbal Bruno Nesta perspectiva então cabe verificar se o resultado desvio de verbas ocorreria do mesmo modo sem a intervenção da paciente ou em outras palavras como ensinado por este último autor se entre o seu atuar e o resultado típico existe a necessária relação de causa e efeito STJ HC 18206SP Rel Min Fernando Gonçalves j 4122001 Sobrevindo o óbito por infecção em face da cirurgia há relação de causalidade entre o resultado morte da vítima e a causa ato de desferir facadas daí decorrendo que a morte foi provocada pelo comportamento do agente art 13 do CP o que caracteriza homicídio e não lesão corporal seguida de morte STF HC 78049PR Rel Min Maurício Corrêa j 1º121998 Art 14 Dizse o crime V art 70 do CPP Crime consumado I consumado quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição legal V art 111 I do CP Tentativa II tentado quando iniciada a execução não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente V art 111 II do CP V art 4º do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais Pena de tentativa Parágrafo único Salvo disposição em contrário punese a tentativa com a pena correspondente ao crime consumado diminuída de um a dois terços V art 2º da Lei n 107950 crimes de responsabilidade V art 1º da Lei n 710683 crimes de responsabilidade de governadores e secretários V art 1º da Lei n 807290 crimes hediondos D O U T R I N A 1 Crime consumado Consumase o crime quando o tipo está inteiramente realizado ou seja quando o fato concreto se subsume no tipo abstrato da lei penal Quando são preenchidos todos os elementos do tipo objetivo pelo fato natural ocorre a consumação Consumase o crime quando o agente realiza todos os elementos que compõem a descrição do tipo legal 11 Consumação e exaurimento Não se confunde a consumação com o exaurimento pois neste após a consumação outros resultados lesivos ocorrem O crime pode estar consumado e dele não haver resultado todo o dano que o agente previra e visara Assim a corrupção passiva que se consuma com a solicitação exaurese com o recebimento da vantagem indevida o crime de extorsão mediante sequestro consumase com o arrebatamento da vítima e exaurese com o recebimento do resgate etc 12 Consumação no crime omissivo Tratandose de crime omissivo impróprio como a omissão é forma ou meio de se alcançar um resultado a consumação ocorre com o resultado lesivo e não com a simples inatividade do agente como nos delitos omissivos puros 2 Tentativa A tentativa é a realização incompleta do tipo penal do modelo descrito na lei Na tentativa há prática de ato de execução mas o sujeito não chega à consumação por circunstâncias independentes a sua vontade A tentativa é o crime que entrou em execução mas no seu caminho para a consumação é interrompido por circunstâncias acidentais A figura típica não se completa 3 Iter criminis fases a Cogitatio é na mente do ser humano que se inicia o movimento criminoso É a elaboração mental da resolução criminosa que começa a ganhar forma debatendose entre os motivos favoráveis e desfavoráveis e desenvolvese até a deliberação e o propósito final isto é até que se firma a vontade cuja concretização constituirá o crime Essa fase é impunível b Preparação constituise dos atos preparatórios os quais são externos ao agente que passa da cogitação à ação objetiva por exemplo armase dos instrumentos necessários à prática da infração penal procura o local mais adequado ou a hora mais favorável para a realização do crime etc De regra os atos preparatórios também não são puníveis c Execução dos atos preparatórios passase naturalmente aos atos executórios Atos de execução são aqueles que realizam efetivamente a conduta proibida d Consumação segundo o CP dizse do crime consumado quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição legal 4 Natureza e tipicidade da tentativa A tentativa é a realização incompleta da figura típica A tentativa é um tipo penal ampliado um tipo penal aberto um tipo penal incompleto mas um tipo penal Constitui ampliação temporal da figura típica 41 Tipicidade conjugação de normas penais A tipicidade da tentativa decorre da conjugação do tipo penal com o dispositivo que a define e prevê a sua punição que tem eficácia extensiva uma vez que por força dele é que se amplia a proibição contida nas normas penais incriminadoras a fatos que o agente realiza de forma incompleta A norma contida no art 14 II de caráter extensivo cria novos mandamentos proibitivos transformando em puníveis fatos que seriam atípicos 5 Elementos da tentativa a Início da execução o CP adotou a teoria objetiva exigindo o início da execução de um fato típico ou seja exige a existência de uma ação que penetre na fase executória do crime Uma atividade que se dirija no sentido da realização de um tipo penal A tentativa só é punível a partir do momento em que a ação penetra na fase de execução b Não consumação do crime por circunstâncias independentes da vontade do agente pode ser qualquer causa interruptiva da execução desde que estranha à vontade do agente c Dolo em relação ao crime total o agente deve agir dolosamente isto é deve querer a ação e o resultado final que concretize o crime perfeito e acabado É necessário que o agente tenha intenção de produzir um resultado mais grave do que aquele que vem efetivamente a conseguir Não existe dolo especial de tentativa diferentemente do dolo do crime consumado 6 Espécies ou formas de tentativas 61 Tentativa imperfeita Na tentativa o processo executório é interrompido por circunstâncias estranhas à vontade do agente como por exemplo o agressor é seguro quando está desferindo os golpes na vítima para matála Na tentativa imperfeita o agente não exaure toda a sua potencialidade lesiva ou seja não chega a realizar todos os atos executórios necessários à produção do resultado por circunstâncias estranhas à sua vontade 62 Tentativa perfeita Na tentativa perfeita o agente realiza todo o necessário para obter o resultado mas mesmo assim não o atinge A fase executória realizase integralmente mas o resultado visado não ocorre por circunstâncias alheias à vontade do agente A execução se conclui mas o crime não se consuma 7 Punibilidade da tentativa a Teoria subjetiva fundamenta a punibilidade da tentativa na vontade do autor contrária ao Direito Para esta teoria o elemento moral a vontade do agente é decisiva porque esta é completa perfeita Imperfeito é o delito sob o aspecto objetivo que não chega a consumarse Por isso segundo esta teoria a pena da tentativa deve ser a mesma do crime consumado Desde que a vontade criminosa se manifeste nos atos de execução do fato punível a punibilidade estará justificada b Teoria objetiva a punibilidade da tentativa fundamentase no perigo a que é exposto o bem jurídico e a repressão se justifica uma vez iniciada a execução do crime Não se equipara o dano ou perigo ocorrido na tentativa com o que resultaria do crime consumado Esta é a teoria adotada pelo nosso CP J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Se o documento estava em branco embora se possa presumir que estava pronto para ser falsificado por meio da inserção de dados falsos não se pode dizer que tal prática se consumou e nem mesmo que tenha tido início A conduta representa mero ato preparatório impunível TJPR Apelação 04041174 Rel Lilian Romero j 811 2007 Atividade desenvolvida pelos réus que ingressou na fase da tentativa porquanto já haviam operado modificações no equipamento substituindo o de leitura de cartões Meio fraudulento que fora montado e portanto iniciandose a execução do delito Inocorrência de crime impossível por alegada eficácia do sistema de segurança manifestamente nada avultando que caracterizasse a absoluta ineficácia do meio ou absoluta impropriedade do objeto como prevê a lei Diminuição da tentativa que aplicado o critério da fase do iter criminis deve se dar no máximo previsto TRF3ª Região Apelação 200461020081188SP Rel Peixoto Jr j 22102007 O art 14 do Código Penal prevê em seu parágrafo único que os redutores a serem considerados para a tentativa devem ser de 13 ou 23 sem fixar os critérios para fixação tendo a jurisprudência consolidado o entendimento no sentido de que a aplicação do percentual deve decorrer da apreciação da quantidade da fase de execução percorrida ou seja quanto mais o agente se aproxima da consumação do delito menor é a diminuição da pena e viceversa STJ HC 75332GO Rel Jane Silva j 4102007 O delito de atentado violento ao pudor se consuma com a efetiva prática de ato libidinoso diverso da conjunção carnal mediante violência ou grave ameaça É a hipótese dos autos conforme expressamente consignado no v acórdão guerreado Não é admissível que o magistrado de forma manifestamente contrária à lei e se utilizando de argumentos de equidade tais como ser mais justo e proporcional ao caso concreto em razão da alegada menor gravidade da conduta condene réu por atentado violento ao pudor tentado com a aplicação da respectiva causa de diminuição da pena se o delito efetivamente se consumou Precedentes STJ REsp 956741RS Rel Min Félix Fischer j 3082007 O crime impossível somente se caracteriza quando o agente após a prática do fato jamais poderia consumar o crime pela ineficácia absoluta do meio empregado ou pela absoluta impropriedade do objeto material nos termos do art 17 do Código Penal A ação externa alheia à vontade do agente impedindo a consumação do delito após iniciada a execução caracteriza a tentativa art 14 II do CP STJ HC 45616SP Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 982007 O Código Penal brasileiro adotou no que concerne à aplicação da pena no caso de tentativa apenas critérios objetivos É o que se vê do art 14 parágrafo único quando se pune a hipótese com a pena correspondente ao crime consumado diminuindose de um a dois terços Esta diminuição não está ligada à gravidade do fato delituoso ou às circunstâncias pessoais do agente Mas ao percurso criminal feito percorrido pelo último Quanto mais próxima ficou a consumação menor deve ser a redução de pena e viceversa TJRS Apelação 70019097674 Rel Sylvio Baptista Neto j 1752007 Muito embora seja um delito formal o crime de extorsão admite a figura da tentativa na hipótese em que a vítima não cede às exigências do autor TJMG Apelação 106250504492420011 Rel William Silvestrini j 2452006 O apelante não chegou a ter a posse mansa e pacífica das coisas subtraídas eis que foi preso em flagrante quando ainda mantinha a vítima subjugada sendo recuperados os bens subtraídos A ação delituosa durou entre dois e cinco minutos Esclareceu a vítima que foi abraçada pelo apelante e que com a outra mão apontava lhe uma arma Subtraiulhe os pertences foram caminhando tendo o apelante colocado a arma na cintura Enquanto caminhavam policiais perceberam a atitude suspeita do apelante o abordaram e o prenderam recuperando as coisas subtraídas Está claro que o crime não se consumou Delito desclassificado para a forma tentada TJRJ Apelação 200605001540 Rel Roberto Rocha Ferreira j 254 2006 Se o acusado afirmando a pretensão de incendiar a oficina da vítima joga gasolina no local e é obstado pela própria vítima a prosseguir na ação ficou o mesmo somente nos atos preparatórios não podendo falarse em tentativa Nos atos preparatórios o crime ainda não existe TJMG Apelação 1013499009018 20011 Rel Antonio Carlos Cruvinel j 442006 Roubo tentado com utilização de arma de brinquedo Condutora de veículo que denuncia aos Milicianos da existência na via pública de elemento armado roubando os condutores de veículos deixando claro que não foi roubada por ter arrancado com seu veículo Tese defensiva que sustenta ausência do início de atos executórios Atos preparatórios impuníveis Com razão a Defesa Pública eis que a mera intenção da prática do ato delituoso sem início dos atos de execução não pode configurar tentativa de roubo TJRJ Apelação 200505006522 Rel Ivan Cury j 2832006 Nos termos do art 14 II do Código Penal só há tentativa quando iniciada a conduta delituosa o crime não se consuma por fatores alheios à intenção do agente Na hipótese em tela não se verificou qualquer ato de execução mas somente a cogitação e os atos preparatórios dos acusados que confessaram a intenção de roubar determinada agência dos Correios Descabida pois a imputação do crime de roubo idealizado A conduta preparatória de portar ilegalmente arma de fogo de uso permitido subsumese ao art 14 da Lei n 108262003 evidenciando a competência da Justiça Estadual STJ Conflito de Competência 56209MA Rel Min Laurita Vaz j 14122005 A correta delimitação entre atos preparatórios e início de execução tem sido apontada pela doutrina como um dos maiores problemas da dogmática penal maximizado pela circunstância de que tal diferenciação consiste também na linha limítrofe entre a punição e a irrelevância para o Direito Penal O sistema funcionalista jurídicopenal apresentado por Claus Roxin nos idos de 1970 ao preencher as interrogações dogmáticas do finalismo através de valorações políticocriminais atua vg sobre a teoria objetiva adotada para definição da tentativa punível ou seja do início de realização da ação típica valorandoa de acordo com a função do Direito Penal e tornandoa mais cristalina e individualizada Na diferenciação entre atos preparatórios e executórios para fins de delimitação da tentativa deve o intérprete partir de uma concepção funcionalista conjugandoa com a teoria objetivomaterial e sua variante objetivoindividual que impõe além de um juízo valorativo sobre a ameaça ao bem jurídico tutelado a observação do plano concreto do autor aferindo se o ato investigado guarda relação de imediatidade com o começo de execução segundo o planejamento delituoso Configura tentativa de furto a ação do réu que invade a residência da vítima pelo telhado para fins de subtração patrimonial e é surpreendido por terceiros quando escolhia os objetos a serem subtraídos estando claro o pleno funcionamento do plano concreto de execução delituosa do agente TJMG Apelação 106860409845570011 Rel Alexandre Victor de Carvalho j 29112005 Tentativa de extorsão mediante sequestro Alegação de que não se teria ido além de atos preparatórios Tentativa plenamente configurada quando comparsas do paciente de arma em punho se acercaram do veículo em que se achava a pessoa visada devendose a não consumação do crime a que bastaria ressaltese a simples privação da liberdade dessa independentemente da obtenção da vantagem pretendida à circunstância de haver a vítima logrado escapar à ação dos agentes ao perceber a aproximação destes STF HC 81647PB Rel Min Ilmar Galvão j 1642002 Desistência voluntária e arrependimento eficaz Art 15 O agente que voluntariamente desiste de prosseguir na execução ou impede que o resultado se produza só responde pelos atos já praticados D O U T R I N A 1 Desistência voluntária O agente embora tenha iniciado a execução não a leva adiante mesmo podendo prosseguir desiste da realização típica Na desistência voluntária o agente mudou de propósito já não quer o crime na forçada mantém o propósito mas recua diante da dificuldade de prosseguir 2 Voluntária e espontânea distinção Não é necessário que a desistência seja espontânea basta que seja voluntária A desistência espontânea ocorre quando a ideia inicial parte do próprio agente e voluntária é a desistência sem coação moral ou física mesmo que a ideia inicial tenha partido de outrem ou mesmo decorrido de pedido da própria vítima 3 Arrependimento eficaz No arrependimento eficaz o agente após ter esgotado todos os meios de que dispunha necessários e suficientes arrependese e evita que o resultado aconteça ou seja pratica nova atividade para evitar que o resultado ocorra Aqui também não é necessário que seja espontâneo basta que seja voluntário 31 Necessidade da eficácia do arrependimento O êxito da atividade impeditiva do resultado é indispensável caso contrário o arrependimento não será eficaz Se o agente não conseguir impedir o resultado por mais que se tenha arrependido responderá pelo crime consumado Mesmo que a vítima contribua para a consumação 32 Atos já praticados tentativa qualificada Tanto na desistência voluntária como no arrependimento eficaz o agente responderá pelos atos já praticados que de per si constituírem crimes Isso em doutrina chamase tentativa qualificada 4 Natureza jurídica da desistência voluntária e do arrependimento eficaz Hungria e seguidores afirmam tratarse de causa extintiva da punibilidade No entanto não são causas de extinção da punibilidade pois esta pressupõe a causa da punibilidade que na hipótese seria a tentativa que não existiu Não havendo tentativa pela falta de um dos seus elementos não ocorrência por circunstâncias alheias à vontade do agente não se pode falar em extinção da punibilidade mas se deve falar tão somente em inadequação típica J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Dado início a execução do crime de estupro consistente no emprego de grave ameaça à vítima e na ação via contato físico só não se realizando a consumação em virtude de momentânea falha fisiológica alheia à vontade do agente tudo isso caracteriza a tentativa e afasta simultaneamente a denominada desistência voluntária Precedente desta Corte STJ REsp 792625DF Rel Min Félix Fischer j 10102006 A falsificação da carteira de trabalho e previdência social e a sua utilização com a finalidade de comprovar tempo de serviço e obter aposentadoria por invalidez são condutas típicas O arrependimento eficaz com relação ao crime de estelionato não exclui a tipicidade das condutas anteriormente praticadas art 15 do CP Para a consumação do delito de falsidade ideológica não se exige a ocorrência de prejuízo basta que haja potencialidade de dano O crime de uso de documento falso também não exige o resultado naturalístico TRF3ª Região RESE 200061080087529 Rel André Nabarrete j 9102006 Reconhecimento do arrependimento eficaz pois o réu logo após o cometimento do fato informou a Polícia sobre o ocorrido evitando eficazmente a produção do seu resultado Causa de exclusão da tipicidade TJRS Apelação 70011269776 Rel Aymoré Roque Pottes de Mello j 10112005 Se pelo menos uma das vítimas portava dinheiro embora pequena a quantia nada havendo que impedisse a subtração mesmo assim o acusado tendo interrompido voluntariamente os atos de execução temse como presente o quadro de desistência voluntária que ocorre quando o agente por vontade própria sem a influência de fator externo deixa de prosseguir na execução do crime ou impede a ocorrência de seu resultado art 15 do CP TJDF Apelação 20040310137065 Rel Romão C Oliveira j 20102005 Diversamente do que pode suceder na desistência voluntária quando seja ela mesma o fator impeditivo do delito projetado ou consentido o arrependimento eficaz é fato posterior ao aperfeiçoamento do crime tentado ao qual no entanto se em concreto impediu se produzisse o resultado típico a lei dá o efeito de elidir a punibilidade da tentativa e limitála à consequente aos atos já praticados STF HC 84653SP Rel Min Sepúlveda Pertence j 282005 Ocorre a desistência voluntária quando o crime não se consuma por vontade do próprio agente vale dizer este inicia a execução não a leva adiante desistindo de consumar o crime Por conseguinte na tentativa o agente inicia a execução do crime e só não o consuma por circunstâncias alheias a sua vontade O agente pratica todos os atos executórios e o resultado não se opera por motivos independentes da vontade do agente Portanto a desistência voluntária e a tentativa são hipóteses que não podem se confundir Uma exclui a outra A desistência voluntária é causa de exclusão da tipicidade da tentativa TJRJ Apelação 200105003068 Rel Flávio Nunes Magalhães j 8112001 Não há falar em desistência voluntária nem em arrependimento eficaz mas sim em tentativa imperfeita na hipótese em que o agente embora tenha iniciado a execução do ilícito alvejando a vítima com disparo não exaure toda sua potencialidade lesiva ante a falha da arma de fogo empregada fugindo do local do crime em seguida STJ HC 16348SP Rel Hamilton Carvalhido j 1962001 Arrependimento posterior Art 16 Nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa reparado o dano ou restituída a coisa até o recebimento da denúncia ou da queixa por ato voluntário do agente a pena será reduzida de um a dois terços V art 65 III b do CP D O U T R I N A 1 Natureza jurídica e fundamento O arrependimento posterior constitui causa obrigatória de redução de pena com fundamento em razões de política criminal relacionada sobretudo a fins preventivos especiais Possui igualmente a mesma natureza jurídica a colaboração espontânea consagrada no art 6º da Lei n 903495 crime organizado 2 Requisitos necessários 1 Requisitos objetivos a crime praticado sem violência ou grave ameaça b reparação do dano arts 65 III b e 312 3º do CP ou restituição da coisa c realizado até o recebimento da denúncia ou queixa 2 Requisitos subjetivos ato voluntário do agente J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A reparação integral do dano antes do recebimento da denúncia no crime de estelionato art 171 caput do CP autoriza tão somente o reconhecimento da causa de redução da pena prevista no art 16 do Código Penal Na linha dos precedentes desta Corte a reparação do dano anteriormente ao recebimento da denúncia não exclui o crime de estelionato em sua forma básica uma vez que o disposto na Súmula 554 do STF só tem aplicação para o crime de estelionato na modalidade emissão de cheques sem fundos prevista no art 171 2º inciso VI do Código Penal Inviável a aplicação do disposto no art 34 da Lei n 924995 ao crime de estelionato STJ HC 61928SP Rel Min Félix Fischer j 492007 Aplicação do art 16 do CP Ausência dos requisitos legais Impossibilidade A aplicação do art 16 do Código Penal exige a comprovação da integral reparação do dano ou a restituição da coisa até o recebimento da denúncia devendo o ato ser voluntário o que não ocorreu na espécie STJ REsp 711027RS Rel Min Laurita Vaz j 622007 O arrependimento posterior é causa de diminuição de pena objetiva bastando para a sua configuração seja voluntário e realizado antes do recebimento da denúncia mediante a devolução ou reparação integral do bem jurídico lesado Na hipótese observase mormente da leitura do termo de declarações prestado pela própria vítima que o recorrente voluntariamente e logo após os fatos narrados na denúncia restituiu relativamente ao crime de estelionato os bens havidos de forma indevida e fraudulenta STJ RHC 20051RJ Rel Min Laurita Vaz j 5122006 Não é necessário que a reparação do dano seja espontânea para a incidência do art 16 do CP bastando a voluntariedade ainda que a devolução tenha ocorrido porque o agente foi descoberto TJRS Apelação 70013991518 Rel Constantino Lisboa de Azevedo j 862006 Para o reconhecimento da minorante do arrependimento posterior é necessária a reparação integral do dano ou a restituição total da coisa STJ REsp 765588RS Rel Min Félix Fischer j 722006 A causa especial de diminuição de pena decorrente do arrependimento posterior tem natureza subjetiva e portanto esse benefício não se estende aos demais coautores que não participaram da reparação do dano TRF3ª Região Apelação 95031036437 Rel André Nekatschalow j 3012006 Não ocorrendo a integral reparação do dano afastase a concessão das benesses previstas pelo art 16 da Lei Penal STJ REsp 612587PR Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 2892005 Não há falar na incidência do art 16 do CP que trata da redução de pena em face de arrependimento posterior quando a restituição da res apropriada é apenas parcial STJ HC 18032RO Rel Hamilton Carvalhido j 362002 Apesar de a lei se referir a ato voluntário do agente a reparação do dano prevista no art 16 do CP é circunstância objetiva devendo comunicarse aos demais réus STJ REsp 264283SP Rel Min Félix Fischer j 1322001 Não está caracterizado o arrependimento posterior se a restituição do bem se deu por terceira pessoa independente da vontade do réu STJ REsp 232718SC Rel Min Félix Fischer j 1322001 Crime impossível Art 17 Não se pune a tentativa quando por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto é impossível consumarse o crime D O U T R I N A 1 Crime impossível ou tentativa inidônea a Por ineficácia absoluta do meio empregado o meio por sua natureza é inadequado inidôneo absolutamente ineficaz para produzir o resultado pretendido pelo agente É indispensável que o meio seja inteiramente ineficaz Se a ineficácia for relativa haverá tentativa punível b Por absoluta impropriedade do objeto o objeto é absolutamente impróprio para a realização do crime visado Aqui também a inidoneidade tem de ser absoluta Há crime impossível por exemplo nas manobras abortivas em mulher que não está grávida no disparo de arma de fogo com animus necandi em cadáver 11 Punibilidade do crime impossível a Teoria subjetiva para esta teoria realmente decisivo é a intenção do agente Toda tentativa é em si mesma inidônea uma vez que não alcança o resultado visado A inidoneidade porém deve ser apreciada não conforme a realidade dos fatos mas segundo a avaliação do agente no momento da ação Assim o autor de um crime impossível deve sofrer a mesma pena da tentativa b Teoria objetiva para esta teoria como não há no crime impossível os elementos objetivos da tentativa e o bem jurídico não corre perigo não há tentativa e o agente não deve ser punido Assim não havendo idoneidade nem nos meios nem no objeto não se pune essa ação O crime impossível constitui figura atípica Esta é a teoria adotada pelo nosso CP c Teoria sintomática esta teoria por sua vez busca examinar se a realização da conduta do agente é a revelação de sua periculosidade Mesmo na tentativa inidônea se esta revelar indícios da presença de periculosidade no agente deverá ser punida 2 Crime putativo O crime putativo só existe na imaginação do agente Este supõe erroneamente que está praticando uma conduta típica quando na verdade o fato não constitui crime Como o crime só existe na imaginação do agente esse conceito equivocado não basta para torná lo punível Há no crime putativo um erro de proibição às avessas o agente imagina proibida uma conduta permitida 3 Crime provocado 31 Flagrante preparado Quando o agente por sua exclusiva iniciativa concebe a ideia do crime realiza os atos preparatórios começa a executálos e só não consuma seu intento porque a autoridade policial que foi previamente avisada intervém para impedir a consumação do delito e prendêlo em flagrante Não há a figura do chamado agente provocador A iniciativa é espontânea e voluntária do agente E a presença da força policial é a circunstância alheia à vontade do agente que impede a consumação 32 Flagrante provocado Neste o delinquente é impelido à prática do delito por um agente provocador normalmente um agente policial Isso ocorre por exemplo quando a autoridade policial pretendendo prender o delinquente armalhe uma cilada O agente sem saber participa de uma encenação teatral O agente não tem qualquer possibilidade de êxito crime impossível 33 Flagrante forjado Também não se confunde com o provocado Naquele os policiais criam provas de um crime que não existe É um dos casos mais tristes da rotina policial e infelizmente ocorre com muito mais frequência do que se imagina Ocorre por exemplo quando agentes policiais enxertam no bolso de quem estão revistando substância entorpecente É evidente a inexistência de crime J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A O simples fato de os agentes terem os seus passos observados por fiscais de segurança é insuficiente para que se considere o meio eleito para a prática de furto como absolutamente inidôneo porquanto ainda que mínima existe possibilidade de fuga de modo a afastar a incidência do art 17 do CP TJMG Apelação 100240444362510011 Rel Vieira de Brito j 2912008 Falsificação grosseira Se as rasuras e sobreposição de carimbos são facilmente perceptíveis pelo simples exame do documento configurase crime impossível por absoluta ineficácia do meio nos termos do artigo 17 do Código Penal TRF3ª Região Apelação 200161040051784 Rel Márcio Mesquita j 2912008 Se o criminoso percorreu todos os atos necessários à consumação do delito chegando a sair do estabelecimento vítima com os objetos que pretendia subtrair quando só então foi abordado pelos vigilantes do local correto é o reconhecimento do crime de furto em sua forma tentada O chamado crime impossível previsto no art 17 do CP caracterizase somente quando o expediente utilizado pelo sujeito ativo é inidôneo para atingir o fim pretendido Existindo alguma possibilidade ainda que mínima de eficácia do meio empregado configurase uma conduta perfeitamente típica uma vez que o agente poderia ou não alcançar seu objetivo TJMG Apelação 101450739980000011 Rel Eduardo Brum j 4122007 O criminoso precisaria de dois aparelhos um para copiar os dados dos cartões inclusive a senha do usuário e outro para ler os dados capturados O fato de não se ter apreendido ou encontrado o segundo aparelho não torna o fato atípico ou o crime impossível por impropriedade do meio exatamente porque se trata de um delito tentado em que os atos executórios foram interrompidos TRF3ª Região Apelação 200561170017344 Rel Johonsom Di Salvo j 2102007 O crime impossível somente se caracteriza quando o agente após a prática do fato jamais poderia consumar o crime pela ineficácia absoluta do meio empregado ou pela absoluta impropriedade do objeto material nos termos do art 17 do Código Penal Na espécie houve início da execução do crime na medida em que o réu constrangeu a vítima mediante violência a praticar com ele conjunção carnal fato que não se consumou por circunstância alheia à sua vontade qual seja a ausência de ereção STJ AgRg no REsp 715892SC Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 148 2007 O crime impossível somente se caracteriza quando o agente após a prática do fato jamais poderia consumar o crime pela ineficácia absoluta do meio empregado ou pela absoluta impropriedade do objeto material nos termos do art 17 do Código Penal A ação externa alheia à vontade do agente impedindo a consumação do delito após iniciada a execução caracteriza a tentativa art 14 II do CP STJ HC 45616SP Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 982007 Inexistência de crime impossível Tratandose o crime de roubo de delito complexo temse por iniciada a execução tão logo praticada a violência ou grave ameaça à vítima O fato de inexistir bens materiais em poder da vítima não desnatura a ocorrência do crime em sua modalidade tentada STJ REsp 897373SP Rel Min Laurita Vaz j 342007 A recorrida no momento da subtração da res furtiva estava sendo vigiada pelo sistema de segurança da loja por meio do circuito interno de TV tendo sido abordada por uma vendedora que constatou a prática delituosa Como há a possibilidade mesmo que mínima de o delito se consumar não está configurada a hipótese de crime impossível STJ REsp 710667RS Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 238 2005 Se demonstrada a potencialidade lesiva do documento falsificado tendo inclusive em razão deste sido deferido benefício aposentadoria ilegal que perdurou por mais de três anos não há que se falar em crime impossível STJ REsp 622322RS Rel Min Feliz Fischer j 21102004 Crime impossível inexistência Flagrante preparado de crime de mera conduta já anteriormente consumado inaplicabilidade da Súmula 145 Cuidandose de concussão crime de mera conduta que já se consumara com a exigência de vantagem indevida a nulidade de prisão do servidor quando dias depois recebia a quantia exigida obviamente não torna impossível o delito antes consumado STF HC 80033BA Rel Min Sepúlveda Pertence j 1842000 Art 18 Dizse o crime V art 3º do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais Crime doloso I doloso quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzilo V art 5º XXXVIII d da CF V arts 36 2º 77 I 81 I e 83 I do CP Crime culposo II culposo quando o agente deu causa ao resultado por imprudência negligência ou imperícia Parágrafo único Salvo os casos expressos em lei ninguém pode ser punido por fato previsto como crime senão quando o pratica dolosamente D O U T R I N A 1 Tipo objetivo O tipo objetivo representa a exteriorização da vontade aspecto externoobjetivo que concretiza o tipo subjetivo O fundamento material de todo crime é a concretização da vontade num fato externo uma vez que crime não é somente a vontade má mas a vontade má concretizada num fato 11 O autor da ação Como regra geral os tipos não caracterizam objetivamente o autor limitandose a utilizar uma fórmula neutra que admite qualquer pessoa como autora Em muitos crimes porém o autor recebe uma individualização especial que o distingue do anonimato exigindolhe determinada qualidade ou condição pessoal como ocorre por exemplo no denominado crime próprio ou especial Pode ser condição jurídica acionista profissional ou social comerciante natural gestante mãe de parentesco ascendente 12 Ação ou omissão O núcleo objetivo de todo crime é a ação Os tipos penais podem descrever simplesmente uma atividade finalista ou então uma atividade finalista que produz determinado resultado na primeira hipótese teríamos os crimes formais e na segunda os crimes materiais ou de resultado Frequentemente os tipos penais apresentam outros elementos que complementam a ação típica descrita tais como referências à vítima ao autor aos meios ou formas especiais de execução condições de lugar tempo maneira de execução ou outras circunstâncias objetivas do fato 13 Resultado Nos crimes materiais a ação ao se realizar sempre modifica alguma coisa produzindo um resultado que não a integra embora faça parte do tipo O resultado numa concepção naturalística é a transformação do mundo exterior Segundo esse entendimento admitemse crimes sem resultado No entanto admitindose o resultado concebido como evento num conceito jurídico identificandose com ofensa dano ou perigo a um bem jurídico tutelado pela norma penal forçoso é concluir que não há crime sem resultado 14 Nexo causal Nos crimes materiais o tipo de injusto objetivo somente se realiza quando entre a ação e o resultado houver um nexo de causalidade No entanto devese ter presente a advertência de Wessels para quem nos delitos de resultado a existência do nexo causal é o mais importante mas não o único pressuposto da imputação Fundamento da imputação objetiva do resultado socialmente danoso é a causalidade da ação para a ocorrência do resultado típico mas nem toda causação é na espécie juridicamente relevante de forma que fundamente a responsabilidade jurídicopenal 2 Tipo subjetivo O tipo subjetivo abrange todos os aspectos subjetivos do tipo de conduta proibida que concretamente produzem o tipo objetivo O tipo subjetivo é constituído de um elemento geral dolo que por vezes é acompanhado de elementos especiais intenções e tendências que são elementos acidentais 3 Elemento subjetivo geral dolo Dolo é a consciência e a vontade de realização da conduta descrita em um tipo penal O dolo é constituído por dois elementos um cognitivo que é o conhecimento do fato constitutivo da ação típica e um volitivo que é a vontade de realizála O primeiro elemento o conhecimento é pressuposto do segundo que é a vontade que não pode existir sem aquele 4 Teorias do dolo a Teoria da vontade para esta teoria tida como clássica dolo é a vontade dirigida ao resultado A essência do dolo deve estar na vontade não de violar a lei mas de realizar a ação e obter o resultado Esta teoria não nega a existência da representação consciência do fato que é indispensável mas destaca sobretudo a importância da vontade de causar o resultado b Teoria da representação segundo esta teoria para a existência do dolo é suficiente a representação subjetiva ou a previsão do resultado como certo ou provável Esta é uma teoria hoje completamente desacreditada e até mesmo seus grandes defensores Von Liszt e Frank acabaram reconhecendo que somente a representação do resultado era insuficiente para exaurir a noção de dolo sendo necessário um momento de mais intensa ou íntima relação psíquica entre o agente e o resultado c Teoria do consentimento para esta teoria também é dolo a vontade que embora não dirigida diretamente ao resultado previsto como provável ou possível consente na sua ocorrência ou o que dá no mesmo assume o risco de produzilo A representação é necessária mas não suficiente à existência do dolo e consentir na ocorrência do resultado é uma forma de querêlo Esta teoria parte da valoração do elemento intelectivo do dolo ignorando o elemento volitivo que é fundamental O próprio dolo eventual não pode prescindir do elemento volitivo 5 Elementos do dolo a Elemento cognitivo ou intelectual para a configuração do dolo exigese a consciência daquilo que se pretende praticar Essa consciência deve ser atual isto é deve estar presente no momento da ação quando ela está sendo realizada É insuficiente segundo Welzel a potencial consciência das circunstâncias objetivas do tipo uma vez que prescindir da atualidade da consciência equivale a destruir a linha divisória entre dolo e culpa convertendo aquele em mera ficção b Elemento volitivo vontade a vontade incondicionada deve abranger a ação ou omissão conduta o resultado e o nexo causal A vontade pressupõe a previsão isto é a representação na medida em que é impossível querer algo conscientemente senão aquilo que se previu ou representou em nossa mente pelo menos parcialmente A previsão sem vontade é algo completamente inexpressivo indiferente ao Direito Penal e a vontade sem representação isto é sem previsão é absolutamente impossível 6 Dolo direto ou imediato No dolo direto o agente quer o resultado representado como fim de sua ação A vontade do agente é dirigida à realização do fato típico O objeto do dolo direto é o fim proposto os meios escolhidos e os efeitos colaterais representados como necessários à realização do fim pretendido Assim o dolo direto compõese de três aspectos a a representação do resultado dos meios necessários e das consequências secundárias b o querer o resultado bem como os meios escolhidos para a sua consecução c o anuir na realização das consequências previstas como certas necessárias ou possíveis decorrentes do uso dos meios escolhidos para atingir o fim proposto ou da forma de utilização desses meios 61 Dolo direto de primeiro grau O dolo direto em relação ao fim proposto e aos meios escolhidos é classificado como de primeiro grau e em relação aos efeitos colaterais representados como necessários é classificado como de segundo grau Como sustenta Juarez Cirino dos Santos o fim proposto e os meios escolhidos porque necessários ou adequados à realização da finalidade são abrangidos imediatamente pela vontade consciente do agente essa imediação os situa como objetos do dolo direto Enfim quando se trata do fim diretamente desejado pelo agente denominase dolo direto de primeiro grau 62 Dolo direto de segundo grau Os efeitos colaterais representados como necessários em face da natureza do fim proposto ou dos meios empregados são abrangidos mediatamente pela vontade consciente do agente mas a sua produção necessária os situa também como objetos do dolo direto não é a relação de imediatidade mas a relação de necessidade que os inclui no dolo direto O agente pode até lamentar a sua ocorrência mas se os representa como efeitos colaterais necessários e portanto como parte inevitável da ação típica então constituem objeto do dolo direto Enfim quando o resultado é desejado como consequência necessária do meio escolhido ou da natureza do fim proposto denominase dolo direto de segundo grau 7 Dolo eventual Há dolo eventual quando o agente não quer diretamente a realização do tipo mas a aceita como possível ou até provável assumindo o risco da produção do resultado art 18 I in fine do CP No dolo eventual o agente prevê o resultado como provável ou ao menos como possível mas apesar de prevêlo age aceitando o risco de produzilo Assumir o risco é alguma coisa mais que ter consciência de correr o risco é consentir previamente no resultado caso este venha efetivamente a ocorrer 71 Elementos do dolo eventual consciência e vontade A consciência e a vontade que representam a essência do dolo também devem estar presentes no dolo eventual Para que este se configure é insuficiente a mera ciência da probabilidade do resultado ou a atuação consciente da possibilidade concreta da produção desse resultado É indispensável determinada relação de vontade entre o resultado e o agente e é exatamente esse elemento volitivo que distingue o dolo da culpa 72 Dolo eventual e mera esperança da ocorrência do resultado O dolo eventual não se confunde com a mera esperança ou o simples desejo de que determinado resultado ocorra como no exemplo trazido por Welzel do sujeito que manda seu adversário a um bosque durante uma tempestade na esperança de que seja atingido por um raio 73 Dolo direto e dolo eventual distinção Procurase distinguir o dolo direto do eventual afirmandose que o primeiro é a vontade por causa do resultado o segundo é a vontade apesar do resultado No entanto nosso Código equiparouos quanto aos efeitos 8 Elemento subjetivo especial do tipo O especial fim ou motivo de agir embora amplie o aspecto subjetivo do tipo não integra o dolo nem com ele se confunde uma vez que como vimos o dolo esgotase com a consciência e a vontade de realizar a ação com a finalidade de obter o resultado delituoso ou na assunção do risco de produzilo O especial fim de agir que integra determinadas definições de delitos condiciona ou fundamenta a ilicitude do fato constituindo assim elemento subjetivo do tipo de ilícito de forma autônoma e independente do dolo 81 Concretização desnecessária A ausência desses elementos subjetivos especiais descaracteriza o tipo subjetivo independentemente da presença do dolo Enquanto o dolo deve materializarse no fato típico os elementos subjetivos especiais do tipo especificam o dolo sem necessidade de se concretizarem sendo suficiente que existam no psiquismo do autor 82 Delitos de intenção Delitos de intenção requerem um agir com ânimo finalidade ou intenção adicional de obter um resultado ulterior ou uma ulterior atividade distintos da realização do tipo penal Tratase portanto de uma finalidade ou ânimo que vai além da realização do tipo As intenções especiais integram a estrutura subjetiva de determinados tipos penais exigindo do autor a persecução de um objetivo compreendido no tipo mas que não precisa ser alcançado efetivamente Faz parte do tipo de injusto uma finalidade transcendente um especial fim de agir como por exemplo para si ou para outrem art 157 com o fim de obter art 159 em proveito próprio ou alheio art 180 etc 83 Delitos de tendência Nos delitos de tendência a ação encontrase envolvida por determinado ânimo cuja ausência impossibilita a sua concepção Nestes crimes não é a vontade do autor que determina o caráter lesivo do acontecer externo mas outros extratos específicos inclusive inconscientes Com efeito não se exige a persecução de um resultado ulterior ao previsto no tipo senão que o autor confira à ação típica um sentido ou tendência subjetivo não expresso no tipo mas deduzível da natureza do delito ex o propósito de ofender arts 138 139 e 140 do CP propósito de ultrajar art 212 do CP 84 Especiais motivos de agir Pertencem também ao tipo subjetivo os motivos de agir embora como afirmava Maurach nem sempre seja clara a diferença entre motivos e intenções o motivo impulsiona a intenção atrai A verdade é que os motivos têm caracteres anímicos e impulsionam as realizações de condutas como por exemplo motivo torpe motivo fútil motivo nobre relevante valor social ou moral etc 85 Momentos especiais de ânimo Características como sem escrúpulos sem consideração satisfazer instinto sexual inescrupulosamente e outras semelhantes assinalam estados anímicos especiais que não constituem grau de responsabilidade pessoal pelo fato e por isso os inimputáveis também podem agir com essas características especiais de ânimo Como afirmava Welzel tratase pois de elementos subjetivos do injusto que fundamentam ou reforçam o juízo de desvalor social do fato Maurach não concordava com essa classificação afirmando que se trata de autênticos elementos típicos objetivos que reclamam congruência do dolo 9 Tipo de injusto culposo Culpa é a inobservância do dever objetivo de cuidado manifestada em conduta produtora de um resultado não querido objetivamente previsível A estrutura do tipo de injusto culposo é diferente da do tipo de injusto doloso neste é punida a conduta dirigida a um fim ilícito enquanto no injusto culposo se pune a conduta mal dirigida normalmente destinada a um fim penalmente irrelevante quase sempre lícito O núcleo do tipo de injusto nos delitos culposos consiste na divergência entre a ação efetivamente praticada e a que devia realmente ter sido realizada em virtude da observância do dever objetivo de cuidado 10 A finalidade no crime culposo A direção finalista da ação nos crimes culposos não corresponde à diligência devida havendo uma contradição essencial entre o querido e o realizado pelo agente O agente que conduz um veículo e causa de forma não dolosa a morte de um pedestre realiza uma ação finalista conduzir o veículo O fim da ação ir a um lugar determinado é jurídicopenalmente irrelevante O meio escolhido o veículo neste caso também o é No entanto será jurídicopenalmente relevante a forma de utilização do meio se o agente por exemplo conduzir a uma velocidade excessiva 11 A tipicidade no crime culposo A tipicidade do crime culposo decorre da realização de uma conduta não diligente causadora de uma lesão ou de perigo a um bem jurídicopenalmente protegido Contudo a falta do cuidado objetivo devido configurador da imprudência negligência ou imperícia é de natureza objetiva Em outros termos no plano da tipicidade tratase apenas de analisar se o agente agiu com o cuidado necessário e normalmente exigível 12 Excludente de criminalidade Nada impede que uma conduta seja tipicamente culposa e no entanto não seja antijurídica Pode o agente realizar uma conduta culposa típica mas encontrarse ao abrigo de uma excludente de antijuridicidade Por exemplo o corpo de bombeiros chamado com urgência para estancar um grande incêndio em uma refinaria no percurso atinge involuntariamente e sem têlo previsto um pedestre ferindoo gravemente À evidência que se encontrava em estado de necessidade observados claro seus requisitos 13 Culpabilidade no crime culposo A culpabilidade nos crimes culposos tem a mesma estrutura da culpabilidade dos crimes dolosos imputabilidade consciência potencial da ilicitude e exigibilidade de comportamento conforme ao Direito O questionamento sobre as condições pessoais do agente para se constatar se podia agir com a diligência necessária e se lhe era exigível nas circunstâncias concretas tal conduta é objeto do juízo de culpabilidade 131 Inexigibilidade de outra conduta A inexigibilidade de outra conduta é perfeitamente admissível como excludente de culpabilidade nos crimes culposos Quando um indivíduo por exemplo realiza uma conduta sem observar os cuidados devidos quando no caso concreto apresentavase impraticável ou de difícil observância ou em outros termos era inexigível outra conduta não pode ser censurável por eventual resultado danoso que involuntariamente produzir 132 Erro de proibição no crime culposo Nada impede por outro lado que possa ocorrer erro de proibição nos crimes culposos quando por exemplo o erro incidir sobre os limites do dever objetivo de cuidado Aliás não é nada incomum a dúvida no tráfego de veículos sobre o direito de prioridade ou a obrigação de esperar 14 Elementos do tipo de injusto culposo O tipo de injusto culposo apresenta os seguintes elementos constitutivos inobservância do cuidado objetivo devido produção de um resultado e nexo causal previsibilidade objetiva do resultado conexão interna entre desvalor da ação e desvalor do resultado 141 Inobservância do cuidado objetivo devido A inobservância do cuidado objetivamente devido resulta da comparação da direção finalista real com a direção finalista exigida para evitar as lesões dos bens jurídicos A infração desse dever de cuidado representa o injusto típico dos crimes culposos No entanto é indispensável investigar o que teria sido in concreto para o agente o dever de cuidado E como segunda indagação devese questionar se a ação do agente correspondeu a esse comportamento adequado Somente nesta segunda hipótese quando negativa surge a reprovabilidade da conduta Ação arriscada não viola dever de cuidado A análise destas questões deve ser extremamente criteriosa na medida em que uma ação meramente arriscada ou perigosa não implica necessariamente a violação do dever objetivo de cuidado Com efeito além das normas de cuidado e diligência será necessário que o agir descuidado ultrapasse os limites de perigos socialmente aceitáveis na atividade desenvolvida Atividades perigosas riscos tolerados Não se ignora que determinadas atividades trazem na sua essência determinados graus de perigos No entanto o progresso e as necessidades quotidianas autorizam a assunção de certos riscos que são da natureza de tais atividades como por exemplo médicocirúrgica tráfego de veículos construção civil em arranhacéus etc Nesses casos somente quando faltar a atenção e cuidados especiais que devem ser empregados poderseá falar de culpa 142 Produção de um resultado O resultado integra o injusto culposo O crime culposo não tem existência real sem o resultado Há crime culposo quando o agente não quer nem assume o risco da produção de um resultado previsível mas que mesmo assim ocorre Se houver inobservância de um dever de cuidado mas se o resultado não sobrevier não haverá crime Assim a norma de cuidado pode ter sido violada a conduta pode ter sido temerária mas por felicidade pode não se configurar um delito culposo por faltarlhe o resultado que o tipificaria 143 Relação de causa e efeito É indispensável que o resultado seja consequência da inobservância do cuidado devido ou em outros termos que este seja a causa daquele Com efeito quando for observado o dever de cautela e ainda assim o resultado ocorrer não se poderá falar em crime culposo Atribuir nessa hipótese a responsabilidade ao agente cauteloso constituirá autêntica responsabilidade objetiva pela ausência de nexo causal 1431 Inevitabilidade do resultado exclui tipicidade Os limites da norma imperativa encontramse no poder de cumprimento pelo sujeito por isso o dever de cuidado não pode ir além desses limites A inevitabilidade do resultado exclui a própria tipicidade Em outros termos é indispensável que a inobservância do cuidado devido seja a causa do resultado tipificado como crime culposo 144 Previsibilidade objetiva do resultado O resultado deve ser objetivamente previsível O aferimento da ação típica deve obedecer às condições concretas existentes no momento do fato e da necessidade objetiva naquele instante de proteger o bem jurídico Assim como nos crimes dolosos o resultado deve ser abrangido pelo dolo nos culposos deverá sêlo pela previsibilidade A previsibilidade objetiva se determina mediante um juízo levado a cabo colocandose o observador p ex o juiz na posição do autor no momento do começo da ação e levando em consideração as circunstâncias do caso concreto cognoscíveis por uma pessoa inteligente mais as conhecidas pelo autor e a experiência comum da época sobre os cursos causais 145 Conexão interna entre desvalor da ação e desvalor do resultado O conteúdo do injusto no fato culposo é determinado pela coexistência do desvalor da ação e do desvalor do resultado É indispensável a existência de uma conexão interna entre o desvalor da ação e o desvalor do resultado isto é que o resultado decorra exatamente da inobservância do cuidado devido ou em outros termos que esta seja a causa daquele Com efeito no delito culposo o desvalor da ação está representado pela inobservância do cuidado objetivamente devido e o desvalor do resultado pela lesão ou perigo concreto de lesão para o bem jurídico 15 Modalidades de culpa Tanto na imprudência quanto na negligência há a inobservância de cuidados recomendados pela experiência comum no exercício dinâmico do quotidiano humano E a imperícia por sua vez não deixa de ser somente uma forma especial de imprudência ou de negligência 151 Imprudência Imprudência é a prática de uma conduta arriscada ou perigosa e tem caráter comissivo É a imprevisão ativa culpa in faciendo ou in committendo Conduta imprudente é aquela que se caracteriza pela intempestividade precipitação insensatez ou imoderação Imprudente será por exemplo o motorista que embriagado viaja dirigindo seu veículo automotor com visível diminuição de seus reflexos e acentuada liberação de seus freios inibitórios 152 Negligência Negligência é a displicência no agir a falta de precaução a indiferença do agente que podendo adotar as cautelas necessárias não o faz É a imprevisão passiva o desleixo a inação culpa in ommittendo É não fazer o que deveria ser feito Negligente será por exemplo o motorista de ônibus que trafegar com as portas do coletivo abertas causando a queda e morte de um passageiro 153 Imperícia Imperícia é a falta de capacidade despreparo ou insuficiência de conhecimentos técnicos para o exercício de arte profissão ou ofício A inabilidade para o desempenho de determinada atividade fora do campo profissional ou técnico tem sido considerada na modalidade de culpa imprudente ou negligente conforme o caso 1531 Imperícia e erro profissional distinção Imperícia não se confunde com erro profissional O erro profissional é um acidente escusável justificável e de regra imprevisível que não depende do uso correto e oportuno dos conhecimentos e regras da ciência Esse tipo de acidente não decorre da má aplicação de regras e princípios recomendados pela ciência Devese à imperfeição e precariedade dos conhecimentos humanos operando portanto no campo do imprevisto e transpondo os limites da prudência e da atenção humanas No entanto embora o médico não tenha carta branca não pode ao mesmo tempo ficar limitado por dogmas inalteráveis Tendo agido racionalmente segundo os preceitos fundamentais da lexis artis ou quando deles se afastar o fizer por motivos justificáveis não terá de prestar contas à justiça penal por eventual resultado fatídico 16 Espécies de culpa Afora a dificuldade prática de comprovar in concreto na maioria dos casos qual das duas espécies ocorreu destacase a praticamente inexistência de diferença entre não prever um resultado antijurídico e prevêlo mas confiar levianamente na sua não ocorrência se este de qualquer sorte se verificar Na verdade temse questionado se a culpa consciente não seria muitas vezes indício de menor insensibilidade éticosocial de maior atenção na execução de atividades perigosas na medida em que na culpa inconsciente o descuido é muito maior e consequentemente mais perigoso já que a exposição a risco poderá ser mais frequente pois o agente nem percebe a possibilidade de ocorrência de um evento danoso Mais culpado é aquele que não cuidou de olhar o caminho diante de si em cotejo com aquele que teve esse cuidado mas credulamente se persuadiu de que o obstáculo se afastaria a tempo Köller 161 Culpa consciente Há culpa consciente também chamada culpa com previsão quando o agente deixando de observar a diligência a que estava obrigado prevê um resultado previsível mas confia convictamente em que ele não ocorra Quando o agente embora prevendo o resultado espera sinceramente que este não se verifique estarseá diante de culpa consciente e não de dolo eventual No entanto na análise desta espécie de culpa devese agir com cautela pois a simples previsão do resultado não significa por si só que o agente age com culpa consciente uma vez que mais que a previsão o que a caracteriza efetivamente é a consciência acerca da lesão ao dever de cuidado Logo nada impede que possa ocorrer erro de proibição quando o agente se equivocar a respeito da existência ou dos limites do dever objetivo de cuidado 162 Culpa inconsciente A ação sem previsão do resultado previsível constitui a chamada culpa inconsciente culpa ex ignorantia A previsibilidade do resultado é o elemento identificador das duas espécies de culpa A imprevisibilidade desloca o resultado para o caso fortuito ou força maior Na culpa inconsciente no entanto apesar da presença da previsibilidade não há a previsão por descuido desatenção ou simples desinteresse A culpa inconsciente caracterizase pela ausência absoluta de nexo psicológico entre o autor e o resultado de sua ação 163 Culpa imprópria Só impropriamente se pode admitir falar de culpa em uma conduta que prevê e quer o resultado produzido sob pena de violentar os conceitos dogmáticos da teoria do delito A chamada culpa imprópria só pode decorrer de erro e de erro culposo sobre a legitimidade da ação realizada E erro culposo não se confunde com crime culposo Com efeito a culpa imprópria culpa por extensão ou assimilação decorre do erro de tipo evitável nas descriminantes putativas ou do excesso nas causas de justificação Nessas circunstâncias o agente quer o resultado em razão de a sua vontade encontrarse viciada por um erro que com mais cuidado poderia ser evitado Quando no entanto o erro for inevitável não há que se falar em culpa própria ou imprópria na medida em que a inevitabilidade do erro exclui por completo a responsabilidade penal 17 Dolo eventual e culpa consciente Os limites fronteiriços entre dolo eventual e culpa consciente constituem um dos problemas mais tormentosos da Teoria do Delito Há entre ambos um traço comum a previsão do resultado proibido Mas enquanto no dolo eventual o agente anui ao advento desse resultado assumindo o risco de produzilo em vez de renunciar à ação na culpa consciente ao contrário repele a hipótese de superveniência do resultado na esperança convicta de que este não ocorrerá 171 Distinção entre dolo eventual e culpa consciente Na hipótese de dolo eventual a importância negativa da previsão do resultado é para o agente menos importante do que o valor positivo que atribui à prática da ação Por isso entre desistir da ação ou praticála mesmo correndo o risco da produção do resultado opta pela segunda alternativa Já na culpa consciente o valor negativo do resultado possível é para o agente mais forte do que o valor positivo que atribui à prática da ação Por isso se estivesse convencido de que o resultado poderia ocorrer sem dúvida desistiria da ação Não estando convencido dessa possibilidade calcula mal e age No dolo eventual o agente decide agir por egoísmo a qualquer custo enquanto na culpa consciente o faz por leviandade por não ter refletido suficientemente 172 Teorias diferenciadoras dolo eventual e culpa consciente a Teoria da probabilidade diante da dificuldade de demonstrar o elemento volitivo o querer o resultado admite a existência do dolo eventual quando o agente representa o resultado como de muito provável execução e apesar disso atua admitindo ou não a sua produção No entanto se a produção do resultado for menos provável isto é pouco provável haverá culpa consciente b Teoria da vontade ou do consentimento é insuficiente que o agente represente o resultado como de provável ocorrência sendo necessário que a probabilidade da sua produção seja incapaz de remover a vontade de agir Haveria culpa consciente se ao contrário desistisse da ação se estivesse convencido da probabilidade do resultado No entanto não estando convencido calcula mal e age produzindo o resultado A teoria da probabilidade desconhece o elemento volitivo que é fundamental na distinção entre dolo eventual e culpa consciente que por isso mesmo é mais bem delimitado pela teoria do consentimento 18 Concorrência e compensação de culpas 181 Concorrência de culpas Há concorrência de culpas quando dois indivíduos um ignorando a participação do outro concorrem culposamente para a produção de um fato definido como crime Imaginese por exemplo o choque de dois veículos em um cruzamento com lesões recíprocas onde os dois condutores estejam igualmente errados um em velocidade excessiva e o outro com o sinal fechado Havendo concorrência de culpa os agentes respondem isoladamente pelo resultado produzido De observarse que nessa hipótese não se pode falar em concurso de pessoas ante a ausência do vínculo subjetivo Na realidade verificase uma das hipóteses da chamada autoria colateral onde não há adesão de um à conduta de outro 182 Não há compensação de culpas Não se admite compensação de culpa em Direito Penal Eventual culpa da vítima não exclui a do agente elas não se compensam As culpas recíprocas do ofensor e do ofendido não se extinguem A teoria da equivalência dos antecedentes causais adotada pelo nosso Código Penal não autoriza outro entendimento Somente a culpa exclusiva da vítima exclui a daquele para quem nesse caso a ocorrência do evento foi pura infelicitas facti No entanto à evidência a contribuição da vítima deverá ser valorada na aplicação da penabase art 59 do CP 183 Excepcionalidade do crime culposo Nas legislações modernas a regra é de que as infrações penais sejam imputadas a título de dolo e só excepcionalmente a título de culpa e nesse caso quando expressamente prevista a modalidade da figura delituosa art 18 parágrafo único Com a simples análise da norma penal incriminadora constatase esse fenômeno quando o Código admite a modalidade culposa há referência expressa à figura culposa quando não a admite silencia a respeito da culpa Por isso quando o sujeito pratica o fato culposamente e a figura típica não admite a forma culposa não há crime 19 Crime preterdoloso e crime qualificado pelo resultado Além das duas modalidades de crimes dolosa e culposa expressamente reguladas pelo nosso Código Penal doutrina e jurisprudência reconhecem a existência de uma terceira que costumam designar como crime preterdoloso ou crime qualificado pelo resultado 191 Crime preterdoloso ou preterintencional Crime preterdoloso ou preterintencional tem recebido o significado de crime cujo resultado vai além da intenção do agente isto é a ação voluntária inicia dolosamente e termina culposamente porque a final o resultado efetivamente produzido estava fora da abrangência do dolo 192 Crime preterdoloso e crime qualificado pelo resultado No crime qualificado pelo resultado ao contrário do preterdoloso o resultado ulterior mais grave derivado involuntariamente da conduta criminosa lesa um bem jurídico que por sua natureza não contém o bem jurídico precedentemente lesado Assim enquanto a lesão corporal seguida de morte art 129 3º seria preterintencional o aborto seguido da morte da gestante arts 125 e 126 combinados com o art 127 in fine seria crime qualificado pelo resultado O raciocínio é simples nunca se conseguirá matar alguém sem ofender sua saúde ou integridade corporal enquanto para matar alguém não se terá necessariamente de fazêlo abortar 1 Publicado no Diário Oficial da União de 31 de dezembro de 1940 retificado em 3 de janeiro de 1941 J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A O simples fato de se tratar de delito decorrente de acidente de trânsito não implica ser tal delito culposo se há nos autos dados que comprovam a materialidade e demonstram a existência de indícios suficientes de autoria do crime de homicídio doloso Precedentes STJ AgRg no Ag 850473DF Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 14112007 Reputase inepta a denúncia que não trata do elemento volitivo necessário à configuração do delito de desobediência qual seja o dolo limitandose à narrativa de uma conduta eminente culposa decorrente de obstáculos burocráticos e da negligência de funcionários subordinados STJ HC 82589MS Rel Min Laurita Vaz j 9102007 Homicídio culposo Acidente de trânsito Falta de dever de cuidado não demonstrada Conduta culposa não configurada O crime de homicídio culposo exige para a sua configuração a descrição de fato que revele a existência de negligência imprudência ou imperícia STJ HC 74781SP Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 4 102007 Se a imputatio facti em eventual crime previsto no art 22 caput da Lei n 749285 não demonstra o elemento subjetivo especial do tipo a saber o fim de promover evasão de divisas do País então a denúncia é inepta dada a inobservância ao disposto no art 41 do Código de Processo Penal STJ REsp 783989RJ Rel Min Félix Fischer j 1992006 Admitese a responsabilidade penal da pessoa jurídica em crimes ambientais desde que haja a imputação simultânea do ente moral e da pessoa física que atua em seu nome ou em seu benefício uma vez que não se pode compreender a responsabilização do ente moral dissociada da atuação de uma pessoa física que age com elemento subjetivo próprio Cf REsp 564960SC 5ª Turma Rel Min Gilson Dipp DJ de 1362005 Precedentes STJ RHC 19119MG Rel Min Félix Fischer j 1262006 Inexistência de elementos do dolo eventual Inexistente qualquer elemento mínimo a apontar para a prática de homicídio em acidente de trânsito na modalidade dolo eventual impõese a desclassificação da conduta para a forma culposa STJ REsp 705416SC Rel Min Paulo Medina j 2352006 O homicídio resultado de acidente automobilístico no caso concreto não deve ser tido como doloso mas como culposo pois o acusado não queria e nem assumiu o risco de produzir o resultado fatídico No máximo houve grave imprudência ou grande imperícia o que não desloca o julgamento para o Tribunal Popular TJMG Apelação 103820202138330011 Rel Gudesteu Biber j 1712006 A doutrina penal brasileira instrui que o dolo ainda que eventual conquanto constitua elemento subjetivo do tipo deve ser compreendido sob dois aspectos o cognitivo que traduz o conhecimento dos elementos objetivos do tipo e o volitivo configurado pela vontade de realizar a conduta típica Se o dolo eventual não é extraído da mente do acusado mas das circunstâncias do fato concluise que a denúncia limitouse a narrar o elemento cognitivo do dolo o seu aspecto de conhecimento pressuposto ao querer vontade A análise cuidadosa da denúncia finaliza o posicionamento de que não há descrição do elemento volitivo consistente em assumir o risco do resultado em aceitar a qualquer custo o resultado o que é imprescindível para a configuração do dolo eventual A comparação entre a narrativa ministerial e a classificação jurídica dela extraída revela a submissão do paciente a flagrante constrangimento ilegal decorrente da imputação de crime hediondo praticado com dolo eventual Afastado elemento subjetivo dolo resta concluir que o paciente pode ter provocado o resultado culposamente O tipo penal culposo além de outros elementos pressupõe a violação de um dever objetivo de cuidado e que o agente tenha a previsibilidade objetiva do resultado a possibilidade de conhecimento do resultado o conhecimento potencial que não é suficiente ao tipo doloso Considerando que a descrição da denúncia não é hábil a configurar o dolo eventual o paciente em tese deu causa ao resultado por negligência STJ HC 44015SP Rel Min Gilson Dipp j 13122005 O homicídio culposo se caracteriza com a imprudência negligência ou imperícia do agente modalidades da culpa que não se confundem com a inobservância de regra técnica da profissão que é causa de aumento que denota maior reprovabilidade da conduta O julgador contudo não pode se utilizar da mesma circunstância fática para reconhecêlas sob pena de incorrer em vedado bis in idem STJ REsp 606170SC Rel Min Laurita Vaz j 25102005 No Direito Penal não existe compensação de culpas se o agente agiu com um mínimo de culpa sequer deve ser punido pelo seu crime TJMG Apelação 200000049475060001 Rel Maria Celeste Porto j 2492005 A condenação penal exige prova inequívoca da conduta negligente eou imperita do médico que podendo agir deixa de cumprir protocolo para tratamento do paciente seja por inércia seja por desconhecimento da profissão Havendo mais de uma solução médica a escolha por uma em detrimento de outra de modo honesto não caracteriza culpa in omittendo TJMG Apelação 200000044812540001 Rel Alexandre Victor de Carvalho j 1242005 Na dogmática penal a responsabilidade se fundamenta em ações atribuídas às pessoas físicas Dessarte a prática de uma infração penal pressupõe necessariamente uma conduta humana Logo a imputação penal a pessoas jurídicas frisese carecedoras de capacidade de ação bem como de culpabilidade é inviável em razão da impossibilidade de praticarem um injusto penal Precedentes do Pretório Excelso e desta Corte STJ REsp 622724SC Rel Min Félix Fischer j 18112004 Publicação na imprensa de entrevista de Magistrado na qual prestou esclarecimento a respeito de notícia veiculada em jornais nas quais estava sendo acusado de haver mantido a prisão civil por débito alimentar em razão de diferença de pagamento de R 020 vinte centavos Crime sequer em tese caracterizado Inexistência de animus injuriandi Manifestação tida como ofensiva feita com o propósito de esclarecimento à sociedade e em defesa da própria honra e dignidade profissional Rejeição Não basta à caracterização do delito de injúria a simples manifestação tida como ofensiva É mister também a intenção deliberada de ofender o animus injuriandi sem o qual o crime não se caracteriza pela inexistência de elemento subjetivo do tipo TJMG Queixacrime 100000031256890001 Rel Kelsen Carneiro j 26112003 A tese de que era inexigível conduta diversa pela ré que passava por dificuldades financeiras e buscava melhores condições de sobrevivência nos Estados Unidos não pode ser admitida como fundamento para a absolvição da acusada no presente caso uma vez que o Código Penal não contempla a inexigibilidade de conduta diversa como causa geral de exclusão da culpabilidade devendo ser admitida somente em certas hipóteses STJ REsp 518635RJ Rel Min Gilson Dipp j 268 2003 Em sede de direito penal não se admite a incidência da responsabilidade objetiva em consonância com o princípio expresso no brocardo latino nullun crimen nulla poena sine culpa Se o recorrente na condição de tenentecoronel médico de corporação militar atestou a incapacidade de soldados com base em laudos médicos desconhecendo a falsidade destes não pode ser responsabilizado penalmente pela máfé de terceiros STJ RHC 11119PI Rel Min Fontes de Alencar j 3102002 Alegação de desconhecimento do conteúdo da bagagem afastada Dolo direto configurado pela vontade livre e consciente do apelante em transportar substância entorpecente para o exterior na condição de mula não havendo que se falar em culpa consciente pois o risco que assumiu foi apenas o de ser preso em flagrante e não de produzir o resultado criminoso TRF3ª Região Apelação 200061810065709 Rel Theotonio Costa j 342001 Agravação pelo resultado Art 19 Pelo resultado que agrava especialmente a pena só responde o agente que o houver causado ao menos culposamente V art 65 parágrafo único da Lei n 807890 Código de Defesa do Consumidor D O U T R I N A 1 Agravação pelo resultado Não há crime sem culpabilidade Este dispositivo representa mais uma tentativa expressa em afastar total e definitivamente qualquer responsabilidade objetiva especialmente aos crimes preterdolosos e qualificados pelo resultado vejase Exposição de Motivos item n 16 2 Requisitos necessários a Crime praticado sem violência ou grave ameaça à pessoa a violência contra a coisa não exclui a minorante b reparação do dano causado pelo crime ou restituição da coisa a reparação deve ser pessoal e completa Se não for pessoal e completa e voluntária constituirá simples circunstância atenuante c reparação ou restituição devem ser voluntárias não é necessário que sejam espontâneas é suficiente que sejam voluntárias podendo pois o agente ser convencido a reparar o dano ou restituir a coisa d a reparação ou a restituição devem ocorrer até a data do recebimento da denúncia ou da queixa na eventualidade de ocorrerem após o recebimento das iniciais referidas funcionará somente como atenuante genérica art 65 III b in fine 3 Limites e extensão do arrependimento posterior A finalidade da previsão em exame é abranger todas as causas de aumento situadas no desdobramento causal da ação Exposição de Motivos item n 16 Em síntese alcança somente os crimes preterdolosos e os crimes qualificados pelo resultado 4 Exclusão das qualificadoras majorantes e agravantes A previsão não se aplica às qualificadoras majorantes e agravantes pois estas devem necessariamente ser abrangidas pelo dolo do sujeito ativo É insuficiente eventual culpa para essas hipóteses J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Lesões corporais seguidas de morte Policiais civis que nas dependências de delegacia espancam preso com tamanha violência que lhe provocam a morte instantes depois Comprovado o nexo causal entre as ações dos réus e o resultado morte da vítima resulta configurado o delito de lesão corporal seguida de morte art 129 3º do CP Tratandose de crime preterdoloso é descabido reconhecer agravante genérica salvo a reincidência pois as demais somente são aplicáveis nos delitos dolosos TJMG Apelação 100799502314350011 Rel Gudesteu Biber j 14122004 Lesão corporal seguida de morte Hipótese de morte por emoção Vítima octogenário Nexo de causalidade evidenciado Lesão corporal não é apenas ofensa à integridade corpórea mas também à saúde Portanto tanto é lesão a desordem das funções fisiológicas como a das funções psíquicas O caso dos autos é de autêntico crime preterdoloso Houve dolo no antecedente lesão à saúde e culpa no resultado subsequente morte A morte da vítima não foi sequer desejada pelos agentes que tampouco assumiram o risco de produzila A culpa é o elemento subjetivo do resultado qualificador TJMG Apelação 101450101324810011 Rel Herculano Rodrigues j 11112004 Por força do disposto no parágrafo único do art 18 e no art 19 ambos do CP a responsabilidade penal mesmo nos crimes qualificados pelo resultado não pode ser objetiva princípio da culpabilidade Se em relação ao resultado mais grave não ocorreu dolo ou culpa ele não pode ser atribuído ao acusado STJ REsp 285560SP Rel Min Félix Fischer j 1162002 Erro sobre elementos do tipo Art 20 O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo mas permite a punição por crime culposo se previsto em lei Descriminantes putativas 1º É isento de pena quem por erro plenamente justificado pelas circunstâncias supõe situação de fato que se existisse tornaria a ação legítima Não há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo V arts 386 V e 411 do CPP Erro determinado por terceiro 2º Responde pelo crime o terceiro que determina o erro Erro sobre a pessoa 3º O erro quanto à pessoa contra a qual o crime é praticado não isenta de pena Não se consideram neste caso as condições ou qualidades da vítima senão as da pessoa contra quem o agente queria praticar o crime V arts 70 73 e 74 do CP Erro sobre a ilicitude do fato Art 21 O desconhecimento da lei é inescusável O erro sobre a ilicitude do fato se inevitável isenta de pena se evitável poderá diminuíla de um sexto a um terço V art 65 II do CP V art 3º do Declei n 465742 Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro Parágrafo único Considerase evitável o erro se o agente atua ou se omite sem a consciência da ilicitude do fato quando lhe era possível nas circunstâncias ter ou atingir essa consciência V art 8º do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais D O U T R I N A 1 Erro de tipo e erro de proibição O erro que vicia a vontade isto é aquele que causa uma falsa percepção da realidade tanto pode incidir sobre os elementos estruturais do delito erro de tipo quanto sobre a ilicitude da ação erro de proibição Não representam simples renovação de normas mas uma profunda modificação conceitual São novas concepções com novas e maiores abrangências Assis Toledo 2 Ausência de conhecimento da ilicitude e ignorância da lei O desconhecimento da ilicitude de um comportamento e o desconhecimento de uma norma legal são coisas completamente distintas A ignorância da lei não pode confundirse com o desconhecimento do injusto ilicitude até porque a ilicitude de um fato não está no fato em si nem nas leis vigentes mas entre ambos isto é na relação de contrariedade que se estabelece entre o fato e o ordenamento jurídico Assis Toledo 3 Ignorância da antijuridicidade e ignorância da lei distinção A ignorância da lei é o desconhecimento dos dispositivos legislados ao passo que a ignorância da antijuridicidade é o desconhecimento de que a ação é contrária ao Direito Por ignorar a lei pode o autor desconhecer a classificação jurídica a quantidade da pena ou as condições de sua aplicabilidade possuindo contudo representação da ilicitude do comportamento Por ignorar a antijuridicidade faltalhe tal representação As situações são destarte distintas como distinto é o conhecimento da lei e o conhecimento do injusto Alcides Munhoz Netto 4 Teoria dos elementos negativos do tipo Com esta teoria criouse o tipo total de injusto o qual abrangeria também as causas de justificação como elementos negativos do tipo Nesses termos se o crime é o injusto tipificado toda circunstância que exclua o injusto faz desaparecer a tipicidade Sustentase que referida teoria acaba identificando inadequadamente tipicidade e antijuridicidade Logo se as causas de justificação excluem o injusto passam a assumir a condição de características negativas do tipo 41 Conteúdo da teoria dos elementos negativos Para referida teoria a tipicidade abrangeria a ilicitude e o tipo penal e esta não são elementos autônomos e interligados mas um todo normativo unitário O dolo nessas circunstâncias deveria abranger não somente os elementos constitutivos do tipo incriminador mas também a ausência de causas justificantes Por isso concluía não haver dolo quando estiver presente uma causa justificante Enfim o erro nas descriminantes putativas fáticas seria erro de tipo e como tal excluiria o dolo 5 Erro de tipo e erro de proibição Erro de tipo é o que recai sobre circunstância que constitui elemento essencial do tipo É a falsa percepção da realidade sobre um elemento do crime É a ignorância ou a falsa representação de qualquer dos elementos constitutivos do tipo penal É indiferente que o objeto do erro se localize no mundo dos fatos dos conceitos ou das normas jurídicas Importa isto sim que faça parte da estrutura do tipo penal 51 Erro de tipo essencial exclusão da tipicidade O erro de tipo essencial sempre exclui o dolo permitindo quando for o caso a punição pelo crime culposo uma vez que a culpabilidade permanece intacta O erro de tipo inevitável exclui portanto a tipicidade não por falta do tipo objetivo mas por carência do tipo subjetivo Assim haverá a atipicidade por exclusão do dolo somente quando o erro for inevitável mesmo que haja previsão de modalidade culposa 52 Erro de tipo no crime de calúnia No crime de calúnia o agente imputa falsamente a alguém a autoria de um fato definido como crime que sinceramente acredita tenha sido praticado Faltalhe o conhecimento da elementar típica falsamente uma condição do tipo Se o agente não sabia que a imputação era falsa não há dolo excluindose a tipicidade caracterizando o erro de tipo 53 Erro de tipo e desacato Igualmente no crime de desacato o agente desconhece que a pessoa contra a qual age desrespeitosamente é funcionário público imaginando que se trata de um particular normal Falta a elementar do tipo funcionário público desaparecendo o dolo do crime de desacato podendo configurar como forma subsidiária quem sabe o crime de injúria 54 Erro de tipo nos crimes omissivos Nada impede que o erro de tipo ocorra nos crimes omissivos impróprios Por exemplo o agente desconhece sua condição de garantidor ou tem dela errada compreensão O erro incide sobre a estrutura do tipo penal omissivo impróprio O agente não presta socorro podendo fazêlo ignorando que se trata de seu filho que morre afogado Desconhece a sua posição de garante Incorre em erro sobre elemento do tipo penal omissivo impróprio qual seja a sua posição de garantidor 55 Erro sobre a relação causal O erro pode recair sobre a relação causal da ação e o resultado isto é a aberratio causae Nos crimes de resultado o tipo compreende a ação o resultado e o nexo causal Pode ocorrer muitas vezes que o autor não perceba não anteveja a possibilidade do acontecer causal da conduta realizada Mas o desvio do curso imaginado pelo agente não exclui o dolo Por exemplo desejando matar a vítima por afogamento jogaa de uma ponte porém na queda ela vem a morrer de fratura no crânio provocada pelo impacto em uma pedra Responderá por homicídio doloso 6 Erro de proibição Erro de proibição é o que incide sobre a ilicitude de um comportamento O agente supõe por erro ser lícita a sua conduta O objeto do erro não é pois nem a lei nem o fato mas a ilicitude isto é a contrariedade do fato em relação à lei O agente supõe permitida uma conduta proibida O agente faz um juízo equivocado daquilo que lhe é permitido fazer em sociedade 61 Erro de proibição exclusão da culpabilidade O erro de proibição quando inevitável exclui a culpabilidade impedindo a punição a qualquer título em razão de não haver crime sem culpabilidade Se o erro de proibição for evitável a punição se impõe porém sempre por crime doloso ou melhor sem alterar a natureza do crime mas com pena reduzida pois como afirma Cerezo Mir a culpabilidade reprovabilidade pessoal da conduta antijurídica é sempre menor no erro de proibição evitável 62 Jurisprudência alemã sentença de 1831952 A errônea suposição de que não concorre um elemento do fato origina o erro de tipo O sujeito crê que seu atuar é permitido em virtude de não saber o que faz sua vontade não está dirigida à realização do tipo Pelo contrário o erro sobre a antijuridicidade concerne à proibição da conduta O sujeito sabe o que faz mas supõe erroneamente que sua ação é permitida 63 Erro de proibição em crimes culposos O erro de proibição também pode ocorrer nos crimes culposos e não somente nos dolosos como pode parecer à primeira vista inclusive quando o erro de proibição for evitável Nada impede por exemplo que o agente se equivoque sobre qual é o dever objetivo de cuidado A evitabilidade do erro de proibição tem o condão de reduzir a punibilidade da infração penal sem contudo afetar a sua natureza dolosa ou culposa 7 Elementos normativos especiais da ilicitude Os elementos normativos do tipo não se confundem com os elementos jurídicos normativos da ilicitude Enquanto aqueles são elementos constitutivos do tipo penal estes embora integrem a descrição do crime referemse à ilicitude e assim sendo constituem elementos sui generis do fato típico na medida em que são ao mesmo tempo caracterizadores da ilicitude Esses elementos normativos especiais da ilicitude normalmente são representados por expressões como indevidamente injustamente sem justa causa sem licença da autoridade etc 71 Erro sobre elementos normativos especiais da ilicitude A despeito da polêmica sobre o tema como o dolo deve abranger todos os elementos que compõem a figura típica e se as características especiais do dever jurídico forem um elemento determinante da tipicidade concreta a nosso juízo o erro sobre elas deve ser tratado como erro de tipo 72 Revelação de segredo profissional erro de tipo Um profissional médico por exemplo revela segredo do paciente mas sinceramente acreditando que não lhe causará nenhum dano pelo contrário até lhe trará algum benefício Numa reunião científica em um congresso de medicina revela a doença de que o paciente é portador esperando obter benefício dessa revelação Nem imagina que isso possa de algum modo por alguma circunstância que ele desconhece trazer prejuízo para o paciente Nesse caso esse erro se refere a uma condição do tipo 73 Revelação de segredo profissional erro de proibição Se ao contrário imaginar que a divulgação que faz realiza com justa causa então o erro será sobre a ilicitude descaracterizadora da culpabilidade Por exemplo o médico está pleiteando o pagamento de honorários que o paciente lhe está recusando e imagina que para fundamentar o pagamento de honorários tem de explicitar o tipo de tratamento que realizou e o tipo de enfermidade do paciente Por isso nem pensa que está quebrando o sigilo com justa causa Aqui não seria na realidade um erro sobre a constituição do tipo sem justa causa mas sobre a ilicitude da conduta 8 Erro de tipo permissivo erro eclético Quando o objeto do erro for pressuposto de uma causa de justificação afirmase ocorre erro de tipo permissivo Com efeito há efetivamente um misto de erro de tipo e erro de proibição indireto podendose afirmar que se trata de um erro eclético com estrutura parecida com o erro de tipo mas com consequência semelhante ao erro de proibição 81 Erro de tipo permissivo não afasta o dolo Na verdade embora não haja o afastamento do dolo no erro de tipo permissivo porque o autor conhece o tipo e a sua função e até merecesse um tratamento mais rigoroso segundo essa concepção a reprovação que se deve dirigir ao autor afeta somente a sua falta de atenção e isso corresponde quanto ao conteúdo da culpabilidade a uma reprovação de crime culposo 82 Erro de tipo permissivo e erro de permissão diferença O erro de tipo permissivo enfim diferenciase do erro de permissão porque não apenas não se relaciona com a antijuridicidade da conduta como está sempre ligado à falsa representação sobre o conteúdo de seu significado jurídicopenal 83 Erro no estado de necessidade sobre a evitabilidade Na hipótese de estado de necessidade por exemplo o agente erra sobre a evitabilidade do perigo acha que não há outra maneira de evitálo que não seja sacrificando o interesse alheio quando na verdade existe outra maneira só que o agente não a vê Esse erro sobre a evitabilidade ou inevitabilidade do perigo é um erro sobre um elemento do tipo permissivo sobre um pressuposto da descriminante A situação é de estado de necessidade putativo À evidência que o autor age dolosamente conhece o tipo penal sabe o que faz houvese apenas com desatenção na avaliação da situação concreta 84 Erro de tipo permissivo solução do CP Situações como essas serão resolvidas em nosso Direito com base no art 20 1º do CP como erro de tipo permissivo se for escusável isenta de pena se for inescusável permanecerá a punibilidade por crime culposo se houver previsão da respectiva modalidade 85 Erro de tipo permissivo um erro sui generis A desinteligência a respeito do erro que incide sobre os pressupostos fáticos das descriminantes putativas erro de tipo permissivo é uma questão meramente acadêmica no Direito brasileiro na medida em que recebeu tratamento diferenciado do erro de proibição art 20 1º do CP Relevantes na verdade são as consequências que tal erro produz Afetará o dolo como o erro de tipo ou afetará a culpabilidade como o erro de proibição 86 Erro de tipo permissivo consequência O caput do art 20 do CP determina que o erro sobre o tipo incriminador exclui o dolo enquanto o seu 1º que trata do erro sobre os pressupostos fáticos das descriminantes putativas isenta de pena O CP ao regular o erro de tipo permissivo art 20 1º não estabelece que a sua consequência é a exclusão do dolo como faz em relação ao erro de tipo incriminador prevendo apenas a isenção de pena 87 Erro de tipo permissivo afasta a culpabilidade A conclusão inarredável a que se chega a esta altura é que o erro de tipo permissivo não exclui o dolo do tipo que permanece íntegro Apenas afasta a culpabilidade dolosa se for evitável e igualmente a culposa se for inevitável Como se constata o erro de tipo incriminador e o erro de tipo permissivo não têm a mesma natureza e não geram as mesmas consequências 88 Erro sui generis misto de erro de tipo e erro de proibição O erro de tipo permissivo constitui uma terceira espécie de erro Seria um misto de erro de tipo e de erro de proibição indireto O erro se constitui somente na crença do autor de que a norma proibitiva é afastada excepcionalmente diante de uma proposição permissiva Em síntese tratase de um erro sui generis que estruturalmente se parece mais com erro de tipo do que com erro de proibição mas que também se assemelha a um erro de proibição porque a causa de justificação exclui a antijuridicidade sua consequência e não a tipicidade do fato 9 Erro culposo não se confunde com crime culposo Ao contrário do que tradicionalmente se admite o erro de tipo culposo isto é evitável sobre os pressupostos fáticos das descriminantes não produz crime culposo Admitir a existência de culpa no erro de tipo permissivo vencível onde o agente prevê e quer o resultado produzido constitui uma violência traumática à estrutura e aos conceitos dogmáticos da teoria do delito 91 Erro culposo e crime culposo distinção Os conceitos de erro culposo e de crime culposo são completamente distintos No erro culposo a vontade se dirige à realização de algo proibido cuja antijuridicidade poderia ser captada com maior atenção no crime culposo a vontade orientase para um fim lícito ou até louvável sendo defeituosa apenas a respectiva execução A diversidade de situações concerne à intencionalidade do resultado já que na hipótese de descriminante putativa com erro vencível o resultado é querido enquanto no crime culposo o resultado nunca é querido decorrendo de mera imprevisão de sua superveniência 92 Escusabilidade ou inescusabilidade da culpa no erro A escusabilidade ou inescusabilidade de culpa no erro não afeta a natureza do crime O erro culposo podia ter sido evitado no caso de erro sobre a ilicitude mas o crime permanece íntegro na sua natureza dolosa se foi doloso não se altera em absoluto Somente se diminui a pena Como afirmava Gallas Quem mata uma pessoa crendo erroneamente que seria agredido injustamente por ela sabe que mata mas acredita que na situação representada isso fosse lícito 93 Erro culposo e crime doloso Antes da ação isto é durante a elaboração do processo psicológico o agente valora mal uma situação ou os meios a utilizar laborando em erro culposamente pela falta de cautela na avaliação já no momento subsequente na ação propriamente age dolosamente finalisticamente objetivando o resultado produzido embora calcado em erro culposo Em síntese não há crime culposo em nenhuma hipótese nas descriminantes putativas a denominada culpa imprópria nada mais é que um crime doloso 10 Erro de tipo incriminador e erro de tipo permissivo O erro de tipo incriminador inevitável impede a configuração do fato típico doloso enquanto o erro de tipo permissivo inevitável impede a configuração da culpabilidade dolosa E quem sabe que mata por exemplo porém crê erroneamente que pode fazêlo mata dolosamente e não simplesmente por culpa Circunstâncias especialíssimas no entanto imaginadas pelo agente reduzem a censurabilidade da sua conduta porque a fidelidade subjetiva ao Direito fundamenta sempre uma menor reprovação de culpabilidade que a desobediência consciente da lei 11 Modalidades de erro sobre a ilicitude O erro sobre a ilicitude do comportamento pode apresentarse sob três modalidades erro de proibição direto erro de mandamento e erro de proibição indireto erro de permissão Qualquer das hipóteses de erro sobre a ilicitude pode ser escusável ou não Inescusável é o erro que o agente pode evitar pode não errar pode enfim ter consciência da ilicitude Consciência efetiva e potencial consciência graus distintos O grau de reprovação sobre quem age sem saber apenas podendo saber e sobre quem age efetivamente sabendo isto é consciente da ilicitude da sua conduta não pode ser o mesmo Manifestase Jescheck admitindo uma diferença material entre o atuar conscientemente contra o Direito e a sua infração inconsciente consequente de erro vencível Não se pode reprovar quem não sabia mas apenas podia saber igualmente a quem efetivamente sabia isto é a quem tinha a real consciência da ilicitude Sem dúvida alguma a conduta de quem tinha real consciência da ilicitude é muito mais censurável Em virtude dessa diferença no grau de reprovação embora punindose quem age com consciência potencial diminuise a pena aplicável proporcionalmente ao menor juízo de reprovação Diminui se a pena aplicável mas não se afasta a culpabilidade que nas circunstâncias é reconhecidamente diminuída Consequências dos diversos graus de consciência Podese traçar o seguinte paralelo consciência real punição normal consciência potencial punição reduzida ausência de potencial consciência absolvição 111 Erro de proibição direto No erro de proibição direto o agente enganase a respeito da norma proibitiva Portanto o crime que pratica é um crime de ação comissivo porque ou desconhece a norma proibitiva ou a conhece mal É indiferente porque afinal tanto o erro como a ignorância da norma para todos os efeitos são erro Essa modalidade já foi analisada suficientemente 112 Erro mandamental O erro de mandamento ocorre nos crimes omissivos O erro recai sobre uma norma mandamental sobre uma norma impositiva sobre uma norma que manda fazer que está implícita evidentemente nos tipos omissivos Pode haver erro de mandamento em qualquer crime omissivo próprio ou impróprio 113 Erro de proibição indireto Esta modalidade de erro é denominada erro de permissão porque o autor não crê que o fato seja lícito simplesmente senão que desconhece a ilicitude no caso concreto em razão da suposição errônea da existência de uma proposição permissiva 12 Erro sobre excludentes de culpabilidade O erro sobre excludentes da culpabilidade não é tratado pela lei brasileira Podese no entanto buscar a solução por meio da analogia A alternativa efetivamente correta no entanto será a inexigibilidade de outra conduta J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Art 20 erro de tipo É imprescindível que a defesa comprove a caracterização do erro sobre elementar do tipo penal o que não ocorreu no caso dos autos não sendo suficiente mera alegação do réu de desconhecimento da empreitada criminosa TRF3ª Região Apelação 200461190032279 Rel Johonsom Di Salvo j 1222008 Estupro Vítima menor de 14 anos Erro de tipo O Pretório Excelso em precedente assentou que o erro quanto à idade da ofendida é o que a doutrina chama de erro de tipo ou seja erro quanto a um dos elementos integrantes do erro do tipo TJPR Apelação 3950192 Rel Lauro Augusto Fabrício de Melo j 2092007 Crime contra a ordem tributária Erro de tipo afastado posto que pelas circunstâncias em que os fatos ocorreram restou claro que o réu tinha plena consciência da conduta que praticava assim como quanto aos seus efeitos quais sejam a redução da base de cálculo e o pagamento a menor dos tributos devidos TRF3ª Região Apelação 200261020129784 Rel Luiz Stefanini j 2882007 A legítima defesa putativa supõe negligência na apreciação dos fatos e por isso não exclui a responsabilidade civil pelos danos que dela decorram STJ REsp 513891RJ Rel Ari Pargendler j 2032007 Calúnia Erro de tipo Por mais caluniosa que possa ter sido a imputação feita pelo apelado ao Promotor de Justiça inferese dos autos que aquele não tinha conhecimento da falsidade do fato caracterizandose o erro de tipo previsto no art 20 do Código Penal o qual exclui o dolo e por via de consequência a consumação do tipo penal TJPR Apelação 03227961 Rel Waldomiro Namur j 1º22007 Somente ocorre a legítima defesa putativa quando o agente erradamente se julga diante de uma agressão iminente ou atual e injusta e portanto legalmente autorizado à reação que empreende Cassase portanto decisão do Júri que reconhece a descriminante mesmo derivada de culpa em manifesta oposição à prova dos autos TJMG Apelação 106990303128460011 Rel Gudesteu Biber j 8112005 Ainda que se entenda mais adequado o desdobramento dos quesitos da legítima defesa putativa da forma como é feita na legítima defesa própria o questionário adaptado ao novo tratamento da descriminante não pode ser tido como nulo Se os jurados terminaram por rejeitar a tese da legítima defesa putativa mas reconhecendo o erro do acusado aceitaram que ele derivou de culpa não há que se falar na absolvição do acusado mas sim em seu apenamento de acordo com a modalidade culposa do crime TJMG Apelação 101940201954350031 Rel Beatriz Pinheiro Caires j 262005 Se o agente é infrator afeito ao comércio e uso de armas de fogo em assalto e crimes assemelhados processado por roubo à mão armada porte de armas e outras modalidades delituosas não pode encontrar receptividade sua alegação de ignorar que uma das armas encontradas em seu poder era de uso exclusivo das forças armadas pretendendo com sua alegação beneficiarse pela desclassificação do ilícito com base em erro de tipo ou mesmo erro de proibição ou seja desconhecimento da ilicitude de seu uso dela arma ou propriedade TJMG Apelação 104330307580830011 Rel Hyparco Immesi j 262005 Art 21 erro de proibição Os apelantes tinham perfeita consciência de que os CDS por eles expostos na rua em banca de camelô em Rio das Pedras eram produtos falsos Tal delito atua em prejuízo de todo o mercado fonoaudiovisual e acarreta sérias consequências a ordem pública e até mesmo econômica Também não há que se falar em erro de proibição ou mesmo de tipo pois os agentes ativos tinham plena consciência de que suas condutas são proibidas por lei TJRJ Apelação 200705006150 Rel Maria Raimunda T Azevedo j 13122007 O apelante que se enquadra na categoria de homem médio é agente de segurança da Câmara Municipal do Rio de Janeiro lotado na Diretoria de Segurança do Legislativo exerce tal função há vinte e cinco anos tem acesso aos mais variados meios de comunicação O delito que lhe foi imputado não é daqueles adstritos a um seguimento da sociedade violação do sigilo de proposta de concorrência patrocínio simultâneo ou tergiversação etc ao contrário é de conhecimento comum mormente porque a mídia durante longo período divulgou amplamente campanha para desarmamento da população civil não sendo possível acolher a tese defensiva de que agiu sem consciência da ilicitude do fato TJRJ Apelação 200705003807 Rel Valmir Ribeiro j 8112007 O conjunto probatório permite concluir que o dinheiro norteamericano estava na bagagem de mão do recorrido O dinheiro portado tem origem como comprova a Declaração de Imposto de Renda apresentada Não é crime transitar com moeda estrangeira pelo hall do aeroporto Toda prova evidencia que o recorrido desconhecia o regulamento da receita federal sobre a informação da saída dos dólares Erro sobre a ilicitude inevitável TRF3ª Região Apelação 200161190035486SP Rel Cecília Mello j 632007 A simples manutenção de espaço destinado à prática de prostituição traduzse em conduta penalmente reprovável sendo que a possível condescendência dos órgãos públicos e a localização da casa comercial não autoriza por si só a aplicação da figura do erro de proibição com vistas a absolver o réu STJ REsp 870055SC Rel Min Gilson Dipp j 2722007 Abolitio criminis Cloreto de etila Retroatividade benéfica Inocorrência Erro de proibição Inocorrência 1 Na compreensão da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça a Resolução n 1042000 editada pelo Diretor da ANVISA é inválida por não referendada pelo colegiado 2 O cloreto de etila é substância entorpecente de porte para uso próprio e comércio clandestino proibidos pela Lei de Tóxicos 3 Não há falar em erro de proibição quando a conduta do agente ela mesma o exclui de forma evidente primus ictus oculi STJ HC 35664SP Rel Min Hamilton Carvalhido j 17112005 O agente não pode se valer do erro de proibição quando por suas condições pessoais podia alcançar a ilicitude da sua conduta Ressaltese que a mídia transmite de forma exaustiva notícias de prisão em flagrante de indivíduos que retiram animais silvestres de seu habitat natural ou os mantêm aprisionados Ademais não é crível que um indivíduo que more em um sítio contando mais de 70 anos de idade não saiba das restrições legais à retirada de animais silvestres da mata bem como à sua manutenção em gaiolas sem necessária licença da autoridade competente TJRJ Apelação 200505003358 Rel Roberto Guimarães j 2382005 Casa de prostituição Apelante que não possuía sequer potencial consciência da ilicitude Ocorrência de erro de proibição Absolvição Aplicase o art 21 do Código Penal que trata do erro sobre a ilicitude do fato quando a acusada é pessoa simples que se prostituiu durante parte de sua vida e no momento aluga quartos de sua residência para encontros entre prostitutas e clientes em plena zona do meretrício TJMG Apelação 100000026480040001 Rel Márcia Milanez j 68 2002 Coação irresistível e obediência hierárquica Art 22 Se o fato é cometido sob coação irresistível ou em estrita obediência a ordem não manifestamente ilegal de superior hierárquico só é punível o autor da coação ou da ordem V arts 62 II e III 65 III c e 146 3º I e II do CP V arts 386 V e 411 do CPP D O U T R I N A 1 Inexigibilidade de comportamento diverso previsão expressa Nosso Código Penal prevê expressamente duas situações que excluem a culpabilidade em razão da inexigibilidade de comportamento diverso são causas legais que excluem a culpabilidade a coação irresistível e a obediência hierárquica art 22 2 Coação irresistível Coação irresistível com idoneidade para afastar a culpabilidade é a coação moral a conhecida ameaça uma vez que a coação física exclui a própria ação não havendo consequentemente conduta típica Coação irresistível é tudo o que pressiona a vontade impondo determinado comportamento eliminando ou reduzindo o poder de escolha 3 Coação física irresistível não há ação A coação física vis absoluta por sua vez exclui a ação por ausência de vontade Neste caso o executor é considerado apenas um instrumento de realização da vontade do coator que na realidade é o autor mediato 4 Coação moral existe ação Na coação moral existe vontade embora seja viciada Nas circunstâncias em que a ameaça é irresistível não é exigível que se oponha a essa ameaça para se manter em conformidade com o Direito Quem nesta situação executa um fato criminoso não é considerado culpável porque sua vontade não pode determinarse livremente 5 Irresistibilidade da coação A irresistibilidade da coação deve ser medida pela gravidade do mal ameaçado Essa gravidade deve relacionarse com a natureza do mal e evidentemente com o poder do coator em produzilo Não pode ser algo que independa da vontade do coator fora da sua disponibilidade Nesse caso deixa de ser grave o mal ameaçado deixa de ser irresistível a coação 6 Ameaças vagas e imprecisas Ameaças vagas e imprecisas não podem ser consideradas suficientemente graves para configurar coação irresistível e justificar a isenção de pena Somente o mal efetivamente grave e iminente tem o condão de caracterizar a coação irresistível prevista pelo art 22 do CP 7 Iminência do mal ameaçado A iminência aqui não se refere à imediatidade tradicional puramente cronológica mas significa iminente à recusa isto é se o coagido recusarse o coator tem condições de cumprir a ameaça em seguida seja por si mesmo seja por interposta pessoa 8 Ameaça de mal a terceiro possibilidade É indiferente que a vítima do mal ameaçado seja o próprio coagido ou alguém de suas ligações afetivas O fato é que esse mal essa ameaça constitui uma coação moral O que importa é que o temor do agente lhe impeça de deliberar livremente ou obedece à ordem ou o mal que teme se concretiza 9 Irresistibilidade da coação afasta concurso de pessoas Na hipótese de irresistibilidade a solução legal é considerar punível exclusivamente o coator que no caso é o autor mediato uma vez que o executor é mero instrumento agindo inculpavelmente Não há propriamente concurso de pessoas mas simples autoria mediata o coator é o único responsável pelo fato do qual tinha o domínio final 10 Coação resistível diminuição da reprovabilidade Na hipótese de coação resistível não haverá exclusão da culpabilidade penal logicamente porque o sujeito pode agir em conformidade com o direito e neste caso haverá concurso de pessoas Porém como há a coação embora resistível e o agente age por causa dessa ameaça há uma diminuição do grau de reprovação e consequentemente uma redução de pena caracterizando uma atenuante genérica art 65 III c 1ª figura 11 Punibilidade do coator sempre O coator por sua vez será sempre punível na coação irresistível na condição de autor mediato na coação resistível na condição de coautor ou de partícipe dependendo das demais circunstâncias Somente quando a coação for resistível o coator sofrerá a agravante do art 62 II porque na coação irresistível ele será autor mediato e esta será o meio de sua execução Caso contrário haveria bis in idem 12 Obediência hierárquica relação de direito público A segunda parte do art 22 prevê a obediência hierárquica que requer uma relação de direito público e somente de direito público A hierarquia privada própria das relações da iniciativa privada não é abrangida por este dispositivo 121 Ordem não manifestamente ilegal Em virtude dessa subordinação hierárquica o subordinado cumpre ordem do superior desde que essa ordem não seja manifestamente ilegal podendo no entanto ser apenas ilegal Porque se a ordem for legal o problema deixa de ser de culpabilidade podendo caracterizar causa de exclusão de ilicitude 122 Cumprir ordem ilegal exclui culpabilidade A ordem pode ser ilegal mas não manifestamente ilegal não flagrantemente ilegal Quando a ordem for ilegal mas não manifestamente o subordinado que a cumpre não agirá com culpabilidade por ter avaliado incorretamente a ordem recebida incorrendo numa espécie de erro de proibição 123 Cumprimento de ordem legal não há ilicitude Se o agente cumprir ordem legal de superior hierárquico estará no exercício de estrito cumprimento de dever legal O cumprimento de ordem legal não apresenta nenhuma conotação de ilicitude ainda que configure alguma conduta típica ao contrário caracteriza a sua exclusão art 23 124 Ordem manifestamente ilegal ambos respondem Quando cumprida ordem manifestamente ilegal tanto o superior hierárquico quanto o subordinado são puníveis O subordinado não tem a obrigação de cumprir ordens ilegais Tem a obrigação de cumprir ordens inconvenientes inoportunas mas não ilegais Não tem o direito como subordinado de discutir a oportunidade ou conveniência de uma ordem Mas a ilegalidade mais que o direito tem o dever de apontála e negarse a cumprir ordem manifestamente ilegal 125 Funcionário civil conveniência e oportunidade O funcionário civil não discute a oportunidade ou conveniência mas discute a legalidade Uma ordem pode ser ilegal porque não obedece à forma estabelecida em lei Basta isso e já será ilegal O funcionário civil subalterno não é obrigado a cumprir ordem ilegal Ademais se representar qualquer prejuízo a terceiro será tão responsável quanto o superior 13 A obediência hierárquica no Código Penal Militar O funcionário militar não discute a legalidade porque tem o dever legal de obediência e qualquer desobediência pode constituir crime de insubordinação art 163 do CPM O subalterno militar não é culpado qualquer que seja a sua convicção sobre a ilegalidade da ordem Pelo crime eventualmente decorrente só responde o autor da ordem 131 Ordem manifestamente criminosa deve recusarse O Código Penal Militar diferentemente do Código Penal estabelece implicitamente apenas que o militar não deve obedecer a ordem manifestamente criminosa art 38 2º A questão é completamente diferente Evidentemente seria absurdo afirmar que alguém tem o dever de obedecer a ordem criminosa Aí seria a inversão total das instituições políticas e democráticas 132 Ordem manifestamente criminosa e coação irresistível possibilidade A culpabilidade do subordinado militar pode ser excluída pela coação irresistível Por exemplo o agente militar sabe que a ordem é manifestamente criminosa mas é coagido a cumprila Se a ameaça ou a ordem representar efetivamente uma coação irresistível o subordinado militar será beneficiado pela primeira parte do art 22 isto é pela excludente da coação irresistível mas não pela subordinação hierárquica 14 Coação irresistível beneficia militar e civil Coação irresistível é uma excludente que pode beneficiar qualquer pessoa funcionário ou não militar ou civil Isso quer dizer que o funcionário militar não poderá alegar subordinação hierárquica se a ordem for manifestamente criminosa mas se os requisitos estiverem presentes poderá alegar coação irresistível e assim o superior responderá sozinho pelo crime 15 Subordinado se excede na execução ambos respondem Tanto na hipótese do funcionário civil quanto do subordinado militar quando houver excesso isto é quando o subordinado for além daquilo que lhe impôs o superior por conta própria ambos responderão pelo fato o superior com pena agravada e o subordinado com pena atenuada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A doutrina entende que para caracterizar a excludente de culpabilidade do art 22 do Código Penal são necessários cinco requisitos a existência de uma ameaça de dano grave injusto e atual extraordinariamente difícil de ser suportado pelo coato b inevitabilidade do perigo na situação concreta do coato c ameaça voltada diretamente contra a pessoa do coato ou contra pessoas queridas a ele ligadas d existência de pelo menos três partes envolvidas o coator o coato e a vítima e irresistibilidade da ameaça avaliada segundo o critério do homem médio e do próprio coato concretamente TRF3ª Região Apelação 200661190012289 Rel Higino Cinacchi j 2812008 Para que ocorra a coação moral irresistível deve ser de tal natureza que a pessoa fique fragilizada e não tenha meios de evitar a prática do ato que não desejava praticar TJMG Apelação 100270608355380011 Rel Antônio Armando dos Anjos j 2882007 A excludente de culpabilidade prevista no art 22 do Código Penal não pode ser invocada no âmbito do direito privado uma vez que a configuração da obediência hierárquica pressupõe relação de subordinação entre o mandante e o executor do ato com previsão para este último de consequências graves no caso de descumprimento da ordem possível apenas no direito público TRF3ª Região Apelação 200161200071883 Rel André Nekatschalow j 2762005 Peculato Humildes servidores representados por agentes de segurança e policiais de baixa patente não podem ser incriminados como coautores por terem agido por temor do patrão e chefe de hierarquia superior STJ Ação Penal 266RO Rel Min Eliana Calmon j 1º62005 Exige o art 22 do Código Penal que para a exclusão da culpabilidade seja a coação irresistível inevitável insuperável atual uma força a que o coato não pode subtrairse ou enfrentar TJMG Apelação 107020305858560011 Rel Gudesteu Biber j 2332004 Na coação moral o coator exige que o coato pratique um fato ilícito com a ameaça de imporlhe ou a alguém que lhe seja próximo uma espécie de gravame caso seja praticada a ação pretendida Se para suportar a ameaça perpetrada for necessário o desprendimento de força extraordinária teremos um caso de coação irresistível excludente da culpabilidade STJ HC 27619GO Rel Min Félix Fischer j 52 2004 Para caracterização da obediência hierárquica são necessários dois requisitos a relação administrativa de subordinação bem como a legalidade manifesta do ato praticado pelo subordinado TJMG Apelação 200000039509830001 Rel Maria Celeste Porto j 1832003 Exclusão da ilicitude Art 23 Não há crime quando o agente pratica o fato V arts 65 314 386 V e 411 do CPP V art 188 I do CC I em estado de necessidade II em legítima defesa III em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito Parágrafo único Excesso punível Parágrafo único O agente em qualquer das hipóteses deste artigo responderá pelo excesso doloso ou culposo D O U T R I N A 1 Excludentes de antijuridicidade ou causas de justificação A doutrina tem utilizado uma terminologia bem variada para denominar as causas legais de exclusão da antijuridicidade tais como causas excludentes de ilicitude causas excludentes de antijuridicidade causas de justificação causas justificantes causas de exclusão do crime entre outras 2 Elementos objetivos e subjetivos das causas de justificação Assim como há elementos objetivos e subjetivos no tipo originando a divisão em tipo objetivo e tipo subjetivo nas causas de justificação há igualmente componentes objetivos e subjetivos Por isso não basta que estejam presentes os pressupostos objetivos de uma causa de justificação sendo necessário que o agente tenha consciência de agir acobertado por uma excludente isto é com vontade de evitar um dano pessoal ou alheio 21 Animus vingativo afasta a excludente Não estará amparado em legítima defesa quem agir movido por vingança ainda que se comprove a seguir que a vítima estava prestes a sacar sua arma para matálo Enfim só age em legítima defesa quem o faz com animus defendendi A presença do elemento subjetivo afasta o desvalor da ação pois age conforme ao direito 3 Causas supralegais de justificação Como o legislador não pode prever todas as hipóteses em que as transformações produzidas pela evolução éticosocial de um povo passam a autorizar ou permitir a realização de determinadas condutas inicialmente proibidas devese em princípio admitir a existência de causas supralegais de exclusão da antijuridicidade em que pese alguma resistência oferecida por parte da doutrina 4 Consentimento do ofendido O consentimento do titular de um bem jurídico disponível afasta a contrariedade à norma jurídica ainda que eventualmente a conduta consentida venha a adequarse a um modelo abstrato de proibição Nesse caso o consentimento opera como causa justificante supralegal afastando a proibição da conduta como por exemplo nos crimes de cárcere privado art 148 furto art 155 dano art 163 etc 41 Requisitos do consentimento justificante a Que a manifestação do ofendido seja livre sem coação fraude ou outro vício de vontade b que o ofendido no momento de consentir possua capacidade para fazêlo isto é compreenda o sentido e as consequências de sua aquiescência c que se trate de bem jurídico disponível d que o fato típico se limite e se identifique com o consentimento do ofendido 5 Excesso nas causas de justificação Em qualquer das causas de justificação quando o agente dolosa ou culposamente excederse nos limites da norma permissiva responderá pelo excesso O excesso pode ocorrer em qualquer das modalidades de excludentes Ademais esse excesso pode decorrer de dolo de culpa ou simplesmente de caso fortuito hipótese em que não se poderá falar de responsabilidade penal 51 Pressuposto do excesso nas causas justificantes Para se caracterizar o excesso é indispensável que a situação inicialmente configure a existência de uma excludente cujo exercício em um segundo momento mostrese excessivo 52 Excesso doloso crime doloso Ocorre quando o agente deliberadamente aproveitase da situação excepcional que lhe permite agir para impor sacrifício maior do que o estritamente necessário à salvaguarda do seu direito ameaçado ou lesado Configurado o excesso doloso responderá o agente pelo fato praticado beneficiandose somente da atenuante do art 65 III c ou da minorante do art 121 1º quando for o caso 53 Excesso culposo tipificação residual Será culposo o excesso quando for involuntário podendo decorrer de erro de tipo escusável ou mesmo de erro de proibição evitável quanto aos limites da excludente O excesso culposo só pode decorrer de erro havendo uma avaliação equivocada do agente quando nas circunstâncias eralhe possível avaliar adequadamente 54 Excepcionalidade do crime culposo Devese ter presente o princípio da excepcionalidade do crime culposo insculpido no art 18 parágrafo único do Código Penal Dessa forma o excesso culposo somente será punível quando houver previsão legal da modalidade culposa 55 Excesso uso imoderado ou desnecessário do meio Enfim o excesso punível seja a título de dolo seja a título de culpa decorre do uso imoderado ou desnecessário de determinado meio que causa resultado mais grave do que o razoavelmente suportável nas circunstâncias 6 Cumprimento de dever legal e exercício de direito Quem cumpre estritamente dever imposto por lei ou exerce regularmente um direito não comete crime ainda que eventualmente sua conduta venha a adequarse a determinado tipo penal art 23 III do CP Tanto o cumprimento do comando legal como o exercício da permissão que a ordem jurídica admite afastam a antijuridicidade do comportamento que eventualmente se encontre tipificado 7 Estrito cumprimento de dever legal Quem pratica uma ação em cumprimento de um dever imposto por lei não comete crime Há situações em que a lei impõe determinada conduta e em face das quais embora típica não será ilícita ainda que cause lesão a bem juridicamente tutelado Assim não são crimes a ação do carrasco que executa a sentença de morte do carcereiro que encarcera o criminoso do policial que prende o infrator em flagrante etc 71 Requisitos necessários a Estrito cumprimento somente os atos rigorosamente necessários justificam o comportamento permitido b de dever legal é indispensável que o dever seja legal isto é decorra de lei não o caracterizando obrigações de natureza social moral ou religiosa A norma da qual emana o dever tem de ser jurídica e de caráter geral lei decreto regulamento etc 72 Limites da permissão a autoridades O art 292 do CPP norma permissiva não autoriza contudo que os agentes do Estado possam amiúde matar ou ferir pessoas apenas porque são marginais ou estão delinquindo ou então estão sendo legitimamente perseguidas A própria resistência do eventual infrator não autoriza essa excepcional violência oficial 73 Resistência a atos de autoridades Se a resistência ilegítima constituirse de violência ou grave ameaça ao exercício legal da atividade de autoridades públicas configurase uma situação de legítima defesa permitindo a reação dessas autoridades desde que empreguem moderadamente os meios necessários para impedir ou repelir a agressão Mas repitase a atividade tem de ser legal e a resistência com violência tem de ser injusta além da necessidade da presença dos demais requisitos da legítima defesa Será uma excludente dentro de outra 74 Destinatários agentes públicos e cidadãos comuns Apesar de os destinatários naturais desta excludente de criminalidade serem os agentes públicos nada impede que possa ser aplicada ao cidadão comum quando atuar claro sob a imposição de um dever legal Por exemplo o dever que têm os pais de guarda vigilância e educação dos filhos art 231 IV do CC Algum constrangimento praticado no exercício do pátrio poder estaria justificado pelo estrito cumprimento do dever legal desde que não haja excesso logicamente 75 Direito correcional está superado Aquela tolerância que a lei e os costumes tinham com pais e tutores admitindo até pequenos castigos aos menores sob sua guarda está superada Em relação aos mestres essa permissividade foi completamente abandonada Deve ser fiscalizado com rigor o exercício do dever de guarda e educação de filhos e pupilos para se evitar autênticas torturas ou restrições censuráveis do direito de liberdade e de integridade tipificadoras de verdadeiros crimes 76 Excesso nas causas de justificação Reforma Penal de 1984 Em qualquer das causas de justificação art 23 do CP quando o agente dolosa ou culposamente excederse dos limites da norma permissiva responderá pelo excesso A Reforma Penal de 1984 melhor sistematizada prevê a punibilidade do excesso em relação a todas as excludentes sem exceção ao contrário da redação original do Código Penal de 1940 Com efeito o excesso pode ocorrer em qualquer das modalidades de excludentes Ademais esse excesso pode decorrer de dolo de culpa ou simplesmente de caso fortuito hipótese em que não se poderá falar de responsabilidade penal 77 Limites do estritamente legal excesso e abuso Em outros termos o limite do lícito termina necessariamente onde começa o abuso pois aí o dever deixa de ser cumprido estritamente no âmbito da legalidade para mostrarse abusivo excessivo e impróprio caracterizando sua ilicitude Exatamente assim configurase o excesso pois embora o cumprimento do dever se tenha iniciado dentro dos limites do estritamente legal o agente pelo seu procedimento ou condução inadequada acaba indo além do estritamente permitido excedendose por conseguinte 78 Estrito cumprimento legal e o excesso compatibilidade Não há convém se destaque qualquer ilogicidade ou paradoxo entre o reconhecimento de estrito cumprimento de dever legal e a configuração de excesso na sua execução tanto que o Código Penal com a redação determinada pela Lei n 720984 consagra a punição do excesso para todas as modalidades de excludentes Por isso a incompatibilidade ou impossibilidade do excesso no estrito cumprimento do dever legal somente poderia ser defendida antes da Reforma Penal de 1984 quando o Código Penal na sua versão original só o prescrevia para a hipótese da legítima defesa 79 Estrito cumprimento de dever legal punição do excesso Na análise do excesso é indispensável que a situação inicialmente caracterize a presença de uma excludente cujo exercício em um segundo momento mostrese excessivo Assim por exemplo o agente pode encontrarse inicialmente no estrito cumprimento de dever legal isto é satisfazendo todos seus requisitos legais mas durante seu exercício pelos meios que emprega ou pela imoderação do seu uso ou ainda pela intensidade do seu emprego acaba ultrapassando os limites do estritamente legal exatamente como ocorre na legítima defesa que se inicia legítima deslegitimandose contudo pela imoderação do uso que faz dos meios adequados Não há incompatibilidade entre o excesso e o exercício de estrito cumprimento do dever legal que como tal inicia mas que na sua execução ultrapassa os limites do estritamente necessário 710 Estrito cumprimento de dever legal excesso doloso ou culposo O excesso será doloso quando o agente deliberadamente aproveita se da situação excepcional que lhe permite agir para impor sacrifício maior do que o estritamente necessário à salvaguarda do seu direito ameaçado ou lesado Configurado o excesso doloso responderá o agente dolosamente pelo fato praticado beneficiandose somente pela atenuante do art 65 III c ou com a minorante do art 121 1º quando for o caso Será culposo o excesso quando for involuntário podendo decorrer de erro de tipo escusável ou mesmo de erro de proibição evitável quanto aos limites da excludente O excesso culposo só pode decorrer de erro havendo uma avaliação equivocada do agente quando nas circunstâncias lhe era possível avaliar adequadamente 8 Exercício regular de direito O exercício de um direito desde que regular não pode ser ao mesmo tempo proibido pelo direito Regular será o exercício que se contiver nos limites objetivos e subjetivos formais e materiais impostos pelos próprios fins do direito Fora desses limites haverá o abuso de direito e estará portanto excluída esta causa de justificação O exercício regular de um direito jamais poderá ser antijurídico 81 Exercício regular de acordo com a lei Qualquer direito público ou privado penal ou extrapenal regularmente exercido afasta a antijuridicidade Mas o exercício deve ser regular isto é deve obedecer a todos os requisitos objetivos exigidos pela ordem jurídica 82 Intervenções médicas e cirúrgicas As intervenções médicas e cirúrgicas constituem em regra exercício regular de direito Nada impede é claro que excepcionalmente caracterizem estado de necessidade como ocorre com a previsão do art 146 3º I do CP embora nessa hipótese específica constitua exclusão da tipicidade 83 Violência esportiva O resultado danoso que decorre do boxe da luta livre do judô do futebol etc como atividades esportivas autorizadas e regularizadas pelo Estado constitui exercício regular de direito Se no entanto o desportista afastarse das regras que disciplinam a modalidade esportiva que desenvolve responderá pelo resultado lesivo que produzir segundo seu dolo ou sua culpa 9 Ofendículos Ofendículos são as chamadas defesas predispostas que em regra constituemse de dispositivos ou instrumentos objetivando impedir ou dificultar a ofensa ao bem jurídico protegido seja patrimônio domicílio ou qualquer outro bem jurídico 91 Ofendículos e defesas mecânicas predispostas Há autores que distinguem os ofendículos da defesa mecânica predisposta Os ofendículos seriam percebidos com facilidade pelo agressor como fragmentos de vidros sobre o muro grades fossos etc que representam uma resistência normal natural prevenindo quem tentar violar o direito protegido As defesas mecânicas predispostas por sua vez encontrarseiam ocultas ignoradas pelo suposto agressor como por exemplo armas automáticas predispostas cercas eletrificadas ou qualquer tipo de armadilhas prontas para disparar no momento da agressão 92 Natureza jurídica das ofendículas Alguns autores incluem as ofendículas na excludente do exercício regular de direito outros na legítima defesa onde a potencialidade lesiva de certos recursos cães ou engenhos será tolerada quando atingirem o agressor e censurada quando o atingido for inocente Esse entendimento oferece melhores recursos para a análise de cada caso concreto diante da necessidade dos diversos requisitos da legítima defesa 93 Exercício regular de direito e legítima defesa Na verdade a decisão de instalar os ofendículos constitui exercício regular de direito isto é exercício do direito de autoprotegerse No entanto quando se reage ao ataque esperado inegavelmente constitui legítima defesa preordenada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Não há como aplicar aos crimes de roubo o princípio da insignificância causa supralegal de exclusão de ilicitude pois tratandose de delito complexo em que há ofensa a bens jurídicos diversos o patrimônio e a integridade da pessoa é inviável a afirmação do desinteresse estatal à sua repressão Precedentes STJ HC 60185MG Rel Min Laurita Vaz j 342007 O estrito cumprimento do dever legal pressupõe dois requisitos o estrito cumprimento somente os atos necessários justificam o comportamento em princípio ilícito e o dever legal a norma da qual emana o dever caracterizarseá pela obrigatoriedade e juridicidade TJMG Apelação 102100301340140011 Rel Antônio Armando dos Anjos j 1332007 O habeas corpus constituise em meio impróprio para apreciar a alegação de que o paciente teria agido em estrito cumprimento do dever legal se não demonstrada de pronto qualquer ilegalidade ou abuso de poder Precedentes STJ HC 51363SP Rel Gilson Dipp j 1262006 Age em estrito cumprimento do dever legal o agente que cumpre sem excesso dever que lhe é imposto por lei Se a prisão do autor derivou de atuação legítima dos órgãos estatais não se pode responsabilizar o Estado por tal fato dada a absoluta ausência de ilegalidade No plano da responsabilidade objetiva o dano ressarcível pode resultar de ato doloso culposo ou revelador de falha da máquina administrativa Mas se os agentes judiciários agem no estrito cumprimento do dever legal e o autor não prova o dano moral alegado não há o dever de indenizar TJMG Apelação 107010407942350011 Rel José Francisco Bueno j 922006 Destarte ainda que conhecível fosse a presente irresignação especial no mérito a pretensão do recorrente não lograria perspectiva de êxito isto porque a sentença penal absolutória faz coisa julgada no juízo cível nos casos em que o juízo criminal afirma a inexistência material do fato típico ou exclui sua autoria tornando preclusa a responsabilização civil bem como na hipótese de reconhecida ocorrência de alguma das causas excludentes de antijuridicidade STJ REsp 645496RS Rel Min Luiz Fux j 2092005 A confirmação da decisão que absolveu sumariamente os denunciados se impõe já que cabalmente comprovado que estes agiram amparados pela excludente de ilicitude da legítima defesa e no estrito cumprimento do dever legal TJMG Recurso de Ofício 100240272374030011 Rel Armando Freire j 2382005 Não age ao amparo do exercício regular de direito o marido que constrange sua esposa à cópula intra matrimonium tendo em vista que a recusa injustificada aos deveres do casamento constitui causa para a separação judicial e não autorização normativa para a prática de crimes sexuais TJRS Apelação 70009102377 Rel Marco Antonio Ribeiro de Oliveira j 2992004 É obrigatória a formulação aos jurados das teses sustentadas pela defesa mesmo quando invocada causa supralegal de exclusão da culpabilidade que é cediço não se encontra agasalhada de forma expressa no ordenamento jurídico vigente sob pena de cerceamento de defesa TJMG Apelação 100000025404660001 Rel Reynaldo Ximenes Carneiro j 2982002 Estrito cumprimento do dever legal e exercício regular do direito Excludentes de antijuridicidade O estrito cumprimento do dever legal do profissional da advocacia pressupõe sua manifestação sobre questões pertinentes ao objeto da causa e o exercício regular do direito a observância aos requisitos objetivos delineados pelo Poder Público para fazer prevalecer o direito subjetivo penal e extrapenal do acusado STF HC 81517SP Rel Maurício Corrêa j 242002 Estrito cumprimento do dever legal não ocorrência desta excludente ante a agressão desnecessária e excessiva perpetrada pelo apelante TJMG Apelação 100000022161090001 Rel Odilon Ferreira j 2622002 O excesso exculpante não se confunde com o excesso doloso ou culposo por ter como causas a alteração no ânimo o medo a surpresa Ocorre quando é oposta à agressão injusta atual ou iminente reação intensiva que ultrapassa os limites adequados a fazer cessar a agressão STF HC 72341RS Rel Min Maurício Corrêa j 1361995 Estado de necessidade Art 24 Considerase em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual que não provocou por sua vontade nem podia de outro modo evitar direito próprio ou alheio cujo sacrifício nas circunstâncias não era razoável exigirse V art 65 do CPP V art 188 I do CC 1º Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo V art 13 2º do CP 2º Embora seja razoável exigirse o sacrifício do direito ameaçado a pena poderá ser reduzida de um a dois terços D O U T R I N A 1 Estado de necessidade definição O estado de necessidade caracterizase pela colisão de interesses juridicamente protegidos devendo um deles ser sacrificado em prol do interesse social Como salientava Heleno Fragoso O que justifica a ação é a necessidade que impõe o sacrifício de um bem em situação de conflito ou colisão diante da qual o ordenamento jurídico permite o sacrifício do bem de menor valor desde que imprescindível acrescentamos para a salvaguarda do bem preservado 2 Exemplo dos dois náufragos No exemplo clássico dois náufragos disputam a mesma tábua que não suporta mais de um uma vida terá de ser sacrificada para salvar outra Em tais hipóteses o Direito reconhecendo sua impotência para salvar os bens em perigo admite que um deles seja sacrificado em benefício do outro aguardando a solução natural para proclamála legítima Aliás nem adiantaria dispor de forma diversa uma vez que o instinto de sobrevivência e de preservação pessoal é muito mais forte do que qualquer coação psicológica que a sanção penal possa representar 3 Postura do Estado política criminal Ao contrário do que entendia o jusnaturalismo segundo o qual haveria a derrogação da ordem jurídica o Direito continua presente apenas se acomoda dentro dos limites das possibilidades humanas para manterse eficaz sob pena de normativizar paradoxalmente alheio à realidade social Esse sentido humanitário do Direito não exigindo renúncias heroicas é o fundamento éticosocial para excluir a ilicitude de comportamentos praticados em estado de necessidade 4 Estado de necessidade e legítima defesa O estado de necessidade não se confunde com a legítima defesa Nesta a reação realizase contra bem jurídico pertencente ao autor da agressão injusta enquanto naquela a ação se dirige em regra contra um bem jurídico pertencente a terceiro inocente Em ambas há a necessidade de salvar um bem ameaçado 5 Estado de necessidade direito ou faculdade Ao contrário de uma corrente doutrinária que vê no estado de necessidade o exercício de um direito reconhecemos nela uma faculdade do indivíduo de escolher entre deixar perecer o seu interesse juridicamente protegido ou sufragar o interesse antagônico igualmente tutelado pela ordem jurídica 6 Estado de necessidade excludente O CP brasileiro consagra o estado de necessidade como excludente de criminalidade sem as restrições adotadas pela legislação alemã Assim o Código Penal brasileiro não estabelece expressamente a ponderação de bens como também não define a natureza dos bens em conflito ou a condição dos titulares dos respectivos bens Adota em outros termos a chamada teoria unitária 7 Estado de necessidade justificante e estado de necessidade exculpante Na doutrina alemã buscando solução para alguns casos específicos objetivando preencher lacunas deixadas pelo art 54 de seu revogado Código Penal particularmente a necessária interrupção da gravidez por recomendação médica que não fosse própria ou de parentes passou a sustentar a existência de um estado de necessidade supralegal com fundamento na ponderação de bens e deveres originando a conhecida teoria diferenciadora do estado de necessidade 8 Estado de necessidade no direito alemão O ordenamento jurídico alemão previa duas formas de estado de necessidade a estado de necessidade jurídicopenal causa de exclusão de culpabilidade art 54 do CP alemão b estado de necessidade jurídicocivil causa de exclusão da ilicitude arts 228 e 904 do CC alemão 9 Estado de necessidade teoria diferenciadora a Estado de necessidade justificante quando o bem ou interesse sacrificado for de menor valor Nesta hipótese a ação será considerada lícita afastando sua criminalidade desde que tenha sido indispensável para a conservação do bem mais valioso b Estado de necessidade exculpante quando o bem ou interesse sacrificado for de valor igual ou superior ao que se salva Neste caso o Direito não aprova a conduta No entanto ante a inexigibilidade de conduta diversa exclui a culpabilidade 10 Estado de necessidade exculpante dificuldade Uma excludente da culpabilidade como é o caso do estado de necessidade exculpante pressupõe uma ação típica e antijurídica e num conflito de bens onde somente um pode ser salvo a ação de qualquer de seus titulares não pode ser qualificada de antijurídica à luz do dispositivo referido pelo menos quando se tratar de bens de igual valor No entanto quando o bem ou interesse sacrificado for de maior valor pela desproporcionalidade entre valor preservado e valor sacrificado parecenos que não está abrigado pela previsão do estado de necessidade justificante quando então a ação típica será também antijurídica 11 Ponderação de bens e culpabilidade diminuída A previsão do 2º do art 24 que não é outra coisa que a ponderação de bens prevendo uma culpabilidade diminuída permite a redução de pena ainda que excepcionalmente art 24 2º Por essa previsão minorante quando houver desproporcionalidade entre os bens em conflito perecendo o bem mais valioso afastase legalmente não só o estado de necessidade justificante mas também o estado de necessidade exculpante Por isso nessas hipóteses observadas as circunstâncias fáticas admitimos a possibilidade do estado de necessidade justificante mas somente como causa supralegal de exclusão da culpabilidade 12 Estado de necessidade e colisão de deveres Apesar de nosso CP adotar a teoria unitária ainda assim se admite a inexigibilidade de outra conduta para se reconhecer o estado de necessidade exculpante principalmente nos casos de colisão de deveres quando o agente tem de optar por uma alternativa cumprimento de um dever em detrimento de outro Essa opção poderá ser motivada por fatores pessoais de tal significação que seria impossível exigir um comportamento diverso 121 Dever de agir e dever de omitir preferência Neste conflito entre um dever de agir e um dever de omitirse entendese que tem preferência o dever de omitirse porque se não se salvar aquela pessoa garantida na verdade não se está fazendo nada ela morrerá mas não pela ação do agente morrerá pelo não impedimento Agora o dever de omitirse significa para o seu descumprimento a violação de uma norma proibitiva Assim entre esse dever e o de ação predomina o dever de não agir que é mais consentâneo com os fins do Direito 13 Requisitos do estado de necessidade São os seguintes existência de perigo atual e inevitável não provocação voluntária do perigo inevitabilidade do perigo por outro meio inexigibilidade de sacrifício do bem ameaçado direito próprio ou alheio elemento subjetivo finalidade de salvar o bem do perigo ausência de dever legal de enfrentar o perigo 131 Existência de perigo atual e inevitável Atual na definição de Reale Junior é o que é presente subsiste e persiste Iminente é o que está prestes a ser atual mas ainda não o é Perigo não se confunde com dano mas a atualidade do perigo engloba a iminência do dano uma vez que perigo é a probabilidade de dano Por isso embora nosso CP preveja somente o perigo atual aceita a iminência do dano Inevitável segundo Assis Toledo é a lesão necessária na medida da sua necessidade para salvar o bem ameaçado Perigo passado ou futuro impossibilidade Perigo passado ou futuro não pode justificar o estado de necessidade Se o dano ou perigo já se efetivou a ação do agente somente estará legitimada para impedir sua continuação Se o perigo for futuro poderá até não se concretizar se for passado caracterizará vingança Em qualquer das hipóteses faltalhes a característica da atualidade permitindo a utilização de outros recursos 132 Não provocação voluntária do perigo A expressão do Código que não provocou por sua vontade deve ser entendida como sinônima de que não provocou intencionalmente Dessa forma a simples circunstância de ter cometido intencionalmente o fato por exemplo dirigir em velocidade inadequada para o local que origina a situação de necessidade por si só não impede a alegação do estado de necessidade Será necessário que a própria situação de necessidade tenha sido provocada intencionalmente 133 Inevitabilidade do perigo por outro meio Havendo outra possibilidade razoável de afastar o perigo esta excludente não se justifica mesmo que essa possibilidade seja a fuga ao contrário da legítima defesa Devese buscar a realização do comportamento menos lesivo desde que suficiente para o mesmo fim Quando o agente se utilizar de meio mais grave do que o necessário estaremos diante de excesso doloso ou culposo 134 Inexigibilidade de sacrifício do bem ameaçado O princípio da razoabilidade nos permite afirmar com segurança que quando o bem sacrificado for de valor superior ao preservado será inadmissível o reconhecimento de estado de necessidade No entanto como já referimos se as circunstâncias o indicarem a inexigibilidade de outra conduta poderá excluir a culpabilidade 135 Direito próprio ou alheio Como a ordem jurídica protege bens jurídicos sem se preocupar com quem seja seu titular admite a invocação de estado de necessidade para salvar direito próprio ou alheio Na defesa de direito alheio não se exige qualquer relação jurídica específica do agente com o titular do bem preservado sendo suficiente que os interesses em conflito sejam tutelados pelo Direito 136 Estado de necessidade de terceiro Embora no estado de necessidade de terceiro a vontade deste seja substituída pela do agente quando se tratar de bens disponíveis a intervenção deste dependerá do consentimento do titular do direito a salvaguardar que poderá preferir solução diferente ou quem sabe até suportar o dano 137 Elemento subjetivo finalidade de salvar o bem do perigo Para caracterizar o estado de necessidade é insuficiente o conhecimento objetivo da situação de perigo É necessário que o agente aja com o objetivo de salvar o bem do perigo Essa motivação do agente deve ser configurada no momento da ação ficando excluída a mera coincidência de fatores desconhecidos ou não desejados pelo agente posteriormente constatados 138 Ausência de dever legal de enfrentar o perigo É da essência de algumas funções ou profissões o dever de enfrentar determinado grau de perigo não cabe nesses casos a alegação de estado de necessidade A exigência de sacrifício no exercício dessas atividades perigosas não pode atingir o nível de heroísmo O princípio do razoável também vige aqui embora em sentido inverso para se salvar um bem patrimonial é inadmissível que se exija o sacrifício de uma vida Dever de enfrentar o perigo não é absoluto Além de o dever de enfrentar o perigo limitarse ao período em que se encontra no exercício da atividade respectiva esse dever não tem caráter absoluto a ponto de negarse qualquer possibilidade de ser invocado o estado de necessidade 14 Causa de diminuição de pena minorante A flexibilidade que se deve ter na análise da razoabilidade do sacrifício do bem em conflito está assegurada na previsão do 2º do art 24 Em outros termos significa que mesmo não se tratando de estado de necessidade mas diante das circunstâncias que não justificam o crime diminuem a censurabilidade da conduta autorizando a redução de pena Não deixa de ser como já referimos a admissão de uma culpabilidade diminuída J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Improcedente a alegação do apelante de ter tentado subtrair os bens apreendidos na sua posse porque se encontrava em estado de necessidade uma vez que se trata de pessoa apta para o trabalho e não comprovou situação de penúria TJDF Apelação 20051010036827 Rel Min Getúlio Pinheiro j 1232008 Dificuldades financeiras desemprego ou até mesmo doença não caracterizam a excludente de ilicitude do estado de necessidade ou inexigibilidade de outra conduta para o que é imprescindível que bens ou interesses estejam correndo perigo em decorrência de ato não provocado voluntariamente pelo agente TJMG Apelação 103840604653560011 Rel Antônio Armando dos Anjos j 9102007 Para a configuração da descriminante do estado de necessidade no delito de furto fazse necessária a comprovação de que o agente se encontrava em situação de absoluta miserabilidade a justificar o ataque ao patrimônio alheio não bastando a simples alegação de estar passando por dificuldade TJMG Apelação 10002040018034001 Rel Vieira de Brito j 14112006 Não configuram a hipótese do estado de necessidade meras afirmações de dificuldades de ordem financeira por parte do agente ainda mais quando os bens subtraídos a justificar a investida contra o patrimônio alheio não são aptos para saciar sua fome e de sua família TJMG Apelação 107010305084620011 Rel William Silvestrini j 572006 Se a prova judicial demonstrou que o acusado estava vivendo na sua modesta casa em situação de extrema penúria juntamente com esposa e três filhos doentes sem qualquer tipo de ajuda alimentar ou mesmo de assistência médica e medicamentosa para afastar o risco de morte a que seus familiares estavam submetidos porque o Estado omitindose no seu dever constitucional deixou todos ao desamparo não vejo como possa esse mesmo Estado através do exercício da jurisdição penal mandar para o cárcere o cidadão atingido pela sua perceptível ineficiência administrativa daí porque temse como perfeitamente configurada a excludente de ilicitude consubstanciada no estado de necessidade descrito no art 24 do Código Penal eis que o acusado Cosme praticou o ato visando satisfazer a fome da esposa e filhos doentes TJRJ Apelação 200405002354 Rel Valmir de Oliveira Silva j 1392005 Para a caracterização do estado de necessidade é mister que o agente esteja diante de uma situação de perigo real e inevitável ou seja perigo que não pode ser evitado senão pela violação do bem de terceiro inocente TFR 1ª Região Apelação 199739000078767 Rel Hilton Queiroz j 2282005 Deve ser mantida a absolvição proferida em Primeira Instância se constatado que o réu agiu amparado pela excludente de ilicitude do estado de necessidade sendo flagrante a sua condição de penúria o que justificou a sua investida desesperada contra o patrimônio alheio TJMG Apelação 200000044519160001 Rel Vieira de Brito j 2992004 Apelante que por ser portador do vírus da AIDS apropriouse de numerários da Petrobras empresa onde trabalhava com o objetivo de financiar seu tratamento médico e de mais duas pessoas portadoras da mesma doença Inexistência da excludente de ilicitude narrada no art 23 I do Código Penal Para sua configuração é necessária a comprovação de inevitabilidade do comportamento lesivo ou seja só haverá estado de necessidade se o único meio de que dispunha o agente na ocasião era lesar bem de terceiro para salvaguardar o seu próprio Sentença mantida TJRJ Apelação 200205002707 Rel Nilza Bitar j 1092002 Não cabe reconhecimento do estado de necessidade se o agente podendo subtrair gêneros alimentícios de primeira necessidade opta por bebidas e guloseimas TJRS Apelação 70000864827 Rel Tupinambá Pinto de Azevedo j 1752000 Legítima defesa Art 25 Entendese em legítima defesa quem usando moderadamente dos meios necessários repele injusta agressão atual ou iminente a direito seu ou de outrem V arts 65 314 386 V e 411 do CPP V arts 188 I e 1210 1º do CC D O U T R I N A 1 Considerações gerais A legítima defesa um dos institutos jurídicos mais bem elaborados através dos tempos representa uma forma abreviada de realização da justiça penal e da sua sumária execução Na definição do Código Penal entendese em legítima defesa quem usando moderadamente dos meios necessários repele injusta agressão atual ou iminente a direito seu ou de outrem art 25 2 Fundamento da legítima defesa A legítima defesa apresenta um duplo fundamento de um lado a necessidade de defender bens jurídicos perante uma agressão de outro defender o próprio ordenamento jurídico que se vê afetado ante uma agressão ilegítima 3 Natureza jurídica da legítima defesa As teorias subjetivas que consideram a legítima defesa causa excludente de culpabilidade procuram fundamentála na perturbação de ânimo do agredido ou nos motivos determinantes do agente As teorias objetivas por sua vez consideram a legítima defesa como excludente de antijuridicidade Na verdade o exercício da legítima defesa é um direito do cidadão e constitui causa de justificação 4 Requisitos da legítima defesa a Agressão injusta atual ou iminente b direito próprio ou alheio c meios necessários usados moderadamente d elemento subjetivo animus defendendi Este último é um requisito subjetivo os demais são objetivos 41 Agressão injusta atual ou iminente Agressão é a conduta humana que lesa ou põe em perigo um bem ou interesse juridicamente tutelado Injusta será a agressão que não estiver protegida por uma norma jurídica isto é não for autorizada pelo ordenamento jurídico Agressão e provocação É irrelevante que a agressão não constitua ilícito penal A agressão porém não pode confundirse com provocação do agente devendose considerar a sua intensidade para valorála adequadamente Agressão justa não fundamenta legítima defesa A reação a uma agressão justa não caracteriza legítima defesa como por exemplo reagir à regular prisão em flagrante ou a ordem legal de funcionário público etc O raciocínio é lógico se a agressão ação é lícita a defesa reação não pode ser legítima Injustiça da agressão consideração objetiva A injustiça da agressão deve ser considerada objetivamente sem relacionála com o seu autor uma vez que o inimputável também pode praticar condutas ilícitas ainda que seja inculpável Atual ou iminente Além de injusta a agressão deve ser atual ou iminente Atual é a agressão que está acontecendo isto é que ainda não foi concluída iminente é a que está prestes a acontecer que não admite nenhuma demora para a repulsa Agressão iminente não se confunde com agressão futura A reação do agredido para caracterizar a legítima defesa deve ser sempre preventiva Demora na repulsa descaracterização A reação deve ser imediata à agressão já que a demora na repulsa descaracteriza o instituto da legítima defesa Se passou o perigo deixou de existir e não pode mais fundamentar a defesa legítima que se justificaria para eliminálo Segundo Bettiol a legítima defesa deve exteriorizarse antes que a lesão ao bem tenha sido produzida Agressão passada ou futura A ação exercida após cessado o perigo caracteriza vingança que é penalmente reprimida Igual sorte tem o perigo futuro que possibilita a utilização de outros meios inclusive a busca de socorro da autoridade pública 42 A direito próprio ou alheio Qualquer bem jurídico pode ser protegido pelo instituto da legítima defesa para repelir agressão injusta sendo irrelevante a distinção entre bens pessoais e impessoais Assim podese classificála em legítima defesa própria quando o repelente da agressão é o próprio titular do bem jurídico ameaçado ou atacado e legítima defesa de terceiro quando objetiva proteger interesses de outrem Bens disponíveis de terceiros No entanto na defesa de direito alheio devese observar a natureza do direito defendido Como adverte Assis Toledo quando se tratar de direitos disponíveis e de agente capaz a defesa por terceiro não pode fazerse sem a concordância do titular desses direitos obviamente 43 Meios necessários usados moderadamente Embora se reconheça a legitimidade da reação pessoal nas circunstâncias definidas pela lei o Estado exige que essa legitimação excepcional obedeça aos limites da necessidade e da moderação A configuração de uma situação de legítima defesa está diretamente relacionada com a intensidade da agressão com a periculosidade do agressor e com os meios de defesa disponíveis Meios necessários Necessários são os meios suficientes e indispensáveis para o exercício eficaz da defesa Se não houver outros meios poderá ser considerado necessário o único meio disponível Mas nesta hipótese a análise da moderação deverá ser mais exigente Uso moderado dos meios Esta circunstância deve ser determinada pela intensidade real da agressão e pela forma do emprego e uso dos meios disponíveis Como afirmava Welzel a defesa pode chegar até onde seja requerida para a efetiva defesa imediata porém não deve ir além do estritamente necessário para o fim proposto Havendo disponibilidade de defesas igualmente eficazes devese escolher aquela que produza menor dano Princípio da proporcionalidade Admitimos a invocação do princípio da proporcionalidade na legítima defesa na medida em que os direitos absolutos devem circunscreverse a limites muito exíguos Seria no mínimo paradoxal admitir o princípio da insignificância para afastar a tipicidade de determinados fatos e sustentar o direito de reação desproporcionada à agressão como por exemplo matar alguém para defender quaisquer valores menores 44 Elemento subjetivo animus defendendi A legítima defesa deve ser objetivamente necessária e subjetivamente orientada pela vontade de defenderse Com efeito o animus defendendi atribui significado positivo a uma conduta objetivamente desvaliosa A reação legítima autorizada pelo Direito somente se distingue da ação criminosa pelo seu elemento subjetivo o propósito de defenderse 5 Legítima defesa real ou própria É a tradicional defesa legítima contra agressão injusta atual ou iminente onde estão presentes todos os requisitos da sua configuração 6 Legítima defesa putativa hipótese de erro arts 20 1º e 21 do CP Ocorre quando alguém se julga erroneamente diante de uma agressão injusta atual ou iminente encontrandose portanto legalmente autorizado a repelila A legítima defesa putativa supõe que o agente atue na sincera e íntima convicção da necessidade de repelir essa agressão imaginária Esta modalidade de legítima defesa só existe na representação do agente uma vez que objetivamente não existe 61 Consequência do erro afeta a culpabilidade Se o autor supõe erroneamente a ocorrência de uma causa de justificação independentemente de o erro referirse aos pressupostos objetivos da causa justificante ou à sua antijuridicidade a conduta continuará sendo antijurídica No entanto se esse erro nas circunstâncias era inevitável exculpará o autor se era evitável diminuirá a pena na medida de sua evitabilidade 7 Legítima defesa sucessiva possibilidade Haverá legítima defesa sucessiva na hipótese de excesso que permite a defesa legítima do agressor inicial Verificase quando por exemplo o agredido exercendo a defesa legítima excedese na repulsa Nessa hipótese o agressor inicial contra o qual se realiza a legítima defesa tem o direito de defenderse do excesso já que o agredido pelo excesso transformase em agressor injusto 8 Legítima defesa recíproca É inadmissível legítima defesa contra legítima defesa ante a impossibilidade de defesa lícita em relação a ambos os contendores como é o caso típico do duelo Somente será possível a legítima defesa recíproca quando um dos contendores pelo menos incorrer em erro configurando a legítima defesa putativa 9 Legítima defesa e estado de necessidade a No estado de necessidade há um conflito de interesses legítimos e a sobrevivência de um significará o perecimento do outro na legítima defesa o conflito ocorre entre interesses lícitos de um lado e ilícitos de outro b na legítima defesa a preservação do interesse ameaçado se faz por meio de defesa enquanto no estado de necessidade essa preservação ocorre por meio de ataque c no estado de necessidade existe ação e na legítima defesa reação 10 Legítima defesa contra dirimente de culpabilidade É possível legítima defesa contra quem pratica uma conduta acobertado por uma dirimente de culpabilidade como por exemplo coação moral irresistível ou obediência hierárquica Como a exclusão da culpabilidade não afasta a sua ilicitude é perfeitamente possível a reação defensiva legítima 11 Questões especiais É possível estado de necessidade contra estado de necessidade Também são possíveis legítimas defesas putativas recíprocas ou legítima defesa real contra legítima defesa putativa J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Não há como se considerar que o apelante ao colocar fogo e inutilizar o processo em praça pública agiu em legítima defesa de sua honra sendo certo que a contrário disso estarseia abrindo um perigoso precedente pois todo réu em qualquer demanda judicial poderia alegar a legítima defesa da honra a fim de justificar atos transgressores contra o Estado Democrático de Direito TJPR Apelação 04144785 Rel José Laurindo de Souza Netto j 1422008 Homicídio consumado e tentado Legítima defesa putativa Absolvição sumária Inadmissibilidade O erro e seus limites alegados pelo réu no sentido de que pensou que pelas circunstâncias de vir em sua direção duas pessoas envolvidas em contendas no interior de um clube estava sofrendo uma injusta agressão deverão ser objeto de apreciação e valoração pelo Conselho de Sentença juízo natural para o julgamento dos crimes contra a vida TJDF RESE 20050510000698 Rel João Timóteo j 1712008 Afastase a excludente da legítima defesa se ausentes os requisitos legais para a sua configuração TJDF Apelação 20041010011163 Rel Arnoldo Camanho j 101 2008 A alegação da excludente da legítima defesa requer a comprovação dos seus requisitos de difícil prova não podendo ser aferidos na estreita via do habeas corpus STJ RHC 22264PI Rel Jane Silva j 11122007 Para a absolvição sumária baseada na legítima defesa fazse necessária a existência de provas convincentes da presença da causa de exclusão do crime O mesmo podese dizer em relação ao pleito subsidiário consistente na desclassificação delitiva Havendo controvérsia remetese a apreciação de tais questões ao Tribunal do Júri TJDF RESE 20051010054340 Rel Aparecida Fernandes j 25102007 Disparo de arma de fogo Art 15 Lei n 108262003 Não há legítima defesa putativa se restou comprovado que o disparo foi efetuado quando a vítima já deixara o local e a discussão havia cessado Ademais não houve qualquer agressão ou movimento indicativo de iminente violência da vítima contra o parente do agente TJDF Apelação 20060310008632 Rel Mário Machado j 11102007 Legítima defesa Para caracterização desta excludente é necessária a presença simultânea de determinados requisitos quais sejam agressão injusta atual ou iminente direito próprio ou alheio uso moderado dos meios necessários e animus defendendi No caso dos autos o apelante desferiu chutes e pontapés na vítima seu exsogro um senhor de 74 anos após uma suposta agressão verbal do mesmo não respeitando os limites da necessidade e moderação TJRJ Apelação 200705002851 Rel Alexandre H Varella j 692007 Cediço que na etapa de pronúncia mero juízo de admissibilidade da acusação vigora o princípio in dubio pro societate bastando apenas indícios de autoria Havendo ausência de prova incontroversa acerca da ocorrência da legítima defesa a questão deve ser dirimida pelo Conselho de Sentença para que possa decidir sobre a excludente invocada TJMG RESE 10024044459394001 Rel Eduardo Brum j 3062006 Legítima defesa Necessidade de elemento subjetivo Para a caracterização da legítima defesa é imprescindível que haja o dolo de defenderse Não age em legítima defesa aquele que aceita participar de briga com seu desafeto e o golpeia não obstante a intervenção de seguranças que tentavam apartar os contendores TJMG Apelação 10456000070353001 Rel Erony da Silva j 1522005 Não age ao abrigo da legítima defesa agente que mata desafeto após afugentálo perseguilo e prostrálo ao solo desatendendo a pedidos de clemência que lhe são dirigidos TJRS Apelação 70008968323 Rel Newton Brasil de Leão j 1982004 Somente se caracteriza a excludente da legítima defesa quando a conduta defensiva é a necessária para repelir agressão atual ou iminente TJMG Apelação 100000034621080001 Rel Tibagy Salles j 7102003 Age em legítima defesa quem após injustas e atuais agressões físicas proferidas pela vítima desfere um tiro de arma de fogo e diante da continuidade das agressões atira novamente interrompendo a ação da mesma TJPR Apelação 01270006 Rel Oto Luiz Sponholz j 31102002 Legítima Defesa de Terceiro Reconhecida a falta de moderação nos recursos utilizados para repelir a agressão obrigatória é a apresentação ao Conselho de Sentença dos quesitos referentes ao excesso punível Precedentes do STF e do STJ A não apresentação ao Conselho de Sentença de quesito obrigatório configura nulidade absoluta STJ REsp 212943RS Rel Min Gilson Dipp j 24 2002 Age em legítima defesa própria o agente que ao sofrer agressão reage incontinenti utilizandose de meio moderado que esteja ao seu alcance para evitála As provocações verbais e o fato de a vítima encontrarse armada e ter iniciado as agressões são motivos suficientes para caracterizar a legítima defesa excludente da ilicitude TJPR Recurso Crime Ex Officio 01169124 Rel Oto Luiz Sponholz j 72 2002 Responsabilidade civil do Estado caracterização morte causada a particular por agente da Polícia Rodoviária em serviço irrelevância nas circunstâncias do caso de ter sido o servidor absolvido por legítima defesa de terceiro se a agressão a esse não atribuída à vítima mas a outrem não atingido STF RE 229653PR Rel Min Sepúlveda Pertence j 1262001 Relata a denúncia haver o marido incurso nas sanções do art 121 2º incisos I e IV do Código Penal efetuado diversos disparos contra sua mulher de quem se encontrava separado residindo ela há algum tempo mais de 30 dias em casa de seus pais onde foi procurada ao que parece em tentativa frustrada de reconciliação e morta A absolvição pelo Júri teve por fundamento ação em legítima defesa da honra decisão confirmada pelo Tribunal de Justiça ao entendimento não ser aquela causa excludente desnaturada pelo fato de o casal estar separado há algum tempo e porque a vítima não tinha comportamento recatado Nestas circunstâncias representa o acórdão violação à letra do art 25 do Código Penal no ponto que empresta referendo à tese da legítima defesa da honra sem embargo de se encontrar o casal separado há mais de trinta dias com atropelo do requisito relativo à atualidade da agressão por parte da vítima Entendese em legítima defesa reza a lei quem usando moderadamente dos meios necessários repele injusta agressão atual ou iminente a direito seu ou de outrem STJ REsp 203632MS Rel Min Fontes de Alencar j 1942001 Legítima defesa da honra de terceiro O homicídio constitui uma reação absurdamente imoderada e fora do limite do razoável da necessidade quando praticado porque o réu ficou indignado com boatos desabonadores espalhados pela vítima acerca de uma conhecida sua TJDF Apelação 20000750031637 Rel Aparecida Fernandes j 26102000 Título III Da Imputabilidade Penal Inimputáveis Art 26 É isento de pena o agente que por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado era ao tempo da ação ou da omissão inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento V art 97 do CP V arts 149 a 154 386 V e 411 do CPP V art 46 da Lei n 113432006 Redução de pena Parágrafo único A pena pode ser reduzida de um a dois terços se o agente em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento V art 387 do CPP V arts 171 a 179 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal Menores de dezoito anos Art 27 Os menores de 18 dezoito anos são penalmente inimputáveis ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial V art 228 da CF V Lei n 225254 corrupção de menores V art 7º parágrafo único da Lei n 717083 Lei de Segurança Nacional V art 104 da Lei n 806990 Estatuto da Criança e do Adolescente D O U T R I N A 1 Inimputabilidade e culpabilidade diminuída 11 Imputabilidade e responsabilidade Imputabilidade é a capacidade de culpabilidade é a aptidão para ser culpável Imputabilidade não se confunde com responsabilidade que é o princípio segundo o qual a pessoa dotada de capacidade de culpabilidade imputável deve responder por suas ações 12 Inimputabilidade A falta de sanidade mental ou a falta de maturidade mental que é a hipótese da menoridade 18 anos podem levar ao reconhecimento da inimputabilidade pela incapacidade de culpabilidade Podem levar dizemos porque a ausência dessa sanidade mental ou dessa maturidade mental constitui um dos aspectos caracterizadores da inimputabilidade Imaturidade penal menoridade A imaturidade mental isoladamente esgota o conceito de inimputabilidade porque por presunção legal o menor de dezoito anos é mentalmente imaturo e consequentemente incapaz de culpabilidade Nessa hipótese é suficiente que se faça a comprovação da idade do menor isto é do aspecto puramente biológico Insanidade mental falta de discernimento Em se tratando de sanidade mental a questão é mais complexa porque além de não ser mentalmente são ou não possuir desenvolvimento mental completo por doença ou perturbação mental é necessária a consequência desse distúrbio incapacidade de discernimento No caso de anormalidade psíquica devem reunirse dois aspectos indispensáveis um aspecto biológico que é o da doença em si da anormalidade propriamente e um aspecto psicológico que é o referente à capacidade de entender ou de autodeterminarse de acordo com esse entendimento 121 Menoridade A imputabilidade por presunção legal iniciase aos dezoito anos Para definir a maioridade penal a legislação brasileira seguiu o sistema biológico ignorando o desenvolvimento mental do menor de dezoito anos considerandoo inimputável independentemente de possuir a plena capacidade de entender a ilicitude do fato ou de determinarse segundo esse entendimento 122 Doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado Doença mental Por doença mental devemse compreender as psicoses e como afirmava Aníbal Bruno aí se incluem os estados de alienação mental por desintegração da personalidade ou evolução deformada dos seus componentes como ocorre na esquizofrenia ou na psicose maníacodepressiva e na paranoia as chamadas reações de situação distúrbios mentais com que o sujeito responde a problemas embaraçosos do seu mundo circundante Teria sido melhor a utilização da expressão alienação mental que de forma mais abrangente compreenderia todos os estados mentais mórbidos ou não que demonstrassem a incapacidade do criminoso Desenvolvimento mental incompleto Desenvolvimento mental incompleto por sua vez é aquele que ainda não se concluiu abrangendo os surdosmudos e os silvícolas inadaptados em cujos casos a psicopatologia forense determinará em cada caso concreto se a anormalidade produz a incapacidade referida pela lei A menoridade é o exemplo mais eloquente de desenvolvimento mental incompleto mas por presunção legal absoluta está fora da imputabilidade Surdomudo comprovação casuística O surdomudo privado do som e da comunicação oral em regra fica alijado da cultura sem assimilar suas normas sem a capacidade de avaliar o sentido éticosocial de seus atos Ante a possibilidade de educarse e ajustarse ao meio social sua plena capacidade de entendimento e de autodeterminação deve ser comprovada em cada caso particular Condição biológica surdomudez insuficiência No entanto a condição biológica surdomudez é insuficiente por si só para caracterizar a inimputabilidade Será indispensável comprovar in concreto as consequências de incapacidade de compreensão e de autodeterminação decorrentes dessa deficiência congênita Silvícolas aculturados Aos surdosmudos equiparamse os silvícolas que podem hoje estar aculturados No entanto o nível de adaptação social às normas de cultura da comunidade social deve ser avaliado em cada caso particular Evidentemente que a situação dos silvícolas não tem natureza patológica mas decorre da ausência de adaptação à vida social urbana ou mesmo rural à complexidade das normas éticojurídicosociais reguladoras da vida dita civilizada e à diferença de escala de valores Desenvolvimento mental retardado Como desenvolvimento mental retardado compreendese a oligofrenia em suas formas tradicionais idiotia imbecilidade e debilidade mental No magistério de Aníbal Bruno são formas típicas que representam os dois extremos e o ponto médio de uma linha contínua de gradações da inteligência e vontade e portanto da capacidade penal desde a idiotia profunda aos casos leves de debilidade que tocam os limites da normalidade mental São figuras teratológicas que degradam o homem da sua superioridade psíquica normal e criam no Direito punitivo problemas de inimputabilidade ou de imputabilidade diminuída em vários graus Casos fronteiriços Em outros termos desenvolvimento mental retardado é aquele que não atingiu a maturidade psíquica Em regra nas hipóteses de desenvolvimento mental retardado aparecem com alguma frequência as dificuldades dos chamados casos fronteiriços particularmente nas oligofrenias Os casos fronteiriços apresentam situações atenuadas ou residuais de psicoses de oligofrenias 13 Culpabilidade diminuída A culpabilidade fica diminuída em razão da menor censura que se lhe pode fazer em razão da maior dificuldade de valorar adequadamente o fato e posicionarse de acordo com essa capacidade A pessoa nessas circunstâncias tem diminuída sua capacidade de censura de valoração consequentemente a censurabilidade de sua conduta antijurídica deve sofrer redução 14 Consequências jurídicopenais Comprovada a inimputabilidade do agente a absolvição se impõe art 26 aplicandose medida de segurança nos termos dos arts 96 a 99 No entanto na hipótese dos fronteiriços isto é de culpabilidade diminuída é obrigatória no caso de condenação a imposição de pena reduzida para somente num segundo momento se comprovadamente necessária ser substituída por medida de segurança Inimputabilidade e medida de segurança causa da absolvição A comprovação da inimputabilidade do agente porém não é suficiente para aplicarse a medida de segurança É preciso que se comprove que essa inimputabilidade no caso concreto é a causa da absolvição ou seja que a inimputabilidade é o fundamento da absolvição Alguém recebe medida de segurança por exemplo porque nas condições em que se encontra não pode receber pena ou seja receberia pena se fosse imputável Fundamentos para absolvição impedem medida de segurança Se fizermos uma comparação com um sujeito imputável e chegarmos à conclusão de que naquelas circunstâncias processuais esse sujeito imputável seria absolvido por qualquer razão que não seja a inimputabilidade em que se absolveria também o imputável não se terá fundamento legal para impor ao inimputável uma medida de segurança Culpabilidade diminuída pena diminuída A culpabilidade diminuída dá como solução a pena diminuída na proporção direta da diminuição da capacidade ou nos termos do art 98 do CP a possibilidade de se necessitar de especial tratamento curativo aplicarse uma medida de segurança substitutiva da pena Semiimputabilidade condenação Nesse caso é necessário primeiro condenar o réu semiimputável para só então poder substituir a pena pela medida de segurança porque essa medida de segurança é substitutiva da pena reduzida Quer dizer é preciso que caiba a pena reduzida ou seja que o agente deva ser condenado E o art 98 fala claramente em condenado Logo no caso da semiimputabilidade requerse se for o caso a condenação Culpabilidade diminuída redução obrigatória Em que pese o texto legal utilizar o verbo pode a redução de pena na hipótese de culpabilidade diminuída é obrigatória e não mera faculdade do juiz J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Art 26 Incidente de insanidade mental instaurado a requerimento da Defesa a partir de indícios de sério comprometimento da saúde mental do paciente em virtude do consumo sistemático de drogas Indícios de que se trata de dependente químico Perícia ainda não ultimada Necessidade de transferência do paciente para Hospital de Custódia e Tratamento à vista dos citados indícios sob pena de caracterização de constrangimento por se manter em cela comum pessoa supostamente em sofrimento mental TJRJ HC 200705906794 Rel Geraldo Prado j 13122007 O Código Penal adota o sistema vicariante onde reconhecida a semiimputabilidade do condenado o magistrado pode diminuir a pena ou substituíla por medida de segurança Uma ou outra e não as duas como fez o sentenciante Assim deve ser provido o recurso ministerial para excluir da pena privativa de liberdade a diminuição prevista no art 26 parágrafo único do Código Penal TJRS Apelação 70019945039 Rel Marco Antônio Ribeiro de Oliveira j 882007 Esquizofrenia paranoide Sendo manifesta a inimputabilidade do réu art 26 do Código Penal constatada por laudo de exame psiquiátrico correta a decisão que o absolve sumariamente com fundamento no art 411 do Código de Processo Penal aplicandolhe contudo medida de segurança consistente em internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico pelo prazo mínimo de 3 três anos nos termos do art 97 1º do Código Penal TJPR Recurso Crime Ex Officio 03913766 Rel Jesus Sarrão j 1752007 Ato infracional equiparado a roubo qualificado Laudo psiquiátrico Doença mental Manutenção da internação Ilegalidade Ordem concedida Há constrangimento ilegal na decisão judicial que embora partindo da premissa de que o adolescente é portador de doença mental ordena a aplicação ou manutenção de medida socioeducativa STJ HC 45752SP Rel Min Paulo Medina j 30112006 Sendo incontroversa a inimputabilidade do réu que se encontra preso em estabelecimento prisional resta configurado o constrangimento ilegal STJ HC 60232ES Rel Min Gilson Dipp j 7112006 Incapacidade parcial Condenação mantida Redução de ofício da pena Não é isento de pena o réu que embora seja portador de epilepsia e retardo mental é capaz de compreender o caráter ilícito de sua conduta TJPR Apelação 02833745 Rel Rogério Kanayama j 1372006 Não há como reconhecer em sede de habeas corpus a semiimputabilidade do condenado para fins de redução da pena aplicandose o disposto no parágrafo único do art 26 do Código Penal com base em prova emprestada que não foi aceita nas instâncias antecedentes bem como não foi submetida ao contraditório no processo criminal que deu origem à condenação do paciente STJ HC 44759SP Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 6122005 Restando constatada a doença mental ou a insanidade do acusado impõese a absolvição sumária do agente e a aplicação da medida de segurança cabível STJ HC 42314SP Rel Min Gilson Dipp j 6122005 Reconhecida pelo laudo médico tão somente a redução na capacidade de autodeterminação tal circunstância de forma alguma garante aprioristicamente o enquadramento na hipótese do parágrafo único do artigo 26 do CP Não há qualquer nulidade a ser corrigida se o Conselho de Sentença optando por uma das teses apresentadas afastou a semiimputabilidade à luz de laudo conclusivo pela inexistência de doença mental STJ HC 43565MT Rel Min Hélio Quaglia Barbosa j 6102005 A medida de segurança prevista no Código Penal quando aplicada ao inimputável ou semiimputável ainda no processo de conhecimento pode ter prazo indeterminado perdurando enquanto não for averiguada a cessação da periculosidade Precedentes Não há vinculação entre o prazo de duração da medida de segurança imposta ao semiimputável ainda no processo de conhecimento com o tempo de duração da pena privativa de liberdade substituída STJ HC 42683SP Rel Min Gilson Dipp j 1392005 Denúncia por tráfico de drogas Apesar da expressiva quantidade da droga apreendida 50 g cinquenta gramas de crack não se pode afirmar ainda com segurança absoluta que a mesma destinava ela ao consumo do próprio paciente principalmente diante do seu encaminhamento dias antes do flagrante para tratamento psiquiátrico por ser considerado toxicômano tanto que a decisão que recebeu a denúncia suspendeu o processo e deferiu a instauração do incidente de dependência toxicológica requerido pela defesa STJ HC 41555SP Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 692005 A imputabilidade se consubstancia mesmo que o paciente sofra de alcoolismo pois a doença em si não gera inimputabilidade e sim os efeitos que ela eventualmente opere sobre o agente ao tempo do crime O fato de ter o paciente sido considerado inimputável em outros processos pelo mesmo crime não significa que o seja indefinidamente pois deve ser observado se no caso concreto ele não possuía a capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento STF HC 85721RJ Rel Min Joaquim Barbosa j 2862005 Para a aplicação do art 56 parágrafo único da Lei n 600176 o qual se destina à proteção dos silvícolas é necessária a verificação do grau de integração do índio à comunhão nacional Evidenciado no caso dos autos que paciente encontrase integrado à sociedade não há que se falar na concessão do regime especial de semiliberdade previsto no Estatuto do Índio o qual é inaplicável inclusive aos condenados pela prática de crime hediondo ou equiparado como ocorrido in casu Precedentes STJ HC 30113MA Rel Min Gilson Dipp j 5102004 Em sede de inimputabilidade ou semiimputabilidade vigora entre nós o critério biopsicológico normativo Dessa maneira não basta simplesmente que o agente padeça de alguma enfermidade mental fazse mister ainda que exista prova vg perícia de que este transtorno realmente afetou a capacidade de compreensão do caráter ilícito do fato requisito intelectual ou de determinação segundo esse conhecimento requisito volitivo à época do fato ie no momento da ação criminosa STJ HC 33401RJ Rel Min Félix Fischer j 2892004 Interdição por doença mental com internamento sua admissibilidade independentemente da extinção da punibilidade pelo cumprimento da pena de crimes cometidos pelo interdito possibilidade de sua efetivação em hospital de custódia e tratamento destinado à execução de medidas de segurança impostas a inimputáveis LEP art 99 STF RHC 82924SP Rel Min Sepúlveda Pertence j 1982003 A absolvição do paciente em processocrime anterior por reconhecida inimputabilidade com a imposição de medida de segurança de internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico dá existência a uma fundada dúvida acerca de sua integridade mental a qual pode não se relacionar necessariamente com eventual dependência toxicológica gerando a necessidade de realização de exame de insanidade mental do paciente STJ RHC 13826SP Rel Min Félix Fischer j 1542003 Art 27 Súmula 74 do STJ Para efeitos penais o reconhecimento da menoridade do réu requer prova por documento hábil O critério para o reconhecimento da menoridade na data do fato deve ser objetivo o aniversário do acusado elemento cronológico STJ HC 37064SP Rel Min Paulo Medina j 11102005 O Código Penal é o código das pessoas maiores de idade Por isso entende o Relator a qualificadora do concurso de duas ou mais pessoas pressupõe nos crimes de furto e roubo por exemplo concurso de pessoas imputáveis Não é portanto qualificado o furto praticado por pessoa imputável e pessoa inimputável menor de 18 anos STJ HC 38097SP Rel Min Nilson Naves j 23112004 Consoante o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça não houve qualquer modificação na interpretação do art 121 5º da Lei n 806990 frente à nova maioridade civil tratada no art 5º da Lei n 104062002 portanto as disposições do Estatuto da Criança e do Adolescente têm incidência a princípio sobre aqueles que ainda não atingiram a maioridade penal na data do cometimento do ato infracional pois de outra forma estarão sujeitos às normas do Código Penal STJ HC 29722RJ Rel Min Laurita Vaz j 322004 A dúvida sobre a questão da maioridade do paciente na época do fato deve ser interpretada pelo princípio in dubio pro reo impondose dessa forma o trancamento da ação penal STJ HC 17299RJ Rel Min Vicente Leal j 722002 Constitui documento hábil a atestar a menoridade do paciente quando da prática do delito pelo qual restou condenado cópia da certidão de nascimento autenticada pelo Cartório do Juízo oficiante STJ HC 17338RJ Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 27112001 Emoção e paixão Art 28 Não excluem a imputabilidade penal I a emoção ou a paixão V arts 65 III c e 121 1º do CP Embriaguez II a embriaguez voluntária ou culposa pelo álcool ou substância de efeitos análogos V art 61 II l do CP 1º É isento de pena o agente que por embriaguez completa proveniente de caso fortuito ou força maior era ao tempo da ação ou da omissão inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento V arts 386 V e 411 do CPP V art 45 da Lei n 113432006 2º A pena pode ser reduzida de um a dois terços se o agente por embriaguez proveniente de caso fortuito ou força maior não possuía ao tempo da ação ou da omissão a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento V arts 62 e 63 do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais D O U T R I N A 1 Emoção e paixão definição Emoção é uma viva excitação do sentimento É uma forte e transitória perturbação da afetividade a que estão ligadas certas variações somáticas ou modificações particulares das funções da vida orgânica A paixão é a emoção em estado crônico perdurando como um sentimento profundo e monopolizante amor ódio vingança fanatismo desrespeito avareza ambição ciúme etc 11 Emoção e paixão diferença Emoção e paixão praticamente se confundem embora haja pequena diferença entre ambas e esta se origine naquela A emoção é uma descarga tensional passageira de vida efêmera enquanto a paixão podese afirmar é o estado crônico da emoção que se alonga no tempo representando um estado contínuo e duradouro de perturbação afetiva Em outras palavras a emoção dá e passa enquanto a paixão permanece alimentandose nas suas próprias entranhas 12 Emoção e paixão semelhança É extremamente difícil distinguir com segurança emoção e paixão uma vez que não apresentam diversidades de natureza ou de grau pois esta nasce daquela e assim como há paixões violentas e emoções calmas o inverso também é verdadeiro embora se diga que a emoção é aguda e a paixão é crônica A única diferença que se pode afirmar com certeza é que a emoção é passageira e a paixão é duradoura 13 Emoção e paixão tratamento legal Em nosso Direito positivo a emoção e a paixão não apresentam maiores problemas embora possam reduzir inegavelmente a vis electiva entre o certo e o errado Esses estados emocionais não eliminam a censurabilidade da conduta art 28 I do CP poderão apenas diminuíla com a correspondente redução de pena desde que satisfeitos determinados requisitos legais 2 Requisitos legais necessários Esses requisitos são a provocação injusta da vítima o domínio nos casos da lesão ou do homicídio minorantes ou a influência em caso de qualquer outro crime atenuante desse estado emocional que deve ser violento sob o psiquismo do agente Então além da violência emocional é fundamental que a provocação tenha sido da própria vítima e por meio de um comportamento injusto ou seja não justificado não permitido não autorizado 3 Estados emocionais e doença mental Ressalvados esses casos os estados emocionais ou passionais só poderão servir como modificadores da culpabilidade se forem sintomas de uma doença mental isto é se forem estados emocionais patológicos Mas nessas circunstâncias já não se tratará de emoção ou paixão estritamente falando e pertencerá à anormalidade psíquica cuja origem não importa se tóxica traumática congênita adquirida ou hereditária 4 Trauma emocional e surto psicótico O trauma emocional pode fazer eclodir um surto psicótico e nesse estado pode o agente praticar um delito Mas aí o problema deve ser analisado à luz da inimputabilidade ou da culpabilidade diminuída nos termos do art 26 e seu parágrafo único Por exemplo a extrema agressividade de uma personalidade paranoica que demonstra um desequilíbrio emocional patológico a própria embriaguez pode pela habitualidade levar à eclosão de uma psicose tóxica deixando de ser um problema de embriaguez ou qualquer outra substância tóxica para ser tratada à luz do mesmo dispositivo legal 5 Embriaguez completa e acidental Entre as causas biológicas que podem excluir ou diminuir a responsabilidade penal o Código inclui a embriaguez desde que completa e acidental A embriaguez pode ser definida como a intoxicação aguda e transitória provocada pela ingestão do álcool ou de substância de efeitos análogos Segundo a classificação mais tradicional a embriaguez apresenta três estágios inicial de excitação de depressão letárgico sono profundo ou coma 6 Adoção da actio libera in causa Pelos postulados da actio libera in causa se o dolo não é contemporâneo à ação é pelo menos contemporâneo ao início da série causal de eventos que se encerra com o resultado danoso Como o dolo é coincidente com o primeiro elo da série causal deve o agente responder pelo resultado que produzir Transportando essa concepção para a embriaguez antes de embriagarse o agente deve ser portador de dolo ou culpa não somente em relação à embriaguez mas também em relação ao fato delituoso posterior 61 Inexistência de relação causal decisão de embriagarse Basileu Garcia inconformado com as consequências da embriaguez voluntária ou culposa e com o entendimento sustentado por Hungria afirmava Não percebemos o nexo de causalidade psíquica entre a simples deliberação de ingerir bebida alcoólica e um crime superveniente O agente não pensa em delinquir Nem mesmo admitase supõe que vai embriagarse Entretanto embriagase totalmente e pratica lesões corporais num amigo Pode eventualmente configurar responsabilidade objetiva 62 Actio libera in causa natureza da responsabilidade Ao contrário do que seria na hipótese de actio libera in causa a conduta praticada pelo ébrio segundo o CP será considerada dolosa ou culposa não pela natureza da embriaguez voluntária ou culposa pertencente à fase de imputabilidade real mas segundo o elemento subjetivo do momento em que a ação é praticada Em outros termos isso significa que de uma embriaguez dolosa pode resultar um crime culposo assim como de uma embriaguez culposa pode resultar um crime doloso 63 Vontade do ébrio vontade livre política criminal Considerando a motivação da norma um fator inibitório e objetivando prevenir a embriaguez o legislador brasileiro equiparou a vontade do ébrio à vontade livre e consciente de qualquer agente imputável No entanto nem sempre se pode admitir que seja consequência de actio libera in causa pois Manzini já reconhecia que se a lei admite a imputabilidade a título de dolo para as infrações penais praticadas em estado de embriaguez mesmo quando culposamente adquirido fêlo por motivos de política criminal que nada tem que ver com actio libera in causa 7 Embriaguez não acidental análise casuística Para nós ocorrendo a embriaguez não acidental voluntária ou culposa devese analisar in concreto se o agente nas circunstâncias é capaz de culpabilidade Pelo menos minimizando as consequências práticas o quotidiano tem sido favorável porque os casos de embriaguez que se apresentam nos tribunais raramente para não dizer nunca são de embriaguez completa que produza total supressão do discernimento 8 Formas ou modalidades de embriaguez A embriaguez sob o aspecto subjetivo isto é referente à influência do momento em que o agente se coloca em estado de embriaguez pode apresentarse como a não acidental voluntária intencional ou culposa imprudente b acidental caso fortuito ou força maior c preordenada d habitual eou patológica 9 Embriaguez não acidental voluntária ou culposa Há embriaguez voluntária dolosa quando o agente ingere bebida alcoólica com a intenção de embriagarse Será culposa a embriaguez quando decorrer da ingestão imprudentemente excessiva de bebida alcoólica sem que o agente queira embriagarse O aspecto doloso ou culposo impropriamente falando da embriaguez decorre não do fato praticado sob o estado etílico mas da própria embriaguez intencional ou derivada de imprudência no uso de substância inebriante álcool ou droga O fato de o agente ter querido embriagarse ou ter querido simplesmente beber não altera o grau de sua responsabilidade penal 91 Actio libera in causa necessidade de previsibilidade A actio libera in causa como já referimos fundamenta a punibilidade de ações praticadas em estado de embriaguez não acidental No entanto não abrange aquelas situações em que o agente quer ou imprudentemente se embriaga sem prever ou poder prever a ocorrência de um fato delituoso Nelas o que é livre na causa não é a ação criminosa mas somente a embriaguez Poderá o agente praticar um ilícito penal em estado de embriaguez que era absolutamente imprevisível no momento ou antes da embriaguez Nessa hipótese não vige o princípio da actio libera in causa 92 Actio libera in causa e imprevisibilidade Quando há imprevisibilidade não se pode falar de actio libera in causa diante da impossibilidade de se relacionar esse fato a uma formação de vontade contrária ao direito anterior ao estado de embriaguez isto é quando o agente se encontrava em perfeito estado de discernimento 93 Postura equivocada dos tribunais brasileiros Os tribunais pátrios não têm realizado uma reflexão adequada decidindo quase que mecanicamente se a embriaguez não é acidental punese o agente Se houve ou não previsibilidade do fato no estágio anterior à embriaguez não tem sido objeto de análise É muito fácil o Código diz que a embriaguez voluntária ou culposa não isenta de pena ponto final O moderno Direito Penal há muito está a exigir uma nova e profunda reflexão sobre esse aspecto que os nossos tribunais não têm realizado 10 Embriaguez acidental caso fortuito ou força maior Embriaguez acidental é a proveniente de caso fortuito ou de força maior Caso fortuito ocorre quando o agente ignora a natureza tóxica do que está ingerindo ou não tem condições de prever que determinada substância na quantidade ingerida ou nas circunstâncias em que o faz poderá provocar a embriaguez Força maior é algo que independe do controle ou da vontade do agente Ele sabe o que está acontecendo mas não consegue impedir Exemplo de força maior seria a coação na qual o sujeito é forçado a ingerir uma substância tóxica de qualquer natureza 101 Embriaguez acidental e completa Se a embriaguez acidental for completa acarretará a irresponsabilidade penal Considerase completa a embriaguez no segundo estágio isto é quando os reflexos ficam lentos o pensamento fica confuso a coordenação motora apresenta deficiências a noção de distância fica prejudicada Nessas circunstâncias o agente perde a capacidade de entendimento ou de autodeterminação 102 Embriaguez completa e acidental consequência psíquica Da embriaguez completa e acidental é necessário comprovar que ela provocou efetivamente a consequência psíquica perda da capacidade de discernimento ou de autodeterminação ou de ambos para então isentar de pena 103 Embriaguez acidental e medida de segurança A embriaguez acidental caracterizadora de perturbação meramente transitória como não é doença mental não acarreta a medida de segurança O agente somente receberá a absolvição A reforma penal de 1984 aboliu a medida de segurança inclusive para o ébrio habitual que era consagrada pelo Código Penal de 1940 104 Embriaguez acidental inimputabilidade e redução de pena O art 28 2º prevê em razão de embriaguez acidental havendo diminuição da capacidade psíquica a redução da pena a aplicar Para o reconhecimento da inimputabilidade exige que a embriaguez acidental seja completa art 28 1º enquanto para a imputabilidade diminuída basta a embriaguez acidental art 28 2º 105 Embriaguez acidental raridade As ocorrências de embriaguez acidental são inusitadas raríssimas A possibilidade que se examina normalmente que surge a toda hora é sempre de embriaguez não acidental isto é voluntária ou culposa 11 Embriaguez preordenada Embriaguez preordenada é aquela em que o agente deliberadamente se embriaga para praticar a conduta delituosa liberando seus freios inibitórios e fortalecendo sua coragem Nesta forma de embriaguez apresentase a hipótese de actio libera in causa por excelência O sujeito tem a intenção não apenas de embriagarse mas esta é movida pelo propósito criminoso a embriaguez constitui apenas meio facilitador da execução de um ilícito desejado 12 Embriaguez habitual e patológica A embriaguez habitual não se confunde com a embriaguez crônica ou patológica Quem se apresenta habitualmente embriagado tende ao alcoolismo crônico que se caracteriza por anomalias psíquicas A embriaguez patológica manifestase em pessoas predispostas e assemelhase à verdadeira psicose devendo ser tratada juridicamente como doença mental art 26 e seu parágrafo único 13 Consequências dos diversos tipos de embriaguez A embriaguez pode apresentar as seguintes consequências a acidental isenção de pena quando for completa e proveniente de caso fortuito ou força maior redução de pena nas mesmas circunstâncias quando for incompleta b não acidental punição quando for voluntária ou culposa independentemente de ser completa ou incompleta c preordenada punição com agravação de pena d patológica inimputabilidade ou semiimputabilidade culpabilidade diminuída 14 Caso fortuito e força maior Na hipótese de força maior a punibilidade de um fato típico é afastada diante da impossibilidade de evitarse o resultado danoso embora previsível Na hipótese de caso fortuito o fundamento da impunibilidade reside na imprevisibilidade do resultado embora evitável que é o mínimo exigível para configurar a culpa consciente Enfim a força maior caracterizase pela inevitabilidade embora previsível e o caso fortuito pela imprevisibilidade embora evitável do resultado J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A embriaguez voluntária ou culposa não é causa de exclusão da imputabilidade nos termos do artigo 28 inciso II do Código Penal TJPR Apelação 03301586 Rel Rogério Coelho j 2122008 A tese de que o réu agiu motivado por violenta emoção diante da alegada injustiça que vinha sofrendo por parte do promotor responsável pelo ajuizamento da Ação Civil Pública não retira o dolo de sua conduta TJPR Apelação 04144785 Rel José Laurindo de Souza Netto j 1422008 A intoxicação etílica ou qualquer outra desde que voluntária não exclui a imputabilidade conforme expressamente dispõe o art 28 II do CP em aplicação do princípio da actio libera in causa de boa política criminal sendo certo que referências à exaltação de ânimo ainda que conjugadas à menção ao consumo de bebidas alcoólicas são insuficientes à comprovação do estado de embriaguez para eventual afastamento da capacidade intelectual e volitiva do acusado TJPR Apelação 04301502 Rel Antônio Loyola Vieira j 6122007 Não sendo demonstrado que o acusado foi coagido a ingerir bebida alcoólica a embriaguez voluntária não o exime de responsabilidade penal TJPR Apelação 04265414 Rel Marcus Vinicius de Lacerda Costa j 22112007 Para ensejar a isenção de pena a embriaguez deve ser originária de caso fortuito ou força maior Sendo voluntária não isenta o réu de pena não se cogitando de nulidade por falta de realização de exame toxicológico quando nada é alegado a propósito desta tese defensiva e a questão só é levantada nas alegações finais da defesa Em nenhum momento foi alegada a incapacidade de entendimento do caráter delituoso do fato por ingestão acidental de bebidas e estupefacientes ou de determinarse de acordo com esse entendimento Inteligência do artigo 28 1º do Código Penal TJDF Apelação 20061010056956 Rel George Lopes Leite j 2510 2007 A embriaguez voluntária ou culposa por álcool ou substância de efeitos análogos não exclui a imputabilidade penal nos termos do art 28 inciso II do Código Penal Aplicação da teoria actio libera in causa Mesmo que o agente não tenha consciência da ilicitude da conduta ao tempo da ação ou da omissão sua responsabilidade persiste por ter ação livre na causa A embriaguez ocorreu quando o agente estava em pleno uso e gozo das faculdades mentais seguindose o cometimento do delito TJDF Apelação 20060710258587 Rel George Lopes Leite j 692007 Título IV Do Concurso de Pessoas Art 29 Quem de qualquer modo concorre para o crime incide nas penas a este cominadas na medida de sua culpabilidade V arts 106 I e 117 1º do CP V arts 77 I 189 270 e 580 do CPP V art 40 VI da Lei n 113432006 V art 75 da Lei n 807890 Código de Defesa do Consumidor 1º Se a participação for de menor importância a pena pode ser diminuída de um sexto a um terço 2º Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave serlheá aplicada a pena deste essa pena será aumentada até metade na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave D O U T R I N A 1 Concurso eventual de pessoas O fato punível pode ser obra de uma ou de várias pessoas Frequentemente a ação delituosa é produto da concorrência de várias condutas praticadas por sujeitos distintos Essa reunião de pessoas no cometimento de uma infração penal dá origem ao chamado concursus delinquentium 2 Terminologia do Código Penal O CP de 1940 utilizava a terminologia coautoria para definir o concurso eventual de delinquentes o CP de 1969 utilizou a expressão concurso de agentes Na visão da reforma penal de 1984 no entanto concurso de pessoas é a melhor forma para definir a reunião de pessoas para o cometimento de um crime 3 Teorias sobre o concurso de pessoas Algumas teorias procuram definir o complexo problema da criminalidade coletiva pluralística dualística e monística 31 Pluralística Segundo esta teoria a cada participante corresponde uma conduta própria um elemento psicológico próprio e um resultado igualmente particular À pluralidade de agentes corresponde a pluralidade de crimes Existem tantos crimes quantos forem os participantes do fato delituoso Chegouse a ver na participação um crime distinto especial o crime de concurso 32 Dualística Para esta teoria há dois crimes um para os autores aqueles que realizam a atividade principal a conduta típica emoldurada no ordenamento positivo e outro para os partícipes aqueles que desenvolvem uma atividade secundária que não realizam a conduta nuclear descrita no tipo penal Contudo apesar dessa concepção dupla o crime continua sendo um só e muitas vezes a ação daquele que realiza a atividade típica o executor é menos importante que a do partícipe 33 Monística ou unitária Esta teoria não faz qualquer distinção entre autor e partícipe instigação e cumplicidade Todo aquele que concorre para o crime causao em sua totalidade e por ele responde integralmente Embora o crime seja praticado por diversas pessoas permanece único e indivisível O crime é o resultado da conduta de cada um e de todos indistintamente Essa concepção parte da teoria da equivalência das condições necessárias à produção do resultado Teoria adotada pelo Código Penal Nosso CP de 1940 adotou a teoria monística A reforma penal de 1984 permanece acolhendo a mesma teoria procurou contudo atenuar os seus rigores distinguindo com precisão a punibilidade de autoria e participação Adotou como regra a teoria monística e como exceção a concepção dualista mitigada distinguindo a atuação de autores e partícipes permitindo uma adequada dosagem de pena 4 Requisitos do concurso de pessoas a Pluralidade de participantes e de condutas este é o requisito básico do concurso eventual de pessoas a concorrência de mais de uma pessoa na execução de uma infração penal A participação de cada um e de todos contribui para o desdobramento causal do evento e respondem todos pelo fato típico em razão da norma de extensão do concurso b Relevância causal de cada conduta a conduta típica ou atípica de cada participante deve integrarse à corrente causal determinante do resultado Nem todo comportamento constitui participação pois precisa ter eficácia causal provocando facilitando ou ao menos estimulando a realização da conduta principal c Vínculo subjetivo entre os participantes deve existir também repetindo um liame psicológico entre os vários participantes ou seja consciência de que participam de uma obra comum A ausência desse elemento psicológico desnatura o concurso eventual de pessoas transformandoo em condutas isoladas e autônomas d Identidade de infração penal para que o resultado da ação de vários participantes possa ser atribuído a todos tem que consistir em algo juridicamente unitário Como afirma Damásio não é propriamente um requisito mas consequência jurídica diante das outras condições Respondem todos por um único tipo penal ou não se reconhece a participação ou o próprio concurso na empresa criminosa Mera conivência atipicidade O simples conhecimento da realização de uma infração penal ou mesmo a concordância psicológica caracterizam no máximo conivência que não é punível a título de participação se não constituir pelo menos alguma forma de contribuição causal ou então constituir por si mesma uma infração típica Tampouco será partícipe quem tendo ciência da realização de um delito não o denuncia às autoridades salvo se tiver o dever jurídico de fazêlo 5 Autoria O conceito de autoria não se limita a quem pratica pessoal e diretamente a figura delituosa mas abrange também quem se serve de outrem como instrumento autoria mediata É possível igualmente que mais de uma pessoa pratique a mesma infração penal ignorando que colabora na ação de outrem autoria colateral ou então consciente e voluntariamente coopere na ação de outrem quer praticando atos de execução coautoria quer instigando induzindo ou auxiliando participação na realização de uma conduta punível Várias teorias procuram definir o conceito do autor 51 Conceito restritivo de autor Autor é aquele que realiza a conduta típica descrita na lei isto é o que pratica o verbo núcleo do tipo mata subtrai falsifica etc Para esta teoria ao contrário do conceito extensivo de autor nem todo aquele que interpõe uma causa realiza o tipo penal pois causação não é igual à realização do delito As espécies de participação instigação e cumplicidade serão nesta acepção causas de extensão da punibilidade visto que por não integrarem a figura típica constituiriam comportamentos impuníveis Complementos do conceito restritivo de autor Este conceito é complementado pela teoria objetiva da participação que se apresenta sob dois aspectos a Teoria objetivo formal esta teoria atémse à literalidade da descrição legal e define como autor aquele cujo comportamento se amolda ao círculo abrangido pela descrição típica e como partícipe aquele que produz qualquer outra contribuição causal ao fato b teoria objetivomaterial a teoria objetivomaterial procurou suprir os defeitos da formal objetiva considerando a maior perigosidade que deve caracterizar a contribuição do autor em comparação com a do partícipe em outras palavras considerando a maior importância objetiva da contribuição do autor em relação à contribuição do partícipe 52 Conceito extensivo de autor Para esta teoria é autor todo aquele que contribui com alguma causa para o resultado Para ela instigador e cúmplice são igualmente autores já que não distingue a importância da contribuição causal de uns e outros Porém não se pode ignorar existem preceitos especiais sobre a participação deixando claro que esta deve ser tratada diferentemente da autoria Assim para esta teoria o tratamento diferenciado a cúmplice e instigador constitui causas de restrição ou limitação da punibilidade Complemento do conceito extensivo de autor A teoria extensiva de autor vem unida à teoria subjetiva da participação que seria um complemento necessário daquela Segundo esta teoria é autor quem realiza uma contribuição causal ao fato seja qual for seu conteúdo com vontade de autor enquanto é partícipe quem ao fazêlo possui unicamente vontade de partícipe O autor quer o fato como próprio age com o animus auctoris o partícipe quer o fato como alheio age com animus socii 53 Teoria do domínio do fato A teoria do domínio do fato partindo do conceito restritivo de autor tem a pretensão de sintetizar os aspectos objetivos e subjetivos impondose como teoria objetivosubjetiva Embora o domínio do fato suponha um controle final aspecto subjetivo não requer somente a finalidade mas também uma posição objetiva que determine o efetivo domínio do fato Autor segundo esta teoria é quem tem o poder de decisão sobre a realização do fato É não só o que executa a ação típica como também aquele que se utiliza de outrem como instrumento para a execução da infração penal autoria mediata Consequências da teoria do domínio do fato A teoria do domínio do fato tem as seguintes consequências 1ª a realização pessoal e plenamente responsável de todos os elementos do tipo fundamentam sempre a autoria 2ª é autor quem executa o fato utilizando outrem como instrumento autoria mediata 3ª é autor o coautor que realiza uma parte necessária do plano global domínio funcional do fato embora não seja um ato típico desde que integre a resolução delitiva comum Âmbito de aplicação da teoria do domínio do fato O âmbito de aplicação da teoria do domínio do fato com seu conceito restritivo de autor limitase aos delitos dolosos Somente nestes se pode falar em domínio final do fato típico pois os delitos culposos caracterizamse exatamente pela perda desse domínio A doutrina alemã trabalha com dois conceitos distintos de autor nos delitos dolosos utiliza o conceito restritivo de autor fundamentado na teoria do domínio do fato e nos delitos culposos utiliza um conceito unitário de autor que não distingue autoria e participação 6 Autoria mediata É autor mediato quem realiza o tipo penal servindose para a execução da ação típica de outra pessoa como instrumento A teoria do domínio do fato molda com perfeição a possibilidade da figura do autor mediato Todo o processo de realização da figura típica segundo esta teoria deve apresentarse como obra da vontade reitora do homem de trás o qual deve ter absoluto controle sobre o executor do fato O autor mediato realiza a ação típica por intermédio de outrem que atua sem culpabilidade 61 Autoria mediata e domínio do fato Modernamente se defende a prioridade da autoria mediata diante da participação em sentido estrito Em muitos casos se impõe a autoria mediata mesmo quando fosse possível sob o ponto de vista da acessoriedade limitada admitir a participação caso do executor inculpável desde que o homem de trás detenha o domínio do fato Nessas circunstâncias o decisivo para distinguir a natureza da responsabilidade do homem de trás reside no domínio do fato 62 Algumas hipóteses de autoria mediata As hipóteses mais comuns de autoria mediata decorrem do erro da coação irresistível e do uso de inimputáveis para a prática de crimes o que não impede a possibilidade de sua ocorrência em ações justificadas do executor quando por exemplo o agente provoca deliberadamente uma situação de exclusão de criminalidade para aquele como já referimos neste trabalho 63 Pressupostos de punibilidade Os pressupostos necessários de punibilidade devem encontrarse na pessoa do homem de trás no autor mediato e não no executor autor imediato Com base nesse argumento alguns autores admitem em princípio a possibilidade de autoria mediata nos crimes especiais ou próprios desde que o autor mediato reúna as qualidades ou condições exigidas pelo tipo Já nos crimes de mão própria será impossível a figura do autor mediato Além desses casos especiais a autoria mediata encontra seus limites quando o executor realiza uma conduta conscientemente dolosa 7 Coautoria Coautoria é a realização conjunta por mais de uma pessoa de uma mesma infração penal Coautoria é em última análise a própria autoria É desnecessário um acordo prévio como exigia a antiga doutrina bastando a consciência de cooperar na ação comum É a atuação consciente de estar contribuindo na realização comum de uma infração penal Essa consciência constitui o liame psicológico que une a ação de todos dando o caráter de crime único Todos participam da realização do comportamento típico sendo desnecessário que todos pratiquem o mesmo ato executivo 71 Fundamento da coautoria A coautoria fundamentase no princípio da divisão de trabalho em que todos tomam parte atuando em conjunto na execução da ação típica de tal modo que cada um possa ser chamado verdadeiramente autor É o que pode ocorrer especialmente naqueles crimes que Beling chamou de crimes de ação dupla como por exemplo no crime de estupro enquanto um dos agentes segura a vítima o outro a possui sexualmente 72 Inexistência de relação de acessoriedade Na coautoria não há relação de acessoriedade mas a imediata imputação recíproca visto que cada um desempenha uma função fundamental na consecução do objetivo comum O decisivo na coautoria segundo a visão finalista é que o domínio do fato pertença aos vários intervenientes que em razão do princípio da divisão de trabalho se apresentam como peça essencial na realização do plano global 8 Participação em sentido estrito Participação em sentido estrito como espécie do gênero concurso de pessoas é a intervenção em um fato alheio o que pressupõe a existência de um autor principal O partícipe não pratica a conduta descrita pelo preceito primário da norma penal mas realiza uma atividade secundária que contribui estimula ou favorece a execução da conduta proibida Não realiza atividade propriamente executiva 81 Ampliação da punibilidade A norma que determina a punição do partícipe implica uma ampliação da punibilidade de comportamentos que de outro modo seriam impunes pois as prescrições da Parte Especial do Código não abrangem o comportamento do partícipe Bettiol insiste que o critério distintivo entre autor e partícipe deve apoiarse na tipicidade sendo que a tipicidade da conduta do partícipe decorre da norma referente à participação enquanto a tipicidade da conduta do autor decorre da norma principal incriminadora 82 Natureza secundária da participação Do exame do fundamento da punibilidade do partícipe se chega à conclusão natural de que a participação é uma atividade secundária que adere a outra principal A participação só adquire relevância jurídica quando estiver unida a um fato principal A participação somente se reveste de tipicidade por meio da norma de extensão reguladora da codelinquência 83 Espécies de participação a Instigação ocorre a instigação quando o partícipe atua sobre a vontade do autor no caso do instigado Instigar significa animar estimular reforçar uma ideia existente O instigador limitase a provocar a resolução criminosa do autor não tomando parte nem na execução nem no domínio do fato b induzimento induzir significa suscitar uma ideia tomar a iniciativa intelectual fazer surgir no pensamento do autor uma ideia até então inexistente Essa forma de instigação os autores têm denominado determinação que nós preferimos chamar de induzimento c cumplicidade esta é a participação material em que o partícipe exterioriza a sua contribuição por meio de um comportamento de um auxílio Pode efetivarse por exemplo mediante o empréstimo da arma do crime de um veículo para deslocarse com mais facilidade de uma propriedade etc 84 Requisitos da participação em sentido estrito São necessários dois requisitos eficácia causal e consciência de participar na ação de outrem É insuficiente a exteriorização da vontade de participar Não basta realizar a atividade de partícipe se esta não influir na atividade final do autor Não tem relevância a participação se o crime não for pelo menos tentado Por outro lado é indispensável saber que coopera na ação delitiva de outrem mesmo que o autor desconheça ou até recuse a cooperação O partícipe precisa ter consciência de participar na ação principal e no resultado 85 Fundamento da punibilidade da participação a Teoria da participação na culpabilidade segundo esta teoria o partícipe é punido pela gravidade da influência que exerce sobre o autor convertendoo em delinquente ou no mínimo contribuindo para tanto Para esta teoria o partícipe age corrompendo o autor conduzindoo a um conflito com a sociedade tornandoo culpável e merecedor de pena b Teoria do favorecimento ou da causação o fundamento da punição do partícipe para esta teoria reside no fato de ter favorecido ou induzido o autor a praticar um fato socialmente intolerável consequentemente típico e antijurídico O agente é punível não porque colaborou na ação de outrem mas porque com a sua ação ou omissão contribuiu para que o crime fosse cometido É indiferente que o autor aja ou não culpavelmente Para esta teoria a vontade do partícipe deve dirigirse à execução do fato principal 86 Princípio da acessoriedade da participação a Teoria da acessoriedade extrema até 1943 vigorou na Alemanha esta teoria para a qual o comportamento principal deveria ser típico antijurídico e culpável excetuandose apenas as circunstâncias agravantes e atenuantes da pena Por esta teoria se o autor fosse inimputável ou incidisse em erro de proibição ou por qualquer razão fosse inculpável o partícipe seria impunível Assim a acessoriedade da participação seria absoluta estaria condicionada à punibilidade da ação principal b Teoria da acessoriedade mínima para esta teoria é suficiente que a ação principal seja típica sendo indiferente a sua juridicidade Isso equivale a afirmar que uma ação justificada para o autor constitui crime para o partícipe Em outros termos aquele que induzir o autor a agir em legítima defesa responderá pelo crime enquanto o executor autor direto será absolvido pela excludente de antijuridicidade c Teoria da acessoriedade limitada esta teoria exige que a conduta principal seja típica e antijurídica Isso quer dizer que a participação é acessória da ação principal de um lado mas que também depende desta até certo ponto Não é necessário que o autor seja culpável É suficiente que sua ação seja antijurídica isto é contrária ao direito sem necessidade de ser culpável O fato é comum mas a culpabilidade é individual 87 Provocação de aparente excludente Pode ocorrer o que os autores têm denominado provocação de uma situação de legítima defesa em que o instigador induz um terceiro a agredir outrem que sabe estar armado Este reage em legítima defesa e mata o agressor induzido que o instigador queria eliminar Pela teoria da acessoriedade limitada o instigador não pode ser punido como partícipe em razão de o fato principal estar justificado para o executor Solução adotada pela doutrina alemã A solução recomendada pelos alemães é a punição do instigador como autor mediato da ação justificada do autor direto Isso ocorreria porque o instigador teria o domínio final do fato apenas se utilizando dos participantes diretos do conflito como instrumentos de realização da sua vontade criminosa 9 Concurso em crime culposo 91 Doutrina alemã A doutrina alemã não admite a possibilidade de coautoria nos delitos culposos entendendo que qualquer contribuição na causa produtora do resultado não querido caracteriza em si a autoria Essa concepção germânica decorre da adoção da teoria do domínio do fato visto que nos crimes culposos esse domínio não existe Já em relação à participação em sentido estrito instigação e cumplicidade o Código Penal alemão determina expressamente que ela só é possível na forma dolosa 26 e 27 92 Doutrina espanhola Em sentido diametralmente oposto a doutrina espanhola não só admite a coautoria nos crimes culposos como também a participação em sentido estrito O comum acordo impossível quanto ao resultado é perfeitamente admissível na conduta imprudente que de regra é voluntária Um dos grandes argumentos dos espanhóis é que a participação além de permitir melhor graduação da responsabilidade penal mantém o princípio da acessoriedade Assim por exemplo aquele que induz outrem a uma atividade perigosa para si não será castigado se ocorrer um acidente com lesão ou morte Sua cooperação esbarraria na atipicidade da conduta de matarse ou de autolesionarse 93 Doutrina brasileira A doutrina brasileira admite a coautoria em crime culposo rechaçando contudo a participação Pode existir na verdade um vínculo subjetivo na realização da conduta que é voluntária inexistindo contudo tal vínculo em relação ao resultado que não é desejado Os que cooperam na causa isto é na falta do dever de cuidado objetivo agindo sem a atenção devida são coautores Assim no exemplo do passageiro que induz o motorista de táxi a dirigir em velocidade excessiva e contribui diretamente para um atropelamento que para os alemães seria autor e para os espanhóis seria simples partícipe para a doutrina brasileira seria coautor 94 A melhor doutrina espanhola Sem dúvida dogmaticamente falando a melhor e mais correta é a doutrina espanhola na medida em que não há nenhuma razão técnico científica para impedir a configuração tanto da autoria quanto da participação em sentido estrito 10 Concurso em crimes omissivos 101 Participação em crime omissivo e participação por omissão Não se pode confundir participação em crime omissivo com participação por omissão em crime comissivo A participação no crime omissivo ocorre normalmente por meio de um agir positivo do partícipe que favorece o autor a descumprir o comando legal tipificador do crime omissivo O paciente que instiga o médico a não comunicar a existência de uma enfermidade contagiosa às autoridades sanitárias não é autor de delito autônomo mas partícipe de um crime omissivo Já o caixa que deixa o cofre aberto para facilitar o furto é partícipe com sua ação omissiva de um crime comissivo Coautoria em crime omissivo possibilidade Se o agente estiver igualmente obrigado a agir não será partícipe mas autor ou como pensamos ser possível coautor desde que haja a consciência de anuir à omissão de outrem Esse vínculo subjetivo caracterizador da unidade delitual tem o mesmo efeito tanto na ação ativa quanto na passiva Assim como o comando é comum nos crimes omissivos a proibição da conduta criminosa é igualmente comum nos crimes comissivos o que nem por isso impede a coautoria Autoria e coautoria em crime omissivo distinção Se duas pessoas deixarem de prestar socorro a uma pessoa gravemente ferida podendo fazêlo sem risco pessoal praticarão individualmente o crime autônomo de omissão de socorro Agora se essas duas pessoas de comum acordo deixarem de prestar socorro nas mesmas circunstâncias serão coautoras do crime de omissão de socorro O princípio é o mesmo dos crimes comissivos houve consciência e vontade de realizar um empreendimento comum ou melhor no caso de não realizálo conjuntamente Participação em crimes omissivos impróprios possibilidade A participação também pode ocorrer nos chamados crimes omissivos impróprios comissivos por omissão mesmo que o partícipe não tenha o dever jurídico de não se omitir Claro se tiver tal dever será igualmente autor ou coautor se houver a resolução conjunta de se omitir É perfeitamente possível que um terceiro que não está obrigado ao comando da norma instigue o garante a não impedir o resultado Qual seria a natureza da responsabilidade desse instigador Autor do crime consumado Claro que não A sua atividade acessória secundária contribuiu moralmente para a resolução criminosa do garante que é autor 11 Autoria colateral Há autoria colateral quando duas ou mais pessoas ignorando uma a contribuição da outra realizam condutas convergentes objetivando a execução da mesma infração penal É o agir conjunto de vários agentes sem reciprocidade consensual no empreendimento criminoso que identifica a autoria colateral A ausência do vínculo subjetivo entre os intervenientes é o elemento caracterizador da autoria colateral 111 Limites subjetivos da responsabilidade Na coautoria será indiferente saber quem disparou o tiro fatal pois ambos responderão pelo delito consumado Já na autoria colateral é indispensável saber quem produziu o quê Imaginese que dois disparem mas o tiro de um apenas foi o causador da morte da vítima sendo que o do outro a atingiu superficialmente O que matou responde pelo homicídio e o outro responderá por tentativa Se houvesse o liame subjetivo ambos responderiam pelo homicídio em coautoria 112 Autoria incerta e autoria desconhecida A autoria incerta não se confunde com autoria desconhecida ou ignorada Nesta desconhecese quem praticou a ação na autoria incerta sabese quem a executou mas se ignora quem produziu o resultado A autoria incerta que pode decorrer da autoria colateral ficou sem solução em nosso CP A sugestão na impossibilidade de definir o causador do resultado será condenar os autores por tentativa abstraindose o resultado cuja autoria é desconhecida 12 Multidão delinquente Essa forma sui generis de concurso de pessoas pode assumir proporções consideravelmente graves pela facilidade de manipulação de massas que em momentos de grandes excitações anulam ou reduzem consideravelmente a capacidade de orientarse segundo padrões éticos morais e sociais A prática coletiva de delito nessas circunstâncias apesar de ocorrer em situação normalmente traumática não afasta a existência de vínculos psicológicos entre os integrantes da multidão caracterizadores do concurso de pessoas 121 Individualização da conduta Nos crimes praticados por multidão delinquente é desnecessário que se descreva minuciosamente a participação de cada um dos intervenientes sob pena de inviabilizar a aplicação da lei A maior ou menor participação de cada um será objeto da instrução criminal 122 Influência de multidão em tumulto atenuante Quem praticar o crime sob a influência de multidão em tumulto poderá ter sua pena atenuada art 65 e do CP Por outro lado terão a pena agravada os que promoverem organizarem ou liderarem a prática criminosa ou dirigirem a atividade dos demais art 62 I do CP 13 Punibilidade do concurso de pessoas A reforma penal mantém a teoria monística Adota porém a teoria restritiva de autor fazendo perfeita distinção entre autor e partícipe que abstratamente incorrem na mesma pena cominada ao crime que praticarem Esta concretamente variará segundo a culpabilidade de cada participante E em relação ao partícipe variará ainda de acordo com a importância causal da sua contribuição Punibilidade do coautor e do partícipe A rigor para punir o coautor que intervém materialmente na execução do crime o art 29 do CP seria desnecessário uma vez que a tipicidade de sua conduta decorre da norma incriminadora violada Contudo esse dispositivo é indispensável para a punibilidade do partícipe cuja tipicidade se fundamenta nessa norma de extensão 131 Participação de menor importância A participação aqui referida diz respeito exclusivamente ao partícipe e não ao coautor Ainda que a participação do coautor tenha sido pequena terá ele contribuído diretamente na execução propriamente do crime A sua culpabilidade naturalmente superior à de um simples partícipe será avaliada nos termos do art 29 caput do Código Penal e a pena a ser fixada obedecerá aos limites abstratos previstos pelo tipo penal infringido Já o partícipe que houver tido participação de menor importância poderá ter sua pena reduzida de um sexto a um terço podendo ficar aquém do limite mínimo cominado nos termos do art 29 1º Obrigatoriedade da redução direito subjetivo Alguns doutrinadores entendem que a redução prevista no art 29 1º é facultativa A equivalência na determinação poderia segundo afirmam autorizar a equiparação no plano da culpabilidade No entanto a faculdade resumese ao grau de redução entre um sexto e um terço da pena Reconhecida a participação de menor importância a redução se impõe Será porém facultado ao juiz reduzila em maior ou menor grau se constatar maior ou menor intensidade volitiva do partícipe se constatar maior ou menor culpabilidade deste 132 Cooperação dolosamente distinta Ocorre quando a conduta executada difere daquela idealizada a que aderira o partícipe isto é o conteúdo do elemento subjetivo do partícipe é diferente do crime praticado pelo autor Por exemplo A determina a B que dê uma surra em C Por razões pessoais B mata C excedendose na execução do mandado Pela lei anterior os dois responderiam pelo delito de homicídio podendo o partícipe beneficiarse com uma causa de diminuição de pena art 48 parágrafo único Limites da responsabilidade subjetiva dolo de cada um A solução dada pela reforma leva à punição de A no exemplo supracitado pelo delito de lesões corporais que foi o crime desejado cuja pena será elevada até a metade se o homicídio for previsível A regra da disposição em exame pretende ter aplicação a todos os casos em que o partícipe quis cooperar na realização de delito menos grave O concorrente deverá responder de acordo com o que quis segundo o seu dolo e não de acordo com o dolo do autor Crimes preterdolosos resultado paradoxal Pela disposição da Parte Especial o autor que querendo produzir lesões corporais acaba causando a morte mesmo não a desejando responde pelo delito de lesões corporais seguidas de morte O partícipe nas mesmas circunstâncias segundo a norma em exame responderá pelo delito de lesões corporais Se o crime mais grave for previsível sua pena será aumentada até a metade Um verdadeiro contrassenso o autor ou coautor receberia uma pena mínima de quatro anos e o partícipe três meses de detenção que poderá ser elevada até quatro e meio Solução excesso nos meios e excesso no fim Há excesso nos meios quando o executor emprega meios diferentes dos que foram combinados com o partícipe Nessa hipótese a responsabilidade pelo resultado mais grave é exclusiva do autor do excesso E por outro lado há excesso no fim quando embora os meios empregados sejam aqueles queridos por todos o resultado produzido é mais grave do que o previsto Devese fazer ainda a seguinte distinção se o resultado mais grave decorre como consequência natural do fato ou por simples culpa do executor a responsabilidade se comunica ao partícipe pois embora o partícipe não tenha previsto nem querido aquele resultado mais grave quis também dolosamente os meios utilizados que por sua natureza produziram o resultado mais grave Agora evidentemente se o excesso decorre de dolo especial do executor somente este será o responsável pelo resultado mais grave J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A participação de menor importância causa redutora da reprimenda somente tem aplicação quando efetivamente evidenciada a contribuição insignificante ou mínima do partícipe na realização do intento delituoso TJMG Apelação 1070205213709 90011 Rel Pedro Vergara j 1222008 Em sede de concurso de pessoas adota o art 29 do CP a teoria monística de modo que todos que concorrem para o crime por ele respondem acarretando os efeitos de unitariedade e de indivisibilidade do ilícito já que o resultado final é obtido através do somatório das condutas de cada um dos agentes TJPR Apelação 04432115 Rel Carlos Hoffmann j 2412008 Se a contribuição dada pelo agente é de natureza tal que sem ela o delito não poderia ter sido cometido segundo a teoria do domínio funcional do fato tratase de coautoria e não mera participação Somente se aplica a redutora por participação de menor importância ao partícipe nunca ao coautor TJPR Apelação 03951104 Rel José Carlos Dalacqua j 29112007 Mesmo que o codenunciado não tenha desferido qualquer tiro na vítima como instigou e incentivou o seu irmão a atirar na sua cabeça pode estar caracterizado o concurso de agentes Nos termos do art 29 caput do Código Penal aquele que de qualquer maneira concorre para a prática da infração deve incidir na pena a ela cominada na medida de sua culpabilidade Na fase de pronúncia existindo prova da existência do fato e dos suficientes indícios de autoria devem os acusados ser submetidos ao Conselho de Sentença pois vigora o princípio do in dubio pro societate TJRS RESE 70021283163 Rel Marco Antônio Ribeiro de Oliveira j 21 112007 Havendo o liame subjetivo entre os agentes divisão de tarefas pluralidade de condutas e relevância das ações sabendo cada qual o que deveria fazer e o que sua comparsa faria ocorre a coautoria e não a participação de menor importância TJDF Apelação 20040910106882 Rel Edson Alfredo Smaniotto j 1392007 Coautoria A coautoria não exige atos de execução material como o disparo de tiros Identificase pela efetiva cooperação do agente na prática delituosa pela unidade de propósitos vinculando os coautores das diversas ações dirigidas ao resultado final desejado ou mesmo assumido com dolo eventual RT 663320 TAPR Apelação 2551939 Rel Rogério Kanayama j 362004 DJ 682004 Estando o agente no cenário do latrocínio a ele adere conscientemente pouco importando se a morte da vítima foi causada por um dos comparsas pois havia previsibilidade do resultado em virtude da utilização de arma de fogo na prática do delito RT 776576 Responde pelo crime de latrocínio em coautoria o agente que embora não tenha efetuado o disparo contra vítima contribuiu para a realização do delito vínculo subjetivo assumindo assim o risco do resultado morte TJSP RT 667272 Para a admissão da participação de menor importância é imprescindível que não paire dúvida de que o agir do acusado não tenha influenciado no êxito do desiderato Se restar indicado que o acusado atuou de forma direta e ativa na empreitada criminosa há coautoria TACRSP RT 797611 TJPR Apelação 04040319 Rel Eduardo Fagundes j 2862007 Configurandose decisiva a atuação do réu para o êxito da empreitada delituosa não há falar em participação mas sim em coautoria e a participação de menor importância não se aplica ao agente que realiza uma parte necessária do plano global domínio funcional do fato embora a sua ação não evidencie por si só um ato típico desde que integre a resolução delitiva comum TJMG Apelação 104600501760780011 Rel Hélcio Valentim j 1742007 Responde pelo crime de latrocínio em coautoria o agente que embora não tenha efetuado o disparo contra a vítima contribuiu para a realização do delito vínculo subjetivo assumindo assim o risco do resultado morte TJPR Revisão Criminal 03054284 Rel Lauro Augusto Fabrício de Melo j 1º32007 Não pode ser considerado um mero partícipe aquele que influencia decisivamente para o êxito da empreitada criminosa divisão de tarefas evidenciada coautoria caracterizada teoria monista todo aquele que concorre para o crime causao em sua totalidade e por ele responde integralmente TJPR Apelação 03780749 Rel Antônio Martelozzo j 1112007 Na hipótese de concurso de agentes não há que se falar em inépcia da denúncia por falta de individualização pormenorizada das ações de cada um se a imputatio facti permite o exercício da ampla defesa Precedentes do STF e do STJ STJ HC 56811RJ Rel Min Félix Fischer j 10102006 A extensão dos efeitos da decisão ocorrerá sempre que a solução da questão penal tiver de ser uniforme para todos os envolvidos Implica em grave ilegalidade o processamento do partícipe acusado de conduzir o autor principal até o local do crime e de lhe emprestar a arma quando o próprio executor do delito no mesmo processo é absolvido mediante decisão irrecorrível Extensão que deveria ter sido proclamada quando do julgamento da apelação criminal TJMG Apelação 100000643248410001 Rel Paulo Cezar Dias j 252006 O acusado que na divisão de trabalho tinha o domínio funcional do fato a saber fuga do local do crime é coautor e não mero partícipe pois seu papel era previamente definido importante e necessário para a realização da infração penal A sentença penal condenatória no caso de concurso de agentes deve guardar estrita consonância com as condutas de cada agente particularizadas na denúncia STJ HC 30503SP Rel Min Paulo Medina j 18102005 Na hipótese de concurso de agentes no crime de roubo com resultado morte o coautor que não efetuou o disparo de arma de fogo causador da morte da vítima também responde pelo delito de latrocínio consubstanciado no art 157 3º do Código Penal A vontade de participar de crime menos grave em regra é excepcional reclamando prova efetiva por parte de quem alega que há de ser examinada e cotejada com todos os elementos do conjunto da prova STJ HC 31169SP Rel Min Hamilton Carvalhido j 16122004 Não pode prosperar a desclassificação para crime menos grave lesão corporal pela hipótese do art 29 2º do CPB se restou demonstrado que o agente sabia da intenção homicida do corréu emprestoulhe a arma do crime e auxiliou a condução da vítima ao local dos fatos TJMG Apelação 105250100211740011 Rel Edelberto Santiago j 14122004 O Código Penal é o código das pessoas maiores de idade Por isso entende o Relator a qualificadora do concurso de duas ou mais pessoas pressupõe nos crimes de furto e roubo por exemplo concurso de pessoas imputáveis Não é portanto qualificado o furto praticado por pessoa imputável e pessoa inimputável menor de 18 anos STJ HC 38097SP Rel Min Nilson Naves j 23112004 Para a caracterização da majorante do concurso de pessoas é imprescindível que os agentes tenham consciência de que participam de uma obra comum liame psicológico Não é necessário que o acordo de vontades seja prévio bastando que o pacto exista TJMG Apelação 200000042766770001 Rel Alexandre Victor de Carvalho j 3182004 O conceito de participação por força da teoria unitária não impõe que o agente necessariamente atue em todos os atos da execução bastando que concorra de qualquer modo para a sua realização ainda que não realize a conduta descrita no preceito primário do tipo penal violado mas atua ou decisivamente contribui para a consecução do crime desta forma preenchendo os requisitos do concurso de pessoas pela pluralidade de condutas com relevância causal de cada uma sobressaindo um liame subjetivo evidente como a identidade de infração para todos TJRJ Apelação 200305001990 Rel Paulo Ventura j 2742004 Não há que se falar em participação de menor importância mas de coautoria se o acervo probatório indica que o agente dividiu com outrem as tarefas de espoliar os bens das vítimas ainda que para a execução do crime a sua tarefa tenha sido de recolher o numerário enquanto o outro comparsa ameaçava as vítimas apontando lhes uma arma de fogo evidenciando pois a atuação conjunta dos dois vinculados física e psicologicamente para o evento ilícito TJMG Apelação 2000000399163 10001 Rel Antônio Armando dos Anjos j 1062003 Coautoria Participação Advogado que instrui testemunha a prestar depoimento inverídico nos autos de reclamação trabalhista Conduta que contribuiu moralmente para o crime fazendo nascer no agente a vontade delitiva Art 29 do CP Possibilidade de coautoria STF HC 81327SP Rel Min Ellen Gracie j 1112 2001 Participação de menor importância Reconhecimento Agente que não pratica nenhum ato de execução do delito não havendo provas de que haja participado da partilha do dinheiro subtraído Recurso parcialmente provido A participação de menor importância regulada pelo art 29 1º do CP é aquela que embora inserida no encadeamento causal demonstrase dispensável pois a infração penal teria ocorrido de outra forma TJMG Apelação 100000023188220001 Rel Sérgio Resende j 1392001 Não é possível cindir a conduta de coautores para imputar a um a prática de crime na modalidade tentada e a outro na modalidade consumada pelo simples fato de um haver sido preso em flagrante enquanto o outro evadiuse levando consigo parte da res furtiva eis que o legislador pátrio adotou no tocante a coautoria a teoria unitária monista segundo a qual só se pode atribuir para todos os coautores o mesmo crime TJDF Apelação 20000410033802 Rel Carmelita Brasil j 832001 Circunstâncias incomunicáveis Art 30 Não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal salvo quando elementares do crime V art 20 3º do CP D O U T R I N A 1 Comunicabilidade das circunstâncias condições e elementares A comunicabilidade ou incomunicabilidade das circunstâncias que envolvem autor e crime têm sido um dos mais tormentosos problemas da responsabilidade penal A reforma de 1984 pode ter ampliado esse conflito ao incluir as condições de caráter pessoal distinguindoas das circunstâncias 2 Circunstâncias objetivas e subjetivas Circunstâncias são dados fatos elementos ou peculiaridades que apenas circundam o fato principal Não integram a figura típica podendo contribuir contudo para aumentar ou diminuir a sua gravidade As circunstâncias podem ser objetivas ou subjetivas Objetivas são as que dizem respeito ao fato objetivamente considerado à qualidade e condições da vítima ao tempo lugar modo e meios de execução do crime E subjetivas são as que se referem ao agente às suas qualidades estado parentesco motivos do crime etc 3 Condições de caráter pessoal Condições de caráter pessoal são as relações do agente com o mundo exterior com outros seres com estado de pessoa de parentesco etc Elementares do crime são dados fatos elementos e condições que integram determinadas figuras típicas Certas peculiaridades que normalmente constituiriam circunstâncias ou condições podem transformarse em elementos do tipo penal e nesses casos deixam de circundar simplesmente o injusto típico para integrálo 4 Comunicabilidade das elementares O art 30 do Código Penal determina que as circunstâncias e as condições de caráter pessoal não se comunicam salvo quando elementares do crime Por serem pessoais dizem respeito exclusivamente ao agente que as tem como atributo Cada agente responderá de acordo com suas circunstâncias e condições pessoais Comunicabilidade de circunstâncias objetivas Ao determinar que as circunstâncias e as condições de caráter pessoal não se comunicam a contrario sensu determina que as de caráter objetivo se comunicam desde que conhecidas do agente quando desconhecidas há erro de tipo 5 Síntese da comunicabilidade e incomunicabilidade a As circunstâncias e condições de caráter pessoal não se comunicam entre coautores e partícipes por expressa determinação legal b As circunstâncias objetivas e as elementares do tipo sejam elas objetivas ou subjetivas só se comunicam se entram na esfera de conhecimento dos participantes 6 Comunicabilidade nos limites da culpabilidade A comunicabilidade das circunstâncias objetivas e das elementares do crime deve ser examinada nos termos do art 29 caput na medida da culpabilidade de cada participante É imperioso que o participante tenha agido ao menos culposamente em relação à circunstância objetiva ou em relação à elementar do crime para que possa haver comunicabilidade J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Havendo concurso de pessoas basta que um dos agentes utilize a arma circunstância objetiva para que a qualificadora se estenda a todos os demais STJ REsp 877299PE Rel Min Gilson Dipp j 2252007 Sendo o exercício de atividade comercial circunstância elementar do tipo da receptação qualificada tal circunstância apesar de ser de caráter pessoal comunica se a todos os réus nos termos do art 30 do Código Penal STJ REsp 738550ES Rel Min Gilson Dipp j 14112006 A qualificadora da utilização de recurso que impossibilitou a defesa da vítima diz respeito ao modo de execução do tipo penal sendo portanto circunstância de caráter objetivo a qual somente se comunica aos corréus caso esteja inserida na esfera de seu conhecimento STJ HC 47398PE Rel Min Gilson Dipp j 1312 2005 No homicídio do tipo mercenário a qualificadora relativa ao cometimento do delito mediante paga ou promessa de recompensa é uma circunstância de caráter pessoal não passível portanto de comunicação aos coautores ou partícipes por força do art 30 do Código Penal Precedente As qualificadoras objetivas não se enquadram nas circunstâncias incomunicáveis devendo por isso ser estendidas aos participantes do delito STJ RHC 14900SC Rel Min Jorge Scartezzini j 176 2004 Em se tratando de elementar do crime de peculato é perfeitamente admissível segundo o texto do art 30 do Código Penal a comunicação da circunstância da função pública aos coautores e partícipes do crime inclusive quanto àquele estranho ao serviço público STJ HC 30832PB Rel Min Laurita Vaz j 1832004 As circunstâncias subjetivas ou de caráter pessoal são aquelas referentes à pessoa do agente e sua relação com a vítima ou eventuais concorrentes para a prática delitiva Desde que não configurem elementares do tipo penal não se comunicam entre os participantes do crime O motivo fútil configura circunstância de caráter pessoal não se comunicando entre os participantes do delito Precedentes STJ HC 23529MG Rel Min Gilson Dipp j 2052003 Extensão de benefício Circunstâncias pessoais desiguais Recurso improvido A extensão de benefício nos próprios termos do art 580 do Código de Processo Penal só é cabível quando a decisão anterior se fundar em motivos que não sejam de caráter exclusivamente pessoal STJ RHC 12869MG Rel Min Hamilton Carvalhido j 12112002 Casos de impunibilidade Art 31 O ajuste a determinação ou instigação e o auxílio salvo disposição expressa em contrário não são puníveis se o crime não chega pelo menos a ser tentado D O U T R I N A 1 Participação impunível A participação está condicionada a dois requisitos fundamentais eficácia causal e consciência de participar na ação comum De outro lado sabese que em regra o crime não será punido se não foi pelo menos tentado Isto é as duas primeiras fases do iter criminis elaboração mental e preparação do crime não são puníveis desde que esta última não constitua em si mesma algum crime 2 Formas de participação impuníveis As formas de participação o art 31 do Código Penal exemplifica como ajuste determinação instigação e auxílio A participação em um crime que não chegou a se iniciar não teve eficácia causal e sem essa eficácia não se há que falar em participação criminosa Nessas circunstâncias como atividade acessória que é a participação em qualquer de suas formas não será punível 3 Tentativa de participação impunível A tentativa de participação é impunível por duas razões em primeiro lugar porque a participação em regra só constitui perigosidade criminal quando leva a um fato principal real em segundo lugar porque punir a simples tentativa de participação principalmente em caso de cumplicidade evocaria um verdadeiro Direito Penal de ânimo 4 Se constituir crime em si mesmo A ressalva do art 31 diz respeito às hipóteses em que os atos constitutivos da participação constituem em si mesmos crimes autônomos tipificados no ordenamento legal como por exemplo a incitação ao crime e a formação de quadrilha J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Homicídio Instigação caracterizada Instigação é uma espécie de participação moral em que o partícipe age sobre a vontade do autor quer provocando para que surja nele a vontade de cometer o crime induzimento quer estimulando a ideia existente que é a instigação propriamente dita mas de qualquer modo contribuindo moralmente para a prática do crime TJMG Apelação 103470600283910011 Rel Walter Pinto da Rocha j 7112007 A contribuição ou o auxílio para a realização do delito constitui forma de participação no mesmo punível nos termos do art 29 do CP TJMG Apelação 100000026154900001 Rel Mercêdo Moreira j 2852002 O ajuste a instigação e o auxílio a teor do art 31 do CP são impuníveis todavia tal determinação só é válida se o crime não chega pelo menos a ser tentado No entanto ocorrendo início de execução qualquer daquelas condutas já equivale à coparticipação delitiva eis que tratase de ato que contribuiu para a produção do resultado TACrimSP Apelação 12579611 Rel Luiz Ambra j 762001 Título V Das Penas Capítulo I Das Espécies de Pena Art 32 As penas são I privativas de liberdade II restritivas de direitos III de multa V art 5º XLV XLVI XLVII XLVIII XLIX L e LXVII da CF V art 5º do Declei n 368841 LCP V Lei n 721084 LEP V art 6º 3º a 5º da Lei n 489865 abuso de autoridade D O U T R I N A 1 Sanção penal A pena é um mal que se impõe por causa da prática de um crime conceitualmente a pena é um castigo embora seu fim essencial não seja necessariamente retributivo 2 Espécies de pena A reforma eliminou a classificação que existia no Código Penal de 1940 entre penas principais e penas acessórias O elenco de penas atualmente se limita às privativas de liberdade reclusão e detenção restritivas de direitos prestação de serviços à comunidade interdição temporária de direitos e limitação de fim de semana e multa 3 Princípios da sanção penal a Legalidade a pena deve ser cominada por lei anterior ao fato art 5º XXXIX da CF art 1º do CP b individualização a pena deve ser individualizada em cada caso concreto segundo a culpabilidade do infrator art 5º XLVI da CF c personalidade nenhuma pena poderá passar da pessoa do condenado art 5º XLV da CF d proporcionalidade proporcional ao crime e nos limites da culpabilidade e humanidade o Estado não pode aplicar sanções que atinjam a dignidade da pessoa humana ou lesionem a constituição físicopsíquica do condenado Esse princípio fundamenta a proibição da pena de morte da prisão perpétua e de quaisquer penas cruéis ou infamantes de tortura e de maustratos 4 Penas proscritas pela Constituição Pena de morte salvo em caso de guerra declarada prisão perpétua trabalhos forçados banimento e quaisquer penas cruéis art 5º XVLII da CF J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A Lei das Leis proíbe a pena de morte salvo em caso de guerra declarada nos termos do inciso XIX do art 84 e o aprisionamento em caráter perpétuo alíneas a e b do inciso XLVII do art 5º no claro pressuposto da regenerabilidade da pessoa que se encontre em regime de cumprimento de condenação penal STF RE 472584MG Rel Min Carlos Britto j 3052006 Seção I Das penas privativas de liberdade V art 62 da Lei n 909995 Juizados Especiais V arts 2º e 20 da Lei n 102592001 Reclusão e detenção Art 33 A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado semiaberto ou aberto A de detenção em regime semiaberto ou aberto salvo necessidade de transferência a regime fechado V art 5º XLVIII e XLIX da CF V arts 6º e 110 a 119 da Lei n 721084 LEP 1º Considerase a regime fechado a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média V arts 87 a 90 da Lei n 721084 LEP V arts 2º e 3º da Lei n 807290 crimes hediondos b regime semiaberto a execução da pena em colônia agrícola industrial ou estabelecimento similar V arts 91 e 92 da Lei n 721084 LEP c regime aberto a execução da pena em casa de albergado ou estabelecimento adequado V arts 93 a 95 e 203 2º da Lei n 721084 LEP 2º As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva segundo o mérito do condenado observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso a o condenado a pena superior a 8 oito anos deverá começar a cumprila em regime fechado b o condenado não reincidente cuja pena seja superior a 4 quatro anos e não exceda a 8 oito poderá desde o princípio cumprila em regime semiaberto c o condenado não reincidente cuja pena seja igual ou inferior a 4 quatro anos poderá desde o início cumprila em regime aberto V art 77 2º do CP 3º A determinação do regime inicial de cumprimento da pena farseá com observância dos critérios previstos no art 59 deste Código V art 59 III do CP 4º O condenado por crime contra a administração pública terá a progressão de regime do cumprimento da pena condicionada à reparação do dano que causou ou à devolução do produto do ilícito praticado com os acréscimos legais 4º acrescentado pela Lei n 10763 de 12 de novembro de 2003 D O U T R I N A 1 Reclusão e detenção A reforma penal de 1984 adotou penas privativas de liberdade como gênero e manteve a reclusão e a detenção como espécies sucumbindo à divisão histórica do direito pátrio A reclusão destinase aos crimes mais graves e somente esta pode iniciar em regime fechado A detenção está reservada para os crimes de menor gravidade e jamais poderá iniciar seu cumprimento em regime fechado art 33 caput do CP 2 Consequências distintas entre reclusão e detenção Estas são algumas das distinções mais importantes entre reclusão e detenção justificando a manutenção de ambas a limitação na concessão de fiança a autoridade policial somente poderá conceder fiança nas infrações punidas com detenção ou prisão simples art 322 do CPP nunca nos crimes punidos com reclusão nestes quando for o caso a fiança deverá ser requerida ao juiz b espécies de medidas de segurança para infração penal punida com reclusão a medida de segurança será sempre detentiva já para autor de crime punido com detenção a medida de segurança poderá ser convertida em tratamento ambulatorial art 97 do CP c incapacidade para o exercício do pátrio poder tutela ou curatela somente os crimes punidos com reclusão praticados pelos pais tutores ou curadores contra os respectivos filhos tutelados ou curatelados geram essa incapacidade Na hipótese de prática de crimes punidos com detenção nas mesmas circunstâncias não gerarão os mesmos efeitos No entanto a incompatibilidade fática justificará a busca mediante ação própria no juízo competente família e sucessões ou da criança infância e juventude d prioridade na ordem de execução arts 69 caput e 76 ambos do Código Penal executase primeiro a reclusão e depois a detenção ou prisão simples e influência decisiva nos pressupostos da prisão preventiva art 313 I do CPP 3 Regimes penais ou prisionais A Lei n 720984 manteve a classificação dos regimes de cumprimento de pena instituída pela Lei n 641677 Agora os regimes são determinados fundamentalmente pela espécie e quantidade da pena e pela reincidência aliadas ao mérito do condenado num autêntico sistema progressivo O regime fechado será executado em estabelecimento de segurança máxima ou média o semiaberto será executado em colônia agrícola industrial ou estabelecimento similar e finalmente o regime aberto será cumprido em casa de albergado ou em estabelecimento adequado 31 Regime disciplinar diferenciado Recentemente a Lei n 107922003 instituiu o que denominou regime disciplinar diferenciado a ser cumprido em cela individual que poderá ter duração máxima de 360 dias sendo possível sua repetição desde que não ultrapasse um sexto da pena segundo a dicção legal Para um exame mais abrangente ver anotações ao art 38 4 Regime inicial A fixação do regime inicial de execução das penas privativas de liberdade compete ao juiz da condenação Ela integra o ato decisório final art 59 III do CP Cumpre ao juiz da execução decidir motivadamente sobre a progressão ou regressão de regimes art 66 III b da LEP Os fatores fundamentais para determinação do regime inicial são espécie e quantidade da pena aplicada e reincidência Esses fatores são complementados pelos elementos do art 59 do Código Penal isto é quando aqueles três fatores art 33 caput combinado com o seu 2º e alíneas não determinarem a obrigatoriedade de determinado regime então os elementos do art 59 é que orientarão qual regime deverá ser aplicado art 33 3º do CP 5 Critérios e regra geral do regime inicial O caput do art 33 estabelece as regras gerais dos regimes penais ou seja a reclusão pode ser iniciada em qualquer dos três regimes fechado semiaberto e aberto a detenção somente nos regimes semiaberto e aberto salvo necessidade de transferência ao regime fechado regressão Equivale a dizer que jamais se poderá iniciar o cumprimento de pena de detenção em regime fechado 51 Os critérios do 2º 1º Quando a alínea a determina que a pena superior a oito anos deverá começar a ser cumprida em regime fechado é evidente que está se referindo tão somente à pena de reclusão pela simples e singela razão de que a cabeça do artigo já estabeleceu que a detenção não pode começar seu cumprimento em regime fechado Logo este critério só serve para a pena de reclusão 2º A alínea b faculta ao não reincidente com pena superior a 4 anos e que não exceda a 8 cumprila desde o início em regime semiaberto Também aqui essa faculdade só serve para a reclusão porque a detenção não poderá iniciar no regime aberto em razão da quantidade da pena superior a 4 anos e não poderá iniciar no regime fechado porque o caput proíbe Logo para a detenção não há a faculdade que a alínea b oferece para a reclusão Para a detenção nas circunstâncias com pena superior a 4 anos só pode ser o regime semiaberto b reclusão acima de 4 anos tanto pode começar no regime semiaberto como no fechado mas nunca no aberto Aqui para os não reincidentes com pena superior a 4 anos os requisitos ou elementos do art 59 é que determinarão se será suficiente o regime semiaberto ou se terá de ser o fechado Por isso a faculdade mas somente para a pena de reclusão c pena de detenção superior a 4 anos excedendo ou não a 8 anos condenado reincidente ou não só poderá iniciar o cumprimento da pena em regime semiaberto 3º A alínea c faculta ao condenado não reincidente com pena igual ou inferior a 4 anos desde o início cumprila em regime aberto Essa alínea parece ser a maior causadora de equívocos E essa é a única que se dirige às duas espécies de penas reclusão e detenção Mas o fato de o dispositivo dizer que o não reincidente pode iniciar o cumprimento de pena no regime aberto não está a contrario sensu afirmando que o reincidente deverá obrigatoriamente iniciar o cumprimento da pena em regime fechado Não O que a norma legal diz é que o reincidente não pode iniciar em regime aberto Só isso Se a pena for de reclusão de até 4 anos e o condenado for reincidente o regime inicial poderá ser o fechado ou o semiaberto Os requisitos do art 59 é que determinarão qual dos dois regimes será o mais adequado isto é qual dos dois será necessário e suficiente para atingir os fins da pena art 33 3º do CP Se porém a pena for de detenção nas mesmas circunstâncias com condenado reincidente o regime só poderá ser o semiaberto Condenado à pena de detenção reincidente não tem opção qualquer que seja a quantidade de pena deverá iniciar sempre em regime semiaberto 511 Condenado não reincidente Com pena de até 4 anos terseão as seguintes possibilidades 1ª detenção poderá iniciar no regime semiaberto ou no aberto Para adotar um ou outro regime o juiz levará em conta os requisitos do art 59 do CP 2ª reclusão poderá iniciar em qualquer dos três regimes fechado semiaberto ou aberto 52 Regime inicial para detenção a Detenção só pode iniciar em regime semiaberto ou aberto b detenção nunca pode iniciar em regime fechado c detenção superior a 4 anos reincidente ou não só pode iniciar em regime semiaberto d detenção reincidente qualquer quantidade de pena só pode iniciar em regime semiaberto e detenção de até 4 anos não reincidente poderá iniciar em regime semiaberto ou aberto de acordo com os elementos do art 59 521 Reincidente condenado à detenção Não pode iniciar em regime aberto segundo a alínea c Também não pode iniciar em regime fechado ante a proibição do caput do art 33 Sobralhe no entanto o regime semiaberto que é seu regime legal para iniciar o cumprimento de pena 53 Regime inicial para reclusão a Reclusão superior a 8 anos sempre inicia em regime fechado b reclusão superior a 4 anos reincidente sempre inicia em regime fechado c reclusão superior a 4 anos até 8 não reincidente pode iniciar em regime fechado ou semiaberto Dependerá das condições do art 59 do CP d reclusão até 4 anos reincidente pode iniciar em regime fechado ou semiaberto Dependerá do art 59 e reclusão até 4 anos não reincidente pode iniciar em qualquer dos três regimes fechado semiaberto ou aberto segundo recomendarem os elementos do art 59 54 Influência do fator reincidência O fator reincidência quando se trata de pena de detenção só influi no regime inicial quando for de até 4 anos que não poderá ser aberto Quando se tratar de reclusão influi no regime inicial quando for de até 4 anos que poderá ser semiaberto ou fechado e quando for superior a 4 anos até 8 que deverá ser necessariamente fechado 55 Condenação anterior à multa A condenação anterior à pena de multa só tem efeito diferenciado em relação ao sursis art 77 1º Para fins de fixação do regime inicial e para efeitos de substituição da pena de prisão por penas restritivas de direitos ou multa constituise em fator impeditivo A lei não faz qualquer distinção arts 33 2º e 43 II 6 Progressão condicionada à reparação de dano O 4º acrescido pela Lei n 107632003 condiciona a progressão de regime nos crimes contra a Administração Pública à reparação do dano causado ou à devolução do produto do ilítico praticado com os acréscimos legais Pela modalidade desses crimes nem sempre será possível a reparação de dano ante a dificuldade de sua apuração Assim essa previsão legal somente será aplicável naquelas infrações em que se possa dimensionar a extensão do pretenso dano Nas demais isto é quando se tratar de dano ideal ou seja sem parâmetros seguros para aquilatálo essa previsão legal é inaplicável Certamente o legislador não pretendeu inviabilizar a progressão de regime nesses crimes se essa foi sua intenção equivocouse redondamente editando norma penal ilegítima 61 Irretroatividade da obrigação de reparar o dano Tratandose de norma penal mais grave não pode ser aplicada a fatos praticados antes de sua vigência Tampouco se pode tachála de norma processual para invocar o princípio tempus regit actum Qualquer norma penal que de alguma forma restrinja os direitos do cidadão encontra obstáculo constitucional quanto a seus efeitos retroativos J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 269 do STJ É admissível a adoção do regime prisional semiaberto aos reincidentes condenados a pena igual ou inferior a 4 quatro anos se favoráveis as circunstâncias judiciais Súmula 341 do STJ A frequência a curso de ensino formal é causa de remição de parte do tempo de execução de pena sob regime fechado ou semiaberto Súmula 716 do STF Admitese a progressão de regime de cumprimento de pena ou a aplicação imediata de regime menos severo nela determinada antes do trânsito em julgado da sentença condenatória Súmula 717 do STF Não impede a progressão de regime de execução da pena fixada em sentença não transitada em julgado o fato de o réu se encontrar em prisão especial Súmula 718 do STF A opinião do julgador sobre a gravidade em abstrato do crime não constitui motivação idônea para a imposição de regime mais severo do que o permitido segundo a pena aplicada Súmula 719 do STF A imposição do regime de cumprimento mais severo do que a pena aplicada permitir exige motivação idônea A gravidade abstrata do delito já foi levada em consideração pelo legislador para a cominação das penas mínima e máxima Nos delitos materiais contra a ordem tributária a lesão ao erário público é elementar do tipo Imprestáveis ambas as circunstâncias portanto para exasperação da penabase que deve ser fixada no mínimo legal O regime inicial à falta de qualquer consideração desfavorável na sentença é o aberto com fundamento no art 33 2º c do CP STF HC 92274MS Rel Min Ricardo Lewandowski j 1922008 Fixada a penabase no mínimo legal e na falta de circunstâncias judiciais desfavoráveis ao réu primário e com bons antecedentes não é possível infligir regime prisional mais gravoso apenas com base na gravidade genérica do delito Inteligência do art 33 2º e 3º cc o art 59 ambos do Código Penal Incidência das Súmulas n 718 e 719 do Supremo Tribunal Federal STJ HC 67984SP Rel Min Laurita Vaz j 20112007 É pacífico o entendimento de ambas as Turmas desta Corte no sentido de que o cometimento de falta grave pelo preso durante o cumprimento da pena implica a perda dos dias remidos sem que isso caracterize ofensa ao princípio da individualização da pena e ao direito adquirido A remição da pena constitui mera expectativa de direito exigindose ainda a observância da disciplina pelos internos Precedentes STF AIAgR 513810RS Rel Min Joaquim Barbosa j 2592007 Uma vez atendidos os requisitos constantes do art 33 2º c e 3º cc o art 59 do CP quais sejam a ausência de reincidência a condenação por um período igual ou inferior a 4 quatro anos e a existência de circunstâncias judiciais totalmente favoráveis deve o réu cumprir a pena privativa de liberdade no regime prisional aberto A gravidade genérica do delito por si só é insuficiente para justificar a imposição do regime inicial fechado para o cumprimento de pena Fazse indispensável a criteriosa observação dos preceitos inscritos nos arts 33 2º c e 3º do CP STJ HC 48267SE Rel Min Félix Fischer j 1682007 A aplicação do art 33 3º do Código Penal deve ser acompanhada das razões que justificam a fixação de regime de cumprimento da pena fora dos parâmetros estabelecidos no art 33 2º do mesmo diploma legal sob pena de violação ao art 93 IX da Constituição da República STF HC 89947PB Rel Min Joaquim Barbosa j 12122006 A progressão no regime de cumprimento da pena nas espécies fechado semiaberto e aberto tem como razão maior a ressocialização do preso que mais dia ou menos dia voltará ao convívio social STF HC 90049RS Rel Min Marco Aurélio j 512 2006 A obrigatoriedade do exame criminológico e do parecer multidisciplinar da Comissão Técnica de Classificação para fins de progressão de regime de cumprimento de pena foi abolido pela Lei n 109722003 Nada impede no entanto que facultativamente seja requisitado o exame pelo Juízo das Execuções de modo fundamentado dadas as características de cada caso concreto STF HC 86631PR Rel Min Ricardo Lewandowski j 592006 Início do cumprimento da pena no regime semiaberto conforme estipulado na sentença ou no regime aberto se não houver estabelecimento adequado STF HC 86199SP Rel Min Eros Grau j 1842006 O preceito inscrito no art 33 2º c do Código Penal não obriga o magistrado sentenciante mesmo tratandose de réu primário e sujeito a pena não superior a quatro anos de prisão a fixar desde logo o regime penal aberto A norma legal em questão permite ao juiz impor ao sentenciado regime penal mais severo desde que o faça em decisão suficientemente motivada A opção pelo regime aberto constitui mera faculdade legal reconhecida ao magistrado sentenciante Precedentes STF HC 86624SP Rel Min Celso de Mello j 13122005 O réu reincidente condenado a pena inferior a quatro anos e com circunstâncias judiciais favoráveis poderá iniciar o cumprimento em regime semiaberto Arts 33 e 59 do Código Penal Súmula 269 do STJ STJ REsp 574448SP Rel Min Félix Fischer j 1º62004 Concurso material Sanções que somadas ultrapassam 8 anos Hipótese que reclama a fixação do regime inicial fechado Inteligência do art 33 2º a do CP e art 111 da LEP TJMG Apelação 10000003536133000 Rel Kelsen Carneiro j 232004 Nos termos da Lei de Execuções Penais o cumprimento de pena em determinado regime sofre incidência das condenações subsequentes porquanto operada a unificação da nova pena com o remanescente tal somatória pode gerar um regime mais gravoso ao apenado Enquanto não resolvida a unificação sobretudo porque o juízo competente aguarda informações acerca de novas condenações não gera constrangimento o fato de o reeducando ser submetido a regime diverso do cumprimento por razões acautelatórias STJ HC 21411PR Rel José Arnaldo da Fonseca j 1922004 A fuga do condenado do estabelecimento prisional é considerada falta grave art 50 inciso II da Lei n 721084 que justifica a regressão do regime de prisão do semiaberto para o fechado nos termos do art 118 inciso I da Lei n 721084 Inexistência de constrangimento ilegal ou de ofensa ao art 5º inciso XXXVI da Constituição Federal STF HC 83506MG Rel Min Nelson Jobim j 4112003 A fixação do regime prisional integra o processo de individualização da pena regulandose pela compreensão sistemática do art 33 2º e do art 59 ambos do Código Penal com integração do critério do quantum da pena e o critério pertinente às circunstâncias judiciais É de rigor a fixação do regime prisional semiaberto na hipótese de condenado não reincidente com pena inferior a 8 anos sem registro de circunstâncias judiciais desfavoráveis sendo descabida a imposição de regime fechado apenas em razão da gravidade do delito STJ HC 22120SP Rel Min Vicente Leal j 12112002 Regras do regime fechado Art 34 O condenado será submetido no início do cumprimento da pena a exame criminológico de classificação para individualização da execução V art 5º XLVI da CF V arts 5º a 9º e 96 a 98 da Lei n 721084 LEP 1º O condenado fica sujeito a trabalho no período diurno e a isolamento durante o repouso noturno V arts 31 a 35 da Lei n 721084 LEP 2º O trabalho será em comum dentro do estabelecimento na conformidade das aptidões ou ocupações anteriores do condenado desde que compatíveis com a execução da pena V art 5º XLVII c da CF 3º O trabalho externo é admissível no regime fechado em serviços ou obras públicas V arts 36 37 e 126 a 129 da Lei n 721084 LEP D O U T R I N A 1 Regime fechado No regime fechado o condenado cumpre a pena em penitenciária e estará obrigado ao trabalho em comum dentro do estabelecimento penitenciário na conformidade de suas aptidões ou ocupações anteriores desde que compatíveis com a execução da pena Neste regime o condenado fica sujeito ao isolamento durante o repouso noturno art 34 1º do CP porém na prática esse isolamento noturno com os requisitos exigidos para a cela individual art 88 da LEP não passa de mera carta de intenções do legislador brasileiro sempre tão romântico na fase de elaboração dos diplomas legais 2 Serviço externo e cursos de instrução Quem cumpre pena em regime fechado não tem direito a frequentar cursos quer de instrução quer profissionalizantes E o trabalho externo só é possível ou admissível em obras ou serviços públicos desde que o condenado tenha cumprido pelo menos um sexto da pena e desde que sejam tomadas as cautelas contra a fuga e em favor da disciplina art 37 da LEP 3 Exame criminológico no início da execução Tanto o Código Penal art 34 quanto a LEP art 8º determinam a obrigatoriedade do exame criminológico no início de cumprimento da pena para possibilitar a sua efetiva individualização Esta é outra das tantas normas ornamentais do Direito Penal nacional dificilmente é cumprida 4 Regras do regime disciplinar diferenciado Pela nova redação do art 52 da LEP atribuída pela Lei n 107922003 o regime disciplinar diferenciado poderá ser aplicado sem prejuízo da sanção correspondente à falta grave nas seguintes situações 1ª prática de fato previsto como crime doloso que ocasione subversão da ordem ou disciplina internas art 52 caput 2ª quando apresente alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade 1º e finalmente 3ª quando haja fundadas suspeitas de envolvimento ou participação a qualquer título em organizações criminosas quadrilha ou bando 41 Limite de duração do regime disciplinar diferenciado Esse regime terá duração máxima de trezentos e sessenta dias sem prejuízo de repetição da sanção por nova falta grave de mesma espécie até o limite de um sexto da pena aplicada o recolhimento será em cela individual admitindo visitas semanais de duas pessoas sem contar as crianças com duração de duas horas o preso terá direito à saída da cela por duas horas diárias para banho de sol J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 40 do STJ Para obtenção dos benefícios de saída temporária e trabalho externo considerase o tempo de cumprimento da pena no regime fechado De acordo com o sistema progressivo de execução das penas privativas de liberdade art 112 LEP o condenado que se encontra em regime fechado deverá galgar o regime imediatamente menos severo semiaberto para só então alcançar o regime aberto A progressão prisional per saltum carece de amparo jurídico no nosso sistema jurídicopenal TJPR Agravo 04208193 Rel Lauro Augusto Fabrício de Melo j 632008 É sempre preferível que a pessoa processada ou condenada seja custodiada em presídio no local em que reside inclusive para facilitar o exercício do seu direito à assistência familiar mas se a sua permanência em presídio local se evidencia impraticável ou inconveniente em razão da periculosidade do agente ou de outras circunstâncias que implicam na sua submissão ao Regime Disciplinar Diferenciado RDD previsto na Lei n 107922003 é mister pôr em ressalto a preponderância ao interesse social da segurança e da própria eficácia da segregação individual STJ HC 92714RJ Rel Min Napoleão Nunes Maia Filho j 6122007 Prisão regime prisional integralmente fechado progressão Precedentes A Lei n 114642007 no ponto em que disciplinou a progressão de regime trouxe critérios mais rígidos do que os anteriormente estabelecidos na Lei de Execução Penal vigente à época do fato Não se aplica o cumprimento da pena imposta pelos critérios da Lei n 114642007 o que significaria afronta ao princípio da irretroatividade da lei penal mais gravosa art 5º XL da Constituição da República e art 2º do Código Penal STF HC 91631SP Rel Min Cármen Lúcia j 1610 2007 A Lei de Execução Penal ela mesma às expressas admite o trabalho externo para os presos em regime fechado à falta por óbvio de qualquer incompatibilidade por isso que acolhe o benefício desde que tomadas as cautelas contra a fuga e em favor da disciplina STJ HC 45392DF Rel Min Nilson Naves j 932006 Considerandose que os princípios fundamentais consagrados na Carta Magna não são ilimitados princípio da relatividade ou convivência das liberdades públicas vislumbrase que o legislador ao instituir o Regime Disciplinar Diferenciado atendeu ao princípio da proporcionalidade Legítima a atuação estatal tendo em vista que a Lei n 107922003 que alterou a redação do art 52 da LEP busca dar efetividade à crescente necessidade de segurança nos estabelecimentos penais bem como resguardar a ordem pública que vem sendo ameaçada por criminosos que mesmo encarcerados continuam comandando ou integrando facções criminosas que atuam no interior do sistema prisional liderando rebeliões que não raro culminam com fugas e mortes de reféns agentes penitenciários eou outros detentos e também no meio social STJ HC 40300RJ Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 762005 Incompatibilidade da fixação do regime inicial fechado se a quantidade da pena imposta permite seja estabelecido o semiaberto e as circunstâncias judiciais na determinação da penabase foram consideradas na r sentença condenatória como favoráveis ao réu Precedentes STJ HC 15385MG Rel Min Félix Fischer j 22 52001 Regras do regime semiaberto Art 35 Aplicase a norma do art 34 deste Código caput ao condenado que inicie o cumprimento da pena em regime semiaberto V arts 91 e 92 da Lei n 721084 LEP 1º O condenado fica sujeito a trabalho em comum durante o período diurno em colônia agrícola industrial ou estabelecimento similar 2º O trabalho externo é admissível bem como a frequência a cursos supletivos profissionalizantes de instrução de segundo grau ou superior V arts 122 II 124 parágrafo único e 125 da Lei n 721084 LEP D O U T R I N A 1 Regime semiaberto No regime semiaberto não há previsão para o isolamento durante o repouso noturno Neste regime o condenado terá direito a frequentar cursos profissionalizantes de instrução de segundo grau ou superior Também ficará sujeito ao trabalho em comum durante o período diurno em colônia agrícola industrial ou em estabelecimento similar Aqui no regime semiaberto o trabalho externo é admissível inclusive na iniciativa privada ao contrário do que ocorre no regime fechado 2 Serviço externo desde o início da pena O juiz da condenação na própria sentença já poderá conceder o serviço externo Ou então posteriormente o juiz da execução poderá concedêlo desde o início do cumprimento da pena A exigência de cumprimento de um sexto da pena se verifica apenas quando tal benefício for concedido pela direção do estabelecimento penitenciário que dependerá também da aptidão disciplina e responsabilidade do apenado art 37 da LEP STF RTJ 1201122 3 Exame criminológico no regime semiaberto O Código Penal art 35 e a LEP art 8º parágrafo único regulam o mesmo tema o primeiro criando uma obrigação e a segunda uma faculdade Evidentemente prevalece a norma cogente Um estatuto faculta outro determina cumprese a determinação Ora a LEP não proíbe a realização do exame pelo contrário permite embora não o obrigue como faz o Código Penal Também não impede que outro diploma legal da mesma hierarquia determine sua realização Esse exame é fundamental para a individualização da pena E individualizar na execução penal significa dar a cada preso as melhores condições para o cumprimento da sanção imposta O exame criminológico está para a adequada execução da pena como os exames clínicos e laboratoriais estão para o tratamento dos pacientes da medicina J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Condenado que deverá cumprir sua pena em regime domiciliar até a sua remoção à colônia penal agrícola Configura constrangimento ilegal o fato de o paciente estar cumprindo a sua pena em regime fechado quando lhe foi fixado regime para o semiaberto para o cumprimento da pena TJPR HC 4516261 Rel Marcus Vinicius de Lacerda Costa j 29112007 Restando demonstrado nos autos que as condições pessoais do apenado são favoráveis deve ser permitido o trabalho externo ou frequência em cursos de instrução mesmo que o regime seja o semiaberto TJPR Agravo em Execução 4348318 Rel Maria José de Toledo Marcondes Teixeira j 22112007 Paciente condenado à reclusão em regime semiaberto A natureza hedionda do delito por si só não constitui fundamento idôneo para o indeferimento à concessão do benefício do trabalho externo O pacífico entendimento desta Corte ao contrário do decidido pelo Tribunal local é no sentido da desnecessidade do cumprimento mínimo da pena para a concessão do benefício do trabalho externo desde que satisfeitos os demais requisitos necessários de natureza subjetiva STJ HC 65356AC Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 982007 O reiterado descumprimento do dever de pernoitar na Cadeia Pública caracteriza desrespeito às condições impostas na audiência admonitória e do próprio regime semiaberto justificando a regressão do regime prisional inicialmente fixado STJ HC 58630MT Rel Min Gilson Dipp j 1582006 No caso em tela não há constrangimento ilegal na decisão judicial que para autorizar o trabalho externo a detento que cumpre pena sob o regime semiaberto exige demonstração da existência legal da empresa em que pretende trabalhar STJ HC 42593MS Rel Min Félix Fischer j 6102005 Na linha de precedentes desta Corte a falta de vagas em estabelecimento adequado para o cumprimento da pena imposta em regime semiaberto não justifica a permanência do condenado em condições prisionais mais severas STJ RHC 16058SP Rel Min Félix Fischer j 582004 Descumpridas as regras do regime semiaberto cabe ao juízo da execução penal e não ao Tribunal de Alçada decidir a respeito da mudança do regime prisional para o mais gravoso STJ HC 30804SP Rel Min Laurita Vaz j 1632004 Regime semiaberto A prisão domiciliar em princípio só é admitida quando se tratar de réu inserido no regime prisional aberto ex vi o art 117 da Lei de Execução Penal Precedentes do col Supremo Tribunal Federal Excepcionalmente porém tem a jurisprudência entendido ser possível a concessão do benefício no caso de regime prisional diverso do aberto em face de comprovada doença grave se o tratamento médico necessário não puder ser ministrado no presídio em que se encontra o apenado STJ HC 20690SP Rel Min Félix Fischer j 2022003 Réu condenado ao cumprimento de pena em regime semiaberto progressão concedida para o regime aberto inexistência de vaga em estabelecimento adequado cumprimento das condições necessárias do regime mais benéfico Não configura constrangimento ilegal a manutenção do paciente em Delegacia de Polícia quando mesmo em estabelecimento impróprio restam observadas as condições impostas ao regime aberto até que surja vaga em instituto adequado STJ RHC 13562MG Rel Min Jorge Scartezzini j 1822003 O regime imposto na sentença deve informar a sua execução não importando contudo em constrangimento ilegal o tempo de permanência necessário à transferência do condenado do estabelecimento próprio da prisão provisória para aqueloutro ajustado ao regime decretado na condenação imposta Tal tempo deve subordinarse ao princípio da razoabilidade que faz injustificável transferência que se retarde por mais de 30 dias STJ HC 15788SP Rel Min Hamilton Carvalhido j 4 102001 Regras do regime aberto Art 36 O regime aberto baseiase na autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado V arts 93 a 95 113 a 117 e 119 da Lei n 721084 LEP 1º O condenado deverá fora do estabelecimento e sem vigilância trabalhar frequentar curso ou exercer outra atividade autorizada permanecendo recolhido durante o período noturno e nos dias de folga 2º O condenado será transferido do regime aberto se praticar fato definido como crime doloso se frustrar os fins da execução ou se podendo não pagar a multa cumulativamente aplicada V art 118 da Lei n 721084 LEP D O U T R I N A 1 Regime aberto O regime aberto baseiase na autodisciplina e no senso de responsabilidade do apenado O condenado só permanecerá recolhido em casa de albergado ou em estabelecimento adequado durante o repouso noturno e nos dias de folga Deverá trabalhar frequentar cursos ou exercer outra atividade autorizada fora do estabelecimento e sem vigilância Com responsabilidade e disciplinadamente o detento deverá demonstrar que merece a adoção desse regime e que para ele está preparado sem frustrar os fins da execução penal sob pena de ser transferido para outro regime mais rigoroso art 36 2º do CP 2 Consentimento do condenado O ingresso do condenado em regime aberto supõe a aceitação do seu programa e das condições impostas pelo juiz art 113 da LEP Essa aceitação do condenado não está prevista em relação às penas restritivas de direitos 3 Perda do regime aberto a Se praticar falta grave crime doloso frustrar os fins da execução não pagar podendo a multa aplicada cumulativamente art 36 2º do CP b se for condenado por crime anterior a pena que somada ao restante em execução torne incabível o regime aberto art 118 I II e 1º da LEP Salvo a hipótese de condenação posterior nos demais casos deve ser ouvido o condenado sobre o novo fato art 118 2º da LEP 4 Prisão civil Embora o Supremo Tribunal já tenha decidido que a prisão civil não pode ser convertida em prisãoalbergue RT 552413 parecenos que a casa de albergado é o melhor local para cumprir aquela espécie de prisão 5 Prisão domiciliar Segundo a orientação da reforma penal o regime aberto como gênero deverá ser cumprido em a prisãoalbergue b prisão em estabelecimento adequado e c prisão domiciliar arts 33 1º c do CP e 117 da LEP Logo prisão domiciliar constitui somente espécie do gênero aberto e como exceção exige a presença de mais requisitos para a sua concessão 6 Falta de casa de albergado Na ausência de casa de albergado por construção pretoriana deve o indivíduo cumprir pena em prisão domiciliar jamais sendo admissível que seja determinado seu cumprimento em regime mais grave em razão da inexistência de casa de albergado Deve ainda que excepcionalmente ser concedido ao condenado recolhimento domiciliar enquanto não houver vaga em estabelecimento adequado Significa dizer em outros termos que a natureza do regime não transmuda para outro menos grave pela ausência de vaga no regime mais liberal enquanto a vaga não existir como têm decidido acertadamente nossas Cortes Superiores 7 Progressão e regressão A sanção aplicada possibilita ao apenado progredir ou regredir nos regimes ampliando ou diminuindo o seu status libertatis O ponto propulsor de conquista ou de perda de maiores regalias no cumprimento da pena privativa de liberdade consiste no mérito ou demérito do condenado arts 33 2º do CP e 112 da LEP 71 Progressão A partir do regime fechado fase mais severa do cumprimento da pena possibilita o Código a conquista progressiva de parcelas da liberdade suprimida Na progressão evoluise de um regime mais rigoroso para outro menos rigoroso Na progressão além do mérito do condenado é indispensável que ele tenha cumprido pelo menos um sexto da pena no regime anterior nos termos do art 112 da LEP Isso quer dizer que o condenado não poderá passar direto do regime fechado para o aberto sem passar obrigatoriamente pelo semiaberto 72 Progressão para o regime aberto Em se tratando de regime aberto além do cumprimento de um sexto da pena e do mérito do condenado devese observar se o beneficiário preenche os requisitos do art 114 da LEP ou seja se o apenado está trabalhando ou se demonstra a possibilidade de vir a fazêlo imediatamente e se apresenta pelos seus antecedentes e pelo resultado dos exames a que se submeteu fundados indícios de que se ajustará com autodisciplina e senso de responsabilidade ao novo regime 73 A progressão nos crimes hediondos A determinação de cumprir integralmente a pena em regime fechado nos crimes hediondos Lei n 807290 viola o sistema progressivo adotado por nosso ordenamento jurídico A doutrina sempre teve grande dificuldade em aceitar a proibição da progressão nos crimes hediondos a despeito da jurisprudência pátria que era toda em sentido contrário até o antológico voto do Ministro Gilmar Mendes HC 82959 o qual abriu caminho para o surgimento da Lei n 114642007 Na verdade além de violar o sistema progressivo de cumprimento de pena e a individualização desta ignora a política criminal recomendada pelo Estado Democrático de Direito 731 Progressão no crime de tortura hediondo A Lei n 945597 oferece finalmente um fundamento jurídico para se reinterpretar a proibição da progressão constante do art 2º 1º da Lei n 807290 ao estabelecer que o condenado por crime de tortura iniciará o cumprimento da pena em regime fechado com a exceção que prevê Há certa unanimidade nacional sobre o entendimento de que a Constituição fixou um regime comum para o crime de tortura tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins terrorismo e os definidos como crimes hediondos art 5º XLIII da CF equiparandoos quanto a sua danosidade social 732 Crime de tortura aplicação extensiva e retroativa Com o tratamento que a Lei n 945597 estabelece para o crime de tortura inegavelmente mais benéfico reconhecendo o direito à progressão está autorizada a interpretação extensiva da nova dicção legal para estendêla às demais infrações definidas como crimes hediondos inclusive retroativamente Afora a regra geral de hermenêutica que permite no Direito Criminal a interpretação extensiva da lei mais benéfica há o tratamento uniforme que a Constituição Federal estabeleceu a essa modalidade de infrações penais 733 Tratamento desuniforme conserto hermenêutico Não se pode ignorar que a disciplina do cumprimento de pena constante dos dois diplomas legais é conflitante e por conseguinte desuniforme de um lado proíbe a progressão de regime para os crimes hediondos terrorismo ainda não tipificado e tráfico de entorpecentes Lei n 809290 de outro admite o regime progressivo para o crime de tortura Lei n 945597 Contudo como o ordenamento jurídico é composto por um sistema harmônico e racional de normas eventuais e aparentes contradições devem encontrar solução racional no próprio sistema por meio das regras de hermenêutica e dos princípios gerais de direito Assim a partir da edição da Lei n 945597 devese reconhecer a aplicabilidade do sistema progressivo aos crimes hediondos e afins sem restrições inclusive retroativamente Nesse sentido ver Alberto Silva Franco O regime progressivo em face das Leis n 807290 e 945597 Bol IBCCrim n 58 edição especial set 1997 p 2 734 Exclusão do parecer da CTC e do exame criminológico O sistema progressivo adotado pela reforma penal de 1984 sofreu profundas alterações em verdadeiro retrocesso em decorrência das alterações patrocinadas pela Lei n 107922003 Dentre tantas modificações exclui expressamente o parecer da Comissão Técnica de Classificação e o exame criminológico Para progredir teoricamente o condenado deverá cumprir pelo menos um sexto da condenação e merecer o benefício Esse merecimento porém será valorado pelo bom comportamento carcerário certificado pelo diretor do estabelecimento penitenciário Não definiu contudo o novo diploma legal o que seja bom comportamento carcerário lacuna que certamente será fonte de profundas divergências 74 Regressão O condenado que cumpre pena em regime aberto pode ser transferido para regime semiaberto ou fechado e o que cumpre em regime semiaberto poderá ser transferido para o regime fechado A regressão está prevista como obrigatória para qualquer dos regimes mais rigorosos quando o sentenciado pratica fato definido como crime doloso ou falta grave ou sofre condenação por crime anterior cuja pena somada ao restante da pena em execução torna incabível o regime atual art 118 da LEP 741 Regressão de condenação em regime aberto Quando o condenado se encontra em regime aberto poderá ocorrer a regressão também se frustra os fins da pena ou se podendo não paga a multa art 36 2º do CP e art 118 1º da LEP A regressão pelo não pagamento de multa mostrase desproporcional e absurda basta adotar meios adequados para executála desde que não se trate de condenado insolvente 742 Necessidade de audiência do condenado Nessas hipóteses bem como nas hipóteses de prática de fato definido como crime doloso ou falta grave o condenado deve ser ouvido previamente art 118 2º da LEP 75 Requisitos da progressão São necessários os seguintes requisitos a um sexto da pena é a exigência de cumprimento de uma parcela da pena no regime anterior no direito vigente fixado em um sexto no mínimo Não se estabeleceu se esse percentual deve ser considerado sobre a pena aplicada ou sobre o restante da pena a cumprir Na primeira operação não há problema Evidentemente terá de ser sobre a pena aplicada e não sobre o saldo restante Na segunda operação é que poderia surgir a dúvida que no entanto não nos parece que seja fundada b mérito do condenado é a demonstração que o condenado deverá dar durante a execução da pena de que está apto para ser transferido para um regime menos rigoroso c exame criminológico é a pesquisa dos antecedentes pessoais familiares sociais psíquicos psicológicos do condenado para a obtenção de dados que possam revelar a sua personalidade d Parecer da Comissão Técnica de Classificação essa Comissão é encarregada de elaborar um programa individualizador e de acompanhar a execução das penas privativas de liberdade Compete lhe também propor ao juízo das execuções penais as progressões e regressões dos regimes bem como as conversões emitindo os respectivos pareceres art 6º da LEP 76 STF progressão nos crimes hediondos Finalmente o Supremo Tribunal Federal em sua constituição plenária num verdadeiro despertar cívico através do Habeas Corpus 82959 declarou a inconstitucionalidade do 1º do art 2º da Lei n 807290 Lei dos crimes hediondos que previa o cumprimento da pena em regime integralmente fechado nos crimes hediondos e assemelhados com voto histórico do Ministro Gilmar Mendes A Lei n 11464 de 27 de março de 2007 seguindo a orientação consagrada pelo STF altera os parágrafos do art 2º da Lei n 807290 com as seguintes inovações a o cumprimento da pena iniciará em regime fechado b a progressão nos crimes hediondos ocorrerá após o cumprimento de dois quintos 25 sendo o apenado primário e de três quintos 35 se reincidente c em caso de sentença condenatória o juiz decidirá fundamentadamente se o réu poderá apelar em liberdade 77 Dois aspectos fundamentais adotados pelo STF a O reconhecimento do sistema progressivo e a individualização da pena como direitos e garantias fundamentais b a eficácia erga omnes de declaração de inconstitucionalidade em controle difuso ou aberto art 102 I a da CF limitada pelo efeito ex nunc O primeiro aspecto esclarece os limites reservados ao legislador ordinário o sistema progressivo de cumprimento da pena é uma garantia constitucional O legislador ordinário pode disciplinar a individualização da pena nas três fases mas não pode excluíla em nenhuma delas sob pena de violar esse preceito fundamental Aí reside a inconstitucionalidade do dispositivo questionado que obrigava o cumprimento integral da pena em regime fechado nos crimes hediondos e assemelhados Seria inócuo por conseguinte incluir a individualização da pena entre os direitos e as garantias fundamentais e ao mesmo tempo permitir que o legislador ordinário a seu alvedrio pudesse suprimir ou anular seu conteúdo 78 Efeito erga omnes da decisão do STF O STF atribuiu por unanimidade efeito erga omnes à sua decisão em julgamento de controle difuso de constitucionalidade aplicou por analogia o disposto no art 27 da Lei n 986899 que se refere a julgamento de hipóteses de controle concentrado ou abstrato de constitucionalidade ADIn ou ADC Com essa decisão o STF adotou o entendimento de que em se tratando de controle incidental ou difuso é pertinente estender os efeitos da decisão a outras hipóteses suscetíveis de serem alcançadas pelo reconhecimento in concreto de inconstitucionalidade E assim o fez em nome da segurança jurídica e do excepcional interesse social conceitos revestidos também de carga constitucional Bol IBCCrim n 161 abr 2006 p 1 79 Eficácia erga omnes e efeito ex nunc Essa decisão com eficácia erga omnes e efeito ex nunc permite que em outros processos que ainda se encontrem em fase recursal ou executória cuja pena ainda não tenha sido integralmente cumprida possam igualmente ser beneficiados pelo sistema progressivo desde que seus requisitos sejam examinados casuisticamente pelo juiz competente Referida decisão não está por conseguinte limitada ao processo objeto de exame no Habeas Corpus 82959 e tampouco permite que outros juízes ou tribunais recusem seu cumprimento invocando como obstáculo o disposto no inciso X do art 52 da Constituição Federal 710 Eficácia erga omnes torna inócua declaração do Senado Essa decisão na realidade tornou sem objeto a competência do Senado Federal como destaca Luís Roberto Barroso A verdade é que com a criação da ação genérica de inconstitucionalidade pela EC n 1665 e com o contorno dado à ação direta pela Constituição de 1988 essa competência atribuída ao Senado tornouse um anacronismo Uma decisão do Pleno do Supremo Tribunal Federal seja em controle incidental ou em ação direta deve ter o mesmo alcance e produzir os mesmos efeitos Respeitada a razão histórica da previsão constitucional quando de sua instituição em 1934 já não há mais lógica razoável em sua manutenção Luís Roberto Barroso O controle de constitucionalidade no Direito brasileiro São Paulo Saraiva 2004 p 92 Em sentido semelhante vejase o magistério do constitucionalista Min Gilmar Mendes Gilmar Ferreira Mendes Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade 3 ed São Paulo Saraiva 2004 p 266 8 Exame criminológico A realização do exame criminológico tem a finalidade exatamente de fornecer elementos dados condições subsídios sobre a personalidade do condenado examinandoo sob os aspectos mental biológico e social para concretizar a individualização da pena por meio dessa classificação dos apenados 81 Fase processual para realização do exame Sem se preocupar com a controvérsia sobre o melhor momento processual para a realização do exame criminológico a LEP optou por determinar tal realização após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória ou seja somente após declarada a culpa ou se for o caso a periculosidade do agente Exposição de Motivos item n 30 82 Local de realização do exame criminológico O exame criminológico deverá ser realizado no Centro de Observação Criminológica nos termos no art 96 da LEP Somente se inexistir Centro de Observação que deverá constituirse de unidade autônoma ou em anexo a estabelecimento penal é que será admitida a realização do referido exame pela Comissão Técnica de Classificação art 98 83 Esvaziamento das funções da CTC e do COC Pela nova redação atribuída ao art 6º da LEP a Comissão Técnica de Classificação CTC perdeu a atribuição de elaborar o programa de individualização dos condenados às penas restritivas de direitos como previa a redação anterior Tampouco referida comissão poderá propor à autoridade competente as progressões regressões ou conversões Essa conclusão decorre da conjugação da nova redação do art 6º da LEP com a supressão do parágrafo único do art 112 que condicionava a progressão de regime ao parecer da CTC ou exame do COC quando fosse o caso Com efeito a partir da vigência da nova lei 2122003 não há mais necessidade para a progressão de regime do parecer da Comissão Técnica de Classificação ou do exame criminológico J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Se o condenado preenche os requisitos para o cumprimento da pena em regime aberto em função da quantidade de pena imposta e diante do reconhecimento da presença de circunstâncias judicias favoráveis como primariedade e ausência de maus antecedentes na própria dosimetria da reprimenda não cabe a imposição de regime semiaberto com fundamento exclusivo na periculosidade do agente STJ HC 48343SP Rel Min Gilson Dipp j 1142006 Admitese a concessão da prisão domiciliar ao apenado cumprindo pena em regime aberto que se enquadre nas hipóteses previstas no art 117 da Lei de Execução Penal ou excepcionalmente quando se encontrar cumprindo pena em estabelecimento compatível com regime mais gravoso por inexistência de vagas em casa de albergado Precedentes Não se encontrando o paciente em qualquer daquelas hipóteses a relativa distância entre o local em que se encontra a casa de albergado e a cidade em que alega possuir residência e trabalho fixos não é razão que autoriza a concessão da prisão domiciliar Habeas corpus denegado STJ HC 44880MT Rel Min Félix Fischer j 17112005 Não demonstrado de plano a impossibilidade da prestação de assistência médica devida no local em que se acha recolhido o paciente deve ser indeferida a prisão domiciliar STJ HC 38729PB Rel Min Hélio Quaglia Barbosa j 1722005 O cumprimento de pena em regime domiciliar só é possível em princípio aos condenados ao regime prisional aberto o que não é o caso do paciente condenado ao cumprimento de pena em regime fechado Precedentes Somente em casos excepcionais mesmo na hipótese de ter sido estabelecido o regime fechado para o cumprimento de pena é possível o deferimento da prisão domiciliar quando demonstrada de plano a necessidade de especial tratamento de saúde que não poderia ser suprida no local em que o condenado se encontra preso Precedente STJ RHC 13840SP Rel Min Gilson Dipp j 842003 Assentada jurisprudência desta Corte no sentido de que a falta de vagas em estabelecimento adequado para o cumprimento da pena imposta em regime aberto não justifica a permanência do condenado em condições prisionais mais severas nas dependências de delegacia policial Em casos que tais lícita é a concessão em caráter provisório e excepcional do cumprimento da pena em regime domiciliar até o surgimento de uma vaga no estabelecimento adequado às exigências do regime aberto STJ RHC 12984MG Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 15102002 O simples fato de a Lei de Execuções Penais garantir ao maior de 60 anos o direito de ser recolhido em estabelecimento próprio e adequado a suas condições pessoais não autoriza por si só a concessão de prisão domiciliar STJ HC 17429PR Rel Min Gilson Dipp j 1582002 A pretensão de cumprimento da pena em regime domiciliar por ser o condenado septuagenário e portador de enfermidade deve ser formulada perante o Juízo da Vara das Execuções Penais STJ HC 19093SP Rel Min Vicente Leal j 164 2002 Regime especial Art 37 As mulheres cumprem pena em estabelecimento próprio observandose os deveres e direitos inerentes à sua condição pessoal bem como no que couber o disposto neste Capítulo V art 5º XLVIII e L da CF V arts 19 parágrafo único 82 1º 89 e 117 III e IV da Lei n 721084 LEP D O U T R I N A 1 Regime especial feminino A lei determina tratamento especial às mulheres com a estabelecimento próprio as mulheres não podem cumprir pena junto com os presos do sexo masculino b condição pessoal devem ser respeitados os direitos e deveres inerentes à condição de mulher Têm direito de manter o filho consigo durante a fase de amamentação art 5º XLVIII e L da CF J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A garantia inscrita no art 5º L da Constituição da República não significa que todas as lactantes tenham direito a cumprir pena em domicílio mas ao contrário pressupõe o recolhimento ao estabelecimento prisional público Ademais inexiste nos autos qualquer evidência de que uma vez recolhida a paciente ao cárcere o Estado não disponha de meios suficientes à concretização daquela garantia constitucional STJ HC 20690SP Rel Min Félix Fischer j 2022003 Direitos do preso Art 38 O preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade impondose a todas as autoridades o respeito à sua integridade física e moral V art 5º XLIX da CF V arts 3º i e 4º a b c d e f g e i da Lei n 489865 abuso de autoridade V arts 3º e 40 a 43 da Lei n 721084 LEP D O U T R I N A 1 Direitos assegurados ao condenado A Constituição brasileira assegura ao condenado absoluto respeito à sua integridade física e moral art 5º XLIX e art 40 da LEP Todos os direitos não alcançados pela condenação são protegidos No entanto como efeito constitucionalpenal o condenado perde seus direitos políticos enquanto perdurarem os efeitos da condenação criminal irrecorrível art 15 III da CF 2 Direitos e deveres Os direitos do preso estão relacionados nos arts 10 a 27 e 41 da LEP Os deveres correspondentes encontramse relacionados nos arts 38 39 e 44 a 52 do mesmo Estatuto 3 Regime Disciplinar Diferenciado direito penal de autor Com o RDD o governo brasileiro passa a adotar o proscrito direito penal de autor de cunho fascista ressuscitado por movimentos raciais e capitaneado por Gunther Jakobs com seu direito penal do inimigo As previsões da Lei n 107922003 não se destinam a fatos mas a determinadas espécies de autores impondo isolamento celular de até um ano não em decorrência da prática de determinado crime mas porque na avaliação subjetiva de determinada instância de controle social formal representam alto risco social ou carcerário ou então porque há suspeitas de participação em quadrilha ou bandos prescrição capaz de fazer inveja ao condenado neossocialismo alemão das décadas de 30 e 40 do século passado Com efeito percebese que às instâncias de controle não importa o que se faz direito penal do fato mas sim quem faz direito penal de autor Em outros termos não se pune pela prática do fato mas sim pela qualidade personalidade ou caráter de quem faz num autêntico direito penal de autor 31 Hipóteses de aplicação do Regime Disciplinar Diferenciado Pela nova redação atribuída ao art 52 da LEP o regime disciplinar diferenciado poderá ser aplicado nas seguintes situações 1ª prática de fato previsto como crime doloso que ocasione subversão da ordem ou disciplina internas caput 2ª que apresentam alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade 1º e finalmente 3ª quando houver fundadas suspeitas de envolvimento ou participação a qualquer título em organizações criminosas quadrilha ou bando 1ª hipótese subversão da ordem ou disciplina internas Prática de fato previsto como crime doloso que ocasione subversão da ordem ou disciplina internas art 52 caput Para a aplicação do indigitado Regime Disciplinar Diferenciado não é suficiente a prática de crime doloso por si só sendo necessário que este ocasione a subversão da ordem ou disciplina Há uma exigência cumulativa qual seja a prática do crime doloso e a sua consequência Em outros termos que a prática de uma conduta definida como crime produza em razão de sua concretização a subversão da ordem ou disciplina internas 311 Absoluta necessidade do Regime Disciplinar Diferenciado Mas ainda assim a prática de crime doloso e a consequente subversão da ordem ou disciplina não bastam para impor o Regime Disciplinar Diferenciado que é em última instância uma sanção cruel degradante e violadora do princípio da humanidade da pena Com efeito em cada caso concreto o juiz deverá examinar num segundo momento isto é superadas as questões de adequação típica a real necessidade da adoção dessa monstruosidade própria de um direito penal de autor proscrito nos Estados Democráticos de Direito Como medida cautelar devem ademais estar presentes os requisitos respectivos fumus boni juris e periculum in mora 312 O que é subversão da ordem ou disciplina internas Em que isso consiste Necessariamente deverá ocasionar de forma concreta no interior do estabelecimento prisional profunda alteração da ordem ou da disciplina de molde a substituir os monitores coordenadores e guardas penitenciários a ponto de os detentos obterem o controle da penitenciária É digamos um estado de emergência pois somente a excepcionalidade dessa ordem poderia justificar uma violência tão absurda como o famigerado RDD 313 Sanção degradante e desumana Essa preocupação não diminui mesmo que a decisão e definição passe necessariamente pelo crivo do Poder Judiciário sob os auspícios do contraditório da ampla defesa e do devido processo legal A violência e o gravame da sanção estão na sua essência e na sua motivação assim nada e ninguém poderá descaracterizar esse aspecto salvo a sua revogação definitiva Convém registrar ademais que o juiz das execuções criminais a autoridade competente para aplicálo e fiscalizálo após ouvir o Ministério Público e a Defesa decidirá fundamentadamente nos termos previstos no texto constitucional CF art 93 IX sob pena de nulidade Mais do que nunca se não houver forma de evitar a decretação desse esdrúxulo e inconstitucional regime que se observe rigorosamente o procedimento disciplinar previsto nos arts 59 e 60 da LEP assegurandose todas as garantias constitucionais fundamentais 2ª Hipótese alto risco para a ordem e a segurança 1º Afinal o que é alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade Paulo César Busato também com acerto questiona a submissão ao regime diferenciado deriva da presença de um alto grau de risco para a ordem e segurança do estabelecimento penal ou da sociedade Porém a respeito de que estamos falando Não seria da realização de um delito ou de uma falta grave regulada pela administração da cadeia porque esta já se encontra referida na redação principal do mesmo artigo que trata exatamente dela Que outra fonte de risco social ou penitenciário pode decorrer de comissões que não sejam faltas nem delitos Paulo César Busato Regime disciplinar diferenciado p 39 3ª Hipótese suspeitas de participação em organizações criminosas Esta é a hipótese mais absurda de toda previsão do odioso Regime Disciplinar Diferenciado pois além de adotar um direito penal de autor em vez do direito penal do fato transforma o primado da certeza em meras presunções e suspeitas proscritas do direito penal da culpabilidade próprio de um Estado Democrático de Direito Essa preocupação doutrinária ganha relevo quando se tem em conta os abusos do poder de denunciar que se tem praticado no Brasil a partir da última década do século passado Criticamente no mesmo sentido questiona Paulo César Busato a mera suspeita de participação em bandos ou organizações criminosas justifica o tratamento diferenciado Porém se o juízo é de suspeita não há certeza a respeito de tal participação e não obstante já aparece a imposição de uma pena diferenciada ao menos no que se refere à sua forma de execução Enfim é desnecessário aprofundarse para concluir pela inconstitucionalidade da previsão legal que acabamos de examinar J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A O Supremo Tribunal Federal estabeleceu que é constitucional a prerrogativa de o advogado ser preso em sala de Estado Maior até o trânsito em julgado da condenação A expressão sala de Estado Maior deve ser interpretada como sendo uma dependência em estabelecimento castrense sem grades com instalações condignas O preceito legal que confere aos advogados o direito à prisão especial antes do trânsito em julgado da condenação não desnatura o caráter da medida que representa uma restrição à liberdade de locomoção ainda que em condições diferenciadas dos demais presos STF Reclamação 4713SC Rel Min Ricardo Lewandowski j 17122007 A execução provisória do julgado é plenamente possível constituindo mero efeito da condenação na medida em que os recursos eventualmente interpostos quais sejam o recurso extraordinário e o especial não têm efeito suspensivo razão pela qual à luz do Enunciado 716 da Súmula do Supremo Tribunal Federal admitese a progressão de regime de cumprimento da pena ou a aplicação imediata de regime menos severo nela determinada antes do trânsito em julgado da sentença condenatória STJ HC 70472SP Rel Min Laurita Vaz j 28112007 RDD É constitucional a resolução que permite o cumprimento em estabelecimento federal sob competência do Juízo de Execução Criminal da Justiça Federal de pena imposta por decisão da Justiça Estadual As penas privativas de liberdade devem ser executadas com respeito à integridade física e moral do preso proibidas as penas cruéis Constatada a observância aos preceitos reguladores do cumprimento da pena contidos na Constituição da República e na Lei de Execução Penal tornase descabida a alegação de ilegalidade O direito ao cumprimento da pena em local próximo ao seio familiar de modo a facilitar a ressocialização do condenado não é absoluto podendo ser ultrapassado por decisão do Juízo da Execução sobretudo se fundamentado no resguardo da segurança pública STJ HC 77835PR Rel Jane Silva j 2092007 Tratandose de acusado ao qual não foi imposta pena privativa de liberdade restaria francamente desarrazoada a consideração de sua impossibilidade de votar a uma por ausência de empecilho material físico ao exercício do sufrágio o qual não poderia se submeter a conjecturas relacionadas a eventos futuros incertos e hipotéticos a duas pois o simples fato de ser um condenado não elide seu direito de participar da escolha dos destinos políticos da nação os quais o afetarão de maneira direta e indireta Assim deve ser mantido o direito de votar do acusado conforme foi assegurado na sentença salientandose que deve ser comunicada a Justiça Eleitoral tão somente para que seja procedida a suspensão de sua elegibilidade em consonância com uma interpretação restritiva do art 15 III da Constituição Federal TJMG Apelação 100240273597280011 Rel Márcia Milanez j 1772007 As normas contidas na Lei n 721084 somente devem ser aplicadas ao condenado pela Justiça Militar quando recolhido a estabelecimento sujeito à jurisdição ordinária o que não ocorre in casu pois o paciente se encontra cumprindo pena em estabelecimento penal militar Precedentes do STJ e do Pretório Excelso STJ HC 39237SP Rel Min Félix Fischer j 832005 Trabalho do preso Art 39 O trabalho do preso será sempre remunerado sendolhe garantidos os benefícios da Previdência Social V art 201 I da CF V arts 28 a 30 41 II e III 126 a 129 da Lei n 721084 LEP D O U T R I N A 1 Trabalho prisional O trabalho prisional é um direitodever do apenado e será sempre remunerado art 29 da LEP A jornada normal de trabalho não pode ser inferior a seis nem superior a oito horas diárias com repouso aos domingos e feriados art 33 da LEP Não poderá ter remuneração inferior a três quartos do salário mínimo 2 Destino da remuneração obtida A remuneração obtida com o trabalho prisional tem destinação prevista na própria LEP art 29 1º e 2º a saber a indenização dos danos causados pelo crime desde que determinados judicialmente e não reparados por outros meios b assistência à família c pequenas despesas pessoais d ressarcimento do Estado pelas despesas realizadas com a manutenção do condenado proporcionalmente e o saldo restante se houver deve ser depositado em caderneta de poupança para formação de pecúlio que será entregue ao condenado quando sair da prisão 3 Previdência social Estão assegurados ao detento as garantias e todos os benefícios da Previdência Social inclusive a aposentadoria apesar de não ser regulado pela Consolidação das Leis do Trabalho art 28 2º da LEP 4 Presos políticos e provisórios O condenado por crime político não está obrigado ao trabalho art 200 da LEP nem o preso provisório art 31 parágrafo único da LEP mas se trabalharem terão os mesmos direitos dos demais presos 5 Remição pelo trabalho Remir significa resgatar abater descontar pelo trabalho realizado dentro do sistema prisional parte do tempo de pena a cumprir desde que não seja inferior a seis horas e nem superior a oito Significa que pelo trabalho agora também pelo estudo o condenado fica desobrigado de cumprir determinado tempo de pena 51 Remição pelo estudo Lei n 124332011 Finalmente a praxis jurisprudencial foi confirmada pela Lei n 124332011 que passou a determinar a remição também pelo estudo do condenado Convém destacar no entanto que trabalho e estudo não podem ser realizados e contabilizados nos mesmos horários isto é não podem ser simultâneos devendo ser cumpridos em horários distintos Em outros termos a LEP com a redação determinada pela Lei n 124332011 permite a cumulação de remição pelo estudo e pelo trabalho art 126 3º desde que cumpridos em horários compatíveis Com efeito a remição que era feita na base de três dias de trabalho por um de pena sofreu um acréscimo relativamente ao estudo com a alteração da LEP nos seguintes termos Art 126 O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir por trabalho ou por estudo parte do tempo de execução da pena 1º A contagem de tempo referida no caput será feita à razão de I 1 um dia de pena a cada 12 doze horas de frequência escolar atividade de ensino fundamental médio inclusive profissionalizante ou superior ou ainda de requalificação profissional divididas no mínimo em 3 três dias II 1 um dia de pena a cada 3 três dias de trabalho A divisão das doze horas de estudo pelos três dias não precisa ser aritmética isto é pode ser mais horas em um dia menos em outro por exemplo seis horas em um dia e três em cada um dos outros ou mesmo dois em um e quatro em outro enfim desde que as doze horas sejam divididas em três dias correspondendo na média quatro horas por dia Assim cada três dias de estudo com um mínimo de doze horas remirá um dia de pena 52 A remição abrange regime aberto e liberdade condicional A remição pelo estudo foi estendida também para o cumprimento de pena em regime aberto e fruição de liberdade condicional art 126 6º ao contrário da remição pelo trabalho que continua limitada ao cumprimento de pena nos regimes fechado e semiaberto art 126 caput sendo mantido pela nova redação Como o trabalho era pressuposto para o ingresso no regime aberto não havia remição para aqueles que ingressavam nesse regime Contudo com a admissão da remição pelo estudo por isonomia abrese a possibilidade em tese para quem cumpre pena em regime aberto também poder obter remição pelo trabalho a exemplo daquele que estiver frequentando curso de educação regular ou profissionalizante art 126 6º O estudo fora da prisão deve ser comprovado mensalmente art 129 1º por meio de declaração da respectiva unidade de ensino a frequência e o aproveitamento escolar A contrario sensu o estudo realizado no interior do estabelecimento prisional não precisa dessa formalidade embora deva ser certificado ou atestado pelo Diretor da Unidade prisional O preso provisório cautelarmente que não está obrigado ao trabalho se trabalhar ou estudar também poderá remir parte de sua futura condenação 7º 53 Conclusão do ensino fundamental majoração do tempo remido O tempo remido em função das horas de estudo será acrescido de 13 um terço no caso de conclusão do ensino fundamental médio ou superior durante o cumprimento da pena desde que certificadas pelo órgão competente do sistema de educação 5º que pode ser a própria unidade de ensino sendo desnecessário que o MEC forneça essa comprovação A nosso juízo o cálculo desse acréscimo um terço deve ser feito no final do total remido independentemente de ter concluído o curso há mais tempo Tratase de inovação que certamente estimulará o preso a não abandonar os estudos considerando que é sabidamente alta a evasão escolar também no âmbito do sistema prisional Estendendo a remição ao estudo do prisioneiro o legislador mais uma vez acabou seguindo o melhor entendimento doutrináriojurisprudencial com efeito por todas as razões que o estudo apresenta acrescidas do efeito de evitar a ociosidade do preso por construção pretoriana aliada ao entendimento doutrinário a dedicação ao estudo no interior das prisões também justifica a remição nas mesmas condições do trabalho Nesse sentido em boa hora o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 341 com o seguinte enunciado A frequência a curso de ensino formal é causa de remição de parte do tempo de execução de pena sob regime fechado ou semiaberto A lei apenas ampliou para abranger também o regime aberto e a liberdade condicional 54 Disciplina e abrangência da remição pelo estudo Os tribunais consagraram o instituto da remição pelo estudo e o legislador veio a disciplinar o modus operandi desse direito do recluso regrando a sua concessão Impedese assim que cada juiz continue adotando um critério subjetivo e variável de número de horas de estudo para efetuar o desconto de um dia de pena tratando desigualmente quem se encontra nas mesmas condições O legislador definiu as atividades que são consideradas estudo ou frequência escolar de forma a não deixar dúvidas atividade de ensino fundamental médio inclusive profissionalizante ou superior ou ainda de requalificação profissional art 126 1º I Destacou ainda que os cursos a serem frequentados podem ser na forma presencial ou telepresencial desde que certificadas pelas autoridades educacionais competentes 55 Comunicação do tempo remido anualidade Ao condenado será comunicada a relação de seus dias remidos art 129 3º ante a ausência de previsão legal do período dessa comunicação acreditamos que seja razoável interpretar como obrigatória essa comunicação anual aliás como já lhe era assegurada a declaração anual do restante de sanção a cumprir art 41 XVI da LEP sob pena de responsabilidade da autoridade judiciária competente Parecenos que uma declaração mensal dessa natureza oneraria em demasia a estrutura do sistema penitenciário sem maiores resultados práticos na medida em que todo preso tem direito a essa declaração para fins de cálculo de seus direitos também denominados benefícios penitenciários progressão livramento condicional etc 56 Natureza da remição tempo de pena cumprido A remição por fim passou a ser considerada como tempo de pena cumprido para todos os efeitos art 128 e não somente para indulto e livramento condicional afastando definitivamente aquela polêmica sobre ser pena cumprida ou desconto de pena a cumprir Como norma penal material mais benéfica tem efeito retroativo Representa na verdade uma grande vantagem a todos os prisioneiros enfim implicando verdadeiro acréscimo do cumprimento de pena para todos os efeitos 57 Inadmissibilidade da remição sem trabalho efetivo Uma corrente sustenta que a remição deve ser concedida mesmo sem a realização do trabalho prisional se este não ocorrer porque o Estado não ofereceu as condições necessárias por considerálo um direito do condenado Discordamos dessa orientação sucintamente pelas seguintes razões 1 em primeiro lugar porque a lei exige comprovação documental do tempo trabalhado art 129 e define como crime de falsidade ideológica o fato de declarar ou atestar falsamente a prestação de serviço para fins de remição art 130 2 em segundo lugar exige declaração do juiz com audiência do Ministério Público 3 finalmente conceder a remição mesmo aos que não trabalham igualálosia injustamente aos que trabalham para conseguila Com efeito conceder a remição independentemente de o condenado haver trabalhado passa a assegurar a concessão automática da remição de quase um terço da pena e não é esse o sentido da lei por mais que desejemos a concessão desse benefício direito As exigências constantes dos arts 129 e 130 da LEP não autorizam outra interpretação embora respeitando o entendimento mais liberal e até torcendo para que prevaleça na jurisprudência brasileira essa orientação vide justificativa em nosso Tratado v 1 58 Falta grave pode revogar a remição de até um terço 13 da remição A prática de falta grave que antes revogava todo o tempo remido a partir da Lei n 124332011 poderá revogar no máximo até um terço da pena remida art 127 8º Permitese assim ao juiz uma avaliação pormenorizada em cada caso e com certa margem de discricionariedade Consequentemente dependerá da gravidade da falta podendo essa redução ser bem inferior a um terço que é seu teto A revogação incidirá sobre o total da pena remida somandose aquela remida pelo trabalho com a remida pelo estudo Tratase de norma penal material posterior mais benéfica que por conseguinte retroage para alcançar as remições anteriores inclusive daqueles que já perderam o tempo remido Nesse sentido recentemente o STJ no HC 200046RS considerou que essa norma penal material redução de até um terço da pena remida deve retroagir por ser mais benéfica para alcançar as faltas graves praticadas antes do início de vigência da Lei n 124332011 59 Prescrição da perda dos dias remidos Por fim como as penas são regra geral muito longas temos sustentado que se faz necessário estabelecer limite temporal para essa perda dos dias remidos Sugerimos que se adote por analogia a previsão constante do art 64 I do CP qual seja não se aplica a perda dos dias remidos se a falta grave for praticada há mais de cinco anos após conquistada a remição Em outros termos remição conquistada há mais de cinco anos incorporase aos direitos públicos subjetivos do detento e não pode mais lhe ser subtraída nem mesmo por eventual falta grave Acreditamos que a revogação de remição conquistada nos últimos cinco anos nos termos legais isto é até um terço já representa uma severa punição que observa inclusive o princípio da proporcionalidade Não se pode desconhecer a dificuldade de sobreviver no interior das prisões e as deficiências do sistema prisional não podem ser atribuídas exclusivamente ao detento como se tem feito ao longo de todos os tempos Haveria uma espécie de preclusão ou se preferirem de decadência do direito do Estado de aplicar a punição ao detento para suprimirlhe um direito conquistado há mais de cinco anos Parecenos mais do que razoável pois se a reincidência desaparece para o indivíduo que se encontra em liberdade por que fazer uma punição retroagir para suprimir uma conquista do detento há mais de cinco anos Seria irrazoável e desarrazoado entendimento em sentido contrário venia concessa J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A É pacífico o entendimento de ambas as Turmas desta Corte no sentido de que o cometimento de falta grave pelo preso durante o cumprimento da pena implica a perda dos dias remidos sem que isso caracterize ofensa ao princípio da individualização da pena e ao direito adquirido A remição da pena constitui mera expectativa de direito exigindose ainda a observância da disciplina pelos internos Precedentes STF AIAgR 513810RS Rel Min Joaquim Barbosa j 2592007 A remissão a teor do disposto no art 126 2º da LEP pode ser concedida ao preso mesmo que este não trabalhe desde que impossibilitado de fazêlo em razão de acidente O acidente in itinere aquele classificado como sendo o ocorrido no deslocamento para o local de trabalho autoriza a concessão da remição STJ REsp 783247RS Rel Min Félix Fischer j 1292006 O estudo assim como o trabalho é atividade que possibilita a reinserção do condenado ao meio social Sendo assim o termo trabalho constante do art 126 da Lei de Execução Penal deve receber interpretação extensiva admitindose a remição face ao tempo dispensado com a atividade estudantil Precedentes STJ HC 44271DF Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 2062006 Jornada de trabalho aquém do mínimo previsto na LEP Soma das horas trabalhadas para que cada vinte e quatro horas corresponda a um dia de pena a ser remido Aplicação dos princípios da legalidade e da razoabilidade TJRS Agravo em Execução 70012556114 Rel Danúbio Edon Franco j 2992005 A interpretação mais benéfica do art 126 da LEP confere aos dias trabalhados pelo réu o caráter de pena efetivamente executada devendo ser acrescidos portanto ao tempo de pena já cumprido pelo acusado Precedentes O tempo remido pelo paciente deve ser considerado como pena efetivamente cumprida para fins de futuro cálculo para a obtenção de quaisquer benefícios da execução em especial in casu do livramento condicional STJ HC 42130SP Rel Min Gilson Dipp j 1882005 Nos termos do art 126 da Lei de Execuções Penais aos condenados que cumprem pena em regime aberto não é possível o benefício da remição Precedentes do Pretório Excelso e desta Corte STJ REsp 668162RS Rel Min Félix Fischer j 3 22005 Legislação especial Art 40 A legislação especial regulará a matéria prevista nos arts 38 e 39 deste Código bem como especificará os deveres e direitos do preso os critérios para revogação e transferência dos regimes e estabelecerá as infrações disciplinares e correspondentes sanções V art 24 I da CF V arts 38 e 39 40 a 43 44 a 60 116 118 e 119 da Lei n 721084 LEP D O U T R I N A Legislação complementar A LEP Lei n 721084 que pode ser complementada por leis estaduais regula não só os direitos e o trabalho dos presos mas também todo o processo executório penal A legislação estadual contudo não poderá dispor sobre Direito processual privativo da União J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Aos profissionais da advocacia é assegurada a prerrogativa de confinamento em Sala de EstadoMaior até o trânsito em julgado de eventual sentença condenatória Prerrogativa essa que não se reduz à prisão especial de que trata o art 295 do Código de Processo Penal A prerrogativa de prisão em Sala de EstadoMaior tem o escopo de mais garantidamente preservar a incolumidade física daqueles que diuturnamente se expõem à ira e retaliações de pessoas eventualmente contrariadas com um labor advocatício em defesa de contrapartes processuais e da própria Ordem Jurídica STF HC 91089SP Rel Min Carlos Britto j 492007 O indeferimento da transferência do preso para penitenciária do Estado em que reside sua família foi devidamente motivado não podendo ser considerado abusivo ou ilegal O paciente está preso no distrito de sua culpa onde ainda responde a outros processos criminais Assim embora a assistência da família seja um direito fundamental do preso não se pode concluir que o paciente foi alijado do contato com sua família por arbitrariedade do juízo de origem Ao contrário foi o próprio paciente quem deu causa a esse afastamento com o cometimento dos crimes por que foi condenado Não está excluída a possibilidade de no futuro cessados os motivos que ensejaram o indeferimento o pleito de transferência vir a ser atendido STF HC 89597SP Rel Min Joaquim Barbosa j 17102006 Não cabe à autoridade estadual de acordo com o art 49 da Lei de Execução Penal dispor sobre as faltas disciplinares de natureza grave aplicandose nessa seara as normas constantes da Lei de Execuções Penais A definição de falta grave por implicar a restrição de diversos benefícios na execução da pena como a perda de dias remidos art 127 da LEP e a regressão de regime de cumprimento de pena art 118 inciso I da LEP deve ser interpretada restritivamente nos termos do art 50 do referido diploma legal STJ HC 59436SP Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 158 2006 Os peremptórios termos do art 127 da Lei de Execução Penal determinam a revogação integral dos dias remidos em função do cometimento de falta grave até porque a remição da pena gera mera expectativa de direito como já assentado na iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores não havendo falar em limitação qualquer à perda do benefício legal STJ AgRg no REsp 788174RS Rel Min Hamilton Carvalhido j 3052006 A possibilidade de transferência de estabelecimento prisional está sujeita à apreciação pelo Juiz competente da conveniência do deslocamento do detento no interesse da segurança da sociedade não constituindo direito subjetivo do réu STJ HC 48567SP Rel Min Paulo Medina j 1852006 Demonstrada a necessidade de cuidado fisioterápico e a impossibilidade de sua realização na Penitenciária em que o paciente se encontra custodiado deve ser determinada a sua transferência à Casa de Detenção de Dutra Ladeira até que se complete o tratamento médico necessário STJ HC 47239MG Rel Min Gilson Dipp j 13122005 Não existe qualquer ilegalidade ou inconstitucionalidade na determinação administrativa assinada pelo Diretor da Casa de Custódia de Londrina que proibiu pelos presos o consumo de cigarro dentro das dependências daquela unidade STJ RMS 16701PR Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 1952005 A Lei n 72101984 garante ao paciente o direito à assistência de médico particular e à realização dos exames necessários caso esteja impossibilitado de fazêlo nas dependências do estabelecimento prisional STF HC 85431SP Rel Min Joaquim Barbosa j 1752005 A transferência do preso para estabelecimento prisional situado próximo ao local onde reside sua família não é norma absoluta cabendo ao Juízo de Execuções Penais avaliar a conveniência da medida mormente quando houver risco de cumprimento inadequado de pena no local pretendido pelo condenado STJ HC 18599RS Rel Min Félix Fischer j 8102002 Tem direito à prisão especial nos termos do 1º do art 40 da Lei n 487865 o preso funcionário da Polícia Civil enquanto não perder tal condição e enquanto não transitar em julgado a decisão condenatória STJ HC 14223MG Rel Min Hamilton Carvalhido j 1042001 Superveniência de doença mental Art 41 O condenado a quem sobrevém doença mental deve ser recolhido a hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou à falta a outro estabelecimento adequado V art 26 do CP V art 154 do CPP V arts 99 a 101 e 183 da Lei n 721084 LEP D O U T R I N A 1 Contagem de tempo O tempo de internação será computado no tempo de prisão art 42 Essa internação em regra não se confunde com medida de segurança Somente se se tratar de enfermidade mental duradoura deverá ocorrer a substituição de uma por outra Havendo substituição da pena por medida de segurança as normas de cumprimento passarão a ser as da medida de segurança e não mais as da pena art 183 da LEP 2 Duração dessa medida de segurança Nessa hipótese a medida de segurança não poderá ter duração superior ao correspondente à pena substituída Esse é o marco em que a liberdade do condenado pode sofrer a intervenção do Estado já devidamente delimitada pelo princípio da culpabilidade Se persistir a enfermidade mental deverá ser colocado à disposição do juízo cível competente J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Superveniência de doença mental Medida de segurança substitutiva de pena privativa de liberdade Réu que permanece internado Tempo de cumprimento da pena corporal excedido Flagrante constrangimento ilegal STJ HC 88849SP Rel Jane Silva j 28112007 O entendimento desta Corte é no sentido de que a superveniência de doença mental no curso do cumprimento da pena privativa de liberdade enseja sua substituição por medida de segurança limitada contudo ao tempo que faltar para o término da sanção imposta na condenação STJ HC 44972SP Rel Min Paulo Gallotti j 92 2006 A duração da medida de segurança substitutiva imposta em razão da superveniência de doença mental não pode ultrapassar o tempo determinado para o cumprimento da pena privativa de liberdade sob pena de ofensa à coisa julgada Cumprida a pena estabelecida na sentença penal evidente o constrangimento ilegal na manutenção da medida de segurança STJ HC 41419SP Rel Min Nilson Naves j 692005 A decisão quanto ao sobrestamento do feito por motivo de superveniência de doença mental não pode ser tomada pelo Conselho de Sentença Tratase de decisão de cunho estritamente processual nada tendo que ver com a consideração sobre a inimputabilidade ou não do paciente à época da ação que constitui o crime pelo qual está sendo processado STJ HC 30686PE Rel Min Paulo Medina j 25 62004 Quando a insanidade mental sobrevém à sentença condenatória o apenado deve ser internado em manicômio art 682 do CPP não sendo o caso de anulação do processo STF HC 77173SP Rel Min Maurício Corrêa j 17111998 Detração Art 42 Computamse na pena privativa de liberdade e na medida de segurança o tempo de prisão provisória no Brasil ou no estrangeiro o de prisão administrativa e o de internação em qualquer dos estabelecimentos referidos no artigo anterior V art 8º do CP V arts 301 a 310 311 a 316 319 320 e 408 1º do CPP V Lei n 796089 prisão temporária V art 111 da Lei n 721084 LEP D O U T R I N A 1 Detração penal Por meio da detração penal se permite descontar na pena ou na medida de segurança o tempo de prisão ou de internação que o condenado cumpriu antes da condenação art 42 Esse período anterior à sentença penal condenatória é tido como de pena ou medida de segurança efetivamente cumpridas 2 Podem ser objeto de detração a Prisão provisória no Brasil ou no estrangeiro prisão provisória é a prisão processual ou seja a prisão que pode ocorrer durante a fase processual antes de a condenação transitar em julgado No direito vigente temos as seguintes hipóteses de prisão provisória prisão em flagrante delito prisão temporária prisão preventiva prisão decorrente de sentença de pronúncia e prisão decorrente de sentença condenatória recorrível A prisão em qualquer dessas hipóteses deve ser descontada da pena aplicada b prisão administrativa a prisão administrativa que não se confunde com a prisão civil stricto sensu não tem natureza penal e pode decorrer de infração disciplinar ou hierárquica especialmente na seara militar A prisão na hipótese de extradição em que o extraditando fica preso enquanto tramita o respectivo procedimento pois segundo o STF essa prisão não tem natureza penal consequentemente pode ser interpretada como prisão administrativa A nosso juízo contudo tratase de prisão inconstitucional não havendo fundamento constitucional para sua existência art 5º LXI da CF A prisão civil em sentido estrito não foi contemplada com a possibilidade da detração penal c internação em casas de saúde a lei fala em internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico Admitimos contudo que a internação em casa de saúde com finalidade terapêutica também deve ser contemplada com a detração penal Não teria sentido suspender a execução da pena durante o período em que o condenado fosse obrigado por motivos de saúde a permanecer hospitalizado 3 Detração e penas restritivas de direitos Há entendimento respeitável de que por necessária e permitida interpretação analógica deve ser admitida a detração também das penas restritivas de direitos como limitação de fim de semana e prestação de serviços à comunidade Acreditamos que as interdições temporárias de direitos também devem ser contempladas com o mesmo tratamento que for dispensado às outras duas espécies de penas restritivas de direitos 4 Detração e nexo processual A interpretação mais liberal da doutrina e da jurisprudência tem admitido a detração por prisão ocorrida em outro processo isto é sem nexo processual desde que por crime cometido anteriormente J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Com base na promessa de reciprocidade em que se apoia o presente pedido de extradição a República Federal da Alemanha deverá assegurar a detração do tempo em que o Extraditando tenha permanecido preso no Brasil por força do pedido formulado STF Ext 1090 Rel Min Cármen Lúcia j 21112007 É firme o entendimento desta Corte no sentido de que o período em que o réu permanece preso provisoriamente em razão de flagrante serve apenas para desconto da reprimenda a ser cumprida não se empregando a detração para fins prescricionais HC 22484SP Rel Min Jorge Scartezzini Quinta Turma DJ de 26 2003 Precedentes STJ HC 67491SP Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 410 2007 Na linha de precedentes desta Corte é inviável aplicarse a detração em relação aos crimes cometidos posteriormente à custódia cautelar Precedentes STJ REsp 848531RS Rel Min Félix Fischer j 2662007 O período em que esteve custodiado réu posteriormente absolvido somente pode ser descontado da pena relativa a crime cometido em período anterior Entendimento contrário significaria que o réu antes mesmo de delinquir já estaria beneficiado com a redução da pena em razão de prisão que se afigurou injusta em processo diverso Precedentes do STJ e do STF STJ REsp 878574RS Rel Min Gilson Dipp j 10 52007 É possível aplicar a detração penal em processos distintos desde que o delito pelo qual o sentenciado cumpre pena tenha sido praticado antes daquele em que foi decretada a sua segregação cautelar Precedentes desta Corte STJ REsp 687428RS Rel Min Laurita Vaz j 622007 Detração penal considerandose o lapso em que o paciente esteve em liberdade provisória Impossibilidade por ausência de previsão legal A regra inscrita no artigo 42 do CPB prevê o cômputo de período relativo ao cumprimento de pena ou de medida restritiva de liberdade STF HC 81886RJ Rel Min Maurício Corrêa j 14 52002 A competência para apreciar pedido de detração consoante entendimento pretoriano é do Juízo das Execuções Criminais não se viabilizando pleito manejado diretamente ao Superior Tribunal de Justiça ainda que preventivamente O abatimento de pena pressupõe lógica e juridicamente o trânsito em julgado da decisão condenatória Não se vislumbra restrição ao direito de locomoção na simples condição de comparecimento quinzenal a Juízo sem qualquer outra formalidade que autorize sua inclusão no rol do art 42 do Código Penal mesmo se adotando posicionamento liberalizante Precedentes STJ HC 16048RJ Rel Min Fernando Gonçalves j 22112001 O tempo de prisão cautelar efetivamente cumprida em regime domiciliar deve ser computado na pena privativa de liberdade para fins de detração CP art 42 STJ HC 11225CE Rel Min Edson Vidigal j 642000 Seção II Das penas restritIvas de direitos Penas restritivas de direitos Art 43 As penas restritivas de direitos são I prestação pecuniária II perda de bens e valores III Vetado IV prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas V interdição temporária de direitos VI limitação de fim de semana Incisos I II e IV com redação determinada pela Lei n 9714 de 25 de novembro de 1998 O inciso III previa o recolhimento domiciliar Esse dispositivo foi vetado pelo Presidente da República sob o argumento da dificuldade de fiscalização Os incisos V e VI representam os anteriores incisos II e III que foram renumerados pela Lei n 971498 V arts 56 e 57 do CP V arts 78 1º e 81 III do CP V arts 48 147 a 155 e 181 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal V art 78 da Lei n 807890 Código de Defesa do Consumidor D O U T R I N A 1 Penas restritivas de direitos A denominação penas restritivas de direitos não foi muito feliz pois de todas as modalidades de sanções sob a referida rubrica somente uma se refere especificamente à restrição de direitos interdição temporária de direitos As outras prestação pecuniária e perda de bens e valores são de natureza pecuniária prestação de serviços à comunidade e limitação de fim de semana referemse mais especificamente à restrição da liberdade do apenado Teria sido mais feliz a classificação geral das penas em privativas de liberdade reclusão e detenção pecuniárias multa prestações pecuniárias e perda de bens e valores restritivas de liberdade recolhimento domiciliar limitação de fim de semana e prestação de serviços à comunidade restritiva de direitos compreendendo somente as efetivas interdições ou proibições 2 Classificação e espécies As penas restritivas de direitos dividemse em a genéricas aquelas que podem ser aplicadas em quaisquer infrações penais que não exijam uma pena restritiva específica multa prestação pecuniária perda de bens prestação de serviços à comunidade e limitação de fim de semana b específicas aquelas aplicáveis somente em determinados crimes mais precisamente naqueles praticados no exercício de determinadas atividades com violação do dever a elas inerente ou por crimes culposos no trânsito de veículos interdição temporária de direitos que se subdivide em proibição do exercício de cargo função ou atividade pública bem como de mandato eletivo proibição do exercício de profissão atividade ou ofício que dependam de habilitação especial de licença ou autorização do Poder Público suspensão de autorização ou de habilitação para dirigir veículo e proibição de frequentar determinados lugares esta última acrescentada pela Lei n 971498 Nesses crimes a pena substitutiva legal obrigatória será uma dessas e não uma pena substitutiva genérica 21 Modalidades e definições a Prestação pecuniária segundo a definição legal consiste no pagamento em dinheiro à vítima a seus dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social de importância fixada pelo juiz não inferior a um salário mínimo nem superior a 360 salários mínimos art 45 1º b perda de bens e valores pertencentes ao condenado em favor do Fundo Penitenciário Nacional considerandose como teto o prejuízo causado pela infração penal ou o proveito obtido pelo agente ou por terceiro aquele que for mais elevado art 45 3º c prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas consiste no dever de prestar determinada quantidade de horas de trabalho não remunerado e útil para a comunidade durante o tempo livre em benefício de pessoas necessitadas ou para fins comunitários arts 43 IV e 46 d interdição temporária de direitos arts 43 V e 47 subdividese em proibição do exercício de cargo função ou atividade pública bem como de mandato eletivo proibição do exercício de profissão atividade ou ofício que dependam de habilitação especial de licença ou autorização do Poder Público suspensão de autorização ou de habilitação para dirigir veículo e proibição de frequentar determinados lugares esta última acrescentada pela Lei n 971498 e limitação de fim de semana arts 43 VI e 48 consiste na obrigação de o condenado permanecer aos sábados e domingos por determinado período em casa de albergado ou em estabelecimento adequado f multa art 44 2º é a pena pecuniária tradicional mas aqui com caráter substitutivo g prestação de outra natureza inominada art 45 2º a chamada prestação pecuniária pode se houver concordância do beneficiário ser substituída por prestação de outra natureza art 45 2º 3 Fase processual da substituição a Na sentença condenatória ao fixar a pena definitiva o juiz verificando a quantidade de pena não superior a quatro anos ou a natureza do crime culposo constatando a presença dos requisitos legais deve fazer a substituição por uma pena restritiva art 59 IV b durante a execução condenado que não obtiver a substituição na condenação poderá ter uma nova oportunidade durante a execução mediante conversão art 180 da LEP 4 Caráter substitutivo As penas restritivas de direitos são sempre substitutivas da pena privativa de liberdade Essas penas não podem ser suspensas ou substituídas Elas é que substituem a pena de prisão Primeiro o magistrado fixa a pena de prisão que seria definitiva e depois se for o caso faz a substituição pela pena restritiva cabível Já no Juizado Especial ao contrário da previsão do Código Penal as penas restritivas de direitos e a multa têm caráter alternativo à prisão É apenas uma questão sistemática quase semântica 41 Penas alternativas ou restritivas de direitos Curiosidade as penas alternativas na verdade são substitutivas e não alternativas isto é não podem ser aplicadas diretamente mas somente em substituição à pena privativa de liberdade Igualmente embora sejam conhecidas como penas alternativas receberam equivocadamente o nomen iuris de penas restritivas de direitos Coisas da sabedoria do legislador brasileiro 42 Exceção à insubstituibilidade dessas penas A pena de prestação pecuniária pode excepcionalmente ser substituída por prestação de outra natureza desde que presentes certas circunstâncias art 45 2º Seria em outros termos a substituição da substituição 5 Penas alternativas na reforma penal de 1984 Eram adotadas as seguintes alternativas com a mesma equivocada denominação de penas restritivas de direitos 1ª multa substitutiva arts 44 parágrafo único e 60 2º 2ª prestação de serviços à comunidade arts 43 I e 46 3ª limitação de fim de semana arts 43 III e 48 4ª interdições temporárias de direitos arts 43 II e 47 6 Retroatividade das novas penas A nova legislação elevou a possibilidade de substituição de penas inferiores a um ano para até quatro inclusive Logo é mais benéfica retroagindo portanto em todas as hipóteses anteriores à Lei n 9714 que não concedeu a substituição em razão da quantidade da pena privativa e liberdade aplicada 61 Retroatividade e requisitos da substituição Não se pode ignorar que o novo limite de quatro anos é somente um dos requisitos para a substituição exigindose outros como modalidade de execução com violência à pessoa ou grave ameaça reincidência em crime doloso em tese e prognose da suficiência da substituição 62 Limites da retroatividade Como se trata de lei penal material mais benéfica atinge a própria coisa julgada O juiz das execuções criminais será o competente para rever essas questões 63 Retroatividade e processos nos tribunais Não pode ser suprimido um grau de jurisdição Ademais decisão contrária pode tornarse irrecorrível pelo afunilamento dos recursos excepcionais 64 Retroatividade e ausência dos requisitos Se o primeiro grau referiuse a ausência dos requisitos para a substituição não há que se falar em supressão de grau de jurisdição a menos que tais requisitos ausentes sejam a quantidade de pena hoje presente ou a reincidência não dolosa 65 Reincidência dolosa e processo em grau recursal Como regra a reincidência dolosa é fator impeditivo da substituição Só excepcionalmente a reincidência dolosa pode ser considerada para permitir a substituição quando em face de condenação anterior a medida seja socialmente recomendável Por economia processual nesta hipótese inclinome em admitir que o próprio órgão recursal pode avaliar a substituibilidade ou não da condenação 66 Retroatividade e reincidência específica A reincidência específica reeditada por si só impede a aplicação dos benefícios da nova lei J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos não prevista no art 43 do Código Penal constitui violação ao Princípio da Reserva Legal TJMG Apelação 100240279204380011 Rel Alexandre Victor de Carvalho j 1312 2005 A imposição da pena restritiva de direito como induvidosa expressão da individualização da resposta penal reclama devida fundamentação sendo defeso ao magistrado escolher a limitação de fim de semana em detrimento de espécie menos grave prevista no rol do art 43 do Código Penal sem declinar ainda que sucintamente os motivos ensejadores de sua indicação STJ HC 25838RS Rel Min Hamilton Carvalhido j 322005 A sentença condenatória à pena restritiva de direito não comporta execução provisória Constituição da República art 5º inciso LVII e Lei de Execução Penal art 147 STJ HC 28290RS Rel Min Hamilton Carvalhido j 1082004 O princípio do livre convencimento exige fundamentação concreta vinculada do ato decisório A escolha das penas restritivas de direito dentre as previstas no art 43 do CP sem apontar qualquer fundamento não preenche as exigências constitucionais e infraconstitucionais art 93 inciso IX 2ª parte da Carta Magna e arts 157 381 e 387 do CPP Não se pode confundir livre convencimento com convicção íntima Precedentes STJ HC 29357RS Rel Min Félix Fischer j 1832004 A Lei n 971498 que deu nova redação aos arts 43 a 47 do Código Penal introduziu entre nós o sistema de substituição de pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos e por ser mais benigna tem aplicação retroativa nos termos do art 2º parágrafo único do Estatuto Penal e do art 5º XL da Constituição STJ REsp 475248MG Rel Min Vicente Leal j 2022003 Art 44 As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade quando I aplicada pena privativa de liberdade não superior a 4 quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou qualquer que seja a pena aplicada se o crime for culposo II o réu não for reincidente em crime doloso III a culpabilidade os antecedentes a conduta social e a personalidade do condenado bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente 1º Vetado 2º Na condenação igual ou inferior a 1 um ano a substituição pode ser feita por multa ou por uma pena restritiva de direitos se superior a 1 um ano a pena privativa de liberdade pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos e multa ou por duas restritivas de direitos 3º Se o condenado for reincidente o juiz poderá aplicar a substituição desde que em face de condenação anterior a medida seja socialmente recomendável e a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do mesmo crime 4º A pena restritiva de direitos convertese em privativa de liberdade quando ocorrer o descumprimento injustificado da restrição imposta No cálculo da pena privativa de liberdade a executar será deduzido o tempo cumprido da pena restritiva de direitos respeitado o saldo mínimo de 30 trinta dias de detenção ou reclusão 5º Sobrevindo condenação a pena privativa de liberdade por outro crime o juiz da execução penal decidirá sobre a conversão podendo deixar de aplicála se for possível ao condenado cumprir a pena substitutiva anterior Veto do 1º este parágrafo do projeto original n 268496 previa três espécies de penas alternativas advertência frequência a curso e submissão a tratamento Embora se afirme que o Presidente da República desejasse vetar somente a advertência as outras duas também foram vetadas porque constavam do mesmo parágrafo O texto vetado tinha a seguinte redação Quando a condenação for inferior a 6 seis meses o juiz entendendo suficiente pode substituir a pena privativa de liberdade por advertência que consistirá em admoestação verbal ao condenado ou por compromisso de frequência a curso ou submissão a tratamento durante o tempo da pena aplicada Parágrafo revogado o conteúdo do inciso I deste artigo acabou revogando o anterior parágrafo único que tinha a seguinte redação Parágrafo único Nos crimes culposos a pena privativa de liberdade aplicada igual ou superior a 1 um ano pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos e multa ou por duas penas restritivas de direitos exequíveis simultaneamente O caput permanece com a redação determinada pela Lei n 720984 Incisos I e II com redação determinada pela Lei n 971498 O inciso III permanece com redação determinada pela Lei n 720984 O 1º foi vetado pelo Sr Presidente da República Os 2º a 5º foram acrescentados pela Lei n 971498 V arts 58 parágrafo único 59 IV 60 2º 69 1º e 2º e 77 III do CP D O U T R I N A 1 Requisitos necessários à substituição A aplicação de pena restritiva de direitos está condicionada a determinados requisitos objetivos e subjetivos que devem ser simultâneos 1º Quantidade de pena aplicada pena não superior a quatro anos reclusão ou detenção independentemente da natureza do crime doloso ou culposo pode ser substituída por pena restritiva de direitos Não se faz distinção entre crime doloso e crime culposo para penas de até quatro anos qualquer dos dois poderá ser objeto de substituição 2º Natureza do crime cometido no entanto é fundamental a análise da natureza do crime se doloso ou culposo na medida em que para o crime culposo não há limite da pena aplicada 3º Modalidade de execução que o crime não tenha sido praticado com violência ou grave ameaça à pessoa A ampliação do cabimento das penas alternativas para pena não superior a quatro anos recomendou que se ampliasse o elenco de requisitos necessários Considerase aqui não só o desvalor do resultado mas fundamentalmente o desvalor da ação que nos crimes violentos é sem dúvida muito maior e consequentemente seu autor não deve merecer o benefício da substituição 4º Réu não reincidente em crime doloso as penas restritivas de direitos são em tese inaplicáveis em casos de reincidência art 44 II do CP Aqui na redação determinada pela Lei n 720984 diferentemente da suspensão condicional não se fazia qualquer distinção entre reincidente em crime doloso e reincidente em crime culposo Agora com a nova redação somente a reincidência em crime doloso pode em princípio impedir a substituição em análise Dessa forma aumentase a liberalidade basta que um dos crimes a condenação anterior ou a atual seja culposo e não haverá reincidência dolosa A própria reincidência em crime doloso agora não é fator de impedimento absoluto pois em face de condenação anterior a medida substituição poderá ser socialmente recomendável Muito se terá de dizer sobre este tópico Somente a reincidência específica art 44 3º in fine constitui impedimento absoluto para a aplicação de pena restritiva de direitos 5º Prognose de suficiência da substituição os critérios para a avaliação da suficiência da substituição são representados pela culpabilidade antecedentes conduta social e personalidade do condenado bem como os motivos e as circunstâncias do fato todos previstos no art 44 III do Código Penal Dos elementos do art 59 somente as consequências do crime e o comportamento da vítima foram desconsiderados para a formação do juízo de suficiência Considerando a grande elevação das hipóteses de substituição devese fazer uma análise bem mais rigorosa desse requisito Será por meio dele que o Poder Judiciário poderá equilibrar e evitar eventuais excessos que a nova previsão legal poderá apresentar 11 Prudência na análise desses requisitos Aqui como na suspensão condicional o risco a assumir na substituição deve ser prudencial e diante de sérias dúvidas sobre a suficiência da substituição esta não deve ocorrer sob pena de o Estado renunciar ao seu dever constitucional de garantir a ordem pública e a proteção de bens jurídicos tutelados 12 Substituição nos crimes culposos Tratandose de crimes culposos não há limite para a substituição Ressalvase apenas que agora tanto nos crimes culposos como nos crimes dolosos penas privativas de liberdade superiores a um ano a substituição será por uma pena restritiva de direitos a cabível na espécie e multa ou então por duas penas restritivas de direitos desde que possam ser executadas simultaneamente art 44 2º 13 Substituição e aplicação cumulativa A possibilidade de substituir por uma pena restritiva de direitos e multa pena superior a um ano não impede que seja possível a aplicação cumulativa de pena restritiva de direitos e multa em crimes dolosos ou mesmo culposos com penas de até um ano Será possível a aplicação cumulativa em delitos que cominem pena privativa de liberdade cumulada com a de multa como ocorre por exemplo com os delitos de usurpação arts 161 e 162 do CP Substituise a pena privativa de liberdade por uma restritiva e mantémse a pena de multa Caso contrário quando a lei prevê cumulativamente pena privativa de liberdade e multa o juiz ficaria sempre impossibilitado de fazer a substituição da pena de prisão porque também não pode deixar de aplicar a pena de multa prevista cumulativamente O que a lei não permite efetivamente é a substituição cumulativa que não se confunde com aplicação cumulativa das duas penas referidas para crimes com penas não superiores a um ano A verdade é que a substituição cumulativa permitida restringese somente às condenações superiores a um ano 14 Substituição nas penas de até um ano de prisão Pena aplicada não superior a um ano de prisão poderá ser substituída por pena de multa art 44 2º primeira parte do CP Essa previsão não impede contudo a possibilidade abstratamente considerada de efetuarse a substituição por pena restritiva de direitos isto é a possibilidade de substituir por multa não exclui ipso facto a possibilidade de substituirse por pena restritiva de direitos As circunstâncias gerais é que determinarão qual das duas substituições no caso concreto será a mais recomendável 15 Substituição nas penas de até seis meses de prisão Pelo texto legal revogado era o limite máximo permitido para aplicar a multa substitutiva que agora se estendeu para pena de até um ano de prisão Até esse limite de pena agora não poderá ser substituída por prestação de serviços à comunidade Essa pena somente é aplicável a penas superiores a seis meses art 46 caput 2 Obrigatoriedade da substituição Não se trata de mera faculdade do aplicador da lei Satisfeitos os requisitos legais a substituição é obrigatória constituindo um direito público subjetivo do condenado 3 Reincidência dolosa inciso II e 3º Agora com a nova redação somente a reincidência em crime doloso pode em princípio impedir a substituição em análise Dessa forma aumentase a liberalidade basta que um dos crimes a condenação anterior ou a atual seja culposo e não haverá reincidência dolosa 31 Relatividade dos efeitos da reincidência E mesmo a reincidência dolosa poderá não constituir obstáculo definitivo à substituição desde que em face da condenação anterior a medida seja socialmente recomendável Somente a reincidência específica art 44 3º in fine constitui impedimento absoluto para a aplicação de pena restritiva de direitos 32 Substituição socialmente recomendável Essa expressão socialmente recomendável pode ser interpretada como prognose favorável de necessidade e suficiência da substituição O grande equívoco está em determinar que se leve em consideração a condenação anterior que já foi objeto de valoração e não está mais em julgamento incorrendose em bis in idem Sugerimos que o juízo de tratarse ou não de medida socialmente recomendável incida sobre o fato em julgamento ainda que se possa cotejar com a condenação anterior 4 Conversão das penas restritivas de direitos Em determinadas circunstâncias as penas restritivas de direitos podem ser convertidas em pena privativa de liberdade observada a detração art 44 4º e 5º do CP e art 181 e parágrafos da LEP 41 Coercibilidade da conversão Ao adotar as penas restritivas de direitos como substitutivas da pena de prisão era indispensável dotálas de coercibilidade E para isso nada melhor do que a previsão da possibilidade de convertêlas em pena privativa de liberdade A finalidade da conversão em outras palavras é garantir o êxito das penas substitutivas 42 Limite temporal da conversão A conversão deixou de ser pela pena efetivamente aplicada independentemente do tempo de cumprimento da sanção restritiva Atendendo o clamor de doutrina e jurisprudência adotouse o princípio da detração deduzindose o tempo de pena restritiva efetivamente cumprido 43 Conversão e detração penal Pela legislação revogada faziase a conversão pelo tempo de pena aplicada sem descontar o período cumprido de pena restritiva antigo art 45 Para afastar essa brutal injustiça a nova lei adotou com acerto o princípio da detração penal determinando a dedução do tempo cumprido de pena restritiva de direitos 44 Ressalva quantum mínimo de conversão A afirmação de dever ser respeitado o saldo mínimo de trinta dias de detenção ou reclusão segundo alguns entendimentos referese ao mínimo de dias de penas alternativas cumprido para permitir a dedução da pena de prisão a converter Ou seja cumprimento inferior a 30 dias não poderia ser aplicado à detração Pensamos o contrário a ressalva do saldo mínimo de trinta dias referese ao período mínimo de conversão possível para desestimular o descumprimento injustificado nos últimos dias da substituição Saldo é o que falta para cumprir e nunca o tempo de pena restritiva já cumprido Por exemplo indivíduo condenado a seis meses de prisão tem sua pena convertida em prestação de serviços à comunidade Nos últimos dias começa a descumprir todas as restrições impostas Ora para se manter a coercibilidade do cumprimento das restrições impostas essa conversão deverá ser no mínimo de trinta dias Parece justo Antes pela lei revogada a conversão era pelo total da pena aplicada sem detração Houve com efeito inegável avanço 45 Conversão exclusão das penas pecuniárias As penas de prestação pecuniária e perda de bens e valores em razão de sua natureza pecuniária a exemplo da pena de multa não podem ser convertidas em pena de prisão pela falta de pagamento Afora a proibição de conversão em prisão da pena pecuniária só existia a pena de multa consagrada pela Lei n 926896 os seguintes aspectos do texto legal caracterizam essa exclusão 1º descumprimento injustificado da restrição imposta Ora nas penas pecuniárias multa prestação pecuniária e perda de bens e valores não há restrição a cumprir 2º dedução do tempo cumprido da pena restritiva de direitos Ora nas penas pecuniárias não há tempo a cumprir 46 Prisão simples impossibilidade de conversão Prisão simples substituída por pena restritiva de direitos não pode ser convertida em pena de prisão O texto é expresso ao referirse a detencão ou reclusão art 45 4º in fine E a interpretação extensiva contra o infrator é inadmissível em Direito Penal 5 Causas gerais de conversão 1ª Descumprimento injustificado da restrição imposta somente o descumprimento injustificado da restrição imposta leva à necessidade de conversão obrigatória art 44 4º Por isso o condenado deve nesses casos sempre ser ouvido pelo juiz pois poderá justificar o descumprimento da condição 2ª Nova condenação por outro crime nova condenação por outro crime passa a ser causa de relativa obrigatoriedade de conversão em pena de prisão pelo restante da pena a cumprir art 44 5º É indiferente que a nova condenação se refira a crime anterior à primeira condenação ou a crime praticado durante o cumprimento da pena restritiva Enfim na hipótese de nova condenação por outro crime poderá haver duas alternativas uma obrigatória e outra facultativa a a conversão será obrigatória se houver incompatibilidade no cumprimento das duas condenações a anterior e a nova isto é se não for possível o cumprimento simultâneo das duas condenações b a conversão será facultativa se for possível o cumprimento simultâneo da pena em cumprimento e da nova condenação não será necessária a conversão 51 Nova condenação com pena substituída ou suspensa A nova redação não faz referência ao fato de a nova condenação ter sido suspensa ou substituída como ocorria na redação anterior No entanto são duas circunstâncias suspensão ou substituição da nova condenação que se existirem autorizam a manutenção da pena substitutiva anterior Enfim para a conversão ter lugar é preciso que a nova pena aplicada não tenha sido substituída ou suspensa e não seja possível o cumprimento simultâneo das duas condenações art 44 5º do CP 52 Causas especiais de conversão A Lei de Execução Penal em seu art 181 1º a 3º prevê outras causas de conversão específicas para cada modalidade de pena restritiva São elas 1 Para prestação de serviços à comunidade a quando o condenado não for localizado por encontrarse em lugar incerto e não sabido ou desatender à intimação por edital b não comparecer injustificadamente à entidade ou programa em que deva prestar serviço c recusarse injustificadamente a prestar o serviço que lhe foi imposto d praticar falta grave 2 Para limitação de fim de semana a não comparecimento ao estabelecimento designado para o cumprimento da pena b recusa em exercer a atividade determinada pelo juiz c como na hipótese de prestação de serviços à comunidade se o apenado não for encontrado ou não atender intimação por edital se praticar falta grave ou sofrer condenação por crime à pena privativa de liberdade que não seja substituída ou suspensa 3 Para interdição temporária de direitos a se o apenado exercer injustificadamente o direito interditado b como nas demais modalidades de penas restritivas a não localização do apenado por encontrarse em lugar incerto e não sabido ou o não atendimento da intimação por edital c se praticar falta grave ou sofrer condenação por crime à pena privativa de liberdade que não seja suspensa ou substituída também causará a conversão 6 Outras questões apresentadas pela Lei n 971498 61 Os crimes hediondos e a Lei n 971498 Aquelas infrações definidas como crimes hediondos ou assemelhados que satisfizerem os requisitos exigidos pelo art 44 do CP admitem a aplicação de penas restritivas de direitos Na verdade a substituição de penas somente estará vedada quando a pena privativa de liberdade aplicada for superior a quatro anos ou o crime for daqueles praticados com violência ou grave ameaça à pessoa 62 Crimes hediondos e violência ficta A violência real física ou moral por si só impede a substituição por penas alternativas A violência ficta por sua vez nos crimes hediondos não autoriza tratamento diverso O desvalor da ação nesses casos é juridicamente superior tanto que a violência é presumida Na verdade nesses crimes o fato impeditivo da substituição não é a natureza da violência real ou ficta mas a natureza da própria infração Ademais o desvalor do resultado é o mesmo do crime praticado com violência real 63 Multa substitutiva e outras penas pecuniárias Condenação superior a um ano pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos e multa ou por duas restritivas de direitos Teria sido mais feliz a previsão se autorizasse a substituição nesses casos por uma pena restritiva de direitos e uma pena pecuniária Tal como está pelo princípio da legalidade é inadmissível essa substituição por uma restritiva de direitos stricto sensu e outra pena pecuniária prestações pecuniárias ou perda de bens e valores 64 Equívoca previsão da aplicação das penas pecuniárias O texto legal não prevê nem as hipóteses em que podem ser aplicadas as penas de prestação pecuniária e de perda de bens e valores tampouco as suas formas de execução Afora o vexame de considerar duas penas pecuniárias como restritivas de direitos 65 Penas pecuniárias travestidas de restritivas de direitos Mantendo o entendimento do tópico anterior como prestações pecuniárias e perda de bens e valores são definidas como restritivas de direitos nada impede que uma ou outra seja aplicada cumulativamente com pena de multa nas penas superiores a um ano de prisão art 44 2º 2ª parte 66 Aplicação da Lei n 9714 nos crimes de tóxicos Nada impede que a pena privativa de liberdade aplicada em decorrência de condenação pelo art 16 da Lei de Tóxicos seja substituída por pena restritiva de direitos O disposto no art 12 do CP autoriza essa interpretação 67 Conflito das Leis n 971498 e 909995 671 Lesão corporal leve dolosa Pela nova lei não será admitida a substituição por pena restritiva de direitos pois se trata de crime cometido com violência à pessoa art 44 I Na verdade esse crime não está afeto à Parte Geral do Código Penal pois se trata de infração penal de menor potencial ofensivo art 61 da Lei n 909995 aplicandoselhe a política criminal consensual da referida lei Enfim permanece inalterado seu tratamento político criminal 672 Crimes de ameaça art 147 e constrangimento ilegal art 146 Nesses dois crimes as circunstâncias são semelhantes pois são praticados com grave ameaça à pessoa Não se lhes aplicariam as novas penas alternativas pois o novo texto legal exclui da substituição os crimes praticados com violência moral grave ameaça No entanto a exemplo da lesão corporal leve são da competência dos Juizados Especiais Criminais cuja filosofia políticocriminal permanece inalterada Essa é a nosso juízo a interpretação mais razoável 68 Incoerência da política criminal brasileira A despeito da grande expectativa pelas necessárias e esperadas penas alternativas vemos com grande ceticismo o futuro de tais sanções pela falta de vontade política em dotar de infraestrutura necessária para permitir a sua adequada operacionalização 69 Gancho para novas exasperações de penas Ademais a ampliação da possibilidade de substituição de pena de até quatro anos servirá de desculpa para voltarem a exasperar as penas de muitas infrações penais com a finalidade de impedir a aplicação das penas restritivas de direitos Gostaríamos de estar equivocado mas quem viver verá J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Às penas restritivas de direitos aplicamse os mesmos prazos das penas privativas de liberdade para fins de prescrição STJ HC 82544RS Rel Jane Silva j 279 2007 O exercício da prostituição não pode ser alegado como motivo para a negativa de substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos máxime quando a ré é primária Legalidade da atividade hoje devidamente disciplinada pela Classificação Brasileira de Ocupações CBO do Ministério do Trabalho TRF5ª Região Apelação 200683000061593 Rel Margarida Cantarelli j 492007 Para que o réu seja beneficiado com a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos é indispensável o preenchimento dos requisitos objetivos e subjetivos constantes do art 44 do Código Penal o que não ocorreu no caso Precedentes STJ HC 77836RJ Rel Min Félix Fischer j 782007 Operase a conversão da pena restritiva de direitos em privativa de liberdade quando ocorre o descumprimento injustificado da restrição imposta STJ HC 64658RJ Rel Min Nilson Naves j 562007 O equívoco da argumentação do recorrente está em confundir a pena de multa prevista abstratamente no tipo penal com a prestação pecuniária substitutiva da pena privativa de liberdade art 44 2º do Código Penal Todavia tais reprimendas possuem natureza totalmente diversas não havendo qualquer impedimento legal para sua cumulação STF RHC 90114PR Rel Min Eros Grau j 562007 A Lei n 91741998 que trata das penas restritivas de direitos limitouse a alterar o Código Penal nessa matéria Tal alteração não alcança os crimes militares objeto de lei especial distinta no ponto o Código Penal Militar O fato de o paciente encontrarse na reserva não o subtrai ao campo de incidência do Código Penal Militar cujas normas sua conduta violou STF HC 86079SP Rel Min Joaquim Barbosa j 2692006 Na espécie o paciente foi condenado à pena de 2 anos de reclusão em regime aberto não é reincidente em crime doloso o crime não foi praticado com violência ou grave ameaça à pessoa e a culpabilidade os antecedentes a conduta social e a personalidade bem como os motivos e as circunstâncias lhe são favoráveis tanto que a penabase foi fixada pelo juiz no mínimo legal Dessa forma presentes os requisitos do art 44 do Código Penal deve ser reconhecida a possibilidade de substituição da pena STJ HC 42483RJ Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 38 2006 Fixada a pena em mais de quatro anos não cabe a aplicação do art 44 do Código Penal STJ HC 50388MG Rel Min Félix Fischer j 252006 Não obstante o 3º do art 44 do Código Penal admita a concessão da substituição ao réu reincidente quando não se trate de reincidência específica ou seja condenação pela prática do mesmo delito devem estar presentes os demais requisitos previstos nos incisos I e III do referido dispositivo legal exigindo ainda que a medida seja socialmente recomendável o que não se verifica na espécie STJ REsp 689178SP Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 442006 Tendo sido a pena imposta abaixo do limite de 4 anos de reclusão e não sendo o caso de delito praticado com violência ou grave ameaça é direito subjetivo do réu ver a possibilidade da substituição de sua pena apreciada pelo Juízo que o condenou Precedentes STJ RHC 16620RJ Rel Min Gilson Dipp j 2222005 A reincidência genérica em crime doloso não impede a imposição de pena restritiva de direito quando em face da condenação anterior a resposta penal substitutiva se mostrar socialmente recomendável Código Penal art 44 3º STJ RHC 15948SP Rel Min Hamilton Carvalhido j 16122004 Ao reduzir para 3 anos de reclusão a pena imposta ao paciente deve o Tribunal pronunciarse até mesmo de ofício acerca da possibilidade de substituição da pena STJ HC 22947RJ Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 1022004 Havendo concurso de crimes a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos é possível quando o total das reprimendas não ultrapasse o limite de quatro anos disposto no art 44 inciso I do Código Penal STJ HC 21681SP Rel Min Laurita Vaz j 1762003 A pena restritiva de direitos consistente em aplicação de prestação pecuniária substitutiva da privativa de liberdade pode ser cumulativa à incidência de multa por se tratar de institutos de natureza jurídica diversa STJ EDcl no AgRg no Ag 356220RS Rel Min Félix Fischer j 21112002 Conversão das penas restritivas de direitos Art 45 Na aplicação da substituição prevista no artigo anterior procederseá na forma deste e dos arts 46 47 e 48 1º A prestação pecuniária consiste no pagamento em dinheiro à vítima a seus dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social de importância fixada pelo juiz não inferior a 1 um salário mínimo nem superior a 360 trezentos e sessenta salários mínimos O valor pago será deduzido do montante de eventual condenação em ação de reparação civil se coincidentes os beneficiários 2º No caso do parágrafo anterior se houver aceitação do beneficiário a prestação pecuniária pode consistir em prestação de outra natureza 3º A perda de bens e valores pertencentes aos condenados darseá ressalvada a legislação especial em favor do Fundo Penitenciário Nacional e seu valor terá como teto o que for maior o montante do prejuízo causado ou do provento obtido pelo agente ou por terceiro em consequência da prática do crime 4º Vetado O Presidente da República quando da edição da Lei n 9714 de 25 de novembro de 1998 vetou o dispositivo que previa o recolhimento domiciliar como pena alternativa art 43 III do CP Em consequência vetou também o 4º do art 45 que disciplinava a medida Texto vetado O recolhimento domiciliar baseiase na autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado O condenado deverá sem vigilância trabalhar frequentar curso ou exercer atividade autorizada permanecendo recolhido nos dias ou horários de folga em residência ou qualquer local destinado à sua moradia habitual conforme estabelecido na sentença Caput com redação determinada pela Lei n 9714 de 25 de novembro de 1998 Os 1º 2º e 3º foram acrescentados pela Lei n 9714 de 25 de novembro de 1998 V art 181 1º b e c da Lei n 721084 Lei de Execução Penal D O U T R I N A 1 Nova redação Caput e parágrafos com redação determinada pela Lei n 971498 2 Nomen iuris equivocado Erro crasso resultante de cópia malfeita do texto anterior O nomen iuris não tem nenhuma relação com a nova redação do dispositivo Com um pouquinho de atenção se perceberia que a disciplina da conversão está prevista no 4º do art 44 e não mais neste artigo 3 Definições legais 31 Prestação pecuniária Segundo a definição legal consiste no pagamento em dinheiro à vítima a seus dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social de importância fixada pelo juiz não inferior a um salário mínimo nem superior a 360 salários mínimos art 45 1º 311 Duvidosa constitucionalidade A fixação dessa sanção penal em salários mínimos é pelo menos de duvidosa constitucionalidade Teria sido mais feliz e manteria a harmonia do Código Penal relativamente à sanção pecuniária se tivesse sido utilizado o critério exitoso do sistema diasmulta 312 Definição falaciosa da prestação pecuniária A finalidade desta sanção segundo a dicção do 1º é reparar o dano causado pela infração penal Tanto é verdade que o valor pago deverá ser deduzido do montante de eventual condenação em ação de reparação civil se coincidentes os beneficiários art 45 1º Teria sido mais adequado e mais autêntico definila como multa reparatória que é sua verdadeira natureza 313 Destinatários da prestação pecuniária Preferencialmente o montante da condenação nesta sanção destinase à vítima ou a seus dependentes Somente em duas hipóteses essa condenação terá outro destinatário se não houver dano a reparar ou não houver vítima imediata Nesses casos o montante da condenação destinarseá a entidade pública ou privada com destinação social 314 Exclusão dos sucessores Ao destinar especificamente à vítima ou dependentes excluem se peremptoriamente os sucessores suprimindo a relação sucessória Assim os sucessores somente serão destinatários enquanto forem dependentes e o direito decorrerá não da relação de sucessão mas da relação de dependência 315 Limites da prestação pecuniária Afora o grande equívoco no parâmetro escolhido salário mínimo destacase o erro em limitála em um salário mínimo considerando sua natureza reparatória Não raro o dano causado pela infração penal poderá ser inferior a esse limite especialmente nas infrações de menor potencial ofensivo Mais adequado é o sistema diasmulta que permite a aplicação mínima de um terço do salário mínimo art 49 e 1º do CP Ademais os mais pobres terão grande dificuldade para suportar esse novo limite 316 Limitação da compensação condenação em ação reparatória Pelo texto legal que exige condenação eventual composição ou conciliação cível não pode ser compensada pela sanção de prestação pecuniária ainda que procedida em ação reparatória cível e com coincidência de destinatários Não se pode negar que se trata de uma limitação equivocada que recomenda interpretação extensiva 317 Extensão da compensação às conciliações cíveis A despeito do texto legal acreditamos ser possível estender a dedução prevista na segunda parte do 1º em exame às conciliações devidamente homologadas em ações de reparação civil 318 A prestação pecuniária e a Lei n 909995 Coerente com o afirmado no tópico anterior admitimos a possibilidade de compensar o montante da pena de prestação pecuniária decorrente de transação penal arts 76 ou 79 ou de condenação na audiência de instrução e julgamento art 81 com eventual composição cível art 74 Mas isso só poderá ocorrer em ação penal pública incondicionada na medida em que a composição cível extingue a punibilidade nas ações de iniciativa privada ou pública condicionada à representação não havendo consequentemente sanção penal de qualquer natureza 32 Prestação de outra natureza inominada art 45 2º A chamada prestação pecuniária pode se houver concordância do beneficiário ser substituída por prestação de outra natureza art 45 2º 321 Prestação de outra natureza exclusão das penas pecuniárias Se a prestação pecuniária pode ser substituída por prestação de outra natureza à evidência essa nova prestação não pode ser de natureza pecuniária eliminandose prima facie as penas de multa e perda de bens e valores 322 Pena inominada constitucionalidade duvidosa Pena inominada é pena indeterminada e viola o princípio da reserva legal art 5º XXXIX da CF e art 1º do CP Esse princípio exige que preceito e sanção sejam claros precisos certos e determinados Em termos de sanções criminais é inadmissível pelo princípio de legalidade expressões vagas equívocas ou ambíguas O CP neste parágrafo segundo Damásio de Jesus comina sanção de conteúdo vago impreciso e incerto Damásio E de Jesus em seu Penas alternativas 2 ed São Paulo Saraiva 2000 Essa pena seria na realidade a substituta da substituta da pena de prisão 323 Natureza consensual dessa conversão A substituição da natureza da prestação depende da aceitação do beneficiário isto é referida operação tem caráter consensual Em outros termos essa troca da natureza da prestação dependerá do consentimento do beneficiário consequentemente este precisa ser previamente ouvido 324 Quem é o beneficiário art 45 2º Não pode ser o autor da infração penal ou condenado Caso contrário abrirseia grande espaço para a vindita privada Destinandose à vítima ou a seus dependentes frequentemente aquele o condenado preferiria cumprir prestação de outra natureza com inegáveis prejuízos aos seus destinatários Logo o vocábulo beneficiário não pode estar se referindo ao beneficiário da substituição penal mas com certeza referese ao beneficiário do resultado da aplicação dessa pena pecuniária que como afirmamos tem caráter indenizatório 325 Competência para aplicação da pena inominada Não pode ser do órgão recursal em razão da sua consensualidade Além da supressão de um órgão de jurisdição não seria possível convocar o beneficiário para ser ouvido na sessão de julgamento sobre seu assentimento na conversão da natureza da prestação Encontrandose em grau de recurso deve baixar à origem 326 Conversão somente da prestação pecuniária fundamento Curiosamente somente a prestação pecuniária é autorizada a ser convertida em prestação de outra natureza As outras duas sanções pecuniárias pena de multa e perda de bens e valores não recebem a mesma faculdade Essa curiosa liberalidade do legislador tem uma explicação e não uma justificação é que aquela sanção prestação pecuniária destinase em tese à vítima ou seus dependentes enquanto estas duas multa e perda de bens destinamse ao Fundo Penitenciário Nacional É o velho descaso de sempre com o primo pobre do processo criminal a vítima além do mau hábito de prodigalizar o alheio 33 Perda de bens e valores Pertencentes ao condenado em favor do Fundo Penitenciário Nacional considerandose como teto o prejuízo causado pela infração penal ou o proveito obtido pelo agente ou por terceiro aquele que for mais elevado art 45 3º Tratase na verdade da odiosa pena de confisco 331 Confisco de bens e valores Sob a disfarçada e eufemística expressão perda de bens a liberal Constituição cidadã em verdadeiro retrocesso criou a possibilidade dessa pena que não teve a coragem de denominar corretamente pena de confisco O Código Penal brasileiro de 1940 não o consagrava e a própria Constituição de 1969 o proibia restando somente como efeitos da condenação o confisco dos instrumentos e produtos do crime em determinadas circunstâncias O próprio Carrara já afirmava que o confisco de bens é desumano impolítico e aberrante Aliás até a atual Constituição paraguaia de 1992 em seu art 20 proíbe o confisco de bens como sanção criminal 332 Perda de valores inconstitucionalidade Ou a perda de valores tem o mesmo significado de perda de bens ou é inconstitucional Se tiver o mesmo sentido a expressão é repetitiva e desnecessária Se não o tiver será inconstitucional basicamente por duas razões de um lado porque não estaria prevista pela atual Constituição que se refere somente a perda de bens e de outro porque viola o princípio da personalidade da pena podendo atingir parcela do patrimônio do outro cônjuge e dos herdeiros e sucessores 333 Destinação e objeto do confisco O produto desta sanção penal destinase ao Fundo Penitenciário Nacional assim como a pena de multa O objeto desse confisco no entanto não serão os instrumentos ou produtos do crime mas o próprio patrimônio do condenado definido como bens e valores 334 Distinção entre confiscopena e confiscoefeito da condenação Há duas distinções básicas 1ª o confiscoefeito destinase à União como receita não tributária enquanto o confiscopena destinase ao Fundo Penitenciário Nacional 2ª o objeto do conficoefeito são os instrumentos e produtos do crime art 91 II do CP enquanto o objeto do confiscopena é o patrimônio pertencente ao condenado art 45 3º do CP Não é lamentavelmente nem a reparação do prejuízo causado nem o proveito do crime 335 Limites do confisco Temos dois limites 1º limitação do quantum a confiscar pelo menos para suavizar a inconstitucionalidade desta sanção estabeleceuse como teto o maior valor entre o montante do prejuízo causado ou do proveito obtido com a prática do crime 2º limitação em razão da quantidade de pena aplicada esta sanção somente pode ser aplicada na hipótese de condenação que não ultrapasse o limite de quatro anos de prisão E somente caberá essa pena de perda de bens quando for possível a substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos segundo a previsão do art 45 e seus parágrafos 336 Ressalva legislação especial com destinação diversa Legislação especial pode relativamente a esta sanção penal darlhe destinação diversa do Fundo Penitenciário Nacional O art 243 da CF por exemplo prevê a expropriação de glebas de terras destinadas ao cultivo de drogas destinandoas ao assentamento de colonos semterra A inconstitucional Medida Provisória n 171398 convertida na Lei n 980499 alterou o art 62 da Lei n 113432006 para permitir a apreensão e o leilão de bens relacionados com o tráfico de drogas 337 Inconversibilidade das sanções pecuniárias em pena de prisão A Lei n 926896 eliminou a possibilidade de converter em pena de prisão por falta de pagamento a única pena pecuniária então existente no Código a pena de multa Como a prestação pecuniária e a perda de bens e valores têm como a pena de multa a mesma natureza pecuniária aplicaselhes a mesma proibição de conversão Interpretação diversa significa adotar dois pesos e duas medidas tratando desigualmente institutos iguais proíbese a conversão em prisão na impossibilidade de pagar a pena de multa mas se autoriza tal conversão em prisão na eventual impossibilidade de cumprir as outras duas penas pecuniárias Não seria coerente 338 Recolhimento domiciliar vetado O veto presidencial a esta modalidade de pena prevista no projeto original como pena substitutiva não impede a aplicação normal da prisão domiciliar naquelas hipóteses previstas no art 117 da LEP que representa uma subespécie do regime aberto 4 Descumprimento injustificado e a Lei n 909995 conversão Não mudou nada a conversão da pena de multa continua proibida pela Lei n 926896 A possibilidade de conversão para as penas restritivas de direitos já existia no texto do Código Penal A interpretação dominante mais liberal no entanto por política criminal não admite a conversão Pessoalmente gostamos da sugestão de Antonio Maurício Ribeiro Lopes de resolvêla com a execução de obrigação de fazer J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Pena pecuniária Impossibilidade de cumprimento Paciente desempregado Substituição da pena restritiva de direitos Possibilidade Comprovada a impossibilidade financeira do paciente que ensejaria o descumprimento justificado da pena restritiva de direitos impõese a sua alteração por outra que melhor se ajuste à situação STJ HC 82544RS Rel Jane Silva j 2792007 Na hipótese vertente a fixação da pena pecuniária art 45 do CP pouco acima do mínimo legal encontrase devidamente fundamentada pois considerouse além da situação econômica do réu o montante auferido com a prática delitiva STJ REsp 897876RS Rel Min Félix Fischer j 1262007 A pena de multa e prestação pecuniária modalidade de pena restritiva de direitos possuem naturezas jurídicas distintas As penas restritivas de direitos prescrevem no mesmo prazo em que prescreveria a pena privativa de liberdade que elas substituíram STJ REsp 815894SP Rel Min Félix Fischer j 17102006 A prestação pecuniária é espécie de pena restritiva de direitos que consiste no pagamento em dinheiro à vítima seus dependentes às entidades públicas ou privadas que tenham destinação social STJ RHC 15603RS Rel Min Gilson Dipp j 652004 Prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas Art 46 A prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas é aplicável às condenações superiores a 6 seis meses de privação da liberdade 1º A prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas consiste na atribuição de tarefas gratuitas ao condenado 2º A prestação de serviços à comunidade darseá em entidades assistenciais hospitais escolas orfanatos e outros estabelecimentos congêneres em programas comunitários ou estatais 3º As tarefas a que se refere o 1º serão atribuídas conforme as aptidões do condenado devendo ser cumpridas à razão de 1 uma hora de tarefa por dia de condenação fixadas de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho 4º Se a pena substituída for superior a 1 um ano é facultado ao condenado cumprir a pena substitutiva em menor tempo art 55 nunca inferior à metade da pena privativa de liberdade fixada Foi revogado o parágrafo único que tinha a seguinte redação As tarefas serão atribuídas conforme as aptidões do condenado devendo ser cumpridas durante 8 oito horas semanais aos sábados domingos e feriados ou em dias úteis de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho Caput com redação determinada e parágrafos acrescentados pela Lei n 971498 V art 78 1º do CP V art 78 III da Lei n 807890 Código de Defesa do Consumidor V arts 149 1º e 158 1º da Lei n 721084 Lei de Execução Penal D O U T R I N A 1 Prestação de serviços à comunidade A doutrina tem conceituado a prestação de serviços à comunidade como o dever de prestar determinada quantidade de horas de trabalho não remunerado e útil para a comunidade durante o tempo livre em benefício de pessoas necessitadas ou para fins comunitários arts 43 IV e 46 2 Respeito às aptidões pessoais do condenado As atividades atribuídas ao sentenciado devem guardar estreita correspondência com as aptidões pessoais de cada um e não coincidir com a jornada normal de trabalho de forma a alterar o mínimo possível a rotina diária art 46 3º Por isso é arbitrária e consequentemente ilegal a determinação de prestar qualquer serviço comunitário que não seja correspondente à formação e aptidões do condenado que nessa hipótese pode negarse a prestálo justificadamente 3 Locais de cumprimento desta pena Afastaramse liminarmente as entidades privadas que visam lucros de forma a impedir a exploração de mão de obra gratuita e o consequente locupletamento sem a devida contraprestação O art 46 arrola exemplificativamente como beneficiárias as entidades assistenciais hospitais escolas orfanatos e diz a lei outros estabelecimentos congêneres em programas comunitários ou estatais Logo toda instituição filantrópica de utilidade pública ou comunitária poderá ser conveniada e credenciada para participar desse programa alternativo à pena de prisão 4 Horários de cumprimento A coincidência de horários da prestação de serviços à comunidade com a jornada normal de trabalho gera um desconforto absolutamente desnecessário que terá certamente reflexos negativos na pretendida ressocialização do sentenciado Por isso o horário deverá atender prevalentemente as disponibilidades do condenado não podendo jamais prejudicar seus afazeres rotineiros art 46 3º do CP 5 Início e horário de cumprimento O trabalho comunitário na nova legislação brasileira não terá necessariamente de ser executado em oito horas semanais como ocorria na previsão anterior Essa alteração se justifica antes a conversão era por oito horas semanais e agora é à razão de uma hora de tarefa por dia de condenação O cumprimento começa com o primeiro comparecimento ao local determinado pelo juiz da execução art 149 2º da LEP As horas semanais podem ser distribuídas livremente nos dias recomendados e se for necessário podem até concentrarse em um só dia Mas é indispensável que se harmonizem com as disponibilidades do condenado 51 Novo parâmetro de conversão uma hora de tarefa por dia de condenação A conversão se fazia à razão de oito horas semanais pelo período de tempo a cumprir Com a nova redação a conversão se faz à razão de uma hora de tarefa por dia de condenação Em princípio a nova modalidade é mais vantajosa pela previsão anterior o cumprimento semanal representava em média trinta e duas horas agora essa soma regular com exceção do cumprimento em menor tempo representará trinta horas mensais A nosso juízo é desnecessário fixar essa pena em dias 52 Cumprimento em menor tempo 4º Esta pena de prestação de serviços comunitários desde que superior a um ano não excedendo a quatro pode ser cumprida em menor tempo do que aquele correspondente à pena substituída Nunca poderá exceder a metade da pena substituída Por isso agora poderão ser cumpridas mais de oito horas semanais 53 Cumprimento superior a oito horas semanais Agora não só é possível como é recomendável cumprir uma carga horária superior a oito horas semanais Caso contrário não seria possível cumprir esta pena em menor tempo como faculta o 4º deste artigo 54 Injustiça da limitação do cumprimento antecipado Somente a prestação de serviços à comunidade superior a um ano pode ser cumprida em menor tempo A pena superior a seis meses e não superior a um ano pelo texto legal terá de ser cumprida integralmente Imaginemse dois indivíduos condenados em coautoria um recebe um ano de pena e o outro um ano e um dia tendo ambos suas penas convertidas em prestação de serviços comunitários O primeiro terá de cumprir integralmente seu ano de pena enquanto o segundo poderá cumprila pela metade na mais flagrante injustiça Adotamos nesses casos a sugestão de Damásio de Jesus de estender a toda pena de prestação de serviços comunitários o direito de cumprila em menor tempo art 46 4º 55 Exclusão das outras penas restritivas Não deixa de ser curioso que o cumprimento da pena em menor tempo se limite à prestação de serviços à comunidade excluindo dessa possibilidade as demais penas temporais interdição temporária de direitos e limitação de fim de semana Embora seja verdade que a interdição temporária de direitos não há como ampliála ou diminuí la No entanto o mesmo não ocorre com a limitação de fim de semana Não haveria dificuldade por exemplo para que a limitação de fim de semana pudesse ser cumprida também no meio da semana feriados noite etc Tal como está será mais benéfico para o infrator receber a pena de prestação de serviços comunitários 56 Para pena superior a seis meses limitação equivocada É injustificada essa limitação impedindo que o magistrado no caso concreto faça a melhor adequação da pena a aplicar É mais um cerceamento desnecessário à dosimetria penal 57 Pena superior a seis meses e a Lei n 909995 À evidência que essa limitação iníqua não se aplica nas infrações de menor potencial ofensivo pois limitaria demasiadamente as opções do magistrado nos Juizados Especiais Criminais orientados por uma política criminal consensual 58 Novidade ou a entidades públicas O acréscimo da expressão ou a entidades públicas foi absolutamente inócuo e desnecessário na medida em que foi mantida a relação das entidades beneficiárias Houve apenas o deslocamento do caput para o 2º 6 Finalidades da sanção penal O fato de dever ser cumprida enquanto os demais membros da comunidade usufruem seu período de descanso gera aborrecimentos angústia e aflição Esses sentimentos são inerentes à sanção penal e integram seu sentido retributivo Ao mesmo tempo o condenado ao realizar essa atividade comunitária sentese útil por perceber que está emprestando uma parcela de contribuição e recebe muitas vezes o reconhecimento da comunidade pelo trabalho realizado Contudo o sucesso dessa iniciativa dependerá muito do apoio que a própria comunidade der à autoridade judiciária ensejando oportunidade de trabalho ao sentenciado 7 Características do trabalho comunitário As características fundamentais que o trabalho em proveito da comunidade deve reunir são gratuidade aceitação pelo condenado e autêntica utilidade social 8 Juízo competente A prestação de serviços à comunidade deve ser aplicada pelo juiz da condenação Porém a designação da entidade ou programa comunitário onde deverá ser cumprida será atribuição do juiz da execução que conhece a situação das entidades adequadas e fiscalizará a execução da pena O mesmo juiz da execução poderá alterar a forma horário e local de cumprimento da pena com a finalidade de ajustála às condições pessoais do condenado e conciliála com suas atividades de modo a não prejudicálo 9 Ausência de casa de albergado O parágrafo único do art 3º da Lei n 720984 permitiu ao juiz optar pelo sursis em substituição à limitação de fim de semana ante as dificuldades locais No entanto os estudiosos de modo geral têm olvidado que tal permissão se referia somente ao prazo de um ano a partir da vigência da referida lei 91 Ausência de casa de albergado inconveniência do sursis A ausência de casa de albergado recomenda a adoção de outra pena restritiva de direitos e não a simplória adoção do sursis Há uma gama de alternativas exatamente para escolher a possível e recomendável nas circunstâncias J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A O cumprimento da Prestação de Serviços à Comunidade é matéria afeta ao Juízo de Execução e a seu critério o cumprimento em um só dia as 8 horas semanais art 46 do CP A substituição da prestação de serviços à comunidade por outra de prestação pecuniária ainda que maior não atende os critérios da necessidade e suficiência para a prevenção e reprovação da conduta TJRS Apelação 70023115116 Rel Elba Aparecida Nicolli Bastos j 1332008 Violação ao art 46 do Código Penal Reforma da sentença para alterar a pena privativa de liberdade substituída pela prestação de serviços à comunidade pela pena de multa Recurso Crime 71001509686 Rel Clademir José Ceolin Missaggia j 2112008 Sendo os condenados de origem chinesa e desconhecendo o idioma português ou o inglês não é razoável a aplicação da pena de prestação de serviços à comunidade uma vez que a dificuldade de comunicação interferirá diretamente no correto cumprimento da pena Em atendimento aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade e diante das características singulares do caso concreto admitese a substituição da pena de prestação de serviços à comunidade por mais uma pena de multa TRF2ª Região Apelação 200651015033417 Rel Liliane Roriz j 225 2007 Sendo a prestação de serviços à comunidade imposta ao ora paciente capaz de contribuir para o fim da execução penal e para a reintegração social deste não há qualquer ilegalidade em sua exigência como condição para o livramento condicional STJ HC 27984SP Rel Min Jorge Scartezzini j 1722004 É defesa a substituição da pena privativa de liberdade por prestação de serviços à comunidade na hipótese de condenação não superior a 6 meses de privação de liberdade Precedente Não procede o pedido de imediata aplicação da limitação de fim de semana por esta Corte uma vez que cabe ao juiz da condenação dentro de suas determinações legais indicar a pena restritiva de direitos que deverá substituir a pena corporal estabelecida STJ HC 25527SP Rel Min Gilson Dipp j 4112003 Interdição temporária de direitos Art 47 As penas de interdição temporária de direitos são V art 2º da Lei n 107950 crimes de responsabilidade V art 78 I da Lei n 807890 Código de Defesa do Consumidor I proibição do exercício de cargo função ou atividade pública bem como de mandato eletivo V arts 15 III e V e 37 4º da CF II proibição do exercício de profissão atividade ou ofício que dependam de habilitação especial de licença ou autorização do poder público V arts 56 e 92 I do CP V art 12 I e II do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais V art 154 1º e 2º da Lei n 721084 Lei de Execução Penal III suspensão de autorização ou de habilitação para dirigir veículo V art 57 do CP IV proibição de frequentar determinados lugares Inciso IV acrescentado pela Lei n 971498 V proibição de inscreverse em concurso avaliação ou exame públicos Inciso V acrescentado pela Lei n 125502011 D O U T R I N A 1 Interdição temporária de direitos A interdição temporária de direitos é uma pena específica ao contrário das outras duas que são genéricas e se aplica somente a determinados crimes As interdições temporárias somente podem ser aplicadas nas hipóteses de crimes praticados com abuso ou violação dos deveres inerentes ao cargo função profissão atividade ou ofício É indispensável que o delito praticado esteja diretamente relacionado com o mau uso do direito interditado 2 Efeito pedagógico das interdições Pela gravidade das consequências financeiras que produz é de grande potencial preventivo geral inibindo abusos e desrespeitos aos deveres funcionais e profissionais próprios de cada atividade A interdição temporária de direitos tem efetivamente grande reflexo econômico Ao proibir que o sentenciado realize sua tarefa laboral naturalmente remunerada reduzirá sensivelmente os seus rendimentos É uma sanção que como dizia Manoel Pedro Pimentel atinge fundo os interesses econômicos do condenado sem acarretar os males representados pelo recolhimento à prisão por curto prazo 3 Prevenção especial É também de grande alcance preventivo especial ao afastar do tráfego motoristas negligentes e ao impedir que o sentenciado continue a exercer determinada atividade no desempenho da qual se mostrou irresponsável ou perigoso estará impedindo que se oportunizem as condições que poderiam naturalmente levar à reincidência 4 Distinção referente aos efeitos da condenação As interdições temporárias não se confundem com os efeitos da condenação que não são sanções penais mas apenas consequências reflexas da decisão condenatória A interdição de direitos é uma sanção penal aplicável independentemente da sanção que couber no âmbito ético ou administrativo Isto é a condenação criminal não inibe os Conselhos Regionais de Classes e a Administração Pública de aplicarem em suas esferas de competência as sanções correspondentes 5 Espécies de interdições 1ª Proibição do exercício de cargo função ou atividade pública bem como de mandato eletivo não se trata de incapacidade definitiva mas de uma suspensão temporária que terá a duração da pena de prisão substituída O funcionário condenado a essa sanção deve estar no exercício efetivo do cargo 2ª Proibição do exercício de profissão atividade ou ofício que dependam de habilitação especial licença ou autorização do Poder Público há profissões atividades ou ofícios que exigem habilitação especial ou autorização do Poder Público para poderem ser exercidas São exemplos eloquentes os casos de advogados engenheiros arquitetos médicos etc Qualquer desses profissionais que for condenado por crime praticado no exercício de seu mister com infringência aos deveres que lhe são inerentes poderá receber tal sanção 3ª Suspensão de autorização ou de habilitação para dirigir veículo esta é aplicável exclusivamente aos crimes culposos de trânsito art 57 do CP A suspensão de autorização ou de habilitação é pena e a inabilitação para dirigir veículo quando utilizado como meio para a prática de crime doloso é efeito não automático da condenação art 92 III do CP 4ª Proibição de frequentar determinados lugares essa foi a grande novidade nesta modalidade de pena a única efetivamente restritiva de direitos aliás esta seria restritiva de liberdade Só temos de deplorar a pobreza inventiva do legislador incapaz de criar qualquer coisa de razoável qualidade técnicodoutrinária Que o legislador das décadas de 30 e 40 pudesse pensar nesta forma de restrição da liberdade pode até ser razoável quando ainda se falava em zona do meretrício casa de tavolagem etc Na atualidade com a concorrência desleal que se instalou na sociedade não se pode mais falar em zona do meretrício pois está disseminada pela sociedade casa de tavolagem por sua vez é algo que nunca ficou bem esclarecido pois nunca tivemos oportunidade de conhecer uma ou saber onde haja existido alguma Ademais as pessoas hoje não têm mais tempo e condição de frequentar lugares dessa natureza Enfim proibir de frequentar que lugar Aquele em que eventualmente o crime foi cometido embora sem qualquer relação com a conduta delituosa sem qualquer efeito ou influência criminógena Assim chegaríamos ao absurdo de ter de proibir determinado motorista de trafegar em certa rodovia onde eventualmente foi autor de um crime culposo etc É lamentável 5ª Proibição de inscreverse em concurso avaliação ou exame públicos esta é a quinta espécie de pena de interdição temporária de direitos art 47 V ou seja uma subespécie de pena restritiva de direitos acrescida pela confusa Lei n 12550 de 15 de dezembro de 2011 Olvidouse o legislador atual que as penas de interdição temporária de direitos são específicas ao contrário das demais penas restritivas que são genéricas aliás exatamente o mesmo que aconteceu com o legislador que elaborou a Lei n 971498 que acrescentou a proibição de frequentar determinados lugares como a quarta pena de interdição de direitos Nos dois diplomas legais que acabamos de mencionar o legislador esqueceuse de indicar em quais hipóteses ou casos deveriam ser aplicadas deixando uma lacuna em nosso Código Penal Nesse sentido destaquese que as penas de interdição de direitos originárias constantes do art 47 I II e III têm sua destinação específica prevista nos arts 56 e 57 do mesmo diploma legal Logicamente da forma como ficou redigida essa previsão legal proibição de inscreverse em concurso avaliação ou exame públicos surge apenas como se fosse mais uma das penas restritivas de direitos genéricas permitindo ao julgador aplicála se quiser pois pode preferir outra pena genérica Contudo por erro do legislador ad hoc que desconhece a estrutura e a harmonia do Código Penal as duas últimas penas de interdição temporária de direitos proibição de frequentar determinados lugares e proibição de inscreverse em concurso avaliação ou exame públicos não têm a natureza de penas específicas como as primeiras três constantes do art 47 Por isso embora a intenção do legislador pelo que se depreende de seu texto e da oportunidade de sua publicação tenha sido a fraude das provas do ENEM a sua aplicação não é obrigatória Ou seja a proibição de inscreverse em concurso avaliação ou exame públicos poderá acabar por opção do julgador não sendo a pena aplicada para quem for condenado pelo crime descrito no art 311A fraudes em certames de interesse público O julgador por óbvio poderá preferir uma das penas alternativas genéricas 51 Relação do crime com a atividade exercida Cumpre ressaltar que a interdição não pode abranger todas as profissões ou atividades que o condenado eventualmente possa exercer Ela deverá restringirse apenas à profissão atividade ou ofício no exercício do qual ocorreu o abuso Como afirmava Hungria a interdição pressupõe que a ação criminosa tenha sido realizada com abuso de poder de profissão ou atividade ou com infração de dever a ela inerente 52 Crime praticado por funcionário público Não é necessário que se trate de crime contra a Administração Pública para receber a pena de interdição basta que o agente de alguma forma tenha violado os deveres que a qualidade de funcionário público lhe impõe 6 Início da execução da pena Quando se tratar de funcionário público a autoridade superior deverá no prazo de 24 horas após ter sido cientificada baixar ato administrativo a partir do qual começa a execução da pena art 154 1º da LEP 7 Efeitos administrativos da interdição Depois de cumprida a pena o condenado poderá voltar a exercer suas funções normais desde que não haja impedimento de ordem administrativa O legislador penal esqueceuse de regulamentar os efeitos administrativos que naturalmente devem decorrer da aplicação desta sanção tais como vencimentos férias tempo de serviço vantagens funcionais etc Na ausência de previsão na órbita penal tais questões deverão ser tratadas à luz da legislação pertinente 8 Interdição de mandato eletivo O exercício de mandato eletivo poderá ser um dos direitos políticos do indivíduo que será afetado pela condenação Haverá uma espécie de suspensão parcial dos direitos políticos Com esta sanção não ocorrerá a perda do mandato eletivo o que poderá acontecer em outras circunstâncias mas como efeito específico da condenação nos termos do art 92 I do Código Penal 9 Suspensão da habilitação de motorista Infrações culposas praticadas no tráfego de veículos devem receber esta pena alternativa específica art 57 A sanção é aplicável ao condenado que à época do crime era autorizado ou habilitado a conduzir veículos automotores 91 Fundamento políticocriminal O veículo transformouse em instrumento de vazão da agressividade da prepotência do desequilíbrio emocional que se extravasam na direção perigosa E uma das finalidades desta sanção é afastar do trânsito os autores de delitos culposos que no mínimo são uns descuidados Não resta a menor dúvida de que ao limitar sua aplicação aos delitos culposos essa previsão se mostrou extremamente tímida ante a magnitude da criminalidade praticada ao volante do automóvel 92 Uso de veículo na prática de crime doloso A utilização de veículo como meio para a prática de crime doloso sujeita o autor a receber como efeito da condenação a inabilitação para dirigir veículos art 92 93 Infrator habilitado na data do crime Esta sanção é aplicável ao condenado que à época do crime era autorizado ou habilitado à condução de veículos Permitir sua aplicação àquele que venha a habilitarse antes da sentença equivaleria a permitir que o infrator modifique a posteriori a sanção aplicável em flagrante desrespeito ao princípio da reserva legal A aplicação da referida sanção não impede que a autoridade policial administrativamente determine a realização de novos exames de habilitação com prévia apreensão do documento de habilitação art 77 do CNT J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Não há incompatibilidade entre a pena substitutiva de inabilitação para exercício de cargo função ou atividade pública com a perda do cargo público do art 92 do Código Penal se aquela se refere a todo e qualquer cargo atividade ou função que o réu porventura viesse a assumir após a decisão condenatória e não especificamente ao cargo de policial rodoviário federal que ele já ocupava STJ REsp 897815RS Rel Min Gilson Dipp j 1262007 Inexistindo circunstâncias desfavoráveis ao condenado motivo pelo qual a pena privativa de liberdade foi fixada em seu mínimo legal deve a suspensão de habilitação para dirigir veículo automotor ser fixada também no patamar mínimo nos moldes da pena corporal precedente do STJ Dada a duplicidade da incidência da suspensão ex vi art 302 da Lei 950397 e art 47 inciso III do Código Penal a pena privativa de liberdade é de ser in casu substituída por uma outra restritiva de direitos diversa da aplicada STJ REsp 737306RO Rel Min Félix Fischer j 610 2005 Se a pena privativa de liberdade fixada de maneira isolada foi substituída por duas penas restritivas de direitos sendo uma delas a descrita no inciso III do art 47 do Código Penal interdição temporária de direitos consistente na suspensão da habilitação para dirigir veículo automotor devese aplicar a regra do art 55 do Código Penal segundo a qual as penas restritivas de direitos terão a mesma duração da pena privativa de liberdade substituída STJ REsp 495402AC Rel Min Gilson Dipp j 1282003 Limitação de fim de semana Art 48 A limitação de fim de semana consiste na obrigação de permanecer aos sábados e domingos por 5 cinco horas diárias em casa de albergado ou outro estabelecimento adequado V arts 93 a 95 151 a 153 158 1º e 181 2º da Lei n 721084 Lei de Execução Penal Parágrafo único Durante a permanência poderão ser ministrados ao condenado cursos e palestras ou atribuídas atividades educativas V art 152 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal D O U T R I N A 1 Limitação de fim de semana A limitação de fim de semana consiste na obrigação de o condenado permanecer aos sábados e domingos por cinco horas diárias em casa de albergado ou em estabelecimento adequado de modo a permitir que a sanção penal seja cumprida em dias normalmente dedicados ao descanso sem prejudicar as atividades laborais do condenado bem como a sua relação sociofamiliar 2 Finalidades da prisão descontínua A prisão descontínua limitação de fim de semana tem a intenção de evitar o afastamento do apenado de sua tarefa diária de manter suas relações com sua família e demais relações sociais profissionais etc E fundamentalmente impedir o encarceramento com o inevitável contágio do ambiente criminógeno que essa instituição total produz 3 Início e horário da execução A execução propriamente dita iniciará com o primeiro comparecimento do apenado ao estabelecimento determinado art 151 parágrafo único da LEP O juiz da execução penal cientificará o apenado do local dia e hora de comparecimento Nada impede que a pena seja cumprida em horários diversos como noturno diurno vespertino ou matutino adaptandose às disponibilidades do estabelecimento desde que também e principalmente não prejudique as atividades profissionais do albergado 4 Local de cumprimento Referida sanção deverá prioritariamente ser cumprida em casa de albergado que o legislador romântico espera que venha a existir em todas as comarcas brasileiras Na época da promulgação e publicação da Lei n 720984 existiam apenas uma em Porto AlegreRS e duas ou três no Estado de São Paulo as quais se destinavam ao cumprimento de penas privativas de liberdade em regime aberto Hoje o panorama ainda não mudou 5 Descaso oficial com as penas alternativas O legislador da reforma concedeu o prazo de um ano para que a União Estados Distrito Federal e Territórios tomassem as providências necessárias para a efetiva execução das penas restritivas de direitos art 3º da Lei n 720984 Esqueceuse no entanto do histórico descaso da Administração Pública brasileira para com o sistema penitenciário de modo geral e com os reclusos em particular 6 Inaplicabilidade da limitação de fim de semana Diante desse quadro desolador as casas de albergado não passaram de uma carta de intenções de nosso legislador Referidos estabelecimentos que são de pequeno custo em termos de arquitetura penitenciária não foram construídos A falta de tais estabelecimentos tornou inviável a aplicação desta sanção que a maioria dos juízes prudentemente substitui por outra alternativa 7 Novas penas alternativas Correse o risco de a política oficial do faz de conta repetirse Falase insistentemente no Ministério da Justiça em privilegiar as penas alternativas Há projetos em andamento elevando a possibilidade de sua aplicação para penas de até quatro anos inclusive Mas advirta se se tal política não vier acompanhada de dotação orçamentária de infraestrutura penitenciária com investimentos adequados viabilizando a efetiva aplicação de tais penas será um novo caos na política penitenciária nacional Quem viver verá 8 Ausência de casa de albergado O parágrafo único do art 3º da Lei n 720984 permitiu ao juiz optar pelo sursis em substituição à limitação de fim de semana ante as dificuldades locais No entanto os estudiosos de modo geral têm olvidado que tal permissão se referia somente ao prazo de um ano a partir da vigência da referida lei 81 Inadmissibilidade de conversão em prisão domiciliar É inadmissível autorizar limitação de fim de semana na própria residência do condenado pois equivale a oficializar a impunidade para determinados condenados beneficiados 9 Juízo competente O juiz da condenação aplicará a sanção penal no caso a limitação de fim de semana quando cabível e exequível Caberá porém ao juiz da execução determinar a forma de cumprimento das penas de prestação de serviços à comunidade e de limitação de fim de semana ajustandoas às condições pessoais do condenado às características do estabelecimento da entidade ou do programa comunitário 10 Penas restritivas como incidente de execução Além da aplicação pelo juiz da condenação das penas restritivas a Lei de Execução Penal prevê outra possibilidade de aplicação pelo juiz da execução dessas mesmas sanções art 180 Essa possibilidade que a lei chamou também de conversão e que se opera já no curso do cumprimento da pena constitui um incidente de execução que exige a presença de requisitos próprios a seguir examinados 101 Quem pode beneficiarse dessa conversão É bom lembrar o seguinte a nenhum reincidente tanto em crime doloso quanto em crime culposo pode ter sua pena substituída por multa ou pena restritiva de direitos b nenhum réu reincidente em crime doloso poderá ter sua pena suspensa sursis c e finalmente nenhuma dessas penas não substituídas ou não suspensas inferiores a dois anos poderá receber o livramento condicional Pois essa pena privativa de liberdade de curta duração que não pode ser substituída e tampouco suspensa terá uma oportunidade futura de ser revista em sua execução e finalmente ser substituída por uma restritiva de direitos 102 Requisitos para essa conversão São necessários os seguintes requisitos a que a pena não seja superior a dois anos b que esteja sendo cumprida em regime aberto c que já tenha sido cumprido um quarto da pena d que os antecedentes e a personalidade do condenado recomendem a conversão 11 Consentimento do condenado A aplicação das penas restritivas ao contrário do que ocorre com o regime aberto art 113 da LEP não está condicionada ao consentimento do condenado como prevê o direito espanhol Como o sucesso ou insucesso das penas alternativas depende diretamente da boa aceitação pelo condenado dessas penas é recomendável que se ouça o sentenciado Se este não a desejar não deve ser aplicada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A limitação de fim de semana assim como a pena de prestação de serviços à comunidade a teor do art 148 da Lei de Execução Penal pode ser modificada a qualquer tempo pelo Juízo da Execução que é o competente para averiguar as condições em que as mesmas serão cumpridas TJMG Apelação 104330517004360011 Rel Sérgio Braga j 2952007 Se a pena de limitação de fim de semana deve ser efetivada em Casa de Albergado não pode o paciente na falta do referido estabelecimento ser submetido a cumprimento da reprimenda em Presídio situação mais gravosa do que a estabelecida pelo decreto condenatório Precedente da Turma Deve ser cassado o acórdão recorrido a fim de que o paciente cumpra a pena restritiva de direitos concernente à limitação de fim de semana em regime domiciliar até que surja estabelecimento adequado STJ HC 60919DF Rel Min Gilson Dipp j 1010 2006 Competência Conflito positivo Em se tratando de cumprimento da pena de limitação de fim de semana em casa de albergado ou outro estabelecimento adequado afirmase a competência do Juízo estadual o suscitado STJ Conflito de Competência 34101RS Rel Min Fontes de Alencar j 22102003 Seção III Da pena de multa Multa Art 49 A pena de multa consiste no pagamento ao fundo penitenciário da quantia fixada na sentença e calculada em diasmulta Será no mínimo de 10 dez e no máximo de 360 trezentos e sessenta diasmulta V art 101 do CPP V arts 118 1º e 164 a 170 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal V art 77 da Lei n 807890 Código de Defesa do Consumidor 1º O valor do diamulta será fixado pelo juiz não podendo ser inferior a um trigésimo do maior salário mínimo mensal vigente ao tempo do fato nem superior a 5 cinco vezes esse salário 2º O valor da multa será atualizado quando da execução pelos índices de correção monetária V art 77 da Lei n 807890 Código de Defesa do Consumidor D O U T R I N A 1 Pena de multa A pena de multa consiste na imposição ao condenado da obrigação de pagar ao Fundo Penitenciário determinada quantia em dinheiro considerando a gravidade do delito a culpabilidade do agente e particularmente sua condição econômica 2 Cominação da pena de multa Em vez de repetir em cada tipo penal a espécie ou cabimento da pena restritiva ou a quantidade de multa inseriu um capítulo específico para as penas restritivas e cancelou as referências a valores de multa substituindo a expressão multa de simplesmente por multa em todos os tipos da Parte Especial do Código que cominam pena pecuniária Em decorrência dessa técnica os tipos penais não trazem mais em seu bojo os limites mínimo e máximo da pena cominada dentro dos quais o julgador deveria aplicar a sanção necessária e suficiente à reprovação e prevenção do crime 3 Características da multa penal Duas são as características essenciais tradicionais da pena de multa em todos os países 1ª a possibilidade de sua conversão em pena de prisão caso não seja paga 2ª seu caráter personalíssimo ou seja a impossibilidade de ser transferida para os herdeiros ou sucessores do apenado Essas características continuam em vigor nos países que aplicam com seriedade penas alternativas à prisão sem afastarlhes o caráter coercitivo de sanção penal Nesses países proíbese inclusive a aplicação de pena de multa a condenado insolvente sem pruridos de inconstitucionalidade Para os insolventes se prescrevem outras alternativas à prisão 4 Caráter personalíssimo da pena de multa Por esse princípio nenhuma pena pode passar da pessoa do condenado Por isso que ao contrário de outras sanções pecuniárias a pena de multa se extingue com a morte do condenado art 107 I Mesmo com a edição da Lei n 926896 a pena de multa não se transmite aos herdeiros e sucessores independentemente dos limites da herança 5 O sistema diasmulta Passouse a adotar novamente o sistema diasmulta que somente fora abandonado pelo Código Penal de 1940 Por esse sistema o valor de um diamulta deverá corresponder à renda média que o autor do crime aufere em um dia considerandose sua situação econômica e patrimonial Nessa aferição levarseá em consideração não só o seu salário mas toda e qualquer renda inclusive de bens e capitais apurado na data do fato 6 Limites da pena de multa O valor mínimo de um diamulta é de 130 do maior salário mínimo vigente à época do crime e o valor máximo é de cinco vezes esse salário Estabelecendo a renda média que o acusado aufere em um dia o juiz fixará o valor do diamulta entre os limites de 130 do salário mínimo que é o menor valor do diamulta e cinco salários mínimos que é o seu maior valor E o limite mínimo de diasmulta será de 10 e o máximo de 360 Assim a pena de multa poderá atingir até 1800 salários mínimos podendo ainda ser elevada ao triplo isto é até 5400 salários mínimos art 60 1º 7 Situação econômica e gravidade da infração O Código Penal ao cominar penas pecuniárias considerou dois aspectos absolutamente distintos a renda média que o condenado aufere em um dia de um lado e a gravidade do delito e a culpabilidade do agente de outro 8 Cálculo da pena de multa O seu cálculo em regra deve ser feito em duas operações e excepcionalmente em três 1ª operação estabelecese o número de diasmulta dentro do limite estabelecido de 10 a 360 Na eleição desse número devese levar em conta a gravidade do delito as circunstâncias judiciais as circunstâncias legais e inclusive as majorantes e minorantes Enfim com o exame desses dados fixase apenas a quantidade de diasmulta a ser aplicada na sentença 2ª operação de posse do número de diasmulta obtido com a primeira operação fixa se o valor de cada diamulta nos limites estabelecidos no art 49 e seus parágrafos já referidos Para essa fixação se leva em consideração tão somente a situação econômica do réu pois a gravidade do delito e a culpabilidade já foram valoradas na primeira operação para fixar a quantidade de diasmulta Assim atendese à prescrição do Código que determina que se leve em conta principalmente e não exclusivamente a situação econômica do réu 3ª operação se porém o juiz constatar que em virtude da situação econômica do acusado ela será ineficaz poderá elevála até o triplo art 60 1º do CP ajustandoa ao fato e ao agente 81 Fundamentação obrigatória A fixação da pena de multa não pode ser produto de uma decisão arbitrária As razões que levarem o magistrado a aplicar esta ou aquela quantia de multa deverão ser demonstradas fundadamente na sentença Essa necessidade é consequência do princípio constitucional da individualização da pena art 5º XLVI da CF 9 Multa substitutiva O Código Penal previu duas hipóteses em que preenchidos os demais requisitos a pena privativa de liberdade pode ser substituída por multa 1ª quando as penas privativas de liberdade não forem superiores a seis meses independentemente de tratarse de crime doloso ou culposo art 60 2º do CP 2ª nos crimes culposos cuja pena seja igual ou superior a um ano de detenção poderá ser substituída por multa e uma pena restritiva de direitos art 44 parágrafo único do CP 91 Compulsoriedade da substituição Embora a lei fale em pode ser substituída tal substituição não fica na dependência do livrearbítrio do juiz Estando presentes os requisitos que a ensejam e mostrandose suficiente à reprovação e prevenção do crime não poderá ser negada Esta a substituição é um direito público subjetivo do réu a exemplo segundo alguns penalistas do sursis e do livramento condicional Nada impede que no caso concreto o juiz prefira fazer a substituição por uma pena restritiva de direitos por ser a mais recomendável no caso concreto 92 A multa substitutiva nas leis especiais Essas leis especiais que adotam critérios diferentes na cominação da pena não consagram contudo a multa substitutiva Mas também não a proíbem Logo estando presentes os requisitos e se beneficiar o acusado deverá ser aplicada 93 Jurisprudência sobre a multa substitutiva Mudando a orientação inicial o STJ sumulou em sentido contrário à sua orientação inicial Cominadas cumulativamente em lei especial penas privativa de liberdade e pecuniária é defeso a substituição da prisão por multa Súmula 171 do STJ Nossa posição é pela possibilidade da cumulação por encontrar fundamento legal na cominação abstrata nos tipos penais 10 Aplicação na legislação extravagante Combinandose o art 12 do Código Penal com o art 2º da Lei n 720984 que suprimiu somente as referências a valores de multas concluise que as regras gerais deste Código aplicamse somente às leis penais especiais com penas de multa expressas concretamente em cruzeiros hoje seriam reais como é o caso do Código de Propriedade Industrial e da Lei das Contravenções Penais só para exemplificar 101 Inaplicabilidade em determinadas leis Outras leis que adotaram a unidade salário mínimo como padrão referencial como é o caso da Lei de Mercado de Capitais Lei n 472865 e a legislação de pesca Declei n 22167 caça Lei n 519767 florestas 477165 entre outras não podem receber a aplicação do sistema diasmulta 11 Abrangência do sistema diasmulta Outra questão interessante é saber se o novo sistema se aplica a todos os tipos penais do Código que cominam pena de multa ou outra forma referencial É que existem tipos penais na Parte Especial que têm a pena pecuniária cominada em salários mínimos art 244 por exemplo Isso significa que estabelecem penas de modo diverso das regras gerais do Código Essas cominações especiais não foram canceladas e permanecem como eram antes da Lei n 720984 Nesses casos também não se aplica o sistema diasmulta J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Na fixação da pena de multa inicialmente determinase o número de diasmulta onde deve ser guardada uma proporcionalidade com a sanção privativa imposta definitivamente compreendendo todos os fatores nela valorados quais sejam circunstâncias judiciais agravantes atenuantes causas de aumento e de diminuição Em seguida fixase o valor de cada diamulta oportunidade em que deve ser considerada a situação financeira do condenado TRF5ª Região Apelação 200681000166593 Rel Amanda Lucena j 27112007 Cumprimento da pena de multa Cabe ao Juízo da Execução avaliar a miserabilidade jurídica do sentenciado examinando as condições socioeconômicas para o pagamento da multa e custas processuais sem prejuízo para seu sustento e de sua família STJ REsp 748664RS Rel Min Laurita Vaz j 2662007 A pena de multa deve ser fixada em duas fases critério bifásico Na primeira fixa se o número de diasmulta considerandose as circunstâncias judiciais art 59 do CP Na segunda determinase o valor de cada diamulta levandose em conta a situação econômica do réu Precedentes do STJ In casu não houve a devida proporcionalidade entre a penabase e o quantum dos diasmulta STJ REsp 897876RS Rel Min Félix Fischer j 1262007 O disposto no art 49 1º do CP destinase tão somente à pena de multa sendo incabível sua aplicação analógica em relação ao cálculo da prestação pecuniária porquanto tratase de institutos jurídicos diversos STJ REsp 896171SC Rel Min Félix Fischer j 1742007 Inexiste previsão legal para a isenção da pena de multa em razão da situação econômica do réu devendo esta servir tão somente de parâmetro para a fixação de seu valor STJ REsp 838154RS Rel Min Félix Fischer j 17102006 Revelase manifestamente ilegal a fixação da pena de multa em 500 diasmulta ultrapassando o limite máximo permitido no Código Penal eis que a fixação de tal reprimenda também deve pautarse de acordo com o que fora valorado pelo julgador quando da análise do art 59 do Código Penal bem como não pode ser fixada de forma e ultrapassar o limite de 360 diasmulta previsto no art 49 do Código Penal STJ HC 47006PE Rel Min Gilson Dipp j 1142006 A condenação anterior à pena de multa não impede o oferecimento da proposta de suspensão condicional do processo desde que preenchidos os demais requisitos legais STJ REsp 407293SP Rel Min Hamilton Carvalhido j 18112003 A correção monetária incidente sobre a multa aplicada por força de condenação criminal tem como termo inicial o prazo previsto para o recolhimento do principal isto é a partir do 11º dia de encerramento do processo STJ EREsp 23695SP Rel Min William Patterson j 1381997 Pagamento da multa Art 50 A multa deve ser paga dentro de 10 dez dias depois de transitada em julgado a sentença A requerimento do condenado e conforme as circunstâncias o juiz pode permitir que o pagamento se realize em parcelas mensais V arts 164 e 169 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal 1º A cobrança da multa pode efetuarse mediante desconto no vencimento ou salário do condenado quando V art 168 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal a aplicada isoladamente b aplicada cumulativamente com pena restritiva de direitos c concedida a suspensão condicional da pena 2º O desconto não deve incidir sobre os recursos indispensáveis ao sustento do condenado e de sua família V art 5º XLV da CF D O U T R I N A 1 Prazo para o pagamento da multa O Código Penal art 50 determina que a multa deve ser paga dentro de dez dias depois de transitada em julgado a sentença A Lei de Execução Penal por sua vez determina que o prazo para a multa ser cobrada é de dez dias a partir da citação requerida para esse fim art 164 2 Pagamento voluntário e pagamento compulsório Poderseá argumentar que o prazo do Código Penal é para a multa ser paga e o prazo da LEP é para a multa ser cobrada ou em outros termos a previsão do CP é para pagamento voluntário e a previsão da LEP é para pagamento compulsório 3 Formas de pagamento da multa Há três modalidades de pagamento da pena de multa 1ª pagamento integral 2ª pagamento parcelado 3ª desconto em folha 4 Prazo para pedir parcelamento O prazo de dez dias para o pedido de parcelamento é o previsto no art 164 da Lei de Execução Penal 10 dias art 169 caput da LEP a partir da citação para pagamento e não aquele do Código Penal a partir do trânsito em julgado da sentença referido no art 50 do CP 41 Revogação do parcelamento da multa Se houver atraso no pagamento ou seja se o condenado for impontual ou então se melhorar de situação econômica será revogado o parcelamento art 169 2º da LEP A expressão revogará o benefício deixa claro que se trata de norma cogente e não de mera faculdade do juiz 5 Hipóteses de desconto da multa em folha Tratandose de réu solto esse desconto pode ocorrer quando a pena pecuniária for a aplicada isoladamente em caso de contravenções penais ou de multa substitutiva b aplicada cumulativamente com pena restritiva de direitos c em caso de sursis como também de livramento condicional quando esta ainda não tiver sido cumprida Entendemos também cabível em caso de livramento condicional apesar de o legislador não têla consagrado expressamente pela flagrante semelhança de situações 51 Limite permitido de desconto em folha Esse desconto deverá ficar dentro do limite de um décimo e da quarta parte da remuneração do condenado desde que não incida sobre os recursos indispensáveis ao seu sustento e ao de sua família arts 50 2º e 168 I da LEP Se o condenado estiver preso a multa poderá ser cobrada mediante desconto na sua remuneração art 170 da Lei de Execução Penal 52 Responsabilidade do empregador O responsável pelo recolhimento no caso o empregador do acusado será intimado para efetuar o recolhimento na data e no local estabelecidos pelo juiz da execução sob pena de incorrer em crime de desobediência J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Não é admissível a execução provisória da pena de multa consoante dispõem os arts 50 do Código Penal e 164 da Lei de Execuções Penais STJ HC 53192SC Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 20112006 Encontrase pacificada no âmbito desta Corte a orientação no sentido de que o Ministério Público não mais detém legitimidade para propor ação de execução de pena de multa em razão da nova sistemática trazida pela Lei n 926896 que deu nova redação ao art 51 do Código Penal passando a titularidade para a Fazenda Pública Precedentes STJ REsp 804143SP Rel Min Félix Fischer j 254 2006 Compete ao Juízo da Execução Penal determinar a intimação do condenado para realizar o pagamento da pena de multa art 50 do CP Ausente o adimplemento da obrigação deve a Fazenda Pública ajuizar a execução fiscal Entendimento jurisprudencial desta Corte STJ AgRg no REsp 397242SP Rel Min Paulo Medina j 762005 Considerando que a Lei de Execução Penal ao instituir o benefício do parcelamento da pena de multa ao condenado que esteja em situação econômica penosa não fez constar qualquer limitação em relação ao número de prestações em que o pagamento deve ser efetuado cumpre ao Magistrado considerar razoavelmente as peculiaridades do caso concreto e então ajustarlhe a sua decisão com observância ao princípio da individualização da pena sendo certo que a lei lhe faculta até mesmo a determinação de diligências para a verificação das reais condições financeiras do condenado art 169 1º da LEP TJMG Agravo 10000044092781001 Rel Sérgio Braga j 2482004 Conversão da multa e revogação Art 51 Transitada em julgado a sentença condenatória a multa será considerada dívida de valor aplicandoselhe as normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública inclusive no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da prescrição Artigo com redação determinada pela Lei n 9268 de 1º de abril de 1996 V Lei n 683080 execução fiscal 1º e 2º do primitivo art 51 expressamente revogados pelo art 3º da Lei n 9268 de 1º de abril de 1996 D O U T R I N A Nova redação A Lei n 9268 de 1º de abril de 1996 deu nova redação a este artigo transformando a multa penal após o trânsito em julgado em dívida de valor 1 Dívida de valor A expressão dívida de valor identifica a intenção de transformar a sanção penal em débito monetário No entanto tal circunstância por si só não altera a natureza penal dessa sanção que é consequência jurídica de infração penal A transformação em dívida de valor encerra dois outros objetivos justificar a proibição da possibilidade de converter a multa não paga em prisão e satisfazer os hermeneutas civis segundo os quais dívida de valor pode ser atualizada monetariamente 2 Dívida ativa não tributária Segundo o art 39 2º da Lei n 432064 são dívida ativa não tributária os créditos da Fazenda Pública tais como os provenientes de empréstimos compulsórios contribuições estabelecidas em lei multas de qualquer origem ou natureza exceto as tributárias 3 Impossibilidade de conversão da multa A Lei n 926896 que deu nova redação ao art 51 impede a conversão da multa não paga em pena de prisão Mesmo antes da edição da Lei n 926896 já apontávamos algumas dificuldades para aceitar a conversão pura e simples da pena de multa em prisão tão somente pelo não pagamento ver nesse sentido nosso Lições de Direito Penal p 199 4 Competência para a execução da pena de multa A competência para a execução da pena de multa que não foi alterada pela Lei n 926896 continua sendo do juiz das execuções criminais e a legitimidade para a sua promoção continua sendo do Ministério Público correspondente Assim todas as questões suscitadas na execução da multa penal como por exemplo o quantum da execução atualização monetária ou causas interruptivas ou suspensivas da prescrição e principalmente causas extintivas de punibilidade eventualmente suscitadas em embargos de execução não serão da competência do juízo cível Referida lei além de não fazer qualquer referência à execução da pena de multa deixou vigentes os dispositivos penais relativos à sua execução 41 Dívida de valor e natureza criminal da multa penal A opção do legislador em considerar a multa penal como dívida de valor não altera a sua natureza de sanção criminal que continua limitada pelo princípio da personalidade da pena Aliás por isso o art 4º da Lei n 683080 é inaplicável à multa penal Por outro lado o fundamento políticolegislativo para essa opção do legislador objetiva justificar a inconversibilidade da pena de multa não paga em prisão e satisfazer os hermeneutas civis segundo os quais dívida de valor pode ser atualizada monetariamente A multa penal será dívida ativa não tributária art 39 2º da Lei n 432064 42 Multa penal herdeiros e sucessores Sanção criminal seja de natureza pecuniária ou não é a consequência jurídica do delito e como tal está limitada pelos princípios limitadores do direito repressivo penal dentre os quais se destacam os princípios da legalidade e da personalidade da pena Pelo princípio da personalidade da pena aliás a grande característica diferenciadora da pena criminal pecuniária das demais penas pecuniárias herdeiros e sucessores não respondem por essa sanção Ademais não se pode esquecer que a morte do agente é a primeira causa extintiva da punibilidade art 107 I do CP 43 Fundo Penitenciário Nacional A Lei Complementar n 7994 que criou o Fundo Penitenciário Nacional prevê como uma de suas receitas a pena de multa art 2º V O fato de passar a ser considerada dívida de valor além de não alterar a natureza dessa sanção também não pode alterar a sua destinação qual seja o Fundo Penitenciário Nacional 44 Fazenda Pública destinação inconstitucional Não é competência da Fazenda Pública executar créditos do Fundo Penitenciário Nacional decorrentes de sentença condenatória criminal considerese ou não dívida de valor A execução de sanções criminais privativas de liberdade restritivas de direitos ou pecuniárias é competência exclusiva do juízo criminal A execução ou cobrança da pena de multa integra a persecução penal e o único órgão do Estado com competência para exercitála é o Ministério Público com assento no juízo criminal E o processo de execução penal é o único instrumento legal que o Estado pode utilizar coercitivamente para tornar efetivo o conteúdo decisório de uma sentença penal condenatória 45 Competência concorrente União e Estado A competência concorrente art 24 I da CF para legislar sobre determinada matéria destinase a a suprir a ausência de normas federais sobre o tema ou b a adicionar pormenores à lei federal básica já editada Destarte não pode haver conflito entre as legislações estaduais e a legislação federal e se ocorrer prevalecerá a legislação federal Por isso as leis estaduais que instituíram Fundos Penitenciários Estaduais nos respectivos Estados atribuindolhes a arrecadação das multas penais são inconstitucionais pois se chocam com o art 49 do Código Penal e com a Lei Complementar n 7994 que destinam ao Fundo Penitenciário Nacional a arrecadação das multas criminais Se não houvesse essas previsões legais as unidades federativas poderiam dispor livremente sobre os destinos das referidas arrecadações No entanto ante a existência das previsões do Código Penal e da lei complementar em análise os Estados não podem dar lhes destinações diversas 46 Destinação do produto da multa criminal A arrecadação proveniente das multas penais sempre se destinou ao aparelhamento construções e reformas do sistema penitenciário nacional desde a sua origem com a criação do selo penitenciário por meio do Decreto n 2479734 regulamentado pelo Decreto n 1141 Seguindo essa orientação a Lei Complementar n 79 em seu art 1º fixa os objetivos do Fundo Penitenciário Nacional quais sejam proporcionar recursos e meios para financiar e apoiar as atividades e programas de modernização e aprimoramento do Sistema Penitenciário Brasileiro Logo o produto da arrecadação dessas multas em sua totalidade está destinado de forma vinculada ao Fundo Penitenciário Nacional art 2º da LC n 7994 47 Malversação de verbas públicas Dar outra destinação à multa penal como atribuíla a entidades sociais ou filantrópicas ao arrepio da lei fazendose uma análise desapaixonada poderá configurar improbidade administrativa e malversação de verbas públicas Com efeito por muito menos que isso prefeitos têm sido levados à prisão por aplicar verbas em rubricas diferentes das previstas 48 Competência União ou Estado Tratarse de crimes da competência da Justiça Federal ou da Justiça dos Estados é discussão bizantina A Lei Complementar n 7994 destinou a arrecadação proveniente das sanções criminais pecuniárias em um primeiro momento ao Fundo Penitenciário Nacional independentemente da natureza do crime ou da jurisdição competente para julgálo Somente em um momento posterior por meio de convênios celebrados prevê o repasse de parcelas dessa arrecadação às unidades federativas Estados e Distrito Federal Em outros termos embora a rigor a utilização dos recursos arrecadados se destine em última instância às unidades federativas a gestão e gerenciamento de sua aplicação vinculada expressamente aos objetivos definidos na lei criadora do FUNPEN é prerrogativa exclusiva da União 49 Inscrição em dívida ativa impossibilidade jurídica É insustentável a interpretação segundo a qual após o trânsito em julgado as multas penais devem ser inscritas em dívida ativa da Fazenda Pública nos termos da lei Que lei Em primeiro lugar a indigitada Lei n 926896 não prevê que a multa penal deva ser inscrita em dívida ativa como se tem afirmado em segundo lugar se previsse seria uma heresia jurídica pois transformaria um título judicial sentença condenatória em título extrajudicial dívida ativa Este por conseguinte mais sujeito a impugnações e embargos demandando todo um procedimento administrativo inadmissível para quem já dispõe de um título judicial com toda a sua carga de certeza em terceiro lugar deslocaria ilegalmente o crédito do Fundo Penitenciário Nacional para um crédito comum extraorçamentário da União 410 Atribuição para inscrever em dívida ativa A quem competiria promover a inscrição da dívida ativa da União A ProcuradoriaGeral da Fazenda Nacional instada a se manifestar emitiu o judicioso Parecer n 152897 afastando de suas atribuições por falta de previsão legal entre outros argumentos inscrever em dívida ativa as multas penais E afora essa instituição ninguém mais detém tal atribuição Ver de forma mais abrangente em Cezar Roberto Bitencourt Manual de Direito Penal 5 ed São Paulo RT 1998 5 Prescrição da multa e causas modificadoras Ficou interessante a confusão criada com a nova lei o lapso prescricional continua sendo regulado pelo Código Penal art 114 mas as causas interruptivas e suspensivas da prescrição são as previstas pela Lei de Execução Fiscal 683080 e pelo Código Tributário Nacional com exceção é claro da morte do agente inteligência da Lei n 926896 51 A inevitável prescrição durante a execução A prescrição da pena de multa isoladamente aplicada continua a verificarse em apenas dois anos art 114 cujo prazo começa a correr a partir do trânsito em julgado para a acusação Assim a maioria das condenações à pena pecuniária escapará pela porta larga da prescrição a menos que se introduza um dispositivo legal determinando que a prescrição não corre enquanto se procede à cobrança judicial da multa 6 Finalidades da citação prevista no art 164 da LEP Essa citação na verdade tem três finalidades alternativas a pagar a multa imposta b nomear bens à penhora ou c depositar a importância correspondente Porém se decorridos os dez dias e o condenado não tomar nenhuma das três providências acima referidas serlheão penhorados tantos bens quantos bastem para garantir a execução nos termos do art 164 1º da Lei de Execução Penal 7 Atualização monetária da pena de multa O 1º do art 49 determina que o valor do diamulta será fixado tendo em consideração o salário mínimo vigente na data do fato E o 2º do mesmo artigo determina que a multa será atualizada monetariamente quando for executada Esses dois parágrafos respeitando o princípio da legalidade deixam claro que o valor da multa deve considerar a data do fato e que a sua atualização monetária terá aquela data como marco inicial As demais teorias sobre o início do prazo para atualização embora respeitáveis a nosso juízo não encontram respaldo legal 8 Dosagem da multa na tentativa A dosimetria da pena de multa não observa os parâmetros estabelecidos no art 68 ao contrário primeiro se encontra a quantidade de diasmulta onde o caráter tentado já é valorado e depois o valor de cada diamulta como já mencionamos no item dosimetria da pena de multa As operadoras referidas no art 68 não são valoradas em fase tríplice nem mesmo as causas de aumento e de diminuição Por isso o limite mínimo da pena de multa não pode ser inferior aos dez dias estabelecidos no caput do art 49 J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 693 do STF Não cabe habeas corpus contra decisão condenatória a pena de multa ou relativo a processo em curso por infração penal a que a pena pecuniária seja a única cominada Com o advento da Lei n 926896 que alterou o art 51 do Código Penal a pena de multa passou a ser considerada dívida de valor cuja cobrança compete à Fazenda Pública nos moldes da Lei de Execução Fiscal A simples conversão da multa em dívida de valor contudo não lhe retira o caráter penal atribuído pela própria Constituição Federal no art 5º XLVI c Precedentes Subsiste assim a regra de que a extinção do processo de execução criminal apenas pode ocorrer se cumprida a pena imposta na sentença a qual no caso compreende não só a privativa de liberdade mas também a de multa a menos que sobrevenha alguma das causas extintivas da punibilidade previstas no art 107 do Código Penal Precedentes Esse entendimento não implica manter o processo de execução penal indefinidamente em aberto aguardando a cobrança judicial da multa pela Fazenda Pública Isso porque nada impede que o apenado cumpra por sua própria iniciativa a pena pecuniária que lhe foi imposta na sentença condenatória obtendo assim a extinção do processo executivo criminal pelo cumprimento efetivo e integral da reprimenda STJ REsp 843296RS Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 29112007 A nova redação do art 51 do Código Penal trazida pela Lei n 926896 determina que após o trânsito em julgado da sentença condenatória a pena pecuniária deve ser considerada dívida de valor saindo da esfera de atuação do Juízo da Execução Penal e se tornando responsabilidade da Fazenda Pública que poderá ou não executála de acordo com os patamares que considere relevante Tal situação contudo não lhe retira o caráter punitivo devendo o processo de execução criminal ser extinto somente após o efetivo cumprimento da pena pecuniária salvo é claro se sobrevier uma das causas extintivas da punibilidade previstas no art 107 do Código Penal STJ REsp 928965RS Rel Min Laurita Vaz j 2592007 O Código Penal é um conjunto integrado de normas que devem ser interpretadas de modo harmônico e sistêmico à luz das disposições constitucionais A condenação anterior à pena de multa não é apta por si só para autorizar a reincidência pois constitui dívida de valor que não é suscetível sob nenhum fundamento mercê de garantia constitucional art 5º LXVII de conversão em pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos STJ HC 22736SP Rel Min Paulo Medina j 19122003 A orientação da Terceira Seção desta Egrégia Corte firmouse no sentido de que compete ao Juízo da Execução Penal determinar a intimação do condenado para realizar o pagamento da pena de multa a teor do que dispõe o art 50 do Código Penal e acaso ocorra o inadimplemento da referida obrigação o fato deve ser comunicado à Fazenda Pública a fim de que ajuíze a execução fiscal no foro competente de acordo com as normas da Lei n 683080 porquanto a Lei n 926896 ao alterar a redação do art 51 do Código Penal afastou a titularidade do Ministério Público STJ REsp 459750SP Rel Min Laurita Vaz j 2462003 Suspensão da execução da multa Art 52 É suspensa a execução da pena de multa se sobrevém ao condenado doença mental V arts 26 e 77 a 82 do CP V art 167 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal D O U T R I N A 1 Efeito de doença mental A superveniência de doença mental suspende a execução da pena de multa à semelhança do que ocorre com a execução da pena privativa de liberdade art 41 do CP e art 167 da LEP quando o condenado deve ser recolhido a hospital de custódia e tratamento psiquiátrico 2 Duração da suspensão por doença mental Não pode ser por prazo indefinido Como não é causa de suspensão ou de interrupção da prescrição pode durar enquanto a doença persistir desde que não se verifique a prescrição Ocorrida esta extinguese a punibilidade J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Pena de multa substituída por medida de segurança Tratamento ambulatorial Não comparecimento a exame de cessação da periculosidade Expedição de mandado de captura STJ HC 55715SP Rel Min Félix Fischer j 622007 Capítulo II Da Cominação das Penas V art 6º 4º da Lei n 489865 abuso de autoridade Penas privativas de liberdade Art 53 As penas privativas de liberdade têm seus limites estabelecidos na sanção correspondente a cada tipo legal de crime V arts 32 I e 75 do CP V art 284 da Lei n 473765 Código Eleitoral D O U T R I N A Cominação de pena Cominação significa a prescrição de pena correspondente a determinado delito Tradicionalmente o direito codificado brasileiro prevê a sanção penal em cada tipo penal A norma penal compõese de duas partes a o preceito que contém o imperativo de proibição ou comando e b a sanção preceito secundário que constitui a ameaça de punição a quem violar o preceito primário As penas privativas de liberdade mantida a tradição vêm cominadas no preceito secundário estabelecendo seus limites mínimo e máximo em cada tipo incriminador Penas restritivas de direitos Art 54 As penas restritivas de direitos são aplicáveis independentemente de cominação na parte especial em substituição à pena privativa de liberdade fixada em quantidade inferior a 1 um ano ou nos crimes culposos V arts 44 e 59 IV do CP V arts 147 a 155 e 180 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal D O U T R I N A 1 Novo sistema de cominação Em relação às penas restritivas adotouse outro sistema de cominação de penas mais flexível mas sem alterar a estrutura do Código Penal Elas não estão previstas para cada tipo penal como as privativas de liberdade Há um capítulo próprio estabelecendo seus pressupostos requisitos e condições gerais e especiais de aplicação evitandose todos os problemas que o casuísmo poderia apresentar Sua aplicabilidade está regulada nos arts 54 a 57 do Código 2 Penas autônomas e substitutivas As penas restritivas são autônomas e substitutivas da pena privativa de liberdade Significa que primeiro o juiz deve encontrar a pena privativa de liberdade que seria definitiva e a seguir satisfeitos os requisitos que autorizam a substituição deve proceder a ela São substituíveis as penas inferiores a um ano ou quando os crimes forem culposos 3 Momento de aplicação a Na condenação individualizada a pena concretizada na sentença o juiz deve examinar a possibilidade de substituição arts 44 e 59 IV b durante a execução como incidente de execução quando se fizerem presentes os requisitos objetivos e subjetivos estabelecidos no art 180 da LEP J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A As penas restritivas de direito têm assento constitucional inciso XLVI do art 5º da Constituição Federal e são timbradas pela contraposição aos efeitos certamente traumáticos e estigmatizantes do cárcere O exame dos requisitos necessários à substituição integra o já tradicional sistema trifásico de aplicação de pena Donde o magistrado não poder silenciar sobre o art 44 do Código Penal art 59 do Código Penal Para atender à teleologia da norma o juiz precisa adentrar no exame das circunstâncias do caso concreto para nelas encontrar os fundamentos da negativa ou da concessão das penas restritivas de direito No caso a menção ao art 44 do Código Penal não atende às garantias da individualização da pena e da fundamentação das decisões judiciais Ordem concedida para cassar a pena imposta ao paciente e determinar ao Juízo de primeiro grau que proceda com base na análise das circunstâncias do caso concreto ao exame de que trata o art 44 do Código Penal STF HC 90991RS Rel Min Carlos Britto j 2162007 A sanção penal estabelecida pelo art 302 do Código de Trânsito Brasileiro de suspender ou proibir a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor por se tratar de uma pena restritiva de direitos aplicada conjuntamente com a pena corporal não pode ser substituída por outra de mesma natureza ao arbítrio do julgador Impossibilidade de interpretar extensivamente os arts 44 e 54 do CP que preveem apenas a substituição de penas privativas de liberdade por restritivas de direitos STJ REsp 347829RS Rel Min Laurita Vaz j 1082004 A decisão que indefere a substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos deve ser fundamentada Estabelecida a penabase no mínimo legal não pode ser o benefício negado somente pelo fato de responder a outros processos em andamento STJ HC 11279RS Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 7121999 Art 55 As penas restritivas de direitos referidas nos incisos III IV V e VI do art 43 terão a mesma duração da pena privativa de liberdade substituída ressalvado o disposto no 4º do art 46 Artigo com redação determinada pela Lei n 9714 de 25 de novembro de 1998 V arts 32 II 44 e 45 do CP D O U T R I N A 1 Limite de duração das penas restritivas de direitos O limite de duração das penas restritivas será o mesmo que teria a pena privativa de liberdade substituída art 55 do CP A pena restritiva não pode ter duração superior nem inferior à da pena privativa de liberdade substituída ressalvado o disposto no 4º do art 46 2 Cumprimento em menor tempo A ressalva no final deste artigo referese à possibilidade de cumprir a pena de prestação de serviços comunitários em menor tempo Essa possibilidade para evitar dúvida deve ficar expressa na decisão que efetuar a substituição da pena J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A As penas restritivas de direitos prescrevem no mesmo prazo em que prescreveria a pena privativa de liberdade que elas substituíram STJ HC 74872SP Rel Min Félix Fischer j 25102007 Se a pena privativa de liberdade fixada de maneira isolada foi substituída por duas penas restritivas de direitos sendo uma delas a descrita no inciso III do art 47 do Código Penal interdição temporária de direitos consistente na suspensão da habilitação para dirigir veículo automotor devese aplicar a regra do art 55 do Código Penal segundo a qual as penas restritivas de direitos terão a mesma duração da pena privativa de liberdade substituída STJ REsp 495402AC Rel Min Gilson Dipp j 1282003 Art 56 As penas de interdição previstas nos incisos I e II do art 47 deste Código aplicamse para todo o crime cometido no exercício de profissão atividade ofício cargo ou função sempre que houver violação dos deveres que lhes são inerentes D O U T R I N A 1 Aplicação obrigatória das penas de interdição Como pena restritiva específica na hipótese de substituição serão necessariamente aplicadas as penas previstas no art 47 I e II para crimes cometidos no exercício de profissão atividade ofício cargo ou função sempre que houver violação dos deveres que lhes são inerentes 2 Pressupostos necessários É indispensável que o crime tenha sido praticado no exercício das atividades referidas e com violação dos deveres inerentes a tais atividades Com efeito é necessário que o crime praticado esteja diretamente relacionado com o mau uso do direito interditado Caso contrário a pena violará o direito do cidadão de desenvolver livremente a profissão que eleger 3 Execução das interdições A autoridade superior do condenado deverá no caso de funcionário público no prazo de 24 horas após cientificada da condenação baixar ato administrativo a partir do qual começa a execução da pena Na hipótese do art 47 II e III o juiz das execuções determinará à autoridade competente a apreensão dos documentos que autorizam o exercício do direito interditado art 154 da LEP 4 Inobservância da interdição Constitui obrigação da autoridade competente e faculdade do particular comunicar ao juiz da execução o descumprimento da interdição art 155 da LEP que poderá resultar em conversão em pena de prisão se o descumprimento for injustificado arts 45 II do CP e 181 3º da LEP Art 57 A pena de interdição prevista no inciso III do art 47 deste Código aplicase aos crimes culposos de trânsito V arts 121 3º e 4º e 129 6º e 7º do CP D O U T R I N A 1 Suspensão da habilitação de motorista Esta pena só é aplicável nos crimes culposos de trânsito Nesses crimes havendo substituição por pena restritiva de direitos necessariamente essa alternativa deve ser aplicada por ser uma pena específica prevista especialmente para esse tipo de crime 2 Confronto com efeitos da condenação Esta pena substitutiva não se confunde com a inabilitação do art 92 III Esta é efeito extrapenal específico da condenação quando o veículo for utilizado como meio para praticar crime doloso Aquela é pena substitutiva de pena privativa de liberdade decorrente de crime culposo no trânsito 3 Inobservância da interdição Vide anotações ao art 56 Constitui causa de conversão em pena de prisão arts 45 II do CP e 181 3º da LEP J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Em respeito ao princípio da proporcionalidade reconhecidas como favoráveis as circunstâncias do art 59 do Código Penal tanto que a pena pelo crime de homicídio culposo na direção de veículo automotor foi fixada no piso legal a pena de suspensão de habilitação para dirigir veículo automotor deve também ser fixada em seu mínimo Precedentes do STJ STJ REsp 824234DF Rel Min Laurita Vaz j 1782006 Acidente de trânsito homicídio culposo e lesão corporal culposa Impossível o decote da pena de suspensão da habilitação imposta ao apelante vez que se trata de sanção obrigatória prevista na norma incriminadora art 302 da Lei 950397 não constituindo a sua imposição faculdade conferida ao Magistrado Deve ser reduzido o prazo de suspensão da habilitação estabelecido na sentença vez que tal sanção deve guardar proporcionalidade com a pena privativa de liberdade TJMG Apelação 103720200343050011 Rel Vieira de Brito j 2572006 Pena de multa Art 58 A multa prevista em cada tipo legal de crime tem os limites fixados no art 49 e seus parágrafos deste Código V arts 164 a 170 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal Parágrafo único A multa prevista no parágrafo único do art 44 e no 2º do art 60 deste Código aplicase independentemente de cominação na parte especial D O U T R I N A 1 Limites equivocados da multa Comete profundo equívoco este artigo quando afirma que os limites da pena de multa prevista nos tipos penais estão fixados no art 49 e seus parágrafos Perguntase e a majoração estabelecida no 1º do art 60 não é um limite E sendo um limite não será ele aplicável a todos os tipos legais de crimes que tenham a previsão de pena pecuniária Ou aquela majoração até o triplo só será aplicável nos casos de multa substitutiva que independe de cominação na Parte Especial As respostas a essas indagações demonstram que realmente os limites da multa não são somente os do art 49 e seus parágrafos mas também o do art 60 1º que se aplica tanto à multa prevista nos tipos legais de crimes como nas multas substitutivas 2 Cominação da multa substitutiva Quando aplicada na condição de pena substitutiva a multa não se encontra prevista nos respectivos tipos penais arts 44 parágrafo único e 60 2º cc o art 58 parágrafo único 3 Cominação abstrata da multa As normas incriminadoras não estabelecem mais os seus limites mínimo e máximo como fazia o Código Penal em sua redação original O art 2º da Lei n 720984 substituiu a expressão multa de por multa em todos os tipos penais do Código Penal e das leis especiais alcançadas pelo art 12 que cominem pena de multa Capítulo III Da Aplicação da Pena Fixação da pena Art 59 O juiz atendendo à culpabilidade aos antecedentes à conduta social à personalidade do agente aos motivos às circunstâncias e consequências do crime bem como ao comportamento da vítima estabelecerá conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime I as penas aplicáveis dentre as cominadas II a quantidade de pena aplicável dentro dos limites previstos III o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade IV a substituição da pena privativa da liberdade aplicada por outra espécie de pena se cabível V art 5º XLVI da CF V arts 33 3º 44 III 60 2º 68 77 II e 78 2º do CP V arts 6º IX 381 III e 387 II e III do CPP V art 2º 1º da Lei n 807290 crimes hediondos D O U T R I N A 1 Individualização da pena A individualização da pena ocorre em três momentos distintos a individualização legislativa processo por meio do qual são selecionados os fatos puníveis e cominadas as sanções respectivas estabelecendo seus limites e critérios de fixação da pena b individualização judicial elaborada pelo juiz na sentença é a atividade que concretiza a individualização legislativa que cominou abstratamente as sanções penais e finalmente c individualização executória que ocorre no momento mais dramático da sanção criminal que é o do seu cumprimento 2 Finalidade da pena Alheio às teorias modernas sobre fins e funções da pena o art 59 determina que a pena deve ser a necessária e suficiente para a reprovação e prevenção do crime observadas as circunstâncias que estabelece 3 Circunstâncias e elementares do crime Os fatores que integram a descrição da conduta típica são as chamadas elementares do tipo ou elementos essenciais constitutivos do delito Elementares do crime são dados fatos elementos ou condições que integram determinadas figuras típicas Certas peculiaridades que normalmente constituiriam circunstâncias ou condições podem transformarse em elementos do tipo penal e nesses casos deixam de circundar simplesmente o injusto típico para integrá lo Circunstâncias por sua vez são dados fatos elementos ou peculiaridades que apenas circundam o fato principal Não integram a figura típica podendo contudo contribuir para aumentar ou diminuir a sua gravidade O tipo penal além dos seus elementos essenciais pode ser integrado por outras circunstâncias acidentais que embora não alterem a sua constituição ou existência influem na dosagem final da pena 31 Distinção entre elementar e circunstância Para se distinguir uma elementar do tipo penal de uma simples circunstância do crime basta excluíla hipoteticamente se tal raciocínio levar à descaracterização do fato como crime ou fizer surgir outro tipo de crime estarseá diante de uma elementar Se no entanto a exclusão de determinado requisito não alterar a caracterização do crime tratarseá de uma circunstância do crime 4 Circunstâncias judiciais As circunstâncias que não constituem nem qualificam o crime são conhecidas na doutrina como circunstâncias judiciais circunstâncias legais e causas de aumento e de diminuição da pena Os elementos constantes no art 59 do CP são denominados circunstâncias judiciais porque a lei não os define e deixa a cargo do julgador a função de identificálos no bojo dos autos e mensurálos concretamente Não são efetivas circunstâncias do crime mas critérios limitadores da discricionariedade judicial que indicam o procedimento a ser adotado na tarefa individualizadora da penabase 41 Culpabilidade Impõese que se examine aqui a maior ou menor censurabilidade do comportamento do agente a maior ou menor reprovabilidade do comportamento praticado não se esquecendo porém a realidade concreta em que ocorreu especialmente a maior ou menor exigibilidade de outra conduta O dolo que agora se encontra localizado no tipo penal pode e deve ser aqui considerado para avaliar o grau de censurabilidade da ação tida como típica e antijurídica quanto mais intenso for o dolo maior será a censura quanto menor a sua intensidade menor será a censura 42 Antecedentes Por antecedentes se devem entender os fatos anteriores praticados pelo réu que podem ser bons ou maus São maus antecedentes aqueles fatos que merecem a reprovação da autoridade pública e que representam expressão de sua incompatibilidade com os imperativos éticojurídicos A finalidade desse modulador como os demais constantes do art 59 é simplesmente demonstrar a maior ou menor afinidade do réu com a prática delituosa Admitir certos atos ou fatos como antecedentes negativos não significa uma condenação ou simplesmente uma violação do princípio constitucional de presunção de inocência como alguns doutrinadores e parte da jurisprudência têm entendido Não nos parece a melhor corrente embora respeitável o entendimento de que inquéritos instaurados e processos criminais em andamento absolvições por insuficiência de provas prescrições abstratas retroativas e intercorrentes não podem ser considerados como maus antecedentes porque violaria a presunção de inocência Com efeito ao serem admitidos como antecedentes negativos não encerram novo juízo de censura isto é não implicam condenação caso contrário nos outros processos nos quais tenha havido condenação sua admissão como maus antecedentes representaria uma nova condenação o que é inadmissível A persistir esse entendimento mais liberal restariam como maus antecedentes somente as condenações criminais que não constituam reincidência E se essa fosse a intenção do ordenamento jurídico em vez de referirse aos antecedentes terseia referido às condenações anteriores irrecorríveis Embora tenha sido válido ao seu tempo hoje em um Estado Democrático de Direito é insustentável o entendimento de Nélson Hungria segundo o qual também devem ser apreciados como antecedentes penais os processos paralisados por superveniente extinção da punibilidade antes de sentença final irrecorrível inquéritos arquivados por causas impeditivas da ação penal condenações ainda não passadas em julgado processos em andamento até mesmo absolvições anteriores por deficiência de prova Com efeito sob o império de uma nova ordem constitucional e constitucionalizando o Direito Penal somente podem ser valoradas como maus antecedentes decisões condenatórias irrecorríveis Assim quaisquer outras investigações preliminares processos criminais em andamento mesmo em fase recursal não podem ser valorados como maus antecedentes 43 Conduta social Devese analisar o conjunto do comportamento do agente em seu meio social na família na sociedade na empresa na associação de bairro etc Embora sem antecedentes criminais um indivíduo pode ter sua vida recheada de deslizes infâmias imoralidades reveladores de desajuste social Por outro lado é possível que determinado indivíduo mesmo portador de antecedentes criminais possa ser autor de atos beneméritos ou de grande relevância social ou moral 44 Personalidade Deve ser entendida como síntese das qualidades morais e sociais do indivíduo Na análise da personalidade devese verificar a sua boa ou má índole sua maior ou menor sensibilidade éticosocial a presença ou não de eventuais desvios de caráter de forma a identificar se o crime constitui um episódio acidental na vida do réu As infrações criminais praticadas pelo réu durante a menoridade servem para subsidiar a análise da personalidade do agente assim como outras infrações criminais praticadas depois do crime objeto do processo em julgamento Essas duas circunstâncias constituem elementos concretos reveladores da personalidade identificada com o crime que não podem ser ignorados 45 Os motivos do crime Os motivos constituem a fonte propulsora da vontade criminosa Não há crime gratuito ou sem motivo Para a dosagem da pena é fundamental considerar a natureza e qualidade dos motivos que levaram o indivíduo à prática do crime 46 As circunstâncias As circunstâncias referidas no art 59 não se confundem com as circunstâncias legais relacionadas no texto legal arts 6l 62 65 e 66 do CP mas defluem do próprio fato delituoso tais como forma e natureza da ação delituosa os tipos de meios utilizados objeto tempo lugar forma de execução e outras semelhantes 47 As consequências do crime Não se confundem com a consequência natural tipificadora do ilícito praticado Devese na verdade analisar a maior ou menor danosidade decorrente da ação delituosa praticada ou o maior ou menor alarma social provocado isto é a maior ou menor irradiação de resultados não necessariamente típicos do crime 48 Comportamento da vítima Estudos de vitimologia demonstram que muitas vezes as vítimas contribuem decisivamente na consecução do crime Esses comportamentos são não raro verdadeiros fatores criminógenos que embora não justifiquem o crime nem isentem o réu de pena podem minorar a censurabilidade do comportamento delituoso como por exemplo a injusta provocação da vítima A verdade é que o comportamento da vítima pode contribuir para fazer surgir no delinquente o impulso delitivo 5 Inadmissível non bis in idem Aquelas circunstâncias que constituírem qualificarem ou privilegiarem o crime ou de alguma forma agravarem ou atenuarem a pena não devem ser avaliadas neste momento para evitar a dupla valoração 6 Circunstâncias judiciais nos denominados crimes societários Nenhuma das leis esparsas especiais ou extravagantes consagra um modo especial de dosimetria penal aplicandose por inteiro as previsões contidas no Código Penal quando mais não seja por determinação da regra expressa no art 12 do referido estatuto penal material Dessa forma culpabilidade antecedentes conduta social personalidade do agente motivos circunstâncias e consequências do crime são exatamente as mesmas previstas no Código Penal com os mesmos conteúdos sentidos funções finalidades e limites que nesse diploma legal são concebidos Nada autoriza no ordenamento jurídico brasileiro que se lhes deem dimensões outras que distingam da orientação consagrada na doutrina e jurisprudência nacionais ao longo de sua história Assim é absolutamente equivocada e infundada a valoração dos predicados relacionados no art 59 do Código Penal 7 Pena aquém do mínimo impossibilidade interpretação equivocada O equivocado entendimento de que circunstância atenuante não pode levar a pena para aquém do mínimo cominado ao delito partiu de interpretação analógica desautorizada baseada na proibição que constava no texto original do parágrafo único do art 48 do Código Penal de 1940 não repetido destaquese na Reforma Penal de 1984 Lei n 720984 Ademais esse dispositivo disciplinava uma causa especial de diminuição de pena quando o agente quis participar de crime menos grave mas impedia que ficasse abaixo do mínimo cominado No entanto nem mesmo esse diploma revogado parte geral estendia tal previsão às circunstâncias atenuantes ao contrário do que entendeu a interpretação posterior à sua revogação 8 Pena aquém do mínimo uma garantia constitucional Na verdade o entendimento contrário partia de uma interpretação equivocada que a dicção do atual art 65 do Código Penal não autoriza Com efeito esse dispositivo determina que as circunstâncias atenuantes sempre atenuam a pena independentemente de já se encontrar no mínimo cominado A previsão legal definitivamente não deixa qualquer dúvida sobre sua obrigatoriedade e eventual interpretação diversa viola não apenas o princípio da individualização da pena tanto no plano legislativo quanto no judicial como também o princípio da legalidade estrita 9 Aplicação obrigatória do art 65 direito subjetivo Enfim deixar de aplicar uma circunstância atenuante para não trazer a pena para aquém do mínimo cominado nega vigência ao disposto no art 65 do CP que não condiciona a sua incidência a esse limite violando o direito público subjetivo do condenado à pena justa legal e individualizada Essa ilegalidade deixando de aplicar norma de ordem pública caracteriza uma inconstitucionalidade manifesta 10 Súmula 231 do STJ carência de fundamento jurídico Por fim e a conclusão é inarredável a Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça carece de adequado fundamento jurídico afrontando inclusive os princípios da individualização da pena e da legalidade estrita Não há lei alguma proibindo que em decorrência do reconhecimento de circunstância atenuante a penabase possa ficar aquém do mínimo cominado Pelo contrário há lei que determina art 65 peremptoriamente a redução da pena em razão de uma atenuante sem condicionar seu reconhecimento a nenhum limite Ver nesse sentido nosso Tratado de Direito Penal volume 1 capítulo da aplicação da pena 11 Limites temporais dos efeitos dos maus antecedentes É indispensável que se respeite a limitação temporal dos efeitos dos maus antecedentes adotandose o parâmetro previsto para os efeitos da reincidência fixado no art 64 do CP em cinco anos por autorizada analogia Advogando a mesma tese sustenta Salo de Carvalho Amilton Bueno de Carvalho e Salo de Carvalho Aplicação da pena e garantismo 3 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2004 p 52 no mesmo sentido José Antonio Paganella Boschi Das penas e seus critérios de aplicação Porto Alegre Ed Livraria do Advogado 2000 p 208 in verbis o recurso à analogia permitenos limitar o prazo de incidência dos antecedentes no marco dos cinco anos delimitação temporal da reincidência visto ser a única orientação permitida pela sistemática do Código Penal J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 241 do STJ A reincidência penal não pode ser considerada como circunstância agravante e simultaneamente como circunstância judicial Ao fixar a pena o MM Juiz a quo deve observar todas as circunstâncias judiciais do art 59 do Código Penal Embora nem todas as circunstâncias sejam totalmente favoráveis ao apelante a penabase foi fixada de maneira exacerbada e deve ser proporcionalmente diminuída em observância aos princípios da repressão e prevenção do crime TJMG Apelação 105110601006050011 Rel Antônio Carlos Cruvinel j 18122007 A fixação da penabase deve ser lastreada em dados concretos que se refiram aspectos externos à descrição típica Não podem ser utilizados processos penais em curso à guisa de maus antecedentes sob pena de violação da garantia constitucional da presunção de inocência Podese considerar como circunstância judicial desfavorável o fato de o crime ter sido praticado contra entidade pública que se encontra em particular situação de precariedade na hipótese o Sistema de Seguridade Social Justificase o acréscimo punitivo no estabelecimento da pena base do delito de quadrilha ou bando lastreada na maior culpabilidade quando se apura participação de maior vulto na associação criminosa STJ HC 76148RJ Rel Min Maria Thereza de Assis Moura j 18122007 Para fins de exacerbação da penabase ações penais em curso por si só não podem ser consideradas como maus antecedentes Precedentes do STJ STJ HC 90838MG Rel Min Napoleão Nunes Maia Filho j 13122007 A sentença condenatória impôs regime prisional mais gravoso valendose da interpretação conjunta dos arts 59 e 33 2º ambos do Código Penal o que afasta a alegação de qualquer ilegalidade Fixada a penabase acima do mínimo legal em razão do reconhecimento judicial expresso e fundamentado de serem desfavoráveis algumas das circunstâncias judiciais não há como conceder ao Paciente o benefício da substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos à luz do disposto no art 44 inciso III do Código Penal STJ HC 64900RS Rel Min Laurita Vaz j 11122007 A capacidade para entender o caráter ilícito da conduta e de se autodeterminar segundo esse entendimento faz parte do próprio conceito de culpabilidade não podendo portanto ser usado para justificar a exacerbação da penabase acima do mínimo legal A penabase não pode ser exasperada utilizandose de elemento normativo do próprio tipo penal Inaceitável a utilização de padrões morais tais como o não atuar movido por sentimentos de elevada nobreza moral e generosidade para avaliar a motivação do crime STJ HC 66238GO Rel Min Maria Thereza de Assis Moura j 6122007 Os arts 59 e 61 I do Código Penal preveem respectivamente os maus antecedentes como circunstância judicial a ser considerada na fixação da penabase e a reincidência como circunstância legal que sempre deverá agravar a pena sendo esta portanto norma de natureza cogente ou seja de aplicação obrigatória Não há falar no caso em bis in idem pois o juiz levou em consideração condenações diversas para elevar a pena em decorrência dos maus antecedentes e da reincidência STJ AgRg no REsp 958914RS Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 29 112007 A circunstância de o réu ter utilizado recursos oficiais em destinação diversa à exigida por constituir elemento constitutivo do próprio tipo não pode ser sopesada como negativa conduta social a justificar o aumento da penabase STJ HC 82000SP Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 28112007 A instância ordinária examinando as circunstâncias judiciais do art 59 do Código Penal aplicáveis ao caso concreto considerouas desfavoráveis razão pela qual de forma devidamente fundamentada fixou a penabase acima do mínimo legal Não houve na hipótese o alegado bis in idem da valoração judicial da reincidência A Corte a quo ao recalcular a pena considerou desfavoráveis os maus antecedentes do Paciente devidamente configurados por condenação transitada em julgado que embora se preste a configurar a agravante da reincidência não foi utilizada na segunda fase como circunstância genérica de aumento de pena STJ HC 56791SP Rel Min Laurita Vaz j 20112007 A despeito da haver certa discricionariedade do Juiz na aferição das circunstâncias do art 59 do Código Penal deve fazêlo objetivamente respeitando o critério da proporcionalidade entre o aumento implementado e as circunstâncias judiciais consideradas desfavoráveis No caso dos autos considerando a efetiva existência de maus antecedentes por condenações anteriores transitadas em julgado e personalidade voltada para o crime está justificada a fixação da penabase acima do mínimo legal contudo o Magistrado o fez de forma exacerbada e desproporcional STJ HC 52974SP Rel Min Laurita Vaz j 20112007 A pena privativa de liberdade não pode ser fixada abaixo do mínimo legal com supedâneo em meras atenuantes Precedentes e Súmula n 231STJ STJ REsp 923099RS Rel Min Félix Fischer j 25102007 Não há entre as denominadas circunstâncias judiciais e as circunstâncias legais diferença ontológica qualquer afastando por isso a reincidência dos maus antecedentes enquanto circunstância judicial pois que tem a mesma função determinada pela mesma causa possuindo apenas força e grau de intensidade diversas STJ REsp 713813RS Rel Min Hamilton Carvalhido j 2792007 O julgador deve ao individualizar a pena examinar com acuidade os elementos que dizem respeito ao fato obedecidos e sopesados todos os critérios estabelecidos no art 59 do Código Penal para aplicar de forma justa e fundamentada a reprimenda que seja proporcionalmente necessária e suficiente para reprovação do crime In casu os argumentos judiciais tecidos ao fixar o quantum da reprimenda são insuficientes para amparar a exasperação na fixação da penabase acarretando pois flagrante desproporcionalidade entre a sua fixação e as circunstâncias apresentadas ferindo pois o princípio da individualização da pena STJ HC 46395MS Rel Min Laurita Vaz j 2792007 As circunstâncias judiciais devem ser sopesadas com base em fatores concretos contidos nos autos da ação penal sendo necessária a fundamentação de todas elas em atenção ao princípio da individualização das penas e da necessidade de motivação das decisões judiciais sendo defeso ao Magistrado apenas apontálas como desfavoráveis ao condenado STJ HC 82928MS Rel Jane Silva j 139 2007 A grande quantidade de substância entorpecente apreendida é circunstância judicial que justifica o aumento da penabase acima do mínimo legal Precedentes do STJ e do STF STJ HC 82233DF Rel Min Félix Fischer j 782007 A doutrina interpretando o art 59 do Código Penal assentou que em homenagem ao princípio constitucional da presunção da inocência só configura mau antecedente a condenação por fato anterior transitada em julgado após o novo fato ilícito não sendo juridicamente possível considerar mau antecedente criminal a circunstância de o réu figurar como indiciado em inquérito policial ou mesmo denunciado em ação penal ainda em curso Precedentes do Superior Tribunal de Justiça TRF1ª Região HC 200101000368790GO Embora existente mais de uma causa especial de aumento de pena deve haver uma só incidência e não duplo ou triplo aumento O grau máximo depende das circunstâncias judiciais TRF1ª Região Apelação 200643000027569 Rel Tourinho Neto j 2672007 A pena não pode ser aumentada com base em elementos do tipo ou por causa do silêncio dos acusados O não comparecimento à delegacia apenas indica o desejo dos réus de permanecer em silêncio TRF3ª Região Apelação 19996105006838 3SP Rel Márcia de Oliveira j 622007 Fixada a penabase no mínimo legal porquanto reconhecidas as circunstâncias judiciais favoráveis ao réu primário e de bons antecedentes não é cabível infligir regime prisional mais gravoso apenas com base na gravidade genérica do delito Inteligência do art 33 2º e 3º cc art 59 ambos do Código Penal STJ HC 59657SP Rel Min Laurita Vaz j 2192006 1 O assalto a casa lotérica justamente no horário em que estava lotada de clientes colocando em risco as vidas das pessoas é circunstância em nada estranha ao elenco do art 59 do Código Penal 2 A intensidade do dolo em razão de haver o réu arquitetado o assalto trazendo pessoas de fora para este município salvo se houvesse incorrido na dupla valoração é circunstância a que o juiz pode e deve atribuir função na individualização da penabase fundamentalmente porque inexiste qualquer diferença ontológica entre as circunstâncias judiciais cuja função depende da valoração do juiz e as legais que têm função obrigatória 3 Das circunstâncias judiciais não há reclamar consideração de cada qual inclusive para afirmálas inexistentes mas que efetiva e concretamente sejam particularizadas na sua existência aquelas a que o Magistrado atribui função individualizadora 4 Incorre em bis in idem o Juiz que invoca como circunstância judicial referindoa sem mais a violência elementar do roubo Código Penal art 61 tanto quanto grava com vício a individualização da pena atribuindo ao réu circunstância que lhe é absolutamente estranha objetiva e subjetivamente STJ HC 16461SE Rel Min Hamilton Carvalhido j 282005 Na dosimetria da pena três fases devem ser observadas Na primeira fixase a penabase segundo a observância das circunstâncias judiciais do art 59 na segunda essa pena pode ser acrescida ou reduzida ante a existência ou não de agravantes ou atenuantes e na última deve incidir sobre a pena apurada na segunda fase eventuais causas de aumento ou diminuição STJ HC 14201SP Rel Min Édson Vidigal j 2032001 Critérios especiais da pena de multa Art 60 Na fixação da pena de multa o juiz deve atender principalmente à situação econômica do réu 1º A multa pode ser aumentada até o triplo se o juiz considerar que em virtude da situação econômica do réu é ineficaz embora aplicada no máximo 2º Multa substitutiva 2º A pena privativa de liberdade aplicada não superior a 6 seis meses pode ser substituída pela de multa observados os critérios dos incisos II e III do art 44 deste Código V arts 49 a 52 58 e 72 do CP V art 77 da Lei n 807890 Código de Defesa do Consumidor D O U T R I N A 1 Critérios especiais da pena de multa Vide anotações ao art 49 2 Multa substitutiva e triplicação da pena Vide anotações ao art 49 e seus parágrafos 3 Cumulação de penas de multa Determinados tipos penais preveem penas cumulativas uma de prisão e outra de multa Pois bem quando a pena de prisão puder ser substituível por multa nesse caso aplicamse duas penas de multa a multa substitutiva e a multa original uma vez que a cumulação não é facultativa mas obrigatória Não há nenhum impedimento legal Caso contrário estarseia suprimindo uma pena 4 Substituição em tentativa Limite da redução A pena da tentativa já reduzida nos termos do art 14 parágrafo único concretiza a pena de prisão definitiva Esta já reduzida pela natureza tentada do crime sendo substituída por multa não pode ter nova redução em razão da tentativa JTACrim 87274 Essa redução será possível em tese na tentativa de contravenção quando aplicável diretamente e não em substituição pena de multa Como não há crime punível direta e exclusivamente com pena de multa nesses delitos é inadmissível a segunda redução agora na pena de multa trazendoa para baixo dos dez dias mínimos 5 Conversão da pena de multa não paga A Lei n 926896 transformando a pena de multa em dívida de valor eliminou ao mesmo tempo a possibilidade de convertêla em prisão por falta de pagamento Esqueceuse todavia de revogar o art 85 da Lei n 909995 que por analogia e grande dose de compreensão devese entender derrogado 6 Prescrição da pena de multa A pena de multa prescreve em dois anos quando for a única cominada ou a única aplicada Lei n 926896 Prescreverá contudo no mesmo prazo da pena privativa de liberdade quando for alternativa ou cumulativamente cominada ou cumulativamente aplicada Vide anotações ao art 114 7 Da pretensão punitiva e da pretensão executória A prescrição de dois anos tanto pode atingir a pretensão punitiva quanto a pretensão executória Prescrevendo qualquer das pretensões estatais seja punitiva seja executória a multa não poderá ser executada estará igualmente prescrita ao contrário de alguns entendimentos já manifestados 8 Causas suspensivas e interruptivas da prescrição Embora a competência para a execução da pena de multa a nosso juízo permaneça com o juiz das execuções criminais e com o Ministério Público apenas com novo procedimento as causas suspensivas e interruptivas da prescrição não serão aquelas previstas no Código Penal arts 116 e 117 mas as relacionadas na Lei de Execução Fiscal Lei n 683080 e no Código Tributário Nacional J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 171 do STJ Cominadas cumulativamente em lei especial penas privativa de liberdade e pecuniária é defeso a substituição da prisão por multa Inexiste previsão legal para a isenção da pena de multa em razão da situação econômica do réu devendo esta servir tão somente de parâmetro para a fixação de seu valor STJ REsp 760050RS Rel Min Félix Fischer j 1782006 A discricionariedade do julgador na fixação da pena de multa devese se nortear dentro dos parâmetros estabelecidos pelos arts 49 e 60 do Código Penal STJ REsp 722561RS Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 1432006 Impossibilidade de isenção do pagamento da pena de multa pelo condenado pois a condição econômicofinanceira é de ser levada principalmente e não unicamente em conta devendo a dosimetria da pena pecuniária atender também a outras circunstâncias em paralelismo com a pena privativa de liberdade STJ REsp 667441RS Rel Min Hélio Quaglia Barbosa j 6102005 Reduzida uma pena a privativa de liberdade impõese em idêntica proporção a redução da outra a de multa STJ HC 35682MG Rel Min Nilson Naves j 306 2005 Condenação por infringência ao art 311 do Código de Trânsito Aplicação de pena de seis meses de detenção substituída por pena restritiva de direito As penas privativas de liberdade superiores a seis meses são substituídas por pena restritiva de direito Afronta ao art 46 do CP O Diploma Penal prevê no art 60 2º para as penas privativas de liberdade não superiores a seis meses a conversão da pena privativa de liberdade em multa Pena aplicada no mínimo legal Presença dos requisitos subjetivos e objetivos para conversão da pena privativa de liberdade por multa STF HC 83293RS Rel Min Gilmar Mendes j 1632004 Circunstâncias agravantes Art 61 São circunstâncias que sempre agravam a pena quando não constituem ou qualificam o crime V arts 76 II 387 e 484 parágrafo único I e II do CPP I a reincidência II ter o agente cometido o crime a por motivo fútil ou torpe b para facilitar ou assegurar a execução a ocultação a impunidade ou vantagem de outro crime c à traição de emboscada ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificultou ou tornou impossível a defesa do ofendido d com emprego de veneno fogo explosivo tortura ou outro meio insidioso ou cruel ou de que podia resultar perigo comum e contra ascendente descendente irmão ou cônjuge f com abuso de autoridade ou prevalecendose de relações domésticas de coabitação ou de hospitalidade ou com violência contra a mulher na forma da lei específica Redação da alínea f determinada pela Lei n 11340 de 7 de agosto de 2006 g com abuso de poder ou violação de dever inerente a cargo ofício ministério ou profissão h contra criança maior de 60 sessenta anos enfermo ou mulher grávida Redação da alínea h determinada pela Lei n 10741 de 1º de outubro de 2003 i quando o ofendido estava sob a imediata proteção da autoridade j em ocasião de incêndio naufrágio inundação ou qualquer calamidade pública ou de desgraça particular do ofendido l em estado de embriaguez preordenada V art 28 II do CP V art 76 da Lei n 807890 Código de Defesa do Consumidor D O U T R I N A 1 Agravantes genéricas As agravantes e as atenuantes genéricas são chamadas de circunstâncias legais porque vêm expressamente relacionadas no texto legal as agravantes nos arts 61 e 62 e as atenuantes nos arts 65 e 66 todos do Código Penal Essas circunstâncias não integram a figura típica limitamse a circundar o crime 2 Limite do agravamento O Código não estabelece a quantidade de aumento ou de diminuição das agravantes e atenuantes legais genéricas deixandoa à discricionariedade do juiz No entanto sustentamos que a variação dessas circunstâncias não deve ir muito além do limite mínimo das majorantes e minorantes que é fixado em um sexto Caso contrário as agravantes e as atenuantes se equiparariam àquelas causas modificadoras da pena que a nosso juízo apresentam maior intensidade situandose pouco abaixo das qualificadoras no caso das majorantes Tampouco pode ultrapassar os limites mínimo e máximo cominados no tipo legal 3 Aplicação das agravantes nos crimes culposos Tanto as agravantes quanto as atenuantes aplicamse às hipóteses de crimes culposos Doutrinariamente não vemos nenhuma razão para a não aplicação das agravantes nos crimes culposos em que pese a corrente jurisprudencial majoritária em sentido contrário O dispositivo estabelece que são circunstâncias que sempre agravam a pena excluindo somente as elementares e qualificadoras do crime 4 Elenco das agravantes I Reincidência configurase com a prática de novo crime após ter sido definitivamente condenado por crime anterior no Brasil ou no exterior O trânsito em julgado pelo crime anterior constitui pressuposto para a reincidência II a Motivo fútil ou torpe motivo fútil é aquele desproporcionado insignificante É o pretexto gratuito desproporcionado em relação à causa e à ação Motivo torpe é aquele repugnante que ofende gravemente os princípios éticos dominantes em determinado meio social Torpe é o motivo vil abjeto II b Para facilitar ou assegurar a execução ocultação a impunidade ou vantagem de outro crime esta agravante pressupõe a existência de outro crime que seria o crimefim em que se pretende facilitar assegurar ocultar ou garantir a impunidade ou vantagem Aplicase somente ao crimemeio ainda que o crimefim não venha a ocorrer ou enfim a finalidade não seja atingida II c À traição de emboscada ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificultou ou tornou impossível a defesa do ofendido as agravantes relacionadas nesta alínea constituem modos ou formas astuciosas e até insidiosas de cometimento do crime a saber 1 Traição contém fortíssimo conteúdo imoral deslealdade perfídia Na traição a vítima é surpreendida pelo ataque súbito ou sorrateiro do agente Esta figura em regra só pode ocorrer nos crimes contra a pessoa 2 Emboscada assemelhase à traição com a diferença de que naquela o agente espera escondido de tocaia a passagem da vítima para surpreendêla 3 Dissimulação é o encobrimento do propósito criminoso do agente É o ardil utilizado para surpreender a vítima 4 Outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa esta previsão destaca que a relação contida nesta alínea é meramente exemplificativa admitindo outras hipóteses similares Devem contudo como as hipóteses elencadas caracterizarse pela insídia pela astúcia não a configurando por exemplo a superioridade em armas ou em força física O exemplo mais comum desta modalidade similar é a surpresa A ocorrência destas modalidades na hipótese de homicídio qualificao II d Com emprego de veneno fogo explosivo tortura ou outro meio insidioso ou cruel ou de que podia resultar perigo comum relacionamse aqui exemplificativamente os meios de cometimento do crime que se caracterizam pela insidiosidade ou crueldade Meio insidioso veneno é aquele capaz de iludir a atenção da vítima Meio cruel fogo explosivo tortura é aquele que causa desnecessariamente maior sofrimento à vítima ou revela uma brutalidade fora do comum ou em contraste com o mais elementar sentimento de piedade Exposição de Motivos do Código Penal de 1940 n 38 Meio de que pode resultar perigo comum fogo explosivo é o que pode atingir indeterminado número de pessoas ou coisas Por razões óbvias esta agravante não se aplica aos crimes de perigo comum por integrálos II e Contra ascendente descendente irmão ou cônjuge nos crimes praticados contra parentes nas linhas relacionadas violamse deveres decorrentes do parentesco O parentesco pode ser legítimo ilegítimo natural ou civil Não se aplica a agravante em relação a cônjuge se o casal se encontra judicialmente separado ou divorciado II f Com abuso de autoridade ou prevalecendose de relações domésticas de coabitação ou de hospitalidade consideramse aqui situações pessoais ou familiares que facilitam a prática delituosa além de implicarem a infringência de especiais deveres 1 Abuso de autoridade referese às relações privadas em que haja um vínculo de dependência ou subordinação com exercício abusivo ou ilegítimo de autoridade no direito privado como por exemplo empregador tutor curador pais etc 2 Relações domésticas são as que existem entre aqueles que participam do quotidiano de uma mesma família familiares empregados amigos frequentadores habituais etc 3 Relações de coabitação referemse àqueles que convivem sob o mesmo teto particularmente sob o aspecto das relações de convivência 4 Relações de hospitalidade referemse à estada de alguém em casa alheia sem a durabilidade da coabitação não sendo necessário intimidade como por exemplo visita para uma refeição um drinque etc II g Com abuso de poder ou violação de dever inerente a cargo ofício ministério ou profissão a acepção de abuso de poder aqui ao contrário da alínea anterior referese ao exercício abusivo de autoridade pública Abuso é o uso do poder além dos limites legais e violação de dever é o desrespeito às normas que norteiam cargo ofício ministério ou profissão Não há abuso de poder sem violação de dever mas pode haver violação de dever sem abuso de poder Cargo e ofício devem ser públicos Profissão é a atividade habitualmente exercida por alguém e Ministério indica atividade religiosa II h Contra criança maior de 60 anos enfermo ou mulher grávida considerase nas quatro hipóteses a presumida menor capacidade de defesa dessas vítimas além da perversidade e covardia do agente Consequentemente tratase de presunção juris tantum Criança é quem se encontra ainda longe da puberdade aceitandose como regra o limite de sete a oito anos O Estatuto do Idoso mudou a redação deste dispositivo substituindo a expressão velho por maior de 60 sessenta anos Pela redação anterior era considerada velho toda pessoa com mais de 70 anos o que não impedia que se considerasse como tal quem com idade inferior se apresentasse combalido enfraquecido ou precocemente envelhecido Com a nova redação essa interpretação mais liberal será inadmissível ante a impossibilidade de darse interpretação extensiva a normas penais repressivas Enfermo é a pessoa doente cuja resistência tenha sido diminuída pela enfermidade Enfermo no entanto deve receber interpretação ampla para abranger por exemplo os deficientes físicos e os portadores de moléstia física ou mental Mulher grávida a gravidez iniciase com a fecundação do óvulo e termina com a expulsão do feto Para se configurar esta agravante é indispensável que o agente tenha consciência da gravidez da vítima II i Quando o ofendido estava sob a imediata proteção da autoridade encontrase nessa situação quem está sendo protegido ou custodiado pela autoridade pública A maior censurabilidade da conduta caracterizase não só pela audácia do agente como especialmente pelo desrespeito à autoridade pública Não basta a proteção genérica que a todos abrange mas se exige a imediata e direta proteção de determinada autoridade pública v g os linchamentos em praça pública quando a vítima é retirada da custódia policial II j Em ocasião de incêndio naufrágio inundação ou qualquer calamidade pública ou de desgraça particular do ofendido a enumeração do dispositivo é meramente enunciativa Nessas circunstâncias o agente aproveitase da situação para praticar o crime pois a calamidade ou a desgraça afrouxam naturalmente a vigilância dos bens juridicamente tutelados facilitando a execução delituosa Além da maior dificuldade em elucidar os fatos a conduta do agente revela sua maior insensibilidade e correspondente maldade justificando a agravação da sanção penal II l Em estado de embriaguez preordenada o agente embriaga se propositalmente para praticar o crime Com a embriaguez preordenada o agente procura liberar os freios inibitórios para praticar o crime e quem sabe buscar uma escusa É indiferente o grau da embriaguez com exceção da coma alcoólica que poderia configurar a actio libera in causa É necessária a prova de que o propósito da embriaguez era praticar o crime J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 241 do STJ A reincidência penal não pode ser considerada como circunstância agravante e simultaneamente como circunstância judicial O ciúme por si só como sentimento comum à maioria da coletividade não se equipara ao motivo torpe Na verdade o ciúme patológico tem a intensidade exagerada de um sentimento natural do ser humano que se não serve para justificar a ação criminosa tampouco serve para qualificála TJPR RESE 04449789 Rel Edison de Oliveira Macedo Filho j 20122007 A reincidência não constitui bis in idem posto que é imposta por se considerar mais censurável a conduta daquele que reitera a prática criminosa colocando em risco a ordem social bem como por demonstrar a sua incapacidade de aceitação das normas legais STJ REsp 928438RS Rel Jane Silva j 29112007 Os arts 59 e 61 I do Código Penal preveem respectivamente os maus antecedentes como circunstância judicial a ser considerada na fixação da penabase e a reincidência como circunstância legal que sempre deverá agravar a pena sendo esta portanto norma de natureza cogente ou seja de aplicação obrigatória Não há falar no caso em bis in idem pois o juiz levou em consideração condenações diversas para elevar a pena em decorrência dos maus antecedentes e da reincidência STJ AgRg no REsp 958914RS Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 29 112007 Dentro dos limites legais e observada a Súmula 241 do STJ caracterizados os maus antecedentes e a reincidência incidem os dispositivos previstos respectivamente no art 59 e no art 61 inciso I do CP Precedentes STJ AgRg no REsp 917060RS Rel Min Félix Fischer j 25102007 Fere o disposto no art 61 inciso I do CP a rejeição de sua incidência sob pretexto de bis in idem concretamente inocorrente Precedentes STJ AgRg no REsp 951859RS Rel Min Félix Fischer j 18102007 Nos termos do art 67 do Código Penal e da firme jurisprudência da 3ª Seção a respeito a circunstância agravante da reincidência prevalece sobre a atenuante da confissão Precedentes STJ REsp 912053MS Rel Min Carlos Fernando Mathias j 16102007 Uma vez que o crime foi praticado com violência presumida descabe aplicar a agravante do art 61 inciso II alínea h do Código Penal sob pena de evidente bis in idem uma vez que a menoridade da vítima é circunstância elementar do crime Precedente desta Corte STJ REsp 617315DF Rel Min Laurita Vaz j 982005 Mantida a agravante prevista no art 61 inciso II alínea c do Código Penal tendo em vista que o modo de agir do réu ao oferecer dinheiro à pequena vítima para acompanhálo até sua casa encobriu a intenção criminosa TJRS Apelação 70010973352 Rel Nereu José Giacomolli j 1442005 A atenuante da menoridade prepondera sobre qualquer outra circunstância inclusive sobre a reincidência por sua vez mais gravosa do que as consequências do delito e as agravantes genéricas STJ HC 32081MS Rel Min Laurita Vaz j 1722005 Incabível a agravante genérica prevista no artigo 61 inciso II alínea e do Código Penal pois há nos autos prova préconstituída de que a vítima não era esposa do paciente porquanto casados apenas em cerimônia religiosa A norma penal refere unicamente o cônjuge sendo vedado no Direito Penal ampliar tal conceito restritivo com o emprego de analogia in malam partem STJ HC 23419PB Rel Min Fernando Gonçalves j 2892004 O motivo fútil e o uso de meio de que dificultou ou impossibilitou a defesa da vítima são integrantes do tipo do homicídio qualificado e por isso não podem ser incluídas na quesitação de julgamento de réu pronunciado por homicídio simples Precedentes STJ REsp 457280MG Rel Min Gilson Dipp j 1062003 Se na sentença de pronúncia o Juiz monocrático após acurado exame do conjunto fáticoprobatório afastou as qualificadoras motivo fútil e recurso que impossibilitou a defesa da vítima não se poderia incluir essas circunstâncias como agravantes genéricas no questionário apresentado ao Tribunal do Júri mormente quando a acusação se conformou com a decisão que pronunciou o réu por homicídio em sua forma simples Precedentes do STJ STJ HC 17509SP Rel Min Vicente Leal j 2122002 Não se revelando nos autos o motivo do crime não há falar seja ele fútil até porque não há como valorar uma conduta reputandoa fútil ou não se não se sabe o motivo que lhe deu causa STJ REsp 172163DF Rel Min Hamilton Carvalhido j 104 2001 Agravantes no caso de concurso de pessoas Art 62 A pena será ainda agravada em relação ao agente que I promove ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos demais agentes II coage ou induz outrem à execução material do crime V art 22 do CP III instiga ou determina a cometer o crime alguém sujeito à sua autoridade ou não punível em virtude de condição ou qualidade pessoal IV executa o crime ou nele participa mediante paga ou promessa de recompensa D O U T R I N A Agravantes no concurso de pessoas A previsão deste artigo identificase com o princípio de que cada um deve ser punido nos limites de sua culpabilidade Destinase a qualquer participante seja autor coautor ou partícipe do crime desde que I Promova ou organize a cooperação no crime ou dirija a atividade dos demais agentes punese mais severamente aquele que exerce um papel de liderança entre os participantes independentemente de ser ou não o autor intelectual II Coaja ou induza outrem à execução material do crime coagir e induzir não são sinônimas e diferem profundamente em grau de intensidade de eficácia embora como agravantes a lei as tenha equiparado Induzir significa suscitar uma ideia fazer surgir uma ideia até então inexistente A coação poderá ter efeitos diversos se for irresistível exclui a punibilidade do coagido podendo dependendo das circunstâncias transformar o coator em autor mediato se este não estiver participando diretamente do fato criminoso vide Cezar Roberto Bitencourt Lições de Direito Penal 3 ed Ed Livraria Porto Alegre 1995 p 109 Se for resistível constituirá uma atenuante para o coagido art 65 III c III Instigue ou determine a cometer o crime alguém sujeito à sua autoridade ou não punível em virtude de condição ou qualidade pessoal instigar significa animar estimular reforçar uma ideia existente O instigador limitase a provocar a resolução criminosa determinar tem sido utilizado pelos penalistas como sinônimo de induzir significa induzir tomar a iniciativa intelectual suscitar uma ideia inexistente Necessário porém que o agente esteja submetido à sua autoridade ou seja por alguma razão pessoal inimputável louco menor silvícola etc IV Execute o crime ou nele participe mediante paga ou promessa de recompensa esta agravante pune mais severamente a torpeza da conduta praticada conhecida como crime mercenário A vantagem não necessariamente econômica pode ser de qualquer natureza Configurase a agravante indiferentemente de a promessa ser ou não cumprida J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A O reconhecimento de agravante não envolve a questão da quebra de congruência entre a imputação e a sentença por força do art 385 do CPP Precedentes No caso concreto inclusive a agravante consistente na organização e direção da conduta dos demais agentes art 62 I do CP aparece implicitamente na exordial acusatória STJ HC 89124DF Rel Min Félix Fischer j 13112007 A pretensão recursal de afastar a aplicação do art 62 inciso I do Código Penal implicaria no reexame do conjunto probatório o que seria inviável em sede de recurso especial nos termos da Súmula 7 desta Corte STJ REsp 799814SC Rel Min Laurita Vaz j 25102007 É pacífico o entendimento desta Corte de que existindo mais de uma condenação anterior com trânsito em julgado uma pode ser apreciada na fase do art 59 do CPB para caracterizar os mausantecedentes do réu e a outra figurar como agravante genérica prevista no art 62 I do CPB na segunda fase da dosimetria da pena sem que tal configure bis in idem STJ HC 83965RJ Rel Min Napoleão Nunes Maia Filho j 4102007 A agravante prevista no art 62 I do CP não pode ser aplicada in casu pois evidenciado prima facie nos autos que o paciente não exercia sobre os demais qualquer liderança que justificasse a incidência dessa norma STJ HC 12609MG Rel Min Félix Fischer j 7112000 Aplicação da agravante prevista no art 62 IV ao crime de extorsão mediante sequestro Não se pode considerar uma circunstância como elementar do tipo e ainda assim utilizála para agravar a pena STJ HC 10993RJ Rel Min Félix Fischer j 1142000 Reincidência Art 63 Verificase a reincidência quando o agente comete novo crime depois de transitar em julgado a sentença que no País ou no estrangeiro o tenha condenado por crime anterior V arts 9º 33 2º b e c 77 I 83 I e II 95 110 caput e 117 VI do CP D O U T R I N A 1 Reincidência Reincidente é quem pratica um crime após ter transitado em julgado sentença que no País ou no estrangeiro condenouo por crime anterior enquanto não houver transcorrido cinco anos do cumprimento ou da extinção da pena 2 Contravenção anterior Quem é condenado por um crime e depois pratica uma contravenção é reincidente art 7º da LCP No entanto quem pratica uma contravenção e depois um crime não é reincidente art 63 do CP 3 Primário e reincidente Chamase primário aquele que jamais sofreu qualquer condenação irrecorrível Chamase reincidente aquele que cometeu um crime após a data do trânsito em julgado da sentença que o condenou por crime anterior enquanto não transcorrido o prazo de cinco anos contados a partir do cumprimento ou da extinção da pena A terceira categoria é a do criminoso que não é primário nem é reincidente O réu que está sendo julgado e já tem contra si uma sentença condenatória anterior transitada em julgado após o cometimento do segundo crime não pode ser considerado reincidente ou primário Na nova lei penal porém somente há referência aos réus reincidentes e não reincidentes 4 Reincidência e condenação à multa A condenação anterior à pena de multa é expressamente afastada como causa impeditiva do sursis art 77 1º No entanto a condenação anterior à pena de multa a nosso juízo não desnatura a reincidência uma vez que o art 63 não fala em condenação anterior à pena de prisão Eventualmente seu efeito é afastado Havia duas correntes jurisprudenciais antes da reforma penal de 1984 sobre a condenação anterior à pena de multa 1ª não havia reincidência 2ª somente haveria reincidência se ambos os crimes fossem dolosos J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Dobrar as penasbase por força da reincidência é providência que não se compadece com o sistema adotado pelo Código Penal que sequer admitiu isto no concurso formal próprio e na continuidade delitiva não específica causas gerais de aumento da pena Afinal de contas a reincidência é mera agravante e neste caso até convive com a confissão TJRJ EI 200705400173 Rel Nildson Araújo da Cruz j 4122007 Caracterizada a reincidência de bis in idem não há falar porque não se está punindo o agente duas vezes pelo mesmo fatocrime mas sim considerando a reincidência produzida ou aprofundada pelo novo delito na perspectiva de sua personalidade como elemento obviamente influente na resposta penal a ser editada expressão da reprovação que se lhe faz pelo novo crime praticado STJ REsp 713813RS Rel Min Hamilton Carvalhido j 2792007 Para a caracterização da agravante da reincidência é necessária a ocorrência de três fatos a a prática de crime anterior b o trânsito em julgado da sentença condenatória e c a prática de novo crime após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória STJ HC 79558DF Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 216 2007 A reincidência além de ter sido considerada em momento inadequado não restou demonstrada pelo magistrado que se limitou a afirmar que o réu praticou o delito quando se encontrava preso por outro motivo situação que por si só não caracteriza a referida circunstância agravante STJ HC 67709PE Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 2162007 A condenação anterior por contravenção penal conquanto não caracterize reincidência pode ser considerada como reveladora de maus antecedentes STJ HC 66067SP Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 14112006 Tendo em vista que a segunda conduta delituosa tráfico de entorpecentes foi cometida pelo paciente antes do trânsito em julgado da condenação pelo primeiro crime latrocínio não há que se falar em reincidência em razão do que dispõe o art 63 do Código Penal STJ HC 53878PE Rel Min Paulo Gallotti j 2282006 A condenação anterior à pena de multa não é apta por si só para autorizar a reincidência pois constitui dívida de valor que não é suscetível sob nenhum fundamento mercê de garantia constitucional art 5º LXVII de conversão em pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos STJ HC 22736SP Rel Min Paulo Medina j 19122003 Art 64 Para efeito de reincidência I não prevalece a condenação anterior se entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 cinco anos computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional se não ocorrer revogação II não se consideram os crimes militares próprios e políticos V art 9º do CPM D O U T R I N A 1 Temporariedade dos efeitos da reincidência Este dispositivo afastou o efeito do fantasma da reincidência que pairava sobre o cidadão como uma inconstitucional pena perpétua Decorridos cinco anos do cumprimento ou da extinção da pena sem delinquir extinguemse os efeitos da reincidência Apesar de desaparecer a condição de reincidente o agente não readquire a condição de primário que é como um estado de virgem que violado não se refaz A reincidência é como o pecado original desaparece mas deixa sua mancha servindo por exemplo como antecedente criminal art 59 caput 2 Cômputo do livramento condicional e do sursis No prazo depurador de cinco anos incluise o período de prova do sursis e do livramento condicional não revogados Esse prazo decorre a partir da audiência admonitória art 160 Aplausos em relação à inclusão do prazo do sursis e preocupação em relação ao livramento condicional um condenado a longa pena por exemplo que recebe livramento condicional para cumprir mais de cinco anos poderá voltar a delinquir antes mesmo de extinguir a pena e não será considerado reincidente J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A No caso presente a determinação pelo Juízo monocrático do regime fechado revelase exacerbada pois se a jurisprudência admite a possibilidade de fixação de regime semiaberto ao condenado reincidente cuja pena seja inferior a 4 quatro anos consoante a Súmula 269 do STJ com mais razão devese aplicar o referido entendimento ao réu primário art 64 inciso I do Código Penal como é o caso do paciente STJ HC 88620RR Rel Min Napoleão Nunes Maia Filho j 18122007 Os maus antecedentes relativos à condenação com trânsito em julgado depois de ultrapassado o quinquênio estabelecido no art 64 inciso I do CP a personalidade do agente perigosa e voltada à prática delitiva a culpabilidade acentuada e as consequências do crime ante o volume de atividades criminosas desenvolvidas constituem circunstâncias judiciais desfavoráveis que justificam a exasperação da penabase STJ HC 86890RR Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 20112007 Decorridos mais de cinco anos a r sentença penal condenatória anterior não prevalece para efeito da reincidência art 64 inciso I do CP subsistindo no entanto para efeito de maus antecedentes Precedentes do STF e desta Corte STJ HC 71690SP Rel Min Félix Fischer j 25102007 Não prevalece a condenação anterior para efeito de reincidência se entre a data do cumprimento da pena e a infração posterior tiver decorrido lapso temporal superior a cinco anos computado o período de prova do livramento condicional como no caso art 64 inciso I do Código Penal STJ HC 60048SP Rel Min Paulo Gallotti j 18102007 A disposição inserta no inciso I do art 64 do Código Penal não pode ser interpretada de modo restritivo vale dizer como só excludente da reincidência eis que a lei por óbvio está a excluir sim a eficácia do antecedente na individualização da pena impedindo a sua consideração como elemento informador da personalidade do agente no tempo do crime STJ HC 45526SP Rel Min Hamilton Carvalhido j 20 102005 Circunstâncias atenuantes Art 65 São circunstâncias que sempre atenuam a pena I ser o agente menor de 21 vinte e um na data do fato ou maior de 70 setenta anos na data da sentença V art 77 2º e 115 do CP V Súmula 74 do STJ II o desconhecimento da lei V art 21 do CP III ter o agente a cometido o crime por motivo de relevante valor social ou moral b procurado por sua espontânea vontade e com eficiência logo após o crime evitarlhe ou minorarlhe as consequências ou ter antes do julgamento reparado o dano V art 16 do CP c cometido o crime sob coação a que podia resistir ou em cumprimento de ordem de autoridade superior ou sob a influência de violenta emoção provocada por ato injusto da vítima V arts 22 e 23 III do CP d confessado espontaneamente perante a autoridade a autoria do crime e cometido o crime sob a influência de multidão em tumulto se não o provocou D O U T R I N A 1 Atenuantes genéricas As agravantes e as atenuantes genéricas são chamadas de circunstâncias legais porque vêm expressamente relacionadas no texto legal Essas circunstâncias não integram a figura típica limitamse a circundar o crime Como diz o caput do artigo são de aplicação obrigatória pois sempre atenuam a pena 2 Limite do agravamento O Código não estabelece a quantidade de aumento ou de diminuição das agravantes e atenuantes legais genéricas deixandoa à discricionariedade do juiz No entanto sustentamos que a variação dessas circunstâncias não deve ir muito além do limite mínimo das majorantes e minorantes que é fixado em um sexto Caso contrário as agravantes e as atenuantes se equiparariam àquelas causas modificadoras da pena que a nosso juízo apresentam maior intensidade situandose pouco abaixo das qualificadoras no caso das majorantes Tampouco pode ultrapassar os limites mínimo e máximo cominados no tipo penal 3 Elenco das atenuantes I Ser o agente menor de vinte e um na data do fato ou maior de setenta anos na data da sentença os menores de dezoito anos estão fora do Direito Penal Suas eventuais infrações são disciplinadas pelo ECA A menoridade do agente 18 a 21 anos é objeto de atenuante no direito brasileiro reconhecendose sua imaturidade e a necessidade de tratamento especial Contudo a execução penal não recebe a devida individualização da pena que o menor merece sendo incluído na população carcerária comum A emancipação e a maioridade decorrentes do matrimônio não afastam essa atenuante O velho por sua menor temibilidade e também por humanidade recebe a mesma atenuante A menoridade deve ser na data do fato e a velhice na data da sentença Considerase a data da sentença o dia em que ela é entregue pelo juiz em cartório devidamente certificada pelo escrivão Menoridade e maioridade produzem ainda outro efeito o prazo prescricional é reduzido pela metade art 115 II O desconhecimento da lei o desconhecimento da lei é inescusável art 21 1ª parte presumindose conhecida por todos A ignorantia legis não isenta de pena nem é causa de sua diminuição No entanto seu desconhecimento in concreto constitui esta atenuante III a Motivo de relevante valor social ou moral a relevante valor social importante considerável valor social isto é que seja de interesse coletivo b relevante valor moral igualmente importante considerável valor moral isto é adequado aos princípios éticos dominantes segundo aquilo que a moral média reputa nobre e merecedor de indulgência O valor social ou moral do motivo deve ser considerado sempre objetivamente segundo a média existente na sociedade e não subjetivamente segundo a opinião do agente As diferenças dessas atenuantes com as privilegiadoras do art 121 são as seguintes em primeiro lugar distinguemse em relação à intensidade da motivação sofrida pelo agente Na qualificadora do homicídio ela é tão forte que chega a ser decisiva para a sua prática sendo o agente dominado por ela III b Arrependimento eficiente ou reparação do dano nesta alínea há duas figuras o arrependimento ou a reparação do dano Para configurar o arrependimento é suficiente que o agente logo após o crime tenha procurado espontaneamente e com eficiência evitar ou minorar as consequências enfim são necessários os seguintes elementos a logo após o crime b com espontaneidade c com eficiência A eficiência exigida pela atenuante não se confunde com eficácia e limitase ao esforço desprendido pelo agente para evitar ou minorar as consequências e não ao resultado efetivamente conseguido Já a reparação do dano não precisa ser logo após o crime bastando que seja antes do julgamento III c Coação resistível ordem superior ou violenta emoção a coação resistível na coação moral existe vontade embora possa ser viciada A resistibilidade da coação deve ser medida pela gravidade do mal ameaçado Essa gravidade deve relacionarse com a natureza do mal e evidentemente com o poder do coator em produzilo Na hipótese de coação resistível não haverá exclusão da culpabilidade penal logicamente porque o sujeito pode agir em conformidade com o direito Porém como há a coação como há ameaça efetiva embora resistível e o agente age por causa dessa ameaça há uma diminuição do grau de reprovação do grau de censura e consequentemente uma redução de pena que é caracterizada pela atenuante genérica b ordem superior a obediência hierárquica requer uma relação de direito público e somente de direito público Em virtude da subordinação hierárquica o subordinado cumpre ordem do superior Mas o subordinado não tem no entanto a obrigação de cumprir ordens ilegais Ele tem a obrigação de cumprir ordens inconvenientes inoportunas mas não ilegais Não tem o direito como subordinado de discutir a oportunidade ou conveniência de uma ordem Mas a ilegalidade mais que o direito tem o dever de apontála e negarse a cumprir ordem manifestamente ilegal Quando a cumpre respeitando ordem superior beneficiase da atenuante c violenta emoção a intensidade da emoção nesta atenuante é menor que no homicídio privilegiado apenas influenciando o agente A distinção entre esta atenuante e o homicídio privilegiado situase na intensidade da emoção sentida e na imediatidade da reação No homicídio privilegiado o agente age sob o domínio de violenta emoção e logo após a provocação da vítima na atenuante genérica ele se encontra sob a influência da emoção sendo indiferente o requisito temporal III d Confissão espontânea a confissão antes da reforma de 1984 era admitida somente quando se referisse a crime cuja autoria fosse ignorada ou atribuída a outrem Agora essa exigência desapareceu sendo suficiente a confissão da autoria A confissão pode ocorrer perante a autoridade policial ou judicial indiferentemente Embora a lei fale em confissão espontânea doutrina e jurisprudência têm admitido como suficiente sua voluntariedade A confissão retratada no entanto não configurará a atenuante III e Influência de multidão em tumulto a conduta delituosa deve ter sido influenciada pelo tumulto desde que o agente não o tenha provocado Não se desconhece que nos tumultos em momentos de grandes excitações com a facilidade de manipulação de massas anulase ou reduzse consideravelmente a capacidade de orientarse segundo padrões éticos morais e sociais justificandose assim esta atenuante Em sua redação original o Código Penal de 1940 exigia que o agente não fosse reincidente e que a reunião fosse lícita J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 74 do STJ Para efeitos penais o reconhecimento da menoridade do réu requer prova por documento hábil Súmula 231 do STJ A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal A confissão espontânea é uma circunstância atenuante genérica art 65 III d do CP que exige entre outros pressupostos a espontaneidade e a aceitação pelo réu da conduta criminosa imputada STJ HC 61030RJ Rel Jane Silva j 20112007 A diminuição da pena aquém do mínimo legal em face de circunstância atenuante destoa do entendimento cristalizado na Súmula 231 desta Egrégia Corte Superior de Justiça STJ HC 59548MS Rel Min Laurita Vaz j 20112007 Considerando o magistrado a confissão do réu para fins de fixação da autoria do crime de rigor a incidência da atenuante legal do artigo 65 inciso III alínea d do Código Penal que ademais dispensa a aferição dos motivos que levaram o agente a pronunciála Precedentes STJ HC 46858MS Rel Min Hamilton Carvalhido j 13112007 Presente documento capaz de comprovar a idade do réu abaixo dos vinte e um anos ao tempo da prática da infração é obrigatória a aplicação da atenuante da menoridade constante no artigo 65 I do Código Penal STJ HC 91262MS Rel Jane Silva j 8112007 Para a configuração da delação premiada art 25 2º da Lei n 749286 ou da atenuante da confissão espontânea art 65 III d do CP é preciso o preenchimento dos requisitos legais exigidos para cada espécie não bastando contudo o mero reconhecimento pelo réu da prática do ato a ele imputado sendo imprescindível também a admissão da ilicitude da conduta e do crime a que responde STJ REsp 934004RJ Rel Jane Silva j 8112007 Em se tratando de lesão corporal seguida de morte a privilegiadora da violenta emoção incide somente se o crime é cometido logo em seguida a injusta provocação emoçãochoque e quando a violência da emoção domina o agente Já a atenuante genérica do art 65 III c do CP não exige a emoçãochoque mas somente a emoçãoestado que identifica a influência de violenta emoção Cezar Roberto Bitencourt TJPR Apelação 03924525 Rel Oto Luiz Sponholz j 2092007 Cabe o reconhecimento da atenuante da confissão mesmo quando o réu se retrata em juízo ao se validar a confissão extrajudicial TJPR Apelação 3794349 Rel Marques Cury j 1942007 As circunstâncias atenuantes são de aplicação obrigatória ou cogente segundo a dicção do art 65 do Código Penal e devem ser reconhecidas ainda que a pena base se encontre fixada no patamar mínimo previsto para o tipo por se tratar de direito subjetivo do réu TJPR Apelação 3018862 Rel Jorge Wagih Massad j 19 42007 Ainda que retratada em juízo a confissão extrajudicial enseja o reconhecimento da circunstância atenuante prevista no art 65 inc III d do CP se utilizada para fundamentar a condenação TJMG Apelação 104140501148520011 Rel Walter Pinto da Rocha j 1432007 É obrigatória a incidência da atenuante da menoridade na individualização da pena se o sentenciado à época dos fatos era menor de vinte um anos de idade Precedente STJ HC 64340RJ Rel Min Félix Fischer j 2722007 As circunstâncias atenuantes caracterizamse como direito subjetivo do acusado ao decréscimo da pena sempre que presentes quaisquer das hipóteses do artigo 65 I a III do Código Penal TJPR Apelação 3829192 Rel Jorge Wagih Massad j 222 2007 O privilégio contido no 1º do art 121 do CP não se confunde com a atenuante genérica do art 65 III a do mesmo diploma legal STJ HC 47448MS Rel Min Félix Fischer j 6122005 A atenuante da menoridade prepondera sobre qualquer outra circunstância inclusive sobre a reincidência por sua vez mais gravosa do que as consequências do delito e as agravantes genéricas Somente as circunstâncias judiciais atinentes à personalidade aos antecedentes à conduta social e à culpabilidade do agente são invariáveis independendo do delito praticado STJ HC 32081MS Rel Min Laurita Vaz j 1722005 Se a impetração não logrou comprovar o parcelamento do débito previdenciário antes do oferecimento da denúncia não há que se falar em extinção da punibilidade do paciente ou em aplicação do disposto nos artigos 168A 3º e 65 inciso III alínea b do Código Penal STJ HC 38941TO Rel Min Gilson Dipp j 1811 2004 Evidenciado que o paciente possuía mais de 70 anos na data da prolação do decreto condenatório temse como deficiente e omissa a dosimetria da reprimenda que deixa de aplicar a atenuante obrigatória STJ RHC 13053RJ Rel Min Gilson Dipp j 632003 Art 66 A pena poderá ser ainda atenuada em razão de circunstância relevante anterior ou posterior ao crime embora não prevista expressamente em lei V art 387 do CPP D O U T R I N A 1 Circunstâncias inominadas A ausência desta previsão legal criou grandes desconfortos particularmente aos Presidentes dos Tribunais do Júri Reconhecida a existência de atenuantes depois não eram localizadas no rol do art 65 É impossível catalogar num texto legal todos os fatos que poderão ocorrer futuramente na sociedade Sua configuração dependerá de tratarse de circunstância relevante anterior ou posterior à prática do crime ainda que não prevista expressamente em lei 2 Atenuantes incompletas Determinadas circunstâncias legalmente previstas podem não se completar pela falta de um ou outro requisito O formalismo impede o seu reconhecimento Pois bem se tal circunstância assumir a condição de relevante poderá ser reconhecida por meio deste dispositivo No Tribunal do Júri as circunstâncias inominadas correspondem ao quesito genérico das atenuantes art 484 parágrafo único do CPP 3 Omissão legislativa A previsão legal referese apenas a circunstância anterior ou posterior ao crime Omitiuse em relação a circunstância concomitante que também pode ser relevante A nosso juízo justificase a adoção da analogia in bonan parte Tanto nas outras quanto nesta o magistrado deve motivar fundadamente sua decisão J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Somente pode ser reconhecida a existência da atenuante inominada quando houver uma circunstância não prevista expressamente em lei que permita ao Juiz verificar a ocorrência de um fato indicativo de uma menor culpabilidade do agente STJ REsp 875649MG Rel Min Félix Fischer j 2792007 Admissível a aplicação cumulativa da atenuante da confissão espontânea com uma atenuante inominada desde que por motivos distintos a critério subjetivo do órgão julgador Reduções com fundamentações distintas Descaracterizado assim o alegado bis in idem STJ REsp 303073DF Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 1352003 Concurso de circunstâncias agravantes e atenuantes Art 67 No concurso de agravantes e atenuantes a pena deve aproximarse do limite indicado pelas circunstâncias preponderantes entendendose como tais as que resultam dos motivos determinantes do crime da personalidade do agente e da reincidência D O U T R I N A 1 Circunstâncias preponderantes no concurso de agravantes e atenuantes Em um mesmo fato delituoso podem concorrer circunstâncias agravantes e atenuantes que podem ser objetivas e subjetivas O art 67 nessa hipótese determina que a pena deve aproximarse do limite indicado pelas circunstâncias preponderantes O Código exemplifica como preponderantes os motivos determinantes do crime a personalidade do agente e a reincidência 2 Motivos preponderantes A nosso juízo é natural que os motivos determinantes que não qualifiquem ou privilegiem o crime sejam considerados preponderantes em relação às demais circunstâncias legais inclusive em relação à menoridade Na verdade o fato delituoso concretamente examinado é que deve indicar essa preponderância Doutrina e jurisprudência consideram a menoridade preponderante J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A reincidência prepondera sobre a circunstância atenuante da confissão espontânea nos termos do art 67 do Código Penal STJ HC 81954PR Rel Min Maria Thereza de Assis Moura j 29112007 Nos termos do art 67 do Código Penal e da firme jurisprudência da 3ª Seção a respeito a circunstância agravante da reincidência prevalece sobre a atenuante da confissão Precedentes STJ REsp 912053MS Rel Min Carlos Fernando Mathias j 16102007 De rigor a aplicação da atenuante prevista no artigo 65 inciso I do Código Penal se à data dos fatos o paciente era menor de 21 anos atentandose evidentemente para a circunstância de que ela prepondera sobre a agravante da reincidência a teor do disposto no art 67 do mesmo diploma STJ HC 40888SP Rel Min Paulo Gallotti j 2122006 O art 67 do Código Penal dispõe sobre o concurso das circunstâncias agravantes e atenuantes estabelecendo como preponderantes aquelas que resultam dos motivos determinantes do crime da personalidade do agente e da reincidência devendo a opção pela prevalência de uma sobre a outra ser concretamente motivada STJ HC 35643RJ Rel Min Paulo Gallotti j 742005 A circunstância atenuante da menoridade prepondera sobre as demais circunstâncias legais e judiciais prevalecendo sobre maus antecedentes Precedentes do STF e do STJ STJ HC 30797SP Rel Min Hamilton Carvalhido j 16122004 Cálculo da pena Art 68 A penabase será fixada atendendose ao critério do art 59 deste Código em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes por último as causas de diminuição e de aumento Parágrafo único No concurso de causas de aumento ou de diminuição previstas na parte especial pode o juiz limitarse a um só aumento ou a uma só diminuição prevalecendo todavia a causa que mais aumente ou diminua D O U T R I N A 1 Dosimetria da pena Como discricionariedade não se confunde com arbitrariedade nosso Código Penal estabelece critérios a serem observados para a fixação da pena Assim todas as operações realizadas na dosimetria da pena que não se resumem a uma simples operação aritmética devem ser devidamente fundamentadas esclarecendo o magistrado como valorou cada circunstância analisada desenvolvendo um raciocínio lógico e coerente que permita às partes acompanhar e entender os critérios utilizados nessa valoração 2 Limites da dosagem de pena A individualização da pena segundo a Constituição art 5º XXXIX e XLVI encontra seus limites na lei ordinária Por isso é inconstitucional extrapolar os limites legais mínimo e máximo com agravantes e atenuantes por violar os princípios da pena determinada e da sua individualização 3 Fases do cálculo da pena O cálculo da pena nos termos do art 68 do CP deve operarse em três fases distintas a a penabase deve ser encontrada analisandose as circunstâncias judiciais do art 59 b a pena provisória analisando se as circunstâncias legais que são as atenuantes e as agravantes e finalmente chegarseá à c pena definitiva analisandose as causas de diminuição e de aumento 4 Penabase Para se encontrar a penabase devese analisar todos os moduladores relacionados no art 59 do Código Penal Na realidade todos conjuntamente e quaisquer deles isoladamente podem ser favoráveis ou desfavoráveis ao réu Por isso embora formem um conjunto devem ser analisados individualmente sendo insuficientes consoante reiterada jurisprudência considerações genéricas e superficiais ou mesmo conclusões sem embasamento fáticojurídico 5 Circunstâncias favoráveis Se todas as operadoras do art 59 forem favoráveis ao réu a pena base pode ficar no mínimo previsto Se algumas circunstâncias forem desfavoráveis deve afastarse do mínimo se contudo o conjunto for desfavorável deve aproximarse do termo médio Em regra o cálculo da pena deve iniciar próximo do mínimo e só excepcionalmente quando as circunstâncias revelarem especial gravidade justificase a fixação da penabase distanciada do mínimo legal 6 Nulidade pela falta de fundamentação A ausência de fundamentação ou de análise das circunstâncias judiciais ou mesmo a sua análise deficiente gera nulidade absoluta da decisão judicial O entendimento majoritário é o de que não persiste tal nulidade quando a penabase for fixada no limite mínimo 7 Fixação no limite mínimo fundamentação necessária A fixação da pena no limite mínimo permitido sem a devida fundamentação viola o ius accusacionis e frauda o princípio constitucional da individualização da pena que em outros termos significa dar a cada réu a sanção que merece isto é necessária e suficiente à prevenção e repressão do crime Assim devese entender que a ausência de fundamentação gera nulidade mesmo que a pena seja fixada no mínimo desde que haja recurso da acusação é claro Por isso sustentamos a necessidade de revisar o entendimento majoritário 8 Pena provisória Encontrada a penabase em seguida passa o julgador ao exame das atenuantes e agravantes aumentando ou diminuindo a pena em certa quantidade que resultará no que chamamos de pena provisória As atenuantes e as agravantes não podem levar a pena para aquém ou para além dos limites estabelecidos no tipo penal infringido sob pena de violarse o primeiro momento da individualização da pena que é legislativo privativo de outro poder e é realizada por meio de outros critérios e com outros parâmetros além de infringir os princípios da reserva legal e da pena determinada art 5º XXXIX e XLVI da CF recebendo a pecha de inconstitucional por aplicar pena não cominada 9 Atenuantes e limite mínimo cominado Quando a penabase estiver fixada no mínimo impedirá sua diminuição ainda que se constate in concreto a presença de uma ou mais atenuantes sem que isso caracterize prejuízo ao réu que já recebeu o mínimo possível STF RT 541472 RT 537412 10 Crimes com duas qualificadoras Finalmente quando houver duas qualificadoras uma deverá ser valorada como tal e a outra deverá ser considerada como agravante genérica desde que elencada tal circunstância caso contrário deverá ser avaliada como circunstância judicial 11 Pena definitiva Na terceira e última fase do cálculo da pena analisamse as causas de aumento e de diminuição Esta terceira fase deve incidir sobre a pena até então encontrada que pode ser a pena provisória decorrente da segunda operação como também a penabase se no caso concreto não existirem atenuantes ou agravantes 12 Causas de aumento e de diminuição As causas de aumento e de diminuição também são conhecidas como majorantes e minorantes As majorantes e minorantes são fatores de aumento ou redução da pena estabelecidos em quantidades fixas ex metade dobro triplo um terço ou variáveis ex um a dois terços 13 Distinção entre majorantes e qualificadoras Alguns doutrinadores não fazem distinção entre as majorantes e as qualificadoras No entanto as qualificadoras constituem verdadeiros tipos penais tipos derivados com novos limites mínimo e máximo enquanto as majorantes e minorantes como simples causas modificadoras da pena somente estabelecem a sua variação Ademais as majorantes e minorantes funcionam como modificadoras na terceira fase do cálculo da pena o que não ocorre com as qualificadoras que estabelecem limites mais elevados dentro dos quais será calculada a penabase Assim por exemplo enquanto a previsão do art 121 2º caracteriza uma qualificadora a do art 155 1º configura uma majorante 14 Cálculo em forma de cascata Se houver mais de uma majorante ou mais de uma minorante as majorações e as diminuições serão realizadas em forma de cascata isto é incidirão umas sobre as outras sucessivamente Primeiro se aplicam as causas de aumento depois as de diminuição 15 Concurso de majorantesminorantes da Parte Especial Concorrendo mais de uma causa de aumento ou de diminuição previstas na parte especial pode o juiz limitarse a um só aumento ou a uma só diminuição prevalecendo todavia a causa que mais aumente ou diminua art 68 parágrafo único Essa possibilidade destinase exclusivamente às majorantes e minorantes previstas na Parte Especial do Código Já as localizadas na Parte Geral deverão operar todas incidindo umas sobre as outras sem exceção 16 Ausência de causas modificadoras da pena Na ausência de agravantes e atenuantes e de majorantes e minorantes a penabase deve ser tornada definitiva Na ausência apenas de majorantes ou minorantes será então a pena provisória tornada definitiva 17 Dosimetria no concurso de crimes As majorações decorrentes do concurso formal próprio e da continuação delitiva incidirão sobre aquela que seria a pena definitiva isto é depois de realizadas todas as fases estabelecidas pelo art 68 18 Fixação do regime inicial Encontrada a pena definitiva o juiz deverá fixar o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade mesmo que ela venha a ser substituída ou suspensa porque poderá haver conversão ou revogação da medida alternativa art 59 III do CP 19 Possibilidade de substituição ou suspensão da pena O magistrado deverá analisar finalmente quando a natureza do crime e quantidade da pena privativa de liberdade permitirem a possibilidade de substituição art 59 IV do CP ou de suspensão da sua execução art 157 da LEP Nessas hipóteses a decisão concessiva ou negatória deverá ser sempre devidamente motivada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Apenamento readequado Majorante não pode ser empregada como circunstância judicial pena de ferir o sistema trifásico e o espírito do art 68 parágrafo único CP TJRS Apelação 70021862636 Rel Aramis Nassif j 5122007 O caminho para a dosimetria da pena no nosso sistema encontrase delineado no art 68 do Código Penal através do método trifásico criado por Nelson Hungria Primeiro se fixa à penabase com a análise dos vetores do art 59 do Código Penal Segundo se estabelece a pena provisória a partir do cálculo das circunstâncias agravantes e atenuantes Por fim como se calcula a pena definitiva a partir das causas de aumento e de diminuição sempre optando como diz a lei pela que mais aumente ou diminua a pena Aplicação do redutor da Lei de Tóxicos Descabimento Tratase de um benefício aplicável apenas em relação às drogas não podendo ser utilizado genericamente TJRS Apelação 70021556410 Rel Mário Rocha Lopes Filho j 5122007 Na fixação da pena o magistrado observará o método trifásico adotado no art 68 do CP no qual após a aplicação das circunstâncias judiciais analisamse as circunstâncias agravantes e atenuantes para só então serem consideradas as causas de aumento e de diminuição O reconhecimento da atenuante confissão espontânea não pode alterar o cálculo aritmético da pena tendo em vista que o MM Juiz a quo já fixou a penabase no mínimo legal previsto para o delito Precedentes Súmula 231 do STJ TRF 5ª Região Apelação 200681000166593 Rel Amanda Lucena j 27112007 As decisões judiciais devem ser cuidadosamente fundamentadas principalmente na dosimetria da pena em que se concede ao Juiz um maior arbítrio de modo que se permita às partes o exame do exercício de tal poder O método trifásico deve ser rigorosamente obedecido posto que resulta de disposição legal sendo que a exacerbação desmotivada da penabase traz sérios prejuízos à parte interferindo inclusive nas fases seguintes da fixação STJ HC 90150MS Rel Jane Silva j 20 112007 O método trifásico deve ser rigorosamente obedecido posto que resulta de disposição legal mas se é feita inversão das suas fases e ela resulta em favor do réu sem recurso da acusação deve ser mantida STJ HC 81726GO Rel Jane Silva j 2592007 Cálculo de pena Critério trifásico Art 68 CP Pena aquém do mínimo Possibilidade O sistema trifásico para dosimetria da pena é cogente e não admite alteração pelo magistrado Antecede ao cálculo da causa geral de modificação da pena Art 71 CP a determinação da atenuante Art 65 II d CP O princípio da proporcionalidade abriga a possibilidade de estando a penabase fixada no mínimo legal romper com este limite se presente atenuante TJRS Apelação 70017823337 Rel Aramis Nassif j 1292007 É nula a dosimetria da pena que não atende ao disposto nos arts 59 e 68 do Código Penal sendo a fixação da penabase desprovida de fundamentação em elementos concretos bem como realizada em desacordo com o critério trifásico STJ HC 67709PE Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 2162007 A pena deve ser fixada em estrita observância ao critério trifásico estabelecido nos arts 59 67 e 68 do CP com fundamentação concreta e vinculada tal como exige o próprio princípio do livre convencimento fundamentado arts 157 381 e 387 do CPP cc o art 93 inciso IX segunda parte da Lex Maxima STJ REsp 896146MT Rel Min Félix Fischer j 1462007 O magistrado sentenciante sendo seguido pelo acórdão impugnado usou as qualificadoras do concurso de agentes e do emprego de arma indevidamente como circunstâncias judiciais para agravar a penabase em flagrante desrespeito ao critério trifásico de aplicação da pena insculpido no art 68 do Código Penal As instâncias ordinárias consideraram ainda o emprego de arma como qualificadora para agravar a pena em evidente bis in idem constrangendo ilegalmente o Paciente STJ HC 36983SP Rel Min Laurita Vaz j 14122004 Não há ferimento ao método trifásico quando a pena é fixada no mínimo legal a partir de operação onde o julgador compensou a circunstância judicial dos maus antecedentes art 59 CP com a atenuante da menoridade art 65 I CP e logo em seguida fez incidir as causas de aumento da pena Cumprido o caminho do art 68 do CP Ademais só o fato de a penabase ter sido fixada no mínimo já era suficiente para rebater qualquer alusão a constrangimento em face da atenuante da menoridade pois como se sabe esta não impõe a redução aquém do limite legal STJ HC 24515SP Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 342003 Método trifásico Para fixação da pena privativa de liberdade o sistema adotado pelo Código Penal é o método de Hungria CP art 68 Ou seja o sistema de três fases Por ele primeiro o julgador fixa a penabase atendendo às circunstâncias judiciais Elas classificamse em dois grupos a circunstâncias subjetivas Tratam da culpabilidade dos antecedentes da conduta da personalidade e dos motivos do crime b circunstâncias objetivas São as circunstâncias do crime suas consequências e o comportamento da vítima Na sentença o juiz ao fixar a pena base acima do mínimo legal levando em consideração os antecedentes desabonadores do recorrente agiu dentro dos estritos parâmetros legais STF RHC 82589BA Rel Min Nelson Jobim j 1132003 Esta Corte já firmou entendimento de que é inviável a fixação da penabase abaixo do mínimo legal em razão das atenuantes Tal desiderato é incompatível com o princípio da legalidade formal Súmula 231 do STJ STJ REsp 399187RS Rel Min Jorge Scartezzini j 22102002 Concurso material Art 69 Quando o agente mediante mais de uma ação ou omissão pratica dois ou mais crimes idênticos ou não aplicamse cumulativamente as penas privativas de liberdade em que haja incorrido No caso de aplicação cumulativa de penas de reclusão e de detenção executase primeiro aquela V art 3º 3º do Dec n 98293 crimes de natureza tributária 1º Na hipótese deste artigo quando ao agente tiver sido aplicada pena privativa de liberdade não suspensa por um dos crimes para os demais será incabível a substituição de que trata o art 44 deste Código 2º Quando forem aplicadas penas restritivas de direitos o condenado cumprirá simultaneamente as que forem compatíveis entre si e sucessivamente as demais D O U T R I N A 1 Concurso de crimes Quando um sujeito mediante unidade ou pluralidade de comportamentos pratica dois ou mais delitos surge o concurso de crimes concursus delictorum O concurso pode ocorrer entre crimes de qualquer espécie comissivos ou omissivos dolosos ou culposos consumados ou tentados simples ou qualificados e ainda entre crimes e contravenções 2 Sistemas de aplicação da pena a Cúmulo material este sistema recomenda a soma das penas de cada um dos delitos componentes do concurso b cúmulo jurídico a pena a ser aplicada deve ser maior do que a cominada a cada um dos delitos sem no entanto chegar à soma delas c absorção considera que a pena do delito mais grave absorve a pena do delito menos grave que deve ser desprezada d exasperação recomenda a aplicação da pena mais grave aumentada de determinada quantidade em decorrência dos demais crimes 3 Sistemas adotados no Brasil O direito brasileiro adota somente os sistemas do cúmulo material concurso material e concurso formal impróprio e da exasperação concurso formal próprio e crime continuado 4 Espécies de concurso de crimes Nosso Código prevê três concurso material concurso formal e crime continuado 5 Concurso material Ocorre o concurso material quando o agente mediante mais de uma conduta ação ou omissão pratica dois ou mais crimes idênticos ou não No concurso material há pluralidade de condutas e pluralidade de crimes Quando os crimes praticados forem idênticos ocorre o concurso material homogêneo dois homicídios e quando forem diferentes caracterizarseá o concurso material heterogêneo estupro e homicídio 6 Extinção da punibilidade A extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada crime isoladamente art 119 do CP em qualquer das espécies de concursos 7 Cumprimento das penas Podem ser aplicadas cumulativamente Havendo reclusão e detenção cumprese primeiro aquela que é mais grave 8 Substituição de penas No concurso material uma das penas não podendo ser suspensa as demais não podem ser substituídas 1º 9 Execução de penas restritivas As penas restritivas compatíveis aplicadas cumulativamente devem ser cumpridas simultaneamente e sucessivamente quando forem incompatíveis 2º 10 Individualização das penas Em caso de concurso as penas devem ser individualizadas antes de serem somadas para que se saiba exatamente a pena que corresponde a cada infração STF RTJ 95823 J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 243 do STJ O benefício da suspensão do processo não é aplicável em relação às infrações penais cometidas em concurso material concurso formal ou continuidade delitiva quando a pena mínima cominada seja pelo somatório seja pela incidência da majorante ultrapassar o limite de um 01 ano A autonomia de desígnios para cada crime perpetrado caracteriza o concurso material devendo as respectivas reprimendas ser somadas em conformidade com o art 69 do Código Penal STJ HC 59073RS Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 4 102007 Consoante entendimento consolidado nesta Corte aferir se o crime de tentativa de homicídio absorve ou não o delito de porte ilegal de arma de fogo depende de atenta análise do contexto fático em que ocorreu o delito a fim de averiguar se o porte da arma constituiu efetivamente meio necessário ou normal fase de preparação ou execução do homicídio Considerado o quadro fáticoprobatório delineado pelo acórdão recorrido os atos anteriores à tentativa de homicídio consistentes no porte ilegal de arma de fogo em diversas outras oportunidades notadamente sem vinculação ao propósito homicida não podem ser tidos como antefato impunível daquele delito mas sim como conduta autônoma a ensejar a incidência na espécie do art 69 do Código Penal STJ REsp 828231RS Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 1682007 É pacífica a jurisprudência desta Corte Superior no sentido de que afora as hipóteses de praeludia coiti os crimes de estupro e de atentado violento ao pudor enquanto de espécies diversas consubstanciam concurso material ainda que praticados nas mesmas condições de tempo lugar e maneira de execução STJ HC 80969SP Rel Min Carlos Fernando Mathias j 1682007 Vislumbrandose a existência de três condutas distintas três ações autônomas de destruir vegetação nativa de construir em solo não edificável e de impedir a regeneração natural da vegetação através das quais três crimes diferentes foram praticados deve ser reconhecida a hipótese de concurso material descrita no art 69 do Código Penal no qual é prevista a cumulatividade das penas STJ REsp 846453SC Rel Min Gilson Dipp j 1942007 A ofensa a bens personalíssimos com violência ou grave ameaça à pessoa no caso dos crimes da mesma espécie dois homicídios consumados com um homicídio tentado pode ensejar o crime continuado na forma preconizada no parágrafo único do art 71 do Código Penal O que in casu poderia acarretar o aumento da pena mais grave até o triplo Sendo assim a aplicação do concurso material aos homicídios perpetrados constitui situação mais favorável aos pacientes Precedente STJ HC 64340RJ Rel Min Félix Fischer j 2722007 Esta Corte seguindo orientação do Supremo Tribunal Federal já decidiu pela impossibilidade de reconhecimento da continuidade delitiva em crimes contra a liberdade sexual contra vítimas diversas hipótese em que se incide a regra do concurso material STJ HC 65380SP Rel Min Gilson Dipp j 1322007 Não se caracteriza bis in idem a condenação por crime de quadrilha armada e roubo qualificado pelo uso de armas e concurso de pessoas tendo em vista a autonomia e independência dos delitos Precedentes do STJ e do STF STJ HC 60695RJ Rel Min Gilson Dipp j 7112006 Concurso material Nos termos do art 69 do Código Penal as penas privativas de liberdade aplicamse cumulativamente o que no caso em exame representa 3 três anos 9 nove meses e 10 dez dias de reclusão conforme consignado no acórdão impugnado Dessa forma considerando o disposto no art 44 inc I cc os arts 69 1º e 77 todos do Código Penal a hipótese não comporta sursis por força da quantidade da pena imposta que é superior a 2 dois anos da mesma forma que não se admite substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito tendo em vista a violência ou grave ameaça à pessoa no roubo qualificado tentado que se estende ao furto qualificado CP art 69 1º STJ HC 35763SP Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 16112004 Havendo concurso de crimes a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos é possível quando o total das reprimendas não ultrapasse o limite de quatro anos disposto no art 44 inc I do Código Penal STJ HC 21681SP Rel Min Laurita Vaz j 1762003 Concurso formal Art 70 Quando o agente mediante uma só ação ou omissão pratica dois ou mais crimes idênticos ou não aplica selhe a mais grave das penas cabíveis ou se iguais somente uma delas mas aumentada em qualquer caso de um sexto até metade As penas aplicamse entretanto cumulativamente se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos consoante o disposto no artigo anterior Parágrafo único Não poderá a pena exceder a que seria cabível pela regra do art 69 deste Código V art 3º 3º do Dec n 98293 crimes de natureza tributária D O U T R I N A 1 Concurso formal Ocorre o concurso formal quando o agente mediante uma só conduta ação ou omissão pratica dois ou mais crimes idênticos ou não Nesta espécie de concurso há unidade de ação e pluralidade de crimes 11 Concurso formal próprio O concurso formal pode ser próprio perfeito quando a unidade de comportamento corresponder à unidade interna da vontade do agente isto é o agente deve querer realizar apenas um crime obter um único resultado danoso 1ª parte do caput Não devem existir na expressão do Código desígnios autônomos 12 Concurso formal impróprio O concurso formal será impróprio imperfeito quando o agente desejar a realização de mais de um crime tiver consciência e vontade em relação a cada um deles 2ª parte do caput 2 Desígnios autônomos Desígnios autônomos caracterizamse pela unidade de ação e multiplicidade de determinação de vontade com diversas individualizações Os vários eventos neste caso não são apenas um perante a consciência e a vontade embora sejam objeto de uma única ação O agente pode estuprar com finalidade dupla satisfazer sua lascívia e transmitir Aids à vítima 3 Sistemas de aplicação de pena Enquanto no concurso formal próprio se adotou o sistema de exasperação da pena pela unidade de desígnios no concurso formal impróprio se aplica o sistema do cúmulo material como se fosse concurso material diante da diversidade de intuitos do agente art 70 2º Enfim o que caracteriza o crime formal é a unidade de conduta mas o que justifica o tratamento penal mais brando é a unidade do elemento subjetivo que impulsiona a ação 4 Parâmetro para o aumento de pena Para a escolha do acréscimo um sexto até metade o fundamento será o número de crimes ou resultados e as consequências gerais produzidas 5 Concurso material benéfico Quando houver concurso formal ou crime continuado entre um crime grave e um de pequena gravidade o sistema de exasperação adotado pode elevar a pena além daquilo que a simples soma aritmética representaria Nesses casos determina a lei que a elevação não poderá ultrapassar o limite representado pela simples soma parágrafo único 6 Concorrência de concurso formal e crime continuado A regra geral é que as penas dos diversos crimes sejam somadas cúmulo material As exasperações autorizadas do concurso formal e do crime continuado constituem exceções Admitilas uma sobre a outra contradiria a política criminal benéfica que as inspirou Há duas orientações 1ª pode 2ª não pode STF RTJ 117744 Nossa posição não pode acumular duas exceções de uma regra geral J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 243 do STJ O benefício da suspensão do processo não é aplicável em relação às infrações penais cometidas em concurso material concurso formal ou continuidade delitiva quando a pena mínima cominada seja pelo somatório seja pela incidência da majorante ultrapassar o limite de um 01 ano Na esteira da já consolidada jurisprudência desta Corte Superior no caso de latrocínio art 157 3º parte final do Código Penal uma única subtração patrimonial com dois resultados morte caracteriza concurso formal impróprio art 70 parte final do Código Penal Precedentes STJ HC 56961PR Rel Min Laurita Vaz j 18122007 O JuizPresidente do Tribunal do Júri reconhecido o concurso formal de crimes não se exonera do dever constitucional de motivar a individualização da resposta penal STJ RHC 10699ES Rel Min Hamilton Carvalhido j 31102007 A melhor técnica para dosimetria da pena privativa de liberdade em se tratando de crimes em concurso formal é a fixação da pena de cada uma das infrações isoladamente e sobre a maior pena referente à conduta mais grave apurada concretamente ou sendo iguais sobre qualquer delas fazerse o devido aumento considerandose nessa última etapa o número de infrações que a integram STJ HC 85513DF Rel Jane Silva j 1392007 Quando o Réu inicia a conduta delituosa com o escopo de lesar o patrimônio de mais de uma vítima com uma só ação devese aplicar o art 70 segunda parte do Código Penal A mera reiteração criminosa não configura a continuidade delitiva prevista no art 71 do Código Penal STJ REsp 690760RS Rel Min Laurita Vaz j 2442007 Os crimes em tese praticados o foram em detrimento de serviço prestado pela União e a afronta narrada deuse propter officium razão pela qual compete à Justiça Federal o processamento do feito Existindo concurso formal de delitos a pena a ser considerada para a fixação de competência é o resultado do acréscimo à pena máxima cominada ao delito de maior gravidade e caso seja superior a dois anos afastase a competência do juizado especial STJ Conflito de Competência 43293RS Rel Min Paulo Medina j 2452006 Crime de furto praticado no mesmo contexto fático contra vítimas diferentes constitui concurso ideal Precedentes do Pretório Excelso e do STJ STJ REsp 728004RS Rel Min Félix Fischer j 642006 Configurase concurso formal quando o agente mediante uma só ação pratica crimes de roubo contra vítimas diferentes eis que caracterizada a violação a patrimônios distintos STJ REsp 794956RS Rel Min Gilson Dipp j 442006 Prescrição concurso de crimes A regra é a de que tratandose de concurso de crimes a extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada um isoladamente Evidentemente que a regra preside tanto o concurso material quanto o formal e o crime continuado No concurso formal é lícito venha a prescrição a recair sobre o aumento de pena quando o agente tenha praticado dois crimes STJ HC 45140DF Rel Min Nilson Naves j 2792005 Crime continuado Art 71 Quando o agente mediante mais de uma ação ou omissão pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e pelas condições de tempo lugar maneira de execução e outras semelhantes devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro aplicaselhe a pena de um só dos crimes se idênticas ou a mais grave se diversas aumentada em qualquer caso de um sexto a dois terços V art 71 do CPP Parágrafo único Nos crimes dolosos contra vítimas diferentes cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa poderá o juiz considerando a culpabilidade os antecedentes a conduta social e a personalidade do agente bem como os motivos e as circunstâncias aumentar a pena de um só dos crimes se idênticas ou a mais grave se diversas até o triplo observadas as regras do parágrafo único do art 70 e do art 75 deste Código D O U T R I N A 1 Origem histórica O crime continuado deve sua formulação aos glosadores 1100 a 1250 e pósglosadores 1250 a 1450 e teve suas bases lançadas efetivamente no século XIV com a finalidade de permitir que os autores do terceiro furto pudessem escapar da pena de morte ver nesse sentido nosso Manual de Direito Penal 2 Definição do crime continuado Ocorre o crime continuado quando o agente mediante mais de uma conduta ação ou omissão pratica dois ou mais crimes da mesma espécie devendo os subsequentes pelas condições de tempo lugar maneira de execução e outras semelhantes ser havidos como continuação do primeiro São diversas ações cada uma em si mesma criminosa que a lei considera por motivos de política criminal como um crime único 3 Natureza jurídica do crime continuado Há três teorias a respeito a teoria da unidade real para esta teoria os vários comportamentos lesivos do agente constituem efetivamente um crime único uma vez que são elos de uma mesma corrente e traduzem uma unidade de intenção que se reflete na unidade de lesão Para esta teoria possuindo um dolo unitário as ações continuadas configuram a manifestação incompleta da mesma unidade real e psicológica b teoria da ficção jurídica admite que a unidade delitiva é uma criação da lei pois na realidade existem vários delitos E se efetivamente se tratasse de crime único a pena deveria ser a mesma cominada para um só dos crimes concorrentes c teoria da unidade jurídica ou mista o crime continuado não é uma unidade real mas também não é mera ficção legal A continuidade delitiva constitui uma figura própria e destinase a fins determinados constituindo uma realidade jurídica e não uma ficção Não se cogita de unidade ou pluralidade de delitos mas de um terceiro crime que é o crime de concurso cuja unidade delituosa decorre da lei 4 Teoria adotada pelo nosso Código Nosso Código Penal adotou a teoria da ficção jurídica para fins exclusivos de aplicação da pena visando atenuar a sanção penal atento à política criminal que inspirou o instituto Para fins de prescrição e decadência v g os crimes consideramse isoladamente 5 Teorias do crime continuado a Teoria subjetiva destaca como caracterizador do crime continuado somente o elemento subjetivo consistente na unidade de propósito ou de desígnio b teoria objetivosubjetiva além dos requisitos objetivos exige unidade de desígnios isto é uma programação inicial com realização sucessiva como por exemplo o operário de uma fábrica que desejando subtrair uma geladeira o faz parceladamente levando algumas peças de cada vez Em síntese exige unidade de resolução criminosa e homogeneidade de modus operandi c teoria objetiva apuramse os elementos constitutivos da continuidade delitiva objetivamente independente do elemento subjetivo isto é da programação do agente Despreza a unidade de desígnio ou unidade de resolução criminosa como elemento caracterizador do crime continuado Essa é a teoria adotada pelo nosso Código 6 Requisitos do crime continuado a Pluralidade de condutas o mesmo agente deve praticar duas ou mais condutas b pluralidade de crimes da mesma espécie são da mesma espécie os crimes que lesam o mesmo bem jurídico embora tipificados em dispositivos diferentes c nexo da continuidade delitiva deve ser apurado pelas circunstâncias de tempo lugar modo de execução e outras semelhantes 1 condições de tempo deve existir certa periodicidade que permita observarse certo ritmo certa uniformidade entre as ações sucessivas embora não se possam fixar a respeito indicações precisas 2 condições de lugar deve existir entre os crimes da mesma espécie uma conexão espacial para caracterizar o crime continuado 3 maneira de execução a lei exige semelhança e não identidade A semelhança na maneira de execução se traduz no modus operandi de realizar a conduta delitiva 4 outras condições semelhantes como outras condições semelhantes a doutrina aponta a mesma oportunidade e a mesma situação propícias para a prática do crime 7 Avaliação das circunstâncias objetivas Todas as circunstâncias objetivas devem ser analisadas individualmente mas valoradas no seu conjunto e a ausência de qualquer delas por si só não desnatura a continuidade delitiva Na verdade nenhuma dessas circunstâncias constitui elemento estrutural do crime continuado cuja ausência isolada possa por si só descaracterizálo 8 Valoração criteriosa das circunstâncias Na ausência de critérios têmse cometido os maiores absurdos jurídicos na jurisprudência pátria chegando alguns acórdãos descriteriosamente a admitir a continuidade de crimes com intervalos de seis dez e até doze meses Cabe indagar sobraria o que para o concurso material 9 Crime continuado específico Convencionouse chamar crime continuado específico aquele previsto no parágrafo único do art 71 isto é praticado com violência à pessoa desde que se trate de vítimas diferentes 10 Requisitos do crime continuado específico Devem ocorrer simultaneamente três requisitos 1º contra vítimas diferentes 2º com violência ou grave ameaça à pessoa 3º somente em crimes dolosos 11 Crime continuado contra bens pessoais A circunstância de tratarse de vítimas diferentes é apenas uma exceção que permite elevar a pena até o triplo Logo uma interpretação sistemática recomenda que se aceite a continuidade delitiva contra bens personalíssimos ainda que se trate da mesma vítima apenas nesta hipótese a elevação da pena estará limitada a até dois terços nos termos do caput do art 71 e não até o triplo como prevê o parágrafo único 12 Reiteração criminosa A continuidade delitiva não deve ser reconhecida ao multirreincidente isto é ao criminoso profissional ou habitual que faz do crime uma profissão de fé 13 Crimes consumados e tentados Nada impede que haja continuidade delitiva entre crimes tentados e consumados ou entre as formas simples e qualificadas de um crime J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 243 do STJ O benefício da suspensão do processo não é aplicável em relação às infrações penais cometidas em concurso material concurso formal ou continuidade delitiva quando a pena mínima cominada seja pelo somatório seja pela incidência da majorante ultrapassar o limite de um 01 ano Súmula 605 do STF Não se admite continuidade delitiva nos crimes contra a vida Súmula 711 do STF A lei penal mais grave aplicase ao crime continuado ou ao crime permanente se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência Súmula 723 do STF Não se admite a suspensão condicional do processo por crime continuado se a soma da pena mínima da infração mais grave com o aumento mínimo de um sexto for superior a um ano Na fixação do quantum de aumento de pena na continuidade delitiva o critério fundamental é o número de infrações praticadas sendo adequado estabelecerse no máximo o incremento quando da prática de sete crimes STJ HC 76148RJ Rel Min Maria Thereza de Assis Moura j 18122007 Em se tratando de crime continuado não há falar em fixação da penabase de cada ilícito praticado individualmente art 71 do CP Verificado que os delitos são idênticos aplicase a pena de um só dos delitos aumentando de um sexto a dois terços STJ HC 91430MG Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 28112007 O reconhecimento da continuidade delitiva demanda revolvimento fáticoprobatório providência inadmissível na via do Habeas corpus Precedentes do STJ Inexiste continuidade delitiva entre os crimes de atentado violento ao pudor e estupro por serem de espécies distintas e demandarem o preenchimento de requisitos subjetivos e objetivos diversos Precedentes do STJ STJ HC 85034SP Rel Min Napoleão Nunes Maia Filho j 28112007 Para a caracterização da continuidade delitiva é imprescindível o preenchimento dos requisitos previstos no art 71 do Código Penal In casu impossível o reconhecimento da continuidade delitiva dos crimes julgados pela primeira ação penal em relação aos julgados pela segunda ação penal pois ausente está o requisito referente às mesmas circunstâncias de lugar uma vez que foram praticados em municípios e países diversos Precedentes STJ HC 74355RJ Rel Min Félix Fischer j 811 2007 Para efeito de reconhecimento da continuidade delitiva é imprescindível dentre outros requisitos que os crimes praticados apresentem a mesma forma de execução ex vi do art 71 do Código Penal In casu tal não ocorreu uma vez que o agente para a prática dos delitos se utilizou de diferentes meios e circunstâncias Se entre as séries delituosas houver diferença de meses não haverá continuidade delitiva mas sim reiteração delitiva devendo ser aplicada a regra do concurso material Precedentes desta Corte e do Pretório Excelso STJ REsp 962017RS Rel Min Félix Fischer j 25102007 Para majoração da pena na continuidade delitiva específica prevista no parágrafo único do art 71 do Código Penal deve haver fundamentação com base no número de infrações cometidas e também nas circunstâncias judiciais do art 59 do Código Penal Precedentes desta Corte Embora não exista bis in idem na utilização das circunstâncias judiciais desfavoráveis para a elevação da penabase e para o aumento empregado no reconhecimento da continuidade delitiva específica verifica se ter havido na espécie flagrante desproporcionalidade e excesso de valoração de tais circunstâncias pelo acórdão ora hostilizado que para a prática de dois crimes de latrocínio e três crimes de roubo entendeu por bem dobrar a maior das penas fixadas aos ilícitos componentes do crime continuado STJ HC 53886PR Rel Min Laurita Vaz j 25102007 A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça orientase no sentido de que para caracterizar a continuidade delitiva é necessário o preenchimento de requisitos de ordem objetiva e subjetiva Constatada a mera reiteração em que as condutas criminosas são autônomas e isoladas afastase a ideia de continuidade delitiva para se acolher a tese da habitualidade ou profissionalismo na prática de crimes circunstância que merece um tratamento penal mais rigoroso tendo em vista o maior grau de reprovabilidade STJ REsp 742402RS Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 2792007 A continuidade delitiva pode ser reconhecida na fase de execução de pena mas exigese que estejam presentes os requisitos do art 71 do Código Penal prática de dois ou mais crimes da mesma espécie cometidos mais ou menos numa mesma época e local e com maneira de execução semelhante Se os crimes foram cometidos contra vítimas diferentes em comarcas distintas e com lapso temporal muito grande não há como se reconhecer à continuação delitiva Não estando presentes os requisitos exigidos pelo legislador não se configura a continuidade delitiva mas sim a habitualidade criminosa STJ HC 75199SP Rel Jane Silva j 2792007 Esta Corte vem entendendo que para caracterizar a continuidade delitiva não basta a comprovação dos requisitos objetivos crimes de mesma espécie cometidos nas mesmas circunstâncias de tempo lugar e modo de execução exigese também a unidade de desígnios ou seja o liame volitivo entre os delitos a demonstrar que os atos criminosos apresentamse entrelaçados que a conduta posterior constitui um desdobramento da anterior STJ REsp 696967SP Rel Min Laurita Vaz j 69 2007 Nos chamados crimes continuados dolosos praticados contra a vida a pena de um só pode ser aumentada em até o triplo não se mostrando ilegal o aumento no dobro quando devidamente motivada a decisão Inteligência do art 71 parágrafo único do CP STJ HC 44761RJ Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 982007 A continuidade delitiva é uma ficção jurídica que beneficia o agente entendendo que vários delitos cometidos sejam considerados como desdobramento do primeiro conforme o preenchimento dos requisitos objetivos e subjetivos Na presente hipótese verificouse que o ora Paciente é um criminoso profissional praticando habitualmente delitos contra o patrimônio o que afasta a aplicação da continuidade delitiva por ser merecedor de tratamento penal mais rigoroso STJ HC 63995SP Rel Min Laurita Vaz j 982007 O aumento da pena pela continuidade delitiva se faz basicamente quanto ao art 71 caput do Código Penal por força do número de infrações praticadas STJ HC 80434DF Rel Min Laurita Vaz j 2862007 Concurso material Pedido de aplicação do disposto no art 71 do Código Penal Fundamentação deficiente da dosimetria da pena Viabilidade em tese de se analisar em sede de habeas corpus a correção de decisão que entendeu configurado o concurso material em face de alegação de configuração da continuidade delitiva Sentença deficientemente fundamentada sem indicação específica das circunstâncias e fatos que caracterizariam o concurso material nem referência às razões a justificar a não aplicação do disposto no art 71 do Código Penal Ordem deferida parcialmente apenas para determinar nova dosimetria da pena devidamente justificada STF HC 89786RJ Rel Min Joaquim Barbosa j 273 2007 A jurisprudência desta Corte está sedimentada no sentido de que estupro e atentado violento ao pudor configuram concurso material e não crime continuado STF HC 89770SP Rel Min Eros Grau j 10102006 Esta Corte vemse posicionando a favor da teoria mista que entende imprescindível para a caracterização da continuidade delitiva o preenchimento dos requisitos objetivos mesmas condições de tempo espaço e modus operandi e subjetivo unidade de desígnios STJ REsp 832919RS Rel Min Gilson Dipp j 3102006 Multas no concurso de crimes Art 72 No concurso de crimes as penas de multa são aplicadas distinta e integralmente V arts 49 a 52 60 e 114 do CP D O U T R I N A 1 A multa no concurso de crimes A pena de multa não obedece às regras diferenciadas do tratamento dispensado ao concurso de crimes Deve ser aplicada individualmente a cada crime que compõe o concurso No concurso formal por exemplo se houver três crimes somamse três penas correspondentes a cada um não se aplicando o sistema da exasperação Mas essa regra a nosso ver serve somente para o concurso formal e não para o crime continuado 2 Multa substitutiva O disposto no art 72 não se aplica à multa substitutiva A fixação da pena definitiva já levou em consideração o concurso de crimes e ficando dentro do limite que permite a substituição por pena de multa esta deve operarse Mas é uma pena pela outra Caso contrário seria prejudicial ao réu 3 Crime continuado Não se questiona que para fins de aplicação de pena no direito brasileiro o crime continuado é considerado crime único Ficção ou realidade não faz diferença para nós aplicase pena de multa una Nesse sentido STF RTJ 105409 J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Multa Crime continuado Não incidência do art 72 do CP Na linha dos precedentes desta Corte as penas de multa em caso de crime continuado são calculadas sem a incidência do disposto no art 72 do Código Penal o qual se aplica apenas aos concursos material e formal STJ REsp 905854SP Rel Min Félix Fischer j 2510 2007 As penas de multa no caso de concurso de crimes material e formal aplicamse cumulativamente diversamente do que ocorre com o crime continuado induvidoso concurso material de crimes gravado pela menor culpabilidade do agente mas que é tratado como crime único pela lei penal vigente como resulta da simples letra dos arts 71 e 72 do Código Penal à luz dos arts 69 e 70 do mesmo diploma legal STJ AgRg no REsp 607929PR Rel Min Hamilton Carvalhido j 2642007 Apesar de esta Corte já terse manifestado pela inaplicabilidade do art 72 do Código Penal às hipóteses de crime continuado entendo que o texto legal prevê uma regra de exceção para a aplicação da pena de multa e seu conteúdo é claro nas hipóteses de concurso formal perfeito art 70 1ª parte do CP e de crime continuado art 71 do CP a pena de multa será multiplicada pelo número de infrações cometidas não incidindo na sua fixação o sistema de exasperação STJ REsp 519429SP Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 692005 Erro na execução Art 73 Quando por acidente ou erro no uso dos meios de execução o agente ao invés de atingir a pessoa que pretendia ofender atinge pessoa diversa responde como se tivesse praticado o crime contra aquela atendendose ao disposto no 3º do art 20 deste Código No caso de ser também atingida a pessoa que o agente pretendia ofender aplicase a regra do art 70 deste Código D O U T R I N A 1 Aberratio ictus A aberratio ictus ou erro na execução não se confunde com o erro quanto à pessoa no qual há representação equivocada da realidade pois o agente acredita tratarse de outra pessoa No erro de execução a pessoa visada é a própria embora outra venha a ser atingida involuntária e acidentalmente O agente dirige a conduta contra a vítima visada o gesto criminoso é dirigido corretamente mas a execução sai errada e a vontade criminosa vai concretizarse em pessoa diferente 2 Erro com resultado único Ocorre a aberratio ictus com unidade simples resultado único quando o agente errando o alvo atinge somente a pessoa não visada matandoa Na realidade teria havido uma tentativa de homicídio em relação à vítima virtual e um homicídio culposo em relação à vítima efetiva Contudo pelo dispositivo em exame considerase somente o homicídio doloso como praticado contra a vítima virtual A tentativa fica subsumida 3 Erro com resultado duplo E há aberratio ictus com unidade complexa resultado duplo quando além da pessoa visada o agente atinge também uma terceira Nesta hipótese com uma só conduta o agente pratica dois crimes e diante da unidade da atividade criminosa justificase a determinação do Código de dispensar o mesmo tratamento do concurso formal próprio 4 Erro na execução com dolo eventual Se o agente agir com dolo eventual em relação ao terceiro não visado o agente deve responder pelos dois crimes Nesta hipótese o concurso permanece formal porém as penas devem somarse como ocorre no concurso formal impróprio diante dos desígnios autônomos do agente 5 Qualidades da vítima Nas hipóteses de erro na execução consideramse as qualidades ou condições da pessoa visada a vítima virtual e não as da pessoa atingida a vítima efetiva Por exemplo o agente pretendendo matar um forasteiro atira e vem a matar seu próprio pai que se encontrava próximo Sobre o fato não incide a agravante genérica da relação de parentesco art 61 II e 1ª figura Agora se o agente pretendendo matar o próprio pai atira e vem a matar um forasteiro sobre o fato incide a agravante genérica antes referida J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Verificandose que na espécie incide a figura da aberratio ictus com unidade complexa art 73 segunda parte do CP vez que o réu por erro no uso dos meios de execução atingiu a vítima ERS além da vítima GSA vítima visada caso não é de aplicação da regra do crime continuado art 71 do CP mas sim do concurso formal art 70 do CP tendo em vista que na espécie incide a regra do art 73 segunda parte do Código Penal TJPR Apelação 04004375 Rel Mário Helton Jorge j 1272007 A aberratio ictus não deve ser acolhida como forma de afastar eventual responsabilidade do agente quando este afirma que não tinha a intenção de atingir a vítima havendo erro na execução pois a conduta criminosa ainda persiste TJPR RESE 03885398 Rel Luiz Osório Moraes Panza j 2862007 Aberratio ictus Concurso formal de delitos Pena Hipótese em que se atingiu não só a pessoa visada como também terceiro por erro de execução Regência da espécie pela disciplina do concurso formal Precedente do Supremo Tribunal Federal HC 62655BA DJ de 771985 Rel Min Francisco Rezek Se por erro de execução o agente atingiu não só a pessoa visada mas também terceira pessoa aplicase o concurso formal STF RT 598420 STJ REsp 439058DF Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 1352003 Homicídio qualificado tentado e consumado Recurso ministerial que pretende a aplicação da regra do concurso formal imperfeito Aberratio ictus Autonomia de desígnios caracterizada Recurso ministerial provido O cometimento de uma só conduta que acarreta em resultados diversos um dirigido pelo dolo direto e outro pelo dolo eventual configura a diversidade de desígnios Precedente do STF Hipótese em que se verifica o concurso formal imperfeito que se caracteriza pela ocorrência de mais de um resultado através de uma só ação cometida com propósitos autônomos STJ REsp 138557DF Rel Min Gilson Dipp j 1452002 Resultado diverso do pretendido Art 74 Fora dos casos do artigo anterior quando por acidente ou erro na execução do crime sobrevém resultado diverso do pretendido o agente responde por culpa se o fato é previsto como crime culposo se ocorre também o resultado pretendido aplicase a regra do art 70 deste Código D O U T R I N A 1 Aberratio delicti Há aberratio delicti ou desvio do crime quando o agente também por acidente ou inabilidade atinge bem jurídico diverso do pretendido fora das hipóteses que configuram a aberratio ictus A natureza dos bens jurídicos visado e atingido é diferente Nesta hipótese o agente responde por culpa se o fato é previsto como crime culposo A punibilidade do resultado não pretendido fica na dependência de previsão da modalidade culposa daquela conduta 2 Ocorrência de resultado duplo Se ocorrer também o resultado pretendido aplicase a regra do concurso formal Assim se o agente arremessa uma pedra para quebrar a vitrine e acaba ferindo também a balconista responderá pelo crime de dano e pela lesão corporal culposa contudo se o agente arremessa a pedra para ferir um transeunte e acaba quebrando também a vitrine responderá tão somente pela lesão corporal dolosa porque o crime de dano não tem a correspondente figura culposa J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Disparo de arma de fogo e lesão corporal leve em aberratio criminis Art 15 da Lei n 108262003 e art 129 6º do Código Penal pela incidência da regra contida no art 74 do Código Penal TJRS Apelação 70017523564 Rel Vladimir Giacomuzzi j 1º32007 Aberratio criminis art 74 do CP Ocorre a figura quando alguém movido pelo ciúme e embriagado o que lhe retira o dolo mesmo eventual da ação provoca incêndio em colchão que guarnece a cama do amante propagandose o fogo contra sua expressa vontade e apesar de seus esforços pela residência Viabilidade de censura penal por delito de dano e incêndio culposo em concurso formal TJRS Apelação 690026380 Rel Guilherme Oliveira de Souza Castro j 661990 Limite das penas Art 75 O tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 30 trinta anos V art 5º XLVII b da CF 1º Quando o agente for condenado a penas privativas de liberdade cuja soma seja superior a 30 trinta anos devem elas ser unificadas para atender ao limite máximo deste artigo 2º Sobrevindo condenação por fato posterior ao início do cumprimento da pena farseá nova unificação desprezando se para esse fim o período de pena já cumprido V arts 111 parágrafo único e 118 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal D O U T R I N A 1 Limite de cumprimento da pena de prisão Como o que a disposição legal limita é o tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade nada impede que o agente autor de vários crimes possa receber condenação superior àquele limite 2 Unificação de penas superiores a 30 anos Quando no entanto as condenações de um mesmo agente atingirem soma superior a trinta anos devem elas ser unificadas para atender ao limite máximo estabelecido art 75 1º do CP 3 Exclusão dos benefícios penitenciários O limite de 30 anos é tão somente para o cumprimento de pena não sendo aplicável para outros benefícios como progressão indulto livramento condicional etc 4 Unificação por fato posterior Quando o condenado praticar novo crime durante a execução far seá nova unificação de penas abatendose o tempo já cumprido art 75 2º Não deixa contudo de conceder um passaporte de impunidade ao sujeito que condenado a 30 anos de prisão pratique novos delitos no início de seu cumprimento 5 Sugestão de Basileu Garcia Por isso continua atualizada a sugestão de Basileu Garcia quando criticava o Código Penal de 1940 que deveria facultar a imposição de um acréscimo penal sobre o limite fixado no art 55 para o caso de crime cometido supervenientemente à condenação irrecorrível J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 715 do STF A pena unificada para atender ao limite de trinta anos de cumprimento determinado pelo art 75 do Código Penal não é considerada para a concessão de outros benefícios como o livramento condicional ou regime mais favorável de execução Para fins de observância do limite trintenário havendo nova condenação por crime cometido após o início do cumprimento da reprimenda outra unificação das penas deve ser realizada desprezandose neste cálculo o período já cumprido Inteligência do art 75 2º do CPB Precedentes do STJ e STF STJ HC 87823SP Rel Min Napoleão Nunes Maia Filho j 18122007 Nos termos do art 75 2º do Código Penal sobrevindo condenação por crime praticado posteriormente ao início da execução procedese a nova unificação desprezandose o período de pena já cumprido Se o somatório das penas não alcança o limite máximo de 30 trinta anos não há falar em unificação STJ HC 43695SP Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 5122006 Não é possível a unificação das penas para fins de cumprimento da reprimenda e concessão de benefício com esteio no art 75 do CP pois a doutrina e jurisprudência pátria são uníssonas em afirmar que para a obtenção de benefício na execução seria levado em conta o montante das penas efetivamente aplicadas ao réu tendo o limite de trinta anos efeito exclusivo na duração do encarceramento STJ HC 39653SP Rel Min Hélio Quaglia Barbosa j 1º 92005 Medida de segurança Projeção no tempo Limite A interpretação sistemática e teleológica dos arts 75 97 e 183 os dois primeiros do Código Penal e o último da Lei de Execuções Penais deve fazerse considerada a garantia constitucional abolidora das prisões perpétuas A medida de segurança fica jungida ao período máximo de trinta anos STF HC 84219SP Rel Min Marco Aurélio j 1682005 A unificação das penas prevista no art 75 do Código Penal não tem qualquer efeito sobre eventuais benefícios relativos à execução penal restringindose apenas à duração do encarceramento que fica limitado no máximo de 30 trinta anos Súmula 715STF O cálculo para a concessão de qualquer benefício por ocasião da execução penal deve ter por base o somatório das penas privativas de liberdade efetivamente impostas ao condenado STJ HC 39184SP Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 1952005 Concurso de infrações Art 76 No concurso de infrações executarseá primeiramente a pena mais grave D O U T R I N A 1 Concurso de penas Concorrendo dois tipos de penas cumprese primeiro a mais grave 2 Cumulação de penas de multa A jurisprudência está dividida a na cominação cumulativa de detenção e multa não há impedimento a que a primeira seja substituída por multa desde que presentes os pressupostos legais STJ REsp 9157 DJU 21101991 p 14753 b o STF tem entendimento contrário não admitindo a cumulação quando há cominação cumulativa da pena privativa de liberdade com a multa 1ª T HC 70445 Rel Moreira Alves DJU 2521994 p 2592 3 Cumulação de penas Súmula 171 do STJ Mudando a orientação inicial o STJ sumulou em sentido contrário à sua orientação inicial Cominadas cumulativamente em lei especial penas privativa de liberdade e pecuniária é defeso a substituição da prisão por multa Nossa posição é pela possibilidade da cumulação por encontrar fundamento legal na cominação abstrata nos tipos penais 4 Jurisprudência questionável A jurisprudência tem entendido historicamente que a menoridade que é um aspecto da personalidade é a circunstância mais relevante até mais do que a reincidência Essa maior relevância para nós não é absoluta Admitimos é verdade que em relação à reincidência a menoridade seja mais relevante Porém não podemos esquecer os motivos determinantes do crime que podem assumir as mais variadas formas podem ser nobres fúteis torpes graves imorais etc e embora não justifiquem o crime podem alterar profundamente a sua reprovabilidade tanto que em algumas hipóteses qualificam ex art 121 2º II ou privilegiam art 121 1º a conduta criminosa 5 Súmula derrogada A Súmula 605 do STF Não se admite continuidade delitiva nos crimes contra a vida editada antes da Lei n 720984 a nosso juízo foi derrogada pelo art 71 parágrafo único Nesse sentido STF RTJ 121665 6 Limites dos efeitos da unificação de penas Há duas correntes a a unificação em 30 anos limitase à finalidade de cumprimento STF RHC 68237 DJU 9111990 p 12729 HC 66212 DJU 1621990 p 928 b a unificação tem efeitos amplos TACrimSP Ag 406603 j 16101985 J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A No caso de condenação por dois crimes em concurso material com distintas penas privativas de liberdade e regimes prisionais incompatíveis a pena mais grave deve ser cumprida em primeiro lugar STJ HC 24274TO Rel Min Gilson Dipp j 1712 2002 O art 76 do CP aplicase aos casos de concurso material determinando o cumprimento da pena mais grave antes de qualquer outra mas isso não significa ter força bastante para desconstituir pena já cumprida e em seu lugar colocar novo quantum por condenação em crime hediondo com vistas à progressão de regime e livramento condicional STJ HC 22319SP Rel Min Fernando Gonçalves j 1710 2002 Na hipótese de concurso de infrações a pena mais grave deve ser executada em primeiro lugar CP art 76 Havendo condenação em reclusão e às penas restritivas de direitos aquela deve ser cumprida em primeiro lugar STF HC 80558RJ Rel Min Nelson Jobim j 1962001 Capítulo IV Da Suspensão Condicional da Pena Requisitos da suspensão da pena Art 77 A execução da pena privativa de liberdade não superior a 2 dois anos poderá ser suspensa por 2 dois a 4 quatro anos desde que V arts 156 a 163 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal I o condenado não seja reincidente em crime doloso II a culpabilidade os antecedentes a conduta social e personalidade do agente bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do benefício III não seja indicada ou cabível a substituição prevista no art 44 deste Código 1º A condenação anterior a pena de multa não impede a concessão do benefício 2º A execução da pena privativa de liberdade não superior a 4 quatro anos poderá ser suspensa por 4 quatro a 6 seis anos desde que o condenado seja maior de 70 setenta anos de idade ou razões de saúde justifiquem a suspensão 2º com redação determinada pela Lei n 9714 de 25 de novembro de 1998 V arts 33 2º c e 65 I do CP D O U T R I N A 1 Suspensão condicional da pena A suspensão condicional da pena é hoje uma verdadeira condenação ou seja não é mais que uma simples modificação na forma de cumprimento da pena que suspende especialmente na regulamentação do nosso CP o qual determina que no primeiro ano de prazo deverá o condenado prestar serviços à comunidade art 46 ou submeterse à limitação de fim de semana art 48 Na verdade o sursis atualmente como é conhecido esse instituto significa a suspensão parcial da pena privativa de liberdade durante certo tempo e mediante determinadas condições 2 Natureza jurídica Firmouse o entendimento que concebe o sursis como um direito público subjetivo do condenado art 157 da LEP desde que presentes seus requisitos objetivos e subjetivos Nesse sentido STF HC 69596 DJU 6111992 p 20107 3 Penas passíveis de receberem sursis A suspensão condicional restringese às penas privativas de liberdade art 80 do CP Parece lógico pois as demais alternativas à pena de prisão visam igualmente preservar um mínimo de sentido retributivo da pena e representam uma forma de no dizer de Jescheck fazer o condenado sentir os efeitos da condenação 4 Revelia e sursis A revelia do condenado como já ocorria na legislação anterior por si só não inviabiliza a concessão do sursis Respeitase o direito do cidadão de não comparecer a juízo para defenderse 5 Requisitos necessários 1 Requisitos objetivos a natureza e quantidade da pena somente pena privativa de liberdade arts 77 e 80 Limite de dois anos para os sursis simples e especial e de quatro anos para o sursis etário b inaplicabilidade de penas restritivas de direitos deverá o magistrado também verificar se no caso concreto não é indicada ou cabível pena restritiva de direitos arts 44 e 77 III do CP 2 requisitos subjetivos a não reincidência em crime doloso somente a reincidência em crime doloso impede a concessão do sursis É irrelevante a reincidência em crime culposo b prognose de não voltar a delinquir os elementos definidores da medida da pena art 77 II informarão da conveniência ou não da suspensão da execução da pena aplicada na sentença 51 A condenação no estrangeiro A condenação anterior por crime doloso mesmo no estrangeiro impede a concessão do sursis independentemente de homologação no Brasil formalidade esta somente exigida para efeitos de execução da sentença estrangeira 52 Condenação anterior à pena de multa A condenação precedente a pena pecuniária não obstaculiza a obtenção de sursis independentemente da natureza do crime doloso ou culposo 53 Condenação há mais de cinco anos Somente pelo efeito reincidência não impede a concessão do sursis se decorridos mais de cinco anos do cumprimento da pena ou da extinção da punibilidade art 64 I Poderá eventualmente não satisfazer o requisito II do art 77 54 Sursis e penas restritivas Em regra as penas restritivas de direitos são de menor rigor repressivo No entanto as penas de interdição temporária podem ser mais gravosas que o sursis mesmo o simples Por outro lado o sursis especial é a resposta penal mais benéfica de todo o nosso ordenamento jurídico Esses casos o magistrado deve examinar cuidadosamente e aplicar a sanção menos prejudicial ao condenado 541 Incompatibilidade do inciso III do art 77 Houve aqui uma lamentável omissão do legislador ao não adequar este inciso aos novos limites da pena restritiva de direitos A possibilidade de substituição por penas restritivas é requisito impeditivo do sursis A observância desse requisito ficou prejudicada 542 Limites do sursis e limites das penas restritivas Penas superiores a dois anos de prisão não admitem sursis mas podem ser substituídas por penas alternativas arts 77 caput e 44 I do CP É só uma demonstração da grande desarmonia que se está instalando no sistema penal brasileiro com as ditas reformas pontuais 543 Esvaziamento do regime aberto Da mesma forma o regime aberto terá aplicação bastante restrita basicamente nas infrações praticadas com violência ou grave ameaça à pessoa ou cometidas por reincidentes específicos 544 Desarmonia no sistema penal e omissão legislativa A Lei n 971498 esqueceu de corrigir entre outros dispositivos os arts 58 parágrafo único 77 caput e inciso III do CP e 181 da LEP para complementar as causas especiais de conversão das novas penas restritivas 55 Dois sursis simultâneos Teoricamente é possível que um condenado já beneficiado com o sursis receba novamente esse mesmo benefício em caráter provisório enquanto aguarda eventuais recursos A confirmação das duas condenações porém impossibilita o exercício de ambos os benefícios que serão automaticamente revogados devendo ser cumpridas as penas normalmente a menos que a soma de ambas as condenações não ultrapasse o limite de dois anos que unificadas representarão um único sursis e desde que não afastem o pressuposto do art 77 II 56 Sursis sucessivo Há ainda outra hipótese de o acusado poder receber mais de um sursis neste caso sucessivo Com a temporariedade dos efeitos da reincidência agora limitados a cinco anos pelo art 64 I o então reincidente em crime doloso pode voltar a obter o sursis quando praticar outro crime desde que tenham decorrido mais de cinco anos desde o cumprimento da pena ou a extinção de sua punibilidade Com o decurso desses cinco anos sem cometer crimes adquire a condição de não reincidente 57 Perdão judicial e sursis O perdão judicial que não é fator gerador de reincidência art 120 e tampouco tem natureza condenatória permite a concessão de sursis em futura condenação Em sentido contrário entendendo que a sentença que concede o perdão judicial é de natureza condenatória manifestase Damásio de Jesus mantendo seu entendimento anterior à reforma 58 Valoração das circunstâncias favoráveis Ainda que uma circunstância isolada desfavorável não seja obstáculo à aplicação do sursis a valoração daquelas deve ser global o que torna possível uma conclusão sobre a conduta futura do réu Não é indispensável que todas as circunstâncias sejam favoráveis como ocorre com o sursis especial Basta que no geral não sejam desfavoráveis de modo a criar dúvidas fundadas sobre a possibilidade de o condenado voltar a delinquir 59 Necessidade de fundamentação Toda vez que a condenação à pena privativa de liberdade não for superior a dois anos o juiz deverá na sentença manifestarse fundadamente sobre a concessão ou não do sursis art 157 da LEP 6 Espécies de suspensão condicional a Sursis simples ou comum nesta espécie o condenado fica sujeito ao cumprimento de prestação de serviços à comunidade ou de limitação de fim de semana como condição legal obrigatória no primeiro ano de prazo Esta é a espécie agora normal tradicional e mais frequente de suspensão condicional no nosso Código b sursis especial por esta modalidade o condenado fica dispensado do cumprimento das já referidas penas restritivas de direitos no primeiro ano do período de prova art 78 2º do CP As condições do 1º serão substituídas pelas do 2º ambos do mesmo art 78 c sursis etário para este tipo de sursis elevouse o limite da pena aplicada superior a dois até quatro anos inclusive E em decorrência desse limite o período de prova também é maior quatro a seis anos 7 Requisitos do sursis etário Como a previsão desta espécie de sursis está no segundo parágrafo do art 77 que estabelece os requisitos gerais para o sursis simples evidentemente que estes também são exigidos para o sursis do septuagenário 71 Setenta anos na data da condenação O condenado deve ser maior de setenta anos na data da condenação Embora não haja previsão legal nesse sentido essa é a interpretação que se pode tirar do art 65 I 2ª parte do Código Penal Como o dispositivo existe em benefício do apenado e visa a execução da pena pensamos que se houver recurso de decisão condenatória a data limite para a verificação da idade deve ser a da publicação do acórdão que confirmar aquela 72 Razões de saúde que justifiquem a suspensão Esta é uma nova espécie de sursis e não simplesmente um novo requisito do sursis etário Razões de saúde será um fundamento alternativo e não simultâneo ou concomitante à maioridade de setenta anos para concessão do sursis A redação deixa claro que razões de saúde podem justificar o sursis para pena não superior a quatro anos independentemente da idade Condenação superior a quatro anos ainda que o condenado apresente problemas de saúde não será fundamento por esta previsão legal para a concessão de sursis por essa razão 8 Requisitos do sursis especial Além de satisfazer os requisitos exigidos para o sursis simples deve satisfazer mais dois ter reparado o dano salvo impossibilidade de fazêlo e que todas as circunstâncias do art 59 sejam inteiramente favoráveis Nesta hipótese qualquer delas sendo desfavorável impedirá o sursis especial restando contudo o simples J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Uma única ocorrência penal não é motivo suficiente para impedir a concessão do sursis STJ HC 80923RJ Rel Min Maria Thereza de Assis Moura j 6122007 Em razão do disposto no art 697 do Código de Processo Penal o magistrado ao condenar o réu à pena privativa de liberdade não superior a 2 dois anos por constituir direito subjetivo deste deve obrigatoriamente se manifestar sobre a concessão ou não da suspensão condicional da pena A omissão relativa à análise obrigatória quanto à aplicação do sursis não tem o condão de por si só anular a condenação e os demais atos processuais dela decorrentes STJ HC 92399MG Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 20112007 Inaplicabilidade do sursis se não cumpridos os requisitos do art 77 do Código Penal uma vez que cabível a substituição da pena STJ REsp 897815RS Rel Min Gilson Dipp j 1262007 Evidenciado que foi fixada ao réu pena privativa de liberdade inferior a dois anos suas circunstâncias judiciais foram quase todas favoravelmente consideradas além deste ser tecnicamente primário a situação processual do paciente se enquadra nas hipóteses legais do art 77 do Código Penal Somente uma circunstância judicial foi desfavoravelmente considerada qual seja o motivo do crime tendo em vista ter agido com espírito de vingança a qual por si só não é suficiente para obstar a concessão da benesse da suspensão condicional da pena STJ HC 74359MG Rel Min Gilson Dipp j 1752007 A substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ou então a concessão do sursis não são viáveis tendo em vista a existência de maus antecedentes Precedentes STJ HC 70212RJ Rel Min Félix Fischer j 34 2007 O sursis concedido ao ora Paciente restou revogado pelo Tribunal a quo sem fundamentação apropriada já que se deu com amparo apenas no fato de se tratar de crime severo e violento fl 19 o que não configura obstáculo legal à concessão de tal benefício nos termos do art 77 e incisos do Código Penal Ordem concedida para fixar o regime aberto para o cumprimento da pena reclusiva imposta ao Paciente restabelecendo o sursis concedido na sentença de primeiro grau STJ HC 50924SP Rel Min Laurita Vaz j 452006 Antecedentes Inquéritos Policiais Pena Dosimetria Substituição Sursis Requisitos Subjetivos A substituição da pena privativa de liberdade e a concessão de sursis exigem o preenchimento de requisitos objetivos e subjetivos capazes de recomendálas no caso concreto como suficientes à reprovação e prevenção da conduta infracional Muito embora seja entendimento desta Corte que a condenação sem trânsito em julgado não pode ser causa impeditiva para a concessão do sursis inviável a concessão da ordem se o acórdão combatido considerou que não foram preenchidos os demais requisitos subjetivos necessários à concessão do sursis Fundamento que não combatido na impetração é suficiente à manutenção do acórdão STJ HC 47590MS Rel Min Hélio Quaglia Barbosa j 1622006 Não se concede o benefício da suspensão condicional da execução da pena como direito subjetivo do condenado podendo ela ser indeferida quando o juiz processante demonstrar concretamente a ausência dos requisitos do art 77 do CP STF HC 84342RJ Rel Min Carlos Britto j 1242005 Suspensão condicional da pena decisão negativa Fundamentação necessidade Nulidade ocorrência Faltando conveniente fundamentação à decisão que deixa de conceder ao réu o benefício da suspensão da pena padece ela nesse ponto de nulidade Ordem de habeas corpus concedida a fim de que haja a indicação dos pertinentes motivos de fato e de direito STJ HC 36559SP Rel Min Nilson Naves j 7122004 O art 77 1º do Código Penal não veda a concessão da suspensão condicional da pena na hipótese de reincidência decorrente de anterior imposição de multa STJ HC 22736SP Rel Min Paulo Medina j 19122003 Regime Aberto Pena Restritiva de Direito Impossibilidade Sursis Cabimento Ordem Concedida Não faz jus à pena restritiva de direito o condenado por crime que tenha a integrálo a violência ou a grave ameaça É de se conceder no entanto o benefício do sursis quando o acórdão embora adotando a penabase mínima estabelecida na sentença somente cabível ante a favorabilidade das circunstâncias judiciais ao réu e fixando regime que pressupõe autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado Código Penal art 36 qual seja o aberto como inicial do cumprimento de pena que reduziu a quantum inferior a 2 anos denega a suspensão condicional da execução da pena prisional ao argumento simples da ausência de seus pressupostos subjetivos fundando nessa evidente contradição o constrangimento ilegal que grava o decisum colegiado e se mostra evidente na sua própria letra de modo a ensejar que seja sanado em sede de habeas corpus STJ HC 24628MG Rel Min Hamilton Carvalhido j 1542003 A substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direito como previsto no art 44 do Código Penal importa em proporcionar ao condenado septuagenário situação penal mais benigna do que a concessão de sursis etário previsto no art 77 2º do mesmo Estatuto STJ RHC 9659MG Rel Min Vicente Leal j 2442001 A Lei n 950397 inobstante ser especial não veda a concessão do sursis àquele que satisfaça os requisitos elencados no art 77 do Código Penal Temse como presentes os requisitos subjetivos para a concessão da suspensão condicional da pena na hipótese em que o condenado não for reincidente em crime doloso e o juiz sentenciante no momento da individualização da pena não mencionar a presença de circunstâncias judiciais desfavoráveis STJ HC 14397PI Rel Min Vicente Leal j 1º32001 Art 78 Durante o prazo da suspensão o condenado ficará sujeito à observação e ao cumprimento das condições estabelecidas pelo juiz V arts 158 159 e 162 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal 1º No primeiro ano do prazo deverá o condenado prestar serviços à comunidade art 46 ou submeterse à limitação de fim de semana art 48 2º Se o condenado houver reparado o dano salvo impossibilidade de fazêlo e se as circunstâncias do art 59 deste Código lhe forem inteiramente favoráveis o juiz poderá substituir a exigência do parágrafo anterior pelas seguintes condições aplicadas cumulativamente 2º com redação determinada pela Lei n 9268 de 1º de abril de 1996 V arts 9º 16 65 III b e 91 I do CP a proibição de frequentar determinados lugares b proibição de ausentarse da comarca onde reside sem autorização do juiz c comparecimento pessoal e obrigatório a juízo mensalmente para informar e justificar suas atividades D O U T R I N A 1 Condições legais do sursis simples No primeiro ano de prova o condenado fica obrigado a prestar serviços à comunidade ou submeterse à limitação de fim de semana 1º Ao contrário de alguns autores não confundimos as previsões do art 81 com as condições legais Aquelas são causas de revogação estas são condições impostas Além das condições legais podem ser impostas condições judiciais art 79 2 Condições do sursis etário Serão as mesmas do sursis simples ou se for o caso as do sursis especial se forem satisfeitos aqueles outros dois requisitos do art 78 3 Condições do sursis especial São as seguintes condições 1 proibição de frequentar determinados lugares 2 proibição de ausentarse da comarca onde reside sem autorização judicial 3 comparecimento pessoal e obrigatório a juízo mensalmente para informar e justificar suas atividades art 78 2º 4 Aplicação cumulativa Estas condições que já eram obsoletas agora absurdamente precisam ser todas aplicadas simultaneamente Lei n 926896 J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A O sursis especial é concedido quando as circunstâncias do crime forem totalmente favoráveis ao condenado e tiver ele reparado o dano salvo impossibilidade de fazê lo Ausente tal reparação é inadmissível a concessão do benefício especial Caso em que o réu não reparou o dano tornando incabível a aplicação do sursis especial previsto no 2º do art 78 do Código Penal STJ REsp 858542SE Rel Min Gilson Dipp j 1052007 Regime aberto Inadmissível a cumulação do sursis simples com o sursis especial Provimento parcial do recurso TJRJ Apelação 200505000435 Rel Maria Christina Góes j 1012006 Suspensão condicional da pena Sursis simples arts 78 1º do CP e 158 1º da LEP O Código Penal ao dispor das espécies de suspensão condicional da pena estabeleceu como sursis simples no 1º do art 78 a autorização da sujeição do condenado à prestação de serviços à comunidade no primeiro ano da pena inexistindo pois qualquer incompatibilidade STJ REsp 294188SP Rel Min Félix Fischer j 252002 Art 79 A sentença poderá especificar outras condições a que fica subordinada a suspensão desde que adequadas ao fato e à situação pessoal do condenado V arts 158 e 159 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal V Súmula 249 do TFR D O U T R I N A 1 Condições judiciais As condições judiciais são as que o texto legal deixa à discricionariedade do juiz que contudo deverá observar que sempre sejam adequadas ao fato e à situação pessoal do condenado art 79 Essas condições judiciais não foram enumeradas no texto legal e dependem da discricionariedade do juiz desde que sempre adequadas ao fato e ao condenado 2 Natureza e conteúdo das condições As condições não podem constituir em si mesmas sanções não previstas para a hipótese em obediência ao princípio nulla poena sine lege e em respeito aos direitos individuais e constitucionais do sentenciado Tampouco se admitem condições ociosas isto é representadas por obrigações decorrentes de outras previsões legais como por exemplo reparar o dano ou pagar as custas judiciais 3 Fiscalização do cumprimento das condições O cumprimento das condições impostas deve ser fiscalizado pelo serviço social penitenciário patronatos conselho da comunidade ou instituições beneficiadas com prestação de serviços à comunidade O Ministério Público e o Conselho Penitenciário inspecionarão a atividade fiscalizadora das entidades referidas Eventuais lacunas de normas supletivas serão supridas por atos do juiz da execução art 158 3º da LEP J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Do sursis aplicado O Magistrado considerando insuficiente a prestação de serviços à comunidade durante o primeiro ano previsão expressa do art 78 1º do Código Penal estabeleceu outras condições faculdade que lhe é conferida pelo art 79 do mesmo diploma legal TJRS Apelação 70017384512 Rel Ivan Leomar Bruxel j 18 72007 Se a pena detentiva imposta ao paciente teve sua execução suspensa mediante a concessão de sursis art 77 do CP tendo o magistrado fixado como uma das condições para a obtenção do benefício a proibição de dirigir veículo automotor nos termos do art 79 do CP não há cogitar in casu de cumprimento cumulativo de penas privativa de liberdade e restritiva de direitos inexistindo portanto o alegado bis in idem STJ HC 10044ES Rel José Arnaldo da Fonseca j 232000 Art 80 A suspensão não se estende às penas restritivas de direito nem à multa D O U T R I N A Exclusão das penas restritivas e da multa Estas penas estão expressamente excluídas do sursis Vide anotações ao art 77 Revogação obrigatória Art 81 A suspensão será revogada se no curso do prazo o beneficiário V art 162 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal I é condenado em sentença irrecorrível por crime doloso II frustra embora solvente a execução de pena de multa ou não efetua sem motivo justificado a reparação do dano III descumpre a condição do 1º do art 78 deste Código 1º Revogação facultativa 1º A suspensão poderá ser revogada se o condenado descumpre qualquer outra condição imposta ou é irrecorrivelmente condenado por crime culposo ou por contravenção a pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos 2º e 3º Prorrogação do período de prova 2º Se o beneficiário está sendo processado por outro crime ou contravenção considerase prorrogado o prazo da suspensão até o julgamento definitivo 3º Quando facultativa a revogação o juiz pode ao invés de decretála prorrogar o período de prova até o máximo se este não foi o fixado D O U T R I N A 1 Causas de revogação obrigatória São causas de revogação obrigatória 1ª Condenação em sentença irrecorrível por crime doloso a lei não distingue se a condenação é consequência de fato praticado antes ou depois da infração que originou o sursis ou mesmo durante o seu exercício Basta que a nova condenação transite em julgado durante o período probatório para que o sursis seja revogado 2ª Frustrar embora solvente a execução da pena de multa o simples não pagamento da pena de multa não é causa suficiente para revogar o sursis Somente a frustração da execução da referida pena levará à revogação daquele O deixar de pagála determina tão somente a cobrança judicial art 164 da LEP 3ª Não efetuar sem motivo justificado a reparação do dano a simples não reparação do dano também não é causa revogatória Somente a injustificada sêloá Podendo efetuála o condenado não a faz Podem justificar a não reparação do dano por exemplo a situação econômica do condenado a renúncia da vítima a novação da dívida o paradeiro desconhecido etc 4ª Descumprir a prestação de serviços à comunidade ou a limitação de fim de semana aqui como ocorre na hipótese da reparação do dano somente o descumprimento injustificado dessa condição deve causar a revogação do sursis Para dotar de força suficiente essa condição e garantir a sua execução previuse que o seu descumprimento será causa obrigatória de revogação caso contrário seria uma determinação inócua 5ª Não comparecimento injustificado do réu à audiência admonitória os autores em geral têm chamado esta hipótese de cassação do sursis Em nossa opinião não há razão que justifique a denominação diferenciada das demais situações chamadas de causas de revogação O fato de estar prevista em outro texto legal art 161 da LEP e de o legislador ter dito que a suspensão ficará sem efeito não justifica essa preferência da doutrina 11 Efeito contraditório de condenação Ocorrer a condenação antes do início do sursis durante o processo antes ou depois da sentença condenatória em fase de recurso por si só impedirá a suspensão condicional Não é o que vem ocorrendo sob o frágil argumento de que a lei exige a reincidência Antes da sentença em nosso entendimento uma condenação por crime doloso ainda que tecnicamente não produza reincidência poderá ser causa impeditiva de concessão de sursis Ora se a condenação é causa para obrigatória revogação com muito mais razão será causa para impedir a concessão quando mais não seja para pelo menos dar tratamento isonômico a partes iguais em situações semelhantes 12 Nova condenação durante a fase recursal Com os mesmos argumentos encontrandose em fase recursal a decisão condenatória que concedeu o sursis neste particular deve ser tornada sem efeito pelo órgão que tomar conhecimento da nova condenação 13 A condenação à pena pecuniária A condenação à pena pecuniária não é causa revogatória do sursis Como a condenação anterior à pena de multa mesmo por crime doloso não impede a concessão do sursis seria incoerente que a condenação no curso deste determinasse sua revogação Em relação às causas facultativas o Código foi expresso em excluir a condenação à pena de multa por crime culposo ou contravenção como causa revogatória art 81 1º do CP 14 Nova condenação no estrangeiro A condenação no estrangeiro que pode impedir a concessão do sursis não é causa de sua revogação Na ausência de previsão legal por tratarse de norma restritiva do direito de liberdade do condenado vedase a interpretação extensiva ou a aplicação analógica 2 Revogação facultativa 1º Na hipótese de revogação facultativa a decisão fica sujeita à discricionariedade do juiz que em vez de revogar a suspensão poderá prorrogar o período de provas Aqui a lei se refere às condições legais previstas para o sursis especial art 78 2º do CP e às condições judiciais que houverem sido determinadas art 79 21 Alternativa à prorrogação facultativa O juiz em vez de revogar o período de prova poderá optar por prorrogálo até o máximo se já não se encontrar nesse limite 22 Causas de revogação facultativa 1ª Descumprimento de outras condições do sursis o descumprimento de qualquer condição judicial facultará ao juiz revogar o período probatório ou prorrogálo se já não estiver em seu limite máximo As circunstâncias é que determinarão qual a medida mais prudente a ser tomada 2ª condenação irrecorrível por crime culposo ou contravenção à pena privativa de liberdade e restritiva de direitos esta hipótese afasta a condenação à pena de multa já que se refere especificamente às outras duas modalidades de penas 3ª prática de nova infração penal afirmase que a prática de nova infração penal não revoga a suspensão condicional pois o Código exige condenação definitiva Em sentido contrário sustentamos a possibilidade de revogação do sursis basta que o juiz ao estabelecer as condições judiciais nos termos do art 79 dentre elas arrole a proibição de voltar a delinquir Descumprindoa a revogação será facultativa 23 Como unificar sursis com nova condenação Um indivíduo condenado com a pena suspensa e que durante o período de provas sofre outra condenação à pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos pode não ter revogada a suspensão anterior Como e quando tal indivíduo cumprirá esta segunda pena Será cumprida concomitante ou sucessivamente Nem a lei nem a doutrina tampouco a jurisprudência dizem como e quando será cumprida esta segunda sanção Não se pode esquecer que primeiro se deve executar a pena mais grave art 76 3 O período de prova O lapso temporal em que o beneficiário tem a execução da pena suspensa chamase período de prova O cumprimento das condições impostas e a vida em liberdade sem delinquir são inegavelmente uma prova efetiva de que o beneficiário sentiu os efeitos da condenação e de que não necessitava recolherse à prisão para emendarse 31 Limites do período de prova a Sursis simples e especial dois a quatro anos art 77 caput b sursis etário quatro a seis anos art 77 2º c sursis de contravenção um a três anos art 11 da LCP 32 Prorrogação facultativa A prorrogação facultativa como alternativa à revogação é apenas uma possibilidade que desaparecerá se o período probatório já estiver fixado em seu limite máximo Nessa modalidade de prorrogação facultativa continuam vigentes todas as condições impostas na sentença com exceção daquelas específicas do primeiro ano de prazo prestação de serviços à comunidade ou limitação de fim de semana 33 Prorrogação obrigatória e automática A prorrogação será automática e obrigatória se o beneficiário do sursis estiver sendo processado por outro crime ou contravenção durante o período de prova Essa prorrogação é automática e não depende de despacho judicial decorre da lei e se prolonga até o julgamento definitivo do novo processo 34 Efeitos da prorrogação automática Nesta espécie de prorrogação automática e obrigatória prorrogase tão somente o prazo depurador As condições impostas não subsistem além do prazo anteriormente fixado 35 Nova condenação com prazo prorrogado Se houver condenação revogase automaticamente o sursis e o condenado deverá cumprir as duas condenações Aqui a lei não faz qualquer distinção entre crime doloso e culposo ou entre crime e contravenção Determina simplesmente a prorrogação até o julgamento definitivo J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Na hipótese prevista no inciso I do art 81 do Código Penal a revogação do sursis é obrigatória não dispondo o magistrado de discricionariedade diante de uma segunda condenação irrecorrível pela prática de crime doloso Tendo o apenado sido condenado a pena privativa de liberdade pela prática de crime doloso em decisão irrecorrível durante o período de prova a revogação do sursis é medida que se impõe nos termos do inc I do art 81 do Código Penal STJ RHC 18521MG Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 342007 O período de prova do sursis fica automaticamente prorrogado quando o beneficiário está sendo processado por outro crime ou contravenção E a superveniência de sentença condenatória irrecorrível é caso de revogação obrigatória do benefício mesmo quando ultrapassado o período de prova STJ REsp 723090MG Rel Min Gilson Dipp j 1992006 A norma do art 51 do Código Penal ao dispor que a multa será considerada dívida de valor não lhe retirou a natureza de resposta penal nem instituiu causa legal de prorrogação do sursis que na perspectiva da sanção patrimonial só determina a revogação obrigatória do benefício quando o condenado frustra embora solvente a execução de pena de multa inciso II 1ª parte do art 81 do Código Penal assim mesmo quando tal fato determinar a providência revocatória antes de expirado o prazo do benefício É porque as causas legais de prorrogação do período de prova não são outras que não está sendo processado por outro crime ou contravenção 2º do art 81 do Código Penal ou quando ocorrer causa facultativa de revogação em optando o Juiz por prorrogar o benefício ao invés de decretar a sua revogação isso no período de prova STJ REsp 714245RS Rel Min Hamilton Carvalhido j 18 102005 Revogação obrigatória No caso do inciso I do art 81 do Código Penal é meramente declaratória a decisão que revoga o sursis eis que a desconstituição do benefício é efeito legal da condenação irrecorrível do sentenciado por crime doloso STJ HC 33279SP Rel Min Hamilton Carvalhido j 1462005 O cumprimento do prazo do sursis não aciona imediata e automaticamente a declaração da extinção da punibilidade tendo em vista tratarse de procedimento incidental sujeito às determinações do contraditório Em face disso possível a averiguação posterior da eficiência do benefício se o transcurso foi satisfatório e se o beneficiário atendeu aos pressupostos legais exigidos caso em que a revogação mesmo que operada após o período de prova se afigura correta ante os parâmetros legais Não bastasse isso o fato reclama o entendimento no sentido da revogação automática com a simples ocorrência das condenações no prazo da suspensão condicional STJ HC 26578RJ Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 1062003 Cumprimento das condições Art 82 Expirado o prazo sem que tenha havido revogação considerase extinta a pena privativa de liberdade D O U T R I N A 1 Extinção da pena privativa de liberdade Decorrendo o período probatório sem que tenha havido causas para a revogação extinguirseá a pena privativa de liberdade e o juiz deverá declarálo Se não o fizer a pena estará igualmente extinta pois o que a extingue não é o despacho judicial mas o decurso do prazo sem revogação 2 Descoberta tardia de causas impeditivas do sursis Uma vez extinta a pena ainda que se venha a descobrir que o beneficiário não merecia o sursis obtido em face da existência de causas impeditivas por exemplo não será revogável a suspensão STF RTJ 84689 3 Ônus da recusa do sursis O sentenciado pode recusar a concessão do sursis Nesse caso terá de submeterse ao cumprimento da pena A recusa ou aceitação desse benefício não impede o direito de recorrer no prazo legal 4 Início do cumprimento do sursis O sursis só pode começar a correr depois de a decisão condenatória transitar em julgado art 160 da LEP 5 Audiência admonitória É a solenidade de advertência das consequências do descumprimento das condições do sursis sendo igualmente a oportunidade em que o beneficiado manifesta se aceita as condições impostas J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A suspensão do processo mediante condições introduzida pela Lei n 909995 é semelhante ao sursis do Código Penal E similares também são os motivos para se revogar o benefício 3º e 4º do art 89 da mencionada legislação e arts 81 e 82 do Código Penal Desta forma a interpretação do primeiro texto deve se espelhar naquela feita para os dispositivos penais invocados E no caso os Tribunais majoritariamente defendem que existindo razões para a revogação da suspensão condicional da pena esta deverá operarse no curso do prazo do benefício Ele finalizado sem incidentes a sanção imposta é considerada extinta TJRS RESE 70020487005 Rel Sylvio Baptista Neto j 1682007 Suspensão condicional da pena Extinção da pena privativa de liberdade decretada Réu processado pela prática de outros delitos Prorrogação do período de prova até o julgamento final dos processos O período de prova do sursis fica automaticamente prorrogado quando o beneficiário está sendo processado por outro crime ou contravenção E a superveniência de sentença condenatória irrecorrível é caso de revogação obrigatória do benefício mesmo quando ultrapassado o período de prova Deve ser determinada a prorrogação do período de prova até o julgamento definitivo dos processos em andamento STJ REsp 723090MG Rel Min Gilson Dipp j 19 92006 Sursis Extinção da pena ante o vencimento do período de prova durante o qual o apenado foi condenado em sentença irrecorrível por crime doloso que é causa de revogação obrigatória do benefício nos termos do art 81 I do CP Não há como interpretar diferente o art 82 do CP cujo título é cumprimento das condições Nesse sentido é que entendo que a promoção ministerial requerendo a revogação do sursis não foi intempestiva ainda que apresentada após haver expirado o período de prova Pouco importa se a decisão judicial a respeito foi proferida após vencido o prazo do benefício ou após cumpridas as suas condições pois o que vale para efeito de extinção da pena é que as condições da suspensão tenham sido efetivamente cumpridas e a seu devido tempo sob pena de ficar a Justiça à mercê da boa vontade do beneficiário de comparecer na instituição designada para cumprir a PSC TJRS Agravo em Execução 70014685804 Rel José Antônio Hirt Preiss j 155 2006 A decisão que julga extinta a pena privativa de liberdade pelo cumprimento das condições do sursis com a nota de que a pena de multa deve ser executada pela Fazenda Pública se ajusta aos arts 51 e 82 do Código Penal e à jurisprudência desta Corte Superior de Justiça STJ REsp 714245RS Rel Min Hamilton Carvalhido j 18102005 Suspensão condicional do processo Réu processado por outro crime no curso do benefício Revogação após o término do período de prova e prosseguimento da ação penal Possibilidade O exaurimento do tempo de prova não impede a revogação da suspensão condicional do processo desde que por função de causa legal obrigatória STJ RHC 14827SP Rel Min Hamilton Carvalhido j 1522005 Capítulo V Do Livramento Condicional Requisitos do livramento condicional Art 83 O juiz poderá conceder livramento condicional ao condenado a pena privativa de liberdade igual ou superior a 2 dois anos desde que V arts 68 II e 70 I 128 131 a 146 e 170 1º da Lei n 721084 Lei de Execução Penal I cumprida mais de um terço da pena se o condenado não for reincidente em crime doloso e tiver bons antecedentes V arts 63 e 64 do CP II cumprida mais da metade se o condenado for reincidente em crime doloso III comprovado comportamento satisfatório durante a execução da pena bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído e aptidão para prover à própria subsistência mediante trabalho honesto V art 33 2º do CP V art 112 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal IV tenha reparado salvo efetiva impossibilidade de fazê lo o dano causado pela infração V art 91 I do CP V cumprido mais de dois terços da pena nos casos de condenação por crime hediondo prática da tortura tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e terrorismo se o apenado não for reincidente específico em crimes dessa natureza V art 5º XLIII da CF V Lei n 807290 crimes hediondos Inciso acrescentado pela Lei n 8072 de 25 de julho de 1990 Parágrafo único Para o condenado por crime doloso cometido com violência ou grave ameaça à pessoa a concessão do livramento ficará também subordinada à constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a delinquir V arts 8º 70 I e 131 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal D O U T R I N A 1 Livramento condicional É uma antecipação embora limitada da liberdade Por meio desse instituto colocase no convívio social o criminoso que apresenta em determinado momento do cumprimento da pena suficiente regeneração 11 Condições do livramento condicional Pelo livramento condicional o liberado conquista a liberdade antecipadamente mas em caráter provisório e sob condições O liberado será em outras palavras submetido à prova 12 Natureza jurídica Os sistemas neoclássicos o consideravam um benefício dispensado ao apenado como prêmio por sua boa conduta Na atualidade a doutrina brasileira em regra tem entendido a liberdade condicional como um direito público subjetivo do apenado desde que estejam satisfeitos os requisitos legais Não se pode denominálo substituto penal porque em verdade não substitui a prisão tampouco põe termo à pena mudando apenas a maneira de executála 13 Duração do livramento condicional Esse período de provas em nosso ordenamento jurídico corresponde ao tempo de pena que falta cumprir ao contrário de algumas legislações penais em que o período de prova tem outros limites de duração independentemente do restante de pena a cumprir 14 Cabimento do livramento condicional A pena inferior a dois anos pode beneficiarse com a suspensão condicional a superior a dois dispõe do livramento condicional e a pena de dois anos exatos pode beneficiarse tanto com o livramento condicional como com a suspensão condicional as circunstâncias e os fins da pena é que na hipótese indicarão a medida mais adequada 15 Elenco de alternativas à prisão O elenco de penas criado pela reforma penal tornou desnecessária a ausência de fixação de um limite mínimo de cumprimento de pena para concessão do livramento multa substitutiva para penas de até seis meses art 60 2º do CP pena restritiva de direitos para penas inferiores a um ano ou para crimes culposos art 44 I suspensão condicional para penas de até dois anos art 77 regime aberto inicial para penas de até quatro anos regime aberto como terceira fase possível no cumprimento da pena de prisão e finalmente livramento condicional para penas a partir de dois anos inclusive art 83 com cumprimento de apenas um terço para os não reincidentes ou metade para os reincidentes 2 Requisitos necessários Para que o sentenciado possa desfrutar do livramento condicional necessita preencher alguns requisitos de natureza objetiva e subjetiva e no caso dos chamados crimes violentos necessita de mais um requisito específico que serão todos examinados a seguir 21 Requisitos objetivos a Natureza e quantidade da pena b cumprimento de parte da pena c reparação do dano salvo efetiva impossibilidade a Natureza e quantidade da pena somente a pena privativa de liberdade igual ou superior a dois anos pode ser objeto do livramento condicional art 83 do CP Essa pena ainda que somada que não atingir o mínimo de dois anos e que não puder beneficiarse com outras alternativas tampouco poderá beneficiarse com o livramento condicional devendo ser cumprida integralmente b cumprimento de parte da pena os não reincidentes em crime doloso e com bons antecedentes deverão cumprir mais de um terço da pena imposta e os reincidentes mais da metade O Código Penal de 1940 exigia o cumprimento de mais da metade da pena para os não reincidentes e para os reincidentes mais de três quartos Não fazia distinção entre reincidentes em crime doloso art 60 I do CP de 1940 c reparação do dano salvo efetiva impossibilidade o legislador da reforma foi mais contundente na exigência da reparação do dano ressalvando apenas a efetiva impossibilidade devidamente comprovada Não mais admite aquele tradicional atestado de pobreza de triste memória e que era suficiente para exonerar o infrator da responsabilidade reparatória A reparação do dano é uma obrigação civil decorrente da sentença penal condenatória e o sentenciado que não puder satisfazê lo deverá fazer prova efetiva dessa incapacidade 211 Questões diversas a Crimes hediondos A Lei n 8072 de julho de l990 que define os chamados crimes hediondos exige que o condenado não reincidente específico nesses crimes cumpra pelo menos dois terços da pena aplicada para poder postular o livramento condicional b Exclusão das outras penas Estão consequentemente afastadas deste instituto as penas restritivas de direitos e a pena pecuniária Não se fala das acessórias porque foram abolidas do ordenamento jurídico brasileiro ordinário c Reincidência dolosa e culposa O sistema brasileiro dá tratamento diferenciado para os reincidentes em crimes dolosos e para aqueles que são reincidentes em crimes culposos Com a exigência expressa de que o condenado não seja reincidente em crime doloso para ter direito ao livramento com o cumprimento de apenas um terço da pena imposta permite a contrario sensu que o reincidente em crime culposo teoricamente possa ser beneficiado com referido instituto cumprindo igualmente mais de um terço desde que preencha os demais pressupostos d Livramento condicional e detração penal Para integralizar o tempo mínimo de pena cumprida além da determinação de soma de penas referentes a condenações distintas é computada também via detração penal a prisão provisória administrativa e a internação em hospitais de custódia e tratamento psiquiátrico art 42 do CP A pena remida pelo trabalho é igualmente considerada para efeitos de livramento condicional art 128 da LEP 22 Requisitos subjetivos Os requisitos subjetivos referemse à pessoa do condenado pois é pressuposto básico do livramento condicional que o liberado reingresse na sociedade livre em condições de tornarse membro útil produtivo e em reais condições de reintegrarse socialmente É necessário que esteja em condições de prover sua própria subsistência através do seu trabalho sem necessidade de recorrer a atividade escusa Os requisitos subjetivos são a bons antecedentes b comportamento satisfatório durante a execução da pena c bom desempenho no trabalho atribuído e d aptidão para o trabalho a Bons antecedentes o condenado que houver praticado outras infrações penais que tiver respondido a outros inquéritos policiais que se envolveu em outras infrações do ordenamento jurídico que sofreu outras condenações mesmo as que não caracterizem tecnicamente reincidência que se dedicou ao ócio e à malandragem enfim que não tiver bons antecedentes não poderá beneficiarse do livramento condicional somente com o cumprimento de mais de um terço de pena a1 Não reincidente e bons antecedentes O cumprimento de mais de um terço é uma exceção e como medida excepcional só terá lugar se preencher todos os requisitos expressamente exigidos Assim só terá direito quem não for reincidente em crime doloso e tiver bons antecedentes Faltando um ou outro desses dois requisitos a exceção não se justifica e o condenado deverá cumprir mais da metade da pena a2 Antecedentes e fatos posteriores Devem ser considerados como antecedentes aqueles fatos ocorridos antes do início do cumprimento da pena mesmo que tenham ocorrido após o fato delituoso que deu origem à prisão o que já não pode ocorrer por ocasião da dosimetria e aplicação da pena Os fatos ocorridos durante a prisão além de não serem antecedentes serão objeto de avaliação no requisito que trata da satisfatoriedade do comportamento prisional do recluso e jamais como antecedentes penais que não o são a3 Bons antecedentes e reincidente em crime doloso Este requisito como se percebe só interessa para o não reincidente em crime doloso aquele que for reincidente com ou sem bons antecedentes deverá cumprir mais da metade da pena pelo menos para poder postular o livramento b Comportamento satisfatório durante a execução a previsão anterior Código Penal de 1940 exigia que o recluso tivesse boa conduta carcerária como se isso fosse uma tarefa fácil no ambiente deletério da prisão O bom comportamento com efeito parecia exigir conduta irrepreensível a inadmitir qualquer erro ou falta disciplinar A conduta satisfatória reduz tal exigência mas abrange todo o tempo da execução penal e não somente o período de encarceramento b1 Abrangência do comportamento satisfatório A nova previsão legal é mais realista e ao mesmo tempo mais abrangente pois se preocupa com o comportamento do apenado dentro e fora do cárcere ou seja preocupase com seu comportamento no trabalho externo na frequência a cursos de instrução e profissionalizantes com os períodos de permissões de saídas e saídas temporárias com o regime aberto etc Enfim preocupase não apenas com a conduta carcerária mas com toda a execução da pena que hoje implica maior contato com o mundo exterior ampliando o universo de observação da postura do futuro beneficiado c Bom desempenho no trabalho este requisito inexistente no Código Penal de 1940 preocupase com o desenvolvimento da capacidade do indivíduo de autogerirse aptidão que lhe será indispensável na vida livre Ao referirse a trabalho que lhe foi atribuído fica claro que não se trata apenas das atividades laborais desenvolvidas no interior do cárcere mas também se refere ao trabalho efetuado fora da prisão como por exemplo o serviço externo tanto na iniciativa privada como na pública c1 Desnecessidade de emprego fixo A lei não determina que o apenado deve ter emprego assegurado no momento da liberação O que a lei exige é a aptidão isto é a disposição a habilidade a inclinação do condenado para viver à custa de seu próprio e honesto esforço Em suma de um trabalho honesto Tanto isso é verdade que a lei estabelece como uma das condições obrigatórias do livramento obter ocupação lícita dentro de prazo razoável se for apto para o trabalho art 132 1º a da LEP c2 Prazo razoável para ocupação lícita Constatase pois que além de não exigir a existência de emprego imediato também não fixa prazo determinado para a obtenção de ocupação lícita Fala apenas em prazo razoável e nem poderia ser diferente Mas o que se deverá entender por prazo razoável para conseguir emprego em um país com tantos desempregados Que prazo será razoável em uma sociedade cheia de preconceitos com os estigmatizados pela prisão onde os homens sem tal estigma passam meses sem conseguir um emprego Como exigir que o egresso consiga em exíguo tempo o que milhares de pessoas passam a vida toda sem conseguir Evidentemente que o bom senso deverá prevalecer aliás o próprio legislador foi suficientemente sensato ao não fixar prazo para essa finalidade preferindo adotar um prazo razoável como condição para justificar a vida em liberdade c3 Demonstração da efetiva procura de trabalho Entendemos que cada caso deve ser examinado de acordo com as circunstâncias gerais que o cercam Parecenos que deve ser considerada a demonstração da efetiva procura de trabalho com a comprovação das reais tentativas efetuadas enfim a comprovação de que se não conseguiu emprego não foi por sua má vontade ou simples desinteresse em conseguilo d Aptidão para prover à própria subsistência com trabalho honesto este requisito é consequência natural e direta do anterior Da avaliação do desenvolvimento obtido no trabalho durante a fase de execução se pode chegar a conclusões sobre as reais condições do sentenciado para prover a sua subsistência e de sua família mediante atividade lícita Este requisito será calcado em observações reais Será produto da avaliação do desempenho efetivo do recluso nas tarefas que lhe forem atribuídas dentro e fora da prisão as quais devem guardar direta relação com as condições e aptidões do sentenciado art 34 2º do CP 23 Requisito específico A eliminação da medida de segurança para os imputáveis e os fronteiriços não deixou a ordem jurídica desprotegida Essa preocupação está consagrada no parágrafo único do art 83 do Código Penal A precaução destinase aos autores dos chamados crimes violentos e como afirma a Exposição de Motivos tal exigência é mais uma consequência necessária da extinção da medida de segurança para o imputável item 74 231 Possibilidade de exame pericial O texto em sua redação original determinava que a constatação da situação pessoal do apenado deveria obrigatoriamente efetuarse mediante exame pericial como deixa claro a Exposição de Motivos no item 73 Determinada corrente entende que com a supressão do texto legal da exigência do exame pericial este não pode mais ser realizado pretendendo que o juiz forme sua convicção com base nos elementos que o processo de execução oferecer como se a realização de tal exame viesse em prejuízo do liberando 232 Intolerável restrição à prova Em matéria criminal não se admitem as restrições à prova admitidas no Direito Civil com exceção do estado das pessoas art 155 do CPP O processo penal brasileiro confere ao juiz a faculdade de iniciativa de provas complementares e supletivas autorizandolhe a de ofício determinar a realização daquelas que considerar indispensáveis para o esclarecimento de pontos relevantes Seria um verdadeiro absurdo obrigarse o juiz a incorrer em provável erro por proibilo de utilizar meio de prova moralmente legítimo e disponível como é o caso de um exame pericial J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A As novas disposições não sujeitam o apenado ao exame criminológico para obtenção do livramento condicional no entanto se feito este mostrandose favorável cumprido está o requisito subjetivo para obtenção do benefício A fuga ocorrida anteriormente não pode impedir o benefício se depois disso durante considerável espaço de tempo o apenado mostrou bom comportamento carcerário sob pena de sujeitálo ao regime integralmente fechado que não mais subsiste e a que o paciente nunca esteve sujeito STJ HC 93426RJ Rel Jane Silva j 262 2008 O art 83 I do CPB exige para fins de obtenção do benefício do livramento condicional o cumprimento de mais de um terço da pena total imposta ao sentenciado Assim ofende o princípio da legalidade a decisão que determina a interrupção do prazo para a aquisição da referida benesse uma vez que acaba por criar requisito objetivo não previsto em lei STJ HC 85426SP Rel Min Napoleão Nunes Maia Filho j 13122007 A perpetração de três fugas pode constituir falta grave suficiente a impedir o livramento condicional por ausência do requisito subjetivo STJ HC 71084BA Rel Min Maria Thereza de Assis Moura j 13112007 Nos termos do art 83 do Código Penal a concessão de livramento condicional implica na análise dos requisitos objetivos e subjetivos pelo Juízo da Execução não sendo possível a concessão do benefício para os apenados com comportamento carcerário desfavorável STJ HC 68212SP Rel Min Laurita Vaz j 25102007 Nos termos do art 83 V do Código Penal em se tratando de crime hediondo a concessão do livramento condicional requer o cumprimento de mais de dois terços da pena entendimento que não se modifica com a declaração de inconstitucionalidade do 1º do art 2º da Lei 807290 pelo Supremo Tribunal Federal na medida em que o benefício da progressão de regime não se confunde com o do livramento condicional permanecendo este regido pelo referido dispositivo do Código Penal STJ HC 67528SP Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 622007 Ao condenado primário com maus antecedentes incide o inciso I do art 83 do Código Penal razão pela qual sobressai o direito do paciente ao livramento condicional simples exigindose além dos requisitos objetivos e subjetivos o cumprimento de 13 da pena Precedentes STJ HC 57300SP Rel Min Gilson Dipp j 5122006 O art 83 inciso III do CP não exige que o apenado se encontre efetivamente empregado para a concessão do livramento condicional mas apenas a aptidão para prover à própria subsistência mediante trabalho honesto In casu restou demonstrado inclusive que o paciente possui proposta de emprego STJ HC 47492SP Rel Min Félix Fischer j 1º62006 A concessão do benefício do livramento condicional à luz do art 83 do Código Penal depende da satisfação de requisitos objetivos e subjetivos a serem aferidos pelo Juízo da execução da pena Ausente um dos requisitos objetivos qual seja o cumprimento de dois terços da reprimenda não há falar em constrangimento ilegal no indeferimento do benefício do livramento condicional para o condenado por crime hediondo STJ RHC 18551SP Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 1852006 Os crimes de estupro e atentado violento ao pudor quando cometidos em sua forma simples ou com violência presumida enquadramse na definição legal de crimes hediondos recebendo essa qualificação ainda quando deles não resulte lesão corporal de natureza grave ou morte da vítima Precedentes do STF e do STJ Para fins de concessão do benefício do livramento condicional deve ser atendido o requisito objetivo exigido pelo art 83 inciso V do Código Penal qual seja o cumprimento de mais de 23 dois terços da pena o que não se verifica na espécie STJ HC 51368RS Rel Min Gilson Dipp j 1842006 O tráfico ilícito cometido em 1986 não pode para efeitos de reincidência específica ser considerado hediondo Dessa forma o paciente faz jus ao livramento condicional uma vez que dentre os dois crimes apenas o segundo era definido como hediondo à época em que praticado isto é na vigência da Lei n 807290 Não se configura portanto a reincidência específica de que trata o art 83 V do CP óbice à concessão do benefício STJ HC 20283RJ Rel Min Jorge Scartezzini j 1642002 Soma de penas Art 84 As penas que correspondem a infrações diversas devem somarse para efeito do livramento V art 75 do CP V arts 111 e 118 II da Lei n 721084 Lei de Execução Penal D O U T R I N A 1 Soma de penas A soma de penas é permitida para atingir esse limite mínimo mesmo que tenham sido aplicadas em processos distintos A soma de penas para fins de livramento condicional que era uma faculdade concedida pelo art 60 parágrafo único do Código Penal de l940 com a redação da Lei n 64l677 foi transformada em dever aliás mantido pela reforma penal de 1984 J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 715 do STF A pena unificada para atender ao limite de trinta anos de cumprimento determinado pelo art 75 do Código Penal não é considerada para a concessão de outros benefícios como o livramento condicional ou regime mais favorável de execução Livramento condicional Art 84 do CP O critério correto referendado pela doutrina para a análise do implemento do requisito temporal visando à obtenção de novo livramento condicional é a soma do restante da pena que vinha sendo cumprida com o total do quantum imposto pela segunda condenação tendose como ponto de partida a data em que houve a prisão por essa condenação posterior TJRS Agravo em Execução 70010794618 Rel José Antônio Hirt Preiss j 1442005 Em concorrendo condenações por crime hediondo ou equiparado e delitos outros de natureza diversa o requisito do tempo de cumprimento de pena necessário à obtenção do livramento condicional deve ser aferido a partir da soma das penas privativas de liberdade com exclusão dos 23 dois terços de que cuida o inciso V do art 83 do Código Penal em não se tratando de reincidente específico STJ HC 28140RO Rel Min Hamilton Carvalhido j 16112004 As penas que correspondem a infrações diversas devem somarse para fins de livramento condicional Incidência do requisito de 13 sobre o total das penas na hipótese em específico permitindose o benefício STJ HC 23867RO Rel Min Gilson Dipp j 17122002 Especificações das condições Art 85 A sentença especificará as condições a que fica subordinado o livramento V art 132 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal D O U T R I N A 1 Condições do livramento condicional O livramento condicional é concedido sob condições que serão especificadas na sentença Essas condições que são reguladas pela LEP devem ser fixadas pelo juiz da execução que deferir o livramento condicional As condições podem ser de aplicação obrigatória art 132 1º da LEP ou facultativa art 132 2º da LEP 11 Condições de imposição obrigatória São condições de imposição obrigatória a obter ocupação lícita em tempo razoável se for apto para o trabalho b comunicar ao juiz periodicamente sua ocupação c não mudar da comarca sem autorização judicial art 132 1º da LEP a Obter ocupação lícita dentro de prazo razoável O liberado deve no menor tempo possível obter ocupação lícita e informálo aos órgãos de execução Utilizado durante a privação de liberdade o trabalho prossegue como um elo capaz de facilitar a identificação do apenado com o novo status libertatis que este começa a experimentar As entidades assistenciais deverão prestar apoio ao egresso na difícil tarefa de conseguir trabalho honesto a1 Condenado inapto para o trabalho A Lei de Execução Penal teve o cuidado de preocuparse com a condição física e orgânica do liberado ressalvando a hipótese de este não ser apto para o trabalho art 132 1º O Código Penal não previu essa possibilidade Porém à evidência as normas não são colidentes e a previsão da Lei de Execução Penal tem aplicação assegurada Isso quer dizer que a eventual deficiência física do apenado que o torne inapto para o trabalho por si só não impedirá a obtenção do livramento condicional b Comunicar ao juiz periodicamente sua ocupação Esta condição complementa a anterior O livramento condicional em verdade é uma espécie de liberdade vigiada Além da vigilância e proteção cautelar das entidades próprias patronato assistência social e conselho da comunidade necessita do acompanhamento discreto do juiz das execuções que observará se o liberado continua a exercer regularmente a ocupação que obteve e as eventuais dificuldades encontradas A continuidade no exercício da mesma atividade já é uma boa demonstração de adaptação à nova realidade b1 Periodicidade da comunicação O juiz das execuções deve fixar o prazo máximo possível de intervalo para essas comunicações periódicas de forma a não prejudicar a relação empregatícia do egresso art 26 II da LEP e ao mesmo tempo poder fazer o acompanhamento efetivo da sua evolução c Não mudar do território da comarca sem prévia autorização judicial Embora não se trate de exílio local esta determinação tem a finalidade de limitar o espaço territorial do sentenciado facilitando seu acompanhamento O que se proíbe é apenas a transferência de residência sem prévia autorização do juiz da execução da pena o que quer dizer que nada impede que nos dias de folga feriados e fins de semana o liberado possa fazer algumas incursões por outras comarcas Tampouco se tolhe o direito daquele de buscar melhores condições de vida em outras localidades A possibilidade de trocar de ares reiniciar a vida em outras paragens continua a existir Apenas está condicionada a autorização prévia do juiz da execução Isso quer dizer embora a lei não o diga expressamente que o liberado deve solicitar autorização judicial fundamentando o pedido com a demonstração das eventuais vantagens que terá nessa mudança de domicílio c1 Transferência de jurisdição autorizada Nessa hipótese se for autorizado ao egresso residir fora da jurisdição do juízo da execução deverá ser remetida cópia ao juiz do lugar bem como às autoridades que se incumbirem da observação cautelar e proteção art 133 da LEP Perante esse juízo deverá prestar contas do cumprimento das condições impostas devendo o liberado ser cientificado dessa obrigação 12 Condições de imposição facultativa Além das condições ditas obrigatórias a lei prevê a possibilidade de aplicação de outras condições chamadas judiciais porque são eleitas pelo juiz e têm caráter facultativo A facultatividade dessas condições referese à sua imposição e não ao seu cumprimento pois o egresso para receber o livramento condicional assume o compromisso de cumprilas todas rigorosamente art 137 III da LEP Entre essas condições a Lei de Execução Penal exemplifica com as seguintes a não mudar de residência sem comunicar ao juiz e às autoridades incumbidas da observação e proteção cautelar b recolherse à habitação em hora fixada c não frequentar determinados lugares d abstenção de práticas delituais Essas são contudo algumas das condições possíveis de serem aplicadas mas não as únicas Nada impede que se estabeleçam outras desde que naturalmente sejam adequadas ao fato delituoso e especialmente à personalidade do agente a Não mudar de residência sem comunicar ao juiz e às autoridades incumbidas da observação e proteção cautelar Esta condição é diferente daquela que exige prévia autorização do juiz para residir fora do território da comarca Esta trata da mudança de residência dentro da própria comarca e não depende de prévia autorização judicial é suficiente que o liberado informe ao juiz e órgãos assistenciais o seu novo domicílio Essa nova formalidade prendese à necessidade de os órgãos de execução tornarem efetiva a assistência e fiscalização que lhes foi incumbida e para isso é indispensável conhecer o domicílio do apenado b Recolherse à habitação em hora fixada Esta obrigação somente deve ser imposta como complemento de garantia de determinados sentenciados e em relação a certos delitos Mais do que nunca se deve atender à personalidade do liberado bem como sua saúde e condição física A finalidade básica desta condição é evitar que certos egressos frequentem ambientes pouco recomendáveis e desfrutem de más companhias o que poderia facilitar a reincidência c Não frequentar determinados lugares A imaginação a perspicácia e a sabedoria do magistrado deverão sugerir em casos específicos os locais que determinados apenados não deverão frequentar Geralmente são lugares constituídos de casas de tavolagem e mulheres profissionais determinadas reuniões ou espetáculos ou diversões públicas noturnas onde as companhias e o álcool são fortes estimulantes para romper a fronteira do permitido e podem prejudicar a moral a integração social e o aprendizado éticosocial Porém jamais se deverá proibir a participação generalizada em diversões espetáculos e reuniões pois o ser humano necessita dessa convivência e muitas delas têm inclusive caráter educativo sendo capazes de elevar e enobrecer o espírito do ser humano d Abstenção de práticas delituais Embora o Código Penal e a Lei de Execução Penal não estabeleçam como condição do livramento absterse de delinquir e tampouco relacionem a prática de delitos como causa de revogação quer obrigatória quer facultativa entendemos que o juiz pode e deve estabelecer como condição judicial a abstenção de práticas delituais Não há qualquer impedimento legal quanto à aplicação de tal condição de extraordinária importância prevencionista que descumprida será apenas causa de revogação facultativa e que atualmente constitui a condição fundamental do livramento nas modernas legislações Angel Sola Dueñas et alii Alternativas a la prisión Barcelona PPU p 901 Caso contrário o liberado que praticar crime não correrá nenhum risco de ver seu benefício revogado e só excepcionalmente poderá ter seu exercício suspenso quando aguardará a decisão final art 145 da LEP 13 Possibilidade de modificação das condições As condições judiciais podem ser modificadas no transcorrer do livramento visando sempre atender aos fins da pena e à situação do condenado art 144 da LEP 14 Necessidade de aceitação das condições impostas A eventual não aceitação das condições impostas ou alteradas torna sem efeito o livramento condicional devendo a pena ser cumprida normalmente J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Roubo qualificado Prestação de serviços Condição do livramento condicional Possibilidade Sendo a prestação de serviços à comunidade imposta ao ora paciente capaz de contribuir para o fim da execução penal e para a reintegração social deste não há qualquer ilegalidade em sua exigência como condição para o livramento condicional STJ HC 27984SP Rel Min Jorge Scartezzini j 172 2004 Revogação do livramento Art 86 Revogase o livramento se o liberado vem a ser condenado a pena privativa de liberdade em sentença irrecorrível V arts 140 a 145 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal I por crime cometido durante a vigência do benefício II por crime anterior observado o disposto no art 84 deste Código D O U T R I N A 1 Causas de revogação do livramento condicional Para que a imposição de condições não se tornasse inócua era indispensável que fossem dotadas de coercibilidade o descumprimento destas pode levar à revogação da liberdade conquistada Além do descumprimento das condições legais ou judiciais existem outras causas que se ocorrerem revogarão obrigatoriamente o livramento Nas hipóteses de revogação facultativa o liberado deve ser ouvido antes da revogação 11 Causas de revogação obrigatória São as seguintes a condenação irrecorrível por crime cometido durante a vigência do livramento condicional b condenação por crime cometido antes da vigência do livramento condicional a Condenação irrecorrível por crime cometido durante a vigência do livramento condicional Não basta a prática de crime nem mesmo a instauração de processo mas somente a decisão condenatória irrecorrível tem o condão de revogar a liberdade condicional obrigatoriamente Por outro lado cumpre observar que somente a condenação à pena privativa de liberdade ou seja reclusão ou detenção levará a essa revogação algo inocorrente com as demais penas multa e restritiva de direitos b Condenação por crime cometido antes da vigência do livramento condicional A outra hipótese de revogação obrigatória é a condenação irrecorrível decorrente de crime praticado antes do início do livramento É possível que a ação penal de um crime anteriormente praticado só atinja a decisão final irrecorrível quando o seu autor já se encontre em liberdade condicional por outra condenação b1 Fato anterior e soma de penas Quando a condenação é por fato anterior ao benefício não há recaída no delito tampouco revelação de desadaptação à liberdade condicional Por isso o legislador foi mais complacente com essa hipótese admitindo a soma de penas da nova condenação com a anterior Se o liberado tiver cumprido quantidade de pena que perfaça o mínimo exigido no total das penas incluído o período em que esteve solto continuará em liberdade condicional ou então regressará à prisão e assim que completar o tempo poderá voltar à liberdade condicional b2 Soma da totalidade das penas As somas das penas ao contrário do que pensam alguns doutrinadores deve ser da totalidade das penas aplicadas O art 84 do Código Penal não faz qualquer referência a restante de pena como imaginam referidos penalistas e não cabe ao intérprete restringir onde a lei não restringe Em realidade a nova pena deve ser somada à que estava sendo cumprida mas em suas totalidades E se o tempo de pena cumprido convalidar a concessão do livramento a revogação não se operará Não pode ser outra a interpretação da redação do dispositivo citado que aliás já constava do Código de Processo Penal de 1942 J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A O cometimento de nova infração durante o período do livramento condicional importa na prorrogação do período de prova mediante suspensão do benefício que será finalmente revogado na hipótese de sentença condenatória STJ REsp 821550RS Rel Min Carlos Fernando Mathias j 9102007 Revogação após o término do período de prova Inexistência de suspensão cautelar Impossibilidade Não tendo sido suspenso por medida cautelar o livramento condicional durante o período de prova correta a decisão que declarou a extinção da pena imposta não se mostrando possível a revogação do benefício a teor do que disciplinam os arts 90 do Código Penal e 145 da Lei de Execuções Penais A circunstância de ter o paciente sido preso em flagrante não suspende automaticamente o benefício tendo em conta a inexistência de expressa previsão legal além do que cumpre ao Estado aparelhar seu sistema de execução de penas objetivando em tempo hábil a suspensão do benefício sempre se valendo do mecanismo do art 732 do Código de Processo Penal STJ HC 53572RJ Rel Min Hamilton Carvalhido j 18122006 Não obstante ser obrigatória a revogação do livramento condicional na hipótese de condenação irrecorrível à pena privativa de liberdade por crime cometido durante a sua vigência fazse mister a suspensão cautelar do benefício STJ RHC 19415RJ Rel Min Gilson Dipp j 1582006 Revogação facultativa Art 87 O juiz poderá também revogar o livramento se o liberado deixar de cumprir qualquer das obrigações constantes da sentença ou for irrecorrivelmente condenado por crime ou contravenção a pena que não seja privativa de liberdade V arts 132 e 140 parágrafo único da Lei n 721084 Lei de Execução Penal D O U T R I N A 1 Causas de revogação facultativa Ocorrendo uma das causas facultativas o juiz poderá em vez de revogar advertir o liberado ou então agravar as condições do livramento A gravidade da causa ocorrida a situação penal do apenado e as consequências de seu comportamento é que orientarão o magistrado sobre a decisão a tomar Essas causas são duas 1 deixar de cumprir qualquer das obrigações constantes da sentença 2 condenação irrecorrível por crime ou contravenção a pena não privativa de liberdade a Integram a primeira causa facultativa São aquelas condições obrigatórias contidas no art 132 1º da Lei de Execução Penal ditas legais e as facultativas previstas no 2º do mesmo artigo ditas judiciais todas já examinadas b Condenação irrecorrível por crime ou contravenção A segunda causa de revogação facultativa referese à condenação por crime ou contravenção a pena que não seja privativa de liberdade Para esta hipótese é indiferente que a prática do crime ou da contravenção que deu origem à nova condenação tenha ocorrido antes ou durante a vigência do livramento Contudo a prática de nova infração penal ainda que de natureza menos grave indica a ausência de recuperação e pode aconselhar teoricamente a revogação do benefício 11 Questões diversas a Contravenção condenação a pena de prisão O legislador de 1984 incorreu em evidente esquecimento ao não mencionar a condenação por contravenção a pena privativa de liberdade como causa de revogação facultativa É notório o esquecimento especialmente quando se constata que contravenção punida com pena restritiva de direitos e multa foi arrolada como causa de facultativa revogação b Condenação sem substituição e sem sursis Se o apenado sofrer pena privativa de liberdade sem substituição ou suspensão terá de cumprila E essa obrigação por si só inviabiliza o livramento condicional pela impossibilidade de cumprimento das condições impostas É impossível cumprir duas penas ao mesmo tempo ainda que uma seja fora da prisão Essa interpretação é confortada pelo disposto no art 76 do Código Penal que determina que em caso de concurso de infrações deve ser cumprida em primeiro lugar a pena mais grave c Exceção para cumprimento simultâneo de penas A única exceção prevista para cumprimento simultâneo de duas penas é o caso de penas restritivas de direitos quando forem compatíveis entre si art 69 2º do CP d Repercussão social de nova condenação O apenado que encontrandose em regime de livramento condicional comete novo delito comprova que não está em condições de usufruir desse excepcional estágio de uma nova política criminal A repercussão negativa pela prática de crime durante o período de prova assume dimensões alarmantes e coloca em xeque o próprio sistema perante a opinião pública que de regra é alimentada por manchetes escandalosas veiculadas por uma imprensa sensacionalista 2 Suspensão do livramento condicional Embora nosso ordenamento jurídico preveja a revogação somente quando houver condenação irrecorrível admite contudo a suspensão do exercício do livramento art 145 da LEP Essa suspensão não se confunde com a revogação porque esta é definitiva e aquela é provisória e ficará no aguardo da decisão final sobre o novo crime que se for condenatória aí sim determinará a obrigatória revogação do benefício 21 Novo crime e extinção do período de prova Se houver a prática de crime durante o livramento ainda que tenha havido a suspensão deste com a prisão preventiva do liberado se o período de prova se extinguir antes que se tenha iniciado a ação penal não será possível prorrogar o livramento condicional O apenado terá de ser posto em liberdade imediatamente e a pena estará extinta porque decorreu todo o período de prova sem causa para sua revogação Só haverá a prorrogação do período de prova se o liberado estiver respondendo a processo art 89 22 Condição judicial de não delinquir Viuse a grande importância da distinção entre a simples suspensão e a revogação propriamente dita Por isso defendemos a possibilidade de o juiz fixar como condição judicial a obrigação de não delinquir Como condição judicial seria causa de revogação facultativa Assim o juiz nas circunstâncias com a tradicional e discricionária prudência decidiria no caso concreto se deveria ou não revogar a liberdade condicional J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Livramento condicional Descumprimento das condições impostas Revogação pelo juiz Possibilidade Precedente do Supremo Tribunal Federal Comparecendo espontaneamente o liberado para justificar o descumprimento de obrigação imposta CP art 87 temse por atendida a exigência de prévia audiência inscrita no art 143 da Lei 721084 desmerecendo guarida a arguição de nulidade da decisão por suposta desatenção ao princípio constitucional do contraditório e da ampla defesa que na dicção de Manoel Gonçalves Ferreira Filho exige que em cada passo do processo cada parte tenha a oportunidade de apresentar suas razões O juiz pode decretar de ofício a revogação do livramento condicional quando descumpridas as condições impostas ao réu arts 727 e 730 do CPP condicionada a sua decisão à oitiva prévia do próprio réu e por nada mais STF TJPR HC 03328976 Rel Mendes Silva j 1152006 Homicídio simples e lesão corporal simples Livramento condicional Descumprimento de condição Revogação facultativa Oitiva do réu Para a revogação do livramento condicional pelo descumprimento de condições ao réu impostas é imprescindível quando possível a prévia inquirição deste possibilitando se assim o contraditório e a ampla defesa Precedentes do STJ STJ HC 17228PI Rel Min Félix Fischer j 782001 Efeitos da revogação Art 88 Revogado o livramento não poderá ser novamente concedido e salvo quando a revogação resulta de condenação por outro crime anterior àquele benefício não se desconta na pena o tempo em que esteve solto o condenado D O U T R I N A 1 Efeitos de nova condenação Podemos dividir as causas revogatórias nas seguintes a condenação irrecorrível por crime praticado antes do livramento b condenação irrecorrível por crime praticado durante o livramento condicional c descumprimento das condições impostas d condenação por contravenção a Condenação irrecorrível por crime praticado antes do livramento condicional Nesta hipótese o sentenciado não concorreu durante o livramento para criar a situação que leva à revogação do benefício A revogação ocorre por circunstâncias alheias ao seu procedimento e ao uso que fez da liberdade provisionalmente conquistada Por isso recebe tratamento excepcional a terá direito à obtenção de novo livramento mesmo em relação à pena que estava cumprindo b as duas penas podem ser somadas para efeito de obtenção de novo livramento c o tempo em que esteve em liberdade condicional é computado como de pena efetivamente cumprida b Condenação irrecorrível por crime praticado durante a vigência do livramento Esta hipótese é o resultado do fracasso da tentativa de possibilitar ao apenado o retorno antecipado ao convívio social Neste caso os efeitos são mais drásticos e nem poderia ser diferente a impossibilidade de concessão de novo livramento em relação à mesma pena Evidentemente que em relação à nova condenação se for superior a dois anos e após preencher todos os requisitos poderá obter outra vez a liberdade antecipada Contudo a primeira pena isto é a anterior terá de cumprila integralmente e esse tempo não se somará à nova pena para a obtenção de novo benefício b não se computa o tempo em que esteve solto em liberdade condicional como de pena efetivamente cumprida c Descumprimento das condições impostas na sentença Nesta hipótese só haverá uma pena a que estava sendo cumprida e que fora suspensa A rebeldia do apenado obrigáloá a cumprila integralmente pois não poderá obter novo livramento em relação a essa pena e também não será considerado o tempo em que esteve submetido à prova art 142 da LEP d Condenação por contravenção penal Esta situação que também poderá levar à revogação do livramento art 87 do CP terá os mesmos efeitos que a revogação decorrente do descumprimento das condições não será computado o tempo em que esteve solto e não poderá obter novo livramento em relação à mesma pena 11 Fundamento político da revogação De todos os efeitos o mais grave sem dúvida é a impossibilidade de voltar a beneficiarse com um novo livramento em relação à mesma pena A verdade é que com a prática de crime durante o período de prova ou o descumprimento das condições impostas o liberado deixa de corresponder à expectativa que a sociedade alimentava ao anteciparlhe a liberdade Se o sujeito censuravelmente deu causa à perda de sua liberdade não mais se lhe pode restituir tal condição sob pena de intolerável renúncia ao dever de punir que é inerente ao Estado Se voltou a delinquir perdeu a oportunidade que lhe fora concedida de livrarse solto da pena e demonstrou que sua recuperação não havia sido atingida J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Ocorrendo a revogação do livramento condicional por condenação relativa a crime cometido em data anterior a sua concessão o período que o apenado permaneceu em liberdade deve ser computado como tempo de cumprimento da pena nos termos dos arts 88 do Código Penal e 141 da Lei de Execuções Penais Para o cumprimento da pena restante o regime deve ser fixado com a observância da regra contida no art 118 II da Lei 721084 segundo a qual sobrevindo nova condenação por crime cometido em data anterior à concessão do benefício o parâmetro para a fixação do regime é estabelecido pela soma da pena por esse crime com o restante da pena em execução TJRS Agravo em Execução 70020681672 Rel Marco Antônio Ribeiro de Oliveira j 3102007 Não há previsão legislativa para outros efeitos da revogação do livramento condicional além daqueles previstos no art 88 do Código Penal e no art 142 da Lei n 721084 impossibilidade de nova concessão do benefício e do desconto na pena do período em que esteve solto o apenado STJ HC 44414RJ Rel Min Nilson Naves j 3052006 Revogado o benefício do livramento condicional antes de expirado o período de prova e após o trânsito em julgado da última condenação não há falar em ilegalidade da decisão que determinou a realização de novo cálculo da pena na forma do art 88 do Código Penal STJ HC 43337RJ Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 642006 Extinção Art 89 O juiz não poderá declarar extinta a pena enquanto não passar em julgado a sentença em processo a que responde o liberado por crime cometido na vigência do livramento V arts 145 e 146 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal Art 90 Se até o seu término o livramento não é revogado considerase extinta a pena privativa de liberdade V art 146 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal D O U T R I N A 1 Prorrogação do livramento e extinção da pena O art 90 do Código Penal e o art 146 da Lei de Execução Penal afirmam que se até o término do período de provas o livramento condicional não tiver sido revogado considerarseá extinta a pena privativa de liberdade A precisão desses dois dispositivos não impede que se choquem com a nebulosa redação do art 89 do Código Penal que diz in verbis O juiz não poderá declarar extinta a pena enquanto não passar em julgado a sentença em processo a que responde o liberado por crime cometido na vigência do livramento Mas então o que acontecerá com o livramento O ordenamento jurídico não diz nem o Código Penal nem a Lei de Execução Penal 2 Prorrogação do período de prova Os doutrinadores têm sustentado que haverá prorrogação do livramento enquanto estiver correndo processo por crime cometido durante a vigência daquele Esclarecem imediatamente que se prorroga somente o período de provas até decisão final que se for condenatória revogará o livramento As condições impostas afirmam não subsistirão Mas afinal que livramento condicional é esse sem nenhuma condição Em realidade não há prorrogação de livramento algum mas somente do período de prova 3 Crime anterior e extinção do livramento Já em relação a processo por crime ocorrido antes da vigência do livramento a situação é outra As consequências são diferentes Em primeiro lugar como já afirmamos o tempo em que o liberado esteve submetido à prova é considerado como de pena efetivamente cumprida Assim chegando ao término do período de prova deverá ser declarada extinta a pena mesmo que o novo processo continue em andamento pois ainda que haja condenação a pena anterior já estará cumprida Não teria sentido pois prorrogar o período de prova 4 Não prorrogação das condições Enfim a denominada prorrogação do livramento somente poderá ocorrer em casos de processos por crimes praticados durante a vigência do período de prova Tal efeito não se estende à prática de contravenções Por outro lado também não permanecem as condições impostas na sentença quer sejam as legais quer sejam as judiciais 5 Marco da extinção da pena O marco decisivo da extinção da pena é o limite do período de prova e não a data da declaração pelo juiz que não tem natureza constitutiva J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Art 89 Livramento condicional Prisão em flagrante durante o período de prova Término do período sem expressa revogação Automática extinção da punibilidade Inocorrência Se o condenado é preso em flagrante delito durante o período de prova do livramento condicional sem contudo em tal lapso haver a declaração de revogação ou prorrogação não há falarse em automática extinção da punibilidade STJ AgRg no HC 73714RJ Rel Min Paulo Gallotti j 9102007 O cometimento de nova infração durante o período do livramento condicional importa na prorrogação do período de prova mediante suspensão do benefício que será finalmente revogado na hipótese de sentença condenatória STJ REsp 821550RS Rel Min Carlos Fernando Mathias j 9102007 Livramento condicional Período de prova Nova infração Prorrogação do prazo Extinção da pena Impossibilidade Art 89 do CP Crime cometido durante o período de prova consubstancia hipótese legal de revogação obrigatória do livramento condicional razão pela qual a prática desse novo delito enseja a suspensão do benefício e a prorrogação do período de prova O juiz não poderá declarar extinta a pena enquanto não transitar em julgado a sentença proferida no processo atinente ao delito cometido no curso do livramento condicional STJ RHC 17335RJ Rel Min Paulo Medina j 622007 Art 90 Permanecendo inerte o órgão fiscalizador não se pode restringir o direito do réu após o cumprimento integral do benefício restabelecendo situação já vencida pelo decurso de tempo Incidência do disposto no art 90 do Código Penal Ordem concedida para declarar extinta a pena do paciente STJ HC 83613RJ Rel Jane Silva j 2592007 Expirado o prazo do livramento condicional sem suspensão ou prorrogação art 90 do CP a pena é automaticamente extinta sendo flagrantemente ilegal a sua revogação posterior ante a constatação do cometimento de delito durante o período de prova Precedentes desta Corte e do Pretório Excelso STJ HC 77250SP Rel Min Félix Fischer j 2862007 Decorrido o período de prova sem que o magistrado tenha revogado expressamente o livramento condicional fica extinta a pena privativa de liberdade STF HC 88610RJ Rel Min Ricardo Lewandowski j 562007 Vencido o período de prova do livramento condicional sem anotações de eventuais embaraços a declaração da extinção da pena era de ser consequência imperiosa da decisão do juízo executório não lhe permitindo a possibilidade de retroação ao tempo do cumprimento para revogar o benefício tendo em vista a definitiva condenação em crime praticado naquele momento e só depois percebido Inteligência do art 90 do Código Penal Precedentes In casu o réu cometeu nova infração três dias antes do término do período de prova sendo este suspenso vários meses depois e revogado passados alguns anos STJ RHC 14852RJ Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 2362004 Capítulo VI Dos Efeitos da Condenação Efeitos genéricos e específicos Art 91 São efeitos da condenação I tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime V art 5º XLV da CF V arts 63 a 68 119 140 336 e 387 do CPP V arts 186 932 e 935 do CC V art 584 II do CPC V Súmulas 246 e 560 do STF V Súmulas 92 e 249 do TFR II a perda em favor da União ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boafé V art 5º XLV e XLVI b da CF V arts 118 a 124 do CPP V arts 18 24 e 25 do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais a dos instrumentos do crime desde que consistam em coisas cujo fabrico alienação uso porte ou detenção constitua fato ilícito V art 6º II do CPP b do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso V art 6º II do CPP D O U T R I N A 1 Efeitos gerais A sanção penal pena e medida é a consequência jurídica direta e imediata da sentença penal condenatória No entanto além dessa consequência a sentença condenatória produz outros tantos efeitos ditos secundários de natureza penal e extrapenal Os de natureza penal estão insertos em diversos dispositivos do próprio Código Penal do Código de Processo Penal e da Lei de Execução Penal Os de natureza extrapenal encontramse elencados nos arts 91 e 92 do CP e são denominados efeitos genéricos art 91 e efeitos específicos art 92 da condenação que a seguir serão examinados 2 Finalidade dos efeitos da condenação Os efeitos específicos da condenação em suas três versões objetivam afastar o condenado da situação criminógena impedindo que se oportunizem as condições que provavelmente poderiam levá lo à reincidência reforça a proteção dos bens jurídicos violados e previne a reiteração da conduta delituosa 3 Efeitos genéricos O efeitos genéricos são automáticos sendo desnecessária sua determinação expressa na sentença operandose ope legis São os seguintes I tornar certa a obrigação de indenizar a sentença penal condenatória faz coisa julgada no cível valendo como título executivo nos termos do art 475N II do CPC cuja liquidação far seá na esfera cível II perda em favor da união dos instrumentos e produtos do crime confisco é a perda ou privação de bens do particular em favor do Estado Declarada procedente a ação penal surge a perda em favor da União dos instrumenta et producta sceleris como efeito automático da condenação que se aplica também aos crimes culposos pois nosso Código não faz qualquer restrição nesse sentido 4 Independência das jurisdições A vítima ou seus sucessores não estão obrigados a aguardar o desfecho da ação penal podendo buscar o ressarcimento do dano mediante ação própria no juízo cível art 1525 do CC 5 Transmitese até os limites da herança Como não se trata de pena criminal mas de efeito da condenação a obrigação de indenizar transmitese aos herdeiros do delinquente até os limites da herança 6 Limites subjetivos da coisa julgada A sentença condenatória só pode ser executada no juízo cível contra quem foi réu na ação criminal Para acionar o responsável civil que não tenha sido réu na ação penal será necessária a ação cível específica servindo a condenação penal apenas como elemento de prova e não como título executivo 61 Legitimidade do Ministério Público Tratandose de ofendido pobre o Ministério Público tem legitimidade para postular a reparação ex delicto 7 Extinção da punibilidade e reparação do dano A ocorrência da prescrição ou de qualquer outra causa extintiva da punibilidade não afasta a obrigação de reparar o dano 71 Prescrição da pretensão punitiva Decisão condenatória atingida por ela não pode ser executada no cível TACrimSP JTACrimSP 99377 72 Absolvição criminal e ação reparatória A sentença penal absolutória não impede a propositura da competente ação indenizatória no juízo cível a menos que o fundamento da absolvição seja o reconhecimento da inexistência material do fato de que o acusado não foi o autor do fato ou de que agiu sob excludente de criminalidade 8 Confisco e contravenção penal Sua aplicação restringese às infrações que constituam crimes sendo inadmissível interpretação extensiva para abranger as contravenções penais 81 Confisco de objetos lícitos A lei determina a apreensão dos instrumentos utilizados na prática do crime art 240 1º d do CPP quaisquer que sejam eles No entanto admite o confisco tão somente daqueles instrumentos cujo fabrico alienação uso porte ou detenção constitua fato ilícito art 91 II a do CP 82 Finalidade do confisco Com o confisco o Estado visa impedir que instrumentos idôneos para delinquir caiam em mãos de certas pessoas ou que o produto do crime enriqueça o patrimônio do delinquente constituindose em medida salutar saneadora e moralizadora 83 Confisco prescrição e sursis O confisco prescreve com a condenação mas não se suspende com a concessão do sursis 84 Confisco lesado e terceiro de boafé O confisco pode recair somente em objeto pertencente a quem participou da prática do delito O lesado e o terceiro de boafé não podem ser prejudicados pelo confisco Mas e se os objetos forem ilícitos mantémse a ressalva Nesta hipótese devese agir prudencialmente É possível que excepcionalmente determinadas pessoas obtenham autorizações especiais para possuir ou utilizar objetos originalmente ilícitos E em havendo permissão especial estará eliminada a natureza ilícita legitimando o afastamento do confisco ex colecionador de armas de guerra J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A O reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva alcança também os demais efeitos automáticos e secundários da sentença condenatória STJ HC 94909CE Rel Jane Silva j 4122007 A perda dos instrumentos e produtos do crime em favor da União é efeito automático da sentença penal condenatória por força do art 91 inc II do Código Penal STJ RMS 11410RO Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 8112007 Perdimento de bens apreendidos Produtos ou instrumentos do crime Efetiva utilização devidamente comprovada Pleito de restituição dos bens Alegação de licitude da origem Análise inviável na via eleita Se a sentença condenatória concluiu no sentido da proveniência ilícita dos bens apreendidos e de sua efetiva utilização para a prática dos crimes declarando assim o seu perdimento como efeito da condenação a modificação dessa conclusão não pode ser satisfeita em sede de habeas corpus via inadequada para se proceder ao exame de questões de prova STJ HC 45323SP Rel Min Gilson Dipp j 2132006 Perdimento de bens Restituição de aeronave utilizada no tráfico de drogas Ausência de prova do domínio do avião A falta de demonstração cristalina da propriedade impede a restituição do bem STJ REsp 647579MS Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 1592005 A ausência de certeza da licitude do dinheiro do ora Recorrente que restou apreendido por ocasião de sua prisão em flagrante pela prática do crime de tráfico de entorpecentes afasta a configuração do seu direito líquido e certo demandando pois necessariamente dilação probatória inadmissível no âmbito do remédio heroico A perda dos instrumentos e produtos do crime em favor da União é efeito automático da condenação art 91 II do Código Penal sendo dispensável sua expressa declaração na sentença condenatória STJ RMS 18053SP Rel Min Laurita Vaz j 1942005 Perda de bens e objetos do crime Art 91 II do Código Penal Prescrição da pretensão punitiva Extinção da punibilidade Efeitos da condenação Manutenção Impossibilidade Extinta a condenação pelo reconhecimento da extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva impossível a manutenção de seus efeitos incluindo a perda de bens STJ REsp 679253DF Rel Min Laurita Vaz j 1242005 Art 92 São também efeitos da condenação V arts 15 III e V e 37 4º da CF I a perda de cargo função pública ou mandato eletivo a quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a 1 um ano nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública b quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a 4 quatro anos nos demais casos Inciso I com redação determinada pela Lei n 9268 de 1º de abril de 1996 V arts 47 I e 93 parágrafo único do CP II a incapacidade para o exercício do pátrio poder tutela ou curatela nos crimes dolosos sujeitos à pena de reclusão cometidos contra filho tutelado ou curatelado V arts 33 e 61 II e do CP V art 1637 parágrafo único do CC III a inabilitação para dirigir veículo quando utilizado como meio para a prática de crime doloso V arts 47 III e 93 parágrafo único do CP Parágrafo único Os efeitos de que trata este artigo não são automáticos devendo ser motivadamente declarados na sentença D O U T R I N A Alteração A Lei n 926896 introduziu as atuais alterações no art 92 I 1 Efeitos específicos Os efeitos específicos da condenação não são automáticos dependem de motivação na sentença e são os seguintes I perda de cargo função pública ou mandato eletivo esta previsão não se destina exclusivamente aos chamados crimes funcionais arts 312 a 347 do CP como ocorria na redação original da Lei n 720984 mas a qualquer crime que um funcionário público cometer A Lei n 926896 afastou a injustificada proteção da impunidade de servidores delinquentes que havia sido consagrada pela reforma penal de 1984 distinguindo duas hipóteses a condenação superior a um ano por crime praticado contra a Administração Pública b condenação superior a quatro anos por qualquer outro crime II incapacidade para o exercício de pátrio poder tutela ou curatela III a inabilitação para dirigir veículo quando utilizado como meio para a prática de crime doloso 11 Crime contra a Administração Pública I a É imprescindível que a infração penal tenha sido praticada com abuso de poder ou violação de dever inerente ao cargo função ou atividade públicas É necessário que o agente de alguma forma tenha violado os deveres que a qualidade ou condição de funcionário público lhe impõe 111 Requisitos necessários I a 1 Pena aplicada igual ou superior a um ano de prisão 2 abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública 3 fundamentação na sentença condenatória art 92 I a 112 Correlação entre crime e atividade exercida A perda deve restringirse somente àquele cargo função ou atividade no exercício do qual praticou o abuso porque a interdição pressupõe que a ação criminosa tenha sido realizada com abuso de poder ou violação de dever que lhe é inerente 113 Reabilitação e reintegração na situação anterior A reabilitação no entanto não permite a reintegração na situação anterior Poderá na verdade habilitarse novamente a exercer atividade pública mas outra não a anterior da qual foi eliminado definitivamente 114 Crimes comuns condenação superior a quatro anos Nos crimes comuns onde não há relação com a Administração Pública somente a condenação superior a quatro anos gera o efeito de perda da função pública Mas também nesta modalidade a perda deverá ser declarada expressamente na sentença condenatória 115 Irretroatividade da nova previsão Nenhuma das duas hipóteses tem aplicação retroativa porque são mais graves do que a previsão anterior 12 Incapacidade para o exercício de pátrio poder tutela ou curatela II Qualquer crime doloso praticado contra filho tutelado ou curatelado sujeito a reclusão poderá acarretar a incapacidade Basta que o crime doloso praticado tenha cominada pena de reclusão ainda que a final a pena aplicada venha a ser de outra natureza 121 Incapacidade presumida A incapacidade ora examinada não exige como requisito o abuso do pátrio poder tutela ou curatela presumindo simplesmente a incompatibilidade para o seu exercício basta que o crime seja o doloso e a pena cominada seja de reclusão 122 Requisitos necessários à inaptidão a Prática de crime doloso sujeito a reclusão contra filho tutelado ou curatelado b incapacidade devidamente motivada na sentença 123 Crimes contra a assistência familiar A exigência da prática de crimes dolosos puníveis com reclusão torna a referida incapacidade inaplicável aos crimes contra a assistência familiar arts 244 a 247 puníveis com detenção com exceção dos previstos no art 245 1º e 2º do CP 124 Incapacidade e reabilitação Embora referida incapacidade seja permanente pode ser eliminada pela reabilitação art 93 parágrafo único No entanto é vedada a reintegração na situação anterior privando o filho tutelado ou curatelado de submeterse à autoridade de antigo desafeto que se revelou inidôneo para exercer aquele múnus 13 Inabilitação para dirigir veículo utilizado em crime doloso III A inabilitação para dirigir veículos não se confunde com a proibição temporária pena restritiva aplicável aos autores de crimes culposos no trânsito art 47 III do CP 131 Penas acessórias em crimes falimentares Havia duas correntes a está revogada pois se tornou inexequível RT 637241 RT 617285 b não está revogada STF RT 639396 STJ REsp 210 DJU 941990 p 2748 São duas questões superadas pois agora o que existem são efeitos penais não automáticos decorrentes da sentença penal condenatória que não se confundem com penas acessórias A nova lei com efeito prescreve art 181 e incisos expressamente tais efeitos que exigem motivação na sentença penal condenatória art 181 1º 132 Efeitos da condenação nos crimes falimentares Esses efeitos são os seguintes I inabilitação para o exercício de atividade empresarial II o impedimento para o exercício de cargo ou função em conselho de administração diretoria ou gerência das sociedades sujeitas a esta Lei III a impossibilidade de gerir empresa por mandato ou por gestão de negócio Referidos efeitos somente podem iniciar após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória podendo perdurar por até cinco anos A reabilitação penal pode reduzir sua durabilidade art 181 1º J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Ao contrário do disposto no art 92 I do Código Penal que exige sejam externados os motivos para a decretação da perda do cargo função ou emprego público a Lei n 945597 em seu 5º do art 1º prevê como efeito extrapenal automático e obrigatório da sentença condenatória a referida penalidade de perda do cargo função ou emprego público Precedente do STJ STJ HC 92247DF Rel Min Laurita Vaz j 18122007 A possibilidade de perda do cargo público não precisa vir prevista na denúncia posto que decorre de previsão legal expressa como efeito da condenação nos termos do art 92 do Código Penal STJ HC 81954PR Rel Min Maria Thereza de Assis Moura j 29112007 Para o reconhecimento do efeito específico da condenação qual seja a perda do cargo público não se faz necessária a exposição exauriente acerca do instituto mas tão somente o registro dos elementos fáticos que autorizam a aplicação do instituto no caso em julgamento STJ HC 74104RS Rel Min Carlos Fernando Mathias j 1192007 A perda do cargo como efeito da condenação exige fundamentação específica art 92 parágrafo único do Código Penal STJ HC 50525MS Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 2982007 Mandado de Segurança Criminal Homicídio qualificado Funcionário Público Pena privativa de liberdade superior a quatro anos Perda do cargo Efeito não automático da condenação A perda do cargo ou função pública efeito extrapenal da condenação previsto no art 92 do Código Penal não tem aplicação automática não cabendo ao juiz da execução alterar substancialmente o título condenatório exequendo para incluir tal sanção TJGO Mandado de Segurança 145841101 Rel Juraci Costa j 472007 Capítulo VII Da Reabilitação Reabilitação Art 93 A reabilitação alcança quaisquer penas aplicadas em sentença definitiva assegurando ao condenado o sigilo dos registros sobre seu processo e condenação V art 5º X da CF V art 202 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal Parágrafo único A reabilitação poderá também atingir os efeitos da condenação previstos no art 92 deste Código vedada reintegração na situação anterior nos casos dos incisos I e II do mesmo artigo D O U T R I N A 1 Efeitos práticos do instituto Não há qualquer vantagem prática considerandose que seu maior efeito é garantir o sigilo sobre a condenação cuja garantia é assegurada imediata e automaticamente pelo art 202 da LEP independentemente de qualquer providência jurisdicional ou administrativa 2 Definição doutrinária Reabilitação é a declaração judicial de que estão cumpridas ou extintas as penas impostas ao sentenciado Essa definição não corresponde aos efeitos que a reabilitação produz destoando dos seus objetivos Na verdade apenas garante o sigilo da condenação e suspende condicionalmente os efeitos secundários específicos da condenação 3 Reiteração do pedido Se a reabilitação for negada poderá ser requerida a qualquer tempo desde que o novo pedido seja instruído com novas provas dos requisitos necessários art 94 parágrafo único J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Esta Corte Superior tem entendido que por analogia ao que dispõe o art 748 do Código do Processo Penal que assegura ao reabilitado o sigilo das condenações criminais anteriores na sua folha de antecedentes devem ser excluídos dos terminais dos Institutos de Identificação Criminal os dados relativos a inquéritos arquivados a processos em que tenha ocorrido a reabilitação do condenado e a absolvições por sentença penal transitada em julgado ou ainda que tenha sido reconhecida a extinção da punibilidade do acusado pela prescrição da pretensão punitiva do Estado Precedentes STJ HC 42582SP Rel Min Félix Fischer j 25102005 Por analogia ao disposto no art 748 do Código de Processo Penal também nos casos de inquéritos arquivados processos em que tenha ocorrido a reabilitação do condenado ou a absolvição por sentença penal transitada em julgado ou que tenha sido reconhecida a extinção da punibilidade do acusado pela prescrição da pretensão punitiva do Estado deve ser preservada a sua intimidade com a retirada das anotações referentes a tais feitos de sua folha de antecedentes penais Precedentes STJ REsp 717746SP Rel Min Gilson Dipp j 1882005 Uma vez decretada a prescrição da pretensão punitiva e inexistindo portanto qualquer condenação resta ausente o interesse processual de se obter a reabilitação criminal STJ REsp 665531SP Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 322005 A lei confere ao condenado reabilitado direito ao sigilo de seus registros criminais que não podem constar de folha de antecedentes ou certidão arts 93 do CP e 748 do CPP O réu absolvido seja qual for o fundamento faz jus ao cancelamento do registro pertinente em sua folha de antecedentes STJ RMS 17774SP Rel Min Paulo Medina j 2652004 Art 94 A reabilitação poderá ser requerida decorridos 2 dois anos do dia em que for extinta de qualquer modo a pena ou terminar sua execução computandose o período de prova da suspensão e o do livramento condicional se não sobrevier revogação desde que o condenado V arts 81 e 82 e 86 a 90 do CP V arts 109 146 163 1º 192 e 193 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal I tenha tido domicílio no País no prazo acima referido II tenha dado durante esse tempo demonstração efetiva e constante de bom comportamento público e privado III tenha ressarcido o dano causado pelo crime ou demonstre a absoluta impossibilidade de o fazer até o dia do pedido ou exiba documento que comprove a renúncia da vítima ou novação da dívida V arts 360 a 367 do CC Parágrafo único Negada a reabilitação poderá ser requerida a qualquer tempo desde que o pedido seja instruído com novos elementos comprobatórios dos requisitos necessários D O U T R I N A 1 Requisitos necessários a Decurso de dois anos a partir da extinção de qualquer modo ou do cumprimento da pena art 94 caput do CP incluise como novidade nesse pressuposto temporal o período de prova do sursis e do livramento condicional Se o período de prova for superior a dois anos será necessário aguardar o seu término visto que o cumprimento da pena constitui a essência desse pressuposto b domicílio no País durante o prazo de carência a lei exige que durante esse período de carência o reabilitando tenha tido domicílio no País c demonstração de bom comportamento público e privado a lei exige efetiva e constante demonstração de bom comportamento público e privado Por isso o bom comportamento deve abranger todo o período que mediar a declaração de reabilitação e não somente os dois anos se aquela for declarada depois de escoado aquele biênio caso contrário o requerente não se encontra faticamente reabilitado d ressarcimento do dano ou comprovação de sua impossibilidade considerando que em regra os condenados são pessoas pobres ressalva a lei desde logo a justa comprovação da impossibilidade de fazêlo bem como a renúncia da vítima ou novação da dívida 2 Reabilitação de reincidente A lei atual não faz distinção entre reincidente e não reincidente mantendo o mesmo prazo de carência 3 Domicílio no País exigência de duvidosa constitucionalidade A importância políticocriminal da exigência de que o reabilitando tenha tido domicílio no País durante os dois anos é de difícil compreensão E a nosso juízo representa uma limitação indevida e desnecessária no ius libertatis do indivíduo que cumprida ou extinta a pena tem o direito de locomoverse por onde como e quando quiser Temos sérias dúvidas quanto à constitucionalidade dessa obrigatoriedade 4 Atualização monetária da reparação Desnecessário dizer que o débito deve ser atualizado na data da efetiva liquidação por tratarse de dívida de valor 5 Reparação do dano nos crimes de sedução Discordamos de alguns autores segundo os quais no crime de sedução em que a vítima casouse com terceiro não há que se exigir a reparação pois ignoram que nos crimes sexuais a honra atingida não se repara com um simples e posterior matrimônio Caso contrário a mulher vítima de sedução não pode casarse se quiser buscar a reparação do dano o que convenhamos seria um absurdo 6 Crimes sem dano a reparar Nada impede que alguns crimes não produzam dano a reparar No entanto somente o caso concreto poderá dizer com segurança quais as hipóteses em que o dano não existe 7 Finalidades da reabilitação A rigor a reabilitação tem duas finalidades permitir ao condenado uma folha corrida in albis e restaurar os direitos atingidos pelos efeitos específicos da condenação com exceção das ressalvas expressas 8 Efeitos da reabilitação 1 Sigilo sobre os registros criminais do processo e da condenação este seria o maior e mais importante efeito da reabilitação que no entanto atualmente é obtida imediata e automaticamente com a previsão do art 202 da LEP Impede tão somente a divulgação dos registros criminais afora as hipóteses expressamente ressalvadas 2 suspensão condicional de alguns efeitos da condenação a rigor além de garantir o sigilo já referido a reabilitação só exclui os efeitos específicos previstos no art 92 vedada a reintegração na situação anterior nos casos dos incisos I e II do mesmo artigo 81 Efeitos inócuos da reabilitação Constatase afinal que a reabilitação além de não alcançar nenhuma pena também não impede a reincidência que é um dos mais graves efeitos da condenação 9 Fontes do sigilo dos registros criminais Aliás a reabilitação não é a única fonte do sigilo dos registros criminais O art 748 do CPP que continua em vigor previa o sigilo das condenações anteriores ressalvando somente as requisições por juiz criminal A Lei de Execução Penal em duas oportunidades consagra o sigilo dos registros criminais no art 163 2º quando regula os registros das hipóteses de sursis ressalvando requisições do Poder Judiciário e do Ministério Público para instruir processo criminal no art 202 quando houver cumprimento ou extinção da pena ressalvando igualmente a finalidade de instruir processo criminal ou outros casos expressos em lei E o art 93 do CP na hipótese de reabilitação J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Cassase a decisão que indeferiu a reabilitação ao agente determinando que a reabilitação seja concedida em razão da impossibilidade de reparos de danos hipotéticos não requeridos a um longo tempo pelas vítimas ou seus familiares por renúncia tácita TJMS Apelação 20070215705 Rel João Batista da Costa Marques j 20112007 Reabilitação Observados os requisitos dos arts 93 e 94 do CP e cumpridas as formalidades dos arts 743 e seguintes do CPP a reabilitação é de ser deferida TJRS Recurso de Ofício 70017330978 Rel Constantino Lisbôa de Azevedo j 9 112006 A reabilitação não excluiu tout court a função da condenação que lhe constitui objeto como antecedente penal como exsurge da letra do art 64 inciso I do Código Penal que estabelece o prazo de 5 anos como extintivo do efeito da condenação anterior transitada em julgado como antecedente penal maior do que o prazo da reabilitação que é de 2 anos na letra do art 94 do Código Penal STJ HC 32372SC Rel Min Hamilton Carvalhido j 18102005 Art 94 CP Reabilitação Requisitos Para fins de cumprimento do requisito objetivo previsto no art 94 III do CP deve o condenado necessariamente ressarcir o dano causado pelo crime ou demonstrar a absoluta impossibilidade de fazêlo ou exibir documento que comprove a renúncia da vítima ou a novação da dívida Precedentes do STF Se a vítima ou sua família se mostrarem inertes na cobrança da indenização deve o condenado fazer uso dos meios legais para o ressarcimento do dano provocado pelo delito de modo a se livrar da obrigação salvo eventual prescrição civil da dívida Precedentes do STF STJ REsp 636307RS Rel Min Félix Fischer j 18112004 Art 95 A reabilitação será revogada de ofício ou a requerimento do Ministério Público se o reabilitado for condenado como reincidente por decisão definitiva a pena que não seja de multa V arts 63 e 64 do CP D O U T R I N A 1 Revogação da reabilitação A reabilitação é revogada de ofício ou a requerimento do Ministério Público se o reabilitado for novamente condenado como reincidente a pena que não seja de multa art 95 11 Requisitos para a revogação a Condenação do reabilitado como reincidente por sentença irrecorrível b que a nova condenação seja a pena privativa de liberdade 12 Consequências da revogação Com a revogação da reabilitação os efeitos que estavam suspensos voltam a vigorar 2 Competência para conhecer do pedido O juízo competente para conhecer do pedido de reabilitação será o juízo da condenação e não o da execução art 743 caput do CPP O art 66 da LEP que define a competência do juízo de execução não inclui a reabilitação 3 Recurso cabível O recurso da decisão que conceder ou negar a reabilitação será a apelação uma vez que se trata de decisão com força de definitiva art 593 II do CPP Antes da reforma o recurso cabível era o recurso em sentido estrito art 581 VIII pois a reabilitação era tratada como causa extintiva da punibilidade Acreditamos também que o recurso ex officio previsto no art 746 do CPP continua pois os novos diplomas legais LEP e CP não o suprimiram RT 640324 J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Não é possível a declaração da reabilitação do condenado quando configurada a reincidência haja vista o fato desta ser causa de revogação daquela CP art 95 STJ HC 14202SP Rel Min Edson Vidigal j 2442001 Título VI Das Medidas de Segurança Espécies de medidas de segurança Art 96 As medidas de segurança são I internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou à falta em outro estabelecimento adequado V arts 99 a 101 e 108 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal II sujeição a tratamento ambulatorial V art 45 parágrafo único da Lei n 113432006 Parágrafo único Extinta a punibilidade não se impõe medida de segurança nem subsiste a que tenha sido imposta V arts 107 a 119 do CP V arts 9º II 26 e 42 do CP V arts 386 V 492 II c 549 a 555 581 XIX a XXIII 596 1º 627 685 parágrafo único e 715 do CPP V arts 4º 64 I 66 V d e e 171 a 179 183 e 184 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal D O U T R I N A 1 Abandono do duplo binário Abandonando o chamado sistema duplo binário a reforma penal de 1984 adotou em toda a sua extensão o sistema vicariante eliminando definitivamente a aplicação dupla de pena e medida de segurança para os imputáveis e semiimputáveis A aplicação conjunta de pena e medida de segurança lesa o princípio do ne bis in idem pois por mais que se diga que o fundamento e os fins de uma e outra são distintos na realidade é o mesmo indivíduo que suporta as duas consequências pelo mesmo fato praticado 2 Fundamentos da pena e da medida de segurança O fundamento da pena passa a ser exclusivamente a culpabilidade enquanto a medida de segurança encontra justificativa somente na periculosidade aliada à incapacidade penal do agente Na prática a medida de segurança não se diferenciava em nada da pena privativa de liberdade em regra são cumpridas nos mesmos locais e nas mesmas condições 3 Sistema vicariante Atualmente o imputável que praticar conduta punível sujeitarseá somente à pena correspondente o inimputável a medida de segurança e o semiimputável o chamado fronteiriço sofrerá pena ou medida de segurança isto é ou uma ou outra nunca as duas como ocorre no sistema duplo binário As circunstâncias pessoais do infrator semi imputável é que determinarão qual a resposta penal de que este necessita se o seu estado pessoal demonstrar necessidade maior de tratamento cumprirá medida de segurança porém se ao contrário esse estado não se manifestar no caso concreto cumprirá a pena correspondente ao delito praticado com a redução prevista art 26 parágrafo único 4 Aplicação ao semiimputável Ao semiimputável sempre será aplicada a pena correspondente à infração penal cometida e somente se necessitar de especial tratamento curativo como diz a lei será aquela convertida em medida de segurança Em outros termos se o juiz constatar a presença de periculosidade periculosidade real submeterá o semiimputável a medida de segurança 5 Diferenças entre pena e medida de segurança a As penas têm caráter retributivopreventivo as medidas de segurança têm natureza eminentemente preventiva b o fundamento da aplicação da pena é a culpabilidade a medida de segurança fundamentase exclusivamente na periculosidade c as penas são determinadas as medidas de seguranças são por tempo indeterminado Só findam quando cessar a periculosidade do agente d as penas são aplicáveis aos imputáveis e semiimputáveis as medidas de segurança são aplicáveis aos inimputáveis e excepcionalmente aos semi imputáveis quando estes necessitarem de especial tratamento curativo 6 Princípio da legalidade Todo cidadão tem o direito de saber antecipadamente a natureza e duração das sanções penais pena e medida de segurança a que estará sujeito se violar a ordem jurídicopenal ou em outros termos vige também para as medidas de segurança o princípio da anterioridade legal 7 Aplicabilidade dos princípios limitadores do poder punitivo A medida de segurança e a pena de prisão constituem duas formas semelhantes de invasão da liberdade do indivíduo pelo Estado e por isso todos os princípios fundamentais e constitucionais aplicáveis à pena devem aplicarse também às medidas de segurança 8 Pressupostos para aplicação de medida de segurança a Prática de fato típico punível b periculosidade do agente c ausência de imputabilidade plena 81 Prática de fato típico punível É indispensável que o sujeito tenha praticado um ilícito típico Resumindo a presença de excludentes de criminalidade ou de culpabilidade e a ausência de prova impedem a aplicação de medida de segurança 82 Periculosidade do agente É indispensável que o sujeito que praticou o ilícito penal típico seja dotado de periculosidade que pode ser definida como um estado subjetivo mais ou menos duradouro de antissociabilidade É um juízo de probabilidade tendo por base a conduta antissocial e a anomalia psíquica do agente de que este voltará a delinquir 821 Tipos de periculosidade 1 Periculosidade presumida quando o sujeito for inimputável nos termos do art 26 caput 2 periculosidade real também dita judicial ou reconhecida pelo juiz quando se tratar de agente semi imputável art 26 parágrafo único e o juiz constatar que necessita de especial tratamento curativo 83 Ausência de imputabilidade plena A partir da proibição de aplicação de medida de segurança ao agente imputável a ausência de imputabilidade plena passou a ser pressuposto ou requisito para aplicação de tal medida O agente imputável não pode sofrer medida de segurança somente pena E o semiimputável só excepcionalmente estará sujeito a medida de segurança isto é se necessitar de especial tratamento curativo caso contrário também ficará sujeito somente a pena ou pena ou medida de segurança nunca as duas 9 Imputabilidade e inimputabilidade A partir da reforma penal de 1984 os condenados imputáveis não estão mais sujeitos a medida de segurança Os inimputáveis são isentos de pena art 26 do CP mas ficam sujeitos a medida de segurança Os semiimputáveis estão sujeitos a pena ou a medida de segurança ou uma ou outra 10 Espécies de medidas de segurança a Em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico esta espécie é chamada também de medida detentiva que na falta de hospital de custódia e tratamento pode ser cumprida em outro estabelecimento adequado Tal espécie de medida de segurança é aplicável tanto aos inimputáveis quanto aos semiimputáveis arts 97 caput e 98 do CP que necessitem de especial tratamento curativo b sujeição a tratamento ambulatorial a medida de segurança detentiva internação que é a regra pode ser substituída por tratamento ambulatorial se o fato previsto como crime for punível com detenção Esta medida consiste na sujeição a tratamento ambulatorial por meio do qual são dados cuidados médicos à pessoa submetida a tratamento mas sem internação que no entanto poderá tornarse necessária para fins curativos nos termos do 4º do art 97 do Código Penal 11 Tratamento ambulatorial possibilidade O tratamento ambulatorial é apenas uma possibilidade cuja conveniência as circunstâncias pessoais e fáticas indicarão ou não A punibilidade com pena de detenção por si só não é suficiente para determinar a conversão da internação em tratamento ambulatorial É necessário examinar as condições pessoais do agente para constatar sua compatibilidade ou incompatibilidade com a medida mais liberal Claro se tais condições forem favoráveis a substituição se impõe 12 Alternativas para o semiimputável O semiimputável tem duas alternativas redução obrigatória da pena aplicada art 26 parágrafo único ou substituição da pena privativa de liberdade por medida de segurança internação ou tratamento ambulatorial art 98 13 Tipos de estabelecimentos a Hospital de custódia e tratamento psiquiátrico hospital de custódia e tratamento psiquiátrico não passa de expressão eufemística utilizada pelo legislador da reforma penal de 1984 para definir o velho e deficiente manicômio judiciário Ocorre que apesar da boa intenção do legislador nenhum Estado brasileiro investiu na construção de novos estabelecimentos b estabelecimento adequado a lei não diz o que é estabelecimento adequado mas dá uma pista quando fala que o internado tem direito de ser recolhido a estabelecimento dotado de características hospitalares para submeterse a tratamento art 99 do CP Ironicamente por apresentar características hospitalares os manicômios judiciários têm sido considerados estabelecimentos adequados c local com dependência médica adequada embora sem definir o que seja local com dependência médica adequada e sem distinguilo do estabelecimento adequado a verdade é que enquanto este se destina à internação aquele se destina ao tratamento ambulatorial art 101 da LEP quando não houver hospital de custódia e tratamento Contudo na prática uns substituem os outros é tudo a mesma coisa 131 Locais de tratamento A internação deverá ocorrer em hospital de custódia e tratamento ou à sua falta em outro estabelecimento adequado art 96 do CP Já o tratamento ambulatorial deverá ser realizado também em hospital de custódia e tratamento mas na sua falta poderá ser em outro local com dependência médica adequada art 101 da LEP 14 Prescrição e extinção da punibilidade O art 96 parágrafo único do CP deixa claro que todas as causas extintivas de punibilidade art 107 são aplicáveis à medida de segurança inclusive a prescrição 141 Peculiaridades da prescrição nas medidas de segurança Em primeiro lugar convém registrar que os prazos prescricionais das medidas de segurança são aqueles disciplinados nos arts 109 e 110 do CP Em segundo lugar para fins de contagem do prazo prescricional devese distinguir o inimputável do semiimputável 142 Prescrição e semiimputabilidade O semiimputável sofre uma condenação na qual o juiz fixa a pena justa para o caso individualizandoa art 59 A pena estabelece o marco da prescrição in concreto e constitui o limite da intervenção estatal seja a título de pena seja a título de medida Substituída a pena por medida de segurança esta durará no máximo o tempo da condenação 15 Impossibilidade de aplicação direta de medida de segurança ao semiimputável O juiz jamais poderá tratandose de semiimputável aplicar direto a medida de segurança sem antes condenar o agente a uma pena determinada Depois em um segundo momento necessitando o condenado de especial tratamento curativo a pena deverá ser substituída por medida de segurança 16 Limite da medida de segurança O inimputável não é condenado ao contrário é absolvido e em consequência sofre a medida de segurança Assim não se lhe precisa a duração da privação de liberdade que fica indeterminada Contudo a indeterminação da medida de segurança e sua forma de cumprimento pode traduzirse em uma inconstitucional prisão perpétua Sugerese que a medida de segurança não pode ultrapassar o limite máximo abstratamente cominado ao delito praticado No mesmo sentido se manifesta Luiz Flávio Gomes 17 Prescrição e medidas de segurança a Prescrição da pretensão punitiva Ocorre antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória Subdividese em prescrição in abstrato prescrição retroativa e prescrição intercorrente Estas três subespécies de prescrição só podem ocorrer quando o agente for semiimputável Quando for inimputável somente será possível a primeira hipótese isto é a prescrição abstrata uma vez que sendo absolvido nunca terá uma pena concretizada na sentença b Prescrição da pretensão executória Quando se tratar de inimputável o prazo prescricional deve ser regulado pelo máximo da pena abstratamente cominada já que não existe pena concretizada Em relação ao semiimputável a solução é outra contase o prazo prescricional levandose em conta a pena fixada na sentença e posteriormente substituída J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A É ilegal a prisão de inimputável sujeito a medidas de segurança de internação mesmo quando a razão da manutenção da custódia seja a ausência de vagas em estabelecimentos hospitalares adequados à realização do tratamento STJ HC 81959MG Rel Min Maria Thereza de Assis Moura j 722008 A medida de segurança imposta pelo juízo de conhecimento se sujeita à extinção da punibilidade pela prescrição ex vi do art 96 parágrafo único do CP bem como por não se admitir excetuadas as hipóteses expressamente previstas na Constituição Federal sanções penais imprescritíveis no ordenamento jurídico pátrio Precedentes do STF e do STJ STJ HC 55715SP Rel Min Félix Fischer j 622007 O prazo para a prescrição da medida de segurança regulase pelo máximo da pena privativa de liberdade abstratamente cominada ao delito Precedentes STJ HC 53019SP Rel Min Félix Fischer j 7112006 A medida de segurança prevista no Código Penal quando aplicada ao inimputável ou semiimputável ainda no processo de conhecimento pode ter prazo indeterminado perdurando enquanto não for averiguada a cessação da periculosidade Precedentes Não há vinculação entre o prazo de duração da medida de segurança imposta ao semiimputável ainda no processo de conhecimento com o tempo de duração da pena privativa de liberdade substituída STJ HC 42683SP Rel Min Gilson Dipp j 1392005 Prazo mínimo da medida de segurança Tratandose de semiimputável e optando o magistrado pela substituição da pena por medida de segurança em conformidade com o laudo psiquiátrico desimporta o regime carcerário fixado pois o sistema vicariante determina pena ou medida e uma vez substituída a primeira não mais será executada A redução da pena diante da semiimputabilidade não guarda relação com o prazo mínimo da medida de segurança eis que a primeira diz com a culpabilidade diminuída e a segunda com a periculosidade O prazo mínimo da internação tem relação com o prognóstico de duração do tratamento TJRS Apelação 70007557341 Rel Tupinambá Pinto de Azevedo j 1822004 Imposição da medida de segurança para inimputável Art 97 Se o agente for inimputável o juiz determinará sua internação art 26 Se todavia o fato previsto como crime for punível com detenção poderá o juiz submetêlo a tratamento ambulatorial V art 26 do CP V arts 151 e 386 V do CPP V arts 101 175 e 178 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal 1º Prazo 1º A internação ou tratamento ambulatorial será por tempo indeterminado perdurando enquanto não for averiguada mediante perícia médica a cessação de periculosidade O prazo mínimo deverá ser de 1 um a 3 três anos V arts 175 a 179 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal 2º Perícia médica 2º A perícia médica realizarseá ao termo do prazo mínimo fixado e deverá ser repetida de ano em ano ou a qualquer tempo se o determinar o juiz da execução 3º e 4º Desinternação ou liberação condicional 3º A desinternação ou a liberação será sempre condicional devendo ser restabelecida a situação anterior se o agente antes do decurso de 1 um ano pratica fato indicativo de persistência de sua periculosidade 4º Em qualquer fase do tratamento ambulatorial poderá o juiz determinar a internação do agente se essa providência for necessária para fins curativos V art 175 V da Lei n 721084 Lei de Execução Penal D O U T R I N A 1 Natureza da pena versus natureza da medida de segurança Não é a inimputabilidade ou semiimputabilidade que determinará a aplicação de uma ou outra medida de segurança mas a natureza da pena privativa de liberdade aplicável que se for de detenção permitirá a aplicação de tratamento ambulatorial desde que é claro as condições pessoais o recomendem 2 Conversibilidade do tratamento ambulatorial em internação Por outro lado o submetimento a tratamento ambulatorial não é imutável uma vez que em qualquer fase poderá ser determinada a internação para fins curativos art 97 4º Na prática podese constatar a inadaptabilidade de um semiimputável com o tratamento ambulatorial necessitando de especial tratamento curativo Nessa hipótese devese converter o tratamento ambulatorial em internação que será a medida adequada art 184 da LEP 3 Prazo de duração da medida de segurança As duas espécies de medidas de segurança internação e tratamento ambulatorial têm em princípio duração indeterminada perdurando enquanto não for constatada a cessação da periculosidade mediante perícia médica 2º A lei não fixa o prazo máximo de duração e o prazo mínimo estabelecido de um a três anos é apenas um marco para a realização do primeiro exame de verificação de cessação de periculosidade 4 Execução suspensão e extinção da medida de segurança A medida de segurança só pode ser executada após o trânsito em julgado da sentença art 171 da LEP Para iniciar a execução é indispensável a expedição de guia de internamento ou de tratamento ambulatorial art 173 da LEP A reforma penal de 1984 aboliu a medida de segurança provisória ao não repetir o disposto do art 80 do CP de 1940 41 Término da medida de segurança Falando em término da medida de segurança devemos utilizar duas expressões que definem com precisão situações bem distintas suspensão e extinção da medida de segurança 42 Persistência de periculosidade A suspensão da medida de segurança estará sempre condicionada ao transcurso de um ano de liberação ou desinternação sem a prática de fato indicativo de persistência de periculosidade art 97 3º do CP Somente se esse período transcorrer in albis será definitivamente extinta a medida suspensa ou revogada como diz a lei 43 Suspensão condicional da medida de segurança Comprovada pericialmente a cessação da periculosidade o juiz da execução determinará a revogação da medida de segurança com a desinternação ou a liberação em caráter provisório aplicando as condições próprias do livramento condicional art 178 da LEP Na verdade essa revogação não passa de simples suspensão condicional da medida de segurança pois se o desinternado ou liberado durante um ano praticar fato indicativo de persistência de sua periculosidade será restabelecida a medida de segurança suspensa J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Hipótese na qual se requer a extinção da medida de segurança aplicada ao paciente em substituição à pena corporal sob o fundamento de ter se encerrado o prazo da pena privativa de liberdade imposta na sentença condenatória Evidenciada a ocorrência de flagrante constrangimento ilegal deve ser concedida ordem de habeas corpus ao paciente A medida de segurança prevista na Lei de Execuções Penais hipótese dos autos é aplicada quando no curso da execução da pena privativa de liberdade sobrevier doença mental ou perturbação da saúde mental sendo adstrita ao tempo de cumprimento da pena privativa de liberdade fixada na sentença condenatória sob pena de ofensa à coisa julgada Verificado o cumprimento integral da medida de segurança substitutiva deve ser determinada sua extinção STJ HC 88849SP Rel Jane Silva j 28112007 A medida de segurança de internação a teor do disposto no art 97 1º do Código Penal não está sujeita a prazos predeterminados porém à cessação da periculosidade do réu declarado inimputável É validamente motivada a decisão judicial que prorroga por mais um ano a medida de segurança imposta ao sentenciado com fundamento no exame médicopericial realizado no paciente o qual atesta a necessidade da manutenção da medida Precedentes do STJ STJ HC 70497SP Rel Min Carlos Fernando Mathias j 12112007 O juiz deve aplicar a medida de segurança de internação ao condenado por crime punível com reclusão possibilitada a posterior desinternação ou liberação condicional precedida de perícia médica ex vi do art 97 do CP Precedentes do STJ e do STF STJ REsp 863665MT Rel Min Félix Fischer j 2252007 A medida de segurança prevista no Código Penal quando aplicada ao inimputável ou semiimputável ainda no processo de conhecimento pode ter prazo indeterminado perdurando enquanto não for averiguada a cessação da periculosidade Precedentes STJ HC 48187SP Rel Min Gilson Dipp j 1312 2005 Medida de segurança Projeção no tempo Limite A interpretação sistemática e teleológica dos artigos 75 97 e 183 os dois primeiros do Código Penal e o último da Lei de Execuções Penais deve fazerse considerada a garantia constitucional abolidora das prisões perpétuas A medida de segurança fica jungida ao período máximo de trinta anos STF HC 84219SP Rel Min Marco Aurélio j 1682005 Art 97 do Código Penal Conversão da medida de internação em tratamento ambulatorial Cessação de periculosidade Necessidade de perícia médica É cabível a conversão de medida de internação em tratamento ambulatorial se o juiz da execução conta com exames e informações sobre o tratamento do agente o qual aponta para a desnecessidade da permanência do paciente internado A inocorrência no decurso de um ano de prática de fato indicativo de persistência de periculosidade de que trata o art 97 3º do Código Penal abrange não apenas o cometimento de fato criminoso mas também de fatos que por sua natureza possam ser indicativos de periculosidade como por exemplo a não sujeição do paciente ao tratamento ambulatorial determinado A cessação de periculosidade por sua vez depende de perícia médica avaliativa que ateste o seu fim o que não ocorreu no presente caso STJ HC 36015SP Rel Min Félix Fischer j 2232005 Substituição da pena por medida de segurança para o semiimputável Art 98 Na hipótese do parágrafo único do art 26 deste Código e necessitando o condenado de especial tratamento curativo a pena privativa de liberdade pode ser substituída pela internação ou tratamento ambulatorial pelo prazo mínimo de 1 um a 3 três anos nos termos do artigo anterior e respectivos 1º a 4º D O U T R I N A 1 Substituição da pena por medida de segurança Em duas hipóteses a pena aplicada pode ser substituída por medida de segurança semiimputabilidade ou superveniência de doença mental e em uma a própria medida de segurança tratamento ambulatorial pode ser convertida em internação 11 Hipótese de substituição de pena por medida de segurança Esta operação somente será possível quando se tratar de condenado semiimputável que necessitar de especial tratamento curativo jamais de um imputável Tratandose de semiimputável comprovandose a culpabilidade sempre sofre uma condenação Com base nos elementos do art 59 o juiz fixa a pena com redução obrigatória justa para o caso conforme seja necessário e suficiente art 59 Essa é a regra A substituição é exceção que poderá ocorrer se o condenado necessitar de especial tratamento curativo art 98 12 Para semiimputável somente medida de segurança substitutiva Primeiro se aplica a pena para depois poder substituíla por duas razões 1ª em primeiro lugar porque o art 26 parágrafo único determina que A pena pode ser reduzida e o art 98 estabelece que na hipótese do dispositivo citado a pena privativa de liberdade pode ser substituída Logo a pena tem de ser aplicada para poder ser reduzida ou então se for o caso substituída E para que alguma coisa possa ser substituída por outra é preciso que tal coisa exista e a pena privativa de liberdade só terá existência se for aplicada na sentença condenatória 2ª em segundo lugar somente a pena privativa de liberdade pode ser substituída por medida de segurança uma vez que o art 98 exclui as demais modalidades de penas E como saber qual a pena necessária e suficiente art 59 se não concretizála na sentença individualizandoa Sabese pois que a pena cominada no tipo penal infringido não será necessariamente a que finalmente será aplicada na sentença condenatória tampouco a que será executada 2 Superveniência de doença mental do condenado Quando ocorrer superveniência de doença mental o condenado deve ser recolhido a hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou em não havendo a outro estabelecimento adequado O art 41 do Código Penal determina e o art 183 da LEP permite nesta hipótese a substituição da pena por medida de segurança cujo cumprimento passa a regerse pelas normas de cumprimento de tal medida e não mais pelas normas de execução da pena 3 Duração da medida de segurança substitutiva Tanto na hipótese anterior de réu semiimputável como nesta de superveniência de doença mental a medida de segurança não poderá ter duração superior ao correspondente à pena substituída Na hipótese de ao esgotarse o prazo inicialmente fixado na condenação o paciente ainda não se encontrar recuperado e não podendo ser liberado em razão de seu estado de saúde mental deverá obrigatoriamente ser colocado à disposição do juízo cível competente 4 Verificação da cessação da periculosidade O prazo mínimo estabelecido de um a três anos tratase apenas de um marco para a realização do primeiro exame pericial art 97 1º do CP A determinação legal é de que o exame seja realizado no fim do prazo mínimo fixado na sentença e posteriormente de ano em ano Mas esse é o exame legal obrigatório 41 Repetição do exame ex officio O juiz de execução pode determinar de ofício a repetição do exame a qualquer tempo Cumpre ressaltar para evitar equívocos que a determinação oficial a qualquer tempo só pode ocorrer depois de decorrido o prazo mínimo isto é o juiz só pode determinar de ofício a repetição do exame 2º nunca o primeiro exame 42 Exame requerido pelo Ministério Público Antes de escoado o prazo mínimo referido exame somente poderá ser realizado mediante provocação do Ministério Público ou do interessado procurador ou defensor nunca de ofício Tanto a provocação quanto a decisão devem ser devidamente fundamentadas 5 Contratação de médico particular A Lei de Execução Penal assegura o direito de contratar médico particular de confiança do paciente ou de familiares para acompanhar o tratamento Havendo divergências entre o médico oficial e o particular serão resolvidas pelo juiz da execução art 43 e parágrafo único da LEP 6 Assistente técnico na verificação da cessação de periculosidade Acreditamos embora a LEP seja omissa que o médico particular pode participar também da realização do exame de verificação de cessação da periculosidade como assistente técnico com base no princípio da ampla defesa art 5º IV da CF J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A O art 98 do Código Penal autoriza a substituição da pena privativa de liberdade por medida de segurança ao condenado semiimputável que necessitar de especial tratamento curativo aplicandose o mesmo regramento da medida de segurança para inimputáveis STJ REsp 863665MT Rel Min Félix Fischer j 2252007 Estupro e atentado violento ao pudor Réu semiimputável Substituição da pena privativa de liberdade por medida de segurança Incabimento Descaracterizada a necessidade de tratamento psiquiátrico ao réu que tem diminuída a sua capacidade de entendimento e determinação não há falar em substituição da pena privativa de liberdade por medida de segurança STJ HC 22153GO Rel Min Hamilton Carvalhido j 1942005 Hipótese de réu semiimputável condenado à pena de reclusão para o qual o TJRS dando parcial provimento ao pleito defensivo substituiu a medida de internação anteriormente imposta pelo tratamento ambulatorial O art 98 do Código Penal aplicando as regras do art 97 do mesmo estatuto repressor prevê para os casos de semiimputabilidade a substituição da pena privativa de liberdade pela medida de segurança de internação nos casos de réus apenados com reclusão ou de tratamento ambulatorial para apenados com detenção STJ REsp 567352RS Rel Min Gilson Dipp j 1762004 Direitos do internado Art 99 O internado será recolhido a estabelecimento dotado de características hospitalares e será submetido a tratamento V arts 3º 42 e 99 a 101 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal D O U T R I N A Tratamento adequado do internado Este dispositivo pretende impedir que o sujeito que recebeu medida de segurança fique recolhido em cadeia ou presídio comum Deve receber o tratamento psiquiátrico necessário em hospital de custódia e tratamento ou na sua falta em estabelecimento dotado de características hospitalares J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Aplicada medida de segurança consistente em internação em hospital psiquiátrico configura constrangimento ilegal a manutenção do paciente em centro de detenção provisória Quando não há vaga em estabelecimento adequado hospital psiquiátrico devese submeter o paciente a tratamento ambulatorial STJ HC 67869SP Rel Min Nilson Naves j 1262007 Sendo aplicada ao paciente a medida de segurança de internação constitui constrangimento ilegal sua manutenção em prisão comum ainda que o motivo seja a alegada inexistência de vaga para o cumprimento da medida aplicada A manutenção de estabelecimentos adequados ao cumprimento da medida de segurança de internação é de responsabilidade do Estado não podendo o paciente ser penalizado pela insuficiência de vagas STJ HC 31902SP Rel Min Félix Fischer j 115 2004 Título VII Da Ação Penal Ação pública e de iniciativa privada Art 100 A ação penal é pública salvo quando a lei expressamente a declara privativa do ofendido V arts 19 e 24 a 62 do CPP V art 227 da Lei n 806990 Estatuto da Criança e do Adolescente 1º A ação pública é promovida pelo Ministério Público dependendo quando a lei o exige de representação do ofendido ou de requisição do Ministro da Justiça V arts 5º 4º 24 25 38 e 39 do CPP V art 1º da Lei n 524967 ação pública em crimes de responsabilidade V art 88 da Lei n 909995 Juizados Especiais 2º A ação de iniciativa privada é promovida mediante queixa do ofendido ou de quem tenha qualidade para representálo V arts 5º 5º 30 a 38 e 73 do CPP 3º A ação de iniciativa privada pode intentarse nos crimes de ação pública se o Ministério Público não oferece denúncia no prazo legal V art 5º LIX da CF V art 29 do CPP 4º No caso de morte do ofendido ou de ter sido declarado ausente por decisão judicial o direito de oferecer queixa ou de prosseguir na ação passa ao cônjuge ascendente descendente ou irmão V arts 24 1º e 31 do CPP D O U T R I N A 1 Ação penal O direito de ação penal significa a faculdade de exigir a intervenção do poder jurisdicional para investigar a procedência da pretensão punitiva do Estado no caso concreto Ação é pois o direito de invocar a prestação jurisdicional isto é o direito de requerer em juízo a reparação de um direito violado 2 Limitação do poder punitivo estatal Ao mesmo tempo em que o Estado determina ao indivíduo que se abstenha da prática de ações delituosas asseguralhe também que só poderá punilo se violar aquela determinação dando origem ao ius puniendi Isso representa a consagração do princípio nullum crimen nulla poena sine praevia lege No entanto violada a proibição legal a sanção correspondente só poderá ser imposta por meio do devido processo legal que é a autolimitação que o próprio Estado se impõe para exercer o ius persequendi isto é o direito subjetivo de promover a persecução do autor do crime 3 Espécies de ação penal A ação penal classificase em ação penal pública e ação penal privada Ambas comportam no entanto uma subdivisão a ação penal pública pode ser incondicionada e condicionada e a ação privada pode ser exclusivamente privada e privada subsidiária da pública 4 Ação penal pública O Ministério Público é o dominus litis da ação penal pública art 129 I da CF que se inicia com o oferecimento da denúncia em juízo e deverá conter a narração do fato criminoso circunstanciadamente a qualificação do acusado a classificação do crime e o rol de testemunhas art 41 do CPP 41 Ação pública incondicionada A regra geral é a de que a ação penal seja pública incondicionada Basta o Ministério Público constatar a prática de um crime para promover a ação penal Nas mesmas circunstâncias a autoridade policial ao ter conhecimento da ocorrência de um crime de ação pública incondicionada deverá de ofício determinar a instauração de inquérito policial nos termos do art 5º I do CPP 42 Ação pública condicionada O Ministério Público dependerá para a sua propositura da satisfação de uma condição de procedibilidade sem a qual a ação penal não poderá ser instaurada representação do ofendido ou de quem tenha qualidade para representálo ou ainda requisição do Ministro da Justiça 5 Conflito de interesses públicos e particulares Na ação penal pública condicionada há uma relação complexa de interesses do ofendido e do Estado De um lado o direito legítimo do ofendido de manter o crime ignorado de outro lado o interesse público do Estado em punilo assim não se move sem a representação do ofendido mas iniciada a ação pública pela denúncia prossegue até decisão final sob o comando do Ministério Público 6 Requisição do Ministro da Justiça juízo político Em alguns casos o juízo de conveniência e oportunidade é cometido ao Ministro da Justiça que na realidade faz um juízo político sobre tal conveniência Esses casos são restritos crimes praticados por estrangeiros contra brasileiros fora do Brasil art 7º 3º do CP e nos crimes praticados contra a honra do Presidente ou contra chefe de governo estrangeiro art 145 parágrafo único 1ª parte 7 Vigência do art 141 I do CP Entendemos que o disposto no art 141 I continua em vigor ao lado do disposto no art 26 da Lei de Segurança Nacional Lei n 717083 Esse aliás já era o entendimento mantido pelo STF em relação à anterior Lei de Segurança Nacional RTJ 105915 8 Ação penal privada Constitui exceção ao princípio publicístico da ação penal e por isso vem sempre expressa no texto legal por exemplo no art 145 o Código determina que somente se procede mediante queixa 81 Exclusivamente privada e subsidiária da pública A ação penal privada dividese em a ação penal de exclusiva iniciativa privada art 100 2º do CP quando somente pode ser exercida pelo ofendido ou seu representante legal b ação privada subsidiária da pública art 100 3º nas hipóteses de ação penal pública ante a inércia do Ministério Público em oferecer a denúncia no prazo legal o ofendido ou seu representante legal poderá fazêlo art 5º LIX da CF 811 Decadência na ação privada subsidiária Na ação privada subsidiária a decadência do direito de queixa não extingue a punibilidade permanecendo o ius puniendi estatal cuja titularidade pertence ao Ministério Público que poderá oferecer denúncia enquanto não se operar a prescrição 82 Ação privada personalíssima Alguns autores relacionam ainda como uma terceira modalidade a ação penal privada personalíssima para os crimes de adultério art 240 e de induzimento a erro essencial art 236 pela simples impossibilidade sucessória da legitimação ativa por tratarse de crime personalíssimo 9 Ação penal na Lei n 909995 A Lei n 909995 não altera a natureza da ação penal dos crimes de sua competência com exceção dos crimes de lesões leves e lesões culposas que passam a depender de representação do ofendido art 88 10 Sucessão do direito de queixa A sucessão prevista no 4º limitase a ação de exclusiva iniciativa privada Não se estende porém às hipóteses dos arts 236 parágrafo único e 240 do CP por tratarse de direito personalíssimo J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A representação do ofendido condição de procedibilidade da ação penal pública condicionada prescinde de rigor formal sendo suficiente a demonstração inequívoca da parte interessada de que seja apurada e processada a infração penal A propositura da ação penal pelo Ministério Público não está subordinada ao prazo decadencial Precedentes do STJ STJ HC 92353SP Rel Min Laurita Vaz j 72 2008 Esta Corte já decidiu que em se tratando de ação penal pública incondicionada não está o Ministério Público obrigado a denunciar todos os indiciados Pode propor ação penal com relação àqueles contra quem haja indícios suficientes e determinar quanto aos demais o arquivamento ou o prosseguimento das investigações sendo possível posteriormente o oferecimento de nova denúncia ou o aditamento da primeira STJ HC 50973RN Rel Min Paulo Gallotti j 22112007 Descabe o reconhecimento da decadência em se tratando de ação penal pública incondicionada STJ HC 76019SP Rel Jane Silva j 18102007 A ação penal privada subsidiária só tem cabimento nas hipóteses em que configurada a inércia do Ministério Público ou seja quando transcorrido o prazo para o oferecimento da denúncia o Parquet não a apresenta não requer diligências tampouco pede o arquivamento Encontrase pacificado nesta Corte bem como no Supremo Tribunal Federal o entendimento de que uma vez requerido o arquivamento do inquérito ou de peças de informação pelo ProcuradorGeral da República chefe do Ministério Público da União o atendimento ao seu pedido é irrecusável STJ HC 64564GO Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 1332007 A ação penal privada subsidiária da pública disciplinada nos arts 29 do Código de Processo Penal e 5º inciso LIX da Constituição Federal pode ser intentada tanto nos crimes que devam ser processados mediante ação penal pública condicionada como incondicionada desde que configurada a inércia do Ministério Público ou seja quando o parquet deixar de oferecer a denúncia ou de requerer o arquivamento do inquérito ou ainda de solicitar diligências dentro do prazo previsto pelo art 46 do Código de Processo Penal STJ HC 46959RJ Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 2122006 Se o ofendido é menor de dezoito anos não tendo ele capacidade de estar em juízo cabe ao seu representante legal ingressar com a ação privada ou oferecer representação do mesmo modo é o representante legal quem poderá renunciar àqueles direitos e conceder perdão Quando o ofendido menor completar a idade de dezoito anos extinta de acordo com a lei civil a partir desta faixa etária a figura do representante legal a ele próprio caberá ingressar com a queixa ou com a representação se e desde que não tenha se operado anteriormente antes de que completasse o ofendido dezoito anos a decadência em relação ao seu então representante legal TJMG RESE 100790307881720011 Rel Herculano Rodrigues j 742005 Muito embora seja defeso ao Ministério Público presidir o inquérito policial propriamente dito a competência investigatória da Polícia Judiciária não exclui a de outras autoridades administrativas dentre as quais a do Parquet que nos termos do art 100 1º do Estatuto Repressivo é o titular da ação penal ratio essendi do procedimento investigatório preliminar Por outro lado o inquérito policial por ser peça meramente informativa não é pressuposto necessário para a propositura da ação penal podendo essa ser embasada em outros elementos hábeis a formar a opinio delicti de seu titular como a Ação Civil Pública por exemplo Se até o particular pode juntar peças obter declarações etc é evidente que o Parquet também pode Além do mais até mesmo uma investigação administrativa pode eventualmente supedanear uma denúncia Precedentes desta Corte e do Pretório Excelso STJ REsp 649594GO Rel Min Félix Fischer j 1692004 Queixacrime subsidiária Petição inicial apresentada pelo próprio querelante sem representação de advogado Inviabilidade Decadência caracterizada 1 É condição para a apresentação da queixacrime que a inicial seja subscrita por quem possuir habilitação técnica 2 Tratandose de ação penal privada subsidiária o termo inicial para o seu oferecimento é o dia em que se esgota o prazo para o oferecimento da denúncia STJ Pet 2396CE Rel Min José Delgado j 1882004 A queixacrime embora descreva conduta típica não se encontra acompanhada do mínimo embasamento probatório apto a demonstrar ainda que de modo indiciário a efetiva realização do fato típico por parte da querelada Sem que haja o mínimo lastro probatório a acompanhar a exordial acusatória não há justa causa autorizativa da instauração da persecução penal Precedentes STJ RHC 14235RS Rel Min Félix Fischer j 16122003 A ação penal no crime complexo Art 101 Quando a lei considera como elemento ou circunstâncias do tipo legal fatos que por si mesmos constituem crimes cabe ação pública em relação àquele desde que em relação a qualquer destes se deva proceder por iniciativa do Ministério Público V Súmula 608 do STF D O U T R I N A 1 Crime complexo Sinteticamente podese afirmar que o crime complexo representa a soma ou fusão de dois crimes Na verdade o crime complexo ofende mais de um bem jurídico ao mesmo tempo Exemplo o crime de roubo representa a fusão do crime de subtração art 155 com o de lesão corporal ou ameaça arts 129 ou 147 Caso semelhante ocorre com a injúria real art 140 2º na qual há a fusão da injúria art 140 caput com a lesão corporal art 129 e vias de fato art 21 da LCP 11 Crime complexo nos crimes contra os costumes Com a nova natureza das lesões corporais leves e culposas art 88 da Lei n 909995 seguramente o STF terá de rever no mínimo o fundamento da Súmula 608 com o seguinte verbete No crime de estupro praticado mediante violência real a ação penal é pública incondicionada Com essa súmula o STF deu prevalência ao art 101 sobre o art 225 Essa orientação do STF dividese em a se há violência real com lesão corporal a ação penal é pública pois o crime de lesão era de ação pública incondicionada b no entanto se houver apenas ameaça a ação penal será de iniciativa privada pois a ameaça não é de ação pública incondicionada c quanto ao constrangimento ilegal ele é elementar do próprio crime de estupro RTJ 119760 Dessa forma o STF ignorou o princípio da especialidade ao afastar a aplicação do art 225 dando prioridade ao art 101 que é norma geral 12 Crime complexo e concurso de crimes O crime complexo não se confunde com os crimes processualmente conexos art 76 do CPP nem com o concurso material ou formal no qual o agente pratica dois ou mais crimes arts 69 e 70 13 Violência presumida À violência presumida é inaplicável o art 101 por não configurar a hipótese de crime complexo sendo incabível a aplicação da Súmula 608 J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 608 do STF No crime de estupro praticado mediante violência real a ação penal é pública incondicionada Consoante reiterado posicionamento deste Tribunal nas hipóteses de crime contra os costumes praticado com violência real aplicase o disposto no enunciado sumular 608STF STJ REsp 762043RJ Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 1522007 Tanto a jurisprudência dominante quanto a melhor doutrina admitem que quando ocorrer a violência real contra as vítimas de crime de atentado violento ao pudor há a descaracterização da natureza privada da ação penal para pública incondicionada O uso de arma de fogo para consumar os delitos é suficiente para legitimar o Ministério Público a propor a ação penal STJ HC 30688PE Rel Min Jorge Scartezzini j 1º42004 O Ministério Público é parte legítima para a propositura da ação penal pela prática de atentado violento ao pudor se este foi cometido durante o curso do crime de roubo Presença do constrangimento ilegal violento a dar azo à incidência da regra do art 101 do CP afastandose a do art 225 do mesmo Diploma Legal STJ REsp 343533PR Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 9122003 Queixacrime simultânea Falta de legitimidade e potencialidade Trancamento O caso atrai a aplicação do art 101 do CP por meio do qual a legitimidade para intentar a ação penal em se tratando de crime complexo é exclusiva do ente ministerial Afastase com isso a previsão do art 225 do mesmo Estatuto em face da posição sumular do Egrégio Supremo Tribunal Federal Por essa razão afigurase inaceitável a manutenção da queixacrime mesmo que sobrestada quando a sua existência não trará qualquer efeito introdutório de ação penal Faltalhe legitimidade e potencialidade para a ação respectiva podendo ser objeto de futuras pendências jurídicas e recursos infindáveis cuja polêmica deve ser desde logo afastada STJ HC 24643RJ Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 5122002 Irretratabilidade da representação Art 102 A representação será irretratável depois de oferecida a denúncia V art 25 do CPP D O U T R I N A 1 Representação criminal Representação criminal é a manifestação de vontade do ofendido ou de quem tenha qualidade para representálo visando a instauração da ação penal contra seu ofensor A representação em determinadas ações constitui condição de procedibilidade para que o Ministério Público possa iniciar a ação penal 11 Informalidade da representação A representação não exige qualquer formalidade podendo ser manifestada mediante petição escrita ou oral e neste caso deverá ser tomada por termo em cartório A única exigência legal é que constitua manifestação inequívoca da vontade do ofendido de promover a persecução penal não a caracterizando simples declarações narrativas dos fatos 12 Irretratabilidade da representação A representação como condição de procedibilidade é irretratável após o oferecimento da denúncia Após o Ministério Público oferecer a denúncia a ação penal tornase indisponível 13 Retratação da retratação Há alguns julgados admitindo a retratação da retratação ou em outros termos nova representação após a retratação anterior desde que ocorra dentro do prazo decadencial STF RTJ 7251 2 Requisição do Ministro da Justiça Em certos casos expressos em lei por razões de natureza política a ação pública só poderá ser iniciada mediante requisição do Ministro da Justiça Essa requisição autoriza a iniciar a ação mas não vincula o Ministério Público que mantém a liberdade e independência para examinar a ocorrência das condições que a contrario sensu defluem do art 43 do CPP J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Não há forma rígida para a representação bastando a manifestação de vontade da ofendida para que fosse apurada a responsabilidade do paciente em delito de atentado violento ao pudor Precedentes STJ HC 48692SP Rel Min Gilson Dipp j 442006 A retratação da vítima é admissível até antes do recebimento da denúncia Entretanto tal ato precisa manifestarse sem vício No caso sub judice conforme salientado pelo Tribunal a quo a retratação foi declarada sem efeito porquanto somente foi efetivada pela vítima em razão das ameaças sofridas pelo paciente STJ HC 23765PE Rel Min Jorge Scartezzini j 362003 À luz do comando expresso no art 102 do Código Penal reproduzido no art 25 do Código de Processo Penal iniciada a ação penal pública condicionada com o oferecimento da denúncia a representação manifestada pelo ofendido tornase irretratável STJ HC 12468MT Rel Min Vicente Leal j 1932002 Decadência do direito de queixa ou de representação Art 103 Salvo disposição expressa em contrário o ofendido decai do direito de queixa ou de representação se não o exerce dentro do prazo de 6 seis meses contado do dia em que veio a saber quem é o autor do crime ou no caso do 3º do art 100 deste Código do dia em que se esgota o prazo para oferecimento da denúncia V art 107 IV do CP V art 38 do CPP D O U T R I N A 1 Decadência Decadência é a perda do direito de ação a ser exercido pelo ofendido em razão do decurso de tempo A decadência pode atingir tanto a ação de exclusiva iniciativa privada como a pública condicionada à representação Constitui uma limitação temporal ao ius persequendi que não pode eternizarse Qualquer das duas tanto a queixa quanto a representação deve ser realizada dentro do prazo decadencial isto é antes que este se esgote 11 Natureza do prazo decadencial O prazo decadencial é peremptório não se interrompe nem se suspende O direito de queixa ou de representação não se interrompe pelo seu exercício ao contrário exaurese 12 Lapso de duração do prazo decadencial O prazo decadencial em regra é de seis meses contado da data em que o ofendido veio a saber quem foi o autor do crime ou na ação privada subsidiária da pública do dia em que se esgotou o prazo para o oferecimento da denúncia arts 38 e 46 do CPP 13 Prazo decadencial na Lei n 909995 A Lei n 909995 criou um novo prazo decadencial embora de direito transitório uma vez que somente se aplica aos fatos ocorridos antes da vigência da referida lei trinta dias para os crimes de lesões corporais leves e culposas cometidos antes da vigência da lei Esse prazo começa a correr a partir da intimação pessoal da vítima Para aqueles crimes praticados já na vigência da lei o prazo decadencial é o normal de seis meses arts 103 do CP e 38 do CPP 14 Intimação da vítima somente para fatos anteriores A intimação da vítima somente é necessária para os fatos ocorridos antes da vigência da Lei n 909995 Os fatos ocorridos após 26 de novembro de 1995 não necessitam de tal intimação como os demais crimes 2 Crimes contra a propriedade imaterial Nestes crimes discutese se permanece a regra geral dos seis meses do art 103 do CP ou se este é afastado pelo disposto no art 529 do CPP que fixa o prazo de trinta dias para o oferecimento de queixa a partir da homologação do laudo pericial Pessoalmente acreditamos que o prazo decadencial é o de seis meses conforme a regra geral já que os trinta dias referidos no art 529 do CPP não constituem prazo decadencial e visam tão somente impedir que o ofendido procrastine a propositura da ação penal indefinidamente 3 Dupla titularidade do direito de ação O Supremo Tribunal Federal editou a Súmula 594 com o seguinte verbete Os direitos de queixa e de representação podem ser exercidos independentemente pelo ofendido ou por seu representante legal Pela orientação do Supremo a decadência do direito do ofendido não afeta o direito do representante legal e viceversa contados da data em que vierem a tomar conhecimento da autoria do crime Na verdade o STF reconhece a existência de dois titulares do direito de representar ou oferecer queixa cada um com o respectivo prazo um para o ofendido e outro para seu representante legal J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Prazo decadencial Queixa Início da contagem Art 103 do CP Salvo disposição expressa em contrário o ofendido decai do direito de queixa ou de representação se não o exerce dentro do prazo de seis meses contado do dia em que veio a saber quem é o autor do crime ou no caso do 3º do art 100 deste Código do dia em que se esgota o prazo para oferecimento da denúncia STJ RHC 16876MG Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 1392005 O prazo legal de seis meses para decadência do direito de queixa é contado na forma estabelecida no art 10 do Código Penal na linha do calendário comum Precedentes STJ Apn 360MG Rel Min Antônio de Pádua Ribeiro j 1632005 Não se verifica a decadência do direito de representação se o genitor da vítima o exerceu tão logo tomou conhecimento da ocorrência dos fatos delituosos bem como de sua autoria STJ RHC 15403MG Rel Min Laurita Vaz j 2842004 Em sede de crime de ação penal pública condicionada à representação não se exige fórmula sacramental para a manifestação de vontade do ofendido no sentido de que se promova a responsabilização do autor do delito Precedentes Se a mãe da ofendida dentro dos seis meses previstos em lei procura o Conselho Tutelar da Infância e Juventude para as providências cabíveis não há falar em decadência por falta de representação ou de seu tardio manejo pois nesse caso está suficientemente demonstrada a inequívoca intenção de desencadear a persecutio criminis STJ RHC 14905SP Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 2332004 Renúncia expressa ou tácita do direito de queixa Art 104 O direito de queixa não pode ser exercido quando renunciado expressa ou tacitamente V arts 48 a 50 e 57 do CPP V art 74 parágrafo único da Lei n 909995 Juizados Especiais Parágrafo único Importa renúncia tácita ao direito de queixa a prática de ato incompatível com a vontade de exercêlo não a implica todavia o fato de receber o ofendido a indenização do dano causado pelo crime D O U T R I N A 1 Renúncia Renúncia é a manifestação de desinteresse de exercer o direito de queixa que só pode ocorrer em crimes de ação penal de exclusiva iniciativa privada e antes de esta ser iniciada 11 Fase processual para a renúncia Após iniciada a ação penal privada que se caracteriza pelo recebimento da queixa é impossível renunciar ao direito de queixa que aliás já foi exercido admitindose somente o perdão do ofendido art 105 que é um instituto afim 12 Modalidades de renúncia A renúncia pode ser expressa tácita ou presumida A expressa constará de declaração assinada pelo ofendido seu representante legal ou procurador com poderes especiais art 50 do CPP A tácita caracterizase pela prática de ato incompatível com a vontade de exercer o direito de queixa não a configurando o recebimento de indenização do dano causado pelo crime art 104 parágrafo único do CP A presumida ocorre na nova hipótese criada pelo art 74 parágrafo único da Lei n 909995 2 Perdão e perempção Embora renúncia e perdão sejam causas extintivas da punibilidade nos crimes de ação privada art 107 V do CP após iniciada a ação penal somente por meio do perdão ou da perempção o querelante poderá dar causa à extinção da punibilidade 3 Omissão da queixa e indivisibilidade da ação penal Há um entendimento doutrináriojurisprudencial com o qual não concordamos segundo o qual na hipótese de o ofendido omitir da queixa um dos participantes do crime em caso de concurso de pessoas pode caracterizar renúncia que se estenderá a todos os ofensores Esse entendimento afronta dois dispositivos legais um do Código Penal outro do Código de Processo Penal Ora o Código Penal determina que implicará renúncia tácita ao direito de queixa a prática de ato incompatível com a vontade de exercêlo art 104 parágrafo único e o fato de apresentar queixa contra um ou alguns dos autores do fato delituoso ao contrário demonstra expressamente a vontade de exercer o direito de queixa e jamais ato incompatível com a vontade de exercêlo Por outro lado não se pode ignorar o disposto no art 48 do CPP primeira parte segundo o qual a queixa contra qualquer dos autores do crime obrigará ao processo de todos Logo o raciocínio à luz deste dispositivo deve ser o inverso daquele entendimento ora repudiado 4 Extensão da renúncia Havendo concurso de pessoas a renúncia em relação a um dos autores do crime estendese aos demais art 49 do CPP como consequência do princípio da indivisibilidade da ação penal privada Porém havendo mais de um ofendido a renúncia de um deles não prejudica o direito dos demais 5 A renúncia nos Juizados Especiais Criminais A Lei n 909995 que instituiu os Juizados Especiais Criminais criou uma nova espécie de renúncia presumida que decorre da homologação do acordo da composição cível nas infrações de menor potencial ofensivo da competência daquele Juizado art 74 parágrafo único Pois essa renúncia presumida foi estendida também à representação criminal para aquelas infrações Assim a Lei n 909995 criou a figura da renúncia ao direito de representação art 74 parágrafo único 51 Reparação do dano e renúncia Na realidade foi criada uma espécie sui generis de renúncia tácita art 74 parágrafo único da Lei n 909995 contrariando frontalmente a segunda parte do parágrafo único do art 104 do Código Penal Este novo dispositivo teria revogado o parágrafo único segunda parte do art 104 do Código Penal Sim e não Em outros termos revogou aquele texto do Código quando se tratar de infrações de menor potencial ofensivo que forem da competência do Juizado Especial Já em relação às demais infrações de competência do juízo comum o dispositivo do Código Penal permanece válido e eficaz 52 Ausência de conflito de normas Concluindo a nosso juízo quando as infrações penais praticadas forem da competência dos Juizados Especiais a reparação do dano acarreta a renúncia ao direito de queixa ou representação art 74 parágrafo único no entanto quando nas mesmas circunstâncias as infrações penais praticadas forem da competência da Justiça comum a reparação do dano não implicará renúncia tácita art 104 parágrafo único do CP expresso em relação à queixa Não há conflito de normas a reparação nos crimes ação pública condicionada e privada da competência dos Juizados Especiais tem um efeito e nos da competência da Justiça comum tem outro ou melhor não surte nenhum efeito extintivo É inadmissível neste particular qualquer tentativa de analogia ou interpretação extensiva porque se estaria ferindo o direito irrestrito do ofendido de postular a reparação sem prejuízo de seu direito de petição J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Considerando que o processamento e julgamento dos crimes contra a honra ora deduzidos reclamam a propositura de ação penal privada vige entre os supostos coautores o princípio da indivisibilidade de forma que a renúncia em favor de um deles obrigatoriamente a teor do art 49 do CPP e 104 do CP estendese aos demais gerando quanto a estes da mesma forma a extinção da punibilidade nos termos do art 107 V do CP STJ HC 19088SP Rel Min Félix Fischer j 253 2003 Perdão do ofendido Art 105 O perdão do ofendido nos crimes em que somente se procede mediante queixa obsta ao prosseguimento da ação V arts 51 a 56 do CPP D O U T R I N A 1 Perdão do ofendido O perdão do ofendido consiste na desistência do querelante de prosseguir na ação penal de exclusiva iniciativa privada que iniciou mediante queixacrime Não se confunde com o perdão judicial embora este também constitua causa de extinção da punibilidade art 107 V do CP 2 Formalidade do perdão O perdão do ofendido não exige formalidade especial e poderá ser processual ou extraprocessual isto é poderá ser concedido nos autos do processo ou fora dele Não exige requisitos especiais É suficiente a declaração inequívoca da vontade de perdoar revestida apenas das formalidades destinadas a lhe darem autenticidade J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Estupro Violência presumida Ação penal pública condicionada Sendo a ação penal de titularidade do Ministério Público não têm aplicação os institutos da renúncia do perdão e da perempção próprios e exclusivos da ação penal de iniciativa privada em que se procede mediante queixa STJ RHC 18780SC Rel Min Gilson Dipp j 66 2006 O perdão do ofendido seja ele expresso ou tácito só é causa de extinção da punibilidade nos crimes que se apuram exclusivamente por ação penal privada Precedente STJ HC 44280MG Rel Min Félix Fischer j 6122005 Recusase aplicação aos arts 38 do CPP e 105 do CP em se tratando de crime de violação de direito autoral em decorrência da norma de caráter especial do art 529 do CPP máxime quando antes do prazo fixado naqueles dispositivos há requerimento expresso de abertura de inquérito policial com identificação do responsável autoria viabilizando a realização da perícia condição de procedibilidade da queixa STJ RMS 10589SP Rel Min Fernando Gonçalves j 9 52000 Art 106 O perdão no processo ou fora dele expresso ou tácito V art 61 do CPP I se concedido a qualquer dos querelados a todos aproveita II se concedido por um dos ofendidos não prejudica o direito dos outros III se o querelado o recusa não produz efeito 1º Perdão tácito é o que resulta da prática de ato incompatível com a vontade de prosseguir na ação V art 57 do CPP 2º Não é admissível o perdão depois que passa em julgado a sentença condenatória D O U T R I N A 1 Perdão expresso ou tácito O perdão poderá ser expresso ou tácito Será expresso quando for concedido mediante documento escrito que poderá ser por declaração ou termo nos autos firmado pelo ofendido ou por quem tenha qualidade para representálo Será tácito quando resultar de prática incompatível com a vontade de prosseguir na ação criminal proposta O perdão tácito assim como a renúncia tácita admitirão sua demonstração por qualquer meio de prova art 57 do CPP 2 Limites do perdão O perdão concedido a um dos querelados estenderseá a todos os demais Este dispositivo tem como fundamento dogmático a indivisibilidade da ação penal e como fundamento político evitar que o processo criminal sirva para permitir a vindita privada possibilitando ao particular escolher qual dos ofensores deseja punir Não houvesse essa previsão facilmente poderia ser violado o princípio da indivisibilidade da ação penal art 48 do CPP bastaria propor a ação penal contra todos os autores do crime e depois no curso desta perdoar um ou alguns dos querelados prosseguindo contra os demais 3 Vários querelantes Se houver mais de um querelante o perdão dado por um deles não prejudica o direito dos outros de prosseguir com a ação mantida a indivisibilidade se houver mais de um querelado 4 Bilateralidade do perdão O perdão é um ato bilateral de realização complexa só se completa com sua aceitação pelo querelado Assim havendo mais de um querelado pode um deles não aceitar o perdão Nesse caso a ação prosseguirá somente contra este Esta é a única hipótese excepcional em que o princípio da indivisibilidade da ação penal pode ser quebrado 5 Incondicionalidade do perdão Tanto o perdão quanto a aceitação são incondicionais Como afirmava Magalhães Noronha Perdoase sem exigências e aceitase sem condições 6 Limites temporais do perdão e da renúncia O perdão só pode ocorrer depois de exercido o direito de queixa isto é depois de iniciada a ação penal privada Antes dessa fase a manifestação de desinteresse em processar o infrator caracterizará renúncia ao direito de queixa e não perdão 7 Perdão e a coisa julgada A qualquer momento enquanto não houver decisão condenatória irrecorrível será possível a concessão de perdão mesmo na pendência de recurso especial ou extraordinário art 106 2º do CP 8 Distinções entre perdão e renúncia a A renúncia ao direito de queixa só pode ocorrer antes do oferecimento desta o perdão ao contrário somente após o início da ação penal isto é depois de oferecida a queixacrime b o perdão é um ato da fase processual e a renúncia pertence à fase préprocessual c a renúncia é um ato unilateral o perdão é bilateral isto é depende da aceitação do querelado d a renúncia tem por objeto imediato o direito de querela enquanto o perdão visa a revogação de ato já praticado J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Meros indícios de que terceiras pessoas não denunciadas também praticaram o atentado violento ao pudor contra a vítima não autorizam a concessão do benefício do perdão tácito ainda mais quando tais fatos não tenham nenhuma relação com os da presente ação TJMG Apelação 106290100056150011 Rel Jane Silva j 14122004 O perdão do ofendido seja ele expresso ou tácito só é causa de extinção da punibilidade nos crimes que se apuram exclusivamente por ação penal privada STJ HC 23606RS Rel Min Félix Fischer j 2022003 Título VIII Da Extinção da Punibilidade Extinção da punibilidade Art 107 Extinguese a punibilidade V arts 43 II 58 61 62 67 II e III 131 III 141 581 VIII e IX e 648 VII do CPP V arts 146 187 192 e 193 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal V art 89 5º da Lei n 909995 Juizados Especiais V art 34 da Lei n 924995 Imposto de Renda I pela morte do agente V art 62 do CPP II pela anistia graça ou indulto V arts 21 XVII 48 VIII e 84 XII da CF V art 8º do ADCT V arts 70 I 128 187 a 193 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal V art 2º I da Lei n 807290 crimes hediondos III pela retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso V art 2º parágrafo único do CP IV pela prescrição decadência ou perempção V art 5º XLII e XLIV da CF V arts 38 43 II 60 409 parágrafo único e 497 IX do CPP V pela renúncia do direito de queixa ou pelo perdão aceito nos crimes de ação privada V arts 49 a 60 do CPP VI pela retratação do agente nos casos em que a lei a admite VII Revogado pela Lei n 11106 de 2832005 VIII Revogado pela Lei n 11106 de 2832005 V Súmula 18 do STJ IX pelo perdão judicial nos casos previstos em lei V art 58 parágrafo único do CPP V arts 8º e 39 do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais D O U T R I N A 1 A punibilidade e sua extinção A pena não é elemento do crime mas consequência deste A punição é a consequência natural da realização da ação típica antijurídica e culpável Porém após a prática do fato delituoso podem ocorrer as chamadas causas extintivas que impedem a aplicação ou execução da sanção respectiva No entanto não é a ação que se extingue mas o ius puniendi do Estado De observar que o crime como fato isto é como ilícito penal permanece gerando todos os demais efeitos civis e criminais pois uma causa posterior não pode apagar o que já se realizou no tempo e no espaço 2 Causas extintivas da punibilidade O atual elenco do art 107 não é numerus clausus uma vez que outras causas se encontram capituladas em outros dispositivos como por exemplo o perdão judicial arts 121 5º 129 8º 180 3º 181 240 4º e 348 2º do CP etc a restitutio in integrum art 249 2º as hipóteses do art 7º 2º b e e do CP etc Não se deve confundir no entanto causa extintiva de punibilidade com escusa absolutória embora tenham efeitos semelhantes Aquelas estão previstas na Parte Geral e estas na Parte Especial A seguir definiremos sucintamente cada uma das causas elencadas no referido art 107 3 Morte do agente I Com a morte do agente indiciado réu condenado reabilitando cessa toda atividade destinada à punição do crime processo penal em curso encerrase ou impede que ele seja iniciado e a pena cominada ou em execução deixa de existir Essa causa é uma decorrência natural do princípio da personalidade da pena segundo o qual a pena criminal não pode passar da pessoa do criminoso mors omnia solvit Nem mesmo a pena de multa pode ser transmitida aos herdeiros 31 Morte do agente e dano ex delicto O princípio da personalidade da pena vige tão somente para as sanções criminais pecuniárias ou não sendo inaplicável às consequências civis do crime O espólio do condenado responde pelos danos do crime cuja obrigação se transmite aos seus herdeiros até os limites da herança 32 Falsa morte do agente Há dois entendimentos 1 O pressuposto da declaração de extinção da punibilidade é a morte do agente e como esta não ocorreu a decisão não adquire força de coisa julgada STF RTJ 93986 e 1041063 2 O pressuposto é a certidão falsa e não a morte fictícia A sentença faz coisa julgada formal e material como qualquer decisão fundada em prova falsa Em nossa opinião dependerá da interpretação que se der sobre os limites da proibição constitucional do uso de prova ilícita 4 Anistia graça e indulto II A anistia já se disse é o esquecimento jurídico do ilícito e tem por objeto fatos não pessoas definidos como crimes em regra políticos militares ou eleitorais excluindose normalmente os crimes comuns A anistia pode ser concedida antes ou depois da condenação e como o indulto pode ser total ou parcial A anistia extingue todos os efeitos penais inclusive o pressuposto de reincidência permanecendo contudo a obrigação de indenizar A graça tem por objeto crimes comuns e dirigese a um indivíduo determinado condenado irrecorrivelmente A atual Constituição Federal no entanto não mais consagra a graça como instituto autônomo embora continue relacionada no Código Penal em vigor A iniciativa do pedido de graça pode ser do próprio condenado do Ministério Público do Conselho Penitenciário ou da autoridade administrativa art 188 da LEP O indulto coletivo ou indulto propriamente dito destinase a um grupo indeterminado de condenados e é delimitado pela natureza do crime e quantidade da pena aplicada além de outros requisitos que o diploma legal pode estabelecer 41 Comutação de penas Alguns doutrinadores chamam de indulto parcial a comutação de pena que não extingue a punibilidade diminuindo tão somente a quantidade de pena a cumprir 42 Exclusão constitucional São insuscetíveis de graça ou anistia a prática de tortura o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins o terrorismo e os crimes definidos como hediondos art 5º XLIII da CF e Lei n 807290 43 Competência legislativa A concessão de anistia é de competência exclusiva do Congresso Nacional art 48 VIII da CF independentemente da aceitação dos anistiados e uma vez concedida não pode ser revogada ao passo que a concessão de graça e indulto é prerrogativa do Chefe do Executivo que no entanto poderá delegar a seus Ministros art 84 XII e parágrafo único da CF 5 Abolitio criminis III Toda lei nova que descriminalizar o fato praticado pelo agente extingue o próprio crime e consequentemente se iniciado o processo não prossegue se condenado o réu rescinde a sentença não subsistindo nenhum efeito penal nem mesmo a reincidência 6 Prescrição decadência e perempção IV Prescrição vide anotações aos arts 109 a 118 Decadência é a perda do direito de ação privada ou do direito de representação em razão de não ter sido exercido dentro do prazo legalmente previsto A decadência fulmina o direito de agir atinge diretamente o ius persecuendi Vide anotações ao art 103 Perempção é a perda do direito de prosseguir no exercício da ação penal privada isto é uma sanção jurídica aplicada ao querelante pela sua inércia ou seja pelo mau uso da faculdade que o Poder Público lhe concedeu de agir privativamente na persecução de determinados crimes Na perempção o querelante que já iniciou a ação de exclusiva iniciativa privada deixa de realizar atos necessários ao seu prosseguimento deixando de movimentar o processo levando à presunção de desistência art 60 do CPP 7 Renúncia e perdão aceito V Renúncia é a manifestação de desinteresse de exercer o direito de queixa que só pode ocorrer em ação de exclusiva iniciativa privada e somente antes de iniciála Perdão do ofendido consiste na desistência do querelante de prosseguir na ação penal de exclusiva iniciativa privada O perdão é ato bilateral e só se completa com sua aceitação pelo querelado Vide anotações aos arts 104 a 106 8 Retratação do agente VI Há hipóteses legais em que a retratação exime o réu de pena Esses casos são os de calúnia difamação falso testemunho e falsa perícia Pela retratação o agente reconsidera a afirmação anterior e assim procura impedir o dano que poderia resultar da sua falsidade A injúria não admite retratação 9 Casamento do agente com a vítima VII A Lei n 111062005 com o declarado objetivo de homenagear a mulher brasileira alterando dispositivos considerados discriminatórios na definição de alguns tipos penais no capítulo dos crimes contra os costumes aproveitou para revogar alguns dispositivos do Código Penal como o que definia o crime de adultério Nessa linha digamos honorária foi mais longe e aproveitou para revogar duas causas de extinção da punibilidade esta ora em exame art 107 VII e a prevista no inciso VIII desse mesmo artigo pela singela razão de se referirem aos mesmos crimes sexuais A revogação do inciso VII do art 107 a nosso juízo foi equivocada por duas razões fundamentais a primeira e mais importante é que não encerra nenhuma discriminação à mulher que referido diploma legal pretendeu proteger ao contrário daqueles dispositivos nos quais acertadamente foi suprimida ou alterada a locução mulher honesta a segunda é que a previsão legal não tem o sentido de discriminar ou recomendar o casamento da vítima com seu ofensor como parece ter entendido o legislador ao contrário pretendia apenas oportunizar se sobrevier casamento entre ofensor e vítima o afastamento de ação penal facilitando o êxito conjugal da nova relação que se inicia Seria um contrassenso desejar felicidades aos nubentes que iniciam uma nova vida separados por uma ação penal com o risco de uma condenação sem contar que de regra tais excluídas as infrações praticadas com violência eram de exclusiva iniciativa da ofendida Essa solução equivocada para essa hipótese inciso VII parece nos adequada para a causa seguinte inciso VIII isto é quando o casamento da ofendida celebrarse com outra pessoa que não seu ofensor Contudo a revogação dessas causas extintivas da punibilidade não tem efeito retroativo Na concepção da norma revogada o casamento da vítima com a consequente constituição da família a livrava da desonra e reparava lhe o mal causado pela conduta delituosa do agente Ademais como se tratava de regra de ação privada a convolação de núpcias entre ofensor e vítima implicava o mais completo perdão aceito além da reparação moral restabelecedora do statu quo ante Contudo com o advento da Lei n 120152009 esse efeito teria desaparecido com a transformação da ação penal em pública condicionada nos crimes contra a liberdade sexual ou contra vítima vulnerável 91 Casamento para evitar pena criminal art 1520 do CC Harmonizandose com o texto anterior do Código Penal o atual Código Civil em seu art 1520 prevê que a idade núbil pode ser reduzida Excepcionalmente será permitido o casamento de quem ainda não alcançou a idade núbil art 1517 para evitar imposição ou cumprimento de pena criminal ou em caso de gravidez pelo juiz quando se tratar de vítima de crime sexual No entanto como recorda Rogério Sanches Cunha perdeu sentido referido dispositivo do Código Civil que autorizava o juiz cível a reduzir a idade núbil da vítima para casar e evitar pena criminal Com efeito o casamento da vítima com o agente apesar de não mais extinguir a punibilidade por si só continuava servindo como renúncia ou perdão da vítima basicamente com a mesma consequência de extinção da punibilidade considerando que antes da Lei n 120152009 a ação penal era de exclusiva iniciativa privada Dito de outro modo a previsão do art 1520 do Código Civil tornouse absolutamente inócua para fins penais a partir da vigência da Lei n 120152009 Valerá somente para evitar a gravidez 10 Casamento da vítima com terceiro VIII Esse dispositivo foi revogado pela Lei n 111062005 contudo como não tem efeito retroativo continuará sendo aplicado nos fatos praticados antes de sua entrada em vigor justificandose a manutenção das considerações que lhe fizemos oportunamente Essa previsão tinha a finalidade de proteger a privacidade e a estrutura familiar da ofendida já que a instauração ou o prosseguimento da ação penal poderiam causar males mais graves do que a impunidade do ofensor A presente causa extintiva dependia da ocorrência simultânea de três condições a casamento da vítima com terceiro b ausência de violência real ou grave ameaça c inércia da vítima por mais de sessenta dias a contar da celebração do casamento Assim essa causa tinha uma regra e duas exceções o casamento da vítima com terceiro extinguia a punibilidade porém desde que os crimes não tivessem sido praticados com violência real ou grave ameaça e que a ofendida no prazo de sessenta dias a contar da celebração do casamento não tivesse pedido o prosseguimento da persecução penal 11 Perdão judicial IX Entendemos que se trata de um direito público subjetivo de liberdade do indivíduo a partir do momento que preenche os requisitos legais Como dizia Frederico Marques os benefícios são também direitos pois o campo do status libertatis se vê ampliado por eles de modo que satisfeitos seus pressupostos o juiz é obrigado a concedêlos Ademais é inconcebível que uma causa extintiva de punibilidade fique relegada ao puro arbítrio judicial 111 Alguns casos especiais de perdão judicial No delito de injúria a lei prevê o perdão judicial quando o ofendido de modo reprovável a provocar diretamente ou no caso de retorsão imediata no homicídio e lesão corporal culposos se as consequências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária Mesmo quando a lei possibilita o perdão judicial conforme as circunstâncias ou tendo em consideração as circunstâncias arts 176 parágrafo único e l80 3º do CP prevê requisito implícito qual seja a pequena ofensividade da conduta que se estiver caracterizado obrigará a concessão do perdão 112 Natureza da sentença concessiva do perdão judicial A reforma penal de 1984 incluiuo entre as causas extintivas de punibilidade e explicitou na Exposição de Motivos n 98 que a sentença que o concede não produz efeitos de sentença condenatória O acerto da inclusão do perdão judicial no art 107 IX não se repetiu ao tentar reforçar no art 120 a natureza da sentença concessiva propiciando a sobrevivência do equivocado entendimento de que se trata de sentença condenatória que somente livra o réu da pena e do pressuposto da reincidência A nosso juízo referida sentença é simplesmente extintiva da punibilidade sem qualquer efeito penal principal ou secundário J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A a Morte Morte do agente atestada pela certidão de óbito A punibilidade da ação penal está extinta com base no art 107 I do Código Penal TJRS Apelação 70013210422 Rel José Antônio Cidade Pitrez j 22122005 Homicídio qualificado Pedido de trancamento da ação penal e revogação da prisão preventiva extinção da punibilidade pela morte do agente Trânsito em julgado certidão de óbito falsa Inocorrência de ofensa à coisa julgada Falsa a certidão impõese a revogação da extinção da punibilidade decretada e a consequente retomada da ação penal bem como por óbvio o recolhimento do acusado à prisão TJMG HC 100000340029560001 Rel Edelberto Santiago j 3092003 Decisão que extinguiu a punibilidade do réu pela morte Equívoco Retratação Violação à coisa julgada Inocorrência O desfazimento da decisão que admitindo por equívoco a morte do agente declarou a punibilidade não constitui ofensa à coisa julgada STF HC 60095RJ Rel Min Rafael Mayer STJ RHC 14662SP Rel Min Félix Fischer j 1982003 Falecimento do acusado Extinção da punibilidade A morte do agente é causa de extinção da punibilidade prevista no art 107 I do Código Penal Assim com a morte do acusado resta prejudicado o presente conflito STJ Conflito de Competência 20737SP Rel Min Jorge Scartezzini j 1392000 b Anistia graça ou indulto Indulto Réu condenado por delito de tráfico não tem direito a indulto crime excepcionado no artigo 5º inciso XLIII da Constituição Federal Paraplegia anterior à condenação não beneficia o apenado A doença grave que exija cuidados diários e permanentes não oferecidos pelo sistema carcerário se comprovada oficialmente poderá autorizar benefícios mas não o indulto TJRS Agravo em Execução 70018306787 Rel Elba Aparecida Nicolli Bastos j 822007 Apelante que portava uma arma de fogo revólver Rossi cal 38 municiado com 5 cartuchos sem autorização Impossibilidade de absolvição A materialidade autoria e culpabilidade do apelante restaram sobejamente demonstradas pelo conjunto probatório carreado aos autos A anistia decorrente do Estatuto do Desarmamento beneficia apenas os possuidores de arma de fogo não sendo extensiva àqueles que portam arma de fogo em via pública TJRJ Apelação 200605005479 Rel Gizelda Leitão Teixeira j 5122006 Indulto coletivo A concessão de indulto coletivo por iniciativa do Presidente da República independe de pronunciamento do Conselho Penitenciário STJ AgRg no Ag 330705SP Rel Min Paulo Medina j 27102005 A comutação da pena está alcançada pelo gênero graça revelandose verdadeiro indulto parcial Consoante dispõe o inciso XLIII do artigo 5º da Constituição Federal os crimes definidos como hediondos não são alcançados pela graça notandose a vedação legal no inciso I do art 2º da Lei n 807290 STF HC 85921RJ Rel Min Marco Aurélio j 2962005 A concessão de indulto aos condenados a penas privativas de liberdade inserese no exercício do poder discricionário do Presidente da República limitado à vedação prevista no inciso XLIII do art 5º da Carta da República A outorga do benefício precedido das cautelas devidas não pode ser obstado por hipotética alegação de ameaça à segurança social que tem como parâmetro simplesmente o montante da pena aplicada Revelase inconstitucional a possibilidade de que o indulto seja concedido aos condenados por crimes hediondos de tortura terrorismo ou tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins independentemente do lapso temporal da condenação STF ADIMC 2795DF Rel Min Maurício Corrêa j 852003 Indulto Fixadas exaustivamente as condições objetivas à obtenção do indulto mostrase indevida a inclusão de outros requisitos pela autoridade judiciária sob pena de se substituir a quem detém os poderes de clemência sem dispor de delegação para tanto STJ HC 11730SP Rel Min Hamilton Carvalhido j 1010 2000 c Abolitio criminis Crime do art 12 2º inciso III da Lei n 636876 Não previsão pela nova Lei n 113432006 que reprime e define os crimes de entorpecente Abolitio criminis Extinção da punibilidade A norma penal que embasou a condenação do apenado qual seja art 12 2º inciso III da Lei n 636876 que tipificava a conduta daquele que contribuía de qualquer forma para incentivar ou difundir o uso indevido ou o tráfico ilícito de substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica encontrase expressamente revogada pela n Lei 113432006 que não criminalizou a conduta atribuída ao apenado TJRJ Agravo 200707601865 Rel Ricardo Bustamante j 2622008 Contravenção penal Conduta de veículo sem habilitação Fato posterior à Lei n 950397 Abolitio criminis O ato voluntário de dirigir veículo automotor sem possuir a Carteira de Habilitação antes definido como contravenção penal recebeu novo tratamento jurídico após a edição do novo Código Nacional de Trânsito Ocorrido o fato depois da vigência da Lei n 950397 e não tendo a conduta do réu ocasionado efetivo perigo de dano extinta estará a punibilidade pela abolitio criminis STJ REsp 373422SP Rel Min Vicente Leal j 1642002 d Prescrição decadência ou perempção A r sentença condenou o ora paciente à pena de 2 dois anos de reclusão afora multa a qual foi substituída por pena restritiva de direitos consistente em pagamento de cestas básicas O último pagamento de cesta básica registrado foi em 2810 2003 Daí em diante não se registrou outra causa interruptiva da prescrição Logo pela pena in concreto o lapso prescricional é de 4 quatro anos reduzido pela metade em razão da menoridade do paciente ao tempo do crime Portanto in casu extinta está a punibilidade pela prescrição da pretensão executória ex vi arts 107 inciso IV 109 inciso V 112 inciso II e 115 todos do Código Penal STJ HC 74872SP Rel Min Félix Fischer j 25102007 É de se declarar a extinção da punibilidade dos recorrentes pela prática em tese do crime previsto no art 2º inciso II da Lei n 813790 pela ocorrência da prescrição da pretensão punitiva se entre a data do recebimento da denúncia 27101993 e do julgamento do recurso de apelação interposto 1742002 transcorreu prazo superior à 04 quatro anos ex vi arts 107 inciso IV e 109 inciso V ambos do Código Penal tomandose em consideração a pena abstratamente prevista para o crime em questão haja vista a inexistência de qualquer marco interruptivo entre as datas apontadas STJ REsp 949982SP Rel Min Félix Fischer j 2792007 Perempção A falta de oferta de alegações finais pelo querelante implica a perempção na forma do art 60 III do CPP cuja proclamação se impunha independentemente de pedido da parte a quem aproveitaria Declaração de extinção da punibilidade com desconstituição da sentença prejudicado o exame das questões vertidas no apelo TJRS Apelação 70010018513 Rel Marcelo Bandeira Pereira j 482005 Decadência A ausência dos requisitos elencados no art 44 do CPP é vício sanável durante o curso do prazo decadencial para o exercício do direito de queixa que uma vez decorrido leva à extinção da punibilidade pela decadência art 107 IV do CP STJ RHC 17390SP Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 1462005 A perempção perda do direito de ação motivada pela inércia processual do querelante com a consequente extinção da punibilidade é instituto próprio da ação penal privada não podendo ser invocada quando a persecução criminal é iniciada pelo Ministério Público mediante representação em virtude da prática de crime contra a honra de funcionário público no exercício de suas funções ou em razão delas STJ HC 32577MT Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 582004 e Renúncia ao direito de queixa A questão não comporta mais controvérsia nas Cortes Superiores que já pacificaram o entendimento de que o crime de lesão corporal culposa art 303 do CTB absorve o delito de direção sem habilitação art 309 do CTB funcionando este como causa de aumento de pena art 303 parágrafo único do CTB Destarte extinta a punibilidade do agente em face da expressa renúncia da vítima ao direito de representação pelo delito de lesão corporal também fica extinta a punibilidade com relação ao crime de direção sem habilitação menos grave porquanto absorvido STJ HC 25082SP Rel Laurita Vaz j 1832004 Exercido o direito de renúncia pelo querelante em relação às condutas típicas descritas nos artigos 138 e 140 3º ambos do Código Penal resta caracterizada a extinção da punibilidade a teor do art 107 V do Código Penal STJ Apn 254RJ Rel Min Franciulli Netto j 17122003 f Retratação do agente Falso testemunho Retratação Coautoria Extensão A retratação no crime de falso testemunho por deixar de produzir seus efeitos devolvendo a verdade sobre fatos juridicamente relevantes antes da sentença comunicase igualmente ao coautor que orientou induziu ou instigou a testemunha a mentir em juízo Declarada extinta a punibilidade em relação ao corréu TJRS Apelação 70012245981 Rel José Eugênio Tedesco j 27102005 Falso testemunho Retratação A retratação do agente de crime de falso testemunho antes da sentença final extingue a punibilidade TJRS Apelação 70006528145 Rel Gaspar Marques Batista j 1482003 g Perdão judicial Súmula 18 do STJ A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória da extinção da punibilidade não subsistindo qualquer efeito condenatório Pretensão defensiva objetivando o reconhecimento do perdão judicial Descabimento Evidenciada nos autos a conduta culposa do agente que conduzia o veículo com imprudência imprimindo velocidade excessiva ao percorrer trecho de estrada em declive estando a pista molhada Restou comprovado que no momento do acidente a visibilidade era quase nula circunstância que fez com que a caminhonete quebrasse uma mureta e descesse ribanceira abaixo provocando a morte de seu irmão O benefício almejado não deve ser concedido indiscriminadamente em todos os casos de crimes culposos em que a vítima seja parente próximo do condutor ainda mais quando configurado um dos elementos da culpa Caracterizada a violação do dever de cuidado TJRJ Apelação 200505005211 Rel Adílson Vieira Macabu j 1292006 Acidente automobilístico Perdão judicial Morte do irmão e amigo do réu Concessão Benefício que aproveita a todos Sendo o perdão judicial uma das causas de extinção de punibilidade art107 inciso IX do CP se analisado conjuntamente com o art 51 do Código de Processo Penal o perdão concedido a um dos querelados aproveitará a todos deduzse que o benefício deve ser aplicado a todos os efeitos causados por uma única ação delitiva O que é reforçado exemplo no crime de dano qualificado pela lesão corporal a eventual prescrição desta não afasta a qualificadora daquele 2 A incomunicabilidade nos crimes conexos A extinção da punibilidade de um dos crimes não impede quanto aos outros a agravação resultante da conexão Exemplo no homicídio qualificado por ter sido praticado para ocultar outro crime a prescrição deste não afasta a qualificadora daquele J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A extinção da punibilidade dos crimes em testilha não se estende aos eventuais delitos a eles conexos ou dos quais são pressupostos ou elementos constitutivos não havendo óbice às devidas apurações e persecuções penais nos exatos termos do art 108 do Código Penal TRF 3ª Região RESE 200161810066731 Rel Fausto de Sanctis j 4112003 Prescrição antes de transitar em julgado a sentença Art 109 A prescrição antes de transitar em julgado a sentença final salvo o disposto nos 1º e 2º do art 110 deste Código regulase pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime verificandose V art 5º XLII e XLIV da CF I em 20 vinte anos se o máximo da pena é superior a 12 doze II em 16 dezesseis anos se o máximo da pena é superior a 8 oito anos e não excede a 12 doze III em 12 doze anos se o máximo da pena é superior a 4 quatro anos e não excede a 8 oito IV em 8 oito anos se o máximo da pena é superior a 2 dois anos e não excede a 4 quatro V em 4 quatro anos se o máximo da pena é igual a 1 um ano ou sendo superior não excede a 2 dois VI em 3 três anos se o máximo da pena é inferior a 1 um ano Parágrafo único Prescrição das penas restritivas de direito Parágrafo único Aplicamse às penas restritivas de direito os mesmos prazos previstos para as privativas de liberdade D O U T R I N A 1 Limitação do poder punitivo Com a ocorrência do fato delituoso nasce para o Estado o ius puniendi Esse direito que se denomina pretensão punitiva não pode eternizarse como uma espada de Dâmocles pairando sobre a cabeça do indivíduo Por isso o Estado estabelece critérios limitadores para o exercício do direito de punir e levando em consideração a gravidade da conduta delituosa e da sanção correspondente fixa lapso temporal dentro do qual o Estado estará legitimado a aplicar a sanção penal adequada 2 Definição de prescrição Escoado o prazo que a própria lei estabelece observadas suas causas modificadoras prescreve o direito estatal à punição do infrator Assim podese definir prescrição como a perda do direito de punir do Estado pelo decurso de tempo em razão do seu não exercício dentro do prazo previamente fixado A prescrição constitui causa extintiva da punibilidade art 107 IV 1ª figura do CP 3 Retrocesso da Constituição cidadã Contrariando a orientação contemporânea do moderno Direito Penal liberal que prega a prescritibilidade de todos os ilícitos penais a Constituição brasileira de 1988 declara que são imprescritíveis a prática do racismo e a ação de grupos armados civis ou militares contra a ordem constitucional e o Estado Democrático art 5º XLII e XLIV 4 Natureza jurídica da prescrição Para alguns autores a prescrição é instituto de direito material para outros é de direito processual Para o ordenamento jurídico brasileiro contudo é instituto de direito material regulado pelo Código Penal e nessas circunstâncias contase o dia do seu início 5 Natureza publicística da prescrição A prescrição é de ordem pública devendo ser decretada de ofício a requerimento do Ministério Público ou do interessado Constitui preliminar de mérito ocorrida a prescrição o juiz não poderá enfrentar o mérito devendo de plano declarar a prescrição em qualquer fase do processo 6 Ius puniendi e ius punitionis Com a prática do crime o direito abstrato de punir do Estado concretizase originandose o direito estatal de punir Assim praticado o crime e antes de a sentença penal transitar em julgado o Estado é titular da pretensão punitiva Com o trânsito em julgado da decisão condenatória o ius puniendi concreto transformase em ius punitionis isto é a pretensão punitiva convertese em pretensão executória 61 Distinção entre ius puniendi e ius punitionis Da distinção entre ius puniendi e ius punitionis decorre a classificação da prescrição em prescrição da pretensão punitiva impropriamente denominada prescrição da ação penal e prescrição da pretensão executória também chamada de prescrição da pena 7 Prescrição da pretensão punitiva A prescrição da pretensão punitiva só poderá ocorrer antes de a sentença penal transitar em julgado e tem como consequência a eliminação de todos os efeitos do crime é como se este nunca tivesse existido 71 Termo inicial da prescrição da pretensão punitiva O lapso prescricional começa a correr a partir da data da consumação do crime ou do dia em que cessou a atividade criminosa art 111 apresentando contudo causas que o suspendem art 116 ou o interrompem art 117 72 Modalidades de prescrição da pretensão punitiva A prescrição da pretensão punitiva subdividese em prescrição abstrata prescrição retroativa e prescrição intercorrente que a seguir serão analisadas 721 Prescrição da pretensão punitiva abstrata Denominase prescrição abstrata porque ainda não existe pena concretizada na sentença para ser adotada como parâmetro aferidor do lapso prescricional 722 Parâmetro regulador da prescrição abstrata O prazo da prescrição abstrata regulase pela pena cominada ao delito isto é pelo máximo da pena privativa de liberdade abstratamente prevista para o crime segundo a tabela do art 109 do CP Assim por exemplo a pretensão estatal prescreve em vinte anos se o máximo da pena é superior a doze art 109 I ou em dois anos se o máximo da pena é inferior a um art 109 VI 723 Como encontrar o prazo prescricional abstrato Para encontrálo devemse tomar as seguintes providências a devese observar o máximo de pena privativa de liberdade cominado à infração penal considerase o limite máximo cominado ao delito porque será o limite que poderá atingir a pena que for concretizada na sentença b verificar no art 109 do CP o prazo prescricional correspondente àquele limite de pena cominada prazo preliminar este prazo é básico ou preliminar porque poderá sofrer a incidência de majorantes ou minorantes de aplicação obrigatória bem como menoridade ou velhice que naturalmente alterarão seu limite c verificar se há alguma das causas modificadoras desse prazo 1 majorantes ou minorantes obrigatórias exceto as referentes ao concurso formal próprio e ao crime continuado devese considerar a eventual existência de causas modificadoras da pena quais sejam as majorantes ou minorantes excluindose evidentemente as agravantes e atenuantes Em se tratando de majorante devese considerar o fator que mais aumente e em se tratando de minorante o fator que menos diminua a pena 2 menoridade ou velhice art 115 se o agente era ao tempo do crime menor de vinte e um anos ou na data da sentença maior de setenta o prazo prescricional reduzirseá pela metade Com a incidência dessas causas modificadoras sobre o máximo da pena cominada encontrarseá o prazo prescricional definitivo J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 338 do STJ A prescrição penal é aplicável nas medidas socioeducativas A pena de multa e prestação pecuniária modalidade de pena restritiva de direitos possuem naturezas jurídicas distintas As penas restritivas de direitos prescrevem no mesmo prazo em que prescreveria a pena privativa de liberdade que elas substituíram STJ HC 74872SP Rel Min Félix Fischer j 25102007 A prescrição antes da sentença condenatória contase pelo máximo da pena privativa de liberdade computandose aí também o aumento pela eventual majorante específica Precedentes STJ HC 61371BA Rel Min Félix Fischer j 5 122006 Calúnia Injúria e Difamação Transcorridos mais de quatro anos entre a data dos fatos narrados na exordial ausente qualquer causa interruptiva prescrita está a pretensão punitiva relativamente aos crimes de injúria e difamação a teor do art 109 V do Código Penal Quanto ao crime de calúnia impõese o recebimento da denúncia não se exigindo nesta fase processual comprovação induvidosa da existência da infração STJ REsp 706573CE Rel Min Félix Fischer j 1782006 As penas restritivas de direitos prescrevem no mesmo prazo em que prescreveria a pena privativa de liberdade que elas substituíram Se a pena privativa de liberdade é de 2 dois anos de reclusão tendo ocorrido o trânsito em julgado para a acusação há que se declarar a extinção da punibilidade pelo advento da prescrição da pretensão punitiva visto que entre os marcos interruptivos transcorreu lapso temporal maior que quatro anos arts 107 inciso IV 109 inciso V e 110 1º do CP STJ HC 48972SE Rel Min Félix Fischer j 1º62006 De acordo com o Código Penal temse que a prescrição somente se regula pela pena concretamente aplicada ou ainda pelo máximo de sanção abstratamente previsto É imprópria a decisão que extingue a punibilidade com base em pena em perspectiva Precedentes STJ REsp 817505PR Rel Min Gilson Dipp j 204 2006 Está prescrita a pretensão punitiva do Estado quando houver transcorrido tempo superior ao prazo prescricional considerandose para tanto a data da consumação do crime a pena máxima cominada em abstrato ao tipo penal a idade avançada do acusado à míngua de outro marco interruptivo da prescrição TRF3ª Região RESE 200161810011535 Rel André Nekatschalow j 762004 Transcorrido o prazo quadrienal previsto no art 109 inc V do CP entre a data do recebimento da denúncia e a da publicação da sentença condenatória levandose em conta a pena concretamente aplicada a cada crime de forma isolada por se tratar de concurso material declarase a extinção da punibilidade pela ocorrência da prescrição retroativa STJ HC 11991MS Rel Min Gilson Dipp j 1362000 Na prescrição pela pena in abstractu a exacerbação correspondente à forma qualificada eleva o máximo legal e deve ser considerada STJ RHC 8973RJ Rel Min Vicente Leal j 232000 Prescrição depois de transitar em julgado sentença final condenatória Art 110 A prescrição depois de transitar em julgado a sentença condenatória regulase pela pena aplicada e verifica se nos prazos fixados no artigo anterior os quais se aumentam de um terço se o condenado é reincidente V arts 63 e 64 do CP V art 336 parágrafo único do CPP V Súmula 604 do STF 1º A prescrição depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação ou depois de improvido seu recurso regulase pela pena aplicada não podendo em nenhuma hipótese ter por termo inicial data anterior à denúncia ou queixa V Súmula 146 do STF V Súmula 186 do TFR 2º revogado V art 394 do CPP D O U T R I N A 1 Três modalidades de prescrição Este dispositivo contém três modalidades de prescrição 1ª o caput disciplina a prescrição da pretensão executória 2ª o 1º disciplina a prescrição superveniente ou intercorrente 3ª a conjugação dos dois parágrafos disciplina a prescrição retroativa Essas três modalidades de prescrição levam em consideração a pena concretizada na condenação 2 Prescrição da pretensão executória A prescrição da pretensão executória só poderá ocorrer depois de transitar em julgado a sentença condenatória regulandose pela pena concretizada art 110 e verificandose nos mesmos prazos fixados no art 109 O decurso do tempo sem o exercício da pretensão executória faz com que o Estado perca o direito de executar a sanção imposta na condenação 21 Efeitos da prescrição da pretensão executória Os efeitos dessa prescrição limitamse à extinção da pena permanecendo inatingidos todos os demais efeitos da condenação penais e extrapenais 22 Pressupostos da prescrição da pretensão executória O lapso prescricional da pretensão executória depende de a inocorrência de prescrição da pretensão punitiva seja abstrata retroativa ou intercorrente b sentença condenatória irrecorrível c não satisfação da pretensão executória estatal 23 Como encontrar o prazo prescricional a Tomar a pena privativa de liberdade imposta na sentença condenatória 1 na hipótese de fuga ou de revogação de livramento condicional tomarseá o restante de pena a cumprir para a obtenção do prazo prescricional art 113 do CP 2 no caso de concurso formal e de crime continuado deverá também ser desprezado o quantum de majoração a eles pertinente b Verificar qual é o prazo prescricional correspondente art 109 do CP c Analisar a existência de causas modificadoras do lapso prescricional 1 reincidência reconhecida na sentença eleva em um terço o prazo prescricional 2 art 115 do CP reduz pela metade o lapso prescricional 3 Prescrição da pretensão punitiva retroativa A prescrição retroativa leva em consideração a pena aplicada in concreto na sentença condenatória contrariamente à prescrição in abstrato que tem como referência o máximo de pena cominada ao delito A prescrição retroativa igualmente à intercorrente como subespécie da prescrição da pretensão punitiva constitui exceção à contagem dos prazos do art 109 31 Marco da prescrição retroativa A prescrição retroativa era considerada entre a consumação do crime e o recebimento da denúncia ou entre este e a sentença condenatória art 110 2º do CP Esse parágrafo segundo foi revogado pela Lei n 122342010 como veremos logo adiante Nada impede que a prescrição retroativa ocorra entre a consumação do fato e o acórdão condenatório de segundo grau tendo havido sentença absolutória A pronúncia nos crimes contra a vida também cria um novo marco interruptivo para a prescrição retroativa 32 Pressupostos da prescrição retroativa O lapso prescricional retroativo depende de a inocorrência da prescrição abstrata b sentença penal condenatória c trânsito em julgado para a acusação ou improvimento de seu recurso 33 Como encontrar o prazo prescricional Para encontrar o prazo prescricional na modalidade retroativa devemse adotar as seguintes providências a tomar a pena concretizada na sentença condenatória dever seá computar toda a pena aplicada com exceção da majoração decorrente do concurso formal próprio e do crime continuado A detração somente é aproveitada para a execução da pena ou para a prescrição da pretensão executória b verificar qual é o prazo prescricional correspondente art 109 do CP c analisar a existência de causa modificadora do lapso prescricional cuja única possibilidade é a do art 115 34 Prescrição retroativa hipotética Não há suporte jurídico para o reconhecimento antecipado da prescrição retroativa como se está começando a apregoar com base numa pena hipotética Ademais o réu tem direito a receber uma decisão de mérito onde espera ver reconhecida a sua inocência Decretar a prescrição retroativa com base em hipotética pena concretizada encerra uma presunção de condenação consequentemente de culpa violando os princípios constitucionais da presunção de inocência e do devido processo legal art 5º LVII da CF 4 Prescrição da pretensão punitiva intercorrente ou subsequente A prescrição intercorrente também leva em consideração a pena aplicada in concreto na sentença condenatória poderseia dizer trata se de uma subespécie da prescrição retroativa As prescrições retroativa e intercorrente assemelhamse com a diferença de que a retroativa se volta para o passado isto é para períodos anteriores à sentença em regra e a intercorrente se dirige para o futuro ou seja para períodos posteriores à sentença condenatória recorrível Na verdade a própria prescrição intercorrente tem caráter retroativo pois quando de seu reconhecimento voltase para o passado até a decisão condenatória que é seu marco inicial 41 Marco temporal da prescrição intercorrente O prazo da prescrição intercorrente superveniente ou subsequente começa a correr a partir da sentença condenatória até o trânsito em julgado para acusação e defesa 42 Pressupostos da prescrição intercorrente O lapso prescricional intercorrente depende de a inocorrência de prescrição abstrata e de prescrição retroativa b sentença condenatória c trânsito em julgado para acusação ou improvimento de seu recurso 43 Como encontrar o prazo prescricional Para encontrar o prazo prescricional na modalidade intercorrente devemse adotar as seguintes providências a tomar a pena concretizada na sentença condenatória deverseá computar toda a pena aplicada com exceção da majoração decorrente do concurso formal próprio e do crime continuado A detração somente é aproveitada para a execução da pena ou para a prescrição da pretensão executória b verificar qual é o prazo prescricional correspondente art 109 do CP c analisar a existência de causa modificadora do lapso prescricional cuja única possibilidade é a do art 115 5 Supressão de parcela da prescrição retroativa inconstitucionalidade manifesta 51 A prescritibilidade das infrações penais com duas exceções A regra geral na Constituição Federal é da prescritibilidade das infrações penais excluindo expressamente apenas as hipóteses constantes dos incisos XLII e XLIV de seu art 5º Em outros termos considerou imprescritíveis somente o racismo Lei n 771689 e os crimes decorrentes da ação de grupos armados civis ou militares contra a ordem constitucional e o Estado Democrático de Direito Leis n 717083 e 903495 Os prazos contudo em que essa prescrição pode configurarse é objeto da legislação infraconstitucional que pode legislar sobre prescrição desde que além de respeitar a garantia da duração razoável do processo não a suprima ou não a exclua ainda que parcialmente tornando inócua ou contraditória sua regulamentação como ocorre com a previsão trazida pela Lei n 122342010 Embora a Lei n 122342010 não tenha suprimido o instituto da prescrição de nosso ordenamento jurídico ao excluir a prescrição retroativa em data anterior ao recebimento da denúncia afronta os princípios do não retrocesso ou da proporcionalidade e da duração razoável do processo A violação aos direitos fundamentais do cidadão limitandoos suprimindoos ou excluindoos a pretexto de combater a impunidade é muito mais relevante que possíveis efeitos positivos que porventura possam ser atingidos 52 Oficializado o engavetamento de investigações preliminares A Lei n 122342010 surpreendentemente estabelece novas regras para a prescrição da pretensão punitiva particularmente em sua modalidade retroativa Com alterações nos arts 109 e 110 do Código Penal o novo diploma legal altera limites da prescrição propriamente dita e suprime parcela da prescrição retroativa Ambas permitiam reconhecer a prescrição desde o seu nascedouro isto é inclusive entre a prática do fato e o recebimento da denúncia Pois a Lei n 122342010 proibiu o reconhecimento dessa prescrição entre a prática do fato delituoso e o recebimento da denúncia permitindo dessa forma que polícia e Ministério Público possam retardar impunemente as investigações criminais bem como o início da ação penal em até vinte anos Indagase afinal por que a pena concreta fixada pelo magistrado pode retroagir para o cálculo da prescrição entre o recebimento da denúncia e a sentença condenatória mas não entre a prática do fato e a admissão da denúncia ou queixa Qual o fundamento lógico jurídico ou político para essa restrição normativa Qual seria o elemento relevante que justificaria esse tratamento diferenciado ao mesmo instituto em situações ontologicamente iguais Não há respostas lógicas coerentes jurídicas ou políticas para essas indagações eis que o disposto nos arts 2º e 4º da Lei n 122342010 afronta o bom senso a equidade a isonomia a proporcionalidade a razoabilidade e a própria culpabilidade Indiscutivelmente tratase de meio inadequado para combater a invocada impunidade a despeito de representar uma forma eloquente de o Estado reconhecer a sua incompetência e o seu despreparo para combatêla 53 Ausência de parâmetros para a prescrição in concreto A regência inicial baseada na prescrição in abstracto isto é com base na pena máxima cominada devese exclusivamente à inexistência de elementos para a individualização da pena in concreto que demanda a existência do devido processo legal Encontrada a pena aplicável evidentemente será ela o parâmetro para o exame da incidência da prescrição em todo o seu percurso sendo vedada a supressão de qualquer de suas fases antes ou depois do recebimento da denúncia Aliás essa é a pena justa de que falava Von Liszt qual seja a pena necessária e suficiente para a prevenção e repressão do crime individualizada nos termos do art 59 e seguintes do Código Penal brasileiro O objetivo da prescrição pela pena in concreto é compatibilizar a extinção da punibilidade com o grau de culpabilidade do autor e por consequência de reprovabilidade do comportamento do agente devidamente reconhecido em sentença Em outros termos a prescrição retroativa é um corolário dos princípios da personalidade e da individualização da pena além de demonstrar in concreto que é exatamente a sanção merecida desde o momento em que se consumou o fato delituoso e não aquela abstratamente prevista na norma incriminadora que apenas tem a função de estabelecer os limites mínimo e máximo dentro dos quais o magistrado deverá dosar a pena aplicável ao caso concreto 54 Irrazoável demora do processo fere a dignidade da pessoa humana Tratase de odioso e equivocado retrocesso imposto pelo legislador infraconstitucional com esse diploma legal afrontando além dos princípios da proporcionalidade proibição de excesso e da própria culpabilidade a garantia constitucional da razoável duração do processo A irrazoável demora da investigação do processo enfim da persecutio criminis atinge diretamente a dignidade da pessoa humana que não pode ficar ad eternum sob suspeita ou investigação estatal Com efeito a aplicação da pena depois de decorrido um longo período de tempo encontrará com certeza um acusado completamente modificado distante diferente daquele que praticou a infração penal é como se fosse outro homem que estaria sendo julgado e não aquele que cometeu a infração penal Não se pode olvidar que em um Estado Constitucional Democrático de Direito a lei penal não vige somente para punir o infrator mas igualmente para proteger o cidadão contra os abusos frequentemente praticados pelo Estado constituindo uma espécie de Carta Magna do cidadão investigado contra os abusos do poder repressivo estatal 6 Supressão de parcela do lapso prescricional e violação do princípio da proporcionalidade Qual seria o fundamento lógico jurídico ou político para que o tempo de prescrição contado após o recebimento da denúncia seja diferente daquele contado antes deste fato Haveria algum fundamento de outra natureza dentro da razoabilidade No sistema penal brasileiro os prazos prescricionais estão diretamente vinculados à duração das penas nos termos contidos no art 109 de nosso Código Penal Dito de outra forma a extensão do prazo prescricional está diretamente relacionada à gravidade da pena tanto daquela cominada art 109 quanto a que for concretizada na decisão condenatória art 110 Comprovase aqui claramente a adoção do princípio da proporcionalidade ou seja a pena mais grave corresponde ao lapso prescricional mais extenso a pena menos grave corresponde a prescrição em menor prazo A prescrição in abstracto trabalha com uma pena hipotética ante a ausência de uma pena real que só poderá existir isto é somente se concretizará em futura decisão condenatória quando surgirá a verdadeira pena não somente a pena legal mas a pena justa A prescrição abstrata desconsidera a individualização da pena e a culpabilidade de cada um pairando apenas como limite máximo ante a ausência da pena individualizada e cederá somente quando esta passar a existir sem possibilidade de ser elevada com trânsito em julgado para a acusação Constatase que na hipótese da prescrição abstrata não existe proporção entre culpabilidade pena e prescrição real trinômio que somente aparecerá quando for a pena individualizada em decisão condenatória embora exista proporcionalidade é verdade entre os lapsos prescricionais e a gravidade das sanções cominadas in abstracto como destacamos acima ainda que sobre uma pena hipotética Enfim concretizada a condenação desaparece a razão de ser da pena hipotética que perde sua função indicadora dos limites mínimo e máximo dentro dos quais o juiz deve dosar a pena final Consequentemente a prescrição com base na pena abstrata isto é hipotética deixa de produzir qualquer efeito sobre o condenado cujo lapso prescricional passará a ser medido pela pena real que é sua pena individualizada após o trânsito em julgado para a acusação 61 A culpabilidade é a medida da pena e esta a medida da prescrição Não se pode esquecer que a culpabilidade é a medida da pena a qual não pode ir além desse limite Dessa forma devese reconhecer que a culpabilidade repercute diretamente na pena e indiretamente na prescrição Nesse sentido por sua pertinência invocamos a conclusão de Herman Herschander HERSCHANDER Herman Lei n 12234 de 5 de maio de 2010 ofensa a individualização do prazo prescricional in Boletim do IBCCrim ano 18 n 212 julho de 2010 p 7 in verbis Há portanto no direito penal vigente uma busca de proporcionalidade entre culpabilidade pena e prescrição A culpabilidade deve ser a medida da pena a pena deve ser a medida da prescrição Consequentemente dessa inafastável correlação entre culpabilidade pena e prescrição podese concluir que assim como a Constituição assegura expressamente como garantia fundamental a individualização da pena implicitamente está impondo a individualização da prescrição que se configura com a prescrição pela pena in concreto Portanto a prescrição necessariamente deve guardar proporção com a pena aplicada individualizada logo a supressão do lapso prescricional entre o fato e o recebimento da denúncia viola os princípios da proporcionalidade da culpabilidade da individualização da pena e da própria prescrição Postas essas considerações devese concluir que inevitavelmente a Lei n 12234 ao suprimir o tempo decorrido entre o fato e o recebimento da denúncia afronta o princípio da proporcionalidade em seu trinômio adequação o ato surtirá o fim pretendido com eficiência e eficácia necessidade há outro meio menos lesivo de se atingir esse fim além do proposto com a mesma eficácia ainda que com menos eficiência e proporcionalidade em sentido estrito é compatível o benefício colhido com a lesão causada conforme demonstraremos adiante 62 Evolução e abrangência do princípio da proporcionalidade A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão nos idos de 1789 já exigia expressamente que se observasse a proporcionalidade entre a gravidade do crime praticado e a sanção a ser aplicada a lei só deve cominar penas estritamente necessárias e proporcionais ao delito art 15 No entanto o princípio da proporcionalidade é uma consagração do constitucionalismo moderno embora já fosse reclamado por Beccaria sendo recepcionado pela Constituição Federal brasileira em vários dispositivos tais como exigência da individualização da pena art 5º XLVI proibição de determinadas modalidades de sanções penais art 5º XLVII admissão de maior rigor para infrações mais graves art 5º XLII XLIII e XLIV determinação de penas alternativas para as infrações de menor potencial ofensivo etc O modelo político consagrado pelo Estado Democrático de Direito determina que todo o Estado em seus três Poderes bem como nas funções essenciais à Justiça resulta vinculado em relação aos fins eleitos para a prática dos atos legislativos judiciais e administrativos Em outros termos toda a atividade estatal é sempre vinculada axiomaticamente pelos princípios constitucionais explícitos e implícitos As consequências jurídicas dessa constituição dirigente são visíveis A primeira delas verificase pela consagração do princípio da proporcionalidade não apenas como simples critério interpretativo mas como garantia legitimadoralimitadora de todo o ordenamento jurídico infraconstitucional Assim deparamonos com um vínculo constitucional capaz de limitar os fins de um ato estatal e os meios eleitos para que tal finalidade seja alcançada 63 Abrangência do princípio da proporcionalidade os três Poderes O campo de abrangência e por que não dizer de influência do princípio da proporcionalidade vai além da simples confrontação das consequências que podem advir da aplicação de leis que não observam dito princípio Na verdade modernamente a aplicação desse princípio atinge o exercício imoderado de poder inclusive do próprio poder legislativo no ato de legislar Não se trata evidentemente de questionar a motivação interna da voluntas legislatoris e tampouco de perquirir a finalidade da lei que é função privativa do Parlamento Na realidade a evolução dos tempos tem nos permitido constatar com grande frequência o uso abusivo do poder de fazer leis ad hoc revelando muitas vezes contradições ambiguidades incongruências e falta de razoabilidade que contaminam esses diplomas legais com o vício de inconstitucionalidade Segundo o magistério do Ministro Gilmar Mendes MENDES Gilmar Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade 3 ed São Paulo Saraiva 2004 p 47 a doutrina identifica como típica manifestação do excesso de poder legislativo a violação do princípio da proporcionalidade ou da proibição de excesso Verhältnismässigkeitsprinzip Übermassverbot que se revela mediante contraditoriedade incongruência e irrazoabilidade ou inadequação entre meios e fins No Direito Constitucional alemão outorgase ao princípio da proporcionalidade Verhältnismässigkeit ou ao princípio da proibição de excesso Übermassverbot qualidade de norma constitucional não escrita derivada do Estado de Direito Registrese por oportuno que o princípio da proporcionalidade aplicase a todas as espécies de atos dos poderes públicos de modo que vincula o legislador a administração e o Judiciário O Poder Legislativo não pode atuar de maneira imoderada nem formular regras legais cujo conteúdo revele deliberação absolutamente divorciada dos padrões de razoabilidade assegurados pelo nosso sistema constitucional afrontando diretamente o princípio da proporcionalidade como estamos demonstrando O Poder Público não pode agir com excesso especialmente em matéria criminal considerandose que toda atividade estatal é regida pelo princípio da razoabilidade O exame da adequação de determinado ato estatal ao princípio da proporcionalidade viabiliza o controle de sua razoabilidade que inclui inclusive a fiscalização de constitucionalidade das prescrições normativas emanadas do Poder Público Assim a razoabilidade exerce função controladora na aplicação do princípio da proporcionalidade Com efeito é preciso perquirir se nas circunstâncias é possível adotar outra medida ou outro meio menos desvantajoso e menos grave para o cidadão 64 Excessos do Parlamento controle jurisdicional de constitucionalidade Esses excessos precisam encontrar dentro do sistema político jurídico alguma forma ou algum meio de se não evitálos pelo menos reduzilos a níveis toleráveis a única possibilidade em um Estado Democrático de Direito sem qualquer invasão das atribuições da esfera legislativa é por meio do controle de constitucionalidade exercido pelo Poder Judiciário A função jurisdicional nesse controle adverte o doutrinador argentino Guillermo Yacobucci pondera se a decisão política ou jurisdicional em matéria penal ou processual penal restritiva de direitos está justificada constitucionalmente pela importância do bem jurídico protegido e a inexistência dentro das circunstâncias de outra medida de menor lesão particular YACOBUCCI Guillermo El sentido de los princípios penales Buenos Aires Depalma 1998 p 339 O exame do respeito ou violação do princípio da proporcionalidade passa pela observação e apreciação de necessidade e adequação da providência legislativa numa espécie de relação custobenefício para o cidadão e para a própria ordem jurídica Pela necessidade devese confrontar a possibilidade de com meios menos gravosos atingir igualmente a mesma eficácia na busca dos objetivos pretendidos e pela adequação esperase que a providência legislativa adotada apresente aptidão suficiente para atingir esses objetivos Nessa linha destaca Gilmar Mendes MENDES Gilmar Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade p 50 a modo de conclusão em outros termos o meio não será necessário se o objetivo almejado puder ser alcançado com a adoção de medida que se revele a um só tempo adequada e menos onerosa Ressaltese que na prática adequação e necessidade não têm o mesmo peso ou relevância no juízo de ponderação Assim apenas o que é adequado pode ser necessário mas o que é necessário não pode ser inadequado e completa Gilmar Mendes de qualquer forma um juízo definitivo sobre a proporcionalidade da medida há de resultar da rigorosa ponderação e do possível equilíbrio entre o significado da intervenção para o atingido e os objetivos perseguidos pelo legislador proporcionalidade em sentido estrito 7 Violação da garantia constitucional da duração razoável do processo A organização política e jurídica de todas as nações independentes confere ao Estado as condições os meios e toda a estrutura necessária para desenvolver a persecução penal em prazo razoável nos moldes assegurados não apenas pelos organismos internacionais de proteção dos direitos humanos como também pela nossa Carta Maior art 5º LXXVIII Não se pode ignorar que a excessiva demora além do prazo razoável da prestação jurisdicional efetiva devese exclusivamente à inoperância do Estado que com frequência não cumpre suas funções institucionais em tempo razoável O ônus da inoperância do Estado não pode mais recair sobre os ombros do cidadão acusado Aliás nesse sentido o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos tem recomendado uma releitura do tempo do processo que não pode ser confundido com o tempo absoluto e objetivo devendo relacionarse à subjetividade individual do acusado que não se interrompe e nem se suspende em momento algum Beccaria a seu tempo já afirmava que mais que a gravidade ou extensão da pena é a celeridade processual que pode produzir os melhores efeitos sobre o acusado Vários organismos internacionais têm se preocupado com a razoabilidade do prazo processual reconhecendo que o seu alongamento desmesurado ofende sobretudo a dignidade da pessoa humana Nesse sentido a Convenção Europeia de Direitos Humanos 1950 assegurou o direito à duração razoável do processo prevendo em seu art 6º n 1 o seguinte Toda pessoa tem direito a um julgamento dentro de um tempo razoável perante um tribunal independente e imparcial constituído por lei para fins de determinar seus direitos e deveres de caráter civil ou sobre o fundamento de qualquer acusação penal que lhe seja imputada Na mesma linha a Convenção Americana sobre Direitos Humanos 1969 estabelece em seu art 7º n 5 Toda pessoa presa detida ou retida deve ser conduzida sem demora à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais e tem o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade sem prejuízo de que prossiga o processo 71 Efeitos criminógenos do processo e a dignidade humana O processo penal mesmo considerado como instrumento de garantia de direitos fundamentais pode significar um grave prejuízo ao acusado especialmente quando se alonga além do prazo razoável na medida em que denigre macula e enxovalha a honra e a dignidade do cidadão processado A despeito da presunção constitucional de não culpabilidade aos olhos da sociedade o processado é um malfeitor desonrado e infrator que merece ser castigado Dito de outra forma na concepção da opinião pública o investigado é presumidamente culpado exatamente o contrário da presunção constitucional Ademais não raro a persecução penal pode ensejar várias limitações aos direitos individuais tais como ônus de comparecer aos atos processuais sob pena de condução dever de comunicar ao juiz a mudança de endereço restrição à sua locomoção anotação da distribuição da ação penal indisponibilidade de seus bens mesmo os não relacionados com a suposta infração penal sem se falar em frequentes e desnecessárias prisões cautelares etc Para quem é processado criminalmente o tempo arrastase letargicamente num clima de angústia insegurança e ansiedade transformandose em pena por excelência tão ou mais angustiante que a própria pena privativa de liberdade Em um Estado Democrático de Direito o processo penal não é apenas um instrumento destinado apenas à efetivação do poder de punir mas também meio de garantia contra os excessos do poder repressivo estatal A nova ordem democrática procura conter a natural ânsia de exasperação punitiva do poder constituído exigindo que o processo não se conduza somente com objetivo repressor mas que se transforme também em instrumento de garantia do indivíduo perante o Estado Na realidade é inadmissível que se interprete restritivamente o disposto no art 5º LXXVIII da Constituição da República como desafortunadamente vem fazendo majoritariamente a jurisprudência brasileira ou seja limitandose a relaxar a prisão cautelar quando eventualmente existente Dessa forma a demora excessivamente injustificada em solucionar os casos penais impõe que o Estado por inoperância incompetência ou inaptidão abra mão de seu poder de punir porque na verdade já o exerceu por meio da submissão do acusado ou investigado a intenso e prolongado sentimento de incerteza e angústia enquanto se desenrola o processo 72 Lapso prescricional como marco do prazo razoável arts 109 e 110 Embora os textos jurídicos não o digam expressamente o processo penal regra geral tem um marco temporal além do qual não pode subsistir por ultrapassar o prazo razoável assegurado na Constituição Federal Esse marco que é individualizado pela gravidade da infração penal objeto da persecução penal e da sanção correspondente abstratamente considerada encontrase inserto no art 109 do Código Penal Concretamente esse lapso temporal adequase na ausência de outra previsão infraconstitucional às determinações constantes dos arts 110 pena concretizada e 117 causas interruptivas ambos do mesmo diploma penal material Aliás ao contrário do que geralmente ocorre com a definição do prazo razoável em termos de prescrição dispõese claramente de dados objetivos para a definição do que seja a duração razoável para o exercício da persecução penal Esses dados marcos temporais repetindo estão contidos no art 109 combinado com o art 110 Em outros termos referidos lapsos temporais enunciados nesses dispositivos representam o tempo razoável considerado pelo legislador para início e conclusão da persecutio criminis não confundir com o prazo regular para a instrução criminal hipótese de réu preso antes de 81 dias agora após a reforma processual em torno de 100 dias segundo a doutrina especializada Assim o tempo razoável oscilará segundo a gravidade da infração penal v g vinte anos o prazo mais elástico para os crimes mais graves art 109 I e dois anos o prazo mais exíguo para as pequenas infrações arts 114 I e 109 VI este limite foi elevado para três anos pela Lei n 122342010 73 A multiplicação dos prazos prescricionais causas interruptivas Esses prazos por si mesmos longos são consideravelmente ampliados pelas causas interruptivas constantes do art 117 e seus incisos na medida em que reiniciam sua contagem desde o início Interrompida a prescrição volta a correr novamente por inteiro Em outras palavras o prazo prescricional pela pena in concreto pode ocorrer várias vezes no mesmo processo desde que incompleto Significa reconhecer que não há prazo fixo para o término ou duração do processo penal variando segundo o caso concreto nos limites logicamente estabelecidos pelo disposto nos arts 109 e 110 do Código Penal e agora sob a garantia constitucional de não poder ultrapassar sua duração razoável Evidentemente na ótica do legislador nos dispositivos que acabamos de referir está identificado o lapso temporal que é considerado prazo razoável atualmente reconhecido como garantia constitucional dentro do qual o Estado pode e deve exercer a persecutio criminis 74 Carta branca às autoridades repressoras violação do prazo razoável Como suprimir parte do lapso prescricional entre o fato e o recebimento da denúncia para o fim de excluílo pura e simplesmente da garantia constitucional definida como duração razoável do processo Teria legitimidade o legislador infraconstitucional para excluir lapsos temporais do cômputo do prazo razoável quiçá tornando inócua sua garantia constitucional Quais seriam os limites para essa suposta liberalidade Com efeito excluir o tempo anterior ao recebimento da denúncia significa dar carta branca às autoridades repressoras desrespeitando a garantia da duração razoável do processo para engavetarem os procedimentos investigatórios perenizálos usálos quando bem entenderem como moeda de troca instrumentos de corrupção de chantagem pairando ilegitimamente como espada de Dámocles que a qualquer momento pode recair sobre a cabeça do investigadoprocessado Não se pode ignorar por outro lado os naturais efeitos estigmatizantes do processo penal cujo alongamento funciona como uma verdadeira pena sem julgamento sem condenação e sem individualização Destaquese nessa linha a eloquente manifestação de Ferrajoli é indubitável que a sanção mais temida na maior parte dos processos penais não é a pena quase sempre leve ou não aplicada mas a difamação pública do imputado que tem não só a sua honra irreparavelmente ofendida mas também as condições e perspectivas de vida e de trabalho e se hoje se pode falar em valor simbólico e exemplar do direito penal ele deve ser associado não tanto à pena mas verdadeiramente ao processo e mais exatamente à acusação e à amplificação operada sem possibilidade de defesa pela imprensa e pela televisão FERRAJOLI Luigi Direito e Razão Trad Ana Paula Zomer Fauzi Hassan Choukr Juarez Tavares e Luiz Flávio Gomes São Paulo Revista dos Tribunais 2002 p 588 75 A Lei n 122342010 viola o princípio da duração razoável do processo Podese concluir que o tempo é essencialmente corolário do poder punitivo especialmente quando submete o cidadão a um processo penal que se mostra abusivo quando ultrapassa o prazo razoável Um processo que perdura por tempo superior aos marcos estabelecidos nos arts 109 e 110 do CP ou seja além do prazo razoável garantido pela nossa Carta Política sem perspectiva de conclusão final viola flagrantemente a garantia da duração razoável do processo art 5º LXXVIII vulnera o devido processo legal art 5º LIV e a segurança jurídica art 5º XXXIII e por consequência atinge a própria dignidade da pessoa humana O direito a um processo em tempo razoável é inerente ao devido processo legal Em outros termos o processo com duração razoável é uma consequência inafástavel do due process of law com o qual se confunde Concluindo devese sopesar de um lado os valores constitucionais do exercício do poderdever de julgar art 5º XXXV e de outro o direito subjetivo à razoável duração do processo aliás reforçado com o que denominou Dotti a cláusula de eficiência qual seja o Estado assegurando os meios que garantam a celeridade de sua tramitação art 5º LXXVIII da CF de 1988 Referido princípio razoável duração do processo é chancelado pelo conhecido Pacto de San José da Costa Rica arts 7º 5 e 8º 1 Eventual dúvida decide se em favor da prevalência dos direitos fundamentais do jurisdicionado como asseguram o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e a própria Convenção Americana sobre Direitos Humanos além de outras convenções internacionais 76 Inconstitucionalidade da supressão de parcela do lapso prescricional Podese questionar a prescrição os prazos a morosidade judicial e sua relação com a impunidade Tais questionamentos no entanto não legitimam a criação de distorções que desrespeitem os princípios da proporcionalidade da duração razoável do processo e da culpabilidade fazendo incidir de forma idêntica a norma penal sobre comportamentos ontologicamente diferentes sem um mínimo de individualização Ora a nova regra afronta esses princípios pois o lapso prescricional deixa de relacionarse com o fato delituoso concretamente bem como com a individualização da responsabilidade penal na verdade passa a ser pautado apenas pela pena abstratamente cominada mesmo após a devida instrução criminal a individualização da pena e a adequada resposta penal principalmente no período compreendido entre o fato e o recebimento da denúncia que pode ser desarrazoadamente longo e agora sem ser considerado Ante todo o exposto por mais que se procure salvar o texto legal tentando darlhe uma interpretação conforme a Constituição Federal não vemos contudo outra alternativa razoável que não a declaração de sua inconstitucionalidade por violar tanto o princípio da proporcionalidade quanto o princípio da duração razoável do processo afastandose sua aplicação J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 220 do STJ A reincidência não influi no prazo da prescrição da pretensão punitiva Súmula 146 do STF A prescrição da ação penal regulase pela pena concretizada na sentença quando não há recurso da acusação Súmula 497 do STF Quando se tratar de crime continuado a prescrição regulase pela pena imposta na sentença não se computando o acréscimo decorrente da continuação Súmula 604 do STF A prescrição pela pena em concreto é somente da pretensão executória da pena privativa de liberdade A prescrição da pretensão punitiva intercorrente superveniente ou subsequente regulase pela pena em concreto e ocorrerá nos termos do art 110 1º do Código Penal quando transitado em julgado o decisum condenatório para a acusação ou improvido seu recurso transcorrer o correspondente lapso temporal entre o decreto condenatório e o trânsito em julgado definitivo STJ AgRg no REsp 320423SP Rel Min Paulo Gallotti j 11122007 Em face da reincidência do condenado aumentase em um terço o prazo prescricional portanto entre o trânsito em julgado da condenação para o Ministério Público e o início de cumprimento da pena não transcorreu o lapso necessário para a ocorrência da prescrição da pretensão executória STJ HC 49025SP Rel Min Laurita Vaz j 4102007 Prescrição da pretensão punitiva retroativa Inocorrência O prazo para contagem da prescrição iniciase na data da publicação da sentença condenatória e não na data do trânsito em julgado para a acusação Precedentes STJ EDcl no REsp 763283SC Rel Min Laurita Vaz j 642006 Prescrição da pretensão executória Inocorrência Não realizado o tempo da prescrição da pretensão executória por se cuidar de reincidente não há falar em constrangimento a ser sanado STJ RHC 18290MG Rel Min Hamilton Carvalhido j 18102005 Prescrição da Pretensão Punitiva Inocorrência A prescrição da pretensão punitiva retroativa e intercorrente somente restaria consumada se houvesse transcorrido tempo superior a oito anos entre os fatos e o recebimento da denúncia ou entre esta data e o dia em que foi proferida a condenação o que efetivamente não aconteceu arts 109 IV e 110 1º e 2º do CP STJ HC 18751SP Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 1092002 Prescrição retroativa Sentença condenatória recorrível Inocorrência A prescrição penal retroativa espécie regulada pelo quantum da pena fixada na sentença condenatória recorrível transitada em julgado para a apelação ocorre com o decurso do prazo entre a data da consumação do delito e a do recebimento da denúncia ou entre esta e a da sentença condenatória Inexistindo nos autos elementos capazes de determinar a data do recebimento da denúncia resta impossível acatar a pretensão do impetrante para o fim de reconhecimento da prescrição retroativa STJ HC 13570DF Rel Min Vicente Leal j 132001 A prescrição da pretensão punitiva retroativa regulase pela pena imposta STJ HC 12985SP Rel Min Edson Vidigal j 592000 Termo inicial da prescrição antes de transitar em julgado a sentença final Art 111 A prescrição antes de transitar em julgado a sentença final começa a correr V art 4º do CP I do dia em que o crime se consumou II no caso de tentativa do dia em que cessou a atividade criminosa III nos crimes permanentes do dia em que cessou a permanência IV nos de bigamia e nos de falsificação ou alteração de assentamento do registro civil da data em que o fato se tornou conhecido D O U T R I N A 1 Termo inicial da prescrição da pretensão punitiva A prescrição da pretensão punitiva lato sensu começa a correr I no dia em que o crime se consumou II no caso de tentativa no dia em que cessou a atividade criminosa III nos crimes permanentes no dia em que cessou a permanência IV nos de bigamia e nos de falsificação ou alteração de assento do registro civil na data em que o fato se tornou conhecido 11 Teoria da ação e teoria do resultado O termo inicial da prescrição em regra é o da consumação do crime seja instantâneo ou permanente Embora o art 4º determine que o tempo do crime é o momento da ação em termos de prescrição o Código adota como exceção a teoria do resultado Mas excepcionalmente em se tratando de tentativa e de crime permanente adota a regra geral que é a teoria da atividade J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Prescrição da pretensão punitiva Termo inicial Art 111 II do CP Conforme preceitua o art 111 inciso II do Código Penal A prescrição antes de transitar em julgado a sentença final começa a correr no caso da tentativa do dia em que cessou a atividade criminosa No presente caso referido termo inicial só se iniciou no momento em que o paciente teve seu pedido de aposentadoria indeferido por um funcionário da autarquia previdenciária Assim não se deve considerar como cessação da atividade criminosa a data anterior em que ocorreu o simples protocolo do pedido junto ao INSS O interregno entre o protocolo do pedido e o ato de indeferimento é de ser entendido como o iter criminis percorrido pelo agente STJ HC 77920MS Rel Min Félix Fischer j 2862007 Delito permanente Prescrição da pretensão punitiva Termo inicial Art 111 III do CP O estelionato previdenciário em que há percepção de parcelas sucessivas do benefício é crime permanente cujo lapso prescricional começa a contar da data em que cessa a permanência art 111 inciso III do Código Penal Precedentes STJ REsp 801595RJ Rel Min Félix Fischer j 1942007 Enquanto não se constituir definitivamente em sede administrativa o crédito tributário não se terá por caracterizado no plano da tipicidade penal o crime contra a ordem tributária tal como previsto no art 1º da Lei n 813790 Em consequência e por ainda não se achar configurada a própria criminalidade da conduta do agente sequer é lícito cogitarse da fluência da prescrição penal que somente se iniciará com a consumação do delito CP art 111 I Precedentes STF HC 84092CE Rel Min Celso de Mello j 2262004 O prazo de prescrição é prazo de natureza penal expresso em anos contandose na forma preconizada no art 10 do Código Penal na linha do calendário comum o que significa dizer que o prazo de um ano tem início em determinado dia e termina na véspera do mesmo dia do mês e ano subsequentes Os meses e anos são contados não ex numero mas ex numeratione dierum seja não se atribui 30 dias para o mês nem 365 dias para o ano sendo irrelevante o número de dias do mês 28 29 30 e 31 mas o espaço entre duas datas idênticas de meses consecutivos STJ REsp 188681SC Rel Min Vicente Leal j 592000 Bigamia Prescrição pela pena em concreto Data inicial do prazo Jurisprudência assentada sobre que o prazo começa a correr a partir da notitia criminis levada ao conhecimento da autoridade pública STJ RHC 7206RJ Rel Min José Dantas j 2841998 Em caso de crime continuado o prazo prescricional se conta do último ato integrante da continuidade delitiva STF HC 72254CE Rel Min Sydney Sanches j 305 1995 Termo inicial da prescrição após a sentença condenatória irrecorrível Art 112 No caso do art 110 deste Código a prescrição começa a correr V arts 81 86 e 87 do CP I do dia em que transita em julgado a sentença condenatória para a acusação ou a que revoga a suspensão condicional da pena ou o livramento condicional V arts 140 a 143 162 e 163 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal II do dia em que se interrompe a execução salvo quando o tempo da interrupção deva computarse na pena V arts 41 e 42 do CP D O U T R I N A 1 Termo inicial da prescrição da pretensão executória A prescrição da pretensão executória começa a correr I no dia em que transita em julgado a sentença condenatória para a acusação II no dia em que se interrompe a execução da pena salvo quando referido tempo deva ser computado na pena internação por doença mental III no dia em que transita em julgado a decisão que revoga o sursis ou o livramento condicional art 113 Além dessas hipóteses o art 117 V e VI prevê mais duas pelo início ou continuação do cumprimento da pena e pela reincidência 11 Pressuposto básico da prescrição executória O prazo começa a correr do dia em que transitar em julgado a sentença condenatória para a acusação mas o pressuposto básico para essa espécie de prescrição é o trânsito em julgado para acusação e defesa pois enquanto não transitar em julgado para a defesa a prescrição poderá ser a intercorrente Nesses termos percebese podem correr paralelamente dois prazos prescricionais o da intercorrente enquanto não transitar definitivamente em julgado e o da executória enquanto não for iniciado o cumprimento da condenação pois ambos iniciam na mesma data qual seja o trânsito em julgado para a acusação J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Prescrição da pretensão executória Ocorrência Em se tratando de pena de 1 um ano de reclusão pela prática do delito tipificado no art 180 caput do Código Penal temse o prazo prescricional de 4 quatro anos ex vi dos arts 109 V e 110 1º do Código Penal In casu se a sentença condenatória transitou em julgado para a acusação em 26062000 e conforme demonstrado nos autos a respectiva execução jamais teve início prescrita está a pretensão executória porquanto já transcorrido o referido lapso temporal ex vi dos arts 112 I e 117 V do Código Penal STJ HC 44118MG Rel Min Félix Fischer j 1882005 Prescrição executória Fuga do condenado Cálculo Arts 112 II e 113 do CP Acréscimo da reincidência Mais de uma condenação Ordem de execução Prescrição inocorrente Na hipótese de fuga do condenado ou de revogação de liberdade condicional a prescrição da pretensão executória é calculada pelo resto da pena a ser cumprida contandose do dia em que a execução da sentença é interrompida nos termos dos arts 113 e 112 II do Código Penal Devem ser considerados os prazos previstos no art 109 do Diploma Penal computados eventuais acréscimos ou diminuições decorrentes da reincidência menoridade ou senilidade conforme o caso e se ocorrentes Tratandose de concurso material as condenações não são somadas mas ao contrário procedese à execução das penas graves em 1º lugar Inocorre a prescrição se ainda não consumado o lapso prescricional da pretensão executória do restante da pena reclusiva assim como da detentiva que será executada após o cumprimento da mais grave ficando com a execução suspensa nesse ínterim STJ RHC 9158SP Rel Min Gilson Dipp j 16 121999 Sursis Revogação automática Prorrogação e prescrição arts 82 e 112 do CP Se o beneficiário vem a ser processado por outro delito o período de prova do sursis é prorrogado até o julgamento definitivo Uma vez condenado por crime doloso a revogação é obrigatória não se computando no período de prova o prazo prescricional para o delito cuja pena estava suspensa STJ RHC 8589SP Rel Min Félix Fischer j 1491999 Prescrição no caso de evasão do condenado ou de revogação do livramento condicional Art 113 No caso de evadirse o condenado ou de revogarse o livramento condicional a prescrição é regulada pelo tempo que resta da pena D O U T R I N A Evasão sursis e livramento condicional A evasão revogação do sursis CP art 81 LEP art 162 e do livramento condicional CP arts 86 e 87 LEP art 140 igualmente dão início ao curso prescricional e enquanto a decisão revogatória não for cumprida estará em curso a prescrição executória J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A aplicação do art 113 do Código Penal é restrita às situações por ele especificadas quais sejam evasão de condenado ou revogação de livramento condicional Impossibilidade de aplicação extensiva ou analógica O período de prisão provisória do réu é levado em conta apenas para o desconto da pena a ser cumprida sendo irrelevante para fins de contagem do prazo prescricional que deve ser analisado a partir da pena concretamente imposta pelo Julgador e não do restante da reprimenda a ser executada pelo Estado Precedentes do STJ e do STF STJ REsp 858809SP Rel Min Gilson Dipp j 1962007 O tempo de prisão provisória não pode ser computado para efeito da prescrição mas tão somente para o cálculo de liquidação da pena O art 113 do Código Penal por não comportar interpretação extensiva nem analógica restringese aos casos de evasão e de revogação do livramento condicional STF RHC 85217SP Rel Min Eros Grau j 282005 Perante a lei brasileira CP art 113 no caso de evadirse o condenado ou de revogarse o livramento condicional a prescrição é regulada pelo tempo que resta da pena e conforme o art 112 II temse que o prazo da prescrição da pretensão executória começa a fluir no dia em que se interrompe a execução STF Ext 922 Rel Min Ellen Gracie j 9122004 Prescrição da multa Art 114 A prescrição da pena de multa ocorrerá I em 2 dois anos quando a multa for a única cominada ou aplicada II no mesmo prazo estabelecido para a prescrição da pena privativa de liberdade quando a multa for alternativa ou cumulativamente cominada ou cumulativamente aplicada Artigo com redação determinada pela Lei n 9268 de 1º de abril de 1996 V art 58 do CP D O U T R I N A Alteração redação dada pela Lei n 9268 de 1º de abril de 1996 1 Prescrição da multa disciplinada pela Lei n 720984 Pela previsão da reforma penal de 1984 se a pena de multa fosse a única cominada a única aplicada ou a que ainda não tivesse sido cumprida prescreveria em dois anos art 114 No entanto quando fosse cominada ou aplicada cumulativamente com a pena privativa de liberdade prescreveria com esta que é mais grave art 118 Durante o cumprimento da pena de prisão não corre o prazo prescricional em relação à pena de multa 2 Prescrição da multa disciplinada pela Lei n 926896 Tratase de previsão supérflua que apenas inovou para pior de um lado a redação do inciso I já constava da redação anterior do art 114 de outro a redação do inciso II constava do art 118 que não foi revogado por tal lei 21 Trouxe uma novidade Excluiu o prazo de dois anos de prescrição para a pena de multa quando esta for a única que ainda não foi cumprida como permitia a previsão anterior Agora o prazo prescricional de dois anos vige somente para as duas primeiras hipóteses isto é quando a pena de multa for a única cominada ou a única aplicada Essa circunstância fica muito clara em primeiro lugar pela não inclusão expressa como fazia a redação anterior do art 114 e em segundo lugar pela disposição do inciso II da nova redação pela qual o prazo prescricional da pena de multa cumulativamente cominada ou cumulativamente aplicada corre no mesmo prazo da pena privativa de liberdade 22 Prescrição bienal O lapso prescricional de dois anos tanto pode atingir a pretensão punitiva quanto a pretensão executória Prescrevendo qualquer das pretensões estatais seja punitiva seja executória a multa não poderá ser executada estará igualmente prescrita ao contrário de alguns entendimentos já manifestados 23 Causas interruptivas e suspensivas da prescrição da pena de multa Embora a competência para a execução da pena de multa a nosso juízo permaneça com o Ministério Público apenas com novo procedimento as causas suspensivas e interruptivas da prescrição não serão aquelas previstas no Código Penal arts 116 e 117 mas as relacionadas na Lei de Execução Fiscal Lei n 683080 e no Código Tributário Nacional art 174 ver Súmula 107 do TFR 24 Irretroatividade A nova disciplina dada à prescrição da multa pela Lei n 926896 por ser mais gravosa não retroage em regra J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Aplicação do instituto da prescrição do art 114 do Código Penal Inviabilidade Multa e prestação pecuniária Institutos de naturezas distintas Hipótese em que a pena privativa de liberdade foi substituída por restritivas de direitos consubstanciada em prestação pecuniária A pena de multa e a prestação pecuniária são institutos de naturezas diversas Aplicação do parágrafo único do art 109 do Código Penal que dispõe acerca da prescrição das penas restritivas de direitos STJ REsp 913321SP Rel Min Gilson Dipp j 1962007 Se o agravante foi condenado a pena de multa cumulativamente a pena privativa de liberdade o prazo da prescrição da pena pecuniária é o mesmo previsto para a pena corporal nos termos do artigo 114 inciso II do Código Penal nada interferindo a decisão que posteriormente extinguiu a reprimenda reclusiva pela concessão de indulto sob pena de ofensa à coisa julgada Há de ser acolhida a preliminar arguida pelo réu tendo em vista a ocorrência da prescrição da pretensão executória estatal TRF3ª Região Agravo em Execução 200061810017053SP Rel Luiz Stefanini j 1332007 Pena de multa Prazo bienal superado Ocorrência da prescrição É forçoso o reconhecimento da extinção da punibilidade ante a superveniência da prescrição da pretensão punitiva estatal se transcorrido prazo superior ao biênio consagrado pelo art 114 do CP STJ REsp 605802RJ Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 209 2005 Redução dos prazos de prescrição Art 115 São reduzidos de metade os prazos de prescrição quando o criminoso era ao tempo do crime menor de 21 vinte e um anos ou na data da sentença maior de 70 setenta anos D O U T R I N A 1 Menoridade e velhice O prazo prescricional é reduzido pela metade quando o agente for ao tempo do crime menor de 21 anos ou na data da sentença maior de setenta art 115 A redução prevista neste dispositivo aplicase a qualquer espécie de prescrição seja da pretensão punitiva seja da pretensão executória Considerando a política criminal justificadora da previsão a maioridade de setenta anos pode ser considerada também na época do acórdão condenatório ou confirmatório da condenação 2 Menor emancipado A maioridade civil não se confunde com a penal que se inicia aos dezoito anos Eventual emancipação ou casamento do agente menor de 21 anos não alteram sua idade que inferior a esse limite é causa redutora da prescrição Prescrição e crime continuado Tendose iniciado antes dos 21 anos mesmo o agente continuando após esse marco a redução se impõe por ser considerado crime único 3 Incomunicabilidade das causas redutoras do art 115 As causas redutoras previstas no art 115 são pessoais e portanto incomunicáveis a eventuais participantes da infração penal STF RTJ 11064 J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 74 do STJ Para efeitos penais o reconhecimento da menoridade do réu requer prova por documento hábil Nos termos do art 115 do CP são reduzidos pela metade os prazos prescricionais quando o réu era ao tempo do crime menor de 21 vinte e um anos STJ HC 74872SP Rel Min Félix Fischer j 25102007 A completude e o caráter especial da norma do art 115 do Código Penal excluem a observação do Estatuto do Idoso Lei n 1074103 no que revela como faixa etária a ser considerada a representada por sessenta anos de vida STF HC 89969RJ Rel Min Marco Aurélio j 2662007 Réu maior de 60 anos Alteração do art 115 do Código Penal pelo Estatuto do Idoso Inocorrência Prescrição Não configuração O art 1º do Estatuto do Idoso não alterou o art 115 do Código Penal que prevê a redução do prazo prescricional para o réu com mais de 70 setenta anos na data da sentença Precedente STJ RHC 16856RJ Rel Min Gilson Dipp j 262005 Sendo o crime continuado considerado delito único atingida a maioridade no curso da continuidade delitiva não se aplica o benefício da redução do prazo prescricional previsto no art 115 do Código Penal STJ REsp 504415RS Rel Min Gilson Dipp j 862004 Prescrição Idade do agente Definição temporal Enquanto a menoridade é perquirida em face da data em que cometido o crime a idade avançada o é relativamente ao último provimento judicial O vocábulo sentença empregado no art 115 do Código Penal tem sentido amplo Interposto recurso contra a condenação ou absolvição formalizada na primeira instância considerase a idade do agente na data do decreto condenatório a ser executado presente a circunstância de que o acórdão proferido substitui a sentença atacada quer a reforme ou confirme art 512 do Código de Processo Civil aplicável subsidiariamente STF Extr 591 Rel Min Marco Aurélio j 161995 Causas impeditivas da prescrição Art 116 Antes de passar em julgado a sentença final a prescrição não corre I enquanto não resolvida em outro processo questão de que dependa o reconhecimento da existência do crime V arts 92 a 94 do CPP II enquanto o agente cumpre pena no estrangeiro V arts 8º e 42 do CP Parágrafo único Depois de passada em julgado a sentença condenatória a prescrição não corre durante o tempo em que o condenado está preso por outro motivo V art 152 do CPP V art 111 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal D O U T R I N A 1 Causas modificadoras do curso prescricional A prescrição encontrandose em curso poderá ser obstaculizada pela superveniência de determinadas causas que podem ser suspensivas art 116 ou interruptivas art 117 Ou ainda o período prescricional poderá simplesmente ser reduzido pela metade art 115 2 Suspensão do prazo prescricional Verificandose uma causa suspensiva o curso da prescrição suspendese para ser retomado depois de suprimido ou desaparecido o impedimento Na suspensão o lapso prescricional já decorrido não desaparece permanece válido Superada a causa suspensiva a prescrição recomeça a ser contada pelo tempo que falta somandose com o anterior 21 Causas suspensivas da prescrição da pretensão punitiva São as seguintes a enquanto não for resolvida questão prejudicial a prescrição não corre enquanto não for resolvida em outro processo questão de que dependa o reconhecimento da existência do crime São as chamadas questões prejudiciais reguladas pelos arts 92 a 94 do CPP cuja relação com o delito é tão profunda que a sua decisão em outro juízo pode determinar a existência ou inexistência da própria infração penal b enquanto o agente cumpre pena no estrangeiro o fundamento políticojurídico desta causa suspensiva é que durante o cumprimento de pena no estrangeiro não se consegue a extradição do delinquente E a pena em execução pode ser tão ou mais longa que o próprio lapso prescricional do crime aqui cometido Por isso justificase a suspensão da prescrição c imunidade parlamentar às duas causas previstas pelo Código Penal art 116 a Constituição Federal art 53 2º acrescentou mais uma enquanto não houver licença do Congresso Nacional para que o parlamentar seja processado o prazo prescricional ficará suspenso 211 Imunidade parlamentar prescrição Procurando amenizar esse privilégio parlamentar o Supremo Tribunal Federal em duas oportunidades com composição plenária decidiu que tanto na hipótese de indeferimento do pedido de licença quanto na de ausência de deliberação a suspensão da prescrição ocorre na data do despacho do Ministro Relator determinando a remessa do pedido ao Parlamento DOU de 231993 p 2565 e de 1681991 p 1991 22 Causa suspensiva da prescrição da pretensão executória A prescrição não corre durante o tempo em que o condenado estiver preso por outro motivo art 116 parágrafo único A prescrição fica em suspenso A previsão é lógica enquanto se encontra preso não pode invocar a prescrição da pena que falta cumprir pois sua condição de preso impede a satisfação dessa pretensão executória 23 Novas causas suspensivas da prescrição Além das duas causas suspensivas da prescrição previstas no Código Penal art 116 e daquela prevista na Constituição Federal art 53 2º as Leis n 909995 e 927196 preveem novas hipóteses de causas que impedem o curso prescricional São as seguintes a suspensão condicional do processo b citação por edital sem comparecimento ou constituição de defensor c citação mediante rogatória de acusado no estrangeiro 3 Suspensão condicional do processo A Lei n 909995 que instituiu os Juizados Especiais Criminais e que aproveitou para instituir também a suspensão condicional do processo estabelece em seu art 89 6º que durante o período em que o processo estiver suspenso não corre a prescrição 31 Fundamento político da previsão do art 89 6º da Lei n 909995 Este dispositivo dispensa tratamento isonômico à defesa e à acusação o denunciado é beneficiado pela suspensão do processo mas em contrapartida a sociedade não fica prejudicada pelo curso da prescrição Na hipótese de revogação do benefício o Ministério Público disporá do tempo normal para prosseguir na persecutio criminis Como em regra a suspensão do processo deverá ocorrer no momento do recebimento da denúncia a prescrição voltará a correr por inteiro No entanto em razão dessa fase transitória poderá haver suspensão de muitos processos que já se encontravam em curso Nessas hipóteses havendo revogação da suspensão do processo o novo curso prescricional deverá somarse ao lapso anterior que foi suspenso pois como causa suspensiva o prazo prescricional não recomeça por inteiro 4 Citação por edital sem comparecimento ou constituição de defensor A Lei n 927196 deu a seguinte redação ao art 366 do Código de Processo Penal se o acusado citado por edital não comparecer nem constituir advogado ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes e se for o caso decretar prisão preventiva nos termos do disposto no art 312 41 Requisitos necessários Para que se configure esta nova causa suspensiva da prescrição é necessário que estejam presentes simultaneamente três requisitos 1º citação mediante edital 2º não comparecimento em juízo para interrogatório 3º não constituição de defensor A ausência de qualquer desses requisitos impede a configuração dessa nova causa suspensiva da prescrição 42 Defensor constituído na fase policial Contudo o infrator que houver constituído advogado durante a fase policial ainda que venha a ser citado por edital seu defensor constituído anteriormente impedirá o reconhecimento da causa impeditiva da prescrição 43 Recomeço do curso prescricional O curso prescricional suspenso somente recomeçará a correr na data do comparecimento do acusado computandose o tempo anterior art 366 2º Em outros termos interrompida a suspensão da prescrição esta volta a correr levandose em consideração o tempo anteriormente decorrido isto é somandose 44 Suspensão automática e irretroatividade A suspensão do curso prescricional é efeito automático sendo desnecessário despacho expresso do juiz Contudo como o art 366 tem natureza mista processual e material podendo verificarse hipóteses de suspensão do processo pelo princípio tempus regit actum convém ser mencionado expressamente que a prescrição não está suspensa em razão de sua irretroatividade quando se tratar de crimes praticados antes da vigência da lei 45 Suspensão da prescrição sem suspensão do processo Damásio de Jesus não admite a aplicação parcial do disposto no art 366 isto é suspender o processo e não suspender a prescrição numa espécie de retroatividade parcial Damásio E de Jesus Notas ao art 366 p 3 Em sentido contrário manifestase Luiz Flávio Gomes por fatos anteriores à vigência da Lei n 927196 entendendo que satisfeitos os requisitos do art 366 suspendese o processo permanecendo naturalmente o curso prescricional a suspensão do processo é matéria processual e a prescrição é matéria estritamente penalmaterial Luiz Flávio Gomes Da retroatividade parcial da Lei 927196 p 4 46 Retroatividade parcial ou tempus regit actum Inclinamonos pela aplicação parcial do art 366 embora com argumento um pouco diferenciado Na verdade a suspensão do processo não significa parcial retroatividade mas a simples aplicação do princípio tempus regit actum Nesse momento satisfeitos os requisitos aplicase a lei nova mas somente a partir de agora isto é o processo fica suspenso desde esse momento sem retroagir ao início da relação processual Já a suspensão do curso prescricional fica inviabilizada por se tratar de norma penal material prejudicial à defesa não podendo retroagir Não negamos que de certa forma há tratamento desigual aos dois polos processuais beneficiase a defesa com a suspensão do processo e prejudicase a acusação com a não suspensão da prescrição No entanto esses efeitos diferenciados decorrem da natureza distinta das duas normas jurídicas processual e material como já referimos 47 Suspensão da prescrição nos termos do art 366 do CPP acerto da Súmula 415 do STJ No exame da suspensão da prescrição prevista no art 366 do CPP não se pode perder de vista que a regra geral da Constituição Federal é da prescritibilidade das infrações penais Com efeito nossa Carta Política considerou imprescritíveis somente o crime de racismo art 5º XLII e os crimes decorrentes da ação de grupos armados civis ou militares contra a ordem constitucional e o Estado Democrático de Direito art 5º XLIV Ademais a prescritibilidade das infrações penais constitui garantia fundamental do cidadão que não pode ser ignorada pela legislação infraconstitucional Determina o dispositivo sub examen que se o acusado for citado por edital não comparecer e não constituir advogado ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional Essa previsão pretende evitar que o processo tramite sem o conhecimento do acusado com irreparáveis prejuízos em sua defesa que deve ser ampla e irrestrita 471 Limite temporal do prazo da suspensão da prescrição O referido art 366 apenas determinou que a prescrição deve ficar suspensa durante a paralisação do processo sem contudo declinar o limite temporal dessa suspensão deixando grave lacuna a ser colmatada pela interpretação doutrinária e jurisprudencial Sensatamente ambas adotaram entendimento quase unânime de que o lapso prescricional deve ficar suspenso pelo prazo da prescrição in abstracto considerandose as balizas do art 109 do CP Consequentemente se o crime prescreve abstratamente em quatro 4 anos é por esse tempo que a contagem da prescrição deve ficar suspensa voltando a correr pelo saldo restante É a orientação conforme a garantia constitucional da prescritibilidade das infrações penais Esse entendimento destacam Luiz Flávio Gomes e Silvio Maciel além de evitar na prática a imprescritibilidade dos delitos afigurase proporcional na medida em que o prazo de prescrição ficará suspenso por mais ou menos tempo de acordo com a maior ou menor gravidade do delito Luiz Flávio Gomes e Silvio Maciel Contagem da prescrição durante a suspensão do processo Súmula 415 do STJ Respeitase assim o princípio da proporcionalidade Nessa linha orientouse o Superior Tribunal de Justiça ao editar a Súmula 415 na sessão de 16 de dezembro de 2009 com o seguinte enunciado O período de suspensão do prazo prescricional é regulado pelo máximo da pena cominada A pouca clareza do sucinto texto sumular reclama adequada interpretação para não desnaturálo Inquestionável no particular a afirmação de Gomes e Maciel in verbis É preciso ressaltar que a Súmula 415 está a dizer que a contagem da prescrição fica suspensa pelo prazo da prescrição em abstrato consideradas as balizas do art 109 do CP e não pelo prazo da pena máxima cominada ao delito conforme pode sugerir uma leitura desavisada do enunciado Dito de outra forma se a pena máxima cominada for de seis 6 anos a prescrição em abstrato verificase em doze 12 anos art 109 III do CP e não pelos seis anos que é o tempo da pena cominada Essa é a correta interpretação da Súmula 415 Ou seja ao determinar que a prescrição é regulada pelo máximo da pena cominada a súmula está a afirmar que se aplica o mesmo lapso prescricional correspondente ao máximo da pena cominada à infração penal imputada como destaca a seguinte decisão Consoante orientação pacificada nesta Corte o prazo máximo de suspensão do prazo prescricional na hipótese do art 366 do CPP não pode ultrapassar aquele previsto no art 109 do Código Penal considerada a pena máxima cominada ao delito denunciado sob pena de terse como permanente o sobrestamento tornando imprescritível a infração penal apurada 472 Orientação do STF viola a duração razoável do processo Surpreendentemente no entanto o Supremo Tribunal Federal em uma interpretação reacionária assume posição diametralmente oposta ao entendimento majoritário de doutrina e jurisprudência inclusive sumulada pelo Superior Tribunal de Justiça Com feito segundo nossa Corte Suprema a contagem da prescrição pode ficar suspensa por tempo indeterminado isto é pode perdurar a suspensão da prescrição enquanto durar a do processo Ignoram venia concessa os senhores Ministros da Corte Superior que entendimento como esse pode tornar imprescritíveis crimes não elencados no texto constitucional Ademais confundem causa suspensiva com causa interruptiva da prescrição pelo simples fato de se invocar parâmetro semelhante A nosso juízo como sustentamos anteriormente a regra é da prescritibilidade de todas as infrações penais excluídas as duas relacionadas no texto constitucional art 5º XLII e XLIV CF Esperase que o STF reveja seu entendimento e passe a adotar a orientação sugerida pela Súmula 415 do Superior Tribunal de Justiça e reconheça a necessidade de que a suspensão do curso prescricional precisa ter um termo final sob pena de burlar o texto constitucional Pensar diferente é ignorar o fundamento político da prescrição qual seja impedir a duração desarrazoada duração irrazoável do processo contrariando as determinações dos organismos internacionais de proteção dos direitos humanos anteriormente citados 5 Citação mediante rogatória Acusado que se encontrar no estrangeiro em lugar sabido será citado por meio de carta rogatória independentemente de a infração penal imputada ser ou não afiançável No entanto segundo a nova redação conferida pela Lei n 927196 ao art 368 do CP o prazo prescricional ficará suspenso até o cumprimento da carta rogatória 51 Citação por edital no estrangeiro Agora a citação de quem se encontrar no estrangeiro somente poderá ser por edital quando for desconhecido o seu paradeiro Anteriormente a citação por edital seria possível quando fosse desconhecida a localização do citando ou quando a infração imputada fosse afiançável J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A pretensão punitiva estatal não foi atingida pela prescrição porque se deve excluir do cálculo prescricional o período no qual o processo esteve suspenso nos exatos termos do art 89 da Lei n 909995 STJ HC 72537SP Rel Min Laurita Vaz j 13 122007 Segundo o entendimento desta Corte e do Pretório Excelso não há justa causa para a persecução penal do crime previsto no art 1º da Lei n 813790 quando o suposto crédito fiscal ainda pende de lançamento definitivo uma vez que sua inexistência impede a configuração do delito e por conseguinte o início da contagem do prazo prescricional STJ HC 53622PE Rel Min Laurita Vaz j 1682007 Processocrime Deputados e Senadores Necessidade de licença Prescrição Nova disciplina decorrente da Emenda Constitucional n 352001 Irretroatividade Descabe emprestar à Emenda Constitucional n 352001 eficácia retroativa a ponto de se ter como afastado do mundo jurídico o fenômeno da suspensão da prescrição decorrente da redação primitiva do art 53 da Carta Federal de 1988 STF AgRg na APn 361SC Rel Min Marco Aurélio j 3032006 Nos termos da jurisprudência assente neste Superior Tribunal de Justiça bem como no Supremo Tribunal Federal no período compreendido entre o recebimento pela Assembleia Legislativa de ofício solicitando licença para processar o Governador e o término do mandato deste suspendese o curso do prazo prescricional Pet 277DF Corte Especial Rel Min Antônio de Pádua Ribeiro DJ de 891997 Entretanto com relação aos demais codenunciados sem prerrogativa de foro o prazo prescricional não se suspende Nesse contexto se mostra conveniente o desmembramento do feito autorizado pelo art 80 in fine do Código de Processo Penal para que se prossiga perante o Juízo competente a persecução penal contra aqueles denunciados Precedentes do STJ e do STF STJ AgRg na APn 288DF Rel Laurita Vaz j 632006 Exceção da verdade Tratandose de questão da qual depende o reconhecimento da existência do crime suspendese também o cômputo do prazo prescricional nos termos do art 116 inciso I do Estatuto Repressivo STJ RHC 17578PI Rel Min Gilson Dipp j 1592005 Prisão preventiva por outro delito Causa impeditiva da prescrição executória Art 116 parágrafo único do CP A prisão por crime praticado posteriormente ao cumprimento da pena é causa impeditiva da prescrição da pretensão executória consoante previsão do parágrafo único do art 116 do Código Penal STJ RHC 16584RS Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 832005 Causas interruptivas da prescrição Art 117 O curso da prescrição interrompese V art 202 do CC I pelo recebimento da denúncia ou da queixa V art 394 do CPP II pela pronúncia V art 408 do CPP III pela decisão confirmatória da pronúncia IV pela publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis Redação da Lei n 11596 de 29112007 V art 393 do CPP O projeto de lei que tramitou pelo Congresso Nacional e que foi encaminhado pela Mensagem n 78595 do Poder Executivo incluía como inciso V a este artigo o seguinte V pela decisão do Tribunal que confirma ou impõe a condenação Os incisos subsequentes eram renumerados conservando sua redação original A publicação da Lei n 926896 simplesmente repetiu tanto a numeração quanto o conteúdo originais dos incisos V e VI do art 117 do CP V pelo início ou continuação do cumprimento da pena Redação do inciso V determinada pela Lei n 9268 de 1º de abril de 1996 V art 105 da Lei n 721084 Lei de Execução Penal VI pela reincidência Redação do inciso VI determinada pela Lei n 9268 de 1º de abril de 1996 V arts 63 e 64 do CP 1º Excetuados os casos dos incisos V e VI deste artigo a interrupção da prescrição produz efeitos relativamente a todos os autores do crime Nos crimes conexos que sejam objeto do mesmo processo estendese aos demais a interrupção relativa a qualquer deles Este parágrafo foi revogado pela Lei n 9268 de 1º de abril de 1996 que o omitiu na nova redação que deu ao art 117 do CP V art 29 do CP V arts 76 a 82 do CPP 2º Interrompida a prescrição salvo a hipótese do inciso V deste artigo todo o prazo começa a correr novamente do dia da interrupção Este parágrafo foi revogado pela Lei n 9268 de 1º de abril de 1996 que o omitiu na nova redação que deu ao art 117 do CP V art 202 do CC D O U T R I N A 1 Interrupção do prazo prescricional Ocorrendo uma causa interruptiva o curso da prescrição interrompese desaparecendo o lapso temporal já decorrido recomeçando sua contagem desde o início O lapso prescricional que foi interrompido desaparece como se nunca tivesse existido Excetua se a hipótese prevista no art 117 V isto é ocorrendo evasão da prisão ou revogação do livramento condicional a prescrição não corre por inteiro mas somente o correspondente ao tempo que restar de pena a cumprir art 113 2 Causas interruptivas da prescrição A prescrição encontrandose em curso poderá ser obstaculizada pela superveniência de determinadas causas que podem ser suspensivas art 116 ou interruptivas art 117 Ou ainda o período prescricional poderá simplesmente ser reduzido pela metade art 115 Essas causas interruptivas todas elencadas no art 117 são as seguintes a Recebimento da denúncia ou da queixa I Recebimento não se confunde com oferecimento e caracterizase pelo despacho inequívoco do juiz recebendo a denúncia ou queixa Despacho meramente ordinatório não caracteriza seu recebimento a1 Aditamento da denúncia ou queixa O aditamento da denúncia ou queixa somente interromperá a prescrição se incluir a imputação de nova conduta típica não descrita anteriormente limitandose a essa hipótese A inclusão de novo réu em aditamento não interrompe a prescrição em relação aos demais a2 Rejeição ou recebimento por juiz incompetente A rejeição da denúncia ou queixa à evidência não interrompe a prescrição A interrupção ocorrerá na data em que se em grau recursal a Superior Instância vier a recebêla Igualmente o recebimento das preambulares referidas por juiz incompetente não interrompe o curso prescricional só o interrompendo o recebimento renovado pelo juiz natural b A pronúncia II O marco interruptivo da prescrição será a data da publicação da pronúncia em cartório e não a data de sua lavratura que pode não coincidir com sua publicação Evidentemente a impronúncia ou a absolvição sumária não a interrompem por absoluta falta de previsão legal c Decisão confirmatória da pronúncia III A decisão da Instância Superior confirmatória da pronúncia ou mesmo a que pronuncia o réu em razão de recurso também interrompem a prescrição Uma corrente majoritária entende que mesmo havendo desclassificação pelo Tribunal do Júri para competência do juiz singular ainda assim a pronúncia e a decisão que a confirma constituem causas interruptivas da prescrição RT 513427 e 650264 O acórdão confirmatório da condenação não incluído no art 117 não interrompe a prescrição d Sentença condenatória recorrível IV A prescrição interrompese na data da publicação da sentença condenatória recorrível nas mãos do escrivão isto é a partir da lavratura do respectivo termo art 389 do CPP Antes da sua publicação a sentença não existe juridicamente constituindo simples trabalho intelectual do juiz d1 Sentença anulada não produz efeitos jurídicos A sentença anulada a exemplo de outros marcos interruptivos por não gerar efeitos não interrompe a prescrição pois é como se não existisse Antes da sua publicação a sentença não existe juridicamente constituindo simples trabalho intelectual do juiz Embora atendendose aos avanços tecnológicos admitase sustentar que essa publicação possa ocorrer nos meios eletrônicos ou impressos oficializados para as comunicações judiciais acreditamos que por segurança jurídica devese manter a antiga previsão do Código de Processo Penal que exige a formalidade de ser publicada em mão do escrivão que lavrará nos autos o respectivo termo registrandoa em livro especialmente destinado a esse fim art 389 Acrescentandose não se pode esquecer que forma é garantia A sentença absolutória à evidência também não interrompe a prescrição porém o prazo a ser considerado art 109 será o indicado pelo máximo da pena cominada ao delito d2 Sentença concessiva de perdão judicial A sentença que concede o perdão judicial segundo a Súmula 18 do Superior Tribunal de Justiça declaratória de extinção da punibilidade não interrompe a prescrição Aliás para reforçar esse entendimento lembramos que o perdão judicial não aplica sanção e que o parâmetro balizador do lapso prescricional é a pena aplicada na hipótese da prescrição executória Por isso não convencem as três hipóteses sugeridas por algumas decisões jurisprudenciais segundo as quais o prazo regularseá a pelo período mínimo de dois anos b pelo mínimo ou c pelo máximo abstratamente cominados ao delito d3 Alterações da Lei n 115962007 A Lei n 115962007 cumprindo mais uma etapa de uma política criminal repressora que procura desenfreadamente dizimar o instituto da prescrição ignorando inclusive seus fundamentos políticos tenta eliminar a prescrição intercorrente ou superveniente Com esse objetivo o novo diploma legal alterou a redação do inciso IV do art 117 do Código Penal que ficou nos seguintes termos pela publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis Constatase na verdade que se pretendeu criar mais uma causa interruptiva da prescrição intercorrente qual seja a publicação de eventual acórdão condenatório A inovação consiste basicamente no acréscimo desse novo marco interruptivo a publicação de acórdão condenatório recorrível que certamente demandará criteriosa interpretação tarefa que nos propomos fazer a seguir concisamente Quanto à sentença não há maior novidade a não ser ter deixado expresso que a interrupção prescritiva ocorre com a publicação da sentença aliás exatamente como interpretavam doutrina e jurisprudência nacionais d4 Publicação de acórdão condenatório recorrível Instalouse de plano na doutrina duas interpretações sobre o significado da locução acórdão condenatório trazida pela Lei n 115962007 Para uma corrente à qual nos filiamos acórdão condenatório é aquele que reforma uma decisão absolutória anterior condenando efetivamente o acusado para outra que consideramos uma posição reacionária é condenatório tanto aquele acórdão que reforma decisão absolutória anterior como o que confirma condenação precedente Seria desnecessário invocarmos o velho adágio de que a lei penal material não tem palavras inúteis e tampouco se podem acrescer palavras inexistentes Com efeito em um mesmo processo somente se pode condenar uma vez e não há a figura processual de recondenação confirmação ratificação homologação etc A partir da existência da condenação num determinado processo todo o esforço conhecido pela dialética processual é a busca de sua reforma para absolver o condenado À acusação ainda é permitida a tentativa de agravar a situação do acusado elevando sua pena ou endurecendo o regime de seu cumprimento Em síntese a existência de uma decisão condenatória impede que no mesmo processo haja nova condenação do réu Ninguém desconhece que qualquer tribunal quando aprecia o apelo da defesa de uma decisão condenatória e não acata as razões recursais não profere nova condenação mas simplesmente nega provimento ao apelo da defesa que não se confunde com acórdão condenatório d5 Vedação de interpretação extensiva e analogia O direito penal material não admite interpretação extensiva especialmente para agravar a situação do acusado Na realidade esse entendimento ampliativo está fazendo não apenas uma interpretação extensiva mas analogia in malam partem inadmissível em direito penal material Ademais analogia não é propriamente forma de interpretação mas de aplicação da norma legal A função da analogia não é por conseguinte interpretativa mas integrativa da norma jurídica Com a analogia procurase aplicar determinado preceito ou mesmo os próprios princípios gerais do direito a uma hipótese não contemplada no texto legal como ocorre no presente caso em que o entendimento ampliativo busca colmatar uma lacuna da lei Enfim a analogia não é um meio de interpretação mas de integração do sistema jurídico inaplicável na hipótese que ora analisamos d6 Distinção entre interpretação extensiva e analogia Distinguese na verdade a analogia da interpretação extensiva porque ambas têm objetos distintos aquela visa a aplicação de lei lacunosa esta objetiva interpretar o sentido da norma ampliando o seu alcance Nesse sentido era elucidativo o magistério de Magalhães Noronha que referindose à interpretação extensiva sentenciava aqui o intérprete se torna senhor da vontade da lei conhecea e apura a dando então um sentido mais amplo aos vocábulos usados pelo legislador para que correspondam a essa vontade na analogia prosseguia Magalhães Noronha o que se estende e amplia é a própria vontade legal com o fito de se aplicar a um caso concreto uma norma que se ocupa de caso semelhante Concluindo realmente acórdão confirmatório ou ratificatório pode ser semelhante mas não é igual ao condenatório e em sendo diferente não pode utilizarse da analogia para justificar sua aplicação pois com ela se supre uma lacuna do texto legal que ocorre na hipótese sub examen Por essas singelas razões venia concessa somente o acórdão recursal ou originário que representa a primeira condenação no processo tem o condão de interromper o curso da prescrição nos termos do inciso IV do art 117 do CP d7 Recusa pelo Parlamento do acórdão confirmatório O efeito do acórdão meramente confirmatório ou ratificatório de condenação anterior já foi recusado pelo Congresso Nacional Efetivamente o projeto de lei que tramitou pelo Congresso Nacional e foi encaminhado pela Mensagem n 78595 do Poder Executivo incluía como novo marco interruptivo da prescrição o inciso V deste artigo nos seguintes termos V pela decisão do Tribunal que confirma ou impõe a condenação Nessa redação estava clara a definição de decisão do Tribunal que confirma a condenação ao contrário do novo texto legal A publicação da Lei n 926896 no entanto simplesmente repetiu tanto a numeração quanto o conteúdo originais dos incisos V e VI do art 117 do CP sendo em outros termos recusada pelo Congresso Nacional a proposta de transformar a decisão confirmatória de condenação anterior em novo marco interruptivo da prescrição e Início ou continuação do cumprimento da pena V Com a prisão do agente para cumprir pena interrompese a prescrição iniciada com o trânsito em julgado da sentença para a acusação Com a continuação da prisão interrompida pela fuga ou decorrente de revogação do livramento condicional interrompese a prescrição No entanto nessas duas hipóteses a prescrição volta a correr não por inteiro mas pelo resto de pena que falta cumprir art 113 e1 Prescrição e período de prova Evidentemente durante o período de prova do sursis e do livramento condicional não corre a prescrição executória pois é como se estivesse cumprindo a pena f Reincidência VI A reincidência a rigor tem dois efeitos aumentar o prazo prescricional art 110 caput e interromper o seu curso art 117 VI Segundo uma corrente o momento de interrupção da prescrição não é determinado pela prática do segundo crime mas pela sentença condenatória que reconhece a prática do ilícito pressuposto daquela Em sentido contrário outra corrente minoritária entende que a interrupção ocorre na data do novo crime uma vez que a reincidência seria fática e não jurídica f1 Reincidência e aumento do lapso prescricional O aumento do prazo prescricional no entanto aplicase tão somente à prescrição da pretensão executória STF RTJ 50553 RT 464379 e 512417 Recentemente porém surgiram alguns julgados inclusive do STJ admitindo o aumento decorrente da reincidência também para a prescrição intercorrente RSTJ ano 1 41481 3 Prescrição em crimes conexos Devese observar no entanto que em caso de crimes conexos concurso de crimes objeto do mesmo processo a interrupção da prescrição relativa a qualquer deles estendese a todos Aliás todas as causas interruptivas da prescrição com exceção das previstas nos incisos V e VI prisão e reincidência comunicamse a todos os participantes do crime como determinava expressamente a redação revogada do art 117 1º 4 Causas interruptivas no Tribunal do Júri Os processos de Júri teriam as seguintes causas interruptivas da prescrição da pretensão punitiva recebimento da denúncia ou da queixa publicação da sentença de pronúncia trânsito em julgado do acórdão confirmatório da pronúncia e publicação da sentença condenatória Os demais processos têm somente duas causas interruptivas a data do recebimento da denúncia ou da queixa e a data de publicação da sentença condenatória recorrível 5 Nova redação do art 117 Lei n 926896 A Lei n 926896 pretendeu dar nova redação ao art 117 do Código Penal acrescentandolhe uma sétima causa interruptiva da prescrição qual seja V pela decisão do Tribunal que confirma ou impõe a condenação No entanto no Senado foi excluída a novidade mantendose os seis incisos anteriores Mas por omissão ainda assim houve uma alteração no referido dispositivo Ocorre que esqueceram de após o último inciso do art 117 VI acrescentar uma linha pontilhada significando que os seus dois parágrafos continuavam em vigor Assim a nova redação do art 117 do Código Penal encerrase com os seus seis incisos ficando sem os dois parágrafos originais o 1º disciplinava o efeito interruptivo da prescrição em relação ao concurso de pessoas e aos delitos conexos e o 2º regulava a forma de contagem do prazo prescricional em razão da interrupção 51 Obrigatoriedade da nova redação Não se pode fazer de conta que tais parágrafos continuam a existir porque a sua supressão decorreu de um lapso pois na verdade estão excluídos do atual texto legal que foi publicado no Diário Oficial A disciplina que traziam servirá de subsídio para orientar a interpretação da doutrina e da jurisprudência Equivocamse os Códigos que mantêm os dois parágrafos na redação do art 117 além de induzir o intérprete a erro J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 191 do STJ A pronúncia é causa interruptiva da prescrição ainda que o Tribunal do Júri venha a desclassificar o crime Nos termos do art 117 VI do CP a reincidência como marco interruptivo da prescrição executória verificase na data da prática do novo crime independentemente do trânsito em julgado da condenação STJ HC 80546SP Rel Min Félix Fischer j 692007 A decisão confirmatória da sentença condenatória não é marco interruptivo prescricional STJ HC 63117RJ Rel Min Félix Fischer j 3102006 Os vícios decorrentes da individualização da pena ocasionam tão somente a anulação parcial da sentença não afetando a validade tampouco a eficácia do juízo condenatório Por consequência a nulidade do édito condenatório apenas na parte da fixação da pena não torna inócua a interrupção do lapso prescricional CP art 117 IV Precedentes do Pretório Excelso STJ HC 61864RS Rel Min Félix Fischer j 3102006 Suspensão condicional da pena Pleito de reconhecimento da prescrição da pretensão executória Impossibilidade Existência de marcos interruptivos realização da audiência admonitória e revogação do benefício Em razão da existência de diversos marcos interruptivos do fenômeno da prescrição realização de audiência admonitória e decisão judicial revogadora do benefício temse que o lapso prescricional no presente caso de 4 quatro anos ainda não transcorreu STJ HC 39773PR Rel Min Laurita Vaz j 332005 As causas interruptivas do prazo prescricional são de incidência incontornável STJ REsp 257165PB Rel Min Félix Fischer j 942002 A sentença de medida de segurança internativa do acusado em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico dista do art 117 do Código Penal que é inelástico Finda a punibilidade exaustase a medida de segurança imposta STJ HC 12477SP Rel Min Fontes de Alencar j 5102000 O recebimento da denúncia é causa interruptiva da prescrição Não apreciada a denúncia em razão do disposto na Lei n 909995 art 76 e não efetivada a transação penal não se dá por interrompido o prazo prescricional Prescrição consumada STJ Apn 94DF Rel Min Edson Vidigal j 2162000 A enumeração do art 117 do Código Penal é taxativa e não comporta ampliação por invocação do injusto STJ REsp 100905RS Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 19111996 Art 118 As penas mais leves prescrevem com as mais graves D O U T R I N A Prescrição das penas mais leves As penas mais leves prescrevem com as mais graves segundo a previsão do art 118 do Código Penal desde que referentes à mesma infração penal J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A De acordo com o art 118 do Código Penal as penas mais leves prescrevem com as mais graves Assim a pena de suspensão da habilitação para dirigir veículo automotor imposta cumulativamente com a privativa de liberdade prescreve no prazo desta STJ REsp 628730SP Rel Min Gilson Dipp j 2452005 Na prescrição a pena acessória assim como a pena de multa art 118 do CP acompanham a pena privativa de liberdade STJ REsp 255646MG Rel Min Laurita Vaz j 1282003 Art 119 No caso de concurso de crimes a extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada um isoladamente V arts 69 a 71 do CP D O U T R I N A Prescrição em concurso de crimes Em qualquer das modalidades de concurso de crimes material formal ou continuado crime continuado é uma forma sui generis de concurso de crimes a prescrição incidirá sobre a pena de cada um deles Por isso no concurso formal e no crime continuado a majoração deles decorrente não será considerada para efeito de prescrição STJ RTJ 1131076 e 12082 TRF4ª Reg Ap 15432 DJU 1º111989 p 13478 J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A análise dos prazos prescricionais deve ser feita de modo isolado em relação aos crimes em concurso art 119 do CP Se a maior pena isolada foi de dois anos a prescrição operase em quatro anos e se as demais são inferiores a um ano a prescrição ocorre em dois anos art 109 V e VI do CP STJ HC 94909CE Rel Jane Silva j 4122007 Punibilidade extinção Prescrição concurso de crimes Concurso formal aumento Penas isoladamente A regra é a de que tratandose de concurso de crimes a extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada um isoladamente Evidentemente que a regra preside tanto o concurso material quanto o formal e o crime continuado No concurso formal é lícito venha a prescrição a recair sobre o aumento de pena quando o agente tenha praticado dois crimes STJ HC 45140DF Rel Min Nilson Naves j 2792005 Tratase de concurso de crimes sendo que para efeito de prescrição as penas de um total de 23 anos e 10 meses de reclusão 22 anos e 6 meses de reclusão pelo crime de latrocínio e 1 ano e 4 meses de reclusão pela ocultação de cadáver devem ser consideradas isoladamente art 119 do CP STJ HC 27590SP Rel Min Jorge Scartezzini j 492003 Segundo o cânon inscrito no art 119 no concurso de crime a extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada um isoladamente não dispondo o preceito sobre a prescrição na hipótese do crime continuado STJ RHC 10182SP Rel Min Vicente Leal j 492001 Perdão judicial Art 120 A sentença que conceder perdão judicial não será considerada para efeitos de reincidência V art 107 IX do CP V arts 8º e 39 do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais V Súmula 18 do STJ D O U T R I N A Perdão judicial e reincidência Este dispositivo é um bom exemplo de resultado diverso do pretendido Apesar da esclarecedora manifestação da Exposição de Motivos n 98 e da precisão do art 107 IX o reforço que se quis imprimir na posição assumida pela reforma penal acabou servindo de gancho aos adversários da tese sustentada os quais insistem em que o teor do art 120 reforça a tese da natureza condenatória da sentença concessiva do perdão judicial e não representa mero reforço ao art 107 IX J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 18 do STJ A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória da extinção da punibilidade não subsistindo qualquer efeito condenatório Concedido perdão judicial à ré incide no caso o enunciado sumular 18 desta Corte STJ EDcl no AgRg no Ag 748381MG Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 310 2006 O perdão judicial é tema da sentença penal pressupondo como pressupõe a sua concessão a prática de crime pelo réu STJ HC 22806AC Rel Min Hamilton Carvalhido j 1882005 A sentença que concede o perdão judicial é de efeito declaratório descabendo a inclusão do nome no rol dos culpados e a condenação em custas STJ REsp 39756RJ Rel Min Jesus Costa Lima j 231994 PARTE ESPECIAL Título I Dos Crimes Contra a Pessoa Capítulo I Dos Crimes Contra a Vida V art 5º caput e XXXVIII d da CF V arts 74 1º e 406 a 497 do CPP V Súmula 605 do STF Homicídio simples Art 121 Matar alguém Pena reclusão de 6 seis a 20 vinte anos V art 1º III a da Lei n 796089 prisão temporária V art 1º I da Lei n 807290 crimes hediondos V art 3º V e parágrafo único do Dec n 87993 transplante de órgãos 1º Caso de diminuição de pena 1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral ou sob o domínio de violenta emoção logo em seguida a injusta provocação da vítima o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço 2º Homicídio qualificado 2º Se o homicídio é cometido I mediante paga ou promessa de recompensa ou por outro motivo torpe II por motivo fútil III com emprego de veneno fogo explosivo asfixia tortura ou outro meio insidioso ou cruel ou de que possa resultar perigo comum IV à traição de emboscada ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido V art 76 II do CPP V para assegurar a execução a ocultação a impunidade ou vantagem de outro crime Pena reclusão de 12 doze a 30 trinta anos V art 1º da Lei n 288956 crime de genocídio V art 1º III a da Lei n 796089 prisão temporária V art 1º I da Lei n 807290 crimes hediondos 3º Homicídio culposo 3º Se o homicídio é culposo Pena detenção de 1 um a 3 três anos V art 18 II e parágrafo único do CP V art 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais 4º e 5º Aumento de pena 4º No homicídio culposo a pena é aumentada de um terço se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão arte ou ofício ou se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima não procura diminuir as consequências do seu ato ou foge para evitar prisão em flagrante Sendo doloso o homicídio a pena é aumentada de um terço se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 quatorze ou maior de 60 sessenta anos 4º com redação determinada pela Lei n 10741 de 1º de outubro de 2003 V arts 301 a 310 do CPP V Lei n 806990 Estatuto da Criança e do Adolescente 5º Na hipótese de homicídio culposo o juiz poderá deixar de aplicar a pena se as consequências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária V art 107 IX e 120 do CP D O U T R I N A Alterações A segunda parte do 4º foi acrescentada pela Lei n 806990 de 13 de julho de 1990 O 5º foi acrescentado pela Lei n 6416 de 24 de maio de 1977 1 Homicídio simples Definição de homicídio Homicídio é a eliminação da vida de alguém levada a efeito por outrem Embora a vida seja um bem fundamental do ser individual social que é o homem sua proteção legal constitui um interesse compartido do indivíduo e do Estado Proteção da vida marco inicial O direito protege a vida desde a sua formação embrionária resultante da junção dos elementos genéticos desde então até o início do parto a sua eliminação tipifica o crime de aborto uma vez que o ser evolutivo ainda não é uma criatura humana Outros crimes contra a vida Iniciado o parto a conduta de suprimir a vida do feto já tipificará o crime de homicídio A proteção penal à vida abrange como se constata a vida intrauterina e a vida extrauterina Contudo se durante ou logo após o parto for a própria mãe que sob a influência do estado puerperal põe fim à vida do neonato o crime será o de infanticídio que não deixa de ser uma modalidade sui generis de homicídio privilegiado Por fim quem induz instiga ou auxilia outrem a suicidar se embora o suicídio em si mesmo não seja punível Morte como causa de maior reprovabilidade Em outros tipos penais nos quais a morte não é objeto do tipo penal sua superveniência pode representar causa de maior reprovabilidade refletindo maior punição Assim por exemplo nas lesões corporais seguidas de morte omissão de socorro rixa abandono de incapaz abandono de recémnascido ou nos crimes contra os costumes de perigo comum etc Bem jurídico É a vida humana O Direito Penal protege a vida desde o momento da concepção até que ela se extinga sem distinção da capacidade física ou mental das pessoas Marco inicial da vida A vida começa com o início do parto com o rompimento do saco amniótico é suficiente a vida sendo indiferente a capacidade de viver Antes do início do parto o crime será de aborto Assim a simples destruição da vida biológica do feto no início do parto já constitui o crime de homicídio Vida biológica e vida extrauterina Modernamente não se distingue mais entre vida biológica e vida autônoma ou extrauterina É indiferente a existência de capacidade de vida autônoma sendo suficiente a presença de vida biológica que pode ser representada pela existência do mínimo de atividades funcionais de que o feto já dispõe antes de vir à luz e das quais é o mais evidente atestado a circulação sanguínea Sujeito ativo O sujeito ativo do crime de homicídio pode ser qualquer pessoa pois em se tratando de crime comum não requer nenhuma condição particular O sujeito ativo pode agir só ou associado a outrem Vítima como sujeito ativo do homicídio Não se admite como sujeito ativo do homicídio por fim a própria vítima uma vez que não é crime matar a si próprio e ainda que crime fosse não seria homicídio mas suicídio Essa conduta isoladamente constitui um indiferente penal Típica é a conduta de matar alguém isto é terceira pessoa e não a si mesmo Sujeito passivo Sujeito passivo pode ser qualquer ser vivo nascido de mulher isto é o ser humano nascido com vida A vida começa com o início do parto com o rompimento do saco amniótico Antes do início do parto o crime será de aborto É suficiente a vida sendo indiferente a capacidade de viver Sujeito passivo especial Quando o sujeito passivo de homicídio for o Presidente da República do Senado Federal da Câmara dos Deputados ou do Supremo Tribunal Federal o crime será contra a segurança nacional art 29 da Lei n 717083 Quando se tratar de vítima menor de 14 anos a pena será majorada em um terço 2ª parte do 4º com redação da Lei n 806990 ECA Tipo objetivo A conduta típica consiste em matar alguém isto é eliminar a vida de outrem A ação de matar é aquela dirigida à antecipação temporal do lapso de vida alheia Circunstâncias particulares que ocorrerem na realização do homicídio estão fora do tipo mas poderão integrar as qualificadoras ou privilegiadoras do crime Alguém conteúdo e significado A expressão alguém contida no tipo legal abrange indistintamente o universo de seres humanos ou seja qualquer deles pode ser sujeito passivo do homicídio Alguém significa outro ser humano ou seja o homicídio exige no mínimo a inclusão de dois sujeitos o que mata e o que morre Tipo subjetivo O elemento subjetivo que compõe a estrutura do tipo penal do crime de homicídio é o dolo que pode ser direto ou eventual Dolo é a consciência e a vontade de realização da conduta descrita em um tipo penal no caso do homicídio é a vontade e a consciência de matar alguém Dolo de dano Tratase de dolo de dano e não de perigo uma vez que a subjetividade típica exige que o sujeito ativo tenha a intenção de realmente produzir dano no bem jurídico tutelado Dolo direto de primeiro grau O dolo direto em relação ao fim proposto e aos meios escolhidos é classificado como de primeiro grau Estes são abrangidos imediatamente pela vontade consciente do agente essa imediação os situa como objetos do dolo direto Dolo direto de segundo grau Já os efeitos colaterais representados como necessários em face da natureza do fim proposto ou dos meios empregados são abrangidos mediatamente pela vontade consciente do agente mas a sua produção necessária os situa também como objetos do dolo direto não é a relação de imediatidade mas a relação de necessidade que os inclui no dolo direto Dolo eventual No dolo eventual o agente prevê o resultado como provável ou ao menos como possível mas apesar de prevêlo age aceitando o risco de produzilo Assumir o risco é alguma coisa mais que ter consciência de correr o risco é consentir previamente no resultado caso este venha efetivamente a ocorrer Dolo eventual um processo complexo Dolo eventual é um complexo processo psicológico em que se misturam elementos intelectivos e volitivos conscientes e inconscientes impossíveis de ser reduzidos a um conceito unitário de dolo Dolo eventual e mera esperança Dolo eventual não se confunde com a mera esperança ou simples desejo de que determinado resultado ocorra como no exemplo trazido por Welzel do sujeito que manda seu adversário a um bosque durante uma tempestade na esperança de que seja atingido por um raio Consumação e tentativa Consumase o homicídio quando da ação humana resulta a morte da vítima Aliás a consumação nos crimes materiais é a fração última e típica do agir criminoso Materialidade do homicídio A morte provase com o exame de corpo de delito que pode ser direto ou indireto art 158 do CPP Na impossibilidade desse exame direto ou indireto admitese supletivamente a produção de prova testemunhal art 167 do CPP que não se confunde com exame de corpo de delito indireto Excepcionalidade da prova testemunhal Somente será admissível a prova testemunhal supletiva quando também for impossível o exame de corpo de delito indireto e não apenas o direto Ademais a própria confissão do acusado não supre a ausência dessa prova qualificada da materialidade de qualquer crime material que deixa vestígio Tentativa tipo penal ampliado Como crime material admite a tentativa A tentativa é um tipo penal ampliado um tipo penal aberto um tipo penal incompleto mas um tipo penal Podem ocorrer também as hipóteses de desistência voluntária e arrependimento eficaz Tipicidade da tentativa A tipicidade da tentativa de homicídio decorre da conjugação do tipo penal art 121 com o dispositivo que a define e prevê a sua punição art 14 II Inexistência de dolo especial de tentativa Relativamente às fases de realização do crime em geral não há distinção quanto ao elemento subjetivo entre o crime consumado e o tentado Não existe um dolo especial de tentativa diferentemente do elemento subjetivo informador do crime consumado O dolo da tentativa é o mesmo do crime consumado Quem mata age com o mesmo dolo de quem tenta matar Tentativa branca Nos casos de tentativa branca e o crime de exposição a perigo vida ou saúde o grande traço distintivo limitase ao elemento subjetivo O homicídio é um crime de dano e o perigo para a vida ou a saúde de outrem é um crime de perigo No primeiro o dolo é de dano no segundo é de perigo Classificação doutrinária Crime comum de dano material instantâneo doloso ou culposo Homicídio simples Homicídio simples é a figura básica elementar original na espécie É a realização estrita da conduta tipificada de matar alguém Na verdade o homicídio qualificado apenas acrescenta maior desvalor da ação representada por particulares circunstâncias que determinam sua maior reprovabilidade pois a conduta nuclear típica é exatamente a mesma matar alguém Homicídio simples e crime hediondo Quando o homicídio simples é cometido em atividade típica de grupo de extermínio mesmo por um único executor é definido como crime hediondo art 1º I da Lei n 807290 com redação da Lei n 893094 Caracterização de ação de extermínio Extermínio é a matança generalizada é a chacina que elimina a vítima pelo simples fato de pertencer a determinado grupo ou determinada classe social ou racial Caracterizase a ação de extermínio mesmo que seja morta uma única pessoa desde que se apresente a impessoalidade da ação ou seja pela razão exclusiva de pertencer ou ser membro de determinado grupo social ético econômico étnico etc 2 Homicídio privilegiado As circunstâncias especialíssimas elencadas no 1º do art 121 minoram a sanção aplicável ao homicídio tornandoo um crimen exceptum Contudo não se trata de elementares típicas mas de causas de diminuição de pena que não interferem na estrutura da descrição típica que permanece inalterada Por essa razão as privilegiadoras não se comunicam na hipótese de concurso de pessoas art 30 do CP Figuras privilegiadas de homicídio As formas privilegiadas são as seguintes a impelido por motivo de relevante valor social importante considerável valor social isto é que seja de interesse coletivo b impelido por motivo de relevante valor moral igualmente importante considerável valor moral isto é adequado aos princípios éticos dominantes segundo aquilo que a moral média reputa nobre e merecedor de indulgência O valor social ou moral do motivo deve ser considerado sempre objetivamente segundo a média existente na sociedade e não subjetivamente segundo a opinião do agente c sob o domínio de violenta emoção logo em seguida a injusta provocação da vítima a intensidade da emoção deve ser de tal ordem que o sujeito seja dominado por ela a reação tem de ser imediata e a provocação tem de ser injusta Motivo de relevante valor social Motivo de relevante valor social é aquele que tem motivação e interesse coletivos ou seja a motivação fundamentase no interesse de todos os cidadãos de determinada coletividade relevante é aquele importante ou considerável valor social isto é que seja de interesse de todos em geral ao contrário do valor moral que em regra encerra interesse individual Motivo de relevante valor moral Relevante valor moral por sua vez é aquele superior enobrecedor de qualquer cidadão em circunstâncias normais Fazse necessário que se trate de valor considerável isto é adequado aos princípios éticos dominantes segundo aquilo que a moral média reputa nobre e merecedor de indulgência Necessidade da relevância do motivo Não será qualquer motivo social ou moral que terá a condição de privilegiar o homicídio mas será necessário que seja relevante não basta que tenha valor social ou moral sendo indispensável seja relevante ou seja importante notável digno de apreço Valoração objetiva do motivo O valor social ou moral do motivo deve ser considerado sempre objetivamente segundo a média existente na sociedade e não subjetivamente segundo a opinião do agente que pode ser mais ou menos sensível Sob o domínio de violenta emoção Não é qualquer emoção que pode assumir a condição de privilegiadora no homicídio mas somente a emoção intensa violenta absorvente que seja capaz de reduzir quase que completamente a vis electiva em razão dos motivos que a eclodiram dominando segundo os termos legais o próprio autocontrole do agente Intensidade da emoção A intensidade da emoção deve ser de tal ordem que o sujeito seja dominado por ela ou seja o sujeito ativo deve agir sob o ímpeto do choque emocional Sob o domínio de violenta emoção significa agir sob choque emocional próprio de quem é absorvido por um estado de ânimo caracterizado por extrema excitação sensorial e afetiva que subjuga o sistema nervoso do indivíduo Mera influência da emoção Na hipótese de mera atenuante art 65 c o agente estaria apenas sob a influência da violenta emoção ao contrário dos casos de minorantes que exigem que aquele se encontre dominado pela emoção violenta Ademais no caso da atenuante não há a exigência do requisito temporal logo em seguida pois é indiferente que o crime tenha sido praticado algum tempo depois da injusta provocação da vítima Injusta provocação da vítima Com efeito além da violência emocional é fundamental que a provocação tenha sido da própria vítima e mediante uma provocação injusta que não significa necessariamente antijurídica mas quer dizer não justificada não permitida não autorizada por lei ou em outros termos ilícita Injusta provocação e agressão injusta Injusta provocação não se confunde com agressão injusta Com efeito se a ação que constitui a provocação for legítima e nesse caso cabe ao sujeito ativo submeterse a ela não se pode falar em privilegiadora ou causa de diminuição de pena por faltar um requisito ou elementar indispensável que é a injustiça da provocação Imediatidade entre provocação e reação Para se reconhecer a minorante em apreço nosso Código Penal vinculou a ação sob domínio de violenta emoção a um requisito temporal logo em seguida a injusta provocação da vítima Com efeito a reação tem de ser imediata ou seja é necessário que entre a causa da emoção injusta provocação e esta praticamente inexista intervalo A reação à provocação injusta deve ser imediata de pronto sem intervalo isto é ex improviso Sob o domínio e sob a influência distinção A distinção situase na intensidade da emoção sentida e na imediatidade da reação No homicídio privilegiado o agente age sob o domínio de violenta emoção e logo após a provocação da vítima na atenuante genérica ele se encontra sob a influência da emoção sendo indiferente nesse caso o requisito temporal Requisitos da terceira privilegiadora 1º Emoção violenta 2º injusta provocação da vítima 3º imediatidade entre provocação e reação Privilegiadora e atenuante Se a emoção for menor apenas influenciando a prática do crime ou não for logo em seguida não constituirá a privilegiadora mas a atenuante genérica do art 65 III c última parte A distinção situase na intensidade da emoção sentida e na imediatidade da reação No homicídio privilegiado o agente age sob o domínio de violenta emoção e logo após a provocação da vítima na atenuante genérica ele se encontra sob a influência da emoção sendo indiferente o requisito temporal RTJ 94438 RT 620340 Provocação e agressão Provocação não se confunde com agressão Se aquela colocar em risco a integridade do ofendido assumirá a natureza de agressão autorizando a legítima defesa Concurso com qualificadoras subjetivas Estas privilegiadoras não podem concorrer com as qualificadoras subjetivas por absoluta incompatibilidade Respondendo positivamente os quesitos das privilegiadoras ficam prejudicados os quesitos referentes às qualificadoras subjetivas No entanto nada impede que as privilegiadoras concorram com as qualificadoras objetivas Redução obrigatória Há grande divergência doutrinária sobre a obrigatoriedade ou faculdade de redução da minorante prevista neste dispositivo No entanto o Supremo Tribunal sumulou cominando nulidade absoluta à não formulação de quesito da defesa antes das circunstâncias agravantes E esse é um quesito de defesa Com efeito reconhecido pelo Conselho de Sentença ante a soberania do júri art 5º XXXVIII da CF a redução se impõe O quantum de redução 16 a 13 este sim ficará a critério da discricionariedade prudente do juiz Súmula 162 do STF É absoluta a nulidade do julgamento pelo júri quando os quesitos da defesa não precedem aos das circunstâncias agravantes Homicídio privilegiado e crime hediondo Há incompatibilidade entre este e aquele O homicídio simples só é hediondo quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio Logo não se compatibiliza com relevante valor social ou moral ou logo em seguida a injusta provocação da vítima 3 Homicídio qualificado As circunstâncias que qualificam o homicídio dividemse em a motivos paga promessa de recompensa ou outro motivo torpe ou fútil I e II b meios veneno fogo explosivo asfixia tortura ou outro meio de que possa resultar perigo comum III c modos traição emboscada mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa da vítima IV d fins para assegurar a execução ocultação impunidade ou vantagem de outro crime V a Mediante paga ou promessa de recompensa Este é um crime típico de execução atribuída aos famosos jagunços um crime mercenário É uma das modalidades de torpeza na execução de homicídio esta especificada Na paga o agente recebe previamente a recompensa pelo crime o que não ocorre na promessa de recompensa na qual há somente a expectativa de paga Respondem pelo crime qualificado o que praticou a conduta e o que pagou ou prometeu a recompensa Mandados gratuitos não qualificam A maior reprovabilidade do crime mercenário repousa na venalidade do agente Os mandados gratuitos não qualificam o crime tampouco eventuais benefícios concedidos a posteriori onde não haja acordo prévio Autoria bilateral concurso necessário Respondem pelo crime qualificado o que praticou a conduta e o que pagou ou prometeu a recompensa É indispensável a participação de no mínimo duas pessoas quem paga para o crime ser cometido e quem o executa pela paga ou recompensa b Motivo torpe Torpe é o motivo repugnante abjeto ignóbil vil que repugna à consciência média O motivo torpe não pode coexistir com o motivo fútil Motivo torpe Torpe é o motivo que atinge mais profundamente o sentimento éticosocial da coletividade é o motivo repugnante abjeto vil indigno que repugna à consciência média O motivo não pode ser ao mesmo tempo torpe e fútil A torpeza afasta naturalmente a futilidade O ciúme O ciúme por si só como um sentimento comum à maioria da coletividade não se equipara ao motivo torpe Na verdade o ciúme patológico tem a intensidade exagerada de um sentimento natural do ser humano que se não serve para justificar a ação criminosa tampouco serve para qualificála Vingança e motivo torpe Nem sempre a vingança é caracterizadora de motivo torpe pois a torpeza do motivo está exatamente na causa da sua existência Em sentido semelhante sustenta Fernando de Almeida Pedroso que a vingança como sentimento de represália e desforra por alguma coisa sucedida pode segundo as circunstâncias que a determinaram configurar ou não o motivo torpe o que se verifica e dessume pela sua origem e natureza Incomunicabilidade dos motivos Os motivos que qualificam o crime de homicídio na hipótese de concurso de pessoas são incomunicáveis pois a motivação é individual e não constituem elementares típicas segundo o melhor entendimento doutrinário c Motivo fútil Fútil é o motivo insignificante banal Motivo fútil não se confunde com motivo injusto uma vez que o motivo justo pode em tese excluir a ilicitude afastar a culpabilidade ou privilegiar a ação delituosa Vingança não é motivo fútil embora eventualmente possa caracterizar motivo torpe Ausência de motivo Motivo fútil não se confunde com ausência de motivo Esta é uma grande aberração jurídicopenal A presença de um motivo fútil ou banal qualifica o homicídio No entanto a completa ausência de motivo que deve tornar mais censurável a conduta pela gratuidade e maior reprovabilidade não o qualifica Absurdo lógico homicídio motivado é qualificado homicídio sem motivo é simples Mas o princípio da reserva legal não deixa outra alternativa Por isso defendemos de lege ferenda o acréscimo de uma nova qualificadora ao homicídio ausência de motivo Vingança e motivo fútil Vingança não é motivo fútil embora eventualmente possa caracterizar motivo torpe O ciúme por exemplo não se compatibiliza com motivo fútil Motivo fútil segundo a Exposição de Motivos é aquele que pela sua mínima importância não é causa suficiente para o crime Na verdade essa declaração da Exposição de Motivos não é das mais felizes porque se for causa suficiente para o crime justificáloá logo será excludente de criminalidade Motivo fútil e motivo justo Motivo fútil não se confunde com motivo injusto pois este não apresenta aquela desproporcionalidade referida na Exposição de Motivos E um motivo aparentemente insignificante pode em determinadas circunstâncias assumir certa relevância Por outro lado sendo justo o motivo não se poderá falar em crime Insuficiência e ausência de motivo A insuficiência de motivo não pode porém ser confundida com ausência de motivos Aliás motivo fútil não se confunde com ausência de motivo Esta é uma grande aberração jurídicopenal A presença de um motivo fútil ou banal qualifica o homicídio No entanto a completa ausência de motivo que deve tornar mais censurável a conduta não o qualifica Absurdo lógico ausência de motivo Homicídio motivado é qualificado homicídio sem motivo é simples Mas o princípio da reserva legal não deixa outra alternativa d Emprego de veneno dissimulação A utilização de veneno só qualifica o crime se for utilizado com dissimulação como estratagema como cilada Sua administração forçada ou com conhecimento da vítima não qualifica o crime Se for ministrado com violência poderá caracterizar o meio cruel Emprego de veneno meio insidioso O emprego de veneno é um meio insidioso excepcional e o seu êxito está vinculado exatamente à dissimulação no seu uso Definição de veneno Veneno é toda substância biológica ou química que introduzida no organismo pode produzir lesões ou causar a morte Veneno para fins penais é qualquer substância vegetal animal ou mineral que tenha idoneidade para provocar lesão ao organismo humano Uma substância teoricamente inócua pode assumir a condição de venenosa segundo as condições especiais da vítima Natureza da substância venenosa O que caracteriza o veneno não é a forma de introdução no organismo nem seu aspecto insidioso mas a sua maneira de agir no organismo alterando a saúde ou causando a morte por processo químico ou bioquímico distinguindose nesse particular de outras substâncias de ação física como água quente ferro candente etc Descaracterização de veneno Sua administração forçada ou com conhecimento da vítima não qualifica o crime Se for ministrado com violência poderá caracterizar o meio cruel lato sensu se tiver o propósito de causar grave sofrimento à vítima mas não constituirá meio insidioso Necessidade de prova pericial Convém destacar desde logo que o envenenamento exige a prova pericial toxicológica nos termos do art 158 e seguintes do CPP e Emprego de fogo ou explosivo Exemplificase o emprego de fogo com a utilização de combustível inflamável seguido do ateamento de fogo Fogo pode constituir meio cruel ou meio de que pode resultar perigo comum dependendo das circunstâncias O emprego de explosivo pode ocorrer com o uso de dinamite ou qualquer outro material explosivo v g bomba caseira coquetel molotov Emprego de fogo meio cruel Nada impede que possa casuisticamente constituir meio cruel como vem ocorrendo nos ateamentos de fogo em mendigos pelas ruas das grandes cidades nos últimos tempos Definição de explosivo Explosivo é qualquer objeto ou artefato capaz de provocar explosão ou qualquer corpo capaz de se transformar rapidamente em explosão O emprego de explosivo pode ocorrer com o uso de dinamite ou qualquer outro material explosivo v g bomba caseira coquetel molotov etc f Emprego de asfixia Asfixia é o impedimento da função respiratória com a consequente falta de oxigênio no sangue do indivíduo Essa supressão do oxigênio por determinado período leva a vítima à morte em razão da falta de oxigênio Modalidades de asfixia A asfixia pode ser a mecânica enforcamento afogamento etc b tóxica uso de gás asfixiante A asfixia mecânica segundo doutrina e jurisprudência pode ser produzida por meio de enforcamento estrangulamento afogamento esganadura ou sufocação que são processos de sua provocação g Emprego de tortura Tortura é meio que causa prolongado atroz e desnecessário padecimento A nosso juízo a tortura é uma modalidade de meio cruel distinguindose somente pelo aspecto temporal exigindo uma ação um pouco mais prolongada h Meio insidioso e cruel Meio insidioso Meio insidioso é aquele utilizado com estratagema perfídia Insidioso é o recurso dissimulado consistindo na ocultação do verdadeiro propósito do agente que assim surpreende a vítima que tem sua defesa dificultada ou até impossibilitada Insidioso é o meio disfarçado subreptício ardiloso que objetiva surpreender a vítima desatenta e indefesa Meio cruel Meio cruel é a forma brutal de perpetrar o crime é meio bárbaro martirizante que revela ausência de piedade v g pisoteamento da vítima dilaceração do corpo a facadas etc Meio cruel é o que causa sofrimento desnecessário à vítima Pelo meio cruel o agente objetiva o padecimento de sua vítima revela sadismo Crueldade após a morte descaracterização A crueldade realizada após a morte da vítima não qualifica o crime Nesse sentido era o magistério de Frederico Marques que advertia os atos que podem traduzir a crueldade somente são tais como é óbvio enquanto a pessoa está com vida i Possa resultar perigo comum Meio de que pode resultar perigo comum é aquele que pode atingir um número indefinido ou indeterminado de pessoas Nada impede que haja concurso formal do homicídio com um crime de perigo comum se houver desígnios autônomos Qualificadora e crimes de perigo comum Distinguemse as qualificadoras do homicídio que resultar em perigo comum daqueles denominados crimes de perigo comum Título VIII Capítulo I porque a finalidade do agente é a morte da vítima e não o perigo comum A diferença está no elemento subjetivo j À traição É o ataque sorrateiro inesperado como v g tiro pelas costas que não se confunde com tiro nas costas Não se configura a traição se a vítima pressente a intenção do agente não se configurando igualmente se houver tempo para a vítima fugir Ocultação moral ou física da intenção Traição como qualificadora de homicídio é a ocultação moral ou mesmo física da intenção do sujeito ativo que viola a confiança da vítima é a deslealdade Não se caracteriza unicamente por haver o golpe letal ter sido desferido pelas costas da vítima k Emboscada É a tocaia a espreita verificandose quando o agente se esconde para surpreender a vítima É a ação premeditada de aguardar oculto a presença da vítima para surpreendêla com o ataque indefensável Emboscada é a espera dissimulada da vítima em lugar onde esta terá de passar Emboscada crime premeditado O homicídio qualificado pela emboscada é sempre um crime premeditado pois o sujeito ativo deslocase com antecedência examina o local projeta os próximos passos colocase à espera da passagem da vítima para com segurança e sem risco abatêla Emboscada impossibilidade de defesa A vítima nessa modalidade não tem nenhuma possibilidade de defesa Tratase de uma das formas mais covardes da ação humana criminosa l Mediante dissimulação O agente esconde ou disfarça o seu propósito para surpreender a vítima desprevenida É uma modalidade de surpresa Tanto a ocultação do propósito quanto o disfarce utilizado para se aproximar da vítima qualificam o homicídio Dissimulação modalidade de surpresa Dissimulação é a ocultação da intenção hostil do projeto criminoso para surpreender a vítima O sujeito ativo dissimula isto é mostra o que não é fazse passar por amigo ilude a vítima que assim não tem razões para desconfiar do ataque e é apanhada desatenta e indefesa Por meio de dissimulação o agente esconde ou disfarça o seu propósito para surpreender a vítima desprevenida m Recurso que dificulta ou impossibilita a defesa Somente poderá ser hipótese análoga à traição emboscada ou dissimulação do qual são exemplificativas Em outros termos é necessário que o outro recurso tenha a mesma natureza das qualificadoras elencadas no inciso Exemplo típico é a surpresa n Surpresa A surpresa constitui um ataque inesperado imprevisto e imprevisível além do procedimento inesperado é necessário que a vítima não tenha razão para esperar ou suspeitar da agressão Não basta que a agressão seja inesperada é necessário que o agressor atue com dissimulação procurando com sua ação repentina dificultar ou impossibilitar a defesa da vítima Caracterização da surpresa Para se configurar a surpresa isto é recurso que torna difícil ou impossível a defesa do ofendido é necessário que além do procedimento inesperado não haja razão para a espera ou pelo menos suspeita da agressão pois é a dificuldade ou mesmo impossibilidade de a vítima defenderse que fundamenta a qualificadora Surpresa e traição Por vezes a surpresa confundese com a traição Se por exemplo ao matar a vítima dormindo estiver violando a confiança e a lealdade que a vítima lhe depositava como é o caso de quem convive sob o mesmo teto No entanto haverá surpresa se o sujeito ativo ao procurar a vítima para matála encontraa adormecida exterminandolhe a vida o Para assegurar a execução ocultação impunidade ou vantagem de outro crime Estas qualificadoras constituem o elemento subjetivo do tipo representado pelo especial fim de agir O outro crime pode ter sido praticado por outra pessoa Falase em qualificadora por conexão Neste caso o homicídio é cometido para garantir a prática de outro crime ou evitar a sua descoberta p A premeditação A premeditação não qualifica o crime A preordenação criminosa nem sempre será causa de exasperação de pena diante da maior censurabilidade da conduta Poderá muitas vezes significar relutância resistência à prática criminosa em vez de revelar intensidade de dolo O art 59 será a sede adequada para avaliar a natureza dessa circunstância RT 534396 Abrangência do dolo necessidade Os meios modos e fins que qualificam o homicídio referemse à exacerbação da natureza ilícita da conduta integrando a própria figura típica razão pela qual devem ser abrangidos pelo dolo podendo consequentemente ser excluídos pela ocorrência de erro 4 Homicídio culposo Admite a forma culposa desde que presentes os seguintes requisitos comportamento humano voluntário descumprimento do dever de cuidado objetivo previsibilidade objetiva do resultado morte involuntária Excepcionalidade do crime culposo As legislações modernas adotam o princípio da excepcionalidade do crime culposo isto é a regra é de que as infrações penais sejam imputadas a título de dolo e só excepcionalmente a título de culpa e nesse caso quando expressamente prevista a modalidade culposa da figura delituosa art 18 parágrafo único Por isso quando o sujeito pratica o fato culposamente e a figura típica não admite a forma culposa não há crime Modalidades de culpa Imprudência é a prática de uma conduta arriscada ou perigosa e tem caráter comissivo É a imprevisão ativa culpa in faciendo ou in committendo Conduta imprudente é aquela que se caracteriza pela intempestividade precipitação insensatez ou imoderação Negligência é a displicência no agir a falta de precaução a indiferença do agente que podendo adotar as cautelas necessárias não o faz É a imprevisão passiva o desleixo a inação culpa in ommittendo É não fazer o que deveria ser feito Imperícia é a falta de capacidade despreparo ou insuficiência de conhecimentos técnicos para o exercício de arte profissão ou ofício Imperícia não se confunde com erro profissional O erro profissional é um acidente escusável justificável e de regra imprevisível que não depende do uso correto e oportuno dos conhecimentos e regras da ciência Espécies de culpa Culpa consciente Há culpa consciente também chamada culpa com previsão quando o agente deixando de observar a diligência a que estava obrigado prevê um resultado previsível mas confia convictamente em que ele não ocorra Quando o agente embora prevendo o resultado espera sinceramente que este não se verifique estarseá diante de culpa consciente e não de dolo eventual Culpa inconsciente Ação sem previsão do resultado previsível constitui a chamada culpa inconsciente culpa ex ignorantia A culpa inconsciente caracterizase pela ausência absoluta de nexo psicológico entre o autor e o resultado de sua ação Cuidado objetivamente devido A inobservância do cuidado objetivamente devido resulta da comparação da direção finalista real com a direção finalista exigida para evitar as lesões dos bens jurídicos A infração desse dever de cuidado representa o injusto típico dos crimes culposos No entanto é indispensável investigar o que teria sido in concreto para o agente o dever de cuidado Relação causal É indispensável que o resultado seja consequência da inobservância do cuidado devido ou em outros termos é necessário que este seja a causa daquele Com efeito quando for observado o dever de cautela e ainda assim o resultado ocorrer não se poderá falar em crime culposo Atribuir nessa hipótese a responsabilidade ao agente cauteloso constituirá autêntica responsabilidade objetiva Inevitabilidade do resultado atipicidade Os limites da norma imperativa encontramse no poder de seu cumprimento pelo sujeito por isso o dever de cuidado não pode ir além desses limites A inevitabilidade do resultado exclui a própria tipicidade Em outros termos é indispensável que a inobservância do cuidado devido seja a causa do resultado tipificado como crime culposo Culpa imprópria e erro culposo A culpa imprópria decorre do erro de tipo evitável nas descriminantes putativas ou do excesso nas causas de justificação Nessas circunstâncias o agente quer o resultado em razão de a sua vontade encontrarse viciada por um erro que com mais cuidado poderia ser evitado Dolo eventual e culpa consciente Há entre ambos um traço comum a previsão do resultado proibido Mas enquanto no dolo eventual o agente anui ao advento desse resultado assumindo o risco de produzilo em vez de renunciar à ação na culpa consciente ao contrário repele a hipótese de superveniência do resultado na esperança convicta de que este não ocorrerá Dúvida dolo eventual ou culpa consciente Por fim a distinção entre dolo eventual e culpa consciente resume se à aceitação ou rejeição da possibilidade de produção do resultado Persistindo a dúvida entre um e outra deverseá concluir pela solução menos grave pela culpa consciente Concorrência de culpas Há concorrência de culpas quando dois indivíduos um ignorando a participação do outro concorrem culposamente para a produção de um fato definido como crime Na concorrência de culpa os agentes respondem isoladamente pelo resultado produzido De observarse que nessa hipótese não se pode falar em concurso de pessoas ante a ausência do vínculo subjetivo Compensação de culpas Eventual culpa da vítima não exclui a do agente elas não se compensam As culpas recíprocas do ofensor e do ofendido não se extinguem Somente a culpa exclusiva da vítima exclui a daquele para quem nesse caso a ocorrência do evento foi pura infelicitas facti Tentativa no homicídio preterintencional A tentativa é inadmissível no chamado homicídio preterintencional isto é naquele crime cujo resultado preterdoloso foi maior do que o inicialmente pretendido pelo agente Segundo Hungria a tentativa de homicídio é o inverso do homicídio preterintencional ou ultra voluntatem art 121 3º neste não há o animus occidendi mas verificase o evento morte naquela há o animus occidenti mas o evento morte não se verifica Concurso de pessoas em crime culposo Doutrina alemã autoria A doutrina alemã não admite a possibilidade de coautoria nos crimes culposos entendendo que qualquer contribuição na causa produtora do resultado não querido caracteriza em si a autoria Essa concepção germânica decorre da adoção da teoria do domínio do fato visto que nos crimes culposos esse domínio não existe Doutrina espanhola coautoria e participação Em sentido diametralmente oposto a doutrina espanhola não só admite a coautoria nos crimes culposos como também a participação em sentido estrito O comum acordo impossível quanto ao resultado é perfeitamente admissível na conduta imprudente que de regra é voluntária Esta é a melhor orientação Doutrina brasileira coautoria A doutrina brasileira à unanimidade admite a coautoria em crime culposo rechaçando contudo a participação Pode existir na verdade um vínculo subjetivo na realização da conduta que é voluntária inexistindo contudo tal vínculo em relação ao resultado que não é desejado Os que cooperam na causa isto é na falta do dever de cuidado objetivo agindo sem a atenção devida são coautores Coautoria e participação No exemplo do passageiro que induz o motorista de táxi a dirigir em velocidade excessiva e contribui diretamente para um atropelamento que para os alemães seria autor para os espanhóis seria simples partícipe para a doutrina brasileira seria coautor Homicídio culposo no trânsito maior punição É de uma clareza meridiana a diferença e a maior desvalia entre as ações descuidadas praticadas no trânsito e aquelas demais ações culposas que podem ocorrer no quotidiano social Maior desvalor da ação Priorizar o maior desvalor da ação não é novidade em nosso Direito Penal pois ocorre por exemplo no homicídio qualificado cujo resultado é o mesmo do homicídio simples E isso não significa negar tratamento igualitário a quem matou alguém de forma qualificada e não simples Majorantes do crime de homicídio Inobservância de regra técnica de profissão arte ou ofício Não se confunde com a imperícia modalidade de culpa que indica inaptidão ou insuficiência de capacidade técnica Nesta majorante o agente conhece a regra técnica mas não a observa há uma displicência a respeito da regra técnica O fundamento da culpa é outro Imperícia e inobservância de regra técnica A imperícia é modalidade ou espécie de culpa que se localiza na topologia estrutural do crime culposo isto é no tipo penal Já a inobservância de regra técnica importa em maior reprovabilidade da conduta seja qual for a modalidade da culpa Situase portanto na culpabilidade graduando a reprovabilidade da conduta praticada Omissão de socorro à vítima Aqui a omissão de socorro não constitui crime autônomo o crime continua a ser de resultado morte ao contrário do crime omissivo próprio como ocorre com a previsão do art 135 mas configura simples majorante Em razão da especialidade desta previsão afastam se a adequação típica dos arts 135 e 13 2º c ambos do CP Impossibilidade de prestar socorro atipicidade Essa majorante somente pode ser aplicada quando o socorro omitido pudesse ter sido prestado Por isso a despeito de alguns textos legais prolixos pretendendo punir crime impossível a morte instantânea da vítima ou seu imediato socorro por terceiro impedem a incidência desta majorante Risco pessoal A presença de risco pessoal afasta esta majorante Por isso no caso do agente que deixa o local do acidente temeroso de alguma represália por parte dos parentes da vítima ou de terceiros que possuem condições de prestar socorro não se há que falar em adequação típica da referida majorante pela falta da elementar sem risco pessoal Omissão de socorro injusta É irrelevante que do dispositivo em exame não conste expressamente a elementar típica sem risco pessoal pois somente a omissão de socorro injusta admite a responsabilização do omitente Por outro lado para quem não admite essa orientação se o sujeito ativo deixar de prestar socorro em razão de risco pessoal configurase plenamente a inexigibilidade de outra conduta que é uma excludente supralegal da culpabilidade Não procura diminuir as consequências do comportamento É uma referência redundante na medida em que não deixa de ser uma forma de omitir socorro Na verdade mutatis mutandis essa previsão tem certa conotação de arrependimento posterior a exemplo da previsão do art 16 do CP Fuga para evitar prisão em flagrante Esta majorante constitui uma espécie sui generis de elemento subjetivo do tipo majorado Normalmente tal majorante se confunde com a omissão de socorro No entanto o risco pessoal iminente afasta a tipicidade da própria conduta omissiva e não somente da majorante descaracterizando o crime Prisão em flagrante política equivocada Essa política equivocada em vez de reprimir a fuga tem estimulado muitos motoristas irresponsáveis a abandonar o local do acidente para evitar a prisão em flagrante mostrandose essa previsão legal ser absolutamente contraproducente na medida em que contribui também para diminuir a prestação de socorro Homicídio doloso contra menor A Lei n 806990 Estatuto da Criança e do Adolescente acrescentou essa causa de aumento no 4º do art 121 constituindo verdadeira impropriedade técnica pois referido dispositivo disciplinava causas de aumento incidentes somente no homicídio culposo Majorante objetiva Tratase de causa de aumento de natureza objetiva e de aplicação obrigatória incidindo sempre que o homicídio praticado contra menor de 14 anos for doloso em qualquer de suas modalidades simples privilegiado ou qualificado Tempo da menoridade Como o Código Penal adotou a teoria da atividade art 4º considerase a menoridade na data da prática da ação delituosa ainda que outra seja a da produção do resultado Menoridade e grupo de extermínio Embora esta previsão incluída pelo ECA tenha endereço certo os grupos de extermínio sua aplicação atinge a todos os sujeitos ativos quando o homicídio for praticado contra menor de 14 anos majorando a pena em um terço 41 Homicídio culposo no trânsito A ação que tipifica o crime culposo no trânsito de veículo automotor é consideravelmente mais desvaliosa do que as outras condutas produtoras de crimes culposos no quotidiano social O maior desvalor das ações descuidadas praticadas no volante está diretamente relacionado à quantidade produzida de resultados desvaliosos O veículo transformouse em instrumento de vazão da agressividade humana de prepotência de desequilíbrio emocional que se extravasam nas pistas de rolamento 42 Constitucionalidade de maior reprovação A reprovabilidade da inobservância do cuidado devido no trânsito é muito maior que a relativa a outros comportamentos descuidados produtores de semelhantes resultados O homicídio qualificado também recebe uma sanção muito superior ao homicídio simples que produz exatamente o mesmo resultado O maior desvalor está exatamente na ação Um parágrafo a mais no art 121 do CP punindo diferentemente o crime culposo de trânsito e essa desinteligência não existiria Não vemos nenhuma inconstitucionalidade nessa exasperação penal 5 Majorantes do homicídio A majorante representa um plus de culpabilidade ao contrário da qualificadora que integra a tipicidade As majorantes e minorantes não se confundem com qualificadoras ou agravantes e atenuantes genéricas Funcionam como modificadoras da pena na terceira fase do cálculo de sua aplicação Ademais as majorantes e minorantes estabelecem o quantum fixo ou variável de aumento ou diminuição ao contrário das demais operadoras Este 4º prevê majorantes diferenciadas para homicídio culposo e doloso 51 No homicídio culposo 4º 1ª parte a Inobservância de regra técnica de profissão arte ou ofício esta majorante não se confunde com a imperícia modalidade de culpa que indica inaptidão inabilidade profissional ou insuficiência de capacidade técnica Nesta majorante o agente conhece a regra técnica mas não a observa haveria uma displicência a respeito da regra técnica O fundamento da culpa é outro essa desatenção somente graduaria a culpa Por isso esta majorante ao contrário da imperícia a nosso juízo aplicase somente à profissional contra RTJ 56695 b omissão de socorro à vítima aqui a omissão de socorro não constitui crime autônomo o crime continua a ser de resultado morte mas simples majorante A presença de risco pessoal afasta esta majorante Em razão da especialidade desta previsão afastamse as normas dos arts 135 e 13 2º c ambos do CP c não procura diminuir as consequências do comportamento isto não passa de uma especificação de omissão de socorro Por isso a referência é redundante Heleno Fragoso Lições de Direito Penal Parte Especial v 1 p 47 d fuga para evitar prisão em flagrante esta majorante constitui o elemento subjetivo do tipo majorado Normalmente ela se confunde com a omissão de socorro A dificuldade da identificação de uma ou outra é aparentemente indiferente na medida em que se aplica somente uma majoração No entanto exigese redobrada cautela da defesa pois a omissão de socorro não exige elemento subjetivo do tipo Por isso o risco pessoal iminente afasta a tipicidade da própria conduta omissiva e não somente a majorante descaracterizando o crime 52 No homicídio doloso 4º 2ª parte Esta previsão incluída pelo ECA tem endereço certo os grupos de extermínio No entanto sua aplicação atinge a todos os sujeitos ativos quando o homicídio for praticado contra menor de 14 anos majorando a pena em um terço 53 Proteção do idoso maior de sessenta anos Este penduricalho pode aumentar hoje menoridade velhice amanhã quem sabe desempregado semteto etc Ao contrário da redação de outros dispositivos este somente contempla o maior de sessenta anos significando que vítima com idade igual a sessenta anos não majora a pena do homicídio 54 Isenção de pena ou perdão judicial Referese à hipótese em que o agente é punido diretamente pelo próprio fato que praticou A gravidade das consequências deve ser aferida em função da pessoa do agente não se cogitando aqui de critérios objetivos As consequências de que se cogita não se limitam aos danos morais podendo constituirse de danos materiais Quando as consequências atingirem o agente via indireta exigese entre este e a vítima vínculo afetivo de importância significativa Gravidade das consequências A gravidade das consequências deve ser aferida em função da pessoa do agente não se cogitando aqui de critérios objetivos As consequências não se limitam aos danos morais podendo constituirse de danos materiais Quando as consequências atingirem o agente via indireta exigese entre este e a vítima vínculo afetivo de importância significativa Perdão judicial direito do réu Se estiverem presentes os requisitos exigidos não poderá deixar de conceder o perdão judicial por mero capricho ou qualquer razão desvinculada do referido instituto Trata de um direito público subjetivo de liberdade do indivíduo Causa extintiva de punibilidade não pode ficar relegada ao puro arbítrio judicial Súmula 18 do STJ A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória da extinção da punibilidade não subsistindo qualquer efeito condenatório 6 Questões especiais Homicídio e aberratio ictus A aberratio ictus ou erro na execução não se confunde com o erro quanto à pessoa art 20 3º no qual há representação equivocada da realidade pois o agente acredita tratarse de outra pessoa Coação irresistível e obediência hierárquica A coação irresistível e a obediência hierárquica art 22 são causas legais que excluem a culpabilidade em razão da inexigibilidade de comportamento diverso Coação irresistível Coação irresistível é tudo o que pressiona a vontade impondo determinado comportamento eliminando ou reduzindo o poder de escolha Coação moral Coação irresistível com idoneidade para afastar a culpabilidade é a coação moral a conhecida ameaça uma vez que a coação física exclui a própria ação não havendo consequentemente conduta típica Na coação moral existe vontade embora seja viciada Coação física irresistível A coação física vis absoluta por sua vez exclui a ação por ausência de vontade Neste caso o executor é considerado apenas um instrumento de realização da vontade do coator que na realidade é o autor mediato Irresistibilidade da coação A irresistibilidade da coação deve ser medida pela gravidade do mal ameaçado Essa gravidade deve relacionarse com a natureza do mal e evidentemente com o poder do coator em produzilo Na verdade não pode ser algo que independa da vontade do coator alguma coisa que dependa de um fator aleatório fora da disponibilidade daquele Punibilidade exclusiva do coator Na hipótese de irresistibilidade da coação punese exclusivamente o coator que no caso é o autor mediato uma vez que o executor é mero instrumento agindo inculpavelmente Não há propriamente concurso de pessoas mas simples autoria mediata Coação resistível Na hipótese de coação resistível não haverá exclusão da culpabilidade penal logicamente porque o sujeito pode agir em conformidade com o direito e neste caso haverá concurso de pessoas Porém como há a coação configurase uma diminuição do grau de reprovação art 65 III c 1ª figura Obediência hierárquica A obediência hierárquica requer uma relação de direito público e somente de direito público A hierarquia privada própria das relações da iniciativa privada não é abrangida por este dispositivo Não manifestamente ilegal Em virtude dessa subordinação hierárquica o subordinado cumpre ordem do superior desde que a ordem não seja manifestamente ilegal podendo no entanto ser apenas ilegal Se a ordem for legal o problema deixa de ser de culpabilidade podendo caracterizar causa de exclusão de ilicitude Obediência hierárquica e ordens ilegais O subordinado não tem a obrigação de cumprir ordens ilegais Ele tem a obrigação de cumprir ordens inconvenientes inoportunas mas não ilegais Não tem o direito como subordinado de discutir a oportunidade ou conveniência de uma ordem Mas a ilegalidade mais que o direito tem o dever de apontála e negarse a cumprir ordem manifestamente ilegal Homicídio crime hediondo O homicídio simples praticado em ação típica de grupo de extermínio e o homicídio qualificado são definidos como crimes hediondos art 1º I da Lei n 807290 com redação da Lei n 893094 Pena Na modalidade simples a pena é de reclusão de seis a vinte anos na qualificada de doze a trinta anos Na forma culposa a pena será de detenção de um a três anos Há ainda a possibilidade da aplicação de minorantes 1º e majorantes 4º Ação penal Pública incondicionada em todas as formas Ação penal privada subsidiária A inércia ministerial possibilita ao ofendido ou a quem tenha qualidade para representálo iniciar a ação penal mediante queixa substituindo ao Ministério Público Essa ação penal denominase ação privada subsidiária da pública Natureza da ação privada subsidiária A ação penal no entanto não se transforma em privada mantendo a sua natureza de pública e por essa razão o querelante que a propuser não pode dela desistir renunciar perdoar ou ensejar a perempção Nesta ação a decadência do direito de queixa não extingue a punibilidade Note bem antes do início do parto o crime será de aborto e não de homicídio Quando o sujeito ativo for a própria mãe durante o parto ou logo após poderá caracterizar infanticídio art 123 As causas de aumento 4º devem constar explícita ou implicitamente da denúncia Súmula 605 do STF Não se admite a continuidade delitiva nos crimes contra a vida J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 605 do STF Não se admite continuidade delitiva nos crimes contra a vida a Homicídio simples Decisão do Conselho de Sentença desclassificando o crime de tentativa de homicídio para o delito de lesão corporal A vítima foi atingida no tórax no abdômen e pelas costas tendo um pulmão perfurado Segundo suas declarações antes de começar a alvejála o réu lhe disse vou lhe matar agora As circunstâncias nas quais ocorreu o fato o número de disparos efetuados sempre visando regiões letais e a afirmação do acusado de que iria matar a vítima não deixam dúvida quanto a ter ele agido movido pelo animus necandi A decisão do Tribunal do Júri entendendo que o imputado atuou sem vontade de ceifar a vida da exnamorada mostrase manifestamente contrária aos elementos probatórios constantes dos autos TJRJ Apelação 200705000949 Rel Cairo Ítalo Franca David j 21112007 Hipótese em que o paciente denunciado pela suposta prática de homicídio doloso obteve desclassificação para a modalidade culposa decisão que foi alvo de recurso em sentido estrito provido pelo Tribunal a quo para pronunciálo nos termos da denúncia A questão referente ao elemento subjetivo do agente deve ser submetida ao Tribunal do Júri tendo em vista que na fase da pronúncia prevalece a máxima in dubio pro societatis STJ HC 39687RJ Rel Min Gilson Dipp j 1752005 Pronúncia tentativa de homicídio simples indícios de autoria Princípio do in dubio pro societate TJMG RESE 101450413077060011 Rel Edelberto Santiago j 1822005 Tentativa de homicídio e porte ilegal de arma de fogo Aplicação do Princípio da Consunção Ainda que não se afaste a possibilidade do reconhecimento da autonomia das duas condutas o crime de tentativa de homicídio absorve o de porte ilegal de arma de fogo quando as duas condutas delituosas guardam entre si uma relação de meio e fim estreitamente vinculada STJ REsp 571077RS Rel Min Félix Fischer j 432004 O motivo fútil e o uso de meio de que dificultou ou impossibilitou a defesa da vítima são integrantes do tipo do homicídio qualificado e por isso não podem ser incluídas na quesitação de julgamento de réu pronunciado por homicídio simples Precedentes STJ REsp 457280MG Rel Min Gilson Dipp j 1062003 Não se pode generalizar a exclusão do dolo eventual em delitos praticados no trânsito Na hipótese de racha em se tratando de pronúncia a desclassificação da modalidade dolosa de homicídio para a culposa deve ser calcada em prova por demais sólida No iudicium accusationis inclusive a eventual dúvida não favorece os acusados incidindo aí a regra exposta na velha parêmia in dubio pro societate O dolo eventual na prática não é extraído da mente do autor mas isto sim das circunstâncias Nele não se exige que resultado seja aceito como tal o que seria adequado ao dolo direto mas isto sim que a aceitação se mostre no plano do possível provável O tráfego é atividade própria de risco permitido O racha no entanto é em princípio anomalia extrema que escapa dos limites próprios da atividade regulamentada STJ REsp 249604SP Rel Min Félix Fischer j 249 2002 b Homicídio privilegiado Não há que se ter como contraditória a decisão dos jurados que não vislumbra a ocorrência do homicídio privilegiado e de outro lado reconhece a incidência da atenuante prevista no art 65 III a do Código Penal Precedente O privilégio contido no 1º do art 121 do CP não se confunde com a atenuante genérica do art 65 III a do mesmo diploma legal STJ HC 47448MS Rel Min Félix Fischer j 6122005 A jurisprudência dos Tribunais Superiores incluidamente do Excelso Supremo Tribunal Federal é firme na compreensão de que as circunstâncias privilegiadoras de natureza subjetiva e as qualificadoras de natureza objetiva podem concorrer no mesmo fatohomicídio à falta de contradição lógica STJ HC 28623PR Rel Min Hamilton Carvalhido j 2792005 Art 121 1º do Código Penal Tendo o v acórdão que anulou a decisão do Conselho de Sentença demonstrado exaustivamente que a tese de homicídio privilegiado em razão de violenta emoção está em completa dissonância com o conjunto probatório merece a decisão dos jurados ser anulada para que o paciente se submeta a novo julgamento Entender em sentido contrário como quer o impetrante ensejaria necessariamente no presente caso o cotejo minucioso de matéria fáticoprobatória procedimento vedado em sede de habeas corpus Precedentes STJ HC 33189SP Rel Min Félix Fischer j 292004 Em sede de homicídio tentado na hipótese em que se conjugam as circunstâncias de se tratar de homicídio privilegiado e sob a forma de tentativa branca é razoável a redução da pena no seu percentual máximo STJ REsp 117253DF Rel Min Vicente Leal j 1142000 c Homicídio qualificado Homicídio qualificadoprivilegiado Compatibilidade entre qualificadora inserta no art 121 2º inciso IV com a forma privilegiada Possibilidade Não há incompatibilidade em tese na coexistência de qualificadora objetiva v g 2º inciso IV com a forma privilegiada do homicídio ainda que seja a referente à violenta emoção Precedentes desta Corte e do Pretório Excelso Assim a resposta afirmativa ao quesito atinente a forma privilegiada do crime de homicídio não implica a prejudicialidade do quesito que indagaria aos jurados acerca da qualificadora inserta no art 121 2º inciso IV do CP recurso que dificultou a defesa da vítima STJ REsp 922932SP Rel Min Félix Fischer j 13122007 Crime de homicídio qualificado Apelo defensivo buscando o reconhecimento do homicídio privilegiado Inaplicabilidade ao caso concreto já que fartamente demonstrado nos autos o emprego de recurso que impossibilitou a defesa da vítima que se encontrava dormindo no sofá de sua residência à noite quando foi alvejada por golpes de foice perpetrados pelo apelante que foram a causa eficiente de sua morte TJRJ Apelação 200705001014 Rel Marco Aurélio Bellizze j 2662007 Qualificadoras Se nos autos há indícios a demonstrar que os delitos em tese foram cometidos em razão de xingamentos não se há de excluir nesta fase processual a qualificadora do motivo fútil pois sua caracterização dependerá da análise do ponto de vista do homo medius de ter sido ou não desproporcional a conduta do réu à motivação que lhe possam ter dado as vítimas O motivo determinante de um crime não pode ser ao mesmo tempo fútil e torpe porque essas circunstâncias de natureza subjetiva não podem coexistir vale dizer uma exclui a outra TJPR RESE 1701584 Rel Adalberto Jorge Xisto Pereira j 962005 Não constitui ilegalidade cada autor coautor ou partícipe responder pelas suas circunstâncias pessoais dentre as quais situase a motivação do delito o executor será responsabilizado por ter aceitado retirar a vida de outrem mediante o recebimento de uma contraprestação já o autor intelectual será responsabilizado pela sua intenção ao ter dado causa à prática infracional como é o caso dos autos a paciente acusada de ser a suposta mandante do homicídio foi denunciada também com base no inciso I do 2º do art 121 não devido ao fato do crime ter sido perpetrado sob encomenda mas porque foi torpe a sua motivação As qualificadoras objetivas não se enquadram nas circunstâncias incomunicáveis devendo por isso serem estendidas aos participantes do delito STJ RHC 14900SC Rel Min Félix Fischer j 1762004 A qualificadora inserta no inciso IV do 2º do art 121 do Código Penal reclama para a sua caracterização a preordenação do agente à traição emboscada dissimulação ou a outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido como modo de execução do delito As circunstâncias qualificativas como na Exposição de Motivos da Parte Especial do Código Penal estão enumeradas no 2º do art 121 Umas dizem com a intensidade do dolo outras com o modo de ação ou com a natureza dos meios empregados mas todas são especialmente destacadas pelo seu valor sintomático são circunstâncias reveladoras de maior periculosidade ou extraordinário grau de perversidade do agente STJ HC 30339MG Rel Min Hamilton Carvalhido j 25112003 Os dados que compõem o tipo básico ou fundamental inserido no caput são elementares essentialia delicti aqueles que integram o acréscimo estruturando o tipo derivado qualificado ou privilegiado são circunstâncias accidentalia delicti No homicídio a qualificadora de ter sido o delito praticado mediante paga ou promessa de recompensa é circunstância de caráter pessoal e portanto ex vi do art 30 do CP incomunicável STJ REsp 467810SP Rel Min Félix Fischer j 20112003 A crueldade de que trata o art 121 2º inciso III do Código Penal está desenganadamente situada na natureza do meio utilizado pelo agente para a prática delituosa e não à forma como se perfaz o ilícito Ademais tal dispositivo após citar hipóteses casuísticas tais como emprego de veneno fogo explosivo asfixia e tortura exige alternativamente para que incida mediante fórmula genérica que o agente se utilize de qualquer outro meio cruel reclamando assim potencialidade de causação de padecimento análogo aos das hipóteses expressamente elencadas Tratase pois de hipótese de interpretação analógica ou intra legem STJ REsp 210085PR Rel Min Hamilton Carvalhido j 2122002 d Homicídio culposo Homicídio culposo Acidente de trânsito Falta de dever de cuidado não demonstrada Conduta culposa não configurada O crime de homicídio culposo exige para a sua configuração a descrição de fato que revele a existência de negligência imprudência ou imperícia STJ HC 74781SP Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 4 102007 Homicídio culposo na direção de veículo automotor Culpa exclusiva da vítima Absolvição Se o acidente se deu por culpa exclusiva da vítima conforme bem delineado no v acórdão vergastado não há como se imputar ao condutor do automóvel o delito de homicídio culposo na direção de veículo automotor art 302 do CTB sendo de rigor portanto sua absolvição STJ REsp 873353AC Rel Min Félix Fischer j 1532007 Homicídio culposo Imprudência médica Agravamento pela inobservância de regra técnica da profissão O homicídio culposo se caracteriza com a imprudência negligência ou imperícia do agente modalidades da culpa que não se confundem com a inobservância de regra técnica da profissão que é causa de aumento que denota maior reprovabilidade da conduta O julgador contudo não pode se utilizar da mesma circunstância fática para reconhecêlas sob pena de incorrer em vedado bis in idem Habeas corpus concedido de ofício ao segundo recorrente para também afastar de sua condenação a causa de aumento de pena prevista no 4º do art 121 do Código Penal diante do reconhecimento do bis in idem STJ REsp 606170SC Rel Min Laurita Vaz j 20102005 Homicídio culposo agravado pela omissão de socorro Pedido de desconsideração da causa de aumento de pena prevista no art 121 4º do Código Penal para que se opere a extinção da punibilidade em face da consequente prescrição da pretensão punitiva contada pela pena concreta Alegação de que diante da morte imediata da vítima não seria cabível a incidência da causa de aumento da pena em razão de o agente não ter prestado socorro Alegação improcedente Ao paciente não cabe proceder à avaliação quanto à eventual ausência de utilidade de socorro STF HC 84380MG Rel Min Gilmar Mendes j 542005 Homicídios culposos Clínica pediátrica UTI Neonatal Responsabilidade de diretores e médicos Morte de recémnatos contaminados Ausência de comportamento culposo Ausência de nexo de causalidade Correta a absolvição de todos os réus pois não há como afirmar com segurança com apoio no farto conjunto probatório inclusive na prova técnica que esses na qualidade de garantidores da vida dos recémnascidos houvessem causado com suposta omissão a morte dos mesmos pois não se pode afirmar nem mesmo como provável que se os réus tivessem procedido de forma diferente adotando todas as cautelas que a perícia apurou pudessem ser adotadas o resultado não se teria produzido TJRJ Apelação 200405002283 Rel Marly Macedônio França j 1532005 Operada a desclassificação de homicídio simples para homicídio culposo pelo Conselho de Sentença e uma vez presentes os requisitos legais deve ser concedida ao Ministério Público oportunidade para propor o sursis processual Precedentes do STJ e do Pretório Excelso STJ HC 44160PA Rel Min Félix Fischer j 2010 2005 Homicídio culposo Afogamento Culpa presumida e responsabilidade penal objetiva Inexistência A responsabilidade penal é de caráter subjetivo impedindo o brocardo nullun crimen sine culpa que se atribua prática de crime a presidente de clube social e esportivo pela morte por afogamento de menor que participava de festa privada de associada e mergulhou em piscina funda com outros colegas e com pessoas adultas por perto Inobservância de eventual disposição regulamentar que não se traduz em causa mas ocasião do evento lesivo STJ RHC 11397SP Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 1192001 O fato dos responsáveis de uma empresa não treinarem adequadamente seus profissionais bem como utilizaremse de materiais cabos de aço em situação precária sem a devida manutenção além de não fornecerem os instrumentos adequados para o isolamento da área de trabalho de forma a impedir o acesso de pessoas estranhas denotam a existência de negligência e conduzem à previsibilidade do resultado Observandose sob esse prisma decorre a relação ainda que tênue de causalidade entre o comportamento da empresa através de seus responsáveis ao não fornecer instrumento de trabalho em condições mínimas de segurança e o resultado morte da vítima STJ RHC 9389SP Rel Min Jorge Scartezzini j 442000 Induzimento instigação ou auxílio a suicídio Art 122 Induzir ou instigar alguém a suicidarse ou prestar lhe auxílio para que o faça V art 31 do CP Pena reclusão de 2 dois a 6 seis anos se o suicídio se consuma ou reclusão de 1 um a 3 três anos se da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave V art 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais Parágrafo único I e II Aumento de pena Parágrafo único A pena é duplicada I se o crime é praticado por motivo egoístico II se a vítima é menor ou tem diminuída por qualquer causa a capacidade de resistência D O U T R I N A Bem jurídico O bem jurídico tutelado indiscutivelmente é a vida humana Não existe o direito de morrer de que falava Ferri na medida em que não há um direito sobre a própria vida ou seja um direito de dispor validamente sobre a própria vida Em outros termos a vida é um bem jurídico indisponível Direito à vida O fundamento da participação em suicídio não é como sustentava Carrara a inalienabilidade do direito à vida 49 A vida não é um bem que se aceite ou se recuse simplesmente Só se pode renunciar o que se possui e não o que se é O direito de viver pontificava Hungria não é um direito sobre a vida mas à vida no sentido de correlativo da obrigação de que os outros homens respeitem a nossa vida Atipicidade da tentativa Afora a insensatez que seria criminalizar o suicídio em si seria indefensável uma pena contra um cadáver mors omnia solvit sob o ponto de vista preventivo seria absolutamente inócua a coação psicológica contra quem não se intimida sequer com a superveniência imediata da própria morte Ofensa a bens morais e éticos O suicídio ofende interesses morais e éticos do Estado e só não é punível pela inocuidade de tal proposição A ausência porém de tipificação criminal dessa conduta não lhe afasta a ilicitude uma vez que a supressão de um bem jurídico indisponível caracteriza sempre um ato ilícito Essa ilicitude legitima a coação exercida para impedilo art 146 3º II do CP Natureza jurídica da morte e das lesões corporais de natureza grave É equivocada a orientação doutrinária que sustenta tratarse de condição objetiva de punibilidade do crime de participação em suicídio Como a morte e as lesões corporais graves integram a definição legal do crime de participação em suicídio devem por conseguinte ser abrangidas pelo dolo Não são condição objetiva de punibilidade mas a própria essência da instigação e do mandado Se o crime não se consuma o instigador ou mandante não é responsável Tratase no caso portanto do resultado naturalístico do crime Sujeito ativo e sujeito passivo Sujeito ativo O sujeito ativo do crime de participação em suicídio pode ser qualquer pessoa não requerendo nenhuma condição particular pois se trata dos chamados crimes comuns É indispensável no entanto que o sujeito ativo seja capaz de induzir instigar ou auxiliar a colocação em prática da vontade de alguém de suicidarse Exclusão da vítima Não se admite como sujeito ativo à evidência a própria vítima pois não é crime uma pessoa matarse Essa conduta isoladamente constitui um indiferente penal Típica é a conduta de participar moral ou materialmente do suicídio de outrem Coautoria e participação Assim se alguém induz outrem a suicidarse aquele será autor do crime se no entanto duas pessoas de comum acordo praticarem essa mesma atividade serão coautoras se porém alguém induzir outrem a instigar uma terceira pessoa a suicidarse o indutor será partícipe teve uma atividade meramente acessória e o instigador será autor da participação em suicídio pois realizou a atividade tipificada Sujeito passivo Sujeito passivo será a pessoa induzida instigada ou auxiliada Pode ser qualquer ser humano vivo capaz de entender o significado de sua ação e de determinarse de acordo com esse entendimento Como nesse crime a vítima se autoexecuta é indispensável essa capacidade de discernimento caso contrário estaremos diante de um homicídio praticado mediante autoria mediata Vítima determinada É indispensável que a atividade humana se destine a participar do suicídio de uma pessoa determinada não configurando o crime em exame quando visar um número indeterminado de pessoas como por exemplo a publicação de uma obra literária recomendando como alternativa honrosa de vida o suicídio ainda que leve a esse desiderato um semnúmero de pessoas Suicídio e homicídio coação Se a vítima for forçada a suicidarse ou não tiver condições de oferecer resistência alguma haverá homicídio e não participação em suicídio Tipo objetivo A conduta típica consiste em induzir suscitar fazer surgir uma ideia inexistente instigar animar estimular reforçar uma ideia existente ou auxiliar ajudar materialmente alguém a suicidarse Induzir instigar e auxiliar que teoricamente representariam mera atividade de partícipe neste tipo constituem o núcleo do tipo penal Assim quem realizar qualquer dessas ações em relação ao sujeito ativo não será partícipe mas autor do crime Por isso é um equívoco falar em participação quando se trata de um único sujeito ativo Nada impede que alguém desempenhe a atividade de partícipe instigando induzindo ou auxiliando o sujeito ativo a realizar uma das condutas descritas no tipo Mas nesta hipótese não estará desenvolvendo sua ação diretamente relacionada à vítima mas sim em relação ao autor material do fato Alguém conteúdo e significado Alguém significa outro ser humano além do sujeito ativo O suicídio em si mesmo não é crime Matarse é atípico Ainda que as várias condutas sejam praticadas o sujeito ativo praticará um único crime conteúdo variado Tipo de conteúdo variado Tratase de um tipo penal de conteúdo variado isto é ainda que o agente pratique cumulativamente todas as condutas descritas nos verbos nucleares em relação à mesma vítima praticará um mesmo crime Suicídio induzimento Induzir significa suscitar o surgimento de uma ideia tomar a iniciativa intelectual fazer surgir no pensamento de alguém uma ideia até então inexistente Por meio da indução o indutor anula a vontade de quem finalmente acaba por suicidarse logo a intervenção daquele é que decide o resultado final por isso a conduta do indutor é mais censurável do que a conduta do instigador que veremos adiante Suicídio instigação Instigar por sua vez significa animar estimular reforçar uma ideia existente Ocorre a instigação quando o instigador atua sobre a vontade do autor no caso do instigado O instigador limitase a provocar a resolução de vontade da indigitada vítima não tomando parte nem na execução nem no domínio do fato Tanto no induzimento quanto na instigação é a própria vítima que se autoexecuta Eficácia do meio persuasivo Não é suficiente criar uma situação tentadora para a vítima o que poderia configurar cumplicidade A contribuição deve dirigirse a um fato determinado assim como a um candidato ou candidatos determinados ao suicídio Suicídio auxílio Prestar auxílio representa ao contrário das duas modalidades anteriores uma participação ou contribuição material do sujeito ativo que pode ser exteriorizada por meio de um comportamento de um auxílio material Desejo de suicidarse Um aspecto muito peculiar se deve destacar em todas as modalidades de conduta tipificada relativas à participação em suicídio objetivam a morte de alguém que tem o desejo de suicidarse ressalvada a primeira hipótese na qual o sujeito ativo induz a vítima que como já afirmamos não tinha a resolução de suicidarse Forma omissiva Nada impede que a prestação de auxílio também ocorra sob a forma de omissão quando o sujeito ativo tem o dever jurídico de evitar o suicídio como seria o caso por exemplo do carcereiro que deixa propositalmente o preso com a cinta para facilitarlhe o enforcamento sabendo dessa intenção do suicida Eficácia causal da participação Por derradeiro qualquer que seja a forma ou espécie de participação moral ou material é indispensável a presença de dois requisitos eficácia causal e consciência de participar na ação voluntária de outrem de suicidarse É insuficiente a exteriorização da vontade de participar Não tem relevância a participação se o suicídio não for pelo menos tentado O partícipe no suicídio Nada impede que alguém desempenhe a atividade de partícipe instigando induzindo ou auxiliando o sujeito ativo a realizar uma das condutas descritas no tipo Mas nesta hipótese não estará desenvolvendo sua ação diretamente relacionada à vítima mas sim em relação ao autor material do fato que o executará Alguém significado Alguém expressão utilizada no tipo penal significa outro ser humano além do sujeito ativo O suicídio em si mesmo considerado não é crime Matarse é uma conduta atípica Crime de ação múltipla Ainda que as várias condutas induzir instigar e auxiliar sejam todas praticadas o sujeito ativo praticará um único crime uma vez que este tipo penal é daqueles classificados pela doutrina como de conteúdo variado ou de ação múltipla Prestação de auxílio mediante omissão A forma omissiva somente será possível se houver o dever jurídico de impedir o suicídio Para que se admita a prestação de auxílio ao suicídio mediante omissão é indispensável contudo a existência do dever jurídico de evitar que alguém coloque em prática o ato de suicidarse Orientação contrária equivocada Equivocase a nosso juízo a orientação que não admite o auxílio ao suicídio sob a modalidade omissiva Deixar de impedir a ocorrência de um evento que se tem o dever jurídico de evitar é com certeza uma forma de prestar auxílio Tipo subjetivo adequação típica O dolo é o elemento subjetivo do tipo e consiste na vontade livre e consciente de provocar a morte da vítima através do suicídio ou no mínimo assunção do risco de levála a esse desiderato Abrangência do dolo A vontade do agente deve abranger a ação o resultado e o nexo causal vontade e consciência do fato vontade de alcançar o resultado morte não mediante ação própria mas pela autoexecução O agente deve em outros termos ter consciência e vontade de levar a vítima ao suicídio Dolo e intenção da vítima Ao dolo do agente deve corresponder a intenção da vítima de suicidarse Não haverá crime se por exemplo a vítima estivesse zombando de alguém que acreditava em sua insinuação e por erro vem a falecer Solução diversa deveria ser dada se a morte fosse condição objetiva da punibilidade Dolo eventual Nada impede que o dolo orientador da conduta do agente configure se em sua forma eventual A doutrina procura citar alguns exemplos o pai que expulsa de casa a filha desonrada havendo fortes razões para acreditar que ela se suicidará marido que sevicia a esposa conhecendo a intenção desta de vir a suicidarse reitera as agressões Dolo eventual consciência e vontade A consciência e a vontade também devem estar presentes no dolo eventual para configurar determinada relação de vontade entre o resultado e o agente que é exatamente o elemento que distingue o dolo da culpa É fundamental enfim que o agente represente a possibilidade de levar a vítima ao suicídio e anua à sua ocorrência assumindo o risco de produzilo Inexistência da figura culposa Quando o agente por culpa leva alguém a suicidarse tampouco responderá por homicídio culposo e o fundamento dessa premissa é irretorquível se a cooperação voluntária à morte do suicida não constitui homicídio doloso como poderá constituir homicídio culposo a cooperação imprudente ao suicídio Se o mesmo ato não constitui homicídio quando praticado dolosamente como poderá sêlo quando é praticado culposamente Atipicidade da participação culposa Normativamente não se confundem os atos destinados à causação direta do homicídio e aqueles destinados a levar alguém a suicidarse Ante a ausência de previsão da modalidade culposa da participação em suicídio a provocação culposa deste constitui conduta atípica Consumação e tentativa Consumase com a morte da vítima Consumase o crime quando o tipo está inteiramente realizado isto é quando o fato concreto se subsume no tipo abstrato da lei penal Sem a supressão da vida da vítima não se pode falar em suicídio consumado Admissibilidade da tentativa Como crime material que é em tese admitiria a tentativa No entanto tratase de uma figura complexa que prevê no próprio tipo a sua forma tentada que poderíamos chamar de tentativa qualificada na medida em que é punida se decorrer lesão de natureza grave Em síntese não admite tentativa branca sem a lesão grave Somente a tentativa cruenta com lesão grave é punível Lesões corporais graves A produção de lesões corporais graves não consuma o tipo penal descrito no preceito primário que a ela não se refere Aliás lesões corporais de natureza grave como caracterizadoras da tentativa perfeita aparecem somente no preceito secundário Natureza material desta infração Ao contrário do que afirmava Hungria mero induzimento instigação ou auxílio não consumam o crime de participação em suicídio a menos que se tratasse de crime formal mas os crimes que deixam vestígios são definidos como crimes materiais por excelência e este não é diferente Tentativa qualificada Como crime material que é em tese admitiria a tentativa No entanto tratase de figura complexa que prevê no próprio tipo a sua forma tentada que poderíamos chamar de tentativa qualificada na medida em que é punida se decorrer lesão de natureza grave Lesão corporal de natureza grave A lesão corporal de natureza grave como consequência da participação de alguém que livre e conscientemente queria o resultado morte provocado pela própria vítima é a comprovação mais contundente de que a despeito do dolo do agente o resultado ficou aquém do pretendido qual seja a morte e isso não é outra coisa senão tentativa Tentativa punível O preceito secundário deixa muito claro que existe normativamente a possibilidade de o suicídio apresentarse sob duas formas consumada e tentada Ora ao cominarlhe a pena de dois a seis anos de reclusão se o suicídio se consuma está admitindo a possibilidade de essa conduta ficar na forma tentada e que igualmente deverá ser sancionada embora com outros limites Punibilidade da tentativa O CP destaca que é punível se da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave Como negarlhe a possibilidade de tentativa ou então negarlhe a punibilidade diante de tanta clareza Podemos questionar a espécie de tentativa sua natureza os limites de sua punibilidade mas não podemos afirmar que ela é impossível ou então o que é pior que ela é impunível Participação em suicídio crime complexo Precisase ter presente que a participação em suicídio constitui um crime complexo ou melhor um crime cujo processo executório é complexo uma vez que a sua realização exige a participação voluntária tanto do sujeito ativo quanto do sujeito passivo e para a sua consumação é indispensável que a atividade dos dois sujeitos ativo e passivo seja eficaz Este crime é plurissubjetivo Impunibilidade da tentativa branca Em síntese a participação em suicídio nos termos do nosso Código Penal não admite tentativa branca sem a lesão grave Somente a tentativa cruenta com lesão grave é punível Classificação doutrinária A participação em suicídio é crime comum comissivo excepcionalmente omissivo auxílio de dano material instantâneo doloso de conteúdo variado e plurissubsistente Formas qualificadas Na verdade são figuras majoradas que não se confundem com qualificadas Três são as hipóteses a motivo egoístico é a vantagem pessoal que constitui o elemento subjetivo do tipo b vítima menor o menor para ser vítima de suicídio precisa dispor já de certo discernimento caso contrário o crime será homicídio c capacidade de resistência diminuída enfermidade embriaguez etc Causas de aumento de pena A ação tipificada no dispositivo pode tornarse mais valiosa quer em razão do motivo que a impulsiona quer em razão das condições pessoais da vítima Nesses casos a pena é duplicada O parágrafo único do art 122 elenca três dessas hipóteses as quais passamos a examinar Motivo egoístico Quando o egoísmo for o móvel da ação esta será consideravelmente mais desvaliosa justificandose a maior punição ante o alto grau de insensibilidade revelado pelo agente Essa obstinação pela busca de vantagem pessoal a qualquer preço impõe a necessidade da proporcional elevação da sanção penal correspondente Vítima menor capacidade Para que o menor possa ser vítima de suicídio precisa dispor de certa capacidade de discernimento Como nesse crime a vítima se autoexecuta é indispensável essa capacidade caso contrário estaremos diante de um homicídio praticado por autoria mediata Menoridade limite de idade A nosso juízo a majorante sub examen só é aplicável a menor com idade entre quatorze e dezoito anos A menoridade penal cessa aos dezoito anos art 27 Para menor de quatorze anos de quem o Código Penal considera o consentimento inválido e contra quem quando vítima presume a violência eventual induzimento instigação ou auxílio ao suicídio tipificará o crime de homicídio Formas qualificadas Na verdade são figuras majoradas que não se confundem com qualificadas Três são as hipóteses a motivo egoístico é a vantagem pessoal que constitui o elemento subjetivo do tipo b vítima menor o menor para ser vítima de suicídio precisa dispor já de certo discernimento caso contrário o crime será homicídio c capacidade de resistência diminuída enfermidade embriaguez etc Questões especiais Greve de fome dever médico O médico na hipótese de greve de fome de prisioneiros tem o dever de velar pela saúde e por extensão pela vida dos grevistas Há determinado momento em que a não intervenção com alimentação permitirá que o grevista sofra lesões irreversíveis Nesse momento a intervenção médica estará protegida pelo disposto no art 146 3º do CP Médico como garantidor Ademais o médico está na posição de garantidor e pelo nosso direito conjugandose a previsão do dispositivo que acabamos de citar com a prescrição do art 13 responderá pela morte do grevista na forma omissiva imprópria embora sejam muito raras mortes de prisioneiros em razão de greve de fome Testemunhas de Jeová A transfusão determinada pelo médico quando não houver outra forma de salvar o paciente está igualmente amparada pelo disposto no art 146 3º do CP Eventual violação da liberdade de consciência ou da liberdade religiosa cede ante um bem jurídico superior que é a vida na inevitável relação de proporcionalidade entre os bens jurídicos tutelados Vítima incapaz familiares respondem Quando os familiares ou pessoas encarregadas de menores ou incapazes negarem a assistência médica mesmo por motivos religiosos quer ocultando a gravidade da situação quer não apresentando o menor ou incapaz em um centro médico especializado se sobrevier a morte responderão por homicídio na forma omissiva imprópria Suicídio a dois O chamado suicídio a dois pode apresentar alguma dificuldade na medida em que a punibilidade está diretamente relacionada à atividade desenvolvida por cada um dos participantes e o resultado produzido Duelo americano ou roleta russa Definese como roleta russa A solução indica a responsabilidade do sobrevivente pela participação em suicídio pois com essa prática no mínimo instigou a vítima ao suicídio Se no entanto algum dos contendores for coagido a participar da aposta sobrevivendo o coator este responderá por homicídio doloso Pacto de morte ou suicídio a dois Há o pacto de morte quando duas pessoas combinam por qualquer razão o duplo suicídio Nessa hipótese o sobrevivente responderá por homicídio quando tiver praticado o ato executório Se somente houver induzido instigado ou auxiliado seu parceiro responderá pelo suicídio Se nenhum morrer aquele que realizou atividade executória contra o parceiro responderá por tentativa de homicídio e aquele que ficou somente na contribuição responderá pela tentativa qualificada de suicídio se houver pelo menos lesão corporal grave Pena cominada A pena é de reclusão de dois a seis anos para o crime consumado e de um a três anos se resultar somente lesão corporal grave Nas formas majoradas do parágrafo único a pena é duplicada Ação penal A ação penal é pública incondicionada Como toda ação pública admite ação penal privada subsidiária nos termos da Constituição Federal desde que haja inércia do Ministério Público Note bem haverá homicídio se a vítima for forçada a suicidarse ou não tiver condições de oferecer resistência alguma Este crime não pode ser omissivo J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A peça vestibular ao imputar ao acusado a prática do delito tipificado no art 122 do Código Penal é certo aponta uma das formas do crime em questão induzimento Impõese então invocar a autoridade científica de quem a tem inconcussa o mestre Nélson Hungria Três são as formas do crime em questão o induzimento a instigação e o auxílio Quase nenhuma é a diferença entre induzir e instigar Induzir significa persuadir ou levar alguém a praticar algum ato Instigar além desse mesmo significado encerra também o de acoroçoar um desígnio O induzimento pressupõe a iniciativa na formação da vontade de outrem enquanto a instigação pode ter um caráter secundário ou acessório ou de adesão e estímulo a um propósito já concebido para afastar qualquer hesitação ou perplexidade in Comentários ao Código Penal Vol V Forense 1981 p 232 Também induzimento a suicídio são os maus tratos reiteradamente infligidos a alguém vindo este a matarse de desespero uma vez que haja o dolo direto ou eventual específico do crime isto é a intenção ou aceitação do risco de que a vítima se suicide obra cit p 234 A sentença de pronúncia como é sabido é mero juízo de admissibilidade Resulta daí que além da materialidade reclama somente indícios suficientes de autoria Tais indícios por sua vez não precisam ser concludentes e unívocos como para o efeito da condenação O critério deve ser o in dubio pro societate O acusado na espécie nega a autoria Não é menos verdade contudo que o conjunto probatório nesta fase de cognição parcial indica a existência de outra versão para o acontecimento Assim ante a prova colhida impunhase a pronúncia TJRS RESE 70008851933 Rel Marco Aurélio de Oliveira Canosa j 30112006 Instigação ao suicídio Agente que reiteradamente seviciava a esposa a qual após várias advertências culminou por se matar Indícios suficientes nos autos de inquérito sobre a materialidade e autoria do delito Dolo eventual admissível na hipótese Recurso ministerial provido Demonstrando os autos de inquérito cabalmente a materialidade do crime dando sérios indícios da sua autoria o recebimento da denúncia é medida que se impõe É perfeitamente admissível a hipótese de dolo eventual no crime de instigação ao suicídio quando ocorrente devido às sevícias reiteradas sofridas pela vítima que há muito ameaçava matar se TJSC RESE 990189279 Rel Maurílio Moreira Leite j 1362000 Infanticídio Art 123 Matar sob a influência do estado puerperal o próprio filho durante o parto ou logo após Pena detenção de 2 dois a 6 seis anos V art 30 do CP D O U T R I N A Bem jurídico O bem jurídico do crime de infanticídio a exemplo do homicídio é a vida humana Protegese aqui a vida do nascente e do recémnascido Modernamente não se distingue mais entre vida biológica e vida autônoma ou extrauterina É indiferente a existência de capacidade de vida autônoma sendo suficiente a presença de vida biológica Vida biológica e extrauterina Assim a vida extrauterina autônoma do neonato deixou de ser condição indispensável do infanticídio sendo suficiente a vida biológica que pode ser comprovada pelos batimentos cardíacos pela circulação sanguínea ou qualquer outro critério admitido pela ciência médica Sujeito ativo Somente a mãe pode ser sujeito ativo do crime de infanticídio e desde que se encontre sob a influência do estado puerperal Tratase de crime próprio que não pode ser praticado por qualquer um Sujeito passivo Sujeito passivo segundo expressão literal do art 123 é o próprio filho vocábulo que abrange não só o recémnascido mas também o nascente diante da elementar contemplada no próprio dispositivo durante o parto ou logo após Neonato é o recémnascido e nascente é aquele que está nascendo O feto sem vida não pode ser sujeito passivo Tipo objetivo A conduta típica consiste em matar o próprio filho durante o parto ou logo após Necessário no entanto que a mãe esteja sob a influência do estado puerperal O puerpério elemento fisiopsicológico é um estado febril comum às parturientes que pode variar de intensidade de uma para outra mulher podendo influir na sua capacidade de discernimento O infanticídio é a rigor modalidade especial de homicídio privilegiado Fundamento do infanticídio critério psicológico É fundamental a perturbação psíquica que o estado puerperal pode provocar na parturiente É exatamente essa perturbação decorrente do puerpério que transforma a morte do próprio filho em um delictum exceptum Estado puerperal O estado puerperal existe sempre durante ou logo após o parto mas nem sempre produz as perturbações emocionais que podem levar a mãe a matar o próprio filho Influência do estado puerperal Não significa que o puerpério acarrete sempre uma perturbação psíquica é preciso que fique constatado que esta realmente sobreveio em consequência daquele de modo a diminuir a capacidade de entendimento da parturiente Fora daí não há por que distinguir entre infanticídio e homicídio Nexo causal É indispensável uma relação de causalidade entre o estado puerperal e a ação delituosa praticada esta tem de ser consequência da influência daquele que nem sempre produz perturbações psíquicas na mulher Efeitos do estado puerperal Podem apresentarse quatro hipóteses a o puerpério não produz nenhuma alteração na mulher b acarretalhe perturbações psicossomáticas que são a causa da violência contra o próprio filho c provocalhe doença mental d produzlhe perturbação da saúde mental diminuindolhe a capacidade de entendimento ou de determinação Na primeira hipótese haverá homicídio na segunda infanticídio na terceira a parturiente é isenta de pena em razão de sua inimputabilidade art 26 caput do CP na quarta terá redução de pena em razão de sua semiimputabilidade Concomitância dos elementos normativos A influência do estado puerperal deve conjugarse com outro elemento normativo este de natureza temporal qual seja durante o parto ou logo após A presença de qualquer dos dois elementos isoladamente é insuficiente para tipificar o delictum exceptum Durante ou logo após o parto Expressões como essas logo após logo depois e similares são usuais em nosso ordenamento jurídico Tourinho Filho comentando o flagrante impróprio e o flagrante presumido representados pelas expressões logo após e logo depois respectivamente afirma que o legislador quis estabelecer uma relação de imediatidade embora não de absoluta imediatidade porque senão a hipótese seria outra Elementares normativas avaliação conjunta Por fim nenhuma das elementares nem a personalíssima nem a temporal pode ser avaliada isoladamente Ambas devem ser analisadas individualmente é evidente mas devem ser avaliadas conjuntamente A elementar logo após o parto só alcançará seu verdadeiro sentido se estiver subordinada à elementar anterior sob a influência do estado puerperal Crime próprio privilegiado Tratase com efeito de crime próprio mãe e sob influência do estado puerperal e privilegiado pois o verbo núcleo do tipo é o mesmo do homicídio art 121 mas a pena cominada é bem reduzida para a mesma ação de matar Particularidades do infanticídio Podemse destacar as seguintes que o distinguem do homicídio convencional a qualidade ou condição dos sujeitos ativo e passivo da ação delituosa b influência biopsíquica ou fisiopsicológica do estado puerperal c circunstância temporal contida no tipo durante o parto ou logo após Comunicabilidade da influência do estado puerperal Ninguém discute o fato de que a influência do estado puerperal constitui uma elementar típica do infanticídio Como elementar do tipo ela se comunica e o terceiro que contribuir com a parturiente na morte de seu filho nas condições descritas no art 123 concorrerá para a prática do crime de infanticídio e não de homicídio como sugeria Hungria Desvio subjetivo de condutas Desvio subjetivo de condutas que representa grande inovação consagrada legislativamente pela reforma penal de 1984 art 29 2º do CP se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave serlheá aplicada a pena deste essa pena será aumentada até metade na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave Intensidade da influência do estado puerperal A influência do estado puerperal pode exercer diversas funções e produzir diferentes efeitos dependendo do contexto em que se encontra Assim por exemplo será elementar do tipo quando apenas influenciar a conduta de matar o próprio filho quando porém sua intensidade for suficiente para perturbarlhe a saúde mental a ponto de reduzirlhe a capacidade de discernimento e determinação ou ainda poderá excluir a imputabilidade se atingir o nível de doença mental Estado puerperal condição pessoal ou elementar do tipo O estado puerperal na hipótese de simples partícipe será mera condição pessoal que é incomunicável será elementar do tipo aí comunicável somente quando a própria mãe for autora ou coautora da morte do próprio filho Aborto e infanticídio Temporalmente ficou igualmente bem delimitado o momento fronteiriço entre aborto e infanticídio antes de iniciado o parto a ocisão do feto é aborto após aquele ter começado o crime é infanticídio desde que seja praticado sob a influência do puerpério logicamente Tipo subjetivo adequação típica O dolo direto ou eventual é o elemento subjetivo do tipo e consiste na vontade livre e consciente de matar o próprio filho durante o parto ou logo após ou no mínimo na assunção do risco de matálo ou em outros termos a mãe deve querer diretamente a morte do próprio filho ou assumir o risco de produzila Abrangência do dolo A vontade e a consciência devem abranger a ação da mãe puérpera os meios utilizados na execução comissivos ou omissivos a relação causal e o resultado morte do filho A tipificação deste crime só admite a modalidade dolosa como destacava Heleno Fragoso Exige o dolo porém na forma de vontade viciada pelas perturbações resultantes da influência do estado puerperal Desnecessidade de especial fim de agir Nosso Código Penal não exige o elemento subjetivo especial do tipo isto é o especial fim de agir Esse elemento subjetivo especial é indispensável naquelas legislações que adotam o critério subjetivo pois a conduta de matar o próprio filho deve ser praticada com o fim de ocultar desonra própria Dolo eventual especial A consciência e a vontade também devem estar presentes no dolo eventual para configurar aquela relação volitiva mínima entre o agente e o resultado sendo insuficiente a simples ciência da probabilidade do resultado E essa relação assume transcendental importância neste tipo penal que não admite a modalidade culposa pois constitui o grande elemento diferenciador entre dolo e culpa como já afirmamos Fundamento ético do infanticídio Objetivamente considerada a ação de matar o próprio filho é em tese mais desvaliosa que matar um estranho Embora a influência do estado puerperal não constitua elemento estrutural do dolo não se pode negar que a sua presença minimiza a intensidade deste É exatamente essa circunstância subjetiva especial da puérpera que torna menos desvaliosa a ação de matar o próprio filho comparandose com a mesma ação de matar alguém Consumação e tentativa Consumase o infanticídio com a morte do filho nascente ou recém nascido levada a efeito pela própria mãe Mas para que o crime possa existir é indispensável a existência do sujeito passivo que só pode ser alguém nascente ou recémnascido Expulsão extemporânea de feto inviável Não se trata de infanticídio por faltarlhe uma elementar normativa qual seja durante ou logo após o parto Essa expulsão extemporânea não se confunde com parto mesmo prematuro e a expulsão não foi de alguém nascente mas somente de um feto inviável sem maturidade suficiente para ter e manter vida extrauterina Em linguagem comum dirseia que estamos diante de um aborto No entanto não se configura nenhuma das modalidades do crime de aborto uma vez que a expulsão do feto deuse espontaneamente Nascente sem condições de viver Convém no entanto lembrar que não mais se exige vida extrauterina sendo suficiente a vida biológica Logo um recém nascido inviável pode ser sujeito passivo do crime de infanticídio A lei não exige a capacidade de continuação de vida extrauterina basta estar vivo Tentativa crime material Como crime material que é o crime de infanticídio admite a tentativa e esta se aperfeiçoa quando apesar da ação finalista do sujeito ativo a morte do filho não sobrevém por circunstâncias estranhas à vontade daquele Iniciada a ação de matar esta pode ser interrompida por alguém que impede sua consumação Crime impossível Haverá crime impossível quando a mãe supondoa viva pratica o fato com a criança já morta Não existirá crime igualmente quando a criança nasce morta e a mãe com auxílio de alguém procura desfazer se do cadáver abandonandoo em lugar ermo Classificação doutrinária Crime próprio de dano material comissivo ou omissivo instantâneo doloso Forma culposa Não há previsão da modalidade culposa Se eventualmente decorrer a morte proveniente de culpa o agente deverá ser punido por homicídio culposo Para aprofundarse sobre o nosso entendimento vide nosso Manual de Direito Penal Parte Especial v 2 desta mesma Editora Pena A pena é a detenção de dois a seis anos para o crime consumado Não há previsão de qualificadoras majorantes ou minorantes especiais nem modalidade culposa A ação penal é pública incondicionada Ação penal Como toda ação penal pública admite ação privada subsidiária nos termos da Constituição Federal desde que haja inércia do Ministério Público Note bem antes do início do parto o crime será de aborto Se não houver a influência do estado puerperal ou o requisito temporal não existir durante ou logo após o parto o crime será de homicídio É indispensável a prova pericial de vida extrauterina Atualmente não há uma exigência absoluta de prova médicopericial do estado puerperal Em que pese a divergência doutrinária é possível o concurso de pessoas nos termos do art 30 do CP J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Crime de homicídio triplamente qualificado Sentença de pronúncia Alegação da recorrente no sentido de que o bebê já estaria morto quando foi jogado no rio sem respaldo na conclusão do Auto de Exame Cadavérico que atestou como causa da morte asfixia por afogamento Desclassificação para o crime de infanticídio Impossibilidade Laudo psiquiátrico forense atestando a capacidade da recorrente de entendimento e determinação de conduta à época dos fatos bem como a ausência de estado puerperal TJRJ RESE 200705100161 Rel Marco Aurelio Bellizze j 13112007 Pronúncia Infanticídio Efeito de estado puerperal Absolvição sumária Incabível Após a fase de formação da culpa correta a decisão do juiz que pronuncia a ré pelo crime de infanticídio eis que existem fortes indícios de que sob os efeitos do estado puerperal matou o recémnascido Não afastada a responsabilidade para efeitos de pronúncia Cabe ao Júri o exame do mérito TJRS RESE 70019987700 Rel Elba Aparecida Nicolli Bastos j 1682007 Tribunal do Júri Infanticídio atenuado pela confissão espontânea Veredicto de condenação pelo Tribunal Popular Soberania Apelo Ministerial que hostiliza a dosimetria da pena imposta à apelada Pena de 2 dois anos de detenção no regime aberto bem aplicada Sursis devidamente concedido Circunstâncias judiciais do art 59 do Código Penal bem observadas Em se tratando de ré primária de bons antecedentes sem que sua conduta represente perigo à coletividade justificada a aplicação da penabase no patamar mínimo legal e assim aquietandose TJRJ Apelação 200505004591 Rel Roberto Cortês j 27102005 Pronúncia no crime do art 123 do CP Possibilidade Estado puerperal Comprovação Dispensabilidade do laudo pericial Em tema de infanticídio é dispensável a perícia médica para constatação do estado puerperal visto que este é efeito normal e corriqueiro de qualquer parto TJMG RESE 1000000242953 80001 Rel Herculano Rodrigues j 2092001 Aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento Art 124 Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque Pena detenção de 1 um a 3 três anos V art 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais Aborto provocado por terceiro Art 125 Provocar aborto sem o consentimento da gestante Pena reclusão de 3 três a 10 dez anos Art 126 Provocar aborto com o consentimento da gestante Pena reclusão de 1 um a 4 quatro anos Parágrafo único Aplicase a pena do artigo anterior se a gestante não é maior de 14 quatorze anos ou é alienada ou débil mental ou se o consentimento é obtido mediante fraude grave ameaça ou violência V art 26 caput do CP Forma qualificada Art 127 As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de um terço se em consequência do aborto ou dos meios empregados para provocálo a gestante sofre lesão corporal de natureza grave e são duplicadas se por qualquer dessas causas lhe sobrevém a morte V art 19 do CP Lenocínio Art 128 Não se pune o aborto praticado por médico V art 24 do CP Aborto necessário I se não há outro meio de salvar a vida da gestante Aborto no caso de gravidez resultante de estupro II se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou quando incapaz de seu representante legal D O U T R I N A 1 Figuras típicas de aborto O CP de 1940 tipifica três figuras aborto provocado 124 aborto sofrido 125 aborto consentido 126 Na primeira hipótese a própria mulher assume a responsabilidade pelo abortamento na segunda repudia a interrupção do ciclo natural da gravidez ou seja o aborto ocorre sem o seu consentimento e finalmente na terceira embora a gestante não o provoque consente que terceiro realize o aborto 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é a vida do ser humano em formação O produto da concepção feto ou embrião não é pessoa embora tampouco seja mera esperança de vida ou simples parte do organismo materno pois tem vida própria e recebe tratamento autônomo da ordem jurídica Quando o aborto for provocado por terceiro o tipo penal protege também a incolumidade da gestante Aborto e homicídio distinção Apresentamse duas particularidades uma em relação ao objeto da proteção legal e outra em relação ao estágio da vida que se protege relativamente ao objeto não é a pessoa humana que se protege mas a sua formação embrionária em relação ao aspecto temporal somente a vida intrauterina ou seja desde a concepção até momentos antes do início do parto 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo Sujeito ativo no autoaborto e no aborto consentido art 124 é a própria mulher gestante Somente ela própria pode provocar em si mesma o aborto ou consentir que alguém lho provoque tratandose portanto de crime de mão própria No aborto provocado por terceiro com ou sem consentimento da gestante sujeito ativo pode ser qualquer pessoa independentemente de qualidade ou condição especial 32 Sujeito passivo Sujeito passivo no autoaborto e no aborto consentido art 124 é o feto ou genericamente falando o produto da concepção que engloba óvulo embrião e feto há divergência doutrinária Feto segundo Manzini é pelo menos uma pessoa em formação Nessa espécie de aborto concordamos com Heleno Fragoso a gestante não é ao mesmo tempo sujeito ativo e sujeito passivo não havendo crime na autolesão Ela é somente sujeito ativo do crime 33 Dupla subjetividade passiva A gestante é sujeito passivo no aborto provocado por terceiro sem seu consentimento Nessa espécie de aborto há dupla subjetividade passiva o feto e a gestante Crime contra gestante subsunção No crime de aborto não se aplica a agravante genérica do art 61 II h crime contra gestante pois fica subsumida no tipo central 4 Tipo objetivo adequação típica Aborto é a solução de continuidade artificial ou dolosamente provocada do curso fisiológico da vida intrauterina A conduta típica no autoaborto consiste em provocar o aborto em si mesma isto é interromper a sua própria gestação ou consentir que outrem lho provoque O aborto sem consentimento da gestante art 125 recebe punição mais grave e pode assumir duas formas sem consentimento real ou ausência de consentimento presumido menor de 14 anos alienada ou débil mental Aborto com consentimento art 126 constitui exceção à teoria monística adotada pelo nosso Código Quem provocar aborto com consentimento da gestante não será coautor do crime capitulado no art 124 mas responderá pelo delito previsto no art 126 A segunda figura do art 124 encerra dois crimes um para a gestante que consente art 124 outro para o sujeito que provoca o aborto art 126 Em relação à gestante que consente e ao autor que provoca materialmente o aborto consentido não se aplica o disposto no caput do art 29 do CP Definição de aborto 1 A destruição da vida até o início do parto configura o aborto que pode ou não ser criminoso Após iniciado o parto a supressão da vida constitui homicídio salvo se ocorrerem as especiais circunstâncias que caracterizam o infanticídio que é uma figura privilegiada do homicídio art 122 Definição de aborto 2 Aborto é a interrupção da gravidez antes de atingir o limite fisiológico isto é durante o período compreendido entre a concepção e o início do parto que é o marco final da vida intrauterina Configuração do aborto Para se configurar o crime de aborto é insuficiente a simples expulsão prematura do feto ou a mera interrupção do processo de gestação mas é indispensável que ocorram as duas coisas acrescidas da morte do feto pois somente com a ocorrência desta o crime se consuma Pressuposto e relação causal O crime de aborto pressupõe gravidez em curso e é indispensável que o feto esteja vivo A morte do feto tem de ser resultado direto das manobras abortivas A partir do início do parto o crime será homicídio ou infanticídio 5 Espécies de aborto criminoso 51 Aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento O art 124 tipifica duas condutas com a primeira ela mesma provoca o abortamento com a segunda consente que terceiro lho provoque Tratase nas duas modalidades de crime de mão própria isto é que somente a gestante pode realizar Participação em sentido estrito Como qualquer crime de mão própria admite a participação como atividade acessória quando o partícipe se limita a instigar induzir ou auxiliar a gestante tanto a praticar o autoaborto como a consentir que terceiro lho provoque Coautoria impossibilidade Contudo se o terceiro for além dessa mera atividade acessória intervindo na realização propriamente dos atos executórios responderá não como coautor que a natureza do crime não permite mas como autor do crime do art 126 Provocar ou consentir o aborto A conduta típica com efeito no autoaborto consiste em provocar o aborto em si mesma isto é interromper a sua própria gestação mas a gestante pode praticar o mesmo crime por meio de outra conduta qual seja a de consentir que outrem lhe provoque o aborto Nesta segunda figura consentir no aborto exigemse dois elementos a consentimento da gestante b execução do aborto por terceiro Provocar e consentir ação múltipla A mulher que consente no aborto incidirá nas mesmas penas do autoaborto isto é como se tivesse provocado o aborto em si mesma nos termos do art 124 do CP A mulher que consente no próprio aborto e na sequência auxilia decisivamente nas manobras abortivas pratica um só crime pois provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque é crime de ação múltipla ou de conteúdo variado Aborto consentido e teoria monística da ação A segunda figura do art 124 consentir que lhe provoquem o aborto encerra dois crimes um para a gestante que consente art 124 outro para o sujeito que provoca o aborto art 126 Em relação à gestante que consente e ao autor que provoca materialmente o crime de aborto consentido não se aplica o disposto no caput do art 29 do CP Exceção à teoria monística Quem provoca o aborto com o consentimento da gestante pratica o crime do art 126 do mesmo estatuto e não o do art 124 Assim por exemplo o agente que leva a amásia à casa da parteira contrata e paga os seus serviços é autor do crime tipificado no art 126 enquanto a amásia que consentiu incorre no art 124 Enfim o aborto consentido não admite coautoria entre o terceiro e a gestante 52 Aborto provocado sem consentimento da gestante O aborto sem consentimento da gestante art 125 aborto sofrido recebe punição mais grave e pode assumir duas formas sem consentimento real ou ausência de consentimento presumido menor de 14 anos alienada ou débil mental Consentimento funções dogmáticas A ausência de consentimento constitui elementar negativa do tipo Logo se houver consentimento da gestante afastará essa adequação típica logicamente em se tratando de aborto o eventual consentimento não elimina simplesmente a tipicidade mas apenas a desloca para outro dispositivo legal pelas peculiaridades do próprio crime de aborto que pode ser com ou sem consentimento Aborto provocado e constrangimento ilegal O agente que provoca aborto sem consentimento da gestante não responde pelo crime de constrangimento ilegal uma vez que esse constrangimento integra a definição desse crime de aborto cuja sanção é consideravelmente superior em razão exatamente dessa contrariedade da gestante Dissenso presumido Para provocar aborto sem consentimento da gestante não é necessário que seja mediante violência fraude ou grave ameaça basta a simulação ou mesmo a dissimulação ardil ou qualquer outra forma de burlar a atenção ou vigilância da gestante Em outros termos é suficiente que a gestante desconheça que nela está sendo praticado o aborto 53 Aborto provocado com consentimento da gestante Quem provocar aborto com consentimento da gestante não será coautor do crime capitulado no art 124 a despeito do preceito do art 29 do CP mas responderá pelo delito previsto no art 126 Fundamento da exceção ao monismo Essa exceção à teoria monística no crime de aborto consensual fundamentase no desnível do grau de reprovabilidade que a conduta da gestante que consente no aborto apresenta em relação à daquele que efetivamente pratica o aborto consentido A censura da conduta da gestante que consente é consideravelmente inferior à conduta do terceiro que realiza as manobras abortivas consentidas Desvalor ação e omissão O desvalor do consentimento da gestante é menor que o desvalor da ação abortiva do terceiro que concretamente age Consentir merece determinado grau de censura ao passo que executar a conduta consentida definida como crime de aborto recebe uma censurabilidade bem mais elevada pois implica a comissão do aborto criminalizado a conduta da primeira assemelhase à conivência embora não possa ser adjetivada de omissiva enquanto à do segundo é comissiva Aborto e concurso necessário Convém destacar que o aborto consentido art 124 2ª figura e o aborto consensual art 126 são crimes de concurso necessário pois exigem a participação de duas pessoas a gestante e o terceiro realizador do aborto e a despeito da necessária participação de duas pessoas cada um responde excepcionalmente por um crime distinto 6 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo do crime de aborto é o dolo que consiste na vontade livre e consciente de interromper a gravidez matando o produto da concepção ou no mínimo assumindo o risco de matálo Na primeira hipótese configura o dolo direto na segunda o dolo eventual embora este também possa decorrer da dúvida quanto ao estado de gravidez Matar mulher grávida concurso Matar mulher que sabe estar grávida configura também o crime de aborto verificandose no mínimo dolo eventual nessa hipótese o agente responde em concurso formal pelos crimes de homicídio e aborto Desígnios autônomos soma de penas Se houver desígnios autônomos isto é a intenção de praticar os dois crimes o concurso formal será impróprio aplicandose cumulativamente a pena dos dois crimes caso contrário será próprio e o sistema de aplicação de penas será o da exasperação Lesão corporal gravíssima Heleno Cláudio Fragoso sustentava que se o agente quis apenas praticar lesão corporal na mulher cuja gravidez conhecia ou não podia desconhecer e sobrevém o aborto em razão da violência o crime será de lesão corporal gravíssima art 129 3º 2 V Concurso de homicídio e aborto No entanto se nas mesmas circunstâncias o agente quis matar a gestante conhecendo ou não podendo desconhecer a existência da gravidez responde pelo crime de homicídio em concurso com o crime de aborto o primeiro com dolo direto o segundo com dolo eventual Aborto e lesão corporal gravíssima Da mesma forma quem desfere violento pontapé no ventre de mulher visivelmente grávida acarretandolhe a expulsão e a morte do feto pratica o crime de aborto provocado e não o de lesão corporal de natureza gravíssima previsto no art 129 2º V do CP Aborto culposo atipicidade O aborto culposo é impunível restando somente a eventual reparação de dano 7 Consumação e tentativa 71 Consumação Consumase o crime de aborto em qualquer de suas formas com a morte do feto ou embrião Pouco importa que a morte ocorra no ventre materno ou fora dele É irrelevante ainda que ocorra a expulsão do feto ou que este não seja expelido das entranhas maternas Enfim consumase o aborto com o perecimento do feto ou a destruição do óvulo Materialidade do aborto gravidez em curso Logo a materialidade do aborto pressupõe a existência de um feto vivo consequentemente uma gravidez em curso Assim finda a gravidez não se poderá praticar aborto uma vez que a morte do feto tem de ser resultado das manobras abortivas ou da imaturidade do feto para viver fora do ventre materno em decorrência dessas manobras Relação causal ação abortiva e resultado É indispensável comprovar que o feto ou embrião isto é o ser em formação estava vivo quando a ação abortiva foi praticada e que foi esta que lhe produziu a morte ou seja é necessária uma relação de causa e efeito entre a ação e o resultado produzido Em outros termos o emprego de meios abortivos por si só é insuficiente para concluir com certeza pela produção do crime de aborto Insuficiência da prova testemunhal É indispensável que se prove que o aborto é consequência do meio abortivo utilizado A prova testemunhal por conseguinte é insuficiente para comprovar essa relação Indispensabilidade da prova pericial É necessária prova de que o feto estava vivo no momento da ação Como crime material além de suas particularidades especiais a prova do aborto exige o auto de exame de corpo de delito disciplinado nos arts 158 e seguintes do CPP Meios anticonceptivos não abrangência Desnecessário afirmar que os meios preventivos ou anticonceptivos não são abrangidos pelo conceito de aborto que se estende desde o momento em que duas células germinais se unem constituindo o ovo até aquele em que se inicia o processo de parto 72 Tentativa de aborto O crime de aborto como crime material admite a figura da tentativa desde que a despeito da utilização com eficácia e idoneidade de meios ou manobras abortivas não ocorra a interrupção da gravidez com a morte do feto por causas alheias à vontade do agente 73 Tentativa de autoaborto Por política criminal sustentase a impunibilidade da tentativa do autoaborto pois o ordenamento jurídico brasileiro não pune a autolesão No entanto nosso Código não consagra essa impunibilidade E ademais a tentativa de autoaborto está mais para desistência voluntária ou arrependimento eficaz do que propriamente para tentativa punível Impunibilidade das lesões no autoaborto As eventuais lesões que possam decorrer da tentativa de autoaborto que poderiam constituir crime em si mesmas são como afirmamos impuníveis Por esses fundamentos enfim endossamos a não punibilidade da referida tentativa Tentativa de aborto e crime impossível Há crime impossível nas manobras abortivas em mulher que não está grávida ou no caso de o feto já estar morto antes da prática dos atos abortivos por absoluta impropriedade do objeto ou ainda por inadequação absoluta do meio quando for inteiramente inidôneo para produzir o resultado como rezas feitiçarias ou administração de substâncias absolutamente inócuas Desistência voluntária e arrependimento eficaz Podem ocorrer nas outras figuras de aborto as hipóteses de desistência voluntária e arrependimento eficaz mas nesse caso o agente responderá pelos atos praticados que em si mesmos constituírem crime ressalvada logicamente como destacamos a hipótese de autoaborto 8 Classificação doutrinária Tratase de crime de mão própria no autoaborto e no consentido que somente a gestante pode praticar crime comum de dano material instantâneo e doloso 9 Figuras qualificadas de aborto O art 127 prevê duas causas especiais de aumento pela primeira lesão corporal de natureza grave a pena é elevada em um terço pela segunda morte da gestante a pena é duplicada Inaplicabilidade no autoaborto Somente a lesão corporal de natureza grave ou a morte da gestante qualificam o crime de aborto As ditas qualificadoras aplicamse ao aborto praticado por terceiro arts 125 e 126 e não ao aborto praticado pela própria gestante art 124 Aliás nem teria sentido pois não se pune a autolesão nem o ato de matarse Majorantes na tentativa de aborto É indiferente que o resultado qualificador morte ou lesão decorra do próprio aborto ou das manobras abortivas Significa dizer que a majoração da pena pode ocorrer ainda e quando o aborto não se consume sendo suficiente que o resultado majorador decorra das manobras abortivas Aborto e lesões corporais leves Se em decorrência do aborto a vítima sofre lesões corporais leves o agente responde somente pelo crime de aborto sem a aplicação da majorante constante do art 127 pois essa lesão integra o resultado natural da prática abortiva Aborto agravado preterdoloso Para que se configure o crime qualificado pelo resultado é indispensável que o evento morte ou lesão grave decorra pelo menos de culpa art 19 do CP No entanto se o dolo do agente abranger os resultados lesão grave ou morte da gestante excluirá a aplicação do art 127 que prevê uma espécie sui generis de crime preterdoloso dolo em relação ao aborto e culpa em relação ao resultado agravador Nesse caso o agente responderá pelos dois crimes em concurso formal 10 Excludentes especiais da ilicitude 101 Aborto necessário e aborto humanitário O art 128 do CP determina que Não se pune o aborto praticado por médico I se não há outro meio de salvar a vida da gestante II se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou quando incapaz de seu representante legal Exclusão da ilicitude Quando o CP diz que não se pune o aborto está afirmando que o aborto é lícito naquelas duas hipóteses que excepciona no dispositivo em exame Lembra com propriedade Damásio de Jesus que haveria causa pessoal de exclusão de pena somente se o CP dissesse não se pune o médico que não é o caso Excludente de culpabilidade possibilidade Como em qualquer crime pode apresentarse alguma excludente de culpabilidade legal ou supralegal quando por exemplo apresentarse a gravidez e a necessidade ou possibilidade do aborto mas faltar algum dos requisitos legalmente exigidos pela excludente especial não havendo médico disponível 102 Aborto necessário ou terapêutico O aborto necessário também é conhecido como terapêutico e constitui autêntico estado de necessidade justificandose quando não houver outro meio de salvar a vida da gestante Requisitos do aborto necessário São dois requisitos simultâneos a perigo de vida da gestante b inexistência de outro meio para salvála O requisito básico e fundamental é o iminente perigo à vida da gestante sendo insuficiente o perigo à saúde ainda que muito grave O aborto ademais deve ser o único meio capaz de salvar a vida da gestante caso contrário o médico responderá pelo crime Perigo de vida desnecessidade de consentimento Quando o perigo de vida for iminente na falta de médico outra pessoa poderá realizar a intervenção fundamentada nos arts 23 I e 24 Na hipótese de perigo de vida iminente é dispensável a concordância da gestante ou de seu representante legal art 146 3º do CP até porque para o aborto necessário ao contrário do aborto humanitário o texto legal não faz essa exigência Aborto necessário contra a vontade da gestante O aborto necessário pode ser praticado mesmo contra a vontade da gestante A intervenção médicocirúrgica está autorizada pelo disposto nos arts 128 I aborto necessário 24 estado de necessidade e 146 3º intervenção médicocirúrgica justificada por iminente perigo de vida Ademais tomando as cautelas devidas agirá no estrito cumprimento de dever legal art 23 III 1ª parte pois na condição de garantidor não pode deixar perecer a vida da gestante Consentimento aborto humanitário Enfim o consentimento da gestante ou de seu representante legal somente é exigível para o aborto humanitário previsto no inciso II do art 128 Ausência de direito à vida médico garantidor É fundamental a cobertura legal do expert garantindo a licitude de sua conduta profissional mesmo contra a vontade da gestante pois esta não tem o direito de sacrificar a própria vida em prol do nascituro o que no entanto não impede que o faça ou pelo menos tente Aborto eugenésico inexigibilidade de outra conduta O CP não legitima o chamado aborto eugenésico mesmo que seja provável que a criança nascerá com deformidade ou enfermidade incurável Contudo sustentamos que a gestante que provoca o autoaborto ou consente que terceiro lho pratique está amparada pela inexigibilidade de outra conduta sem sombra de dúvida 103 Aborto humanitário ou ético O aborto humanitário também denominado ético ou sentimental é autorizado quando a gravidez é consequência do crime de estupro e a gestante consente na sua realização Pelo nosso Código Penal não há limitação temporal para a estupradagrávida decidirse pelo abortamento Requisitos do aborto humanitário São necessários os seguintes requisitos a gravidez resultante de estupro b prévio consentimento da gestante ou sendo incapaz de seu representante legal A prova tanto da ocorrência do estupro quanto do consentimento da gestante deve ser cabal Formalização do consentimento O consentimento da gestante ou de seu representante legal quando for o caso deve ser obtido por escrito ou na presença de testemunhas idôneas como garantia do próprio médico Atentado violento ao pudor Doutrina e jurisprudência admitem por analogia o aborto sentimental quando a gravidez resulta de atentado violento ao pudor que é tão indigno e repugnante quanto o crime de estupro À semelhança de situações em que esses horrendos crimes ocorrem e das consequências pessoais e morais seria profundamente injusto punir o médico pelo crime de aborto por puro prurido técnicodogmático Prova do crime de estupro A prova do crime de estupro pode ser produzida por todos os meios em direito admissíveis É desnecessário autorização judicial sentença condenatória ou mesmo processo criminal contra o autor do crime sexual Cautela médica e erro de tipo Acautelandose sobre a veracidade da alegação somente a gestante responderá criminalmente art 124 2ª figura se for comprovada a falsidade da afirmação A boafé do médico caracteriza erro de tipo excluindo o dolo e por consequência afasta a tipicidade 104 Extensão da excludente violência ficta A excludente em exame estendese ao crime praticado com violência ficta art 224 A permissão legal limitase a referirse ao crime de estupro sem adjetiválo Interpretação restritiva no caso implica criminalizar uma conduta autorizada uma espécie de interpretação extensiva contra legis ou seja in malam partem 105 Aborto necessário ou humanitário praticados por enfermeira O Código exclui a ilicitude por dois fundamentos distintos um por estado de necessidade e outro por razões sentimentais no aborto necessário não havendo outro meio de salvar a vida da gestante não só a enfermeira mas qualquer pessoa que lhe faça as vezes não responderá por crime algum Enfermeira e estado de necessidade Em estado de necessidade todas as condutas proibidas no Código Penal são excepcionalmente autorizadas afastandose a proibição Assim nesse caso a enfermeira não responde pelo crime de aborto mas com fundamento no art 24 do CP e não no art 128 I uma vez que não sendo médica não pode invocar essa excludente especial Enfermeira e inexigibilidade de outra conduta Na hipótese de aborto proveniente de estupro a conduta da enfermeira não está acobertada pela excludente especial da ilicitude ante a ausência de uma condição especial ser médico Contudo poderá configurarse a inexigibilidade de outra conduta que se reconhecida excluirá a culpabilidade Somente se for afastada essa possibilidade a enfermeira deverá responder pelo crime Enfermeira auxilia médico acessoriedade limitada Ora se o fato praticado pelo médico que é o autor for lícito não há como punir o partícipe e o fundamento da impunibilidade da conduta da enfermeira enquanto partícipe respaldase na teoria da acessoriedade limitada da participação a qual exige que a conduta principal seja típica e antijurídica 11 Ação penal e sanção penal 111 Ação penal A ação penal a exemplo de todos os crimes contra a vida é pública incondicionada nem podia ser diferente pois esses crimes atacam o bem jurídico mais importante do ser humano que é a vida tanto uterina quanto extrauterina Nesses crimes as autoridades devem agir ex officio 112 Sanção penal No autoaborto art 124 a pena é de detenção de um a três anos no aborto provocado por terceiro sem consentimento art 125 a pena é de reclusão de três a dez anos e no aborto consensual art 126 a pena é de reclusão de um a quatro anos Se a gestante for absolutamente incapaz a pena do aborto consensual também será de três a dez anos Nas ditas formas qualificadas as penas serão majoradas em um terço se a gestante sofrer lesão corporal grave e duplicadas se lhe sobrevier a morte 12 Questões especiais Crime impossível Assim benzedeiras rezas despachos e similares não são idôneos para provocar o aborto e caracterizam crime impossível por absoluta ineficácia do meio art 17 do CP Finalidade do aborto A ação de provocar o aborto tem a finalidade de interromper a gravidez e eliminar o produto da concepção Ela se exerce sobre a gestante ou também sobre o próprio feto ou embrião Aborto provocado e espontâneo Só há crime quando o aborto é provocado se for espontâneo não existe crime Se os peritos não podem afirmar por exemplo que o aborto foi provocado não há certeza da existência de crime e sem tal certeza não se pode falar em aborto criminoso Especializantes dos tipos de aborto O núcleo dos tipos é o verbo provocar que significa causar promover ou produzir o aborto As elementares especializantes como em si mesma sem o consentimento da gestante e com o consentimento da gestante determinarão a espécie de aborto além da particular figura consentir que complementa o crime próprio ao lado do autoaborto Elementares do aborto O crime de aborto exige as seguintes condições jurídicas dolo gravidez manobras abortivas e a morte do feto embrião ou óvulo Crime impossível Haverá crime impossível quando a mãe pratica o fato e o feto já está morto J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Aborto provocado por terceiro com o consentimento da gestante Suficiente demonstração do fato pelo suporte fotográfico auto de exame de corpo de delito auto de necropsia juntamente com os depoimentos colhidos no feito Autoria Não basta a possibilidade de que o réu tenha sido o autor ou participado do fato criminoso É preciso que estejam presentes nos autos indicativos suficientes a respeito da autoria Não incumbe ao réu demonstrar com segurança sua inocência Ao contrário cabe à acusação reunir elementos convincentes e seguros da autoria Recurso defensivo provido para despronunciar o réu TJRS RESE 70020855904 Rel Ivan Leomar Bruxel j 31102007 Aborto qualificado Existindo quatro circunstâncias desfavoráveis redimensionase a penabase em patamar mais elevado mantendo a redução pela atenuante da confissão espontânea em dois meses e o acréscimo em dobro pela forma qualificada resultando na morte da vítima adequada e suficiente a pena para reprovar a conduta TJRS Apelação 70012259693 Rel Jaime Piterman j 1972007 Aborto provocado por terceiro Ré pronunciada pelo art 126 cc o art 127 ambos do CP Pedido de impronúncia Impossibilidade Existência de duas versões nos autos No caso concreto a recorrente nega a autoria delitiva Por outro lado existe outra versão para o acontecimento noticiando a participação da recorrente na prática abortiva com o consentimento da gestante que culminou no resultado morte Impõe se a pronúncia da recorrente eis que na fase de pronúncia reconhecida a materialidade do delito havendo dúvida quanto à participação ou não da acusada impera o princípio do in dubio pro societate cabendo ao Júri popular a análise da questão TJRS RESE 70019903103 Rel José Antônio Cidade Pitrez j 2862007 ADPF Adequação Interrupção da gravidez Feto anencéfalo Política judiciária Macroprocesso Tanto quanto possível há de ser dada sequência a processo objetivo chegandose de imediato a pronunciamento do Supremo Tribunal Federal Em jogo valores consagrados na Lei Fundamental como o são os da dignidade da pessoa humana da saúde da liberdade e autonomia da manifestação da vontade e da legalidade considerados a interrupção da gravidez de feto anencéfalo e os enfoques diversificados sobre a configuração do crime de aborto adequada surge a arguição de descumprimento de preceito fundamental ADPF liminar anencefalia interrupção da gravidez glosa penal processos em curso suspensão Pendente de julgamento a arguição de descumprimento de preceito fundamental processos criminais em curso em face da interrupção da gravidez no caso de anencefalia devem ficar suspensos até o crivo final do Supremo Tribunal Federal ADPF Liminar Anencefalia Interrupção da gravidez Glosa penal Afastamento Mitigação Na dicção da ilustrada maioria entendimento em relação ao qual guardo reserva não prevalece em arguição de descumprimento de preceito fundamental liminar no sentido de afastar a glosa penal relativamente àqueles que venham a participar da interrupção da gravidez no caso de anencefalia STF ADPFQO 54DF Rel Min Marco Aurélio j 2742005 Pedido de autorização para a prática de aborto Nascituro acometido de anencefalia Legislador eximiuse de incluir no rol das hipóteses autorizativas do aborto previstas no art 128 do Código Penal o caso descrito nos presentes autos O máximo que podem fazer os defensores da conduta proposta é lamentar a omissão mas nunca exigir do Magistrado intérprete da Lei que se lhe acrescente mais uma hipótese que fora excluída de forma propositada pelo Legislador Ordem concedida para reformar a decisão proferida pelo Tribunal a quo desautorizando o aborto STJ HC 32159RJ Rel Min Laurita Vaz j 1722004 Provocado por terceiro o crime de aborto art 125 do CP é sempre cometido com violência decorrente da falta de consentimento da gestante STJ HC 18168MG Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 1382002 Aborto Ausência de prova da gravidez Ação penal trancada No delito capitulado no art 124 do CP para instauração da persecução penal é imprescindível a prova de sua materialidade O ônus incumbe ao órgão acusador não sendo suficiente para este mister a simples confissão da acusada Aborto diz a medicina é interrupção da gravidez e portanto fundamental essencial imprescindível o diagnóstico desta como meio de configuração da infração STJ HC 11515RJ Rel Min Fernando Gonçalves j 7112000 Capítulo II Das Lesões Corporais Lesão corporal Art 129 Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem Pena detenção de 3 três meses a 1 um ano V art 27 2º III da Lei n 111052005 V art 88 da Lei n 909995 Juizados Especiais Lesão corporal de natureza grave 1º Se resulta I incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 trinta dias V art 168 2º do CPP II perigo de vida III debilidade permanente de membro sentido ou função IV aceleração de parto Pena reclusão de 1 um a 5 cinco anos V Lei n 111052005 V art 15 I b da Lei n 693881 Política Nacional do Meio Ambiente V art 27 1º da Lei n 717083 Lei de Segurança Nacional V art 233 1º da Lei n 806990 Estatuto da Criança e do Adolescente 2º Se resulta I incapacidade permanente para o trabalho II enfermidade incurável III perda ou inutilização de membro sentido ou função IV deformidade permanente V aborto Pena reclusão de 2 dois a 8 oito anos V art 233 2º da Lei n 806990 Estatuto da Criança e do Adolescente V Lei n 111052005 Lesão corporal seguida de morte 3º Se resulta morte e as circunstâncias evidenciam que o agente não quis o resultado nem assumiu o risco de produzilo Pena reclusão de 4 quatro a 12 doze anos V art 27 2º da Lei n 717083 Lei de Segurança Nacional V art 233 3º da Lei n 806990 Estatuto da Criança e do Adolescente V art 27 2º III e IV da Lei n 111052005 Diminuição de pena 4º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral ou sob o domínio de violenta emoção logo em seguida a injusta provocação da vítima o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço Substituição da pena 5º O juiz não sendo graves as lesões pode ainda substituir a pena de detenção pela de multa V arts 59 IV e 60 2º do CP I se ocorre qualquer das hipóteses do parágrafo anterior II se as lesões são recíprocas Lesão corporal culposa 6º Se a lesão é culposa Pena detenção de 2 dois meses a 1 um ano Aumento de pena 7º Aumentase a pena de um terço se ocorrer qualquer das hipóteses do art 121 4º 7º com redação determinada pela Lei n 8069 de 13 de julho de 1990 V arts 301 a 310 do CPP 8º Aplicase à lesão culposa o disposto no 5º do art 121 8º com redação determinada pela Lei n 8069 de 13 de julho de 1990 V arts 107 IX e 120 do CP Violência doméstica 9º Se a lesão for praticada contra ascendente descendente irmão cônjuge ou companheiro ou com quem conviva ou tenha convivido ou ainda prevalecendose o agente das relações domésticas de coabitação ou de hospitalidade 9º acrescentado pela Lei n 10886 de 17 de junho de 2004 Pena detenção de 3 três meses a 3 três anos Pena com redação determinada pela Lei n 11340 de 7 de agosto de 2006 10 Nos casos previstos nos 1º a 3º deste artigo se as circunstâncias são as indicadas no 9º deste artigo aumenta se a pena em 13 um terço 10 acrescentado pela Lei n 10886 de 17 de junho de 2004 11 Na hipótese do 9º deste artigo a pena será aumentada de 13 um terço se o crime for cometido contra pessoa portadora de deficiência 11 acrescentado pela Lei n 11340 de 7 de agosto de 2006 D O U T R I N A Alteração a Lei n 806990 ECA deu nova redação aos 7º e 8º O art 88 da Lei n 909995 transformou a ação penal dos crimes de lesões leves e culposas em pública condicionada à representação 1 Bem jurídico tutelado O bem jurídico penalmente protegido é a integridade corporal e a saúde da pessoa humana isto é a incolumidade do indivíduo A proteção legal abrange não só a integridade anatômica como também a normalidade fisiológica e psíquica Esse bem jurídico protegido é de natureza individual devendo preponderar assim pelo menos teoricamente o interesse particular perante o interesse do Estado 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa não requerendo nenhuma condição particular pois se trata de crime comum e o tipo penal não faz qualquer referência relativa ao sujeito ativo 22 Sujeito passivo Sujeito passivo também pode ser qualquer pessoa humana viva com exceção das figuras qualificadas 1º IV e 2º V Nessas figuras somente a mulher grávida pode figurar na condição de sujeito passivo do crime de lesões corporais Eventuais danos produzidos em cadáver à evidência não se adequam à conduta descrita no art 129 As restrições à autoria são aquelas próprias limitadas pela própria dogmática penal que afastam a imputabilidade 3 Tipo objetivo adequação típica A conduta típica do crime de lesão corporal consiste em ofender isto é lesar ferir a integridade corporal ou a saúde de outrem Ofensa à integridade corporal compreende a alteração anatômica ou funcional interna ou externa do corpo humano como por exemplo equimoses luxações mutilações fraturas etc Perturbação de ânimo ou aflição Ofensa à saúde compreende a alteração de funções fisiológicas do organismo ou perturbação psíquica A simples perturbação de ânimo ou aflição não é suficiente para caracterizar o crime de lesão corporal por ofensa a saúde Mas configurará o crime qualquer alteração ao normal funcionamento do psiquismo mesmo que seja de duração passageira Pluralidade de lesões crime único O crime de lesão corporal abrange qualquer dano à integridade física ou à saúde de outrem sem animus necandi No entanto a pluralidade de lesões não altera a unidade do crime representando somente o desdobramento em vários atos crime plurissubsistente de uma única ação Dor física e crise nervosa A simples dor física ou crise nervosa sem dano anatômico ou funcional não configura lesão corporal embora não seja necessária violência física para produzila A dor por si só não caracteriza o crime de lesão corporal em razão de sua elevada subjetividade tornála praticamente indemonstrável Lesão corporal e transmissão de moléstia Para transmitir moléstia por contágio por exemplo não é necessária a violência tradicional e não deixa de ser uma forma de produzir lesões corporais mesmo fora das hipóteses dos arts 130 e 131 do CP Indisponibilidade relativa A integridade física apresentase como relativamente disponível as pequenas lesões podem ser livremente consentidas como ocorre v g com as perfurações do corpo para a colocação de adereços antigamente limitados aos brincos de orelhas a ação penal passou a ser condicionada à representação do ofendido Lesão corporal leve e princípio da insignificância A lesão à integridade física ou à saúde deve ser juridicamente relevante É indispensável que o dano à integridade física ou à saúde não seja insignificante Pequenas contusões que não deixam vestígios externos no corpo da vítima provocando apenas dor momentânea não possuem dignidade penal e estão aquém do mínimo necessário para justificar uma sanção criminal Insignificância e infração de menor potencial ofensivo Insignificância não se confunde com infração de menor potencial ofensivo e a previsão desta não impede nem elimina a existência ou reconhecimento daquela O fato de determinada conduta tipificar uma infração penal de menor potencial ofensivo art 98 I da CF não quer dizer que tal conduta configure por si só o princípio de insignificância Aferimento da insignificância A insignificância de determinada conduta deve ser aferida não apenas em relação à importância do bem juridicamente atingido mas especialmente em relação ao grau de sua intensidade isto é pela extensão da lesão produzida Consequência da insignificância Concluindo a insignificância da ofensa afasta a tipicidade Mas essa insignificância só pode ser valorada por meio da consideração global da ordem jurídica observandose a proporcionalidade e particularmente a extensão da lesão sofrida pelo bem jurídico protegido Autolesão impunível Não constitui crime a ação do agente que ofende a sua própria integridade física ou saúde A autolesão não tipifica o crime de lesão corporal Autolesão e estelionato Poderá constituir elementar de uma figura do crime de estelionato quando por exemplo o agente lesa a própria integridade física ou saúde com o fim de obter indenização ou valor de seguro art 171 2º V Nesse caso a punição não é pela autolesão como entidade autônoma mas como uma espécie de estelionato que é crime contra o patrimônio e não contra a pessoa como é o caso da lesão corporal Autolesão e crime militar Se por outro lado com a autolesão o agente pretende criar ou simular incapacidade física para ficar inabilitado para o serviço militar deve responder pelo crime do art 184 do CPM Nessa hipótese o CPM não está punindo igualmente a autolesão mas o meio fraudulento utilizado contra o serviço militar Inimputável e terceiro autor mediato Tratandose de um inimputável menor ébrio ou por qualquer razão incapaz de entender ou de querer que por determinação de outrem pratique em si mesmo uma lesão quem o conduziu à autolesão responderá pelo crime na condição de autor mediato art 20 2º do CP Autoria mediata e autoferimento Quando alguém agredido por outrem para defenderse acaba por se ferir A causa do ferimento foi a ação do agressor logo deverá responder pelo resultado lesivo O ato da vítima de ferirse ao defenderse do ataque constitui uma causa superveniente relativamente independente mas que não produziu por si só o resultado 4 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo do crime de lesões corporais é representado pelo dolo que consiste na vontade livre e consciente de ofender a integridade física ou a saúde de outrem É insuficiente que a ação causal seja voluntária pois no próprio crime culposo em regra a ação também é voluntária É necessário com efeito o animus laedendi Em certas figuras qualificadas há o preterdolo a ofensa à integridade física é punida a título de dolo e o resultado qualificador a título de culpa Abrangência do dolo O dolo deve abranger o fim proposto os meios escolhidos e inclusive os efeitos colaterais necessários Os elementos volitivos e intelectivos do dolo devem abarcar a ação conduta o resultado e o nexo causal sob pena de o agente incorrer em erro de tipo Dolo eventual e preterdolo Indiscutivelmente o dolo pode ser direto ou eventual particularmente esta modalidade de infração penal é uma das poucas que admitem a possibilidade da terceira modalidade qual seja o preterdolo em determinadas figuras qualificadas a ofensa à integridade física é punida a título de dolo e o resultado qualificador a título de culpa 5 Consumação e tentativa Consumase com a lesão efetiva à integridade ou à saúde de outrem consumase no exato momento em que se produz o dano resultante da conduta ativa ou omissiva A pluralidade de lesões infligidas num único processo de atividade não altera a unidade do crime que continua único Admissibilidade da tentativa Como crime material que é a tentativa é tecnicamente admissível com exceção das formas culposa e preterdolosa cuja impossibilidade decorre da natureza de ambas aliás dogmaticamente explicadas Tentativa dificuldade probatória Parte da doutrina tem dificuldade em admitir a viabilidade da tentativa do crime de lesões corporais Confundemse coisas diversas a admissibilidade da tentativa com a dificuldade de prova de sua existência A dificuldade probatória em princípio refoge do âmbito do Direito Penal para repousar no seio do Direito Processual Penal onde deverá encontrar solução Vias de fato e tentativa de lesões corporais Não há tentativa de vias de fato se o meio empregado pelo agente é capaz de causar dano à incolumidade física da vítima Configura tentativa do crime de lesão corporal a ação do agente que traduz manifesto e inequívoco animus laedendi e só não se concretiza por ter sido impedido por terceiro 6 Classificação doutrinária A lesão corporal é crime comum podendo ser praticado por qualquer sujeito ativo sem exigir nenhuma qualidade ou condição especial crime material e de dano que somente se consuma com a produção do resultado isto é com a lesão ao bem jurídico instantâneo e pode apresentarse sob as formas dolosa culposa ou preterdolosa 7 Lesão corporal leve ou simples A definição de lesão corporal leve é formulada por exclusão ou seja configurase quando não ocorre nenhum dos resultados previstos nos 1º 2º e 3º do art 129 Lesão corporal leve simples ou comum é a lesão tipificada em seu tipo fundamental ou seja a ofensa à integridade física ou à saúde de outrem nos limites do caput do artigo mencionado Limites da lesão corporal Lesão corporal não é apenas ofensa à integridade corpórea mas também à saúde A lesão à saúde abrange tanto a saúde do corpo como a mental Se alguém à custa de ameaças provoca em outro um choque nervoso convulsões ou outras alterações patológicas pratica lesão corporal que pode ser leve ou grave dependendo de sua intensidade Lesão dolosa indireta A lesão tipificada no caput do artigo é sempre dolosa e para que se reconheça essa natureza é suficiente que a ação humana seja orientada pelo animus laedendi mesmo que a produza de forma indireta Assim por exemplo o agente desfere uma porretada na vítima que agilmente desviase do golpe mas resvala perde o equilíbrio e cai ferindose na queda Lesão corporal preterdolosa previsão legal O Código Penal em vigor não previu como figura distinta e autônoma a lesão corporal preterdolosa ou seja quando o resultado produzido é mais grave do que aquele efetivamente querido pelo sujeito ativo A figura disciplinada no 3º do art 129 lesão corporal seguida de morte cuida somente do homicídio preterdoloso que é coisa distinta Para aprofundarse vejase nosso Manual de Direito Penal v 2 Parte Especial 8 Lesão corporal grave O 1º relaciona quatro hipóteses que digamos qualificam a lesão corporal pois lhe atribui novos parâmetros máximo e mínimo de pena que são de um a cinco anos de reclusão 81 Incapacidade para as ocupações habituais por mais de trinta dias A incapacidade referida neste dispositivo relacionase ao aspecto funcional e não puramente econômico Tratase da efetiva impossibilidade de realização de sua atividade ocupacional tradicional regular de natureza lícita As ocupações habituais a que se refere o art 129 1º I do CP não têm o sentido de trabalho diário mas de ocupações do quotidiano do indivíduo como por exemplo trabalho lazer recreação etc Por elas não se devem entender somente as ocupações de natureza lucrativa Atividade habitual menores e crianças A lei tem em vista a atividade habitual do indivíduo in concreto é indiferente que não seja economicamente apreciável Esse destaque é relevante na medida em que crianças menores ou bebês também podem ser sujeitos passivos dessa espécie de lesões corporais Necessidade de comprovação pericial Ocupação habitual pessoas idosas O mesmo ocorre com pessoas idosas que embora não tenham mais atividade laboral podem ficar privadas de suas caminhadas ginástica etc Essa incapacidade especialmente para crianças e idosos pode ser causada por meios físicos psíquicos ou mentais Vergonha da vítima não caracterizadora A simples vergonha de aparecer em público mesmo que decorrente de marcas ou cicatrizes deixadas pelas lesões não caracteriza a qualificadora em exame Ocupações habituais exclusão das ilícitas A atividade habitual que pode ter qualquer natureza não pode logicamente ser ilícita isto é proibida por lei Assim o marginal que ferido não puder retomar a prática de crimes por mais de trinta dias não caracteriza a qualificadora em questão Atividades imorais abrangência Contudo a exclusão de atividades ilícitas não abrange atividades imorais evidentemente aquelas que não se revistam de ilegalidade como por exemplo a prostituição que pode ser imoral mas não é em si mesma ilícita No caso de eventual prostituta por exemplo que ferida não puder retomar suas atividades normais por mais de trinta dias estará configurada a qualificadora Fundamento ético da proteção O reconhecimento dessa qualificadora não significa proteger condutas imorais tampouco agravar injustamente a situação do réu mas tratar igualitariamente todo e qualquer cidadão que tenha sua integridade física violada desde que não se refira à prática de condutas ilegais o que não é o caso da prostituição Exame complementar validade Quando o exame pericial tiver a finalidade de determinar a gravidade da infração penal o exame complementar deverá ser realizado logo que tenha decorrido o prazo de trinta dias a contar da data do fato O prazo é material por isso deve obedecer à regra do art 10 do CP incluindose o dia do começo Esse exame é absolutamente necessário art 168 2º do CPP Supressão por prova testemunhal A impossibilidade de sua realização pode ser suprida por prova testemunhal art 168 3º No entanto é imprestável como prova a lacônica resposta sim ao quesito específico desacompanhada de qualquer explicação fundamentadora consoante reiterada jurisprudência Exame no prazo de trinta dias O exame realizado antes do decurso do prazo de trinta dias é inidôneo assim como aquele que vier a ser realizado muito tempo depois de sua expiração Somente não perderá a validade se permanecerem as circunstâncias que permitam apurar a incapacidade da vítima 82 Perigo de vida Não se trata de mera possibilidade mas de probabilidade concreta e efetiva de morte quer como consequência da própria lesão quer como resultado do processo patológico que esta originou Os peritos devem diagnosticar e não simplesmente fazer prognóstico uma vez que não se trata de perigo presumido mas concreto efetivo real Necessidade de comprovação pericial O perigo deve ser pericialmente comprovado O resultado morte deve ser provável e não meramente possível Não basta a resposta laconicamente afirmativa da existência de perigo de vida o laudo pericial deve descrever objetiva e fundamentadamente em que consiste o perigo de vida Efetividade do perigo de vida Não é suficiente a idoneidade da lesão para criar a situação de perigo mas é necessário que esta realmente se tenha verificado A simples sede das lesões não justifica a presunção de perigo que deve ser demonstrado embora não se possa negar que o simples fato de a vítima apresentar traumatismo craniano e comoção cerebral seja suficiente para o reconhecimento do perigo de vida Ausência de dolo do perigo de vida A probabilidade de morte da vítima não deve ser objeto do dolo do agente caso contrário deveria responder por tentativa de homicídio e não por lesão corporal grave com risco de vida 83 Debilidade permanente de membro sentido ou função Debilidade é a redução ou enfraquecimento da capacidade funcional da vítima Permanente por sua vez é a debilidade de duração imprevisível que não desaparece com o correr do tempo Apesar do sentido etimológico do permanente temse admitido que não é necessário que seja definitiva Permanente não é perpétuo Para o reconhecimento da gravidade da lesão por resultado debilidade permanente não é necessário que seja perpétua e impassível de tratamento reeducativo ou ortopédico Essa recuperação artificial já é por si só caracterizadora do estado permanente da debilidade acarretada pela lesão é mais que suficiente para atestar a gravidade da lesão Membro sentido ou função Membros são partes do corpo que se prendem ao tronco que podem ser superiores e inferiores braços mãos pernas e pés sentido é a faculdade de percepção de constatação e por extensão de comunicação visão audição olfato paladar e tato função é a atividade específica de cada órgão do corpo humano ex respiratória circulatória digestiva secretora locomotora reprodutora e sensitiva 84 Aceleração de parto Aceleração de parto é a antecipação do nascimento do feto com vida A terminologia legal aceleração de parto deve ser entendida como antecipação de parto pois somente se pode acelerar aquilo que está em andamento e a previsão legal quis na verdade abranger não apenas o parto em movimento mas todo o parto prematuro ou seja a expulsão precoce do produto da concepção Necessidade de nascer vivo É indispensável que o feto esteja vivo nasça com vida e continue a viver caso contrário se morrer no útero ou fora dele configurase aborto e a lesão corporal será qualificada como gravíssima 2º V Consciência da gravidez da vítima É necessário que o agente tenha conhecimento da gravidez da vítima sob pena de se consagrar a responsabilidade objetiva Consciente da gravidez a aceleração do parto pode ser produto de culpa uma vez que esta será no mínimo consciente Agora o desconhecimento da gravidez determina a desclassificação para lesões leves Natureza objetiva das qualificadoras Todas as qualificadoras contidas no 1º são de natureza objetiva Significa dizer que em havendo concurso de pessoas elas se comunicam desde que logicamente tenham sido abrangidas pelo dolo do participante 9 Lesão gravíssima 2º O Código Penal não utiliza o nomen iuris lesão corporal gravíssima mas a doutrina e a jurisprudência o consagraram para distinguila da lesão corporal grave disciplinada no parágrafo anterior Nas lesões gravíssimas a dimensão das consequências do crime são consideravelmente mais graves Os efeitos da lesão em regra são irreparáveis 91 Incapacidade permanente para o trabalho Incapacidade permanente para o trabalho não se confunde com incapacidade para as ocupações habituais do parágrafo anterior naquela a incapacidade é temporária para ocupações habituais da vítima nesta a incapacidade é permanente e para o trabalho em geral e não somente para a atividade específica que a vítima estava exercendo Extensão da incapacidade A incapacidade nesta espécie de lesões não é para as ocupações habituais da vítima mas somente para o trabalho isto é para o desempenho de uma atividade laboral profissional lucrativa art 129 2º I ao contrário do que ocorre com as lesões graves art 129 1º Essa impossibilidade pode ser física ou psíquica Desclassificação da incapacidade Se ficar incapacitada para determinada atividade específica mas puder exercer outra atividade laboral não se configura a lesão gravíssima ainda que a incapacidade específica seja permanente Desclassificase a infração penal para lesão corporal grave Incapacidade irreversível A incapacidade também não é temporária mas definitiva No entanto não se exige que seja perpétua bastando um prognóstico firme de incapacidade irreversível A incapacidade permanente deve ser de duração incalculada Com efeito permanente na linguagem do Código tem o sentido não transitório ou temporário isto é significa durável e não definitivo Vítima curada irrelevância É irrelevante que a vítima se apresente clinicamente curada se a incapacidade a despeito disso restou comprovada a lesão sofrida é qualificada como gravíssima 92 Enfermidade incurável Enfermidade segundo os especialistas é um processo patológico em curso Enfermidade incurável é a doença cuja curabilidade não é conseguida no atual estágio da medicina pressupondo um processo patológico que afeta a saúde em geral A incurabilidade deve ser confirmada com dados da ciência atual com um juízo de probabilidade Incurabilidade prognóstico pericial Incurável deve ser entendido em sentido relativo sendo suficiente o prognóstico pericial para caracterizála pois em termos de ciência médica nada é certo tudo é provável podese afirmar num exagero de expressão Debilidade e enfermidade distinção Debilidade permanente é o estado consecutivo a uma lesão traumática que limita duradouramente o uso a extensão e a energia de uma função sem comprometer o estado geral do organismo A enfermidade ao contrário deve ser entendida como o estado que duradouramente altera e progressivamente agrava o teor de um organismo Essa distinção a nosso juízo é a que melhor define as diferenças que as duas hipóteses encerram e permite a solução mais justa para cada caso concreto 93 Perda ou inutilização de membro sentido ou função A semelhança deste dispositivo que considera a perda ou inutilização com aquele do parágrafo anterior que disciplina a debilidade permanente de membro sentido ou função é manifesta recomendandose redobrada cautela no seu exame A debilidade permanente 1º III caracteriza lesão grave e a perda ou inutilização 2º III por sua vez configura lesão gravíssima Definição de perda Há perda quando cessa o sentido ou função ou quando o membro ou órgão é extraído ou amputado Perda é a extirpação ou eliminação de órgão membro sentido ou função A perda pode operarse por meio de mutilação ou amputação a primeira ocorre no momento da ação delituosa seccionando o órgão a segunda decorre de intervenção cirúrgica com a finalidade de minorar as consequências Definição de inutilização Há inutilização quando cessa ou se interrompe definitivamente a atividade do membro sentido ou função na inutilização não há a exclusão mas a subsistência embora inoperante Inutilização de membro sentido ou função não é outra coisa que a sua perda funcional e perda é o perecimento físico é a eliminação material do órgão Na inutilização o membro permanece ligado ao corpo mas inoperante em sua atividade própria ou função Debilidade e perda ou inutilização distinção Nem sempre é fácil distinguir debilidade permanente e perda ou inutilização A perda de um olho debilidade não se confunde com a perda da visão perda de sentido Sobre as definições de membro sentido ou função vide anotação anterior 94 Deformidade permanente A deformidade para caracterizar esta qualificadora precisa representar lesão estética de certa monta capaz de produzir desgosto desconforto a quem vê e vexame ou humilhação ao portador Não é por conseguinte qualquer dano estético ou físico capaz de configurar a qualificadora Influência do sexo da vítima Evidentemente que o sexo da vítima também contribui para o grau de exigência da deformidade pois inegavelmente uma cicatriz na face de uma jovem mulher causalhe prejuízo superior talvez intolerável ao que sofreria nas mesmas circunstâncias um jovem varão Diversidade da sede da lesão A deformidade não se limita ao rosto da vítima mas a qualquer outra parte do corpo cujo defeito seja visível como por exemplo lesão óssea em membros inferiores que obriga a vítima a coxear ou na coluna vertebral tornandoa gibosa etc Dano físicoestético Deformidade permanente implica a existência de dano estético considerável decorrente de defeito físico permanente É necessário que haja comprometimento permanente definitivo irrecuperável do aspecto físicoestético A deformidade não perde o carácter de permanente quando pode ser dissimulada por meios artificiais como por exemplo cirurgia plástica Necessidade de a decisão judicial optar A decisão judicial precisa optar reconhecendo expressamente se houve debilidade 1º III ou deformidade permanente 2º IV A deformidade que somente pode ser eliminada ou removida mediante cirurgia plástica constitui comprovadamente a qualificadora Extração de órgãos genitais atipicidade Não caracteriza a perda de membro sentido ou função a cirurgia que extrai órgãos genitais externos de transexual com a finalidade de curálo ou de reduzir seu sofrimento físico ou mental Aliás essa conduta é atípica Faltalhe o dolo de ofender a integridade física ou saúde de outrem 95 Aborto Tratase de crime preterdoloso ou seja há dolo em relação à lesão corporal e culpa em relação ao aborto este é provocado involuntariamente o agente não o quer nem assume o risco de provocálo Para que possa caracterizar a qualificadora da lesão corporal gravíssima não pode ter sido objeto de dolo do agente pois nesse caso terá de responder pelos dois crimes lesão corporal e aborto em concurso formal impróprio ou ainda por aborto qualificado se a lesão em si mesma for grave Consciência da gravidez e erro de tipo É necessário que o agente tenha conhecimento da gravidez sem contudo querer o aborto Se a ação do agente visar o aborto o crime será o do art 125 O desconhecimento da gravidez porém afasta a qualificadora constituindo erro de tipo Lesão ou aborto animus agendi Não se deve confundir as figuras dos arts 127 1ª parte e 129 2º V pois há uma inversão de situações na primeira a lesão é querida e o aborto não na segunda o aborto é que é o resultado desejado enquanto a lesão não nem mesmo eventualmente 10 Lesão seguida de morte 3º Também é conhecido como homicídio preterdoloso dolo nas lesões culpa na morte Se o resultado morte for imprevisível ou decorrente de caso fortuito o sujeito responderá somente pelas lesões corporais Se houver dolo eventual quanto ao resultado mais grave o crime será de homicídio Elemento subjetivo Preterdolo dolo no antecedente e culpa no consequente Se o resultado não foi objeto do querer do agente mas situandose na esfera da previsibilidade o crime é preterdoloso art 129 3º e não homicídio Se a ação não foi orientada pelo ânimo de lesar mas executada com imprudência configurase homicídio culposo Competência Apesar do evento morte a competência é do juiz singular Notese que a figura típica não se encontra no capítulo dos crimes contra a vida que são da competência do Tribunal do Júri mas está localizada no capítulo das lesões corporais 11 Lesões majoradas A pena pode ser aumentada em um terço se ocorrer qualquer das hipóteses do art 121 4º Vide as anotações daquele dispositivo 12 Figuras privilegiadas As formas privilegiadas são as seguintes a impelido por motivo de relevante valor social b impelido por motivo de relevante valor moral c sob o domínio de violenta emoção logo em seguida a injusta provocação da vítima Dominado pela emoção A intensidade da emoção deve ser de tal ordem que o sujeito seja dominado por ela a reação tem de ser imediata e a provocação tem de ser injusta Se a emoção for menor apenas influenciando a prática do crime ou não for logo em seguida não constituirá a privilegiadora mas a atenuante genérica do art 65 III c última parte Injusta provocação da vítima Em se tratando de lesão corporal de homicídio ou lesão corporal seguida de morte a privilegiadora da violenta emoção incide somente se o crime é cometido logo em seguida à injusta provocação emoção choque e quando a violência da emoção domina o agente Sob a influência da emoção A atenuante genérica do art 65 III c do CP não exige a emoção choque mas somente a emoçãoestado que identifica a influência de violenta emoção Lesão recíproca substituição por multa Estando presente qualquer das minorantes relacionadas no 4º ou se as lesões forem recíprocas 5º a pena de detenção poderá ser substituída por multa Essa previsão legal que teve extraordinária importância no passado perdeu seu destaque a partir das modernas reformas penais e particularmente com a Lei n 971498 que ampliou a aplicação da multa substitutiva 13 Formas privilegiadas 4º e 5º As formas privilegiadas são as seguintes 131 Diminuição de pena 4º a Impelido por motivo de relevante valor social b impelido por motivo de relevante valor moral c sob o domínio de violenta emoção logo em seguida a injusta provocação da vítima a intensidade da emoção deve ser de tal ordem que o sujeito seja dominado por ela a reação tem de ser imediata e a provocação tem de ser injusta Se a emoção for menor apenas influenciando a prática do crime ou não for logo em seguida não constituirá a privilegiadora mas a atenuante genérica do art 65 III c última parte Presente qualquer das condições privilegiadoras que na verdade são minorantes a pena pode ser reduzida de um sexto a um terço Vide demais anotações do art 121 1º 132 Substituição de pena 5º a Presente qualquer das minorantes relacionadas no 4º ou b se as lesões forem recíprocas a pena de detenção poderá ser substituída por multa 14 Lesão corporal culposa A lesão corporal será culposa desde que presentes os seguintes requisitos comportamento humano voluntário descumprimento do dever de cuidado objetivo previsibilidade objetiva do resultado lesão corporal involuntária Graduação da culpa O Código Penal ao contrário do Código Civil não faz a graduação da culpa A lesão culposa não recebe consequentemente a qualificação de grave e gravíssima como a lesão dolosa A graduação da culpa deverá ser objeto da dosimetria da pena Consequências do crime e lesão culposa Não havendo a tipificação da lesão culposa em modalidades grave e gravíssima as consequências do crime devem ser valoradas na análise das circunstâncias judiciais art 59 no momento da dosagem da pena Não há nenhuma previsão legal que afaste essa possibilidade Consideração das consequências do crime Apesar de ser crime culposo o desvalor do resultado é muito maior em uma lesão grave ou gravíssima do que em uma lesão leve Não se pode ignorar que tanto uma lesão corporal leve quanto uma lesão corporal com resultados graves ou gravíssimos na modalidade culposa sofrerá a mesma tipificação e receberá exatamente a mesma sanção Consequências no crime culposo Quem culposamente provoca leves escoriações em alguém está sujeito às mesmas penas de quem nas mesmas circunstâncias deixa a vítima tetraplégica por isso é completamente equivocado sustentar que as consequências do crime são irrelevantes além da inexistência de amparo legal para esse entendimento 15 Isenção de pena ou perdão judicial O 8º do art 129 que disciplina o crime de lesões corporais prescreve que em se tratando de lesão culposa aplicase o perdão judicial exatamente nos mesmos termos em que está previsto para o homicídio culposo Com efeito a previsão do 5º do art 121 referese à hipótese em que o agente é punido diretamente pelo próprio fato que praticou em razão das gravosas consequências produzidas que o atingem profundamente A gravidade das consequências deve ser aferida em função da pessoa do agente não se admitindo aqui critérios objetivos As consequências de que se cogita não se limitam aos danos morais podendo constituir danos materiais Quando as consequências atingem o agente via indireta exigese entre este e a vítima vínculo afetivo de importância significativa Doutrina e jurisprudência têm procurado definir essa possibilidade de deixar de aplicar a pena em algumas hipóteses expressamente previstas em lei O entendimento dominante prefere denominar perdão judicial que é o instituto mediante o qual a lei possibilita ao juiz deixar de aplicar a pena diante da existência de certas circunstâncias expressamente determinadas exs arts 121 5º 129 8º 140 1º I e II 180 5º 1ª parte 240 4º I e II 242 parágrafo único e 249 2º 151 Natureza jurídica do perdão judicial Ao analisar o contexto probatório se o juiz reconhecer que os requisitos exigidos estão preenchidos não poderá deixar de conceder o perdão judicial por mero capricho ou qualquer razão desvinculada do referido instituto Embora as opiniões dominantes concebam o perdão judicial como mero benefício ou favor do juiz entendemos que se trata de um direito público subjetivo de liberdade do indivíduo a partir do momento em que preenche os requisitos legais Como dizia Frederico Marques os benefícios são também direitos pois o campo do status libertatis se vê ampliado por eles de modo que satisfeitos seus pressupostos o juiz é obrigado a concedêlos Ademais é inconcebível que uma causa extintiva de punibilidade fique relegada ao puro arbítrio judicial Deverá contudo ser negado quando o réu não preencher os requisitos exigidos pela lei 16 Concurso de crimes Quando praticada contra vítima de estupro ou atentado violento ao pudor a lesão leve é considerada elemento da violência caracterizadora do crime sexual e não infração autônoma 17 Majorantes da lesão corporal 7º Vide as anotações do art 121 4º São as mesmas hipóteses previstas para o homicídio 18 Violência doméstica 9º adequação típica A novel figura recebeu a seguinte tipificação Se a lesão for praticada contra ascendente descendente irmão cônjuge ou companheiro ou com quem conviva ou tenha convivido ou ainda prevalecendose o agente das relações domésticas de coabitação ou de hospitalidade A Lei n 108862004 acrescentou o 9º ao art 129 trazendo uma nova figura penal típica a violência doméstica que se caracteriza quando o agente da lesão corporal mantém alguma relação de parentesco ou de convivência com a vítima nos termos descritos pela norma penal incriminadora e se prevalece das relações domésticas de coabitação ou de hospitalidade Convém destacar que referida tipificação não foi criada ou elaborada pela Lei Maria da Penha que se limitou a alterar a respectiva sanção penal da disposição que já existia desde 2004 Lei n 108862004 mantendo por sua vez intacto o preceito primário A discriminadora Lei n 11340 de 7 de agosto de 2006 abusou na definição das espécies e quantidade de violência doméstica e familiar Dentre outras classificou as seguintes violência física violência psicológica violência sexual violência patrimonial e violência moral art 7º No entanto a despeito de toda essa elástica previsão que tem natureza puramente programática em seara criminal o novo diploma legal não trouxe nenhum acréscimo à definição da violência física que preferimos denominar lesões corporais domésticas ressalvada a cominação sancionatória que recebeu novos limites mínimo e máximo cujas considerações serão acrescidas ao final deste capítulo 181 Fundamentos políticosociais da neocriminalização Ninguém desconhece que a criação desse tipo penal especial é produto da grande atuação dos movimentos feministas que é bom que se diga por justiça receberam apoio de inúmeros segmentos da sociedade sem qualquer ranço social ideológico ou político Procurouse por outro lado minimizar o drama da violência doméstica que assola o País fazendo diariamente milhares de vítimas em sua imensa maioria constituídas por mulheres e crianças Acreditam os movimentos engajados na luta que a instituição dos Juizados Especiais Criminais contribuiu para o aumento desse flagelo que atinge especialmente as camadas sociais desprivilegiadas o que não quer dizer que esse tipo de violência não exista nas classes mais altas 182 Equivocada manutenção da natureza da ação penal Mais que a obrigatoriedade da aplicação de penas não privativas de liberdade estamos convencidos de que a alteração da natureza da ação penal nos crimes de lesões corporais condicionandoa à representação criminal do ofendido ou de seu representante legal art 88 da Lei n 909995 dificulta a punição dos autores desse tipo de infração o qual normalmente no recesso dos lares é praticado contra mulheres e crianças Condicionar a punibilidade dessa espécie de violência doméstica à representação da vítima significa ainda que indiretamente dificultarlhe o alcance da tutela penal na medida em que quando não por outras razões pela simples coabitação com o agressor normalmente mais forte quase sempre temido ou respeitado a vítima não tem coragem nem independência suficientes para manifestar livremente sua vontade de requererautorizar a coerção estatal Por isso a nosso juízo mais que tipificar novas figuras penais eou majorar as sanções cominadas é indispensável alterar mediante previsão legal a natureza da ação penal ou seja excepcionar as lesões corporais leves quando praticadas nas condições descritas no novo dispositivo a ação penal deve ser pública incondicionada Lamentamos que o legislador contemporâneo não se tenha dado conta dessa necessidade tampouco da utilidade políticocriminal de tal orientação Ademais a despeito do nomen iuris imponente da nova figura típica continuava circunscrito ao espaço da definição de infração de menor potencial ofensivo art 2º parágrafo único da Lei n 102592001 mas nesse particular foi alterada pela Lei Maria da Penha Lei n 113402006 que elevou a pena cominada para três anos de detenção 183 Violência doméstica gravidade da ofensa Não é por certo a agravação da sanção cominada aleatoriamente ou não que torna a infração penal mais ou menos grave como podem interpretar alguns mas certamente a sua gravidade está diretamente relacionada com os efeitos resultados ou mais especificamente os danos que causa ou pode causar ao bem jurídico ofendido Em outros termos é a lesividade ou o potencial lesivo que traz em seu bojo que autoriza o reconhecimento da real gravidade de uma infração penal Aliás os próprios limites mínimo e máximo que foram sensivelmente alterados também autorizam interpretála como lesão leve pois a despeito da elevação exagerada do limite máximo trouxe ao mesmo tempo seu limite mínimo para três meses de detenção o mesmo do caput do art 129 No entanto nessa infração penal sui generis dois fatores aleatórios são os verdadeiros definidores se não da gravidade da conduta incriminada pelo menos da sanção cominada São eles a de um lado os sujeitos passivos da conduta incriminada b de outro lado o vínculo decorrente das relações domésticas de coabitação ou de hospitalidade 184 Violência doméstica bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido por essa figura típica não se limita à integridade corporal e à saúde da pessoa humana incolumidade e normalidade fisiológica e psíquica mas abrange também fundamentalmente a harmonia a solidariedade o respeito e a dignidade que orientam e fundamentam a célula familiar Nesse sentido Rogério Sanches Cunha Direito penal p 51 afirma está clara a preocupação do legislador em proteger não apenas a incolumidade física individual da vítima homem ou mulher como também tutelar a tranquilidade e harmonia dentro do âmbito familiar Manifesta o agente nesses casos clara insensibilidade moral violando sentimentos de estima solidariedade e apoio mútuo que deve nutrir para com parentes próximos ou pessoas com quem convive ou já conviveu 185 Violência doméstica impropriedade técnica Esse novo tipo penal aparentemente simples apresenta mais complexidade dogmaticamente falando do que se pode imaginar a começar pelo nomen iuris violência doméstica distinto das demais figuras contidas no mesmo art 129 que se referem todas a lesões corporais de uma ou outra gravidade mas sempre lesões corporais No entanto o preceito primário contido no novo 9º referese à lesão praticada e não à violência praticada Há inegavelmente um descompasso entre o nomen iuris e a descrição da conduta no preceito primário Em nosso entendimento essa opção do legislador apresenta certa impropriedade técnica que embora não seja inédita não deixa de ser inadequada na medida em que se presta a equívocos e divergências interpretativas especialmente quando se tem claro ao contrário do que imaginava a velha doutrina que o termo violência não é sinônimo de lesão corporal Na verdade violência tem significado mais abrangente do que lesão corporal como demonstraremos adiante em tópico específico 186 Lesão corporal e vias de fato distinção Considerando que a conduta tipificada limitase a criminalizar a lesão que outra coisa não é senão a lesão corporal leve eventuais vias de fato por si sós não configuram essa infração penal Vias de fato segundo doutrina e jurisprudência caracterizamse pela prática de atos agressivos sem animus vulnerandi dos quais não resultem danos corporais Aliás é exatamente a inexistência de lesões corporais aliada à ausência de animus laedendi que caracteriza a ofensa como vias de fato Em outros termos podese considerar vias de fato a ação violenta contra alguém com a intenção de causarlhe um mal físico sem contudo ferilo Em síntese para as pretensões da Lei Maria da Penha que discrimina o tratamento dispensado à mulher vias de fato efetivamente pode representar uma violência aliás é uma violência não apenas contra a mulher mas não tipifica o crime de violência doméstica nos termos em que esta foi insculpida no 9º do art 129 do Código Penal sob pena de se violentar o princípio da tipicidade estrita Esse aspecto somente poderá ser resolvido de lege ferenda 187 Violência doméstica deficiência e insuficiência da tipificação Essa não abrangência das vias de fato na criminalização das lesões corporais domésticas coloca em destaque a deficiência e a insuficiência desse novo tipo penal que para atender às aspirações dos movimentos sociais referidos mereceria outra redação mais abrangente mais técnica e menos excludente Para atingir esse desiderato seria recomendável que ao lado do verbo nuclear fosse incluída a locução violência ou mesmo violência doméstica exatamente pela extensão de seu significado A descrição típica que tem o objetivo declarado de coibir a violência praticada no interior dos lares não é clara quanto ao local em que tal infração pode ser praticada Seu conteúdo descritivo permite a interpretação segundo a qual havendo a relação normativa exigida pelo tipo penal entre sujeito ativo e sujeito passivo eventual lesão leve praticada pode ser definida como violência doméstica Mas as coisas não são tão simples Com efeito afora o nomen iuris violência doméstica explícito no tipo penal e a relação exaustiva das pessoas que podem ser sujeito passivo desse crime devese destacar que o crime pode ser praticado prevalecendose o agente das relações domésticas de coabitação ou de hospitalidade elementar normativa que tem aplicação suplementar Essa confusa redação autoriza em outros termos a admitir como sujeito passivo dessa infração não apenas aqueles elencados expressamente no tipo penal mas também outros desde que haja prevalecimento por parte do agente das relações mencionadas na descrição típica 188 Relativa importância do local da violência doméstica Assim acreditamos que pela descrição típica a lesão praticada contra ascendente descendente irmão cônjuge ou companheiro ou com quem conviva ou tenha convivido pode ser praticada em qualquer local e não apenas nos limites territoriais da morada da família comprovandose essa relação com o sujeito passivo eventual crime de lesão corporal leve encontrará adequação típica no 9º e não no caput do art 129 como ocorria até o advento da Lei n 10886 de 17 de junho de 2004 desde que segundo os termos legais prevaleçase da situação doméstica Nesse sentido vale a pena destacar o magistério de Rogério Sanches Cunha Direito penal parte especial 1 ed 2 tir São Paulo Revista dos Tribunais 2008 v 3 p 52 que adverte prevalecer tem o sentido de levar vantagem aproveitarse da condição ou situação pensamos que a hipótese necessariamente pressupõe que o agente se valha da vantagem doméstica de coabitação ou de hospitalidade em relação à vítima merecendo interpretação restritiva Nessa linha cabem ainda mais distinções 1 o crime contra os sujeitos passivos expressos no dispositivo legal como já afirmamos pode ser praticado em qualquer lugar 2 em relação àqueles contra os quais só pode ser praticado com prevalecimento das relações pode ocorrer somente em tese nos limites territoriais em que existam as relações domésticas de coabitação ou de hospitalidade Será pois nesses locais que o sujeito ativo poderá abusar de tais relações e consequentemente em que os sujeitos passivos poderão sentirse inferiorizados 189 Prevalecendose das relações domésticas de coabitação etc Afora o elenco de sujeitos passivos contido no 9º dita violência doméstica pode ser praticada contra outros sujeitos passivos desde que se prevaleça das relações domésticas de coabitação ou de hospitalidade A locução ou ainda prevalecendose quer significar que a mesma conduta proibida pode tipificarse quando for praticada contra outros sujeitos além daqueles expressamente mencionados apenas com o acréscimo da elementar prevalecendose das relações Significa ainda a contrario sensu que a mesma conduta para adequarse ao tipo penal em exame não exige a presença desse elemento normativo qual seja prevalecerse de relações domésticas de coabitação ou de hospitalidade quando a vítima for uma daquelas mencionadas expressamente no texto legal Somente para reforçar em relação aos sujeitos passivos expressamente elencados no dispositivo o prevalecimento das relações está implícito não precisando ser provado Por outro lado cabe mais um registro embora a criminalização da violência doméstica tenha resultado merecidamente do trabalho dos movimentos feministas a verdade é que as mulheres e filhos geralmente vítimas também podem ser sujeitos ativos desse crime 1810 Violência doméstica e relação empregatícia Relações domésticas não se confundem com a relação empregatícia que existe entre patrões e trabalhadores domésticos Nada impede entretanto que entre eles também possam existir relações domésticas e até mesmo relações de coabitação ou hospitalidade como ocorre por exemplo com os crimes tão em moda praticados por babás no recesso do lar de seus empregadores Na verdade somente em cada caso concreto é que se poderá examinar a existência ou não dessas modalidades de relação sejam domésticas de coabitação ou de hospitalidade 1811 Violência e lesão corporal distinção Qual é o real sentido quais os limites de abrangência do vocábulo violência que o legislador utiliza tão frequentemente no Código Penal às vezes adjetivado às vezes não Algumas vezes o utiliza acompanhado da locução grave ameaça outras o limita para abranger somente a violência física como forma de excluir a que se convencionou chamar de violência moral a grave ameaça por vezes ainda o faz acompanhar da locução vias de fato como na definição da injúria real art 140 2º quando esta consiste em violência ou vias de fato Enfim percebese que pode haver grande distinção entre os significados técnicojurídicos de violência e lesão corporal na medida em que a violência não consiste necessariamente em lesão corporal tampouco somente em vias de fato Não se discute em doutrina que a grave ameaça constitui uma espécie do gênero violência No entanto a exemplo do que ocorre na injúria real praticada com violência podese sustentar que a violência mencionada no nomen iuris violência doméstica não abrange a violência moral isto é a grave ameaça vis compulsiva pois quando o legislador deseja integrála ao tipo incriminador o faz expressamente Na verdade sempre que o Código Penal emprega a expressão violência sem a alternativa ou grave ameaça está excluindo a denominada violência moral limitandose a adotar a violência física ou seja aquela que é empregada sobre o corpo da vítima 1812 Contra pessoa portadora de deficiência Por fim o 11 acrescenta uma majorante específica quando a denominada violência doméstica isto é aquela praticada nas condições definidas no 9º ora em exame tiver como destinatário pessoa portadora de deficiência Tratase de uma causa de aumento aberta na medida em que não define natureza espécie ou extensão da deficiência A despeito dessa inadequada previsão não nos parece que se possa utilizar o conceito de pessoa portadora de deficiência contido nos arts 3º e 4º do Decreto n 3298 de 20 de dezembro de 1999 que regulamentou a Lei n 7853 de 24 de outubro de 1989 No particular discordamos do entendimento de Rogério Sanches que invoca exatamente o subsídio do referido decreto Nossa discordância com a venia devida reside no fato de tratarse de um decreto regulamentador de uma lei que não exige regulamentação pelo menos não foi expressa nesse sentido Admitirse a majoração de penas por decreto presidencial implica ferir o princípio da reserva legal A meu juízo a aplicação dessa majorante exige a comprovação médicolegal da existência efetiva da deficiência da vítima além da necessidade de o autor da violência ter conhecimento de que se trata de pessoa portadora de deficiência sob pena de consagrarse a odiosa responsabilidade penal objetiva como reconhece Rogério Sanches Cunha Direito penal p 53 1813 Natureza da ação penal no crime de violência doméstica De que é crime de ação pública não resta a menor dúvida mas será condicionada ou incondicionada Afinal de que crime estamos tratando Violência doméstica ou lesão corporal leve Se admitirmos que se trata somente de um tipo especial de lesão corporal leve evidentemente que a ação penal será pública condicionada nos termos do art 88 da Lei n 909995 Contudo se sustentarmos que a violência doméstica é um crime autônomo distinto do crime de lesão corporal inegavelmente a ação penal será pública incondicionada Provavelmente haverá essas duas correntes Na linha de toda a nossa exposição fica muito claro que para nós tecnicamente o conteúdo do 9º descreve um tipo especial do crime de lesão corporal leve e por isso a ação penal necessariamente só pode ser pública condicionada à representação do ofendido Dogmaticamente essa é a alternativa correta No entanto por questões de política criminal e considerando as razões que levaram à criminalização da chamada violência doméstica admitimos ser razoável sustentar que se trata de crime de ação pública incondicionada sob pena de continuar tudo igual ao que era antes da vigência da Lei n 108862004 dificultando se não inviabilizando a punição desse tipo de violência Acreditamos que a jurisprudência acertadamente adotará essa orientação 19 Causa de aumento de pena 10 Aproveitou o legislador de 2004 para criar a majorante de um terço para os casos dos 1º a 3º do mesmo artigo se as circunstâncias forem as mesmas 10 Com efeito se da violência doméstica resultar lesão corporal de natureza grave gravíssima ou seguida de morte a pena prevista nos 1º 2º ou 3º conforme o caso aumenta se de um terço 191 Pessoa portadora de deficiência majoração de pena Prosseguindo em sua sanha exasperadora o legislador aproveita para nova majorante elevação em um terço quando a lesão corporal doméstica for cometida contra pessoa portadora de deficiência 11 acrescida pela Lei n 113402006 Resta em aberto ainda a definição da espécie ou dos limites da locução portadora de deficiência que deve a nosso juízo circunscreverse à deficiência física mental e psíquica devidamente comprovada nos autos não se aplicando a previsão do Decreto n 329899 20 Pena e ação penal Na lesão leve a pena é de detenção de três meses a um ano na grave reclusão de um a cinco anos na gravíssima reclusão de dois a oito anos na seguida de morte reclusão de quatro a doze anos Na forma culposa a pena será de detenção de dois meses a um ano Há ainda a possibilidade da aplicação de minorantes 4º e 5º e majorantes 7º Os crimes de lesão corporal leve e lesão corporal culposa com o advento do art 88 da Lei n 909999 são de ação penal pública condicionada A lei nova é mais benéfica uma vez que subordina o exercício da pretensão punitiva do Estado à representação do ofendido Deve pois retroagir pouco importando esteja ou não o processo com a instrução criminal iniciada Para as demais espécies de lesões corporais a ação penal continua sendo pública incondicionada A Lei n 108862004 ao incluir um tipo especial de lesão corporal leve com o nomen iuris de violência doméstica cominoulhe a pena de detenção de seis meses a um ano superior portanto àquela prevista no caput do art 129 que é de três meses a um ano de detenção Novamente voltase a elevar a sanção dessa infração penal agora nitidamente com a finalidade de afastála da competência dos juizados especiais Sendo fixada entre três meses e três anos de detenção exclui pelos próprios critérios eleitos pelo legislador a competência dos Juizados Especiais Criminais sendo desnecessária a equivocada previsão do art 41 que determina a não aplicação da Lei n 909995 de duvidosa constitucionalidade art 98 I da CF 21 Questões especiais Confronto com outras figuras típicas Se não ocorrer a efetiva lesão corporal dano pode configurarse a contravenção de vias de fato art 21 da LCP Quanto à lesão corporal e homicídio culposos decorrentes de serviços de alta periculosidade contrariando determinação de autoridade competente vide art 65 parágrafo único da Lei n 807890 CDC Previsão do ECA A Lei n 806990 ECA criou uma majorante para o homicídio doloso e lesão corporal dolosa praticados contra criança nas hipóteses dos 4º do art 121 e 7º do art 129 As causas de aumento 7º devem constar implícita ou explicitamente da denúncia Manipulação genética Ver Lei n 111052005 J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A a Lesão corporal leve Lesão corporal leve Infração de menor potencial ofensivo Aplicabilidade dos institutos despenalizadores da Lei n 909995 STJ HC 69444MS Rel Min Gilson Dipp j 1052007 O delito de lesão corporal leve é autônomo frente ao crime de resistência ao teor do 2º do art 329 do Código Penal Segundo art 88 da Lei n 909995 para o crime descrito no art 129 caput do Código Penal é necessário a representação do ofendido STJ HC 36175SP Rel Min Paulo Medina j 2452005 Art 129 do CP Lesão corporal leve Representação Excesso de formalismo Desnecessidade Suprimento da condição de procedibilidade Vítima que comparece perante a autoridade policial para noticiar a ocorrência dos fatos Exame de corpo de delito Não realização Falta de demonstração de lesão Caracterização Contravenção Vias de fato STJ Apn 290PR Rel Min Félix Fischer j 1632005 b Lesão corporal grave Lesões corporais graves Dosimetria Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos Impossibilidade Se o paciente foi condenado pela prática de lesões corporais de natureza grave delito cometido com violência à pessoa resta afastado o pleito de concessão da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos Precedentes STJ HC 74359MG Rel Min Gilson Dipp 175 2007 No delito de lesão corporal grave em que a violência não é meio mas sim constitutiva do próprio ilícito não é possível a substituição da pena prisional por restritiva de direitos STJ EDcl no AgRg no REsp 478277MG Rel Min Hélio Quaglia Barbosa j 1652006 Tendo em vista os fatos narrados na denúncia bem como os elementos que compõem os autos devese operar a desclassificação do delito de lesão corporal gravíssima art 129 2º III do CP para o de lesão corporal grave art 129 1º III do CP em razão da superveniência de debilidade permanente de sentido perda da visão do olho direito Operada nesta via a desclassificação do delito mostrase viável a proposta de suspensão condicional do processo na forma do art 89 da Lei n 909995 STJ HC 44116PB Rel Min Félix Fischer j 1622006 Lesão corporal grave Constatada mediante laudo pericial a debilidade permanente da função mastigatória em razão da perda de canino superior esquerdo é irrelevante para fins de tipificação penal a possibilidade de restauração mediante tratamento odontológico pois para o reconhecimento da gravidade da lesão não é preciso que ela seja perpétua e impassível de tratamento STJ REsp 609059MG Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 2642005 c Lesão corporal gravíssima Lesão corporal gravíssima Perda do baço por intervenção cirúrgica necessária O interrogando jogou contra a vítima um pedaço de pau TJRS Apelação 70020460044 Rel Marco Antônio Ribeiro de Oliveira j 1582007 Lesão corporal gravíssima ocorrência Pena privativa de liberdade regime de cumprimento Condenado não reincidente Pena inferior a 4 quatro anos imposição Elementos favoráveis existência Regime legal aberto aplicação Em se tratando de pena inferior a 4 quatro anos imposta a réu não reincidente e havendo critérios favoráveis ao condenado reconhecidos pela sentença não é possível como na espécie escapar ao estabelecimento do cumprimento da pena em regime menos rigoroso STJ HC 52876RN Rel Min Nilson Naves 1992006 Quando da fixação da penabase a sentença valorou de um lado a periculosidade de outro a grave deformidade na face de uma jovem mulher de 26 vinte e seis anos de idade Visto que no caso a deformidade permanente foi a qualificadora da lesão corporal por isso a ré se houve como incursa na pena de reclusão prescrita no aludido art 129 2º não poderia tal ponto ou o que tem a ver com ele em razão disso servir de elemento para a fixação da penabase Em outras palavras a resultante deformidade não poderia ao mesmo tempo qualificar o crime 2º e integrar as circunstâncias judiciais art 59 STJ HC 35896DF Rel Min Nilson Naves j 2562004 Lesão corporal gravíssima Dosimetria da pena Incidência das qualificadoras atreladas à lesão corporal de natureza grave É inviável que as qualificadoras atreladas à lesão corporal de natureza grave sejam levadas em conta para majorar a pena do paciente condenado pelo crime de lesão corporal gravíssima conforme doutrinariamente se define o tipo do art 129 2º do CP tendo em vista o princípio da consunção STJ HC 30332RJ Rel Min Jorge Scartezzini 142004 d Lesão corporal seguida de morte Agente que golpeia a vítima com faca na região ventral e frontal levandoa a morte a pretexto de revidar agressão realiza por certo em tese crime de homicídio autorizando sua pronúncia e não delito de lesão corporal seguida de morte TJRS RESE 70022688246 Rel Vladimir Giacomuzzi j 632008 Está claramente comprovado que as agressões do acusado causaram a morte da vítima consubstanciando o delito do artigo 129 3º do CP Importante ressaltar que o dolo do agente se limita a causar as lesões corporais sendo a morte uma consequência que agrava o resultado TJRS Apelação 70020153292 Rel José Antônio Hirt Preiss j 3082007 Condenado o réu por lesão corporal seguida de morte é irrefutável estar caracterizada a violência apta a impedir a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos conforme reza o inciso I do art 44 do Código Penal STJ AgRg no REsp 478277MG Rel Min Hélio Quaglia Barbosa 20102005 e Lesão corporal culposa Art 303 do Código Brasileiro de Trânsito Lesão corporal culposa A prova demonstra que o evento ocorreu por culpa do condutor do veículo Astra que já tendo passado pela via secundária desvio engatou marchaàré para converter no acesso secundário sem certificarse da presença de outros veículos provocando a colisão TJRS Apelação 71001579937 Rel Angela Maria Silveira j 1732008 Lesão corporal culposa na direção de veículo automotor com majorante Rejeitada a preliminar da suspensão condicional do processo em razão do não preenchimento dos requisitos subjetivos do art 77 inciso II do CP combinado com art 89 da Lei n 909995 Acusado assumiu a direção do veículo após ingestão de bebida alcoólica sem habilitação necessária efetuando manobra arriscada de conversão em velocidade incompatível para uma pista de chão batido vindo a perder o controle do veículo deixando de prestar socorro à vítima mesmo tendo sido alertado pelo seu companheiro que chegou a pular a janela do carro em movimento para vir a socorrer a vítima TJRS Apelação 70012889176 Rel Lúcia de Fátima Cerveira j 291 2008 Lei n 909995 Lesão corporal culposa Decadência do direito de representação evidenciada Extinção da punibilidade STJ RHC 11688PA Rel Min Gilson Dipp 4122001 f Violência doméstica Lesão corporal leve Violência doméstica A violência doméstica constitutiva do crime de lesão corporal descrito no art 129 9º do Código Penal impede a incidência da agravante geral prevista no art 61 II letra f do mesmo diploma legal A pena detentiva de oito meses imposta ao condenado em razão do cometimento do crime previsto no art 129 9º do Código Penal pode ser subsituída por restritivas de direito indicadas no art 44 da lei penal fundamental quando atendidas as exigências legais e recomendável a operação à vista dos fins e objetivos da sanção criminal indicados no caput do art 59 TJRS Apelação 70022258974 Rel Vladimir Giacomuzzi j 632008 Violência doméstica Lesão corporal leve Art 129 9º do CPB Retratação tácita da representação Extinção da punibilidade O não comparecimento da ofendida na audiência preliminar demonstra falta de interesse na possível punição do agressor constituindo retratação tácita da representação o que também foi revelado pela conduta posterior quando declarou em juízo sobre a pacificação dos conflitos familiares TJRS Recurso Crime 71001522838 Rel Nara Leonor Castro Garcia j 17122007 Lesão corporal leve Violência doméstica Art 129 9º do CPB A violência intrínseca ao tipo penal não afasta a possibilidade da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito TJRS Recurso Crime 71001520162 Rel Nara Leonor Castro Garcia j 17122007 Capítulo III Da Periclitação da Vida e da Saúde Perigo de contágio venéreo Art 130 Expor alguém por meio de relações sexuais ou qualquer ato libidinoso a contágio de moléstia venérea de que sabe ou deve saber que está contaminado Pena detenção de 3 três meses a 1 um ano ou multa 1º Se é intenção do agente transmitir a moléstia Pena reclusão de 1 um a 4 quatro anos e multa 2º Somente se procede mediante representação V art 100 1º do CP V art 24 do CPP D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é a incolumidade física e a saúde da pessoa humana A existência harmonia e prosperidade da coletividade estão condicionadas à saúde segurança e bemestar de cada um de seus membros e por isso são objeto do interesse público Alguns autores como Magalhães Noronha incluem a vida como bem jurídico tutelado Não nos parece correta essa orientação na medida em que nem sequer há previsão para punição se sobrevier a morte da vítima em decorrência do efetivo contágio Para aprofundar ver nosso Manual v 2 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa homem ou mulher desde que sejam portadores de moléstia venérea Estar contaminado ou portar moléstia venérea é uma condição particular exigida por este tipo penal A ausência dessa condição torna atípica a conduta do agente ainda que aja com dolo de expor o ofendido à contaminação Cônjuge e prostituta O próprio cônjuge masculino ou feminino pode ser sujeito ativo em relação ao seu consorte Nem o matrimônio nem o exercício da prostituição constituem excludentes ou dirimentes da responsabilidade penal pela exposição a contágio de moléstia venérea 22 Sujeito passivo Sujeito passivo também pode ser qualquer ser vivo nascido de mulher sem qualquer condição particular A exemplo do que afirmamos em relação ao sujeito ativo também cônjuge e prostituta podem ser sujeitos passivos da exposição a moléstia venérea Irrelevância do consentimento da vítima Tratase de interesse público e portanto indisponível O eventual consentimento do ofendido não afasta o interesse público em impedir a progressão dessas moléstias que podem adquirir dimensões preocupantes ou quem sabe até atingir o nível de epidemia 3 Tipo objetivo adequação típica A ação consiste em expor colocar em perigo a contágio de moléstia venérea de que sabe ou devia saber ser portador O perigo deve ser direto e iminente isto é concreto demonstrado e não presumido A possibilidade incerta ou remota é irrelevante É suficiente a exposição ao perigo sendo desnecessário o dano que se ocorrer constituirá em tese somente o exaurimento do crime Meio de execução O meio de exposição a contágio venéreo é somente através de relações sexuais ou qualquer outro ato libidinoso Na definição deste crime o legislador utiliza a expressão relações sexuais ao contrário da praxis adotada na definição dos crimes contra os costumes arts 213 a 217 do CP na qual emprega sempre a expressão conjunção carnal À evidência que relações sexuais têm abrangência superior àquela compreendida pela expressão conjunção carnal Relações sexuais abrangência O vocábulo relações sexuais além da dita cópula vagínica abrange também as relações sexuais anormais tais como o coito anal ou oral o uso de instrumentos roliços ou dos dedos para a penetração no órgão sexual feminino ou a cópula vestibular em que não há penetração Relações sexuais ademais englobaria também as relações homossexuais tidas como atos libidinosos diversos da conjunção carnal tão disseminadas na atualidade Atipicidade de outros meios Não há crime de perigo de contágio venéreo se o perigo provier de qualquer outra ação física como por exemplo ingestão de alimentos aperto de mão amamentação uso de utensílios domésticos etc pois a descrição típica ao limitar expressamente às relações sexuais e atos libidinosos exclui qualquer outra forma de contágio Contato pessoal entre os sujeitos É indispensável a existência de contato pessoal entre os sujeitos ativo e passivo ante a exigência da lei de que a exposição de alguém a contágio venéreo se produza através de relações sexuais ou qualquer outro ato libidinoso aliás é impossível manter relações sexuais ou praticar qualquer ato libidinoso sem contato pessoal Nosso Código Penal ainda não pune essas condutas virtuais Desclassificação moléstia grave Se a moléstia venérea for grave mas o ato não for libidinoso ou se o ato for libidinoso mas a moléstia não for venérea tipificará o crime do art 131 e não deste 31 Tipo penal aberto e norma penal em branco A definição de moléstia venérea compete à medicina Assim são admitidas como moléstias venéreas para efeitos penais somente aquelas que o Ministério da Saúde catalogar como tais e esse rol deve variar ao longo do tempo acompanhando não só a evolução dos costumes mas particularmente os avanços da própria ciência médica AIDS não é moléstia venérea A AIDS que não é moléstia venérea e que não se transmite somente por atos sexuais poderá tipificar o crime do art 131 lesão corporal seguida de morte ou até mesmo homicídio dependendo da intenção do agente mas nunca o crime de perigo de contágio venéreo 4 Tipo subjetivo adequação típica Este tipo penal contém três figuras distintas a o agente sabe que está contaminado b não sabe mas deveria saber que está contaminado c sabe que está contaminado e tem a intenção de transmitir a moléstia 1º Dessa distinção se origina a diversidade de elemento subjetivo 1ª de que sabe dolo de perigo direto ou eventual 2ª deve saber dolo eventual de perigo aqui a culpa é equiparada ao dolo eventual para fins de reprovação Dosimetria penal sabe e deve saber Na dosimetria da pena devese levar em consideração a distinção de grau de censura que merece quem sabe daquele que deve saber se é intenção transmitir dolo de dano direto na figura do 1º mais o elemento subjetivo do tipo representado pelo fim especial de transmitir a moléstia Enfim dolo de perigo nas hipóteses do caput e de dano na hipótese do 1º Uso de preservativo exclusão do dolo Se o agente contaminado procura evitar a transmissão da moléstia usando preservativos por exemplo estará com certeza afastando o dolo Com esse comportamento se sobrevier eventual contaminação em tese não deverá responder sequer por lesão corporal culposa pois tomou os cuidados objetivos requeridos nas circunstâncias Deve saber presunção A expressão deve saber como elementar típica é pura presunção incompatível com o Direito Penal da culpabilidade Não se admitem presunções irracionais iníquas e absurdas pois não se pode ignorar a hipótese sempre possível de não se ter ou não se poder adquirir essa consciência Deve saber responsabilidade objetiva A admissão da elementar deve saber como identificadora de dolo eventual impede que se demonstre in concreto a impossibilidade de o agente ter ou adquirir o conhecimento do seu estado de contagiado na medida em que tal conhecimento é presumido E essa presunção legal não é outra coisa que autêntica responsabilidade objetiva presumir o dolo onde este não existe 41 Espécies de dolo direto e eventual Este tipo penal contém três figuras distintas a o agente sabe que está contaminado b não sabe mas devia saber que está contaminado c sabe que está contaminado e tem a intenção de transmitir a moléstia 1º Diversidade de elementos subjetivos 1ª de que sabe dolo de perigo direto ou eventual 2ª deve saber dolo eventual de perigo alguns sustentam até a existência de culpa que é inconcebível 3ª se é intenção transmitir dolo de dano direto na figura do 1º mais o fim especial de transmitir a moléstia Dolo de dano e dolo de perigo Dolo de perigo nas hipóteses do caput e de dano na hipótese do 1º Vamos examinar essas questões à luz da nossa interpretação Sabe dolo direto e eventual Quando o agente sabe que está contaminado isto é quando tem consciência de que é portador de moléstia venérea podem ocorrer as duas espécies de dolo direto e eventual O dolo será sempre de perigo e consistirá na vontade livre e consciente de criar a situação de perigo de contágio venéreo dolo direto ou na aceitação do risco de criála dolo eventual Sabe dolo direto Age nessa hipótese com dolo direto pois a vontade do agente é dirigida à realização do fato típico Não quer transmitir a moléstia venérea mas tem plena consciência e vontade de expor a vítima a perigo de contagiarse O objeto do dolo direto é o fim proposto satisfação da libido os meios escolhidos práticas libidinosas e os efeitos colaterais ou secundários exposição a contágio de moléstia venérea representados como necessários à realização do fim pretendido Sabe dolo eventual Mas mesmo na hipótese em que sabe que está contaminado o agente pode agir com dolo eventual Quando por exemplo o agente sabe que é portador de moléstia venérea prevê a possibilidade de darse o contágio mas não tem certeza de que a moléstia é contagiosa Na dúvida sobre a natureza contagiosa em vez de absterse mantém contato sexual com a vítima e a expõe a perigo Quando o agente não tem certeza de algum elemento típico não deve agir se no entanto apesar da dúvida age assume o risco não da produção do resultado mas da aceitação da possibilidade de sua verificação Sabe não se confunde com dolo A elementar sabe não se confunde com dolo pois este se compõe de dois elementos intelectivo consciência ou previsão e volitivo vontade e a ausência de qualquer deles é suficiente para impedir a configuração dolosa tanto na forma direta quanto na eventual 42 Dolo eventual deve saber que está contaminado O agente percebe alguns sinais de doença venérea mas não tem certeza de sua infecção e quiçá contaminação no entanto mantém relação sexual sem tomar qualquer precaução expondo alguém a perigo Na verdade devia saber havia a possibilidade de ter essa consciência de seu estado esse elemento normativo está presente mas assume o risco de criar uma situação de perigo para terceiro de criar uma situação de ameaça concreta de transmissão da moléstia Nesse caso na dúvida sobre a possibilidade de estar contaminado não podia agir expondo alguém a perigo concreto Deve saber impossibilidade de dolo direto O dolo eventual pode configurarse diante de qualquer das duas elementares sabe e deve saber o dolo direto é que não é admissível na hipótese do deve saber 5 Qualificadora e elemento subjetivo especial do tipo Na hipótese do 1º do art 130 o agente quer transmitir a moléstia venérea mantém a relação sexual com essa finalidade a intenção de transmitir constitui o móvel da ação Se no entanto o agente praticar a relação sexual sabendo que está contaminado tem consciência do risco que expõe a companheira isto é age com dolo eventual quanto ao contágio efetivo responderá pelo art 130 caput e não pelo 1º Intenção do agente dupla função A previsão do 1º se é intenção do agente transmitir a moléstia exerce aqui dupla função dogmática qualifica o crime tipo derivado e constitui elemento subjetivo especial do injusto Impunibilidade da forma culposa Não vemos nenhuma possibilidade de punir a modalidade do crime culposo em razão do princípio de sua excepcionalidade e por isso mesmo seria paradoxal admitir sua equiparação com o dolo 6 Consumação e tentativa O crime de perigo de contágio venéreo consumase com a prática de atos de libidinagem conjunção carnal ou não capazes de transmitir a moléstia venérea independentemente do contágio que poderá ou não ocorrer Atos de libidinagem podem ser representados pelas relações sexuais ou outros atos libidinosos diversos daquelas Efetiva contaminação exaurimento A efetiva contaminação do ofendido constituirá simples exaurimento do crime de perigo de contágio venéreo que para alguns tipificaria crime de dano que poderia ser eventualmente lesão corporal dolosa ou culposa conforme o caso Contudo como o dolo é de perigo presumese que o agente não tenha querido transmitir a moléstia Lesões culposas absorção Lesões corporais culposas fica afastada em razão de sua sanção ser menor que a do crime de perigo além da falta de previsão legal Admissibilidade da tentativa Admite a tentativa a despeito de tratarse de crime de simples perigo Como crime formal compõese de ação e resultado embora tenha sua execução antecipada consumandose com a prática da conduta nuclear típica Frequentemente apresenta um iter criminis que pode ser objeto de fracionamento Haverá tentativa por exemplo quando o agente pretendendo manter relação sexual com a vítima não consegue 7 Crime impossível Quando o ofendido já for contagiado ou portador da mesma moléstia não haverá crime configurandose crime impossível art 17 do CP por absoluta impropriedade do objeto Em outros termos não se pode expor a perigo de contaminação ou mesmo contaminar quem já está contaminado Haverá igualmente crime impossível se o sujeito ativo supuser erroneamente que está contaminado 8 Classificação doutrinária O perigo de contágio venéreo é crime comum pois não exige nenhuma qualidade especial de qualquer dos sujeitos ativo ou passivo é formal consumase com a simples realização de conduta típica independentemente da produção de qualquer resultado instantâneo comissivo e plurissubsistente A conduta descrita no caput do artigo é crime de perigo e a descrita no 1º é de dano Formas qualificadas o 1º constitui uma forma qualificada sui generis do delito representada pelo especial fim de transmitir a moléstia recebendo pena agravada Na forma simples o dolo é de perigo na qualificada é de dano 9 Formas qualificadas O 1º do art 130 define uma forma qualificada sui generis do crime de perigo de contágio venéreo representada pelo especial fim de transmitir a moléstia Nesse parágrafo o legislador utiliza uma técnica sui generis porque emprega o especial fim de agir não como simples elemento subjetivo do tipo mas como elemento identificador e especializante do tipo derivado qualificado Lesão grave ou gravíssima absorção A intenção é de transmitir a moléstia e não simplesmente expor a perigo Assim se sobrevier o dano isto é se o ofendido for contaminado de forma grave ou não o sujeito passivo responderá exatamente pelo previsto há a previsão de dano o elemento subjetivo é de dano e a agravação da sanção existe exatamente em razão dessa finalidade que acaba sendo atingida Eventual lesão corporal grave ou gravíssima é absorvida Concurso formal O crime de perigo de contágio venéreo poderá apresentarse sob a forma de concurso formal com os crimes contra os costumes estupro atentado violento ao pudor atentado ao pudor mediante fraude corrupção etc quando o autor desses crimes souber ou puder saber que está contaminado por moléstia venérea Concurso formal impróprio A prática de qualquer dos crimes sexuais contra os costumes com a intenção de transmitir a moléstia continuará configurando concurso formal mas nesse caso o concurso será formal impróprio somando se as penas como no concurso material por tratarse de desígnios autônomos Forma culposa deve saber Não admite modalidade culposa Embora a expressão deve saber segundo a velha doutrina encerre uma configuração de culpa nesta hipótese ela é equiparada ao dolo recebendo abstratamente a mesma pena 10 Pena e ação penal 101 Pena Alternativa na figura do caput de detenção de três meses a um ano ou multa Cumulativa na figura do 1º de reclusão de um a quatro anos e multa Na dosimetria da pena devese levar em consideração a distinção do grau de censura que merece quem sabe daquele que deve saber 102 Ação penal O crime de perigo de contágio venéreo é de ação pública condicionada à representação da vítima ou de seu representante legal A representação do ofendido constitui somente uma condição de procedibilidade também denominada pressuposto processual O fundamento da condicionabilidade da ação penal reside na natureza da infração penal e que pode trazer danos nefastos ao ofendido seja no seio familiar seja no social 11 Questões especiais Pode este crime ocorrer inclusive entre marido e mulher Pode haver concurso formal com os crimes contra os costumes Pode haver crime impossível se a vítima já estiver contaminada ou se o sujeito ativo supuser erroneamente que está contaminado A definição de moléstia grave compete à medicina A AIDS que não é moléstia venérea e que não se transmite somente por atos sexuais poderá tipificar o crime do art 131 lesão corporal seguida de morte ou até mesmo homicídio dependendo da intenção do agente J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Atentado violento ao pudor Violência presumida Delito de perigo de contágio venéreo art 130 do CP O fato além de monstruoso revela a personalidade doentia do acusado pois mesmo sabendo ser este portador de doença sexualmente transmissível manteve relações libidinosas com a vítima Condenação imposta sem manifestação de inconformidade do Ministério Público quanto à pena Lapso prescricional transcorrido entre o recebimento da denúncia e a publicação da sentença Extinção da punibilidade de ofício TJRS Apelação 70009054917 Rel Marco Antônio Bandeira Scapini j 1282004 Não procede a alegação de que a vítima pretendia infectar o Apelante com o vírus HIV se não restou demonstrada a combinação para a prática do ato sexual e a sua ocorrência remanesce caracterizado o concurso de agentes ainda que não premeditado o assalto diante da participação dos menores nas agressões físicas à vítima dela também subtraindo seus bens TJDF Apelação 19990110461092 Rel Joazil M Gardes j 1º62000 Perigo de contágio venéreo Descaracterização Apelante inculto e simplório Desconhecimento de que estava contaminado por doença venérea Necessidade Não configuração Absolvição determinada TJSP Apelação 2185173 Rel Hélio Freitas j 1981997 Perigo de contágio de moléstia grave Art 131 Praticar com o fim de transmitir a outrem moléstia grave de que está contaminado ato capaz de produzir o contágio Pena reclusão de 1 um a 4 quatro anos e multa D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é a incolumidade física e a saúde da pessoa humana Apresenta particularidade relativamente ao meio através do qual o bem jurídico pode ser atingido contágio de moléstia grave Perigo de contágio e lesões corporais Tratase de lex specialis em relação à proteção contida no art 129 pois as condutas tipificadas como crimes de contágio de moléstias venéreas ou graves são crimes de perigo e poderiam enfrentar dificuldades práticas se permanecessem englobadas na generalidade do art 129 Por isso mesmo para antes do dano punese a simples exposição a perigo que não é mais que a probabilidade de dano Vida não abrangência A vida não integra o bem jurídico protegido pelo art 131 como alguns autores chegam a sustentar Tanto é verdade que se sobrevier a morte da vítima eventual punição por esse dano deslocará a tipificação da conduta para outro dispositivo que poderá ser o 121 ou o 129 3º em clara demonstração de que a vida não está protegida por este artigo legal pelo menos imediatamente 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa homem ou mulher desde que esteja contaminado por moléstia grave e contagiosa A exemplo da exigência do artigo anterior estar contaminado de moléstia grave é uma condição particular exigida pelo tipo penal a diferença é que para aquele tipo importa somente a moléstia venérea para este é indiferente a natureza da moléstia desde que seja grave Sujeito não contaminado A falta desta condição torna atípica a conduta mesmo que haja a intenção de transmitir moléstia grave podendo inclusive caracterizar crime impossível por ineficácia absoluta do meio art 17 22 Sujeito passivo Sujeito passivo igualmente pode ser qualquer pessoa desde que não esteja contaminada por igual moléstia O cônjuge e a prostituta também podem ser sujeitos passivos do perigo de contágio de moléstia grave desde que estejam presentes os elementos subjetivos o dolo e o especial fim de agir 3 Tipo objetivo adequação típica A ação típica punível é praticar isto é realizar ato capaz de transmitir moléstia grave A transmissão pode ocorrer através de qualquer ato inclusive libidinoso desde que a moléstia grave não seja venérea desde que capaz de produzir o contágio O ato praticado precisa ter idoneidade para a transmissão e a moléstia além de grave deve ser contagiosa Meio de execução forma livre O agente pode utilizarse de qualquer meio idôneo para a prática do crime de perigo de contágio de moléstia grave pois o texto legal não faz qualquer restrição ao contrário do perigo de contágio venéreo que só pode ocorrer através de relações sexuais ou qualquer ato libidinoso art 130 Meios diretos Os meios com idoneidade para produzir o contágio de moléstia grave ao contrário da previsão do artigo anterior que exige o contato pessoal podem ser diretos ou indiretos Meios diretos decorrem do contato físico do agente com a vítima como beijo aperto de mão troca de roupa amamentação etc Meios indiretos Meios indiretos decorrem da utilização de objetos utensílios alimentos bebidas ou qualquer outro instrumento que o sujeito passivo pode utilizar para a transmissão da moléstia grave que porta Enfim neste crime ao contrário do perigo de contágio venéreo é desnecessário o contato pessoal Objetos ou meios contaminados atipicidade E se os objetos ou coisas que o agente utilizar com o fim de transmitir moléstia grave estiverem infectados por micróbios ou germes dos quais não é portador Responderá pelo crime descrito no art 131 Certamente não pois falta a elementar típica de que está contaminado Poderá eventualmente configurar o crime do art 132 ou se o contágio se concretizar quem sabe o crime de lesão corporal dependendo das circunstâncias Fim especial transmissão da moléstia A conduta tem de ter a finalidade de transmitir a moléstia Assim por exemplo se a amaseca amamentar a criança desconhecendo que está contaminada ou então ignorando que a moléstia grave que porta é contagiosa não responderá por este crime Se contudo sobrevier lesão corporal ou a morte da criança e ficar comprovada a existência de culpa a amaseca responderá por lesão corporal culposa ou homicídio culposo conforme o caso Transmissão por criança Se ao contrário a criança transmitir a moléstia grave à amaseca os pais da criança não responderão por este crime se houver dolo dos pais responderão por perigo para a vida ou a saúde de outrem lesão corporal tentativa de homicídio ou homicídio conforme o caso concreto e a natureza do dolo que orientou suas condutas Moléstia grave e contagiosa O texto legal referese à transmissão de moléstia grave sem definir ou exemplificar o que deve ser entendido por moléstia grave que à evidência deve ser contagiosa isto é transmissível Mas essa omissão do legislador não implica norma penal em branco Não será com efeito o regulamento da ONU ou do Ministério da Justiça que determinará a gravidade ou contagiosidade de uma ou outra moléstia Tipo anormal elementos normativo e subjetivo O fato de determinada moléstia grave não constar de regulamentos oficiais não lhe retirará por certo a idoneidade para tipificar este crime Ser grave e contagiosa decorre da essência da moléstia e não de eventuais escalas oficiais Tratase em verdade daqueles crimes denominados tipos anormais em razão da presença de elementos normativos ou subjetivos neste caso ambos estão presentes a finalidade de transmitir a moléstia elemento subjetivo e moléstia grave elemento normativo Moléstia grave não contagiosa definição médica Moléstia grave é somente um elemento normativo que exige para a sua compreensão uma atividade valorativa pois implica um juízo de valor sendo insuficiente uma atividade meramente cognitiva Por isso a definição do que é moléstia grave cabe à medicina pois se trata de um conceito médico A moléstia grave por fim não contagiosa não é objeto de preocupação do art 131 Ato de libidinagem O perigo de contágio de moléstia grave está tipificado no art 131 contudo se forem venéreas as moléstias e o meio do perigo de contágio for ato de libidinagem relação sexual ou outro ato libidinoso tipificará o crime descrito no art 130 No entanto se a despeito de serem venéreas as moléstias graves o meio de transmissão for qualquer outro poderá tipificar o crime deste art 131 Perigo concreto O perigo de contágio de moléstia grave deve ser concreto logo precisa ser efetivamente comprovado A gravidade da moléstia bem como a sua contagiosidade e a relação de causalidade entre a conduta do agente e o perigo concreto de contágio tem de ser pericialmente comprovado São moléstias graves e contagiosas dentre outras AIDS varíola tuberculose cólera lepra tifo independentemente de constarem de Regulamento do Ministério da Saúde Moléstia grave e moléstia venérea A moléstia grave pode inclusive ser transmitida através de ato libidinoso e desde que não seja venérea tipificará o crime do art 131 se ao contrário for venérea tipificará o crime do art 130 Da mesma forma se a moléstia grave for venérea mas o ato não for libidinoso a sua transmissão poderá tipificar o crime deste art 131 Em outros termos se a moléstia venérea for grave mas o ato não for libidinoso ou se o ato for libidinoso mas a moléstia grave não for venérea tipificará o crime do art 131 e não deste 4 Tipo subjetivo adequação típica O dolo direto e o elemento subjetivo do tipo constituído pelo fim especial de transmitir a moléstia Por isso diante do fim específico não há dolo de perigo mas de dano Tipo subjetivo adequação típica Estamos diante de um crime de perigo com dolo de dano que só se caracteriza quando o agente pratica a ação e quer transmitir a moléstia Em outros termos o tipo subjetivo do crime de perigo de contágio de moléstia grave compõese do a dolo direto que é o elemento subjetivo geral do tipo e do b elemento subjetivo especial do injusto representado pelo especial fim de agir que é a intenção de transmitir a moléstia grave 41 Dolo geral elemento subjetivo geral O dolo como elemento subjetivo geral requer sempre a presença de dois elementos constitutivos quais sejam o elemento cognitivo consciência e o elemento volitivo vontade Consciência e vontade A consciência como elemento do dolo deve ser atual Assim o agente deve ter não apenas consciência de que está contaminado ou de que sua moléstia grave é contagiosa mas deve ter também consciência da ação que pretende praticar das consequências desta e dos meios que pretende utilizar Além do elemento intelectual é indispensável o elemento volitivo a vontade deve igualmente abranger a ação praticar ato idôneo ou se for o caso a omissão o resultado transmissão da moléstia os meios diretos ou indiretos e o nexo causal relação de causa e efeito Especial fim de agir O tipo subjetivo exige o especial fim de agir Esse fim específico impede que se admita a possibilidade de dolo eventual Logo o dolo do crime de contágio de moléstia grave só pode ser direto Dolo eventual inadmissibilidade O dolo eventual é incompatível com especial fim de agir Por isso a mesma conduta que objetivamente assemelhase à descrição típica não se aperfeiçoa pela ausência ou imperfeição da tipicidade subjetiva se não houver o especial fim de agir Dolo eventual outra tipificação O dolo eventual poderá tipificar tentativa de lesão corporal ou o crime consumado de perigo para a vida ou a saúde de outrem art 132 do CP E se ocorrer a transmissão efetiva da moléstia grave o crime poderá ser de lesão corporal dolosa ou lesão corporal seguida de morte de acordo com o resultado que produzir Complexidade subjetiva especial fim de agir Enquanto o dolo deve materializarse no fato típico os elementos subjetivos especiais do tipo especificam o dolo sem necessidade de se concretizar sendo suficiente que existam no psiquismo do autor Assim o agente pode agir dolosamente isto é praticar atos idôneos para transmitir a moléstia grave a outrem sabendo que está contaminado mas se faltar o especial fim de transmitir a moléstia o crime não se configura O dolo direto existe mas a falta do elemento subjetivo especial não o especificou e reduziu o tipo penal subjetivo desfigurandoo Crimes de intenção Crimes de intenção requerem um agir com ânimo finalidade ou intenção adicional de obter um resultado ulterior distintos da realização do tipo penal Tratase portanto de uma finalidade ou ânimo que vai além da realização do tipo As intenções especiais integram a estrutura subjetiva de determinados tipos penais exigindo do autor a persecução de um objetivo compreendido no tipo mas que não precisa ser alcançado efetivamente 5 Consumação e tentativa O crime de perigo de contágio de moléstia grave consumase com a prática do ato idôneo para transmitir a moléstia sendo indiferente a ocorrência efetiva da transmissão que poderá ou não ocorrer Este crime pode consumarse inclusive por meio de atos de libidinagem desde que a moléstia grave não seja venérea como também pode consumarse com o risco de contágio de moléstia venérea grave desde que os meios não constituam atos de libidinagem Consumação e exaurimento A efetiva contaminação do ofendido constituirá simples exaurimento do crime de perigo de contágio de moléstia grave Contudo embora o crime seja de perigo o dolo é de dano Ademais é indispensável a intenção de contagiar a vítima a ausência desse especial fim afasta a adequação típica relativa ao art 131 Tentativa admissível Este crime admite em tese a forma tentada Tratase de crime formal compondose de ação e resultado é conhecido como crime de execução antecipada consumandose com a simples prática da ação descrita no tipo penal Contudo frequentemente apresenta um iter criminis que pode ser objeto de fracionamento e esse fracionamento é que caracteriza a possibilidade de ocorrência de tentativa Crime impossível Haverá crime impossível se o sujeito passivo estiver contaminado pela mesma moléstia art 17 Em outros termos não se pode expor a perigo de contaminação ou mesmo contaminar quem já está contaminado Se o meio utilizado for completamente inidôneo para produzir o contágio haverá crime impossível haverá igualmente crime impossível se o agente supuser erroneamente que está contaminado de moléstia grave e praticar ato com a finalidade de transmitila Essa suposição equivocada será absolutamente insuficiente para tipificar o crime Erro de tipo e erro de proibição Se o agente supõe que em relação a seu cônjuge não há a proibição de transmitir o contágio da moléstia grave incorre em erro de proibição Tratase no entanto de erro inescusável e nesse caso serviria somente para reduzirlhe a pena art 21 2ª parte Quando por exemplo o agente sabe que está contaminado tem consciência de que é portador de determinada moléstia mas não sabe que se tratava de moléstia grave O desconhecimento dessa elementar grave pode configurar erro de tipo 6 Classificação doutrinária Tratase de crime de perigo com dolo de dano formal doloso comum comissivo e instantâneo Como crime formal tem sua consumação antecipada não exigindo a produção do resultado que sobrevindo o exaurirá É crime de perigo porque a simples prática da conduta expondo a perigo o bem jurídico tutelado já configurará o tipo penal e com dolo de dano porque exige a finalidade de transmitir a moléstia grave que potencialmente produzirá um dano Só admite a forma dolosa e não admite o dolo eventual em razão do especial fim de transmitir a moléstia É comum porque não exige qualquer condição ou qualidade especial do sujeito passivo isto é pode ser praticado por qualquer pessoa contaminada Crime comissivo e omissivo O verbo núcleo praticar exige atividade o que caracteriza um tipo comissivo embora excepcionalmente possa receber a forma omissiva quando por exemplo a mãe contaminada por moléstia grave e contagiosa permite que o filho a toque com a intenção de transmitir lhe a moléstia 7 Questões especiais 71 Lesão corporal gravíssima Como já afirmamos eventual contaminação da vítima integra o próprio tipo do art 131 Somente se se configurar lesão corporal gravíssima o agente responderá exclusivamente por ela art 129 2º Logo entendemos que a própria lesão corporal grave art 129 1º é abrangida pelo exaurimento do crime em que pese o máximo da pena ser pouco acima do máximo da pena do crime previsto no art 131 72 Morte da vítima preterdolo O dolo que orienta a conduta do agente objetiva a transmitir a moléstia grave Pois é exatamente o elemento subjetivo que nos permite identificar e classificar a conduta do agente Nessa descrição típica do art 131 o legislador já sopesou o desvalor do resultado que provavelmente deve atingir a integridade e a saúde do ofendido Convém destacar que a superveniência da morte da vítima com o mesmo dolo não é atribuída ao agente a título de dolo mas tão somente a título de preterdolo Assim seria incoerente atribuir aquela lesão a título de dolo 73 Elemento subjetivo e resultado Se sobrevier a morte da vítima em razão da contaminação o agente responderá por lesão corporal seguida de morte art 129 3º Se a intenção for matar a vítima poderá configurar homicídio doloso tentado ou consumado Se o sujeito ativo agir com dolo eventual ou seja assumir o risco de produzir o contágio de moléstia grave não responderá pelo crime que exige dolo direto Contudo se produzir lesão corporal responderá por ela Se no entanto agir com culpa na transmissão de moléstia grave responderá por lesão corporal culposa ou homicídio culposo de acordo com o resultado que produzir 74 Concurso formal contágio e epidemia Se por fim com sua ação der causa ao surgimento de uma epidemia responderá pelo crime dos arts 131 e 267 2º modalidade culposa em concurso formal 75 Desclassificação dificuldade Dificilmente será possível a desclassificação para o crime de perigo de contágio venéreo porque a ação penal do delito do art 130 do CP é pública condicionada à representação 2º que normalmente não terá sido satisfeita antes do prazo decadencial 8 Pena e ação penal A pena é cumulativa de um a quatro anos de reclusão e multa A ação penal é pública incondicionada Forma culposa Não admite a modalidade culposa Assim responderá por lesão corporal culposa ou homicídio culposo se houver contágio efetivo decorrente de culpa J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A O fato de já existir uma decisão judicial em sede de ação de indenização por danos morais proposta na seara cível não prejudica a instauração de regular inquérito policial para a apuração de eventual crime de perigo de contágio de moléstia grave praticado pelo indiciado tendo em vista a independência via de regra entre as instâncias civil e penal STJ RHC 12468MG Rel Min Félix Fischer j 1092002 Tentativa de homicídio Portador de vírus da AIDS Desclassificação Art 131 do Código Penal Em havendo dolo de matar a relação sexual forçada e dirigida à transmissão do vírus da AIDS é idônea para a caracterização da tentativa de homicídio STJ HC 9378RS Rel Min Hamilton Carvalhido j 18101999 Perigo para a vida ou saúde de outrem Art 132 Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente Pena detenção de 3 três meses a 1 um ano se o fato não constitui crime mais grave Parágrafo único A pena é aumentada de um sexto a um terço se a exposição da vida ou da saúde de outrem a perigo decorre do transporte de pessoas para a prestação de serviços em estabelecimentos de qualquer natureza em desacordo com as normas legais Parágrafo único acrescentado pela Lei n 9777 de 29 de dezembro de 1998 V arts 21 28 a 31 34 e 38 do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais V art 20 da Lei n 717083 Lei de Segurança Nacional D O U T R I N A Alteração o parágrafo único do art 132 foi acrescentado pela Lei n 9777 de 29 de dezembro de 1998 que procura de certa forma resgatar as origens históricas que fundamentaram o surgimento deste dispositivo legal 1 Crime subsidiário É um crime essencialmente subsidiário que só se tipifica se o fato não constitui crime mais grave Não o informa o animus necandi ou o animus laedendi mas apenas a consciência e vontade de expor a vítima a grave perigo Crime residual O caráter subsidiário desta infração entendido como residualidade vai muito além da previsão expressa pois obedecendose ao princípio da tipicidade estará presente sempre que a conduta humana adequar se a qualquer outra descrição típica independentemente da gravidade da sanção cominada arts 130 e 136 Princípio da especialidade Nas hipóteses dos crimes de perigo de contágio venéreo art 130 com igual punição e maustratos art 136 com punição inferior a previsão do art 132 é afastada pelo princípio da especialidade segundo o qual a norma especial afasta a norma geral Pessoa determinada e crime de perigo comum O perigo concreto que constitui seu elemento objetivo é limitado a determinada pessoa não se confundindo portanto o crime em questão com os de perigo comum ou contra a incolumidade pública 2 Bem jurídico tutelado A vida e a saúde da pessoa humana ou em termos mais abrangentes a incolumidade pessoal constitui o objeto da tutela penal isto é a vida e a integridade fisiopsíquica são os bens jurídicos protegidos A prescrição do art 132 incrimina a exposição a perigo não só da vida mas também da saúde de outrem 21 Vida e saúde crime de perigo A importância desses bens jurídicos vida e saúde justifica a preocupação do legislador que proíbe simples condutas que visem colocálos em perigo a ordem jurídica não espera que o dano se produza para protegêlos crime de dano sendo suficiente a criação de uma situação concreta de perigo a esses bens para receber a reprovação penal 3 Sujeitos do crime Qualquer pessoa pode ser sujeito ativo e sujeito passivo deste crime desde que seja determinada Não se exige qualquer condição ou atributo especial dos sujeitos e não se faz necessária igualmente nenhuma relação de subordinação dependência ou assistência 31 Requisitos especiais ausência Por isso naqueles casos em que o tipo penal exige requisitos especiais do sujeito para a legitimação criminal do agente a ausência de qualquer deles poderá subsidiariamente levar à tipificação do crime descrito no art 132 Tratase com efeito de crime comum 32 Inexistência de relação jurídica É indiferente a inexistência de uma especial relação jurídica entre um e outro assim é desnecessário um vínculo obrigacional entre sujeito ativo e sujeito passivo ao contrário do que ocorre com os crimes previstos nos arts 133 134 e 136 Nestes crimes o sujeito ativo é determinado expressamente o que não ocorre com a infração prevista no art 132 33 Dever de enfrentar o perigo atividades especiais Determinadas pessoas no exercício de determinadas atividades funções ou profissões não podem em tese apresentarse como sujeito passivo do crime do art 132 Não há crime quando o periclitante tem o dever legal de enfrentar o perigo como no caso dos bombeiros dos policiais etc Não há o crime quando se trata de perigo inerente a certas profissões ou atividades como a dos enfermeiros a dos amansadores de animais a dos toureiros etc 4 Tipo objetivo adequação típica Expor colocar em perigo a vida ou a saúde de alguém O perigo deve ser direto em relação a pessoa determinada e iminente prestes a acontecer isto é concreto efetivo presente imediato demonstrado e não presumido É desnecessário o dano sendo suficiente a exposição a perigo O perigo deve ser individual se ocorrer perigo comum isto é extensivo a um número indeterminado de pessoas o crime poderá ser contra a incolumidade pública 41 Perigo futuro e incerto O perigo remoto e incerto longínquo ou presumido não constitui o perigo contemplado no art 132 A possibilidade futura incerta ou remota é insuficiente para configurar perigo concreto direto e determinado requerido por este tipo penal 42 Perigo intolerável O perigo convém destacar deve apresentarse necessariamente como uma anormalidade como uma ação desaprovada pela moral jurídica e pela moral social representando em outros termos o perigo não tolerável 43 Desnecessidade de dano É desnecessário o dano sendo suficiente a exposição a perigo a ação física cria a situação de perigo mas não objetiva o dano embora este não lhe seja desconhecido se no entanto o objetivasse o crime seria de dano e a sua não ocorrência configuraria uma figura tentada 44 Concurso de crimes possibilidade Se com uma única ação o agente criar situação de perigo a várias pessoas perfeitamente determinadas e individualizadas haverá concurso formal de crimes Se porém com mais de uma conduta criar situação de perigo a mais de uma pessoa devidamente individualizadas haverá concurso material de crimes 45 Concurso com outros crimes possibilidade Discordamos das afirmações simplistas de que este crime não admite concurso de crimes em razão da sua natureza subsidiária pois são temas completamente distintos O concurso de crimes é inadmissível com efeito entre a norma subsidiária e a norma principal afora essa circunstância não vemos nenhum impedimento políticodogmático 46 Consentimento da vítima irrelevância É indiferente para a configuração do crime de perigo para a vida ou a saúde de outrem o eventual consentimento da vítima em razão da indisponibilidade dos bens jurídicos protegidos igualmente irrelevante é o motivo impulsionador da ação 47 Perigo para a vida ou para a saúde Expor a perigo a saúde de alguém é colocar em risco as suas funções vitais Essa exposição a perigo da saúde admitirá certamente certa graduação de tal sorte que o risco à saúde em grau mais intenso pode aproximarse do risco de eliminação da própria vida 48 Vida ou saúde dosimetria penal Essa distinção com certeza será somente uma questão de intensidade de graduação do risco criado e ante a equiparação legal deve ser objeto de valoração somente no momento da dosimetria penal pois inquestionavelmente a conduta que expõe a perigo a vida de alguém apresenta um desvalor do resultado muito superior àquela que põe em perigo a saúde 49 Crimes de abandono e maustratos No abandono de incapaz há a infração de um dever ou relação jurídica particular de cuidado guarda vigilância ou autoridade pressupondose que a vítima seja incapaz de defenderse do perigo decorrente do abandono no crime de abandono de recémnascido além da limitação e identificação de quem pode ser sujeito ativo e passivo é indispensável o fim especial de ocultar desonra própria no crime de maustratos há uma particular relação jurídica de autoridade guarda ou vigilância para o fim de educação ensino tratamento ou custódia 410 Perigo de vida e crimes de perigo comum O perigo produzido pela conduta do agente deve expor pessoa certa e determinada o que não impede que mais de uma pessoa possa ser exposta ao perigo desde que perfeitamente individualizadas Se no entanto o perigo recair sobre um número indeterminado de pessoas o crime poderá ser de perigo comum desde que adequado a um dos tipos descritos nos arts 250 a 259 do Código Penal 411 Subsidiariedade É crime subsidiário ficando subsumido por crime mais grave Se a vítima vier a morrer em decorrência desta ação o crime será homicídio culposo art 121 3º se chegar a sofrer lesão culposa o crime continuará sendo o deste artigo cuja pena é mais grave do que a daquele 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é representado pela consciência e vontade do perigo criado com a ação ou omissão sendo definido como dolo de perigo que poderá ser direto ou eventual O agente deve querer conscientemente o estado de perigo ou no mínimo admitilo assumindo o risco de produzilo 51 Elemento subjetivo não inclui dolo de dano O elemento subjetivo deste tipo penal como crime de perigo limita se à consciência e vontade de expor a vítima a grave e iminente perigo estando absolutamente excluído o dolo de dano ou seja eventual animus necandi ou animus laedendi caracterizará outro tipo penal e não este 52 Dolo de dano crime de dano Se o agente pretender por exemplo atingir a vida ou a saúde de alguém com sua ação estarseá diante de uma tentativa de homicídio ou tentativa de lesão corporal respectivamente A diferença está na natureza do dolo nesses casos o dolo será de dano 53 Dolo eventual admissibilidade O dolo eventual também pode configurarse O risco de criar com a ação ou omissão está presente na consciência do agente que apesar disso realiza a conduta e acaba colocando efetivamente em perigo a vida ou a saúde de outrem Determinado agente por exemplo pode praticar certa ação que pode criar uma situação de perigo devidamente previsto Apesar de não querêlo não se abstém ou na linguagem do Código Penal age assumindo o risco de produzilo 6 Exclusão do crime Não se configura o crime de perigo para a vida ou a saúde de outrem quando o sujeito passivo tem o dever legal de enfrentar o perigo como é o caso dos bombeiros policiais etc No entanto essa exclusão não é absoluta pois na hipótese em que o perigo extrapolar os limites os riscos inerentes às atividades poderá eventualmente existir uma figura delituosa 61 Atividades perigosas limites Mesmo nessas atividades perigosas há um limite que se pode exigir do cidadão pois a ordem jurídica não pode pretender atos heroicos do ser humano Quando o indivíduo em qualquer dessas atividades é exposto a perigo que ultrapassa os limites razoáveis ou desproporcionais às suas forças pode ser reconhecido como sujeito passivo do crime de perigo para a vida e a saúde de outrem 62 Dever e poder agir O poder agir é um pressuposto básico de todo comportamento humano É necessário que além do dever haja também a possibilidade física de agir ainda que com risco pessoal 7 Consumação e tentativa 71 Consumação Consumase o crime de perigo para a vida ou a saúde de outrem com o surgimento efetivo do perigo Se sobrevier a morte da vítima o agente responderá por homicídio culposo em razão da subsidiariedade do crime de perigo Sobrevindo lesão corporal o agente não responderá pela modalidade culposa cuja sanção penal é inferior desde que tenha sido demonstrado a existência do dolo de perigo Na condução de veículo No entanto se a exposição a perigo ocorrer na condução de veículo automotor sobrevindo a lesão corporal o agente responderá por lesão corporal culposa sanção mais grave ou se se tratar de lesão corporal majorada nos termos do art 129 7º do CP 72 Tentativa admissibilidade Eventualmente pode ocorrer tentativa embora de difícil configuração Apesar da dificuldade para demonstrar a sua ocorrência é possível teoricamente a tentativa apesar de tratarse de crime de perigo Tentativa de lesão e crime de perigo O crime de exposição a perigo da vida ou da saúde e o crime que objetiva lesar a saúde ou a integridade física são orientados por elementos subjetivos distintos a tentativa de lesão é orientada pelo dolo de dano animus laedendi e no crime de exposição a perigo da vida ou da saúde o dolo é de perigo Tentativa branca Nos casos de tentativa branca e crime de exposição a perigo vida ou saúde o grande traço distintivo limitase ao elemento subjetivo quem por exemplo percebe a determinada distância alguém disparando um tiro contra outrem errando o alvo deverá ficar em uma dúvida atroz afinal estará diante de uma tentativa de homicídio tentativa de lesões corporais ou de uma hipótese do art 132 Os aspectos objetivos são exatamente iguais arma disparo eficácia da arma risco da vítima etc A única diferença residirá exatamente no elemento subjetivo 8 Classificação doutrinária Tratase de crime comum não exigindo nenhuma qualidade ou condição especial dos sujeitos ativo ou passivo é formal consumandose com a simples realização da conduta típica independentemente da produção de qualquer resultado pois se trata de crime de perigo É crime de perigo concreto que não se presume exigindo a sua comprovação É crime doloso de ação livre instantâneo comissivo ou omissivo simples e essencialmente subsidiário 9 Forma culposa Não há previsão de modalidade culposa Mas se sobrevier o dano efetivamente responderá o agente conforme o caso por lesão corporal culposa somente se for aquela prevista no Código de Trânsito Brasileiro ou homicídio culposo 10 Lesão corporal seguida de morte É inadmissível residualmente a lesão corporal seguida de morte pela absoluta ausência do dolo de dano que seria indispensável no crime precedente lesão corporal Por isso a eventual morte da vítima embora precedida de enfermidade decorrente da conduta do agente não tem o condão de qualificar como resultado mais grave a conduta antecedente do agente 11 Figura majorada Embora se trate de simples majorante seu conteúdo contém determinadas elementares que lhe dão características de um novo tipo penal derivado Assim só se configurará essa majorante se o transporte de pessoas destinarse à prestação de serviços em estabelecimentos de qualquer natureza Referido estabelecimento pode ser comercial industrial agrícola ou similar e ainda público ou privado Convém destacar que se o transporte de pessoas destinarse à prestação de serviços em outros locais que não em estabelecimentos como por exemplo em propriedades rurais sítios lavouras etc não estará tecnicamente configurada a elementar típica em estabelecimentos de qualquer natureza 111 Transporte de pessoas para estabelecimentos Embora se trate de simples majorante seu conteúdo contém determinadas elementares que lhe dão características de um novo tipo penal derivado Assim só se configurará essa majorante se o transporte de pessoas destinarse à prestação de serviços em estabelecimentos de qualquer natureza 112 Estabelecimento de qualquer natureza Referido estabelecimento pode ser comercial industrial agrícola ou similar e ainda público ou privado Convém destacar que se o transporte de pessoas destinarse à prestação de serviços em outros locais que não em estabelecimentos como por exemplo em propriedades rurais sítios lavouras etc não estará tecnicamente configurada a elementar típica em estabelecimentos de qualquer natureza 113 Transportes com outra destinação Se o transporte de pessoas tiver outra destinação que não prestar serviços em estabelecimentos seja de lazer seja com objetivos religiosos ou políticos que frequentemente utilizam transportes inadequados não se configurará a majorante em exame A ausência de qualquer das elementares impede a realização do tipo penal 12 Pena e ação penal 121 Pena A pena é a detenção de três meses a um ano para a forma simples e para a figura majorada haverá a elevação obrigatória de um sexto a um terço A faculdade do magistrado limitase ao quantum de majoração dentre os limites fixados e não implica a possibilidade de deixar de aplicar a majoração a seu talante Na dosimetria penal deve se levar em consideração a distinção do grau de censura em razão do maior desvalor do resultado quando o perigo referirse à vida ou de menor desvalor quando a saúde for o bem exposto 122 Ação penal O crime de perigo para a vida ou a saúde de outrem é de ação penal pública incondicionada não se exigindo qualquer formalidade ou manifestação da vítima ou de seu representante legal 13 Questões especiais Se a intenção é causar dano à pessoa o crime será homicídio ou lesão dolosa Confrontar com o art 65 da Lei n 807890 CDC e com os arts 242 243 e 244 da Lei n 8069 ECA J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Arts 14 e 15 da Lei n 108262003 Em relação à configuração do delito disparo de arma de fogo trata a espécie de crime de perigo abstrato a situação de perigo é presumida diferenciandose assim do tipo penal descrito no art 132 do CP Perigo para a vida ou saúde de outrem Magistério de Cezar Roberto Bitencourt e Gilberto Thums As lições continuam atuais bastando para tanto comparar a redação da lei em vigor e da norma anterior O delito consumase portanto com o simples disparo de arma de fogo em lugar habitado ou suas adjacências em via pública ou em direção a ela Precedentes da Corte TJRS Apelação 70016896417 Rel Marco Aurélio de Oliveira Canosa j 3112008 Descabe falar em ocorrência do delito inscrito no art 132 do Código Penal quando o perigo situase no plano abstrato não ocorrendo qualquer ação que concretamente coloque em risco a integridade física ou a saúde de outrem STJ Apn 290PR Rel Min Félix Fischer j 1632005 Crime de perigo para a vida ou a saúde de outrem Art 132 do Código Penal As circunstâncias descritas na denúncia ocorrentes na empresa que o paciente dirige apontam para a configuração da objetividade do crime que é de perigo concreto Não é necessário esperar que suceda início de acidente grave para só aí ter como caracterizado o ilícito do art 132 do CP STF HC 80721SP Rel Min Néri da Silveira j 1042001 Abandono de incapaz Art 133 Abandonar pessoa que está sob seu cuidado guarda vigilância ou autoridade e por qualquer motivo incapaz de defenderse dos riscos resultantes do abandono Pena detenção de 6 seis meses a 3 três anos V arts 13 2º e 61 II f g e i do CP V arts 1566 IV 1634 1741 e 1774 do CC 1º Se do abandono resulta lesão corporal de natureza grave Pena reclusão de 1 um a 5 cinco anos V art 19 do CP 2º Se resulta a morte Pena reclusão de 4 quatro a 12 doze anos V art 19 do CP Aumento de pena 3º As penas cominadas neste artigo aumentamse de um terço V art 61 II e do CP I se o abandono ocorre em lugar ermo II se o agente é ascendente ou descendente cônjuge irmão tutor ou curador da vítima III se a vítima é maior de 60 sessenta anos Inciso III acrescentado pela Lei n 10741 de 1º de outubro de 2003 D O U T R I N A 1 Abandono de incapaz e de recémnascido O atual Código Penal preferiu tratar o abandono de incapaz em duas figuras distintas o abandono de incapaz art 133 que para muitos seria uma espécie de tipo fundamental e o abandono do recémnascido art 134 que seria a figura privilegiada praticada por motivo de honra Crimes de perigo e de dano A figura descrita no caput do art 133 é crime de perigo concreto pois é o próprio núcleo típico abandonar que exige que o risco seja efetivo real concreto As figuras preterdolosas ou qualificadas pelo resultado no entanto recepcionadas nos 1º e 2º são crimes de dano para aqueles que sustentam a vigência desses parágrafos mesmo depois da reforma penal de 1984 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido pela prescrição do art 133 é a segurança da pessoa humana o seu bemestar pessoal particularmente do incapaz de protegerse contra situações de perigo decorrentes de abandono 21 Irrelevância do consentimento do ofendido É irrelevante o consentimento do ofendido em razão da incapacidade para consentir do sujeito passivo e da indisponibilidade dos bens jurídicos protegidos a integridade física passou a bem jurídico relativamente disponível a partir do advento da Lei n 909995 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa que tenha especial relação de assistência e proteção com a vítima ou seja desde que a vítima esteja sob seu cuidado guarda vigilância ou autoridade Tratase por conseguinte de crime próprio que não pode ser praticado por quem não reúna essa circunstância especial Necessidade da relação de assistência A ausência dessa relação especial entre os sujeitos deste crime afasta a sua adequação típica podendo eventualmente configurar outra infração penal como por exemplo omissão de socorro abandono material abandono intelectual conforme o caso 32 Sujeito passivo Sujeito passivo pode ser qualquer pessoa que se encontre numa das relações antes referidas e não somente o menor Exigese do sujeito passivo a presença simultânea de dois requisitos fundamentais a incapacidade b relação de assistência com o sujeito ativo Incapacidade de defenderse do abandono É indispensável que o sujeito passivo além da incapacidade de enfrentar os riscos decorrentes do abandono encontrese numa das condições especiais da relação de assistência referidas no caput do art 133 É necessário que a vítima seja incapaz de defenderse dos riscos decorrentes do abandono 4 Tipo objetivo adequação típica Abandonar significa deixar desassistido desamparado incapaz de defenderse dos riscos resultantes do abandono que se encontre na especial relação de assistência já referida Punese o abandono da própria pessoa e não o abandono do dever de assistila É indiferente que o abandono seja temporário ou definitivo desde que seja por espaço juridicamente relevante isto é capaz de colocar a vítima em risco 41 Cuidado guarda vigilância e autoridade Cuidado significa a assistência a pessoas que de regra são capazes de valer a si mesmas mas que acidentalmente venham a perder essa capacidade Guarda é a assistência a pessoas que não prescindem dela e compreende necessariamente a vigilância Esta importa zelo pela segurança pessoal mas sem o rigor que caracteriza a guarda a que pode ser alheia Autoridade é a inerente ao vínculo de poder de uma pessoa sobre a outra quer a potestas seja de Direito Público quer de Direito Privado Hungria 42 Abandono do dever e abandono da pessoa Punese o abandono da própria pessoa e não o abandono do dever de assistila No caso de abandono o agente viola o dever de assistência que lhe incumbe contudo a transgressão desse dever é insuficiente para constituir o crime porque se pune o abandono da própria pessoa e não simplesmente o abandono do dever de assistila 43 Abandono temporário É indiferente que o abandono seja temporário ou definitivo desde que seja por espaço juridicamente relevante isto é capaz de colocar a vítima em risco Abandono de incapaz O crime consiste em colocar em perigo através de abandono alguém incapaz nas circunstâncias de protegerse dos riscos decorrentes do abandono e a quem o sujeito passivo encontrase vinculado por deveres de assistência e proteção Insuficiência do simples abandono O abandono por si só não realiza a figura típica sendo indispensável que dele resulte um perigo concreto para a vida ou a saúde do abandonado Tratase pois de perigo concreto que precisa ser comprovado Assim ainda que exista o abandono se o perigo não se concretizar quer pela intervenção imediata de terceiro quer pela superação do abandonado quer por qualquer outra razão não se poderá falar em crime Ausência de risco atipicidade Não haverá o crime se por exemplo ao abandonar a vítima o agente procura evitar o risco ficando na espreita aguardando e observando que alguém lhe preste o devido e eficaz socorro Igualmente não se configurará o crime se as circunstâncias demonstrarem que o abandonado não está exposto a risco algum Incapacidade circunstancial e transitória A incapacidade pode ser circunstancial e transitória e por isso pode abranger pessoas civilmente capazes que no entanto encontrem se eventualmente impossibilitadas e incapazes de defenderse por si sós dos perigos à vida e à saúde decorrentes do abandono Pode decorrer de determinada situação de fato que consista na falta de aptidão para a pessoa defender e cuidar de sua própria defesa Incapacidade fáticojurídica A incapacidade mais que fática é jurídica mais que anatômica é físicopsíquica mais que genética é normativa Em outros termos somente a situação concreta havendo a relação de assistência poderá determinar se há ou não a incapacidade de defesa do sujeito passivo 44 Incapazes de fato Tão incapazes são as crianças e os loucos quanto em determinadas condições os velhos os paralíticos os cegos os enfermos os bêbedos como qualquer pessoa que por qualquer motivo não possa defenderse do perigo a que fica exposta em razão do perigo 45 Dever de assistência pressuposto fático O dever de assistência deve existir antes da prática da conduta delituosa porque mais que elementar do tipo constitui seu verdadeiro pressuposto fático Se não houver a violação de nenhum dever especial de zelar pela segurança incolumidade ou defesa do incapaz o abandono não se adequa ao tipo penal art 133 46 Fontes da relação de dever As fontes dessa especial relação de dever de assistência e proteção podem provir de lei de convenção ou de situação anterior lícita ou ilícita criada pelo próprio agente O dever pode decorrer de uma norma de Direito de contrato de particular aceitação do dever por parte do agente ou de pura situação de fato que o tenha colocado na obrigação de assistir a vítima 47 Elementares do crime de abandono Por fim são elementares constitutivas do crime de abandono de incapaz a o abandono b a violação do especial dever de assistência c a superveniência efetiva de perigo concreto à vida ou à saúde do abandonado d a incapacidade de defenderse da situação de perigo e a vontade e a consciência de abandonar incapaz expondoo a perigo 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo deste crime é o dolo de perigo representado pela vontade e consciência de expor a vítima a perigo através de abandono O dolo pode ser direto ou eventual Neste caso o agente deve pelo menos aceitar o risco de perigo concreto para a incolumidade pessoal do abandonado 51 Dolo de dano e dolo de perigo O dolo de dano exclui o dolo de perigo e altera a natureza do crime passando a ser de dano tentativa ou consumação homicídio infanticídio lesão corporal etc 52 Especial fim de agir inexistência Não há exigência de qualquer fim especial de agir sendo equivocada a afirmação de alguns doutrinadores de que este tipo penal exige dolo específico Se contudo houver concretamente a presença de um especial fim de agir provavelmente irá configurarse outro crime 6 Consumação e tentativa 61 Consumação Consumase este crime com o abandono efetivo do incapaz desde que este corra perigo real efetivo isto é concreto ainda que momentâneo pois é irrelevante a duração do abandono ou melhor da situação de perigo provocada pelo abandono Se o agente eventualmente reassumir mesmo após alguns instantes o seu dever de assistência socorrendo a hipotética vítima ainda assim o crime já estará consumado Demonstração da ocorrência de perigo É indispensável que fique demonstrado que a vítima efetivamente ficou exposta a perigo pois o perigo abstrato ou meramente presumido não tipifica este crime A eventual superveniência de dano não é abrangida pelo dolo sob pena de configurar outra infração penal 62 Tentativa admissível Teoricamente é possível a tentativa especialmente na forma comissiva ainda que de difícil configuração A consumação realizase num só momento embora a situação criada possa prolongarse no tempo Isso não impede que possa haver um iter criminis que pode ser interrompido a qualquer momento possibilitando em outros termos a tentativa Intervenção de terceiros tentativa configurada O agente pode abandonar alguém por exemplo nas circunstâncias descritas pelo tipo penal mas a pronta e imediata intervenção de terceiros pode impedir que o risco se concretize ou ainda como exemplificava Altavilla quando a mãe vai expor o filho ao abandono mas no seu caminho é surpreendida e impedida de realizar o seu intento Fuga do incapaz atipicidade Se é o próprio incapaz que foge da vigilância e assistência colocandose consequentemente em situação de abandono não configurará o crime uma vez que faltará a conduta do responsável capaz de produzir o desamparo da vítima criandolhe o risco efetivo Espreita do agente atipicidade Não haverá crime segundo preconizava Carrara pela ausência de perigo concreto quando o agente ocultandose fica na expectativa de que alguém recolha o exposto assim agindo para em caso contrário reassumir a assistência devida 63 Desistência voluntária e arrependimento eficaz Por outro lado acreditamos que esta figura típica na sua modalidade fundamental é incompatível com a desistência voluntária e o arrependimento eficaz em razão da sua natureza de crime de perigo 7 Classificação doutrinária Abandono de incapaz é crime de perigo concreto não admitindo simples presunção próprio pois exige somente aqueles indivíduos que apresentarem o vínculo representado por especial relação de cuidado guarda vigilância ou autoridade podem ser sujeitos ativo e passivo deste crime instantâneo com efeitos permanentes pois a despeito de consumarse de pronto muitas vezes após a consumação do crime pode persistir a situação de perigo independentemente da vontade ou de nova atividade do agente comissivo ou omissivo e somente doloso 8 Formas qualificadas Há duas figuras qualificadas 1º e 2º se do abandono resultar a lesão corporal de natureza grave e b se resultar a morte da vítima Ambas representam crimes preterdolosos cujos resultados mais graves devem ser no mínimo provenientes de culpa art 19 Há ainda duas hipóteses de majorantes previstas no 3º Garantidor privilegiado Na verdade quem abandona incapaz com o qual tem especial relação de assistência ou proteção cria com a sua conduta o risco da ocorrência do resultado e nesse caso assume a condição de garantidor mas na hipótese deste artigo um garantidor privilegiado pois não responde pelo resultado como prevê o art 13 2º c 81 Majoração de pena O 3º encarregase de prever a elevação de um terço da pena aplicada se a o abandono ocorre em lugar ermo b o agente é ascendente ou descendente cônjuge irmão tutor ou curador da vítima Os antigos doutrinadores referiamse nesse caso a agravantes especiais Tratase de uma causa de aumento pois estabelece a quantidade de aumento no caso fixa de um terço Lugar ermo Lugar ermo é o local geograficamente considerado habitualmente solitário Não basta que eventualmente o lugar se encontre isolado ou não frequentado Tratandose de um elemento normativo é fundamental ser cauteloso em sua análise pois as circunstâncias fáticas temporais e espaciais é que deverão indicar se o lugar pode ser tido como ermo Local eventualmente frequentado Para que haja a agravante é necessário que no momento do abandono o lugar habitualmente solitário não esteja por exceção frequentado pois em tal eventualidade deixa de apresentarse a ratio essendi da agravante isto é a maior gravidade do perigo consequente ao abandono Fundamento da majoração da pena O fundamento da majoração da pena em se tratando de lugar ermo residente na maior dificuldade ou quem sabe até impossibilidade de o incapaz encontrar socorro O isolamento do local aumenta a probabilidade de dano e intensifica a situação de perigo Non bis in idem elementares e qualificadoras A majoração deixará de existir se qualquer das figuras elencadas constituir elementar do tipo ou sua qualificadora como pode ocorrer por exemplo no crime de infanticídio Não se aplica igualmente a agravante do art 61 II e para se evitar o bis in idem Princípio da consunção uma única majoração Se o abandono for praticado por qualquer das pessoas relacionadas no inciso II do 3º do art 133 em lugar ermo ao contrário do que afirmam alguns doutrinadores o princípio da consunção obriga a que a majoração da pena se proceda uma única vez 82 Causa de aumento assegurada pelo Estatuto do Idoso Acompanhando os objetivos do Estatuto do Idoso é natural que crime praticado contra pessoa como tal considerada represente maior gravidade e seja considerado merecedor de resposta penal majorada a despeito de discordarmos da fixação legal para o início da velhice especialmente quando a ciência comprova o aumento da longevidade das pessoas e a própria aposentadoria é consideravelmente alterada Enfim o marco inicial da velhice é legal maior de sessenta anos A idade de sessenta anos pela nova redação não autoriza a majoração penal 9 Forma culposa Não há modalidade culposa No entanto se em decorrência de abandono culposo que é impunível resultarem danos para a vítima o agente responderá por eles como por exemplo se for o caso por lesão corporal culposa ou homicídio culposo como crimes autônomos e não como formas qualificadas deste tipo penal 10 Pena e ação penal 101 Pena cominada Para a figura simples a pena é de detenção de seis meses a três anos para as qualificadas a pena é de reclusão de um a cinco anos se resulta lesão corporal de natureza grave e de quatro a doze anos se resulta a morte Quaisquer dessas penas serão elevadas em um terço se houver qualquer das hipóteses previstas no 3º 102 Ação penal A ação penal é de natureza pública incondicionada não se exigindo qualquer formalidade para a sua instauração 11 Questões especiais Não configura o delito a mãe que por absoluta necessidade deixa os filhos trancados em casa para ir trabalhar fora A ausência do dever especial de assistência pode configurar o crime de omissão de socorro art 135 Tratase de crime próprio na medida em que exige especial relação de assistência entre os sujeitos do crime J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Abandono de incapaz Devidamente comprovado através das declarações das testemunhas de que o réu ausentouse de sua residência deixando criança de um ano e meio sozinha mantémse a condenação pelo delito do art 133 do CP TJRS Apelação 70017380957 Rel Elba Aparecida Nicolli Bastos j 30112006 Art 133 do Código Penal Abandono de incapaz Estado puerperal O puerpério não é causa de exclusão da responsabilidade penal eventualmente se devidamente provado poderá ser causa de diminuição da pena TJRS Apelação 70011093465 Rel Danúbio Edon Franco j 262005 Art 133 do Código Penal Viola o dever de zelar pela segurança do incapaz a mãe que deixa os filhos sem assistência desamparados largados afastandose do ambiente de proteção e deixandoos ao abandono concretizandose o perigo em face do princípio de incêndio Configurado o tipo do art 133 do Código Penal TJRS Apelação 70009792490 Rel Danúbio Edon Franco j 4112004 Abandono de incapaz com morte Tipo que repele a forma culposa Afastamento da agravante morte mantida a violação simples Óbito em UTI neonatal de recém nascido prematuro extremo É possível responsabilizar penalmente o médico integrante e equipe hospitalar pelo abandono de incapaz Absolvição pelo CRM que em matéria penal cumpre respeitar parcialmente ante a apresentação de relatório e conclusões médicas sobre a inviabilidade da sobrevida mesmo com a aplicação de recursos que a unidade envolvida não dispunha por isso e porque não há nos autos laudo médicolegal relacionando o resultado fatal ao cuidado que ao recémnascido não foi dado é que se afasta o 2º do tipo do art 133 a morte admitindose apenas a norma singela do caput desse articulado do CP TJRS Apelação 200105003419 Rel Rudi Loewenkron j 752002 Exposição ou abandono de recémnascido Art 134 Expor ou abandonar recémnascido para ocultar desonra própria Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos V arts 61 II e e h e 123 do CP 1º Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave Pena detenção de 1 um a 3 três anos V art 19 do CP 2º Se resulta a morte Pena detenção de 2 dois a 6 seis anos V art 19 do CP D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é a segurança do recémnascido que em nossa concepção conforme expusemos ao examinarmos o sujeito passivo só pode ser quem veio ao mundo há poucos dias não ultrapassando um mês e cujo nascimento não se tenha tornado de conhecimento público Aliás o crime definido neste dispositivo difere do anterior pelos sujeitos ativo e passivo pela motivação honoris causa e fundamentalmente pela ampliação do núcleo típico expor ou abandonar 11 Periclitação da vida e da saúde Em sentido amplo enfim podese afirmar que em termos genéricos aqui também se protege a vida e a integridade fisiopsíquica do recémnascido consoante denominação do Capítulo III da periclitação da vida e da saúde pelas razões e fundamentos que expusemos ao analisarmos o crime de abandono de incapaz 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo O sujeito ativo do crime de abandono de recémnascido somente pode ser a mãe crime próprio visto que objetiva ocultar desonra própria É indiferente que se trate de viúva ou adúltera como sustentava a antiga doutrina Mãe solteira Admitese a própria mulher solteira especialmente em casos de gravidez cada vez mais precoce que vêm acontecendo inclusive com préadolescentes As adolescentes e préadolescentes são excluídas pela inimputabilidade mas deverão receber a proteção do Estatuto da Criança e do Adolescente Mulher honrada É indispensável que se trate de mulher honrada cujo conceito social possa ser abalado pela prova de uma concepção aviltante caso contrário não haveria honra alguma para ocultar Não excluímos a priori a prostituta da possibilidade de também figurar como sujeito ativo do crime de abandono de recémnascido para ocultar desonra própria Para aprofundar ver nosso Manual de Direito Penal v 2 Parte Especial Pai incestuoso ou adúltero Damásio de Jesus Heleno Fragoso e Nélson Hungria entre outros admitem que o pai incestuoso ou adúltero também poderia praticar o crime Aníbal Bruno contrariamente não estendia essa legitimidade ao pai em qualquer circunstância Era razoável o entendimento dominante nos idos do início da década de quarenta Rigidez moral e união estável A rigidez moral no advento do século XXI não é a mesma das primeiras décadas do século XX quando qualquer mulher que desse à luz extramatrimonium era excomungada da sociedade civil Já não se fala mais em união conjugal mas em união estável não se mantêm mais amantes mas namorados casados e a própria legislação civil excluiu a distinção entre filiação legítima e ilegítima Pai incestuoso ou adúltero abandono de incapaz Não concordamos com a extensão do privilegium exceptum a eventual pai adúltero ou incestuoso O pai adúltero incestuoso ou a qualquer título imoral que expuser ou abandonar seu filho recém nascido responderá pelo crime do art 133 como abandono de incapaz sem qualquer privilégio Marido da mulher infiel O marido da mulher infiel que abandonar o recémnascido adulterino tampouco gozará do privilégio Essa exclusão se fundamenta basicamente no fato de que se trata de crime próprio e à semelhança do infanticídio somente a mãe pode ser sujeito ativo do crime de abandono de recémnascido 22 Sujeito passivo O sujeito passivo é o recémnascido com vida fruto de relações extramatrimoniais Ao contrário do nosso diploma legal o Código Rocco italiano estabelece que o abandono deve ocorrer imediatamente após o parto Definição de recémnascido Ante a imprecisão do Código mas atento à finalidade do dispositivo preferimos admitir como sujeito passivo alguém nascido há poucos dias não ultrapassando um mês e desde que não se tenha tornado de conhecimento público Para Magalhães Noronha recém nascido é o que nasceu há poucos dias 3 Tipo objetivo adequação típica Expor a perigo é exercer uma atividade sobre a vítima transportandoa no espaço da situação de segurança mais ou menos efetiva em que se encontrava para lugar onde ficará sujeita a risco contra a sua incolumidade pessoal O abandono é por sua vez impropriamente um não fazer Neste caso o agente não transporta a vítima de um para outro lugar onde venha a ficar em perigo Recusase apenas a prestarlhe os cuidados de que necessita Abandono omissão de socorro ou assistência Para caracterizar o abandono não é necessário o afastamento propriamente dito Basta que não se dê o socorro ou a assistência como se deve e lhe é possível fazer criando por esse meio o perigo Enfermeiro abandono de enfermo O enfermeiro por exemplo que está presente mas deliberadamente não presta ao doente grave que assiste os cuidados devidos configura se o crime porém não pela falta ao cumprimento do dever mas por abandono de enfermo com os riscos que daí decorrem Exposição ou abandono Tratarse de exposição ou de abandono é irrelevante o essencial no fato é que o recémnascido por obra da mãe seja posto em situação de risco para a saúde ou a vida Admitemse duas formas de conduta um crime por atividade por exposição em sentido estrito e um crime omissivo por abandono Nascimento sigiloso Falar em nascimento sigiloso nos parece um rematado exagero Não há exigência legal A finalidade de ocultar a gravidez por questões de honra não precisa ir além da cautela de não tornar público tanto o estado gravídico quanto o nascimento do neonato mas isso está muito distante de ser sigiloso Honra sexual aporia Não aceitamos a adjetivação de honra sexual Na verdade a concepção fruto de uma relação espúria em regra extramatrimonial atinge um universo éticomoral muito maior A desonra que se pretende ocultar abrange todo um universo cultural que pode chocar se com o conhecimento de um fruto proibido que certamente receberia a sanção da censura social Reincidência de abandono de recémnascido Eventual repetição da ação de abandonar recémnascido para ocultar desonra própria não configura a proibição descrita no art 134 Essa exclusão não resulta da condenação anterior mas da publicidade e repercussão que o fato anterior produziu não havendo mais honra a proteger honra no sentido utilizado pelo texto legal Abandono de gêmeos Na hipótese de gêmeos o privilégio somente se justifica se a mãe abandonar todos caso contrário responderá pelo crime do art 133 pois o abandono não teria sido para ocultar desonra própria Abandono de gêmeos concurso formal Abandonando gêmeos a responsabilidade penal será na modalidade de concurso de crimes que poderá ser formal ou material segundo as circunstâncias Orgulho injustificado e mulher devassa Estão excluídos do tipo privilegiado o orgulho injustificado a concepção de eventual matrimônio anulado ou mesmo a mulher devassa que já não tem honra a defender As ações praticadas nessas circunstâncias ainda que a vítima seja um recémnascido somente poderão tipificar o crime do artigo anterior cuja pena é mais grave Incapacidade de defesa A incapacidade de autodefesa do recémnascido é de presunção absoluta embora não o seja o perigo decorrente do abandono que precisa ser demonstrado 4 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo geral deste crime a exemplo do abandono de incapaz é o dolo de perigo representado pela vontade e consciência de abandonar o recémnascido expondoo a perigo O dolo de dano exclui o dolo de perigo e altera a natureza do crime passando a ser de dano tentativa ou consumação homicídio infanticídio lesão corporal etc Elemento subjetivo especial ocultar desonra própria Exige no entanto um elemento subjetivo especial do tipo qual seja o especial fim de agir que é ocultar desonra própria logo é indispensável que o nascimento do neonato não seja do conhecimento público isto é do conhecimento de outras pessoas fora do ambiente familiar Qualquer outra finalidade atipicidade Se a causa do abandono do recémnascido for qualquer outra que não a ocultação de desonra própria o crime poderá ser o abandono de incapaz art 133 Dolo eventual improvável O dolo a nosso juízo dificilmente poderá ser eventual A exigência típica de um fim especial dificulta tornando quase impossível a configuração de dolo eventual 5 Consumação e tentativa 51 Consumação Consumase este crime com o abandono efetivo do recémnascido desde que este corra perigo efetivo isto é concreto ainda que momentâneo pois é irrelevante a duração do abandono ou melhor da situação de perigo provocada pelo abandono Se a mãe eventualmente reassumir mesmo após alguns instantes o seu dever de guarda e assistência socorrendo o recémnascido ainda assim o crime já estará consumado 52 Tentativa admissibilidade A consumação realizase num só momento embora a situação criada possa prolongarse no tempo Isso não impede que possa haver um iter criminis a exemplo do abandono de incapaz que pode ser interrompido a qualquer momento possibilitando em outros termos a tentativa O agente pode abandonar um recémnascido por exemplo nas circunstâncias descritas pelo tipo penal mas a pronta e imediata intervenção de alguém pode impedir que o risco se concretize Necessidade da ocorrência de perigo É necessária a demonstração de efetivo perigo pois a despeito de sua tenra idade o perigo pode ter sido evitado pela empregada familiares ou terceiros que imediatamente recolham o abandonado À evidência que nesse caso com a intervenção de terceiro estaríamos diante de tentativa Superveniência de dano A eventual superveniência de dano não é abrangida pelo dolo sob pena de configurar outra infração penal que havendo a influência do estado puerperal poderá configurar o infanticídio caso contrário será homicídio Ocultação do agente ausência de perigo Igualmente não haverá crime pela ausência de perigo concreto quando o agente ocultandose fica na expectativa de que alguém recolha o exposto assim agindo para em caso contrário reassumir a assistência devida 6 Classificação doutrinária Abandono de recémnascido é crime de perigo concreto não admitindo simples presunção próprio pois exige somente a mãe para evitar desonra própria pode ser sujeito ativo deste crime e somente o recémnascido ser sujeito passivo instantâneo com efeitos permanentes pois a despeito de consumarse de pronto muitas vezes após a consumação do crime pode persistir a situação de perigo independentemente da vontade ou de nova atividade do agente comissivo ou omissivo próprio e impróprio e somente doloso com a presença do elemento subjetivo especial do tipo representado pelo fim específico de ocultar desonra própria Essa exigência típica de um fim especial impede a possibilidade da configuração de dolo eventual 7 Formas qualificadas Há duas figuras qualificadas 1º e 2º se do abandono resultar a lesão corporal de natureza grave e b se resultar a morte da vítima Ambas representam crimes preterdolosos cujos resultados mais graves devem ser no mínimo provenientes de culpa art 19 8 Forma culposa Não há modalidade culposa No entanto se em decorrência de abandono culposo resultarem danos para a vítima o agente responderá por eles como se for o caso por lesão corporal culposa ou homicídio culposo como crimes autônomos e não como formas qualificadas deste tipo penal 9 Pena e ação penal 91 Pena cominada Para a figura simples detenção de seis meses a dois anos para as qualificadas para os que entendem que os dois parágrafos do art 134 continuam em vigor mesmo depois da reforma penal de 1984 a pena é de detenção de um a três anos se resulta lesão corporal de natureza grave e de dois a seis anos se resulta a morte 92 Ação penal A ação penal a exemplo do que ocorre com o similar crime de abandono de incapaz é pública incondicionada não se exigindo qualquer manifestação do ofendido ou de seu representante legal 10 Questões especiais Constitui figura privilegiada em relação à do art 133 pelo especial fim de ocultar desonra própria Estão excluídos do tipo o orgulho injustificado concepção de eventual matrimônio anulado ou mesmo a mulher devassa Essas ações respectivas ainda que a vítima seja um recémnascido tipificarão o crime do artigo anterior com pena mais grave A incapacidade de autodefesa do recémnascido é de presunção absoluta J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A O simples intuito de ocultar a desonra não desconfigura o delito de abandono de recémnascido TACrimSP Apelação 194399 Rel Onei Raphael j 2731979 Omissão de socorro Art 135 Deixar de prestar assistência quando possível fazê lo sem risco pessoal à criança abandonada ou extraviada ou à pessoa inválida ou ferida ao desamparo ou em grave e iminente perigo ou não pedir nesses casos o socorro da autoridade pública Pena detenção de 1 um a 6 seis meses ou multa V arts 13 2º e 61 II h do CP Parágrafo único A pena é aumentada de metade se da omissão resulta lesão corporal de natureza grave e triplicada se resulta a morte D O U T R I N A 1 Crime omissivo definição O crime omissivo consiste sempre na omissão de determinada ação que o sujeito tinha obrigação de realizar e que podia fazêlo O crime omissivo dividese em omissivo próprio e omissivo impróprio Os primeiros são crimes de mera conduta enquanto os segundos os omissivos impróprios são crimes de resultado Crimes omissivos próprios Os crimes omissivos próprios ou puros consistem numa desobediência a norma mandamental norma esta que determina a prática de uma conduta que não é realizada Há portanto a omissão de um dever de agir imposto normativamente Crime omissivo sem resultado Nestes crimes omissivos basta a abstenção é suficiente a desobediência ao dever de agir para que o delito se consume O resultado que eventualmente surgir dessa omissão será irrelevante para a consumação do crime podendo apenas configurar uma majorante que alguns doutrinadores sem primar pela correção técnica denominam genericamente como qualificadora Eventual resultado simples majorante Pode acontecer porém que a pessoa em perigo à qual foi omitido socorro venha a sofrer uma lesão grave ou até morrer Neste caso o agente continua sendo responsabilizado por crime omissivo próprio isto é pela simples omissão O eventual resultado morte ou lesão grave nessa hipótese constituirá somente uma majorante a ser considerada no momento da aplicação da pena Omissivos próprios tipologia específica Os crimes omissivos próprios são obrigatoriamente previstos em tipos penais específicos em obediência ao princípio da reserva legal dos quais são exemplos típicos os previstos nos arts 135 244 269 etc Os crimes omissivos impróprios por sua vez como crimes de resultados não têm uma tipologia própria inserindose na tipificação comum dos crimes de resultado como o homicídio a lesão corporal etc Omissivos impróprios causalidade jurídica Na verdade nestes crimes não há uma causalidade fática mas jurídica onde o omitente devendo e podendo não impede o resultado Convém destacar desde logo que o dever de evitar o resultado é sempre decorrente de uma norma jurídica não o configurando deveres puramente éticos morais ou religiosos 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é a preservação da vida e da saúde do ser humano e o fundamento da criminalização da omissão de socorro é o desrespeito ao dever de solidariedade humana um princípio moral erigido por este dispositivo à condição de dever jurídico Essa previsão legal tornou imperativo o auxílio a quem mesmo sem nossa culpa encontrese em situação de perigo e do qual não possa defender se sozinho 21 Fonte dever geral Tratase de um dever geral que se destina a todos objetivando a assistência recíproca necessária na sociedade dos tempos modernos A contrario sensu se a omissão violar algum dever especial constituirá outro crime e não este Dever geral obrigação solidária A assistência de um desobriga aos demais contudo como a obrigação é solidária se a intervenção daquele for insuficiente ou inexitosa os outros continuam obrigados e sua abstenção constituirá o crime omissivo 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa não requerendo nenhuma condição particular pois o dever genérico é de não se omitir O sujeito ativo deve estar no lugar e no momento em que o periclitante precisa do socorro caso contrário se estiver ausente embora saiba do perigo e não vá ao seu encontro para salválo não haverá o crime pois o crime é omissivo e não comissivo 32 Sujeito passivo Sujeito passivo do crime de omissão de socorro somente pode ser a criança abandonada ou extraviada b pessoa inválida ou ferida desamparada ou c qualquer pessoa em grave e iminente perigo Criança abandonada Criança abandonada é aquela que foi exposta ou deixada em algum lugar por seus responsáveis entregue à própria sorte sem condições de prover sua própria subsistência enfim a que foi deixada ao desamparo Omissão de socorro e abandono de incapaz Este crime não se confunde com os de abandono de incapaz ou abandono de recémnascido porque nestes é o próprio sujeito ativo que abandona a vítima enquanto no crime de omissão de socorro o sujeito ativo já encontra a criança abandonada ou extraviada e não lhe presta socorro ou assistência Criança extraviada Criança extraviada é aquela que perdeu o rumo de casa está perdida não sabe onde reside nem voltar para tal lugar desconhece o caminho de volta Com efeito criança extraviada não se confunde com criança abandonada Criança idade máxima O Estatuto da Criança e do Adolescente ECA considera criança quem tiver menos de doze anos art 2º Sustentamos porém que a solução deverá continuar sendo casuística e que será criança para efeitos penais toda aquela que concretamente for incapaz de autodefesa Pessoa inválida ou ferida Pessoa inválida é aquela que por si mesma não pode prover a própria segurança e subsistência é aquela que é indefesa A invalidez pode decorrer das próprias condições pessoais congênitas ou adquiridas ou decorrer de acidentes velhice enfermidade cegueira paralisia aleijão etc pessoa ferida por sua vez é aquela que sofreu um dano ou lesão em sua integridade corporal acidental ou provocada e em consequência sofre perda orgânicofuncional Incapacidade de autodefesa É fundamental que tanto a invalidez quanto o ferimento eliminem a capacidade da vítima de autodefenderse Tanto a pessoa inválida quanto a ferida precisam encontrarse desamparadas ou seja sem possibilidade de exercer a própria defesa e sem quaisquer meios de proteção e assistência Qualquer pessoa em grave e iminente perigo Qualquer pessoa independentemente de ser criança abandonada ou extraviada ou pessoa inválida ou ferida desde que se encontre em grave e iminente perigo Não basta mera possibilidade ou simples presunção de perigo mas é necessária a probabilidade da sua ocorrência por outro lado é indispensável que seja grave isto é que exponha efetivamente a perigo a vida ou a saúde da vítima e ademais além de grave tem de ser iminente isto é prestes a acontecer Perigo de grandes proporções O perigo nesses casos deve ser de grandes proporções e prestes a desencadearse como por exemplo pessoa que se está afogando ou presa em qualquer coisa em vias de ser soterrada etc Oposição da vítima relevância relativa A oposição da vítima por si só não afasta o dever geral de prestar socorro salvo se essa oposição inviabilizar a assistência pois na linguagem do texto legal tornase impossível por serem os bens jurídicos protegidos indisponíveis ressalvado o disposto no art 88 da Lei n 909995 Criação da situação de perigo É indiferente em princípio quem criou a situação de perigo se a própria vítima terceiros ou fenômenos naturais etc No entanto se a situação de perigo foi criada pelo próprio omitente dolosa ou culposamente este se transforma em garantidor e responderá não simplesmente por crime de perigo mas por eventual resultado que advir da situação que criara nos termos do art 13 2º do CP 4 Tipo objetivo adequação típica O crime omissivo não se caracteriza pelo simples não fazer ou fazer coisa diversa mas pelo não fazer o que a norma jurídica determina A omissão de socorro segundo a dicção do texto legal pode ser praticada de duas formas direta ou imediata e indireta ou mediata ou seja o art 135 contém duas figuras típicas a deixar de prestar assistência b não pedir socorro a autoridade pública Na primeira modalidade o dever de assistência é pessoal e direto na segunda indireta há o dever de pedir socorro à autoridade competente A omissão somente tipifica o delito quando nas circunstâncias for possível prestar assistência ou pedir o socorro à autoridade pública sem risco pessoal Risco a terceiro exclusão da ilicitude Risco moral ou patrimonial não afasta a tipicidade da omissão Risco para terceiro não exclui a tipicidade mas poderá excluir a ilicitude por meio do estado de necessidade art 24 Destaquese que o perigo não pode ter sido provocado dolosa ou culposamente pelo sujeito ativo que nessa hipótese passaria à condição de garantidor art 13 2º c 41 Deixar de prestar assistência Quem se depara com a vítima nas circunstâncias descritas no tipo penal não pode deixar de prestarlhe imediata assistência somente se não puder prestála sem risco pessoal deve pedir socorro à autoridade Se a prestação de socorro expuser a risco terceira pessoa a omissão não excluirá a tipicidade mas certamente não constituirá fato antijurídico pois caracterizará estado de necessidade de terceiro Dever de assistência sem vínculo especial O dever de assistência no crime de omissão de socorro não está vinculado a relações jurídicas especiais como ocorre no crime de abandono de incapaz art 133 decorrendo da solidariedade humana que deve existir na coletividade para a autoproteção da vida e da saúde do ser humano Possibilidade sem risco pessoal Qualquer pessoa sem nenhuma qualidade ou condição especial está obrigada a prestar socorro desde que haja possibilidade de fazêlo sem risco pessoal à criança abandonada ou extraviada ou a pessoa inválida ou ferida ao desamparo ou em grave e iminente perigo ou não pedir nesses casos o socorro da autoridade pública 42 Não pedir socorro à autoridade pública O pedido deve ser imediato e necessário pois eventual atraso significará o descumprimento do dever de pedir socorro O pedido pode ser executado de qualquer forma desde que idônea para o fim a que se destina e que chegue o mais rápido possível à autoridade competente Assistência indireta subsidiária A assistência indireta é subsidiária e somente pode ser utilizada quando a direta não puder ser prestada sem risco pessoal ou quando o socorro da autoridade pública puder ser prestada com eficácia Se a urgência e a gravidade da situação de perigo não admitir demora tornando ineficaz o pedido à autoridade o sujeito ativo deverá prestar assistência direta sob pena de responder pela omissão de socorro Assistência direta ou indireta eficácia necessária A alternativa de prestar pessoalmente o socorro ou pedir à autoridade pública que o faça não depende exclusivamente do livre arbítrio do sujeito ativo caso contrário facilmente se poderia frustrar a proteção legal Na verdade a solicitação de socorro à autoridade pública somente exclui o crime quando a assistência dessa autoridade possa tempestivamente afastar o perigo Eficácia das duas assistências faculdade Quando no entanto o perigo puder ser afastado tanto pela ação direta do agente quanto pela ação da autoridade aquele o agente tem a faculdade de eleger a alternativa que lhe pareça melhor Não provocação do perigo pelo agente Destaquese que o perigo não pode ter sido provocado dolosa ou culposamente pelo sujeito ativo que nessa hipótese passaria à condição de garantidor art 13 2º c Autoridade pública Autoridade pública referida no texto legal é aquela que tem atribuição para intervir no caso como por exemplo policial bombeiro comissário de menores Ministério Público etc Possibilidade e ausência de risco pessoal A omissão somente tipifica o crime quando nas circunstâncias for possível prestar assistência ou pedir socorro à autoridade pública sem risco pessoal Possibilidade da conduta Poder agir é pressuposto básico de todo comportamento humano Também na omissão evidentemente é necessário que o sujeito tenha a possibilidade física de agir para que se possa afirmar que não agiu voluntariamente Dever e poder agir É insuficiente o dever de agir É necessário que além do dever haja também a possibilidade física de agir ainda que com risco pessoal Essa possibilidade física falta por exemplo na hipótese de coação física irresistível não se podendo falar em omissão penalmente relevante porque o omitente não tinha a possibilidade física de agir Sem risco pessoal A possibilidade de prestar socorro deve existir sem que o agente se exponha a risco pessoal O Estado não tem o direito de obrigar ninguém a ser herói ou seja a sacrificarse por solidariedade humana Seria paradoxal desumano e não raro ineficaz exigir que alguém sacrificasse a própria vida para salvar a alheia Risco de dano físico à pessoa O risco porém deve afetar a pessoa física Assim se o risco for puramente patrimonial ou moral não excluirá o crime Estes riscos poderão eventualmente caracterizar estado de necessidade afastando dessa forma a antijuridicidade mantendose a tipicidade Assim portanto sendo impossível prestar socorro sem risco pessoal a omissão de socorro será atípica Risco moral ou patrimonial irrelevância O risco moral ou patrimonial não afasta a tipicidade da omissão Risco para terceiro igualmente não exclui a tipicidade mas poderá excluir a ilicitude por meio do estado de necessidade art 24 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo deste crime é o dolo de perigo representado pela vontade de omitir com a consciência do perigo isto é o dolo deve abranger a consciência da concreta situação de perigo em que a vítima se encontra O dolo poderá ser eventual por exemplo quando o agente com sua conduta omissiva assume o risco de manter o estado de perigo preexistente Dolo de perigo É necessário que o dolo abranja somente a situação de perigo o dolo de dano exclui o dolo de perigo e altera a natureza do crime Assim se o agente quiser a morte da vítima responderá por homicídio Especial fim de agir inexistência Este crime não exige elemento subjetivo especial do tipo qual seja o especial fim de agir que se existir poderá descaracterizar a omissão de socorro dando origem a outro tipo penal 6 Concurso de pessoas nos crimes omissivos Os crimes omissivos próprios em nossa concepção admitem tanto a coautoria quanto a participação em sentido estrito A distinção entre coautoria e participação deve ser encontrada na definição desses dois institutos e não na natureza do crime omissivo ou comissivo Coautoria em crime omissivo Se duas pessoas deixarem de prestar socorro a uma pessoa gravemente ferida podendo fazêlo sem risco pessoal praticarão individualmente o crime autônomo de omissão de socorro Agora se essas duas pessoas de comum acordo deixarem de prestar socorro nas mesmas circunstâncias serão coautoras do crime de omissão de socorro Participação em sentido estrito A participação também pode ocorrer nos chamados crimes omissivos impróprios comissivos por omissão mesmo que o partícipe não tenha o dever jurídico de não se omitir Claro se tivesse tal dever seria igualmente autor ou coautor se houvesse a resolução conjunta de se omitir É perfeitamente possível que um terceiro que não está obrigado ao comando da norma instigue o garante a não impedir o resultado 7 Consumação e tentativa Consumase a omissão de socorro no lugar e no momento em que a atividade devida tinha de ser realizada isto é onde e quando o sujeito ativo deveria agir e não o fez A consumação realizase num só momento embora a situação criada possa prolongarse no tempo Tentativa inadmissível A omissão de socorro crime omissivo próprio ou puro por excelência não admite a tentativa pois não exige um resultado naturalístico produzido pela omissão Tratase de crime de ato único unissubsistente que não admite fracionamento Se o agente deixa passar o momento em que devia agir consumouse o delito se ainda pode agir não se pode falar em crime Até o momento em que a atividade do agente ainda é eficaz a ausência desta não constitui crime Tentativa no omissivo impróprio Tratandose de crime omissivo impróprio ao contrário como a omissão é forma ou meio de se alcançar um resultado a consumação ocorre com o resultado lesivo e não com a simples inatividade do agente como nos delitos omissivos puros Naqueles que produzem resultado naturalístico ao contrário dos omissivos próprios admitem tentativa 8 Classificação doutrinária A omissão de socorro é crime omisso próprio e instantâneo consumandose com a simples abstenção da conduta devida no instante em que o sujeito omite a prestação de socorro independentemente da produção de qualquer resultado tratase de crime de perigo pois se visar dano será alterada a tipificação da conduta crime comum que pode ser praticado por qualquer pessoa independentemente de condição ou qualidade especial do sujeito ativo doloso não havendo previsão da modalidade culposa O erro porém quanto à existência do perigo quanto à possibilidade da conduta ou quanto à existência de risco pessoal exclui o dolo 9 Formas qualificadas Não há omissão qualificada pois a omissão é crime de perigo e eventual resultado qualificador a transformaria em crime de dano Na verdade eventual resultado decorrente da omissão lesão grave ou morte não constitui formas qualificadas mas circunstâncias de aumento de pena isto é majorantes 10 Figuras majoradas Eventual resultado decorrente da omissão lesão grave ou morte não constitui forma qualificada Com efeito a superveniência de lesão corporal grave ou morte da vítima constitui uma majorante que deve ser apreciada no momento da aplicação da pena Lesão corporal e homicídio culposos Nos casos de homicídio culposo e lesão corporal culposa a omissão de socorro não constitui crime autônomo mas sim majorante daqueles arts 121 4º e 129 7º Norma especial 101 Relação de causalidade Nas figuras majoradas mesmo que a omissão de socorro seja um crime omissivo próprio que se consuma com a simples inatividade neste caso é indispensável que se analise a relação de causalidade 11 Forma culposa Não há forma culposa O erro quanto à existência do perigo exclui o dolo No entanto sobrevindo dano lesão corporal ou morte o agente responderá pelo crime culposo art 20 e 1º 12 Pena e ação penal A sanção aplicável é alternativamente detenção de um a seis meses ou multa para a conduta tipificada no caput do art 135 Se em razão da omissão sobrevier lesão corporal de natureza grave a pena será majorada de metade se sobrevier a morte será triplicada Majorantes fixas As majorações são fixas não permitindo ao magistrado adotar outros percentuais de aumento para mais ou para menos Sua faculdade portanto limitase à dosimetria penal em relação ao caput que constitui a figura básica e ao reconhecimento ou não da majorante Assim fixada a pena ao crime de omissão de socorro se reconhecer uma das majorantes o limite de elevação está fixado ope legis Ação penal A ação penal é pública incondicionada sendo desnecessária qualquer condição de procedibilidade 13 Questões especiais Nos casos de homicídio culposo e lesão corporal culposa a omissão de socorro não constitui crime autônomo mas sim majorante daqueles arts 121 4º e 129 7º Havendo várias pessoas a assistência de uma delas exclui o dever das demais O risco pessoal iminente afasta a tipicidade da conduta omissiva não se caracterizando o crime J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Art 135 parágrafo único do Código Penal O contexto probatório não demonstra tenha o acusado praticado o delito de omissão de socorro à paciente que já tinha médica assistente TJRS Recurso Crime 71001515741 Rel Ângela Maria Silveira j 17122007 Art 135 do Código Penal Omissão de socorro em prestar assistência à pessoa gravemente ferida quando possível fazêlo sem risco pessoal Demonstrada conduta de desprezo pela vida da vítima e se tratando de réu reincidente com condenação por crimes contra a pessoa não se mostra adequada a substitução prevista no art 44 do Código Penal TJRS Recurso Crime 71001104777 Rel Alberto Delgado Neto j 2632007 Omissão de socorro A interrupção do atendimento médico devido ao paciente enquadrase na categoria da omissão prevista na norma penal do art 135 do CP TJRS Recurso Crime 71000735811 Rel Elaine Maria Canto da Fonseca j 1910 2005 Caracterizase a omissão de socorro se o motorista atropelante foge do local sem sequer tentar socorrer a vítima e sem provar que não o fez por ter sido impedido ou ameaçado por terceiros STJ REsp 161399SP Rel Min Anselmo Santiago j 24 111998 Código Penal art 135 Omissão de socorro É crime cujo sujeito ativo pode ser qualquer pessoa mesmo que não tenha o dever jurídico de prestar assistência Médicos clínicos que se recusam a atender doente grave de doença renal STF RHC 56395 Rel Min Antonio Neder j 881978 Maustratos Art 136 Expor a perigo a vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade guarda ou vigilância para fim de educação ensino tratamento ou custódia quer privandoa de alimentação ou cuidados indispensáveis quer sujeitandoa a trabalho excessivo ou inadequado quer abusando de meios de correção ou disciplina Pena detenção de 2 dois meses a 1 um ano ou multa V arts 13 2º a e 61 II f g e i do CP V arts 1566 IV 1634 1741 e 1774 do CC V art 4º b da Lei n 489865 abuso de autoridade 1º Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave Pena reclusão de 1 um a 4 quatro anos 2º Se resulta a morte Pena reclusão de 4 quatro a 12 doze anos 3º Aumentase a pena de um terço se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 quatorze anos 3º acrescentado pela Lei n 8069 de 13 de julho de 1990 V art 61 II h do CP V art 19 do CP V art 263 da Lei n 806990 Estatuto da Criança e do Adolescente D O U T R I N A Alteração o 3º foi acrescentado pela Lei n 806990 ECA 1 Bem jurídico tutelado Os bens jurídicos protegidos são a vida e a saúde da pessoa humana ou seja a integridade fisiopsíquica do ser humano especialmente daqueles submetidos à autoridade guarda ou vigilância para fins de educação ensino tratamento ou custódia O poder familiar deixou de ser um direito pleno em favor dos genitores e no interesse de quem o exerce transformandose em simples dever de proteção e direção não mais do que um meio para satisfazer seus deveres na medida em que o poder familiar é instituto em benefício da família como um todo 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo Sujeito ativo é somente quem se encontre na condição especial de exercer a autoridade guarda ou vigilância para fins de educação atividade destinada a aperfeiçoar a capacidade individual ensino ministrar conhecimentos visando a formação básica cultural tratamento cura e subsistência ou custódia detenção de uma pessoa para fim autorizado em lei Crime próprio Tratase de crime próprio que não pode ser praticado por quem não reúna essa circunstância especial A ausência dessa relação especial entre os sujeitos ativo e passivo deste crime afasta a sua adequação típica podendo eventualmente configurar outra infração penal como por exemplo a do art 132 Pai tutor curador professor Normalmente podem figurar como sujeito ativo deste crime pais tutores curadores professores diretores de instituições de ensino enfermeiros carcereiros entre outros pois são essas pessoas que em princípio podem exercer as atividades de autoridade guarda ou vigilância para fins de educação ensino tratamento ou custódia 22 Sujeito passivo Somente a pessoa que se encontre subordinada para fins de educação ensino tratamento ou custódia pode ser sujeito passivo Subordinação ou submissão para qualquer outra finalidade além dessas relacionadas no tipo não configurará o crime de maustratos Relação marital A mulher a despeito de com muita frequência ser vítima de maustratos segundo o linguajar popular não pode ser sujeito passivo deste crime tendo o marido ou companheiro como sujeito ativo pois não há nenhuma relação de autoridade guarda ou vigilância entre os cônjuges seja para educação ensino tratamento custódia ou qualquer outra finalidade Violência contra a mulher não configuração Quando o marido ou companheiro praticar violência contra a mulher no recesso do lar ou fora dele responderá por outro crime como por exemplo lesões corporais perigo para a vida ou a saúde de outrem etc A situação será a mesma em relação ao filho maior pois não há qualquer vínculo jurídico de subordinação entre pais e filhos maiores 3 Tipo objetivo adequação típica Várias condutas são tipificadas a privar de alimentação b privar de cuidados indispensáveis c sujeitar a trabalho excessivo ou inadequado d abusar de meios corretivos ou disciplinares Nas três primeiras modalidades o crime é permanente na última é instantâneo a privar de alimentação Para caracterizar os maustratos é suficiente a privação relativa de alimentos pois a privação total pode constituir meio de execução do crime de homicídio tentado ou consumado Logicamente que o crime pode ser perpetrado por meio da supressão absoluta da alimentação desde que seja por um período razoável e depois volte a ser ministrada normalmente ou mesmo em quantidade reduzida b privar de cuidados indispensáveis Significa privar dos cuidados mínimos necessários à preservação da vida ou saúde da pessoa de que se trata Esses cuidados podem ser materiais afetivos ou morais dependendo da idade estado de saúde condições de tempo e local entre outros Importam concretamente os riscos que a ausência de tais cuidados pode acarretar como por exemplo privar o menor de higiene atendimento médico agasalho no inverno etc c sujeitar a trabalho excessivo ou inadequado Será excessivo o trabalho que ultrapassar o limite das forças ou das capacidades da vítima ou que lhe causem cansaço além do suportável Será inadequado o trabalho que não for compatível com as condições físicoorgânicas da vítima ou com suas aptidões pessoais e profissionais de acordo com idade sexo compleição física etc O referencial para o exame da natureza excessiva e imprópria do trabalho é a própria vítima levandose em consideração condicionamento físico mental força muscular idade e sexo d abusar de meios corretivos ou disciplinares Significa aplicar castigos excessivos que coloquem em risco a vida ou a saúde da vítima Nas hipóteses anteriores o agente procede por grosseria irritabilidade espírito de malvadez prepotência ódio cupidez intolerância mas nesta última hipótese tem ele um fim em si mesmo justo isto é o fim de corrigir ou de fazer valer a sua autoridade O justo fim não autoriza o excesso de meio Direito de corrigir excesso Não se veda o direito de corrigir mas tão somente se proíbe o seu exercício abusivo A ação inicialmente é lícita o seu exercício abusivo é que a torna ilícita atingindo o nível de crime Natureza da relação de subordinação A especial relação de subordinação que vincula o sujeito passivo ao sujeito ativo pode decorrer do direito público privado ou mesmo administrativo A inexistência dessa relação vinculativa ou da finalidade prescrita no tipo exclui este crime O direito de correção dos pais O direito de correção conferido a pais tutores e curadores deve ser exercido com moderação e finalidade educativa sendo inadmissível o emprego de violência contra filho menor pupilo ou curatelado O corretivo aplicado pelo pai que resulta em leves escoriações ou hematomas não afetando a saúde do menor nem colocando em risco sua vida não caracteriza o excesso do ius corrigendi Excesso de tutor curador e professor A produção de escoriações ou hematomas decorrentes da conduta de tutor curador professores diretores de instituições de ensino enfermeiros carcereiros entre outros a nosso juízo configura o crime de maustratos e a diferença reside na distinção do grau de liberdade e intensidade das prerrogativas atribuídas aos pais em relação aos demais nominados Relação de subordinação elementar típica Para tipificar o crime de maustratos é indispensável a existência de uma relação de subordinação entre os sujeitos ativo e passivo isto é na dicção do texto legal uma relação de autoridade guarda ou vigilância para fim de educação ensino tratamento ou custódia Elementar especializante crime próprio Tratase de uma elementar típica especializante isto é que torna esta figura típica um crime próprio ou especial que só pode ser praticado por quem tenha uma das modalidades vinculativas elencadas com a vítima A ausência dessa especial relação de subordinação afasta a adequação típica mesmo que a conduta do sujeito ativo se dirija a um fim educativo corretivo ou disciplinar Finalidade da conduta Embora existindo a referida relação mas se a finalidade das condutas tipificadas não se destinar a educação ensino tratamento ou custódia o tipo penal deverá ser outro quem sabe o dos arts 132 129 ou 121 Não é necessário contudo que haja coabitação do sujeito ativo com a vítima nem que esta seja menor Definição das condutas tipificadas Educação abrange toda atividade com a finalidade de ampliar aperfeiçoar e acabar a formação individual sob o aspecto intelectual moral técnico ou profissional ensino consiste em ministrar conhecimentos que devem formar a base cultural do indivíduo que pode ser básico fundamental ou superior e podem ser praticados pelos pais professores instrutores técnicos ou não O ensino podese constatar é menos abrangente que a educação tratamento consiste não só no cuidado para a cura das moléstias como também no cuidado dispensado para a manutenção e subsistência das pessoas custódia deve ser entendido em sentido restrito como a detenção de uma pessoa para fim autorizado em lei Seria o caso por exemplo do carcereiro enfermeiro diretor do hospital etc 4 Tipo subjetivo adequação típica Além da vontade e da consciência de praticar o fato material é indispensável a consciência do abuso cometido Aliás a ausência dessa consciência afasta o dolo ocorrendo o conhecido erro de tipo Na verdade para configurar o dolo é indispensável que o agente tenha vontade e consciência da ação dos meios escolhidos e do excesso que pratica no exercício da atividade que desempenha autoridade guarda ou vigilância para o fim declinado no tipo qual seja de educação ensino tratamento ou custódia Elemento subjetivo dolo de perigo O elemento subjetivo deste tipo penal como crime de perigo limita se à consciência e vontade de expor a vítima a grave e iminente perigo estando absolutamente excluído o dolo de dano ou seja eventual animus necandi ou animus laedendi caracterizará outro tipo penal e não este Consciência do excesso À falta de consciência que se excede que abusa que ultrapassa os limites do razoável não se poderá falar em dolo Essa consciência ao contrário da consciência da ilicitude tem de ser atual isto é tem de existir efetivamente no momento da ação Dolo eventual admissibilidade É possível que o agente não queira expor a vítima a perigo isto é a exposição a perigo pode não ser objeto de sua vontade Contudo nessas circunstâncias é inevitável que pelo menos preveja a possibilidade com o excesso que pratica de expor a perigo a incolumidade da vítima Nesse caso prosseguindo na ação estará no mínimo assumindo o risco de colocála em perigo configurando o dolo eventual O risco de expor com a ação ou omissão está presente na consciência do agente que apesar disso realiza a conduta e acaba colocando efetivamente em perigo a vida ou a saúde de outrem 5 Consumação e tentativa 51 Consumação Consumase o crime com a exposição da vítima a perigo efetivo Logo é suficiente a probabilidade de dano sendo absolutamente desnecessária a ocorrência de qualquer resultado material No entanto tratase de crime de perigo concreto cuja ocorrência deve ser comprovada sendo inadmissível mera presunção Simples empurrão não configura maustratos A conduta descrita no art 136 do CP pretende punir quem coloca em risco a vida ou a saúde de alguém subordinado nas condições ali especificadas e para uma daquelas finalidades Simples empurrão ou mero tapa por mais antipedagógico que seja à primeira vista não configura o crime 52 Tentativa Apesar da dificuldade para demonstrar a sua ocorrência é possível teoricamente a tentativa desde que o eventus periculli não ocorra por circunstâncias estranhas à vontade do agente Quando o fato for suscetível de fracionamento isto é quando apresentar um iter criminis será perfeitamente possível a tentativa Maustratos por omissão tentativa inadmissível Será impossível a tentativa nas modalidades de privação de alimentos ou privação de cuidados indispensáveis que a nosso juízo exigem habitualidade no entanto naquelas modalidades em que um ato isolado é suficiente para consumarse a sua repetição caracterizará crime continuado 6 Classificação doutrinária Tratase de crime próprio pois exige vínculo especial entre os sujeitos ativo e passivo é formal consumandose com a simples realização da conduta típica independentemente da produção de qualquer resultado pois se trata de crime de perigo é crime de perigo concreto que não se presume exigindo a sua comprovação de ação múltipla ou de conteúdo variado pois pode ser praticado por mais de uma conduta perante a mesma vítima permanente nas modalidades de privação de alimentos privação de cuidados necessários e sujeição a trabalho excessivo ou inadequado na modalidade de abuso de correção o crime é em regra instantâneo mas eventualmente pode apresentarse de forma permanente doloso comissivo e omissivo 7 Formas qualificadas Duas formas qualificadas quando da exposição resulta a lesão corporal de natureza grave 1º ou b morte 2º Como crime qualificado pelo resultado o evento mais grave deve ser previsível art 19 Além das modalidades qualificadas a Lei n 806990 ECA criou uma majorante para a hipótese de vítima menor de quatorze anos 3º Lesão corporal leve irrelevância Sobrevindo lesão corporal leve o agente não responderá pela modalidade culposa cuja sanção penal é inferior somente detenção desde que tenha sido demonstrada a existência do dolo de perigo 8 Figura majorada menor de quatorze anos O Estatuto da Criança e do Adolescente Lei n 806990 acrescentou o 3º prevendo a elevação de um terço da pena em razão da menoridade da vítima É necessário que o sujeito ativo saiba que a vítima é menor de quatorze anos Como o texto legal fala em menor de quatorze anos se o fato ocorrer na data em que este completa essa idade a majorante não será aplicável 9 Forma culposa Não há modalidade culposa 10 Pena e ação penal 101 Penas cominadas A sanção penal é alternativa para a figura simples detenção de dois meses a um ano ou multa Para as figuras qualificadas reclusão de um a quatro anos se resulta lesão corporal de natureza grave 1º e de quatro a doze anos se resulta a morte 2º Haverá majorante de um terço se a vítima for menor de quatorze anos 3º As agravantes previstas no art 61 II e f e h não incidem pois são em princípio elementares do próprio tipo 102 Ação penal A ação penal é pública incondicionada sendo desnecessária qualquer condição de procedibilidade 11 Questões especiais A mulher agredida pelo marido não pode ser vítima deste crime em razão da inexistência de vínculo subordinativo e da finalidade respectiva exigidos pelo tipo em exame Entre cônjuges não há relação de subordinação As agravantes do art 61 II e f e h não incidem pois são elementares do próprio tipo J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Maustratos Enfermeiro Não Caracterização O delito do art 136 do Código Penal maustratos possui como tipo objetivo a privação de alimentação de cuidados especiais imposição de trabalho excessivo com abuso dos meios corretivos Na notícia vinculada à exordial narrase fatos desabonadores à conduta profissional do recorrente mas não fatos criminosos A expressão maustratos foi utilizada com significado comum e corriqueiro de falta de caridade ou solidariedade com o doente procedimento realmente deplorável a um enfermeiro porém não configurador do ilícito penal previsto no art 136 do Código Penal TJRJ RESE 3212007 Rel Antonio Carlos Amado j 1392007 Maustratos Legitimidade passiva ad causam Ao sócio que exerce a gerência de sociedade por cotas de responsabilidade limitada dedicada à exploração com fins lucrativos de clínica médica é cabível a imputação de autoria do delito tipificado no art 136 do Código Penal Não é inepta a denúncia que descreve adequadamente a conduta incriminada ainda que não detalhada individualmente se é possível ao denunciado compreender os limites da acusação e em contrapartida exercer ampla defesa O nexo causal que resulta da omissão é de natureza normativa e não naturalística de sorte que a omissão é erigida pelo Direito como causa do resultado porque quem tem o dever legal de evitálo não o faz STJ HC 23362RJ Rel Min Paulo Medina j 1º62004 A figura do inc II do art 1º da Lei n 945597 implica na existência de vontade livre e consciente do detentor da guarda do poder ou da autoridade sobre a vítima de causar sofrimento de ordem física ou moral como forma de castigo ou prevenção O tipo do art 136 do Código Penal por sua vez se aperfeiçoa com a simples exposição a perigo a vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade guarda ou vigilância em razão de excesso nos meios de correção ou disciplina Enquanto na hipótese de maustratos a finalidade da conduta é a repreensão de uma indisciplina na tortura o propósito é causar o padecimento da vítima Para a configuração da segunda figura do crime de tortura é indispensável a prova cabal da intenção deliberada de causar o sofrimento físico ou moral desvinculada do objetivo de educação STJ REsp 610395SC Rel Min Gilson Dipp j 2552004 O julgamento do crime de maustratos contra pessoa menor de quatorze anos deve ser realizado pelo Juizado Especial Criminal STJ REsp 610142RJ Rel Min Gilson Dipp j 2552004 Crime de tortura Delegado de polícia Excesso na acusação e desclassificação da conduta para o crime de maustratos Impossibilidade Reexame do conjunto probatório Quanto ao alegado excesso na acusação não há como transpor na angusta via do habeas corpus o exame do conjunto fático probatório feito pelo acórdão condenatório a fim de verificar se o caso é de maustratos ou de crime de tortura sob pena inclusive de malferimento ao princípio do livre convencimento do juiz STJ HC 27290SC Rel Min Laurita Vaz j 4122003 Capítulo IV Da Rixa Rixa Art 137 Participar de rixa salvo para separar os contendores Pena detenção de 15 quinze dias a 2 dois meses ou multa V arts 29 62 e 65 III e do CP V arts 60 61 74 e 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais Parágrafo único Se ocorre morte ou lesão corporal de natureza grave aplicase pelo fato da participação na rixa a pena de detenção de 6 seis meses a 2 dois anos V arts 19 e 129 1º 2º e 3º do CP D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado A incolumidade da pessoa humana Embora a descrição típica não se refira expressamente à vida ou à saúde do agente sua preocupação com esses bens jurídicos está exatamente na punição da simples participação na rixa pois o legislador reconhece que esta possibilita em tese a produção de maiores danos à integridade físicopsíquica do indivíduo E a própria posição geográfica deste tipo penal a exemplo dos antecessores admite a afirmação de que a objetividade jurídica é efetivamente a incolumidade da pessoa humana Ordem pública Secundariamente podese afirmar que a própria ordem e tranquilidade pública que inevitavelmente acaba sendo atingida pela rixa também constitui objeto da proteção jurídica Tratase enfim de crime de perigo para a vida e a saúde individual e secundariamente contra a incolumidade pública 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo Os participantes da rixa são ao mesmo tempo sujeitos ativos e passivos uns em relação aos outros rixa é crime plurissubjetivo recíproco que exige a participação de no mínimo três contendores no direito pátrio ainda que alguns sejam menores Subjetividade recíproca No entanto ninguém pode ser ao mesmo tempo sujeito ativo e passivo do crime de sua própria conduta Na realidade o rixoso é sujeito ativo da conduta que pratica em relação aos demais e sujeito passivo das condutas praticadas pelos demais rixosos Os rixosos agem uns contra os outros por isso esse misto de sujeito ativopassivo do mesmo crime 22 Sujeito passivo Os próprios rixosos são também sujeitos passivos além de eventuais não participantes que possam ser atingidos pela rixa Com efeito o sujeito passivo pode ser inclusive alguém estranho à rixa que acaba sendo atingido por ela 3 Participantes da rixa A rixa como crime de concurso necessário caracterizase pela pluralidade de participantes cujo número nunca poderá ser inferior a três Participante como regra será todo aquele que estiver presente no lugar e no momento da rixa e entrar diretamente no conflito ou auxiliar qualquer dos contendores Partícipe de rixa O fato de tratarse de um crime de concurso necessário não impede por si só a possibilidade de existir a participação em sentido estrito uma vez que o partícipe em nossa definição não intervém diretamente no fato material não pratica a conduta descrita pelo preceito primário da norma penal mas realiza uma atividade secundária que contribui estimula ou favorece a execução da conduta proibida Não realiza atividade propriamente executiva Participação em sentido estrito A contribuição do partícipe pode ser material ou moral especialmente na rixa ex proposito Por exemplo não responde pelo crime de rixa quem participa somente da discussão antes do início desta salvo se propositalmente contribuiu para a sua eclosão Nesse caso o partícipe deverá responder pelo art 137 combinado com o art 29 pois a adequação típica de sua conduta é de subordinação mediata depende da conjugação da norma principal definidora do crime de rixa com esta norma secundária de caráter extensivo Intervenção para separar rixosos Quem intervém para separar os rixosos não infringe o tipo penal pois lhe falta o elemento subjetivo qual seja a vontade consciente de participar do conflito No entanto se o pacificador excederse do intuito de apartar os rixosos transformase em participante e deverá responder pelo crime de rixa Concurso com outros crimes Responderá o autor identificado em concurso material com a rixa simples ou qualificada Excluemse somente as vias de fato que são integrantes do conteúdo do crime de rixa Há quem sustente que o rixoso identificado como autor e responsável pelo homicídio ou lesão corporal grave não pode responder pelo mesmo fundamento por rixa agravada pois violaria o princípio ne bis in idem 4 Tipo objetivo adequação típica Rixa é uma briga entre mais de duas pessoas acompanhada de vias de fato ou violência recíprocas Para caracterizála é insuficiente a participação de dois contendores pois aquela se caracteriza exatamente por certa confusão na participação dos contendores dificultando em princípio a identificação da atividade de cada um Os rixosos agem individualmente agredindose reciprocamente Participar de rixa A conduta tipificada é participar de rixa que se caracteriza pela existência de agressões recíprocas generalizadas Essa participação pode ocorrer desde o início do conflito ou integrarse durante a sua realização desde que ocorra antes de cessada a luta Necessidade de violência material Estando definida a posição dos contendores não haverá rixa É indispensável que haja violência material produzindo lesões corporais ou pelo menos vias de fato constituída de empurrões socos pontapés puxões de cabelo etc Embora o conflito se apresente geralmente num corpo a corpo poderá configurarse a distância por meio de tiros arremesso de pedras porretes e quaisquer outros objetos pois não é indispensável o contato físico entre os rixosos Simples altercação ou ofensas morais A simples altercação troca de palavras ofensivas não a caracteriza ou na expressão de Hungria É preciso que os contendores venham às mãos formandose o entrevero ou que embora sem o contato dos brigadores estes se acometam reciprocamente por exemplo com pedradas ou disparos de arma de fogo Rixa simulada atipicidade A rixa simulada não constitui crime pela ausência do animus rixandi ainda que dessa simulação sobrevenha lesão corporal grave ou a morte de alguém Nessa hipótese os autores deverão responder por lesões corporais ou homicídio conforme o caso na modalidade culposa 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo deste crime é o dolo representado pela vontade e consciência de participar de rixa isto é consiste no conhecimento de que se trata de uma rixa e na vontade consciente de participar dela Causa da rixa irrelevância A causa que originou a rixa é irrelevante e por outro lado não se exige qualquer fim especial de agir Punese a simples troca de agressões independentemente de qualquer dos participantes resultar ferido O perigo é presumido juris et de iure 6 Consumação e tentativa Consumase com a eclosão das agressões recíprocas Pela natureza complexa da ação nuclear é praticamente impossível configurarse a tentativa embora fosse admitida por Hungria Consumase o crime de rixa com a eclosão das agressões recíprocas isto é quando os contendores iniciam o conflito Consumase no instante em que o participante entra na rixa para tomar parte dela voluntariamente Desistência da rixa irrelevância Ainda que um dos participantes desista da luta antes desta ter chegado ao fim responderá pelo crime inclusive pela qualificadora lesão grave ou morte que pode ocorrer após a sua retirada Para a consumação da rixa é desnecessário que resulte lesão em qualquer dos rixosos Pelo princípio da autonomia adotado pelo nosso Código Penal a rixa é punida em razão do perigo que a sua prática produz Tentativa rixa ex improviso Pela natureza complexa da ação nuclear é praticamente impossível configurarse a tentativa O exemplo trazido por Hungria não serve pois segundo afirmava seriam dois grupos rivais prestes a iniciar confronto previamente combinado quando são surpreendidos pela polícia Ora quando há participação de grupos bem definidos não há rixa que se caracteriza pelo tumulto pela indeterminação da atividade dos participantes Rixa ex proposito Na rixa ex improviso é impossível a tentativa No entanto na rixa ex proposito naquela que é previamente combinada em tese até se pode admitir a tentativa aliás repitase de difícil configuração Rixa e legítima defesa A despeito de algumas dificuldades práticas admitimos a possibilidade de legítima defesa na rixa Quem por exemplo intervém na rixa em defesa própria ou de terceiros poderá invocar a excludente pois não há participação em rixa sem animus rixandi A legítima defesa exclui a antijuridicidade da conduta específica daquele contendor por aquele resultado lesão grave ou homicídio Rixa e legítima defesa putativa A reação contra uma suposta agressão legítima defesa putativa afasta a tipificação do crime de rixa ainda que o erro seja evitável pois mesmo assim faltaria a vontade consciente de participar de rixa erro de tipo permissivo 7 Classificação doutrinária A rixa é crime de concurso necessário participação de pelo menos três de condutas contrapostas pois há reciprocidade de agressões Os crimes de quadrilha ou bando também são de concurso necessário diferentemente são de condutas divergentes de perigo abstrato presumido juris et de iure que decorre da simples troca de desforço físico na sua modalidade simples instantâneos porque se consumam no momento da prática das agressões indiscriminadas crime plurissubsistente que não se completa com ato único doloso pois não há previsão de modalidade culposa comissivo pois só pode ser praticado por meio de uma ação ativa sendo impossível executálo por um não fazer 8 Figuras qualificadas A ocorrência de lesão corporal de natureza grave ou morte qualifica a rixa respondendo por ela inclusive a vítima da lesão grave Mesmo que lesão grave ou a morte atinja estranho não participante da rixa alguém que passava no local por exemplo ainda assim se configura a qualificadora Rixa qualificada e não identificação do autor Quando não é identificado o autor da lesão grave ou homicídio todos os participantes respondem por rixa qualificada sendo identificado o autor os outros continuam respondendo por rixa qualificada e o autor responderá pelo crime que cometeu em concurso material com a rixa qualificada Momento do resultado qualificador A morte e as lesões graves devem ocorrer durante a rixa ou em consequência dela não pode ser nem antes nem depois Assim se ocorrerem antes não a qualificam simplesmente porque não foram sua consequência mas sua causa É indispensável a relação de causalidade isto é que a rixa seja a causa do resultado isto é da lesão grave ou da morte Ocorrência de mais de uma morte ou lesão grave A ocorrência de mais de uma morte ou lesão grave não altera a unidade da rixa qualificada que continua sendo crime único embora devam ser consideradas na dosimetria penal as consequências do crime Vítima rixosa responde pela qualificadora O resultado agravado recairá sobre todos os que dela tomaram parte inclusive sobre eventuais desistentes O participante que sofrer lesão corporal grave também incorrerá na pena da rixa agravada em razão do ferimento que ele próprio recebeu Não é punição pelo mal que sofreu mas pela participação na rixa cuja gravidade é representada exatamente pela lesão que o atingiu 9 Forma culposa Não há modalidade culposa 10 Pena e ação penal 101 Pena cominada A pena é alternativa na figura simples detenção de quinze dias a dois meses ou multa Nas formas qualificadas com lesão grave ou morte reclusão de seis meses a dois anos 102 Natureza da ação penal A ação penal é pública incondicionada sendo desnecessária qualquer condição de procedibilidade para instaurála ou no caso da autoridade policial para iniciar as investigações 11 Questões especiais Não há rixa se a agressão não passar do terreno verbal Quando há participação de grupos bem definidos não há rixa que se caracteriza pelo tumulto pela indeterminação da atividade dos participantes J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Rixa Art 137 do CPB Há rixa quando houve concurso de pessoas em condutas contrapostas TJRS Recurso Crime 71001061886 Rel Nara Leonor Castro Garcia j 20112006 Júri Homicídio simples Tese acatada pelos jurados com desclassificação para o crime de rixa qualificada Decisão contrária à prova dos autos No caso em nenhum momento a contenda iniciouse de forma generalizada com a participação de grupos ou mais de três pessoas mas sim teve início com uma briga entre réus e a vítima para logo em seguida em meio à confusão surgirem diversas pessoas ao lado que começaram uma briga com agressões e cadeiradas TJSC Apelação 20050329431 Rel Irineu João da Silva j 29112005 Não há cogitar em competência do Tribunal do Júri face à morte de um dos rixentos quando da confusão generalizada rixa restar prejudicada a apuração da conduta de cada um deles TJAP Conflito de Competência 049 Rel Raimundo Vales j 3122003 Capítulo V Dos Crimes Contra a Honra Calúnia Art 138 Caluniar alguém imputandolhe falsamente fato definido como crime Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos e multa 1º Na mesma pena incorre quem sabendo falsa a imputação a propala ou divulga 2º É punível a calúnia contra os mortos V art 5º da CF V arts 146 e 519 a 523 do CPP V art 324 da Lei n 473765 Código Eleitoral V art 26 da Lei n 717083 Lei de Segurança Nacional V art 214 do CPM Exceção da verdade 3º Admitese a prova da verdade salvo V arts 85 e 523 do CPP I se constituindo o fato imputado crime de ação privada o ofendido não foi condenado por sentença irrecorrível II se o fato é imputado a qualquer das pessoas indicadas no n I do art 141 III se do crime imputado embora de ação pública o ofendido foi absolvido por sentença irrecorrível D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido pela tipificação do crime de calúnia para aqueles que adotam essa divisão é a honra objetiva isto é a reputação do indivíduo ou seja é o conceito que os demais membros da sociedade têm a respeito do indivíduo relativamente a seus atributos morais éticos culturais intelectuais físicos ou profissionais É em outros termos o sentimento do outro que incide sobre as nossas qualidades ou nossos atributos Honra definição Honra é valor imaterial insuscetível de apreciação valoração ou mensuração de qualquer natureza inerente à própria dignidade e personalidade humana Pela extensão que esse conceito abrange não nos parece adequado nem dogmaticamente acertado distinguir honra objetiva e subjetiva que não passa de adjetivação limitada imprecisa e superficial na medida em que não atinge a essência do bem juridicamente protegido Honra objetiva definição Honra objetiva constitui o sentimento ou o conceito que os demais membros da comunidade têm sobre nós sobre nossos atributos Objetivamente honra é um valor ideal a consideração a reputação a boa fama de que gozamos perante a sociedade em que vivemos Honra comum e honra profissional Na proteção do bem jurídico honra objetiva o Direito Penal não distingue a honra comum da honra profissional a primeira referese à pessoa humana enquanto ser social a segunda relacionase diretamente à atividade exercida pelo indivíduo seus princípios éticoprofissionais a representatividade e o respeito profissional que a sociedade lhe reconhece e lhe atribui nesse sentido podese dizer é a honra especial 11 Consentimento do ofendido como excludente de tipicidade O consentimento do ofendido exclui a tipicidade da conduta do ofensor Ora se após movimentada a pesada máquina judiciária comportamentos posteriores da vítima podem neutralizar a operação jurisdicional é natural que se atribua esse efeito à manifestação anterior de concordância da vítima 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa física desde que seja imputável sem necessidade de reunir qualquer outra condição A pessoa jurídica por faltarlhe a capacidade penal não pode ser sujeito ativo dos crimes contra a honra Exclusão dos inimputáveis Os inimputáveis seja qual for a causa não podem ser sujeito ativo do crime de calúnia embora teoricamente possam a nosso juízo ser sujeito passivo dos crimes contra a honra dependendo logicamente da capacidade de entender o significado ultrajante da imputação 22 Sujeito passivo Qualquer pessoa pode ser sujeito passivo não se lhe exigindo literalmente qualquer condição especial Os inimputáveis fato definido como crime Os inimputáveis também podem ser sujeitos passivos do crime de calúnia isto é podem ser caluniados embora não possam ser sujeito ativo A conduta tipificada não é a imputação falsa da prática de crime mas imputar falsamente fato definido como crime o que é diferente inimputáveis não praticam crimes por faltarlhes a condição de imputáveis mas podem praticar fatos definidos como crime Inimputáveis fundamento ético Embora os inimputáveis não possam praticar crimes podem ser sujeitos passivos do crime de calúnia pois apesar de inimputáveis não podem ser privados da proteção jurídica e deixados à mercê da agravação de qualquer um pois também têm direito à proteção legal da reputação e do sentimento de dignidade Mortos caluniados não são sujeitos passivos Os mortos também podem ser caluniados art 138 2º mas seus parentes serão os sujeitos passivos A honra é um atributo dos vivos somente estes têm personalidade à qual se liga a honra Contudo como com a morte se extingue a personalidade a ofensa punível não atinge a pessoa do morto mas a sua memória O que fundamenta a incriminação é o interesse dos parentes em preservar o bom nome do finado e por isso eles é que são os sujeitos passivos desse crime Desonrados infames e depravados Quanto aos desonrados infames e depravados ao contrário do que previa o direito romano também podem ser sujeitos passivos dos crimes contra a honra Afinal a honra enquanto bem imaterial é atribuída a todo ser humano incorporada à sua personalidade e pode ser diminuída mas nunca totalmente suprimida Penas degradantes Punições como a declaração de infâmia morte civil ou a perda total da capacidade jurídica foram proscritas do direito moderno pois violariam o princípio da dignidade humana Pessoa jurídica Há grande divergência doutrináriojurisprudencial sobre se a pessoa jurídica pode ser sujeito passivo de calúnia O Anteprojeto Nélson Hungria para afastar essa polêmica definia como crime contra a honra da pessoa jurídica Propalar fatos que sabe inverídicos capazes de abalar o crédito de uma pessoa jurídica ou a confiança que esta merece do público art 148 3 Tipo objetivo adequação típica Calúnia é a imputação falsa a alguém de fato definido como crime A calúnia é em outros termos uma espécie de difamação agravada por imputar falsamente ao ofendido não apenas um fato desonroso mas um fato definido como crime Requisitos do crime de calúnia Para que o fato imputado possa constituir calúnia precisam estar presentes simultaneamente todos os requisitos do crime a imputação de fato determinado qualificado como crime b falsidade da imputação c elemento subjetivo animus caluniandi A ausência de qualquer desses elementos impede que se possa falar em fato definido como crime de calúnia 31 Imputar falsamente fato definido como crime a Imputação de fato determinado qualificado como crime a imputação deve referirse a fato determinado sendo insuficiente por exemplo afirmar que a vítima furtou É indispensável individualizar as circunstâncias identificadoras do fato embora não sejam necessários detalhes minuciosos que muitas vezes somente a própria investigação pode conseguir Calúnia equívoca ou implícita Não é necessário que se afirme categoricamente a imputação do fato pois se pode caluniar colocando em dúvida a sua autoria questionar a sua existência supôlo duvidoso ou até mesmo negarlhe a existência calúnia equívoca ou implícita essas também são formas de caluniar alguém ainda que de forma simulada ou até dissimulada frases requintadas de habilidades retóricas de ironias equívocas ou antíteses afirmativas Calúnia reflexa Haverá calúnia reflexa quando por exemplo imputase falsamente alguma autoridade de ter aceito suborno corrupção passiva Ora o terceiro que teria oferecido a propina também é reflexamente vítima de calúnia corrupção ativa Imputação de contravenção Como o tipo penal pune a imputação falsa de crime não pode ser ampliado para abranger também a imputação de contravenção penal Quando a lei quis incluir a contravenção fêlo expressamente como na denunciação caluniosa art 339 2º Assim a imputação falsa de fato contravencional poderá constituir difamação desde que seja desonroso mas nunca calúnia b Falsidade da imputação para que se configure a calúnia é indispensável que a imputação seja falsa isto é não corresponda à verdade O fato além de falso deve ser definido como crime É necessário que qualquer pessoa fora a vítima tome conhecimento dessa imputação E falsidade como veremos tanto pode referirse ao fato em si como à autoria Imputação verdadeira não é crime Afastamos completamente a hipótese historicamente admitida pela doutrina brasileira de a imputação verdadeira constituir crime quando não se admite a exceção da verdade conforme procuramos demonstrar mais adiante Exemplo imputação de crime ao Presidente da República c Elemento subjetivo animus caluniandi é indispensável o propósito de caluniar Todos os requisitos objetivos descritivos e normativos da calúnia podem estar presentes mas se não houver o animus caluniandi não haverá crime Este requisito será mais bem examinado quando tratarmos do tipo subjetivo Erros técnicojurídicos irrelevância À evidência quando se tratar de simples equívocos técnico jurídicos como empregar roubo por furto por si só não caracteriza a calúnia Incontinência verbal discussão Não há calúnia se o fato é produto de incontinência verbal decorrente de acirrada discussão quando impropérios são proferidos irrefletidamente e sem avaliação do conteúdo que encerram Calúnia e denunciação caluniosa Se o sujeito ativo com sua ação der causa a investigação policial ou processo judicial responderá por denunciação caluniosa art 339 32 Propalação da calúnia Os verbos núcleos nesta forma de calúnia são propalar ou divulgar que têm sentido semelhante e consistem em levar ao conhecimento de outrem por qualquer meio a calúnia de que de alguma forma tomou conhecimento Embora tenham significados semelhantes a abrangência das duas expressões é distinta propalar limitase em tese ao relato verbal à comunicação oral circunscreve se a uma esfera menor enquanto divulgar tem uma concepção mais ampla que seria tornar público por qualquer meio inclusive através da fala Número indeterminado de pessoas desnecessidade Não é necessário que um número indeterminado de pessoas tome conhecimento da imputação é suficiente que se comunique a outrem mesmo em caráter confidencial A propalação ou a divulgação são atividades são condutas tipificadas e não resultado Propalador não cria a falsidade Nesta modalidade o propalador não cria a imputação falsa que já foi obra de outro quem a ouve levaa adiante sabendo que a imputação é falsa Com essa conduta embora não tenha criado o fato desonroso amplia a sua potencialidade lesiva Malícia do propalador mantém tipicidade A maliciosa estratégia adotada por alguns especialistas de afirmar que não acredita na veracidade do fato que está propalando ou divulgando não afasta a configuração típica pois mesmo na dúvida não deixa de divulgálo expondo a reputação da vítima Outras estratégias indeterminações Outras estratégias semelhantes como por exemplo indicar a fonte da calúnia reportarse a indeterminações tais como ouvi dizer comentam falam por aí etc ou mesmo pedir segredo não têm o condão de afastar o crime Configurase este mesmo quando se divulga a quem já tem conhecimento da calúnia pois ela servirá de reforço na convicção do terceiro 4 Elemento normativo do tipo falsamente A imputação para constituir crime tem de ser falsa A falsidade da imputação pode recair sobre o fato ou sobre a autoria Na primeira hipótese o fato é inexistente na segunda a existência ou ocorrência do fato é verdadeira falsa é a imputação da autoria Qualquer das duas falsidades satisfaz a elementar normativa exigida pelo tipo penal Erro de tipo Se o agente está convencido de que a imputação é verdadeira não responde pelo crime pois incorre em erro de tipo por ignorar uma elementar do tipo falsamente ou seja não sabe o que faz A certeza do agente embora errônea de que a imputação é verdadeira impede a configuração do dolo 5 Calúnia contra os mortos A ofensa à memória dos mortos atinge os interesses que seus parentes têm em cultuála o legislador brasileiro preocupouse em garantirlhe o respeito criminalizando a conduta de quem lhe imputar falsamente a prática de crime 6 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo geral do crime de calúnia é o dolo de dano que é constituído pela vontade consciente de caluniar a vítima imputandolhe a prática de fato definido como crime de que o sabe inocente É indispensável que o sujeito ativo tanto o caluniador quanto o propalador tenha consciência de que a imputação é falsa isto é de que o imputado é inocente da acusação que lhe faz Dolo direto e eventual Na figura do caput o dolo pode ser direto ou eventual na do 1º somente direto Animus defendendi ausência de dolo Não há animus caluniandi na conduta de quem se limita a analisar e argumentar dados fatos elementos circunstâncias sempre de forma impessoal sem personalizar a interpretação Na verdade postura comportamental como essa caracteriza tão somente o animus defendendi na qual não há a visível intenção de ofender Animus narrandi ausência de dolo Não comete crime de calúnia funcionário público que tem o dever de prestar informações na hipótese de mandado de segurança art 7º I da Lei n 153351 desde que logicamente ressalte da exposição dos fatos tão somente o animus narrandi sem a visível intenção de ofender Elemento subjetivo especial animus caluniandi Além do dolo é indispensável o animus caluniandi elemento subjetivo especial do tipo que parte da doutrina entende desnecessário A calúnia exige afinal o especial fim de caluniar a intenção de ofender a vontade de denegrir o desejo de atingir a honra do ofendido que se não existir não tipificará o crime Ausência de animus ofendendi Qualquer animii que de alguma forma afaste o animus offendendi exclui o elemento subjetivo animus jocandi intenção jocosa caçoar animus consulendi intenção de aconselhar advertir desde que tenha dever jurídico ou moral de fazêlo animus corrigendi intenção de corrigir desde que haja a relação de autoridade guarda ou dependência exercida em limites toleráveis animus defendendi intenção de defender que inclusive em relação à injúria e difamação é excluído expressamente pelo art 142 I do CP e pelo Estatuto da OAB Conhecimento da inocência do imputado No crime de calúnia a exigência do elemento cognitivo do dolo qual seja a consciência de que a imputação é falsa afasta a própria tipicidade não há crime de calúnia sem o conhecimento da inocência do imputado Dolo eventual Embora a consciência da falsidade como elemento do dolo deva ser atual quem na dúvida não se abstém assume o risco de ofender o bem jurídico protegido e nessas circunstâncias responde dolosamente pelo crime Calúnia e difamação As semelhanças essenciais entre calúnia e difamação são ambas lesam a honra objetiva do sujeito passivo referemse a fatos e não a qualidades negativas ou conceitos depreciativos e necessitam chegar ao conhecimento de terceiro para consumarse Calúnia e injúria Semelhanças entre calúnia e injúria são praticamente inexistentes salvo a previsão procedimental que em regra é a mesma para ambas quando for da competência de juiz singular e não houver previsão em lei especial arts 519 e s do CPP Calúnia e difamação natureza do fato imputado A diferença existente entre calúnia e difamação reside fundamentalmente na natureza do fato imputado na calúnia a imputação é da autoria de fato definido como crime enquanto na difamação a imputação é de fato ofensivo à reputação do ofendido depreciativo do seu apreço social mas não é fato criminoso fato criminoso calúnia fato ofensivo difamação Calúnia e difamação elemento normativo A maior diferença entre ambas consiste no elemento normativo falsidade que para a calúnia é indispensável e para a difamação é em regra irrelevante salvo quando se tratar de funcionário público nos termos do art 139 parágrafo único Em síntese a calúnia exige que o fato imputado seja definido como crime e que a imputação seja falsa são duas circunstâncias não contidas na definição da difamação 7 Consumação e tentativa 71 Consumação Consumase o crime de calúnia quando o conhecimento da imputação falsa chega a uma terceira pessoa ou seja quando se cria a condição necessária para lesar a reputação da vítima Ao contrário da injúria neste crime não se consuma o crime quando somente o ofendido toma conhecimento da imputação ilícita pois não é o aspecto interno da honra que é lesado pelo crime Nesse sentido deve haver publicidade caso contrário não existirá ofensa à honra objetiva 72 Tentativa punível Como regra o crime de calúnia não admite a tentativa embora em tese ela seja possível dependendo do meio utilizado mediante escrito por exemplo quando já não se tratará de crime unissubsistente existindo um iter criminis que pode ser fracionado Por meio de telegrama ou fonograma Por telegrama e fonograma apesar de serem meios escritos a tentativa será impossível pois os funcionários inevitavelmente tomarão conhecimento do conteúdo embora sejam obrigados a manter sigilo Calúnia via oral tentativa inviável Se o meio utilizado for a fala entre a emissão da voz e a percepção pelo interlocutor não há espaço para fracionamento isto é para interromper o iter criminis Uma vez proferida a ofensa ouvida por terceiro consumase o crime se não é ouvida não há crime pois não passou de monólogo como se o sujeito ativo falasse de si para si 8 Classificação doutrinária A calúnia é crime formal pois embora descreva ação e resultado não exige sua ocorrência para consumarse isto é consumase independentemente de o sujeito ativo conseguir obter o resultado pretendido que é o dano à reputação do ofendido crime comum podendo ser praticado por qualquer pessoa não sendo exigida nenhuma condição ou qualidade especial do sujeito ativo instantâneo consumase no momento em que a ofensa é proferida ou divulgada de conteúdo variado pois mesmo que o agente impute falsamente a prática de crime e a seguir a divulgue não pratica dois crimes mas apenas um comissivo não podendo em nenhuma de suas formas imputar ou propalar ser praticado por meio de conduta omissiva doloso não havendo previsão de modalidade culposa Pode ser finalmente unissubsistente via oral e plurissubsistente por escrito 9 Exceção da verdade Exceção da verdade significa a possibilidade que tem o sujeito ativo de poder provar a veracidade do fato imputado art 141 3º do CP mediante procedimento especial art 523 do CPP Calúnia é por definição a imputação falsa ou seja é da essência da calúnia a falsidade da acusação 10 Consequência da exceptio veritatis Provada pelo agente que a imputação que faz é verdadeira não se há que falar em calúnia Contudo convém ter presente que a exceptio veritatis não exclui nem a tipicidade nem a ilicitude ou antijuridicidade E não as exclui por uma razão muito simples porque elas nunca existiram e somente pode ser excluído algo que exista isto é algo que ainda que efemeramente tenha tido existência real Exceção da verdade na difamação Na difamação em regra não é admissível a exceção da verdade somente quando o fato ofensivo for imputado a funcionário público e relacionarse ao exercício de suas funções Difamação cometida pela imprensa porém tem ampliada a possibilidade de exceção da verdade art 21 1º Exceção da verdade natureza A exceção da verdade representa uma demanda judicial contra o excepto colocandoo na condição de réu desse procedimento implicando inclusive no caso alteração do juízo competente Três hipóteses não admitem exceção da verdade Não se admite a exceção da verdade nos crimes de ação privada quando o ofendido não foi condenado por sentença irrecorrível 3º I nos fatos imputados contra o Presidente da República ou contra chefe de governo estrangeiro 3º II se o ofendido foi absolvido do crime imputado por sentença irrecorrível 3º III a Nos crimes de ação privada quando o ofendido não foi condenado por sentença irrecorrível seria paradoxal que deixando ao exclusivo arbítrio do ofendido a decisão de enfrentar o strepitus judicii propondo ou não a ação penal fosse permitido que terceiro alheio à vontade daquele viesse a juízo proclamar publicamente a existência do fato e ainda autorizálo a provar judicialmente Cerceamento de defesa não ocorrência Não se configura cerceamento de defesa por duas razões primeira porque o ordenamento jurídico veda previamente o recurso da demonstratio veri ao menos em procedimento próprio assim quem ignora essa proibição e não se abstém da imputação assume o ônus da ressalva legal a segunda razão é que o agente apenas não dispõe desse recurso procedimental para demonstrar a veracidade da imputação mas pode demonstrar na instrução criminal que a sua conduta é atípica por faltarlhe a elementar normativa falsamente b Nos fatos imputados contra o Presidente da República ou contra chefe de governo estrangeiro a imputação da prática de fato criminoso mesmo verdadeiro velipendiaria a autoridade que desempenha e exporia ao ridículo o Presidente da República além de leválo a um vexame incompatível com a grandeza de seu cargo Presidente da República motivação política Convém registrar que a calúnia contra o Presidente da República praticada por motivação política configura crime contra a Segurança Nacional art 2º I combinado com o art 26 da Lei n 7170 de 14 de dezembro de 1983 se não houver essa motivação política o crime será comum c Se o ofendido foi absolvido do crime imputado por sentença irrecorrível a sentença penal absolutória transitada em julgado em nenhuma hipótese pode ser revista Esse caráter políticojurídico absoluto que impede a revisão de sentença penal absolutória não pode admitir que qualquer do povo ou qualquer autoridade pública ou privada possa fazer prova contra a res judicata É irrelevante nessa hipótese que se trate de crime de ação pública ou privada 11 Exceção da verdade e foro privilegiado competência O STF sustenta que ao juízo do processo de conhecimento original compete produzir a instrução também da exceção da verdade competindo ao tribunal somente o julgamento da exceção Contudo o entendimento contrário sem dúvida é juridicamente o correto e atende melhor as garantias fundamentais do excepto uma vez que nessas circunstâncias também se encontra sub judice Orientação de Tourinho Filho processo e julgamento A Suprema Corte contudo entende competir ao Tribunal apenas o julgamento da exceção mesmo porque o art 85 fala tão só em julgamento Evidente que a palavra julgamento aí compreende também o processo Oposta e admitida a exceção da verdade observada a regra do art 523 passa o Juiz à fase instrutória e nesta vai colher conglutinadamente a prova do fato imputado ao réu na queixa ou denúncia e a prova atinente à pretensa veracidade do fato que foi atribuído ao ofendido pelo réu Da mesma forma que os arts 29 VIII e 96 III da CF autorizam o Tribunal de Justiça apenas a julgar as pessoas ali indicadas ninguém ousará dizer que nesses casos o processo competirá a outro órgão Mutatis mutandis é o que se dá com o art 85 Impossibilidade de cisão da ação e da exceção O entendimento da Suprema Corte com a devida vênia é insustentável ante a impossibilidade lógica e jurídica de cindir o julgamento da ação e o da exceção como se fossem autônomas e a prova de uma não incidisse na outra 12 Imputação verdadeira de fato criminoso exceção proibida Segundo orientação maciça da doutrina brasileira não sendo admitida a exceção da verdade no caso previsto no inciso II do 3º do art 138 do CP a falsidade da imputação é presumida nesses casos mesmo sendo verdadeira a imputação segundo sustenta configurase o crime de calúnia Ignora que o Direito Penal da culpabilidade é incompatível com presunções irracionais e iníquas que apenas procuram mascarar uma responsabilidade penal objetiva proscrita do Direito Penal moderno 13 Consequências da proibição da exceção da verdade O fato de proibir que se faça a prova da verdade de fato imputado ao Presidente da República tido como criminoso não cria ipso facto uma nova figura típica do crime de calúnia tampouco elimina uma elementar normativa do crime definido no art 138 do Código Penal calúnia é por definição uma imputação falsa Imputação verdadeira conduta atípica A calúnia somente se configura se estiver presente o elemento normativo falsamente isto é a falsidade da imputação é elementar do tipo Isso quer dizer que a imputação verdadeira da autoria de um fato definido como crime constitui conduta atípica E ninguém pode responder por um crime calúnia se a conduta que pratica não se adequar a uma descrição típica imputar falsamente Proibição de procedimento especial a exceção da verdade A elementar falsamente continua a integrar a descrição típica apenas o sujeito ativo não dispõe do procedimento especial exceção da verdade para demonstrar que sua acusação não é falsa deverá fazêlo na ação penal isto é no processo de conhecimento normalmente Isso evita que os primeiros mandatários figurem como réus em um processo criminal especial Provar inocência em instrução criminal comum Em outros termos durante a instrução criminal o acusado tem todo o direito de comprovar que a sua conduta de imputar ao Presidente da República ou chefe de governo estrangeiro a autoria de um fato definido como crime é atípica isto é não constitui crime por não concorrer um dos elementos do tipo qual seja a falsidade da imputação Calúnia de fato verdadeiro aporia do passado Admitir como caluniosa a imputação a quem quer seja da autoria de fato verdadeiro definido como crime afronta a razoabilidade ignora o princípio da reserva legal cria uma figura esdrúxula de calúnia de fato verdadeiro a proibição legal o crime segundo esse raciocínio inserese não na conduta praticada caluniar mas na espécie do destinatário da imputação isto é do sujeito passivo Assim o crime estaria não na ação caluniar imputando falsamente mas na ousadia de indicar quem foi verdadeiramente o autor do crime configurando a mais absurda heresia jurídicopenal Presidente da República limitação dos meios de prova A lei não diz em lugar algum que é calúnia imputar ao Presidente da República fato verdadeiro definido como crime Diz apenas que quem o fizer não poderá dispor do instituto da exceção da verdade Só isso Terá de defenderse normalmente como nos crimes comuns 14 Calúnia e denunciação caluniosa É um erro crasso qualificar como crime contra a honra o lançamento de expressões reputadas caluniosas contidas em notitia criminis postuladora de instauração de inquérito policial ou similar Se houver imputação falsa o crime poderá ser em tese o de denunciação caluniosa que é de ação penal pública não o de calúnia de ação penal em regra privada 15 Crime de calúnia e exercício da advocacia incompatibilidade Faz parte da sua atividade profissional integra o exercício pleno da ampla defesa esgrimir negar defender argumentar apresentar fatos e provas excepcionar e na sua ação faltalhe o animus caluniandi pois o objetivo é defender os direitos de seu constituinte e não acusar quem quer que seja Eventuais excessos de linguagem devem ser relevados No exercício regular e pleno de sua atividade profissional eventuais excessos de linguagem que porventura cometa o advogado na paixão do debate não constituem crime de calúnia e devem ser relevados uma vez que são quase sempre recursos de defesa cuja dificuldade da causa justifica ou pelo menos elide Abuso judicial sentimento corporativista O repertório jurisprudencial brasileiro é repleto de condenações ou pelo menos de admissão da instauração da ação penal por crime de calúnia Em regra essas ações penais têm no polo passivo membros do Ministério Público ou do próprio Judiciário aflorando um odioso sentimento corporativista arbitrário Na maioria desses casos não só a liberdade de expressão mas também e principalmente o exercício profissional sofrem profundo e revoltante golpe de censura com o objetivo único e exclusivo de intimidar Impossibilidade de calúnia ausência de animus caluniandi Regra geral o advogado no exercício da sua atividade profissional não comete crime de calúnia quando na análise ou defesa de seu constituinte imputa fato definido como crime a alguém por faltarlhe o elemento subjetivo qual seja o propósito de ofender 16 Retratação A calúnia admite a retratação antes da sentença art 143 Retratação é o ato de desdizerse de retirar o que se disse Retratação não se confunde com negação do fato pois retratação pressupõe o reconhecimento de uma afirmação confessadamente errada inverídica A retratação é causa extintiva de punibilidade art 107 VI de caráter pessoal A extinção da punibilidade decorrente de retratação tem efeitos meramente penais não impedindo a propositura de ação de reparação de danos art 67 II do CPP A retratação nos crimes contra a honra é admitida somente na calúnia e difamação sendo inadmitida na injúria 17 Pena e ação penal 171 Pena cominada A sanção penal é cumulativa de seis meses a dois anos de detenção e multa para a modalidade simples caput Há previsão de duas majorantes em um terço art 141 I II III ou duplicada art 145 parágrafo único 172 Natureza da ação penal A ação penal como regra geral aqui há inversão da regra geral é de exclusiva iniciativa privada art 145 Será porém pública condicionada quando a praticada contra Presidente da República ou contra chefe de governo estrangeiro a requisição do Ministro da Justiça b contra funcionário público em razão de suas funções a representação do ofendido art 145 parágrafo único 18 Questões especiais O art 142 prevê as hipóteses de exclusão dos crimes contra a honra onde não se inclui a calúnia Quanto à imunidade parlamentar vide art 53 da CF88 Havendo dúvida na manifestação de alguém quem se julga ofendido pode pedir explicação em juízo art 144 Se o sujeito ativo der causa a investigação policial ou processo judicial responderá por denunciação caluniosa art 339 Não há calúnia se o fato é produto de incontinência verbal decorrente de acirrada discussão J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Calúnia Art 138 do CPB Delito contra honra Queixacrime rejeitada O exercício da ação penal privada não é meio de defesa da imputação de crime feito à querelante o que está sendo investigado mediante os meios legais disponíveis pelo Conselho Tutelar e por consequência pelo Ministério Público TJRS Recurso Crime 71001534510 Rel Nara Leonor Castro Garcia j 1122008 Calúnia Art 138 do CPB cc art 141 III do CPB Afirmação feita no âmbito do processo cível O processo crime não pode ser usado para constituir prova referente a feito cível com sentença transitada em julgado TJRS Recurso Crime 71001538073 Rel Nara Leonor Castro Garcia j 2112008 Calúnia Princípio da indivisibilidade da ação penal privada A renúncia ao direito de queixa em relação a um dos autores da infração penal por força do princípio da indivisibilidade da ação penal privada caracteriza renúncia ao direito de queixa e a todos se estenderá conduzindo a extinção da punibilidade de todos os envolvidos observado os termos do art 49 do CPP TJRS Recurso Crime 71001530716 Rel Ângela Maria Silveira j 2112008 O crime de calúnia prescrito no art 324 do Código Eleitoral exige finalidade eleitoral para que reste configurado Sendo o eventual crime de calúnia praticado em conversa privada por candidato ao pleito eleitoral contra pessoa não diretamente interessada nas eleições e aparentemente sem fins de obter vantagem eleitoral resta afastada a figura típica especial do art 324 do Código Eleitoral e subsiste o tipo penal previsto no art 138 do Código Penal se for o caso STJ Conflito de Competência 72445RS Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 1292007 Para a caracterização do delito de calúnia é necessário que a imputação realizada seja falsa e que o réu saiba desta circunstância bem como que o fato atribuído à vítima seja definido como crime STJ HC 66867RR Rel Min Gilson Dipp j 155 2007 Ofensas irrogadas em juízo Não ocorrência do delito de calúnia se as expressões utilizadas não imputam ao recorrente qualquer prática delitiva abstratamente prevista em lei Embora possível a configuração do delito de injúria através de tais expressões o crime fica afastado em aplicação da imunidade judiciária porque relacionadas com o direito de defesa da parte STJ REsp 885475RJ Rel Min Gilson Dipp j 1942007 Exceção da verdade ajuizada para afastar os crimes de calúnia e difamação visando demonstrar que a Excepta Desembargadora praticou o crime de prevaricação ao proferir sentenças com vício de suposta parcialidade O suposto erro in judicando do magistrado por si só não é capaz de configurar o crime de prevaricação notadamente se não demonstrado de forma inequívoca o dolo específico de satisfazer interesse ou sentimento pessoal sem a qual a conduta tornase atípica Precedentes A Exceção da Verdade não é admitida na hipótese de o Excipiente não demonstrar serem verossímeis as condutas atribuídas ao Excepto STJ ExVerd 50SP Rel Min Luiz Fux j 2132007 A pena máxima prevista para o crime capitulado na queixacrime art 138 cc art 141 III do Código Penal é superior a dois anos não se enquadrando portanto no conceito de crime de menor potencial ofensivo mesmo com a ampliação dada pela Lei n 1025901 Competência da Justiça Comum Estadual Precedentes STJ REsp 822265SC Rel Min Laurita Vaz j 2282006 Calúnia art 138 caput do CP contra funcionário público em razão de suas funções art 141 II do CP Ação penal pública condicionada à representação Queixacrime no entanto recebida Retratação cabal do querelado antes da sentença Cabimento Isenção de pena art 143 do CP Extinção da punibilidade art 107 VI do CP TJRS Apelação 70011210242 Rel Marco Antônio Bandeira Scapini j 1882005 Difamação Art 139 Difamar alguém imputandolhe fato ofensivo à sua reputação Pena detenção de 3 três meses a 1 um ano e multa V art 5º X da CF V arts 519 a 523 do CPP V art 325 da Lei n 473765 Código Eleitoral V art 26 da Lei n 717083 Lei de Segurança Nacional Exceção da verdade Parágrafo único A exceção da verdade somente se admite se o ofendido é funcionário público e a ofensa é relativa ao exercício de suas funções V art 85 do CPP D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado A exemplo do crime de calúnia o bem jurídico protegido é a honra isto é a reputação do indivíduo a sua boa fama o conceito que a sociedade lhe atribui A tutela da honra como bem jurídico autônomo não é um interesse exclusivo do indivíduo mas da própria coletividade que se interessa pela preservação desse atributo além de outros bens jurídicos indispensáveis para a convivência harmônica em sociedade 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa sem qualquer condição especial Por ora a pessoa jurídica não está legitimada a praticar este tipo de crime a despeito da decantada responsabilidade penal desta 22 Sujeito passivo Igualmente qualquer pessoa pode ser sujeito passivo Os inimputáveis também podem ser sujeitos passivos do crime de difamação isto é podem ser difamados desde que tenham capacidade suficiente para entender que estão sendo ofendidos em sua honra pessoal Capacidade de entendimento Essa capacidade evidentemente não se confunde nem com a capacidade civil nem com a capacidade penal uma vez que o próprio inimputável pode têla Honra é um valor social e moral do ser humano bem jurídico imaterial inerente à personalidade e por isso qualquer indivíduo é titular desse bem imputável ou inimputável Pessoa jurídica admissibilidade Contudo modernamente vaise ampliando a corrente que admite a possibilidade de a pessoa jurídica também ser sujeito passivo de crimes contra a honra Vários diplomas legais atribuem essa possibilidade recordemse os seguintes o Decreto n 4776 de 1º de outubro de 1942 considerou a Nação o Governo o regime e as instituições como vítimas dos crimes de calúnia e injúria Pessoa jurídica de direito público As pessoas jurídicas tanto de direito público quanto de direito privado podem ser sujeito passivo do crime de difamação Ninguém ignora os danos e abalos de créditos que as pessoas jurídicas podem sofrer se forem vítimas de imputações levianas de fatos desabonadores do conceito e da dignidade que desfrutam no mercado Difamação contra os mortos Não há previsão legal de crime de difamação contra a memória dos mortos e ad argumentandum se houvesse não seriam eles os sujeitos passivos mas seus parentes que se sentiriam ultrajados com tal desrespeito A ausência de previsão legal não pode ser suprida por analogia ou interpretação analógica Exclusão implícita da difamação Quando o legislador disciplinou o crime de calúnia criou também a figura da calúnia aos mortos art 138 2º Essa postura do legislador serve como sinalização de que a honra dos mortos não é objeto da tutela geral dos crimes contra a honra pois quando desejou abrangê la fêlo expressamente Assim se não houvesse a previsão referida relativa à calúnia ficaria menos difícil sustentar a possibilidade de difamação aos mortos Desonrados infames e depravados Os desonrados infames e depravados também podem ser sujeitos passivos do crime de difamação pois a honra é um atributo inerente à pessoa humana incorporado à sua personalidade conforme sustentamos quando examinamos o crime de calúnia O amor próprio e a dignidade humana aprisionam lá no íntimo de cada um esse atributo pessoal mesmo que não seja reconhecido por mais ninguém 3 Tipo objetivo adequação típica Difamação é a imputação a alguém de fato ofensivo à sua reputação Imputar tem o sentido de atribuir acusar de O fato ao contrário da calúnia não precisa ser falso nem ser definido como crime Difamar imputação de fato concreto Difamar consiste em atribuir fato ofensivo à reputação do imputado acontecimento concreto e não conceito ou opinião por mais gravosos ou aviltantes que possam ser No enterro simbólico da vítima por exemplo poderá existir injúria mas nunca difamação embora muitas vezes a difamação absorva a própria injúria quando ambas resultem de fato único sendo impossível falar em concurso de crimes ante o princípio da consunção Definição de reputação Reputação é a estima moral intelectual ou profissional que alguém goza no meio em que vive reputação é um conceito social A difamação pode eventualmente não atingir essas virtudes ou qualidades que dotam o indivíduo no seu meio social mas assim mesmo violar aquele respeito social mínimo a que todos têm direito Esse aliás é um dos fundamentos pelos quais os desonrados também podem ser sujeito passivo desse crime Imputação de fato verdadeiro funcionário público A imputação mesmo verdadeira de fato ofensivo à reputação configura o crime Constitui exceção a essa definição a imputação de fato ofensivo verdadeiro a funcionário público em razão de suas funções pois por razões políticas não constitui crime em razão de o EstadoAdministração ter interesse em apurar a autenticidade da imputação que inclusive pode constituir falta administrativa embora não caracterize crime Calúnia e difamação distinção Assim enquanto na calúnia há imputação de fato definido como crime na difamação o fato é somente desonroso além de a calúnia exigir o elemento normativo da falsidade da imputação que é irrelevante para o crime de difamação que traz em seu bojo o sentido de divulgar de dar a conhecer Conhecimento de terceiro É indispensável que a imputação chegue ao conhecimento de outra pessoa que não o ofendido pois é a reputação que o imputado goza na comunidade que deve ser lesada e essa lesão somente existirá se alguém tomar conhecimento da imputação desonrosa Com efeito a reputação de alguém não é atingida e especialmente comprometida por fatos que sejam conhecidos somente por quem se diz ofendido Imputação de fato determinado Para que ocorra a difamação é necessário que o fato seja determinado e que essa determinação seja objetiva pois a imputação vaga imprecisa ou indefinida não a caracteriza podendo eventualmente adequarse ao crime de injúria Difamação é a imputação de fato repetindo fato determinado individualizado identificado e não de defeitos ou de qualidades negativas Propalação do ato difamatório O art 139 que tipifica a difamação não contém previsão de propalar ou divulgar a difamação como faz o artigo anterior em relação à calúnia art 138 1º À primeira vista pode parecer que ante essa omissão o propalador ou divulgador não deve responder pelo crime de difamação Contudo essa impressão não é verdadeira e não se trata de analogia Ocorre que quem propala ou divulga fato desonroso imputado a alguém difamao isto é pratica nova difamação Publicidade da difamação Não se pode esquecer ademais que a publicidade da imputação integra proibição legal pois é indispensável que a conduta difamatória chegue ao conhecimento de terceiro pelo menos sendo desnecessário um número indeterminado de pessoas Ora propalar ou divulgar a difamação produz uma danosidade muito superior à simples imputação sendo essa ação igualmente muito mais desvaliosa Propalação difamador desconhecido A nosso juízo punese a ação de propalar mesmo quando e até com mais razão se desconhece quem é o autor da difamação original E não se diga que esse entendimento fere o princípio da reserva legal ou da tipicidade pois propalar difamação de alguém é igualmente difamar e quiçá com mais eficiência mais intensidade e maior dimensão 4 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo do crime de difamação é o dolo de dano que se constitui da vontade consciente de difamar o ofendido imputando lhe a prática de fato desonroso é irrelevante tratarse de fato falso ou verdadeiro e é igualmente indiferente que o sujeito ativo tenha consciência dessa circunstância O dolo pode ser direto ou eventual Animus diffamandi necessidade A difamação exige o especial fim de difamar a intenção de ofender a vontade de denegrir o desejo de atingir a honra do ofendido A ausência desse especial fim impede a tipificação do crime Por isso a simples idoneidade para ofender das palavras é insuficiente para caracterizar o crime como ocorre em determinados setores da sociedade com o uso de palavras de baixo calão por faltarlhe o propósito de ofender Ausência de animus diffamandi Não há animus diffamandi na conduta de quem se limita a analisar e argumentar dados fatos elementos circunstâncias sempre de forma impessoal sem personalizar a interpretação Na verdade postura comportamental como essa não traduz a intenção de ofender a exemplo de todas as hipóteses que referimos relativamente à calúnia Variedade de animus exclusão da responsabilidade Em verdade pode existir uma série de animus que excluem a responsabilidade penal do agente animus jocandi intenção jocosa caçoar animus consulendi intenção de aconselhar advertir desde que tenha dever jurídico ou moral de fazêlo animus corrigendi intenção de corrigir desde que haja a relação de autoridade guarda ou dependência exercida em limites toleráveis animus defendendi intenção de defender que inclusive em relação à injúria e difamação é excluído expressamente pelo art 142 I do CP e pelo Estatuto da OAB art 7º 2º da Lei n 890694 Onus probandi não cabe à vítima Contudo não cabe à vítima o ônus de provar que o fato desonroso tenha sido praticado intencionalmente mas quem o imputou deve demonstrar a ausência do animus diffamandi 5 Consumação e tentativa 51 Consumação Consumase o crime de difamação quando o conhecimento da imputação chega a uma terceira pessoa ou seja quando se cria a condição necessária para lesar a reputação do ofendido Conhecimento exclusivo da vítima A difamação não se consuma quando apenas a vítima tem ciência da imputação ofensiva pois não é o aspecto interno da honra que é lesado pelo crime mas o externo ou seja a sua reputação perante a sociedade Por isso é indispensável a publicidade caso contrário não existirá ofensa à honra objetiva 52 Tentativa admissibilidade Normalmente o crime de difamação não admite a tentativa embora em tese ela seja possível dependendo do meio utilizado a exemplo da calúnia por meio de escrito por exemplo quando já não se tratará de crime unissubsistente existindo um iter criminis que pode ser fracionado Difamação verbal inadmissibilidade de tentativa Se porém o meio utilizado for a fala entre a emissão da voz e a percepção pelo interlocutor não há espaço para fracionamento A difamação verbal não admite tentativa Aliás a situação é exatamente a mesma do crime de calúnia pois são crimes do mesmo gênero e da mesma espécie e que podem ser realizados pelos mesmos meios enfim a afinidade entre ambos é total 6 Classificação doutrinária Crime comum podendo ser praticado por qualquer pessoa não sendo exigida nenhuma condição ou qualidade especial do sujeito ativo a difamação é crime formal pois apesar de descrever ação e resultado não exige que este se verifique para o crime consumarse ou seja consumase independentemente de o sujeito ativo conseguir obter o resultado pretendido que é o dano à reputação do imputado instantâneo consumase no momento em que a ofensa é proferida ou divulgada comissivo não pode ser praticado por meio de conduta omissiva doloso não há previsão de modalidade culposa Pode ser finalmente unissubsistente via oral completandose com ato único e plurissubsistente por escrito encerrando um iter que permite fracionamento elaboração do escrito e recepção do conteúdo pelo destinatário 7 Figuras majoradas Os crimes contra a honra com exceção da injúria real não têm formas qualificadas somente algumas figuras majoradas se o fato é cometido contra o Presidente da República ou chefe de governo estrangeiro contra funcionário público em razão de suas funções na presença de três ou mais pessoas ou por meio que facilite a divulgação da ofensa art 141 I II e III ou ainda quando é praticado mediante paga ou promessa de recompensa art 145 parágrafo único 8 Forma culposa Não há previsão de modalidade culposa 9 Retratação A difamação admite a retratação antes da sentença art 143 Vide o que foi dito no mesmo item em relação ao crime de calúnia 10 Exceção da verdade impossibilidade em tese Ninguém tem o direito de invadir a privacidade de ninguém intrometendose na vida alheia e evidentemente muito menos propalar ou divulgar o que outrem faz ou deixa de fazer Por isso a imputação de qualquer fato que atinja a honra de alguém tipificará o crime de difamação e o agente não tem o direito de demonstrar que o fato é verdadeiro pois o Estado não confere a ninguém o direito de arvorarse em censor da honra alheia Como na difamação não há imputação de fato definido como crime o Estado não tem interesse em saber o que as pessoas andam dizendo ou divulgando Funcionário público admissibilidade A difamação somente admite exceção da verdade quando o fato ofensivo é imputado a funcionário público e relacionese ao exercício de suas funções pois nesse caso o Estado tem interesse em saber se seus funcionários exercem suas funções com dignidade e decoro Ademais o servidor público deve ficar exposto à censura razão pela qual se admite a exceptio veritatis Funcionário público fatos da vida privada O fato desonroso imputado a funcionário público somente admite a exceção da verdade se estiver relacionado ao exercício da função pública caso contrário isto é se a imputação versar sobre fatos relativos à vida privada do funcionário a demonstratio veri não será admitida Ofensiva relativa ao exercício das funções Se o ofendido é funcionário público e a ofensa é relativa ao exercício de suas funções exige a presença de dois fatores simultaneamente que a ofensa relacionada ao exercício das funções públicas seja contemporânea à condição de funcionário público Assim se o ofendido deixar o cargo após a consumação do fato imputado o sujeito ativo mantém o direito à demonstratio veri 11 Exceção da notoriedade Determinado segmento doutrinário tem sustentado que não se justifica punir alguém porque repetiu o que todo mundo sabe e todo mundo diz pois está caracterizada sua notoriedade Segundo Tourinho Filho se o fato ofensivo à honra é notório não pode o pretenso ofendido pretender defender o que ele já perdeu e cuja perda caiu no domínio público ingressando no rol dos fatos notórios Notoriedade do fato irrelevância Quando o Código Penal proíbe a exceção da verdade para o crime de difamação está englobando a exceção da notoriedade em segundo lugar a notoriedade é inócua pois é irrelevante que o fato difamatório imputado seja falso ou verdadeiro em terceiro lugar ninguém tem o direito de vilipendiar ninguém Exceção da verdade meio de prova A exceção da verdade enquanto meio de prova é prevista pelo Código Penal ou seja é instituto de direito material o Código de Processo Penal limitase a disciplinar o seu procedimento como faz em relação a própria ação penal e demais institutos Exceção de notoriedade O Código Penal isto é o direito material não prevê a indigitada exceção de notoriedade ou seja ela não foi consagrada pelo atual direito material brasileiro logo não existe como instituto autônomo de prova A simples referência à exceção de notoriedade feita pelo Código de Processo Penal não tem o condão de criála pois pela orientação adotada pelo nosso sistema repressivo ao direito adjetivo compete somente disciplinar o uso dos institutos existentes no caso só existe a exceção da verdade Desonrado princípio da insignificância No entanto muito excepcionalmente a desonra do imputado pode ser tanta tão generalizada e a destruição moral ser tão devastadora como o famoso exemplo do Ébrio de Vicente Celestino que a notoriedade pode representar a insignificância da ofensa e como tal excluir a tipicidade da imputação Exceção de notoriedade calúnia O art 523 do CPP que refere à vol doiseau a exceção de notoriedade integra o capítulo que disciplina o procedimento de calúnia e injúria Essa constatação encerra a conclusão inevitável de que o procedimento ali previsto destinase exclusivamente à calúnia pois a difamação regra geral não admite aquela exceção Logo não se pode invocála como excludente 12 Pena e ação penal 121 Pena cominada A sanção penal é cumulativa de três meses a um ano de detenção e multa Pode ser majorada em um terço se o fato é cometido contra o Presidente da República ou chefe de governo estrangeiro contra funcionário público em razão de suas funções na presença de três ou mais pessoas ou por meio que facilite a divulgação da ofensa art 141 I II e III ou duplicada quando é praticada mediante paga ou promessa de recompensa art 145 parágrafo único 122 Natureza da ação penal A ação penal como regra geral nos crimes contra a honra há inversão da regra geral é de exclusiva iniciativa privada art 145 Será porém pública condicionada quando a praticada contra Presidente da República ou contra chefe de governo estrangeiro a requisição do Ministro da Justiça b contra funcionário público em razão de suas funções a representação do ofendido art 145 parágrafo único 13 Questões especiais O art 142 prevê as hipóteses de exclusão do crime O art 7º 3º da Lei n 890694 EOAB ampliou a imunidade do advogado E quanto à imunidade parlamentar vide art 53 da CF88 J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Difamação art 139 caput cc 141 II ambos do Código Penal Imprescindível para a configuração do delito de difamação que esteja presente o elemento subjetivo do tipo penal que é o dolo ou seja a intenção consciente de ofender alguém A comunicação de fato ou reclamação de fato com pedido de providências à autoridade não configura o delito de difamação havendo apenas o animus narrandi tratandose de fato atípico TJRS Recurso Crime 71001530344 Rel Ângela Maria Silveira j 2112008 Difamação Rejeição da denúncia Decadência O dies ad quem relativo ao prazo de decadência para o oferecimento de queixa iniciase quando o ofendido tem ciência inequívoca de quem é o autor do crime Na hipótese em que os fatos tidos por criminosos constem do voto proferido em sessão de julgamento na qual a vítima estava ausente a mera publicação do respectivo acórdão não é suficiente à comprovação de que a vítima tenha tomado conhecimento de prática de crime e de sua autoria na data de circulação do Diário da Justiça Nos crimes contra a honra inexistindo tipicidade em tese de condutas descritas como criminosas inclusive porque ausente o dolo específico descaraterizando o crime mesmo em tese a denúncia deve ser rejeitada STJ Apn 488SP Rel Min João Otávio de Noronha j 17102007 Injúria e difamação contra cirurgião plástico Termos usados pela paciente em comunicação ao CRM Animus diffamandi e injuriandi Inexistência No tocante aos crimes de difamação e injúria restou evidenciada no caso concreto a atipicidade do fato ante a falta do elemento subjetivo consubstanciado no propósito de ofender a reputação do médico e sua esposa ou a sua dignidade e decoro STJ HC 43955PA Rel Min Paulo Medina j 382006 Difamação Art 21 da Lei n 525067 Princípio da correlação Embora o fato delituoso atribuído ao querelado esteja capitulado no art 139 do Código Penal a sua condenação por incurso nos termos do art 21 da Lei n 525067 não viola o princípio da correlação porquanto dos fatos narrados se extrai a divulgação da difamação através de jornal incidindo no caso a Lei de Imprensa Animus Diffamandi O texto jornalístico publicado ao insinuar que o querelante utilizou dinheiro público em seu próprio benefício revela a intenção de atingir a sua reputação a sua imagem como pessoa e homem público de modo que caracterizado está o crime de difamação Exceptio veritatis inviável ao caso pois o ofendido não mais era funcionário público ao tempo da difamação TJRS Apelação 70012003356 Rel Roque Miguel Fank j 21122005 Pela lei em vigor pessoa jurídica não pode ser sujeito passivo dos crimes contra a honra previstos no C Penal A própria difamação ex vi legis art 139 do C Penal só permite como sujeito passivo a criatura humana Inexistindo qualquer norma que permita a extensão da incriminação nos crimes contra a pessoa Título I do C Penal não se inclui a pessoa jurídica no polo passivo e assim especificamente Cap IV do Título I só se protege a honra das pessoas físicas Precedentes STJ AgRg no Ag 672522PR Rel Min Félix Fischer j 4102005 Injúria Art 140 Injuriar alguém ofendendolhe a dignidade ou o decoro Pena detenção de 1 um a 6 seis meses ou multa 1º O juiz pode deixar de aplicar a pena V arts 107 IX e 120 do CP I quando o ofendido de forma reprovável provocou diretamente a injúria V art 65 III c do CP II no caso de retorsão imediata que consista em outra injúria 2º Se a injúria consiste em violência ou vias de fato que por sua natureza ou pelo meio empregado se considerem aviltantes Pena detenção de 3 três meses a 1 um ano e multa além da pena correspondente à violência 3º Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça cor etnia religião origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência 3º com redação dada pela Lei n 10741 de 1º de outubro de 2003 Pena reclusão de 1 um a 3 três anos e multa V art 5º X da CF V arts 256 519 a 523 do CPP V art 326 da Lei n 473765 Código Eleitoral V art 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado O objeto da proteção neste crime também é a honra A diferença é que neste dispositivo para aqueles que adotam essa divisão tratase da honra subjetiva isto é a pretensão de respeito à dignidade humana representada pelo sentimento ou concepção que temos a nosso respeito O próprio texto legal encarregase de limitar os aspectos da honra que podem ser ofendidos a dignidade ou o decoro que representam atributos morais e atributos físicos e intelectuais respectivamente Dúvida imputação de fato ou de qualidade negativa Havendo dúvida razoável relativamente à atribuição de fato ou qualidade negativa o intérprete deve optar pela injúria não apenas por ser a figura menos grave das três que lesam a honra mas especialmente por ser a mais abrangente pois toda calúnia ou difamação injuriam o destinatário mas nenhuma injúria o calunia ou o difama Com essa opção não se corre o risco de lesar ou ignorar o princípio da tipicidade Injúria real honra e incolumidade física A injúria real definida no 2º do art 140 é um dos chamados crimes complexos reunindo sob sua proteção dois bens jurídicos distintos a honra e a integridade ou incolumidade física de alguém Contudo destacadamente o bem visado e atingido prioritariamente é a honra pessoal A violência ou vias de fato representam somente os meios pelos quais se busca atingir o fim de injuriar de ultrajar o desafeto Honra pessoal valor imaterial O valor mais precioso que o agente objetiva atingir é imaterial é interior superior à própria dor ou sofrimento físico que o agente possa sentir é o seu valor espiritual a própria alma é aquilo que interiormente o motiva a continuar a aventura humana na Terra a sua honra pessoal O corpo a saúde a integridade ou incolumidade são atingidos reflexamente 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo Sujeito ativo do crime de injúria pode ser qualquer pessoa sem qualquer condição especial A pessoa jurídica segundo o entendimento doutrináriojurisprudencial mais aceito não está legitimada a praticar este tipo de crime apesar do crescimento do entusiasmo pela responsabilidade penal Sujeito passivo Qualquer pessoa igualmente pode ser sujeito passivo inclusive os inimputáveis No entanto relativamente aos inimputáveis com cautela se deve analisar casuisticamente pois é indispensável que tenham a capacidade de entender o caráter ofensivo da conduta do sujeito ativo isto é devem ter consciência de que está sendo lesada sua dignidade ou decoro Pessoas jurídicas Ainda predomina o entendimento segundo o qual a pessoa jurídica não possui honra subjetiva e por isso não pode ser sujeito passivo do crime de injúria embora se admita que os titulares da pessoa jurídica podem ter a honra lesada nessas circunstâncias passando à condição de vítimas do crime Injúria aos mortos impossibilidade Os mortos ao contrário do que ocorre com o crime de calúnia não podem ser injuriados O Código Penal atual abrogou a previsão contida no Código Penal de 1890 art 324 e a ausência de previsão legal criminalizadora não pode ser suprida por analogia ou mesmo por interpretação extensiva No entanto quem denegrir a memória do morto poderá estar injuriando o vivo reflexamente 3 Tipo objetivo adequação típica Injuriar é ofender a dignidade ou o decoro de alguém A injúria que é a expressão da opinião ou conceito do sujeito ativo traduz sempre desprezo ou menoscabo pelo injuriado A injúria é essencialmente uma manifestação de desprezo e de desrespeito suficientemente idônea para ofender a honra da vítima no seu aspecto interno Injúria calúnia e difamação Na injúria ao contrário da calúnia e da difamação não há imputação de fatos mas emissão de conceitos negativos sobre a vítima que atingem esses atributos pessoais a estima própria o juízo positivo que cada um tem de si mesmo Dignidade e decoro Dignidade é o sentimento da própria honorabilidade ou valor social que pode ser lesada com expressões tais como bicha ladrão corno etc Decoro é o sentimento a consciência da própria respeitabilidade pessoal é a decência respeitabilidade que a pessoa merece e que é ferida quando por exemplo se chama alguém de anta imbecil ignorante etc Dignidade e decoro abrangem os atributos morais físicos e intelectuais Conhecimento do ofendido suficiência É preciso que a injúria chegue ao conhecimento do ofendido ou de qualquer outra pessoa pois a ofensa proferida ou executada que não chega ao conhecimento de ninguém não existe juridicamente Injúria e falta de educação A injúria nem sempre decorre do sentido literal do texto ou das expressões proferidas que não raro precisam ser contextualizadas para se encontrar seu verdadeiro sentido É indispensável que seja lesado um mínimo daquela consideração e respeito a que todos têm direito Por isso não se deve confundir injúria com grosseria incivilidade reveladoras somente de falta de educação Espécies de injúria A injúria pode ser imediata quando proferida pelo próprio agente mediata quando se utilizar outro meio ou outra forma para executála uma criança um papagaio repetindo ofensas etc direta quando se refere ao próprio ofendido indireta ou reflexa quando ofendendo alguém atingese também terceiro explícita quando é induvidosa equívoca quando se reveste de incertezas de vacilações Injúria simples A injúria simples pode ser praticada de qualquer forma gestos palavras símbolos atitudes figuras etc A injúria pode ser praticada por todos os meios idôneos para manifestar o pensamento Injúria qualificada Se for empregada violência ou vias de fato na sua execução com caráter aviltante configurarseá injúria real que é uma forma qualificada desse crime Se tiver o propósito de discriminar poderá configurar a injúria preconceituosa outra forma de injúria qualificada Injúria por meio de omissão A injúria também pode ser praticada por meio da omissão como no exemplo lembrado por Magalhães Noronha se uma pessoa chega a uma casa onde várias outras se acham reunidas e cumprimentaas recusando entretanto a mão a uma que lhe estende a destra injuriaa Imputação de fatos vagos ou genéricos Embora no crime de injúria não haja imputação de fatos como ocorre na calúnia e na difamação quando no entanto tratarse de imputação de fatos vagos genéricos difusos de difícil identificação caracterizase a injúria Assim por exemplo afirmar que alguém não costuma honrar seus compromissos é pouco afeito ao trabalho etc Contra pessoa determinada Por fim é indispensável que a vítima seja pessoa determinada embora não seja necessária a sua identificação nominal sendo suficiente que seja possível a sua identificação com certa facilidade Contra determinada coletividade Quando a ofensa é dirigida a determinada coletividade de razoável extensão equiparase a pessoa indeterminada como se fora por exemplo proferir uma injúria contra os comunistas os pretos os católicos etc 4 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo do crime de injúria é o dolo de dano constituído pela vontade livre e consciente de injuriar o ofendido atribuindolhe um juízo depreciativo A consciência tem de ser atual isto é existir no momento próprio da ação sem o qual não se poderá falar em crime doloso Animus injuriandi necessidade Além do dolo fazse necessário o elemento subjetivo especial do tipo representado pelo especial fim de injuriar de denegrir de macular de atingir a honra do ofendido Simples referência a adjetivos depreciativos a utilização de palavras que encerram conceitos negativos por si só são insuficientes para caracterizar o crime de injúria Incontinência verbal mera discussão Em acalorada discussão por falta do elemento subjetivo não há injúria quando as ofensas são produto de incontinência verbal Enfim como referimos nos crimes anteriores a existência de qualquer outro animus distintos do animus ofendendi exclui o crime contra a honra Injúria preconceituosa Na injúria preconceituosa deve estar presente especialmente a consciência de que ofende a honra alheia em razão de raça cor etnia religião ou origem 5 Consumação e tentativa 51 Consumação Consumase o crime de injúria quando a ofensa irrogada chega ao conhecimento do ofendido Ao contrário da difamação e da calúnia para consumarse não é necessário que alguém além da vítima tenha conhecimento da imputação ofensiva pois não é o aspecto externo da honra que é lesado pelo crime mas o interno ou seja aquele sentimento de valor e respeito que cada um deve ter de si próprio isto é a autoestima Proferida diretamente à vítima irrelevância É irrelevante que a injúria seja proferida pessoal e diretamente à vítima pode chegar a seu conhecimento por intermédio de terceiro ou de qualquer meio de correspondência ou envio de mensagens modernas Injúria e desacato Sendo o ofendido funcionário público e o fato tendo sido praticado na sua presença e em razão da função poderá configurar o crime de desacato art 331 desde que o sujeito ativo conheça a circunstância de tratarse de funcionário público 52 Tentativa admissibilidade restrita O crime de injúria não admite a tentativa embora em tese ela seja possível dependendo do meio utilizado a exemplo da calúnia e da difamação por meio de escrito por exemplo quando já não se tratará de crime unissubsistente existindo um iter criminis que pode ser fracionado A injúria pode ser plurissubsistente por escrito encerrando um iter que permite fracionamento elaboração do escrito e recepção do conteúdo pelo destinatário Injúria real possibilidade A injúria real particularmente admite a tentativa quando por exemplo a violência ou as vias de fato aviltantes não se consumam por circunstâncias estranhas à vontade do agente Injúria verbal impossibilidade de tentativa Se for praticada por meio da fala entre a emissão da voz e a percepção pelo interlocutor não há espaço para fracionamento Logo a injúria verbal também não admite tentativa Aliás a situação é exatamente a mesma dos crimes de calúnia e difamação pois são crimes do mesmo gênero e da mesma espécie e que podem ser realizados pelos mesmos meios enfim a afinidade entre os três é muito grande 6 Classificação doutrinária Crime comum podendo ser praticado por qualquer pessoa não sendo exigida nenhuma condição ou qualidade especial do sujeito ativo a injúria é crime formal pois apesar de descrever ação e resultado não é necessário que a vítima se sinta ofendida com as atribuições depreciativas que sofre sendo suficiente que a conduta injuriosa tenha idoneidade para ofender alguém de discernimento ou seja consumase independentemente de o sujeito ativo conseguir obter o resultado pretendido que é o dano à dignidade ou ao decoro do ofendido instantâneo consumase no momento em que a ofensa chega ao conhecimento do ofendido comissivo realizase com uma ação de fazer dificilmente poderá ser praticado por meio de conduta omissiva embora doutrinariamente seja admissível doloso somente pode ser executado sob a forma dolosa não havendo previsão de modalidade culposa Injúria real crime complexo Tratase em regra de crime simples pois atinge somente um bem jurídico a honra pessoal ou profissional na injúria real contudo o crime é complexo ofendendo dois bens jurídicos a honra que in casu é o bem jurídico principalmente visado e a integridade física secundariamente visada 7 Exceção da verdade inadmissibilidade A injúria é o único crime que em hipótese alguma admite a exceção da verdade pois como vimos na calúnia sua admissão é a regra na difamação exceção quando for praticado contra funcionário público em razão do exercício de suas funções Injúria não há imputação de fato Desnecessário repetir que nos crimes de calúnia e difamação há a imputação de fato definido como crime no primeiro somente desonroso no segundo enquanto na injúria não há imputação de fato mas atribuição de conceito depreciativo ao ofendido Juízo depreciativo irrelevância da veracidade Se é natural que fatos possam ser provados o mesmo não ocorre com a atribuição de qualidades negativas defeitos a alguém sob pena de consagrarse o direito à humilhação alheia Por outro lado nunca é demais repetir a veracidade ou autenticidade dos juízos depreciativos que maculam a honra subjetiva do ofendido é absolutamente irrelevante para a caracterização da injúria 8 Perdão judicial definição Perdão judicial é o instituto por meio do qual a lei possibilita ao juiz deixar de aplicar a pena diante da existência de determinadas circunstâncias expressamente determinadas exs arts 121 5º 129 8º 140 1º I e II 180 5º 1ª parte 240 4º I e II 242 parágrafo único 249 2º Na legislação especial também se encontram algumas hipóteses de perdão judicial Perdão judicial direito público subjetivo Embora as opiniões dominantes concebam o perdão judicial como mero benefício ou favor do juiz entendemos que se trata de um direito público subjetivo de liberdade do indivíduo a partir do momento que preenche os requisitos legais Ademais é inconcebível que uma causa extintiva de punibilidade fique relegada ao puro arbítrio judicial Deverá contudo ser negado quando o réu não preencher os requisitos exigidos pela lei Hipóteses do perdão judicial Relativamente aos crimes contra a honra o Código Penal prevê a possibilidade de o juiz deixar de aplicar a pena somente para o crime de injúria nos seguintes casos a quando o ofendido de forma reprovável provocou diretamente a injúria b no caso de retorsão imediata que consista em outra injúria que passamos a examinar Fundamento do perdão judicial Reconhecendo que a injúria foi assacada em momento de irritação com alteração emocional causada pelo ofendido irrefletidamente o legislador reconhece o beneplácito do perdão judicial No entanto a provocação deve ser direta e pessoal ou seja deve ser praticada na presença do ofensor caso contrário não será admitida a isenção de pena pois o ofensor terá tempo para refletir e pensar em outra solução 9 Provocação reprovável e retorsão imediata As duas hipóteses embora semelhantes são inconfundíveis na provocação reprovável há somente uma injúria a de quem reage à provocação pois a conduta do provocador não assume a condição de injúria caso contrário haveria retorsão na retorsão imediata por sua vez há duas injúrias a inicial a originadora do conflito que é revidada com outra injúria Injúria contra injúria retorsão Convém destacar que para existir retorsão é fundamental a existência de duas injúrias real ou formal isto é não poderá haver a figura da retorsão de uma injúria contra outro crime qualquer pois o texto legal fala em retorsão imediata que consista em outra injúria Nada impede que possa existir retorsão a nosso juízo na injúria real desde que não se ignore o princípio da proporcionalidade ou nesse caso talvez até seja mais adequado falar da razoabilidade Provocação e agressão Provocação não se confunde com agressão e a grande diferença reside na intensidade de ambas A provocação não constitui crime não chega ao nível de injúria caso contrário estaríamos diante da retorsão mas deve ser suficientemente desagradável inoportuna e capaz de afetar o equilíbrio emocional do ofensor a ponto de leválo a retorquir a provocação proferindo a ofensa à dignidade ou ao decoro do provocador 91 Provocação reprovável e provocação justa O texto legal deixa muito claro que a provocação tem de ser reprovável ou seja censurável injusta não autorizada em lei Logo não a constituem o exercício regular de direito ou o estrito cumprimento de dever legal a menos que não observem seus requisitos agindo de forma ofensiva Ora provocação justa não é reprovável Provocação e proporcionalidade Na hipótese de provocação não há exigência de proporcionalidade absoluta embora não seja tolerável uma absoluta desproporcionalidade entre a provocação e a injúria proferida pois a complacência do legislador não pode servir de oportunidade para aproveitadores insensíveis e difamadores vingaremse ou simplesmente exteriorizarem o mal que encerram dentro de si quando algum ingênuo ou inculto indivíduo por exemplo com sua ação temerária oportunize essa benevolência legal 92 Retorsão imediata presença dos protagonistas A provocação deve ser pessoal e direta além é claro de censurável ao passo que como veremos a retorsão deve ser imediata pressupondo nos dois casos a necessidade da presença dos protagonistas para possibilitar a reação Retorsão imediata outra injúria A segunda hipótese de perdão judicial nos crimes contra a honra consiste na retorsão imediata que é outra injúria como se fora uma modalidade light do olho por olho dente por dente ou seja injúria por injúria desde que haja relação de imediatidade isto é sem intervalo de tempo entre uma e outra Retorsão imediata e legítima defesa A retorsão imediata não se confunde com legítima defesa pois quando aquela tem lugar o crime de injúria já está consumado algo impensável em termos de legítima defesa cujo requisito temporal exige a iminência ou atualidade da agressão que não se confunde com agressão passada A reação do agredido para caracterizar a legítima defesa deve ser sempre preventiva visando impedir o início ou prosseguimento da agressão Na retorsão a agressão já findou consumouse a injúria Injúria prolongada e legítima defesa Pode até haver uma pequena confusão entre legítima defesa e retorsão no caso por exemplo quando a retorsão reage a uma injúria prolongada que se não for interrompida produzirá dano ainda maior v g alguém fica proferindo publicamente um arsenal de impropérios ou então com violência ou vias de fato cuja ação apresenta um iter criminis que inclusive pode alongarse além do normal Injúria real e legítima defesa Na injúria real é bem mais fácil a admissibilidade da legítima defesa quando por exemplo a retorsão imediata ocorrer antes de consumarse a violência estando presente o requisito da atualidade ou iminência requerida pela excludente Nesses casos não é necessário que se espere o término definitivo da injúria para retorquila e em o fazendo enquanto está sofrendo essa agressão não deixa de caracterizarse ao mesmo tempo uma legítima defesa Retorsão imediata e desforço imediato A retorsão imediata consistente em outra injúria na verdade assemelhase mais ao desforço imediato excepcionalmente permitido na defesa da posse Com efeito a defesa da posse pelo desforço imediato autorizada pelo art 502 do Código Civil é um bom exemplo de exercício regular de direito no caso de esbulho possessório uma vez que o desforço realizase após a consumação do esbulho sem o requisito da atualidade Se houver esse requisito será hipótese de turbação da posse e poderá caracterizar a legítima defesa da posse Desforço imediato e retorsão imediata identificamse pelo requisito temporal da imediatidade que significa logo após Natureza jurídica da retorsão Logo a natureza jurídica da retorsão imediata é exercício regular de um direito instituído pelo dispositivo em exame e à luz do qual deve ser examinado Retorsão e proporcionalidade No caso da retorsão mais que na provocação reprovável a proporcionalidade assume importância relevante não que se devam medir milimetricamente as ofensas mas é inadmissível por exemplo retorquir uma injúria comum com uma injúria real ou principalmente com uma injúria preconceituosa A desproporção e o abuso são flagrantes e esse aproveitamento da situação é incompatível com os fins do Direito Penal 10 Compensação de injúrias A retorsão imediata não se confunde com compensação de injúrias a não ser no plano puramente comportamental No plano jurídico essa compensação não existe na medida em que o perdão judicial disciplinado no 1º do art 140 somente pode ser concedido àquele que respondeu com injúria à injúria que lhe havia sido atribuída Quem proferiu a injúria retorquida deverá ser condenado sem qualquer benefício legal pois foi sua a iniciativa e sua conduta criminosa desenvolveuse livremente sem uma motivação especial como a de quem responde à ofensa que sofre Injúria real contra injúria real legítima defesa e provocação A questão não é tão simples como pode parecer demandando uma reflexão mais detida Pode tratarse de simples retorsão de uma injúria real já consumada com outra do mesmo gênero pode tratarse de resposta a uma provocação mas pode também caracterizar uma excludente tradicional de criminalidade como por exemplo legítima defesa Injúria real possibilidade de legítima defesa A natureza do crime da injúria real permite em tese a possibilidade de ocorrer legítima defesa quando por exemplo a injúria real é praticada para evitar que outra do mesmo gênero aconteça Devese observar no entanto que os requisitos da excludente têm de fazerse presentes como a iminência ou atualidade da injúria que se quer evitar que não tenha sido provocada por quem reage que haja moderação na repulsa etc Injúria consumada impossibilidade de legítima defesa Mas se a injúria que se quer responder já se consumou não se pode falar em legítima defesa por faltarlhe um requisito fundamental iminência ou atualidade da ofensa Resultando contudo lesões corporais graves cumuladas com injúria real nenhum dos figurantes terá quanto àquelas qualquer benefício Concurso de crimes possibilidade Na última hipótese mencionada já estaremos diante da retorsão ou seja a injúria real está revidando outra já consumada falta o requisito da iminência ou atualidade para a legítima defesa que também exige cautela na sua análise pois os fatos podem assumir qualificações jurídicas distintas Se houve de parte a parte somente vias de fato a conjugação de dispositivos é uma e se houve lesões corporais leves cumuladas com a injúria real os dispositivos serão outros E por fim se resultaram lesões corporais graves a consequência será absolutamente diferente 1º interpretação extensiva As previsões do 1º têm inteira aplicação às hipóteses dos dois parágrafos seguintes Assim no primeiro caso das formulações que propusemos com vias de fato recíprocas aplicase a previsão do inciso II do 1º do art 140 ou seja o juiz pode deixar de aplicar a pena no caso de retorsão imediata que consiste em outra injúria no segundo com lesões corporais leves recíprocas os dispositivos aplicáveis a ambos ofendidos e ofensores são o art 129 5º II em relação à pena pelas lesões corporais e o art 140 1º II em relação à pena pela injúria real Provocação retribuição com injúria real E quando o provocado se limita a retribuir com injúria real por meio de vias de fato Haveria algum benefício ao ofensor ou não O ofendido provocador que se limitou à provocação não praticou qualquer crime contra o ofensor Em razão da provocação relativamente à injúria real o ofensor pode beneficiarse da previsão contida no 1º I se a provocação claro puder ser definida como de forma reprovável exigida pela lei caso contrário essa complacência legal não terá aplicação Provocação retribuição com lesões graves Em relação às lesões graves o ofensor não terá qualquer benefício por falta de previsão legal Nenhuma das lesões leves ou graves incluise na expressão violência contida na descrição típica da injúria real para as leves há a previsão do art 129 5º II enquanto para as graves não há qualquer previsão semelhante ao contrário a previsão que beneficia as lesões corporais leves exclui expressamente as lesões graves não sendo graves as lesões 11 Injúria real qualificada Injúria real é a que é praticada mediante violência ou vias de fato que por sua natureza ou pelo meio empregado consideramse aviltantes Para caracterizála é necessário que tanto a violência quanto as vias de fato sejam em si mesmas aviltantes Violência ou vias de fato A despeito do meio utilizado violência ou vias de fato o atual Código Penal situa a injúria real entre os crimes contra a honra como uma espécie sui generis de injúria qualificada atribuindo corretamente prevalência ao bem jurídico que o sujeito ativo pretende ofender Violência ou vias de fato e injúria real distinção Tanto a violência quanto as vias de fato necessitam ter sido empregadas com o propósito de injuriar caso contrário subsistirá somente a ofensa à integridade ou à incolumidade pessoal A distinção entre uma figura delituosa e outra reside exatamente no elemento subjetivo do tipo que distingue uma infração da outra ainda que o fato objetivo seja o mesmo Sentido e natureza da violência O termo violência empregado no texto legal significa a força física material a vis corporalis Não é necessário que a violência utilizada seja irresistível ou idônea para produzir graves danos basta que possa ser definida como violência e tenha condições de produzir lesões corporais não precisa necessariamente produzila Grave ameaça não caracteriza injúria real A grave ameaça isto é a violência moral vis compulsiva não está incluída como elementar da injúria real pois quando o legislador deseja integrála o faz expressamente Com efeito sempre que o Código Penal usa a expressão violência sem a alternativa ou grave ameaça está excluindo a violência moral limitandose à violência física Vias de fato definição Vias de fato caracterizamse pela prática de atos agressivos sem animus vulnerandi dos quais não resultem danos corporais É a inexistência de lesões corporais aliada à ausência de animus laedendi que caracteriza a ofensa em vias de fato Em outros termos podese considerar vias de fato a ação violenta contra alguém com intenção de causarlhe um mal físico sem contudo ferilo Por exemplo safanões troca de empurrões ou mesmo de alguma bofetada sem causar lesão corporal ou qualquer resultado danoso à saúde ou à integridade física Injúria real necessidade do animus injuriandi A ausência do propósito de ofender na injúria real levará o agente a responder somente pelo crime de lesões corporais art 129 do CP ou pela contravenção de vias de fato art 21 da LCP se estiverem devidamente caracterizados Natureza aviltante da ação Além da violência ou vias de fato e do elemento subjetivo é indispensável que as duas elementares referidas sejam em si mesmas ultrajantes isto é que por sua natureza ou pelo meio empregado diz a lei sejam aviltantes Exemplos de vias de fato Raspagem de cabelo chicotada puxões de orelhas ou de cabelos cuspir em alguém ou em sua direção um tapa no rosto de pessoas adultas etc O tapa no rosto da vítima especialmente com a mão aberta ou com as costas da mão traz em sua essência o desprezo a demonstração de prepotência de superioridade ferindo mais a dignidade humana do que a própria integridade física Violência ou vias de fato cumulação de penas O 2º determina a aplicação da pena que comina além da pena correspondente à violência A contravenção se existir será naturalmente absorvida pela injúria real o que não ocorre com eventual crime concorrente Neste último caso as penas devem ser aplicadas cumulativamente Concurso formal impróprio Não há concurso material de crimes como pode parecer Na verdade há concurso formal em razão da unidade comportamental do agente caracterizador dessa modalidade de concursus delinquentius há somente a aplicação do sistema de cumulação de penas em razão dos desígnios autônomos que orientaram a prática delitiva nos termos do art 70 caput segunda parte 12 Violência e lesões corporais distinção A violência como elementar da injúria real não se confunde com lesão corporal caso contrário o legislador têloia dito como o fez em relação às vias de fato É possível empregar violência isto é força física gestos abruptos exercendoos injuriosamente isto é desrespeitosamente sem contudo tipificarse lesões corporais Injúria real crime único e pena única Há cumulação compulsória de pena na injúria real enquanto crime complexo pois a exemplo do roubo do estupro etc há a violação de dois bens jurídicos honra e incolumidade física mas representando somente uma unidade delitiva ou seja haverá apenas um crime quando a violência não ultrapassar o umbral que lesa a integridade física do ofendido aplicandose somente a pena correspondente ao crime contra a honra Eventual concurso com lesões corporais Quando a violência aviltante constituir em si mesma crime nesse caso e somente nesse caso aplicarseão cumulativamente as penas da injúria e do crime correspondente à violência Com a devida vênia essa é a interpretação que se pode dar ao dispositivo em exame sem violentar a teoria do tipo penal 13 Injúria preconceituosa qualificada A Lei n 9459 de 13 de maio de 1997 criou um novo tipo do crime de injúria nos seguintes termos Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça cor etnia religião ou origem Pena reclusão de 1 um a 3 três anos e multa Posteriormente a Lei n 10741 de 1º de outubro de 2003 acrescentou a menção à condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência Fundamento político da injúria racial O fundamento político da alteração legislativa reside no fato de que a prática de crimes descritos na Lei n 771689 preconceito de raça ou cor não raro era desclassificada para o crime de injúria O legislador em sua política criminalizadora resolveu dar nova fisionomia às condutas tidas como racistas e definiuas como injuriosas com exagerada elevação da sua consequência jurídicopenal Proteção jurídica preconceituosa Há grande desproporção na proteção do bem jurídico honra nesta modalidade e na proteção de outros bens jurídicos dentre os quais o bem jurídico vida que no homicídio culposo recebe menor punição a pena isoladamente aplicada é de detenção de um a três anos ao passo que nesta modalidade de injúria é de reclusão a mesma quantidade cumulada com multa Na verdade a própria proteção jurídica é preconceituosa 131 Condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência Custa crer na possibilidade de injuriarse alguém por sua condição de idoso ou portador de deficiência contudo se ocorrer conhecendo o agente tal circunstância inegavelmente aumenta a desvalia da ação injuriosa justificandose a maior reprovação 14 Dolo e elemento subjetivo especial do tipo Para a configuração da injúria por preconceito é fundamental além do dolo representado pela vontade livre e consciente de injuriar a presença do elemento subjetivo especial do tipo constituído pelo especial fim de discriminar o ofendido por razão de raça cor etnia religião origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência Equívocos e excessos condenáveis Têmse cometido equívocos deploráveis com a nova lei pois simples desentendimentos têm gerado prisões e processos criminais de duvidosa legitimidade especialmente quando envolvem policiais negros e se invoca sem qualquer testemunho idôneo a prática de crime de racismo ou então simples discussões rotineiras ou em caso de mau atendimento ao público quando qualquer das partes é de cor negra invocase logo crime de racismo independentemente do que tenha realmente havido Cautela redobrada na avaliação Recomendase mais que nos outros fatos delituosos extrema cautela para não se correr o risco de inverter a discriminação preconceituosa com o uso indevido e abusivo da proteção legal Enfim recomendase muita cautela para se evitar excessos e coibir as transgressões legais efetivas sem contribuir para o aumento das injustiças 15 Pena e ação penal 151 Pena cominada A sanção penal para a figura simples é alternativa detenção de um a seis meses ou multa caput na injúria real é cumulativa detenção de três meses a um ano e multa além da pena correspondente à violência 2º finalmente a injúria por preconceito é sancionada cumulativamente com reclusão de um a três anos e multa 3º 152 Natureza da ação penal A ação penal a exemplo da calúnia e da difamação como regra geral é de exclusiva iniciativa privada art 145 será no entanto pública condicionada art 145 parágrafo único quando a praticada contra Presidente da República ou contra chefe de governo estrangeiro com requisição do Ministro da Justiça b contra funcionário público em razão de suas funções com representação do ofendido A terceira exceção à regra geral segundo o texto legal ocorre quando na injúria real da violência resultar lesão corporal arts 140 2º e 145 caput segunda parte Essa é uma peculiaridade exclusiva da injúria que os outros crimes contra a honra calúnia e difamação não têm Lei n 909995 influência do art 88 O art 88 da Lei n 909995 estabelece que a lesão corporal leve ou culposa é de ação pública condicionada à representação Assim é indispensável que se estabeleça uma distinção entre lesão corporal leve e lesão corporal grave ou gravíssima no caso da primeira a ação penal será pública condicionada à representação no caso das outras lesões será pública incondicionada Mas nesta hipótese há mais uma ressalva a fazer a ação penal será pública incondicionada somente em relação às lesões uma vez que em relação à injúria mantémse a exclusiva iniciativa privativa do ofendido ou seu representante legal Injúria e lesões litisconsórcio ativo Na realidade nessa hipótese havendo interesse do ofendido em propor a ação privada pelo crime de injúria cumulativa com a ação pública condicionada por lesões leves incondicionada por lesões graves ocorrerá litisconsórcio ativo entre o ofendido e o Ministério Público Por fim a injúria nunca será crime de ação pública incondicionada mesmo quando da violência resultar lesão corporal grave 16 Pena e ação penal da injúria por preconceito 161 Pena cominada Um a três anos de reclusão e multa Referida sanção equiparase à sanção aplicável ao homicídio culposo afora a existência de eventual majorante que pode duplicála ferindo o princípio da proporcionalidade que tradicionalmente vem sendo ignorado em toda a última década 162 Natureza da ação penal iniciativa privada A Lei n 945997 que criminalizou a injúria preconceituosa equivocouse quanto à natureza da ação penal correspondente a despeito do rigor sancionatório a mesma pena de um homicídio culposo isso sem as majorantes mantevea de exclusiva iniciativa privada Tratase de postura discriminatória do legislador que ao desincumbirse de uma missão espinhosa deu com uma mão e tirou com a outra criminalizou a conduta mas não impôs a obrigatoriedade da ação penal 17 Questões especiais A testemunha que depõe não pratica injúria a menos que seja visível a intenção de injuriar Em discussão por falta do elemento subjetivo não há injúria quando as ofensas são produto de incontinência verbal A injúria pode configurar em determinadas circunstâncias os crimes de desacato art 331 ou ultraje a culto art 208 J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Injúria Como afirmou a Magistrada analisando a prova do processo para condenar o recorrente pela prática do crime de injúria As afirmações de que a querelante estaria agindo de forma desonrosa retratando o seu desequilíbrio com gesto desleal impensado leviano e malintencionado sem dúvidas ofende sua honra subjetiva e caracteriza a hipótese de injúria as expressões empregadas pelo querelado sem necessidade foram além da argumentação e de levar àquele juízo fatos e informações do interesse da demanda As ofensas constantes contaram com o dolo de diminuir de ferir de machucar ofendendo a honra da querelante TJRS Apelação 70019684505 Rel Sylvio Baptista Neto j 30102007 Os crimes de difamação e injúria prescritos respectivamente nos arts 325 e 326 do Código Eleitoral exigem finalidade eleitoral para que restem configurados Sendo os eventuais crimes de difamação e injúria praticados em conversa privada por candidato ao pleito eleitoral contra pessoa não diretamente interessada nas eleições e aparentemente sem fins de obter vantagem eleitoral restam afastadas as figuras típicas especiais dos arts 325 e 326 do Código Eleitoral e subsistem os tipos penais previstos nos arts 139 e 140 do Código Penal se for o caso STJ Conflito de Competência 72448RS Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 1292007 O crime do art 20 da Lei n 771689 na modalidade de praticar ou incitar a discriminação ou preconceito de procedência nacional não se confunde com o crime de injúria preconceituosa art 140 3º do CP Este tutela a honra subjetiva da pessoa Aquele por sua vez é um sentimento em relação a toda uma coletividade em razão de sua origem nacionalidade No caso em tela a intenção dos réus em princípio não era precisamente depreciar o passageiro a vítima mas salientar sua humilhante condição em virtude de ser brasileiro ie a ideia foi exaltar a superioridade do povo americano em contraposição à posição inferior do povo brasileiro atentandose dessa maneira contra a coletividade brasileira Assim suas condutas em tese subsumemse ao tipo legal do art 20 da Lei n 771686 STJ RHC 19166RJ Rel Min Félix Fischer j 24102006 Disposições comuns Art 141 As penas cominadas neste Capítulo aumentamse de um terço se qualquer dos crimes é cometido I contra o Presidente da República ou contra chefe de governo estrangeiro II contra funcionário público em razão de suas funções III na presença de várias pessoas ou por meio que facilite a divulgação da calúnia da difamação ou da injúria IV contra pessoa maior de 60 sessenta anos ou portadora de deficiência exceto no caso de injúria Inciso IV acrescentado pela Lei n 10741 de 1º de outubro de 2003 V art 65 III e do CP Parágrafo único Se o crime é cometido mediante paga ou promessa de recompensa aplicase a pena em dobro Exclusão do crime Art 142 Não constituem injúria ou difamação punível I a ofensa irrogada em juízo na discussão da causa pela parte ou por seu procurador V art 133 da CF II a opinião desfavorável da crítica literária artística ou científica salvo quando inequívoca a intenção de injuriar ou difamar V art 5º IX da CF III o conceito desfavorável emitido por funcionário público em apreciação ou informação que preste no cumprimento de dever do ofício Parágrafo único Nos casos dos ns I e III responde pela injúria ou pela difamação quem lhe dá publicidade Retratação Art 143 O querelado que antes da sentença se retrata cabalmente da calúnia ou da difamação fica isento de pena V art 107 VI do CP Art 144 Se de referências alusões ou frases se infere calúnia difamação ou injúria quem se julga ofendido pode pedir explicações em juízo Aquele que se recusa a dálas ou a critério do juiz não as dá satisfatórias responde pela ofensa Art 145 Nos crimes previstos neste Capítulo somente se procede mediante queixa salvo quando no caso do art 140 2º da violência resulta lesão corporal Parágrafo único Procedese mediante requisição do Ministro da Justiça no caso do n I do art 141 e mediante representação do ofendido no caso do n II do mesmo artigo V art 100 1º e 2º do CP V art 5º II do CPP D O U T R I N A 1 Formas majoradas dos crimes contra a honra Os crimes contra a honra com exceção da injúria não têm figuras qualificadas No entanto circunstâncias de especial gravidade relativas à condição ou qualidade do sujeito passivo ou mesmo em relação ao modo meio ou motivo da ação podem autorizar a elevação da pena aplicável Essas hipóteses art 141 que não se confundem com qualificadoras são causas de aumento Quantum de aumento Referidas causas permitem a elevação da pena aplicada em um terço mas se o fato for cometido mediante paga ou promessa de recompensa o parágrafo único autoriza a duplicação da pena imposta 2 Presidente da República ou chefe de governo estrangeiro Essa proteção reforçada da honorabilidade do Presidente da República estendese expressamente a chefe de governo estrangeiro por razões não apenas de política criminal mas também de política diplomática que objetivam as boas relações internacionais Enfim a alta relevância política da função exercida pelo Presidente da República primeiro mandatário da Nação justifica essa majoração legal Fundamento político da majorante Basicamente as mesmas razões que impedem a utilização do instituto da exceção da verdade nos crimes praticados contra a honra do Presidente da República e de chefe de governo estrangeiro justificam a majoração da pena considerandose a alta relevância política das funções que exercem Chefe de governo estrangeiro A interpretação do sentido ou da abrangência da locução chefe de governo estrangeiro em se tratando de majorante não pode ter a mesma liberalidade interpretativa concedida quando funciona como causa de exclusão da exceção da verdade Questionamse simplesmente os limites das garantias históricas do Direito Penal que não podem ser violadas a nenhum título ou pretexto e sob nenhum fundamento político ou jurídico sem macular a própria Constituição Federal Chefe de governo e chefe de Estado Para impedir a exceção da verdade admitimos a ampliação do sentido da expressão chefe de governo para abranger chefe de Estado art 138 2º porque objetiva preservar a honorabilidade dessa autoridade mas essa ampliação interpretativa contudo será impossível para majorar a pena art 141 I por violar o princípio da reserva legal algo inadmissível em um Estado Democrático de Direito 3 Contra funcionário público em razão de suas funções É indispensável que no momento do fato o ofendido ostente a qualidade de funcionário público e que a ofensa lhe tenha sido dirigida em razão de suas funções ou seja é necessária uma espécie de vínculo ou de relação entre o ato ofensivo e a função exercida pelo ofendido Relação de causa e efeito função pública e ofensa Deve enfim haver entre o exercício da função pública e a ofensa irrogada uma relação de causa e efeito sendo insuficiente a simples condição de funcionário público ou simples oportunidade Ofensa à atividade particular Quando a ofensa referirse à vida particular do funcionário público sem qualquer relação com a função pública que desempenha a agravante não existe Igualmente quando a ofensa ocorrer após a demissão do cargo ou função pública não se há que falar na majorante pois não existe a atualidade da função exigida pela lei Funcionário público honra pessoal O bem jurídico protegido é a honra pessoal no caso do funcionário público que por ostentar essa condição merece maior proteção e não do Estado que tampouco é o ofendido da história Administração Pública ofensa mediata Mediatamente porém a própria Administração acaba sendo atingida no seu prestígio e honorabilidade e só por isso se justifica a majoração penal A ofensa ao funcionário público não atinge somente a sua dignidade pessoal mas também por extensão o prestígio da própria função pública que exerce Ofensa à honra e desacato Se por fim a ofensa é proferida na presença ou diretamente ao funcionário público no exercício da função ou em razão dela o crime deixa de ser contra a honra para tipificar o desacato art 331 que é crime contra a Administração Pública 4 Na presença de várias pessoas Na presença de várias pessoas significa de um grupo indeterminado ilimitado no máximo e que contenha no mínimo três excluídos autores e vítima Na realidade toda vez que o Código Penal se refere a pluralidade de pessoas se contenta com duas por isso várias pessoas não podem ser menos de três Exclusão dos incapazes É indispensável que as várias pessoas possam ouvir perceber entender ou presenciar a manifestação ofensiva Assim não integram o cômputo mínimo aquelas pessoas que por deficiência de sentidos forem incapazes de testemunhar a ofensa por exemplo o cego o surdo o louco a criança inocente etc ou quando a ofensa é proferida em idioma que os presentes desconhecem Situação de perigo potencialidade divulgadora Este inciso prevê como majorante uma situação de perigo e não de dano que pode ser caracterizada de duas formas na presença de várias pessoas ou por meio que facilite a divulgação da ofensa Qualquer dessas formas possibilita a ocorrência de maior dano ao ofendido pela maior facilidade de divulgação da ofensa irrogada Idoneidade para divulgar Não é necessário que a ofensa seja divulgada sendo suficiente que qualquer das formas empregada seja idônea para divulgála pois como dissemos estas configuram situação de perigo e não de dano Consciência da pluralidade de pessoas O agente deve estar ciente da existência da pluralidade de pessoas presentes Se por qualquer razão mesmo em lugar público a diversidade de pessoas não foi ou nem poderia ser vista ou não era do conhecimento do agente a majorante não se configura pois não fora abrangida pelo dolo 5 Meio que facilita a divulgação da ofensa São meios que facilitam a divulgação escrito e pichações em vias públicas e muros pintura escultura disco altofalante etc Meios de divulgação por excelência são aqueles que constituem a denominada imprensa também conhecidos como meios de comunicação Desnecessidade da efetiva divulgação Não é necessário que a divulgação tenha efetivamente ocorrido basta o emprego de meio capaz de facilitar a divulgação Mas não se pode esquecer é preciso que o meio utilizado tenha condições de facilitar a divulgação ou seja precisa ser usado de modo que crie o perigo de divulgação caso contrário a majorante é inaplicável 6 Condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência O legislador apenas repete neste dispositivo a mesma majorante que acrescentou para o crime de injúria É indispensável convém registrar que o sujeito ativo conheça as condições da vítima quer de pessoa idosa inclusive que é maior de sessenta anos quer de portadora de deficiência O desconhecimento de tais condições afasta o dolo do agente 7 Mediante paga ou promessa de recompensa Nos crimes contra a honra a paga ou promessa de recompensa é excepcionalmente elevada à condição de causa de aumento de pena Tratase do chamado crime mercenário que sempre revela maior torpeza do agente tornandoo merecedor de maior reprovação penal Nesse caso em que a pena aplicada deve ser dobrada mandante e executor respondem igualmente pelo crime com pena majorada Paga ou promessa distinção Esta majorante não exige habitualidade sendo suficiente a sua eventual ocorrência Pode apresentarse sob duas formas paga ou promessa na primeira há o recebimento efetivo na segunda há o compromisso de recompensar A recompensa normalmente é monetária nada impedindo porém que possa assumir outra natureza de vantagem economicamente apreciável 8 Consentimento do ofendido afasta a tipicidade O consentimento do ofendido a despeito de algumas divergências exclui a própria tipicidade da conduta ofensiva alguns autores sustentam que é a antijuridicidade que fica excluída Mas somente o titular do bem lesado pode consentir e não seu representante legal 9 Renúncia e perdão excluem a punibilidade A renúncia ou o perdão que não deixam de significar uma espécie de consentimento ainda que tardiamente manifestado excluem apenas a punibilidade porque o crime já se aperfeiçoou 10 Causas especiais de exclusão de crimes Além dessas causas justificantes comuns a outras infrações penais nestes crimes podem existir circunstâncias especiais capazes de excepcionalmente justificar a prática da conduta geralmente ofensiva Essas causas especiais de exclusão de crime estão relacionadas no art 142 do CP 101 Natureza jurídica das excludentes especiais Há três correntes 1ª causas de exclusão de pena subsistindo portanto a estrutura criminosa da conduta 2ª causas de exclusão da antijuridicidade quando subsistiria a tipicidade do fato sendo excepcionalmente afastada somente a contrariedade ao direito em razão dessas circunstâncias que legitimariam a ação 3ª causas de exclusão da tipicidade ante a ausência do animus vel diffamandi que não ignora porém a possibilidade da exclusão da ilicitude do fato Na verdade as duas últimas acepções praticamente se confundem ou se complementam 102 Nossa posição exclusão de crime Com efeito a exclusão é de crime e não de pena ou desaparece a tipicidade pela falta do animus ofendendis ou desaparece a antijuridicidade pela excepcional autorização da prática de uma conduta típica para preservar interesse social relevante As excludentes aqui relacionadas referemse somente à difamação e à injúria não abrangendo a calúnia como já referido 103 Natureza constitutiva da previsão do art 142 Os preceitos contidos no art 142 do CP são constitutivos pois criam o fundamento das causas especiais de exclusão do crime Não são puramente declaratórios isto é não têm a finalidade exclusiva de lembrar ao julgador que a ofensa perde o caráter de antijurídica quando constitui meio adequado para atingir um fim permitido Seria paradoxal adjetivar de ilícito um meio justo utilizado para um fim justo para só finalmente afirmar que a pena é inaplicável ante a especial autorização legal da conduta 104 Excludentes especiais e elemento subjetivo Como se exige o dolo para a configuração do tipo exigese igualmente o mesmo dolo de agir autorizadamente Não estará por exemplo amparado em legítima defesa quem agir movido por vingança ainda que se comprove a seguir que a vítima estava prestes a sacar sua arma para matálo Em outras palavras só age em legítima defesa quem o faz com animus defendendi A presença do elemento subjetivo afasta o desvalor da ação pois na verdade age conforme ao direito 105 Consciência e vontade de agir corretamente Não basta que ocorra objetivamente a excludente de criminalidade mas é necessário que o autor saiba e tenha vontade de atuar de forma autorizada de forma juridicamente permitida ou seja nos moldes em que lhe assegura o art 142 Quem por exemplo age movido por ódio vingança ou simplesmente com o propósito de ofender à evidência não pode acobertarse sob uma pretensa imunidade penal 11 Espécies de excludentes especiais a Ofensa irrogada em juízo I para que haja a exclusão a ofensa deve relacionarse diretamente com a causa em questão É também conhecida como imunidade judiciária Incluemse como partes autor réu litisconsorte interveniente Prevalece o entendimento majoritário doutrináriojurisprudencial de que a exclusão não inclui as ofensas irrogadas contra o juiz embora o Supremo tenha recomendado tolerância dos juízes STF RTJ 87854 b Crítica literária artística ou científica II a crítica prudente fundamentada não traz em seu bojo conteúdo ilícito seja de natureza literária artística ou científica Essa avaliação crítica faz parte da liberdade de expressão que está no mesmo nível da própria expressão literária artística e científica que hoje não encontra censura oficial A imunidade não é aplicável quando for inequívoco o propósito de ofender c Conceito desfavorável emitido por funcionário público III esta imunidade aplicase somente quando o conceito for emitido no cumprimento de dever de ofício É indispensável que se trate de ato praticado no cumprimento de dever funcional ou seja no desempenho de suas funções legais dentro das atribuições do funcionário 111 Ofensa irrogada em juízo I imunidade judiciária Para que haja a exclusão a ofensa deve relacionarse diretamente com a causa em questão Logo dois requisitos precisam fazerse presentes a que a ofensa seja irrogada em juízo b que se relacione com a causa em discussão Assim é indispensável uma relação causal entre o embate e a ofensa Fundamento político da imunidade judiciária A excludente neste caso justificase por duas razões básicas de um lado para assegurar a mais ampla defesa dos interesses postos em juízo sem o receio de que determinado argumento ou determinada expressão possa ser objeto de imputação criminal de outro lado a veemência dos debates o ardor com que se defende esses direitos pode resultar eventualmente em alusões ofensivas à honra de outrem embora desprovidas do animus ofendendi Ampliação constitucional da imunidade do advogado A Constituição Federal de 1988 ampliou a imunidade do advogado à semelhança do parlamentar declarandoo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão nos limites da lei art 133 da CF Os limites e o conteúdo dessa inviolabilidade abordaremos em tópico especial sob a rubrica imunidade profissional Limites subjetivos da imunidade judiciária O texto legal referese expressamente à parte ou seu procurador Parte é qualquer dos sujeitos da relação processual autor réu litisconsorte e interveniente etc procurador por sua vez é o representante legal da parte com capacidade postulatória ou seja o advogado que é indispensável à administração da justiça art 133 da CF 1ª parte Ministério Público enquanto parte O Ministério Público é parte e se faz representar por um de seus órgãos Expressões ofensivas podem ser trocadas entre as partes ou dirigidas por estas a qualquer outro mesmo estranho à relação processual desde que se relacionem com a causa em debate Outros agentes processuais exclusão Outros agentes processuais como por exemplo juiz escrivão perito testemunha não estão acobertados pela imunidade judiciária podendo eventualmente resguardarse pelo inciso III na condição de funcionários públicos ou ainda pelo art 23 III 1ª parte desde que ajam no estrito cumprimento de dever legal Ofendido estranho à relação processual Como o texto legal não refere que a injúria ou difamação deve ser dirigida contra a parte contrária ou seu procurador não exclui a imunidade mesmo quando a ofensa é dirigida contra alguém estranho à relação processual exemplo testemunha perito ou qualquer terceiro desde que haja conexão com a causa em discussão Essa ausência de restrição legal vem a adequarse ao princípio da ampla defesa Ofensa contra o juiz da causa A imunidade judiciária abrange inclusive a ofensa que é irrogada contra o juiz da causa O Poder Judiciário tem demonstrado grande dificuldade em absorver a inviolabilidade do advogado quando no exercício da profissão profere ofensa dirigida a magistrado embora o Supremo Tribunal Federal tenha recomendado tolerância dos juízes STF RTJ 87854 Ofensa contra juiz da causa entendimento doutrinário Damásio de Jesus A interpretação da disposição ao contrário do que entende pacificamente a jurisprudência não conduz à conclusão de que a exclusão da ilicitude não alcança a hipótese de ofensa irrogada ao juiz na discussão da causa O tipo permissivo não faz nenhuma restrição à pessoa ofendida Heleno Cláudio Fragoso referindose à jurisprudência contrária Tratase de distinção inadmissível que cria uma exceção não prevista em lei Inviolabilidade profissional em juízo ou fora dele Segundo a Constituição o advogado é inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão nos limites da lei art 133 E a lei determina que O advogado tem imunidade profissional não constituindo injúria difamação ou desacato puníveis qualquer manifestação de sua parte no exercício de sua atividade em juízo ou fora dele sem prejuízo das sanções disciplinares perante a OAB art 7º 2º da Lei n 890694 Exclusão do juiz ranço corporativo proscrito A partir desse diploma legal aquele entendimento jurisprudencial majoritário segundo o qual as ofensas irrogadas contra o juiz não eram abrangidas pela imunidade penal do art 142 encontrase completamente superado em relação ao advogado a despeito da reticente posição do Supremo Tribunal Federal Imunidade constitucional do advogado limites A Constituição art 133 e a Lei n 890694 art 7º 2º estabelecem os limites que devem ser respeitados pelos nossos pretórios especialmente pela Corte Suprema que é o seu guardião Aquele entendimento superado a nosso juízo equivocado restringese à parte não podendo alcançar o advogado que passou a ter imunidade semelhante à do parlamentar Eventual excesso ressalva a Lei n 890694 estará sujeito às sanções disciplinares Imunidade profissional constitucionalidade A imunidade atribuída ao advogado disciplinada pela Lei n 890694 que inclui o crime de desacato no exercício profissional em juízo ou fora dele é absolutamente constitucional e não há nenhuma ilegitimidade no fato de não ser estendida essa inviolabilidade aos demais sujeitos da relação processual especialmente às partes do processo Aliás o advogado não é parte mas procurador e a inviolabilidade profissional foi reconhecida somente a ele art 133 e não às partes pela própria Constituição Fundamento da imunidade constitucional O constituinte brasileiro percebeu a dificuldade do mister exercido pelo advogado e do múnus público que assume no patrocínio da busca da Justiça reconhecendo a necessidade de assegurarlhe a inviolabilidade de suas manifestações quando no exercício desse múnus em juízo ou fora dele O Ministério Público e o juiz têm suas próprias garantias constitucionais que tampouco se estendem ao advogado e nem por isso são inconstitucionais Imunidades judiciárias e inviolabilidade do advogado Assim como a vitaliciedade a inamovibilidade e a irredutibilidade de vencimentos são inerentes às atividades do Judiciário e do Ministério Público esta a inviolabilidade profissional agora assegurada pela Constituição Federal é igualmente inerente à atividade profissional do advogado aliás reconhecido pela própria Constituição Federal como indispensável à administração da justiça art 133 1ª parte No exercício da atividade em juízo ou fora dele A Lei n 890694 inegavelmente ampliou a imunidade do advogado que pelo Código Penal limitavase às ofensas irrogadas em juízo No entanto a atividade postulatória é exercida em todos os pleitos em que alguém precise ou queira fazerse representar por advogado em juízo ou fora Não se trata de inviolabilidade ilimitada ao contrário o seu limite está contido na própria lei qual seja no exercício da atividade profissional Limites éticos e jurídicos da inviolabilidade Buscase com a inviolabilidade profissional assegurar o exercício de uma advocacia ética e indispensável à administração da justiça que não se confunde com autorização para levianamente usar os meios de comunicação de massa para realizar verdadeiros debates processuais com linguagens desnecessárias e inadequadas resvalando não raro para ataques pessoais Advogados magistrados e o Ministério Público ninguém está autorizado a abusar dos meios de comunicação deslocando o cerne do processo sob a falácia da publicidade dos atos processuais 112 Crítica literária artística ou científica II Obras literárias artísticas ou científicas estão naturalmente sujeitas a exame análise ou avaliação críticas das quais o autor não pode subtrairse a menos que prefira mantêlas inéditas A crítica prudente fundamentada realizada com animus criticandi não traz em seu bojo conteúdo ilícito seja de natureza literária artística ou científica Crítica da obra e do autor O fato é que o CP admite o exame crítico por mais severo que seja não apenas de determinada obra mas da produção geral e inclusive da capacidade do próprio autor desde que elaborada com a linguagem necessária e suficiente para exprimir o pensamento do crítico Inequívoco propósito de ofender O CP ressalva que a imunidade não é aplicável quando for inequívoco o propósito de ofender Não seria ético nem justo permitir que o literato o artista ou o cientista ficassem expostos ao ataque irresponsável e impune à sua dignidade e reputação por parte de quem quer que desejasse criticálos 113 Conceito desfavorável emitido por funcionário público III Por vezes o funcionário público pode ser levado a usar termos ou expressões ofensivos mas necessários ao fiel relato dos fatos ou argumentos É indispensável para o bom exercício da função pública conceder essa proteção ao servidor que tem o dever legal de informar ou relatar com seriedade e exatidão o que seu cargo ou função lhe atribui Limites da imunidade dever de ofício Esta imunidade aplicase somente quando o conceito for emitido no cumprimento de dever de ofício e ainda quando representar meio adequado ao exercício de um dever funcional caso contrário ultrapassará os limites do estrito dever legal Adequação do meio ao fim pretendido A imunidade funcional limitase ao objeto do relatório da informação da comunicação ou parecer e nos limites do necessário não há liberdade para ultrajar mesmo em nome do dever de ofício quando se mostrar desnecessário desarrazoado ou prepotente Em outros termos devese atentar para a adequação do meio ao fim pretendido Necessidade da ausência do propósito de ofender Se a ofensa não tiver relação direta com o ato funcional mas com o propósito de ofender não se caracteriza a excludente especial como por exemplo aquele que estiver relatando ou informando sobre determinado indivíduo aproveitar a oportunidade para tecer considerações desairosas sobre terceiro ou mesmo relativas ao próprio relatado Animus ofendendi descaracteriza a imunidade Em qualquer das excludentes inclusive da imunidade profissional quando há a inequívoca intenção de ofender é insustentável pretender que a conduta seja protegida pela imunidade do art 142 sendo irrelevante a inexistência nos incisos I e III da ressalva constante do inciso II conforme já demonstramos acima Publicidade da injúria e da difamação Responde pela injúria ou difamação quem dá publicidade nas hipóteses dos itens I e III isto é o parágrafo único do art 142 referese somente à ofensa irrogada em juízo e ao conceito desfavorável emitido por funcionário público no exercício de seu dever funcional 12 Exclusão do crime de calúnia A imunidade contida no dispositivo em exame referese somente à difamação e à injúria não abrangendo a calúnia O Código Penal dispensalhe no entanto tratamento democrático não lhe concede imunidade mas permite a exceção da verdade É justo pois ou o ofensor prova a veracidade da acusação ou responde por ela sem imunidade 13 Retratação definição Retratação é o ato de desdizerse de retirar o que se disse Retratação não se confunde com negação do fato ou negativa de autoria pois retratação pressupõe o reconhecimento de uma afirmação confessadamente errada inverídica É necessário que o agente se desdiga isto é retire expressamente o que afirmara Pela retratação o agente reconsidera a afirmação anterior e assim procura impedir o dano que poderia resultar da sua falsidade Injúria não admite retratação A retratação nos crimes contra a honra é admitida somente na calúnia e difamação sendo inadmitida na injúria 131 Falsa perícia e falso testemunho A retratação ou declaração da verdade também exclui a punibilidade na falsa perícia ou no falso testemunho A declaração da verdade é o meio de corrigir o silêncio com o qual o agente a ocultou art 342 3º Nesta hipótese a retratação deve ser completa e ocorrer antes da publicação da sentença no processo em que ocorreu a falsidade 132 Efeitos da retratação Os efeitos decorrentes da retratação são limitados à área criminal não havendo nenhum reflexo no plano indenizatório por exemplo O próprio Código Penal encarregase de definir a natureza jurídica da retratação ao relacionála como causa extinta da punibilidade art 107 VI Extinção da punibilidade política criminal Foram razões puramente de política criminal que levaram o legislador de 1940 a optar por atribuir o efeito extintivo da punibilidade à retratação cabal e definitiva levada a efeito antes da sentença Nesse sentido admitimos o entendimento de Hungria segundo o qual A retratação é uma espécie de arrependimento eficaz art 13 que se opera após o eventus sceleris 133 Forma conteúdo e momento processual da retratação a Forma e conteúdo da retratação Não há exigência de qualquer formalidade para a validade da retratação É suficiente que seja por escrito nos autos deve ser completa cabal isto é abrangendo tudo o que o ofensor disse contra o ofendido e incondicional Sua incondicionalidade justificase por ser ato unilateral e produzir efeitos independentemente da aceitação da vítima Pode ser feita pelo próprio ofensor ou por seu procurador com poderes especiais para esse fim Concurso de pessoas incomunicabilidade É uma circunstância subjetiva de caráter pessoal que não se comunica aos demais participantes na hipótese de concurso de pessoas Em se tratando de concurso de crimes calúnia e difamação a retratação produz seus efeitos somente em relação ao crime ou fato a que se refere Concurso de crimes retratação de alguns Havendo dois crimes o agente pode retratarse em relação a um e manter a imputação em relação a outro sem que isso sirva para invalidar a retratação e essa individualização tampouco pode ser entendida como retratação parcial condicional ou incompleta pois esses atributos são exigíveis em relação a cada fato em particular capazes de configurar uma unidade delitiva b Validade da retratação momento processual A previsão legal permite que a retratação possa ser feita somente até antes da publicação da sentença embora haja decisão admitindo sua realização até antes do julgamento do recurso Na verdade retratação proferida após a publicação da sentença mesmo recorrível é absolutamente ineficaz para fins de extinção da punibilidade Deverá no máximo ser considerada na dosimetria penal 14 Retratação nos crimes de ação pública condicionada possibilidade A doutrina e a jurisprudência de modo geral sustentam que a retratação somente é admissível nos crimes de exclusiva iniciativa privada Mas os tribunais também já andaram admitindo que a retratação pode existir independentemente de tratarse de ação privada ou pública condicionada Adotamos a segunda orientação desde que seus requisitos legais estejam presentes independentemente da natureza da ação penal privada ou pública condicionada 15 Pedido de explicações em juízo interpelação judicial Quando houver dúvida na manifestação de alguém quem se julgar ofendido pode pedir explicação em juízo nos precisos termos do art 144 Quem se recusa a dálas ou a critério do juiz não as dá satisfatoriamente responde pela ofensa Natureza cautelar do pedido de explicação A interpelação judicial é providência de natureza cautelar destinada a preparar a futura ação penal O ofendido ao formulála postula uma tutela penalcautelar objetivando esclarecer situações equívocas ambíguas ou dúbias buscando viabilizar o exercício de futura ação penal Recusarse a dar explicações ou dálas insatisfatoriamente A segunda parte do dispositivo em exame quem se recusa a dá las ou a critério do juiz não as dá satisfatórias responde pela ofensa é obscura e tem sido objeto de justificados equívocos O interpelado pode recusarse a prestar explicações ou prestálas insatisfatoriamente e nem por isso poderá por si só ser considerado culpado caso contrário teríamos aí um novo tipo penal implícito Não prestar explicações em juízo ou prestálas de forma insatisfatória Consequência da insuficiência das explicações Deixar de prestar as explicações solicitadas ou prestálas de forma insatisfatória apenas autorizará o recebimento da preambular da ação penal queixa ou denúncia conforme o caso Só isso Durante a instrução criminal é que se deverá provar a existência ou inexistência do crime contra a honra e dessa instrução é que se extrairá o resultado final condenatório ou absolutório Competência para julgamento das explicações O juiz que recebe o pedido de explicações que é uma interpelação judicial embora nosso Código não utilize essa terminologia não deve emitir qualquer juízo quer sobre a admissibilidade da interpelação quer sobre a eficácia ou natureza das explicações prestadas ou deixadas de prestar Competência do juiz de eventual ação penal A competência para avaliar julgar neste caso parecenos uma expressão muito forte a eficácia ou prestabilidade das explicações será do juiz da eventual ação penal quando esta for proposta e se for Na realidade o juiz não julga a natureza das explicações ou a sua recusa mas havendo o oferecimento da peça preambular da ação penal denúncia ou queixa num exame prévio sobre a inexistência de justa causa avaliará se as explicações atendem os postulados do art 144 Concebendoas como satisfatórias rejeitará a queixa ou a denúncia o mesmo deverá ocorrer com eventual recusa do interpelado que silencia Juízo de equivocidade O juízo de equivocidade é do próprio ofendido e não do juiz que processa o pedido de explicação Aliás o juiz não julga nem a equivocidade das palavras que podem ter caráter ofensivo nem a recusa ou a natureza das explicações apresentadas Rito procedimental Os diplomas criminais Código Penal e Código de Processo Penal não disciplinam o rito do pedido de explicações em juízo Ante essa omissão o rito processual ou procedimental será o das notificações ou interpelações judiciais disciplinadas no Código de Processo Civil arts 867 a 873 16 Ação penal nos crimes contra a honra 161 Fase preliminar da ação penal A ação penal constitui apenas uma fase da persecução penal que pode iniciar com as investigações policiais inquérito policial sindicância administrativa Comissão Parlamentar de Inquérito etc Essas investigações preliminares são meramente preparatórias de uma futura ação penal 162 Início da ação penal A ação penal propriamente somente nascerá em juízo com o oferecimento de denúncia pelo Ministério Público em caso de ação pública ou de queixa pelo particular quando se tratar de ação penal privada O recebimento de uma ou de outra marcará o início efetivo da ação penal 163 Regra geral ação de exclusiva iniciativa privada A ação penal nos crimes contra a honra como regra geral é de exclusiva iniciativa privada art 145 ao contrário do Código Penal onde a ação penal pública incondicionada é a regra geral 164 Primeira exceção pública condicionada Será pública condicionada art 145 parágrafo único quando a praticada contra Presidente da República ou contra chefe de governo estrangeiro com requisição do Ministro da Justiça b contra funcionário público em razão de suas funções com representação do ofendido 165 Segunda exceção pública incondicionada A ação penal será pública incondicionada arts 140 2º e 145 caput 2ª parte quando na injúria real da violência resultar lesão corporal Essa é uma peculiaridade exclusiva da injúria que os outros crimes contra a honra calúnia e difamação não têm No entanto a ação penal será pública incondicionada somente em relação às lesões corporais pois em relação ao crime de injúria a ação penal continua de exclusiva iniciativa privada 166 Influência do art 88 da Lei n 909995 Com o advento da Lei n 909995 que transformou a natureza da ação penal no crime de lesões corporais leves devese rever essa previsão no crime de injúria Assim quando da violência resultarem lesões corporais leves a ação penal será pública condicionada à representação e somente quando resultarem lesões graves a ação penal será pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 147 do STJ Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes praticados contra funcionário público federal quando relacionados com o exercício da função A imunidade prevista no art 142 inciso I do Código Penal não abrange a ofensa caracterizada como calúnia HC 84107 Segunda Turma Rel Min Carlos Velloso DJU de 1862004 Ainda que se entenda que o preceito do art 142 I do Código Penal abrange as ofensas irrogadas ao Magistrado da causa em virtude do disposto no art 7º 2º da Lei n 890694 Estatuto da OAB e no art 133 da Carta Magna tal imunidade não é absoluta dela se excluindo atos gestos ou palavras que manifestamente desbordem do exercício da profissão como a agressão física ou moral o insulto pessoal e a humilhação pública STF AO 933AM Tribunal Pleno Rel Min Carlos Britto DJU de 622004 STJ RHC 21070TO Rel Min Félix Fischer j 4102007 Crime contra a honra Magistrado Exercício da função jurisdicional Imunidade judiciária Aplicação do art 41 da LOMAN e 142 III do Código Penal Rejeição da queixacrime STJ Apn 482PA Rel Min Humberto Gomes de Barros j 4102007 A imunidade a que se refere o inciso I do art 142 do Código Penal acoberta apenas as coisas que sucedem na economia doméstica do processo fora daí e daí por diante cobertura alguma haverá STJ HC 39277RS Rel Min Nilson Naves j 59 2006 Nos termos do art 143 do Código Penal a retratação para gerar a extinção da punibilidade do agente deve ser cabal ou seja completa inequívoca No caso em que a ofensa foi praticada mediante texto veiculado na internet o que potencializa o dano à honra do ofendido a exigência de publicidade da retratação revelase necessária para que esta cumpra a sua finalidade e alcance o efeito previsto na lei STJ REsp 320958RN Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 592006 Art 138 cc art 141 II do CP Para que a conduta descrita no art 138 do Código Penal seja típica é necessário que as declarações do autor da acusação sejam falsas ou quanto a ocorrência dos fatos ou quanto à autoria Precedentes STJ HC 45779SP Rel Min Félix Fischer j 6122005 Crimes contra a honra A admissão da ação penal pública quando se tratar de ofensa propter officium é uma alternativa oferecida ao ofendido não uma privação do seu direito de queixa Legitimidade pois do servidor público de ajuizar a ação penal para defesa de seus direitos Precedentes do STF STJ Apn 348PA Rel Min Antônio de Pádua Ribeiro j 1852005 O prazo para propositura de ação penal privada ante seu caráter decadencial não se suspende ou interrompe pela formulação de pedido de explicações nos moldes do art 144 do Código Penal em face da ausência de previsão legal a respeito STJ REsp 204291PR Rel Min Fernando Gonçalves j 1782000 Os crimes contra a honra no Código Penal não se confundem com os Crimes de Imprensa Evidência é o disposto no art 141 II Código Penal na presença de várias pessoas ou por meio que facilite a divulgação da calúnia da difamação ou da injúria STJ EDcl no RHC 7512MG Rel Min Luiz Vicente Cernicchiaro j 306 1999 A retratação prevista no art 143 do CP tem sua aplicabilidade restrita a ação penal privada relativa aos crimes de calúnia e de difamação Tratandose de ação penal pública incabível é a retratação Precedente do STF RHC 61303SPSTJ 108586 STJ REsp 60048DF Rel Min Assis Toledo j 561995 Capítulo VI Dos Crimes Contra a Liberdade Individual Seção I Dos Crimes contra a Liberdade Pessoal V art 3º a da Lei n 489865 abuso de autoridade V art 28 da Lei n 717083 Lei de Segurança Nacional Constrangimento ilegal Art 146 Constranger alguém mediante violência ou grave ameaça ou depois de lhe haver reduzido por qualquer outro meio a capacidade de resistência a não fazer o que a lei permite ou a fazer o que ela não manda Pena detenção de 3 três meses a 1 um ano ou multa V art 5º III da CF V art 61 I do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais V arts 6º n 2 e 6 e 9º n 6 da Lei n 107950 crimes de responsabilidade V art 301 da Lei n 473765 Código Eleitoral V art 4º da Lei n 489865 abuso de autoridade V art 232 da Lei n 806990 Estatuto da Criança e do Adolescente V art 71 da Lei n 807890 Código de Defesa do Consumidor Aumento de pena 1º As penas aplicamse cumulativamente e em dobro quando para a execução do crime se reúnem mais de 3 três pessoas ou há emprego de armas 2º Além das penas cominadas aplicamse as correspondentes à violência 3º Não se compreendem na disposição deste artigo I a intervenção médica ou cirúrgica sem o consentimento do paciente ou de seu representante legal se justificada por iminente perigo de vida II a coação exercida para impedir suicídio D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é a liberdade individual ou pessoal de autodeterminação ou seja a liberdade do indivíduo de fazer ou não fazer o que lhe aprouver dentro dos limites da ordem jurídica Assegurase assim ao indivíduo o direito de fazer tudo o que a lei não proibir não podendo ser obrigado a fazer senão aquilo que a lei lhe impuser Liberdade física e psíquica A liberdade que se protege é a psíquica livre formação da vontade isto é sem coação e a física ou seja liberdade de movimento A proteção desse bem jurídico liberdade ganhou assento constitucional nos seguintes termos ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei art 5º II da CF Liberdade e o direito de querer O que se viola ou restringe no crime de constrangimento ilegal não é propriamente uma vontade juridicamente válida mas a liberdade e o direito de querer e atuar agir ou não agir de acordo com as condições pessoais e individuais de cada um 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa não requerendo nenhuma qualidade ou condição particular cuidase pois de crime comum Tratandose contudo de funcionário público desde que no exercício de suas funções o crime praticado poderá ser de acordo com as circunstâncias não este mas qualquer outro como por exemplo os arts 322 e 350 do CP o art 3º da Lei n 489865 etc 22 Sujeito passivo Sujeito passivo pode ser qualquer pessoa desde que capaz de sentir a violência e motivarse com ela em outros termos é necessária a capacidade de autodeterminação ou seja a capacidade de conhecer e se autodeterminar de acordo com esse conhecimento Assim estão excluídos os enfermos mentais as crianças os loucos de todo gênero etc Representantes dos incapazes Se o constrangimento for praticado contra os representantes legais com a finalidade de permitir que se faça algo com eles desautorizado em lei os incapazes serão nesse caso objeto do crime e seus responsáveis serão os sujeitos passivos Incapacidade física ou operacional agravante A incapacidade física isto é a incapacidade operacional aleijados paralíticos etc do sujeito passivo não afasta a possibilidade de ser sujeito passivo do crime de constrangimento ilegal aliás poderá configurar uma agravante art 61 III h enfermo ou j desgraça particular do ofendido conforme o caso Constrangimento ilegal contra criança Quando o constrangimento for praticado contra criança constituirá o crime descrito no art 232 da Lei n 806990 ECA desde que esta se encontre sob sua autoridade guarda ou vigilância Essa previsão minimiza aquele entendimento de que incapaz não pode ser sujeito passivo desse crime Violência contra terceiro autoria mediata Nada impede que a violência ou a grave ameaça sejam exercidas contra pessoa diversa daquela que se pretende constranger Nessa hipótese se a ameaça for irresistível e a conduta do ameaçado for tipificada criminalmente haverá autoria mediata O sujeito ativo será o autor mediato e o constrangido não será autor mas mero executor Nesse caso não haverá concurso de pessoas coautoria ou participação pois o executor agiu sem culpabilidade na verdade faltoulhe o próprio dolo nem se podendo falar em ação que pressupõe voluntariedade e por extensão não se pode falar em tipicidade Autor mediato responde por dois crimes O autor mediato responderá por dois crimes em concurso material pelo constrangimento ilegal e mais o crime que o executor for obrigado a praticar Crime contra a segurança nacional Atentar contra a liberdade do Presidente da República ou os Presidentes dos demais Poderes Legislativo Senado e Câmara e Judiciário constitui crime contra a segurança nacional art 28 da Lei n 7170 de 14121983 3 Tipo objetivo adequação típica O núcleo do tipo é constranger que significa obrigar forçar compelir coagir alguém a fazer ou deixar de fazer alguma coisa a que não está obrigado A finalidade pretendida pelo constrangimento ilegal pode ser qualquer prestação de ordem pessoal moral física psíquica social ou de qualquer natureza profissional econômica comercial jurídica etc desde que não constitua infração penal Característica genérica do constrangimento Com sua característica de generalidade este tipo penal abrange todo constrangimento à livre determinação de vontade que não tenha recebido configuração legal específica Não há especificação legal sobre em que deve consistir o fazer ou o não fazer exigido pelo agente Constrangimento à prática de infração penal Se objetivar a realização de infração penal que o constrangimento sirva de meio ou seja sua elementar será por esta absorvido Se no entanto tratarse de outra infração penal poderá configurarse o crime de tortura como adiante analisamos Modalidades da conduta típica A conduta típica pode apresentarse sob duas modalidades a fazer o que a lei não obriga b não fazer o que ela permite Na primeira hipótese a vítima é forçada a fazer alguma coisa um cruzeiro um passeio uma cirurgia etc Na segunda hipótese a conduta do agente impõe uma omissão da vítima em relação a alguma coisa sem exigência legal Constrangimento legal Se não for ilegítima a coação não haverá constrangimento ilegal podendo eventualmente caracterizar outro crime No entanto ainda que a finalidade do constrangimento seja legítima pertencendo a terceiro constituirá o crime de constrangimento ilegal Constrangimento para evitar ato imoral constitui crime Se objetiva evitar a prática de ato puramente imoral não proibido por lei haverá o crime de constrangimento ilegal como por exemplo impedir o incesto o homossexualismo o exercício da prostituição etc Ora não sendo proibido nem ordenado por lei não pode ser legitimamente impedido ou imposto pela força Constrangimento para impedir prática de crime No entanto se o constrangimento for empregado para impedir a prática de uma infração penal ou qualquer conduta ilícita não constituirá em tese crime pois ninguém tem o direito ou a liberdade de delinquir Evidentemente devese obedecer aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade sendo puníveis eventuais excessos Exercício arbitrário das próprias razões Se o constrangimento visar pretensão legítima do sujeito passivo poderá caracterizar o crime do art 345 Na verdade se a finalidade pretendida pelo sujeito passivo pode ser obtida em juízo que preferiu conseguila coativamente a tipificação de sua conduta deslocase para os crimes contra a Administração da Justiça qual seja exercício arbitrário das próprias razões art 345 Desnecessidade de resistência efetiva da vítima Não é indispensável que o ofendido oponha resistência efetiva contra a coação ou procure superála por meio da fuga pedindo socorro ou empregando qualquer outro recurso é suficiente que mediante violência ou grave ameaça tenhase violentado a sua liberdade interna constrangendoo assim a realizar o que lhe foi imposto sem amparo legal Natureza da ilegitimidade da coação A ilegitimidade da coação pode ser a absoluta quando o agente não tem qualquer direito à ação ou omissão constrangida b relativa há o direito mas a vítima não pode ser forçada como por exemplo constranger a vítima a pagar dívida de jogo Relação causal entre coação e submissão da vítima É indispensável a relação de causalidade entre o emprego da violência ou grave ameaça ou qualquer outro meio e a submissão da vítima à vontade do coator Erro sobre a legitimidade da ação O erro sobre a legitimidade da ação se for inevitável exclui a responsabilidade penal a qualquer título se for evitável excluirá o dolo restando subsidiariamente a culpa art 20 caput que neste crime é impunível salvo se houver lesão corporal que criminaliza a modalidade culposa Irrelevância dos motivos do crime São irrelevantes os motivos O fim mediato ou ulterior do agente não interessa à norma penal 31 Formas ou meios de execução A lei estabelece as seguintes formas de realização do constrangimento ilegal a mediante violência força física real b grave ameaça violência moral intimidação vis compulsiva ou c qualquer outro meio ingestão de álcool drogas hipnose etc reduzindo a capacidade de resistência da vítima Esses quaisquer outros meios precisam ter a capacidade de reduzir ou diminuir sua resistência Há quem classifique esses meios como violência física violência moral violência imprópria algo semelhante ao que fazia Mezger a Mediante violência O termo violência empregado no texto legal significa a força física material a vis corporalis com a finalidade de vencer a resistência da vítima Essa violência pode ser produzida pela própria energia corporal do agente que no entanto poderá preferir utilizar outros meios como fogo água energia elétrica choque gases etc Violência mediante omissão A violência pode ser empregada mediante omissão por exemplo submetendo o ofendido a fome ou sede com a finalidade de fazêlo ceder à vontade do agente Violência mediata A violência poderá ser imediata quando empregada diretamente contra o próprio ofendido ou mediata quando utilizada contra terceiro ou coisa a que a vítima esteja diretamente vinculada Força irresistível desnecessidade Não é indispensável que a força empregada seja irresistível basta que seja idônea para coagir a vítima a fazer ou não fazer o que o sujeito ativo quer Se no entanto a força for resistível e o resultado da ação do coagido constituir crime o coagido também responderá por ele nos termos do art 22 do CP embora com pena atenuada art 65 III c b Mediante grave ameaça Grave ameaça é a violência moral a vis compulsiva que exerce uma força intimidativa inibitória anulando ou minando a vontade e o querer do ofendido procurando assim inviabilizar eventual resistência da vítima Na verdade a ameaça também pode perturbar escravizar ou violentar a vontade da pessoa como a violência material Formas de violência moral A violência moral pode materializarse em gestos palavras atos escritos ou qualquer outro meio simbólico Mas somente a ameaça grave isto é aquela ameaça que efetivamente imponha medo receio temor na vítima e que lhe seja de capital importância opondose a sua liberdade de querer e de agir Mal futuro imediato e determinado O mal prometido a título de ameaça além de futuro e imediato deve ser determinado sabendo o agente o que quer impor Enfim esses são os requisitos que em tese a ameaça de mal ou dano deve apresentar Não são nem absolutos nem numerus clausus podendo no caso concreto apresentarse alguns e outros não sem desnaturar a gravidade da ameaça É indispensável que a ameaça tenha idoneidade intimidativa isto é que tenha condições efetivas de constranger a vítima Crime de ameaça distinção Ao contrário do que ocorre com o crime de ameaça no crime de constrangimento ilegal não é necessário que o mal prometido seja injusto sendo suficiente que injusta seja a pretensão ou a forma de obtêla A injustiça do mal não se encerra em si mesma mas deverá relacionarse ao fim pretendido e à forma de conseguilo O mal pode ser justo mas o fundamento que leva o agente a prometêlo ou o método utilizado podem não sêlo c Qualquer outro meio reduzindolhe a capacidade de resistência Esses outros meios devem ser empregados subreptícia ou fraudulentamente isto é sem violência física ou grave ameaça caso contrário estariam incluídos nas outras duas alternativas Estão abrangidas pela expressão qualquer outro meio as ações químicas estranhas ameaças que restrinjam ou anulem a consciência como por exemplo o emprego de inebriantes entorpecentes ou similares ou até mesmo a máquina da verdade ou pílulas da confissão destinadas a violentar a vontade e a liberdade do ofendido levandoo a declarar o que pretendia calar Fórmula genérica distinta de interpretação analógica Aqui para descrever o meio possível de executar o constrangimento ilegal após relacionar duas hipóteses casuísticas o legislador adotou como em tantas outras oportunidades uma fórmula genérica que não se confunde com interpretação analógica aliás inadmissível em sede de criminalização 32 Crime de constrangimento ilegal e crime de tortura Se a violência ou grave ameaça visar a prática de crime configurar seá o crime de tortura previsto no art 1º I b da Lei n 945597 que estabelece constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça causandolhe sofrimento físico ou mental para provocar ação ou omissão de natureza criminosa Antes da vigência dessa lei a doutrina sustentava que nesses casos ou seja quando o constrangimento fosse para a prática de alguma conduta criminosa o agente responderia pelo crime de constrangimento ilegal e pelo crime que a vítima fora obrigada a praticar nesta hipótese como autor mediato em concurso material Crime de tortura consumação e exaurimento O crime de tortura pode consumarse somente mas pode também se exaurir No crime de tortura a consumação não se confunde com o exaurimento pois podem ocorrer em momentos distintos ou simplesmente não haver exaurimento a despeito de consumarse Na verdade o crime de tortura nesta hipótese consumase com a simples conduta de constranger na forma descrita no caput do art 1º e inciso I independentemente de a vítima praticar a conduta criminosa pretendida pelo sujeito ativo se no entanto o torturado não resistir e praticar o comportamento criminoso exigido pelo sujeito ativo ocorrerá somente o exaurimento do crime de tortura que já se havia consumado Absorção e concurso de crimes Na primeira hipótese quando o crime de tortura apenas se consumou o sujeito ativo responde somente pelo crime de tortura pois o constrangimento é elementar típica desse crime ficando por ele absorvido Na segunda hipótese no entanto havendo exaurimento do crime de tortura o sujeito ativo responderá cumulativamente pelo crime de tortura e pelo crime que o torturado coagido tiver praticado em relação a este como autor mediato O executor coagido não responderá por nada a menos que tenha agido com culpabilidade e nos limites de sua culpabilidade Coação resistível atipicidade da tortura Se a tortura for resistível não tipificará o crime de tortura pois um constrangimento resistível não teria gravidade suficiente para tipificar esse crime e nessa hipótese ambos coator e coato responderão pelo crime que este praticou pois neste caso não haverá figura do simples executor Poderão ser coautores partícipe e autor etc segundo a funcionalidade da posição de cada um e de acordo com a autonomia de vontade que existir conforme procuramos demonstrar ao examinarmos a teoria do domínio do fato e a autoria mediata para onde remetemos o leitor 4 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo geral é o dolo que é representado pela vontade e a consciência de constranger a vítima mediante violência ou grave ameaça a fazer o que a lei não determina ou não fazer o que ela manda A consciência deve abranger a ilegitimidade da ação dos meios escolhidos violência ou grave ameaça e a relação de causalidade entre o constrangimento e a ação ou omissão do sujeito passivo sendo irrelevantes os motivos determinantes com exceção daqueles que excluem a antijuridicidade da conduta O dolo poderá ser direto ou eventual Constrangimento e violência arbitrária Se o constrangimento for praticado para satisfazer pretensão legítima ou se a violência for praticada no exercício da função ou em razão dela poderá configurar exercício arbitrário das próprias razões art 345 ou violência arbitrária art 322 de acordo com as demais circunstâncias Elemento subjetivo especial do tipo necessidade O elemento subjetivo especial do tipo é constituído pelo especial fim de agir qual seja o fim de constranger a vítima à ação ou omissão pretendida Não havendo a finalidade de constranger o ofendido a fazer ou não fazer algo ao desamparo da lei o crime não será o de constrangimento ilegal mas somente aquele que resultar da violência ou grave ameaça vias de fato ameaça lesões corporais etc e desde que objetive a prática de alguma infração penal pois nesse caso poderá configurar crime de tortura Lei n 945597 Constrangimento ilegal culposo Não há previsão de constrangimento ilegal culposo Assim a ação mediante erro de tipo resistível é atípica 5 Consumação e tentativa 51 Consumação Consumase o crime de constrangimento ilegal quando o ofendido faz ou deixa de fazer aquilo a que foi constrangido Não se trata de crime de mera atividade que se consuma com a simples ação mas de crime de lesão que tem execução complexa exigindo duplicidade comportamental a ação coativa do sujeito ativo e a atividade coagida do sujeito passivo fazendo ou não fazendo aquilo a que foi constrangido Assim consumase o crime quando o constrangido em razão da violência ou grave ameaça sofrida começa a fazer ou não fazer a imposição do sujeito ativo Enquanto o coagido não ceder à vontade do sujeito ativo isto é enquanto não der início ao fazer ou não fazer a violência ou grave ameaça podem configurar somente a tentativa 52 Tentativa Como crime material admite a tentativa que se verifica com o início da ação constrangedora que pode ser fracionada A exigência de execução complexa com a ação do sujeito ativo de um lado e a atividade do coagido de outro facilita a identificação do conatus 53 Desistência voluntária e arrependimento eficaz Podem ocorrer também as hipóteses de desistência voluntária e arrependimento eficaz respondendo o agente é claro pelos atos já executados nos termos do art 15 6 Concurso com crimes praticados com violência O que caracteriza o concurso material de crimes não é a soma ou cumulação de penas como prevê o dispositivo em exame mas a pluralidade de condutas pois no concurso formal impróprio isto é naquele cuja conduta única produz dois ou mais crimes resultante de desígnios autônomos as penas também são aplicadas cumulativamente Ora esse comando legal art 146 2º determinando a aplicação cumulativa de penas não autorizou o intérprete a confundir o concurso formal com o concurso material Cúmulo material de penas concurso formal O 2º do art 146 não criou uma espécie sui generis de concurso material mas adotou tão somente o sistema do cúmulo material de aplicação de pena a exemplo do que fez em relação ao concurso formal impróprio art 70 2ª parte Assim quando a violência empregada na prática do crime de constrangimento ilegal constituir em si mesma outro crime havendo unidade de ação e pluralidade de crimes estamos diante de concurso formal de crimes Aplicase neste caso por expressa determinação legal o sistema de aplicação de pena do cúmulo material independentemente da existência ou não de desígnios autônomos Concurso material de crimes possibilidade A despeito de tudo o que acabamos de expor nada impede que concretamente possa ocorrer concurso material como acontece com quaisquer outras infrações penais do crime de constrangimento ilegal com outros crimes violentos desde que é claro haja pluralidade de condutas e pluralidade de crimes mas aí observese já não será mais o caso de unidade de ação ou omissão caracterizadora do concurso formal 7 Classificação doutrinária Tratase de crime comum podendo ser praticado por qualquer pessoa pois não exige qualquer qualidade ou condição especial material somente se consuma com a produção do resultado representado pela atividade do ofendido que cumpre as exigências do sujeito ativo eventualmente subsidiário quando constitui meio de execução ou elementar de alguns tipos penais como já foi exemplificado doloso não havendo previsão da modalidade culposa 8 Formas majoradas 1º Não há previsão de figuras qualificadas o que existe são figuras majoradas As penas são aplicadas em dobro e cumulativamente se houver qualquer das duas majorantes utilização de armas ou reuniremse mais de três pessoas para a execução do crime 81 Reunião de mais de três pessoas Será necessário que no mínimo quatro pessoas tenham participado da fase executória do crime incluindose nesse número o próprio autor principal se houver menores e incapazes Se qualquer delas participou somente da preparação do crime sem intervir na execução ou se limitou à simples atividade de partícipe instigando ou induzindo não será computada no número mínimo necessário para caracterizar a majorante uma vez que o texto legal exige que tenha participado da execução do crime e o simples partícipe não intervém na execução propriamente da conduta típica Fundamento da majoração da pena O fundamento da majoração da pena reside no maior desvalor da ação e especialmente no aumento do temor infundido à vítima diminuindo ou muitas vezes até eliminando a possibilidade de defesa Por isso a necessidade de o número mínimo dos participantes intervir diretamente na execução do crime A relação desses intervenientes é regida pelos princípios que orientam o instituto do concurso de pessoas para o qual não se exige o antigo acordo prévio 82 Emprego de armas Segundo doutrina e jurisprudência referese ao gênero e não ao número de arma Parecenos contudo um pouco estranho que o legislador tão conhecedor do vernáculo adote um critério definidor do número plural para indicar o gênero Armas a nosso juízo é plural e significa mais de uma Para definirse o gênero ou se utilizaria o coletivo arsenal ou quem sabe arma branca arma de fogo armas proibidas etc Fundamento da majoração Como o fundamento da majoração é a elevação do temor que o emprego de armas causaria à vítima é suficiente que pelo menos algum deles esteja armado por isso se referiu a armas Por outro lado dependendo da forma o emprego de uma arma poderá caracterizar somente a grave ameaça Orientação de Nélson Hungria Nélson Hungria um dos coautores do Projeto do Código Penal de 1940 foi o primeiro a sustentar que o plural armas não significa mais de uma mas somente gênero não se ousou contestálo e até hoje se repete a mesma coisa Assim deixamos pelo menos nossa provocação à reflexão sobre os limites do princípio da tipicidade sessenta anos após o emprego do vocábulo discutido Espécies de armas próprias e impróprias As armas podem ser próprias ou impróprias a próprias são aquelas que têm a finalidade específica de ataque ou defesa As armas próprias podem ser de fogo como revólver espingarda bombas granadas etc ou ainda armas brancas como punhal faca facão etc b armas impróprias são aqueles instrumentos cuja finalidade natural não se destina a ataque ou defesa como as próprias embora apresentem potencialidade lesiva normalmente têm sua finalidade desvirtuada por exemplo machado foice tesoura navalha etc Não podem porém ser equiparados a armas objeto tais como pedras madeiras sarrafos cordas móveis mesas cadeiras etc Necessidade do emprego efetivo de arma Somente haverá incidência da majorante se as armas forem efetivamente empregadas na execução do crime Emprego significa uso real efetivo concreto Assim o simples portar arma não o caracteriza desde que não seja ostensivo e com finalidade intimidatória pois o porte ostensivo com a finalidade de infundir medo pode ser uma forma de emprego de arma na execução do crime Arma de brinquedo heresia sumulada Finalmente a discussão mais atual e ao mesmo tempo mais despropositada é acerca da arma de brinquedo a partir da infeliz e equivocada Súmula 174 do STJ sobre a possibilidade de estender sua aplicação nesta majorante A súmula tem o seguinte verbete Nos crimes de roubo a intimidação feita com arma de brinquedo autoriza o aumento da pena Heresia faz escola analogia in malam partem A despeito da paradoxal infelicidade dessa sumulação lá no crime de roubo há quem sustente sua aplicação analógica no crime de constrangimento ilegal Essa orientação ignora os princípios mais comezinhos de Direito Penal adota a analogia in malam partem e viola o princípio da legalidade e da tipicidade estrita Mesmo que integrasse da prescrição legal definidora do crime de roubo ou de suas majorantes não poderia ser estendida ao crime de constrangimento ilegal sem expressa previsão legal 9 Natureza subsidiária Não é recomendável afirmar simplistamente que é um crime tipicamente subsidiário ao contrário o 2º determina que além das penas cominadas aplicamse as correspondentes à violência logo o constrangimento ilegal não é sempre absorvido pela violência Subsidiariedade eventual Somente haverá subsidiariedade naqueles crimes em que o constrangimento constituir meio de realização ou for seu elemento integrante tais como roubo extorsão estupro atentado violento ao pudor etc ficando o constrangimento ilegal absorvido Assim podese admitir que se trata de um crime eventualmente subsidiário Absorção do constrangimento ilegal Quando determinado comportamento mesmo tipificado como ocorre com o constrangimento ilegal constitui meio executivo ou elemento constitutivo de outro crime integra a definição típica deste configurando fato único que é objeto de um único e mesmo dolo por exemplo roubar extorquir estuprar atentar contra ao pudor etc Contudo o fim pretendido nesses crimes referidos não é somente o constrangimento de não fazer o que a lei não obriga ou absterse de fazer o que a lei não proíbe mas vai além objetiva atingir outros bens jurídicos sendo o constrangimento nesses casos o meio normal e natural para a realização da conduta pretendida este é parte de um todo integrando o iter criminis já em sua fase executória 10 Exclusão de tipicidade Intervenção médica ou cirúrgica As intervenções médicas e cirúrgicas constituem em regra exercício regular de direito Nada impede é claro que excepcionalmente caracterizem estado de necessidade como ocorre por exemplo com situações semelhantes à prevista no art 146 3º I do CP embora nessa hipótese específica constitua exclusão da tipicidade Exclusão da adequação típica A intervenção do médico sem consentimento ou a coação nas circunstâncias descritas estão excluídas da adequação típica contida no caput do art 146 ou seja a intervenção médica para evitar iminente perigo de vida ou a coação de qualquer pessoa para impedir o suicídio são atípicas A iminência de perigo de vida ou de suicídio constitui causa excludente de tipicidade Consentimento do paciente consequência Com o consentimento do paciente ou de seu representante legal estará afastada a exclusão da tipicidade pela ausência da elementar sem consentimento mas o estado de necessidade permanecerá como fundamento da intervenção Constrangimento para impedir o suicídio Embora o suicídio não constitua crime em si mesmo somente a participação o caracteriza não deixa de ser um comportamento antijurídico e impedir a sua prática ainda que mediante violência ou grave ameaça não constitui constrangimento ilegal mas legal diante da exceção aqui prevista Essa previsão afasta definitivamente a controvérsia acerca do direito de pôr fim à própria vida que é um bem jurídico indisponível e essa indisponibilidade justifica a intervenção do Estado Risco de vida desnecessidade de consentimento As intervenções médicas ou cirúrgicas justificadas por iminente risco de vida ou a coação exercida para impedir o suicídio independem de consentimento de quem quer que seja 3º A presença dessas circunstâncias exclui a própria tipicidade do fato O fundamento da previsão legal é o estado de necessidade de terceiro mas a existência da previsão em si constitui causa de exclusão da adequação típica São digamos hipóteses em que o estado de necessidade funciona não como excludente da antijuridicidade mas da tipicidade em razão de expressa previsão legal 11 Pena e ação penal 111 Penas cominadas A pena é alternativa detenção de três meses a um ano ou multa No entanto aplicamse cumulativamente e em dobro se houver utilização de armas ou a reunião de mais de três pessoas para a execução do crime Configurandose qualquer das majorantes o magistrado não pode aplicar isoladamente a detenção ou a multa deverá necessariamente aplicar as duas penas e duplicálas A operação deverá ser procedida da seguinte forma primeiro se encontram as penas definitivas depois se as soma e finalmente duplicaseas 112 Natureza da ação penal A ação penal é pública incondicionada sendo desnecessária qualquer condição de procedibilidade devendo a autoridade competente proceder ex officio 12 Questões especiais Há vários crimes afins com este ameaça sequestro ou cárcere privado exercício arbitrário das próprias razões abuso de poder violência arbitrária etc Como já afirmado quando o constrangimento for meio ou elemento de outro crime fica absorvido por este O constrangimento ilegal é sempre absorvido nunca absorvente J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Constrangimento ilegal Art 146 do CPB Internação compulsória ou involuntária Quando então a liberdade de irvir da impetrantepaciente foi restringida por imperativo médico com objetivo de preservação da sua própria vida e dos terceiros com quem interagia deixa de haver constrangimento ilegal passível de correção mediante habeas corpus TJRS HC 71001461623 Rel Nara Leonor Castro Garcia j 22102007 Constrangimento ilegal art 146 do CP configurado Menor constrangido mediante grave ameaça a ingerir bebida alcoólica Existência do fato comprovada e autoria bem determinada TJRS Apelação 70017952862 Rel Luís Gonzaga da Silva Moura j 1362007 Constrangimento ilegal Prova conclusiva da prática do delito conduz à confirmação da sentença condenatória O recorrente foi denunciado como incurso nas sanções do art 146 do Código Penal por ter constrangido mediante grave ameaça a vítima Letícia dos Santos a fazer o que a lei não manda consistente em levála para local ermo A materialidade do delito de constrangimento ilegal encontra respaldo no boletim de ocorrência além da prova oral produzida TJRS Recurso Crime 71001259852 Rel Ângela Maria Silveira j 2152007 Tendo o acórdão recorrido reconhecido a ofensa à liberdade sexual da menor é indevida a tipificação da conduta do Réu apenas como o delito do art 146 do Código Penal já que o constrangimento ilegal é elementar do tipo objetivo do crime de atentado violento ao pudor no qual a coação tem o especial fim de satisfação da concupiscência por atos diversos da conjunção carnal STJ REsp 736346MG Rel Min Laurita Vaz j 722006 Ameaça Art 147 Ameaçar alguém por palavra escrito ou gesto ou qualquer outro meio simbólico de causarlhe mal injusto e grave Pena detenção de 1 um a 6 seis meses ou multa Parágrafo único Somente se procede mediante representação V art 100 1º do CP V arts 24 e 39 do CPP V art 3º a da Lei n 489865 abuso de autoridade V art 28 da Lei n 717083 Lei de Segurança Nacional V art 71 da Lei n 807890 Código de Defesa do Consumidor D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido a exemplo do crime de constrangimento ilegal é a liberdade pessoal e individual de autodeterminação isto é a liberdade psíquica do indivíduo que será abalada pelo temor infundido pela ameaça Liberdade física e psíquica Além da liberdade psíquica livre formação da vontade o dispositivo protege também a liberdade física pois em razão da gravidade da ameaça produzse grande temor acompanhado de sensação de insegurança que tolhe a liberdade de movimento A liberdade enquanto bem jurídico está protegida pela atual Constituição art 5º II da CF Ameaça de um mal injusto e grave A ameaça de um mal injusto e grave perturba a tranquilidade e a paz interior do ofendido que é corroída pelo medo causandolhe insegurança e desequilíbrio psíquico e emocional O que se viola ou restringe no crime de ameaça não é propriamente uma vontade determinada mas a liberdade de elaborar seus pensamentos suas elucubrações suas vontades e podêlas concretizar destemidamente 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa não requerendo nenhuma qualidade ou condição particular tratandose pois de crime comum Tratandose de funcionário público no exercício de suas funções a ameaça poderá configurar o crime de abuso de autoridade art 3º da Lei n 489865 22 Sujeito passivo Sujeito passivo pode ser qualquer pessoa física desde que seja capaz de sentir a idoneidade da ameaça e motivarse com ela atemorizandose em outros termos é necessária a capacidade de conhecer e de se autodeterminar de acordo com esse conhecimento Essa exigência afasta os enfermos mentais as crianças de tenra idade os loucos de todo gênero etc desde que não tenham capacidade de compreensão e entendimento que não se confunde com capacidade jurídica Incapacidade absoluta crime impossível A falta de consciência de capacidade mental para entender a gravidade do mal ameaçado afasta a possibilidade do crime Nesses casos podese afirmar haverá crime impossível pela absoluta impropriedade do objeto art 17 do CP Se no entanto a incapacidade for relativa haverá o crime Pessoa jurídica impossibilidade A pessoa jurídica não é dotada de capacidade de entender e não é portadora de liberdade psíquica Ademais não é intimidável e é incapaz de qualquer sentimento como por exemplo de insegurança medo etc Assim quando a ameaçada for uma pessoa jurídica recairá sobre as pessoas que a compõem e estes se sentiremse atemorizados poderão ser os sujeitos passivos da ameaça Nesse caso haverá somente um crime o de ameaça contra os representantes do ente jurídico Pluralidade de sujeitos passivos concurso formal Na hipótese de mais de um ofendido a conduta unitária constituirá concurso formal em razão da pluralidade de crimes A despeito da unidade da conduta caracterizadora do concurso formal acreditamos que nessas hipóteses estarão bem configurados os desígnios autônomos justificandose a imposição cumulativa das penas Pessoa determinada necessidade de individualização Somente pessoas determinadas podem ser sujeito passivo do crime de ameaça Essa necessidade não chega ao exagero de exigir rigorosa individualização da vítima sendo suficiente que o conteúdo da ameaça se conduza a determinada pessoa que possa ser individualizada com facilidade Enfim ante os termos do art 147 ameaçar alguém pessoa indeterminada não pode ser sujeito passivo desse crime 3 Tipo objetivo adequação típica Ameaçar significa procurar intimidar meter medo em alguém e pode configurar crime em si mesmo como o previsto neste art 147 mas pode ser e geralmente é prevista como meio ou forma de comportamento para atingir determinado resultado ou como elementar de certas condutas ou seja a ameaça pode figurar como a violência em sentido instrumental Medo intensidade Medo é um sentimento cuja valoração é extremamente subjetiva e pode variar de pessoa para pessoa de situação para situação por isso se tem dito que a essência é menos importante que a aparência Mas não se ignora que o temor pode ser de tal nível que cause uma perturbação da mente impedindo completamente a livre determinação da vontade pode a ameaça ser de tal forma aterradora e excluir totalmente a vontade agindo como verdadeira coação irresistível Mal justo ou não grave atipicidade O crime de ameaça consiste na promessa feita pelo sujeito ativo de um mal injusto e grave feita à alguém violando sua liberdade psíquica O mal ameaçado deve ser injusto e grave Se o mal for justo ou não for grave não constituirá o crime A ameaça é a violência moral vis compulsiva que tem a finalidade de perturbar a liberdade psíquica e a tranquilidade do ofendido por meio da intimidação Idoneidade da ameaça A ameaça para constituir o crime tem de ser idônea séria e concreta capaz de efetivamente impingir medo à vítima quando a vítima não lhe dá crédito faltalhe potencialidade lesiva não se configura o crime consequentemente Ameaça inidônea crime impossível Se com o comportamento intimidatório ineficaz o agente tinha efetivamente o propósito de ameaçar isto é de intimidar a vítima configurase crime impossível pela absoluta ineficácia do meio empregado É indiferente se o agente estava ou não disposto a cumprila nem que seja possível cumprila É suficiente que tenha idoneidade para constranger e que o agente tenha consciência dessa idoneidade Formas de ameaça Direta o que ocorre quando o mal prometido visa à pessoa ou ao patrimônio do ameaçado Indireta quando recai sobre pessoa presa ao ofendido por laços de consanguinidade ou afeto intimidar a mãe por um mal ao filho a esposa por um dano ao cônjuge Explícita quando feita às claras abertamente sem subterfúgios dizer a alguém que vai matálo exibirlhe uma arma em tom ameaçador etc Implícita quando o sentido está subentendido ou incluso Costumo liquidar minhas questões com sangue etc Condicional quando dependente de um fato do sujeito passivo ou de outrem Se repetir o que disse eu lhe parto a cara Se fulano me denunciar eu matarei você etc Magalhães Noronha Direito Penal p 170 Meios de execução Os meios enumerados pela lei englobam praticamente todas as possíveis formas de sua realização a por palavra oral que pode ser diretamente por telefone ou até mesmo gravada b escrito relativamente ao escrito é indiferente que seja assinado anônimo ou com pseudônimo c gesto mímica determinados gestos ameaçadores podem simbolizar uma gravidade muito mais intensa da ameaça que as próprias palavras ou escrito como por exemplo descobrir uma arma de fogo ou apontála em direção à vítima etc d qualquer outro meio simbólico simbolizada pode materializarse por meio da exibição de bonecos perfurados com agulha despachos etc Ameaça de mal futuro Só a ameaça de mal futuro mas de realização próxima caracterizará o crime e não a que se exaure no próprio ato ou seja se o mal concretizarse no mesmo instante da ameaça alterase a sua natureza e o crime será outro e não este Por outro lado não o caracteriza a ameaça de mal para futuro remoto ou inverossímil isto é inconcretizável Ameaça injusta e exercício irregular de direito A ameaça de causar mal justo constitui exercício regular de direito desforço imediato na defesa da posse art 502 intervenção cirúrgica protesto de títulos etc ou estrito cumprimento de dever legal executar a sentença de morte policial que prende o condenado carcereiro que recolhe criminoso à prisão etc conforme o caso Ameaça condicional possibilidade A ameaça feita sob a forma condicional subordinando a realização do mal à própria vontade ou conduta da pessoa ameaçada ou mesmo a conduta de terceiro ou a fato alheio não exclui o crime pois crime existe em razão da simples intimidação Nélson Hungria já afirmava a ameaça pode ser condicional mas nem por isso se identifica com a tentativa e constrangimento ilegal nesta há o propósito de intimidação como meio compulsivo para uma determinada ação ou abstenção do paciente ao passo que na ameaça condicional o principal fim do agente não deixa de ser simples incutimento de medo Ameaça em estado de raiva possibilidade O estado de ira de raiva ou de cólera não exclui a intenção de intimidar Ao contrário a ira é a força propulsora da vontade de intimidar Ademais é incorreta a afirmação de que a ameaça do homem irado não tem possibilidade de atemorizar pois exatamente por isso apresenta maior potencialidade de intimidação pelo desequilíbrio que o estado colérico pode produzir em determinadas pessoas Aliás não raro os crimes de ameaça são praticados nesses estados E exatamente o estado de ira ou de cólera é o que mais atemoriza o ameaçado Ameaça em estado de embriaguez Afirmação de que ameaça proferida em estado de embriaguez não configura o crime igualmente deve ser recebida com reservas pois não se pode ignorar os vários estágios que o estado de embriaguez pode apresentar além dos mais diversificados efeitos que pode produzir nos mais variados indivíduos Por isso somente a análise casuística in concreto pode apresentar a solução mais adequada admitindose ou excluindose a tipificação do comportamento Embriaguez exame na culpabilidade A nosso juízo a questão nem se resolve no exame da tipicidade mas no da culpabilidade Com efeito para o exame da potencialidade lesiva da ameaça proferida em estado de embriaguez devese considerar o nível de capacidade de culpabilidade do agente aliado é claro à idoneidade da ameaça no incutimento de medo no ofendido Se se mostrar suficientemente idônea para amedrontar a vítima ainda que concretamente esta não sinta medo a ameaça estará tipificada Embriaguez entendimento de Damásio de Jesus Para Damásio de Jesus é possível que o estado de embriaguez seja tal que exclua a seriedade exigida pelo tipo É possível porém que a embriaguez do sujeito não exclua mas ao contrário torne sério o prenúncio de mal injusto e grave pelo que o crime deve subsistir Ameaça e advertência distinção A ameaça não se confunde com a simples advertência porque nesta a superveniência do mal está condicionada à vontade do agente não se confunde igualmente com a praga ou esconjuro por duas razões básicas primeiro porque o evento não depende da vontade do sujeito ativo ou de alguém que lhe seja submisso segundo porque representa simples desejo ou intenção e como dizia Welzel a vontade má como tal não se pune só se pune a vontade má realizada Constrangimento ilegal e ameaça distinção No crime de constrangimento ilegal a ameaça e a consequente submissão da vontade do ofendido são meios para atingir outro fim representado pelo fazer ou não fazer a que é constrangido Na ameaça ao contrário a finalidade do agente esgotase na própria intimidação e na perturbação da tranquilidade e paz espirituais do ofendido No constrangimento ilegal o sujeito ativo pretende uma conduta positiva ou negativa da vítima enquanto na ameaça deseja somente amedrontá la atemorizála apavorála 4 Tipo subjetivo adequação típica O dolo que pode ser direto ou eventual representado pela vontade e consciência de ameaçar alguém de mal injusto e grave constitui o elemento subjetivo A consciência atual da injustiça do mal e da sua gravidade é fundamental para a tipificação da ameaça Assim se o agente na situação concreta imagina ou supõe equivocadamente que tem o direito de praticar contra a vítima o mal que ameaça incorre em erro que lhe afasta a responsabilidade penal Irrelevância da intenção de concretizar o mal ameaçado Não é necessário que o dolo se estenda à decisão de causar efetivamente o mal ameaçado até porque para caracterizar o crime de ameaça não é necessário que o agente tenha a intenção de concretizá la sendo suficiente a finalidade de infundir medo Animus jocandi exclusão do dolo O animus jocandi exclui o dolo Mas a seriedade da ameaça comporta uma valoração subjetiva muitas vezes de difícil comprovação por isso mais que ser séria a ameaça importa parecer sêlo A idoneidade da ameaça não será avaliada segundo o grau de temor sentido pela vítima mas será valorada de acordo o padrão do homem normal em circunstâncias igualmente normais de acordo com aquilo que naturalmente acontece na sociedade Necessidade do elemento subjetivo especial do tipo Além do dolo está implícito o elemento subjetivo especial do tipo que é constituído pelo especial fim de intimidar Esse elemento subjetivo especial do crime de ameaça só se identifica na perversa intenção de incutir medo exteriorizada seriamente e com ânimo frio pelo agente 5 Consumação e tentativa 51 Consumação Consumase o crime no momento em que o teor da ameaça chega ao conhecimento do ameaçado Se este a desconhece não se pode dizer ameaçado Consumase com o resultado da ameaça isto é com a intimidação sofrida pelo sujeito passivo ou simplesmente com a idoneidade intimidativa da ação Temor na vítima desnecessidade É desnecessário que a ameaça crie na vítima o temor da sua concretização ou que de qualquer forma perturbe a sua tranquilidade tratandose pois de crime formal É suficiente que tenha idoneidade para atemorizar para amedrontar isto é que tenha potencial intimidatório O medo não é fundamental à existência do crime de ameaça aliás é igualmente desnecessária a presença do ofendido no momento em que a ameaça é exteriorizada pelo sujeito ativo 52 Tentativa dificuldade A tentativa é de difícil configuração embora na forma escrita haja quem sustente sua viabilidade Como se trata de crime de ação pública condicionada isto é a que somente se procede mediante representação destaca Damásio de Jesus com muita precisão que se o sujeito exerce o direito de representação é porque tomou conhecimento do mal prenunciado Se isso ocorreu o crime é consumado e não tentado Ameaça crime unissubsistente A impossibilidade de tentativa do crime de ameaça não reside na sua natureza formal até porque a nosso juízo a tentativa não é exclusividade do crime material pois o crime formal também contém na sua essência o resultado que apenas não precisa verificarse para que esse tipo se consume Na verdade regra geral o crime de ameaça é unissubsistente ou seja não é passível de fracionamento 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comum que pode ser praticado por qualquer pessoa pois não exigindo qualquer qualidade ou condição especial formal pois a vítima não precisa sentirse intimidada basta a ação do agente e a vontade de amedrontála A exemplo dos crimes materiais o tipo descreve um resultado mas este que no caso seria o medo sentido pela vítima não precisa verificarse para que o crime se consume Neste crime o legislador antecipa a consumação satisfazendose com o simples desvalor da ação subsidiário quando constitui meio de execução ou elementar de alguns tipos penais doloso não havendo previsão da modalidade culposa 7 Natureza subsidiária da ameaça Tratase de um crime tipicamente subsidiário se a ameaça deixa de ser um fim em si mesmo já não se configura um crime autônomo passando a constituir elemento essencial ou acidental de outro crime a ameaça nesses casos é absorvida por esse outro crime A ameaça é absorvida quando for elemento ou meio de outro crime Fim específico distinto pode ser de outro crime A finalidade de incutir medo na vítima caracteriza o crime de ameaça embora não se produza nesta a intimidação pretendida Mas a existência de determinado fim específico do agente pode com a mesma ação configurar outro crime como por exemplo constrangimento ilegal entre outros 8 Pena e ação penal 81 Cominada A pena cominada ao crime de ameaça é alternativamente a de detenção de um a três meses ou multa A regra é que este crime se resolva na audiência preliminar do Juizado Especial Criminal art 74 da Lei n 909995 Em tese a pena de prisão não deverá ser aplicada ante a política criminal implantada com a referida lei reforçada pela Lei n 971499 82 Natureza da ação penal A ação penal é pública condicionada à representação do ofendido A natureza da ação penal é pública mas a iniciativa da autoridade Polícia na fase investigatória e Ministério Público para iniciar a fase processual depende da provocação ou aquiescência da vítima O ameaçado deverá avaliar a conveniência de instaurarse o procedimento investigatório ou não J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Responde pelas sanções do delito previsto no art 147 do CPB aquele que ameaça por palavra escrito ou gesto ou qualquer outro modo de causar mal injusto e grave às vítimas Todavia se a ameaça foi proferida em meio a discussão entre agente e vítimas o delito não resta configurado por ausência de dolo específico Ademais não sendo encontrada a suposta arma com a qual o agente teria proferido as ameaças e apresentandose confusos os depoimentos das vítimas quanto a sua efetiva existência não há como considerála para a configuração do delito de ameaça TJMG Apelação 10467059305509001 Rel Armando Freire j 811 2005 Essencializandose os fatos descritos num primeiro exame na ameaça de que trata o tipo inserto no art 147 do Código Penal embora se cuide de crime de ação pública depende de representação mostrandose inviáveis a requisição ministerial e o inquérito policial instaurado em consequência STJ HC 22843PI Rel Min Hamilton Carvalhido j 1942005 Recurso em Mandado de Segurança Crime de ameaça art 147 do CP Sujeito passivo Pessoa jurídica Impossibilidade O Hospital impetrante na qualidade de pessoa jurídica não tem qualquer direito muito menos líquido e certo em ser incluído na relação penal que busca averiguação do crime de ameaça art 147 do Código Penal Não obstante pode acionar procedimento administrativo com vistas à possível punição das funcionárias envolvidas na esfera administrativa STJ RMS 15627SP Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 782003 Ameaça Ânimo exaltado Se o ato foi praticado no momento de exaltação de ânimos por motivo de disputa política não há que se falar em configuração do crime de ameaça e sim em simples bravata que não constitui figura típica TJMG Processocrime 10000002761567000 Rel José Antonino Baía Borges j 78 2003 Crime de ameaça Art 147 do Código Penal Ausência de configuração Discussão entre vizinhos A ameaça de que se acabaria com a vítima e filha decorreu de discussão acalorada entre vizinhos surgindo a retratação Falta de justa causa para a ação penal STF HC 82895RJ Rel Min Marco Aurélio j 2462003 Sequestro e cárcere privado Art 148 Privar alguém de sua liberdade mediante sequestro ou cárcere privado Pena reclusão de 1 um a 3 três anos 1º A pena é de reclusão de 2 dois a 5 cinco anos I se a vítima é ascendente descendente cônjuge ou companheiro do agente ou maior de 60 sessenta anos Inciso I com redação dada pela Lei n 11106 de 28 de março de 2005 II se o crime é praticado mediante internação da vítima em casa de saúde ou hospital III se a privação da liberdade dura mais de 15 quinze dias IV se o crime é praticado contra menor de 18 dezoito anos V se o crime é praticado com fins libidinosos Incisos IV e V incluídos pela Lei n 11106 de 28 de março de 2005 2º Se resulta à vítima em razão de maustratos ou da natureza da detenção grave sofrimento físico ou moral Pena reclusão de 2 dois a 8 oito anos V art 5º XV da CF V art 1º da Lei n 288956 crimes de genocídio V art 3º a da Lei n 489865 abuso de autoridade V art 20 da Lei n 717083 Lei de Segurança Nacional V art 1º III b da Lei n 796089 prisão temporária V art 230 da Lei n 806990 Estatuto da Criança e do Adolescente D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido neste tipo penal é a liberdade individual especialmente a liberdade de locomoção isto é a liberdade de movimento do direito de ir vir e ficar liberdade de escolher o local em que se deseja permanecer Não deixa de ser em sentido amplo uma espécie de constrangimento ilegal apenas se diferenciando pela especialidade Livre gozo da liberdade Protegese na verdade o livre gozo da liberdade que não é destruída ou eliminada tanto com o cárcere privado quanto com o sequestro seu exercício ou livre gozo é que fica suprimido cessada a privação o sujeito passivo volta a gozála livremente em toda a sua plenitude A liberdade no sentido em que é protegida neste dispositivo consiste na possibilidade de mudança de lugar sempre e quando a pessoa queira sendo indiferente que a vontade desta se dirija a essa mudança Valoração objetiva da violação A valoração da liberdade violada operase por meio de critério puramente objetivo sendo irrelevante que o ofendido tenha conhecimento de que a sua liberdade pessoal está sendo violada Consentimento da vítima justificante supralegal O consentimento da vítima desde que validamente manifestado exclui o crime como tivemos oportunidade de afirmar o consentimento do titular de um bem jurídico disponível afasta a contrariedade à norma jurídica ainda que eventualmente a conduta consentida se adeque a um modelo abstrato de proibição Nesse caso o consentimento opera como causa justificante supralegal afastando a proibição da conduta Consentimento da vítima extensão restrita Contudo tratandose de bem jurídico tão elementar como é o direito de liberdade convém destacar que o efeito excludente do consentimento da vítima não goza de um absolutismo pleno capaz de legitimar toda e qualquer supressão da liberdade do indivíduo O consentimento não terá valor se violar princípios fundamentais de Direito Público ou de alguma forma ferir a dignidade da pessoa humana como por exemplo tempo de privação de liberdade perpétua ou por muito tempo ou o modo de sua supressão p ex ligado o indivíduo a cadeias encerrado em lugar malsão etc ou o objetivo prestação servil ou de qualquer modo ilícita 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo Como se trata de crime comum sujeito ativo pode ser qualquer pessoa não requerendo nenhuma qualidade ou condição particular se no entanto apresentar a qualidade de funcionário público e praticar o fato no exercício de suas funções poderá configurarse o crime de abuso de autoridade Lei n 489865 Igualmente quem receber eou recolher alguém à prisão sem ordem escrita da autoridade competente também incorre em crime de abuso de autoridade 22 Sujeito passivo Sujeito passivo pode ser qualquer pessoa independentemente de capacidade de conhecer e de autodeterminarse de acordo com esse conhecimento incluindose portanto os enfermos mentais as crianças de tenra idade os loucos de todo gênero etc ao contrário do que ocorre com os crimes anteriores Embora essas pessoas possam não ter capacidade de querer e de exercer o seu direito de liberdade o sequestro ou cárcere privado eliminalhes a possibilidade de serem auxiliadas Pessoas impossibilitadas de locomoção A despeito do entendimento contrário de alguns intérpretes pessoas impossibilitadas de locomoverse por exemplo paralíticos aleijados paraplégicos ou tetraplégicos também podem ser sujeito passivo deste crime pois a proteção legal garante o direito à locomoção por qualquer meio e nesse direito se inclui o direito de ir vir e ficar livremente Pessoa jurídica impossibilidade A pessoa jurídica não pode ser sujeito passivo deste tipo de crime assim como não pode ser aprisionada também não pode ser tolhida em sua liberdade de locomoção pois não dispõe dessa liberdade de movimento Ofendido criança disciplina do ECA Se o sujeito passivo for criança poderá ocorrer um sequestro sui generis disciplinado no Estatuto da Criança e do Adolescente ECA em seus arts 230 234 e 235 Lei n 806990 3 Tipo objetivo adequação típica O Código Penal não define cárcere privado nem sequestro limitandose a punilos igualmente utiliza as expressões sequestro ou cárcere privado com sentidos semelhantes embora estritamente se possa dizer que no cárcere privado há confinamento ou clausura enquanto no sequestro a supressão da liberdade não precisa ser confinada em limites tão estreitos Assim podese encarcerar alguém em um quarto em uma sala em uma casa etc e podese sequestrar retirandoo de determinado lugar e levandoo para outro como para uma ilha um sítio etc Sequestrar e encarcerar modus operandi Nada impede que as duas figuras ocorram em um mesmo fato por exemplo sequestrar e encarcerar aliás nos dias atuais é a modalidade mais comum quem sequestra encarcera Embora não se trate de crime de ação múltipla o agente que sequestrar e encarcerar responderá por um único crime pois na verdade a conduta tipificada é privar alguém de sua liberdade e sequestrar e encarcerar representam tão somente o modus operandi Contudo essa circunstância comprova a maior censurabilidade da ação que deverá ser objeto de avaliação no momento da aplicação da pena Conteúdo material impossibilidade de deslocarse livremente O conteúdo material do crime nas suas modalidades é a impossibilidade de a vítima deslocarse ou afastarse livremente Não é necessária a absoluta impossibilidade de a vítima afastarse do local onde foi colocada ou retirada pelo agente sendo suficiente que não possa fazêlo sem grave risco pessoal A própria inexperiência ou ignorância da vítima sobre as condições do local que lhe possibilitariam fugir não desnatura o crime Elementos constitutivos do tipo A conduta tipificada com efeito é privar alguém de liberdade sendo indiferente o meio escolhido pelo agente que poderá ser o mais diverso violência física ou moral fraude etc Os elementos constitutivos do crime de sequestro ou cárcere privado são a detenção ou retenção de alguém em determinado lugar dissentimento explícito ou implícito do sujeito passivo e a ilegitimidade objetiva da retenção ou detenção além é claro do dolo como elemento subjetivo Extensão da privação de liberdade Sequestro ou cárcere privado exige que a privação de liberdade tenha certa duração Uma privação rápida configuraria tentativa ou constrangimento ilegal Configurase o crime ainda que reste alguma liberdade de locomoverse dentro de certos limites Ilegitimidade da privação de liberdade Embora a ilegitimidade não constitua expressamente elemento normativo do tipo se a privação da liberdade for legítima não se pode falar em crime por exemplo alguém prende um delinquente em flagrante delito e o retém até a chegada da autoridade pública art 301 do CPP Qualquer do povo poderá prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito Privação legítima prolongamento indevido Configurarseá igualmente o crime de cárcere privado quando após a privação legítima da liberdade cessada a legitimidade prolonguese indevidamente a privação de liberdade ou quando por exemplo o paciente recebe alta mas é retido pela administração por falta de pagamento Maustratos e cárcere privado Pai que encarcera menor com finalidade corretiva pratica o crime de maustratos e não cárcere privado 4 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é o dolo que consiste na vontade livre e consciente de privar alguém de sua liberdade desde que tenha conhecimento da sua ilegitimidade e que pode ser praticado tanto por meio de sequestro como de cárcere privado Elemento subjetivo especial desnecessidade Não se exige nenhum elemento subjetivo especial do injusto que se houver poderá configurar outro crime se a privação da liberdade objetivar a obtenção de vantagem ilícita caracterizará o crime de extorsão mediante sequestro art 159 se a finalidade for libidinosa poderá configurar um crime contra os costumes art 215 ou 219 conforme o caso etc Fins especiais e outros crimes Se a finalidade for atentar contra a segurança nacional constituirá crime especial tipificado no art 20 da Lei de Segurança Nacional Lei n 7170 de 14121983 Se for praticado por funcionário público constituirá o crime de violência arbitrária art 322 Se o sequestro for meio para a prática de outro crime será absorvido pelo delitofim Finalidade da ação física definição do tipo A mesma conduta física poderá configurar um ou outro crime de acordo com a sua finalidade isto é segundo a intenção com que fora praticada Assim por exemplo se a intenção do agente não é a de privar a criança de sua liberdade de locomoção mas ao contrário de têla para si e criála como se fora sua o crime não é de sequestro ou cárcere privado mas o de subtração de incapazes previsto no art 249 do CP se não houver a intenção de privação ou restrição de liberdade da vítima menor de 18 anos ou interdito mas somente deixar de entregar sem justa causa a quem legitimamente o reclame o crime será o de sonegação de incapazes art 248 3ª figura Possibilidade do erro O erro seja de tipo seja de proibição como em qualquer crime projeta seus efeitos sobre esta infração penal quer para afastar o dolo e por extensão a tipicidade ante a ausência da modalidade culposa quer para eliminar ou diminuir a culpabilidade 5 Consumação e tentativa 51 Consumação Consumase com a efetiva restrição ou privação da liberdade de locomoção por tempo juridicamente relevante Afirmase que se a privação da liberdade for rápida instantânea ou momentânea não configurará o crime admitindose no máximo sua figura tentada ou quem sabe constrangimento ilegal Crime permanente Esta fase do iter criminis alongase no tempo perdurando enquanto a vítima permanecer privada de sua liberdade Enquanto a vítima não for restituída à liberdade não se encerra a consumação podendo inclusive o sujeito ativo ser preso em flagrante Consumação e exaurimento simultâneos Convém destacar que neste crime ao contrário do que acontece no crime de extorsão mediante sequestro art 159 o exaurimento não ocorre em momento distinto da consumação há entre ambos uma identificação temporal coincidindo consumação e exaurimento Constrangimento ilegal distinção Sequestro ou cárcere privado não se confunde com constrangimento ilegal enquanto naquele a privação de liberdade perdura no tempo neste a privação de liberdade é momentânea para obrigar a vítima a fazer ou deixar de fazer alguma coisa Recinto aberto possibilidade de privação Se o ofendido mesmo em recinto aberto for privado da prática de uma série de atos ou fatos que desejava realizar e foi impedido estará configurado o crime de cárcere privado na medida em que esse tipo penal não exige uma prisão local fechado ou cercado para caracterizar o crime 52 Tentativa admissibilidade Como crime material admite a tentativa que se verifica com a prática de atos de execução sem chegar à restrição da liberdade da vítima como por exemplo quando o sujeito ativo está encerrando a vítima em um depósito é surpreendido e impedido de consumar seu intento Tratandose porém da forma omissiva a tentativa é de difícil ocorrência 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comum que pode ser praticado por qualquer pessoa independentemente de qualquer condição especial material pois produz transformação no mundo exterior consumandose somente com a efetiva privação de liberdade da vítima permanente pois a ofensa do bem jurídico privação da liberdade prolongase no tempo e enquanto a vítima estiver privada de sua liberdade de locomoção a execução estarseá consumando este crime permite em razão da sua natureza permanente que o agente pratique o crime mesmo quando a vítima já se encontra privada de sua liberdade desde que aquele a reduza ainda mais por exemplo alguém que já se encontra em cárcere privado é acorrentado para impossibilitar sua fuga comissivo ou omissivo comissivo quando o sujeito ativo com a sua ação priva a vítima de sua liberdade omissivo quando por exemplo o carcereiro deixar de colocar em liberdade o condenado que já cumpriu a pena ou deixar de restituir a liberdade ao doente mental que recuperou a saúde etc doloso não havendo previsão da modalidade culposa 61 Cárcere privado no interior da prisão possibilidade Se o carcereiro no exercício de suas funções retém ou deixa de liberar o recluso ou detento praticará outro crime no entanto se apenas se aproveita do estabelecimento ou da situação e por outras razões deixa de liberar o indivíduo parecenos perfeitamente possível responder pelo crime de cárcere privado pois não é o local da privação que define a espécie e a natureza do crime a conduta física e seu elemento subjetivo 7 Formas qualificadas Os parágrafos do artigo em análise preveem determinadas circunstâncias que se ocorrerem qualificam o crime em razão da maior lesividade da conduta tipificada que poderá decorrer do maior desvalor da ação 1º ou desvalor do resultado 2º Para as hipóteses do 1º está prevista uma pena de reclusão de dois a cinco anos e para as circunstâncias do 2º a sanção prevista é de reclusão de dois a oito anos 71 Se a vítima é ascendente descendente cônjuge ou companheiro do agente A Lei n 111062005 acrescentou nesse parágrafo como vítima especial decorrente de parentesco a figura do companheiro sem sentido inovador procurando apenas adequar o texto penal ao reconhecimento jurídico da figura doa companheiroa independentemente do sexo Previsão numerus clausus A previsão legal é numerus clausus e como norma repressiva não admite nenhuma forma de extensão assim não se incluem pai ou filho adotivos genro nora padrasto ou madrasta A despeito da evolução éticosocial também estão excluídos os companheiros namorados amantes concubinos ou qualquer outra espécie resultante da moderna união estável Tipicidade estrita filho adotivo excluído A previsão do art 227 7º da CF não autoriza a inclusão do filho adotivo como fundamento da qualificação da figura típica O Direito Penal orientase fundamentalmente pelo princípio da tipicidade e enquanto não houver norma legal criminalizando condutas e cominando as respectivas sanções os enunciados constitucionais funcionarão somente como matrizes orientadoras da futura política criminal mas jamais poderão fundamentar a responsabilidade penal sem previsão legal expressa e específica Qualificadora e agravante exclusão O reconhecimento dessa qualificadora afasta a agravante genérica art 61 II e relativamente ao irmão embora não qualifique por falta de previsão legal configura a referida agravante genérica 72 Se o crime é praticado mediante internação da vítima em casa de saúde ou hospital 1º II A internação da vítima indevidamente em casa de saúde ou hospital revestese de requintada maldade com a utilização de meio artificioso e fraudulento não raro abusando da boafé do ofendido Esse artifício na execução do crime revela determinado grau de periculosidade acima do normal Fundamento da punição Fato como esse somente poderá ocorrer em relação a pessoas de certa forma frágeis pois só quem esteja por alguma razão carente ou necessitada de cuidados médicos pode ser ludibriado com esse meio fraudulento E nesse estado qualquer pessoa tem suas defesas reduzidas e fica mais sujeita a manipulação dessa ordem Essas circunstâncias todas justificam a maior punição do autor Casa de saúde ou hospital irrelevância É indiferente que a internação ocorra em casa de saúde ou em hospital pois não é a natureza do local que agrava o crime mas sua destinação de cura ou tratamento Anuência ou participação A anuência ou participação de qualquer profissional do estabelecimento de saúde responderá pelo mesmo crime segundo os preceitos do concurso de pessoas Se contudo o agente incorrer em erro seja de tipo seja de proibição receberá o tratamento segundo a natureza desse erro e a sua evitabilidade ou inevitabilidade 73 Se a privação da liberdade dura mais de quinze dias 1º III O prolongamento dos crimes permanentes embora não alterem sua tipificação inicial aumenta consideravelmente o sofrimento da vítima e o dano geral que produz ao ordenamento jurídico em termos genéricos A maior durabilidade do crime permanente reflete igualmente maior lesividade objetiva e maior insensibilidade moral que é um componente da periculosidade exacerbada Contagem do prazo é material Na contagem desse prazo que é material incluise o dia do começo art 10 Não nos parece porém que se trate do chamado crime a prazo pois o período referido representa somente um marco para além do qual o crime que já está consumado assume maior gravidade 74 Se resulta à vítima em razão de maustratos ou da natureza da detenção grave sofrimento físico ou moral 2º O 2º em razão do maior desvalor do resultado que pode ir além da simples privação da liberdade produzindo grave sofrimento à vítima comina pena bem superior entre dois e oito anos de reclusão Há duas modalidades de causar grave sofrimento físico ou moral ao ofendido maustratos e natureza da detenção Uso desnecessário de algemas Será necessário que as condições objetivas por si só acarretem maiores sofrimentos à vítima como por exemplo pelas condições de higiene ventilação promiscuidade ou quem sabe para aquelas autoridades que preferem sempre e em quaisquer circunstâncias mesmo quando absolutamente desnecessário manter a vítima algemada 75 Vítima menor de dezoito anos A despeito de não ser mencionado no texto legal a menoridade da vítima somente qualifica o crime se estiver presente na data de sua prática ou execução ainda que a consumação operese algum tempo depois ou seja quando a vítima já tenha ultrapassado essa idade Recordese que o Código Penal adota a teoria da atividade art 4º 76 Se a finalidade for libidinosa A figura normal antes da Lei n 111062005 se satisfazia simplesmente com o dolo geral e a presença de alguma finalidade especial poderia configurar outro crime No entanto de forma inadequada a nova lei incluiu uma qualificadora imprópria qual seja a finalidade libidinosa do sequestro ou cárcere privado deslocando essa qualificadora do Título Dos crimes contra os costumes para o Dos crimes contra a pessoa Antes dessa lei eventual existência de finalidade libidinosa deslocava o crime do art 148 para uma figura descrita nos capítulos dos crimes contra os costumes 8 Concurso entre os crimes de sequestro e de roubo 81 Majorante especial Para o crime de roubo foi previsto como majorante o agente manter a vítima em seu poder restringindo a sua liberdade art 157 2º V acrescentado pela Lei n 9426 de 14121996 Neste dispositivo a lei fala em restrição de liberdade e naquele art 149 em privação logo há uma diferença de intensidade de duração restrição significa a turbação da liberdade algo momentâneo passageiro com a finalidade de assegurar a subtração da coisa mediante violência ou quem sabe de garantir somente a própria fuga privação da liberdade por sua vez tem um sentido de algo mais duradouro mais intenso mais abrangente ou seja suprime total ou parcialmente o exercício da liberdade 82 Concurso material roubo e sequestro Se a privação da liberdade durar mais do que o tempo necessário para garantir o êxito da subtração da coisa alheia ou da fuga deixará de constituir simples majorante para configurar crime autônomo de sequestro em concurso material com o crime contra o patrimônio Se a vítima por exemplo após despojada de seu veículo é obrigada a nele permanecer dele se utilizando os acusados não para assegurar a impunidade do crime cometido mas para a prática de novos roubos contra outras vítimas haverá o crime de sequestro ou cárcere privado art 148 em concurso material com o de roubo 83 Ausência de bis in idem fatos e subjetividades distintas Não ocorre bis in idem pois são dois fatos distintos com elementos subjetivos igualmente distintos o roubo e o sequestro sendo que este foi além da simples garantia daquele Garantida a posse tranquila da res a privação da liberdade passa a ser orientada por novo elemento subjetivo distinto daquele da subtração e da garantia da sua posse 9 Pena e ação penal 91 Penas cominadas A pena é de reclusão de um a três anos na figura simples A sanção penal é de dois a cinco anos se a vítima for ascendente descendente cônjuge do agente ou maior de sessenta anos se o crime é praticado mediante internação da vítima em casa de saúde ou hospital ou se a privação da liberdade dura mais de quinze dias 1º Se no entanto em razão dos maustratos ou da natureza da detenção resultar para a vítima grave sofrimento físico ou moral a pena de reclusão será de dois a oito anos 2º 92 Natureza da ação penal A ação penal é pública incondicionada não sendo exigida nenhuma condição de procedibilidade 10 Questões especiais Este crime pode ser objeto de prisão temporária O consentimento da vítima afasta o crime Pais que levam filhos embora desobedecendo ordem judicial praticam crime de desobediência e não sequestro Pai que encarcera menor com finalidade corretiva pratica maustratos e não cárcere privado J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Sequestro Internação irregular e indevida em estabelecimento psiquiátrico Todas as pessoas têm direito a serem deixadas em paz direito à sua privacidade o mais abrangente dos direitos humanos e comete sequestro quem mediante irregular e indevida internação em hospital psiquiátrico priva um familiar de sua liberdade causandolhe grave sofrimento moral TJRJ Apelação 200505001366 Rel Eduardo Mayr j 8112005 O crime de sequestro e cárcere privado caracterizase pela restrição da liberdade de locomoção alheia em caráter permanente durante um razoável lapso temporal Se as pessoas tinham liberdade de ir e vir descaracterizado está o crime TJMG Apelação 104790406981320011 Rel Jane Silva j 1942005 Comete o crime de cárcere privado o agente que mantém sua mãe de criação e sua tia presas em casa atingindo o direito de locomoção das vítimas TJMG Apelação 101830306138910011 Rel Márcia Milanez j 382004 O crime de sequestro previsto no art 148 do Código Penal pressupõe a vontade livre consciente e autônoma de privar o ofendido da liberdade de locomoção Não há falar na incidência do art 148 do Código Penal mas sim do art 157 2º inciso V do mesmo diploma material se a privação da liberdade da vítima se dá unicamente para a prática do crime de roubo Tal circunstância todavia poderá influir no quantum de acréscimo STJ REsp 265344SP Rel Min Hamilton Carvalhido j 2632002 Não merece reforma a decisão que motivadamente entendeu não configurado o delito de sequestro se evidenciado que o elemento subjetivo do injusto praticado pelo réu restringiuse ao crime de roubo restando ausente a vontade livre consciente e autônoma de privar alguém de sua liberdade Precedente do STF STJ REsp 161143DF Rel Min Gilson Dipp j 18102001 Redução a condição análoga à de escravo Art 149 Reduzir alguém a condição análoga à de escravo quer submetendoo a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva quer sujeitandoo a condições degradantes de trabalho quer restringindo por qualquer meio sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto Pena reclusão de 2 dois a 8 oito anos e multa além da pena correspondente à violência 1º Nas mesmas penas incorre quem I cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador com o fim de retêlo no local de trabalho II mantém vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apodera de documentos ou objetos pessoais do trabalhador com o fim de retêlo no local de trabalho 2º A pena é aumentada de metade se o crime é cometido I contra criança ou adolescente II por motivo de preconceito de raça cor etnia religião ou origem Artigo com redação determinada pela Lei n 10803 de 11 de dezembro de 2003 V art 303 do CPP D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido neste tipo penal é a liberdade individual isto é o status libertatis assegurado pela Carta Magna brasileira Na verdade protegese aqui a liberdade sob o aspecto éticosocial a própria dignidade do indivíduo também igualmente elevada ao nível de dogma constitucional Princípio da dignidade humana Reduzir alguém a condição análoga à de escravo fere acima de tudo o princípio da dignidade humana despojandoo de todos os seus valores éticosociais transformandoo em res no sentido concebido pelos romanos Embora também se proteja a liberdade de autolocomoverse do indivíduo ela vem acrescida com outro valor preponderante que é o amor próprio o orgulho pessoal a dignidade que todo indivíduo deve preservar enquanto ser feito à imagem e semelhança do Criador Condição análoga à de escravo direito à liberdade Ao referirse a condição análoga à de escravo fica muito claro que não se trata de redução à escravidão que é um conceito jurídico segundo o qual alguém pode ter o domínio sobre outrem No caso em exame tratase de reduzir a condição semelhante a isto é parecida equivalente à de escravo pois o status libertatis como direito permanece íntegro sendo de fato suprimido 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo Como se trata de crime comum sujeito ativo pode ser qualquer pessoa não requerendo nenhuma qualidade ou condição particular se no entanto apresentar a qualidade de funcionário público e praticar o fato no exercício de suas funções poderá configurar o crime de abuso de autoridade Lei n 489865 A relação que se estabelece entre os sujeitos do crime é como diz o texto legal análoga à existente entre o senhor e o escravo pois a liberdade deste paira sob o domínio do senhor e dono 22 Sujeito passivo Sujeito passivo pode ser qualquer pessoa civilizada ou não sendo indiferente a idade raça sexo origem condição cultural capacidade jurídica etc especialmente agora quando qualquer discriminação nesse sentido constitui crime de racismo art 5º XLII da CF e Lei n 845997 Pessoa jurídica impossibilidade A pessoa jurídica não pode ser sujeito passivo também deste tipo de crime na medida em que somente a criatura humana pode ser escravizada 3 Tipo objetivo adequação típica Reduzir significa sujeitar uma pessoa a outra em condição semelhante à de escravo isto é a condição deprimente e indigna Consiste em submeter alguém a um estado de servidão de submissão absoluta semelhante comparável à de escravo É em termos bem esquemáticos a submissão total de alguém ao domínio do sujeito passivo reduzindoo à condição de coisa Sujeição da vítima relativa liberdade É irrelevante que a vítima tenha ou disponha de relativa liberdade pois esta não lhe será suficiente para libertarse do jugo do sujeito ativo Ademais a liberdade protegida pelo art 149 não se limita à autolocomoção mas principalmente procura impedir o estado de sujeição da vítima ao pleno domínio de alguém Meios e modos de execução Os meios ou modos para a prática do crime são os mais variados possíveis não havendo qualquer limitação legal nesse sentido o agente poderá praticálo por exemplo retendo os salários pagandoos de forma irrisória mediante fraude fazendo descontos de alimentação e de habitação desproporcionais aos ganhos com violência ou grave ameaça etc Prestação de serviços condições desumanas Quase sempre a finalidade da conduta delitiva é a prestação de serviços ou seja a execução de trabalho em condições desumanas indignas ou sem remuneração adequada Ainda hoje este crime ocorre com frequência em fazendas ou plantações distantes sem falar nos sertões nordestinos Concurso com outros crimes Se algum dos meios utilizados pelo sujeito ativo tipificar algum crime contra a liberdade individual como por exemplo ameaça sequestro entre outros será absorvido pelo crime de redução à condição análoga à de escravo se no entanto tipificar crimes de outra natureza haverá concurso com este que poderá ser formal ou material dependendo da unidade ou pluralidade de condutas Trabalhos forçados ou extraordinários Tipificase o crime por exemplo no caso de alguém forçar o trabalhador a serviços pesados e extraordinários com a proibição de deixar a propriedade agrícola sem liquidar os débitos pelos quais era responsável Não será contudo qualquer constrangimento gerado por eventuais irregularidades nas relações de trabalho que tipificará esse crime 4 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é representado pelo dolo que pode ser direto ou eventual consistindo na vontade livre e consciente de subjugar determinada pessoa suprimindolhe faticamente a liberdade embora esta remanesça de direito Consentimento do ofendido irrelevância Embora se reconheça que em tese a liberdade seja um bem jurídico disponível ao contrário do que ocorre com o crime de sequestro e cárcere privado o consentimento do ofendido mesmo que validamente manifestado não afasta a contrariedade ao ordenamento jurídico em razão dos bensvalores superiores concomitantes à liberdade a que acabamos de nos referir Indisponibilidade do status libertatis A indisponibilidade neste crime não se refere propriamente à liberdade mas ao status libertatis em sentido amplo que abrange aqueles valores dignidade amor próprio etc Assim não há nenhuma contradição em considerar a liberdade individual como disponível lá no art 148 e indisponível aqui no art 149 do mesmo diploma legal 5 Consumação Consumase o crime quando o agente reduz a vítima a condição semelhante à de escravo por tempo juridicamente relevante isto é quando a vítima se torna totalmente submissa ao poder de outrem Período rápido ou momentâneo insuficiente Em razão da sua natureza de crime permanente este não se configurará se o estado a que for reduzido o ofendido for rápido instantâneo ou momentâneo admitindose no máximo dependendo das circunstâncias sua forma tentada Enquanto não for alterado o estado em que a vítima se encontra a consumação não se encerra Consumação e exaurimento simultâneos Neste crime a exemplo do anterior o exaurimento não ocorre em momento distinto da consumação há entre ambos uma identificação temporal coincidindo consumação e exaurimento 6 Tentativa Como crime material admite a tentativa que se verifica com a prática de atos de execução sem chegar à condição humilhante da vítima por exemplo quando conhecido infrator desse tipo penal é preso em flagrante ao conduzir trabalhadores para sua distante fazenda onde o serviriam sem probabilidade de retornar 7 Classificação doutrinária Redução a condição análoga à de escravo é crime comum logo pode ser praticado por qualquer pessoa independentemente de qualquer condição especial material exigindo para consumarse a produção do resultado pretendido pelo agente qual seja a submissão da vítima ao seu jugo ou em termos típicos reduzindoa efetivamente a condição semelhante à de escravo comissivo sendo impossível praticálo por meio da omissão permanente pois a ofensa do bem jurídico a condição a que a vítima é reduzida prolongase no tempo e enquanto a vítima encontrarse nesse estado a execução estar seá consumando doloso não havendo previsão da modalidade culposa 8 Redução a condição análoga à de escravo e crimes afins O crime sob exame pode concorrer com outros por exemplo lesão corporal estupro rapto etc No entanto não será possível o concurso com os crimes contra a liberdade pois estes serão absorvidos por ele No magistério de Florian é natural que a redução a condição análoga à de escravo absorva qualquer outro crime contra a liberdade pois ele se apresenta como privação sintética integral profunda da liberdade do indivíduo Crime sui generis tipo especial Guardadas as proporções e sendo condescendente no exame da taxatividade da tipicidade referido dispositivo disciplina uma espécie sui generis do crime de reduzir a condição análoga à de escravo pois desde que a escravidão foi abolida em nosso País vender alguém como res é dispensarlhe tratamento semelhante ao que davam no seu tempo aos escravos art 238 do ECA 9 Pena e ação penal 91 Pena cominada A pena seguindo o princípio da proporcionalidade é reclusão de dois a oito anos Não há previsão de figuras qualificadas ou majoradas 92 Natureza da ação penal A ação penal é pública incondicionada não sendo necessária qualquer condição de procedibilidade Como toda ação pública admite ação penal privada subsidiária nos termos da Constituição Federal desde que haja inércia do Ministério Público 10 Inovações da Lei n 108032003 101 Limitações consagradas mesmo não desejadas Com esse diploma legal pretendendo reforçar a proteção do trabalhador o legislador restringiu o alcance do tipo penal anterior de crime de forma livre passou a ser especial quer pela limitação do sujeito passivo quer pelos meios ou formas de execução que passaram a ser específicas a sujeito passivo antes qualquer pessoa podia ser sujeito passivo deste crime agora somente o empregado ou trabalhador lato sensu b meio ou forma de execução antes era crime comum e sua execução era de forma livre agora somente pode ser praticado segundo as formas previstas no caput e 1º na nova redação do art 149 102 Como evitar o equívoco legislativo O legislador teria atingido seu objetivo com a seguinte técnica mantendo a redação anterior do caput que era aberta e abrangente e incluindo as novas modalidades somente em parágrafos assim teria evitado a limitação do tipo penal básico transformandoo em tipo especial quanto ao sujeito passivo 103 Sujeito passivo especial da novel figura A partir de agora somente pode ser sujeito passivo deste crime quem se encontrar na condição de contratado empregado empreiteiro operário enfim trabalhador do sujeito ativo Para configurar o crime é indispensável a relação ou vínculo trabalhista entre sujeito ativo e sujeito passivo A ausência dessa relação de prestação de serviço entre sujeito ativo e sujeito passivo impede que se configure esta infração penal ainda que haja a restrição da liberdade prevista no dispositivo Nesse caso deverá ser buscada a adequação típica em outro dispositivo penal Novas majorantes aumentam de metade São as duas causas constantes do 2º ora acrescentado no dispositivo em exame O critério a nosso juízo é absolutamente inadequado na medida em que pela inflexibilidade impede que o magistrado realize a dosagem adequada da pena resultando não raro em uma pena final injusta e desproporcional à gravidade do crime Novas sanções penais A pena privativa de liberdade foi mantida nos limites de dois a oito anos de reclusão como previa a redação anterior Foi acrescida no entanto a pena de multa além da correspondente à violência desde que convém registrar tal violência constitua em si mesma crime autônomo Nesse caso será adotado o sistema do cúmulo material de penas Configurandose qualquer das majorantes a pena privativa de liberdade será elevada de metade Desnecessário lembrar que essas previsões são irretroativas com exceção do sujeito passivo especial que caracteriza uma espécie de abolitio criminis J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A O acórdão recorrido diverge do atual posicionamento do Superior Tribunal de Justiça que se firmou no sentido de que o crime de redução a condição análoga à de escravo por se enquadrar na categoria de delitos contra a organização do trabalho é de competência da Justiça Federal nos termos do art 109 inciso VI da Constituição Federal STJ REsp 909340PA Rel Min Laurita Vaz j 2592007 Na esteira do atual entendimento do Supremo Tribunal Federal e desta Corte o crime de redução a condição análoga à de escravo ainda que praticado contra determinados grupos de trabalhadores por se enquadrar na categoria de delitos contra a organização do trabalho é de competência da Justiça Federal nos termos do art 109 inciso VI da Constituição Federal STJ Conflito de Competência 62156MG Rel Min Laurita Vaz j 2762007 Tendo como parâmetro a dignidade da pessoa humana art 1º caput III CF e os preceitos de que ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante e de que a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais art 5º incisos III e XLI respectivamente é que deve ser considerado o crime de redução a condição análoga à de escravo tipificado no art 149 do Estatuto Repressivo dado que se um ser humano está tendo tratamento assemelhado àquele conferido a um escravo visto como uma propriedade de seu dono e não como uma pessoa por certo que seus mínimos direitos e liberdades não estão sendo garantidos pelo que a dignidade da pessoa humana também não está sendo respeitada a ensejar a punição na seara criminal A conduta dos apelantes que alojam os trabalhadores em ambiente em péssimas condições de higiene não efetuam o pagamento diário de seus trabalhos nem tampouco os direitos previdenciários e ainda vendem produtos diversos em preço superior ao cobrado no comércio em geral que serão descontados após das verbas que os trabalhadores têm para receber acabam por reduzir as vítimas à condição análoga à de escravo art 149 CP eis que acarretam invariavelmente a submissão fática do empregado aos réus inviabilizando inclusive seu retorno para a cidade de origem TRF 3ª Região Apelação 200403990217519 Rel Suzana Camargo 2442006 Crimes de aliciamento de trabalhadores redução à condição análoga à de escravo e formação de quadrilha Não se pode afastar de plano os indícios de que houve o aliciamento de trabalhadores com falsas promessas o qual era realizado de forma estável organizada e estruturada por um grupo de pessoas e a frustração dos direitos trabalhistas pois nitidamente os entes restaram submissos à empresa até a liquidação de seus débitos STJ RHC 17233RJ Rel Min Laurita Vaz j 195 2005 Seção II Dos Crimes contra a Inviolabilidade do Domicílio Violação de domicílio Art 150 Entrar ou permanecer clandestina ou astuciosamente ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito em casa alheia ou em suas dependências Pena detenção de 1 um a 3 três meses ou multa V arts 5º XI e 226 5º da CF V arts 246 283 e 293 do CPP V arts 70 71 e 74 do CC V art 3º b da Lei n 489865 abuso de autoridade 1º Se o crime é cometido durante a noite ou em lugar ermo ou com o emprego de violência ou de arma ou por duas ou mais pessoas Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos além da pena correspondente à violência V art 62 do CP V art 19 do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais 2º Aumentase a pena de um terço se o fato é cometido por funcionário público fora dos casos legais ou com inobservância das formalidades estabelecidas em lei ou com abuso do poder 3º Não constitui crime a entrada ou permanência em casa alheia ou em suas dependências V art 245 do CPP I durante o dia com observância das formalidades legais para efetuar prisão ou outra diligência II a qualquer hora do dia ou da noite quando algum crime está sendo ali praticado ou na iminência de o ser 4º A expressão casa compreende V arts 246 e 248 do CPP I qualquer compartimento habitado II aposento ocupado de habitação coletiva III compartimento não aberto ao público onde alguém exerce profissão ou atividade 5º Não se compreendem na expressão casa V arts 246 e 248 do CPP I hospedaria estalagem ou qualquer outra habitação coletiva enquanto aberta salvo a restrição do n II do parágrafo anterior II taverna casa de jogo e outras do mesmo gênero D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido neste tipo penal continua sendo a liberdade individual ou seja o status libertatis na sua expressão mais elementar que é a inviolabilidade domiciliar a invulnerabilidade do lar que é o lugar mais recôndito que todo ser humano deve possuir para encontrar paz tranquilidade e segurança junto aos seus familiares A intimidade e a privacidade que são aspectos da liberdade individual assumem dimensão superior no recesso do lar e aí mais que em qualquer outro lugar necessitam de irrestrita tutela legal justificandose inclusive a proteção constitucional art 5º X Terminologia múltipla asilo inviolável A variedade terminológica para definir o bem jurídico tutelado inviolabilidade da casa da liberdade individual da tranquilidade doméstica não tem o condão de alterar a natureza do bem tutelado que é a proteção da liberdade da paz e da segurança da célula familiar ou na feliz expressão da Constituição Federal do asilo inviolável Casa habitada privacidade doméstica A criminalização da violação de domicílio objetiva proteger a moradia isto é o lugar que o indivíduo escolheu para a sua morada para o seu repouso e de sua família o bem jurídico é a liberdade e a privacidade individualfamiliar a que todo indivíduo tem direito e é dever do Estado garantirlhe essa inviolabilidade ou seja o direito de cada um viver livre de qualquer intromissão no seu lar na sua casa na sua morada Casa desabitada e moradores ausentes Casa desabitada não é res nullius e também tem proteção jurídicopenal não a mesma proteção que se dá à casa habitada enquanto asilo inviolável do cidadão mas a invasão daquela dependendo das circunstâncias poderá constituir algum crime contra o patrimônio No entanto se houver invasão de casa habitada cujos moradores se encontrem ausentes tipificará o crime de invasão de domicílio pois a despeito da ausência dos moradores o lugar permanece como habitado e repositório da intimidade e privacidade que caracterizam a vida doméstica daqueles Durante a noite ninguém pode entrar Durante a noite ninguém nenhuma autoridade mesmo com ordem judicial pode entrar ou permanecer no recinto do lar nos termos do texto constitucional havendo ordem judicial as autoridades deverão aguardar o amanhecer para só então observando as formalidades legais arts 241 a 248 e 293 todos do CPP poderem adentrar no recinto que independente de sua natureza ou condição constitua o domicílio ou morada de alguém Flagrante delito desastre ou prestar socorro A ressalva constitucional permite o ingresso na casa durante a noite somente em caso de flagrante delito ou desastre ou para prestar socorro art 5º XI in fine Essa ressalva no entanto ampliou a exceção do Código Penal de 1940 que se limitava à existência de flagrante delito nos termos seguintes art 150 3º II do CP 11 Definição jurídicopenal de domicílio O conceito que o Código Civil concebeu a domicílio não é o mesmo que o legislador penal lhe atribuiu deixando claro que este tinha o significado de casa e para afastar qualquer dúvida definiu casa como a qualquer compartimento habitado b aposento ocupado de habitação coletiva c compartimento não aberto ao público onde alguém exerce profissão ou atividade art 150 4º O CP afastou aqueles locais que não devem ser considerados casa para efeitos penais a hospedaria estalagem ou qualquer outra habitação coletiva enquanto aberta salvo a restrição do inciso II do parágrafo anterior b taverna casa de jogo e outras do mesmo gênero art 150 5º 12 Definição jurídicopenal de casa Segundo o texto legal a expressão casa abrange I qualquer compartimento habitado II aposento ocupado de habitação coletiva III compartimento não aberto ao público onde alguém exerce profissão ou atividade 4º Vejamos em que consiste cada um desses enunciados a Qualquer compartimento habitado para configurar casa no sentido de qualquer compartimento habitado não é necessário que esteja fixa ou afixada em determinado local pode ser móvel flutuante errante por exemplo barco trailler motorhome cabina de um trem velho vagão de metrô abandonado abrigo embaixo de ponte ou viaduto etc além de abranger evidentemente quarto de hotel de pensão pensionato etc b Aposento ocupado de habitação coletiva esta previsão abrange com efeito o cômodo onde o indivíduo mora em local destinado a várias pessoas esse cômodo é a sua casa o seu lar protegido pela inviolabilidade constitucional Referida previsão objetiva evitar dúvidas interpretativas em relação a determinados compartimentos quartos de hotéis barracas pensionatos orfanatos etc Compartimentos públicos não abrangência Hotel motel pensão ou similares não são objeto desta proteção penal na sua parte aberta ao público embora não ocorra o mesmo com as partes ocupadas seja o quarto com hóspede seja a parte interna da administração ou mesmo de serviços como cozinha lavanderia etc c Compartimento não aberto ao público onde alguém exerce profissão ou atividade referese aqui não à morada ou lar mas ao local onde o ser humano desenvolve sua profissão atividade ou negócios tais como escritório de advogado engenheiro economista contabilista administrador de empresas ou consultório médico dentário psiquiátrico psicanalítico etc Quem ingressar nesses locais sem consentimento de quem de direito pratica o crime de invasão de domicílio As dependências desses compartimentos que forem abertas ao público como salas de recepções ou de espera não são abrangidas pela proteção legal para fins penais Dependências de casas As dependências de casa para integrarem o conceito jurídicopenal de casa devem ser cercadas gradeadas ou muradas e são espaços acessórios ou complementares da morada ou habitação entendemse como tais dependências os anexos ou compartimentos conjugados como jardim quintal pátio garagem pomar adega etc O que caracteriza a dependência da morada é a sua proximidade e interdependência cujas atividades ali desenvolvidas são intimamente necessárias aos seus moradores Não abrangem a definição de casa O Código Penal no entanto preferiu extremar também o que não é abrangido pela expressão casa I hospedaria estalagem ou qualquer outra habitação coletiva enquanto aberta salvo a restrição do n II do parágrafo anterior II taverna casa de jogo e outras do mesmo gênero 5º 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo Qualquer pessoa pode ser sujeito ativo inclusive o proprietário pois não são a posse e a propriedade os objetos da proteção legal mas a intimidade e a privacidade domésticas como corolário do direito de liberdade A expressão casa pela conotação que o Código Penal lhe atribui vai muito além da simples propriedade para abranger além do seu aspecto material especialmente a sua finalidade e conteúdo ético social o status de morador que integram os direitos naturais da personalidade humana Cônjuge separado ou divorciado O cônjuge separado ou divorciado que invade a residência do outro pratica em tese o crime de invasão de domicílio salvo se sua conduta for orientada por alguma outra finalidade específica podendo receber nesse caso outra definição jurídica Proprietário de casa alugada O proprietário de casa alugada também pode ser sujeito ativo do crime de violação de domicílio se por exemplo adentrála contra a vontade do locatário O inquilino nesse caso o sujeito passivo não sofre violação na posse embora a exerça diretamente mas na sua tranquilidade doméstica na inviolabilidade do seu domicílio que a lei protege até mesmo contra o proprietário do imóvel 22 Sujeito passivo Sujeito passivo é o morador que pode impedir ou anuir à entrada ou permanência na casa é nos termos da lei quem de direito Não é o patrimônio domínio ou posse o objeto da proteção legal mas a liberdade doméstica é o morador a qualquer título proprietário inquilino arrendatário posseiro usufrutuário hóspede etc É ele que tem o direito de admitir ou excluir outrem no interior da sua morada Esse direito pode ser exercido até mesmo contra o proprietário Morador ausente Na ausência do morador o direito de exclusão ou admissão transferese ao cônjuge ascendentes descendentes empregados ou quaisquer outras pessoas que com ele convivam Teoricamente predomina a vontade do chefe da família ou cabeça do casal posições ou status hoje bastante questionados para permitir ou impedir a entrada de estranhos havendo divergência normalmente deve prevalecer a vontade daquele desde que desse consentimento não fique ofendido ou exposto a perigo o direito de liberdade doméstica correspondente a cada um dos conviventes Cônjuges e casais direito partilhado Em se tratando de cônjuges ou para sermos mais abrangentes casais casados amantes companheiros parceiros namorados etc esse direito é partilhado em igualdade de condições havendo dissenso porém a harmonia conjugal recomenda que prevaleça a negativa sob pena de haver violação de domicílio em relação ao dissente ou seja admitimos em outras palavras o direito de veto a qualquer dos parceiros Autorização do cônjuge infiel atipicidade O sujeito passivo que ingressa em um lar autorizado pelo cônjuge infiel o art 226 5º da CF estabelece igualdade jurídica entre os cônjuges não pratica o crime de violação de domicílio na verdade há violação do dever de fidelidade mas por parte do cônjuge infiel e não do terceiro estranho à relação Habilitação coletiva legitimidade Quando se trata de habitação coletiva colégio convento orfanato etc o direito de impedir ou admitir normalmente é atribuição do chefe ou diretor cuja ausência é suprida por um substituto natural e assim sucessivamente Prostituta privacidade do seu domicílio A própria prostituta pode ser sujeito passivo do crime de violação de domicílio quando por exemplo o seu cômodo seja casa quarto ou aposento estiver fechado ao público Ela como qualquer cidadão goza de um mínimo de privacidade tanto no lugar onde mora como no seu local de trabalho isto é compartimento onde exerce profissão ou atividade art 150 4º I e III e 5º I 3 Tipo objetivo adequação típica Entrar significa introduzirse penetrar ingressar ou até mesmo invadir permanecer significa ficar continuar conservarse dentro A permanência pressupõe a entrada lícita incriminandose a recusa em sair o sujeito ativo entra licitamente nesse caso mas insiste em ficar contra a vontade de quem de direito Nada impede porém que o sujeito ativo entre astuciosa ou clandestinamente isto é de forma ilícita e descoberto o crime já consumado na modalidade de entrar recusese a sair contrariando a vontade e determinação de quem de direito Nesse caso não pratica dois crimes pois se trata de crime de ação múltipla Clandestina astuciosa ou contra a vontade Qualquer das duas figuras entrar ou permanecer deve ser clandestina oculta furtiva às escondidas astuciosa fraude ardil artifício ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito o sujeito ativo afronta a vontade do sujeito passivo opondose ao seu querer tácito ou expresso Tanto a entrada quanto a permanência somente configurarão o crime se afrontarem a vontade de quem detém o direito de exclusão ou de permissão Essa contrariedade pode ser presumida expressa ou tácita Casa desabitada ou abandonada Entrar ou permanecer em casa desabitada ou abandonada não tipifica a conduta descrita como invasão de domicílio embora dependendo das circunstâncias possa configurar outra infração penal particularmente contra o patrimônio por isso não é recomendável afirmar simplesmente que a conduta é atípica Convém ademais ter presente que a ausência eventual de moradores não caracteriza casa desabitada ou abandonada 31 Formas de entrada ou permanência francas astuciosas ou clandestinas Nas modalidades em que são utilizadas astúcia ou clandestinidade há a presunção de que elas não são consentidas Aliás a astúcia e a clandestinidade deixam clara essa presunção caso contrário não seria necessário esse ardil quando a forma de entrada adotada for a franca ou seja na ausência de astúcia ou clandestinidade a contrariedade da vítima deve ser expressa ou tácita podendose perceber desde logo que presumida não se confunde com tácita Consentimento do morador Se houver consentimento expresso ou tácito a adequação típica será afastada logicamente O dissenso de quem de direito será presumido na astúcia ou clandestinidade em razão da natureza ou da forma pela qual a conduta foi realizada com fraude ardil artifício na primeira hipótese ou oculta furtiva às escondidas na segunda dificultando a percepção do ofendido que sem saber da presença do invasor não pode ser contra a sua entrada ou permanência não se pode contrariar o que não se conhece é impossível dissentir de algo que se ignora Contrariedade expressa ou tácita Quando a entrada ou permanência for franca a contrariedade tácita ou expressa como elementares do crime deve ser inequívoca há manifestação de vontade expressa quando o sujeito passivo manifesta seu desejo de forma inconfundível pela retirada imediata do invasor podendo materializarse por meio de palavras gestos escritos e qualquer ato eloquente há o dissenso tácito por sua vez quando resultar da prática de atos incompatíveis com a vontade de permitir a entrada ou permanência do sujeito ativo no recinto Dissenso tácito e presumido O dissenso tácito não se confunde com o presumido o primeiro decorre da postura comportamental do sujeito passivo diante da realidade fática materializada com a presença do invasor enquanto o segundo decorre da própria natureza da conduta do sujeito ativo ardilosa sorrateira dissimulada Naquele há a exteriorização da vontade de quem de direito ainda que por meio de uma linguagem não escrita nem falada mas suficientemente clara para transmitir a contrariedade neste a presunção decorre da falta de assentimento na conduta do sujeito ativo representado pelo comportamento astuto e clandestino 4 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo deste crime é o dolo representado pela vontade livre e consciente de entrar ou permanecer em casa alheia contra a vontade do morador Fazse necessário que o agente tenha conhecimento do dissenso de quem de direito e de que se trata de casa alheia Funcionário público formalidades Quando o crime for praticado por funcionário público uma espécie de crime próprio o dolo deve ser integrado pelo conhecimento de que abusa dos poderes inerentes à função pública exercida ou que não observa as formalidades prescritas em lei ou ainda que abusa de poder para entrar ou permanecer em casa alheia Erro jurídicopenal efeitos O erro independentemente de sua natureza se de tipo ou de proibição expargirá seus efeitos excludentes como em qualquer crime Assim se a gente entra em casa alheia ignorando ou desconhecendo que se trata de casa alheia não comete crime pois se trata de erro de tipo que lhe exclui o dolo e por extensão a tipicidade ante a ausência de previsão da modalidade culposa desnecessário questionarse sobre a evitabilidade ou inevitabilidade do erro 5 Consumação e tentativa 51 Consumação Consumase o crime de invasão de domicílio com a entrada ou permanência em casa alheia contrariadas por quem de direito na primeira hipótese consumase tão logo o sujeito ativo se tenha introduzido completamente na casa alheia independentemente do meio empregado na segunda hipótese no exato momento em que a conduta do agente demonstra sua efetiva intenção de permanecer no interior do aposento a despeito do dissenso de quem de direito ou quando o agente fica no interior da casa além do necessário apesar de solicitada a sua retirada Entrada lícita e permanência ilícita Se o agente entra licitamente em casa alheia não comete crime algum se no entanto convidado a retirarse permanece contra a vontade do morador comete o crime que se consuma com esta segunda conduta aliás em princípio a modalidade criminosa de permanecer só ocorre quando a entrada é lícita caso contrário o crime já estará consumado com a simples entrada ilícita seja astuciosa clandestina ou contra a vontade expressa de quem de direito Contudo se ambas entrada e permanência são ilícitas o agente responde apenas por uma pois se trata de crime de ação múltipla 52 Tentativa A tentativa embora de difícil configuração é teoricamente admissível Há tentativa quando o agente pretendendo entrar na casa da vítima é impedido por esta ou quando o agente convidado a retirarse pretendendo permanecer no interior da casa alheia é retirado para fora 6 Classificação doutrinária Crime comum podendo ser praticado por qualquer pessoa não sendo exigida nenhuma condição ou qualidade especial do sujeito ativo de mera conduta pois a descrição típica não vislumbra qualquer resultado não há previsão de qualquer consequência da entrada ou permanência em casa alheia instantâneo 1ª figura consumase no momento em que o agente entra em casa alheia esgotandose aí a lesão jurídica permanente 2ª figura embora pareça redundância não pode ser outro o sentido de permanecer de conteúdo variado pois mesmo que o agente entre e permaneça não pratica dois crimes mas apenas um comissivo na modalidade entrar e omissivo na de permanecer doloso não havendo previsão de modalidade culposa 7 Formas qualificadas tipos derivados As qualificadoras do crime de violação de domicílio estão relacionadas no 1º quais sejam cometido durante a noite ou em lugar ermo ou com o emprego de violência ou de arma ou por duas ou mais pessoas Vejamos sucintamente o significado de cada uma 71 Durante a noite Noite é o período do dia em que há naturalmente a ausência de luz solar e normalmente iniciase pouco mais de uma hora após o sol se pôr e findase com o seu nascimento O fundamento da qualificadora do crime praticado durante a noite reside na sua maior facilidade e no aumento de dificuldade de defesa da vítima especialmente nesse tipo de crime que provavelmente no período noturno surpreende quem está dormindo Durante a noite e durante o repouso noturno Durante a noite não se confunde com durante o repouso noturno elementar temporal contida no 1º do art 155 que é o horário em que a cidade ou o local se encontra repousando ao passo que durante a noite pode abranger períodos anteriores e posteriores ao repouso noturno desde que esteja compreendido entre o início da noite e o crepúsculo da aurora 72 Lugar ermo É aquele distante afastado de difícil acesso isolado habitualmente abandonado onde a possibilidade de socorro é muito remota é o local geograficamente considerado habitualmente solitário não basta que eventualmente o lugar se encontre isolado ou não frequentado Essa circunstância territorial torna mais desvaliosa a ação delituosa justificando consequentemente a sua maior punição por meio da qualificadora O isolamento do local aumenta a probabilidade de dano e intensifica a situação de perigo Lugar ermo dificuldade de socorro Tratandose de um elemento normativo deve ser analisado com cautela pois as circunstâncias fáticas temporais e espaciais é que deverão indicar se o lugar pode ser tido como ermo O fundamento da qualificadora em se tratando de lugar ermo reside na maior dificuldade ou quem sabe até impossibilidade de o incapaz encontrar socorro 73 Emprego de violência O texto legal é omisso quanto à natureza e espécie de violência exigida para configurar a qualificadora a omissão no dispositivo em exame é a manifestação clara de que a grave ameaça não tem o condão de qualificar o crime Como a lei fala em violência sem especificar contra quem ou contra o quê abrange a violência tanto contra a coisa como contra a pessoa Violência concurso de crimes Se da violência à pessoa resultar algum crime haverá concurso de crimes cuja natureza formal ou material somente diante do casuísmo se poderá definir 74 Emprego de arma Embora o texto legal não defina o que deve ser entendido por arma acreditamos que tanto as próprias quanto as impróprias desde que sejam idôneas para impingir medo na vítima serão suficientes para caracterizar a qualificadora Armas próprias e armas impróprias São armas 1º próprias aquelas que têm a finalidade específica de ataque ou defesa As armas próprias podem ser de fogo como revólver espingarda bombas granadas etc ou ainda armas brancas como punhal faca facão etc 2º impróprias aqueles instrumentos cuja finalidade natural não se destina a ataque ou defesa como as próprias embora apresentem potencialidade lesiva normalmente têm sua finalidade desvirtuada por exemplo machado foice tesoura navalha etc Uso efetivo de arma Somente haverá incidência da qualificadora se as armas forem efetivamente empregadas na execução do crime Emprego significa uso real efetivo concreto Assim o simples portar arma não a caracteriza desde que não seja ostensivo e com finalidade intimidatória pois o porte ostensivo com a finalidade de infundir medo pode ser uma forma de emprego de arma na execução do crime Arma de brinquedo inadmissibilidade Sobre a inadmissibilidade de arma de brinquedo para qualificar o crime a despeito da equivocada Súmula 174 do STJ relativamente a crime de roubo vejase o que dissemos a respeito quando examinamos o crime de constrangimento ilegal 75 Duas ou mais pessoas O concurso de pessoas por si só dificulta quando não elimina as possibilidades de resistência da vítima torna muito mais grave o desvalor da ação praticada em concurso independentemente da natureza da participação de cada um se coautoria ou participação em sentido estrito Quando o Código exige participação efetiva na execução do crime fálo expressamente como ocorre no art 146 1º logo a contribuição do partícipe também é computada Essa desproporcionalidade de forças e de probabilidades de vantagens entre sujeitos ativos e vítima fundamenta e justifica essa qualificadora 8 Formas majoradas causas de aumento O 2º prevê uma majorante especial para quando o fato for cometido por funcionário público fora dos casos legais ou com inobservância das formalidades estabelecidas em lei ou com abuso de poder Todos têm o dever constitucional de respeitar a inviolabilidade da casa alheia mormente os funcionários do Estado que antes de tudo devem protegêla assim quando estes funcionários públicos infringem o art 150 violam também um dever funcional 9 Causas de exclusão da antijuridicidade As excludentes de antijuridicidade podem ser as especiais previstas exclusivamente para este tipo penal art 150 3º podem ser as gerais fixadas na Parte Geral do Código Penal art 23 e ainda as constitucionais acrescidas pela nova Carta de 1988 art 5º XI Excludentes especiais O 3º do art 150 do CP prescreve duas hipóteses I durante o dia com observância das formalidades legais para efetuar prisão ou outra diligência II a qualquer hora do dia ou da noite quando algum crime está sendo praticado ou na iminência de o ser Excludentes constitucionais O 3º deve ser analisado em harmonia com o disposto no art 5º XI da Constituição Federal A casa é asilo inviolável do indivíduo ninguém nela podendo penetrar sem o consentimento do morador salvo em caso de flagrante delito ou desastre ou para prestar socorro ou durante o dia por determinação judicial Excludentes gerais O estado de necessidade a legítima defesa o estrito cumprimento de dever legal e o exercício regular de direito afastam a ilicitude de eventual invasão domiciliar logicamente as duas primeiras exigem a presença de seus requisitos formais e materiais e as duas últimas além desses requisitos não dispensam a necessidade das formalidades legais sob pena de responderem pelo crime 10 Pena e ação penal 101 Pena cominada A sanção penal cominada é alternativa na figura simples detenção de um a três meses ou multa caput Na figura qualificada 1º ou seja se o crime é praticado durante a noite em lugar ermo com emprego de violência ou de arma ou por duas ou mais pessoas a pena é detenção de seis meses a dois anos além da pena correspondente à violência O concurso de crimes até pode ser formal se for o caso de unidade de conduta mas o sistema de aplicação de pena é o do cúmulo material a exemplo do que ocorre com o concurso formal impróprio Na figura majorada 2º a pena é aumentada em um terço quando praticado por funcionário público fora dos casos legais ou com inobservância das formalidades legais ou com abuso de poder 102 Natureza da ação penal A ação penal é pública incondicionada sendo dispensável qualquer manifestação do ofendido tanto para a sua instauração quanto para as providências investigatórias preliminares J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Violação de domicílio Art 150 do Código Penal Quando o réu com seus comparsas ingressam no pátio da residência como varanda próximos à porta dos fundos e inclusive no telhado sendo surpreendidos pela vítima resta comprovado o crime de invasão de domicílio na forma tentada TJRS Recurso Crime 71001395722 Rel Alberto Delgado Neto j 22102007 Violação de domicílio Art 150 caput do Código Penal Não ocorreu invasão de domicílio O acusado não agiu de forma clandestina Ausente ainda o dolo específico para a invasão de domicílio pois o autor do fato foi ao local para conversar com a vítima sobre seus filhos e não para invadir a residência TJRS Recurso Crime 71001386747 Rel Angela Maria Silveira j 8102007 Prova penal Banimento constitucional das provas ilícitas CF art 5º LVI Para os fins da proteção jurídica a que se refere o art 5º XI da Constituição da República o conceito normativo de casa revelase abrangente e por estenderse a qualquer aposento de habitação coletiva desde que ocupado CP art 150 4º II compreende observada essa específica limitação espacial os quartos de hotel Doutrina Precedentes Sem que ocorra qualquer das situações excepcionais taxativamente previstas no texto constitucional art 5º XI nenhum agente público poderá contra a vontade de quem de direito invito domino ingressar durante o dia sem mandado judicial em aposento ocupado de habitação coletiva sob pena de a prova resultante dessa diligência de busca e apreensão reputarse inadmissível porque impregnada de ilicitude originária STF RHC 90376RJ Rel Min Celso de Mello j 342007 O delito de violação de domicílio é crimemeio sendo absorvido pelo de lesão corporal gravíssima devendo o apelante ser absolvido pela prática deste delito TJRJ Apelação 200705002851 Rel Alexandre H Varella j 692007 Invasão de domicílio Configurado o delito de violação de domicílio pelo fato de o réu entrar no pátio da residência onde as vítimas tomavam sol em trajes de banho TJRS Recurso Crime 71001355817 Rel Alberto Delgado Neto j 2782007 Violação de domicílio qualificada Art 150 1º do CP Prova testemunhal carreada dá conta de que o autor do fato adentrou no domicílio durante a madrugada sem o consentimento de seu morador de forma clandestina Além disso praticou violência com socos e uso de uma faca contra a moradora vítima O delito em questão é formal que se consuma com a conduta de adentrar em domicílio alheio sem a devida permissão ou consentimento TJRS Recurso Crime 71001237734 Rel Alberto Delgado Neto j 462007 Denúncia por crime de furto em estabelecimento comercial qualificado pelo arrombamento Sentença que desclassifica para o delito de violação de domicílio Alegação de ausência de dolo em razão do estado de embriaguez Não comprovação do alegado Entrada em estabelecimento comercial à noite estando o mesmo fechado ao público Compartimento que está compreendido na expressão casa Prova induvidosa da autoria e do dolo TJRJ Apelação 200605003652 Rel Fátima Clemente j 2692006 Furto Ausência de animus furandi Desclassificação Violação de Domicílio Crime Autônomo Estando as circunstâncias elementares descritas na denúncia promove se a emendatio libelli para conserto da imputação Não havendo demonstração do animus furandi e praticada a invasão de domicílio cujas elementares estão descritas na denúncia inclusive quanto à circunstância de ter sido praticado à noite é de ser mantida a condenação pelo delito do art 150 1º CP TJRS Apelação 70016024564 Rel Aramis Nassif j 1992006 Seção III Dos Crimes contra a Inviolabilidade de Correspondência V art 5º XII da CF V Lei n 411762 Código Brasileiro de Telecomunicações V Lei n 653878 serviços postais Violação de correspondência Art 151 Devassar indevidamente o conteúdo de correspondência fechada dirigida a outrem Pena detenção de 1 um a 6 seis meses ou multa V art 3º c da Lei n 489865 abuso de autoridade V arts 13 e 14 da Lei n 717083 Lei de Segurança Nacional V art 41 XV e parágrafo único da Lei n 721084 Lei de Execução Penal Sonegação ou destruição de correspondência 1º Na mesma pena incorre I quem se apossa indevidamente de correspondência alheia embora não fechada e no todo ou em parte a sonega ou destrói V art 40 1º da Lei n 653878 serviços postais Violação de comunicação telegráfica radioelétrica ou telefônica II quem indevidamente divulga transmite a outrem ou utiliza abusivamente comunicação telegráfica ou radioelétrica dirigida a terceiro ou conversação telefônica entre outras pessoas III quem impede a comunicação ou a conversação referidas no número anterior IV quem instala ou utiliza estação ou aparelho radioelétrico sem observância de disposição legal V art 70 da Lei n 411762 Código Brasileiro de Telecomunicações 2º As penas aumentamse de metade se há dano para outrem 3º Se o agente comete o crime com abuso de função em serviço postal telegráfico radioelétrico ou telefônico Pena detenção de 1 um a 3 três anos 4º Somente se procede mediante representação salvo nos casos do 1º IV e do 3º V art 100 1º do CP V arts 24 38 e 39 do CPP D O U T R I N A Alteração verificar a Lei n 9296 de 24 de julho de 1996 que disciplina o inciso XII parte final do art 5º da Constituição Federal 1 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido neste artigo é a inviolabilidade do sigilo da correspondência das comunicações telegráficas e das comunicações telefônicas A importância desse bem jurídico na garantia da liberdade de expressão fundamentou inclusive a necessidade de protegêlo constitucionalmente elevandoo à condição de garantia constitucional individual art 5º X e XII Liberdade de manifestação do pensamento Protegese a liberdade individual sob o aspecto mais especificamente da liberdade de manifestação do pensamento garantese na verdade a inviolabilidade do sigilo particularmente o sigilo da comunicação cujo desrespeito atingiria mortalmente a essência da privacidade individual que é o direito de viver com o mínimo de interferência de terceiros Direito à privacidade O direito à intimidade ou privacidade que é espécie do gênero direitos da personalidade necessita e recebe a imediata proteção jurídicoconstitucional E a violação do sigilo da correspondência das comunicações telefônicas e telegráficas na era da informática é o ápice da transgressão desse direito que justifica a sua criminalização 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa não requerendo nenhuma condição particular Somente não podem praticar este crime o remetente e o destinatário ante a impossibilidade de se autoviolar o sigilo da própria correspondência Será qualificado o crime se for praticado com abuso de função em serviço postal telegráfico radioelétrico ou telefônico cuja pena será de um a três anos de detenção 2º 22 Sujeito passivo Sujeitos passivos duplo por sua vez são os dois excluídos da possibilidade de serem sujeito ativo isto é o remetente e o destinatário da correspondência Esses dois são os que sofrem o dano com a violação do sigilo da comunicação não protegido pela lei como assegurado pela Constituição Federal como garantia individual do cidadão Enquanto a correspondência não chega às mãos do destinatário pertence ao remetente 3 Tipo objetivo adequação típica O art 151 com redação da Lei n 653878 no caput e nos 1º I e 2º prevê as seguintes formas de conduta tipificadoras de crimes distintos a violação de correspondência caput b apossamento de correspondência 1º I c violação de comunicação telegráfica radioelétrica ou telefônica 1º II d impedimento de comunicação ou conversação 1º III e instalação ou utilização de estação de aparelho radioelétrico 1º IV 31 Violação de correspondência O núcleo do caput que protege a inviolabilidade do sigilo da correspondência é devassar que significa descobrir olhar perscrutar indevidamente correspondência alheia fechada total ou parcialmente É desnecessária a abertura da correspondência basta por qualquer meio tomar conhecimento do seu conteúdo O devassamento sempre constitui crime independentemente do conteúdo da correspondência se relevante ou irrelevante Indevidamente devassa ilegítima O elemento normativo indevidamente exige que a devassa seja ilegítima sem autorização conforme exame que faremos no tópico seguinte Correspondência fechada e correspondência aberta É necessário que a correspondência seja fechada isto é que não tenha sido violada ou devassada por alguém Se não estiver fechada não significa que a conduta seja atípica pois poderá eventualmente tipificar a conduta descrita no 1º I deste mesmo artigo desde que os demais elementos estejam presentes Se contudo o agente limitarse a ler correspondência aberta sem apossarse sonegar ou destruíla não cometerá crime algum desde que não tenha concorrido para a abertura do recipiente onde a correspondência estava acondicionada Tomar conhecimento do conteúdo Não é imprescindível que o sujeito ativo leia sendo escrita a correspondência alheia é suficiente que tome conhecimento do seu conteúdo ou seja o sujeito ativo comete o crime tanto quando abre a correspondência como quando faz sua leitura utilizandose de aparelhagem técnica especial Correspondência definição O Código Penal não define o que deve ser entendido por correspondência Deve ser abrangente Assim pode ser carta bilhete fax fonograma telex telegrama fita de vídeo fita cassete videolaser etc Fundamental mais que o meio ou tipo de correspondência é que esteja fechada demonstrando o seu caráter sigiloso e o desejo de que seu conteúdo seja conhecido somente pelo seu destinatário 32 Elemento normativo do tipo indevidamente Inconstitucionalidade das exceções legais Ao contrário do que fazia a Constituição anterior art 153 9º a atual afirma que é inviolável o sigilo da correspondência sem estabelecer qualquer exceção Na verdade o atual texto constitucional excepciona somente em relação ao sigilo das comunicações telefônicas e nos limites estabelecidos no próprio texto constitucional e posteriormente disciplinado pela Lei n 929696 Inconstitucionalidade das exceções ao sigilo da correspondência Todas as exceções ou autorizações legais relativas à inviolabilidade do sigilo de correspondência são inconstitucionais Ex arts 240 1º f e 243 2º do Código de Processo Penal Sob o império da nova ordem constitucional nenhuma espécie de fundadas razões autoriza legitimamente apreender cartas abertas ou não destinadas ao acusado ou em seu poder art 240 1º f independente da natureza da suspeita ou mesmo certeza ou do conteúdo da correspondência Na verdade esse dispositivo foi derrogado pela Constituição Federal de 1988 art 5º XII 1ª parte Apreensão de correspondência inconstitucionalidade Toda e qualquer apreensão de correspondência com fundamento nos arts 340 e 243 do CPP é inconstitucional e como tal constitui prova ilícita como ocorreu no famoso caso do exPresidente do Banco Central Prof Francisco Lopes independentemente de os Poderes Constituídos reconhecerem essa aleivosia Por outro lado a previsão do art 243 2º do CPP é duplamente inconstitucional primeiro porque fere o princípio da ampla defesa art 5º LV segundo porque afronta a inviolabilidade do advogado no exercício profissional art 133 Finalidade de investigação criminal irrelevância A finalidade de investigação criminal ou instrução processual penal mesmo por ordem judicial só foi excepcionada para autorizar a quebra do sigilo das comunicações telefônicas Essa exceção específica reforça ainda mais o argumento de que para as demais formas de comunicação correspondência comunicações telegráficas e de dados nem mesmo fins investigatórios penais autorizam a violação do sigilo constitucionalmente assegurado O constituinte brasileiro a contrario sensu reforçou essa garantia constitucional que assume a condição de dogma não admite nenhuma exceção Correspondência destinada a preso Nessa mesma linha é absolutamente inconstitucional a devassa do conteúdo da correspondência destinada ao preso realizada pelas autoridades penitenciárias O preso não é res e a própria Lei de Execução Penal asseguralhe todos os direitos que não forem atingidos pela sentença ou pela lei art 3º dentre os quais se destaca a inviolabilidade da correspondência 33 Apossamento de correspondência O 1º I aplica a mesma pena a quem se apossa indevidamente de correspondência alheia mesmo não fechada para sonegála ou destruíla total ou parcialmente Este dispositivo equipara a sonegação de correspondência à sua violação Na hipótese de sonegação ao contrário da violação caput é irrelevante que a correspondência seja aberta ou fechada e que o sujeito ativo tenha ou não conhecimento do seu conteúdo Apossarse indevidamente Apossarse significa apoderarse reter tomar posse da correspondência mas o apossamento deve ser indevido É indiferente que a correspondência esteja fechada ou aberta Como crime de forma livre pode ser praticado com os mais variados meios ou formas com violência real ou moral fraude por erro do carteiro etc Apossamento parcial suficiência Para se configurar o crime é suficiente o apossamento parcial de correspondência de parte dela de algum documento anexo etc Antes da atual redação deste tipo penal estávamos diante de um crime de conteúdo variado ou de ação múltipla e se o agente praticasse mais de uma das condutas tipificadas não incorria em mais de um crime Crime de furto ou dano Se a correspondência tiver valor econômico teoricamente a subtração poderá constituir crime de furto e a destruição crime de dano 4 Violação de comunicação telegráfica radioelétrica ou telefônica Nos termos do inciso II pratica o crime de violação de comunicação quem indevidamente divulga transmite a outrem ou utiliza abusivamente comunicação telegráfica ou radioelétrica dirigida a terceiro ou conversação telefônica entre outras pessoas Divulgar transmitir ou utilizar As condutas tipificadas são divulgar transmitir ou utilizar Divulgar significa dar publicidade tornar público propagar difundir o conteúdo da comunicação indevidamente transmitir é comunicar fazer chegar transferir em tese a um número indeterminado de pessoas Não é necessário porém que uma pluralidade de pessoas tome conhecimento da comunicação pois o tipo penal pune a transmissão a outrem logo é suficiente que uma só pessoa tome conhecimento da comunicação para que se configure o crime utilizar é fazer uso empregar tirar proveito explorar no caso abusivamente comunicação telegráfica radioelétrica ou comunicação telefônica 5 Interceptação de comunicação telefônica exceção constitucional A comunicação telefônica é a única a que a atual Constituição Federal permite exceção eventualmente ao princípio da inviolabilidade do sigilo das comunicações desde que por ordem judicial nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal art 5º XII A Lei n 929696 veio disciplinar as hipóteses possíveis arts 1º e 2º Interceptação telefônica legislação extravagante O art 10 da Lei n 929696 faz a seguinte incriminação Constitui crime realizar interceptação de comunicações telefônicas de informática ou telemática ou quebrar segredo da Justiça sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei Pena reclusão de 2 dois a 4 quatro anos e multa Interceptação telefônica não será admitida Não será admitida a interceptação telefônica nos seguintes casos a não houver indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal b a prova puder ser feita por outros meios disponíveis c o fato investigado constituir infração penal punida no máximo com pena de detenção art 2º da Lei n 929696 Juiz cível incompetência O juiz cível não pode autorizar a interceptação telefônica e o próprio juiz criminal somente poderá fazêlo quando estiverem presentes os pressupostos contidos na Lei n 929696 Para aprofundar a análise deste crime recomendamos que se busquem as monografias específicas 6 Impedimento de comunicação ou conversação Impedir significa barrar não permitir oporse a interromper por qualquer meio a comunicação ou conversação referidas no tipo penal Ao contrário de todas as outras hipóteses do 1º em exame esta é a única em que não há exigência expressa de elemento normativo embora Damásio de Jesus sustente a necessidade de o impedimento ser indevido ou abusivo 7 Instalação ou utilização ilegal de estação ou aparelho radioelétrico O inciso IV do mesmo parágrafo comina a mesma pena do caput a quem instala ou utiliza estação ou aparelho radioelétrico sem observância de disposição legal Esse dispositivo no entanto foi revogado pela Lei n 4117 de 27 de agosto de 1962 Código de Telecomunicações que em seu art 70 dispõe Constitui crime punível com a pena de detenção de 1 a 2 anos aumentada da metade se houver dano a terceiro a instalação ou utilização de telecomunicações sem observância do disposto nesta lei e nos regulamentos redação dada pelo DecretoLei n 236 de 2821967 embora normalmente conste em todos os Códigos Penais comuns e anotados das principais editoras brasileiras o texto revogado do Código Penal 71 Instalar e utilizar ilegalmente Os verbos núcleos do tipo penal contudo mantiveramse os mesmos instalar e utilizar Instalar significa alojar acomodar montar utilizar é empregar utilmente fazer uso servirse tirar vantagem etc Como se trata de crime de ação múltipla ainda que o sujeito instale telecomunicações e a seguir as utilize pratica crime único 72 Elemento normativo sem a devida licença O elemento normativo do tipo consiste em instalar ou utilizar telecomunicações sem observância do disposto nesta lei e nos regulamentos Em outros termos somente a instalação ou utilização sem a devida licença constituirá o crime 8 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é o dolo que se constitui da vontade livre e consciente de violar o conteúdo de correspondência fechada na hipótese do caput dirigida a terceiro É indispensável que o sujeito ativo tenha consciência de que a correspondência se destina a outrem e que ainda assim tenha a vontade de devassála A consciência atual do agente deve abranger a ação os meios utilizados o conhecimento de que essa devassa é indevida isto é sem justa causa que se trata de correspondência destinada a outrem Ausência do elemento cognitivo exclui o dolo A ausência dessa consciência ou da sua atualidade afasta o dolo e por extensão a tipicidade Está excluída desse elemento cognitivo do dolo somente a consciência da ilicitude que não precisa ser atual e está contida na culpabilidade Desnecessário dizer depois do afirmado que o erro de tipo a exemplo do que ocorre com as demais infrações penais exclui o dolo Sonegação de correspondência necessidade de especial fim Na hipótese de sonegação de correspondência há o elemento subjetivo especial do tipo constituído pelo especial fim de sonegála ou destruíla que não precisa concretizarse sendo suficiente que tenha sido o móvel da ação Indevidamente elemento normativo especial Indevidamente como demonstramos acima constitui elemento normativo especial do tipo representando uma característica especial do dever jurídico nessas circunstâncias como o dolo deve abranger todos os elementos que compõem a descrição da figura típica à evidência que o sujeito ativo deve ter consciência desse elemento normativo que é fundamental na determinação da tipicidade concreta Nas hipóteses dos incisos III e IV do 1º não há o elemento normativo típico indevidamente 9 Consumação e tentativa 91 Consumação Consumase o crime de violação de correspondência com o conhecimento do conteúdo da correspondência 1ª figura Enfim consumase o crime com o devassamento da correspondência ou seja com o conhecimento do seu conteúdo que não precisa ser total nem ser na sua essência segredo Sonegação ou destruição crime formal Na dita figura de sonegação ou destruição o crime se consuma com o efetivo apossamento tratandose de crime formal é desnecessário que o agente atinja a eventual finalidade da conduta que pode ou não ocorrer Este crime que preferimos denominar de apossamento de correspondência teve seu momento consumativo alterado em relação à versão original do Código Penal neste diploma legal o crime somente se consumava com a efetiva sonegação ou destruição da correspondência era crime material Sonegação ou destruição exaurimento Agora com a transformação operada pela Lei n 653878 como o crime passou a ser formal consumase com o simples apossamento pois sonegar ou destruir passou a constituir simples elemento subjetivo especial do tipo que pode inclusive não ocorrer sendo suficiente que exista na mente do sujeito ativo como fim especial se ocorrer a efetiva sonegação ou destruição representará somente o exaurimento do crime que já estava consumado 92 Tentativa A tentativa é admissível verificandose quando por exemplo alguém é interrompido por terceiro quando está procurando violar o lacre de uma correspondência para descobrir seu conteúdo embora não seja necessária a abertura do envelope para devassála caracteriza igualmente a tentativa quando o agente não consegue apossarse de correspondência por circunstâncias alheias à sua vontade 10 Classificação doutrinária A violação da correspondência é crime comum logo pode ser praticado por qualquer pessoa independentemente de qualquer condição especial de dupla subjetividade passiva pois tanto remetente quanto destinatário são sujeitos passivos dessa infração penal instantâneo consumase no momento em que o agente recebe a correspondência esgotandose aí a lesão jurídica nada mais podendo ser feito para evitar a sua ocorrência comissivo sendo impossível praticálo por meio da omissão doloso não havendo previsão da modalidade culposa 11 Cônjuge do destinatário ilegitimidade da devassa A convolação a núpcias a nosso juízo não confere a qualquer dos cônjuges o direito de violar o sigilo da correspondência do outro Aníbal Bruno mais contemporizador admitia que em condições normais de convivência é de presumirse entre os cônjuges um consentimento tácito que justificaria o fato contudo não passa de mera presunção que cede quando o outro cônjuge não consentir a violabilidade do sigilo de sua correspondência nesse caso será vedado o devassamento pelo outro Devassa pelo cônjuge crime ou falta de ética No entanto a despeito de não admitirmos o direito de qualquer dos cônjuges devassar a correspondência do outro não chegamos ao extremo de considerála crime Tratase de um desvio de ordem ético social censurável nesse aspecto mas não chega a tipificar infração penal Esse mau hábito de bisbilhotar a correspondência do outro cônjuge longe de revelar harmonia cumplicidade e identidade de propósito isto é a affectio maritalis destaca comportamento contraditório com esses objetivos e certamente não está abrangido pelos deveres conjugais estabelecidos no art 231 e incisos do Código Civil 12 Formas majoradas e qualificadas 121 Majorante especial O 2º do art 151 do CP prevê uma majorante especial que se ocorrer eleva a pena em quantidade fixa aumentase de metade a pena provisoriamente fixada que pode ser a penabase se não existir agravante ou atenuante Essa elevação que é obrigatória é aplicável se houver dano para alguém A natureza do dano que configura tipo aberto pode ser material ou moral mas acima de tudo tem de ser relevante e devidamente comprovada nos autos caso contrário a majoração é inaplicável 122 Qualificadora abuso de função A pena será de um a três anos de detenção se o crime for praticado com abuso de função em serviço postal telegráfico radioelétrico ou telefônico Neste caso o agente deve praticar o crime com infringência a dever funcional Esta qualificadora somente poderá incidir em funcionário de empresa postal telegráfica radioelétrica Qualquer outro agente mesmo funcionário de outros setores das comunicações não incidirá nessa qualificadora Funcionário público infringência de dever funcional Não basta tratarse de funcionário é necessário que o agente tenha abusado da função para praticar o crime é uma espécie de vínculo causal Não responderá pela qualificadora se a despeito de ser funcionário da empresa sua função não for usada com infringência de dever funcional ou não lhe facilitar a prática do crime por exemplo um motorista faxineiro officeboy enfim mais que a condição de funcionário é fundamental a violação de dever funcional por parte do sujeito ativo 13 Subsidiariedade fim em si mesmo Como crime subsidiário quando não constituir meio ou elemento de crime mais grave Se a devassa deixa de ser um fim em si mesmo já não se configura um crime autônomo passando a constituir elemento essencial ou acidental de outro crime como por exemplo o sujeito ativo viola correspondência para praticar o crime de extorsão art 158 somente responderá por este crime Pode inclusive constituir espionagem contra interesses protegidos pela Lei de Segurança Nacional arts 13 e 14 da Lei n 717083 14 Exclusão da ilicitude abrangência As excludentes de criminalidade relacionadas no art 23 do Código Penal não se limitam aos crimes definidos nesse diploma legal sendo aplicadas por extensão do seu art 12 a todas as infrações penais disciplinadas em outros textos legais desde que especificamente não disciplinem o assunto de forma diversa Excludentes especiais duvidosa constitucionalidade Além das excludentes tradicionais art 23 do CP o art 10 da Lei n 653878 estabelece que não constitui violação a abertura de correspondência nas hipóteses que relaciona Diante da atual Constituição Federal art 5º XII que não admite exceção à inviolabilidade da correspondência temos seriíssimas dúvidas quanto à constitucionalidade dessa previsão legal 15 Pena e ação penal 151 Pena cominada Nas figuras simples a pena é alternativa de detenção de até seis meses ou multa Esta forma de cominar a sanção penal sem fixar o limite mínimo divorciase do sistema tradicional do ordenamento jurídico brasileiro independentemente de determonos na análise sobre vantagens e desvantagens de um e outro sistema de certa forma é mais um exemplo de desarmonia que o excesso de leis extravagantes vem causando na codificação penal nacional Ausência de mínimo legal incomum Na ausência desse mínimo legal que tradicionalmente os tipos penais cominam é possível que na condenação seja fixada a pena mínima em um dia aliás se as operadoras do art 59 forem todas favoráveis ao acusado esse quantitativo deverá ser fixado como pena base Justificase esse entendimento porque a lei não pode ser interpretada restritivamente Esse limite só não poderá ser inferior porque atingiria frações de dia e segundo a previsão do art 11 do Código Penal frações de dia devem ser desprezadas Interceptação telefônica reclusão Para a figura do crime de interceptação telefônica a pena é de reclusão de dois a quatro anos e multa o crime de instalação ou utilização ilegal de estação ou aparelho radioelétrico é punível com a pena de detenção de um a dois anos aumentada da metade se houver dano a terceiro Figura qualificada Na figura qualificada 3º detenção de um a três anos Na forma majorada 2º a pena é aumentada de metade 152 Natureza da ação penal A ação penal é pública condicionada à representação com exceção dos casos dos 1º IV e 3º cuja ação penal é pública incondicionada Titular do direito de representar será tanto o remetente quanto o destinatário pois o que se protege não é o direito de propriedade da correspondência mas a liberdade pessoal ou mais especificamente a privacidade individual que é atingida pela violação do sigilo da correspondência A desinteligência entre remetente e destinatário quanto a exercer o direito de representar não impede que apenas um represente 16 Questões especiais 1 Tratase de crime de dupla subjetividade Enfim podese representar conjunta ou separadamente Se qualquer dos dois morrer antes ou depois da entrega da correspondência a titularidade da representação deverá obedecer à ordem elencada no art 24 do CPP 2 A representação referida no art 45 da Lei n 653878 da autoridade administrativa ao Ministério Público Federal constitui apenas uma impropriedade técnica não passando de simples forma de notitia criminis puramente administrativa e pode ser atribuída ao desconhecimento jurídicopenal do legislador de leis extravagantes Contudo esta previsão legal deixa claro que as infrações de violação da correspondência definidas em leis especiais são de ação penal pública incondicionada ao contrário daquelas previstas no Código Penal com a redação da Lei n 653878 J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Não se mostra ilícita a prova colhida mediante interceptação telefônica se evidenciado que durante as investigações pela Polícia Federal quando se procedia à diligência de forma regular e em observância aos preceitos legais foram obtidas provas suficientes para embasar a acusação contra os Pacientes sendo certo que a posterior declinação de competência do Juízo Federal para o Juízo Estadual não tem o condão de por si só invalidar a prova até então colhida Precedentes do STF e do STJ STJ HC 56222SP Rel Min Laurita Vaz j 11122007 Dano moral Acusação injustificada por parte do prefeito de cometimento de crime de violação de correspondência por vereador Configura dano moral a injustificada acusação por parte de prefeito de cometimento de crime de violação de correspondência por vereador considerando ter sido efetuada em sessão plenária leitura de ofício remetido pelo prefeito solicitando providências ao presidente da Câmara de Vereadores Caso em que a missiva enviada ao prefeito de cuja entrega se encarregou o réu a pedido do remetente não estava lacrada possuindo ainda conteúdo público TJRS Apelação 70014961213 Rel Umberto Guaspari Sudbrack j 22112006 A providência prevista no art 514 do CPP diz com os delitos funcionais próprios em que a condição de funcionário é elementar do tipo delito especial próprio não tendo aplicação quando se trata de delito funcional impróprio delito especial impróprio no qual a condição de funcionário atua como majorante ou qualificadora v g arts 150 2º 151 3º e 295 do CP STJ REsp 271937SP Rel Min Félix Fischer j 234 2002 Correspondência comercial Art 152 Abusar da condição de sócio ou empregado de estabelecimento comercial ou industrial para no todo ou em parte desviar sonegar subtrair ou suprimir correspondência ou revelar a estranho seu conteúdo Pena detenção de 3 três meses a 2 dois anos V art 196 1º XII do CP V art 3º c da Lei n 489865 abuso de autoridade V art 47 da Lei n 653878 serviços postais Parágrafo único Somente se procede mediante representação V art 100 1º do CP V arts 24 38 e 39 do CPP D O U T R I N A 1 Considerações preliminares O disposto no art 152 constitui especial extensão dos conceitos emitidos no dispositivo anterior aplicandose especificamente à correspondência comercial Todos os conceitos que emitimos no capítulo anterior apenas são complementados naquilo que os elementos especializantes o exigirem quer por limitarem quer por ampliarem ou simplesmente modificarem as figuras analisadas no referido capítulo 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido aqui também é a inviolabilidade do sigilo da correspondência acrescido de duas condições especiais não exigidas no artigo anterior uma relativa ao sujeito ativo que só pode ser sócio ou empregado outra referente à natureza do destinatário da correspondência que é limitado a estabelecimento comercial ou industrial Punição mais elevada bem jurídico mais valioso Na ótica do legislador sigilos e segredos comerciais invenções e novas tecnologias constituem interesses superiores aos protegidos no art 151 pois somente essa avaliação justifica tamanha elevação da sanção penal Embora o tipo penal não se limite à proteção desses interesses devemos reconhecer que não raro podem ser objeto do conteúdo dessas correspondências 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo Como crime próprio somente poderá ser sujeito ativo quem reunir as qualidades ou condições especialmente exigidas pelo tipo penal no caso o sócio ou empregado de estabelecimento comercial ou industrial Qualquer outro indivíduo acionista investidor colaborador vendedor autônomo ou representante comercial não poderá ser sujeito ativo deste crime por faltarlhe a condição especial de sócio ou empregado a não ser que aja ao abrigo do concurso de pessoas Sócio ou empregado de outros estabelecimentos Sócio ou empregado de qualquer outro estabelecimento que não seja comercial ou industrial como por exemplo prestadores de serviços cooperativas sociedades civis etc ainda que execute qualquer das condutas descritas no tipo não infringirá a proibição nele contida o legislador ao nominar expressamente estabelecimentos comerciais ou industriais exclui ipso facto todos os demais estabelecimentos que não se incluam nessa classificação Abuso da condição de sócio Para que o sujeito ativo incorra na proibição deste artigo é indispensável que a conduta seja praticada com abuso da condição de sócio ou de empregado como o tipo penal não exige que haja abuso de função é desnecessário que o sócio ou o empregado seja o encarregado de cuidar da correspondência do estabelecimento sendo suficiente sua qualidade de sócio ou empregado e que indevidamente se aproveite dessa condição para desviar sonegar subtrair ou suprimir correspondência ou revelar a estranho seu conteúdo no todo ou em parte 32 Sujeito passivo Sujeitos passivos por sua vez são o estabelecimento comercial ou industrial e os respectivos sócios ou o estabelecimento e os demais sócios na hipótese de um deles ser o sujeito ativo Não têm legitimidade para ser sujeito passivo deste crime estabelecimentos prestadores de serviços cooperativas sociedades civis etc por faltar lhe a elementar típica comercial ou industrial 4 Tipo objetivo adequação típica O núcleo do tipo é alternativo desviar desencaminhar sonegar esconder não entregar subtrair tirar suprimir fazer desaparecer ou revelar divulgar a estranho o conteúdo de correspondência Além de crime próprio as condutas descritas no dispositivo em exame caracterizam o chamado crime de ação múltipla Conteúdo parcial irrelevância O crime se caracteriza ainda que a conduta do agente atinja parcialmente o conteúdo da correspondência ou somente documentos anexos Uso abusivo da condição pessoal A tipificação das condutas está limitada ao uso abusivo da condição de sócio ou empregado Abusar significa praticar qualquer daquelas condutas indevidamente sem justa causa ou em condições inadequadas isto é em desacordo com a condição atribuições direitos ou deveres de sócio ou de empregado Se no entanto na prática de quaisquer daquelas condutas não houver abuso da especial condição do sujeito ativo sócio ou empregado isto é agir nos limites do que lhe é permitido não haverá o crime Somente correspondência comercial Somente a correspondência comercial encontra amparo no art 152 não sendo comercial a tutela da inviolabilidade do seu sigilo será abrangida pelo disposto no art 151 Essa correspondência comercial pode assumir as mais variadas formas tais como cartas ofícios requerimentos fax notas avisos memorandos contas faturas duplicatas dossiês instruções perícias balancetes levantamentos etc O estranho desnecessária condição especial O estranho a quem pode ser revelado o conteúdo de correspondência comercial pode ser qualquer um sem necessidade de qualquer condição especial funcionário da empresa ou não que saiba do que se trata ou não que tenha interesse no conteúdo ou não Se tiver conhecimento poderá dependendo das circunstâncias e da natureza da sua participação responder pelo crime como coautor ou partícipe Concorrer para o crime coautoria ou participação Se no entanto a despeito do interesse que tiver não houver concorrido de nenhuma forma para a revelação do conteúdo da correspondência não responderá por este crime 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é o dolo constituído pela vontade livre e consciente de violar o sigilo da correspondência comercial por meio das condutas descritas no tipo penal O sujeito ativo deve necessariamente ter conhecimento de que a correspondência se destina ao estabelecimento comercial ou industrial e que tem o dever de zelar pela sua inviolabilidade e não revelar a estranho o seu conteúdo O dolo pode apresentarse sob a forma direta ou eventual Modalidade culposa inexistência Não há previsão de modalidade culposa a eventual ocorrência de erro essencial a exemplo dos demais crimes opera naturalmente os efeitos próprios segundo a natureza do erro de tipo de proibição ou provocado por terceiro 6 Consumação e tentativa 61 Consumação Consumase o crime com a prática efetiva das ações de desviar sonegar subtrair ou suprimir a correspondência ou na segunda modalidade revelar a estranho seu conteúdo A prática de mais de uma das condutas nucleares não configura concurso de crimes respondendo o agente por uma única figura delitiva pois como já referimos trata se de crime de conteúdo variado também conhecido como de ação múltipla 62 Tentativa A tentativa é admissível na medida em que as condutas descritas admitem fracionamento possibilitando a identificação com relativa facilidade da interrupção da fase executória enfim estamos diante de um crime plurissubsistente 7 Classificação doutrinária A violação de correspondência comercial é crime próprio pois só pode ser praticado por sócio ou empregado de estabelecimento comercial ou industrial dupla subjetividade ativa representada pelas duas espécies de sujeitos ativos sócio ou empregado instantâneo pois se consuma no momento em que o agente pratica qualquer das condutas nucleares do tipo comissivo sendo impossível praticálo por omissão doloso não havendo previsão da modalidade culposa 8 Pena e ação penal 81 Pena cominada A pena é a privativa de liberdade de detenção de três meses a dois anos Como se constata a sanção penal com exceção das formas qualificadas é consideravelmente superior àquela cominada ao crime de violação de correspondência descrita no artigo anterior Para o legislador as ações tipificadas neste dispositivo são mais desvaliosas que aquela descrita no art 151 e a lesão produzida por estas condutas é igualmente mais grave Mas onde se localizam essas diferenças ou quais são os fundamentos da maior danosidade do crime descrito neste art 152 comparativamente àquele do art 151 se teoricamente tratase do mesmo bem jurídico Desproporcionalidade da punição Na ótica do legislador sigilos e segredos comerciais invenções e novas tecnologias representam interesses superiores aos protegidos no art 151 Pode ser decepcionante para quem acreditava que valores pessoais e individuais relacionados à personalidade deveriam preponderar comparativamente aos bens patrimoniais mas não foi essa a ótica do legislador de 1940 e com muito mais razão será neste mundo globalizado do início do século XXI 82 Natureza da ação penal A ação penal é pública condicionada à representação Titular do direito de representar serão tanto a pessoa jurídica quanto os sócios quando o sujeito ativo houver sido um empregado quando porém o sujeito ativo tiver sido um dos sócios serão a própria pessoa jurídica e os demais sócios Sócios e pessoa jurídica podem representar conjunta ou separadamente A renúncia de qualquer deles não prejudica o direito dos demais 9 Questões especiais Confrontar com o art 153 do CP com os crimes de violação de segredo de fábrica e violação de segredo de negócio art 195 XI e XII da Lei n 927996 e com os crimes de segredos industriais ou técnicos arts 13 IV e 14 da Lei n 717083 Seção IV Dos Crimes contra a Inviolabilidade dos Segredos Divulgação de segredo Art 153 Divulgar alguém sem justa causa conteúdo de documento particular ou de correspondência confidencial de que é destinatário ou detentor e cuja divulgação possa produzir dano a outrem Pena detenção de 1 um a 6 seis meses ou multa 1ºA Divulgar sem justa causa informações sigilosas ou reservadas assim definidas em lei contidas ou não nos sistemas de informações ou banco de dados da Administração Pública Pena detenção de 1 um a 4 quatro anos e multa 1º Somente se procede mediante representação 2º Quando resultar prejuízo para a Administração Pública a ação penal será incondicionada V art 100 1º do CP V arts 24 38 39 e 232 do CPP V art 47 da Lei n 653878 serviços postais 1ºA e 2º acrescentados pela Lei n 9983 de 14 de julho de 2000 D O U T R I N A 1 Considerações preliminares Nesta seção o Código Penal disciplina somente a violação de segredos que atingem aspectos da liberdade individual Protege no entanto a inviolabilidade de segredos que importe ofensa a outros interesses quiçá mais relevantes ou mais diretamente atingidos em outros dispositivos como nos arts 325 violação de sigilo funcional e 326 violação do sigilo de proposta de concorrência além de outros diplomas legais extravagantes que também tutelam segredos cujos interesses no entanto são diversos quer pela sua natureza quer pela pessoa atingida 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é a preservação do sigilo de atos ou fatos secretos ou confidenciais cuja divulgação pode causar dano a outrem é em termos esquemáticos a inviolabilidade dos segredos que como nos dois artigos anteriores representa um aspecto da liberdade individual Limites da proteção penal A proteção penal porém limitase a documentos particulares ou correspondências confidenciais 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo Sujeito ativo será somente o destinatário ou detentor de documento particular ou de correspondência confidencial que contenha segredo ou conteúdo confidencial cuja revelação possa causar dano a alguém Logo é não só aquele a quem o documento ou correspondência se destina como também quem legítima ou ilegitimamente o possui ou detém Publicidade não autorizada Embora o destinatário seja o proprietário do documento ou da correspondência confidencial desde o dia em que a recebe não pode darlhe publicidade sem autorização do seu autor ou remetente caso contrário responderá pelo crime Natureza da detenção revelação injusta Na hipótese da figura do detentor nosso Código Penal não exige que a detenção seja ilegítima ao contrário do que faz o Código Penal Rocco art 621 Assim é indiferente a natureza da detenção do documento ou da correspondência se legítima ou ilegítima importa tão somente que a revelação seja injusta isto é sem justa causa Se a detenção for ilegítima porém poderá tipificarse em concurso o crime previsto no art 151 o sujeito ativo apropriouse da correspondência devassoua e depois ainda divulgou seu conteúdo Crimemeio e crimefim punição do último No entanto estando presente a relação crimemeiocrimefim recomendase a punição somente do crimefim no caso a divulgação de segredo que aliás coincidentemente cominam a mesma pena Ausência da condição de destinatário ou detentor Não pratica o crime quem não sendo destinatário ou detentor recebe a informação ou vem a ter conhecimento do segredo em razão da divulgação feita pelo agente ainda que saiba de sua origem ilícita a menos que tenha concorrido de algum modo para a prática do crime art 29 do CP Igualmente não o comete quem o propala por ouvir dizer ou ter visto o documento ou correspondência 32 Sujeito passivo Sujeito passivo é o titular do segredo isto é a pessoa cuja divulgação do conteúdo confidencial pode causarlhe dano ainda que não seja o autor do documento ou o remetente da correspondência é em outros termos quem tem legítimo interesse em que se mantenha em segredo o conteúdo do documento particular ou da correspondência confidencial Destinatário como sujeito passivo O próprio destinatário pode ser sujeito passivo na hipótese de o detentor divulgar o segredo O sujeito passivo nem sempre é quem transmite o segredo ao destinatário ou detentor Nesse sentido Monteiro de Barros exemplifica se por exemplo a esposa transmite ao médico a doença do marido vindo aquele a revelála este é quem figurará como sujeito passivo do delito Sujeito passivo e prejudicado distinção Sujeito passivo não se confunde com prejudicado embora em regra coincidam na mesma pessoa essas condições podem recair em sujeitos distintos Aquele é o titular do bem jurídico protegido e na hipótese lesado enquanto este é qualquer pessoa que em razão do crime sofre prejuízo ou dano material ou moral o primeiro será a vítima da relação processualcriminal e o segundo será testemunha embora interessada Damásio de Jesus no entanto não faz essa distinção ao afirmar que é preciso que a divulgação possa produzir dano a outrem Esse outrem é o sujeito passivo do delito Pode ser o remetente o destinatário ou terceiro qualquer Relevância da distinção direitos decorrentes A relevância da distinção repousa nos direitos decorrentes dessa condição que cada um tem o sujeito passivo é o titular do direito de representar criminalmente contra o sujeito ativo detém a faculdade de autorizar a revelação do segredo além de ter o direito da reparação ex delicto ao prejudicado por outro lado restalhe o direito de postular a reparação do dano sofrido 4 Tipo objetivo adequação típica Divulgar sem justa causa conteúdo de documento particular ou de correspondência confidencial isto é tornar público ou do conhecimento de um número indeterminado de pessoas Objetiva a proteção da vida privada mantendo secretos fatos relevantes que não se deseja sejam divulgados Meios de divulgação qualquer A divulgação pode produzirse por qualquer meio imprensa rádio televisão Internet exposição ao público obras literárias etc Enfim sempre que haja comunicação a um número indeterminado de pessoas Elementares típicas O tipo penal compõese dos seguintes elementos a documento particular ou correspondência confidencial b divulgação do seu conteúdo pelo destinatário ou detentor c ausência de justa causa d possibilidade de dano a terceiro e dolo com seu elemento subjetivo Documento sigiloso vinculado ao dano O documento particular deve ter natureza sigilosa no entanto o caráter sigiloso por si só é insuficiente para tipificar o crime sendo necessário que se vincule ao dano efetivo ou potencial que a divulgação possa produzir Documento e correspondência devem ter interesse moral ou material uma vez que fatos inócuos não podem converterse em segredos protegidos pelo Direito Penal pela simples vontade do remetente 41 Documento particular ou correspondência confidencial Documento segundo Hungria é todo escrito de que resulte a prova de fato juridicamente relevante tenha ou não caráter econômico Documento nos termos a que se refere este artigo tem acepção restrita mais ou menos nos limites em que é definido pelo Código de Processo Penal art 232 e s desde que não seja público Documento enfim é qualquer escrito instrumento ou papel Documento público exclusão Referindose o texto legal expressamente a documento particular ou correspondência confidencial fácil é concluir que não é objeto dessa proteção penal o documento público mesmo aqueles que trazem em seu bojo segredos v g testamento cerrado Sobre a inviolabilidade ou devassa de documento público secreto ou não o Código disciplina em outros capítulos Documento sigiloso potencialidade danosa Segredo é algo que não deve ser revelado sendo necessária a preservação do sigilo não podendo sair da esfera da privacidade pessoal É indispensável que o documento contenha um segredo cuja revelação tenha idoneidade para produzir dano a alguém Logo a simples chancela de secreto ou confidencial que determinados documentos recebem não é suficiente para caracterizar o documento secreto ou a correspondência confidencial definida neste tipo penal Sigilo do conteúdo da correspondência O sigilo ademais deve recair sobre o conteúdo da correspondência ou documento e não sob o seu aspecto formal Assim documentos ou correspondências irrelevantes inócuas ou por qualquer razão incapazes de produzir dano ao sujeito passivo não são objeto da proteção legal do art 153 No entanto isso não significa que enquanto correspondências não tenham a proteção legal pois a inviolabilidade do seu sigilo continua bem jurídico penalmente protegido mas já então à luz do art 151 Documento eletrônico Mas no atual estágio da evolução tecnológica poderseá sustentar como se fazia até pouco tempo que documento ou correspondência somente podem ser escritos À evidência que não ninguém pode ignorar que na atualidade podese receber documento ou correspondência confidencial das mais variadas formas como por exemplo através de email videolaser videoclip gravações em fitas cassete fitas de vídeo etc Correspondência confidencial Quanto à definição de correspondência reportamonos ao que dissemos ao analisar o art 151 A adjetivação de confidencial significa que deve ter um conteúdo realmente secreto isto é que deve chegar ao conhecimento de determinada pessoa ou de limitado número delas coisa que se deve manter em sigilo respeitandose a vontade e o interesse legítimo de alguém 42 Elemento normativo do tipo sem justa causa Não se trata de crime comum com descrição tradicional puramente objetiva mas de tipo anormal contendo um elemento normativo da antijuridicidade sem justa causa Assim o tipo penal é aberto e exige um juízo de valor para complementar a análise da tipicidade Divulgação contra legis Somente a divulgação injusta contra legis caracterizará o crime Poderão justificar a divulgação de segredo por exemplo entre outras as seguintes condições delatio criminis art 5º 3º do CPP exercício de um direito exibição de uma correspondência para comprovar judicialmente a inocência de alguém não há infração na conduta de quem na defesa de interesse legítimo junta aos autos de interdição documento médico de natureza confidencial estrito cumprimento de dever legal apreensão de documento em poder de alguém art 240 1º f do CPP o dever de testemunhar em juízo art 206 do CPP consentimento do ofendido tratase de direito disponível ou qualquer excludente de criminalidade ou mesmo dirimentes de culpabilidade Indiciamento indevido constrangimento ilegal Havendo justa causa para divulgação de segredo o fato é atípico constitui constrangimento ilegal o indiciamento do agente em inquérito policial sendo passível de habeas corpus 43 Natureza do segredo tutelado tipo aberto Tratase inegavelmente de tipo aberto afinal a que segredo se protege Aliás segredo só consta do nomen iuris e não do preceito O nomen iuris não é elementar do tipo Segredo é algo que não deve ser revelado ou que se tem razão fundamento ou interesse para ocultar Pode resultar de manifestação expressa ou tácita da vontade do interessado Confidências verbais atipicidade Estão excluídas da proteção penal as confidências obtidas verbalmente isto é através da fala oralmente Em sentido semelhante manifestavase Nélson Hungria afirmando que no tocante às confidências orais e sem cunho de necessidade ficam por conta e risco de quem as faz sem precatarse contra intrusos e sacosrotos Assim é indispensável que o agente tenha sido destinatário ou detentor de dados ou informações recebidas através de documentos Segredo condicionado possibilidade Magalhães Noronha falava que o segredo podia ser condicionado ou seja oculto até certa data ou acontecimento A antecipação do conhecimento integrará o delito Em sentido semelhante manifestava se Hungria segundo o qual não importa que o vínculo de segredo seja temporário ou condicionado ao advento de determinado fato ainda em tal hipótese seu rompimento antecipado é crime Logo podese concluir a temporariedade ou condicionalidade por si só não exclui a proteção legal do segredo 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade livre e consciente de divulgar o conteúdo de documento particular ou correspondência confidencial tendo consciência de tratarse de conteúdo sigiloso e que pode produzir dano a alguém Ademais é necessário que o agente tenha consciência de que a sua conduta é ilegítima isto é sem justa causa Elemento subjetivo especial desnecessidade Não há exigência de nenhum elemento subjetivo especial do injusto nem mesmo a finalidade de obter qualquer vantagem com a divulgação 6 Consumação e tentativa 61 Consumação Consumase o crime com o ato de divulgar independentemente da ocorrência efetiva de dano pois o próprio tipo exige somente que a conduta tenha a potencialidade para produzir dano sendo desnecessário que este se efetive tratandose pois de crime formal É insuficiente a comunicação a uma só pessoa ou a um número restrito de pessoas fazse necessária uma difusão extensiva algo que torne possível o conhecimento de um número indeterminado de pessoas 62 Tentativa A tentativa é de difícil configuração mas teoricamente possível pois não se trata de crime de ato único e o fato de prever a potencialidade de dano decorrente da conduta de divulgar por si só não a torna impossível Concordamos com o exemplo sugerido por Magalhães Noronha que questiona Se o possuidor de um documento que contém segredo o está afixando em logradouro público e é interrompido ou obstado por terceiro não realizou atos de execução não tentou divulgar não realizou parcialmente o tipo Necessidade de representação irrelevância A necessidade de o ofendido representar contra o sujeito passivo tampouco obstaculiza a tentativa O exercício desse direito não tem nenhuma relação com a consumação do crime tentar ou consumar relacionase à atividade do sujeito ativo e o fato de ofendido representar e com isso levar ao conhecimento de terceiro não altera a natureza da conduta do agente que por razões estranhas à sua vontade foi impedido de consumar a divulgação do segredo 7 Classificação doutrinária Crime próprio que exige sujeito ativo especial quem não tiver a condição de destinatário ou detentor mesmo que revele o segredo de que tem conhecimento não responde por esse crime a não ser as hipóteses de concurso de pessoas art 29 e parágrafos formal pois se consuma com a simples conduta de divulgar sendo antecipado o resultado instantâneo consumase no momento em que o agente divulga o segredo esgotandose aí a lesão jurídica comissivo pois é impossível praticálo mediante omissão doloso não havendo previsão da modalidade culposa 8 Divulgação de informações sigilosas ou reservadas A Lei n 99832000 acrescentou que constitui crime a divulgação sem justa causa de informações sigilosas ou reservadas independentemente de constarem ou não nos sistemas de informações ou banco de dados da Administração Pública Tudo que se disse a respeito do verbo divulgar e da elementar normativa sem justa causa relativamente ao tipo anterior se aplica a esta nova infração penal 81 Bem jurídico protegido O bem jurídico protegido continua sendo a liberdade individual apenas sob o aspecto da privacidade e a inviolabilidade da intimidade pessoal especialmente resguardados os dados e informações pessoais armazenados pela Administração Pública 82 Informações sigilosas ou reservadas definidas em lei O vocábulo informações pode ter uma abrangência exagerada incompatível com as limitações próprias do direito penal Por isso o texto legal se encarrega de limitarse àquelas definidas em lei Assim não bastam tarjas faixas carimbos ou coisa do gênero que as definam como sigilosas para que adquiram essa condição Fazse necessário que texto legal estritamente falando lei assim o defina Caso contrário esbarrase na atipicidade Não admitimos que outros diplomas legais tais como decretos resoluções ou medidas provisórias possam equipararse à lei 9 Pena e ação penal 91 Pena cominada A pena cominada é alternativa detenção de um a seis meses ou multa Crimes como este nunca deverão afastarse da competência dos Juizados Especiais Criminais e dificilmente poderá ser in concreto outra sanção que não uma alternativa e via de regra pena de multa Leis n 909995 e 971498 Na hipótese do 1ºA a pena será de um a quatro anos de detenção e multa 92 Natureza da ação penal A ação penal é pública condicionada à representação tratase de direito disponível e como tal o início da ação penal depende de provocação do ofendido Em razão da disponibilidade do bem jurídico tutelado o consentimento do ofendido exclui a própria adequação típica Havendo prejuízo para a Administração Pública a ação penal será pública incondicionada 2º 10 Questões especiais Qual a espécie e extensão de dano E a prescrição corre da emissão do documento ou correspondência do seu recebimento ou quando Por quantos anos ou décadas dura a obrigação do sigilo Será crime imprescritível Essas questões demonstram a insegurança jurídica decorrente deste dispositivo Os arts 153 e 154 não esgotam a proteção de segredos Os arts 196 1º XII 325 e 326 tipificam outras figuras semelhantes J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Divulgação de segredo Prescrição da pena in abstrato O Juízo processante entendeu que as condutas relativas aos crimes de concorrência desleal ou qualquer outra previsibilidade legal envolvendo direito autoral propriedade intelectual e divulgação de segredo intelectual ou material foram atingidas pela decadência declarando a extinção de punibilidade STJ REsp 823292SP Rel Min Laurita Vaz j 2862007 Havendo justa causa para a divulgação de segredo o fato é atípico constituindo constrangimento ilegal o indiciamento do agente em inquérito policial TACrimSP Recurso ex officio 188671 Rel Lauro Malheiros j 861978 Violação do segredo profissional Art 154 Revelar alguém sem justa causa segredo de que tem ciência em razão de função ministério ofício ou profissão e cuja revelação possa produzir dano a outrem Pena detenção de 3 três meses a 1 um ano ou multa Parágrafo único Somente se procede mediante representação V art 100 1º do CP V arts 24 38 39 e 207 do CPP V art 229 do CC V art 195 XII da Lei n 927996 V art 21 da Lei n 717083 Lei de Segurança Nacional D O U T R I N A 1 Considerações preliminares Os arts 153 e 154 ocupamse somente dos segredos relativos ao exercício de atividades da vida privada pois a proteção do sigilo ou segredo da função pública operase através dos arts 325 e 326 do CP 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido continua sendo também neste artigo a liberdade individual agora sob o aspecto da inviolabilidade do segredo profissional é como realça o nomen iuris o sigilo de segredo profissional cuja divulgação pode causar dano a outrem Este dispositivo incrimina somente a divulgação de segredo relativo ao exercício de atividade privada porquanto o sigilo relacionado à função pública é protegido pelos arts 325 e 326 ambos do CP 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo Sujeito ativo somente pode ser quem tem ciência de segredo em razão de função ministério ofício ou profissão Tratase de uma modalidade muito peculiar de crime próprio uma vez que a condição especial não se encontra no sujeito ativo mas na natureza da atividade que lhe possibilita ter ciência do segredo profissional Confidentes necessários em razão do mister Sujeitos ativos são os confidentes necessários aqueles a quem são confiados segredos em razão do seu mister no caso em apreço função ministério ofício ou profissão A terminologia confidentes necessários fundamentase na essência de determinadas atividades em que a relação profissionalcliente encerra confidências sigilos segredos cuja revelação indevida fere no mínimo a ética profissional Crime profissional revelação sem justa causa Pela importância que certas relações encerram e a gravidade do dano ou prejuízo que a divulgação sem justa causa pode causar ao ofendido o CP preferiu eleválas à condição de crime Essas atividades podem ser as exercidas por médicos dentistas advogados engenheiros sacerdotes etc Auxiliares e ajudantes Podem igualmente praticar este crime os auxiliares ou ajudantes das pessoas obrigadas ao sigilo profissional desde que tenham conhecimento do segredo no exercício de suas atividades de auxiliares ou ajudantes 32 Sujeito passivo Sujeito passivo é o titular do segredo que pode ser pessoa física ou jurídica a quem pertencem os dados secretos Aplicase aqui o que já dissemos quanto à distinção entre sujeito passivo e prejudicado aquele é o titular do bem jurídico protegido e este é qualquer pessoa que em razão do fato delituoso sofra prejuízo ou dano material ou moral Direito de representação sujeito passivo O sujeito passivo além do direito de representar contra o sujeito ativo pode habilitarse como assistente do Ministério Público no processo criminal art 268 do CPP ao passo que ao prejudicado resta somente a possibilidade de buscar a reparação do dano na esfera cível Nesse particular estamos retificando a orientação que adotávamos quando anotamos nosso CP em coautoria com Luiz Regis Prado 4 Tipo objetivo adequação típica A conduta tipificada é revelar que significa contar a alguém segredo profissional Revelar tem uma abrangência mais restrita do que divulgar aqui implica um número indeterminado de pessoas lá é suficiente alguém Segredo profissional de criação e de invenção Esta matriz típica objetiva a proteção do segredo profissional específico da criação e da invenção mantendo secretos fatos relevantes punindo além da violação dos segredos de que se tem conhecimento no exercício de certas atividades profissionais a espionagem industrial comercial e artística A proteção inclui o segredo oral e não apenas documental Relação causal conhecimento do segredo É indispensável uma relação causal entre o conhecimento do segredo e a especial qualidade do sujeito ativo em razão de função ministério ofício ou profissão isto é um nexo causal entre o exercício da atividade e o conhecimento do segredo É indiferente o modo ou a forma como teve conhecimento do segredo por escrito oral compulsando documentos consultando videoclip etc desde que esteja relacionado a função ministério ofício ou profissão Justa causa fundamento legal A justa causa que torna atípica a conduta deve ser legal isto é deve encontrar fundamento direto ou indireto em norma jurídica Nosso Código Penal filiase à orientação que dá proteção absoluta ao segredo profissional Advogado por exemplo que revela segredo de seu cliente à parte contrária em prejuízo daquele pratica crime de patrocínio infiel art 355 A violação de sigilo profissional advogado médico etc também constitui falta éticoadministrativa Ausência de notoriedade vontade de preserválo Para que o segredo justifique a proteção penal é necessário que reúna dois elementos um negativo ausência de notoriedade isto é que não seja de conhecimento público outro positivo vontade decisiva do titular de preserválo Não deixa de ser secreto um fato sobre o qual corre boato incerto 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade livre e consciente de revelar segredo de que teve conhecimento em razão de função ministério ofício ou profissão tendo consciência de que se trata de segredo profissional e que pode produzir dano a alguém Ademais é necessário que o agente tenha consciência que a revelação é ilegítima isto é sem justa causa Elemento subjetivo especial desnecessário Não há exigência de nenhum elemento subjetivo especial do injusto nem mesmo a finalidade de obter qualquer vantagem com a revelação Tampouco há previsão de modalidade culposa por mais escancarada que seja a culpa do sujeito ativo 6 Consumação e tentativa 61 Consumação Consumase o crime no momento em que o sujeito ativo revela a terceiro conteúdo de segredo de que teve ciência nas circunstâncias definidas no tipo penal consumase com o simples ato de revelar independentemente da ocorrência efetiva de dano pois é suficiente que a revelação tenha potencialidade para produzir a lesão que se ocorrer constituirá o exaurimento do crime Comunicação a uma pessoa suficiência É suficiente a comunicação a uma só pessoa ao contrário do que ocorre com o crime de divulgação de segredo que necessita ser difundido extensivamente para um número indeterminado de pessoas Em síntese revelar pode ser somente para uma pessoa enquanto divulgar implica naturalmente um número indeterminado delas Revelar é menos que divulgar 62 Tentativa A tentativa é de difícil configuração mas teoricamente possível especialmente através de meio escrito pois não se trata de crime de ato único e o fato de prever a potencialidade de dano decorrente da conduta de revelar por si só não a torna impossível O dano potencial pode ser de qualquer natureza patrimonial moral público ou privado pessoal ou familiar 7 Elemento normativo da descrição típica sem justa causa O simples dever moral é insuficiente em tese para constituir justa causa capaz de autorizar a revelação de segredo As justas causas por excelência decorrem de lei Excludentes e dirimentes gerais As excludentes de criminalidade e as dirimentes de culpabilidade constituem causas justas para a revelação afastando assim o elemento normativo da descrição típica Consentimento do ofendido Tratandose de bem jurídico disponível o consentimento do ofendido exclui a adequação típica da conduta de revelar segredos profissionais O consentimento afasta a elementar sem justa causa Se vários forem os sujeitos passivos isto é interessados na manutenção do segredo subsistirá o crime em relação aos que não consentiram Proibição de testemunhar O próprio ordenamento jurídico brasileiro reconhece a importância dos segredos profissionais tanto que protege a sua inviolabilidade inclusive excluindo os profissionais da obrigação de depor que é um dever de todos art 206 1ª parte do CPP aliás os profissionais a quem são confiados segredos nas circunstâncias aqui examinadas são proibidos de depor salvo se desobrigados pela parte interessada quiserem dar o seu testemunho art 207 do CPP Desobrigação de depor fundamento ético Mesmo desobrigados do sigilo do segredo pela parte os profissionais continuam desobrigados de depor fáloão somente se quiserem diz o art 207 do CPP A proteção legal do segredo protege tanto o titular do segredo quanto o seu destinatário mesmo liberado pelo titular do segredo razões éticas justificam a recusa do profissional de depor acerca de segredos de que tenha tido ciência em razão de função ministério ofício ou profissão Ninguém pode ser obrigado a violentar seus princípios éticos aliás em nome dos quais as pessoas são levadas a confiarlhes suas intimidades Prestar esclarecimentos eufemismos oficiais Esses profissionais na verdade não são obrigados a depor nem prestar informações ou esclarecimentos que não passam de eufemismos utilizados por determinadas autoridades com visível abuso de autoridade para burlar a proteção legal A título de ilustração destacamos a prescrição do Código de Ética Médica aprovado pela Lei n 326857 que dispõe O médico está obrigado pela ética e pela lei a guardar segredo sobre fatos de que tenha conhecimento por ter visto ouvido ou deduzido no exercício de sua atividade profissional ficando na mesma obrigação todos os auxiliares art 36 Denunciação de crime não é justa causa A nosso juízo a denunciação de crime não constitui justa causa para a revelação de segredo contrariamente ao que pensava Heleno Cláudio Fragoso e nesse particular é muito elucidativa a citação que transcrevemos do Código de Ética Médica Erro de tipo O crime de violação de segredo profissional por sua própria natureza é um dos mais propícios às duas espécies de erro Assim por exemplo se o profissional revelar segredo de um cliente ou paciente acreditando sinceramente que não lhe causará nenhum dano mas que a despeito dessa convicção se produz Nessa hipótese erra sobre uma condição do tipo possibilidade de dano logo incorre em erro de tipo Erro de proibição Se no entanto acredita piamente que a revelação que faz realizaa corretamente como por exemplo para cobrar honorários nem pensa que age com justa causa acredita apenas que tem o direito de fazêlo Nessa hipótese não erra sobre uma elementar do tipo sem justa causa mas sobre a ilicitude da conduta logo incorre em erro de proibição 8 Classificação doutrinária Crime próprio que exige sujeito ativo especial somente profissional daquelas profissões especiais que tiver ciência do segredo em razão da função ministério ofício ou profissão pode responder por esse crime a não ser as hipóteses de concurso de pessoas art 29 e parágrafos formal pois se consuma com a simples conduta de revelar o segredo sendo pois antecipado o resultado Aliás o dano nem precisa ocorrer basta a potencialidade lesiva da conduta instantâneo consumase no momento em que o agente divulga o segredo esgotandose aí a lesão jurídica comissivo pois é impossível praticálo por meio da omissão doloso não havendo previsão da modalidade culposa 9 Pena e ação penal 91 Pena cominada A pena cominada é alternativa detenção de um mês a um ano ou multa 92 Natureza da ação penal A ação penal é pública condicionada à representação tratase de direito disponível e como tal o início da ação penal depende de provocação do ofendido Se o titular do segredo for menor de dezoito anos ou interdito o direito de representar deve ser exercido pelo seu representante legal 10 Questões especiais Vide art 195 XII da Lei n 927996 regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial A justa causa que torna atípica a conduta deve ser legal Advogado que revela segredo de seu cliente à parte contrária em prejuízo daquele pratica crime de patrocínio infiel art 355 A violação de sigilo profissional advogado médico etc também constitui falta éticoadministrativa Devese lembrar no entanto que o dever de sigilo não é absoluto na medida em que alguns deveres jurídicos são superiores àquele cujas presenças constituiriam justa causa J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Não há como exigir que o advogado preste depoimento em processo no qual patrocinou a causa de uma das partes sob pena de violação do art 7º XIX da Lei n 890694 Estatuto da Advocacia É prerrogativa do advogado definir quais fatos devem ser protegidos pelo sigilo profissional uma vez que deles conhece em razão do exercício da advocacia Optando por não depor merece respeito sua decisão STJ AgRg no HC 48843MS Rel Min Nilson Naves j 31102007 A violação do segredo profissional só constitui crime quando a revelação é feita sem justa causa por quem tem ciência dele em razão da função ministério ofício ou profissão sendo ela capaz de produzir dano a outrem e mesmo assim a adequação típica exige a presença do dolo o que não se verifica no fornecimento de prontuário médico de vítima de homicídio em cumprimento de requisição da autoridade competente para fazêlo sendo oportuno lembrar que o crime de violação do segredo profissional somente se procede mediante representação direito que pertence ao interessado na manutenção do segredo e que se extingue com a morte não se transmitindo aos herdeiros que só poderão apresentar se forem atingido pela revelação conforme ensinamentos de Heleno Cláudio Fragoso No caso não se está exigindo que a paciente revele segredo que a vítima de um possível homicídio tenha revelado ao médico que a operou mas sim o fornecimento do prontuário para se saber qual a rotina médica adotada antes durante e depois da cirurgia fatal com o fim de se obter as informações necessárias à elucidação da causa do óbito sua autoria e se o médico responsável negligenciou na observância de regra técnica de profissão TJRJ HC 405503 Rel Valmir de Oliveira Silva j 14102003 Advogado Testemunha Recusa Sigilo profissional Art 7º XIX Lei n 890694 É direito do advogado recusarse a depor como testemunha em processo no qual funcionou ou deva funcionar ou sobre fato relacionado com pessoa de quem seja ou foi advogado mesmo quando autorizado ou solicitado pelo constituinte bem como sobre fato que constitua sigilo profissional STJ AgRg na APn 206RJ Rel Min Cesar Asfor Rocha j 1042003 Título II Dos Crimes Contra o Patrimônio Capítulo I Do Furto Furto Art 155 Subtrair para si ou para outrem coisa alheia móvel Pena reclusão de 1 um a 4 quatro anos e multa V arts 180 a 183 e 312 do CP V arts 80 I 82 84 e 1473 VI do CC 1º A pena aumentase de um terço se o crime é praticado durante o repouso noturno 2º Se o criminoso é primário e é de pequeno valor a coisa furtada o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção diminuíla de um a dois terços ou aplicar somente a pena de multa V arts 59 IV 60 2º 63 e 180 3º do CP V art 172 do CPP 3º Equiparase à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico Furto qualificado 4º A pena é de reclusão de 2 dois a 8 oito anos e multa se o crime é cometido I com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa II com abuso de confiança ou mediante fraude escalada ou destreza V art 171 do CPP V arts 24 e 25 do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais III com emprego de chave falsa IV mediante concurso de duas ou mais pessoas V arts 29 e 62 do CP 5º A pena é de reclusão de 3 três a 8 oito anos se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior 5º acrescentado pela Lei n 9426 de 24 de dezembro de 1996 D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Nosso Código Penal vigente no Título dos Crimes contra o Patrimônio dividiuos em oito capítulos I furto II roubo e extorsão III usurpação IV dano V apropriação indébita VI estelionato e outras fraudes VII receptação VIII disposições gerais Contudo nem todos os crimes contra o patrimônio estão incluídos nesse capítulo da Parte Especial Nas leis extravagantes e no próprio Código Penal encontraremos outros crimes que também ofendem o patrimônio público ou particular tais como a usura art 4º da Lei n 1521 e os crimes falimentares Lei n 111012005 nos crimes de peculato art 312 do CP corrupção arts 317 e 333 e concussão art 316 há também a lesão patrimonial embora o legislador tenha preferido incluílos no Título relativo aos Crimes contra a Administração Pública 2 Bem jurídico tutelado Bens jurídicos protegidos diretamente são a posse e a propriedade de coisa móvel como regra geral e admitimos também a própria detenção como objeto da tutela penal na medida em que usálo portá lo ou simplesmente retêlo já representa um bem para o possuidor ou detentor da coisa A posse como bem jurídico protegido pela criminalização da conduta de furtar remonta ao direito romano desde Justiniano que prescrevia de obligationibus quae ex delicio nascuntur furto é a tomada fraudulenta de uma coisa de seu uso ou de sua posse Institutas de Justiniano Livro IV Título I 1º Garrara já destacava que para os práticos o crime de furto consistia tanto na violação do direito de propriedade quanto do de posse constituindo na última hipótese furto impróprio pois o proprietário já se encontrava privado da coisa subtraída Nesse aspecto equivocavase Nélson Hungria Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro Forense 1980 v 7 p 17 quando afirmava A posse como mero fato só por si ou não correspondente ao direito de propriedade embora protegida pelo direito civil não entra na configuração do furto Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 221 pontificando a corrente majoritária em sentido diametralmente oposto a Hungria sustentava que o objeto jurídico imediato do crime de furto é a proteção da posse e apenas secundariamente a propriedade é protegida Somente a posse legítima contudo recebe a proteção jurídicopenal assim ladrão que furta de ladrão responde pelo crime de furto apenas o sujeito passivo do segundo furto não será o ladrão mas o verdadeiro dono ou possuidor legítimo de quem a coisa fora anteriormente subtraída A lei protege igualmente a propriedade pois não se pode negar que o proprietário sofre dano patrimonial com a subtração ou o desaparecimento da coisa sobre a qual tinha a posse direta ou indireta Somos obrigados a admitir contudo que a proteção da posse vem em primeiro lugar e só secundariamente se tutela a propriedade Esta é o direito complexo de usar gozar e dispor de seus bens jus utendi fruendi et abutendi aquela a posse é na expressão de Ihering a relação de fato estabelecida entre o indivíduo e a coisa pelo fim de sua utilização econômica Enfim posse é fato protegida pelo direito como fato enquanto fato E é exatamente essa situação de fato que o diploma legal protege imediatamente 21 Não podem ser objeto de furto Objeto de furto somente pode ser coisa móvel O ser humano vivo não pode ser objeto de furto pela singela razão de que não se trata de coisa Poderá responder por inúmeras outras infrações não de natureza patrimonial tais como sequestro cárcere privado subtração de incapazes lesão corporal etc A própria subtração de cadáver em princípio não pode ser objeto material de furto constitui na verdade crime contra o respeito aos mortos art 211 No entanto quando eventualmente o cadáver for propriedade de alguém passando a ter valor econômico pode ser objeto de furto como por exemplo quando algo que pertence a uma instituição de ensino para estudos científicos é furtado Não podem ser objeto do crime de furto por exemplo aquelas coisas que não pertencem a ninguém tais como res nullius coisa que nunca teve dono res derelicta coisa que já pertenceu a alguém mas foi abandonada pelo proprietário e res commune omnium coisa de uso comum que embora de uso de todos como o ar a luz ou o calor do Sol a água do mar e dos rios não pode ser objeto de ocupação em sua totalidade ou in natura E assim o é porque a coisa subtraída para constituir objeto de furto deve pertencer a alguém e em qualquer das hipóteses antes mencionadas não pertence a ninguém Os direitos reais ou pessoais não podem ser objeto de furto Contudo os títulos ou documentos que os constituem ou representam podem ser furtados ou subtraídos de seus titulares ou detentores 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa menos o proprietário este não pode ser sujeito ativo do crime de furto mesmo em relação ao possuidor pois faltará à coisa a elementar normativa alheia ou seja ninguém pode furtar coisa própria poderá no máximo praticar o crime do art 346 Pelas mesmas razões condômino coerdeiro ou sócio também não podem ser sujeito ativo desse crime de furto Na mesma linha de raciocínio o possuidor tampouco pode ser sujeito ativo do crime de furto na medida em que estando de posse da coisa não pode subtraíla de outrem Ademais se inverter a natureza da posse que detém o crime que praticará não será este mas o de apropriação indébita art 168 Sujeitos passivos são o proprietário o possuidor e eventualmente até mesmo o detentor da coisa alheia móvel desde que tenha algum interesse legítimo sobre a coisa subtraída Na verdade para o possuidor inegavelmente a perda da posse também representa um dano patrimonial Assim tanto o proprietário quanto o possuidor são sujeitos passivos do crime de furto Ter a coisa a qualquer título ou simplesmente poder usála constitui um bem para o possuidor ou mesmo o detentor 4 Tipo objetivo adequação típica Subtrair coisa alheia móvel para si ou para outrem Subtrair significa tirar retirar surrupiar tirar às escondidas Subtrair não é a simples retirada da coisa do lugar em que se encontrava é necessário a posteriori sujeitála ao poder de disposição do agente A finalidade deste é dispor da coisa com animus definitivo para si ou para outrem O ordenamento jurídico brasileiro continua não punindo criminalmente o furto de uso A coisa objeto da subtração tem de ser móvel sendolhe equiparada a energia elétrica A coisa móvel tem de ser alheia Coisa sem dono ou por este abandonada não pode ser objeto de furto Subtrair coisa própria constitui conduta atípica A coisa móvel precisa ser economicamente apreciável A estrutura da descrição típica do crime de furto não se limita a dados puramente objetivos encontrandose enriquecida por elementos extraídos das searas da antijuridicidade e da antiga definição da culpabilidade com grande carga normativa e subjetiva Enfim a tipificação do crime de furto materializase com a subtração da coisa móvel pertencente a outrem orientada pela intenção do agente do assenhoramento próprio ou de terceiro 41 Objeto material do crime de furto Coisa para fins penais é tudo que possa constituir objeto da ação física de subtrair isto é coisa corpórea passível de ser deslocada removida apreendida ou transportada de um lugar para outro A eventual intangibilidade da coisa não afasta sua idoneidade para ser objeto de subtração Contudo em princípio a luz o ar o calor a água do mar ou dos rios não podem ser apreendidos consumidos ou utilizados em sua totalidade Mas como lembra Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 20 parcialmente podem ser aproveitados ou consumidos como força ou energia e nesse caso são passíveis de furto Coisa imóvel com efeito pode ser objeto de inúmeras infrações mas nunca dos crimes de furto e roubo As definições de coisa móvel e imóvel no direito penal não têm exatamente a mesma correspondência no direito civil ou mesmo no direito comercial Apesar da prescrição em sentido contrário do Código Civil para fins penais são consideradas coisas móveis apólices da dívida pública com cláusula de inalienabilidade art 79 do CC materiais separados provisoriamente de um prédio art 81 II navios art 1473 VI e aeronaves art 1473 VII Em verdade todos esses objetos podem facilmente ser subtraídos e retirados do lugar onde se encontram sem que o dono ou possuidor o perceba são em outros termos de acordo com sua natureza coisas móveis configurando portanto a elementar exigida pelo tipo penal Por isso merecem a tutela penal a despeito da natureza jurídica de imóveis que o Código Civil lhes atribui Coisa móvel para o direito penal é todo e qualquer objeto passível de deslocamento de remoção apreensão apossamento ou transporte de um lugar para outro Na definição de Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 21 a noção desta em direito penal é escrupulosamente realística não admitindo as equiparações fictícias do direito civil Assim os imóveis somente se por qualquer meio forem mobilizados poderão ser objeto de furto Os acessórios do imóvel árvores arbustos casas madeira plantas que forem mobilizados também podem ser objeto de furto Nessa mesma linha a despeito de o Código Civil considerar coisa móvel os direitos reais art 83 eles não podem ser objeto do crime de furto por não se tratar de coisas suscetíveis de serem apreendidas subtraídas removidas ou transportadas pelo sujeito ativo 42 Elemento normativo coisa alheia A condição alheia é elemento normativo indispensável à tipificação da subtração de coisa móvel sua ausência torna a conduta atípica A expressão alheia tem o sentido de coisa que não tem ou nunca teve dono Por isso as coisas sem dono res nullius abandonadas res derelicta e as coisas comuns res communes omnium não podem ser objeto de furto em sua totalidade Esta última res communes já destacava Hungria pode ser entretanto parcialmente captada e aproveitada como força ou energia ar liquefeito calor solar como força motriz etc incidindo essa parte especializada na propriedade de alguém e assim tornandose objeto adequado do furto Observese porém que o desvio ou represamento de águas correntes alheias em proveito próprio ou alheio tipifica o crime de usurpação art 161 lº I do CP e não o crime de furto Fazse necessário demonstrar que a res furtiva pertence a alguém Não há necessidade de identificar o proprietário ou possuidor A comprovação de que pertence a alguém tem a finalidade de excluir a res nullius res derelicta e res desperdita No caso da última hipótese poderá caracterizar apropriação indébita art 169 43 Proprietário que subtrai coisa da qual não tem a posse atipicidade Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 223 refletindo sobre o tema exemplifica com um direito real de garantia como o penhor quando alguém dá ao credor em garantia de dívida coisa móvel a título de penhor Posteriormente impossibilitado de honrar o crédito e não querendo ficar privado de sua coisa resolve subtraíla Admite tratarse do crime de furto prossegue Noronha a despeito de ter havido subtração de coisa própria Para Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 189 e Heleno Cláudio Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 316 haveria infração ao art 346 do CP Damásio de Jesus e Paulo José da Costa Jr Comentários ao Código Penal Parte Especial São Paulo Saraiva 1988 v 2 p 197 acompanham o entendimento esposado por Hungria A figura do crime de furto no entanto desde o direito romano tem como objetividade jurídica a proteção do patrimônio posse propriedade detenção etc de igual sorte o verbo nuclear representativo desse crime tem sido sistematicamente subtrair Por fim dentro da harmonia adotada pelo Código Penal de 1940 todos os crimes contra o patrimônio têm sede própria qual seja o Título II de sua Parte Especial A infração penal descrita no art 346 do Código Penal está inserta no Título XI que disciplina os Crimes contra a Administração Pública mais especificamente aqueles que forem praticados contra a administração da justiça Ora nenhum desses crimes tem como objetividade jurídica o patrimônio alheio ou principalmente o próprio Com efeito se dano patrimonial existir indevidamente necessita da proteção legal que por certo ante a ausência de tipificação específica não estará no âmbito penal Porém o ordenamento jurídico como um todo tem condições de estender seu manto protetor para assegurar eventual lesão de quem assim se sentir institutos tais como busca e apreensão sequestro ações possessórias indenizatórias etc enfim um arsenal de medidas estará à disposição de eventual lesado sem necessidade de destruir o direito penal para suprir uma lacuna desconhecida pelo então legislador Para aprofundar vide nosso Tratado v 3 44 Lesão patrimonial bem economicamente apreciável Para Heleno Fragoso não pode existir crime patrimonial se não houver lesão a interesse jurídico apreciável economicamente aplicandose nesses casos a noção civilística segundo a qual é elementar ao conceito de patrimônio a avaliação econômica dos bens ou relações que o compõem Em sentido contrário posicionavase Nélson Hungria reconhecendo que embora a nota predominante do elemento patrimonial seja seu caráter econômico devese advertir que por extensão também se dizem patrimoniais aquelas coisas que embora sem valor venal representam uma utilidade ainda que simplesmente moral Hungria Tratase de crime material por excelência sendo indispensável a superveniência do eventus damni Não se pode falar em crime de furto em nossa concepção sem a existência efetiva de diminuição do patrimônio alheio A coisa subtraída não deve ter enfim para o sujeito passivo apenas valor monetário mas representar pelo menos alguma utilidade de qualquer natureza para que possa ser considerada integrante de seu patrimônio 45 Irrelevância da motivação do crime de furto Na verdade em nosso entendimento é irrelevante o motivo ou finalidade que orientou a conduta do agente ou seja é absolutamente desnecessário que o sujeito ativo tenha praticado a subtração visando a obtenção de lucro ou mesmo que tenha conseguido efetivamente algum lucro sendo suficiente que o tenha feito para si ou para outrem sabendo que se trata de coisa alheia e apresente algum dano patrimonial Igualmente a motivação de vingança contra a vítima ou apenas proporcionar um agrado a um amigo desafeto da vítima não altera a tipicidade do crime desde que presente o animus rem sibi habendi 46 Coisa perdida abandonada e coisa comum A coisa perdida não se encontra na posse de ninguém Mas coisa perdida não é coisa abandonada consequentemente o dono não renunciou a sua propriedade apenas e tão somente ignora o local onde ela se encontra Por isso a coisa perdida não pode ser objeto de subtração Teoricamente até se poderia discutir a existência residual da proteção do direito de propriedade Seria no entanto mera discussão acadêmica no caso improdutiva na medida em que o art 169 II tipifica essa conduta como apropriação de coisa achada a especialidade afasta a generalidade A coisa abandonada res derelicta não pode ser objeto de subtração nem de apropriação indébita Constitui res derelicta repetindo qualquer objeto abandonado pelo dono e nessa circunstância por ele declarado sem valor econômico ainda que eventualmente possa ser valioso para terceiro Mas convém ter presente que o abandono da coisa deve ser evidente inequívoco preciso não o caracterizando por exemplo o simples fato de ser uma coisa velha com as aberturas em precárias condições facilitando inclusive o acesso Essas circunstâncias por si sós não autorizam estranho a penetrar em seu interior e dispor de seus bens 5 Natureza e efeito do consentimento da vítima no crime de furto Destacase por fim que o crime de furto pressupõe o dissenso da vítima sendo irrelevante contudo que seja praticado na presença ou ausência desta na medida em que a clandestinidade embora seja a regra não constitui elemento estrutural desse crime No entanto ao se examinar a natureza e importância do consentimento do ofendido devemse distinguir aquelas situações que caracterizam exclusão de tipicidade das que operam como excludentes de antijuridicidade Na verdade se fizermos uma análise ainda que superficial constataremos que em muitas figuras delituosas de qualquer Código Penal a ausência de consentimento faz parte da estrutura típica como característica negativa do tipo Logo a presença de consentimento afasta a tipicidade da conduta que para configurar crime exige o dissenso da vítima por exemplo o rapto art 219 a invasão de domicílio art 150 a violação de correspondência art 151 etc Outras vezes o consentimento do ofendido constitui verdadeira elementar do crime como ocorre por exemplo no rapto consensual art 220 e no aborto consentido art 126 Nesses casos o consentimento é elemento essencial do tipo penal Enfim são duas formas distintas de o consentimento do ofendido influir na tipicidade para excluíla quando o tipo pressupõe o dissenso da vítima para integrála quando o assentimento da vítima constitui elemento estrutural da figura típica 6 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo é constituído pelo dolo que é seu elemento subjetivo geral e pelo especial fim de agir que é seu elemento subjetivo especial O dolo por sua vez constituise pela vontade consciente de subtrair coisa alheia isto é que pertença a outrem É indispensável que o dolo abranja todos os elementos constitutivos do tipo penal sob pena de configurarse o erro de tipo e como não há previsão da modalidade de furto culposo a evitabilidade ou inevitabilidade do erro é irrelevante pois ambos excluirão a tipicidade salvo se se tratar de simulacro de erro É indispensável enfim que o agente saiba que se trata de coisa alheia Quando no entanto o agente por erro supuser que a coisa subtraída é própria não responderá pelo crime de furto por faltar lhe o conhecimento ou a consciência da elementar normativa alheia O sujeito crê que seu atuar é permitido em virtude de não saber o que faz não estando consequentemente sua vontade dirigida à realização do tipo como reconheceu a célebre jurisprudência alemã de 18 de março de 1952 Estarseá diante do que se chama de crime putativo que evidentemente crime não é O elemento subjetivo especial do tipo por sua vez é representado pelo fim especial de apoderarse da coisa subtraída para si ou para outrem A ausência desse animus apropriativo finalidade de apossamento desnatura a figura do crime de furto Logicamente quando essa circunstância se fizer presente haverá uma espécie de inversão do ônus da prova devendo o agente demonstrar in concreto que a finalidade da subtração era outra e não a de apoderarse da coisa para si ou para outrem 7 Consumação e tentativa 71 Consumação Quanto ao momento consumativo do crime de furto podemse destacar basicamente três orientações distintas a que é suficiente o deslocamento da coisa mesmo que ainda não tenha saído da esfera de vigilância da vítima b que é necessário afastarse da esfera de vigilância do sujeito passivo c que é necessário um estado de posse tranquilo ainda que momentâneo Consumase o crime de furto com a retirada da coisa da esfera de disponibilidade da vítima assegurandose em consequência a posse tranquila mesmo passageira por parte do agente em outros termos consumase quando a coisa sai da posse da vítima ingressando na do agente A posse de quem detinha a coisa é substituída pela posse do agente em verdadeira inversão ilícita Enfim o apossamento ou assenhoramento ocorre quando a coisa alheia sai da vigilância ou disponibilidade do ofendido embora seja bastante difícil precisar aprioristicamente o momento em que ocorre essa verdadeira inversão da posse Apesar de tratarse de crime material a fase executória não raro é tão exígua que ação e consumação praticamente se confundem assim por exemplo quando o agente subtrai alimento e ainda no local o ingere A despeito da necessidade dessas duas circunstâncias sair da disponibilidade da vítima e estar na posse tranquila do agente é possível teoricamente ocorrer a consumação do furto sendo o agente preso em flagrante Com efeito a amplitude do conceito de flagrante estabelecido pelo art 302 IV do Código de Processo Penal permite essa interpretação Segundo esse dispositivo considerase em flagrante delito até mesmo quem é encontrado logo depois com instrumentos armas objetos ou papéis que façam presumir ser ele o autor da infração Nessas circunstâncias nada impede que a res furtiva tenha saído da esfera de vigilância da vítima e ainda que momentaneamente o agente tenha tido sua posse tranquila tendose consumado o furto 72 Tentativa O furto como crime material admite com segurança a figura tentada Sempre que a atividade executória seja interrompida no curso da execução por causas estranhas à vontade do agente configurase a tentativa Em outros termos quando o processo executório for impedido de prosseguir antes de o objeto da subtração ser deslocado da esfera de vigilância e disponibilidade da vítima para a posse tranquila do agente não se pode falar em crime consumado Consumase o delito afirma Damásio de Jesus Direito Penal v 2 p 306 no momento em que a vítima não pode mais exercer as faculdades inerentes à sua posse ou propriedade instante em que o ofendido não pode mais dispor do objeto material Não se pode falar em crime consumado quando por exemplo a vítima percebe que está sendo furtada pelo punguista e sai em sua perseguição prendendoo em seguida na posse da res furtiva Inegavelmente o evento jurídico pretendido pelo agente apossamento da coisa alheia não se realizou uma vez que o objeto pretendido não saiu da esfera de vigilância da vítima e consequentemente não entrou na pose tranquila do agente 721 Questões controvertidas Não há tentativa quando por exemplo o agente introduz a mão no bolso da vítima para subtrairlhe os valores mas esta não traz consigo nenhum centavo Equivocadamente Nélson Hungria posicionavase em sentido contrário considerando que a inexistência de dinheiro fora meramente acidental e que o insucesso do meliante resultou de puro caso fortuito Devemse na verdade distinguir duas hipóteses 1 se a vítima tem dinheiro acondicionado em outro bolso o bem jurídico patrimônio corre sério risco há o perigo efetivo de dano 2 contudo se a vítima não tem dinheiro algum no momento não há qualquer risco a seu patrimônio em face da inexistência do bem A ação do agente desde o princípio estava destinada ao insucesso pois não se pode furtar o nada Enfim na primeira hipótese a impropriedade do objeto é relativa na segunda a impropriedade é absoluta tratandose de crime impossível art 17 do CP 73 Furtos em supermercados tentativa ou crime impossível Ocorre furto tentado não havendo que se falar em crime impossível no caso do agente que subtrai diversas mercadorias de supermercado só não consumando o delito porque aleatoriamente é revistado ao passar pela portaria do estabelecimento Caracterizase o furto tentado simples e eventualmente crime impossível quando o crime material não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente não chegando a res furtiva a sair da esfera de vigilância do dono e consequentemente não passando para a posse tranquila daquele Se o agente teve a posse tranquila da res furtiva apesar do pouco tempo de forma totalmente desvigiada é indiscutível a ocorrência do furto consumado sendo portanto irrelevante o tempo de duração da disponibilidade da coisa 8 Furto durante o repouso noturno Com a expressão durante o repouso noturno por certo a lei não se refere ao nascer e ao pôr do sol mas ao período de recolhimento aquele em que a população deve dormir Essa circunstância de natureza puramente sociológica deve ser analisada casuisticamente considerando os hábitos e costumes da localidade onde o fato ocorreu A existência ou não da majorante é matéria de fato que deve ser examinada em cada caso concreto Na linha restritiva a que nos propomos para se configurar a majorante do repouso noturno necessita ser praticado em casa habitada já em horário de repouso porque nessas circunstâncias efetivamente afrouxase a vigilância do sujeito passivo facilitando não só a impunidade mas também o êxito do empreendimento delituoso Levantaramse sobre o tema algumas orientações distintas a o lugar precisa ser habitado com pessoa repousando RT 559358 b o lugar não precisa ser habitado RT 537372 e 590361 c os moradores não devem estar acordados RT 498323 d não se exige a presença de moradores STF RTJ 64593 e RT 637366 81 Lugar habitado e com pessoas repousando Não se podem perder de vista dois aspectos fundamentais a finalidade protetiva da norma e a necessidade de sua interpretação restritiva como já referimos Nessa linha sustentamos a conveniência políticocriminal de adotar a primeira opção qual seja para se admitir caracterizada a majorante do repouso noturno é necessário que o lugar seja habitado e se encontre com pessoa repousando O próprio Nélson Hungria em seu tempo já reconhecia que essa agravante não se aplica quando o furto é praticado em local onde os moradores não se encontram repousando mas festejando pois em tal caso sustentava Hungria desaparece a razão de ser da maior punibilidade 82 Lugar desabitado e ausência dos moradores Jurisprudência e doutrina dominantes com acerto reconhecem a inaplicabilidade da majorante do repouso noturno quando o furto é praticado em lugar desabitado estabelecimento comercial por exemplo ou na ausência dos moradores O acerto dessa orientação reside no fato de que a majorante está diretamente ligada à cessação ou afrouxamento da vigilância Ora em lugar desabitado ou na ausência de moradores não pode cessar ou diminuir algo que nem sequer existe 83 Inaplicabilidade à hipótese de furto qualificado Indubitavelmente a majorante do repouso noturno é inaplicável às hipóteses de furto qualificado podendo contudo ser considerada na dosimetria da pena como circunstância do crime art 59 9 Furto de pequeno valor aplicase ao furto qualificado O 2º do art 155 prevê a possibilidade de reduzir a sanção cominada para o crime de furto quando se tratar de réu primário e de pequeno valor a coisa subtraída Presentes esses dois requisitos a pena de reclusão pode ser substituída pela de detenção somente pela pena de multa ou apenas ser reduzida de um a dois terços Em outros termos o pequeno desvalor do resultado e a primariedade do agente recomendam menor reprovação deste determinando em obediência ao princípio da proporcionalidade a redução da sanção para adequála à menor gravidade do fato Este dispositivo procura corrigir pela equidade o excessivo rigor da sanção cominada a um simples crime de furto aplicase tanto ao furto simples quanto ao furto durante o repouso noturno excluindose segundo interpretação majoritária do furto qualificado A despeito da tradição e da solidez desse entendimento não vemos nenhuma base sólida contundente e jurídica para excluir essa minorante do furto qualificado A inaplicabilidade da majorante do repouso noturno justificase pela incidência de duas agravações da pena a simples qualificadora já dobra a sanção penal da figura simples não havendo razão lógica para ainda ser elevada em mais um terço Contudo na hipótese da minorante do pequeno valor não se está cuidando de duas causas de aumento mas tão somente de redução sobre um tipo qualificado Não há com efeito fundamento político jurídico para punir um réu primário que subtrai coisa de pequeno valor com abuso de confiança com a mesma pena daquele que subtrai coisa valiosa nas mesmas circunstâncias São coisas diferentes que merecem reprimendas igualmente diferentes devendo incidir por isso mesmo a minorante para aquele conforme demonstraremos em outro tópico 91 Primariedade reincidentes e não reincidentes A primariedade como primeiro requisito necessário para a configuração da minorante embora encerre um conceito negativo não se confunde com não reincidência especialmente a partir da reforma penal de 1984 Lei n 7209 que introduziu um novo conceito qual seja o de não reincidente A Parte Geral do Código adota um critério distinto do da Parte Especial trabalha com os conceitos de reincidente e não reincidente enquanto a Parte Especial utiliza os conceitos de reincidente e primário Anteriormente reincidente e primário constituíam definições excludentes ou uma ou outra tanto que se adotava o seguinte conceito primário é o não reincidente A partir da reforma penal referida essa concepção deixou de ser verdadeira na medida em que passaram a existir três digamos categorias primário reincidente e não reincidente Com efeito chamase primário quem nunca sofreu qualquer condenação irrecorrível reincidente quem praticou um crime após o trânsito em julgado de decisão condenatória em primeiro ou segundo grau enquanto não tenha decorrido o prazo de cinco anos do cumprimento ou da extinção da pena não reincidente como categoria é aquele que não é primário e tampouco ostenta a condição de reincidente essa é definição exclusiva para o direito brasileiro sendo inaplicável genericamente às legislações alienígenas Não é reincidente por exemplo quem comete o segundo ou terceiro crime antes do trânsito em julgado de crime anterior quem comete novo crime após o decurso de cinco anos do cumprimento de condenação anterior ou da extinção da punibilidade etc Constatase enfim que o termo primariedade tem tecnicamente um conceito bem delimitado Eventuais condenações anteriores por si sós ou meros antecedentes criminais negativos não são causas impeditivas do reconhecimento da existência desse requisito à luz de nosso ordenamento jurídico em vigor Tratandose de norma criminal não pode ter interpretação extensiva para restringir a liberdade do cidadão 92 Coisa de pequeno valor A doutrina em geral tem definido como pequeno valor aquele cuja perda pode ser suportada sem maiores dificuldades pela generalidade das pessoas Ao rico lembrava Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 243 porque talvez nem perceberá sua falta ao pobre porque na sua penúria de pouco lhe valerá Embora nos desagrade a fixação de determinado quantum por sua relatividade ante a necessidade de um paradigma aceitamos a orientação majoritária segundo a qual de pequeno valor é a coisa que não ultrapassa o equivalente ao salário mínimo Contudo na seara tributária a própria receita encarregouse de estabelecer valores muito superiores para os quais não admite a execução fiscal no momento fixado em R 250000 Diante desse entendimento da receita é natural que se considere nos crimes fiscais ou tributários não apenas pequeno valor mas valor insignificante para excluir a própria tipicidade da conduta segundo o princípio da insignificância 93 Aplicabilidade das privilegiadoras no furto qualificado A jurisprudência majoritária historicamente tem negado essa possibilidade e tem encontrado eco na própria doutrina Contudo mais recentemente essas orientações têm cedido espaço a uma interpretação racionalmente mais liberal com uma análise mais políticodogmática e menos anatômicoanacrônica que sempre procurou dar sentido à norma segundo a ordem crescente ou decrescente que aparecem nos dispositivos legais Não há nenhuma razão lógica metodológica ou científica para que um tipo fundamental de crime possa receber a incidência ora de privilegiadora ora de qualificadora mas nunca de ambas Quando determinado crime satisfizer in concreto os requisitos legais exigíveis para caracterizar a privilegiadora como é o caso da primariedade e do pequeno valor da coisa furtada se incidir ao mesmo tempo alguma qualificadora não há fundamento jurídico que autorize a não aplicação da privilegiadora Por que razão optandose por uma linha excludente se deve dar preferência à qualificadora em detrimento da privilegiadora E por que não se pode interpretar em sentido contrário na medida em que em se tratando de normas criminalizadoras recomendase sempre a interpretação mais favorável Sintetizando a primariedade e o pequeno valor da res furtiva permitem a substituição da pena de reclusão por detenção reduzila de um a dois terços ou aplicar somente multa 94 Pequeno valor e pequeno prejuízo distinção Para fins de aplicação do disposto no 2º do art 155 do CP não se identificam pequeno valor da res furtiva e pequeno prejuízo resultante da ação delituosa Quando o legislador deseja considerar o prejuízo sofrido pela vítima o faz expressamente como no estelionato art 171 lº do CP O valor da res furtiva deve ser medido ao tempo da subtração não se identificando com o pequeno prejuízo que dela resultar Como a previsão legal referese a pequeno valor da coisa furtada é irrelevante a circunstância de a vítima recuperar o bem subtraído e não sofrer prejuízo algum Nos crimes contra o patrimônio a recuperação do bem subtraído não pode ser admitida como causa da atipicidade da conduta do agente e nem mesmo como fundamento da privilegiadora pequeno valor Os crimes patrimoniais tipificamse pelo assenhoreamento da coisa subtraída orientada pela intenção dolosa do agente 10 Furto qualificado tipo derivado O modus operandi no crime de furto pode apresentar particularidades que representem maior gravidade na violação do patrimônio alheio produzindo maior alarma social tornando a conduta mais censurável e por isso mesmo merecedora de maior punibilidade quer pelo maior desvalor da ação quer pelo maior desvalor do resultado destruição ou rompimento de obstáculo Essas particularidades podem assumir diversos graus de intensidade recebendo de acordo com sua gravidade a qualificação de agravantes majorantes ou qualificadoras Observando o princípio da reserva legal optouse por estabelecer taxativamente aquelas circunstâncias que por sua gravidade tornam o crime qualificado que a rigor constituem novos tipos penais derivados mas autônomos com novos parâmetros sancionatórios bem mais graves distintos da figura fundamental furto simples Destacava Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 38 que segundo o critério geral não poderiam passar de accidentalia do furto mas a lei destacando no caso para apriorístico rigor de punição uma species do genus furto considera as ipso facto essentialia em relação a esta A graduação do injusto penal observa sua maior ou menor danosidade que ora é representada como dissemos pelo desvalor da ação ora pelo desvalor do resultado Inegavelmente como destaca Weber Martins Batista O furto e o roubo no Direito e no Processo Penal 2 ed Rio de Janeiro Forense 1997 a reprovabilidade é maior para quem utiliza meios excepcionais para superar obstáculos defensivos do patrimônio alheio ou se organiza para essa finalidade ou ainda trai a confiança que alguém lhe depositara descuidandose por isso mesmo da vigilância de seu patrimônio A presença de apenas uma delas é suficiente para qualificar o crime mudando sua capitulação e substancialmente sua punição eventual concurso de duas ou mais qualificadoras não modifica a pena abstratamente cominada contudo deve ser considerada na medida da pena concretizada ou seja uma delas a nosso juízo a mais grave ou mais bem comprovada nos autos servirá para estabelecer a penabase fixando o marco do tipo penal derivado enquanto as demais devem ser trabalhadas na operação dosimétrica da pena visando encontrar o resultado definitivo 101 Com destruição ou rompimento de obstáculo I Somente a violência empregada contra a coisa caracteriza a qualificadora do furto pois quando for utilizada contra a pessoa o crime será de roubo A violência deve ser contra obstáculo que dificulte a subtração e não contra a própria coisa que é o objeto da subtração Obstáculo é tudo o que é empregado para proteger a coisa contra eventual ação delitiva Não se considera obstáculo aquilo que integra a própria coisa como por exemplo os vidros do automóvel a menos que sejam rompidos para subtrair objetos que se encontram no interior do veículo mas não para subtrair o próprio da mesma forma o simples desparafusamento dos faroletes ou dos pneus de um automóvel não tipifica a qualificadora É indispensável que a violência seja exercida contra um obstáculo exterior à coisa que se pretende subtrair contudo o obstáculo pode ser interno ou externo externo quando a violência se direciona por exemplo a obstáculo que objetiva impedir o acesso à parte interna de uma casa ou edifício ou qualquer outro ambiente fechado interno quando a ação violenta se dirige a obstáculo interno isto é que se encontra no interior do local da subtração tais como cofres armadilhas armários etc Enfim para efeitos penais não constitui obstáculo a resistência inerente à própria coisa que por si mesma dificulte sua subtração O obstáculo deve ter a finalidade de proteger o patrimônio e para vencêlo o agente deve empregar violência para destruílo ou rompêlo Mas registrese é indispensável que exista obstáculo a ser vencido isto é que haja resistência a ser vencida caso contrário não se poderá falar nessa qualificadora A qualificadora contida no inciso I do 4º do art 155 apresenta duas hipóteses distintas destruição e rompimento Destruir significa desfazer completamente o obstáculo demolilo ao passo que romper é arrombar arrebentar cortar serrar perfurar deslocar ou forçar de qualquer modo o obstáculo com ou sem dano à substância da coisa Há destruição quando ocorre a demolição o aniquilamento ou o desaparecimento de eventual obstáculo que de alguma forma sirva de proteção ao objeto da subtração O rompimento por sua vez consiste no arrombamento deslocamento ou supressão do obstáculo visando facilitar a subtração da coisa alheia Não é necessário que o agente ingresse de corpo inteiro no local onde se encontra a res sendo suficiente retirála pela abertura forçada seja com a mão seja com algum instrumento apropriado 1011 O tempo da prática da violência A violência na verdade é o meio para concretizar a subtração da coisa alheia Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 245 sustentava que a violência devia ser anterior ou contemporânea à apreensão refutando inclusive autores alienígenas como Manzini por exemplo pois trabalhavam sobre textos legais distintos Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 401 em posição antagônica seguida por Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 197 contestava Magalhães Noronha pois a subtração contida no texto legal abrange não apenas a apreensão mas também a remoção Na verdade não há qualquer relevância se a violência contra a coisa se opera antes ou depois de sua apreensão desde que logicamente se concretize antes da consumação do crime Assim destruição ou rompimento praticado para consumar a subtração mesmo após a apreensão física da coisa também qualifica o crime agora se o rompimento ou a destruição for praticado após a consumação do furto constituirá crime autônomo 102 Com abuso de confiança ou mediante fraude escalada ou destreza II Confiança é um sentimento interior de credibilidade representando um vínculo subjetivo de respeito e consideração entre o agente e a vítima pressupondo especial relação pessoal entre ambos Abuso de confiança por sua vez consiste em uma espécie de traição à confiança produto de relações de confiabilidade entre sujeitos ativo e passivo exatamente a razão pela qual foi facilitado o acesso à coisa alheia Exemplos típicos são os casos dos empregados domésticos incluindose também quem se vale da relação de hospitalidade ou coabitação Convém advertir contudo que não basta a simples relação empregatícia para caracterizar a qualificadora sendo indispensável um vínculo subjetivo caracterizador da confiança e por isso mesmo passível de ser quebrado Assim simples furto de objetos no local de trabalho não qualifica o furto por abuso de confiança que não é uma condição natural e obrigatória das relações trabalhistas ou domésticas pode no máximo incidir no furto simples a agravante genérica das relações domésticas de coabitação ou hospitalidade art 61 II f É necessário que a confiança seja natural conquistada normalmente isto é sem ardil caso contrário a qualificadora que se apresenta não é o abuso de confiança mas a fraude Dois requisitos se fazem necessários abuso da confiança depositada pelo ofendido e que a coisa se encontre em razão dessa confiança na esfera de disponibilidade do agente É indispensável ademais que o agente tenha consciência de que pratica o crime abusando da relação de confiança que mantém com a vítima 1021 Incomunicabilidade do abuso de confiança Confiança é uma circunstância de caráter pessoal e como tal em princípio é incomunicável aos diversos participantes de uma mesma infração penal art 30 contudo na hipótese ela constitui elementar do crime qualificado incidindo na ressalva do mesmo art 30 que determina nesses casos a comunicabilidade das elementares típicas independentemente de sua natureza objetiva ou subjetiva Convém destacar no entanto que a comunicabilidade não apenas de elementares subjetivas mas de qualquer natureza somente existe se o participante conhecer essa circunstância antes da prática delituosa caso contrário ela não terá sido abrangida por seu dolo resultando incomunicável por sua natureza subjetiva mas pelo desconhecimento do agente que em relação à elementar não agiu com dolo 1022 Abuso de confiança e apropriação indébita O furto qualificado ora examinado difere da apropriação indébita basicamente por dois aspectos fundamentais o momento da deliberação criminosa e o do apossamento da res Na apropriação indébita o agente exerce a posse em nome de outrem enquanto no furto com abuso de confiança tem mero contato mas não a posse da coisa naquela o dolo é superveniente enquanto neste há dolus ab initio Nélson Hungria advertia com acerto que não se deve confundir esse furto qualificado com a apropriação indébita que em princípio pressupõe abuso de confiança Nesta o agente exerce desvigiada posse de fato sobre a coisa que em razão da confiança lhe fora autorizada pelo dominus para determinado fim no furto em razão da confiança o agente tem contato com a coisa mas não a posse que continua na plena esfera de vigilância e disponibilidade do dono Em outros termos o abuso de confiança elementar que qualifica o crime de furto não se confunde com a confiança implícita da apropriação indébita Nesse sentido é impecável o exemplo citado por Damásio de Jesus Direito Penal v 2 p 323 pela semelhança e proximidade entre as duas situações que apenas se distinguem no detalhe essencial Suponhase que o sujeito numa biblioteca apanhe o livro que lhe foi confiado pela bibliotecária e o esconda sob o paletó subtraindoo Responde por delito de furto qualificado pelo abuso de confiança Suponhase agora que o sujeito da mesma biblioteca pública tome emprestado o livro e levandoo para casa vendao a terceiro Neste caso responde por apropriação indébita Embora pareça sutil é uma distinção que faz a diferença efetiva entre um crime e outro No mesmo sentido o exemplo de Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 43 é lapidar Assim o caixeiroviajante que se apropria de dinheiros recebidos da clientela do patrão comete apropriação indébita mas o caixeiro sedentário que iludindo a vigilância do patrão subtrai mercadoria das prateleiras ou dinheiro da caixa registradora ou recebido no balcão comete furto qualificado 1023 Furto mediante fraude Mediante fraude é a segunda qualificadora contemplada no inciso II do 4º do art 155 Fraude é a utilização de artifício de estratagema ou ardil para vencer a vigilância da vítima em outros termos tratase de manobra enganosa para ludibriar a confiança existente em uma relação interpessoal destinada a induzir ou a manter alguém em erro com a finalidade de atingir o objetivo criminoso Na verdade a fraude não deixa de ser uma forma especial de abuso de confiança ou na feliz expressão de Guilherme Nucci Código Penal comentado 2 ed São Paulo Revista dos Tribunais 2002 p 435 é uma relação de confiança instantânea formada a partir de um ardil A qualificadora aperfeiçoase quer a fraude seja utilizada para a apreensão da coisa quer para seu assenhoreamento Não há nenhuma restrição quanto à forma meio ou espécie de fraude basta que seja idônea para desviar a atenção do dono proprietário ou simples vigilante da disponibilidade e segurança da res Assim caracteriza meio fraudulento qualquer artimanha utilizada para provocar a desatenção ou distração da vigilância para facilitar a subtração da coisa alheia Embora a fraude seja característica inerente ao crime de estelionato aquela que qualifica o furto não se confunde com a deste No furto a fraude burla a vigilância da vítima que assim não percebe que a res lhe está sendo subtraída no estelionato ao contrário a fraude induz a vítima a erro Esta voluntariamente entrega seu patrimônio ao agente No furto a fraude visa desviar a oposição atenta do dono da coisa ao passo que no estelionato o objetivo é obter seu consentimento viciado pelo erro logicamente O dissenso da vítima no crime de furto mesmo fraudulento e sua aquiescência embora viciada no estelionato são dois aspectos que os tornam inconfundíveis 1024 Furto mediante escalada Escalada em sentido vernacular significa assaltar subindo por escalada subir a algum lugar usando escadas trepar a subir a galgar atingir Escalada que em direito penal tem sentido próprio é a penetração no local do furto por meio anormal artificial ou impróprio que demanda esforço incomum Escalada não implica necessariamente subida pois tanto é escalada galgar alturas quanto saltar fossos rampas ou mesmo subterrâneos desde que o faça para vencer obstáculos O acesso ao local da subtração deve apresentar determinada dificuldade a ponto de exigir esforço incomum habilidade ou destreza para superála Se para ingressar no recinto mesmo através de uma janela ou saltando um muro não for exigível desforço anormal não se pode falar em escalada como qualificadora do crime de furto Os meios artificiais utilizáveis para a superação de obstáculo à subtração sem violência são quaisquer meios idôneos para consegui lo estejam no local ou sejam levados pelo agente A existência de obstáculo por si só não caracteriza a qualificadora sendolhe indispensável a idoneidade para dificultar a ação delitiva Importa isso sim é a realidade da defesa sendo irrelevante a intenção do dono Em síntese a escalada consiste no fato de penetrar o agente no lugar em que se encontra a coisa objeto da subtração por via anormal por entrada não destinada a esse fim e da qual não tem o direito de utilizarse E mais consiste não apenas em ingresso no local por via incomum mas sobretudo superando obstáculo difícil que demande o uso de instrumento especial ou de invulgar habilidade do agente Afinal o fundamento dessa qualificadora é como destacava Sebastian Soler Sebastian Soler Derecho Penal argentino 3 ed Buenos Aires TEA 1970 v 4 p 222 o mesmo que determinou a agravação do furto praticado com chave falsa ou seja punir mais gravemente aquele que mesmo sem usar violência mas com habilidade ou grande esforço vence obstáculos efetivamente defensivos da res 1025 Furto praticado com destreza Finalmente a destreza que é a última qualificadora constante do inciso II do 4º do art 155 Significa especial habilidade capaz de impedir que a vítima perceba a subtração realizada em sua presença É a subtração que se convencionou chamar de punga A destreza pressupõe uma atividade dissimulada que exige habilidade incomum aumentando o risco de dano ao patrimônio e dificultando sua proteção O folclórico batedor de carteiras o conhecido punguista é o exemplo mais característico do furto com destreza que não se confunde com o trombadinha que se choca com a vítima e com violência arranca lhe os pertences Não configura a destreza quando o ladrão age a descoberto mesmo que o faça com rapidez invulgar pois não eliminou totalmente a possibilidade de defesa da vítima Não se pode falar em destreza quando por inabilidade do agente é surpreendido pela vítima no momento da ação Contudo se for descoberto logo após a subtração por mero acidente ou simples suspeita sem qualquer vínculo com a perfeição ou imperfeição da ação a qualificadora deve ser reconhecida A habilidade assegurou o êxito da execução outras causas podem ter impedido num momento posterior a disponibilidade definitiva Na verdade a destreza deve ser analisada sob a ótica da vítima e não de terceiro Assim se ela não percebe a punga é irrelevante para caracterizála que terceiro impeça sua consumação Destreza não se confunde com audácia que se caracteriza por exemplo com o arrebatamento violento O arrebatamento não revela destreza do autor mas exagerada distração da vítima No entanto o arrebatamento com o rompimento de obstáculo constitui furto qualificado 4º I Embora o arrebatamento por si só praticado sem violência à pessoa constitua furto simples havendo violência à pessoa constituirá roubo Tampouco se pode reconhecer a destreza quando a subtração é praticada com vítima que se encontra dormindo mesmo que o faça com o cuidado necessário para não despertála Sintetizando a destreza constitui a habilidade física ou manual empregada pelo agente na subtração fazendo com que a vítima não perceba o seu ato É o meio empregado pelos batedores de carteira pickpockets ou punguistas na gíria criminal brasileira O agente adestrase treina especializase adquirindo habilidade tal com mãos e dedos que a subtração ocorre como um passe de mágica dissimuladamente Por isso a prisão em flagrante próprio do punguista afasta a qualificadora devendo responder por tentativa de furto simples na verdade a realidade prática comprovou exatamente a inabilidade do incauto 103 Com emprego de chave falsa III Chave falsa é qualquer instrumento de que se sirva o agente para abrir fechaduras tendo ou não formato de chave Exemplos grampo alfinete prego fenda gazua etc A chave verdadeira à evidência não qualifica o crime pois lhe falta a elementar normativa falsa O emprego de chave falsa traduz maior perigosidade do agente que dessa forma demonstra a instabilidade da normal proteção patrimonial que uma fechadura por si só não pode elidir o risco de sua violação Equivocado nesse particular o antigo magistério de Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 251 que professava o seguinte Na mesma ordem de ideias são também falsas as chaves verdadeiras furtadas ou perdidas Não há como excluílas da disposição legal Se o que a lei veda é a abertura ilícita da coisa que representa a custódia maior razão existe contra o emprego da chave subtraída ou achada pois já é obtida criminosamente quer por ter sido furtada quer por não ter sido devolvida ao dono Na verdade se a chave verdadeira for ardilosamente conseguida pelo agente a qualificadora será pelo emprego de fraude art 155 4º II 2ª figura contudo se aquela for esquecida na fechadura ou encontrada normalmente em algum lugar pelo agente ou por terceiro indiferentemente o furto será simples ao contrário do que sustentava Noronha 1031 Modus operandi e simples posse de chave falsa A locução se o crime é cometido traduz ideia de ação não se referindo portanto a resultado logo referese ao modus operandi sendo por conseguinte irrelevante o êxito do empreendimento delituoso para que a qualificadora se aperfeiçoe É suficiente que a chave falsa seja utilizada pelo agente independentemente de conseguir seu intento de apreender a res pretendida A simples posse de chave falsa no entanto por mais suspeita que seja não passa de autêntico ato preparatório teoricamente impunível Excepcionalmente porém desde que satisfeitas as elementares específicas pode tipificar a contravenção do art 25 da LCP Para representar pelo menos o início de execução elemento objetivo da tentativa é necessário ao menos que o agente esteja introduzindo o instrumento falso na fechadura quando é interrompido por causa estranha à sua vontade art 14 II do CP 104 Mediante concurso de duas ou mais pessoas IV Finalmente estamos diante da última mais complexa e mais polêmica das qualificadoras elencadas para o furto Para melhor interpretála devese começar repassando as manifestações de alguns dos principais especialistas a partir inclusive de Nélson Hungria O magistério de Hungria pode ser sintetizado no seguinte tratase de crime eventualmente coletivo devendose em princípio observar as regras sobre a participação criminosa concurso de pessoas com algumas modificações a necessidade da presença in loco dos concorrentes ou seja participação efetiva na fase executiva é necessária uma consciente combinação de vontades sendo insuficiente uma adesão voluntária mas ignorada É irrelevante que algum dos participantes seja inimputável ou isento de pena pela mesma razão é indiferente que apenas um seja identificado Ajuste prévio que não chega sequer a ser tentado é impunível Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 4467 Para Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 251 a qualificadora pretende impedir a conjugação de esforços e evitar o enfraquecimento da defesa privada é indispensável acordo de vontades sob pena de caracterizar a autoria colateral a exemplo de Hungria a inimputabilidade de qualquer dos participantes não elimina a qualificadora que nesse particular deve ser avaliada sob o critério objetivo é aplicável ao instigador a agravante genérica Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 199 por sua vez preleciona não se exige a presença dos coautores na fase executória nem ajuste prévio ou combinação bastando a consciência recíproca de cooperar na ação comum o fundamento do gravame reside na maior eficiência do crime organizado ou associado É irrelevante a inimputabilidade de qualquer dos concorrentes Disciplinase pela previsão do concurso de pessoas Damásio de Jesus Direito Penal v 2 p 3256 por seu turno defende é desnecessária a presença in loco dos concorrentes lembrando a autoria mediata a exemplo de Fragoso adverte que comete crime quem de qualquer modo concorre para ele é desnecessário acordo prévio e como a lei não faz nenhuma exigência devemse aplicar os princípios do concurso de pessoas Em apertada síntese procuramos retratar o pensamento desses ilustres penalistas que fizeram escola entre nós Numa coisa praticamente todos concordam com mais ou menos restrições para a boa interpretação dessa qualificadora devemse aplicar os princípios orientadores do concurso de pessoas com o que aliás estamos de pleno acordo A partir daí começam profundas diferenças especialmente com o advento da reforma penal de 1984 Lei n 7209 que deu outra roupagem ao concursus delinquentium a começar pela terminologia que de coautoria espécie passou a concurso de pessoas gênero além de acrescentar que cada concorrente responde na medida de sua culpabilidade 11 Concursus delinquentium e concurso de duas ou mais pessoas Incorre em grave equívoco quem afirmar que segundo nosso Código Penal comete crime quem de qualquer forma concorre para ele Na realidade a assertiva não é verdadeira e o legislador não pode ser acusado desse paradoxo pois em nenhum momento incidiu nesse erro crasso pois nem mesmo implicitamente afirmou que comete o crime quem de qualquer modo concorre para ele Na verdade o texto legal afirma que quem de qualquer modo concorre para o crime incide nas penas a ele cominadas o que são coisas muito diferentes A contrario sensu com efeito está afirmando implicitamente que não o comete quem de qualquer modo concorre para o crime Nesse sentido precisa e enfática é a crítica de Weber Martins Batista O furto e o roubo no Direito e no Processo Penal p 189 que merece ser transcrita in verbis O Código Penal não comete a heresia de consagrar expressa ou implicitamente que comete o crime quem de qualquer forma concorre para ele O que está na lei corretamente é que incide nas penas cominadas ao crime expressão com que implicitamente se afirma que não o comete quem de qualquer modo concorre para ele Comete o crime ninguém afirma de outro modo quem participa materialmente de sua execução Não fora isso e seria desnecessária a norma de extensão do art 29 do Código Penal Enfim todos os que concorrem moral ou materialmente para o crime são punidos pelo Código Penal art 29 caput mas a qualificadora somente se configurará no furto cometido por duas ou mais pessoas que necessariamente devem encontrarse no local do crime pois como adverte Weber Martins O furto e o roubo no Direito e no Processo Penal p 189 o furto só será cometido mediante o concurso de duas ou mais pessoas se estas participarem na fase executiva do delito Somente assim se pode fazer presente a maior temibilidade e eficiência da delinquência coletiva que seria o fundamento da maior punibilidade O próprio Supremo Tribunal Federal já reconheceu ainda na vigência da lei anterior a necessidade da participação efetiva dos agentes na execução do crime Argumentou então com muita propriedade o relator Ministro Djaci Falcão Acórdão da 2ª Turma do STF j 16101979 RTJ 951242 que se o legislador visa no caso a punir mais gravemente a soma de esforços para a prática do crime circunstância a que se agrega a da redução de capacidade de defesa da vítima razão a nosso ver dessa agravação parecenos evidente que o preceito deva ser interpretado teleologicamente como endereçado à hipótese de cooperação de agentes na fase de execução do crime única hipótese em que aquelas duas circunstâncias se fazem realmente presentes Mais não precisaria ser dito 111 Teoria monística temperada pelo conceito restritivo de autor Incorre em erro grosseiro quem sustentando entendimento contrário continua afirmando que não há mais diferença entre autor principal e autor secundário no atual sistema brasileiro Na verdade não se pode ignorar que embora a reforma penal de 1984 tenha mantido a teoria monística da ação adotou a teoria restritiva de autor Ver nosso Tratado de Direito Penal v 1 Cap Concurso de Pessoas item 51 fazendo perfeita distinção entre autor e partícipe que abstratamente incorrem na mesma pena cominada ao crime que praticarem mas que concretamente variará segundo a culpabilidade de cada participante art 29 e 1º e 2º em relação ao partícipe variará ainda de acordo com a importância causal da sua contribuição Ora esse tratamento diferenciado de autor e partícipe adotado pela reforma penal de 1984 não pode ser ignorado quando estivermos perante a qualificadora do crime de furto que segundo a orientação dominante deve ser orientada pelos princípios que fundamentam o instituto concurso de pessoas especialmente considerando que um sistema jurídico não pode abrir mão da harmonia e coerência características fundamentais que devem presidilo 112 O ajuste e a determinação são em tese impuníveis O ajuste e a determinação reconhece o próprio Código Penal art 31 são penalmente irrelevantes se pelo menos não participarem de sua execução aliás não constituem nem agravante genérica quanto mais qualificar um crime Nesse particular já era o magistério do velho Hungria que continua com a razão ao exigir para configurar a qualificadora a presença in loco dos concorrentes isto é a participação efetiva na execução do crime Enfim para reconhecer a configuração da qualificadora devemse observar os princípios orientadores do instituto concurso de pessoas notadamente a distinção entre coautoria e participação a começar pela necessidade da causalidade física e psíquica que passamos a analisar 113 Coautoria e participação em sentido estrito Coautoria é a realização conjunta por mais de uma pessoa de uma mesma infração penal Coautoria é em última análise a própria autoria É desnecessário um acordo prévio como exigia a antiga doutrina bastando a consciência de cooperar na ação comum É a atuação consciente de estar contribuindo na realização comum de uma infração penal A resolução comum de executar o fato é o vínculo que converte as diferentes partes em um todo único Todos participam da realização do comportamento típico sendo desnecessário que todos pratiquem o mesmo ato executivo Basta que cada um contribua efetivamente na realização da figura típica e que essa contribuição possa ser considerada importante no aperfeiçoamento do crime Na coautoria não há relação de acessoriedade mas a imediata imputação recíproca visto que cada um desempenha uma função fundamental na consecução do objetivo comum O decisivo na coautoria segundo a visão finalista é que o domínio do fato pertença aos vários intervenientes que em razão do princípio da divisão de trabalho apresentamse como peça essencial na realização do plano global 1131 Participação em sentido estrito O Código Penal não define o que deve ser entendido por participação A participação em sentido estrito como espécie do gênero concurso de pessoas é a intervenção em um fato alheio o que pressupõe a existência de um autor principal O partícipe não pratica a conduta descrita pelo preceito primário da norma penal mas realiza uma atividade secundária que contribui estimula ou favorece a execução da conduta proibida Não realiza atividade propriamente executiva A norma que determina a punição do partícipe implica uma ampliação da punibilidade de comportamentos que de outro modo seriam impunes pois as prescrições da Parte Especial do Código não abrangem o comportamento do partícipe Para que a contribuição do partícipe ganhe relevância jurídica é indispensável que o autor ou coautores iniciem pelo menos a execução da infração penal Por derradeiro qualquer que seja a forma ou espécie de participação é indispensável a presença de dois requisitos eficácia causal e consciência de participar na ação de outrem É insuficiente a exteriorização da vontade de participar Não basta realizar a atividade de partícipe se esta não influir na atividade final do autor Não terá relevância a participação se o crime não for pelo menos tentado Por outro lado é indispensável saber que coopera na ação delitiva de outrem mesmo que o autor desconheça ou até recuse a cooperação O partícipe precisa ter consciência de participar na ação principal e no resultado 1132 Causalidade física e psíquica elemento objetivo subjetivo De plano deixamos consignado que não aceitamos a afirmação de que a qualificadora do concurso de pessoas tem natureza puramente objetiva para nós essa qualificadora não tem caráter objetivo e tampouco subjetivo mas objetivosubjetivo objetivo quanto à necessidade da presença efetiva de duas ou mais pessoas na execução do crime independentemente da responsabilidade ou da punibilidade do comparsa subjetivo quanto à exigência de participação in concreto dos concorrentes efetivamente contribuindo conscientemente na realização efetiva do crime de furto A causalidade é apenas o elemento material objetivo do concurso de pessoas a contribuição causal física importante necessária mas insuficiente para aperfeiçoar o instituto É indispensável a presença ao mesmo tempo de um elemento subjetivo a vontade e a consciência de participar da obra comum O concurso de pessoas compreende não só a contribuição causal puramente objetiva mas também a contribuição subjetiva pois como diz Soler Derecho Penal argentino p 240 participar não quer dizer só produzir mas produzir típica antijurídica e culpavelmente um resultado proibido Assim não basta a constatação puramente objetiva da existência de mais de um indivíduo na cena do crime ou no cenário criminal é indispensável comprovar a efetiva contribuição e a existência real dos dois elementos objetivosubjetivo que acabamos de examinar sob pena de não se configurar a qualificadora 114 Participação impunível impede a configuração da qualificadora Verificamos que a participação está condicionada a dois requisitos fundamentais eficácia causal e consciência de participar na ação comum De outro lado sabese que em regra o crime não será punido se não for pelo menos tentado ou seja as duas primeiras fases do iter criminis elaboração mental e preparação do crime não são puníveis desde que esta última não constitua em si mesma algum crime Na mesma linha de orientação estão as formas de participação que o art 31 do Código Penal exemplifica como ajuste determinação instigação e auxílio A participação em um crime que não chegou a se iniciar não teve eficácia causal e sem essa eficácia não há falar em participação criminosa Nessas circunstâncias como atividade acessória que é a participação em qualquer de suas formas não será punível Em relação à qualificadora a interpretação não pode ser outra sob pena de consagrarse a odiosa responsabilidade penal objetiva evocandose verdadeiro direito penal de autor Com efeito a conduta de cada participante deve integrarse à corrente causal determinante do resultado Nem todo comportamento por essa razão constitui participação ou no caso a qualificadora em exame pois precisa ter eficácia causal provocando facilitando ou ao menos estimulando a realização da conduta principal Por outro lado deve existir também repetindo um liame psicológico entre os vários participantes ou seja consciência de que participam na obra comum A ausência desse elemento psicológico desnatura o concurso eventual de pessoas transformandoo em condutas isoladas e autônomas Ora tratandose de obras ou condutas isoladas autônomas não se pode falar em concurso de pessoas que traria implícito aquele fundamento majorativo da qualificadora 115 Autoria colateral atipicidade da qualificadora do concurso de pessoas A ausência do vínculo subjetivo não apenas afasta o concurso de pessoas como já destacamos mas também impede a configuração da qualificadora do art 155 4º IV que não passaria de circunstância puramente objetiva uma espécie de autoria mediata Há autoria colateral quando duas ou mais pessoas ignorando uma a contribuição da outra realizam condutas convergentes objetivando a execução da mesma infração penal É o agir conjunto de vários agentes sem reciprocidade consensual no empreendimento criminoso que identifica a autoria colateral A ausência do vínculo subjetivo entre os intervenientes é o elemento caracterizador da autoria colateral Ora o reconhecimento da qualificadora nessas circunstâncias quando um dos agentes ignora que participa ou contribui na subtração praticada por outrem implica autêntica responsabilidade objetiva logo os agentes devem responder isoladamente pelo crime de furto simples 12 Autoria mediata impossibilidade da qualificadora de concurso de pessoas Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 199 e Damásio de Jesus Direito Penal v 2 p 325 sustentam a desnecessidade da presença dos coautores na fase executória Fragoso ou no local da execução Damásio para a configuração da qualificadora mediante concurso de duas ou mais pessoas lembrando Damásio aliás a figura do mandado que segundo afirma também qualificaria o crime É autor mediato quem realiza o tipo penal servindose para a execução da ação típica de outra pessoa como instrumento A teoria do domínio do fato molda com perfeição a possibilidade da figura do autor mediato O autor mediato realiza a ação típica por meio de outrem que atua sem culpabilidade As hipóteses mais comuns de autoria mediata decorrem do erro da coação irresistível e do uso de inimputáveis para a prática de crimes o que não impede a possibilidade de sua ocorrência em ações justificadas do executor quando por exemplo o agente provoca deliberadamente uma situação de exclusão de criminalidade para aquele como já referimos neste trabalho Em todas essas hipóteses normalmente o executor age sozinho isto é sem a presença do homem de trás ou mandante desaparecendo por conseguinte aquele fundamento da agravação da censura comportamental Assim em princípio em caso de autoria mediata não há fundamento político ou jurídico para a agravação da sanção penal por meio da qualificadora 13 Comunicabilidade ou incomunicabilidade da qualificadora desvio subjetivo de condutas Esta é outra regra prevista para o instituto de concurso de pessoas de absoluta pertinência à qualificadora mediante concurso de pessoas sob pena de consagrarse autêntica responsabilidade objetiva Com efeito é possível que a qualificadora se aplique a um e não a outros concorrentes do mesmo crime Na verdade essa previsão legal tem como corolário o desvio subjetivo de condutas qual seja o agente responde pelo que quis segundo o que quis O art 30 do Código Penal determina que as circunstâncias e as condições de caráter pessoal não se comunicam salvo quando elementares do crime Por serem pessoais dizem respeito exclusivamente ao agente que as tem como atributo Cada agente responderá de acordo com suas circunstâncias e condições pessoais Na verdade seria uma heresia aplicar esse mandamento como dogma na Parte Geral e agora na Parte Especial especificamente sobre o crime in concreto negarlhe vigência principalmente porque serve para dobrar a pena sem qualquer possibilidade de dosála A comunicabilidade das circunstâncias objetivas quando desconhecidas do agente já era criticada pela doutrina sob o império da lei anterior que a via como autêntica responsabilidade objetiva A reforma de 1984 comprometida inteiramente com o direito penal da culpabilidade procurou afastar todo e qualquer resquício da responsabilidade objetiva Mas para que essa filosofia se faça verdadeira é indispensável adequar os postulados da Parte Geral do Código Penal à velha Parte Especial que necessariamente deve receber os influxos da moderna orientação consagrada nos fundamentos gerais do Código A comunicabilidade das circunstâncias objetivas e das elementares do crime deve ser examinada nos termos do art 29 caput na medida da culpabilidade de cada participante É imperioso que o participante tenha agido ao menos culposamente em relação à qualificadora isto é em relação à contribuição na ação de outrem para que possa haver comunicabilidade Esses postulados à evidência aplicamse integralmente à qualificadora do concurso de pessoas sob pena de se reconhecer a famigerada responsabilidade objetiva Assim aquele indivíduo que pratica a subtração da coisa ignorando que estava recebendo o auxílio de alguém não pode responder pelo crime qualificado agora o concorrente que conscientemente contribui com o autor direto da ação que ignorava a contribuição como dissemos responde pela qualificadora O princípio do desvio subjetivo de condutas autoriza essa interpretação um dos participantes responde pelo furto qualificado e outro por furto simples sem nenhum problema de ordem dogmática 14 Punibilidade desproporcional da qualificadora do concurso de pessoas Para o legislador brasileiro praticar um furto mediante a participação de mais de uma pessoa constitui circunstância mais grave que cometer um roubo nas mesmas circunstâncias Essa é sem sombra de dúvida a única conclusão a que se pode chegar ao se comparar a punibilidade que o Código Penal atribui aos dois crimes praticados mediante concurso de pessoas no caso do roubo a pena é elevada de um terço até metade ao passo que na hipótese de furto a pena é duplicada dois a quatro anos Em outros termos no crime de furto o concurso de pessoas qualifica o crime enquanto no roubo não passa de simples causa de aumento majorante Constatase de plano que estamos diante de uma questão de extrema relevância jurídica necessitando ser enfrentada num plano superior acima portanto da legislação infraconstitucional Tratase com efeito de flagrante violação do princípio da proporcionalidade representado pela duplicação da pena na hipótese do crime de furto quando praticado mediante concurso de pessoas A equação é simples tanto no furto como no roubo o concurso de pessoas qualifica o crime com a diferença de que no primeiro a pena dobra enquanto no segundo que é mais grave é acrescida de um terço até metade Os dois tipos penais protegem em princípio o mesmo bem jurídico o patrimônio o roubo como crime complexo protege ao mesmo tempo a liberdade individual e a integridade física e a saúde que são simultaneamente atingidos pela ação incriminada Logo o roubo é um crime bem mais grave como se verifica pelos limites mínimo e máximo das sanções cominadas para o furto um a quatro anos de reclusão para o roubo quatro a dez anos No entanto paradoxalmente a participação de mais de uma pessoa no crime de roubo representa majoração de pena bem menor que a prevista para o crime de furto E convenhamos a simples mudança terminológica qualificadora no furto e causa de aumento no roubo não altera a essência das circunstâncias fáticojurídicas praticar a subtração mediante concurso de pessoas Nesse sentido merece ser invocada mais uma vez a doutrina de Lenio Streck Parecer na Ap Crim n 70000284455 2ª CCrim do TJRGS que preleciona Ora no furto a presença de mais de uma pessoa não coloca em risco a integridade física da vítima e sim facilita o agir subtraente já no roubo a presença de mais pessoas coloca em risco sobremodo a integridade física da vítima Não obstante isto o Código Penal valoriza mais a coisa propriedade privada que a vidaintegridade física Ademais essa desuniformidade de tratamento de situações semelhantes fere também o princípio da isonomia igualmente assegurado constitucionalmente 15 Furto de veículo automotor qualificadora especial A Lei n 9426 de 24 de dezembro de 1996 cria uma nova figura de furto qualificado distinta daquelas relacionadas no 4º do art 155 sempre que a coisa móvel objeto da ação consistir em veículo automotor automóveis caminhões lanchas aeronaves motocicletas jet skis etc Com essa nova qualificadora 5º pretendeuse inibir a conduta de subtrair veículo automotor exasperando exageradamente a sanção correspondente fixandoa entre três e oito anos de reclusão O texto legal é o seguinte A pena é de reclusão de 3 três a 8 oito anos se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior Essa nova previsão merece objetivamente dois destaques a esqueceuse de tipificar o chamado furto de uso tão corriqueiro na atualidade que reconhecidamente constitui figura atípica e b para a configuração da nova qualificadora não basta que a subtração seja de veículo automotor é indispensável que este venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior Se o veículo automotor ficar na mesma unidade federativa não incidirá a qualificadora pois essa elementar integra o aspecto material dessa especial figura qualificada Sintetizando os furtos de veículos automotores em geral não são atingidos pela nova qualificadora acrescentada pela referida lei Em outros termos as tradicionais e costumeiras subtrações de veículos automotores que perturbam o quotidiano do cidadão não serão alcançadas pela nova qualificadora se não vierem efetivamente a ser transportados para outros Estados ou para o exterior Com efeito a incidência da qualificadora nos termos legais exige que o veículo tenha ultrapassado os limites territoriais do Estadomembro ou do próprio território nacional pois se trata de elementar objetiva espacial 151 Dois momentos consumativos distintos Essa qualificadora cria um problema sério sobre o momento consumativo da nova figura delitiva Afinal pode um tipo penal apresentar dois momentos consumativos distintos um no momento da subtração e outro quando ultrapassar a fronteira de um Estado federado ou do próprio País Com efeito quando o agente pratica a subtração de um veículo automotor em princípio é impossível saber com segurança se será transportado para outro Estado ou para fora do território nacional Assim essa qualificadora somente se consuma quando o veículo ingressa efetivamente em outro Estado ou em território estrangeiro Na verdade não basta que a subtração seja de veículo automotor É indispensável que este venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior atividade que poderá caracterizar um posterius em relação ao crime anterior já consumado Nessas circunstâncias é impossível em regra reconhecer a tentativa da figura qualificada quando por exemplo um indivíduo é preso no mesmo Estado dirigindo um veículo furtado Paradoxalmente fugindo completamente à tradição brasileira em relação aos crimes contra o patrimônio a nova qualificadora deixou de cominar a pena pecuniária Assim diante do princípio da reserva legal não se pode imaginar que a supressão seja decorrência de mero esquecimento que aliás ainda que tenha ocorrido será irrelevante Resultado não há previsão legal de pena de multa para essa hipótese 152 Furto de veículo automotor para uso e de componentes de veículo atipicidade Não apenas a subtração de veículo automotor para uso continua sendo uma figura atípica como a subtração de componentes do veículo como pneus rodas motor acessórios etc não tipifica o furto qualificado do 5º uma vez que a eles o texto legal não se refere Restará logicamente a configuração do furto normal Realizamos apenas uma análise sucinta das principais inovações trazidas pela lei epigrafada 153 Furto de uso intenção de restituir Nosso Código Penal de 1940 criminaliza somente a subtração com animus definitivo da coisa alheia art 155 Ocorre o denominado furto de uso quando alguém indevidamente subtrai coisa alheia infungível para utilizála momentaneamente restituindoa na íntegra à esfera de disponibilidade do sujeito passivo Conduta que satisfaça essas características não excede os limites do ilícito civil Constitui em outros termos figura atípica perante o atual Código Penal O furto de uso também possui elementos normativo e subjetivo O elemento objetivo caracterizase pela pronta restituição o subjetivo pelo fim especial de uso momentâneo A locução para si ou para outrem caracterizadora do elemento subjetivo especial do tipo constitui elementar subjetiva definidora do propósito de assenhorearse em definitivo da res furtiva Exatamente esse especial fim de agir distingue a subtração tipificada no art 155 do CP e o conhecido furto de uso Neste sem sombra de dúvida a finalidade especial deve ser o uso momentâneo da res e não seu apossamento definitivo embora em ambos esteja presente o dolo constituído pela vontade consciente de subtrair coisa alheia móvel Para adequarse à descrição típica do crime de furto é insuficiente que o agente pretenda apenas usar momentaneamente a coisa alheia é indispensável que o animus furandi isto é a intenção de apoderarse em definitivo seja o móvel de sua ação De modo geral se exigem para reconhecer o crime de furto de uso os seguintes requisitos a devolução rápida quase imediata da coisa alheia b restituição integral e sem dano do objeto subtraído c devolução antes que a vítima constate a subtração d elemento subjetivo especial fim exclusivo de uso 1531 Restituição in integro do objeto furtado para uso A coisa deve ser restituída integralmente isto é intacta em si mesma e em seus acessórios no próprio local em que fora subtraída Assim a restituição in integro é elemento constitutivo do furto de uso O simples abandono da res é ato possessório incompatível com a ação de quem pretendia apenas usar na medida em que o abandono ocorre quando o proprietário ou possuidor renunciando à posse se desfaz da coisa Nesse sentido já pontificava Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 245 afirmando que A res deve ser devolvida a local em que seja exercível o imediato poder de disposição do dono se o agente a deixa alhures sem qualquer aviso ao proprietário assume o risco de que não se opere a restituição pouco se lhe dá que esta se realize ou não e a hipótese se equipara à do ladrão que depois de assenhorearse da coisa resolve abandonála o que não o exime de responder a título de furto 154 Subtração de veículo para fuga de perseguição policial A subtração de veículo alheio por exemplo para usálo em fuga de perseguição policial não exclui o elemento subjetivo do furto não apenas porque o motivo é irrelevante à tipificação desse crime mas também porque o propósito de evadirse torna evidente a ausência da intenção de restituílo Incumbe ao réu demonstrar a inexistência de dolo no furto de uso especialmente se o objeto material da subtração não for por ele restituído ou deixado no local em que foi subtraído Usar um veículo sem autorização do dono ou possuidor quer para fugir da polícia quer devolvendoo danificado é como sustenta Guilherme de Souza Nucci Código Penal comentado p 427 o modo que o autor possui de demonstrar a sua franca intenção de dispor da coisa como se não pertencesse a outrem Além disso é preciso haver imediata restituição não se podendo aceitar lapsos temporais exagerados Logicamente havendo a subtração de um veículo para dar uma volta sendo devolvido pouco tempo depois batido ou danificado ou ainda com razoável consumo de combustível não se pode negar que houve diminuição no patrimônio da vítima nesses casos caracterizou se o crime de furto 16 Furto de energia equiparação a coisa móvel O Código Penal brasileiro a exemplo do Código Penal Rocco de 1930 art 624 equiparou a coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico Essa opção do legislador de 1940 fundamentouse na divergência doutrinal sobre a qualificação de coisa atribuída à energia elétrica nessa linha negavase a possibilidade de admitir a tipificação de furto à apropriação de energia Partidário dessa corrente Fontán Balestra Tratado de Derecho Penal Buenos Aires 1969 t 5 p 440 afirmava que a energia elétrica não tem corporalidade característica essencial das coisas e por essa razão não podia integrar a noção jurídica de coisa objeto material de furto O direito civil pode socorrerse da analogia para equiparar a eletricidade à coisa não o pode contudo o direito penal que o veda ao menos in malam partem sustentava Balestra Objetivando evitar a impunidade da subtração de energia ou no mínimo o debate sobre o tema muitos códigos dos países ocidentais adotaram a equiparação de uma coisa a outra Foi o que ocorreu como afirma Weber Martins Batista O furto e o roubo no Direito e no Processo Penal p 103 na Alemanha com a lei de 09041900 na Suíça com a de 24061902 na Espanha com a lei de 10011941 etc Destaca Luiz Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 373 que a energia deve ser suscetível de apossamento podendo ser separada da substância ou matéria a que está ligada ou ainda de sua fonte geradora 161 Uso indevido de energia furto ou estelionato No entanto nem todo uso indevido de energia elétrica vem a se adequar à conduta tipificada como furto art 155 3º Na verdade a energia elétrica pode ser desviada antes ou depois do medidor oficial da companhia energética Quando esse desvio ocorre antes do medidor oficial em nossa concepção configura a efetiva subtração de energia elétrica que legalmente é equiparada a coisa móvel tipificandose o crime de furto A figura do furto pressupõe uma ligação clandestina desde a origem ilícita Ademais essa subtração nada tem que a torne qualificada amoldandose por isso com perfeição à figura do furto simples ao contrário do que normalmente se tem entendido Seria demais além de suportar uma ficção de coisa ainda agravar exageradamente uma subtração simples Contudo quando o desvio da energia ocorre após o medidor o agente para subtraíla necessita fraudar a empresa fornecedora induzindoa a erro causandolhe um prejuízo em proveito próprio A ligação da energia continua oficial o fornecedor ludibriado acredita que a está fornecendo corretamente desconhecendo o estratagema adotado pelo consumidor Enfim nessa hipótese com certeza a conduta amoldase à figura do estelionato A ligação lícita preexistente afasta uma conduta cujo verbo nuclear é subtrair coisa alheia móvel que pressupõe a inexistência da posse do objeto subtraído 162 Equiparação aberta qualquer energia que tenha valor econômico Mas o dispositivo em exame equipara a coisa móvel além da energia elétrica também qualquer outra que tenha valor econômico A Exposição de Motivos justificouse da seguinte forma Para afastar qualquer dúvida é expressamente equiparada à coisa móvel e consequentemente reconhecida como possível objeto de furto a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico Toda energia economicamente utilizável suscetível de incidir no poder de disposição material e exclusiva de um indivíduo como por exemplo a eletricidade a radioatividade a energia genética dos reprodutores etc pode ser incluída mesmo do ponto de vista técnico entre as coisas móveis a cuja regulamentação jurídica portanto deve ficar sujeita item n 56 Passadas seis décadas podese ampliar o rol exemplificativo da Exposição de Motivos lembrando por exemplo da energia solar térmica luminosa sonora mecânica atômica etc Sobre a energia genética tão em voga Magalhães Noronha já destacava que o esperma do reprodutor é coisa tanto como o leite que se ordenha Assim concluía Noronha apesar da diferente forma de apoderarse no caso por meio da cobertura da fêmea inegavelmente se deve concluir que a hipótese é adequada ao caput do art 155 Devese evidentemente considerar que Magalhães Noronha não conheceu as técnicas de inseminação artificial in vitro proveta etc Na verdade o modo ou forma de subtrair a energia genética não altera em tese sua tipificação criminal 163 Natureza da subtração de energia permanente ou instantânea Primeiramente se deve decidir a natureza do crime de subtrair energia na medida em que há inúmeras espécies de energia algumas delas podem caracterizar crime permanente e outras quem sabe crime continuado Em relação à energia elétrica a mais comum a ligação clandestina e o uso prolongado dias meses e até anos caracterizam crime permanente ou crime continuado A importância da solução dessa questão reside na diferença da punibilidade de uma e outra situação pois no caso de configurar crime continuado incidirá a majoração prevista no art 71 do Código Penal Como tivemos oportunidade de definir ocorre crime continuado quando o agente mediante mais de uma conduta ação ou omissão pratica dois ou mais crimes da mesma espécie que pelas condições de tempo lugar maneira de execução e outras semelhantes devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro São diversas ações cada uma em si mesma criminosa que a lei considera por motivos de política criminal como um crime único Há portanto reiteração da ação inicial Por outro lado permanente é aquele crime cuja consumação se alonga no tempo dependente da atividade do agente que poderá cessar quando este quiser cárcere privado sequestro Crime permanente não pode ser confundido com crime instantâneo de efeitos permanentes homicídio furto cuja permanência não depende da continuidade da ação do agente O que se alonga no tempo não são os efeitos mas a atividade do agente consumadora da infração penal Com efeito no crime permanente embora a ação praticada seja única ela não se esgota na execução como ocorre nos crimes instantâneos mas se prolonga no tempo Assim na subtração de energia elétrica considerase consumado o crime quando o agente faz a ligação e começa a usufruir da energia mas ele continua a consumar se enquanto perdurar a fruição da res sem solução de continuidade enquanto não for interrompida Logo estamos perante um crime permanente cuja consumação se protrai no tempo 164 Furto de energia e furto de sinal de TV a cabo O art 155 3º equipara a coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico Certamente sinal de TV a cabo não é energia elétrica devese examinar por conseguinte seu enquadramento na expressão genérica qualquer outra contida no dispositivo em exame A locução qualquer outra referese por certo a energia que apenas por razões linguísticas ficou implícita na redação do texto legal mas apesar de sua multiplicidade energia solar térmica luminosa sonora mecânica atômica genética entre outras inegavelmente sinal de TV não é nem se equipara a energia seja de que natureza for Na verdade energia se consome se esgota diminui e pode inclusive terminar ao passo que sinal de televisão não se gasta não diminui mesmo que metade do País acesse o sinal ao mesmo tempo ele não diminui ao passo que se fosse a energia elétrica entraria em colapso Não se pode adotar interpretação extensiva para sustentar que o 3º equiparou a coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra coisa quando na verdade se refere a qualquer outra energia Se a pretensão do legislador fosse essa equiparar coisa móvel a coisa que tenha valor econômico poderia ter utilizado uma forma mais clara por exemplo equiparase à coisa móvel qualquer outra que tenha valor econômico Afora o fato de em não sendo energia não poder ser objeto material do crime de furto o sinal de televisão tampouco pode ser subtraído pois como já afirmamos subtrair significa retirar surrupiar tirar às escondidas a coisa móvel de alguém Ora quem utiliza clandestinamente sinal de televisão não o retira e tampouco dele se apossa não havendo qualquer diminuição do patrimônio alheio que em última instância é o bem jurídico protegido no crime de furto Nesse sentido sustenta João Eduardo Grimaldi da Fonseca O furto de sinal de televisão a cabo Bol do IBCCrim 10318 jun de 2001 com precisão Não há desfalque no patrimônio o prejuízo decorre do que a empresa em virtude da utilização indevida do sinal que retransmite deixa de receber não do que desta se subtrai Por outro lado subtrair não é a simples retirada da coisa do lugar em que se encontrava é necessário a posteriori sujeitála ao poder de disposição do agente e na hipótese o uso clandestino de sinal de televisão não apresenta aquele elemento subjetivo de apossamento para si ou para outrem 17 Pena e ação penal No furto simples a pena é de reclusão de um a quatro anos no furto noturno é majorada em um terço no privilegiado pode ter a reclusão substituída por detenção diminuída de um a dois terços ou substituída por multa no furto qualificado a pena cominada é exatamente o dobro da pena da figura simples qual seja dois a oito anos de reclusão e na nova qualificadora 5º a reclusão será de três a oito anos A pena de prisão será cumulativa com a de multa exceto no furto privilegiado em que aquela pode ser substituída por esta e na hipótese do 5º em que a reclusão foi cominada isoladamente Haverá isenção de pena se for praticado contra ascendente descendente ou cônjuge na constância da sociedade conjugal A natureza da ação penal é pública incondicionada salvo nas hipóteses do art 182 quando será condicionada à representação J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A a Furto simples O crime de furto consumase no momento ainda que breve em que o agente tornase possuidor da res furtiva sendo desnecessária a posse mansa e pacífica do bem Precedentes STJ REsp 899482RS Rel Min Carlos Fernando Mathias j 9 102007 Se os fiscais do estabelecimento comercial estavam a vigiar a acusada e após a subtração e ocultação dos bens subtraídos é abordada já fora do estabelecimento temse caracterizada a figura do crime impossível vez que jamais conseguiria chegar à consumação por absoluta ineficácia do meio empregado diante do sistema de segurança do estabelecimento vítima TJMG Apelação 100240393910400011 Rel Vieira de Brito j 1892007 Em havendo dúvida razoável acerca da possibilidade de se tratar na hipótese de coisa abandonada imperiosa é a absolvição do réu já que o apossamento de res derelicta não configura infração penal TJRS Apelação 70016095267 Rel Luís Gonzaga da Silva Moura j 1362007 Res derelicta não há crime quando a coisa estava abandonada TJRS Apelação 70018388298 Rel Amilton Bueno de Carvalho j 2132007 O delito de furto se consuma no momento em que o agente se torna possuidor da res subtraída Para que o agente se torne possuidor é prescindível que a res saia da esfera de vigilância da vítima bastando que cesse a clandestinidade Precedentes do STJ e do Pretório Excelso RTJ 135161192 Sessão Plenária STJ REsp 765704RS Rel Min Félix Fischer j 18102005 Furto Supermercado Segurança por meio de vigilância eletrônica Crime impossível Absoluta ineficácia do meio empregado Não configuração A presença de sistema eletrônico de vigilância no estabelecimento comercial não torna o agente completamente incapaz de consumar o furto logo não há que se afastar a punição a ponto de reconhecer configurado o crime impossível pela absoluta ineficácia dos meios empregados Precedentes STJ REsp 554233RS Rel Min Laurita Vaz j 2382005 Hipótese em que o réu acusado de furto simples foi absolvido nas instâncias inferiores por insuficiência de provas Incabível a hipótese de inversão do ônus da prova diante do fato de que a res furtiva foi apreendida em poder do acusado se a hipótese retrata situação em que o réu foi surpreendido com o objeto furtado dias após o fato narrado na exordial acusatória Ao réu compete negar os fatos a ele imputados e não a prova de sua inocência que é presumida Precedente do STF STJ REsp 633615RS Rel Min Gilson Dipp j 2892004 b Repouso noturno Aplicase a majorante prevista no art 155 1º do CP se o delito é praticado durante o repouso noturno período de maior vulnerabilidade pouco importando que tenha sido praticado em dependência não integrante do corpo principal da residência da vítima cf STFRE ED 117966SP 2ª Turma Rel Ministro Aldir Passarinho DJ de 2991989 Precedentes No caso foram subtraídas durante a madrugada roupas que estavam estendidas no varal da residência da vítima enquanto ela e sua família dormiam STJ REsp 920022RS Rel Min Félix Fischer j 2862007 Não incide a majorante do repouso noturno quando embora a subtração tenha ocorrido na madrugada não havia ninguém na residência onde se deu a subtração TJMG Apelação 104140501148520011 Rel Walter Pinto da Rocha j 143 2007 Aplicase a majorante prevista no art 155 1º do Código Penal se o delito é praticado durante o repouso noturno período de maior vulnerabilidade inclusive para estabelecimentos comerciais como ocorreu in casu Precedentes STJ REsp 704828RS Rel Min Félix Fischer j 282005 c Furto privilegiado Furto privilegiado O réu entrou no pátio da residência da vítima e subtraiu um botijão de gás trocandoo por drogas Reconhecida a forma privilegiada por restarem atendidos os requisitos do 2º do art 155 do Código Penal Princípio da bagatela Inaplicabilidade Descabe a aplicação do princípio da bagatela na medida em que o bem furtado possui expressão econômica significativa para o orçamento familiar da vítima empregada doméstica aposentada TJRS Apelação 70021197652 Rel Naele Ochoa Piazzeta j 632008 A existência de aparato de segurança no estabelecimento comercial não ilide de forma absolutamente eficaz a consumação do delito de furto Precedentes No caso de furto para efeito da aplicação do princípio da insignificância é imprescindível a distinção entre ínfimo ninharia e pequeno valor Este ex vi legis implica eventualmente furto privilegiado aquele atipia conglobante dada a mínima gravidade A interpretação deve considerar o bem jurídico tutelado e o tipo de injusto Verificase inaplicável in casu o princípio da insignificância sendo imperioso portanto dar prosseguimento à persecutio criminis in iudicio STJ REsp 961752RS Rel Min Félix Fischer j 29112007 Furto e dano qualificado Arts 155 e 163 III ambos do Código Penal Frasco de condicionador de cabelo e tubo contendo ativador de cachos Princípio da insignificância Intervenção estatal mínima Tipicidade da conduta em tese materialmente atípica Baixa periculosidade do réu Admitese em tese a atipicidade da conduta quando não adequada aos postulados materiais da norma penal incriminadora Desproporção à primeira vista entre a resposta estatal e a gravidade do fato STF HC 92364RJ Rel Min Ricardo Lewandowski j 2102007 Indispensável à aplicação do princípio da insignificância estejam comprovados o desvalor do dano o da ação e o da culpabilidade não bastando o pequeno valor da coisa furtada sob pena de criarse um direito ao cidadão que pratique subtração mínima em verdadeira afronta ao dever estatal de manutenção da ordem social TJDF Apelação 20050410108475 Rel Mário Machado j 1532007 Hipótese na qual o paciente juntamente com outro corréu teria em tese furtado um interfone residencial avaliado em cinquenta reais motivo pelo qual requer a aplicação do princípio da insignificância com o consequente trancamento da ação penal contra ele instaurada Ao considerar o delito como de bagatela permitindose a incidência do princípio da insignificância ao caso em virtude da obtenção de vantagem de pequeno valor monetário o Estado acabaria estimulando a prática reiterada de pequenos delitos Precedente Os furtos de pequeno valor não podem ser equiparados àqueles praticados por agentes que possuem personalidade voltada para a prática delituosa ou àqueles que praticam furtos vultosos Tratandose de réu primário e de bem de pequeno valor ocorrida a desclassificação do crime de furto qualificado para a figura típica simples podese aplicar o dispositivo legal a respeito do furto privilegiado STJ RHC 17892DF Rel Min Gilson Dipp j 6122005 Subtração de uma cabeça de gado avaliada em R 54000 quinhentos e quarenta reais No furto impossível o reconhecimento do privilégio na subtração de uma cabeça de gado avaliada em R 54000 quinhentos e quarenta reais TACrimSP Apelação 13793275 Rel Guilherme G Strenger j 1º72004 d Furto qualificado Desclassificase o delito de furto com abuso de confiança para o de apropriação indébita quando preexistente a detenção da coisa No caso em tela o agente na condição de funcionário de estabelecimento comercial apropriase de cheques de terceiro dados em pagamento de mercadoria TJPR Apelação 4035269 Rel Marques Cury j 25102007 Configura o crime de furto qualificado pela fraude art 155 4º II do Código Penal a conduta consistente no furto de água praticado mediante ligação clandestina que permitia que a água fornecida pela CAESB fluísse livremente sem passar pelo medidor de consumo STJ REsp 741665DF Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 18 102007 Furto qualificado Rompimento de obstáculo Escalada Ausência de exame de corpo de delito O exame de corpo de delito é indispensável para comprovar a materialidade do crime sendo que sua realização de forma indireta somente é possível quando os vestígios tiverem desaparecido por completo ou o lugar se tenha tornado impróprio para a constatação dos peritos Sendo possível realizar a perícia de local a prova testemunhal ou a confissão do acusado essa por expressa determinação legal não se prestam a suprir o exame de corpo de delito Precedentes Impõese afastar a incidência das qualificadoras porque na ausência de laudo pericial não existe prova concreta que comprove inequivocamente a materialidade do arrombamento ou da escalada STJ HC 85901MS Rel Min Laurita Vaz j 2792007 Furto qualificado Aplicação do art 155 2º Código Penal Impossibilidade A divergência jurisprudencial restou demonstrada visto que foram cumpridas as exigências do art 541 parágrafo único do Código de Processo Civil e do art 255 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça Incabível a aplicação do privilégio constante no art 155 2º do Código Penal em face da incidência da circunstância qualificadora Precedentes STJ REsp 718529SP Rel Min Laurita Vaz j 259 2007 Segundo entendimento desta Corte para fins de pagamento de seguro ocorre furto mediante fraude e não estelionato o agente que a pretexto de testar veículo posto à venda o subtrai v g REsp 226222RJ DJ 17121999 HC 8179GO DJ de 175 1999 Sendo o segurado vítima de furto é devido o pagamento da indenização pela perda do veículo nos termos previstos na apólice de seguro STJ REsp 672987MT Rel Min Jorge Scartezzini j 2692006 I O delito de furto assim como o de roubo consumase com a simples posse ainda que breve da coisa alheia móvel subtraída mediante violência ou grave ameaça sendo desnecessário que o bem saia da esfera de vigilância da vítima II Viola o princípio da legalidade a aplicação da majorante do crime de roubo resultante do concurso de pessoas ao crime de furto qualificado pela mesma circunstância STJ REsp 798760RS Rel Min Gilson Dipp j 1432006 Não é dado ao juiz sob o calor do princípio da proporcionalidade investir em tema da estrita competência legislativa transformando em majorante aquilo que o Código Penal trata como circunstância qualificadora do crime Assim o concurso de agentes no furto funciona como qualificadora e não nos moldes do que ocorre no roubo como majorante TJRS Apelação 70011143237 Rel Marcelo Bandeira Pereira 77 2005 O Código Penal é o código das pessoas maiores de idade Por isso entende o Relator a qualificadora do concurso de duas ou mais pessoas pressupõe nos crimes de furto e roubo por exemplo concurso de pessoas imputáveis Não é portanto qualificado o furto praticado por pessoa imputável e pessoa inimputável menor de 18 anos STJ HC 38097SP Rel Min Nilson Naves j 23112004 Furto qualificado Aplicação do privilégio Impossibilidade é inaplicável o privilégio no crime de furto quando este for qualificado por alguma das hipóteses previstas no 4º do art 155 do CP TACrimSP Apelação 14401291 Rel Maia da Cunha j 139 2004 Furto qualificado Abuso de confiança Valor da palavra da vítima para seu reconhecimento no crime de furto é impossível o afastamento da qualificadora do abuso de confiança praticado por empregado se a própria vítima afirma que acreditava no acusado TACrimSP Apelação 13642455 Rel Barbosa de Almeida j 2162004 Furto qualificado Fraude Agente que faz cartões eletrônicos clonados e com eles saca dinheiro das contas bancárias das vítimas Configuração pratica furto mediante fraude o agente que faz clones dos cartões magnéticos das vítimas e com eles efetua saques de dinheiro das suas contas bancárias TACrimSP Apelação 13776873 Rel Marcos Ramos j 1352004 Furto qualificado Art 155 4º II do CP Agente que mediante fraude subtrai energia elétrica Caracterização incorre nas penas do art 155 4º II do CP o agente que mediante fraude rompe os lacres metálicos dos links e o lacre plástico do relógio medidor de eletricidade e conecta a entrada da energia diretamente com a rede pública TACrimSP Apelação 13552211 Rel Almeida Sampaio j 352004 Furto de coisa comum Art 156 Subtrair o condômino coerdeiro ou sócio para si ou para outrem a quem legitimamente a detém a coisa comum Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos ou multa V art 168 do CP 1º Somente se procede mediante representação V art 100 1º do CP V arts 24 38 e 39 do CPP 2º Não é punível a subtração de coisa comum fungível cujo valor não excede a quota a que tem direito o agente D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias No Código Penal de 1890 o furto de coisa comum não recebia um tratamento autônomo independente Era abrangido pela seguinte previsão O crime de furto se cometerá ainda que a coisa pertença a herança ou comunhão em estado de indivisão art 334 Na verdade o furto de coisa comum como figura autônoma continua desconhecido em muitas legislações modernas que não o distinguem da figura simples O Código Penal de 1940 a exemplo do Código Penal Rocco de 1930 art 627 tipifica o furto de coisa comum como crime de natureza especial atribuindolhe sanção consideravelmente inferior comparada ao tipo simples Não deixa de ser mutatis mutandis uma espécie de furto privilegiado 2 Bem jurídico tutelado Tratase de modalidade especial do crime de furto distinguindose deste pela especial relação existente entre os sujeitos ativo e passivo e pelo objeto da subtração que deve ser comum a ambos os sujeitos Em outros termos bem jurídico tutelado são a posse legítima e a propriedade de coisa comum isto é pertencente aos sujeitos ativo e passivo simultaneamente 3 Sujeitos do crime Tratandose de crime próprio sujeito ativo somente pode ser o condômino coerdeiro ou sócio da coisa comum Essa condição do sujeito ativo é elementar do tipo e como tal comunicase a coautores e partícipes Damásio de Jesus Direito Penal v 2 p 332 não distingue sócio de pessoa jurídica regularmente constituída de sócio de simples sociedade de fato porque argumenta como a lei fala em sócio não fazendo qualquer distinção quanto à sua natureza é irrelevante que a sociedade seja legalmente constituída ou de fato Se o sujeito ativo está no entanto na posse da coisa comum o crime será o de apropriação indébita art 168 do CP e não o furto de coisa comum Sujeito passivo considerandose a natureza especial do crime são o condômino coproprietário coerdeiro ou sócio ou qualquer outro possuidor legítimo Se a subtração operarse contra possuidor ou detentor ilegítimo não se tipificaria o furto de coisa comum mas sim o furto previsto no art 155 4 Tipo objetivo adequação típica A ação típica a exemplo do artigo anterior é subtrair apenas o objeto material do crime a ser subtraído em vez de coisa alheia deve ser coisa comum de quem legitimamente a detém O conceito de subtração é exatamente o mesmo que procuramos externar quando examinamos crime de furto Logicamente para tipifïcarse o furto de coisa comum fazse necessário que esta se encontre legitimamente na detenção de outrem encontrandose contudo na posse do agente o crime será o de apropriação indébita art 168 havendo porém emprego de violência ou grave ameaça o crime será o de roubo a despeito de sua natureza comum O objeto material é a coisa móvel Imóvel a exemplo do furto e do roubo não pode ser objeto desse crime A coisa móvel tem de ser comum isto é de propriedade comum Se for fungível ou seja se puder ser substituída por outra coisa de mesma espécie quantidade e qualidade art 85 do CC a subtração será impunível art 156 2º do CP desde que não exceda o valor da quota do agente a despeito de revestirse do caráter de ilícita Tratandose porém de coisa infungível mesmo que o valor da coisa subtraída não supere o da quota individual o agente responderá por furto de coisa comum Enfim para incidir essa espécie de excludente de antijuridicidade especial é indispensável que concorram simultaneamente dois requisitos legais a que a coisa comum seja fungível b que seu valor não ultrapasse a quota a que o sujeito ativo tem direito art 156 2º Condomínio é a propriedade posse ou direito em comum isto é exercido por dois ou mais indivíduos simultaneamente coerdeiros são herdeiros de um mesmo espólio sócio é uma das pessoas que mediante contrato obrigamse a unir esforços e bens para a consecução de um fim comum Cada sócio herdeiro ou condômino tem seu direito limitado pelo direito dos demais logo subtraindo a coisa comum lesa o direito dos outros Preciso e insuperável era o magistério de Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 48 Na communio pro indiviso da propriedade de uma coisa cada comunheiro dispõe de uma cota ideal in toto et in qualibet parte e assim se um deles subtrai a coisa não está subtraindo coisa alheia mas ao mesmo tempo alheia e própria em cada uma de suas partículas 41 Sócio que furta da própria sociedade Questionase se o sócio pode ser sujeito ativo do crime de furto de coisa pertencente a sociedade regularmente constituída Sociedade irregular não tem personalidade jurídica e portanto se confunde com a figura dos sócios Para uma corrente o sócio pode subtrair coisa pertencente a pessoa jurídica na medida em que os conceitos do direito civil e do direito comercial não são recepcionados pelo direito penal e o patrimônio que serve a sociedade é patrimônio comum dos sócios O sócio que furta da sociedade pessoa jurídica comete o crime do art 155 e não o furto de coisa comum O patrimônio pertence exclusivamente à sociedade e não aos sócios pelo menos diretamente Nesse sentido também se manifestava Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 338 para quem em tal hipótese o patrimônio da sociedade não constitui patrimônio dos sócios sendo ela titular exclusiva do mesmo Em que pese a autorizada opinião de Hungria VII 46 a subtração de bens que integram o patrimônio da sociedade praticada pelo sócio que não tem a posse dos mesmos constitui furto art 155 assim como a apropriação indébita daqueles que em sua posse tiver será o crime do art 168 CP Há divergência doutrináriojurisprudencial A dúvida sobre a condição de sócio herdeiro ou condômino constitui questão prejudicial art 92 do CPP que deve ser dirimida fora do juízo criminal segundo a organização judiciária de cada Estado A regra é que seja da competência do Juizado de Família e Sucessões Nesse caso deve ser suspensa a instrução criminal enquanto se resolve a questão prejudicial Questão a ser dirimida referese aos bens adquiridos durante a conhecida união estável se estariam incluídos nos chamados bens em condomínio No matrimônio observado o regime de bens adotado não resta dúvida de que se faz presente o instituto do condomínio relativo aos bens comuns todos no regime da comunhão universal e dos aquestos nos demais regimes Na constância da sociedade conjugal pela natureza da relação não se pode falar em crime de furto E quando excepcionalmente isso puder ocorrer o agente será isento de pena art 181 Essa figura delitiva em princípio somente poderá surgir se os cônjuges estiverem judicialmente separados e nesse caso somente se procede mediante representação do cônjuge ofendido art 182I do CP Na novel união estável contudo é indispensável que se faça prova irrefutável não só de sua existência mas particularmente de seu caráter estável art 226 3º da CF Ainda que se configure eventualmente qualquer das figuras previstas no 4º do art 155 são inaplicáveis as qualificadoras no furto de coisa comum Havendo violência contudo contra a pessoa o crime não será este mas o de roubo e sem qualquer atenuação especial independentemente da natureza comum do objeto material da subtração 5 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo é constituído pelo dolo que é seu elemento subjetivo geral e pelo especial fim de agir que é seu elemento subjetivo especial O dolo é constituído pela vontade consciente de subtrair coisa comum isto é que seja objeto de comunhão seja com sócio condômino ou coerdeiro O elemento subjetivo especial do tipo por sua vez é representado pelo fim especial de apoderarse da coisa subtraída para si ou para outrem É indispensável por fim que o agente saiba que se trata de coisa comum Quando no entanto o agente por erro supuser que a coisa comum é alheia responderá igualmente pelo crime de furto comum Essa interpretação se justifica porque não se poderia por erro atribuirlhe a responsabilidade por um crime mais grave que aquele que efetivamente cometeu Contudo se subtrair coisa própria imaginando que era comum não responderá por crime algum Estarseá diante do que se chama de crime putativo que evidentemente crime não é 6 Consumação e tentativa 61 Consumação de furto de coisa comum Consumase o crime de furto de coisa comum com a retirada da coisa da esfera de disponibilidade da vítima coproprietária ou copossuidora assegurandose consequentemente a posse tranquila ainda que passageira por parte do agente enfim consumase quando a coisa sai da posse da vítima ingressando na do agente o assenhoreamento ocorre quando a coisa comum sai efetivamente da vigilância ou disponibilidade do ofendido Apesar da necessidade de a res sair da disponibilidade da vítima e estar na posse tranquila do agente também é possível que em tese ocorra a consumação do furto sendo o agente preso em flagrante Nesses casos como já referido não há possibilidade material por parte do ofendido de exercer o poder de disposição da coisa pois ignora seu paradeiro 62 Tentativa de furto de coisa comum O furto de coisa comum como crime material admite a tentativa Quando a atividade executória for interrompida no curso da execução por causas estranhas à vontade do agente configurase a forma tentada Em outros termos quando o processo executório for impedido de prosseguir antes de o objeto da subtração ser deslocado da esfera de vigilância e disponibilidade da vítima para a posse tranquila do agente não se pode falar em crime consumado Consumase o crime no momento em que a vítima não pode mais dispor da posse ou propriedade da coisa subtraída Caracterizase o crime tentado enfim quando o crime material não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente não chegando a res furtiva a sair da esfera de vigilância do dono e consequentemente não passando para a posse tranquila daquele Se o agente teve a posse tranquila da res furtiva apesar do pouco tempo de forma totalmente desvigiada é indiscutível a ocorrência do furto consumado sendo portanto irrelevante o tempo de duração da disponibilidade da coisa As peculiaridades restrições e limitações são as mesmas examinadas no dispositivo anterior para onde remetemos o leitor 7 Causa especial de exclusão da antijuridicidade A subtração de coisa fungível que não ultrapassa a quota a que o agente tem direito não é punível art 156 2º consoante disciplina específica do dispositivo em exame Podese questionar afinal estamos diante de isenção de pena ou de exclusão de antijuridicidade Determinada corrente sustenta que se trata de isenção de pena outra que a previsão legal é causa de exclusão da antijuridicidade Na verdade a redação do 2º do art 156 apresenta uma sutileza que altera profundamente a natureza de sua previsão Com efeito se o dispositivo legal afirmasse que o agente não é punível como faz em inúmeros artigos do Código Penal estaríamos certamente diante de uma situação cristalina de isenção de pena No entanto não foi essa a previsão legal ao contrário prevê referido dispositivo que não é punível a subtração Ora subtração impunível significa subtração lícita permitida indiferente ao direito penal Portanto como conclui lucidamente Damásio de Jesus Direito Penal v 2 p 333 tratase de fato lícito isto é de causa de exclusão da antijuridicidade e não de isenção de pena Essa excludente especial as gerais ou comuns estão relacionadas no art 23 para configurarse exige os seguintes requisitos a fungibilidade da coisa comum b valor não superior à quota a que o agente tem direito Tratandose de coisa infungível é irrelevante que o agente tenha direito a quota superior ao valor subtraído o crime estará tipificado Igualmente ainda que se trate de coisa fungível se o valor subtraído for superior à quota a que o sujeito tem direito o crime também estará tipificado Assim a fungibilidade da coisa comum e seu limite da quota são elementares limitadoras da excludente especial sob exame 8 Pena e ação penal A pena cominada ao furto de coisa comum é alternativa de detenção de seis meses a dois anos ou multa A natureza da ação penal é pública condicionada à representação do ofendido ou de quem tenha qualidade para representálo J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Para o ajuizamento de queixacrime entendese que a situação fática deve ser descrita na procuração a fim de evitar eventual denunciação caluniosa por parte do querelado No caso em apreço o querelante nem sequer fez alusão aos arts 156 do CP furto de coisa comum 195 I XI e XII da Lei n 927996 concorrência desleal o que de fato não ocorreu A polêmica em torno da descrição do fato criminoso na procuração perderia o objeto se o querelante ou ofendido assinasse a queixacrime junto com seu procurador Isso porque desta forma estaria ratificando todo o conteúdo da ação penal privada TJRS HC 70019268341 Rel Nereu José Giacomolli j 1052007 Mesmo que o fato descrito na exordial caracterize em princípio o delito próprio de furto de coisa comum ao qual o legislador condicionou o processo ao exercício do direito de representação pelos coerdeiros tal manifestação não exige forma rígida bastando que a intenção das vítimas seja demonstrada de forma inequívoca Devem ser consideradas válidas as atitudes dos coerdeiros após o fato delituoso que demonstraram o firme interesse de que fosse apurada a responsabilidade criminal da paciente eis que compareceram ao Ministério Público pugnando pela instauração da ação penal e posteriormente à Delegacia onde prestaram depoimento acerca dos fatos STJ HC 60680PB Rel Min Gilson Dipp j 2442007 Apelação criminal Furto de coisa comum Absolvição por ser o fato praticado não punível Aplicação da causa excludente da ilicitude prevista no art 156 2º do CP Bens furtados fungíveis peças de couros O apelante retirou a metade a que teria direito na sociedade razão pela qual a subtração deixa de ser punível TJSP Apelação 8333143300 Rel Péricles Piza j 1292005 Capítulo II Do Roubo e da Extorsão Roubo Art 157 Subtrair coisa móvel alheia para si ou para outrem mediante grave ameaça ou violência a pessoa ou depois de havêla por qualquer meio reduzido à impossibilidade de resistência Pena reclusão de 4 quatro a 10 dez anos e multa V arts 129 146 e 147 do CP V arts 82 84 e 1473 VI do CC V art 1º III c da Lei n 796089 prisão temporária 1º Na mesma pena incorre quem logo depois de subtraída a coisa emprega violência contra pessoa ou grave ameaça a fim de assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa para si ou para terceiro V art 20 da Lei n 717083 Lei de Segurança Nacional 2º A pena aumentase de um terço até metade I se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma II se há o concurso de duas ou mais pessoas V arts 29 62 e 288 do CP III se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhece tal circunstância IV se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior V se o agente mantém a vítima em seu poder restringindo sua liberdade Incisos IV e V acrescentados pela Lei n 9426 de 24 de dezembro de 1996 3º Se da violência resulta lesão corporal grave a pena é de reclusão de 7 sete a 15 quinze anos além de multa se resulta morte a reclusão é de 20 vinte a 30 trinta anos sem prejuízo da multa 3º com redação determinada pela Lei n 9426 de 24 de dezembro de 1996 que elevou a pena mínima da primeira parte do dispositivo de cinco para sete anos de reclusão V art 19 do CP V art 1º III c da Lei n 796089 prisão temporária V arts 1º II e 9º da Lei n 807290 crimes hediondos V Súmula 610 do STF D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Os três Códigos Penais brasileiros Código Criminal de 1830 Código republicano de 1890 e o atual Código Penal de 1940 não ignoraram a existência de distinções entre furto e roubo O Código Criminal do Império retrocedeu em relação às Ordenações Filipinas ao não distinguir a violência contra a coisa e contra a pessoa equiparandoas no crime de roubo Sem grande melhora o Código republicano disciplinou o crime de roubo nos arts 356 a 358 Mas somente o atual Código Penal purificou a figura do crime de roubo ao afastar dela a violência contra a coisa que com acerto vai alojarse no crime de furto qualificado A grave ameaça a pessoa foi inovação acrescentada pelo atual diploma legal além de equipararlhe genericamente a impossibilidade de a vítima resistir ou defenderse 2 Bem jurídico tutelado Tratase de crime complexo tendo como elementares constitutivas a descrição de fatos que isoladamente constituem crimes distintos protege com efeito bens jurídicos diversos o patrimônio público ou privado de um lado e a liberdade individual e a integridade física e a saúde que são simultaneamente atingidos pela ação incriminada Com efeito separandose as condutas podemse identificar com facilidade dois crimes distintos contra o patrimônio como gênero são protegidas como espécie a posse a propriedade e a detenção a exemplo do que ocorre com o crime de furto contra a pessoa como gênero são protegidas a liberdade individual quando praticado mediante grave ameaça e a integridade física e psíquica do ser humano como espécies Sintetizando são bens jurídicos protegidos pelo art 157 e seus parágrafos além do patrimônio posse propriedade e detenção a liberdade individual constrangimento ilegal a integridade física lesão corporal e a vida das pessoas morte no latrocínio 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo a exemplo do crime de furto pode ser qualquer pessoa crime comum menos o proprietário por faltarlhe a elementar coisa alheia Se este praticar a subtração poderá responder por exercício arbitrário das próprias razões dependendo das circunstâncias e do elemento subjetivo que orientar sua conduta além de incorrer nas sanções correspondentes à violência empregada Sujeito passivo também pode ser o proprietário o possuidor e eventualmente o mero detentor da coisa ou até mesmo terceiro que sofra a violência O sujeito passivo da violência ou da ameaça pode ser diverso do sujeito passivo da subtração pode ocorrer com efeito que a violência seja empregada não contra o proprietário ou possuidor da coisa alheia mas contra terceiro Nessa hipótese haverá dois sujeitos passivos um em relação ao patrimônio e outro em relação à violência ambos vítimas de roubo sem contudo dividir a ação criminosa que continua única As duas vítimas do patrimônio e da violência estão intimamente ligadas pelo objetivo final do agente subtração e apossamento da coisa subtraída 4 Tipo objetivo adequação típica O roubo nada mais é que o furto qualificado pela violência à pessoa Por mais que se queira inovar na definição do crime de roubo a despeito do nomen iuris próprio e de pena autônoma não se pode negar sua similitude com um furto qualificado pelo emprego de violência ou grave ameaça à pessoa ou de qualquer outro meio para impossibilitar sua resistência Esse já era o magistério do velho Carrara Francesco Carrara Programa de Derecho Criminal Parte Especial Bogotá Ed Temis 1973 v 6 IV p 191 para quem o roubo vem a ser uma forma mais odiosa que o furto cometido na presença do dono e essa odiosidade decorre da maior audácia ao sacarlhe os objetos não apenas à sua vista mas dele próprio ou de suas mãos O Código Penal de 1940 adotou em termos de furto e de roubo o sistema seguido pela Alemanha e particularmente pela Itália classificando como roubo somente a subtração cometida com emprego de violência ou grave ameaça à pessoa e como furto qualificado a subtração praticada com violência à própria coisa Com efeito o núcleo típico é igualmente subtrair para si ou para outrem coisa alheia móvel O roubo distinguese do furto exclusivamente pela violência real ou ficta utilizada contra a pessoa No furto qualificado pela destruição ou rompimento de obstáculo a violência é praticada contra a coisa no roubo é contra a pessoa Enfim tudo o que dissemos a respeito do crime de furto com exceção do meio usado aplicase ao crime de roubo 41 Irrelevância de motivação distinta da finalidade de apossamento da res Para a configuração do roubo é irrelevante que o sujeito ativo o pratique com a intenção de vingarse da vítima ou de terceiro basta que o faça com a intenção de apossarse da coisa para si ou para outrem É irrelevante a razão ou o motivo pelo qual pretende apoderar se da res desde que de alguma forma represente alguma vantagem ou interesse não gostamos da expressão lucro porque juridicamente tem significado próprio que nem sempre se confunde com o gozo proveito ou vantagem que a subtração de uma coisa alheia pode trazer O objeto material no crime de roubo é duplo como duplos também podem ser os sujeitos passivos são a coisa alheia móvel e a pessoa que não precisa ser necessariamente a mesma que sofreu a violência pessoal e a subtração da coisa móvel O roubo pode ser próprio ou impróprio 5 Modus operandi mediante violência ou grave ameaça ou qualquer outro meio A violência elemento estrutural do crime de roubo é distinta da violência do furto qualificado art 155 4º I neste a violência é empregada contra a coisa naquele contra a pessoa A violência no roubo pode ser imediata ou mediata imediata contra o dono detentor posseiro ou possuidor mediata contra terceiro A subtração operase por meio da grave ameaça da violência à pessoa ou depois de havêla reduzido por qualquer meio à impossibilidade de resistência Tratase ao contrário do furto de tipo especial cujos meios executórios são nele especificados Aliás o uso dos meios qualquer deles como elementares constitutivas integra a figura típica do roubo caracterizando seu emprego por si só o início da execução desse crime Logicamente desnecessário afirmar desde que o uso da violência ou grave ameaça vise à subtração da coisa 51 Violência física vis corporalis Violência física à pessoa consiste no emprego de força contra o corpo da vítima Para caracterizar essa violência do tipo básico de roubo é suficiente que ocorra lesão corporal leve ou simples vias de fato na medida em que lesão grave ou morte qualifica o crime Vias de fato são a violência física sem dano à integridade corporal O termo violência empregado no texto legal significa a força física material a vis corporalis com a finalidade de vencer a resistência da vítima Essa violência pode ser produzida pela própria energia corporal do agente que no entanto poderá preferir utilizar outros meios como fogo água energia elétrica choque gases etc A violência pode ser empregada pela omissão submetendo por exemplo o ofendido a fome ou sede com a finalidade de fazêlo ceder à vontade do agente A violência poderá ser imediata quando empregada diretamente contra o próprio ofendido e mediata quando utilizada contra terceiro ou coisa a que a vítima esteja diretamente vinculada Não é indispensável que a violência empregada seja irresistível basta que seja idônea para coagir a vítima colocála em pânico amedrontála suficiente enfim para minar sua capacidade de resistência Violentos empurrões e trombadas também caracterizam o emprego de violência física necessária e suficiente para caracterizar o crime de roubo Contudo aqueles empurrões ou trombadas tidos como leves utilizados apenas com a finalidade de desviar a atenção da vítima não têm sido considerados idôneos para caracterizar o crime de roubo 52 Grave ameaça vis compulsiva Ameaça grave violência moral é aquela capaz de atemorizar a vítima viciando sua vontade e impossibilitando sua capacidade de resistência A grave ameaça objetiva criar na vítima o fundado receio de iminente e grave mal físico ou moral tanto a si quanto a pessoas que lhe sejam caras É irrelevante a justiça ou injustiça do mal ameaçado na medida em que utilizada para a prática de crime tornaa também antijurídica Mediante grave ameaça constitui forma típica da violência moral é a vis compulsiva que exerce força intimidativa inibitória anulando ou minando a vontade e o querer do ofendido procurando assim inviabilizar eventual resistência da vítima Na verdade a ameaça também pode perturbar escravizar ou violentar a vontade da pessoa como a violência material A violência moral pode materializarse em gestos palavras atos escritos ou qualquer outro meio simbólico Mas somente a ameaça grave isto é aquela que efetivamente imponha medo receio temor na vítima e que lhe seja de capital importância opondose a sua liberdade de querer e de agir O mal ameaçado pode consistir em dano ou em simples perigo desde que seja grave impondo medo à vítima que em razão disso sintase inibida tolhida em sua vontade incapacitada de opor qualquer resistência ao sujeito ativo No entanto é desnecessário que o dano ou perigo ameaçado à vítima seja injusto bastando que seja grave Na verdade a injustiça deve residir na ameaça em si e não no dano ameaçado O mal prometido a título de ameaça além de futuro e imediato deve ser determinado sabendo o agente o que quer impor Nesse sentido Magalhães Noronha pontificava Compreendese que o mal deva ser determinado pois indefinível e vago não terá grandes efeitos coativos verossímil também ou seja que se possa realizar e não fruto de mera fanfarronice ou bravata iminente isto é suspenso sobre o ofendido nem em passado nem em futuro longínquo quando respectivamente não teria força coatora ou esta seria destituída do vigor necessário inevitável pois caso contrário se o ofendido puder evitálo não se intimidará dependente via de regra da vontade do agente já que se depende da de outrem perderá muito de sua inevitabilidade Enfim esses são os requisitos que em tese a ameaça grave deve apresentar esses meios não são nem absolutos nem numerus clausus podendo no caso concreto apresentarse alguns e outros não sem desnaturar a gravidade da ameaça É indispensável que a ameaça tenha idoneidade intimidativa isto é que tenha condições efetivas de constranger a vítima 521 Idoneidade da grave ameaça O aferimento da eficácia da ameaça é de caráter puramente subjetivo sofrendo certamente influência direta de aspectos como nível cultural idade sexo condição social estado de saúde etc A eficácia virtual da ameaça deve ser avaliada considerandose o nível médio de difícil aferição dos indivíduos com a mesma condição ou padrão da vítima Manzini Assim não se deve excluir a priori a idoneidade da ameaça ainda que de plano pareça mirabolante pois há pessoas dominadas por crendices que são facilmente impressionáveis Oportuna a seguinte decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo Rei Juiz Celso Limongi RT 701305 Se a vítima se sentiu atemorizada porque o acusado fazia menção de sacar da cintura uma arma a ameaça portanto existiu o que caracteriza o roubo simples não sendo caso de desclassificação para furto por arrebatamento 522 Simulação de arma e arma de brinquedo A simulação de estar armado ou a utilização de arma de brinquedo quando desconhecida ou não percebida pela vítima constituem grave ameaça suficientemente idônea para caracterizar o crime de roubo O pavor da vítima especialmente na atualidade quando a população urbana anda dominada pelo medo coletivo impede que realize uma atenta observação para constatar a realidade das coisas Na realidade são irrelevantes os meios utilizados pelo sujeito ativo reais ou imaginários para amedrontar a vítima mostrar que porta uma arma fingir que a tem consigo ou simplesmente ameaçar de agressão têm a mesma idoneidade para amedrontar pessoas normais Não importa inclusive a sinceridade da ameaça basta que a vítima se sinta amedrontada e em consequência impossibilitada de reagir à ação criminosa O assalto de inopino surpreendendo as vítimas afirmando tratarse de assalto e exigindo a entrega dos pertences constitui grave ameaça mesmo sem mostrar armas A atemorização da vítima que é subjetiva decorre das próprias circunstâncias da abordagem e do próprio pavor que atualmente domina a população O ordenamento jurídico de 1940 conheceu apenas a voz de prisão a violência urbana do final do século encarregouse de popularizar a similar voz de assalto que podese afirmar constitui inegavelmente um neologismo do termo ameaça e é idôneo para caracterizar a grave ameaça 53 Qualquer outro meio de redução da resistência Aqui para descrever o meio possível de executar o roubo após relacionar duas hipóteses casuísticas o legislador adotou como em tantas outras oportunidades uma fórmula genérica que não se confunde com interpretação analógica aliás inadmissível em sede de criminalização Essa fórmula genérica objetiva tipificar qualquer outro meio utilizado que se assemelhe à violência real ou moral e que por ela não seja abrangida mas que tenha o condão de deixar a vítima à mercê do sujeito ativo Enfim à violência ou grave ameaça é equiparado todo e qualquer meio pelo qual o sujeito ativo sem empregar violência ou incutir medo consegue evitar que a vítima ofereça resistência ou defesa por exemplo o uso de soníferos anestésicos narcóticos hipnose superioridade numérica ou superioridade física considerável Convém destacar porém que o outro qualquer meio referido no art 157 tem natureza excludente isto é não é similar nem se confunde com violência ou grave ameaça caso contrário seria desnecessário equiparálos Assim poderá ter qualquer outra natureza produzir qualquer outra sensação que não seja medo ou temor minar a resistência da vítima paralisála ou imobilizála mas nunca poderá assemelharse a violência ou grave ameaça Enfim se o mencionado qualquer outro meio assemelharse ou confundirse com qualquer delas se tornará desnecessária a generalidade pois terá idoneidade por si próprio para integrar a gravidade representada pela violência ou grave ameaça Esses outros meios devem ser empregados subreptícia ou fraudulentamente isto é sem violência física ou grave ameaça caso contrário estariam incluídos nas outras duas alternativas devem contudo ter capacidade para reduzir ou diminuir a resistência da vítima Estão abrangidas pela expressão qualquer outro meio as ações químicas estranhas ameaças que restrinjam ou anulem a consciência como o emprego de inebriantes entorpecentes ou similares ou até mesmo a máquina da verdade ou pílulas da confissão destinadas a violentar a vontade e a liberdade do ofendido levandoo a declarar o que pretendia calar 531 A individualização de outros meios na legislação estrangeira Alguns Códigos alienígenas fazem referência expressa a outros meios outros não como o atual Código espanhol art 237 A solução do nosso Código Penal tem a vantagem de ampliar a definição da subtração violenta e afastar eventual dificuldade em aceitar algumas hipóteses que caracterizem a redução à impossibilidade de resistência da vítima tais como hipnose entorpecentes álcool ou mesmo quando o meio violento contra a pessoa é usado indiretamente O Superior Tribunal de Justiça já decidiu por exemplo que a dissimulação dos réus como policiais para a subtração de coisa móvel caracteriza o crime de roubo Tais meios devem ser usados ardilosamente às escondidas desacompanhados evidentemente de violência ou grave ameaça caso contrário serão estas e não aqueles que integrarão a definição típica do crime de roubo Se no entanto a própria vítima se coloca em condições de incapacidade de oferecer resistência o crime que tipificará eventual subtração não será o de roubo mas certamente o de furto cometido aproveitandose da oportunidade criada pela vítima ou por quem vigiasse a res Por fim a violência física ou moral pode ser dirigida tanto contra o detentor da coisa sendo ou não proprietário como contra terceiro que eventualmente perturbe o sujeito ativo Logo o sujeito passivo da violência pode ser um e o sujeito passivo do dano patrimonial outro sem que por isso se caracterize mais de um crime Deve ser especificado na denúncia em que consistiu o meio que levou a vítima à incapacidade de resistência 54 Violência ou grave ameaça para fugir sem a coisa Alguns identificam na hipótese o roubo impróprio na forma tentada outros concurso de tentativa de furto com crime contra a pessoa Acreditamos que tecnicamente a segunda hipótese é a mais sustentável De roubo impróprio tentado ou consumado certamente não se trata Não se pode ignorar que a tipificação dessa infração penal exige não apenas a violência imediatamente posterior ao apossamento da res mas também e cumulativamente o objetivo de assegurar a impunidade eou a detenção da coisa Logo a ausência de qualquer das elementares seja da violência seja da finalidade especial impede a configuração de roubo próprio ou impróprio consumado ou tentado Na verdade como destaca Weber Martins Batista O furto e o roubo no Direito e no Processo Penal p 230 com acerto o agente quis furtar a coisa começou a fazêlo não esperava ser surpreendido e como isso aconteceu desistiu da prática do furto e tentou fugir Enfim a ausência do elemento subjetivo especial do tipo impede a configuração do roubo impróprio Inegavelmente um dos objetivos do emprego de meio violento no roubo impróprio é nos termos da lei assegurar a impunidade do crime No entanto incorre em grave equívoco quem sustenta que há roubo impróprio quando o agente ao ser surpreendido subtraindo a coisa alheia desiste de consumála e emprega violência ou grave ameaça para garantir a fuga Na verdade assegurar a impunidade do crime significa empregar a violência para garantir a subtração que acaba de fazer da qual não desistiu mas não o caracteriza aquela violência utilizada após ter desistido do apossamento da coisa empregandoa tão somente para fugir sem esta Enfim a violência utilizada na fuga para não ser preso por tentativa de furto não caracteriza roubo impróprio Somente o configura quando surpreendido o agente não desiste do crime e emprega a violência com o objetivo de fugir com a coisa mesmo que não o consiga 541 Violência para assegurar a fuga não tipifica crime de roubo Assim por exemplo o indivíduo que ingressa em um veículo para subtrairlhe o tocafitas surpreendido pelo dono desistindo da subtração tenta escapar lutando com um terceiro mas sem o toca fitas Não vemos outra tipificação possível que não a tentativa de furto em concurso com crime contra a pessoa lesões corporais leves graves homicídio etc Nesse sentido já era o magistério de Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 208 se a subtração é apenas tentada e o agente na fuga emprega violência haverá concurso material de tentativa de furto e do crime que for praticado contra a pessoa lesões corporais homicídio etc Uma coisa é empregar violência para não ser preso pela tentativa de furto após desistir da res furtiva outra é utilizar a violência objetivando fugir com a coisa que caracteriza a conduta emoldurada no 1º do art 157 Mais simples ao menos aparentemente é a conduta de quem foge com a coisa sem violência ou grave ameaça a pessoa Assim a atitude daquele que procura desvencilharse da vítima que o agarra sem agredila ou ameaçála constitui crime de furto e não o de roubo Essa atitude de desvencilharse ainda que com algum esforço não constitui a violência requerida como elementar do crime de roubo 6 Espécies de roubo próprio e impróprio O atual Código Penal brasileiro a exemplo da maioria dos Códigos alienígenas distingue roubo próprio e impróprio A violência no crime de roubo pode ocorrer antes durante ou após a subtração da coisa alheia móvel em outros termos pode ser empregada no início da ação no apossamento da coisa quando a subtração já está consumada e por fim ainda quando objetiva assegurar a impunidade do crime Pois é exatamente esse elemento temporal da utilização da violência que distingue a propriedade ou impropriedade do roubo 61 Roubo próprio No roubo próprio caput a violência ou grave ameaça ou a redução da impossibilidade de defesa são praticadas contra a pessoa para a subtração da coisa Os meios violentos são empregados antes ou durante a execução da subtração pois representam em outros termos o modus operandi de realização da subtração de coisa alheia móvel que aliás é a única e fundamental diferença que apresenta em relação ao crime de furto Pratica roubo e não furto o agente que além de impedir a vítima de prosseguir em seu caminho mandaa em tom intimidativo ficar quieta não reagir e lhe passar o dinheiro e o relógio logrando assim subtrair tais coisas pois nessas circunstâncias ademais da violência indireta também houve grave ameaça Discordamos nesse sentido do entendimento de Luiz Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 392 para quem a violência empregada durante a subtração também caracterizaria o roubo impróprio Pelo menos essa é a conclusão que tiramos de sua seguinte afirmação referindose a roubos próprio e impróprio Este se dá quando a violência ou grave ameaça são praticadas concomitantemente ou após a subtração com o fim de assegurar a impunidade do delito ou detenção da coisa enquanto aquele caracterizase quando o agente emprega a violência ou a grave ameaça para só depois efetuar a subtração o apoderamento da coisa propriamente dita grifamos concomitantemente Com efeito a locução temporal logo depois constante do 1º tipificador do roubo impróprio impede que se admita a prática da violência concomitantemente com a subtração Ora uma das distinções básicas entre uma e outra espécies de roubo reside exatamente no momento do emprego da violência ou grave ameaça Ademais o emprego da violência somente poderá ter como finalidade imediata assegurar o êxito do empreendimento impunidade eou detenção da coisa se for praticada após a subtração como exige o 1º caso contrário não passará de simples meio de execução da própria subtração que caracteriza o roubo próprio nos termos do caput do art 157 No entanto a bem da verdade mais adiante o próprio Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 393 de modo conclusivo afirma que o meio executivo violento é utilizado imediatamente após o apossamento da coisa Enfim essa inegável contradição do ilustre penalista deve ser produto de simples lapso admissível em um trabalho de fôlego como é o seu exemplar Curso de Direito Penal 62 Roubo impróprio No roubo impróprio a violência ou grave ameaça são praticadas logo depois da subtração para assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa subtraída Não há roubo impróprio sem a subtração anterior da coisa móvel seguindose a grave ameaça ou violência para garantir a detenção da res furtiva Essa modalidade está capitulada no 1º do art 157 São exemplos típicos de roubo impróprio aquele em que o sujeito ativo já se retirando do portão com a res furtiva alcançado pela vítima abatea assegurando a detenção ou então já na rua constata que deixou um documento no local que o identificará e retornando para apanhálo agride o morador que o estava apanhando garantindo a impunidade São duas ordens de razões que fundamentam segundo o texto legal a violência posterior à subtração como elementar do roubo impróprio assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa para si ou para outrem A elementar assegurar a impunidade deve necessariamente receber interpretação relativa isto é não pode representar tecnicamente o sentido que dogmaticamente se pode emprestar a essa expressão mas apenas o sentido de o agente poder desvencilharse de empecilhos que lhe dificultem a fuga impedir ao menos momentaneamente sua prisão complicar seu reconhecimento pessoal etc Nessa primeira hipótese a detenção ou posse precária da res já está garantida sendo portanto desnecessária a violência Por outro lado assegurar a detenção segunda hipótese referese ao simples êxito momentâneo da ação delituosa isto é que lhe permita ausentarse do local na posse da coisa subtraída não mais que isso 621 A tipificação do roubo impróprio não admite a hipótese de qualquer outro meio No roubo impróprio ao contrário do roubo próprio não há previsão legal como executivo da utilização de qualquer outro meio limitandose ao emprego de violência ou grave ameaça Rechaçamos assim o entendimento daqueles que admitem outros meios além de violência ou grave ameaça na caracterização do roubo impróprio É inadmissível qualquer interpretação extensiva ou analógica para incluir como elementar típica meio que a lei não prevê ampliando o jus puniendi estatal e ferindo o princípio da tipicidade taxativa Assim em nossa concepção a eventual utilização desse recurso qualquer outro meio após a subtração não tipifica o crime de roubo próprio ou impróprio O crime patrimonial certamente será o de furto podendo logicamente haver concurso com outro Nesse particular é irrelevante que a omissão legislativa tenha sido voluntária ou involuntária como discutiam Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 56 e Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 2623 622 Limites temporais do roubo impróprio A locução logo depois de subtraída a coisa constante do lº do art 157 fixa os limites temporais do roubo impróprio Assim a violência ou grave ameaça devem ser empregadas em seguida logo depois imediatamente logo após a subtração da coisa alheia A expressão logo depois tem sentido próprio no sistema criminal brasileiro que a utiliza em alguns dispositivos sendo os mais tradicionais os da definição de flagrância art 302 II do CPP e quase flagrância art 302 III Acreditamos que se deva dar em direito penal interpretação semelhante àquela elaborada na seara do direito processual penal pela similitude de situações Em outros termos logo depois de subtraída a coisa não admite decurso de tempo entre a subtração e o emprego da violência ou seja o modus violento somente é caracterizador do roubo se for utilizado até a consumação do furto que o agente pretendia praticar posse tranquila da res sem a vigilância da vítima Superado esse momento o crime está consumado e consequentemente não pode sofrer qualquer alteração portanto eventual violência empregada constituirá crime autônomo em concurso com furto consumado 623 Marcos temporais delimitadores do roubo impróprio Assim comete roubo impróprio tanto quem apanha a coisa móvel e surpreendido emprega violência ou grave ameaça no momento da surpresa acaba de cometer o crime art 302 II do CPP como quem perseguido as emprega logo após a subtração da coisa móvel art 302 III Necessário contudo que a utilização da violência ou grave ameaça vise assegurar a impunidade ou garantir a detenção da coisa subtraída No entanto esse requisito temporal imediatidade não pode ser analisado fora do caso concreto rompendo o contexto da ação de subtrair com o da violência posterior Em síntese dois marcos delimitam a existência do roubo impróprio a tomada ou subtração da coisa e a violência antes de o agente colocar se a bom recato como referia Hungria Antes ou durante o apossamento da coisa alheia o emprego da violência caracteriza roubo próprio depois de subtraída e retirada da esfera de vigilância do dono desfrutando o agente de sua posse tranquila não se pode mais falar em roubo próprio ou impróprio mas em furto em concurso com outro crime contra a pessoa Os momentos seguintes à posse tranquila que sucede a subtração da coisa são por conseguinte o limite final da existência do roubo impróprio 63 Roubo próprio e impróprio distinção A distinção fundamental entre roubo próprio e roubo impróprio reside basicamente no momento e na finalidade do emprego da violência ou grave ameaça ou seja as diferenças são temporais e ideológicas além dos meios utilizáveis mais restritos no roubo impróprio Assim quando o sujeito ativo pratica a violência em sentido amplo antes da subtração ou durante ela responde por roubo próprio quando porém após apanhar a coisa alheia emprega violência ou grave ameaça responde por roubo impróprio No roubo próprio o modus operandi violento é utilizado antes ou durante a subtração constituindo o meio de executála no roubo impróprio que inicialmente configurava um furto após a subtração da coisa é empregada violência ou grave ameaça para assegurar a impunidade do crime ou garantir a detenção da coisa o roubo próprio por sua vez pode ser praticado por meio da grave ameaça da violência física ou de qualquer outro meio que reduza a vítima à impossibilidade de resistência Constatase que o roubo impróprio não admite o meio genérico de execução limitandose à violência ou grave ameaça A eventual utilização desse recurso qualquer outro meio após a subtração não tipifica o crime de roubo próprio ou impróprio O crime certamente será o de furto podendo configurarse concurso de crimes quando os quaisquer outros meios posteriormente utilizados constituírem por si sós crime 7 Objeto material do crime de roubo Tratandose de crime complexo é natural que o roubo possua mais de um objeto material no caso a pessoa humana e a coisa alheia móvel A pluralidade de objetos materiais desse crime amplia a dificuldade de se verificar a ocorrência de crime impossível pela impropriedade do objeto na medida em que havendo idoneidade de qualquer dos objetos materiais será suficiente para se considerar o início de execução da conduta típica Nesse aspecto corrigimos a afirmação equivocada que fizemos Assim ao contrário do que afirmamos anteriormente não se trata de roubo impossível quando o sujeito ativo emprega violência contra a vítima para subtrairlhe os pertences quando esta os esqueceu em sua residência a impossibilidade do roubo entretanto se caracteriza quando o sujeito ativo emprega violência contra cadáver para subtrair eventuais valores que estejam consigo Na primeira hipótese a inexistência de coisa alheia móvel não impede a tipificação de roubo em razão de existirem dois bens jurídicos tutelados coisa alheia móvel e pessoa humana na segunda cadáver não é pessoa faltando lhe portanto essa elementar Neste caso a impossibilidade do roubo decorre da absoluta impropriedade do objeto No primeiro mantémse a tipicidade em razão da violência contra a pessoa 8 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo é constituído pelo dolo que é seu elemento subjetivo geral e pelo especial fim de agir que é seu elemento subjetivo especial O dolo constituise por sua vez pela vontade consciente de subtrair coisa alheia isto é que pertença a outrem É necessário que o agente saiba que se trata de coisa alheia isto é tenha conhecimento ou consciência da existência da elementar normativa alheia É indispensável enfim que o dolo abranja todos os elementos constitutivos do tipo penal sob pena de configurarse o erro de tipo que por ausência de dolo ou dolo defeituoso afasta a tipicidade salvo se se tratar de simulacro de erro O elemento subjetivo especial do tipo por sua vez é representado pelo especial fim de apoderarse da coisa subtraída para si ou para outrem A ausência desse animus apropriativo finalidade de apossamento desnatura a figura do crime de furto Logicamente quando essa circunstância se fizer presente haverá uma espécie de inversão do ônus da prova devendo o agente demonstrar in concreto que a finalidade da subtração era outra e não a de apoderarse da coisa para si ou para outrem 81 Duplicidade de elementos subjetivos especiais No roubo impróprio por sua vez há dois elementos subjetivos especiais do tipo a finalidade de apossamento da coisa alheia normal do roubo próprio e mais o especial fim de assegurar a impunidade ou a detenção da coisa subtraída Essa circunstância era reconhecida por Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 2089 que afirmava Como no roubo impróprio sucedemse as ações de subtrair para si ou para outrem e empregar violência ou grave ameaça para assegurar a impunidade ou a posse da coisa o tipo subjetivo requer não só o dolo próprio do furto e violência pessoal como também os elementos subjetivos dados pelo fim de agir dolo específico Como esse tipo penal não exige a finalidade de locupletarse são desnecessários os motivos ou a intenção de lucro para configurarse o crime de roubo próprio ou impróprio 9 Roubo majorado qualificado 2º Embora alguns doutrinadores não façam distinção entre majorantes e qualificadoras ou pelo menos não lhe atribuam relevância não abrimos mão da precisão terminológica especialmente porque grande parte de nossos leitores é de acadêmicos de Direito que necessitam desde logo de boa orientação Por isso convém registrar que as circunstâncias enunciadas no 2º do art 157 constituem simples majorantes ou se preferirem causas de aumento de pena As qualificadoras constituem verdadeiros tipos penais derivados com novos limites mínimo e máximo enquanto as majorantes como simples causas modificadoras da pena somente estabelecem sua variação mantendo os mesmos limites mínimo e máximo Ademais as majorantes funcionam como modificadoras somente na terceira fase do cálculo da pena ao contrário das qualificadoras que fixam novos limites mais elevados dentro dos quais será estabelecida a penabase Assim o elenco constante do 4º do art 155 constituise de qualificadoras ao passo que o relacionado no dispositivo sub examen configura simples majorantes 91 Se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma I Segundo a dicção do texto legal é necessário o emprego efetivo de arma sendo insuficiente o simples portar Para Luiz Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 394 no entanto é suficiente para a caracterização da majorante que o sujeito ativo porte a arma ostensivamente de modo que ameace a vítima vale dizer não é imprescindível que venha a fazer uso do instrumento para praticar a violência ou grave ameaça sob pena de esvaziamento da ratio legis Divergimos desse entendimento uma vez que a tipificação legal condiciona a ser a violência ou grave ameaça exercida com o emprego de arma e empregála significa uso efetivo concreto real isto é a utilização da arma no cometimento da violência Não era outro o magistério de Sebastian Soler Derecho Penal argentino p 266 que ao comentar o Código Penal argentino com previsão semelhante ao nosso pontificava A lei exige que o roubo tenha sido cometido com armas o que não quer dizer que o ladrão apenas as tenha razão pela qual acreditamos sinceramente infundado levantar dúvidas a esse respeito ante o texto de nossa lei Outras leis não a nossa merecem censura por referirse ao mero fato de portála 911 Inidoneidade lesiva de arma de brinquedo ou descarregada A inidoneidade lesiva da arma de brinquedo descarregada ou simplesmente à mostra que pode ser suficiente para caracterizar a ameaça tipificadora do roubo caput não tem o mesmo efeito para qualificálo a despeito do que pretendia a equivocada Súmula 174 do STJ em boa hora revogada atendendo a súplica unânime da doutrina nacional O fundamento dessa majorante reside exatamente na maior probabilidade de dano que o emprego de arma revólver faca punhal etc representa e não no temor maior sentido pela vítima Por isso é necessário que a arma apresente idoneidade ofensiva qualidade inexistente em arma descarregada defeituosa ou mesmo de brinquedo Enfim a potencialidade lesiva e o perigo que uma arma verdadeira apresenta não existem nos instrumentos antes referidos Pelas mesmas razões não admitimos a caracterização dessa majorante com o uso de arma inapta a produzir disparos isto é inidônea para o fim a que se destina Em síntese a maior probabilidade de dano propiciada pelo emprego de arma amplia o desvalor da ação tornandoa mais grave ao mesmo tempo a probabilidade de maior êxito no empreendimento delituoso aumenta o desvalor do resultado justificandose a majoração de sua punibilidade 912 O emprego de arma de brinquedo e a velha doutrina clássica Na mesma linha de pensamento o emprego de arma de brinquedo tipifica o roubo mas não o torna qualificado ou majorado pois como já afirmamos a razão de ser da qualificadora reside na maior potencialidade lesiva e no maior perigo que a arma verdadeira produz e não na maior intimidação sentida pela vítima Esse sentimento que serve para caracterizar a grave ameaça tipificadora do roubo não produz o mesmo efeito para majorálo sob pena de incorrerse em grosseiro bis in idem A velha doutrina de décadas passadas que atribuía conteúdo subjetivo à majorante admitia sua caracterização com o simples emprego de arma de brinquedo por todos Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 58 No entanto essa superada orientação não encontra nenhuma repercussão na moderna doutrina penal Damásio de Jesus Heleno Fragoso Weber Martins Batista Luiz Regis Prado Luiz Flávio Gomes Guilherme de Souza Nucci entre tantos outros que à unanimidade rechaça interpretações extensivas abrangentes ou analógicas Contudo nossos tribunais superiores STF e STJ em incompreensível conservadorismo continuaram acolhendo aquela vetusta orientação ignorando que o fundamento da majorante ao contrário do que imaginava Hungria não é a intimidação da vítima mas a lesividade e o perigo representados pela arma verdadeira 913 O emprego de arma de brinquedo e a Súmula 174 do STJ Foi nessa linha que o Superior Tribunal de Justiça na contramão da história resolveu sumular essa orientação 1996 divorciada dos sãos princípios democráticos e jurídicos orientadores de um direito penal da culpabilidade nos seguintes termos Nos crimes de roubo a intimidação feita com arma de brinquedo autoriza o aumento da pena Súmula 174 A lei exige o emprego de armas e arma de brinquedo não é arma mas brinquedo Nessa concepção acompanhanos Andrei Zenckner Schmidt O princípio da legalidade penal no Estado Democrático de Direito Porto Alegre Livr do Advogado Ed 2001 p 189 ao afirmar Creio que qualquer pessoa ao ser indagada acerca do significado de uma arma de brinquedo diria que se trata de um brinquedo e não de uma arma um equívoco metodológico contudo permitiu um dos nossos mais elevados tribunais afirmar que arma de brinquedo é arma Súmula 174 do STJ Com efeito não se pode confundir o emprego de arma fictícia que é idôneo para ameaçar e por conseguinte para tipificar o crime de roubo com emprego efetivo de arma verdadeira que qualifica o crime Na verdade a doutrina reconhece a existência de apenas duas espécies de armas próprias e impróprias Como o legislador não se socorreu de nenhuma fórmula genérica equiparando à arma qualquer objeto capaz de intimidar é impossível admitir majoração do roubo ameaçado com brinquedo como se fosse com arma O próprio princípio da tipicidade impede essa interpretação extensiva Aliás o próprio Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 86 sustentava ardorosamente que a lei penal deve ser interpretada restritivamente quando prejudicial ao réu e extensivamente no caso contrário Menos mal que o próprio Superior Tribunal de Justiça por intermédio de suas duas Turmas com jurisdição em matéria criminal capitaneado pelo Ministro Félix Fischer movimentouse no sentido de revogar a indigitada Súmula 174 Devemos saudar a sensibilidade inteligência e principalmente bomsenso de nossos ministros 92 Se há concurso de duas ou mais pessoas II Como no furto é a concorrência de duas ou mais pessoas na prática do crime ainda que qualquer delas seja inimputável que pode tipificar esta majorante no roubo É indispensável a nosso juízo a participação efetiva na execução material do crime Aplicase aqui aliás tudo o que escrevemos sobre a punibilidade do concurso de pessoas na qualificadora do crime de furto para onde remetemos o leitor evitandose assim a desnecessária repetição 93 Em serviço de transporte de valores e o agente conhece essa circunstância III Além de a vítima encontrarse realizando o serviço de transporte de valores é necessário que o agente saiba dessa circunstância pois o objetivo da lei é tutelar exatamente a segurança desse transporte Assim o que caracteriza essa majorante não é a natureza móvel dos valores mas o ofício do sujeito passivo isto é encontrarse em serviço de transporte de valores O desconhecimento dessa circunstância pelo agente afasta o fundamento político da majorante tornandoa juridicamente inaplicável sem falar na indispensabilidade de todos os atos e circunstâncias serem contemporaneamente abrangidos pelo dolo sob pena de exclusão da tipicidade erro de tipo Por isso se o agente assaltar a vítima ignorando que esta transporta valores não se caracteriza a majorante respondendo aquele por conseguinte pelo roubo comum Os valores podem consistir em dinheiro ou qualquer outro bem valioso passível de ser transportado tais como títulos joias ouro pedras preciosas etc desde que suscetível de ser convertido em dinheiro como sustentava Bento de Faria Os frequentes assaltos aos carrosfortes constituem essa qualificadora Sujeito passivo desta majorante não pode ser em hipótese alguma o proprietário dos valores transportados A majorante é estar a vítima em serviço de transporte de valores como serviço sempre se presta a outrem e não a si próprio isso significa que os valores transportados por quem se encontra em serviço não são próprios mas de terceiro que é o dono ou proprietário de tais valores Logo sendo roubado o próprio dono ou proprietário quando se encontra transportando valores não incide a majorante 94 Roubo de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior IV Seguindo a política criminal capitalista para a qual o patrimônio é muito mais valioso que a própria vida que orientou a inclusão do 5º no art 155 a Lei n 942696 transformou a mesma conduta de subtrair automotores em majorante do crime de roubo com a inclusão do inciso IV no 2º do art 157 Para a configuração dessa nova majorante no entanto a exemplo do que ocorre no crime de furto não basta que a subtração seja de veículo automotor É indispensável a exemplo da similar figura de furto que este venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior atividade que poderá caracterizar um posterius em relação ao crime anterior já consumado Quando porém essa majorante concorrer com qualquer das demais previstas no mesmo parágrafo que será a regra neste tipo de crime perderá praticamente sua razão de ser pois acabará funcionando somente como circunstância judicial art 68 parágrafo único uma vez que não prevista como agravante Afinal pontifica Damásio de Jesus Direito Penal v 2 p 343 Ora o crime de roubo de veículo automotor geralmente automóvel ainda que para transporte para outro Estado ou para o exterior normalmente é cometido com emprego de arma e mediante concurso de pessoas art 157 2º I e II Diante disso o novo tipo surtirá pouco efeito prático 95 Roubo de veículo automotor com sequestro da vítima V No inciso V representando a segunda nova majorante do crime de roubo consta o seguinte se o agente mantém a vítima em seu poder restringindo sua liberdade Essa previsão de todas as novidades trazidas por uma lei não muito feliz Lei n 942696 parecenos a mais adequada No entanto a restrição da liberdade poderá dependendo das circunstâncias assumir a natureza de outro crime como v g os dos arts 148 e 159 em concurso com o crime de roubo na medida em que priva a vítima de sua liberdade ou até mesmo configurar outro crime mais grave absorvendo no caso o roubo por exemplo a extorsão mediante sequestro art 159 Por isso é preciso cautela na análise dessa questão sob pena de deixarse praticamente impune o crime de sequestro Assim quando o sequestro manutenção da vítima em poder do agente for praticado concomitantemente com o roubo de veículo automotor ou pelo menos como meio de execução do roubo ou como garantia contra ação policial estará configurada a majorante aqui prevista Agora quando eventual sequestro for praticado depois da consumação do roubo de veículo automotor sem nenhuma conexão com sua execução ou garantia de fuga não se estará diante da majorante especial mas se tratará de concurso de crimes podendo inclusive tipificarse como já referimos a extorsão mediante sequestro o extorquido é o próprio sequestrado 951 Sequestro cometido como meio de execução do roubo ou contra ação policial Não é outra a preocupação de Damásio de Jesus Direito Penal v 2 p 344 que após considerar a praticamente inocuidade da nova majorante visto que dificilmente deixa de vir acompanhada de outra majorante prevista no mesmo parágrafo conclui que a majoração deve ser interpretada da seguinte forma a sequestro cometido como meio de execução do roubo ou contra a ação policial incide o art 157 2º afastado o concurso de crimes b sequestro praticado depois da subtração sem conexão com a execução ou com a ação policial concurso de crimes Concordamos em princípio com essa conclusão damasiana Quanto à primeira hipótese mencionada nenhum reparo a fazer quanto à segunda contudo recomendamos mais prudência em sua avaliação Damásio não sugere que crimes poderiam concorrer com o roubo na hipótese sugerida 952 Sequestro relâmpago extorsão mediante sequestro Sustentamos que nos casos popularmente conhecidos como sequestrorelâmpago cometidos diariamente nas principais capitais brasileiras onde a vítima é colocada em portamalas de veículos pelas mãos de marginais perigosos que percorrem horas a fio os mais variados bairros da cidade ameaçando gravemente a vítima exigindo lhe extorquindo mais bens ou valores às vezes as violentando sexualmente e cujo resultado final é absolutamente imprevisível e completamente aleatório configurase crime mais grave que a simples majorante da restrição da liberdade da vítima A moldura legal adequada para esse tipo de conduta cujo resultado mais ou menos grave não passa de mero detalhe acidental ou circunstancial do evento a nosso juízo é o art 159 do Código Penal ou seja extorsão mediante sequestro Esta por ser mais grave absorve o crime de roubo afastando consequentemente o concurso com esse crime 96 Elevação da pena mínima no roubo qualificado No roubo qualificado pelo resultado lesão grave a reclusão será de sete aumentada pela Lei n 942696 a quinze anos se for morte latrocínio será de vinte a trinta anos como já previa a redação anterior Antes da vigência dessa lei na hipótese de lesão grave a pena mínima prevista era de cinco e não sete anos de reclusão Foi um aumento isolado sem nenhuma justificativa lógica política ou técnica na medida em que não fez o mesmo em relação ao latrocínio Igualmente não estendeu à extorsão art 158 as novas majorantes incluídas no 2º do art 157 ou seja aquelas acrescentadas nos incisos IV e V do 2º 10 Eventual presença de duas causas de aumento Havendo a incidência de mais de uma causa de aumento três correntes disputam a preferência dos especialistas a devese proceder somente a um aumento fundamentado numa das causas existentes se houver mais de uma majorante as demais podem ser consideradas como agravantes ou não havendo previsão legal como simples circunstâncias judiciais art 59 valorável na fixação da penabase b o aumento quando variável v g um sexto a dois terços ou um terço até metade deve ser proporcional ao número de causas incidentes assim configurandose somente uma majorante o aumento pode limitarse ao mínimo incidindo contudo mais de uma a elevação deve ser maior podendo atingir inclusive o máximo da majoração permitida v g até metade dois terços etc Essa tem sido a orientação preferida pelos tribunais superiores STF e STJ c a existência de mais de uma causa de aumento não significa por si só a elevação da pena na mesma proporção o julgador exercendo seu poder discricionário pode optar por um único aumento pois o que deve ser considerado é a gravidade do meio empregado ou do modus operandi e não o número de incisos do 2º que se possa configurar Concorrendo mais de uma causa de aumento ou de diminuição previstas na parte especial pode o juiz limitarse a um só aumento ou a uma só diminuição prevalecendo todavia a causa que mais aumente ou diminua art 68 parágrafo único do CP Bitencourt Tratado de Direito Penal 12 ed p 599 Esse enfim é o parâmetro legal e o aplicador não se pode distanciar demasiadamente dessa orientação sob pena de violar o princípio da individualização da pena Por isso em nossa concepção o ideal é reunir as duas primeiras correntes que citamos anteriormente ou seja proceder apenas a um aumento aplicando somente uma majorante na segunda fase da dosimetria penal 1ª mas proceder a essa variação proporcional ao número de causas de aumento incidentes 2ª isto é a maior ou menor elevação acompanhará tanto a intensidade quanto a quantidade de majorantes Assim concorrendo uma majorante a elevação da pena em princípio deve ser o mínimo previsto se no entanto apresentarse mais de uma v g roubo duplamente majorado com emprego de arma e em concurso de pessoas a única majoração deverá assumir nível mais elevado Nada impede porém que se prefira adotar apenas uma majorante aplicável na segunda fase do cálculo de penas utilizandose as demais como agravantes genéricas ou mesmo como circunstâncias judiciais conforme o caso 11 Consumação e tentativa 111 Consumação do crime de roubo A consumação do crime de roubo se perfaz no momento em que o agente se torna possuidor da res furtiva subtraída mediante violência ou grave ameaça independentemente de sua posse mansa e pacífica Ademais para a configuração do roubo é irrelevante que a vítima não porte qualquer valor no momento da violência ou grave ameaça visto tratarse de impropriedade relativa e não absoluta do objeto o que basta para caracterizar o delito em sua modalidade O roubo próprio consumase com a retirada da coisa da esfera de disponibilidade da vítima Vemse firmando o entendimento sobre a desnecessidade de posse tranquila mesmo passageira do agente O roubo impróprio consumase com o emprego da violência ou grave ameaça à pessoa após a subtração É irrelevante a ausência de prejuízo decorrente da restituição do bem bastando que este seja retirado da esfera de disponibilidade da vítima ficando na posse tranquila ainda que passageira do delinquente O entendimento jurisprudencial que vem predominando inclusive no Pretório Excelso tem como consumado o roubo tão só pela subtração dos bens da vítima mediante violência ou grave ameaça ainda que ato contínuo o próprio ofendido detenha o agente e recupere a res O crime de roubo consumase no momento em que o assaltante realiza a subtração plena da res mesmo que pouco tempo depois seja preso em flagrante presumido 1111 Crime complexo consumase com a realização das infrações que o integram O roubo é crime complexo cuja unidade jurídica se completa pela reunião de dois crimes distintos constrangimento ilegal CP art 146 e furto art 155 O crime de roubo se consuma no momento em que o agente se apodera da res subtraída mediante grave ameaça ou violência Para consumarse é desnecessário que saia da esfera de vigilância do antigo possuidor sendo suficiente que cesse a clandestinidade ou a violência Sendo o roubo crime complexo sua consumação somente se opera quando plenamente realizadas as infrações penais que o integram isto é tanto a violência ou grave ameaça à pessoa quanto a subtração patrimonial Caso contrário haverá apenas tentativa de roubo próprio quando o agente por exemplo após praticada a violência contra a vítima é imediatamente perseguido preso e a coisa é recuperada pela vítima pois o agente não tem em nenhum momento a posse tranquila da res No entanto pequenos detalhes têm levado a decisões díspares sobre o momento consumativo do crime de roubo próprio ou impróprio Nesse sentido vejase o seguinte acórdão do STJ Temse por consumado o delito de roubo quando é a coisa retirada com violência da posse e vigilância da vítima ainda quando o agente tenha sido preso instantes depois com o produto do crime STJ RE Rel Min Dias Trindade DJU 1231990 p 1712 112 Tentativa do crime de roubo Quanto ao roubo próprio é tranquila a admissibilidade da tentativa Em relação ao roubo impróprio há duas correntes 1 é inadmissível a tentativa 2 é admissível quando após a subtração o agente é preso ao empregar a violência ou grave ameaça Para as duas correntes se a subtração for apenas tentada e houver violência ou grave ameaça na fuga haverá furto tentado em concurso com crime contra a pessoa e não roubo tentado Como crime complexo o início da execução coincide com a prática da ameaça ou da violência ou ainda com o uso de qualquer outro meio para inibir a vítima objetivando a subtração da coisa O uso de qualquer desses meios integra a descrição típica do roubo caracterizando o início da execução Logo responde por tentativa de roubo o agente que apontando um revólver para a vítima determina que saia de seu veículo pois assim já ingressou na fase executiva do crime de roubo A inexistência de objeto de valor em poder da vítima não descaracteriza a figura típica prevista no art 157 do Código Penal porquanto o roubo é modalidade de crime complexo cuja primeira ação a violência ou grave ameaça constitui início de execução Na dosimetria penal para a redução da pena no caso de tentativa de roubo parágrafo único do art 14 do CP não devem ser levadas em consideração as circunstâncias judiciais mas o iter criminis isto é o caminho propriamente percorrido na elaboração do empreendimento criminoso 12 Roubo qualificado pelo resultado lesão grave ou morte O 3º do art 157 dispõe Se da violência resulta lesão corporal grave a pena é de reclusão de 7 sete a 15 quinze anos além de multa se resulta morte a reclusão é de 20 vinte a 30 trinta anos sem prejuízo da multa As duas hipóteses elencadas no dispositivo em exame caracterizam condições de exasperação da punibilidade em decorrência da efetiva maior gravidade do resultado Comparando o texto legal com outras previsões semelhantes do Código Penal se da violência resulta lesão corporal grave ou se resulta morte constatase que pela técnica legislativa empregada pretendeu o legislador criar duas figuras de crimes qualificados pelo resultado para alguns crimes preterdolosos A exemplo do que ocorre com a lesão corporal de natureza grave a morte em princípio deve decorrer de culpa Contudo normalmente o resultado mais grave lesão ou morte é produto de culpa que complementaria a conhecida figura do crime preterdoloso dolo no antecedente e culpa no consequente como a doutrina gosta de definir Terseia assim o crime patrimonial executado dolosamente com violência acrescido de um resultado mais grave resultante de culpa a lesão grave ou a morte da vítima Essa pelo menos é a estrutura clássica do crime preterdoloso A regra repetindo é que nesses crimes o resultado agravador seja sempre produto de culpa Contudo na hipótese em apreço a extrema gravidade das sanções cominadas uniu o entendimento doutrinário que passou a admitir a possibilidade indistintamente de o resultado agravador poder decorrer tanto de culpa quanto de dolo direto ou eventual 121 Afastamento da responsabilidade objetiva nos resultados agravadores Há outra unanimidade sobre esses resultados agravadores a impossibilidade de o agente responder pelo resultado mais grave sem culpa especialmente a partir da reforma penal de 1984 A locução lesão corporal de natureza grave deve ser interpretada em sentido amplo para abranger tanto as lesões graves art 129 1º quanto as gravíssimas art 129 2º Ademais a lesão corporal tanto pode ser produzida na vítima da res furtiva quanto em qualquer outra pessoa que venha a sofrer a violência As qualificadoras lesão grave ou morte aplicamse às modalidades de roubo próprio e impróprio No entanto a lesão corporal de natureza leve art 129 caput é absorvida pelo crime de roubo constituindo a elementar normativa violência física Assim quem ao subtrair coisa alheia móvel fere sem gravidade a vítima não responde por dois crimes roubo e lesão corporal leve a lesão corporal leve constitui apenas a elementar exigida pelo tipo descritivo do crime de roubo Sintetizando é indiferente que o resultado mais grave seja voluntário ou involuntário justificandose a agravação da punibilidade desde que esse resultado não seja produto de caso fortuito ou força maior ou seja desde que decorra pelo menos de culpa aplicase indistintamente tanto ao roubo próprio quanto ao impróprio Ademais a violência tanto pode ser praticada contra a vítima da subtração como contra terceira pessoa como acontece normalmente no roubo comum 122 Latrocínio crime hediondo A segunda parte do 3º do art 157 tipifica o crime conhecido como latrocínio o Código Penal não utiliza essa terminologia que é matar alguém para subtrair coisa alheia móvel A Lei n 8072 de 25 de julho de 1990 definiu o latrocínio como crime hediondo excluído de anistia graça indulto fiança e liberdade provisória A pena será cumprida inicialmente em regime fechado 1º do art 2º com redação dada pela Lei n 11464 de 2007 Nesse caso a prisão temporária é de trinta dias prorrogável por igual período Em caso de sentença condenatória o juiz decidirá fundamentadamente se o réu poderá apelar em liberdade 3º do art 2º com redação determinada pela Lei n 11464 de 2007 Essa previsão legal resultou de verdadeira cruzada que o Supremo Tribunal Federal vem fazendo nos últimos anos na tentativa de constitucionalizar o direito penal assegurando o direito de apelar em liberdade todo acusado que se encontrar respondendo a processo criminal A progressão de regime nos crimes hediondos exige o cumprimento de dois quintos da pena na hipótese de réus primários e três quintos na hipótese de reincidentes 2º do art 2º As majorantes do 2º não se aplicam ao latrocínio As causas especiais de aumento de pena previstas para os crimes de roubo inscritas no 2º do art 157 do CP não são aplicáveis em nenhuma das hipóteses contidas no 3º 123 Pela lesão corporal grave A lesão grave qualificadora do roubo é aquela tipificada nos 1º e 2º do art 129 que necessariamente deve decorrer pelo menos de culpa do agente art 19 Assim se ao praticar um roubo o sujeito ativo causar lesões corporais leves não responderá por elas que ficam absorvidas pelo roubo subsumidas na elementar violência Contudo se essas lesões forem de natureza grave 1º e 2º graves ou gravíssimas responderá pelo crime do art 157 3º primeira parte independentemente de têlas produzido dolosa ou culposamente É indispensável evidentemente que a gravidade da lesão seja comprovada mediante perícia Podese afirmar com certa segurança que doutrina e jurisprudência não discrepam quanto à aplicação do disposto no 3º tanto ao roubo próprio quanto ao impróprio é indiferente que o agente produza o resultado mais grave na vítima lesão grave ou morte para cometer a subtração durante sua execução ou após sua realização É desnecessário que a vítima da violência seja a mesma da subtração da coisa alheia desde que haja conexão entre os dois fatos nesse caso tratandose de vítima da violência distinta daquela da subtração haverá dois sujeitos passivos sem desnaturar a unidade do crime complexo que continua único 124 Pelo resultado morte latrocínio A morte da vítima é a qualificadora máxima deste crime Tudo o que dissemos sobre o roubo qualificado pelas lesões corporais graves aplicase ao roubo com morte Exatamente como na lesão grave a morte pode resultar em outra pessoa que não a dona da coisa subtraída havendo igualmente dois sujeitos passivos Poderia o legislador ter adotado o nomen juris latrocínio não o fez provavelmente porque preferiu destacar que a despeito dessa violência maior lesão grave ou morte o latrocínio continua sendo roubo isto é um crime na essência de natureza patrimonial Observandose a sistemática de nosso Código Penal constatase que o art 157 3º pretendeu tipificar um crime preterdoloso uma vez que a locução utilizada se resulta indica normalmente resultado decorrente de culpa e não meio de execução de crime no caso roubo próprio ou impróprio No entanto como já referimos no tópico anterior a severidade das penas cominadas não se harmoniza com crime preterdoloso Procurando minimizar a inocuidade congênita da estrutura tipológica em apreço a doutrina passou a sustentar a possibilidade de o resultado morte ser produto de dolo culpa ou preterdolo indiferentemente Toda sanção agravada em razão de determinada consequência do fato somente pode ser aplicada ao agente se este houver dado causa pelo menos culposamente Com o latrocínio não é diferente aplicandose integralmente o consagrado princípio nulla poena sine culpa e rechaçandose completamente a responsabilidade objetiva 125 Erro crasso do legislador equiparação de dolo e culpa No entanto não se pode silenciar diante de um erro crasso do legislador que equiparou dolo e culpa pelo menos quanto às consequências nesse caso específico Na verdade o evento morte no latrocínio tanto pode decorrer de dolo de culpa ou de preterdolo e se lhe atribuir a mesma sanção com a gravidade que lhe é cominada 20 a 30 anos de reclusão o que agride o bomsenso e fere a sistemática do ordenamento jurídico brasileiro Este nos crimes culposos releva o desvalor do resultado destacando fundamentalmente o desvalor da ação v g no homicídio doloso 6 a 20 anos e no culposo l a 3 anos Enfim uma coisa é matar para roubar ou para assegurar a impunidade ou o produto do crime outra muito diferente é provocar esses mesmos resultados involuntariamente As consequências num plano de razoabilidade jamais poderão ser as mesmas como está acontecendo com este dispositivo Nesse particular recomendamos venia concessa ao prezado leitor uma passagem dolhos no que escrevemos a respeito quando abordamos as lesões corporais graves e gravíssimas no segundo volume de nosso Tratado de Direito Penal 126 Resultado morte decorrente de grave ameaça não tipifica latrocínio Em relação à tipificação do crime de latrocínio merece destaque a elementar típica da violência uma vez que examinando o caput do art 157 e o texto de seu 3º definidor desse crime constatase uma séria distinção no caput tipificase o emprego da grave ameaça ou violência a pessoa e no parágrafo referido o resultado agravador deve resultar de violência Essas redações estão muito claras nos respectivos textos legais não exigindo nenhum esforço demonstrativo o que permite não nos alongarmos sobre o assunto Por outro lado também é desnecessário discorrer longamente sobre os distintos significados das locuções grave ameaça e violência a pessoa que aliás já foram trabalhadas neste mesmo capítulo Assim a vexata quaestio limitase à diferença de tipificação entre o crime de roubo comum normal se assim se pode referir e aquele qualificado pelo resultado emoldurado no 3º A violência contida no 3º é somente a física vis corporalis e não a moral vis compulsiva O resultado agravador lesão grave ou morte para tipificar a figura insculpida no dispositivo em exame deve necessariamente resultar de violência que como demonstramos à saciedade itens 51 e 52 não se confunde com grave ameaça especialmente na sistemática adotada em nosso Código Penal Assim por exemplo no caso de alguém que é assaltado e mesmo sem o emprego de violência física assustase com a presença de arma sofrendo um enfarto e vindo a falecer não se tipifica o crime de latrocínio Nessa hipótese a alternativa legal surge por meio do concurso de crimes roubo e homicídio este poderá ser doloso ou culposo dependendo das circunstâncias fáticas do elemento subjetivo etc Entendimento contrário satisfazendose simplesmente com a relação causal entre o roubo e o resultado mais grave sem examinar o pressuposto da elementar violência não resiste ao crivo dos princípios da tipicidade estrita e da reserva legal representando quanto ao excesso autêntica responsabilidade objetiva totalmente afastada pela reforma penal de 1984 e pela Constituição Federal de 1988 127 Morte de comparsa inocorrência de latrocínio A morte de qualquer dos participantes do crime sujeito ativo não configura latrocínio Assim se um dos comparsas por divergências operacionais resolve matar o outro durante um assalto não há falar em latrocínio embora o direito proteja a vida humana independentemente de quem seja seu titular e não apenas a da vítima do crime patrimonial Na realidade a morte do comparsa nas circunstâncias não é meio modo ou forma de agravar a ação desvaliosa do latrocínio que determina sua maior reprovabilidade A violência exigida pelo tipo penal está intimamente relacionada aos sujeitos passivos naturais patrimonial ou pessoal da infração penal sendo indispensável essa relação causal para configurar o crime preterdoloso especialmente agravado pelo resultado No entanto convém ter cautela ao analisar essas questões pois também aqui tem inteira aplicação o erro quanto à pessoa art 20 3º do CP Se o agente pretendendo matar a vítima acaba matando o coautor responderá pelo crime de latrocínio como se tivesse atingido aquela logo é latrocínio Não haverá latrocínio por sua vez quando a própria vítima reage e mata um dos assaltantes A eventual morte de comparsa em virtude de reação da vítima que age em legítima defesa não constitui ilícito penal algum sendo paradoxal pretender a partir de uma conduta lícita da vítima agravar a pena dos autores 13 Tentativa de latrocínio pluralidade de alternativas Há inúmeras correntes sobre as diferentes possibilidades fático jurídicas das formas tentadas do crime de latrocínio Tratandose de crime complexo cujos crimesmembros são o roubo e a morte surgem grandes dificuldades interpretativas quando algum de seus componentes não se consuma Sem sombra de dúvida porém quando não se consumar nem a subtração nem a morte a tentativa será de latrocínio Ocorrendo somente a subtração e não a morte admitese igualmente a tentativa de latrocínio Quando se consuma somente a morte e não a subtração as divergências começam a aparecer Sem pretender esgotar as inúmeras possibilidades admitidas pela doutrina e pela jurisprudência passamos a elencar algumas 1 homicídio e subtração consumados é pacífico o entendimento de que há latrocínio consumado 2 homicídio consumado e subtração tentada há diversas correntes a latrocínio consumado Súmula 610 b tentativa de latrocínio c homicídio qualificado consumado em concurso com tentativa de roubo d apenas homicídio qualificado 3 homicídio tentado e subtração consumada são apresentadas duas soluções a tentativa de latrocínio STF b tentativa de homicídio qualificado pela finalidade 4 homicídio tentado e subtração tentada tentativa de latrocínio STF 14 Latrocínio com pluralidade de vítimas Apesar de o latrocínio ser um crime complexo mantém sua unidade estrutural inalterada mesmo com a ocorrência da morte de mais de uma das vítimas A pluralidade de vítimas não configura continuidade delitiva e tampouco qualquer outra forma de concurso de crimes havendo na verdade um único latrocínio A própria orientação do Supremo Tribunal Federal firmouse no sentido de que a pluralidade de vítimas não implica a pluralidade de latrocínios Precedentes do STF HC Rel Min Carlos Velloso RT 734625 HC 75006lSP Rel Maurício Corrêa j 2751997 Não se pode ignorar que o crimefim inicialmente pretendido foi o de roubo e não um duplo ou triplo latrocínio ou melhor não duas ou três mortes A ocorrência de mais de uma morte não significa a produção de mais de um resultado que em tese poderia configurar o concurso formal de crimes Na verdade a eventual quantidade de mortes produzidas em um único roubo representa a maior ou menor gravidade das consequências cuja valoração tem sede na dosimetria penal por meio das operadoras do art 59 do Código Penal Embora para a configuração do 3º do art 157 do CP seja secundária a ocorrência da subtração patrimonial e o fundamental seja por excelência a nota de violência contra a pessoa durante a tentativa ou a consumação do roubo é a danosidade social que essa conduta produz ou pode produzir que fundamenta a exacerbada punição contida no dispositivo Mas essa retribuição pública já está contida na sanção cominada 15 Concurso do crime de roubo com o de quadrilha A cumulação da qualificadora do crime de roubo emprego de arma com a qualificadora de quadrilha armada exige elaborada reflexão O crime de quadrilha é autônomo independe dos demais crimes que vierem a ser cometidos pelo bando Tratase de crime permanente que se consuma com o ato da associação ou formação de quadrilha em si mesmo sua unidade perdura a despeito dos diversos crimesfins cometidos pelos integrantes do grupo criminoso não se dissocia e não se alia a outras infrações penais mantendo a unidade e individualidade típicas A condenação por quadrilha armada não absorve nenhuma das cláusulas especiais de aumento da pena de roubo previstas no art 157 2º I II e III do Código Penal Tanto os membros de uma quadrilha armada podem cometer o roubo sem emprego de armas quanto cada um deles pode praticálo em concurso com terceiros todos estranhos ao bando 16 Pena ação penal e competência No roubo simples a pena é de reclusão de quatro a dez anos caput e 1º no roubo majorado qualificado a pena é elevada de um terço até metade no roubo qualificado pelo resultado lesão grave a reclusão será de sete aumentada pela Lei n 942696 a quinze anos se for morte latrocínio será de vinte a trinta anos Em todas as hipóteses a pena de prisão será cumulativa com a de multa A ação penal como não poderia deixar de ser é em qualquer hipótese de natureza pública incondicionada A competência para julgar o crime de latrocínio a despeito de um dos crimesmembros ser contra a vida é do juiz singular Essa opção políticocriminal foi feita pelo legislador brasileiro de 1940 e tem sido respeitada pela legislação posterior pela doutrina e jurisprudência brasileiras 161 Inconstitucionalidade da proibição de progressão de regime nos crimes hediondos O Supremo Tribunal Federal em sua constituição plenária através do Habeas Corpus 82959 declarou a inconstitucionalidade do 1º do art 2º da Lei n 807290 Lei dos Crimes Hediondos que previa o cumprimento da pena em regime integralmente fechado nos crimes hediondos e assemelhados com voto histórico do Ministro Gilmar Mendes Dois aspectos fundamentais merecem destaque nesse julgamento tão esperado pela comunidade jurídica especializada a o reconhecimento do sistema progressivo e o da individualização da pena como direitos e garantias fundamentais e b a eficácia erga omnes de declaração de inconstitucionalidade em controle difuso ou aberto art 102 I a da CF limitada pelo efeito ex nunc O primeiro aspecto esclarece os limites reservados ao legislador ordinário o sistema progressivo de cumprimento da pena é uma garantia constitucional O legislador ordinário pode disciplinar a individualização da pena nas fases legislativa judicial e executória mas não pode excluíla em nenhuma dessas etapas sob pena de violar esse preceito fundamental Seria inócuo por conseguinte incluir a individualização da pena entre os direitos e as garantias fundamentais e ao mesmo tempo permitir que o legislador ordinário a seu alvedrio pudesse suprimir ou anular seu conteúdo O segundo aspecto não menos importante foi o efeito erga omnes que o STF atribuiu à sua decisão em julgamento de controle difuso de constitucionalidade aplicou por analogia o disposto no art 27 da Lei n 986899 que se refere a julgamento de hipóteses de controle concentrado ou abstrato de constitucionalidade ADIn ou ADC Com essa decisão o STF entendeu que em se tratando de controle incidental ou difuso aquela Corte Suprema pode estender os efeitos da decisão a outras situações processuais suscetíveis de serem alcançadas pelo reconhecimento in concreto de inconstitucionalidade orientando se nesse sentido em nome da segurança jurídica e do excepcional interesse social que são conceitos igualmente abrangidos pelo marco constitucional 162 Eficácia erga omnes e efeito ex nunc Essa decisão com eficácia erga omnes e efeito ex nunc permite que os réus em outros processos que ainda se encontrem em fase recursal ou executória cuja pena ainda não tenha sido integralmente cumprida possam igualmente ser beneficiados pelo sistema progressivo desde que seus requisitos sejam examinados casuisticamente pelo juiz competente Referida decisão não está por conseguinte limitada ao processo objeto de exame no Habeas Corpus 82959 e tampouco permite que outros juízes ou tribunais recusem seu cumprimento invocando como obstáculo o disposto no inciso X do art 52 da Constituição Federal Nesse sentido vejase o magistério do Ministro Gilmar Mendes in verbis A amplitude conferida ao controle abstrato de normas e a possibilidade de que se suspenda liminarmente a eficácia de leis ou atos normativos com eficácia geral contribuíram certamente para que se quebrantasse a crença na própria justificativa desse instituto que se inspirava diretamente numa concepção de separação de Poderes hoje necessária e inevitavelmente ultrapassada Se o Supremo Tribunal pode em ação direta de inconstitucionalidade suspender liminarmente a eficácia de uma lei até mesmo de uma Emenda Constitucional por que haveria a declaração de inconstitucionalidade proferida no controle incidental valer tão somente para as partes Enfim somente poderá ser negada a progressão em processos similares cuja pena ainda não tenha sido integralmente cumprida se o juízo competente constatar in concreto o não atendimento dos requisitos legais exigidos para a progressão 163 Nova disciplina da progressão de regimes nos crimes hediondos Finalmente a Lei n 11464 de 27 de março de 2007 seguindo a orientação consagrada pelo Supremo Tribunal Federal minimiza os equivocados excessos da Lei n 807290 alterando os parágrafos do seu art 2º com as seguintes inovações a o cumprimento da pena iniciará em regime fechado b a progressão nos crimes hediondos ocorrerá após o cumprimento de dois quintos 25 sendo o apenado primário e de três quintos 35 se reincidente c em caso de sentença condenatória o juiz decidirá fundamentadamente se o réu poderá apelar em liberdade J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 610 do STF Há crime de latrocínio quando o homicídio se consuma ainda que não realize o agente a subtração de bens da vítima Condenação por tentativa de latrocínio art 157 3º 2ª parte combinado com o art14 inciso II ambos do Código Penal Autoria materialidade e qualificadoras de emprego de arma e do concurso de pessoas comprovadas pelas circunstâncias da prisão em flagrante para configurar a tentativa de latrocínio é necessária a comprovação de que o réu agiu com dolo de matar para subtrair para garantir a subtração ou para assegurar sua fuga mas que por circunstâncias alheias à sua vontade não se consumaram os eventos morte e subtração no caso está ausente o elemento subjetivo do tipo do latrocínio o dolo de matar para roubar ou assegurar a posse do produto do roubo ou seja o animus necandi TJRJ Apelação 200505000448 Rel Maria Christina Góes j 2412008 Quando o agente valese de agressão física contra a vítima para subtrair a coisa caracterizando o roubo mas não utiliza a arma de fogo que portava é impossível reconhecer contra ele a causa de aumento prevista no artigo 157 2º I do Código Penal Empreendida perseguição dos réus logo após a subtração impossibilitando que eles tivessem a posse mansa e pacífica do objeto não se consuma o roubo caracterizando sua modalidade tentada O quantitativo de pena inferior a quatro anos e a não reincidência dos agentes impõe a fixação do regime inicial aberto para o cumprimento da pena TJMG Apelação 100240612640650011 Rel Antônio Carlos Cruvinel j 16102007 Como a confissão do agente na fase investigatória serviu para firmar o decreto condenatório apesar de posterior retratação deve ser aplicada a causa atenuante prevista no art 65 inciso III alínea d do Código Penal Para que se justifique o aumento além do mínimo previsto no 2º do art 157 é necessário que se demonstre o acentuado desvalor da ação e do resultado do comportamento do agente e os reflexos que porventura exerçam sobre a magnitude do injusto não bastando apenas o número de causas de aumento incidentes TJPR Apelação 3028662 Rel Marques Cury j 1972007 Temse delito de roubo consumado quando o agente subtrai bem da vítima mediante grave ameaça evadindose em seguida do local não se podendo admitir que a eficiência da polícia em localizálo e detêlo recuperando a res caracterize a figura da tentativa TJMG Apelação 100240612187150011 Rel Vieira de Brito j 37 2007 Quando não há ameaça suficiente a ponto de intimidar a vítima e sendo a violência exercida contra a coisa in casu consistente em puxar a bolsa da vítima que a segura de outro lado para impedir a subtração a violência é contra a bolsa e não contra a pessoa devendo ser operada a desclassificação para o crime de furto TJMG Apelação 100270609426560011 Rel Maria Celeste Porto j 266 2007 Estando a arma inapta a causar perigo real à integridade física da vítima o crime de roubo não poderá ser majorado pela aplicação da causa especial de aumento de pena do 2º inciso I do art 157 do Código Penal senão deverá somente integrar o tipo penal básico por representar a utilização da arma desmuniciada apenas a ameaça genérica eficiente a causar temor à vítima na forma descrita no caput do referido artigo TJRJ Apelação 200705001794 Rel Leila Albuquerque j 56 2007 Roubo Desclassificação para furto simples Violência e grave ameaça Hipótese em que não se questiona a dinâmica dos fatos restando definido no v acórdão guerreado de maneira clara e ausente de dúvidas que o réu abordou a vítima exigindolhe que entregasse dinheiro Não havendo reação o ora recorrido empurroua e puxou sua bolsa fugindo em seguida Para a configuração do crime de roubo é necessário haver o emprego de violência ou grave ameaça contra a vítima Entretanto a violência não precisa ser de tal gravidade a ponto de ensejar lesões corporais como nas vias de fato Ademais a grave ameaça pode ser empregada de forma velada configurandose isso sim pelo temor causado à vítima o que leva a permitir que o agente promova a subtração sem que nada possa a pessoa lesada fazer para impedilo STJ REsp 848465DF Rel Min Félix Fischer j 2252007 O Código Penal através de seus dispositivos conceitua juridicamente a arma como sendo o instrumento destinado ao ataque ou à defesa ou destinado para outros fins tornase apto para agredir Desta forma não se inclui na qualificadora prevista no art 157 2º I Código Penal o emprego pelo agente de arma descarregada defeituosa ou de brinquedo a não ser que tal objeto tenha sido usado em agressão à vítima No caso em tela o recorrente praticou o delito utilizandose de uma arma de brinquedo razão pela qual se mantém o fato delituoso como roubo simples TJRS Apelação 70019097674 Rel Sylvio Baptista Neto j 1752007 Para a caracterização da causa especial de aumento de pena prevista no art 157 2º I do Código Penal não é necessário que o próprio acusado utilize a arma bastando que um dos coautores a empregue no momento da prática delituosa TJPR Apelação 3794349 Rel Marques Cury j 1942007 Roubo qualificado Palavra da vítima isolada nos autos A palavra da vítima isoladamente não pode sustentar a condenação do acusado pois o Estado Democrático de Direito exige a comprovação idônea da prática delituosa para que se fundamente um decreto condenatório TJMG Apelação 105120603332870011 Rel Alexandre Victor de Carvalho 2332007 É possível a incidência do princípio da insignificância mesmo nos crimes cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa porque o juízo de tipicidade material não passa pela análise do comportamento da vítima ou seja seu dissenso ou contrariedade à ação do agente e sim em um juízo de lesividade da conduta nullum crimen sine iniuria Sendo o delito de roubo espécie de crime complexo a lesividade da conduta para se adequar a este tipo penal deve abranger necessariamente os dois valores protegidos pela norma sendo imprescindível significativa lesão ao patrimônio e à pessoa cumulativamente Não havendo lesividade relevante ao patrimônio da ofendida ocorre a descaracterização do crime complexo de roubo TJMG Apelação 10024990876823001 Rel Alexandre Victor de Carvalho 1322007 O crime complexo revelase pela fusão de dois ou mais tipos penais constituindo uma unidade jurídica restando incabível uma análise fragmentada das condutas que o integram Por tutelar bens jurídicos diversos o patrimônio e a liberdade ou a integridade da pessoa resta inviável a aplicação do princípio da insignificância ao crime de roubo A violência torna a conduta irremediavelmente relevante restando afastada a arguição de atipicidade pela eventual bagatela da coisa roubada STJ REsp 468998MG Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 1782006 Por autônomo e independente do crime de roubo praticado com a mesma arma o crime de disparo de arma de fogo não pode ser apontado como meio necessário fase de preparação ou execução daquele delito primeiro Inaplicabilidade do princípio da consunção TJDF Apelação 20030410126844 Rel Alfeu Machado j 45 2006 Roubo Agente que inicia a execução do delito que não se consuma por circunstâncias alheias à sua vontade Tentativa Desclassificação para lesão corporal leve Impossibilidade configura roubo tentado a conduta do agente que iniciada a execução não consuma o delito por circunstâncias alheias à sua vontade qual seja as vítimas conseguiram se desvencilhar O fato dos agressores desconhecerem se possuíam algo de valor ou ainda se tiveram posse de qualquer objeto por poucos instantes é irrelevante verificandose a real intenção do agente o que impede a desclassificação do crime para lesão corporal leve TACrimSP Apelação 14472831 Rel Lineu Peinado j 6102004 O crime de roubo se consuma no momento em que o agente se torna possuidor da res furtiva mediante grave ameaça ou violência ainda que não obtenha a posse tranquila do bem sendo prescindível que saia da esfera de vigilância da vítima Precedentes do STJ e do STF STJ EREsp 235205SP Rel Min Laurita Vaz j 25 82004 Roubo Agente que após praticada a violência ou grave ameaça contra a vítima é desde logo perseguido e preso sendo a coisa arrebatada recuperada Tentativa Ocorrência a consumação do roubo próprio crime complexo operase quando são plenamente realizadas as infrações penais que a integram ou seja a violência ou grave ameaça à pessoa e a subtração patrimonial de modo que haverá apenas tentativa quando o agente após praticada a violência ou a grave ameaça contra a vítima é desde logo perseguido e preso sendo a coisa arrebatada recuperada pelo ofendido pois embora praticada lesão corporal ou grave ameaça enquanto não se consumar o furto com o apossamento da res mediante a retirada do objeto material da esfera de disponibilidade do sujeito passivo não há que se falar em consumação no roubo TACrimSP Apelação 13842456 Rel Devienne Ferraz j 1082004 Roubo Simulação de arma de fogo Reconhecimento da qualificadora do art 157 2º I do CP Impossibilidade é impossível reconhecer a qualificadora do art 157 2º I do CP quando o agente para render a vítima e ter sucesso na sua empreitada coloca a mão debaixo da blusa ou utiliza um instrumento para simular arma de fogo circunstância apenas caracterizadora do roubo TACrimSP Apelação 14336250 Rel Berenice Marcondes César j 862004 Extorsão Art 158 Constranger alguém mediante violência ou grave ameaça e com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica a fazer tolerar que se faça ou deixar de fazer alguma coisa Pena reclusão de 4 quatro a 10 dez anos e multa V art 1º III d da Lei n 796089 prisão temporária 1º Se o crime é cometido por duas ou mais pessoas ou com emprego de arma aumentase a pena de um terço até metade V art 20 da Lei n 717083 Lei de Segurança Nacional 2º Aplicase à extorsão praticada mediante violência o disposto no 3º do artigo anterior V arts 1º III e 9º da Lei n 807290 crimes hediondos 3º Se o crime é cometido mediante a restrição da liberdade da vítima e essa condição é necessária para a obtenção da vantagem econômica a pena é de reclusão de 6 seis a 12 doze anos além da multa se resulta lesão corporal grave ou morte aplicamse as penas previstas no art 159 2º e 3º respectivamente 3º acrescentado pela Lei n 11923 de 17 de abril de 2009 D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias A despeito de a extorsão como crime autônomo ser produto das modernas legislações pode ser reconhecido como seu antecedente no direito romano o crimen repetundarum que era a cobrança indevida praticada por funcionário público ou magistrado mediante ameaça No período imperial surge como crime extraordinário a concussio D 47 12 que podia ser pública ou privada Concussio publica era o fato de alguém simular autoridade ou exercício de função pública para extorquir dinheiro ou valores A concussio privata ou crimen minari era a ameaça de ação pública para obter vantagem patrimonial Os práticos com seu extraordinário trabalho interpretativo ampliaram esses conceitos para admitir o crime sempre que houvesse emprego de ameaça para a obtenção de vantagem pelo temor que se infundia à vítima O Código Penal francês napoleônico deu início à codificação da extorsão art 400 quando fosse praticada pela força violência ou coação cuja punição era com trabalhos forçados A extorsão não recebeu assento nas Ordenações Filipinas O Código Penal republicano de 1890 foi o primeiro diploma brasileiro a recepcionar o crime de extorsão em nosso ordenamento jurídico 2 Bem jurídico tutelado Os bens jurídicos protegidos na criminalização da extorsão que também é crime complexo a exemplo do crime de roubo são a liberdade individual o patrimônio posse e propriedade e a integridade física e psíquica do ser humano Constatase que a extorsão pode produzir uma multiplicidade de resultados de um lado a violência sofrida pela vítima que se materializa no constrangimento físico ou psíquico causado pela conduta do sujeito ativo de outro lado a causação de prejuízo alheio em razão da eventual obtenção de indevida vantagem econômica que como veremos pode até não se concretizar sendo suficiente que tenha sido o móvel da ação A extorsão é muito semelhante ao crime de roubo oferecendo inclusive grande dificuldade prática para definir in concreto se determinado fato pode ser classificado como roubo ou como extorsão especialmente nos chamados assaltos a mão armada Em verdade não apenas o modus operandi de ambos é assemelhado mas também os bens jurídicos protegidos na definição da extorsão são exatamente os mesmos que elencamos ao abordar o crime de roubo 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo a exemplo do crime de roubo pode ser qualquer pessoa sem a exigência de qualquer condição especial crime comum é quem constrange a vítima a agir ativa ou passivamente com o intuito de obter vantagem patrimonial ilícita para si ou para terceiro Sujeito passivo também pode ser qualquer pessoa inclusive quem sofre o constrangimento sem lesão patrimonial O sujeito passivo da violência ou da ameaça pode ser diverso do sujeito passivo da perda patrimonial assim pode ser que a violência recaia sobre uma pessoa e que outra sofra a perda patrimonial Nessa hipótese haverá dois sujeitos passivos um em relação ao patrimônio e outro em relação à violência ambos vítimas de extorsão Por fim a própria pessoa jurídica pode ser vítima do crime de extorsão Seus representantes legais podem ser coagidos a fazer tolerar ou deixar de fazer alguma coisa desejada pelo sujeito passivo 4 Tipo objetivo adequação típica Extorsão é o ato de constranger alguém mediante violência ou grave ameaça com o fim de obter vantagem econômica indevida para si ou para outrem a fazer tolerar que se faça ou deixar de fazer alguma coisa A conduta tipificada é constranger coagir obrigar que tem o mesmo sentido daquele empregado na definição do crime de constrangimento ilegal art 146 Mediante violência física real ou grave ameaça vis compulsiva violência moral por sua vez tem o mesmo significado das locuções idênticas contidas no art 157 que tipifica o roubo A finalidade do constrangimento na extorsão é obter indevida vantagem econômica para si ou para outrem distinguindose nesse particular do violento exercício arbitrário das próprias razões porque neste a vantagem pretendida é em princípio legítima art 345 do CP A conduta do agente objetiva constranger a vítima a a fazer b tolerar que se faça ou c deixar de fazer alguma coisa Na primeira hipótese mediante violência ou grave ameaça de morte por exemplo o sujeito constrange a vítima a depositar determinado valor em sua conta bancária na segunda com o emprego de violência física ou moral constrange a vítima a permitir que use seu automóvel em determinada viagem na última o constrangimento violento é para impedir a vítima de praticar determinada conduta ou determinado ato por exemplo cobrarlhe um crédito pessoal Por fim a locução utilizada pelo texto legal qualquer coisa como ação tolerância ou omissão correspondente da coagida constrangida a fazer tolerar ou deixar de fazer qualquer coisa tem o significado abrangente de qualquer fato a ser praticado pelo sujeito passivo em consequência do constrangimento sofrido 41 Meios e formas de execução da extorsão violência física e grave ameaça Os meios ou formas de execução são a violência física ou moral grave ameaça devidamente analisadas quando estudamos o crime de roubo Tudo o que lá se disse a respeito aplicase aqui naturalmente sendo desnecessária portanto sua repetição Advirtase que a violência empregada deve conter gravidade suficiente para criar uma espécie de coação isto é ter idoneidade suficiente para determinar ao sujeito passivo a necessidade de fazer ou não fazer a ação desejada pelo agente Podese acrescentar ademais que o meio utilizado mais frequentemente na prática do crime de extorsão é sem dúvida a grave ameaça sendo indiferente que o mal prometido pelo agente seja em si mesmo justo ou injusto conforme o examinaremos no próximo tópico 42 A extorsão mediante grave ameaça e o crime de ameaça do art 147 Não se pode confundir a grave ameaça meio executivo do crime de extorsão com o crime de ameaça descrito no art 147 neste é necessário que o mal ameaçado seja injusto naquele é indiferente que seja justo ou injusto Na verdade ainda que se tenha em princípio o direito de infligir um mal a alguém a ameaça de fazêlo quando feita como meio de praticar um crime tornao ilegal Contudo recomenda se cautela na análise dessa questão para evitar equívocos Como afirmava Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 69 é preciso porém não confundir o caso em que o mal é em si mesmo justo e injusta a vantagem pretendida e o em que injusto o mal é justa a vantagem pretendida no primeiro há extorsão no segundo não apresentandose o crime de violento exercício arbitrário das próprias razões art 345 Assim será este o crime cometido v g pelo proprietário que obtém do ladrão sob ameaça de morte a restituição da res furtiva já na sua posse tranquila 43 Obtenção de indevida vantagem econômica A vantagem pretendida pelo agente para sua caracterização deverá ter necessariamente natureza econômica sob pena de se configurar outra infração penal ou simplesmente não se tipificar infração penal alguma A vantagem deve ser indevida isto é injusta ilegítima não devida e econômica Qualquer outra vantagem não apreciável economicamente não caracteriza esse tipo penal O constrangimento deve ser para obrigar a fazer tolerar que se faça ou não fazer alguma coisa desde que o intuito do agente seja a obtenção de alguma vantagem econômica para si ou para outrem mesmo que não a consiga Se a vantagem visada pelo sujeito ativo não for econômica poderá configurar constrangimento ilegal art 146 deixando em princípio de tipificar crime contra o patrimônio A vantagem econômica buscada na extorsão é mais abrangente que a do furto ou roubo alcançando por exemplo não apenas a coisa alheia móvel mas todo interesse ou direito patrimonial alheio A tipificação do crime de extorsão pretende proteger o patrimônio em geral e não apenas a posse ou propriedade de coisa móvel como ocorre com os crimes de furto e roubo Enfim qualquer que seja a vantagem econômica patrimonial pretendida pelo sujeito ativo satisfaz a elementar normativa exigida pelo tipo penal em exame É desnecessário que a exigência da vantagem seja imperativa sendo suficiente que insinuada desde que a ação de constranger seja praticada mediante violência ou grave ameaça Aspecto interessante desse crime é que a despeito de ser crime patrimonial a vantagem econômica na estrutura tipológica exerce papel podese dizer secundário tanto que não é objeto do dolo mas do elemento subjetivo especial do tipo 44 Ato juridicamente nulo e a tipificação da extorsão Segundo o magistério de Luiz Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 405 o ato juridicamente nulo art 145 CC que nenhum benefício de ordem econômica possa produzir não configura a extorsão crime impossível por impropriedade do objeto art 17 restando apenas o constrangimento ilegal art 146 CP Esse entendimento segue a orientação de Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 275 que após destacar a natureza patrimonial da extorsão e afirmar que não havendo lesão contra o patrimônio faltará objetividade jurídica do delito afirma A nosso ver não cometeria delito de extorsão quem obrigasse um menor de 16 anos a assinar um documento de dívida por ser o ato praticado por pessoa absolutamente incapaz Cód Civil art 5º como também não cometeria extorsão quem coagisse outrem a firmar documento no qual prometesse tornar se seu escravo pois seria ilícito o objeto do ato Cód Civil art 145 n II Nesses como nos outros casos do art 145 da lei civil há crime impossível por absoluta impropriedade do objeto Temos dificuldade em aceitar esse entendimento a despeito da autoridade de seu autor na medida em que o intuito de obter indevida vantagem econômica constitui tão somente um elemento subjetivo especial do tipo que não se confunde com o dolo e como tal não precisa consumarse Com efeito como tivemos oportunidade de afirmar o especial fim ou motivo de agir embora amplie o aspecto subjetivo do tipo não integra o dolo nem com ele se confunde uma vez que como vimos o dolo esgotase com a consciência e a vontade de realizar a ação com a finalidade de obter o resultado delituoso ou na assunção do risco de produzilo Na verdade o especial fim de obter indevida vantagem econômica não traduz o dolo este sim deve materializarse no fato típico que animou a conduta do agente Os elementos subjetivos especiais do tipo como é o caso do intuito de obter indevida vantagem econômica especificam o dolo sem necessidade de se concretizar sendo suficiente que existam no psiquismo do autor Assim resta irrelevante a licitude ou ilicitude do objeto do ato coativo A orientação de Magalhães Noronha embora superada apresenta pelo menos certa coerência na medida em que classifica a extorsão como crime material exigindo para sua consumação ofensa ao patrimônio Para Luiz Regis Prado porém tratase de crime formal sendo portanto irrelevante a obtenção da vantagem econômica 5 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo é constituído pelo dolo representado pela vontade consciente de usar da violência real ou moral para constranger alguém a fazer tolerar ou deixar de fazer alguma coisa O dolo no crime de extorsão é constituído pela vontade consciente de usar da violência ou grave ameaça para constranger alguém a fazer tolerar que se faça ou deixar de fazer alguma coisa No entanto a obtenção de vantagem econômica constitui somente a finalidade ou intenção adicional de obter um resultado ulterior ou uma ulterior atividade distinta portanto da realização ou consumação do tipo penal A obtenção da vantagem econômica com efeito é uma finalidade ou ânimo que vai além da realização do tipo Portanto a eficácia ou ineficácia do constrangimento para a obtenção de tal vantagem econômica é irrelevante O elemento subjetivo geral portanto é acrescido do elemento subjetivo especial do tipo constituído pelo especial fim de obter indevida vantagem econômica para si ou para outrem que foi analisado melhor no tópico anterior 6 Extorsão majorada coautoria e emprego de armas A extorsão cujo parentesco com o crime de roubo poderia qualificálos como irmãos gêmeos consagra praticamente as mesmas majorantes deste dizse praticamente pelo fato de tratarse de apenas duas das hoje cinco causas de aumento previstas para o roubo quais sejam ser o crime cometido por duas ou mais pessoas ou com emprego de arma A própria majoração para os dois crimes é a mesma de um terço até metade 61 Se a extorsão é cometida por duas ou mais pessoas Ao contrário do furto e do roubo a redação do artigo exige que o crime seja cometido por duas ou mais pessoas Por isso na extorsão é indispensável a presença e efetiva participação na execução material do fato de duas ou mais pessoas ainda que qualquer delas seja inimputável Não basta para configurar a majorante a simples participação em sentido estrito instigação e cumplicidade Mantendo coerência com a orientação que sustentamos longamente ao examinar o crime de furto repetido no roubo discordamos do entendimento de Luiz Regis Prado segundo o qual nessa majorante no crime de extorsão é dispensável que todos estejam presentes no locus delicti exigindose somente os requisitos inerentes ao tema de concurso de pessoas art 29 do CP A nosso juízo é absolutamente indispensável a contribuição efetiva de mais de uma pessoa no cometimento de qualquer desses crimes mas especialmente no de extorsão onde o Código Penal é muito mais enfático referindose aliás a ser o crime cometido por duas ou mais pessoas Na verdade não se pode esquecer que concurso de pessoas é gênero do qual decorrem as espécies coautoria e participação cujos conceitos examinamos ao fazer o estudo do crime de furto para onde remetemos o leitor Em nossa concepção quando o texto legal referese taxativamente a ser o crime cometido por duas ou mais pessoas está inegavelmente fazendo uma opção limitadora pela coautoria excluindo dessa forma a mera participação em sentido estrito Por isso é necessário que as duas ou mais pessoas realizem materialmente a conduta delituosa sendo insuficiente a mera instigação ou cumplicidade participação em sentido estrito especialmente considerando o fundamento políticocriminal da majorante dificulta defesa da vítima maior perigosidade etc Convém recordar que coautoria é a realização conjunta por mais de uma pessoa da mesma infração penal É a atuação consciente de estar contribuindo na realização comum de uma infração penal Todos participam da realização do comportamento típico sendo desnecessário que todos pratiquem o mesmo ato executivo 62 Com emprego de arma Segundo o texto legal para a tipificação desta majorante a extorsão deve ser cometida com emprego de arma é indispensável portanto o emprego efetivo de arma sendo insuficiente portála ou simplesmente ostentála 1º o que nesses casos poderia configurar apenas a grave ameaça Em outros termos a infração penal deve ser cometida com emprego de arma o que significa o uso real efetivo concreto desse instrumento A necessidade do emprego efetivo de arma no cometimento do crime é tão flagrante que o próprio Superior Tribunal de Justiça no infeliz episódio de sumular como majorante o emprego de arma de brinquedo fêlo contudo somente em relação ao roubo sem estendê la à extorsão Desnecessária portanto qualquer consideração neste momento a respeito da possibilidade de arma de brinquedo poder majorar a pena que a exemplo do roubo pode no máximo caracterizar ameaça elementar típica da extorsão 7 Omissão da Lei n 942696 majorantes relativas a veículo automotor O roubo e a extorsão sempre receberam o mesmo tratamento nas esferas legislativa doutrinária e jurisprudencial as mesmas penas as mesmas majorantes e as mesmas qualificadoras Esse tratamento minimizou eventuais equívocos na definição jurídica do fato que muitas vezes é de difícil distinção A partir da Lei n 942696 o roubo passou a ter um tratamento mais duro enquanto a extorsão não recebeu as duas novas majorantes do 2º do art 157 quais sejam subtração de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior inciso IV e o agente manter a vítima em seu poder restringindo sua liberdade inciso V 8 Extorsão qualificada lesão grave ou morte Na extorsão praticada com violência na qual não se inclui a grave ameaça o 2º manda aplicar o 3º do art 157 que dispõe Se da violência resulta lesão corporal grave a pena é de reclusão de 7 sete a 15 quinze anos além de multa se resulta morte a reclusão é de 20 vinte a 30 trinta anos sem prejuízo da multa As duas hipóteses elencadas como no roubo caracterizam condições de exasperação da punibilidade em razão da maior gravidade do resultado Na extorsão como referimos no estudo do roubo pretendeu o legislador criar duas figuras de crimes qualificados pelo resultado para alguns crimes preterdolosos A extorsão qualificada pela morte da vítima também foi qualificada como crime hediondo art 9º da Lei n 807290 Enfim a exemplo do que o próprio dispositivo legal faz remetemos o leitor para o que dissemos a respeito das qualificadoras quando abordamos o crime de roubo para não sermos repetitivos 9 Roubo e extorsão semelhanças e dessemelhanças No roubo e na extorsão o agente emprega violência ou grave ameaça para submeter a vontade da vítima No roubo o mal é iminente e o proveito é contemporâneo na extorsão o mal prometido é futuro e futura também é a vantagem que o agente objetiva No roubo o agente toma a coisa ou obriga a vítima sem opção a entregála na extorsão a vítima pode em princípio optar entre acatar a ordem e oferecer resistência Em outros termos como afirmava Frank o ladrão subtrai o extorsionário faz com que se lhe entregue a coisa Questionando os diversos critérios apontados como diferenciadores dos dois crimes Nélson Hungria destacava o seguinte No roubo há uma contrectatio na extorsão há uma traditio Doutrina e jurisprudência procuram extremar diferenças entre roubo e extorsão havendo ato da vítima no despojamento de bens será extorsão não havendo ato da vítima será roubo No roubo o agente subtrai a coisa mediante violência na extorsão a vítima a entrega ao agente Eventual equívoco de interpretação não causa prejuízo considerável na medida em que as penas são iguais No estelionato diferentemente a vítima é enganada com fraude na extorsão é coagida com violência real ou ficta Mas as distinções entre roubo e extorsão nem sempre são assim tão claras haja vista a grande desinteligência que reina em doutrina e jurisprudência sobre a espécie de ambos conforme examinaremos a seguir 91 Roubo e extorsão são crimes da mesma espécie Haveria no Código Penal brasileiro algum tipo penal mais semelhante em seus elementos estruturais que roubo e extorsão É por demais frequente a dúvida sobre a correta capitulação entre um e outra quando não um nível jurisdicional adota uma capitulação e outro dá qualificação diversa ao mesmo fato no mesmo processo aliás o próprio Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 667 interpreta equivocadamente ao qualificar de extorsão o assalto exemplificado por Von Liszt que inegavelmente constitui roubo se o saudoso penalista vivesse os tempos atuais talvez não incorresse nesse equívoco Assim qual seria a razão de invariavelmente os tribunais brasileiros a partir dos superiores STF Ver 50139 Rel Min Carlos Velloso DJU 3081996 p 30606 STJ HC 10375MG Rel Min Fernando Gonçalves DJU 22111999 afirmarem singelamente que não são crimes da mesma espécie além da finalidade de cumularem as sanções penais Alguém do meio com o mínimo de senso jurídico teria alguma dificuldade em admitir que o popular assalto é uma das tantas modalidades de crime de roubo Pois mesmo nesses casos a jurisprudência consegue vacilar A título puramente ilustrativo transcrevemos a ementa de um acórdão sem qualquer preferência pois poderia ser qualquer outro dos milhares sobre o mesmo tema No assalto é irrelevante que a coisa venha a ser entregue pela vítima ao agente ou que este a subtraia Tratase de roubo Constrangido o sujeito passivo a entrega do bem não pode ser considerada ato livremente voluntário tornando tal conduta de nenhuma importância no plano jurídico TACrimSP AC 882591 Rel Penteado Navarro RT 718429 Preferimos citar esse acórdão porque faz a opção correta isto é segundo os preceitos legais é roubo mas demonstra implicitamente a divergência sobre a capitulação da conduta tanto que o relator teve de demonstrar que assalto tipifica roubo e não extorsão Como sustentar então sem incorrer em paradoxos que roubo e extorsão não são crimes da mesma espécie Por certo não há nenhuma razão técnicojurídica dogmática ou científica para negar essa obviedade a não ser a adoção de uma políticacriminal exasperadora na linha do movimento de lei e ordem incompatível com um moderno Estado Democrático de Direito 92 Roubo e extorsão constrangimento mediante violência ou grave ameaça Na extorsão há constrangimento mediante violência ou grave ameaça de mal posterior visando a futura vantagem ao passo que no roubo o mal é imediato e o prejuízo é atual Neste crime o agente subtrai ele próprio mediante violência ou grave ameaça a coisa de quem a detém ao passo que na extorsão é a vítima que é constrangida a entregála geralmente em intervalo de tempo irrelevante entre a coação daquele e a ação desta Aliás para os saudosistas o velho Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 66 com a majestade de sempre estabelecia com brilho invulgar a distinção das duas infrações nos seguintes termos Há entre a extorsão e o roubo aos quais é cominada pena idêntica uma tal afinidade que em certos casos praticamente se confundem Conceitualmente porém a distinção está em que na extorsão diversamente do roubo é a própria vítima que coagida se despoja em favor do agente No entanto prossegue Hungria do ponto de vista prático tanto faz que o agente tire a carteira ou que esta lhe seja entregue pela vítima Mas se o fundamento da miopia jurídica que acode alguns tribunais reside realmente na ânsia de majorar a pena talvez seja menos comprometedor tecnicamente refugiarse na subjetividade da graduação da pena em vez de continuar negando o óbvio ao afirmar que roubo e extorsão não são crimes da mesma espécie evitando a condição do pior cego isto é daquele que não quer enxergar Pelo menos na dosimetria penal podem elevar a pena até o triplo considerandose que ambos os crimes são praticados com violência ou grave ameaça art 71 parágrafo único Mesmo que a exasperação penal seja um pouco forçada seria digamos juridicamente menos constrangedor mantendo a linha verbal da extorsão Para encerrar este tópico afirmar que roubo e extorsão não são crimes da mesma espécie depois de tudo isso é mutatis mutandis como conclui lapidarmente Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 67 o dizerse que no roubo a violência e a locupletação se realizam no mesmo contexto de ação enquanto na extorsão há um lapso de tempo ainda que breve entre uma e outra é distinguir onde a lei não distingue Tanto pode haver extorsão com violência atual e futura e é o caso mais frequente quanto com violência e locupletação contemporâneas Assim afirmar que extorsão e roubo não são crimes da mesma espécie é distinguir onde a lei não distingue e para agravar a situação do réu é absolutamente inadmissível 10 Crimes de extorsão e de constrangimento ilegal conflito aparente de normas A extorsão podese afirmar é uma espécie do gênero crime de constrangimento ilegal art 146 Na verdade o constrangimento ilegal é qualificado pela especial intenção de obter indevida vantagem econômica que aliás é a única diferença relevante na estrutura típica dos dois crimes afinal exatamente por essa razão a ação de constranger é transportada do Título dos Crimes contra a Pessoa para o Título dos Crimes contra o Patrimônio Na verdade estamos diante do denominado conflito aparente de normas que nesse caso resolvese pelo princípio da especialidade Com efeito considerase especial uma norma penal em relação a outra geral quando reúne todos os elementos desta acrescidos de mais alguns denominados especializantes Isto é a norma especial crime de extorsão acrescenta elemento próprio intuito de obter indevida vantagem econômica à descrição típica prevista na norma geral crime de constrangimento ilegal Assim podese concluir toda conduta que realiza o tipo do crime especial realiza também necessariamente o tipo do geral enquanto o inverso não é verdadeiro Para sintetizar com esse elemento especializante intuito de obter indevida vantagem econômica não há nenhuma dificuldade para solucionar esse conflito aparente de normas A INCONSTITUCIONALIDADE DA NOVA TIPIFICAÇÃO DO CRIME DE SEQUESTRO RELÂMPAGO 11 Extorsão mediante restrição de liberdade Sustentamos que nos casos popularmente conhecidos como sequestrorelâmpago cometidos diariamente nas principais capitais brasileiras em que a vítima é colocada em portamalas de veículos pelas mãos de marginais perigosos que percorrem por horas a fio os mais variados bairros da cidade ameaçandoa gravemente exigindo lhe extorquindo mais bens ou valores às vezes a violentando sexualmente e cujo resultado final é absolutamente imprevisível e completamente aleatório configurase crime mais grave que a simples majorante da restrição da liberdade da vítima A moldura legal adequada para esse tipo de conduta cujo resultado mais ou menos grave não passa de mero detalhe acidental ou circunstancial do evento a nosso juízo é o art 159 do Código Penal ou seja extorsão mediante sequestro Esta por ser mais grave absorve o crime de roubo afastando consequentemente o concurso com esse crime BITENCOURT Cezar Roberto Tratado de direito penal parte especial 5 ed São Paulo Saraiva 2009 v 3 p 86 111 Nova tipificação extorsão especial O novo texto legal no entanto preferiu tipificálo como uma modalidade de extorsão especial acrescentando o 3º no art 158 com a redação supra Lei n 119232009 A partir dessa previsão legal poderemos ter paradoxalmente infrações penais com restrição da liberdade da vítima necessárias e não necessárias 112 Extorsão mediante restrição da liberdade Embora não nos pareça ser a tipificação mais adequada considerandose que há um sequestro para extorquir o legislador optou pelo termo médio isto é nem pela extorsão mediante sequestro art 159 nem pela extorsão simples do caput do art 158 mas por uma figura especial de extorsão qual seja a extorsão com sequestro da vítima ou como preferimos denominála extorsão mediante restrição de liberdade Dessa forma o novo texto legal pôs termo à divergência relativa à tipificação dessa conduta delituosa que passou a ser o grande terror da vida urbana e reclamava uma definição precisa de sua adequada moldura típica em respeito à função taxativa da tipicidade estrita Desnecessário repetir a grande semelhança que existe entre os crimes de sequestro e cárcere privado art 148 roubo art 157 extorsão art 158 e extorsão mediante sequestro art 159 a despeito das consideráveis diferenças das sanções cominadas Apesar de o sequestrorelâmpago poder antes da Lei n 119232009 agasalharse segundo algumas correntes doutrináriojurisprudenciais ora no crime de roubo ora no de extorsão e ora no de extorsão mediante sequestro faziase necessária uma tipificação específica para se afastar a insegurança jurídica que rondava a todos 113 Interpretação conglobada caput e 3º A interpretação do novo 3º deve necessariamente ser conjunta com a previsão do caput resultando assim constranger mediante restrição da liberdade da vítima e essa condição seja necessária para a obtenção da vantagem econômica Em outros termos essa novel figura delituosa deve apresentar os seguintes elementos a constrangimento ilegal b especial fim de obter vantagem econômica c restrição da liberdade da vítima como condição necessária O verbo nuclear constranger que integra a nova figura delitiva e mediante violência ou grave ameaça constantes do caput encontramse implícitas na elementar mediante restrição da liberdade que é uma das modalidades mais graves de violência devidamente criminalizada Mas é necessário que o constrangimento ilegal tenha a finalidade de obter vantagem econômica indevida e que ocorra mediante restrição da liberdade da vítima como condição indispensável para sua concretização 114 Elementar típica restrição da liberdade A restrição da liberdade da vítima como condição necessária para a obtenção da vantagem econômica é elementar indispensável para a caracterização dessa infração penal No entanto a restrição da liberdade poderá dependendo das circunstâncias assumir a natureza de outro crime como por exemplo os dos arts 148 157 2º V e 159 na medida em que priva a vítima de sua liberdade ou pode até mesmo configurar outro crime mais grave absorvendo no caso o roubo ou a própria extorsão como por exemplo a extorsão mediante sequestro art 159 3º Por isso é preciso cautela na análise dessa questão sob pena de deixarse praticamente impune o crime de sequestro Assim quando o sequestro manutenção da vítima em poder do agente for praticado concomitantemente com o roubo ou pelo menos como meio de execução do roubo ou como garantia contra ação policial estará configurada essa infração penal própria ou imprópria ou mesmo a sua majorante constante no inciso V do art 157 Agora quando eventual sequestro for praticado depois da consumação do roubo de veículo automotor por exemplo sem nenhuma conexão com sua execução ou garantia de fuga não se estará diante da majorante especial 2º V do art 157 mas tratarseá de concurso de crimes roubo e a nova extorsão pode inclusive tipificar a extorsão mediante sequestro quando por exemplo exigir que a vítima mantenha contato com terceiros para assegurarlhe a vantagem econômica como condição de sua liberação 115 Indispensabilidade da restrição da liberdade No entanto se a restrição da liberdade da vítima imposta pelo agente não for indispensável para a prática da ação o crime tipificado não se adequará ao disposto neste 3º podendo na realidade tipificar o crime de roubo próprio ou impróprio ou a extorsão simples prevista no caput do art 158 Nesse sentido passamos a ter a restrição da liberdade da vítima como condição necessária ou como condição desnecessária ou supérflua da figura típica Poderão ocorrer as seguintes situações a não necessitando da colaboração da vítima para apoderarse da coisa pretendida restringir sua liberdade de locomoção visando somente garantir o êxito da empreitada subtração ou fuga configurará roubo próprio ou impróprio dependendo das circunstâncias b quando no entanto o agente necessitar da restrição da liberdade da vítima para a obtenção da vantagem econômica privála de sua locomoção pelo tempo necessário e como condição para conseguila configurará a extorsão mediante restrição de liberdade sequestrorelâmpago Em outros termos não é a simples restrição da liberdade da vítima que caracterizará essa extorsão especial mas sua necessidade como condição para obter a vantagem econômica pretendida pois sendo desnecessária configurará outra infração penal 116 Excepcionalmente pode retroagir Finalmente considerando que a lei penal mais benéfica retroage nos termos do art 5 XL da Constituição Federal deverão ser revistos todos os casos que possam eventualmente ser punidos mais gravemente Situação semelhante pode ter ocorrido com aqueles casos em que se interpretou como extorsão mediante sequestro Dessa forma devese verificar casuisticamente qual a interpretação que fora dada à situação fática agora criminalizada como modalidade de extorsão que normalmente era considerada como extorsão mediante sequestro art 159 12 Sequestrorelâmpago qualificado pelo resultado Resultando do sequestrorelâmpago lesão corporal grave ou morte aplicamse as mesmas penas previstas para os casos de extorsão mediante sequestro que atinjam os mesmos resultados art 159 2º e 3º Constatase que nessa previsão os mesmos resultados lesão corporal grave ou morte sofrem punição bem mais grave que a prevista no 2º para a forma qualificada da extorsão tipificada no caput desse artigo Em outros termos para a hipótese do 2º comina se a mesma pena do roubo qualificado pelo resultado sete a quinze anos de reclusão se resulta lesão corporal e vinte a trinta anos se resulta morte além da pena de multa para a hipótese do 3º que ora examinamos cominase a mesma pena da extorsão mediante sequestro dezesseis a vinte e quatro anos se resulta lesão corporal grave e vinte e quatro a trinta anos se resulta morte além da multa Podemos achar e na realidade achamos que as sanções cominadas são exageradamente graves mas não deixam de apresentar certa coerência com a previsão constante do caput que comina pena intermediária entre roubo e extorsão mediante sequestro Mas essa coerência intrínseca no entanto não salva a irrazoabilidade de seu conteúdo que examinaremos 121 Não caracteriza crime hediondo não há previsão legal A despeito de entendimento em sentido contrário temos dificuldade em aceitar esse entendimento GOMES Luiz Flavio SANCHES Rogério Sequestrorelâmpago deixou de ser crime hediondo Lei 119232009 é mais favorável ao réu disponível em httpwwwlfgcombrpublic htmlarticlephp story20090420144538510 acesso em 9102009 por esbarrar no princípio da reserva legal Com efeito nesse sentido a conhecida Lei dos Crimes Hediondos Lei n 807290 relaciona numerus clausus dentre outras as seguintes infrações III extorsão qualificada pela morte art 158 2º IV extorsão mediante sequestro sic e na forma qualificada art 159 caput e 1º 2º e 3º De notar que a norma repressiva especifica não apenas o nomen iuris das infrações penais classificadas como crimes hediondos como também indica os respectivos dispositivos legais artigos parágrafos e incisos dentre os quais à evidência não se encontra o 3º que é novo evidentemente Invocarse por outro lado que o crime igualmente é de extorsão e que o resultado morte também é igual o que justificaria o seu reconhecimento como crime hediondo viola a função da taxatividade do princípio da tipicidade além de implicar a aplicação de analogia in malan partem que é inadmissível Por fim tampouco pode ser invocado o aspecto de cominar as sanções previstas nos 2º e 3º do art 159 que é definido como crime hediondo Convém destacar enfim que a previsão da segunda parte do 3º não converte esse crime em extorsão mediante sequestro apenas comina as penas que lhe são correspondentes sem atribuirlhe por óbvio a mesma natureza E essa cominação inquestionavelmente não tem o condão de alterar a espécie de infração penal e por essa mesma razão não o transforma em crime hediondo por falta de previsão legal expressa Em síntese a extorsão mediante restrição da liberdade da vítima qualificada pelo resultado morte não pode ser reconhecida como crime hediondo por absoluta falta de previsão legal e pela impossibilidade da adoção de analogia in malan partem a despeito do respeitável entendimento em sentido contrário O que a lei determina é somente a aplicação das mesmas penas nada mais Em outros termos a cominação das penas da extorsão mediante sequestro qualificada não converte nesse crime a extorsão mediante restrição da liberdade qualificada pelo resultado morte 13 A gravidade da semelhança entre roubo e extorsão especial Não há no Código Penal brasileiro tipos penais mais assemelhados em seus elementos estruturais que roubo e extorsão tanto que não raro surge a dúvida sobre a correta capitulação entre um e outra recebendo capitulações diversas nos dois graus de jurisdição o mesmo fato num mesmo processo Nesse sentido o que já era difícil acabou ficando muito pior A agravação dessa semelhança reside fundamentalmente na diversidade de punição que não é pouca coisa já que mera questão interpretativa pode resultar em aplicação de pena cinquenta por cento acima considerandose o mínimo legal cominado quatro anos para o roubo e seis para o sequestrorelâmpago que convenhamos não é pouca coisa Com efeito no roubo e na extorsão o agente emprega violência ou grave ameaça para subjugar a vontade da vítima no roubo o mal é iminente e o proveito é contemporâneo na extorsão o mal prometido é de regra futuro imediato como futura também é teoricamente a vantagem que o agente objetiva No roubo o agente toma a coisa ou obriga a vítima sem opção a entregála na extorsão afirmase que a vítima pode em princípio optar entre acatar a ordem ou oferecer resistência embora a prudência recomende nesses tempos bicudos não resistir Mas não se pode negar que todo esse magistério clássico que nos vem da doutrina tradicional ou está superado ou é inaplicável no denominado sequestrorelâmpago que por ser relâmpago exige uma satisfação imediata e nesse aspecto confundese ainda mais com o crime de roubo Na realidade essa faculdade ou opção referida à extorsão que teria ou não a liberdade de entregar a coisa ou objeto exigido pelo agente é praticamente inexistente pois todos os indicadores ante a gravidade da violência generalizada determinam que se acate a ordem do extorquidor ou extorsionário sob pena de pagar com a própria vida eventual rebeldia no atendimento do que lhe é determinado 131 Roubo e extorsão faculdade de escolha Que faculdade seria essa de a vítima escolher ou decidir atender à exigência do assaltante a esse preço À evidência tratase de uma das hipóteses da denominada coação irresistível em que a vítima não tem alternativa senão submeterse à vontade do extorquidor Aliás estamos diante de uma vontade viciada que equivale à inexistência de vontade decorrente de uma coação irresistível Com efeito coação irresistível é tudo o que pressiona a vontade impondo determinado comportamento eliminando ou reduzindo o poder de escolha Na coação moral irresistível existe vontade embora seja viciada BITENCOURT Cezar Roberto Tratado de direito penal parte geral 14 ed São Paulo Saraiva 2009 v 1 p 387 isto é não é livremente formada pelo agente Nas circunstâncias em que a ameaça é irresistível não é exigível que o agente se oponha a essa ameaça especialmente quando corre risco de vida ou à sua integridade física ou de sua família Se isso vale para os acusados em geral com igual razão deve servir para demonstrar que a vítima não entrega a coisa livremente mas mediante coação a qual nas circunstâncias não podia resistir Nesse sentido encontrase completamente superada aquela velha máxima de Frank segundo a qual o ladrão subtrai o extorsionário faz com que se lhe entregue a coisa pois em verdade também no roubo muitas vezes o ladrão assaltante faz a vítima entregarlhe a coisa desejada como destaca lucidamente Martinelli MARTINELLI João Paulo Orsini Projeto de lei que tipifica o sequestrorelâmpago aprovado pelo Senado disponível em httpwwwibccrimorgbrsitenoticiasconteudophpnot id13263 acesso em 8102009 A distinção entre roubo e extorsão baseada apenas no comportamento do agente e da vítima é insuficiente Dizer que o caso é de extorsão porque a vítima é quem age não satisfaz a problemática Se assim fosse quando a vítima entregar seu veículo mediante ameaça também deveria ser o crime de extorsão o mesmo valendo para a hipótese daquele que enfia a mão no bolso abre a carteira e entrega o dinheiro exigido Em ambas as situações houve um comportamento ativo da vítima e nem por isso teremos extorsão 132 Irrelevância de eventual ato da vítima Historicamente se tem dito que havendo ato da vítima no despojamento de bens será extorsão não havendo ato da vítima será roubo que no roubo o agente subtrai a coisa mediante violência na extorsão a vítima a entrega ao agente para não sofrer violência e que eventual equívoco de interpretação não causaria prejuízo considerável na medida em que as penas eram iguais No entanto as distinções entre roubo e extorsão nem sempre são assim tão precisas haja vista a grande desinteligência que reina em doutrina e jurisprudência sobre a espécie de ambos havendo não se pode ignorar uma zona gris em que as duas figuras se confundem sendo difícil precisar com segurança a sua identificação Paradigmático nesse sentido o seguinte acórdão já mencionado No assalto é irrelevante que a coisa venha a ser entregue pela vítima ao agente ou que este a subtraia Tratase de roubo Constrangido o sujeito passivo a entrega do bem não pode ser considerado ato livremente voluntário tornando tal conduta de nenhuma importância no plano jurídico TACrimSP AC 882591 rel Penteado Navarro RT 718429 Não se ignorou nesse julgamento a distinção entre roubo e extorsão apenas o julgador considerou irrelevante a máxima de que ladrão subtrai a coisa no roubo e a vítima a entrega na extorsão 14 Equivocada exasperação punitiva No sistema anterior essa dificuldade não apresentava maiores consequências na medida em que a sanção aplicável na extorsão era exatamente a mesma do roubo ao contrário do que passa a ocorrer com a nova definição legal Na realidade confundemse os aspectos temporais nos crimes de roubo e extorsão de tal modo que não mais se pode afirmar que violência e locupletação num e noutra realizamse em contextos diferentes Tanto pode haver extorsão com violência e vantagem atuais como com violência e locupletação contemporâneas que é exatamente o caso do sequestrorelâmpago e somente essa fugacidade temporal não pode justificar a absurda elevação das sanções cominadas nos limites que destacamos adiante Com efeito qual é a diferença entre o assalto em que o indivíduo apontando uma arma mesmo branca exige que a vítima lhe entregue a carteira roubo e a restrição da liberdade desta exigindolhe a entrega do cartão eletrônico e sua senha sequestrorelâmpago Em nenhuma das hipóteses a vítima dispõe da liberdade de escolha de entregar ou não o objeto exigido pelo assaltante ou seja o atendimento da exigência do ladrão ou extorsionário não resulta da deliberação da vítima como imaginava a antiga doutrina mas decorre da imposição das circunstâncias cujo desatendimento em ambos os casos pode provocar resultados imprevisíveis e irreversíveis como v g a própria morte Pois bem essa identidade de ação causa e consequências impede que se imponham sanções ao sequestrorelâmpago tão absurdamente superiores às previstas para o crime de roubo por violar os sagrados princípios da proporcionalidade da razoabilidade da culpabilidade e da dignidade humana decorrendo daí sua inevitável inconstitucionalidade pois como sustentava Hungria Tanto pode haver extorsão com violência atual e futura e é o caso mais frequente sic quanto com violência e locupletação contemporâneas HUNGRIA Nélson Comentários ao Código Penal p 67 141 A desproporcional cominação de penas entre roubo e extorsão especial O Poder Legislativo não pode atuar de maneira imoderada nem formular regras legais cujo conteúdo revele deliberação absolutamente divorciada dos padrões de razoabilidade assegurados pelo nosso sistema constitucional afrontando diretamente o princípio da proporcionalidade como demonstra uma singela comparação entre as sanções cominadas a algumas infrações penais semelhantes O roubo que como acabamos de demonstrar é uma espécie de irmão siamês do crime de extorsão sendo o paradigma ideal para essa análise recebe a cominação em três marcos diferentes de penas consideramos desnecessário ficar repetindo a existência da pena de multa considerandose que todos os crimes contra o patrimônio Título II do Código Penal trazem cumulada a previsão da pena de multa a roubo simples caput quatro a dez anos b qualificado pela lesão corporal grave 3º 1ª parte sete a quinze anos c qualificado pelo resultado morte 3º 2ª parte vinte a trinta anos Previsão que convenhamos já é um exagero comparandose ao homicídio qualificado por exemplo com pena prevista de doze a trinta anos numa clara demonstração de que para o legislador brasileiro o patrimônio é mais valorizado que a própria vida humana As penas previstas para a extorsão art 158 caput que agora se justifica adjetivála de simples são exatamente as mesmas cominadas ao crime de roubo inclusive as relativas às figuras majoradas 1º e às qualificadas em decorrência de lesão corporal ou morte 2º Essa paridade no tratamento das consequências penais de ambas as figuras elimina por completo eventual interpretação equivocada que as situações fáticolimítrofes nos proporcionam com alguma frequência como demonstramos alhures No entanto as penas cominadas ao sequestrorelâmpago injustificadamente quer pela natureza da infração quer pela gravidade de suas consequências materiais quer por razões políticocriminais respaldadas pelo Estado Democrático de Direito recebem desproporcionalmente a seguinte cominação a modalidade simples seis a doze anos 3º 1ª parte b qualificada pela lesão corporal grave 3º 2ª parte dezesseis a vinte e quatro anos c qualificada pelo resultado morte 3º 2ª parte vinte e quatro a trinta anos 15 Violação da proporcionalidade e inconstitucionalidade O modelo político consagrado pelo Estado Democrático de Direito determina que todo o Estado em seus três Poderes bem como nas funções essenciais à Justiça resulta vinculado em relação aos fins eleitos para a prática dos atos legislativos judiciais e administrativos Em outros termos toda atividade estatal é sempre vinculada axiomaticamente pelos princípios constitucionais explícitos e implícitos As consequências jurídicas dessa constituição dirigente são visíveis A primeira delas verificase pela consagração do princípio da proporcionalidade não apenas como simples critério interpretativo mas como garantia legitimadoralimitadora de todo o ordenamento jurídico infraconstitucional Assim deparamonos com um vínculo constitucional capaz de limitar os fins de um ato estatal e os meios eleitos para que tal finalidade seja alcançada Conjugase pois a união harmônica de três fatores essenciais a adequação teleológica todo ato estatal passa a ter uma finalidade política ditada não por princípios do próprio administrador legislador ou juiz mas sim por valores éticos deduzidos da Constituição Federal vedação do arbítrio Übermassverbot b necessidade Erforderlichkeit o meio não pode exceder os limites indispensáveis e menos lesivos possíveis à conservação do fim legítimo que se pretende c proporcionalidade stricto sensu todo representante do Estado está obrigado ao mesmo tempo a fazer uso de meios adequados e de absterse de utilizar recursos ou meios desproporcionais BONAVIDES Paulo Curso de direito constitucional 6 ed São Paulo Malheiros 1994 p 356397 151 Abrangência do princípio da proporcionalidade O campo de abrangência e por que não dizer de influência do princípio da proporcionalidade vai além da simples confrontação das consequências que podem advir da aplicação de leis que não observam dito princípio Na verdade modernamente a aplicação desse princípio atinge o exercício imoderado de poder inclusive do próprio Poder Legislativo no ato de legislar Não se trata evidentemente de questionar a motivação interna da voluntas legislatoris e tampouco de perquirir a finalidade da lei que é função privativa do Parlamento Na realidade a evolução dos tempos temnos permitido constatar com grande frequência o uso abusivo do poder de fazer leis had hocs revelando muitas vezes contradições ambiguidades incongruências e falta de razoabilidade que contaminam esses diplomas legais com o vício de inconstitucionalidade 152 Controle de constitucionalidade pelo Poder Judiciário Esses excessos precisam encontrar dentro do sistema político jurídico alguma forma ou algum meio de se não combatêlos pelo menos questionálos A única possibilidade no Estado Democrático de Direito sem qualquer invasão das atribuições da esfera legislativa é por meio do controle de constitucionalidade exercido pelo Poder Judiciário O exame do respeito ou violação do princípio da proporcionalidade passa pela observação e apreciação de necessidade e adequação da providência legislativa numa espécie de relação custo benefício para o cidadão e para a própria ordem jurídica Pela necessidade devese confrontar a possibilidade de com meios menos gravosos atingir igualmente a mesma eficácia na busca dos objetivos pretendidos Pela adequação esperase que a providência legislativa adotada apresente aptidão suficiente para atingir esses objetivos Nessa linha destaca Gilmar Mendes MENDES Gilmar Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade p 50 a modo de conclusão em outros termos o meio não será necessário se o objetivo almejado puder ser alcançado com a adoção de medida que se revele a um só tempo adequada e menos onerosa Ressaltese que na prática adequação e necessidade não têm o mesmo peso ou relevância no juízo de ponderação Assim apenas o que é adequado pode ser necessário mas o que é necessário não pode ser inadequado e completa Gilmar Mendes de qualquer forma um juízo definitivo sobre a proporcionalidade da medida há de resultar da rigorosa ponderação e do possível equilíbrio entre o significado da intervenção para o atingido e os objetivos perseguidos pelo legislador proporcionalidade em sentido estrito 153 Equilíbrio da proporcionalidade em matéria penal Em matéria penal mais especificamente segundo Hassemer a exigência de proporcionalidade deve ser determinada mediante um juízo de ponderação entre a carga coativa da pena e o fim perseguido pela cominação penal HASSEMER Winfried Fundamentos del derecho penal trad de Francisco Muñoz Conde e Luís Arroyo Sapatero Barcelona Bosch 1984 p 279 Com efeito pelo princípio da proporcionalidade na relação entre crime e pena deve existir um equilíbrio abstrato legislador e concreto judicial entre a gravidade do injusto penal e a pena aplicada Ainda segundo a doutrina de Hassemer o princípio da proporcionalidade não é outra coisa senão uma concordância material entre ação e reação causa e consequência jurídicopenal constituindo parte do postulado de Justiça ninguém pode ser incomodado ou lesionado em seus direitos com medidas jurídicas desproporcionadas HASSEMER Fundamentos del derecho penal p 279 Ante todo o exposto por mais que se procure salvar o texto legal tentando darlhe uma interpretação conforme a Constituição Federal não vemos contudo outra alternativa razoável que não a declaração de inconstitucionalidade do preceito secundário da nova infração penal conhecido como sequestrorelâmpago 16 Consumação e tentativa 161 Consumação Consumase a extorsão com o comportamento da vítima isto é fazendo tolerando que se faça ou deixando de fazer alguma coisa desde que a ação constrangedora do sujeito ativo tenha sido movida pela finalidade de obter vantagem econômica indevida Enfim para a consumação é desnecessária a efetiva obtenção de vantagem patrimonial pois a extorsão se consuma com o resultado do constrangimento isto é com a vítima sendo constrangida a fazer omitir ou tolerar que se faça A eventual obtenção de vantagem patrimonial se ocorrer representará tão somente o exaurimento da extorsão que já estava consumada Reforçando a extorsão consumase no exato momento em que a vítima com comportamento positivo ou negativo faz deixa de fazer ou tolera que se faça alguma coisa Nesse sentido merece ser transcrito o entendimento de Guilherme de Souza Nucci Código Penal comentado p 451 com o qual estamos de pleno acordo quando sustenta que o crime de extorsão compõese de três estágios in verbis 1º o agente constrange a vítima valendose de violência ou grave ameaça 2º a vítima age por conta disso fazendo tolerando que se faça ou deixando de fazer alguma coisa 3º o agente obtém a vantagem econômica almejada Este último estágio é apenas configurador do seu objetivo com o intuito de não sendo necessário estar presente para concretizar a extorsão 162 Tentativa Independentemente da concepção material ou formal do crime de extorsão a tentativa é admissível Cumpre destacar que ainda que as demais elementares estejam todas presentes a extorsão não estará consumada se a vítima em razão do constrangimento sofrido não se submeter à vontade do autor fazendo tolerando ou deixando de fazer alguma coisa Para sintetizar o simples constrangimento apesar de tratarse de crime formal sem a atuaçâo da vítima fazendo tolerando ou deixando de fazer alguma coisa não passa de tentativa A eventual prisão em flagrante do agente no momento em que recebe a vantagem econômica não configura a tentativa pois a extorsão como vimos já estará consumada Nessa linha podese lembrar o seguinte acórdão do STJ relatado pelo Ministro Edson Vidigal No delito de extorsão não há reconhecer simples tentativa mas crime consumado quando o agente chega a receber vantagem econômica indevida mesmo que posteriormente tenha sido obrigado a devolvêla com a pronta intervenção da polícia RE 100640PR Convém no entanto nesse tipo de situação ter cautela para não admitir como válida a figura do flagrante provocado ou crime de ensaio que não se confunde com flagrante esperado ver nosso Tratado v l 17 Pena e ação penal Na extorsão simples a pena é de reclusão de quatro a dez anos na majorada a pena é elevada de um terço até metade na qualificada pelo resultado lesão grave a reclusão será de sete a quinze anos se for morte será de vinte a trinta anos Em todas as hipóteses a pena de prisão será cumulativa com a de multa Nas hipóteses do 2º o art 9º da Lei n 807290 prevê a majoração de metade da pena aplicada respeitado o limite de trinta anos encontrandose a vítima em qualquer das hipóteses previstas no art 224 do Código Penal A ação penal como não poderia deixar de ser pela gravidade desse crime é de natureza pública absoluta isto é incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 96 do STJ O crime de extorsão consumase independentemente da obtenção da vantagem indevida Ausente o constrangimento mediante violência ou grave ameaça com intuito de obter vantagem econômica indevida o delito do art 158 do Código Penal não se tipifica TJRS Apelação 70021227061 Rel Luís Gonzaga da Silva Moura j 1411 2007 Extorsão Se a vítima reconhece de forma segura um dos acusados detidos em flagrante como sendo aquele que com ela contatava e lhe exigia numerário para a devolução da motocicleta bem assim como sendo o sujeito que lhe fazia ameaças merece crédito a palavra da vítima que firme e coerente ao longo do feito judicial e do inquérito autoriza a condenação pelo delito de extorsão Em relação ao corréu apelado tendo este ofertado justificativa plausível e não havendo outro elemento de prova quanto ao seu envolvimento no fato mas apenas indícios de ser mantida a absolvição TJRS Apelação 70018608992 Rel Roque Miguel Fank j 24102007 Extorsão Concurso material Causa de aumento Arma de fogo Necessidade de apreensão e perícia Para incidir as causas de aumento do crime de roubo pelo emprego de arma de fogo art 157 2º II CP e da extorsão art 158 1º CP mostrase necessária a apreensão e a perícia no objeto utilizado para verificar sua potencial eficácia para produzir disparos Tal necessidade fundase no mesmo argumento dado à revogação da Súmula n 174 do STJ Jurisprudência minoritária inclusive no STJ TJRS Apelação 70020483939 Rel Mario Rocha Lopes Filho j 1º82007 Hipótese na qual o réu após ter subtraído bens da vítima retiroulhe o cartão magnético constrangendoa a revelar a senha bancária além de ameaçar matála ressaltando possuir seu endereço caso voltasse do Banco e não a encontrasse no local dos fatos Configurada a prática dos delitos de roubo e extorsão em concurso material A jurisprudência desta Corte e do Supremo Tribunal Federal rechaçam a ocorrência de crime único em casos como o presente STJ HC 47395SP Rel Min Gilson Dipp j 2282006 Extorsão Inteligência da Súmula 96 do STJ Por ser delito formal no delito de extorsão temse por desnecessário o auferimento da vantagem indevida bastando para a consumação do delito tão somente o constrangimento da vítima STJ REsp 714949RS Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 482005 Arts 158 1º e 159 1º do Código Penal Súmula 96 do STJ Continuidade delitiva Crimes de espécies diferentes Concurso material O delito de extorsão enquanto crime formal prescinde para sua consumação da efetiva obtenção da indevida vantagem econômica sendo esta mero exaurimento da conduta criminosa Precedentes e Súmula 96 do STJ Não há como se reconhecer a continuidade delitiva entre os delitos de extorsão e extorsão mediante sequestro porquanto aquela exige crimes da mesma espécie e homogeneidade de execução o que inocorre na hipótese STJ REsp 696352SP Rel Min Félix Fischer j 1532005 Art 157 2º I II e V e art 158 1º do Código Penal Delito único Concurso material Na linha de precedentes desta Corte e do Pretório Excelso configuramse os crimes de roubo e extorsão em concurso material se o agente após subtrair alguns pertences da vítima obrigaa a entregar o cartão do banco e fornecer a respectiva senha STJ REsp 684423SP Rel Min Félix Fischer j 7122004 O delito de extorsão enquanto crime formal prescinde para sua consumação da efetiva obtenção da indevida vantagem econômica sendo esta mero exaurimento da conduta criminosa Precedentes e Súmula 96 do STJ STJ REsp 641797SP Rel Min Félix Fischer j 4112004 Extorsão mediante sequestro Art 159 Sequestrar pessoa com o fim de obter para si ou para outrem qualquer vantagem como condição ou preço do resgate Pena reclusão de 8 oito a 15 quinze anos Caput com redação determinada pela Lei n 8072 de 25 de julho de 1990 V art 20 da Lei n 717083 Lei de Segurança Nacional V art 1º III e da Lei n 796089 prisão temporária V arts 1º IV e 9º da Lei n 807290 crimes hediondos 1º Se o sequestro dura mais de 24 vinte e quatro horas se o sequestrado é menor de 18 dezoito ou maior de 60 sessenta anos ou se o crime é cometido por bando ou quadrilha 1º com redação dada pela Lei n 10741 de 1º de outubro de 2003 Pena reclusão de 12 doze a 20 vinte anos 2º Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave Pena reclusão de 16 dezesseis a 24 vinte e quatro anos V art 19 do CP 3º Se resulta a morte Pena reclusão de 24 vinte e quatro a 30 trinta anos 2º e 3º com redação determinada pela Lei n 8072 de 25 de julho de 1990 V art 19 do CP 4º Se o crime é cometido em concurso o concorrente que o denunciar à autoridade facilitando a libertação do sequestrado terá sua pena reduzida de um a dois terços 4º com redação determinada pela Lei n 9269 de 2 de abril de 1996 D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias A extorsão mediante sequestro sem sombra de dúvida é a modalidade de extorsão que apresenta maior gravidade que teria sido inspirada por antigo costume de guerra de exigir pagamento pelo resgate de prisioneiros A prática mais ou menos frequente em alguns países na primeira metade do século passado recomendou sua tipificação como crime mais grave Desnecessário por óbvio destacar a frequência rotineira e insuportável com que esse crime passou a ser praticado no Brasil em fins do século XX justificandose sua maior punibilidade pela gravidade dos danos que pode produzir O Código Criminal do Império não disciplinou a extorsão mediante sequestro O Código Penal republicano de 1890 adotava uma definição defeituosa e insatisfatória art 362 O natimorto Código Penal de 1969 previa a mesma infração penal segundo alguns com evidente superioridade técnica nos termos seguintes Extorquir ou tentar extorquir para si ou para outrem mediante sequestro de pessoa indevida vantagem econômica 2 Bem jurídico tutelado Os bens jurídicos protegidos na criminalização da extorsão mediante sequestro a exemplo dos crimes de roubo art 157 e extorsão art 158 são a liberdade individual o patrimônio posse e propriedade e a integridade física e psíquica do ser humano Constatase que a extorsão mediante sequestro também pode produzir uma multiplicidade de danos de um lado a violência sofrida pela vítima que se materializa no constrangimento físico ou psíquico causado pela conduta do sujeito ativo de outro lado a causação de prejuízo alheio em razão da eventual obtenção indevida de qualquer vantagem que como veremos pode até não se concretizar sendo suficiente que tenha sido o móvel da ação Tratase na verdade de um crime complexo isto é pluriofensivo a exemplo do roubo e da extorsão No entanto embora se trate de crime de natureza essencialmente patrimonial codificado no capítulo relativo a essa espécie de bens jurídicos a supressão da liberdade é o fundamento maior da sensível majoração da sanção penal dessa infração criminal Aliás nem poderia ser diferente considerandose o extraordinário valor da liberdade inserta entre os direitos e garantias individuais fundamentais O patrimônio na verdade afastado o aspecto do sequestro já encontraria proteção penal suficiente na tipificação dos crimes de roubo e extorsão 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa sem condição especial uma vez que se trata de crime comum A pessoa jurídica não reúne condições necessárias para mesmo no futuro praticar esse tipo de crime Eventual relação de parentesco não garante os benefícios das escusas absolutórias consagradas nas disposições finais deste Título em razão da violência ou grave ameaça a pessoa art 183 Sujeito passivo também pode ser qualquer pessoa inclusive quem sofre o constrangimento sem lesão patrimonial Assim a vítima do sequestro pode ser diversa da pessoa que sofre ou deve sofrer a lesão patrimonial Haverá nesse caso duas vítimas uma do patrimônio e outra da privação de liberdade mas ambas do mesmo crime de extorsão mediante sequestro Tudo o que se disse sobre bem jurídico sujeito ativo e sujeito passivo no crime de extorsão art 158 aplicase à extorsão mediante sequestro A pessoa jurídica não pode ser sequestrada mas pode ser constrangida a pagar o resgate podendo em consequência também ser sujeito passivo deste crime 4 Tipo objetivo adequação típica A complexidade dessa construção tipológica recomenda cautela em sua interpretação Para sua melhor compreensão acreditamos insuficiente considerar apenas os preceitos primário e secundário da norma quais sejam a tipificação da conduta proibida e a respectiva sanção como normalmente se faz em obediência ao princípio da tipicidade estrita Na verdade não se pode esquecer o nomen juris que o legislador atribuiu a esse tipo penal extorsão mediante sequestro deixando claro que se trata de modalidade especial do crime de extorsão tipificado no artigo anterior Subscrevemos nesse sentido o magistério de Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 72 para quem não é outra coisa que a extorsão qualificada pelo caráter especial do fato constitutivo da violência ou do meio empregado para tornar premente ou eficaz a ameaça Já aqui a extorsão não tem como lastro o constrangimento ilegal na sua forma simples art 146 mas o sequestro de pessoa artigo 148 Com efeito a conduta tipificada é sequestrar isto é reter arrebatar retirar alguém de circulação contra a sua vontade privandoo da liberdade Sequestrar ou encarcerar indiferentemente tipificam o crime constituindo somente modus operandi distinto de praticálo Os elementos constitutivos do crime de extorsão mediante sequestro são retirada de alguém de circulação dissentimento expresso ou implícito finalidade especial de obter qualquer vantagem como condição ou preço do resgate O sequestro pode ser longo ou breve indiferentemente desde que tenha idoneidade para produzir na vítima a certeza de que a supressão de sua liberdade não será passageira e está no mínimo condicionada à satisfação da exigência apresentada para o resgate A elasticidade do tempo de privação da liberdade é circunstância que o legislador considerou para a dosagem de pena 41 Finalidade do sequestro obter qualquer vantagem como condição ou preço O sequestro objetiva conseguir qualquer vantagem como condição ou preço do resgate ou seja como contrapartida da liberação do sequestrado Embora exista alguma divergência em nossa concepção o tipo penal não exige que a vantagem seja indevida nem que seja econômica Mas pela importância do tema é recomendável seja examinado em tópicos específicos O fim especial de obter qualquer vantagem nem sempre é anterior ao ato material de sequestrar alguém Essa ação pode ter sido motivada por qualquer outra razão mas posteriormente enquanto perdurar a privação de liberdade o agente passa a condicionar a libertação do sequestrado ou refém à satisfação de qualquer vantagem como reza o texto legal Nesse caso configura se a chamada progressão criminosa 42 Irrelevância da natureza ou espécie da vantagem visada Não desconhecemos a despeito de nossa convicção a velha divergência reinante sobre a necessidade de interpretar a elementar qualquer vantagem como indevida vantagem econômica Nessa linha Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 287 professava O Código fala em qualquer vantagem não podendo o adjetivo referirse à natureza desta pois ainda aqui evidentemente ela há de ser como no art 158 econômica sob pena de não haver razão para o delito ser classificado no presente título Reforça esse entendimento Heleno Cláudio Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 367 com o seguinte argumento A ação deve ser praticada para obter qualquer vantagem como preço ou condição do resgate Embora haja aqui uma certa imprecisão da lei é evidente que o benefício deve ser de ordem econômica ou patrimonial pois de outra forma este seria um crime contra a liberdade individual Preferimos contudo adotar outra orientação sempre comprometida com a segurança dogmática da tipicidade estrita naquela linha que o próprio Magalhães Noronha gostava de repetir de que a lei não contém patavras inúteis mas também não admite acrescentamos a inclusão de outras não contidas no texto legal Coerente jurídica e tecnicamente correto o velho magistério de Bento de Faria Código Penal brasileiro comentado 3 ed Rio de Janeiro Record 1961 v 5 p 63 que pontificava A vantagem exigida para restituição da liberdade ou como preço do resgate pode consistir em dinheiro ou qualquer outra utilidade pouco importando a forma da exigência Adotamos esse entendimento pelos fundamentos que passamos a expor 421 Abrangência da elementar normativa qualquer vantagem Com efeito os tipos penais desde a contribuição de Mayer não raro trazem em seu bojo determinados elementos normativos que encerram um juízo de valor Convém destacar no entanto como tivemos oportunidade de afirmar que os elementos normativos do tipo não se confundem com os elementos jurídicos normativos da ilicitude Enquanto aqueles são elementos constitutivos do tipo penal estes embora integrem a descrição do crime referemse à ilicitude e assim sendo constituem elementos sui generis do fato típico na medida em que são ao mesmo tempo caracterizadores da ilicitude Esses elementos especiais da ilicitude normalmente são representados por expressões como indevidamente injustamente sem justa causa sem licença da autoridade etc Bitencourt Tratado de Direito Penal Parte Geral 12 ed São Paulo Saraiva 2008 v 1 p 383 Curiosamente no entanto na descrição desse tipo penal extorsão mediante sequestro contrariamente ao que fez na constituição do crime anterior extorsão que seria digamos o tipomatriz do crime extorsivo o legislador brasileiro não inseriu na descrição típica a elementar normativa indevida vantagem econômica Poderia têla incluído não o fez certamente não terá sido por esquecimento uma vez que acabara de descrever tipo similar com sua inclusão art 158 Preferiu no entanto adotar a locução qualquer vantagem sem adjetivála provavelmente para não restringir seu alcance Com efeito a nosso juízo a natureza econômica da vantagem é afastada pela elementar típica qualquer vantagem que deixa clara sua abrangência Quando a lei quer limitar a espécie de vantagem usa o elemento normativo indevida injusta sem justa causa como destacamos nos parágrafos anteriores Assim havendo sequestro para obter qualquer vantagem para si ou para outrem não importando a natureza econômica ou não ou espécie indevida ou não como condição ou preço do resgate estará caracterizado o crime de extorsão mediante sequestro Por fim são absolutamente equivocadas as afirmações de Fragoso seria apenas um crime contra a liberdade individual e Magalhães Noronha sob pena de não haver razão para o delito ser classificado no presente título se a vantagem não for econômica Lições de Direito Penal v 1 p 367 e Direito Penal v 2 p 287 respectivamente 422 Natureza pluriofensiva da extorsão mediante sequestro Esquecem esses doutrinadores que a extorsão mediante sequestro é um crime pluriofensivo e qualquer vantagem exigida pelo tipo é alternativa como condição ou preço do resgate Se condição e preço tivessem nessa hipótese o mesmo significado a previsão dupla seria supérflua e inútil circunstância essa rejeitada pelos estudiosos Aliás o próprio Magalhães Noronha encarregavase de definilos Temos que como condição de resgate a lei referese particularmente ao caso em que o fim do agente seja especialmente obter uma coisa documento ou ato em troca da libertação do sequestrado Preço do resgate dirá em especial da hipótese em que a vantagem se concretize em dinheiro Essa definição na verdade não deixa de ser um tanto quanto contraditória com a posição assumida por Noronha Assim por exemplo aluno que sequestra filho do professor antes da prova final exigindo como condição do resgate sua aprovação não apresenta outra adequação típica que aquela descrita no art 159 É um grande equívoco afirmar que nessa hipótese estarseá diante do crime de sequestro descrito no art 148 do CP ignorando que tal infração penal não exige nenhuma motivação especial esta se existir poderá tipificar outro crime Com efeito ao examinarmos esse crime sequestro fizemos a seguinte consideração Não se exige nenhum elemento subjetivo especial do injusto que se houver poderá configurar outro crime se a privação da liberdade objetivar a obtenção de vantagem ilícita caracterizará o crime de extorsão mediante sequestro art 159 se a finalidade for libidinosa poderá configurar um crime contra os costumes arts 215 ou 219 conforme o caso etc Se no entanto a finalidade for atentar contra a segurança nacional constituirá crime especial tipificado no art 20 da Lei de Segurança Nacional Lei n 7170 de 14121983 Se for praticado por funcionário público constituirá o crime de violência arbitrária art 322 Se o sequestro for meio para a prática de outro crime será absorvido pelo delitofim 43 Vantagem devida seria outra tipificação Para uma parte da doutrina seguindo a orientação de Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 72 se a vantagem for devida haverá crime de sequestro art 148 em concurso com exercício arbitrário das próprias razões art 345 Ignora contudo que quando a lei assim o deseja referese expressamente a vantagem indevida como no caso da extorsão pura e simples Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 287 o mais acerbo e qualificado crítico de Nélson Hungria com acerto afirmava Se confrontarmos o artigo em estudo com o precedente obter indevida vantagem econômica art 158 e obter qualquer vantagem art 159 parecenos que a lei aqui admite seja ela indevida ou devida Comparandose pois os dois dispositivos e atentandose a que a lei não contém palavras inúteis concluise que ela neste passo referese à legitimidade ou ilegitimidade do proveito Por outro lado Hungria equivocase duplamente quando afirma que a vantagem há de ser indevida pois se for legítima existirá exercício arbitrário das próprias razões em concurso com sequestro quais sejam crimes com penas de quinze dias a um mês de detenção art 345 e um a três anos de reclusão Curiosamente o crimefim seria menos grave que o crimemeio invertendo a ordem natural das coisas afora a circunstância de como demonstramos anteriormente o sequestro do art 148 não exigir especial fim de agir Ademais o fato de visar satisfação de pretensão ilegítima por si só não é suficiente para afastar a tipicidade do exercício arbitrário das próprias razões ou em outros termos a legitimidade da pretensão visada não é decisiva para tipificar esse crime Na verdade a solução dessa vexata quaestio deve ser encontrada por meio do conflito aparente de normas chegandose inevitavelmente à conclusão de que quem mesmo para satisfazer pretensão legítima sequestra alguém exigindo como condição do resgate a execução daquela pretensão pratica o crime de extorsão mediante sequestro art 159 A ilegitimidade para concluir como o próprio Hungria afirma em outra passagem resulta de ser exigida como preço da cessação de um crime 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo geral do tipo é o dolo representado pela vontade consciente de sequestrar alguém Como em todos os crimes na extorsão mediante sequestro a vontade e a consciência do agente devem abranger todos os elementos constitutivos do crime sob pena de afastarse a adequação típica O elemento subjetivo especial do tipo é constituído pelo fim especial de obter qualquer vantagem para si ou para outrem como preço ou condição do resgate Essa finalidade especial é o que distingue esse crime do de sequestro Aliás esse elemento subjetivo pode surgir mesmo após o agente ter sequestrado a vítima basta que passe a exigir determinada vantagem como condição ou preço da libertação da vítima ou refém Assim por exemplo responde por esse crime o agente que para chamar a atenção das autoridades para seu problema sequestra um veículo coletivo fazendo os passageiros de reféns e posteriormente durante a negociação com as autoridades exige determinada condição ou pagamento para libertálos 6 Extorsão qualificada modus operandi A doutrina nacional de modo geral tem utilizado equivocadamente a terminologia agravantes especiais ao referirse às figuras qualificadas da extorsão mediante sequestro que vem desde Nélson Hungria e Bento de Faria passando por Magalhães Noronha Heleno Fragoso e Paulo José da Costa Jr e sobrevive com Damásio de Jesus e Luiz Regis Prado Na verdade embora alguns doutrinadores não façam distinção entre majorantes e qualificadoras ou pelo menos não lhe atribuam relevância já destacamos em inúmeras oportunidades que não abrimos mão da precisão terminológica Por isso convém registrar que as circunstâncias enunciadas nos parágrafos do art 159 ao contrário do que se tem afirmado são autênticas qualificadoras As qualificadoras constituem verdadeiros tipos penais derivados é verdade com novos limites mínimo e máximo enquanto as majorantes como simples causas modificadoras da pena somente estabelecem sua variação mantendo os mesmos limites mínimo e máximo Ademais as majorantes funcionam como modificadoras somente na terceira fase do cálculo da pena ao contrário das qualificadoras que fixam novos limites mais elevados dentro dos quais será estabelecida a penabase Façamos a seguir uma análise individualizada destas 61 Duração do sequestro superior a vinte e quatro horas Desnecessário frisar que a privação da liberdade é consequência material e direta dessa infração penal Contudo embora se saiba que as consequências do crime como moduladoras da pena art 59 não se confundem com a consequência natural tipificadora do crime praticado não se pode ignorar que a privação da liberdade em qualquer circunstância será mais ou menos grave na proporção direta de sua duração Logo quanto mais longa mais danosa mais grave e mais destruidora de todos os atributos pessoais éticos e morais que formam a personalidade humana Nessa linha um dia de prisão ou de cativeiro equivale a uma eternidade Por isso justificase que a duração do sequestro superior a vinte e quatro horas qualifique o crime determinando sanção consideravelmente superior àquela cominada no caput do art 159 62 A idade da vítima menor de dezoito anos ou maior de sessenta A idade da vítima inferior a dezoito anos por sua vez é qualificadora que tem fundamento políticocriminal coerente com a mesma política que fundamenta a imputabilidade penal somente para maiores de dezoito anos Na verdade os menores de dezoito anos são pessoas em formação que necessitam mais de orientação que de punição na medida em que suas características pessoais estão em desenvolvimento e são extremamente sensíveis a influências externas Por outro lado desnecessário enfatizar que os filhos especialmente os menores são os bens mais valiosos de qualquer ser humano nessas circunstâncias o agente sabe que sequestrando filhos menores os pais desesperados ficam extremamente vulneráveis e dispostos a satisfazer qualquer exigência imposta E exatamente nisso reside a maior desvalia quer da ação quer do resultado O Estatuto do Idoso Lei n 107412003 aproveitou para acrescentar ao rol das qualificadoras deste parágrafo a circunstância de a vítima ser maior de sessenta anos na data do fato acrescentamos nós No entanto não se pode negar que a simples condição de tratarse de vítima maior de sessenta anos de idade ser fundamento para qualificar o crime fere os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade especialmente quando se tem como cominação da figura qualificada pena entre doze e vinte anos Todavia por opção do legislador está aí essa nova figura que em termos de política criminal só nos faz lamentar o equívoco legislativo Assim agora mais do que nunca é indispensável toda a cautela no exame da circunstância de o sujeito ativo ter efetivo e comprovado conhecimento de que a vítima tinha mais de sessenta anos na data do fato Inquestionavelmente tanto a maior duração do sequestro mais de 24 horas e consequente privação da liberdade da vítima como sua menoridade menos de 18 anos e agora também velhice ampliam tanto o desvalor da ação quanto o desvalor do resultado que justificam na ótica do legislador sua maior penalização art 159 1º 63 Cometido por bando ou quadrilha A prática de qualquer crime por quadrilha ou bando eleva a gravidade do injusto pelo acentuado desvalor da ação e do resultado e no caso de extorsão mediante sequestro constitui qualificadora recebendo sanção autônoma de doze a vinte anos de reclusão A definição de quadrilha ou bando é aquela dada pelo art 288 Assim é indispensável que haja a reunião de mais de três pessoas para praticar crimes Se no entanto objetivarem praticar um único crime ainda que sejam mais de três pessoas não tipificará quadrilha ou bando cuja elementar típica exige a finalidade indeterminada Na verdade a estrutura central do núcleo desse crime reside na consciência e vontade de os agentes organizaremse em bando ou quadrilha com o fim especial elemento subjetivo especial do injusto e imprescindível de praticar crimes Formação de quadrilha ou bando é crime de perigo comum e abstrato de concurso necessário e de caráter permanente inconfundível pelo menos para os iniciados com o concurso eventual de pessoas É indispensável que os componentes do bando ou quadrilha concertem previamente a específica prática de crimes indeterminados como objetivo e fim do grupo É injustificável a confusão que rotineiramente se tem feito entre concurso eventual de pessoas art 29 e associação criminosa art 288 Com efeito não se pode confundir aquele concurso de pessoas que é associação ocasional eventual temporária para o cometimento de um ou mais crimes determinados com esta quadrilha ou bando que é uma associação para delinquir configuradora do crime de quadrilha ou bando que deve ser duradoura permanente e estável cuja finalidade é o cometimento indeterminado de crimes A configuração típica do crime de quadrilha ou bando compõese dos seguintes elementos a concurso necessário de pelo menos quatro pessoas b finalidade específica dos agentes de cometer crimes indeterminados ainda que acabem não cometendo nenhum c estabilidade e permanência da associação criminosa STF HC 722924 Rel Min Celso de Mello DJU 14111996 p 44469 Em outros termos a formação de quadrilha ou bando exige para sua configuração união estável e permanente de criminosos voltada para a prática indeterminada de vários crimes Por tudo isso a qualificadora de bando ou quadrilha somente se configura quando realmente de quadrilha se tratar caso contrário estarseá diante de concurso de pessoas art 29 que não tipifica a figura qualificada em exame 7 Extorsão mediante sequestro qualificada pelo resultado lesão grave ou morte O art 159 dispõe 2º Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave Pena reclusão de 16 dezesseis a 24 vinte e quatro anos 3º Se resulta a morte Pena reclusão de 24 vinte e quatro a 30 trinta anos As duas hipóteses elencadas caracterizam condições de exasperação da punibilidade em decorrência da maior gravidade do resultado A exemplo do que ocorre com os crimes de roubo e de extorsão se resulta lesão corporal grave ou se resulta morte pune se a título de crime qualificado pelo resultado para alguns crimes preterdolosos Normalmente o resultado mais grave lesão ou morte é produto de culpa que complementaria a conhecida figura do crime preterdoloso dolo no antecedente e culpa no consequente como a doutrina gosta de definir Terseia assim o crime contra a liberdade sequestro executado dolosamente acrescido de um resultado mais grave resultante de culpa a lesão grave ou a morte da vítima Essa pelo menos é a estrutura clássica do crime preterdoloso 71 Se resulta lesão corporal de natureza grave A regra repetindo é que nesses crimes o resultado agravador seja sempre produto de culpa Contudo na hipótese em apreço a extrema gravidade das sanções cominadas uniu o entendimento doutrinário que passou a admitir a possibilidade indistintamente de o resultado agravador poder decorrer tanto de culpa quanto de dolo direto ou eventual A locução lesão corporal de natureza grave deve ser interpretada em sentido amplo para abranger tanto as lesões graves art 129 1º quanto lesões gravíssimas art 129 2º Ademais a lesão corporal grave tanto pode ser produzida na vítima do sequestro como na vítima da extorsão ou em qualquer outra pessoa que venha a sofrer a violência Sintetizando é indiferente que o resultado mais grave seja voluntário ou involuntário justificandose a agravação da punibilidade desde que esse resultado não seja produto de caso fortuito ou força maior ou seja decorra pelo menos de culpa 72 Se resulta a morte A morte da vítima é a qualificadora máxima desse crime Exatamente como na lesão grave a morte pode resultar em outra pessoa que não a sequestrada podendo existir dois sujeitos passivos Observandose a sistemática do nosso Código Penal constatase que o art 157 3º pretendeu tipificar um crime preterdoloso já que a locução utilizada se resulta indica normalmente resultado decorrente de culpa e não meio de execução de crime No entanto como já referimos a severidade das penas cominadas não se harmoniza com crime preterdoloso Procurando minimizar a iniquidade congênita da estrutura tipológica em apreço a doutrina passou a sustentar a possibilidade de o resultado morte poder ser produto de dolo culpa ou preterdolo indiferentemente Toda sanção agravada em razão de determinada consequência do fato somente pode ser aplicada ao agente se houver dado causa pelo menos culposamente Com a extorsão mediante sequestro não é diferente aplicandose integralmente o consagrado princípio nulla poena sine culpa rechaçase assim completamente a responsabilidade objetiva No entanto não se pode silenciar diante de um erro crasso do legislador que equiparou dolo e culpa pelo menos quanto às consequências nesse caso específico Na verdade o evento morte tanto pode decorrer de dolo de culpa ou de preterdolo e atribuirlhe a mesma sanção com a gravidade que lhe é cominada 24 a 30 anos de reclusão agride o bomsenso e fere a sistemática do ordenamento jurídico brasileiro que nos crimes culposos releva o desvalor do resultado destacando fundamentalmente o desvalor da ação 73 Extorsão mediante sequestro como crime hediondo A Lei n 807290 definiu a extorsão mediante sequestro como crime hediondo excluído de anistia graça indulto fiança e liberdade provisória com cumprimento de pena integralmente em regime fechado Nesses casos a prisão temporária é de trinta dias e em caso de condenação para apelar segundo a questionada Lei n 807290 a regra é invertida somente recolhimento à prisão art 9º lº e 2º No entanto a Lei n 11464 de 27 de março de 2007 seguindo a orientação consagrada pelo Supremo Tribunal Federal HC 82959 minimiza os equivocados excessos da Lei n 807290 alterando os parágrafos do seu art 2º e determina que o cumprimento da pena inicie em regime fechado ou seja consagra o sistema progressivo de regimes de pena além de obrigar a fundamentação sobre a necessidade de prisão 8 Delação premiada favor legal antiético Delação premiada consiste na redução de pena podendo chegar em algumas hipóteses até mesmo a total isenção de pena para o delinquente que delatar seus comparsas concedida pelo juiz na sentença final condenatória desde que sejam satisfeitos os requisitos que a lei estabelece Tratase de instituto importado de outros países independentemente da diversidade de peculiaridades de cada ordenamento jurídico e dos fundamentos políticos que o justificam A Lei dos Crimes Hediondos Lei n 807290 em seu art 7º introduziu um parágrafo 4º no art 159 do Código Penal cuja redação estabelecia uma minorante causa de diminuição de pena em favor do coautor ou partícipe do crime de extorsão mediante sequestro praticado por quadrilha ou bando que denunciasse o crime à autoridade facilitando assim a libertação do sequestrado Dessa forma premiavase o participante delator que traísse seu comparsa com a redução de um a dois terços da pena aplicada Por essa redação para que fosse reconhecida a configuração da cognominada delação premiada era indispensável que a extorsão mediante sequestro tivesse sido cometida por quadrilha ou bando e que qualquer de seus integrantes denunciando o fato à autoridade possibilitasse a libertação da vítima Posteriormente a Lei n 926996 ampliou as possibilidades da traição premiada ao conferir ao 4º a seguinte redação se o crime é cometido em concurso o concorrente que o denunciar à autoridade facilitando a libertação do sequestrado terá sua pena reduzida de um a dois terços 81 A condenável proliferação da denominada delação premiada A partir dessa nova redação tornouse desnecessário que o crime de extorsão tenha sido praticado por quadrilha ou bando que exige a participação de pelo menos quatro pessoas sendo suficiente que haja concurso de pessoas ou seja é suficiente que dois participantes pelo menos tenham concorrido para o crime e um deles tenha delatado o fato criminoso à autoridade possibilitando a libertação do sequestrado Enfim com essa retificação legislativa de 1996 iniciouse a proliferação da traição bonificada defendida pelas autoridades como grande instrumento de combate à criminalidade organizada ainda que contrariando esse discurso o último diploma legal referido tenha afastado exatamente a necessidade de qualquer envolvimento de possível organização criminosa Com efeito a eufemisticamente denominada delação premiada que foi inaugurada no ordenamento jurídico brasileiro com a Lei dos Crimes Hediondos Lei n 807290 art 8º parágrafo único proliferou em nossa legislação esparsa atingindo níveis de vulgaridade assim passou a integrar as leis de crimes contra o sistema financeiro art 25 2º da Lei n 749286 crimes contra o sistema tributário art 16 parágrafo único da Lei n 813790 crimes praticados por organização criminosa art 6º da Lei n 903495 crimes de lavagem de dinheiro art 1º 5º da Lei n 961398 e a Lei de Proteção a Vítimas e Testemunhas art 13 da Lei n 980799 O fundamento invocado é a confessada falência do Estado para combater a dita criminalidade organizada que é mais produto da omissão dos governantes ao longo dos anos do que propriamente alguma organização ou sofisticação operacional da delinquência massificada Na verdade virou moda falar crime organizado organização criminosa e outras expressões semelhantes para justificar a incompetência e a omissão dos detentores do poder nos últimos quinze anos pelo menos Chega a ser paradoxal que se insista numa propalada sofisticação da delinquência num país onde impera a improvisação e tudo é desorganizado como se pode aceitar que só o crime seja organizado Quem sabe o Poder Público num exemplo de funcionalidade comece combatendo o crime desorganizado já que capitulou ante o que resolveu tachar de crime organizado pelo menos combateria a criminalidade de massa devolvendo a segurança à coletividade brasileira que tem dificuldade até mesmo de transitar pelas ruas das capitais Estáse tornando intolerável a inoperância do Estado no combate à criminalidade seja ela massificada organizada ou desorganizada conforme nos têm demonstrado as alarmantes estatísticas diariamente 82 Premiação do traidordelator Estado imoral estimula a falta de ética e a imoralidade Como se tivesse descoberto uma poção mágica o legislador contemporâneo acena com a possibilidade de premiar o traidor atenuando a sua responsabilidade criminal desde que delate seu comparsa facilitando o êxito da investigação das autoridades constituídas Com essa figura esdrúxula o legislador brasileiro possibilita premiar o traidor oferecendolhe vantagem legal manipulando os parâmetros punitivos alheio aos fundamentos do direitodever de punir que o Estado assumiu com a coletividade Não se pode admitir sem qualquer questionamento a premiação de um delinquente que para obter determinada vantagem dedure seu parceiro com o qual deve ter tido pelo menos uma relação de confiança para empreenderem alguma atividade no mínimo arriscada que é a prática de algum tipo de delinquência Estamos na verdade tentando falar da moralidade e justiça da postura assumida pelo Estado nesse tipo de premiação Qual é afinal o fundamento ético legitimador do oferecimento de tal premiação Convém destacar que para efeito da delação premiada não se questiona a motivação do delator sendo irrelevante que tenha sido por arrependimento vingança ódio infidelidade ou apenas por uma avaliação calculista antiética e infiel do traidordelator Venia concessa será legítimo o Estado lançar mão de meios antiéticos e imorais como estimular a deslealdade e traição entre parceiros apostando em comportamentos dessa natureza para atingir resultados que sua incompetência não lhe permite através de meios mais ortodoxos Certamente não é nada edificante estimular seus súditos a mentir trair delatar ou dedurar um companheiro movido exclusivamente pela ânsia de obter alguma vantagem pessoal seja de que natureza for No entanto a despeito de todo esse questionamento ético que atormenta qualquer cidadão de bem a verdade é que a delação premiada é um instituto adotado em nosso direito positivo Falando em peculiaridades diversas lembramos que nos Estados Unidos o acusado como uma testemunha presta compromisso de dizer a verdade e não o fazendo comete crime de perjúrio algo inocorrente no sistema brasileiro em que o acusado tem o direito de mentir sem que isso lhe acarrete qualquer prejuízo conforme lhe assegura a Constituição Federal Essa circunstância por si só desvirtua completamente o instituto da delação premiada pois descompromissado com a verdade e isento de qualquer prejuízo ao sacrificála o beneficiário da delação dirá qualquer coisa que interesse às autoridades na tentativa de beneficiarse Essa circunstância retira eventual idoneidade que sua delação possa ter se é que alguma delação pode ser considerada idônea 83 Modus operandi da delação premiada omissão legislativa imperdoável Por outro lado a legislação brasileira é omissa em disciplinar o modus operandi a ser observado na celebração desse acordo processual Na realidade a praxis tem desrecomendado não apenas o instituto da delação como também as próprias autoridades que a têm utilizado bastando recordar apenas para ilustrar a hipótese do doleiro da CPI dos Correios e do exassessor do atual Ministro Palocci que foram interpelados e compromissados a delatar na calada da noite eou no interior das prisões enfim nas circunstâncias mais inóspitas possíveis sem lhes assegurar a presença e orientação de um advogado sem contraditório ampla defesa e o devido processo legal A delação premiada constante do 4º do art 159 é causa de obrigatória redução de pena desde que o crime tenha sido cometido em concurso de pessoas e a contribuição do delator seja eficaz isto é leve a efetiva libertação da vítima sequestrada O texto legal é taxativo ao dizer que o denunciante terá sua pena reduzida de um a dois terços A delação no entanto que deve ser endereçada à autoridade Delegado de Polícia Ministério Público ou Juiz de Direito está vinculada à efetiva libertação da vítima ou seja é indispensável a relação de causa e efeito a libertação da vítima deve necessariamente decorrer da contribuição efetiva do delator A simples vontade ainda que acompanhada da ação efetiva do delator é insuficiente para justificar a redução de pena Em outros termos é indispensável que a contribuição do delator com sua conduta de alcaguete seja eficaz no contexto em que se desenvolve o processo libertatório do ofendido Como destaca Alberto Silva Franco Crimes hediondos 4 ed São Paulo Revista dos Tribunais 2000 p 251 a conduta do delator deve ser relevante do ponto de vista objetivo e voluntária sob o enfoque subjetivo Isso significa de um lado que cabe ao delator o fornecimento de dados concretos que causal e finalisticamente conduzam à libertação do sequestrado A delação premiada a despeito da ausência de previsão legal deve ser voluntária isto é produto da livre manifestação pessoal do delator sem sofrer qualquer tipo de pressão física moral ou mental representando em outras palavras intenção ou desejo de abandonar o empreendimento criminoso sendo indiferentes as razões que o levam a essa decisão Não é necessário que seja espontânea sendo suficiente que seja voluntária há espontaneidade quando a ideia inicial parte do próprio sujeito há voluntariedade por sua vez quando a decisão não é objeto de coação moral ou física mesmo que a ideia inicial tenha partido de outrem como da autoridade por exemplo ou mesmo resultado de pedido da própria vítima O móvel enfim da decisão do delator vingança arrependimento inveja ou ódio é irrelevante para efeito de fundamentar a delação premiada segundo a ótica de uma sociedade imoral 84 A definição do quanto a reduzir necessidade de critérios objetivos A definição do quantum a reduzir deve vincularse a critério objetivo que permita justificar a maior ou menor redução de pena dentro dos limites estabelecidos de um a dois terços Um dos critérios sugeridos segundo Silva Franco Crimes hediondos p 253 é o maior ou menor tempo levado para a liberação do sequestrado Mas esse pode ser apenas um dos critérios a serem considerados havendo outros mais relevantes como por exemplo a maior ou menor facilidade encontrada pela autoridade para libertar a vítima e especialmente a maior ou menor contribuição do delator para a libertação daquela Em síntese a redução da pena aplicada será tanto maior quanto mais relevante for a contribuição da delação para a libertação do sequestrado maior contribuição equivale a maior redução menor contribuição significará menor redução mantendose uma autêntica proporcionalidade nessa relação de causa e efeito Não afastamos por fim a aplicação cumulativa da minorante constante do 4º ora em exame com a do parágrafo único do art 8º da Lei n 807290 porque as duas previsões legais visam objetivos distintos na primeira hipótese a finalidade é a libertação do sequestrado na segunda o objetivo é o desmantelamento da quadrilha ou bando Por isso se com a mesma delação o delator propiciar que se desbarate uma quadrilha e ao mesmo tempo possibilite libertar a vítima fará jus certamente à incidência das duas minorantes 9 Crime hediondo Tanto a figura simples quanto as qualificadas são consideradas crimes hediondos Sobre crimes hediondos vide nota ao 3º do art 157 pois tudo que lá dissemos tem aplicação aqui A pena será majorada de metade se a vítima a não for maior de quatorze anos b for alienada ou débil mental se o agente souber disso c não puder por qualquer causa oferecer resistência 10 Consumação e tentativa Consumase esta infração penal com o sequestro da vítima isto é com a privação de sua liberdade consumase no exato momento em que a vítima é sequestrada isto é quando tem sua liberdade de ir e vir suprimida mesmo antes do pedido de resgate A consumação no crime de extorsão mediante sequestro não exige que a vantagem econômica seja alcançada Basta que a pessoa seja privada de sua liberdade e que a intenção de conseguir vantagem econômica indevida seja externada Assim irrelevante o fato de a vítima ser posta em liberdade ante o insucesso da exigência Tratase de crime permanente e sua consumação se opera no local em que ocorre o sequestro com o objetivo de obter o resgate e não no da entrega deste Eventual recebimento do resgate constituirá apenas exaurimento do crime que apenas influirá na dosagem final da pena A maior dificuldade no tratamento desses crimes reside na definição da tentativa que tem sido objeto de imensa controvérsia e complexidade grande parte em decorrência da deficiente técnica legislativa que tem dificultado as soluções estritamente jurídicas É admissível em princípio a tentativa desde que o agente inicie a ação de sequestrar a vítima embora in concreto às vezes seja de duvidosa configuração Não se pode no entanto falar em tentativa de extorsão mediante sequestro se o agente embora não obtendo a vantagem pretendida praticou todos os atos para a consumação do crime 11 Pena e ação penal As penas aplicáveis são as seguintes a caput reclusão de oito a quinze anos b 1º reclusão de doze a vinte anos c 2º reclusão de dezesseis a vinte e quatro anos d 3º reclusão de vinte e quatro a trinta anos A minorante da delação permite a redução de um a dois terços da pena aplicada 7º da Lei n 807290 Referida lei suprimiu a pena de multa que era cumulativa A ação penal não poderia ser diferente é pública incondicionada A autoridade policial deve agir ex officio J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Absorção da extorsão mediante sequestro pelo roubo Impossibilidade Desígnios autônomos O crime de extorsão mediante sequestro pode ser praticado em concomitância com o roubo desde que a privação da liberdade das vítimas não tenha por fim único a facilitação da execução deste último delito STJ HC 72093DF Rel Jane Silva j 18102007 O tipo penal previsto no art 159 1º do Código Penal exige para a sua consumação apenas que o agente proceda ao sequestro de pessoa com o fim de obter para si ou para outrem qualquer vantagem como condição ou preço do resgate por período superior a 24 vinte e quatro horas STJ HC 54174RJ Rel Min Gilson Dipp j 1292006 Delação premiada Inocorrência Para a aplicação da benesse prevista no art 159 4º do Código Penal devese preencher os requisitos nela constantes Precedente STJ HC 50319SP Rel Min Félix Fischer j 662006 Art 159 1º do Código Penal Dosimetria da pena Sendo de 12 a 20 anos de reclusão a pena cominada ao delito de extorsão mediante sequestro na forma qualificada e diante da existência de circunstância judicial desfavorável e de agravante legal revelase razoável a pena aplicada no acórdão atacado de 15 anos de reclusão STJ HC 43953RJ Rel Min Paulo Gallotti j 732006 A liberação da vítima após configurada a expectativa de êxito da prática delituosa recebimento do dinheiro ainda que nenhuma outra violência tenha sido praticada contra ela não se mostra como uma conduta própria a autorizar a benesse legal inserta no artigo 159 4º do Código Penal A regra do 4º do art 159 do Código Penal acrescentada pela Lei n 807290 pressupõe a delação à autoridade e o efeito de haverse facilitado a liberação do sequestrado STF HC 69328SP Rel Min Marco Aurélio DJ 561992 STJ REsp 223364PR Rel Min Hélio Quaglia Barbosa j 3062005 A libertação da vítima de sequestro por corréu antes do recebimento do resgate é causa de diminuição de pena conforme previsto no art 159 4º do Código Penal com a redação dada pela Lei n 926996 que trata da delação premiada Mesmo que o delito tenha sido praticado antes da edição da Lei n 926996 aplicase o referido dispositivo legal por se tratar de norma de direito penal mais benéfica STJ HC 40633SP Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 1º92005 Inexiste na espécie a possibilidade de desclassificação do crime de extorsão mediante sequestro para os previstos nos arts 146 ou 345 do Código Penal uma vez que compulsando o acórdão prolatado resta evidenciada a existência do seu elemento objetivo bem como do seu elemento subjetivo consubstanciado na vontade consciente e livre do ora Paciente e de seus comparsas em privarem as vítimas de suas liberdades e assim permanecerem até a obtenção da vantagem pretendida entrega dos dólares STJ HC 29476MS Rel Min Laurita Vaz j 411 2004 Extorsão indireta Art 160 Exigir ou receber como garantia de dívida abusando da situação de alguém documento que pode dar causa a procedimento criminal contra a vítima ou contra terceiro Pena reclusão de 1 um a 3 três anos e multa V art 71 da Lei n 807890 Código de Defesa do Consumidor V art 2º III da Lei n 813790 crimes contra a ordem tributária econômica e contra as relações de consumo D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Sobre a extorsão indireta a Exposição de Motivos do Código Penal de 1940 da lavra do Ministro Francisco Campos faz a seguinte afirmação Destinase o novo dispositivo a coibir os torpes e opressivos expedientes a que recorrem por vezes os agentes da usura para garantirse contra o risco do dinheiro mutuado São bem conhecidos esses recursos como por exemplo o de induzir o necessitado cliente a assinar um contrato simulado de depósito ou a forjar no título de dívida a firma de algum parente abastado de modo que não resgatada a dívida no vencimento ficará o mutuário sob a pressão da ameaça de um processo por apropriação indébita ou falsidade item n 57 Esse crime pode ser praticado normalmente por agiotas embora para sua configuração não seja indispensável a existência de usura É suficiente em princípio que o sujeito ativo procure garantirse exigindo do devedor documento que possa dar causa a processo criminal contra si ou contra terceiro A lei procura com efeito impedir que credores inescrupulosos não necessariamente agiotas ou usurários aproveitemse do desespero de eventuais devedores para extorquirlhes compromissos documentais idôneos para havendo inadimplemento instaurar procedimento criminal contra o devedor ou terceira pessoa 2 Bem jurídico tutelado A extorsão indireta é mais um daqueles crimes pluriofensivos na medida em que os bens jurídicos protegidos neste dispositivo são o patrimônio e a liberdade individual do sujeito passivo aquele diretamente esta secundariamente A natureza do documento exigido pelo sujeito ativo representa inegavelmente risco potencial à liberdade do sujeito passivo Na verdade poderseia considerar esses dois bens jurídicos vistos isoladamente patrimônio e liberdade sob uma outra ótica digamos mais específica definindo com precisão o verdadeiro bem jurídico protegido pelo dispositivo em exame qual seja a regularidade das relações entre credor e devedor Assim o bem jurídico stricto sensu é a normalidade e moralidade das relações entre devedor e credor 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa mesmo não sendo agiota a despeito do conteúdo da Exposição de Motivos que se referiu especificamente aos agentes da usura Não se trata por evidente de crime próprio podendo ser praticado por qualquer pessoa que para garantir um crédito mesmo não usurário abuse da situação de outrem exija documento que possa resultar em procedimento criminal Enfim embora possa ser preferentemente praticada por agiotas a extorsão indireta não lhes é exclusiva isto é não se trata de uma espécie de usura Sujeito passivo também pode ser qualquer pessoa geralmente o devedor na medida em que inegavelmente é necessária a existência de uma relação de débito e crédito garantia de dívida Ademais a exemplo das outras formas de extorsão é possível a existência de pluralidade de vítimas a ação pode ser realizada contra o devedor mas o documento exigido ou entregue pode incriminar terceiro A lei protege em outros termos toda e qualquer pessoa contra todo e qualquer credor independentemente da existência de juros legais ou ilegais 4 Tipo objetivo adequação típica A configuração desse tipo penal pressupõe a existência dos seguintes requisitos a exigência ou recebimento de documento que possa dar causa a processo penal contra a vítima ou terceiro b existência de relação creditícia c abuso da situação de necessidade do sujeito passivo A ação tipificada consiste em exigir ou receber documento que possa dar causa a procedimento criminal contra a vítima ou contra terceiro O texto legal equipara exigência a recebimento tipificando crime de conteúdo variado ou como preferem alguns de ação múltipla Na primeira hipótese há a imposição de uma situação ou conditio sine qua non na segunda há a aceitação de uma proposição de iniciativa do próprio devedor que entrega o documento comprometedor naquela há uma atividade positiva uma imposição do credor nesta o sujeito ativo do crime aquiesce em receber o documento que o próprio devedor toma a iniciativa de entregarlhe 41 O fundamento ou a razão de ser da dívida inteiramente irrelevante É irrelevante que se trate de dívida existente ou se refira a dívida futura Qualquer das ações tipificadas deve ser realizada para obter garantia de dívida abusando da situação de alguém Como afirmava Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 372 este crime ocorre quando o devedor não tem garantias para oferecer ao credor funcionando o documento recebido ou exigido como segurança do pagamento O fundamento ou a razão de ser da dívida é inteiramente irrelevante 42 A existência da dívida ou sua legitimidade não exclui o crime A existência da dívida ou sua legitimidade não exclui o crime pois sua ilicitude reside na natureza criminalmente comprometedora do documento exigido concomitante com a situação difícil em que a vítima se encontra Em outros termos ilícito não é o crédito mas a garantia exigida Por isso para a configuração do crime definido no art 160 do Código Penal é indispensável que além da exigência ou recebimento de documento que possa dar lugar a procedimento criminal contra a vítima ou terceira pessoa haja abuso da situação ou condição necessitada de alguém Não se trata da simples condição de devedor mas sim de sua situação de penúria decorrente de suas dificuldades prementes que deixam a vítima vulnerável Nesse sentido merece destaque a consideração que fazia Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 293 in verbis Denominou o Código esta figura criminal extorsão indireta e dentre os característicos que a distinguem cumpre apontar primeiramente o estado angustioso de necessidade da vítima que por ele coagida resignase à entrega da garantia ilegal O agente não precisa ter concorrido para o estado aflitivo da vítima sendo suficiente que se aproveite dessa situação 43 Documento confessando a prática de crime existente ou não O documento público ou particular deve ser entendido em sentido estrito tem de ter conteúdo criminalmente comprometedor capaz de dar margem a procedimento criminal Esse tipo penal tem o sentido de proteger o indivíduo contra a chantagem O documento pode encerrar a confissão de um crime efetivamente praticado pode ser a delação de alguém de sua família etc Não é necessário que o documento se refira à prática de crime inexistente cuja autoria a vítima atribua a si ou a terceiro O crime existirá mesmo quando em garantia de dívida a vítima é obrigada a firmar documento confessando a autoria de crime que efetivamente executou De posse do documento o credor isto é o sujeito ativo do crime de extorsão indireta está em condições de provocar a instauração ou o início de um procedimento criminal independentemente de o devedor isto é a vítima poder demonstrar a inautenticidade do documento a coação ocorrida a simulação que o documento representa enfim sua inocência 44 Recebimento de cheque sem fundos não caracteriza extorsão indireta O recebimento puro e simples de cheque sem fundos como garantia de dívida não é suficiente para caracterizar o crime de extorsão indireta especialmente a partir do momento em que se pacificou o entendimento de que cheque dado em garantia de dívida não constitui ordem de pagamento e por extensão não constitui aquela modalidade de estelionato art 171 2º VI do CP Todavia se essa garantia do cheque sem fundos resultar de exigência abusiva do credor que se prevalece de uma situação aflitiva de seu devedor em estado de insolvência poderseá estar diante da figura típica descrita no art 160 do CP Esse entendimento baseiase na própria descrição típica que se refere a procedimento criminal Este ao contrário de processo criminal abrange também as investigações preliminares muitas vezes necessárias para se descobrir a natureza do cheque emitido podese afirmar em outros termos que a despeito do atual entendimento a respeito do cheque dado em garantia ele é potencialmente idôneo para dar causa a procedimento criminal não sendo recomendável assim deixar o devedor juridicamente desprotegido Nesse sentido estamos de acordo com o magistério de Magalhães Noronha que sustentava Basta então potencialidade é suficiente ser apto a esse fim Não se exige é bem de ver que o procedimento seja iniciado pois o fim do agente é conserválo como um mal iminente sobre o devedor no caso de não ser solvido o débito É assim condição indispensável que ele possa fundamentar o processo crime Mesmo no caso de ser justo o procedimento criminal contra a vítima se o agente retém o documento que dará origem ao processo para garantir a dívida somos de parecer que não se excluirá o delito O processo em relação ao agente é injusto porque injusto o fim que o move O simples pedido feito a policiais para que cobrem uma dívida por si só não configura crime algum A ameaça de processar feita por advogado caso a outra parte não cumpra obrigação assumida não constitui extorsão indireta aliás não constitui crime algum Por fim não nos parece que a conduta tipificada tenha a gravidade que o Código lhe empresta mostrandose na prática de difícil ocorrência 5 Tipo subjetivo adequação típica O dolo é representado pela vontade consciente de exigir ou receber documento como garantia de dívida abusando da situação de alguém O agente deve ter consciência da necessidade ou aflição da vítima situação e de que o documento pode dar causa a procedimento criminal É irrelevante a natureza da dívida se legítima ou ilegítima sendo suficiente que o sujeito ativo exija o documento referido no tipo penal para garantila É necessário igualmente o elemento subjetivo especial do tipo constituído pelo especial fim de agir no caso garantir abusivamente dívida existente ou futura da qual o sujeito ativo é credor 6 Consumação e tentativa Na modalidade de exigir crime formal consumase a extorsão indireta com a simples exigência sendo impossível teoricamente a interrupção do iter criminis nessa modalidade consumase a extorsão ainda que não ocorra a traditio do documento exigido pelo sujeito ativo Tratase de crime de dano que é inerente à apropriação acarretadora por si só de diminuição do patrimônio do ofendido Na forma de receber crime material consumase com o efetivo recebimento que eventualmente pode ser interrompido isto é impedido por causa estranha à vontade do agente sendo possível nesse caso a tentativa É admissível a tentativa 7 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são a reclusão de um a três anos e multa muito inferiores àquelas cominadas em qualquer das outras modalidades de extorsão Como nessa infração penal o modus operandi não inclui a violência ou grave ameaça o desvalor da ação é consideravelmente menor justificandose no caso sua menor punibilidade A ausência de violência ou grave ameaça torna possível em princípio a aplicação de pena substitutiva desde que os demais requisitos objetivos e subjetivos estejam presentes A natureza da ação penal a exemplo das demais modalidades de extorsão é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Extorsão indireta Não faz jus à pena restritiva de direito o condenado por crime que tenha a integrálo a violência ou a grave ameaça É de se conceder no entanto o benefício do sursis quando o acórdão embora adotando a penabase mínima estabelecida na sentença somente cabível ante a favorabilidade das circunstâncias judiciais ao réu e fixando regime que pressupõe autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado Código Penal artigo 36 qual seja o aberto como inicial do cumprimento de pena que reduziu a quantum inferior a 2 anos denega a suspensão condicional da execução da pena prisional ao argumento simples da ausência de seus pressupostos subjetivos fundando nessa evidente contradição o constrangimento ilegal que grava o decisum colegiado e se mostra evidente na sua própria letra de modo a ensejar que seja sanado em sede de habeas corpus STJ HC 24628MG Rel Min Hamilton Carvalhido j 1542003 Para a configuração do delito de extorsão indireta é necessário que o documento exigido ou recebido pelo credor se preste a instauração de procedimento criminal viável contra o devedor o que não ocorre com o cheque prédatado dado em garantia de dívida porquanto a sua emissão em tais condições não constitui crime STJ REsp 1094RJ Rel Min Costa Leite j 12121989 Capítulo III Da Usurpação V art 2º da Lei n 817691 crimes contra a ordem econômica combustíveis Alteração de limites Art 161 Suprimir ou deslocar tapume marco ou qualquer outro sinal indicativo de linha divisória para apropriarse no todo ou em parte de coisa imóvel alheia Pena detenção de 1 um a 6 seis meses e multa V art 2º da Lei n 817691 crimes contra a ordem econômica combustíveis 1º Na mesma pena incorre quem Usurpação de águas I desvia ou represa em proveito próprio ou de outrem águas alheias Esbulho possessório II invade com violência a pessoa ou grave ameaça ou mediante concurso de mais de duas pessoas terreno ou edifício alheio para o fim de esbulho possessório V arts 1210 1212 e 1213 do CC 2º Se o agente usa de violência incorre também na pena a esta cominada 3º Se a propriedade é particular e não há emprego de violência somente se procede mediante queixa V art 100 2º do CP V arts 29 a 38 do CPP D O U T R I N A Alteração de limites 1 Considerações introdutórias O Código Penal de 1940 cuja Parte Especial permanece em vigor a despeito da proteção civil estendeu também sua proteção ao bem imóvel pelo menos em algumas hipóteses restritas Sob a denominação genérica de usurpação o Código Penal criminaliza neste art 161 três figuras similares de infrações contra a propriedade imóvel quais sejam a alteração de limites b usurpação de águas c esbulho possessório O Código Criminal do Império 1830 e o Código Penal de 1890 também disciplinaram essa matéria embora ainda não tivessem sua fisionomia individual bem definida Esse tipo penal na verdade além de proteger a alteração de limites de propriedade imóvel criminaliza também a usurpação de águas e o esbulho possessório 2 Bem jurídico tutelado Neste dispositivo não se cuida da coisa móvel mas da imóvel Os bens jurídicos protegidos são a posse e a propriedade imobiliária Nélson Hungria a nosso juízo equivocadamente adotava entendimento restritivo isto é afastava a posse como objeto da proteção penal Nesse sentido afirmava Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 89 O que a lei protege com a incriminação da alteração de limites como em todas as outras formas de usurpação é a propriedade e não a posse Esta é protegida como um meio de proteção à propriedade porque faz presumir o domínio por parte de quem a exerce Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 298 assumindo posição radicalmente contrária à de Hungria não apenas admitia a proteção da posse como sustentava que esta era a prioridade imediata da proteção penal e apenas por extensão a propriedade também resulta protegida A precisão do magistério de Noronha merece ser transcrita in verbis O objeto específico da tutela do dispositivo é a posse da coisa imóvel é ela a objetividade imediata que se tem em vista Protegendoa protege também a lei a propriedade pois a posse é a propriedade exteriorizada atualizada Mas como no furto tem preeminência no plano da proteção legal a posse ainda que entre em conflito com a propriedade Se no Direito Civil o possuidor pode intentar ação possessória contra o proprietário razão maior existe para o Direito Penal proteger aquele quando o ato do segundo apresenta caráter mais grave invadindo a órbita do ilícito penal Constatase que a argumentação de Magalhães Noronha é irrefutável e por isso mesmo está mais próxima do entendimento majoritário da doutrina mais recente com a ressalva apenas de que prioritariamente é protegida a propriedade imóvel a posse que a ela corresponde isto é na ordem inversa da orientação sustentada por Magalhães Noronha Protegese com efeito a inviolabilidade do patrimônio imobiliário que a despeito de não poder ser objeto de subtração como no furto e no roubo pode ser indevidamente invadido ocupado ou deteriorado restringindo ou anulando o livre uso e gozo do proprietário ou possuidor além do livre exercício de sua posse tranquila 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeitos ativo e passivo são os proprietários e possuidores de imóveis logicamente ativo quando pratica a ação alteradora de limites imobiliários e passivo quando sofre seus efeitos Carrara Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 88 e Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 377 só admitiam o proprietário do imóvel limítrofe isto é o proprietário lindeiro como sujeito ativo na medida em que somente este podia acrescer ao seu a diferença alterada Mas a nosso juízo o possuidor também pode ser sujeito ativo a aquisição via usucapião é uma realidade pois pode alterar marcos e tapumes objetivando ampliar sua posse invadindo assim o imóvel vizinho A despeito da existência de entendimento em sentido contrário em princípio estamos diante de crime próprio pois somente o vizinho do imóvel lindeiro proprietário ou possuidor pode praticálo e essa característica é inegavelmente uma condição especial exigida pelo tipo penal pois somente estes podem beneficiarse com a alteração dos limites divisórios entre imóveis limítrofes Opondose a entendimento que admitia a possibilidade de futuro proprietário do imóvel lindeiro poder praticar o crime de alteração de limites Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 89 refutouo com o seguinte argumento A possibilidade de usurpação subordinada à futura aquisição do imóvel vizinho é uma possibilidade condicionada incompatível com o crime de alteração de limites Quando a lei se refere ao fim de apropriação evidentemente está a exigir que a ele corresponda a possibilidade de uma apropriação imediata e não sujeita a condição futura pois de outro modo estaria considerando como realidade atual um simples e mesmo incerto projeto Paulo José da Costa Jr no entanto sustenta que além do proprietário lindeiro o arrendatário o possuidor e até mesmo um futuro comprador pode ser sujeito ativo desse crime Nesse sentido completa Paulo José Comentários ao Código Penal São Paulo Saraiva 2000 p 491 O proprietário para ampliar sua propriedade O arrendatário para usufruir de uma porção superior à arrendada O possuidor porque ao requerer o usucapião o fará com vistas a uma propriedade maior E o futuro comprador porque pelo mesmo preço mediante um deslocamento dos limites primitivos obterá uma área maior Temos dificuldades no entanto em admitir essa abrangência da legitimidade ativa sustentada por Costa Jr Na verdade o acerto em relação ao proprietário e ao possuidor não se estende ao arrendatário e a própria justificativa desnuda essa impossibilidade com efeito em relação a este Costa Jr justifica afirmando que o arrendatário praticá loia para usufruir de uma porção superior à arrendada No entanto usufruir de porção maior não pode em hipótese alguma ser interpretado como apropriarse E essa distinção no fim especial exigido pelo tipo penal absolutamente inexistente no móvel da ação do arrendatário impede que este possa ser sujeito ativo desse crime Contudo em relação ao futuro comprador excepcionalmente admitimos a possibilidade de figurar sujeito ativo 31 A impossibilidade de o condômino ser sujeito ativo Questão interessante é sobre a possibilidade de o condômino ser sujeito ativo do crime de alteração de limites Na verdade na copropriedade ou condomínio pro indiviso onde há composse sobre todo o imóvel marcada pela indivisão de fato e de direito à evidência é impossível o crime de alteração de limites pela absoluta impropriedade do objeto art 17 do CP No entanto desde que se trate de condomínio pro diviso acreditamos que não há nenhuma dificuldade na medida em que a divisão é provisória e sujeita a posterior divisão judicial Com efeito neste os condôminos delimitam suas partes tácita ou expressamente a possuir na coisa comum parte certa e determinada Há na realidade comunhão sine compossessione uma vez que cada coproprietário tem posse sobre parte certa do imóvel tendo direito inclusive aos interditos proprietários quer contra estranhos quer contra os outros condôminos arts 1199 e 1314 do CC Assim o coproprietário que remover sinais divisórios no condomínio pro diviso com o fim de apropriarse de parte sobre a qual outro condômino exerce sua posse pratica esse crime Por fim quanto ao sujeito passivo somente podem ser igualmente o proprietário e o possuidor não havendo nesse particular qualquer divergência doutrinária 4 Tipo objetivo adequação típica São elementos integrantes do crime de alteração de limites a existência de tapume marco ou qualquer outro sinal indicativo de linha divisória b sua supressão ou deslocamento c fim de apropriar se de coisa alheia imóvel Os objetos das ações incriminadas são tapume marco ou qualquer outro sinal indicativo de linha divisória As ações tipificadas são suprimir e deslocar tapume marco ou qualquer outro sinal indicativo da linha divisória de propriedade imóvel Suprimir significa eliminar destruir fazer desaparecer A consequência da ação de suprimir deve ser apagar fazer desaparecer por completo a demarcação da linha divisória inviabilizando que se possa constatar onde esta se localizava Por isso não caracteriza supressão o simples ato de arrancar tapumes ou marcos de uma cerca sem tapar os respectivos buracos existentes no solo que são denunciadores da linha divisória Ação como essa poderá no máximo caracterizar o crime de dano ou mesmo de furto na hipótese de haver subtração do material extraído Deslocar por sua vez tem o significado de afastar remover isto é mudar de um lugar para outro sinal divisório marco tapume etc de propriedade imobiliária Nesse caso não desaparecem como no caso da supressão mas são deslocados para outros pontos outros lugares induzindo à conclusão de que a linha divisória é outra que não a real É irrelevante para a configuração do crime que os sinais possam ser com facilidade recolocados nos mesmos lugares ou substituídos por outros nas mesmas condições A conduta já se aperfeiçoou e o crime já se consumou Em outros termos a supressão apaga completamente a linha divisória enquanto o deslocamento remove os sinais para outro ponto indicando a linha divisória incorretamente A simples colocação de novos marcos sem a supressão dos anteriores em princípio não tipifica o crime A diferença juridicamente considerável não reside na espécie de marco ou tapume mas na modalidade de ação isto é na supressão ou no deslocamento do sinal divisório seja de que natureza for naquela o sinal desaparece em definitivo neste é simplesmente removido em qualquer dessas modalidades tipificase o crime de alteração de limites e ainda que o sujeito pratique as duas ações isto é primeiro desloque e depois suprima os sinais o crime será único pois se trata de infração de conteúdo variado 41 Formas ou aspectos dos diferentes sinais divisórios Os sinais divisórios enfim podem assumir as seguintes formas a tapumes são cercas muros ou quaisquer meios físicos utilizados para separar ou cercar imóveis b marcos são sinais materiais tocos pedras estacas piquetes indicativos da divisória Nélson Hungria dava a seguinte definição a marcos e tapumes Tapume no sentido estrito que lhe atribui o art 161 caput é toda cerca sebe viva ou seca cerca de arame tela metálica etc ou muro de pedra tijolos adobes cimento armado destinado a assinalar o limite entre dois ou mais imóveis Marco é toda coisa corpórea pedras piquetes postes árvores tocos de madeira padrões etc que artificialmente colocada ou naturalmente existente em pontos da linha divisória de imóveis serve também ao fim de atestála permanentemente ainda que não perpetuamente E por fim c qualquer outro sinal indicativo de linha divisória representa uma fórmula genérica para abranger qualquer meio modo ou forma de sinais divisórios de imóveis tais como valas regos sulcos trilhas cursos dágua entre outros Assim tapumes e marcos são enumerações puramente exemplificativas É desnecessário que se trate de sinal permanente ou contínuo sendo suficiente que tenha idoneidade para demarcar os limites da propriedade imobiliária Por fim também é irrelevante que os sinais tenham sido produto de convenção entre as partes ou resultado de decisão judicial basta que sejam indicadores efetivos das lindes dos referidos imóveis 42 Atipicidade da conduta de acrescer outros sinais divisórios É fundamental que se tenha presente a necessidade para configurar as condutas tipificadas de que haja supressão ou deslocamento de sinais divisórios dessa forma não há crime na simples colocação de outros sinais indicativos de limites divisórios mesmo que invada o terreno vizinho se não houver supressão ou deslocamento dos marcos originais não indo além de meros ilícitos civis turbação da posse Contudo se a colocação de novos marcos produzir alterações que a lei proíbe tornar confusos ou irreconhecíveis os marcos originais admitimos que se configurará o crime em exame Aceitamos assim embora com cautela eventuais decisões pretorianas que admitem como típicas as condutas que causem confusão ou dificuldade de monta para a observação da linha limítrofe de imóveis contíguos 43 Peculiaridades especiais do crime de usurpação Há entendimento de que a ação deve ser mais ou menos clandestina e deve ser apta a confundir os limites vigentes Por essa razão a alteração de limites embora se trate de propriedade imóvel dificilmente pode ter por objeto as construções imobiliárias cuja alteração é constatada de imediato A eventual ocorrência de esbulho possessório após a alteração de limites absorve este que tem natureza subsidiária A despeito de tratarse de bem imóvel não descurou o legislador em adjuntarlhe o elemento normativo alheio a exemplo do que fez em relação à tutela da coisa móvel que também deve ser alheia Relativamente a esse elemento normativo aplicase aqui tudo o que dissemos a seu respeito quando abordamos os crimes de furto e de roubo 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo do tipo é o dolo representado pela vontade consciente de alterar ou deslocar tapume ou marco indicativo de linha divisória de imóvel produzindo a alteração nas linhas divisórias dos imóveis É indispensável que o sujeito ativo tenha consciência não apenas da ação mas também da existência e função dos marcos divisórios e de suas funções Não há previsão de modalidade culposa O erro de tipo se ocorrer afasta a tipicidade e na ausência de modalidade culposa é irrelevante tratarse de erro evitável ou inevitável 51 Elemento subjetivo especial para apropriarse de coisa móvel alheia Além do dolo exigese o elemento subjetivo especial do tipo constituído pelo especial fim de apropriarse no todo ou em parte de imóvel alheio É exatamente essa finalidade específica que distingue a ação de outras infrações penais Assim por exemplo se o agente objetivar a simples apropriação dos marcos ou tapumes o crime será o de furto art 155 se a finalidade for somente de destruílos ou seja causar prejuízos sem qualquer intenção de alterar limites e de apropriarse do imóvel o crime será de dano art 163 se a alteração se produzir na pendência de processo judicial objetivando induzir o juiz ou perito a erro o crime será de fraude processual art 347 se finalmente a conduta do agente tiver por objetivo somente restaurar a linha legítima o crime tipificado será de exercício arbitrário das próprias razões art 345 Apropriarse não tem o significado de adquirir a propriedade ou o dominus na medida em que a aquisição de propriedade imóvel é um ato complexo que exige o registro do título aquisitivo em Cartório do Registro Especial Procurase na verdade impedir o apossamento ou apoderamento ilegítimo da propriedade imóvel alheia isto é proibir a posse adquirida ilicitamente Apropriarse tem pois neste dispositivo o sentido de apossarse 511 Objeto do fim especial somente imóvel por natureza Objeto do fim especial somente pode ser imóvel por natureza art 79 do CC2002 isto é aquele que pode ser dividido demarcado cujos limites lindeiros podem ser representados por marcos tapumes ou qualquer sinal divisório Estão excluídos dessa proteção legal os chamados imóveis por ficção Assim estão excluídos os imóveis por acessão física artificial por acessão intelectual e por determinação legal arts 43 II e III do CC16 e 80 do CC2002 É desnecessário por fim o proveito pessoal pois o verbo apropriarse não tem esse sentido restritivo podendo na verdade resultar proveito para outrem 6 Consumação e tentativa Consumase a alteração de limites com a efetiva supressão ou deslocamento do marco tapume ou qualquer outro sinal indicativo da linha divisória sendo irrelevante alcançar ou não o objetivo de apropriarse da propriedade alheia imóvel Em verdade como já afirmamos a apropriação constitui o especial fim de agir que como elemento subjetivo especial do injusto não precisa concretizarse sendo suficiente que tenha sido o móvel orientador da ação do agente Como destacava Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 303 a communis opinio dos tratadistas tem como consumado o crime tãosó com a remoção ou supressão dos lindes Em realidade essa é efetivamente a realidade das coisas como deixa claro a própria redação do artigo e particularmente o nomen iuris do art 161 alteração de limites Eventuais consequências decorrentes da alteração de limites uso fruição ou exploração da propriedade não ultrapassam os lindes do exaurimento do crime situandose nos limites extensivos do dano experimentado pela vítima A admissão da tentativa não é tema dos mais pacíficos havendo profundas divergências No entanto mesmo para os que classificam como crime formal é admissível a tentativa pois o sujeito passivo pode ser surpreendido quando inicia a retirada dos diversos sinais indicativos da linha divisória sendo interrompido durante a fase executória que outra coisa não é senão uma figura tentada art 14 II do CP 7 Pena e ação penal As penas cominadas são a detenção de um a seis meses e multa cujos limites não são mais estabelecidos em cada tipo penal A ação penal por sua vez é pública incondicionada Contudo tratandose de propriedade particular e não havendo emprego de violência a ação penal será de exclusiva iniciativa privada Quando examinarmos a figura do esbulho possessório a última deste dispositivo procederemos melhor análise desses dois aspectos Usurpação de águas I 1 Considerações introdutórias O Código Criminal brasileiro de 1830 não tipificou essa infração penal que foi recepcionada pelo primeiro Código Penal republicano 1890 com a seguinte redação Si para desviar do seu curso agua de uso publico ou particular Penas de prizão cellular por um a seis mezes e multa de 5 a 20 do damno causado A usurpação de águas tipifica crime autônomo e distinto daquele capitulado no caput do art 161 especialmente em relação a seu objeto material A opção do Código Penal por disciplinar as três figuras de forma distinta e autônoma permite melhor exame dogmático embora até por isso apresente maiores deficiências estruturais 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido aqui também são a posse e a propriedade imobiliárias enfatizando particularmente o direito sobre o uso das águas por seu titular Protegese aqui o direito real do proprietário e não simplesmente um direito pessoal ou obrigacional Protegese com efeito uso gozo ou exploração das águas segundo sua destinação São protegidas as águas consideradas imóveis art 79 do CC enquanto parte líquida do solo uma vez que as móveis ou mobilizadas recebem a proteção dos arts 155 e 157 Não são apenas as águas que já se encontram na propriedade da vítima mas também aquelas cujo curso natural por lá deva passar Assim a ação de desviar ou represar impede o uso e gozo de quem tem esse direito 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa não se exigindo qualquer qualidade ou condição especial do agente mesmo o proprietário que dentro de seus domínios altera o curso ou saída das águas art 71 1º do Código de Águas pode ser sujeito ativo desse crime É perfeitamente admissível o instituto do concurso de pessoas sem qualquer restrição especial Sujeito passivo por sua vez é quem tem a posse ou o direito de utilização das águas ou melhor dito é quem pode sofrer o prejuízo em decorrência do desvio ou represamento do curso dágua Sujeito passivo à evidência pode ser tanto pessoa física quanto pessoa jurídica 4 Tipo objetivo adequação típica As condutas tipificadas são desviar ou represar Desviar significa alterar ou mudar o curso das águas fluentes ou estagnadas represar conter ou interromper o curso das águas impedindo que prossigam seu fluxo natural Pressuposto fático é que as águas se encontrem na posse isto é no uso e gozo de alguma pessoa física ou jurídica Assim estão excluídas dessa proteção legal a res nullius res communes omnium Alheias não são apenas as águas que não pertencem ao agente mas também as comuns ou seja aquelas sobre as quais todos tenham direito Em outros termos alheias são também as águas de uso comum Na verdade não pode ser considerada alheia apenas a porção de água que se encontre nos limites da propriedade da vítima O Código de Águas arts 71 e 72 e o Código Civil arts 1288 e 1290 prescrevem direitos e obrigações aos proprietários de imóveis atravessados por águas correntes proibindo a alteração no ponto de saída das águas remanescentes Nessa linha o art 71 do Código de Águas prescreve Os donos ou possuidores de prédios atravessados ou banhados pelas correntes e com aplicação tanto para a agricultura como para a indústria contanto que o refluxo das mesmas águas não resulte prejuízo aos prédios que ficam superiormente situados e que inferiormente não se altere o ponto de saída das águas remanescentes nem se infrinja o disposto na última parte do parágrafo único do art 69 Dec n 2464334 41 O objeto material da proteção penal são as águas O objeto material da proteção penal são as águas Como destaca com acerto Paulo José da Costa Jr o bem tutelado não é a água que pode ser legitimamente retirada com bombas ou manualmente em quantidade reduzida O que se tutela são as águas consideradas em seu complexo como bens imóveis podendo ser correntes ou estagnadas contínuas ou intermitentes perenes ou temporárias públicas ou privadas ou mesmo do subsolo Comentários ao Código Penal p 493 Em outros termos objeto material da proteção legal são as águas em estado natural fluentes ou estagnadas concebidas como imóvel As águas segundo o Código de Águas Decreto n 24643 de 107 1934 podem ser públicas ou privadas aquelas destinadas ao uso coletivo e estas destinadas à satisfação das necessidades e interesses individuais São águas públicas os mares territoriais golfos baías enseadas e portos correntes lagos e canais navegáveis ou flutuáveis as fontes e reservatórios públicos Públicas enfim são somente as águas perenes embora não percam essa característica se secarem eventualmente durante determinada estiagem forte art 3º do Dec n 2464334 Destaca o mesmo decreto que as águas assoladas pela seca também são consideradas públicas de uso comum art 5º São comuns as correntes não navegáveis ou flutuáveis e que não formem correntes de tal natureza art 7º São águas particulares todas as nascentes e todas as águas que se situem em imóveis particulares desde que não sejam classificadas como águas públicas ou comuns art 8º Ainda são considerados particulares os lagos ou lagoas que se situem apenas em um imóvel particular e sejam apenas por ele cercados art 2º 3º 42 Águas represadas e águas correntes São protegidas tanto as águas represadas quanto as correntes isto é aquelas que passam ou passariam pelo imóvel do sujeito passivo a despeito do silêncio de nosso Código Penal Ademais como destacava Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 3823 o mesmo se diga das águas perenes ou temporárias contínuas ou intermitentes e inclusive a água do subsolo e a água estagnada já que desviar significa mudar o leito das águas A simples extração de água não configura esse crime podendo eventualmente como coisa mobilizada tipificar furto desde que reúna os requisitos exigidos pelo tipo penal 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo geral é o dolo constituído pela vontade consciente de impedir a posse de outrem sobre as águas a que tem direito desviandoas ou represandoas O elemento subjetivo especial do tipo é constituído pelo especial fim de obter proveito para si ou para outrem E como o elemento subjetivo especial não precisa consumar se é suficiente que exista na mente do sujeito ativo Em outros termos é irrelevante para a configuração do tipo penal que o agente consiga obter algum proveito para si ou para terceiro Contudo se o agente desvia ou represa águas alheias com o propósito exclusivo de causar prejuízo à vítima isto é sem a intenção de obter qualquer vantagem ou proveito para si ou alguém não se poderá falar desse crime mas tão somente do dano art 163 Com efeito embora o especial fim de agir não integre o dolo ele o aperfeiçoa e o complementa e essa finalidade especial é exatamente o diferencial que determina a tipificação modeladora da conduta praticada 6 Consumação e tentativa Consumase o crime de usurpação de águas no exato momento em que o sujeito ativo efetua o desvio ou o represamento ainda que não obtenha o proveito desejado tratandose pois de crime formal Alguns autores exigem a obtenção do proveito pretendido Celso Delmanto Na primeira figura formal e instantânea consumase no momento do desvio ao passo que na segunda represar material e permanente a consumação protraise no tempo ou seja enquanto durar o represamento A admissibilidade da figura tentada não é assunto pacífico na doutrina No entanto desviar ou represar águas alheias são condutas que envolvem alguma complexidade e inegavelmente admitem fracionamento ou seja são ações que em seu curso executório podem ser interrompidas por circunstâncias alheias à vontade do agente Logo essa interrupção do iter criminis involuntariamente configura a tentativa 7 Pena e ação penal As penas cominadas são a detenção de um a seis meses e multa cujos limites não são mais estabelecidos em cada tipo penal Se houve emprego de violência haverá concurso material com a infração penal que aquela tipificar A ação penal por sua vez é pública incondicionada Contudo tratandose de propriedade particular e não havendo emprego de violência a ação penal será de exclusiva iniciativa privada art 161 3º Esbulho possessório II 1 Considerações introdutórias Nossos Códigos Penais do século XIX não conheceram esse delito tratandose por conseguinte de figura penal bastante recente e com feição própria distinta do instituto similar disciplinado no Código Civil brasileiro Realmente neste é necessário que a vítima seja desalojada da posse condição absolutamente desnecessária em nossa legislação penal sendo suficiente que a perda da posse constitua o fim especial do agente A previsão ora em exame inspirouse no Código Penal Rocco 1930 que ao contrário do brasileiro criminalizava a turbação de pacífica posse alheia de imóveis art 634 Convém destacar que o Código Penal brasileiro silenciou quanto à figura da simples turbação da posse embora devase reconhecer em todo esbulho sempre ocorre turbação no entanto se essa turbação não tiver pelo menos o propósito de desalojamento da posse a conduta será atípica 2 Bem jurídico tutelado Os bens jurídicos protegidos são a posse da propriedade imobiliária Prioritariamente protegese a posse da coisa imóvel embora também se proteja a propriedade devese ressaltar que se tutela a posse independentemente da propriedade podendose aliás contrapor a esta Como destacava com acerto Magalhães Noronha pois se a proteção possessória é outorgada ao proprietáriopossuidor não há como não dispensála também ao possuidor não proprietário até contra o proprietário São tuteladas igualmente a integridade e a saúde física e mental do sujeito passivo na medida em que o crime pode ser praticado com violência ou grave ameaça à pessoa O modus operandi ofende paralelamente esses aspectos da pessoa humana que são abundantemente protegidos no Título que cuida dos crimes contra a pessoa Essa proteção múltipla de bens jurídicos distintos permite que se possa classificálo como espécie de crime complexo 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa com exceção do proprietário ou condômino a despeito de algum entendimento a nosso juízo equivocado em sentido contrário Em outros termos sujeito ativo é qualquer pessoa que venha a invadir justamente terreno ou edifício que se encontre na posse legítima de outrem Para Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 311 o proprietário pode ser sujeito ativo do crime de esbulho possessório quando o pratica contra possuidor que esteja exercendo a posse direta legitimamente Contudo não se pode esquecer da elementar normativa alheio contida pelo tipo penal quando se refere a terreno ou edifício alheio com certeza na ação do proprietário que invade seu próprio imóvel falta a elementar alheio exigida pela descrição típica Pela mesma razão o condômino de imóvel pro indiviso não pode ser sujeito ativo de esbulho possessório em relação ao possuidor por faltarlhe como afirmamos a elementar normativa alheio O concurso de pessoas no crime de esbulho pode desempenhar dois papéis distintos a saber se concorrerem apenas dois sujeitos para a prática do crime estarseá diante do concurso eventual de pessoas nos termos do art 29 do CP Contudo havendo concurso de mais de duas pessoas convertese no denominado concurso necessário que nesse caso configura elementar da estrutura típica do crime perdendo sua natureza de eventual Na verdade a descrição típica exige o emprego de violência ou grave ameaça à pessoa ou alternativamente concurso de mais de duas pessoas Enfim a ausência das duas elementares impede a tipificação do esbulho mesmo que haja invasão da propriedade imóvel Sujeito passivo do esbulho possessório é quem se encontra na posse do terreno ou edifício invadido seja o proprietário ou seja a qualquer título o possuidor do imóvel enfiteuta usufrutuário arrendatário locatário titular de servidão etc conforme reconhece a doutrina Em outros termos sujeito passivo é todo aquele que no Direito Civil pode valerse das ações possessórias 4 Tipo objetivo adequação típica São elementos constitutivos do crime de esbulho a invasão de prédio terreno ou edifício b emprego de violência ou grave ameaça ou concurso de mais de duas pessoas c fim especial de esbulhar A ação tipificada é invadir que significa penetrar ingressar introduzirse violenta ou hostilmente no entanto o mesmo verbo pode significar entrar ou introduzir clandestinamente Podese na verdade invadir determinado lugar não através de violência mas ardilosa astuciosa ou sorrateiramente Afinal essa possibilidade variada de interpretações levou o legislador a definir com precisão o sentido que estava emprestado ao verbo invadir acrescentando somente que a invasão mediante violência grave ameaça ou com o concurso de mais de duas pessoas com finalidade esbulhativa seria objeto de proibição penal Com efeito o esbulho possessório pode ser executado com violência real física ou ficta grave ameaça ou com a participação de no mínimo três pessoas Esbulho é a perda da posse o desalojamento do possuidor Assim a invasão pacífica isto é sem violência de qualquer natureza não é tipificada como crime quem invade imóvel alheio ainda que com a finalidade de esbulhar mas sem empregar violência ou grave ameaça e sem fazêlo mediante o concurso de mais de duas pessoas não comete o crime de esbulho A ilicitude desse tipo de comportamento encontra resposta no Código Civil Esbulho com o sentido de ocupação que é a concepção penalística do instituto não encerra necessariamente a ideia de perpetuidade Com efeito nem sempre o esbulhador tem a intenção de instalarse em definitivo no imóvel invadido sem contudo descaracterizar o esbulho 41 Violência à pessoa ou grave ameaça A forma de execução alternativa com violência vis corporalis ou grave ameaça vis compulsiva ou mediante concurso de mais de duas pessoas Na primeira hipótese exigese violência à pessoa e não à coisa Na segunda exigese a participação de mais de duas pessoas a nosso juízo na concepção do legislador a reunião de mais de duas pessoas para prática do esbulho representa uma espécie de violência presumida Enfim tudo o que dissemos sobre violência ou grave ameaça quando examinamos o crime de roubo tem aqui inteira aplicação sendo portanto desnecessário repetilo Contudo relativamente ao concurso de pessoas necessitamos algumas considerações na medida em que para caracterizarse o esbulho sem violência ou grave ameaça fazse necessário o mínimo de três pessoas 42 Esbulho mediante concurso de mais de duas pessoas Quando o esbulho for praticado por meio do concurso de mais de duas pessoas não se configura o concurso eventual de pessoas coautoria ou participação uma vez que se trata de elementar típica do modus faciendi da execução criminal ainda que essa reunião de pessoas seja produto de eventualidade Nesse caso o concurso necessário que não é circunstância qualificadora ou majoradora da pena mas integra o próprio conteúdo da descrição típica constitui elementar caracterizadora podese dizer de uma espécie de violência presumida Para alguns autores Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 312 Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 385 Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 435 esbulho sem violência exige no mínimo quatro pessoas o autor e mais três Parecenos insustentável essa orientação cuja exigência adaptandose o elemento subjetivo já poderia caracterizar uma quadrilha Hungria com a clarividência de sempre sustenta ser suficiente o número de três concorrentes Na verdade o texto legal não exige que o invasor conte com o concurso de mais de duas pessoas mas que a invasão seja executada mediante o concurso de mais de duas pessoas Sem maiores considerações que nos parecem desnecessárias adotamos a orientação minoritária admitindo a suficiência de um mínimo de três pessoas para configurar o crime de esbulho quando este for praticado sem violência física ou grave ameaça 43 Esbulho civil e esbulho penal Embora o Código Penal se utilize da definição de esbulho oferecida pelo direito civil com ela não se confunde Na verdade na concepção do Código Civil a caracterização do esbulho exige que o possuidor perca a posse isto é seja dela afastado ao passo que para o Código Penal é suficiente que a finalidade de esbulhar constitua o especial fim de agir que como todos sabemos não precisa concretizarse Nessa linha discordamos frontalmente daqueles que sugerem de lege ferenda para equipararse à previsão do Código Civil a criminalização da simples turbação Júlio Fabbrini Mirabete Direito Penal São Paulo Atlas 1987 v 2 p 236 O Direito Penal no caso é mais protetivo satisfazendose com a simples existência do elemento subjetivo especial do tipo o fim de esbulhar Na realidade há podese afirmar certa inversão de papéis dos dois ramos do direito na medida em que o direito penal deve manter seu caráter subsidiário e intervir somente quando outros meios de controle social não funcionem Em outros termos somente uma ofensa mais grave do bem jurídico que deveria encontrar proteção no direito penal no entanto nesse caso usando a linguagem do Código Civil a simples turbação da posse já é criminalizada como esbulho enquanto para o Direito Civil é necessário que a vítima seja desalojada da posse para configurar tal esbulho Nessas circunstâncias estamos diante de uma injustificada criminalização com evidente violação do princípio da ultima ratio 44 Esbulho de imóvel do SFH Se o imóvel esbulhado foi ou é objeto de financiamento do Sistema Financeiro da Habitação incorrerá no esbulho possessório definido na Lei Especial art 9º da Lei n 574171 Se o agente desocupar o imóvel espontaneamente antes de qualquer medida coativa será isento de pena O Superior Tribunal de Justiça já decidiu que não há esbulho possessório de unidade do Sistema Nacional de Habitação quando a ocupação se dá naturalmente por força de contrato celebrado com a Caixa Econômica Federal O fato de ter o ocupante se tornado posteriormente inadimplente não configura o esbulho possessório do art 161 do Código Penal nem o do art 9º da Lei n 574171 Na hipótese de invasão de terras da União Estados ou Municípios ver a Lei n 4947 de 6 de abril de 1966 art 20 5 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo é constituído pelo elemento subjetivo geral que é o dolo representado pela vontade livre e consciente de invadir violentamente terreno ou edifício alheio além do elemento subjetivo especial do tipo constituído pelo especial fim de praticar o esbulho possessório ou seja o propósito de colocar a vítima para fora do imóvel e ocupálo Assim quando a invasão tiver como propósito a simples turbação da posse a conduta será atípica pois lhe faltará o especial fim de esbulhar como exemplifica Paulo José da Costa Jr Comentários ao Código Penal p 496 se a invasão se der para colher frutos forçar uma servidão de passagem ou mesmo cortar algumas árvores não estará caracterizado o crime Configura a conduta uma turbação não prevista em lei 6 Consumação e tentativa Consumase o crime de esbulho com a simples invasão ainda que o esbulho não se concretize Tratase de crime formal o esbulho se ocorrer representará apenas o exaurimento do crime que já se consumara com a efetiva invasão do imóvel Admitese em tese a tentativa quando o sujeito ativo não consegue entrar no imóvel por circunstâncias alheias a sua vontade 7 Usurpação em concurso com violência O 2º do art 161 determina que se o sujeito ativo usa de violência incorre também na pena a esta cominada Dois aspectos fundamentalmente demandam alguma reflexão tratase de concurso de crimes que modalidade Qual sistema de aplicação de penas deve ser adotado Inicialmente devese registrar que essa previsão somente é aplicável quando a violência empregada constituir em si mesma crime caso contrário não haverá para ela pena cominada Por outro lado devese ter presente que o uso de violência ou grave ameaça como tal é elementar constitutiva do crime de esbulho Nesse tipo penal mesmo fora da violência presumida concurso de mais de duas pessoas somente a violência que constituir em si mesma crime excederá a mera função de elementar constitutiva do esbulho Nesse caso a pena do esbulho deve ser cumulada com a pena correspondente à infração penal constituída pela violência Qualquer das três figuras alteração de limites usurpação de águas ou esbulho possessório praticada com uso de violência que constitua em si mesma crime configura certamente concurso de crimes No entanto não se trata de concurso material como reiteradamente tem repetido a doutrina nacional Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 94 Noronha Direito Penal v 2 p 314 Damásio Direito Penal v 2 p 381 etc Em momento algum o texto legal sugeriu que se trata de concurso material não passando de equivocada interpretação doutrinária O Código Penal utiliza na verdade o sistema do cúmulo material de penas nas hipóteses de concurso material de crimes e concurso formal impróprio arts 69 e 70 caput segunda parte Assim os crimes de usurpação previstos no art 161 praticados com violência que constitua em si mesma crime configuram em regra concurso formal quando forem objeto de ação de uma única e mesma ação ainda que dividida em vários atos 8 Pena e ação penal As penas cominadas são cumulativas nas três figuras alteração de limites usurpação de águas e esbulho possessório detenção de um a seis meses e multa Se o agente empregar violência responderá também pelo crime correspondente aplicandose o princípio do cúmulo material de penas Ficam absorvidas as vias de fato Na propriedade particular e sem violência à pessoa real a ação penal é de exclusiva iniciativa privada 3º Na hipótese contrária a ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Conflito de competência Esbulho possessório em imóveis de propriedade da Caixa Econômica Federal Configurada a prática de delito em detrimento de bem de empresa pública federal compete à Justiça Federal o processo e julgamento da respectiva ação penal art 109 inciso IV da Constituição da República STJ Conflito de Competência 47687SP Rel Min Hamilton Carvalhido j 2482005 Esbulho possessório Não ocorrência Matéria a ser tratada na esfera civil Ordem concedida Inocorrendo o esbulho possessório de unidade do sistema nacional de habitação eis que a ocupação se deu naturalmente por força de contrato celebrado com a CEF mesmo ante a circunstância de ter o ocupante se tornado posteriormente inadimplente não há se falar na existência das figuras do art 161 e parágrafos do CP nem do art 9º da Lei n 574171 STJ RHC 1636SP Rel Min Cid Flaquer Scartezzini j 2241992 Crimes de alteração de limites esbulho possessório e ameaça praticados contra terceiros em terreno de marinha Competência da Justiça Estadual por não caracterizada ofensa a bens serviços ou interesses da União Federal STJ Conflito de Competência 2190SC Rel Min Assis Toledo j 21111991 Supressão ou alteração de marca em animais Art 162 Suprimir ou alterar indevidamente em gado ou rebanho alheio marca ou sinal indicativo de propriedade Pena detenção de 6 seis meses a 3 três anos e multa V art 64 do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O dispositivo em exame tem como antecedente o Projeto Sá Pereira que num primeiro momento considerava espécie de furto a conduta de quem ferra contraferra assinala ou contraassinala animal alheio art 217 Posteriormente referido dispositivo recebeu a seguinte redação Cometerá furto o que ferrar ou contraferrar animal alheio com outra marca que não a do próprio dono salvo se o tiver feito a seu mando ou de seu preposto art 186 2º O Projeto Alcântara seguiu com pequena variação a mesma orientação do Projeto Sá Pereira embora classificasse a mesma infração penal como variante da apropriação indébita Posteriormente no entanto a Comissão Revisora houve por bem restringir o dispositivo para incluindoo na figura da usurpação limitar sua abrangência à supressão ou alteração de marca ou sinal indicativo de propriedade em animais de gado ou rebanho alheio A limitação operouse em dois aspectos excluiuse a marcação de animais desmarcados de um lado e de outro a incriminação está condicionada a animal integrante de gado ou rebanho Essa cautela levou em consideração que somente quando violada a precaução do proprietário representada pela marca dos animais se justifica a criminalização da conduta 2 Bem jurídico tutelado Ao contrário das outras figuras de usurpação no art 162 o objeto da tutela penal não é a propriedade imobiliária Os bens jurídicos protegidos são a posse e a propriedade de semoventes bois vacas cavalos carneiros porcos etc constitutivos de gado ou rebanho que são considerados para o direito penal coisas móveis embora para o direito civil possam eventualmente ser tratados como imóveis art 43 III do CC16 por acessão intelectual quando por exemplo imobilizados num prédio para sua exploração industrial Convém destacar que o bem jurídico protegido não é a marca ou sinal do animal em si mesmos pois aqueles são apenas o meio de proteger ou identificar a propriedade deste Por isso quem adquire animais e suprime ou altera a marca ou sinal que estes traziam identificadores do proprietário anterior não comete crime algum Ademais essa conduta não seria indevida e os animais não mais seriam alheios Mas nesse caso já se estariam examinando elementos especiais da ilicitude integrantes da tipicidade O objeto material sobre o qual recai a ação delituosa por sua vez é a marca ou sinal indicativo de propriedade Assim como na indústria e no comércio a marca protege o produto no animal ela tem a mesma finalidade advertindo a todos quanto a quem ele pertence 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser pessoa sem condições especiais tratandose portanto de crime comum Acreditamos que o detentor em nome de outrem também pode ser sujeito ativo desse crime Exemplifica com acerto Luiz Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 441 o administrador que dolosamente suprime a marca do gado ou rebanho com o propósito de dificultar a identificação da propriedade excluindo a hipótese em que usurpa a marca e inverte o título de posse já que nesse caso terseá apropriação indébita Sujeito passivo igualmente pode ser qualquer pessoa física ou jurídica desde que dona dos animais objeto da ação 4 Tipo objetivo adequação típica As condutas tipificadas são suprimir e alterar Suprimir significa fazer desaparecer retirar alterar quer dizer modificar transformar mudar em gado ou rebanho alheios indevidamente marca ou sinal indicativos de propriedade Enfim qualquer das duas ações consiste em modificar o estado de fato anterior relativamente à sinalização indicativa do animal Com a ação de alterar não é necessária mudança completa da marca sendo suficiente para a tipificação do crime a mudança de algum traço que a desfigure Marca ou sinal são meios identificadores da origem e propriedade de animais Os proprietários rurais no entanto são criativos na utilização de outros símbolos ou figuras para identificar suas marcas Por isso além da marca pode ser objeto da ação qualquer outro sinal que identifique a propriedade normalmente localizado nos chifres ou no focinho do animal 41 Somente em animais já marcados A conduta incrimina a supressão ou alteração somente de animais já marcados sendo atípica a conduta executada em animais ainda não assinalados isto é não marcados As condutas suprimir e alterar não deixam dúvida pressupõem a existência de marca ou sinal pois somente se pode suprimir ou alterar algo existente Nesse sentido equivocavase Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 316 quando sugeria que o crime poderia ser praticado mesmo em animal desmarcado Marca é o distintivo caracterizador da propriedade normalmente é constituída pelas iniciais do proprietário em outros termos marca é a caracterização do animal com ferro candente ou modernamente com a utilização de alguma substância química Sinal além da marca também é objeto material da ação incriminada Sinal é todo e qualquer distintivo artificial que não se confunda com a marca normalmente localizado no focinho ou nos chifres dos animais Embora a Lei n 4714 de 29 de junho de 1965 regule as dimensões e a localização das marcas em animais bem como seu registro sua observância é irrelevante para a configuração do crime sendo suficiente que possam ser reconhecidas como identificadores da propriedade alheia Com efeito é indiferente que a marca ou sinal tenham sido registrados em órgão próprio como prevê a Lei n 471465 para caracterizar o crime pois o que se protege penalmente não é a marca em si ou por si mesma mas seu sentido indicativo da propriedade alheia É suficiente que simbolizem a propriedade de alguém e venham a ser indevidamente suprimidos ou alterados Contudo convém ter presente que a marca por si só não constitui prova incontestável da propriedade até porque existem animais não marcados cuja propriedade é incontestável ou animais marcados que podem não pertencer ao dono da marca 42 Concurso com outros crimes A alteração ou supressão de marcas em animais alheios não se confunde com outros crimes como o furto por exemplo porque não há subtração da coisa alheia com a apropriação indébita mesmo quando se encontre em sua posse porque ainda não há a efetiva apropriação com o estelionato porque a fraude não é seguida pela obtenção imediata e efetiva de vantagem ilícita Contudo se qualquer das condutas descritas no art 162 for meio para a prática de outro crime como furto estelionato apropriação indébita aquele ficará absorvido o que não impede a nosso juízo eventual concurso com outro crime Na verdade a subtração dos animais furto e posterior alteração da marca originam o concurso de crimes embora em regra tenha sido considerado post factum impunível Da mesma forma quem compra os animais e altera a marca para colocar a sua não pratica o crime não apenas por ter o direito de fazêlo mas também por faltar a elementar alheio 43 Elementares típiconormativas indevidamente e alheio A ação de alterar ou suprimir marca ou sinal deve incidir sobre animais alheios isto é não pertencentes ao sujeito ativo sendo irrelevante que se encontrem em propriedade da vítima do sujeito ativo ou de terceiro O elemento normativo indevidamente caracteriza tipo aberto Assim quando autorizada ou permitida a alteração ou supressão da marca ou sinal ainda que contrariada pelo proprietário não constitui crime faltandolhe a elementar normativa indevidamente Situação semelhante ocorre com quem adquire um rebanho por exemplo e suprime a marca anterior apondo a sua evidentemente se trata de comportamento atípico pois podese afirmar a alteração ou supressão nesse caso é legítima ou seja devida 44 Significado e limite das locuções gado ou rebanho Questão relevante porém será interpretar o sentido ou abrangência dos coletivos gado ou rebanho contidos no texto legal que ao longo do tempo têm recebido definições díspares das quais destacamos algumas começando pela emitida por Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 98 Por gado ou rebanho se entende toda pluralidade gregária de quadrúpedes que costumam ser criados ou mantidos em pastos campos retiros ou currais Quando os animais são de grande porte bois cavalos muares falase em gado quando de pequeno porte carneiros cabritos porcos etc preferese o termo rebanho Para Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 318 gado é substantivo que indica animais geralmente criados nos campos e empregados nos serviços da lavoura para fins industriais comerciais ou consumo doméstico Rebanho particularmente designa porção de gado lanígero de animais guardados por pastor mas indica também reunião multidão ajuntamento de animais Para Bento de Faria Código Penal brasileiro comentado p 73 por sua vez gado é denominação que inculca os animais geralmente criados no campo e destinados ao consumo e a serviços industriais ou comerciais rebanho é a multidão de gado Resumindo gado ou rebanho são sinônimos que genericamente significam uma pluralidade de animais quadrúpedes bois vacas cavalos carneiros ovelhas etc Na verdade a nosso juízo o verdadeiro sentido de gado ou rebanho se apresenta ou não significado distinto parecenos irrelevante O que importa efetivamente é que ambos são substantivos coletivos isto é implicam mais de um animal No entanto isso não quer dizer que para a configuração do crime seja necessário que a supressão ou alteração de marca ou sinal deva ocorrer em mais de um animal mas que o animal que tiver a marca alterada ou suprimida deve integrar o rebanho ou gado de alguém Assim a alteração ou supressão de marca em apenas um animal que se encontre isolado não tipifica esse crime porque em tais circunstâncias o animal pode ser facilmente identificado pois somente quando integra um rebanho pode existir o perigo de passar à propriedade alheia 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo geral é o dolo representado pela vontade livre e consciente de alterar ou suprimir marca ou sinal em animais alheios O sujeito ativo além da vontade de produzir o resultado da alteração ou supressão da identificação do gado ou rebanho alheio deve obrigatoriamente ter consciência de que se trata de animal pertencente a outrem e ademais de que essa ação é indevida isto é desautorizada ilegítima não permitida O desconhecimento de qualquer das duas circunstâncias alheia ou indevida pode caracterizar erro de tipo e por extensão afastar a tipicidade em razão da vontade viciada Implicitamente há a exigência do elemento subjetivo especial do tipo constituído pelo especial fim de provocar dúvida sobre a propriedade dos animais Como sustentava Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 317 é necessário que o agente tenha o escopo de apoderarse dos semoventes ele suprime ou altera a marca para depois irrogar a propriedade Nesse particular a redação primitiva do Projeto do Código Penal de 1940 era mais clara pois destacava expressamente o elemento subjetivo especial do injusto nos seguintes termos para dele isto é do gado ou rebanho se apropriar no todo ou em parte Com essa supressão da redação final para configurar o crime é suficiente criar a possibilidade de usurpação da propriedade de animais alheios 6 Consumação e tentativa Consumase com a simples supressão ou alteração de marca ou sinal independentemente das consequências ainda que o fato se dê em relação a apenas um animal desde que integrante de algum rebanho Admitimos a consumação em um único animal ao contrário do entendimento de parte da doutrina pois a expressão em gado ou rebanho alheio não significa que a ação deve incidir sobre uma coletividade animal como se chega a afirmar mas simplesmente que deve tratarse de animal pertencente a gado ou rebanho alheio isto é pertencente a outrem É admissível em princípio a tentativa quando por exemplo mesmo realizando qualquer das condutas descritas no tipo penal o sujeito ativo por circunstâncias alheias a sua vontade não produz o resultado pretendido Nessa linha Magalhães Noronha afirmava que as ações de suprimir ou alterar são fragmentáveis podendo o agente ser obstado de prosseguir antes de consumar sua ação 7 Pena e ação penal Aplicamse cumulativamente as penas cominadas de detenção de seis meses a três anos e multa A ação penal é pública incondicionada sendo desnecessária qualquer manifestação do ofendido a despeito da disponibilidade do patrimônio Capítulo IV Do Dano Dano Art 163 Destruir inutilizar ou deteriorar coisa alheia Pena detenção de 1 um a 6 seis meses ou multa V art 29 da Lei n 392461 monumentos arqueológicos e préhistóricos Dano qualificado Parágrafo único Se o crime é cometido I com violência à pessoa ou grave ameaça II com emprego de substância inflamável ou explosiva se o fato não constitui crime mais grave III contra o patrimônio da União Estado Município empresa concessionária de serviços públicos ou sociedade de economia mista V arts 20 26 e 37 XIX e XX da CF IV por motivo egoístico ou com prejuízo considerável para a vítima Pena detenção de 6 seis meses a 3 três anos e multa além da pena correspondente à violência D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O Código Criminal do Império 1830 disciplinou o crime de dano art 266 distinguindo aquele praticado contra bens públicos e o cometido contra bens particulares art 178 Equiparou equivocadamente ao crime de dano a alteração de limites e o esbulho possessório art 267 O Código Penal de 1890 republicano contemplou o dano em diversos dispositivos arts 326 a 329 e a exemplo do diploma anterior manteve a distinção entre o dano contra bens públicos e particulares além de também considerar dano a alteração de limites e a usurpação de águas Finalmente o Código Penal de 1940 cuja Parte Especial ainda se encontra em vigor com técnica superior afastou os equívocos cometidos em razão da semelhança do dano com outras figuras penais O atual diploma legal disciplina o dano nas seguintes espécies dano simples art 163 dano qualificado art 163 parágrafo único introdução ou abandono de animais em propriedade alheia art 164 dano em coisa de valor artístico arqueológico ou histórico art 165 alteração de local especialmente protegido art 166 Preferimos no entanto por razões puramente didáticas examinar em capítulos separados cada figura delituosa com exceção do dano simples e qualificado não havendo nenhuma razão para abordálos separadamente 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é o patrimônio público ou privado tanto sob o aspecto da posse quanto da propriedade Nesta previsão legal ao contrário da maioria das infrações contra o patrimônio não existe o animus lucrandi que apenas eventual e excepcionalmente pode existir desde que seja indireto ou mediato O elemento normativo alheia contido no tipo penal significa tanto a coisa que pertence a outrem como a que se encontra na posse de terceiro O objetivo da norma é preservar a integridade e a integralidade dos bens ou interesses para o proprietário ou possuidor abrangendo não apenas o valor substancial como também a utilidade que possam ter para estes que não deixa de ser valor Nessa linha já pontificava Manzini Trattato di Diritto Penale italiano Padova 1947 v 8 p 433 afirmando que O objeto específico da tutela penal em relação ao crime de dano do art 635 é o interesse público concernente à inviolabilidade do patrimônio mobiliário ou imobiliário ofendido por fato que suprime ou diminui a utilização ou o preço da coisa alheia O objeto material do crime de dano é coisa alheia móvel ou imóvel e corpórea Corpórea pois somente esta pode ser fisicamente danificada deve ser alheia pois tratandose de patrimônio tem natureza de bem disponível e dele o proprietário pode dispor usar e gozar ademais a res nullius e a res derelicta não podem ser objeto do crime de dano 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa sem qualquer condição especial O proprietário da coisa móvel ou imóvel como regra não pode ser sujeito ativo do crime de dano mesmo que esta se encontre legitimamente em poder de terceiro locatário comodatário depositário etc O tipo penal em exame pune o dano produzido sobre coisa alheia e coisa própria evidentemente não pode ser considerada alheia O possuidor por sua vez pode ser sujeito ativo do crime de dano deteriorando inutilizando ou destruindo a propriedade de terceiro que mantém sua posse indireta O titular da nua propriedade ou do domínio direto no entanto poderá ser sujeito ativo do crime de dano contra o usufrutuário ou enfiteuta O condômino igualmente pode ser sujeito ativo do dano que destrói inutiliza ou deteriora a coisa comum exceto se se trata de coisa fungível e não ultrapassar a quota a que tem direito a exemplo do que ocorre com o furto de coisa comum Sujeito passivo normalmente é o proprietário mas não está excluído o possuidor da coisa aquisições com alienações fiduciárias reservas de domínios longas posses mansas e pacíficas etc 4 Tipo objetivo adequação típica A conduta tipificada é destruir eliminar fazer desaparecer inutilizar tornar imprestável inútil ou deteriorar estragar arruinar O objeto material do crime de dano é coisa alheia corpórea que pode ser móvel ou imóvel O dano produzido pode ser total ou parcial A coisa perdida também pode ser objeto do crime de dano pois continua sendo alheia A imaterialidade do dano moral o exclui da esfera de proteção penal restando confinado ao âmbito da responsabilidade civil Na destruição a coisa deixa de existir em sua individualidade ainda que subsista a matéria que a compõe por exemplo matar um animal estilhaçar uma vidraça ou também quando venha a desaparecer tornandose inviável sua recuperação Na inutilização a coisa não é destruída perde somente a adequação ao fim a que se destinava desaparecendo sua utilidade sem perder completamente sua individualidade Deteriorar tem o significado de estragar enfraquecer sua essência diminuindo seu valor ou utilidade sem destruíla ou inutilizála Na deterioração a coisa sofre uma avaria substancial embora não se desintegre totalmente restando apenas diminuída sua utilidade ou seu valor econômico Pelo poder de síntese de Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 321 vale a pena ser transcrito seu magistério A destruição diz respeito em geral à ação que recai sobre a coisa de modo que a faça perder a essência ou forma primitivas atentando contra sua existência A deterioração implica em especial ideia de adulteração A coisa não é destruída não se lhe tira a existência porém tornase menos própria ao fim a que é destinada piorase ou alterase sua condição ou estado A inutilização vai além da deterioração por isso que produz o efeito de tornar estéril a coisa de tirar a sua utilidade Não é mister serem integrais a danificação parcial é também crime Enfim qualquer das condutas incriminadas conteúdo variado implica diminuição de valor e de utilidade da coisa alheia 41 Natureza do dano diminuição da utilidade da coisa Como o dano é um crime contra o patrimônio o resultado danoso deve sempre ser de natureza patrimonial representado pela perda ou diminuição de valor econômico ou de utilidade No entanto é suficiente que a coisa alheia tenha valor de uso independentemente de eventual valor pecuniário A diminuição da utilidade da coisa a despeito da ausência de valor comercial será o bastante para caracterizar o dano penalmente criminalizado Fora dessas hipóteses isto é se não houver prejuízo para o ofendido não se pode falar em crime de dano 42 Melhoria da coisa alheia decorrente da ação do agente Decorrendo da ação do agente melhoria que eleve o valor ou a utilidade da coisa alheia não se pode falar em crime Ora a ação incriminada é exatamente contrária à que aumenta o valor econômico ou a utilidade da coisa alheia No entanto não se pode negar que a intervenção alheia em uma obra de arte uma criação artística ao desnaturála ainda que teoricamente a tenha melhorado pode em termos autorais representar sim um prejuízo ao retirarlhe a autenticidade e a originalidade danificando enfim uma criação que é ninguém desconhece protegida por lei Exemplo clássico nesse sentido é o lembrado por Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 322 do pintor ou escultor que faz na obra de outro modificações que a aperfeiçoam ou a aprimoram Em princípio não comete crime de dano no entanto não se pode ignorar a violação da autenticidade e originalidade da obra além do aspecto subjetivo uma vez que como destacava Magalhães Noronha a questão aliás está estreitamente ligada ao dolo do agente circunstância a que juristas que andam às testilhas neste ponto não atentam Normalmente os autores quando abordam o crime de dano olvidamse de examinar a necessidade do nexo causal entre a ação do sujeito ativo e o dano uma vez que aquela será a causa e este o resultado independentemente 43 Fazer desaparecer lacuna na descrição típica A doutrina ao longo do tempo tem criticado a falta de tipificação da ação de fazer desaparecer coisa alheia quando não houver perecimento Contrariamente no entanto Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 105 adotando posicionamento não seguido pela maioria comparava o fazer desaparecer com destruição e nesse sentido pontificava Como tal também se entende por força de compreensão o fazer desaparecer uma coisa de modo a tornar inviável a sua recuperação ex atirandoa a um abismo impraticável Essa postura de Hungria levou à seguinte crítica fulminante de Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 323 Se assim fosse a lei teria sido redundante nos dispositivos invocados referiase aos arts 305 e 356 Dandonos razão o Código vindouro ao tratar do delito diz taxativamente Destruir inutilizar deteriorar ou fazer desaparecer coisa alheia art 175 Na verdade com inteira razão Magalhães Noronha reclamava da deficiência da descrição do crime de dano pois também o produz o desaparecimento da coisa que entretanto não se enquadra na redação do artigo Imaginese que alguém para prejudicar outrem faz desaparecer um objeto de valor deste Furto não é pois não há o animus furtandi Não se pode negar contudo que há ofensa ao patrimônio do ofendido que se vê privado daquele objeto valioso Será dano Inegavelmente sim Mas se enquadraria no enunciado do art 163 de nosso Código Penal À evidência que não Vejamos pois não se pode afirmar que o agente destruiu o objeto que o deteriorou ou o inutilizou Não o destruiu porque o objeto continua a existir certamente não o deteriorou e não o inutilizou porque ele continua com a mesma utilidade que tinha e dela desfrutará quem dele se apossar 44 Desaparecimento e fazer desaparecer significados distintos O eventual desaparecimento que pode decorrer da destruição não se confunde com o fazer desaparecer pois naquela hipótese há o perecimento da coisa ou seja sua desintegração material seu desmanche sua decomposição que tem como consequência a imprestabilidade algo que inocorre com a ação de fazer desaparecer pois a coisa alheia permanece intacta inteira completa perfeitamente útil para a finalidade a que se destina Por isso devese saudar a previsão do Anteprojeto de Código Penal que acrescenta essa figura na descrição do crime de dano com a seguinte redação Art 192 Destruir inutilizar deteriorar ou fazer desaparecer coisa alheia 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo do crime de dano é o dolo representado pela vontade livre e consciente de causar prejuízo a terceiro não havendo fim especial de agir em que pese o entendimento de Hungria Em nossa concepção é desnecessário o concomitante propósito de prejudicar o proprietário ou possuidor do bem ou interesse danificado A produção de dano é criminalizada porque gera um prejuízo desautorizado a terceiro Enfim é necessário que o dano seja um fim em si mesmo São em princípio irrelevantes os motivos que levaram o agente a produzir o dano o próprio fim de lucro desde que indireto e eventual pode orientar a conduta do agente Não se pode negar é verdade nem sempre o crime de dano é alheio a uma finalidade ou proveito econômico desde que não constitua um fim especial e imediato mas desde que seja a consequência natural indireta ou mediata da ação do agente Ou seja o proveito econômico não deve ser um fim em si mesmo mas decorrente de outro acontecimento embora por ele produzido Para exemplificar nada melhor que trazer à colação aqueles casos sugeridos por Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 102 no caso do ferreiro que destrói o alambique do fabricante de açúcar na esperança de obter a encomenda de outro ou no do aficionado do turf que envenena o cavalo favorito para aumentar a probabilidade de êxito do cavalo em que apostou ou mesmo no do indivíduo que corta árvore secular do prédio vizinho para proporcionar melhor vista e portanto maior valor ao próprio prédio 51 Especial fim de agir pode configurar crime distinto No entanto o especial fim de agir quando for o móvel orientador da conduta do agente poderá desnaturar o crime de dano dandolhe outra fisionomia especialmente porque não se pode olvidar que o dano pode ser e frequentemente é meio de execução ou elementar de outro crime Na verdade desde que o dano deixe de ser um fim em si mesmo passando a ser meio ou modo para executar ou realizar outro crime desconfigurase como crime autônomo passando a integrar uma figura complexa ou progressiva de outra infração penal Passandose uma vista dolhos em nosso Código Penal encontrarseão inúmeros exemplos do que acabamos de afirmar furto com destruição ou rompimento de obstáculo art 155 4º I destruição de tapumes art 161 sabotagem art 202 in fine violação de sepultura com violência à coisa art 210 destruição de prova documental art 305 etc Por outro lado o dano pode constituir elementar de outros tipos penais especialmente aqueles que integram o rol das infrações penais contra a incolumidade pública que acarretam perigo comum tais como incêndio inundação explosão desmoronamento Por fim quando o dano for causado para evitar ou impedir a prova de autoria de outro crime patrimonial v g furto roubo apropriação indébita etc praticado pelo mesmo agente será absorvido por aquele O dano convém destacar é sempre absorvido nunca absorvente 6 Dano qualificado O modus operandi no crime de dano pode apresentar particularidades que representam maior gravidade na violação do patrimônio alheio tornando a conduta mais censurável e por isso mesmo merecedora de maior punibilidade quer pelo maior desvalor da ação quer pelo maior desvalor do resultado Essas particularidades podem assumir diversos graus de intensidade recebendo de acordo com sua gravidade a qualificação de agravantes majorantes ou qualificadoras Observando o princípio da reserva legal optouse por estabelecer taxativamente aquelas circunstâncias que por sua gravidade tornam o crime qualificado e que a rigor constituem novo tipo penal derivado mas autônomo com novos parâmetros sancionatórios bem mais graves distintos da figura fundamental dano simples O fundamento políticocriminal para qualificar o crime de dano quando praticado contra patrimônio público decorre da própria natureza desses bens que a todos pertencem e de ninguém recebem cuidado e atenção especial sendo consequentemente mais vulneráveis à ação predatória de vândalos e outros infratores de qualquer natureza A graduação do injusto penal observa sua maior ou menor danosidade que é representada como dissemos ora pelo desvalor da ação ora pelo desvalor do resultado Inegavelmente a reprovabilidade é maior por parte de quem utiliza meios de excepcional gravidade para produzir maior dano ao patrimônio alheio emprego de substância inflamável ou explosiva ou emprega violência à pessoa ou grave ameaça por meio das quais o dano vai além do simples patrimônio para atingir a própria pessoa humana outras vezes o objeto material do dano assume maior dimensão como ocorre com o patrimônio público etc 61 Concurso de qualificadoras e sua comunicabilidade A presença de apenas uma delas é suficiente para qualificar o crime mudando sua capitulação e substancialmente sua punição eventual concurso de duas ou mais qualificadoras não modifica a pena abstratamente cominada contudo deve ser considerada na medição da pena ou seja uma delas a mais grave ou mais bem comprovada nos autos servirá para estabelecer a penabase fixando o marco do tipo penal derivado qualificado enquanto as demais devem ser trabalhadas na operação dosimétrica da pena visando encontrar o resultado definitivo Nesse crime as qualificadoras com exceção do motivo egoístico são de natureza objetiva e por conseguinte comunicamse aos coautores nos termos do art 30 do Código Penal Nas figuras qualificadas a pena de multa é aplicada cumulativamente com a pena privativa de liberdade ao contrário das figuras simples em que as mesmas penas são aplicadas alternativamente Façamos a seguir uma análise individualizada dessas elementares definidoras de novo tipo penal o dano qualificado 62 Com violência à pessoa ou grave ameaça O fundamento políticocriminal da qualificadora reside na maior gravidade do injusto pois esse modus operandi com violência ou grave ameaça amplia consideravelmente o desvalor da ação justificandose sua maior punibilidade Ao praticar o crime dessa forma o agente ofende outros bens jurídicos como a liberdade individual ou a incolumidade pública podendo inclusive constituir crime autônomo mais grave Somente a violência contra a pessoa qualifica o dano A violência e a grave ameaça podem ser exercidas contra outra pessoa que não a proprietária ou possuidora do bem danificado A violência ou grave ameaça tanto podem ser utilizadas durante a execução do crime como para assegurar sua consumação Somente a empregada após a consumação do dano não o qualifica Tanto a violência quanto a grave ameaça devem visar a prática do dano isto é devem ser o meio utilizado para a produção do prejuízo Por isso não se pode reconhecer a qualificadora quando evidente que a violência praticada não teve a finalidade de possibilitar a prática do crime de dano nem foi exercida pelo agente como meio para assegurar sua execução Se por exemplo o agente após praticado o dano sendo surpreendido pela vítima agridea produzindolhe lesões corporais não se tratará de dano qualificado pela violência ou grave ameaça Nessa hipótese responde pelo crime de dano simples em concurso material com o crime de lesões corporais No entanto não há necessidade de que o sujeito passivo da violência seja o mesmo do dano sendo suficiente a existência de relação de causa e efeito ou de meio e fim entre ambos O crime de dano enfim pode ser eventualmente daqueles que se poderiam chamar de crime de dupla subjetividade passiva quando são vítimas ao mesmo tempo dois indivíduos titulares de bens jurídicos distintos De plano devese destacar que a ameaça art 147 e as vias de fato art 21 da LCP são absorvidas pelo dano qualificado descrito neste dispositivo art 163 parágrafo único I 63 Equiparação de violência e grave ameaça uma praxe do legislador de 1940 Mais uma vez neste dispositivo o legislador equiparou a violência à grave ameaça dandolhes juridicamente a mesma importância Violência à pessoa consiste no emprego de força contra o corpo da vítima e não contra o próprio patrimônio que está sendo objeto do dano Para caracterizála é suficiente que ocorra lesão corporal leve ou simples vias de fato O termo violência empregado no texto legal significa a força física material a vis corporalis A violência pode ser produzida pela própria energia corporal do agente que no entanto poderá preferir utilizar outros meios como fogo água energia elétrica choque gases etc Ameaça grave violência moral é aquela capaz de atemorizar a vítima viciandolhe a vontade impossibilitando sua capacidade de resistência A grave ameaça objetiva criar na vítima o fundado receio de iminente e grave mal físico ou moral tanto a si quanto a pessoas que lhe sejam caras É irrelevante a justiça ou injustiça do mal ameaçado na medida em que utilizada para a prática de crime tornase também antijurídica Mediante grave ameaça constitui forma típica da violência moral é a vis compulsiva que exerce força intimidativa inibitória anulando ou minando a vontade e o querer do ofendido procurando assim inviabilizar eventual resistência da vítima Na verdade a ameaça também pode perturbar escravizar ou violentar a vontade da pessoa como a violência material A violência moral pode materializarse em gestos palavras atos escritos ou qualquer outro meio simbólico Mas somente a ameaça grave isto é aquela ameaça que efetivamente imponha medo receio temor na vítima e que lhe seja de capital importância opondose a sua liberdade de querer e de agir 64 Graduação do mal ameaçado dano ou perigo O mal ameaçado pode consistir em dano ou em simples perigo desde que seja grave impondo medo à vítima que em razão disso sintase inibida tolhida em sua vontade incapacitada de opor qualquer resistência ao sujeito ativo No entanto é desnecessário que o dano ou perigo ameaçado à vítima seja injusto bastando que seja grave Na verdade a injustiça deve residir na ameaça em si e não no dano ameaçado 65 Dano praticado com violência concurso material de crimes ou cúmulo material de penas Quando da violência empregada para produzir o dano resultarem lesões corporais haverá a aplicação cumulativa das penas correspondentes ao dano qualificado pela violência e as decorrentes das lesões corporais Registramos desde logo que consideramos grande equívoco afirmar que a violência implica concurso material de crime pois se ignora a verdadeira natureza desse concurso O fato de determinarse a aplicação cumulativa de penas não significa que se esteja reconhecendo aquela espécie de concurso mas apenas que se adota o sistema do cúmulo material de penas que é outra coisa Concluindo o art 163 parágrafo único não criou uma espécie sui generis de concurso material mas adotou tão somente o sistema do cúmulo material de aplicação de pena a exemplo do que fez em relação ao concurso formal impróprio art 70 2ª parte Assim quando a violência empregada na prática do crime de dano constituir em si mesma outro crime havendo unidade de ação e pluralidade de crimes estaremos diante de concurso formal de crimes No entanto a despeito de tudo o que acabamos de expor nada impede que concretamente possa ocorrer concurso material do crime de dano com outros crimes violentos como acontece com quaisquer outras infrações desde que é claro haja pluralidade de condutas e pluralidade de crimes mas aí observese já não será mais o caso de unidade de ação ou omissão caracterizadora do concurso formal 66 Com emprego de substância inflamável ou explosiva se o fato não constitui crime mais grave A utilização de substância inflamável ou explosiva deve ser meio para a prática do crime de dano É necessário que a substância inflamável ou explosiva seja utilizada como meio de execução do crime pois o próprio texto legal diz com emprego de A subsidiariedade dessa qualificadora é expressa se o fato não constitui crime mais grave uma vez que qualquer delas substância inflamável ou explosiva pode ser utilizada para a prática de crimes contra a incolumidade pública arts 250 a 259 Assim o crime de dano fica excluído pelo crime mais grave do qual é subsidiário Nesses termos se o fato é acompanhado de perigo comum o crime único a ser reconhecido será o de incêndio o de explosão etc A própria natureza das substâncias inflamável ou explosiva por si só já é suficiente para justificar a agravação da censura da conduta que as utiliza como meio para a prática de qualquer crime inclusive o de dano O gravame destacava Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 327 aplicase já porque a posse dessas substâncias está sujeita a licença especial já porque seu emprego produz maiores danos e finalmente porque elas despertam grande receio ou temor na população por isso mesmo sendo mais intenso o alarma social consequente ao crime A locução utilizada pelo legislador com emprego de deixa claro que a qualificadora se configura quando o agente emprega as substâncias inflamáveis ou explosivas na execução do crime isto é qualquer das duas deve ser usada como meio perigoso que é para a prática do crime 67 Contra o patrimônio da União Estado Município empresa concessionária de serviços públicos ou sociedade de economia mista Qualifica o dano ser o crime cometido contra o patrimônio da União Estado Município empresa concessionária de serviços públicos ou sociedade de economia mista redação determinada pela Lei n 5346 de 3111967 O conceito de patrimônio público das pessoas jurídicas de direito público mencionadas no dispositivo em exame não se confunde com aquele concebido pelo Código Civil Somente aqueles bens efetivamente pertencentes ao patrimônio público podem ser objeto dessa qualificadora inclusive as coisas de uso público comum ou especial Não será qualificado o crime de dano praticado contra o patrimônio de empresa pública ou fundação instituída pelo Poder Público Por definição legal empresa pública é a entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado com patrimônio próprio e capital exclusivo da União criada por lei para a exploração de atividade econômica que o Governo seja levado a exercer por força de contingência ou de conveniência administrativa podendo revestirse de qualquer das formas admitidas em direito art 5º II do DecretoLei n 20067 com redação do art 1º do DecretoLei n 90069 68 Por motivo egoístico ou com prejuízo considerável para a vítima Os motivos que podem levar à prática do crime podem ser morais imorais sociais ou antissociais Quando os motivos têm natureza moral ou social a conduta humana violadora da ordem jurídica é digna de menor reprovabilidade social no entanto quando a motivação tiver natureza imoral ou antissocial a reprovabilidade será naturalmente superior podendo majorar e até qualificar eventual infração penal cometida Para qualificar o crime de dano como as duas últimas figuras o legislador brasileiro elegeu um motivo e uma consequência que considerou agravarem sobremodo a censurabilidade dessa infração penal um subjetivo outra objetiva motivo egoístico ou prejuízo considerável para a vítima 681 Por motivo egoístico De plano convém destacar que o dispositivo que estamos examinando não tem a pretensão de punir ou criminalizar o egoísmo que é um sentimento pessoal e de certa forma não deixa de ser dentro de determinados limites algo necessário para a vida social pois em sua base não deixa de ser um reflexo do instinto de conservação Por isso a locução utilizada pelo Código Penal deve ser interpretada como motivo antissocial uma vez que nem todo egoísmo tem essa conotação Motivo egoístico não é qualquer impulso antissocial característico de todo crime de dano Egoístico é somente o motivo que se prende a futuro interesse econômico ou moral Assim como exemplificava Hungria a danificação do trabalho ou equipamento de um concorrente para vencer a competição ou para valorizar seu similar Motivo egoístico no magistério irretocável de Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 328 É o egoísmo exacerbado que na satisfação dos interesses individuais lesa ofende e extingue os interesses dos semelhantes É o exagerado amor ao bem próprio É o egocentrismo em que o eu é o centro de todo o interesse é a finalidade de toda ação do indivíduo que para satisfazêlo calca aos pés os interesses e direitos do próximo Motivo egoístico não se vincula à satisfação de qualquer sentimento menos nobre tal como ódio despeito inveja ou desprezo sob pena de confundirse com o dano simples que normalmente é motivado por algum sentimento dessa ordem Nessa modalidade de dano qualificado pode aparecer excepcionalmente o animus lucrandi 682 Com prejuízo considerável O prejuízo considerável deve ser aferido em relação ao patrimônio do ofendido que não deixa de ser um critério extremamente relativo na medida em que um dano de grande monta genericamente considerado pode não representar prejuízo considerável para a vítima possuidora de grande fortuna por outro lado pequeno dano nas mesmas circunstâncias pode destruir economicamente alguém de pouquíssimas posses Não era outro o entendimento de Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 111 que a seu tempo já professava O caráter de gravidade objetiva como se depreende da letra da lei é referível à condição de fortuna da vítima um prejuízo patrimonial que não tenha maior relevo para um homem abastado pode ser considerável para um operário No entanto ainda assim devese reconhecer é o critério mais justo por vincular o dano causado ao patrimônio do ofendido além de respeitar o moderno princípio da proporcionalidade relacionase à capacidade de suportabilidade deste Ademais essa é a determinação legal prejuízo considerável para a vítima Segundo Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 403 e Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 111 somente se configurará a qualificadora do prejuízo considerável se houver dolo em relação a esse prejuízo grave isto é se o agente o quis tendo dele consciência ou pelo menos assumiu o risco de produzilo 7 Consumação e tentativa Consumase o crime com o efetivo dano causado isto é com a destruição inutilização ou deterioração da coisa alheia O dano é crime material que só se configura quando há prejuízo para a vítima decorrente da diminuição do valor ou da utilidade da coisa destruída inutilizada ou deteriorada Por isso fazse necessária a comprovação pericial do resultado danoso sob pena de não se tipificar a figura delituosa Mesmo que a destruição seja parcial desde que torne imprestável a coisa ou a inutilize é suficiente para consumar o crime que a intenção do agente fosse a destruição total O dano é crime de ação múltipla ou de conteúdo variado Assim mesmo que o agente num primeiro momento deteriore a coisa alheia e insatisfeito com esse resultado inutilizea para seus fins normais e por fim a destrua haverá somente um crime Essa determinação enfurecida no agir demolidor do agente deverá ser avaliada na dosimetria penal particularmente no exame da censurabilidade da conduta culpabilidade e consequências do crime Como crime material que é o dano admite a tentativa quando o agente é interrompido na ação que executava objetivando a deterioração inutilização ou destruição de coisa alheia Consideramos temerário afirmar que há tentativa quando o agente não obtém o resultado pretendido uma vez que o resultado parcial já é suficiente para consumar o crime de dano Na verdade a tentativa somente pode configurarse quando o estrago não for relevante 8 Pena e ação penal Na figura simples aplicase alternativamente pena de detenção de um a seis meses ou multa na qualificada cumulativamente detenção de seis meses a três anos e multa A ação penal é de iniciativa privada na figura simples caput e na figura qualificada na hipótese do parágrafo único IV Nas outras três hipóteses de formas qualificadas parágrafo único I II e III a ação penal é pública incondicionada art 167 J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Dano qualificado Agente que danifica telefone público e resiste à prisão O delito restou caracterizado porquanto o réu ao danificar o telefone público atingiu o patrimônio de empresa concessionária de serviço público cuja exploração é reservada à união diretamente ou mediante autorização concessão ou permissão nos termos do inciso XI do art 21 da CF TJRS Apelação 70022197560 Rel Aristides Pedroso de Albuquerque Neto j 1332008 Lesões corporais Ameaça Dano qualificado Concurso material Conjunto probatório convincente e suficiente a ensejar a condenação dos réus pelos delitos de lesões corporais ameaça e dano qualificado descritos na denúncia Versão acusatória fundamentada nos relatos da vítima lineares e convergentes em todas as oportunidades e que restou corroborado pelo auto de exame de corpo de delito e pelas fotografias acostadas ao feito TJRS Apelação 70018132308 Rel Fabianne Breton Baisch j 1322008 Para a configuração do crime de dano inserto no art 163 do Código Penal fazse imprescindível a vontade deliberada de causar prejuízo patrimonial ao dono da coisa animus nocendi Não comete crime de dano o preso que danifica a parede da cela movido por exclusivo instinto de fuga TJPR Apelação 4236424 Rel Carlos Augusto A de Mello j 13122007 Dano Fuga de preso Na linha de precedentes desta Corte não configura crime de dano se a ação do preso foi realizada exclusivamente para a consecução de fuga A evasão por parte de preso só está prevista como crime na hipótese de violência contra a pessoa art 352 do CP STJ REsp 867353PR Rel Min Félix Fischer j 2252007 Crime de dano Estabelecimento prisional Objetivo de fuga Dolo específico Ausência Inexiste crime de dano se o preso destrói inutiliza ou deteriora os obstáculos materiais à consecução da fuga porque ausente o dolo específico ou seja o propósito de causar prejuízo ao titular do objeto material do crime STJ REsp 661904RS Rel Min Paulo Medina j 1142006 Somente restará configurada a qualificadora prevista no art 163 parágrafo único inciso I do CP se for empregada violência ou grave ameaça à pessoa para a consecução do delito de dano Vale dizer a violência ou grave ameaça deve ser um meio para a prática do delito de dano hipótese em que este será qualificado pelo modo no qual foi levado a efeito STJ Apn 290PR Rel Min Félix Fischer j 163 2005 Crime de dano contra empresa concessionária de serviço de telefonia Inexistência de prejuízo a bens ou interesses da União Competência da justiça estadual Compete à Justiça Estadual Comum julgar e processar crime de dano cometido contra empresas concessionárias de serviços públicos por inexistente prejuízo da União Precedentes STJ Conflito de Competência 40865PB Rel Min Hamilton Carvalhido j 2522004 Introdução ou abandono de animais em propriedade alheia Art 164 Introduzir ou deixar animais em propriedade alheia sem consentimento de quem de direito desde que do fato resulte prejuízo Pena detenção de 15 quinze dias a 6 seis meses ou multa V art 64 do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Nosso Código Penal de 1940 inspirouse nos precedentes italianos como os Códigos Zanardelli e sardo que disciplinaram esse crime por vez primeira como figura autônoma punindo o dano causado por animais em propriedade alheia além da denominada pastagem abusiva O Código Penal Rocco de 1930 recepcionou essa figura delitiva dandolhe contorno semelhante àquele que posteriormente seria adotado pelo legislador brasileiro de 1940 2 Bem jurídico tutelado Os bens jurídicos protegidos neste dispositivo continuam sendo a posse e a propriedade imóvel rural ou urbana que constituem aspectos do patrimônio especialmente contra dano causado por animais em plantações e terrenos cultivados Ganham especial relevo os danos causados por essa forma a plantações ou a qualquer espécie de terrenos cultivados Bento de Faria Código Penal brasileiro comentado p 102 destacou com absoluto acerto que a locução propriedade não é empregada no tipo penal com o significado de domínio mas com o objetivo de indicar o terreno do prédio rústico ou urbano cultivado ou não passível de ser danificado por animais Protegendo o patrimônio inegavelmente o Código tutela também o domínio mas não apenas este indo além para alcançar também a posse mesmo desacompanhada daquele como ocorre em outros crimes patrimoniais Consequentemente como destacava lucidamente Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 330 a lei falando em propriedade alheia referese não só ao imóvel ao terreno no domínio pleno de outrem como também àquele que por justo título se acha na posse alheia como nos casos de enfiteuse usufruto etc 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa com exceção em princípio do proprietário Sujeito ativo é quem realiza a conduta descrita no tipo penal Embora não seja pacífico acreditamos que o proprietário também pode ser autor desse crime quando por alguma razão a posse direta estiver com terceiro por exemplo havendo arrendamento rural se o proprietário introduz seus animais que danificam a plantação do arrendatário A corrente capitaneada por Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 113 entende que nessa hipótese poderia configurarse crime de dano ou até mesmo de furto Não comungamos desse entendimento exatamente porque interpretamos a locução propriedade alheia com aquele sentido mais abrangente defendido por Bento de Faria Socorrenos igualmente Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 331 que pontificava Sendo a posse destacada do domínio protegida pela disposição penal seguese que o proprietário pode ser sujeito ativo do crime uma vez que o terreno ou imóvel esteja na posse justa de outrem Achandose no entanto o imóvel no pleno domínio do proprietário evidentemente que este não pode ser sujeito ativo desse crime Aquela solução aventada por Hungria e Fragoso crime de dano parece nos possível quando o agente for condômino do imóvel invadido e o prejuízo resultar de dano a plantações ou coisas pertencentes somente a outro condômino Sujeito passivo é o possuidor ou proprietário havendo posse justa daquele ou quando for também proprietário do imóvel onde os animais foram introduzidos 4 Tipo objetivo adequação típica As condutas tipificadas são introduzir fazer entrar fazer penetrar ou deixar abandonar soltar largar animais em propriedade alheia É necessário que por exigência expressa do tipo penal não haja consentimento do ofendido e ademais decorra efetivo prejuízo Esses são os elementos estruturais da figura típica que passamos a examinar 41 Introduzir animais em propriedade alheia A primeira conduta proibida é introduzir que como já referimos significa levar para dentro fazer entrar providenciar a penetração de animais em propriedade alheia desautorizadamente causando dano a alguém É irrelevante que os animais estejam sozinhos acompanhados pelo sujeito ativo ou por alguém a seu mando A proibição penal é de que os animais sejam introduzidos de qualquer forma sem consentimento de quem de direito Tratase como se constata de crime de forma livre isto é pode ser praticado por qualquer meio modo ou forma Contudo convém destacar a advertência sempre lúcida de Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 331 que pontificava não se pode falar em abandono quando o agente deixa os animais nas vizinhanças do terreno de modo que eles para aí se dirigem não é isso deixar animais em propriedade alheia É porém introdução Mais ardilosa ou astuta mas sempre introdução pois a lei não distingue os modos que se operam 42 Deixar animais em propriedade alheia A segunda conduta criminalizada caracteriza o abandono que é representado pelo verbo deixar que significa deixar abandonar soltar consentir Nessa hipótese a introdução dos animais não foi criminosa logo podem eles ter ingressado clandestinamente isto é sem o conhecimento de seu dono ou ter sido introduzidos com o consentimento de quem de direito Na primeira hipótese introduzir os animais são levados ou lhes é facilitado o ingresso em propriedade alheia na segunda deixar encontrandose à revelia do dono os animais em propriedade alheia ou com o consentimento do proprietário do imóvel são ali deixados intencionalmente Na primeira figura os animais são introduzidos criminosamente na segunda seu abandono é que caracteriza o crime Naquela o sujeito ativo tem a iniciativa de levar os animais à propriedade alheia na segunda abandonaos em propriedade alheia após nela haverem ingressado sem seu conhecimento 43 Sem consentimento de quem de direito A introdução ou abandono de animais deve ocorrer sem consentimento de quem de direito Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 4056 sustentava Tratase de expressão supérflua que foi eliminada no atual CP italiano posto que constasse do Código Zanardelli É claro que o consentimento descriminaria a ação já que se trata de bem jurídico disponível Contrariamente para Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 112 Não se trata de uma cláusula supérflua quer significar que o consentimento descriminante tanto pode ser dado pelo dono do terreno ou mandatário autorizado quanto pelo possuidor legítimo seja ou não titular de direito real locatário comodatário depositário judicial usufrutuário enfiteuta credor anticrético promitentecomprador imitido na posse etc e mais que outorgado o consentimento não haverá ilícito penal por mais insólito ou grave que tenha sido o dano Luiz Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 458 por sua vez definiu a locução sem consentimento de quem de direito da seguinte forma Embora presente no tipo diz respeito à antijuridicidade Sua ausência torna a conduta não só atípica como permitida 431 As possíveis funções dogmáticas do consentimento do ofendido Como o consentimento pode ter funções e significados diversos mesmo quando constante do tipo penal justificase que se faça uma pequena digressão a respeito Com efeito examinando esses aspectos do consentimento da vítima do crime fizemos as seguintes considerações No entanto ao se examinar a natureza e importância do consentimento do ofendido devese distinguir aquelas situações que caracterizam exclusão de tipicidade das que operam como excludentes de antijuridicidade Na verdade se fizermos uma análise ainda que superficial constataremos que em muitas figuras delituosas de qualquer Código Penal a ausência de consentimento faz parte da estrutura típica como uma característica negativa do tipo Logo a presença de consentimento afasta a tipicidade da conduta que para configurar crime exige o dissenso da vítima como por exemplo o rapto art 219 já revogado a invasão de domicílio art 150 a violação de correspondência art 151 etc Outras vezes o consentimento do ofendido constitui verdadeira elementar do crime como ocorre por exemplo no rapto consensual art 220 já revogado e no aborto consentido art 126 Nesses casos o consentimento é elemento essencial do tipo penal Bitencourt Tratado de Direito Penal v 1 p 3067 432 Função dogmática do consentimento na introdução ou abandono de animais em propriedade alheia O tipo penal que ora analisamos traz em sua construção típica a locução sem consentimento de quem de direito adequada exatamente à última hipótese a que nos referimos ou seja constitui elementar típica nesse caso como característica negativa expressa da figura típica A ausência de consentimento de quem de direito aqui é elementar do tipo a presença do consentimento afasta a tipicidade da conduta Enfim se o sujeito passivo consentir na introdução dos animais a conduta do sujeito ativo será atípica isto é indiferente para o direito penal Afastase categoricamente a natureza justificante do consentimento do tipo em exame que poderá existir é verdade quando decorrer de vontade juridicamente válida do titular de um bem disponível nesse caso inexistirá contrariedade à norma jurídica Com efeito consentimento do ofendido com o condão de afastar a antijuridicidade de uma conduta é aquele que se impõe de fora para dentro para excluir a ilicitude sem integrar a conduta típica como poderia acontecer por exemplo nos crimes de cárcere privado art 148 furto art 155 dano art 163 etc 44 A ocorrência efetiva de prejuízo A superveniência de prejuízo é condição indispensável à configuração do crime constituindo segundo alguns condição objetiva de punibilidade A ausência de prejuízo dano economicamente apreciável impede a configuração típica do crime Na verdade a inocorrência de prejuízo impede a própria tipificação da conduta na medida em que resultar prejuízo é elementar típica do crime Por isso a falta de prejuízo antes de ser mera condição objetiva de punibilidade afasta a tipicidade da conduta não se podendo falar em punibilidade de comportamento atípico O prejuízo a que se refere o tipo penal em exame é distinto daquele decorrente da simples introdução ou abandono de animais Caso contrário seria absolutamente desnecessário prevêlo como elementar típica do crime de introdução ou abandono de animais em propriedade alheia Convém destacar contudo que a intenção do agente não deve ser o dano mas introduzir ou abandonar animais em propriedade alheia cuja consequência é a produção de prejuízo Se no entanto o agente objetivar especificamente a produção de dano o crime será aquele capitulado no art 163 dano Se por fim pretender alimentar seus animais com a pastagem da propriedade alheia deixará de existir o dano em si mesmo passando a caracterizarse o crime de furto com verdadeira subtração de coisa alheia 45 Prejuízo condição objetiva da punibilidade ou elementar típica O prejuízo exigido pelo tipo penal em exame ao contrário do entendimento da maioria Nélson Hungria Heleno Fragoso Damásio de Jesus e mais recentemente Luiz Regis Prado que afirma tratarse de condição objetiva de punibilidade é elemento constitutivo do crime é como referimos repetidamente uma elementar do tipo e como tal sua ausência não afasta apenas a punibilidade mas a própria tipicidade do comportamento produzindo consequências absolutamente distintas Na verdade convém ter presente que a condição objetiva da punibilidade é extrínseca ao crime estranha portanto à tipicidade à antijuridicidade e à culpabilidade é poderseia dizer um posterius do crime está fora dele A condição objetiva da punibilidade deve encontrarse fora de qualquer relação causal com a conduta humana Se ela se encontra afirmava Bettiol Diritto Penale p 141 em relação de pendência causal com a ação no sentido que possa ser considerada como efeito ainda que remoto da ação tal evento não se poderá considerar condição de punibilidade mas será elemento constitutivo do fato 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo do crime de introdução ou abandono de animais em propriedade alheia é o dolo constituído pela vontade livre e consciente de introduzir ou deixar animais em propriedade alheia É necessário que o sujeito ativo tenha conhecimento de que a propriedade é alheia Não há necessidade de elemento subjetivo especial do tipo ante a ausência de previsão legal A existência de eventual elemento subjetivo especial pode alterar a figura delitiva Embora indispensável a produção de prejuízo para a tipificação do crime visto que aquele constitui elementar do tipo penal convém destacar que se houver por parte do agente a intenção de causar prejuízo o crime será o de dano previsto no art 163 Alguns julgados equivocadamente têm exigido o animus de prejudicar O fim de prejudicar está ínsito na própria ação do agente mais especificamente no dolo pois seria ingênuo imaginar o dolo de introduzir ou abandonar animais em propriedade alheia sem produzir qualquer dano ou prejuízo por outro lado se a intenção do agente for alimentar os animais na plantação alheia o crime será o de furto e não este do art 164 Constatase enfim que o elemento subjetivo deve ser distinto do de danificar ou subtrair pastagem ou qualquer nutriente do imóvel invadido Não há previsão de modalidade culposa 6 Consumação e tentativa Consumase o crime de introdução ou abandono de animais em propriedade alheia somente com o efetivo prejuízo ou seja com a diminuição do patrimônio da vítima Tratase de crime material isto é que exige resultado naturalístico Não se pode ignorar que o tipo penal condiciona a tipificação criminosa a desde que do fato resulte prejuízo Essa exigência típica impõe como condição a produção de um dano superior àquele mínimo natural e próprio da simples introdução ou abandono de animais em propriedade alheia quer com seu andar quer com o estar ou meras passadas Se esse dano fosse suficiente à configuração do crime não se teria exigido expressamente a produção de prejuízo porque aquele lhe é inerente 61 Tentativa entendimento ultrapassado da doutrina clássica Não comungamos do entendimento majoritário da doutrina que nega a possibilidade da tentativa no crime de introdução ou abandono de animais basicamente porque o tipo exige a produção de prejuízo para consumarse Essa orientação que foi capitaneada por Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 112 peca pela simplicidade silogística Dizia Hungria seguido fielmente pelos demais É condição objetiva do crime a superveniência de prejuízo Se este não ocorre não se poderá reconhecer sequer tentativa pois diversamente do dano no seu tipo fundamental não é exigido aqui o animus nocendi O silogismo não se sustenta em si mesmo independentemente de questionarmos a afirmação de que a causação de prejuízo constitui condição objetiva da punibilidade com o que não concordamos Em primeiro lugar a configuração ou não de tentativa não tem qualquer relação com condições extrínsecas do crime como é o caso de uma condição objetiva da punibilidade por exemplo o decreto da falência da empresa para que o falido possa responder por crimes falimentares Por outro lado mesmo como elementar do crime que é nossa orientação a exigência do prejuízo para consumarse a infração não inviabiliza o reconhecimento da tentativa pelo contrário facilita sua identificação pelo menos na modalidade de introduzir animais em propriedade alheia Assim por exemplo se o agente é surpreendido e interrompido por alguém no momento em que está efetuando a introdução dos animais em propriedade alheia não se pode negar que já iniciou o iter criminis cuja intervenção circunstância alheia à vontade do agente impede a consumação 62 Aspectos caracterizadores da tentativa Na verdade o que caracteriza a figura da tentativa não é a existência ou inexistência de condição objetiva de punibilidade mas a interrupção do processo executório por circunstâncias alheias à vontade do agente por exemplo o agressor é seguro quando está desferindo os golpes na vítima para matála Em segundo lugar a inexigência de dolo de prejuízo que seria um elemento subjetivo especial do tipo inexistente no crime em exame tampouco é motivo para afastar a tentativa Com efeito se houvesse esse dolo o crime seria de dano desnaturando aquela infração penal Mas não se pode esquecer que o dolo genérico é constituído pela vontade e consciência da realização de todos os elementos constantes do tipo penal entre os quais se inclui o prejuízo 63 Aporias do passado e falácia de autoridade Ninguém seria ingênuo a ponto de imaginar que uma pessoa introduza animais em plantação alheia e ignore que dessa ação voluntária possa decorrer prejuízo a outrem ou em outros termos não tenha representado mentalmente a possibilidade da ocorrência desse prejuízo Essa representação consciente basta para que o dolo genérico abranja a elementar causação de prejuízo Seria talvez na linha da orientação que combatemos o único crime material plurissubsistente a não admitir tentativa afrontando não apenas os fundamentos dogmáticos mas a própria lógica do sistema pois todos aqueles autores reconhecem que se trata de crime material e plurissubsistente Enfim o fundamento mais forte para se sustentar na atualidade a impossibilidade de tentativa no crime de introdução ou abandono de animais é o argumento de autoridade isto é apenas porque a seu tempo Nélson Hungria adotou essa orientação No entanto embora Hungria seja reconhecido por todos nós como o Papa do Direito Penal Brasileiro ele também era falível e vez por outra equivocavase 7 Questões especiais abrangência da locução animais Questionase se apenas um animal poderia tipificar o delito em razão de o artigo falar em animais Adotamos o entendimento segundo o qual o vocábulo animais é genérico não sendo exigível a pluralidade para configurar o crime É suficiente que a ação seja praticada com apenas um animal de pequeno ou grande porte para tipificar a infração penal desde que resulte prejuízo Nessa linha Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 112 concluía Com o vocábulo animais no plural o texto legal quer apenas designar o genus e não uma indispensável pluralidade basta a introdução ou abandono de um só animal que seja De outro modo poderia ser iludida a incriminação cuidando o agente de evitar que nunca estivesse introduzindo ou abandonando em vezes sucessivas mais de um animal Se a penetração de animais decorrer de culpa o dono responderá somente pelos danos causados na esfera cível Por isso temos dificuldade em aceitar o entendimento que admite a tipificação desse crime quando por omissão os animais invadem propriedade alheia e destroem a plantação A forma omissiva somente pode ocorrer na modalidade deixar animais que é tipificada como a segunda figura criminosa Quando o dano for meio ou consequência de outro crime será absorvido por este Como crime que deixa vestígio a introdução ou abandono de animais é indispensável auto de exame de corpo de delito art 158 do CPP 8 Pena e ação penal As penas cominadas alternativamente são detenção de quinze dias a seis meses ou multa A ação penal é de exclusiva iniciativa privada art 167 do CP O direito de queixa caberá não só ao proprietário do imóvel mas também ao possuidor quando o bem jurídico violado for somente a posse J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Introduzir animais em propriedade alheia Art 164 do CPB Queixacrime Perempção O recurso em sentido estrito é incabível em sede de Juizados Especiais Criminais conhecido como apelação por maioria O querelado sem autorização colocou 50 cabeças de gado novilhas na área rural da propriedade do querelante que está sub judice em litígio com o próprio querelado TJRS Recurso Crime 71001165703 Rel Nara Leonor Castro Garcia j 18122006 Dano em coisa de valor artístico arqueológico ou histórico Art 165 Destruir inutilizar ou deteriorar coisa tombada pela autoridade competente em virtude de valor artístico arqueológico ou histórico Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos e multa V art 216 da CF V Lei n 392461 monumentos arqueológicos e préhistóricos D O U T R I N A 1 Considerações especiais O Código Criminal do Império de 1830 e o Código Penal Republicano de 1890 não previam infração penal semelhante à descrita no atual art 165 Apenas mais recentemente se tem procurado proteger e preservar coisas e lugares que se destacam por seus valores artístico histórico ou arqueológico As Constituições brasileiras a partir da de 1934 começaram a impor deveres especiais nesse campo ao Poder Público A infração penal art 165 do Código Penal de 1940 foi inspirada no Código Penal Rocco de 1930 art 733 que previa como contravenção penal o dano a coisa própria isto é praticado pelo proprietário de valor arqueológico histórico ou artístico O art 165 contudo foi revogado tacitamente pelo art 62 I da Lei n 960598 Lei dos Crimes Ambientais que regula completamente a mesma matéria punindo com reclusão de um a três anos e multa Tratase com efeito de lei especial e lei geral lex especialis derrogat lex generalis J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A legislação brasileira qualifica com a nota da tipicidade penal a conduta daquele que transgride a inviolabilidade do patrimônio artístico arqueológico ou histórico nacional CP arts 165 e 166 Esses preceitos do Código Penal brasileiro objetivam tornar mais efetiva a proteção estatal destinada a resguardar a integridade do acervo cultural do País O remédio jurídicoprocessual do habeas corpus revelase incompatível com a pretendida comprovação da alegada atipicidade da conduta do agente eis que o exame dessa postulação envolve necessariamente a análise aprofundada da prova penal insuscetível de apreciação na via estreita do writ constitucional Precedentes STF HC 73449RS Rel Min Celso de Mello j 24 1996 O ordenamento positivo brasileiro dando consequência e efetividade à cláusula constitucional que impõe ao Poder Público a obrigação de proteger os bens e valores culturais legitima a punição criminal daquele cuja conduta desrespeita e ofende a integridade do patrimônio artístico arqueológico ou histórico nacional CP arts 165 e 166 Esses preceitos do Código Penal brasileiro que tipificam os crimes de dano cultural objetivam tornar mais efetiva a proteção estatal destinada a resguardar a inviolabilidade do acervo histórico arqueológico e artístico do País A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmouse no sentido de reconhecer que nos crimes praticados contra bens serviços ou interesse da União de suas autarquias ou de empresas públicas federais a competência penal originária para processar e julgar os Prefeitos Municipais pertence ao Tribunal Regional Federal Precedente STF HC 72506MG Rel Min Celso de Mello j 2351995 Alteração de local especialmente protegido Art 166 Alterar sem licença da autoridade competente o aspecto de local especialmente protegido por lei Pena detenção de 1 um mês a 1 um ano ou multa V Lei n 392461 monumentos arqueológicos e préhistóricos D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O disposto no art 166 foi revogado tacitamente pelo art 63 da Lei n 960598 Lei dos Crimes Ambientais que disciplina completamente a conduta incriminada aliás de forma mais abrangente lex especialis derrogat lex generalis O novo texto legal tem a seguinte redação Alterar o aspecto ou estrutura de edificação ou local especialmente protegido por lei ato administrativo ou decisão judicial em razão de seu valor paisagístico ecológico turístico artístico histórico cultural religioso arqueológico etnográfico ou monumental sem autorização da autoridade competente ou em desacordo com a concedida Provavelmente atento a esse novo dispositivo da Lei dos Crimes Ambientais o Anteprojeto de Reforma da Parte Especial suprimiu o crime disciplinado no art 166 do Código de 1940 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é o ambiente sob seu aspecto cultural estético particularmente a inviolabilidade do patrimônio público cultural nacional Essa proteção recai em coisas imóveis de regra representadas por sítios paisagens ou quaisquer espécies de locais bucólicos que embelezam determinados lugares e constituem bem comum A beleza ou estética que se protege pode decorrer da própria natureza ou ser especialmente complementada pela arte ou ofício do ser humano Hungria destacava a existência de uma semelhança que denominava íntimo parentesco muito grande entre essa infração penal e aquela prevista no art 165 que se refere ao dano contra coisas de valor artístico Em ambas na verdade protegemse coisas que justificam sua conservação pelo embelezamento ou valorização estética que encerram No entanto há profundas diferenças entre as duas infrações penais a começar pelo próprio objeto material da proteção penal o dispositivo anterior art 165 protege coisas de valor artístico arqueológico ou histórico ou seja a proteção destinase à coisa em si a sua essência enquanto este art 166 tutela local especialmente protegido isto é não se preocupa com a essência mas tão somente com seu aspecto externo com seu visual sua estética independentemente da substância Para a consumação do crime é suficiente a simples alteração estética sendo desnecessária a destruição inutilização ou deterioração material exigida pelo art 165 O simples dano à forma já caracteriza o crime Por fim na proteção de local as coisas são sempre imóveis ao contrário do dispositivo anterior em que podem ser tanto móveis quanto imóveis 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa independente de qualidade ou condição especial pois se trata de crime comum Nesse crime o proprietário também pode ser sujeito passivo quando produz alteração de local que lhe pertence mas que se encontra especialmente protegido por lei a proteção legal de determinado local com efeito cria restrições ao direito de domínio em prol do interesse público Sujeito passivo é uma pessoa jurídica de direito público interno União Estado ou Município primariamente uma vez que o crime lesa seu patrimônio secundariamente particular proprietário ou possuidor do local protegido 4 Tipo objetivo adequação típica A conduta tipificada é alterar isto é mudar desfigurar local especialmente protegido por lei A alteração implica mudança do estado anterior ou preexistente É indispensável a existência de previsão legal protegendo o local atingido Faltando o elemento normativo sem licença da autoridade competente isto é havendo licença especial de autoridade competente não se configurará o delito Não há necessidade de produção de dano sendo suficiente a modificação de aspecto ou desfiguração do visual O objeto da ação será sempre constituído por imóvel Para configurarse o crime não é necessário que a modificação seja integral pois a alteração parcial pode caracterizar a ação que o tipo penal proíbe A finalidade do tipo em exame é reforçar a preocupação do legislador de proteger a aparência o visual ou a configuração de determinado lugar pelo que representa para a coletividade O crime pode ser executado por qualquer meio ante a ausência de previsão legal desde que se trate de local especialmente protegido por lei Na linguagem de Magalhães Noronha aspecto é a fisionomia de alguma coisa é o modo com que ela se apresenta a nossa vista Local por sua vez na ótica da lei é sinônimo de lugar que a lei proíbe seja alterado 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é o dolo constituído pela vontade livre e consciente de alterar isto é modificar desfigurar local especialmente protegido por lei Para a configuração do dolo é indispensável que o agente saiba que o local alterado é protegido por lei eventual desconhecimento dessa condição afasta a adequação típica exigida pelo art 166 podendo levar o agente a responder subsidiariamente pelo crime de dano comum do art 163 devendose observar a natureza da ação penal O desconhecimento da existência de especial proteção legal do local pode configurar erro de tipo excluindo a atipicidade dessa modalidade especial de dano Devese ter presente à evidência que em caráter residual e subsidiário permanece o crime de dano tipificado no art 163 Não há exigência de elemento subjetivo especial do injusto A conduta culposa é impunível 6 Consumação e tentativa Consumase o crime de alteração de local especialmente protegido com a alteração efetiva de aspecto do local causando modificação no mundo exterior Fazse necessário que a ação do agente altere formalmente determinado local que seja protegido por lei Eventual consentimento da autoridade competente não só afasta a adequação típica como também a própria antijuridicidade passando a ser uma conduta lícita Admitese em tese a tentativa tratandose pois de crime material cuja execução admite fracionamento A ação humana pode ser interrompida durante sua execução antes que a alteração pretendida pelo agente se concretize 7 Classificação doutrinária Tratase de crime comum porque não exige condição especial do sujeito ativo material na medida em que produz um resultado naturalístico doloso não há previsão legal para a figura culposa embora o dano culposo também seja ilícito devendo buscar sua reparação na esfera civil de forma livre pode ser praticado por qualquer meio forma ou modo instantâneo a consumação operase de imediato não se alongando no tempo unissubjetivo pode ser praticado em regra apenas por um agente plurissubsistente pode ser desdobrado em vários atos que no entanto integram a mesma conduta isto é seu iter criminis pode ser fracionado permitindo consequentemente a tentativa 8 Questões especiais O atual Anteprojeto de Código Penal Parte Especial suprimiu esse tipo penal O DecretoLei n 25 de 30 de novembro de 1937 prevê o tombamento de sítios e paisagens A denúncia precisa indicar qual a lei que protege especialmente o local A dúvida sobre a existência de proteção legal pode configurar dolo eventual A rigor a objetividade jurídica na essência é a mesma do art 165 sendo diferentes somente as condutas tipificadas 9 Pena e ação penal A pena cominada pela redação original do Código Penal era alternativamente detenção de um mês a um ano ou multa A partir da vigência da Lei Ambiental Lei n 960598 a pena privativa de liberdade passou a ser de um a três anos de reclusão agora cumulada com a pena de multa A ação penal é de natureza pública incondicionada devendo em consequência a autoridade competente agir de ofício A natureza do bem jurídico protegido local especialmente protegido por lei recomenda essa opção do legislador de 1940 As diferentes modalidades de ação penal já foram anotadas em cada artigo deste capítulo Ela é pública nos crimes de dano qualificado art 163 I II e III nas figuras previstas nos arts 165 e 166 Nas figuras previstas no art 163 no inciso IV do seu parágrafo único e no art 164 a ação é de exclusiva iniciativa privada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A legislação brasileira qualifica com a nota da tipicidade penal a conduta daquele que transgride a inviolabilidade do patrimônio artístico arqueológico ou histórico nacional CP arts 165 e 166 Esses preceitos do Código Penal brasileiro objetivam tornar mais efetiva a proteção estatal destinada a resguardar a integridade do acervo cultural do País O remédio jurídicoprocessual do habeas corpus revelase incompatível com a pretendida comprovação da alegada atipicidade da conduta do agente eis que o exame dessa postulação envolve necessariamente a análise aprofundada da prova penal insuscetível de apreciação na via estreita do writ constitucional Precedentes STF HC 73449RS Rel Min Celso de Mello j 24 1996 O ordenamento positivo brasileiro dando consequência e efetividade à cláusula constitucional que impõe ao Poder Público a obrigação de proteger os bens e valores culturais legitima a punição criminal daquele cuja conduta desrespeita e ofende a integridade do patrimônio artístico arqueológico ou histórico nacional CP arts 165 e 166 Esses preceitos do Código Penal brasileiro que tipificam os crimes de dano cultural objetivam tornar mais efetiva a proteção estatal destinada a resguardar a inviolabilidade do acervo histórico arqueológico e artístico do País A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmouse no sentido de reconhecer que nos crimes praticados contra bens serviços ou interesse da União de suas autarquias ou de empresas públicas federais a competência penal originária para processar e julgar os Prefeitos Municipais pertence ao Tribunal Regional Federal Precedente STF HC 72506MG Rel Min Celso de Mello j 2351995 Ação penal Art 167 Nos casos do art 163 do n IV do seu parágrafo e do art 164 somente se procede mediante queixa V art 100 2º do CP V arts 29 a 38 do CPP D O U T R I N A As diferentes modalidades de ação penal já foram anotadas em cada artigo deste capítulo Ela é pública nos crimes de dano qualificado art 163 I II e III nas figuras previstas nos arts 165 e 166 Nas figuras previstas no art 163 no n IV do seu parágrafo único e no art 164 a ação é de exclusiva iniciativa privada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Não tendo em momento algum tanto a exordial acusatória como os laudos periciais e o v acórdão condenatório demonstrado se realmente foi utilizada uma substância inflamável ou explosiva capaz de justificar a imputação de dano qualificado e não de dano simples que nos termos do art 167 do Código Penal somente se procede mediante queixa é de se reconhecer a ilegitimidade ad causam do Parquet STJ HC 39377PB Rel Min Félix Fischer j 11102005 Crime de dano Ilegitimidade do Ministério Público Sendo o crime de dano simples contra bens patrimoniais de particular carece o Ministério Público de legitimidade para dar início a ação penal que é privativa do ofendido STJ RHC 3486PB Rel Min Anselmo Santiago j 851995 Capítulo V Da Apropriação Indébita Apropriação indébita Art 168 Apropriarse de coisa alheia móvel de que tem a posse ou a detenção Pena reclusão de 1 um a 4 quatro anos e multa V art 312 do CP V arts 644 664 681 1197 1198 e 1208 do CC V art 5º da Lei n 749286 crimes contra o Sistema Financeiro Nacional Aumento de pena 1º A pena é aumentada de um terço quando o agente recebeu a coisa I em depósito necessário V arts 647 a 652 do CC II na qualidade de tutor curador síndico liquidatário inventariante testamenteiro ou depositário judicial V arts 1976 a 2022 do CC V arts 148 a 150 do CPC III em razão de ofício emprego ou profissão V arts 21 e s da Lei n 111012005 Lei de Falências Publicado como 1º o único parágrafo do art 168 D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias No Brasil as Ordenações Filipinas não faziam distinção entre furto e apropriação indébita Os Códigos de 1830 art 258 e 1890 art 331 não tiveram melhor sorte O Projeto Sá Pereira seguiu o direito francês adotando o nomem juris abuso de confiança Na realidade a atual terminologia apropriação indébita foi uma opção correta digase de passagem do Projeto Alcântara Machado sem restringirse a um abuso de confiança Exatamente essa orientação foi a adotada pelo Código Penal de 1940 com a seguinte definição apropriarse de coisa alheia móvel de que tem a posse ou detenção 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é a inviolabilidade do patrimonial particularmente em relação à propriedade Na verdade protege o direito de propriedade direta e imediatamente contra eventuais abusos do possuidor que possa ter a intenção de dispor da coisa alheia como se fosse sua Esse já era o entendimento sustentado por Galdino Siqueira Direito Penal brasileiro Parte Especial 1924 p 723 A transferência da coisa deve ser feita a título precário com a obrigação de restituíla ou de fazer dela uso determinado por isso que a apropriação indébita é uma ofensa ao direito de propriedade e não ao direito de posse Acreditamos no entanto que o dispositivo em exame protege mais do que o simples direito de propriedade Os direitos reais de garantia como o usufruto e o penhor também estão protegidos penalmente uma vez que o usufrutuário assim como o devedor pode apropriarse indevidamente da res violando o direito do nuproprietário ou do credor pignoratício Ao contrário do que ocorre no crime de furto a posse não recebe por este dispositivo a tutela jurídica O Código Penal brasileiro silenciou sobre a elementar abuso de confiança ao contrário de inúmeros Códigos europeus por influência do direito francês Pode existir e na maioria das vezes é normal que exista uma relação de fidúcia na prática desse tipo de crime mas decididamente não é elemento indispensável a sua configuração É necessário e suficiente que a justa posse ou detenção exercida pelo agente alieno domine sobre a coisa alheia preexista à ilícita apropriação 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa que tenha a posse ou detenção legítima de coisa alheia móvel O proprietário não pode ser sujeito ativo desse crime assim sujeito ativo será sempre pessoa diversa do proprietário seja possuidor ou detentor independentemente de haver recebido a posse ou detenção de terceiro O nuproprietário por exemplo que vende a coisa que o usufrutuário por alguma razão lhe emprestara responderá pelo crime de estelionato contudo o usufrutuário que a aliena sem o consentimento do nuproprietário responde por apropriação indébita O condômino sócio ou coproprietário também pode ser sujeito ativo de apropriação indébita desde que não se trate de coisa fungível e a apropriação não exceda à quota que lhe cabe Sujeito passivo é qualquer pessoa física ou jurídica titular do direito patrimonial atingido pela ação tipificada em regra é o proprietário e excepcionalmente o mero possuidor quando a posse direta decorra de direito real usufruto ou penhor uma vez que se relacionam à propriedade Assim não apenas o dono da coisa pode ser sujeito passivo de apropriação indébita como também o titular de direito real de garantia como usufrutuário ou credor pignoratício 4 Pressuposto da apropriação indébita O pressuposto do crime de apropriação indébita é a anterior posse lícita da coisa alheia da qual o agente se apropria indevidamente A posse que deve preexistir ao crime deve ser exercida pelo agente em nome alheio isto é em nome de outrem É necessário que o agente possa ter disponibilidade física direta ou imediata da coisa alheia subsequente à traditio voluntária livre e consciente Contudo a essa disponibilidade material não deve corresponder a disponibilidade jurídica uti dominus O que o agente possuía alieno domine passa a possuir causa dominii Dáse uma contradictio entre causa possessionis vel detentionis e a superveniente conduta do agente em relação à coisa possuída ou detida Com efeito não há violação da posse material do dominus pois a coisa alheia já se encontra no legítimo e desvigiado poder de disponibilidade física do agente 5 Tipo objetivo adequação típica A ação incriminada consiste em apropriarse de coisa alheia móvel de que o agente tem a posse ou detenção Apropriarse é tomar para si isto é inverter a natureza da posse passando a agir como se dono fosse da coisa alheia de que tem posse ou detenção Na apropriação indébita ao contrário do furto e do estelionato o sujeito passivo tem anteriormente a posse lícita da coisa Recebea legitimamente 51 Elemento subjetivo transformador da natureza da posse Pressuposto do crime de apropriação indébita reiterando é a anterior posse lícita da coisa alheia da qual o agente se apropria indevidamente Como afirmava Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 416 a posse que deve preexistir ao crime deve ser exercida pelo agente em nome alheio nomine alieno isto é em nome de outrem seja ou não em benefício próprio Quer dizer nesse crime o dolo é subsequente pois a apropriação seguese à posse da coisa Na verdade no crime de apropriação indébita há uma alteração do título da posse uma vez que o agente passa a agir como se dono fosse da coisa alheia de que tem a posse legítima É fundamental a presença do elemento subjetivo transformador da natureza da posse de alheia para própria Ao contrário do crime de furto o agente tem a posse lícita da coisa Recebea legitimamente Muda somente o animus que o liga à coisa Este primeiro elemento posse legítima de coisa alheia móvel sobre o qual se deve inverter o animus rem sibi habendi é indispensável ao exame da caracterização do crime de apropriação indébita Em não havendo a anterior posse legítima de coisa alheia móvel não se pode falar em apropriação indébita onde a inversão do título da posse é fundamental No entanto se o sujeito ativo age de má fé mantendo em erro a vítima que entrega a coisa ludibriada pratica o crime de estelionato e não o de apropriação indébita Ao contrário se a vontade de possuir a coisa isto é o animus antecede a posse que já é adquirida em nome próprio e não no de terceiro não se configura apropriação indébita 6 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é o dolo constituído pela vontade livre e consciente de apropriarse de coisa alheia móvel de que tem a posse em nome de outrem ou em outros termos a vontade definitiva de não restituir a coisa alheia ou desviála de sua finalidade O dolo que se encontra na ação deve abranger todos os elementos configuradores da descrição típica sejam eles fáticos jurídicos ou culturais O autor como afirma Claus Roxin Teoría del tipo penal Buenos Aires Depalma 1979 p 171 somente poderá ser punido pela prática de um fato doloso quando conhecer as circunstâncias fáticas que o constituem Eventual desconhecimento de um ou outro elemento constitutivo do tipo constitui erro de tipo excludente do dolo O dolo é na espécie como afirma Fernando Fragoso Crime contra o sistema nacional Lei 749286 in Heleno Fragoso Lições de Direito Penal p 693 a vontade de assenhorearse de bem móvel animus rem sibi habendi com consciência de que pertence a outrem invertendo o título da posse Em outros termos o agente deve ter vontade e consciência de apropriarse de coisa alheia isto é de tomar para si coisa que não lhe pertence Essa é a representação subjetiva que deve abranger e orientar a ação do sujeito ativo 61 Inversão do título ou natureza da posse No crime de apropriação indébita como já referimos há uma inversão do título da posse já que o agente passa a agir como se dono fosse da coisa alheia de que tem a posse legítima É fundamental a presença do elemento subjetivo transformador da natureza da posse de alheia para própria como elemento subjetivo especial do injusto sob pena de não se configurar a apropriação indevida Afirmase que nesse crime o dolo é subsequente pois a apropriação seguese à posse lícita da coisa O dolo é na espécie como afirma Fernando Fragoso a vontade de assenhorearse de bem móvel animus rem sibi habendi com consciência de que pertence a outrem invertendo o título da posse Contrariando esse entendimento Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 423 sustentava que não existe dolo subsequente O dolo deve necessariamente dominar a ação ressalvada a situação excepcional de actio libera in causa e no caso se revela com a apropriação ou seja quando o agente inverte o título da posse 62 Real sentido da locução dolo subsequente Na verdade embora pareça não chegam a ser contraditórias as duas orientações basta que se procure emprestar maior precisão aos termos empregados isto é devese interpretar adequadamente o sentido da locução dolo subsequente Explicando não se desconhece que o dolo necessariamente e sempre tem de ser atual isto é contemporâneo à ação proibida Se fosse anterior estarseia diante de um crime premeditado se fosse posterior de crime não se trataria pois a conduta praticada não teria sido orientada pelo dolo Com efeito quando se fala em dolo subsequente não se está pretendendo afirmar que o dolo é posterior à ação de apropriarse como pode ter interpretado Heleno Fragoso logicamente buscase apenas deixar claro que é necessário o animus apropriandi ocorrer após a posse alieno nomine 7 Consumação e tentativa 71 A consumação O momento consumativo do crime de apropriação indébita convém registrar de plano é de difícil precisão pois depende em última análise de uma atitude subjetiva A consumação da apropriação indébita e por extensão o aperfeiçoamento do tipo coincidem com aquele momento em que o agente por ato voluntário e consciente inverte o título da posse exercida sobre a coisa passando a dela dispor como se proprietário fosse Contudo a certeza da recusa em devolver a coisa somente se caracteriza por algum ato externo típico de domínio com o ânimo de apropriarse dela O animus rem sibi habendi característico do crime de apropriação indébita precisa ficar demonstrado à saciedade Se o agente não manifesta a intenção de ficar com a res e ao contrário a restitui à vítima tão logo possível o dolo da apropriação indébita não se aperfeiçoa A simples demora na devolução da res quando não existe prazo previsto para tanto não caracteriza o delito de apropriação indébita Consumase enfim com a inversão da natureza da posse caracterizada por ato demonstrativo de disposição da coisa alheia ou pela negativa em devolvêla 72 A tentativa Como crime material a tentativa é possível embora de difícil configuração Hungria Comentários ao Código Penal p 145 criticava duramente a corrente contrária à admissibilidade da tentativa nos termos seguintes Não acolhemos a opinião daqueles que entendem não ser possível a tentativa de apropriação indébita É ela configurável não apenas no exemplo clássico do mensageiro infiel que é surpreendido no momento de violar o envelope que sabe conter valores senão também toda a vez que a apropriação encerra um iter ou como diz Hafter se executa mediante um ato reconhecível ab externo einen äusserlich erkennbaren Akt como por exemplo venda ou penhor A despeito da dificuldade de sua comprovação a identificação da tentativa fica na dependência da possibilidade concreta de se constatar a exteriorização do ato de vontade do sujeito ativo capaz de demonstrar a alteração da intenção do agente de apropriarse da coisa alheia Não se pode negar a configuração da tentativa quando por exemplo o proprietário surpreende o possuidor efetuando a venda de coisa que lhe pertence e somente a intervenção daquele circunstância alheia à vontade do agente impede a tradição da coisa ao comprador desde que nenhum ato anterior tenha demonstrado essa intenção Magalhães Noronha e Heleno Fragoso embora assumindo a existência de controvérsia reconhecem que como crime de dano a apropriação indébita doutrinariamente admite a tentativa 8 Formas majoradas de apropriação indébita A apropriação indébita não apresenta estritamente figuras qualificadas mas prevê hipóteses de causas de aumento de pena majorantes no 1º do art 168 cuja elevação obrigatória será em um terço Tratandose de majoração compulsória devese examinar a caracterização dessas majorantes com mais rigor e de forma restritiva como recomenda a dogmática penal São as seguintes situações em que o agente recebe a coisa 81 Coisa recebida em depósito necessário O direito civil distingue o depósito em necessário art 647 do CC e voluntário art 627 Para o direito penal pelo que deste dispositivo consta o depósito voluntário não recebe a mesma proteção penal em outros termos essa posse transformada indevidamente em domínio pelo depositário poderá caracterizar apropriação indébita simples sem qualquer majoração especial Depósito necessário significa que o sujeito passivo não tem outra escolha está obrigado a confiar o objeto ou valor ao agente Por isso o desvalor da ação é mais grave sendo merecedor de maior reprovação em razão da vulnerabilidade do sujeito passivo que ficou à mercê do depositário Tal relação de dependência destaca Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 477 impõe um dever maior de probidade deste Assim a infração penal praticada na referida circunstância acentua a gravidade do injusto não só pelo maior desvalor da ação mas também pelos notórios efeitos deletérios causados pela infração Realmente o fundamento da majoração especial da punição reside na falta de liberdade de escolha do depositante que premido pelas circunstâncias tornase presa vulnerável Em contrapartida o dever de probidade do depositário aumenta na mesma proporção pelo múnus público que exerce ainda que não se trate de uma função pública 811 Depósito necessário legal ou miserável O depósito necessário pode ser legal ou miserável É legal quando decorre de expressa previsão normativa quando se pode escolher o depositário Será miserável o depósito por outro lado quando feito em situações excepcionais que reduzam embora não anulem a possibilidade de escolha do depositante calamidade como incêndio inundação naufrágio ou saque O depósito necessário disciplinado no inciso I do 1º do art 168 é apenas aquele conhecido como miserável ou seja levado pela necessidade de salvar a coisa da iminência de uma calamidade ou como define o próprio Código Civil o que se efetua por ocasião de alguma calamidade como o incêndio a inundação o naufrágio ou o saque art 647 Está excluído por conseguinte o depósito legal A apropriação do depósito legal pode configurar peculato quando se tratar de funcionário público ou outro crime que pode até ser a apropriação indébita majorada por outro fundamento e não pelo depósito necessário A apropriação de depósito miserável configura a majoração em exame por depósito necessário 812 Depósito originário de hospedagem O Código Civil equiparou o depósito originado de hospedagem ao depósito necessário art 649 Não se pode esquecer contudo que em direito penal não prevalecem as ficções do direito privado Com efeito os hospedeiros que se apropriarem dos objetos dos hóspedes que lhes tenham sido confiados cometerão apropriação indébita A majorante que incidirá no entanto não será a de depósito necessário mas a de abuso de confiança no exercício de profissão art 168 1º III do CP Não se deve confundir ademais o ato de empregados afanarem pertences dos hóspedes uma vez que essa conduta constitui furto e não apropriação indébita 82 Qualidade pessoal do agente tutor curador síndico liquidatário inventariante testamenteiro ou depositário judicial Esse rol contido no inciso II é numerus clausus não admitindo a inclusão de qualquer outra hipótese semelhante ou seja não abrange pessoa que desempenhe função diversa das relacionadas no dispositivo por exemplo o comissário que administra os bens da concordata sob pena de violar o princípio da reserva legal O fundamento dessa majorante é o de que nas condições elencadas o sujeito ativo viola também deveres inerentes ao cargo ou função que desempenha na verdade justificador de maior reprovabilidade social São funções que exigem maior abnegação do indivíduo que geram uma expectativa de segurança e seriedade provocando eventual conduta ilícita maior censura por isso o crime praticado caracteriza infidelidade a um múnus público Tutor é alguém que devidamente compromissado assume o dever de orientar reger e educar menor não sujeito ao pátrio poder ou poder familiar além de administrar seus bens Curador é quem exerce basicamente as mesmas funções mas em relação a pessoas maiores declaradas incapazes que por deficiência mental não podem autoadministrarse nem administrar seus bens Tanto tutor quanto curador devem ser judicialmente constituídos Síndico era a denominação que se dava ao encarregado da administração da falência mais especificamente da massa falida sob direção e superintendência do juiz na antiga Lei de Falências Decretolei n 766145 Atualmente porém a Lei de Falências Lei n 111012005 denomina administrador judicial a pessoa que exerce essa função O inventariante por sua vez administra o espólio até o final julgamento da partilha Testamenteiro é aquele que é incumbido de promover o cumprimento de disposições de última vontade do de cujus isto é seu testamento Os poderes e as obrigações do testamenteiro são disciplinados pelo Código Civil Depositário judicial é o funcionário encarregado de receber em depósito a guarda de móveis joias títulos de crédito metais preciosos objeto de ações ou processos judiciais Se for funcionário público responderá por peculato e não por apropriação indébita Incorrerá contudo na majorante em exame se se tratar de particular nomeado pelo juiz 83 Em razão de ofício emprego ou profissão O fundamento da majorante deste inciso é o mesmo do anterior pois igualmente aqui o sujeito ativo viola deveres inerentes a sua qualidade profissionalfuncional Em outros termos em razão da natureza da atividade laborativa o sujeito ativo tem sua ação criminal facilitada em razão da confiança existente entre ele e a vítima Somente se configura qualquer das causas de aumento em exame se a conduta proibida for praticada em razão de ofício emprego ou profissão sendo insuficiente que exista objetivamente a qualidade ou condição do sujeito ativo Em outros termos é indispensável que a apropriação indébita se concretize por meio de ato característico de ofício emprego ou profissão já que se não dermos uma interpretação restritiva a qualquer dessas agravantes raras serão as hipóteses em que a apropriação indébita se apresentará sem aumento de pena O exemplo nesse sentido lembrado por Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 358 é definitivo Assim se uma pessoa paga a um ourives o serviço que lhe fez em uma joia e não tendo ele troco passa o dono mais tarde para recebêlo o que não consegue apropriandose aquele da diferença comete apropriação indébita simples Tratase de pagamento de serviço de remuneração própria de todo e qualquer trabalho Não é ele recebedor ou trocador de dinheiro Cometeria entretanto apropriação indébita com a majorativa se não restituísse a joia entregue para conserto ou reparação pois neste caso ele a recebeu em razão de ofício Ofício referese à arte mecânica ou manual exigindo certo grau de habilidade ou conhecimento embora possa ser empregado com o significado de função pública Entendese por ofício qualquer ocupação habitual consistente em prestação de serviços ou trabalhos manuais artesão alfaiate cabeleireiro etc Emprego é a relação de ocupação em atividade ou serviço particular e como regra implica um vínculo de subordinação ou dependência entre as partes Profissão é toda e qualquer atividade habitualmente desenvolvida pelo indivíduo com fim lucrativo Não nos parece a definição mais adequada a que considera profissão como o exercício de ocupação de natureza intelectual e independente Profissão sintetizava Hungria é um gênero do qual são espécies o ofício e o emprego 9 Apropriação furto e estelionato Na apropriação indébita ao contrário do crime de furto ou estelionato o agente tem a posse lícita da coisa Recebeua legitimamente muda somente o animus que o liga à coisa No entanto se o agente a recebe de máfé mantendo em erro quem a entrega pratica o crime de estelionato e não o de apropriação Com efeito o que distingue a apropriação indébita desses crimes é que com ela não se produz violação da posse material do dominus a coisa não é subtraída ou ardilosamente obtida pois já se encontra no legítimo poder de disponibilidade física do agente Enquanto nesses crimes a disponibilidade fática sobre a res é obtida com o próprio crime na apropriação indébita essa disponibilidade física precede ao crime No furto há uma subtração no estelionato uma obtenção fraudulenta na apropriação indébita uma arbitrária inversão da natureza da posse No furto o agente obtém tirando no estelionato enganando na apropriação indébita aproveitandose Naqueles crimes há um dolus ab initio enquanto na apropriação indébita o dolo é subsequente 10 Apropriação indébita e relação mandantemandatário A relação mandantemandatário pode apresentar uma gama variada de situações que pode ir da simples infração éticodisciplinar passando pelo inadimplemento contratual ilícito civil até a caracterização de infração penal estelionato apropriação indébita etc Diante dessa multiplicidade de situações é impossível estabelecer regras genéricas visto que somente o casuísmo poderá indicar a natureza de eventual infração civil ética ou criminal A figura da apropriação indébita pressupõe a existência de elemento subjetivo especial do injusto ou seja a tomada da coisa alheia em proveito próprio A existência de relação jurídica mandante mandatário leva à conclusão da inexistência do dolo O simples fato de o mandatário por exemplo depositar em conta bancária valor por ele administrado não implica necessariamente a inversão do onus probandi o que colocaria nos ombros do agente a obrigação de fazer prova de fato negativo o de não haver praticado o crime mormente com a consequência de não a implementando vir a ser condenado Não se pode cogitar da prova da ausência da intenção de apropriarse porquanto inerente à razoabilidade que norteia o procedimentopadrão 101 Necessidade de prova cabal sobre o animus de inversão da natureza da posse Com efeito não se pode esquecer que a figura da apropriação indébita exige um elemento subjetivo especial do tipo qual seja tomar para si a coisa de que tem posse com a intenção de não restituíla ou desviála da finalidade para a qual a recebeu Será da acusação por certo a obrigação de provar que o simples depósito bancário inverteu a natureza da posse Se o Estadoacusador não consegue trazer aos autos elementos convincentes a respeito da existência de dolo na apropriação da coisa isto é se não há a indispensável certeza sobre a intenção final do agente elemento subjetivo especial do injusto a apropriação indébita não está configurada e a composição do litígio deve resolver se na esfera do direito privado Por outro lado quando o advogado recebe valores a título de pagamento parcial de honorários para ajuizar ação mas não o faz incorre em inadimplência contratual civil e não no crime do art 168 do Código Penal pois não recebeu tais importâncias para restituílas pressuposto fundamental da apropriação indébita 11 Pena e ação penal A pena cominada alternativamente é de reclusão de um a quatro anos e multa Pode ser majorada em um terço se ocorrerem as circunstâncias relacionadas no 1º A ação penal é pública incondicionada salvo nas hipóteses do art 182 quando será condicionada à representação Haverá isenção de pena se for praticado contra ascendente descendente ou cônjuge na constância da sociedade conjugal 12 Algumas questões especiais Para a configuração do delito de apropriação indébita é indispensável que o agente tenha obtido legitimamente a posse ou a detenção da coisa sem transferência do domínio de modo que se obrigue a restituíla Por essa razão não a configura a posse de mercadoria com opção de compra hipótese caracterizada de contrato de compra e venda cujo inadimplemento acarreta mera infração contratual A mora ou simples descaso em devolver não configuram por si só apropriação indébita Se o agente na locação de coisa móvel deixa de restituíla no prazo convencionado sem contudo revelar animus rem sibi habendi o fato constitui mero ilícito civil e não apropriação indébita Por fim coisa fungível emprestada ou depositada para ser restituída na mesma espécie quantidade e qualidade não pode geralmente ser objeto de apropriação indébita J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Consoante consignado no v acórdão vergastado foi realizado um contrato de mútuo entre empresas no qual se transferiu a propriedade do numerário Isso porque é da essência do mútuo a transferência do domínio do bem Por isso com o repasse da quantia em dinheiro para o réu como decorrência do contrato de mútuo passou ele a ser seu proprietário Logo tendo a propriedade do bem transferido não poderia praticar o crime de apropriação indébita já que este exige a apropriação de coisa alheia móvel de que tem a posse ou a detenção Esse foi o entendimento perfilhado pelo e Tribunal a quo Todavia no caso em tela o réu não pode ser considerado como o proprietário do bem mas sim mero possuidor ou detentor tendo em vista o princípio de que a pessoa jurídica não se confunde com as pessoas que a compõem Vale dizer ela tem personalidade jurídica distinta da de seus sócios não se confundindo com a pessoa natural dos sócios que a constituem princípio da individualidade e também possui patrimônio próprio inconfundível e incomunicável com o patrimônio individual de cada um de seus sócios princípio da autonomia patrimonial Entretanto o fato de esta Corte reconhecer que o réu não era proprietário mas mero detentor dos valores depositados na conta da empresa não implica automaticamente em sua condenação nas sanções do art 168 do CP STJ REsp 932896PR Rel Min Félix Fischer j 2882007 A materialidade e autoria das várias condutas de apropriação indébita praticadas pela ré durante o período em que trabalhou na lotérica da vítima consistindo em estornar valores de contas que eram pagas na lotérica bem como fazer depósitos fictícios na sua conta de seus familiares e das colegas de trabalho sacando os valores posteriormente estão fartamente comprovadas na instrução criminal principalmente na prova documental e pela palavra da vítima TJRS Apelação 70018155168 Rel Marlene Landvoigt j 2352007 O fato da coisa indevidamente apropriada ser bem fungível não impede a caracterização do crime de apropriação indébita Precedentes desta Corte e do Pretório Excelso STJ REsp 880870PR Rel Min Félix Fischer j 1532007 No delito de apropriação indébita a devolução da quantia apropriada antes do recebimento da denúncia não enseja a extinção da punibilidade Precedentes do STJ e do STF STJ REsp 843713RS Rel Min Félix Fischer j 12122006 O réu na condição de advogado patrocinou causa cível em favor da vítima Levantou a importância depositada mediante alvará em 1995 conforme certificado pelo escrivão Ademais consta nos documentos os números da OAB e do CPF do acusado Ademais há informação do escrivão de ter o réu levado os autos para extrair cópias sem devolvêlos o que motivou o incidente de restauração de autos Réu e vítima ajuizaram demandas no cível onde houve condenação do réu a pagar a importância Efetivamente em 1999 o réu efetuou o depósito Como houve restituição da coisa antes do recebimento da denúncia é de ser reconhecida a causa especial de diminuição de pena do art 16 do Código Penal cujo quantum há de se considerar a separação TJRS Apelação 70015836265 Rel Nereu José Giacomolli j 3182006 Art 168 1º III do CP Verbas repassadas pela União para empresa privada Convênio cumprido Incorporação da quantia restante ao patrimônio da empresa Apropriação indevida Compete à Justiça Estadual processar e julgar a apropriação indevida de verbas que embora repassadas pela União já estavam incorporadas ao patrimônio da empresa privada STJ HC 53273DF Rel Min Félix Fischer j 126 2006 Como afirmou a Magistrada analisando a prova do processo e condenando o recorrente pela prática dos crimes de apropriação indébita e abandono de incapaz da análise do acervo probatório colacionado ao bojo dos autos verificase que dúvidas não pairam acerca da prática dos delitos descritos na inicial Quanto ao primeiro fato a apropriação indébita restou incontroverso que o acusado juntamente com o advogado da vítima em agosto de 1999 sacou a expressiva quantia de R 14850074 pertencente a Manoel em decorrência de exitosa ação movida contra a Rede Ferroviária Deste valor foram descontados os honorários advocatícios do profissional restando um saldo de cerca de R 10800000 O acusado porém administrou o dinheiro como se seu fosse gastandoo conforme a sua conveniência pessoal utilizando inclusive parte para suas despesas pessoais acrescento tão somente que a situação de abandono ficou devidamente caracterizada na medida em que a vítima Manoel embora tivesse possibilidade de alta não podia deixar o nosocômio por ausência total de amparo por parte de seus familiares especialmente do réu único irmão e curador TJRS Apelação 70013641659 Rel Sylvio Baptista Neto j 2612006 O crime previsto no art 168 1º inciso III do Código Penal é de ação penal pública incondicionada sendo improcedente portanto a alegação de extinção da punibilidade pela decadência do direito de representação Precedentes STJ RHC 17340SP Rel Min Félix Fischer j 2862005 Apropriação indébita Apropriação de pensão destinada a curatelado de parte do curador submetendo o primeiro a intensas privações TJRS Apelação 70001936996 Rel Tupinambá Pinto de Azevedo j 242003 Apropriação indébita previdenciária Art 168A Deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes no prazo e forma legal ou convencional Pena reclusão de 2 dois a 5 cinco anos e multa 1º Nas mesmas penas incorre quem deixar de I recolher no prazo legal contribuição ou outra importância destinada à previdência social que tenha sido descontada de pagamento efetuado a segurados a terceiros ou arrecadada do público II recolher contribuições devidas à previdência social que tenham integrado despesas contábeis ou custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços III pagar benefício devido a segurado quando as respectivas cotas ou valores já tiverem sido reembolsados à empresa pela previdência social 2º É extinta a punibilidade se o agente espontaneamente declara confessa e efetua o pagamento das contribuições importâncias ou valores e presta as informações devidas à previdência social na forma definida em lei ou regulamento antes do início da ação fiscal 3º É facultado ao juiz deixar de aplicar a pena ou aplicar somente a de multa se o agente for primário e de bons antecedentes desde que I tenha promovido após o início da ação fiscal e antes de oferecida a denúncia o pagamento da contribuição social previdenciária inclusive acessórios ou II o valor das contribuições devidas inclusive acessórios seja igual ou inferior àquele estabelecido pela previdência social administrativamente como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas execuções fiscais Caput e parágrafos acrescentados pela Lei n 9983 de 14 de julho de 2000 D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido são as fontes de custeio da seguridade social particularmente os direitos relativos à saúde à previdência e à assistência social art 194 da CF São protegidas especialmente contra a apropriação indébita que pode ser praticada por quem tem o dever de recolher os tributos e taxas É em outros termos a tutela da subsistência financeira da previdência social 2 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo é o substituto tributário caput que por lei tem o dever de recolher do contribuinte e repassar as contribuições à previdência social Sujeito ativo nas figuras descritas no 1º é o titular de firma individual os sócios solidários os gerentes diretores ou administradores que efetivamente hajam participado da administração da empresa concorrendo efetivamente na prática da conduta criminalizada Sujeito passivo é o Estado representado pelo INSS Instituto Nacional do Seguro Social que é o órgão encarregado da seguridade social 3 Tipo objetivo adequação típica A conduta tipificada no caput é deixar de repassar que tem o sentido de não transferir não recolher ou não pagar à previdência social as contribuições recolhidas ou descontadas dos contribuintes no prazo e forma legal ou convencional Tratase na verdade de apropriação indébita previdenciária Uma opção legislativa que tem a função política de eliminar a grande polêmica que pairava sobre a natureza e espécie do crime que era previsto no art 95 d da Lei n 821291 Esse nomen iuris abrange todas as figuras tipificadas no dispositivo em exame caput e 1º 31 Pressuposto contribuições recolhidas Somente é possível repassar algo que se tenha recebido ou recolhido O prefixo re tem etimologicamente esse sentido de repetição Portanto o sujeito ativo somente poderá repassar as contribuições quando as houver recolhido pois somente assim terá sua posse e não as repassando poderá apropriarse 32 Prazo e forma legal ou convencional norma penal em branco Os prazos e as formas legais ou convencionais são estabelecidos em outros diplomas legais tratandose portanto de norma penal em branco Por ora devese consultar a Lei n 821291 que estabelece os prazos e as formas para que o repasse seja feito 4 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo geral é o dolo representado pela vontade consciente de deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes Tratandose de apropriação indébita é indispensável o elemento subjetivo especial do injusto representado pelo especial fim de apropriarse dos valores pertencentes à previdência social isto é o agente se apossa com a intenção de não restituílos Nesse sentido fica superada a posição anterior do STF e do TRF da 4ª Região que a nosso juízo sob a égide da legislação anterior era inatacável Revigorase assim o entendimento que já adotavam o STJ e o TRF da 5ª Região os quais já sustentavam a necessidade do elemento subjetivo especial 5 Figuras do caput e do 1º distinção A conduta tipificada no caput tem a finalidade de punir o substituto tributário que deve recolher à previdência social o que arrecadou do contribuinte e deixou de fazêlo ver art 31 da Lei n 821291 Já as figuras descritas no 1º destinamse ao contribuinteempresário que deve recolher a contribuição que arrecadou do contribuinte 6 Deixar de recolher no prazo legal 1º I Deixar de recolher significa não efetivar o pagamento de contribuição ou outra importância destinada à previdência social que tenha sido descontada de pagamento efetuado a segurados a terceiros ou arrecadada do público Essa figura corresponde ao antigo art 95 d da Lei n 821291 61 Pressuposto que tenha sido descontado de pagamento efetuado Pressuposto dessa infração é que o sujeito ativo tenha descontado de pagamento efetuado a segurado a terceiros ou tenha arrecadado do público Esse pressuposto deixa o sujeito ativo na posse do valor correspondente e não o recolhendo no prazo legal apropriase indevidamente de valores pertencentes à previdência 62 Antiga figura do art 95 d A figura anterior não mencionava expressamente que o desconto tivesse sido feito embora parte da doutrina e da jurisprudência sustentassem essa necessidade Assim a partir da atual lei somente se concretiza a apropriação previdenciária quando for descontada a contribuição do segurado e o empregador deixar de repassála à previdência 7 Deixar de recolher contribuições devidas 1º II Deixar de recolher contribuições que tenham integrado despesas contábeis ou custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços O não recolhimento dessa contribuição desde que tenha integrado o cálculo dos custos o que normalmente ocorre configura a conduta descrita no tipo em exame Apresenta certa semelhança com o antigo art 95 e da Lei n 821291 71 Despesas contábeis ou custos relativos a produtos e serviços A contribuição previdenciária devida pelo empregador deve integrar as despesas contábeis ou custos relativos a produtos e serviços O valor correspondente por certo é levado em consideração no cálculo para a fixação do preço do produto ou do serviço tratando se de despesa operacional por exemplo 20 sobre a folha de remuneração acrescidos do percentual relativo ao seguro de acidente do trabalho 72 Pressuposto que tenham integrado os custos Tendo integrado os custos seu valor correspondente é recebido pelo empresário ou empregador e nessas condições adquire a posse dos valores correspondentes Não os recolhendo apropriase indebitamente 8 Deixar de pagar benefício devido 1º III Deixar de pagar significa não efetivar o pagamento de benefício devido a segurado cujos valores ou cotas já tenham sido reembolsados à empresa pela previdência Essa figura equivale àquela prevista no art 95 f da Lei n 821291 81 Pressuposto reembolso realizado Para a configuração dessa infração é pressuposto que a previdência social tenha efetuado reembolso à empresa e tendoo recebido esta não o repassa ao segurado Sem esse pressuposto não se poderia falar em apropriação indébita 9 Consumação e tentativa O momento consumativo tratandose de apropriação indébita é de difícil precisão pois depende em última análise de uma atitude subjetiva Consumase enfim com a inversão da natureza da posse caracterizada por ato demonstrativo de disposição da coisa alheia ou pela negativa em devolvêla Como crime material a tentativa é possível embora de difícil configuração 10 Causa extintiva da punibilidade Extinguese a punibilidade se o agente declara confessa e efetua o pagamento devido antes do início da ação fiscal e ainda presta as informações devidas à previdência social Frisandose sempre que a confissão é da dívida e nunca de crime caso contrário violaria o princípio da presunção de inocência 101 Início da ação fiscal antes Não pode ser apenas o que dispõem o art 243 e parágrafos do Decreto n 304899 com a simples notificação de lançamento do tributo A ação fiscal somente pode ser considerada iniciada a partir da cientificação pessoal do contribuinte de sua instauração pois somente então se completa a relação procedimental da ação fiscal Assemelhase à denúncia espontânea do CTN art 138 102 Requisitos para extinção da punibilidade a Declara o valor devido demonstra o total arrecadado do contribuinte e não repassado b confessa o não recolhimento admite não ter feito o recolhimento ou repasse na época e na forma previstas em lei Frisese confissão de dívida tão somente não se trata de confissão de crime pois se assim fosse seria inconstitucional c efetua o pagamento recolhe todo o devido principal acrescido dos acessórios d presta as informações devidas as informações que deve prestar à previdência são relativas ao débito em causa somente e caráter espontâneo dos requisitos a espontaneidade de toda e qualquer ação humana não tem nem pode ter o significado de arrependimento sob pena de assassinar o vernáculo tampouco tem o sentido de revelar vontade de colaborar com o Estado mas apenas que o agente teve a iniciativa de praticar referidas condutas Literalmente há espontaneidade quando a iniciativa é do próprio agente e voluntário é tudo que não for produto de coação embora a iniciativa não tenha partido do agente que pode inclusive ter recebido e aceito sugestões opiniões ou influências externas f antes do início da ação fiscal a ação fiscal somente pode ser considerada iniciada a partir da cientificação pessoal do contribuinte de sua instauração pois somente então se completa a relação procedimental da ação fiscal 103 Aplicação do art 34 da Lei n 924995 O STF considerava aplicável o disposto no art 34 extinção da punibilidade da lei referida à hipótese de não recolhimento de contribuições previdenciárias Assim a partir de agora poderá surgir o entendimento de que há duas hipóteses para a extinção da punibilidade antes da instauração da ação fiscal com todos os requisitos já examinados e antes do oferecimento da denúncia É importante para o Fisco oportunizar ao contribuinte o recolhimento total do tributo que é em última instância a finalidade dessas leis arrecadadorascriminalizadoras 11 Irretroatividade da lei nova n 99832000 Pela lei anterior n 924995 segundo o STF o pagamento extintivo da punibilidade podia ser feito até o recebimento da denúncia A nova lei n 99832000 nesse particular mais restritiva é muito mais severa pois admite a extinção da punibilidade somente quando o pagamento for efetuado antes do início da ação fiscal Logo é irretroativa não se aplicando aos fatos ocorridos antes de sua vigência 14102000 12 Perdão judicial ou pena de multa O 3º cria uma hipótese sui generis perdão judicial ou multa Caso a ação fiscal já tenha sido iniciada ao pagamento de todo o débito pode corresponder somente uma ou outra das consequências referidas está afastada a extinção da punibilidade As hipóteses são alternativas perdão judicial ou pena de multa mas os requisitos são cumulativos Os operadores do art 59 deverão recomendar uma ou outra alternativa 121 Valor de pouca monta inocuidade Que o valor do débito previdenciário contribuição e acessórios não seja superior ao mínimo exigido pela própria previdência social para ajuizamento de execução fiscal O perdão judicial nos termos postos é praticamente inócuo uma vez que se limita a valores ínfimos desde que não sejam suficientes para justificar sua cobrança judicial que já foi definido em até 1000 Ufir Lei n 944197 art 1º 122 Princípio da insignificância configurado Se o Fisco não tem interesse em cobrar judicialmente o crédito tributário não há igualmente fundamento para a imposição de sanções criminais Prevê a nova lei assim o cabimento do perdão judicial ou da pena de multa isoladamente A nosso juízo em termos tributáriofiscais configurase em sede criminal o princípio de insignificância excluindose a própria tipicidade 123 Requisitos necessários ao perdão judicial ou multa 1 Primário é aquele que nunca sofreu qualquer condenação irrecorrível réu não reincidente na linguagem da reforma penal de 1984 é aquele que não é primário mas já desapareceram os efeitos da reincidência art 64 I do CP 2 bons antecedentes quem não tem comprovadamente antecedentes negativos isto é não tem condenação irrecorrível fora das hipóteses da reincidência 3 pagamento integral do débito contribuição previdenciária e acessórios 4 pequeno valor da dívida o valor do débito previdenciário contribuição e acessórios não é superior ao mínimo exigido pela própria previdência social para o ajuizamento de execução fiscal 13 Crimes praticados após a Lei n 99832000 efeitos práticos a Pagamento feito antes do início da ação fiscal extingue a punibilidade b pagamento após o início da ação fiscal mas antes do oferecimento da denúncia admite perdão judicial ou aplicação somente da multa art 168A 3º I do CP c pagamento após o oferecimento da denúncia mas antes de seu recebimento admite a aplicação do arrependimento posterior art 16 do CP d pagamento após o recebimento da denúncia atenuante genérica art 65 do CP 14 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são reclusão de dois a cinco anos e multa Na hipótese do 3º pode ser aplicada somente a pena de multa ou concedido o perdão judicial A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Art 168A do CPB apropriação indébita previdenciária O pagamento integral dos débitos tributários ou previdenciários propicia a extinção da punibilidade com todas as suas consequências não obstante esse pagamento possa se dar em qualquer fase do processo penal de forma parcelada ou não 2º do art 9º da Lei n 106842003 Restou provado nos autos que a empresa efetuou o pagamento integral do débito previdenciário devendose aplicar o 2º do art 9º da Lei 106842003 Extinção da punibilidade pelo pagamento integral do débito previdenciário TRF5ª Região Apelação 200580000003340 Rel Amanda Lucena j 27112007 É imprescindível à caracterização tanto do crime de apropriação indébita como das modalidades equiparadas no caso a apropriação de contribuições sociais que o agente tenha agido dolosamente A demonstração de sérias dificuldades financeiras pelas quais passava a empresa dirigida pelos apelados constante dos autos respalda a inexigibilidade de conduta diversa Improvado o dolo não se tipifica o crime capitulado no art 168A do Código Penal TRF5ª Região Apelação 200481000016501CE Rel Ridovaldo Costa j 1242007 O delito de Apropriação Indébita Previdenciária é do tipo omissivo próprio em que a tipicidade fica condicionada a um não fazer algo que o agente devia e podia fazer O Direito não exige condutas impossíveis Não se imputa omissão a quem não pode efetivamente agir conforme a norma Destarte o Parquet deve demonstrar que o agente tinha a possibilidade de realizar a conduta exigida pela norma pois tal possibilidade é elemento objetivo do tipo e portanto ônus exclusivo da acusação Todavia o empresário que permanece exercendo sua atividade econômica pagando salários fornecedores e recebendo pro labore ainda que em valor reduzido pode recolher as contribuições previdenciárias Diante da gravidade do delito pois o tipo visa assegurar a manutenção do sistema previdenciário e proporcionar aos segurados um mínimo de dignidade no ocaso de suas vidas apenas na hipótese de graves dificuldades financeiras devidamente comprovadas pela defesa deve ser reconhecida a inexigibilidade de conduta diversa Tratandose de período curto de não recolhimento havendo dúvida razoável sobre a saúde financeira da empresa impõese a aplicação do princípio in dubio pro reo TRF2ª Região Apelação 200550010030122ES Rel Maria Helena Cisne j 2822007 É imprescindível para a caracterização do crime de apropriação indébita previdenciária que o agente tenha agido dolosamente O crime previsto no art168A do CPB não se exaure com o mero deixar de pagar exigindo a prova inequívoca da intenção de se apropriar dos valores devidos de iludir o Fisco Não comete o crime quem registra todos os débitos em sua contabilidade e não dispõe de recursos financeiros suficientes para a quitação dos tributos Precedentes deste TRF 5ª INQ 716PEPleno EINFAC n 202SEPleno ACR 415SE Segunda Turma TRF5ª Região Emb Inf 200283000035084PE Rel Margarida Cantarelli j 22112006 O entendimento dominante nesta Corte Regional orienta que a simples omissão no repasse de contribuições previdenciárias não configura por si só o tipo previsto no art 168A do Código Penal Em verdade atento à vedação constitucional da prisão por dívidas este Tribunal vem reclamando esteja perfeitamente demonstrada pelo dominus litis a presença do dolo específico consubstanciado na vontade livre e consciente do agente de deixar de repassar à previdência social os montantes recolhidos dos contribuintes TRF5ª Região Inquérito 200605000413300 Rel José Maria Lucena j 22112006 A Terceira Seção desta Corte no julgamento do ERESP 331982CE pacificou entendimento de que o crime de apropriação indébita previdenciária caracterizase com a simples conduta de deixar de recolher as contribuições descontadas dos empregados sendo desnecessário o animus rem sibi habendi para a sua configuração Tratase pois de crime omissivo próprio ou puro que se aperfeiçoa independentemente do fato de o agente empregador vir a se beneficiar com os valores arrecadados de seus empregados e não repassados à Previdência Social A exigência do dolo específico tornaria praticamente impossível atingir o objetivo do legislador ao editar a norma contida no art 168A do Código Penal que é o de proteger o patrimônio público e os segurados da Previdência Social STJ REsp 501460RS Rel Min Paulo Gallotti j 2332004 Apropriação de coisa havida por erro caso fortuito ou força da natureza Art 169 Apropriarse alguém de coisa alheia vinda ao seu poder por erro caso fortuito ou força da natureza Pena detenção de 1 um mês a 1 um ano ou multa Parágrafo único Na mesma pena incorre Apropriação de tesouro I quem acha tesouro em prédio alheio e se apropria no todo ou em parte da quota a que tem direito o proprietário do prédio V arts 1264 a 1266 do CC Apropriação de coisa achada II quem acha coisa alheia perdida e dela se apropria total ou parcialmente deixando de restituíla ao dono ou legítimo possuidor ou de entregála à autoridade competente dentro no prazo de 15 quinze dias V arts 1233 a 1235 e 1237 do CC D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias No direito brasileiro em pleno século XIX o Código Criminal do Império de 1830 igualmente desconheceu essa figura penal Somente com o Código Penal de 1890 já no período republicano foi criminalizada essa conduta nos seguintes termos É crime de furto sujeito às mesmas penas e guardadas as distinções do artigo precedente 1º Apropriarse alguém de coisa alheia que venha ao seu poder por erro engano ou caso fortuito O atual Código Penal de 1940 tipifica essas condutas como espécie do gênero apropriação indébita Tratase com efeito de modalidade mais branda cuja pena cominada é de um mês a um ano Aqui a coisa não é entregue licitamente ao agente como na apropriação indébita comum mas lhe vem às mãos por erro caso fortuito ou força da natureza Na verdade o legislador brasileiro inspirouse no Código Penal Rocco de 1930 art 637 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é a inviolabilidade do patrimônio particularmente o direito de propriedade O erro o caso fortuito e a força da natureza podem transferir a posse mas em princípio não têm idoneidade para transmitir a propriedade Na hipótese de apropriação de coisa achada tutelase também a posse pois o possuidor legítimo que perder a posse da coisa tem o direito de reavêla art 521 do CC16 A apropriação indébita prevista no artigo anterior distinguese das figuras constantes neste dispositivo basicamente pelo fundamento da transferência da posse 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa sem qualquer condição especial O proprietário não pode ser sujeito ativo desse crime que contém em sua estrutura típica as elementares coisa alheia e prédio alheio assim sujeito ativo será sempre pessoa diversa do proprietário seja possuidor ou detentor independentemente de haver recebido a posse ou detenção de terceiro O condômino sócio ou coproprietário também pode ser sujeito ativo de apropriação indébita desde que não se trate de coisa fungível e a apropriação não exceda à quota que lhe cabe Sujeito passivo é igualmente qualquer pessoa física ou jurídica titular do direito patrimonial atingido pelas ações tipificadas pode ser inclusive o sócio o coerdeiro ou condômino Na hipótese de apropriação de tesouro sujeito passivo pode ser o proprietário do imóvel bem como o enfiteuta que tem o direito de uso e gozo pleno do imóvel Na hipótese de apropriação de coisa achada sujeito passivo pode ser além do proprietário o possuidor legítimo 4 Tipo objetivo adequação típica O núcleo da ação tipificada é igual ao do art 168 e tudo o que lá dissemos sobre o verbo nuclear aplicase aqui A forma contudo como o sujeito ativo entra na posse da coisa ou objeto alheio é diversa A coisa alheia não é entregue ou confiada licitamente ao agente mas vem a seu poder por erro caso fortuito ou força da natureza Erro pode ser entrega de uma coisa por outra entregar à pessoa errada supor a obrigação de entregar etc Ao erro de quem transmite deve corresponder a boafé de quem a recebe Em outros termos o erro pode incidir sobre a coisa sobre a pessoa a quem se entrega ou sobre a razão da entrega No entanto o erro sobre o valor da coisa ou seu preço é penalmente irrelevante Caso fortuito é o evento acidental que acaba conduzindo determinada coisa ou objeto a mãos indevidas equivale praticamente a força maior configurando enfim todos os fatos cujos efeitos não é possível evitar Caso fortuito e força maior têm sido historicamente objeto de grande divergência doutrinária que no entanto recusamonos a reproduzir neste espaço por sua absoluta improdutividade já que a doutrina os tem equiparado ao atribuirlhes os mesmos efeitos Força da natureza por sua vez é energia física e ativa que pode provocar mudança natural e violenta das coisas e dos objetos São exemplos dessa força o tufão o terremoto a enchente etc Acompanhamos no particular o magistério de Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 151 quando afirmava O dispositivo legal menciona o caso fortuito e a força da natureza fazendo a exemplo aliás do Código suíço uma distinção que se pode dizer desnecessária pois o caso fortuito abrange todo e qualquer acontecimento estranho na espécie à vontade do agente e do dominus Tanto é caso fortuito se a coisa alheia vem ao meu poder em consequência da queda de um avião em meu terreno quanto se foi trazida pela correnteza de uma enchente Se bois alheios por mero instinto de vagueação ou acossados pelo fogo de uma queimada entram nas minhas terras ou se peças de roupa no coradouro do meu vizinho são impelidas por um tufão até meu quintal tudo é caso fortuito O erro na entrega da coisa deve ser espontâneo e não provocado pois nessa hipótese configurarseá o crime de estelionato 5 Apropriação de tesouro A ação incriminada é apropriarse de tesouro achado isto é assenhorearse de tesouro achado em prédio alheio sem efetuar a divisão que determina a lei civil meio a meio com o proprietário do imóvel O ato de achar deve ser um acontecimento fortuito acidental involuntário sob pena de caracterizar crime de furto Achar tesouro significa encontrar um conjunto de coisas preciosas ou valiosas em local pertencente a terceira pessoa É indispensável contudo que esse conjunto de preciosidades seja encontrado acidentalmente caso contrário não haverá a obrigação de dividilo com o proprietário art 1265 do CC Com efeito se for encontrado por algum pesquisador a mando do dono ou de terceiro não autorizado pertencerá integralmente ao proprietário do imóvel e sua apropriação constituirá crime de furto Por prédio devese entender qualquer imóvel seja representado por terreno seja por edifício 51 A definição de tesouro Tesouro é o depósito antigo de moeda ou coisas preciosas enterradas ou ocultas de cujo dono não se tem notícia Tesouro é por definição coisa sem dono O Código Civil por sua vez define tesouro como o depósito antigo de coisas preciosas oculto e de cujo dono não haja memória que será dividido por igual entre o proprietário do prédio e o que achar o tesouro casualmente É indiferente que o tesouro se encontre em móvel ou imóvel desde que as demais características do conceito jurídico de tesouro estejam presentes Característico do tesouro é o fato de ser desconhecido seu proprietário O tesouro pode estar escondido no solo ou em qualquer outro local inclusive dentro de um móvel Contudo não o caracteriza o depósito natural de pedras preciosas ao contrário do tesouro aquelas constituem acessório do solo e como tais mesmo que tenham sido descobertas acidentalmente pertencem por inteiro ao dono do solo ressalvadas as exceções legais 6 Apropriação de coisa achada A ação incriminada é igualmente apropriarse só que agora de coisa perdida Não se pode confundir coisa perdida com coisa esquecida Aquela desapareceu por causa estranha e por vezes ignorada à vontade do proprietário ou possuidor que desconhece seu destino ou paradeiro a esquecida saiu da esfera de disponibilidade por um lapso de memória e teoricamente o dono saberá onde encontrála ou pelo menos tem uma noção de lugar e tempo onde e quando a perdeu O que configura o crime não é o recebimento ou encontro acidental mas a posterior apropriação da coisa alheia não a devolvendo ou recusandose a restituíla ao legítimo dono Com efeito no momento em que o sujeito se apossa da coisa achada não pratica nenhum ilícito civil ou criminal pois essa conduta não está proibida no sistema jurídico brasileiro Na realidade o crime nasce em momento posterior ou seja quando o agente deixa evidenciado o animus rem sibi habendi isto é quando motu proprio passa a se comportar em relação à coisa achada como se dono fosse 61 Coisa perdida Coisa perdida é a de que seu proprietário ou possuidor perdeu a disponibilidade ou custódia ignorando onde ela se encontra A simples perda da coisa não implica a perda do domínio perdese a posse mas não a propriedade O objeto material é a coisa perdida e não a abandonada nem a res nullius Não se confunde com coisa perdida a escondida nem a que se encontra na esfera de vigilância do dono mesmo que este não tenha condições de encontrála temporariamente objeto perdido em algum de seus aposentos etc Tampouco se pode considerar perdida coisa que o proprietário ou possuidor esqueceu na posse de outrem pois poderá reclamála a qualquer momento É indispensável que a perda da coisa seja acidental ou decorra de culpa do possuidor ou proprietário Se for perdida por ação de quem posteriormente vier a achála o crime será o de furto 611 O Código Civil impõe a obrigação de devolver coisa achada A lei civil impõe a obrigação de devolver a coisa achada art 1233 do CC e o Código Penal criminaliza a conduta de quem no prazo de quinze dias dolosamente não a devolve ou não a entrega à autoridade competente A obrigação de restituíla ao proprietário surge no momento em que este se torna conhecido Se o agente supõe por erro plenamente justificado que a coisa que encontrou está abandonada e não perdida não haverá dolo na apropriação art 20 lº do CP Pratica o crime de apropriação de coisa achada por exemplo o titular de conta bancária que teve ciência de dinheiro nela depositado que não lhe pertencia mas mesmo assim sacao e não o restitui configurase com efeito o crime de apropriação de coisa havida por erro art 169 caput do CP 62 Elemento temporal quinze dias Este elemento deve ser bem interpretado para evitar confusões com sérios reflexos nas consequências materiais desse equívoco É equivocada a afirmativa de que o legislador previu um prazo para o crime consumarse uma vez que o prazo de quinze dias constitui uma elementar típica Sua previsão legal tem sentido apenas político criminal objetivando proporcionar ao indivíduo tempo suficiente para efetuar a devolução ou entrega da coisa alheia Somente se configura a apropriação de coisa achada após ultrapassado o prazo legal de quinze dias sem que o achador devolva a coisa ao dono ou a entregue à Polícia Assim não excedida a faixa legal de quinze dias nem se tipifica o crime A obrigação de devolver a res perdida na verdade surge desde o momento em que o agente a encontra e tem ciência desse estado da coisa encontrada A autoridade competente que tiver conhecimento desse fato deve efetuar a busca e apreensão embora crime não haja a infração civil operase a partir do momento em que o achador retém a coisa achada em seu poder o crime contudo somente se configurará a partir do momento em que se completarem quinze dias sem a entrega da coisa achada à autoridade competente pois somente a partir daí a apropriação se torna penalmente relevante 7 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é o dolo constituído pela vontade livre e consciente de apropriarse de coisa alheia nas hipóteses referidas no dispositivo em exame Fazse necessário o especial fim de obter vantagem em proveito próprio ou alheio O elemento subjetivo na apropriação de tesouro é igualmente o dolo representado pela vontade de apropriarse dele e o especial fim da obtenção de vantagem constituída pela metade a que faz jus o dono do prédio onde o tesouro foi encontrado Na apropriação de tesouro é indispensável que o agente tenha consciência da obrigação de dividir em igualdade de condições com o proprietário do prédio O erro ou desconhecimento dessa obrigação elementar típica constitui erro de tipo ao contrário do que afirmou no passado equivocadamente Heleno Fragoso O simples deixar de entregar a coisa achada à autoridade competente no prazo de quinze dias ou de devolvêla ao proprietário que se tornou conhecido é insuficiente para tipificar o crime de apropriação de coisa achada é indispensável que a omissão na entrega ou devolução seja orientada pelo animus rem sibi habendi 8 Consumação e tentativa A consumação como no artigo anterior é de difícil precisão pois depende em última análise de uma atitude subjetiva Consumase enfim com a inversão da natureza da posse caracterizada por ato demonstrativo de disposição da coisa alheia como própria ou pela negativa em devolvêla A consumação da apropriação de tesouro ou de coisa achada não ocorre no momento ou no lugar em que o tesouro ou a coisa foram encontrados mas sim no momento em que o agente se apropria de tais objetos Na denúncia deve constar que foi superado o prazo 15 dias para devolução ou entrega da coisa Como crime material a exemplo do que dissemos no capítulo anterior a tentativa é doutrinariamente possível embora de difícil configuração apenas casuisticamente se poderá definir sua ocorrência A dificuldade concreta de sua comprovação não é por si só motivo suficiente para afastar a possibilidade de sua ocorrência Não se desconhece é verdade que sua comprovação depende da objetivação da subjetividade possessória do sujeito ativo contudo a exteriorização da intenção daquele permitirá a valoração da natureza do animus com que mantém a coisa alheia Luiz Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 488 filiase modernamente à corrente que não admite a tentativa 9 Minorante do pequeno valor nos crimes de apropriação indébita Nos crimes de apropriação indébita em suas diversas modalidades arts 168 168A e 169 é aplicável a minorante prevista no art 155 2º do Código quando o criminoso for primário e de pequeno valor a coisa apropriada A definição do que é coisa de pequeno valor não tem ressonância pacífica quer na doutrina quer na jurisprudência Para se lhe dar interpretação mais adequada devemse ter em consideração as peculiaridades e as circunstâncias pessoais e locais onde o fato é praticado O art 170 determina que se aplique essa disposição às diversas espécies de apropriação indébita Presentes esses dois requisitos a pena de reclusão pode ser substituída pela de detenção somente pela pena de multa ou apenas ser reduzida de um a dois terços Em outros termos o pequeno desvalor do resultado e a primariedade do agente recomendam menor reprovação deste determinando em obediência ao princípio da proporcionalidade a redução da sanção para adequála à menor gravidade do fato a exemplo do que ocorre no crime de furto 91 Pequeno valor definição doutrináriojurisprudencial A doutrina em geral tem definido como pequeno valor aquele cuja perda pode ser suportada sem maiores dificuldades pela generalidade das pessoas Ao rico lembrava Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 243 porque talvez nem perceberá sua falta ao pobre porque na sua penúria de pouco lhe valerá Embora nos desagrade a fixação de determinado quantum por sua relatividade ante a necessidade de um paradigma aceitamos a orientação majoritária segundo a qual de pequeno valor é a coisa que não ultrapassa o equivalente ao salário mínimo Contudo na seara tributária a própria receita encarregouse de estabelecer valores muito superiores para os quais não admite a execução fiscal no momento fixados em R 500000 Diante desse entendimento da receita é natural que se considere nos crimes fiscais ou tributários não apenas pequeno prejuízo mas valor insignificante para excluir a própria tipicidade da conduta segundo o princípio da insignificância 92 Pequeno valor da coisa alheia e pequeno prejuízo Para fins de aplicação do disposto no 2º do art 155 invocado pelo art 170 não se identificam pequeno valor da coisa alheia e pequeno prejuízo resultante da ação delituosa Quando o legislador deseja considerar o prejuízo sofrido pela vítima o faz expressamente como no estelionato art 171 1º Assim o valor da coisa alheia achada ou da contribuição previdenciária deve ser medido ao tempo da apropriação recordandose sempre que ele não se identifica com o pequeno prejuízo que dela resultar Sintetizando a primariedade e o pequeno valor da coisa alheia nas modalidades de apropriação indébita permitem a substituição da pena de reclusão por detenção reduzila de um a dois terços ou aplicar somente multa em todas as diversas espécies de apropriação indébita tipificadas nos arts 168 168A e 169 Pequeno valor não se confunde com pequeno prejuízo art 171 1º Convém destacar por fim que tanto o art 170 como o 2º do art 155 autorizam a aplicação do benefício da minorante quando o condenado for primário e de pequeno valor o objeto do crime sem qualquer referência aos antecedentes 10 Pena e ação penal As penas cominadas são alternativamente detenção de um mês a um ano ou multa O art 170 recomenda a especial redução da pena em um terço quando se tratar de agente primário e de pequeno valor a coisa apropriada Coerente com o que sustentamos ao examinar o furto de pequeno valor admitimos sua aplicação às hipóteses elencadas no 1º do art 168 A ação penal é pública incondicionada salvo nas hipóteses do art 182 quando será condicionada à representação J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Apropriação de coisa achada Art 169 II do Código Penal A simples comparação entre a expressão pecuniária do bem jurídico atingido pela conduta e o curso do trâmite processual ao Poder Público não atrai o conceito de insignificância para a esfera penal TJRS Recurso Crime 71001551944 Rel Alberto Delgado Neto j 31 32008 Apropriação de coisa achada Art 169 inciso II do Código Penal Telefone celular encontrado em estrada Prova acima de toda a dúvida razoável Evidence beyond a reasonable Não ocorrência Absolvição TJRS Recurso Crime 71001525567 Rel Clademir José Ceolin Missaggia j 2112008 Apropriação indébita Emendatio libelli em 2º grau para alterar a capitulação para o delito de apropriação de coisa havida por caso fortuito Art 169 do CP O réu foi condenado pelo delito de apropriação indébita porquanto vendeu animal de propriedade de seu vizinho No entanto não houve a entrega do bem por parte do proprietário pois o boi passou para o campo do réu porque a cerca encontravase em más condições Dessa forma a conduta descrita na inicial configura o delito previsto no art 169 do CP e não apropriação indébita Assim alterada a capitulação e provadas a materialidade e a autoria do delito o acusado restou condenado pelo delito previsto no art 169 do CP à pena de 15 diasmulta no valor unitário de 15 do salário mínimo vigente à data do fato De ofício declarada extinta a punibilidade pela prescrição TJRS Apelação 70011588308 Rel Lúcia de Fátima Cerveira j 184 2007 Apropriação de coisa havida por erro Tratandose de crime permanente eis que a sua consumação se prolonga no tempo temse que o prazo prescricional iniciase na data da cessação da indevida apropriação da coisa havida por erro Não transcorrido o prazo de 4 anos entre nenhum dos marcos legais interruptivos previstos em lei em feito cujo delito tem pena máxima prevista em 1 ano é imprópria a alegação de ocorrência da extinção da punibilidade pela prescrição da pena in abstrato STJ HC 15403SP Rel Min Gilson Dipp j 2592001 Art 170 Nos crimes previstos neste Capítulo aplicase o disposto no art 155 2º D O U T R I N A Nos crimes de apropriação indébita em suas diversas modalidades arts 168 e 169 é aplicável o privilégio previsto no art 155 2º deste Código quando o criminoso for primário e de pequeno valor a coisa apropriada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Confusão acerca dos conceitos de pequeno valor com o de ausência de prejuízo esta última não contemplada como condição privilegiadora aplicável aos delitos de apropriação indébita STJ REsp 628147PR Rel Min Gilson Dipp j 2192004 Apropriação indébita art 168 1º III do Código Penal Não é de ser considerada em caso como o sub judice a figura privilegiada do art 170 do Código Penal porquanto a exemplo do que ocorre com o furto privilegiado art 155 2º não se identificam os conceitos de pequeno valor da coisa apropriada e de pequeno ou nenhum prejuízo da ação delituosa Até porque a restituição só se fez por inteiro após o resultado de uma ação civil de prestação de contas STF HC 75051SP Rel Min Sydney Sanches j 2751997 Capítulo VI Do Estelionato e outras Fraudes Estelionato Art 171 Obter para si ou para outrem vantagem ilícita em prejuízo alheio induzindo ou mantendo alguém em erro mediante artifício ardil ou qualquer outro meio fraudulento Pena reclusão de 1 um a 5 cinco anos e multa V arts 289 a 302 e 304 do CP V art 6º da Lei n 749286 crimes contra o Sistema Financeiro Nacional V Lei n 807890 Código de Defesa do Consumidor V Súmulas 17 48 e 107 do STJ 1º Se o criminoso é primário e é de pequeno valor o prejuízo o juiz pode aplicar a pena conforme o disposto no art 155 2º V art 172 do CPP 2º Nas mesmas penas incorre quem Disposição de coisa alheia como própria I vende permuta dá em pagamento em locação ou em garantia coisa alheia como própria V arts 356 a 359 447 a 457 481 533 e 565 a 568 do CC V art 5º da Lei n 749286 crimes contra o Sistema Financeiro Nacional Alienação ou oneração fraudulenta de coisa própria II vende permuta dá em pagamento ou em garantia coisa própria inalienável gravada de ônus ou litigiosa ou imóvel que prometeu vender a terceiro mediante pagamento em prestações silenciando sobre qualquer dessas circunstâncias V arts 652 1225 1419 a 1421 e 1911 do CC Defraudação de penhor III defrauda mediante alienação não consentida pelo credor ou por outro modo a garantia pignoratícia quando tem a posse do objeto empenhado V art 170 V da CF V arts 1431 1433 1435 1467 a 1471 do CC Fraude na entrega de coisa IV defrauda substância qualidade ou quantidade de coisa que deve entregar a alguém Fraude para recebimento de indenização ou valor de seguro V destrói total ou parcialmente ou oculta coisa própria ou lesa o próprio corpo ou a saúde ou agrava as consequências da lesão ou doença com o intuito de haver indenização ou valor de seguro V art 765 do CC Fraude no pagamento por meio de cheque VI emite cheque sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado ou lhe frustra o pagamento V art 65 da Lei n 735785 cheque V Súmulas 246 521 e 554 do STF 3º A pena aumentase de um terço se o crime é cometido em detrimento de entidade de direito público ou de instituto de economia popular assistência social ou beneficência V Súmula 24 do STJ D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Nas Ordenações Filipinas o estelionato denominouse burla ou inliço Livro V Título 665 e lhe era cominada a pena de morte quando o prejuízo fosse superior a vinte milréis O Código Criminal do Império 1830 adotou o nomen juris estelionato prevendo várias figuras além da seguinte descrição genérica todo e qualquer artifício fraudulento pelo qual se obtenha de outrem toda a sua fortuna ou parte dela ou quaisquer títulos O Código Penal republicano 1890 seguiu a mesma orientação casuística tipificando onze figuras de estelionato incluindo uma modalidade genérica nos seguintes termos usar de artifício para surpreender a boafé de outrem iludir a sua vigilância ou ganharlhe a confiança induzindoo em erro ou engano por esses e outros meios astuciosos procurar para si lucro ou proveito 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é a inviolabilidade do patrimônio particularmente em relação aos atentados que podem ser praticados mediante fraude Tutelase tanto o interesse social representado pela confiança recíproca que deve presidir os relacionamentos patrimoniais individuais e comerciais quanto o interesse público de reprimir a fraude causadora de dano alheio O crime de estelionato destacava Manzini Trattato di Diritto Penale italiano p 527 não é considerado como um fato limitado à agressão do patrimônio de Tício ou de Caio mas antes como manifestação de delinquência que violou o preceito legislativo o qual veda o servirse da fraude para conseguir proveito injusto com dano alheio quem quer que seja a pessoa prejudicada em concreto O estelionatário é sempre um criminoso mesmo que tenha fraudado em relações que por si mesmas não merecem proteção jurídica porque sua ação é em qualquer caso moral e juridicamente ilícita 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo do crime de estelionato pode ser qualquer pessoa sem qualquer condição especial crime comum O concurso eventual de pessoas em qualquer de suas formas coautoria e participação pode facilmente se configurar Na descrição típica o legislador destaca que a vantagem indevida pode ser para si o sujeito ativo ou para outrem Essa terceira pessoa pode ser coautor ou partícipe do crime sendo alcançada pelo concurso de pessoas art 29 do CP Contudo nada impede que o outrem beneficiário do produto do estelionato seja terceiro estranho e insciente do crime isto é sem qualquer participação quer em seu planejamento quer em sua execução se ignorar inclusive a origem criminosa da vantagem que se lhe atribui não será passível de punição Sujeito passivo pode ser igualmente qualquer pessoa física ou jurídica devese destacar que pode haver dois sujeitos passivos quando por exemplo a pessoa enganada for diversa da que sofre o prejuízo o empregado sofre o golpe fraude do agente mas quem suporta o prejuízo da ação é o empregador A vítima efetiva na verdade é quem sofre o dano material decorrente da ação como destacava Roberto Lyra Estelionato in Repertório enciclopédico do Direito Brasileiro Rio de Janeiro Borsoi sd v 21 p 53 Sujeito passivo da ação do erro é quem sofre sua materialidade o patrimônio afetado pode ser de outrem que experimenta o resultado o prejuízo Em verdade não se pode perder de vista que o bem jurídico protegido é o patrimônio assim sujeito passivo é quem sofre a lesão patrimonial A necessidade do nexo causal entre a fraude e a lesão patrimonial não significa devese reconhecer que ambos devam ser suportados pela mesma pessoa 31 Criança e débil mental impossibilidade Para a tipificação do crime de estelionato é indispensável a existência de fraude criando ou mantendo alguém em erro No entanto para a vítima poder ser enganada é indispensável que tenha capacidade de discernimento Nesses casos podese dizer há impropriedade absoluta do objeto do erro pois um dos elementos do estelionato é o emprego de meio fraudulento para enganar ou manter a vítima em erro como esses incapazes não têm capacidade de entender e de querer não podem ser ludibriados logo tampouco podem ser sujeitos passivos desse crime Assim se a vítima não tiver capacidade de autodeterminação como a criança ou o débil mental o crime será o do art 173 do CP Se no entanto não tiver capacidade natural de ser iludida como por exemplo ébrio em estado de coma o crime será o de furto 4 Fraude civil e fraude penal ontologicamente iguais Nélson Hungria estabeleceu a seguinte distinção entre ilícito penal e ilícito civil Ilícito penal é a violação da ordem jurídica contra a qual pela sua intensidade ou gravidade a única sanção adequada é a pena e ilícito civil é a violação da ordem jurídica para cuja debelação bastam as sanções atenuadas da indenização da execução forçada ou in natura da restituição ao status quo ante da breve prisão coercitiva da anulação do ato etc grifos do original Comerciar é a arte de negociar de tirar vantagem econômica do negócio ou qualquer transação que se realize esse aspecto encerra um jogo de inteligência de astúcia uma espécie de brincadeira de escondeesconde donde resultou a expressão popular de que o segredo é a alma do negócio Em outros termos é normal nas transações comerciais ou civis certa dose de malícia entre as partes que com habilidade procuram ocultar eventuais deficiências de seu produto para assim realizar um negócio mais lucrativo ou vantajoso Não era outro o entendimento de Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 380 que reconhecia Se assim não fosse raro seria o negócio ou a transação em que se não divisaria fraude punível pois neles são frequentes os pequenos ardis os ligeiros artifícios os leves expedientes visando a resultado rendoso 41 Atos maliciosos de comércio não se confundem com a burla fraudulenta A questão fundamental é afinal quando essa malícia ou habilidade ultrapassa os limites do moralmente legítimo para penetrar no campo do ilícito do proibido do engodo ou da indução ao erro Na verdade a ilicitude começa quando se extrapolam os limites da malícia e se utilizam o engano e o induzimento a erro para a obtenção de vantagem em prejuízo de alguém No entanto nessas circunstâncias se estiver caracterizado o engano a burla ainda assim pode configurarse não mais que a fraude civil que terá como consequência a anulação do contrato com as respectivas perdas e danos Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 446 destacava um exemplo muito elucidativo Se alguém vende um automóvel silenciando sobre defeito essencial por exemplo quebra da transmissão isto será uma fraude civil que anulará o contrato Se alguém todavia vende um automóvel sem motor iludindo o adquirente praticará um estelionato ou seja uma fraude penal Com efeito atos maliciosos de comércio que não atingem o nível de burla embora irregulares não constituem estelionato para o qual é insuficiente a habitual sagacidade do mundo dos negócios 42 Critérios para distinguir fraude civil e fraude penal Como se distingue a fraude civil da fraude penal Há diferença essencial entre uma e outra Existem critérios seguros para apurála Doutrina e jurisprudência por longo tempo debateramse na tentativa de encontrar critérios seguros que permitissem detectar a distinção entre as espécies ou natureza da fraude Carmignani retrocedendo à concepção romana afirmou que na fraude penal deveria existir grande perversidade e impostura A famosa teoria miseenscène atribuída a um autor alemão foi desenvolvida pelos franceses e recepcionada por Carrara 2344 Para os defensores dessa concepção a fraude civil pode revestirse de simples mentira ou silêncio enquanto a fraude penal exigiria determinada artificiosidade para ludibriar a vítima Essa teoria também perdeu atualidade e adeptos pois a distinção da natureza da fraude não reside apenas no meio ou modo de execução Após demorada enumeração de teorias Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 191 acaba concluindo O critério que nos parece menos precário é o que pode ser assim fixado há quase sempre fraude penal quando relativamente idôneo sic o meio iludente se descobre na investigação retrospectiva do fato a ideia preconcebida o propósito ab initio da frustração do equivalente econômico Tirante tal hipótese de ardil grosseiro a que a vítima se tenha rendido por indesculpável inadvertência ou omissão de sua habitual prudência o inadimplemento preordenado ou preconcebido é talvez o menos incerto dos sinais orientadores na fixação de uma linha divisória nesse terreno contestado da fraude 43 Teorias explicativas da distinção entre fraude civil e penal Várias teorias enfim objetivas e subjetivas pretenderam explicar a distinção entre as duas espécies de fraudes civil e penal Os argumentos no entanto não apresentaram suficientes e convincentes conteúdos científicos que ancorassem as conclusões que sugeriam levando a moderna doutrina a recusálas Na verdade não há diferença ontológica entre fraude civil e fraude penal sendo insuficientes todas as teorias que sem negarlhes importância procuraram estabelecer in abstracto um princípio que as distinguisse com segurança não se pode responsavelmente firmar a priori um juízo definitivo sobre o tema Fraude é fraude em qualquer espécie de ilicitude civil ou penal repousando eventual diferença entre ambas tão somente em seu grau de intensidade Na fraude civil objetivase o lucro do próprio negócio enquanto na fraude penal se visa o lucro ilícito A inexistência de dano civil impede que se fale em prejuízo ou dano penal Essa distinção além de complexa não é nada pacífica Não há critério científico que abstrata ou concretamente distinga com segurança uma fraude da outra Concluindo somente razões políticocriminais podem justificar a separação em termos de direito positivo entre fraude civil e fraude penal Essa seleção mesmo objetivando atender ao interesse social não pode adequarse a um padrão abstrato de irretocável conteúdo e segurança científicos Por isso o máximo que se pode tolerar é a fixação de critérios elucidativos que permitam uma segura opção do aplicador da lei 5 Tipo objetivo adequação típica A ação tipificada é obter vantagem ilícita para si ou para outrem em prejuízo alheio induzindo ou mantendo alguém em erro mediante artifício ardil ou qualquer outro meio fraudulento A característica fundamental do estelionato é a fraude utilizada pelo agente para induzir ou manter a vítima em erro com a finalidade de obter vantagem patrimonial ilícita No estelionato há dupla relação causal primeiro a vítima é enganada mediante fraude sendo esta a causa e o engano o efeito segundo nova relação causal entre o erro como causa e a obtenção de vantagem ilícita e o respectivo prejuízo como efeito Na verdade é indispensável que a vantagem obtida além de ilícita decorra de erro produzido pelo agente isto é que aquela seja consequência deste Não basta a existência do erro decorrente da fraude sendo necessário que da ação resulte vantagem ilícita e prejuízo patrimonial Ademais à vantagem ilícita deve corresponder um prejuízo alheio A configuração do crime de estelionato exige a presença dos seguintes requisitos fundamentais 1 emprego de artifício ardil ou qualquer outro meio fraudulento 2 induzimento ou manutenção da vítima em erro 3 obtenção de vantagem patrimonial ilícita em prejuízo alheio do enganado ou de terceiro Façamos um sucinto exame de cada um 51 Emprego de artifício ardil ou qualquer outro meio fraudulento Para enganar alguém induzindoo ou mantendoo em erro podese empregar artifício ardil ou qualquer outro meio fraudulento Artifício é toda simulação ou dissimulação idônea para induzir uma pessoa em erro levandoa à percepção de uma falsa aparência da realidade ardil é a trama o estratagema a astúcia qualquer outro meio fraudulento é uma fórmula genérica para admitir qualquer espécie de fraude que possa enganar a vítima Com essa expressão genérica tornase desnecessária a precisão conceitual de artifício e ardil que são meramente exemplificativos da fraude penal tratandose de crime de forma livre Significa poderse afirmar ademais que se o Ministério Público imputar a prática do fato delituoso mediante artifício e a final a prova dos autos demonstrar que se trata de ardil não haverá nenhum prejuízo para a defesa e tampouco se poderá afirmar que o Parquet pecou por desconhecimento técnicodogmático É indispensável que o meio fraudulento seja suficientemente idôneo para enganar a vítima isto é para induzila a erro A inidoneidade do meio no entanto pode ser relativa ou absoluta sendo relativamente inidôneo o meio fraudulento para enganar a vítima poderá configurar se tentativa de estelionato contudo se a inidoneidade for absoluta tratarseá de crime impossível por absoluta ineficácia do meio empregado art 17 52 Induzimento ou manutenção da vítima em erro Induzir tem o significado de o agente incutir ou persuadir alguém com sua ação Examinando o significado desse verbo na tipificação do crime de induzimento ao suicídio fizemos as seguintes considerações Induzir significa suscitar o surgimento de uma ideia tomar a iniciativa intelectual fazer surgir no pensamento de alguém uma ideia até então inexistente Por meio da indução o indutor anula a vontade de alguém Mutatis mutandis aplicamse os mesmos conceitos para o caso de estelionato No entanto nesta figura não se emprega o verbo instigar como faz naquele crime contra a vida preferindo o verbo manter que quer dizer que a vítima já se encontra em erro limitandose o agente com sua ação fraudulenta a não alterar os fatos Contudo se a conduta do agente for meramente omissiva ou não revestirse de fraude ainda que comissiva não se poderá falar em crime de estelionato Erro é a falsa representação ou avaliação equivocada da realidade A vítima supõe por erro tratarse de uma realidade quando na verdade está diante de outra faz em razão do erro um juízo equivocado da relação proposta pelo agente A conduta fraudulenta do sujeito leva a vítima a incorrer em erro O agente coloca ou mantém a vítima numa situação enganosa fazendo parecer realidade o que efetivamente não é Ex o autor finge manter uma agência de venda de carros recolhe o dinheiro da vítima prometendo lhe que entregará o bem almejado e desaparece Nucci Código Penal comentado p 561 Essa conduta delituosa pode concretizarse de duas formas induzindo a vítima a erro ou mantendoa Na primeira hipótese a vítima em razão do estratagema do ardil ou engodo utilizado pelo agente é levada ao erro na segunda aquela já se encontra em erro voluntário ou não limitandose a ação do sujeito ativo a manter o ofendido na situação equivocada em que se encontra Em outros termos a obtenção da vantagem ou proveito ilícito decorre da circunstância de o agente induzir a vítima ao erro ou de mantêla no estado de erro em que se encontra Enfim é possível que o agente provoque a incursão da vítima em erro ou apenas se aproveite dessa situação em que a vítima se encontra De qualquer sorte nas duas modalidades comete o crime de estelionato Mas parecenos importante destacar mesmo na segunda hipótese a conduta é comissiva pois para manter o agente deve agir positivamente 53 Obtenção de vantagem ilícita em prejuízo alheio elemento normativo A conduta nuclear por excelência está representada pelo verbo obter isto é conseguir proveito ou vantagem ilícita em razão de engano provocado no ofendido Para a configuração do estelionato é indispensável que o agente obtenha proveito indevido em prejuízo alheio Exige o tipo penal a produção de duplo resultado vantagem ilícita e prejuízo alheio que examinaremos logo a seguir Estamos diante de um crime que apresenta grande complexidade estrutural tipológica pela riqueza de elementos objetivos normativos e subjetivos que o compõem destacandose de plano a duplicidade de nexo causal e de resultados A duplicidade de nexo causal está representada por dupla relação de causa e efeito num primeiro momento funciona a fraude como causa e o engano decorrente do ardil como efeito no momento subsequente o erro consequente do engano como causa e a obtenção da vantagem indevida e o dano patrimonial correspondente esses dois representando a segunda duplicidade Tratase com efeito de crime de resultado duplo uma vez que para se consumar exige a obtenção de vantagem ilícita de um lado e a ocorrência efetiva de um prejuízo para a vítima de outro A ausência de qualquer desses resultados descaracteriza o estelionato consumado restando em princípio a figura da tentativa Vantagem ilícita é todo e qualquer proveito ou benefício contrário à ordem jurídica isto é não permitido por lei A obtenção da vantagem ilícita ao contrário do que ocorre nos crimes de furto e de apropriação indébita é elemento constitutivo do estelionato A simples imoralidade da vantagem é insuficiente para caracterizar essa elementar típica Prejuízo alheio por sua vez significa perda dano diminuição de lucro ou de patrimônio pertencente a outrem 54 À vantagem ilícita deve corresponder um prejuízo alheio À vantagem ilícita deve corresponder simultaneamente um prejuízo alheio a ausência de qualquer dos dois descaracteriza o crime de estelionato Na ausência dessa correspondência isto é se o sujeito ativo obtiver a vantagem ilícita mas não causar prejuízo a terceiro faltará a elementar típica em prejuízo alheio Nessa hipótese não se pode afirmar que houve estelionato fazse necessário que se examine a possibilidade teórica da ocorrência da tentativa Contudo a ausência de prejuízo por si só não é suficiente para caracterizar a tentativa ao contrário do entendimento esposado por Damásio de Jesus Direito Penal v 2 p 427 Na verdade somente a casuística pode oferecernos com mais segurança a resposta correta mas de plano podese assegurar que é indispensável nesses casos examinar se a não ocorrência de prejuízo alheio foi provocada por causas estranhas à vontade do agente art 14 II Ora se esse elemento da tentativa não estiver presente não se pode falar na figura tentada de estelionato São indiferentes os meios utilizados pelo agente tanto para o induzimento da vítima em erro quanto para sua manutenção Em qualquer das hipóteses é necessária uma influência decisiva no processo de formação de vontade da vítima abrangendo os aspectos volitivos e intelectivos 6 Vantagem ilícita irrelevância da natureza econômica Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 390 examinando o crime de extorsão mediante sequestro professava O Código fala em qualquer vantagem não podendo o adjetivo referirse à natureza desta pois ainda aqui evidentemente ela há de ser como no art 158 econômica sob pena de não haver razão para o delito ser classificado no presente título No entanto o mesmo Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 390 em sua análise da elementar vantagem ilícita contida no crime de estelionato parece ter esquecido que essa infração penal também está classificada no Título dos Crimes contra o Patrimônio ao asseverar que Essa vantagem pode não ser econômica e isso é claramente indicado por nossa lei pois enquanto que na extorsão ela fala em indevida vantagem econômica aqui menciona apenas a vantagem ilícita É aliás opinião prevalente na doutrina Nessa linha de Magalhães Noronha com posição não muito clara Luiz Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 413 na atualidade referindose à extorsão mediante sequestro leciona No que tange à vantagem descrita no tipo simples interpretação do dispositivo induziria à conclusão de que não deva ser necessariamente econômica Contudo outro deve ser o entendimento De fato a extorsão está encartada entre os delitos contra o patrimônio sendo o delitofim e no sequestro apesar de o próprio tipo não especificar a natureza da vantagem parece indefensável entendimento diverso Em relação ao estelionato referindose à elementar vantagem ilícita Regis Prado sustenta Curso de Direito Penal brasileiro p 501 Prevalece o entendimento doutrinário de que a referida vantagem não necessita ser econômica já que o legislador não restringiu o seu alcance como o fez no tipo que define o crime de extorsão no qual empregou a expressão indevida vantagem econômica 61 Nosso entendimento irrelevância da natureza da vantagem Examinando o mesmo tema no crime de extorsão mediante sequestro fizemos a seguinte afirmação Preferimos contudo adotar outra orientação sempre comprometida com a segurança dogmática da tipicidade estrita naquela linha que o próprio Magalhães Noronha gostava de repetir de que a lei não contém palavras inúteis mas que também não admite acrescentamos a inclusão de outras não contidas no texto legal Coerente jurídica e tecnicamente correto o velho magistério de Bento de Faria Código Penal brasileiro p 63 que pontificava A vantagem exigida para restituição da liberdade ou como preço do resgate pode consistir em dinheiro ou qualquer outra utilidade pouco importando a forma da exigência Adotamos esse entendimento pelos fundamentos que passamos a expor Curiosamente no entanto na descrição desse tipo penal extorsão mediante sequestro contrariamente ao que fez na constituição do crime anterior extorsão que seria digamos o tipo matriz do crime extorsivo o legislador brasileiro não inseriu na descrição típica a elementar normativa indevida vantagem econômica Poderia têla incluído não o fez Certamente não terá sido por esquecimento uma vez que acabara de descrever tipo similar com sua inclusão art 158 Preferiu no entanto adotar a locução qualquer vantagem sem adjetivála provavelmente para não restringir seu alcance Por tudo isso em coerência com o entendimento que esposamos sobre a locução qualquer vantagem que acabamos de transcrever sustentamos que a vantagem ilícita elementar do crime de estelionato pelas mesmas razões não precisa ser necessariamente de natureza econômica O argumento de que a natureza econômica da vantagem é necessária pelo fato de o estelionato estar localizado no Título que disciplina os crimes contra o patrimônio além de inconsistente é equivocado Uma coisa não tem nada que ver com a outra os crimes contra o patrimônio protegem a inviolabilidade patrimonial da sociedade em geral e da vítima em particular o que não se confunde com a vantagem ilícita conseguida pelo agente Por isso não é a vantagem obtida que deve ter natureza econômica o prejuízo sofrido pela vítima é que deve ter essa qualidade 62 O prejuízo alheio além de patrimonial deve ser concreto O prejuízo alheio além de patrimonial isto é economicamente apreciável deve ser real concreto não podendo ser meramente potencial Prejuízo destacava Magalhães Noronha é sinônimo de dano e como o crime é contra o patrimônio esse dano há de ser patrimonial Aqui se justifica essa interpretação pois está de acordo com o bem jurídico tutelado que é a inviolabilidade do patrimônio alheio Elucidativo nesse particular o magistério de Sebastian Soler Derecho Penal argentino p 356 Prejuízo patrimonial não quer dizer somente prejuízo pecuniário a disposição tomada pode consistir na entrega de uma soma em dinheiro de uma coisa móvel ou imóvel de um direito e também de um trabalho que se entenda retribuído ou de um serviço tarifado Pode também consistir na renúncia a um direito que positivamente se tem Deve tratarse em todo caso de um valor economicamente apreciável sobre o qual incida o direito de propriedade no sentido amplo em que tal direito é entendido pela lei penal 63 A vantagem deve ser injusta embora não precise ser econômica Por fim a vantagem tem de ser injusta ilegal indevida Se for justa estará afastada a figura do estelionato podendo configurar em tese exercício arbitrário das próprias razões art 345 do CP Quando a lei quer limitar a espécie de vantagem usa o elemento normativo indevida injusta sem justa causa ilegal como destacamos em inúmeras passagens deste trabalho Assim havendo a fraude para enganar e obter vantagem ilícita para si ou para outrem não importa a natureza econômica ou não Contudo quanto à espécie é diferente deve ser injusta Concluindo a vantagem ilícita não precisa ter natureza econômica mas deve necessariamente ser injusta ao passo que o prejuízo alheio em razão do bem jurídico violado deve ser economicamente apreciável 7 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo geral do estelionato é o dolo representado pela vontade livre e consciente de ludibriar alguém por qualquer meio fraudulento para obter vantagem indevida em prejuízo de outrem Deve abranger não apenas a ação como também o meio fraudulento a vantagem indevida e o prejuízo alheio Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 2256 a seu tempo já chamava a atenção para esse aspecto Não existe o crime sem a vontade conscientemente dirigida à astúcia mala que provoca ou mantém o erro alheio e à correlativa locupletação ilícita em detrimento de outrem O dolo na primeira figura induzir em erro deve anteceder o emprego do meio fraudulento e a produção dos resultados vantagem ilícita e prejuízo alheio Na segunda figura manter em erro o dolo é concomitante ao referido erro constatada a existência do erro o dolo consiste exatamente em sua manutenção É necessário que o agente tenha consciência de que obtém uma vantagem indevida visto que se for devida legal ou justa não se cuidará de estelionato mas teoricamente de exercício arbitrário das próprias razões art 345 O erro sobre a justiça ou legalidade da vantagem constitui erro de tipo pois incide sobre uma elementar típica 71 Elemento subjetivo especial obter vantagem ilícita Fazse necessário ainda o elemento subjetivo especial do tipo constituído pelo especial fim de obter qualquer vantagem ilícita para si ou para outrem A simples finalidade de produzir dano patrimonial ou prejuízo a alguém sem visar a obtenção de proveito injusto não caracteriza o estelionato Não há previsão de modalidade culposa de estelionato a despeito da possibilidade de alguém ser induzido ou mantido em erro por imprudência ou negligência 8 Consumação e tentativa 81 Consumação do estelionato Consumase o estelionato em sua forma fundamental no momento e no lugar em que o agente obtém o proveito a que corresponde o prejuízo alheio Na verdade é indispensável que a vantagem obtida além de indevida decorra do erro produzido pelo agente isto é que aquela seja consequência deste Não basta a existência do erro decorrente da fraude sendo necessário que da ação resulte vantagem ilícita e prejuízo patrimonial de outrem Com efeito à vantagem ilícita deve corresponder um prejuízo alheio numa relação de causa e efeito Em outros termos não se pode falar em consumação sem a presença do binômio proveito ilícitoprejuízo alheio 82 Tentativa de estelionato Tratandose de crime material que admite seu fracionamento é perfeitamente admissível a tentativa uma vez que o iter criminis pode ser interrompido por causas estranhas à vontade do agente Para o êxito da fraude é necessário que o meio fraudulento seja suficientemente idôneo para enganar a vítima isto é para induzila a erro A inidoneidade do meio no entanto pode ser relativa ou absoluta sendo relativamente inidôneo o meio fraudulento para enganar a vítima poderá configurarse tentativa de estelionato se estiverem presentes os demais requisitos contudo se a inidoneidade for absoluta tratarseá de crime impossível art 17 No estelionato crime que requer a cooperação da vítima o início de sua execução se dá com o engano da vítima Quando o agente não consegue enganar a vítima o simples emprego de artifício ou ardil caracteriza apenas a prática de atos preparatórios não se podendo cogitar de tentativa de estelionato Com efeito não caracteriza estelionato a obtenção de vantagem ilícita em prejuízo alheio se a despeito de comprovada a autoria o meio empregado pelo agente for ineficaz para induzir ou manter a vítima em erro 9 Estelionato e falsidade Há quatro orientações distintas quando o agente se utiliza do falsum como meio para a prática do estelionato 1 O estelionato absorve a falsidade quando esta for o meio fraudulento utilizado para a prática do crimefim que é o estelionato O Superior Tribunal de Justiça sumulou essa orientação nos seguintes termos Quando o falso se exaure no estelionato sem mais potencialidade lesiva é por este absorvido Súmula 17 2 Há concurso formal entre estelionato e o crime de falsum para essa corrente é indiferente a espécie ou natureza da falsidade material ideológica documento público ou particular ou simples uso de documento falso STF RTJ 11770 TRF da 4ª Região DJU 591990 p 201045 3 O crime de falso prevalece sobre o estelionato mas somente quando se tratar de falsidade de documento público cuja pena é superior à do estelionato TRF da 1ª Região DJU 2071993 p 28577 4 Há concurso material para esta corrente é indiferente que a falsidade seja de documento público ou particular TJSP RJTJSP 85366 10 Estelionato privilegiado minorante de aplicação obrigatória Embora semelhante à previsão do furto privilegiado aqui se requer pequeno valor do prejuízo 171 lº enquanto no furto se exige pequeno valor da res furtiva necessitando consequentemente ser avaliado o efetivo prejuízo sofrido pela vítima O pequeno prejuízo deve ser verificado via de regra por ocasião da realização do crime e na hipótese de tentativa é aquele que decorreria da pretendida consumação Para fins de aplicação do disposto no 1º do art 171 do CP não se identificam pequeno prejuízo causado à vítima e pequeno valor da res furtiva art 155 2º do CP resultante da ação delituosa No crime de furto o valor da res furtiva deve ser medido ao tempo da subtração não se identificando com o pequeno prejuízo que dela resultar Como a previsão legal para essa infração referese a pequeno valor da coisa furtada é irrelevante a circunstância de a vítima recuperar o bem subtraído e não sofrer prejuízo algum As minorantes constituem direitos públicos subjetivos do réu cuja admissão é obrigatória estando presentes os dois requisitos legais primariedade e pequeno prejuízo Para reconhecimento da figura privilegiada tem predominado o entendimento mais liberal de que o limite de um salário mínimo não é intransponível 11 Figuras especiais de estelionato Com o mesmo tratamento penal dispensado ao tipo fundamental o legislador de 1940 previu modalidades especiais de estelionato Desnecessário dizer que cada figura apresenta alguma peculiaridade que a distingue do tipo fundamental sob pena de não haver razão para sua especialidade O 2º do art 171 com efeito prevê seis modalidades especiais de estelionato disposição de coisa alheia como própria alienação ou oneração fraudulenta de coisa própria defraudação de penhor fraude na entrega de coisa fraude para recebimento de indenização ou valor de seguro e fraude no pagamento por meio de cheque Façamos uma análise sucinta de cada uma dessas figuras especiais de estelionato 111 Disposição de coisa alheia como própria I Convém destacar preliminarmente que os mesmos elementos constitutivos do estelionato em sua modalidade fundamental também estão presentes nessa figura emprego da fraude em razão da qual o sujeito passivo acredita que a coisa que lhe é oferecida pertence ao estelionatário a incursão em erro da vítima com a consequente vantagem indevida do agente e o correspondente prejuízo de alguém As condutas incriminadas são vender permutar dar em pagamento em locação ou em garantia coisa alheia como própria Essa modalidade consiste em realizar qualquer dos atos jurídicos mencionados tendo por objeto coisa alheia como se fosse própria Exigese a máfé do sujeito ativo e correspondente boafé do sujeito passivo no caso o comprador é enganado além do proprietário é claro A disposição da coisa é inerente ao domínio e só o tem o proprietário a quem o Código Civil confere além do uso e gozo da coisa sua disponibilidade Podem ser objeto material desse crime tanto os bens móveis quanto os imóveis É necessário que a ação física esteja relacionada à coisa alheia compra e venda troca dação em pagamento Consumase o crime como o tipo básico com a obtenção da vantagem ilícita e o prejuízo para a vítima Considerandose tratarse de crime material a tentativa é perfeitamente possível já que o iter criminis pode ser interrompido Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa sujeito passivo é o comprador de boafé enganado pelo vendedor incluindo também o próprio proprietário da coisa Exigese antagônica relação de subjetividade a máfé do sujeito ativo versus a boafé do sujeito passivo Todos os demais elementos estruturais previstos para o tipo fundamental caput do art 171 aplicamse aos tipos especiais que não deixam de ser tipos derivados 112 Alienação ou oneração fraudulenta de coisa própria II O que muda efetivamente nesse tipo penal é o objeto material em vez de ser coisa alheia tratase de coisa própria impedida por alguma razão de ser alienada As ações incriminadas incidem sobre coisa própria gravada com ônus de inalienabilidade Quando todos os direitos imanentes ao direito de propriedade reúnemse na pessoa do proprietário falase em dominium plenum Nem sempre porém o dono da coisa dispõe de todos esses atributos da propriedade sendo uma das restrições possíveis a inalienabilidade que pode decorrer de lei convenção ou testamento Outra restrição ao direito de propriedade especialmente importante para o direito penal é a indisponibilidade de coisa gravada de ônus que nada mais é do que o desmembramento de alguns dos direitos que compõem o dominium Pois esse desmembramento constitui ônus para o proprietário e recaindo sobre a coisa tem natureza real e não simplesmente obrigacional podese citar como exemplo a hipoteca a anticrese e o penhor Além dos direitos reais por natureza entre outros enfiteuse servidões usufruto Quem recebe a coisa com qualquer desses ônus desconhecendo a existência destes é lesado em seu direito e fraudado em sua expectativa sofre prejuízo patrimonial e é vítima do crime tipificado no dispositivo em exame A promessa de venda não é abrangida como forma de crime nos conceitos de venda permuta ou dação em pagamento do art 171 2º do CP Assim o silêncio do promitente vendedor sobre o fato de estar o imóvel arrestado em execução por exemplo não tipifica o crime de alienação fraudulenta de coisa própria Essa proibição tipificada referese expressamente ao ato de vender que não se confunde com o mero compromisso de compra e venda este não passa de obrigação de fazer Só recorrendo à analogia seria possível enquadrar a promessa de venda no art 171 2º II do CP mas a incriminação analógica é vedada pelo Direito Penal moderno Concretamente porém dependendo das demais circunstâncias poderá caracterizar o tipo fundamental descrito no caput Com efeito para fins criminais não há como confundir venda com promessa de compra e venda a obrigação de fazer que resulta da promessa deve ser resolvida no juízo cível sendo estranho ao tipo penal que no art 171 2º II exige para sua configuração o núcleo vender sendo portanto diferentes seus conceitos normativos e doutrinários O sujeito ativo ao contrário da previsão do inciso anterior é o dono da coisa que está impedido por lei contrato ou testamento de alienála aliás como se trata de crime próprio só o dono da coisa pode sêlo A coisa pode também ser gravada com ônus impeditivo de alienação v CC16 art 674 Em qualquer das hipóteses é necessário que o sujeito ativo iluda a vítima sobre a condição da coisa silenciando sobre qualquer das circunstâncias enumeradas Sujeito passivo é quem recebe a coisa nas condições enumeradas e na última hipótese também o promitente comprador 113 Defraudação de penhor III A ação tipificada é defraudar garantia pignoratícia mediante alienação venda troca doação etc ou por outro modo desvio consumo destruição abandono etc sem consentimento do credor Defraudar significa lesar privar ou tomar um bem de outrem Tipifica se o estelionato nessa modalidade quando o devedor pignoratício que tem a posse do objeto empenhado defrauda mediante alienação não consentida pelo credor ou por outro modo a garantia pignoratícia art 171 III do CP A alienação de lavoura de soja por exemplo constituída em garantia por meio de cédula rural pignoratícia sem o consentimento do credor configura essa modalidade especial de estelionato Ocorre a defraudação de penhor quando é feita a alienação do objeto empenhado inciso III do 2º do art 171 do CP sem o consentimento do credor independentemente de a espécie de depósito ser regular ou irregular A defraudação do penhor para aperfeiçoarse em sua anatomia jurídica geralmente prescinde do exame pericial a exigência além de estimular a impunidade seria verdadeira contradicta in re ipsa considerandose que é da natureza desse ilícito penal o desaparecimento da garantia real representada pelo penhor O consentimento do ofendido representando a ausência do elemento normativo do tipo afasta a tipicidade da conduta do sujeito ativo A penhora destinada a servir de garantia da execução não se equipara à hipótese prevista no inciso III do 2º do art 171 do Código Penal onde se cuida de fraude relativamente à coisa pertencente ou possuída pelo agente mas vinculada em garantia de débito a um direito real penhor Esse crime portanto só se configura quando o objeto empenhado permanece em poder do devedor em determinadas situações expressamente previstas na lei por força da cláusula constituti o que não é o caso da penhora que constitui simples ato processual de garantia do juízo Sujeito ativo é o devedor dono do objeto empenhado que está na posse da coisa Sujeito passivo é o credor pignoratício Para a configuração do delito exigese o dolo Não se pode ver por exemplo na atitude do réu vendendo parte de minguada safra ante dificuldades financeiras o dolo de defraudar mediante alienação não consentida a garantia pignoratícia 114 Fraude na entrega de coisa IV Em alguns tipos de penhor não há a entrega efetiva da coisa ao credor verificandose tão somente a tradição ficta por meio do constitutum possessorium Assim enquanto o credor recebe a posse jurídica da coisa o devedor mantém a posse natural Esse aspecto ocorre no penhor agrícola pecuniário industrial e mercantil conforme procuramos demonstrar no exame da apropriação indébita Está excluído do dispositivo em exame o penhor legal art 1467 do CC que só ocorre com a transferência de posse para o credor A ação tipificada é defraudar trocar adulterar alterar A fraude deve ter por objeto a substância essência qualidade espécie ou quantidade número peso ou dimensão O sujeito ativo deve ter a obrigação de entregar a coisa obrigação legal judicial ou contratual Substância é a matéria ou essência que compõe alguma coisa qualidade é o atributo ou propriedade de algo quantidade é a medida de qualquer coisa A simples falta de quantidade ou de qualidade da coisa não constitui o crime previsto no art 171 2º IV do CP Para que se componha o estelionato com efeito é imprescindível a ocorrência da fraude a beneficiar o agente e a prejudicar o ofendido O estelionato nessa modalidade consistente na fraude na entrega de coisa não se configura com a simples defraudação mas com a efetiva traditio da coisa ao destinatário Assim inexistindo esta responde o agente pelo crime do art 275 e não do art 171 2º IV ambos do CP Sujeito ativo é quem tem a obrigação jurídica de entregar a coisa e com a obrigação de fazêlo Sujeito passivo é o destinatário da coisa isto é quem tem o direito de recebêla Devese distinguir a emissão do cheque como contraprestação da emissão relativa a dívida pré constituída Na primeira hipótese estando configurados o dolo e o prejuízo patrimonial haverá o crime Na segunda não A explicação é lógica e simples Falta o dano patrimonial O estelionato é crime contra o patrimônio e se a dívida já existia a emissão da cártula ainda que não honrada não provoca prejuízo algum ao credor 115 Fraude para o recebimento de indenização ou valor de seguro V O bem jurídico protegido nessa modalidade de estelionato é o patrimônio do segurador As modalidades de ação elencadas são taxativas exigindo o tipo que o dano produzido seja idôneo para o recebimento da indenização ou valor de seguro Como destaca Paulo José da Costa Jr nesse tipo penal há duas espécies de fraudes executadas com o objetivo de receber a indenização do seguro 1 destruição ou ocultação da coisa própria 2 lesão do corpo agravamento de lesão ou moléstia de que esteja acometido Destruir significa aniquilar fazer desaparecer ou extinguir total ou parcialmente ocultar significa esconder ou encobrir coisa própria lesar significa ofender fisicamente causar dano danificar o próprio corpo ou a saúde ou agravar as consequências de lesão ou doença A fraude para recebimento de seguro é crime formal que não requer a ocorrência de dano efetivo em prejuízo do ofendido para consumarse algo que ocorre pela simples conduta de ocultar Assim o emprego do meio fraudulento é necessário e suficiente para a caracterização do crime desde que sua finalidade seja o recebimento da indenização do seguro elemento subjetivo especial Enfim consumase o estelionato independentemente do recebimento da indenização pretendida A locução que deve entregar constitui elemento normativo integrante do tipo penal a exemplo das locuções que sabe e deve saber constantes das definições do crime de receptação conforme demonstramos no exame daquela infração penal O elemento subjetivo geral é o dolo representado pela vontade consciente de praticar qualquer das condutas descritas no tipo penal com a finalidade de receber indenização ou valor de seguro O elemento subjetivo especial do tipo é exatamente a finalidade de receber a indenização ou o seguro no entanto reiterando o fim não precisa ser atingido basta que seja a finalidade desejada pelo agente Sujeito ativo é o proprietário da coisa ocultada ou destruída ou o paciente da mutilação Se o dano ou lesão forem praticados sem o conhecimento do beneficiário responderá pelo crime de lesão corporal dolosa ou de dano normalmente em concurso com o crime de estelionato simples art 171 caput Sujeito passivo é o segurador que responderá pelo pagamento injusto do valor do seguro Tratase de crime próprio e de perigo O eventual recebimento do seguro pretendido representará o simples exaurimento do crime 116 Fraude no pagamento por meio de cheque VI Nossos dois Códigos anteriores 1830 e 1890 não conheceram essa modalidade de estelionato cuja criação coube à Lei n 259112 então conhecida como Lei do Cheque Foram cominadas as mesmas sanções previstas para o crime de estelionato para a emissão de cheques sem a correspondente provisão de fundos Essa previsão foi recepcionada pela Consolidação Piragibe O Código Penal de 1940 cuja Parte Especial permanece em vigor acresceu à previsão anterior a incriminação da conduta de frustrar o pagamento de cheque Duas são as figuras tipificadas emitir e frustrar Emitir tem o sentido de colocar em circulação o cheque sem suficiente provisão de fundos Não se confunde com o simples ato de preenchêlo ou assinálo Frustrar significa obstar o pagamento bloqueando retirando o saldo existente ou dando contraordem e dessa forma evitar o pagamento do cheque mas somente a frustração indevida pode configurar crime Para verificarse essa segunda figura no momento da emissão do título devem existir fundos caso contrário a conduta será a primeira tipificada O emitente tem o direito de obstar o pagamento do cheque desde que fundado em motivo justo Somente a frustração fraudulenta do pagamento de cheque tipifica o crime em exame Igualmente a frustração de cheque pósdatado não configura crime pois esse tipo de cheque não é ordem de pagamento mas apenas uma garantia substituindo a histórica nota promissória A frustração do pagamento de cheque emitido como garantia de dívida não caracteriza fraude em sua emissão pois o crime tipificado como estelionato exige que a obtenção da vantagem ilícita em prejuízo alheio seja decorrente de induzimento ou mantença de alguém em erro mediante artifício ou qualquer meio fraudulento Cheque é uma ordem de pagamento à vista Tratase de um titulo de crédito cuja definição é encontrada no âmbito do direito comercial Sua valoração é jurídica A suficiência de provisão de fundos elemento normativo consiste na existência de fundos disponíveis em poder do sacado banqueiro em regra que sejam suficientes para efetivar o pagamento quando da apresentação do referido título art 4º 1º da Lei n 735785 O agente que visando a vantagem indevida emite cheque falsificando a assinatura do titular da conta pratica crime de estelionato em sua forma fundamental Tratandose de conta encerrada igualmente se caracteriza o crime previsto no caput do art 171 1161 Cheque pósdatado e cheque especial A característica fundamental desse título de crédito é ser uma ordem de pagamento à vista Por isso quando alguém recebe cheque para ser apresentado em data futura está recebendo o cheque descaracterizado em sua essência travestido de mera promessa de pagamento O cheque pósdatado desnatura a ordem de pagamento à vista que esse instituto representa Com efeito cheque emitido em garantia de dívida isto é pósdatado prédatado para alguns representa uma promessa de pagamento a exemplo da nota promissória Eventual inexistência de fundos suficientes quando de sua apresentação não caracteriza portanto o estelionato definido no dispositivo em exame Se não for compensado por falta de suficiente provisão de fundos constituirá somente um ilícito civil e não chega ao status de crime pela falta daquela característica natural do cheque de ser ordem de pagamento à vista Aliás a existência de avalista no cheque permite a presunção de que foi dado como garantia ou promessa e não como ordem de pagamento Algo semelhante ocorre na hipótese em que alguém recebe um cheque sem fundos em substituição a outro título de crédito que não fora devidamente resgatado Não é possível alegar fraude ou máfé do emitente pois o credor confiou no devedor que já não havia resgatado outro título buscou na verdade outra garantia que lhe parecera mais eficaz não havendo aí falar em crime mas em simples infração civil No entanto se esse outro título for uma duplicata acreditamos que o pagamento com cheque sem suficiente provisão de fundos pode perfeitamente caracterizar o crime de estelionato em exame pois o credor está convencido de que está recebendo o valor correspondente ao pagamento de seu crédito Pode com efeito ser enganado vendo ser frustrada sua expectativa de receber seu crédito Desnecessário frisar que não se configurará o crime se também nessa hipótese o cheque for pósdatado Habitualmente as agências bancárias têm honrado o pagamento de cheques de clientes especiais mesmo quando ultrapassam os limites contratados A recusa nesses casos é eventual Essa eventualidade não pode ser decisiva para tipificar criminalmente a conduta do emitente O estelionato pressupõe sempre a máfé do agente que nesses casos à evidência não existe Nesse sentido aplicase a Súmula 246 do STF que tem o seguinte enunciado Comprovado não ter havido fraude não se configura o crime de emissão de cheque sem fundos 1162 Sujeitos ativo e passivo do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa que emita seu próprio cheque sem suficiente provisão de fundos Quando for utilizado cheque de terceiro sem fundos suficientes não se tipificará essa infração penal mas a do caput pois quem emite o cheque é outra pessoa O endossante tampouco pode ser sujeito ativo desse crime uma vez que endossar não se confunde com emitir Também não tem o endossante autoridade para frustrar o pagamento de cheque emitido por outrem Sujeito passivo é o tomador o beneficiário do cheque que pela ausência de fundos sofre o dano patrimonial podendo ser indiferentemente pessoa física ou jurídica 12 Majorante especial do crime de estelionato O estelionato não apresenta figuras qualificadas mas prevê a majoração da pena equivocadamente concebida pela doutrina como qualificadora ignorando que tecnicamente majorante e qualificadora não se confundem como demonstramos em várias passagens desta obra A pena aplicada deve ser majorada em um terço 3º se a infração for cometida em prejuízo de entidade de direito público ou de instituto de economia popular assistência social ou beneficência Súmula 24 do STJ O Banco do Brasil SA por exemplo é uma sociedade de economia mista e como tal uma entidade de direito privado ou seja o Banco do Brasil é sociedade por ações de economia mista que não se confunde com entidade de direito público referida no 3º do art 171 Em sede de direito penal material é inadmissível interpretação extensiva ou analógica para agravar a situação do acusado especialmente para incluir o que a lei não consagra Não se pode invocar interesse indireto deste ou daquele ente ou órgão público administrado por uma entidade de direito privado para justificar a agravação da pena 13 Arrependimento posterior e as Súmulas 246 e 554 Sob a rubrica arrependimento posterior a reforma penal de 1984 Lei n 720984 criou essa minorante aplicável a determinados crimes praticados sem violência ou grave ameaça à pessoa quando houver reparação do dano ou restituição da coisa antes do recebimento da denúncia ou da queixa A despeito de todas as merecidas críticas que recebeu tratase de instituto moderno que procura relativizar a extraordinária importância que o direito penal do século XX atribuiu aos crimes patrimoniais tendo ganho interpretação liberal de doutrina e jurisprudência A configuração do arrependimento posterior tecnicamente considerado exige a presença dos seguintes requisitos a Crime praticado sem violência ou grave ameaça à pessoa A violência contra a coisa como ocorre no crime de furto qualificado ou de dano não exclui a minorante b Reparação do dano causado pelo crime ou restituição da coisa A reparação do dano deve ser pessoal completa e voluntária A restituição também deve ser total Se a restituição não for pessoal completa e voluntária constituirá somente circunstância atenuante genérica a ser considerada no momento da aplicação da pena Não é necessário que a reparação ou a restituição sejam espontâneas basta que sejam voluntárias podendo pois o agente ser convencido a reparar o dano ou restituir a coisa No entanto não ocorrerá o benefício se o agente for obrigado de qualquer forma a indenizar ou restituir o objeto material mesmo que por sentença judicial c A reparação ou restituição devem ocorrer antes do recebimento da denúncia ou da queixa Ocorrendo a reparação ou a restituição após o recebimento da denúncia ou da queixa funcionará apenas como atenuante genérica art 65 III b in fine do CP A reparação do dano a despeito da previsão legal em exame pode corporificar outros institutos penais No caso de peculato culposo por exemplo havendo a reparação do dano se for anterior a sentença irrecorrível extinguese a punibilidade art 312 3º se for posterior reduzirseá a pena pela metade A maior benevolência da norma penal nessa hipótese de peculato culposo tem o objetivo de facilitar e estimular o agente a repor o erário público que a todos aproveita 131 Reparação de danos e as Súmulas 246 e 554 As duas súmulas têm os seguintes enunciados Comprovado não ter havido fraude não se configura o crime de emissão de cheque sem fundos 245 O foro competente para o processo e julgamento dos crimes de estelionato sob a modalidade da emissão dolosa de cheque sem provisão de fundos é o do local onde se deu a recusa do pagamento pelo sacado 554 É desnecessário frisar que no caso abrangido pela Súmula 554 o crime de estelionato já se consumara e o máximo que poderia ocorrer com o pagamento antes da denúncia seria a incidência da minorante do art 16 que prevê redução de pena No entanto após a reforma penal que criou a norma do art 16 em análise o Supremo Tribunal Federal continuou aplicando a Súmula 554 como no RHC 62912 RT 598427 Referida súmula originouse da discussão sobre a natureza do estelionato na modalidade de emissão de cheques sem suficiente provisão de fundos se afinal tratase de crime material ou formal Acabou prevalecendo o entendimento de que como crime material a consumação ocorria com o efetivo prejuízo da vítima e só se verificava na agência bancária em que ocorresse a recusa de pagamento e não no local da emissão do cheque Constatase que o fundamento é diferente daquele que justificou a previsão do art 16 antes referido e tratase de construção pretoriana sumulada mais favorável ao agente Por isso sempre sustentamos que a súmula continua tendo a aplicação à hipótese restrita do art 171 2º VI a disposição do art 16 ficará para os demais casos 14 Algumas questões especiais O erro artifício ou ardil devem preexistir à obtenção da vantagem ilícita A enumeração legal do meio fraudulento é meramente exemplificativa podendo ocorrer o estelionato por outros subterfúgios Deve existir uma relação causal entre o meio utilizado pelo sujeito ativo e o erro do lesado No furto praticado com fraude o agente ilude a vítima para facilitar a subtração da coisa Para caracterizar o estelionato é irrelevante a máfé da vítima isto é a torpeza bilateral Estelionato no exercício de comércio sobrevindo a falência constitui crime falimentar Em caso de fraude processual ver o art 347 do CP Há algumas fraudes especiais disciplinadas em outros diplomas legais tais como fraude em cédulas rurais hipotecárias art 21 do DecretoLei n 16767 desvio de créditos e financiamentos governamentais ou incentivos fiscais art 3º da Lei n 713483 fraude em relação aos benefícios da Lei Sarney art 14 1º e 2º da Lei n 750586 A respeito de fraude no pagamento por meio de cheque vide as Súmulas 246 521 e 554 do STF 15 Pena e ação penal As penas cominadas são a reclusão de um a cinco anos e multa Na hipótese do 3º a pena será majorada em um terço na figura do privilegiado pode ter a reclusão substituída por detenção diminuída de um a dois terços ou substituída por multa A ação penal é pública incondicionada salvo nas hipóteses do art 182 quando será condicionada à representação Haverá isenção de pena se for praticado contra ascendente descendente ou cônjuge na constância da sociedade conjugal 16 Transcrição das principais súmulas relativas ao estelionato 161 Súmulas do Supremo Tribunal Federal Súmula 246 do STF Comprovado não ter havido fraude não se configura o crime de emissão de cheque sem fundos Súmula 521 do STF O foro competente para o processo e julgamento dos crimes de estelionato sob a modalidade da emissão dolosa de cheque sem provisão de fundos é o do local onde se deu a recusa do pagamento pelo sacado Súmula 554 do STF O pagamento de cheque emitido sem provisão de fundos após o recebimento da denúncia não obsta ao prosseguimento da ação penal Súmula 17 do STJ Quando o falso se exaure no estelionato sem mais potencialidade lesiva é por este absorvido Súmula 24 do STJ Aplicase ao crime de estelionato em que figure como vítima entidade autárquica a Previdência Social a qualificadora do 3º do art 171 do Código Penal 162 Súmulas do Superior Tribunal de Justiça Súmula 48 do STJ Compete ao juízo local da obtenção da vantagem ilícita processar e julgar crime de estelionato cometido mediante falsificação de cheque Súmula 107 do STJ Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar crime de estelionato praticado mediante falsificação de guias de recolhimento das contribuições previdenciárias quando não ocorrente lesão à autarquia federal J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 17 do STJ Quando o falso se exaure no estelionato sem mais potencialidade lesiva é por este absorvido Súmula 24 do STJ Aplicase ao crime de estelionato em que figure como vítima entidade autárquica da Previdência Social a qualificadora do 3º do art 171 do Código Penal Súmula 48 do STJ Compete ao juízo do local da obtenção da vantagem ilícita processar e julgar crime de estelionato cometido mediante falsificação de cheque Súmula 73 do STJ A utilização de papelmoeda grosseiramente falsificado configura em tese o crime de estelionato da competência da Justiça Estadual Súmula 107 do STJ Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar crime de estelionato praticado mediante falsificação das guias de recolhimento das contribuições previdenciárias quando não ocorrente lesão à autarquia federal Súmula 244 do STJ Compete ao foro do local da recusa processar e julgar o crime de estelionato mediante cheque sem provisão de fundos Súmula 246 do STF Comprovado não ter havido fraude não se configura o crime de emissão de cheque sem fundos Súmula 521 do STF O foro competente para o processo e julgamento dos crimes de estelionato sob a modalidade da emissão dolosa de cheque sem provisão de fundos é o do local onde se deu a recusa do pagamento pelo sacado Súmula 554 do STF O pagamento de cheque emitido sem provisão de fundos após o recebimento da denúncia não obsta ao prosseguimento da ação penal Prescrição da pretensão punitiva Ocorrência Estelionato contra a Previdência Social Art 171 3º do CP Uso de certidão falsa para percepção de benefício Crime instantâneo de efeitos permanentes Diferença do crime permanente Delito consumado com o recebimento da primeira prestação dos proventos indevidos Termo inicial de contagem do prazo prescritivo Inaplicabilidade do art 111 III do CP STF HC 85601SP Rel Min Cezar Peluso j 6112007 Art 171 3º do Código Penal Percepção de segurodesemprego após admissão em novo emprego Princípio da insignificância Inaplicabilidade Não há que se falar em incidência do princípio da insignificância na hipótese em que o réu mediante fraude obteve dos cofres públicos a título de segurodesemprego mesmo estando devidamente empregado a quantia de R 35196 à época correspondente a mais de dois salários mínimos Tal valor se afasta daquilo que seria considerado como penalmente irrelevante STJ REsp 961038RN Rel Min Félix Fischer j 1810 2007 A reparação integral do dano antes do recebimento da denúncia no crime de estelionato art 171 caput do CP autoriza tão somente o reconhecimento da causa de redução da pena prevista no art 16 do Código Penal Na linha dos precedentes desta Corte a reparação do dano anteriormente ao recebimento da com isso vantagem patrimonial ilícita É atípica a conduta do denunciado que dá coisa própria em garantia à promessa de compra e venda não auferindo vantagem nem propiciando prejuízo alheio STJ HC 36619PE Rel Min Paulo Medina j 22 22005 Art 171 2º I e II cc o art 171 caput do CP Súmula 17 desta Corte Crime praticado contra a justiça do trabalho como meio para se chegar ao delitofim Ausência de potencialidade lesiva Competência da justiça estadual O Enunciado 17 da Súmula desta Corte somente se aplica se o falso além de ser crimemeio para o estelionato estiver desprovido per se de potencialidade lesiva hipótese inocorrente na espécie STJ HC 34608SC Rel Min Félix Fischer j 292004 Duplicata simulada Art 172 Emitir fatura duplicata ou nota de venda que não corresponda à mercadoria vendida em quantidade ou qualidade ou ao serviço prestado Pena detenção de 2 dois a 4 quatro anos e multa Caput com redação determinada pela Lei n 8137 de 27 de dezembro de 1990 crimes contra a ordem tributária econômica e contra as relações de consumo V art 11 h da Lei Delegada n 462 intervenção no domínio econômico Parágrafo único Nas mesmas penas incorrerá aquele que falsificar ou adulterar a escrituração do Livro de Registro de Duplicatas D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O legislador de 1940 basicamente repetiu art 172 a redação da Lei n 18736 alterando apenas a sanção cominada para um a três anos de detenção Essa redação por sua vez foi alterada pelo DecretoLei n 265 de 28 de fevereiro de 1967 que ampliou sua abrangência e alterou a sanção anterior art 5º A Lei n 547468 também alterou o conteúdo do art 172 do Código Penal O parágrafo único porém foi mantido com redação determinada pela Lei n 547468 A redação atual do art 172 devese à Lei n 813790 que novamente ampliou a abrangência do conteúdo daquele dispositivo que disciplina a emissão de fatura duplicata ou nota de venda além de voltar a majorar a sanção correspondente caput com redação determinada pela Lei n 813790 relativa a crimes contra a ordem tributária econômica e contra as relações de consumo 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é o patrimônio particularmente as relações econômicas provenientes do comércio objetivando garantir a autenticidade dos institutos comerciais Pretende proteger os interesses patrimoniais do sacado ou de quem eventualmente possa efetuar qualquer operação mercantil com o título fraudulento Tratase segundo Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 476 de crime de perigo para o patrimônio que se apresenta por meio de uma falsidade documental pretendese evitar possível dano que a emissão fraudulenta de duplicata cause por se tratar de título circulável via endosso 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeitos ativos serão em regra os diretores gerentes ou administradores de empresas associações ou sociedades que praticarem a ação tipificada sendo insuficiente a condição de sócio diretor ou gerente Sujeito ativo na primeira figura é quem expede ou aceita duplicata fictícia ou falsa isto é que não corresponda a compra e venda efetiva Convém destacar que agora não apenas a emissão de duplicata fraudulenta constitui esse crime mas também a emissão de fatura ou nota de venda o tipificam Lei n 813790 Tratandose de pessoa jurídica serão penalmente responsáveis seus diretores administradores ou gerentes desde que tenham conhecimento da fraude e participem da decisão Não passará contudo de simples conivência impunível se o sacado previamente informado de que será expedida duplicata simulada abstiverse de denunciar o sacador na verdade a simples ciência da emissão irregular do título não o torna partícipe da ação delituosa O sacado que aceita o título sabendo que é simulado incorre no mesmo crime na condição de coautor art 29 do CP O endossatário e o avalista por si sós não podem ser sujeitos ativos desse tipo penal a menos que ajam de comum acordo com o sujeito ativo Nessa hipótese também seriam abrangidos pelo art 29 do Código Na verdade endossatário e avalista não podem praticar a conduta de emitir os documentos referidos nesse tipo mas tal aspecto não impede que possam ser alcançados pelo instituto concurso eventual de pessoas inclusive sob a modalidade da coautoria e não apenas da participação stricto sensu Essa possibilidade de concorrerem para o crime em exame não impede que qualquer dos dois ou ambos pratiquem o crime de estelionato se lesarem o tomador do título descontandoo como legítimo por exemplo Sujeito passivo é o recebedor isto é quem desconta a duplicata aquele que aceita a duplicata como caução e também o sacado de boa fé que corre o risco de ser protestado Não é indispensável registrese a participação na figura delituosa da pessoa contra quem a duplicata foi emitida Havendo coautoria entre emitente e aceitante sujeito passivo será quem fez o desconto e não o sacado 4 Tipo objetivo adequação típica A conduta incriminada consiste em emitir que significa expedir ou colocar em circulação fatura duplicata ou nota de venda que não corresponda à mercadoria vendida ou ao serviço prestado O título deve ser simulado isto é não deve corresponder à venda efetiva de bens ou à prestação de serviços Para que o crime se aperfeiçoe não é necessária a participação do sacado uma vez que após sua emissão o emitente pode endossála antes mesmo do aceite transferindo assim sua propriedade A Lei n 813790 acrescentou à duplicata a fatura ou nota de venda elementos normativos do tipo criminalizando a emissão irregular de qualquer desses títulos Fatura ou nota de venda é o documento no qual devem ser discriminadas as mercadorias vendidas ou os serviços prestados em outros termos fatura ou nota de venda é a escrita unilateral do vendedor que deve acompanhar as mercadorias objeto do contrato ao serem entregues ou expedidas Fatura não é título de crédito não é comercializável nem pode ser objeto de endosso não passando em verdade de uma espécie de certidão de nascimento que deve acompanhar a mercadoria ou o serviço prestado Duplicata é um título de crédito que deve ser sacado em correspondência estrita com fatura com a finalidade de circular comercialmente art 2º da Lei n 547468 Nota de venda a nosso juízo confundese com a fatura pois tem a mesma finalidade daquela como já destacamos acima Com ou sem assinatura verdadeira ou falsa do aceitante a emissão de duplicata a que não corresponde negócio enquadrase no art 172 do Código A falsificação do aceite aposto em duplicata simulada não configura crime autônomo pois está ínsita na figura típica do art 172 do CP 41 Falsificação ou adulteração do livro de registro de duplicatas Pratica o mesmo crime quem falsifica ou adultera a escrituração do livro de registro de duplicatas parágrafo único do art 172 Falsificar no caso específico significa efetuar o lançamento de um título fictício isto é que não tenha correspondência na contraprestação que retrata adulterar por sua vez referese à alteração de um lançamento anterior relativo a um título válido ou verdadeiro Concorrendo com a emissão de duplicata simulada ficará absorvida a falsidade ou adulteração do livro referido Limitase sua punição quando é praticada a falsidade ou adulteração mas a duplicata não chega a ser emitida No livro de registro de duplicatas o comerciante deve obrigatoriamente escriturar em ordem cronológica todas as duplicatas emitidas com todos os dados necessários para identificálas Por expressa disposição legal esse livro não pode conter emendas rasuras borrões ou entrelinhas art 19 2º e 3º da Lei n 547468 exatamente para evitar a fraude Como no entanto pode ser substituído por qualquer sistema mecanizado acaba facilitando exatamente aquilo que pretendia inviabilizar qual seja a banalização da fraude Subscrevemos integralmente a crítica autorizada de Luiz Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 530 quando afirma Não agiu com propriedade o legislador ao inserir a referida figura no artigo 172 já que aplica a ela toda a principiologia do delito de falsum e a hipótese em questão é de falsidade de documento particular equiparado a documento público art 297 2º Ademais a referida conduta gravita em torno da expedição de duplicata sendo absorvida pelo delito definido no caput do crime em exame por se tratar de antefato ou pósfato impunível 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é o dolo constituído de vontade conscientemente dirigida à emissão de duplicata simulada fatura ou nota de venda que não corresponda à mercadoria vendida ou ao serviço prestado Em outros termos o dolo consiste na emissão do título fatura duplicata ou nota de venda com pleno conhecimento de que não encontra correspondência fática isto é sem a contrapartida da efetiva venda de mercadoria e da prestação de serviço correspondente A consciência deve abranger necessariamente todos os elementos constitutivos do tipo penal 6 Consumação e tentativa Consumase o crime de emissão de duplicata simulada no momento em que o título é colocado em circulação independentemente de eventual prejuízo do sacado ou de terceiro como crime formal consumase com a simples emissão do título independentemente de eventual prejuízo a terceiro A doutrina de modo geral tem negado a possibilidade da configuração da forma tentada do crime de emissão de duplicata simulada porque se trata de crime formal e unissubsistente não admitindo fracionamento Contudo quernos parecer é muito arriscada uma afirmação negativa quando a casuística oferece determinadas situações que podem configurar perfeitamente a tentativa Diante dessas circunstâncias não afastamos a priori a possibilidade da ocorrência da tentativa já que se trata de crime fracionável cujo iter criminis pode eventualmente ser interrompido por circunstâncias alheias à vontade do agente 7 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são reclusão de dois a quatro anos e multa As mesmas penas são aplicadas para a figura tipificada no parágrafo único relativas à falsificação do livro de registro de duplicatas A ação penal é pública incondicionada salvo nas hipóteses do art 182 quando ficará condicionada à representação J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Art 172 do Código Penal Continuidade delitiva Majoração Número de infrações cometidas O aumento da pena pela continuidade delitiva se faz basicamente quanto ao art 71 caput do Código Penal por força do número de infrações praticadas Qualquer outro critério subjetivo viola o texto legal enfocado In casu como foram dois os crimes praticados o aumento deve darse na fração de 16 um sexto Precedentes do STF e do STJ STJ HC 43725SP Rel Min Félix Fischer j 17112005 A consumação do delito previsto no art 172 do CP crime formal e unissubsistente dáse com a simples e efetiva colocação da duplicata em circulação independentemente do prejuízo Demonstrado que a emissão dos títulos de crédito foi efetuada na cidade de FrancaSP consoante documentos acostados aos autos a competência para o processamento e julgamento do feito é do Juízo Comum Estadual daquela Comarca lugar em que ocorrida a infração STJ RHC 16053SP Rel Min Paulo Medina j 282005 A nova redação do art 172 do Código Penal dada pela Lei n 813790 não excluiu do tipo o ato de emitir duplicata que não corresponda a uma venda de mercadoria ou prestação de serviço efetivamente realizadas Precedente da Suprema Corte STJ REsp 443929SP Rel Min Paulo Gallotti j 16122004 Conforme entendimento da Terceira Seção deste Tribunal A consumação do delito previsto no art 172 do Código Penal se dá com a simples e efetiva colocação da duplicata em circulação independentemente do prejuízo CC 27049PE Rel Min Félix Fischer DJ 1482000 p 135 que deve ser considerado quando da fixação da penabase como uma das circunstâncias judiciais consequências do crime STJ HC 35236PR Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 9112004 Abuso de incapazes Art 173 Abusar em proveito próprio ou alheio de necessidade paixão ou inexperiência de menor ou da alienação ou debilidade mental de outrem induzindo qualquer deles à prática de ato suscetível de produzir efeito jurídico em prejuízo próprio ou de terceiro Pena reclusão de 2 dois a 6 seis anos e multa V art 4º b da Lei n 152151 crimes contra a economia popular D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O direito antigo não criminalizava o abuso de incapazes como figura autônoma preferindo integrálo em um conceito mais abrangente de estelionato e usura O abuso de incapazes foi introduzido na legislação pelo Código Penal francês de 1810 napoleônico que disciplinava o abuso das paixões necessidades ou fraquezas do menor acabando por influenciar outras legislações europeias que recepcionaram o abuso de incapazes incluindoo entre os crimes contra o patrimônio O Código Penal de 1890 acolheu a novel figura nos seguintes termos Abusar em próprio ou alheio proveito das paixões ou inexperiência de menor interdito ou incapaz e fazêlo subscrever ato que importe efeito jurídico em dano dele ou de outrem não obstante a nulidade do ato emanada da incapacidade pessoal O natimorto Código Penal de 1969 retornava à fórmula da legislação antiga Abusar em proveito próprio ou alheio da necessidade paixão ou inexperiência de menor ou da doença ou deficiência mental de outrem induzindo qualquer deles à prática de ato que produza efeito jurídico em prejuízo próprio ou de terceiros O legislador brasileiro de 1940 ao tipificar o abuso de incapazes inspirouse no Código Penal Rocco de 1930 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é o patrimônio especialmente aquele atribuído aos menores ou incapazes com a finalidade de impedir todo e qualquer abuso ou aproveitamento por parte de quem quer que seja com ou sem escrúpulos O dispositivo em exame procura garantir a inviolabilidade patrimonial punindo quem aproveitandose da menoridade alienação ou debilidade mental de alguém leveo a praticar condutas com efeitos jurídicos em benefício do autor ou de terceiro Considerando que se trata de crime contra o patrimônio é indispensável que o ato praticado seja idôneo para produzir efeitos patrimoniais Contudo por se tratar de crime formal o dano não precisa se concretizar O estado das pessoas protegidas no caso menores e incapazes tornaas mais vulneráveis e expostas a fraudes e burlas Por essa razão o Estado aumenta a vigilância e proteção ao patrimônio dessas pessoas Assim condutas que em relação aos maiores e capazes poderiam no máximo caracterizar um ilícito civil são elevadas à condição de crimes quando praticadas contra incapazes e menores 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa independentemente de ostentar alguma condição ou qualidade especial ou seja sujeito ativo é quem abusa de menor ou alienado ou débil mental induzindoo à prática de algum ato capaz de produzir efeito jurídico em prejuízo próprio ou de terceiro Sujeito passivo somente pode ser menor alienado ou débil mental ou nos próprios termos do Código Penal é o incapaz que ostentando essa condição for induzido a praticar ato suscetível de produzir efeito jurídico em prejuízo próprio ou de outrem A enumeração do artigo é numerus clausus menor alienado ou débil mental Considerase menor para os efeitos aqui tratados aquele com idade inferior a dezoito anos independente da menoridade civil Pelo nosso Código Penal quem completa dezoito anos se torna penalmente responsável art 27 O alienado de que fala a lei é o louco ou seja a pessoa privada de razão em virtude de perturbação psíquica Débeis mentais são em geral aqueles indivíduos portadores de retardamento mental ou de parada no desenvolvimento das funções psíquicas Nesta categoria incluemse os idiotas os imbecis e os débeis mentais propriamente ditos É a esse conceito de anormais que a lei se refere Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 434 4 Tipo objetivo adequação típica São elementos constitutivos do crime de abuso de incapazes a menoridade ou alienação ou debilidade mental do sujeito passivo b abuso da necessidade paixão ou inexperiência do menor ou da alienação ou debilidade mental de outrem c induzimento à prática de ato suscetível de efeito jurídico em detrimento da vítima ou de outrem d elemento subjetivo geral e especial do tipo A ação tipificada é abusar isto é prevalecerse da inexperiência paixão ou necessidade do menor ou de sua condição de alienado ou débil mental para induzi lo pela persuasão ou pela fraude à prática de ato suscetível de produzir efeitos jurídicos É desnecessária a fraude ou a indução a erro sendo suficiente que o agente abuse da imaturidade ou da debilidade da vítima A ação deve ser em proveito próprio ou alheio e em prejuízo do sujeito passivo ou de terceiro 41 Necessidade paixão ou inexperiência do menor Necessidade paixão e inexperiência do menor são tratadas como sinônimos ou pelo menos como expressões que produzem no menor o mesmo resultado ou seja tornamno mais vulnerável e desprotegido carente de amparo e de proteção legal E é exatamente dessas circunstâncias que o agente deve abusar quando se tratar de menor fundamentando o desvalor da conduta criminalizada Essas elementares no entanto são exigidas somente em relação ao menor e não quanto ao alienado ou débil mental Necessidade não quer dizer apenas aquilo que é indispensável que é essencial mas se refere ao estado de menor a sua vulnerabilidade diante de carências típicas dessa situação frágil merecedora de maior amparo do Estado paixão é a emoção em estado crônico que pode perdurar como sentimento mais profundo e monopolizante Mas o sentido de paixão neste dispositivo significa a fragilidade do menor envolvido com um sentimento que lhe diminui as resistências afasta as desconfianças aumenta a confiança no sujeito ativo e é exatamente esse estado que torna mais desvaliosa a conduta incriminada inexperiência no caso não se limita à tradicional definição de falta de prática ou de habilidade em determinada função ou atividade deve ser examinada no sentido da imaturidade da ausência de conhecimentos gerais que permitam aquilatar adequadamente todas as circunstâncias que autorizem uma tomada de decisão no mundo socioeconômico ou melhor dito em toda e qualquer ação transação atividade O ordenamento jurídico preocupase com as pessoas que não dispõem de conhecimento maturidade e discernimento para autodeterminarse na vida social limitando suas responsabilidades e a validade de seus atos 42 Ato suscetível de produzir efeito jurídico O ato juridicamente nulo em razão da absoluta incapacidade da vítima pode ser objeto desse crime Sustentase que se fosse admissível argumentar que o crime não se consuma em razão da incapacidade absoluta da vítima não teria sentido a criminalização contida no dispositivo em exame No entanto quando o ato praticado pela vítima é absolutamente nulo e sem qualquer efeito jurídico por causa diversa da incapacidade da vítima não há crime pois esse tipo de ato não pode acarretar efeitos jurídicos o que é uma elementar requerida pelo tipo legal 43 Natureza do proveito ou vantagem Questão interessante convém destacar é a definição da natureza do proveito que o agente ativo deve pretender com a conduta praticada Terá necessariamente natureza patrimonial considerandose que o tipo penal se encontra no título dos crimes contra o patrimônio Não nos parece que assim seja pois mesmo que o proveito seja por exemplo de ordem puramente moral não afastará por si só a natureza patrimonial da infração penal Nesse particular é muito feliz a hipótese lembrada por Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 461 Se certo homem inimigo de uma família abusa das paixões de menor a ela pertencente induzindoo a praticar ato que lhe pode acarretar a ruína sem que com isso obtenha lucro não deixa de praticar o crime em análise O delito é patrimonial porque o patrimônio é que foi a objetividade jurídica atingida Tem toda a razão Magalhães Noronha Na verdade para que o crime se consume é absolutamente irrelevante que o sujeito ativo obtenha o proveito pretendido embora de modo geral os crimes patrimoniais sejam materiais o abuso de incapazes é crime formal e a obtenção de proveito como elemento subjetivo especial do injusto não precisa verificarse basta que tenha orientado a conduta do agente Ora se o proveito não precisa verificarse para o crime aperfeiçoarse não teria maior sentido exigir que aquele tivesse esta ou aquela natureza Nesta linha adotamos a orientação que sustenta a desnecessidade de o proveito ser de natureza econômica ou patrimonial Assim devemse distinguir com precisão duas coisas básicas proveito e prejuízo Não é necessário que ambos tenham a mesma natureza podendo um ter cunho moral e outro econômico sem qualquer relevância típica O proveito deve ser próprio ou alheio o prejuízo igualmente deve ser próprio ou de terceiro Mas acaba por aí a semelhança de proveito e prejuízo A rigor o que não pode deixar de ter natureza econômica é o prejuízo da vítima ou de terceiro e é exatamente em razão do prejuízo que se qualifica o crime patrimonial e não segundo a vantagem ou proveito obtido ou pretendido pelo sujeito ativo Por fim com a vedação legal de obter proveito nos termos em que o prescreve é evidente que a lei está se referindo a proveito injusto isto é sem causa sem fundamento legal indevido O crime de abuso de incapazes integra o Capítulo do Estelionato e Outras Fraudes Embora de estelionato não se trate não se pode negar que leva implícita em sua definição forte carga de engodo de ardil abrangida pelo verbo abusar Ademais seria um contrassenso falar em fraude por parte de alguém que procura obter proveito justo 5 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo é composto pelo dolo e pelo elemento subjetivo especial do tipo constituído pelo fim específico de obter indevido proveito para si ou para outrem O dolo é representado pela vontade consciente de persuadir o menor ou incapaz a praticar ato que lhe seja prejudicial e idôneo a produzir efeitos jurídicos É indispensável que o agente tenha conhecimento da incapacidade da vítima seja em razão da menoridade seja em razão da alienação ou debilidade mental Nesse sentido mantémse atual o magistério de Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 460 que sustentava age dolosamente o delinquente que conhecendo as peculiares condições da vítima dela abusa induzindoa a praticar um ato ruinoso para ela ou para outrem O agente tem pois ciência do resultado e vontade de alcançálo pondo por isso em ação os meios aptos e hábeis 51 Dolo eventual Elemento subjetivo especial Havendo dúvida sobre esse estado da vítima o agente deve abster se de agir sob pena de responder pelo crime por dolo eventual Com efeito a dúvida do sujeito ativo não afasta o dolo pois como sustentava Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 460 quem duvida não ignora e se pratica o ato arriscase Nos termos da lei arriscar é querer Contudo o desconhecimento do estado da vítima menoridade alienação ou debilidade mental afasta a tipicidade da conduta configurando erro de tipo Mas esse tipo penal não se satisfaz somente com o dolo exige algo mais um plus o elemento subjetivo especial do injusto qual seja o especial fim de agir que in casu é representado pela locução em proveito próprio ou alheio Na verdade o preceito primário criminaliza a conduta de abusar em proveito próprio ou alheio ou seja abusar com a finalidade de obter vantagem para si ou para outrem 6 Consumação e tentativa Consumase o crime de abuso de incapazes no momento e no lugar em que o incapaz pratica o ato a que foi induzido pelo sujeito ativo desde que suscetível de produzir efeitos jurídicos independente da obtenção do proveito visado A tentativa é teoricamente admissível Tratase de uma das espécies de crime formal que pelo menos em tese pode ter fracionada sua fase executória como reconhece Heleno Cláudio Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 485 7 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativas são reclusão de dois a seis anos e multa A ação penal é pública incondicionada salvo nas hipóteses do art 182 quando será condicionada à representação J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Abuso de incapaz Dúvidas quanto ao estado mental da suposta vítima Meros indícios Prova contraditória Insuficiente ao decreto condenatório Melhor solução Pronunciamento do non liquet Existindo meros indícios prova contraditória e geradora de dúvida quanto à falta de higidez mental da suposta vítima e sendo essa imprescindível à configuração da figura típica a absolvição é medida que se impõe em atenção ao princípio in dubio pro reo TJMG Apelação 104390200472620011 Rel Pedro Vergara j 6112007 Abuso de incapaz Trancamento da ação penal Atipicidade da conduta Matéria não analisada pelo tribunal a quo Supressão de instância Denúncia que imputou à paciente a prática de crime de abuso de incapaz eis que teria em tese aproveitandose da incapacidade de tia idosa feito com que a mesma lhe transferisse valores constantes em contas bancárias STJ RHC 15760RS Rel Min Gilson Dipp j 1152004 Abuso de incapazes Se as procurações outorgadas por instrumento público se mostram idôneas a produzir efeitos jurídicos em prejuízo da outorgante incapaz não há nulidade a viciar o processo criminal por falta de perícia em tais instrumentos STF HC 64015RS Rel Min Carlos Madeira j 1761986 Induzimento à especulação Art 174 Abusar em proveito próprio ou alheio da inexperiência ou da simplicidade ou inferioridade mental de outrem induzindoo à prática de jogo ou aposta ou à especulação com títulos ou mercadorias sabendo ou devendo saber que a operação é ruinosa Pena reclusão de 1 um a 3 três anos e multa V arts 814 e 816 do CC V arts 50 a 58 do DecLei n 368841 Lei das Contravenções Penais V art 2º da Lei n 152151 crimes contra a economia popular D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O Código Civil brasileiro estabelece As disposições dos arts 814 e 815 não se aplicam aos contratos sobre títulos de bolsa mercadorias ou valores em que se estipulem a liquidação exclusivamente pela diferença entre o preço ajustado e a cotação que eles tiverem no vencimento do ajuste Observando os dois textos legais civil e penal Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 270 com muita propriedade sentenciou Podese dizer então que o art 174 ora comentado cuida do induzimento do inexperiente simplório ou pobre de espírito ainda que não atinja o grau de debilidade mental a qualquer forma de jogo ilícito ou lícito O vacante Código Penal de 1969 chegou a disciplinar essa infração nos seguintes termos Abusar em proveito próprio ou alheio da inexperiência ou da simplicidade ou inferioridade mental de outrem induzindoo à prática de jogo ou aposta ou especulação em títulos ou mercadorias que lhe resulte danosa Mas esse diploma legal que transformava um crime de perigo em crime de dano nunca chegou a entrar em vigor 2 Bem jurídico tutelado Como todas as infracões penais constantes do presente Título o patrimônio considerado lato sensu é o bem jurídico protegido contudo cada figura penal destaca determinada particularidade da segurança patrimonial que merece maior atenção do legislador No presente caso objetivase tutelar o patrimônio pertencente às pessoas simples ignorantes ou inexperientes contra a burla a fraude ou ardil simbolizados por apostas ou jogos e até mesmo pela especulação com títulos ou mercadorias Desnecessário enfatizar que as pessoas com as condições destacadas no tipo simples ignorantes e inexperientes não apresentam as mínimas condições de obter êxito nesse tipo de atividade em que esteja ausente a máfé do sujeito ativo Como se trata de crime de perigo normalmente os crimes contra o patrimônio são de dano nesta figura o legislador penal procurou evitar a exposição a perigo do patrimônio da vítima simples inexperiente ou ignorante 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa capaz sem qualquer condição especial desde que abuse da inexperiência simplicidade ou inferioridade mental da vítima induzindoa a praticar qualquer das condutas descritas no tipo penal em exame Em outros termos sujeito ativo é quem induz a vítima a jogo aposta ou especulação bolsista podendo inclusive ser pessoa diversa daquela que contrata ou compete com a vítima Sujeito passivo é qualquer pessoa maior ou menor inexperiente simples ou mentalmente inferior Neste caso ao contrário do dispositivo anterior não se refere a debilidade mental mas somente a inferioridade mental sendo desnecessário por conseguinte que a vítima seja um anormal Na prática em nossa longa experiência profissional nunca nos deparamos com um caso concreto em que a vítima apresentasse comprovadamente esse caráter de inferioridade mental Aliás concretamente essa terminologia fica sujeita a longas discussões sobre o que pode ser considerado inferioridade mental que acabará inevitavelmente com a definição autoritária de um laudo psiquiátrico No entanto essa raridade não significa que não possa ocorrer mas o mais comum é que tal exploração ocorra com menores mulheres incultas e homens rústicos enfim pessoas simples desacostumadas às habilidades e malícias que tais atividades exigem para que qualquer indivíduo possa ter alguma chance de sucesso 4 Tipo objetivo adequação típica A ação tipificada é representada pelo verbo nuclear abusar que tem o sentido de prevalecerse aproveitarse da inexperiência simplicidade ou inferioridade mental de alguém para induzilo à prática de jogo aposta ou à especulação com títulos ou mercadorias Nesta última hipótese deve tratarse de operação ruinosa tendo o agente ou devendo ter consciência dessa circunstância Jogo e aposta são espécies de um mesmo gênero naquele o ganho que se busca provém de determinada ação praticada pelo jogador nesta o evento independe como regra da participação dos apostadores cujo resultado se vincula exclusivamente ao fator sorte É irrelevante que se trate de jogo lícito ou ilícito considerandose que a finalidade da norma é proteger o patrimônio de pessoas incautas inexperientes ignorantes ou inferiores mentalmente A elementar que deve prevalecer é exatamente essa inferioridade que as torna hipossuficientes e justifica a proteção penal A ação deve ser em proveito próprio ou alheio 5 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo é constituído pelo dolo como elemento geral e pelo elemento subjetivo especial do injusto O dolo é representado pela vontade consciente de induzir a vítima à prática do jogo aposta ou especulação aproveitandose de sua inexperiência simplicidade ou inferioridade mental É absolutamente indispensável que o sujeito ativo tenha conhecimento de que se trata de pessoa que apresenta uma das condições exigidas pelo tipo penal ou seja pessoa inexperiente simples ou mentalmente inferior Evidentemente que eventual dúvida sobre a existência de qualquer dessas condições não beneficia o infrator caracterizando o dolo eventual Na verdade havendo dúvida sobre a existência das elementares o agente deve absterse de agir pois arriscandose assume o risco de infringir a lei e deve responder por isso Em várias passagens de nosso Tratado externamos nosso repúdio ao recurso a expressões como sabe ou deve saber ou sabendo ou devendo saber Bitencourt Tratado de Direito Penal v 2 p 209 uma vez que no atual estágio do direito penal não podem mais identificar a espécie ou natureza do elemento subjetivo do tipo Com efeito para a configuração do dolo exigese a consciência daquilo que se pretende praticar Essa consciência no entanto deve ser atual isto é deve estar presente no momento da ação quando ela está sendo realizada É insuficiente segundo Welzel a potencial consciência das circunstâncias objetivas do tipo uma vez que prescindir da consciência atual equivale a destruir a linha divisória entre dolo e culpa convertendo aquele em mera ficção Não admitimos como já destacamos que devendo saber possa traduzirse em culpa ou presunção de dolo como chegou a ser sustentado por alguns eminentes doutrinadores pátrios do passado Noronha Direito Penal v 2 p 465 6 Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 271 Não vemos nenhuma possibilidade de punir a modalidade do crime culposo em razão de sua excepcionalidade Por isso mesmo seria paradoxal admitir sua equiparação com o dolo O elemento subjetivo especial do injusto por sua vez é constituído pelo fim especial de obter proveito próprio ou alheio Tratase de crime de intenção caracterizado pela locução em proveito próprio ou alheio Desnecessário destacar que o proveito como elemento subjetivo especial do tipo não precisa concretizarse sendo suficiente que tenha sido o móvel da ação do agente 6 Consumação e tentativa Consumase com a prática pelo induzido de jogo aposta ou especulação na bolsa independentemente da superveniência de eventual obtenção do proveito visado Não se pode perder de vista que se trata de crime contra o patrimônio sui generis na medida em que se consuma independentemente de lesão patrimonial configurando por conseguinte crime de perigo Alguns autores sustentam inclusive que o crime estará consumado mesmo que a vítima obtenha lucro na operação que realizar porque se trata de crime formal por todos Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 490 Parecenos questionável esse entendimento majoritário que no mínimo obscurece o elemento subjetivo do tipo Pelo Código Penal de 1969 esse crime passaria a ser material exigindo o resultado de dano patrimonial para caracterizar a consumação A tentativa é admissível já que o processo executório pode ser fracionado Somente o casuísmo permitirá a avaliação in concreto da possibilidade ou não da figura tentada 7 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são reclusão de um a três anos e multa A ação penal é pública incondicionada salvo nas hipóteses do art l82 quando será condicionada à representação Heleno Fragoso Lições de Direito penal v 1 p 491 já criticava a seu tempo a excessiva gravidade da sanção cominada Tendose em vista a configuração técnica do delito crime formal e de perigo a pena é evidentemente excessiva J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Induzimento à especulação em continuidade delitiva art 174 cc o art 71 caput ambos do CPB O réu em proveito próprio aproveitando da inexperiência e da simplicidade das vítimas as induzia à prática de jogo e aposta Para tanto explorava no local onde era realizado um rodeio o jogo do dedal consistente em esconder uma bola de esponja sob um dentre três recipientes metálicos induzindo as vítimas a efetuarem apostas indicando sob qual dos recipientes a bola se encontra TJRS Apelação 70009104431 Rel Aymoré Roque Pottes de Mello j 2872005 Fraude no comércio Art 175 Enganar no exercício de atividade comercial o adquirente ou consumidor V art 2º IX da Lei n 152151 crimes contra a economia popular V Lei n 807890 Código de Defesa do Consumidor V Lei n 813790 crimes contra a ordem tributária econômica e contra as relações de consumo I vendendo como verdadeira ou perfeita mercadoria falsificada ou deteriorada II entregando uma mercadoria por outra Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos ou multa 1º Alterar em obra que lhe é encomendada a qualidade ou o peso de metal ou substituir no mesmo caso pedra verdadeira por falsa ou por outra de menor valor vender pedra falsa por verdadeira vender como precioso metal de outra qualidade Pena reclusão de 1 um a 5 cinco anos e multa 2º É aplicável o disposto no art 155 2º D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O Código Penal francês de 1810 mais uma vez surge como a fonte moderna pois previa a fraude no comércio de pedras e metais preciosos ao lado da fraude sobre a natureza ou quantidade de quaisquer mercadorias além do uso de pesos ou medidas falsos Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 491 Os Códigos Penais italianos a partir do século XIX sempre trataram da fraude no comércio As Ordenações Filipinas também dispuseram sobre a fraude no comércio de determinados segmentos adotando uma individualização bem casuística Embora o Código Criminal do Império de 1830 não tenha enfrentado diretamente o exame da matéria integrou no estelionato a troca das coisas que se devem entregar por outras diversas O Código Penal de 1890 igualmente disciplinava a fraude comercial como integrante de estelionato art 338 Finalmente o legislador de 1940 criou um tipo mais abrangente e menos casuístico que passa a ser objeto de exame 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido como todas as demais infrações deste Título do Código Penal é o patrimônio especialmente contra a fraude praticada na atividade comercial Subsidiariamente protegese também a moralidade das relações comerciais buscando preservar a honestidade e a boafé que devem orientar toda a atividade comercial que é vital para a satisfação de grande parte das necessidades materiais da coletividade 3 Sujeitos ativo e passivo Esse é um tipo penal que já apresenta dificuldade na identificação de quem pode realmente ser sujeito ativo do crime Com efeito além de o nomen juris ser fraude no comércio o conteúdo típico exige que o engano se opere no exercício de atividade comercial Há histórica divergência na doutrina admitindose qualquer pessoa sem condição especial Por essas razões sucintas sujeito ativo só pode ser comerciante ou comerciário diante da elementar do tipo no exercício da atividade comercial mesmo que a atividade seja faticamente exercida pois nesse caso o crime será tipificado no art 171 2º IV do CP Sujeito passivo por sua vez pode ser qualquer pessoa desde que determinada e seja adquirente ou consumidor Sujeito passivo enfim é quem adquire a coisa ou mercadoria com um dos vícios mencionados no tipo penal Nada impede que o sujeito passivo seja comerciante embora não seja necessária essa qualidade pois como já afirmamos pode ser qualquer pessoa sendo qualquer pessoa não está afastado o próprio comerciante 4 Tipo objetivo adequação típica Enganar isto é iludir adquirente ou consumidor no exercício de atividade comercial de duas formas a vendendo não permutando dando em pagamento doando etc I como verdadeira ou perfeita mercadoria falsificada ou deteriorada b entregando uma mercadoria por outra O engano pode referirse à substância qualidade quantidade ou procedência II Na primeira figura a ação incriminada consiste em enganar vendendo mercadoria falsificada ou deteriorada como verdadeira ou perfeita Deve tratarse portanto de venda e não de permuta dação ou entrega da mercadoria a qualquer outro título O objeto material da ação é mercadoria que pode ser coisa móvel ou semovente art 191 do Código Comercial Falsificada é a mercadoria adulterada a que o sujeito ativo dá a aparência de legítima ou genuína Deteriorada é a mercadoria estragada total ou parcialmente A fraude requerida pelo tipo penal em exame consiste exatamente em apresentá la como perfeita ou verdadeira Na segunda modalidade a conduta incriminada consiste em enganar o consumidor ou adquirente entregando uma mercadoria por outra ou seja o sujeito passivo adquire uma mercadoria e recebe outra diversa daquela que havia comprado Nessa hipótese há presunção da existência de uma relação obrigacional na qual a mercadoria foi determinada e individualizada não podendo ser entregue outra em seu lugar Embora a lei fale em enganar o adquirente ou consumidor o que significa fraude não é necessário que haja previamente um ardil artifício ou meio fraudulento induzindo o comprador na aquisição da coisa O engano está na efetivação na realização mesma da venda nos fatos mencionados de vender e entregar Noronha Direito Penal v 2 p 469 A fraude pode referirse à substância da mercadoria farinha por sal à qualidade ou quantidade Mesmo que seja falsificada se a vítima não foi enganada sabendo que a mercadoria não é verdadeira a conduta é atípica 41 A possível revogação pelo Código de Defesa do Consumidor Alguns autores questionam se o art 175 do CP não teria sido revogado pela Lei n 813790 e pelo denominado Código de Defesa do Consumidor Lei n 807890 O art 7º IX da Lei n 813790 dispõe que Constitui crime contra as relações de consumo vender ter em depósito para vender ou expor à venda ou de qualquer forma entregar matériaprima ou mercadoria em condições impróprias ao consumo O art 18 6º da Lei n 807890 por sua vez esclarece que São impróprios ao uso e consumo I os produtos cujos prazos de validade estejam vencidos II os produtos deteriorados alterados adulterados avariados falsificados corrompidos fraudados nocivos à vida ou à saúde perigosos ou ainda aqueles em desacordo com as normas regulamentares de fabricação distribuição ou apresentação Essa superposição de leis disciplinando praticamente a mesma matéria recomenda prudência e aguda observação em seu exame devendose observar que o art 2º 1º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro dispõe que lei posterior revoga a anterior quando disciplina inteiramente a matéria nela contida Para Paulo José da Costa Jr Comentários ao Código Penal p 547 todo o art 175 do Código Penal foi revogado pelo art 7º IX da Lei n 813790 Para Luiz Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 557 nota n 4 estaria revogado somente o inciso I do art 175 Assim se lei posterior disciplinando os crimes perpetrados nas relações de consumo tratou da venda pelo comerciante de mercadoria falsificada ou deteriorada como se fosse verdadeira ou perfeita não subsiste dúvida de que a norma anterior encontrase revogada Não adotamos venia concessa nenhum desses entendimentos Na verdade exatamente em respeito àquela previsão da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro consideramos que as leis posteriores não regularam inteiramente a mesma matéria sendo assim impossível admitir a revogação tácita do dispositivo em exame do Código Penal Com efeito casuisticamente devemse confrontar os diversos diplomas legais e resolver a questão por meio do conflito aparente de normas e aplicar in concreto aquela que contemplar todas as elementares típicas Por fim se as mercadorias tiverem fim medicinal ou alimentício a conduta poderá adequarse às descrições dos arts 212 1º e 273 ambos do Código Penal configurando crime contra a saúde pública e não contra o patrimônio 42 Fraude no comércio de metais ou pedras preciosas 1º Aqui se trata de fraude no comércio específico de metais ou pedras preciosas onde é fácil enganar o comprador inexperiente causando maiores danos razão pela qual a pena também é mais grave O valor elevado por outro lado dos objetos do comércio justifica a maior punição das condutas criminalizadas Em qualquer dos casos está implícita a exigência de prejuízo ao adquirente ou comprador São na verdade quatro hipóteses de figuras qualificadas a alterar qualidade ou peso de metal em obra encomendada ao agente b substituir pedra verdadeira por falsa ou por outra de menor valor também em obra encomendada ao agente c vender pedra falsa por verdadeira d vender como precioso metal de outra qualidade Nas duas primeiras hipóteses a vítima encomenda ao sujeito ativo a elaboração de uma obra com um metal determinado platina por exemplo ou com determinada pedra Na confecção contudo o agente substitui o material por outro metal inferior no primeiro caso traindo a confiança que aquela lhe depositara no segundo substitui a pedra verdadeira por uma falsa ou por outra de menor valor A ação consiste em enganar a vítima alterando a qualidade ou o peso do metal empregado na obra executada ou substituindo pedra verdadeira por falsa ou por outra de valor inferior Em qualquer das duas hipóteses é indispensável a configuração de prejuízo para o adquirente ou consumidor Assim não haverá crime se por exemplo a alteração ou substituição do material beneficiar o consumidor Por fim nas duas últimas hipóteses criminalizase a venda de pedra falsa por verdadeira bijuteria por joia por exemplo ou de metal de qualidade inferior latão zinco como se precioso fosse ouro prata platina Essa transação para tipificar o tipo penal somente pode ser produto de venda e não de qualquer outra relação negocial como doação dação em pagamento transação etc Todas as quatro hipóteses disciplinadas no 1º do artigo em exame configuram crime material e somente se consumam com a entrega e a aceitação do objeto da transação 5 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo é constituído pelo dolo direto ou eventual representado pela vontade consciente de vender produto falsificado ou deteriorado entregar uma mercadoria por outra ou ainda alterar ou substituir metal ou pedra preciosa no exercício de atividade comercial É indispensável que o sujeito ativo tenha consciência de que está enganando o adquirente ou consumidor e que conheça as diferentes qualidades ou propriedades de cada produto enfim é necessário que o dolo abranja todos os elementos constitutivos do tipo O eventual desconhecimento de que entrega produto de menor valia ou pedra falsa no lugar da verdadeira configurará erro de tipo que se justificável excluirá a tipicidade Concluindo não se configura a fraude no comércio sem a comprovação do tipo subjetivo ou seja o dolo abrangente de todas as elementares típicas 6 Consumação e tentativa Consumase o crime de fraude no comércio com o engano efetivo do sujeito passivo que se opera com a venda ou entrega da mercadoria ao adquirente ou consumidor Não se consuma antes de a mercadoria encontrarse em poder do sujeito passivo para que se possa constatar o vício ou sua diversidade Nesse momento e nesse lugar consumase o crime que é material É admissível a tentativa diante da possibilidade de fracionamento dos atos executórios ou seja circunstâncias alheias à vontade do agente podem impedir que consume seu intento 7 Pena e ação penal As penas cominadas para a modalidade simples caput I e II são alternativas detenção de seis meses a dois anos ou multa para as figuras qualificadas as penas são cumulativas reclusão de um a cinco anos e multa A primariedade e o pequeno valor do objeto material permitem a substituição da pena de reclusão por detenção reduzila de um a dois terços ou aplicar somente multa aplicando o disposto no art 155 2º destacado expressamente no texto legal 2º A ação penal como é regra nos crimes contra o patrimônio é pública incondicionada dispensando qualquer manifestação de interesse do ofendido J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A fraude no comércio art 175 I CP é crime próprio a impor que o acusado necessariamente deve ser comerciante ou comerciário O agente que não tenha dita qualidade configurando mero particular a realizar negócio jurídico de compra e venda em cujo objeto foram encontrados vícios não pratica o crime acima referido Atipicidade reconhecida Ademais em não se subsumindo a conduta a outro tipo penal estando o ilícito revestido de características civis nessa esfera deverá ser solvido sendo impositivo que se absolva o acusado O Direito Penal considera relevantes apenas condutas da vida social das quais resultem lesões significantes e que por merecerem especial atenção justificam a ação do Estado restringindo os direitos fundamentais da dignidade e da liberdade da pessoa humana TJRS Apelação 70007068786 Rel Aramis Nassif j 332004 A acusação por prática de fraude no comércio de veículos pelo sistema de venda programada não tem repercussão no sistema financeiro nacional não atraindo a competência da Justiça Federal STJ HC 16463MS Rel Min Vicente Leal j 75 2002 Outras fraudes Art 176 Tomar refeição em restaurante alojarse em hotel ou utilizarse de meio de transporte sem dispor de recursos para efetuar o pagamento Pena detenção de 15 quinze dias a 2 dois meses ou multa Parágrafo único Somente se procede mediante representação e o juiz pode conforme as circunstâncias deixar de aplicar a pena D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Tratase de infração penal que não era prevista como figura autônoma pelo direito penal anterior durante a vigência do Código de 1890 a doutrina dominante a concebia como estelionato Durante a Idade Média a Itália já reprimia essa modalidade de conduta em algumas leis penais A França por sua vez disciplinava a matéria desde 1873 vindo a alterála em sucessivas oportunidades 1926 e 1937 Os Projetos Sá Pereira e Alcântara Machado já disciplinavam a matéria como simples contravenção A previsão do atual Código Penal de 1940 Parte Especial segundo a doutrina inspirouse no Código Penal suíço de 1937 art 150 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é a inviolabilidade do patrimônio de proprietários de hotéis restaurantes ou meios de transportes contra a lesão fraudulenta a que com facilidade são expostos nesse ramo de atividade Criminalizase a conduta de contrair obrigação seja consumindo alimentos e bebidas seja alojandose em hotéis seja servindose de meio de transporte sem dispor no entanto dos recursos necessários para satisfazêla Ao lado desse interesse privado existe logicamente o interesse público relativo à harmonia e à estabilidade da ordem jurídica 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo é quem pratica qualquer das ações proibidas pelo artigo em exame tomar refeição em restaurante alojarse em hotel ou utilizarse de meio de transporte sem dispor dos meios necessários para pagálos sujeito ativo à evidência pode ser qualquer pessoa independente de qualidade ou condição especial tratandose pois de crime comum Como é a impossibilidade de cumprir a obrigação assumida que caracteriza a infração penal há a presunção legal de tratarse de sujeito ativo capaz de assumir tal obrigação Assim não poderá ser sujeito ativo desse crime o incapaz por faltarlhe a responsabilidade necessária para assumir uma obrigação civil Sujeito passivo por outro lado pode ser pessoa física ou jurídica Nem sempre quem sofre o engano é quem suporta o prejuízo A pessoa enganada garçom motorista pode ser diversa da que sofre o prejuízo ou seja pode existir mais de um sujeito passivo de um único e mesmo crime Pode ocorrer aqui fenômeno semelhante ao estelionato em que muitas vezes quem é ludibriado não é quem tem o prejuízo 4 Tipo objetivo adequação típica O tipo penal prevê três espécies de condutas puníveis 1 tomar refeição em restaurante 2 alojarse em hotel 3 utilizarse de meio de transporte Tomar refeição em restaurante significa que a conduta deve ser realizada no estabelecimento tanto que se o sujeito ativo somente encomenda a refeição para ser entregue em outro lugar não pratica o crime em exame podendo no entanto incorrer no crime de estelionato Alojarse em hotel abrange todos os estabelecimentos similares destinados a acolher hóspedes tais como hospedarias albergues pensões etc Utilizarse de meio de transporte tem o sentido de coletivo como ônibus táxi metrô etc Nas três hipóteses é condição indispensável que o agente não disponha de recursos para efetuar o pagamento consistindo a fraude exatamente no fato de o agente silenciar quanto à impossibilidade de pagamento A fraude consiste em o agente utilizarse dos serviços relacionados sem dispor dos recursos para pagálos mas apresentarse como se os tivesse comportase como um cliente normal honesto que honrará o compromisso assumido induzindo o sujeito passivo em erro Em qualquer das modalidades existe uma obrigação assumida que é descumprida Refeição inclui também bebidas restaurante compreende local para servir refeição café pensão boîte etc hotel abrange hospedarias albergues e pensões Concluindo não haverá crime se a refeição não for tomada em restaurante isto é no estabelecimento mas for encomendada para entrega em domicílio O passageiro clandestino não pratica esse crime que exige o descumprimento de uma obrigação assumida mas sim o de estelionato 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo dessa infração penal é representado pelo dolo que pode ser direto ou eventual constituído pela vontade consciente de praticar qualquer das ações relacionadas no tipo penal É indispensável que a consciência do agente abranja todos os elementos constitutivos da descrição legal especialmente que não dispõe dos valores necessários para pagar pela obrigação que acaba de assumir Eventual desconhecimento do agente do fato de que por exemplo encontrase sem dinheiro quando se aloja em hotel pede refeição ou toma um meio de transporte não configura o crime por faltarlhe a consciência dessa circunstância A tipicidade é afastada por erro de tipo 6 Consumação e tentativa A relevância jurídica de qualquer das condutas surge somente com o não pagamento das despesas efetuadas ou seja após a prática de qualquer das condutas refeição alojamento ou transporte Logo estamos diante de um crime material isto é um crime de dano que somente se concretiza com a ocorrência efetiva de prejuízo Em outros termos o crime se consuma com a prática de qualquer das condutas incriminadas quando o agente toma total ou parcialmente a refeição quando obtém o alojamento mesmo que por tempo exíguo ou se serve do transporte sem dispor de recursos para efetuar o pagamento Admitese a tentativa em que pesem algumas posições contrárias como a de Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 480 que afirmava Tão logo a vítima sic iniciou a refeição alojouse em hotel ou serviuse de meio de transporte não tendo recursos ação incriminada já se realizou Esse entendimento não nos parece sustentável na medida em que inegavelmente estamos diante de um crime cuja fase executória admite fracionamento e por conseguinte tentativa Nesse sentido o exemplo sugerido por Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 278 é impecável Já tendo sido trazida a refeição ou ao entrar o agente no quarto do hotel ou no veículo de transporte é descoberto por aviso de terceiro ou outra circunstância o plano de burla que assim se frustra 7 Pena e ação penal As penas cominadas são alternativamente detenção de quinze dias a dois meses ou multa A ação penal é pública condicionada à representação do ofendido Perdão judicial conforme as circunstâncias o juiz pode deixar de aplicar a pena J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Fraude no pagamento por meio de cheque Emissão de cheque sem suficiente provisão de fundos para pagamento de despesas de hospedagem em estabelecimento hoteleiro Cheque emitido para documentar dívida preexistente referente a pagamento de diárias de hotel Ausência de prejuízo novo Estelionato é crime material que exige o auferir de vantagem nova com a prática da manobra Conduta que mais se afeiçoa ao disposto no art 176 do CP para o qual é desclassificada a infração Apelo parcialmente provido TJRS Apelação 70015266919 Rel Paulo Moacir Aguiar Vieira j 30112006 Fraude Art 176 do Código Penal Há prova concreta da conduta do réu na forma do previsto no art 176 do Código Penal pois se hospedou no motel e não demonstrou qualquer providência para a satisfação do débito contraído mesmo após se retirar do local A incidência do parágrafo único pressupõe a ação clara do réu ainda que posteriormente em satisfazer o débito que permanece confirmando a versão de que tinha o dolo de fraudar o estabelecimento TJRS Recurso Crime 71001002062 Rel Alberto Delgado Neto j 6112006 Fraudes e abusos na fundação ou administração de sociedade por ações Art 177 Promover a fundação de sociedade por ações fazendo em prospecto ou em comunicação ao público ou à assembleia afirmação falsa sobre a constituição da sociedade ou ocultando fraudulentamente fato a ela relativo Pena reclusão de 1 um a 4 quatro anos e multa se o fato não constitui crime contra a economia popular 1º Incorrem na mesma pena se o fato não constitui crime contra a economia popular V Lei n 152151 crimes contra a economia popular V Capítulo VII da Lei n 111012005 V Lei n 640476 sociedades por ações I o diretor o gerente ou o fiscal de sociedade por ações que em prospecto relatório parecer balanço ou comunicação ao público ou à assembleia faz afirmação falsa sobre as condições econômicas da sociedade ou oculta fraudulentamente no todo ou em parte fato a elas relativo II o diretor o gerente ou o fiscal que promove por qualquer artifício falsa cotação das ações ou de outros títulos da sociedade III o diretor ou o gerente que toma empréstimo à sociedade ou usa em proveito próprio ou de terceiro dos bens ou haveres sociais sem prévia autorização da assembleia geral IV o diretor ou o gerente que compra ou vende por conta da sociedade ações por ela emitidas salvo quando a lei o permite V o diretor ou o gerente que como garantia de crédito social aceita em penhor ou em caução ações da própria sociedade VI o diretor ou o gerente que na falta de balanço em desacordo com este ou mediante balanço falso distribui lucros ou dividendos fictícios VII o diretor o gerente ou o fiscal que por interposta pessoa ou conluiado com acionista consegue a aprovação de conta ou parecer VIII o liquidante nos casos dos ns I II III IV V e VII IX o representante da sociedade anônima estrangeira autorizada a funcionar no País que pratica os atos mencionados nos ns I e II ou dá falsa informação ao Governo 2º Incorre na pena de detenção de 6 seis meses a 2 dois anos e multa o acionista que a fim de obter vantagem para si ou para outrem negocia o voto nas deliberações de assembleia geral D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias A matéria foi introduzida no Brasil pela Lei n 3150 de 3 de novembro de 1882 que foi alterada pelo Decreto n 164 de 1890 o qual acabou inspirando o Código Penal republicano do mesmo ano A legislação penal nessa matéria foi modificada com o advento da lei sobre sociedade por ações DecretoLei n 2627 de 26 de setembro de 1940 arts 167172 O CP de 1940 no art 177 reproduziu praticamente sem alterações o que se continha nos arts 168 e 171 do DecretoLei n 2627 A disposição do art 167 n 8 que o CP não incorporara ficou tacitamente revogada pois a nova lei cuidou integralmente da matéria As contravenções dos arts 169 e 170 do DecretoLei n 2627 estão revogadas com o advento da nova lei sobre sociedade por ações Lei n 640476 O Decreto n 262740 foi revogado pela última lei citada Essa lei n 640476 não cuida da matéria penal que continua disciplinada pelo Código Penal A Lei n 638576 criou a Comissão de Valores Mobiliários atribuindolhe competência para fiscalizar e inspecionar as sociedades por ações abertas aplicando penalidades pelos atos ilegais de administradores e acionistas O legislador de 1940 trata no art 177 das fraudes e abusos na fundação e administração de sociedades por ações que como já mencionamos são reguladas pela Lei n 640476 que é a lei especial mencionada pelo Código Civil de 2002 em seu art 1089 A Lei n 640476 no entanto a chamada Lei das Sociedades Anônimas não contém matéria criminal que continua a ser disciplinada no art 177 do Código Penal No caput daquele dispositivo tratase da fraude na constituição da sociedade por ações ao passo que nos incisos do 1º se cuida das fraudes praticadas no funcionamento de tais sociedades 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é o patrimônio particularmente daqueles que investem em sociedades abertas isto é tutelase o patrimônio dos acionistas contra a organização e a administração fraudulenta e abusiva das sociedades por ações O interesse dos acionistas apresentase por meio de um conjunto de princípios que se pode resumir como veracidade e autenticidade das informações dados números sobre a constituição funcionamento e administração da sociedade integridade do capital social e funcionamento correto do mercado de título mobiliário e finalmente atuação correta de administradores e fiscais no interesse da sociedade Todos esses aspectos em outros termos constituem abstratamente o patrimônio do acionista Convém destacar a absoluta insuficiência do combate sob o aspecto criminal ao excessivo número de fraudes praticadas quer na constituição quer na administração das sociedades de capital aberto e inclusive no mercado mobiliário Os mecanismos que se têm criado para reprimir os abusos e preservar os interesses dos acionistas em geral e particularmente dos minoritários estão longe de satisfazer as necessidades mercadológicas Por fim a Lei de Economia Popular Lei n 152151 criminaliza uma série de condutas que também podem adequarse a vários dos tipos contidos no art 177 e seus incisos Há que ter muita cautela para constatar in concreto qual dos dois diplomas legais deve ser aplicado O critério sugerido pela doutrina de modo geral é o de aplicar a Lei de Economia Popular sempre que a sociedade for organizada mediante subscrição pública apresentando cunho nitidamente popular Acreditamos no entanto que somente o casuísmo poderá nos indicar a norma aplicável questão que a nosso juízo deve ser solucionada pelo conflito aparente de normas 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo deve ser quem funda a sociedade por ações No caso sujeitos ativos são os fundadores da sociedade os primeiros subscritores do capital desde que façam afirmação falsa ou ocultação fraudulenta Podem concorrer para o crime coautor ou partícipe evidentemente os que não sendo fundadores atuam em nome da instituição financeira que intermedeia a subscrição pública por exemplo art 82 da Lei n 640476 Sujeito passivo pode ser qualquer pessoa que por alguma razão subscreva como acionista sendo vítima da afirmação falsa sobre a constituição da sociedade ou de ocultação fraudulenta de fato relevante relativa à sociedade 4 Tipo objetivo adequação típica A primeira conduta criminalizada contida no caput do art 177 tem a seguinte formulação Promover a fundação de sociedade por ações fazendo em prospecto ou em comunicação ao público ou à assembleia afirmação falsa sobre a constituição da sociedade ou ocultando fraudulentamente fato a ela relativo Tratase de fraude na constituição de sociedade por ações visando a atrair capitais e interessados no empreendimento Constatase que embora o caput criminalize uma conduta promover prevê duas formas ou meios de executála fazer afirmação falsa ou ocultar fato fraudulentamente Afirmação falsa obviamente é aquela que não corresponde à realidade aquela que é inverídica fictícia isto é representada pela criação de fatos artificiais inexistentes distorcidos ou inidôneos que atraiam investidores para a subscrição de capital social Essa falsidade informativa pode ocorrer de várias formas como exemplificava Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 484 in verbis A simulação de subscrição ou entradas a designação de pessoas de grande conceito ou representação social como ligadas à empresa a mentira sobre o objeto em que recairá atividade da companhia a afirmação mendaz sobre os recursos técnicos que ela possui para realizar sua finalidade a assertiva mentirosa sobre a produção e o consumo de produtos em desconformidade com as reais possibilidades da companhia etc A segunda forma criminalizada da conduta de promover a fundação de sociedade por ações é a ocultação fraudulenta de fato relativo à mencionada sociedade Em outros termos os fundadores da sociedade por ações ocultam informações reais verdadeiras e relevantes da sociedade enganando os possíveis investidores É necessário que a informação afirmação falsa ou ocultação fraudulenta de fato refirase a fato relevante devendo possuir potencialidade lesiva Assim não tipifica esse crime informação ou omissão de comunicação de circunstância de conteúdo não relevante incapaz de produzir ou causar uma situação de perigo de dano A informação segundo a exigência contida no caput deve ser promovida em prospecto em comunicação ao público ou à assembleia Sociedade por ações pode apresentarse sob a forma de sociedade anônima ou em comandita por ações qualquer das duas satisfaz esse elemento normativo do tipo A primeira é a sociedade em que o capital é dividido em ações limitandose a responsabilidade do sócio ao preço de emissão das ações subscritas ou adquiridas a segunda sociedade em comandita por ações é aquela em que o capital é dividido por ações respondendo os acionistas apenas pelo valor das ações subscritas ou adquiridas mas tendo os diretores ou gerentes responsabilidade subsidiária ilimitada e solidária pelas obrigações sociais Fran Martins Curso de Direito Comercial p 301 e 419 Na hipótese de ocultação fraudulenta o crime é omissivo puro 41 Fraude na fundação de sociedade por ações crime subsidiário A Lei n 152151 Lei de Economia Popular criminaliza em seu art 3º VII a X fatos que também vêm a se adequar a diversas figuras típicas elencadas no art 177 do CP Com efeito as infrações praticadas contra sociedades por ações constituem em princípio crimes contra a economia da sociedade se não significam a mesma coisa andam pelo menos muito próximo demandando extrema cautela a busca da distinção A subsidiariedade da figura descrita no caput do dispositivo em exame é expressa assim somente se tipificará esse crime se o fato não constitui crime contra a economia popular preceito secundário do art 177 caput do CP A questão fundamental afinal passa a ser como encontrar a melhor solução para esse aparente conflito de normas 42 Conflito aparente de normas Para Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 4823 a solução seria a seguinte Em se tratando de sociedade por ações parecenos necessário o exame de que o fato tenha lesado ou posto em perigo as pequenas economias de um grande extenso e indefinido número de pessoas Assim se o fato é enquadrável no art 177 do Código e em dispositivos da Lei 1521 de 1951 que substituiu o Decretolei 869 de 1938 mas se a lesão real ou potencial atinge apenas a uma ou duas dezenas de pessoas ricas ou de magnatas que subscreveram todo o capital social cremos que muito mal o delito poderia ser considerado contra a economia do povo Ao contrário se a subscrição fosse feita por avultado e extenso número de pessoas que com seus minguados recursos subscreveram uma ou outra ação a ofensa patrimonial seria dirigida contra a economia popular Numa hipótese temos pequeno grupo de pessoas prejudicado noutra é a bem dizer o povo tal o número de lesados que sofre o dano Essa orientação também era destacada por Heleno Cláudio Fragoso nos seguintes termos O critério em geral aceito pela doutrina e que se extrai da própria lei de economia popular é o de aplicar esta sempre que a sociedade por ações for organizada por subscrição pública apresentando cunho nitidamente popular Na atualidade a partir da Lei n 640476 a abertura de capitais a subscrição de ações é sempre pública chegando ao conhecimento de em tese milhões de pessoas Não nos agradam as sugestões de Magalhães Noronha e Heleno Fragoso pois ambas pecam pela falta de cientificidade Não se podem inventar critérios casuísticos toda vez que surgir o conflito aparente de normas criando divergências doutrináriojurisprudenciais e gerando insegurança jurídica Na verdade a solução deverá ser necessariamente a tradicional isto é aquela oferecida pelos princípios orientadores do conflito aparente de normas 43 Princípios da subsidiariedade e da especialidade Nesse caso contudo devese trabalhar com dois princípios ao contrário do que normalmente ocorre quando a solução é encontrada com a utilização de apenas um deles Com efeito são aplicáveis os princípios da subsidiariedade e da especialidade A subsidiariedade vem expressa no preceito secundário do dispositivo em exame como já referimos No entanto para aplicar o princípio da subsidiariedade é fundamental definir a espécie de crime que determinado fato constitui Essa definição somente poderá ser encontrada com segurança por meio do princípio da especialidade Considerase especial uma norma penal em relação a outra geral quando reúne todos os elementos desta acrescidos de mais alguns denominados especializantes Isto é a norma especial acrescenta elemento próprio à descrição típica prevista na norma geral Assim como afirma Jescheck Tratado de Derecho Penal trad Mir Puig e Muñoz Conde Barcelona Bosch 1981 p 1035 toda a ação que realiza o tipo do delito especial realiza também necessariamente ao mesmo tempo o tipo do geral enquanto o inverso não é verdadeiro Somente os fatos in concreto podem permitir o confronto analítico perante os dois diplomas legais para atribuirlhes a qualificação correta 5 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo é constituído pelo dolo direto ou eventual representado pela vontade consciente de promover a fundação de sociedade por ações fazendo afirmação falsa sobre a constituição da sociedade ou ocultando fraudulentamente fato relevante Alguns autores como Damásio de Jesus Regis Prado Heleno Fragoso Direito Penal v 2 p 462 Curso de Direito Penal brasileiro p 572 Lições de Direito Penal v 1 p 519 respectivamente entre outros sustentam a necessidade da presença do elemento subjetivo especial do injusto que seria representado pelo fim especial de constituir a sociedade por ações Embora numa visão simplista tenhamos acompanhado esse entendimento nas primeiras edições deste Código acreditamos que essa não seja a melhor orientação pelo menos não é dogmaticamente sustentável Com efeito o que segundo se tem afirmado constituiria o fim especial do injusto é exatamente o que caracteriza o dolo vontade e consciência de constituir sociedade por ações ou seja sem essa vontade consciente não se pode falar em dolo Nesse sentido reformulando nossa posição anterior entendemos não existir o mencionado elemento subjetivo especial do tipo como destaca lucidamente Guilherme Nucci Código Penal comentado p 5856 ao afastar esse elemento subjetivo in verbis Não se pode concordar com tal concepção pois o mencionado intuito de constituir a sociedade é conduta ínsita ao verbo do tipo promover ou seja gerar Basta pois o dolo 6 Consumação e tentativa Consumase com a afirmação falsa ou a ocultação fraudulenta independentemente da efetiva constituição da sociedade ou da ocorrência de efetivo prejuízo Esse já era o entendimento sustentado por Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 485 Não se exige para a consumação resultado externo ou estranho à ação do agente Esta por si só é bastante para integralizar o delito Assim comunicada pelos indicados na lei a afirmação ou a omissão falsa o crime está consumado mesmo que nenhuma ação seja subscrita sendo suficiente a potencialidade da ação Tratase com efeito de crime formal A tentativa embora tecnicamente admissível na forma comissiva é de difícil ocorrência Alguns autores seguindo a orientação de Nélson Hungria não admitem a possibilidade de tentativa Na forma omissiva ocultação fraudulenta à evidência a tentativa é impossível 7 Fraude sobre as condições econômicas de sociedade por ações 1 I Em todos os incisos do 1º a incriminação referese a abusos e fraudes relativos ao funcionamento das sociedades por ações ao contrário da previsão do caput que criminaliza a fraude na constituição da sociedade O diretor o gerente ou o fiscal de sociedade por ações que em prospecto relatório parecer balanço ou comunicação ao público ou à assembleia faz afirmação falsa sobre as condições econômicas da sociedade ou oculta fraudulentamente no todo ou em parte fato a elas relativo O princípio da subsidiariedade expressamente mencionada no caput aplicase também em todas as figuras tipificadas nos incisos do lº se o fato não constitui crime contra a economia popular 71 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido pela previsão do inciso I é exatamente o mesmo do caput do dispositivo ou seja o patrimônio alheio particularmente daqueles que investem em sociedades abertas em outros termos tutelase o patrimônio dos acionistas contra a organização e a administração fraudulenta e abusiva das sociedades por ações Damásio de Jesus sugere que secundariamente o legislador procura proteger a veracidade das informações referentes ao valor das ações e outros títulos da sociedade 72 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo tratandose de crime próprio somente pode ser o diretor gerente fiscal ou liquidante O diretor é normalmente um dos principais acionistas eleito pelo conselho de administração ou pela assembleia geral O gerente é o administrador geral ou parcial da empresa não necessariamente acionista podendo ser apenas um funcionário contratado para gerir o empreendimento com determinados poderes decisórios Fiscal é o membro do conselho fiscal cujas atribuições podem ser mais ou menos abrangentes mas sempre definidas em estatuto Destaca com acerto Damásio de Jesus Direito Penal v 2 p 463 o rol não pode ser ampliado ou seja o membro do conselho administrativo por exemplo não pode cometer esse crime Liquidante por fim é a pessoa nomeada pela assembleia geral ou pelo conselho de administração com a atribuição de proceder à dissolução da companhia fixar a forma operacional e dirigir sua execução dispondo dos poderes que lhe são atribuídos pelos arts 210 e 211 da Lei n 640476 A Lei das Sociedades Anônimas Lei n 640476 considera administradores os membros da diretoria e os do conselho de administração Contudo como referida lei não contemplou matéria penal permanece inalterado o art 177 do Código seus parágrafos e incisos que relacionam como sujeitos ativos somente diretor gerente e fiscal Por isso é impossível admitir como sujeitos ativos os membros do conselho de administração ante a proibição de analogia e interpretação extensiva em matéria penal Referidos administradores poderão no entanto ser alcançados por meio do concurso de pessoas quer sob a figura da coautoria quer da participação em sentido estrito Sujeito passivo a exemplo do que ocorre com a previsão do caput pode ser qualquer pessoa física ou jurídica 73 Tipo objetivo adequação típica A conduta tipificada é semelhante à do caput fazer afirmação falsa ao público ou à assembleia sobre as condições econômicas da sociedade ou ocultar fraudulentamente fato a elas relativo Diferentemente da previsão do caput aqui a fraude não é praticada na constituição de sociedade por ações mas em seu funcionamento A afirmação falsa ou a ocultação fraudulenta é relativa às condições econômicas da sociedade já constituída O prospecto constante do texto legal nesta figura penal referese ao aumento de capital mediante subscrição pública pois a lei determina que se observe na elevação de capital que assim se realizar o previsto para a constituição arts 170 6º e 82 ambos da Lei n 640476 Relatório é o documento elaborado pela administração sobre os negócios da sociedade e os principais fatos administrativos juntamente com outros documentos deverá ser publicado até cinco dias antes da assembleia geral ordinária art 133 da Lei n 640476 Parecer é o documento elaborado pelo conselho fiscal aos acionistas e à assembleia geral em todas as oportunidades legalmente determinadas Balanço é a demonstração financeira por excelência da sociedade que apresenta o resultado da verificação de ativo e passivo A Lei das Sociedades Anônimas alterou a terminologia adotada na legislação anterior passando a denominar demonstrações financeiras o que a lei antecessora chamava de balanço Por isso já sustentava Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 521 onde a lei penal fala em balanço deveria agora falar em demonstrações financeiras Na configuração do crime que ora examinamos a falsa afirmação e a ocultação fraudulenta devem recair sobre o balanço patrimonial A falsidade que recaia sobre as demais demonstrações financeiras constituirá falsidade documental comum Além do prospecto do relatório do parecer e do balanço o texto legal referese genericamente a qualquer outra comunicação ao público ou à assembleia na qual se faça afirmação falsa sobre as condições econômicas da sociedade ou ocultação fraudulenta de fato a elas relativo É indispensável que a falsidade ou a ocultação fraudulenta refirase a fato relevante capaz de influir em decisões ou deliberações da assembleia e de quem tem interesse na sociedade Como destacava Hungria as fraudes com o objetivo de alterar o balanço são as mais variadas possíveis justificandose por conseguinte a preocupação do legislador penal ao criminalizar tais condutas Os demais dados do tipo são os mesmos do caput sendo desnecessário reexaminálos 74 Consumação e tentativa Consumase com a afirmação falsa ou a ocultação fraudulenta contida em qualquer dos documentos referidos independente do efetivo prejuízo consumase enfim com a expedição do prospecto com a apresentação do relatório parecer ou balanço ou com a comunicação falsa ao público ou à assembleia A tentativa embora tecnicamente admissível é de difícil ocorrência e mesmo quando se configura sua comprovação apresenta grande dificuldade 8 Falsa cotação de ações ou título de sociedade 1º II Essa conduta já fora objeto do Código Penal de 1890 art 340 n 3 Tratase da proibição de conduta que objetive criar mercados fictícios para a valorização dos títulos da sociedade ou então para facilitar a baixa de sua cotação o diretor o gerente ou o fiscal que promove por qualquer artifício falsa cotação das ações ou de outros títulos da sociedade 1º II 81 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo a exemplo do inciso anterior crime próprio somente pode ser o diretor gerente fiscal ou liquidante Os demais membros do conselho deliberativo não podem ser sujeito ativo desse crime salvo se concretamente forem alcançados pelo instituto do concurso de pessoas coautoria ou participação em sentido estrito Sujeito passivo pode ser qualquer pessoa física ou jurídica independentemente da existência de condição ou qualidade especial Concretamente como regra serão os sócios ou os terceiros que possam eventualmente sofrer dano patrimonial em decorrência da ação delituosa 82 Tipo objetivo adequação típica A conduta tipificada é promover mediante qualquer artifício falsa cotação de ações ou de outros títulos de sociedade Cotação falsa é a que não corresponde ao valor regular do mercado determinado pela oferta e procura A falsa cotação das ações produz indicação inverídica sobre a situação econômica de qualquer companhia induzindo em erro aos que transacionarem com a empresa A falsa cotação tanto pode ser para aumentar como para diminuir o valor das ações Esse crime só pode ser praticado em relação a empresas cujos títulos tenham cotação regular no mercado de ações na medida em que somente estes podem ser objeto de cotação falsa ou correta O meio utilizado para promover a falsidade de cotação pode ser qualquer artifício ou seja qualquer ardil falsidade mentira ficção desde que tenha idoneidade para enganar ou iludir o mercado acionário Em síntese artifício é qualquer atividade lícita ou ilícita que possa alterar artificialmente a cotação dos títulos para mais ou para menos Os demais dados são os mesmos do caput 83 Consumação e tentativa Como crime formal a falsa cotação de ações ou títulos de sociedade consumase independentemente da superveniência de qualquer dano proveniente da cotação falsa Em outros termos o crime consumase no momento em que o sujeito ativo obtém a falsa cotação A tentativa é admissível uma vez que o emprego de artifício fraudulento idôneo constitui início da execução que no entanto pode não atingir a cotação falsa pretendida 9 Empréstimo ou uso indevido de bens ou haveres lº III O inciso III tipifica o abuso de diretor ou gerente que toma empréstimo à sociedade ou usa em proveito próprio ou de terceiro dos bens ou haveres sociais sem prévia autorização da assembleia geral Esse crime apresenta alguma semelhança com o chamado de apropriação indébita embora seja específico em relação a diretor ou gerente crime próprio que apenas usa ou toma por empréstimo bens da sociedade a que serve A grande diferença da apropriação indébita reside exatamente na falta do animus apropriandi pois o abuso do patrimônio alheio limitase a seu uso indevido 91 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser o diretor gerente ou o liquidante crime próprio Os demais membros do conselho deliberativo a exemplo do inciso anterior não podem ser sujeito ativo desse crime salvo se concretamente forem alcançados pelo instituto do concurso de pessoas coautoria ou participação em sentido estrito Na verdade a lei penal não prevê como possíveis autores do crime os membros do conselho de administração que a nova Lei das Sociedades por Ações inclui entre os administradores da sociedade Sujeito passivo é a própria sociedade como um todo e individualmente seus acionistas que sofrem diretamente uma perda patrimonial 92 Tipo objetivo adequação típica As condutas tipificadas são tomar por empréstimo ou usar dos bens ou haveres sociais Empréstimo é contrato pelo qual uma coisa é entregue com a obrigação de ser restituída em espécie e gênero comodato e mútuo Usar dos bens móveis ou imóveis ou haveres sociais haveres em geral como títulos dinheiro etc desde que o faça arbitrariamente isto é sem autorização da assembleia geral Necessário que o bem usado indevidamente seja devolvido e que esse uso seja irregular isto é alheio aos interesses sociais O legislador pretendeu proteger a sociedade contra os maus administradores que usam seus cargos para obter vantagem indevida Nesse sentido o art 154 2º da Lei n 640476 proíbe que o administrador se aproveite das facilidades de suas funções em prejuízo da companhia O eventual reconhecimento ou autorização posterior da assembleia geral não tem o condão de afastar o crime que já está consumado As condutas tipificadas enfim devem ocorrer em proveito próprio ou alheio e desautorizadamente ou nos termos da lei sem prévia autorização da assembleia geral É irrelevante a superveniência de dano ou prejuízo para a sociedade de acionistas O crime de abuso na administração de sociedade por ações art 177 1º III do CP é formal dispensando a ocorrência de prejuízo concreto para sua configuração Se contudo o sujeito ativo dispuser da coisa animo domini a infração penal terá outra coloração estarseá diante do crime de apropriação indébita agravado art 168 3º 93 Consumação e tentativa Como crime formal ou seja não exigindo efetivo dano material consumase com o empréstimo ou uso de bens ou haveres da sociedade independentemente da superveniência de prejuízo A tentativa é admissível em princípio ante a possibilidade de interrupção do iter criminis Sustentase que na figura representada pelo verbo usar é impossível a tentativa pois o primeiro ato de uso já consuma o delito No entanto na figura de tomar por empréstimo a tradição do objeto material pode ser impedida por circunstâncias alheias à vontade do agente 10 Compra e venda de ações da sociedade 1º IV A Lei das Sociedades Anônimas Lei n 640476 consagra o princípio fundamental de os administradores dessas sociedades não poderem negociar com as próprias ações art 30 O Código Penal de 1890 já incriminava esse fato O Código Penal de 1940 na mesma linha incrimina o diretor ou o gerente que compra ou vende por conta da sociedade ações por ela emitidas salvo quando a lei o permite 1º IV 101 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser o diretor gerente ou o liquidante crime próprio Os demais membros do conselho deliberativo a exemplo do inciso anterior não podem ser sujeito ativo desse crime salvo se concretamente forem alcançados pelo instituto do concurso de pessoas coautoria ou participação em sentido estrito A nova Lei das Sociedades por Ações inclui os membros do conselho de administração entre os administradores da sociedade Contudo a lei penal não prevê como possíveis autores do crime os membros do referido conselho Sujeito passivo é a própria sociedade como um todo e individualmente seus acionistas que sofrem diretamente uma perda patrimonial 102 Tipo objetivo adequação típica O que se pune é a compra ou venda pela sociedade de suas próprias ações salvo quando a lei o autoriza como ocorre na hipótese do art 30 da Lei n 640476 As condutas proibidas estão representadas pelos verbos nucleares comprar adquirir por meio oneroso e vender alienar ou ceder por preço determinado Essa proibição abrange todas as formas de transações capazes de produzir efeitos econômicos Comprar e vender nesse caso têm o sentido de qualquer negócio que produza os efeitos econômicos de compra e venda Somente é proibida a compra ou venda efetuada por conta da sociedade e não a que for celebrada em nome ou por conta de terceiro Por outro lado o elemento normativo típico salvo quando a lei o permite significa que o ordenamento jurídico pode determinar em situações expressas essa operação e nesses casos não apenas ficará afastada a antijuridicidade mas a própria tipicidade pela ausência de um elemento normativo típico Nessas circunstâncias salvo hipóteses previstas casuisticamente na legislação diretor gerente e liquidante estão proibidos de comprar ou vender ações em nome da sociedade Enfim a compra das próprias ações pela companhia aberta deverá seguir necessariamente as normas expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários que poderá subordinála a prévia autorização em cada caso concreto art 30 2º da Lei n 640476 Destacava Nélson Hungria que Comentários ao Código Penal v 7 p 298 a ratio da incriminação é no caso de negociação das ações da própria sociedade impedir a redução clandestina do capital social em prejuízo da empresa ou da garantia oferecida aos credores ou evitar especulações no sentido da alta ou baixa fictícia das ações ou o ensejo a outras possíveis fraudes 103 Consumação e tentativa Consumase o crime com a compra ou venda por conta da sociedade das próprias ações independentemente da produção de qualquer resultado econômico A tentativa é em tese admissível 11 Caução de ações da sociedade 1º V Este é o segundo dispositivo a incriminar condutas que praticam abusos com as ações da própria sociedade O inciso IV proíbe a compra e venda das ações este incrimina aceitar em garantia as ações da própria sociedade o diretor ou o gerente que como garantia de crédito social aceita em penhor ou em caução ações da própria sociedade 111 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser o diretor ou gerente e o liquidante crime próprio Sujeito passivo é a própria sociedade e seus acionistas a exemplo do que ocorre no inciso anterior 112 Tipo objetivo adequação típica A ação incriminada consiste em aceitar em penhor ou caução as ações da própria sociedade em garantia de crédito social Para a configuração desse crime é necessário que a sociedade tenha crédito de acionista ou de terceiro e que como garantia desse crédito o sujeito ativo aceite as ações da própria sociedade Ora as ações nada mais são do que dívidas da sociedade para com os acionistas Assim recebendo em garantia as próprias ações a sociedade reuniria a posição incompatível de credora e fiadora ao mesmo tempo pois como sustentava Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 529 é evidente que as próprias ações seriam sempre uma garantia fictícia para a sociedade As ações de uma companhia em outros termos nada mais são que títulos representativos de dívida sua para com os acionistas Garantia de crédito social não se confunde com a caução prestada por diretores como garantia de gestão que é permitida 113 Consumação e tentativa Como crime formal consumase com a aceitação das ações em garantia de dívida sendo indiferente a ocorrência efetiva de prejuízo A tentativa é admissível pois a ação incriminada pode ser fragmentada contra a vontade do agente 12 Distribuição de lucros ou dividendos fictícios 1º VI Aqui se incrimina a distribuição de lucros ou dividendos fictícios nos seguintes termos o diretor ou o gerente que na falta de balanço em desacordo com este ou mediante balanço falso distribui lucros ou dividendos fictícios 121 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo somente pode ser o diretor ou gerente da companhia crime próprio Nessa figura o liquidante ao contrário das hipóteses previstas nos incisos anteriores não pode ser sujeito ativo art 177 1º VIII Acreditamos que os fiscais que aprovarem o balanço falso mesmo sabendo da falsidade somente poderão responder por esse crime por meio do instituto do concurso de pessoas Sujeito passivo também aqui é a própria sociedade Não nos parece que nesta hipótese os acionistas possam ser tidos como sujeitos passivos pois acabam sendo beneficiados mesmo involuntariamente com distribuição irreal de dividendos 122 Tipo objetivo adequação típica A ação incriminada consiste em distribuir dividendos que não correspondem a lucros efetivos e que portanto constituem em outros termos lesão ao patrimônio da sociedade e por extensão de seus acionistas A Lei das Sociedades por Ações estabelece que a companhia somente pode pagar dividendos à conta de lucro líquido no exercício de lucros acumulados e de reserva de lucros art 201 da Lei n 640476 Distribuir dividendos significa pagálos ou creditálos aos acionistas Em qualquer sociedade comercial o lucro é apurado mediante balanço A distribuição dos dividendos e dos lucros à evidência somente pode ser feita de acordo com o balanço A distribuição de dividendos sem a existência de lucro correspondente procura dar aparência de prosperidade induzindo em erro o comércio em geral o sistema financeiro e o próprio mercado mobiliário Essa fraude além de prejudicar o patrimônio social beneficia os próprios diretores e demais administradores a quem o estatuto geralmente atribui participação nos lucros da companhia Distribuição de lucro fictício induz os investidores em erro fazendoos supor a existência de uma situação financeira e patrimonial irreal da sociedade Na hipótese de balanço falso poderá haver concurso material com o crime de falsidade ideológica art 299 se houver sido falsificado pelo agente ou então com o crime de uso de documento falso art 304 123 Consumação e tentativa Como crime formal consumase com a distribuição dos lucros ou dividendos sem corresponderem ao apurado em balanço Tratandose de crime formal é irrelevante a obtenção de vantagem ou a causação de prejuízo A tentativa é admissível 13 Aprovação fraudulenta de conta ou parecer 1º VIII O crime de aprovação fraudulenta de conta ou parecer está previsto nos seguintes termos o diretor o gerente ou o fiscal que por interposta pessoa ou conluiado com acionista consegue a aprovação de conta ou parecer 131 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser o diretor gerente ou fiscal e o liquidante crime próprio Nesse crime os próprios fiscais aparecem como sujeito ativo pois as contas elaboradas pelos administradores das sociedades anônimas são submetidas a parecer do conselho fiscal Sujeito passivo é a própria sociedade e seus acionistas 132 Tipo objetivo adequação típica Duas são as modalidades de condutas puníveis por meio de interposta pessoa ou conluiado com acionista conseguir aprovação de conta ou parecer Interposta pessoa é o testa de ferro que comparece para votar acionista conluiado é o de máfé aliciado ou subornado Na primeira figura os administradores ou fiscais cedem suas ações ao testa de ferro para que possam votar na assembleia pela votação das contas ou parecer na segunda os sujeitos ativos limitamse a corromper acionistas que são detentores de votos evidentemente para que votem segundo os interesses daqueles O conluio caracteriza a má fé de todos os participantes Dessa forma quem eventualmente participar de boafé isto é desconhecendo a trama existente não responde pelo crime Obviamente como destacava Nélson Hungria as contas ou pareceres devem estar em contraste com a verdade importando sua aprovação um dano ou perigo de dano ao interesse da sociedade ou de terceiro Como se trata de crime de fraude é necessário que as contas ou pareceres estejam em desacordo com a realidade O acionista conluiado e o testa de ferro ao contrário do que pensavam alguns penalistas serão coautores abrangidos pelo disposto no art 29 do Código Penal Cumpre destacar que a ação para anular assembleia prescreve em dois anos art 286 da Lei n 640476 133 Consumação e tentativa Consumase com a efetiva aprovação ou seja com a deliberação da assembleia A tentativa é admissível quando a operação é interrompida por exemplo antes da aprovação da assembleia por circunstâncias alheias à vontade do agente 14 Crimes de liquidante 1º VIII A sociedade por ações pode liquidarse judicial ou extrajudicialmente Nessa atividade o liquidante também pode cometer crime O inciso VIII incrimina especificamente a conduta do liquidante o liquidante nos casos dos incisos I II III IV V e VII Com efeito o liquidante pode ser igualmente sujeito ativo das figuras tipificadas nesses incisos estando excluído somente da conduta descrita no n VI Enfim para apurar os crimes que podem ser praticados pelo liquidante devese examinar o conteúdo de cada um daqueles tipos penais Assim as anotações que lá fizemos aqui se aplicam O sujeito ativo evidentemente é o liquidante de sociedade por ações e o sujeito passivo é a sociedade e os acionistas 15 Crimes do representante da sociedade estrangeira lº IX Ao representante de sociedade anônima estrangeira autorizada a funcionar no Brasil são estendidas as incriminações dos incisos I e II do 1º além de incorrer nas mesmas penas do caput deste artigo se prestar falsas informações ao governo A tipificação é a seguinte o representante da sociedade anônima estrangeira autorizada a funcionar no País que pratica os atos mencionados nos incisos I e II ou dá falsa informação ao governo 1º IX Bens jurídicos protegidos nesse dispositivo são o patrimônio societário como nas demais figuras além da credibilidade e autenticidade das informações que devem ser prestadas ao Estado 151 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo somente pode ser o representante de sociedade anônima estrangeira em funcionamento no Brasil Não significa que o sujeito ativo no momento da ação deva encontrarse em território nacional poderá praticar o crime a distância a empresa é que deve encontrarse em funcionamento no País Sujeito passivo pode ser a sociedade anônima os acionistas nas hipóteses dos incisos I e II e na hipótese da conduta de dar falsa informação ao governo o sujeito passivo é o Estado 16 Crime de acionista negociação de voto 2º Nesse dispositivo procurase proteger a lisura e a retidão das assembleias gerais criminalizando a conduta do acionista que negociar seu voto nos seguintes termos Incorre na pena de detenção de 6 seis meses a 2 dois anos e multa o acionista que a fim de obter vantagem para si ou para outrem negocia o voto nas deliberações de assembleia geral 2º O voto é o instrumento pelo qual os acionistas manifestam seus interesses e vontades perante o órgão máximo das sociedades anônimas que é a assembleia geral 161 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo à evidência só pode ser o acionista crime próprio Outros eventuais participantes dessa infração penal somente poderão ser alcançados por meio do instituto do concurso de pessoas art 29 Sujeito passivo é a própria sociedade e os demais acionistas que não intervieram direta ou indiretamente na prática desse crime 162 Tipo objetivo adequação típica A conduta incriminada está representada pelo verbo nuclear negociar que tem o sentido de comprar vender comerciar receber ou dar em pagamento o voto nas deliberações da assembleia geral Essa negociação proibida é aquela que tem a finalidade de obter vantagem para si ou para outrem Punese com efeito a negociação isto é a compra venda ou permuta de voto nas deliberações de assembleia geral mas somente aquela desautorizada indevida ilegítima embora não conste do texto legal esse elemento normativo o elemento subjetivo especial do injusto deixa claro tal aspecto Por outro lado o acordo de acionistas passou a ser permitido pela Lei n 640476 Como destaca Damásio de Jesus Direito Penal v 2 p 473 De verse que o art 118 da Lei n 6404 de 1976 admite o acordo de acionistas inclusive no que diz respeito ao voto nas assembleias Essa disposição porém não revogou o 2º do art 177 do CP Ela permite o acordo lícito de natureza meramente política nas deliberações das assembleias gerais No entanto devese destacar que uma previsão não elimina a outra pois se distinguem em suas finalidades a negociação que constitui crime objetiva obter vantagem para si ou para outrem o acordo de acionistas autorizado pela Lei das Sociedades Anônimas por sua vez tem finalidade e natureza política e existe em função dos acionistas em geral e não para beneficiar um ou outro acionista em particular O tipo incriminador em síntese pune a negociação ilícita mercenária que visa à obtenção de vantagem ilegítima em prejuízo alheio ou de outros acionistas quando não da própria sociedade Como afirma Guilherme de Souza Nucci a negociação proibida de voto pressupõe uma troca o voto em qualquer sentido para receber como compensação uma vantagem qualquer 17 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são reclusão de um a quatro anos e multa se não constituir crime contra a economia popular subsidiariedade expressa No crime de negociação de voto art 177 2º as penas são mais brandas detenção de seis meses a dois anos e multa A ação penal é pública incondicionada salvo nas hipóteses previstas no art 182 quando estará condicionada à representação J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Art 177 1º VII do Código Penal Atipicidade Não configura interposição de pessoas para fins de subsunção ao tipo previsto no art 177 1º inciso VII do Código Penal razão por que é atípico o exercício de voto em assembleia de acionistas por detentor de parte do capital acionário já qualificado como votante STJ HC 58052SP Rel Min Paulo Medina j 632007 Crime de abuso na administração de sociedade por ações art 177 1º III do CP Crime de mera conduta que dispensa prejuízo concreto para a sua configuração A juntada de outros documentos e a realização de exame de corpo de delito se necessário poderão ser feitos na instrução STF HC 55929PE Rel Min Soares Muñoz j 441978 Emissão irregular de conhecimento de depósito ou warrant Art 178 Emitir conhecimento de depósito ou warrant em desacordo com disposição legal Pena reclusão de 1 um a 4 quatro anos e multa V art 15 do Dec n 11021903 estabelecimento de empresa de armazénsgerais D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O Código Criminal do Império 1830 desconheceu completamente o crime de emissão irregular de conhecimento de depósito ou warrant A ausência da criminalização dessa mesma figura penal permaneceu no Código Penal de 1890 Somente o Decreto n 1102 de 21 de novembro de 1903 que disciplinou as empresas de armazénsgerais trouxe as primeiras disposições penais A Consolidação das Leis Penais deu a seguinte definição para essa infração penal incorrerão nas penas de prisão celular por um a quatro anos os que emitirem os títulos denominados de conhecimento de depósito ou warrant em desacordo com as disposições da lei em vigor O legislador de 1940 inspirouse nesse dispositivo da Consolidação das Leis Penais praticamente o reproduzindo 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido a despeito de algumas controvérsias é inegavelmente o patrimônio especialmente aquele representado pelos títulos de conhecimento de depósito ou warrant Não os títulos em si e tampouco a fé pública de que devem revestirse títulos dessa natureza A fé pública como bem jurídico protegido é objeto de outro Capítulo e de outro Título do Código Penal Assim somente por extensão e secundariamente podese admitir que a fé pública se inclua no objetivo da proteção penal insculpida no dispositivo em exame Os títulos em si mesmos encontrariam com efeito melhor proteção em outros Capítulos do Código Penal contudo a disponibilidade patrimonial conhecimento de depósito ou direito real pignoratício warrant que representam emprestamlhes extraordinário valor patrimonial e é exatamente esse significado econômico que representa o objeto da proteção da norma penal Tratase portanto de crime patrimonial 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo é quem emite conhecimento de depósito ou warrant em desacordo com disposição legal é em regra o depositário da mercadoria que pode ser representado por qualquer pessoa em nome da empresa de armazénsgerais É perfeitamente possível a coautoria entre depositário e depositante ou terceiro desde que tenha ciência de participar na emissão irregular dos títulos Sujeito passivo é o portador ou endossatário do título que normalmente sofrerá o prejuízo de sua irregularidade 4 Conhecimento de depósito e warrant Armazénsgerais segundo o art 1º do Decreto n 1102 de 21 de novembro de 1903 são aquelas empresas que têm a finalidade de guardar e conservar e emitir títulos que as representem Referidas empresas com efeito têm como fim a guardar e conservar mercadorias e produtos depositados independentemente de sua origem ou destino b emitir títulos característicos que as representem sendo negociáveis e endossáveis A relação contratual que se estabelece entre quem entrega as mercadorias e o armazémgeral chamase depósito quem deixa a mercadoria nos armazénsgerais é o depositante e estes são os depositários Têm a obrigação de conservar os produtos ou mercadorias que lhes são entregues em nome de outrem O título correspondente é o conhecimento de depósito e o warrant São na verdade dois títulos unidos que podem contudo ser separados Enquanto as mercadorias permanecem em depósito os respectivos títulos entram em circulação podendo ser transferidos por endosso conferindo ao portador o direito de livre disposição da mercadoria correspondente O warrant e o conhecimento de depósito têm funções distintas individualmente considerados O warrant é título pignoratício isto é atribui a seu portador o direito real de penhor da mercadoria nele especificada até o limite do crédito mencionado no primeiro endosso garantindo o pagamento dessa importância O conhecimento de depósito por sua vez é o título de propriedade da mercadoria Atribui ao portador a disponibilidade da coisa fica limitado no entanto pelo limite contido no endosso do warrant Resumindo o adquirente dos títulos 1 conhecimento de depósito e 2 warrant tornase proprietário não apenas deles mas das próprias mercadorias que representam Na verdade a reunião dos dois títulos em poder de um mesmo titular atribuilhe as qualidades de proprietário e credor 5 Tipo objetivo adequação típica A conduta tipificada consiste em emitir isto é pôr em circulação conhecimento de depósito ou warrant em desacordo com disposições legais que regem a matéria Decreto n 11021903 A emissão dos referidos títulos é criminosa quando viola as disposições legais que continuam contidas no vetusto decreto de 1903 O conhecimento de depósito é título de propriedade da mercadoria atribuindo ao portador a disponibilidade da coisa O warrant por sua vez é título de garantia emitido sobre mercadoria depositada em armazénsgerais de acordo com o conhecimento de depósito Ambos são títulos que circulam mediante endosso e a posse dos dois garante ao possuidor a propriedade da mercadoria neles mencionada Quando o depositário isto é o armazémgeral desvia a mercadoria pratica o crime de apropriação indébita quando no entanto a emissão falsa de warrant e conhecimento de depósito serve para obter empréstimo bancário por exemplo constitui crimemeio sendo absorvido pelo estelionato crimefim 51 Elemento normativo em desacordo com disposição legal Primeiramente devese destacar que o tipo penal em exame configura o que se chama de norma penal em branco exigindo a complementação de normas distintas no caso do Decreto n 11021903 Em outros termos somente compulsando a legislação relativa ao conhecimento de depósito e warrant ou seja o decreto referido poderseá saber se sua emissão obedeceu à disposição legal A locução em desacordo com disposição legal constitui elemento normativo do tipo Se a emissão corresponder aos mandamentos legais estarseá diante de fato atípico não havendo incidência da norma penal A emissão segundo o decreto referido é irregular quando a a empresa não está legalmente constituída art 1º do Decreto n 11021903 b não houver autorização do governo federal para a emissão arts 2º e 4º c não existirem em depósito as mercadorias mencionadas d existir emissão de mais de um título para a mesma mercadoria ou produto mencionados nos títulos e não se revestir o título das formalidades legais art 15 6 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo é constituído pelo dolo direto ou eventual representado pela vontade consciente de emitir conhecimento de depósito ou warrant irregularmente Desnecessário destacar que o sujeito ativo tenha conhecimento de que a emissão do título está em desacordo com as disposições legais 7 Consumação e tentativa Consumase o crime com a colocação em circulação dos títulos independentemente da produção de prejuízo decorrente da emissão destes Tratase dos chamados crimes de consumação antecipada A doutrina de modo geral não tem admitido a figura da tentativa classificando essa infração penal como unissubsistente 8 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são a reclusão de um a quatro anos e a multa A ação penal é pública incondicionada sendo desnecessária qualquer manifestação do ofendido Fraude à execução Art 179 Fraudar execução alienando desviando destruindo ou danificando bens ou simulando dívidas Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos ou multa Parágrafo único Somente se procede mediante queixa D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Encontramos igualmente antecedentes desse crime nas Ordenações Filipinas no Livro V Título XLVI O Código Criminal de 1890 contemplava essa infração penal com a seguinte redação O devedor não comerciante que se constituir em insolvência ocultando ou alheando maliciosamente seus bens ou simulando dívidas em fraude de seus credores legítimos será punido com a pena de prisão de seis meses a dois anos Esse diploma legal inseria referida infração entre os crimes contra a propriedade pública e particular Título XII Na legislação estrangeira embora se encontrem crimes idênticos ou semelhantes não existe uma uniformidade ora é classificado entre os crimes contra a propriedade ora entre os crimes contra a administração da justiça O legislador brasileiro de 1940 preferiu incluir a fraude contra a execução no Título que trata dos crimes contra o patrimônio 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido nesse tipo penal também é o patrimônio mais especificamente contra manobras ardilosas ou fraudulentas de devedores que na tentativa de inviabilizar a ação judicial de seus credores procuram evitar a execução forçada Por outro lado num plano secundário e reflexo o dispositivo em exame procura garantir o respeito às decisões judiciais e por conseguinte a administração da justiça cujo prestígio resulta comprometido quando suas decisões são impedidas de se executar por fraudes daqueles que foram condenados Enfim tutelase diretamente o patrimônio e indiretamente o respeito à administração da justiça 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo será sempre o devedor demandado judicialmente Nada impede que o sujeito ativo seja comerciante contrariamente ao que pensava Heleno Fragoso Com efeito o comerciante que praticar qualquer das constantes da descrição típica incorrerá nessa infração penal Responderá por crime falimentar somente se for decretada judicialmente sua falência uma vez que o decreto de sua quebra é condição objetiva de punibilidade O crime de fraude à execução conquanto próprio no que diz respeito ao sujeito pode admitir o concurso de outras pessoas Sujeito ativo não é apenas o devedor pois pode ocorrer que terceiro pratique a ação ilícita subtraindo a coisa à execução desviandoa destruindoa etc insciente o devedor Sujeito passivo será o credor que aciona judicialmente o devedor ardiloso isto é o credor que propõe a execução judicial que se vê esvaziado pela fraude praticada pelo sujeito ativo 4 Tipo objetivo adequação típica O crime consiste em fraudar execução por meio de uma das condutas relacionadas no tipo penal inviabilizando a constrição de bens que foram desviados pelo sujeito ativo impossibilitando em outros termos a satisfação da pretensão demandada Em outros termos fraudar a execução significa tornar impossível a execução judicial pela inexistência de bens sobre os quais possa recair a penhora O agente pode fraudar a execução alienando seus bens desviandoos destruindoos ou danificandoos ou ainda simulando dívidas Alienação é todo ato de transferir o domínio de bens a terceiros abrangendo inclusive a própria cessão de direitos Convém destacar contudo que a alienação em sede de direito penal não se presume fraudulenta juris et de jure Como o direito penal não admite presunções de nenhuma natureza também a finalidade fraudadora da alienação deve ser comprovada Nem toda alienação tem a finalidade de fraudar eventual credor mesmo que exista eventual demanda judicial pois pode ser necessária a alienação ou economicamente conveniente ao agente Assim é fundamental detectar o elemento subjetivo que orientou a eventual alienação Somente a alienação simulada a título gratuito ou a preço vil pode ser considerada prima facie fraudulenta Enfim a alienação por justo preço não é criminosa desde que realizada sem o propósito de inviabilizar eventual penhora Desvio de bens é todo comportamento ou conduta que implique a inviabilização da penhora pela ausência de bens pertencentes ao agente que pode configurarse por inúmeras formas tais como ocultação simulação de transferência remessa para o exterior etc Na destruição a coisa deixa de existir em sua individualidade ainda que subsista a matéria que a compõe por exemplo matar um animal estilhaçar uma vidraça ou também quando vem a desaparecer tornandose inviável sua recuperação Na inutilização embora a coisa não seja destruída perde a adequação ao fim a que se destinava desaparecendo sua utilidade sem perder completamente a individualidade Assim a inutilização também pode ser uma forma de destruir para efeitos de fraude à execução uma vez que ao contrário do crime de dano não faz aqui essa distinção Danificar significa avariar o patrimônio diminuirlhe o valor causandolhe certa deterioração Deteriorar tem o sentido de estragar enfraquecer a essência diminuindo seu valor ou utilidade sem destruíla ou inutilizála Na deterioração a coisa sofre avaria substancial embora não se desintegre totalmente restando apenas diminuída sua utilidade ou seu valor econômico Simular dívida finalmente significa assumir obrigação inexistente admitir a execução de crédito fictício Nesse caso sustentava Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 298 é necessário que o crédito fictício cujo titular é coautor do crime provoque o concurso de credores e o rateio do ativo em prejuízo dos credores legítimos Antes disso o que pode haver é simples tentativa 41 Pressuposto do crime de fraude à execução Pressuposto do crime de fraude à execução é exatamente a existência de uma ação de execução judicial cobrando o sujeito passivo Com qualquer das ações arroladas alienando desviando destruindo ou danificando bens ou simulando dívidas deve tornar se inviável a execução da dívida pela inexistência ou insuficiência de patrimônio do agente A fraude à execução é crime de que só cogita a lei penal na pendência de uma lide civil que só tem lugar após a citação do devedor para o processo de execução Execução é o processo instaurado para exigir o cumprimento compulsório de um título judicial ou extrajudicial Tratase de um processo em que se procura por meio da penhora de bens do executado a satisfação do crédito do exequente A questão é exatamente esta a conduta tipificada objetiva impedir que o executado por meios fraudulentos inviabilize a concretização da execução isto é satisfaça sua pretensão Por isso não nos parece correta a abrangência que se tem dado à locução fraude à execução para alcançar o processo de conhecimento O direito penal não admite interpretação extensiva se o legislador quisesse incluir os processos de conhecimento e cautelar teria adotado outra terminologia menos restritiva como lide ação demanda processo judicial etc Não o fez desautorizando portanto ao intérprete fazêlo Se o objeto da conduta praticada pelo agente recair em bens impenhoráveis não haverá crime 5 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo é constituído pelo dolo e pelo elemento subjetivo especial do injusto O dolo direto ou eventual é representado pela vontade consciente de fraudar a execução praticando qualquer das condutas elencadas no tipo penal É indispensável que o agente saiba que está sendo judicialmente executado O desconhecimento dessa circunstância pode configurar erro de tipo afastando o dolo O elemento subjetivo especial do injusto consiste na finalidade de prejudicar os credores É irrelevante que o agente pretenda obter vantagem econômica vingarse de alguém ou qualquer outro interesse 6 Consumação e tentativa O crime consumase no momento em que a execução fraudada se torna inviável pela insolvência do agente decorrente de qualquer das ações tipificadas Como se trata de crime material qualquer das ações praticadas pelo agente será atípica se a despeito delas continuar solvente Restandolhe bens suficientes para garantir o juízo não se poderá falar em crime de fraude à execução A tentativa é perfeitamente admissível quando por exemplo o agente for impedido de consumar qualquer das ações tipificadas Discordamos do entendimento manifestado por Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 593 segundo o qual haverá tentativa quando apesar das manobras fraudulentas o devedor permanece com bens ou valores suficientes para garantir a execução Com efeito como destacamos no parágrafo anterior se a conduta do agente não afetar seu patrimônio permanecendo a possibilidade de fazer frente a demanda judicial sua ação será atípica Esse crime somente pode ocorrer em ação judicial na esfera cível e é indispensável que o agente tenha conhecimento da existência da ação ajuizada 7 Pena e ação penal As penas cominadas são alternativamente detenção de seis meses a dois anos ou multa A ação penal é de exclusiva iniciativa privada art 179 parágrafo único No entanto quando o crime for cometido contra a União Estado ou Município a ação penal é pública incondicionada nos termos do art 24 2º do CPP acrescentado pela Lei n 8699 de 27 de agosto de 1993 J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Fraude à execução art 179 do Código Penal Proposta de transação penal Legitimidade Cabe ao Ministério Público propor a transação penal ainda que em ação penal privada A disponibilidade material da vítima reside na fase prévia de composição dos danos e iniciativa processual Elaborada a proposta de transação penal pelo magistrado com a presença do Ministério Público em audiência não se insurgindo sequer na fase recursal presumese de acordo com o conteúdo não havendo o que anular pelos princípios dos arts 2º e 65 da Lei n 909995 Art 76 2º inciso III da Lei n 909995 TJRS Recurso Crime 71000887844 Rel Alberto Delgado Neto j 9102006 Fraude à execução Revelase como atípica e portanto imune à sanção penal a conduta do devedor que aliena parte de seu patrimônio após citado para pagamento em ação de execução ou oferecimento de bens à penhora se resta comprovado não haver seu patrimônio sofrido qualquer abalo em decorrência do ato sendo ainda sintomática a aquisição com o valor recebido de imóvel de preço superior Delito do art 179 do Código Penal não configurado STJ HC 15317SP Rel Min Fernando Gonçalves j 1192001 Só se procede mediante queixa na hipótese do crime previsto no art 179 do Código Penal a teor da norma do parágrafo único deste dispositivo legal De outro lado não se admite reiteração de denúncia por crime do art 171 do Código Penal se anteriormente pelo mesmo fato fora a ação penal correspondente trancada pelo Superior Tribunal de Justiça STJ HC 9877PA Rel Min Fernando Gonçalves j 1391999 Capítulo VII Da Receptação Receptação Art 180 Adquirir receber transportar conduzir ou ocultar em proveito próprio ou alheio coisa que sabe ser produto de crime ou influir para que terceiro de boafé a adquira receba ou oculte Pena reclusão de 1 um a 4 quatro anos e multa V art 33 da Lei n 113432006 V art 2º 1º da Lei n 81769l crimes contra a ordem econômica combustíveis V arts 1º I e 3º 3º do Dec n 98293 crime de natureza tributária Receptação qualificada 1º Adquirir receber transportar conduzir ocultar ter em depósito desmontar montar remontar vender expor à venda ou de qualquer forma utilizar em proveito próprio ou alheio no exercício de atividade comercial ou industrial coisa que deve saber ser produto de crime Pena reclusão de 3 três a 8 oito anos e multa 2º Equiparase à atividade comercial para efeito do parágrafo anterior qualquer forma de comércio irregular ou clandestino inclusive o exercido em residência 3º Adquirir ou receber coisa que por sua natureza ou pela desproporção entre o valor e o preço ou pela condição de quem a oferece deve presumirse obtida por meio criminoso Pena detenção de 1 um mês a 1 um ano ou multa ou ambas as penas 4º A receptação é punível ainda que desconhecido ou isento de pena o autor do crime de que proveio a coisa 5º Na hipótese do 3º se o criminoso é primário pode o juiz tendo em consideração as circunstâncias deixar de aplicar a pena Na receptação dolosa aplicase o disposto no 2º do art 155 6º Tratandose de bens e instalações do patrimônio da União Estado Município empresa concessionária de serviços públicos ou sociedade de economia mista a pena prevista no caput deste artigo aplicase em dobro Redação do caput e 1º a 6º determinada pela Lei n 9426 de 24 de dezembro de 1996 D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias A autonomia da receptação em relação ao crime precedente consolidouse na doutrina no alvorecer do século XIX e seus antecedentes políticofilosóficos podem ser creditados a Carpsóvio século XVII A partir desse período a receptação passou a ter como pressuposto não apenas um crime especificamente contra o patrimônio mas qualquer crime que pudesse indevidamente acarretar vantagem patrimonial em prol do agente No direito codificado contudo coube a Feuerbach introduzila no Código bávaro de 1813 do qual foi seu autor intelectual Afastouse a partir de então o superado entendimento segundo o qual a receptação era uma forma de cumplicidade ante o paradoxo de admitirse a participação em crime já consumado As Ordenações Filipinas previam o crime de receptação embora lhe cominassem a sanção correspondente ao crime originário Livro V Título 65 2º O Código Criminal do Império considerava a receptação como uma espécie de cumplicidade posterior do crime precedente O Penal de 1890 manteve a orientação do Código anterior A Lei n 9426 de 24 de dezembro de 1996 publicada no DOU de 26 de dezembro de 1996 e retificada no de 15 de janeiro de 1997 acrescentou os dois primeiros parágrafos renumerou os outros quatro com pequenas alterações além de incluir no caput do art 180 os verbosnúcleo transportar e conduzir 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido diretamente é o patrimônio público ou privado Admitimos que a posse também seja objeto da tutela penal na medida em que representa um aspecto importante do patrimônio e podendo ser objeto do crime de furto ou roubo satisfaz a exigência de ser produto de crime precedente não se pode negar contudo que a propriedade é o bem jurídico protegido por excelência Objeto de receptação somente pode ser coisa móvel embora o Código Penal não faça essa exigência expressa na descrição típica Nesse sentido esclarecia Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 304 que um imóvel não pode ser receptado pois a receptação pressupõe um deslocamento da res do poder de quem ilegitimamente a detém para o receptador de modo a tornar mais difícil a sua recuperação por quem de direito 21 O ser humano vivo não pode ser objeto de receptação O ser humano vivo por exemplo não pode ser objeto de receptação pela simples razão de que não se trata de coisa A compra ou aquisição a qualquer título de cadáver em princípio tampouco pode ser objeto material de receptação pois em tese não constitui coisa além de não possuir via de regra valor econômico tratase na verdade de crime contra o respeito aos mortos art 211 No entanto quando eventualmente o cadáver for propriedade de alguém passando a ter valor econômico pode ser objeto de receptação como por exemplo algo que pertence a uma instituição de ensino para estudos científicos e é furtado sendo objeto de furto poderá na sequência ser também objeto de receptação Não podem ser objeto de receptação por outro lado aquelas mesmas coisas que também não podem ser objeto do crime de furto como as que não pertencem a ninguém tais como res nullius coisa que nunca teve dono res derelictacoisa que já pertenceu a alguém mas foi abandonada pelo proprietário e res commune omnium coisa de uso comum que embora de uso de todos como o ar a luz ou o calor do sol a água do mar e dos rios não pode ser objeto de ocupação em sua totalidade ou in natura Para efeitos penais constitui res derelicta qualquer objeto abandonado pelo dono e como tal por ele declarado sem valor econômico ainda que para terceiro possa ser valioso apoderarse de coisa de ninguém res nullius constitui para o direito privado forma de aquisição da propriedade de coisa móvel ocupação algo impossível de ocorrer quando a coisa tem dono E assim o é porque a coisa subtraída para constituir objeto de furto deve pertencer a alguém e nas hipóteses antes mencionadas não pertence a ninguém 22 Os direitos reais ou pessoais não podem ser objeto de receptação Os direitos reais ou pessoais finalmente tampouco podem ser objeto de furto pois direitos não se confundem com coisa Contudo os títulos ou documentos que os constituem ou representam podem ser furtados ou subtraídos de seus titulares ou detentores nesses casos sendo produto de crime antecedente podem igualmente ser objeto de receptação O objeto material do crime de receptação há de ser produto de crime isto é há de ser o resultado mediato ou imediato de um fato definido como crime É irrelevante que tal produto haja sido substituído por outro Embora se reconheça certa controvérsia na doutrina a verdade é que perante nosso Código Penal que se refere apenas a produto de crime inegavelmente a coisa subrogada representando produto de crime também pode ser objeto de receptação A ilicitude do produto do crime precedente não desaparece evidentemente com a substituição por qualquer outra coisa diretamente obtida com aquele Por fim não são produto de crime os instrumenta sceleris A razão é simples esses instrumentos não são produto do crime eventual aquisição ocultação ou recebimento desses poderá configurar o crime de favorecimento pessoal art 348 se houver a intenção de auxiliar o autor do crime a subtrairse à ação da autoridade pública 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa independente de qualidade ou condição especial menos o coautor ou partícipe do crime anterior participar do crime anterior por exemplo e a seguir comprar a parte dos demais que seja pressuposto da receptação A receptação para eventual participante do crime antecedente coautor ou partícipe constitui pósfato impunível O 1º porém com a redação determinada pela Lei n 942696 tipifica um crime próprio que somente pode ser praticado por comerciante ou industrial mesmo que a atividade comercial seja irregular ou clandestina Excepcionalmente pode ser sujeito ativo o proprietário da coisa receptada quando por exemplo esta for objeto de garantia v g penhor encontrandose em poder de terceiro Afinal ao contrário do que ocorre nas hipóteses de furto roubo dano ou apropriação indébita onde emprega a locução coisa alheia na descrição do crime de receptação o legislador referese apenas a coisa sem se preocupar com sua titularidade Nesse particular a doutrina dominante não tem admitido que o proprietário da coisa receptada possa eventualmente figurar como sujeito ativo do crime de receptação Sujeito passivo será sempre o sujeito passivo do crime de que proveio a coisa bem ou objeto da receptação em outros termos o sujeito passivo do crime de receptação é o mesmo sujeito passivo do crime anterior 4 Tipo objetivo adequação típica receptação simples A despeito de a receptação estar topograficamente situada no Título que trata dos crimes patrimoniais não é necessário que o crime precedente seja contra o patrimônio Contudo em razão do bem jurídico patrimônio que esse tipo penal tutela é indispensável que o pressuposto dele crime anterior proporcione ao sujeito passivo vantagem econômica que a receptação se encarrega de garantir ou assegurar Receptação é o crime que produz a manutenção consolidação ou perpetuidade de uma situação patrimonial anormal decorrente de crime anterior praticado por outrem O Código Penal de 1940 disciplina duas modalidades de receptação dolosa e uma culposa a a receptação própria consiste em adquirir aquisição gratuita ou onerosa receber a qualquer título ou ocultar esconder em proveito próprio ou alheio coisa que sabe ser produto do crime b na receptação imprópria mediação para a receptação a ação incriminada é influir incentivar estimular aliciar convencer para que terceiro de boafé a adquira receba ou oculte É indispensável que o terceiro esteja de boafé caso contrário será igualmente autor da receptação O terceiro de boafé não comete crime Distinguiu ainda o legislador de 1940 para dispensarlhe um tratamento mais brando a receptação culposa que considerou uma espécie do gênero receptare A receptação própria apresenta segundo a versão original do Código Penal de 1940 as seguintes condutas adquirir receber ou ocultar as inovações transportar e conduzir serão examinadas em tópico separado Todas elas incluindo as novidades direcionam se para um objeto determinado pelo próprio tipo penal não para um objeto qualquer mas um objeto que deve apresentar uma característica peculiar que é o fato de tratarse de coisa produto de crime Essa procedência criminosa do objeto da receptação define sua natureza acessória dependente parasitária de outro crime na linguagem de Hungria 41 Modalidades de receptação própria A primeira conduta incriminada está representada pelo verbo adquirir que pode significar compra permuta troca dação em pagamento recebimento de herança Como destacava Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 514 verificase o crime mesmo que o título não seja injusto Por exemplo o herdeiro que sabendo da origem criminosa da coisa a adquire por sucessão o credor que para receber aceita a coisa que sabe ser produto de crime etc Aquisição é a obtenção da coisa a título de domínio em definitivo Somente se aperfeiçoa com a efetiva tradição da coisa Antes da traditio pode existir tentativa de receptação Na aquisição onerosa é indiferente que o preço pago seja vil ou justo O preço vil embora seja indício legal da receptação culposa é irrelevante na receptação dolosa A normalidade ou justeza do preço por si só não afasta a possibilidade da receptação dolosa que como veremos repousa em outros fundamentos A segunda figura tipificada está representada pelo verbo receber que tem sentido mais abrangente pode significar aceitar o que lhe é oferecido ou entregue recolher o que lhe é devido entrar na posse da coisa que lhe é entregue etc Na versão de Hungria recebimento é a tomada de posse da coisa entregue a qualquer outro título que não seja o de propriedade Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 304 exemplificava com receber a coisa em depósito ou para guardála ou em penhor ou para usála conservála consumila Nesse exemplo de Hungria constatase que já está abrangido o utilizar de qualquer modo bem como a novidade da receptação qualificada ter em depósito Por fim a terceira figura da receptação própria é constituída pelo verbo ocultar que ontologicamente expressa a ideia de esconder fraudulentamente alguma coisa de alguém Somente se oculta algo que deveria ser público ou do conhecimento geral Ocultar é dissimular a posse ou detenção da coisa de origem criminosa escondendoa é colocar a coisa em local onde seja difícil encontrála ou localizála Tem razão Hungria em rechaçar o entendimento de que na ocultação estaria implícita a aquisição ou recebimento da coisa que naturalmente precederiam aquela O seguinte exemplo de Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 304 deixa esse aspecto muito claro Quem apreende por exemplo a coisa abandonada pelo ladrão para acobertarse de suspeitas e a oculta para posteriormente entregar lha mediante recompensa é incontestavelmente receptador e no entanto não se pode dizer que tenha adquirido a coisa 42 Receptação imprópria influência sob terceiro Por fim a denominada receptação imprópria descrita na segunda parte do caput está vazada nos seguintes termos ou influir para que terceiro de boafé a adquira receba ou oculte Para Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 515 o agente se conduz como mediador pois o agente não executa as ações incriminadas apenas estimula o terceiro de boafé a praticálas Em sentido contrário posicionase Paulo José da Costa Jr Comentários ao Código Penal p 610 sustentando que ao influir que terceiro de boafé fique com a coisa produto de crime não age como mediador mas como autor intelectual do crime que se aperfeiçoa mesmo que sua sugestão não seja aceita A solução a esse impasse é facilmente encontrada com a resposta à seguinte questão afinal qual é a conduta típica imputada ao sujeito ativo da receptação imprópria Resposta óbvia influir Ora sendo essa a conduta incriminada evidentemente a razão está com Paulo José da Costa Jr quem influi nos termos tipificados não é simples mediador da ação criminosa mas verdadeiro e único autor da receptação imprópria até porque o terceiro induzido a erro deve estar de boafé caso contrário será coautor da receptação 421 Influência como atividade nuclear da conduta típica Na receptação imprópria a conduta de influir que teoricamente representaria mera atividade de partícipe nesse tipo de crime constitui o núcleo do tipo penal Assim quem influir para que o terceiro de boa fé pratique qualquer das ações elencadas no dispositivo legal não será partícipe mas autor do crime de receptação e o terceiro de boafé não pratica crime algum Não se pode esquecer que o partícipe não executa a conduta descrita no preceito primário da norma penal no caso influir mas realiza uma atividade secundária que contribui estimula ou favorece a execução da conduta proibida A receptação é crime estritamente comissivo sendo impossível praticálo mediante omissão salvo a figura representada pelo verbonúcleo ocultar Quem não revela onde se encontra o produto de crime do qual não participou não comete crime algum a não ser que tenha o dever jurídico de fazêlo art 13 2º 422 Omissão do legislador de 1996 Convém finalmente destacar a omissão do legislador de 1996 relativamente à receptação imprópria contida na parte final do caput do art 180 Na verdade o legislador olvidouse de acrescentar à figura da receptação imprópria representada pelo verbo influir as condutas de transportar e de conduzir as mesmas que foram introduzidas na figura da receptação própria pela Lei n 942696 Assim por exemplo se alguém influir para que terceiro de boafé transporte ou conduza coisa que sabe ser produto de crime praticará uma conduta penalmente irrelevante Essa é apenas uma das tantas incoerências do legislador de reformas pontuais do Código Penal que está sofrendo paulatina destruição em sua consistência sistemática 43 Um tipo misto alternativo e ao mesmo tempo cumulativo A receptação descrita no caput apresenta a curiosidade de ser um tipo misto alternativo e ao mesmo tempo cumulativo Com efeito se o agente praticar cumulativamente as condutas de adquirir receber transportar conduzir ou ocultar coisa produto de crime praticará um único crime ocorrendo o mesmo se influir para que terceiro de boafé adquira receba ou oculte coisa proveniente de crime Tratase de crimes de ação múltipla ou de conteúdo variado No entanto se o agente praticar as duas espécies de receptação própria e imprópria ou seja primeiro adquirir coisa que sabe ser produto de crime e depois influenciar para que terceiro de boafé faça o mesmo cometerá dois crimes nessas modalidades estamos diante de tipos mistos cumulativos e não alternativos como nas circunstâncias antes relacionadas 5 Novas figuras da Lei n 942696 receptação ou favorecimento Não se trata de profunda modificação conceitual mas de simples ampliação de sua abrangência incluindo no caput ao lado das condutas tradicionais adquirir receber ocultar e influir novos núcleos típicos que em si mesmos não apresentam nenhum conteúdo lesivo transportar e conduzir Como presente de Natal presente grego dezembro de 1996 o legislador brasileiro incluiu no caput do art 180 do CP mais duas condutas de receptar transportar ou conduzir além das novidades incluídas nos 1º e 2º desfigurando a natureza jurídica e histórica da receptação Dificilmente transportar e conduzir poderão assumir a conotação sugerida pela definição de receptação de acarretar a manutenção consolidação ou perpetuidade de uma situação patrimonial anormal ou simplesmente do proveito econômico decorrente de crime anterior praticado por outrem 51 Distinção entre favorecimento e receptação O Código Penal de 1940 fez a distinção entre favorecimento e receptação classificou o primeiro como crime contra a administração da justiça e a segunda entre os crimes contra o patrimônio O animus lucrandi é que distingue a receptação do favorecimento Em verdade a distinção entre receptação e crime de favorecimento data do início do século XIX no mesmo período em que se difundiu a autonomia da receptação em relação ao crime precedente A receptação pessoal recebeu a qualificação de favorecimento e à receptação real atribuiuse o nomen juris de receptação As condutas de transportar ou conduzir enxertadas pela Lei n 942696 não implicam em regra aquele animus lucrandi próprio da receptação constituindo verdadeira anomalia tipológica no direito pátrio simples amostra da criminosa retalhação do Código Penal a que se está procedendo com a inflação diária desordenada e descriteriosa de leis esparsas chamada de reformas pontuais Essa nossa crítica à nova estrutura do crime de receptação não logrou unanimidade perante os especialistas como se pode observar da seguinte observação a simples introdução de condutas novas aliás típicas do comércio clandestino de automóveis não tem o condão de romper o objetivo do legislador de qualificar a receptação alterando as penas mínima e máxima que saltaram da faixa de l a 4 anos para 3 a 8 anos No entanto reforçando nossa visão crítica destacamos o magistério de Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 6023 que referindose à receptação qualificada assevera Não se pode olvidar que a referida norma foi estruturada num manifesto erro técnico de composição típica já que o legislador inseriu no 1º do art 180 um tipo penal independente sem atrelagem ao tipo fundamental 52 Receptação de receptação possibilidade E admissível receptação de receptação ou seja a mesma coisa pode ser objeto material de sucessivas receptações Tanto é produto de crime o resultado do crime originário como aquele que provém de intercorrente receptação No entanto se na cadeia criminosa houver aquisição ou recebimento por terceiro de boafé estará configurada uma solução da continuidade do status ilícito criado pelo crime originário Essa anormalidade jurídica somente seria mantida por meio de intercorrentes aquisições de máfé Assim quem adquire coisa que fora recebida ou adquirida por terceiro de boafé não pratica crime de receptação mesmo que saiba que a coisa provém de crime Esse já era o entendimento esposado por Maggiore Derecho Penal trad José J Ortega Torres Bogotá Temis 1956 v 5 p 1067 segundo o qual não há crime no caso de quem adquiria as coisas delituosas de um possuidor de boafé já que estas coisas em consequência da posse de boafé perderam a qualidade de delituosas Nem sempre contudo a aquisição recebimento ou ocultação de produto de crime constitui receptação podendo conforme as circunstâncias tipificar outra infração penal Quem adquire ou recebe para guardar por exemplo moeda falsa não pratica receptação mas o crime do art 289 1º do CP quando o faz para tornar seguro o produto do crime em auxílio a outrem incorre em favorecimento real art 349 A aquisição ou recebimento de coisas produto de vários crimes caracteriza apenas uma receptação desde que logicamente sejam adquiridas em uma única oportunidade isto é por meio de uma única ação 6 Significado dogmático das elementares sabe e deve saber O legislador brasileiro contemporâneo ao definir as condutas típicas continua utilizando as mesmas técnicas que eram adotadas na primeira metade do século XX ignorando a extraordinária evolução da teoria geral do delito Continua utilizando expressões como sabe ou deve saber que outrora eram adotadas para identificar a natureza ou espécie de dolo A adoção dessa técnica superada constitui demonstração evidente do desconhecimento do atual estágio da evolução do dolo e da culpabilidade Ignora nosso legislador que a consciência da ilicitude não é mais elemento do dolo mas da culpabilidade e que tal consciência por construção dogmática não precisa mais ser atual bastando que seja potencial independente de determinação legal A atualidade ou simples possibilidade de consciência da ilicitude servirá apenas para definir o grau de censura a ser analisado na dosagem de pena sem qualquer influência na configuração da infração penal Essa técnica de utilizar em alguns tipos penais as expressões sabe ou deve saber se justificava no passado quando a consciência da ilicitude era considerada pelos causalistas elemento constitutivo do dolo a exemplo do dolus malus dos romanos um dolo normativo No entanto essa construção está completamente superada como superada está a utilização das expressões sabe e deve saber para distinguir a natureza ou espécie do dolo diante da consagração definitiva da teoria normativa pura da culpabilidade a qual retirou o dolo da culpabilidade colocandoo no tipo extraindo daquele a consciência da ilicitude e situandoa na culpabilidade que passa a ser puramente normativa Para esclarecermos nossa crítica à equivocada utilização das expressões sabe e deve saber na construção dos tipos penais precisamos fazer uma pequena digressão sobre a evolução da teoria do delito particularmente em relação ao dolo e à culpabilidade Como se sabe o finalismo desloca o dolo e a culpa para o injusto retirandoos de sua tradicional localização a culpabilidade com o que a finalidade é levada ao centro do injusto Como consequência na culpabilidade concentramse somente aquelas circunstâncias que condicionam a reprovabilidade da conduta contrária ao direito e o objeto da reprovação repousa no próprio injusto O conteúdo da culpabilidade finalista normativa pura exibe substanciais diferenças em relação ao modelo normativo neokantiano que manteve dolo e culpa como seus elementos Digase mais uma vez que enquanto na concepção causalista o dolo e a culpa eram partes integrantes da culpabilidade no finalismo passam a ser elementos não desta mas do injusto Também na corrente finalista incluise o conhecimento da proibição na culpabilidade de modo que o dolo é entendido somente como dolo natural puramente psicológico e não como no causalismo que era considerado o dolus malus dos romanos constituído de vontade previsão e conhecimento da realização de uma conduta proibida 61 Síntese dos postulados fundamentais das teorias do dolo e da culpabilidade Para melhor compreendermos a estrutura do dolo e da culpabilidade e particularmente a desintegração e reestruturação de ambos fazse necessário pelo menos passar uma vista dolhos na evolução das teorias do dolo e da culpabilidade A teoria extremada do dolo a mais antiga situa o dolo na culpabilidade e a consciência da ilicitude que deve ser atual no próprio dolo Defende a existência de um dolo normativo constituído de vontade previsão e conhecimento da realização de uma conduta proibida consciência atual da ilicitude Por isso para essa teoria o erro jurídicopenal independentemente de ser erro de tipo ou erro de proibição exclui sempre o dolo quando inevitável por anular ou o elemento normativo consciência da ilicitude ou o elemento intelectual previsão do dolo Equipara assim as duas espécies de erro quanto a seus efeitos A locução deve saber se for considerada como indicativa de dolo direto ou indireto revive de certa forma a superada teoria limitada do dolo com sua cegueira jurídica sugerida por Mezger ao recriar uma espécie de dolo presumido Na verdade para relembrar a teoria limitada do dolo foi apresentada como um aperfeiçoamento da teoria extremada e procurando evitar as lacunas de punibilidade que esta possibilitava equiparou ao conhecimento atual da ilicitude a cegueira jurídica ou inimizade ao direito Segundo Welzel El nuevo sistema de Derecho Penal una introducción a la doctrina de la acción finalista trad José Cerezo Min Barcelona Ed Ariel 1964 p 106 o aperfeiçoamento da teoria extremada do dolo foi buscado sem sucesso de duas formas criando de um lado um tipo auxiliar de culpa jurídica pela falta de informação jurídica do autor e de outro lado pela relevância da cegueira jurídica ou inimizade ao direito adotadas pelo Projeto de Código Penal de 1936 Para Mezger há casos em que o autor do crime normalmente um delinquente habitual demonstra desprezo ou indiferença tais para com os valores do ordenamento jurídico que mesmo não se podendo provar o conhecimento da antijuridicidade deve ser castigado por crime doloso De certa maneira ainda que por via transversa com essa equiparação ou ficção Mezger substitui na teoria limitada do dolo o conhecimento atual da ilicitude pelo conhecimento presumido pelo menos nesses casos Assim Mezger seu grande idealizador introduziu finalmente o polêmico elemento denominado culpabilidade pela condução de vida criando dessa forma a possibilidade de condenação do agente não por aquilo que ele faz mas por aquilo que é dando origem ao combatido direito penal de autor No entanto essa proposição de Mezger de presumirse o dolo quando a ignorância da ilicitude decorresse de cegueira jurídica ou de animosidade com o direito isto é de condutas incompatíveis com uma razoável concepção de direito ou de justo não foi aceita diante da incerteza de tais conceitos A mesma sorte merece ter a expressão deve ou deveria saber que cria uma espécie de dolo presumido dissimulador de autêntica responsabilidade objetiva incompatível com a teoria do dolo deve ela ser endereçada às construções jurídicas que se utilizam de subterfúgios como as expressões antes referidas por violarem o princípio da culpabilidade Contudo as teorias do dolo extremada e limitada caíram em desuso ante a reforma penal alemã da segunda metade do século XX que aderiu aos princípios fundamentais das teorias da culpabilidade Não se pode perder de vista que a teoria estrita da culpabilidade parte da reelaboração dos conceitos de dolo e de culpabilidade Empreendida pela doutrina finalista com a qual surgiu cujos representantes maiores foram Welzel Maurach e Kaufmann essa teoria separa o dolo da consciência da ilicitude Assim o dolo em seu aspecto puramente psicológico dolo natural é transferido para o injusto passando a fazer parte do tipo penal A consciência da ilicitude e a exigibilidade de outra conduta passam a fazer parte da culpabilidade num puro juízo de valor A culpabilidade passa a ser um pressuposto básico do juízo de censura Dolo e consciência da ilicitude são portanto para a teoria da culpabilidade conceitos completamente distintos e com diferentes funções dogmáticas Como afirma Muñoz Conde El error en Derecho Penal Valencia Tirant lo Blanch 1989 p 33 o conhecimento da antijuridicidade tendo natureza distinta do dolo não requer o mesmo grau de consciência o conhecimento da antijuridicidade não precisa ser atual pode ser simplesmente potencial 62 Sentido e função das elementares sabe e deve saber na definição do crime de receptação Dolo é o conhecimento e a vontade da realização do tipo penal Todo dolo tem um aspecto intelectivo e um aspecto volitivo O aspecto intelectivo abrange o conhecimento atual de todas as circunstâncias objetivas que constituem o tipo penal Para a configuração do dolo exigese a consciência daquilo que se pretende praticar Essa consciência no entanto deve ser atual isto é deve estar presente no momento da ação quando ela está sendo realizada É insuficiente segundo Welzel a potencial consciência das circunstâncias objetivas do tipo uma vez que prescindir da consciência atual equivale a destruir a linha divisória entre dolo e culpa convertendo aquele em mera ficção A previsão isto é a representação ou consciência deve abranger correta e completamente todos os elementos essenciais do tipo sejam eles descritivos ou normativos Mas essa previsão constitui somente a consciência dos elementos integradores do tipo penal ficando fora dela a consciência da ilicitude que como já afirmamos está deslocada para o interior da culpabilidade É desnecessário o conhecimento da proibição da conduta sendo suficiente o conhecimento das circunstâncias de fato necessárias à composição do tipo A Lei n 942696 ao disciplinar o crime de receptação utilizou as expressões sabe ser produto de crime caput e deve saber ser produto de crime lº do mesmo dispositivo A velha doutrina ao analisar as expressões sabe e deve saber via em ambas a identificação do elemento subjetivo da conduta punível o dolo direto era identificado pela elementar sabe e o dolo eventual pela elementar deve saber alguns autores identificavam nesse caso a culpa Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 405 Damásio de Jesus Direito Penal v 2 p 148 todos analisando o art 130 Aliás foi provavelmente com esse sentido que se voltou a utilizar essas expressões já superadas na Lei n 942696 Na hipótese do sabe afirmavam os doutrinadores há plena certeza da origem delituosa da coisa Nesse caso não se trata de mera suspeita que pode oscilar entre a dúvida e a certeza mas há na realidade plena convicção da origem ilícita da coisa receptada Assim a suspeita e a dúvida não servem para caracterizar o sentido da elementar sabe Logo concluíam tratase de dolo direto Na hipótese do deve saber a origem ilícita do objeto material afirmavam significa somente a possibilidade de tal conhecimento isto é a potencial consciência da ilicitude do objeto Nas circunstâncias o agente deve saber da origem ilícita da coisa sendo desnecessária a ciência efetiva basta a possibilidade de tal conhecimento Dessa forma na mesma linha de raciocínio concluíam tratase de dolo eventual No entanto essa interpretação indicadora do dolo por meio do sabe ou deve saber justificavase quando vigia incontestavelmente a teoria psicológiconormativa da culpabilidade que mantinha o dolo como elemento da culpabilidade situando a consciência da ilicitude no próprio dolo Contudo a sistemática hoje é outra a elementar sabe que é produto de crime significa ter consciência da origem ilícita do que está comprando isto é ter consciência da ilicitude da conduta elemento da culpabilidade normativa e a elementar deve saber por sua vez significa a possibilidade de ter essa consciência da ilicitude Logo considerando que esse elemento normativo consciência da ilicitude integra a culpabilidade encontrandose portanto fora do dolo somos levados a concluir que as elementares referidas são indicativas de graduação da culpabilidade e não do dolo como entendia a velha doutrina Em contrapartida a consciência do dolo seu elemento intelectual além de não se limitar a determinadas elementares do tipo como sabe ou deve saber não se refere à ilicitude do fato mas a sua configuração típica devendo abranger todos os elementos objetivos descritivos e normativos do tipo Ademais o conhecimento dos elementos objetivos do tipo ao contrário da consciência da ilicitude tem de ser atual sendo insuficiente que seja potencial sob pena de destruir a linha divisória entre dolo e culpa como referia Welzel Em sentido semelhante manifestase Muñoz Conde Derecho Penal Parte General 2 ed Valencia Tirant lo Blanch p 285 afirmando que O conhecimento que exige o dolo é o conhecimento atual não bastando um meramente potencial Quer dizer o sujeito deve saber o que faz e não haver devido ou podido fazer Na verdade a admissão da elementar deve saber como identificadora de dolo eventual impede que se demonstre in concreto a impossibilidade de ter ou adquirir o conhecimento da origem ilícita do produto receptado na medida em que tal conhecimento é presumido E essa presunção legal outra coisa não é que autêntica responsabilidade objetiva presumir o dolo onde este não existe No entanto reconhecendose a elementar deve saber como indicadora de potencial consciência da ilicitude isto é como elemento integrante da culpabilidade poderseá demonstrar quando for o caso sua inocorrência ou mesmo a existência de erro de proibição permitindo melhor adequação da aplicação da lei 63 Reelaboração de Welzel do conceito de consciência de ilicitude Com efeito ante a reelaboração efetuada por Welzel do conceito de consciência de ilicitude introduzindolhe o dever de informarse flexibilizouse esse elemento sendo suficiente a potencial consciência da ilicitude No entanto não basta simplesmente não ter consciência do injusto para inocentarse É preciso indagar se havia possibilidade de adquirir tal consciência e em havendo essa possibilidade se ocorreu negligência em não adquirila ou falta ao dever concreto de procurar esclarecer sobre a ilicitude da conduta praticada A expressão deve saber como elementar típica é pura presunção incompatível com o direito penal da culpabilidade Precisase enfim ter sempre presente que não se admitem mais presunções irracionais iníquas e absurdas pois a despeito de exigirse uma consciência profana do injusto constituída dos conhecimentos hauridos em sociedade provindos das normas de cultura dos princípios morais e éticos não se pode ignorar a hipótese sempre possível de não se ter ou não se poder adquirir essa consciência Com efeito nem sempre o dever jurídico coincide com a lei moral Não poucas vezes o direito protege situações amorais e até imorais contrastando com a lei moral por razões de política criminal de segurança social etc Assim nem sempre é possível estabelecer a priori seja o crime uma ação imoral A ação criminosa pode ser eventualmente até moralmente louvável v g art 121 1º do CP A norma penal por sua particular força e eficácia induz os detentores do poder político a avassalar a tutela de certos interesses e finalidades ainda que contrastante com os interesses gerais do grupo social Por derradeiro constar de texto legal a atualidade ou potencialidade de consciência do ilícito é erronia intolerável uma vez que a ciência penal encarregouse de sua elaboração interpretativa A constatação de sua atualidade ou mera possibilidade fundamentará a maior ou menor reprovabilidade da conduta proibida a ser avaliada no momento de aplicação da pena e jamais como identificadora do dolo no próprio tipo penal Concluindo a previsão isto é o conhecimento deve abranger todos os elementos objetivos e normativos da descrição típica E esse conhecimento deve ser atual real concreto e não meramente presumido Agora a consciência da ilicitude esta sim pode ser potencial mas será objeto de análise somente no exame da culpabilidade que também é predicado do crime 64 Sabe e deve saber como simples elementares normativas do tipo penal De todo o exposto concluise que as elementares sabe e deve saber não são ao contrário do que sustentava a antiga doutrina penal brasileira indicativas da espécie de dolo direto ou eventual mas configuram tão somente elementos normativos do tipo que estabelecem a graduação da maior ou menor censura da conduta punível Enfim ignoramos completamente a existência das elementares sabe e deve saber para efeito de classificação das espécies de dolo no crime de receptação dolosa até porque o dolo eventual não se compõe da simples possibilidade de consciência deve saber como sustentava a teoria da probabilidade O grau de reprovação para concluir sobre quem age sem saber apenas podendo saber e sobre quem age efetivamente sabendo isto é consciente da ilicitude da sua conduta não pode ser o mesmo Manifestase Jescheck admitindo uma diferença material entre o atuar conscientemente contra o direito e a sua infração inconsciente consequente de erro vencível Não se pode reprovar quem não sabia mas apenas podia saber igualmente a quem efetivamente sabia isto é a quem tinha a real consciência da ilicitude Sem dúvida alguma a conduta de quem tinha real consciência da ilicitude é muito mais censurável E é em virtude dessa diferença no grau de reprovação que embora punindose quem age com consciência potencial deve diminuir a pena aplicável proporcionalmente ao menor juízo de reprovação Diminuise a pena aplicável mas não se afasta a culpabilidade que nas circunstâncias pode ser reconhecidamente diminuída 7 Consumação e tentativa A receptação própria lª figura é crime material e consumase com a efetiva tradição da coisa proveniente de crime Na receptação própria é perfeitamente admissível a tentativa considerandose tratar se de crime material por conseguinte admite o fracionamento de sua fase executória Devese destacar que o simples acordo entre o ladrão e o futuro receptador não constitui tentativa Contudo se esse acordo for celebrado antes da prática do crime anterior poderá em princípio configurar a participação do pretenso receptador como coautor ou partícipe dependendo das circunstâncias concretas art 29 do CP A ação delitiva nas modalidades de transportar conduzir e ocultar configura crime permanente cuja consumação se protrai no tempo possibilitando a prisão em flagrante enquanto perdurar a ação Na receptação qualificada além das mesmas condutas antes referidas também ter em depósito e expor à venda constituem crime permanente Na receptação imprópria 2ª figura o crime é formal consumandose com a influência exercida pelo sujeito ativo embora parte da jurisprudência entenda necessária a realização da conduta típica pelo induzido Na verdade ao descrever essa espécie de receptação o Código Penal não exige que o terceiro de boafé acabe praticando a conduta a que o autor pretendeu induzilo Assim consumase a receptação imprópria com a simples influência exercida por aquele Questão que merece cuidado é contudo o exame da idoneidade e eficácia do ato praticado para influenciar terceiro para adquirir receber ou ocultar o produto de crime A tentativa diante da natureza formal dessa espécie de receptação é teoricamente inadmissível 8 Receptação qualificada tipo autônomo ou derivado A Lei n 942696 deu nova redação ao 1º do art 180 substituindo a receptação culposa por uma figura que recebeu a denominação de receptação qualificada A simples inclusão no caput dos verbos transportar e conduzir por si só já desnaturou completamente o crime de receptação que tem o sentido de receptar isto é adquirir receber ou ocultar coisa de procedência criminosa Dicionário Aurélio O paradoxo se completa com a inclusão dos dois primeiros parágrafos que estariam mais bem situados em um tipo penal autônomo pois como assevera Alberto Silva Franco força é convir que o tipo tal como foi estruturado expressa uma péssima qualidade técnica de composição típica Essas inovações inclusive no plano de técnica legislativa estimularam o questionamento quanto à denominação receptação qualificada Na lição de Damásio de Jesus Direito Penal v 2 p 673 a Lei 4299 atribuiu ao parágrafo a denominação receptação qualificada Ocorre que o dispositivo contém uma norma de ampliação Além disso o crime de receptação mesmo com a nova redação não possui nenhum tipo qualificado E o 1º a que se refere o 2º não define figura típica qualificada Tratase de uma figura penal independente contém verbos que não estão previstos no caput repete outros e exige elementos subjetivos do tipo Seguindo a mesma orientação manifestouse Alberto Silva Franco Código Penal e sua interpretação jurisprudencial Parte Especial 7 ed São Paulo Revista dos Tribunais 2001 v 2 p 2967 para quem antes de mais nada não se compreende que se denomine receptação qualificada não uma figura criminosa derivada de um tipo básico mas sim um tipo com plena autonomia conceitual 81 A qualificadora constitui tipo derivado A qualificadora constitui verdadeiro tipo penal tipo derivado com novos limites mínimo e máximo mais elevados dentro dos quais será calculada a penabase A qualificadora acrescenta elementos acidentais que alteram o tipo fundamental com o fim de justificar a elevação da pena nele cominada Essa podese afirmar é a construção tipológica tradicional do nosso sistema jurídico Contudo isso não quer dizer que a falta de técnica legislativa com a inclusão de algumas condutas inexistentes no tipo fundamental e a inclusão de elementos normativos e subjetivos seja suficiente para desnaturar conceitualmente a figura qualificada da receptação assim denominada pelo legislador e topologicamente situada em parágrafo do artigo definidor do tipo básico que a nosso juízo é suficiente para identificálas Socorrenos Guilherme Nucci Código Penal comentado p 601 que conclui Portanto a simples introdução de condutas novas aliás típicas do comércio clandestino de automóveis não tem o condão de romper o objetivo do legislador de qualificar a receptação alterando as penas mínima e máxima que saltaram da faixa de l a 4 anos para 3 a 8 anos Não se pode negar enfim que na tipificação da receptação qualificada estão presentes circunstâncias especiais e acidentais crime próprio elemento normativo no exercício de atividade comercial ou industrial além dos verbosnúcleo especiais que justificam a elevação da censura penal Finalmente há outros aspectos relativos à receptação qualificada que demandam maior reflexão especialmente a hipótese de violação do princípio da proporcionalidade 82 Adequação típica receptação qualificada A receptação qualificada é crime próprio exigindo do sujeito ativo uma qualidade especial qual seja tratarse de comerciante ou industrial que deve praticálo no exercício do seu mister profissional mesmo que irregular ou clandestino Essa exigência legal não apenas reconhece a maior desvalia da ação executada pelo agente como afasta a possibilidade de o cidadão comum isto é sem a qualificação especial mencionada responder diretamente por essa espécie de infração penal Na verdade esse somente poderá ser alcançado por meio do concurso eventual de pessoas Na elaboração desse tipo penal mais uma vez o legislador voltou a excederse no elencar as condutas nucleares representadas por doze verbos mesmo tratandose de um tipo misto alternativo isto é de conteúdo variado Os verbos nucleares são os seguintes adquirir receber transportar conduzir ocultar ter em depósito desmontar montar remontar vender expor à venda e utilizar De modo geral as condutas relacionadas no dispositivo em exame não trazem em seu bojo aquela força lesiva típica dos crimes mais graves do Código Penal matar extorquir sequestrar constranger etc Essas condutas podem inserirse naquelas que Florian Florian Trattato di Diritto Penale Milão 1910 v l p 308 denominava moralmente inocentes Por isso somente com o complemento de elementos normativos e subjetivos poderão tornarse penalmente relevantes Essa complementação que está contida no texto legal é a coisa produto de crime No entanto muitas vezes a descrição objetiva da conduta proibida necessita não apenas de elementos normativos como reconhecera Mayer mas também de elementos subjetivos que representam estados anímicos orientadores da conduta executada pelo agente Por isso qualquer das condutas descritas praticadas pelo sujeito ativo devem necessariamente ter como objetivo a obtenção de proveito para si ou para outrem em outros termos o agente deve agir com animus lucrandi 821 Ter em depósito Ter em depósito significa receber produto de crime retendoo e conservandoo em proveito próprio ou de terceiro Esse depósito recebido por comerciante ou industrial pode ser gratuito ou oneroso Essa modalidade de conduta de duvidosa técnica legislativa enquanto definidora de ação humana afasta possível discussão sobre como a coisa produto de crime veio parar nas mãos do sujeito ativo isto é se houve aquisição recebimento ou qualquer outra forma de utilização Por outro lado se facilita a repressão estatal dificulta sobremodo a defesa do imputado na medida em que inverte o ônus da prova tendo de demonstrar que a despeito de tal produto encontrarse em suas dependências desconhecia sua origem ilícita não autorizou nem tomou parte na ação de depositar e até que não sabia da existência de tal depósito Enfim tratase de uma figura que ademais de constituir crime permanente consagra indisfarçável responsabilidade objetiva 822 Desmontar Desmontar significa desarmar determinado mecanismo invenção veículo computador ou qualquer outro aparato separandolhe as respectivas peças total ou parcialmente A desmontagem configurase sem necessidade de tornar o objeto desmontado inútil a sua finalidade original A desmontagem não implica necessariamente o ato de ter em depósito isto é aquela pode ocorrer sem a existência deste que se existir não alterará a configuração típica que continua sendo crime único conteúdo variado O óbvio ululante nos ensina que somente pode ser desmontado algo que tenha sido montado e que tais operações se inserem em uma regra natural inversa da ordem em que aparecem no tipo penal ou seja montar desmontar e finalmente remontar essa enfim é a ordem natural das coisas montar desmontar e remontar 823 Montar Montar significa encaixar ou arrumar determinados componentes cada qual em sua posição funcional cujo somatório representará outro objeto artefato ou instrumento resultante do conjunto harmonioso de peças previamente elaboradas normalmente para essa finalidade Como o objeto material da receptação em qualquer de suas espécies deve necessariamente ser produto de crime ficase a imaginar aquele exemplo tradicional do furto continuado em que o nubente pretendendo casarse e não dispondo dos recursos necessários vai subtraindo da indústria em que trabalha peças individuais que ao final montadas garantemlhe a geladeira de que necessita As diversas subtrações efetuadas tipificam o conhecido furto continuado Quem nas circunstâncias podendo saber da origem criminosa das peças montála visando proveito próprio ou de terceiro em princípio praticaria receptação qualificada É um pouco complicado admitir essa tipificação especialmente considerando a abismal sanção cominada 3 a 8 anos de reclusão essa conduta dependendo do tipo de material produto de crime que é montado está mais para favorecimento real art 349 do que para receptação qualificada venia concessa Enfim a casuística certamente permitirá a melhor adequação típica ficando apenas a lembrança da dificuldade pragmática 824 Remontar Remontar pela lógica do vernáculo não pode seguir imediatamente o ato de montar especialmente quando se tem a locução desmontar cujo significado acabamos de examinar Explicase como remontar é montar novamente não pode ser remontado o que está montado por isso destacamos a desordem em que esses três verbos estão enunciados Na verdade à operação de montardesmontar seguese a de remontar pelo menos quando o agente pretende refazer o que fora desfeito Perdoenos o leitor mas o excesso de verbos utilizados pelo legislador levanos por vezes a jogar um pouco com as palavras como acabamos de fazer 825 Vender ou expor à venda Vender ou expor à venda devia ser proibido esse tipo de construção tipológicopenal pois acaba criando situações ridículas e não apenas inusitadas 1 Vender é alienar algo a alguém por um preço convencionado trocar no caso por dinheiro a coisa produto de crime vender é comerciar negociar o produto do crime Vender é transferir a outrem mediante pagamento a coisa obtida com o crime anterior 2 Expor à venda é colocar em exposição o objeto material produto de crime para atrair comprador é a exjbição do corpus delicti para ser vendido 826 Utilizar de qualquer forma Finalmente utilizar de qualquer forma coisa que deve saber ser produto de crime Essa deve ser a ordem direta do enunciado para melhor compreendêlo Utilizar é fazer uso da coisa empregála de qualquer modo Também nesse particular a redação do texto legal não é das mais felizes quando utiliza depois de arrolar onze verbos a expressão genérica ou de qualquer forma utilizar Essa generalização infeliz pode conduzir a equívocos como ocorre com a interpretação dada por Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 604 que referindose à locução conclui denota a necessidade de aplicação de interpretação analógica de forma que qualquer conduta do comerciante ou do industrial à similitude daquelas exemplificadamente expostas pelo legislador que implicar uso da coisa obtida criminosamente caracteriza o delito em epígrafe Na verdade a expressão ou de qualquer forma utilizar não guarda nenhuma relação de similitude com as outras onze condutas elencadas no texto legal como parece ter interpretado Regis Prado Na realidade a locução de qualquer forma está se referindo tão somente ao modo de utilizar a coisa produto de crime tratandose de crime de forma livre isto é na modalidade de utilizar pode ser praticado de qualquer modo que o agente eleger Com efeito a despeito dessa fórmula genérica é inadmissível a adoção de analogia ou mesmo de interpretação analógica em matéria repressiva penal As condutas elencadas quer no caput quer no 1º são taxativas numerus clausus como convém ao direito penal da culpabilidade Reforça nossa orientação o magistério de Silva Franco Código Penal e sua interpretação jurisprudencial v 2 p 2967 ao sustentar que admitir que a referida locução significa a possibilidade de inclusão no tipo de outras ações não consagradas no texto legal corresponde a ofensa manifesta ao princípio da legalidade sob o enfoque da estrita reserva legal 9 Receptação simples receptação qualificada e princípio da proporcionalidade As alterações introduzidas pela Lei n 942696 na definição da receptação produziram efeitos além do desejado pelo legislador brasileiro sendo objeto de profundas divergências conceituais com indesejáveis consequências práticojurídicas A controvérsia pode ser resumida no seguinte enunciado no caput definidor de crime comum o tipo penal exige a presença de dolo direto representado pela locução típica que sabe ser produto de crime na redação do 1º definidor de crime próprio exigese dolo eventual representado pela locução que deve saber ser produto de crime Assim analisando essas duas locuções sob uma ótica superada que as considera definidoras do dolo punirseia de forma mais grave 3 a 8 anos de reclusão a figura mais branda do 1º que só admitiria dolo eventual em detrimento do crime mais grave caput que exige dolo direto cuja pena se mantém de um a quatro anos de reclusão 91 Criar via interpretação um terceiro tipo penal de receptação Alguns doutrinadores chegaram ao extremo de sugerir a desconsideração da pena cominada no 1º aplicandose aquela prevista para o caput do mesmo artigo Segundo Damásio de Jesus Código Penal comentado São Paulo Saraiva 1999 p 637 essa seria a solução menos pior in verbis O preceito secundário do 1º deve ser desconsiderado uma vez que ofende os princípios constitucionais da proporcionalidade e da individualização legal da pena Realmente nos termos das novas redações literalmente interpretadas se o comerciante devia saber da proveniência ilícita do objeto material a pena é de reclusão de três a oito anos 1º se sabia só pode subsistir o caput reclusão de um a quatro anos A imposição de pena maior ao fato de menor gravidade é inconstitucional desrespeitando os princípios da harmonia e da proporcionalidade Essa sugestão de Damásio de Jesus recebeu importantes adesões doutrinárias embora tenha enfrentado a resistência dos tribunais No entanto o sempre indefectível Alberto Silva Franco Código Penal e sua interpretação jurisprudencial v 2 p 2969 com argumentação erudita chancela o entendimento damasiano nos seguintes termos A argumentação de Damásio Evangelista de Jesus sobre o tema op cit p 6 é irrespondível se a pena abstrata ou concreta de quem sabe é mais censurável do que a do sujeito que devia saber sendo comum no sistema da legislação penal brasileira descrever as duas situações subjetivas no mesmo tipo não podia a Lei 942696 ferindo o princípio da proporcionalidade inserir o devia saber de menor censurabilidade em figura autônoma 1º com pena de três a oito anos de reclusão subsistindo o sabia de maior reprovabilidade no caput com pena de um a quatro anos A proporcionalidade que indica equilíbrio foi ferida Não se observou na palavra de Suzana de Toledo Barros a ideia de relação harmônica entre dois valores O princípio da proporcionalidade e o controle constitucional das leis restritivas de direitos fundamentais Brasília Brasília Editora 1996 p 71 Se a lei nova fugindo do sistema desvinculou o deve saber do sabe colocandoos em dois tipos autônomos a pena abstrata do deve saber não pode ser mais grave do que a do sabe Outro segmento doutrinário embora com argumentação e concepção diversas das nossas não endossa a orientação capitaneada por Damásio de Jesus no sentido de criar um terceiro tipo penal de receptação um misto entre as previsões do caput e de seu 1º a união do preceito primário previsto no 1º com a previsão do preceito secundário do caput Sugerese um tipo penal digase de passagem não previsto em lei as condutas descritas em um dispositivo com a aplicação de penas cominadas em outro para condutas distintas ilegalidade absurda já que se trata de tipo penal desconhecido do legislador penal Pois bem assim está posta a divergência Constata se de plano que a análise crítica limitouse à comparação das locuções sabe e deve saber ignorando completamente todos os demais elementos constantes das duas estruturas tipológicas inclusive a classificação dos dois crimes sendo um comum caput e outro próprio 1º o desvalor das ações e dos resultados tampouco foram objeto de consideração embora toda a crítica tenha sido centrada no princípio da proporcionalidade as condutas distintas igualmente não foram avaliadas Percebese mais uma vez que o absurdo e hoje desnecessário uso das locuções sabe e deve saber na tipificação de condutas criminosas como demonstramos no tópico anterior só serve para dificultar a interpretação e boa aplicação da lei penal Não houvesse o legislador contemporâneo inserido tais expressões nas construções tipológicas não se estaria perdendo tempo com discussão puramente dogmática com sérios reflexos nas consequências jurídicas do crime 92 Nosso entendimento divergente não há inconstitucionalidade Estamos de pleno acordo que num Estado Democrático de Direito está assegurado como um dos seus princípios materiais o da proporcionalidade que impede a cominação ou mesmo a aplicação de pena em flagrante contradição com a gravidade do fato A aplicação de pena nesses termos viola não apenas o princípio da proporcionalidade mas a própria dignidade da pessoa humana Com efeito o princípio da proporcionalidade exige o respeito à correlação entre a gravidade da pena e a relevância do dano ou perigo a que o bem jurídico protegido está sujeito e particularmente a importância do próprio bem jurídico tutelado No entanto o juízo de proporcionalidade in concreto resolvese por meio de valorações e comparações Contudo nessa relação valorativa não se pode ignorar toda a construção tipológica com seus diversos elementos objetivos subjetivos e normativos e particularmente desconsiderar o desvalor da ação e o desvalor do resultado para fixarse exclusivamente na comparação de duas locuções isoladas sabe e deve saber de duvidosa natureza subjetiva ou normativa Com efeito o tipo descrito no caput do art 180 retrata um crime comum que pode ser praticado por qualquer pessoa enquanto a descrição contida no 1º configura crime próprio que exige uma qualidade especial do sujeito ativo no caso que se trate de comerciante ou industrial e mais que a conduta criminosa seja praticada no exercício da atividade profissional mesmo que exercida irregular ou clandestinamente Essa mudança da espécie de tipo penal de comum para especial acrescida da exigência de que qualquer das condutas constantes do enunciado típico deve ser praticada no exercício de atividade comercial ou industrial denota um desvalor da ação muito superior àquele decorrente das condutas contidas no caput do mesmo artigo Na verdade no exercício das referidas atividades o indivíduo capta a confiança da sociedade em geral e do consumidor em particular o sujeito ativo que se aproveita de sua atividade profissional comerciante ou industrial para receptar coisa produto de crime abusa da boafé do sujeito passivo merecendo maior censura penal 93 Política de combate ao comércio clandestino de veículos Por outro lado as novas condutas acrescidas pela Lei n 942696 tais como desmontar montar remontar vender expor à venda deixam clara a preocupação do legislador penal a exemplo do que fez relativamente aos crimes de furto e de roubo de veículos automotores arts 155 5º pena de 3 a 8 anos de reclusão 157 2º IV de combater a praga que virou os furtos e roubos de veículos automotores Visivelmente essas condutas típicas do comércio clandestino de veículos pretendem enfrentar com seriedade os conhecidos desmanches de carros que criaram um mercado negro estimulador dos ladrões especializados em nosso país e por extensão em toda a América Latina Nesse sentido destaca com acerto Regis Prado No art 180 1º do Código Penal o legislador visando reprimir mais severamente a atuação de organização criminosa nos delitos patrimoniais qualificou o delito de receptação na modalidade dolosa quando perpetrado no exercício de atividade comercial ou industrial Nesse tipo de receptação com efeito o desvalor do resultado invariavelmente também é superior ao da receptação tradicional não se configurando por todo o exposto a pretendida ofensa ao princípio da proporcionalidade a ponto de inviabilizar a aplicação legal da sanção cominada especialmente com todos os recursos de que o Código Penal disponibiliza por meio do instituto da dosimetria penal arts 59 e s Aliás nesse sentido é razoável a justificativa da Exposição de Motivos sobre a necessidade de punir com maior severidade aquele que faz da receptação um comércio ainda que clandestino conduta de maior gravidade e dano social do que a receptação individual ou simples Ademais a grande incidência prossegue a Exposição de Motivos da receptação na atualidade fator preponderante na ampliação dos casos de furto e roubo é a receptação profissional que vem em geral acompanhada do desmonte da coisa para venda dos componentes dificultando sua identificação e recuperação Nos dias de hoje a receptação simples é insuficiente para coibir a atividade dos chamados desmanches de veículos joias computadores e outros equipamentos Daí a proposta da figura qualificada com pena significativamente maior No entanto isso não quer dizer que estejamos de acordo com a exasperação exagerada da sanção cominada no 1º ora em exame como deixamos claro quando do exame do crime de furto de veículos automotores art 155 5º No entanto apenas não chegamos ao ponto de considerála inconstitucional como apregoa parte da doutrina Assim venia concessa consideramos equivocada por carecedora de fundamento dogmático a conclusão de que os tipos penais descritos no caput e no 1º ferem o princípio da proporcionalidade porque segundo entendem a figura que admite dolo eventual recebe punição mais grave que a outra que admite dolo direto As elementares sabe e deve saber de cunho normativo repetindo não identificam o dolo que a partir da teoria normativa pura da culpabilidade é um dolo psicológico despido de qualquer elemento normativo Por isso aquelas expressões não podem ter qualquer relação com o elemento subjetivo que orienta a conduta do agente especialmente porque o desconhecimento saber ou não representa apenas o elemento intelectual do dolo que para aperfeiçoarse necessita também do elemento volitivo que não está abrangido por aquelas elementares 94 Outras características subjetivas que podem integrar os tipos penais Pode figurar nos tipos penais ao lado do dolo uma série de características subjetivas que os integram ou os fundamentam O próprio Welzel Derecho Penal alemán trad da 12 ed al Juan Bustos Ramírez e Sérgio Yáñez Pérez 3 ed castelhana Santiago Ed Jurídica de Chile 1987 p 83 esclareceu que ao lado do dolo como momento geral e pessoalsubjetivo daquele que produz e configura a ação como acontecimento dirigido a um fim apresentamse frequentemente no tipo especiais momentos subjetivos que dão colorido num determinado sentido ao conteúdo éticosocial da ação Assim o tomar uma coisa alheia é uma atividade dirigida a um fim por imperativo do dolo no entanto seu sentido éticosocial será inteiramente distinto se aquela atividade tiver como fim o uso passageiro ou se tiver o desígnio de apropriação Contudo a excessiva utilização pelo legislador de categorias subjetivadoras da descrição típica além do dolo propriamente dito é uma forma disfarçada de ultrapassar com roupagem de legitimidade os limites taxativos do princípio da reserva legal Essa ideologia subjetivadora na elaboração do preceito primário da norma penal além de inadequada é extremamente perigosa pois esses estados anímicos como ser egoísta cruel ou malvado entre outros podem existir independentemente da relevância da lesão objetiva de bens jurídicos tutelados E nessas circunstâncias quando a conduta é penalmente relevante a tipificação desses estados anímicos pode conduzir à punição do ânimo que é inadmissível no direito penal da culpabilidade Algo semelhante pode ocorrer com a utilização das locuções sabe e deve saber na medida em que nada têm que ver com o dolo que não se limita ao aspecto puramente intelectivo saber ou não saber como a própria definição do Código Penal deixa muito claro art 18 I Assim a concepção normativa dessas locuções tem entre outros também o mérito de evitar a exagerada subjetivação na definição de crimes 95 Elemento normativo da receptação qualificada no exercício de atividade comercial ou industrial De qualquer sorte todas as condutas relacionadas no 1º somente tipificarão a receptação qualificada se visarem a proveito próprio ou alheio no exercício de atividade comercial ou industrial seja ele regular irregular ou clandestino A fúria cega as pessoas e embota o raciocínio dificultando a avaliação adequada do sentido dos termos expressões ou frases O desejo de ser mais drástico e mais abrangente por vezes pode ao mesmo tempo tornar a previsão legal mais restritiva Foi o que ocorreu nesse caso pois nada impede que o agente transporte conduza desmonte monte ou remonte para ficar somente nas novidades coisa que deve saber ser produto de crime sem fazêlo no entanto no exercício de atividade comercial ou industrial regular ou irregular Tais condutas não se amoldariam à figura da receptação qualificada Na verdade no 2º do art 180 o legislador traz uma figura de equiparação ampliando a abrangência do crime próprio contido no 1º Incorpora ao conceito de atividade comercial qualquer forma de comércio irregular ou clandestino inclusive o exercido em residência A pretensão do legislador foi inquestionavelmente como reconhece Silva Franco Código Penal e sua interpretação jurisprudencial v 2 p 2972 alargar a incidência da receptação qualificada em relação às atividades de desmanche de veículos realizadas não apenas em oficinas registradas mas também em oficinas de fundo de quintal Com essa previsão naquele crime próprio que exige a condição especial de ser comerciante ou industrial alargase o tipo para admitir como sujeito ativo também aquele que pratica comércio irregular e até clandestino Contudo constatase mais uma vez um lapso do legislador que ao ampliar a abrangência desse crime próprio esqueceuse de incluir quem exerce atividade industrial irregular ou clandestina como fizera em relação à atividade comercial 2º Assim quem praticar qualquer das condutas descritas no 1º no exercício de atividade industrial mas em caráter irregular ou clandestino não incorrerá nas sanções da receptação qualificada se a conduta for uma daquelas contidas no caput receber transportar conduzir ocultar ou influir poderá responder por receptação simples caso contrário se praticar qualquer das demais condutas contidas exclusivamente no 1º sua atividade será atípica Mas a previsão legal tal como é limitase ao exercício de atividade comercial ou industrial a atividade comercial mesmo irregular ou clandestina Fora dessa hipótese ou seja quando o receptador não se encontrar no exercício dessas atividades a qualificadora não se tipificará 10 Tipo subjetivo adequação típica dolo direto A receptação dolosa segundo a doutrina tradicional contém duas espécies de dolo a o agente sabe que é produto de crime b devia saber que é produto de crime Dessa distinção originase a diversidade de elementos subjetivos 1ª que sabe ser produto de crime dolo direto 2ª que deve saber ser produto de crime dolo eventual Já registramos nosso desapreço por essa concepção que a nosso juízo encontrase superada Para analisar o elemento subjetivo do crime de receptação dolosa simples e qualificada tivemos de superar preliminarmente a divergência sobre o sentido e função das elementares sabe ou deve saber contidas no tipo relativos ao grau de consciência sobre o fato de tratarse de produto de crime Deixamos claro no tópico anterior que não concordamos com a doutrina tradicional que considera referidas elementares indicativas das espécies de dolo direto e eventual Segundo a orientação que adotamos ao contrário do entendimento dominante nenhuma das espécies de receptação dolosa previstas no caput e no 1º admite dolo eventual A impossibilidade do dolo indireto não decorre das elementares sabe e deve saber que como demonstramos são elementos normativos indicadores do grau de censura mas dos próprios verbos nucleares que por seus conteúdos semânticos só aceitam o dolo direto Afinal como destaca Wessels haverá dolo eventual quando o autor não se deixar dissuadir da realização do fato pela possibilidade próxima da ocorrência do resultado e sua conduta justificar a assertiva de que em razão do fim pretendido ele se tenha conformado com a produção do resultado ou até concordado com sua ocorrência em vez de renunciar à prática da ação Ora em qualquer das condutas contidas nas duas espécies de receptação dolosa o agente independente de saber ou dever saber da origem criminosa da coisa quer o resultado de sua ação e esse querer essa vontade livre e consciente é caracterizadora de dolo direto e não de dolo eventual O dever saber não tem o mesmo significado da assunção do risco da produção do resultado O dolo será sempre direto tanto na receptação simples quanto na qualificada e consistirá na vontade livre e consciente de praticar quaisquer das condutas descritas nos tipos em exame isto é de receptar o produto de crime ou influir para que terceiro de boafé o recepte Em outros termos o receptador consciente e voluntariamente realiza uma ou mais das condutas proibidas Age nessa hipótese com dolo direto pois a vontade consciente do agente é dirigida à realização do fato típico O objeto do dolo direto são o fim proposto obtenção da coisa em proveito próprio ou alheio os meios escolhidos crime de forma livre qualquer meio que eleger e os efeitos colaterais ou secundários dano ou prejuízo ao proprietário possuidor ou detentor da coisa representados como necessários à realização do fim pretendido 101 Em relação ao fim proposto e aos meios escolhidos Em relação ao fim proposto e aos meios escolhidos o dolo direto é de primeiro grau e em relação aos efeitos colaterais representados como necessários o dolo direto é de segundo grau Os efeitos colaterais ou secundários são abrangidos mediatamente pela vontade consciente do agente mas é sua produção necessária que os situa também como objeto do dolo direto não é sua relação de imediatidade mas a relação de necessidade que o inclui no dolo direto Não se pode esquecer que as elementares sabe e deve saber não se confundem com dolo pois este se compõe de dois elementos repetindo intelectivo consciência ou previsão e volitivo vontade e a ausência de qualquer deles volitivo ou intelectivo é suficiente para impedir a configuração dolosa tanto na forma direta quanto na eventual Com efeito a presença in concreto das elementares sabe e deve saber significa somente a atualidade ou potencialidade da consciência da ilicitude respectivamente sem qualquer relevância na definição ou constituição da espécie de dolo direto ou indireto O dolo deve ser antecedente ou contemporâneo não se admitindo o dolo subsequente Não há dolo subsequente em direito penal Quem adquire coisa alheia móvel de boafé e só posteriormente descobre tratarse de produto de origem criminosa não pratica o crime de receptação Poderá contudo praticar a receptação se a partir desse conhecimento procura ocultar tal aquisição Por fim apenas para afastar alguns pruridos convém lembrar que o Código Penal brasileiro equipara dolo direto e dolo eventual quanto a seus efeitos art 18 I nos precisos termos da Exposição de Motivos da lavra do Ministro Francisco Campos in verbis O dolo eventual é assim plenamente equiparado ao dolo direto É inegável que arriscar se conscientemente a produzir um evento vale tanto quanto querêlo ainda que sem interesse nele o agente o ratifica ex ante presta anuência ao seu advento Até porque a consciência e a vontade que representam a essência do dolo também devem estar presentes no dolo eventual Para que este se configure é insuficiente a mera ciência da probabilidade do resultado ou a atuação consciente da possibilidade concreta da produção desse resultado como sustentam os defensores da teoria da probabilidade É indispensável determinada relação de vontade entre o resultado e o agente e é exatamente esse elemento volitivo que distingue o dolo da culpa 102 Elemento subjetivo especial do injusto em proveito próprio ou alheio Exigese ademais o elemento subjetivo especial do tipo constituído pelo fim especial de obter vantagem em proveito próprio ou alheio Pois é exatamente esse fim especial que distingue a receptação do crime de favorecimento real art 349 Convém destacar que esse fim especial configurador do elemento subjetivo do injusto não precisa concretizarse sendo suficiente que exista na mente do sujeito ativo e que tenha sido a mola propulsora de sua ação delitiva Esse especial fim de agir embora amplie o aspecto subjetivo do tipo penal não integra o dolo nem com ele se confunde uma vez que o dolo esgotase com a consciência e a vontade de realizar a ação com a finalidade de obter o resultado criminoso A finalidade especial do agir que integra determinadas definições delituosas como é o caso da receptação dolosa condiciona ou fundamenta a ilicitude do fato constituindo assim elemento subjetivo especial do crime de forma autônoma e independente do dolo 11 Receptação culposa metodologia diferenciada O legislador penal de 1940 além de dominar uma técnica legislativa invejável sempre primou pela harmonia sistemática e pela estrutura metodológica Tal qualidade do então legislador não impediu que aqui ou acolá fugisse de seus cuidados pragmáticos e metodológicos dificultando por vezes a própria interpretação de alguns preceitos consagrados pelo diploma penal que elaborou Essa situação excepcional também se faz presente na disciplina do crime de receptação particularmente na definição de sua modalidade culposa fugindo completamente à tradição e ao método adotado na definição dos crimes culposos Com efeito na Parte Geral do Código quando tratou de definições afirmou que se diz do crime culposo quando o agente deu causa ao resultado por imprudência negligência ou imperícia art 18 II Posteriormente na Parte Especial quando admite pelo princípio da excepcionalidade a infração penal em sua modalidade culposa art 18 parágrafo único adota uma fórmula simples repetidamente se o homicídio é culposo art 121 3º se a lesão é culposa art 129 6º se culposo o incêndio art 250 2º se o crime é culposo art 270 2º se o crime é culposo art 272 2º se o crime é culposo art 273 2º se o crime é culposo art 278 2º se o crime é culposo art 280 2º Essa é a regra mantida ao longo de todo o Código com variação mínima servindose sempre do conceito que emitiu lá na Parte Geral Afinal surpreendentemente no crime de receptação o legislador mudou o método tradicional afastou a técnica até então adotada e emitiu a seguinte definição de receptação culposa adquirir ou receber coisa que por sua natureza ou pela desproporção entre o valor e o preço ou pela condição de quem a oferece deve presumirse obtida por meio criminoso 3º O primeiro questionamento a fazer é afinal nesta metodologia de definição o legislador teria abandonado a concepção de crime culposo que orientou basicamente todas as tipificações da modalidade culposa Aqueles princípios orientadores do crime culposo devem ser aplicados nessa definição de receptação culposa Todos esses aspectos exigem alguma consideração críticodogmática que fizemos em nosso Tratado 111 Devemse observar os postulados fundamentais do crime culposo Na verdade mesmo nessa definição assistemática da receptação culposa é impossível ignorar os postulados fundamentais do crime culposo Assim recomendamos que se adote inclusive a definição emitida pelo legislador na Parte Geral do Código Penal art 18 II bem como as modalidades de culpa excluindose apenas a imperícia ante a impossibilidade prática de sua ocorrência Na realidade os indícios específicos de culpa relacionados pelo legislador demonstram a necessidade de cautela nas operações mencionadas Esses indícios são os seguintes a natureza da coisa b desproporção entre o valor e o preço c condição de quem oferece Esses três requisitos exigem atenção do adquirente cuja desconsideração ou má avaliação pode levar à presunção de culpa A inobservância desses requisitos representa na realidade a imprudência ou negligência do agente Com efeito a observância do dever objetivo de cuidado isto é a diligência devida constitui o elemento fundamental do tipo de injusto culposo cuja análise constitui questão preliminar no exame da culpa Na dúvida no exame daqueles indícios impõese o dever de absterse da realização da conduta pois quem se arrisca nessa hipótese age com imprudência e sobrevindo um resultado típico tornase autor de um crime culposo no caso de receptação culposa 112 Indícios de natureza objetiva que exigem observação criteriosa Os indícios relacionados no 1º são de natureza objetiva É indispensável que se examine se havia contraindícios razoáveis ou se o agente incidiu em erro invencível Por isso é indispensável investigar o que teria sido in concreto para o agente o dever de cuidado E como segunda indagação devese questionar se a ação do agente correspondeu a esse comportamento adequado Somente nessa segunda hipótese quando negativa surge a reprovabilidade da conduta A análise dessas questões deve ser extremamente criteriosa na medida em que a aparente falta de cautela por si só não implica necessariamente a violação do dever objetivo de cuidado pois o agente pode ter fundadas razões para não duvidar da legitimidade da origem da coisa ainda que a final se comprove sua origem criminosa Nesses casos a conduta é atípica 12 Autonomia da receptação independência relativa A autonomia da receptação em relação ao crime precedente consolidouse na doutrina no alvorecer do século XIX e seus antecedentes políticofilosóficos podem ser creditados a Carpsóvio século XVII A partir desse período a receptação passou a ter como pressuposto não apenas um crime especificamente contra o patrimônio mas qualquer crime que pudesse indevidamente acarretar vantagem patrimonial em prol do agente No direito codificado contudo coube a Feuerbach introduzila no Código bávaro de 1813 do qual foi o autor intelectual Afastouse a partir de então o superado entendimento segundo o qual a receptação era uma forma de cumplicidade ante o paradoxo de admitirse a participação em um crime já consumado O Código Penal brasileiro de 1940 embora a inclua entre os crimes patrimoniais não se encontra vinculado exclusivamente a eles pode ser pressuposto da receptação todo e qualquer crime que possa proporcionar a seu autor algum proveito econômico e que possa ser consolidado ou garantido com animus lucrandi pelo receptador 121 Crime acessório como autonomia relativa A receptação podese admitir é um crime acessório consequente ou se se preferir parasitário de outro crime Aliás em sua tipificação legal consta a elementar coisa produto de crime significando que necessariamente a receptação deve ser precedida de outro crime Na verdade embora por disposição legal seja irrelevante a identidade ou responsabilidade penal do autor do fato criminoso anterior é indispensável que se comprove a existência material do crime de que proveio a coisa que se diz receptada Com efeito como afirma o 4º a receptação é punível mesmo que seja desconhecido ou isento de pena o autor do crime anterior bastando a certeza de que a coisa é produto de crime A inexistência de condenação do crime precedente é irrelevante sendo suficiente a comprovação de sua existência algo que pode ser feito no próprio processo que investiga a receptação Nesse sentido sobre a necessidade de comprovação da existência efetiva do crime precedente podese afirmar que a independência ou autonomia da receptação é relativa isto é ela não existe por si só sendo fruto de uma infração penal com a qual está ontologicamente vinculada Assim a mencionada autonomia da receptação repousa tão somente em sua punibilidade que é absolutamente independente da punibilidade do crime precedente e não em sua configuração típica que ontologicamente deve estar vinculada a outra infração penal precedente A extinção da punibilidade do crime art 108 do CP do qual proveio a coisa objeto de receptação ou a ausência de investigação ou processo criminal é indiferente para a punibilidade da receptação 13 Autor de crime a culpabilidade não é mero pressuposto da pena A redação do 4º prevendo a punibilidade da receptação mesmo que desconhecido ou isento de pena o autor do crime de que proveio a coisa foi objeto de grande debate na doutrina nacional A corrente capitaneada por Damásio de Jesus Direito Penal v 2 p 4513 tem sustentado que o crime é a ação típica e antijurídica sendo a culpabilidade mero pressuposto da pena e que ademais com essa redação do 4º o Código Penal estaria adotando o mesmo entendimento A tipicidade a antijuridicidade e a culpabilidade são predicados de um substantivo que é a conduta humana definida como crime Não nos convence o entendimento que até pouco tempo foi dominante na doutrina brasileira segundo o qual a culpabilidade no atual estágio deve ser tratada como mero pressuposto da pena e não mais como integrante da teoria do delito Assumindo essa orientação Damásio de Jesus pioneiramente passou a definir o crime como a ação típica e antijurídica admitindo a culpabilidade somente como mero pressuposto da pena Aliás nesse sentido o saudoso Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 216 depois de afirmar que crime é o conjunto dos pressupostos da pena esclarecia Crime é assim o conjunto de todos os requisitos gerais indispensáveis para que possa ser aplicável a sanção penal A análise revela que tais requisitos são a conduta típica antijurídica e culpável Rosenfeld em sua crítica contundente à teoria normativa afirmou que a culpabilidade de um homem não pode residir na cabeça dos outros Mezger respondendo a essa objeção de Rosenfeld reconhece que O juízo pelo qual se afirma que o autor de uma ação típica e antijurídica praticoua culpavelmente referese na verdade a uma determinada situação fática da culpabilidade que existe no sujeito mas valorizase ao mesmo tempo esta situação considerandoa como um processo reprovável ao agente Somente através desse juízo valorativo de quem julga se eleva a realidade de fato psicológica ao conceito de culpabilidade O juízo de censura não recai somente sobre o agente mas especial e necessariamente sobre a ação por este praticada Por derradeiro para não deixar dúvida sobre a natureza e a localização da culpabilidade defendida por Welzel El nuevo sistema de Derecho Penal p 79 invocamos as próprias palavras deste sobre sua concepção de delito O conceito da culpabilidade acrescenta ao da ação antijurídica tanto de uma ação dolosa quanto de uma não dolosa um novo elemento que é o que a converte em delito 131 Fundamento dessa política criminal do Código Penal de 1940 Não impressiona o argumento de que o Código Penal brasileiro admite a punibilidade da receptação mesmo quando desconhecido ou isento de pena o autor do crime de que proveio a coisa e que como a receptação pressupõe que o objeto receptado seja produto de crime o legislador de 1940 estaria admitindo crime sem culpabilidade Convém registrar que em 1942 quando nosso Código entrou em vigor ainda não se haviam propagado as ideias do finalismo welzeliano que apenas se iniciava Ao contrário do que se imagina essa política criminal adotada pelo Código de 1940 tem outros fundamentos 1º de um lado representa a adoção dos postulados da teoria da acessoriedade limitada que também foi adotada pelo direito penal alemão em 1943 segundo a qual para punir o partícipe é suficiente que a ação praticada pelo autor principal seja típica e antijurídica sendo indiferente sua culpabilidade 2º de outro lado representa a consagração da prevenção na medida em que pior que o ladrão é o receptador pois a ausência deste enfraquece o estímulo daquele 3º finalmente o fato de o nosso Código prever a possibilidade de punição do receptador mesmo que o autor do crime anterior seja isento de pena não quer dizer que esteja se referindo ipso facto ao inimputável O agente imputável por inúmeras razões por exemplo coação moral irresistível erro de proibição erro provocado por terceiro pode ser isento de pena Concluímos com a afirmação irrefutável de Cerezo Mir Curso de Derecho Penal espãnol Madrid Tecnos 1985 p 267 Os diferentes elementos do crime estão numa relação lógica necessária Somente uma ação ou omissão pode ser típica só uma ação ou omissão típica pode ser antijurídica e só uma ação ou omissão antijurídica pode ser culpável 14 Perdão judicial 5º 1ª parte Na receptação culposa sendo o acusado primário e considerando as circunstâncias pode ser concedido o perdão judicial 5º 1ª parte Nas circunstâncias a que se refere referido parágrafo além da primariedade deve ser considerada a culpa levíssima e o pequeno prejuízo causado Perdão judicial é o instituto por meio do qual a lei possibilita ao juiz deixar de aplicar a pena diante da existência de circunstâncias expressamente determinadas exs arts 121 5º 129 8º 140 1º I e II 180 5º 1ª parte 240 4º I e II 242 parágrafo único 249 2º Na legislação especial também se encontram algumas hipóteses de perdão judicial 141 Direito público subjetivo de liberdade Embora algumas opiniões concebam o perdão judicial como mero benefício ou favor do juiz entendemos que se trata de direito público subjetivo de liberdade do indivíduo a partir do momento em que preenche os requisitos legais Como dizia Frederico Marques os benefícios são também direitos pois o campo do status libertatis se vê ampliado por eles de modo que satisfeitos seus pressupostos o juiz é obrigado a concedêlos Ademais é inconcebível que uma causa extintiva de punibilidade fique relegada ao puro arbítrio judicial Deverá contudo ser negado quando o réu não preencher os requisitos exigidos pela lei Enfim se ao analisar o contexto probatório o juiz reconhecer que os requisitos exigidos estão preenchidos não poderá deixar de conceder o perdão judicial por mero capricho ou qualquer razão desvinculada do referido instituto Para afastar a desinteligência das diversas interpretações que existiam sobre a natureza jurídica da sentença que concede o perdão judicial a reforma penal de 1984 incluiuo entre as causas extintivas de punibilidade e explicitou na Exposição de Motivos n 98 que a sentença que o concede não produz efeitos de sentença condenatória O acerto da inclusão do perdão judicial no art 107 IX não se repetiu ao tentar reforçar no art 120 a natureza da sentença concessiva propiciando a sobrevivência do equivocado entendimento de que se trata de sentença condenatória que somente livra o réu da pena e do pressuposto da reincidência A nosso juízo referida sentença é simplesmente extintiva da punibilidade sem qualquer efeito penal principal ou secundário 15 Receptação privilegiada 5º 2ª parte Na receptação dolosa é admissível o tratamento previsto para o furto privilegiado art 155 2º a primariedade e o pequeno valor da coisa produto de crime permitem substituir a pena de reclusão por detenção reduzila de um a dois terços ou aplicar somente multa A privilegiadora presentes os requisitos legais aplicase a qualquer das espécies de receptação própria ou imprópria Com efeito o 2º do art 155 prevê a possibilidade de se reduzir a sanção cominada para o crime de furto quando se tratar de réu primário e de pequeno valor a coisa subtraída Em outros termos o pequeno desvalor do resultado e a primariedade do agente recomendam menor reprovação deste determinando em obediência ao princípio da proporcionalidade a redução da sanção para adequála a menor gravidade do fato 151 Primariedade do acusado A primariedade como primeiro requisito necessário para a configuração da minorante embora encerre um conceito negativo não se confunde com não reincidência especialmente a partir da reforma penal de 1984 Lei n 7209 que introduziu um novo conceito qual seja não reincidente Assim a Parte Geral do Código adota um critério distinto da Parte Especial trabalha com os conceitos reincidente e não reincidente enquanto a Parte Especial utiliza os conceitos reincidente e primário Anteriormente reincidente e primário constituíam definições excludentes ou uma ou outra tanto que se adotava o seguinte conceito primário é o não reincidente 152 Coisa de pequeno valor O segundo requisito legal é que se trate de coisa de pequeno valor definição que está longe de ser pacífica quer na doutrina quer na jurisprudência Como elemento normativo do tipo para interpretálo adequadamente deverseá ter em consideração as peculiaridades e as circunstâncias pessoais e locais de onde o fato é praticado Na seara tributária a própria Receita Federal encarregouse de estabelecer valores muito superiores para os quais não admite a execução fiscal no momento fixado em R 250000 Diante desse entendimento da Receita é natural que se considere nos crimes fiscais ou tributários não apenas pequeno valor mas valor insignificante para excluir a própria tipicidade da conduta segundo o princípio da insignificância 16 Receptação majorada 6º Na receptação dolosa quando o objeto material constituirse de bens e instalações do patrimônio da União Estado Município empresa concessionária de serviços públicos ou sociedade de economia mista justificará a majoração da reprovação penal Em razão da natureza dos bens pertencentes ao Estado agravase exageradamente a pena Elevouse o mínimo de um para dois anos de reclusão Aliás essa excessiva e injustificável exasperação penal já era censurada pelo saudoso Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 311 e 316 que referindose à equivocada redação original do Código de 1940 destacava Em código algum figura a receptação com pena aprioristicamente mais grave do que a daqueles de que pode provir e prosseguia No direito brasileiro a tradição constante foi no sentido da menor punibilidade da receptação em confronto com o crime de que deriva 17 Pena e ação penal Na receptação dolosa simples as sanções penais são cumulativas reclusão de um a quatro anos e multa na qualificada reclusão de três a oito anos e multa na culposa detenção de um mês a um ano ou multa ou ambas pode ser alternativa ou cumulativa além de admitirse o privilégio do art 155 2º se o réu for primário e as circunstâncias recomendarem na majorada a pena do caput pode ser duplicada Lei n 942696 A ação penal é pública incondicionada ressalvadas as hipóteses do art 182 do Código Penal J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Comete o delito previsto no art 180 caput do CP o agente que conduz objetos que sabia ser produto de crime TJRS Apelação 70022405575 Rel Constantino Lisbôa de Azevedo j 632008 Não se discute que para a caracterização do delito previsto no art 180 caput do Código Penal é indispensável que o agente tenha prévia ciência da origem criminosa do objeto Contudo tendo em vista que se trata de um comportamento subjetivo a prova neste caso é sutil e difícil Assim tornase importante a verificação dos fatos circunstanciais que envolvem a infração e a conduta do agente Ora não deixa de ser evidente e desta forma induvidoso que o apelante sabia da origem ilícita das motocicletas Não só não trouxe qualquer fato em sentido contrário afinal foram encontrados três veículos em sua residência e que ali apareceram da noite para o dia sem qualquer justificativa plausível como demonstrando culpa tentou fugir com a aproximação dos policiais TJRS Apelação 70022951388 Rel Sylvio Baptista Neto j 632008 Crime de extorsão Desclassificação para receptação dolosa Possibilidade Os recorrentes cometeram o crime de receptação dolosa e não o de extorsão Ocorre que não existe dúvida sobre o cometimento do delito do art 180 do Código Penal porque eles apelantes tinham a posse da motocicleta da vítima E não se pode falar em ausência de conhecimento da origem ilícita daquele objeto pois exigiam dinheiro para devolvêlo Esta atitude só faz sentido com o reconhecimento que eles apelantes sabiam do fato criminoso antecedente e procuravam tirar vantagem da situação Por outro lado a ação posterior de exigir dinheiro para a devolução do veículo não caracterizou a extorsão por falta de idoneidade da ameaça Afinal a ameaça configuradora da extorsão é aquela capaz de criar no espírito do lesado fundado receio de iminente e grave mal físico ou moral injusto ou não à sua pessoa ou à pessoa que lhe seja particularmente cara Ora por mais valioso que considerasse a vítima a sua motocicleta não se crê que se sentisse coagida a praticar ela ou algum familiar ato pessoalmente constrangedor para reaver o veículo A exigência do pagamento de quinhentos reais não se enquadra na hipótese em questão e nem no conceito de ameaça fornecido pela jurisprudência e referido acima TJRS Apelação 70022607667 Rel Sylvio Baptista Neto j 2822008 Art 180 3º do Código Penal Receptação culposa A condição de quem ofereceu a mercadoria e a flagrante desproporção entre valor R 96500 e preço pago R 10000 permitiam ao acusado ainda que seja pessoa pobre e de reduzida instrução presumir a origem ilícita do bem TJRS Recurso Crime 71001538172 Rel Ângela Maria Silveira j 1122008 O Superior Tribunal de Justiça há muito firmou sua jurisprudência no sentido de que talonário de cheques e cartão de crédito não podem ser objeto de receptação por não possuírem em si o valor econômico indispensável à caracterização de crime contra o Patrimônio REsp 256160DF Rel Min Fernando Gonçalves Sexta Turma DJ de 1542002 Precedentes STJ HC 86267SP Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 4102007 Segundo orientação pacífica desta Corte não tem fundamento a alegação de inconstitucionalidade do 1º do art 180 do Código Penal porquanto ele descreve conduta apurável em tipo penalmente relevante STJ HC 49444RJ Rel Min Maria Thereza de Assis Moura j 562007 Receptação dolosa Adulteração de sinal identificador de veículo automotor Continuidade delitiva Impossibilidade Crimes de espécies diferentes Não se aplica a continuidade delitiva entre os crimes de receptação e adulteração de sinal identificador de veículo automotor eis que não sendo da mesma espécie possuem elementos objetivos e subjetivos distintos não havendo portanto homogeneidade de execução Precedentes STJ REsp 899003SP Rel Min Gilson Dipp j 1052007 Não se admite a aplicação da pena prevista para a receptação simples art 180 caput CP ao réu condenado pela prática do delito de receptação qualificada art 180 1º CP A pena mais severa cominada à forma qualificada do delito se justifica pela maior gravidade e reprovabilidade da conduta uma vez que praticada no exercício de atividade comercial ou industrial Precedentes STJ REsp 847826SP Rel Min Félix Fischer j 21112006 Sendo o exercício de atividade comercial circunstância elementar do tipo da receptação qualificada tal circunstância apesar de ser de caráter pessoal comunica se a todos os réus Nos termos do art 30 do Código Penal STJ REsp 738550ES Rel Min Gilson Dipp j 14112006 A aplicação do art 180 1º do Código Penal introduzido pela Lei n 942696 não ofende o princípio da proporcionalidade tendo em vista o intuito legislativo de apenar mais gravemente a conduta dolosa de agentes que atuam no exercício de atividade comercial ou industrial STJ REsp 800799RS Rel Min Laurita Vaz j 1992006 Capítulo VIII Disposições Gerais Art 181 É isento de pena quem comete qualquer dos crimes previstos neste título em prejuízo I do cônjuge na constância da sociedade conjugal II de ascendente ou descendente seja o parentesco legítimo ou ilegítimo seja civil ou natural Art 182 Somente se procede mediante representação se o crime previsto neste título é cometido em prejuízo I do cônjuge desquitado ou judicialmente separado II de irmão legítimo ou ilegítimo III de tio ou sobrinho com quem o agente coabita Art 183 Não se aplica o disposto nos dois artigos anteriores I se o crime é de roubo ou de extorsão ou em geral quando haja emprego de grave ameaça ou violência à pessoa II ao estranho que participa do crime III se o crime é praticado contra pessoa com idade igual ou superior a 60 sessenta anos Inciso III acrescentado pela Lei n 10741 de 1º de outubro de 2003 D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O Código Napoleônico de 1810 não se afastou da orientação romana admitindo a impunidade para o crime de furto desde que cometido entre cônjuges ascendentes e descendentes Os dois Códigos Penais brasileiros do século XIX 1830 e 1890 previam a impunidade para os crimes de furto praticados entre parentes O atual Código Penal brasileiro 1940 adotou a mesma orientação seguindo a filosofia romana Prioriza a harmonia e a integridade dos laços familiares assegurando a imunidade absoluta ou relativa de acordo com o nível de parentesco entre autor e vítima disciplinada nos arts 181 e 182 2 Repercussão do Estatuto do Idoso nos crimes patrimoniais Quando tratou dos crimes em espécie praticados contra quem o legislador conceituou como idoso pessoa com idade igual ou superior a 60 anos de idade o estatuto determinou que referidas infrações penais são de ação pública incondicionada não se lhes aplicando os arts 181 e 182 do Código Penal art 95 Embora com algum esforço se possa compreender a boa intenção do legislador e especialmente tentando salvar aquela superada máxima de que a lei não tem palavras inúteis concretamente podese afirmar que não apenas as palavras são inúteis como toda a previsão relativa aos dois artigos mencionados é absolutamente desnecessária e supérflua Com efeito suprimindose essa previsão legal art 95 a situação continua exatamente a mesma ou seja aquelas prescrições dos arts 181 e 182 do Código Penal não se aplicam aos crimes tipificados no Estatuto do Idoso Na verdade a nenhum outro crime de natureza patrimonial ou não aplicase o disposto nos indigitados arts 181 e 182 do CP 21 Ampliação das imunidades relativas aos crimes patrimoniais Por outro lado o mesmo Estatuto do Idoso no seu art 110 amplia as causas excludentes daquelas imunidades dos crimes contra o patrimônio incluindo um terceiro inciso no art 183 do CP com a seguinte redação se o crime é praticado contra pessoa com idade igual ou superior a 60 sessenta anos Com essa previsão legal é irrelevante que o crime patrimonial seja praticado contra cônjuge ascendente ou descendente se o ofendido tiver idade igual ou superior a sessenta anos A despeito de pretender proteger o idoso a nosso juízo é discriminatório taxar de idoso pessoa com sessenta anos de idade especialmente quando a ciência tem comprovado o grande aumento da longevidade neste início de milênio Com efeito muitas pessoas na faixa dos sessenta anos não deixarão de se sentir de certa forma discriminadas ao serem por determinação legal consideradas idosas 3 Imunidade penal absoluta Tratase de causas pessoais de exclusão de pena escusas absolutórias que funcionam segundo Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 562 como condições negativas de punibilidade do crime O fundamento que os romanos já utilizavam continua a justificar a política criminal adotada pelo legislador de 1940 ou seja o Estado prefere renunciar ao ius puniendi para preservar a paz social por razões de política criminal O fato não perde sua ilicitude sendo puníveis por essa razão eventuais estranhos que dele participarem 31 As escusas absolutórias não excluem o crime impedem a aplicação da pena A escusa absolutória pessoal não exclui o crime impede somente a aplicação de pena às pessoas relacionadas no dispositivo art 181 a Cônjuge na constância da sociedade conjugal A primeira hipótese destinase somente aos cônjuges na constância da sociedade conjugal excluindose o concubinato companheirismo casamento religioso sem efeitos civis a união estável bem como os cônjuges separados ou divorciados A vigência do casamento é considerada ao tempo do crime e não ao tempo em que instaurada a ação penal ou julgada em primeiro ou segundo grau O casamento posterior ao fato não tem efeito extintivo da punibilidade como ocorria nos crimes sexuais antes da alteração procedida pela Lei n 111062005 Pela mesma razão é irrelevante que após o fato delituoso sobrevenha separação judicial ou divórcio a imunidade judicial persistirá porque ao tempo do fato havia a causa extintiva No mesmo sentido a eventual anulação do matrimônio independentemente da causa não retroagirá para o fim de afastar a impunidade salvo se ficar comprovada a máfé do sujeito ativo b Ascendente ou descendente seja o parentesco legítimo ou ilegítimo civil ou natural Esta segunda hipótese dirigese aos crimes praticados por ascendente contra descendente e viceversa seja qual for a natureza do parentesco civil natural legítimo ou ilegítimo Ascendentes e descendentes são os parentes vinculados uns aos outros em linha reta tais como bisavô avô pai filho neto bisneto etc Para se admitir a imunidade nessa linha não há grau de limitação Pela previsão do Código Penal admitindo a relação de parentesco civil ou natural já estaria incluída a filiação adulterina e incestuosa Pelo Texto Constitucional de 1988 essa orientação foi reforçada ficando absolutamente proibida qualquer discriminação relativa à filiação Os filhos havidos ou não da relação do casamento ou por adoção terão os mesmos direitos e qualificações proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação art 227 6º da CF O parentesco afim como sogro nora e genro não é alcançado pela imunidade penal independentemente das equiparações procedidas pelo direito civil 4 Imunidade relativa condição de procedibilidade No art 182 o Código Penal trata das chamadas imunidades relativas que não afastam a punibilidade do fato praticado mas criam determinado obstáculo ao exercício da ação penal Nas hipóteses relacionadas nesse dispositivo legal a autoridade pública autoridade policial ou Ministério Público de uma condição de procedibilidade representação do ofendido para instaurar a ação penal Na verdade não se trata de imunidade absoluta ou relativa mas simplesmente de alteração da espécie de ação penal condicionada à representação do ofendido desde que o crime patrimonial tenha sido praticado em prejuízo do cônjuge desquitado ou judicialmente separado irmão legítimo ou ilegítimo tio ou sobrinho com quem o agente coabita Convém registrar para evitar equívocos que os crimes de exclusiva iniciativa privada não são abrangidos pelo disposto no artigo em exame que se restringe aos crimes de ação pública pois naqueles a iniciativa da ação penal já depende da vontade exclusiva da vítima 41 Hipóteses de imunidades relativas As hipóteses destacadas são as seguintes a Cônjuge desquitado ou judicialmente separado Embora o texto legal utilize a terminologia desquitado devese darlhe interpretação contextualizada uma vez que desde 1977 o desquite foi substituído pela separação judicial e pelo divórcio Assim essa condição de procedibilidade é exigida quando o crime patrimonial for praticado por excônjuges um contra o outro que se encontrem separados ou divorciados A separação de fato está excluída dessa relação pois nessa hipótese estará configurada a imunidade absoluta disciplinada no art 181 na medida em que a separação de fato não rompe juridicamente o vínculo matrimonial b Irmão legítimo ou ilegítimo É indiferente que se trate de irmãos bilaterais germanos ou unilaterais Se o dano for além do irmão atingindo também algum estranho desaparecerá a condição de procedibilidade mantendo a ação penal sua natureza jurídica normal de pública incondicionada c Tio ou sobrinho com quem o agente coabita Tio e sobrinho são parentes em linha colateral ao contrário de ascendente e descendente que o são em linha reta ad infinitum A exigência legal para condicionar a ação penal à representação do ofendido nessa hipótese é de que vítima e infrator coabitem sob o mesmo teto com animus duradouro sendo insuficientes algumas passagens esporádicas Coabitar é morar junto na mesma casa sob o mesmo teto Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 533 destacava que coabitação é qualidade que a lei requer entre os parentes devem ser coabitantes nada importando todavia que o crime se dê fora da residência comum como quando por exemplo se acham em viagem em cidade diferente daquela onde têm coabitação É necessário segundo se presume do texto legal que vítima e infrator convivam no momento do crime A coabitação anterior ou posterior ao fato é indiferente para configurar a coabitação exigida 5 Exclusão de imunidade ou privilégio A imunidade art 181 e a condição de procedibilidade art 182 são afastadas em determinadas circunstâncias que o legislador houve por bem especificar no texto legal art 183 Assim a isenção prevista no art 181 que é absoluta não se aplica quando o crime for de roubo ou extorsão quando houver emprego de violência a pessoa ou grave ameaça ou quando a vítima for maior de sessenta anos Nas mesmas circunstâncias também é afastado o privilégio estabelecido no art 182 quanto à necessidade de representação Nas hipóteses de crime de roubo ou extorsão ou quando de qualquer forma haja emprego de violência ou grave ameaça não se justificam os favores concedidos pela lei De forma genérica podese afirmar os benefícios ora em exame somente se aplicam às hipóteses de crimes patrimoniais praticados sem violência ou grave ameaça à pessoa 51 Concurso eventual de estranhos coautoria ou participação O concurso eventual de pessoas art 29 pode ocorrer em qualquer espécie de crime com ou sem responsabilidade penal de um ou mais intervenientes Por outro lado no concursus delinquentium as circunstâncias de caráter pessoal somente se comunicam quando forem elementares do crime art 30 As condições ou estado das pessoas relacionadas nos arts 181 e 182 não são elementos constitutivos dos crimes patrimoniais de que tratam Por essa razão de forma simplificada podese afirmar que as imunidades previstas nesses dois dispositivos não se comunicam ao estranho que eventualmente participe da prática dos crimes de acordo com a regra geral estabelecida pelo art 30 antes referido No entanto o próprio legislador preocupouse em espancar qualquer dúvida interpretativa possível e dispôs expressamente que a impunibilidade ou punibilidade relativa não se estende ao estranho J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Art 181 É aplicável aos atos infracionais as escusas absolutórias previstas no art 181 do Código Penal O tratamento dispensado aos adolescentes não pode ser mais rigoroso do que aquele conferido aos adultos Subtração de bens da sua própria mãe TJRS Apelação Cível 70021736236 Rel Claudir Fidelis Faccenda j 811 2007 Crimes contra o patrimônio Infração do art 168 1º II cc o art 299 ambos do CP cometido em detrimento de descendentes Pretensão de trancamento da ação penal por falta de justa causa Alegação de incidência na espécie da escusa absolutória do art 181 inciso II do Código Penal Pleito prematuro Delitos ainda não confessados nem assumidos Inexistência de óbice a que oportuno tempore seja reconhecida a incidência da escusa absolutória em tela Desnecessidade de se trancar a ação penal respectiva STJ HC 35050MG Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 742005 Art 182 O crime previsto no art 168 1º inciso III do Código Penal é de ação penal pública incondicionada sendo improcedente portanto a alegação de extinção da punibilidade pela decadência do direito de representação Precedentes STJ RHC 17340SP Rel Min Félix Fischer j 2862005 Inexistindo hipótese de causa prevista no art 182 e incisos do Código Penal a exigência de representação carece de fundamento STJ RHC 16397SP Rel Min Félix Fischer j 26102004 Art 183 A Lei n 1074103 Estatuto do Idoso deu nova redação ao art 183 do CP acrescentando o inciso III que afasta a imunidade absoluta prevista no art 181 do mesmo codex quando a vítima tiver idade igual ou superior a 60 anos Na espécie na data de 932005 o agente furtou da residência de sua avó um televisor 20 polegadas Denúncia rejeitada porque incidindo a escusa absolutória do art 181 do CP o juiz considerou extinta a punibilidade A vítima entretanto à época dos fatos contava com 68 anos de idade incidindo dessa forma o inciso III do art 183 do CP A data de nascimento da ofendida 941936 consta na ocorrência policial e na sua qualificação quando das declarações prestadas perante a autoridade policial A exigência de que a Certidão de Nascimento acompanhasse a denúncia representa formalismo excessivo sendo que a própria defesa além de não tecer alegações contrárias concordou com possível juízo de retratação TJRS RESE 70015223381 Rel Fabianne Breton Baisch j 1392006 Título III Dos Crimes contra a Propriedade Imaterial Capítulo I Dos Crimes contra a Propriedade Intelectual Violação de direito autoral Art 184 Violar direitos de autor e os que lhe são conexos V art 12 da Lei n 960988 proteção da propriedade intelectual de programa de computador Pena detenção de 3 três meses a l um ano ou multa 1º Se a violação consistir em reprodução total ou parcial com intuito de lucro direto ou indireto por qualquer meio ou processo de obra intelectual interpretação execução ou fonograma sem autorização expressa do autor do artista intérprete ou executante do produtor conforme o caso ou de quem os represente Pena reclusão de 2 dois a 4 quatro anos e multa 2º Na mesma pena do 1º incorre quem com o intuito de lucro direto ou indireto distribui vende expõe à venda aluga introduz no País adquire oculta tem em depósito original ou cópia de obra intelectual ou fonograma reproduzido com violação do direito de autor do direito de artista intérprete ou executante ou do direito do produtor de fonograma ou ainda aluga original ou cópia de obra intelectual ou fonograma sem a expressa autorização dos titulares dos direitos ou de quem os represente 3º Se a violação consistir no oferecimento ao público mediante cabo fibra ótica satélite ondas ou qualquer outro sistema que permita ao usuário realizar a seleção da obra ou produção para recebêla em um tempo e lugar previamente determinados por quem formula a demanda com intuito de lucro direto ou indireto sem autorização expressa conforme o caso do autor do artista intérprete ou executante do produtor de fonograma ou de quem os represente Pena reclusão de 2 dois a 4 quatro anos e multa 4º O disposto nos 1º 2º e 3º não se aplica quando se tratar de exceção ou limitação ao direito de autor ou os que lhe são conexos em conformidade com o previsto na Lei n 9610 de 19 de fevereiro de 1998 nem a cópia de obra intelectual ou fonograma em um só exemplar para uso privado do copista sem intuito de lucro direto ou indireto Artigo com redação determinada pela Lei n 10695 de 1º de julho de 2003 V art 91 do CP D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias A violação de direito autoral não era objeto de disciplina nas Ordenações Afonsinas e Manuelinas O Código Criminal de 1830 criminalizava a violação de direitos autorais como uma forma sui generis do crime de furto art 261 O Código Penal de 1890 por sua vez ampliou a proteção penal da violação dos direitos autorais fazendoo em vários dispositivos O legislador de 1940 procurou sintetizar as previsões do diploma anterior Finalmente o caput do art 184 recebeu a redação dada pela Lei n 6895 de 17 de dezembro de 1980 e os 1º e 2º receberam a redação da Lei n 8635 de 16 de março de 1993 que acrescentou o 3º cuja vigência durou até julho de 2003 com o advento da Lei n 106952003 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é o direito autoral que na verdade constitui um complexo de direitos morais ou patrimoniais nascidos com a criação da obra Em outros termos o objeto jurídico da proteção penal é a propriedade intelectual Os direitos autorais abrangem os direitos de autor e os direitos que lhe são conexos Direitos conexos aos do autor são os relativos à interpretação e à execução da obra por seu criador considerandose como tais a gravação reprodução transmissão retransmissão representação ou qualquer outra modalidade de comunicação ao público O direito de arena também constitui um direito conexo ao do autor A locução violar direitos do autor adquiriu a abrangência ampliada para significar violação de todo e qualquer direito autoral inclusive aqueles denominados conexos Os direitos de autor nascem com a criação e utilização econômica de obra intelectual artística estética científica literária escultural ou cultural e decorrem do próprio ato de criação podem ser morais e patrimoniais 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa sem nenhuma condição especial Nada impede que ocorram as figuras da coautoria e da participação desde que presente o elemento subjetivo do crime Sujeito passivo somente pode ser o titular do direito autoral isto é o criador de obra intelectual que pode ser literária científica ou artística ou na ausência do criador seus herdeiros ou sucessores Em verdade os direitos do autor podem ser total ou parcialmente transferidos a terceiros ressalvados aqueles de natureza personalíssima como o de proceder a modificações na obra A pessoa jurídica de direito público ou privado também pode ser sujeito passivo desse crime Quando for pessoa jurídica de direito público a ação penal será pública incondicionada 4 Tipo objetivo adequação típica A violação dos direitos de autor pode concretizarse de formas variadas tais como a reprodução gráfica da obra original ou comercialização de obras originais sem autorização do autor ou seu representante legal A ação delituosa consiste em violar direito de autor ou os que lhe são conexos Violar significa transgredir falsificar ou ofender o direito do autor A lei penal não define o que é direito de autor ou direito autoral Essa definição deve ser buscada na lei civil 961098 caracterizandose pois como norma penal em branco O direito autoral surge com a criação de obra original independentemente de qualquer formalidade ou registro Direito autoral consiste nos benefícios vantagens prerrogativas e direitos patrimoniais morais e econômicos provenientes de criações artísticas científicas literárias e profissionais de seu criador inventor ou autor Direito autoral enfim na definição de Álvaro Mayrink da Costa Direito Penal 4 ed Rio de Janeiro Forense 1994 p6701 engloba o direito de autor e os chamados direitos conexos do direito de autor direitos dos artistas intérpretes ou executantes dos produtores de fonogramas e dos organismos de radiodifusão disciplina a atribuição de direitos relativos às obras literárias científicas e artísticas Essa abrangência é favorecida pela nova definição legal que incluiu os direitos conexos aos de autor Violar direito autoral significa infringir ofender transgredir direitos do autor que podem ser morais patrimoniais ou econômicos e os que lhes são conexos 41 Inovações da Lei n 106952003 A redação anterior punia a violação de direito de autor que não tivesse o intuito de obtenção de lucro mantida nesse particular A nova redação incluiu no caput a violação de direitos conexos aos de autor As alterações produzidas pela Lei n 106952003 com efeito incluíram nesse tipo penal os direitos conexos aos de autor que são aqueles relacionados aos artistas intérpretes ou executantes aos produtores fonográficos e às empresas de radiodifusão consoante o disposto nos arts 89 a 96 da Lei n 961098 Foi mantida a mesma pena de três meses a um ano de detenção ou multa para a figura simples Direitos conexos são podese dizer direitos análogos aos de autor direitos afins próximos ou vizinhos aos de autor De um modo geral a doutrina procura situar os denominados direitos conexos em três aspectos distintos artistas gravadoras de discos incluímos aí as editoras de livros e emissoras de rádio e de televisão Esses três setores e aí acrescentamos os próprios artistas especialmente aqueles que são intérpretes como órgãos ou meios de divulgação do trabalho intelectual artístico ou literário são na verdade difusores divulgadores ou multiplicadores das criações dos autores Essa função difusora também é exercida pelas editoras gráficas e musicais Na hipótese de livro por exemplo detentora de direito conexo é a editora que produz divulga comercializa e divulga a obra do autor A Lei n 106952003 acrescentou a conduta de quem aluga original ou cópia de obra intelectual ou fonograma reproduzido com violação do direito de autor do direito de artista intérprete ou executante ou do direito do produtor de fonograma ou ainda aluga original ou cópia de obra intelectual ou fonograma sem a expressa autorização dos titulares dos direitos ou de quem os represente Não se inclui ao contrário do que pretendem alguns doutrinadores o videofonograma sob o equivocado argumento de que foi extirpado do tipo por descuido do legislador ou porque nesse caso a previsão ficaria sem sentido pois não abrangeria a locação de fitas VHS e DVDs Com efeito o fato de não ser habitual em nosso país a locação de livros revistas ou CDs musicais não autoriza a inclusão de figuras não contidas expressamente no tipo penal Essa pretensão desnecessário destacar viola o princípio da reserva legal Na verdade permanece uma lacuna na medida em que a previsão da lei referida não abrange aquelas hipóteses das locadoras de vídeos e DVDs que muitas vezes servemse de material adquirido licitamente são originais e não cópias piratas mas que não têm autorização para serem locadas ou comercializadas dessa forma isto é embora sejam originais devidamente adquiridos a sua destinação natural é o uso doméstico e não a locação 5 Figuras qualificadas majoração penal Os 1º e 2º do art 184 com a nova redação disciplinam as figuras qualificadas da violação de direitos autorais com sensível majoração da resposta penal São tipificadas como qualificadas as seguintes condutas 1 Reproduzir reprodução por qualquer meio ou processo obra intelectual total ou parcialmente para fins comerciais isto é com intuito de lucro direto ou indireto sem autorização expressa do detentor do direito É proibida a reprodução de obra intelectual interpretação execução ou fonograma A autorização pode ser dada pelo detentor do direito ou por seu representante legal 1º 2 Distribuir vender expor à venda alugar introduzir no País adquirir ocultar emprestar trocar ou ter em depósito com o fim de lucro original ou cópia de obra intelectual fonograma ou videofonograma produzidos ou reproduzidos com violação de direito autoral 2º Esses dois parágrafos abrangem especialmente a prática da pirataria de obras intelectuais culturais e artísticas Nessas figuras a pena mínima que era de um ano foi elevada para dois anos mantendose a máxima nos mesmos quatro anos 51 Intuito de lucro é o fundamento da majoração penal A finalidade lucrativa da mesma conduta violadora de direitos autorais e dos que lhes são conexos qualifica o crime cuja pena cominada é de dois a quatro anos de reclusão e multa Aumentouse a pena mínima de um para dois anos mantendose a máxima nos quatro anos cumulada com a de multa A finalidade comercial intuito de lucro amplia consideravelmente o desvalor da ação e do resultado da conduta violadora do direito autoral Esse caráter mercenário da pirataria autoral justifica a majoração da sanção penal A violação em si mesma já é criminosa e a sua finalidade mercantil a torna abjeta e merecedora de maior reprovação social Essa providência legislativa tem o mérito de excluir a suspensão do processo quando o móvel do crime for o intuito de lucro visando maior coercibilidade no combate a essa modalidade tão difundida de infração penal Na verdade a elevação da pena mínima para dois anos teve um objetivo específico declarado impossibilitar a figura do instituto da suspensão condicional do processo Reforçouse assim a proteção desse bem jurídico que no entanto é absolutamente insuficiente para enfrentar o fenômeno da pirataria se não vier acompanhada de uma política governamental que disponibiliza recursos materiais humanos tanto para a polícia judiciária quanto para o próprio Poder Judiciário 52 Combate à indústria do xerox A indústria do xerox nas universidades em geral estava necessitando de uma medida legislativa mais enérgica e moralizadora em todo o país Incrivelmente os próprios professores de direito irresponsavelmente têm estimulado essa forma de violação de direitos autorais A exploração da conhecida atividade fotocopiadora tipifica a figura qualificada considerandose o intuito de lucro de seus exploradores É bom colocar a barba de molho pois a figura qualificada é crime de ação pública incondicionada 53 Elemento normativo do tipo sem autorização Tratase de um elemento relativo à ilicitude inserta no próprio tipo que assume dupla função ou seja não é apenas um aspecto relativo à ilicitude mas também uma característica da própria tipicidade Para que se aperfeiçoe a adequação típica das figuras qualificadas é indispensável que a conduta ocorra sem autorização expressa de quem de direito A ausência de autorização constitui elementar típica havendo autorização a conduta será atípica pela falta desse elemento normativo O eventual desconhecimento da inexistência de autorização pode configurar o erro de tipo que sendo invencível afasta completamente a tipicidade da conduta 6 Repressão da cyberpirataria A violação dos direitos autorais e conexos pode operarse por meio das chamadas novas tecnologias especialmente através da Internet O 3º em consonância com o art 26 VI da Lei n 9610 reprime o comércio ilegal de obras intelectuais por vias tecnológicas Pretende esse dispositivo coibir o trânsito ilegal de obras intelectuais na rede mundial de computadores Internet Na verdade por esses meios o sujeito ativo não promove a venda direta ao consumidor do produto que tipificaria condutas do parágrafo anterior mas disponibiliza em seu site para download obras não autorizadas pelo autor ou seu representante legal Por essa previsão para a caracterização da violação do direito de autor tornase desnecessária a disponibilização física da obra em CD DVD VHS etc A própria materialidade do delito será comprovada através de outros meios que a tecnologia pode oferecer independentemente de eventual apreensão física dos produtos alterados adulterados ou falsificados Essa previsão legal pode ainda não ser a ideal mas já oferece as condições mínimas para se começar a combater a pirataria da era cibernética 7 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo do tipo é constituído pelo dolo que é representado pela vontade livre e consciente de violar direito autoral alheio além do elemento subjetivo especial do tipo nas três figuras a seguir discriminadas Nas modalidades qualificadas em todas elas exigese o elemento subjetivo do tipo constituído pelo especial fim de lucro direto ou indireto Pois é exatamente essa motivação que justifica a maior gravidade da sua punição Nas modalidades de obra teatral e musical exigese o elemento subjetivo do tipo constituído pelo especial fim de lucro direto e imediato na figura do 1º representado pelo fim especial de comércio e finalmente na figura do 2º pelo fim especial de venda O delito previsto no art 184 2º do Código Penal pressupõe a vontade livre e consciente do agente de vender expor à venda alugar introduzir no País adquirir ocultar emprestar trocar ou ter em depósito com intuito de lucro original ou cópia de obra intelectual fonograma ou videofonograma produzidos ou reproduzidos com violação de direito autoral A eventual ausência dessa vontade consciente de praticar qualquer das condutas elencadas com o fim de lucro afasta a qualificadora 8 Consumação e tentativa Consumase com a prática efetiva das ações incriminadas com a publicidade de obra inédita ou reproduzida tratandose de pintura ou escultura com a exposição pública no caso de obra musical ou teatral consumase com a publicação com sua execução ou representação em local onde se exija retribuição Nas formas de exposição e depósito tratase de crime permanente Como crime material é admissível a tentativa em qualquer das figuras descritas Apresenta um iter criminis fracionável durante o qual o agente pode ser involuntariamente interrompido 9 Classificação doutrinária Crime comum podendo ser praticado por qualquer pessoa Não exige qualquer qualidade ou condição especial crime de mera conduta sendo desnecessária a produção de resultado crime instantâneo com exceção das modalidades de expor à venda e ter em depósito descritas no 2º quando adquire a natureza de permanente unissubjetivo podendo ser executado por uma única pessoa 10 Pena e ação penal Na figura simples é cominada alternativamente detenção de três meses a um ano ou multa nas figuras qualificadas 1º e 2º é cumulativa reclusão de dois a quatro anos e multa Em relação à conduta do caput a ação penal é de iniciativa privada salvo se o crime for praticado em prejuízo de entidade de direito público autarquia empresa pública sociedade de economia mista ou fundação instituída pelo Poder Público Em relação às condutas tipificadas nos 1º e 2º a ação penal será pública incondicionada art 186 11 Algumas questões especiais A matéria tem sido objeto de numerosos tratados e convênios celebrados com vários países bem como de diversas convenções internacionais No exame dessa matéria devese atentar sempre para essas convenções internacionais a fim de evitar equívocos interpretativos O registro de obra intelectual não constitui condição para a propositura da queixacrime por infringência ao art 184 do Código Penal uma vez que o bem imaterial por se equiparar a propriedade móvel transmitese pela simples tradição inexistindo pois qualquer formalidade para a defesa do direito do autor Ausente o fim lucrativo na aquisição de fitas de videocassete reproduzidas clandestinamente temse por configurado o crime de receptação e não o de violação de direito autoral previsto no art 184 2º Por fim a Lei n 106952003 alterou consideravelmente aspectos procedimentais desses crimes contra a propriedade imaterial arts 524 a 530 do CPP J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Violação de direito autoral Art 184 2º CP Autoria e materialidade devidamente comprovadas Princípio da insignificância Inaplicabilidade Condenação mantida TJRS Apelação 70022722060 Rel José Eugênio Tedesco j 632008 Crime contra a propriedade intelectual Art 184 1º e 2º do CP Apreendidos com o réu quase duzentos CDs comprovadamente falsos e admitida por ele mesmo a exposição à venda ao reduzido preço de cinco reais cada deve ser mantida a condenação por violação de direito autoral TJRS Apelação 70021573886 Rel Gaspar Marques Batista j 1º 112007 Comete o crime previsto no art 184 2º do CP o agente que com intuito de lucro expõe à venda diversos CDs e DVDs reproduzidos com violação dos direitos dos autores sem a expressa autorização dos titulares dos direitos ou de quem os represente TJRS Apelação 70021208681 Rel Constantino Lisbôa de Azevedo j 1º 112007 Crime de violação de direito autoral Incompetência da Justiça Federal Ausência de lesão aos interesses da União Competência da Justiça Estadual Em face do princípio da especialidade o crime do art 184 2º do Código Penal prevalece sobre o delito de descaminho independentemente da origem do fonograma ou videofonograma reproduzido com violação ao direito do autor Precedentes Cingindose a denúncia ao crime de violação de direito autoral sem imputar aos Recorrentes qualquer conduta que possa evidenciar eventual crime de descaminho inexiste ofensa a bem interesse ou serviço da União apto a ensejar a competência da Justiça Federal para decidir o feito STJ RHC 21841PR Rel Min Laurita Vaz j 16102007 Art 184 2º do CP Crime contra a propriedade intelectual Competência Justiça estadual Produtos provenientes do exterior Irrelevância Paciente não denunciado por descaminho Compete à Justiça Estadual processar e julgar crimes contra a propriedade intelectual quando não praticados em detrimento de bens serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas Precedentes Não opera o deslocamento da competência para a Justiça Federal a circunstância de que os produtos teriam sido adquiridos no exterior uma vez que in casu o recorrente não foi denunciado por crime de descaminho Precedentes STJ RHC 21791PR Rel Min Félix Fischer j 2592007 Usurpação de nome ou pseudônimo alheio Art 185 Revogado pela Lei n 10695 de 1º72003 D O U T R I N A 1 Considerações especiais Esse dispositivo foi revogado pela Lei n 106952003 e tinha a seguinte redação Atribuir falsamente a alguém mediante o uso de nome pseudônimo ou sinal por ele adotado para designar seus trabalhos a autoria de obra literária científica ou artística A pena era de detenção de 6 meses a 2 anos e multa Antes de sua revogação comentamos que este era outro crime que não havia sido objeto dos Códigos Penais do século XIX 1830 e 1890 Foi o Código Penal de 1940 que tratou do crime de usurpação de nome ou pseudônimo alheio insculpido entre os crimes contra a propriedade material Comentamos também que a nosso juízo essa infração penal estaria mais bem situada entre os crimes contra a fé pública a exemplo da tradição italiana Código Penal Rocco Com a mencionada revogação atualmente essa conduta é reprimida pelo direito somente na esfera civil agindo o legislador de acordo com o princípio da intervenção mínima ultima ratio do direito penal Art 186 Procedese mediante I queixa nos crimes previstos no caput do art 184 II ação penal pública incondicionada nos crimes previstos nos 1º e 2º do art 184 III ação penal pública incondicionada nos crimes cometidos em desfavor de entidades de direito público autarquia empresa pública sociedade de economia mista ou fundação instituída pelo Poder Público IV ação penal pública condicionada à representação nos crimes previstos no 3º do art 184 V arts 24 e s do CPP Artigo com redação dada pela Lei n 10695 de 1º de julho de 2003 D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O Código Penal de 1940 em sua redação original prescrevia Nos crimes previstos neste Capítulo somente se procede mediante queixa salvo quando praticados em prejuízo de entidade de direito público No início da década de 1980 o legislador brasileiro insatisfeito com a clareza da redação anterior que manteve preferiu estabelecer expressamente a abrangência do significado entidade de direito público acrescentando ao final daquele texto o seguinte autarquia empresa pública sociedade de economia mista ou fundação instituída pelo poder público e nos casos previstos nos 1º e 2º do art 184 desta Lei Lei n 6895 de 17121980 que resultou na redação atual que vigorou até julho de 2003 2 Natureza da ação penal A ação penal que era em regra de exclusiva iniciativa do ofendido nos crimes contra a propriedade intelectual assumiu as seguintes modalidades de exclusiva iniciativa privada I nas hipóteses dos crimes previstos no caput do art 184 pública condicionada à representação IV nos crimes previstos no 3º do mesmo dispositivo e finalmente pública incondicionada nos crimes previstos nos 1º e 2º do art 184 II bem como quando o crime for praticado contra entidade de direito público autarquia empresa pública sociedade de economia mista ou fundação instituída pelo Poder Público III 3 Prazo decadencial geral ou especial Discutese se permanece a regra geral dos seis meses dos arts 103 do CP e 38 do CPP ou se esta é afastada pelo disposto no art 529 do CPP que fixa o prazo de trinta dias para o oferecimento de queixa a partir da homologação do laudo pericial O prazo decadencial na realidade é o de seis meses conforme a regra geral uma vez que os trinta dias referidos no art 529 do CPP não constituem prazo decadencial e visam tão somente impedir que o ofendido procrastine a propositura da ação penal indefinidamente Caso contrário qual seria afinal o prazo para iniciar as investigações policiais e para postular a realização da apreensão e da perícia Sustentamos que essas diligências devem ocorrer dentro do prazo decadencial de seis meses No entanto a partir da homologação da apreensão ou da perícia a queixa não pode tardar mais de trinta dias Esse prazo embora preclusivo não se confunde com aquele chamado de decadencial que se refere exclusivamente ao direito de ação este ao contrário é um prazo procedimental preclusivo ininterrupto que não se suspende mas alheio ao direito de ação ao contrário do que normalmente tem sido sustentado Nesse particular o Supremo Tribunal Federal cometeu um erro crasso em matéria criminal no acórdão cuja ementa transcrevemos a seguir a título de ilustração Tratandose de ação privativa do ofendido em crime contra a propriedade imaterial o prazo para oferecer a queixa é o de trinta dias previsto no art 529 do CPP que é regra especial E o entendimento que se extrai do aludido dispositivo é que este prazo de decadência começa a fluir da intimação do despacho homologatório do laudo pericial dos objetos que constituem o corpo de delito pois salvo os casos expressos os prazos correrão da intimação conforme dispõe o art 798 5º a do CPP STF RHC 673007SP Rel Carlos Madeira RT 648349 Constatase facilmente que nesse julgamento a Suprema Corte confundiu alhos com bugalhos Não existe esse prazo decadencial de trinta dias como procuramos demonstrar no parágrafo anterior A partir da vigência da Lei n 106952003 1º72003 a previsão contida nos arts 524 a 530 do CPP será aplicável exclusivamente aos crimes previstos no caput do art 184 do CP ou seja naqueles cuja ação penal é de exclusiva iniciativa privada art 530A do CPP com redação determinada pelo art 3º da lei referida Sintetizando o prazo decadencial para a propositura da ação penal privada é o de seis meses contudo homologado o laudo pericial a queixacrime deve ser intentada no prazo improrrogável de trinta dias art 529 do CPP que não se confunde com aquele relativo ao direito de ação 4 Prova do direito de ação art 526 do CPP pré constituída A prova do direito de ação exigida pelo art 526 do CPP consubstanciase com a certidão do registro de marca patente ou direito autoral junto ao órgão federal competente que confere oficialmente a titularidade ao autor Se o crime houver deixado vestígios é indispensável que a inicial da ação penal denúncia ou queixa seja instruída com prova pericial dos objetos que constituam o corpo de delito art 525 do CPP Nos crimes contra a propriedade imaterial o laudo pericial exigido pelo art 527 do CPP tem caráter de medida cautelarpreparatória sendo pressuposto legal para o exercício da ação penal porque envolve crime que deixa vestígios Assim a decisão que a homologa tem a natureza de interlocutória mista com força de definitiva admitindo a apelação nos termos do art 593 II do CPP J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Art 184 2º do Código Penal A concessão da suspensão condicional do processo está condicionada ao preenchimento pelo acusado dos requisitos dos arts 89 da Lei n 909995 e 77 do Código Penal Restando motivada a negativa de oferecimento da benesse pelo Ministério Público em razão do não preenchimento do requisito objetivo não se verifica o alegado constrangimento ilegal Na esteira da jurisprudência desta Corte e do Supremo Tribunal Federal a proposta de suspensão condicional do processo é prerrogativa do Ministério Público sendo vedado ao magistrado oferecêla de ofício STJ HC 61091RJ Rel Min Laurita Vaz j 1812 2007 Nos crimes contra a propriedade intelectual de ação penal pública a autoridade policial pode instaurar o inquérito e proceder à busca e apreensão de acordo com a regra geral descrita no art 240 1º do CPP afastandose a aplicação do art 527 do Código de Processo Penal STJ REsp 543037RJ Rel Min Gilson Dipp j 219 2004 Ação penal Queixacrime Crime contra a propriedade intelectual Prazo decadencial CPP artigo 529 Consumação Em sede de crime de utilização de modelo patenteado cuja ação penal tem como condição de procedibilidade a realização de perícia incide o prazo decadencial de trinta dias após a homologação do laudo expresso na regra específica do art 594 do CPP STJ HC 10911PR Rel Min Vicente Leal j 2832000 Capítulo II Dos Crimes contra o Privilégio de Invenção Arts 187 a 191 Revogados pela Lei n 9279 de 145 1996 Capítulo III Dos Crimes contra as Marcas de Indústria e Comércio Arts 192 a 195 Revogados pela Lei n 9279 de 145 1996 Capítulo IV Dos Crimes de Concorrência Desleal Art 196 Revogado pela Lei n 9279 de 1451996 V arts 243 e 244 da Lei n 927996 regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial O art 244 da referida lei revoga expressamente os arts 169 a 189 do Declei n 790345 Código da Propriedade Industrial e os arts 187 a 196 do Declei n 284840 Código Penal Os crimes contra a propriedade industrial estão disciplinados nos arts 183 a 195 da Lei n 927996 Título IV Dos Crimes contra a Organização do Trabalho V arts 47 a 49 do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais V art 4º da Lei n 771689 crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor V art 8º III da Lei n 785389 apoio às pessoas portadoras de deficiências Atentado contra a liberdade de trabalho Art 197 Constranger alguém mediante violência ou grave ameaça I a exercer ou não exercer arte ofício profissão ou indústria ou a trabalhar ou não trabalhar durante certo período ou em determinados dias Pena detenção de 1 um mês a 1 um ano e multa além da pena correspondente à violência II a abrir ou fechar o seu estabelecimento de trabalho ou a participar de parede ou paralisação de atividade econômica Pena detenção de 3 três meses a 1 um ano e multa além da pena correspondente à violência V arts 722 a 725 da CLT lockout V Lei n 778389 direito de greve D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias No Brasil nem as Ordenações do Reino de Portugal nem o Código Criminal do Império 1830 regularam a matéria O Código Penal de 1890 foi o primeiro diploma legal brasileiro a prever o crime contra o atentado à liberdade de trabalho art 203 O legislador de 1940 do atual Código Penal não apenas manteve a criminalização da conduta como a inseriu em Título autônomo denominado Crimes contra a Organização do Trabalho A segunda parte do inciso II deste artigo foi revogada tacitamente e substituída pelo disposto no art 29 VII da Lei n 433064 Essa lei no entanto foi revogada pela Lei de Greve n 778389 a qual não prevê crimes especiais dispondo apenas que a responsabilidade pelos atos praticados ilícitos ou crimes cometidos no curso da greve será apurada conforme o caso segundo a legislação trabalhista civil ou penal art 15 A Constituição Federal protege os direitos dos trabalhadores urbanos e rurais assim como o direito de greve ou seja a organização do trabalho arts 7º 8º e 9º A competência para julgálos segundo a CF é da Justiça Federal art 109 VI segundo o STF no entanto somente serão da competência da Justiça Federal aqueles que ofenderem interesses coletivos do trabalho os demais serão da Justiça Estadual Compete à Justiça Federal processar e julgar os delitos decorrentes de greve se atentam contra a organização do trabalho ou os direitos e deveres dos trabalhadores coletivamente considerados 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é a liberdade de trabalho isto é a liberdade de escolher o trabalho a profissão arte ofício ou indústria que o indivíduo deseja exercer e de decidir quando abrir ou fechar seu próprio estabelecimento de trabalho Não há crime contra a organização do trabalho quando não forem atacados direitos dos trabalhadores como um todo e sim caracterizada mera lesão a direito individual de natureza patrimonial em que a competência se firma em prol da Justiça Estadual Cuidandose de possível lesão somente a direito individual não há falar em crime contra a organização do trabalho para que se dirima a competência a favor do juízo federal Em sentido mais abrangente podese afirmar que o bem jurídico tutelado é a liberdade individual ou pessoal de autodeterminação ou seja a liberdade do indivíduo de fazer ou não fazer o que lhe aprouver dentro dos limites da ordem jurídica A liberdade que se protege é a psíquica livre formação da vontade isto é em coação e a física ou seja liberdade de movimento A proteção desse bem jurídico liberdade ganhou assento constitucional nos termos seguintes ninguém será obrigado a fazer ou não fazer alguma coisa senão em virtude de lei art 5º II da CF Assegurase assim ao indivíduo o direito de fazer tudo o que a lei não proibir não podendo ser obrigado a fazer senão aquilo que a lei lhe impuser Nesse sentido percuciente a afirmação de Flávio Augusto Monteiro de Barros A coação empregada para compelir a pessoa à prestação de ato ou abstenção de fato fora dos casos em que a lei autoriza constitui violação ao princípio da legalidade dando ensejo à configuração do delito de constrangimento ilegal O que se viola ou restringe no crime de atentado à liberdade de trabalho não é propriamente uma vontade juridicamente válida mas a liberdade e o direito de querer e atuar agir ou não agir de acordo com as condições pessoais e individuais de cada um Na verdade somente se diferencia do crime de constrangimento ilegal que poderíamos chamar de tipo básico pela natureza da ação ou omissão que a coação indevida objetiva que na hipótese examinada é específica 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa independentemente de condição ou qualidade especial cuidase pois de crime comum O concurso eventual de pessoas pode normalmente se verificar Sujeito passivo em relação ao inciso I pode ser qualquer pessoa desde que na condição de trabalhador empregado ou patrão conforme o caso em relação ao inciso II primeira parte o sujeito passivo só pode ser o proprietário do estabelecimento Na hipótese desse inciso a pessoa jurídica também pode ser sujeito passivo Quando o constrangimento for praticado contra criança poderá constituir em concurso formal o crime descrito no art 232 da Lei n 806990 ECA desde que a criança se encontre sob sua autoridade guarda ou vigilância do sujeito ativo Nada impede que a violência ou grave ameaça sejam exercidas contra pessoa diversa daquela que se pretende constranger Nessa hipótese se a ameaça for irresistível e a conduta do ameaçado for tipificada criminalmente haverá autoria mediata O sujeito ativo será autor mediato e o constrangido não será autor mas mero executor isto é simples instrumento nas mãos daquele autor mediato que tem o domínio final do fato Nesse caso não haverá concurso de pessoas coautoria ou participação pois o executor agiu sem culpabilidade na verdade faltoulhe o próprio dolo nem se podendo falar em ação que pressupõe voluntariedade por extensão não se pode falar em tipicidade O autor mediato responderá por dois crimes em concurso material pelo atentado à liberdade de trabalho mais o crime que o executor for obrigado a praticar 31 Pessoa jurídica impossibilidade Pessoa jurídica não pode ser sujeito passivo desse crime pois alguém segundo o vernáculo referese exclusivamente à pessoa humana Ainda que evolua e se admita sem restrições a hipótese da responsabilidade penal da pessoa jurídica haverá sempre muitas infrações em que não poderá figurar como sujeito passivo 4 Tipo objetivo adequação típica Atentado contra a liberdade de trabalho é uma espécie do gênero constrangimento ilegal A diferença fundamental deste último no entanto reside na finalidade específica que motiva o sujeito ativo do crime de atentado ora em exame neste o agente pretende constranger a vítima a ter um dos comportamentos descritos no art 197 naquele isto é no constrangimento ilegal art 146 a conduta do agente pretende levar a vítima a não fazer o que a lei permite ou a fazer o que ela não manda com sua característica de generalidade e subsidiariedade esse tipo penal art 146 abrange todo constrangimento à livre determinação de vontade que não tenha recebido configuração legal específica sobre o que deve consistir o fazer ou o não fazer exigido pelo agente 41 Modalidades do constrangimento O núcleo do tipo a exemplo do crime de constrangimento ilegal é constranger que significa obrigar forçar compelir coagir alguém a fazer ou deixar de fazer alguma coisa a que não está obrigado A finalidade pretendida pelo constrangimento nesse tipo penal é obrigar alguém a fazer ou deixar de fazer qualquer das atividades enunciadas no dispositivo legal A conduta típica pode apresentarse sob duas modalidades constranger alguém I a exercer ou não exercer arte ofício profissão ou indústria ou a trabalhar ou não trabalhar durante certo período ou em determinados dias II a abrir ou fechar o seu estabelecimento de trabalho ou a participar de parede ou paralisação de atividade econômica São quatro as hipóteses previstas constranger alguém a a exercer ou não exercer arte ofício profissão ou indústria I 1ª parte compreendese aqui o exercício de toda e qualquer atividade econômica laborativa b trabalhar ou não trabalhar durante certo período ou em determinados dias I 2ª parte a finalidade da ação aqui é forçar a vítima a trabalhar ou não trabalhar em determinados dias ou períodos isto é suprimirlhe a liberdade de trabalho de decisão sobre onde como e quando trabalhar c abrir ou fechar seu estabelecimento econômico o estabelecimento pode ser relativo à exploração de qualquer atividade profissional comercial industrial ou agrícola d participar de parede ou paralisação de atividade econômica esta figura foi revogada pelo art 29 da Lei n 433064 O constrangimento pode ser praticado contra pessoa diversa daquela cujo trabalho o agente deseja cercear Não é necessário que o ofendido oponha resistência efetiva contra a coação ou procure superála pedindo socorro ou empregando qualquer outro recurso é suficiente que mediante violência ou grave ameaça tenhase violentado sua liberdade interna constrangendoo assim a realizar o que lhe foi imposto ou a não fazer o que pretendia sem amparo legal 42 Tipificação quando se tratar de greve ilegal Havendo greve ilegal tipificarseá o delito do art 29 da Lei n 4330 de lº de junho de 1964 Para a configuração do tipo penal é indispensável o emprego de violência ficta ou real Predomina o entendimento jurisprudencial de que só será da competência da Justiça Federal quando forem ofendidos órgãos e instituições que preservam coletivamente os direitos trabalhistas Em que pese o entendimento do STF sobre a competência para julgar os crimes contra a organização do trabalho definida sob a égide da Constituição anterior a atual estabelece que compete aos juizes federais processálos e julgálos art 109 VI da CF88 É indispensável a relação de causalidade entre o emprego da violência ou grave ameaça ou qualquer outro meio e a submissão da vítima à vontade do coator O erro sobre a legitimidade da ação se for inevitável exclui a responsabilidade penal a qualquer título se for evitável excluirá o dolo restando subsidiariamente a culpa art 20 caput que nesse crime é impunível 43 Formas ou meios de execução mediante violência ou grave ameaça A lei estabelece as seguintes formas de realização do atentado contra a liberdade de trabalho a mediante violência força física real ou b grave ameaça violência moral intimidação vis compulsiva Só é legítima a greve exercida pacificamente O uso da violência ou grave ameaça a desnatura e transforma em atividade delituosa No atentado contra a liberdade de trabalho os meios executivos são a violência e a grave ameaça O emprego de uma ou de outra constitui a ratio da incriminação a Mediante violência O termo violência empregado no texto legal significa a força física material a vis corporalis com a finalidade de vencer a resistência da vítima Essa violência pode ser produzida pela própria energia corporal do agente que no entanto poderá preferir utilizar outros meios como fogo água energia elétrica choque gases etc A violência poderá ser imediata quando empregada diretamente contra o próprio ofendido e mediata quando utilizada contra terceiro ou coisa a que a vítima esteja diretamente vinculada Não é indispensável que a força empregada seja irresistível basta que seja idónea para coagir a vítima a fazer ou não fazer o que o sujeito ativo quer b Mediante grave ameaça Constitui forma típica da violência moral é a vis compulsiva que exerce força intimidativa inibitória anulando ou minando a vontade e o querer do ofendido procurando assim inviabilizar eventual resistência da vítima Na verdade a ameaça também pode perturbar escravizar ou violentar a vontade da pessoa como a violência material A violência moral pode materializarse em gestos palavras atos escritos ou qualquer outro meio simbólico Mas somente a ameaça grave isto é aquela ameaça que efetivamente imponha medo receio temor na vítima e que lhe seja de capital importância opondose a sua liberdade de querer e de agir 44 Ameaça de mal futuro imediato e determinado O mal prometido a título de ameaça além de futuro e imediato deve ser determinado sabendo o agente o que quer impor O mal deve ser a determinado pois sendo indefinível e vago não terá grandes efeitos coativos b verossímil ou seja que se possa realizar e não fruto de mera fanfarronice ou bravata c iminente isto é suspenso sobre o ofendido nem em passado nem em futuro longínquo quando respectivamente não teria força coatora ou esta seria destituída do vigor necessário d inevitável pois caso contrário se o ofendido puder evitálo não se intimidará e dependente via de regra da vontade do agente já que se depender da de outrem perderá muito de sua inevitabilidade Enfim esses são os requisitos que em tese a ameaça de mal ou dano deve apresentar A enumeração não é absoluta nem numerus clausus podendo no caso concreto apresentarse alguns e outros não sem desnaturar a gravidade da ameaça É indispensável que a ameaça tenha idoneidade intimidativa isto é que tenha condições efetivas de constranger a vítima Ao contrário do que ocorre com o crime de ameaça no crime de atentado contra a liberdade de trabalho não é necessário que o mal prometido seja injusto sendo suficiente que injusta seja a pretensão ou a forma de obtêla 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é o dolo direto ou eventual representado pela consciência e vontade de concretizar os elementos da descrição típica mediante violência ou grave ameaça São irrelevantes os motivos do constrangimento como por exemplo ser executado com fins de reivindicação legítima ou por quaisquer outras razões A consciência abrange a ilegitimidade da ação dos meios escolhidos violência ou grave ameaça e a relação de causalidade entre o constrangimento e a ação ou omissão do sujeito passivo sendo irrelevantes os motivos determinantes com exceção daqueles que excluem a antijuridicidade da conduta Se o constrangimento for praticado para satisfazer pretensão legítima ou se a violência for praticada no exercício da função ou em razão dela poderá configurar exercício arbitrário das próprias razões art 345 ou violência arbitrária art 322 de acordo com as demais circunstâncias 51 Elemento subjetivo especial do tipo O elemento subjetivo especial do tipo é constituído pelo especial fim de agir qual seja o fim de constranger a vítima à ação ou omissão pretendida Não havendo a finalidade de constranger o ofendido a fazer ou não fazer o que o sujeito ativo pretende o crime não será o de atentado à liberdade de trabalho mas somente aquele que resultar da violência ou grave ameaça vias de fato ameaça lesões corporais etc 6 Consumação e tentativa Consumase o crime de atentado contra a liberdade de trabalho quando o ofendido faz ou deixa de fazer o que foi constrangido na primeira hipótese com o efetivo exercício ou suspensão do exercício de arte ofício profissão ou indústria em face da violência na segunda com o trabalho quando não deveria ou com a suspensão quando deveria trabalhar e na terceira hipótese com a abertura ou fechamento do estabelecimento de trabalho Devese ter presente que não se trata de crime de mera atividade que se consuma com a simples ação mas de crime de lesão que tem uma execução complexa exigindo uma duplicidade comportamental a ação coativa do sujeito ativo e a atividade coagida do sujeito passivo fazendo ou não fazendo o que foi constrangido Assim consumase o crime quando o constrangido em razão da violência ou grave ameaça sofrida começa a fazer ou não fazer a imposição do sujeito ativo Enquanto o coagido não ceder à vontade do sujeito ativo isto é enquanto não der início ao fazer ou não fazer a violência ou grave ameaça podem configurar somente a tentativa 61 Possibilidade de tentativa Como crime material admite a tentativa que se verifica com o início da ação constrangedora que pode ser fracionada A exigência de uma execução complexa com a ação do sujeito ativo de um lado e a atividade do coagido de outro facilita a identificação do conatus Podem ocorrer também as hipóteses de desistência voluntária e arrependimento eficaz respondendo o agente é claro pelos atos já executados nos termos do art 15 7 Pena e ação penal Nas figuras do inciso I a pena é cumulativa detenção de um mês a um ano e multa na figura do inciso II as penas são as mesmas mas o mínimo porém é de três meses Em todas as hipóteses são acrescidas ainda as penas correspondentes à violência que de per si constituírem crime A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Crimes contra a liberdade individual e contra a organização do trabalho Competência Compete à Justiça Federal o julgamento dos crimes que ofendam o sistema de órgãos e instituições que preservam coletivamente os direitos do trabalho e não os crimes que são cometidos contra determinado grupo de trabalhadores A infringência dos direitos individuais de trabalhadores inexistindo violação de sistema de órgãos e instituições destinadas a preservar a coletividade trabalhista afasta a competência da Justiça Federal STJ RHC 15702MA Rel Min Paulo Medina j 21102004 Ações lesivas a direitos trabalhistas individuais tal como atentado contra a liberdade de trabalho de uma funcionária de estabelecimento comercial que após ter comunicado ao empregador seu estado de gravidez teria sido submetida a cumprir seu horário de trabalho de forma constrangedora não configura crime contra a organização do trabalho susceptível de fixar a competência da Justiça Federal prevista no art 109 VI da CF STJ Conflito de Competência 21920SP Rel Min Vicente Leal j 11111998 O crime contra a liberdade do trabalho CP art 197 não se confunde com o crime contra a organização do trabalho ou decorrentes de greve Lei n 433064 art 29 Se o crime não ofende o sistema destinado a preservar coletivamente o trabalho a competência é da justiça estadual comum STJ Conflito de Competência 13953SP Rel Min Edson Vidigal j 491995 Greve Delitos Competência Compete à justiça federal processar e julgar os delitos decorrentes de greve se atentam contra a organização do trabalho ou os direitos e deveres dos trabalhadores coletivamente considerados STJ Conflito de Competência 1355SP Rel Min Jesus Costa Lima j 2091990 Atentado contra a liberdade de contrato de trabalho e boicotagem violenta Art 198 Constranger alguém mediante violência ou grave ameaça a celebrar contrato de trabalho ou a não fornecer a outrem ou não adquirir de outrem matériaprima ou produto industrial ou agrícola Pena detenção de 1 um mês a 1 um ano e multa além da pena correspondente à violência D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias A liberdade contratual foi uma das tantas conquistas asseguradas pela Revolução Francesa que garantiu uma nova orientação libertadora do indivíduo das velhas e autoritárias relações medievais representando uma mudança filosófica de concepção do indivíduo do Estado e da sociedade O direito brasileiro desconheceu essa infração penal até o século XIX sendo ignorada inclusive pelos Códigos Penais de 1830 e 1890 O Código Penal de 1940 foi o primeiro diploma nacional a disciplinar essa matéria cujo texto se manteve inalterado até o início do século XXI 2 Bem jurídico tutelado Estamos diante de um tipo penal com objetividade jurídica complexa tradicionalmente denominado crime pluriofensivo isto é com duas figuras típicas cujos bens jurídicos protegidos são distintos Com efeito na primeira parte do tipo o bem jurídico protegido é a liberdade de trabalho mais especificamente a liberdade de celebrar contrato de trabalho A conduta proibida limita indevidamente a comercialização do produto do trabalho do ofendido Na segunda parte do dispositivo segundo a doutrina dominante o objeto jurídico da proteção penal não é a liberdade de trabalho mas a normalidade das relações de trabalho Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 77 Noronha Direito Penal v 2 p 61 A conduta proibida é aquela que tem como objetivo que a vítima não forneça a outrem ou não adquira matériaprima ou produto industrial ou agrícola matériaprima matérias básicas à produção seria a substância que serve ou se destina à elaboração ou fabricação de produto industrial resultado da indústria manufatureira ou mecânica ou agrícola 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa independentemente de qualidade ou condição especial por exemplo o empregador preposto terceira pessoa etc Sujeito passivo pode ser igualmente qualquer pessoa que sofra a coação tipificada por exemplo comerciante industrial ou qualquer indivíduo que seja constrangido a não fornecer a matériaprima ou o produto O constrangimento exercido em uma mesma circunstância contra mais de uma pessoa constitui crime único Embora não seja desarrazoado o entendimento de Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 77 quando sustenta que a pessoa jurídica pode ser sujeito passivo do crime de boicotagem violenta não nos parece tecnicamente adequado à norma proibitiva Com efeito qualquer das duas figuras descritas no dispositivo em exame exige que a conduta de constranger seja praticada contra alguém e em nosso vernáculo não há espaço para abranger como alguém uma ficção em vez da pessoa natural 4 Tipo objetivo adequação típica O núcleo do tipo a exemplo do crime de constrangimento ilegal é constranger que significa obrigar forçar compelir coagir alguém a fazer ou deixar de fazer alguma coisa a que não está obrigado A finalidade pretendida pelo constrangimento nesse tipo penal é obrigar alguém a fazer ou deixar de fazer qualquer das atividades enunciadas no dispositivo legal A conduta típica pode apresentarse sob três modalidades constranger alguém mediante violência ou grave ameaça 1 a celebrar contrato de trabalho 2 ou a não fornecer a outrem ou 3 não adquirir de outrem matériaprima ou produto industrial ou agrícola Esse tipo penal prevê duas modalidades de atentado 1ª atentado contra a liberdade de contrato de trabalho 2ª boicotagem violenta na área do comércioindústria Nas duas hipóteses há como no crime anterior constrangimento ilegal especificado porém pela finalidade que orienta a conduta do agente 41 Atentado contra a liberdade de contrato de trabalho Na primeira modalidade o constrangimento objetiva a celebração de contrato de trabalho coletivo ou individual Somente se configurará o crime se o constrangimento for para a celebração do contrato de trabalho isto é se o constrangimento for para não celebrar referido contrato não haverá esse crime restando como crime subsidiário tão somente o crime de constrangimento ilegal art 146 No entanto se a conduta do sujeito ativo objetivar constranger alguém a não celebrar contrato de trabalho sua ação será atípica pois o legislador olvidouse de criminalizar a forma negativa dessa conduta Restará contudo subsidiariamente a possibilidade de referido comportamento adequarse ao tipo penal descrito no art 146 constrangimento ilegal Não se pode ignorar que se trata de grave falha do legislador pois tão grave quanto obrigar à celebração de contrato de trabalho é impedir sua celebração mediante violência ou grave ameaça 42 Boicotagem violenta na área do comércioindústria Na segunda figura punese a boicotagem violenta nessa hipótese o constrangimento é para não fornecer ou não adquirir matériaprima ou produto industrial ou agrícola Essa figura é também conhecida como boicotagem violenta Somente o boicote violento mediante violência ou grave ameaça é adequado ao modelo descrito no tipo penal Contrato de trabalho que pode ser individual ou coletivo é o acordo tácito ou expresso correspondente à relação de emprego art 442 da CLT Matériaprima é o produto original massa ou substância bruta da qual se pode extrair alguma coisa isto é serve para produzir ou industrializar algum outro produto Somente o boicote por matériaprima ou produto industrial ou material caracterizam o crime ficando afastado por conseguinte quando a boicotagem for motivada por dinheiro em razão do princípio da tipicidade taxativa Não é necessário que o ofendido oponha resistência efetiva contra a coação ou procure superála pedindo socorro ou empregando qualquer outro recurso é suficiente que mediante violência ou grave ameaça tenhase violentado sua liberdade interna constrangendoo assim a realizar o que lhe foi imposto ou a não fazer o que pretendia sem amparo legal É indispensável a relação de causalidade entre o emprego da violência ou grave ameaça ou qualquer outro meio e a submissão da vitima à vontade do coator 43 Formas ou meios de execução mediante violência ou grave ameaça A lei estabelece as seguintes formas de realização do atentado contra a liberdade de contrato de trabalho e boicotagem violenta a mediante violência força física real ou b grave ameaça violência moral intimidação vis compulsiva No atentado contra a liberdade de contrato de trabalho e boicotagem violenta a exemplo do crime examinado no capitulo anterior os meios executivos são a violência e a grave ameaça O emprego de uma ou de outra constitui a ratio da incriminação a Mediante violência O termo violência empregado no texto legal significa a força física material a vis corporalis com a finalidade de vencer a resistência da vítima Essa violência pode ser produzida pela própria energia corporal do agente que no entanto poderá preferir utilizar outros meios como fogo água energia elétrica choque gases etc A violência poderá ser imediata quando empregada diretamente contra o próprio ofendido e mediata quando utilizada contra terceiro ou coisa a que a vítima esteja diretamente vinculada b Mediante grave ameaça Constitui forma típica da violência moral é a vis compulsiva que exerce força intimidativa inibitória anulando ou minando a vontade e o querer do ofendido procurando assim inviabilizar eventual resistência da vítima Na verdade a ameaça também pode perturbar escravizar ou violentar a vontade da pessoa como a violência material A violência moral pode materializarse em gestos palavras atos escritos ou qualquer outro meio simbólico Mas somente a ameaça grave isto é aquela que efetivamente imponha medo receio temor na vítima e que lhe seja de capital importância opondose a sua liberdade de querer e de agir 5 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo nas duas figuras típicas é constituído pelo dolo representado pela vontade consciente de constranger alguém mediante violência ou grave ameaça a firmar contrato de trabalho ou a boicotar alguém na entrega de matériaprima ou produto industrial ou agrícola O elemento subjetivo especial do tipo é constituído pelo especial fim de agir qual seja o fim de constranger a vítima à ação ou omissão pretendida descrita no tipo penal Não havendo a finalidade de constranger o ofendido a fazer ou não fazer o que o sujeito ativo pretende o crime não será o de atentado à liberdade de contrato de trabalho e boicotagem violenta mas somente aquele que resultar da violência ou grave ameaça vias de fato ameaça lesões corporais etc 51 Impossibilidade da modalidade culposa De modo geral a doutrina tem entendido desnecessária a presença de elemento subjetivo especial do injusto Não há previsão da modalidade culposa de atentado à liberdade de contrato de trabalho ou boicotagem violenta Na verdade os meios executórios violência e grave ameaça por si sós já afastam qualquer possibilidade de discutir a eventualidade ou razoabilidade de criminalizar a modalidade culposa 6 Consumação e tentativa Na primeira figura consumase com a assinatura do contrato ou com o início do trabalho na segunda o crime consumase com a omissão pretendida pelo agente não aquisição ou não fornecimento A tentativa é em tese possível Devese ter presente que não se trata de crime de mera atividade que se consuma com a simples ação mas de crime de lesão que tem execução complexa exigindo duplicidade comportamental a ação coativa do sujeito ativo e a atividade coagida do sujeito passivo fazendo ou não fazendo o que foi constrangido Assim consumase o crime quando o constrangido em razão da violência ou grave ameaça sofrida começa a fazer ou não fazer a imposição do sujeito ativo Enquanto o coagido não ceder à vontade do sujeito ativo isto é enquanto não der início ao fazer ou não fazer a violência ou grave ameaça podem configurar somente a tentativa Como crime material admite a tentativa que se verifica com o início da ação constrangedora que pode ser fracionada A exigência de uma execução complexa com a ação do sujeito ativo de um lado e a atividade do coagido de outro facilita a identificação do conatus 7 Concurso de crimes violência tipificada Se qualquer das condutas for praticada com violência à pessoa haverá concurso de crimes formal impróprio cumulandose as respectivas penas critério do cúmulo material A cominação cumulativa das sanções cominadas ao crime de atentado à liberdade de contrato de trabalho e boicotagem violenta com a pena correspondente à violência não criou uma espécie sui generis de concurso material mas adotou tão somente o sistema do cúmulo material de aplicação de pena a exemplo do que fez em relação ao concurso formal impróprio art 70 2ª parte Aplicase nesse caso por expressa determinação legal o sistema de aplicação de penas do cúmulo material independentemente da existência ou não de desígnios autônomos A aplicação cumulativa de penas mesmo sem a presença de desígnios autônomos constitui exceção da aplicação de penas prevista para o concurso formal impróprio No entanto a despeito de tudo o que acabamos de expor nada impede que concretamente possa ocorrer concurso material como acontece com quaisquer outras infrações penais do crime de atentado contra a liberdade de trabalho com outros crimes violentos desde que é claro haja pluralidade de condutas e pluralidade de crimes mas aí observese já não será mais o caso de unidade de ação ou omissão caracterizadora do concurso formal 8 Pena e ação penal A pena cominada cumulativamente é detenção de um mês a um ano e multa além da pena correspondente à violência a ação penal é pública incondicionada Em todas as hipóteses são acrescidas ainda as penas correspondentes à violência que de per si constitui crime A competência é da Justiça Federal art 109 VI da CF Atentado contra a liberdade de associação Art 199 Constranger alguém mediante violência ou grave ameaça a participar ou deixar de participar de determinado sindicato ou associação profissional Pena detenção de 1 um mês a 1 um ano e multa além da pena correspondente à violência V arts 511 e s da CLT organização sindical V art 3º f da Lei n 489865 abuso de autoridade V art 5º XVII da CF D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias No Brasil a Constituição de 1934 foi o primeiro estatuto legal a garantir o direito de sindicalizarse A proteção penal contudo que fora desconhecida dos Códigos Penais anteriores foi introduzida pelo legislador de 1940 Sebastian Soler Derecho Penal argentino p 144 comentando artigo do Código Penal argentino semelhante ao nosso afirmou que referida infração penal é uma criação moderna da luta econômica A liberdade associativa foi elevada a garantia fundamental pela Constituição Federal de 1988 arts 5º XVII e 8º V 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é a liberdade de associação e filiação sindical ou profissional assegurada pela atual Constituição Federal arts 5º XVII e 8º V Com absoluta razão Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 652 com a coragem que sempre o caracterizou criticava duramente a forma como a liberdade sindical era concebida nos anos de chumbo nos seguintes termos Todos sabem que se trata de liberdade inteiramente ilusória pois o Ministério do Trabalho controla com mão de ferro a organização dos sindicatos aplicando textos ditatoriais da CLT arts 528 e 530 a Seja como for a liberdade de associação é que constitui o bem jurídico que a lei penal tutela A liberdade sindical e de associação representam um dos pressupostos de um Estado Democrático de Direito Pelos termos do art 199 a tutela penal abrange as diversas modalidades de associações e sindicatos pois o que protege é exatamente a liberdade associativa 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa sendo desnecessária condição ou qualidade especial Pode ser inclusive membro ou integrante de sindicato ou associação Esses normalmente são as pessoas mais interessadas no ingresso ou não de certas pessoas em determinado sindicato ou associação Se o sujeito ativo for funcionário público sua conduta poderá configurar também o crime de abuso de autoridade art 3º f da Lei n 489865 Sujeito passivo igualmente pode ser qualquer pessoa desde que se trate de trabalhador ou profissional que possa integrar algum sindicato ou alguma associação de classe Na modalidade de conduta deixar de participar sujeito passivo somente pode ser membro ou integrante de associação ou sindicato o qual seja constrangido a abandonar nessa modalidade portanto tratase de crime próprio 4 Tipo objetivo adequação típica A ação básica do tipo é constranger alguém mediante violência ou grave ameaça Constrangimento mediante violência e grave ameaça tem o mesmo sentido daquele utilizado nos artigos anteriores já analisados para onde remetemos o leitor Somente é criminalizada a conduta de constranger mesmo mediante violência ou grave ameaça a participação ou não participação em determinado sindicato ou em determinada associação profissional O constrangimento a participar ou não participar genericamente de qualquer sindicato ou associação não tipifica esse crime mas tão somente o crime de constrangimento ilegal art 146 Associação profissional pode ser definida como gênero da qual o sindicato é a espécie Associação é a união ou agrupamento de pessoas cuja finalidade é a defesa estudo e coordenação dos interesses profissionais que constituem ou integram referida entidade associativa art lº do DecretoLei n 140239 e art 511 do DecretoLei n 545243 CLT Sindicato por sua vez é a associação profissional reconhecida pelo Poder Público como legítima representante da classe de sindicalizados art 50 do DecretoLei n 140239 e art 561 da CLT Não há sindicato sem os requisitos ou formalidades legais A partir do decretolei antes referido distinguiuse associação e sindicato assim é possível categorias associaremse sem se sindicalizar mas é impossível sindicalizaremse sem associarse numa verdadeira relação de gênero e espécie 41 Trabalho individual e crime contra a organização do trabalho Trabalho protegido penalmente neste Título é instituto de interesse coletivo Não se confunde com o direito individual do empregado ou do empregador pois interessa antes de tudo à coletividade ao Estado em última instância A lesão produzida por essa infração penal deve repercutir nas relações de trabalho e não apenas no interesse particular deste ou daquele trabalhador ou empregador individualmente considerado Em outros termos se a conduta do sujeito ativo nem sequer gerar perigo para a organização do trabalho isto é não ultrapassar os interesses individuais para atingir os do sindicato ou associação profissional não se pode falar em crime contra a organização do trabalho Somente haverá resultado próprio do crime de atentado contra a liberdade de associação ocorrendo perigo para a existência ou funcionamento do sindicato ou da associação Caso contrário o fato será restrito à relação individual de trabalho O trabalho como bem despersonalizado não é afetado Os meios executórios do crime de atentado à liberdade de associação violência ou grave ameaça são os mesmos dos artigos anteriores que receberam exaustiva e até repetitiva análise de nossa parte 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo do crime de atentado contra a liberdade de associação é o dolo constituído pela vontade livre e consciente de constranger alguém mediante violência ou grave ameaça a participar ou deixar de participar de determinado sindicato ou associação profissional Não há previsão de modalidade culposa 6 Consumação e tentativa Consumase o atentado contra a liberdade de associação quando o agente com violência ou grave ameaça impede a associação de alguém em determinado sindicato ou associação profissional ou quando por meio da mesma espécie de conduta consegue fazer alguém associarse em determinado sindicato ou associação profissional Em outros termos o atentado à liberdade de associação consumase no momento em que o ofendido em razão dos meios violentos empregados participa ou deixa de participar de sindicato ou de associação profissional Admitese em tese a tentativa Com o eventual emprego de meio violento sem conseguir a efetiva adesão a sindicato ou associação profissional ou então o impedimento de tal adesão o crime não passará de sua modalidade tentada 7 Pena e ação penal A pena cominada cumulativamente é de detenção de um mês a um ano e multa além da pena correspondente à violência que em si mesma constituir crime Eventual contravenção vias de fato por exemplo não determina a cumulação de penas A ação penal é de natureza pública incondicionada A competência é da Justiça Federal e por extensão a atribuição investigativopolicial é da Polícia Federal Mas a competência somente será da Justiça Federal se a ação do agente atingir a existência da associação ou do sindicato que é um interesse coletivo de todos os trabalhadores No entanto será da competência da Justiça Estadual se for atingido somente o interesse individual do trabalhador J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Organização do trabalho CP parte especial Título IV é objeto jurídico Trabalho aqui é instituto de interesse coletivo Não se confunde com o direito individual do empregado e do empregador Interessa antes de tudo à sociedade ao Estado Repercute nas relações de trabalho Se a conduta do trabalhador e do empregador não gera sequer perigo para a organização do trabalho não extrapolando efeitos a sindicato ou associação profissional não se configura o crime descrito no art 199 CP atentado contra a liberdade de associação Só haverá resultado próprio desse crime ocorrendo perigo para a existência ou funcionamento do sindicato ou da associação Caso contrário o fato será restrito à relação individual de trabalho O trabalho como bem jurídico despersonalizado não é afetado STJ RHC 4749CE Rel Min Luiz Vicente Cernicchiaro j 28111995 Paralisação de trabalho seguida de violência ou perturbação da ordem Art 200 Participar de suspensão ou abandono coletivo de trabalho praticando violência contra pessoa ou contra coisa Pena detenção de 1 um mês a 1 um ano e multa além da pena correspondente à violência Parágrafo único Para que se considere coletivo o abandono de trabalho é indispensável o concurso de pelo menos três empregados D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias No direito brasileiro a criminalização do exercício da greve ocorreu pela vez primeira com o Código Penal de 1890 na contramão do espírito filosóficoeconômico que animava os proclamadores da República Esse descompasso políticofilosófico levou a rápida alteração nesse particular do primeiro Código republicano A Constituição de 1937 considerou toda greve e todo lockout condutas antissociais incompatíveis com os interesses nacionais art 139 postura adequada digase de passagem ao período ditatorial do Estado Novo O Código Penal de 1940 no entanto proibiu somente a greve violenta ou aquela em que houvesse interrupção de serviço de interesse coletivo art 201 A Constituição Federal símbolo de outros tempos ao contrário daquela do Estado Novo assegura aos trabalhadores o direito de greve art 9º nos limites de um Estado Democrático de Direito 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido ao contrário do que tem sustentado a imensa maioria da doutrina não é a liberdade de trabalho Greve e lockout não são exercício do direito de trabalhar mas sua negação ou seja é seu não exercício greve é o não trabalho O bem jurídico tutelado é a regularidade e moralidade das relações trabalhistas é a correção e a moralidade que devem orientar os contratos de trabalho que venia concessa não se confunde com liberdade de trabalho Na verdade greve e suspensão de trabalho como elementares do crime em exame em princípio não o caracterizam somente quando qualquer das duas for executada com violência contra a pessoa ou contra coisa 3 Sujeitos ativo e passivo O sujeito ativo deve ser necessariamente empregado ou empregador pois o tipo penal prescreve a suspensão ou o abandono coletivo de trabalho Em outros termos sujeito passivo será o participante da greve violenta ou o empregador que tenha promovido a suspensão do trabalho lockout mediante violência Na hipótese da greve o crime é plurissubjetivo isto é crime de concurso necessário uma vez que além de referirse a abandono coletivo reforça a nosso juízo desnecessariamente a exigência do concurso de no mínimo três empregados Equivocamse aqueles doutrinadores que sustentam tratarse de crime unissubjetivo pois ignoram que não existe coletivo representado por uma unidade No caso do lockout é desnecessária a multiplicidade de empregadores não sendo hipótese de concurso necessário se houver concurso será eventual art 29 do CP Nesse particular Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 65 sustentava equivocadamente ser indispensável que os patrões da mesma empresa sócios ou empregados de categoria participem do lockout violento Sujeito passivo pode ser qualquer pessoa sem condição especial incluindo empregado e empregador A pessoa jurídica pode ser sujeito passivo do crime na modalidade de abandono coletivo de trabalho independentemente de a violência ser praticada contra a pessoa ou contra coisa ao contrário do entendimento sustentado por Luiz Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 95 Na verdade pode haver dupla subjetividade passiva isto é a vítima da violência pode ser distinta da vítima da greve ou da suspensão de trabalho 4 Tipo objetivo adequação típica A conduta tipificada é participar que segundo o próprio texto legal exige pluralidade de pessoas no mínimo três parágrafo único de suspensão ou abandono coletivo de trabalho praticado com violência contra pessoa ou contra coisa A violência real deve ser praticada durante a suspensão ou abandono de trabalho coletivo A violência é aquela utilizada contra a pessoa ou contra a coisa no exercício da ação tipificada propriamente e não para coagir alguém a participar da greve ou suspensão de trabalho Essa conduta está tipificada no art 197 II Como a finalidade da violência empregada é garantir a eficácia da pressão inviabilizar possível tentativa de conciliação ou entre outras razões pela brutalidade natural dos participantes ela deve ocorrer no curso da ação isto é da suspensão ou da paralisação coletiva do trabalho 41 A incriminação alcança todos os participantes A nosso juízo a incriminação alcança todos os que participarem independentemente de serem ou não os autores da violência sendo suficiente o vínculo psicológico entre eles Com efeito a locução praticando com violência é elementar do tipo que nos termos do art 30 do CP comunicase a todos os que intervierem em sua realização independentemente de terem ou não empregado violência Basta que tenham anuído à conduta dos demais O simples porte de armas brancas pelos piquetes de greve com o objetivo de impedir o trabalho de outros companheiros ocasionando a paralisação das atividades do empregador não constitui violência contra a pessoa ou contra a coisa respaldada pela previsão do art 200 do CP As ações ilícitas decorrentes de greves não podem ser enquadradas como crimes contra a organização do trabalho se não ofendem órgãos e instituições destinados a preservar coletivamente o trabalho mas pessoas isoladamente 42 Abandono coletivo e suspensão do trabalho Abandono coletivo do trabalho é a paralisação efetuada pelos trabalhadores ou seja a tradicional greve Contudo a despeito de o dispositivo falar em abandono coletivo não se trata de crime de concurso necessário isto é aquele que exige necessariamente a participação de mais de uma pessoa em sua execução Na verdade o legislador pretendeu apenas evidenciar a necessidade de o abandono coletivo ocorrer pelo menos de parte de três empregados conjuntamente Quanto à suspensão do trabalho que é sua paralisação promovida pelos empregadores lockout isto é a greve patronal não há a mesma exigência no tipo penal por isso não se pode afirmar que para a configuração da conduta típica a suspensão deva operarse por pelo menos três patrões Contudo segundo a doutrina majoritária o verbo nuclear participar demonstra a necessidade da intervenção de pelo menos três pessoas podendo ser um empregador e dois empregados por exemplo 43 Violência contra pessoa ou coisa A greve em si mesma não constitui crime além de ser um direito democraticamente assegurado aos trabalhadores foi elevada ao nível de garantia constitucional art 9º Somente a greve promovida mediante violência tanto contra pessoa quanto contra coisa é tipificada como crime Por isso a greve sem violência mesmo que seja declarada ilegal pelos órgãos fiscalizadores não constituirá crime se não houver violência física A simples ilegalidade da greve não a transforma ipso facto em crime pois a ilicitude penal sempre enriquecida de exigências típiconormativas não respalda todas as ilicitudes do ordenamento jurídico mas somente aquelas que se adequarem a determinado modelo descrito em um dispositivo penal Esse dispositivo afasta as consequências da distinção que o Código Penal faz em relação à violência praticada sobre a coisa e à violência praticada contra a pessoa quando tipifica os crimes de furto e de roubo Assim indiferentemente tanto a violência empregada contra a coisa como a utilizada contra a pessoa são elementares do crime paralisação de trabalho seguida de violência ou perturbação da ordem A violência deve ser anterior ou contemporânea ao período de suspensão ou abandono coletivo de trabalho Na verdade não há qualquer relevância se a violência contra pessoa ou coisa se opera antes ou depois do início da greve ou da suspensão do trabalho desde que logicamente se concretize antes da consumação do crime A ausência de previsão legal dos meios modos ou formas de praticar a violência autoriza a utilização de quaisquer deles manuais ou mecânicos desde que sejam idôneos para o fim proposto 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo constituído pela vontade livre e consciente de participar de suspensão ou abandono coletivo de trabalho praticando violência contra pessoa ou contra coisa É indispensável que o sujeito ativo tenha consciência do emprego da violência no exercício da atividade incriminada Não é exigido qualquer elemento subjetivo especial do tipo sendo por isso irrelevante o motivo ou a razão pela qual a greve ou o lockout se realiza Não há previsão tampouco de modalidade culposa 6 Consumação e tentativa Consumase com a suspensão ou abandono coletivo do trabalho e a prática de violência isto é consumase o crime no momento em que instalada a greve ou o lockout se produz a violência contra pessoa ou coisa Como normalmente a maioria dos grevistas está investida de espírito pacífico isto é participa da greve realmente pelos fins nela declarados somente respondem pela violência aqueles que dela participaram ou de alguma forma para ela concorreram embora todos respondam pelo crime previsto neste artigo Admitese como crime material a tentativa Quando por exemplo a despeito da violência empregada por razões estranhas à vontade dos participantes o resultado pretendido não se produzir caracterizada estará a tentativa 7 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são detenção de um mês a um ano e multa além da pena correspondente à violência A ação penal é de natureza pública incondicionada Paralisação de trabalho de interesse coletivo Art 201 Participar de suspensão ou abandono coletivo de trabalho provocando a interrupção de obra pública ou serviço de interesse coletivo Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos e multa V art 3º II da Lei n 152151 crimes contra a economia popular D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O Código Penal de 1940 dispensa tratamento distinto para a greve em empresas privadas art 200 e empresas públicas ou que pelo menos executem serviços de interesse coletivo art 201 Ao contrário do diploma anterior não admitiu como meio executório a greve mediante grave ameaça mas somente aquela praticada mediante violência física inovou igualmente nas sanções cominadas como veremos ao final Sob os auspícios da Constituição ditatorial de 1937 o legislador de 1940 criminalizou a prática de greve ou do lockout pacíficos ou não de atividades públicas ou de interesse social Posteriormente a esse diploma legal codificado inúmeras leis disciplinaram o direito de greve ampliando ou restringindo esse direito dentre as quais destacamos as seguintes a Lei n 4330 de 1º de junho de 1964 que para parte da doutrina ao regulamentar o direito de greve teria revogado o art 201 do Código Penal admitindoa contudo em atividades fundamentais art 16 A Lei n 7783 de 28 de junho de 1989 conhecida como Lei de Greve revogou a Lei n 4330 disciplinou o direito de greve definiu as atividades essenciais além de regular o atendimento das atividades inadiáveis da comunidade 11 A possível revogação do dispositivo em exame Discutese longamente sobre a validade ou revogação do art 201 ora em exame não apenas pela Lei n 778389 mas com o reforço que esta recebeu com o advento da Constituição Federal de 1988 De modo geral a doutrina tem considerado revogado esse dispositivo penal orientação que também adotamos Confrontando a atual Lei de Greve n 778389 e a Constituição Federal de 1988 parecenos inquestionável que o disposto no art 201 do Código Penal se encontra efetivamente revogado Contudo considerando as divergências reinantes sobre o tema faremos brevíssimas considerações sobre esse dispositivo penal embora consideremos impecável a conclusão de Alberto Silva Franco Código Penal e sua interpretação jurisprudencial p 2863 ao afirmar que caso seja usada violência ou grave ameaça para a interrupção da obra pública ou serviço de interesse coletivo então o delito cometido será aquele do art 200 do CP Em conclusão a penalização ou tipificação da conduta antes descrita no revogado art 201 como crime é que ficará na dependência da lei complementar a que se refere o art 37 VII da CF à qual cometeu a tarefa de estabelecer os limites do direito de greve e as sanções cabíveis 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido a exemplo do artigo anterior não é a liberdade de trabalho Greve e lockout não são exercício do direito de trabalhar mas sua negação ou seja o seu não exercício greve é o não trabalho O bem jurídico são a regularidade e a moralidade das relações trabalhistas especialmente aquelas relacionadas a obras públicas ou serviços de interesse coletivo são a correção e a moralidade que devem orientar os contratos de trabalho o que venia concessa não se confunde com liberdade de trabalho Na verdade a simples greve ou suspensão de trabalho mesmo sem violência tipificam o crime desde que provoquem a interrupção de obra pública ou serviço de interesse coletivo ao contrário do previsto no artigo anterior em que somente se configuram quando qualquer das duas for executada com violência contra pessoa ou contra coisa 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo deve ser necessariamente o empregado greve o empregador suspensão que tem sob sua responsabilidade a obra pública ou o serviço de interesse coletivo pois o tipo penal prescreve a suspensão ou o abandono coletivo de trabalho Pode ser inclusive o próprio trabalhador na hipótese conjugandose a abrangência do art 29 do CP por meio da figura do concurso de pessoas Em outros termos sujeito passivo será o participante da greve violenta ou o empregador que tenha promovido a suspensão do trabalho lockout mediante violência No caso de lockout é desnecessária a multiplicidade de empregadores não sendo hipótese de concurso necessário se houver concurso será eventual art 29 do CP Nesse particular Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 65 sustentava equivocadamente ser indispensável que os patrões da mesma empresa sócios ou empregados de categoria participem do lockout violento Sujeito passivo pode ser qualquer pessoa sem condição especial incluindo empregado e empregador A pessoa jurídica de direito público pode ser sujeito passivo do crime na modalidade de abandono coletivo de trabalho Mediatamente pode ser sujeito passivo a coletividade beneficiária da obra pública ou serviço do interesse coletivo 4 Tipo objetivo adequação típica A conduta tipificada é participar de suspensão ou abandono coletivo de trabalho nos mesmos termos do artigo anterior No entanto a incriminação aqui ocorreria quando provocasse a interrupção de obra pública ou serviço de interesse coletivo independentemente do emprego de violência contra coisa ou pessoa Suspensão coletiva de trabalho é a greve patronal lockout Abandono coletivo de trabalho é a greve dos empregados Constituirá crime se de qualquer deles suspensão ou abandono resultar a interrupção de obra pública ou serviço de interesse coletivo É indispensável que haja a participação de um número razoável de empregados A participação de determinado número insuficiente para acarretar a interrupção da obra pública ou serviço de interesse coletivo não tipifica a ação 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de participar de suspensão ou abandono coletivo de trabalho provocando assim a interrupção de obra pública ou serviço de interesse coletivo O dolo pode ser direto e eventual mas sem qualquer exigência de elemento subjetivo especial do injusto Tampouco há previsão de modalidade culposa Não sendo exigido elemento subjetivo especial do injusto é por isso mesmo irrelevante o motivo ou a razão pela qual a greve ou o lockout se realizam 51 Tipicidade de greve pacífica excepcionalmente A greve pacífica e ordeira em atividades fundamentais era incriminada Este dispositivo art 201 como referido nas considerações preliminares foi revogado pela Lei n 433064 que regula o direito de greve tornandoa admissível em atividades fundamentais A Emenda Constitucional de 1969 declarou que não será permitida a greve nos serviços públicos e atividades essenciais definidas em lei art 162 Evidentemente que esse texto constitucional não tem o condão de revigorar a incriminação de uma lei revogada A nova Lei de Greve n 778389 por sua vez revogou a Lei n 433064 A atual Constituição Federal 1988 consagrou o direito de greve de forma ampla Somente os abusos sujeitam os responsáveis às penas da lei art 9º 2º da CF Assim o art 201 do CP em nossa concepção é inaplicável Há no entanto crime de greve pacífica nos casos dos arts 2º I e 22 da Lei n 433064 devendose considerar o disposto na Lei de Greve n 778389 6 Consumação e tentativa Consumase com a suspensão ou abandono de obra pública ou serviço de interesse coletivo isto é consumase o crime no momento em que instalada a greve ou o lockout se produz a interrupção da obra pública ou serviço referido no tipo Admitese como crime material a tentativa Quando por exemplo a despeito do início da realização de greve pacífica por razões estranhas à vontade dos participantes não ocorrer a paralisação de obra ou serviço de interesse público caracterizada estará a tentativa 7 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são detenção de um mês a um ano e multa além da pena correspondente à violência com as observações que fizemos relativas a esse tema nos exames dos arts 197 e 198 a ação penal é pública incondicionada Invasão de estabelecimento industrial comercial ou agrícola Sabotagem Art 202 Invadir ou ocupar estabelecimento industrial comercial ou agrícola com o intuito de impedir ou embaraçar o curso normal do trabalho ou com o mesmo fim danificar o estabelecimento ou as coisas nele existentes ou delas dispor Pena reclusão de 1 um a 3 três anos e multa D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Os Códigos Penais de 1830 e 1890 não prescreveram nenhum modelo típico semelhante à invasão de estabelecimento industrial comercial ou agrícola descrito no art 202 do atual Código Penal pois vigiam em períodos em que o direito de greve e a liberdade de trabalho não tinham a mesma expressão sociopolítica O Código Penal de 1940 surgindo em período econômica política e culturalmente distinto daquele do século XIX necessitava reprimir eventuais excessos que pudessem ser cometidos por organizações associações profissionais ou sindicatos visando garantir a ordem e estabilidade sociais Essa nova realidade sociocultural justificou a adoção pelo legislador de 1940 do crime em exame inspirandose no Código Penal Rocco de 1930 art 508 2 Bem jurídico tutelado Os bens jurídicos protegidos são ao mesmo tempo a liberdade e a organização do trabalho O patrimônio do proprietário também se inclui na proteção jurídica desse tipo penal Tratase na verdade de crime pluriofensivo pois viola bens jurídicos individuais que se vinculam ao funcionamento normal de estabelecimento de trabalho e a sua integridade A despeito de esse crime situarse em outro Título do Código Penal a verdade é que não se pode ignorar que o patrimônio individual é o centro da tutela penal Por isso acreditamos que se trata de uma figura topograficamente mal situada certamente estaria mais bem localizada no Título que cuida dos crimes contra o patrimônio 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa empregada ou não Apesar de não ser crime de concurso necessário por sua natureza dificilmente será executado por uma única pessoa Assim sendo como crime de forma livre pode ser executado por uma ou mais pessoas indistintamente Sujeitos passivos são o proprietário do estabelecimento e a coletividade conjuntamente Ninguém pode ser mais interessado na regularidade dos serviços prestados e particularmente na integridade de seu estabelecimento seja ele industrial comercial ou agrícola do que o próprio dono Vivemos em um país capitalista gostem ou não O interesse comum da coletividade embora no conjunto seja superior não é mais intenso direto e imediato que o do proprietário do patrimônio atingido Esse aspecto aliás é tão eloquente que podemos demonstrálo com um dado definitivo o consentimento do empregador afasta a tipicidade dos comportamentos descritos no dispositivo em exame 4 Tipo objetivo adequação típica O objeto material é o estabelecimento industrial comercial ou agrícola Há duas figuras distintas 1ª invasão ou ocupação de estabelecimento 2ª sabotagem As condutas alternativas tipificadas são invadir que significa entrar à força arbitrária ou hostil e ocupar que tem o sentido de apossarse arbitrariamente de estabelecimento industrial comercial ou agrícola A invasão ou ocupação tem a finalidade de impedir ou embaraçar o curso normal do trabalho A ausência dessa finalidade desclassifica o crime para simples invasão de domicílio Impedir é obstaculizar não permitir tornar inviável o curso normal do trabalho Embaraçar tem o sentido de obstar criar dificuldades opor óbices etc A sabotagem apresentase sob três modalidades de ação a danificar o estabelecimento b danificar as coisas existentes no estabelecimento c dispor das coisas existentes no estabelecimento Danificar significa destruir inutilizar deteriorar o objeto da proteção jurídica no caso qualquer dos estabelecimentos mencionados Em qualquer das três hipóteses a ação deve ser praticada com o fim de impedir ou perturbar o trabalho caso contrário o crime será simplesmente de dano 5 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo é constituído pelo dolo representado pela vontade consciente de invadir ou ocupar estabelecimento industrial comercial ou agrícola ou danificar os próprios estabelecimentos ou as coisas neles existentes ou ainda delas dispor O elemento subjetivo especial do tipo que é indispensável é constituído pelo fim especial de impedir ou embaraçar o curso normal do trabalho Não há previsão de modalidade culposa Agindo o sujeito ativo por exemplo para fazer justiça com as próprias mãos não se caracteriza a conduta em exame mas exercício arbitrário das próprias razões Sem o especial fim de agir podem caracterizarse os crimes dos arts 163 dano ou 155 furto ou ainda do art 150 invasão de domicílio para qualquer das condutas praticadas com fins políticos vide o art 15 da Lei n 717083 6 Consumação e tentativa Consumase com a invasão ou ocupação com danificação ou disposição nas formas descritas independentemente da obtenção dos fins pretendidos A sabotagem por sua vez consumase no momento em que o sujeito ativo danifica o estabelecimento ou as coisas nele existentes ou no instante em que delas dispõe A tentativa é admissível em ambos os crimes visto que a fase executória de qualquer deles admite fracionamento 7 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são reclusão de um a três anos e multa Não há previsão de violência nem como elementar típica nem como qualificadora ou majorante da sanção penal A ação penal é de natureza pública incondicionada 8 Questões especiais Praticado o dano contra propriedade particular sem que a denúncia demonstre a intenção do agente de embaraçar o curso normal do trabalho competente é a Justiça Estadual para o processo e julgamento da infração mediante queixa Sem o motivo determinante da ação delituosa não se pode inferir a prática do delito previsto no art 202 do CP sob qualquer de suas formas A entrada de sócio de empresa comercial em escritório da firma para verificar irregularidades que comprometiam seu patrimônio não constitui crime contra a organização do trabalho pois o que caracteriza o delito do art 202 do CP é o intuito de embaraçar o curso normal do trabalho ou com o mesmo fim danificar o estabelecimento Frustração de direito assegurado por lei trabalhista Art 203 Frustrar mediante fraude ou violência direito assegurado pela legislação do trabalho Pena detenção de 1 um ano a 2 dois anos e multa além da pena correspondente à violência 1º Na mesma pena incorre quem I obriga ou coage alguém a usar mercadorias de determinado estabelecimento para impossibilitar o desligamento do serviço em virtude de dívida II impede alguém de se desligar de serviços de qualquer natureza mediante coação ou por meio da retenção de seus documentos pessoais ou contratuais 2º A pena é aumentada de um sexto a um terço se a vítima é menor de 18 dezoito anos idosa gestante indígena ou portadora de deficiência física ou mental 1º e 2º acrescentados pela Lei n 9777 de 29 de dezembro de 1998 D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O Código Criminal do Império 1830 e o Código Penal republicano 1890 não se preocuparam com a necessidade de proteção penal de direitos trabalhistas Assim o Código Penal de 1940 foi o primeiro diploma legal brasileiro a disciplinar essa matéria no âmbito criminal O preceito secundário do art 203 sanção penal recebeu nova redação determinada pela Lei n 9777 de 29 de dezembro de 1998 Os 1º e 2º foram acrescentados pela mesma lei A expressão crimes contra a organização do trabalho utilizada no art 125 VI da CF não abrange o crime praticado pelo empregador que fraudulentamente viola direito trabalhista de determinado empregado 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido abrange todo e qualquer direito que seja protegido pela legislação trabalhista Como destaca Damásio de Jesus Direito Penal v 2 p 47 O legislador buscou tutelar a legislação trabalhista entendendo indispensável ao desenvolvimento harmônico da sociedade o cumprimento dos deveres impostos ao empregado e ao empregador Tratase como se percebe de norma penal em branco pois à legislação trabalhista compete definir e disciplinar os direitos assegurados aos empregados e aos empregadores 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser o empregador o empregado ou qualquer pessoa empregador preposto ou alguém estranho à relação trabalhista independentemente da existência de relação empregatícia embora naturalmente haja uma relação de emprego entre o autor do fato e o sujeito passivo Sujeito passivo direto é a pessoa cujo direito trabalhista é frustrado violado ou sonegado Quem sofre direta e imediatamente o dano consequente da infração penal inegavelmente é o titular do direito frustrado Mediatamente podese admitir o próprio Estado como sujeito passivo Com efeito a fraude pode ser praticada pelo patrão ou pelo operário ou por ambos de comum acordo para por exemplo violar direito assegurado pelas leis trabalhistas que sendo de ordem pública são irrenunciáveis Nessa hipótese o sujeito passivo direto e imediato é o Estado e não o empregado ou operário 4 Tipo objetivo adequação típica A ação consiste em frustrar impedir iludir privar mediante violência ou fraude direito assegurado pela legislação do trabalho Os meios executivos devem ser mediante violência vis corporalis ou fraude manobra ardilosa astuciosa uso de artifício Sobre o que seja violência recomendamos que se observem as considerações feitas na análise dos arts 197 e 198 deste Código A ameaça vis compulsiva não é meio idôneo para praticar o crime pois o tipo penal adota como meios executivos somente violência vis corporalis e fraude A ação do agente frustra direito assegurado pela legislação do trabalho Tratase de norma penal em branco dependente de definição da legislação trabalhista pois será nela que identificaremos essa norma complementadora do tipo penal em análise Embora a lei não distinga pelo menos expressamente entre direitos renunciáveis e irrenunciáveis certamente visa sobretudo proteger Tratandose é fácil reconhecer de direitos renunciáveis o empregado pode legalmente deles abrir mão sendo desnecessária a adoção pelo empregador dos meios fraudulentos que o legislador pretende coibir 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo do crime é o dolo constituído pela vontade consciente de frustrar mediante fraude ou violência direito assegurado pela legislação trabalhista É indispensável que o agente tenha consciência e vontade de empregar o meio executivo seja a fraude seja a violência Não há necessidade da presença de qualquer elemento subjetivo especial do injusto sendo irrelevantes as razões ou motivos que levaram o agente a praticar a ação incriminada O preceito primário da norma penal incriminadora é incompleto tratandose de caso típico de norma penal em branco Somente se poderá identificar uma infração penal após investigação preliminar sobre a existência de um direito trabalhista violado que deverá ser esclarecido pelas leis trabalhistas 6 Consumação e tentativa Consumase o crime no lugar e no momento em que o titular de direito assegurado pela legislação trabalhista se vê impedido de exercêlo ou seja com a frustração efetiva do direito Admitese a tentativa na medida em que sua execução pode sofrer fracionamento 7 Novos tipos assemelhados Os dois incisos do 1º acrescentados pela Lei n 977798 criam na verdade dois novos tipos penais O inciso I exige o elemento subjetivo especial do injusto Assim a coação obrigar também é coagir para usar mercadorias de determinado estabelecimento só constituirá esse tipo penal se objetivar a impossibilidade de desligamento do serviço No inciso II mediante coação ou retenção dos documentos da vítima objetivase impedir o desligamento do trabalho 8 Penas e ação penal 81 Sanções cominadas As sanções penais anteriormente cominadas cumulativamente eram detenção de um mês a um ano e multa além da correspondente à violência alteradas com o advento da Lei n 9777 de 29 de dezembro de 1998 Com efeito as penas cominadas cumulativamente passaram a ser detenção de um a dois anos e multa além da correspondente à violência para o tipo básico e assemelhados incisos I e II A política criminal despenalizadora e descarcerizadora das Leis n 909995 e 971498 trazem em seu ventre involuntariamente o embrião da velha política criminal funcional para afastarse da abrangência desses dois diplomas legais os detentores do poder exasperam as cominações penais daquelas infrações que lhes aprouverem como tem ocorrido com inúmeras infrações penais Na previsão do 2º a pena deverá obrigatoriamente ser majorada entre um sexto e um terço Pela redação que é taxativa parece que houve aí uma preocupação com as minorias Nesse sentido esqueceramse de arrolar entre outros homossexuais prostitutas negros amarelos asiáticos drogados etc Convém recordar no entanto que é inadmissível analogia 82 Natureza da ação penal A ação penal é de natureza pública incondicionada Predomina o entendimento jurisprudencial segundo o qual só será da competência da Justiça Federal quando forem ofendidos órgãos e instituições que preservem coletivamente os direitos trabalhistas 9 Questões especiais Pagamento de salário inferior ao mínimo legal tipifica esse crime Pode haver concurso desse delito com o de falsidade ideológica art 299 Há decisões jurisprudenciais entendendo que o pagamento dos salários dos empregados com cheque sem fundo não tipifica o crime TRF DJU 7111979 p 8331 mas sim estelionato Praticam o crime em questão a nosso juízo os donos de postos de gasolina que descontam do salário dos frentistas os cheques sem fundos recebidos de clientes 10 Competência para processar e julgar Compete à Justiça Comum processar e julgar crime de falsificação e uso de documento particular em reclamação trabalhista por não importar em prejuízo aos bens serviços ou interesses da União STJ CComp 17428SP Rel Min Fernando Gonçalves DJU 9121997 O que estabelece a competência da Justiça Federal são os crimes que afrontam o chamado sistema de órgãos e instituições preservadores coletivamente dos direitos e deveres dos trabalhadores e não o delito cometido por empregador que em tese viola mediante fraude qualquer direito trabalhista TACrimSP HC Rel Des Roberto de Almeida RT 587327 J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Delito previsto no art 203 do Código Penal praticado em detrimento de alguns ex empregados Crime contra a organização do trabalho Inexistência Competência da justiça estadual Não havendo lesão a direitos de trabalhadores coletivamente considerados ou à organização geral do trabalho não há que se falar na competência da Justiça Federal prevista no art 109 VI da CF88 Verificado que o ilícito do art 203 do Código Penal foi praticado em detrimento de alguns ex empregados deve ser declarada competente a Justiça Estadual para instrução e julgamento do feito Precedentes STJ Conflito de Competência 47966MG Rel Min Maria Thereza de Assis Moura j 2822007 Deuse ainda o crime de frustração dos direitos assegurados pela legislação trabalhista vez que além dos trabalhadores não terem sido formalmente registrados seus direitos trabalhistas não foram quitados a revelar a configuração desse tipo penal A fraude da conduta está justamente no não cumprimento da promessa ocorrida durante o ato de aliciamento de pagamento de todos os direitos trabalhistas decorrentes da relação inaugurada Conquanto o não registro do empregado quando da contratação ou início da prestação de serviços seja suficiente para a configuração do delito do art 203 CP os recorrentes mesmo após oito dias de serviço sequer efetuaram o pagamento correspondente aos dias laborados o que está a afastar assim o argumento de que não houve tempo hábil para o registro dos empregados porque o dever do empregador é justamente o de registrar seu empregado antes do início do serviço e efetuar o pagamento do devido nos termos do contrato de trabalho TRF3ª Região Apelação 200403990217519 Rel Suzana Camargo 2442006 Frustração de direito assegurado por lei trabalhista Extinção da punibilidade Pagamento do tributo Aplicação analógica da Lei n 924995 A Lei n 924995 é clara e expressa ao estabelecer o seu âmbito de eficácia vale dizer os crimes definidos na Lei n 813790 e Lei n 472965 não podendo por isso mesmo ser aplicada a delito previsto no art 203 do Código Penal Recurso desprovido STJ RHC 18010PR Rel Min Félix Fischer j 732006 Frustração de direito assegurado por lei trabalhista Recebimento de salário a menor Pagar salário a menor do que consta na anotação da carteira de trabalho configura ao menos em tese o delito de frustração de direito assegurado por lei trabalhista tipificado no art 203 do Código Penal STJ RHC 15713MG Rel Min Hamilton Carvalhido j 29112005 Sendo certo que somente em 1772000 fora publicada a Lei n 99832000 que inseriu o art 337A no CP e considerando que as omissões das remunerações pagas aos empregados fato gerador das contribuições previdenciárias se deram em 1997 período em que não havia pena cominada àquela conduta não há como condenar o réu em atenção ao princípio da reserva legal segundo o qual não pode haver crime nem pena sem lei anterior nullum crimen nulla poena sine praevia lege O crime previsto no art 203 do Código Penal se constituiu em delitomeio que restou absorvido pelo delito principal qual seja não anotar as CTPS visando a supressão de contribuição previdenciária À míngua de prova no tocante à autoria do delito art 171 do CP não há supedâneo legal para um decreto condenatório impondose a manutenção da absolvição TRF 1ª Região Apelação 200234000256636 Rel Hilton Queiroz j 2512005 Frustração de lei sobre a nacionalização do trabalho Art 204 Frustrar mediante fraude ou violência obrigação legal relativa à nacionalização do trabalho Pena detenção de 1 um mês a 1 um ano e multa além da pena correspondente à violência V arts 352 a 371 da CLT V Súmula 115 do TFR D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias A Constituição brasileira de 1937 adotou uma política nacionalista instituindo a nacionalização do trabalho proibindo que empresas nacionais contratassem mais estrangeiros do que brasileiros art 146 O mesmo princípio nacionalizador foi mantido nas Constituições de 1946 art 157 XI e 1967 com a Emenda n 169 art 165 XII A Constituição Federal de 1988 adotou nesse particular outra orientação determinando que todos brasileiros e estrangeiros residentes no País são iguais perante a lei e livres para exercer qualquer atividade profissional art 5º XIII Na mesma senda da Constituição de 1937 o Código Penal do mesmo ano tipificou como crime a frustração de lei sobre a nacionalização do trabalho desde que fosse praticado mediante fraude ou violência 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é o interesse na nacionalização do trabalho particularmente o interesse do Estado em garantir a reserva de mercado para os brasileiros em seu próprio território 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser o empregador o empregado ou qualquer pessoa independentemente da existência de relação empregatícia Embora normalmente o sujeito ativo seja o empregador o crime pode ser praticado por terceiros que com conhecimento de causa pratiquem a ação Sujeito passivo não é necessariamente uma pessoa física individual somente A ofensa pelo texto legal produzse diretamente a interesse coletivo que é bem representado pelo Estado Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 660 4 Tipo objetivo adequação típica A ação tipificada consiste em frustrar impedir iludir privar mediante violência ou fraude direito assegurado pela legislação do trabalho O meio executivo deve ser violência vis corporalis ou fraude manobra ardilosa astuciosa uso de artifício A ameaça vis compulsiva não é meio idôneo para praticar o crime A ação do agente visa frustrar obrigação legal relativa à nacionalização do trabalho isto é as normas legais que determinam o emprego de mão de obra nacional mais especificamente as leis trabalhistas Tratase também de norma penal em branco 41 Meios executórios normativos mediante fraude ou violência O Código Penal resolveu determinar as formas de conduta que são tipificadas criminalmente limitandoas em duas modalidades aquelas que forem praticadas mediante fraude ou violência Assim a frustração de obrigação legal relativa à nacionalização do trabalho que não for cometida mediante fraude ou violência embora ilegal não tipificará esse crime sendo penalmente irrelevante a Mediante fraude Mediante fraude é o primeiro modus operandi contemplado expressamente no tipo penal ora em exame Fraude é a utilização de artifício de estratagema ou ardil para vencer a vigilância da vítima em outros termos tratase de manobra enganosa para ludibriar a confiança existente em uma relação interpessoal destinada a induzir ou a manter alguém em erro com a finalidade de atingir o objetivo criminoso Na verdade a fraude não deixa de ser uma forma especial de abuso de confiança ou na feliz expressão de Guilherme Nucci é uma relação de confiança instantânea formada a partir de um ardil Não há nenhuma restrição quanto à forma meio ou espécie de fraude basta que seja idônea para desviar a atenção de quem deve vigiar o estrito cumprimento da nacionalização do trabalho Assim caracteriza meio fraudulento qualquer artimanha utilizada para provocar a desatenção ou distração da vigilância para facilitar a frustração dessa obrigação legal b Mediante violência A violência requerida pelo tipo penal é somente a vis corporalis estando afastada a violência moral grave ameaça que aliás foi intencionalmente omitida pelo legislador Sobre violência praticada contra a pessoa remetemos o leitor para os capítulos que tratam dos crimes tipificados nos arts 197 e 198 onde examinamos com vagar essa matéria 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é o dolo constituído pela vontade consciente de frustrar obrigação legal relativa à nacionalização do trabalho com emprego de violência ou fraude O eventual uso de ameaça não tipifica esse crime Não há exigência de elemento subjetivo especial do injusto Não há tampouco previsão de modalidade culposa 6 Consumação e tentativa Consumase o crime com a efetiva frustração de lei que disponha sobre a nacionalização do trabalho O momento consumativo será o descumprimento da obrigação legal relativa à nacionalização do trabalho Admitese a tentativa uma vez que é possível o fracionamento de sua execução Quando por exemplo o agente inicia a execução do crime não consegue atingir o momento consumativo por circunstâncias alheias a sua vontade 7 Penas e ação penal As penas cominadas são cumulativamente detenção de um mês a um ano e multa além da correspondente à violência Sobre a aplicação cumulativa da pena correspondente à violência vejamse as considerações que fizemos ao analisar os arts 197 e 198 nesta mesma obra Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 660 destacava que se frustrando com violência ou fraude obrigação relativa à nacionalização do trabalho art 204 o agente violar direito individual assegurado pela lei trabalhista praticará em concurso formal igualmente o crime previsto no art 203 CP art 70 CP A ação penal é de natureza pública incondicionada Exercício de atividade com infração de decisão administrativa Art 205 Exercer atividade de que está impedido por decisão administrativa Pena detenção de 3 três meses a 2 dois anos ou multa V arts 47 e 48 do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Nossos Códigos Penais do século XIX 1830 e 1890 não cuidaram do crime de exercício de atividade com infração de decisão administrativa Tratase de inovação acolhida pelo Código Penal de 1940 que a incluiu entre os crimes contra a organização do trabalho É infração penal que segundo a Exposição de Motivos ou atenta imediatamente contra o interesse público ou imediatamente ocasiona uma grave perturbação da ordem econômica item 67 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é a garantia de execução das decisões administrativas ou mais especificamente o interesse do Estado no cumprimento de suas decisões administrativas Embora o tipo penal não demonstre essa diretriz induzindo inclusive a entendimento contrário a verdade é que a decisão administrativa caracterizadora dessa infração penal será somente aquela relativa a trabalho ofício ou profissão Infração a outras decisões administrativas por certo não tipifica essa infração penal 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo é a pessoa que está impedida de exercer determinada atividade administrativa Não deixa de ser uma espécie sui generis de crime próprio embora não exija qualidade ou condição especial mas somente quem está proibido de exercer pode desobedecer tal proibição É o óbvio ululante Sujeito passivo é o Estado titular do interesse violado 4 Tipo objetivo adequação típica A ação consiste em exercer isto é desempenhar desenvolver realizar atividade Exercer ademais tem o significado de prática repetitiva de atos próprios da atividade administrativamente proibida Requer que o agente aja com habitualidade porquanto o exercício de atividade implica reiteração repetição constância Tem em outros termos a natureza de habitualidade e somente essa repetitividade é que caracteriza seu exercício donde se pode concluir que a prática isolada de uma ou outra ação de um ou outro ato executório por si só mesmo violando decisão administrativa isto é ainda que constitua ilícito administrativo não tem o condão de caracterizar a infração penal que é enriquecida como dissemos de exigências típico dogmáticas Nesse particular não foi feliz o Supremo Tribunal Federal em decisão que teve como relator o Ministro Sydney Sanches ao assumir a seguinte orientação A conduta típica prevista no art 205 por ser específica exclui a do art 282 que trata do exercício ilegal de medicina Basta um ato de desobediência à decisão administrativa para que se configure o delito em questão art 205 STF HC 748261SP Rel Min Sydney Sanches DJU 2981997 Atividade é trabalho função ofício labor não são por conseguinte somente aquelas profissões regulamentadas e aprovadas pelo Ministério do Trabalho tais como médico secretária contador advogado doméstica como entendem alguns É necessário que haja decisão administrativa impedindo seu exercício e não decisão judicial Se houver infração à decisão judicial a infração penal será outra art 330 desobediência ou art 359 desobediência a decisão judicial sobre perda ou suspensão de direito e não esta Se a desobediência for por exercer função pública ilegalmente a figura delitiva será a prevista no art 324 exercício funcional ilegalmente antecipado ou prolongado 41 Emanação de órgão administrativo competente Fazse necessário ademais que tal decisão tenha emanado de órgão administrativo legalmente competente para emitila Enfim o crime consiste em violar a decisão administrativa impeditiva do exercício da atividade Nesse sentido podese exemplificar com o acerto da seguinte decisão do TACrim de São Paulo Configura em tese o delito previsto no art 205 do CP de 1940 exercer a advocacia em reclamação trabalhista após ter a inscrição cancelada pela OAB em razão da incompatibilidade prescrita no art 84 VII da Lei n 421563 Pendendo recurso de eventual decisão administrativa precisase distinguir havendo efeito suspensivo eventual prática da atividade impedida não configura o crime contudo sendo o efeito meramente devolutivo configurada estará a infração penal 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo constitutivo do tipo subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de infringir decisão administrativa praticando a atividade que lhe fora proibida Não há exigência de elemento subjetivo especial do injusto sendo assim irrelevante a razão ou motivo pelo qual o sujeito passivo infringe a decisão administrativa que lhe veda tal prática 6 Consumação e tentativa Consumase o crime com a prática reiterada dos atos próprios da atividade que o sujeito se encontra impedido de exercer isto é consumase com o efetivo exercício da atividade que está proibido de realizar Tratase de crime habitual e por essa razão é inadmissível a tentativa pois somente a prática reiterada de conduta proibida é capaz de tipificar essa infração penal Assim atos isolados constituem um indiferente penal por não se adequarem à descrição típica 7 Pena e ação penal As penas cominadas alternativamente são detenção de três meses a dois anos ou multa A natureza da ação penal é pública incondicionada Nessa infração penal não há previsão do meio executório mediante violência por conseguinte tampouco se comina cumulativamente pena correspondente à violência Considerandose que a despeito de encontrarse no Título que trata dos Crimes contra a Organização do Trabalho essa infração penal não envolve interesse coletivo do trabalho a competência não é da Justiça Federal mas da Justiça Estadual em sentido contrário ver Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 128 J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Exercício de atividade com infração de decisão administrativa e falsificação de documento particular Competência Hipótese em que o recorrido foi denunciado pelos delitos descritos nos arts 205 e 298 do Código Penal Havendo conexão ou continência a regra geral prevista no Código de Processo Penal é a unidade de processos e julgamento perante o juízo prevalente A competência dos Juizados Especiais de previsão constitucional é absoluta STJ REsp 883863RJ Rel Min Gilson Dipp j 1942007 A conduta imputada ao paciente e pela qual foi condenado é exatamente a prevista no art 205 do Código Penal exercer atividade com infração de decisão administrativa Era competente a Justiça Federal para o processo e julgamento por se tratar de crime senão contra a organização do trabalho propriamente dita art 109 inc VI da CF ao menos em detrimento de interesses de autarquia federal como é o Conselho Regional de Medicina que impusera ao réu a proibição de exercer a profissão inc IV do mesmo art 109 da CF A conduta típica prevista no art 205 por ser específica exclui a do art 282 que trata do exercício ilegal de medicina E no caso o que houve foi o exercício da profissão já obstado anteriormente por decisão administrativa que vem a ser descumprida STF HC 74826SP Rel Min Sydney Sanches j 1131993 Aliciamento para o fim de emigração Art 206 Recrutar trabalhadores mediante fraude com o fim de leválos para território estrangeiro Pena detenção de 1 um a 3 três anos e multa Redação determinada pela Lei n 8683 de 15 de julho de 1993 D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Essa infração penal foi disciplinada pela primeira vez em nosso ordenamento jurídico pelo Código Penal de 1940 sob o nomen juris aliciamento para o fim de emigração A Lei n 8683 de 15 de julho de 1993 deu nova redação ao art 206 acrescentandolhe a exigência de fraude como elemento objetivo do tipo além de substituir o verbo aliciar por recrutar trabalhadores O Anteprojeto de Código Penal Parte Especial propõe alterações relevantes que no entanto a exemplo dos demais dispositivos optamos por não analisar em razão da variedade de projetos e anteprojetos que emperram o Congresso Nacional 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é o interesse do Estado em garantir a permanência dos trabalhadores brasileiros no Brasil ou seja manter a mão de obra no território nacional Protegese o interesse público na não emigração do trabalhador nacional partindo da presunção de que essa evasão de trabalhadores é danosa à economia nacional Essa presunção é absoluta não podendo ser elidida para afastar sua atipicidade em nenhuma circunstância 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa independentemente de qualidade ou condição especial tratandose portanto de crime comum Sujeito passivo mediato é o Estado e imediato qualquer pessoa na condição de trabalhador que seja recrutada mediante fraude Não nos parece adequado priorizar sempre o Estado em detrimento de direitos sagrados dos cidadãos por isso sempre que for possível identificar o titular do direito lesado será ele o sujeito passivo do crime como normalmente ocorre nesse tipo de infração penal embora grande parte da doutrina entenda que sujeito passivo seja apenas o Estado Nesse particular estamos mudando orientação que adotamos em nosso Código Penal comentado 4 Tipo objetivo adequação típica A ação consiste em recrutar que tem o sentido de atrair aliciar aliás este era o verbonúcleo na redação anterior seduzir pessoas para leválas a trabalhar no exterior Trabalhadores significa pluralidade isto é no mínimo três pessoas que tenham qualificação profissional O legislador utilizou o vocábulo no plural exatamente para exigir multiplicidade que em nossa concepção deve ser de no mínimo três pois quando se contenta com apenas dois declara expressamente arts 150 1º 155 4º e 157 2º II etc O grau de habilidade ou qualificação técnica dos trabalhadores é irrelevante para a tipificação do crime Por trabalhadores deve ser compreendido todos os prestadores de serviço estagiários remunerados ou não empregados autônomos trabalhadores domésticos trabalhadores eventuais etc e qualquer deles pode ser aliciado É necessário que a ação se dirija a pluralidade de pessoas que reúnam a qualidade exigida pelo tipo isto é que sejam efetivamente de trabalhadores 41 Punibilidade da emigração fraudulenta A lei pune a emigração fraudulenta enganadora do trabalhador não a espontânea A exigência da elementar mediante fraude foi introduzida pela Lei n 868393 que não existia na redação anterior Exemplo típico ocorre com o aliciamento de mulheres para trabalhar no exterior exercendo atividades dignas com altos salários quando na verdade a finalidade é exercer a prostituição O aliciamento para fim de emigração exige a elementar normativa da fraude no recrutamento Simplesmente recrutar trabalhadores com o fim de leválos para o exterior em si mesmo não é crime ainda que possa caracterizarse como ilícito em outras searas jurídicas 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo geral é o dolo representado pela vontade consciente de recrutar trabalhadores para o exterior com o uso de meio fraudulento Há necessidade de um elemento subjetivo especial do injusto constituído pelo especial fim de realizar emigração ao contrário do que pensava Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 662 Se a finalidade for levar trabalhadores em vez do exterior para outro lugar do território nacional o crime será o do art 207 que a seguir será examinado e não o deste dispositivo A ausência de tais finalidades na prática dessas condutas as torna irrelevantes para o direito penal 6 Consumação e tentativa Consumase o crime com o aliciamento de trabalhadores recrutandoos com o emprego de fraude com a finalidade de leválos para o exterior independentemente da efetiva emigração crime formal É teoricamente admissível a tentativa 7 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são detenção de um a três anos e multa A natureza da ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Crime de aliciamento para o fim de emigração Comprovação do meio fraudulento empregado pelo acusado Estelionato Caracterizado o prejuízo aos trabalhadores e a vantagem indevida auferida pelo réu Prova acusatória hábil a fundamentar um juízo de condenação Fixação da pena um pouco acima do mínimo legal para os crimes de aliciamento para o fim de emigração e estelionato em concurso material TRF3ª Região Apelação 200061100004788 Rel Ramza Tartuce j 2292003 Crime de aliciamento para o fim de emigração A lei pune o recrutamento de pessoas mediante fraude com o fim de causar a emigração de trabalhadores pouco importando se o ânimo é ou não definitivo TRF3ª Região HC 20030300007285 0 Rel Carlos Loverra j 1692003 Aliciamento de trabalhadores de um local para outro do território nacional Art 207 Aliciar trabalhadores com o fim de leválos de uma para outra localidade do território nacional Pena detenção de 1 um a 3 três anos e multa 1º Incorre na mesma pena quem recrutar trabalhadores fora da localidade de execução do trabalho dentro do território nacional mediante fraude ou cobrança de qualquer quantia do trabalhador ou ainda não assegurar condições do seu retorno ao local de origem 2º A pena é aumentada de um sexto a um terço se a vítima é menor de 18 dezoito anos idosa gestante indígena ou portadora de deficiência física ou mental 1º e 2º com redação determinada pela Lei n 9777 de 29 de dezembro de 1998 D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Os Códigos Penais do século XIX 1830 e 1890 não se preocuparam com eventual aliciamento de trabalhadores especialmente dentro do próprio território nacional O Código de 1890 criminalizava somente a conduta que aliciasse trabalhador para deixar o emprego sob a promessa de recompensa ou ameaça Assim o legislador de 1940 inovou com essa figura se houve justificativa para sua existência naquele tempo na atualidade perdeu sua razão de ser Curiosamente a Lei n 9777 de 29 de dezembro de 1998 ampliou a sanção penal e acrescentou ao artigo os 1º e 2º majorando as penas exageradamente 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é o interesse do Estado em evitar o êxodo de trabalhadores no território nacional Procurase evitar que alguma região fique despovoada em detrimento de outra Interessa ao Estado como destaca Paulo José da Costa Jr Comentários ao Código Penal p 691 evitar o êxodo de mão de obra barata proveniente de zonas desfavorecidas do País produzindo concentrações urbanas e desajustes socioeconômicos 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa independentemente de qualidade ou condição especial tratandose portanto de crime comum Sujeito passivo mediato é o Estado imediato qualquer pessoa na condição de trabalhador que seja aliciada mediante fraude na hipótese do 1º Não nos parece adequado priorizar sempre o Estado em detrimento de direitos sagrados dos cidadãos por isso sempre que for possível identificar o titular do direito lesado será ele o sujeito passivo do crime como normalmente ocorre nesse tipo de infração penal embora grande parte da doutrina entenda que sujeito passivo seja apenas o Estado Nesse particular estamos mudando a orientação que adotamos neste nosso Código Penal comentado 4 Tipo objetivo adequação típica Essa infração penal é similar àquela do artigo anterior distinguindo se somente na finalidade naquele o recrutamento tem a finalidade de propiciar a emigração neste o aliciamento é feito para deslocar os trabalhadores de um local para outro dentro do próprio território nacional A ação consiste em aliciar isto é atrair recrutar seduzir trabalhadores agora internamente Trabalhadores a exemplo da previsão do artigo anterior significa pluralidade isto é no mínimo três pessoas que tenham qualificação profissional A lei pune o êxodo aliciado não o espontâneo uma vez que este é assegurado pela Constituição direito de ir vir e ficar procura preservar essas pessoas em seus locais de origem visando o equilíbrio da geografia humana e impedir o desajuste social e econômico que o êxodo das zonas mais desfavorecidas produziria Localidade é qualquer lugarejo vila cidade ou povoado Como a expressão trabalhadores não está no singular exigese no mínimo mais de dois trabalhadores para que possa configurarse o tipo penal Para o êxodo ser penalmente relevante as localidades precisam ser consideravelmente afastadas Há entendimento jurisprudencial segundo o qual é necessária a demonstração de prejuízo efetivo para a região onde o aliciamento ocorre Se o fim é levar trabalhadores para fora do País o crime será o do art 206 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo geral é o dolo e o elemento subjetivo especial do tipo é constituído pelo especial fim de propiciar o êxodo 6 Consumação e tentativa Consumase com o aliciamento de trabalhadores independentemente do êxodo efetivo crime formal O crime de aliciamento de trabalhadores definido no art 207 do Código Penal se consuma no momento em que o agente convence o trabalhador a transferirse para outra localidade do território nacional acertando com ele as condições e os meios como isso se fará Por conseguinte os veículos de qualquer natureza utilizados para deslocarse ao lugar de destino de nenhuma forma podem ser considerados instrumentos desse ilícito ou prova de sua materialidade No momento do deslocamento o crime já estava consumado É teoricamente admissível a tentativa 7 Novo tipo penal 1º A Lei n 9777 de 29 de dezembro de 1998 acrescentou os 1º e 2º ao art 207 no primeiro cria nova figura penal no segundo uma majorante elevando a pena de um sexto a um terço O tipo descrito no 1º é um misto das infrações descritas nos arts 206 e 207 ao menos em uma de suas modalidades onde consta como meio executório mediante fraude Daquele dispositivo contém a exigência de fraude e deste o êxodo de trabalhadores limitase ao território nacional Apresenta três formas a mediante fraude b cobrança de valores do trabalhador e c não assegurar condições de retomo ao local de origem As duas primeiras modalidades são de fácil comprovação a terceira apresenta uma dificuldade dogmática prática condicional do crime A ação típica nuclear será o recrutamento de trabalhadores ou a não facilitação do retorno à origem E se o trabalho no local recrutado durar dez anos Qual será o iter criminis É de difícil configuração Nesse dispositivo não se pune a transferência de trabalhadores dentro do território nacional punese a transferência mediante aliciamento 8 Pena e ação penal As penas anteriormente cominadas cumulativamente eram detenção de dois meses a um ano e multa atualmente são detenção de um a três anos e multa Mais uma vez constatase uma exasperação absurda desproporcional e injustificada das penas cominadas Na previsão do 2º a pena deverá obrigatoriamente ser majorada entre um sexto e um terço Pela redação que é taxativa parece que houve aí uma preocupação com as minorias menor de dezoito anos idosa gestante indígena ou portadora de deficiência física ou mental É inadmissível analogia A ação penal é pública incondicionada 9 Leis n 909995 e 971498 fundamentos para exasperação penal Repetese aqui exatamente o mesmo procedimento adotado no 2º do art 203 Não só a redação é a mesma mas também o que é pior a orientação políticocriminal que há tempo estamos denunciando a política criminal despenalizadora e descarcerizadora dessas duas leis 9099 e 9714 traz em seu ventre involuntariamente o embrião da velha política criminal funcional para afastar da abrangência desses dois diplomas legais os detentores do poder exasperam as cominações penais daquelas infrações que lhes aprouverem Mais detalhes sobre esse tema podem ser encontrados em nossa obra Novas penas alternativas Tratase na verdade de um tipo penal esdrúxulo desnecessário superado e na atualidade absolutamente injustificado Nos primórdios da nossa República ou vá lá na primeira metade do século XX até se pode admitir que houvesse esse tipo de preocupação nacional Contudo na atualidade num país absolutamente povoado com tanta carência de emprego em todos os recantos sobrando mão de obra em todos os segmentos sociais essa criminalização perdeu sua razão de ser pois como destacava Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 78 a lei tem em vista a regularidade a normalidade do trabalho no país evitando que regiões mais favorecidas corram o risco do chômage enquanto outros que não oferecem as mesmas vantagens se despovoem e lutem com a falta de braços Tal fato rompe a harmonia e o equilíbrio necessários à ordem econômica e social J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Tratase de crimes de aliciamento de trabalhadores redução a condição análoga à de escravo e atentado contra a liberdade de trabalho cujo alvo não se limitava a determinado grupo de trabalhadores Inteligência dos comandos insertos no art 109 VA VI da Constituição Federal no art 10 VII da Lei n 506066 e no Título IV da Parte Especial do Código Penal Precedentes do STF e deste STJ Conflito conhecido para declarar competente o Juízo Federal de Marabá suscitado STJ Conflito de Competência 47455PA Rel Min Maria Thereza de Assis Moura j 269 2007 Tratase de crime de aliciamento de trabalhadores que eram levados de uma unidade da Federação para outra Pela denúncia narrase um sofisticado esquema de burla à organização do trabalho e à dignidade humana Inteligência dos comandos insertos no art 109 VA VI da Constituição Federal no art 10 VII da Lei n 506066 e no Título IV da Parte Especial do Código Penal Compete assim à Justiça Federal processar e julgar a ação penal em apreço STJ RHC 18242RJ Rel Min Maria Thereza de Assis Moura j 632007 O deslocamento do apelante juntamente com sua filha para outros Estados da Federação para efetuarem a divulgação de trabalho rural com promessa de ganhos bastante elevados utilizandose para tanto de carro de som caracteriza o crime de aliciamento de pessoas previsto no art 207 do Código Penal A ofensa à Organização do Trabalho relativamente ao crime do art 207 do CP está na ocupação das vagas de emprego abertas por pessoas de outras localidades A objetividade jurídica do crime de aliciamento de trabalhadores de um local para outro do território nacional está no não êxodo dos trabalhadores sendo que se consuma com o simples recrutamento ou sedução dos interessados com a finalidade de levá los para outra localidade Estado da Federação Município vila lugarejo prescindível portanto o efetivo deslocamento TRF3ª Região Apelação 200403990217519 Rel Suzana Camargo 2442006 Título V Dos Crimes contra o Sentimento Religioso e contra o Respeito aos Mortos Capítulo I Dos Crimes contra o Sentimento Religioso Ultraje a culto e impedimento ou perturbação de ato a ele relativo Art 208 Escarnecer de alguém publicamente por motivo de crença ou função religiosa impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso Pena detenção de 1 um mês a 1 um ano ou multa Parágrafo único Se há emprego de violência a pena é aumentada de um terço sem prejuízo da correspondente à violência V arts 40 e 65 do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais V art 3º d e e da Lei n 489865 abuso de autoridade V art 59 I da Lei n 600173 Estatuto do Índio D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O legislador de 1940 ao contrário de outros crimes optou por classificar em um mesmo Título os crimes contra o sentimento religioso e os crimes contra o respeito aos mortos Além de o respeito aos antepassados e aos mortos apresentar estreita ligação com as mais antigas formas de religião a Constituição brasileira de 1988 passou a garantir a liberdade de consciência e de crença sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida na forma da lei a proteção aos locais de culto e a suas liturgias art 5º VI 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é o sentimento religioso como interesse éticosocial independentemente da religião professada secundariamente protegese a liberdade de culto e de crença a exemplo do que fazia o primeiro Código Penal republicano de 1890 Essa liberdade constitui atualmente uma das garantias individuaiscoletivas asseguradas pela atual Constituição Federal 1988 art 5º VI O Estado tem interesse em proteger as religiões como instituições éticosociais que lhe são úteis e ao mesmo tempo necessárias 3 Sujeitos ativo e passivo O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa independentemente de sua crença religiosa ou qualquer outra qualidade ou condição especial Podem ser sujeito ativo desse crime inclusive pastores sacerdotes ou ministros de outras religiões como já tivemos exemplos em programas televisivos num passado recente Alguns o denominam crime vago em razão da indeterminacão do sujeito passivo pois protegeria interesses coletivos sentimento religioso e liberdade de culto sendo o sujeito passivo imediato desse crime a coletividade e mediatamente a pessoa que sofrer a ação diretamente Nesse sentido segundo Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 66970 Estes crimes violam diretamente interesses coletivos motivo pelo qual sujeito passivo deles é primariamente o corpo social Será sujeito passivo particular ou secundário qualquer pessoa física ou jurídica que sofrer a ação incriminada Outros contudo exigem a presença efetiva de alguma pessoa determinada para satisfazer a exigência da elementar alguém constante do tipo em exame o que decididamente não quer dizer um grupo indeterminado de pessoas Embora possa parecer à primeira vista uma discussão meramente acadêmica ela se justifica a partir do atual Texto Constitucional que elevou a liberdade de consciência e de crença ao nível de garantia constitucional individual 31 A orientação que adotamos Pessoalmente achamos que o sujeito passivo ora pode ser a pessoa individual primeira parte do dispositivo penal ora pode ser a coletividade ou corpo social segunda e terceira partes dependendo in concreto da figura lesiva que é praticada É incontroverso que a liberdade de consciência e de crença constitui uma garantia fundamental individual assegurada pela atual Constituição brasileira no entanto o livre exercício dos cultos religiosos individual e ao mesmo tempo coletivo e a proteção aos locais de culto e a suas liturgias são garantias constitucionais coletivas Na primeira hipótese o sujeito passivo é a pessoa de quem se zomba sacerdote ministro crente religioso etc na segunda pode ser o indivíduo impedido ou turbado em sua prática religiosa se a ação incriminada for contra ele praticada ou a coletividade quando aquela for dirigida contra o exercício coletivo de culto religioso e finalmente na terceira hipótese o sujeito passivo imediato somente pode ser a coletividade e apenas mediatamente o indivíduo Nesse particular pela clareza e precisão merece ser transcrita a orientação de Paulo José da Costa Jr Comentários ao Código Penal p 695 a qual subscrevemos integralmente Sujeito passivo no caso do ultraje é a pessoa de quem se zomba sacerdote ministro crente Ou então no caso de turbação ou vilipêndio de culto a ofendida é a coletividade religiosa atingida Resumindo a identificação do provável sujeito passivo está diretamente vinculada à conduta tipificada na primeira figura do escarnecimento sujeito passivo é a pessoa física determinada que sofre o escárnio essa ação dirigida aos crentes em geral não é adequada a essa descrição típica ao contrário do apregoado pela Exposição de Motivos na segunda isto é no impedimento ou turbação de prática ou culto religioso o sujeito passivo pode ser aquele que sofre diretamente a ação ou dependendo das circunstâncias a coletividade religiosa quando a ação for contra o exercício coletivo de culto religioso finalmente no caso de vilipêndio o sujeito passivo é a coletividade como um todo 4 Tipo objetivo adequação típica Embora o Código Penal dispense somente um artigo para o sentimento religioso prevê na verdade três crimes como se constata nas figuras que tipifica Com efeito como dissemos nas considerações preliminares o Código Penal de 1940 reuniu em um único dispositivo esses crimes aliás essa é a causa da dificuldade de apurar com segurança no plano teórico quem pode ser sujeito passivo dessas infrações penais Teria adotado melhor técnica legislativa e teria sido mais preciso e mais sistemático se tivesse por exemplo destacado o ultraje a culto religioso do impedimento ou da turbação de culto O tipo prevê três figuras distintas a escarnecer de alguém publicamente por motivo de crença ou função religiosa b impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso c vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso 41 Escárnio por motivo de religião A primeira conduta punível é escarnecer que significa zombar troçar de alguém O escárnio deve ser realizado publicamente de sorte que a conduta realizada particularmente sem que chegue ao conhecimento das pessoas em geral não é adequada ao tipo penal Não é necessário porém que o ofendido esteja presente ou que o escárnio se realize face a face no entanto deverá dirigirse a pessoa determinada e não contra grupos religiosos em geral Isso justifica a afirmação inicial que fizemos sobre o sujeito passivo imediato ser a pessoa em particular alguém Por fim o escárnio deve ser praticado por motivo de crença ou função religiosa da vítima Crença é a fé que alguém tem em determinada religião cujos postulados são aceitos e respeitados incondicionalmente Função aqui não é aquela própria do direito administrativo mas se refere à atividade exercida por padres pastores freiras ou rabinos no desempenho da missão religiosa que escolheram 42 Impedimento ou perturbação de culto religioso A segunda conduta criminalizada pela norma é impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso Impedir significa evitar que comece ou paralisar cerimônia já em andamento Perturbar por sua vez é tumultuar embaraçar ou atrapalhar culto ou cerimônia religiosa Como se trata de crime de forma livre o meio pode ser qualquer um escolhido livremente pelo sujeito ativo tais como vaias ruídos violência etc Perturba a cerimônia ou prática de culto religioso quem a tumultua desorganiza e altera seu desenvolvimento regular Cerimônia é a realização de culto religioso praticado solenemente isto é aquele praticado com certo aparato missa procissão casamento batizado etc Prática de culto religioso é o ato religioso não solene reza ensino de catecismo etc A conduta impeditiva ou turbadora deve necessariamente dirigirse contra culto ou cerimônia religiosa É irrelevante o local em que esta ou aquele se realiza ou seja se ocorre dentro ou fora do templo como por exemplo numa procissão na viasacra que normalmente os católicos celebram na Quaresma Convém destacar ademais que o culto ou cerimônia religiosa protegidos pela lei não podem atentar contra a moral e os bons costumes como magia negra macumba etc 43 Vilipêndio público de ato ou objeto obsceno Por fim a terceira modalidade de conduta é vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso Vilipendiar é aviltar menosprezar ultrajar ato ou objeto de culto religioso Essa figura penal preserva o sentimento religioso e ao mesmo tempo também a liberdade de culto aliás repetindo assegurados pela Constituição art 5º VI Também o vilipêndio pode ocorrer em local fechado dentro ou fora do templo Ato de culto religioso referido no texto legal são exatamente as cerimônias e práticas religiosas a que acabamos de nos referir objeto de culto religioso são todos aqueles que servem para a celebração desses atos tais como altar púlpito paramentos turíbulos etc Estão excluídos da tipifícacão aqueles objetos que não integram a essência do culto propriamente dito como bancos instrumentos musicais luminárias entre outros Finalmente é necessário que os objetos do culto estejam destinados ao culto pois se se encontrarem expostos à venda não tipificarão o crime 5 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo é constituído pelo dolo direto ou eventual representado pela vontade consciente de escarnecer publicamente de alguém em razão de sua religião ou função religiosa de impedir ou perturbar a realização de culto religioso ou vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso Sintetizando na primeira figura escarnecer o elemento subjetivo geral é o dolo exigido nas três figuras e o elemento subjetivo especial do tipo representado por motivo de crença ou função religiosa na segunda o elemento subjetivo resumese a impedir ou perturbar cerimônia ou culto religioso não sendo exigido nenhum elemento subjetivo especial do injusto por fim na terceira figura vilipendiar além do dolo exigese também o elemento subjetivo especial do injusto qual seja o propósito de ofender o sentimento religioso Nas figuras primeira e terceira não existindo o elemento subjetivo estará afastada a adequação típica 6 Consumação e tentativa Consumase o crime na primeira figura com o escarnecimento de pessoa determinada na forma escrita é admissível a tentativa na segunda figura consumase com o efetivo impedimento ou perturbação crime material Consumase em outros termos o crime do art 208 do CP com a perturbação da cerimônia religiosa bastando para integrar o elemento subjetivo geral das figuras penais o dolo eventual sendo irrelevante o fim visado pelo agente Teoricamente é admissível a tentativa Por fim na terceira figura o crime consumase com o efetivo vilipêndio isto é com o menosprezo de ato ou objeto de culto religioso 7 Majorante especial com violência Quando da violência empregada resultarem lesões corporais haverá a aplicação cumulativa das penas correspondentes ao crime contra o sentimento religioso e as decorrentes das lesões corporais violência O art 208 parágrafo único não criou uma espécie sui generis de concurso material mas adotou tão somente o sistema do cúmulo material de aplicação de pena a exemplo do que fez em relação ao concurso formal impróprio art 70 2ª parte Assim quando a violência empregada na prática do crime em exame constituir em si mesma outro crime havendo unidade de ação e pluralidade de crimes estaremos diante de concurso formal Impõese nesse caso por expressa determinação legal o sistema do cúmulo material de aplicação de pena independentemente da existência de desígnios autônomos A aplicação de penas mesmo sem a presença de desígnios autônomos constitui uma exceção de penas prevista para o concurso formal impróprio Mas aquela é norma genérica prevista na Parte Geral do Código Penal art 70 2ª parte esta constante do dispositivo em exame art 208 parágrafo único é norma específica contida na Parte Especial do diploma legal onde se individualizam as normas genéricas ao destinálas a cada figura delituosa No entanto a despeito de tudo o que acabamos de expor nada impede que concretamente possa ocorrer concurso material da presente infração penal com outros crimes violentos como acontece com quaisquer outras infrações desde que é claro haja pluralidade de condutas e pluralidade de crimes mas aí observese já não será mais o caso de unidade de ação ou omissão caracterizadora do concurso formal 8 Pena e ação penal As penas cominadas alternativamente são detenção de um mês a um ano ou multa Havendo violência real será majorada em um terço sem prejuízo da pena correspondente à violência a ação penal é pública incondicionada Capítulo II Dos Crimes contra o Respeito aos Mortos Impedimento ou perturbação de cerimônia funerária Art 209 Impedir ou perturbar enterro ou cerimônia funerária Pena detenção de 1 um mês a 1 um ano ou multa Parágrafo único Se há emprego de violência a pena é aumentada de um terço sem prejuízo da correspondente à violência V arts 40 e 65 do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O Código Criminal do Império de 1830 em nosso ordenamento jurídico não disciplinava essa modalidade de infração penal O primeiro Código Penal republicano de 1980 foi o primeiro a preocuparse com esse tema ao contemplar a profanação de cadáver sepulturas ou mausoléus como contravenção Segundo a Exposição de Motivos do Código Penal brasileiro de 1940 os crimes contra o respeito aos mortos têm parentesco próximo com os crimes contra o sentimento religioso o que justificaria a reunião dessas duas categorias de infrações penais num mesmo Título da Parte Especial do Código Penal 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é o sentimento de respeito aos mortos Protegese o sentimento ou na feliz expressão de Hungria Comentários ao Código Penal v 8 p 69 o que a lei penal protege não é a paz dos mortos mas o sentimento de reverência dos vivos para com eles Com efeito o sentimento de reverência e piedade para com os mortos é comum à generalidade dos povos ferilos é ferir a própria sociedade Todo ser humano normal tem consciência desse sentimento éticosocial 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo é qualquer pessoa independentemente de qualidade ou condição especial Toda pessoa natural dotada de capacidade e querer pode figurar como sujeito ativo dessa infração penal Sujeito passivo é o corpo social ou seja a coletividade Ao corpo social como um todo interessa a manutenção do respeito aos entes que já passaram A impossibilidade de o cadáver figurar como sujeito passivo reside em sua natureza de res insuscetível de dispor de algum direito cadáver é objeto e não sujeito 4 Tipo objetivo adequação típica A segunda conduta criminalizada pela norma penal contida no art 209 é impedir ou perturbar enterro ou cerimônia fúnebre Protegese na verdade o sentimento de veneração e de piedade que os mortos suscitam Impedir significa evitar que comece ou paralisar a cerimônia já em andamento Perturbar por sua vez é tumultuar embaraçar ou atrapalhar enterro ou cerimônia funerária Como se trata de crime de forma livre o meio pode ser qualquer um escolhido livremente pelo sujeito ativo tais como vaias ruídos violência etc Perturba o enterro ou a cerimônia funerária quem a tumultua desorganiza e altera seu desenvolvimento regular 41 Contra enterro ou cerimônia fúnebre A conduta impeditiva ou turbadora deve dirigirse necessariamente contra enterro ou cerimônia fúnebre É irrelevante o local onde esta ou aquele se realiza ou seja se ocorre dentro ou fora de templo de cemitério ou capela mortuária Enterro é o transporte do corpo do falecido até o local de sepultamento ou de cremação é a transladação do cadáver para sua última morada com ou sem acompanhamento Cerimônia funerária é o ato religioso ou civil de encomendação e despedida que se realiza em homenagem ao defunto Cerimônia funerária é a realização da atividade de encomendação da alma do defunto praticada solenemente isto é realizada com certo aparato com missa procissão etc em outros termos consiste nos últimos atos de homenagem e despedida que se presta ao morto 5 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo é constituído pelo dolo e pelo elemento subjetivo especial do tipo representado pelo especial fim implícito de violar o sentimento de respeito ao morto Para a configuração do crime do art 209 do CP é necessário que o agente tenha vontade e consciência de perturbar com sua conduta a cerimônia funerária Tratase certamente de crime doloso o elemento subjetivo em todo o caso pode ser eventual A necessidade do elemento subjetivo especial do injusto tem encontrado resistência particularmente na jurisprudência No entanto no plano dogmático é indispensável o propósito do agente de impedir ou perturbar a cerimônia funerária sob pena de não se configurar essa conduta típica 6 Consumação e tentativa Consumase o crime com o efetivo impedimento ou perturbação de enterro ou cerimônia fúnebre Admitese em princípio a tentativa por se tratar de crime material cujos atos executórios podem ser fracionados contra a vontade do sujeito ativo Se o resultado pretendido não for atingido apesar de terem sido utilizados meios idôneos não se poderá falar em crime consumado mas tão somente na figura tentada 7 Figura majorada Não há previsão de figura qualificada com novos limites mínimo e máximo mas somente uma majorante especial isto é quando for praticada com violência Na verdade o emprego de violência real majora a pena em um terço parágrafo único Se a violência constituir crime em si mesma haverá soma de penas Para não sermos repetitivos remetemos o leitor ao capítulo anterior em rubrica semelhante pois tudo o que lá dissemos a respeito da violência e da aplicação cumulativa de pena aplicase aqui 8 Pena e ação penal As penas cominadas alternativamente são detenção de um mês a um ano ou multa com a majoração de um terço se houver violência Se a violência constituir crime em si mesma haverá aplicação cumulativa de penas A ação penal a exemplo dos demais crimes deste capítulo é publica incondicionada Violação de sepultura Art 210 Violar ou profanar sepultura ou urna funerária Pena reclusão de 1 um a 3 três anos e multa V art 67 do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Os romanos consideravam seus mortos como divindades denominandoos deuses manes e concebiam as sepulturas como os templos desses deuses Primeiramente a violação tumular era abrangida pelos crimes privados somente no final do Império passou a ser objeto de ação pública apesar de ser punida com sanção pecuniária No direito canônico os túmulos eram considerados coisa sagrada e seus profanadores eram punidos como autores de quase sacrilégio sujeitos à pena de excomunhão Posteriormente eram entregues ao chamado braço secular para lhes serem aplicadas outras sanções A criminalização das condutas de violar ou profanar sepultura ou urna funerária somente veio a ocorrer em nosso ordenamento jurídico com o surgimento do Código Penal de J940 uma vez que as próprias Ordenações do Reino e o Código Criminal do Império 1830 não se preocuparam com essa infração penal O Código Penal de 1890 por sua vez tratou dessa infração penal como contravenção 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é o sentimento de respeito aos mortos a exemplo do que ocorre no artigo anterior Protegese igualmente o sentimento de veneração que se tem pelos que já faleceram Embora na doutrina alienígena haja quem sustente ser o bem tutelado a saúde pública Carrara Programa Criminal 3185 ou o sentimento religioso Eugênio CuelloCalón Derecho Penal Madrid 1936 p 286 a doutrina brasileira a nosso juízo acertadamente sustenta que o bem jurídico protegido é o sentimento de respeito aos mortos A defesa da religião é objeto de disciplina em outro capítulo Tampouco será a saúde pública que por sua vez encontra proteção em outro Título da Parte Especial deste Código Na verdade o bem jurídico tutelado não é a chamada paz dos mortos pois os mortos não são titulares de direito Magalhães Noronha afirmava que é um direito dos vivos que a lei protege Tal como na calúnia aos mortos art 138 2º o que aqui se tutela é o sentimento dos parentes ou amigos sobrevivos de respeito e reverência aos que partiram desta vida 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa não requerendo nenhum predicado ou condição particular Não ficam afastados nem mesmo familiares do defunto Sujeito passivo são os familiares e amigos do morto e mediatamente a coletividade a despeito de o entendimento majoritário da doutrina nacional ser no sentido inverso isto é primeiro a coletividade e secundariamente os familiares e amigos 4 Tipo objetivo adequação típica A primeira conduta típica consiste em violar isto é abrir devassar alterar o objeto material que é sepultura lugar próprio para receber cadáveres ou urna funerária recipiente onde se guardam partes do cadáver ossos ou cinzas A sepultura comum conhecida como vala ou cova pode ser violada com a remoção da terra que a cobre expondo os restos mortais as sepulturas de melhor padrão são conhecidas como túmulos que podem ser violados com sua abertura expondo igualmente o cadáver ou seus fragmentos Tratandose de urna funerária a violação darseá de qualquer forma desde que exponha os restos mortais às intempéries Profanar significa tratar com desprezo aviltamento ou irreverência profanar é ultrajar vilipendiar ou macular sepultura ou urna funerária Profana sepultura quem remove suas pedras danifica ornamentos apaga inscrições escreve palavras injuriosas ou pornográficas coloca objetos grotescos ou obscenos provocando irrisão zombaria etc Embora pareça que o legislador tratou as duas condutas como sinônimas na verdade elas não se confundem a profanação é independente da violação quem viola profana mas nem sempre quem profana viola Não é necessário para a configuração dessa infração penal que os restos mortais cadáver ossos ou cinzas sejam removidos da sepultura ou da urna mortuária O vocábulo sepultura deve ser compreendido em sentido amplo para abranger não apenas o local cova ou urna onde se deixam os restos mortais mas tudo o que integra esses locais como seus acessórios naturais À sepultura pertencem com efeito todos os objetos e ornamentos que a ela se ligam permanentemente não estando incluídas porém as coroas e flores Para a configuração do crime é necessário que haja restos humanos na sepultura ou urna 5 Tipo subjetivo adequação típica A violação de sepultura somente é punível a título de dolo sendo necessário que haja no agente a vontade consciente de violar ou profanar sepultura ou urna funerária O tipo subjetivo é composto pelo elemento subjetivo geral o dolo e o elemento subjetivo especial do tipo na modalidade de profanar que é representado pelo especial fim de ultrajar de macular sepultura ou urna funerária 6 Consumação e tentativa Consumase com a violação ou profanação efetiva sendo irrelevante que a sepultura ou urna se encontre em cemitério público ou privado Consumase enfim com qualquer ato de vandalismo sobre a sepultura ou alteração chocante de aviltamento ou de grosseira irreverência Como crime material admite a tentativa pois sua execução é passível de fracionamento Devese atentar no entanto a que frequentemente a tentativa de violação já poderá constituir a figura consumada de profanação 7 Furto em sepultura tipificacão Há duas correntes a a subtração dos dentes do cadáver configura o crime do art 211 ou mesmo o do art 210 e não o do art 155 pois cadáver é coisa fora do comércio Não pertence a ninguém RJTJSP 107461 Configurarseá o crime de furto no entanto se o cadáver pertencer a instituto científico ou peça arqueológica TJSP RT 619291 b se a finalidade era furtar a violação da sepultura é absorvida pelo crime de furto TJSP RT 595313 O furto de objetos da sepultura sem violação ou profanação tipifica o crime do art 155 8 Pena e ação penal As penas cominadas são cumulativamente reclusão de um a três anos e multa A ação penal é de natureza pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Violação de sepultura Laudo pericial Descumprimento dos preceitos do art 159 do CPP Nulidade incorrente O auto de constatação de danos equivocadamente nominado embora não tenha sido realizado por peritos oficiais ou existam informes sobre a qualificação dos mesmos alcança o seu objetivo porque o art 159 1º do CPP não exclui a possibilidade de qualquer pessoa idônea vir a desempenhar a função de perito Insurgência que não atinge os elementos intrínsecos da peça pericial Ao mais nem mesmo necessário laudo oficial para confirmar as violações na medida em que outros elementos de prova podem definir sua existência Nulidade da prova material inocorrente Irrefutáveis os aspectos concernentes à materialidade do delito a autoria recai certa sobre o apelante que foi surpreendido por testemunha ainda no local do fato e portando a ferramenta utilizada para as depredações levadas a efeito TJRS Apelação 70016957987 Rel Fabianne Breton Baisch j 1010 2007 Violação de sepultura Vilipêndio de cadáver Os acusados com intuito de realizar um trabalho ingressaram por volta da meianoite no cemitério de Passo Fundo Uma das corrés com a mãe doente havia buscado auxílio numa casa de umbanda Esta foi apanhada em sua residência em automóvel dos corréus e conduzida ao cemitério Lá chegando enquanto a beneficiada pelo trabalho segurava uma lanterna e era amparada pela corré os dois acusados removeram as lajes de uma sepultura onde havia sido há poucos dias enterrado um homem de 87 anos de idade Após abriram o caixão fizeram uma incisão no abdome do cadáver sacrificaram um cachorro e uma galinha sobre o corpo do enterrado nele introduzindo vários papéis Em seguida despejaram álcool sobre o cadáver atearam fogo e fecharam a sepultura Tudo foi acompanhado pelo acendimento de velas ao lado da sepultura e iluminação de lanterna à meianoite O alegado transe mediúnico eventualmente existente e ainda que presente em face da dimensão existencial em que se labora nos processos não é excludente de tipicidade ilicitude e nem de culpabilidade TJRS Apelação 70014529440 Rel Nereu José Giacomolli j 2262006 Homicídio qualificado ocultação de cadáver e violação de sepultura art 121 2º inc I III e IV do CP cc arts 210 e 211 ambos do mesmo diploma legal Inconfigurada a continuidade delitiva restando caracterizado o concurso material sendo os três crimes de espécies diferentes TJRS Apelação 70010563955 Rel José Antônio Cidade Pitrez j 742005 Destruição subtração ou ocultação de cadáver Art 211 Destruir subtrair ou ocultar cadáver ou parte dele Pena reclusão de 1 um a 3 três anos e multa V arts 3º a 8º e 14 da Lei n 943497 remoção de órgãos tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante e tratamento D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias A preocupação e o respeito para com os mortos são sentimentos que as civilizações têm demonstrado ao longo da história da Humanidade desde a Antiguidade Os Códigos Criminais brasileiros do século XIX 1830 e 1890 não se ocuparam desse crime A criminalização das condutas de destruir subtrair ou ocultar cadáver somente veio a ocorrer em nosso ordenamento jurídico com o advento do Código Penal de 1940 já que as próprias Ordenações do Reino que vigoraram por longo tempo no Brasilcolônia tampouco se preocupavam com essa infração penal 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é o sentimento de respeito aos mortos o sentimento de veneração que se tem pelos que já faleceram Tutelase em outros termos o sentimento dos parentes e amigos do morto e não o próprio de cujus que não é titular de direito Quanto à retirada de órgãos para fins de transplante ver Leis n 547968 e 848992 A Lei n 9434 de 4 de fevereiro de 1997 alterada pela Lei n 10211 de 23 de março de 2001 fixa normas sobre a remoção de órgãos tecidos e partes do corpo humano para fins de tratamento e de transplantes Assim essas atividades médico cirúrgicas para transplantes ou outra finalidade terapêutica dependerão de autorização do cônjuge ou parente maior de idade observandose a linha sucessória reta ou colateral até o segundo grau inclusive firmada em documento subscrito por duas testemunhas presentes à verificação da morte art 4º Após a retirada de tecidos órgãos e partes o cadáver será condignamente recomposto para ser entregue aos familiares ou seus responsáveis legais para encomendação e sepultamento A violação dos preceitos da Lei n 943497 constitui crime nos termos de seus arts 14 a 20 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa inclusive os parentes do morto não requerendo nenhuma condição particular Tratandose no entanto de crime comum é perfeitamente possível a ocorrência do instituto do concurso eventual de pessoas art 29 Sujeito passivo a exemplo dos tipos anteriores são os familiares e amigos do morto e só mediatamente a coletividade Nesse particular acreditamos que a maioria da doutrina não tem razão quando sustenta que o sujeito passivo imediato é a coletividade Na verdade a definição de quem pode ser sujeito passivo desse crime deve estar intimamente vinculada ao bem jurídico tutelado e na medida em que se admite que esse bem jurídico é o sentimento dos parentes e amigos do morto e não o próprio de cujus sujeito passivo direto só podem ser os parentes e amigos restando a coletividade secundariamente como titular passivo E por mais que se queira argumentar nenhuma coletividade por mais harmônica integrada e coesa que seja sentirá mais a perda de um de seus membros que os próprios familiares logo não é justo nem sensato que aquela e não estes seja sujeito passivo desse crime contra o respeito aos mortos 4 Tipo objetivo adequação típica São três as condutas tipificadas destruir subtrair e ocultar Destruir demolir destroçar fazer desaparecer um cadáver é fazêlo desaparecer isto é leválo a deixar de ser considerado como tal subtrair significa retirálo do local em que se encontrava sob a proteção e a vigilância de alguém É a retirada do cadáver segundo Damásio de Jesus da situação em que se encontra sob a guarda da família de amigos parentes ou empregados do cemitério mesmo que tal proteção seja exercida de forma indireta ou a distância ocultar é fazer desaparecer o cadáver de alguém sem destruílo esconder temporariamente Damásio de Jesus destaca com muita propriedade que esse crime somente pode ser executado antes de o cadáver ser sepultado pois após ter sido depositado em seu lugar definitivo o crime somente poderá ser cometido por destruição ou subtração As partes do cadáver prevê o tipo penal também podem ser objeto material No entanto como objeto material por excelência dessa infração penal é o cadáver é necessário que as partes sejam retiradas de um cadáver isto é um corpo sem vida não o configurando por conseguinte a amputação de membro de uma pessoa por exemplo que evidentemente não pode ser equiparada a cadáver 41 Objeto material do crime cadáver O objeto material é o cadáver que é o corpo humano inanimado inclusive o natimorto Não se compreendem na expressão cadáver os ossos nem as cinzas Como parte dele devem ser compreendidas não só aquelas que foram sepultadas separadamente mas também por exemplo a subtração de partes como cabeça tronco ou membros Cadáver na definição de Von Liszt é o corpo humano inanimado enquanto a conexão de suas partes não cessou de todo Cadáver na definição popular é o corpo humano sem vida embora se possa acrescentar que o é enquanto conserva a aparência humana os restos dele em completa decomposição ou mesmo suas cinzas não são parte de cadáver como os escombros de uma construção destruída ou demolida podem ser considerados como tais Cadáver por sua destinação natural não pode ser objeto de furto ou mesmo de dano por exemplo ou qualquer outro crime patrimonial pois se trata de coisa extra commercium não integrando o patrimônio de ninguém salvo quando é submetido a experiências científicas 42 O corpo do natimorto e o feto como objeto material O corpo de natimorto e o feto podem ser objeto material desse crime ou seja podem ser considerados cadáver para efeitos do previsto no art 211 ora em exame Para uma corrente o natimorto e o feto não são cadáveres por lhes faltar o elemento essencial para caracterizálos como tais vida extrauterina autônoma Para essa concepção portanto cadáver referese aos restos exânimes de alguém que tenha vivido para a segunda em sentido contrário é abrangido pela noção cadáver não apenas o natimorto como também o feto de mais de seis meses que considera desnecessária vida extrauterina autônoma finalmente para a terceira concepção somente o natimorto pode ser cadáver por considerar que o natimorto inspira o mesmo sentimento de respeito de coisa sagrada sendo tratado na vida social como defunto o que não ocorre com o feto Modernamente Luiz Regis Prado adota a segunda orientação afirmando que cadáver abarca em seu sentido tanto o natimorto quanto o feto desde que este já tenha atingido a maturidade necessária para sua expulsão Segundo doutrina e jurisprudência majoritárias o corpo do natimorto expulso do ventre materno após ter atingido a capacidade de vida extrauterina é considerado cadáver para efeito de caracterização do crime previsto no art 211 do CP Nesse sentido a jurisprudência com alguma reiteração tem entendido que no caso do feto que não atinge a maturidade necessária para sua expulsão com probabilidade de vida extrauterina por não estar a gestação acima de 180 dias seu corpo não deve ser considerado cadáver para a finalidade penal 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é o dolo constituído pela vontade consciente de destruir subtrair ou ocultar cadáver ou parte dele independentemente da finalidade que tenha animado sua conduta Logicamente a vontade consciente do agente deve abranger todos os elementos constitutivos do tipo como exige o princípio da tipicidade taxativa 6 Consumação e tentativa Consumase o crime do art 211 com a destruição do cadáver não é necessário que haja destruição total pois o próprio tipo penal se satisfaz com parte dele com a subtração isto é a retirada do corpo da esfera de vigilância ou proteção de quem de direito ou com a sua ocultação ou seja fazendoo desaparecer mesmo que temporariamente Como nas três figuras se trata de crime material é perfeitamente admissível a forma tentada bastando que a consumação não ocorra por circunstâncias alheias à vontade do agente 7 Pena e ação penal As penas cominadas são cumulativamente reclusão de um a três anos e multa A ação penal é de natureza pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Ocultação de cadáver Análise da prova produzida que torna imperativo o desate condenatório Materialidade e autoria incontroversas Confissão judicial do réu admitindo ter matado a vítima em legítima defesa e após isso ocultado seu cadáver e que restou corroborada pelo restante da prova testemunhal colhida Circunstâncias a evidenciarem o intuito do acusado de suprimir as consequências do ato face ao receio de vir a ser responsabilizado criminalmente pelo delito antecedente Irrelevância do estado emocional e da motivação do agente para a configuração do crime bastando apenas a prova do dolo genérico na conduta consistente na vontade de praticar uma das figuras típicas descritas no art 211 do CP o que no caso restou devidamente demonstrado Tese defensiva de ausência de dolo afastada TJRS Apelação 70018674010 Rel Fabianne Breton Baisch j 27 22008 O crime previsto no art 211 do Código Penal na forma ocultar é permanente Logo se encontrado o cadáver após atingida a maioridade o agente deve ser considerado imputável para todos os efeitos penais ainda que a ação de ocultar tenha sido cometida quando era menor de 18 anos Precedentes STJ REsp 900509PR Rel Min Félix Fischer j 2662007 Vilipêndio a cadáver Art 212 Vilipendiar cadáver ou suas cinzas Pena detenção de 1 um a 3 três anos e multa V art 14 da Lei n 943497 remoção de órgãos tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante e tratamento D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias A criminalização das condutas de destruir subtrair ou ocultar cadáver somente veio a ocorrer em nosso ordenamento jurídico com o advento do Código Penal de 1940 As Ordenações do Reino e o Código Criminal de 1830 não disciplinaram o crime de vilipêndio a cadáver O Código Penal de 1890 por sua vez como pioneiro em nosso sistema jurídico tipificou infração penal semelhante porém como mera contravenção penal 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é o sentimento de respeito aos mortos a exemplo do que ocorre com o dispositivo anteriormente analisado art 211 tutelase em outros termos o sentimento dos parentes e amigos do morto e não o próprio de cujus que não é titular de direito 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa inclusive os parentes do morto não requerendo nenhuma condição particular Tratandose porém de crime comum nada impede possa configurarse o instituto do concurso eventual de pessoas art 29 Sujeito passivo a exemplo dos crimes anteriores deste mesmo Capítulo são os familiares e amigos do morto e só mediatamente a coletividade Nesse particular discordamos da maioria da doutrina quando sustenta que sujeito passivo imediato é a coletividade por todos Damásio de Jesus Direito Penal v 3 p 83 Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 177 Na realidade a definição de quem pode ser sujeito passivo desse crime deve estar intimamente vinculada ao bem jurídico tutelado e na medida em que se admite que esse bem jurídico é o sentimento dos parentes e amigos do morto e não o próprio de cujus o sujeito passivo direto só podem ser os parentes e amigos restando a coletividade secundariamente como titular passivo Por mais que se queira argumentar nenhuma coletividade por mais harmônica integrada e coesa que seja sentirá mais a perda de um de seus membros que os próprios familiares não sendo portanto justo nem sensato que aquela e não estes sejam sujeito passivo desse crime 4 Tipo objetivo adequação típica A ação tipificada é vilipendiar que significa aviltar ultrajar e pode ser praticada de diversas formas v g com palavras gestos escritos etc O vilipêndio pode ser por palavras atos ou escritos Com efeito vilipendiar cadáver é ultrajálo aviltálo Tratase de ato que se pratica junto ao cadáver ou a suas cinzas e não mediante declarações em público publicações em jornais etc Objeto material é o cadáver que é o corpo humano inanimado inclusive do natimorto como afirmamos ao examinar o crime descrito no artigo anterior No entanto ao contrário da previsão deste artigo o vilipêndio a cadáver não destaca que as partes deste também são protegidas pela norma penal Tutelase o cadáver e suas cinzas isto é os menores fragmentos possíveis de um cadáver assim sendo quer nos parecer que a omissão quis significar a desnecessidade de sua repetição além de que cinzas constituem teoricamente as menores porções em que se pode fragmentar alguma coisa material como é o caso de um cadáver Acreditamos que as partes tronco membros cabeça etc de um cadáver também encontram a proteção da norma penal contida no art 212 Não seria racional sustentar que o menosprezo das cinzas de um cadáver constitui crime e a mesma conduta praticada contra membros ou órgãos dele não o seja pois como destacava Magalhães Noronha referindose a lei às cinzas humanas não precisava falar sobre a parte do cadáver protegendo aquela não pode deixar de proteger esta 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo geral é o dolo representado pela vontade consciente de menosprezar cadáver ou suas cinzas O elemento subjetivo especial do tipo é constituído pelo fim especial de aviltar de ultrajar de vilipendiar Para a configuração do crime de vilipêndio de cadáver é indispensável a presença do elemento moral do fim específico consistente no desejo consciente de desprezar o corpo sem vida da vítima com intenção clara de ultrajálo Assim por exemplo o agente que depois de atirar na vítima ausentase do local dos fatos retornando logo depois e com o pé empurra a vítima supostamente falecida para conferir se realmente está morta não pratica o crime de vilipêndio por faltar o elemento subjetivo especial que é a vontade consciente dirigida à prática da ação com o objetivo de profanar o cadáver 6 Consumação e tentativa Consumase o crime com o ato ultrajante quando material ou simplesmente com o vilipêndio verbal junto ou sobre o cadáver ou suas cinzas Dependendo da forma de execução é possível em tese a tentativa salvo quando é praticado oralmente 7 Pena e ação penal As penas cominadas são cumulativamente detenção de um a três anos e multa A ação penal é de natureza pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Homicídio qualificado e vilipêndio de cadáver art 121 2º inciso IV e art 212 ambos do CP na forma do art 29 do CP A sentença de pronúncia exige apenas prova do crime e indícios de que foram os réus os autores Manutenção da sentença que pronunciou o réu quanto ao delito de vilipêndio de cadáver pois nesta etapa processual a dúvida por mínima que seja sempre se resolve em favor da sociedade devendo ser mantido o delito conexo na decisão TJRS RESE 70019775741 Rel José Antônio Cidade Pitrez j 1392007 Concurso material havido entre o crime de homicídio culposo e o vilipêndio de cadáver vilipendiou o cadáver extirpandolhe o pênis art 121 3º e art 212 ambos do Código Penal TJRS Apelação 70017949165 Rel José Antônio Cidade Pitrez j 352007 Título VI Dos Crimes contra a Dignidade Sexual D O U T R I N A 1 Crimes contra a liberdade e a dignidade sexual 2 Alterações da Lei n 111062005 Em 2005 a Lei n 11106 de 29 de março procedeu a profundas alterações nesse Título em primeiro lugar além de outras pequenas alterações que serão examinadas suprimiu integralmente o Capítulo III que abordava os crimes de rapto arts 219 a 222 fazendoo desaparecer do nosso diploma legal Referida lei revogou também o art 217 objeto do Capítulo II que tipificava o crime de sedução atendendo no particular a antiga reivindicação de doutrina e jurisprudência Alterou por fim o Capítulo V que se denominava Do lenocínio e do tráfico de mulheres para Do lenocínio e do tráfico de pessoas ampliando consideravelmente a sua abrangência 3 Impropriedade do título Dos crimes contra os costumes A impropriedade do título Dos crimes contra os costumes já era reconhecida nos idos de 1940 pois não correspondia aos bens jurídicos que pretendia tutelar violando o princípio de que as rubricas devem expressar e identificar os bens jurídicos protegidos em seus diferentes preceitos A Reforma Penal de 1984 Lei n 720984 que se limitou à Parte Geral do Código Penal poderia ter aproveitado para corrigir essa equivocada terminologia a exemplo do que fez a reforma penal espanhola de 1989 que substituiu a expressão Delitos contra la honestidad na rubrica do Título IX do Código Penal espanhol anterior que disciplinava os crimes sexuais pela de Delitos contra la libertad sexual que foi mantida pelo atual Código Penal espanhol de 1995 Finalmente a Lei n 120152009 veio reparar essa anomalia 4 Adequação do bem jurídico tutelado A liberdade além de ser um dos bens jurídicos mais importantes da coletividade social ao lado da própria vida e da saúde e ser certamente um dos mais desrespeitados também é frequentemente utilizada como meio para atentar contra outros bens jurídicos como ocorre por exemplo em alguns crimes contra o patrimônio roubo art 157 extorsão mediante sequestro art 159 etc contra a dignidade sexual estupro violação sexual assédio sexual estupro de vulnerável etc contra a administração da justiça exercício arbitrário das próprias razões arts 345 arrebatamento de preso art 353 motim de presos art 354 etc 41 Pluralidade de bens jurídicos tutelados Junto ao bem jurídico liberdade ofendemse também outros bens jurídicos que desempenham no contexto papel mais importante na ordem sociojurídica recebendo a proteção penal mais em razão desses outros valores do que pela própria liberdade violada a qual nesses tipos penais desempenha papel secundário Indiscutivelmente em alguns crimes sexuais como nos citados exemplos do estupro e da violação sexual ao lado da liberdade individual lesamse outros bens jurídicos e o ataque à liberdade é somente como destaca Muñoz Conde Muñoz Conde Derecho Penal p 206 um meio comissivo que se valora dentro de outro crime configurando um delito complexo perdendo sua autonomia típica embora não perca sua independência substancial como bem jurídico necessitado e capaz de receber a proteção que lhe dá o Direito Penal 42 Liberdade sexual faculdade de escolha Não temos dúvida na mesma linha de raciocínio que a liberdade sexual entendida como a faculdade individual de escolher livremente não apenas o parceiro ou parceira sexual como também quando onde e como exercitála constitui um bem jurídico autônomo distinto da liberdade genérica com dignidade para receber autonomamente a proteção penal Reconhecemos a importância de existir um contexto valorativo de regras que discipline o comportamento sexual nas relações interpessoais pois estabelecerá os parâmetros de postura de liberdade de hábitos como uma espécie de cultura comportamental que reconhece a autonomia da vontade para deliberar sobre o exercício da liberdade sexual de cada um e de todos livremente 5 Moral sexual não é o bem jurídico tutelado Contudo impõe que se destaque que não é essa dita moral sexual o bem jurídico tutelado pela norma penal mas sim os específicos bens jurídicos identificados em cada tipo penal sob pena de converterse o Direito Penal em instrumento ideológico próprio da Inquisição Na verdade quando do exame in concreto dos específicos bens jurídicos de cada tipo penal deverseão adotar como parâmetro exatamente os limites contextuais desse elemento normativocultural situando no contexto de um Estado Democrático de Direito com a pluralidade que o caracteriza Na verdade esses conceitos prévios dominantes em determinado contexto social são considerados pelo legislador no momento legislativo como também pelo próprio julgador no momento de concretizar seus preceitos na hora de decidir 6 Abrangência do Título VI Além dos crimes contra a liberdade sexual o título correspondente aos Crimes contra a dignidade sexual abrange outras modalidades de crimes tais como crimes sexuais contra vulnerável Cap II lenocínio e o tráfico de pessoa Cap V e por fim o ultraje público ao pudor Cap VI Mas o exame do bem jurídico especificamente será procedido quando tratarmos individualmente cada tipo penal Menos mal que a Lei n 111062005 revogou integralmente o capítulo do crime de rapto o crime de sedução além de outras infrações penais do mesmo Título VI do Código Penal Capítulo I Dos Crimes contra a Liberdade Sexual Estupro Art 213 Constranger alguém mediante violência ou grave ameaça a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso Pena reclusão de 6 seis a 10 dez anos Caput com redação determinada pela Lei n 12015 de 7 de agosto de 2009 1º Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é menor de 18 dezoito ou maior de 14 catorze anos Pena reclusão de 8 oito a 12 doze anos 2º Se da conduta resulta morte Pena reclusão de 12 doze a 30 trinta anos 1º e 2º acrescentados pela Lei n 12015 de 7 de agosto de 2009 1 Considerações preliminares A Lei n 120152009 alterou o Título VI do Código Penal que passou a tutelar a dignidade sexual diretamente vinculada à liberdade e ao direito de escolha de parceiros suprimindo de uma vez por todas a superada terminologia crimes contra os costumes Na realidade reconhece que os crimes sexuais violentos ou fraudulentos atingem diretamente a dignidade liberdade e personalidade do ser humano 2 Rigores dos povos antigos Os povos antigos já puniam com grande severidade os crimes sexuais principalmente os violentos dentre os quais destacavase o de estupro Após a Lex Julia de adulteris 18 dC no antigo direito romano procurouse distinguir adulterius de stuprum significando o primeiro a união sexual com mulher casada e o segundo a união sexual ilícita com viúva Em sentido estrito no entanto consideravase estupro toda união sexual ilícita com mulher não casada Contudo a conjunção carnal violenta que ora se denomina estupro os romanos incluíam no conceito amplo do crimen vis com a pena de morte 3 Unificação dos crimes sexuais violentos O legislador unificou os crimes de estupro e atentado violento ao pudor Poderia ter aproveitado para substituir as expressões que identificam as figuras anteriores conjunção carnal estupro e ato libidinoso diverso de conjunção carnal por relações sexuais que é uma expressão mais abrangente capaz de englobar os dois vocábulos anteriores O vocábulo relações sexuais além da dita cópula vagínica abrange também na linguagem clássica as relações sexuais anormais tais como o coito anal ou oral o uso de instrumentos roliços ou dos dedos para a penetração no órgão sexual feminino ou a cópula vestibular em que não há penetração 4 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido a partir da redação determinada pela Lei n 120152009 é a liberdade sexual da mulher e do homem ou seja a faculdade que ambos têm de escolher livremente seus parceiros sexuais podendo recusar inclusive o próprio cônjuge se assim o desejarem Na realidade também nos crimes sexuais especialmente naqueles praticados sem o consenso da vítima o bem jurídico protegido continua sendo a liberdade individual na sua expressão mais elementar a intimidade e a privacidade que são aspectos da liberdade individual estas últimas assumem dimensão superior quando se trata da liberdade sexual atingindo sua plenitude quando se cuida da inviolabilidade carnal que deve ser respeitada inclusive pelo próprio cônjuge que a nosso juízo também pode ser sujeito ativo do crime de estupro 41 Liberdade sexual feminina Liberdade sexual da mulher significa o reconhecimento do direito de dispor livremente de suas necessidades sexuais ou voluptuárias ou seja a faculdade de comportarse no plano sexual segundo suas aspirações carnais sexuais lascivas e eróticas governada somente por sua vontade consciente tanto sobre a relação em si como relativamente à escolha de parceiros Esse realce é importante porque para o homem parece que sempre foi reconhecido esse direito Em outros termos homem e mulher têm o direito de negaremse a submeterse à prática de atos lascivos ou voluptuosos sexuais ou eróticos que não queiram realizar opondose a qualquer possível constrangimento contra quem quer que seja inclusive contra o próprio cônjuge namoradoa ou companheiro a união estável no exercício dessa liberdade podem inclusive escolher o momento a parceria o lugar ou seja onde quando como e com quem lhes interesse compartilhar seus desejos e necessidades sexuais Em síntese protegese acima de tudo a dignidade sexual individual de homem e mulher indistintamente consubstanciada na liberdade sexual e direito de escolha 42 Limitações eticamente toleráveis Admitimos como limitações possíveis somente no plano ético moral o respeito mútuo e a fidelidade que os parceiros estabelecem nas suas relações próprias de vida em comum Enfim o presente tipo penal a partir da redação determinada pela Lei n 120152009 insere se na finalidade abrangente de garantir a todo ser humano que tenha capacidade de autodeterminarse sexualmente que o faça com liberdade de escolha e vontade consciente pretendese em outros termos assegurar que a atividade sexual humana seja realizada livremente por todos 5 Sujeitos ativo e passivo 51 Sujeito ativo de estupro Sujeito ativo individualmente considerado sob a ótica da redação anterior somente podia ser o homem Nesse período já sustentávamos não haver impedimento que uma mulher pudesse ser coautora de estupro diante das previsões dos arts 22 29 e 30 in fine do CP Embora o crime de estupro fosse catalogado como crime próprio pressupondo no autor uma particular condição ou qualidade pessoal ser do sexo masculino nada havia que impedisse a mulher de ser partícipe desse delito contra a liberdade sexual Sustentávamos ainda que a mulher podia ser excepcionalmente a própria autora nesse caso mediato quando por exemplo o autor imediato executor sofresse coação irresistível de uma mulher para praticar conjunção carnal violenta Como nessa hipótese somente o coator responde pelo crime art 22 do CP o sujeito ativo do crime de estupro seria uma mulher 511 Prostituta vítima e autora de estupro Sempre defendemos por outro lado que prostituta podia ser vítima do crime de estupro ver edições anteriores de nosso Tratado de direito penal e que o marido também podia ser sujeito ativo de estupro contra a própria mulher parceira Nessa linha evidentemente a mulher a partir de agora também pode ser autora do crime de estupro contra o próprio marido quando obrigálo por exemplo à prática de atos de libidinagem contra a vontade daquele 512 Qualquer dos cônjuges pode ser autor Dito de outra forma qualquer dos cônjuges a nosso juízo pode constranger criminosamente o outro à prática de qualquer ato libidinoso incorrendo nas sanções cominadas nesse dispositivo legal Nenhum dos cônjuges tem o direito de subjugar seu consorte e submetêlo contra a vontade à prática sexual seja de que natureza for O chamado débito conjugal não assegurava ao marido o direito de estuprar sua mulher e agora viceversa ou seja tampouco assegura a esta o direito de estuprar aquele forçandoo à relação sexual contra sua vontade Garantelhes tão somente o direito de postular o término da sociedade conjugal ante eventual recusa dos préstimos conjugais Em outros termos os direitos e as obrigações de homens e mulheres são constitucionalmente iguais art 5º I da CF inclusive no plano das relações sexuais matrimoniais 52 Sujeito passivo de estupro Sujeito passivo antes do advento da Lei n 120152009 era somente a mulher virgem ou não recatada ou não inclusive cônjuge ou companheira O constrangimento ilegal empregado pelo marido para realizar a conjunção carnal à força já sustentávamos não constituía exercício regular de direito A liberdade sexual já era um direito assegurado a toda mulher independentemente de idade virgindade aspecto moral ou qualquer outra qualificaçãoadjetivação que se possa imaginar a despeito de respeitável orientação doutrinário jurisprudencial em sentido contrário No crime de estupro não se pode perquirir sobre a conduta ou honestidade pregressa da ofendida podendo dele ser sujeito passivo até mesmo a mais vil odiada ou desbragada prostituta Assim qualquer mulher pode ser vítima de estupro honesta prostituta virgem idosa etc sempre que for obrigada a prática sexual contra sua vontade 521 Homem sujeito passivo de estupro Mudou apenas no aspecto de que o homem em qualquer circunstância quando violentado também é sujeito passivo do crime de estupro a exemplo do que ocorria com o antigo crime de atentado violento ao pudor Em outros termos o crime de estupro pode ocorrer em relação hétero ou homossexual homem com homem e mulher com mulher 6 Tipo objetivo adequação típica Estupro na linguagem do Código Penal de 1940 era o constrangimento de mulher à conjunção carnal mediante violência ou grave ameaça Nesse sentido era o magistério de Magalhães Noronha in verbis Mas na lei como dissemos o estupro só é constituído pelo coito normal e dessarte é ele a conjunção sexual contra a vontade da mulher Magalhães Noronha Direito Penal 11 ed São Paulo Saraiva 1978 p 113 Conjunção carnal por sua vez é a cópula vagínica representada pela introdução do órgão genital masculino na cavidade vaginal Por essa razão não abrange o coito anal e a fellatio in ore pois como destacava Hungria o ânus e a boca não são órgãos genitais Conjunção significa união e carnal é o adjetivo que a qualifica consequentemente conjunção carnal representa a união da carne O vocábulo conjunção carnal por outro lado foi usado em vários artigos 215 217 e negativamente nos arts 214 e 216 O revogado art 215 que criminalizava a conjunção carnal com mulher mediante fraude no parágrafo único a qualificava se fosse mantida com mulher virgem que seria o defloramento mediante fraude O art 217 também já revogado criminalizava o crime de sedução protegendo a virgindade da mulher que fosse deflorada mediante conjunção carnal Em outros termos nesses dispositivos todos o legislador usou a expressão conjunção carnal com o significado de cópula vagínica por isso não se pode pretender dar outro significado à mesma expressão empregada na primeira parte do art 213 61 Um conceito abrangente de estupro Portanto as mudanças contempladas pela Lei n 120152009 reunindo os antigos crimes de estupro art 213 e atentado violento ao pudor art 214 para unificálos em um conceito mais abrangente de estupro não têm o condão de alterar o significado do vocábulo conjunção carnal que continua sendo a cópula vagínica diversa de outros atos de libidinagem Na realidade a partir desse diploma legal passamos a ter duas espécies distintas de estupro quais sejam a constranger à conjunção carnal b constranger à prática de outro ato libidinoso Essa reunião contudo de conceitos distintos conjunção carnal e atos libidinosos diversos não tem força suficiente para fundilos em uma entidade unitária superior com significado único Assim essa diversidade de sentido recomenda que se faça a análise individualizada de cada uma dessas figuras 62 Primeira modalidade constranger à conjunção carnal A ação tipificada é constranger forçar compelir obrigar alguém pessoa do sexo feminino virgem ou não menor ou maior honesta ou prostituta mediante violência vis corporalis ou grave ameaça vis compulsiva à conjunção carnal cópula vagínica É questionável na nossa ótica pelo menos que o homem não possa ser coagido ou forçado à conjunção carnal introdução do órgão genital masculino na cavidade vaginal no mínimo por razões psicológicas Esse aspecto contudo não impede que o homem possa ser vítima de constrangimento sexual praticado por mulher apenas quernos parecer essa violência feminina caracterizaria a segunda figura qual seja praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso A primeira figura constranger à conjunção carnal era a única e a totalidade da definição do crime de estupro antes do advento da Lei n 120152009 Qualquer outra forma de coito dito anormal que antes constituiria atentado violento ao pudor agora configurará somente a outra espécie de estupro a 2ª figura 621 Introdução de dedos na vagina A introdução de dedos na vagina da ofendida por exemplo não caracteriza conjunção carnal pois como afirmamos esta pressupõe a introdução do membro genital masculino na cavidade vaginal e dedos não são órgãos genitais Portanto essa prática desde que forçada pode caracterizar a segunda figura do estupro qual seja a prática de ato libidinoso diverso da conjunção carnal 622 Atos preliminares são absorvidos pela ação principal Há devese destacar as denominadas preliminares antes da conjunção carnal pelo menos na relação sexual consensual espontânea voluntária Assim os atos de libidinagem preliminares ainda que sejam diversos da conjunção carnal são por esta absorvidos integrando todos a primeira modalidade de estupro devendose interpretálos como objeto dos mesmos desígnios Podem resultar nesse contexto manchas hematosas no seio na face nas coxas ou no pescoço pois são abrangidos pelo conceito geral de praeludia coiti ou seja fazem parte da ação física do próprio crime de estupro stricto sensu por isso esses atos libidinosos não configuram crime autônomo distinto da primeira modalidade de estupro 63 Segunda modalidade constranger à prática de outro ato libidinoso Constranger tem o mesmo sentido do analisado em relação à conjunção carnal A finalidade no entanto nesta segunda figura é a prática de ato libidinoso diverso da conjunção carnal ou como refere o atual texto legal ou outro ato libidinoso para diferenciálo da conjunção carnal Esta segunda modalidade pode ser praticada de duas formas praticar ou permitir Na forma praticar é a própria vítima obrigada a realizar o ato isto é deve adotar uma posição ativa na forma permitir aquela é submetida à violência de forma passiva Em outros termos constatase que nesta segunda figura incriminase não só o fato de o autor constranger sua vítima a praticar outro ato libidinoso há a efetiva participação da vítima ainda que forçada mas também a conduta que faz a vítima permitir que com ela se pratique tal ato nesse caso a vítima tem uma participação forçada exclusivamente passiva 631 Lacuna na forma de permitir No entanto podese apontar uma pequena lacuna nesta segunda figura com efeito na forma de permitir só foi tipificada a modalidade de outro lado libidinoso consequentemente permitir a conjunção carnal a priori seria atípica Certamente haverá alguma dificuldade em sua interpretação que o tempo ajudará a resolver 632 Atos de libidinagem in genere Libidinoso é ato lascivo voluptuoso que objetiva prazer sexual aliás libidinoso é espécie do gênero atos de libidinagem que envolve também a conjunção carnal Embora a cópula vagínica também seja ato libidinoso não é juridicamente concebida como ato libidinoso diverso sendo abrangida pela primeira figura antes examinada Aliás as duas figuras conjunção carnal e ato libidinoso diverso são espécies do gênero atos de libidinagem O constrangimento ilegal objetiva a prática de atos de libidinagem qualquer das duas modalidades ou ambas isoladas conjunta ou simultaneamente A violência aliada ao dissenso da vítima duas elementares típicas uma expressa violência e outra implícita dissenso deve ser longamente demonstrada nas duas figuras típicas Por outro lado tratandose de crime de ação múltida ou de conteúdo variado não há que falar em concurso de crimes material ou formal quando praticados no mesmo contexto Superase assim aquela enorme dificuldade da jurisprudência majoritária que insistia em interpretar no mesmo contexto a configuração de concurso material de crimes 64 Modus operandi violência ou grave ameaça O termo violência empregado no texto legal significa a força física material a vis corporalis com a finalidade de vencer a resistência da vítima Essa violência pode ser produzida pela própria energia corporal do agente que no entanto poderá preferir utilizar outros meios como fogo água energia elétrica choque gases etc A violência poderá ser imediata quando empregada diretamente contra o próprio ofendido e mediata quando utilizada contra terceiro ou coisa a que a vítima esteja diretamente vinculada Não é necessário que a força empregada seja irresistível basta que seja idônea para coagir a vítima a permitir que o sujeito ativo realize seu intento Grave ameaça constitui forma típica da violência moral é a vis compulsiva que exerce uma força intimidativa inibitória anulando ou minando a vontade e o querer da ofendida procurando assim inviabilizar eventual resistência da vítima Na verdade a ameaça também pode perturbar escravizar ou violentar a vontade da pessoa como a violência material A violência moral pode materializarse em gestos palavras atos escritos ou qualquer outro meio simbólico Caracteriza o tipo somente a ameaça grave isto é aquela ameaça que efetivamente imponha medo receio temor na vítima e que lhe seja de capital importância opondose à sua liberdade de querer e de agir 641 Grave ameaça violência moral Grave ameaça deve consistir em intimidação na ameaça de um mal grave e sério capaz de impor medo à vítima O desvalor da ação nesses casos é juridicamente superior tanto que a violência é presumida Ademais o desvalor do resultado é o mesmo do crime praticado com violência real O mal prometido a título de ameaça além de futuro e imediato deve ser determinado sabendo o agente o que quer impor O mal deve ser a determinado pois sendo indefinível e vago não terá grandes efeitos coativos b verossímil ou seja que se possa realizar e não fruto de mera fanfarronice ou bravata c iminente isto é suspenso sobre o ofendido nem em passado nem em futuro longínquo quando respectivamente não teria força coatora ou esta seria destituída do vigor necessário d inevitável pois caso contrário se o ofendido puder evitálo não se intimidará e dependente via de regra da vontade do agente já que se depende da de outrem perderá muito de sua inevitabilidade Enfim esses são os requisitos que em tese a ameaça de mal ou dano graves deve apresentar 642 Irrelevância da injustiça do mal prometido Ao contrário do que ocorre com o crime de ameaça no crime de estupro não é necessário que o mal prometido seja injusto sendo suficiente que injusta seja a pretensão ou a forma de obtêla A injustiça do mal não se encerra em si mesma mas deverá relacionarse ao fim pretendido e à forma de conseguilo O mal pode ser justo mas o fundamento que leva o agente a prometêlo ou o método utilizado podem não sêlo É irrelevante enfim que a ameaça para obter os favores sexuais seja justa ou legal Sua finalidade especial constranger à conjunção carnal é que determina sua natureza ilícita transformandoa não apenas em ilegal mas também em penalmente típica Segundo Hungria o agente não pode prevalecerse dessa condição para obter a posse sexual da vítima contra a sua vontade Nélson Hungria Comentários ao Código Penal 5 ed Rio de Janeiro Forense 1981 v 8 p 122 643 Dissenso da vítima nível de resistência do ofendido A conjunção carnal praticada mediante violência ou grave ameaça tipifica o crime capitulado no art 213 do Código Penal primeira parte sendo irrelevante a virgindade da vítima ou mesmo tratarse de mulher casada solteira ou viúva ou até mesmo prostituta A configuração do crime repousa na supressão do poder força ou capacidade de resistência da mulher de defenderse ou de oporse à prática do ato sexual A ordem jurídica não pode exigir de ninguém a capacidade de praticar atos heróicos Também aqui vigem os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade recomendandose concretamente a avaliação da correlação de forças especialmente a superioridade de forças do agente Assim não é necessário que se esgote toda a capacidade de resistência da vítima a ponto de colocar em risco a própria vida para reconhecer a violência ou grave ameaça 7 Importunação ofensiva ao pudor e o princípio da proporcionalidade A partir da Lei dos Crimes Hediondos que elevou a pena de estupro e atentado violento ao pudor para seis a dez anos de reclusão em que pese alguma divergência passar as mãos nas coxas nas nádegas ou nos seios da vítima ou mesmo um abraço forçado configuram a nosso juízo a contravenção penal do art 61 da lei especial quando praticados em lugar público ou acessível ao público Atos de pouca importância ainda que ofensivos ao pudor não podem ser classificados como estupro ou tentativa de estupro adequando à tipificação dessa contravenção 71 Desproporcionalidade dos respectivos desvalores Com efeito a diferença do desvalor da ação que há no sexo anal e oral e suas variáveis praticados com violência e nos demais atos libidinosos menos graves é incomensurável Se naqueles a gravidade da sanção cominada mínimo de seis anos de reclusão pode ser considerada razoável o mesmo não ocorre com os demais atos que confrontados com a gravidade da sanção referida beiram as raias da insignificância Nesses casos quando ocorrem em lugar público ou acessível ao público devem ser desclassificados para a contravenção penal do art 61 LCP 8 Beijo lascivo e regiões pudendas Beijo lascivo que nunca soubemos exatamente o que é os tradicionais amassos toques nas regiões pudendas apalpadelas sempre integraram segundo superada orientação jurisprudencial os chamados atos libidinosos diversos de conjunção carnal No entanto a partir da Lei dos Crimes Hediondos repetindo que elevou a pena mínima para seis anos de reclusão faltalhes a danosidade proporcional que se encontra no sexo anal ou oral violentos sendo impossível equiparálos Em outros termos diante da gravidade da sanção cominada mínimo de seis anos de reclusão e a desproporcional gravidade dos demais atos libidinosos supramencionados resta evidente que não lesam o bem jurídico protegido pela norma penal constante do art 213 ora sub examen Devem quando praticados em público ser desclassificados para a contravenção penal da importunação ofensiva ao pudor art 61 9 Estupro qualificado pelo resultado lesão grave ou morte da vítima Os parágrafos do art 213 dispõem se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é menor de 18 dezoito ou maior de 14 catorze anos a pena é de reclusão de 8 oito a 12 doze anos 1º se da conduta resulta morte a reclusão é de 12 doze a 30 trinta anos 2º Nas duas qualificadoras decorrentes da violência o maior desvalor do resultado lesão grave ou morte da vítima é real e não presumido O desvalor da ação já está valorado na cominação do caput do artigo sub examen abrangendo inclusive as modalidades qualificadas As duas hipóteses relativas à violência elencadas no dispositivo em exame caracterizam condições de exasperação da punibilidade em decorrência da efetiva maior gravidade do resultado Comparando o texto legal com outras previsões semelhantes do Código Penal v g arts 157 3º e 158 2º e 3º se da violência resulta lesão corporal grave ou se resulta morte constatase que pela técnica legislativa empregada pretendeu o legislador criar duas figuras de crimes qualificados pelo resultado para alguns crimes preterdolosos para outros 91 Tratamento semelhante à lesão seguida de morte A exemplo do que ocorre com a lesão corporal seguida de morte art 129 3º esta a morte em princípio deve decorrer de culpa Com efeito normalmente o resultado mais grave lesão ou morte é produto de culpa e não meio de execução do crime que complementaria a conhecida figura do crime preterdoloso dolo no antecedente e culpa no consequente como a doutrina gosta de definir Terseia assim o crime sexual estupro praticado dolosamente com violência elementar típica acrescido de um resultado mais grave decorrente de culpa a lesão grave ou a morte da vítima Essa pelo menos é a estrutura clássica do crime preterdoloso A regra repetindo é que nesses crimes o resultado agravador seja sempre produto de culpa Contudo nas hipóteses em apreço a extrema gravidade das sanções cominadas máximos de doze e trinta anos respectivamente levanos a admitir a possibilidade indistintamente de o resultado agravador lesão grave ou morte poder decorrer tanto de culpa quanto de dolo para evitarmos uma situação paradoxal Sintetizando é indiferente que o resultado mais grave seja voluntário ou involuntário segundo o texto legal justificandose a agravação da punibilidade desde que esse resultado não seja produto de caso fortuito ou força maior ou seja desde que decorra pelo menos de culpa 92 Resultado doloso não há concurso de crimes Com efeito se o agente houver querido dolo direto ou assumido dolo eventual o risco da produção do resultado mais grave as previsões desses parágrafos não deveriam teoricamente ser aplicadas Haveria nessa hipótese concurso material de crimes ou formal impróprio dependendo das circunstâncias o de natureza sexual caput e o resultante da violência lesão grave ou morte Curiosamente no entanto se houver esse concurso de crimes dolosos a soma das penas poderá resultar menor do que as das figuras qualificadas decorrente da desarmonia do sistema criada pelas reformas penais ad hoc Por essas razões isto é para evitar esse provável paradoxo sugerimos que as qualificadoras constantes dos 1º e 2º devem ser aplicadas mesmo que o resultado mais grave decorra de dolo do agente Parecenos que essa é a interpretação mais recomendada nas circunstâncias observandose o princípio da razoabilidade 93 Abrangência da lesão corporal grave A locução lesão corporal de natureza grave deve ser interpretada em sentido amplo para abranger tanto as lesões graves art 129 1º quanto as gravíssimas art 129 2º É indispensável evidentemente que a gravidade da lesão seja comprovada mediante perícia No entanto a lesão corporal de natureza leve art 129 caput é absorvida pela previsão do caput do art 213 subsumindose na elementar normativa violência ou grave ameaça 94 Estupro e morte da vítima equiparação equivocada Como já referimos a severidade das penas cominadas não se harmoniza com crime preterdoloso Procurando minimizar a inocuidade congênita da estrutura tipológica em apreço sustentamos a possibilidade de o resultado morte ser produto de dolo culpa ou preterdolo indiferentemente Tudo o que dissemos sobre o estupro qualificado pelas lesões corporais graves aplicase ao estupro com morte da vítima Toda sanção agravada em razão de determinada consequência do fato somente pode ser aplicada ao agente se este houver dado causa pelo menos culposamente Com o estupro não é diferente aplicandose integralmente o consagrado princípio nulla poena sine culpa e rechaçandose completamente a responsabilidade penal objetiva No entanto não se pode silenciar diante de um erro crasso do legislador que equiparou dolo e culpa pelo menos quanto às consequências nesse caso específico Na verdade o evento morte no crime de estupro tanto pode decorrer de dolo de culpa ou de preterdolo e atribuirselhe a mesma sanção com a gravidade que lhe é cominada doze a trinta anos de reclusão agride o bom senso e fere a sistemática do ordenamento jurídico brasileiro Este nos crimes culposos releva o desvalor do resultado destacando fundamentalmente o desvalor da ação v g no homicídio doloso 6 a 20 anos e no culposo 1 a 3 anos 10 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo do crime de estupro é o dolo constituído na primeira modalidade pela vontade consciente de constranger a vítima contra a sua vontade à conjunção carnal na segunda modalidade pela mesma vontade consciente de constrangêla à prática de outro ato libidinoso diverso da conjunção carnal ou de permitir que com ela se pratique Em outros termos o dolo como elemento subjetivo geral requer sempre a presença de dois elementos constitutivos quais sejam um cognitivo consciência e outro volitivo vontade A consciência como elemento do dolo deve ser atual isto é deve existir no momento da ação quando ela está acontecendo ao contrário da consciência da ilicitude elemento da culpabilidade que pode ser potencial Além desse elemento intelectual é indispensável ainda o elemento volitivo sem o qual não se pode falar em dolo direto ou eventual Dito de outra forma a vontade deve abranger igualmente a ação constranger o resultado execução efetiva os meios violência ou grave ameaça e o nexo causal relação de causa e efeito Por isso quando o processo intelectualvolitivo não atinge um dos componentes da ação descrita na lei o dolo não se aperfeiçoa isto é não se completa 101 Fim de satisfazer a própria lascívia desnecessidade Enfim é possível que o dolo que como vimos esgotase com a consciência e a vontade de constranger alguém à prática de ato de libidinagem esteja presente e ainda assim não se complete o tipo subjetivo que no crime de estupro exige um elemento subjetivo especial como fim da ação Com efeito a despeito da divergência doutrináriojurisprudencial é necessário o elemento subjetivo especial do injusto ou seja o especial fim de constranger a vítima homem ou mulher à prática de ato de libidinagem sob pena de não se configurar esse crime Contudo é desnecessária a finalidade de satisfazer a própria lascívia para caracterizar o crime que existe por exemplo no crime descrito no art 218A 11 Consumação do crime de estupro O crime de estupro na modalidade constranger à conjunção carnal consumase desde que haja introdução completa ou incompleta do órgão genital masculino na vagina da vítima mesmo que não tenha havido rompimento da membrana himenal quando existente consumase enfim com a cópula vagínica sendo desnecessária a ejaculação Na modalidade praticar ou permitir a prática de outro ato libidinoso consumase o crime com a efetiva realização ou execução de ato libidinoso diverso de conjunção carnal o momento consumativo dessa modalidade coincide com a prática do ato libidinoso 12 Admissibilidade da tentativa Doutrinariamente é admissível a tentativa embora a dificuldade prática de sua constatação Caracterizase o crime de estupro na forma tentada quando o agente iniciando a execução é interrompido pela reação eficaz da vítima mesmo que não tenha chegado a haver contatos íntimos No estupro como crime complexo que é a primeira ação violência ou grave ameaça constitui início de execução porque está dentro do próprio tipo como sua elementar Assim para a ocorrência da tentativa basta que o agente tenha ameaçado gravemente a vítima com o fim inequívoco de constrangêla à conjunção carnal 13 Classificação doutrinária Tratase de crime comum não exige qualquer qualidade ou condição especial do sujeito ativo que agora tanto pode ser homem como também mulher indistintamente material crime que causa transformação no mundo exterior deixando vestígios doloso não há previsão de modalidade culposa de forma livre pode ser praticado por qualquer forma ou meio eleito pelo sujeito ativo comissivo o verbo nuclear implica a prática de uma ação instantâneo a consumação não se alonga no tempo configurandose em momento determinado unissubjetivo pode ser cometido por uma única pessoa plurissubsistente a conduta pode ser desdobrada em vários atos dependendo do caso 14 Pena e ação penal A pena cominada para o caput do art 213 é isoladamente reclusão de seis a dez anos Decorrendo da conduta lesão corporal de natureza grave a pena será reclusão de oito a doze anos 1º Tratandose de vítima menor de dezoito e maior de quatorze anos a pena será igualmente de oito a doze anos 1º in fine decorrendo da conduta do agente a morte da vítima a reclusão será de doze a trinta anos 2º Nessa hipótese o limite máximo foi elevado em cinco anos em relação à lei anterior No particular por ser mais grave essa cominação é irretroativa 141 Aplicação de majorantes especiais Há ainda as majorantes especiais contidas no art 226 de quarta parte na hipótese do inciso I pelo concurso de pessoas e de metade se o agente enquadrase em umas das hipóteses relacionadas no inciso II Por outro lado em razão da revogação expressa dos arts 223 e 224 resulta inaplicável a majoração de metade da pena aplicada determinada pelo art 9º da Lei dos Crimes Hediondos além da previsão especial do estupro de vulnerável art 217A que comina pena mais grave tutelando as mesmas vítimas relacionadas no art 224 Ademais eliminase a fastidiosa discussão sobre um possível bis in idem que consumiu algumas resmas de papel 142 Natureza da ação penal A natureza da ação penal por fim relativa aos crimes constantes dos Capítulos I e II do Título VI é tratada quando analisamos o disposto no art 225 cujo conteúdo tem a finalidade de disciplinar exatamente esse tema Pela complexidade que assumiu a partir da Lei n 120152009 concentramos seu exame nesse dispositivo para onde remetemos o leitor Art 214 Revogado pela Lei n 12015 de 782009 Violação sexual mediante fraude Art 215 Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima Pena reclusão de 2 dois a 6 seis anos Parágrafo único Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica aplicase também multa Caput e parágrafo único com redação determinada pela Lei n 12015 de 7 de agosto de 2009 D O U T R I N A 1 Considerações preliminares Com as alterações introduzidas a Lei n 120152009 a exemplo da nova definição do crime de estupro que unificou estupro e atentado violento ao pudor reúne posse sexual mediante fraude art 215 e atentado ao pudor mediante fraude art 216 em uma única figura delituosa sob o nomen juris de violação sexual mediante fraude com duas modalidades de condutas quais sejam ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém Essa nova definição consagra um crime de ação múltipla ou de conteúdo variado isto é ainda que o agente pratique as duas condutas comete apenas um crime não se podendo falar em concurso de crimes num mesmo contexto fático O conceito de mulher honesta evolui na mesma proporção que evoluem os padrões éticomorais adotados pela comunidade social no entanto ao longo de mais de seis décadas causou muitos constrangimentos à mulher brasileira Com efeito antes do advento da Lei n 111062005 exigiase que a vítima fosse mulher honesta para a configuração da figura típica o que implicava um juízo de valor elemento normativo do tipo que deveria obedecer aos padrões éticosociais vigentes na comunidade e revelados pelos costumes Em boa hora essa excrescência rançosamente discriminatória foi extirpada do nosso ordenamento jurídicopenal pelo referido diploma legal Tal evolução enfim completase com a Lei n 120152009 transformando a posse sexual mediante fraude em crime comum cujos sujeitos ativos e passivos não exigem nenhuma qualidade ou condição especial podendo figurar qualquer pessoa tanto no polo ativo como no polo passivo Em outros termos eliminase a tutela penal específica à mulher e à virgindade dandose tratamento igualitário a homens e mulheres como recomenda o Estado Democrático de Direito 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é a liberdade sexual de homem e mulher que têm sua vontade viciada em decorrência do emprego de fraude pelo sujeito ativo ou seja é a inviolabilidade carnal da pessoa humana homem ou mulher protegendoa dos atos fraudulentos com os quais se vicia o consentimento para praticar ato de libidinagem em qualquer de suas modalidades conjunção carnal ou outro ato libidinoso Essa fraude ou outro meio similar induz a vítima a erro quanto àao parceirao da relação sexual A partir da redação determinada pela Lei n 120152009 o bem jurídico considerado como a liberdade sexual da mulher e do homem ficou muito mais patente ou seja a faculdade que ambos têm de escolher livremente seus parceiros sexuais Na realidade também nos crimes sexuais especialmente naqueles praticados sem o consenso da vítima o bem jurídico protegido continua sendo a liberdade individual na sua expressão mais elementar a intimidade e a privacidade que são aspectos da liberdade individual a intimidade e a privacidade assumem dimensão superior quando se trata da liberdade sexual atingindo sua plenitude quando se trata da inviolabilidade carnal Protegese genericamente a dignidade sexual individual de homem e mulher indistintamente consubstanciada na liberdade sexual e direito de escolha Em outros termos o presente tipo penal inserese na finalidade abrangente de garantir a todo ser humano que tenha capacidade de autodeterminarse sexualmente que o faça com liberdade de escolha e vontade consciente 3 Sujeito ativo Sujeito ativo a partir de sua definição como crime comum pode ser qualquer pessoa homem ou mulher independentemente de qualidade ou condição especial inclusive os denominados transexuais como sempre reconheceu a velha doutrina desde a entrada em vigor do Código Penal em 1942 a exemplo do que ocorria com o crime de atentado violento ao pudor art 214 revogado Contrariando aquela música celebrizada por Tim Maia segundo a qual só não era permitido homem com homem e mulher com mulher agora em tese vale tudo isto é a violação sexual mediante fraude pode ocorrer entre pessoas do mesmo sexo ou em outros termos podem figurar nos polos ativos e passivos homens e mulheres em relações homo e heterossexuais No particular contudo essa concepção não pode retroagir para atingir fatos praticados por mulher antes da vigência da Lei n 120152009 como também fatos tendo como sujeito passivo pessoa do sexo masculino eram condutas atípicas Com efeito a utilização pela redação anterior dos termos conjunção carnal e mulher como sujeito passivo limitava a admissão somente do homem como sujeito ativo ressalvada a hipótese de participação nos termos do art 29 4 Sujeito passivo Sujeito passivo igualmente pode ser qualquer pessoa independentemente de gênero qualidade ou condição especial logicamente a partir da vigência da Lei n 120152009 Fatos anteriores somente podem ter como sujeito passivo a mulher sendo inadmissível questionarse sua honestidade moral sexual ética etc Tratandose no entanto de vítima com idade inferior a quatorze anos menor de quatorze o crime será o de estupro de vulnerável art 217A Essa menoridade com pequena diferença não maior de quatorze anos antes da vigência desse diploma legal configurava estupro com violência presumida art 213 cc o art 224 a 5 Tipo objetivo adequação típica Tratandose de crime de ação múltipla com dois verbos ter e praticar com seus respectivos complementos impõese que se faça análise individualizada de cada modalidade possível dessa infração penal particularizando as peculiaridades de cada conduta para melhor compreensão do significado e da abrangência pretendidos pelo novo diploma legal 51 Ter conjunção carnal com alguém A nova redação substituiu a locução ter conjunção carnal com mulher que era específica admitia somente a mulher como sujeito passivo por uma redação genérica mais abrangente possibilitando com o pronome indefinido alguém que homem também possa ser sujeito passivo desse crime Conjunção carnal repetindo é a cópula vagínica que exige a figuração de homem e mulher na relação sexual fraudulenta ou não agora podendo figurar indistintamente um e outra tanto no polo passivo como no ativo embora afiguresenos impossível a prática de conjunção carnal entre mulheres resultando da relação lésbica a nosso juízo a configuração da prática de outro ato libidinoso diverso de conjunção carnal Com efeito ter manter praticar conjunção carnal que é a introdução repetindo do órgão genital masculino na cavidade vaginal exige a participação de homem e mulher embora o texto legal refirase a alguém as relações de outra natureza são identificadas em nosso sistema jurídico como ato libidinoso diverso de conjunção carnal 511 Necessidade típica vítima ludibriada É indispensável que a vítima tenha sido ludibriada iludida e não que se tenha entregue à prática libidinosa por rogos carícias ou na expectativa de obter alguma vantagem do agente Assim não há como considerar ludibriada fraudada ou enganada a mulher que empresta seu corpo para satisfazer desejos sexuais de alguém na expectativa de receber em troca bens materiais ou simplesmente para a própria satisfação dos mesmos instintos que impulsionam o suposto ofensor Na mesma linha pode configurar violação sexual mediante fraude a prática de atos libidinosos com paciente durante o atendimento médico desde que sua motivação subjetiva desviese da finalidade médica Com efeito a prática por médico ginecologista de toques desnecessários com o objetivo de satisfazer sua lascívia caracteriza a presente infração penal 512 Mulher honesta discriminação superada Antes do advento da Lei n 111062005 exigiase que a vítima fosse mulher honesta para a configuração da figura típica o que implicava um juízo de valor elemento normativo do tipo que deveria obedecer aos padrões éticosociais vigentes na comunidade e revelados pelos costumes Em boa hora essa excrescência rançosamente discriminatória foi extirpada do nosso ordenamento jurídicopenal pelo referido diploma legal O elemento normativo honesta adjetivador do sujeito passivo mulher nos crimes sexuais finalmente suprimido do Código Penal representa acreditamos um problema superado em nosso direito positivo A honestidade da mulher passou a ser irrelevante nesses crimes sexuais Com efeito esse elemento normativo ante a evolução dos costumes caracterizava uma boa demonstração da violação da reserva legal por meio do uso exagerado de fórmulas genéricas ou de qualquer forma que dependam exclusivamente de juízos de valor Por razões semelhantes é irrelevante que se trate de mulher virgem ou não menor ou maior honesta ou prostituta ao contrário do que previa originalmente o mesmo dispositivo na versão do legislador de 1940 embora sob outra rubrica 52 Praticar outro ato libidinoso com alguém Na linguagem do legislador de 1940 CP em sua redação original nas definições de atentado ao pudor v g arts 214 216 utilizavase ato libidinoso diverso da conjunção carnal para distinguilo desta última Em realidade não se pode ignorar que ato libidinoso é gênero do qual conjunção carnal é uma de suas espécies ou seja a conjunção carnal também é ato libidinoso embora distinto dos demais Razão pela qual preferíamos a terminologia anterior que deixava clara essa distinção embora nos curvemos à preferência do texto legal para facilitarmos a compreensão do leitor Essa segunda conduta tipificada pela redação da Lei n 120152009 consiste em o agente homem ou mulher praticar outro ato libidinoso com alguém homem ou mulher mediante fraude Nessa hipótese o sujeito ativo pratica executa realiza mantém com a vítima masculina ou feminina ato libidinoso diverso de conjunção carnal fraudulentamente Essa modalidade de conduta ao contrário da primeira ter conjunção carnal admite homem com homem e mulher com mulher sem nenhuma dificuldade linguísticodogmática Em outros termos a mulher pode ser sujeito ativo do crime de violação sexual mediante fraude tendo como vítima tanto homem quanto mulher que convenhamos tratase de grande inovação na seara dos direitos e liberdade sexuais Embora possa parecer excessiva liberalidade do legislador com a homossexualidade representa em verdade a constatação de uma realidade que quando consentida inserese no contexto da normalidade da moral contemporânea mas quando forçada ou fraudada constitui uma das formas mais graves de violação da liberdade sexual individual 521 Semelhança atentado ao pudor mediante fraude A descrição da segunda conduta apresenta redação semelhante à prevista no art 216 ora revogado que disciplinava o crime de atentado ao pudor mediante fraude Nesse dispositivo revogado no entanto o agente induzia o ofendido a agir praticando ou submetendo se à prática de ato libidinoso diverso da conjunção carnal Constatase que pela redação revogada a vítima tinha uma atitude eminentemente ativa e participativa na execução da conduta incriminada o sujeito ativo limitavase a induzir mediante fraude o ofendido a praticar ou submeterse à prática de ato libidinoso diverso da conjunção carnal Em outros termos o sujeito ativo não praticava atos de libidinagem com a vítima apenas a induzia a praticálo ou submeterse à sua prática com quem quer que seja 522 Desígnios autônomos Perdeu importância o animus do sujeito ativo uma vez que se visava a conjunção carnal apenas tipificaria a primeira conduta do mesmo tipo penal e não outra infração penal como ocorria anteriormente posse sexual mediante fraude Na verdade a fraude constitui vício do consentimento da vítima seria mutatis mutandis o dolo sob o ângulo dos vícios de consentimento no campo do direito civil O emprego de violência afasta a fraude Não se pode falar em violação sexual mediante fraude quando há violência ainda que presumida pela idade dao ofendidao 53 Meios ou formas de execução das modalidades de violação sexual 531 Mediante fraude Mediante fraude é o meio ou forma de execução das duas espécies de condutas ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso ou seja manter cópula vagínica ou praticar outro ato libidinoso fraudulentamente o que não deixa de ser um tanto surrealista A fraude é o engodo o ardil o artifício que leva ao engano A fraude deve constituir meio idôneo para enganar o ofendido homem ou mulher dependendo das demais circunstâncias sobre a identidade pessoal do agente ou sobre a legitimidade da conjunção carnal ou do ato libidinoso diverso preferíamos essa expressão que identificava com maior clareza sua distinção com a conjunção carnal Contudo a fraude não pode anular a capacidade de entendimento ou mesmo de resistência da vítima Nessa linha exemplifica Rogério Sanches Cunha in verbis A fraude utilizada na execução do crime não pode anular a capacidade de resistência da vítima caso em que estará configurado o delito de estupro de vulnerável art 217A do CP Rogério Sanches Cunha Comentários à Reforma Criminal de 2009 p 43 5311 Idoneidade da fraude indispensabilidade Contudo a fraude deve constituir meio idôneo para enganar o ofendido que se encontra de boafé sobre a identidade pessoal do agente ou sobre a legitimidade da relação carnal Em outros termos a vítima precisa ser enganada pelo agente sob pena de não se configurar a fraude havendo dúvida a menor que seja há previsão e quem prevê e consente assume no mínimo os riscos das consequências descaracterizando a entrega mediante ardil É irrelevante repetindo a honestidade da vítima ao contrário do que prescrevia o Código Penal em sua redação original A fraude nessa infração penal não se confunde com as branda verba os allectamenta as dolosae promissiones da sedução mas exige mais que isso vale dizer o engano do ofendido homem ou mulher sobre a identidade pessoal do agente ou sobre a legitimidade da conjunção carnal a que se presta Já afirmávamos ante a redação anterior que a relação sexual obtida com promessa de casamento ou como prova de virgindade não tipifica esse crime A doutrina refere como exemplos possíveis do crime o fato de o agente simular celebração de casamento a substituição de uma pessoa por outra hipóteses de casamento por procuração etc 5312 Estelionato sexual difícil caracterização A violação sexual mediante fraude também conhecida na terminologia anterior posse sexual como estelionato sexual é de difícil caracterização pois não é qualquer meio enganoso que serve de suporte a essa entidade criminal Necessita para se configurar que a vítima seja levada a situação de erro ou nela seja mantida quanto à identidade do sujeito ativo ou mesmo quanto à legitimidade do ato sexual É preciso o emprego de artifícios e estratagemas criando uma situação de fato ou uma disposição de circunstâncias que torne insuperável o erro do ofendido 532 Outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação da vontade da vítima Por fim o tipo penal prevê uma forma genérica analógica de as condutas serem praticadas além da fraude que acabamos de examinar outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação da vontade da vítima Incluiríamos aqui um exemplo de Nucci para quem haveria estupro sem contato físico na segunda modalidade prevista Exemplifica Nucci A modificação trazida no tipo penal do estupro elimina a exigência do contato físico para a sua configuração Afinal mencionase a conjunção carnal esta sim física ou outro ato libidinoso Ora ato de satisfação da libido ou desejo sexual pode ser variado Exemplificando se alguém mediante ameaça com arma de fogo obriga a vítima a se despir em sua frente o que lhe confere prazer sexual naturalmente está cometendo estupro consumado Guilherme de Souza Nucci Crimes contra a Dignidade Sexual p 22 Venia concessa não se pode ir tão longe com penas cominadas de seis a dez anos de reclusão admitindo a simples contemplação lasciva como configuradora do crime de estupro de qualquer espécie Com efeito nesse constrangimento exemplificado por Nucci não há a prática de ato libidinoso diverso de conjunção carnal não passando de contemplação lasciva pessoal mediante grave ameaça Na realidade essa contemplação ainda que forçada não podia ser admitida como hipótese de atentado violento ao pudor como era definida essa segunda modalidade de estupro O máximo que poderíamos conceber seria examinar in concreto a possibilidade de adequarse à parte alternativa do disposto no art 215 Embora nos pareça mais adequado ante a ausência de previsão legal específica e na impossibilidade de adequarse ao contemplado no art 227 que o agente respondesse pelo crime de constrangimento ilegal com penas majoradas art 146 e 1º e 2º Convenhamos parecenos insustentável defender a possibilidade da prática do crime de estupro sem haver sequer qualquer contato físico com a vítima Certamente não é essa a mens legis contida no referido dispositivo legal 5321 Previsão analógica similitude ao paradigma Por outro lado não se deve descuidar do aspecto de que essa previsão genérica ou analógica ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima deve assemelharse à fraude isto é deve ser meio que tenha a mesma capacidade de ludibriar a vítima desde que não chegue ao extremo de inviabilizar a sua livre manifestação de vontade Nesse sentido a lúcida manifestação de Rogério Sanches in verbis a fraude utilizada na execução do crime não pode anular a capacidade de resistência da vítima caso em que estará configurado o delito de estupro de vulnerável art 217A do CP Rogério Sanches Cunha in Comentários à Reforma Criminal de 2009 p 43 Estamos de pleno acordo com esse entendimento no entanto não é isso que reza o texto legal ou seja admite outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima Ora meio que impeça a livre manifestação de vontade significa vontade inexistente e esta não se confunde com vontade viciada ou fraudada Alguém sem vontade livre com vontade suprimida ou inexistente não reage não pode oferecer resistência e ser possuídoa sem poder oferecer resistência configura estupro e sendo menor de quatorze anos é vulnerável art 217A 1º Por isso recomendase muita cautela no exame dessa elementar que não pode chegar ao ponto de impedir a livre manifestação da vítima 5322 Mulher desonesta erro de tipo e erro de proibição Se o agente conhecedor da má fama de determinada mulher estiver convencido de que em razão disso não é proibido pregarlhe uma peça para assim possuíla sexualmente incorrerá em duplo erro penal de tipo e de proibição Seria erro de tipo por imaginar que a existência de determinada característica pessoal desonestidade da mulher afasta a tipicidade penal e erro de proibição por acreditar que com tais características não lhe era proibido tal conduta Podese discutir tão somente a escusabilidade ou inescusabilidade do erro Teoricamente somente para argumentar poderseá sustentar ao menos por algum tempo essa possibilidade dogmática de erro penal restando tão somente como mencionamos o questionamento de sua escusabilidade ou inescusabilidade de tal erro 6 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo do crime de violação sexual mediante fraude é o dolo constituído pela vontade consciente de ter conjunção carnal com a vítima ou praticar outro ato libidinoso diverso da conjunção carnal ou de permitir que com ela se pratique fraudulentamente ou seja com o emprego de fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a sua livre manifestação de vontade 61 Elemento intelectual do dolo A consciência como elemento do dolo deve ser atual isto é deve existir no momento em que a ação está acontecendo ao contrário da consciência da ilicitude elemento da culpabilidade que pode ser apenas potencial Na verdade não basta que a consciência elemento intelectual do dolo seja meramente potencial como ocorre na culpabilidade Essa distinção justificase porque o agente deve ter plena consciência no momento da ação daquilo que quer praticar conjunção carnal ou outro ato libidinoso com alguém mediante fraude Assim o agente deve ter não apenas consciência de que pratica uma relação sexual fraudulenta mas além disso deve estar consciente também que ludibria a vontade da vítima mediante engodo bem como das consequências de sua ação e dos meios que utiliza para executála 62 Elemento volitivo Além do elemento intelectual é indispensável ainda o elemento volitivo sem o qual não se pode falar em dolo direto ou eventual Em outras palavras a vontade deve abranger igualmente a ação a prática de conjunção carnal ou outro ato libidinoso o resultado execução efetiva da ação proibida os meios fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima e o nexo causal relação de causa e efeito Por isso quando o processo intelectual volitivo não atinge um dos componentes da ação descrita na lei o dolo não se aperfeiçoa isto é não se completa Na realidade o dolo somente se configura com a presença simultânea da consciência e da vontade de todos os elementos constitutivos do tipo penal Com efeito quando o processo intelectual volitivo não abrange qualquer dos requisitos da ação descrita na lei o dolo não se completa e sem dolo não há crime pois não há previsão da modalidade culposa 63 Elemento subjetivo especial do injusto crime de tendência É possível que o dolo esteja presente e ainda assim não se complete o tipo subjetivo posto que o crime de violação sexual mediante fraude exige um elemento subjetivo especial implícito como finalidade da ação Na realidade o especial fim ou motivo de agir embora amplie o aspecto subjetivo do tipo não integra o dolo nem com ele se confunde uma vez que como vimos o dolo esgotase com a consciência e a vontade de realizar a ação com a finalidade de obter o resultado delituoso ou na assunção do risco de produzilo O especial fim de agir que integra determinadas definições de delitos condiciona ou fundamenta a ilicitude do fato constituindo assim elemento subjetivo especial do tipo de ilícito de forma autônoma e independente do dolo A denominação correta por isso é elemento subjetivo especial do tipo ou elemento subjetivo especial do injusto que se equivalem porque pertencem simultaneamente à ilicitude e ao tipo que a ela corresponde A ausência desses elementos subjetivos especiais descaracteriza o tipo subjetivo independentemente da presença do dolo Por outro lado enquanto o dolo deve materializarse no fato típico os elementos subjetivos especiais do tipo especificam o dolo sem necessidade de se concretizarem sendo suficiente que existam no psiquismo do autor 631 Crimes de tendência Com efeito na violação sexual mediante fraude é necessário o elemento subjetivo especial do injusto ou seja o especial fim de possuir sexualmente a vítima homem ou mulher ludibriandoa sob pena de não se configurar essa infração penal Esse crime inserese naquela tipologia que Welzel denominava crimes de tendência Nos delitos de tendência a ação encontrase envolvida por determinado ânimo cuja ausência impossibilita a sua concepção não é a vontade do autor que determina o caráter lesivo do acontecer externo mas outros extratos específicos inclusive inconscientes Neles não se exige a persecução de um resultado ulterior ao previsto no tipo senão que o autor confira à ação típica um sentido ou tendência subjetivo não expresso no tipo mas deduzível da natureza do delito ex o propósito de ofender arts 138 139 140 CP propósito de ultrajar art 212 CP Luiz Regis Prado e Cezar Roberto Bitencourt Elementos de Direito Penal São Paulo Revista dos Tribunais 1995 v 1 p 88 A ação em tais crimes deve expressar uma tendência subjetiva do agente indispensável para compreender os crimes sexuais No magistério de Welzel a tendência especial de ação sobretudo se trata aqui da tendência voluptuosa nos delitos de lascívia Ação lasciva é exclusivamente a lesão objetiva do pudor levada a efeito com tendência subjetiva voluptuosa Welzel Derecho Penal Alemán p 115 Referidos crimes são chamados também de crimes de tendência intensificada nos quais o tipo requer o ânimo ou tendência de realizar a própria conduta típica sem transcendêla como ocorre nos delitos de intenção 7 Consumação da violação fraudulenta Consumase a violação sexual mediante fraude na sua primeira figura ter conjunção carnal com a introdução do pênis na vagina da vítima ainda que parcialmente independentemente de ejaculação a consumação do crime não necessita que a conjunção carnal seja completada basta como se percebe que seja iniciada Consumase por sua vez a segunda figura com a prática de ato libidinoso diverso da conjunção carnal O momento consumativo coincide com a prática do ato libidinoso 71 Admissibilidade da tentativa Admitese a tentativa quando por qualquer razão estranha à vontade do agente não consegue consumar seu intento como por exemplo induz a vítima em erro em razão da fraude mas não consegue ou é impedido de consumar o crime ou seja de praticar propriamente o ato de libidinagem Em outros termos o ato executório é fracionável e pode ocorrer a sua interrupção quando por exemplo a vítima apercebese do engano antes que o ato seja praticado 8 Classificação doutrinária Tratase de crime comum não se exige do sujeito ativo qualquer qualidade ou condição material crime que produz resultado através da prática de conjunção carnal de forma vinculada somente pode ser praticado por meio fraudulento ou similar comissivo induzir implica necessariamente ação ativa instantâneo cujo resultado se dá de forma instantânea não se alongando no tempo de dano consumase somente com a efetiva lesão a um bem jurídico tutelado unissubjetivo que pode ser praticado por um só agente plurissubsistente a conduta em tese é composta de uma pluralidade de atos 9 Pena e ação penal A pena cominada é isoladamente de reclusão de dois a seis anos Na linha exasperadora das sanções penais adotada pelo legislador contemporâneo a pena cominada teve duplicado seus limites mínimo e máximo injustificadamente Como novidade foi prevista a pena de multa se o crime for cometido com o fim de obter vantagem econômica a despeito de ser bastante improvável essa finalidade nesse tipo de infração penal Na nossa ótica essa previsão é absolutamente equivocada e inócua além de deslocada pois dificilmente esse tipo de infração penal terá motivação econômica Na realidade tal previsão deveria constar da nova redação do art 218 que contempla o uso de menor de quatorze anos para satisfazer a lascívia de outrem Nesse tipo penal a motivação do agente invariavelmente é a obtenção de lucro Desafortunadamente o parágrafo único que consagrava essa possibilidade foi equivocadamente vetado Com efeito vetado deveria ter sido o parágrafo único deste art 215 Para compensar as qualificadoras da virgindade e menoridade entre 18 e 14 anos foram suprimidas desse tipo penal Essas antigas qualificadoras quais sejam tratarse de vítima virgem ou menor de dezoito anos e maior de quatorze que foram abolidas pelo atual diploma legal não devem ser consideradas na dosagem de pena pois por determinação legal foram excluídas do ordenamento jurídico em sentido contrário manifestase Rogério Sanches Cunha in Luiz Flávio Gomes Rogério Sanches Cunha e Valério de Oliveira Mazzuoli Comentários à Reforma Criminal de 2009 São Paulo Revista dos Tribunais 2009 p 43 Essa revogação expressa desautoriza sua valoração na dosimetria penal pois agravaria a situação do infrator sine legis Na hipótese de o sujeito ativo ser ascendente padrasto madrasta irmão cônjuge etc a pena aplicada será majorada de metade art 226 II A natureza da ação penal será estudada quando examinarmos o disposto no art 225 A natureza da ação penal por fim relativa aos crimes constantes dos Capítulos I e II do Título VI é tratada quando analisamos o disposto no art 225 cujo conteúdo tem a finalidade de disciplinar exatamente esse tema Pela complexidade que assumiu a partir da Lei n 120152009 concentramos seu exame nesse dispositivo para onde remetemos o leitor Art 216 Revogado pela Lei n 12015 de 782009 Assédio sexual Art 216A Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual prevalecendose o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego cargo ou função Pena detenção de 1 um a 2 dois anos Artigo acrescentado pela Lei n 10224 de 15 de maio de 2001 Parágrafo único Vetado 2º A pena é aumentada em até 13 um terço se a vítima é menor de 18 dezoito anos 2º acrescentado pela Lei n 12015 de 7 de agosto de 2009 D O U T R I N A 1 Considerações preliminares Com a edição da Lei n 120152009 perdese uma grande oportunidade para corrigir a construção tipológica do moderno crime de assédio sexual conforme acerba crítica que fizemos desde sua entrada em vigor É indispensável que se defina o objeto da conduta nuclear representada pelo verbo constranger conforme análise que faremos adiante Preocupouse o legislador como sempre exclusivamente com a elevação da punição ao infrator criando uma majorante especial com o aumento de até um terço da pena se a vítima for menor de dezoito anos No mais mantemos nossa análise crítica nos termos a seguir Não questionamos a relevância dos bens jurídicos tutelados liberdade sexual indiscriminação nas relações trabalhistas honra e dignidade pessoais merecedores sob todos os aspectos de proteção jurídica Discutimos na verdade a necessidade pertinência e utilidade da criminalização desse tipo de comportamento que jurídica e eticamente censurável já encontra suficiente proteção em nosso ordenamento jurídico nos setores civil trabalhista administrativo inclusive na área criminal por meio de algumas figuras delitivas tais como constrangimento ilegal art 146 ameaça art 147 violação sexual mediante fraude art 215 importunação ofensiva ao pudor art 61 da LCP perturbação da tranquilidade art 65 da LCP de lege ferenda ainda poderia receber melhor tratamento na seara do direito trabalhista para a iniciativa privada e do direito administrativo para o âmbito do setor público 11 Princípio da intervenção mínima O princípio da intervenção mínima orienta e limita o poder incriminador do Estado preconizando que a criminalização de uma conduta só se legitima se constituir meio necessário para a proteção de determinado bem jurídico Se outras formas de sanção ou outros meios de controle social revelaremse suficientes para a tutela desse bem sua criminalização é inadequada e não recomendável Se para o restabelecimento da ordem jurídica violada forem suficientes medidas civis ou administrativas são estas que devem ser empregadas e não as penais Por isso o direito penal deve ser a ultima ratio isto é deve atuar somente quando os demais ramos do direito revelaremse incapazes de dar a tutela devida a bens relevantes na vida do indivíduo e da própria sociedade Como preconizava Maurach Na seleção dos recursos próprios do Estado o Direito Penal deve representar a ultima ratio legis encontrarse em último lugar e entrar somente quando resulta indispensável para a manutenção da ordem jurídica Resumindo enfim antes de recorrer ao direito penal devemse esgotar todos os meios extrapenais de controle social No entanto os legisladores contemporâneos tanto de primeiro como de terceiro mundo têm abusado da criminalização e da penalização em franca contradição com o princípio em exame levando ao descrédito não apenas o direito penal mas também a sanção criminal que acaba perdendo a força intimidativa diante da inflação legislativa reinante nos ordenamentos positivos A criminalização do assédio sexual inserese nesse contexto além de provavelmente vir a fundamentar muitas denunciações caluniosas especialmente nas demissões sem justa causa 12 Assédio sexual significado jurídico A popularização do famigerado assédio sexual que passou a ter um sentido técnicojurídico específico e bem delimitado constrangimento indevido de subordinado com o intuito de obter favores sexuais traz em seu bojo um grande desserviço à sociedade brasileira vulgarizando a violência sexual popularmente os crimes sexuais graves estupro e atentado violento ao pudor já estão sendo noticiados pela grande mídia como simples assédios sexuais Essa confusão ocorre porque os donos da verdade formadores de opinião que têm a convicção de saber e conhecer tudo confundem todos os crimes sexuais com a novel infração que está descrita assim Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual prevalecendose o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego cargo ou função art 216A do CP com redação determinada pela Lei n 10224 de 1552001 2 Bem jurídico tutelado Na tipificação do crime de assédio sexual a proteção penal estende se para além da liberdade sexual abrangendo com efeito outros bens jurídicos que embora não tenham a mesma relevância elevam no contexto a importância e de certa forma fundamentam na ótica do legislador a necessidade da proteção penal desse aspecto da liberdade sexual Assim bens jurídicos protegidos são 1 a liberdade sexual de homem e mulher indiferentemente ao contrário do que ocorre com o crime de estupro por exemplo que protege exclusivamente esse direito de pessoa do sexo feminino 2 a honra e a dignidade sexuais são igualmente protegidas por esse dispositivo e por fim 3 a dignidade das relações trabalhistafuncionais também assumem a condição de bem jurídico penalmente protegido por esse novo dispositivo legal A importância da liberdade sexual justifica sua proteção penal pois integra a própria honra pessoal que é valor imaterial insuscetível de apreciação valoração ou mensuração de qualquer natureza O respeito à liberdade sexual é um corolário da dignidade e personalidade humanas e tem caráter absoluto É irrelevante o eventual desvalor que o próprio indivíduo ou a sociedade lhe possam atribuir em determinadas circunstâncias ou que possa parecer inútil nociva ou renunciada porque por exemplo optouse por uma vida devassa e libertina por se ter entregue à prostituição por exemplo representando para a sociedade elemento negativo ou perturbador Não se pode esquecer aliás que a prostituta também pode ser vítima do crime de estupro art 213 na medida em que sua opção pela prostituição não a obriga submeterse contra a sua vontade à prática de todo e qualquer ato libidinoso com todo e qualquer indivíduo e em quaisquer circunstâncias Por honra e dignidade sexuais entendemos o respeito que cada indivíduo homem e mulher merece da coletividade como ente social em geral concebendoo digno e honrado quanto a esse aspecto de sua personalidade de outro lado em particular é o direito que o indivíduo tem de conceber definir desenvolver e exercer respeitados os limites da moralidade pública sua atividade sexual honradamente 3 Sujeito ativo do assédio sexual Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa homem ou mulher em relações hetero ou homossexuais Com a expressão alguém o tipo penal admite que o constrangimento possa ser praticado por sujeito ativo do mesmo sexo da vítima desde que apresente a elementar relativa à hierarquia funcional ou ascendência O inverso não é verdadeiro isto é o subordinado ou subalterno não pode ser sujeito ativo do crime de assédio sexual faltalhe a condição especial exigida pelo tipo que emoldura um crime próprio A ausência do vínculo laboral ou funcional entre assediante e assediado torna a conduta atípica pelo menos em relação a essa novel infração penal 4 Sujeito passivo do assédio sexual Igualmente à evidência sujeito passivo também pode ser do mesmo sexo do sujeito ativo desde que se encontre na condição subalterna exigida pelo tipo penal A inexistência de vínculo de subordinação entre vítima e sujeito ativo afasta a tipicidade da conduta Na hipótese de a vítima desfrutar de posição semelhante ou superior ao sujeito ativo a mesma conduta de constranger não configura assédio sexual em outros termos não há crime de assédio sexual entre colegas de trabalho estudo ou lazer Coautoria e participação em sentido estrito são perfeitamente possíveis inclusive entre homens e mulheres em qualquer dos polos ativo ou passivo A própria autoria mediata não pode ser afastada quando por exemplo o sujeito ativo que tem o domínio do fato utilizase de terceiro para obter por meio do constrangimento vantagem ou favorecimento sexual Nessa hipótese devemse observar evidentemente os postulados do domínio final do fato e da autoria mediata conforme demonstramos em nosso Manual de direito penal Assim a condição especial exigida pelo tipo penal deve residir no autor mediato e não no autor direto que é mero executor É enfim irrelevante o gênero a que pertence a vítima masculino ou feminino como também o é em relação ao sujeito ativo 5 Tipo objetivo adequação típica Tratandose do crime de assédio sexual seria natural esperar que a conduta de eventual agente desse crime fosse representada pelo verbo assediar que no idioma pátrio tem o significado de perseguir com insistência No entanto o legislador preferiu como fez no passado nas hipóteses dos crimes de estupro e atentado violento ao pudor arts 213 e 214 utilizar como verbo nuclear constranger na verdade constranger alguém exatamente a mesma locução utilizada no crime de atentado violento ao pudor Diferentemente no entanto nas tipificações anteriores o verbo nuclear recebe os respectivos complementos verbais constranger mulher à conjunção carnal estupro e constranger alguém a praticar ato libidinoso ambas agora na nova modalidade de estupro O núcleo do tipo com efeito é constranger que nos crimes de estupro art 213 e atentado violento ao pudor art 214 é utilizado com o significado de obrigar forçar compelir coagir alguém a fazer ou não fazer alguma coisa Mas nessas duas hipóteses estamos diante de um verbo duplamente transitivo exigindo complemento objeto direto e indireto que a redação do novel artigo não apresenta 51 Dificuldade interpretativa equivocada construção frasal A construção frasal do novo tipo penal com efeito causa certa perplexidade uma vez que nos obriga a identificar a desinência desse verbo e qual ou quais os complementos que está a exigir Se tiver o mesmo sentido daquele empregado nos outros dois crimes a que acabamos de nos referir onde estaria a dupla complementação verbal objeto direto e objeto indireto Constranger quem a quê A primeira pergunta encontra resposta no texto proposto alguém mas resta a segunda pergunta constranger a quê Essa indagação não tem resposta gramatical no texto legislado pois com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual constitui o especial fim de agir e não o complemento verbal exigido pelo verbo duplamente transitivo A afirmação de que no crime de assédio sexual não há que se tipificar nenhuma conduta da vítima e ela não precisa fazer nada depois do constrangimento para a configuração do delito não responde a essas indagações A desnecessidade de a vítima fazer ou deixar de fazer qualquer coisa com o que acordamos para configurar o assédio sexual não elimina a imperatividade de o verbo transitivo constranger receber adequadamente seus complementos verbais Na verdade a exigência dos complementos verbais e a desnecessidade de a vítima praticar qualquer ato são coisas absolutamente diversas e uma não afasta a outra na medida em que não são excludentes 52 Solução da dificuldade linguística Com efeito a solução dessa dificuldade linguística deve ser encontrada na interpretação do verdadeiro sentido emprestado ao verbo constranger na definição dessa nova infração penal Para começar devese reconhecer que seu sentido ou significado não é o mesmo daquele utilizado nos crimes de estupro e atentado violento ao pudor obrigar forçar compelir coagir caso contrário a oração estaria incompleta faltarlheia um complemento verbal Essa nossa concepção é favorecida pela própria estrutura do texto que não coloca entre vírgulas o elemento subjetivo especial do tipo com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual como normalmente ocorre nessas construções tipológicas Na verdade essa construção gramatical nos obriga a interpretar o verbo constranger com o sentido de embaraçar acanhar criar uma situação ou posição constrangedora para a vítima que lhe dá segundo a definição clássica a conceituação de crime formal Por fim como o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual não precisa realizarse para a consumação do crime é suficiente a ação de constranger que nesse tipo penal não exige a efetiva prática de atos voluptuosos bastando que sejam o móvel da ação 53 Crime de ação livre Não foi previsto qualquer meio ou modo para a execução do tipo penal que por isso mesmo tem forma livre isto é pode ser praticado por qualquer meio ou forma desde que sejam suficientes para criar um estado de constrangimento à vítima não se afastando inclusive o uso não obrigatório da violência ou grave ameaça à pessoa Essa referência ao emprego de violência no assédio sexual rendeunos a velada crítica de Rogério Sanches Cunha nos seguintes termos Apesar de Cezar Bitencourt admitir a violência ou grave ameaça como meios de execução do crime prevalece que não pode o agente valerse de tais comportamentos executivos hipóteses configuradoras de delito de estupro art 213 Luiz Flávio Gomes Rogério Sanches Cunha e Valério de Oliveira Mazzuoli Comentários à Reforma Criminal de 2009 p 46 Na realidade apenas para aclarar não defendemos o emprego de violência como um dos meios de execução do assédio sexual admitimos apenas a possibilidade de uma conduta mais contundente do assediador sustentando adiante item 57 que a grave ameaça que é uma espécie de violência crime do art 147 é absorvida pelo crime de assédio sexual Vias de fato que é outra espécie de violência não constitui crime mera contravenção salvo na injúria aviltante art 140 2º Aliás falando de violência na injúria real tivemos oportunidade de afirmar Na verdade a violência como elementar da injúria real não se confunde com lesão corporal caso contrário o legislador têloia dito como o fez em relação às vias de fato É possível empregar violência isto é força física gestos abruptos exercendoos injuriosamente isto é desrespeitosamente sem contudo tipificar lesões corporais Cezar Roberto Bitencourt Tratado de Direito Penal crimes contra a pessoa 9 ed São Paulo Saraiva 2009 v 2 p 332 Ademais o definitivo na definição da conduta incriminada centra se no elemento subjetivo orientador do comportamento do agente No estupro seu elemento subjetivo é o dolo constituído pela vontade consciente de constranger a vítima contra a sua vontade à prática de conjunção carnal ou outro ato libidinoso na nova concepção no assédio sexual por sua vez o elemento subjetivo é o dolo constituído pela vontade livre e consciente de assediar sexualmente a vítima simplesmente e não de possuíla à força isto é não de constrangêla à prática de atos de libidinagem que seria o estupro na versão atual 54 Taxatividade da tipicidade Contudo não se pode perder de vista o princípio da tipicidade taxativa ou seja estrita que não admite em nenhuma norma incriminadora interpretação aberta abrangente ampla ou mesmo extensiva Por isso não admitimos que o simples causar embaraço seja suficiente para tipificar o crime de assédio sexual pois o mero desconforto ou embaraço não tem a força necessária para atingir a intensidade da gravidade requerida pelo verbo constranger que no entanto repetindo nesse novo tipo penal não tem o sentido de obrigar forçar coagir Assediar sexualmente ou melhor constranger implica importunação séria grave ofensiva chantagista ou ameaçadora a alguém subordinado na medida em que o dispositivo legal não dispensa a existência e infringência de uma relação de hierarquia ou ascendência Simples gracejos meros galanteios ou paqueras não têm idoneidade para caracterizar a ação de constranger Nesse sentido contamos com a companhia de Luiz Flávio Gomes que lucidamente afirma É preciso bom senso para distinguir o constrangimento criminoso do simples flert do gracejo da paquera Nem toda abordagem é assédio Luiz Flávio Gomes et al Comentários à Reforma Criminal de 2009 Em outros termos para ser erigido à condição de crime é necessário que o assédio sexual crie uma situação embaraçosa constrangedora ou de chantagem para a vítima que mesmo não o aceitando isto é não correspondendo às investidas de seu algoz sintase efetivamente em risco na iminência ou probabilidade de sofrer grave dano ou prejuízo de natureza funcional ou trabalhista 55 Dano ou prejuízo à vítima Esse dano ou prejuízo que a vítima assediada ou constrangida tem medo ou receio de sofrer não se limita à possibilidade de desemprego demissão ou redução de sua remuneração eventuais empecilhos discriminações ou dificuldades de qualquer natureza para a progressão na carreira no emprego cargo ou função também podem configurar meio forma ou modo do constrangimento sofrido pela vítima Convém destacar que o assédio criminoso aperfeiçoase independentemente de a vítima assediada constrangida e assustada praticar qualquer conduta exigida querida ou esperada pelo sujeito ativo A ocorrência de eventual contato físico ato libidinoso absolutamente desnecessário pode configurar crime mais grave dependendo da natureza do ato e do meio utilizado ou representar simplesmente o exaurimento do crime de assédio 56 Desnecessidade da prática de atos libidinosos Já afirmamos que para a configuração do crime de assédio sexual é absolutamente desnecessária a prática de qualquer ato libidinoso entre autor e vítima e se ocorrer representará em tese somente o exaurimento da infração penal Tipificase o crime de assédio sexual com a simples ação de constranger que ante a omissão legislativa pode ser praticada de forma livre desde que seja orientada pelo objetivo especial de obter vantagem ou qualquer tipo de proveito de natureza sexual que exista o vínculo hierárquico ou de ascendência e que o agente se prevaleça dessa relação A tipificação ademais não exige o emprego de violência ou grave ameaça ao contrário do que ocorre nos crimes de estupro e atentado violento ao pudor Bastam o temor reverencial e a insistência constrangedora do sujeito ativo deixando subliminarmente demonstrado que eventual recusa poderá produzir prejuízo profissional ou funcional àao recusante Contudo devese acautelar se com as sensibilidades exageradas daquelas pessoas fantasiadoras ou excessivamente inventivas que podem criar mentalmente situações inexistentes 57 Prática de ameaça grave excesso retórico Se o constrangimento nos termos previstos no art 216A ocorrer por meio de ameaça de mal injusto e grave poderá segundo Luiz Flávio Gomes configurar concurso material de crimes Temos dificuldade dogmaticamente falando em aceitar essa concepção a despeito da autoridade de seu autor Com efeito não se pode perder de vista que o assédio sexual por definição legal é crime de forma livre como já demonstramos Essa liberdade de ação permite embora não seja necessário que o constrangimento contido no tipo penal em exame apresentese sob a forma de ameaça inclusive de mal injusto e grave Por outro lado não se pode ignorar o caráter subsidiário do crime de ameaça Aliás referindonos à natureza subsidiária desse crime tivemos oportunidade de afirmar Tratase efetivamente de um crime tipicamente subsidiário se a ameaça deixa de ser um fim em si mesmo já não se configura um crime autônomo passando a constituir elemento essencial ou acidental de outro crime a ameaça nesses casos é absorvida por esse outro crime A ameaça é absorvida quando for elemento ou meio de outro crime Embora a finalidade de incutir medo na vítima de fazerlhe mal injusto e grave caracterizem o crime de ameaça a existência de determinado fim específico do agente pode com a mesma ação configurar outro crime como por exemplo o próprio assédio sexual Por tudo isso a nosso juízo eventual ameaça grave ou não é absorvida pelo crime de assédio sexual que é consideravelmente mais grave 58 Condição especial relação de hierarquia ou ascendência A tipificação do assédio sexual exige a condição especial crime próprio de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego cargo ou função da qual o sujeito ativo deve prevalecer se elemento normativo A simples existência dessa relação entre os sujeitos é insuficiente para caracterizar o crime sendo necessário que o sujeito ativo se prevaleça dessa condição para subjugar a vontade da vítima Como sintetiza com muita propriedade Luiz Flávio Gomes Como veremos esse constrangimento de outro lado além de ter finalidade sexual ainda requer determinadas condições só é típico para os fins do art 216A se ocorrer dentro de uma relação de subordinação empregatícia O assédio tem que ter relação com o emprego ou cargo público 581 Relação superiorsubalterno A relação superiorsubalterno pode existir na seara pública e na seara privada Na relação hierárquica há uma escala demarcando posições graus ou postos ordenados configuradores de uma carreira funcional Na ascendência contrariamente não existe essa organização funcional mas tão somente uma situação de influência ou respeitoso domínio podendo atingir inclusive o nível de temor reverencial Nesse sentido discordamos do entendimento esposado por Guilherme Nucci segundo o qual a superioridade hierárquica retrata uma relação laboral no âmbito público enquanto a ascendência reflete a mesma relação porém no âmbito privado ambas inerentes ao exercício de emprego cargo ou função Guilherme Nucci Código Penal Comentado Na verdade a ascendência não se vincula a qualquer relação laboral funcional ou trabalhista no âmbito público ou privado como destacamos acima Cargo e função referemse ao setor público disciplinado pelo direito administrativo emprego expressa a relação empregatícia no setor privado O Código Penal brasileiro disciplina a obediência hierárquica art 22 segunda parte que requer uma relação de direito público e somente de direito público A hierarquia privada própria das relações da iniciativa privada não é abrangida por esse dispositivo 582 Vantagem ou favorecimento sexual O constrangimento deve ter como fim especial a obtenção de favores sexuais que como elemento subjetivo especial do injusto não precisa ser atingido para o crime consumarse Como vantagem ou favorecimento sexual devese entender qualquer benefício ou aproveitamento libidinoso ou voluptuoso que mova inequivocamente a ação do agente Não os configuram em princípio manifestações elogiosas meros reconhecimentos de competência ou aplicação etc Vantagem na verdade não é das expressões mais adequadas para ser utilizada em crimes sexuais na medida em que sugere lucro ganho superávit enfim resultado mais de cunho patrimonial que de natureza sexual A finalidade especial de obter vantagem ou favorecimento sexual por outro lado está afastada quando o sujeito ativo objetiva uma relação duradoura um namoro efetivo por exemplo Na verdade esse crime somente pode ocorrer quando o superior constranger o subalterno a prestarlhe contrariadamente favores sexuais mesmo que não os consiga A eventual ocorrência de atos libidinosos constituirá em princípio simples exaurimento do crime Acreditamos piamente nesse caso que não tipificarão estupro ou atentado violento ao pudor a menos que se caracterize a impossibilidade de a vítima resistir à prática da libidinagem propriamente dita além do emprego de violência ou grave ameaça 6 Patrão e empregado doméstico abrangência da tipificação brasileira É possível que o patrão ou patroa assedie sexualmente seu empregado ou empregada doméstica caracterizando o crime ante a existência da condição especial representada pela relação empregatícia Acreditamos inclusive que a própria diarista também pode ser vítima desse crime uma vez que ainda que passageiramente encontrase inferiorizada na relação laboral A chantagem sexual agora criminalizada quando realizada com prevalecimento de relação de superioridade decorrente do exercício de emprego cargo ou função não abrange ministério ou ofício tampouco alcança aquelas condutas executadas com prevalecimento de relações domésticas de coabitação ou de hospitalidade fruto do desastrado e paradoxal veto presidencial como veremos em tópico próprio Mas é preciso ter presente que relações domésticas expressão vetada no parágrafo único não se confundem com a relação empregatícia entre patrões e trabalhadores domésticos cujo assédio se ocorrer estará adequado ao descrito no art 216A desde que os demais requisitos legais também se façam presentes 61 Professores e alunos atipicidade de eventual assédio Nessa linha acreditamos que tampouco o eventual assédio sexual entre professores e alunos encontrase recepcionado no art 216A na medida em que a relação docentediscente não implica relação de superioridade ou ascendência inerentes ao exercício de emprego cargo ou função nem mesmo em se tratando de instituições de ensino público Com efeito ainda que o professor de instituição pública exerça cargo ou função sua relação com o aluno é inerente à docência não prevista no limitado tipo penal em exame Nesse particular a previsão do Código Penal espanhol não sofreria essa restrição pois contém expressamente em seu texto legal que o abuso deve ocorrer em uma situação de superioridade laboral docente ou hierárquica Por essas razões equivocamse aqueles que admitem que eventual assédio sexual entre alunos e professores esteja recepcionado pelo art 216A do CP Pensar diferente seria dar interpretação extensiva à norma penal incriminadora inadmissível na seara penal por violar a função taxativa da tipicidade penal Contudo oa professora também pode ser sujeito do crime de assédio sexual ativo no caso de praticálo contra suaseu secretáriao ou assessoraassessor ou passivo quando sofrêlo por parte de seu superior ou empregador 62 Atipicidade da relação incestuosa Finalmente a relação incestuosa por sua vez continua a ser somente uma questão de moralidade independentemente do grau de parentesco dos envolvidos condenada exclusivamente pela consciência ética e pela moral que repudiam com acerto digase de passagem a promiscuidade intrafamiliar Quando no entanto satisfizer outros requisitos legais como por exemplo a violência ou a menoridade poderá caracterizar estupro ou atentado violento ao pudor mas nesses casos os crimes ocorrerão independentemente da eventual relação de parentesco existente 7 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo geral é o dolo constituído pela vontade livre e consciente de constranger a vítima com o fim inequívoco de obterlhe favores sexuais vantagem ou favorecimento Esse elemento subjetivo deve abranger como em qualquer crime doloso todos os elementos constitutivos do tipo penal Como a lei não diz a que o agente constrange alguém a definição do dolo fica altamente prejudicada sendo salva apenas pela exigência legal do elemento subjetivo especial do injusto que não se confunde com o dolo Mas como se poderá falar em elemento subjetivo especial se não podemos identificar com a precisão devida o elemento subjetivo geral isto é o dolo Enfim precisamos trabalhar com os dados que a norma jurídica nos oferece O constrangimento ilegal especificado no dispositivo em exame tem o fim especial repetindo de obter vantagem ou favorecimento sexual Como elemento subjetivo especial vantagem ou favorecimento sexual não precisa realizarse basta que seja subjetivamente o móvel da ação do agente Não há previsão de modalidade culposa negligência imprudência ou imperícia 8 Consumação e tentativa Consumase o crime de assédio sexual com a prática de atos concretos efetivos suficientemente idôneos para demonstrar a existência de constrangimento sendo desnecessárias digamos as vias de fato De forma semelhante ao que ocorre no crime de ameaça no assédio sexual a ação constrangedora tem de ser grave suficientemente idônea para duas coisas incutir medo receio ou insegurança na vítima e ao mesmo tempo ferirlhe o sentimento de honra sexual de liberdade de escolha de parceiros enfim o sentimento de amor próprio Caso contrário não se poderá falar em crime Consumase o assédio sexual na verdade independentemente de a vítima submeterse à chantagem sexual constrangedora Doutrinariamente é admissível a tentativa embora a dificuldade prática da sua constatação Assim por exemplo quando hipótese muito pouco provável o constrangimento for feito por escrito vídeo ou qualquer outro meio do gênero é interceptado por terceiro antes de a vítima tomar conhecimento 9 Classificação doutrinária Tratase de crime próprio somente podendo ser cometido por quem ostenta a condição especial de superior hierárquico ou ascendência sobre a vítima inerentes ao exercício de emprego cargo ou função comissivo por sua própria natureza seria muito difícil assediar por meio de omissão a menos que essa patologia seja portada pela vítima formal que em tese não causa transformação no mundo exterior não é exigível um resultado efetivo doloso não há previsão de modalidade culposa instantâneo a consumação não se alonga no tempo unissubjetivo pode ser cometido por uma única pessoa plurissubsistente a conduta pode ser desdobrada em vários atos 10 Onus probandi extensão e limites A ação de constranger aliada ao dissenso da vítima deve ser longamente demonstrada Não bastam meras alegações acusações levianas infundadas ou sem provas concretas É inadmissível como normalmente ocorre em determinados crimes sexuais aceitar somente a palavra da vítima como fundamento de uma decisão condenatória que não venha corroborada com outros convincentes elementos probatórios Concordamos pelo menos em parte com a afirmação de Rômulo Andrade Moreira quando sustenta Atentese porém para o fato de que acima da palavra da vítima há o princípio da presunção de inocência do acusado de forma que aquela deverá ser corroborada por um mínimo de lastro probatório ainda que apenas por indícios 11 Absoluta insuficiência de indícios Discordamos de qualquer orientação que possa satisfazerse com simples indícios para corroborar a palavra da vítima Não ignoramos que em regra os crimes sexuais são praticados na clandestinidade sendo praticamente impossível a existência de prova testemunhal Contudo no assédio sexual a regra será outra ambiente de trabalho funcionários empregados colegas jantares restaurantes convites presentes flores bilhetinhos enfim é possível deixar um rastro de dados indícios e provas denunciadores pelo menos da existência de uma relação extraprofissional Ainda assim não será suficiente por si só para demonstrar a ocorrência do crime Necessária se faz também a demonstração do prevalecimento da condição de superior e a finalidade de obter favores sexuais É possível afinal que o superior esteja efetivamente apaixonado isto é realmente interessado em uma relação sentimental e afetiva séria com alguém com quem eventualmente mantém relação de superioridade ou ascendência Enfim não só os tarados mas também os apaixonados podem assediar seus eleitos A questão fundamental será definir quando esse assédio ultrapassa o limite do permitido do politicamente correto e invade a seara do proibido do moralmente censurável e agora do legalmente criminalizado Ao que consta o Direito Penal mesmo na linha do movimento de lei e ordem não proibiu as pessoas de se apaixonar mesmo aquelas entre as quais exista uma relação de hierarquia ou ascendência relativa a emprego cargo ou função A proibição na verdade reside em abusar ou prevalecerse dessa relação para tentar obter favores sexuais constrangendo seu subordinado 12 Importunação ofensiva ao pudor e assédio sexual A contravenção art 61 somente pode ocorrer em lugar público ou acessível ao público o assédio sexual por sua vez pode ocorrer em qualquer lugar embora o mais frequente seja no próprio ambiente de trabalho ou pelo menos a partir daí A contravenção não se corporifica por meio de ação praticada entre quatro paredes ao contrário do assédio que em princípio ocorre em espaços mais restritos Uma das características dessa contravenção é a publicidade do ato ao contrário do assédio sexual que não tem como elementar esse aspecto embora eventualmente até possa ocorrer em lugar público ou acessível ao público Distinção mais séria reside na relação de hierarquia ou ascendência sobre a vítima elementar completamente estranha à figura contravencional Mas o traço fundamental para marcar a grande distinção entre as duas figuras reside no bem jurídico tutelado que na contravenção não é a liberdade sexual ou relação laboral mas os bons costumes 13 Constrangimento ilegal e assédio sexual Afora as elementares distintas nas duas figuras típicas os bens jurídicos protegidos são igualmente diversos No constrangimento ilegal é a liberdade individual de autodeterminação ou seja a liberdade de o indivíduo fazer o que lhe aprouver dentro dos limites da ordem jurídica no assédio sexual é a liberdade de escolha de parceiros a honra sexual e a dignidade nas relações de trabalho O crime de assédio sexual podese afirmar constitui modalidade de especificação do crime de constrangimento ilegal mais restrito específico e até por isso punido com maior severidade que o tipo geral abrangente e subsidiário contido no art 146 do CP O constrangimento ilegal exige para sua tipificação o emprego de violência grave ameaça ou por qualquer meio a redução da capacidade de resistência da vítima algo que até pode ocorrer no assédio sexual mas é absolutamente desnecessário Aliás se for empregado esse modus operandi para obter favores sexuais o crime deixará de ser assédio para configurar estupro ou atentado violento ao pudor tentado ou consumado dependendo das circunstâncias Enfim eventual emprego de violência em qualquer de suas formas para obter vantagem ou favorecimento sexual pode desnaturar por completo a figura do crime de assédio sexual que só persistirá residualmente isto é se por alguma razão faltar um elemento constitutivo dos crimes sexuais violentos por exemplo a resistência da vítima estupro ou atentado violento ao pudor 14 Assédio sexual e assédio moral É uma impropriedade falar em assédio moral especialmente quando se procuram na legislação alienígena determinadas figuras típicas como ocorre no caso da França Eventuais comportamentos moralmente constrangedores encontrarão apoio em outras searas do direito trabalhista administrativo disciplinar ou mesmo no Direito Penal em outros tipos por exemplo nos arts 146 ou 147 ou nos crimes contra a honra Contudo se se quiser distinguir no impropriamente denominado assédio moral a finalidade da ação criminalizada não é obter vantagem ou favorecimento moral como ocorre no assédio sexual mas humilhar constranger moralmente a vítima colocála em situação vexatória etc Mas isso repetindo encontra proteção em outros setores do ordenamento jurídico Quanto menos se falar sobre isso melhor para não estimular mais uma esdrúxula figura típica 15 Causas de aumento de pena Das majorantes constantes do art 226 apenas duas não podem ser aplicadas no crime de assédio sexual ante a proibição do bis in idem uma vez que se confundem com elementares típicas contidas no art 216A se o agente é preceptor ou empregador da vítima pois nessas hipóteses existe em tese relação de hierarquia ou ascendência inerentes ao exercício de emprego cargo ou função art 226 II do CP Nas demais hipóteses elencadas no mesmo dispositivo ou seja se o agente é ascendente pai adotivo padrasto irmão tutor ou curador da vítima ou por qualquer outro título tem autoridade sobre ela a nosso juízo não se faz presente aquele vínculo referido no dispositivo em exame que só pode decorrer do exercício de emprego cargo ou função Com efeito nem mesmo a respeito de tutor ou curador pode se falar em emprego cargo ou função nos quais o agente poderia prevalecerse da relação de superioridade A mesma exigência de tipicidade taxativa afasta a possibilidade dessa exclusão Portanto são causas de aumento perfeitamente aplicáveis ao crime de assédio sexual Quanto à causa relacionada no inciso I concurso de pessoas do art 226 não há qualquer dúvida relativa a sua incidência 16 Veto do parágrafo único Constava do parágrafo único que recebeu o veto presidencial o seguinte Incorre na mesma pena quem cometer o crime I prevalecendose de relações domésticas de coabitação ou de hospitalidade II com abuso ou violação de dever inerente a ofício ou ministério Constatase pelo texto vetado que se criminalizava a conduta daquele que nas mesmas circunstâncias se prevalecesse de relações domésticas de coabitação ou de hospitalidade I ou abusasse ou violasse dever inerente a ofício ou ministério Esse veto impede a punição por assédio sexual das condutas praticadas nas circunstâncias descritas no parágrafo vetado Assim por exemplo eventuais assédios praticados por padres freiras e pastores a seus subordinados do mesmo sexo ou não não tipificam o crime de assédio sexual podendo logicamente dependendo das circunstâncias constituir outro crime Embora não tenha sido essa a intenção do veto pelo menos minimizou a abrangência dessa nova mania nacional todas as condutas que se amoldarem às descrições do veto assédio prevalecendose de relações domésticas de coabitação ou de hospitalidade com abuso ou violação de dever inerente a ofício ou ministério serão atípicas Digamos que o veto presidencial produziu aquilo que popularmente se diz o tiro saiu pela culatra Ou seja pretendendo ampliar a abrangência e intensidade da norma criminalizadora o veto a restringiu 161 Fundamentos do veto presidencial As razões do veto pasmem foram as seguintes No tocante ao parágrafo único projetado para o art 216A cumpre observar que a norma que dele consta ao sancionar com a mesma pena do caput o crime de assédio sexual cometido nas situações que descreve implica inegável quebra do sistema punitivo adotado pelo Código Penal e indevido benefício que se institui em favor do agente ativo daquele delito É que o art 226 do Código Penal institui de forma expressa causas especiais de aumento de pena aplicáveis genericamente a todos os crimes contra os costumes dentre as quais constam as situações descritas nos incisos do parágrafo único projetado para o art 216A Assim no caso de o parágrafo único projetado vir a integrar o ordenamento jurídico o assédio sexual praticado nas situações nele previstas não poderia receber o aumento de pena do art 226 hipótese que evidentemente contraria o interesse público em face da maior gravidade daquele delito quando praticado por agente que se prevalece de relações domésticas de coabitação ou de hospitalidade 17 Pena e natureza da ação penal 171 Pena cominada A pena cominada é a detenção de seis meses a dois anos O Código Penal espanhol de 1995 LO n 101995 previu pioneiramente o crime de assédio sexual denominado acoso sexual art 1841 cominandolhe somente a pena de arresto de fin de semana A reforma penal espanhola de 2003 LO n 152003 alterou a previsão anterior cominando pena de prisão de três a seis meses ou multa de seis a dez meses Em nosso sistema penal como única novidade da Lei n 120152009 foi previsto o aumento de até um terço da pena aplicada se a vítima for menor de dezoito anos 2º Para Nucci resolveu o legislador conferir maior proteção ao adolescente com idade variável entre 16 e 17 anos levandose em consideração a relação de trabalho regular prevista pelo art 7º XXXIII da Constituição Federal Ou ainda o aprendiz com idade superior a 14 anos Teria razão o legislador se houvesse limitado essa maior proteção aos menores de quatorze ou dezesseis anos cuja idade reclama efetivamente maior proteção penal considerandose o atual estágio de maturidade atingido pela juventude na era da globalização informatizada 172 Correção na previsão da majorante até um terço Não acompanhamos Nucci por outro lado na crítica que faz à fórmula escolhida para fixar a majorante qual seja o aumento em até um terço Sustenta Nucci Ora não havendo a cominação do mínimo pode o magistrado querendo fixar apenas um dia Tal medida é incompatível com o cenário das causas de aumento diversas que são das agravantes Quando opta pela inserção de causas de aumento deve o legislador estipular exatamente o mínimo e o máximo ex de um terço a dois terços ou somente um valor estanque ex um terço Não tem sentido estabelecer um valor máximo sabendose que o mínimo possível para qualquer elevação consiste em um singelo dia Guilherme de Souza Nucci Crimes contra a Dignidade Sexual comentários à Lei 12015 São Paulo Revista dos Tribunais 2009 p 32 Não se pode esquecer que as majorantes e minorantes como simples causas modificadoras da pena somente estabelecem sua variação sendo recomendável maior flexibilidade facilitando a melhor individualização da pena Somos contrários ao engessamento do juiz especialmente quanto à dosimetria penal em que o julgador precisa de algum espaço para usar sua sensibilidade e ajustar a pena abstrata ao caso concreto Na verdade não é recomendável a absoluta determinação nem indeterminação absoluta Em outros termos se a indeterminação absoluta não é conveniente também a absoluta determinação não é menos inconveniente Se a pena absolutamente indeterminada deixa demasiado arbítrio ao julgador com sérios prejuízos aos direitos fundamentais do indivíduo igualmente a pena absolutamente determinada pena tarifária impede o seu ajustamento pelo juiz ao fato e ao agente diante da realidade concreta 173 Engessamento do julgador desrecomendável Devese destacar ademais que a majoração em um terço estabelecido de forma fixa representa um aumento brutal na dosimetria da pena especialmente quando se trata de majoração obrigatória assegurando um grande salto em sua dosagem Por isso é importante que se estabeleça o limite máximo até um terço por exemplo como foi previsto permitindo ao julgador com seu senso de justiça e com a responsabilidade que o cargo lhe atribui eleger o quantum de elevação que lhe parecer adequado segundo as circunstâncias judiciais Por outro lado ainda que admita in extremis a majoração em um dia como exemplifica Nucci ainda assim pode ser significativo imaginese a pena de dois anos recebendo um dia de majoração alterará a prescrição de quatro para oito anos Essa pequena alteração acarreta enorme consequência punitiva ao infrator 174 Natureza da ação penal Quanto a natureza da ação penal nos crimes previstos nos Capítulos I e II do Título VI da Parte Especial remetemos o leitor para os comentários que realizamos no art 225 o qual define a ação penal das respectivas infrações penais Capítulo II Dos Crimes Sexuais contra Vulnerável Título do Capítulo II com redação determinada pela Lei n 12015 de 7 de agosto de 2009 Art 217 Revogado pela Lei n 11106 de 2832005 Estupro de vulnerável Art 217A Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 catorze anos Pena reclusão de 8 oito a 15 quinze anos 1º Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que por enfermidade ou deficiência mental não tem o necessário discernimento para a prática do ato ou que por qualquer outra causa não pode oferecer resistência 2º Vetado 3º Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave Pena reclusão de 10 dez a 20 vinte anos 4º Se da conduta resulta morte Pena reclusão de 12 doze a 30 trinta anos Artigo acrescentado pela Lei n 12015 de 7 de agosto de 2009 D O U T R I N A 1 Considerações preliminares Observandose as hipóteses mencionadas como caracterizadoras da condição de vulnerabilidade concluiremos sem maiores dificuldades que o legislador optou por incluir nessa classificação pessoas que são absolutamente inimputáveis embora não todas quais sejam menor de quatorze anos ou alguém que por enfermidade ou deficiência mental não tem o necessário discernimento para a prática do ato ou que por qualquer outra causa não pode oferecer resistência Na realidade o legislador faz uma grande confusão com a idade vulnerável ora referese a menor de quatorze anos arts 217A 218 e 218A ora a menor de dezoito arts 216 2º 218B 230 1º 231 2º I 231A 2º I A partir daí podese admitir que o legislador embora não tenha sido expresso trabalhou com duas espécies de vulnerabilidade uma absoluta menor de quatorze anos e outra relativa menor de dezoito conforme destacou desde logo Guilherme Nucci 2 Menor vulnerável e o tratamento do ECA Menor de quatorze anos 14 é exatamente o infantojuvenil ou criançaadolescente protegido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente ECA que merece atendimento especial do Estado e da lei e que agora finalmente o legislador penal reconhece sua vulnerabilidade Essa é uma oportunidade rara para abordarmos algo que sempre nos preocupou qual seja a vitimização secundária dos menores que sofrem de abuso sexual no plano familiar e extrafamiliar historicamente tratados pelas autoridades repressoras Polícia Ministério Público e Judiciário como simples objeto de investigação e meio de prova 3 A verdade real e a vitimização secundária Destacamos em especial o abuso sexual infantojuvenil intrafamiliar como uma das mais graves formas de violência pois lesa os direitos fundamentais das crianças e adolescentes apresentando contornos de durabilidade e habitualidade tratase portanto de um crime que deixa mais do que marcas físicas atingindo a própria alma das pequenas vítimas Consiste na utilização de uma criança ou adolescente para satisfação dos desejos sexuais de um adulto que sobre ela tem uma relação de autoridade ou responsabilidade socioafetiva A origem do abuso sexual intrafamiliar transcende as fronteiras das culturas e tem seus precedentes nos primórdios da civilização humana 4 Vitimização primária e vitimização secundária O processo de violência sexual intrafamiliar contra crianças e adolescentes pode ser entendido por vitimização primária na medida em que no âmbito procedimentalinvestigatório constatase outro tipo de vitimização em que a violência é causada pelo sistema de justiça que viola outros direitos vitimizando novamente a criança ou adolescente Essa revitimização denominase vitimização secundária que outra coisa não é senão a violência institucional do sistema processual penal fazendo das vítimas infantojuvenis novas vítimas agora do estigma processualinvestigatório pode dificultar senão até inviabilizar o processo de superação do trauma provocando ainda uma sensação de frustração impotência e desamparo com o sistema de controle social aumentando o descrédito e a desconfiança nas instituições de justiça criminal 5 Abuso sexual intrafamiliar O abuso sexual intrafamiliar é um dos temas mais sensíveis da realidade social e criminal nos tempos atuais principalmente porque se sabe que as consequências para as crianças e adolescentes abusadas sexualmente são perenes colocando em risco o equilíbrio biopsicossocial para o resto de suas vidas Um dos aspectos mais complexos tanto do ponto de vista jurídico como criminológico é relativo à posição dessa vítima criançaadolescente como testemunha no processo penal É comum tanto no Brasil como no exterior que crianças e adolescentes sejam chamadas a depor em processos judiciais criminais para falarem sobre situações de violência que sofreram Essa fala das crianças e dos adolescentes no momento da audiência integra o acervo probatório processual Ocorre porém que em razão da forma tradicional de inquirição das vítimas e testemunhas de crime sexual quando crianças e adolescentes pode ampliar a violência por aquelas experimentadas Esse aspecto levou à elaboração do projeto de Lei n 41262004 que propõe a alteração do Estatuto da Criança e do Adolescente recomendando o modelo alternativo de inquirição conforme o Projeto depoimento sem dano criado por operadores do direito de Porto Alegre e utilizado no 2º Juizado da Infância e Juventude dessa capital 6 Menor sujeito de direitos e não apenas objeto O debate sobre o tema está estabelecido Deve refletir e discutir o tema de redução de danos às vítimas e testemunhas no processo judicial gerando novas perspectivas de conhecimento teórico e prático devese buscar uma discussão interdisciplinar através da abordagem jurídica psicológica e da assistência social entrecruzando os amplos domínios do social da ciência do jurídico da ética e do psicológico oferecendo uma linguagem comumespecial indispensável para se trabalhar no campo da violência familiar Na realidade propõemse diferentes olhares sobre o mesmo tema mas todos preocupados em preservar a dignidade humana como um direito fundamental também e especialmente aos infantojuvenis aos quais ao longo da vigência do atual diploma legal ECA temlhes sido sonegados os direitos e garantias processuaiscriminais que a Constituição Federal assegura a todos inclusive aos piores delinquentes adultos O fundamental é que se perceba de uma vez por todas que crianças e adolescentes vítimas de violência sexual intrafamiliar ou não antes de objeto de investigação e de meio de prova são acima de tudo sujeitos de direitos e que a sociedade em nenhuma hipótese tem o direito de revitimizálos seja a pretexto da busca da mitológica verdade real seja para assegurar a mais ampla defesa do eventual acusado 7 Produção de prova sem revitimizar A prova de culpa ou de inocência deve ser buscada por todo e qualquer outro meio moralmente legítimo e não vedado em lei desde que não se queira arrancála de quem já foi vitimizado pela violência sexual sofrida Não se pode esquecer de sua vulnerabilidade natural que é somatizada pela peculiar circunstância do trauma sofrido pela violência sexual de que fora vítima A ausência de outras provas ou a impossibilidade de produzilas com a idoneidade que exige uma decisão acusatória tampouco justificam que se revitimizem os infantojuvenis que não podem ser duplamente punidos pela incompetência ou ineficiência do sistema repressivo penal Em outros termos que o Estado cure suas chagas buscando aprimorar seu sistema investigativo penal sem contudo punir duplamente os infantojuvenis a quem a Constituição Federal assegura proteção especial 8 Proteção do menor sem revitimizálo Em outros termos que a proteção de menores vulneráveis nesse art 217A não sirva para que as autoridades repressivas Ministério Público Polícia e Poder Judiciário ampliem a revitimização secundária sobre os menores vítimas da violência sexual que ora se pretende reprimir Esperase que o Estado aprimore seus meios investigativosrepressivos com técnicas mais avançadas e material humano mais bem preparado oferecendo as condições necessárias a um combate mais eficaz a esse tipo de criminalidade sem revitimizar quem já sofrera a primeira violência que a função preventiva não foi capaz de evitar 9 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido no crime de estupro de vulnerável é a dignidade sexual do menor de quatorze anos e do enfermo ou deficiente mental que tenha dificuldade em discernir a prática do ato sexual a exemplo do que ocorre com a previsão contida nos arts 218 e 218A e B todos constantes do Capítulo II do Título VI Na realidade na hipótese de crime sexual contra vulnerável não se pode falar em liberdade sexual como bem jurídico protegido pois se reconhece que não há a plena disponibilidade do exercício dessa liberdade que é exatamente o que caracteriza sua vulnerabilidade Na realidade a criminalização da conduta descrita no art 217A procura proteger a evolução e desenvolvimento normal da personalidade do menor para que na sua fase adulta possa decidir livremente e sem traumas psicológicos seu comportamento sexual 91 Não há autonomia suficiente para falarse em liberdade Nessa linha é o magistério de Muñoz Conde para quem mais que a liberdade do menor ou incapaz que obviamente não existe nesses casos pretendese na hipótese do menor proteger sua liberdade futura ou melhor dito a normal evolução e desenvolvimento de sua personalidade para que quando seja adulto decida livremente seu comportamento sexual Francisco Muñoz Conde Direito Penal Parte Especial 12 ed Valência Tirant lo Blanch 1999 p 196 No mesmo sentido para a pesquisadora Luciane Potter em trabalho realizado antes da reforma penal de 2009 nos crimes sexuais que envolvem crianças e adolescentes mais do que a liberdade sexual são violadas também a integridade física psíquica e a dignidade da pessoa humana pois a sexualidade em crianças e adolescentes jovens cujas personalidades ainda se encontram em desenvolvimento não se pode consequentemente falar em liberdade sexual ou autonomia para determinar seu comportamento no âmbito sexual Luciane Potter Bitencourt Vitimização Secundária Infantojuvenil p 712 10 Sujeito ativo Qualquer pessoa pode ser sujeito ativo do crime de estupro de vulnerável indistintamente homem ou mulher contra inclusive pessoa do mesmo sexo Como destacamos no capítulo que examinamos o estupro de adultos coautoria e participação em sentido estrito são perfeitamente possíveis inclusive contra vítimas do mesmo sexo dos autores ou partícipes 11 Sujeito passivo Sujeito passivo igualmente pode ser qualquer pessoa que apresente a qualidade ou condição especial de vulnerabilidade exigida pelo tipo penal seja pela menoridade de quatorze anos seja em razão de tratar se de alguém que por enfermidade ou deficiência mental não tem o necessário discernimento para a prática do ato ou que por qualquer outra causa não pode oferecer resistência Aqui no estupro de vulnerável a vítima vulnerável do sexo masculino também em qualquer circunstância quando violentada é sujeito passivo do crime de estupro a exemplo do que ocorria com o antigo crime de atentado violento ao pudor Em outros termos o crime de estupro de vulnerável também pode ocorrer em relação a hetero ou homossexual homem com homem e mulher com mulher 12 Vulnerabilidade e a violência presumida O legislador atribui num primeiro momento a condição de vulnerável ao menor de quatorze anos ou a quem por enfermidade ou deficiência mental não tem o necessário discernimento para a prática do ato ou que por qualquer outra causa não possa oferecer resistência Logo adiante no entanto já no art 218B deparase novamente com a adjetivação de vulnerável para outra faixa etária qual seja menor de dezoito anos aparentemente sem qualquer justificativa razoável Com efeito é situação completamente diferente a condição de menor de quatorze anos comparada à condição do menor de dezoito anos e maior de quatorze Inegavelmente o legislador ampliou o conceito de vulnerabilidade que define satisfatoriamente a condição do menor de quatorze anos para alcançar incompreensivelmente o menor de dezoito anos art 218B 121 Concepções distintas de vulnerabilidade Na realidade o legislador utiliza o conceito de vulnerabilidade para diversos enfoques em condições distintas Esses aspectos autorizam nos a concluir que há concepções distintas de vulnerabilidade Na ótica do legislador devem existir duas espécies ou modalidades de vulnerabilidade ou seja uma vulnerabilidade absoluta e outra relativa aquela se refere ao menor de 14 anos configuradora da hipótese de estupro de vulnerável art 217A esta se refere ao menor de 18 anos empregada ao contemplar a figura do favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual art 218B Aliás os dois dispositivos legais usam a mesma fórmula para contemplar a equiparação de vulnerabilidade nas respectivas menoridades 14 e 18 anos qual seja ou a quem por enfermidade ou deficiência mental não tem o necessário discernimento para a prática do ato ou que por qualquer outra causa não pode oferecer resistência Nos dois dispositivos o legislador cria hipóteses de interpretação analógica ou que por qualquer outra causa não pode oferecer resistência que deve obedecer aos atributos dos respectivos paradigmas 122 Dissimulação da violência presumida De notarse que o legislador dissimuladamente usa os mesmos enunciados que foram utilizados pelo legislador de 1940 para presumir a violência sexual Constatase que o legislador anterior foi democraticamente transparente mesmo em período de ditadura destacando expressamente as causas que levavam à presunção de violência curiosamente no entanto quando nosso ordenamento jurídico deve redemocratizarse sob os auspícios de um novo modelo de Estado Constitucional e Democrático de Direito o legislador contemporâneo usa a mesma presunção de violência porém disfarçadamente na ineficaz pretensão de ludibriar o intérprete e o aplicador da lei A proteção conferida profetiza Nucci aos menores de 14 anos considerados vulneráveis continuará a despertar debate doutrinário e jurisprudencial O nascimento de tipo penal inédito não tornará sepulta a discussão acerca do caráter relativo ou absoluto da anterior presunção de violência Guilherme de Souza Nucci Crimes contra a Dignidade Sexual p 37 123 Tentativa de impedir orientação do STF Tratase inequivocamente de uma tentativa dissimulada de estancar a orientação jurisprudencial que se consagrou no Supremo Tribunal Federal sobre a relatividade da presunção de violência contida no dispositivo revogado art 224 Nessa linha merece destaque parte do antológico acórdão do Ministro Marco Aurélio que pontificou A presunção não é absoluta cedendo às peculiaridades do caso como são as já apontadas ou seja o fato de a vítima aparentar mais idade levar vida dissoluta saindo altas horas da noite e mantendo relações sexuais com outros rapazes como reconhecido no seu depoimento e era de conhecimento público HC STF 73662MG 2ª T Rel Min Marco Aurélio de Mello 2152005 Reconhecendo a relatividade da presunção de violência contida no revogado art 224 no mesmo acórdão prosseguiu o Ministro Marco Aurélio Nos nossos dias não há crianças mas moças com doze anos Precocemente amadurecidas a maioria delas já conta com discernimento bastante para reagir ante eventuais adversidades ainda que não possuam escala de valores definidos a ponto de vislumbrarem toda a sorte de consequências que lhes podem advir HC STF 73662MG 2ª T Rel Min Marco Aurélio de Mello 2152005 13 Tipo objetivo adequação típica O preceito primário do crime de estupro de vulnerável é basicamente o mesmo do crime de violação sexual mediante fraude ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém ressalvado o meio que deve ser fraudulento na violação sexual e a vulnerabilidade da vítima no estupro especial Em outros termos as condutas incriminadas são exatamente as mesmas distinguindose no tocante ao sujeito passivo que no estupro de vulnerável é somente qualquer pessoa vulnerável menor de quatorze anos ou alguém que por enfermidade ou deficiência mental não tem o necessário discernimento para a prática do ato ao passo que na violação sexual fraudulenta pode ser qualquer pessoa maior de 14 anos mas com emprego de meio fraudulento 131 Fundamento da punição presumida incapacidade O fundamento da incriminação do estupro de vulnerável reside na presumida incapacidade do ofendido de autodeterminarse e consequentemente de consentir relativamente ao exercício da sexualidade enquanto a violação sexual art 215 fundamentase no concreto uso de meio fraudulento para possuir sexualmente a vítima 132 Misto de estupro antigo e atentado violento ao pudor Podese afirmar guardadas as proporções que há um misto do crime de estupro art 213 e da posse sexual mediante fraude art 215 distinguindose de ambos contudo pela ausência de violência ou grave ameaça em relação ao primeiro e pela inexistência de meio fraudulento em relação ao segundo Restalhe no entanto a prática sexual conjunção carnal ou outro ato libidinoso com alguém vulnerável nos termos definidos no caput do art 217 Esse fundamento é mais que suficiente para justificar a tutela penal exatamente pela vulnerabilidade que referidos sujeitos passivos apresentam a gravidade da sanção cominada que não deixa de ser proporcional à gravidade do desvalor da ação praticada no entanto recomenda que se avalie criteriosamente a real existência relatividade de suas condições de vulneráveis 133 Prática de conjunção carnal com menor de 14 anos Ter isto é manter praticar copular conjunção carnal com menor é uma redação abrangente a exemplo de com alguém isto é mais aberta que possibilita em tese que menor do sexo masculino também possa ser sujeito passivo desse crime Contudo embora tenhamos dificuldade em admitir no crime de estupro que se caracteriza pela posse sexual violenta que o homem possa ser sujeito passivo do constrangimento à conjunção carnal por mulher admitimos essa possibilidade nessa infração penal exatamente pela ausência de violência real No estupro de vulnerável em outros termos nada impede que mulher constranja menor de quatorze anos mantendo com ele conjunção carnal configurandose a primeira conduta dessa infração penal 134 Prática de outro ato libidinoso com alguém A segunda conduta tipificada consiste em o agente homem ou mulher praticar outro ato libidinoso com menor de quatorze anos sexo masculino ou feminino indistintamente Nessa hipótese o sujeito ativo pratica executa realiza exercita com a vítima masculina ou feminina incapaz de consentir na ótica estrita do texto legal ato libidinoso diverso de conjunção carnal Essa modalidade de conduta a exemplo da primeira ter conjunção carnal admite homem com homem e mulher com mulher sem nenhuma dificuldade linguísticodogmática Em outros termos a mulher pode ser sujeito ativo do crime de estupro de vulnerável tendo como vítima menor tanto do sexo masculino quanto feminino 135 Dissenso da vítima nível de resistência do ofendido A conjunção carnal ou a prática de outro ato libinoso mediante violência ou grave ameaça tipifica o crime capitulado no art 213 do Código Penal primeira parte A configuração desse crime é fácil constatar repousa na supressão do poder força ou capacidade de resistência do ofendido de defenderse ou de oporse à prática do ato sexual embora não se exija uma resistência heroica recomendandose concretamente a avaliação da correlação de forças especialmente a superioridade de forças do agente Assim não é necessário que se esgote toda a capacidade de resistência da vítima a ponto de colocar em risco a própria vida para reconhecer a violência ou grave ameaça 136 Inexistência de grau de resistência Esse aspecto no entanto dissenso a vítima ou grau de resistência basicamente não existe no estupro de vulnerável Dizemos basicamente porque assim como a violência é presumida a incapacidade de resistir igualmente o é nessa infração penal No entanto tal qual a violência essa presunção implícita também em relação à capacidade de consentir ou mutatis mutandis de resistir é igualmente submetida à necessidade de ser comprovada in concreto relativizandose tais presunções conforme explanamos acima 14 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo do crime de estupro de vulnerável é o dolo constituído pela vontade consciente de ter conjunção carnal com a vítima vulnerável ou praticar outro ato libidinoso diverso da conjunção carnal Equiparase a prática das mesmas condutas com alguém que por enfermidade ou deficiência mental não tem o necessário discernimento para a prática do ato ou que por qualquer outra causa não pode oferecer resistência No particular o sujeito ativo deve ter conhecimento ou consciência de que se trata de menor de quatorze anos ou de alguém que em razão de sua deficiência mental não tem o necessário entendimento para a prática do ato 141 Elementos do dolo consciência e vontade A consciência de todas as elementares do tipo como elemento do dolo deve ser atual isto é deve existir no momento em que a ação está acontecendo ao contrário da consciência da ilicitude elemento da culpabilidade que pode ser apenas potencial Assim o agente deve ter não apenas consciência de que pratica uma relação sexual com alguém mas também que o faz com menor de quatorze anos ou com alguém portador de deficiência mental e além disso deve ter consciência também das consequências de sua ação e dos meios que utiliza para executála Além desse elemento intelectual é indispensável ainda o elemento volitivo sem o qual não se pode falar em dolo direto ou eventual Em outras palavras a vontade deve abranger igualmente a ação prática de conjunção carnal ou outro ato libidinoso o resultado execução efetiva da ação proibida os meios de forma livre ou algum meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima e o nexo causal relação de causa e efeito Por isso quando o processo intelectualvolitivo não atinge um dos componentes da ação descrita na lei o dolo não se aperfeiçoa isto é não se realiza Na realidade o dolo somente se completa com a presença simultânea da consciência e da vontade de todos os elementos constitutivos do tipo penal 142 Elemento subjetivo especial do injusto crime de tendência Nesse crime estupro de vulnerável é necessário o elemento subjetivo especial do injusto ou seja o especial fim de possuir sexualmente a vítima homem ou mulher sabendo o agente que é considerada vulnerável sob pena de não se configurar essa infração penal Esse crime inserese naquela tipologia que Welzel denominava crimes de tendência Nesses crimes de tendência a ação encontrase envolvida por determinado ânimo cuja ausência impossibilita a sua concepção Em tais crimes não é a vontade do autor que determina o caráter lesivo do acontecer externo mas outros extratos específicos inclusive inconscientes Com efeito não se exige a persecução de um resultado ulterior ao previsto no tipo senão que o autor confira à ação típica um sentido ou tendência subjetivo não expresso no tipo mas deduzível da natureza do delito ex o propósito de ofender arts 138 139 140 CP propósito de ultrajar art 212 CP 143 Crimes de tendência A ação deve expressar uma tendência subjetiva do agente indispensável para se compreender os crimes sexuais especialmente No magistério de Welzel a tendência especial de ação sobretudo se se trata aqui da tendência voluptuosa nos delitos de lascívia Ação lasciva é exclusivamente a lesão objetiva do pudor levada a efeito com tendência subjetiva voluptuosa Esses crimes são chamados também de crimes de tendência intensificada nos quais o tipo requer o ânimo ou tendência de realizar a própria conduta típica sem transcendêla como ocorre nos delitos de intenção É possível que o dolo esteja presente e ainda assim não se complete o tipo subjetivo visto que o crime de estupro de vulnerável a exemplo do estupro de adulto exige um elemento subjetivo especial implícito como finalidade da ação Na realidade o especial fim ou motivo de agir embora amplie o aspecto subjetivo do tipo não integra o dolo nem com ele se confunde uma vez que como vimos o dolo esgotase com a consciência e a vontade de realizar a ação com a finalidade de obter o resultado delituoso ou na assunção do risco de produzilo 144 Especial fim fundamenta a ilicitude O especial fim de agir que integra determinadas definições de delitos condiciona ou fundamenta a ilicitude do fato constituindo assim elemento subjetivo especial do tipo de ilícito de forma autônoma e independente do dolo A ausência desses elementos subjetivos especiais descaracteriza o tipo subjetivo independentemente da presença do dolo Por outro lado enquanto o dolo deve materializarse no fato típico os elementos subjetivos especiais do tipo especificam o dolo sem necessidade de se concretizarem sendo suficiente que existam no psiquismo do autor 145 Resultado lesão grave ou morte da vítima Os parágrafos do art 217A dispõem se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave a pena é de reclusão de 10 dez a 20 vinte anos 3º se da conduta resulta morte a reclusão é de 12 doze a 30 trinta anos 4º Nesse tópico examinaremos as qualificadoras que resultam da violência Aliás o legislador preferiu o vocábulo se da conduta resulta em lugar de se da violência resulta sem maiores consequências dogmáticas na execução do crime propriamente Nessas qualificadoras que só podem decorrer de violência empregada embora o legislador tenha preferido a locução da conduta o maior desvalor do resultado lesão grave ou morte da vítima é real e não presumido O desvalor da ação já está valorado no preceito primário do caput do artigo sub examen 15 Consumação do estupro de vulnerável O crime de estupro de vulnerável na modalidade constranger à conjunção carnal consumase desde que haja introdução completa ou incompleta do órgão genital masculino na vagina da vítima mesmo que não tenha havido rompimento da membrana himenal quando existente consumase enfim com a cópula vagínica sendo desnecessária a ejaculação Na modalidade praticar ou permitir a prática de outro lado libidinoso consumase o crime com a efetiva realização ou execução de ato libidinoso diverso de conjunção carnal o momento consumativo dessa modalidade coincide com a prática do ato libidinoso 16 Admissibilidade da tentativa É admissível doutrinariamente a tentativa a despeito da dificuldade prática de sua constatação Caracterizase a figura tentada do crime de estupro de vulnerável quando o agente iniciando a execução é interrompido pela reação eficaz da vítima ou intervenção de terceiro mesmo que não tenha chegado a haver contatos íntimos No estupro ante sua natureza de crime complexo a primeira ação violência ou grave ameaça constitui início de execução porque está dentro do próprio tipo como sua elementar Assim para a ocorrência da tentativa basta que o agente tenha empregado violência contra a vítima com o fim inequívoco de constrangêla à prática de relação sexual em qualquer de suas modalidades 17 Classificação doutrinária Tratase de crime comum não exige qualquer qualidade ou condição especial do sujeito ativo o fato de somente alguém vulnerável poder ser sujeito passivo não o qualifica como crime próprio material crime que causa transformação no mundo exterior isto é deixa vestígios doloso não há previsão de modalidade culposa de forma livre pode ser praticado por qualquer forma ou meio eleito pelo sujeito ativo comissivo o verbo nuclear implica a prática de uma ação instantâneo a consumação não se alonga no tempo configurandose em momento determinado unissubjetivo pode ser cometido por uma única pessoa plurissubsistente a conduta pode ser desdobrada em vários atos dependendo do caso 18 Pena e ação penal A pena cominada para o caput do art 217A é isoladamente reclusão de oito a quinze anos Decorrendo da conduta lesão corporal de natureza grave a pena será de reclusão de dez a vinte anos 3º decorrendo da conduta do agente a morte da vítima a reclusão será de doze a trinta anos 4º Há ainda as majorantes especiais contidas no art 226 de quarta parte na hipótese do inciso I pelo concurso de pessoas e de metade se o agente enquadrase em umas das hipóteses relacionadas no inciso II Por outro lado a nosso juízo é inaplicável a majoração de metade da pena determinada pelo art 9º da Lei dos Crimes Hediondos por falta de previsão legal A natureza da ação penal por fim relativa aos crimes constantes dos Capítulos I e II do Título VI é tratada quando analisamos o disposto no art 225 cujo conteúdo tem a finalidade de disciplinar exatamente esse tema Pela complexidade que assumiu a partir da Lei n 120152009 concentramos seu exame nesse dispositivo para onde remetemos o leitor Art 218 Induzir alguém menor de 14 catorze anos a satisfazer a lascívia de outrem Pena reclusão de 2 dois a 5 cinco anos Parágrafo único Vetado Artigo com redação determinada pela Lei n 12015 de 7 de agosto de 2009 D O U T R I N A 1 Considerações preliminares Lenocínio é a atividade de prestar assistência à libidinagem de outrem ou dela tirar proveito O lenocínio em sentido lato pode abranger não apenas a atividade criminosa dos mediadores como também daqueles que se aproveitam de um modo geral da prostituição ou degradação moral No lenocínio por certo estão compreendidos o tráfico de mulheres recrutamento e transporte de mulheres destinadas à prostituição o proxenetismo mediação para servir a lascívia de outrem favorecimento à prostituição manutenção de casa de prostituição e o rufianismo aproveitamento parasitário do ganho das prostitutas Nosso Código Penal de 1940 em seus arts 227 a 230 contempla hipóteses de lenocínio mediação para servir a lascívia de outrem favorecimento da prostituição manutenção de casa de prostituição e sua exploração lucrativa A mediação para servir a lascívia de outrem é a primeira modalidade do crime de lenocínio disciplinada no Código Penal de 1940 como atividade dos proxenetas Claro está contudo que tem como destinatário somente vítimas maiores isto é adultas A mediação para servir a lascívia de outrem usando menores como vítima constitui novidade como crime autônomo disciplinada pela Lei n 12015 de 2009 que ora comentamos A Lei n 11106 de 28 de março de 2005 já havia incluído como qualificadora do art 227 a prática desta mesma conduta tendo como vítima menor de dezoito anos e maior de quatorze 1º cominando a mesma pena de dois a cinco anos de reclusão Não deixam de ser contraditórias as duas previsões i o induzimento de alguém menor de quatorze anos a satisfazer a lascívia de outrem é cominado com dois a cinco anos de reclusão art 218 ii o induzimento de alguém maior de quatorze anos e menor de dezoito a satisfazer a lascívia de outrem é cominado com dois a cinco anos de reclusão art 227 1º Em outros termos se a vítima for menor de quatorze anos incidirá o art 218 se no entanto for maior incidirá o art 227 1º primeira figura A rigor mediação para servir a lascívia de outrem envolvendo somente adultos não tem razão de existir o dispositivo deveria ser revogado ante a evolução liberal do comportamento sexual da sociedade contemporânea Nessa linha incensurável a conclusão de Guilherme Nucci in verbis não tem o menor sentido buscar a punição de quem dá a ideia indução para que alguém maior de 18 anos satisfaça a lascívia prazer sexual de outra pessoa E daí Sem ter havido qualquer forma de violência nenhum prejuízo adveio para qualquer dos envolvidos Crimes contra a Dignidade Sexual p 45 Aliás punição como essa prevista no art 227 do Código Penal redação de 1940 além de ignorar o princípio da intervenção mínima caracteriza a violação indevida pelo Estado da liberdade sexual do cidadão exatamente direito que o próprio Estado deveria proteger 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido no crime de uso de menor para servir a lascívia de outrem é genericamente a dignidade sexual desse menor Igualmente neste crime não se trata da liberdade sexual atual do menor de quatorze anos como bem jurídico protegido que na nossa ótica não existe nessa faixa etária pois como criança ainda não tem sua personalidade formada e por extensão além de não se tratar de liberdade sexual tampouco se pode falar no exercício de dita liberdade Em outros termos a criminalização da conduta descrita no art 218 visa proteger o desenvolvimento e a evolução saudável da personalidade do menor para que na sua fase adulta possa decidir livremente e sem traumas psicológicos seu comportamento sexual Enfim o bem juridicamente protegido numa visão mais abrangente é a dignidade sexual por excelência do menor absolutamente vulnerável Procurase em outros termos tutelar a formação sexual dos menores protegendoos especialmente contra a depravação e a luxúria os quais não podem e não devem ser expostos desde cedo a essa espécie de degradação moral Também para Rogério Greco o bem jurídico tutelado pela previsão do art 218 é a dignidade sexual do menor de 14 quatorze anos bem como o direito a um desenvolvimento sexual condizente com a sua idade No mais tudo do que dissemos sobre o bem jurídico tutelado quando examinamos o artigo anterior aplicase a este dispositivo e ambos e distinguem somente pelos tipos de condutas que cada um proíbe 3 Sujeito ativo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa homem ou mulher sem nenhuma condição especial Eventual qualidade especial do agente em relação à vítima ascendente descendente tutor etc qualifica o crime O outrem aquele que se serve da ação criminosa isto é que se aproveita da vítima para satisfazer sua lascívia não é coautor deste crime pois a finalidade exigida pelo tipo é satisfazer a lascívia de outrem e não a própria poderá dependendo das circunstâncias responder pelo crime de estupro de vulnerável art 217A se praticar algum ato sexual que constitua conjunção carnal ou outro ato libidinoso diverso Essa tipificação é no mínimo extravagante criminaliza a conduta de quem induz a prática da conduta mas não incrimina quem se beneficia da conduta da vítima menor isto é quem a executa 4 Sujeito passivo Sujeito passivo igualmente pode ser qualquer pessoa desde que menor de quatorze anos Tratandose de vítima adulta o crime será o capitulado no art 227 na hipótese de menor de dezoito e maior de quatorze será a figura qualificada prevista no 1º desse mesmo dispositivo Tratase de crime que necessariamente exige a participação efetiva de outrem que no entanto não é punido Pode ser tanto do sexo masculino quanto do feminino pois a lei não os distingue em outros termos pessoas de ambos os sexos podem ser induzidas a satisfazer a lascívia alheia 5 Tipo objetivo adequação típica A ação tipificada a exemplo da previsão constante do art 227 consiste em induzir alguém menor de 14 anos isto é persuadir aliciar levar alguém a satisfazer a lascívia de outrem Em outros termos induzir significa suscitar a ideia tomar a iniciativa intelectual fazer surgir no pensamento do autor uma ideia até então inexistente que não deixa de ser uma forma ou espécie de instigação esta mais abrangente que os autores tradicionais têm denominado determinação e a qual nós preferimos chamar de induzimento Realmente para que haja induzimento de alguém a satisfazer a lascívia de outrem é necessário que tenha havido promessas dádivas ou súplicas como forma de cativar a confiança e a vulnerabilidade da vítima 51 Fim do induzimento satisfazer a lascívia de outrem A finalidade do induzimento é satisfazer a lascívia de outrem mediante a prática de conduta lasciva Tratase em outros termos de práticas sexuais contemplativas exibicionistas expositivas v g streep tease como por exemplo vestirse com determinadas fantasias para satisfazer certas taras etc A lascívia a ser satisfeita repetindo deve ser a de outrem e não a própria Outrem deve ser pessoa certa determinada isto é identificada de qualquer sexo caso contrário constituiria o crime do art 228 favorecimento da prostituição A proibição contida no texto legal no entanto não exige que se trate de determinado indivíduo Podem ser até vários a cuja lascívia o sujeito passivo se prestará na mesma ação O que se exige é que as pessoas sejam certas pois se o induzimento se referir a número indeterminado vago e impreciso de indivíduos o crime passa a ser o de favorecimento da prostituição art 228 Aquele que se serve da ação criminosa isto é que se aproveita da vítima para satisfazer sua lascívia não é coautor do crime pois a finalidade exigida pelo tipo é satisfazer a lascívia de outrem e não a própria poderá dependendo das circunstâncias caracterizar o crime de estupro de vulnerável art 217A se praticar algum ato sexual que constitua conjunção carnal ou outro ato libidinoso diverso Não se exige ademais para a tipificação deste crime nem habitualidade nem venalidade por falta de previsão legal 52 Tipificação necessidade de contato físico Para a tipificação do crime similar contemplado no art 227 mediação para servir a lascívia de outrem a doutrina tradicional entendia que era indispensável uma relação direta do terceiro com a vítima Nesse sentido era o magistério de Hungria que professava Perante o nosso Código porém é iniludível a necessidade de uma relação direta entre a vítima e o terceiro de modo que tal fato não configura o lenocínio mediador podendo dadas as circunstâncias constituir o crime de corrupção de menores ou atentado violento ao pudor 53 Distinguese da nova previsão do art 218 Nesse particular basicamente distinguese a nova previsão do art 218 que além da menoridade da vítima menor de quatorze anos dispensa a necessidade de contato físico dela com o terceiro O fundamento dessa conclusão é bem simples a prática de qualquer ato libidinoso conjunção carnal ou outro ato libidinoso com menor de quatorze anos caracteriza o crime de estupro de vulnerável nos ternos do art 217A Não é outro o entendimento de Rogério Greco quando afirma Por satisfazer a lascívia somente podemos entender aquele comportamento que não imponha à vítima menor de 14 catorze anos a prática de conjunção carnal ou outro ato libidinoso uma vez que nesses casos teria o agente que responder pelo delito de estupro de vulnerável em virtude da regra constante do art 29 do Código Penal que seria aplicada ao art 217A do mesmo diploma repressivo Código Penal comentado p 622623 Nessa linha e observando nossa função de intérprete obrigamonos a evitar o conflito de normas penais que sabemos todos é apenas aparente Nesse sentido aqueles contatos superficiais como simples toques que em tese poderiam caracterizar importunação ofensiva ao pudor art 61 da LCP poderiam integrar a novel infração penal desde que se trate de vítima menor de quatorze anos de qualquer sexo 54 Punição do partícipe em crime de estupro de vulnerável Nesse sentido falece razão para a inconformidade manifestada por Guilherme de Souza Nucci que entendendo estar impedida a punição do partícipe de estupro de vulnerável conclui Ocorre que o legislador possivelmente por falta de orientação criou a figura do art 218 excepcionando o indutor e concedendolhe a pena de reclusão de dois a cinco anos Cuidase de uma exceção pluralística à teoria monística Concedeu pena menor ao indutor Entretanto aquele que instigar ou auxiliar um menor de 14 anos a praticar ato sexual com outrem seria considerado partícipe do crime de estupro de vulnerável Crimes contra a Dignidade Penal p 46 E logo adiante reforçando sua premissa Nucci exemplifica Portanto se A induz dar a ideia a menor de 14 anos B a ter conjunção carnal com C responderá pelo delito enquanto C deve ser processado como incurso no art 217A estupro de vulnerável O partícipe moral tem pena mínima de dois anos enquanto o autor tem pena mínima de oito anos Sob outro prisma caso A instigue fomentar ideia preexistente a menor de 14 anos B a ter conjunção carnal com C ambos A e C responderão por estupro de vulnerável com pena mínima de oito anos Venia concessa discordamos da premissa e da sua conclusão Em primeiro lugar a previsão do art 218 não é de induzir menor à prática de qualquer ato sexual conjunção carnal ou outro ato libidinoso como parece ter interpretado Nucci mas tão somente induzir menor a satisfazer a lascívia de outrem que não se confunde com a interpretação referida 55 Limites da abrangência do art 218 Em segundo lugar o exemplo dado pelo autor é igualmente equivocado e não se adapta à previsão constante do art 218 Ora o exemplo sugerido pelo penalista é induzir à prática de conduta tipificada como estupro de vulnerável consequentemente tanto indutor quanto instigador responderão indistintamente como partícipes dessa modalidade de estupro Agora exemplificativamente se A induz dá a ideia menor de 14 anos B a satisfazer a lascívia de C responderá pelo delito enquanto C não por faltarlhe a elementar satisfazer a lascívia de outrem satisfez a própria lascívia De notarse ademais que ao contrário dos argumentos do autor o texto do art 218 não contém os vocábulos praticar ato sexual ou ter conjunção carnal que altera substancialmente o conteúdo o sentido e a abrangência do dispositivo Nessa linha é incensurável a conclusão de Rogério Sanches Cunha in verbis no lenocínio comum art 227 não importa a espécie de lascívia que a vítima é induzida a satisfazer Já no art 218 tratandose de vítima menor de 14 anos não pode consistir em conjunção carnal ou atos libidinosos diversos da cópula normal pois nesses casos haverá o crime de estupro de vulnerável art 217A do CP Limitase portanto às práticas sexuais meramente contemplativas como por exemplo induzir alguém menor de 14 anos a vestirse com determinada fantasia para satisfazer a luxúria de alguém Comentários à Reforma Criminal de 2009 p 53 56 A previsão do art 218 não exige contato físico Por todos esses fundamentos sustentamos que a atual previsão do art 218 não exige sequer contato físico da vítima com terceiro podendo inclusive configurar o crime a simples contemplação lúdica da vítima em circunstâncias suficientes para excitar a lascívia de alguém Nesse sentido lembrava Hungria que A jurisprudência italiana já reconheceu o proxenetismo até mesmo no caso em que o agente se limita a tirar fotografias da vítima em atitude impudica para com elas excitar a lascívia alheia Comentários ao Código Penal p 276 E isso é bom destacar porque o Código Rocco 1930 não dispunha de previsão similar ao estupro de vulnerável art 217A 57 Induzimento e instigação Por fim cabe uma palavra a respeito da instigação na medida em que o tipo penal contém somente o verbo induzir Afinal o instigador incidiria nesse tipo penal Embora possa parecer uma certa preciosidade técnica na realidade são expressões que têm significados muito próximos por vezes utilizada uma pela outra sem maior dificuldade No entanto ambas têm sentidos distintos embora muito parecidos Com efeito há instigação quando o partícipe atua sobre a vontade do autor no caso do instigado Instigar repetindo significa animar estimular reforçar uma ideia existente o induzimento ao contrário cria uma ideia que até então não existia O instigador limitase a provocar a resolução criminosa do autor não tomando parte nem na execução nem no domínio do fato É indiferente o meio utilizado para a instigação persuasão conselho dissuasão etc Para que haja instigação é necessária uma influência no processo de formação da vontade abrangendo os aspectos volitivo e intelectivo Não é suficiente criar uma situação tentadora para o autor o que poderia configurar cumplicidade A instigação deve dirigirse a um fato determinado assim como a um autor ou autores determinados Hans Welzel Derecho Penal Alemán trad Juan Bustos Ramírez e Sergio Yáñez Pérez Santiago Ed Jurídica de Chile 1970 p 166 58 Instigação e princípio da taxatividade A instigação é resumindo uma espécie de participação moral em que o partícipe age sobre a vontade do autor quer provocando para que surja nele a vontade de cometer o crime induzimento quer estimulando a ideia existente instigar que é a instigação propriamente dita mas de qualquer modo contribuindo moralmente para a prática do crime Enfim em respeito à função taxativa do princípio da tipicidade não se pode admitir o instigador como autor dessa infração penal Contudo havendo autor principal induzindo menor de quatorze anos a satisfazer a lascívia de outrem certamente o instigador e igualmente o cúmplice responderá como partícipe dessa infração penal 6 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo é composto pelo dolo que consiste na vontade consciente de praticar a conduta incriminada induzir no dispositivo ou seja o dolo é constituído pela vontade consciente de levar a vítima a praticar ação que objetive a satisfazer a lascívia de outrem Se o agente for movido pelo fim de lucro a pena de prisão será acrescida da pena de multa A existência de qualquer outra finalidade será irrelevante O elemento subjetivo do agente também tem que abranger a situação de vulnerabilidade da vítima no caso menor de quatorze anos Assim por exemplo se o agente desconhece que o menor tem menos de quatorze anos há erro de tipo que descaracteriza o delito em apreço Convém destacar que a exemplo das demais hipóteses relacionadas a crimes sexuais contra vulneráveis o dolo tem que abranger além da idade da vítima também o aspecto de tratarse de alguém na condição de vulnerabilidade Com efeito o desconhecimento de que se trata de menor de quatorze anos como também de que pela idade pode tratarse de alguém legalmente reconhecido como em situação de vulnerabilidade menor de 14 quatorze anos pode configurar erro de tipo No entanto tendo consciência de que se trata de menor de quatorze anos a vulnerabilidade regra geral lhe é inerente o que teoricamente inviabiliza a invocação de erro de tipo 7 Consumação e tentativa Consumase o crime do art 218 do Código Penal com o efetivo induzimento ou seja quando a vítima é convencida pelo agente a satisfazer a lascívia de terceiro Isso não quer dizer contudo que para consumarse este crime seja necessária a satisfação da lascívia de outrem Consumase enfim com o convencimento da vítima menor em satisfazer a luxúria alheia independentemente de a outra pessoa atingir o gozo genésico Na realidade a consequência ou resultado da conduta de induzir é a obtenção do assentimento da vítima em proporse a satisfazer a lascívia de outrem atendendo a pretensão do sujeito ativo mesmo que não a realize Nesse sentido venia concessa a eventual satisfação da lascívia alheia representará simples exaurimento do crime Em outros termos a nosso juízo tratase de crime material cuja consumação ocorre quando a vítima é convencida pelo agente a satisfazer a lascívia de outrem O legislador resolveu antecipar a consumação do crime objetivando proteger o menor de quatorze anos que não tem aptidão volitiva do ponto de vista sexual mas isso não o transforma em crime formal Convém destacar por outro lado para afastar alguns equívocos interpretativos que se o agente induz a vítima a praticar ato libidinoso com alguém de qualquer natureza seja conjunção carnal ou outro ato libidinoso diverso não configurará este crime do art 218 mas o de estupro de vulnerável consumado ou tentado dependendo das circunstâncias Nessa hipótese também o beneficiário responderá pelo estupro Admitese a tentativa embora teoricamente difícil seja sua constatação Exigese muita cautela para não incriminar qualquer palavra como tipificadora do delito em sua forma tentada 8 Classificação doutrinária Tratase de crime comum não exige qualquer condição ou qualidade especial do sujeito ativo material para consumarse exige como resultado o convencimento efetivo em satisfazer a lascívia de outrem ainda que esta não se concretize e que se acontecer caracterizará apenas o seu exaurimento de forma livre pode ser praticado por qualquer meio ou forma escolhidos pelo agente comissivo as ações representadas pelos verbos nucleares implicam ação positiva do agente unissubjetivo que pode ser praticado por apenas um agente plurissubsistente a conduta pode ser seccionada em mais de um ato instantâneo o resultado se produz de imediato numa relação de proximidade entre ação e consequência 9 Pena e ação penal A pena cominada é de reclusão de dois a cinco anos na modalidade simples A pena será majorada se ocorrer qualquer das hipóteses previstas no art 226 Equivocadamente no entanto foi vetado o parágrafo único que cominava pena de multa se o crime fosse cometido com o fim de obter vantagem econômica Nesse tipo de infração penal a motivação do agente invariavelmente é a obtenção de lucro A natureza da ação penal por fim relativa aos crimes constantes dos Capítulos I e II do Título VI é tratada quando analisamos o disposto no art 225 cujo conteúdo tem a finalidade de disciplinar exatamente esse tema Pela complexidade que assumiu a partir da Lei n 120152009 concentramos seu exame nesse dispositivo para onde remetemos o leitor Satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente Art 218A Praticar na presença de alguém menor de 14 catorze anos ou induzilo a presenciar conjunção carnal ou outro ato libidinoso a fim de satisfazer lascívia própria ou de outrem Pena reclusão de 2 dois a 4 quatro anos Artigo acrescentado pela Lei n 12015 de 7 de agosto de 2009 D O U T R I N A 1 Considerações preliminares Esta figura típica não tem precedente na legislação brasileira e tampouco apresenta maior semelhança com algum tipo já contido no nosso Código Penal de 1940 com suas múltiplas alterações No entanto a corrupção sexual de menores já era contemplada no art 218 desse diploma legal visando proteger a iniciação precoce de menores entre 14 e 18 anos nas atividades sexuais especialmente sua exploração por adultos Para os menores de 14 anos a punição dos adultos que desrespeitassem sua vulnerabilidade sexual era bem mais severa considerandose violência presumida Inegavelmente a contemplação desta nova figura vem preencher uma grande lacuna pela qual se ressentia nosso ordenamento jurídico especificamente em relação ao menor vulnerável O crime de corrupção de menores que era previsto no art 218 do CP alcançava somente os maiores de 14 e menores de 18 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido no crime de satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente é a exemplo do crime de estupro de vulnerável a dignidade sexual desse menor Também neste crime não se trata da liberdade sexual atual do menor de 14 anos como bem jurídico protegido que sustentamos não existir nessa faixa etária pois como criança ainda não tem sua personalidade formada e por extensão não se pode falar em liberdade sexual e muito menos no exercício dessa liberdade A criminalização das condutas descritas no art 218A visa proteger o desenvolvimento e a evolução saudável da personalidade de dito menor para que em sua fase adulta possa decidir livremente e sem traumas psicológicos sobre seu comportamento sexual Procurase em outros termos proteger a formação moral sexual dos menores protegendoos contra a depravação e a luxúria a que não podem e não devem ser expostos desde cedo aliás espécie de degradação moral que os meios televisivos que invadem livremente os lares brasileiros têmse encarregado de propagar 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo tratandose de crime comum pode ser qualquer pessoa homem ou mulher independente de a vítima ser do mesmo sexo ou não Sujeito passivo somente pode ser o menor de 14 anos tanto do sexo masculino como do feminino Haverá certamente sérias divergências em relação aos menores já sexualmente corrompidos 4 Tipo objetivo adequação típica O tipo prevê duas modalidades alternativas de condutas a praticar na presença da vítima conjunção carnal ou outro ato libidinoso b induzir a vítima a presenciar conjunção carnal ou outro ato libidinoso Na primeira hipótese o agente desrespeita a presença do menor vulnerável e pratica ato libidinoso conjunção carnal ou ato diverso para satisfazer lascívia própria ou de terceiro Na verdade o agente aproveitase da presença do menor para satisfazer sua própria lascívia ou a de terceiro sem contudo interferir na vontade ou na manifestação desta e sem qualquer contato físico 41 Interferência na liberdade de vontade Na segunda hipótese o agente interfere na liberdade de vontade da vítima ainda carente das condições necessárias para se autodeterminar livremente fazendolhe nascer a ideia de presenciar ato de libidinagem Nesta modalidade o agente vicia a vontade da vítima ainda criança ou préadolescente persuadindoa a assistir a prática de conjunção carnal ou outro ato libidinoso corrompendoa sexualmente Em qualquer uma das duas condutas tipificadas há potencial suficiente para perverter depravar viciar ou desnaturar a formação moralsexual de menor vulnerável que o Estado visa proteger justificandose sua incriminação mormente em uma época em que mundialmente se faz grande campanha para combater a pornografia infantil Enfim qualquer uma das condutas i praticar na presença da vítima atos de libidinagem ou ii induzila a presenciálos constrangea a assistir atos de luxúria de lascívia ou de libidinagem que são capazes de despertar seus instintos lascivos ou estimular precocemente sua sexualidade todos idôneos para abalar seu psiquismo ainda em desenvolvimento 42 Meio executivo do crime O meio executivo do crime pode ser tanto praticar ato libidinoso conjunção carnal ou ato libidinoso diverso na presença da vítima menor de 14 anos de qualquer sexo como induzila a presenciar ato libidinoso a fim de satisfazer a lascívia de outrem Ato libidinoso é ato lascivo voluptuoso erótico e concupiscente que pode ser a conhecida conjunção carnal cópula vagínica ou qualquer outro ato libidinoso diverso da conjunção carnal Dentre estes últimos podemse destacar como os mais graves quando praticados mediante violência real ou presumida o sexo anal e o sexo oral por representarem nessas circunstâncias um desvirtuamento de sua finalidade funcional e por isso violentarem de forma mais grave a liberdade sexual individual do ser humano Aparentemente podese ter a impressão de que a Lei n 120152009 aboliu a violência presumida com a revogação do art 224 sem a reposição de disposição semelhante à que constava em suas alíneas No entanto essa impressão é absolutamente equivocada ante as contemplações do disposto nos arts 217A 218A por exemplo Na verdade o legislador de 1940 contemplou expressamente a adoção da violência presumida ao passo que o legislador atual foi dissimulado 43 Não há participação direta da vítima Desnecessário destacar por fim que em nenhuma das hipóteses tipificadas a vítima participa diretamente do ato de libidinagem limitandose a presenciálos como diz o texto legal A eventual participação de menor vulnerável em qualquer ato libidinoso altera a tipificação da conduta passando a caracterizar o estupro de vulnerável art 217A 44 Na presença de alguém menor de quatorze anos O texto legal utiliza os vocábulos na presença de alguém menor e induzilo a presenciar ou seja com os termos presença e presenciar fica claro que o menor vulnerável deve encontrarse fisicamente no local onde se realiza a cena de libidinagem Presença e presenciar têm significado muito específico iniludível de que o indivíduo deve estar pessoalmente ou dito de outra forma de corpo presente onde se desenrola o acontecimento libidinoso Em outros termos na presença ou presenciar significa estar presente ver assistir in loco e não indiretamente via qualquer mecanismo tecnológico físico ou virtual como permitiria o mundo tecnológico Para os dicionaristas presença é o fato de uma pessoa ou uma coisa encontrarse num lugar determinado e presenciar significa assistir a estar presente a e numa segunda versão pode ser verificar observar algo 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo do crime satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente é o dolo constituído pela vontade consciente de praticar as ações descritas no tipo penal qual seja praticar ato de libidinagem conjunção carnal ou outro ato libidinoso ou de induzir a vítima a praticálo ou a presenciálo sendo irrelevante o propósito de corromper No entanto o dolo somente se completa com a presença simultânea da consciência e da vontade de todos os elementos constitutivos do tipo penal Com efeito quando o processo intelectualvolitivo não abrange qualquer dos requisitos da ação descrita na lei o dolo não se completa e sem dolo não há crime pois não há previsão da modalidade culposa 6 Fim especial satisfazer a própria lascívia O fim especial de satisfazer a própria lascívia como também a de outrem constitui a razão de ser da conduta incriminada aliás poder seia afirmar que a satisfação sexual do agente não se esgota no ato sexual em si mas reside fundamentalmente na sensação de ser visto por um menor vulnerável isto é em saber que o menor está assistindo a execução do ato É como se o agente não se satisfizesse com a libidinagem propriamente mas com o fato de um menor vulnerável assistilo O verdadeiro prazer reside em ser visto por um menor naquelas circunstâncias É digamos verdadeiramente uma perversão sexual do agente 7 Consumação do crime Há duas modalidades distintas de condutas i praticar ato de libidinagem conjunção carnal ou outro ato libidinoso na presença de menor e ii induzilo a presenciar Na modalidade de praticar como crime material consumase com a efetiva prática de ato libidinoso na presença de menor de 14 anos Na modalidade de induzir a presenciar tal ato também como crime material para alguns formal consumase com o efetivo induzimento ou seja quando a vítima é convencida pelo agente a presenciar a prática de conjunção carnal ou outro ato libidinoso Consumase enfim com o convencimento da vítima menor pelo sujeito passivo a contemplar a cena lasciva independente de satisfazer a luxúria de outrem bem como de esta atingir o gozo genésico Na realidade o resultado da conduta de induzir é a obtenção do assentimento da vítima em assistir o ato de libidinagem Em nenhuma das hipóteses a vítima participa da prática libidinagem caso contrário configurará o crime de estupro de vulnerável art 217 A 71 Figura tentada Convém destacar que satisfazer a lascívia própria ou de outrem constitui o elemento subjetivo especial do injusto que como se sabe não precisa concretizarse sendo suficiente que tenha orientado a conduta do sujeito ativo Se esta ocorrer efetivamente representará simples exaurimento do crime Admitese a tentativa embora teoricamente difícil seja sua constatação Exigese muita cautela para não incriminar qualquer palavra ou gesto como tipificadora desse crime em sua forma tentada 8 Classificação doutrinária Tratase de crime comum não exige qualquer condição ou qualidade especial do sujeito ativo material para consumarse exige como resultado o real convencimento de satisfazer a lascívia de outrem ainda que esta não se concretize e que se acontecer caracterizará apenas o seu exaurimento de forma livre pode ser praticado por qualquer meio ou forma escolhida pelo agente comissivo as ações representadas pelos verbos nucleares implicam ação positiva do agente unissubjetivo que pode ser praticado por apenas um agente plurissubsistente a conduta pode ser seccionada em mais de um ato instantâneo o resultado se produz de imediato numa relação de proximidade entre ação e consequência 9 Majoração de pena Os crimes contra a dignidade sexual catalogados nos Capítulos I a II do Título VI do Código Penal recebem aumento de quarta parte se houver concurso de duas pessoas ou mais previsto no inciso I do art 226 de metade se concorrer qualquer das hipóteses relacionadas no inciso II do mesmo artigo São hipóteses que dificultam a defesa da vítima I ou violam os princípios morais e familiares além do abuso da autoridade exercida sobre a vítima Em todas essas hipóteses o legislador considerou o maior desvalor da ação dos agentes 10 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é a reclusão de dois a quatro anos A pena aplicada será majorada segundo as previsões do art 226 será elevada de quarta parte se houver concurso de pessoas I e elevada de metade se ocorrer alguma das hipóteses elencadas no inciso II A natureza da ação penal por fim relativa aos crimes constantes dos Capítulos I e II do Título VI é tratada quando analisamos o disposto no art 225 cujo conteúdo tem a finalidade de disciplinar exatamente esse tema Pela complexidade que assumiu a partir da Lei n 120152009 concentramos seu exame nesse dispositivo para onde remetemos o leitor Favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual de vulnerável Art 218B Submeter induzir ou atrair à prostituição ou outra forma de exploração sexual alguém menor de 18 dezoito anos ou que por enfermidade ou deficiência mental não tem o necessário discernimento para a prática do ato facilitála impedir ou dificultar que a abandone Pena reclusão de 4 quatro a 10 dez anos 1º Se o crime é praticado com o fim de obter vantagem econômica aplicase também multa 2º Incorre nas mesmas penas I quem pratica conjunção carnal ou outro ato libidinoso com alguém menor de 18 dezoito e maior de 14 catorze anos na situação descrita no caput deste artigo II o proprietário o gerente ou o responsável pelo local em que se verifiquem as práticas referidas no caput deste artigo 3º Na hipótese do inciso II do 2º constitui efeito obrigatório da condenação a cassação da licença de localização e de funcionamento do estabelecimento Artigo acrescentado pela Lei n 12015 de 7 de agosto de 2009 D O U T R I N A 1 Considerações preliminares O art 218 do Código Penal em sua versão original criminalizava a conduta de quem corrompesse menor de dezoito e maior de catorze anos com ele praticando ato de libidinagem ou o induzisse a praticálo ou presenciálo Sustentavase por via de consequência que somente poderia ser sujeito passivo quem ainda não fosse corrompido Poder seia vislumbrar alguma semelhança da novel infração com a revogada corrupção de menores Desde logo afora a idade das possíveis vítimas não vemos nenhuma identificação entre as elementares da atual figura com a anterior Por outro lado nesta novel infração o sujeito ativo não precisa ter qualquer contato físico muito menos praticar algum ato de libidinagem conjunção carnal ou ato libidinoso diverso com o suposto ofendido Com efeito o ofendido isto é aquele menor que vier a prostituirse passando a exercer a prostituição ou outra forma de exploração sexual somente é induzido atraído ou submetido pelo agente sem com ele praticar qualquer ato de libidinagem 11 Inovação terminológica Neste tipo penal o legislador inova abandonando a velha terminologia corrupção de menores e relativiza o termo vulnerável para criminalizar determinadas condutas libidinosas praticadas contra menores de dezoito anos Nesse sentido merece destaque a afirmação de Nucci Eliminouse qualquer referência à expressão corrupção de menores Passase a adotar a terminologia relativa à figura do vulnerável Com isso mais uma vez tornase clara a utilização do conceito de vulnerabilidade para diversos enfoques Podese enfatizar ser a vulnerabilidade relativa e absoluta como já expusemos nos comentários ao art 217A Crimes contra a dignidade sexual p 53 No entanto a submissão de menor de dezoito anos à prostituição ou à exploração sexual era contemplada no art 244A do ECA que cominava a pena de quatro a dez anos de reclusão No particular foi mantido o mesmo padrão de sanção penal Por outro lado como destaca Rogério Sanches Já nas modalidades induzir facilitar ou atrair alguém menor de dezoito e maior de quatorze anos incidia o art 228 1º com pena de 3 a 8 anos A lei nova nesse ponto é mais gravosa não podendo retroagir para alcançar fatos pretéritos Luiz Flavio Gomes Rogério Sanches Cunha e Valério de Oliveira Mazzuoli Comentários à Reforma Criminal de 2009 p 60 grifos do original 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido no crime de favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual de vulnerável é genericamente a dignidade sexual de pessoa definida como vulnerável Aliás vulnerável para este dispositivo legal diferentemente dos três artigos anteriores é o menor de dezoito anos naqueles dispositivos é o menor de quatorze além de quem por enfermidade ou deficiência mental não tem o necessário discernimento para a prática do ato Em outros termos a criminalização da conduta descrita no art 218B visa proteger o desenvolvimento e a formação saudável da personalidade do menor para que na sua fase adulta possa decidir livremente e sem traumas psicológicos seu comportamento sexual Enfim o bem juridicamente protegido numa visão mais abrangente é a dignidade sexual do menor relativamente vulnerável e de quem por deficiência mental não tem o necessário discernimento para a prática do ato Procurase em outros termos assegurar o respeito à dignidade sexual à intimidade e privacidade desses sujeitos passivos protegendoos especialmente contra a depravação e a luxúria ante a dificuldade que deve ser comprovada de discernimento que apresentam 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo como se trata de crime comum pode ser qualquer pessoa homem ou mulher independentemente de a vítima ser do mesmo sexo Não há exigência de qualquer outra qualidade ou condição especial do sujeito ativo Sujeito passivo somente pode ser o menor de dezoito anos tanto do sexo masculino como feminino Embora o texto legal não o diga fazse necessário que o menor não tenha menos de quatorze anos pois nesse caso o crime poderá ser o de estupro de vulnerável art 217A Ainda poderá figurar como sujeito passivo quem por enfermidade ou deficiência mental não tem o necessário discernimento para a prática do ato Nessa última hipótese a exploração sexual não pode atingir o nível de prática de ato de libidinagem sob pena de poder configurar o estupro de vulnerável já mencionado Nesse sentido procedente a conclusão de Rogério Greco in verbis Assim para que o agente responda pelo tipo penal previsto pelo art 218B do Código Penal a sua conduta deve ser dirigida tão somente no sentido de explorar o enfermo ou deficiente mental que não tenha o discernimento para o ato sem que com ele seja praticada qualquer conduta libidinosa Dessa forma exemplifica Greco incorreria na mencionada figura típica o agente que explorasse sexualmente a vítima para que tirasse fotos eróticas trabalhasse em casas de streaptease ou mesmo de disquesexo simulando para o cliente atos sexuais através do telefone etc Código Penal comentado p 632 4 Tipo objetivo adequação típica Prostituição é o exercício habitual do comércio carnal do próprio corpo para satisfação sexual de indeterminado número de pessoas O que caracteriza efetivamente a prostituição é a indeterminação de pessoas e a habitualidade da promiscuidade É indiferente que se trate de vítima já desencaminhada para que se caracterize o crime de favorecimento da prostituição pois a lei tanto pune o induzimento ou aliciamento como a facilitação da prostituição Em sentido semelhante manifestase Yordan Moreira Delgado O sujeito ativo homem ou mulher através de uma das condutas referidas faz com que o sujeito passivo homem ou mulher em situação de vulnerabilidade se prostitua ou seja de outra forma explorado sexualmente Na prostituição a vítima comercializa o seu corpo em troca de dinheiro ou de outros bens como roupa comida etc É possível contudo que a vítima seja explorada sexualmente sem nada receber em troca por isso o legislador mencionou outra forma de exploração sexual Comentários à Lei 1201509 consultado em httpjus2uolcombrdoutrinatextoaspid13629p1 A conduta do agente pode ser praticada também mediante omissão se não na forma de induzir alguém a essa atividade pelo menos para facilitála deixando por exemplo de realizar atividade a que estivesse obrigado para impedir garantidor art 13 2º e alíneas do Código Penal o exercício de prostituição 41 Condutas que seduzem para o crime As primeiras três condutas incriminadas no caput são submeter sujeitar subjugar induzir suscitar a ideia tomar a iniciativa intelectual convencer ou atrair incentivar estimular seduzir à prostituição ou outra forma de exploração sexual Também pode ser realizada a conduta por meio da facilitação que é chamada de lenocínio acessório Facilitar é tornar fácil favorecer afastar dificuldades e empecilhos caracterizase quando o agente auxilia a vítima na prostituição ajudaa nesse mister arranjandolhe clientes colocandoa em pontos ou locais adequados enfim propicialhe os meios condições ou oportunidades para prostituirse Em outros termos a facilitação prevista no Código Penal se traduz na criação dos mecanismos indispensáveis à consumação do delito Esses primeiros quatro verbos nucleares submeter induzir atrair e facilitar representam condutas de certa forma sedutoras isto é aliciadoras da vontade da vítima normalmente em dificuldades ou em situações vulneráveis não no sentido do art 217 ou seja em situações carentes de oportunidades de recursos ou de meios materiais e pessoais para aspirar algo melhor na vida Por essas razões tornam se presas fáceis dos vendilhões da moral alheia que se aproveitam de pessoas que se encontram em dificuldades dessa ordem que ficam a mercê desses espertalhões especuladores das desgraças humanas os quais procuram mostrarlhe aspectos atraentes para a finalidade a que se propõem 42 Condutas que visam impedir o abandono Criminalizamse ainda as condutas de impedir e dificultar o abandono da prostituição ou exploração sexual Impedir oporse não deixar que desista que alguém a abandone isto é impedir que alguém com sério propósito de abandonar a prostituição a deixe sendo insuficientes meras declarações da prostituta Dificultar por sua vez é criar embaraços atrapalhar fazer exigências difíceis de ser cumpridas com a finalidade de inviabilizar o abandono da prostituição pela vítima As duas últimas condutas impedir ou dificultar ao contrário das antes examinadas não visam a atração ou a inclusão da vítima no mundo da prostituição mas evitar que a abandone o que para o direito penal tem o mesmo significado Em outras palavras o agente pode ainda impedir ex ameaçando ou dificultar criando obstáculos ou empecilhos que a vítima deixe a prostituição ou a exploração sexual Embora a depravação moral seja em tese uma viagem sem volta há sempre a expectativa de que mesmo os prostituídos possam recuperarse isto é afastarse da vida mundana com o pouco de dignidade que lhes resta Esse é podese afirmar o fundamento para justificar igual punição também do agente que impede ou dificulta o abandono da prostituição 43 Meios morais visando impedimento do abandono Geralmente o impedimento de abandono da prostituição será por coação moral psicológica ou econômica e dessa forma inviabiliza se a saída ou o abandono da prostituição É fácil compreender a eficácia de condutas dessa ordem na medida em que as pessoas que se encontram nessa situação são via de regra desprovidas de maiores recursos financeiros morais psicológicos ou materiais sem condições de enfrentar quem os explora e por razões como essas acabam de certa forma sendo escravizadas por seus exploradores posto que não têm condições de libertarse do jugo seus rufiões Nas três últimas formas de conduta do agente uma facilitadora da prostituição facilitar e duas mantedoras no statu quo ante impedir ou dificultar a vítima já está sendo explorada sexualmente e é mantida nessa situação ao contrário das hipóteses em que o agente submete induz ou atrai pois nesses casos a vítima ainda não estava sendo explorada sexualmente 44 Não há necessidade de finalidade lucrativa Para a configuração do delito de favorecimento da prostituição não se exige a finalidade lucrativa a qual se existir dará causa também à aplicação de pena pecuniária Embora o fim de lucro seja a regra não é ele indispensável uma vez que a prostituição pode ocorrer por puro vício ou depravação moral Contudo se houver a finalidade lucrativa aplicarseá também a pena de multa 1º Em outros termos quem com a finalidade de obter lucro arranja parceiro à mulher embora já desencaminhada para fins de relacionamento sexual comete o delito de favorecimento à prostituição sendo punido nessa hipótese com a cumulação da pena de multa 45 Revogação do art 244A do ECA Por fim adverte Rogério Sanches Cunha que antes da Lei 120152009 submeter menor de 18 anos à exploração sexual se subsumia ao disposto no art 244A do ECA com pena de 4 a 10 anos A alteração portanto manteve a sanção penal Já nas modalidades induzir facilitar ou atrair alguém menor de 18 e maior de 14 anos incidia o art 228 1º com pena de 3 a 8 anos A lei nova nesse ponto é mais gravosa não podendo retroagir para alcançar fatos pretéritos Luiz Flavio Gomes Rogério Sanches Cunha e Valério de Oliveira Mazzuoli Comentários à Reforma Criminal de 2009 p 60 5 Menor de dezoito anos e extensão do conceito de vulnerável Em um primeiro momento temse a impressão de que o legislador atribuiu a condição de vulnerável somente ao menor de quatorze anos ou a quem por enfermidade ou deficiência mental não tem o necessário discernimento para a prática do ato ou que por qualquer outra causa não pode oferecer resistência art 217A À evidência como destacamos ao examinarmos o estupro de vulnerável nessas hipóteses é presumida implicitamente a violência No entanto agora já no art 218B deparamonos novamente com a adjetivação de vulnerável para outra faixa etária qual seja menor de dezoito anos aparentemente sem qualquer justificativa razoável Essa opção políticocriminal do legislador gera no mínimo alguma perplexidade afora a dificuldade de se encontrar com segurança a sua interpretação mais adequada sem afrontar o princípio da reserva legal 51 Duas espécies de vulnerabilidade Devemos partir necessariamente do entendimento de que na ótica do legislador deve existir duas espécies ou modalidades de vulnerabilidade ou seja uma vulnerabilidade absoluta e outra relativa aquela referese ao menor de catorze anos configuradora da hipótese de estupro de vulnerável art 217A esta referese ao menor de dezoito anos contemplando a figura do favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual de vulnerável art 218B Nesse sentido esclarece Guilherme de Souza Nucci A Lei 12015 trouxe novo formato no art 218B ao trato com a questão delicada da vida sexual dos menores de 18 anos Eliminouse qualquer referência à expressão corrupção de menores Passase a adotar a terminologia relativa à figura do vulnerável Com isso mais uma vez tornase clara a utilização do conceito de vulnerabilidade para diversos enfoques Podese enfatizar ser a vulnerabilidade relativa e absoluta como já expusemos nos comentários ao art 217A Crimes contra a dignidade sexual p 53 52 Fórmulas de equiparação das menoridades Aliás os dois dispositivos 217A e 218B usam a mesma fórmula para contemplar a equiparação das respectivas menoridades 14 e 18 anos qual seja ou a quem por enfermidade ou deficiência mental não tem o necessário discernimento para a prática do ato ou que por qualquer outra causa não pode oferecer resistência Na realidade nos dois dispositivos o legislador cria hipóteses de interpretação analógica que deve obedecer os atributos dos respectivos paradigmas 53 Ampliação do conceito de vulnerabilidade Inegavelmente o legislador ampliou conceito de vulnerabilidade que define satisfatoriamente a condição do menor de quatorze anos para alcançar incompreensivelmente o menor de dezoito anos art 218B Os aplausos quanto ao acerto legislativo em relação à primeira hipótese não se repetem relativamente à segunda especialmente considerandose a evolução da moral sexual na sociedade contemporânea a maioridade civil aos dezoito anos a juventude se casando a partir dos dezesseis anos vivendo juntos votando aos dezesseis anos além da independência e da maturidade que a adquiriu neste início de milênio Com efeito esses atributos todos demonstram a absoluta desnecessidade de presunções e ficções jurídicas para criminalizar comportamentos morais com pesadas sanções penais privativas de liberdade Apresentase ainda mais paradoxal essa presunção de vulnerabilidade assumida pelo legislador em relação ao menor de dezoito se compararmos os usos e costumes e particularmente a moral sexual contemporânea com a dos idos da década de quarenta do século passado eloquente nesse sentido a política criminal adotada pelo legislador de 1940 que acertada e expressamente presumiu a violência nos então denominados crimes contra os costumes art 224 e suas alíneas somente em relação aos crimes sexuais praticados contra menor de quatorze anos 54 Confusão entre moral e direito Enfim o atual texto legal é retrógrado reacionário e ignora a evolução da sociedade confunde moral com direito tornandose merecedor de críticas além de exigir interpretação restritiva Taxar de relativa a adjetivação de vulnerável é insuficiente para se dar valoração conforme ao texto constitucional demandando in concreto a necessidade de se comprovar caso a caso a efetiva vulnerabilidade de dito menor Em outros termos como já ocorria na presunção de violência art 224 a segundo decisões do STF a ausência de comprovação dessa elementar torna eventual conduta atípica São circunstâncias fáticas que não só devem ser comprovadas e valoradas contextualizadamente como também e fundamentalmente devem estar descritas na denúncia que necessariamente deve dizer em que consiste a dita vulnerabilidade de menor de dezoito anos ou enfermo ou deficiente mental logicamente maior de quatorze 55 Necessidade de comprovar a vulnerabilidade Finalmente a despeito das críticas que endereçamos a essa opção políticocriminal do legislador para que a conduta do agente apresente adequação típica além de praticar no mínimo uma das condutas descritas no tipo penal art 218B é indispensável que a vítima seja efetivamente vulnerável Desnecessário enfatizar que menor de quatorze anos que vier a praticar ato de libidinagem cuja vulnerabilidade é absoluta e por isso não demanda qualquer prova além da tenra idade o crime será o de estupro de vulnerável art 217 A e não o descrito no dispositivo que ora analisamos se somente presenciar a prática de ato libidinoso de qualquer natureza poderá configurar o crime do art 218A 6 Prática de libidinagem com vítima vulnerável de favorecimento da prostituição Não apenas os que favorecem a prostituição ou exploram sexualmente as pessoas em estado de vulnerabilidade são criminalmente responsabilizados por crimes cometidos contra esses vulneráveis mas também quem com eles praticar conjunção carnal ou ato libidinoso diverso Nesse sentido a proibição constante do 2º em seu inciso I quem pratica conjunção carnal ou outro ato libidinoso com alguém menor de 18 dezoito e maior de 14 catorze anos na situação descrita no caput deste artigo Exemplifica Nucci nos seguintes termos os clientes de prostitutas e garotos de programa com menos de 18 anos podem ser punidos por tipo penal independente com penas elevadas de reclusão de quatro a dez anos Crimes contra a dignidade sexual p 59 61 Menor em condição de ser explorado sexualmente Contudo convém destacar a prática de conjunção carnal ou outro ato libidinoso com maior de quatorze anos e menor de dezoito somente tipificará o crime descrito neste dispositivo se o menor encontrarse na situação descrita no caput deste artigo nesse sentido Guilherme e Souza Nucci Crimes contra a dignidade sexual p 54 ou seja somente quando envolver prostituição de menor ou outra forma de exploração sexual Em outros termos a prática de relação sexual com maior de quatorze anos livre e espontaneamente configura conduta atípica caso contrário todos os nossos jovens e adolescentes deveriam ser remetidos à prisão Seria absurdo pensar diferente além de retroceder no tempo desconsiderando a própria revogação do crime de sedução que mais restritiva exigia as elementares da inexperiência ou justificável confiança Em outros termos o fundamento básico da incriminação da prática sexual com menores maiores de quatorze anos não é a relação em si mas exercitála com menor que se encontra na condição de vítima de exploração sexual ou prostituição 62 Atipicidade da conduta do cliente ocasional Merece destaque ainda o aspecto do cliente ocasional da prostituta que apenas busca o prazer com um produto que lhe é oferecido no mercado Nesse sentido por mais boa vontade que se tenha com o texto legal não há como admitir que o cliente eventual da prostituta a submete à prostituição Na verdade ele encontra uma condição preexistente que lhe é livremente oferecida e para a qual não concorreu de forma alguma Nesse contexto não há espaço para se admitir o sentido atribuído ao verbo submeter resultando portanto atípica a conduta do cliente eventual 63 Inovação criminalizadora do legislador Tratase de uma inovação do legislador na medida em que antes da Lei n 120152009 cuidavase de conduta atípica ante a ausência de previsão legal a menos que fosse possível o seu enquadramento em alguma daquelas hipóteses de presunção de violência antigo art 224 Embora a prostituição em si mesma continue sendo um indiferente penal o moralista legislador resolveu criminalizar a conduta de quem praticar ato de libidinagem conjunção carnal ou outro ato libidinoso com alguém prostituído ou sexualmente explorado desde que menor de dezoito anos por considerálo vulnerável Ignorouse que os adolescentes inclusive préadolescentes estão iniciando sua vida sexual muito cedo a partir dos treze ou quatorze anos alguns ainda mais cedo Por outro lado cabe a advertência quanto àqueles já comprovadamente prostituídos ou sexualmente explorados pois certamente enfrentarseá dificuldades quanto à adequação típica considerandose o bem jurídico protegido Provavelmente quer nos parecer seguirseá aquela orientação doutrináriojurisprudencial que afastava a tipicidade do crime de corrupção de menores antigo art 218 quando se tratasse de menor já corrompido 64 Elementar normativa condição de vulnerável Importante relembrar novamente o aspecto da relatividade da condição de vulnerável do maior de quatorze anos e menor de dezoito Considerandose que a vulnerabilidade constitui uma elementar normativa do tipo desde que se considere o nomen juris como integrante do tipo devese demonstrar cabalmente sua configuração pois sua ausência afasta a tipicidade da conduta mesmo que se comprove a prática de ato de libidinagem Essa circunstância permite nos afirmar que nem toda prática de conjunção carnal ou ato libidinoso diverso com menor de dezoito anos em prostíbulos ou similares configura o crime descrito no inciso que ora examinamos mas somente naquelas hipóteses que restar comprovada a condição de vulnerabilidade do ofendido e desde que adequadamente descrita na denúncia Desnecessário destacar que a prática dos mesmos atos de libidinagem com menor de quatorze anos configura o estupro de vulnerável art 217A crime bem mais grave 65 Possível erro de tipo Logicamente não se pode desprezar a possibilidade bastante frequente da ocorrência de erro de tipo relativamente à idade do menor sendo ademais impossível determinarse ao consumidor que antes de qualquer ato de libidinagem exija a apresentação de documentos os quais ainda assim podem não ser verdadeiros Nesse meio por outro lado é comum que menores tenham aparência envelhecida além de sua idade real decorrente de insônia noites maldormidas ingestão excessiva de álcool enfim os maustratos que a vida devassa lhes oferece contribuem para a aparência de amadurecimento entendase envelhecimento precoce Esses aspectos suficientemente idôneos para levar ao erro afastam a tipificação do crime pela ausência de dolo 7 Lacuna do inciso I do 2º do art 218B Vislumbramos uma grande lacuna no inciso I do 2º que não pode ser sanada com os instrumentos da analogia e da interpretação analógica No caput do art 218B são contemplados como ofendidos não apenas o menor de dezoito anos mas também alguém que por enfermidade ou deficiência mental não tem o necessário discernimento para a prática do ato Em outros termos o legislador equiparou a capacidade individual e a vulnerabilidade desses sujeitos às do menor de dezoito anos tipificando as condutas do caput quando forem praticadas tanto contra menor de dezoito anos quanto contra àqueles que pelas razões mencionadas não têm o necessário discernimento da prática de ato libidinoso No inciso que acabamos de mencionar no entanto o qual determina que incorre nas mesmas penas quem praticar conjunção carnal ou outro ato libidinoso contra alguém menor de dezoito anos e maior de quatorze omite a mesma proibição em relação aos demais sujeitos passivos constantes do caput 71 Lacuna que não pode ser colmatada Diante dessa lacuna quem na mesma situação descrita no caput praticar conjunção carnal ou outro ato libidinoso com alguém que por enfermidade ou deficiência mental não tem o necessário discernimento para a prática do ato pratica conduta atípica ante a redação do inciso I do 2º que ora examinamos Dessa forma não vemos como salvar essa lacuna que por tratarse de norma penal incriminadora não pode ser colmatada pela analogia e tampouco pela interpretação analógica sob pena de violar o princípio da reserva legal 8 Prática de ato libidinoso com menor de catorze anos Tratandose de vítima menor de catorze anos a eventual prática de qualquer ato de libidinagem seja conjunção carnal seja outro ato libidinoso conforme já afirmamos configurará o crime de estupro de vulnerável art 217A em detrimento de qualquer outro menos grave 9 Responsabilidade penal objetiva proprietário ou responsável pelo local O inciso II do 2º do art 218B que ora examinamos determina que incorre nas mesmas penas I II o proprietário o gerente ou o responsável pelo local em que se verifiquem as práticas referidas no caput deste artigo Afinal onde está a ação atribuída ao proprietário gerente ou responsável pelo local em que podem verificarse as práticas referidas no caput deste artigo O Poder Legislativo não pode atuar de maneira imoderada nem formular regras legais cujo conteúdo revele deliberação absolutamente divorciada dos padrões de razoabilidade assegurados pelo nosso sistema constitucional afrontando diretamente os princípios da culpabilidade da legalidade e da proporcionalidade como ocorre com mais frequência do que seria tolerável Desde o Iluminismo procurase eliminar dentro do possível toda e qualquer intervenção desnecessária do Estado na vida privada dos cidadãos Com efeito as ideias do Iluminismo e do direito natural diminuíram o autoritarismo do Estado assegurando ao indivíduo um novo espaço na ordem social Essa orientação que libertou o indivíduo das velhas e autoritárias relações medievais implica necessariamente a recusa de qualquer forma de intervenção ou punição desnecessária ou exagerada 91 Violação do princípio da legalidade O disposto no inciso II do 2º por outro lado não atende ao postulado da taxatividade do princípio de legalidade imposto pela Constituição art 5º XXXIX da CF Inquestionavelmente o referido dispositivo viola flagrantemente o dogma hoje constitucional do nullum crimen sine lege certa não descrevendo conduta alguma imputada a proprietário gerente ou responsável pelo estabelecimento onde alguém considerado vulnerável possa ser vítima de crime descrito no caput do art 218B Para Luis Luisi a taxatividade Expressa a exigência de que as leis penais especialmente as de natureza incriminadora sejam claras e o mais possível certas e precisas Tratase de um postulado dirigido ao legislador vetando ao mesmo a elaboração de tipos penais com a utilização de expressões ambíguas equívocas e vagas de modo a ensejar diferentes e mesmo contrastantes entendimentos O princípio da determinação taxativa preside portanto a formulação da lei penal a exigir qualificação e competência do legislador e o uso por este de técnica correta e de uma linguagem rigorosa e uniforme Os princípios constitucionais penais 2 ed Porto Alegre Sérgio A Fabris Editor p 24 92 Inexistência de verbo nuclear O mais grave ainda não é a vagueza imprecisão e abertura do tipo penal todas essas deficiências também presentes mas principalmente a ausência de conduta atribuída ao suposto sujeito ativo nominado no próprio inciso II ora sub examen Com efeito não se trata apenas de imprecisão obscuridade ou abertura típica que por si só já é extremamente grave mas fundamentalmente da inexistência de verbo nuclear que defina a conduta proibida que possa ser imputada ao sujeito ativo e da qual possa defenderse Esclarecedor nesse sentido o magistério de Figueiredo Dias in verbis No plano da determinabilidade do tipo legal ou tipo de garantia precisamente o tipo formado pelo conjunto de elementos cuja fixação se torna necessária para uma correcta sic observância do princípio da legalidade infra 11º Cap 3 importa que a descrição da matéria proibida e de todos os outros requisitos de que dependa em concreto uma punição seja levada até a um ponto em que se tornem objectivamente determináveis sic os comportamentos proibidos e sancionados e consequentemente se torne objectivamente sic motivável e dirigível a conduta dos cidadãos Direito penal parte geral Coimbra Coimbra Editora 2004 t I p 173174 grifamos 93 Tipo penal aberto Caracterizase por outro lado tipo penal aberto mais ou menos quando a descrição típica não é suficientemente precisa dando grande margem para significativa interpretação sobre quais condutas seriam abrangidas gerando a mais absurda insegurança jurídica No presente caso art 218B 2º II no entanto mais que um tipo penal aberto podese afirmar que estamos diante de um não tipo visto que não descreve qualquer conduta violando por consequência o constitucional princípio da tipicidade e não há tipo penal sem a descrição de uma conduta humana violadora de determinado bem jurídico que se pretenda tutelar No dispositivo sub examen com efeito há ausência de descrição de comportamento proibido devendo o proprietário gerente ou responsável responder pelo crime do caput pelo simples fato de ostentar essa qualidade ou condição 94 Direito penal de autor Disposição legal como essa adota o mais autêntico modelo de um direito penal de autor de cunho nazifacista ressuscitado por movimentos raciais e capitaneados no plano políticocriminal por Günther Jakobs com seu direito penal do inimigo Esse direito penal arbitrário remonta a Mezger hoje reconhecido colaborador do nazismo conforme denuncia Muñoz Conde quando sugeriu a culpabilidade pela condução de vida Considerase como núcleo da culpabilidade segundo essa concepção de Mezger não o fato mas o autor O que importa realmente para a reprovação é a personalidade do agente ou o caráter ou a sua conduta social em última análise o que ele é e não o que faz não o como faz 95 Ausência de conduta descrita De notarse que o dispositivo que ora criticamos repetindo não descreve conduta do agente limitase a descrever sua condição de responsável pelo local dos fatos em que outros praticam conduta reproduzida no caput independentemente de qualquer vínculo subjetivo com uns e outros Como não é atribuição do magistrado completar tipos penais defeituosos v g art 218B II a constatação de deficiência dessa envergadura implica necessariamente o reconhecimento de sua inconstitucionalidade Por fim quanto ao disposto no 3º não se lhe reserva melhor sorte pois como acessório deve seguir o principal que é o 2º II perdendo por isso o objeto 10 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é o dolo constituído pela vontade consciente de praticar qualquer das ações descritas no tipo penal qual seja submeter induzir ou atrair à prostituição ou outra forma de exploração sexual qualquer das vítimas elencadas no tipo penal bem como facilitar impedir ou dificultar que a abandone O elemento subjetivo do agente também tem de abranger a situação de vulnerabilidade da vítima assim por exemplo se o agente desconhece que a pessoa explorada sexualmente tem menos de dezoito anos há erro de tipo que descaracteriza o delito em apreço Convém destacar que a exemplo das demais hipóteses relacionadas a crimes sexuais contra vulneráveis o dolo tem de abranger a idade da vítima e o aspecto de tratarse de alguém na condição de vulnerabilidade 101 Erro de tipo desconhecimento de elementar típica O desconhecimento de que se trata de menor de dezoito anos art 218B como também de que pelas circunstâncias pode ser alguém reconhecido como em situação de vulnerabilidade menor de 18 anos ou que por enfermidade ou deficiência mental não tem o necessário discernimento para a prática do ato pode configurar erro de tipo Este segundo aspecto erro sobre a condição de vulnerabilidade limitase à hipótese do favorecimento da prostituição porque no caso de estupro de vulnerável art 217A a vulnerabilidade é em tese de presunção absoluta que decorre da própria menoridade da vítima menor de 14 anos Logo tendo consciência de que se trata de menor de quatorze anos a vulnerabilidade lhe é inerente o que inviabiliza a invocação de erro de tipo 11 Consumação e tentativa Para a tipificação do delito é desnecessário que a vítima se entregue à prostituição com a multiplicidade de relações carnais pois o que se objetiva é a resolução ou deliberação de a vítima dedicarse à prostituição podendo caracterizarse com frequência a estabelecimento adequado pelo modo de vida etc Com efeito consumase com o início de uma vida de prostituição ou com seu prosseguimento sendo desnecessário o efetivo comércio carnal como prostituta Na realidade consumase o crime de favorecimento à prostituição ou outra forma de exploração sexual quando a ação do sujeito ativo produz na vítima o efeito por ele pretendido ou seja quando é levada por ele à prostituição ou é impedida de abandonála Admitese em tese a tentativa embora em regra difícil seja sua constatação Recomenda se muita cautela para não incriminar qualquer ação como tipificadora do delito tentado 12 Classificação doutrinária Tratase de crime comum não exige qualquer condição ou qualidade especial do sujeito ativo material para se consumar exige como resultado a incorporação do estado de prostituição absorvendo a ideia de adotar como meio de vida o comércio carnal independentemente de já haver praticado algum ato sexual de forma livre pode ser praticada por qualquer meio ou forma eleita pelo agente instantâneo não há delonga entre a ação humana e o resultado não se alongando no tempo a sua execução comissivo os verbos nucleares indicam ação positiva do agente unissubjetivo que pode ser praticado por apenas um agente plurissubsistente normalmente esses tipos de condutas implicam a reiteração de atos distintos desdobrandose por conseguinte em vários atos habitual constituise de atos que isoladamente são penalmente irrelevantes 13 Pena e ação penal A pena cominada é a de reclusão de quatro a dez anos Se houver a finalidade de obter vantagem econômica na prática do crime será aplicada também a pena de multa A pena aplicada será majorada se ocorrer qualquer das hipóteses do art 226 e seus incisos Se qualquer das condutas tipificadas for praticada com o fim de obter vantagem econômica além da pena de prisão será aplicada uma pena pecuniária qual seja a pena de multa A natureza da ação penal por fim relativa aos crimes constantes dos Capítulos I e II do Título VI é tratada quando analisamos o disposto no art 225 cujo conteúdo tem a finalidade de disciplinar exatamente esse tema Pela complexidade que assumiu a partir da Lei n 120152009 concentramos seu exame nesse dispositivo para onde remetemos o leitor Capítulo III Do Rapto Rapto violento ou mediante fraude Art 219 Revogado pela Lei n 11106 de 2632005 Rapto consensual Art 220 Revogado pela Lei n 11106 de 2632005 Diminuição de pena Art 221 Revogado pela Lei n 11106 de 2632005 Concurso de rapto e outro crime Art 222 Revogado pela Lei n 11106 de 2632005 Capítulo IV Disposições Gerais Art 223 Revogado pela Lei n 12015 de 782009 Art 224 Revogado pela Lei n 12015 de 782009 Ação penal Art 225 Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título procedese mediante ação penal pública condicionada à representação Artigo com redação determinada pela Lei n 12015 de 7 de agosto de 2009 Parágrafo único Procedese entretanto mediante ação penal pública incondicionada se a vítima é menor de 18 dezoito anos ou pessoa vulnerável Parágrafo com redação determinada pela Lei n 12015 de 7 de agosto de 2009 1 Considerações preliminares previsão anterior A ação penal nos crimes constantes dos Capítulos I II e III deste Título VI da Parte Especial era em regra de exclusiva iniciativa privada procedendose somente mediante queixa No entanto se ocorresse nos crimes de estupro e atentado violento ao pudor já revogado lesão grave ou morte a ação penal seria pública incondicionada por se tratar de crime complexo art 101 Posteriormente o STF pacificou esse entendimento com a edição da Súmula 608 Havia no entanto duas exceções Rômulo Moreira numa visão mais abrangente inclui hipóteses que desconsideramos nessa classificação e por isso classifica em quatro exceções cf destacamos em nosso Tratado sendo a ação penal de natureza pública quando houvesse a vítima ou responsáveis que não pudessem custear as despesas do processo sem se privar de recursos indispensáveis à manutenção própria ou da família nessa hipótese a ação penal era condicionada à representação b abuso de pátrio poder hoje poder familiar tutela ou curatela art 225 1º II para essa hipótese o crime seria de ação pública incondicionada 2º uma vez que o representante legal que deveria exercer o direito de representar era o próprio autor do crime Com a alteração da ação penal nesses crimes essas duas exceções por razões óbvias desapareceram 2 A ação penal nos crimes previstos nos Capítulos I e II do Título VI A redação deste artigo determinada pela Lei n 120152009 prescreve que a ação penal para os crimes constantes dos Capítulos I e II do Título VI Dos Crimes contra a Liberdade Sexual e dos Crimes Sexuais contra Vulnerável respectivamente passa a ser pública condicionada à representação Inverte dessa forma sua natureza que era de exclusiva iniciativa privada a nosso juízo equivocadamente embora tenha recebido o aplauso da doutrina 3 A ação penal nos crimes contra vítima vulnerável Paradoxalmente no entanto o parágrafo único do mesmo dispositivo legal determina que a ação penal é pública incondicionada se a vítima for menor de dezoito anos ou pessoa vulnerável ou seja na hipótese dos crimes previstos no Capítulo II do Título VI do Código Penal o exercício da ação penal não depende de qualquer condição Há uma contradição frontal com o disposto no caput do mesmo dispositivo Afinal nos crimes sexuais contra vulnerável Capítulo II a ação penal será pública condicionada à representação como determina o caput do questionado art 225 sub examen ou será pública incondicionada como afirma o seu parágrafo único 31 Paradoxo restringe o exercício da liberdade sexual Tratase de um dos aspectos de uma verdadeira vexata quaestio deste Capítulo IV que cuida de disposições gerais o outro reside na contradição do ordenamento jurídico que a pretexto de proteger um direito constitucionalmente tutelado a liberdade sexual do cidadão restringe exatamente o exercício dessa liberdade o qual era protegido pela natureza da ação penal de exclusiva iniciativa privada reconhecendo nesses crimes a prevalência do interesse individual em relação ao interesse do Estado Na realidade eliminando o direito da vítima à ação privada o legislador constrangea ao determinar que a natureza da ação penal nesses crimes passa a ser pública ainda que condicionada à representação Este último fator no entanto não afasta essa violência pública do Estado contra o exercício da liberdade sexual ante o princípio da indisponibilidade da ação pública conforme demonstraremos adiante Não há dúvida quanto às inúmeras contradições que as inovações contempladas pela Lei n 120152009 apresentam dentre as quais incluise a natureza da ação penal para reprimir os crimes sexuais previstos nos dois primeiros capítulos deste Título VI 32 Interpretação sistemática No processo interpretativo como um todo partindo do aspecto literal o intérprete envolvese com a lógica e procura descobrir os fundamentos políticojurídicos da norma em exame Tenta relacionar a lei que examina com outras que dela se aproximam ampliando seu ato interpretativo Busca encontrar o verdadeiro sentido da lei em seu aspecto mais geral dentro do sistema normativo afastando eventuais contradições A essa altura deparase o intérprete com o elemento sistemático investigando o sentido global do direito que a lei expressa apenas parcialmente Assim buscase situar a norma no conjunto geral do sistema que engloba para justificar sua razão de ser Ampliase a visão do intérprete aprofundandose a investigação até as origens do sistema situando a norma como parte de um todo 33 Irrelevância da mens legislatoris erro crasso É desnecessário descobrir o que poderá ter pretendido o legislador com um texto flagrantemente contraditório não havendo magia que permita suprimir o choque frontal que as duas premissas a do caput e a do parágrafo único apresentam É irrelevante o que o legislador quis ou pretendeu dizer não se podendo ignorar o que efetivamente contém no comando legal Em outros termos relevante é o verdadeiro conteúdo da norma e sua interrelação com o sistema penal em conjunto Nessa linha não se pode deixar de reconhecer a ilogicidade que os dois preceitos encerram ambos caput e parágrafo único são absolutamente contraditórios resultando impossível compatibilizá los Há inegavelmente um erro crasso de técnica legislativa que hermeneuticamente precisa encontrar uma solução plausível dentro do direito penal da culpabilidade i há uma norma mais liberal caput definindo a ação penal como pública condicionada à representação ii e outra norma de ordem pública determinando a obrigatoriedade da ação penal definida como pública incondicionada ambas destinadas aos crimes do Capítulo II Dos Crimes Sexuais contra Vulnerável À evidência que ambas não podem ser aplicadas concomitantemente aos mesmos crimes sendo necessário eleger qual das duas deve ter primazia 34 A interpretação mais favorável ação pública condicionada Devese reconhecer de plano que a norma constante do caput do art 225 que define ação penal como pública condicionada é duplamente mais vantajosa ou seja tanto para a vítima quanto para o infrator reconhece à vítima a preponderância de seu interesse comparado ao interesse estatal relativamente ao infrator a persecutio criminis depende da iniciativa do ofendido não havendo a obrigatoriedade da ação penal enquanto não ofertada a denúncia Por outro lado a norma constante do parágrafo único que impõe a ação pública incondicionada agrava a situação de ambos ofendido e infrator trazendo consigo a indisponibilidade da ação penal e ignora a preponderância do direito do ofendido colocandoo em segundo plano como simples sujeito passivo mediato desrespeita o seu direito ao exercício à liberdade sexual além de piorar a condição do agente Enfim em ambas ação pública condicionada e incondicionada o Ministério Público é o dominus litis da ação penal art 129 I da CF que se inicia com o oferecimento da denúncia A regra geral é a de que a ação penal seja pública incondicionada Por isso em geral os crimes previstos na Parte Especial do Código Penal bem como na legislação especial são de ação pública incondicionada Por outro lado a ação pública condicionada continua sendo iniciada pelo Ministério Público mas dependerá para sua propositura da satisfação de uma condição de procedibilidade sem a qual não poderá ser instaurada representação do ofendido ou de quem tenha qualidade para representálo ou ainda requisição do ministro da Justiça Em outros termos embora a ação continue pública em determinados crimes por considerar os efeitos mais gravosos aos interesses individuais o Estado atribui ao ofendido o direito de avaliar a oportunidade e a conveniência de promover a ação penal pois este poderá preferir suportar a lesão sofrida a exporse nos tribunais Em ação dessa natureza há uma relação complexa de interesses do ofendido e do Estado De um lado o direito legítimo do ofendido de manter o crime ignorado de outro lado o interesse público do Estado em punilo assim não se move sem a representação do ofendido mas iniciada a ação pública pela denúncia prossegue até decisão final sob o comando do Ministério Público 4 Violação do exercício da liberdade sexual Não compartilhamos do entusiasmo daqueles que veem na publicização da ação penal maior proteção das vítimas da violência sexual não passando de um grande e grave equívoco ideológico além de representar uma violência não apenas à liberdade sexual mas fundamentalmente ao seu exercício que é tolhido pelo constrangimento estatal que obriga a vítima a se submeter publicamente ao strepitus fori à exploração midiática aos fuxicos tradicionais que casos como esses invariavelmente provocam Atribuir por outro lado a titularidade da ação penal ao Parquet não é sinônimo de maior proteção à vítima ou ao bem jurídico tutelado pelo contrário desrespeita o direito daquela que nesses casos tem o direito preponderante à proteção de sua intimidade e privacidade além de ignorar a tradição de nosso sistema jurídico que historicamente nos crimes contra a liberdade sexual atribuía a titularidade da ação penal exclusivamente à vítima ou a seu representante legal Por essas razões certamente a obrigatoriedade da ação penal pública a partir da denúncia afastará ainda mais as vítimas da busca pela justiça para não se submeterem à obrigatoriedade da ação penal 41 Imperativo de foro íntimo Referida espécie de ação inspirase em imperativos de foro íntimo e na colisão de interesses coletivos com interesses individuais podendo o ofendido preferir afastálos do strepitus fori evitando a publicidade escandalosa que a divulgação processual provocaria por isso nesses casos o Estado permite a subordinação do interesse público ao particular Nos crimes sexuais afirma Luiz Flávio Gomes não existem interesses relevantes apenas do Estado Antes e sobretudo também marcantes são os interesses privados o interesse de recato de preservação da privacidade e da intimidade etc Luiz Flávio Gomes A ação penal é pública condicionada disponível em httpwwwlfgcombr 2892009 Assegurar a iniciativa da vítima para a persecutio criminis nos crimes sexuais visa evitar novo e penoso sofrimento dela que pela inexpressiva ofensa desproporcional gravidade entre a lesão e a sanção estatal correspondente ou pela especialíssima natureza do crime que é o caso lesando valores íntimos prefere amargar a sua dor silenciosamente Essa decisão é exclusiva da vítima Pretendese assim evitar a divulgação e a repercussão social que podem causar ao ofendido ou a seus familiares dano maior do que a impunidade gerando a conhecida vitimização secundária geralmente ignorada não só pelas autoridades repressoras como também pelo próprio legislador 42 Obrigatoriedade da ação inibirá denúncia de muitas vítimas Aliás é exatamente o que ocorrerá nos crimes sexuais com a transformação da ação penal em pública condicionada Certamente o tiro sairá pela culatra pois essa publicização da ação penal levará as sofridas vítimas dos crimes sexuais a ficarem mais reticentes mais temerosas e desencorajadas a denunciar seus possíveis agressores por não disporem privatisticamente do exercício da ação penal Nos crimes sexuais quando há desinteresse da vítima a instrução probatória resulta visivelmente prejudicada por isso é recomendável que se procure conciliar os interesses privados com o interesse público facilitando o resultado positivo da prestação jurisdicional 5 Inconstitucionalidade da publicização da ação penal A partir da nova política criminal que prioriza o interesse estatal em prejuízo do interesse privado da vítima iniciada a ação penal não mais poderá ser interrompido o seu fluxo não haverá desistência conciliação renúncia perdão perempção etc Nesse sentido ainda que a vítima se arrependa terá de suportar o strepitus fori até o final ignorandose a advertência de Paganella Boschi para quem se para a imposição da pena tivéssemos que destroçar ainda mais uma vida então o sistema jurídico seria uma iniquidade José Antonio Paganella Boschi Ação penal Rio de Janeiro Aide 1993 p 119 Essa é a palavra adequada a eliminação da ação penal de natureza privada representa para a vítima uma verdadeira iniquidade Em síntese por todas as razões expostas temos dúvida sobre a constitucionalidade da eliminação da ação penal privada nos crimes contra a liberdade sexual malferindo o art 5º caput in fine e inciso X da CF Para os outros crimes dos demais capítulos do mesmo título não vemos nenhum problema sobre a natureza da ação penal 6 Injustificável polêmica sobre a vigência da Súmula 608 do STF Estamos convencidos venia concessa de que se trava uma discussão não apenas desnecessária como inócua sobre a sobrevivência do conteúdo da Súmula 608 do STF que aliás a rigor já era desnecessária Na realidade justificouse a seu tempo à edição da referida súmula não a necessidade de normatizar algum ponto juridicamente obscuro mas tão somente o fato de vivermos em um país em que a norma constitucional e a legislação infraconstitucional são olimpicamente desrespeitadas impunemente a partir dos próprios poderes constituídos priorizandose a normatização através de portarias regulamentos resoluções etc e finalmente sumular Nesse vazio de vigência normativa o Supremo Tribunal Federal sentiu politicamente a necessidade de sumular algo que está claramente expresso na ordem jurídica editando a Súmula 608 com o seguinte enunciado No crime de estupro praticado mediante violência real a ação penal é pública incondicionada O mérito da edição dessa súmula foi não só pacificar interpretações não raro equivocadas mas fundamentalmente esclarecer que o estupro praticado mediante violência real é um crime complexo e a natureza da ação penal segue a natureza da infração penal segundo disciplina do Código Penal Apenas isso Contudo não houvesse outras razões para a manutenção da validade do enunciado sumular questionado a polêmica sobre a natureza da ação penal no crime de estupro praticado mediante violência real é por si só fundamento bastante para justificar a sua manutenção conforme demonstramos abaixo 7 Estupro qualificado pelo resultado crime complexo Ninguém discorda contudo que o crime de estupro com violência real constitui o conhecido crime complexo que aliás recebeu atenção especial do legislador o qual previu norma específica determinando a natureza da ação penal nos seguintes termos quando a lei considera como elemento ou circunstâncias do tipo legal fatos que por si mesmos constituem crimes cabe ação pública em relação àquele desde que em relação a qualquer destes se deva proceder por iniciativa do Ministério Público art 101 Essa previsão legal ao contrário do que se tem entendido não só é especial como também específica uma vez que se destina a todos os crimes complexos distribuídos pelo Código Penal independentemente do capítulo em que se encontrem insertos Na realidade as previsões sobre a ação penal constantes do Capítulo IV fazem parte de uma subespécie daquela regra geral segundo a qual a natureza da ação penal quando não for incondicionada deve vir expressa em lei nesse sentido tratase de norma geral para esses crimes sexuais Não teria sentido seu afastamento por previsões sobre a natureza da ação penal as quais em razão do princípio da excepcionalidade devem ser sempre expressas 71 A especialidade da previsão constante do art 101 A previsão do art 101 é digamos uma espécie de contraveneno às normas que excepcionam a natureza da ação penal ou seja essas normas que excepcionam a iniciativa da persecutio criminis são a razão de ser da previsão constante do art 101 do CP Com efeito se não houvesse tais previsões seria desnecessária a definição contida no art 101 pois na ausência de menção expressa a ação penal seria sempre pública incondicionada art 100 Em outras palavras a previsão do art 101 do Código Penal destinase especificamente àquelas infrações penais cuja persecutio criminis depende da iniciativa do ofendido na medida em que as outras não necessitam dessa previsão são de ação pública incondicionada Ademais essa interpretação sistemática resolve a delicada questão sobre a natureza da ação penal do crime de estupro praticado com violência real especialmente quando há morte da vítima além de observar o princípio da razoabilidade assegurando a harmonia hermenêutica do ordenamento jurídico nacional Ou se ousaria afirmar que mesmo havendo morte da vítima tratase de ação penal pública condicionada à representação logicamente não afrontarseia o princípio da razoabilidade 72 Prevalência da natureza dos fatos que compõem o crime complexo Em outros termos a natureza da ação penal do crime complexo segue a natureza da ação penal pública dos fatos que o compõem e tanto a lesão corporal grave quanto o homicídio são crimes de ação pública incondicionada Seria uma irracionalidade sustentar que no crime de matar alguém pelo simples fato de estar vinculado a outro crime igualmente grave no caso a persecutio criminis não poderia ser pública incondicionada Interpretação como essa afrontaria o sistema penal deixaria a descoberto um dos bens jurídicos a vida mais valiosos quiçá o mais importante de todos sua perda torna irrelevante os demais no plano pragmático além de violar o princípio da razoabilidade Foi a nosso juízo interpretando sob essa ótica que o Supremo Tribunal Federal sentiuse obrigado a editar a Súmula 608 para assegurar a valoração sistemática do nosso Código Penal de 1940 cuja parte especial continua em vigor Aliás a mesma crise interpretativa que levou à necessidade da edição da referida súmula apresentase agora justificandose que se mantenha vigente para assegurar a melhor interpretação sistemática de nosso diploma legal conforme demonstramos em outro tópico 73 Desnecessidade da Ação Direta de Inconstitucionalidade n 4301 No particular consideramos absolutamente desnecessária a ADIn n 4301 proposta pelo Ministério Público perante o Supremo Tribunal Federal postulando a declaração de inconstitucionalidade do art 225 sem redução de texto para considerar que a ação penal no caso de estupro com resultado morte ou lesão corporal grave da vítima seja pública incondicionada Invocou o Parquet três fundamentos básicos 1º ofensa ao princípio da dignidade da pessoa humana 2º ofensa ao princípio da proteção deficiente 3º possível extinção da punibilidade em massa nos processos em andamento por que passariam a exigir manifestação da vítima sob pena de decadência Venia concessa i não há ofensa à dignidade da pessoa humana pelo contrário procura preservála na medida em que tenta minimizar a vitimização secundária que ocorreria com a exposição da vítima nesse tipo de crime além de observar um mínimo da importância do seu interesse privado comparado ao interesse público Na nossa avaliação aliás para realmente respeitar esses valores deverseia manter a natureza privada da ação penal nesses crimes sem a violência real como sustentamos em outro tópico ii Tampouco se pode falar em proteção deficiente quando se constata que há cominação de penas havendo lesão grave ou morte com máximos de doze e trinta anos de reclusão respectivamente Há na nossa avaliação a observância do princípio da proporcionalidade até com algum excesso configurandose uma adequada proteção dos bens jurídicos lesados Por fim iii não há que falar em extinção da punibilidade por qualquer causa em crimes de estupro qualificado pelo resultado os quais como já demonstramos continuam como sempre foram crimes de ação pública incondicionada quer por tratar se de crimes complexos quer pela manutenção da validade da Súmula 608 do STF A prescrição tanto para a hipótese de uma qualificadora quanto para outra somente ocorre em vinte anos 8 Síntese sobre a definição de ação penal O direito de ação penal consiste na faculdade de exigir a intervenção do poder jurisdicional para que se investigue a procedência da pretensão punitiva do EstadoAdministração nos casos concretos Ação é pois o direito de invocar a prestação jurisdicional isto é o direito de requerer em juízo a reparação de um direito violado Mas ao mesmo tempo em que o Estado determina ao indivíduo que se abstenha da prática de ações delituosas asseguralhe também que só poderá punilo se violar aquela determinação dando origem ao ius puniendi Isso representa a consagração do princípio nullum crimen nulla poena sine praevia lege No entanto violada a proibição legal a sanção correspondente só poderá ser imposta através do devido processo legal que é a autolimitação que o próprio Estado se impõe para exercer o ius persequendi isto é o direito subjetivo de promover a persecução do autor do crime Cumpre lembrar no entanto que a ação penal propriamente constitui apenas uma fase da persecução penal que pode iniciar com as investigações policiais inquérito policial sindicância administrativa Comissão Parlamentar de Inquérito etc Essas investigações preliminares são meramente preparatórias de uma futura ação penal A ação penal propriamente somente nascerá em juízo com o oferecimento de denúncia pelo Ministério Público em caso de ação pública ou de queixa pelo particular quando se tratar de ação penal privada O recebimento de uma ou de outra marcará o início efetivo da ação penal Aumento de pena Art 226 A pena é aumentada I de quarta parte se o crime é cometido com o concurso de 2 duas ou mais pessoas II de metade se o agente é ascendente padrasto ou madrasta tio irmão cônjuge companheiro tutor curador preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer outro título tem autoridade sobre ela III Revogado pela Lei n 11106 de 2832005 Artigo com redação determinada pela Lei n 11106 de 28 de março de 2005 D O U T R I N A 1 A majoração da pena nos crimes sexuais Os crimes então denominados contra os costumes catalogados nos Capítulos I a III deste Título recebiam um aumento de quarta parte se ocorressem quaisquer das hipóteses previstas no art 226 São hipóteses que dificultam a defesa da vítima I violam os princípios moraisfamiliares além do abuso da autoridade exercida sobre a vítima II e violentam o matrimônio além da impossibilidade de reparar o delito pelo casamento com a vítima III sendo este último inciso revogado pela Lei n 111062005 Em todos esses casos o legislador considerava o maior desvalor da ação dos agentes bem como o maior desvalor do resultado 11 A inclusão de novos dados Esse diploma legal de 2005 incluiu no inciso II padrasto ou madrasta tio cônjuge ou companheiro além de elevar o aumento de pena de quarta parte para metade Assim se o crime for cometido por duas ou mais pessoas a elevação será de quarta parte inciso I se no entanto houver relação de parentesco ou de autoridade nos termos contidos no inciso II a elevação será de metade e não mais de quarta parte como previa a redação anterior Citada lei revogou o inciso III do mesmo art 226 12 Inalteração do art 226 A Lei n 120152009 no entanto nada alterou do art 226 permitindo sua aplicação tal qual lhe determinou aquele diploma legal de 2005 Contudo convém registrar que as majorantes previstas no art 226 são aplicáveis somente aos crimes previstos no Capítulo II do Título VI que o antecedem considerandose que o Capítulo III foi integralmente revogado pela lei de 2005 Vejamos cada uma das duas majorantes que restaram no art 226 2 Concurso de duas ou mais pessoas e concursus delincuencium Incorre em grave equívoco quem afirma que segundo nosso Código Penal comete crime quem de qualquer forma concorre para ele Na realidade essa assertiva não é verdadeira e o legislador não pode ser acusado desse paradoxo pois em nenhum momento incidiu nesse erro crasso Nem mesmo implicitamente afirmou que comete o crime quem de qualquer modo concorre para ele Na verdade o texto legal afirma que quem de qualquer modo concorre para o crime incide nas penas a ele cominadas o que são coisas muito diferentes A contrario sensu com efeito está afirmando implicitamente que não o comete quem de qualquer modo concorre para o crime Nesse sentido precisa e enfática é a crítica de Weber Martins Batista relativamente à qualificadora similar no crime de furto que merece ser transcrita in verbis O Código Penal não comete a heresia de consagrar expressa ou implicitamente que comete o crime quem de qualquer forma concorre para ele O que está na lei corretamente é que incide nas penas cominadas ao crime expressão com que implicitamente se afirma que não o comete quem de qualquer modo concorre para ele Comete o crime ninguém afirma de outro modo quem participa materialmente de sua execução Não fora isso e seria desnecessária a norma de extensão do art 29 do Código Penal 21 Coautoria e participação Enfim todos os que concorrem moral ou materialmente para o crime são punidos pelo Código Penal art 29 caput mas a majorante somente se configurará no crime sexual cometido em concurso de duas ou mais pessoas que necessariamente devem encontrarse no local do crime Referindose ao crime de furto nesse sentido adverte Weber Martins o furto só será cometido mediante o concurso de duas ou mais pessoas se estas participarem na fase executiva do delito O Furto e o Roubo p 189 pois somente assim pode fazerse presente a maior temibilidade e eficiência da delinquência coletiva que seria o fundamento da maior punibilidade 22 Orientação do STF participação efetiva O próprio Supremo Tribunal Federal já reconheceu ainda na vigência da lei anterior a necessidade da participação efetiva dos agentes na execução do crime Argumentou então com muita propriedade o relator Ministro Djaci Falcão que se o legislador visa no caso a punir mais gravemente a soma de esforços para a prática do crime circunstância a que se agrega a da redução de capacidade de defesa da vítima razão a nosso ver dessa agravação parecenos evidente que o preceito deva ser interpretado teleologicamente como endereçado à hipótese de cooperação de agentes na fase de execução do crime única hipótese em que aquelas duas circunstâncias se fazem realmente presentes Acórdão unânime do STF Rel Min Djaci Falcão de 1979 Mais não precisaria ser dito 23 Autoria e participação distinção legal Incorre em erro grosseiro quem sustentando entendimento contrário continuar afirmando que não há mais diferença entre autor principal e autor secundário no atual sistema brasileiro Acórdão unânime do TACrimSP 4ª Câmara de 1º21979 JTACrimSP 57235 Na verdade não se pode ignorar que embora a reforma penal de 1984 tenha mantido a teoria monística da ação adotou contudo a teoria restritiva de autor vejase o que afirmamos sobre essa teoria em nosso Tratado de Direito Penal Parte Geral 15 ed São Paulo Saraiva 2010 v 1 p 4856 fazendo perfeita distinção entre autor e partícipe que abstratamente incorrem na mesma pena cominada ao crime que praticarem mas que concretamente variará segundo a culpabilidade de cada participante art 29 e 1º e 2º e em relação ao partícipe variará ainda de acordo com a importância causal da sua contribuição Cezar Roberto Bitencourt Tratado de Direito Penal Parte Geral 15 ed São Paulo Saraiva 2010 v 1 p 500 Ora esse tratamento diferenciado de autor e partícipe adotado pela reforma penal de 1984 não pode ser ignorado quando estivermos perante a majorante concurso de duas ou mais pessoas nos crimes contra a dignidade sexual Capítulos I e II que segundo o entendimento dominante deve ser orientada pelos princípios que fundamentam o instituto concurso de pessoas especialmente considerando que um sistema jurídico não pode abrir mão da harmonia e coerência características fundamentais que devem presidilo 24 Impunibilidade do ajuste e determinação O ajuste e a determinação reconhece o próprio Código Penal art 31 são penalmente irrelevantes se pelo menos não participarem de sua execução aliás não constituem nem agravante genérica quanto mais qualificar ou majorar um crime Nesse particular já era o magistério do velho Hungria Comentários ao Código Penal v 8 p 467 No mesmo sentido Sebastian Soler Derecho Penal argentino p 236 referindose ao crime de furto ao exigir para configurar aquela qualificadora a presença in loco dos concorrentes isto é a participação efetiva na execução da infração penal Enfim para reconhecer a configuração da majorante do art 226 I do CP devemse observar os princípios orientadores do instituto concurso de pessoas notadamente a distinção entre coautoria e participação a começar pela necessidade da causalidade física e psíquica da conduta dos participantes Concluise portanto que somente com a presença in loco dos participantes admitese a configuração da majorante em exame ou dito de outra forma somente se for caso de coautoria a majorante farseá presente 3 Violação dos princípios moraisfamiliares No inciso II são relacionadas causas majorantes de duas espécies distintas quando o crime sexual for praticado contra parentes ou quando o agente abusar da relação de autoridade que mantém sobre a vítima O texto legal tem a seguinte redação se o agente é ascendente padrasto ou madrasta tio irmão cônjuge companheiro tutor curador preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer outro título tem autoridade sobre ela Consideramse aqui situações pessoais ou familiares que facilitam a prática delituosa além de implicarem a infringência de especiais deveres do sujeito ativo para com a vítima Nos crimes praticados contra parentes nas linhas relacionadas violamse deveres decorrentes do parentesco que pode ser legítimo ilegítimo natural ou civil Essas circunstâncias fundamentam maior reprovação da conduta praticada pelo agente e justificam perfeitamente a majoração da reprimenda aplicável 31 Abuso de autoridade O abuso de autoridade pode ser também de outra natureza relativo às relações privadas em que haja um vínculo de dependência ou subordinação com exercício abusivo ou ilegítimo de autoridade no direito privado por exemplo empregador tutor curador etc O agente que praticar crime sexual contra vítima a que esteja ligado por esse tipo de vínculo justifica a majoração legal prevista Abuso é o uso do poder além dos limites legais e violação de dever é o desrespeito às normas que norteiam cargo ofício ministério ou profissão Não há abuso de poder sem violação de dever mas pode haver violação de dever sem abuso de poder 32 Relações domésticas de coabitação ou hospitalidade Finalmente com a locução por qualquer outro título tem autoridade sobre ela a previsão legal amplia a punibilidade das condutas criminosas que de alguma forma abusarem de relações domésticas de coabitação ou de hospitalidade que o agente se encontre em posição de superioridade ou de anfitrião em relação à vítima É indispensável contudo que esteja plenamente caracterizada essa situação ou posição privilegiada do agente sendo possível abusar dessa circunstância a Relações domésticas são as que existem entre aqueles que participam do quotidiano de uma mesma família familiares empregados amigos frequentadores habituais etc b Relações de coabitação referemse àqueles que convivem sob o mesmo teto particularmente sob o aspecto das relações de convivência c Relações de hospitalidade referemse à estada de alguém em casa alheia sem a durabilidade da coabitação não sendo necessário intimidade por exemplo visita para uma refeição um drinque etc 33 Qualquer outro meio interpretação analógica Concluindo é preciso muita cautela no exame da subordinação ou submissão da vítima nessas outras relações abrangidas pela expressão por qualquer outro título tem autoridade sobre ela A interpretação deve ser necessariamente restritiva Considerase nessas hipóteses a presumida menor capacidade de defesa das vítimas que ademais afrouxam naturalmente a vigilância dos bens juridicamente tutelados facilitando a execução delituosa além da perversidade e covardia do agente tratase consequentemente de presunção juris tantum 34 Maior censurabilidade A maior censurabilidade da conduta caracterizase não só pela audácia do agente mas especialmente pelo desrespeito à vítima que se encontra em posição francamente desfavorável Além da maior dificuldade normalmente em elucidar os fatos a conduta do agente revela maior insensibilidade e correspondente maldade justificandose a agravação da sanção penal Para se configurar essa agravante é indispensável que o agente tenha consciência da causa majorante que necessariamente deve ser abrangida pelo dolo sob pena de consagrar se autêntica responsabilidade objetiva As circunstâncias agravantes previstas no art 61 II e f g e h não podem ser consideradas na fixação da pena se esta já foi majorada em razão do disposto no art 226 II 35 Concurso de causas de aumento Se no caso concreto incidirem as duas circunstâncias de aumento da pena concurso de pessoas e relação parental ou pessoal da vítima isto é se por exemplo o agente for tio da vítima e praticar a conduta em concurso de pessoas o juiz limitarseá a um só aumento na aplicação da pena prevalecendo a causa que mais aumente conforme dispõe o art 68 parágrafo único do Código Penal no exemplo prevalece a aplicação do aumento de pena previsto no inciso II 4 Parcelas de aumento Em síntese a partir da Lei n 12015 o aumento de pena será de quarta parte se o crime for praticado com o concurso de duas ou mais pessoas será contudo de metade se ocorrer qualquer das hipóteses relacionadas no inciso II do art 226 Capítulo V Do Lenocínio e do Tráfico de Pessoa para fim de Prostituição ou outra forma de Exploração Sexual Título do Capítulo V com redação determinada pela Lei n 12015 de 7 de agosto de 2009 Mediação para servir a lascívia de outrem Art 227 Induzir alguém a satisfazer a lascívia de outrem Pena reclusão de 1 um a 3 três anos 1º Se a vítima é maior de 14 catorze e menor de 18 dezoito anos ou se o agente é seu ascendente descendente cônjuge ou companheiro irmão tutor ou curador ou pessoa a quem esteja confiada para fins de educação de tratamento ou de guarda 1º com redação determinada pela Lei n 11106 de 28 de março de 2005 Pena reclusão de 2 dois a 5 cinco anos 2º Se o crime é cometido com emprego de violência grave ameaça ou fraude Pena reclusão de 2 dois a 8 oito anos além da pena correspondente à violência 3º Se o crime é cometido com o fim de lucro aplicase também multa 1 Considerações preliminares Tratase da primeira figura das seis que compõem o Capítulo V que contempla os crimes contra o lenocínio e o tráfico de pessoas do Título VI da Parte Especial do Código Penal Mediação para satisfazer a lascívia de outrem afirmase que é uma hipótese de lenocínio principal no qual o sujeito ativo toma a iniciativa de induzir a vítima à prostituição Nesse sentido o lenocínio seria secundário ou acessório quando a atividade realizase sobre uma situação precedente de prostituição ou corrupção como por exemplo mantendo local para explorar a prostituição rufianismo etc Advirtase preliminarmente que referidos crimes estão na contramão da evolução social e perderam seu sentido ante a evolução dos hábitos e da moral sexual nas últimas décadas 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é a moralidade pública sexual objetivando particularmente evitar o incremento e o desenvolvimento da prostituição Lenocínio significa prestar assistência ou auxiliar à vida libertina de outrem ou dela tirar proveito Em um sentido mais abrangente lenocínio abarca o proxenetismo mediação para satisfazer a lascívia de outrem o favorecimento à prostituição e o rufianismo e inclusive o tráfico de pessoas para fins de exploração sexual O lenocínio enfim é um dos crimes mais degradantes que acompanha a civilização ao longo de toda a sua história ao longo dos séculos Nesse sentido Heleno Fragoso com maestria já denunciava a torpeza que a prática do lenocínio encerra nos seguintes termos O lenocínio inscrevese entre os mais torpes dos crimes ofendendo a moral pública e os bons costumes Visa a lei penal com a incriminação das ações previstas neste capítulo proteger a moral pública sexual tendo em vista especialmente o interesse em evitarse o incremento e o desenvolvimento da prostituição bem como a corrupção moral que em torno dela se exerce Heleno Claudio Fragoso Lições de Direito Penal p 53 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa homem ou mulher sem nenhuma condição especial Eventual qualidade especial do agente em relação à vítima ascendente descendente tutor etc qualifica o crime Sujeito passivo igualmente pode ser qualquer pessoa homem ou mulher não se exigindo que se trate de menor Na verdade a menoridade quando existir qualificará o crime nos termos do 1º Tratase de crime que necessariamente exige a participação efetiva do sujeito passivo que no entanto não é punido Pode ser tanto do sexo masculino quanto do feminino pois a lei não os distingue pessoas de ambos os sexos podem ser induzidas a satisfazer a lascívia alheia 4 Tipo objetivo adequação típica A ação tipificada consiste em induzir isto é persuadir aliciar levar alguém a satisfazer a lascívia de outrem Outrem deve ser pessoa determinada de qualquer sexo caso contrário constituiria o crime do art 228 A finalidade do induzimento é satisfazer a lascívia de outrem através de qualquer prática libidinosa A lascívia a ser satisfeita deve ser a de outrem e não a própria No entanto nada impede que o ato seja praticado pelo próprio agente limitandose o terceiro a presenciá lo O artigo não exige que se trate de determinado indivíduo Podem ser até vários a cuja lascívia o sujeito passivo se prestará na mesma ação O que se exige é que as pessoas sejam certas pois se o induzimento se referir a número indeterminado vago e impreciso de indivíduos o crime passa a ser o do artigo seguinte favorecimento da prostituição 41 Desnecessidade de habitualidade ou venalidade Para que haja induzimento de alguém a satisfazer a lascívia de outrem é necessário que tenham ocorrido promessas dádivas ou súplicas A meretriz não pode ser tida como vítima do delito previsto no art 227 do CP pois não é induzida mas se presta voluntariamente à lascívia de outrem Aquele que se serve da ação criminosa isto é que se aproveita da vítima para satisfazer sua lascívia não é coautor do crime pois a finalidade exigida pelo tipo é satisfazer a lascívia de outrem e não a própria Não se exige para a tipificação do crime nem habitualidade nem venalidade 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo constituído pela vontade consciente de levar a vítima a praticar ação que objetive a satisfazer a lascívia de outrem Não vemos no conteúdo típico descritivo a existência de elemento subjetivo especial do tipo representado por alguma finalidade salvo o fim de lucro Se o agente for movido por esse fim mercenário a pena de prisão será acrescida da pena de multa A existência de qualquer outra finalidade será irrelevante 6 Consumação e tentativa Consumase com a efetiva satisfação da luxúria alheia independentemente de a outra pessoa atingir o gozo genésico O crime se consuma afirmava Fragoso com a efetiva prática de qualquer ato que importe na satisfação da lascívia de terceiro a quem a mediação favoreça Não se exclui portanto que se trate de ato praticado pelo próprio agente limitandose o terceiro a presenciálo Heleno Claudio Fragoso Lições de Direito Penal p 55 Admitese a tentativa embora teoricamente difícil seja sua constatação Exigese muita cautela para não incriminar qualquer palavra como tipificadora do delito tentado Em outros termos recomendase que se observe a idoneidade do ato praticado para o induzimento da vítima ou seja ato que seja capaz de levála a satisfazer a lascívia de outrem 7 Classificação doutrinária Tratase de crime comum não exige qualquer condição ou qualidade especial do sujeito ativo material para consumarse exige como resultado a efetiva satisfação da lascívia de outrem de forma livre pode ser praticado por qualquer meio ou forma escolhida pelo agente comissivo as ações representadas pelos verbos nucleares implicam ação positiva do agente unissubjetivo que pode ser praticado por apenas um agente plurissubsistente como a habitualidade implica a reiteração de atos a conduta é necessariamente composta de uma variedade de atos distintos instantâneo o resultado se produz de imediato numa relação de proximidade entre ação e consequência 8 Formas qualificadas Há quatro hipóteses que qualificam o crime a a menoridade da vítima 1º 1ª parte b a autoridade do agente 1º 2ª parte c a violência grave ameaça ou fraude 2º d o fim de lucro 3º Se a vítima for maior de quatorze e menor de dezoito anos a pena será de reclusão de dois a cinco anos Se for menor de quatorze anos haverá presunção de violência por disposição do art 232 1º 1ª parte Se o agente é seu ascendente descendente cônjuge ou companheiro irmão tutor ou curador ou pessoa a quem a vítima esteja confiada para fins de educação de tratamento ou de guarda a pena é de reclusão de dois a cinco anos Esse dispositivo não inclui a esposa somente o marido Nesse 1º 2ª parte o legislador simplesmente substituiu a expressão marido por cônjuge ou companheiro Se há emprego de violência vis corporalis grave ameaça vis compulsiva ou fraude ardil artifício a pena será de dois a oito anos além da pena correspondente à violência Essa previsão abrange a violência presumida art 224 por força do art 232 2º Se o agente for movido pelo fim de lucro além da pena de prisão prevista aplicarseá também a de multa por constituir o lenocínio mercenário crime mais grave em razão de sua maior torpeza 3º 9 Concurso com crimes praticados com violência O preceito secundário da norma penal em exame comina pena de detenção de três meses a um ano e multa além da pena correspondente à violência Discordamos radicalmente do entendimento doutrinário sustentado inclusive por Hungria Comentários ao Código Penal v 8 p 31 segundo o qual essa previsão legal estaria reconhecendo expressamente o concurso material entre a mediação para servir a lascívia de outrem e o resultado da violência que constituir em si mesmo crime O questionamento é inevitável afinal dispositivos como esse há uma grande quantidade deles com redação semelhante estariam dando nova definição ao concurso material ou se limitam a cominar a soma de penas adotando o sistema do cúmulo material quando o crime que definem é praticado com violência tipificada isto é em si mesmo crime Com efeito o que caracteriza o concurso material de crimes não é a soma ou cumulação de penas como prevê o dispositivo em exame mas a pluralidade de condutas pois no concurso formal impróprio isto é naquele cuja conduta única produz dois ou mais crimes resultantes de desígnios autônomos as penas também são aplicadas cumulativamente Ora esse comando legal determinando a aplicação cumulativa de penas não autorizou o intérprete a confundir o concurso formal impróprio com o concurso material Na verdade concurso de crimes e sistema de aplicação de penas são institutos inconfundíveis o primeiro relacionase à teoria do delito e o segundo à teoria da pena por isso a confusão é injustificável 91 Sistema do cúmulo material de penas Concluindo a cominação cumulativa com a pena correspondente à violência não criou uma espécie sui generis de concurso material mas adotou tão somente o sistema do cúmulo material de aplicação de penas a exemplo do que fez em relação ao concurso formal impróprio art 70 2ª parte Assim quando a violência empregada na prática de crime de lenocínio e tráfico de mulheres constituir em si mesma outro crime havendo unidade de ação e pluralidade de crimes estaremos diante de concurso formal de crimes Cezar Roberto Bitencourt Tratado de Direito Penal Parte Especial 15ª ed São Paulo Saraiva 2010 vol 1 p 680 Aplicase no entanto por expressa determinação legal o sistema de aplicação de pena do cúmulo material independentemente da existência ou não de desígnios autônomos A aplicação cumulativa de penas mesmo sem a presença de desígnios autônomos constitui exceção da aplicação de penas prevista para o concurso formal impróprio 92 Possibilidade e concurso material No entanto a despeito de tudo o que acabamos de expor nada impede que concretamente possa ocorrer concurso material como acontece com quaisquer outras infrações penais dos delitos definidos neste capítulo do Código Penal com outros crimes violentos desde que é claro haja pluralidade de condutas e pluralidade de crimes mas aí observese já não será mais o caso de unidade de ação ou omissão caracterizadora do concurso formal Esse entendimento aplicase também às previsões constantes dos arts 228 230 e 231 deste Código 10 Pena e ação penal Reclusão de um a três anos na modalidade simples As figuras qualificadas recebem três graus de sanções diferentes nas figuras do 1º a reclusão é de dois a cinco anos na figura do 2º é de dois a oito anos além da pena correspondente à violência e na do 3º se aplica também multa A ação penal é pública incondicionada não dependendo por conseguinte da manifestação da vontade do ofendido Favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual Art 228 Induzir ou atrair alguém à prostituição ou outra forma de exploração sexual facilitála impedir ou dificultar que alguém a abandone Pena reclusão de 2 dois a 5 cinco anos e multa 1º Se o agente é ascendente padrasto madrasta irmão enteado cônjuge companheiro tutor ou curador preceptor ou empregador da vítima ou se assumiu por lei ou outra forma obrigação de cuidado proteção ou vigilância Pena reclusão de 3 três a 8 oito anos Caput e 1º com redação determinada pela Lei n 12015 de 7 de agosto de 2009 2º Se o crime é cometido com emprego de violência grave ameaça ou fraude Pena reclusão de 4 quatro a 10 dez anos além da pena correspondente à violência 3º Se o crime é cometido com o fim de lucro aplicase também multa D O U T R I N A 1 Considerações preliminares O falso moralismo impediu o legislador contemporâneo de excluir do ordenamento jurídico brasileiro um tipo penal completamente superado e absolutamente desacreditado em razão de sua praticamente inaplicabilidade ao longo de quase sete décadas de vigência Contraditoriamente para um legislador que pretende proteger a liberdade sexual individual que é a finalidade que este texto se autoatribui Lei n 120152009 criminaliza ao mesmo tempo o exercício dessa liberdade Com efeito tratandose de prostituição entre adultos sem violência ou grave ameaça temos dificuldade em aceitar que o legislador infraconstitucional tenha legitimidade para criminalizar exatamente o exercício livre da sexualidade de cada um art 5º X e XLI Nesse sentido sentencia Luiz Flávio Gomes Enquanto de adulto se trate cada um dá à sua vida sexual o rumo que bem entender O plano moral não pode ser confundido com o plano jurídico O Estado não tem o direito de instrumentalizar as pessoas como dizia Kant para impor uma determinada orientação moral ou sexual Crimes contra a dignidade sexual e outras reformas penais in httpwwwjusbrasilcombrnoticias1872027crimescontraa dignidadesexualeoutrasreformaspenais A rigor podese afirmar não houve mudanças significativas em relação ao conteúdo da redação anterior do mesmo dispositivo legal além de incluir no caput o verbo facilitar e o elemento normativo analógico à prostituição ou seja ou outra forma de exploração sexual Abandonouse ainda a referência à figura qualificada constante do art 227 1º para adotála de maneira expressa e específica 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é como na figura anteriormente examinada a moralidade pública sexual objetivando particularmente evitar o incremento e o desenvolvimento da prostituição A prostituição que não é crime é outro comportamento humano degradante e embora lícita é moralmente censurável que com o passar dos séculos a sociedade também não conseguiu eliminar Incriminase em verdade o favorecimento ou a exploração da prostituição que em si mesma não é crime A pretexto de proteger o legislador invade a liberdade sexual do cidadão assegurada constitucionalmente e pretendendo regular o exercício dessa liberdade confunde moral com direito esquecendose do processo secularizador implantado no final do século XVIII que separou crime e pecado moral e direito Nesse sentido é absolutamente procedente a advertência de Nucci nos seguintes termos Esperase do Judiciário a posição de guardião dos ditames constitucionais particularmente o direito à intimidade e à vida privada não se podendo invadir o cenário do relacionamento sexual entre adultos Guilherme de Souza Nucci Crimes contra a Dignidade Sexual p 75 3 Sujeito ativo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa homem ou mulher sem nenhuma condição especial tratandose por conseguinte de crime comum A única exigência é a tradicional para todas as infrações penais qual seja que se trate de indivíduo imputável 4 Sujeito passivo Sujeito passivo igualmente pode ser qualquer pessoa homem ou mulher contemplando inclusive a pederastia que também é uma forma de prostituição Ainda se polemiza sobre a admissibilidade de funcionar como sujeito passivo dessa infração penal pessoa já prostituída embora a melhor jurisprudência esteja se consolidando no sentido de afastála Com efeito não há sentido algum em induzir ou atrair alguém à prostituição tratandose de pessoas já prostituídas levando uma vida devassa Acreditamos no entanto que nas modalidades de impedir ou dificultar o seu abandono não haja maiores dificuldades em admitilas como sujeitos passivos desde que se trate de principiantes Contudo tratandose de profissionais já experientes com vivência na vida mundana essas duas condutas apresentamse inócuas isto é sem idoneidade para lesar o bem jurídico tutelado 41 Homossexual como sujeito passivo O homossexual também pode em tese ser sujeito passivo do crime de favorecimento à prostituição pois a opção sexual é um direito constitucionalmente assegurado a todos e o exercício dessa opção não o torna corrompido A condição amoral da vítima é irrelevante para que ela receba a proteção penal da norma em exame 5 Tipo objetivo adequação típica As críticas absolutamente procedentes a este dispositivo são praticamente unânimes na doutrina nacional pois além de contrariar a evolução comportamental da sociedade deste início de milênio ignora a liberdade sexual assegurada no texto constitucional Nesse sentido assevera Nucci Tratandose de prostituição juvenil o bem jurídico ganha outro tom e outra importância porém cuidandose de prostituição de adulto com clientela adulta sem violência ou grave ameaça não há a menor razão para a tutela penal do Estado O tipo penal ora mantido com poucas alterações inócuas continuará sem aplicação prática Guilherme de Souza Nucci Crimes contra a Dignidade Sexual p 74 51 Condutas incriminadas O tipo penal contempla cinco condutas nucleares tendo sido acrescentada pela Lei n 120152009 a de dificultar o abandono da prostituição lato sensu As primeiras duas condutas incriminadas no caput são i induzir que significa suscitar a ideia tomar a iniciativa intelectual convencer alguém e ii atrair que é incentivar estimular seduzir à prostituição ou outra forma de exploração sexual Complementam o conteúdo desse dispositivo a exemplo da previsão contida no art 218B três outras modalidades de condutas representadas pelos verbos facilitar impedir e dificultar o abandono da prostituição ou exploração sexual Facilitar é favorecer tornar fácil eliminar dificuldades e obstáculos à prostituição Facilita quem auxilia a vítima a iniciarse na prostituição ajudaa nesse mister arranjando lhe clientes colocandoa em pontos ou locais adequados Prostituição é o exercício habitual do comércio carnal para satisfação sexual de indeterminado número de pessoas O que realmente caracteriza a prostituição é a indeterminação de pessoas e a habitualidade da promiscuidade É irrelevante que se trate de vítima já desencaminhada para que se caracterize o crime pois a lei tanto pune o induzimento ou aliciamento como a facilitação 52 Condutas sedutoras As ações de induzir atrair e facilitar epresentam condutas que de certa forma seduzem isto é aliciam a vontade da vítima não raro em dificuldades ou em situações carentes de oportunidades de recursos ou de meios materiais e pessoais para aspirar sucesso na vida Por essas razões tornamse presas fáceis dos exploradores da moral alheia que se aproveitam de pessoas que se encontram em dificuldades dessa natureza que ficam à mercê dos especuladores da desgraça humana os quais procuram mostrarlhes aspectos atraentes induzindoas a erro sobre seus verdadeiros objetivos 53 Impedir o abandono da prostituição Criminalizase ainda outras condutas que ao contrário das que acabamos de examinar não buscam atrair de qualquer forma a vítima para a prostituição ou exploração sexual mas pretendem de algum modo inviabilizar que a abandone Tais condutas na verdade pretendem manter o status quo ante ou seja impedir ou dificultar o abandono da prostituição ou exploração sexual Impedir oporse não deixar que desista de que alguém a abandone isto é impedir que alguém com sério propósito de abandonar a prostituição a deixe sendo insuficientes meras declarações da prostituta Dificultar por sua vez é criar embaraços atrapalhar fazer exigências difíceis de ser cumpridas com a finalidade de inviabilizar o abandono da prostituição pela vítima Geralmente o impedimento de abandono da prostituição será por coação econômica que é um dos argumentos mais eloquentes também nesse meio 54 Questionável punição do impedimento Se já é questionável criminalizar o favorecimento da prostituição a situação fica ainda mais crítica ao incriminar as condutas de impedir ou dificultar sem violência ou grave ameaça como diz Nucci na base do argumento que alguém prostituído a abandone especialmente por tratarse de pessoa maior de idade portanto livre para fazer suas opções de vida Não se pode olvidar que prostituirse ou exercer a prostituição não constitui crime algum Incensurável no particular a procedente crítica apresentada por Nucci que transcrevemos Ora como se pretende punir alguém que convença outrem a não abandonar a prostituição pela força de palavras de convencimento Mesmo na forma facilitar a prostituição alheia soanos crime de configuração impossível em face do bem jurídico tutelado hoje a dignidade sexual A contradição é evidente o agente facilita a prática de ato considerado não criminoso prostituição A intervenção mínima não é respeitada padecendo o tipo penal de legitimidade constitucional para ser aplicado Guilherme de Souza Nucci Crimes contra a Dignidade Sexual p 75 55 Desnecessidade de fim de lucro Para a configuração do delito de favorecimento da prostituição não se exige o fim de lucro mas independentemente de sua existência haverá aplicação da pena de multa pois sua cominação é cumulativa com a de prisão prevista para o caput Antes da Lei n 120152009 no entanto somente quem com o fim de lucro arranjasse parceiro à mulher por exemplo para fins de relacionamento sexual sofria a pena de prisão cumulada com a de multa Paradoxalmente assim quando se tratar de vítima menor vulnerável art 218B somente será aplicada a pena pecuniária se houver a finalidade de obter vantagem econômica 1º Embora o fim de lucro seja a regra não é ele indispensável uma vez que a prostituição pode ocorrer por puro vício ou depravação moral 6 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo do crime de favorecimento à prostituição é o dolo constituído pela vontade consciente de praticar qualquer das condutas descritas no tipo induzir facilitar impedir ou dificultar conducentes à prática da prostituição ou outra forma de exploração sexual A consciência de todas as elementares do tipo como elemento do dolo deve ser atual isto é deve existir no momento em que a ação está acontecendo O agente deve ter plena consciência no momento em que pratica a ação daquilo que quer realizar favorecer à prostituição com qualquer das condutas descritas no tipo penal Assim o agente deve ter não apenas consciência de que pratica uma relação sexual com alguém mas também que o faz com menor de quatorze anos ou com alguém portador de deficiência mental e além disso deve ter consciência também das consequências de sua ação e dos meios que utiliza para executála Além desse elemento intelectual é indispensável ainda o elemento volitivo sem o qual não se pode falar em dolo direto ou eventual Em outras palavras a vontade deve abranger igualmente a ação em qualquer de suas modalidades escritas no tipo o resultado exercício da prostituição os meios de forma livre e o nexo causal relação de causa e efeito Por isso quando o processo intelectualvolitivo não atinge um dos componentes das ações descritas na lei o dolo não se aperfeiçoa isto é não se realiza Na realidade o dolo somente se completa com a presença simultânea da consciência e da vontade de todos os elementos constitutivos do tipo penal 61 Desnecessidade de elemento subjetivo especial do tipo Não vemos nessa figura típica a exigência de elemento subjetivo especial do injusto a despeito de boa parte da doutrina considerála necessária Admitir a necessidade de referido elemento subjetivo para configurar essa infração penal poderá levar à inadequação típica quando o favorecimento da prostituição em qualquer de suas modalidades tenha sido motivado por outras razões alheias ao suposto fim especial de satisfazer a lascívia de outrem Em outros termos na nossa ótica é suficiente que o agente pratique qualquer das condutas descritas no tipo consciente de que está favorecendo o exercício da prostituição ou impedindo o seu abandono Não há por outro lado previsão da modalidade culposa 7 Consumação e tentativa Para a tipificação do delito é desnecessário que a vítima se entregue à prostituição com a multiplicidade de relações carnais pois o que se objetiva é a resolução ou deliberação da vítima de dedicarse à prostituição podendo caracterizarse com frequência a estabelecimento adequado pelo modo de vida etc Com efeito consumase com o início de uma vida de prostituição ou com seu prosseguimento sendo desnecessário o efetivo comércio carnal como prostituta Na realidade consumase o crime de favorecimento à prostituição ou outra forma de exploração sexual art 228 do CP quando a ação do sujeito ativo produz na vítima o efeito por ele pretendido isto é quando levada por ele à prostituição ou é impedida de abandonála Esclarece Rogério Sanches Cunha que nas modalidades induzir atrair e facilitar consumase o delito no momento em que a vítima passa a se dedicar à prostituição ou outra forma de exploração sexual colocandose de forma constante à disposição dos clientes ainda que não tenha atendido nenhum E conclui Sanches Cunha Já na modalidade de impedir ou dificultar o abandono da exploração sexual o crime consumase no momento em que a vítima delibera por deixar a atividade e o agente obsta esse intento protraindo a consumação durante todo o período de embaraço crime permanente Rogério Sanches Cunha Direito Penal p 269 Admitese em tese a tentativa embora em regra difícil seja sua constatação Recomendase muita cautela para não incriminar qualquer ação como tipificadora do delito tentado 8 Classificação doutrinária Tratase de crime comum não exige qualquer condição ou qualidade especial do sujeito ativo material para se consumar exige como resultado a incorporação do estado de prostituição absorvendo a ideia de adotar como meio de vida o comércio carnal independentemente de já haver praticado algum ato sexual de forma livre pode ser praticada por qualquer meio ou forma eleita pelo agente instantâneo não há delonga entre a ação humana e o resultado não se alongando no tempo a sua execução comissivo os verbos nucleares indicam ação positiva do agente unissubjetivo que pode ser praticado por apenas um agente plurissubsistente normalmente esses tipos de condutas implicam a reiteração de atos distintos desdobrandose por conseguinte em vários atos habitual constituise de atos que isoladamente são penalmente irrelevantes 9 Redefinição das formas qualificadas Adequadamente o texto legal abandona a adoção das qualificadoras contidas no 1º do art 227 redefinindoas em seu próprio 1º Excluiu no entanto a menoridade entre 14 e 18 anos como uma das qualificadoras que é coberta pela previsão do art 218B Excluiu igualmente descendente pela falta de sentido lógico e pessoa a quem esteja confiada para fins de educação de tratamento ou de guarda ficando esse dispositivo com a seguinte redação Se o agente é ascendente padrasto madrasta irmão enteado cônjuge companheiro tutor ou curador preceptor ou empregador da vítima ou se assumiu por lei ou outra forma obrigação de cuidado proteção ou vigilância 1º A pena cominada nessas hipóteses é de três a oito anos 91 Manutenção da qualificadora relativa à violência Foi mantida a qualificadora relativa à violência 2º Com efeito se houver o emprego de violência vis corporalis grave ameaça vis compulsiva ou fraude ardil artifício a pena será reclusão de quatro a dez anos na redação anterior era de dois a oito anos além da pena correspondente à violência Se o agente for movido pelo fim de lucro segundo previsão do 3º além da pena de prisão prevista aplicarseá também a de multa por constituir o lenocínio mercenário crime mais grave em razão de sua maior torpeza 3º No particular há uma incongruência resultante da desatenção do legislador que não lendo o texto anterior cominou novamente a pena de multa no caput cumulativamente com a pena privativa de liberdade ignorando a ressalva constante do 3º que reserva essa sanção penal cumulativa para quando ficasse configurada a finalidade de lucro 10 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é de reclusão de dois a cinco anos na modalidade simples cumulada com a pena de multa independentemente de haver finalidade econômica Paradoxalmente no entanto quando se tratar de vítima menor vulnerável art 218B somente será aplicada a pena pecuniária se houver a finalidade de obter vantagem econômica 1º A cominação distinta da pena de multa nos dois dispositivos criou uma situação paradoxal no favorecimento à prostituição de adulto art 228 a cominação da multa está no caput aplicase sempre quando se tratar de vítima menor art 218B a previsão consta do 1º aplicandose somente se houver finalidade econômica Ou seja quando a vítima for maior ocorrerá sempre a aplicação da pena de multa quando se tratar de vítima menor a aplicação de multa dependerá de prova da existência de finalidade econômica 101 Punição das figuras qualificadas Pela previsão do 1º o crime será qualificado com pena de reclusão de três a oito anos se o agente é ascendente padrasto madrasta irmão enteado cônjuge companheiro tutor ou curador preceptor ou empregador da vítima ou se assumiu por lei ou outra forma obrigação de cuidado proteção ou vigilância Se houver violência grave ameaça ou fraude a pena será de quatro a dez anos 2º Se a violência empregada na prática do crime constituir em si mesma outra infração penal haverá a cumulação de penas que não significa concurso material conforme demonstramos no capítulo em que abordamos o crime de rufianismo A ação penal é pública incondicionada não dependendo de qualquer condição ou manifestação de quem quer que seja Casa de prostituição Art 229 Manter por conta própria ou de terceiro estabelecimento em que ocorra exploração sexual haja ou não intuito de lucro ou mediação direta do proprietário ou gerente Caput com redação determinada pela Lei n 12015 de 7 de agosto de 2009 Pena reclusão de 2 dois a 5 cinco anos e multa D O U T R I N A 1 Considerações preliminares Distinguese este crime manter estabelecimento para exploração sexual daquele descrito no art 228 favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual Na previsão do art 228 pretendese coibir que o sujeito ativo facilite a prostituição de alguém isto é de pessoa certa e determinada Ao passo que neste art 229 objetivase impedir outra forma de favorecimento à prostituição como diz Rogério Sanches uma forma especial Rogério Sanches Direito Penal p 270 nota n 24 talvez a mais importante qual seja a manutenção de local para o exercício da prostituição mas nessa hipótese de maneira geral e indeterminada Com a criminalização da manutenção de casa de prostituição agora estabelecimento em que ocorra exploração sexual paradoxalmente o legislador penal proíbe a exploração de uma atividade que é permitida e confundindo moral com direito condena a prostituição a realizarse nas ruas nos guetos clandestinamente 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido genericamente como ocorre com todos os crimes constantes do Título VI da Parte Especial do CP é a dignidade sexual do ser humano como parte integrante da personalidade do indivíduo A proibição constante do art 229 tem a pretensão de proteger a moralidade sexual pública objetivando particularmente evitar ou restringir o incremento e o desenvolvimento da prostituição A exploração da prostituição no entanto é um dos comportamentos mais degradantes e moralmente censuráveis que a civilização ao longo de sua história não conseguiu eliminar 3 Sujeito ativo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa homem ou mulher desde que mantenha na condição de proprietário ou gerente casa do ramo com ou sem finalidade lucrativa embora esta esteja implícita nessa modalidade de conduta Na verdade excluise a prostituta que mantém o local para ela própria e sozinha explorar o comércio carnal visto que o tipo penal exige que o sujeito ativo mantenha a casa para a prostituição alheia e não para a própria Entendimento contrário transforma em penalmente punível o exercício da prostituição em autêntica responsabilidade objetiva considerandose que o exercício da prostituição não constitui crime O terceiro no entanto em nome de quem o agente ou se preferirem o executor mantiver a casa de prostituição também será sujeito passivo se tiver ciência de que tal atividade é exercida em seu nome Estão excluídos da responsabilidade penal os serviçais desses locais camareiras garçons cozinheiras etc pois se deve punir quem tem o exercício e o controle da casa de prostituição e certamente não são esses humildes trabalhadores 4 Sujeito passivo Sujeito passivo será sempre a pessoa prostituída homem ou mulher que permanece no local bordel casa de prostituição ou estabelecimento de exploração sexual ou a ele se dirige para fim libidinoso local especialmente mantido para esse fim Adotando entendimento contrário Guilherme de Souza Nucci argumenta que a pessoa que se prostitui não é sujeito passivo tendo em vista que o ato em si não é considerado ilícito penal além do que ela também está ferindo os bons costumes ao ter vida sexualmente desregrada de modo que não pode ser vítima de sua própria liberdade de ação Guilherme de Souza Nucci Código Penal Comentado p 699 Na verdade ela não é vítima de sua própria ação exercer a prostituição mas é vítima segundo o texto legal da exploração de quem mantém o local para essa finalidade ou melhor dito para explorar o exercício dessa atividade 41 A coletividade não é sujeito passivo dessa infração penal Por fim adotando um posicionamento um pouco mais crítico não admitimos a sociedade como sujeito passivo dessa infração penal uma vez que nem sequer se sente incomodada ignorando praticamente esse tipo de conduta Admitir a coletividade como sujeito passivo dessa infração penal constitui uma posição arbitrária que impõe um estado ou situação não assumida espontaneamente pela própria sociedade 5 Casa de prostituição Casa de prostituição segundo a concepção tradicional é o local em que as prostitutas permanecem para o exercício do comércio carnal à espera de seus potenciais clientes Embora a lei se refira alternativamente a ou lugar destinado a encontros para fim libidinoso devese interpretar restritivamente como outro local para encontro de prostituição adequandose ao nomen juris do tipo penal A finalidade libidinosa é a mesma da prostituição que abrange todas as variações possíveis do comércio carnal isto é não especialidades na exploração do sexo para incluir algumas e excluir outras 6 Tipo objetivo adequação típica A conduta incriminada é representada pelo verbo nuclear manter que significa sustentar conservar ou custear a antiga casa de prostituição modernizada pela Lei n 120152009 para estabelecimento em que ocorra exploração sexual Em outros termos o crime consiste em manter esses locais seja sob a terminologia tradicional casa de prostituição seja com o neologismo estabelecimento onde ocorra exploração sexual explorálos ou dirigilos exatamente para o fim mencionado no tipo penal qual seja para que ocorra exploração sexual Aliás além de haver esquecido o nomen juris da infração penal a única grande mudança no texto legal desse dispositivo foi substituir casa de prostituição ou lugar destinado a encontros para fim libidinoso por estabelecimento em que ocorra exploração sexual Na realidade podese afirmar como diria um famoso dirigente esportivo mudouse para continuar tudo igual ou seja nada mudou Em outros termos mudouse o rótulo mas a substância é a mesma 61 Exploração sexual sentido e alcance A grande questão passa a ser afinal qual o sentido que o legislador quis atribuir à expressão exploração sexual em substituição à milenar prostituição ou se preferirem casa de prostituição Como destaca Luiz Flávio Gomes o comércio que tem como objeto o sexo privado entre maiores que conta com conotação positiva em razão da segurança da higiene etc não é a mesma coisa que exploração sexual que tem conotação negativa e aproveitamento fruição de uma debilidade etc Luiz Flávio Gomes em httpwwwjusbrasilcombrnoticias1872027crimescontraa dignidadesexualeoutrasreformaspenais O legislador abusou da utilização da expressão exploração sexual empregandoa em múltiplos sentidos arts 218B 228 229 231 231 A embora não tenha declinado com alguma clareza qual o significado que lhe atribui em cada hipótese Pelo menos neste art 229 emprega a expressão exploração sexual com o significado de prostituição e esta não mudou seu sentido ao longo dos últimos dois milênios Aliás parecenos que Nucci tem essa mesma compreensão do significado de exploração sexual para fins do art 229 Guilherme Nucci Crimes contra a Dignidade Sexual p 79 que determinada casa além de bar sauna motel etc é lugar destinado à exploração sexual considerada esta a prostituição e outras formas fraudulentas de obtenção de sexo grifamos 62 Crime habitual Manter implica a ideia de habitualidade que não deve ser confundida com permanência São desnecessários o fim de lucro e a mediação direta do proprietário ou gerente segundo elementar expressa que constitui característica negativa da constituição tipológica A tipificação desse delito exige prova da habitualidade O verbo manter implica a ideia de continuidade de reiteração da repetição da mesma ação que não se confunde com permanência cuja ação única alongase no tempo Não haverá crime portanto por inadequação da tipicidade se não houver prova da reiteração 63 A tolerância das autoridades Por fim a eventual tolerância das autoridades ou a indiferença na repressão criminal bem como o pretenso desuso não se apresentam em nosso sistema jurídicopenal como causa de exclusão da tipicidade A norma incriminadora não pode ser neutralizada ou ser considerada revogada em decorrência de desvirtuada atuação das autoridades constituídas art 2º caput da LINDB Na realidade a evidente inaplicabilidade ou inefetividade da proibição constante do tipo sub examen demonstra o grande equívoco na tipificação dessa conduta que ora se repete com a Lei n 120152009 7 Natureza e finalidade do estabelecimento Há dois aspectos indispensáveis para se poder caracterizar determinado local casa de prostituição ou estabelecimento em que possa ocorrer exploração sexual como destinado à prostituição ou exploração sexual i a natureza do local e ii a sua finalidade exclusiva ou no mínimo preponderante Com efeito a prostituição desde os primórdios da civilização humana sempre existiu e sem dúvida podese afirmar com segurança uma de suas características sempre foi a clandestinidade e por essa razão os locais de suas instalações ou explorações nunca primaram pela transparência legalidade e oficialidade Os prostituídos ou melhor as prostituídas não quer dizer que não houvesse prostituídos apenas eram enrustidos sempre foram marginalizadas e eram constrangidas a buscar locais afastados velhos pobres insalubres e antihigiênicos conquistando os adjetivos pejorativos de prostíbulos bordéis ou lupanários E finalmente considerando a concentração desses locais em determinadas áreas suburbanas passouse a denominálas zona do meretrício embora ainda sejam discriminadas mas já menos excluídas 71 Migração dos prostíbulos para a zona urbana É bem verdade que a evolução dos tempos o crescimento das cidades e a liberalidade dos costumes permitiram e até facilitaram a migração desses prostíbulos para regiões menos excluídas das cidades pelo menos na zona urbana Esses locais por outro lado ganharam em qualidade higiene e até em luxo mas não perderam a sua natureza qual seja de concentração de mulheres dispostas a comercializar clandestinamente o próprio corpo fazendo dessa atividade o seu meio de vida Sintetizando esses ambientes independentemente da denominação que se lhe atribua casa de prostituição ou estabelecimento de exploração sexual serão sempre o local de encontro de pessoas em busca do prazer e da satisfação sexual Essa é a sua natureza 72 Finalidade específica do local exploração sexual Por outro lado é fundamental que se identifique com clareza e precisão a finalidade do local isto é do prostíbulo ou bordel ou se preferirem a nova terminologia estabelecimento em que ocorra exploração sexual Essa finalidade deve necessariamente ser exclusiva e específica isto é deve tratarse de local de encontros para a prática de libidinagem ou comércio da satisfação carnal em outras palavras para o exercício da prostituição ou na linguagem do atual texto legal de exploração sexual 73 Hotéis e motéis de alta rotatividade inadequação típica Acreditamos que o legislador pretendeu exatamente o contrário isto é afastar a polêmica instalada sobre a possibilidade de esses estabelecimentos também poderem ser interpretados como locais de prostituição usando para isso inclusive uma expressão mais forte qual seja exploração sexual A finalidade sabemos todos de tais estabelecimentos hotéis motéis restaurantes etc como regra é outra bem diferente qual seja explorar o comércio de hospedagem e alimentação faltandolhes o fim específico de explorar a prostituição Nesse sentido muito pertinente a crítica de Luiz Flávio Gomes No que diz respeito ao delito do art 229 do CP casa de prostituição a melhor interpretação é a restritiva ou seja desde que o ato sexual envolva maiores não há que se vislumbrar qualquer tipo de crime nas casas destinadas aos encontros sexuais Luiz Flávio Gomes em httpwwwjusbrasilcombrnoticias1872027crimescontraa dignidadesexualeoutrasreformaspenais Por todas essas razões consideramos que eventuais encontros ainda que frequentes para satisfazer a lascívia em hotéis motéis ou restaurantes não tipificam a conduta descrita no art 229 74 Manutenção de hotéis e motéis inadequação típica Havia mesmo antes da Lei n 120152009 profunda divergência sobre o fato de hotéis licenciados pela polícia e casas mantidas em zonas de meretrício inclusive pagando impostos e taxas constituírem ou não esse crime Há decisões inadmitindo as conhecidas casas de massagem banhos ou duchas como lugar destinado à prostituição a despeito de disfarçarem a prática do comércio sexual Estão excluídos já estavam e continuam na verdade atualmente dessa definição os motéis ou hotéis de alta rotatividade destinados a encontros de namorados amantes ou companheiros cônjuges enfim casais para fins libidinosos que não se confundem com prostituição A praxis tem comprovado que em regra ninguém se dirige a um motel com uma prostituta e lá tampouco existe alguma à espera do freguês Em tese esses locais destinamse a receber toda espécie de hóspedes geralmente para fins libidinosos mas sem que isso implique o comércio carnal 75 Bar e ginástica inadequação típica Para a configuração do delito do art 229 do Código Penal em se tratando de comércio relativo a bar ginástica etc é necessária a transformação do estabelecimento em local exclusivo de prostituição É incensurável no particular a conclusão de Nucci quando destaca De todo modo é preciso provar que o agente responsável pelo estabelecimento somente o mantém com essa finalidade facilitação da prostituição Se o objetivo da casa é diverso como por exemplo oferecer hospedagem tal como se dá com hotéis e motéis não há que se falar no delito do art 229 Guilherme de Souza Nucci Crimes contra a Dignidade Sexual p 82 8 Consentimento do ofendido e exclusão da antijuridicidade Todas as pessoas maiores têm o direito e a liberdade de orientarem sua vida sexual da forma como quiserem inclusive de se prostituírem podem exercer sua sexualidade satisfazer seus instintos e fantasias sexuais livremente desde que não violem direitos de terceiros especialmente de menores Nesse sentido é o magistério de Luiz Flávio Gomes As pessoas maiores contam com a liberdade de darem à sua vida sexual a orientação que quiserem Podem se prostituir podem vender o prazer sexual ou carnal podem se exibir de forma privada etc Só não podem afetar direitos de terceiros nem muito menos envolver menores Luiz Flávio Gomes em httpwwwjusbrasilcombrnoticias1872027crimescontraa dignidadesexualeoutrasreformaspenais Por isso apesar dos falsos moralismos ao longo dos séculos desde Maria Madalena o exercício da prostituição continua sendo uma atividade lícita embora moralmente questionável a despeito da existência de rufiões e proxenetas aliás estes e somente estes é que devem ser criminalizados pela exploração ilícita que fazem das pessoas prostituídas 81 Tolerância da sociedade com o exercício da prostituição Com efeito a sociedade ao longo dos tempos não só convive como entende tolera e aceita não apenas a prostituição como também as próprias prostitutas que convivem normalmente no meio social Razões as mais variadas podem levar alguém a prostituirse inclusive a falta de opção para sobreviver embora não interesse aqui questionar esses fundamentos mas apenas destacar o direito de as pessoas direcionarem sua sexualidade como melhor lhes aprouver Aliás ao longo de mais de vinte e cinco anos de magistério superior tivemos como nossas alunas inúmeras meninas que mantinham seus estudos trabalhando como garotas de programa e nem por isso eram piores ou diferentes das demais Certamente não era uma simples opção de vida mas imperiosa necessidade para manteremse na universidade 82 Local adequado para o exercício da prostituição Nem todas podem exercer a prostituição com a comodidade de uma garota de programa necessitam de um local adequado de preferência o melhor lugar possível Por essa razão basicamente as prostitutas procuram batalham lutam para ser aceitas nas denominadas casas de prostituição ou estabelecimentos em que ocorra exploração sexual Em outros termos lutam prostituemse sobrevivem nesses locais por vontade própria livremente sem coação ou imposição de natureza alguma ou seja consentem em trabalhar e até viver muitas delas nesses locais destinados a prostituição atos de libidinagem ou exploração sexual como quer o atual legislador 83 Prostituição exercício de atividade lícita A prostituição e consequentemente seu exercício são uma atividade lícita permitida e aceita pela sociedade não hipócrita os hipócritas fazem que censuram Como a liberdade sexual é um direito de todos e a prostituição não só não é crime como é permitida isto é lícita a sua proteção penal dirigese a um bem jurídico disponível seja qual for a concepção que se tenha sobre o tema Enfim estamos chegando no ponto que queríamos chegar qual seja examinar os efeitos do consentimento do ofendido em se deixar explorar em estabelecimento em que pode ocorrer a lei fala em que ocorra exploração sexual Vejamos a seguir 84 Efeitos do consentimento da ofendida Para exercerem a prostituição as prostitutas consentem livremente em praticála em locais adequados como são as denominadas casas de prostituição ou atualmente os estabelecimentos em que ocorra exploração sexual Em outros termos a conduta dos proprietários gerentes ou responsáveis por esses estabelecimentos até pode ser típica mas não será antijurídica se ficar demonstrado o consentimento das supostas ofendidas Nessa linha complementa Luiz Flávio Gomes As pessoas maiores frequentam essas casas se quiserem e quando quiserem São livres para isso Nos parece um absurdo processar o dono de um motel ou de uma casa de prostituição que é frequentada exclusivamente por pessoas maiores de idade Luiz Flávio Gomes em httpwwwjusbrasilcombrnoticias1872027crimescontraa dignidadesexualeoutrasreformaspenais Pois a utilização desse recurso dogmático consentimento do ofendido impede que esse absurdo de que fala Luiz Flávio Gomes se concretize 9 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo é constituído pelo dolo representado pela vontade consciente de manter por conta própria ou de terceiro casa de prostituição ou na nova terminologia estabelecimento em que ocorra exploração sexual É indispensável que o agente tenha conhecimento dessa destinação específica do estabelecimento para que se configure o dolo Exige igualmente necessária a presença do elemento subjetivo especial do tipo isto é pelo especial fim de manter local destinado à finalidade libidinosa Contudo não nos parece que seja possível admitir como especial fim do tipo a vontade de satisfazer o prazer sexual alheio através da manutenção de um lugar Guilherme de Souza Nucci Código Penal Comentado p 699 10 Consumação do crime Consumase com a manutenção de estabelecimentos em que ocorra exploração sexual enfim com a manutenção de local destinado a encontros libidinosos que o legislador passou a denominar exploração sexual Esse crime é habitual exigindo a prática reiterada do mesmo comportamento para caracterizálo não podendo ser confundido com crime permanente Tratandose de crime habitual por certo a prática de um ou outro encontro amoroso é insuficiente para consumar o delito cuja tipificação exige a prática repetida de condutas que isoladamente constituem um indiferente penal Aliás a descrição anterior desse tipo penal referiase a encontros no plural que deixava clara a necessidade de uma pluralidade de encontros para no mínimo atender a essa elementar típica 11 Figura tentada Como crime habitual não admite tentativa Discordamos nesse particular do entendimento de Paulo José da Costa Jr Comentários ao Código Penal 6 ed São Paulo Saraiva 2000 p 747 quando sustenta que a realização de um único encontro configura a forma tentada desse crime habitual pela singela razão de que crime habitual não admite tentativa Nesse sentido merece destaque a lição de Nucci que subscrevemos integralmente mantemos a nossa posição de ser juridicamente impossível a prisão em flagrante no caso do art 229 Com a nova redação há maior razão para se afastar essa atitude estatal Além de se exigir prova da habitualidade o que demanda tempo algo incompatível com o flagrante pode ser exigível prova de existência da exploração sexual prática de qualquer crime sexual envolvendo esse estado Crimes contra a Dignidade Sexual p 823 12 Classificação doutrinária Tratase de crime comum não exige qualquer condição ou qualidade especial do sujeito ativo formal para consumarse não exige como resultado a efetiva degradação da moral sexual em sentido contrário posicionase Nucci Crimes contra a Dignidade Sexual p 81 sustentando tratarse de crime material que exigiria a efetiva exploração sexual de forma livre pode ser praticado por qualquer meio ou forma comissivo manter implica ação positiva do agente unissubjetivo pode ser praticado por apenas um agente o que não inviabiliza a possibilidade do concurso de pessoas plurissubsistente como a habitualidade implica a reiteração de atos a conduta é necessariamente composta de uma variedade de atos distintos habitual constituise de atos que isoladamente são penalmente irrelevantes 13 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de reclusão de dois a cinco anos e multa por razão óbvia a atividade incriminada visa quase sempre a obtenção de lucro A ação penal é pública incondicionada não dependendo da iniciativa de quem quer que seja Contudo a despeito da obrigatoriedade da ação penal as casas de prostituição ou na nova terminologia estabelecimentos em que ocorra exploração sexual continuam proliferando em todo o País Rufianismo Art 230 Tirar proveito da prostituição alheia participando diretamente de seus lucros ou fazendose sustentar no todo ou em parte por quem a exerça Pena reclusão de 1 um a 4 quatro anos e multa 1º Se a vítima é menor de 18 dezoito e maior de 14 catorze anos ou se o crime é cometido por ascendente padrasto madrasta irmão enteado cônjuge companheiro tutor ou curador preceptor ou empregador da vítima ou por quem assumiu por lei ou outra forma obrigação de cuidado proteção ou vigilância Pena reclusão de 3 três a 6 seis anos e multa 2º Se o crime é cometido mediante violência grave ameaça fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação da vontade da vítima Pena reclusão de 2 dois a 8 oito anos sem prejuízo da pena correspondente à violência Redação dos parágrafos determinada pela Lei n 12015 de 7 de agosto de 2009 D O U T R I N A 1 Considerações preliminares Procurando compensar de certa forma o abandono dos prostituídos o legislador neste dispositivo dispensalhes certa atenção buscando protegêlos daqueles que os exploram direta ou indiretamente conhecidos como rufiões Neste crime o legislador por meio da Lei n 120152009 limitouse a alterar o conteúdo das qualificadoras sem contudo modificar as respectivas cominações penais esquecendose apenas da pena de multa para as hipóteses do 2º Aproveitou no entanto para incluir às qualificadoras do crime a utilização de fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a moralidade sexual na medida em que o rufianismo é modalidade do lenocínio consistente em viver à custa da prostituição alheia A proibição constante do art 230 objetiva particularmente evitar ou restringir a exploração da prostituição que é um dos comportamentos mais degradantes e moralmente censuráveis no entanto a despeito de sua criminalização a sociedade ao longo de toda a sua história não conseguiu eliminar O rufião explora as mulheres que fazem da prostituição seu meio de vida incentivando consequentemente o comércio sexual O bem jurídico protegido genericamente como ocorre com todos os crimes constantes do Título VI da Parte Especial do CP é a dignidade sexual do ser humano como parte integrante da personalidade do indivíduo 3 Sujeito ativo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa embora em regra este crime seja praticado por homem popularmente conhecido como rufião ou cafetão nada impede contudo que mulher também o pratique sendo ou não meretriz podendo igualmente viver da exploração de quem exerce a prostituição Essa possibilidade não deixa de fazer parte da conquista feminina para o bem e para o mal da igualdade de tratamento 4 Sujeito passivo Sujeito passivo poderá ser qualquer pessoa homem ou mulher que exerça a prostituição e seja explorado pela figura do rufião Há uma certa hipocrisia em defender ainda que mediatamente o corpo social ou a coletividade como sujeito passivo desse tipo de infração penal considerandose que a rigor a sociedade mostrase indiferente com a existência destino ou moralidade da prostituição Por esse motivo na nossa ótica não há mais razão de ser em considerar a sociedade como sujeito passivo mediato dos crimes de favorecimento da prostituição casa de prostituição e rufianismo 5 Tipo objetivo adequação típica Configura o crime de rufianismo fazerse alguém sustentar no todo ou em parte por prostituta participando habitualmente do lucro auferido da prostituição independentemente do emprego de violência ou grave ameaça A ação tipificada é tirar proveito da prostituição alheia isto é auferir vantagem aproveitarse economicamente de pessoa que a exerça Há duas modalidades de aproveitarse a participando diretamente dos lucros b fazendose sustentar por quem exerça a prostituição Na primeira hipótese o agente participa dos lucros como verdadeiro sócio da prostituta A participação nos lucros deve ser direta não configurando a venda de bebidas ou o recebimento de aluguéis por exemplo na segunda hipótese fazerse sustentar o rufião é mantido por ela completa ou parcialmente sem uma participação mais efetiva e mais clara nos lucros auferidos 51 Somente a prostituição alheia Prostituição alheia significa em primeiro lugar que se trata de prostituição exercida por outrem e não pelo sujeito ativo do rufianismo e em segundo lugar que deve tratarse efetivamente de prostituta e não simplesmente de mulher que vive às expensas de amantes determinados eventuais ou temporários ou seja mulher que digamos explora um aqui outro ali mas enfim um número relativamente determinado de parceiros Exigência primeira isto é fundamental para a caracterização do delito do art 230 do Código Penal é a demonstração da condição de prostituta da vítima isto é de que se trata de mulher que comercializa o sexo como meio de vida da qual o rufião se aproveita 52 Consentimento da vítima O consentimento da vítima segundo corrente majoritária é irrelevante considerandose que a proteção penal se exerce igualmente em relação à moralidade pública e não apenas somente em relação à vítima entendimento com o qual não concordamos pois não reconhecemos a coletividade como sujeito passivo mediato Por isso segundo esse entendimento também é indiferente que a prostituta ofereça espontaneamente ao rufião essa possibilidade Essa interpretação reconhece que se trata de bem jurídico indisponível além de admitir que a vítima via de regra encontrase em situação fragilizada não dispondo das condições ideais para manifestar e exercer livremente a sua vontade ou no mínimo sendo de difícil comprovação 53 Necessidade da característica da habitualidade Nas duas modalidades de condutas tirar proveito ou fazendose sustentar é indispensável a característica da habitualidade Pressupõese habitual e direta participação nos ganhos o habitual sustento total ou parcial do agente pela prostituta ou prostituto A simples vantagem ocasional ou o recebimento eventual de um presente ou outro ou alguma ajuda esporádica não tipificam esse delito 6 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo é constituído pelo dolo que se fundamenta na vontade consciente de tirar proveito da prostituição alheia ou de sustentarse dela Não concordamos com parte da doutrina que exige nesta infração penal o especial fim de agir Endossamos nesse particular o magistério de Paulo José da Costa Jr quando afirma que apesar de aquele que desfruta da meretriz estar concorrendo de certa forma para a satisfação da lascívia de terceiro não é essa a finalidade perseguida pelo agente O crime dispensa assim para o seu aperfeiçoamento a presença do dolo específico Código Penal Comentado p 750 7 Consumação do crime habitual Consumase com a prática reiterada com habitualidade de uma das condutas descritas no tipo penal isto é quando o agente rufião passa a participar dos lucros ou a ser sustentado por quem exerce a prostituição Convém destacar que não se confunde com crime permanente cuja execução de ação única alongase no tempo permitindo a prisão em flagrante Não é o caso do rufianismo que se caracteriza pela repetição de condutas várias que isoladamente constituem um indiferente penal somente sua repetição sistemática é que acaba configurando o tipo penal que ora se examina No particular concordamos com o magistério de Guilherme de Souza Nucci que também o reconhece como crime habitual Crimes contra a Dignidade Sexual p 86 71 Figura tentada Como crime habitual que diríamos próprio a tentativa é juridicamente inadmissível já que somente a prática reiterada de vários atos pode tipificar o crime de rufianismo A simples vantagem ocasional ou o recebimento eventual de um mimo um auxílio eventual repetindo não tipificam essa infração penal 8 Classificação doutrinária Tratase de crime comum não exige qualquer condição ou qualidade especial do sujeito ativo formal para consumarse não exige como resultado a efetiva degradação da moral sexual de forma livre pode ser praticada por qualquer meio ou forma escolhido pelo agente comissivo ambas condutas implicam ação positiva do sujeito ativo unissubjetivo pode ser praticado por apenas um indivíduo plurissubsistente como a habitualidade implica a repetição de atos a conduta é necessariamente composta de uma variedade deles habitual constituise de atos que isoladamente são penalmente irrelevantes Tratandose de crime habitual próprio não admite tentativa 9 Formas qualificadas A Lei n 12015 suprimiu o texto anterior do 1º que remetia à previsão do art 227 1º redefinindo e ampliando as hipóteses qualificadoras como já o fizera no art 228 1º Com efeito a nova qualificadora prevê as seguintes hipóteses se a vítima é menor de dezoito e maior de catorze anos ou se o crime é cometido por ascendente padrasto madrasta irmão enteado cônjuge companheiro tutor ou curador preceptor ou empregador da vítima ou por quem assumiu por lei ou outra forma obrigação de cuidado proteção ou vigilância Qualifica igualmente o crime o eventual emprego de violência física ou moral fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação da vontade da vítima 2º Antes da Lei n 12015 era prevista somente a violência como qualificadora neste parágrafo 91 Nova definição de concurso material de crimes A previsão da qualificadora decorrente de violência tem a pena cominada sem prejuízo da pena correspondente à violência 2º Certamente a essa previsão legal não corresponde uma nova definição de concurso material de crimes cuja sede reside no art 69 Com efeito o que caracteriza o concurso material de crimes não é a soma ou cumulação de penas como prevê o dispositivo em exame mas a pluralidade de condutas pois no concurso formal impróprio isto é naquele cuja conduta única produz dois ou mais crimes resultantes de desígnios autônomos as penas também são aplicadas cumulativamente Ora esse comando legal art 230 2º determinando a aplicação cumulativa de penas não autorizou o intérprete a confundir o concurso formal impróprio com o concurso material Na verdade concurso de crimes e sistema de aplicação de penas são institutos inconfundíveis o primeiro relacionase à teoria do delito e o segundo à teoria da pena por isso a confusão é injustificável 92 Sistema de cumulação material de crime Quando a violência empregada na prática do crime de constrangimento ilegal constituir em si mesma outro crime havendo unidade de ação e pluralidade de crimes estaremos diante de concurso formal de crimes Empregase nesse caso por expressa determinação legal o sistema de aplicação de pena do cúmulo material independentemente da existência ou não de desígnios autônomos A aplicação cumulativa de penas mesmo sem a presença de desígnios autônomos constitui uma exceção da aplicação de penas prevista para o concurso formal impróprio No entanto a despeito de tudo o que acabamos de expor nada impede que concretamente possa ocorrer concurso material como acontece com quaisquer outras infrações penais do crime de constrangimento ilegal com outros crimes violentos desde que é claro haja pluralidade de condutas e pluralidade de crimes mas aí observese já não será mais o caso de unidade de ação ou omissão caracterizadora do concurso formal 10 Pena e ação penal As penas cominadas para as condutas descritas no caput cumulativamente são reclusão de um a quatro anos e multa Para as hipóteses previstas no 1º foram mantidas a pena de reclusão de três a seis anos além da multa para as hipóteses contidas no 2º foram mantidas a reclusão de dois a oito anos além da pena correspondente à violência Esqueceuse o legislador nesta última hipótese da cominação da pena de multa assim paradoxalmente para a figura simples do caput há cominação da multa se houver a qualificadora do 2º será sem multa A ação penal é pública incondicionada sendo absolutamente desnecessária qualquer manifestação do ofendido ou de seu representante legal Tráfico internacional de pessoa para fim de exploração sexual Art 231 Promover ou facilitar a entrada no território nacional de alguém que nele venha a exercer a prostituição ou outra forma de exploração sexual ou a saída de alguém que vá exercêla no estrangeiro Pena reclusão de 3 três a 8 oito anos 1º Incorre na mesma pena aquele que agenciar aliciar ou comprar a pessoa traficada assim como tendo conhecimento dessa condição transportála transferila ou alojála 2º A pena é aumentada da metade se I a vítima é menor de 18 dezoito anos II a vítima por enfermidade ou deficiência mental não tem o necessário discernimento para a prática do ato III se o agente é ascendente padrasto madrasta irmão enteado cônjuge companheiro tutor ou curador preceptor ou empregador da vítima ou se assumiu por lei ou outra forma obrigação de cuidado proteção ou vigilância ou IV há emprego de violência grave ameaça ou fraude 3º Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica aplicase também multa Artigo com redação determinada pela Lei n 12015 de 7 de agosto de 2009 D O U T R I N A 1 Considerações preliminares Na redação original de nosso Código Penal de 1940 cuja Parte Especial recordando continua em vigor o nomen juris deste crime era tráfico de mulheres limitando assim a abrangência de quem poderia figurar como sujeito passivo que necessariamente deveria ser pessoa do sexo feminino A Lei n 11106 de 28 de março de 2005 além de alterar o nomen juris para tráfico internacional de pessoas ainda substituiu no 1º do art 227 o vocábulo marido pelo de cônjuge ou companheiro democratizando a abrangência do alcance desse dispositivo legal A mais importante inovação desse diploma legal no entanto referese a ampliação da criminalização do tráfico de pessoas dividindoa em dois tipos penais i tráfico internacional de pessoas e ii tráfico interno de pessoas sendo este constante do art 231A que foi acrescido pelo mesmo diploma legal Cria ainda a figura do intermediador caput suprimida de certa forma pela Lei n 120152009 que no entanto traz a figura do aliciador no 1º que se equivalem 2 Início da modernização da legislação Atento a esse flagelo que aflige um semnúmero de nações o Brasil começou a adaptar sua legislação a partir de 2005 Assim a Lei n 111062005 além de alterar o nomen juris de tráfico de mulheres constante da redação original do Código Penal de 1940 para tráfico internacional de pessoas ampliou não apenas os limites territoriais em que o crime pode ser praticado como também o sujeito passivo da infração penal que pode ser qualquer pessoa do sexo masculino ou feminino indiferentemente Acrescentou ademais a pena de multa à pena privativa de liberdade cominada no caput e nos respectivos parágrafos 3 Inclusão de finalidade especial do tipo Com a Lei n 120152009 o legislador voltou a alterar o nomen juris do crime inserindo a finalidade do tráfico internacional de pessoa qual seja para o fim de exploração sexual além de alterar pessoas para pessoa no singular sem qualquer necessidade ou utilidade na medida que incluiu no caput o vocábulo alguém indicador de que qualquer indivíduo pode ser sujeito passivo desse crime Aliás na cabeça do artigo também inseriu a expressão ou outra forma de exploração sexual sem contudo excluir a prostituição Reestruturou enfim os parágrafos desse artigo ao recriar o 3º com o deslocamento da pena de multa do caput 4 Destinatários países de terceiro mundo O tráfico internacional de pessoa para fins voluptuários é uma atividade criminosa que tem como vítima basicamente indivíduos de países de terceiro mundo que são levados para países mais desenvolvidos Nesse sentido como país em desenvolvimento o Brasil sofre nos dois polos ou seja possui muitas vítimas do tráfico internacional ao mesmo tempo em que tem servido de destino para tantas outras vítimas de países subdesenvolvidos como por exemplo os da própria América Latina 5 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a moralidade pública sexual que visa limitar territorialmente o exercício da prostituição e proibir o tráfico de pessoa com essa finalidade A despeito da inviabilidade de eliminar a prostituição um mal que aflige a todos os países uns mais outros menos este dispositivo tenta pelo menos impedir que prostitutas estrangeiras ampliem esse problema éticosocial que por si só já é grande demais Numa visão bemhumorada do problema poderia parecer uma certa reserva de mercado impedindo que a concorrência estrangeira ingresse no mercado nacional O bem jurídico protegido genericamente como ocorre com todos os crimes constantes do Título VI da Parte Especial do Código Penal é a dignidade sexual do ser humano como parte integrante da personalidade do indivíduo que deve ser protegida dentro e fora do território nacional 6 Sujeito ativo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa independente do sexo embora geralmente seja praticado por homem em regra por mais de uma pessoa O homossexualismo que acompanha a humanidade desde seus primórdios parece que se universalizou No dizer de Rogério Sanches Cunha qualquer pessoa pode praticar o delito em estudo seja atuando como empresário ou funcionário do comércio do sexo seja como consumidor do produto traficado Rogério Sanches Cunha Direito Penal p 275 7 Sujeito passivo Sujeito passivo a partir da Lei n 111062005 será tanto o homem quanto a mulher independente de sua honestidade sexual que venha exercer a prostituição no Brasil ou que seja levada para o exterior com a mesma finalidade Mesmo antes da citada lei a mulher independente de sua honestidade sexual que viesse ao Brasil para exercer a prostituição seria sujeito passivo dessa infração penal Convém destacar apenas para registro histórico que havia forte corrente doutrináriojurisprudencial que adotava orientação em sentido contrário No entanto Rogério Sanches Cunha lembra que antes da Lei n 12015 havia doutrina exigindo que o ofendido apresentasse a condição de prostituta que convenhamos era um grande equívoco Rogério Sanches Cunha Direito Penal p 275 8 Tipo objetivo adequação típica A ação tipificada é promover impulsionar colocar em execução realizar ou facilitar tornar fácil facultar desobstaculizar ajudar auxiliar a entrada ou a saída no território nacional de pessoa para exercer a prostituição ou outra forma de exploração sexual aqui ou lá A lei fala somente em alguém antes falava somente em mulher depois em 2005 em pessoa não exigindo a pluralidade de vítimas nem as adjetivando quanto à honestidade sendo suficiente a finalidade de vir a exercer o meretrício ou qualquer outra forma de exploração sexual ou sair do território nacional para a mesma finalidade 9 A finalidade de lucro Para a tipificação do tráfico internacional de pessoa é indiferente a finalidade de lucro embora essa seja a regra Contudo se esse fim estiver presente aplicase cumulativamente a pena de multa 3º pois a conduta tipificada é mais desvaliosa Se o tráfico ocorrer dentro do território nacional ou seja tratandose de tráfico interno o crime será o do art 231A acrescentado pela Lei n 111062005 Como se pune a entrada a simples passagem pelo território nacional não tipifica o delito 10 Figuras equiparadas Agenciar podese afirmar desde logo substitui o anterior intermediar que constava no caput do artigo antes da redação decorrente da Lei n 12015 Houve somente o deslocamento da conduta incriminada para o 1º do mesmo artigo sem contudo descriminalizála Nesse sentido é o magistério de Rogério Sanches Cunha o verbo intermediar servir de mediador entre duas pessoas presente no caput antes da Lei n 120152009 foi substituído por agenciar subsumindose ao disposto no 1º Portanto não houve supressão da figura criminosa mas simples alteração formal continuando típico Rogério Sanches Cunha Direito Penal p 276 nota 30 11 Irretroatividade das novas condutas Por outro lado as condutas aliciar atrair a simpatia envolver seduzir buscar adeptos para comprar adquirir mediante pagamento subornar ou corromper com dinheiro ou com favores transportar deslocar de um local para outro conduzir transferir remover mudar de um lugar para outro e alojar hospedar abrigar acolher instalar eram condutas atípicas e como tais não podem retroagir para alcançar fatos praticados antes da entrada em vigor da referida lei Por outro lado a conduta de agenciar que abrange o significado de intermediar também não deixa de ser atípica sob outros significados antes do advento da atual norma penal em outros termos só pode retroagir com o sentido de intermediar 12 Consciência de que se trata de pessoa traficada O texto legal 1º destaca expressamente que para as condutas de transportar transferir e alojar é indispensável que o sujeito ativo tenha conhecimento dessa condição isto é tratase de pessoa traficada para fim de exploração sexual o que não quer dizer por outro lado que para as demais condutas esse conhecimento seja desnecessário lembrando que todas as condutas são dolosas e sem consciência de todos os elementos do tipo não há dolo 13 Omissão da conduta vender Curiosamente ao contrário da previsão constante do próximo artigo tráfico interno de pessoa vender alguém para a mesma finalidade de exploração sexual não foi criminalizada constituindo grande lacuna no direito brasileiro que não pode ser suprida por analogia e tampouco por interpretação analógica 14 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo é constituído pelo dolo representado pela vontade consciente dirigida à prática da ação tipificada em qualquer das suas formas ciente de que a vítima vai exercer a prostituição no país a que se destina seja no Brasil seja no exterior A definição típica em qualquer das modalidades constantes no caput exige o especial fim de agir equivocadamente ainda denominada por alguns dolo específico qual seja para fim de exploração sexual em qualquer de suas formas A antiga desinteligência relativa a essa exigência ficou completamente superada com a redação da Lei n 12015 a começar pelo nomen juris dessa infração penal qual seja Tráfico internacional de pessoa para fim de exploração sexual No mesmo sentido Rogério Sanches Cunha Direito Penal p 276 Guilherme de Souza Nucci Crimes contra a Dignidade Sexual p 88 Pois esse fim especial de exploração sexual configura exatamente o elemento subjetivo especial do tipo ou do injusto que como tal não precisa concretizarse sendo suficiente que tenha sido motivador da conduta do sujeito ativo 15 Consumação e tentativa Consumase o crime previsto no art 231 do Código Penal com a promoção ou a facilitação da entrada de pessoa homem ou mulher no território nacional ou da saída de pessoa para o exterior a fim de exercer a prostituição ou outra forma de exploração sexual independentemente de que ela venha efetivamente a exercêla No entanto o seu exercício efetivo no Brasil ou no exterior respectivamente se ocorrer constituirá apenas o exaurimento do crime A tentativa é teoricamente admissível sempre que for possível interromper a fase executiva por circunstâncias alheias à vontade do sujeito ativo 16 Classificação doutrinária Tratase de crime comum não exige qualquer condição ou qualidade especial do sujeito ativo formal a partir da última alteração deixou de ser crime material consumase independentemente da ocorrência do efetivo exercício da prostituição ou outra forma de exploração sexual bastando que essa tenha sido a finalidade do tráfico de forma livre pode ser praticado por qualquer meio ou forma pelo agente comissivo promover e facilitar implicam ação positiva do agente instantâneo ação e resultado encontramse próximos um do outro muitas vezes praticamente concomitantes plurissubsistente tratamse de condutas que podem ter sua fase executória interrompida implicando não raro um certo caráter de habitualidade embora não possa ser definido como crime habitual 17 Pena e ação penal A pena cominada é a reclusão de três a oito anos Somente haverá a aplicação da pena de multa se houver o fim da obtenção de vantagem econômica esta pena foi deslocada do caput retornando para o 3º que foi recriado Foram suprimidas as qualificadoras que constavam do 1º As qualificadoras do 2º foram substituídas por uma causa de aumento de metade se I a vítima é menor de 18 dezoito anos II a vítima por enfermidade ou deficiência mental não tem o necessário discernimento para a prática do ato III se o agente é ascendente padrasto madrasta irmão enteado cônjuge companheiro tutor ou curador preceptor ou empregador da vítima ou se assumiu por lei ou outra forma obrigação de cuidado proteção ou vigilância ou IV há emprego de violência grave ameaça ou fraude A ação penal é pública incondicionada isto é não depende de qualquer condição ou manifestação da vítima ou de seu representante legal para a sua instauração Tráfico interno de pessoa para fim de exploração sexual Art 231A Promover ou facilitar o deslocamento de alguém dentro do território nacional para o exercício da prostituição ou outra forma de exploração sexual Pena reclusão de 2 dois a 6 seis anos 1º Incorre na mesma pena aquele que agenciar aliciar vender ou comprar a pessoa traficada assim como tendo conhecimento dessa condição transportála transferila ou alojála 2º A pena é aumentada da metade se I a vítima é menor de 18 dezoito anos II a vítima por enfermidade ou deficiência mental não tem o necessário discernimento para a prática do ato III se o agente é ascendente padrasto madrasta irmão enteado cônjuge companheiro tutor ou curador preceptor ou empregador da vítima ou se assumiu por lei ou outra forma obrigação de cuidado proteção ou vigilância ou IV há emprego de violência grave ameaça ou fraude 3º Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica aplicase também multa Artigo com redação determinada pela Lei n 12015 de 7 de agosto de 2009 D O U T R I N A 1 Considerações preliminares Este art 231A complementa de certa forma as previsões constantes do artigo antecedente que se limita a incriminar o tráfico internacional e criminaliza o tráfico interno de pessoa para fim de prostituição ou outra forma de exploração sexual A Lei n 120152009 reestruturou o conteúdo da redação anterior e separou claramente quem promove o deslocamento de pessoa para o exercício da prostituição ou outra forma de exploração sexual daqueles que agenciam ou intermedeiam o tráfico para essa finalidade Criou corretamente o objetivo das condutas incriminadas como fim especial do injusto possibilitando assim a consumação do crime independentemente da concretização efetiva da prostituição ou exploração sexual da vítima 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é igualmente a moralidade pública sexual objetivando também limitar territorialmente o exercício da exploração sexual da qual a prostituição passou a ser tratada como uma de suas espécies tentase proibir o tráfico de pessoa agora interno com essa finalidade A despeito da inviabilidade de eliminar a exploração sexual mal que aflige a todos uns mais outros menos este dispositivo procura pelo menos impedir o deslocamento de prostitutas ou prostituídos de um lugar cidades Estados etc para outro agravando esse problema éticosocial que por si só já assume grandes proporções Objetivase em outros termos na impossibilidade de evitar a exploração sexual pelo menos restringir o seu exercício 21 Bem jurídico genérico O bem jurídico protegido genericamente como ocorre com todos os crimes constantes do Título VI da Parte Especial do Código Penal é a dignidade sexual do ser humano como parte integrante da personalidade do indivíduo que deve ser protegida dentro e fora do território nacional Com a Lei n 120152009 o legislador voltou a alterar o nomen juris do crime inserindo a finalidade do tráfico internacional de pessoa qual seja para o fim de exploração sexual Aliás na cabeça do artigo também inseriu a expressão ou outra forma de exploração sexual sem contudo excluir a prostituição aspecto que será examinado adiante 3 Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa independentemente do sexo embora geralmente seja praticado por homem em regra por mais de uma pessoa a despeito de tratarse de crime unissubjetivo Sujeito passivo igualmente pode ser tanto homem quanto mulher independentemente de sua honestidade sexual já prostituídos ou não pode inclusive tratarse de criança ou adolescente Tudo o que se disse relativamente aos sujeitos ativos e passivos no artigo anterior aplicase a este 4 Tipo objetivo adequação típica As ações tipificadas pela redação anterior eram promover intermediar ou facilitar no território nacional o recrutamento o transporte a transferência o alojamento ou o acolhimento da pessoa que venha exercer a prostituição aqui no Brasil Esse tipo penal que foi introduzido pela Lei n 111062005 objetivava proibir o tráfico interno de pessoas com a finalidade de exercer a prostituição No entanto com a redação contemplada pela Lei n 120152009 o texto do caput do art 231A resultou no seguinte Promover ou facilitar o deslocamento de alguém dentro do território nacional para o exercício da prostituição ou outra forma de exploração sexual Promover nesse artigo significa impulsionar colocar em execução realizar e a segunda conduta facilitar quer dizer tornar fácil facultar desobstaculizar ajudar auxiliar o deslocamento de alguém no território nacional para exercer a prostituição lato sensu 41 Alterações introduzidas pela Lei n 120152009 As alterações produzidas pela Lei n 120152009 além de incluírem ao lado da prostituição o exercício de outra forma de exploração sexual desdobraram o conteúdo do caput deslocando as condutas equipadas para o 1º que examinaremos em seguida Por outro lado suprimiram o verbo intermediar que no entanto é abrangido pelo verbo agenciar como veremos Ademais deslocaram ou suprimiram o recrutamento transporte transferência alojamento ou acolhimento para subespécies de condutas que passaram a constar no final do 1º como figuras equiparadas Assim restou no caput somente as ações de promover ou facilitar o deslocamento de alguém dentro do território nacional para o exercício da prostituição ou outra forma de exploração sexual Essa reestruturação do tipo penal recebe o aplauso de Nucci in verbis A nova redação do art 231A diversamente do que ocorreu com o art 231 tornouse mais apurada Separouse quem promove o deslocamento da pessoa de quem agencia ou intermedeia o tráfico E o mais importante colocouse o exercício da prostituição ou outra forma de exploração sexual como finalidade a ser atingida mas não necessariamente Guilherme de Souza Nucci Crimes contra a Dignidade Sexual p 92 42 A proibição limitase ao território nacional Embora a prostituição em si não constitua crime o Estado mais uma vez por intermédio do Direito Penal pretende inviabilizar a sua exploração de qualquer natureza e em qualquer lugar ampliando o combate de todo tipo de exploradores dessa milenar mazela social Não se podeignorar o crescimento do chamado turismo sexual com grande divulgação em toda a Europa chamando a atenção de nossas autoridades e preocupando toda a coletividade brasileira especialmente porque as principais vítimas têm sido crianças e adolescentes Ao contrário da proibição constante no artigo anterior tráfico internacional de pessoa a deste dispositivo em exame circunscrevese ao território nacional tráfico interno de pessoa Ainda que as condutas nucleares não sejam exatamente as mesmas a finalidade dos dispositivos legais no entanto é idêntica combater a prostituição no território nacional seja com o tráfico interno seja com a importação de pessoas prostituídas ou a prostituíremse no cenário nacional 43 Descriminalização de condutas Ficam fora da atual criminalização as condutas de promover ou facilitar o recrutamento e o acolhimento de pessoa que venha exercer a prostituição no território nacional Em outros termos essas condutas foram descriminalizadas sendo portanto retroativas para beneficiar eventuais infratores sob essas modalidades 5 Figuras equiparadas Agenciar podese afirmar desde logo substitui o anterior intermediar que constava no caput do artigo antes da redação decorrente a Lei n 12015 Houve somente o deslocamento da conduta incriminada para o 1º do mesmo artigo sem contudo descriminalizála Por outro lado as condutas aliciar atrair a simpatia envolver seduzir buscar adeptos para vender alienar trocar por dinheiro fazer comércio comprar adquirir mediante pagamento subornar ou corromper com dinheiro ou com favores transportar deslocar de um local para outro conduzir transferir remover mudar de um lugar para outro e alojar hospedar abrigar dar abrigo acolher instalar são condutas atípicas e como tais não podem retroagir para alcançar fatos praticados antes da entrada em vigor da referida lei Por outro lado a conduta de agenciar que abrange o significado intermediar também não deixa de ser atípica sob outros significados antes do advento da atual norma penal Em outros termos só pode retroagir com o sentido de intermediar 51 Consciência da condição de pessoa traficada O texto legal 1º destaca expressamente que para as condutas de transportar transferir e alojar é indispensável que o sujeito ativo tenha conhecimento dessa condição isto é que se trata de pessoa traficada para fim de exploração sexual O que não quer dizer por outro lado que para as demais condutas esse conhecimento seja desnecessário lembrando que todas as condutas são dolosas e sem consciência de todos os elementos do tipo não há dolo 6 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo deste crime é o dolo constituído pela vontade dirigida à prática de qualquer das condutas tipificadas e com a consciência de que a pessoa vai exercer a prostituição no território nacional É indispensável que o sujeito ativo tenha consciência da finalidade do tráfico de pessoa sob pena de incorrer em erro de tipo 61 Polêmica sobre o elemento subjetivo do tipo Antes da vigência da Lei n 120152009 sustentando a existência de elemento subjetivo especial do tipo fizemos as considerações a seguir que se mantêm atualizadas A nosso juízo o elemento subjetivo especial do tipo pode ser objeto de longa discussão diante da redação utilizada pelo legislador que não se insere naquelas fórmulas tradicionais conhecidas de todos Contudo a sustentação de que tal elemento subjetivo se faz presente no tipo penal em exame não é desarrazoada e na nossa concepção está representada pela elementar que venha exercer a prostituição final do caput Admitimos é verdade que o texto expresso na redação do tipo penal oferece alguma dificuldade de interpretação a despeito de sua clareza vernacular que nem sempre se traduz em clareza técnicolegislativa 62 Que venha exercer a prostituição Analisando o texto legal contido no respeitável Código Penal Comentado de Guilherme de Souza Nucci nossas dúvidas aumentaram pois constatamos a seguinte redação que venha a exercer a prostituição art 231A in fine Código Penal Comentado 5 ed São Paulo Revista dos Tribunais 2005 p 827 Fomos consultar o nosso próprio Código Penal Comentado movidos pela curiosidade e constatamos uma redação diferente que venha exercer a prostituição art 231A in fine Código Penal Comentado 3 ed São Paulo Saraiva 2005 p 920 sem a letra a antes de exercer possivelmente tenha ocorrido inadvertidamente um erro de digitação suficiente para conduzir a uma interpretação diferente Neste exato momento em que escrevemos não sabemos qual é a redação que retrata com fidelidade o texto legal publicado no Diário Oficial Seria fácil ir consultálo mas como para o nosso propósito imediato é irrelevante preferimos ignorálo para trabalhar com as duas hipóteses textuais À primeira vista podese ter a impressão de que a pequena diferença de redações não alteraria em nada o sentido dogmático do tipo penal em exame Podemos estar enganados e se estivermos por certo é por conhecimento deficiente da língua portuguesa Na verdade as duas redações mencionadas no texto e no contexto têm sentidos e funções distintos A redação contida no Código de Nucci representa o resultado material da ação incriminada e integra o próprio tipo penal ao passo que a outra redação que venha exercer a prostituição constitui o elemento subjetivo especial do injusto naquele o resultado deve necessariamente ocorrer para que o crime se consume ao passo que neste o elemento subjetivo especial do tipo não precisa verificarse sendo suficiente que seja o motivador da ação do agente para a prática do crime 63 O resultado deve ser abrangido pelo dolo Com efeito o resultado deve ser abrangido pelo dolo do agente enquanto o elemento subjetivo especial do injusto existe como destacava Welzel ao lado do dolo como momento geral pessoal subjetivo daquele que produz e configura a ação como acontecimento dirigido a um fim apresentamse frequentemente no tipo especiais momentos subjetivos que dão colorido num determinado sentido ao conteúdo éticosocial da ação Derecho Penal Alemán p 83 Nessa linha examinando o elemento subjetivo especial do injusto tivemos oportunidade de afirmar na realidade o especial fim ou motivo de agir embora amplie o aspecto subjetivo do tipo não integra o dolo nem com ele se confunde uma vez que como vimos o dolo esgotase com a consciência e a vontade de realizar a ação com a finalidade de obter o resultado delituoso ou na assunção do risco de produzilo O especial fim de agir que integra determinadas definições de delitos condiciona ou fundamenta a ilicitude do fato constituindo assim elemento subjetivo do tipo de ilícito de forma autônoma e independente do dolo A denominação correta por isso é elemento subjetivo especial do tipo ou elemento subjetivo especial do injusto que se equivalem porque pertencem à ilicitude e ao tipo que a ela corresponde Tratado de Direito Penal 9 ed São Paulo Saraiva 2004 v 1 p 2612 64 Consequências das distintas redações Fica claro enfim que é fundamental a distinção das consequências que decorrem de uma e outra redação Não teria sentido criminalizar o tráfico de pessoas e exigir que o crime somente se configurasse após decorrido tempo suficiente para se comprovar que as vítimas efetivamente passaram a exercer a prostituição Assim considerando se que a elementar contida no final do caput configura elemento subjetivo especial do tipo com a simples realização de qualquer das três condutas representadas pelos verbos nucleares promover intermediar ou facilitar a execução do objeto material da tutela penal estará consumado o crime independentemente de as vítimas efetivamente exercerem ou não a prostituição Essa reflexão embora não tenha perdido atualidade por seu conteúdo dogmático ficou facilitada com a redação contemplada pela Lei n 120152009 qual seja para o exercício da prostituição ou outra forma de exploração sexual que define claramente o especial fim das condutas incriminadas Não bastasse essa elementar especial do tipo também consta em sua rubrica que o tráfico interno de pessoa é para fim de exploração sexual Não pode mais haver discussão sobre esse tema Assunto encerrado 65 Consumação e tentativa Tratase como afirmamos no início deste capítulo de um dispositivo legal que complementa o anterior tráfico internacional consumandose por conseguinte com a efetiva prática de qualquer das condutas descritas no tipo independentemente do exercício efetivo da prostituição que se ocorrer constituirá apenas o exaurimento do crime A tentativa é pelo menos em tese admissível a despeito da dificuldade prática em comprovála 7 Classificação doutrinária Cuidase de crime comum não exige qualquer condição ou qualidade especial do sujeito ativo formal para consumarse não exige como resultado o efetivo exercício da prostituição ou outra exploração sexual de forma livre pode ser praticado por qualquer meio ou forma pelo agente comissivo ações de promover facilitar implicam ação positiva do agente assim como as demais figuras equiparadas instantâneo ação e resultado encontramse próximos um do outro muitas vezes praticamente concomitantes plurissubsistente o crime pode ser interrompido em sua fase executória por circunstâncias alheias à vontade do agente 8 Pena e ação penal A pena cominada é de reclusão de dois a seis anos As qualificadoras foram substituídas pela majorante que eleva a pena de metade nas seguintes hipóteses I a vítima é menor de 18 dezoito anos II a vítima por enfermidade ou deficiência mental não tem o necessário discernimento para a prática do ato III se o agente é ascendente padrasto madrasta irmão enteado cônjuge companheiro tutor ou curador preceptor ou empregador da vítima ou se assumiu por lei ou outra forma obrigação de cuidado proteção ou vigilância ou IV há emprego de violência grave ameaça ou fraude Somente será aplicada cumulativamente a pena de multa se o crime for cometido com o objetivo de obter vantagem econômica que convenhamos é a regra dessa infração penal A ação penal é pública incondicionada isto é não depende de qualquer condição ou manifestação da vítima ou de seu representante legal para a sua instauração Art 232 Revogado pela Lei n 12015 de 782009 Capítulo VI Do Ultraje Público ao Pudor Ato obsceno Art 233 Praticar ato obsceno em lugar público ou aberto ou exposto ao público Pena detenção de 3 três meses a 1 um ano ou multa D O U T R I N A 1 Considerações preliminares Nélson Hungria destacava que até o século XVIII ainda não fora nitidamente elaborada a noção de pudor público como um bem imaterial tutelável por si mesmo Com efeito o direito antigo não conheceu esta modalidade de crime tanto no direito romano quanto na Idade Média A ofensa ao pudor público era ou enquadravase no conceito de crime contra os costumes ou era abrangida pela ampla definição do crime de injúria A sua incriminação mais remota autonomamente remonta à lei francesa de julho de 1791 restringindo se somente ao ultraje público das mulheres O Código Penal francês de 1810 código napoleônico ampliou sua abrangência para todas as pessoas Na legislação brasileira foi introduzida pelo Código Criminal do Império de 1830 sendo mantida e ampliada inadequadamente pelo Código Republicano de 1890 sendo repetido com melhor técnica pelo atual Código Penal de 1940 2 Bem jurídico tutelado Bens jurídicos protegidos são a moralidade pública e o pudor público particularmente no que se refere ao aspecto sexual considerandose que esse tipo penal encontrase no título que disciplina os crimes contra os costumes Para definir pudor público é necessário considerar os hábitos sociais os costumes locais que variam com muita rapidez no tempo e no espaço não só em um mesmo povo mas inclusive em uma mesma cidade As liberalidades concedidas na atualidade são infinitamente superiores às permitidas quando entrou em vigor o Código Penal de 1940 Por outro lado condutas admitidas em determinados ambientes são absolutamente reprováveis em outros ainda que os elementos sejam os mesmos A nudez completa exibida nos carnavais cariocas os minibiquínis utilizados nas praias brasileiras dão bem uma ideia da prática de atos que em outras circunstâncias seriam considerados obscenos 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa independente do sexo Esse crime como a regra geral admite naturalmente o concurso de pessoas Sujeito passivo é a coletividade além de qualquer pessoa que eventualmente presencie o ato que nesse caso também assume a condição de sujeito passivo 4 Tipo objetivo adequação típica A ação tipificada é praticar ato obsceno isto é ato que ofenda o pudor público objetivamente considerandose o sentimento comum vigente no meio social Obsceno é o que ofende o pudor ou a vergonha ou seja um sentimento de repulsa e humilhação criado por um comportamento indecoroso Só pode ser ato obsceno aquele que se refira à sexualidade não o caracterizando a manifestação verbal obscena É necessário que o ato obsceno seja praticado em lugar público aberto ou exposto ao público É necessário que o ato obsceno possa ser visto independentemente de in concreto vir a sêlo realmente por indeterminado número de pessoas A publicidade inerente à prática do ato obsceno se refere apenas ao local em que é praticado somente se exigindo seja assistido por terceiros para efeito de prova É indispensável a consciência da publicidade do lugar 41 Exemplos clássicos de ato obsceno Como exemplos clássicos do crime de ato obsceno podemse destacar entre outros o trottoir de travestis deixando entrever seu corpo nu a chispada correr nu ou urinar na via pública exibindo o pênis A automasturbação quando executada em lugar aberto ou exposto ao público também constitui ato obsceno A prática de ato obsceno se traduz em manifestação corpórea voluntária isto é em um agere atentatório ao pudor público Por isso a exibição de revista pornográfica pode tipificar outros crimes mas não ato obsceno Entendeuse por longo tempo que o prolongado beijo lascivo constituía ato obsceno Evidentemente que a liberalidade atual afastou a tipicidade desse comportamento pois o beijo além de não ter nada de obsceno de há muito não escandaliza mais ninguém A apalpadela nos seios ou leve toque nas regiões pudendas em ambiente público ou aberto ao público mesmo em vítima menor de quatorze anos sem emprego de violência caracteriza ato obsceno e não crime contra a liberdade sexual Conduta como essa merece reprimenda mas na proporcionalidade de sua gravidade que ao contrário de outros atos não atinge o nível de reprovabilidade e repúdio do atentado violento ao pudor cuja sanção cominada é a mesma de um homicídio simples o que evidencia sua desproporção 5 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo é o dolo consistente na vontade consciente de praticar ato obsceno em lugar público aberto ou exposto ao público Não há necessidade do propósito de ofender o pudor público ou de especial fim erótico É necessário que o agente tenha consciência de que se encontra em lugar público a dúvida poderá originar o dolo eventual Nessa infração não vemos como necessário o elemento subjetivo do injusto que seria o especial fim de ofender a moralidade e o pudor público Magalhães Noronha Direito Penal v 3 p 289 Basta com efeito que tenha a vontade consciente de praticar o ato obsceno em lugar público ou exposto ao público Enfim a carga de subjetividade dessa infração penal esgotase no próprio dolo sem qualquer outro elemento subjetivo especial Não há previsão de modalidade culposa a despeito do entendimento contrário da velha doutrina italiana que se justificava com o que prescrevia o Código Rocco art 527 2ª parte 6 Consumação e tentativa Consumase com a prática do ato obsceno sendo irrelevante a presença de outras pessoas ou que estas se sintam ofendidas A tentativa é teoricamente admissível embora difícil de se configurar Embora crime formal e de perigo exemplifica Wiliam Wanderley Jorge admitese a tentativa quando por exemplo o agente começa a se despir para a outrora famosa chispada correr nu pela rua e é impedido 7 Classificação doutrinária Tratase de crime comum não exige qualquer condição ou qualidade especial do sujeito ativo formal para consumarse não exige como resultado a efetiva ofensa ao pudor de alguém ou que tenha realmente sido presenciado de forma livre pode ser praticado por qualquer meio ou forma pelo agente comissivo as ações representadas pelos verbos nucleares implicam ação positiva do agente unissubjetivo por ser praticado por apenas um agente plurissubsistente via de regra a conduta é necessariamente composta por atos distintos instantâneo o resultado se produz de imediato numa relação de proximidade entre ação e consequência 8 Pena e ação penal A pena cominada alternativamente é detenção de três meses a um ano ou multa A ação penal é pública incondicionada isto é não depende de qualquer condição ou manifestação da vítima ou de seu representante legal para a sua instauração Escrito ou objeto obsceno Art 234 Fazer importar exportar adquirir ou ter sob sua guarda para fim de comércio de distribuição ou de exposição pública escrito desenho pintura estampa ou qualquer objeto obsceno Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos ou multa Parágrafo único Incorre na mesma pena quem I vende distribui ou expõe à venda ou ao público qualquer dos objetos referidos neste artigo II realiza em lugar público ou acessível ao público representação teatral ou exibição cinematográfica de caráter obsceno ou qualquer outro espetáculo que tenha o mesmo caráter III realiza em lugar público ou acessível ao público ou pelo rádio audição ou recitação de caráter obsceno D O U T R I N A 1 Considerações preliminares Neste art 234 contemplase a segunda modalidade de crime que o legislador de 1940 considerou como crime de ultraje público ao pudor A nosso juízo essa superada infração penal devia de há muito ter sido extirpada do direito positivo brasileiro especialmente a partir da vigência da Constituição Federal de 1988 que tenta eliminar toda a forma de censura às atividades artísticas e culturais No entanto ainda não foi desta vez desafortunadamente parece que teremos de esperar o advento de uma nova Parte Especial para a supressão definitiva dessa ultrapassada figura penal 2 Bem jurídico tutelado Bens jurídicos protegidos continuam sendo a moralidade pública e o pudor público particularmente no que se refere ao aspecto sexual considerandose que esse tipo penal a exemplo daquele que abordamos no capítulo anterior encontrase no título que disciplina os crimes contra os costumes Contudo a ofensa ao bem jurídico protegido neste dispositivo não se produz com um ato como no crime anterior ato obsceno que embora aviltante é rápido e fugaz mas com a prática de condutas que perduram e atingem grande número de pessoas ampliando consequentemente sua danosidade social 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa independente do sexo Esse crime como a regra geral admite naturalmente o concurso de pessoas e normalmente sua prática envolve mais de um agente Sujeito passivo é a coletividade além de qualquer pessoa que eventualmente presencie o ato que nesse caso também assume a condição de sujeito passivo 4 Tipo objetivo adequação típica Poderseia afirmar numa linguagem imprópria que estamos diante da tipificação de um crime ultrapassado superado pela evolução dos costumes e especialmente admitido aceito e até regulamentado pelo Poder Público que se beneficia de escrito desenho pintura estampa ou qualquer objeto obsceno cobrando taxas e impostos abastecendo como gosta de fazer as arcas do Tesouro Nacional indiferente a uma suposta imoralidade pública ou no caso à natureza criminal de tais atividades Endossando o magistério de Guilherme de Souza Nucci limitamonos a transcrevêlo Com maior razão do que já expusemos quanto ao art 233 não há cabimento na manutenção deste tipo penal especialmente após a edição da Constituição Federal de 1988 que busca eliminar toda a forma de censura às atividades artísticas O próprio Estado como bem lembrado por Delmanto vem incentivando essa prática coletando impostos e disciplinando o assunto Não é à toa que proliferam publicações filmes sites na Internet locais para shows e apresentações produtos eróticos enfim toda sorte de material obsceno acessível a qualquer pessoa através de comercialização distribuição e exposição pública Guilherme de Souza Nucci Código Penal Comentado p 714 41 A inevitável descriminalização O futuro desse tipo penal a exemplo de tantos outros é sua descriminalização Por ora como usos e costumes não têm o condão de revogar tipos penais devese aplicarlhe o princípio da adequação social que em síntese tem o seguinte significado segundo Welzel Derecho Penal Alemán p 83 o direito penal tipifica somente condutas que tenham certa relevância social caso contrário não poderiam ser delitos Deduzse consequentemente que há condutas que por sua adequação social não podem ser consideradas criminosas Em outros termos segundo essa teoria as condutas que se consideram socialmente adequadas como ocorre com o tipo penal em exame não podem constituir crimes e por isso não se revestem de tipicidade Cezar Roberto Bitencourt Tratado de Direito Penal Parte Geral p 4950 Assim concretamente o juiz não deve sequer receber a denúncia fundamentando tal decisão com a atipicidade da conduta imputada 42 Crime de ação múltipla fim especial À luz da doutrina contudo tratase de crime de ação múltipla prevendo várias ações nucleares fazer importar exportar adquirir ou ter sob sua guarda Referidas ações devem ter por objeto escrito composição gráfica manuscrita ou impressa desenho representação gráfica de coisas ou objetos pintura representação colorida de coisas ou objetos estampa figura impressa por meio de chapa gravada ou qualquer outro meio imagens esculturas fotografias etc para fim de comércio distribuição ou exposição pública Com efeito as condutas tipificadas devem ser realizadas para fim de comércio distribuição ou exposição pública Manzini denominou esse crime lenocínio intelectual em que o lenão prostitui a ciência e a arte explorandoas oferecendoas a terceiros de modo que lhes excite a concupiscência e a sensualidade Vincenzo Manzini Trattato di Diritto Penale Italiano Torino 1951 v 7 p 413 43 Descriminalização relativa a obras artísticas literárias e científicas Em relação a obras artísticas literárias e científicas é discutível o caráter de obscenidade mesmo que tenha o propósito de excitar a sensualidade No parágrafo único vêm relacionadas condutas que são equiparadas para a aplicação da mesma sanção às condutas do caput Com o advento da Constituição de 1988 e a evolução e liberalidade dos costumes dificilmente as hipóteses dos incisos II e III serão puníveis configurandose a hipótese do princípio da adequação social As normas anteriores à Constituição em que o âmbito de proteção revelase distanciado da realidade fática em razão da qual foi editada hão que valerse das regras de interpretação para lhe assegurar a aplicação que ainda se revela eficaz nesse sentido exemplificativamente vejase a seguinte decisão Não deve o juiz receber a denúncia quando o fato narrado não conta mais com a reprovação necessária para justificar a ação penal É pelo grau de reprovabilidade da média da população que se afere a pertinência da pretensão punitiva TACrimSP Rel José Pacheco JTACrimSP 89135 As normas penais cujo objeto de proteção é o pudor público devem ser interpretadas à luz dos princípios constitucionais de maneira que assegurem aqueles valores e o de liberdade de empresa direito fundamental prescrito no art 5º XIII cc o art 170 da Constituição Federal 5 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo é constituído pelo dolo representado pela vontade consciente de praticar qualquer das condutas descritas no tipo penal Neste tipo penal mais do que em qualquer outro devese ter o cuidado de observar que o dolo deve abranger todos os elementos constitutivos da descrição típica sob pena de configurar o conhecido erro de tipo No entanto para o exame do dolo é absolutamente irrelevante a opinião do agente sobre a obscenidade da ação que deve ser valorada pelo normal sentimento da coletividade Contudo essa opinião que atinge o nível de conhecimento ou melhor de desconhecimento do caráter obsceno da ação pode eventualmente adequarse ao erro de proibição que in concreto devese examinar se é escusável ou inescusável 51 O fim especial do tipo O elemento subjetivo especial do injusto está expressamente representado pelo fim de comércio de distribuição ou exposição pública O fato de o tipo penal não exigir o fim especial de ofender o pudor público não significa que não seja exigido elemento subjetivo especial do injusto como destacamos 6 Consumação e tentativa Consumase com a prática das ações tipificadas sendo desnecessária a efetiva ofensa ao pudor público Como cada ação fazer importar vender e realizar é distinta fazse necessário que in concreto se verifique a fase de sua execução A tentativa é teoricamente admissível pois como destacava Magalhães Noronha o delito perfilhado pela lei compõese de ações que se prolongam no tempo podendo consequentemente ser interrompidas antes que cheguem à consumação Magalhães Noronha Direito Penal v 3 p 298 7 Classificação doutrinária Tratase de crime comum não exige qualquer condição ou qualidade especial do sujeito ativo formal para consumarse não exige como resultado a efetiva ofensa ao pudor de alguém de forma livre pode ser praticado por qualquer meio ou forma pelo agente comissivo as ações representadas pelos verbos nucleares implicam ação positiva do agente unissubjetivo por ser praticado por apenas um agente plurissubsistente via de regra a conduta é necessariamente composta por atos distintos instantâneo o resultado se produz de imediato numa relação de proximidade entre ação e consequência e permanente na modalidade ter sob sua guarda sua execução alongase no tempo 8 Pena e ação penal A sanção cominada alternativamente é a detenção de seis meses a dois anos ou multa Crime que passou a ser da competência dos Juizados Especiais Criminais Ação penal é pública incondicionada não dependendo de qualquer manifestação do ofendido ou de seu representante legal Capítulo VII Disposições Gerais Capítulo acrescentado pela Lei n 12015 de 7 de agosto de 2009 Aumento de pena Incluído pela Lei n 12015 de 2009 Art 234A Nos crimes previstos neste Título a pena é aumentada I Vetado II Vetado III de metade se do crime resultar gravidez e IV de um sexto até a metade se o agente transmite à vítima doença sexualmente transmissível de que sabe ou deveria saber ser portador Artigo acrescentado pela Lei n 12015 de 7 de agosto de 2009 D O U T R I N A 1 Disposições gerais acrescidas pela Lei n 120152009 As majorantes previstas nestas segundas disposições gerais art 234A aplicamse a todos os crimes constantes do Título VI da Parte Especial do CP ao contrário daquelas previstas no art 226 que são aplicáveis somente nas infrações constantes dos dois primeiros capítulos do mesmo Título Resultando gravidez a pena será elevada de metade inciso III se o agente transmitir à vítima doença sexualmente transmissível da qual tem ou deveria ter conhecimento de que é portador a pena será aumentada de um sexto até metade IV Vejamos cada uma delas 11 Se do crime resultar gravidez Embora o texto legal nada mencione intuise que se está referindo a gravidez da vítima do crime sexual certamente Não se ignora que a conduta do estuprador produz males por vezes insuperáveis à violentada podendo inclusive resultar em uma gravidez indesejada e como tal passível de abortamento legalmente autorizado art 128 II Com efeito o aborto humanitário também denominado ético ou sentimental é autorizado quando a gravidez é consequência de crime de estupro e a gestante consente na sua realização Constatase que como destaca Rogério Greco a conduta do estuprador acaba não somente causando um mal à mulher que foi vítima de seu comportamento sexual violento como também ao feto que teve ceifada sua vida Rogério Greco Código Penal Comentado p 668 Na realidade há duas desvalias superiores a serem consideradas como fundamento da maior reprovação do injusto o desvalor da ação do agente que produz a gravidez é por si só superior à conduta que não produza essa consequência por outro lado o desvalor do resultado é potencializado duplamente ou seja em primeiro lugar por ter gerado a gravidez nesses casos sempre indesejável em segundo lugar o aborto legal justificável somente pela hediondez de sua origem torna muito mais censurável a conduta incriminada 12 Resultando gravidez da infratora Resultando gravidez da infratora haveria aplicação dessa majorante Hipótese pouco provável no sistema anterior passa a ser perfeitamente possível a partir da Lei n 120152009 que contempla naturalmente a possibilidade de a mulher também ser sujeito ativo do crime de estupro Certamente a previsão legal não admite essa conotação pois não passaria de mutatis mutandis uma espécie de autolesão que não representa maior desvalor do resultado da conduta para a vítima Poderseia questionar ainda sobre dois outros aspectos nessa mesma hipótese o ofendido poderia ser obrigado a reconhecer a paternidade e responder pelas obrigações que esta em circunstâncias normais lhe impõe 13 Ofensora sem direito Relativamente à ofensora certamente não lhe recai qualquer responsabilidade como pai caso contrário estarseia permitindo que aquela se beneficiasse da própria torpeza Relativamente ao pretenso filho a questão apresentase mais complexa demandando maior reflexão pois o estupro ademais pode ter tido a finalidade exclusiva de arranjar um bom pai para o futuro filho da infratora escolhendo por exemplo um magnata como vítima Essas questões contudo por demandarem maior raciocínio e consequentemente espaço físico como não têm conotação penal deixaremos que os especialistas do direito de família trabalhem na busca da melhor solução jurídica 14 Contaminação da vítima com doença sexualmente transmissível Em primeiro lugar para que se configure a majorante prevista no art 234A IV não basta que o sujeito ativo estupre a vítima e a contagie com doença sexualmente transmissível Esse é apenas o aspecto objetivo material da descrição da majorante Para que essa majorante se aperfeiçoe no entanto é indispensável que o agente saiba isto é tenha consciência ou pelo menos deva saber ou seja possa ter consciência de que é portador 141 Conhecimento de sua situação pessoal Para configurar a presente majorante por expressa disposição legal fazse necessário que o agente saiba que é portador da doença sexualmente transmissível Se o agente contaminado procura evitar a transmissão da moléstia usando preservativos por exemplo estará com certeza afastando o dolo Com esse comportamento se sobrevier eventual contaminação em tese não deverá responder sequer por lesão corporal culposa pois tomou os cuidados objetivos requeridos nas circunstâncias e pensar diferente significa sustentar a odiosa responsabilidade penal objetiva Art 234B Art 234B Os processos em que se apuram crimes definidos neste Título correrão em segredo de justiça Artigo acrescentado pela Lei n 12015 de 7 de agosto de 2009 D O U T R I N A Processos que devem tramitar em segredo de justiça O salutar princípio da publicidade dos atos processuais arts 5º LX e 93 IX ambos da CF determina que tais atos como regra geral são públicos Contudo o ordenamento jurídico excepciona quando por exemplo da publicidade possa decorrer violação à intimidade do cidadão Nos processos em que se apura a prática de crimes contra a dignidade sexual há grave exposição da intimidade da vítima que deve ser preservada justificandose que os respectivos processos corram em segredo de justiça sem prejuízo do devido processo legal Art 234C Vetado Título VII Dos Crimes Contra a Família Capítulo I Dos Crimes contra o Casamento Bigamia Art 235 Contrair alguém sendo casado novo casamento Pena reclusão de 2 dois a 6 seis anos 1º Aquele que não sendo casado contrai casamento com pessoa casada conhecendo essa circunstância é punido com reclusão ou detenção de 1 um a 3 três anos 2º Anulado por qualquer motivo o primeiro casamento ou o outro por motivo que não a bigamia considerase inexistente o crime D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é o interesse do Estado em proteger a organização jurídica matrimonial consistente no princípio monogâmico que é adotado como regra nos países ocidentais 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo é a pessoa que sendo casada contrai novo matrimônio ou que sendo solteira viúva ou divorciada contrai núpcias com pessoa que sabe ser casada 1º Sujeitos passivos são o Estado e secundariamente o cônjuge do primeiro casamento e o contraente do segundo desde que de boafé Tratase de crime de concurso necessário 3 Tipo objetivo adequação típica A conduta típica consiste em pessoa casada contrair adquirir assumir novas núpcias sendo pressuposto para o delito a existência formal de casamento anterior Deixa de existir o crime quando for declarado nulo ou anulado o matrimônio anterior ou o posterior este por razão diversa da bigamia 2º 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo constituído pela vontade consciente de celebrar novo matrimônio já sendo casado O erro sobre a subsistência do matrimônio anterior exclui o dolo mas a existência de dúvida é suficiente para configurar o dolo eventual não há necessidade de qualquer elemento subjetivo especial do injusto Não há previsão de modalidade culposa 5 Consumação e tentativa A consumação ocorre no instante da celebração do novo casamento É absolutamente desnecessária a existência de conjunção carnal Admitese a tentativa embora altamente controvertida como por exemplo com o começo da realização de alguns atos de celebração 6 Classificação doutrinária Tratase de crime instantâneo de efeitos permanentes próprio de mera conduta de concurso necessário e comissivo 7 Bigamia e falsidade documental Atos preparatórios do novo patrimônio poderão configurar o delito de falsidade documental No entanto após a consumação a bigamia absorve o crime de falso 8 Bigamia pluralidade de crimes Quando a pessoa casada contrair mais de um matrimônio haverá concurso material de crimes O fato de já ser bígamo não imuniza a prática repetitiva do mesmo ato ilícito 9 Questões especiais O casamento religioso não é pressuposto deste delito salvo se efetuado na forma do art 226 2º da Constituição Federal É irrelevante ser o matrimônio anterior nulo ou anulável O 1º do art 235 admite a suspensão condicional do processo nos termos do art 89 da Lei n 909995 em razão da pena mínima abstratamente cominada igual a um ano Vide arts 188 e s e 207 a 224 do CC 10 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é a reclusão de dois a seis anos Para a conduta prevista no 1º a pena é alternativa de reclusão ou detenção de um a três anos Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A O delito de bigamia exige para se consumar a precedente falsidade isto é a declaração falsa no processo preliminar de habilitação do segundo casamento de que inexiste impedimento legal Constituindose a falsidade ideológica crimemeio etapa da realização da prática do crime de bigamia crimefim não há concurso do crime entre estes delitos Assim declarada anteriormente a atipicidade da conduta do crime de bigamia pela Corte de origem não há como na espécie subsistir a figura delitiva da falsidade ideológica em razão do princípio da consunção STJ HC 39583MS Rel Min Laurita Vaz j 832005 Bigamia Art 235 do Código Penal Alegação de inexistência de dolo no agir do acusado que acreditava já encaminhado o divórcio por advogado Circunstâncias que não amparam a alegação do réu que afirmou ser solteiro para a segunda esposa Ademais o segundo matrimônio foi contraído antes da entrada em vigor da Lei do Divórcio o que comprova a impossibilidade de na época contrair novo casamento TJRS Apelação 70001215037 Rel Carlos Cini Marchionatti j 1411 2000 Crime de bigamia O prazo de prescrição da pretensão punitiva no crime de bigamia começa a correr da data em que a notitia criminis é levada ao conhecimento da autoridade pública e não da data do delito art 111 IV do Código Penal Precedentes do STF STF RE 113763SP Rel Min Sydney Sanches j 1731989 Induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento Art 236 Contrair casamento induzindo em erro essencial o outro contraente ou ocultandolhe impedimento que não seja casamento anterior Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos Parágrafo único A ação penal depende de queixa do contraente enganado e não pode ser intentada senão depois de transitar em julgado a sentença que por motivo de erro ou impedimento anule o casamento D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a regular formação da família em particular a ordem matrimonial 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo é qualquer dos cônjuges homem ou mulher do casamento anulado Sujeitos passivos são o Estado e em particular o cônjuge enganado 3 Tipo objetivo adequação típica A conduta incriminada consiste em contrair casamento sob duas modalidades A primeira induzindo aliciando persuadindo a erro essencial previsto pelo art 219 do Código Civil A segunda ocultando escondendo sonegando impedimento que não seja casamento anterior e sim aqueles presentes no art 183 I a XII do Código Civil que fazem com que o matrimônio seja nulo ou anulável arts 207 e 209 do CC 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente dirigida à realização de casamento induzindo a vítima a erro essencial ou ocultandolhe impedimento Não há previsão de modalidade culposa e tampouco se exige elemento subjetivo especial do tipo 5 Consumação e tentativa Consumase o crime no momento em que se realiza o casamento A tentativa é juridicamente impossível em decorrência da condição de processabilidade prevista no art 236 parágrafo único A tentativa ainda que fosse possível seria impunível 6 Classificação doutrinária Tratase de crime instantâneo plurissubsistente material e de conteúdo variado 7 Condição de procedibilidade A ação penal que só pode ser intentada pelo cônjuge enganado é de natureza privada O trânsito em julgado de sentença que anulou o casamento constitui pressuposto processual ou condição de procedibilidade que não se confunde com a existência do crime ou com condição objetiva de punibilidade Tratase apenas de condição para o exercício válido da ação penal 8 Prescrição termo inicial A prescrição somente começa a correr a partir do dia em que transita em julgado a sentença anulatória do casamento A partir desse momento surge o direito de exercer a pretensão punitiva 9 Questões especiais O meio empregado pelo agente deve ser hábil a enganar O crime admite a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada inferior a um ano Vide arts 183 a 188 207 a 224 arts 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais e 30 do CP 10 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é a reclusão de dois a seis anos Ação penal de exclusiva iniciativa do cônjuge enganado J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Caso em que o réu é acusado de ter forjado casamento a fim de regularizar sua situação de estrangeiro residente no Brasil Situação improvada Em seu depoimento judicial a esposa não confirma a simulação do matrimônio esclarecendo ao contrário que ela e o réu mantinham um relacionamento há mais de dois anos o que leva a presumir que a união não foi um ato precipitado e artificioso TRF4ª Região Apelação 199904010117953 Rel Eloy Bernst Justo j 882000 Conhecimento prévio de impedimento Art 237 Contrair casamento conhecendo a existência de impedimento que lhe cause a nulidade absoluta Pena detenção de 3 três meses a 1 um ano D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a regular formação da família em particular a ordem matrimonial 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo é qualquer pessoa que contrai casamento ciente da existência de impedimento absoluto Se ambos os cônjuges têm conhecimento há coautoria Sujeitos passivos são o Estado e o cônjuge que desconhecia o impedimento 3 Tipo objetivo adequação típica Tratase de norma subsidiária em relação à prevista no artigo anterior art 236 do CP Aqui contrai casamento sabendo da existência de impedimento que leve à nulidade absoluta O tipo não exige um comportamento ativo Assim é suficiente deixar de declarar a existência de causa de nulidade absoluta sendo suficiente pois a simples omissão O impedimento deve ser absoluto isto é que torne o matrimônio nulo previsto no art 183 I a VIII do Código Civil 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo constituído pela vontade consciente dirigida à realização de casamento induzindo o outro a erro essencial sobre sua pessoa ou ocultandolhe impedimento matrimonial É indispensável que o sujeito ativo tenha consciência da existência do impedimento essa exigência afasta a possibilidade de dolo eventual 5 Consumação e tentativa O crime consumase com a efetivação do casamento isto é com a conclusão do casamento A tentativa embora de difícil configuração é admissível 6 Classificação doutrinária Tratase de crime instantâneo formal subsidiário plurissubsistente comissivo ou omissivo 7 Questões especiais Caso o impedimento conhecido seja o do art 183 VI do Código Civil casado haverá crime de bigamia art 235 do CP A ação penal é de natureza pública em virtude da admissibilidade da coautoria entre os cônjuges O tipo é um exemplo de norma penal em branco visto que o conceito de impedimento é fornecido pela lei civil Tratase de infração de menor potencial ofensivo art 61 da Lei n 909995 com a competência para o processo e julgamento reservada aos Juizados Especiais Criminais O crime admite a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada inferior a um ano Vide arts 183 a 191 do CC art 3º do Declei n 320041 organização e proteção à família arts 60 61 e 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais 8 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é de detenção de três meses a um ano Ação penal pública incondicionada Simulação de autoridade para celebração de casamento Art 238 Atribuirse falsamente autoridade para celebração de casamento Pena detenção de 1 um a 3 três anos se o fato não constitui crime mais grave D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a regular formação da família em particular a ordem matrimonial 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa Sujeitos passivos são o Estado e os cônjuges que agem de boafé isto é que são ludibriados 3 Tipo objetivo adequação típica A conduta incriminada está em atribuirse imputarse falsamente com mentira fingimento autoridade para celebração de casamento O agente proclamase autoridade para a celebração de casamento Essa atribuição falsa exige conduta inequívoca do agente que procure demonstrar que possui tal atribuição Alguns autores falam em competência Magalhães Noronha Direito Penal São Paulo Saraiva 1986 v 3 p 308 Heleno Fragoso Lições de Direito Penal p 103 4 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é o dolo constituído pela vontade consciente de atribuirse falsamente autoridade para celebração de casamento O erro do agente quanto à sua atribuição para a prática do ato exclui o dolo Não há previsão de modalidade culposa 5 Consumação e tentativa Ocorre a consumação quando o agente pratica ato próprio da autoridade que se atribuiu falsamente A tentativa é em tese admissível O erro do agente exclui o dolo 6 Classificação doutrinária Tratase de crime formal de simples atividade ou mera conduta plurissubsistente subsidiário e comissivo 7 Convalidação do ato e tipicidade O casamento realizado perante autoridade incompetente é nulo art 208 do Código Civil No entanto a nulidade será considerada sanada em dois anos quando não alegada o que não impede a configuração do delito Em síntese sua validação pelo decurso de tempo não retroage para afastar a sua tipicidade 8 Questões especiais Pelo que dispõe o art 1535 do CC o escrivão não possui autoridade para celebrar casamento Todavia se o sujeito se faz passar por juiz de paz e simultaneamente outro se declara escrivão há concurso de pessoas Admitese a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada igual a um ano Vide arts 192 a 201 do CC art 47 do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais art 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais 9 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é detenção de um a três anos se o fato não constitui crime mais grave Ação penal pública incondicionada Simulação de casamento Art 239 Simular casamento mediante engano de outra pessoa Pena detenção de 1 um a 3 três anos se o fato não constitui elemento de crime mais grave D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a regular formação da família em particular a ordem matrimonial cujo sistema adotado é monogâmico 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo será qualquer pessoa que simule o matrimônio Aqueles que participarem do casamento tendo ciência da simulação são coautores Sujeito passivo é a pessoa enganada o outro nubente ou seu representante legal além do próprio Estado 3 Tipo objetivo adequação típica O comportamento tipificado é simular que tem o sentido de fingir de representar disfarçar aparentar aquilo que não é No magistério de Hungria é figurar como contraente do matrimônio numa farsa que resulte para outro contraente a convicção de que está casando seriamente Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 8 p 344 É indispensável a utilização de meio enganoso para a prática do crime Se os dois contraentes simulam o casamento não se configura este crime uma vez que faltou o engano de outra pessoa 31 Elemento normativo do tipo Para configurarse o crime é indispensável que a simulação de casamento ocorra por meio de engano ardil fraude armadilha do outro contraente Assim a simples representação de estar se casando para pregar uma peça nos amigos é insuficiente para caracterizálo 32 Crime subsidiário Este crime será absorvido se o comportamento puder tipificar crime mais grave e isso poderá configurarse quando houver por exemplo algum outro fim especial na conduta como posse sexual mediante fraude usando a simulação de casamento como meio 4 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é o dolo que consiste na vontade consciente de enganar o outro contraente simulando casamento por meio de engano Não há necessidade de elemento subjetivo especial do injusto que se existir poderá configurar outro crime 5 Consumação e tentativa Consumase o crime de simulação de casamento com a efetiva simulação mesmo que o casamento não se realize A tentativa é teoricamente admissível 6 Classificação doutrinária Tratase de crime material comissivo plurissubsistente subsidiário 7 Questões especiais Representante legal ascendente tutor ou curador será sujeito passivo quando seu consentimento for indispensável à celebração do casamento Para a configuração desse delito não se exige que o casamento seja realizado perante autoridade incompetente para a sua celebração Admitese a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada igual a um ano Vide art 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais 8 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é a detenção de um a três anos se o fato não constitui crime mais grave Ação penal pública incondicionada Adultério Art 240 Revogado pela Lei n 11106 de 2832005 Capítulo II Dos Crimes contra o Estado de Filiação Registro de nascimento inexistente Art 241 Promover no registro civil a inscrição de nascimento inexistente Pena reclusão de 2 dois a 6 seis anos D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a segurança do estado de filiação e a fé pública dos documentos oficiais 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa Sujeitos passivos são o Estado e em particular todas as pessoas prejudicadas pelo registro 3 Tipo objetivo adequação típica A ação típica consiste em promover causar originar provocar no registro civil a inscrição de registro inexistente ou seja a falsidade material ou ideológica integra a conduta Este crime absorve o crime de falsidade ideológica pela especialidade 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo constituído pela vontade consciente de promover o registro civil de nascimento inexistente Não há exigência de elemento subjetivo especial do injusto 5 Consumação e tentativa O crime consumase com a efetiva inscrição no registro de nascimento inexistente Admitese teoricamente a tentativa 6 Classificação doutrinária Tratase de crime instantâneo de efeitos permanentes comissivo de perigo abstrato e material unissubjetivo 7 Questões especiais O delito de falsidade fica absorvido pelo crime do art 241 em virtude do princípio da consunção É irrelevante que a declaração falsa verse sobre pessoa viva ou natimorto Está isento de pena o réu que agiu com erro art 21 Vide art 2º do Declei n 586043 modifica o art 348 do CC e Lei n 806990 Estatuto da Criança e do Adolescente 8 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é a reclusão de dois a seis anos Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Registro de nascimento falso Conduta que se viu materializar mediante apresentação ao registrador público de documento de nascimento vivo visivelmente adulterado Crime que do modo como perpetrado se revelou impossível Acusada índia e analfabeta Absolvição O Notário de imediato percebeu que o documento apresentado estava falsificado Em pesquisa no Cartório constatou que o número da declaração n 8903561 era o mesmo que tinha originado o registro da filha da irmã da apelante TJRS Apelação 70017816117 Rel Marcelo Bandeira Pereira j 2812 2006 Parto suposto Supressão ou alteração de direito inerente ao estado civil de recémnascido Art 242 Dar parto alheio como próprio registrar como seu o filho de outrem ocultar recémnascido ou substituílo suprimindo ou alterando direito inerente ao estado civil Pena reclusão de 2 dois a 6 seis anos Parágrafo único Se o crime é praticado por motivo de reconhecida nobreza Pena detenção de 1 um a 2 dois anos podendo o juiz deixar de aplicar a pena D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a segurança do estado de filiação e a fé pública dos documentos oficiais 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo da modalidade dar parto alheio como próprio é somente a mulher Nas demais formas será qualquer pessoa Sujeito passivo é o Estado bem como os herdeiros prejudicados as pessoas lesadas com o registro e os recémnascidos 3 Tipo objetivo adequação típica O tipo apresenta quatro formas de conduta A primeira consiste em dar conceber ou outorgar parto alheio como próprio parto suposto no qual a mulher atribui a si a maternidade de filho alheio em regra simulando prenhez e parto A segunda forma é registrar escrever ou lançar no registro civil como sendo seu filho de outra pessoa A terceira é ocultar encobrir esconder o neonato com a supressão eliminação de direitos inerentes ao seu estado civil ou seja o recém nascido não é apresentado para assumir seus direitos A quarta modalidade é substituir trocar fisicamente os recémnascidos alterando modificando consequentemente direito inerente ao estado civil destes de modo que a um se atribua o estado civil que a outro competia 4 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo em todas as condutas é o dolo representado pela vontade consciente de praticar a ação incriminada Nas duas últimas modalidades porém exigese também o elemento subjetivo especial do tipo consistente no especial fim de suprimir direitos inerentes ao estado civil dos neonatos 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a realização efetiva de qualquer das condutas descritas no tipo penal seja dando parto alheio como próprio seja registrando filho alheio como próprio seja ocultando ou substituindo recémnascido de forma a suprimir ou alterar direito inerente ao estado civil Admitese teoricamente tentativa ante a possibilidade de fracionamento da fase executória 6 Classificação doutrinária Tratase de crimes instantâneos e plurissubsistentes Na primeira modalidade tratase de crime próprio enquanto nas demais são crimes comuns Nas duas últimas figuras típicas as condutas configuram crimes por tendência 7 Forma privilegiada A pena poderá ser atenuada podendo ser concedido o perdão judicial ao agente desde que tenha praticado o crime por motivo de reconhecida nobreza altruísmo humanidade solidariedade art 242 parágrafo único 8 Falsidade ideológica absorção A eventual falsidade que venha a servir de crimemeio para a prática do delito do art 242 fica absorvido por este Com o advento da Lei n 6898 de 30 de março de 1981 o presente dispositivo passou a prevalecer sobre o crime de falsidade ideológica art 299 em virtude do princípio da especialidade da norma penal 9 Questões especiais O privilégio previsto no parágrafo único é aplicável a todas as formas típicas A forma privilegiada prevista no parágrafo único deste artigo admite suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada igual a um ano Vide Lei n 586043 modifica o art 348 do CC Lei n 806990 Estatuto da Criança e do Adolescente e art 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais 10 Pena e ação penal Para o caput é de reclusão de dois a seis anos A forma privilegiada comina pena de detenção de um a dois anos podendo o juiz deixar de aplicar a pena Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Parto suposto Registro de filhas de outrem como próprias Trancamento de ação penal Ausência de justa causa não evidenciada Motivo de reconhecida nobreza não demonstrado de plano Dúvidas a serem dirimidas no decorrer da instrução processual Evidenciado que em princípio os pacientes teriam dado parto alheio como próprio registrando como suas as filhas de outrem caracterizado está em tese o delito que lhes é imputado tornandose prematuro o trancamento da ação penal Não há prejuízos aos réus no tocante ao não reconhecimento na via eleita do perdão judicial descrito no art 242 parágrafo único do Código Penal pois este poderá ser aplicado pelo Magistrado se comprovado o motivo nobre no momento da prolação da sentença STJ RHC 17569SP Rel Min Gilson Dipp j 1952005 O habeas corpus constituise em meio impróprio para a análise de alegações que exijam o reexame do conjunto fáticoprobatório como a apontada extinção da punibilidade no que concerne ao fato de registrar como seu filho de outrem visto que o agente seria o falecido cônjuge da paciente Não se vislumbra a ocorrência da prescrição em relação aos delitos previstos no art 242 do Código Penal se não transcorrido o prazo previsto para tanto A partir da data em que os fatos se tornaram públicos tem início a contagem do prazo prescricional da pretensão punitiva a teor do art 111 inc IV do mesmo Diploma de Lei STJ HC 31077GO Rel Min Gilson Dipp j 4122003 Parto suposto Evidenciado o fim nobre e altruístico da apelante ao registrar filho alheio como seu verificando que a vontade não era suprimir ou alterar direitos inerentes ao estado civil impõese absolver com fundamento no art 386 inciso III do Código de Processo Penal TJRS Apelação 692081714 Rel Cristovam Daiello Moreira j 28101992 Sonegação de estado de filiação Art 243 Deixar em asilo de expostos ou outra instituição de assistência filho próprio ou alheio ocultandolhe a filiação ou atribuindolhe outra com o fim de prejudicar direito inerente ao estado civil Pena reclusão de 1 um a 5 cinco anos e multa D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido são a segurança do estado de filiação e a fé pública dos documentos oficiais 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa Sujeitos passivos são o Estado e em particular o menor prejudicado 3 Tipo objetivo adequação típica O núcleo do tipo está representado pelo verbo deixar abandonar desamparar largar filho próprio ou alheio sendo necessário que o agente oculte a filiação do menor ou altere não a declare ou lhe dê outra O abandono deve ocorrer num asilo de expostos ou outra instituição similar pública ou particular O agente deixa o menor em asilo não lhe revelando a filiação ou lhe atribuindo filiação falsa 31 Abandono em outro local O eventual abandono em local de outra natureza não tipificará com certeza este crime mas poderá configurar o dos arts 133 ou 134 conforme o caso Asilo de expostos ou instituição similar constitui elementar típica indispensável para a caracterização deste tipo penal 4 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é o dolo constituído pela vontade consciente de deixar menor em asilo de expostos ou em local similar complementado pelo elemento subjetivo especial do tipo que consiste no especial fim de prejudicar direito inerente ao estado civil 5 Consumação e tentativa Consumase o delito com o efetivo abandono no local previsto verificandose a ocultação ou a alteração do estado civil desde que logicamente tenha a finalidade de prejudicar direito inerente à filiação Admitese a tentativa 6 Classificação doutrinária Tratase de crime material de tendência comissivo e plurissubsistente 7 Questões especiais Se a criança for deixada em lugar diverso do previsto no tipo poderá configurarse o delito dos arts 133 ou 134 do CP Admitese a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada igual a um ano Vide Lei n 806990 Estatuto da Criança e do Adolescente e art 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais 8 Limitação à liberdade de prova penal Adotamse no juízo penal as restrições à prova estabelecidas no juízo cível quanto ao estado das pessoas art 155 do CPP O estado é a situação da pessoa em relação à família à capacidade e à cidadania Ademais as questões relativas ao estado civil das pessoas constituem questões prejudiciais de natureza civil que devem ser resolvidas no juízo cível 9 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é a reclusão de um a cinco anos e multa Ação penal pública incondicionada Capítulo III Dos Crimes contra a Assistência Familiar Abandono material Art 244 Deixar sem justa causa de prover a subsistência do cônjuge ou de filho menor de 18 dezoito anos ou inapto para o trabalho ou de ascendente inválido ou maior de 60 sessenta anos não lhes proporcionando os recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada fixada ou majorada deixar sem justa causa de socorrer descendente ou ascendente gravemente enfermo Caput com redação dada pela Lei n 10741 de 1º de outubro de 2003 Pena detenção de 1 um a 4 quatro anos e multa de uma a dez vezes o maior salário mínimo vigente no País Parágrafo único Nas mesmas penas incide quem sendo solvente frustra ou ilide de qualquer modo inclusive por abandono injustificado de emprego ou função o pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada fixada ou majorada D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido são a estrutura e o organismo familiar particularmente a sua preservação relativamente ao amparo material devido por ascendentes descendentes e cônjuges reciprocamente 2 Sujeitos do crime Sujeitos ativos são os cônjuges genitores ascendentes ou descendentes Sujeitos passivos são o cônjuge o filho menor de dezoito anos ou inapto para o trabalho ascendente inválido ou ascendente ou descendente de enfermo 3 Tipo objetivo adequação típica São três as figuras previstas pelo tipo A primeira consiste em o agente deixar de prover atender abastecer munir os meios necessários à subsistência alimento remédio vestuário habitação de cônjuge filho menor de dezoito anos ou inapto para o trabalho ascendente inválido ou valetudinário com idade avançada e enfermo A conduta subsequente é faltar ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada fixada ou majorada sendo necessária a existência de sentença judicial alimentícia seja homologando acordo entre as partes seja fixando a pensão ou majorandoa Também incorre nessa forma típica o devedor que vise fraudar o pagamento de pensão art 244 parágrafo único É considerada abandono pecuniário A terceira forma de conduta é deixar de socorrer largar abandonar ascendente ou descendente gravemente enfermo doença física ou mental O tipo penal ainda apresenta um elemento normativo justificante que consiste na expressão justa causa 31 Ascendente maior de sessenta anos O Estatuto do Idoso nesta infração penal substituiu a figura do valetudinário pela do maior de sessenta anos Afora o fato de adequar o Código Penal à filosofia do Estatuto do Idoso troca seis por meia dúzia isto é dá uma coisa pela outra praticamente Acreditamos aliás que pode representar certa perda na medida em que eventual valetudinário com idade inferior aos sessenta anos estará excluído dessa proteção penal 32 Crime cumulativo misto A prática de duas ou mais condutas constitui concurso material de crimes pois não se trata dos chamados crimes de conteúdo variado As diversas condutas tipificadas constituem crimes distintos autônomos cumulativos dando origem ao cúmulo de penas 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo que consiste na vontade consciente de deixar de prover à subsistência ou de faltar ao pagamento de pensão ou ainda de omitir socorro nas diversas hipóteses previstas pela lei Não há exigência de qualquer elemento subjetivo especial do tipo 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a recusa do agente em proporcionar os recursos necessários à vítima ou quando falta ao pagamento de pensão ou deixa de prestar socorro É inadmissível a tentativa 6 Classificação doutrinária Tratase de crime permanente omissivo puro unissubjetivo e unissubsistente 7 Questões especiais Quando o agente pratica mais de uma conduta configurase concurso material de crimes Para a lei penal os meios de recursos à subsistência não são tão abrangentes quanto aqueles previstos no campo do Direito Civil art 400 O agente já condenado que prosseguir em sua conduta delituosa poderá ser novamente processado sendo observado o disposto no art 71 do CP A inobservância da ordem prevista nos arts 397 e 398 do Código Civil não se enquadra como justa causa para a não prestação de alimentos A prisão civil não interfere na configuração do delito do art 244 Vide Lei n 806990 Estatuto da Criança e do Adolescente art 22 e parágrafo único da Lei n 547868 ação de alimentos e art 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais 8 Pena e ação penal Detenção de um a quatro anos e multa de uma a dez vezes o maior salário mínimo do País Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Para a configuração do crime de abandono material em quaisquer de suas figuras típicas mister a prova de que o agente tenha deixado de prover sem justa causa a subsistência do sujeito passivo Prova a ser produzida pela acusação porque em favor da ré milita a presunção da inocência Insuficiência de prova quanto ao dolo específico de abandono elemento normativo do tipo penal previsto no art 244 do CP Acusada que inclusive ao sair de casa levou a filha consigo e posteriormente antes de deixar a filha aos cuidados do pai procurou o Conselho Tutelar para expor sua situação condutas incompatíveis com o dolo do abandono Absolvição que se impõe TJRS Apelação 70018719526 Rel Fabianne Breton Baisch j 1322008 O agente que por absoluta carência de meios deixa de assistir economicamente as pessoas de sua obrigação não está sujeito à pena prevista pelo art 244 do CP visto que o crime de abandono material é doloso por essência O delito de abandono material art 244 do CP só se tipifica quando o réu possuindo recursos para prover o sustento da família deixa de fazêlo propositadamente TJPR Apelação 0429158 1 Rel Carlos Augusto A de Mello j 13122007 O inadimplemento da pensão alimentícia por si só não tipifica o delito do art 244 do Código Penal o qual exige a demonstração dos elementos objetivos e do ânimo deliberado de abandono A execução civil inclusive com a modalidade de cominação de prisão é suficiente à manutenção da paz jurídica No caso em tela inclusive o acusado pagou todas as parcelas que estavam atrasadas TJRS Apelação 70020652137 Rel Nereu José Giacomolli j 22112007 Patente o dolo necessário à configuração do delito tipificado no art 244 caput do Código Penal quando o acusado abandonou o filho aos cuidados da mãe deixando de efetuar o pagamento de pensão alimentícia judicialmente fixada e de prestar qualquer outra forma de auxílio nem mesmo demonstrando interesse em visitar o infante eventualmente TJRS Apelação 70018406991 Rel Roque Miguel Fank j 10102007 O acusado sem qualquer justificativa deixou de atender às necessidades básicas de seu filho Agiu é certo intencionalmente Ao mudar de cidade e constituir nova família entendeu por bem deixar de prover a subsistência do filho tido com a primeira mulher Em outras palavras desobrigouse da paternidade deixandoo aos cuidados exclusivos da mãe e dos parentes quando tinha capacidade de por qualquer forma alcançar o mínimo de suas condições Apelo ministerial provido para condenar o apelado como incurso no art 244 do Código Penal à pena de 1 ano de detenção substituída por restritiva de direitos na modalidade de prestação pecuniária e à sanção pecuniária correspondente a um salário mínimo vigente à época do fato TJRS Apelação 70015369689 Rel Marlene Landvoigt j 882007 Abandono material Depreendese do conjunto probatório que o réu costumava atrasar o pagamento da pensão alimentícia de sua filha mas acabava efetuando o mesmo com os valores que obtinha à época Conforme bem salientado pela magistrada a quo o pagamento parcial não significa que houve abandono material da filha Salientese que para a configuração do delito do art 244 do Código Penal o autor deve possuir condições de pagar a referida pensão alimentícia e deixála de pagar por sua livre vontade O réu trabalha com lavagens de carros em um posto de gasolina auferindo os seus rendimentos mediante as comissões que recebe por serviço prestado Diante desse fato não é improvável que o réu não possuísse condições materiais para o pagamento da pensão alimentícia da filha pois o rendimento percebido varia de acordo com o volume de serviços prestados TJRS Apelação 70008910069 Rel Lúcia de Fátima Cerveira j 2132007 Não há que se falar em violação aos princípios do devido processo legal do contraditório e da ampla defesa em razão do deferimento de guarda provisória de menores de idade 5 anos 4 anos e 40 dias respectivamente a guardiães de fato antes da citação da genitora ou de curador especial Isto porque a situação em que as crianças se encontravam era de emergência uma vez que vítimas de maustratos e abandono material estando a genitora internada em hospital psiquiátrico para tratamento de doença mental Ademais a referida decisão judicial apenas objetivou assegurar o superior interesse das crianças protegendoas Precedente REsp 124621SP STJ RMS 11064MG Rel Min Jorge Scartezzini j 2232005 Crime de abandono material Trancamento da ação penal por falta de justa causa Improcedência Não se evidencia estreme de dúvidas a inocência do ora Paciente porquanto a denúncia descreve de forma consistente e suficiente para a deflagração da persecução penal a existência em tese de fato tipificado como abandono material caracterizado pelo descumprimento do dever legal de prover a subsistência de seus dependentes STJ RHC 15493RS Rel Min Laurita Vaz j 2842004 Entrega de filho menor a pessoa inidônea Art 245 Entregar filho menor de 18 dezoito anos a pessoa em cuja companhia saiba ou deva saber que o menor fica moral ou materialmente em perigo Pena detenção de 1 um a 2 dois anos 1º A pena é de 1 um a 4 quatro anos de reclusão se o agente pratica delito para obter lucro ou se o menor é enviado para o exterior 2º Incorre também na pena do parágrafo anterior quem embora excluído o perigo moral ou material auxilia a efetivação de ato destinado ao envio de menor para o exterior com o fito de obter lucro D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a assistência familiar no particular aspecto da assistência aos filhos menores 2 Sujeitos do crime Sujeitos ativos somente serão os pais legítimos naturais ou adotivos outras pessoas mesmo tutor não podem ser autor deste crime a não ser por meio do instituto do concurso de pessoas Sujeito passivo é o filho menor de dezoito anos sendo irrelevante a natureza da filiação aliás agora proibida pela CF 3 Tipo objetivo adequação típica A conduta típica consiste em o agente entregar deixar sob os cuidados guarda ou vigilância filho menor de dezoito anos a pessoa capaz de colocálo em perigo moral cáften meretriz ou material ébrio contumaz portador de doença infectocontagiosa etc O 2º prevê uma conduta autônoma desprovida de perigo referente ao sujeito que auxilia ajuda a enviar o menor ao exterior 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo consistente na vontade de entregar menor de dezoito anos a pessoa com a qual pode ficar em perigo Na hipótese de saber que pode correr perigo o dolo pode ser direto ou eventual na hipótese em que deve saber o elemento subjetivo só pode ser dolo eventual A nosso juízo é inadmissível a forma culposa contra Heleno Fragoso 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a entrega efetiva do menor art 245 caput ou na segunda hipótese com o auxílio nos atos praticados para enviar o menor ao exterior art 245 2º Admitese a tentativa embora de difícil configuração 6 Classificação doutrinária Tratase de crime de perigo abstrato instantâneo próprio caput formal unissubjetivo e plurissubsistente 7 Forma qualificada 1º Há duas formas que qualificam o crime a quando o elemento subjetivo especial do tipo consiste no especial de fim de obter lucro b quando o filho é enviado para o exterior 8 Questões especiais O tutor não pode ser sujeito ativo deste crime que admite a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada igual a um ano Vide arts 238 e 239 da Lei n 806990 Estatuto da Criança e do Adolescente e art 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais 9 Pena e ação penal Detenção de um a dois anos para o caput A forma qualificada comina pena de reclusão de um a quatro anos 1º e 2º Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Tráfico internacional de crianças pretendido trancamento no fato de ter transitado em julgado a decisão proferida no juízo civil deferindo a adoção de menor por casal estrangeiro circunstância que não inibe o juízo penal de apurar eventual fraude no procedimento onde teriam atuado falsas mães biológicas Tendo o Congresso Nacional através do Decreto Legislativo n 28 de 2491990 e o Governo Federal por força do Decreto n 99710 de 21111990 incorporado ao direito pátrio os preceitos contidos na Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança não mais há de se discutir sobre a competência da justiça federal em casos de tráfico internacional de criança aplicandose a hipótese do art 109 V da CF88 STJ RHC 6322PB Rel Min Anselmo Santiago j 21101997 Abandono intelectual Art 246 Deixar sem justa causa de prover à instrução primária de filho em idade escolar Pena detenção de 15 quinze dias a 1 um mês ou multa D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é o direito à instrução fundamental dos filhos menores Tutelase enfim a educação dos filhos menores procurando assegurarlhes a educação necessária para facilitarlhes o convívio social 2 Sujeitos do crime Sujeitos ativos são os pais legítimos naturais ou adotivos Sujeito passivo é o filho em idade escolar qual seja aquela compreendida entre sete e quatorze anos 3 Tipo objetivo adequação típica A ação tipificada consiste em deixar de prover ou seja de providenciar a instrução primária de seu filho O tipo apresenta um elemento normativo contido na expressão sem justa causa isto é omitir as medidas necessárias para que seja ministrada instrução ao filho em idade escolar Como causas que justifiquem a omissão do agente podem ser entendidas as dificuldades de acesso às escolas e a falta de escolas tão comum em alguns Estados além do grau de instrução rudimentar ou nula dos próprios pais Heleno Cláudio Fragoso Lições de Direito Penal p 135 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de deixar de prover a instrução primária de filho em idade escolar Não há nenhum elemento subjetivo especial do tipo 5 Consumação e tentativa Consumase o crime quando por tempo juridicamente relevante o sujeito não providencia a instrução fundamental do filho A tentativa é praticamente indemonstrável 6 Classificação doutrinária Tratase de crime omissivo próprio permanente unissubsistente e de mera conduta 7 Questões especiais A idade escolar de que fala o tipo é apenas uma qualidade pessoal do sujeito passivo Não há configuração do delito quando a educação do menor é ministrada em casa em decorrência do local em que se encontra Vide art 229 da CF 8 Pena e ação penal As penas cominadas alternativamente são a detenção de quinze dias a um mês ou multa Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Abandono intelectual Art 246 do Código Penal Evasão escolar decorrente da vontade da adolescente que não mais desejava estudar e foi viver com o namorado inobstante os esforços da genitora incabível a responsabilização criminal desta Ausente o dolo ou seja a vontade dos genitores em impedir que o filho frequente a escola e não sendo o delito punível a título de culpa não há como receber a denúncia Não será processando criminalmente os genitores que se resolverá o problema muito mais complexo de cunho social cuja solução demanda atendimento sociopsicológico do adolescente e de sua família TJRS Recurso Crime 71000939157 Rel Ângela Maria Silveira j 4122006 Inexiste previsão constitucional e legal como reconhecido pelos impetrantes que autorizem os pais ministrarem aos filhos as disciplinas do ensino fundamental no recesso do lar sem controle do poder público mormente quanto à frequência no estabelecimento de ensino e ao total de horas letivas indispensáveis à aprovação do aluno STJ MS 7407DF Rel Min Francisco Peçanha Martins j 2442002 Art 247 Permitir alguém que menor de 18 dezoito anos sujeito a seu poder ou confiado à sua guarda ou vigilância I frequente casa de jogo ou malafamada ou conviva com pessoa viciosa ou de má vida II frequente espetáculo capaz de pervertêlo ou de ofenderlhe o pudor ou participe de representação de igual natureza III resida ou trabalhe em casa de prostituição IV mendigue ou sirva a mendigo para excitar a comiseração pública Pena detenção de 1 um a 3 três meses ou multa D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico é a formação e educação moral do menor embora o tipo penal não consagre esse nomen juris 2 Sujeitos do crime Sujeitos ativos serão não apenas os pais como qualquer pessoa a quem o menor foi confiado isto é que o tenham sob seu poder guarda ou vigilância Sujeito passivo é o menor de dezoito anos submetido ao poder ou confiado à guarda ou vigilância do agente 3 Tipo objetivo adequação típica O núcleo do tipo é o verbo permitir dar liberdade tolerar admitir de maneira expressa ou tácita que menor de dezoito anos realize qualquer das condutas previstas nos incisos I a IV O primeiro caso inciso I prevê que o menor compareça com habitualidade a casa de jogo ou malafamada cassino cabaré casa de carteado ou conviva tenha contato habitual com pessoa viciosa ou de má vida como viciados em drogas prostitutas etc O inciso II também exige a frequência na conduta do menor em assistir ou participar de espetáculos que venham a pervertêlo ou ofenderlhe o pudor Na conduta do inciso III o menor reside fixa residência mora ou trabalha presta serviço mediante pagamento em casa onde é realizado o meretrício O último inciso diz respeito ao menor que mendigue viva como pedinte ou sirva a mendigo para excitar estimular despertar a comiseração compaixão pública 31 Habitualidade O comparecimento uma ou outra vez ao local proibido é insuficiente para caracterizar o sentido do verbo frequentar que tem o sentido de reiteração repetição ou seja habitualidade Somente o comparecimento reiterado terá idoneidade para tipificar a conduta proibida nos incisos I e II do dispositivo em exame 32 Pessoa viciosa ou de má vida O significado e o alcance de expressões como essas também mudam ao longo do tempo especialmente passados mais de sessenta anos Pessoa viciosa pode ser compreendida como desregrada descomprometida com o bom comportamento de má vida por sua vez referese ao aspecto moral particularmente em relação aos sadios costumes sociais 33 Espetáculo capaz de perverter ou ofender o pudor Perverter tem o sentido de corromper de depravar ofender o pudor quer dizer atingir o pudor envergonhar É necessário que o menor frequente espetáculos que apresentem cenas ou atos depravados despudorados capazes de prejudicar a sua formação moral 34 Mendigo que excita a comiseração pública Comiseração pública é a piedade a pena a compaixão que a situação mendicante de alguém pode despertar na sociedade Mendigo é o pedinte andarilho que busca nas ruas as migalhas doadas que possam garantirlhe a sobrevivência 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de permitir a liberalidade do menor em qualquer das formas previstas no tipo penal Para o inciso IV se exige também o elemento subjetivo especial do tipo consistente no especial fim de excitar a comiseração pública 5 Consumação e tentativa Consumase o crime quando o menor pratica quaisquer das condutas previstas no caso de permissão anterior Se a permissão for posterior à prática a consumação dáse com o assentimento Admite se a tentativa em princípio somente se a permissão for antes da prática da conduta 6 Classificação doutrinária Tratase de crime instantâneo de perigo abstrato omissivo e de forma vinculada 7 Questões especiais O agente poderá incorrer em erro a respeito do local ou atividade art 20 do CP A prática de mais uma conduta dá lugar ao concurso material pois não se trata de crime de conteúdo variado Admite a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada inferior a um ano Vide art 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais arts 50 4º do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais e 240 da Lei n 806990 Estatuto da Criança e do Adolescente 8 Pena e ação penal As penas cominadas alternativamente são a detenção de um a três meses ou multa Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Abandono moral Art 247 IV do Código Penal Excitação da comiseração pública Inexistência Não se pode concordar com a condenação pela prática do crime do art 247 IV do Código Penal se a acusada vítima de extrema miséria permite que a filha menor vá para a rua em busca de algum dinheiro que servirá para prover de alimentos a ela e os demais irmãos não restando evidenciado o objetivo de excitar a comiseração pública TJMG Apelação 1000000353417 90001 Rel Antonio Carlos Crunivel j 11112003 Capítulo IV Dos Crimes contra o Pátrio Poder Tutela ou Curatela Induzimento a fuga entrega arbitrária ou sonegação de incapazes Art 248 Induzir menor de 18 dezoito anos ou interdito a fugir do lugar em que se acha por determinação de quem sobre ele exerce autoridade em virtude de lei ou de ordem judicial confiar a outrem sem ordem do pai do tutor ou do curador algum menor de 18 dezoito anos ou interdito ou deixar sem justa causa de entregálo a quem legitimamente o reclame Pena detenção de 1 um mês a 1 um ano ou multa D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Os bens jurídicos são o pátrio poder a tutela ou a curatela mais especialmente os direitos a seu exercício 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa Sujeitos passivos são aqueles que detêm o direitodever de exercer o pátrio poder tutela ou curatela isto é são os pais tutores ou curadores bem como menor de dezoito anos ou interdito 3 Tipo objetivo adequação típica São três figuras típicas A primeira consiste em induzir persuadir incitar menor de dezoito anos ou interdito à fuga ou seja deve ser no sentido de que o menor escape por seus próprios meios e para os fins que se propuser A segunda conduta é confiar entregar transmitir a outrem o incapaz de modo arbitrário A terceira conduta finalmente é deixar de entregálo menor de dezoito anos ou interdito caracterizando a sonegação de incapaz Essa modalidade apresenta dois elementos normativos que são as expressões sem justa causa e legitimamente 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de praticar qualquer das condutas descritas no tipo Não há exigência de elemento subjetivo especial do tipo tampouco previsão de modalidade culposa 5 Consumação e tentativa Consumase o crime a com a efetiva fuga do incapaz b com a entrega c com a recusa injustificada do agente Admitese a tentativa somente nas duas últimas modalidades induzimento a fuga e entrega arbitrária 6 Classificação doutrinária Tratase de crime instantâneo material e plurissubsistente no induzimento a fuga comissivo instantâneo e de mera conduta na entrega arbitrária e omissivo puro e permanente na sonegação de incapaz 7 Questões especiais Aquele que separado judicialmente e desprovido de pátrio poder recusase a entregar filho menor incorre nas sanções do art 359 do CP nesse sentido TACrimSP RT 500346 No crime do art 248 o menor é persuadido a sair do local onde se encontra o que não ocorre no art 249 no qual o incapaz é retirado do lugar Admitese a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada inferior a um ano Vide arts 60 61 e 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais 8 Pena e ação penal As penas cominadas alternativamente são detenção de um mês a um ano ou multa Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A No crime de subtração de incapaz o menor é tirado do poder de quem o tem sob sua guarda em virtude de lei ou ordem judicial ao passo que o de sonegação de incapaz consiste na recusa de entrega retenção sem justa causa do incapaz a quem legitimamente o reclame TAMG Apelação 14549 Rel Edelberto Santiago j 17111986 Há justa causa para a ação penal pelo delito do art 248 do CP instaurada contra quem vende recémnascido cuja guarda lhe fora confiada pela mãe TACrimSP HC 90250 Rel Albano Nogueira j 1931979 Subtração de incapazes Art 249 Subtrair menor de 18 dezoito anos ou interdito ao poder de quem o tem sob sua guarda em virtude de lei ou de ordem judicial Pena detenção de 2 dois meses a 2 dois anos se o fato não constitui elemento de outro crime 1º O fato de ser o agente pai ou tutor do menor ou curador do interdito não o exime de pena se destituído ou temporariamente privado do pátrio poder tutela curatela ou guarda 2º No caso de restituição do menor ou do interdito se este não sofreu maustratos ou privações o juiz pode deixar de aplicar pena D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Os bens jurídicos são a garantia e a proteção da instituição familiar particularmente em relação aos direitos relativos ao pátrio poder à tutela ou à curatela mais especificamente os direitos a seu exercício 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa inclusive o pai tutor ou curador destituídos ou temporariamente privados do pátrio poder tutela curatela ou guarda 1º Sujeitos passivos são os pais tutores ou curadores e especialmente o incapaz 3 Tipo objetivo adequação típica A conduta típica consiste em subtrair tirar retirar furtar o incapaz do poder guarda ou vigilância de quem de direito Para tipificar esta infração o comportamento deve ser de tal ordem que crie um estado ou situação que inviabilize a guarda ou vigilância do responsável Eventual consentimento do incapaz é irrelevante na medida em que este não tem capacidade para consentir 31 Meios ou formas de execução Os meios de execução em tese são irrelevantes para a tipificação do crime que pode ser mediante violência ou grave ameaça ou simplesmente mediante sedução fraude ardil estratagema ou até mesmo com o consentimento da vítima embora legalmente inválido Essas questões contudo devem ser objeto de avaliação na dosimetria da pena 32 Crime subsidiário Somente haverá este crime se não caracterizar outro de natureza mais grave e não apenas quando constitua elemento de outro crime como refere equivocadamente o preceito secundário Essa questão é facilmente resolvida através do conflito aparente de normas 33 Fuga do menor atipicidade Se o menor fugir sozinho procurando posteriormente a companhia e a proteção do agente não se constituirá este crime Contudo o eventual auxílio à iniciativa do menor contribuindo para sua realização a nosso juízo tipifica o crime contrário Heleno Fragoso 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de subtrair menor ou interdito do poder ou guarda de quem legalmente o detenha É indispensável evidentemente que o agente tenha conhecimento de que o incapaz se encontra sob a guarda ou proteção legal de outrem 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a efetiva subtração do incapaz mesmo que o agente não consiga consolidar seu domínio sobre a vítima mantendo uma posse intranquila Admitese teoricamente a tentativa 6 Classificação doutrinária Tratase de crime instantâneo comissivo material comum e subsidiário 7 Subtração de incapazes e outros crimes Se a subtração ocorrer para fim libidinoso há o delito previsto nos arts 219 ou 220 do CP Caso a finalidade da subtração seja a obtenção do resgate configurase o crime do art 159 extorsão mediante sequestro Quando o sujeito realizar a conduta típica com o emprego de violência física ou moral responderá em concurso com ela Não é sujeito ativo aquele que venha a acolher o menor interdito Se o objetivo do agente for meramente a privação de liberdade do incapaz incorrerá no art 146 constrangimento ilegal 8 Perdão judicial Por política criminal o juiz poderá deixar de aplicar a pena se o agente restituir o menor ou interdito sem que este tenha sofrido maus tratos ou privações Essa devolução nessas condições não deixa de caracterizar uma espécie de arrependimento posterior que nesta hipótese recebe um tratamento mais benéfico do que aquele previsto no art 16 do CP 9 Questões especiais A subtração poderá darse por induzimento porém seus elementos diferem dos previstos no art 248 do CP Admite a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada inferior a um ano Vide art 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais art 237 da Lei n 806990 Estatuto da Criança e do Adolescente 10 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é a detenção de dois meses a dois anos se o fato não constitui elemento de outro crime Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Subtração de incapaz Incabível Comprovado pelos depoimentos que o apelante constrangeu a criança a entrar no veículo e a manteve privada de sua liberdade sob ameaça de arma de fogo telefonando para a mãe afirmando que ia matála pratica o réu o delito do art 148 1º do Código Penal e não subtração de incapaz TJRS Apelação 70021148168 Rel Elba Aparecida Nicolli Bastos j 18102007 Há crime de subtração de incapaz se o acusado se excedeu na autorização que a representante legal do menor tinha lhe dado tirando o menor de sua convivência TJMG Apelação 101140404015630011 Rel Paulo Cezar Dias j 2442007 Não há crime de subtração de incapazes se os menores que eram levados pelo acusado para a sua casa eram abandonados e viviam nas ruas em situação de risco TJMG Apelação 100240265260380011 Rel José Antonino Baía Borges j 1722005 Falsidade ideológica Sequestro Desclassificação para o delito do art 249 do CP subtração de incapaz Comprovada a ocorrência dos delitos de falsidade ideológica por meio de certidão de nascimento falsa e subtração de incapaz eis que a ré subtraiu criança permanecendo com ela por trinta e sete dias cuidandoa como se fosse sua filha Declarada extinta a punibilidade pela prescrição quanto ao delito de subtração de incapaz TJRS Apelação 70005965991 Rel Silvestre Jasson Ayres Torres j 1732004 TÍTULO VIII DOS CRIMES CONTRA A INCOLUMIDADE PÚBLICA Capítulo I Dos Crimes de Perigo Comum Incêndio Art 250 Causar incêndio expondo a perigo a vida a integridade física ou o patrimônio de outrem Pena reclusão de 3 três a 6 seis anos e multa Aumento de pena 1º As penas aumentamse de um terço I se o crime é cometido com intuito de obter vantagem pecuniária em proveito próprio ou alheio II se o incêndio é a em casa habitada ou destinada a habitação b em edifício público ou destinado a uso público ou a obra de assistência social ou de cultura c em embarcação aeronave comboio ou veículo de transporte coletivo d em estação ferroviária ou aeródromo e em estaleiro fábrica ou oficina f em depósito de explosivo combustível ou inflamável g em poço petrolífero ou galeria de mineração h em lavoura pastagem mata ou floresta Incêndio culposo 2º Se culposo o incêndio a pena é de detenção de 6 seis meses a 2 dois anos D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública particularmente o perigo comum que pode decorrer das chamas provenientes de um incêndio A simples exposição a perigo justifica a proteção uma vez que a eventual produção de dano é irrelevante para a caracterização do crime 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa inclusive o proprietário do bem incendiado Sujeitos passivos são a coletividade e aqueles que têm sua integridade pessoal ou patrimonial lesada ou ameaçada pelo dano 3 Tipo objetivo adequação típica A conduta típica consiste em causar incêndio devendo este ser entendido como a voluntária causação de fogo relevante que investindo uma coisa individuada subsiste por si mesmo e pode propagarse expondo a perigo coisas outras ou pessoas não determinadas ou indetermináveis de antemão O incêndio é fogo perigoso potencialmente lesivo à vida à integridade corporal ou ao patrimônio de um número indeterminado de pessoas É irrelevante para a caracterização do crime a natureza da coisa incendiada bem como os meios executórios dos quais se vale o agente desde que idôneos para a configuração do incêndio 31 Fogo ou incêndio não perigoso Se o incêndio ou mesmo o simples fogo não for perigoso isto é não representar um perigo real concreto efetivo a um número indeterminado de pessoas ou bens não caracterizará o crime de incêndio podendo no máximo tipificar crime de dano desde que se trate de coisa alheia art 163 4 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de causar incêndio Não há exigência de qualquer elemento subjetivo especial do tipo A existência de um fim especial poderá agravar a pena qualificar o crime ou quem sabe tipificar outra infração penal Se visar a obtenção de vantagem pecuniária em proveito próprio ou alheio a pena será majorada em um terço 1º I Poderá configurar crime contra a segurança nacional art 20 da Lei n 717083 5 Perigo a pessoa certa e determinada Somente haverá o crime em análise se o incêndio acarretar perigo para um número indeterminado de pessoas ou de bens Se o agente visar expor a perigo somente uma pessoa certa e determinada o crime será aquele do art 132 do CP 6 Consumação e tentativa Consumase o crime com a superveniência da situação de perigo comum e não apenas com o início do fogo Não se trata de perigo abstrato sendo necessárias não apenas a produção de fogo autônomo e relevante mas também a verificação do perigo concreto efetivo embora não se exija a produção de chamas Admitese a tentativa 7 Classificação doutrinária Crime comum de perigo concreto e coletivo simples de forma livre comissivo ou omissivo plurissubsistente 8 Formas qualificadas 1º I Se o crime é cometido com o intuito de obter vantagem pecuniária em proveito próprio ou alheio não havendo perigo à incolumidade pública o agente que incendeia coisa própria a fim de obter indenização de valor seguro responde pelo delito do art 171 2º V do CP Entretanto em ocorrendo perigo comum não há falar em fraude mas sim em incêndio qualificado que absorve esta II Se o incêndio é a em casa habitada ou destinada a habitação basta que o agente saiba ser a casa destinada a habitação sendo desnecessária a presença de pessoas dentro dela b em edifício público de propriedade da União do Estado ou do Município ou destinado a uso público igrejas cinemas teatros ou a obra de assistência social hospitais creches sanatórios ou a veículo de cultura museus bibliotecas c em embarcação aeronave comboio ou veículo de transporte coletivo barcos trens ônibus aviões embora não ocupados por pessoas ou coisas d em estação ferroviária ou aeródromo aqui se incluem as construções portuárias e as estações rodoviárias e em estaleiro fábrica ou oficina mesmo que se verifique a ausência de pessoas no local f em depósito de explosivo matéria detonante ou deflagrante combustível substância capaz de fomentar o fogo ou inflamável substância facilmente combustível g em poço petrolífero ou galeria de mineração em razão da gravidade dos efeitos produzidos h em lavoura pastagem mata ou floresta lavoura é terra cultivada pastagem é campo coberto de ervas para a alimentação do gado mata é o conjunto de árvores de grande porte e floresta é agrupamento de matas 9 Forma culposa Decorre da inobservância pelo agente do cuidado objetivamente necessário exigido pelas circunstâncias com a consequente produção de um estado de perigo coletivo Embora o dispositivo em exame não o defina a culpa pode decorrer de negligência imprudência ou imperícia 10 Concurso com o crime de homicídio Quando o sujeito ativo objetiva com a produção do incêndio matar ou lesionar pessoa certa haverá concurso formal entre o delito de incêndio e homicídio qualificado art 121 parágrafo único III tentado ou consumado ou o de lesão corporal com a agravante do art 61 II d Se o incêndio é motivado por inconformismo político vide Lei n 717083 art 20 11 Incêndio em mata ou floresta Caracterizase o delito insculpido no art 41 da Lei n 960598 Provocar incêndio em mata ou floresta quando do incêndio não advir perigo à incolumidade pública visto que aquele dispositivo tutela o ambiente resguardando a integridade das matas e florestas 12 Incêndio em lavoura ou pastagem Se o fogo porém for provocado em lavoura ou pastagem poderá incorrer o agente nas penas do art 250 já que o art 41 da Lei de Crimes Ambientais referese tão somente ao fogo potencialmente lesivo às matas e florestas cf Luiz Regis Prado Crimes contra o ambiente São Paulo Revista dos Tribunais 1998 p 141 13 Poluição atmosférica decorrente de incêndio Para a hipótese de poluição atmosférica oriunda de incêndio com resultados lesivos à saúde humana aos animais e à flora vide art 54 da Lei n 960598 Vide ainda art 173 do CP arts 41 e 54 da Lei n 960598 Lei dos Crimes Ambientais art 26 e da Lei n 477165 Código Florestal art 10 a da Lei n 519767 proteção à fauna e no tocante ao 2º Lei n 909995 Juizados Especiais 14 Questões especiais Tratase de fato atípico a acusação de incêndio em coisa própria sem a produção de perigo comum Não se verificando risco à incolumidade pública e não sendo própria a coisa o delito será de dano simples art 163 caput do CP ou qualificado art 163 parágrafo único II Se o agente provoca o incêndio com o intuito de expor a perigo um número determinado de pessoas responderá pelo crime do art 132 do CP Se o agente faz fogo por qualquer modo em floresta e demais formas de vegetação sem tomar as precauções adequadas queima controlada ou queimada responde pela contravenção penal ínsita na alínea e do art 26 do Código Florestal e não pelo delito de incêndio doloso ou culposo art 250 do CP desde que não haja risco à coletividade 15 Pena e ação penal Para a modalidade simples caput a pena é de reclusão de três a seis anos e multa Nas formas qualificadas as penas são aumentadas em um terço Tratandose de incêndio culposo a pena é de detenção de seis meses a dois anos Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Incêndio Comete o delito previsto no art 250 1º II a do CP o agente que ateia fogo em residência habitada ou destinada a habitação expondo a perigo a integridade física e o patrimônio dos moradores e vizinhos TJRS Apelação 70022812325 Rel Constantino Lisbôa de Azevedo j 2122008 Incêndio Imperiosa a condenação quando o conjunto probatório indica a autoria do acusado pela prática de incêndio Pela dicção da norma incriminadora do art 250 do CP basta que o delito exponha a perigo o patrimônio de outrem TJRS Apelação 70020316063 Rel Gaspar Marques Batista j 6122007 Crime de incêndio Apenamento Comunicação ao TRE Art 15 III CF A conduta criminalizada no art 250 CP é apenada com reclusão ao invés de detenção É obrigatória a comunicação ao Tribunal Regional Eleitoral acerca do trânsito em julgado da condenação órgão competente para avaliar a capacidade eletiva do cidadão Precedentes TJRS Apelação 70021262845 Rel José Eugênio Tedesco j 22112007 Art 250 1º II a do CP Agravante do art 61 II h do CP Duplo incêndio Alegação afastada Desígnio único Presente um único desígnio de incendiar o prédio onde residia a excompanheira deve ser afastada a pretensão de reconhecimento de duplo incêndio Constatado que o réu sabia que a filha da ex companheira residia na parte inferior do prédio juntamente com duas crianças impõese o reconhecimento da majorante da casa habitada bem como da agravante de crime cometido contra criança TJRS Apelação 70020144853 Rel Gaspar Marques Batista j 692007 Incêndio A ausência de perícia não é hábil a afastar a materialidade do fato A prova testemunhal é apta a suprir a ausência de laudo técnico A pena de multa não pode ser afastada pois integra o preceito secundário do tipo penal do art 250 de forma cumulativa TJRS Apelação 70020031217 Rel Gaspar Marques Batista j 127 2007 Art 250 1º II a do CP Ausência de laudo pericial Prova testemunhal suficiente Condenação Coerente prova testemunhal é suficiente para atestar materialidade e autoria do delito de incêndio quando ausente laudo pericial Apelo ministerial provido TJRS Apelação 70018562488 Rel Gaspar Marques Batista j 2862007 Incêndio culposo Comete o delito previsto no art 250 2º cc o art 258 2ª parte do CP a agente que agindo com imprudência provoca explosão ao inserir óleo diesel em lamparina ainda acesa permitindo assim que o fogo se alastrasse pela residência da vítima causando a morte de uma pessoa Condenação mantida TJRS Apelação 70019171529 Rel Constantino Lisbôa de Azevedo j 2452007 Incêndio Prova pericial O crime do art 250 do CP exige para comprovação de sua materialidade laudo pericial como determina o art 173 do CPP Existência de dois laudos contraditórios Prevalência do laudo elaborado por perito oficial que concluiu pelo curtocircuito como causa provável do incêndio Sentença absolutória mantida TJRS Apelação 70009086125 Rel José Eugênio Tedesco j 1692004 O crime de incêndio é material resultado natural ou material e de perigo concreto resultado jurídico Todavia a verificação da assertiva feita no v acórdão recorrido acerca do summatum opus exigindo a análise fáticoprobatória esbarra no óbice insculpido na Súmula 7STJ STJ REsp 498839SP Rel Min Félix Fischer j 58 2003 O incêndio é crime em que se expõe conscientemente a incolumidade pública a perigo ou dano pela destruição de um objeto pelo fogo A pena do crime de incêndio é aumentada em até 13 sempre que evidentes as circunstâncias previstas no 1º do art 250 do Código Penal A expressão casa habitada ou destinada à habitação inserida na letra a do inc II do 1º do art 250 do Código Penal abrange as edificações que sirvam de habitação ainda que eventualmente STJ REsp 109867DF Rel Min Gilson Dipp j 4122001 Explosão Art 251 Expor a perigo a vida a integridade física ou o patrimônio de outrem mediante explosão arremesso ou simples colocação de engenho de dinamite ou de substância de efeitos análogos Pena reclusão de 3 três a 6 seis anos e multa 1º Se a substância utilizada não é dinamite ou explosivo de efeitos análogos Pena reclusão de 1 um a 4 quatro anos e multa Aumento de pena 2º As penas aumentamse de um terço se ocorre qualquer das hipóteses previstas no 1º I do artigo anterior ou é visada ou atingida qualquer das coisas enumeradas no n II do mesmo parágrafo Modalidade culposa 3º No caso de culpa se a explosão é de dinamite ou substância de efeitos análogos a pena é de detenção de 6 seis meses a 2 dois anos nos demais casos é de detenção de 3 três meses a 1 um ano D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública particularmente o perigo comum que pode decorrer das condutas proibidas A simples exposição a perigo justifica a proteção uma vez que a eventual produção de dano é irrelevante para a caracterização do crime 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa Sujeito passivo além da coletividade é a pessoa especificamente atingida pelos efeitos da explosão 3 Tipo objetivo adequação típica A conduta tipificada é expor a perigo que tem o sentido de arriscar colocar em perigo o bem protegido Difere do tipo do art 132 por acrescentar como bem jurídico protegido o patrimônio de outrem além da forma de sua execução Tratase na verdade de exposição a perigo da vida integridade física e patrimonial de número incerto de pessoas mediante a explosão que é ato ou efeito de rebentar com violência estrondo e deslocamento de ar b arremesso de engenho de dinamite ou de substância de efeitos análogos consiste no lançamento a distância de artefato feito de substância explosiva que pode ser de dinamite ou nitroglicerina ou o TNT os explosivos à base de ar líquido as gelatinas explosivas etc c colocação de dinamite ou substância de efeitos análogos pôr em determinado local 4 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de causar explosão ou arremessar ou colocar engenho de dinamite ou substância análoga É indispensável que o agente tenha consciência ademais de que expõe a perigo a vida a incolumidade física ou patrimônio de número indeterminado de pessoas Não há necessidade de fim especial isto é de elemento subjetivo do tipo que se existir poderá caracterizar outro crime ou então caracterizar uma majorante visar a obtenção de vantagem pecuniária 2º 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com o arremesso ou a colocação do engenho instalandose uma situação de iminente perigo A tentativa é admissível nas duas primeiras modalidades 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comum de perigo concreto e coletivo de forma vinculada alternativa de conteúdo variável formal pluriofensivo unissubjetivo e plurissubsistente 7 Forma privilegiada Quando o artefato usado não se tratar de dinamite ou substância de efeitos análogos 1º mas sim de explosivo menos danoso como a pólvora 8 Formas majoradas Ocorrem quando se verifica a ocorrência de qualquer das hipóteses elencadas no art 250 1º I e II 9 Forma culposa Se a explosão resulta da desatenção do agente que não observa as regras de cuidado exigíveis pelas circunstâncias A modalidade culposa prevista no 3º restringese à hipótese de explosão não abarcando o mero arremesso ou a colocação do artefato explosivo A culpa pode decorrer de negligência imprudência ou imperícia 10 Dano qualificado Não ocorrendo perigo à incolumidade pública e não sendo própria a coisa responderá o agente pelo delito de dano qualificado art 163 parágrafo único II 11 Questões especiais É imprescindível para o delito de explosão que ocorra perigo concreto à vida integridade física ou patrimônio alheio caso contrário a conduta poderá caracterizar o delito insculpido no art 42 da Lei n 960598 Lei dos Crimes Ambientais Contemplase também a implosão em que há um processo endotérmico de dilatação de gases explosão endotérmica Se a explosão ofende a segurança nacional vide art 20 da Lei n 717083 Lei da Segurança Nacional Os 1º e 3º admitem suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada igual ou inferior a um ano Vide ainda arts 60 61 e 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais 12 Pena e ação penal A pena prevista para o caput é de reclusão de três a seis anos e multa As penas aumentamse de um terço se ocorrem as hipóteses do 1º I e II do art 250 Na forma privilegiada a pena é de reclusão de um a quatro anos e multa Em se tratando de incêndio culposo com emprego de dinamite ou substância de efeitos análogos a pena é de detenção de seis meses a dois anos se outra a substância a pena é de detenção de três meses a um ano Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Crimes de incêndio e explosão na forma qualificada Absolvição em grau de recurso por inexistência de prova Hipótese na qual os recorridos condenados em primeiro grau de jurisdição por suposto envolvimento na explosão do Osasco Plaza Shopping foram absolvidos em grau de recurso STJ REsp 880283SP Rel Min Gilson Dipp j 12122006 Explosão Configurase o delito do art 251 1º quando o agente arremessa artefato explosivo não consistente em dinamite ou similar em direção à vítima expondo a risco sua integridade física TJRS Apelação 70008695405 Rel Gaspar Marques Batista j 1282004 Delito de explosão art 251 1º e 2º do Código Penal Prova que atesta a prática pelo réu do agir comportamental que lhe é imputado Preparou artefatos tendentes a explodir a pólvora e um botijão de gás que fora preparado com o corte da mangueira que leva o gás ao fogão colocandoo na garagem da residência onde moram as vítimas imediatas TJRS Apelação 70005752522 Rel Marco Antônio Barbosa Leal j 4112003 Uso de gás tóxico ou asfixiante Art 252 Expor a perigo a vida a integridade física ou o patrimônio de outrem usando de gás tóxico ou asfixiante Pena reclusão de 1 um a 4 quatro anos e multa Modalidade culposa Parágrafo único Se o crime é culposo Pena detenção de 3 três meses a 1 um ano D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública particularmente o perigo comum que pode decorrer das condutas proibidas A simples exposição a perigo justifica a proteção uma vez que a eventual produção de dano é irrelevante para a caracterização do crime 2 Sujeitos do crime Qualquer pessoa pode ser o sujeito ativo O sujeito passivo ao lado da coletividade é a pessoa que tem sua vida a integridade física ou patrimônio ofendidos ou ameaçados por qualquer gás tóxico ou asfixiante 3 Tipo objetivo adequação típica A conduta criminalizada é expor a perigo a vida a integridade física ou o patrimônio de indiscriminado número de pessoas Na execução dessa exposição a perigo o agente utilizará gás tóxico que ocasione o envenenamento ou asfixiante que produza sufocação A natureza ou qualidade do gás deve ser comprovada através de exame pericial 31 Toxicidade do gás potencialidade lesiva É indispensável que o gás tenha toxicidade suficiente para pôr em risco a vida saúde ou patrimônio de outrem A detonação de ampola de gás lacrimogêneo mesmo em recinto fechado não tem a toxicidade suficiente para criar o perigo exigido pelo tipo penal A conduta é atípica 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é dolo representado pela vontade consciente de expor a perigo o bem jurídico protegido por meio do uso de gás tóxico ou asfixiante Pode configurarse também o dolo eventual Se houver dolo de dano que também pode ser eventual caracterizarseá outro crime 5 Consumação e tentativa Consumase com a instalação da situação de perigo comum ou seja de perigo concreto É indispensável a ocorrência efetiva de perigo para a incolumidade pública Admitese teoricamente a tentativa 6 Classificação doutrinária Crime comum formal pluriofensivo de perigo concreto e coletivo unissubjetivo 7 Forma culposa A forma culposa a exemplo das demais figuras poderá configurar se quando o agente agir com negligência imprudência ou imperícia ou seja pode decorrer da não observância parágrafo único do cuidado necessário pelo sujeito ativo do delito A culpa não decorre da simples possibilidade de saber que se trata de gás tóxico ou asfixiante 8 Letalidade do gás irrelevância Para a caracterização do crime não é preciso que o gás seja mortal Se o gás não é tóxico ou asfixiante poderá o ato configurar contravenção penal art 38 da Lei das Contravenções Penais 9 Questões especiais O agente que com sua conduta visa expor a perigo de vida número determinado de pessoas pratica o delito constante do art 132 do CP Caso a intenção do sujeito ativo seja provocar a morte de certa pessoa responderá ele também pelo delito de homicídio qualificado art 121 2º III do CP em concurso formal O presente artigo admite suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada igual ou inferior a um ano Art 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais 10 Pena e ação penal As penas cominadas alternativamente são a reclusão de um a quatro anos e multa Se o crime for culposo a pena cominada será de detenção de três meses a um ano Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Proibição de uso da substância pela Resolução n 1900 da Anvisa Tratase do brometo de metila de gás liquefeito inflamável altamente tóxico incolor à temperatura e pressão ambiente e em razão de sua alta persistência na atmosfera a substância também é prejudicial à camada de ozônio Destarte o Brasil é signatário da Convenção de Viena para a Proteção da Camada de Ozônio 1985 e do Protocolo de Montreal 1987 promulgado e publicado no Brasil pelo Decreto n 99280 de 661990 comprometendose internacionalmente a reduzir e proibir substâncias dentre as quais o brometo de metila degradadoras da Camada de Ozônio Muito embora não haja hierarquia formal estrita entre os diversos atos administrativos exarados acerca da matéria que imponha a princípio o afastamento de um ou de outro o conflito deve se resolver favoravelmente ao ato emanado pela autoridade competente qual seja a da Anvisa carecendo os demais órgãos de legitimidade para tratar do assunto Outrossim a resolução deve preponderar pela precaução e preservação do meio ambiente proteção à camada de ozônio e à saúde toxicidade do produto na linha do compromisso assumido pelo Brasil nos atos internacionais TRF3ª Região Apelação em MS 200061000107981 Rel Alexandre Sormani j 3112007 Uso de gás tóxico ou asfixiante Réu denunciado na forma dolosa e condenado na modalidade culposa circunstância não compreendida explícita ou implicitamente na denúncia Sentença nula Se a nulidade da sentença não foi arguida no apelo a absolvição é um imperativo TJRS Apelação 70003453883 Rel Constantino Lisbôa de Azevedo j 1422002 Fabrico fornecimento aquisição posse ou transporte de explosivos ou gás tóxico ou asfixiante Art 253 Fabricar fornecer adquirir possuir ou transportar sem licença da autoridade substância ou engenho explosivo gás tóxico ou asfixiante ou material destinado à sua fabricação Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos e multa D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública particularmente o perigo comum que pode decorrer das condutas proibidas A simples exposição a perigo justifica a proteção uma vez que a eventual produção de dano é irrelevante para a caracterização do crime 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa independentemente de qualquer qualidade ou condição Sujeito passivo é a coletividade isto é o Estado que é por presunção titular da incolumidade pública 3 Tipo objetivo adequação típica São cinco as modalidades de condutas típicas alternativamente previstas 1 fabricar elaborar criar produzir 2 fornecer entregar a outrem a título gratuito ou oneroso 3 adquirir obter gratuita ou onerosamente 4 possuir ter sob guarda ou à disposição e 5 transportar conduzir ou remover de um lugar para outro A lei presume o perigo comum sendo dispensável a sua superveniência 31 Elemento normativo sem licença da autoridade Tais condutas devem ser realizadas sem licença de autoridade Tratase de elemento normativo referente à ausência de uma causa de justificação que uma vez presente exclui a tipicidade O desconhecimento da inexistência dessa licença ou mesmo o desconhecimento da necessidade de tal licença pode caracterizar erro de tipo 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de praticar qualquer das condutas descritas no tipo penal Não é necessário nenhum elemento subjetivo especial do tipo Não há previsão de modalidade culposa 5 Consumação e tentativa Consumase com a prática de qualquer das condutas típicas incriminadas A tentativa é de difícil configuração 6 Classificação doutrinária Tratase de crime de perigo abstrato comum doloso de conteúdo variável e vago 7 Questões especiais A contravenção do art 18 da Lei das Contravenções Penais é absorvida pelo crime descrito no presente artigo Se o fabrico de explosivos é meio para a prática do crime de dano qualificado art 163 parágrafo único II não se verifica o concurso material mas sim a absorção daquele por este vide RT 378226 e RF 223321 Vide arts 22 e 26 da Lei n 645377 que dispõe sobre a responsabilidade civil e criminal em se tratando de danos nucleares Vide ainda art 242 da Lei n 806990 Estatuto da Criança e do Adolescente 8 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são a detenção de seis meses a um ano e multa Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Posse ilegal de explosivos Art 16 parágrafo único inc III da Lei n 108262003 A prova oral colhida foi uníssona ao apontar que um dos réus em conjunção de esforços e conjugação de vontades com o outro transportou o material explosivo sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar incidindo nas sanções do art 16 parágrafo único inc III da Lei 108262003 recaindo suas condutas no verbo possuir exatamente como referido na denúncia já que a descrição contida nesse tipo penal não contempla a modalidade transportar A alegação de desconhecimento da necessidade de autorização para o transporte do material não vinga pois segundo preceitua o art 21 caput primeira parte do Código Penal o desconhecimento da lei é inescusável TJRS Apelação 70018142109 Rel Marco Antônio Ribeiro de Oliveira j 592007 O porte de artefato explosivo não enseja a competência federal face à inexistência de lesão a bens serviços ou interesses da União não se configurando também como crime contra a segurança nacional se a motivação não tinha natureza política Restando evidenciado o delito do art 253 do CP sobressai a competência da Justiça Comum Estadual STJ Conflito de Competência 21227RJ Rel Min Gilson Dipp j 16121998 Inundação Art 254 Causar inundação expondo a perigo a vida a integridade física ou o patrimônio de outrem Pena reclusão de 3 três a 6 seis anos e multa no caso de dolo ou detenção de 6 seis meses a 2 dois anos no caso de culpa D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública particularmente o perigo comum que pode decorrer da conduta proibida A simples exposição a perigo justifica a proteção pois a eventual produção de dano é irrelevante para a caracterização do crime 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa independentemente de qualidade ou condição Sujeito passivo é a coletividade ao lado das pessoas que têm sua vida e integridade física e patrimonial expostas a perigo pela inundação 3 Tipo objetivo adequação típica A conduta tipificada é causar dar causa motivar produzir inundação alagamento provocado pela saída de água de seus limites expondo a perigo concreto e efetivo a vida a integridade física ou o patrimônio alheio O crime pode ser praticado por ação ou omissão desde que na segunda hipótese haja o dever de evitar a inundação 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade de causar inundação tendo a consciência de que expõe a perigo a vida a integridade física ou patrimônio de outrem Não há previsão de elemento subjetivo especial do tipo Punese também a modalidade culposa 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a efetivação da inundação desde que dela decorra perigo concreto Mesmo que haja a inundação se houver o perigo real efetivo não se consumará este crime Admitese em tese a tentativa 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comum de perigo concreto e coletivo plurissubsistente pluriofensivo comissivo e omissivo 7 Forma culposa O próprio preceito secundário prevê atipicamente a modalidade culposa Caracterizarseá a forma culposa se a inundação decorrer da desatenção das regras de cuidados exigíveis pelas circunstâncias 8 Inundação e perigo de inundação Não há que confundir a tentativa de inundação com o crime de perigo de inundação art 255 A distinção entre ambos é feita pelo elemento subjetivo pois no perigo de inundação o agente não quer o alagamento nem assume o risco de produzilo 9 Questões especiais Se não se configura perigo à incolumidade pública a inundação poderá conforme o caso caracterizar o crime de usurpação de águas art 161 1º I ou dano art 163 Vide art 20 da Lei n 717083 na hipótese de devastamento atentatório à segurança nacional 10 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente para a conduta dolosa são a reclusão de três a seis anos e multa Para a modalidade culposa a pena é de detenção de seis meses a dois anos Ação penal pública incondicionada Perigo de inundação Art 255 Remover destruir ou inutilizar em prédio próprio ou alheio expondo a perigo a vida a integridade física ou o patrimônio de outrem obstáculo natural ou obra destinada a impedir inundação Pena reclusão de 1 um a 3 três anos e multa D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública particularmente o perigo comum que uma vez decorrer das condutas proibidas A simples exposição a perigo justifica a proteção uma vez que a eventual produção de dano é irrelevante para a caracterização do crime 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa Sujeito passivo é a coletividade em especial aqueles que têm sua vida e integridades física e patrimonial ameaçadas de dano 3 Tipo objetivo adequação típica São três as ações alternativamente previstas remover deslocar transpor transferir mudar de lugar destruir eliminar fazer desaparecer ou inutilizar tornar inútil inoperante ou imprestável O objeto material é o obstáculo natural ou obra destinada a impedir inundação cuja remoção destruição ou inutilização cause perigo concreto e efetivo à vida à integridade física ou ao patrimônio de outrem 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de praticar qualquer das condutas proibidas com a consciência de que pode expor a perigo a vida saúde ou integridade física ou patrimônio de outrem 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a prática de qualquer das condutas descritas criando o perigo comum independentemente da ocorrência efetiva da inundação É inadmissível teoricamente a tentativa 6 Questões especiais No crime em exame o sujeito ativo não quer a inundação embora tenha conhecimento do perigo de sua ocorrência Entendem alguns que a superveniência da inundação faz com que o agente responda pelo crime do art 255 em concurso formal com a modalidade deste artigo 7 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são a reclusão de um a três anos e multa Ação penal pública incondicionada Desabamento ou desmoronamento Art 256 Causar desabamento ou desmoronamento expondo a perigo a vida a integridade física ou o patrimônio de outrem Pena reclusão de 1 um a 4 quatro anos e multa Modalidade culposa Parágrafo único Se o crime é culposo Pena detenção de 6 seis meses a 1 um ano D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública particularmente o perigo comum que pode decorrer da conduta proibida A simples exposição a perigo justifica a proteção pois a eventual produção de dano é irrelevante para a caracterização do crime 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa Aqui se inclui até mesmo o dono do imóvel que sofre o desabamento Sujeitos passivos são a coletividade e aqueles diretamente lesados pelo desabamento ou desmoronamento 3 Tipo objetivo adequação típica A conduta incriminada consiste em causar originar produzir provocar desabamento ou desmoronamento O desabamento ou o desmoronamento podem ser totais ou parciais desde que motivem o aparecimento de perigo concreto para pessoas e bens Desabamento é a construção Desmoronamento é de solo é de terra é de rocha Magalhães Drumond Comentários ao Código Penal v 9 p 71 apud Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 9 p 49 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de provocar desabamento ou desmoronamento com a consciência de que haverá perigo para a incolumidade pública O dolo eventual também pode configurarse O fim especial do agente é irrelevante para a configuração deste crime 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a criação da situação de perigo concreto e comum quer pelo desabamento quer pelo desmoronamento Admite se teoricamente a tentativa 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comum de perigo concreto e coletivo material de forma livre comissivo ou omissivo e pluriofensivo 7 Forma culposa No parágrafo único há previsão da modalidade culposa quando o desabamento ou desmoronamento resulta da não observância pelo sujeito ativo do dever de cuidado necessário 8 Questões especiais Caso não sobrevenha risco à incolumidade pública poderá o desabamento caracterizar a contravenção prevista no art 29 da Lei das Contravenções Penais Se não houve perigo comum restringindose o desabamento com vítimas à área interna do terreno desclassificase para os arts 121 3º e 129 6º do CP Se o desabamento ou desmoronamento foi alcançado mediante emprego de explosivo com a consequente produção de perigo concreto é mister a aplicação do princípio da consumação respondendo o agente apenas pelo delito do art 251 Admitese a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada igual ou inferior a um ano Vide art 30 9 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são para o crime doloso reclusão de um a quatro anos e multa Para a forma culposa a pena cominada é a detenção de seis meses a um ano e multa Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Em se evidenciando na letra da denúncia e da sentença condenatória a causação culposa da morte e das lesões corporais dos operários da obra não há falar em configuração do delito previsto no art 256 do Código Penal mas sim nos crimes de homicídio e lesão corporal culposos STJ HC 34493SP Rel Min Hamilton Carvalhido j 3052006 Subtração ocultação ou inutilização de material de salvamento Art 257 Subtrair ocultar ou inutilizar por ocasião de incêndio inundação naufrágio ou outro desastre ou calamidade aparelho material ou qualquer meio destinado a serviço de combate ao perigo de socorro ou salvamento ou impedir ou dificultar serviço de tal natureza Pena reclusão de 2 dois a 5 cinco anos e multa D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública particularmente o perigo comum que pode decorrer das condutas proibidas A simples exposição a perigo justifica a proteção já que a eventual produção de dano é irrelevante para a caracterização do crime 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa incluindose o próprio proprietário do aparelho ou material de salvamento Sujeitos passivos são a coletividade e aqueles diretamente lesados pelas condutas proibidas 3 Tipo objetivo adequação típica São três as figuras típicas previstas neste artigo devendo ambas ocorrer por ocasião de incêndio inundação naufrágio ou outro desastre ou calamidade a subtrair tirar levar astuciosamente b ocultar encobrir esconder ou inutilizar destruir tornar inútil O objeto material é o aparelho material ou qualquer outro meio destinado a serviço de combate ao perigo de socorro ou salvamento c impedir obstar ou dificultar tornar difícil serviço de tal natureza Para tanto pode o agente utilizarse de quaisquer meios violência fraude ameaça 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de praticar qualquer das condutas incriminadas no tipo penal consciente da existência de inundação naufrágio ou outro desastre ou calamidade pública Não há exigência de qualquer elemento subjetivo especial do injusto Não há previsão de modalidade culposa 5 Consumação e tentativa Na primeira figura o crime se consuma com a efetiva subtração ocultação ou inutilização dos objetos descritos mesmo que não haja frustração de salvamento ou de socorro Admitese em tese a tentativa na segunda figura a consumação ocorre com o impedimento ou a dificultação da realização do serviço nessas hipóteses também é admissível a tentativa 6 Classificação doutrinária Tratase de crime de perigo abstrato comum doloso de conteúdo variado e de forma vinculada alternativa 7 Questões especiais O comportamento omissivo por si só não caracteriza este crime salvo se o omitente tiver o dever legal de impedir a produção do resultado art 13 2º Se o incêndio inundação ou naufrágio for resultado da conduta do agente poderá responder pelo crime em concurso material com o previsto no art 257 Caso o sujeito ativo tenha subtraído ou danificado o aparelho ou material alheio destinado ao socorro ou salvamento responderá pelo crime de furto art 155 ou dano art 163 em concurso material 8 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são reclusão de dois a cinco anos e multa Ação penal pública incondicionada Formas qualificadas de crime de perigo comum Art 258 Se do crime doloso de perigo comum resulta lesão corporal de natureza grave a pena privativa de liberdade é aumentada de metade se resulta morte é aplicada em dobro No caso de culpa se do fato resulta lesão corporal a pena aumentase de metade se resulta morte aplicase a pena cominada ao homicídio culposo aumentada de um terço D O U T R I N A 1 Crime qualificado pelo resultado A primeira parte do artigo descreve o delito qualificado pelo resultado ou preterdoloso em que a lesão corporal de natureza grave ou morte é imputada ao agente do crime doloso contra a incolumidade pública a título de culpa A segunda parte trata de lesão corporal ou morte provocada pelo atuar culposo do sujeito ativo do delito de perigo comum 2 Majoração da pena Na primeira parte o dispositivo comina pena privativa de liberdade aumentada até a metade no caso de lesão corporal de natureza grave e aplicada em dobro se resulta morte A segunda parte determina que em se tratando de lesão corporal a pena é aumentada de metade e na hipótese de morte aplicase a pena cominada ao homicídio culposo aumentada de um terço 3 Concurso de crimes Em havendo várias vítimas responderá o agente por apenas um delito qualificado pelo resultado excluindose o concurso formal nesse sentido JTACrimSP 84211 RT 599370 Se o crime resulta com morte e lesão corporal aplicase a qualificadora da morte por ser mais grave nesse sentido JTACrimSP 84211 J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Penabase cálculo Incêndio Cód Penal art 250 1º I Habeas corpus correção da pena No cálculo da penabase o juiz há de dar toda atenção às circunstâncias estabelecidas pelo art 59 do Código Penal Unicamente a elas é o que a melhor técnica recomenda Quando a circunstância por si só já qualifica o crime não pode ela ingressar no processo mental da primeira fase de fixação da pena Non bis in idem STJ HC 42273MG Rel Min Nilson Naves j 1422006 Incêndio Prova pericial Desclassificação Se a acusação imputa a ação de atear fogo em casa habitada provocando incêndio no qual ocorreu a morte de uma pessoa e lesão corporal grave em outra o crime a ser identificado é o do art 250 1º II a combinado com o art 258 e não o do art 121 2º III tudo do Código Penal A distinção entre uma hipótese e outra se estabelece fundamentalmente pela indeterminação das pessoas que possam ser vitimadas Nesse tipo de infração é imprescindível além dos laudos necroscópico e de lesão o de incêndio pena de nulidade TJRS Recurso Crime 683048870 Rel Gilberto Niederauer Corrêa j 92 1984 Difusão de doença ou praga Art 259 Difundir doença ou praga que possa causar dano a floresta plantação ou animais de utilidade econômica Pena reclusão de 2 dois a 5 cinco anos e multa Modalidade culposa Parágrafo único No caso de culpa a pena é de detenção de 1 um a 6 seis meses ou multa D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública particularmente o perigo comum resultante de doenças e pragas que possam causar danos a florestas plantações ou animais de utilidade econômica A simples exposição a perigo justifica a proteção pois a eventual produção de dano é irrelevante para a caracterização do crime e se ocorrer representará apenas o exaurimento do crime 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa incluindose o próprio proprietário de floresta plantações ou animais Sujeitos passivos são a coletividade e aqueles diretamente lesados pelas condutas proibidas A incolumidade pública 3 Tipo objetivo adequação típica Difundir significa espalhar disseminar propagar Doença é a perturbação a alteração da saúde ou ainda o processo que causa enfraquecimento ou morte dos animais no caso deve tratarse de doença grave isto é de moléstia grave e transmissível ex peste bubônica febre aftosa lagarta das plantas gelequídeo Praga é qualquer outro mal grave que atinge a coletividade de plantas ou animais praga à semelhança da epidemia é um surto maléfico e transeunte capaz de danificar floresta plantação ou animais de utilização econômica 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de difundir doença ou praga tendo consciência de causar perigo comum Não há necessidade de qualquer elemento subjetivo especial do injusto Punese também a modalidade culposa 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a real difusão de doença ou praga desde que seja potencialmente lesiva isto é desde que seja idônea a causar dano a floresta plantação ou animais Não é necessária a comprovação real do perigo comum sendo suficiente sua idoneidade perigosa Admitese teoricamente a tentativa 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comum de perigo abstrato material unissubjetivo plurissubsistente de forma livre 7 Forma culposa A modalidade culposa está prevista no parágrafo único e ocorre quando a difusão é produto de desatenção do agente ao cuidado exigível pelas circunstâncias 8 Questões especiais O presente artigo segundo Regis Prado foi tacitamente revogado pelo disposto no art 61 da Lei n 960598 Lei dos Crimes Ambientais que comina pena de reclusão de um a quatro anos e multa para o agente que disseminar doença ou praga ou espécies que possam causar dano à agricultura à pecuária à fauna à flora ou aos ecossistemas Crimes contra o ambiente São Paulo Revista dos Tribunais 1998 p 160 e s Para caracterizar este delito é preciso que a difusão afete número considerável de plantas ou animais Admite suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada inferior a um ano Vide Lei n 477165 Código Florestal e Lei n 5197 proteção à fauna Consultar ainda no tocante ao parágrafo único arts 60 61 e 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais 9 Pena e ação penal As penas cominadas para a forma dolosa são reclusão de dois a cinco anos e multa para a forma culposa a pena é de detenção de um a seis meses ou multa Ação penal pública incondicionada Capítulo II Dos Crimes contra a Segurança dos Meios de Comunicação e Transporte e outros Serviços Públicos Perigo de desastre ferroviário Art 260 Impedir ou perturbar serviço de estrada de ferro I destruindo danificando ou desarranjando total ou parcialmente linha férrea material rodante ou de tração obra de arte ou instalação II colocando obstáculo na linha III transmitindo falso aviso acerca do movimento dos veículos ou interrompendo ou embaraçando o funcionamento de telégrafo telefone ou radiotelegrafia IV praticando outro ato de que possa resultar desastre Pena reclusão de 2 dois a 5 cinco anos e multa Desastre ferroviário 1º Se do fato resulta desastre Pena reclusão de 4 quatro a 12 doze anos e multa 2º No caso de culpa ocorrendo desastre Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos 3º Para os efeitos deste artigo entendese por estrada de ferro qualquer via de comunicação em que circulem veículos de tração mecânica em trilhos ou por meio de cabo aéreo D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública em especial a segurança dos meios de transporte de comunicações e outros serviços públicos 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa inclusive empregados ou funcionários da empresa ferroviária Sujeito passivo é o Estado isto é a coletividade assim como os titulares dos bens jurídicos lesados pelas condutas proibidas 3 Tipo objetivo adequação típica Tratase de crime de ação múltipla ou de conteúdo variado A conduta típica consiste em impedir interromper obstruir ou perturbar alterar modificar atrapalhar serviços de transporte por estrada de ferro 3º de modo que possa resultar em desastre ferroviário Além dos exemplos dos incisos I a III o crime pode ser praticado por qualquer ato IV sendo necessária a ocorrência de perigo concreto Entendese por desastre todo o acidente grave ou complexo que expõe a perigo a incolumidade de pessoas e a integridade de coisas de maneira indeterminada sem que se exija um acontecimento extraordinário excepcional e que ocasione a comoção pública Fragoso Lições de Direito Penal Parte Especial 3 ed Rio de Janeiro Forense 1981 p 184 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de praticar qualquer das condutas incriminadas ou seja a vontade de impedir ou perturbar perigosamente serviço de estrada de ferro tendo consciência de poder ocasionar desastre ferroviário É indispensável a consciência do perigo de desastre embora este não seja objeto da vontade do agente 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a real situação de perigo ou seja com a superveniência do perigo de desastre Não se trata pois de perigo abstrato mas de perigo concreto real efetivo que se caracteriza com a probabilidade da ocorrência de desastre As condutas tipificadas mesmo realizadas podem in concreto não acarretar qualquer probabilidade de desastre deixando nesse caso de configurarse o crime Admitese em tese a tentativa 6 Classificação doutrinária Tratase de crime de perigo concreto material comissivo ou omissivo e de forma livre 7 Forma qualificada Está prevista uma figura de crime preterdoloso o tipobase prevê um crime de perigo concreto que se evoluir para um dano desastre não representará simples exaurimento mas constituirá uma figura qualificada ou seja um crime de dano na forma preterdolosa 1º 8 Forma culposa Está prevista também a modalidade culposa quando ocorre o desastre em razão de imprudência negligência ou imperícia ou seja quando o sujeito ativo age com inobservância do cuidado objetivo exigido pelas circunstâncias 2º 9 Atividade de cunho político A conduta que tem como objetivo simular uma situação de perigo será quando muito punida a título de culpa Caso se observe cunho político na ação do sujeito devese verificar o art 15 da Lei n 717083 Lei de Segurança Nacional 10 Questões especiais O crime de perigo de desastre ferroviário absorve o previsto no art 266 quando for provocado pela omissão de aviso decorrente de impedimento ou embaraço de serviço telegráfico telefônico ou radiotelegráfico Nélson Hungria Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro Forense 1959 v 9 p 65 Vide arts 258 e 263 do Código Penal caso resulte morte ou lesão corporal em alguém Vide art 29 da Lei n 960598 Lei dos Crimes Ambientais Lei n 411762 Código Brasileiro de Telecomunicações e art 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais 11 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente para o caput são reclusão de dois a cinco anos e multa para a figura qualificada são reclusão de quatro a doze anos e multa para a forma culposa é de detenção de seis meses a dois anos Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Desastre ferroviário Via férrea administrada por sociedade de economia mista Competência estadualfederal A segurança dos meios de transporte em princípio não constitui interesse próprio da União nem envolve seus serviços Sociedade de economia mista não justifica se desloque a competência para a área federal Caso de perigo de desastre ferroviário a ser então processado na esfera estadual STJ Conflito de Competência 45652SP Rel Min Nilson Naves j 2292004 Atentado contra a segurança de transporte marítimo fluvial ou aéreo Art 261 Expor a perigo embarcação ou aeronave própria ou alheia ou praticar qualquer ato tendente a impedir ou dificultar navegação marítima fluvial ou aérea Pena reclusão de 2 dois a 5 cinco anos Sinistro em transporte marítimo fluvial ou aéreo 1º Se do fato resulta naufrágio submersão ou encalhe de embarcação ou a queda ou destruição de aeronave Pena reclusão de 4 quatro a 12 doze anos Prática do crime com o fim de lucro 2º Aplicase também a pena de multa se o agente pratica o crime com intuito de obter vantagem econômica para si ou para outrem Modalidade culposa 3º No caso de culpa se ocorre o sinistro Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública especialmente a segurança dos meios de transportes marítimo fluvial e aéreo 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa até mesmo o proprietário da embarcação ou aeronave Sujeito passivo é a coletividade isto é o Estado e em ocorrendo sinistro também os titulares dos bens jurídicos ofendidos 3 Tipo objetivo adequação típica São previstas duas modalidades de conduta a expor colocar pôr a perigo embarcação ou aeronave b praticar realizar executar qualquer ato que vise impedir interromper obstruir ou dificultar tornar difícil custoso a navegação marítima fluvial ou aérea excluída a lacustre Embarcação é entendida como não apenas o navio propriamente dito senão também qualquer outra construção flutuante destinada a transporte coletivo de pessoas ou coisas seja qual for a sua força motriz sua forma ou composição Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 9 p 80 Aeronave é qualquer aparelho capaz de transportar pessoas ou coisas pelo espaço 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de expor a perigo embarcação ou aeronave própria ou alheia ou praticar qualquer ato tendente a impedir ou dificultar navegação marítima fluvial ou aérea Não há exigência de elemento subjetivo especial do injusto Se houver contudo o especial fim de obter vantagem econômica será aplicada cumulativamente a pena de multa 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com criação efetiva do estado de perigo ou seja com a probabilidade de dano ou desastre consequente da ação praticada É irrelevante que a embarcação ou aeronave encontrese em movimento ou estacionada A tentativa é teoricamente admissível 6 Classificação doutrinária Tratase de crime de perigo concreto material de dano 1º de forma livre plurissubsistente e de tendência 2º 7 Forma qualificada A ocorrência de naufrágio perda submersão afundamento ou encalhe impedimento a flutuação de embarcação ou queda precipitação ao solo ou água ou destruição assolamento despedaçamento de aeronave qualificam o crime na forma preterdolosa 8 Forma culposa Quando sobrevém desastre em decorrência da inobservância do cuidado objetivo exigido pelas circunstâncias 3º 9 Questões especiais Quando a destruição total ou parcial de embarcação ou aeronave se der por incêndio ou explosão configurase o delito do art 250 1º II c ou do art 251 2º Compreende a expressão vantagem econômica várias hipóteses entre elas o dinheiro Vide arts 252 e 262 do CP Vide art 15 da Lei n 717083 Lei de Segurança Nacional e art 35 do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais 10 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente para a hipótese do caput é reclusão de dois a cinco anos para a forma qualificada é de reclusão de quatro a doze anos 1º na figura majorada é acrescida pena de multa 2º À forma culposa cominase pena de detenção de seis meses a dois anos Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Não ofende o princípio do ne bis in idem o fato dos controladores de voo estarem respondendo a processo na Justiça Militar e na Justiça comum pelo mesmo fato da vida qual seja o acidente aéreo que ocasionou a queda do Boeing 737800 da Gol Linhas Aéreas no Município de Peixoto de Azevedo no Estado do Mato Grosso com a morte de todos os seus ocupantes uma vez que as imputações são distintas STJ Conflito de Competência 91016MT Rel Min Paulo Gallotti j 2722008 Atentado contra a segurança de transporte marítimo Modalidade culposa Pela prova dos autos a conduta do réu revela a materialidade a autoria e a culpabilidade pelo crime de atentado contra a segurança de transporte marítimo Manutenção da decisão que condenou o réu nas penas do art 261 3º do Código Penal pois houve culpa consciente O capitão agiu com negligência e imperícia ao decidir levar o navio até o porto de desembarque e tentar evitar o resultado danoso que foi o naufrágioencalhe TRF4ª Região Apelação 199804010945043 Rel Amir José Finocchiaro Sarti j 861999 Atentado contra a segurança de outro meio de transporte Art 262 Expor a perigo outro meio de transporte público impedirlhe ou dificultarlhe o funcionamento Pena detenção de 1 um a 2 dois anos 1º Se do fato resulta desastre a pena é de reclusão de 2 dois a 5 cinco anos 2º No caso de culpa se ocorre desastre Pena detenção de 3 três meses a 1 um ano D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública em especial a segurança dos meios de transportes 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa incluindose o proprietário dos veículos de transporte público Sujeito passivo é a coletividade por meio do Estado havendo sinistros também os titulares dos bens jurídicos lesados 3 Tipo objetivo adequação típica São duas as condutas incriminadas a expor a perigo b impedir ou dificultar o funcionamento O objeto material é outro meio de transporte público aqueles não mencionados pelo art 261 do CP como embarcações lacustres ônibus etc Considerase transporte público não apenas o que é exercido pelo Estado ou autarquia mas todo aquele que serve ao interesse público ainda que explorado por empresa particular concessionária do Poder Público 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de expor a perigo transporte público É possível o dolo eventual Nas figuras de impedir ou dificultar é necessário que o agente tenha consciência de criar perigo comum embora este não seja objeto de sua vontade 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a efetiva superveniência da situação de perigo de desastre expondo número indeterminado de pessoas A tentativa é admitida 6 Forma qualificada Está prevista uma figura de crime preterdoloso o tipobase prevê um crime de perigo concreto que se evoluir para um dano desastre não representará simples exaurimento mas constituirá uma figura qualificada ou seja um crime de dano na forma preterdolosa 1º 7 Forma culposa Quando o desastre provier de desatenção do agente ao cuidado objetivo necessário nas circunstâncias configurará a modalidade culposa 8 Questões especiais Vide arts 263 e 258 do CP Se o agente tem como objetivo matar uma pessoa determinada há concurso com o art 121 do CP homicídio O caput e o 2º admitem a suspensão condicional do processo em razão das penas mínimas abstratamente cominadas igual ou inferior a um ano Vide art 15 da Lei n 717083 Lei de Segurança Nacional arts 60 61 e 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais art 27 da Lei n 645377 responsabilidade civil e criminal por danos nucleares 9 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é detenção de um a dois anos caput A forma qualificada comina pena de reclusão de dois a cinco anos Para a forma culposa a pena é de detenção de três meses a um ano Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A O art 262 do CP tutela a incolumidade pública e especialmente os meios de transporte Expõe a perigo por meio de transporte quem de forma rudimentar e caseira adapta seu veículo a GLP Havendo na adaptação feita pequenos vazamentos de gás no interior do veículo perigo real é o que basta para tipificar o crime do art 262 do CP pois porventura ocorrendo explosão o crime é outro mais grave TACrimSP Apelação 4328474 Rel Brenno Marcondes JTACrimSP 87402 Forma qualificada Art 263 Se de qualquer dos crimes previstos nos arts 260 a 262 no caso de desastre ou sinistro resulta lesão corporal ou morte aplicase o disposto no art 258 D O U T R I N A Tratase de forma qualificada que abrange os artigos antecedentes 260 a 262 se resulta lesão corporal ou morte Estabelece a aplicação nesses artigos do disposto no art 258 do CP quando do sinistro ou desastre ocorrer morte ou lesão corporal em algum indivíduo Arremesso de projétil Art 264 Arremessar projétil contra veículo em movimento destinado ao transporte público por terra por água ou pelo ar Pena detenção de 1 um a 6 seis meses Parágrafo único Se do fato resulta lesão corporal a pena é de detenção de 6 seis meses a 2 dois anos se resulta morte a pena é a do art 121 3º aumentada de um terço D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública especialmente a segurança dos meios de transporte público terrestres aéreos e fluviais ou marítimos 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa Sujeito passivo é o Estado ou seja a coletividade constituída por um número indeterminado de pessoas ou coisas 3 Tipo objetivo adequação típica A ação típica é arremessar atirar lançar com força projétil qualquer coisa ou objeto sólido e pesado que se lança no espaço O arremesso deve ser feito contra veículo de transporte público em movimento observado nessa condição maior perigo O transporte pode estar sendo realizado por terra água ou ar Somente veículo de transporte público em movimento pode ser objeto deste crime Assim não o tipificará o arremesso de projétil a veículo particular ou estacionado 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de arremessar projétil contra veículo de transporte público com a consciência de que pode causar perigo comum 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com o simples arremesso não sendo necessário que o objeto atinja o alvo desde que se trate de objeto idôneo a produzir perigo comum Ao contrário dos crimes descritos nos artigos anteriores tratase de perigo abstrato ou presumido Não se admite a tentativa 6 Classificação doutrinária Tratase de crime de perigo abstrato instantâneo unissubjetivo unissubsistente comissivo e de mera conduta 7 Forma qualificada Está prevista uma figura de crime preterdoloso o tipobase prevê um crime de perigo abstrato que se evoluir para um dano lesão corporal ou morte não representará simples exaurimento mas constituirá uma figura qualificada ou seja um crime de dano na forma preterdolosa dolo culpa parágrafo único 8 Questões especiais Para a configuração do crime exigese que o projétil seja capaz de causar dano a pessoa ou coisas ou seja idôneo para produzir perigo Caso o agente tenha como objetivo atingir pessoa determinada responde pelo crime previsto no art 121 ou 129 do CP O arremesso é compreendido em sentido amplo feito manualmente ou em qualquer aparelho como arma de fogo Em veículo estacionado não tem razão de ser pode configurar crime de dano Admite a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada inferior a um ano Vide arts 28 e 37 do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais arts 60 61 e 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais 9 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é detenção de um a seis meses para a figura preterdolosa as penas são de seis meses a dois anos lesão corporal e se resulta morte a pena é a mesma do homicídio culposo art 121 3º elevada de um terço Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Transporte de passageiros arremesso de objeto para o interior do veículo lesão em passageiro fato de terceiro excludente de responsabilidade A presunção de culpa da transportadora pode ser ilidida pela prova de ocorrência de fato de terceiro comprovadas a atenção e cautela a que está obrigada no cumprimento do contrato de transporte a empresa O arremesso de objeto de fora para dentro do veículo não guarda conexidade com a atividade normal do transportador Sendo ato de terceiro exclui a responsabilidade do transportador pelo dano causado ao passageiro Precedentes STJ REsp 231137RS Rel Min Castro Filho j 29102003 Arremesso de projétil Se a prova testemunhal constante nos autos está a indicar o denunciado como autor do delito mormente quando uma das testemunhas arroladas pela defesa confirma a presença do acusado no local do delito impossível se mostra o deferimento do pleito absolutório TJDF Apelação 20010310050544 Rel Gilberto de Oliveira j 1792002 Arremesso de projétil Lançamento de pedras contra ônibus durante movimento grevista Causação de ferimentos no motorista e numa passageira Conjunto probatório indicativo da autoria do lançamento das pedras que produziram lesões nas vítimas Pena corporal substituída por multa Sentença condenatória devidamente fundamentada Recurso improvido TJDF Apelação 1568595 Rel Carlos Augusto Faria j 26101995 Atentado contra a segurança de serviço de utilidade pública Art 265 Atentar contra a segurança ou o funcionamento de serviço de água luz força ou calor ou qualquer outro de utilidade pública Pena reclusão de 1 um a 5 cinco anos e multa Parágrafo único Aumentarseá a pena de um terço até a metade se o dano ocorrer em virtude de subtração de material essencial ao funcionamento dos serviços D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública em especial dos serviços públicos tais como água luz força ou calor entre outros de utilidade pública 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa inclusive o próprio fornecedor funcionário que exerça atividades relativas aos serviços de utilidade pública Sujeito passivo é o Estado ou seja a coletividade além dos titulares dos bens jurídicos atingidos pela conduta criminosa 3 Tipo objetivo adequação típica A ação delituosa consiste em atentar contra a segurança tornando incerta ou insegura a prestação dos serviços ou contra o funcionamento destes de modo que possa perturbar sua real atividade com risco de paralisação Atentar contra a segurança é tornar insegura a operação de serviço tornandoo perigoso atentar contra o funcionamento é colocar o serviço em risco de paralisação 31 Espécies de serviços públicos Os serviços mencionados são os de água luz força ou calor mas com a expressão qualquer outro de utilidade pública o tipo abrange ainda os serviços de gás limpeza hospitalares etc 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente dirigida à prática do atentado com consciência de criar perigo comum Não há exigência de elemento subjetivo especial do injusto Se o ato tiver cunho político ou ideológico poderá atentar contra a Lei de Segurança Nacional 5 Consumação e tentativa Consumase o crime quando o sujeito executa qualquer ato idôneo a perturbar a segurança ou o funcionamento dos serviços de utilidade pública Tratase de crime de perigo abstrato configurandose com a simples ação ainda que não se demonstre a efetiva probabilidade de dano Admitese embora de difícil configuração e demonstração a tentativa 6 Classificação doutrinária Tratase de crime de perigo abstrato instantâneo unissubjetivo plurissubsistente de forma livre e formal 7 Forma majorada Será majorada 13 até metade quando o agente causar dano à prestação dos serviços decorrente da subtração furto de material essencial à atividade parágrafo único 8 Questões especiais Vide art 15 da Lei n 717083 se o objetivo é perturbar a ordem políticosocial É irrelevante que o serviço seja oferecido por entidade pública ou particular Em caso de sociedade de economia mista concessionária de serviço público estadual a competência é da Justiça Estadual A infração prevista no caput admite suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada igual a um ano Vide art 27 da Lei n 645377 responsabilidade civil e criminal por danos nucleares Quando o meio de execução para a prática do crime for fogo ou explosivo configura se o delito do art 250 incêndio ou do art 251 explosão do CP 9 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são reclusão de um a cinco anos e multa Na forma majorada a pena é aumentada de um terço até a metade Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Atentado contra a segurança de serviço de utilidade publica art 265 CP Recorrentes condenados em 1 um ano de reclusão reconhecimento da prescrição da punibilidade pela prescrição superveniente exame de mérito prejudicado STJ REsp 97132RJ Rel Min Anselmo Santiago j 1861998 Interrupção ou perturbação de serviço telegráfico ou telefônico Art 266 Interromper ou perturbar serviço telegráfico radiotelegráfico ou telefônico impedir ou dificultarlhe o restabelecimento Pena detenção de 1 um a 3 três anos e multa Parágrafo único Aplicamse as penas em dobro se o crime é cometido por ocasião de calamidade pública D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a regularidade nos serviços telegráficos radiotelegráficos ou telefônicos relativo à incolumidade pública 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa inclusive aquela que executa os referidos serviços Sujeito passivo é o Estado ou seja a coletividade 3 Tipo objetivo adequação típica As condutas incriminadas são a interromper fazer parar cessar ou perturbar modificar atrapalhar desorganizar a realização dos serviços b impedir interromper não permitir ou dificultar tornar difícil custoso o seu restabelecimento O objeto material é o serviço telegráfico radiotelegráfico ou telefônico Telégrafo é a instalação que permite a transmissão de mensagens a distância por meio de um código de sinais através dos fios no radiotelégrafo as mensagens são emitidas através de ondas eletromagnéticas e o telefone é o aparelho capaz de reproduzir a distância a palavra falada bem como os sons 31 Abrangência do tipo penal Não se trata de interromper ou perturbar o funcionamento de um aparelho telegráfico ou telefônico ou dificultar ou impedir determinada comunicação art 151 1º III do CP mas se trata da interrupção ou perturbação do serviço telegráfico ou telefônico como um todo isto é tratase de ato capaz de perturbar o funcionamento de todo o sistema telegráfico ou telefônico ou pelo menos de parte dele 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de interromper ou perturbar qualquer dos serviços enumerados no tipo penal impedir ou dificultar seu restabelecimento podendo atingir número indeterminado de pessoas Não há necessidade de qualquer elemento subjetivo especial do tipo 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a interrupção ou perturbação da prática de qualquer das condutas previstas no tipo penal ou quando o sujeito ativo consegue impedir ou dificultar seu restabelecimento A despeito de tratarse de crime de perigo abstrato admitese teoricamente a tentativa 6 Classificação doutrinária Tratase de crime de perigo comum e abstrato comissivo ou omissivo formal e de forma livre e unissubjetivo 7 Forma majorada A pena é majorada em dobro quando a prática do crime se der por ocasião de calamidade pública catástrofe infortúnio 8 Questões especiais Se o sujeito tem por fim interromper ou perturbar a comunicação entre pessoas determinadas podese configurar o crime previsto no art 151 1º III do CP Vide art 15 da Lei n 717083 fins políticos art 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais art 41 do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais e Lei n 411762 Código Brasileiro de Telecomunicações A enumeração dos serviços prevista no tipo é taxativa não se admitindo a analogia com o serviço postal ou radiotelefônico Pratica o crime o sujeito que aplica violência contra as instalações e aparelhos bem como contra o pessoal dos serviços mencionados no tipo Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 9 p 89 9 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são detenção de um a três anos e multa Para a figura majorada é cominada pena em dobro Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Perturbação de serviço telefônico O agente que liga para o n 190 a fim de passar um trote ofendendo os policiais militares que lá trabalham não comete o crime previsto no art 266 do CP que exige a presença do dolo específico qual seja a vontade livre e consciente de perturbar o serviço telefônico Absolvição decretada TJRS Apelação 70008081531 Rel Constantino Lisbôa de Azevedo j 652004 Capítulo III Dos Crimes contra a Saúde Pública Epidemia Art 267 Causar epidemia mediante a propagação de germes patogênicos Pena reclusão de 10 dez a 15 quinze anos 1º Se do fato resulta morte a pena é aplicada em dobro 2º No caso de culpa a pena é de detenção de 1 um a 2 dois anos ou se resulta morte de 2 dois a 4 quatro anos D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é a incolumidade pública particularmente em relação à saúde pública 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa independentemente de qualquer qualidade ou condição especial Sujeito passivo é o Estado isto é a coletividade bem como as eventuais pessoas efetivamente atingidas pela epidemia 3 Tipo objetivo adequação típica A ação tipificada é causar provocar produzir originar epidemia mediante a propagação ato de multiplicar espalhar disseminar de germes patogênicos Por epidemia entendese o surto de uma doença acidental e transitória que ataca um grande número de indivíduos ao mesmo tempo em determinado país ou região Bento de Faria Código Penal brasileiro comentado Rio de Janeiro Record 1961 v 6 p 253 Germes patogênicos são apenas os seres unicelurares que produzem moléstias infecciosas É irrelevante o modo de propagação utilizado pelo agente desde que seja idôneo para contagiar inúmeras pessoas 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo geral é o dolo representado pela vontade consciente de praticar a ação tendente a causar epidemia e o elemento subjetivo especial do tipo consiste no especial fim de causar epidemia com a propagação de germes patogênicos A falta do elemento subjetivo especial afasta a tipicidade deste crime podendo dar lugar a outro crime por exemplo envenenamento de água potável 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a efetiva propagação da epidemia ou seja quando numerosas pessoas são acometidas pela doença Admitese em tese a tentativa 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comum de perigo concreto e coletivo plurissubsistente comissivo ou omissivo e hediondo 7 Forma qualificada Está prevista uma figura de crime preterdoloso o tipobase prevê um crime de perigo abstrato que se evoluir para um dano morte não representará simples exaurimento mas constituirá uma figura qualificada ou seja um crime de dano na forma preterdolosa dolo culpa parágrafo único Nesse caso aplicase a pena em dobro 1º 8 Forma culposa A modalidade culposa ocorre quando a epidemia causadora da morte decorre de inobservância do cuidado objetivo exigido pelas circunstâncias 2º 9 Questões especiais Caso a intenção do agente seja a de contaminar certa pessoa poderá responder pelo delito do art 131 do CP A forma qualificada prevista no 1º é a considerada crime hediondo nos termos da Lei n 807290 art 1º A modalidade culposa descrita na primeira parte do 2º admite a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada igual a um ano Vide art 1º III i da Lei n 796089 prisão temporária art 1º da Lei n 807290 crimes hediondos art 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais Urge não confundir epidemia com pandemia e endemia Convém esclarecer que se a disseminação se dá por extensa área do globo terrestre haverá pandemia Se a doença infecciosa é própria de certa localidade ou aí se instala e permanece dizse endemia E Magalhães Noronha Direito Penal São Paulo Saraiva 1986 v 4 p 5 10 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é reclusão de dez a quinze anos se ocorrer morte preterdolosa a pena será duplicada se a epidemia decorrer de culpa a pena é de detenção de um a dois anos se da culpa resultar morte a pena é de detenção de dois a quatro anos Infração de medida sanitária preventiva Art 268 Infringir determinação do poder público destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa Pena detenção de 1 um mês a 1 um ano e multa Parágrafo único A pena é aumentada de um terço se o agente é funcionário da saúde pública ou exerce a profissão de médico farmacêutico dentista ou enfermeiro D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é a incolumidade pública particularmente em relação à saúde pública 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa independentemente de qualquer qualidade ou condição especial Sujeito passivo é o Estado isto é a coletividade bem como as eventuais pessoas efetivamente atingidas pela epidemia 3 Tipo objetivo adequação típica A conduta nuclear tipificada é representada pelo verbo infringir que tem o sentido de quebrantar transgredir violar As determinações do Poder Público são materializadas através de leis decretos regulamentos portarias emanados de autoridade competente visando impedir a introdução ou propagação de doença contagiosa suscetível de transmitirse por contato mediato ou imediato 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de infringir as determinações do Poder Público Não há necessidade de qualquer elemento subjetivo especial do injusto nem previsão de modalidade culposa 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a simples desobediência a determinação do Poder Público destinada a impedir a introdução ou propagação de doença contagiosa Embora se trate de crime de perigo abstrato admitese teoricamente a possibilidade de configurarse a tentativa 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comum formal de perigo abstrato e coletivo comissivo ou omissivo unissubjetivo doloso 7 Forma majorada Ocorre se o sujeito ativo é funcionário da saúde pública ou exerce a profissão de médico dentista ou enfermeiro convém acrescentar que para a incidência da majorante é necessário que haja o descumprimento de especial dever que incumba ao agente no caso concreto em razão do cargo ou profissão 8 Questões especiais Tratase de norma penal em branco visto que o seu complemento é ditado por lei ou atos administrativos emanados do Poder Público Admite a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada inferior a um ano Vide art 9º da Lei n 764988 banco de sangue art 16 da Lei n 780289 agrotóxicos arts 228 e 229 da Lei n 806990 Estatuto da Criança e do Adolescente 9 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são detenção de um mês a um ano e multa Configurandose a majorante tal pena é aumentada de um terço Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Infração de medida preventiva sanitária A pena máxima cominada a esse delito é um ano de reclusão e o fato narrado na denúncia ocorreu em 2072002 Diante de tais circunstâncias é imperativo o reconhecimento da prescrição abstrata da pretensão punitiva estatal TJRS Apelação 70012435467 Rel Lúcia de Fátima Cerveira j 1712007 O delito do art 268 do CP contém norma penal em branco impondose pois para a sua configuração que se demonstre qual a determinação do poder público descumprida TACrimSP Apelação 143065 Rel Rafael Granato j 16121976 Omissão de notificação de doença Art 269 Deixar o médico de denunciar à autoridade pública doença cuja notificação é compulsória Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos e multa D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública particularmente a seriedade que deve orientar o atendimento da saúde pública 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo é apenas o médico tratandose por conseguinte de crime próprio Sujeito passivo é a coletividade 3 Tipo objetivo adequação típica Deixar o médico de denunciar significa a omissão do médico em comunicar à autoridade pública a existência de doença cuja notificação é compulsória ou seja o médico infringe o dever legal que lhe cabe por lei ou ato administrativo de comunicar à autoridade competente a ocorrência de doença cuja notificação é compulsória 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de omitir a comunicação à autoridade pública sobre a existência de doença cuja notificação é compulsória Não há previsão de modalidade culposa 5 Consumação e tentativa Consumase com a não comunicação no prazo estipulado em regulamento ou ato normativo ou quando não previsto prazo com a prática de ato incompatível com o dever de denunciar Não se admite a tentativa 6 Classificação doutrinária É crime próprio omissivo puro e de perigo abstrato e coletivo 7 Questões especiais Será obrigatória a notificação das doenças profissionais e das produzidas por condições especiais de trabalho comprovadas ou suspeitas art 169 da CLT Embora se verifique a violação do segredo profissional com a comunicação feita pelo médico esta não caracteriza o crime do art 154 do CP devido à ausência do elemento normativo do tipo sem justa causa que exclui a tipicidade da conduta Tratase de norma penal em branco complementada por lei ou ato administrativo Vide Lei n 625975 organização das ações de vigilância epidemiológica sobre o Programa Nacional de Imunizações estabelece normas relativas à notificação compulsória de doenças Lei n 643777 Dec n 7823176 regulamenta a Lei n 625975 Portaria n 110096 do Ministério de Estado da Saúde relaciona as doenças de notificação compulsória 8 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é detenção de seis meses a dois anos Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Desobediência Delito caracterizado em tese Médico que em nome do sigilo profissional se recusa a fornecer esclarecimento à Justiça acerca de crime de que fora vítima a sua paciente Inquérito entretanto instaurado por solicitação desta Ausência pois de constrangimento ilegal Habeas corpus denegado Inteligência dos arts 330 269 e 154 do CP O dever de guardar segredo profissional não é absoluto O que a lei proíbe é a revelação ilegal a que tenha por móvel a simples leviandade a jactância a maldade TJSP HC 136052 Rel Martins Bonilha j 95 1978 Omissão de notificação de doença Febre tifoide Imputação a farmacêutico A denúncia à autoridade pública de doença cuja notificação é compulsória só é exigível do médico e não também do farmacêutico TACrimSP Apelação Rel Rafael Granato RT 492355 Envenenamento de água potável ou de substância alimentícia ou medicinal Art 270 Envenenar água potável de uso comum ou particular ou substância alimentícia ou medicinal destinada a consumo Pena reclusão de 10 dez a 15 quinze anos 1º Está sujeito à mesma pena quem entrega a consumo ou tem em depósito para o fim de ser distribuída a água ou a substância envenenada Modalidade culposa 2º Se o crime é culposo Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos D O U T R I N A Alteração legislativa a pena cominada foi prevista pela Lei n 807290 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública particularmente em relação à saúde pública 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa inclusive o proprietário da água ou da substância alimentícia ou medicinal quando essa substância for destinada a consumo Sujeito passivo é o Estado representando a coletividade 3 Tipo objetivo adequação típica A ação tipificada é envenenar colocar veneno sendo este a substância mineral ou orgânica que absorvida causa a morte ou dano sério ao organismo Celso Delmanto Código Penal comentado 3 ed Rio de Janeiro Renovar 1991 p 417 Objeto material são a água potável de uso comum ou particular é a água destinada à alimentação podendo ser de uso público ou particular b substância alimentícia destinada a consumo é toda aquela que sólida ou líquida tenha por finalidade a alimentação do homem c substância medicinal destinada a consumo é aquela utilizada interna ou externamente para a cura ou prevenção de doenças humanas 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de envenenar as substâncias mencionadas Na hipótese descrita no 1º exige elemento subjetivo especial do tipo representado pelo especial fim de agir qual seja para o fim de ser distribuída 5 Consumação e tentativa Na hipótese descrita no caput a consumação ocorre com o efetivo envenenamento No caso do 1º o crime se consuma com a entrega ou guarda do objeto material desde que esteja presente a finalidade de ser distribuída A tentativa é admissível 6 Classificação doutrinária Crime comum de perigo abstrato e coletivo e permanente na modalidade ter em depósito Com o advento da Lei n 893094 que deu nova redação ao conteúdo do art 1º da Lei n 807290 a conduta descrita no artigo em análise não mais configura crime hediondo 7 Forma culposa Se as condutas de envenenar entregar a consumo ou ter em depósito são produtos da violação pelo sujeito ativo das regras de cuidado objetivo 2º 8 Pena e ação penal A pena cominada para as hipóteses do caput e do 1º é reclusão de dez a quinze anos Para a modalidade culposa a pena é detenção de seis meses a dois anos Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A O objeto jurídico tutelado pelo tipo penal inscrito no art 270 do Código Penal é a incolumidade pública não importando o fato de as águas serem de uso comum ou particular bastando que sejam destinadas ao consumo de indeterminado número de pessoas STJ HC 55504PI Rel Min Laurita Vaz j 11122007 Corrupção ou poluição de água potável Art 271 Corromper ou poluir água potável de uso comum ou particular tornandoa imprópria para consumo ou nociva à saúde Pena reclusão de 2 dois a 5 cinco anos Modalidade culposa Parágrafo único Se o crime é culposo Pena detenção de 2 dois meses a 1 um ano D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública especialmente a saúde pública 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa Sujeito passivo é a coletividade ou seja um número indeterminado de pessoas 3 Tipo objetivo adequação típica Corromper significa estragar apodrecer infectar poluir é sujar profanar conspurcar É necessário que a conduta recaia sobre água potável que é aquela destinada à alimentação de indeterminado número de pessoas tornandoa imprópria para o consumo não potável ou nociva à saúde potencialmente lesiva à saúde humana 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de corromper ou poluir água que sabe ser potável e destinada a consumo humano Não há exigência de qualquer fim especial do agir 5 Consumação e tentativa O crime se consuma com a corrupção ou poluição de água potável independentemente da eventual ocorrência de dano A tentativa é teoricamente admissível podendose verificar quando por exemplo o agente após ter iniciado a ação não consegue poluir ou corromper água potável e tornála imprópria para consumo 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comum de perigo abstrato e coletivo e de conteúdo variado unissubjetivo e plurissubsistente 7 Forma culposa Quando a corrupção ou poluição provier da desatenção ao dever objetivo de cuidado por parte do sujeito ativo configurando imprudência negligência ou imperícia caracteriza a modalidade culposa 8 Questões especiais Será atípica a conduta do agente se a água já se encontrar poluída Se a substância destinada a corromper ou poluir a água se tratar de veneno o crime será o do art 270 do CP No caso do art 270 a água é totalmente imprestável ao consumo humano já no art 271 seu uso é nocivo O dispositivo em apreço segundo Luiz Regis Prado foi tacitamente revogado pelo art 54 caput da Lei n 960598 Lei dos Crimes Ambientais cf Luiz Regis Prado Crimes contra o ambiente São Paulo Revista dos Tribunais 1998 p 151 e s Admitese a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada inferior a um ano 9 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é reclusão de dois a cinco anos Em se tratando de conduta culposa detenção de dois meses a um ano Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Poluição de água potável art 271 caput do CP Poluição de poço mediante o emprego de animal em decomposição Autoria e materialidade não evidenciadas Não necessidade de comprovação técnica de anterior potabilidade bastando o uso regular e contínuo pela comunidade Sendo crime material tal comprovação deve ser feita após seja por perícia direta ou indireta sob pena de ser o meio empregado inidôneo TJRS Apelação 699477865 Rel Carlos Roberto Lofego Canibal j 296 2000 Falsificação corrupção adulteração ou alteração de substância ou produtos alimentícios Art 272 Corromper adulterar falsificar ou alterar substância ou produto alimentício destinado a consumo tornandoo nocivo à saúde ou reduzindolhe o valor nutritivo Pena reclusão de 4 quatro a 8 oito anos e multa 1ºA Incorre nas penas deste artigo quem fabrica vende expõe à venda importa tem em depósito para vender ou de qualquer forma distribui ou entrega a consumo a substância alimentícia ou o produto falsificado corrompido ou adulterado 1º Está sujeito às mesmas penas quem pratica as ações previstas neste artigo em relação a bebidas com ou sem teor alcoólico Modalidade culposa 2º Se o crime é culposo Pena detenção de 1 um a 2 dois anos e multa Artigo com redação determinada pela Lei n 9677 de 2 de julho de 1998 D O U T R I N A Alteração legislativa dispositivo com a redação final determinada pela Lei n 9677 de 2 de julho de 1998 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública especialmente a saúde pública As ações incriminadas apresentamse frequentemente como fraude ou lesão patrimonial em atos de comércio embora a sua gravidade decorra do perigo comum que produzem 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa embora o mais comum seja o crime ser praticado por industrial comerciante ou mesmo agricultor Sujeito passivo é a coletividade assim como qualquer pessoa que seja lesada ou colocada em perigo pela ação do sujeito ativo 3 Tipo objetivo adequação típica Tanto a rubrica quanto o tipo penal foram alterados pela Lei n 967798 que classifica os crimes descritos nos arts 272 a 277 do CPP como hediondos As condutas incriminadas alternativamente são as seguintes a corromper estragar infectar b adulterar contrafazer deturpar c falsificar dar ou referir como verdadeiro o que não é e d alterar modificar transformar O objeto material é a substância ou produto alimentício destinado à alimentação destinado ao consumo É preciso que a conduta do agente torne essa substância efetivamente danosa à saúde de indeterminado número de pessoas 31 Ampliação de crimes hediondos No 1ºA são previstas penas idênticas ao caput para quem fabrica produz vende comercializa negocia aliena de forma onerosa expõe à venda põe à vista mostra apresenta oferece exibe para a venda importa faz vir do exterior tem em depósito para vender coloca em lugar seguro conserva mantém para si mesmo distribui dá reparte ou entrega a consumo repassa a substância alimentícia ou o produto falsificado corrompido adulterado 32 Proteção a bebidas crime hediondo No 1º também alterado pela Lei n 967798 foi estendida a mesma proteção às bebidas com ou sem teor alcoólico 4 Potencialidade lesiva das ações É necessário que as ações de corromper adulterar falsificar ou alterar apresentem efetiva nocividade danosa à saúde humana ou sejam capazes de reduzir o valor nutritivo propriedades nutricionais da substância ou do produto alimentício 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de praticar qualquer das condutas descritas no tipo penal nas hipóteses descritas no 1ºA exigese o elemento subjetivo especial do tipo representado pelo especial fim de agir para vender 6 Consumação e tentativa Consumase o crime com a corrupção adulteração falsificação ou alteração da substância ou do produto alimentício inclusive bebidas sem teor alcoólico No 1ºA consumase com a venda exposição à venda importação depósito para vender distribuição ou entrega a consumo Admitese a tentativa 7 Classificação doutrinária Tratase de crime comum de perigo concreto e coletivo comissivo ou omissivo de conteúdo variado e permanente nas modalidades exposição à venda e ter em depósito 8 Forma culposa Quando a nocividade da substância ou produto alimentício resultar da inobservância do cuidado objetivo exigido pelas circunstâncias 2º configurarseá a modalidade culposa 9 Questões especiais Ainda que o falsificador venda o produto responderá unicamente pela conduta descrita no caput O 2º admite a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada igual a um ano Vide art 2º III e V da Lei n 152151 crimes contra a economia popular caso não se configure perigo à saúde pública art 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais 10 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são reclusão de quatro a oito anos e multa Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Condutas apuradas crimes contra a saúde pública que se encontram tipificadas no art 272 do CP na redação anterior à Lei n 967798 as quais se consumam no momento em que a substância se torna nociva à saúde Ou seja já no momento da fabricação e comercialização a competência se encontrava definida STJ Conflito de Competência 34540SP Rel Min Félix Fischer j 2662002 Crime de falsificação etc de substâncias ou produto alimentícios art 272 do CP Nocividade à saúde Exigência para caracterizálo Para que se caracterize o delito previsto no art 272 e parágrafos do Código Penal é indispensável que a falsificação ou adulteração etc das substâncias torne o produto nocivo à saúde Não basta o processo fraudulento É imprescindível que ele torne a coisa prejudicial a higidez humana TJRS Apelação 70000988295 Rel Sylvio Baptista Neto j 2192000 Falsificação corrupção adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais Art 273 Falsificar corromper adulterar ou alterar produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais Pena reclusão de 10 dez a 15 quinze anos e multa 1º Nas mesmas penas incorre quem importa vende expõe à venda tem em depósito para vender ou de qualquer forma distribui ou entrega a consumo o produto falsificado corrompido adulterado ou alterado 1ºA Incluemse entre os produtos a que se refere este artigo os medicamentos as matériasprimas os insumos farmacêuticos os cosméticos os saneantes e os de uso em diagnóstico 1ºB Está sujeito às penas deste artigo quem pratica as ações previstas no 1º em relação a produtos em qualquer das seguintes condições I sem registro quando exigível no órgão de vigilância sanitária competente II em desacordo com a fórmula constante do registro previsto no inciso anterior III sem as características de identidade e qualidade admitidas para a sua comercialização IV com redução de seu valor terapêutico ou de sua atividade V de procedência ignorada VI adquiridos de estabelecimento sem licença da autoridade sanitária competente Modalidade culposa 2º Se o crime é culposo Pena detenção de 1 um a 3 três anos e multa Artigo com redação determinada pela Lei n 9677 de 2 de julho de 1998 D O U T R I N A Alteração legislativa a redação de todo este dispositivo foi determinada pela Lei n 9677 de 2 de julho de 1998 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública especialmente em relação à saúde pública 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa que pratique uma das ações descritas no dispositivo em exame independentemente da qualidade de produtor ou comerciante Sujeito passivo é a coletividade cuja saúde seja lesada ou colocada em perigo pela ação do sujeito ativo 3 Tipo objetivo adequação típica Os núcleos do tipo previstos no caput são os verbos falsificar dar ou referir como verdadeiro o que não é corromper estragar infectar adulterar contrafazer deturpar e alterar modificar transformar Nas mesmas penas incorrerá quem importar fazer vir do exterior vender comercializar negociar alienar de forma onerosa expor à venda pôr à vista mostrar apresentar oferecer exibir para a venda tiver em depósito para vender colocar em lugar seguro conservar mantiver para si mesmo distribuir dar repartir ou entregar a consumo repassar o produto falsificado corrompido adulterado ou alterado 31 Objeto material do crime O objeto material é o produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais ou seja próprios para o tratamento a cura ou a prevenção de enfermidades Incluemse entre esses produtos a teor do 1ºA os medicamentos as matériasprimas os insumos farmacêuticos os cosméticos os saneantes e os de uso em diagnóstico Ademais cabe assinalar que estará sujeito às penas previstas no caput quem importar vender expuser à venda tiver em depósito para vender distribuir ou entregar a consumo produtos em qualquer das seguintes condições a saber 1ºB a sem registro quando exigível no órgão de vigilância sanitária competente b em desacordo com a fórmula constante do registro previsto na letra anterior c sem as características de identidade e qualidade admitidas para a sua comercialização d com redução de seu valor terapêutico ou de sua atividade e de procedência ignorada ou f adquiridos de estabelecimento sem licença da autoridade sanitária competente 32 Inclusão de novos objetos materiais A Lei n 967798 ampliou o rol dos objetos materiais destas infrações penais incluindo no 1º entre outros a medicamento que já era abrangido por remédio matériaprima substância a partir da qual se pode fabricar ou produzir outra insumos farmacêuticos produtos combinados resultantes de várias matériasprimas cosméticos produtos destinados à limpeza conservação e maquiagem da pele saneantes produtos de limpeza em geral vide Guilherme de Souza Nucci Código Penal comentado 33 Produtos destinados a fins terapêuticos ou medicinais É a substância destinada à cura ou ao alívio de doenças bem como ao combate de males e enfermidades 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de praticar qualquer das condutas descritas no artigo em exame Na hipótese do caput não há exigência de elemento subjetivo especial do tipo nas demais hipóteses porém exigese esse elemento subjetivo consistente no especial fim de agir para vender no 1º 5 Crime hediondo A Lei n 967798 alterou a pena de prisão de um a três anos para dez a quinze anos de reclusão mantendo a multa cominada Referida lei criou outras figuras típicas incluindoas no caput e nos parágrafos Por fim a Lei n 969598 classificou estes crimes como hediondos incluindoos no rol do art 1º da Lei n 807290 6 Consumação e tentativa Consumase o crime com a falsificação corrupção adulteração ou alteração do produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais caput ou com a efetiva importação venda exposição à venda depósito distribuição ou entrega a consumo do produto falsificado corrompido adulterado ou alterado nas condições descritas no 1ºB 1ºA O perigo para a saúde pública é presumido pela lei A tentativa é teoricamente admissível 7 Classificação doutrinária Tratase de crime comum de perigo abstrato e coletivo plurissubsistente permanente nas modalidades ter em depósito e expor à venda e de forma vinculada 8 Forma culposa Quando qualquer das condutas perpetradas decorre da desatenção às regras de cuidado objetivo pelo agente 2º configurase a modalidade culposa 9 Questões especiais O texto do presente artigo foi alterado pela Lei n 967798 com a inserção de novos parágrafos ampliação da tutela dispensada e elevação substancial das sanções penais além de transformálo em crime hediondo cf art 1º VII da Lei n 807290 Vide art 2º III da Lei n 152151 crimes contra a economia popular Lei n 813790 crimes contra a ordem tributária econômica e contra as relações de consumo 10 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente para o caput e os 1ºA e 1ºB são reclusão de dez a quinze anos e multa Para a hipótese de crime culposo 2º as penas são de detenção de um a três anos e multa Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A importação de produto de origem estrangeira destinado a fins medicinais sem registro na ANVISA determina a ocorrência do delito insculpido no art 273 1ºB incisos I V e VI do CP TRF 4ª Região Apelação 200470010096263 Rel Élcio Pinheiro de Castro j 662007 Alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais Improvimento Comete o crime previsto no art 273 1º e 2º do CP quem tem em depósito para venda produto falsificado ou alterado ainda que não tenha ciência da falsificação TJRS Apelação 70006624175 Rel Gaspar Marques Batista j 23102003 O art 273 1ºB I do Código Penal tipifica a ação de vender expor à venda ou ter em depósito para fins de comércio distribuir ou entregar a consumo produto sem registro quando este é exigível no órgão de vigilância sanitária Não há óbice legal à punição de uma conduta na esfera administrativa e na esfera penal se houver sua previsão como infração à legislação sanitária federal assim como sua tipificação no Código Penal ou na legislação penal especial STJ RHC 12264RS Rel Min Gilson Dipp j 10122002 Emprego de processo proibido ou de substância não permitida Art 274 Empregar no fabrico de produto destinado a consumo revestimento gaseificação artificial matéria corante substância aromática antisséptica conservadora ou qualquer outra não expressamente permitida pela legislação sanitária Pena reclusão de 1 um a 5 cinco anos e multa D O U T R I N A Alteração legislativa a cominação da pena deste dispositivo foi determinada pela Lei n 9677 de 2 de julho de 1998 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública especialmente naquilo que se refere a saúde pública 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa que pratique uma das ações descritas no dispositivo em exame embora normalmente seja o industrial ou o comerciante Sujeito passivo é a coletividade cuja saúde seja lesada ou colocada em perigo pela ação do sujeito ativo 3 Tipo objetivo adequação típica A conduta típica consiste em empregar utilizar aplicar no fabrico de produto destinado ao consumo empregado na alimentação de indeterminado número de pessoas revestimento gaseificação artificial matéria corante substância aromática antisséptica conservadora ou qualquer outra não expressamente permitida na legislação sanitária 31 Revestimento Revestimento é tudo aquilo que cobre determinada superfície com a finalidade de protegêla ou embelezála 32 Gaseificação artificial Tratase de operação provocada por um processo não natural que tem a finalidade de reduzir algo sólido ou líquido a gás ou a vapor 33 Substância corante aromática ou antisséptica Substância corante é a destinada a colorir ou tingir alguma coisa aromática é a substância que contém propriedades odoríficas perfumada cheirosa antisséptica é a substância capaz de impedir ou dificultar a proliferação de microrganismos 34 Qualquer outra substância não permitida Tratase de uma previsão genérica que não se confunde com interpretação analógica para admitir a proibição do uso de outros meios similares demonstrando que a enumeração do tipo não é numerus clausus 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de praticar a conduta descrita no tipo penal Não há exigência de qualquer elemento subjetivo especial do tipo Não há previsão de modalidade culposa 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com o emprego do processo ou substância não expressamente permitida pela legislação sanitária Não há previsão de modalidade culposa Admitese a tentativa 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comum formal instantâneo de perigo comum abstrato e coletivo unissubjetivo e plurissubsistente 7 Questões especiais Tratase de norma penal em branco que se complementa com a legislação sanitária Caracterizam o delito previsto no art 274 a venda exposição à venda manutenção em depósito ou entrega a consumo de produtos nessas condições Vide art 2º III da Lei n 152151 crimes contra a economia popular art 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais 8 Pena e ação penal A Lei n 967798 promoveu a modificação no tocante à sanção penal cominada para a figura delitiva em apreço Assim não apenas a modalidade de pena privativa de liberdade detenção mas também os seus limites um a três meses foram substancialmente alterados após o advento do citado diploma estando fixada em reclusão de um a cinco anos e multa Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Emprego de processo proibido ou de substância não permitida O emprego de açúcar na fabricação de vinho ainda que em quantidade superior à permitida não tipifica o delito previsto no art 274 do CP eis que não se trata de ingrediente proibido pela legislação sanitária TJRS Apelação 70009907932 Rel Constantino Lisbôa de Azevedo j 28102004 Invólucro ou recipiente com falsa indicação Art 275 Inculcar em invólucro ou recipiente de produtos alimentícios terapêuticos ou medicinais a existência de substância que não se encontra em seu conteúdo ou que nele existe em quantidade menor que a mencionada Pena reclusão de 1 um a 5 cinco anos e multa Artigo com redação determinada pela Lei n 9677 de 2 de julho de 1998 D O U T R I N A Alteração legislativa redação determinada pela Lei n 9677 de 2 de julho de 1998 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública especialmente a saúde pública 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa embora seja mais comum ser praticado por comerciantes e fabricantes Sujeito passivo é a coletividade em geral e em particular aqueles que comprarem ou consumirem os produtos 3 Tipo objetivo adequação típica A ação incriminada consiste em inculcar fazer falsa indicação dar a entender indicar citar a existência de substância que não se encontra no conteúdo de produtos alimentícios terapêuticos ou medicinais ou que nele existem em quantidade inferior à mencionada O objeto material é o invólucro tudo aquilo destinado a envolver embrulhar cobrir o produto p ex rótulo bula ou recipiente o que serve para acondicionar o produto p ex frasco vidro lata de produtos alimentícios terapêuticos ou medicinais 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de praticar a ação descrita no tipo penal ou seja fazer a falsa indicação Não há exigência de qualquer elemento subjetivo especial do tipo 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a simples falsa indicação independentemente de venda ou entrega do produto a consumo público Admitese teoricamente a tentativa 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comum formal instantâneo de perigo abstrato e coletivo unissubjetivo plurissubsistente e comissivo 7 Questões especiais A Lei n 967798 promoveu a modificação no tocante à sanção penal cominada para a figura delitiva em apreço Assim além da previsão de pena de multa cumulativa houve alteração da modalidade de pena privativa de liberdade cominada e de suas respectivas margens penais no regime anterior detenção de um a três meses A falsa indicação exteriorizada em folhetos catálogos prospectos não tipifica o delito do art 275 mas poderá conforme o caso configurar o delito do art 175 do CP 8 Pena e ação penal As penas cominadas são reclusão de um a cinco anos e multa Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Mistura de aguardente em uísque ou só o uso do primeiro líquido em garrafa rotulada com o nome de outro produto para dizer que aquela bebida alcoólica é uísque como ocorre na hipótese em testilha não configura o crime art 272 porque o produto final não apresentou nocividade à saúde É isto o que informa o laudo pericial do serviço de inspeção vegetal Tratase por outro lado da infração penal do art 275 do mesmo diploma legal pois o agente afirmou indicou apregoou que aquela bebida continha substâncias que não entravam em sua composição ou existiam em quantidade inferior a mencionada Ademais neste caso a consumação independe de qualquer outro resultado uma vez que a presunção de perigo é absoluta TJRS Apelação 70000988295 Rel Sylvio Baptista Neto j 2192000 A mera aposição de rótulo falso em recipiente de produto alimentício configura o delito do art 275 do Código Penal STF HC 44807GB Rel Min Amaral Santos j 1621968 Produto ou substância nas condições dos dois artigos anteriores Art 276 Vender expor à venda ter em depósito para vender ou de qualquer forma entregar a consumo produto nas condições dos arts 274 e 275 Pena reclusão de 1 um a 5 cinco anos e multa D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública especialmente a saúde pública 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa embora normalmente seja praticado por comerciante Sujeito passivo é a coletividade e particularmente o sujeito que sofrer direta e pessoalmente o risco ou dano decorrente da ação do sujeito ativo 3 Tipo objetivo adequação típica As condutas alternativamente incriminadas idênticas às descritas nos arts 272 1ºA e 273 1º são a vender b expor à venda c ter em depósito para vender ou d de qualquer forma entregar a consumo O objeto material é o produto nas condições dos arts 274 e 275 do CP Como a lei não exige a prática da atividade comercial do agente não é necessário que se caracterize a habitualidade sendo suficiente apenas uma das condutas 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de praticar uma das condutas criminalizadas sendo necessário que o agente tenha consciência de que se trata de produto nas condições referidas nos arts 274 ou 275 na modalidade de ter em depósito há o elemento subjetivo especial do tipo representado pelo especial fim de agir para vender 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a realização de qualquer das condutas previstas A tentativa é teoricamente admissível Ação penal pública incondicionada 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comum formal de conteúdo variado comum na modalidade de vender ou entregar a consumo e permanente nas modalidades expor à venda e ter em depósito de perigo comum unissubjetivo e plurissubsistente 7 Concurso de crimes Se o agente pratica o crime inscrito nos arts 274 ou 275 do CP e logo depois realiza qualquer das condutas previstas no art 276 responderá apenas por aquele constituindo o art 276 post factum impunível 8 Questões especiais A Lei n 967798 alterou substancialmente a sanção penal cominada desta figura delitiva Assim não apenas a modalidade de pena privativa de liberdade detenção e seus limites um a três meses foram modificados com o advento do citado diploma mas também se adotou a cominação cumulativa da pena de multa Tratase de infração que admite suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada igual a um ano Sendo produto de primeira necessidade art 2º III da Lei n 152151 crimes contra a economia popular 9 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são reclusão de um a cinco anos e multa Ação penal pública incondicionada Substância destinada à falsificação Art 277 Vender expor à venda ter em depósito ou ceder substância destinada à falsificação de produtos alimentícios terapêuticos ou medicinais Pena reclusão de 1 um a 5 cinco anos e multa Artigo com redação determinada pela Lei n 9677 de 2 de julho de 1998 D O U T R I N A Alteração legislativa artigo com redação determinada pela Lei n 9677 de 2 de julho de 1998 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública particularmente a saúde pública 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa embora normalmente seja praticado por comerciante Sujeito passivo é a coletividade e particularmente o sujeito que sofrer direta e pessoalmente o risco ou dano decorrente da ação do sujeito ativo 3 Tipo objetivo adequação típica As condutas incriminadas alternativamente são as seguintes a vender b expor à venda c ter em depósito para vender d ceder Com exceção desta última as outras três condutas são idênticas às previstas nos arts 272 1ºA e 273 1º lá examinadas Ceder por sua vez significa entregar a outrem de qualquer forma o produto incriminado O objeto material é a substância destinada à falsificação de produtos alimentícios terapêuticos ou medicinais 31 Substância destinada à falsificação Não é necessário que a substância sirva unicamente para falsificar produtos mencionados Assim a finalidade falsificadora deve ser examinada casuisticamente Devese ter especial cuidado ao examinar quando a substância tiver múltipla destinação necessitando ficar bem demonstrada a finalidade concreta da razão do agir do autor 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de praticar uma das condutas criminalizadas exigese igualmente o elemento subjetivo especial do tipo qual o fim especial de destinar à falsificação do produto A existência de outra finalidade ainda que as condutas sejam praticadas não configurará este crime 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a efetiva realização de qualquer das condutas incriminadas Embora admissível a tentativa é de difícil ocorrência 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comum formal de perigo abstrato e coletivo de conteúdo variado e permanente nas modalidades expor à venda e ter em depósito unissubjetivo e plurissubsistente 7 Questões especiais A Lei n 967798 alterou substancialmente a sanção penal cominada para esta figura delitiva ampliando os seus limites e modificando a modalidade de pena privativa de liberdade prevista Configura crime único a prática de duas ou mais condutas pois se trata de tipo misto alternativo Admitese a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada igual a um ano Vide art 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais 8 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são reclusão de um a cinco anos e multa Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A ausência do exame pericial competente do produto falsificado arreda a configuração do delito previsto no art 277 do CP TJSP Apelação Rel Onei Raphael RT 440359 Na descrição do disposto no art 277 do CP o que se visa proteger é a consciência de todos impedindose que o ato de fraudar venha em detrimento da natural qualidade ou garantia dos produtos alimentícios na sua inteireza TACrimSP Apelação 3812418 Rel Roberto de Almeida j 241985 Outras substâncias nocivas à saúde pública Art 278 Fabricar vender expor à venda ter em depósito para vender ou de qualquer forma entregar a consumo coisa ou substância nociva à saúde ainda que não destinada à alimentação ou a fim medicinal Pena detenção de 1 um a 3 três anos e multa Modalidade culposa Parágrafo único Se o crime é culposo Pena detenção de 2 dois meses a 1 um ano D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública no especial aspecto da saúde pública 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa embora normalmente seja praticado por comerciante Sujeito passivo é a coletividade e particularmente o sujeito que sofrer direta e pessoalmente o risco ou dano decorrente da ação do sujeito ativo 3 Tipo objetivo adequação típica São as seguintes as condutas alternativamente incriminadas a fabricar b ter em depósito para vender c ou de qualquer forma entregar a consumo O objeto material indicado é a coisa ou substância objeto material nociva lesiva ou danosa à saúde ainda que não destinada à alimentação ou a fim medicinal ex loções esmaltes papéis roupas cigarros brinquedos etc 31 Crime subsidiário e alternativo Quando se tratar de produtos destinados à alimentação ou a fins medicinais o agente responderá pelos tipos dos arts 272 e 273 Para evitar dúvidas o artigo fez ressalva expressa nesse sentido 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de praticar uma das condutas descritas no tipo com conhecimento de que se trata de substância nociva à saúde pública O elemento subjetivo do tipo referese ao especial fim de agir para vender Somente é exigido elemento subjetivo especial do tipo na modalidade de ter em depósito que deve ser para fim de vender ou entregar a consumo 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a realização de qualquer das condutas tipificadas A tentativa é admissível embora de difícil ocorrência 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comum de perigo abstrato e coletivo de conteúdo variado formal e permanente nas modalidades expor à venda e ter em depósito unissubjetivo e plurissubsistente 7 Forma culposa Haverá a modalidade culposa quando a prática da conduta for resultado da desatenção ao cuidado objetivo necessário por parte do agente 8 Questões especiais O art 278 exige a nocividade efetiva da coisa ou substância ou seja deve ser realmente danosa à saúde pública Se o agente realiza mais de uma das condutas descritas responderá por só um crime por se tratar de tipo misto alternativo Para que se realize o crime é irrelevante o grau de nocividade do produto o qual deverá ser apreciado pelo juiz apenas quando da aplicação da pena art 59 Vide arts 63 e 64 da Lei n 807890 Código de Defesa do Consumidor art 74 do Dec n 9881690 regulamenta a Lei de Agrotóxicos Lei n 780289 9 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são detenção de um a três anos e multa A forma culposa comina pena de detenção de dois meses a um ano Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Entrega a consumo de sangue contaminado art 278 do Código Penal Dolo plenamente caracterizado segundo os fatos apurados nas instâncias ordinárias Pena fixada dentro dos limites legais por decisão suficientemente fundamentada STF HC 68867RJ Rel Min Octavio Gallotti j 17121991 Substância avariada Art 279 Revogado pela Lei n 8137 de 27121990 Medicamento em desacordo com receita médica Art 280 Fornecer substância medicinal em desacordo com receita médica Pena detenção de 1 um a 3 três anos ou multa Modalidade culposa Parágrafo único Se o crime é culposo Pena detenção de 2 dois meses a 1 um ano D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública particularmente no aspecto da saúde pública 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa e não apenas o farmacêutico mas toda e qualquer pessoa que fornecer de qualquer modo a substância medicinal em desacordo com a receita médica balconista prático etc contra Magalhães Noronha Sujeito passivo é a coletividade bem como aquele que recebe a substância diversa da prescrita em receita médica 3 Tipo objetivo adequação típica Consiste em fornecer dar entregar ceder vender a título gratuito ou oneroso substância medicinal terapêutica ou profilática em desacordo com receita médica elemento normativo do tipo Por receita médica entendese a prescrição feita pelo médico por escrito em regra em papel com seu timbre E Magalhães Noronha Direito Penal 17 ed São Paulo Saraiva 1986 v 4 p 50 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de fornecer a substância medicinal sabendo que está em desacordo com a receita médica É irrelevante o desconhecimento de risco para a saúde da vítima na medida em que o perigo é presumido 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a entrega efetiva da substância em desacordo com a receita médica Admitese em tese a tentativa 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comum de perigo abstrato e coletivo formal unissubjetivo e plurissubsistente 7 Forma culposa parágrafo único Tipificarseá a figura culposa quando o fornecimento da substância resultar da desatenção ao dever de cuidado exigido 8 Questões especiais Em se tratando de substância corrompida adulterada modificada ou alterada incidirá o agente nos delitos inscritos nos arts 272 ou 273 do CP Ainda que a substituição feita pelo farmacêutico seja benéfica responderá ele pelo crime do art 280 pois a lei penal tutela a saúde pública ameaçada por semelhante arbitrariedade nesse sentido RT 592342 e JTACrimSP 83255 Caso o farmacêutico entenda haver na receita manifesto equívoco por parte do médico deverá localizar este para que corrija expressamente o erro art 254 do regulamento do Departamento Nacional de Saúde não encontrando o médico e sendo urgente a entrega do medicamento poderá o farmacêutico corrigir a receita agindo em estado de necessidade art 24 do CP 9 Pena e ação penal A pena cominada é a detenção de dois meses a um ano Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A O crime do art 280 do CP se consuma com a entrega da substância medicinal não correspondente à receita pois só então se apresenta o perigo que a lei na espécie presume TACrimSP HC Rel Isnard dos Reis RT 297408 Art 281 Revogado pela Lei n 6368 de 21101976 Exercício ilegal da medicina arte dentária ou farmacêutica Art 282 Exercer ainda que a título gratuito a profissão de médico dentista ou farmacêutico sem autorização legal ou excedendolhe os limites Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos Parágrafo único Se o crime é praticado com o fim de lucro aplicase também multa D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública em especial a saúde pública 2 Sujeitos do crime Na primeira parte do artigo qualquer pessoa pode ser sujeito ativo crime comum Na segunda apenas o médico dentista ou farmacêutico podem ser sujeito ativo pois somente estes podem exceder os limites Sujeito passivo é a coletividade 3 Tipo objetivo adequação típica São tipificadas duas figuras neste artigo a exercer desempenhar praticar ainda que a título gratuito a profissão de médico dentista ou farmacêutico sem a autorização legal elemento normativo do tipo A finalidade lucrativa qualifica o delito Convém destacar que além da habilitação profissional é necessário o registro do título diploma ou licença na repartição do órgão competente b exercer a profissão de médico dentista ou farmacêutico excedendolhe os limites Na primeira hipótese exercese a profissão sem ter tal qualificação ou pelo menos sem estar inscrito regularmente no órgão competente Na segunda hipótese o agente tem a qualificação profissional e está devidamente inscrito no órgão competente mas se excede no seu exercício Tratase aqui de norma penal em branco pois esses limites são determinados por leis especiais 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de exercer ilegalmente a profissão ou se exceder no seu exercício Não há exigência de qualquer elemento subjetivo especial do tipo mas se houver o fim especial de lucro o crime será qualificado 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com o exercício habitual e reiterado da profissão de médico dentista ou farmacêutico Em razão da habitualidade necessária não se admite a tentativa 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comum na primeira parte e próprio na segunda de perigo abstrato e coletivo de concurso necessário e habitual 7 Forma qualificada Ocorre quando agente comete o crime com intuito de obter vantagem econômica 8 Exercício ilegal de outras profissões Em se tratando de exercício ilegal de profissão ou atividade diferente da de médico dentista ou farmacêutico vide art 47 da Lei das Contravenções Penais Incide no art 359 do CP o médico dentista ou farmacêutico que suspenso ou privado por decisão judicial do exercício de sua profissão continua a desempenhála Vide art 47 do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais 9 Questões especiais Distinguese o delito do art 282 do crime do art 284 porque no curandeirismo o agente é pessoa ignorante e rude que se dedica à cura de moléstias por meios grosseiros enquanto no exercício ilegal da medicina o agente demonstra aptidões e conhecimentos médicos embora não seja autorizado a exercer a medicina 10 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é detenção de seis meses a dois anos Na figura qualificada aplicase cumulativamente a pena de multa Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Art 282 parágrafo único do CP Optometrista Exercício ilegal da medicina Constatado que o réu realizava apenas atos inerentes à profissão de tecnólogo em optometria inexistindo prova de que também realizasse atos privativos de médico oftalmologista a absolvição deve ser mantida TJRS Apelação 70022513485 Rel Gaspar Batista j 2122008 Responsabilidade civil do Estado Auto de infração Acupuntura Suspensão das atividades profissionais Ato ilícito Inocorrência Revelase lícita a determinação prévia pela administração pública no exercício do poder de polícia que impõe restrição ao profissional da fisioterapia que exercia a atividade de acupuntura sem o respectivo alvará ainda que o auto de infração tenha indicado equivocadamente a infração como exercício ilegal da medicina TJRS Apelação Cível 70015335078 Rel Luiz Ary Vessini de Lima j 1522007 Condenado o paciente à pena de 6 seis meses de detenção pela prática de exercício ilegal de medicina art 282 CP a prescrição passa a ser regulada pela pena in concreto Nos termos dos arts 109 e 110 do Código Penal se entre os marcos interruptivos transcorreram mais de dois anos impõese declarar a extinção da punibilidade do acusado em face da incidência da prescrição da pretensão punitiva na sua modalidade retroativa ou intercorrente STJ HC 43042MG Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 1662005 Exercício ilegal de arte farmacêutica e curandeirismo Embora o curandeirismo seja prática delituosa típica de pessoa rude sem qualquer conhecimento técnico profissional da medicina e que se dedica a prescrever substâncias ou procedimentos com o fim de curar doenças não se pode descartar a possibilidade de existência do concurso entre tal crime e o de exercício ilegal de arte farmacêutica se o agente também não tem habilitação profissional específica para exercer tal atividade STJ HC 36244DF Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 2222005 Homicídio simples e exercício ilegal da medicina Pronúncia Acertada a pronúncia pelo crime de exercício ilegal de medicina que é conexo ao de homicídio devendo ser também julgado pelo Tribunal do Júri a teor do que dispõe o art 78 I do CPP TJRS RESE 70008260945 Rel Manuel José Martinez Lucas j 2842004 Exercício ilegal da medicina Não infringe a norma o art 282 do Código Penal a ré que exerce a função de parteira distinta da atividade médicaobstetra mesmo que não possua documentação legal para exercer tal profissão A assistência prestada pela acusada não constitui o crime em exame pois o que ocorreu foi o exercício ilegal da profissão de parteira É assente no direito a vedação de interpretação analógica de regra de direito penal in malan partem Inadmissível pois a condenação da acusada por não constituir o fato ilícito penal TJRS Apelação 70000304063 Rel Saulo Brum Leal j 1632000 Exercício ilegal da medicina Charlatanismo Atuação como crimemeio para se chegar ao delitofim Absorção pelo delito mais grave Exercício ilegal da medicina acusado que sendo médico atendia como tal e ministrava medicação a ser adquirida em estabelecimento comercial especializado Condenação mantida Inteligência do art 282 do Código Penal TJRS Apelação 297005175 Rel Marco Antônio Ribeiro de Oliveira j 941997 Charlatanismo Art 283 Inculcar ou anunciar cura por meio secreto ou infalível Pena detenção de 3 três meses a 1 um ano e multa D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública destacandose principalmente a saúde pública 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa inclusive o próprio médico que anuncia cura por método secreto e infalível Sujeito passivo é a coletividade e especialmente a pessoa lesada ou iludida pelo sujeito ativo 3 Tipo objetivo adequação típica Os núcleos alternativamente indicados são inculcar propor como vantajoso indicar aconselhar ou anunciar apregoar difundir noticiar cura por meio secreto ou infalível A inculca ou anúncio é de cura por meio secreto oculto ou infalível que não falha indefectível O anúncio do meio ou a cura por médicos é permitido nos termos do Declei n 411342 e por dentistas conforme a Lei n 508176 desde que não se trate de moléstias para as quais não haja tratamento próprio podendo inclusive constituir infração disciplinar 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de inculcar ou anunciar cura por processo secreto ou infalível tendo conhecimento da falsidade Não há exigência de qualquer elemento subjetivo especial do tipo Não há previsão tampouco de modalidade culposa 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a conduta de inculcar ou anunciar cura por processo secreto ou infalível com conhecimento da falsidade O perigo para a saúde pública é presumido Admitese a tentativa 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comum de perigo abstrato e coletivo e de conteúdo variado 7 Questões especiais O charlatanismo não se confunde com exercício ilegal da medicina art 282 Neste crime o agente entende ser eficaz o tratamento ou meio por ele prescrito Naquele o sujeito ativo conhece a ineficácia do meio por ele inculcado ou anunciado Se o agente pratica o crime com finalidade lucrativa haverá concurso formal com o delito de estelionato art 171 Vide arts 27 e 47 do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais 8 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são detenção de três meses a um ano e multa Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Liberdade de culto charlatanismo Curandeirismo Denúncia Inépcia A denuncia deve descrever o fato delituoso com todas suas circunstâncias de modo a ensejar o exercício do direito de defesa O charlatanismo e o curandeirismo integram o rol dos crimes contra a saúde pública ou seja praticado contra número indeterminado de pessoas Crimes de perigo concreto probabilidade de dano O direito penal da culpa é incompatível com o perigo abstrato hipótese ocorrente no plano hipotético O homem responde pelo que fez ou deixou de fazer Refutese a simples suposição Dessa forma a denúncia precisa indicar o resultado sentido normativo Caso contrário será inepta A liberdade de culto e garantia constitucional com proteção do local e da liturgia STJ HC 1498RJ Rel Min Luiz Vicente Cernicchiaro j 18121992 Curandeirismo Art 284 Exercer o curandeirismo I prescrevendo ministrando ou aplicando habitualmente qualquer substância II usando gestos palavras ou qualquer outro meio III fazendo diagnósticos Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos Parágrafo único Se o crime é praticado mediante remuneração o agente fica também sujeito à multa D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a incolumidade pública particularmente a saúde pública 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa feiticeiro cartomante pai de santo médium etc Sujeito passivo é a coletividade bem como qualquer pessoa que seja tratada pelo agente 3 Tipo objetivo O núcleo do tipo é o verbo exercer desempenhar praticar O curandeirismo pode ser conceituado como o exercício da arte de curar de quem não tem a necessária habilitação profissional por meios não científicos Admite três modos de execução a prescrevendo receitando ministrando dando a consumo ou aplicando utilizando habitualmente qualquer substância b usando gestos palavras ou qualquer outro meio c fazendo diagnósticos identificando a doença pelos sintomas exteriorizados 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de praticar reiteradamente qualquer das condutas descritas no art 284 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a prática reiterada e com habitualidade do curandeirismo através das condutas descritas nos incisos do artigo em exame É inadmissível a tentativa em razão da habitualidade 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comum de perigo abstrato e coletivo formal habitual e de forma vinculada 7 Forma qualificada Haverá a figura qualificada quando o agente exerce o curandeirismo com finalidade lucrativa Nessa hipótese aplicase cumulativamente a pena de multa 8 Concurso com outros crimes Os crimes dos arts 282 283 e 284 do CP não se confundem Explicase que enquanto o exercente ilegal da medicina tem conhecimentos médicos embora não esteja devidamente habilitado para praticar a arte de curar e o charlatão pode ser o próprio médico que abastarda sua profissão com falsas promessas de cura o curandeiro caribamba mezinheiro raizeiro é o ignorante chapado sem os conhecimentos da medicina que se arvora em debelador dos males corpóreos Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 9 p 154 Se o agente explora a credulidade pública despido do propósito curativo pratica a contravenção do art 27 da Lei das Contravenções Penais 9 Questões especiais Embora apenas o inciso I mencione expressamente o advérbio habitualmente a habitualidade é imprescindível para a caracterização do delito em qualquer de suas modalidades 10 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é detenção de seis meses a dois anos A forma qualificada comina a pena pecuniária cumulativamente Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Curandeirismo Perfuração da cavidade nasal Lesão corporal de natureza grave Autoria e materialidade demonstradas Condenação mantida TJRS Apelação 70012447579 Rel Aristides Pedroso de Albuquerque Neto j 5102006 Paciente condenada pela prática do delito de curandeirismo Se a inicial acusatória imputou à paciente a prática do delito de curandeirismo de forma genérica deixando de detalhar qual a conduta por ela realizada que se adequa ao tipo penal atribuído não explicitando quais os trabalhos de curandeirismo foram praticados pela ré resta configurado o constrangimento ilegal O simples fato de a ré ter recebido valores da vítima prometendolhe a cura de sua enfermidade não autoriza a instauração de processo criminal tendo em vista que para se configurar o tipo penal do art 284 do Estatuto Repressivo é necessária a prática de uma das condutas descritas em seus incisos STJ HC 59312PR Rel Min Gilson Dipp j 1292006 Prisão em flagrante Liberdade provisória negada Reiteração criminosa Acusado sem endereço certo A ordem solicitada em habeas corpus deve ser negada porque o paciente como admitiu em seu interrogatório e confirmado por certidões já foi mais de uma vez condenado pelo crime de curandeirismo e se solto continua a praticálo Esta reincidência impede a concessão de fiança ou a suspensão do processo TJRS HC 298001298 Rel Sylvio Baptista Neto j 1921998 O curandeirismo ficou comprovado com a habitualidade com que o réu ministrava os passes e obrigava adultos e menores a ingerirem sangue de animais e bebida alcoólica colocando em perigo a saúde e levando os adolescentes a dependência do álcool STJ REsp 50426MG Rel Min Jesus Costa Lima j 1081994 Forma qualificada Art 285 Aplicase o disposto no art 258 aos crimes previstos neste Capítulo salvo quanto ao definido no art 267 D O U T R I N A O art 285 determina a aplicação do art 258 aos crimes previstos nos arts 268 a 284 se do perigo à saúde pública resulta lesão corporal ou morte O delito do art 267 epidemia tem a lesão corporal como integrante da conduta típica e a morte como resultado qualificador 1º e 2º daí a razão de sua exclusão expressamente indicada no art 285 Vide arts 1º e 9º da Lei n 807290 crimes hediondos art 1º III j da Lei n 796089 Título IX Dos Crimes contra a Paz Pública Incitação ao crime Art 286 Incitar publicamente a prática de crime Pena detenção de 3 três a 6 seis meses ou multa D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a paz pública 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa Sujeito passivo é a coletividade 3 Tipo objetivo adequação típica A ação incriminada consiste em incitar estimular instigar açular provocar a prática de crime ou seja excluemse a contravenção ou fatos imorais O crime deve ser determinado pois a instigação feita genericamente por ser vaga não teria eficácia ou idoneidade É necessário que a incitação ocorra em público a publicidade do ato é elemento do tipo sendo necessária a sua percepção por um indeterminado número de pessoas 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de incitar ou seja de estimular a prática de crime tendo o agente ciência de que se dirige a um número indeterminado de pessoas 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a simples incitação desde que perceptível por um número indefinido de pessoas Admitese a tentativa quando o meio de execução é a forma escrita 6 Classificação doutrinária Tratase de crime formal de forma livre de perigo comum e abstrato e vago 7 Questões especiais Vide art 23 IV da Lei n 717083 Lei de Segurança Nacional É indiferente para a configuração do crime que o instigamento recaia sobre pessoa determinada O agente pode responder em concurso com a prática do crime pela pessoa instigada art 29 do CP resultando em concurso material entre os dois ilícitos penais Vide art 155 do CPM incitação à prática de crimes militares art 53 a a l da Lei n 411762 Código Brasileiro de Telecomunicações art 33 2º da Lei n 113432006 entorpecentes art 20 da Lei n 771689 crimes resultantes de preconceitos de raça ou cor arts 60 61 e 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais Vide art 3º da Lei n 288956 crime de genocídio 8 Pena e ação penal As penas cominadas alternativamente são detenção de três a seis meses ou multa Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Incitação ao crime Art 286 do CPB Nulidade da audiência preliminar decretada No procedimento especial do Juizado Especial Criminal é expresso que a audiência preliminar será presidida por Juiz de Direito proibindo assim a delegação de jurisdição art 72 da Lei 909995 A denunciada incitou instigou o adolescente a disparar contra a vítima a fim de nela ocasionar lesões corporais E isso é conduta tipificada pelo ordenamento penal seja como crime ou ato infracional A diferença está em quem pratica o ato mas não há diferença se o instigador age incitando adulto ou adolescente TJRS Recurso Crime 71001365543 Rel Nara Leonor Castro Garcia j 1382007 Substância entorpecente técnica de cultivo Incitação ao crime investigação Internet veiculação Competência Justiça estadual A divulgação pela internet de técnicas de cultivo de planta destinada à preparação de substância entorpecente não atrai por si só a competência federal Ainda que se trate no caso de hospedeiro estrangeiro a ação de incitar desenvolveuse no território nacional daí não se justificando a aplicação dos incisos IV e V do art 109 da Constituição STJ Conflito de Competência 62949PR Rel Min Nilson Naves j 11102006 Incitação ao crime Art 286 do CP Julgado o feito na jurisdição comum a Turma Recursal Criminal não é competente para apreciar recurso de apelação Declinada a competência para o egrégio Tribunal de Justiça do estado TJRS Recurso Crime 71000824177 Rel Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak j 2412006 Incitação ao crime não o pratica quem segundo a denúncia não incitou ninguém à prática do delito mas ao contrário teria acedido à instigação de terceiro STF HC 75755GO Rel Min Sepúlveda Pertence j 1721998 Apologia de crime ou criminoso Art 287 Fazer publicamente apologia de fato criminoso ou de autor de crime Pena detenção de 3 três a 6 seis meses ou multa D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a paz pública 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa sem qualquer condição ou qualidade especial Sujeito passivo é a coletividade 3 Tipo objetivo adequação típica A conduta típica é fazer apologia elogiar exaltar enaltecer O elogio é referente a fato criminoso ou a seu autor de forma que constitua incentivo indireto ou implícito à repetição da ação delituosa H C Fragoso Lições de Direito Penal Parte Especial 3 ed Rio de Janeiro Forense 1981 p 283 É ainda requisito do tipo a publicidade isto é requerse a percepção de um número indefinido de pessoas 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de fazer apologia do crime consciente de que atinge um número indeterminado de pessoas Não há exigência de qualquer fim específico 5 Consumação e tentativa Ocorre a consumação com a apologia perceptível por um número indeterminado de pessoas A tentativa é teoricamente admissível desde que o meio não seja o oral 6 Classificação doutrinária Tratase de crime formal de forma livre de perigo comum e abstrato instantâneo e vago 7 Questões especiais A apologia feita ao autor do crime deve referirse aos meios de execução necessários à prática deste e não à personalidade do delinquente Não configura o crime o elogio feito a crimes culposos ou a acontecimentos futuros Esse crime é considerado forma de instigação indireta Se o agente faz apologia a vários crimes haverá concurso formal art 70 do CP Admitese concurso formal entre apologia e crime praticado posteriormente Vide art 22 da Lei n 717083 Lei de Segurança Nacional 8 Pena e ação penal As penas cominadas alternativamente são detenção de três a seis meses ou multa Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Instigação e induzimento ao uso de entorpecentes Hipótese na qual o impetrante alega a inépcia da exordial oferecida contra o réu denunciado por instigação e induzimento ao uso de entorpecentes e associação para o tráfico pois na qualidade de cantor de funk teria instigado e induzido o uso de substâncias ilícitas especialmente as comercializadas pela facção criminosa da qual seria membro Embora não se exija a descrição pormenorizada das condutas do agente isso não significa que o órgão acusatório pode oferecer denúncia sem a devida descrição dos fatos como no caso dos autos em que a acusação nem sequer transcreveu trechos das músicas que fariam apologia ao crime não tendo ainda demonstrado de que forma o réu teria concorrido para a divulgação das músicas na rede mundial de computadores STJ HC 63966RJ Rel Min Gilson Dipp j 2442007 Apologia de crime ou criminoso Contravenção penal Paz pública A denúncia deve descrever a infração penal com todas as suas circunstâncias No caso do art 287 CP indicar a conduta que elogia ou incentiva fato criminoso ou autor do crime A apologia de contravenção penal não satisfaz elemento constitutivo desse delito Além disso imprescindível registrar que a apologia se deu publicamente isto é dirigida ou presenciada por número indeterminado de pessoas ou em circunstância em que a elas possa chegar a mensagem Só assim será relatado o resultado perigo a paz pública juridicamente entendido como a probabilidade perigo concreto de o crime ser repetido por outrem ou seja estimular terceiros a delinquência STJ RHC 4660RJ Rel Min Luiz Vicente Cernicchiaro j 591995 No caso do art 287 CP indicar a conduta que elogia ou incentiva fato criminoso ou autor do crime A apologia de contravenção penal não satisfaz elemento constitutivo desse delito STJ RHC 3997RJ Rel Min Luiz Vicente Cernicchiaro j 8111994 Quadrilha ou bando Art 288 Associaremse mais de três pessoas em quadrilha ou bando para o fim de cometer crimes Pena reclusão de 1 um a 3 três anos Parágrafo único A pena aplicase em dobro se a quadrilha ou bando é armado D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a paz pública 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa em um número mínimo de quatro incluindose também os inimputáveis Sujeito passivo é a coletividade um número indeterminado de indivíduos 3 Tipo objetivo adequação típica O núcleo do tipo é associarse que significa unirse ajuntarse reunirse É necessária a união de mais de três pessoas caracterizando quadrilha ou bando ou seja exigemse no mínimo quatro pessoas Entendese por quadrilha ou bando a reunião estável ou permanente que não significa perpétua para o fim de perpetração de uma indeterminada série de crimes A associação tem como objetivo a prática de crimes excluídos a contravenção ou atos imorais 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de associarse a outras pessoas com a finalidade de praticar crimes criando um vínculo associativo entre os participantes Exigese o elemento subjetivo especial do tipo caracterizando especial fim de cometer crimes 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a simples associação de mais de três pessoas para a prática de crimes colocando em risco a paz pública sendo desnecessária pois a prática de qualquer crime A tentativa é absolutamente inadmissível 6 Classificação doutrinária Tratase de crime de perigo comum e abstrato de concurso necessário comissivo e permanente 7 Forma qualificada Qualificase o crime quando a quadrilha está armada armas próprias ou inadequadas A incidência da qualificadora parágrafo único não requer que todos os integrantes da quadrilha estejam armados 8 Quadrilha ou bando e concurso de pessoas A associação de forma estável e permanente bem como o objetivo de praticar vários crimes é o que diferencia o crime de quadrilha ou bando da coautoria Para a configuração do crime é irrelevante que o bando tenha ou não praticado algum delito 9 Questões especiais A disposição legal ao exigir uma quantidade mínima de pessoas admite o inimputável como integrante da quadrilha Quando os agentes têm como fim a prática de crimes previstos no art 8º da Lei n 807290 crimes considerados hediondos 1º de tortura terrorismo tráfico de drogas incidirão no tipo do art 288 do CP e nas sanções do art 8º da mesma lei observada ainda a qualificadora do art 288 e do crime cometido Quando a quadrilha pratica algum crime o integrante que concorre para a sua efetivação responde por ele em concurso material com o previsto no art 288 do CP Vide art 1º III l da Lei n 796089 prisão temporária arts 35 e 40 VI da Lei n 113432006 entorpecentes arts 1º e 9º da Lei n 807290 crimes hediondos art 2º da Lei n 288956 crime de genocídio arts 16 e 24 da Lei n 717083 Lei de Segurança Nacional Lei n 903495 crime organizado 10 Pena e ação penal Reclusão de um a três anos A forma qualificada comina pena em dobro Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Crime de quadrilha ou bando Penas fixadas em 1 ano e 1 ano e três meses de reclusão Prescrição superveniente Ocorrência Ordem concedida para declarar a extinção da punibilidade pela ocorrência da prescrição superveniente da pretensão punitiva estatal tão somente quanto ao crime de quadrilha ou bando art 288 do CPB STJ HC 90767SP Rel Min Napoleão Nunes Maia Filho j 2122008 Tentativa de homicídio qualificado em concurso Formação de quadrilha Concurso material STJ HC 93489RJ Rel Min Napoleão Nunes Maia Filho j 2122008 Operação Anaconda Crime de quadrilha O acórdão recorrido enumera os vultosos bens acumulados pelo ora Recorrente e também por corréus os quais depois de exaustiva comparação com dados de rendimentos imposto de renda movimentações financeiras etc são tidos como de origem ilícita logrando demonstrar diante do vasto acervo probatório que o grupo se locupletou com vantagens e ganhos ilícitos decorrentes direta ou indiretamente do crime de quadrilha valendo destacar a notória desproporcionalidade entre o patrimônio do Recorrente e seus rendimentos de origem lícita Tendo concluído a instância ordinária pela existência de bens ilegalmente acumulados em decorrência direta ou indireta da atividade da quadrilha não é possível em sede de recurso especial reabrir essa questão STJ REsp 827940SP Rel Min Laurita Vaz j 1422008 Mesmo nos crimes permanentes há necessidade de que o agente ativo seja encontrado em circunstância que autorize o reconhecimento do flagrante Impossível o flagrante por crime de quadrilha se os demais corréus se encontravam presos desde longa data não podendo se reunir com o paciente STJ HC 65834AL Rel Min Jane Silva j 4102007 O crime de quadrilha ou bando é autônomo ou formal ou seja sua consumação se dá com a convergência de vontades e independe da punibilidade ulterior dos delitos visados STJ HC 49194SP Rel Min Napoleão Nunes Maia Filho j 2662007 O reconhecimento da continuidade delitiva quanto ao crime contra a ordem tributária não obsta a caracterização do delito previsto no art 288 do Código Penal Precedentes STJ REsp 569318RS Rel Min Félix Fischer j 1522005 Título X Dos Crimes contra a Fé Pública Capítulo I Da Moeda Falsa Moeda falsa Art 289 Falsificar fabricandoa ou alterandoa moeda metálica ou papelmoeda de curso legal no país ou no estrangeiro Pena reclusão de 3 três a 12 doze anos e multa 1º Nas mesmas penas incorre quem por conta própria ou alheia importa ou exporta adquire vende troca cede empresta guarda ou introduz na circulação moeda falsa 2º Quem tendo recebido de boafé como verdadeira moeda falsa ou alterada a restitui à circulação depois de conhecer a falsidade é punido com detenção de 6 seis meses a 2 dois anos e multa 3º É punido com reclusão de 3 três a 15 quinze anos e multa o funcionário público ou diretor gerente ou fiscal de banco de emissão que fabrica emite ou autoriza a fabricação ou emissão I de moeda com título ou peso inferior ao determinado em lei II de papelmoeda em quantidade superior à autorizada 4º Nas mesmas penas incorre quem desvia e faz circular moeda cuja circulação não estava ainda autorizada D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a fé pública em particular a circulação monetária 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa Sujeito passivo é o Estado bem como a pessoa ofendida 3 Tipo objetivo adequação típica A ação típica é falsificar imitar reproduzir por fraude passar por verdadeiro a fabricando ou seja há contrafação criase um novo objeto b alterando que significa modificar alterar o já existente para aumentar seu valor A moeda metálica ou papelmoeda objeto material deve dispor de curso legal recebimento obrigatório decorrente de lei no País ou no estrangeiro 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade de falsificar a moeda mediante contrafação ou alteração Não se exige nenhum elemento subjetivo especial nem mesmo de colocála em circulação 5 Classificação doutrinária Tratase de crime comum comissivo plurissubsistente e instantâneo 6 Falsificação grosseira atipicidade A falsificação grosseira não constitui esse crime pois é necessário que aquela seja hábil para enganar uma pessoa de diligência ordinária A moeda que não possui curso legal exigido pelo tipo está fora de circulação pode configurarse meio de execução para a prática de estelionato art 171 do CP 7 Questões especiais Entendese que ocorre crime único na falsificação de várias moedas na mesma ocasião No entanto se em épocas diferentes admitese crime continuado Se o falsificador põe em circulação moeda fabricada a partir de fragmentos de moeda verdadeira configurase o delito em exame e não o delito do art 290 do CP Vide arts 43 e 44 do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais e quanto ao 2º vide ainda art 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais 8 Figura do 1º crime subsequente à falsificação As condutas incriminadas são a importar ou exportar b adquirir c vender d trocar d ceder e emprestar f guardar g introduzir na circulação O objeto material é a moeda falsificada 9 Figura privilegiada crime subsequente Quando o agente recebe de boafé a moeda falsa após conhecer a falsidade e a restitui à circulação 2º 10 Figura qualificada 3º As condutas típicas são fabricar emitir ou autorizar a fabricação ou emissão a de moeda com título ou peso inferior ao estabelecido por lei b de papelmoeda cédula em quantidade superior à autorizada ou seja de forma irregular Título é a proporção ou teor de liga metálica legalmente estabelecida para a composição de moeda 101 Desviar e fazer circular moeda não autorizada 4º Os núcleos são desviar mudar a direção o destino e fazer circular ou seja o agente retira o dinheiro do local onde se encontra e o põe em circulação antecipadamente de forma abusiva O elemento material é moeda verdadeira 11 Concurso de crimes Quando o agente pratica mais de uma das condutas típicas responde por um só crime Se o agente introduz na circulação moeda falsa de forma ardilosa responde em concurso material com o crime de estelionato A figura privilegiada 2º admite a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada inferior a um ano 12 Questões especiais Funcionário público é aquele definido no art 327 do CP Se o funcionário público tiver lucro com a prática desse crime poderá responder em concurso formal com o delito do art 312 do CP peculato ou outro delito patrimonial A emissão de moeda metálica em excesso é figura atípica 13 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são reclusão de três a doze anos e multa Para a forma privilegiada a pena é de detenção de seis meses a dois anos e multa Na hipótese da figura qualificada as penas cominadas são reclusão de três a doze anos e multa Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 73 do STJ A utilização de papelmoeda grosseiramente falsificado configura em tese o crime de estelionato da competência da Justiça Estadual Condenação pelo crime do art 289 1º do CP Direito de apelar em liberdade Inexistência O direito de apelar em liberdade pode ser denegado ainda que o réu permaneça solto durante a instrução criminal nas hipóteses em que se evidencia no momento da prolação da sentença condenatória qualquer das hipóteses previstas no art 312 do CPP Resta devidamente fundamentada a decisão que decretou a prisão preventiva do recorrente com expressa menção à situação concreta que se caracteriza pela garantia da ordem pública em virtude da reiterada atividade delitiva que demonstra a possibilidade de prática de novos delitos Precedentes STJ RHC 20465SP Rel Min Laurita Vaz j 20112007 Falsificação de moeda R 5000 Princípio da insignificância Pequeno valor Inaplicabilidade No caso de crime de falsificação de moeda a norma não busca resguardar somente o aspecto patrimonial mas também e principalmente a moral administrativa que se vê flagrantemente abalada com a circulação de moeda falsa A menor quantidade de notas ou o pequeno valor de seu somatório não é apto a quantificar o prejuízo advindo do ilícito perpetrado a ponto de caracterizar a mínima ofensividade da conduta para fins de exclusão de sua tipicidade STJ REsp 964047DF Rel Min Napoleão Nunes Maia Filho j 25102007 O crime de introdução de moeda falsa em circulação previsto no art 289 1º do CP pode ser elidido com a demonstração de ausência de dolo o que não ocorreu no caso concreto Hipótese em que a agente usou cédula falsa no comércio e foi presa em flagrante com outras de igual natureza escondidas em sua roupa Inexistência de prova quanto à alegada boafé Não se aplica o princípio da insignificância aos crimes contra a fé pública notadamente o de moeda falsa do art 289 1º do CP Precedente ACR n 4916CE Quarta Turma Rel Lázaro Guimarães DJ 2162007 p 1449 TRF 5ª Região Apelação 200683000061593 Rel Margarida Cantarelli j 492007 Não se apresentando grosseira a falsificação e possuindo a cédula falsa portanto potencialidade lesiva configurase em princípio o crime de moeda falsa de competência da Justiça Federal STJ Conflito de Competência 82647TO Rel Min Maria Thereza de Assis Moura j 2282007 O crime de moeda falsa exige para sua configuração que a falsificação não seja grosseira A moeda falsificada há de ser apta à circulação como se verdadeira fosse 2 Se a falsificação for grosseira a ponto de não ser hábil a ludibriar terceiros não há crime de estelionato 3 A apreensão de nota falsa com valor de cinco reais em meio a outras notas verdadeiras nas circunstâncias fáticas da presente impetração não cria lesão considerável ao bem jurídico tutelado de maneira que a conduta do paciente é atípica STF HC 83526CE Rel Min Joaquim Barbosa j 1632004 Crime de moeda falsa Competência Justiça federal Anulação do processo desde o recebimento da denúncia O crime de moeda falsa art 289 do Código Penal por ofender serviço afeto privativamente à União é da competência da Justiça Federal vez que inexistente previsão legal de sua delegação TJRS Apelação 70001206093 Rel Marco Antônio Ribeiro de Oliveira j 2672000 Crimes assimilados ao de moeda falsa Art 290 Formar cédula nota ou bilhete representativo de moeda com fragmentos de cédulas notas ou bilhetes verdadeiros suprimir em nota cédula ou bilhete recolhidos para o fim de restituílos à circulação sinal indicativo de sua inutilização restituir à circulação cédula nota ou bilhete em tais condições ou já recolhidos para o fim de inutilização Pena reclusão de 2 dois a 8 oito anos e multa Parágrafo único O máximo da reclusão é elevado a 12 doze anos e o da multa a Cr 40000 quarenta mil cruzeiros se o crime é cometido por funcionário que trabalha na repartição onde o dinheiro se achava recolhido ou nela tem fácil ingresso em razão do cargo D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a fé pública 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa Sujeitos passivos são o Estado e secundariamente aquele que sofre o prejuízo 3 Tipo objetivo adequação típica As ações incriminadas consistem em a formar cédula nota ou bilhete representativo ou seja o agente por justaposição de fragmentos de cédulas verdadeiras inutilizadas ou recolhidas forma outra nota hábil a circular legitimamente b suprimir eliminar anular sinal de inutilização das cédulas recolhidas com o objetivo de fazêlas circular novamente c restituir introduzir pôr novamente em circulação o objeto material cédula falsificada suprimida ou que foi recolhida para inutilização 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo e o elemento subjetivo especial do tipo consiste no fim especial de restituir à circulação na modalidade suprimir 5 Consumação e tentativa A consumação ocorre com a falsificação supressão do sinal ou a circulação A tentativa é admissível 6 Classificação doutrinária Tratase de crime de ação múltipla plurissubsistente formal na modalidade suprimir e comum 7 Forma qualificada Se o agente era funcionário da repartição onde estava recolhido o dinheiro ou tinha fácil acesso a ela em razão de seu cargo 8 Questões especiais A forma qualificada cominava um valor para a multa No entanto com o advento da Lei n 720984 a pena pecuniária será fixada na forma do art 49 do CP Urge não confundir esse crime com o previsto no artigo antecedente art 289 falsificação por alteração Se o agente de boafé recebe dinheiro nas condições descritas por este artigo responde pelo crime de receptação art 180 Vide arts 43 e 44 do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais 9 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são reclusão de dois a oito anos e multa caput Na forma qualificada a pena máxima é elevada a doze anos e multa Ação penal pública incondicionada sendo de competência da Justiça Federal Petrechos para falsificação de moeda Art 291 Fabricar adquirir fornecer a título oneroso ou gratuito possuir ou guardar maquinismo aparelho instrumento ou qualquer objeto especialmente destinado à falsificação de moeda Pena reclusão de 2 dois a 6 seis anos e multa D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a fé pública 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa Sujeito passivo é o Estado 3 Tipo objetivo adequação típica As condutas alternativamente incriminadas são a fabricar b adquirir c fornecer a título oneroso ou gratuito d possuir e guardar O objeto material é o maquinismo aparelho instrumento bem como qualquer objeto que seja mais adequado à falsificação de moeda isto é o objeto deve ser daqueles que mais propriamente mais adequadamente ou via de regra são usados para falsificar moeda e mais que a tal fim sejam destinados no caso concreto 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de praticar qualquer das ações descritas no tipo penal Não se exige qualquer elemento subjetivo especial do tipo 5 Consumação e tentativa Consumase o delito com a realização de uma das condutas típicas A tentativa é admissível excluindose a modalidade fornecer 6 Classificação doutrinária Tratase de crime instantâneo permanente figuras possuir e guardar de conteúdo variado de forma livre e subsidiário 7 Questões especiais Se o agente pratica mais de uma das condutas previstas responde somente por um crime do tipo misto cumulativo Quando utiliza objeto e falsifica moeda responde pelo crime do art 289 falsificação que absorve o previsto no art 291 do CP 8 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são reclusão de dois a seis anos e multa Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Crimes de moeda falsa e petrechos para sua fabricação Competência da justiça federal Restando dúvida quanto à qualidade da falsificação bem como havendo conexão com o crime do art 291 do Código Penal a competência é da Justiça Federal STJ Conflito de Competência 30147RS Rel Min Hélio Quaglia Barbosa j 2482005 Petrechos para falsificação de moeda art 291 do CP Se os petrechos ou instrumentos apreendidos não se prestam apenas para a contrafação da moeda já que podem ser utilizados para a prática de outras fraudes como por exemplo o conto do paco a competência para conhecer da ação penal é da Justiça Estadual STJ Conflito de Competência 7682SP Rel Min Anselmo Santiago j 1661994 Emissão de título ao portador sem permissão legal Art 292 Emitir sem permissão legal nota bilhete ficha vale ou título que contenha promessa de pagamento em dinheiro ao portador ou a que falte indicação do nome da pessoa a quem deva ser pago Pena detenção de 1 um a 6 seis meses ou multa Parágrafo único Quem recebe ou utiliza como dinheiro qualquer dos documentos referidos neste artigo incorre na pena de detenção de 15 quinze dias a 3 três meses ou multa D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a fé pública em particular a moeda de curso legal 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa Sujeitos passivos são o Estado bem como aquele que foi prejudicado 3 Tipo objetivo adequação típica As ações previstas no tipo são emitir pôr em circulação nota bilhete ficha vale ou título ao portador ou a que falte indicação do nome da pessoa a quem deva ser pago bem como recebêlos ou utilizálos como dinheiro parágrafo único Título ao portador é aquele transmitido por simples tradição manual independentemente de autorização do devedor Este achase obrigado não com determinada pessoa mas exclusivamente perante o portador do título seja ele quem for Washington de Barros Monteiro Curso de Direito Civil São Paulo Saraiva 1994 v 5 p 377 A expressão sem permissão legal é elemento normativo do tipo 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo é a vontade de emitir o título consciente de que não há permissão para a sua circulação Não há exigência de qualquer elemento subjetivo especial do tipo 5 Consumação e tentativa Consumase o crime no momento em que o título é posto em circulação ou seja quando ocorre sua transferência para qualquer pessoa Admitese teoricamente a tentativa 6 Classificação doutrinária Tratase de crime formal instantâneo e comum 7 Questões especiais Os títulos referidos pelo tipo devem conter promessa de pagamento em dinheiro Tratase de norma penal em branco pois a permissão legal encontrase fora do tipo Vide art 3º do Dec n 177A1893 debêntures Lei n 640476 sociedades por ações 8 Pena e ação penal Detenção de um a seis meses ou multa O parágrafo único comina pena de detenção de quinze dias a três meses ou multa Ação penal pública incondicionada Capítulo II Da Falsidade de Títulos e outros Papéis Públicos Falsificação de papéis públicos Art 293 Falsificar fabricandoos ou alterandoos I selo destinado a controle tributário papel selado ou qualquer papel de emissão legal destinado à arrecadação de tributo Inciso I com redação dada pela Lei n 11035 de 22 de dezembro de 2004 II papel de crédito público que não seja moeda de curso legal III vale postal IV cautela de penhor caderneta de depósito de caixa econômica ou de outro estabelecimento mantido por entidade de direito público V talão recibo guia alvará ou qualquer outro documento relativo a arrecadação de rendas públicas ou a depósito ou caução por que o poder público seja responsável VI bilhete passe ou conhecimento de empresa de transporte administrada pela União por Estado ou por Município Pena reclusão de 2 dois a 8 oito anos e multa 1º Incorre na mesma pena quem I usa guarda possui ou detém qualquer dos papéis falsificados a que se refere este artigo II importa exporta adquire vende troca cede empresta guarda fornece ou restitui à circulação selo falsificado destinado a controle tributário III importa exporta adquire vende expõe à venda mantém em depósito guarda troca cede empresta fornece porta ou de qualquer forma utiliza em proveito próprio ou alheio no exercício de atividade comercial ou industrial produto ou mercadoria a em que tenha sido aplicado selo que se destine a controle tributário falsificado b sem selo oficial nos casos em que a legislação tributária determina a obrigatoriedade de sua aplicação 1º com redação dada pela Lei n 11035 de 22 de dezembro de 2004 2º Suprimir em qualquer desses papéis quando legítimos com o fim de tornálos novamente utilizáveis carimbo ou sinal indicativo de sua inutilização Pena reclusão de 1 um a 4 quatro anos e multa 3º Incorre na mesma pena quem usa depois de alterado qualquer dos papéis a que se refere o parágrafo anterior 4º Quem usa ou restitui à circulação embora recebido de boafé qualquer dos papéis falsificados ou alterados a que se referem este artigo e o seu 2º depois de conhecer a falsidade ou alteração incorre na pena de detenção de 6 seis meses a 2 dois anos ou multa 5º Equiparase a atividade comercial para os fins do inciso III do 1º qualquer forma de comércio irregular ou clandestino inclusive o exercido em vias praças ou outros logradouros públicos e em residências 5º acrescentado pela Lei n 11035 de 22 de dezembro de 2004 D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a fé pública em especial a legalidade de títulos e outros papéis públicos 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo é qualquer pessoa quando no entanto for praticado por funcionário público prevalecendose do cargo aplicase o art 295 Sujeitos passivos são o Estado e secundariamente qualquer pessoa que seja efetivamente lesada 3 Tipo objetivo adequação típica A conduta típica consiste em falsificar fabricando criando produzindo ou alterando modificando I selo destinado a controle tributário selo adesivo que comprova o pagamento papel selado selo fixo ou qualquer papel de emissão legal destinada à arrecadação de tributos II papel de crédito público títulos da dívida pública como apólices III vale postal IV título de crédito referente a objeto empenhado e comprovante de depósito V papéis que têm relação com a receita estatal ou seja de ordem tributária VI bilhete passe ou conhecimento de empresa de transporte de administração federal estadual ou municipal Punese ainda aquele que a usa vende empresta troca b suprime elimina em qualquer desses títulos quando legítimos carimbo ou sinal que indica a sua inutilização 2º ou os usa novamente 3º 31 Inovações da Lei n 110352004 O novo diploma legal não acrescentou nada de novo ao inciso I afora a correção na redação do texto excluindo a velharia que representavam as expressões selo postal e estampilha e adequou à abrangência da voracidade do fisco substituindo as expressões imposto ou taxa por tributos Trocou seis por meia dúzia Os demais incisos do caput permaneceram inalterados inclusive a sanção não foi alterada 32 Post factum impunível e exaurimento do crime O texto revogado já pretendia equivocadamente punir o exaurimento do crime com a criminalização da conduta de quem usasse qualquer dos documentos falsificados referidos no art 129 O 1º foi transformado em três incisos acrescendo no inciso I além do uso a criminalização da guarda posse ou detenção de qualquer dos documentos referidos no dispositivo No entanto a exemplo do que ocorria com o texto revogado essas condutas somente serão puníveis se forem praticadas por outra pessoa que não o autor da falsificação 33 Selo falsificado destinado a controle tributário Desde que o legislador brasileiro descobriu que o crime é representado por verbos nucleares utilizou dez no inciso II passou a arrolálos abusivamente na tipificação das infrações penais ignorando os princípios mais comezinhos de sintaxe desinência concordância verbal e pronominal assassinando diariamente o nosso vernáculo É irrelevante que reúna numa mesma oração verbos intransitivos transitivos diretos ou indiretos defectivos etc Preocupase apenas em arrolar o maior número deles atribuindolhes invariavelmente o mesmo complemento As condutas criminalizadas nesse dispositivo também não são puníveis quando praticadas pelo autor da falsificação 34 Crime especial quanto ao autor As condutas doze verbos relacionadas no inciso III do 1º necessitam terem sido praticadas no exercício de atividade comercial ou industrial embora como prevê o 5º é irrelevante que esse exercício seja irregular ou clandestino 35 Responsabilidade penal dos camelôs 5º Os empresários já eram abrangidos pela redação anterior Agora com o novo texto foram alcançados também os camelôs Finalmente um governo que tem a coragem de dar dignidade aos camelôs atribuindolhes a mesma responsabilidade penal dos comerciantes legalizados 5º Esse é o resultado da equiparação à atividade comercial de qualquer forma de comércio irregular ou clandestino Não deixa de ser mais uma forma de inclusão social tão perseguida pelo atual governo popular Com efeito todas as condutas descritas no novo tipo penal com exceção do exportar são próprias do conhecido comércio informal irregular ou clandestino praticado fundamentalmente pelos camelôs e sacoleiros de Foz do Iguaçu A abrangência do parágrafo em exame não deixa nenhuma modalidade de comércio informal fora do alcance do poder repressivo penal público 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade de fabricar ou alterar qualquer dos papéis mencionados falsificandoos exigese o elemento subjetivo especial do tipo consistente no especial fim de tornálos novamente utilizáveis 2º 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a prática das ações previstas no tipo Admitese a tentativa excluída a modalidade usar 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comum não exige sujeito ativo qualificado ou com alguma condição especial instantâneo o resultado ocorre de imediato não se alongando no tempo formal não exige resultado naturalístico de forma livre que pode ser cometido por qualquer meio e de qualquer forma pelo agente unissubjetivo pode ser praticado por apenas um agente plurissubsistente em geral a conduta é integrada por vários atos e comissivo as incontáveis condutas implicam ações ativas 7 Forma privilegiada Quando o agente recebe os títulos falsificados de boafé e os usa ou os restitui à circulação após ter ciência da imitação 4º 8 Questões especiais É irrelevante que a empresa de transporte VI seja pública ou particular exigindose no entanto a sua administração pelo poder estatal O agente que falsifica e usa objeto é punido apenas pelo crime de falsificação Vide arts 36 e parágrafo único 37 e 39 da Lei n 653878 serviços postais Lei n 813790 crimes contra a ordem tributária econômica e contra as relações de consumo art 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais Vide art 295 do CP quando o agente for funcionário público 9 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são reclusão de dois a oito anos e multa a mesma do 1º Aos 2º e 3º é cominada pena de reclusão de um a quatro anos e multa No 4º é de detenção de seis meses a dois anos ou multa Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Crimes de estelionato e falsificação de papéis públicos Guia previdenciária social Posterior quitação pelo contribuinte Dificuldades do INSS para ser ressarcido Prejuízos Competência do juízo federal Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar crime de estelionato praticado mediante falsificação das guias de recolhimento das contribuições previdenciárias quando não ocorre lesão à autarquia federal Súmula 107STJ Mutatis mutandis havendo prejuízos aos interesses do INSS o Juízo Federal se torna o competente para processar e julgar o feito STJ Conflito de Competência 89539SP Rel Jane Silva j 2692007 Falsificação de papéis públicos Configuração Falsificação de guia de DARF Hipótese em que o recorrente foi denunciado como incurso nas sanções do art 293 V do Código Penal porque teria falsificado guias de arrecadação da Receita Federal DARFs através da inserção de autenticação como forma de comprovação do recolhimento dos tributos O inciso V do art 293 do CP referese a guia isto é impresso para pagamento de tributos depósitos etc ou qualquer outro documento relativo à arrecadação de rendas públicas denotando sua especialidade com relação ao tipo penal previsto no art 299 do CP STJ REsp 705288PR Rel Min Gilson Dipp j 482005 Competência Falsificação de papéis públicos Lesão a particular Inexistindo lesão direta a bens serviços ou interesses da União Federal compete à Justiça Estadual processar e julgar crime de falsificação de papéis públicos praticado mediante falsificação de guias de recolhimento de seguro obrigatório DPVAT e falsificação de guias de recolhimento de taxas e impostos sobre propriedade de veículos automotores IPVA STJ Conflito de Competência 20147SP Rel Vicente Leal j 1031999 Petrechos de falsificação Art 294 Fabricar adquirir fornecer possuir ou guardar objeto especialmente destinado à falsificação de qualquer dos papéis referidos no artigo anterior Pena reclusão de 1 um a 3 três anos e multa D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a fé pública referente aos selos e sinais 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa Tratandose de funcionário público que se prevalece do cargo a pena é majorada nos termos do art 295 Sujeito passivo é o Estado representando a coletividade 3 Tipo objetivo adequação típica As ações alternativamente incriminadas são a fabricar b adquirir c fornecer d possuir e guardar O elemento material é o objeto especialmente destinado à falsificação de qualquer papel mencionado no art 293 do CP 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade de praticar uma das condutas descritas no dispositivo em exame com a ciência de que se trata de objeto destinado à falsificação dos papéis públicos referidos no art 293 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a prática de qualquer das ações incriminadas independentemente da produção de qualquer resultado As figuras da posse e da guarda configuram crime permanente autorizando a prisão em flagrante enquanto sua consumação se protrai no tempo A tentativa teoricamente é possível nas figuras de fabricar adquirir e fornecer 6 Classificação doutrinária Tratase de crime formal comum de ação múltipla instantâneo e permanente nas figuras possuir e guardar unissubjetivo unissubsistente 7 Questões especiais Vide art 295 do CP se o crime é praticado por funcionário público O objeto especialmente destinado à falsificação é aquele mencionado pelo art 291 do CP Quando o agente falsifica os petrechos e falsifica o título responde pelo crime do art 289 do CP que absorve o delito em análise Vide arts 1º e 38 da Lei n 653878 quando se trata de selo ou vale postal art 1º VI do Dec n 98293 crimes de natureza tributária art 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais 8 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são reclusão de um a três anos e multa Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Petrechos de falsificação O reconhecimento da atipicidade da conduta eventuais irregularidades no laudo da perícia grafotécnica e a ausência de provas suficientes para o crime previsto no art 294 do Código Penal Petrechos de falsificação são questões que demandam um profundo exame probatório para sua verificação Inviável pois em uma ação de cognição sumária como o habeas corpus proceder sua análise STJ RHC 17284MT Rel Min Hélio Quaglia Barbosa j 6102005 Falsificação de papéis públicos Petrechos de falsificação Concurso aparente de normas Ant factum impunível Não há concurso material de crimes na hipótese em que o agente fabrica adquire fornece possui ou guarda objetos destinados à falsificação de papéis públicos pois a segunda consubstancia mero ato preparatório ou ant factum impunível STJ HC 11799SP Rel Min Vicente Leal j 1652000 Art 295 Se o agente é funcionário público e comete o crime prevalecendose do cargo aumentase a pena de sexta parte D O U T R I N A Tratase de figura majorada que incide sobre os arts 293 e 294 do CP quando o sujeito ativo é funcionário público art 327 do CP e comete o crime prevalecendose do cargo que ocupa Capítulo III Da Falsidade Documental Falsificação do selo ou sinal público Art 296 Falsificar fabricandoos ou alterandoos I selo público destinado a autenticar atos oficiais da União de Estado ou de Município II selo ou sinal atribuído por lei a entidade de direito público ou a autoridade ou sinal público de tabelião Pena reclusão de 2 dois a 6 seis anos e multa 1º Incorre nas mesmas penas I quem faz uso do selo ou sinal falsificado II quem utiliza indevidamente o selo ou sinal verdadeiro em prejuízo de outrem ou em proveito próprio ou alheio III quem altera falsifica ou faz uso indevido de marcas logotipos siglas ou quaisquer outros símbolos utilizados ou identificadores de órgãos ou entidades da Administração Pública Inciso III acrescentado pela Lei n 9983 de 14 de julho de 2000 2º Se o agente é funcionário público e comete o crime prevalecendose do cargo aumentase a pena de sexta parte D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a fé pública no particular aspecto dos selos e sinais 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo é qualquer pessoa Sujeitos passivos são o Estado e secundariamente a pessoa prejudicada 3 Tipo objetivo adequação típica A conduta típica consiste em a falsificar fabricando criando ou alterando modificando I selo público destinado a autenticar atos oficiais do poder federal estadual ou municipal II selo ou sinal atribuído legalmente a entidade de direito público de tabelião b usar selo ou sinal falsificado 1º c utilizar de forma indevida selo ou sinal verdadeiro em prejuízo de terceiro ou de proveito próprio ou alheio 1º II 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade de falsificar fabricando ou alterando o selo ou sinal ciente de que é destinado à autenticação de documentos oficiais Não há exigência de qualquer finalidade especial 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a falsificação total ou parcial com a utilização do selo falso ou com a verificação efetiva do prejuízo dano ou vantagem Admitese a tentativa excluindo a figura de usar selo falso 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comum material no uso indevido instantâneo e simples 7 Forma majorada Há previsão de majoração de pena para alguns qualificadora quando o agente é funcionário público e pratica o crime prevalecendo se do cargo 2º 71 Prevalecendose do cargo A expressão prevalecendose do cargo 2º não significa valerse o agente do posto ocupado mas abusar no exercício das funções respectivas das funções específicas de sua competência utilizandoas maliciosamente para a prática do crime Sylvio do Amaral Falsidade documental 2 ed São Paulo Revista dos Tribunais 1978 p 17 8 Questões especiais Quando o usuário é o próprio falsificador responde apenas pelo crime de falsificação É atípica a simples detenção do objeto material selo ou sinal falsificado Se o agente utiliza indevidamente selo ou sinal por meio de crime furto roubo etc incorre nas sanções previstas para os delitos em concurso material Entendese que não caracteriza o especial fim de agir elemento subjetivo do tipo a prática do crime em prejuízo de outrem ou em proveito próprio ou alheio 1º II Vide art 3º 3º do Dec n 98293 crime de natureza tributária 9 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são reclusão de dois a seis anos e multa caput a mesma cominada às hipóteses dos 1º e 2º Na forma qualificada a pena é igual à do caput aumentada de sexta parte Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Consta na denúncia que os 13 espelhos de cédula de identidade apesar de materialmente falsos estavam sem fotografias e sem impressões datiloscópicas Todavia entendo possível considerar tratarse de crime tentado ou mesmo o previsto no art 296 inciso II do Código Penal falsificação de selo ou sinal público uma vez que os espelhos segundo a denúncia possuíam sinais públicos falsos ostentando chancelas mecânicas representando assinatura de pessoa indicada como Delegado de Polícia Diretor do Instituto de Identificação do Estado de São Paulo TRF 3ª Região HC 200203000366190 Rel Cotrim Guimarães j 11102005 Crime de falsificação de selo ou sinal público na modalidade de utilização inciso II do 1º do art 296 do CP De acordo com a denúncia o impetrantepaciente que é presidente de entidade de ensino não reconhecida ou autorizada utilizavase de certificados encimados com o selo da República Federativa do Brasil comumente usado em documentação oficial do MEC para que candidatos a cargos públicos se habilitassem Sua conduta pelo menos à primeira vista é típica STJ RHC 1829SP Rel Min Adhemar Maciel j 2931993 Falsificação de selo ou sinal público Art 296 II do Código Penal O tipo restringe se a mera conduta sendo despiciendo o prejuízo a terceiro A substituição de folha do processo por outra numerada por pessoa estranha ao Cartório com imitação da rubrica do serventuário alcança o objeto jurídico protegido pelo dispositivo legal a fé pública considerado o sinal de autenticidade O dolo decorre da vontade livre e consciente de praticar o ato STF HC 68433DF Rel Min Marco Aurélio j 192 1991 Falsificação de documento público Art 297 Falsificar no todo ou em parte documento público ou alterar documento público verdadeiro Pena reclusão de 2 dois a 6 seis anos e multa 1º Se o agente é funcionário público e comete o crime prevalecendose do cargo aumentase a pena de sexta parte 2º Para os efeitos penais equiparamse a documento público o emanado de entidade paraestatal o título ao portador ou transmissível por endosso as ações de sociedade comercial os livros mercantis e o testamento particular 3º Nas mesmas penas incorre quem insere ou faz inserir I na folha de pagamento ou em documento de informações que seja destinado a fazer prova perante a previdência social pessoa que não possua a qualidade de segurado obrigatório II na Carteira de Trabalho e Previdência Social do empregado ou em documento que deva produzir efeito perante a previdência social declaração falsa ou diversa da que deveria ter sido escrita III em documento contábil ou em qualquer outro documento relacionado com as obrigações da empresa perante a previdência social declaração falsa ou diversa da que deveria ter constado 3º e respectivos incisos acrescentados pela Lei n 9983 de 14 de julho de 2000 4º Nas mesmas penas incorre quem omite nos documentos mencionados no 3º nome do segurado e seus dados pessoais a remuneração a vigência do contrato de trabalho ou de prestação de serviços 4º acrescentado pela Lei n 9983 de 14 de julho de 2000 D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é a fé pública particularmente em relação à autenticidade de documento público 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo é qualquer pessoa Sujeitos passivos são o Estado e secundariamente quem for prejudicado Tratandose de funcionário público a pena será majorada em um sexto se cometer o crime prevalecendose de seu cargo 3 Tipo objetivo adequação típica As ações incriminadas são a falsificar no todo contrafação total com formação global por inteiro ou em parte contrafação parcial com acréscimo de dizeres letras etc documento público b alterar modificar adulterar dizeres letras documento público verdadeiro 31 Documento público Por documento público entendese aquele que é elaborado na forma prescrita em lei por funcionário público no exercício de suas atribuições compreendido o documento formal e substancialmente público observadas as formalidades condicionantes de sua eficácia jurídica do País Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 9 p 223 e também os traslados fotocópias autenticadas certidões ou telegramas desde que referentes a ato oficial de funcionário público e ainda o mencionado pelo 2º 4 Folha de pagamento ou documento de informações 3º I A Lei n 99832000 incluiu os 3º e 4º no artigo em exame criando novas figuras típicas especificando algumas falsidades documentais No 3º as infrações são comissivas e no 4º são omissivas Na primeira hipótese as condutas tipificadas divididas em três incisos são inserir ou fazer inserir dados que mencionam incondizentes com a verdade Inserir tem o sentido de introduzir ou colocar ao passo que fazer inserir significa estimular incentivar que outrem introduza ou coloque na folha de pagamento ou em documento de informações que seja destinado a fazer prova perante a previdência social pessoa que não possua a qualidade de segurado obrigatório 41 Carteira de Trabalho e Previdência Social do empregado II Inserir ou fazer inserir na Carteira de Trabalho e Previdência Social do empregado ou em documento que deva produzir efeito perante a previdência social declaração falsa ou diversa da que deveria ter sido escrita A falsidade aqui é ideológica em descompasso com a figura do caput 42 Documento contábil ou qualquer outro documento III Inserir ou fazer inserir em documento contábil ou em qualquer outro documento relacionado com as obrigações da empresa perante a previdência social declaração falsa ou diversa da que deveria ter constado Isso é uma especificação do crime de falsidade ideológica descrito no art 299 5 Falsidade ideológica confundida com falsidade material Chega a ser constrangedora a equivocada inclusão no art 297 que trata de falsidade material de condutas que identificam falsidade ideológica quando deveriam ter sido introduzidas no art 299 com a cominação de pena que lhes parecesse adequada A falsidade material com efeito altera o aspecto formal do documento construindo um novo ou alterando o verdadeiro a falsidade ideológica por sua vez altera o conteúdo do documento total ou parcialmente 6 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade de falsificar ou alterar documento público com a consciência de que o faz ilicitamente É desnecessária a finalidade específica de prejudicar 7 Consumação e tentativa Consumase o crime com a prática de qualquer das condutas descritas no tipo penal independentemente do uso posterior ou qualquer outra consequência A tentativa é teoricamente admissível 8 Classificação doutrinária Tratase de crime comum comissivo formal instantâneo unissubjetivo e plurissubsistente 9 Figura majorada Quando o sujeito ativo é funcionário público art 327 do CP e pratica o crime prevalecendose do cargo vide nota ao artigo anterior 1º 10 Falsificação grosseira estelionato A falsificação deve ser aquela capaz de enganar ou seja não há esse crime quando a falsificação se apresenta de forma grosseira podendo ocorrer um delito patrimonial como o estelionato Quanto à falsidade no crime de estelionato vide comentários do art 171 do CP Entendese que para a configuração do delito do art 297 do CP fazse necessário o exame de corpo de delito 11 Falsificação e sonegação fiscal absorção Quando a falsificação tem como fim a sonegação fiscal Lei n 572965 esse crime absorve a falsidade Nesse sentido TJSP RT 518329 Entendese que se o agente falsifica o documento público e depois o utiliza será punido apenas pelo crime de falsificação 12 Falsificação total ou parcial irrelevância A falsificação ou adulteração pode produzir um documento completamente novo ou simplesmente alterar um documento verdadeiro introduzindolhe elementos não verdadeiros 13 Questões especiais Quanto aos títulos transmissíveis por endosso 2º como cheque duplicata que após determinado prazo puderem ser transferidos apenas mediante cessão civil deixam de ser equiparados a documentos públicos Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 9 p 266 A simples eliminação de palavras de um texto caracteriza o delito do art 305 e não a alteração Vide arts 1º e 3º 3º do Dec n 98293 crime de natureza tributária art 64 da Lei n 838391 altera a legislação do Imposto de Renda art 49 IV da CLT art 348 1º e 2º da Lei n 473765 Código Eleitoral art 2º da Lei n 749286 crimes contra o Sistema Financeiro Nacional 14 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são reclusão de dois a seis anos e multa A figura majorada comina a mesma pena aumentada de sexta parte Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A O agente que omite dados na Carteira de Trabalho e Previdência Social atentando contra interesse da Autarquia Previdenciária estará incurso nas mesmas sanções do crime de falsificação de documento público nos termos do 4º do art 297 do Código Penal sendo a competência da Justiça Federal para processar e julgar o delito consoante o art 109 inciso IV da Constituição Federal STJ Conflito de Competência 58443MG Rel Min Laurita Vaz j 2722008 Inexiste ilegalidade em face da fixação da penabase para o crime de falsificação de documento público pouco acima do mínimo legal de 2 anos em vista das circunstâncias que cercam o cometimento do delito que denotam a participação do paciente em forte esquema de adulteração de passaportes com objetivos não totalmente esclarecidos tudo a caracterizar o dolo excessivo e a personalidade inclinada ao cometimento de crimes STJ HC 87574SP Rel Min Napoleão Nunes Maia Filho j 11122007 Estelionato e falsificação de documento público Absorção do falsum pelo estelionato Delitos autônomos Hipótese na qual o paciente mesmo após ter consumado a prática dos dois delitos de estelionato continuou a utilizar o documento adulterado a fim de falsear a sua identificação pelo fato de ostentar inúmeros antecedentes criminais Crime de falsificação de documento público que não se exauriu nos referidos estelionatos porquanto continuou a utilizar a identidade adulterada mesmo após a utilização dos cheques receptados não havendo que se falar em aplicação da Súmula 17STJ STJ HC 90136RJ Rel Jane Silva j 2011 2007 Ocorrendo o crime de falsificação de documento e de uso desse mesmo documento o delito do art 297 do Código Penal constitui crimemeio e é absorvido pelo crime fim de uso de documento falso CP art 304 TJPR Apelação 3874084 Rel Miguel Kfouri Neto j 1522007 O uso dos papéis falsificados quando praticado pelo próprio autor da falsificação configura post factum não punível mero exaurimento do crimen falsi respondendo o falsário em tal hipótese pelo delito de falsificação de documento público CP art 297 ou conforme o caso pelo crime de falsificação de documento particular CP art 298 Doutrina Precedentes STF STF HC 84533MG Rel Min Celso de Mello j 1492004 Falsificação de documento particular Art 298 Falsificar no todo ou em parte documento particular ou alterar documento particular verdadeiro Pena reclusão de 1 um a 5 cinco anos e multa D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a fé pública particularmente em relação à autenticidade dos documentos particulares 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo é qualquer pessoa Sujeito passivo é o Estado bem como eventual pessoa lesada 3 Tipo objetivo adequação típica As ações aqui incriminadas são as mesmas previstas no artigo anterior vide art 297 do CP No entanto o objeto material deste tipo é o documento particular É considerado todo escrito devido a um autor determinado contendo a exposição de fatos ou declarações de vontade dotado de significação ou relevância jurídica H C Fragoso Lições de Direito Penal Parte Especial 3 ed p 3312 Documento particular é aquele não compreendido pelo art 297 e seu 2º ou seja é aquele elaborado sem a intervenção de funcionário ou de alguém que tenha fé pública 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de falsificar ou alterar documento particular Não se exige qualquer elemento subjetivo especial do tipo 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a simples falsificação ou alteração do documento independentemente de seu uso posterior Admitese em tese a tentativa 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comissivo comum de conteúdo variado unissubjetivo e plurissubsistente 7 Questões especiais O falsificador não responde pelo crime de uso art 304 do CP quando se utiliza do documento falsificado Vide art 3º 3º do Dec n 98293 crime de natureza tributária art 349 da Lei n 473765 Código Eleitoral art 1º III e IV da Lei n 813790 crimes contra a ordem tributária econômica e contra as relações de consumo 8 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são a reclusão de um a cinco anos e a multa Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A pena cominada para o crime de falsificação de documento público é mais grave do que a prevista para o estelionato e para a falsificação de documento particular Logo deve preponderar o local da consumação do crime de falsificação de documento público por aplicação da regra do art 78 II a do Código de Processo Penal STJ Conflito de Competência 86419GO Rel Min Maria Thereza de Assis Moura j 12 92007 Confissão documental do paciente Exame de corpo de delito Não houve condenação pelo crime de falsificação de documento particular Código penal art 298 ante a inexistência do exame de corpo de delito Outras provas foram consideradas para amparar a condenação pelo crime de estelionato tornando prescindível a realização de perícia STF HC 82122SE Rel Min Ellen Gracie j 3052003 Falsidade ideológica Art 299 Omitir em documento público ou particular declaração que dele devia constar ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita com o fim de prejudicar direito criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante Pena reclusão de 1 um a 5 cinco anos e multa se o documento é público e reclusão de 1 um a 3 três anos e multa se o documento é particular Parágrafo único Se o agente é funcionário público e comete o crime prevalecendose do cargo ou se a falsificação ou alteração é de assentamento de registro civil aumentase a pena de sexta parte D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a fé pública referente à autenticidade dos documentos 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo é qualquer pessoa Sujeito passivo é o Estado bem como a pessoa lesada 3 Tipo objetivo adequação típica As condutas alternativamente incriminadas consistem em a omitir não dizer não mencionar em documento público ou particular a declaração que nele devia constar b inserir introduzir diretamente ou c fazer inserir forma indireta nele declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita A declaração deve recair sobre fato juridicamente relevante ou seja é mister que a declaração falsa constitua elemento substancial do ato de documento Uma simples mentira mera irregularidade simples preterição de formalidade etc não constituirão E Magalhães Noronha Direito Penal 17 ed v 4 p 161 31 Falsidade ideológica e falsidade material distinção O tipo referese à falsidade ideológica e não à material diferenciandose as duas de modo que enquanto a falsidade material afeta a autenticidade ou a inalterabilidade do documento na sua forma extrínseca e conteúdo intrínseco a falsidade ideológica afetao tão somente na sua ideação no pensamento que suas letras encerram A falsidade ideológica versa sobre o conteúdo do documento enquanto a falsidade material diz respeito a sua forma No falso ideológico basta a potencialidade de dano independente de perícia 4 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo geral é o dolo representado pela vontade de falsificar documento público ou particular e o elemento subjetivo do tipo consiste no especial fim de agir de prejudicar direito criar obrigações ou alterar a verdade 5 Consumação e tentativa Consumase o delito com a prática das condutas típicas A tentativa é admitida nas modalidades inserir e fazer inserir 6 Classificação doutrinária Crime comum comissivo ou omissivo simples e de conteúdo variado 7 Forma qualificada Dois os qualificadores do tipo a quando o agente é funcionário público e pratica o crime valendose do cargo vide nota do art 296 do CP b se a falsificação ou alteração é de assentamento do registro civil 8 Falsidade e simulação fraudulenta Entendese que a simulação configura o crime de falsidade ideológica No entanto cumpre notar que a simulação fraudulenta servindo de documento de engano e locupletação ilícita em certos casos deixa o quadro dos crimina falsi para figurar entre os crimes patrimoniais Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 9 p 284 como duplicata simulada fraude à execução etc O registro de filho alheio como próprio parágrafo único atualmente é previsto no art 249 do CP E a conduta de promover no registro civil a inscrição de nascimento existente é crime no art 241 do CP 9 Folha assinada em branco Quanto à falsidade em folha assinada em branco entendese que a é crime de falsidade ideológica se a folha foi abusivamente preenchida pelo agente que tinha sua posse legítima b se o papel estava sob a guarda do agente ou foi obtido por outro meio criminoso sendo preenchido de forma abusiva há crime de falsidade material art 297 ou 298 c quando na hipótese anterior houver revogação do mandato ou tiver cessado a obrigação ou faculdade de preencher o papel o agente também responde por falsidade material H C Fragoso Lições de Direito Penal Parte Especial 3 ed p 358 Damásio E de Jesus Direito Penal v 4 1994 p 53 10 Questões especiais Se o falsificador usa o documento falsificado responde apenas pelo crime do art 299 do CP Vide art 168 1º II da Lei n 111012005 nova Lei de Falências art 125 III da Lei n 681580 Estatuto do Estrangeiro art 49 I da CLT arts 315 e 350 parágrafo único da Lei n 473765 Código Eleitoral art 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais Quando o objetivo do agente é cometer o crime de sonegação fiscal vide nota ao art 297 do CP 11 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são reclusão de um a cinco anos e multa documento público reclusão de um a três anos e multa documento particular A figura majorada comina a mesma pena aumentada de sexta parte Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Petição apresentada em juízo com endereço inverídico não caracteriza o documento previsto na falsidade ideológica pois este é sempre sujeito a averiguação pelo oficial de justiça Conduta descrita na exordial acusatória que não se subsume a falsidade ideológica pois o elemento objetivo do delito caracterizado pelo ato de falsear a verdade assim como o elemento subjetivo manifestado pelo intuito de prejudicar direito criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante não restaram devidamente caracterizados na espécie Estando flagrantemente demonstrada a atipicidade da conduta praticada pelo paciente diante da ausência de elemento constitutivo do tipo consistente no intuito de falsear a verdade causando prejuízo a outrem correta a alegação de falta de justa causa para investigações policiais e instauração de ação penal STJ RHC 20414RS Rel Jane Silva j 11 122007 In casu da análise dos autos constatase a atipicidade da conduta imputada aos pacientes considerando que a mesma não se subsume ao tipo penal do art 299 do Código Penal ante a ausência das elementares do núcleo do tipo penal De fato a conduta imputada aos pacientes é atípica uma vez que a troca das palavras não aprovado por não apreciado não resultou em prejuízo criou obrigação ou alterou a verdade sobre fato juridicamente relevante na forma como estabelecido no art 299 do Código Penal razão pela qual deve ser concedida a ordem a fim de que seja trancado o inquérito policial quanto a este fato TRF 1ª Região HC 200701000181940 Rel Ítalo Fioravanti Sabo Mendes j 1892007 Tendo o agente sido preso em flagrante declinando nome falso perante a autoridade policial não há que se falar em falsidade ideológica nem em falsa identidade pois tal fato constituise num reflexo do direito à ampla defesa seja para fugir de um passado criminoso ou em autodefesa inexistindo pois nessa conduta o dolo específico reclamado nas figuras delitivas em comento TJMG Apelação 1064702021284 90011 Rel Antônio Armando dos Santos j 1072007 A utilização de carteira de identidade de terceiro substituindo o agente a fotografia do verdadeiro portador pela sua para a abertura de contacorrente em estabelecimento bancário caracteriza o delito de falsidade ideológica descrito no artigo 299 do Código Penal e não o crime previsto no artigo 307 do mesmo Estatuto uma vez que o documento de identidade utilizado pelo réu não era falso não correspondendo apenas a fotografia colada no documento A configuração do delito de falsidade ideológica não exige a existência de dano efetivo sendo suficiente a potencialidade de um evento danoso Não pode o crime de falsidade ideológica ser absorvido pelo crime de estelionato quando a potencialidade lesiva não se exaure no falso TJDF Apelação 20010110880415 Rel Roberval Casemiro Belinati j 9 52007 O crime de falsidade ideológica quando utilizado como meio para cometimento do crime de apropriação indébita crimefim é por este absorvido STJ REsp 318395SE Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 18122003 Falso reconhecimento de firma ou letra Art 300 Reconhecer como verdadeira no exercício de função pública firma ou letra que o não seja Pena reclusão de 1 um a 5 cinco anos e multa se o documento é público e de 1 um a 3 três anos e multa se o documento é particular D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a fé pública em particular a autenticidade de firma ou letra dos documentos 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo somente pode ser o funcionário público que possua fé pública para reconhecer a firma ou a letra Sujeito passivo mediato é o Estado bem como a pessoa lesada imediatamente 3 Tipo objetivo adequação típica A ação incriminada é reconhecer admitir atestar como verdadeiras a firma assinatura ou a letra manuscrito quando não o é conferindo fé ao documento público ou privado Reconhecer como verdadeiro significa atribuir tal condição a firma ou letra que não a tem ou seja reconhecêlas como verdadeiras quando na realidade são falsas 31 Firma ou letra definições Firma é a assinatura por extenso ou abreviadamente letra é o manuscrito integral de alguém que também subscreve o documento O reconhecimento pode ser autêntico semiautêntico por semelhança ou indireto A lei não os distingue para efeitos de tipificação do crime 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo constituído pela vontade de praticar a conduta incriminada com conhecimento de que a firma ou letra não é falsa O erro quanto à autenticidade exclui o dolo Como não há previsão de modalidade culposa mesmo que o erro seja evitável a conduta será atípica desde que não se trate de um simulacro de erro Não há exigência de elemento subjetivo especial do tipo 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com o reconhecimento feito pelo funcionário público independentemente da utilização do documento ou da produção de eventual prejuízo A tentativa é teoricamente admissível Em sentido contrário não admitindo tentativa Guilherme de Souza Nucci Código Penal comentado p 761 6 Classificação doutrinária Tratase de crime formal próprio instantâneo unissubjetivo e plurissubsistente 7 Questões especiais É irrelevante para a configuração do crime o meio utilizado pelo agente para o reconhecimento Aquele que falsifica o documento e o apresenta ao agente desse crime poderá responder pelo art 300 partícipe e pelo art 297 ou 298 em concurso material Vide art 304 do CP art 352 da Lei n 473765 Código Eleitoral 8 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são reclusão de um a cinco anos e multa documento público e de um a três anos e multa documento particular Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Falso reconhecimento de firma Não tendo as provas colhidas o condão de atestar tenha o apelado concorrido para o falso reconhecimento de firma perpetrado por sua mãe não se pode responsabilizálo pelo crime tipificado no art 300 do Código Penal TJRS Apelação 70013794334 Rel Roque Miguel Fank j 1462006 O delito de falso reconhecimento de firma ou letra art 300 do CP por cominar pena máxima de 3 três ou 5 cinco anos de reclusão é da competência da vara comum porquanto extrapola o novo limite de 2 dois anos estabelecido pelo art 2º da Lei n 10259 de 1412001 À unanimidade julgaram procedente o conflito estabelecendo a competência ao juízo suscitado Vara Criminal da Comarca de Carazinho TJRS Conflito de Competência 70004638292 Rel Roque Miguel Fank j 9102002 Certidão ou atestado ideologicamente falso Art 301 Atestar ou certificar falsamente em razão de função pública fato ou circunstância que habilite alguém a obter cargo público isenção de ônus ou de serviço de caráter público ou qualquer outra vantagem Pena detenção de 2 dois meses a 1 um ano Falsidade material de atestado ou certidão 1º Falsificar no todo ou em parte atestado ou certidão ou alterar o teor de certidão ou de atestado verdadeiro para prova de fato ou circunstância que habilite alguém a obter cargo público isenção de ônus ou de serviço de caráter público ou qualquer outra vantagem Pena detenção de 3 três meses a 2 dois anos 2º Se o crime é praticado com o fim de lucro aplicase além da pena privativa de liberdade a de multa D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a fé pública em especial relativamente a certidões e atestados emitidos por funcionário público 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo é o funcionário público caput ou qualquer pessoa 1º As ações incidem sobre fato ou circunstância inerente ou atinente à pessoa a quem se destina o atestado ou certidão e condicionante da obtenção de um benefício de ordem de caráter público Nélson Hungria Comentários ao Código Penal p 292 No mesmo sentido Guilherme de Souza Nucci Código Penal comentado p 763 Sujeito passivo é o Estado 3 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo constituído pela vontade de praticar qualquer das condutas descritas no dispositivo em exame e o elemento subjetivo do tipo que consiste no especial fim de obter lucro 4 Consumação e tentativa Consumase o crime com a prática de qualquer das condutas tipificadas independentemente de qualquer outro resultado ou consequência consumase enfim no momento em que o agente conclui a certidão ou o atestado Admitese a tentativa embora seja difícil a sua configuração 5 Classificação doutrinária Tratase de crime formal próprio caput comum 1º e instantâneo de efeitos permanentes unissubjetivo e plurissubjetivo 6 Figura majorada Quando o agente pratica o crime com o fim de lucro 2º a pena é majorada em um sexto 7 Questões especiais Entendese que quando for o caso de certidão ou atestado escolar caracterizase o crime do art 297 do CP Quando a prática do crime tem fins políticos vide art 175 do CE O art 301 admite a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada inferior a um ano Vide ainda art 304 do CP 8 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é a detenção de dois meses a um ano O 1º comina pena de detenção de três meses a dois anos Na figura majorada aplicase além da pena privativa de liberdade caput ou 1º a de multa Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A fraude cometida para obtenção de benefício previdenciário ainda que consistente na sua mera aprovação configura o crime de estelionato art 171 3º do Código Penal que por suas circunstâncias especiais tem natureza permanente regulando se a prescrição pela regra do art 111 inciso III do Código Penal cessando a permanência quando do recebimento da última parcela do benefício fraudulento Portanto a aduzida prática do delito de certidão ou atestado ideologicamente falso consistiu em crimemeio Tratandose de conflito aparente entre normas deve ser observado o princípio da consunção na forma da progressão criminosa antefactum impunível onde o delito menos grave que é praticado como meio necessário para a realização do crime mais grave crimefim fica por este absorvido TRF 3ª Região Recurso Criminal 200361810081893 Rel Cotrim Guimarães j 274 2004 Desclassificação do crime de estelionato para certidão ou atestado ideologicamente falso Matéria de direito passível de ser analisada pela via do Habeas Corpus Hipótese que a pena máxima em abstrato cominada para o delito corretamente tipificado autoriza a extinção da punibilidade pela prescrição TRF 3ª Região HC 200103000328317 Rel Castro Guerra j 8102002 O crime previsto no 1º do art 301 do Código Penal falsidade material de atestado ou certidão diverso daquele tipificado no caput do aludido dispositivo não é delito próprio de servidor público podendo ser praticado por qualquer pessoa Precedentes STJ REsp 251009DF Rel Min Fernando Gonçalves j 1º102002 Diversamente do tipificado no caput do art 301 do Código Penal Certidão ou Atestado Ideologicamente Falso o crime previsto no 1º daquele artigo Falsificar Material de Atestado ou Certidão não é crime próprio de servidor público podendo ser praticado por qualquer pessoa Precedentes do Superior Tribunal de Justiça STJ REsp 209245DF Rel Min Hamilton Carvalhido j 1º32001 Falsidade de atestado médico Art 302 Dar o médico no exercício da sua profissão atestado falso Pena detenção de 1 um mês a 1 um ano Parágrafo único Se o crime é cometido com o fim de lucro aplicase também multa D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a fé pública particularmente em relação ao atestado médico 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo é somente o médico Sujeito passivo é o Estado 3 Tipo objetivo adequação típica A ação incriminada é dar fornecer entregar atestado falso que é o objeto material É necessária a realização da conduta no exercício da profissão médica ou seja relativa aos atos que incumbem ao médico em sua atividade O atestado deve versar sobre fato relevante como por exemplo a constatação de doença ou enfermidade Assim o simples prognóstico não o configura 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo geral é o dolo constituído pela vontade consciente de dar ou emitir atestado médico falso A existência eventual do elemento subjetivo especial do tipo parágrafo único consistente no especial fim de obter lucro configura a forma majorada 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a entrega do atestado falso ao interessado ou a outra pessoa visto que a conduta tipificada é dar atestado falso independentemente de qualquer outro resultado ou consequência Admitese teoricamente a tentativa 6 Classificação doutrinária Tratase de crime próprio sujeito ativo somente médico formal unissubjetivo plurissubsistente instantâneo e comissivo 7 Forma qualificada Quando o agente comete o delito com o fim de lucro parágrafo único 8 Questões especiais Se o médico é funcionário público comete o crime do art 301 do CP Pratica o crime de corrupção passiva art 317 do CP o agente que sendo funcionário público e em razão de seu ofício fornece atestado com fim lucrativo Admitese em tese a configuração do art 302 do CP no caso de atestação de óbito sem qualquer exame no cadáver mediante paga Nesse sentido STF RT 50748 Admitese a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada inferior a um ano Vide ainda art 304 do CP Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais 9 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é a detenção de um mês a um ano A forma qualificada prevê também a aplicação de pena de multa Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Falsificação de atestado médico art 301 1º do Código Penal A falsidade ideológica do art 302 do Código Penal exige a ciência do profissional de que atesta enfermidade inexistente No caso sequer há prova segura de que o réu não sofria da enfermidade por ocasião do julgamento perante o Tribunal do Júri pois inclusive já estava sob efeito de medicação TJRS Recurso Crime 71001557610 Rel Alberto Delgado Neto j 3132008 Atestado médico Presunção de veracidade A simples ausência do CID que possibilitaria a identificação da doença não acarreta isoladamente a presunção de falsidade do atestado médico TJRS Recurso Cível 71001497171 Rel Eduardo Kraemer j 2022008 Falsidade de atestado médico Art 302 do Código Penal Pela via estreita do remédio heroico não cabe discutir a prova no âmbito do Habeas Corpus Suspeitando a Juíza de Direito em audiência de processo cível de possível falsidade em atestado médico não se caracteriza como coação ilegal a determinação de abertura de inquérito para investigação do fato TJRS HC 71001073519 Rel Alberto Delgado Neto j 23102006 Reprodução ou adulteração de selo ou peça filatélica Art 303 Reproduzir ou alterar selo ou peça filatélica que tenha valor para coleção salvo quando a reprodução ou a alteração está visivelmente anotada na face ou no verso do selo ou peça Pena detenção de 1 um a 3 três anos e multa Parágrafo único Na mesma pena incorre quem para fins de comércio faz uso do selo ou peça filatélica D O U T R I N A Alteração legislativa o presente artigo foi derrogado pelo art 39 da Lei n 653878 que dispõe sobre os serviços postais com pequena correção linguística mas cominando pena menor detenção de até dois anos e pagamento de três a dez diasmulta 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a fé pública em especial os selos e peças filatélicas 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa tratandose de crime comum que não exige nenhuma qualidade ou condição especial Sujeitos passivos são o Estado e secundariamente a pessoa lesada pelo fato praticado 3 Tipo objetivo adequação típica A conduta tipificada é reproduzir copiar produzir fazer igual ou alterar modificar contrafazer parcialmente adulterar bem como usar parágrafo único para fins comerciais selo postal recolhido ou peça filatélica como carimbos cartões blocos comemorativos provas etc É necessário que estes tenham valor para coleção Tratase de um tipo especial de falsificação normalmente crimemeio para a prática de estelionato 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo constituído pela vontade consciente de falsificar ou alterar selo ou peça filatélica A existência eventual do elemento subjetivo especial do tipo parágrafo único consistente no especial fim de obter lucro configura a forma majorada 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a efetiva falsificação ou adulteração ou seja quando qualquer destas estiver concluída Admitese teoricamente a tentativa 6 Classificação doutrinária Tratase de crime formal comum comissivo e instantâneo unissubjetivo e plurissubsistente 7 Questões especiais Entendese que este artigo e seu parágrafo único foram revogados pelo art 39 e seu parágrafo único da Lei n 653878 Admitese a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada igual a um ano Vide art 39 da Lei n 653878 serviços postais art 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais 8 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são detenção de um a três anos e multa as mesmas penas são aplicadas ao parágrafo único Ação penal pública incondicionada Uso de documento falso Art 304 Fazer uso de qualquer dos papéis falsificados ou alterados a que se referem os arts 297 a 302 Pena a cominada à falsificação ou à alteração D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a fé pública 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo é qualquer pessoa excluído o autor da falsificação Sujeitos passivos são o Estado e secundariamente a pessoa prejudicada 3 Tipo objetivo adequação típica A conduta incriminada é fazer uso que significa empregar utilizar qualquer dos papéis falsificados ou alterados referidos nos arts 297 a 302 do CP como se fossem autênticos ou verdadeiros É necessário que seja utilizado o documento falso em sua destinação específica É indispensável a utilização efetiva do documento falso sendo insuficiente a simples alusão 31 Apresentação espontânea ou solicitação de autoridade Quando se trata de Carteira Nacional de Habilitação o simples porte caracteriza o crime embora somente seja exibido por solicitação da Autoridade de Trânsito Nessa hipótese portála é fazer uso Na hipótese de outro documento a nosso juízo o simples porte de documento que apenas é encontrado mediante revista da autoridade competente não caracteriza este crime 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo consistente na vontade de usar documento falso consciente da falsidade Não é exigível qualquer fim especial do injusto Não há previsão de modalidade culposa 5 Consumação e tentativa Consumase o delito com a utilização do documento A tentativa é de difícil configuração 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comum formal instantâneo de efeitos permanentes comissivo unissubjetivo e plurissubsistente 7 Questões especiais Quando a falsificação do documento é grosseira ou seja sem potencialidade alguma de causar dano não há o crime de uso Nesse sentido STF RJ 121140 A prescrição no delito desse art 304 do CP começa a correr do primeiro ato de uso do documento que quando reiterado caracteriza crime continuado O falsificador que usa o documento é punido apenas por um crime o de falsificação Poder seá admitir a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada igual ou inferior a um ano à falsificação ou alteração Não basta trazer consigo o documento é necessário que saia da esfera de domínio pessoal do sujeito ativo Vide art 49 III da CLT arts 7º e 14 da Lei n 749286 crimes contra o Sistema Financeiro Nacional 8 Pena e ação penal A pena cominada é a mesma cominada ao crime de alteração ou falsificação arts 297 a 302 do CP de acordo com a natureza do documento pública ou privada Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 200 do STJ O juízo Federal competente para processar e julgar acusado de crime de uso de passaporte falso é o do lugar onde o delito se consumou Comete o delito previsto no art 304 do CP o agente que abordado por policiais rodoviários apresenta Carteira Nacional de Habilitação falsificada TJRS Apelação 70022411409 Rel Constantino Lisbôa de Azevedo j 2412008 O delito de uso de documento falso configurase mesmo que o documento tenha sido apresentado após solicitação policial Precedentes nesse sentido Documento falso capaz de enganar o cidadão comum que não detém conhecimento técnico ou experiência profissional para reconhecer a falsidade Cometimento do delito do art 304 do Código Penal TJRS Apelação 70022300222 Rel Aristides Pedroso de Albuquerque Neto j 2412008 Não se sustenta a condenação da apelante pela prática do crime de uso de documento falso sob o fundamento de ter se valido de seu nome de solteira para retirar passaporte quando sabidamente se encontrava separada de fato de seu cônjuge e na iminência de obter o divórcio não havendo na hipótese qualquer finalidade em prejudicar direito criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante em seu benefício TRF 1ª Região Apelação 200139000075146 Rel Olindo Menezes j 1512008 Comete o delito de falsidade ideológica o agente que utilizandose de certidão de nascimento falsa obtém cédula de identidade ideologicamente inautêntica com dados pessoais de terceiro alterando assim verdade sobre fato juridicamente relevante Crime de uso de documento falso art 304 CP que nesse contexto acaba ficando absorvido pelo delito de falsidade ideológica art 299 CP aquele crimemeio este crimefim TJRS Apelação 70021865183 Rel José Eugênio Tedesco j 19122007 O réu não responde em concurso material pelo crime de falsificação de documento art 297 e de uso de documento falso art 304 pois que este é o crimefim e portanto absorve aquele que é o crimemeio devendo portanto ser condenado somente pelo uso TRF 1ª Região Apelação 200101000327600 Rel Tourinho Neto j 272007 Supressão de documento Art 305 Destruir suprimir ou ocultar em benefício próprio ou de outrem ou em prejuízo alheio documento público ou particular verdadeiro de que não podia dispor Pena reclusão de 2 dois a 6 seis anos e multa se o documento é público e reclusão de 1 um a 5 cinco anos e multa se o documento é particular D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a fé pública particularmente em relação à segurança de documento público ou particular 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo é qualquer pessoa até mesmo o proprietário do documento quando não tem dele disponibilidade Sujeito passivo é o Estado bem como eventual pessoa prejudicada 3 Tipo objetivo adequação típica As ações tipificadas consistem em a destruir eliminar destruir assolar b suprimir que é fazer desaparecer sem que o objeto seja destruído ou escondido c ocultar que significa esconder encobrir de modo que não seja encontrado O objeto material é o documento público ou particular verdadeiro de que o agente não podia dispor 31 Documento original Não há crime do art 305 do CP se o objeto material for translado certidão ou cópia autêntica de documento original existente No entanto poderá ocorrer outro delito como dano ou furto Se o documento é falso poderá configurar o crime de fraude processual art 347 ou favorecimento pessoal art 348 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo geral é o dolo consistente na vontade de praticar qualquer das condutas descritas no dispositivo em exame É indispensável o elemento subjetivo especial do tipo que consiste no especial fim de agir em benefício próprio ou de outrem ou em prejuízo de terceiro 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a destruição supressão ou ocultação do documento Admitese a tentativa 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comum instantâneo permanente na modalidade ocultar comissivo unissubjetivo e plurissubsistente 7 Supressão de documento e crime de dano No dano há um atentado contra o documento em si na supressão objetivase prejudicar alguém o agente destrói o documento como meio de prova 8 Questões especiais Entendese que a supressão de documento descaracteriza a prática do crime de furto ou apropriação indébita anterior Quando se trata de documento judicial ou processo e o agente é o procurador ou advogado configurase o crime do art 356 do CP Admitese a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada igual a um ano caso seja o documento particular Vide Lei n 813790 se o crime é cometido contra a ordem tributária art 168 1º V da Lei n 111012005 9 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são reclusão de dois a seis anos e multa se o documento é público reclusão de um a cinco anos e multa se o documento é particular Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Supressão de documento Destruição de cheque Comprovado que o réu destruiu documento particular verdadeiro de que não podia dispor cheque em benefício próprio e em prejuízo alheio deve ser mantida a condenação nas sanções do art 305 do CP TJRS Apelação 70020484671 Rel Gaspar Marques Batista j 612 2007 Supressão de documento Cometem o crime previsto no art 305 do CP os agentes que concorrem na condição de partícipes na supressão e ocultação de autos de infração de trânsito em benefício próprio TJRS Apelação 70019132380 Rel Constantino Lisbôa de Azevedo j 1462007 Supressão de documentos públicos Sendo o crime do art 305 CP punido somente a título de dolo a vontade livre e consciente dirigida a destruir suprimir ou ocultar o objeto material não se compadece com a ideia de que a recusa de devolvêlo para impunidade do delito anterior estelionato realiza um dos verbos nucleares do tipo Não ocultou não destruiu nem suprimiu o documento Reteveo para assegurar a impunidade do delito anterior Como não há forma qualificada pela conexão teleológica a única repercussão do delito seria na fixação da pena TJRS Apelação 70013060546 Rel Aramis Nassif j 1432007 Supressão de documento Tendo em vista que se caracteriza o delito do art 305 do Código Penal o rasgar cheque emitido para se eximir da obrigação pela dívida o recorrente como destacou o Magistrado cometeu o crime referido afirmando em sua sentença No entanto havendo esta divergência entre as palavras da vítima e do réu entendo que as palavras daquela sobrepõemse as desta ainda mais no presente caso onde não existe qualquer interesse ou vantagem na vítima destruir a cártula Tal preponderância se dá uma vez que a vítima em princípio não teria motivos para rasgar o referido documento que era aliás o único documento hábil a servir de prova em uma possível ação para o ressarcimento da dívida Por óbvio que a vítima não rasgaria o próprio dinheiro TJRS Apelação 70013681291 Rel Sylvio Baptista Neto j 2612006 O delito do art 305 do Código Penal na forma ocultar é permanente Logo sua consumação se protrai no tempo o que impede na espécie que se reconheça a extinção da punibilidade em virtude da prescrição da pretensão punitiva STJ HC 28837PB Rel Min Félix Fischer j 1632004 Capítulo IV De outras Falsidades Falsificação do sinal empregado no contraste de metal precioso ou na fiscalização alfandegária ou para outros fins Art 306 Falsificar fabricandoo ou alterandoo marca ou sinal empregado pelo poder público no contraste de metal precioso ou na fiscalização alfandegária ou usar marca ou sinal dessa natureza falsificado por outrem Pena reclusão de 2 dois a 6 seis anos e multa Parágrafo único Se a marca ou sinal falsificado é o que usa a autoridade pública para o fim de fiscalização sanitária ou para autenticar ou encerrar determinados objetos ou comprovar o cumprimento de formalidade legal Pena reclusão ou detenção de 1 um a 3 três anos e multa D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a fé pública em particular a segurança quanto à autenticidade das marcas 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa sem exigência de qualidade ou condição especial Sujeitos passivos são o Estado e secundariamente a vítima lesada pela conduta praticada 3 Tipo objetivo adequação típica As ações incriminadas são 1 falsificar fabricando contrafação ou alterando 2 ou usar empregar utilizar marca ou sinal empregado pelo Poder Público federal estatal ou municipal a no contraste de metal precioso b na fiscalização alfandegária c para o fim de fiscalização sanitária ou para autenticar ou encerrar determinados objetos ou comprovar o cumprimento de formalidade legal parágrafo único A marca que não se confunde com a de natureza industrial é propriamente um selo de garantia também destinado a comprovar a autenticidade de determinados objetos ou a certificar publicamente a qualidade ou estado do respectivo conteúdo ou a inculcar o cumprimento de formalidade legal O sinal é uma determinada impressão simbólica do Poder Público destinada a autenticar a legitimidade do metal precioso Bento de Faria Código Penal brasileiro comentado 3 ed Rio de Janeiro Record 1961 v 7 p 65 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo consistente na vontade de falsificar ou usar a marca ou sinal falsificado com conhecimento de que são usados pelo Poder Público para as finalidades declinadas no dispositivo em exame Não é exigido qualquer fim especial 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a efetiva fabricação ou alteração ou com o uso Admitese a tentativa na modalidade falsificar 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comum unissubjetivo plurissubsistente na falsificação simples e comissivo 7 Questões especiais O agente que falsificar a marca ou sinal depois de utilizála responde apenas pela falsificação por entenderse que comete crime único O tipo referese apenas a marcas ou sinais que possuam caráter oficial não configurando esse crime a falsificação de marcas de fábrica os certificados de origem etc E Magalhães Noronha Direito Penal 17 ed v 6 p 181 O parágrafo único admite suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada igual a um ano 8 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são reclusão de dois a seis anos e multa O parágrafo único comina pena de reclusão ou detenção de um a três anos e multa Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Hipótese em que a denúncia veiculou a imputação em concurso material com o tráfico de entorpecentes do delito de falsificação de sinal identificador previsto no art 306 parágrafo único do Código Penal em razão da adulteração dos dados oficiais identificadores da aeronave pilotada pelo paciente in casu a matrícula da aeronave no registro aeronáutico brasileiro O delito do art 306 parágrafo único do CP ao atingir bens e interesses da União desloca ratione materiae a competência para a Justiça Federal que prevalece sobre a justiça comum estadual ainda que no exercício de jurisdição federal delegada por imperativo do critério da especialidade TRF 3ª Região HC 199903000416180 Rel Theotonio Costa j 1522000 Falsa identidade Art 307 Atribuirse ou atribuir a terceiro falsa identidade para obter vantagem em proveito próprio ou alheio ou para causar dano a outrem Pena detenção de 3 três meses a 1 um ano ou multa se o fato não constitui elemento de crime mais grave D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a fé pública no tocante à identidade pessoal 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo é qualquer pessoa Sujeito passivo é o Estado bem como a pessoa que eventualmente for prejudicada 3 Tipo objetivo adequação típica A conduta típica consiste em atribuir inculcar irrogar imputar a si mesmo ou a outrem falsa identidade sendo esta constituída por todos os elementos de identificação civil da pessoa ou seja o seu estado civil idade filiação matrimônio nacionalidade etc e seu estado social profissão ou qualidade pessoal H C Fragoso Lições de Direito Penal Parte Especial 3 ed p 381 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo consistente na vontade de atribuirse ou atribuir a outrem a falsa identidade exigese porém o elemento subjetivo do tipo consistente no especial fim de agir para obter em proveito próprio ou alheio ou para causar dano a outrem 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a atribuição efetiva da falsa identidade independentemente de atingir o especial fim de agir Admitese a tentativa embora de difícil ocorrência 6 Classificação doutrinária Tratase de crime formal instantâneo subsidiário de forma livre comum unissubjetivo e plurissubsistente 7 Questões especiais A atribuição pode darse na forma verbal ou escrita Quando a falsa atribuição referese a funcionário público o agente pode responder pelo art 45 ou 46 uso ilegítimo de uniforme da LPC Se ocorre usurpação de função pública aplicase o art 328 do CP Em caso de o agente recusarse a fornecer dados de sua identidade ou fornecêlos contrariando a realidade responde pelo art 68 e parágrafo único da LPC desde que a informação seja negada à autoridade Admitese a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada inferior a um ano 8 Pena e ação penal As penas cominadas alternativamente são detenção de três meses a um ano ou multa se o fato não constitui elemento de crime mais grave Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A falsa identidade para ser tipificada deve conter a vontade livre e consciente de atribuirse identidade diversa e por isso presente o dolo direto de enganar de ocultar a real identidade sonegandose à aplicação da lei penal Quando o meio aplicado não é eficaz carece a conduta de tipicidade TJRS Recurso Crime 71001559020 Rel Nara Leonor Castro Garcia j 1122008 O agente que ao ser interpelado por autoridade policial identificase falsamente com o intuito de esconder seus maus antecedentes não comete o crime previsto no art 307 do CP pois age em autodefesa o que torna atípica a conduta TJRS Apelação 70021974092 Rel Constantino Lisbôa de Azevedo j 2412008 Segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça não comete o delito previsto no art 307 do Código Penal o réu que diante da autoridade policial atribui se falsa identidade em atitude de autodefesa porque amparado pela garantia constitucional de permanecer calado ex vi do art 5º LXIII da CF88 STJ HC 88998RS Rel Min Napoleão Nunes Maia Filho j 18122007 Não se pode cogitar do crime tipificado no art 307 do CPB na hipótese em que alguém se atribui uma identidade falsa com o fim de livrarse de uma prisão ou ocultar o seu passado criminoso revelandose tal conduta como ato de autodefesa resguardado pela Carta Magna TJMG Apelação 100240612187150011 Rel Vieira de Brito j 372007 É atípica a conduta do réu que se atribui falsa identidade para se ver livre da prisão por já ter outras condenações ou por temer que a sua identificação pessoal lhe cause agravamento da situação Tratase do exercício do direito de autodefesa assegurado constitucionalmente precedentes do STJ e do TJDFT TJDF 1ª Turma Recursal Apelação 20060510054373 Rel Editte Patrício j 2952007 Art 308 Usar como próprio passaporte título de eleitor caderneta de reservista ou qualquer documento de identidade alheia ou ceder a outrem para que dele se utilize documento dessa natureza próprio ou de terceiro Pena detenção de 4 quatro meses a 2 dois anos e multa se o fato não constitui elemento de crime mais grave D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado A fé pública em particular a identidade pessoal 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo é qualquer pessoa Sujeito passivo é o Estado 3 Tipo objetivo adequação típica São duas as condutas alternativamente incriminadas a usar utilizar empregar documento de identidade alheio como se fosse próprio b ceder entregar fornecer documento próprio ou de terceiro O elemento material é passaporte título de eleitor caderneta de reservista ou qualquer outro documento de identidade alheio 31 Como próprio Significa que o agente está se passando por outra pessoa sem contudo atribuirse falsa identidade Apenas o agente se utiliza de documento alheio Não deixa de ser em outros termos uma figura especial do crime de falsa identidade 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo consistente na vontade de usar como próprio documento alheio ou de ceder a terceiro documento próprio ou de terceiro para que este o utilize com conhecimento de sua ilicitude Não há exigência de qualquer elemento subjetivo especial do injusto com exceção da última figura ceder a outrem para que dele se utilize 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com o uso ou com a entrega do documento alheio para uso A tentativa é admissível na modalidade ceder 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comum formal unissubjetivo unissubsistente na forma usar e subsidiário 7 Questões especiais Entendese que a cessão do documento poderá ser a título oneroso ou gratuito Se o agente usa o documento que lhe foi fornecido incorre na primeira figura do tipo uso Admitese a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada inferior a um ano Vide arts 45 e 46 do Declei n 368841 Lei das Contravenções Penais 8 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são detenção de quatro meses a dois anos e multa se o fato não constitui elemento de crime mais grave Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 200 do STJ O juízo federal competente para processar e julgar acusado de crime de uso de passaporte falso é o do lugar onde o delito se consumou Materialidade delitiva comprovada pelo auto de apresentação e apreensão pelo laudo pericial e pela própria confissão do réu que admitiu ter providenciado a obtenção de passaporte por elemento desconhecido tendo se utilizado do documento para viajar para os EUA Não se pode desclassificar o delito para a forma prevista no art 308 do Código Penal visto que houve a adulteração do documento inclusive com a troca da fotografia de sua titular pela foto do apelante o que caracteriza o delito de falsum previsto no art 297 do Código Penal TRF 3ª Região Apelação 200003990203886 Rel Ramza Tartuce j 17122002 Quem usa documento alheio adulterado como se fosse próprio comete o delito capitulado no art 304 do Código Penal e não o do art 308 do mesmo Codex posto que este só é aplicável subsidiariamente quando não há adulteração no documento TRF 3ª Região Apelação 98030499424 Rel Casem Mazloum j 1851999 Uso de passaporte alheio Processocrime Competência da Justiça Federal do lugar onde no território nacional foi usado o documento embora que somente constatada a adulteração no país estrangeiro a que destinado o visto STJ Conflito de Competência 12680MG Rel Min José Dantas j 641995 Fraude de lei sobre estrangeiros Art 309 Usar o estrangeiro para entrar ou permanecer no território nacional nome que não é o seu Pena detenção de 1 um a 3 três anos e multa Parágrafo único Atribuir a estrangeiro falsa qualidade para promoverlhe a entrada em território nacional Pena reclusão de 1 um a 4 quatro anos e multa Parágrafo único acrescentado pela Lei n 9426 de 24 de dezembro de 1996 D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a fé pública em particular a política imigratória 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo é o estrangeiro caput ou qualquer pessoa Sujeito passivo é o Estado 3 Tipo objetivo adequação típica A ação incriminada é usar empregar utilizar para entrar ou permanecer no território nacional nome imaginário fictício ou de terceiro ou seja que não corresponde ao verdadeiro 1 Entrar significa que o indivíduo utiliza nome alheio para conseguir ingressar no território nacional 2 permanecer significa que o agente entra legitimamente e após usa nome que não é o seu para continuar no território nacional 31 Atribuir falsa qualidade O parágrafo único prevê uma conduta autônoma consiste em atribuir imputar inculcar a estrangeiro falsa qualidade entendida como a que se refere a sua subjetividade jurídica p ex nacionalidade emprego ou função É necessário que a atribuição se faça para promover a entrada de estrangeiro no País fim especial 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo e o elemento subjetivo especial do injusto consiste no especial fim de agir para entrar ou permanecer no País ou para promoverlhe a entrada no território nacional parágrafo único 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a utilização do nome falso Não se admite a tentativa caput Consumase o delito tipificado no parágrafo único com a atribuição da falsa qualidade sendo a tentativa possível 6 Classificação doutrinária Tratase de crime próprio formal instantâneo de efeitos permanentes e comissivo art 309 caput do CP Para o parágrafo único crime comum formal comissivo e simples unissubjetivo em ambas as figuras 7 Questões especiais O tipo referese ao conceito jurídico de território compreendido não apenas o solo mas também o mar territorial o espaço aéreo e de modo geral a zona onde impera a soberania do Estado E Magalhães Noronha Direito Penal 17 ed v 6 p 189 Não há crime se o agente faz declaração falsa a respeito de atributos que não possui O parágrafo único art 310 foi incluído no presente artigo por força da Lei n 9426 de 24 de dezembro de 1996 DOU 26121996 Pode a atribuição ser feita de forma oral ou escrita parágrafo único É atípica a imputação feita para que o estrangeiro permaneça no País parágrafo único Admite art 309 a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada igual a um ano Vide arts 65 parágrafo único e 125 III da Lei n 681580 Estatuto do Estrangeiro art 1º da Lei n 942696 altera dispositivos do Código Penal 8 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são detenção de um a três anos e multa caput reclusão de um a quatro anos e multa parágrafo único Ação penal pública incondicionada competente a Justiça Federal caput e parágrafo único J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Art 309 do CP fraude de lei sobre estrangeiros uso de nome falso Apresentação de documento alheio como próprio O apelante estrangeiro usou nome que não era o seu com a finalidade de permanecer no país irregularmente por estar vencido seu prazo de permanência como turista fazendo uso de documento que não lhe pertencia a fim de identificarse a policiais Irrelevante a alegação de que não foi comprovada a autenticidade do documento já que o delito de fraude de lei sobre estrangeiros previsto no art 309 do Código Penal tratase de crime formal em que a conduta típica perfazse no momento em que o agente estrangeiro faz uso de nome falso fictício ou de terceiro por escrito ou oralmente com a especial finalidade de entrar ou permanecer no território nacional independente do uso de documento falso ou verdadeiro TRF 3ª Região Apelação 96030413429 Rel Theotonio Costa j 2961999 Art 310 Prestarse a figurar como proprietário ou possuidor de ação título ou valor pertencente a estrangeiro nos casos em que a este é vedada por lei a propriedade ou a posse de tais bens Pena detenção de 6 seis meses a 3 três anos e multa Artigo com redação determinada pela Lei n 9426 de 24 de dezembro de 1996 D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a fé pública especialmente no que tange à ordem políticoeconômica nacional 2 Sujeitos do crime Sujeito ativo é qualquer pessoa desde que brasileira pois somente esta pode assumir a condição de testa de ferro de um estrangeiro Sujeito passivo é o Estado brasileiro 3 Tipo objetivo adequação típica A ação típica é prestarse a figurar ou seja o agente testa de ferro apresentase como o real proprietário ou possuidor de ação título ou valor pertencente a estrangeiro proibido legalmente de exercer a propriedade ou posse sobre tais bens Prestarse a figurar significa estar disposto a representar alguém admitir fazerse passar por outrem no caso estrangeiro na condição de proprietário ou possuidor de certos bens tanto a título gratuito quanto oneroso Objetivase evitar a burla à finalidade de manter nacionais determinadas empresas ou companhias ou de certos bens ou valores sem a ingerência de capital estrangeiro 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo constituído pela vontade de figurar como proprietário ou possuidor dos bens mencionados com conhecimento de que o faz ilicitamente Não é necessária a existência de elemento subjetivo especial do injusto Não há previsão de modalidade culposa 5 Consumação e tentativa Consumase o crime quando o agente se faz passar por proprietário ou possuidor dos bens mencionados ou seja quando passa aparentemente a ter ou possuir os referidos bens ou valores que concretamente não lhe pertencem A tentativa é em tese admitida 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comum formal instantâneo simples unissubjetivo plurissubsistente e de forma livre 7 Norma penal em branco Tratase de norma penal em branco visto que o tipo referese a casos em que a lei CF veda a propriedade ou posse de determinados bens por estrangeiros 8 Questões especiais É irrelevante seja o agente brasileiro nato ou naturalizado Admite se a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada inferior a um ano Vide art 65 parágrafo único da Lei n 909995 Juizados Especiais 9 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são detenção de seis meses a três anos e multa Ação penal pública incondicionada Adulteração de sinal identificador de veículo automotor Art 311 Adulterar ou remarcar número de chassi ou qualquer sinal identificador de veículo automotor de seu componente ou equipamento Pena reclusão de 3 três a 6 seis anos e multa Caput com redação determinada pela Lei n 9426 de 24 de dezembro de 1996 1º Se o agente comete o crime no exercício da função pública ou em razão dela a pena é aumentada de um terço 2º Incorre nas mesmas penas o funcionário público que contribui para o licenciamento ou registro do veículo remarcado ou adulterado fornecendo indevidamente material ou informação oficial 1º e 2º acrescentados pela Lei n 9426 de 24 de dezembro de 1996 D O U T R I N A 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a fé pública especialmente a proteção da propriedade e da segurança no registro de automóveis O objeto material é o número do chassi ou outro sinal identificador componente ou equipamento de veículo automotor 2 Sujeitos do crime Sujeitos ativos podem ser qualquer pessoa na hipótese do caput e o funcionário público nos 1º e 2º do CP Sujeitos passivos são o Estado e secundariamente o indivíduo lesado 3 Tipo objetivo adequação típica São duas as condutas tipificadas alternativamente adulterar falsificar mudar alterar por meio de qualquer modificação ou remarcar tornar a marcar alterando pôr marca nova em Os elementos objetivos são número de chassi estrutura de aço sobre a qual a carroceria do veículo é montada ou qualquer sinal identificador marca ou traço que possibilita autenticar ou reconhecer alguma coisa como por exemplo placa plaqueta de veículo automotor de seu componente parte elementar ou equipamento 31 Contribuição de funcionário público O 2º prevê uma forma de participação consistente no fato de o funcionário público contribuir prestar auxílio colaborar para o licenciamento ou registro do veículo remarcado ou adulterado fornecendo indevidamente material ou informação oficial incorrendo nas penas de reclusão de três a seis anos e multa a mesma cominada para o caput do artigo O funcionário público ao fornecer indevidamente o material ou informação oficial está infringindo dever funcional 32 Qualquer sinal identificador É qualquer outro dado marca ou sinalização inserta no veículo para individualizálo ou simplesmente para facilitar sua identificação tais como a numeração do chassi colocada nos respectivos vidros etc 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo constituído pela vontade consciente de alterar ou remarcar o número ou sinal individualizador do veículo Não é necessário que o sujeito saiba que o veículo é produto de crime Na hipótese do 2º o funcionário público encarregado do registro ou licenciamento do veículo deve ter consciência de que se trata de veículo remarcado ou adulterado 5 Consumação e tentativa Consumase o crime com a efetiva adulteração ou remarcação do número do chassi ou de qualquer outro sinal identificador do veículo automotor de seu componente ou equipamento Admitese teoricamente a tentativa quando por exemplo o agente é surpreendido antes de concluir a adulteração ou remarcação 6 Classificação doutrinária Tratase de crime comum caput próprio 2º comissivo material unissubjetivo e plurissubsistente 7 Figura majorada Se o agente comete o crime no exercício da função pública em efetivo desempenho ou em razão dela por motivo de sua função pela qualidade de funcionário a pena é aumentada de um terço Esta majorante não se aplica à hipótese descrita no 2º para evitar bis in idem uma vez que funcionário público é elementar típica 8 Questões especiais Este artigo foi incluído no Código Penal pela Lei n 9426 de 24 de dezembro de 1996 DOU 26121996 Confira no 2º o elemento indevidamente sem amparo legal A informação oficial é aquela conhecida ratione officii exigese o exame de corpo de delito 9 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são a reclusão de três a seis anos e multa Ação penal pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Art 311 do CP Adulteração de placa de motocicleta Finalidade de ludibriar a fiscalização de trânsito Irrelevante a finalidade do agente pois o delito está consumado no momento em que adultera ou remarca qualquer sinal identificador de veículo automotor ludibriando a fé pública TJRS Apelação 70023145378 Rel Gaspar Marques Batista j 1332008 Adulteração de sinal identificador de veículo automotor A configuração do delito ora em exame não depende da presença de uma finalidade específica de agir de modo que mesmo ausente a intenção de dar cobro a delitos precedentes à adulteração caracterizase o tipo criminoso a que se refere o art 311 CP Jurisprudência sedimentada do STJ Não pode o juiz criminal a pretexto da pobreza do condenado criar hipótese anômala de isenção de pena de multa máxime porque o direito penal encontrase adstrito ao princípio da legalidade TJRS Apelação 70022571731 Rel José Eugênio Tedesco j 2122008 Art 311 do CP Remarcação de motor de veículo Dolo comprovado Verificado que o réu ao remarcar o novo motor do veículo com o mesmo número do original sem comunicar ao DETRAN agiu mais imbuído da tentativa de escapar da burocracia do que por mera ignorância deve ser afastada a alegação de ausência de dolo TJRS Apelação 70022550180 Rel Gaspar Marques Batista j 2122008 Crime previsto no art 311 1º do Código Penal adulteração de sinal identificador de veículo automotor Alegações a atipicidade da conduta b que o paciente não seria o destinatário da norma penal e c violação do princípio da proporcionalidade ou da razoabilidade Na espécie afigurase de todo evidente que a conduta imputada ao paciente substituição de placas particulares de veículo automotor por placas reservadas obtidas junto ao Detran não se mostra apta a satisfazer o tipo do art 311 do Código Penal Não há qualquer dúvida de que o órgão de controle Detran sabia e poderia saber sempre que se cuidava de placas reservadas fornecidas à Polícia Federal Ordem concedida para que seja trancada a ação penal contra o paciente por não restarem configurados nem em longínqua apreciação os elementos do tipo em tese STF HC 86424SP Rel Min Ellen Gracie j 1110 2005 Capítulo V Das Fraudes em Certames de Interesse Público Fraudes em certames de interesse público Art 311A Utilizar ou divulgar indevidamente com o fim de beneficiar a si ou a outrem ou de comprometer a credibilidade do certame conteúdo sigiloso de I concurso público II avaliação ou exame públicos III processo seletivo para ingresso no ensino superior ou IV exame ou processo seletivo previstos em lei Pena reclusão de 1 um a 4 quatro anos e multa 1º Nas mesmas penas incorre quem permite ou facilita por qualquer meio o acesso de pessoas não autorizadas às informações mencionadas no caput 2º Se da ação ou omissão resulta dano à administração pública Pena reclusão de 2 dois a 6 seis anos e multa 3º Aumentase a pena de 13 um terço se o fato é cometido por funcionário público D O U T R I N A 1 Considerações preliminares Convém registrar já neste preâmbulo que a nova previsão legal cria grande desarmonia na estrutura e topografia do velho Código Penal de 1940 ao confundir bens jurídicos distintos privados e públicos Com efeito no Primeiro Título da Parte Especial disciplinamse os crimes contra a pessoa em que se inclui a divulgação de segredo prevista no art 153 ao passo que no Título XI localizamse os crimes contra a Administração Pública entre os quais se tipifica o de violação de sigilo funcional art 325 Assim a inclusão no tipo penal em exame fraudes em certames de interesse público destrói a harmonia de todo o sistema metodicamente estruturado do Código Penal dificultando inclusive a identificação dos bens jurídicos tutelados e a própria tipicidade das condutas eventualmente praticadas na medida em que aqueles bens jurídicos são protegidos em mais de um dispositivo legal arts 153 1º e 325 por exemplo além de ter criado uma miscelânea com inclusão de alterações ao Código Penal em lei absolutamente estranha a essa disciplina A rigor com postura como essa e não é a primeira vez que ocorre fenômeno semelhante o legislador contemporâneo fere o decoro parlamentar desrespeitando a sua tradição histórica que ao longo do tempo conquistou o respeito de todos nós cidadãos demonstrando a falta de seriedade com que os diplomas legais passaram a ser elaborados em nosso País em pleno Estado Democrático de Direito Com efeito novamente o legislador contemporâneo não perdeu a oportunidade de apresentar mais uma presepada natalina brindando os cidadãos brasileiros com sua conhecida incompetência despreparo e desrespeito a sua relevante função em um Estado Democrático de Direito qual seja a de legislar no âmbito infraconstitucional É inadmissível em qualquer país de mediana qualidade históricocultural que o legislador insira alterações ao Código Penal em lei destinada a criar Empresa de Serviços Hospitalares Realmente na Lei n 12550 de 15 de dezembro de 2011 que cria empresa pública denominada Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares o legislador aproveitou para alterar o art 47 do Código Penal além de acrescentarlhe o art 311A criando um capítulo especial de artigo único Visto de fora parece que o abnegado legislador brasileiro pretendeu esconder dos cidadãos a criação de um novo crime para surpreendêlos pelo desconhecimento de sua existência e ademais ainda determinou que esse diploma legal entrasse em vigor imediatamente sem vacatio legis 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico protegido é a preservação do sigilo de certames públicos posto que sua divulgação causará dano aos concorrentes que ficam naturalmente em desigualdade de condições e à própria credibilidade dos órgãos ou empresas promotoras desses eventos Na verdade a lei penal ao proteger o sigilo do conteúdo desses certames de interesse público assegura a garantia da ordem pública que é a tranquilidade de recorrer em igualdade de condições às conquistas pessoais e profissionais mediante seleção democrática dentre aqueles que satisfazem as exigências e requisitos legais de cada certame Se fosse permitida a indiscrição ou vazamento do sigilo a alguns dos concorrentes ferindo a isonomia e a lisura do certame estarseia evidentemente desmoralizando a competição e criando um entrave por vezes insuperável e em detrimento do próprio interesse social que é a moralidade probidade e impessoalidade de todo e qualquer certame de interesse público 3 Sujeitos ativo e passivo do crime Sujeitos ativos podem ser quaisquer pessoas que de um modo geral participam como candidatos do certame público e igualmente quem integra a estrutura que organiza ou aplica o meio ou instrumento seletivo dos candidatos que em razão dessa circunstância tem conhecimento indevidamente de conteúdo sigiloso Quer nos parecer que a conduta deste que viola dever funcional de guardar sigilo é consideravelmente mais grave do que a conduta de terceiro estranho à estrutura organizativa mesmo daquele que participa como concorrente a uma vaga ou posto disputado Nada impede no entanto que funcionário público possa praticar as condutas aqui incriminadas inclusive e especialmente aquelas contidas no 1º Esse entendimento justificase exatamente porque grande número desses processos seletivos é promovido ou organizado pelo Poder Público tanto da Administração Direta quanto da Indireta Não pratica o crime contudo quem não sendo integrante da estrutura responsável pela organização do certame e tampouco concorrente ou participante do processo seletivo recebe informação ou de qualquer forma vem a ter conhecimento do conteúdo sigiloso em razão da divulgação feita pelo agente ainda que saiba de sua origem ilícita a menos que tenha concorrido de algum modo para a prática do crime art 29 do CP Igualmente não o comete quem o propala por ouvir dizer e sem que tenha contribuído de alguma forma para o seu vazamento Sujeitos passivos são de um modo geral os concorrentes ou postulantes de uma vaga ou lugar disputado que acabam sendo prejudicados pela utilização ou divulgação indevida de conteúdo sigiloso do certame ou processo seletivo público Secundariamente também pode ser sujeito passivo o EstadoAdministração representando a coletividade poderá igualmente ser sujeito passivo imediato quando se tratar de concurso público ou processo seletivo lato sensu por ele promovido 4 Tipo objetivo adequação típica São duas as condutas tipificadas alternativamente utilizar ou divulgar indevidamente conteúdo sigiloso de certame de interesse público Tratase como veremos de crime de conteúdo variado ou seja ainda que o agente pratique ambas as condutas responderá por crime único a Utilizar significa usar servirse de fazer uso aproveitar tirar vantagem auferir proveito indevidamente de conteúdo sigiloso Há na verdade uma imensa variedade de significados deste verbo nuclear segundo os dicionaristas Mas juridicamente significa aproveitarse do conhecimento de conteúdo sob sigilo e nessas condições seria mais apropriado que o concorrente funcionasse como sujeito ativo embora também não seja impossível que o próprio funcionário do órgão responsável pelo certame também pudesse cometer esse crime via essa conduta No entanto não se pode negar que terceiro também pode utilizar o conhecimento de conteúdo sigiloso para tirar proveito seja vendendo seja negociando ou até mesmo chantageando alguém b Divulgar por sua vez tem uma concepção ampla e significa dar a conhecer propagar tornar público por qualquer meio escrito falado impresso internet etc inclusive pela fala isto é oralmente o conteúdo sigiloso de certame público O crime de calúnia tem como uma de suas modalidades propalar ou divulgar a calúnia art 138 1º Examinando essas condutas tipificadoras do crime de calúnia afirmamos que Os verbosnúcleos nesta forma de calúnia são propalar ou divulgar que têm sentido semelhante e consistem em levar ao conhecimento de outrem por qualquer meio a calúnia que de alguma forma tomou conhecimento Embora tenham significados semelhantes a abrangência das duas expressões é distinta propalar limitase em tese ao relato verbal à comunicação oral circunscreve se a uma esfera menor enquanto divulgar tem uma concepção mais ampla BITENCOURT Cezar Roberto Tratado de direito penal parte especial 11 ed São Paulo Saraiva 2010 v 2 p 321 Logo podese constatar que propalar acaba sendo absorvido pela conduta de divulgar que é mais abrangente sendo irrelevante a não previsão dessa conduta neste dispositivo 41 Abrangência da divulgação e conteúdo do objeto sigiloso É desnecessário que a divulgação atinja um número determinado de pessoas sendo suficiente apenas a comunicação a alguém mesmo em caráter confidencial para que se caracterize a ação de divulgar o conteúdo proibido De notarse que a proibição típica recai na conduta ou atividade de divulgar conteúdo sigiloso e não no resultado por ela atingido isto é o número de pessoas que tomou conhecimento da divulgação Sendo divulgado a uma só pessoa que seja o conteúdo sigiloso tornase acessível ao conhecimento de muitas outras Assim basta que o conteúdo sigiloso seja levado ao conhecimento de alguém para que se reconheça ter ocorrido a divulgação É exatamente o que também ocorre no crime de divulgação ou propalação de calúnia como já referimos Configurase o crime mesmo quando se divulga a alguém que já tenha conhecimento do objeto do sigilo pois este servirá de reforço na convicção do terceiro Por fim são objetos da proteção do conteúdo sigiloso os seguintes certames de interesse público I concurso público II avaliação ou exame públicos III processo seletivo para ingresso no ensino superior ou IV exame ou processo seletivo previstos em lei 42 Elemento normativo do tipo indevidamente Não se trata de crime comum com descrição tradicional puramente objetiva mas de tipo anormal contendo um elemento normativo da antijuridicidade indevidamente Assim o tipo penal é aberto e exige um juízo de valor para complementar a análise da tipicidade Indevidamente a exemplo de outras expressões semelhantes tais como sem justa causa injustamente sem licença da autoridade são elementos jurídicos normativos da ilicitude ou antijuridicidade embora também constem da descrição típica não se confundem com os elementos normativos do tipo tais como coisa alheia mulher honesta etc Na verdade a despeito de integrarem o tipo penal são elementos do dever jurídico e por conseguinte da ilicitude Indevidamente que normalmente se relaciona à antijuridicidade nesse caso exclui a tipicidade e não aquela E isso acontece somente porque o legislador incluiu a antijuridicidade entre os elementos integrantes do próprio tipo penal Assim somente a divulgação injusta indevida contra legis caracterizará o crime Poderão justificar a divulgação de sigilo ou melhor de conteúdo sigiloso por exemplo entre outras as seguintes condições delatio criminis art 5º 3º do CPP exercício de um direito exibição de uma correspondência para comprovar judicialmente a inocência de alguém Concluindo havendo justa causa para divulgação de sigilo o fato é atípico constitui constrangimento ilegal o indiciamento do agente em inquérito policial sendo passível de habeas corpus para trancamento de ação penal por falta de justa causa 5 Permissão ou facilitação de acesso a conteúdo sigiloso referido no caput As condutas incriminadas no 1º permitir ou facilitar por qualquer meio o acesso de pessoas não autorizadas a conteúdo sigiloso têm conotação de crime próprio na medida em que referidas condutas destinamse especificamente a quem é encarregado de cuidar vigiar e proteger o resguardo do sigilo de certame coletivo Em outros termos as pessoas funcionários públicos ou não envolvidas na estrutura que organiza eou aplica o processo seletivo são os destinatários das condutas tipificadas neste parágrafo Certamente não são terceiros ou mesmo participantes que têm o dever funcional de impedir que alguém tenha acesso a conteúdo sigiloso de processos seletivos que este dispositivo legal pretende coibir O dever funcional tanto na iniciativa privada quanto no setor público é certamente o fundamento do dever de fidelidade das pessoas que estão diretamente vinculadas à estrutura responsável pela organização e aplicação do certame de interesse público como refere a ementa deste artigo Nada impede é verdade que terceiros desvinculados desse dever que acabamos de referir possam ser alcançados pelo instituto do concurso eventual de pessoas art 29 do CP 6 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade livre e consciente de divulgar conteúdo sigiloso de certame de interesse público tendo consciência da natureza sigilosa desse conteúdo e que ademais pode produzir dano a alguém No entanto é necessário que o agente tenha consciência de que a sua conduta é ilegítima desautorizada indevida isto é sem justa causa Este tipo penal exige como elemento subjetivo especial do tipo o fim de beneficiar a si ou a outrem ou de comprometer a credibilidade do certame conteúdo sigiloso Tratandose de elemento subjetivo especial é irrelevante que tais objetivos se concretizem sendo suficiente que integrem a vontade consciente do agente para configurar o crime A eventual ausência de tais elementos desnatura esta infração penal 7 Consumação e tentativa Consumase o crime com a efetiva utilização ou divulgação de conteúdo sigiloso de certame de interesse público independentemente da quantidade de pessoas que tome conhecimento de dito conteúdo Já nas modalidades de permitir ou facilitar o acesso de pessoas não autorizadas previstas no 1º a situação é diferente para que essas condutas se concretizem é indispensável que as pessoas desautorizadas tenham acesso efetivamente ao conteúdo sigiloso a que se refere o presente dispositivo legal Admitese teoricamente a tentativa ainda que seja de difícil comprovação Tratase com efeito de crime plurissubsistente cujo iter criminis pode ser fracionado 8 Figura majorada fato cometido por funcionário público Aumentase a pena aplicada em um terço se o fato é cometido por funcionário público É irrelevante segundo a dicção do texto legal que referido funcionário público encontrese no exercício da função ou não pois ao contrário do que normalmente ocorre em previsões de majoração de pena dessa natureza o novo texto legal não faz essa distinção Contudo não se pode ignorar a teleologia do dispositivo penal qual seja coibir que os funcionários públicos do próprio Ministério ou Secretaria de Estado no caso encarregados ou destinatários do objeto do concurso pratiquem crimes violando o dever funcional Na verdade o que fundamenta a majoração sub examine é o dever funcional de fidelidade que todo funcionário público tem para com a administração em razão do cargo ou função que exerce Consequentemente referida majorante somente se configura quando se tratar de funcionário vinculado ao órgão no caso Ministério ou Secretaria da Administração Pública encarregada da realização ou preparação do concurso ou certame público em que ocorra a fraude Significa em outros termos que a simples qualidade de funcionário público por si só não é fundamento suficiente para caracterizar a majorante contida nesse 3º sob pena de violar o princípio da tipicidade estrita dogma da teoria do delito que não pode ser ignorado Assim por exemplo se se tratar de determinado funcionário público pertencente a outra esfera administrativa federal estadual ou municipal que não aquela que promove o certame de interesse público ou simplesmente integre outro Ministério ou Secretaria ainda que da mesma esfera administrativa mas indiferente ou alheia ao concurso que se realiza não poderá este sofrer essa majoração penal por faltarlhe aquele dever funcional que o vincula ao seu cargo ou função a que antes nos referimos Ou dito de outra forma para que se possa aplicar essa majorante é indispensável que a infração penal tenha sido praticada com violação dos deveres inerentes ao cargo função ou mesmo à atividade privada É necessário que o agente de alguma forma tenha violado os deveres que a sua qualidade ou condição de funcionário público lhe impõe 9 Pena e ação penal As penas cominadas às ações descritas no caput e no 1º do novel art 311A cumulativamente são reclusão de um a quatro anos e multa Para a figura qualificada descrita no 2º isto é quando da ação ou omissão resulta dano à administração pública as penas cominadas são de dois a seis anos de reclusão e multa Verificandose no entanto a majorante descrita no 3º do mesmo dispositivo legal qual seja ter sido o fato cometido por funcionário público a pena aplicada será majorada em um terço 13 Prevendo esse parágrafo que se o fato for cometido por funcionário público significa que referida majorante não será aplicada quando o funcionário público for mero partícipe posto que nessa hipótese não terá cometido o fato mas apenas concorrido de qualquer forma para a sua prática por outrem Não se pode esquecer que embora nosso sistema penal tenha adotado como regra a teoria monística da ação o art 29 do CP e seus parágrafos fazem distinção quanto à punibilidade dependendo do grau ou espécie de participações no crime conforme demonstramos ao examinar o instituto do concurso eventual de pessoas especialmente em seu último tópico BITENCOURT Cezar Roberto Tratado de direito penal parte geral 17 ed São Paulo Saraiva 2012 v 1 p 545 A ação penal é pública incondicionada não exigindo por conseguinte qualquer manifestação de eventual ofendido para o início da persecutio criminis TÍTULO XI DOS CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA Capítulo I Dos Crimes Praticados por Funcionário Público contra a Administração em Geral Peculato Art 312 Apropriarse o funcionário público de dinheiro valor ou qualquer outro bem móvel público ou particular de que tem a posse em razão do cargo ou desviálo em proveito próprio ou alheio Pena reclusão de 2 dois a 12 doze anos e multa 1º Aplicase a mesma pena se o funcionário público embora não tendo a posse do dinheiro valor ou bem o subtrai ou concorre para que seja subtraído em proveito próprio ou alheio valendose de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário Peculato culposo 2º Se o funcionário concorre culposamente para o crime de outrem Pena detenção de 3 três meses a 1 um ano 3º No caso do parágrafo anterior a reparação do dano se precede à sentença irrecorrível extingue a punibilidade se lhe é posterior reduz de metade a pena imposta D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Segundo Costa e Silva Administração Pública é o conjunto das funções exercidas pelos vários órgãos do Estado em benefício do bem estar e do desenvolvimento da sociedade Em outros termos é a atividade do Estado na busca do bem comum através dos seus três Poderes Executivo Legislativo e Judiciário Celso Ribeiro Bastos Dicionário de Direito Constitucional São Paulo Saraiva 1994 p 2 3 os quais devem funcionar conjunta e harmonicamente Administração Pública no âmbito do direito penal não tem a abrangência restrita tal como é recepcionada nos ramos do direito constitucional e administrativo que normalmente a concebem como o exercício de uma das funções vitais no âmbito da divisão dos Poderes Os crimes contra a Administração Pública propriamente foram divididos pelo Código Penal de 1940 em três capítulos crimes praticados pelos seus próprios integrantes funcionários crimes praticados por particular contra a Administração Pública e crimes contra a Administração da Justiça Os primeiros seriam delicta in officio ou seja delicta propia ou seja daqueles que integram a função administrativa estatal os segundos seriam os crimes praticados pelo particular contra a Administração Pública os quais recebem a denominação de delicta communia finalmente no terceiro capítulo com os crimes contra a Administração da Justiça revela que nosso Código Penal não consagrou um título específico e autônomo para esses crimes ao contrário de algumas legislações de direito comparado tratandoos apenas como espécie do gênero o que revela a amplitude que atribui ao vocábulo Administração Pública 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico penalmente protegido segundo a doutrina tradicional é a Administração Pública particularmente em relação a seu próprio interesse patrimonial e moral A tutela penal pretende na realidade abranger dois aspectos distintos em primeiro lugar objetiva garantir o bom funcionamento da Administração Pública bem como o dever do funcionário público de conduzirse com lealdade e probidade em segundo visa proteger o patrimônio mobiliário do Poder Público Ganha destaque enquanto objeto de proteção penal a probidade administrativa embora em se tratando de crime material não possa dispensar a produção de um dano patrimonial A existência abstrata ou concreta de um crime contra a Administração Pública pressupõe a realização de uma conduta imoral ainda que nem toda imoralidade possa por si só caracterizar um delito Podese afirmar com base nisso que a prática de peculato caracteriza crime em primeiro lugar por uma lei específica prever a possibilidade de punição art 312 do CP mas essa lei só resta legitimada porque o peculato ofende princípios fundamentais do pacto social democrático Um servidor por exemplo que desvia verbas em proveito próprio ou alheio pratica ato de improbidade administrativa pois além de lesar o patrimônio do erário público ofende os princípios gerais da Administração Pública 21 Dupla ofensividade Sintetizando para a maioria da doutrina há duas objetividades jurídicas 1ª a genérica representada pelo normal funcionamento da Administração Pública 2ª e a específica que é a segurança patrimonial dos bens móveis pertencentes ao erário público e o dever de fidelidade do funcionário ao patrimônio público Essa foi a orientação seguida pela doutrina clássica brasileira que pode ser exemplificada pela manifestação de Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 3456 é punido o peculato menos porque seja patrimonialmente lesivo do que pela quebra de fidelidade ou pela inexação no desempenho do cargo público mas é absolutamente indispensável à sua configuração o advento de concreto dano patrimonial O dano material indeclinável do peculato não é outra coisa que um desfalque patrimonial sofrido pela administração pública No mesmo sentido Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 90 repetia que não há dúvida de que o dano que deste crime resulta é menos patrimonial que moral e político 22 Pluriofensividade do peculato No entanto não nos parece que essa seja a melhor orientação ante a pluralidade de condutas tipificadas e a pluriofensividade do crime de peculato Na verdade nem sempre o sujeito ativo está vinculado ao órgão público a cujo patrimônio a coisa móvel apropriada pertence Pode ocorrer por outro lado que o agente não se encontre vinculado a nenhuma entidade pública embora tenha a posse da coisa móvel em razão de sua função especialmente com a amplitude do conceito penal de funcionário público atribuída pela atual legislação brasileira Por isso nem sempre se poderá afirmar que o peculato constitui necessariamente a violação de um dever de fidelidade que subsiste somente entre o funcionário e o órgão ao qual está vinculado Poderia restar por vezes o dever em sentido amplo entre o funcionário e o Estado aliás não haveria dever algum de fidelidade quando a coisa apropriada ou desviada pertencesse a particular 23 Crime funcional Tratase de crime funcional equivocadamente chamado de crime de responsabilidade que na definição de Von Hippel é aquele em que a qualidade de funcionário público intervém tanto como condicionante da pena quanto como majorante Apud Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 317 A eficiência do Estado está diretamente relacionada com a credibilidade honestidade e probidade de seus agentes pois a atuação do corpo funcional refletese na coletividade influenciando decididamente na formação éticomoral e política dos cidadãos especialmente no conceito que fazem da organização estatal 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo Sujeito ativo somente pode ser o funcionário público ou aquele expressamente equiparado a este para fins penais tratandose de crime próprio A condição especial funcionário público no entanto como elementar do crime de peculato comunicase ao particular que eventualmente concorra na condição de coautor ou partícipe para a prática do crime nos termos da previsão do art 30 do CP Dessa forma é necessário que pelo menos um dos autores reúna a condição especial de funcionário público podendo os demais não possuir tal qualidade É indispensável contudo que o particular extraneus tenha consciência da qualidade especial do funcionário público sob pena de não responder pelo crime de peculato Desconhecendo essa condição o dolo do particular não abrange todos os elementos constitutivos do tipo configurandose o conhecido erro de tipo que afasta a tipicidade da conduta Responderá no entanto por outro crime consoante o permissivo contido no art 29 2º do Código Penal que abriga a chamada cooperação dolosamente distinta autorizandoo a responder em princípio pelo crime de apropriação indébita exatamente o crime que pretendia praticar 32 Sujeito passivo Sujeito passivo como nos demais crimes é o titular do bem jurídico ou do interesse penalmente protegido Sujeitos passivos são o Estado e as demais entidades de direito público relacionadas no art 327 1º do CP Se o bem móvel for particular na hipótese de peculato malversação o proprietário ou possuidor desse bem também será sujeito passivo Discordamos do entendimento tradicional da doutrina que define nessa hipótese especial o particular como sujeito passivo secundário Na verdade não vemos nenhuma razão lógica ou jurídica para colocá lo em segundo plano mesmo que se trate de infração penal localizada no Título XI que por razões metodológicas cuida dos crimes contra a Administração Pública pois especificamente lesa tanto bem jurídico pertencente ao erário público quanto bem jurídico pertencente ao particular patrimônio Na realidade o Estado é sempre sujeito passivo primário de todos os crimes desde que avocou a si o monopólio do ius puniendi daí o caráter público do direito penal que somente tutela interesses particulares pelos reflexos que sua violação acarreta na coletividade Com efeito a lei penal protege em primeiro plano o interesse da ordem jurídica geral cujo titular é o Estado e secundariamente o interesse do particular Como lecionava Heleno Fragoso o que na doutrina se considera sujeito passivo é o titular do interesse imediatamente ofendido pela ação delituosa ou do bem jurídico particularmente protegido pela norma penal ou seja o sujeito passivo particular ou secundário 321 Estado como sujeito passivo direto Em outros crimes porém como estes capitulados nos crimes contra a Administração Pública praticados por seus próprios funcionários é o Estado que aparece como sujeito passivo particular pois é titular do bem jurídico diretamente ofendido pela ação incriminada Quando nessa espécie de crime atingese também o patrimônio ou qualquer outro interesse penalmente tutelado do particular este também se apresenta como sujeito passivo e se alguém deve ser denominado como sujeito secundário acreditamos que ainda assim deveria ser o Estado que é sempre ofendido e não o particular eventualmente lesado Em síntese o Estado que é o sujeito passivo permanente de todos os crimes praticados contra a Administração Pública deve ser contudo considerado como sujeito passivo secundário sempre que houver lesado ou ofendido diretamente bem jurídico pertencente a algum particular Finalmente para não sermos repetitivos tudo o que afirmamos a respeito do sujeito passivo secundário neste capítulo estendese aos demais crimes quando haja dupla ofensa de bens jurídicos pertencentes ao Estado e ao particular 4 Pressuposto do crime de peculato O pressuposto do crime de peculato em relação às duas figuras do caput do art 312 é a anterior posse lícita isto é legítima da coisa móvel pública dinheiro valor ou qualquer outro bem móvel da qual o funcionário público apropriase indevidamente A posse que deve preexistir ao crime deve ser exercida pelo agente em nome alheio ou seja em nome do Poder Público já que a ausência da posse altera a tipicidade da conduta podendo caracterizar o peculatofurto art 312 1º ou residualmente o crime de furto art 155 A posse mencionada no dispositivo em exame deve ser entendida em sentido amplo abrangendo inclusive a simples detenção e até o poder de disposição direta sobre a coisa A exemplo da apropriação indébita art 168 é necessário que o agente possa ter disponibilidade física direta ou imediata da coisa móvel pública alheia Concordamos que essa disponibilidade material possa corresponder inclusive à disponibilidade jurídica para satisfazer o pressuposto da anterior posse prévia desde que seja entendida essa disponibilidade como mesmo não dispondo fisicamente da detenção material da coisa o poder de exercêla por meio de ordens requisições ou mandados 41 Insuficiência da posse prévia em razão de cargo A existência da posse prévia é insuficiente por si só sendo necessário que esta advenha de cargo exercido pelo funcionário público O texto legal referese à posse em razão de cargo e não em razão do exercício de função como destacava com muita propriedade Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 340 conceitualmente a preexistente posse deve terse operado em razão do cargo isto é fazse mister uma íntima relação de causa e efeito entre o cargo e a posse Não basta que a res tenha sido confiada contemplatione officii é preciso que a sua entrega ao funcionário resulte de mandamento legal ex vi legis ou pelo menos de inveterada praxe não proibida por lei É necessário que o funcionário público seja nomeado e empossado em cargo público oficialmente A confiança depositada no funcionário público que recebe a coisa objeto material do crime de peculato é proveniente de imposição legal em razão do cargo público exercido pelo agente É mister que receba o bem em razão do cargo que exerce significando que a entrega da coisa ao agente deve ser feita em decorrência de sua competência ou atribuição funcional circunscrevendose o ato às atribuições inerentes ao cargo que ocupa Assim sustenta a doutrina nacional Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 340 Paulo José da Costa Jr Comentários ao Código Penal p 9867 Luiz Régis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 351 que se alguém confiar a um amigo por exemplo que é fiscal da receita determinada quantia para saldar um débito apropriandose o agente desse valor não pratica peculato mas apropriação indébita Com efeito se o recebimento da coisa não decorrer do cargo em que está investido não existe aquela especial violação de dever de ofício incriminada no peculato e na malversação 42 Em razão do cargo relação objetiva Na verdade convém destacar em razão do cargo deve ser uma relação objetiva existente entre a posse e o cargo uma relação diríamos de causa e efeito entre este e aquela e não apenas uma relação de confiança subjetiva Por isso não é suficiente que o agente seja funcionário público é necessário que receba o objeto material repetindo em razão do cargo que lhe atribua esse mister funcional O objeto material do peculato dinheiro valor ou qualquer outro bem móvel pode pertencer à Administração Pública ou a particular desde que se encontre na posse ou tenha sido entregue ao agente em razão do seu cargo Essa orientação já era adotada pelo nosso CP anterior ao contrário do Código Penal Rocco que fazia distinção tipificando em figura autônoma como malversazione art 315 A preferência da legislação brasileira equiparando a incriminação do peculato tanto de bens públicos quanto de bens particulares fundamentase na identidade de razões de punir o Estado também responde pelos danos causados por seus funcionários ao patrimônio de terceiros que se encontrem sob sua responsabilidade 5 Tipo objetivo adequação típica O crime de peculato recepcionado pelo nosso CP apresenta as seguintes figuras típicas a peculatoapropriação 1ª parte do caput b peculatodesvio 2ª parte c peculatofurto 1º d peculato culposo 2º O crime de peculato na precisa descrição do caput do art 312 peculato próprio consiste no apossamento ou desvio destinação diversa por parte de funcionário público de coisa móvel dinheiro valor ou qualquer outro bem móvel pública ou particular de que tem a posse em razão do cargo em proveito próprio ou alheio A semelhança do crime de peculato com a apropriação indébita que tem natureza patrimonial é pouco mais que aparente pois ambos apresentam uma diferença estrutural O peculato aparentemente uma figura imprópria de crime contra a Administração Pública é mais que uma apropriação indébita qualificada pela condição de funcionário público do seu agente ativo Na verdade decorre a da qualidade do sujeito ativo funcionário público no crime de peculato b do título da posse que no peculato deverá estar relacionado com o cargo ou serviço enquanto na apropriação indébita pode ser de qualquer natureza c da pluralidade de condutas previstas para as modalidades do peculato 51 Peculatoapropriação objeto material 1ª parte O verbo apropriarse tem o significado de assenhorearse tomar como sua apossarse apropriarse é tomar para si isto é inverter a natureza da posse passando a agir como se dono fosse da coisa móvel pública de que tem posse ou detenção Acomodaa ao fim que tem em vista numa linguagem de Magalhães Noronha numa situação aparente de proprietário quer retendoo quer consumindoo quer alienandoo etc No peculato a exemplo da apropriação indébita e ao contrário do furto e do estelionato o sujeito passivo tem anteriormente a posse lícita da coisa como destacamos no tópico anterior O agente recebea legitimamente 511 Objeto material dinheiro ou qualquer bem móvel O objeto material da ação penal tipificada deve ser dinheiro valor ou qualquer outro bem móvel público ou particular de que o agente tem a posse abrangendo a detenção e a posse indireta desde que lícita em razão do cargo ratione officii A exemplo do que ocorre com a apropriação indébita o funcionário público apoderase do objeto material que se encontra em sua posse agindo como se proprietário fosse praticando atos de animus domini Dinheiro é elemento material descritivo do tipo valor e outro bem móvel são elementos normativos sendo este de valoração jurídica e aquele de valoração extrajurídica Dinheiro pode ser representado por moeda metálica ou papelmoeda de curso legal no país valor é qualquer título papel de crédito ou documento negociável ou conversível em dinheiro ou mercadoria como ações apólices títulos da dívida pública vale postal letras de câmbio nota promissória etc Bem móvel finalmente é toda e qualquer coisa passível de ser apreendida e deslocada de um lugar para outro de loco ad locum Evidentemente a exemplo do crime de furto a energia elétrica ou qualquer outra forma de energia de valor econômico também é equiparada à coisa móvel podendo ser igualmente objeto material do crime de peculato A despeito de o legislador ter incluído qualquer bem móvel e valor elementos normativos de valoração jurídica como objetos materiais do crime de peculato preferiu destacar que dinheiro também pode representar esse objeto O objetivo do legislador nesse particular foi afastar o entendimento da antiga doutrina que não admitia peculato de coisa fungível limitando a incidência dessa infração penal às coisas infungíveis Afirmavase que na hipótese de coisa fungível o funcionário era devedor de quantidade e não de espécie estando obrigado somente a devolver o tantumdem que poderia fundamentar ação cível administrativa ou ainda algum outro crime diverso do peculato chamado de residual 512 Objeto fungível e infungível Essa finalidade pretendida pelo legislador justifica a enumeração do objeto material do crime de peculato afastando definitivamente qualquer desinteligência sobre a possibilidade de dinheiro poder ser objeto de peculato a fungibilidade in natura não afasta o crime de peculato do funcionário que se apropria de dinheiro público de que tem a posse mesmo que pretenda devolvêlo oportunamente Ainda que possa caracterizarse em tese um simples uso sem o animus rem sibi habendi não há como afastar a punibilidade pois se trata inegavelmente de um desvio Dinheiro enfim por ficção legal quando recebido ou guardado por funcionário público perde sua condição de fungível O funcionário público quando recebe numerário em razão do cargo passa a ser uma longa manus da Administração Pública Por isso o recebimento de dinheiro por funcionário público em razão do cargo significa seu ingresso imediato no erário público Na verdade o funcionário público não é considerado mero depositário não lhe sendo permitido nem mesmo a compensação de créditos salvo se for expressamente autorizado por legislação administrativa Não afasta o crime o suposto crédito ou mesmo a prestação de fiança ou caução para evitar eventual dano Na verdade a devolução posterior do dinheiro não descaracteriza o crime pois há sempre um desvio de finalidade Contudo o desvio de verbas ou rendas públicas sem a finalidade de obter vantagem pessoal mas em proveito da própria Administração Pública constitui crime capitulado no art 315 do CP onde será devidamente examinado 513 Mistura de dinheiro atipicidade Eventual mistura do próprio dinheiro do funcionário público com o da Administração para facilitar o troco por exemplo não configura por si só crime algum No mesmo sentido destaca Paulo José da Costa Jr Comentários ao Código Penal p 988 que tampouco configura conduta punível quando o funcionário tiver necessidade de valerse de pequenas quantias do dinheiro público recebido para enfrentar despesas de manutenção ou de condução quando a serviço do Estado das quais posteriormente deverá ser reembolsado Ou por haver esquecido em casa o próprio dinheiro 514 Prestação de serviço atipicidade Não se equipara à coisa móvel por outro lado a prestação de serviço de um funcionário a outro fruir o funcionário do serviço de outro não constitui esse crime Não é coisa a prestação de serviço como exemplificava Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 222 Portanto se o chefe de uma repartição emprega funcionário em serviço seu desviandoo de suas ocupações funcionais não pratica peculato incorrendo em outro delito ou de qualquer maneira praticando falta contra a probidade administrativa Com acerto conclui ainda Magalhães Noronha afirmando que essa conduta é atípica porque se apropriar de dinheiro valor ou bem móvel não é fruir de serviço do funcionário público pois ele não é coisa 52 Peculatodesvio 2ª parte O verbo núcleo desviar tem o significado neste dispositivo legal de alterar o destino natural do objeto material ou darlhe outro encaminhamento ou em outros termos no peculatodesvio o funcionário público dá ao objeto material aplicação diversa da que lhe foi determinada em benefício próprio ou de outrem Nesta figura peculatodesvio não há o propósito de apropriar se que é identificado como o animus rem sibi habendi podendo ser caracterizado o desvio proibido pelo tipo com simples uso irregular da coisa pública objeto material do peculato Ao invés do destino certo e determinado do bem de que tem a posse o agente lhe dá outro no interesse próprio ou de terceiro O desvio poderá consistir no uso irregular da coisa pública No entanto para que se complete essa conduta típica é indispensável a presença do elemento subjetivo especial do tipo ou seja que se faça o desvio em proveito próprio ou alheio Esse elemento subjetivo está implícito na figura anterior peculatoapropriação pois seria incompreensível apropriarse em benefício de terceiro Com efeito se o desvio operarse em benefício da própria Administração não haverá peculato mas desvio de verba 521 Natureza do proveito exigido Poderseá discutir a natureza do proveito exigido para configurar esse crime como fizemos em alguns crimes patrimoniais examinados no volume 3º do nosso Tratado Contrariamente contudo ao que se poderia exigir nos crimes patrimoniais aqui mesmo que implique nesta figura valor patrimonial o proveito pode ser de qualquer natureza patrimonial moral funcional etc Nessa modalidade o crime consumase com a efetivação do desvio independentemente da real obtenção de proveito para si ou para outrem 522 Posse viciada inadmissibilidade A posse não pode estar viciada de violência fraude ou erro se ela decorre de violência haverá concussão se foi obtida mediante fraude ou engano pode caracterizar em tese concussão ou estelionato dependendo das demais circunstâncias se no entanto a posse provier de erro de outrem o crime será aquele previsto no próximo dispositivo art 313 e objeto de análise no capítulo seguinte 53 Peculatofurto O 1º prevê o chamado peculatofurto no qual o funcionário público não tem a posse do objeto material e o subtrai ou concorre para que outro o subtraia em proveito próprio ou alheio valendose de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário Essa facilidade é qualquer circunstância de fato propícia à prática do crime notadamente o fácil ingresso à repartição ou local onde se achava a coisa subtraída Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 350 Segundo o magistério de Antonio Pagliaro e Paulo José da Costa Jr Dos crimes contra a Administração Pública São Paulo Malheiros 1999 p 46 nesta hipótese para que se possa falar de apropriação indébita ou de desvio é necessário que o uso por sua natureza e por sua duração seja tal que comprometa a utilidade da coisa para a administração pública ou para outro sujeito ao qual pertença Naturalmente para que se aperfeiçoe o crime é preciso que haja um compromisso sério na utilização da coisa 531 Posse momentânea atipicidade O peculato de uso que se tipificaria pelo uso momentâneo do objeto material do peculato o qual se encontra na posse do funcionário em razão do cargo sem animus domini e o devolve intacto após sua utilização não configura crime Em se tratando de Prefeito Municipal contudo conduta semelhante adequase à descrição típica constante do art 1º II do Decretolei n 20167 que disciplina os crimes de responsabilidade dos prefeitos municipais 54 Peculato culposo A punibilidade de crimes patrimoniais a título de culpa é excepcionalíssima aliás seguindo o princípio da excepcionalidade do crime culposo assegurada no próprio Código Penal art 18 parágrafo único Ocorre o peculato culposo quando o funcionário público concorre para que outrem se aproprie desvie ou subtraia o objeto material da proteção penal em razão de sua inobservância ao dever objetivo de cuidado necessário 2º No caso o funcionário negligente não concorre diretamente no fato e para o fato praticado por outrem mas com sua desatenção ou descuido propicia ou oportuniza involuntariamente a que outrem pratique um crime doloso que pode ser de outra natureza 541 Participação culposa em crime doloso impossibilidade Nesse sentido procuramos deixar claro que como se tem reiteradamente afirmado não há participação dolosa em crime culposo e viceversa Com efeito o funcionário público responde na modalidade culposa pela inobservância do dever objetivo de cuidado isto é por sua negligência deixando o objeto material desprotegido ao facilitar ainda que inadvertidamente que terceiro pratique outro crime contra o patrimônio público que em razão de seu cargo deveria proteger Não há convém destacar participação da ação culposa do funcionário na conduta dolosa do terceiro que pode ou não ser outro funcionário público inexistindo por conseguinte qualquer vínculo ou liame subjetivo entre ambos Há em verdade uma espécie de autorias colaterais Contudo para que se caracterize o peculato culposo não basta a ação ou omissão descuidada do funcionário faltoso sendo indispensável que aliada à sua desatenção ocorra a prática de outro fato agora doloso por parte de terceiro sem o qual não se configurará o peculato culposo mesmo que sobrevenha um dano ao patrimônio da Administração Pública 542 Reparação de dano extinção da punibilidade Dispõe o 3º que na hipótese de reparação do dano se precedente à sentença criminal irrecorrível extinguese a punibilidade se lhe é posterior reduz de metade a pena imposta No peculato doloso a compensação a reparação do dano ou a restituição do objeto material não excluem o crime constituindo apenas circunstância atenuante art 65 III b Constatase que nessa hipótese o legislador atribui relevância excepcional à reparação do dano na hipótese de peculato culposo O ressarcimento pode ser promovido tanto pelo acusado quanto por terceiro atingindo o mesmo objetivo e produzindo a mesma consequência Por fim o ressarcimento ou mesmo a extinção da punibilidade não impedem a aplicação de eventual sanção administrativa ante eventual infração administrativa 6 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo do crime de peculato é o dolo constituído pela vontade de transformar a posse em domínio a exemplo do que ocorre no crime de apropriação indébita ou seja é a vontade livre e consciente de apropriarse de coisa móvel pertencente ao Estado de que tem a posse em nome do próprio Estado Em outros termos é a vontade definitiva de não restituir a coisa dinheiro valor ou qualquer outra coisa móvel pertencente ao Poder Público ou desviála de sua finalidade O dolo deve abranger todos os elementos configuradores da descrição típica sejam eles fáticos jurídicos ou culturais O autor somente poderá ser punido pela prática de um fato doloso quando conhecer as circunstâncias fáticas que o constituem Eventual desconhecimento de um ou outro elemento constitutivo do tipo configura erro de tipo excludente do dolo O dolo é na espécie a vontade de assenhorearse de bem móvel animus rem sibi habendi com consciência de que pertence ao Estado invertendo o título da posse Em outros termos o agente deve ter vontade e consciência de apropriarse de coisa móvel do Estado isto é de tomar para si coisa que não lhe pertence No crime de peculato a exemplo do que ocorre na apropriação indébita há uma inversão no título da posse já que o agente passa a agir como se dono fosse da coisa pertencente ao Estado de que tem a posse legítima É fundamental a presença do elemento subjetivo transformador da natureza da posse de alheia para própria como elemento subjetivo especial do injusto sob pena de não se configurar o peculato Essa é a representação subjetiva que deve abranger e orientar a ação do sujeito ativo 61 Atualidade do dolo O dolo necessariamente e sempre tem de ser atual isto é contemporâneo à ação proibida Se fosse anterior estarseia diante de um crime premeditado se fosse posterior de crime não se trataria pois a conduta praticada não teria sido orientada pelo dolo Com efeito quando se fala em dolo subsequente não se está pretendendo afirmar que o dolo é posterior à ação de apropriarse logicamente buscase apenas deixar claro que é necessário o animus apropriandi ocorrer após a posse alieno nomine É indispensável a presença do elemento subjetivo especial do tipo representado pelo especial fim de agir em proveito próprio ou alheio presente em todas as modalidades 7 Consumação e tentativa 71 Consumação O momento consumativo do crime de peculato é de difícil precisão pois depende em última análise de uma atitude subjetiva A consumação do crime e por extensão o aperfeiçoamento do tipo coincidem com aquele em que o agente por ato voluntário e consciente inverte o título da posse passando a reter o objeto material do crime dinheiro valor ou qualquer outro bem móvel como se dono fosse uti dominus Consumase o crime com a efetiva apropriação desvio ou subtração do objeto material ou seja quando o funcionário público torna seu o patrimônio do qual detém a posse ou desvia em proveito próprio ou de terceiro sendo irrelevante o prejuízo efetivo para a Administração Pública Essa exteriorização da alteração do título da posse consumadora do crime de peculato revelase com a retenção além do tempo necessário uso pessoal ou consumo alienação que são atos característicos de quem é dono ou age como animus domini Consumase enfim com a inversão da natureza da posse caracterizada por ato demonstrativo de disposição da coisa alheia Contudo a certeza da intenção somente se caracteriza por algum ato externo típico de domínio com o ânimo de apropriarse dela O animus rem sibi habendi também característico do crime de peculato precisa ficar demonstrado Se o agente não manifesta a intenção de ficar com a res e ao contrário a restitui à repartição de pronto o dolo do peculatoapropriação não se aperfeiçoa 72 Tentativa Como crime material a tentativa do crime de peculato é possível embora de difícil configuração A despeito da dificuldade de sua comprovação a identificação da tentativa fica na dependência da possibilidade concreta de se constatar a exteriorização do ato de vontade do sujeito ativo capaz de demonstrar a alteração da intenção do agente de apropriarse da coisa pertencente ao Poder Público de que detém a posse Não se pode negar a configuração da tentativa quando por exemplo o funcionário é surpreendido efetuando a venda de coisa pertencente ao Estado e somente a intervenção de terceiro circunstância alheia à vontade do agente impede a tradição da coisa ao comprador 8 Comunicabilidade da condição de funcionário público A qualidade de funcionário público do agente se estende também aos coautores ou partícipes do delito art 30 do CP Contudo se o particular desconhece ser o sujeito ativo funcionário público responde por outro crime excluindose o peculato pois nesse aspecto o terceiro participante incorre em erro de tipo na medida em que essa condição especial do autor não entrou na esfera de conhecimento do terceiro que por isso mesmo não pode por ela responder Entendimento diverso levaria à autêntica responsabilidade objetiva proscrita no Direito Penal de um Estado Democrático de Direito 9 Sonegação de tributo incidente sobre produto de crime impossibilidade moral e jurídica 91 Delimitação do tema O Supremo Tribunal Federal no julgamento do Habeas Corpus n 77530RS relatado pelo Min Sepúlveda Pertence manifestou entendimento já sufragado pelo TRF da 4ª Região e pelo STJ no sentido da possibilidade de condenação pelo crime de sonegação fiscal quando houver supressão ou redução de tributo incidente sobre valores de origem criminosa Isso porque dentre outros fundamentos o art 43 do CTN destaca que o IRRF tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica ao mesmo tempo que o art 118 do mesmo diploma legal prescreve que a definição legal do fato gerador é interpretada abstraindose I da validade jurídica dos atos efetivamente praticados pelos contribuintes responsáveis ou terceiros bem como da natureza do seu objeto ou dos seus efeitos Não obstante cremos possível contraditar tal solução com base num fundamento que salvo melhor juízo ainda não fora apreciado pelos nossos tribunais Primeiramente convém ressaltar que as normas do CTN devem ser interpretadas de acordo com os princípios constitucionais em matéria tributária e nesse rumo de nada vale sustentar qualquer posicionamento com base na exclusiva interpretação autopoiética do art 118 do CTN dada a ausência do método hermenêuticoconstitucional requerido por um Estado Democrático de Direito 92 Disponibilidade econômica ou jurídica versus confisco A Constituição da República Federativa do Brasil em seu art 145 1º estipula o princípio da capacidade contributiva Por outro lado também assegura a nossa Carta Magna que a Administração Pública direta e indireta obedecerá dentre outros ao princípio da moralidade art 37 caput da CF88 Quernos parecer que essas duas garantias constitucionais devem nortear a interpretação do fato gerador no que tange à incidência do Imposto de Renda de Pessoa Física e nesse sentido não parece subsistir constitucionalmente válida a interpretação no sentido da incidência da exação em relação a valores de procedência criminosa Isso com base nos argumentos a seguir expostos 921 Disponibilidade econômica ou jurídica A aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica a que se refere o art 43 do CTN deve levar em consideração a licitude da renda já que somente assim poderemos falar em disponibilidade efetiva e válida Com efeito o autor de um delito de peculato possui a detenção dos valores apropriados ou subtraídos mas não possui a propriedade ou posse legítima desses valores disponibilidade Até poderá movimentar os valores produto do delito mas não se pode afirmar jurídica essa movimentação quando o direito determina a obrigação de devolver os valores indevidos Especificamente quanto aos crimes funcionais a Lei n 842992 considera ato de improbidade administrativa o enriquecimento ilícito quando o agente aufere qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão de cargo mandato função emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art 1º art 9º caput da Lei n 842992 prescrevendo como sanção a perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio art 12 I da Lei n 842992 E mais também o art 91 II b do CP estabelece como efeito da condenação penal a devolução do produto do crime 922 Disponibilidade de valores de origem criminosa Nesse caso não se pode falar em disponibilidade de valores de origem criminosa quando o próprio direito obriga o autor como efeito da condenação penal ou como sanção civil decorrente da improbidade administrativa à perda e restituição desses valores Como afirmar que os valores de origem criminosa estão na esfera de disponibilidade do agente se o próprio direito determina a perda desses valores De duas uma ou se obriga o apelante a restituir os valores indevidamente desviados e não se o condena por sonegação fiscal ou se o condena por sonegação fiscal sem que lhe seja imposta a devolução dos valores Como afirmar disponível um bem cuja restituição seja cogente É claro que não se está a discutir aqui a possibilidade de tributação incidente sobre as atividades lícitas desempenhadas por alguém que por meio de dinheiro ilícito consegue obter renda legítima Assim se um traficante com o dinheiro obtido no tráfico vier a constituir por exemplo uma revenda de automóveis é lógico que a venda dos produtos ao consumidor por ser em tese legítima está sujeita à tributação Aqui o fato gerador do IRPJ renda obtida com a venda de automóveis é lícito embora decorrente de valores ilícitos Até se poderia afirmar a incidência de IRPF em valores obtidos de forma ilícita ou imoral mas isso não pode ser confundido com valores obtidos de forma criminosa para os quais o direito estabelece como efeito da condenação a perda e devolução do produto do crime Origem ilícita lato sensu não pode venia concessa ser confundida com origem criminosa injusto penal culpável isto é a prática de crime não pode ser erigida em fato gerador de tributo 93 Ofensa ao princípio da capacidade contributiva O art 43 do CTN adotou a doutrina alemã da propriedade econômica substance over form na doutrina americana ou seja para a configuração do fato gerador do imposto de renda reconhecese como contribuinte a pessoa a quem se imputa a riqueza tributável pouco importando se a imputação é fundada no direito de propriedade ou na posse Não obstante o princípio da capacidade contributiva obriganos a uma reinterpretação dessa regra na medida do patrimônio jurídico do contribuinte Só se pode reconhecer capaz de contribuir aquele que possui a obrigação legal de recolher a exação como uma espécie de ônus políticofiscal imposta pelo Estado para o aumento e manutenção de seu patrimônio 931 Capacidade contributiva e efeitos da condenação penal Se é efeito direto da condenação a obrigação de restituir os bens e valores produto do crime bem como todo o proveito daí decorrente não parece constitucionalmente válido afirmarmos que o condenado que há de suportar esses efeitos também tenha de recolher o tributo sobre seu delito e os acessórios oriundos da obrigação fiscal Mutatis mutandis ocorre o mesmo na hipótese de peculato A prosperar tal tese chegaremos à conclusão absurda de que um ladrão de veículos por exemplo deve declarar perante a Receita Federal todos os automóveis furtados durante o respectivo exercício fiscal E o que é pior a sonegação fiscal aqui refutada acarretaria verdadeiro bis in idem Todos os condenados por crimes contra o patrimônio ou de conotação patrimonial deveriam também sêlo por crime de sonegação fiscal caso os valores ultrapassassem o limite de isenção o que convenhamos é uma grande heresia Se a lei estabelece como efeito da condenação a restituição do produto e do proveito do crime essa mesma lei não pode obrigar o condenado a suportar uma exação incidente sobre aqueles efeitos Portanto não há capacidade contributiva nessa situação porque o art 145 1º da CF88 autoriza a administração tributária a constituir os respectivos créditos só nos casos em que o patrimônio seja pessoal ou seja de propriedade lícita do contribuinte Entendimento diverso irá ofender a garantia à propriedade enunciada no art 5º XXII da Constituição Federal 932 Confisco penal e isonomia tributária Por outro lado essa solução não ofende o princípio da isonomia tributária A Constituição Federal em seu art 150 II veda à Federação instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida independentemente da denominação jurídica dos rendimentos títulos ou direitos A garantia constitucional assegura tratamento paritário e equânime para as pessoas que se encontrem na mesma situação jurídica ou seja em se tratando de situações jurídicas diversas impossível falar em tratamento isonômico Ora o autor de um crime não está sujeito ao recolhimento de IRPF da mesma forma que todos os demais contribuintes pela simples razão de que não possui patrimônio disponível para a incidência do tributo Não se pode vislumbrar identidade de situações entre um indivíduo que possui rendimentos mensais lícitos e outro que auferiu ganhos de forma criminosa em determinado evento delituoso já que o primeiro estará sujeito ao pagamento da exação sem prejuízo em seu patrimônio econômico sobre o qual recaiu o tributo enquanto o segundo teria de recolher o imposto e ao mesmo tempo a obrigação legal de restituir os valores criminosamente obtidos Em outras palavras serão idênticas as situações verificadas entre uma pessoa que possua patrimônio pessoal legítimo e outra que não o tenha de forma válida Uma pessoa que ganha R 200000 no mês sujeitandose ao pagamento de R 15000 a título de IRPF não está na mesma situação jurídica de outra pessoa que auferiu os mesmos R 200000 mas teve de restituílos em razão da apropriação indevida um recolhe o tributo como custo político para a manutenção legítima de R 185000 o outro teria de recolher o mesmo tributo R 15000 mas não teria a sua disposição os mesmos R 185000 além de sofrer as sanções penais pela mesma conduta bis in idem É notório que ambos não estão em situações equivalentes 94 Ofensa ao princípio da moralidade administrativa Outro princípio elementar de um Estado Democrático de Direito é a moralidade sobre a qual deve pautarse a administração do Estado Em que pese a polissemia desse termo a verdade é que sua previsão constitucional faz recair sobre o administrador o dever de demonstrar que sua atuação não ofende a moralidade administrativa ou seja trata se de um princípio constitucional negativo responsável não pela demonstração daquilo que se possa considerar moral mas sim das situações verificadas que in concreto devem ser reputadas imorais A existência abstrata ou concreta de um crime pressupõe a realização de uma conduta imoral ainda que nem toda imoralidade possa por si só caracterizar um delito A secularização do direito impõe à ciência penal a obrigação de instituir crimes somente diante de atos ofensivos aos valores fundamentais do indivíduo e da sociedade Podemos afirmar com base nisso que a prática de peculato caracteriza crime em primeiro lugar porque uma lei específica prevê a possibilidade de punição art 312 do CP mas essa lei só resta legitimada porque o peculato ofende princípios fundamentais do pacto social democrático Um servidor público que desvia verbas públicas em proveito próprio ou alheio pratica ato de improbidade administrativa porque além de lesar o patrimônio da Administração Pública está a ofender os princípios gerais desta Prova disso é que a Lei n 842992 em seu art 11 arrola os atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípios da Administração Pública Tais considerações são suficientes para que cheguemos à notória conclusão de que o apelante praticou uma imoralidade ao desviar as verbas públicas 941 Imoralidade na tributação de produto de crime Sendo isso correto como admitir que o Estado agora pretenda cobrar tributos incidentes sobre valores ilicitamente obtidos Seria moral considerar que o Estado ao cobrar tributo incidente sobre dinheiro sujo estaria lucrando com a prática do delito A CF88 determina como vimos a obrigação de moralidade administrativa e isso faz com que o Estado ao considerar como fato gerador do IRPF os valores ilicitamente e imoralmente obtidos pelo servidor acabe por beneficiarse com a torpeza alheia Ou será que se pretende afirmar moral a obtenção de lucro com a prática do delito Cobrar imposto sobre os valores oriundos de peculato é uma prática administrativa que coloca o Estado ao lado do criminoso na medida em que o aumento da arrecadação seria diretamente proporcional ao aumento da criminalidade Daí que não se pode admitir conclusão inevitável que haja um crime de sonegação fiscal quando o tributo supostamente sonegado incida sobre valores que são obtidos com a prática de um crime Por todas essas razões resta evidente a atipicidade material de sonegação fiscal quando o tributo supostamente sonegado incidir sobre valores obtidos de forma criminosa 10 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de reclusão de dois a doze anos e multa para o crime de peculato em sua modalidade dolosa se culposo o peculato a pena de detenção isoladamente cominada é de três meses a um ano Na hipótese de peculato culposo configurase infração penal de menor potencial ofensivo da competência do Juizado Especial sendo admitida transação penal A ação penal é pública incondicionada sendo irrelevante sua natureza dolosa ou culposa J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A manutenção da r sentença absolutória é medida que se impõe se no decorrer da instrução criminal não restar demonstrado que o apelado tomou para si a propriedade de valores pagos por empresas à Infraero ou que deu aos referidos valores destinação diversa da exigida em proveito próprio ou alheio Em face da ausência de prova robusta quanto à autoria outra medida não se impõe a ser a aplicação do consagrado princípio in dubio pro reo No Direito Penal Moderno não se admite condenação por mera presunção TRF 1ª Região Apelação 20023300003219 1BA Rel Ney Bello j 11122007 Peculato e concussão Exasperação da penabase em virtude do cargo de delegado exercido pelo paciente Os crimes descritos nos arts 312 e 316 do Código Penal são delitos de mão própria só podem ser praticados por funcionário público O legislador foi mais severo relativamente aos crimes patrimoniais ao cominar pena em abstrato de 2 dois a 12 doze anos para o crime de peculato considerada a pena de 1 um a 4 quatro anos para o crime congênere de furto Daí que o acréscimo da pena base com fundamento no cargo exercido pelo paciente configura bis in idem A Primeira Turma desta Corte no julgamento do HC n 83510 Rel o Ministro Carlos Britto fixou o entendimento de que a condição de Prefeito Municipal não pode ser considerada como circunstância judicial para elevar a penabase Substituindo o cargo de prefeito pelo de delegado a hipótese destes autos é a mesma STF HC 88545SP Rel Min Eros Grau j 1262007 Comete o crime previsto no art 312 1 do CP o funcionário público municipal que valendose da facilidade que lhe proporcionava tal qualidade subtrai dinheiro do DMAE mediante o estratagema de adquirir remédio subsidiado com receita falsa passandoo para terceiras pessoas e recebendo 50 do valor do mesmo Condenação mantida Prova Ausência de elementos probatórios capazes de estabelecer o juízo de certeza indispensável para sustentar uma condenação Dúvida intransponível que deve ser resolvida em favor dos réus Sentença confirmada TJRS Apelação 70008241325 Rel Constantino Lisbôa de Azevedo j 1762004 Em se tratando de elementar do crime de peculato é perfeitamente admissível segundo o texto do art 30 do Código Penal a comunicação da circunstância da função pública aos coautores e partícipes do crime inclusive quanto àquele estranho ao serviço público STJ HC 30832PB Rel Min Laurita Vaz j 1832004 No peculato a restituição do valor desviado não importa por si só no afastamento do animus rem sibi habendi até porque para a caracterização do tipo penal do art 312 é irrelevante a efetiva obtenção da vantagem ilícita Não há falar na incidência do art 16 do CP que trata da redução de pena em face de arrependimento posterior quando a restituição da res apropriada é apenas parcial STJ HC 18032RO Rel Hamilton Carvalhido j 362002 Peculato mediante erro de outrem Art 313 Apropriarse de dinheiro ou qualquer utilidade que no exercício do cargo recebeu por erro de outrem Pena reclusão de 1 um a 4 quatro anos e multa D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O legislador brasileiro de 1940 teve como paradigma o disposto no art 316 do Código Penal italiano de 1930 para incluir previsão semelhante no nosso Código Penal de 1940 cuja Parte Especial repetindo continua em vigor Essa figura típica tem sido denominada pela doutrina peculato impróprio Sua impropriedade reside no fato de que ao contrário do peculato próprio o sujeito ativo nessa figura não tem previamente a posse da res objeto material da infração penal Na realidade no peculato impróprio o funcionário público aproveitando se do erro de outrem apropriase de dinheiro ou de qualquer outra utilidade recebidos no exercício do cargo 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração Pública particularmente em relação a seu próprio interesse patrimonial e moral A eficiência do Estado como já destacamos está diretamente vinculada à credibilidade honestidade e probidade de seus agentes pois a atuação do corpo funcional refletese na coletividade influenciando decididamente na formação éticomoral e política dos cidadãos especialmente no conceito que fazem da organização estatal Em síntese protegese o interesse da Administração Pública relativamente à fidelidade e probidade dos agentes do Poder Público mais do que nunca agora sob a égide da Constituição Federal de 1988 reforçase como objeto de proteção penal a probidade administrativa art 37 e incisos Secundariamente são igualmente protegidos os interesses patrimoniais de quem por erro acaba entregando dinheiro ou qualquer outra utilidade ao funcionário público no exercício do cargo 21 Objeto material Por fim o objeto material do peculato decorrente de erro de outrem dinheiro ou qualquer utilidade pode pertencer tanto à Administração Pública quanto à particular desde que seja entregue ao sujeito ativo funcionário público no exercício do cargo O que caracteriza esse tipo de peculato não é a natureza da titularidade do objeto material pública ou privada mas a condição especial do sujeito ativo funcionário público que o recebe por erro no exercício de cargo público 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo Sujeito ativo somente pode ser o funcionário público ou aquele expressamente equiparado para fins penais tratandose por conseguinte de crime próprio A condição especial funcionário público como elementar do crime de peculato comunicase ao particular que eventualmente concorra na condição de coautor ou partícipe para a prática do crime nos termos da previsão dos arts 29 e 30 ambos do CP É indispensável contudo que o particular extraneus tenha consciência da qualidade especial do funcionário público sob pena de não responder pelo crime de peculato Se o particular desconhecer essa condição o seu dolo não estará abrangendo todos os elementos constitutivos do tipo configurandose o conhecido erro de tipo que afasta a tipicidade da conduta Nessa hipótese o particular responderá por outro crime consoante o permissivo contido no art 29 2º do Código Penal que abriga a chamada cooperação dolosamente distinta 32 Sujeitos passivos Sujeitos passivos são o Estado e as entidades de direito público Se o bem móvel dinheiro ou outra utilidade for particular o proprietário ou possuidor desse bem também será sujeito passivo Com essa infração o sujeito ativo lesa tanto bem jurídico pertencente ao erário público dever funcional quanto bem jurídico pertencente ao particular patrimônio Na verdade o Estado é sempre sujeito passivo primário de todos os crimes desde que o Estado evocou a si o monopólio do ius puniendi daí o caráter público do direito penal que somente tutela interesses particulares pelos reflexos que sua violação acarreta na coletividade Com efeito a lei penal protege em primeiro plano o interesse da ordem jurídica geral cujo titular é o Estado e secundariamente o interesse do particular 4 Ausência do pressuposto do crime de peculato posse prévia da res Na hipótese do presente art 313 peculato por erro de outrem o sujeito ativo não dispõe previamente da posse do dinheiro ou da utilidade de que se apropria ao contrário estes lhe vêm às mãos por erro de terceiro assim o funcionário público que não dispunha da posse previamente aproveitase do erro de outrem que indevidamente erro ou equívoco lhe entrega a res Destaquese ademais que tal erro não pode ter sido provocado pelo sujeito ativo sob pena de alterarse a figura típica que já não será essa modalidade de peculato Também nessa espécie de apropriação decorrente de erro de outrem é necessário que o agente possa ter disponibilidade física direta e imediata da coisa alheia dinheiro ou utilidade 41 No exercício de cargo público O recebimento do dinheiro ou utilidade é insuficiente por si só para que essa infração se adeque ao tipo penal em exame sendo necessário que esse recebimento por erro ocorra no exercício de cargo público e não em razão do cargo como é o caso do art 312 antes examinado Devese adotar o princípio da taxatividade no exame dessa elementar típica Nesse sentido as locuções no exercício do cargo e em razão do cargo não têm o mesmo significado jurídicopenal embora por vezes até possam confundirse No entanto o funcionário público por exemplo que estiver afastado do efetivo exercício do cargo por licença enfermidade férias ou por qualquer razão em disponibilidade que receber dinheiro ou utilidade decorrente de erro de outrem praticará crime mais grave como o estelionato exemplificativamente mantendo alguém em erro com a possível majorante do 3º art 171 Certamente em hipótese semelhante o recebimento da res ocorre em razão do cargo embora não se encontre no seu exercício que fática e juridicamente são coisas distintas e é exatamente essa especificação de linguagem com a preciosidade de nosso vernáculo que permite a perfeita adequação típica de condutas aparentemente semelhantes Por fim é necessário ademais que o funcionário público seja regularmente nomeado e empossado em cargo público oficialmente 5 Tipo objetivo adequação típica O núcleo da ação tipificada aqui no art 313 é igual ao do art 312 e tudo o que lá dissemos sobre o verbo nuclear aqui se aplica A forma contudo como o sujeito ativo entra na posse da coisa ou objeto alheio dinheiro ou utilidade é diversa Este não lhe é previamente confiado ou entregue licitamente mas lhe vem às mãos por erro de outrem A conduta enfim consiste em apropriarse apossarse de dinheiro ou qualquer outra utilidade que no exercício do cargo recebeu por erro de outrem a exemplo do que ocorre no peculatoapropriação A entrega pode ser efetuada por um extraneus ou mesmo por outro funcionário público também no exercício de seu cargo A entrega e o recebimento têm origem no erro ou na ignorância que nessa hipótese equivalemse para efeitos desta tipificação 51 Máfé subsequente Na infração tipificada nesse dispositivo penal o agente no momento em que recebe o numerário ou qualquer utilidade não está agindo de máfé exatamente por desconhecer as circunstâncias ao contrário do que ocorreria se os recebesse em razão do cargo estando dele afastado contudo posteriomente constatando o engano ou erro de quem lhe fez a entrega ou pagamento e não procede à devolução do que por ignorância ou erro lhe foi entregue ou pago apropriase indevidamente comprometendo o prestígio e a probidade da Administração Pública 52 Erro de outrem não provocado Erro pode ser entrega de uma coisa por outra entregar ao funcionário errado supor obrigação de entregar etc Ao erro de quem paga ou entrega deve corresponder em princípio a boafé de quem recebe Essa boafé não existiria desde o primeiro momento se o funcionário recebesse em razão de cargo mas do qual não se encontrasse no exercício sabe de imediato que a vítima está incidindo em erro Em outros termos o erro pode incidir sobre a coisa entregue dinheiro ou qualquer utilidade sobre o funcionário a quem se entrega ou sobre o local ou a razão da entrega É indispensável no entanto que tal erro seja espontâneo e não provocado pelo sujeito ativo e que ocorra em função do cargo ocupado por este Em outros termos se o agente induz a vítima a erro o crime poderá ser o de estelionato caso a vítima faça a entrega do objeto material mediante exigência do funcionário público responderá este pelo delito descrito no art 316 do CP São pequenos detalhes que podem alterar profundamente a figura típica 53 Objeto material dinheiro ou qualquer outra utilidade Dinheiro é a moeda corrente nacional que tem a finalidade de propiciar a aquisição ou pagamento de bens serviços ou qualquer outra utilidade Utilidade é tudo aquilo que sirva para consumo uso proveito econômico ou possa ser avaliado e apreciado economicamente Tal utilidade requerida para essa infração penal peculato em qualquer de suas modalidades terá sempre e necessariamente natureza econômica 54 Equiparação com estelionato impropriedade A velha doutrina falava na hipótese dessa infração penal em peculatoestelionato isto é o peculato consistia na apropriação de dinheiro ou qualquer outra utilidade em decorrência do erro de outrem o sujeito apropriase dessa vantagem indevida mantendo ou aproveitandose do erro do sujeito passivo estão presentes em tese as principais elementares do estelionato a vantagem indevida o potencial prejuízo de alguém o erro e o ardil No entanto a despeito das semelhanças entre as duas figuras típicas esta não se confunde com o estelionato porque neste a indução a erro é consequência da conduta do próprio agente ao passo que no peculato decorrente de erro de outrem o sujeito ativo não concorre para ele o dinheiro ou a utilidade vemlhe às mãos por erro ou equívoco sem a sua cooperação O erro nessa modalidade de peculato não se confunde com o erro do crime de estelionato Neste o erro em que incorre a vítima é decorrência da atividade ardilosa do sujeito ativo engendrado com artifícios ou ardis ao passo que no peculato mediante erro de outrem o erro nasce e aperfeiçoase na vítima sem qualquer influência ou interferência do sujeito ativo Em síntese nessa modalidade de peculato a vítima não é constrangida como na concussão nem enganada como no estelionato Em decorrência do erro da vítima a vantagem dinheiro ou outra utilidade lhe vem às mãos generosamente 55 Recusa de devolução da coisa havida por erro Caracterizase o crime porém quando o funcionário que recebeu a coisa dinheiro ou qualquer utilidade recusase a devolvêla depois de notificado notificado no sentido de cientificado do erro tomado ciência do equívoco Ademais é necessário que repetindo o funcionário tenha recebido a coisa no exercício de cargo público e não em razão dele pois nesta hipótese o crime poderia ser de corrupção passiva Contudo se o funcionário sujeito ativo incide em erro ao receber o objeto também entregue em razão de erro ou não não se caracteriza o crime por ausência de dolo que é o elemento subjetivo informador dessa infração penal 56 O erro como elementar típica O recebimento do objeto material dinheiro ou outra utilidade dessa modalidade de peculato decorre de erro de outrem isto é de quem faz a entrega O erro pode recair sobre a coisa sobre a obrigação ou sobre a quantidade da coisa devida dinheiro ou qualquer utilidade e particularmente sobre quem deva recebêla Nesse sentido Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 354 já destacava que o erro pode incidir a sobre a competência do funcionário para receber b sobre a obrigação de entregar ou prestar c sobre o quantum da coisa a entregar a entrega é excessiva apropriandose o agente do excesso Enfim é indiferente a natureza ou espécie do erro que leva o sujeito passivo a entregar equivocadamente o valor ou utilidade a funcionário que não devia recebêlo 561 Irrelevância da causa do erro É absolutamente irrelevante a causa do erro ignorância desconhecimento confusão desatenção etc desde que repetindo tenhase originado espontaneamente sem qualquer intervenção provocativa do sujeito ativo É indispensável no entanto que esse erro do sujeito passivo seja não só voluntário como também espontâneo pois se decorrer de provocação do funcionário que recebe o objeto do equívoco valor ou qualquer outra utilidade poderá tipificar o crime de concussão ou uma das figuras de estelionato dependendo das circunstâncias fáticas 6 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo constituído pela vontade de apropriar se daquilo que recebeu por erro de outrem O dolo no entanto deve apresentarse em momento posterior ao recebimento quando normalmente o sujeito ativo encontrase de boafé Dizer contudo que o dolo deve apresentarse em momento posterior não significa que seja dolus subsequens o qual não admitimos como possível pois na verdade o dolo é concomitante ao momento da apropriação da res que é evidentemente posterior ao recebimento Deu para entender acreditamos O dolo afinal é atual isto é coincidente com o momento da apropriação Não há exigência de elemento subjetivo especial do injusto Não há tampouco previsão de modalidade culposa 7 Consumação e tentativa 71 Consumação O momento consumativo dessa modalidade de peculato a exemplo do previsto no artigo anterior é de difícil precisão pois depende em última análise de uma atitude subjetiva do sujeito ativo Consumase o crime com a efetiva apropriação do objeto material dinheiro ou qualquer utilidade ou seja quando o funcionário público torna seu o patrimônio que recebeu no exercício do cargo público por erro de outrem sendo irrelevante o prejuízo efetivo para a Administração Pública A apropriação do bem público no entanto não se materializa apenas num momento subjetivo necessitando de um fato exterior que constitua um ato de domínio e revele o propósito de apropriarse A exteriorização da vontade do agente consumadora desse tipo de peculato revelase com a retenção ignorando a notificação ou pedido de sua devolução por quem de direito Solicitada a devolução e desatendida pelo funcionário público consumase o crime ficando caracterizado o ato demonstrativo de disposição de coisa alheia como própria Se no entanto o agente não manifesta a intenção de ficar com a res e ao contrário constatado o erro a restitui à repartição ou a quem lhe entregou por erro de pronto o dolo não se aperfeiçoa 72 Tentativa Tratandose de crime material a tentativa é possível embora de difícil configuração A despeito da dificuldade de sua comprovação a identificação da tentativa fica na dependência da possibilidade concreta de se constatar a exteriorização do ato de vontade do sujeito ativo 8 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de reclusão de um a quatro anos e multa A ação penal é de natureza pública incondicionada não sendo exigida qualquer manifestação do ofendido ou representante legal Admitese a transação e a suspensão condicional do processo em razão de a pena mínima abstratamente cominada não ser superior a um ano art 89 da Lei n 909995 J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Afastada a hipótese de peculato mediante erro de outrem No delito descrito no art 313 do Código Penal a entrega da vantagem indevida deve ser feita espontaneamente pela vítima No caso concreto o comportamento do réu foi decisivo para receber o proveito criminoso Não houve espontaneidade e sim indução Se num primeiro momento a vítima pensava dever ao Fisco cabia ao réu esclarecer que sua dívida era tão ínfima que sequer seria cobrada Mas aproveitandose da ingenuidade da presa fácil que aparentava ser a viúva Luci mentiulhe acerca dos valores e se mostrou solícito em prestar seus serviços para quitar o débito TRF 3ª Região Apelação 200303990250658 Rel Johonsom Di Salvo j 1322007 O peculato é denominado crime próprio pois exige a condição de funcionário público como característica especial do agente condição que é de caráter pessoal elementar do crime e que se comunica ao paciente por ele ter conhecimento de que sua exesposa era funcionária pública Não há constrangimento ilegal na denúncia do paciente pela prática em tese de peculato mediante erro de outrem pois embora não fosse funcionário público a condição da exmulher por ser elementar do crime foi a ele comunicada O concurso material dos crimes de peculato e de apropriação indébita é em princípio neste caso específico possível pois os autos revelam que a conta onde foram depositados os valores indevidos permaneceu na titularidade conjunta do paciente e sua exesposa funcionária pública durante um período e na titularidade exclusiva do paciente durante outro período STJ RHC 12506MG Rel Gilson Dipp j 1792002 Peculato mediante erro de outrem Rejeição da denúncia A modalidade do art 313 CP não se perfaz quando inexistiu equívoco relativo ao montante pago omitindose consciente e reiteradamente descontos impostos por lei orgânica municipal Ainda que ocorrente erro na transferência de dinheiro ou qualquer utilidade só se consubstancia apropriação por parte de quem os recebeu se recusa devolvêlos embora notificado TJRS Apelação 695069294 Rel Aristides Pedroso de Albuquerque Neto j 381995 Inserção de dados falsos em sistema de informações Art 313A Inserir ou facilitar o funcionário autorizado a inserção de dados falsos alterar ou excluir indevidamente dados corretos nos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração Pública com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou para causar dano Pena reclusão de 2 dois a 12 doze anos e multa Artigo acrescentado pela Lei n 9983 de 14 de julho de 2000 D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias A Lei n 9983 de 14 de julho de 2000 introduziu dentre outras figuras penais a presente infração com o objetivo de criminalizar a conduta de funcionário público consistente na inserção de dados falsos alteração ou exclusão indevidas de dados corretos nos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração Pública com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou para causar dano O projeto da referida lei previa originalmente a mesma infração penal limitada porém à previdência social consoante se depreende do seguinte texto inserir o funcionário autorizado ou facilitar a inserção de dados falsos alterar ou excluir indevidamente dados corretos nos sistemas informatizados ou bancos de dados da previdência social com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou para causar dano à essa instituição Com o estrondoso progresso da tecnologia e por consequência a invasão e consagração da informática as organizações públicas e privadas passaram a adotar universalmente os microprocessadores e microcomputadores que passaram a ser a base de qualquer corporação independentemente de suas importâncias e dimensões política social ou econômica No entanto a popularização da informática facilitou seu uso também pelos particulares e com a mesma eficiência que possibilita a estruturação dos serviços das grandes instituições especialmente nas administrações públicas torna as também vulneráveis a todo tipo de pirataria com riscos de produção de danos incalculáveis Essas facilidades tanto para administrar quanto para fraudar propiciadas pela informatização em massa serve de justificativa para criminalizar condutas como a descrita no artigo ora em exame 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração Pública especialmente a probidade administrativa não diferindo muito da proteção objetivada pela criminalização do peculato tipificado no art 312 enfatizandose principalmente a sua organização e eficiência indispensáveis para atingir os desideratos a que se propõe Em sentido estrito o bem jurídico tutelado é a segurança do conjunto de informações da Administração Pública especialmente seu sistema informatizado que somente pode ser manuseado modificado ou alimentado por funcionários devidamente autorizados e nos limites expressamente permitidos Exatamente por isso punese o funcionário que autorizado a manusear esses dados informatizados adulteraos seja incluindo dados falsos seja excluindo ou alterando indevidamente dados corretos 21 Objeto material dados verdadeiros dos sistemas informatizados Do exposto resulta absolutamente claro que o objeto material dessa infração penal são os dados verdadeiros dos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração Pública em geral Os dados falsos a nosso juízo não podem ser considerados como objeto material porque não recebem a proteção penal sendo apenas consequências da conduta proibida que se pretende evitar 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo Sujeito ativo somente pode ser o funcionário público e especialmente aquele devidamente autorizado a trabalhar com a informatização ou sistema de dados da Administração Pública O tipo penal que tipifica crime próprio tem o especial cuidado de destacar que o sujeito ativo dessa infração penal é o funcionário autorizado afastando dessa forma qualquer outro funcionário que eventualmente imiscuirse indevidamente nos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração Pública Assim o funcionário público não autorizado somente poderá concorrer para esse crime na forma do art 29 caso contrário deverá responder por outra infração penal 32 Sujeito passivo Sujeito passivo é o Estado União Estados Distrito Federal e Municípios além das demais pessoas jurídicas descritas no art 327 1º do CP e eventualmente qualquer cidadão que possa resultar lesado por essa conduta delituosa 4 Tipo objetivo adequação típica As condutas tipificadas são a inserir introduzir incluir alimentar o sistema ou facilitar a inserção tornar possível fácil permitir ou seja que outrem insira dados falsos b alterar mudar modificar ou excluir retirar eliminar remover indevidamente dados corretos dos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração Pública Qualquer das condutas tem de demonstrar a finalidade específica de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou simplesmente causar dano Inegavelmente o projeto em sua redação original como destacamos limitavase a criminalizar as mesmas condutas relativamente ao sistema previdenciário A redação final que resultou no atual texto legal ampliou seu espectro para abranger toda a Administração Pública direta e indireta As duas primeiras condutas inserir ou facilitar a inserção têm por objeto o dado falso isto é desconforme com a realidade numa espécie de falsidade ideológica como a descrita no art 299 Com efeito a falsidade versa sobre o conteúdo do dado e a exemplo da falsidade ideológica basta a potencialidade de dano para caracterizar o crime O dano se efetivamente sobrevier representará somente o exaurimento do crime O dado falso inserido no sistema informatizado da Administração Pública sob seu aspecto formal é verdadeiro isto é existente real e efetivo mas seu conteúdo é falso ou seja a ideia ou declaração que o dado contém não corresponde à verdade 41 Facilitar sua inserção Na modalidade de facilitar sua inserção o sujeito ativo da infração penal isto é o funcionário público autorizado não realiza pessoalmente a infração legal mas utilizase de interposta pessoa que pode ou não ser funcionário público no caso não autorizado a operar os dados informatizados da Administração Pública Esse terceiro pode ou não ter consciência de que contribui para a prática de um ato ilegal se o tiver responderá pelo mesmo crime em razão da ampliação da adequação típica determinada pelo art 29 do Código Penal concurso eventual de pessoas Se ignorar contudo que concorre para a prática de infração legal será mero instrumento utilizado pelo verdadeiro autor autoria mediata para a prática do crime não passando ele de mero executor que não responde pelo fato por faltarlhe o dolo que é o elemento subjetivo do crime 42 Alterar ou excluir dados corretos As duas últimas condutas alterar ou excluir têm por objeto dados corretos dos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração Pública Nessas duas hipóteses as informações verdadeiras é que são substituídas ou excluídas dos sistemas informatizados Substancialmente não há muita diferença entre inserir dados falsos ou alterar ou excluir dados verdadeiros afora a preocupação com o princípio da taxatividade fechando todas as alternativas possíveis de forma a evitar qualquer alteração nos referidos dados seja com inserção de conteúdos falsos ou alteraçãosupressão de dados verdadeiros tanto uma forma quanto outra tipificará igualmente a infração descrita no dispositivo em exame 43 Somente alteração ou exclusão indevidas No entanto nestas duas últimas figuras alterar ou excluir há uma outra peculiaridade somente se está proibindo a alteração ou a exclusão indevidas Indevida será toda e qualquer alteração ou exclusão não permitida em lei não autorizada ou seja contrárias à ordem jurídica Significa dizer que pode haver alteração ou exclusão autorizada permitida isto é devida Nessas hipóteses não configurará a elementar exigida pelo tipo penal quando tais condutas forem executadas de acordo com permissivo legal estatutário ou regulamentar 44 Obtenção de vantagem indevida elemento normativo Afinal qual é a natureza da vantagem Será somente a econômica ou poderá ser vantagem de qualquer natureza Como o tipo penal não define essa questão é indispensável que se encontre dentro do próprio sistema do Código Penal qual pode ser a natureza dessa vantagem Preliminarmente não podendo esquecer que o Código Penal ora usa indevida vantagem ora indevida vantagem econômica e por vezes simplesmente qualquer vantagem indevida Certamente essa variedade terminológica não se apresenta desacompanhada de fundamento políticojurídico ou seja de um modo geral o grande cuidado metodológico e o esmerado tecnicismo do legislador de 1940 indicam que a opção por uma ou outra locução sempre foi fundamentada e encerra o verdadeiro sentido que o então legislador lhes quis atribuir Os tipos penais desde a contribuição de Mayer não raro trazem em seu bojo determinados elementos normativos que encerram um juízo de valor Convém destacar no entanto como tivemos oportunidade de afirmar que os elementos normativos do tipo não se confundem com os elementos jurídicos normativos da ilicitude Enquanto aqueles são elementos constitutivos do tipo penal estes embora integrem a descrição do crime referemse à ilicitude e assim sendo constituem elementos sui generis do fato típico na medida em que são ao mesmo tempo caracterizadores da ilicitude Esses elementos especiais da ilicitude normalmente são representados por expressões como indevidamente injustamente sem justa causa sem licença da autoridade etc Bitencourt Tratado de Direito Penal 2008 v 1 p 383 Quando o legislador quer limitar a espécie de vantagem usa o elemento normativo indevida injusta sem justa causa que normalmente são locuções empregadas como sinônimas A vantagem exigida pelo tipo penal tem de ser injusta ilegal isto é indevida Se for justa a vantagem pretendida pelo funcionário falsário estará afastada a figura de inserção de dados falsos em sistema de informações podendo configurar outro crime como por exemplo exercício arbitrário das próprias razões art 345 residualmente se não houver outra figura mais grave Quando a lei quer limitar a espécie de vantagem usa o elemento normativo indevida injusta sem justa causa ilegal como destacamos em inúmeras passagens no volume 3º do Tratado ao examinarmos os crimes contra o patrimônio 45 Natureza da vantagem indevida Finalmente questão interessante a analisar ainda neste tópico referese à natureza da vantagem indevida Contrariamente ao que fez o legislador em alguns dispositivos deste Código como por exemplo ao definir o crime de extorsão art 158 estabeleceu que a finalidade era obter indevida vantagem econômica Poderia têlo feito não o fez e certamente não terá sido por esquecimento Preferiu no entanto adotar a locução vantagem indevida sem definir sua espécie provavelmente para não restringir seu alcance Coerente com o entendimento que adotamos ao longo de toda esta obra sempre comprometidos com a segurança dogmática da tipicidade estrita naquela linha que Magalhães Noronha gostava de repetir de que a lei não tem palavras inúteis mas também não admite acrescentamos nós a inclusão de outras não contidas no texto legal Por isso mesmo contrariando a maioria da doutrina de que a vantagem indevida pode consistir em qualquer utilidade econômica ou não pouco importando a forma de exigência 5 Inserção de dados falsos em sistemas de informações e estelionato Falavase na hipótese do peculato impróprio art 313 também em peculatoestelionato isto é o peculato consistia na apropriação de dinheiro ou qualquer outra utilidade em decorrência do erro de outrem o sujeito apropriase dessa vantagem indevida mantendo ou aproveitandose do erro do sujeito passivo estariam presentes em tese as elementares do estelionato No entanto a despeito das semelhanças entre as duas figuras típicas esta não se confunde com o estelionato porque neste a indução a erro é consequência da conduta do próprio agente ao passo que no peculato decorrente de erro de outrem o sujeito ativo não concorre para ele o dinheiro ou a utilidade vemlhe às mãos por erro ou equívoco sem a sua cooperação O erro nessa modalidade de peculato não se confunde com o erro do crime de estelionato conforme destacamos no capítulo anterior 51 Equiparações desautorizadas Parte da doutrina tem insistido em comparar a infração penal descrita neste art 313A não só com o denominado peculato impróprio art 313 como também novamente com o crime de estelionato Nesse sentido sustenta Guilherme Nucci Código Penal comentado p 981 2 a criação desse novo tipo penal incluindoo a Lei 99832000 no contexto do peculato equivale a comparálo com o peculato impróprio ou o peculatoestelionato No capítulo anterior com efeito onde admitimos o crime de peculato mediante erro de outrem como peculato impróprio afastamos toda e qualquer possibilidade de ser confundido com o crime de estelionato que exige outras elementares típicas que não se fazem presentes no peculato impróprio art 313 e muito menos no crime de inserção de dados falsos em sistema de informações art 313A No peculato impróprio o texto legal nem sequer menciona a exigência de vantagem indevida ilícita e muito menos prejuízo alheio Aliás não há falar em crime de estelionato sem a produção de prejuízo efetivo a alguém e o crime de inserção de dados falsos em sistema de informações pode configurarse sem a produção de prejuízo tratando se pois de crime formal enquanto o estelionato é crime material no qual o resultado integra o próprio tipo penal 52 Dessemelhanças com o estelionato As diferenças do crime em exame com o estelionato não param por aí Com efeito a configuração do crime de estelionato exige a presença dos seguintes requisitos fundamentais 1 emprego de artifício ardil ou qualquer outro meio fraudulento 2 induzimento ou manutenção da vítima em erro 3 obtenção de vantagem patrimonial ilícita em prejuízo alheio do enganado ou de terceiro Examinando o crime de estelionato tivemos oportunidade de fazer a seguinte síntese Tratado de Direito Penal 2005 v 3 p 278 No estelionato há dupla relação causal primeiro a vítima é enganada mediante fraude sendo esta a causa e o engano o efeito segundo nova relação causal entre o erro como causa e a obtenção de vantagem ilícita e o respectivo prejuízo como efeito Na verdade é indispensável que a vantagem obtida além de ilícita decorra do erro produzido pelo agente isto é que aquela seja consequência desta Não basta a existência do erro decorrente da fraude sendo necessário que da ação resulte vantagem ilícita e prejuízo patrimonial Ademais à vantagem ilícita deve corresponder um prejuízo alheio Como se constata enfim essas elementares do estelionato não integram o tipo penal de inserção de dados falsos em sistemas de informações que está mais para o crime de falsum do que para estelionato 53 Natureza da finalidade especial O fim especial de obter vantagem indevida constante do art 313 A ora em exame constitui somente o elemento subjetivo especial do injusto que nem sequer precisa concretizarse bastando que exista como fundamento da motivação subjetiva do agente para a prática do crime ao passo que no crime de estelionato a exigência de vantagem ilícita é da essência do crime Com efeito a conduta nuclear por excelência está representada pelo verbo obter isto é conseguir proveito ou vantagem ilícita em razão de engano provocado no ofendido Para a configuração do estelionato é indispensável que o agente obtenha proveito indevido em prejuízo alheio Exige o tipo penal a produção de duplo resultado vantagem ilícita e prejuízo alheio 6 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de praticar qualquer das condutas tipificadas de inserir ou facilitar a inclusão de dados falsos ou ainda alterar ou excluir indevidamente dados corretos dos sistemas informatizados da Administração Pública Exigese a presença do elemento subjetivo especial do injusto qual seja o especial fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou simplesmente de causar dano É desnecessário que a vantagem seja obtida basta que exista subjetivamente como condutora do comportamento do sujeito ativo 7 Consumação e tentativa Consumase o crime de alteração de dados informáticos em quaisquer de suas modalidades com a simples prática de qualquer das condutas descritas no dispositivo independentemente de o sujeito ativo obter eventual vantagem indevida ou resultar dano de qualquer natureza Enfim finalidade específica como especial fim de agir não precisa concretizarse A tentativa a despeito de tratarse de crime formal é teoricamente possível em todas as figuras tipificadas por tratarse de infração penal cuja fase executória admite fracionamento 8 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de reclusão de dois a doze anos e multa A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Inserção de dados falsos em sistema informatizado princípio da especialidade Fato único Conflito aparente de normas Estelionato Não pode um único fato estar adequado a mais de uma norma incriminadora Estagiário de Ciretran que mediante pagamento opera registros de transferência de veículos no sistema informatizado dispensando a comprovação do recolhimento do respectivo tributo Crime tipificado no art 313A do Código Penal não obstante a conduta também esteja amoldada a outros tipos penais como as corrupções ativa e passiva gerando conflito aparente de normas Prevalece a primeira conduta típica em face do princípio da especialidade TJRS Apelação 70019697341 Rel Gaspar Marques Batista j 1º 112007 Afastamento da tese de aplicação do art 313A no período de vacatio legis se o fato capitulado no citado art 313A do Código Penal acrescentado pela Lei 99832000 encontrase descrito a partir do 29º fato ocorrido em maio de 2002 de modo que todas as condenações por esse artigo alcançaram apenas os fatos ocorridos após o advento da referida Lei STJ REsp 810931RS Rel Gilson Dipp j 1962007 Modificação ou alteração não autorizada de sistema de informações Art 313B Modificar ou alterar o funcionário sistema de informações ou programa de informática sem autorização ou solicitação de autoridade competente Pena detenção de 3 três meses a 2 dois anos e multa Caput acrescentado pela Lei n 9983 de 14 de julho de 2000 Parágrafo único As penas são aumentadas de um terço até a metade se da modificação ou alteração resulta dano para a Administração Pública ou para o administrado Parágrafo único acrescentado pela Lei n 9983 de 14 de julho de 2000 D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Este dispositivo também foi inserido no atual Código Penal pela Lei n 9983 de 14 de julho de 2000 que no projeto original n 933A era tipificado como uma espécie sui generis de prevaricação art 319A embora o nomen juris fosse basicamente o mesmo deste art 313B Nos tempos atuais a utilização da informática passou a ser indispensável em qualquer atividade pública ou privada sendo necessário por evidente que o próprio direito penal fosse chamado a coibir a prática de determinadas condutas ante os graves danos e irreparáveis prejuízos que o seu mau uso pode produzir na sociedade agigantandose na mesma proporção da grandeza das instituições públicas ou privadas nacionais ou internacionais Por outro lado a facilidade do uso lícito dessas máquinas está diretamente ligada à facilidade também de sua adulteração modificação ou simples alteração que precisa ser eficazmente combatida 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração Pública particularmente a probidade administrativa mais precisamente é o interesse em assegurar o regular funcionamento do EstadoAdministração principalmente seu patrimônio bem como o do administrado além de garantir o prestígio que os seus atos devem desfrutar perante a coletividade 21 Objeto material sistema de informações e de informatização O objeto material da proteção penal é o sistema público de informações e seu programa de informatização o qual na era da informática passa a desfrutar de extraordinária importância tornando se por isso mesmo merecedor dessa proteção 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo Sujeito ativo somente pode ser qualquer funcionário público nesse caso ao contrário do dispositivo anterior não precisa ser aquele devidamente autorizado a trabalhar com a informatização ou sistema de dados da Administração Pública Em outras palavras qualquer funcionário público que faça uso de computador no exercício de sua atividade funcional mesmo não autorizado pode em princípio praticar a infração do dispositivo em exame É perfeitamente possível a participação do extraneus via concurso eventual de pessoas art 29 32 Sujeito passivo Sujeito passivo é o EstadoAdministração Estadosmembros Distrito Federal e Municípios especialmente em seus sistemas informatizados e eventualmente qualquer cidadão que possa resultar lesado em decorrência da violação do sistema penalmente protegido 4 Tipo objetivo adequação típica As condutas descritas no núcleo do tipo estão representadas pelos verbos modificar e alterar a modificar transformar dar novo conteúdo produzir de forma distinta etc b alterar mudar dar nova configuração modificar o acesso etc o sistema de informações ou programa de informática da Administração Pública Em outros termos modificar significa uma radical transformação no programa ou sistema de informações da Administração Pública ao passo que alterar embora também represente modificação em dito programa não atinge a mesma profundidade ou seja não chega a alterar a sua essência mantendo suas propriedades fundamentais No mesmo sentido é o entendimento externado por Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 479 que sustenta a ação de modificar expressa uma transformação radical no programa ou no sistema de transformações enquanto na alteração embora também se concretize uma mudança no programa ela não chega a desnaturálo totalmente A primeira conduta com efeito dá nova forma ao sistema ou programa ao passo que a segunda tem o sentido de manter o sistema ou programa anterior embora alterado em sua forma original 41 Objeto material O tipo penal estabelece como objeto material o sistema de informações e o programa de informática utilizado pela administração pública O sistema de informações define Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 480 é um conjunto de programas integrado regularmente para permitir com o máximo de rapidez e eficiência um processo de captura armazenamento resumo e relato de informações úteis ao exercício funcional do usuário que no caso é a Administração Pública E programa de informática é o software que possibilita ao computador transformarse em depositário e repositório de dados informações elementos constituindo um sistema de armazenagem de dados facilitando a realidade complexa da vida moderna em qualquer atividade 42 Elemento normativo especial sem autorização ou solicitação de autoridade competente Sem autorização ou solicitação de autoridade competente constitui elemento normativo especial da ilicitude que por sua sede antecipa o exame da própria ilicitude da conduta que passa a ser examinada já no âmbito da tipicidade penal A falta de autorização ou solicitação não representa mera irregularidade administrativa mas constitui a própria ilicitude da conduta representando um elemento normativo constitutivo negativo do tipo penal Devese destacar que os elementos normativos do tipo alheia honesto obsceno etc não se confundem com os elementos jurídiconormativos da ilicitude Enquanto aqueles são elementos constitutivos do tipo penal estes embora também integrem a descrição do crime referemse à ilicitude e assim sendo constituem elementos sui generis do fato típico na medida em que são ao mesmo tempo caracterizadores da ilicitude Esses elementos normativos especiais da ilicitude são normalmente representados por expressões como indevidamente injustamente sem justa causa sem licença da autoridade sem autorização legal ou mesmo não autorizado por lei etc Enfim qualquer das condutas modificar ou alterar deve ser realizada sem autorização ou solicitação de autoridade competente Significa dizer que a existência de autorização ou solicitação de autoridade competente não só afasta eventual ilicitude da conduta como também afasta a própria tipicidade Sintetizando como o dolo deve abranger todos os elementos que compõem a figura típica e se as características especiais do dever jurídico forem elemento determinante da tipicidade concreta como é o caso a nosso juízo o erro sobre elas deve ser tratado como erro de tipo excluindo logicamente a tipicidade 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade de praticar qualquer das condutas tipificadas quais sejam modificar ou alterar programas de informações ou de informática da Administração Pública Nesta infração penal não há a exigência da presença de elemento subjetivo especial do injusto representado por um fim especial como no dispositivo anterior que exige o fim específico de obter vantagem indevida ou simplesmente causar dano 6 Classificação doutrinária Tratase de crime próprio que exige qualidade ou condição especial do sujeito ativo no caso somente funcionário público formal crime que se consuma com a simples prática da conduta descrita no tipo não exigível a superveniência de qualquer resultado concreto instantâneo a execução não se alonga no tempo ocorrendo em momento determinado comissivo os dois verbos nucleares implicam ação não sendo possível a execução sob a forma de omissão unissubjetivo o crime pode ser praticado por uma pessoa embora admita o concurso eventual de pessoas plurissubsistente crime que em sua fase executória admite fracionamento 7 Consumação e tentativa Consumase a modificação ou alteração do sistema de informações com a simples prática de qualquer das condutas descritas no dispositivo desde que sem autorização ou solicitação de autoridade competente não sendo necessária a produção de dano algum à Administração Pública A tentativa é teoricamente possível desde que haja interrupção da fase executória por circunstâncias alheias à vontade do agente 8 Causa de aumento produção de dano Se da ação praticada qualquer delas resultar dano para a Administração Pública ou para terceiro as penas serão aumentadas de um terço até metade Punese de forma especial o resultado concreto da infração penal que na hipótese configura o exaurimento qualificado da conduta delituosa Se o crime for praticado por ocupante de cargo em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta sociedade de economia mista empresa pública ou fundação instituída pelo Poder Público a pena será aumentada de um terço conforme determina o 2º do art 327 do Código Penal 9 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de detenção de três meses a dois anos e multa Tratase de infração de menor potencial ofensivo sendo portanto da competência do Juizado Especial Criminal admitindose por conseguinte a transação penal A ação penal é pública incondicionada não sendo exigível qualquer manifestação da parte ofendida Extravio sonegação ou inutilização de livro ou documento Art 314 Extraviar livro oficial ou qualquer documento de que tem a guarda em razão do cargo sonegálo ou inutilizálo total ou parcialmente Pena reclusão de 1 um a 4 quatro anos se o fato não constitui crime mais grave D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Embora a doutrina de um modo geral cite a previsão do art 255 do Código Penal argentino quernos parecer que esse dispositivo deve ser analisado com grande cuidado pois também guarda muita semelhança com o disposto no art 356 do nosso Código Penal especialmente se observarmos a finalidade probatória exigida pelo Código argentino como os possíveis sujeitos ativos dessa infração penal destoando da previsão do nosso dispositivo a seguir examinado afora o fato de referido dispositivo argentino prever também a modalidade culposa ao contrário da previsão brasileira Os verbos nucleares também são diferentes Parece no entanto que os tratadistas brasileiros não perceberam essas diferenças pelo menos a elas não se referiram Parecenos que se deve trabalhar melhor a prescrição do art 255 do Código Penal argentino quando aborda o art 356 do diploma legal brasileiro 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração Pública especialmente a probidade administrativa A finalidade da tutela penal é a preservação do regular funcionamento da Administração Pública particularmente garantir a integridade e idoneidade de livros oficiais e documentos confiados a funcionário público em razão de seu cargo O objeto material é livro oficial ou qualquer documento público ou privado Essa documentação pode ser de qualquer natureza tais como de valor histórico contábil patrimonial registral protocolar etc O objeto material da ação caracterizase segundo profetizava Sebastian Soler Derecho Penal argentino p154 por constituirse de meios substancialmente necessários para o exercício de um ato de autoridade administrativo legislativo ou judicial com o que se excluem os objetos que o Estado tem como patrimônio Isso não impede porém que o objeto material da ação possa ter valor patrimonial Livro ou documento aqui exigido distinguese convém destacar de documentos de valor probatório recebido por alguém na condição de advogado ou procurador que configurará o crime previsto no art 356 do Código Penal sonegação de documento ou objeto de valor probatório 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo Sujeito ativo somente pode ser o funcionário público ou aquele expressamente a este equiparado para fins penais que tenha a guarda de livro oficial ou de documento em razão do cargo Somente este pode ser sujeito ativo deste crime É admissível a participação de terceiro via concurso eventual de pessoas Se o sujeito for um particular estranho à Administração Pública o crime cometido será aquele do art 337 subtração ou inutilização de livro ou documento e não este descrito no art 314 a menos que tenha concorrido com o funcionário público responsável sendo alcançado pelo disposto no art 29 do CP A falta da condição especial de funcionário público poderá observada a presença das demais elementares típicas configurar o crime previsto no art 337 do CP crime praticado por particular contra a Administração Pública 32 Sujeitos passivos Sujeitos passivos são o Estado e as entidades de direito público como regra geral Se o particular de alguma forma também for lesado com o extravio a inutilização ou a sonegação de livro oficial ou de qualquer documento será incluído como sujeito passivo direto o que pode ocorrer por exemplo quando o objeto material lhe pertença 4 Tipo objetivo adequação típica As condutas típicas alternativamente descritas são a extraviar perder livro oficial ou qualquer outro documento protocolos pareceres plantas relatórios etc de que tem a guarda em razão de cargo b sonegálo deixar de apresentar c inutilizálo tornálo imprestável total ou parcialmente 41 Entendimento doutrinário clássico A antiga doutrina ao examinar a conduta de extraviar a começar por Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 336 adotava a seguinte orientação extraviar é desencaminhar desviar do destino Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 239 extravio é desvio descaminho e mudança de destino ou fim Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 403 extraviar desencaminhar fazer desaparecer Paulo José da Costa Jr Comentários ao Código Penal p 457 extraviar é desviar do destino é desencaminhar Damásio de Jesus Direito Penal v 2 p 146 extraviar quer dizer desencaminhar desviar alterar a sua destinação Mais recentemente podese dizer que parte da nova geração de penalistas pelo menos continua trilhando o mesmo caminho Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 383 extraviar expressa a ideia de desencaminhar de desviar destino de desaparecimento Guilherme Souza Nucci Código Penal comentado p 984 extraviar é fazer com que algo não chegue ao seu destino que em outras palavras quer dizer a mesma coisa desencaminhar desviar do destino 42 Entendimento doutrinário recente Constatase que se passaram décadas daquela primeira e sintética afirmação de Hungria extraviar é desencaminhar desviar do destino correta ou incorreta não interessa aqui fazer juízo de valor importando apenas constatar que se continua a adotar exatamente a mesma definição com o mesmo sentido sem aquela reflexão mínima recomendável ao menos pelo passar dos anos Recusamonos a seguir nesse caminho precisamos reinterpretar o velho Código Penal em respeito à nova ordem democrática e especialmente ao princípio da tipicidade estrita de novos tempos de Estado Democrático de Direito 43 Nossa interpretação sobre extraviar Extraviar a nosso juízo é perder é não saber onde se guardou arquivou ou protocolou extravio é produto de descuido de desatenção de desleixo no trato da coisa pública in casu de livro oficial ou qualquer documento de que o funcionário tem a guarda em razão do cargo Em outros termos extraviar é negligenciar no dever de cuidado que incumbe ao funcionário público no exercício do cargo Logo a definição que sempre se deu à conduta de extraviar é equivocada e fere o princípio da reserva legal além de configurar autêntica responsabilidade penal objetiva como veremos Com efeito desencaminhar ou desviar do destino definição da velha doutrina é dar destinação diferente daquela que na realidade deveria ter é utilizar mal é dar uma finalidade inadequada ou imprópria e jamais poderá confundirse com o simples extravio que implica conduta omissiva Extraviar na nossa concepção significa desconhecer seu paradeiro ignorar a sua localização não saber onde se encontra o objeto material perdêlo enfim é não ter como localizálo A afirmação de Regis Prado de que perdura o extravio enquanto o agente entender que o livro ou documento deva permanecer extraviado encerra a nosso juízo uma espécie de dolo subsequente inadmissível em direito penal pois o dolo deve ser contemporâneo à ação típica e nunca posterior Ademais manterse extraviado enquanto o agente o desejar desnatura a ação de extraviar que se caracteriza no momento em que o objeto é procurado e não é encontrado em que sua busca resulta inexitosa mas isso ocorre exatamente por desconhecer seu paradeiro e não por não querer encontrálo ou desejar que continue extraviado como sustentam alguns 431 Extraviar natureza omissiva Para concluir essas considerações críticas cabe uma última interrogação afinal qual seria a verdadeira razão que teria levado a velha doutrina a adotar uma interpretação tão distante do real significado da conduta extraviar Considerando o elevadíssimo nível de nossos mais respeitados penalistas socorrenos somente um fundamento tem cunho dogmático e foi intencional extraviar tem natureza intrinsecamente omissiva e encerra um ato negligente Em outros termos como ninguém os penalistas ignora o princípio da excepcionalidade do crime culposo tampouco desconhece o sentido culposo que decorre desse verbo nuclear ao contrário do mencionado similar argentino e a clara equiparação das condutas extraviar sonegar e inutilizar contidas no tipo penal que descreve crime de conteúdo variado o velho e matreiro Hungria seguido por todos procurou salvar o texto legal emprestandolhe o significado já referido como se fora o pretendido pela mens legis Na realidade estamos diante de um verbo nuclear extraviar que encerra uma conduta omissiva descuidada e por que não dizer que só pode resultar da desatenção do sujeito ativo representadora de uma conduta negligente que caracteriza em regra culpa stricto sensu Mas o legislador equiparoua às outras duas sonegar e inutilizar atribuindolhes a mesma danosidade social Contudo não se pode ignorar a realidade dos fatos indiscutivelmente o desvalor da ação de extraviar é consideravelmente inferior ao desvalor da ação de sonegar ou inutilizar livro oficial e qualquer documento de que o funcionário tenha a guarda em razão do cargo Ademais essas condutas são comissivas aquela extraviar além de omissiva só pode resultar de negligência culpa demonstradora da inferioridade do grau de responsabilidade penal no nosso sistema jurídico que propugna pela excepcionalidade do crime culposo com atribuição díspar da responsabilidade penal Com efeito nosso ordenamento jurídico não equipara crimes dolosos e culposos ao contrário distingueos atribuindolhes responsabilidades e consequências igualmente distintas Por isso essa equiparação que evidentemente é atribuída a título de dolo nesse dispositivo afrontaria todo o sistema e a filosofia de nosso direito punitivo que consagraria uma autêntica responsabilidade penal objetiva proibida pela atual Constituição Federal Extraviar com efeito denota negligência desatenção mas é atribuído ao agente a título de dolo Apresentava sem dúvida grande dificuldade na redação original do Código Penal de 1940 talvez esse aspecto tenha levado o velho Hungria a adotar a alternativa mencionada que passou a defender sendo seguido por seus contemporâneos e sucessores 432 Reforma Penal de 1984 figura do garantidor No entanto a Reforma Penal de 1984 sob o comando do saudoso Ministro Francisco de Assis Toledo oferecenos possibilidade de solução jurídicodogmática sem necessidade de buscarmos subterfúgios linguísticosdoutrinários para justificar o por vezes injustificável Referimonos à receptação no texto legal da figura do agente provocador No Código de 1940 em sua versão original o garantidor era simples produto de elaboração doutrinária não havendo nenhuma norma legal que permitisse identificálo A Reforma Penal de 1984 regulou expressamente quando tratou da relação de causalidade as hipóteses em que o agente assume a condição de garantidor e não impedindo o resultado responde pelo crime comissivo por omissivo impróprio Nesses crimes o agente não tem simplesmente a obrigação de agir mas a obrigação de agir para evitar um resultado isto é deve agir com a finalidade de impedir a ocorrência de determinado evento Nos crimes comissivos por omissão há na verdade um crime material isto é um crime de resultado Nesse sentido a Reforma Penal de 1984 Parte Geral cedendo à antiga elaboração doutrinária ao regular a figura do garantidor determina que o dever de agir para evitar o resultado incumbe a quem a tenha por lei obrigação de cuidado proteção ou vigilância b de outra forma assumiu a responsabilidade de impedir o resultado c com seu comportamento anterior criou o risco da ocorrência do resultado art 13 2º 433 Pressupostos do crime omissivo impróprio Devese observar assim a presença dos pressupostos fundamentais do crime omissivo impróprio tais como poder de agir evitabilidade do resultado e evidentemente dever de impedilo Por fim como os pressupostos fáticos que configuram a condição de garantidor dever de guarda em razão do cargo que exerce são elementos constitutivos do tipo devem ser abrangidos pelo dolo Por isso o agente funcionário público deve ter consciência da sua condição de garantidor da não ocorrência do resultado qual seja do não extravio do objeto material mencionado no tipo penal O erro sobre os pressupostos fáticos dessa condição constitui erro de tipo 434 Modalidade culposa do Código argentino Para arrematar o art 255 do Código Penal argentino invocado por Fragoso e Magalhães Noronha consagra coerentemente a modalidade culposa da respectiva infração penal Dentre os verbos nucleares ademais convém ressaltar não se inclui o de extraviar que apresenta a dificuldade interpretativa que procuramos demonstrar Os verbos utilizados pelo Código Penal argentino são subtrair ocultar destruir ou inutilizar E por fim ressaltamos novamente que para a previsão do tipo penal argentino como destacava Soler Derecho Penal argentino p 154 deve tratarse de objetos custodiados com a finalidade de serem utilizados como meios de prova de registros ou de documentos destaque acrescentado similar ao previsto no art 356 do Código Penal brasileiro À míngua de previsão da modalidade culposa em nosso diploma legal resta evidentemente a responsabilidade administrativa por eventual extravio do objeto material da conduta penal em exame a ser apurada através do devido processo legal administrativo não deixando dessa forma o funcionário negligente impune 5 Sonegar e inutilizar Sonegar é omitir deixar de mencionar ou de apresentar quando lhe é exigido por quem de direito e desde que o funcionário esteja obrigado a fazêlo Sonegação na dicção de Magalhães Noronha é não apresentar relacionar ou mencionar quando isso é devido Inutilizar é retirar a aptidão é tornar inidônea desnaturar a coisa total ou parcialmente suprimindo suas propriedades essenciais tornandoa inapta para atingir suas finalidades Inutilizar é tornar uma coisa imprestável para o fim que se destina Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 356 A inutilização mesmo total não chega ao ponto de destruíla pois mantém seus caracteres identificadores embora não sirva mais à sua destinação legal Em outros termos pode subsistir no plano material mas tornase ineficaz ou inútil no plano funcional ou seja perde a razão de ser 51 Em razão do cargo É necessário que o livro oficial ou documento tenha sido confiado ao funcionário público para a guarda ratione officii ou seja em razão do cargo público que ocupa A confiança ao funcionário público não se refere somente à guarda ou detenção material do livro ou documento mas também à faculdade de dele dispor visto que administrar não se resume apenas em têlo sob sua guarda física Sem esse pressuposto o crime poderá ser aquele capitulado no art 337 do Código Penal ainda que o sujeito ativo seja funcionário público pois lhe falta o dever funcional próprio e inerente ao cargo Essas condutas sonegar ou inutilizar devem ser cometidas pelo funcionário público que tem a incumbência em razão do cargo da guarda de livro oficial ou qualquer documento público ou particular Quaisquer das ações repetindo mais uma vez devem ser cometidas pelo funcionário público no exercício do cargo qual seja o de guarda do livro oficial ou documento Não está isso naturalmente jungido à noção de lugar noutras palavras tanto a guarda existe quando a coisa se encontra em seu lugar normal na repartição etc como quando acidentalmente aí não se encontra incumbindo do mesmo modo ou mais ainda a guarda ao funcionário público Noronha Direito Penal v 2 p 239 52 Livro oficial ou qualquer documento Livro oficial ou qualquer documento público ou particular para ter idoneidade de constituir objeto material deste crime deve ser de interesse da administração pública ou do serviço público mesmo que represente somente como destacava Hungria simples valor histórico ou sirva apenas a expediente burocrático Estão em jôgo sic in exemplis os livros de escrituração das repartições públicas ou de registros os protocolos os papéis de arquivos ou de museus relatórios plantas projetos representações queixas formalizadas pareceres provas escritas de concurso propostas em concorrência pública autos de processos administrativos etc Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 3556 53 Violação do dever funcional O marcante nessa infração penal não é a qualidade de funcionário público isso é básico pois sendo crime funcional é condição indispensável é seu pressuposto mas é a violação do dever funcional é a infidelidade do sujeito ativo que desonra a confiança que a Administração Pública depositara nele Nesse sentido vale a pena invocar mais uma vez o magistério de Soler Derecho Penal argentino p 154 justificando a agravação da pena que existe naquele Código Penal esta se funda exclusivamente no descumprimento de deveres de custódia O decisivo aqui não é a qualidade pessoal do depositário mas a natureza pública ou oficial da custódia e o motivo desta ser ou não objeto de propriedade do Estado O natimorto Código Penal de 1969 art 348 suprimiu a exigência de que o objeto material da ação seja livro oficial satisfazendose com o fato de o sujeito ativo funcionário público ter a guarda de livro oficial ou não em razão do cargo público 6 Subsidiariedade expressa se não constituir crime mais grave O próprio tipo penal deixa expresso o caráter subsidiário dessa infração penal isso quer dizer que em tese esta infração penal fica subsumida por crime mais grave especialmente quando concretizar algum crime de dano contra a Administração Pública É necessário nessa interpretação ter presente que o dolo do agente não é de dano e sempre que a conduta dolosamente orientada encontrar adequação típica com sanção maior deverá prevalecer ante este crime que por disposição legal repetindo tem natureza subsidiária A configuração de qualquer infração penal mais grave afasta a incidência do dispositivo que cominando a pena de reclusão de um a quatro anos declarase a seguir se o fato não constitui crime mais grave tratandose por conseguinte de crime subsidiário ou suplementar Se por exemplo o sujeito inutilizar livro oficial ou documento de que tem a guarda em razão do cargo com o fim especial de obter alguma vantagem a capitulação incidirá no art 305 do CP que comina pena mais grave Não se trata como se vê apenas daquela espécie de crime residual que apenas tem incidência quando não haja qualquer outra tipificação mais adequada pois como destaca expressamente o texto legal essa tipificação é afastada somente se o fato não constituir crime mais grave É possível por exemplo que o fato constitua supressão de documento art 305 subtração ou inutilização de documento art 337 ficando afastada a aplicação das sanções do art 314 em exame Contudo se o fato constituir crime menos grave como por exemplo sonegação ou destruição de correspondência art 151 1º I do CP prevalecerá a tipificação deste art 314 7 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é o dolo constituído pela vontade livre e consciente de praticar qualquer das condutas elencadas na descrição típica qual seja de sonegar ou destruir livro oficial ou qualquer documento de que tem a guarda em razão do cargo O dolo que se encontra na ação deve abranger todos os elementos configuradores do tipo penal sejam eles fáticos jurídicos ou culturais O autor somente poderá ser punido pela prática de um fato doloso quando conhecer as circunstâncias fáticas que o constituem Eventual desconhecimento de um ou outro elemento constitutivo do tipo caracteriza erro de tipo excluindo o dolo Dolo é a vontade de sonegar ou destruir livro oficial ou qualquer documento com consciência de que exerce a guarda em razão do cargo e não da função que desempenha Em outros termos o sujeito ativo deve ter vontade e consciência de sonegar ou inutilizar livro oficial ou qualquer documento de que tem a guarda em razão do cargo Essa é a representação subjetiva que deve abranger e orientar a sua ação O dolo deve necessariamente dominar a ação 8 Consumação e tentativa Consumase o crime com o extravio sonegação ou inutilização de livro ou documento confiado a funcionário em razão de seu cargo Na modalidade de extraviar segundo Magalhães Noronha José Paulo da Costa Jr e Damásio de Jesus o crime é permanente protraindose a consumação enquanto o documento ou livro permanecer extraviado Não nos parece contudo pois a permanência constatável in concreto não é da ação em si de extraviar mas da sua consequência ou seja tratase de crime instantâneo de efeitos permanentes afora o fato de não admitirmos essa modalidade em razão do caráter negligente a não ser admitido como forma de omissão imprópria garantidor Nessa mesma linha da velha doutrina Hungria e Fragoso eram omissos nesse particular Na modalidade de sonegar consumase o crime quando surge a exigência legal de apresentar qualquer dos objetos materiais e o agente não o faz em outros termos para que se configure a modalidade de sonegar livro oficial ou qualquer documento é indispensável que o funcionário tenha o dever jurídico de apresentálos e injustificadamente neguese a fazêlo não o apresente ou o oculte intencionalmente Nessa modalidade dificilmente se poderá caracterizar a figura tentada pois na prática não há como interromper o iter criminis A doutrina anterior acertadamente não admitia a tentativa por todos Noronha Direito Penal v 2 p 240 A modalidade de inutilizar consumase com o início da ação pois o tipo penal se satisfaz com a inutilização parcial Nessa hipótese a tentativa embora casuisticamente até possa ocorrer é de difícil e quase improvável configuração 9 Subsidiariedade expressa crimes residuais Reiterando o art 314 é expressamente subsidiário Portanto se há ofensa à fé pública prevalece o art 305 Não sendo o agente funcionário público responde pelo crime do art 337 do CP Se a sonegação ou inutilização é feita por advogado ou procurador que recebeu o documento ou objeto de valor probatório temse como crime previsto no art 356 do CP 10 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é de reclusão de um a quatro anos se o fato não constituir crime mais grave A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Sonegação de documentos públicos art 314 do CP Retenção de documentos necessários à administração pública por secretário municipal após o desligamento do cargo Apresentação condicionada ao pagamento de vencimentos atrasados O delito do art 314 do Código Penal é próprio de modo que é imprescindível que a alegada recusa na apresentação dos documentos tenha ocorrido enquanto ainda era funcionário público Absolvição TJPR Apelação 03245825 Rel Noeval de Quadros j 1112007 Emprego irregular de verbas ou rendas públicas Art 315 Dar às verbas ou rendas públicas aplicação diversa da estabelecida em lei Pena detenção de 1 um a 3 três meses ou multa D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Silvio Martins Teixeira Crimes contra a administração pública da justiça e disposições finais Rio de Janeiro 1951 p 58 destacava que antes do atual Código Penal ante a ausência de previsão legal proibindo o desvio de verbas públicas alguns chefes de repartição no fim do ano faziam as despesas necessárias com a verba da repartição destinada a outros misteres Na verdade também depois da entrada em vigor do Código Penal de 1940 a malversação de verbas e rendas públicas ocorria normalmente no interesse da própria administração mesmo porque se o desvio ocorrer em benefício de fins particulares próprios ou de terceiros o crime configurado será o de peculato Com esta rubrica dos crimes contra as finanças públicas a Lei n 10028 de 19 de outubro de 2000 acrescentou o Capítulo IV no Título XI da Parte Especial do Código Penal A partir da Lei de Improbidade Administrativa Lei n 842992 com a edição da Lei de Responsabilidade Fiscal LC n 1012000 complementada pela Lei n 100282000 que criou novos tipos penais crimes contra as finanças públicas tornamse efetivos os princípios constitucionais da Administração Pública art 37 da CF 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é o patrimônio da Administração Pública assim como a probidade administrativa especialmente o desenvolvimento regular da atividade administrativa a moralidade necessária e indispensável à causa pública embora também seja tutelado o patrimônio particular ainda que este permaneça num plano secundário A especificidade do bem jurídico tutelado reside no interesse específico da Administração Pública na observância dos deveres de probidade e idoneidade dos funcionários no uso legítimo da qualidade e da função pública e principalmente em que evitem o abuso dessa condição ou da função que ostentam e exercem 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo Sujeito ativo do crime de emprego irregular de verbas ou rendas públicas é somente o funcionário público que pode dispor das rendas e verbas públicas pois somente dispondo dessa faculdade o funcionário poderá cometer o crime em exame Certamente só pode efetuar a operação de destinar verbas ou rendas públicas diversamente do que prevê a disposição legal o funcionário que pode dispor legitimamente de tais valores ou seja quem os administra Com efeito somente poderá cometer este crime quem possui atribuição legal para ordenar despesa o denominado ordenador de despesas Não abrange por certo quem apenas realiza isto é quem cumpre ou executa a ordem expedida pelo sujeito ativo próprio o ordenador de despesas Nesse caso à evidência o funcionário que executa a ordem deverá ter sua conduta examinada à luz do art 22 segunda parte do CP ou seja à luz do princípio da obediência hierárquica 311 Ordenador de despesas Seguindo esse entendimento Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 358 apontava como sujeitos ativos dessa infração penal presidente da República governadores ministros ou secretários de Estados presidentes ou diretores de autarquias com patrimônio desdobrado da superior entidade de direito público em cuja órbita gravitam administradores públicos em geral Contudo esse moderno ordenador de despesas que via de regra não se confunde com o titular das Pastas Executivas não deixa de ser uma forma encontrada para afastar pelo menos em parte as responsabilidades civis administrativas e penais das autoridades públicas os verdadeiros mandatários do Poder Público Em tese o ordenador de despesas responderia diretamente por eventual responsabilidade criminal e só casuisticamente se poderá aprofundar o exame da responsabilidade ou não do verdadeiro administrador do Poder Público Tratandose de Prefeito Municipal convém que se observe o art 1º II e III do Decretolei n 20167 32 Sujeito passivo Sujeito passivo é o Estado União Estados Distrito Federal e Municípios bem como as entidades de direito público relacionadas no art 327 1º do Código 4 Tipo objetivo adequação típica Consiste a conduta incriminada em empregar irregularmente as verbas dinheiros especificamente destinados pela lei orçamentária dotações a este ou àquele serviço público ou fim de utilidade pública ou rendas públicas todo e qualquer dinheiro recebido da Fazenda Pública em desacordo com a lei orçamentária especial elemento normativo do tipo Para atender à elementar exigida pelo tipo penal é indispensável que exista lei regulamentando a aplicação dos recursos orçamentário financeiros não pode ser qualquer lei por certo mas somente a lei orçamentária referida no art 165 5º da Constituição Federal Logicamente não se pode desconhecer que além dessa lei orçamentária existem leis especiais que vinculam a aplicação de determinados recursos como ocorre com algumas taxas tarifas contribuição social enfim tributos diversos com determinações específicas A lei a que se refere o texto legal deve ser considerada no sentido substancial afastando dessa forma eventuais prescrições em decretos que regulamentem outros atos administrativos 41 Necessidade de leis orçamentárias Para a configuração do crime no entanto é necessária a existência de lei disciplinando a gestão financeira e principalmente estabelecendo as vedações Evidentemente as leis orçamentárias próprias lei orçamentária anual plano plurianual e lei de diretrizes orçamentárias estabelecem determinações e proibições específicas A Lei Complementar n 1012000 quando disciplina a geração de despesa estabelece que a ação governamental que resulte no aumento de despesa deve ser acompanhada de declaração de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias Não há para o Estado em princípio qualquer dano patrimonial As verbas ou rendas públicas são aplicadas no interesse da própria Administração Pública embora com destinação diferente daquela prevista em lei Não há por conseguinte subtração ou apropriação das receitas públicas pois se for destinada a fins particulares em proveito próprio ou de terceiro o crime seria o de peculato 42 Aplicação diversa da estabelecida em lei e despesa não autorizada por lei Como destacamos no tópico anterior dar destinação diversa da prevista em lei exige a previsão em lei orçamentária Dar destinação diversa da prevista em lei não se confunde com ordenação de despesa não autorizada por lei são coisas diversas naquela existe lei prevendo a destinação da aplicação que no entanto é desviada para outra finalidade nesta determinase a realização de despesa sem a autorização legal violandose a proibição penal constante do art 359 D do Código Penal acrescido pela Lei n 100282000 A falta de autorização legal para a destinação das rendas públicas não constitui mera irregularidade administrativa como sustentam alguns mas representa um elemento constitutivo do tipo cuja ausência ou seja a exigência de autorização legal afasta a tipicidade da conduta Em síntese com o vocábulo despesa não autorizada por lei devese entender despesa legalmente proibida sob pena de inverter se o princípio elementar de qualquer Estado Democrático de Direito segundo o qual tudo o que não está proibido é permitido 43 Despesa justificada embora não autorizada por lei Não se pode perder de vista que a probidade e a moralidade administrativa exigem presentemente respeito absoluto à legalidade administrativa aliás é esse o fundamento desse emaranhado de leis LC n 101 e Lei n 10028 embretadoras dos administradores públicos No entanto esta como qualquer outra conduta criminosa pode beneficiarse de uma excludente de criminalidade particularmente do estado de necessidade desde que seus requisitos estejam presentes Discordamos nesse particular da orientação adotada por Luiz Flávio Gomes e Alice Bianchini Crimes de responsabilidade fiscal São Paulo Revista dos Tribunais 2001 quando afirmam que a inexistência de autorização constitui tão somente indício de irregularidade havendo necessidade para se criminalizar a conduta que se verifique diretamente a existência de uma lesão não justificada ao bem jurídico Com efeito uma lesão justificada a qualquer bem jurídico penalmente tutelado constitui excludente de criminalidade deslegitimandose como afirmam a possibilidade de punir criminalmente referida conduta Na realidade ante o atual ordenamento jurídico com o advento da Constituição Federal de 1988 das Leis n 866693 e 100282000 e da Lei Complementar n 1012000 a inexistência de autorização legal constitui indício de antijuridicidade que pode à evidência ser afastado por uma causa de justificação art 23 do CP 44 Inexigibilidade de conduta diversa Por outro lado eventuais dificuldades administrativoorçamentárias podem socorrer ao administrador probo e honesto mesmo que não se revistam da condição de causas de justificação penalmente falando mas circunstancialmente tornando inexigível comportamento diverso eliminando nesse caso a reprovabilidade da ação configurando causa de exclusão da culpabilidade 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é o dolo constituído pela vontade livre e consciente de empregar verbas públicas diversamente do previsto em lei Como não existe dolo restrito abrangendo este correta e completamente todos os elementos constitutivos do tipo devese especialmente ter consciência atual de que se estão destinando verbas e rendas públicas a fins diversos do estabelecido em lei O eventual desconhecimento da inexistência de autorização legal caracteriza erro de tipo que exclui o dolo e por extensão a própria tipicidade art 20 caput No entanto como já afirmamos para esses crimes contra as finanças públicas tratarse de erro evitável ou inevitável é irrelevante na medida em que não há previsão da modalidade culposa Assim independentemente da natureza do erro de tipo sempre haverá exclusão da tipicidade salvo se se tratar de um simulacro de erro Não há necessidade de qualquer elemento subjetivo especial do injusto satisfazendose a descrição típica simplesmente com a presença do dolo pura e simples 6 Consumação e tentativa 61 Consumação Consumase o crime que para nós é formal quando a ordem é efetivamente executada ou seja quando as verbas e rendas públicas forem efetivamente destinadas a fins diversos do estabelecido em lei Não basta portanto o simples lançamento escritural a mera programação etc para sua aplicação pelo Poder Público contrariando previsão legal Enquanto não for cumprida a determinação do ordenador de despesas não se produzirá qualquer efeito isto é não haverá qualquer lesividade ao patrimônio público e sem essa lesividade não se pode falar em crime a ausência de lesão ao patrimônio que se pretende proteger impede a caracterização da tipicidade estrita de qualquer conduta descrita como crime de dano 62 Tentativa Na nossa concepção tratase de crime formal Assim coerente com nossa definição de consumação admitimos a possibilidade de tentativa embora de difícil comprovação Parecenos perfeitamente possível o fracionamento da ação tipificada tratandose de crime plurissubsistente Por exemplo o agente público determina a aplicação da receita pública em fins diversos do estabelecido em lei e por circunstâncias alheias a sua vontade a ordem não é cumprida sendo impedido por algum obstáculo fora do seu alcance responde nesse caso pelo crime na forma tentada 7 Pena e ação penal São cominadas alternativamente as penas de reclusão de um a três meses ou multa Ao passo que a pena cominada para o crime do art 359D ordenação de despesa não autorizada é de um a quatro anos de reclusão A ação penal é pública incondicionada Concussão Art 316 Exigir para si ou para outrem direta ou indiretamente ainda que fora da função ou antes de assumila mas em razão dela vantagem indevida Pena reclusão de 2 dois a 8 oito anos e multa Excesso de exação 1º Se o funcionário exige tributo ou contribuição social que sabe ou deveria saber indevido ou quando devido emprega na cobrança meio vexatório ou gravoso que a lei não autoriza Pena reclusão de 3 três a 8 oito anos e multa 1º com redação determinada pela Lei n 8137 de 27 de dezembro de 1990 2º Se o funcionário desvia em proveito próprio ou de outrem o que recebeu indevidamente para recolher aos cofres públicos Pena reclusão de 2 dois a 12 doze anos e multa D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O Código Penal francês de 1791 criminalizou a concussão embora não lhe tenha dado nenhuma definição O Código de Napoleão de 1810 também cuidou da concussão atribuindolhe melhor definição encaminhando podese afirmar os contornos que assumiria nas codificações posteriores Foi exatamente esse Código que influenciou nosso Código Criminal de 1830 o qual disciplinou várias modalidades de concussão incluindo a cobrança abusiva de tributos O Código Penal de 1890 por sua vez tipificou o crime de concussão no art 219 preferindo uma descrição mais específica embora tenha incluído em seu texto uma modalidade de corrupção 3º O Código Penal de 1940 finalmente disciplinou a concussão em seu art 316 trazendo consigo o excesso de exação que tem como benefício o próprio Poder Público 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração Pública mais especificamente a moralidade e a probidade da Administração Pública A posição geográfica dessa figura delitiva localizada no Título XI da Parte Especial com o título Crimes contra a Administração Pública não deixa qualquer sombra de dúvida aliás reiterado no subtítulo do primeiro capítulo Também integram os bens jurídicos protegidos pelo tipo penal em exame o patrimônio particular e a própria liberdade individual embora se encontrem num plano secundário pois as infrações que os violam diretamente são objeto de punição nos dois primeiros títulos da Parte Especial do Código crimes contra a pessoa e crimes contra o patrimônio 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo Sujeito ativo somente pode ser o funcionário público tratandose por conseguinte de crime próprio Considerandose que a essência do crime reside no abuso da função ou da autoridade ou poder dela decorrentes resulta que somente o funcionário público pode praticálo Não é indispensável que seja no exercício da função podendo ocorrer nas férias no período de licença ou mesmo antes de assumila desde que o faça em razão dela 32 Sujeito passivo Sujeitos passivos são o Estado representando todo e qualquer órgão ou entidade de direito público e secundariamente também o particular lesado No mesmo sentido sustenta Damásio de Jesus Direito Penal v 2 p 154 afirmando que sujeito passivo é o Estado titular do interesse protegido e violado pela lesão do dever de integridade que deve nortear a atividade funcional No plano secundário aparece também como sujeito passivo o particular vítima da exigência ou outro funcionário Sendo o Estado sujeito passivo imediato em crimes que ofendem a moralidade pública como é o caso da concussão por uma questão lógica não pode ser ao mesmo tempo o beneficiário do produto do crime Nesse sentido a inteligência sempre acurada de Rui Stoco et al Código Penal e sua interpretação jurisprudencial São Paulo Revista dos Tribunais 1995 v 2 p 3854 referindose a vantagem indevida afirma com absoluta precisão Deve ela beneficiar o próprio agente ou terceiro não a Administração Pública hipótese que constituiria o crime previsto no art 316 1º Portanto a locução ou para outrem não pode em hipótese alguma abranger o Estado como o terceiro favorecido pela ação criminosa do agente Assim quando a conduta abusiva do agente funcionário público visar beneficiar a própria Administração Pública lato sensu isto é o próprio Estado não se adequará à descrição típica do art 316 ora em exame 4 Tipo objetivo adequação típica O elemento material do crime de concussão consiste a na exigência da vantagem indevida b para o próprio funcionário ou para terceiro c mediante um ato de imposição exigir A conduta típica consiste em exigir para si ou para outrem direta ou indiretamente ainda que fora da função ou antes de assumila mas em razão dela vantagem indevida O verbo nuclear exigir tem o sentido de obrigar ordenar impor ao sujeito passivo a concessão da pretendida vantagem indevida Convém destacar que exigir não se confunde com o simples solicitar verbo núcleo da corrupção passiva pois naquele há uma imposição do funcionário que valendose do cargo ou da função que exerce constrange o sujeito passivo com sua exigência Nessa linha era impecável o magistério de Bento de Faria Código Penal brasileiro comentado Rio de Janeiro p 509 que pontificava O delito em questão caracterizandose porém pela exigência da vantagem indevida há de expressar uma forma da violência É indispensável que a exigência implícita ou explícita seja motivada pela função que o agente exerce ou exercerá Característica fundamental do crime de concussão é o abuso de autoridade que pode repousar na qualidade de funcionário ou na função pública exercida Nesse sentido destacava Bento de Faria Código Penal brasileiro comentado p 509 se não se verificar o abuso quer da referida qualidade quer da função o ato estranho a ela configurará a extorsão prevista no art 158 Não existindo função ou não havendo relação de causalidade entre ela e o fato imputado não se pode falar em crime de concussão podendo existir residualmente qualquer outro crime tais como extorsão constrangimento ilegal estelionato etc 41 Necessidade da elementar normativa vantagem indevida A vantagem como se constata deve ser indevida Vantagem indevida é aquela que é ilícita ilegal injusta contra lege enfim que não é amparada pelo ordenamento jurídico Normalmente a ilegalidade da vantagem é determinada por norma extrapenal Ademais a vantagem pode ser presente ou futura O crime de concussão é formal ou seja sua consumação não depende da ocorrência do resultado naturalístico verificandose com a simples exigência da vantagem indevida Enfim não se pode falar em crime de concussão quando a exigência de vantagem por parte do sujeito ativo ocorre após a ação ou o benefício da suposta vítima 42 Natureza da vantagem indevida Doutrina e jurisprudência de um modo geral têm sustentado a necessidade de a vantagem ser de natureza econômicopatrimonial Nesse sentido afirmase que a vantagem pode relacionarse a qualquer ganho lucro ou benefício de natureza patrimonial mesmo que possa ser obtido indiretamente Adotando isoladamente entendimento contrário Bento de Faria afirmava A vantagem póde sic ser expressa por dinheiro ou qualquer outra utilidade seja ou não de ordem patrimonial proporcionando um lucro ou proveito No entanto conforme destacamos ao examinarmos os crimes de extorsão art 158 e extorsão mediante sequestro art 159 quando a lei quer restringir a vantagem à natureza econômica o faz expressamente posicionamento normalmente adotado na disciplina dos crimes patrimoniais arts 155 a 183 Por isso sustentamos que no crime de concussão a vantagem indevida pode ser de qualquer natureza patrimonial quando a vantagem exigida referirse a bens ou valores materiais não patrimonial de valor imaterial simplesmente para satisfazer sentimento pessoal buscar uma forma de reconhecimento por pura vaidade como por exemplo a concessão de um título honorífico a conferência de um título de graduação enfim a vantagem indevida pode não ter necessariamente valor econômico Ademais a exigência da vantagem não precisa ser nem anterior ao fato nem contemporânea a ele podendo concretizarse no futuro e ainda ter como destinatário tanto o próprio sujeito ativo quanto terceira pessoa outrem Resumindo a vantagem indevida ilícita ilegal pode ser atual ou futura pode ser patrimonial ou não patrimonial para si ou para terceiro direta ou indireta e a exigência indevida deve ser feita em razão da função ainda que fora dela 43 Corrupção passiva e concussão na dúvida a menos grave Na praxis a demonstração de que se trata de solicitação corrupção passiva do funcionário corrupto e não exigência concussão enfrenta grande dificuldade probatória assim como a comprovação de que se trata de concussão exigência do funcionário e não de corrupção ativa oferta ou promessa Aliás na comparação do crime de concussão art 316 em que há exigência do funcionário corrupto portanto conduta ontologicamente mais grave com o crime de corrupção passiva art 317 no qual o funcionário corrupto apenas solicita a vantagem indevida constatase uma absurda inversão na graduação legislativa da sanção cominada a concussão crime mais grave recebe punição mais branda qual seja reclusão de dois a oito anos e multa a corrupção passiva crime menos grave comparativamente recebe punição consideravelmente mais grave qual seja reclusão de dois a doze anos e multa Podese afirmar sem qualquer menosprezo institucional ao Poder Legislativo que aqui se concentra o lixo da produção legislativa ad hoc que tomou conta do Parlamento nos últimos quinze anos que conseguiu destruir a harmonia que o sistema jurídico nacional até então apresentava e desorganizar definitivamente a rica sistematização que o bemelaborado Código Penal de 1940 ostentava aliás reconhecida e elogiada pelo continente europeu O princípio da proporcionalidade para ficar somente neste assegurado pela atual Constituição da República repousa sonolentamente no leito constitucional seu berço esplêndido à espera quem sabe de uma revisão infraconstitucional em vez de constitucional numa operação humilde despretensiosa que aceite a modesta colaboração dos especialistas das diversas searas cada qual na sua especialidade 44 Exigência de vantagem indevida para o órgão público excesso de exação Devese necessariamente distinguir a figura da concussão do excesso de exação pois neste a vantagem indevida não é para o funcionário mas para a própria Administração Pública a que serve No exame sério específico e técnico da concussão como de qualquer outro crime não se pode prescindir da análise das elementares típicas além do bem jurídico tutelado e dos sujeitos ativo e passivo dessa infração penal aliás tal análise deve começar por estes últimos a Bem jurídico tutelado Quanto ao bem jurídico protegido não há dificuldade alguma em sua identificação quer na doutrina quer na jurisprudência que à unanimidade reconhecemno como a moralidade e a probidade da Administração Pública A posição geográfica dessa economia delitual figura delitiva situada no Capítulo XI da Parte Especial do Código Penal com o título Crimes contra a Administração Pública não deixa qualquer sombra de dúvida aliás reiterada no subtítulo do primeiro capítulo b Sujeitos ativo e passivo Sujeito ativo tratandose de crime próprio somente pode ser funcionário público considerandose que a essência do crime reside no abuso da função Nesse particular tampouco existe divergência Convém destacar porém que sujeito ativo não se confunde com beneficiário ou destinatário do resultado do crime haja vista que o especial fim da ação é exigir para si ou para outrem Como esse outrem pode desconhecer completamente a ação criminosa certamente não pode ser considerado sujeito ativo do crime mesmo que possa ser seu beneficiário Contudo se tiver consciência dos fatos e a eles anuir será também certamente sujeito ativo do crime mesmo que não reúna a qualidade especial de funcionário público exigida pelo tipo penal pois será alcançado pela previsão do art 29 do Código Penal Sujeito passivo por sua vez recebe a mesma unanimidade pelo menos na doutrina brasileira é o Estado ou a Administração Pública Tornase indispensável examinar e confrontar o destinatário da vantagem indevida com o sujeito passivo dessa infração penal Quem são Afinal o sujeito passivo de uma infração penal pode ser ao mesmo tempo o beneficiário do resultado econômico ou patrimonial que essa produz Na solução dessa vexata quaestio devemse distinguir sujeito ativo sujeito passivo e destinatário do produto do crime lembrando desde logo que o elemento subjetivo do injusto contido expressamente na descrição típica exige que o especial fim da conduta incriminada seja buscar a vantagem indevida para si ou para outrem Em síntese o bem jurídico protegido é a moralidade da Administração Pública o Estado é o sujeito passivo imediato Falta esclarecer quem pode ser o terceiro representado pela expressão outrem e se o sujeito passivo pode confundirse com o beneficiário dessa infração penal o que passamos a fazer no tópico seguinte 441 Destinatário do produto da concussão particular ou ente público A locução ou para outrem indica a possibilidade de a ação objetivar um resultado para terceira pessoa que pode ser física ou jurídica Questão que merece ser destacada sob esse aspecto é a possibilidade de a terceira pessoa ser de direito público ou não Em caso positivo interessa a este estudo a hipótese em que o funcionário infrator estaria exigindo a vantagem indevida para o próprio órgão público a que serve e não para si Será afinal isso possível isto é pode o Estado ser o destinatário do produto importante não confundir aqui sujeito ativo com destinatário pois como afirmava Levi não parece lícito dizer que neste caso ou em outros análogos o réu tenha constrangido o Estado abusando de seu ofício da ação criminosa de seu funcionário locupletandose com o crime que deveria combater O órgão público não é evidentemente sujeito ativo do crime mas concretamente pode ser o beneficiário do produto do crime ou seja beneficiase da consequência da ação ilícita sem sujar as mãos Por exemplo em um dos tantos hospitais públicos deste país internase um paciente pelo Sistema Único de Saúde SUS e cobrase a complementação pela diferença de internação de diária de medicação de instalações etc Essa cobrança ingressa no caixa oficial do hospital muitos deles conveniados e não nos bolsos do funcionário dito infrator Afinal quem é o beneficiário direto da ação que se quer criminosa o funcionário ou o hospital pessoa jurídica de direito público interno Em nossa concepção não se podem mascarar os fatos ou argumentar com subterfúgios adotando posições paradoxais e frontalmente contraditórias Se no exemplo do hospital público ou equiparado como pretendem alguns o funcionário cobrar duplamente ou complementarmente pela internação de um paciente segurado pelo SUS em nome do hospital e para benefício deste é indispensável que se examinem todos os aspectos da questão a quem é o beneficiário da dita cobrança indevida b os hospitais públicos integram a Administração Pública c os hospitais conveniados com o SUS assumem a natureza de órgão público d os funcionários de hospitais conveniados são equiparados a funcionários públicos para efeitos penais Desnecessário enfatizar que em tese a exigência do médico cobrando diferenças do paciente segurado pelo SUS para si próprio pode tipificar o crime de concussão De modo geral no entanto a doutrina tem negado a possibilidade de órgãos da Administração Pública ou empresas públicas serem sujeito ativo de crime mesmo contraditoriamente aqueles que defendem a responsabilidade penal da pessoa jurídica No mesmo sentido grande parte da doutrina nega também a possibilidade de órgãos públicos poderem ser apontados como destinatários do produto de crime embora defendam a tributação do proveito do crime etc Concluindo quando a vantagem exigida pelo funcionário público genuíno ou equiparado destinarse ao próprio órgão para o qual trabalha seja público ou equiparado não se tipifica o crime de concussão por faltarlhe o elemento subjetivo para si ou para outrem Poderá residualmente tipificar outra infração penal desde que satisfaça in concreto todas as suas elementares típicas 5 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo é composto pelo dolo como elemento subjetivo geral e pelo elemento subjetivo especial do injusto O dolo é constituído pela vontade consciente de exigir vantagem indevida do sujeito passivo direta ou indiretamente É necessário que o agente saiba que se trata de exigência de vantagem indevida e que o faz em razão da função que exerce ou assumirá isto é que tenha conhecimento ou consciência dessa circunstância É indispensável enfim que o dolo abranja todos os elementos constitutivos do tipo penal sob pena de configurarse o erro de tipo o qual por ausência de dolo ou dolo defeituoso afasta a tipicidade salvo se se tratar de simulacro de erro 51 Elemento subjetivo especial para si ou para outrem O elemento subjetivo especial do tipo é representado pela finalidade da ação que visa a vantagem indevida para si ou para outrem Como elemento subjetivo especial não é necessário que se concretize isto é que a vantagem seja efetivamente alcançada pelo destinatário para si ou para outrem sendo suficiente que esta seja a finalidade orientadora da conduta do agente A ausência desse animus para si ou para outrem desnatura a figura do crime de concussão Logicamente quando essa circunstância se fizer presente haverá uma espécie de inversão do ônus da prova devendo o agente demonstrar in concreto que a finalidade da exigência era outra e não a de obter vantagem indevida para si ou para outrem 6 Consumação e tentativa 61 Consumação Consumase o crime de concussão com a simples exigência do sujeito ativo ou seja no momento em que o sujeito passivo toma conhecimento de seu conteúdo O crime capitulado no art 316 caput do Código Penal é formal e consumase com a mera imposição do pagamento indevido não se exigindo o consentimento da pessoa que a sofre nem sequer a consecução do fim visado pelo agente Com efeito não é necessário que se efetive o recebimento da vantagem exigida se ocorrer este representará somente o exaurimento do crime que se encontrava perfeito e acabado com a imposição do sujeito ativo 62 Tentativa inadmissibilidade Dogmaticamente a tentativa é inadmissível pois se trata de crime unissubsistente isto é de ato único não admitindo fracionamento Contudo concretamente pode ser que a exigência se revista de diversos atos por exemplo a exigência da vantagem indevida é feita por meio de correspondência que se extravia sendo interceptada pela autoridade policial antes de a vítima conhecer seu conteúdo Nessa hipótese pode teoricamente dependendo da idoneidade de exigência caracterizarse tentativa de concussão 7 Excesso de exação O excesso de exação constitui uma modalidade especial de concussão em razão do destinatáriobeneficiário especial do seu produto o próprio Estado Exação é a cobrança correta de tributos O dispositivo que passamos a examinar objetiva coibir não a exação que é em si mesma uma atividade legítima do Estado mas seu excesso por configurar na hipótese mais que um ilícito um crime ilícito tipificado 71 Tipo objetivo adequação típica O excesso de exação configurase quando o funcionário exige tributo ou contribuição social que sabe ou deveria saber serem indevidos ou quando devidos emprega na cobrança meio vexatório vergonhoso humilhante ou gravoso que implica maiores despesas para o contribuinte que a lei não autoriza elemento normativo do tipo 1º O excesso de exação constitui modalidade especial de concussão uma espécie de tipo derivado contido no 1º do art 316 do diploma legal em exame Na versão original do Código Penal de 1940 o excesso de exação tinha a seguinte descrição típica se o funcionário exige imposto taxa ou emolumento que sabe indevido ou quando devido emprega na cobrança meio vexatório ou gravoso que a lei não autoriza A Lei n 8137 de 27 de dezembro de 1990 deu lhe no entanto a seguinte definição se o funcionário exige tributo ou contribuição social que sabe ou deveria saber indevido ou quando devido emprega na cobrança meio vexatório ou gravoso que a lei não autoriza art 20 Nesta nova versão o legislador substituiu a locução imposto taxa ou emolumento por tributo ou contribuição social Dessa forma mesmo que não tenha pretendido restringiu o objeto material da conduta delituosa Com efeito no conceito de tributo e de contribuição social não se inclui emolumento Tributo é toda prestação pecuniária compulsória em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir que não constitua sanção de ato ilícito instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada art 3º do CTN Podemse citar como espécies de tributos impostos taxas e contribuições de melhoria As contribuições sociais por sua vez foram criadas pela Constituição Federal de 1988 arts 149 e 195 que as inseriu na moderna parafiscalidade 72 Tarifas emolumentos e custas atipicidade Essa mudança na definição do excesso de exação não se limitou contudo à restrição de seu objeto material mas excedeuse absurdamente na majoração da sanção penal elevandoa de seis meses a dois anos de detenção ou multa para três a oito anos de reclusão e multa De plano devese destacar que o abuso na cobrança de tarifas preço público emolumentos devidas a notários e registradores ou custas devidas a escrivães e oficiais de justiça não configura excesso de exação pois não constituem nem tributo nem contribuição social Tratase de conduta atípica nos termos do 1º do art 316 do Código Penal com a redação determinada pela Lei n 813790 Por essas mesmas razões afirmamos que quando o funcionário de hospital cobra indevidamente a complementação de diárias ou custas hospitalares para o próprio hospital e não para si ou para outrem sua conduta não tipifica concussão pelos fundamentos que já expusemos e tampouco pode ser desclassificada para excesso de exação porque não constitui tributo ou contribuição social 73 Sujeitos do crime de excesso de exação Sujeito ativo somente pode ser funcionário público tratandose de crime próprio O particular pode evidentemente concorrer para o crime por meio da figura do concurso de pessoas Sujeito passivo é o contribuinte lesado pelo órgão arrecadador do Estado que não raro espolia o cidadão indefeso perante a fúria arrecadadora do Tesouro É rematado equívoco afirmar que sujeito ativo é o ente detentor da competência tributária ou de contribuição social como afirma Luiz Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 400 na verdade o órgão público é o grande beneficiário da conduta de seu mau servidor fraudador do patrimônio de contribuinte espoliado Não se pode esquecer inclusive que a responsabilidade do Estado pelos danos causados por seus servidores a terceiros é objetiva Para aqueles que defendem a responsabilidade penal da pessoa jurídica poderia inclusive ser a hipótese de entidades públicas responderem criminalmente 74 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo é composto pelo dolo como elemento subjetivo geral e pelo elemento subjetivo especial do injusto O dolo é constituído pela vontade consciente de exigir tributo ou contribuição social que sabe ou deveria saber indevido ou quando devido emprega na cobrança meio vexatório ou gravoso que a lei não autoriza Não há previsão de modalidade culposa do crime de excesso de exação assim na eventual negligência imprudência ou mesmo imperícia na avaliação do quantum do tributo ou contribuição social devida pratica conduta atípica cabendo ao contribuinte lesado tão somente a repetição do indébito Mais uma vez constatase que o EstadoAdministração é sempre generoso com seus próprios erros e excessos ao contrário do que ocorreria se a situação fosse inversa em que normalmente por exemplo erro de lançamento contábil pode tipificar crime de sonegação fiscal 8 Desvio de produto recebido indevidamente O 2º do art 316 do CP prevê modalidade especial do excesso de exação 1º que se configura quando o funcionário público desvia total ou parcialmente em benefício próprio ou alheio o que recebeu indevidamente para recolher aos cofres públicos Tratase de um tipo derivado que é a forma qualificada do crime de excesso de exação com o acréscimo de nessa hipótese o sujeito ativo desviar em proveito próprio ou de outrem o produto indevidamente recebido em nome do Estado O bem jurídico tutelado e os sujeitos ativo e passivo são exatamente os mesmos da figura simples do excesso de exação apenas nessa figura há necessidade do elemento subjetivo do injusto representado pela elementar em proveito próprio ou de outrem art 316 2º do CP 9 Consumação e tentativa Consumase o crime de exação com a simples exigência ou com o emprego do meio vexatório ou gravoso que a lei não autoriza 1º 2ª parte Como a lei fala em exigir vantagem indevida e não em recebê la consumase o crime com a simples ação independentemente de qualquer resultado tratandose pois de crime de simples atividade ou mera conduta A figura tentada apresenta as dificuldades próprias do crime de ato único não admitindo teoricamente fracionamento ficando afastada por conseguinte a tentativa O eventual recebimento da vantagem exigida apenas exaure o crime que se consumara com a simples exigência 10 Pena e ação penal As penas cominadas para o crime de concussão caput são cumulativamente reclusão de dois a oito anos e multa para o crime de excesso de exação são cominadas por sua vez as penas de reclusão de três a oito anos e multa de acordo com a redação determinada pela Lei n 813790 Para a figura de desvio de tributo recebido indevidamente finalmente as sanções cominadas são reclusão de dois a doze anos e multa A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Concussão Art 316 CP Ausência de dolo Absolvição Não há falar em concussão quando não houve qualquer exigência bem como quando os agentes não tinham ciência da ilegalidade da vantagem solicitada TJRS Apelação 70022320402 Rel José Eugênio Tedesco j 2822008 Policiais civis que exigem dinheiro para reaver caminhonete furtada Crime de concussão caracterizado Pai e filhos sustentando a mesma versão desde o inquérito policial Prova suficiente para demonstrar a ocorrência do crime de concussão mesmo ante a negativa dos policiais civis acusados Ilegitimidade ativa de comerciante de automóveis se não ficou bem demonstrada ligação com os agentes da lei autores do delito Tratandose de crime próprio somente funcionários públicos podem ser sujeitos ativos do crime do art 316 do CP TJRS Apelação 70021382734 Rel Gaspar Marques Batista j 2122008 Concussão Art 316 CP Funcionário público por equiparação Art 327 1º CP Fatos praticados anteriormente ao advento da Lei n 99832000 Atipicidade Precedentes deste órgão fracionário e do STF Improvimento do apelo do Ministério Público Art 386 III CPP TJRS Apelação 70021706387 Rel José Eugênio Tedesco j 6122007 Concussão A atual orientação jurisprudencial é indissonante no sentido de que antes do advento da Lei n 99832000 o médico que atendia pacientes do SUS não era considerado funcionário público e consequentemente não poderia cometer o delito previsto no art 316 do CP Absolvição mantida TJRS Apelação 70021528849 Rel Constantino Lisbôa de Azevedo j 29112007 Concussão e corrupção passiva Caracterizase a concussão e não a corrupção passiva se a oferta da vantagem indevida corresponde a uma exigência implícita na conduta do funcionário público que nas circunstâncias do fato se concretizou na ameaça STF HC 89686SP Rel Min Sepúlveda Pertence j 1262007 A conduta descrita na denúncia não é a de concussão mas de excesso de exação sob a forma do 2º do art 316 do Código Penal porquanto foi narrado que o acusado exigiu imposto territorial rural ITR que sabia indevido e ficou com o numerário para si sendo certo que imposto é a espécie mais importante do gênero tributo Ainda segundo a acusação houve exaurimento da conduta delituosa TRF 3ª Região Apelação 200303990250658 Rel Johonsom Di Salvo j 1322007 Excesso de exação qualificado O fato de o oficial de justiça desviar em proveito próprio quantia que recebeu indevidamente para pagamento de pensão alimentícia não configura o delito previsto no art 316 2º do CP eis que o numerário não se destinava aos cofres públicos elemento essencial para a plena tipificação Absolvição decretada TJRS Apelação 70008221442 Rel Constantino Lisbôa de Azevedo j 1542004 Corrupção passiva Art 317 Solicitar ou receber para si ou para outrem direta ou indiretamente ainda que fora da função ou antes de assumi la mas em razão dela vantagem indevida ou aceitar promessa de tal vantagem Pena reclusão de 2 dois a 12 doze anos e multa Pena com redação dada pela Lei n 10763 de 12 de novembro de 2003 1º A pena é aumentada de um terço se em consequência da vantagem ou promessa o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional 2º Se o funcionário pratica deixa de praticar ou retarda ato de ofício com infração de dever funcional cedendo a pedido ou influência de outrem Pena detenção de 3 três meses a 1 um ano ou multa D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O Código Criminal do Império 1830 distinguia a peita art 130 na qual a corrupção corporificavase por meio do dinheiro ou qualquer outro donativo e o suborno art 133 que era a corrupção por meio da influência ou do peditório O art 131 tipificava especificamente a peita relativa aos magistrados O Código Penal de 1890 por sua vez que empregava a mesma terminologia reunia numa única seção sob o nomen iuris de peita ou suborno as mesmas modalidades de corrupção que eram contempladas separadamente pelo diploma legal anterior ou seja disciplinando separadamente a corrupção ativa e passiva O Código Penal de 1940 finalmente inspirado no Código suíço disciplinou não apenas em dispositivos separados mas também em capítulos distintos a corrupção passiva e a corrupção ativa rompendo em tese a bilateralidade obrigatória dessa infração penal que via de regra pode consumarse a passiva independentemente da correspondente prática da ativa e viceversa Essa opção do legislador tratando as espécies de corrupção ativa e passiva como crimes autônomos facilita sua punibilidade os quais nas modalidades de solicitar passiva e oferecer ativa por exemplo independem da anuência do particular ou do funcionário público respectivamente para consumaremse não significando contudo que tenha abandonado a teoria monística da ação ou que tenha afastado de forma absoluta a bilateralidade ou o caráter plurissubjetivo do crime de corrupção que em tese continua possível receber ou aceitar como demonstraremos adiante 2 Bem jurídico tutelado A tipificação penal exige a ofensa de alguma gravidade aos bens jurídicos protegidos pois nem sempre qualquer ofensa a esses bens ou interesses é suficiente para configurar o injusto típico Enfim o direito penal e com ele a sanção somente se justificam em função da proteção de bens jurídicos que devem ser devidamente identificados e individualizados sob pena de incorrer em puras abstrações justificadoras de sistemas do tipo lei e ordem Bem jurídico protegido no dispositivo em exame é a Administração Pública especialmente sua moralidade e probidade administrativa Protegese na verdade a probidade de função pública sua respeitabilidade bem como a integridade de seus funcionários constituindo a corrupção passiva a venalidade de atos de ofício num verdadeiro tráfico da função pública A corrupção como já destacamos não representa um problema novo e tampouco é característica de determinado regime ou forma de governo mas acompanha a civilização humana ao longo dos tempos recebendo contemporaneamente a preocupação de organismos internacionais como ocorre por exemplo com a Convenção Interamericana contra a Corrupção primeiro tratado internacional sobre o tema ao determinar que cada Estadoparte proibirá e sancionará o ato de oferecer ou prometer a um funcionário público de outro Estado direta ou indiretamente através de seus nacionais pessoas que têm residência habitual em seu território e empresas nele domiciliadas qualquer objeto de valor pecuniário ou outros benefícios como presentes favores promessas ou vantagens para que em troca o dito funcionário realize ou omita qualquer ato no exercício de suas funções públicas relacionado com uma transação de natureza econômica ou comercial Entre aqueles Estadospartes que hajam tipificado o delito de suborno transnacional este será considerado um ato de corrupção para os propósitos da presente convenção art 8º 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo Sujeito ativo somente pode ser o funcionário público ao contrário da corrupção ativa que pode ser praticada por qualquer pessoa independentemente de condição ou qualidade especial Pode figurar como sujeito ativo aquele que mesmo não se encontrando no exercício da função pública utilizase dela para praticar o crime ou se encontra temporariamente afastado como por exemplo férias licença etc Ademais admitindo a descrição típica a prática de condutas descritas direta ou indiretamente significa que o sujeito ativo pode utilizarse para sua execução de interposta pessoa Nada impede que o sujeito ativo qualificado pela condição de funcionário público consorciese com um extraneus para a prática do crime com a abrangência autorizada pelo art 29 do Código Penal pode inclusive um funcionário público agindo como particular participar de corrupção passiva nas mesmas condições de um extraneus 32 Sujeito passivo Sujeito passivo é o EstadoAdministração União Estado Distrito Federal e Município bem como a entidade de direito público além do particular eventualmente lesado quando por exemplo o funcionário público solicita a vantagem indevida não ofertada nem prometida por aquele não configurando portanto a corrupção ativa 4 Tipo objetivo adequação típica A corrupção passiva consiste em solicitar receber ou aceitar promessa de vantagem indevida para si ou para outrem em razão da função pública exercida pelo agente mesmo que fora dela ou antes de assumila mas de qualquer sorte em razão da mesma É necessário que qualquer das condutas solicitar receber ou aceitar implícita ou explícita seja motivada pela função pública que o agente exerce ou exercerá Não existindo função ou não havendo relação de causalidade entre ela e o fato imputado não se pode falar em crime de corrupção passiva podendo existir residualmente qualquer outro crime tais como apropriação indébita estelionato etc a Solicitar no sentido do texto legal quer dizer pedir postular demandar direta ou indiretamente para si ou para outrem Nessa modalidade é desnecessária a prática de qualquer ato pelo extraneus ou mesmo de sua simples anuência à solicitação do funcionário para que o crime se configure A despeito de denominarse corrupção passiva ela implica conduta ativa um agir um fazer na modalidade de solicitar por exemplo Tratase de crime formal de simples atividade que se consuma com a mera solicitação b receber significa obter direta ou indiretamente para si ou para outrem a vantagem indevida Nessa modalidade a iniciativa parte do extraneus a quem o funcionário público adere isto é não apenas aceita como recebe a oferta ou promessa daquele À ação de receber corresponde o oferecimento ou a promessa de vantagem indevida caracterizadora da corrupção ativa c aceitar representa a anuência do funcionário público à promessa indevida de vantagem futura ofertada pelo extraneus Nessa modalidade ao contrário da anterior não há o recebimento da vantagem indevida sendo suficiente que o funcionário mostrese de acordo com a oferta isto é concorde com o recebimento futuro da promessa feita É necessário que haja uma promessa formulada por um extraneus que é aderida pelo funcionário público aceitando recebêla futuramente Pressuposto dessa figura é a existência de promessa de vantagem indevida formulada pelo agente corruptor configuradora do crime de corrupção ativa Em outros termos como demonstraremos no tópico seguinte nas duas modalidades receber e aceitar estamos diante de crime de concurso necessário no qual a bilateralidade está caracterizada O objeto é a vantagem de cunho patrimonial ou não desde que ilícita ou indevida elemento normativo do tipo e solicitada recebida ou aceita em razão da função pública do agente Esse objeto material representa o conteúdo da vantagem indevida solicitada ou recebida ou então da promessa aceita que é o preço pelo qual o funcionário corrupto se vende Como a lei preferiu não definila como vantagem patrimonial basta que seja suficiente para corromper o funcionário venal que pode não ser econômica e que nem por isso deixe de ser vantagem indevida isto é ilícita Enfim para caracterizar vantagem indevida é necessário que a ação traduza comércio da função isto é deve existir mercancia da função pública É necessário que a ação do funcionário corrupto seja inequívoca demonstrando o propósito do agente de traficar com a função que exerce É indispensável que a ação do sujeito ativo tenha o propósito de vender isto é de comercializar a função pública Cumpre destacar porém que nem toda dádiva ou presente importa em corrupção como demonstraremos no tópico 42 deste mesmo capítulo logo abaixo 41 Elemento normativo especial da ilicitude vantagem indevida A vantagem como se constata deve ser indevida Vantagem indevida é aquela que é ilícita ilegal injusta ou contra lege isto é não amparada pelo ordenamento jurídico Normalmente a ilegalidade da vantagem é determinada por norma extrapenal Ademais a vantagem pode ser presente ou futura A solicitação recebimento ou aceitação da vantagem indevida pode ser direta ou indireta É direta quando o sujeito ativo a formula diretamente à vítima ou de forma explícita deixando clara a sua pretensão é indireta quando o sujeito valese de interposta pessoa ou a formula tácita implícita ou sub repticiamente O fato de o sujeito ativo não efetuar pessoalmente a solicitação recebimento ou aceitação da vantagem indevida não desnatura a corrupção apenas confirma a regra valendose de interposta pessoa na tentativa de exporse o menos possível Por outro lado é indiferente que o ato funcional objeto da venalidade seja lícito ou ilícito ou seja que contrarie os deveres do cargo ou da função A indiferença sobre a licitude ou ilicitude do ato objeto da conduta ativa ou omissiva do funcionário venal a primeira hipótese seria de corrupção imprópria a segunda seria própria reside na gravidade do tráfico ou comércio da função que acarreta o descrédito e a degradação da Administração Pública perante a coletividade 42 Corrupção antecedente e consequente irrelevância Por fim a distinção entre corrupção antecedente e subsequente não apresenta maior relevância quanto a sua punibilidade A primeira corresponde à propina dada ou prometida em face de uma conduta futura e a segunda referese a uma pretérita No particular é irretocável o magistério de Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 259 quando afirma A conduta criminosa pode manifestarse antes ou depois do ato ou noutras palavras a corrupção pode ser antecedente ou subsequente dandose a primeira quando o funcionário ainda praticará o ato para o qual foi peitado e a segunda quando já o havendo executado recebe agora sem anterior acordo ou promessa a vantagem indevida ou ilícita É incorreto afirmar diante do texto do art 317 que não está contemplada a corruptio subsequens Em primeiro lugar não integra o tipo delitivo implícita ou explicitamente a necessidade do pactum sceleris entre corrupto e corruptor em segundo lugar o agente venal mesmo sem o prévio ajuste ao praticar o ato em favor de determinado beneficiário pode fazêlo contando com a recompensa conhecendoo por exemplo e sabendo de seu poder econômico e seu curriculum que o credencia como gratificador de quem o serve fato que se concretiza como supunha o corrupto Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 369 já fazia essa leitura nos seguintes termos o legislador pátrio não rejeitou o critério que remonta ao direito romano mesmo a recompensa não ajustada antes do ato ou omissão do intraneus pode ter sido esperada por este sabendo ele que o extraneus é homem rico e liberal ou acostumado a gratificar a quem o serve 421 Inaplicabilidade na corrupção ativa Resumindo nada impede que o funcionário pratique o ato funcional com a expectativa de ser agraciado com recompensa imoral vindo de acordo com sua previsão a recebêla posteriormente o que caracteriza igualmente a mercancia da função pública a despeito da inexistência de ajuste ou acordo prévio incapaz de afastar o caráter criminoso da conduta do funcionário corrupto No entanto é oportuno salientar que essa conclusão incensurável quanto à corrupção passiva é inaplicável à corrupção ativa ante os termos da descrição contida no art 333 é atípica a conduta de quem dá a funcionário qualquer vantagem após aquele ter praticado ato funcional e não tendo antes concorrido de qualquer modo para que o fizesse A proibição contida no art 333 incrimina a conduta de oferecer ou prometer vantagem indevida para que faça ou deixe de fazer e não porque fez ou deixou de fazer que são coisas completamente diferentes nos termos da previsão legal constitui corrupção ativa oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público para determinálo a praticar omitir ou retardar ato de ofício Podese até discordar da desarmonia do texto legal e do paralelismo que teoricamente deveria existir entre as figuras ativa e passiva mas isso não nos autoriza a ignorar os princípios da reserva legal e da tipicidade estrita e insistir na equivalência de figuras distintas significa adotar analogia de normas incriminadoras inadmissível em direito penal A doutrina italiana por fim é inaplicável no caso visto que o Código Rocco continha previsão expressa em sentido contrário art 321 43 Vantagem indevida e os princípios da adequação social e da insignificância Aspecto igualmente importante e que também deve ser examinado relativamente à elementar normativa vantagem indevida referese a sua abrangência isto é aos limites daquilo que pode ser considerado como indevida vantagem ou em outros termos o que constitui ou não objeto material do crime de corrupção Nesse sentido cumpre destacar desde logo que nem toda dádiva ou presente importa em corrupção Assim como não é aceitável que alguém presenteie por exemplo um magistrado com um apartamento ou um automóvel de luxo não se pode pensar em corrupção com uma garrafa de vinho ou uma cesta de Natal tão comum na comunidade cristã no mundo inteiro O tipo penal implica uma seleção de comportamentos e ao mesmo tempo uma valoração de dito comportamento o típico já é penalmente relevante Contudo também é verdade determinados comportamentos em si mesmos típicos carecem de relevância por serem correntes no meio social pois muitas vezes há um descompasso entre as normas penais incriminadoras e o socialmente permitido ou mesmo tolerado A tipicidade de um comportamento proibido é enriquecida pelo desvalor da ação e pelo desvalor do resultado lesando efetivamente o bem juridicamente protegido constituindo o que se chama de tipicidade material donde se conclui que o comportamento que se amolda a determinada descrição típica formal porém substancialmente irrelevante adequandose ao socialmente permitido ou tolerado não realiza materialmente a descrição típica Nesse sentido não é qualquer oferta qualquer regalo ou qualquer mimo que terá idoneidade material ou se preferirem relevância social de forma a lesar o bem jurídico tutelado materializando a tipicidade do crime de corrupção A doutrina nacional em meados do século passado já se preocupava com algo semelhante embora com linguagem e fundamento um tanto diferentes destacava com efeito a irrelevância de determinados donativos para configurar o crime de corrupção como deixam claro algumas passagens que passamos a examinar O próprio Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 3701 preconizava Deve notarse porém que as gratificações usuais de pequena monta por serviços extraordinários não se tratando é bem de ver de ato contrário à lei não podem ser consideradas material de corrupção Também não se entendem como tal as tradicionais boas festas de Natal ou Ano Novo aos carteiros ou lixeiros Podese acrescentar v g que eventual mistura do próprio dinheiro do funcionário público com o da administração para facilitar o troco por exemplo não configura por si só crime algum No mesmo sentido destaca Paulo José da Costa Jr Comentários ao Código Penal p 447 discorrendo sobre o crime de peculato que tampouco configura conduta punível quando o funcionário tiver necessidade de valerse de pequenas quantias do dinheiro público recebido para enfrentar despesas de manutenção ou de condução quando a serviço do Estado das quais posteriormente deverá ser reembolsado Ou por haver esquecido em casa o próprio dinheiro Para concluir a tipicidade penal exige uma ofensa de alguma gravidade aos bens jurídicos protegidos pois nem sempre qualquer ofensa a esses bens ou interesses é suficiente para configurar o injusto típico Segundo o princípio da insignificância é imperativa uma efetiva proporcionalidade entre a gravidade da conduta que se pretende punir e a drasticidade da intervenção estatal Amiúde condutas que se amoldam a determinado tipo penal sob o ponto de vista formal não apresentam nenhuma relevância material Nessas circunstâncias podese afastar liminarmente a tipicidade penal porque em verdade o bem jurídico não chegou a ser lesado como ocorre nas hipóteses que examinamos neste tópico 44 Reembolso de despesas indenizáveis atipicidade Algo semelhante ocorre por exemplo com as despesas indenizatórias que devem ser repassadas aos oficiais de justiça de todo o Brasil alguns estatizados outros não que despendem de recursos pessoais para realizar suas diligências os quais necessariamente devem ser repostos pelas partes Nesse sentido destaca Fernando Capez Curso de Direito Penal São Paulo Saraiva 2005 v 3 p 434 Tratandose de mero pedido de reembolso de quantia que não exceda o que foi despendido pelo servidor para a realização da diligência como por exemplo reposição de verba gasta com combustível não se caracteriza o crime de corrupção passiva É certo que tal pagamento é indevido na medida em que tais despesas não podem ser pagas diretamente ao funcionário público mas sempre por meio de guias cujo recolhimento é feito em bancos oficiais Entretanto não se pode falar em vantagem pois houve mero reembolso sem qualquer lucro para o agente público Não se caracteriza portanto a elementar vantagem indevida mas apenas ressarcimento irregular Realmente nessa hipótese nem se pode falar em vantagem muito menos em vantagem indevida pois se vantagem fosse não seria indevida na medida em que reembolsar despesas realizadas jamais representará vantagem e sem a presença dessa elementar normativa não se pode falar em corrupção ativa ou passiva ademais o reembolso além de não configurar vantagem é devido mesmo que o procedimento adotado possa eventualmente ser equivocado podendo no máximo caracterizar simples irregularidade administrativa sem qualquer conotação penal Nessa linha Salo de Carvalho e Alexandre Wunderlich em memorável arrazoado forense demonstram que A jurisprudência é ciente de que a estrutura de organização judiciária no Brasil padece do sério problema da falta de verba oficial para que se cumpram os mandados judiciais De igual forma é nítido na esfera civil que as despesas devem ser pagas pelo interessado quer adiantando as quantias presumivelmente necessárias quer como ocorreu reembolsando os serventuários pelas despesas Assim a norma processual civil descaracteriza hipótese de crime quando a parte arca com as despesas para o cumprimento dos mandados judiciais Para concluir a tipicidade penal exige uma ofensa de alguma gravidade aos bens jurídicos protegidos pois nem sempre qualquer ofensa a esses bens ou interesses é suficiente para configurar o injusto típico Segundo o princípio da insignificância é imperativa uma efetiva proporcionalidade entre a gravidade da conduta que se pretende punir e a drasticidade da intervenção estatal Amiúde condutas que se amoldam a determinado tipo penal sob o ponto de vista formal não apresentam nenhuma relevância material Nessas circunstâncias podese afastar liminarmente a tipicidade penal porque em verdade o bem jurídico não chegou a ser lesado como ocorre nas hipóteses que examinamos neste tópico 45 Natureza da vantagem indevida patrimonial e extrapatrimonial A doutrina de um modo geral temse dividido sobre a necessidade de a vantagem ser de natureza econômicopatrimonial Para Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 370 por exemplo a indébita vantagem solicitada recebida ou prometida há de ter caráter patrimonial há de representar um pretium no mercado ou compra e venda do ato funcional dinheiro ou qualquer utilidade material utila reperiebantur ea quibuscunquesciret aliquis uto Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 260 por sua vez perfilhava em sentido contrário afirmando somos dos que optam pelo sentido amplo Ao contrário do que se passa na concussão onde a expressão pode ser tomada em sentido restrito aqui se trata do fato de o funcionário corromperse isto é praticar ou não um ato visando a uma retribuição que pode não ser econômica sem que nem por isso deixe de traficar com a função pública Essa é a corrente majoritária admitindo que a vantagem pode ser de qualquer natureza moral material ou patrimonial mesmo que possa ser obtida indiretamente Ao examinarmos os crimes contra o patrimônio particularmente os de extorsão art 158 e extorsão mediante sequestro art 159 destacamos que quando a lei quer restringir a vantagem à natureza econômica o faz expressamente orientação normalmente adotada na disciplina dos crimes patrimoniais arts 155 a 183 Por isso a exemplo do que sustentamos quando examinamos o crime de concussão a vantagem indevida pode ser de qualquer natureza patrimonial quando a vantagem exigida referirse a bens ou valores materiais não patrimonial de valor imaterial simplesmente para satisfazer sentimento pessoal buscar uma forma de reconhecimento por pura vaidade como por exemplo a concessão de um título honorífico a conferência de um título de graduação enfim a vantagem indevida pode não ter necessariamente valor econômico 46 A indispensável bilateralidade residual no crime de corrupção A decantada perspicácia de Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 42930 levouo a essa inevitável constatação ao afirmar Perante nosso Código atual a corrupção nem sempre é crime bilateral isto é nem sempre pressupõe em qualquer de suas modalidades um pactum sceleris O pactum sceleris ou bilateralidade só se apresenta nas modalidades de recebimento da vantagem indevida ou da aceitação da promessa de tal vantagem por parte do intraneus corrompido ou da adesão do extraneus corruptor à solicitação do intraneus ou nas formas qualificadas previstas nos 1º e parág único respectivamente dos arts 317 e 333 Esse entendimento de Hungria foi acompanhado por Paulo José da Costa Jr Comentários ao Código Penal p 470 nos termos seguintes das modalidades de corrupção passiva previstas em lei ao menos duas receber e aceitar importam na bilateralidade da conduta Não era outro o entendimento de Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 416 que enfaticamente pontificava na forma de receber o crime é bilateral sendo inconcebível a condenação do agente sem a do correspondente autor da corrupção ativa À corrupção do funcionário passiva corresponde a ação do particular que de alguma forma a promove ativa especialmente nas modalidades de receber e aceitar promessa de vantagem sendo por conseguinte impossível a ocorrência de um crime sem a do outro Interessante destacar na mesma linha de raciocínio a acertada conclusão de Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 382 que mesmo não declinando expressamente a obrigatoriedade da bilateralidade nesses tipos de corrupção passiva afirma Tanto no recebimento como na aceitação da promessa perfazse também o correspondente delito de corrupção ativa art 333 Em tal caso não há que falar em tentativa porque ou o delito se consuma com o recebimento ou com a aceitação da vantagem indevida ou o funcionário a repele caracterizandose apenas o delito de corrupção ativa 461 Modalidade sui generis de autoria colateral Enfim o crime de corrupção nas modalidades de solicitar ou oferecer nas quais digamos a despeito de consumado crime formal não ocorre o exaurimento em razão da não adesão de corrupto e corruptor um na ação do outro caracterizase uma espécie sui generis de autoria colateral ante a ausência desse liame subjetivo entre ambos Concluindo a tipificação da corrupção nas modalidades de solicitar passiva art 317 e oferecer ativa art 333 em crimes autônomos não decorre do afastamento da teoria monística da ação mas da inexistência das causalidades física e psicológica que impedem a imputação penal concorrente por não caracterizar concurso de pessoas seja eventual seja necessário Por outro lado a corrupção nas modalidades de receber e aceitar que presumem a correspondente oferta ou promessa do corruptor são condutas física e subjetivamente vinculadas umas às outras Embora o pactum sceleris não seja requisito obrigatório repetindo em todas as hipóteses do crime de corrupção nas modalidades de receber vantagem indevida ou aceitar promessa a bilateralidade é inerente a referidas condutas pois somente se recebe ou se aceita se houver em contrapartida quem ofereça ou prometa Em outros termos para a configuração da corrupção passiva segundo esses verbos nucleares é indispensável a presença da figura ativa e viceversa No plano material portanto o reconhecimento da corrupção passiva nas modalidades de receber ou aceitar implica necessariamente a configuração da correspondente corrupção ativa bilateralidade seja na modalidade de oferecer seja na modalidade de prometer art 333 no plano processual contudo essa bilateralidade que é fáticojurídica depende da produção da prova da autoria correspondente 5 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo é representado pelo dolo que é constituído pela vontade consciente de solicitar receber ou aceitar direta ou indiretamente vantagem indevida do sujeito passivo da infração penal É necessário que o agente saiba que se trata de vantagem indevida e que o faz em razão da função que exerce ou assumirá isto é que tenha consciência dessa circunstância É indispensável enfim que o dolo abranja todos os elementos constitutivos do tipo penal sob pena de configurarse o erro de tipo que por ausência de dolo ou por dolo defeituoso afasta a tipicidade salvo se se tratar de simulacro de erro O elemento subjetivo especial do tipo é representado pela finalidade da ação que visa vantagem indevida para si ou para outrem Tratandose de elemento subjetivo especial não é necessário que se concretize isto é que a vantagem seja efetivamente alcançada pelo destinatário para si ou para outrem sendo suficiente que essa seja a finalidade orientadora da conduta do agente Mas a ausência desse animus para si ou para outrem desnatura a figura do crime de corrupção passiva Logicamente quando essa circunstância se fizer presente haverá uma espécie de inversão do ônus da prova devendo o agente demonstrar in concreto que a finalidade da conduta praticada era outra e não a de obter vantagem indevida para si ou para outrem 6 Consumação e tentativa 61 Consumação A corrupção passiva consumase instantaneamente isto é com a simples solicitação da vantagem indevida recebimento desta ou com a aceitação da mera promessa daquela Para a tipificação dessa infração penal é irrelevante que o ato funcional venha a ser praticado ou não em decorrência da propina O crime de corrupção na modalidade de solicitar é formal ou seja sua consumação não depende do recebimento efetivo configurandose com a simples solicitação da vantagem indevida mesmo que não seja atendida não sendo necessária a adesão do extraneus à vontade do agente para consumar se Por isso é fundamental que nessa modalidade a solicitação preceda a obtenção da indevida vantagem isto é a solicitação não pode ser posterior a ela Nas hipóteses de recebimento ou de aceitação da vantagem indevida em que a iniciativa é do corruptor consumase a corrupção passiva com o recebimento ou com a manifestação do aceite da promessa Nessas duas hipóteses recebimento e aceitação também se aperfeiçoa o correspondente crime de corrupção ativa crime bilateral 62 Tentativa Não é em regra admissível a tentativa nas modalidades de solicitar vantagem indevida ou aceitar promessa dela tratandose na terminologia de alguns autores de crimes de consumação antecipada Na verdade em qualquer das modalidades embora seja de difícil configuração a figura tentada quando in concreto for possível interromper o iter criminis a tentativa poderá configurarse 7 Figura majorada parágrafo único A exemplo da previsão do parágrafo único do art 333 corrupção ativa se o funcionário público em razão da vantagem ou promessa dela retarda ou omite ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional a pena é majorada em um terço Não deixa de ser uma espécie de punição pelo exaurimento do crime Entretanto se o funcionário pratica ato de ofício de natureza legal sem violar o dever funcional não incide na forma qualificada e sim no caput do art 317 do CP Com efeito para a tipificação do caput do art 317 é irrelevante a infração de dever funcional no entanto para configurar a aplicação da causa de aumento paradoxalmente somente se houver infringência de tal dever justificando a perplexidade na medida em que o exaurimento do crime somente fundamenta maior sanção penal se houver a infringência de dever funcional Por outro lado a majorante se configura desde que haja omissão ou retardamento de ato de ofício em razão da vantagem ou promessa dela Para essa hipótese omissiva não há exigência expressa de infringência de dever funcional embora em regra o retardamento ou omissão de ato de ofício implique em princípio a violação do dever funcional salvo se houver alguma justificativa razoável Há ainda a majorante especial prevista no art 327 2º do Código Penal 8 Figura privilegiada pedido ou influência O funcionário pratica deixa de praticar ou retarda ato de ofício com infração de dever funcional cedendo a pedido ou influência de outrem 2º Essa majorante aplicase em todos os crimes descritos neste capítulo O menor desvalor da ação reside na motivação da conduta que não é constituída pela venalidade da função traficada por vantagem indevida mas cede atendendo pedido ou por influência de outrem ou seja para satisfazer interesse ou pretensão de terceiros ou para agradar ou bajular pessoas influentes Nessa hipótese afastada a motivação da venalidade é necessária a presença da elementar normativa de infringência de dever funcional Em outros termos se o funcionário praticar deixar de praticar ou retardar ato de ofício cedendo a pedido ou influência de outrem sem contudo infringir dever funcional não se configura a minorante 9 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de reclusão de dois a doze anos e multa A figura majorada prevê a mesma pena aumentada de um terço e a privilegiada detenção de três meses a um ano ou multa A partir de 13 de novembro de 2003 a pena privativa de liberdade foi elevada para dois a doze anos de reclusão Lei n 107632003 mantida cumulativamente a de multa Essa pena como sempre é irretroativa sendo aplicável somente aos fatos praticados após a sua vigência Mantém um equívoco políticolegislativo qual seja o exagerado distanciamento entre o mínimo e o máximo deixando margem muito grande ao poder discricionário do julgador na dosagem da pena A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Corrupção Ativa Comete o crime previsto no art 333 parágrafo único do CP o agente que promete a entrega de dinheiro a Vereador para que este infringindo dever funcional providencie a aprovação de emenda a Projeto de Lei Complementar Corrupção Passiva Pratica o delito contemplado no 1º do art 317 do CP o Vereador que solicita dinheiro para ser aprovada emenda a Projeto de Lei Complementar infringindo dever funcional TJRS Apelação 70021540331 Rel Constantino Lisbôa de Azevedo j 632008 Comprovadas materialidade e autoria delitiva do crime de corrupção passiva A circunstância de o réu ser Agente de Polícia Federal à época da conduta delitiva não impede a decretação da perda de seu atual cargo de Delegado de Polícia Federal nos termos do art 92 I a do Código Penal TRF 3ª Região Apelação 200461020077203 Rel André Nekatschalow j 12112007 Art 317 do CP Corrupção passiva Réu policial militar Competência da justiça militar Em se tratando de policial militar que solicitou vantagem indevida em razão da função a competência para processo e julgamento do feito é da justiça castrense à luz do art 9º inciso II c do Código Penal Militar Anulação parcial do feito por incompetência absoluta do órgão julgador TJRS Apelação 70018782417 Rel Gaspar Marques Batista j 1752007 Corrupção Passiva Cometem o crime previsto no art 317 do CP os policiais civis que em razão da função solicitam e recebem dinheiro do proprietário de um veículo furtado que foi recuperado TJRS Apelação 70017362690 Rel Constantino Lisbôa de Azevedo j 30112006 Art 317 1º do CP Para a configuração do delito de corrupção passiva se faz necessário que o ato de ofício em torno do qual é praticada a conduta incriminada seja da competência ou atribuição inerente à função exercida pelo funcionário público Precedentes do STJ e do STF STJ REsp 825340MG Rel Félix Fischer j 178 2006 Facilitação de contrabando ou descaminho Art 318 Facilitar com infração de dever funcional a prática de contrabando ou descaminho art 334 Pena reclusão de 3 três a 8 oito anos e multa D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O legislador brasileiro mais uma vez volta a adotar exceção à teoria monística consagrada como regra ao longo de todo o Código Penal E o faz segundo sua justificativa para punir com maior severidade esta figura autônoma de facilitação de contrabando ou descaminho do que o próprio contrabando ou descaminho A razão dessa opção legislativa repousaria na infidelidade do servidor pela violação de dever funcional caracterizadora de grave ato de improbidade administrativa Embora os fundamentos sejam verdadeiros a opção mostrase desnecessária e inadequada na medida em que se poderia atingir o mesmo objetivo com o simples destaque em um parágrafo do art 334 que trata do crime de contrabando ou descaminho A inadequação dessa opção do legislador pode ser constatada por exemplo na opção doutrinária feita por Magalhães Noronha que em seu respeitável Manual de Direito Penal alterou a sequência que adota no exame dos crimes em espécie sempre seguindo a ordem prevista pelo Código Penal para abordar conjuntamente esse crime com aquele do contrabando ou descaminho por sua evidente correlação simplificando a própria análise elaborada 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração Pública especialmente sua moralidade e probidade administrativa Protegese na verdade a probidade da função pública sua respeitabilidade bem como a integridade de seus funcionários e de forma muito especial o dever funcional que nesse tipo de infração penal é vulnerado pela infidelidade à confiança que a Administração Pública depositara em seus agentes 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo somente pode ser o funcionário público mas não qualquer funcionário somente aquele que exerça a função fiscalizadora pois a essência da reprovação penal reside exatamente na infringência desse dever funcional Em outros termos não basta ser funcionário público é indispensável que este facilitando o contrabando ou descaminho viole seu dever funcional de fiscalizálo Se outro funcionário público sem esse dever funcional específico por exemplo concorrer de alguma forma para o crime de contrabando ou descaminho responderá por este art 334 e não pela figura especial da facilitação art 318 Nada impede que possa ocorrer a figura do concurso eventual de pessoas seja com extraneus seja com outro funcionário sem esse dever funcional Ademais se não concorrerem com algum funcionário que tenha o dever funcional de fiscalizar contrabando ou descaminho responderão pelo crime de contrabando ou descaminho e não por sua facilitação pois a ausência desse elemento normativo altera a figura típica Sujeito passivo é o Estado representado pela União Estados membros Distrito Federal ou Municípios especialmente em sua integridade orçamentáriofiscal 4 Tipo objetivo adequação típica A conduta típica consiste em facilitar promover tornar propício de forma comissiva ou omissiva com infração ao dever funcional qual seja o dever de reprimir e combater o contrabando ou descaminho Facilitar é tornar fácil remover obstáculos ou empecilhos que possam dificultar a ação de contrabandear ou descaminhar mercadorias A ação de facilitar pode ser concretizada através de ação ou de omissão A ratio dessa punição autônoma reside na conveniência de punir mais severamente o funcionário que transgride o dever funcional de combater o contrabando ou o descaminho O crime do art 318 do Código Penal tem como pressuposto a infração a dever funcional somente podendo ser praticado pelo funcionário que tem como atribuição legal prevenir e reprimir o contrabando ou descaminho Assim não pratica o crime em questão por exemplo o funcionário público em cujas atribuições não se inclui a repressão ao crime do art 334 do Código Penal Na ausência do elemento normativo do tipo com infração de dever funcional o funcionário público poderá responder como participante do crime de contrabando ou descaminho tipificado no art 334 nos moldes do art 29 ambos do CP Sintetizando é necessário que o funcionário facilite o contrabando ou descaminho infringindo seu dever funcional isto é deixando de cumprir os deveres que lhe são inerentes em razão da função que exerce qual seja a de controlar fiscalizar e impedir a entrada ou saída de mercadorias do território nacional irregularmente ou assegurar o pagamento dos impostos devidos quando estas forem permitidas 41 Competência da Justiça Federal O processo é de competência da Justiça Federal Vide o art 3º do Decretolei n 1666 produção comércio e transporte clandestino de açúcar e álcool art 7º da Lei n 472965 crime de sonegação fiscal e o art 21 da Lei n 813790 crimes contra a ordem tributária econômica e contra as relações de consumo 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo do crime de facilitação de contrabando ou descaminho é o dolo constituído pela vontade de facilitar o contrabando ou o descaminho tendo consciência de que infringe dever funcional Não há exigência de qualquer finalidade especial do injusto Tampouco há previsão de modalidade culposa sendo punível somente a conduta dolosa 6 Consumação e tentativa Consumase o crime com a simples ação de facilitar com infringência de dever funcional independentemente de se efetivar o contrabando ou o descaminho O crime funcional é facilitálo e não praticálo Pode portanto acontecer destacava Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 346 que ele já tenha desempenhado todo o seu papel nada mais lhe restando por fazer e dessarte consumado o crime do art 318 ainda que o mesmo não ocorra A ocorrência efetiva do contrabando ou descaminho representará apenas o exaurimento do crime sem qualquer relevância na pena cominada restando a possibilidade à evidência de sua adequação na fase de dosimetria penal in concreto A tentativa é teoricamente possível desde que a facilitação ocorra por meio de conduta ativa sendo omissa a facilitação por óbvio não se configurará a figura tentada 7 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de reclusão de três a oito anos e multa A pena privativa de liberdade constatase é tanto a cominada à corrupção passiva art 317 quanto à concussão art 316 mas isso cabe novamente o destaque é fruto da esquizofrenia legiferante a que nos referimos quando abordamos o crime de concussão pois a punição original dessa infração penal era coerentemente de dois a cinco anos de reclusão tendo sido modificada pelo legislador de plantão com a Lei n 813790 art 21 Ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A O delito de facilitação de contrabando ou descaminho art 318 do Código Penal tem caráter formal consumandose no momento em que ocorre o ato de facilitação ainda que não se dê por realizado o contrabando ou descaminho não exigindo a lei fim especial da conduta sendo irrelevante o agente visar ou não à vantagem As provas carreadas aos autos demonstram à saciedade a prática pela ré do delito capitulado no art 318 do Código Penal posto ter procedido à liberação fraudulenta de mercadorias sujeitas ao pagamento de tributos Se se tratasse realmente de mercadorias isentas de pagamento de imposto não haveria motivos para a não observância de todas as etapas dos trâmites legais para o respectivo desembaraço TRF 3ª Região Apelação 199903990266193 Rel Suzana Camargo j 262 2007 Crime de facilitação a descaminho ou prevaricação Os elementos indicativos dos autos levam a crer que o delito de descaminho teria se consumado com a liberação das mercadorias dada pelo paciente Consequentemente incorreria o mesmo no delito de facilitação a descaminho art 318 do Código Penal STJ HC 27689PR Rel Min Félix Fischer j 9122003 Prevaricação Art 319 Retardar ou deixar de praticar indevidamente ato de ofício ou praticálo contra disposição expressa de lei para satisfazer interesse ou sentimento pessoal Pena detenção de 3 três meses a 1 um ano e multa D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias No nosso Código Criminal do Império 1830 era considerada prevaricação uma série de violações de deveres praticados por funcionários públicos por afeição ódio ou contemplação ou para promover interesse pessoal seu art 129 O Código Penal de 1890 seguiu o mesmo sistema do anterior art 207 mas subordinou ao crime várias outras infrações de deveres praticados por advogado ou procurador que o Código vigente com técnica superior situou entre os crimes contra a administração da justiça Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 375 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a probidade de função pública sua respeitabilidade bem como a integridade de seus funcionários Prevaricação é a infidelidade ao dever de ofício e à função exercida é o descumprimento das obrigações que lhe são inerentes movido o agente por interesses ou sentimentos próprios Dentre os deveres inerentes ao exercício da função pública o mais relevante deles é o que consiste no cumprimento pronto e eficaz das atribuições do ofício que deve ser realizado escrupulosa e tempestivamente para lograr a obtenção dos fins funcionais O sentimento do funcionário público não pode ser outro senão o do dever cumprido e o de fazer cumprir os mandamentos legais Embora aqui o funcionário infiel não negocie com a sua função como ocorre na corrupção passiva denigrea igualmente pois viola o dever de ofício em prol de interesses subalternos interesses ou sentimentos pessoais relativamente ao ato que deve praticar Essa criminalização objetiva enfim impedir procedimento que ofende e degrada o bem jurídico interesse da administração pública quando o funcionário é impelido por objetivos ou sentimentos pessoais contrários portanto aos deveres que lhe são inerentes ao cargo e à função O objeto material do crime de prevaricação é o ato de ofício que é aquele que o funcionário público deve praticar em decorrência dos seus deveres funcionais consequentemente segundo o tipo penal é necessário que o sujeito ativo encontrese no exercício de suas funções regulamentares 3 Sujeitos do crime 31 Sujeito ativo Sujeito ativo somente pode ser o funcionário público a exemplo do que ocorre no crime de corrupção passiva tratandose por conseguinte de crime próprio que exige essa condição especial do sujeito ativo mas somente advirtase se for competente para realizar o ato de ofício administrativo legislativo ou judicial É indispensável que o agente encontrese no exercício de sua função e para satisfação de interesse ou sentimento pessoal retarde ou deixe de praticar indevidamente ato de ofício ou o pratique contra disposição expressa de lei Evidentemente que não pode praticar esse crime quem não se encontra no exercício da função ou por qualquer razão encontrese temporariamente dela afastado como por exemplo de férias de licença etc 32 Sujeito passivo Sujeito passivo é o EstadoAdministração União Estado Distrito Federal e Município bem como a entidade de direito público além do particular eventualmente lesado ou prejudicado pela conduta do funcionário O Estado é sempre sujeito passivo primário de todos os crimes naquela linha de que a lei penal tutela em primeiro lugar o interesse da ordem jurídica geral da qual aquele é o titular No entanto há crimes como este que ora estudamos em que o próprio Estado surge como sujeito passivo particular individual pois lhe pertence o bem jurídico ofendido pela ação do funcionário infiel 4 Tipo objetivo adequação típica As condutas tipificadas alternativamente são as seguintes retardar ou deixar de praticar indevidamente ato de ofício ou praticálo contra disposição legal As duas primeiras modalidades são omissivas e a última é comissiva O agente em qualquer dos casos visa a satisfação de interesse ou sentimento pessoal interesse esse que pode ser patrimonial ou moral o sentimento por sua vez é resultado de amor ódio paixão emoção etc do agente A criminalização dessas condutas tem por objetivo evitar procedimento que denigre o bem jurídico protegido interesse da administração pública por funcionário impelido por objetivos particulares quais sejam a satisfação de interesses ou sentimentos pessoais 41 Ação de retardar Retardar significa protelar atrasar procrastinar indevidamente a prática de ato de ofício isto é não realizar no prazo normalmente estabelecido para sua execução deixando fluir tempo relevante para a sua prática na hipótese de inexistência de prazo fixado para satisfazer sentimento ou interesse pessoal Exemplo da conduta de retardar ato de ofício seria a hipótese do atendente de cartório judicial que devendo expedir alvará de soltura por não simpatizar com o advogado deixa de fazêlo com a brevidade que a medida exige Enfim retardar é não praticar o ato em tempo oportuno ou praticálo fora do prazo legal Mesmo que o ato possa ser praticado após a expiração do prazo legal ainda que tal retardamento não acarrete sua invalidade configurará o crime de prevaricação 42 Ação de deixar de praticar Deixar de praticar constitui conduta omissiva através da qual devendo realizar determinado ato o funcionário mantémse inerte com a intenção ou o propósito de não realizálo Distinguese da conduta anterior porque naquela a intenção do funcionário é apenas procrastinar a realização do ato que mesmo com atraso termina sendo praticado nesta contrariamente o ato acaba não sendo tempestivamente executado isto é em tempo hábil para atingir a sua finalidade ou seja deixar de praticar é omitilo de forma definitiva e não simplesmente retardálo Convém destacar porém que tanto numa hipótese quanto noutra o ato de que se trata deve ser legítimo Convém destacar ademais que quando se utiliza de obstrucionismo como mero expediente dissimulador do retardamento ou da omissão indevida da prática de ato de ofício configurase o crime de prevaricação que exige nessa modalidade grande cautela e habilidade na sua apuração ante a dificuldade para se apurar se há ou houve excesso de zelo ou velada obstrução indevida 421 Ausência de prazo dificuldade na sua caracterização Nas duas modalidades omissivas particularmente quando não há prazos fixos previamente estipulados para a prática do ato de ofício normalmente há maior dificuldade para sua apuração principalmente da conduta de retardar ato de ofício indevidamente pois o prazo legalmente fixado é um marco que no plano objetivo facilita a comprovação da omissão funcional Nesse caso normalmente o funcionário púbico detém certa discricionariedade na avaliação de conveniência e oportunidade de praticar certos atos que afasta possível prevaricação ressalvada a hipótese de restar demonstrada a configuração de autêntica arbitrariedade discricionariedade e arbitrariedade são coisas absolutamente distintas discricionariedade implica liberdade de ação e decisão no plano administrativo nos limites legalmente permitidos arbitrariedade por sua vez é característica de ação contrária ao ordenamento jurídico que ultrapassa os limites legalmente permitidos Ato discricionário na definição de Hely Lopes Meirelles não se confunde com ato arbitrário Discrição e arbítrio são conceitos inteiramente diversos Discrição é liberdade de ação dentro dos limites legais arbítrio é ação contrária ou excedente da lei Ato discricionário portanto quando permitido pelo Direito é legal e válido ato arbitrário é sempre e sempre ilegítimo e inválido 422 Elementar normativa indevidamente O retardamento ou a omissão deixar de praticar de ato de ofício configurarão as condutas contidas no texto legal somente se ocorrerem indevidamente isto é sem causa justa Indevidamente como elementar normativa tanto na primeira como na segunda condutas significa que o retardamento ou a omissão devem ser injustos ilegais isto é não amparados pelo ordenamento jurídico enfim contra legis Significa por outro lado reconhecer que podem ocorrer motivos de força maior os quais justifiquem o retardamento ou a omissão de atos de ofício que como reconhece nosso Código Penal afastam a antijuridicidade da conduta Ademais não é podese afirmar ato de ofício o praticado contra as normas vigentes ou a sistemática habitual Indevida é a omissão não permitida não autorizada é aquela que infringe o dever funcional de agir 43 Praticar ato de ofício contra disposição legal Por fim praticar ato de ofício contra disposição expressa de lei significa que o funcionário pratica um ato ilegal contraria o ordenamento jurídico constituindo na verdade uma infração administrativopenal bem mais grave que as representadas nas duas primeiras condutas retardar ou deixar de praticar que são puramente omissivas mereceria a nosso juízo sanção mais grave que a cominada no dispositivo se observarmos o princípio da proporcionalidade embora tal consideração não passe do plano políticocriminal ante a proibição do venerável princípio da reserva legal 431 Proporcionalidade ignorada Desejamos apenas deixar claro que o legislador não foi feliz ao dispensar o mesmo tratamento a condutas tão díspares com desvalores tão diferenciados como são as condutas contidas no art 319 do CP Nessa modalidade nas palavras de Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 377 o agente substitui a vontade da lei pelo seu arbítrio praticando não o ato que é de seu dever praticar mas outro contrário à disposição expressa de lei ilegítimo Mais que ilegítimos diríamos nós ilegal como prescreve o dispositivo em estudo A locução contra disposição expressa de lei referese a ato legislativo emanado do poder competente isto é do Poder Legislativo e elaborado de acordo com o processo legislativo previsto no texto constitucional Portanto a expressão lei utilizada no tipo penal tem o significado restrito formal compreendendo o conteúdo e o sentido desse tipo de diploma jurídico que o comando normativo deve ser claro preciso e expresso de tal forma a não pairar dúvida ou obscuridade a respeito do procedimento a adotar Enfim a prática de ato no exercício da função contra expressa disposição de lei é nula e ainda assume o caráter de fraudulenta se o ato tiver sido dolosamente orientado quando fosse possível e obrigatória a realização de um ato válido Manzini orientavase nesse sentido destacando que não é um ato de ofício mas sim um expediente caprichoso e fraudulento que impõe maior reprovação à conclusão contrária aos deveres de ofício 44 Ato de ofício próprio da função ou cargo O crime de prevaricação somente se aperfeiçoa quando o funcionário público no exercício de sua função retarda ou omite ato de ofício indevidamente ou o pratica contra disposição expressa de lei É necessário que qualquer das condutas incriminadas refirase a ato de ofício isto é relativo às atribuições funcionais e territoriais regulares do funcionário público Em outros termos o retardamento ou omissão indevidos ou sua prática contra disposição legal expressa deve referirse a ato de ofício da competência do funcionário prevaricador Com efeito para a configuração do crime de prevaricação exigese que o ato retardado ou omitido indevidamente ou praticado contra expressa disposição de lei esteja compreendido nas específicas atribuições funcionais do servidor público prevaricador Se o ato não é da competência do funcionário poderseá identificar outro crime mas com certeza não o de prevaricação Quando determinado ato por exemplo pode ser realizado por qualquer do povo à evidência não se trata de ato de ofício 45 Satisfação de interesse ou sentimento pessoal É indispensável por fim que a ação ou omissão do funcionário público seja praticada para satisfazer interesse ou sentimento pessoal constituindo uma característica fundamental que distingue a prevaricação de outros crimes da mesma natureza Com efeito essa particularidade diferenciadora dos demais crimes similares foi uma introdução do grande Código Criminal do Império reconhecido mundialmente como um dos melhores diplomas legais codificados do século XX distanciandose no particular do não menos extraordinário Código Penal francês de 1810 Com efeito passouse a exigir que a infidelidade funcional com descumprimento ou violação de dever funcional tivesse uma causa psicológica que o atual Código Penal de 1940 sintetizou no especial fim de satisfazer interesse ou sentimento pessoal No entanto como essa satisfação de interesse ou sentimento pessoal constitui elementar subjetiva especial do injusto vamos examinála mais detidamente no tópico seguinte 5 A prevaricação praticada por juiz no exercício da função jurisdicional ou administrativa O magistrado a exemplo de qualquer funcionário público também pode ser sujeito ativo do crime de prevaricação tanto no exercício da função jurisdicional como também da função administrativa como já pontificava Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 3789 o nosso vigente Código rejeitando o exemplo de certos Códigos alienígenas não distingue para diverso tratamento penal entre a prevaricação do juiz e a do funcionário em geral uma e outra estão compreendidas no art 319 Heleno Cláudio Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 425 ratificava esse entendimento in verbis tendo em vista o critério que adotou nossa lei em relação a essa espécie de delitos não se exclui que o crime possa também ser praticado por magistrados e outros funcionários da justiça Exemplo de deixar de praticar ato de ofício seria a conduta de magistrado que toma conhecimento de dados ou fatos que o tornam impedido de manterse na presidência de determinado processo criminal mas por razões pessoais satisfação de interesse ou sentimento continua praticando atos processuais deliberando e determinando diligências etc para só mais adiante invocar seu impedimento por fatos que tomou ciência há mais tempo ou mesmo que nunca venha a reconhecer esse estado quando comprovadamente existir Nessa hipótese mais que mera irregularidade funcional administrativa ou puramente processual transcende para o plano material tipificando o crime de prevaricação o Código Penal brasileiro de 1940 não distingue a prevaricação praticada por juiz daquela praticada por qualquer outro funcionário ao contrário da orientação seguida pelas legislações modernas como por exemplo o atual Código Penal espanhol arts 446 e 447 51 Prevaricação judicial no Código Penal espanhol Muñoz Conde Derecho Penal p 978 exemplifica como prevaricação el retraso excesivo en la adopción de una resolución la arbitrariedad que no es la esencia de la prevaricación sino una forma de manifestación de la misma la desviación de poder la decisión desigual de supuestos iguales se le da por ej la licencia de construcción a unos pero no a otros que se encuentran en la misma situación Nesse sentido vale a pena transcrever ao menos a primeira parte do art 449 do atual Código Penal espanhol in verbis 1 En la misma pena señalada en el artículo anterior incurrirá el Juez Magistrado o Secretario Judicial culpable de retardo malicioso en la Administración de Justicia Se entenderá por malicioso el retardo provocado para conseguir cualquier finalidad ilegítima art 449 Vide nosso Tratado de Direito Penal 52 Motivação similar nos dois diplomas legais Nosso Código Penal que não distingue prevaricação de juízes e demais funcionários ao contrário do espanhol fundamenta como este a criminalização da prevaricação no fim especial motivador da conduta o espanhol na obtenção de qualquer finalidade ilegítima ou o que dá no mesmo contrária ao Direito o brasileiro na satisfação de interesse ou sentimento pessoal o que mutatis mutandis significa basicamente a mesma coisa A ausência dessa finalidade especial tanto num quanto noutro diploma legal desqualifica a prevaricação para pura infração administrativa Aclarando finalmente o sentido da elementar sentimento pessoal vale a pena invocar novamente o magistério de Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 378 que sentenciava Por sentimento pessoal entendese a afeição a simpatia a dedicação a benevolência a caridade o ódio a parcialidade grifamos o despeito o desejo de vingança a paixão política o prazer da prepotência ou do mandonismo a subserviência o receio de molestar os poderosos etc Normalmente a ilegalidade do retardamento ou da omissão da prática do ato de ofício encontrase na própria norma penal seja de natureza material seja de natureza processual embora possa situarse em normas extrapenais como nas leis de organização judiciária de direito administrativo fiscal etc 6 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo constituído pela vontade consciente de retardar ou omitir indevidamente ato de ofício ou praticálo contra disposição expressa de lei É indispensável que o agente tenha consciência de que o retardamento ou a omissão do ato que compete realizar é indevido ou seja sem justificativa ou então que o pratica contra as disposições legais ou seja que sua realização nas circunstâncias contraria as determinações do ordenamento jurídico É necessário como temos repetido que o dolo abranja todos os elementos constitutivos do tipo penal sob pena de configurarse o erro de tipo que por ausência de dolo ou por dolo defeituoso afasta a tipicidade salvo se se tratar de simulacro de erro 61 Satisfação de interesse ou sentimento pessoal Necessária a presença do elemento subjetivo especial do tipo representado pelo especial fim de agir que na dicção da descrição típica é para satisfazer interesse ou sentimento pessoal isto é há a necessidade de que o móvel da ação seja a satisfação desse tipo de interesse ou sentimento Interesse pessoal que pode ser material ou moral é aquele que por alguma razão satisfaz pretensão ambição ou anseio do agente podendo ser representado por qualquer vantagem ou proveito que possa ser obtido pelo sujeito ativo em razão de sua conduta incriminada nesse tipo penal Tratandose de interesse patrimonial material devese atentar para a inexistência de pacto acordo ou qualquer vínculo com terceiro interessado que se existir poderá configurar corrupção ou concussão Sentimento pessoal por sua vez reflete um estado afetivo ou emocional do próprio agente que pode manifestarse em suas mais variadas formas tais como amor paixão emoção ódio piedade carinho afeto vingança favorecimento ou prejuízo a alguém etc É irrelevante que se trate de sentimentos nobres honrados ou de relevante valor social O ônus demandado para satisfação de sentimentos pessoais independentemente de sua natureza deve ser suportado pessoal e exclusivamente pelo funcionário e jamais às custas de sua função pública do dever funcional e de fidelidade para com a Administração Pública 62 Satisfação de interesse ou sentimento de terceiro Evidentemente essa elementar subjetiva especial exigida não se confunde com interesse ou sentimento de terceiro que mesmo quando se verifica não tem idoneidade para satisfazer o especial fim exigido pelo tipo penal em apreço Aliás o próprio Supremo Tribunal Federal já se manifestou nesse sentido STF RTJ 111289 E mais que isso e com absoluto acerto o STF destacou em outra oportunidade que a denúncia peça inicial da ação penal precisa indicar qual a ação ou omissão praticada pelo funcionário e sua natureza isto é se a conduta foi por interesse ou sentimento pessoal pois são elementos necessários à configuração do delito do art 319 Por isso é indispensável que a denúncia esclareça em que consiste o fim de agir isto é qual é o interesse ou sentimento pessoal que motivou a conduta do agente sob pena de inépcia sendo inviabilizada a ampla defesa do acusado 7 Consumação e tentativa O crime de prevaricação consumase nas modalidades omissivas com o retardamento ou a omissão do ato devido sem justa causa ou com a prática do ato de ofício contra disposição expressa de lei Nas duas primeiras hipóteses como crime omissivo próprio que são o crime consumase no lugar e no momento em que o ato de ofício devia ter sido realizado e não o foi não havendo espaço portanto para a figura tentada Na terceira figura típica o crime é comissivo e consumase com a prática de ato de ofício contrariando expressa disposição de lei Na modalidade de praticar ato contra disposição expressa de lei a despeito da dificuldade de apurar in concreto quando está sendo executado o ato é teoricamente possível a tentativa por tratarse de crime plurissubsistente que admite fracionamento de sua fase executória 8 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de detenção de três meses a um ano e multa Aumentase de um terço nas hipóteses previstas no art 327 2º do Código Penal Tratase como se constata de infração de menor potencial ofensivo sendo por conseguinte da competência do Juizado Especial Criminal art 61 da Lei n 909995 com aplicação prioritariamente de penas alternativas A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A É cediço na Corte Especial que em regra inadmitese o denominado crime de exegese O suposto erro in judicando do magistrado por si só não é capaz de configurar o crime de prevaricação notadamente se não demonstrado de forma inequívoca o dolo específico de satisfazer interesse ou sentimento pessoal sem a qual a conduta tornase atípica Precedentes HC 30792PI Rel Min Paulo Medina DJ 15122003 REsp 293621MA Rel Fernando Gonçalves DJ 1832002 RHC 9865MS Relator o Min Félix Fischer DJ de 1162001 HC 80788MA Relator o Min Sidney Sanches DJ de 732003STF STJ Exceção da Verdade 50SP Rel Min Luiz Fux j 2132007 Prevaricação imprópria Art 319A Deixar o Diretor de Penitenciária eou agente público de cumprir seu dever de vedar ao preso o acesso a aparelho telefônico de rádio ou similar que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo Pena detenção de 3 três meses a 1 um ano Artigo acrescentado pela Lei n 11 466 de 28 de março de 2007 D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Dentre os deveres inerentes ao exercício da função pública o mais relevante deles é o que consiste no pronto e eficaz cumprimento das atribuições do ofício que deve ser realizado tempestivamente para obter os fins funcionais O sentimento do funcionário público não pode ser outro senão o do dever cumprido e o de fazer cumprir os mandamentos legais No entanto no novo dispositivo legal ao contrário do que ocorre no crime de prevaricação o sujeito ativo não viola o dever de ofício para satisfazer interesses ou sentimentos pessoais mas apenas deixa de vedar acesso do preso aos aparelhos de comunicação ou seja uma simples omissão de dever funcional excepcionalmente erigida à condição de crime Essa omissão do diretor de estabelecimento prisional impelido por objetivos ou sentimentos pessoais não degrada nem desmoraliza a Administração Pública ao contrário do que ocorre na prevaricação clássica 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido que no crime de prevaricação é a probidade da função pública sua respeitabilidade bem como a integridade de seus funcionários não se descortina com a clareza exigida pela dogmática penal A infidelidade ao dever de ofício e à função exercida que é o núcleo do bem jurídico que a norma penal incriminadora da prevaricação objetiva proteger não existe na nova incriminação prevaricação imprópria acrescida pela Lei n 11466 de 28 de março de 2007 é o descumprimento das obrigações que lhe são inerentes movido o agente por interesses ou sentimentos próprios Impedir dentro do possível que preso ou interno comuniquese permanentemente com o exterior do sistema prisional por qualquer meio é uma das tantas obrigações próprias da atividade dos administradores e agentes do sistema penitenciário No entanto a realidade brasileira tem demonstrado que os apelos do governo às empresas de telecomunicações na tentativa de vedar tais comunicações especialmente com os conhecidos telefones celulares esbarraram em dificuldades técnicooperacionais ainda sem uma resposta satisfatória dos especialistas Atribuirse portanto a responsabilidade penal por tais comunicações ao Diretor ou Administrador do presídio beira à responsabilidade objetiva proscrita do direito penal da culpabilidade 3 Impropriedade dessa criminalização Não há nesta nova figura convém que se destaque a violação dolosa do dever de ofício em prol de interesses subalternos interesses ou sentimentos pessoais do sujeito ativo denegrindo a função ou cargo que exerce ao contrário do que ocorre no crime de prevaricação art 319 Não há enfim procedimento que ofenda e degrade o interesse da Administração Pública que deveria ser o bem jurídico protegido pois o funcionário não é impelido por objetivos ou sentimentos pessoais contrariando os deveres que são inerentes ao cargo e à função A eventual omissão nessa hipótese estaria melhor localizada a nosso juízo no plano administrativo como falta funcional onde encontraria solução mais adequada observandose o princípio da proporcionalidade exigência irrenunciável de um Estado Democrático de Direito 4 Sujeitos do crime 41 Sujeito ativo Sujeito ativo somente pode ser o diretor de estabelecimento penitenciário ou quem suas vezes fizer tratandose por conseguinte de crime próprio que exige essa condição especial do sujeito ativo Serventuários que não ocupem ou exerçam essa função não podem ser responsabilizados por essa infração penal salvo se comprovadamente forem alcançados pelo disposto no art 29 do CP É indispensável que o agente encontrese no exercício da sua função não podendo praticar esse crime evidentemente quem não se encontra no exercício da função ou que por qualquer razão encontrese temporariamente dela afastado como por exemplo de férias de licença etc Em respeito ao princípio da tipicidade estrita a criminalização contida no presente dispositivo não alcança eventual diretor das conhecidas cadeias públicas que não têm a mesma dimensão e complexidade institucional das penitenciárias que são expressamente invocadas no texto legal 42 Sujeito passivo Sujeito passivo é o EstadoAdministração União Estado Distrito Federal e excepcionalmente Município O Estado é sempre sujeito passivo primário de todos os crimes naquela linha de que a lei penal tutela em primeiro lugar o interesse da ordem jurídica geral da qual aquele é o titular Em alguns crimes como este no entanto o próprio Estado surge como sujeito passivo particular individual representando a coletividade 5 Tipo objetivo adequação típica A conduta descrita no art 319A prevaricação imprópria configura um autêntico crime omissivo próprio que consiste na desobediência a uma norma mandamental isto é uma norma que determina a prática de uma conduta que não é realizada oportuno tempore Há nessa espécie de crime a omissão de um dever de agir imposto normativamente Com efeito o crime omissivo próprio não se caracteriza pelo simples não fazer ou fazer coisa diversa mas pelo não fazer o que a norma jurídica determina pois a omissão em si mesma não existe mas apenas a omissão de uma conduta legalmente determinada Ademais aqui na prevaricação imprópria como em qualquer crime omissivo somente se tipficará a omissão quando nas circunstâncias for possível cumprir a norma mandamental no caso vedar o acesso a aparelho telefônico de rádio ou similar Prevaricação é a infidelidade ao dever de ofício à função exercida é o descumprimento das obrigações que lhe são inerentes sendo movido o agente por interesses ou sentimentos pessoais A criminalização objetiva impedir procedimento que ofende e denigre o bem jurídico interesse da Administração Pública quando o funcionário é impelido por objetivos próprios estranhos aos seus deveres funcionais No entanto não é o que ocorre com a descrição contida no art 319A e por isso só impropriamente e ainda assim com grande esforço interpretativo se poderá interpretála como crime de prevaricação Em outros termos o Estado incompetente na solução do problema a exemplo de Pilatos lava as mãos e responsabiliza o funcionário pela solução de um problema que ele EstadoAdministração não conseguiu resolver seja por sua inoperância seja pela alegada impossibilidade operacional 51 Crime omissivo próprio deixar de vedar A conduta incriminada no novo dispositivo deixar de vedar o acesso de preso a aparelho telefônico ou similar configura como afirmamos acima crime omissivo próprio ou seja o agente mantémse inerte com a vontade consciente de não realizar a conduta devida simplesmente sem qualquer finalidade outra Com efeito o agente não visa a satisfação de interesse ou sentimento pessoal que é a elementar subjetiva especial caracterizadora da infidelidade funcional como ocorre na prevaricação clássica Tratase de crime próprio que exige qualidade ou condição especial do sujeito qual seja a de ser diretor de penitenciária ou agente público substituto do diretor Por isso se o diretor ou seu substituto legal expedir ordem portaria ou resolução proibindo o uso de aparelho telefônico ou similar no interior da penitenciária ou então determinando aos seus subordinados que impeçam os internos de fazerem uso de tais aparelhos não se poderá imputarlhe a omissão ora criminalizada independentemente de sua ordem ser cumprida ou não com êxito conforme veremos no exame dos pressupostos da omissão Realmente a determinação do diretor concretamente para que se tome as medidas necessárias para vedar o uso de aparelho telefônico de rádio ou similar representa um comportamento ativo incompatível com a inércia dolosa característica dos crimes omissivos próprios como pretende ser o que ora examinamos 52 A ação do diretor afasta a tipicidade No entanto o não atendimento da ordem do diretor da penitenciária seja por impossibilidade operacional seja física pessoal ou institucional impede que se caracterize o crime pois o diretor não se omitiu isto é não deixou de agir determinou a vedação não ficou inerte ao contrário agiu ou seja tomou as providências que lhe cabiam embora não tenha conseguido êxito O dever que a norma lhe impõe determinar a vedação de acesso aos meiosinstrumentos de comunicação é atendido pelo diretor mas circunstâncias alheias à sua vontade impedem que o resultado seja obtido e consequentemente a ineficácia de suas medidas não podem acarretar lhe qualquer responsabilidade penal Nessa hipótese não se configura a omissão descrita no art 319A 53 Abrangência do elemento subjetivo Não se pode perder de vista que a vontade livre e consciente do sujeito ativo deve abranger a ação omissiva conduta o resultado e o nexo causal A vontade pressupõe a previsão isto é a representação na medida em que é impossível querer algo conscientemente senão aquilo que se previu ou representou na nossa mente pelo menos parcialmente Ademais a vontade de realização do tipo objetivo no caso deixar de vedar ao preso acessos aos aparatos de comunicação pressupõe a possibilidade de influir no curso causal isto é de efetivamente tornar possível a vedação normativamente determinada pois tudo o que estiver fora da possibilidade de influência concreta do agente pode ser desejado ou esperado mas não significa querer realizálo Somente pode ser objeto da norma jurídica algo que o agente possa concreta e fisicamente realizar ou omitir Fora dessa hipótese não se pode imputar o resultado a esse agente Considerando se pois que as prisões brasileiras regra geral não são dotadas dos mecanismos tecnológicos necessários para impedir a efetiva entrada e utilização dos aparelhos de comunicação mencionados no texto legal a exigência de o diretor de penitenciária impedir sua entrada sob pena de configurarse crime omissivo próprio configura autêntica responsabilidade penal objetiva na medida em que impõe uma obrigação legal impossível de ser cumprida violando inclusive o princípio da proporcionalidade sob o aspecto da adequação 54 Ato de ofício deixar de cumprir dever de vedar acesso Embora o novo dispositivo legal não fale em ato de ofício que é aquele que o funcionário público deve praticar em decorrência dos seus deveres funcionais mencionao em outros termos deixar de cumprir seu dever de vedar ao preso o acesso consequentemente segundo o tipo penal é indispensável que o sujeito ativo encontrese no exercício de suas funções regulamentares quais sejam administrando ou dirigindo o estabelecimento penitenciário Em outros termos ao contrário do art 319 que se refere a ato de ofício o novo dispositivo legal especifica o conteúdo de um ato previamente identificado qual seja o dever de vedar ao preso o acesso a aparelho telefônico ou similar Esse novo tipo penal dispensou o elemento normativo indevidamente exigido no crime de prevaricação Indevidamente como elementar normativa significa que a omissão deve ser injusta ilegal isto é não amparada pelo ordenamento jurídico enfim contra legis Contudo nada impede que circunstâncias especiais possam inviabilizar o atendimento do comando na norma incriminadora justificando por exemplo a omissão Dessa forma podese sustentar que somente a omissão indevida só a omissão sem causa justa pode configurar o descumprimento do comando legal Igualmente não há exigência do tradicional elemento subjetivo especial do injusto qual seja para satisfazer interesse ou sentimento pessoal que constitui uma característica fundamental do crime de prevaricação Elemento subjetivo portanto é o dolo constituído pela vontade consciente de omitirse isto é deixar vedar ao preso o acesso ao telefone ou similar 6 Pressupostos fundamentais do crime omissivo Como se trata de genuíno crime omissivo próprio não se pode ignorar a necessidade de se fazerem presentes os pressupostos fundamentais de todo crime omissivo quais sejam a Poder agir o poder agir é um pressuposto básico de todo comportamento humano também na omissão evidentemente é necessário que o sujeito tenha a possibilidade física de agir para que se possa afirmar que não agiu voluntariamente É insuficiente pois o dever de agir isto é de vedar o acesso ao aparelho telefônico como exige o tipo penal Em outros termos é necessário que além do dever haja também a possibilidade física de agir ainda que com risco pessoal Essa possibilidade física falta por exemplo na hipótese de coação física irresistível não se podendo falar em omissão penalmente relevante porque o omitente não tinha a possibilidade física de agir Aliás a rigor nem poderia ser chamado de omitente porque lhe faltou a própria vontade b Evitabilidade do resultado mas ainda que o omitente tivesse a possibilidade de agir fazendose um juízo hipotético de eliminação seria um juízo hipotético de acréscimo imaginandose que a conduta devida foi realizada precisamos verificar se o resultado teria ocorrido ou não Ora se a realização da conduta devida impede o resultado considerase a sua omissão causa desse resultado No entanto se a realização da conduta devida não tivesse impedido a ocorrência do resultado que a despeito da ação do agente ainda assim se verificasse devese concluir que a omissão não deu causa a tal resultado E a ausência dessa relação de causalidade ou melhor no caso relação de não impedimento impede que se atribua o resultado ao omitente sob pena de consagrarse uma odiosa responsabilidade objetiva Pois bem como se pode constatar a prática da ação devida exigida também pelo novo dispositivo legal não assegura que o resultado não ocorrerá Na realidade tal como surgiu a norma sob o ponto de vista prático é inócua se não forem tomadas as medidas necessárias especialmente tecnológicas de molde a propiciar que a administração penitenciária tenha condições de efetivamente impedir o ingresso de tais aparatos no interior das prisões brasileiras c Dever de impedir o resultado quando se trata de crime omissivo impróprio que não é o caso do dispositivo em exame se o agente podia agir e se o resultado desapareceria com a conduta omitida ainda assim não se pode imputar o resultado ao sujeito que se absteve É necessária uma terceira condição ou seja é preciso que o sujeito tivesse o dever de evitar o resultado isto é o especial dever de evitá lo ou em outros termos que ele fosse garantidor da sua não ocorrência 7 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo do crime de prevaricação imprópria é o dolo constituído pela vontade consciente de não vedar o uso de aparelho telefônico rádio ou similar pelos reclusos É indispensável que o agente tenha vontade e consciência de descumprir o comando determinado no artigo ora sub examen É necessário como temos repetido que o dolo abranja todos os elementos constitutivos do tipo penal sob pena de configurarse o erro de tipo que por ausência de dolo ou por dolo defeituoso afasta a tipicidade salvo se se tratar de simulacro de erro Curiosamente no entanto a despeito da pretensão do legislador de equiparar a nova figura penal ao crime de prevaricação não se exige a presença de elemento subjetivo especial do tipo representado pelo especial fim de agir que na dicção do artigo anterior 319 é para satisfazer interesse ou sentimento pessoal isto é há a necessidade de que o móvel da ação seja a satisfação desse tipo de interesse ou sentimento Mas exatamente pela ausência de elemento subjetivo especial do tipo tornase necessária uma clareza melhor da existência de dolo isto é da vontade consciente de omitirse isto é de não vedar o acesso que o tipo penal proíbe e especialmente porque a previsão legal não admite a modalidade culposa e na nossa concepção não é admissível nem mesmo dolo eventual 8 Consumação e tentativa 81 Consumação A conduta omissiva descrita no art 319A como crime omissivo próprio que é consumase no lugar e no momento em que a conduta devida tinha de ser realizada isto é onde e quando o sujeito ativo diretor de penitenciária deveria agir e não o fez Em sentido semelhante referindose ao crime omissivo Frederico Marques sustentava que temse a infração por consumada no local e tempo onde não se efetuou o que se deveria efetuar Cometemse pois delitos de omissão ali onde o autor para cumprir o dever jurídico a ele imposto devesse praticálo e não onde se encontrasse no momento de seu comportamento inerte Enfim a consumação realizase num só momento não se alongando no tempo 82 Tentativa impossibilidade A prevaricação imprópria crime omissivo próprio por excelência não admite a figura tentada pois não se lhe exige nenhum resultado naturalístico produzido pela conduta omissiva Tratase na realidade de crime de mera atividade ou melhor inatividade é crime de ato único unissubsistente que não admite fracionamento Se o agente deixa passar o momento em que devia e podia agir consumouse o crime se ainda pode agir não há que se falar em crime Até o momento em que a ação do agente pode ser eficaz a ausência dela não constitui crime No entanto se nesse momento a atividade devida não ocorrer consumase o crime não havendo espaço portanto para fracionamento da conduta omisssiva 9 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é a pena privativamente de liberdade na modalidade de detenção de três meses a um ano Aumentase de um terço nas hipóteses previstas no art 327 2º do Código Penal Tratase como se constata de infração de menor potencial ofensivo sendo por conseguinte da competência do Juizado Especial Criminal art 61 da Lei n 909995 com aplicação prioritariamente de penas alternativas A ação penal é pública incondicionada Condescendência criminosa Art 320 Deixar o funcionário por indulgência de responsabilizar subordinado que cometeu infração no exercício do cargo ou quando lhe falte competência não levar o fato ao conhecimento da autoridade competente Pena detenção de 15 quinze dias a 1 um mês ou multa D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Condescendência criminosa é uma modalidade de prevaricação que recebeu tratamento diferenciado do legislador por considerar a menor desvalia da ação criminalizada que envolve relação pessoalfuncional O Código Criminal do Império disciplinava essa infração penal como espécie de prevaricação art 129 4º caminho também seguido pelo Código Penal de 1890 art 207 6º O Código Penal de 1940 preferiu destacála como figura autônoma para darlhe tratamento mais adequado proporcional a sua menor gravidade O Anteprojeto de Reforma do Código Penal por sua vez descriminaliza essa modalidade de infração penal entendendo provavelmente que de minimis non curat praetor 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração Pública especialmente sua moralidade e probidade administrativa Protegese na verdade a probidade de função pública sua respeitabilidade bem como a integridade de seus funcionários A probidade e moralidade da Administração Pública também ficam comprometidas quando os funcionários desta de níveis mais elevados omitemse na correção e responsabilização das infrações cometidas pelos subalternos 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo somente pode ser o funcionário público e que ostente posição hierarquicamente superior à do infrator Pode haver a participação de indivíduo não funcionário através do concurso de pessoas Sujeito passivo é o Estado representando União Estadosmembros Distrito Federal e Municípios enquanto titular e responsável pela Administração Pública 4 Tipo objetivo adequação típica Tratase a despeito do nomen juris distinto de uma modalidade menos grave de prevaricação que encerra um sentimento indulgente São duas as condutas típicas previstas a deixar de responsabilizar subordinado que cometeu infração no exercício do cargo b não levar o fato ao conhecimento da autoridade competente quando lhe falta competência Ambas as condutas são omissivas próprias e têm como pressuposto a prática de infração penal ou administrativa pelo funcionário no desempenho de suas funções Deixar de responsabilizar significa a não imposição das sanções disciplinares cabíveis ao funcionário subalterno faltoso omitindose o superior quanto à obrigação de apurar a infração cometida Não levar ao conhecimento da autoridade competente significa deixar de comunicála quando não sendo competente para apurála devia e podia fazêlo As duas modalidades são omissivas na primeira omitese de responsabilizar o faltoso na segunda omitese de comunicar a ocorrência da falta à autoridade competente O elemento material causa psicológica do crime consiste na omissão do dever funcional de promover a responsabilidade administrativa do infrator seu subalterno quando competente para apurálo ou não o sendo na omissão do dever de comunicar o fato à autoridade competente É indispensável contudo que a infração esteja diretamente relacionada com o exercício do cargo ou seja deve ter sido cometida ratione officii Infração contudo praticada fora do exercício funcional a omissão do superior em apurála não tipifica o crime ora em exame 41 Criminalização desnecessária Inevitável chegar à derradeira conclusão a criminalização desse tipo de conduta é uma demasia ante a existência de outros mecanismos de controle formalizado particularmente o Direito Administrativo que podem ocuparse melhor desse tipo de relacionamento omissivo na esfera da Administração Pública Em verdade na prática tal previsão dificilmente ganha aplicação não que tais fatos não aconteçam ao contrário ocorrem mas normalmente o chefe do chefe isto é a autoridade competente que toma conhecimento da omissão do funcionário faltoso também adota indulgência semelhante omitindose igualmente Apenas por exceção poderseá chegar à punição e nesse caso normalmente a motivação não é mais nobre que a indulgência punida pelo contrário é movida por sentimento negativo vingança perseguição etc Convenhamos falando sério e sem meias palavras somente motivações do gênero animarão colegas de trabalho a buscar a criminalização de uma ação indulgente sem maiores consequências Sintetizando condescendência criminosa é a omissão administrativa praticada por funcionário público o qual por indulgência deixa de responsabilizar inferior hierárquico que cometeu infração administrativa no exercício do cargo ou quando não sendo competente deixa de comunicar sua ocorrência à autoridade que o seja 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de praticar qualquer das condutas tipificadas É necessário que o sujeito ativo tenha ciência da falta cometida pelo subalterno Se por alguma razão não a teve mesmo que fruto de negligência a omissão é atípica não se podendo falar em crime ante a ausência de previsão da modalidade culposa 51 Especial motivo de agir por indulgência É indispensável a presença do elemento subjetivo do tipo consistente no especial motivo de agir por indulgência clemência condescendência Esse crime a nosso juízo é um dos poucos que se pode afirmar sem medo de errar que embora não esteja expresso no tipo penal exige um elemento subjetivo especial do injusto motivador da conduta incriminada o sentimento piedoso condescendente o fim especial na realidade está contido na elementar normativa do tipo por indulgência Não deixa de ser um elemento subjetivo especial sui generis mas é o fim especial de agir tanto que se for outro o motivo determinante da omissão da autoridade superior o crime poderá ser o de prevaricação descrito no art 319 e não este 6 Consumação e tentativa Consumase o crime com a simples omissão por parte do sujeito ativo quando tomando conhecimento do fato não providencia a responsabilidade do infrator No entanto a lei penal não se refere ao prazo dentro do qual o superior hierárquico deve responsabilizar o subalterno infrator ou comunicar o fato à autoridade competente Destacava Hungria porém que segundo o Estatuto dos Funcionários Públicos Civis a autoridade que tiver ciência de irregularidades no serviço público deve promoverlhe a apuração imediata em processo administrativo art 217 da Lei 171152 Assim podese concluir ter seá o crime como consumado desde que tendo conhecimento da infração cometida pelo subalterno o superior hierárquico deixa de providenciar imediatamente na apuração de sua responsabilidade salvo a existência de força maior devidamente justificada Tratandose de crime omissivo próprio a tentativa é inadmissível segundo a orientação que adotamos 7 Classificação doutrinária Tratase de crime formal que não exige resultado naturalístico para sua consumação próprio que exige qualidade ou condição especial do sujeito de forma livre que pode ser praticado por qualquer meio ou forma pelo agente instantâneo não há demora entre a ação e o resultado unissubjetivo que pode ser praticado por um agente apenas e unissubsistente crime que em regra é praticado com um único ato não admitindo em consequência fracionamento em sua execução 8 Pena e ação penal As penas cominadas alternativamente são de detenção de quinze dias a um mês ou multa evidentemente da competência do Juizado Especial Criminal A ação penal é como mais um exagero dessa criminalização pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Para a configuração do delito previsto no art 320 do CP devese ter como pressuposto o cometimento de infração administrativa ou penal no exercício do cargo Logo necessária decisão trânsita em julgado dando conta do cometimento de uma infração ou crime in casu a prática de peculato e advocacia administrativa pelo oficial escrevente Evidente é a ausência de justa causa descabendo instauração de inquérito policial Demonstrados portanto o fumus boni juris e o periculum in mora impõese a confirmação da liminar concedida TJRS HC 71000903161 Rel Martinha Terra Salomon j 2122006 Condescendência criminosa Crime de menor potencial ofensivo Competência O crime de condescendência criminosa art 320 do CP tem pena prevista de 15 dias a 1 mês de detenção Logo é delito de menor potencial ofensivo a teor da Lei n 102592002 sendo competente para processo e julgamento a Turma Recursal Criminal TJRS HC 70013331343 Rel Gaspar Marques Batista j 15122005 Advocacia administrativa Art 321 Patrocinar direta ou indiretamente interesse privado perante a administração pública valendose da qualidade de funcionário Pena detenção de 1 um a 3 três meses ou multa Parágrafo único Se o interesse é ilegítimo Pena detenção de 3 três meses a 1 um ano além da multa D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Relativamente aos crimes contra a ordem tributária econômica e contra as relações de consumo a advocacia administrativa é disciplinada pela Lei n 813790 art 3º III que por ser especial afasta a geral Código Penal Por isso o patrocínio de interesse privado ante a administração fazendária em matéria tributária ou previdenciária é criminalizado pela lei de sonegação tributária lex especialis derogat legi generali que aplica inclusive a pesadíssima pena de reclusão de um a quatro anos Na mesma balada a Lei n 866693 que regulamenta as licitações e contratos da Administração Pública também criou sua própria figura de advocacia administrativa art 91 punindo o patrocínio de interesse privado perante a Administração Pública Tal como ocorre na hipótese dos crimes tributários também na seara das licitações públicas havendo advocacia administrativa será aplicável a previsão contida nesta lei cuja pena cominada é de seis meses a dois anos de detenção e multa Dispomos como acabamos de constatar de três modalidades de advocacia administrativa uma geral e duas especiais punindo pela mesma conduta com sanções absolutamente distintas a despeito de tratarse do mesmo bem jurídico tutelado ignorando princípios básicos como os da proporcionalidade e da humanidade da pena criminal 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração Pública especialmente sua moralidade e probidade administrativa Protegese na verdade a probidade de função pública sua respeitabilidade bem como a integridade de seus funcionários Como destaca Damásio de Jesus Direito Penal v 2 p 181 a lei penal protege o regular funcionamento da administração governamental tutelandoa da conduta irregular de seus componentes que em razão do cargo procuram defender interesses alheios ao Estado de particulares lícitos ou ilícitos Com efeito ao funcionário público no exercício da função não é permitido agir para a satisfação de interesse privado próprio ou de terceiro 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo somente pode ser o funcionário público crime próprio que pode agir no entanto por interposta pessoa indiretamente Afora esse aspecto admitese a possibilidade do concurso eventual de pessoas Sujeito passivo é o Estado União Estados Distrito Federal e Municípios particularmente em relação à moralidade e probidade administrativa Embora não se trate de crime de resultado se houver prejuízo a terceiro este também poderá figurar como sujeito passivo secundário 4 Tipo objetivo adequação típica A ação incriminada consiste em patrocinar advogar proteger defender direta ou indiretamente interesse privado de particular perante a Administração Pública valendose da qualidade de funcionário isto é aproveitandose da facilidade de acesso junto a seus colegas e da camaradagem consideração ou influência de que goza entre estes Com o prestígio que tem no interior das repartições públicas e a facilidade de acesso às informações ou troca de favores a interferência de um funcionário público patrocinando interesse privado de alguém retira a imparcialidade e a isenção que a Administração Pública deve manter na administração de interesse público O que se reprime efetivamente é o patrocínio de interesse privado que pode inclusive chocarse com os próprios interesses da Administração especialmente na forma qualificada em que o interesse é ilegítimo 41 Objeto material interesse privado O objeto material da proteção penal é o interesse privado perante a Administração Pública independentemente de ser ou não legítimo apenas a sua ilegitimidade qualifica o crime O nomen juris advocacia administrativa talvez não seja o mais adequado pois a priori dá uma ideia de que a ação seja privativa de advogado o que não corresponde à realidade pois o verbo nuclear utilizado patrocinar deixa claro que seu significado é defender proteger postular que teoricamente pode ser cometido por qualquer pessoa No entanto nesse caso tratase de crime funcional exigindo consequentemente que o sujeito ativo ostente a condição especial de funcionário público Pelo menos o Anteprojeto da Reforma Penal mudou o nomen juris dessa figura penal para patrocínio indevido eliminando dessa forma os inconvenientes que acabamos de apontar Interesse privado por sua vez é qualquer finalidade meta ou objetivo a ser alcançado pelo particular perante a Administração Pública patrocinado pelo funcionário É irrelevante a legitimidade ou ilegitimidade do interesse patrocinado embora a ilegitimidade tenha o condão de qualificar o crime Lesa diretamente o interesse da Administração porque sua finalidade é ter a condição de decidir sem a interferência exterior de quem quer que seja especialmente de um particular 42 Patrocínio direto ou indireto O patrocínio pode ser direto sem interposta pessoa ou indireto quando se utiliza de terceiro Pode ser ainda formal e explícito petições requerimentos etc ou dissimulado seja acompanhando o andamento de processos seja tomando conhecimento das decisões adotadas etc Em qualquer das hipóteses presumese que o agente aja aproveitandose das facilidades que sua condição de funcionário público lhe proporciona Nesse sentido já pontificava Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 384 o patrocínio pode ser exercido direta ou indiretamente isto é pelo próprio funcionário ou servindo êste sic como intermediário de alguém que se sabe agir à sombra do seu prestígio ex um seu filho e que será copartícipe do crime Ademais no patrocínio não se exige a contrapartida de vantagem econômica ou de qualquer outra natureza pode ser usado por exemplo para satisfazer interesse pessoal prestar um favor a alguém etc A motivação da conduta enfim é irrelevante para a caracterização do crime Para a caracterização do crime é insuficiente a simples informação dos interesses postulados precisam ser defendidos 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de patrocinar interesse privado perante a Administração Pública É desnecessário que o agente vise vantagem pessoal ou aja por interesse ou sentimento pessoal Na figura qualificada o sujeito ativo deve ter conhecimento da ilegitimidade do interesse que patrocina Não há previsão de modalidade culposa como a imensa maioria quase totalidade dos crimes contra a Administração Pública 6 Consumação e tentativa Consumase o crime de advocacia administrativa com a realização do primeiro ato que caracterize o patrocínio ou seja com a prática de um ato inequívoco de patrocinar interesse privado perante a Administração Pública sendo irrelevante o sucesso ou insucesso do patrocínio Não é necessário que o funcionário público atue como verdadeiro patrono do indivíduo A tentativa é admissível embora de difícil ocorrência É interessante o exemplo sugerido por Damásio de Jesus do funcionário público que é surpreendido no momento em que vai apresentar uma petição à autoridade sendo impedido de levála a seu conhecimento por circunstâncias alheias à sua vontade 7 Forma qualificada Há a figura qualificada que fundamenta a elevação da pena para três meses a um ano de detenção quando o patrocínio destinarse a interesse ilegítimo parágrafo único A ilegitimidade do interesse a que se refere a norma penal é relacionada àquele contrário ao direito tratandose por conseguinte de elemento normativo do tipo penal Patrocinar perante a Administração Pública interesse privado já é por si só desvalioso sendo porém ilegítimo esse interesse certamente o desvalor dessa ação será consideravelmente superior justificando na ótica do legislador a configuração qualificada da infração penal com a consequente majoração da sanção penal correspondente Essa qualificadora deixa claro que para caracterizar o crime de advocacia administrativa não é necessário que o interesse privado patrocinado seja ilegítimo a ilegitimidade na verdade apenas aumenta o desvalor da ação e se sobrevier também o maior desvalor do resultado justificando sua maior punição Para a incidência da forma qualificada é mister que o agente tenha conhecimento do caráter de ilegitimidade que reveste o interesse privado por ele pleiteado 8 Causa de aumento de pena O art 327 2º do CP prevê ainda a majoração especial um terço quando os autores do crime forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta sociedade de economia mista empresa pública ou fundação instituída pelo poder público 9 Questões especiais derrogação O art 321 ora comentado foi derrogado pelo art 91 da Lei n 866693 Lei de Licitações dada sua especificidade Dessa forma quando se trata de patrocínio direto ou indireto do interesse privado perante a Administração Pública no que se refere à licitação será aplicável o presente e referido art 91 e não mais o art 321 do estatuto penal Paulo José da Costa Jr Direito Penal das licitações comentários aos artigos 89 a 99 da Lei 8666 de 2161993 São Paulo Saraiva 1994 p 24 É possível o concurso formal do delito de advocacia administrativa com os arts 316 317 e 333 do CP Admitese a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada inferior a um ano Vide os arts 91 da Lei n 866693 Lei de Licitações 3º III da Lei n 813790 crimes contra a ordem tributária econômica e contra as relações de consumo e 89 da Lei n 909995 Juizados Especiais 10 Pena e ação penal As penas cominadas alternativamente são de detenção de um a três meses ou multa para a figura simples Para a figura qualificada a cominação é cumulativa detenção de três meses a um ano e multa A ação penal é pública incondicionada sendo desnecessária qualquer manifestação do ofendido ou seu representante legal J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Extraise dos autos que o membro do Ministério Público agiu dentro do seu dever legal para proteger o patrimônio público não particular ausente o crime de advocacia administrativa STJ AgRg na APn 305DF Rel Min Carlos Alberto Menezes Direito j 1652007 Violência arbitrária Art 322 Praticar violência no exercício de função ou a pretexto de exercêla Pena detenção de 6 seis meses a 3 três anos além da pena correspondente à violência D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias 11 Entendimento do Supremo Tribunal Federal O Supremo Tribunal Federal vinha entendendo que o art 3º i da Lei n 489895 descrevendo o abuso de autoridade como atentado à incolumidade física do indivíduo não revogou o crime de violência arbitrária definido no art 322 do CP Argumentava a Suprema Corte que na legislação brasileira os crimes de violência arbitrária não se confundem com o crime de abuso de poder O crime de abuso de poder descrito no art 350 do CP integra o capítulo dos crimes contra a Administração da Justiça o art 322 que descreve a violência arbitrária encontrase no capítulo que descreve os crimes praticados por funcionário público contra a Administração Pública em geral sendo que a violência deve ser praticada no exercício da função ou a pretexto de exercêla Esse dispositivo pune cumulativamente a violência praticada que pode ir de vias de fato a homicídio Logo não pode ter sido absorvido pelo crime de abuso de autoridade Lei 489865 cuja pena privativa de liberdade é de dez dias a seis meses de detenção Nesse sentido sustentava o Supremo Tribunal Federal que a Lei n 489865 não revogou expressamente o art 322 do CP tampouco com ele é incompatível nem regulou exaustivamente a matéria Ademais a Lei n 489865 é omissa quanto à cumulação da punição correspondente à violência que via de regra é punível com maior severidade que o abuso de autoridade 12 Entendimento do TACRIMSP Para o entendimento contrário capitaneado pelo Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo extinto a Lei n 489865 regulou integralmente a matéria de abuso de poder na qual se inclui a violência arbitrária O art 322 teria sido objeto de inúmeras críticas e sugestões e a edição da Lei n 489865 teria atendido justamente a essa demanda Ademais a nova previsão era mais elástica permitindo melhor adequação na dosagem da pena além da dúvida sobre a lei anterior abranger a violência física e moral Estamos com Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 415 e a corrente minoritária retificando nosso entendimento anterior pois acreditamos que a finalidade da Lei n 489865 foi outra conforme demonstraremos quando tratarmos do crime de abuso de poder descrito no art 350 do CP 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração Pública especialmente no que diz respeito a sua moralidade e probidade administrativa Protegese na verdade a probidade de função pública sua respeitabilidade bem como a integridade de seus funcionários Protegese ademais outro bem jurídico qual seja a incolumidade e integridade física e a própria liberdade do indivíduo 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo somente pode ser o funcionário público tratandose por conseguinte de crime próprio no caso crime funcional Sujeito passivo é o Estado União Estadosmembros Distrito Federal e Municípios bem como aquele que sofre a violência arbitrária que na linguagem universal da doutrina seria sujeito passivo secundário 4 Tipo objetivo adequação típica O núcleo do tipo é o verbo praticar exercer cometer violência entendida esta somente como a vis corporalis abrangendo vias de fato lesão corporal ou homicídio É preciso que a conduta seja realizada pelo agente no exercício de sua função ou a pretexto de exercêla O emprego da violência deve ser arbitrário desprovido pois de legitimidade A violência quando autorizada pela lei e é exercida no estrito limite de sua necessidade evidentemente não constitui crime Constatase que a violência além de integrar como elementar a descrição típica do crime funcional é punida autonomamente quando constitui crime em si mesma As vias de fato não são destacadas para punição autônoma porque contravenções segundo a regra geral são absorvidas pelo crime que integram Violência à pessoa consiste no emprego de força contra o corpo da vítima Para caracterizála é suficiente que ocorra lesão corporal leve ou simples vias de fato O termo violência empregado no texto legal significa força física material a vis corporalis A violência pode ser produzida pela própria energia corporal do agente que no entanto poderá preferir utilizar outros meios como fogo água energia elétrica choque gases etc Como dizia Garraud citado por Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 3845 sob essa expressão genérica a lei abrange tôdas sic as violências desde as mais graves como o homicídio e as lesões corporais até as mais leves como as vias de fato entendendose por esta última expressão os maustratos que não consistam em espancar ou ferir como por exemplo o fato de empurrar uma pessoa de puxála pelos cabelos ou pelas vestes de escarrarlhe no rosto de arremessarlhe um objeto para molestála embora sem derrame de sangue ou sujála de amarrála de lhe arrebatar brutalmente algum objeto de vendála de amordaçála 41 Violência praticada no exercício da função ou a pretexto de exercêla É indispensável que a violência vis corporalis ou vis compulsiva seja praticada no exercício da função ou a pretexto de exercêla isto é com a desculpa real ou fictícia de exercêla Em outros termos usase da violência como se esta fosse necessária ou indispensável para poder exercer adequadamente a dita função pública Ademais o uso da violência deve ser arbitrário ou seja deve ser injustificada ilegítima desnecessária para o pretendido exercício funcional oportunamente será valorada pelo julgador Para caracterizar a violência arbitrária é necessário que o sujeito ativo esteja no exercício da função ou a utilize a pretexto de tal exercício O exercício da função deve ser a causa e não a simples oportunidade para o uso da violência Assim por exemplo se o fiscal sanitário aproveita sua presença na casa de seu desafeto para agredilo responderá apenas por lesões corporais ou vias de fato e não também pelo crime funcional de violência arbitrária Em qualquer caso não haverá o crime em exame se a violência não estiver diretamente relacionada à função do agente Ausente essa vinculação funcional haverá apenas o crime a que corresponder a violência 42 Violência arbitrária crime de policiais Violência arbitrária diziase no passado é crime específico de policiais Não raro esses agentes para obter a confissão de determinado crime ou forçar o fornecimento de provas de autoincriminação submetiam os suspeitos frequentemente a processos que chegavam a lembrar os da tortura medieval No presente a violência arbitrária pode estar começando a ser também podese dizer crime específico de membros do Ministério Público que não raro estão fazendo o papel de polícia inclusive arbitrária invadindo domicílios escritórios de advocacia prendendo e interrogando suspeitos até mesmo na calada da noite conforme tem denunciado a grande mídia Condenando esse tipo de abuso policial invocamos o magistério de Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 38990 não é apenas no Brasil que a polícia usa métodos de brutalidade O mal existe desgraçadamente em quase todo o mundo À exceção talvez da Inglaterra Bélgica e países escandinavos em tôda sic parte os policiais costumam atribuirse à margem da lei a faculdade de exercer violência contra os indivíduos que eles conseguem ter temporàriamente sic à sua mercê para investigações A consciência policial entrou em crise aguda Notadamente depois que se inventou por iniciativa dos Estados totalitários a chamada polícia política segundo os moldes mais ou menos atenuados da famosa Gestapo As causas dêsse sic mal são múltiplas a improvisação dos policiais a ausência de critérios de seleção no seu recrutamento o desestímulo ao dever pela má remuneração a incapacidade dos atuais funcionários para assimilação dos métodos da polícia técnica ou científica e acima de tudo o espírito de prepotência arbitrária e crueldade que surge nos homens de educação inferior quando investidos de autoridade O policial truculento é o proverbial vilão com a vara na mão 43 Violência arbitrária em concurso com violência O preceito sancionador determina a aplicação de seis meses a três anos de detenção além da pena correspondente à violência Em primeiro lugar convém destacar que a violência constitui em si mesma elementar típica do crime de violência arbitrária logo o cúmulo material de penas mencionado em dito preceito não pode estar referindose a todo e qualquer tipo de violência sob pena de incorrer em bis in idem Este crime violência arbitrária praticado com o emprego de violência que constitua em si mesma crime configura certamente concurso de crimes No entanto não se trata de concurso material como reiteradamente tem repetido a doutrina nacional quando analisa os crimes contra a vida e contra o patrimônio Em momento algum o texto legal sugere que se trata de concurso material não passando de equivocada interpretação doutrinária Não se pode esquecer por outro lado que o que caracteriza o concurso material de crimes não é a pluralidade de infrações como ocorreria na hipótese em exame mas sim a pluralidade de condutas que em princípio não ocorre na ação única de praticar violência no exercício da função pois se confundem na integração desse tipo penal 5 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo é composto pelo dolo consistente na vontade consciente de praticar violência no exercício de função ou a pretexto de exercêla Alguns autores sustentam ainda a necessidade do elemento subjetivo especial do injusto consistente na intenção de abusar de sua autoridade Destacava no entanto Magalhães Noronha os motivos são indiferentes ódio vingança amor cobiça ou pura arbitrariedade somente deverão ser valorados na dosimetria penal 6 Consumação e tentativa Consumase o crime de violência arbitrária com a efetiva prática da violência desde que no exercício da função pública ou a pretexto de exercêla Como a violência é elemento integrante do tipo o crime consumase com a prática desta em qualquer de suas modalidades analisadas ao longo deste capítulo A tentativa é teoricamente admissível embora por vezes seja de difícil configuração quando por exemplo a violência consistir em vias de fato Possível como dissemos é difícil no entanto poderá ser vez por outra a sua comprovação 7 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é a de detenção de seis meses a três anos além da pena correspondente à violência se houver Admite se a suspensão condicional do processo em razão de a pena mínima abstratamente cominada não ser superior a um ano A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Art 322 do Código Penal Crime de violência arbitrária Eventual revogação pela Lei n 489865 Inocorrência Precedentes do STF O crime de violência arbitrária não foi revogado pelo disposto no art 3º alínea i da Lei de Abuso de Autoridade Precedentes da Suprema Corte STJ HC 48083MG Rel Min Laurita Vaz j 2011 2007 Abandono de função Art 323 Abandonar cargo público fora dos casos permitidos em lei Pena detenção de 15 quinze dias a 1 um mês ou multa 1º Se do fato resulta prejuízo público Pena detenção de 3 três meses a 1 um ano e multa 2º Se o fato ocorre em lugar compreendido na faixa de fronteira Pena detenção de 1 um a 3 três anos e multa D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O Código Criminal de 1830 imperial já disciplinava o crime de abandono de função nos seguintes termos largar ainda que temporariamente o exercício do emprego sem prévia licença de legítimo superior ou exceder o tempo de licença concedida sem motivo urgente e participado Penas o grau máximo três anos de suspensão do emprego e multa correspondente à metade do tempo No grau médio dois anos e multa correspondente à metade do tempo No grau mínimo um ano e multa correspondente à metade do tempo art 157 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração Pública especialmente sua moralidade e probidade administrativa Protegese na verdade a probidade de função pública sua respeitabilidade bem como a integridade de seus funcionários 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo somente pode ser o funcionário público desde que investido em cargo público que abandona as suas funções Sujeito passivo é o Estado União Estadosmembros Distrito Federal e Municípios 4 Tipo objetivo adequação típica A conduta nuclear do tipo está representada pelo verbo abandonar que significa deixar o serviço público afastarse dele ainda que não definitivamente largar intencionalmente o cargo que ocupa na Administração Pública ou seja o agente afastase totalmente do cargo por ele ocupado fora dos casos permitidos em lei elemento normativo do tipo É procedente e bemhumorada a crítica de Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 287 ao elemento normativo do abandono para tipificar o crime fora dos casos permitidos em lei questionando Seria necessário dizêlo Haverá abandono permitido em lei A rigor a menção era desnecessária Fêla entretanto a lei para ressaltar o elemento relativo à antijuridicidade Assim se comporta a lei quando quer salientar o elemento da ilicitude ou antijuridicidade 41 Abandono sem afastamento do cargo Há entendimento de que o abandono do cargo público pode ocorrer sem que o funcionário se afaste da repartição pública sendo suficiente que se abstenha de seu ofício Em sentido contrário posicionase no entanto Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 285 entendendo que o abandono do cargo para configurar crime deve ser total exemplificando Se o funcionário v g não se apresenta em determinado lugar para exercer naquele dia atividade peculiar mas indebitamente permanece na repartição não há abandono de cargo que é o que a lei diz Ficará naturalmente sujeito a sanções disciplinares Ademais nem toda ausência constitui abandono de função pública É necessário que tenha decorrido tempo suficientemente razoável para caracterizar seu descaso ou seu ânimo de afastarse do cargo que geraria a probabilidade de prejuízo tipificador da violação do interesse protegido ainda que nenhum dano concreto tenha produzido Em outros termos afastamento de funcionário que não crie esse perigo não é abandono assumindo no máximo a condição de falta administrativa 42 Abandono temporário de função pública A lei admite o abandono temporário da função pública como diz o texto legal nos casos previstos em lei Em outros termos o tipo penal permite que o funcionário afastese do cargo licitamente como por exemplo em licença para tratamento da saúde em gozo de férias em licença para tratar de assuntos particulares em licença para estudos de aperfeiçoamento com ou sem remuneração etc mas isso convenhamos não tem o sentido de abandono deixar ao desamparo representando no máximo ausência ou afastamento autorizado que tem sentido completamente diferente de abandonar Contudo o abandono pode ser justificado embora o texto legal não faça a ressalva com a elementar sem justa causa pela presença das excludentes tradicionais Quando por exemplo o abandono for causado por motivo de força maior ou estado de necessidade evidentemente nessas hipóteses não haverá crime Cessados contudo a força maior ou o estado de necessidade e continuando ausente o funcionário público caracterizarseá o abandono criminoso da função 43 Desnecessidade da ocorrência de prejuízo Para a configuração do abandono de função pública a lei penal brasileira não exige a ocorrência de prejuízo ao contrário do que prevê o Código Penal argentino art 252 como destacava Soler Derecho Penal argentino p 147 o delito requer a existência de dano ao serviço público Para o Código Penal brasileiro com efeito é suficiente que o abandono crie a possibilidade de prejuízo público ou particular crime de perigo portanto A produção efetiva de prejuízo público como veremos adiante é condição de maior reprovabilidade do abandono qualificando a figura típica A eventual produção de prejuízo particular por falta de previsão legal não qualifica a infração penal embora deva ser considerada in concreto na dosagem de pena consequência do crime art 59 44 Acefalia do cargo necessidade O abandono de função ou de cargo público não se confunde com o abandono de emprego disciplinado na Consolidação das Leis do Trabalho e no próprio Estatuto dos Funcionários Públicos Civis arts 132 II e 138 da Lei n 811290 O crime de abandono de função art 323 do CP para caracterizarse segundo Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 388 pressupõe necessariamente a consequente acefalia do cargo isto é a inexistência ou ocasional ausência de substituto legal do desertor O abandono de emprego por sua vez caracterizase pela ausência do serviço sem justa causa por mais de trinta dias consecutivos Esse abandono do emprego por mais de trinta dias consecutivos uma condição objetiva se tiver uma causa justa força maior estado de necessidade etc afasta a sua ilicitude descaracterizando a falta grave que poderia levar à demissão por justa causa Sem a acefalia do cargo público isto é havendo substituto o eventual abandono por parte do funcionário público não constitui o crime em exame embora possa caracterizar falta disciplinar pela previsão do Estatuto do Servidor Público 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de abandonar o cargo não sendo exigido qualquer fim especial do injusto É irrelevante a ausência de animus do abandono definitivo do cargo sendo suficiente portanto o conhecimento da sua natureza e do seu conteúdo que todo funcionário deve ter Não há igualmente previsão de modalidade culposa 6 Consumação e tentativa Consumase o crime com o efetivo abandono do cargo público por período de tempo juridicamente relevante de forma a criar probabilidade de dano à Administração Pública A tentativa é de difícil ocorrência embora excepcionalmente até possa admitila residindo a maior dificuldade na comprovação daquela Lúcido nesse sentido o magistério de Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 288 Não é possível a tentativa ou o abandono não se acha caracterizado podendo a qualquer momento o funcionário retornar a seu cargo sujeito apenas a sanções disciplinares ou já se manifestou e com ele houve a consumação 7 Formas qualificadas prejuízo público e faixa de fronteira Ao contrário do que refere equivocadamente Nélson Hungria as prescrições contidas nos 1º e 2º não caracterizam simples majorantes ou meras causas de aumentos mas tipificam como já demonstramos na melhor técnica dogmática figuras qualificadas por apresentarem novos limites mínimo e máximo das sanções correspondentes próprios das figuras derivadas de infrações penais Prescrevem com efeito os mencionados parágrafos novos limites qualitativos e quantitativos de penas caso o abandono efetivamente acarrete prejuízo público 1º ou o fato se verifique em lugar compreendido na faixa da fronteira O prejuízo nesse tipo penal representaria em tese o simples exaurimento do crime pois se trata de crime formal de notar que como destacamos no início deste capítulo contrariamente aos códigos italiano e argentino o prejuízo público decorrente do abandono não consta do caput como elementar do crime No entanto sua efetiva ocorrência foi transformada pelo legislador brasileiro em fundamento de maior reprovação penal ao eleválo à condição de figura qualificada O prejuízo público 1º enfim que pode ser contra o interesse público ou coletivo não precisa ser necessariamente patrimonial podendo ser de qualquer natureza desde que signifique de algum modo algum dano ao serviço público e indiretamente à coletividade como por exemplo a paralisação de algum serviço público não recolhimento do lixo não recolhimento de impostos etc 71 O prejuízo não pode ser representado pelo próprio abandono Devese registrar apenas que o prejuízo qualificador do abandono não pode ser aquele próprio e inerente ao abandono mas outro além deste sob pena de todo e qualquer abandono restar sempre qualificado e certamente não é esse o sentido da lei caso contrário o prejuízo deveria constar como elementar do tipo e não simplesmente como uma qualificadora contida no tipo derivado Em outros termos o prejuízo qualificador do abandono deve consistir em um dano diverso daquele inerente à violação do dever funcional do cargo abandonado 72 Abandono em local de fronteira A segunda qualificadora a ocorrência do abandono em lugar abrangido por faixa de fronteira de acordo com a Lei n 663479 é aquela situada dentro de cento e cinquenta quilômetros ao longo das fronteiras nacionais como aliás já estabelecia a Constituição Federal de 1937 Justificase essa qualificadora pela importância estratégica que a Administração Pública ocupa nesses locais especialmente no caso brasileiro onde longos trechos das fronteiras com países limítrofes ocorrem por linhas secas A eventual deserção ou abandono do funcionário pode inclusive colocar em risco a própria segurança nacional Prevê ainda a lei penal aquela forma qualificada especial do art 327 2º quando o funcionário for ocupante de cargo em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta sociedade de economia mista empresa pública ou fundação instituída pelo Poder Público 8 Pedido de aposentadoria ou demissão Se o afastamento por óbvio for precedido do pedido de demissão devidamente concedida não caracteriza abandono consequentemente não tipifica a conduta descrita nesse tipo penal Se o funcionário público entretanto entrou com o pedido de aposentadoria ou demissão deverá esperar o deferimento deste caso contrário poderá responder pelo delito do art 323 do CP Não deixa de abandonar o cargo o funcionário que dele se afasta por haver pedido demissão Na realidade deve aguardar que ela seja deferida para só então poder afastarse embora não esteja explícito em nosso Código Penal ao contrário da previsão constante do Código Penal argentino No entanto após a concessão da demissão solicitada não haverá crime mesmo que não exista substituto não tenha sido nomeado outro funcionário ou este ainda não tenha entrado em exercício etc Com a demissão desaparecem inegavelmente os deveres funcionais do demitido para com a Administração Pública Se esta não providenciou o preenchimento imediato do cargo vago a responsabilidade é sua e não do funcionário demitido que não mais integra o corpo funcional 9 Pena e ação penal As penas cominadas alternativamente para o caput são de detenção de quinze dias a um mês ou multa No 1º as penas cumulativamente são de detenção de um a três anos e multa e finalmente para o 2º também cumulativamente de um a três anos de detenção e multa A ação penal é pública incondicionada Exercício funcional ilegalmente antecipado ou prolongado Art 324 Entrar no exercício de função pública antes de satisfeitas as exigências legais ou continuar a exercêla sem autorização depois de saber oficialmente que foi exonerado removido substituído ou suspenso Pena detenção de 15 quinze dias a 1 um mês ou multa D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O Código Criminal de 1830 preferiu seguir a orientação francesa criminalizou a antecipação do exercício funcional art 138 e o seu prolongamento indevido art 140 separadamente Essa técnica foi mantida no nosso primeiro Código Penal republicano 1889 a indevida antecipação do exercício funcional art 225 e o seu prolongamento indevido art 227 Finalmente o nosso Código Penal de 1940 por influência do Código Penal Rocco preferiu disciplinar as duas condutas delitivas num único dispositivo art 324 que será a seguir examinado 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração Pública especialmente sua moralidade e probidade administrativa Protegese na verdade a probidade de função pública sua respeitabilidade bem como a integridade de seus funcionários A atuação funcional do agente público pressupõe por isso mesmo a legitimidade de sua investidura no cargo e na função sendo portanto incompatível tanto com sua antecipação quanto com sua permanência indevida Em síntese esse dispositivo legal tutela o funcionamento regular e normal da administração pública proibindo o exercício ilícito e abusivo da função no interesse da eficiência da atividade prestada à coletividade 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo somente pode ser o funcionário público nomeado antes porém de ter tomado posse por falta de cumprimento de formalidades legais na primeira modalidade de conduta antecipação do exercício na segunda modalidade permanência indevida na função já afastado por exoneração remoção substituição ou suspensão De todas essas hipóteses no entanto somente na segunda exoneração estarseá diante de exfuncionário visto que nos demais casos o afastamento ou é temporário suspensão ou é relativo Sujeito passivo é o Estado União Estadosmembros Distrito Federal e Municípios além dos órgãos públicos relacionados no 1º do art 327 4 Tipo objetivo adequação típica O exercício funcional ilegalmente antecipado ou prolongado consiste na antecipação do exercício da função antes de satisfazer às exigências legais ou em continuar a exercêla sem autorização mesmo sabendo oficialmente que foi exonerado removido substituído ou suspenso São duas as condutas incriminadas a entrar no exercício da função pública antes de satisfeitas as exigências legais elemento normativo do tipo é norma penal em branco complementada por exemplo pelo Estatuto dos Funcionários Públicos Civis da União b continuar a exercêla a função pública sem autorização elemento normativo do tipo depois de saber oficialmente que foi exonerado removido substituído ou suspenso Na primeira proíbese o início irregular da função na segunda o exercício prolongado sem autorização quando tem conhecimento oficial de que já se encontra legalmente impedido de exercêla Em síntese pretendendo tutelar o funcionamento regular e normal da Administração Pública o tipo penal proíbe o exercício ilícito e abusivo da função no interesse da eficiência da atividade prestada à coletividade A primeira conduta entrar no exercício de função pública exige que o funcionário tenha consciência de quais exigências são necessárias para seu ingresso nessa função mesmo que o tipo penal não o diga expressamente como faz por exemplo quando descreve a segunda conduta que exige o conhecimento oficial A necessidade dessa consciência integra o próprio dolo sob pena de em desconhecendoas incorrer em erro de tipo que afasta o dolo e por extensão a própria tipicidade As exigências legais para o ingresso na função pública são previstas em legislação específica constituindo norma penal em branco que completa a norma proibitiva A segunda conduta criminalizada é o prosseguimento sem autorização do exercício da função quando não mais pode fazêlo por ter sido exonerado removido substituído ou suspenso Nessas hipóteses exige o texto legal que o funcionário tenha conhecimento oficial do impedimento e ainda assim prossiga no exercício da função É indispensável pois a comunicação oficial e pessoal ao funcionário sendo inadmissível a presunção de dito conhecimento por ter sido publicado no Diário Oficial por exemplo A exigência do comunicado oficial tem dois fundamentos básicos primeiro impede a injustiça da presunção do conhecimento segundo evita perseguições pessoais ideológicas ou políticas além de não permitir a alegação falaciosa do funcionário de que desconhecia a existência do ato impugnativo E ainda para que o prolongamento na função ocorra de forma ilegítima A elementar sem autorização deixa claro que a despeito dos aspectos determinantes do afastamento do funcionário de sua função pode este excepcionalmente receber autorização especial para nela prosseguir Assim havendo autorização restará afastada sua tipicidade e não apenas a antijuridicidade considerando que desaparece um elemento normativo do tipo penal 41 Entrar no exercício de função e continuar a exercêla Entrar no exercício de função pública e continuar a exercêla indicam dois momentos distintos de uma mesma atividade entrar no exercício significa começar a realizar determinada atividade no caso pública e continuar a exercêla significa prosseguir realizandoa nas hipóteses com os impedimentos legalmente existentes Entrar no exercício tradicionalmente indicaria crime habitual embora entrar no exercício seja distinto de exercer a primeira locução indicaria instantaneidade e a segunda habitualidade No entanto a habitualidade é definitivamente afastada pelo fato de que a prática de um único ato já caracteriza o exercício de atividade funcional ou mesmo do seu prosseguimento Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 291 advertia que em se tratando de aposentadoria compulsória é ela automática o funcionário passa à inatividade imediatamente ainda que não tenha sido expedido o respectivo decreto É o que dispõe o art 187 da Lei n 1711 Logo completados os setenta anos de idade deve o funcionário afastarse do exercício do cargo independentemente do respectivo decreto sob pena de incorrer na disposição em apreço Temos dificuldade em aceitar essa orientação que era sustentada por Magalhães Noronha uma vez que o Código referese à exoneração remoção substituição ou suspensão poderia ter acrescido a aposentadoria mas não o fez certamente não poderá fazêlo o intérprete pois estaria violando o princípio da tipicidade estrita criminalizando conduta não contida na lei Venia concessa essa omissão do legislador não pode ser suprida com interpretação extensiva que seria na verdade uma autêntica adoção de analogia in malam partem vedada em norma penal repressiva 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade de exercer a função pública mesmo irregularmente tanto antecipadamente como nela prosseguir indevidamente É necessário que o funcionário tenha conhecimento da irregularidade Não basta por conseguinte o dolo eventual ou a simples culpa Não há exigência de qualquer elemento subjetivo especial do injusto e tampouco é admitida a modalidade culposa 6 Consumação e tentativa Consumase o crime com a prática ilegalmente antecipada ou prolongada de um ato de ofício uma vez que por si só já representará exercício da função pública O mesmo ocorre com a prática de qualquer ato de ofício sem autorização após saber oficialmente que se encontra impedido por qualquer das medidas mencionadas no caput Tratandose de crime comissivo exige a prática efetiva pelo agente de algum ato oficial que não se configura pela simples omissão embora seja desnecessária a ocorrência de dano efetivo para a Administração Pública Admitese ao contrário do abandono de cargo descrito no artigo anterior a tentativa por tratarse de crime plurissubsistente 7 Pena e ação penal As penas cominadas alternativamente são de detenção de quinze dias a um mês ou multa Tratandose de infração de menor potencial ofensivo devese necessariamente oportunizar a transação penal A ação penal é pública incondicionada Violação de sigilo funcional Art 325 Revelar fato de que tem ciência em razão do cargo e que deva permanecer em segredo ou facilitarlhe a revelação Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos ou multa se o fato não constitui crime mais grave 1º Nas mesmas penas deste artigo incorre quem I permite ou facilita mediante atribuição fornecimento e empréstimo de senha ou qualquer outra forma o acesso de pessoas não autorizadas a sistemas de informações ou banco de dados da Administração Pública II se utiliza indevidamente do acesso restrito 2º Se da ação ou omissão resulta dano à Administração Pública ou a outrem Pena reclusão de 2 dois a 6 seis anos e multa 1º e 2º acrescentados pela Lei n 9983 de 14 de julho de 2000 D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O nosso primeiro Código Penal republicano na expressão de Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 289 colocouse em plano inferior ao incluir o delito na fórmula genérica do art 192 revelar qualquer pessoa o segredo de que tiver notícia ou conhecimento em razão de ofício emprego ou profissão Destacando seu paradoxo Galdino Siqueira endereçoulhe as procedentes críticas afirmando que englobou na mesma categoria não só a violação do sigilo profissional como a do sigilo dos negócios do Estado cuja repressão tem outro fundamento o interesse não individual mas geral O atual Código Penal 1940 retomou o caminho anterior disciplinando distintamente a violação do segredo profissional art 154 e a violação do sigilo funcional art 325 reconhecendo a necessidade de proteger o sigilo de determinados atos praticados pela Administração Pública que merecem não raro maior reprovação social embora o tenha expressamente considerado um tipo penal subsidiário 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração Pública sua moralidade e probidade administrativa Protegese na verdade a probidade de função pública sua respeitabilidade bem como a integridade de seus funcionários mas particularmente neste dispositivo legal a fidelidade do funcionário público com os misteres da liturgia do cargo que exerce acrescida é verdade da relevantíssima circunstância de o segredo do fato que deve ser mantido chegar ao conhecimento do sujeito ativo em razão de cargo público Convém registrar no entanto que esse dispositivo incrimina somente a divulgação de segredo relativo ao exercício de função pública em razão de cargo público visto que o sigilo relacionado à atividade privada é protegido pelos arts 153 e 154 ambos do CP 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo somente pode ser quem tem ciência de segredo em razão de cargo público Tratase de uma modalidade muito peculiar de crime próprio uma vez que a condição especial não se encontra no sujeito ativo propriamente funcionário público mas na natureza da atividade ou função em razão da qual tem a possibilidade de ter ciência do sigilo funcional Enfim embora não diga expressamente o texto do artigo em exame sujeito ativo somente pode ser funcionário público ainda que o seja transitoriamente como autoriza o art 327 caput pois apenas nessa condição pode ter ciência do segredo funcional em razão do cargo Convém destacar que sujeito passivo não se confunde com prejudicado embora de regra coincidam na mesma pessoa as condições de sujeito passivo e prejudicado podem recair no entanto em sujeitos distintos sujeito é o titular do bem jurídico protegido e nesse caso o lesado prejudicado é qualquer pessoa que em razão do fato delituoso sofre prejuízo ou dano material ou moral Essa distinção não é uma questão meramente acadêmica despicienda de interesse prático como pode parecer à primeira vista Na verdade o sujeito passivo além do direito de representar contra o sujeito ativo pode habilitarse como assistente do Ministério Público no processo criminal art 268 do CPP e ainda tem o direito à reparação ex delicto ao passo que ao prejudicado resta somente a possibilidade de buscar a reparação do dano na esfera cível 4 Tipo objetivo adequação típica A conduta tipificada revelar significa contar a alguém fato de que tem ciência em razão do cargo e que deva permanecer em segredo ou facilitarlhe a revelação é tornar possível ou acessível seu conhecimento sendo duas portanto as condutas previstas a revelar desvelar declarar divulgar fato de que o sujeito ativo tem conhecimento em razão do cargo segredo de ofício e que deva permanecer em segredo Revelar tem uma abrangência mais restrita do que divulgar que implica um número indeterminado de pessoas ao passo que para revelar é suficiente que conte ou declare a alguém b facilitar pôr à disposição facultar a revelação o funcionário propicia dolosamente a descoberta Essa matriz típica objetiva a proteção do sigilo funcional específico próprio e típico da função pública para manter secretos ou sigilosos fatos relevantes inerentes à função pública punindo a violação do sigilo de fatos que se tem conhecimento no exercício de certos cargos públicos A proteção inclui o segredo oral e não apenas o documental ou seja não importa a forma ou o meio pelo qual o funcionário toma conhecimento do fato ou do segredo por escrito oralmente compulsando documentos etc desde que tal conhecimento tenha ocorrido em razão do cargo público que exerce tampouco é relevante o meio ou forma pela qual faz a revelação desde que ressalta a descrição típica se trate de fato que deva permanecer em segredo É indispensável contudo uma relação causal entre o conhecimento do segredo e a especial qualidade do sujeito ativo em razão de cargo público isto é um nexo causal entre o exercício de cargo ou função pública e o conhecimento do segredo que é exatamente o aspecto revelador da infidelidade funcional do sujeito ativo que a norma penal pretende proteger Em outros termos a ciência do fato deve chegar ao conhecimento do sujeito ativo exatamente em razão do cargo que ocupa Assim se teve ciência do fato por outros meios que não em razão do cargo público a sua divulgação não se adequa à descrição desse tipo penal podendo tipificar outro crime 41 Ausência de notoriedade e dever funcional No entanto não é qualquer fato ou segredo que merece a proteção penal Para que o sigilo de fato justifique a proteção penal é necessário que reúna dois elementos um negativo ausência de notoriedade isto é que não seja de conhecimento público ou daqueles fatos cuja publicidade lhe seja inerente sem violar o direito à privacidade individual outro positivo dever funcional de preserválo cujo sigilo funcional é exigido pela elementar típica que deva permanecer em segredo A ausência dessa exigência regulamentar torna a revelação de fato conhecido em razão do cargo uma conduta atípica podendo eventualmente caracterizar falta funcional punível administrativamente pois fatos praticados no seio da Administração Pública embora seu caráter público exigem da própria Administração que mantenha e assegure a privacidade dos atos praticados com e para a coletividade em geral Na verdade a lei penal ao proteger o sigilo funcional assegura igualmente o interesse da Administração Pública que deve gozar da mais absoluta confiança da população em geral que é identificado como dever de fidelidade Se o segredo violado for particular o agente poderá conforme o caso responder pelos delitos inscritos nos arts 151 153 ou 154 do CP quando por exemplo faltar alguma elementar desse tipo penal Não há sigilo contudo diante do crime Tratase por fim de crime subsidiário expressamente destacado no preceito penal secundário se o fato não constitui crime mais grave 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade livre e consciente de revelar segredo de que tem conhecimento em razão de cargo público tendo consciência de que se trata de fato protegido por sigilo funcional e que o dever funcional lhe impede que o divulgue ou seja com conhecimento de todos os elementos constitutivos da descrição típica É desnecessário contudo que o agente tenha consciência de que a revelação é ilegítima ou seja sem justa causa Não há exigência de nenhum elemento subjetivo especial do injusto nem mesmo a finalidade de obter qualquer vantagem com a revelação que se existir poderá caracterizar outro crime como por exemplo corrupção passiva ou concussão 6 Novas figuras penais acrescentadas pela Lei n 99832000 A Lei n 99832000 incluiu dois parágrafos neste artigo No primeiro incrimina novas condutas atualizando o tipo penal à era informatizada no segundo acrescenta uma figura qualificada quando resultar dano para a Administração Pública 61 Violação do sigilo através do sistema informatizado da Administração Pública Bem jurídico é o mesmo já referido em relação ao caput do art 325 mas sujeito ativo no entanto das novas condutas inseridas pela Lei n 99832000 é somente o funcionário público autorizado a operar o sistema de informações ou banco de dados da Administração Pública As condutas criminalizadas no 1º I são permitir ou facilitar o acesso de pessoas não autorizadas a sistemas de informações ou banco de dados da Administração Pública O funcionário público pratica qualquer das condutas tipificadas fornecendo ou emprestando senha ou qualquer outra forma de acesso a pessoas não autorizadas a sistemas de informações ou bancos de dados da Administração Pública 1º I ou ainda o funcionário se utiliza indevidamente de acesso restrito a informações 1º II Permitir que pode ser em forma omissiva ou comissiva significa admitir consentir ou liberar a realização ou a prática de alguma conduta no caso em apreço o acesso a sistemas de informações ou banco de dados da Administração Pública Facilitar significa afastar obstáculos tornar mais fácil viabilizar meios para acessar sistemas informatizados da Administração Pública meios que o próprio texto penal exemplifica como sendo mediante atribuição fornecimento e empréstimo de senha ou qualquer outra forma expressão com a qual abre a possibilidade da utilização de meios análogos aos relacionados ou seja o legislador autoriza nesses casos a interpretação analógica Em síntese na modalidade permitir o sujeito ativo admite que pessoa não autorizada tenha acesso a sistemas de informações ou banco de dados da Administração Pública fornecendolhe a senha ou código secreto ou prestandolhe outra forma de auxílio ao passo que na modalidade facilitar o próprio funcionário auxilia o extraneus a obter as informações fornecendolhe a senha ou outros meios de acesso Pessoas não autorizadas são aquelas alheias ao sistema e que não têm legitimidade legal regulamentar ou estatutária para ingressar e principalmente ter conhecimento dos sistemas de informações e bancos de dados da Administração Pública 62 Utilização indevida de acesso restrito No inciso II há outra modalidade de acesso ao sistema informatizado da Administração Pública também introduzida pela Lei n 99832000 utilizase indevidamente de acesso restrito Essa conduta típica consiste em o funcionário público utilizarse indevidamente de acesso restrito a sistema de informações ou banco de dados da Administração Pública Esse enunciado do inciso II é incompleto na medida em que omite o complemento relativamente a que acesso se está referindo Em razão do texto do inciso anterior presumese que se refira também ao sistema de informações ou banco de dados da Administração Pública embora o texto legal com uma linguagem vernacular equivocada não o diga expressamente Utilização indevida é o uso não permitido ou por pessoa não autorizada das informações mencionadas para fins diversos dos interesses da Administração Pública violandose o indeclinável dever de fidelidade Indevidamente significa sem autorização sem causa que o justifique constituindo elemento normativo especial do tipo que se existir tornará a conduta atípica e permitida Falase em acesso restrito porque pela própria natureza da função e relevância do sistema a Administração Pública seleciona e limita determinado setor de seus agentes que são capacitados e preparados tecnicamente para ter acesso ao sistema de informações e banco de dados em razão da natureza sigilosa dos dados e informações que compõem o seu sistema de informatização 7 Consumação e tentativa Consumase o crime de violação de sigilo funcional com a revelação do segredo 1ª parte ou com sua facilitação 2ª parte consumase no momento em que o sujeito ativo revela a terceiro fato que teve ciência nas circunstâncias definidas no tipo penal isto é em razão do cargo e que deve ser mantido em segredo consumase enfim com o simples ato de revelar independentemente da ocorrência efetiva de dano pois é suficiente que a revelação tenha potencialidade para produzir a lesão que se ocorrer constituirá o exaurimento do crime e nessa hipótese qualifica a infração penal que tem exagerada elevação de pena dois a seis anos de reclusão e multa Para a tipificação do crime de violação de sigilo funcional é suficiente a revelação a uma só pessoa ao contrário do que ocorre com o crime de divulgação de segredo art 153 por exemplo que necessita ser difundido extensivamente para um número indeterminado de pessoas Em síntese revelar pode ser somente para uma pessoa enquanto divulgar implica naturalmente um número indeterminado delas Revelar é menos que divulgar A tentativa é de difícil configuração mas teoricamente possível especialmente através de meio escrito pois não se trata de crime de ato único e o fato de prever a potencialidade de dano decorrente da conduta de revelar por si só não a torna impossível O dano potencial pode ser de qualquer natureza patrimonial moral público ou privado pessoal ou familiar Nas novas hipóteses o crime se consuma com o simples fornecimento por qualquer meio da senha ou qualquer forma que facilite o acesso de pessoas não autorizadas independentemente de concretizarse efetivamente o acesso Na última hipótese consumase o crime quando o agente efetivamente se utiliza do acesso restrito sem justa causa 8 Forma qualificada Todo o dispositivo disciplina crime de perigo tanto no caput quanto em seu 1º contudo se de qualquer das condutas sobrevier dano quer para a Administração Pública quer para terceiro configurarseá a modalidade qualificada 2º crime qualificado pelo resultado É inegável que a produção de dano aumenta consideravelmente o desvalor do resultado justificandose a maior reprovabilidade pessoal do injusto típico com a consequente elevação da sanção penal cominada 9 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de detenção de seis meses a dois anos e multa para as figuras simples e de dois a seis anos de reclusão e multa para a figura qualificada crime qualificado pelo resultado A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Crimes contra a honra e violação de sigilo profissional Ilegitimidade do querelante quanto ao delito do art 325 do Código Penal visto tratarse de crime de ação pública incondicionada STJ Apn 216SP Rel Min Barros Monteiro j 5112003 Violação do sigilo de proposta de concorrência Art 326 Devassar o sigilo de proposta de concorrência pública ou proporcionar a terceiro o ensejo de devassálo Pena detenção de 3 três meses a 1 um ano e multa Prejudicado este artigo pelo disposto no art 94 da Lei n 8666 de 21 de junho de 1993 licitações e contratos da Administração Pública D O U T R I N A 1 Considerações especiais A Lei n 8666 de 21 de junho de 1993 Lei de Licitações que dispõe sobre licitações e contratos da Administração Pública disciplina em seu art 94 integralmente a matéria que constava do art 326 do Código Penal nos seguintes termos Devassar o sigilo de proposta apresentada em procedimento licitatório ou proporcionar a terceiro o ensejo de devassálo Pena detenção de dois a três anos e multa Segundo a doutrina especializada com essa nova previsão a lei especial disciplinou de forma mais abrangente toda a matéria contida no art 326 do Código Penal revogandoo tacitamente art 2º 1º da LINDB Por essa razão suprimimos as considerações que constavam nas edições anteriores relativamente ao art 326 do CP Funcionário público Art 327 Considerase funcionário público para os efeitos penais quem embora transitoriamente ou sem remuneração exerce cargo emprego ou função pública 1º Equiparase a funcionário público quem exerce cargo emprego ou função em entidade paraestatal e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública 1º acrescentado pela Lei n 9983 de 14 de julho de 2000 2º A pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos neste Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta sociedade de economia mista empresa pública ou fundação instituída pelo poder público D O U T R I N A 1 Conceituação penal de funcionário público Diversamente da conceituação conferida pelo Direito Administrativo o Direito Penal considera funcionário público quem embora transitoriamente ou sem remuneração exerce cargo emprego ou função pública Ensina Hely Lopes Meirelles Direito Administrativo brasileiro São Paulo Malheiros 1998 p 156 Cargo público com denominação própria atribuições específicas e estipêndio correspondente para ser provido e exercido por um titular na forma estabelecida em lei Função é a atribuição ou conjunto de atribuições que a Administração confere a cada categoria profissional ou comete individualmente a determinados servidores para a execução de serviços eventuais O emprego público por sua vez é o serviço temporário com contrato em regime especial ou de conformidade com o disposto na Consolidação das Leis do Trabalho O conceito de funcionário público fornecido pelo art 327 caput do CP estendese a toda a legislação penal extravagante Nosso Código Penal no art 327 adotou a noção extensiva e deu maior elasticidade ao conceito de funcionário público Isto é não exige para caracterização deste o exercício profissional ou permanente da função pública Basta o indivíduo exercer ainda que temporariamente e sem remuneração cargo emprego ou função pública 2 Conceito de funcionário público mesma amplitude para sujeitos ativo e passivo Não há por que fazer a distinção para fins de aplicação do conceito extensivo de funcionário público entre sujeito ativo e sujeito passivo do delito E isso porque o art 327 emite um nítido comando geral ainda que inserido no Capítulo I do Título XI do Código Penal que deve ser aplicado a todas as hipóteses contempladas no ordenamento penal contidas ou não no Código Assim inseremse no conceito de funcionário público todos aqueles que embora transitoriamente e sem remuneração v g os jurados que são expressamente equiparados pelo art 438 do CPP os mesários e integrantes das Juntas Eleitorais consoante os arts 36 e 120 do Código Eleitoral Lei n 473765 venham a exercer cargo emprego ou função pública ou seja todos aqueles que de qualquer forma exerçamna tendo em vista a ampliação do conceito de funcionário público para fins penais Não são porém funcionários públicos aqueles que apenas exercem um munus público como por exemplo os curadores e tutores dativos os inventariantes judiciais os leiloeiros dativos etc havendo prevalência nesses casos do interesse privado Não se incluem igualmente na equiparação da condição de funcionário público os empregados de concessionários permissão e autorização espécies do gênero são delegações unilaterais da Administração Pública de serviços públicos Por fim esse conceito ampliado de funcionário público para fins penais também deve ser aplicado quando de alguma forma puder beneficiar o sujeito passivo pela sua condição de funcionário público próprio ou por equiparação Em outros termos esse conceito ampliado também deve ser reconhecido quando o funcionário público figurar como sujeito passivo como uma moeda que tem dois lados para usar uma linguagem figurada 3 Equiparação do conceito de funcionário público irretroatividade A Lei n 99832000 acrescentou o 1º ao art 327 que equipara a funcionário público quem exerce cargo emprego ou função em entidade paraestatal nos seguintes termos equiparase a funcionário público quem exerce cargo emprego ou função em entidade paraestatal e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública Esse dispositivo equiparou igualmente a funcionário público para fins penais quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada Entidades paraestatais não se confundem com autarquias considerandose que estas realizam atividades públicas típicas aquelas segundo Hely Lopes Meirelles Direito Administrativo brasileiro p 312 prestamse a executar atividades impróprias do Poder Público mas de utilidade pública de interesse da coletividade e por isso fomentadas pelo Estado que autoriza a criação de pessoas jurídicas para realizálas por outorga ou delegação Aliás os conceitos de entidade paraestatal empresa pública sociedade de economia mista fundação e autarquia são aqueles definidos pelo direito administrativo 31 Ampliação vigente a partir de julho de 2000 não há repristinação de jurisprudência pretérita Significa dizer que antes da vigência dessa lei julho de 2000 não era equiparado a funcionário público quem trabalhasse em empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada caso contrário não teria sido necessária essa previsão expressa do legislador Em outros termos até a entrada em vigor da Lei n 9983 1710 2000 os médicos e administradores de hospitais conveniados pelo SUS não podiam ser considerados funcionários públicos para fins penais na medida em que tal possibilidade somente foi ocorrer com o advento do referido diploma legal A equação é simples ora se passaram a ser considerados funcionários públicos significa reconhecer que antes não o eram Esta aliás é a única interpretação possível da previsão contida no art 5º XL da Constituição Federal a lei penal não retroagirá salvo para beneficiar o réu Os fatos ocorridos antes da vigência da Lei n 99832000 não podem ser alcançados pela equiparação consagrada por essa lei Inadmissível in casu invocar a jurisprudência pretérita que já dava interpretação mais abrangente ao conceito de funcionário público para sustentar a aplicação retroativa da equiparação ora questionada É falacioso por outro lado o argumento de que a jurisprudência terseia antecipado ao legislador na medida em que tenta burlar a proibição constitucional art 5º XL antes mencionada ademais o juízo a ser feito é outro era equivocado o entendimento jurisprudencial anterior que dava abrangência não autorizada à definição de funcionário público Com efeito tal interpretação passou a ser possível a partir da vigência da lei somente para frente jamais para trás 4 Atividade típica de Administração Pública Por fim há outra elementar típica no conceito de equiparação de funcionário público que exige uma pequena reflexão para a execução de atividade típica da Administração Pública Afinal o que pode ser interpretado como atividade típica da Administração Pública Não serão por certo aquelas atividades típicas da iniciativa privada tais como indústria comércio prestação de serviços em geral etc O 1º do art 327 não dá margem a dúvidas quanto à qualidade de funcionário público quando por exemplo determinado hospital por meio de seus médicos ou administradores atende pacientes pelo SUS mediante convênio Essa atividade não se pode negar é tratada como atividade típica da Administração Pública consoante o disposto no art 194 da CF que pode ser gerida complementarmente pela iniciativa privada art 24 parágrafo único da Lei n 808090 5 Causa especial genérica de aumento A causa de aumento incluída pela Lei n 679980 no art 327 que define funcionário público para efeitos penais tem endereço certo destinase a funcionários públicos próprios ou impróprios que exerçam cargos em comissão ou função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta sociedade de economia mista empresa pública ou fundação instituída pelo Poder Público Constatase de plano que o texto legal ao discriminar os entes públicos em que o exercício das funções que detalha devem ter a sanção penal majorada omitiu intencionalmente ou não a inclusão de autarquia que tem natureza jurídica própria e regida por regime jurídico igualmente específico Consequentemente a majorante constante do dispositivo em exame não pode ser aplicada àqueles que exerçam cargos em comissão direção ou assessoramento nas referidas autarquias ante a vedação do uso de analogia in malam partem Ao tratar da equiparação a funcionário público o legislador utilizou a locução entidade paraestatal em seu 1º que por certo abrange também as autarquias contudo no parágrafo seguinte mais específico discriminou em quais dessas entidades o exercício de cargo em comissão ou função de direção ou assessoramento deve ser punido mais severamente Logo é impossível ao intérprete darlhe extensão maior que aquela que o legislador concebeu J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A O médico que atende a beneficiários do SUS mesmo antes da entrada em vigor da Lei n 99832000 que modificou o art 327 1º do Código Penal deve ser considerado funcionário público por equiparação tendo em vista o disposto no caput do retromencionado artigo Precedentes STJ REsp 898170PR Rel Min Félix Fischer j 632007 Pela ampla redação do art 327 do CP quem exerce cargo emprego ou função pública até de forma transitória ou sem remuneração enquadrase no conceito de funcionário público para fins de responsabilização criminal Assim quem exerce a função de estagiário em secretaria municipal é considerado funcionário público para efeitos penais TJRS Apelação 70018653469 Rel Gaspar Marques Batista j 1752007 O médico e o administrador de entidade hospitalar conveniada ao SUS exercem função pública delegada e por isso equiparamse a funcionários públicos para fim de aplicação da legislação penal entendimento que se sustenta mesmo antes do advento da Lei n 99832000 que deu nova redação ao 1º do art 327 do Código Penal Por força do caput do art 327 do Código Penal o conceito de funcionário público na seara penal é amplo incluindo todas as pessoas que exerçam cargo emprego ou função pública STJ REsp 252081PR Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 932006 Exercício de funções da EBCT Art 327 CP Se o recorrido é equiparado a funcionário público nos termos do art 327 do Código Penal e exercia suas funções perante a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos EBCT por certo que sua conduta em tese afeta diretamente serviços e interesse de uma empresa pública a deslocar sua competência para a Justiça Federal nos termos preceituados pelo artigo 109 inciso IV da Constituição Federal TRF 3ª Região Recurso Criminal 200261230004220 Rel Suzana Camargo j 28112005 Capítulo II Dos Crimes Praticados por Particular contra a Administração em Geral Usurpação de função pública Art 328 Usurpar o exercício de função pública Pena detenção de 3 três meses a 2 dois anos e multa Parágrafo único Se do fato o agente aufere vantagem Pena reclusão de 2 dois a 5 cinco anos e multa D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O Código Penal Imperial 1830 reprimiu a conduta de usurpar função pública disciplinando porém separadamente a usurpação de função pública civil e a militar Coube contudo ao Código Penal de 1890 reunir em um mesmo dispositivo a usurpação dessas funções públicas art 224 O Código Penal de 1940 tratou da usurpação de função pública sem se preocupar em destacar sua abrangência prevalecendo na doutrina o entendimento de que a prescrição penal abrangia tanto a seara civil quanto a militar Posteriormente com o surgimento do Código Penal Militar Decretolei n 100169 a usurpação de função pública militar recebeu tratamento específico 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração Pública especialmente sua moralidade e probidade administrativa Protegese na verdade a probidade de função pública sua respeitabilidade bem como a integridade de seus funcionários A atuação funcional do agente público pressupõe por isso mesmo a legitimidade de sua investidura no cargo e na função sendo portanto incompatível com a conduta de quem exerce funções que não são suas Ademais reconhecia Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 304 além da lesão ao direito exclusivo do Estado de escolher e nomear seus funcionários ou as pessoas que em seu nome e interesse agem para consecução de suas finalidades 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa até mesmo o funcionário público incompetente ou investido em outra função ou em outros termos o funcionário que pratica atividade atribuída a outro agente público absolutamente estranha àquela a que está investido A bem da verdade tratandose do capítulo que disciplina os crimes praticados por particulares contra a administração em geral sujeito ativo deve ser o particular extraneus Contudo convém destacar que a ele se equipara quem mesmo sendo funcionário não está investido na função que usurpa No entanto nesse caso é importante que as funções sejam absolutamente distintas ou seja deve ser uma função de todo estranha à de que está investido Sujeito passivo é o Estado que pode ser representado pela União Estadosmembros Municípios e Distrito Federal Não é aplicável a extensão prevista no 1º do art 327 já que referida equiparação limitase às hipóteses em que o funcionário público equiparado é sujeito ativo do crime considerado funcional 4 Tipo objetivo adequação típica A ação nuclear do tipo é representada pelo verbo usurpar assumir ou exercer indevidamente Usurpar é o mesmo que obter mediante fraude tomar violentamente gozar indevidamente O agente de forma ilegítima executa ato relativo à função pública vide o art 327 do CP de natureza gratuita ou remunerada na qual não está legalmente investido Usurpar portanto é assumir e exercitar indevidamente funções ou atribuições que não competem ao agente Com a usurpação de função há indevida e ilegítima intromissão no aparato legal da Administração Pública de um extraneus que se arroga prerrogativas de funcionário que não as tem e pratica atos de ofício como se funcionário competente fosse 41 Prática de ato de ofício da função usurpada Para a configuração do crime de usurpação de função pública não basta que o agente apenas se invista de função indevidamente atribuindo a si mesmo a condição de funcionário público mas deve também e necessariamente praticar ato de ofício privativo da função usurpada Na precisa oração de Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 3045 está sintetizada toda a essência do comando típico contido no art 328 in verbis Não basta fazerse passar pelo ocupante do cargo intitularse como tal desde que não o exerça A lei exige que se usurpe exercício da função e não se contenta com a simples ou mera atribuição da qualidade de funcionário ou do título relativo ao cargo 42 Usurpação e abuso de poder A usurpação de função pública não se confunde com o abuso de poder com efeito uma coisa é excederse no exercício da função pública e outra completamente distinta é investirse na que não possui embora em ambas seu exercício seja ilegal e abusivo Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 410 destacava no entanto que a simples jactância não é penalmente ilícita salvo se contribuir para um fingimento pois em tal caso será reconhecível uma contravenção art 45 No entanto se falsamente alguém se intitula funcionário público com o escopo de induzir alguém em erro e com isso auferir vantagem temse caracterizado o delito do art 171 estelionato mediante fraude 43 Exercício de função por delegação Há situações porém em que o particular independentemente de investidura em cargo algum está devidamente autorizado a exercer uma função pública ou praticar atos de ofício assim como por exemplo a prisão em flagrante delito que segundo o art 301 do CPP qualquer do povo poderá e a autoridade policial e seus agentes deverão prender quem quer que se encontre em situação de flagrância sem se falar nas funções delegadas etc Mas nesses e em qualquer outro caso que haja autorização ou delegação não existe usurpação e portanto não se pode falar em crime A função pública pode ser de qualquer natureza temporária transitória civil ou militar gratuita ou remunerada 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo do crime de usurpação de função é o dolo constituído pela vontade consciente de usurpar função pública ilegitimamente Inexistindo vontade livre e consciente de obter mediante fraude ou assumir indevidamente função de agente do Estado não se caracteriza a usurpação de função pública É indispensável que o sujeito ativo tenha consciência da ilegitimidade do exercício da função usurpada A ausência dessa consciência acarreta erro de tipo excluindo o dolo e por extensão a própria atipicidade Caracterizado o erro de tipo é irrelevante a constatação de sua evitabilidade ou inevitabilidade pois seu efeito é o mesmo ante a ausência de previsão da modalidade culposa salvo se se tratar de um simulacro de erro Por isso não comete o crime quem de boafé pensa ser legítima a ação que pratica que se encontra legalmente investido na função ou que é válida a delegação que recebeu quando na realidade nada é verdadeiro Não se exige qualquer fim especial caracterizador de elemento subjetivo especial do injusto O motivo do agente portanto é irrelevante Tampouco há previsão de modalidade culposa 6 Consumação e tentativa Consumase o crime de usurpação de função pública com o efetivo exercício de pelo menos um ato de ofício típico de função pública em que o agente não está investido Consumase o crime no momento e no lugar em que o ato de ofício é praticado pelo agente A maior ou menor duração do exercício a maior ou menor quantidade de atos praticados devem ser considerados somente na dosagem da pena não se podendo falar porém em continuidade delitiva Se em decorrência da usurpação o agente auferir vantagem de qualquer natureza para si ou para outrem consumarseá a figura qualificada A tentativa é teoricamente admissível e verificase quando iniciada a prática de atos inequívocos de execução é interrompida durante sua realização por circunstâncias alheias à vontade do agente 7 Forma qualificada auferimento de vantagem O parágrafo único do artigo em exame dispõe se do fato o agente aufere vantagem Pena reclusão de dois a cinco anos e multa Constatase que a eventual obtenção de vantagem pelo agente eleva consideravelmente qualitativa e quantitativamente a sanção cominada Caracterizase a figura qualificada quando em virtude da usurpação o agente aufere vantagem patrimonial ou moral para si ou para outrem Tratase não se ignora de crime formal que não exige o resultado material para consumarse excepcionalmente porém a obtenção de vantagem não representa o simples exaurimento do crime mas ao contrário ante previsão expressa qualifica a figura delituosa sendo digna de maior reprovação social 71 Obtenção de vantagem fundamento da reprovação O fundamento da maior reprovabilidade reside portanto na obtenção de vantagem Como a lei é omissa é irrelevante que se trate de vantagem devida ou indevida legítima ou ilegítima Por outro lado tampouco se fez restrição à natureza da vantagem por isso pode ser ela patrimonial ou não Como a lei prevê apenas o auferimento de vantagem não é necessária sua fruição podendo pois a vantagem auferida destinarse a outrem 8 Contravenções penais Se o agente sem realizar qualquer ato de ofício tão somente se apresenta como funcionário público ou usa uniforme ou distintivo de função pública responde pelas contravenções dos arts 45 ou 46 da Lei das Contravenções Penais e não pelo delito do art 328 do CP O delito descrito no caput admite não apenas a transação penal mas também a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada não superior a dois anos Vide os arts 45 46 e 47 do Decretolei n 368841 Lei das Contravenções Penais 9 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de detenção de três meses a dois anos e multa Para a figura qualificada é cominada pena de reclusão de dois a cinco anos e multa A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Comete o delito previsto no art 328 do Código Penal usurpação de função pública aquele que pratica função própria da administração indevidamente ou seja sem estar legitimamente investido na função de que se trate Não bastando portanto que o agente se arrogue na função sendo imprescindível que este pratique atos de ofício como se legitimado fosse com o ânimo de usurpar consistente na vontade deliberada de praticálo Precedente O crime de usurpação de função pública muito embora previsto no capítulo destinado aos crimes praticados por particular contra a Administração Pública pode ser praticado por funcionário público porquanto quando o Código Penal se refere a particular é porque indica que os delitos ali Capítulo II do Título XI ao contrário do capítulo I são crimes comuns e não especiais próprios STJ RHC 20818AC Rel Min Félix Fischer j 2252007 Habeas corpus com o objetivo de revogar prisão preventiva decretada em inquérito Há fortes indícios da materialidade do art 328 do CP pois não requer a demonstração de que particular tenha sofrido prejuízo O sujeito passivo da conduta descrita no art 328 do CP é o Estado titular da moralidade e prestígio necessários ao regular o funcionamento de suas atividades administrativas TRF 3ª Região HC 200203000187763 Rel André Nabarrete j 1º 102002 Resistência Art 329 Oporse à execução de ato legal mediante violência ou ameaça a funcionário competente para executálo ou a quem lhe esteja prestando auxílio Pena detenção de 2 dois meses a 2 dois anos 1º Se o ato em razão da resistência não se executa Pena reclusão de 1 um a 3 três anos 2º As penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das correspondentes à violência D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Na legislação brasileira a criminalização do crime de resistência vem desde o Código Criminal do Império 1830 sendo repetida pelo primeiro Código Penal republicano 1890 com pequenas alterações do texto anterior O Código de 1890 no entanto situava equivocadamente o crime de resistência entre os crimes contra a segurança interna da república como se fosse um crime de Estado ou contra a ordem política constituída ou seja transformava um crime comum em crime político impropriamente O atual Código Penal de 1940 com redação mais enxuta e melhor técnica situou adequadamente o crime de resistência entre os crimes contra a Administração Pública lato sensu 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração Pública especialmente sua moralidade e probidade administrativa O tipo penal protege a autoridade e o prestígio da função pública Tutelase na verdade a normalidade do funcionamento da Administração Pública sua respeitabilidade bem como a integridade de seus funcionários a essência mesmo da tutela penal não é em relação ao funcionário e sim ao próprio ato funcional que se quer prestigiar partindose da presunção logicamente da legalidade do ato Não tendo base legal o ato resistido não se pode falar em crime pois a ausência dessa elementar torna a sua resistência uma conduta atípica 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa que mediante violência ou ameaça obstaculize a prática de ato legal independentemente de qualidade ou condição especial Pode inclusive ser pessoa diversa daquela contra a qual o funcionário executava o ato Sujeito passivo é o Estado União Estado Distrito Federal e Municípios e ao lado dele o funcionário competente ou quem lhe esteja prestando auxílio para a execução do ato legal 4 Tipo objetivo adequação típica A conduta típica consiste em oporse à execução de ato legal a legalidade exigida é tanto a formal quanto a substancial mediante violência emprego de força física ou ameaça prenunciando a prática de um mal grave à vítima a funcionário competente para executálo ou a quem lhe esteja prestando auxílio O crime de resistência portanto é composto dos seguintes elementos constitutivos a oposição ativa mediante violência ou ameaça b a qualidade ou condição de funcionário competente do sujeito passivo ou seu assistente c legalidade do ato a ser executado d elemento subjetivo informador da conduta Vamos dissecálos 41 Oposição ativa mediante violência ou ameaça Oporse à execução de ato legal exige uma conduta ativa positiva e efetiva sendo insuficiente uma atitude passiva contemplativa ou omissiva pois configuraria no máximo a desobediência que poderia tipificar o crime descrito no art 330 A locução mediante violência ou ameaça destaca não apenas o meio e a forma que a oposição deve revestirse como deixa claro que não admite a simples passividade como por exemplo jogarse ao solo agarrarse em algum obstáculo ou simplesmente pôrse em fuga para evitar a prisão A oposição concorda Paulo José da Costa Jr Comentários ao Código Penal p 3045 deve ter caráter militante ativo A mera desobediência a oposição branca a resistência passiva vis civilis realizam o tipo descrito no art 330 Por isso a denominada resistência passiva que se caracterizaria pela omissão sem ataque nem agressão por parte do agressor não tipifica o crime em exame mesmo que não fosse exigida a elementar violência ou ameaça pois de resistência tecnicamente falando não se trata Tal conduta no máximo dependendo das demais elementares poderá configurar o crime de desobediência 411 Violência física ou ameaça A violência exigida pelo tipo penal tanto pode ser a física vis corporalis como a moral vis compulsiva que deve ser praticada em oposição e concomitante ao exercício do ato funcional que se quer resistir A violência física consiste no emprego de força contra o funcionário ou seu assistente Para caracterizála é suficiente que ocorra lesão corporal leve ou simples vias de fato O termo violência especificamente empregado no texto legal significa força física material a vis corporalis E abrange todas as formas de violência desde as mais graves como o homicídio e as lesões corporais até as mais leves como lesões leves ou as próprias vias de fato Mas a violência também pode consistir na simples ameaça que curiosamente o legislador nessa figura típica não exige que seja grave ao contrário do que normalmente se faz nas tipificações que utilizam a ameaça equiparada à violência Essa ameaça pode ser real verbal e segundo a maioria da doutrina pode até ser por escrito quando o agente promete causar mal injusto e grave ao funcionário público 412 Atualidade da prática do ato de ofício A atualidade da execução do ato de ofício é pressuposto indispensável a caracterização do ato de resistir é impossível resistir a algo que não iniciou e principalmente a algo que já terminou A resistência deve ocorrer no momento e no lugar que se realiza o ato que se quer impedir Nesse sentido já sustentava Manzini Tratado de derecho penal p 399 afirmando que se pressupõe já iniciado o ato de ofício ou de serviço e a violência ou ameaça deve ser contemporânea ao desenvolvimento da atividade funcional tendendo a frustrar absoluta ou relativamente a obtenção do escopo a que o ato se dirige Por isso temos dificuldade em admitir que a ameaça possa ser feita por escrito pois por esse meio perdese a atualidade não passando de uma ameaça de mal futuro incompatível com a exigência de contemporaneidade da resistência e da execução do fato de ofício Não pode haver resistência se ainda não se iniciou ou se já cessou a atividade do funcionário É possível a resistência durante todo o desenvolvimento do ato e até a sua conclusão como sustentava 413 Violência contra o funcionário ou seu auxiliar A violência deve ser necessariamente dirigida ao funcionário público ou a quem o auxilie não a caracterizando eventual violência dirigida à coisa Nesse particular era equivocado o entendimento de Hungria uma vez que o Código Penal de 1940 art 329 adota tipificação distinta da utilizada pelo Código Penal italiano de 1930 art 337 Nesse sentido mais uma vez a razão encontrase com Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 311 quando afirmava Não há invocar neste particular autores estrangeiros pois seus Códigos diferem do nosso que é por demais preciso mediante violência ou ameaça a funcionário E concluía com acerto Magalhães Noronha Numa palavra no Código italiano consideram se a violência e a ameaça em oposição a um ato do funcionário no pátrio a oposição a um ato mediante violência ou ameaça ao funcionário É o âmbito daquele mais amplo Ademais polícia não se intimida porque alguém danifica sua viatura como se fora criança amedrontada pelo maior que para assustála quebra seu brinquedo A resistência oposta por assaltante para evitar a prisão quando perseguido logo após a prática do crime de roubo por exemplo não constitui crime autônomo representa tão somente um desdobramento da violência caracterizadora do crime patrimonial 42 A qualidade ou condição de funcionário competente do sujeito passivo Não basta que o sujeito passivo seja funcionário público ou assistente deste sendo indispensável que ele tenha competência para executar o ato que se quer impedir Com efeito pressupostos do crime de resistência são a qualidade ou condição do sujeito passivo que deve necessariamente ser funcionário público competente e a legalidade do ato funcional Em termos bem esquemáticos é necessário que o funcionário pratique ato legal e que este integre o âmbito de suas atribuições funcionais É irrelevante que o executor do ato seja titular primário ou secundário da autoridade pública o fundamental é que tenha competência in concreto para realizálo A proteção penal no entanto pode ser estendida ao extraneus excepcionalmente autorizada pelo texto legal Esse auxílio prestado pode ser requisitado pelo funcionário ou o extraneus sponte sua com o assentimento daquele pode reforçar a atuação funcional No entanto para que se reconheça a legitimidade do auxiliar é necessária a presença in locus do assistido Caso contrário o extraneus estará usurpando de função pública desautorizadamente Por fim o fundamento para ampliar a proteção legal a quem presta auxílio a funcionário competente reside na interpretação de que se trata de um desdobramento de um longa manus do assistido que aquele estaria exercendo uma espécie de função delegada 43 A legalidade do ato a ser executado Requisito igualmente indispensável para a configuração do crime de resistência é a legalidade do ato sob os aspectos formal e substancial a legalidade substancial referese à ordem a ser executada a formal relacionase à forma ou ao meio de sua execução como assevera Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 519 a primeira sedimentase na ausência de fundamento ou razão de ser da concreção do ato enquanto a segunda está relacionada à forma ou à execução do ato Exigese assim a competência do funcionário para a prática do ato bem como a sua legalidade intrínseca além do emprego dos meios legais na sua execução Em outros termos o agente deve executar o ato nos limites de sua competência e nos termos legais Atos ilegais portanto são os que não têm fundamento na lei como por exemplo mandado de prisão fora dos casos que a lei permite ou emitidos por autoridade incompetente ou sem cumprir as formalidades legais etc 431 Direito de resistência ao abuso da autoridade Questão que não pode ser ignorada é a eterna polêmica sobre o direito de resistência contra o arbítrio da autoridade pública Não se desconhece a existência de duas teorias opostas relativamente a esse tema para a primeira presumese legalidade quando proveniente de agentes públicos sendo inadmissível a oposição contra a autoridade inerente a tais atos Essa teoria remonta ao período despótico que sustentava o acerto permanente dos delegados terrestres da divindade para a segunda sustenta o dever do cidadão de rebelarse contra atos ilícitos e a oposição a ato ilegal da autoridade não é antijurídica sendo portanto lícita Uma terceira teoria como sempre procura conciliar as anteriores sustentando a admissibilidade da resistência quando o ato da autoridade é manifestamente ilegal Na dúvida sustenta prevalece o princípio da autoridade 432 Ilegalidade do ato legitima oposição A ilegalidade do ato legitima eventual oposição à sua execução conforme procuraremos demonstrar mais adiante Paulo José da Costa Jr Comentários ao Código Penal p 503 vai mais longe ao afirmar A obediência passiva à ilegalidade não se admite O súdito é um homem não um escravo Dispõe do direito de revoltarse contra o ato indevido e do dever de obedecer à ordem legal A oposição ainda que violenta ao ato ilícito da autoridade é válida é legítima secundum jus Sob o ponto de vista objetivo destacava Soler Derecho Penal argentino p 101 para que exista função lícita requerse que o agente atue dentro da esfera de sua competência tanto material como jurisdicionalmente O ato executado deve ser legal formal e substancialmente pois a ilegalidade do ato torna a resistência legítima excluindo não só a antijuridicidade da ação mas a própria tipicidade embora não desconheçamos repetindo a controvérsia sobre a resistência ao ato ilegal No entanto Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 455 já concordava com esse nosso entendimento in verbis Se o ato for ilegal a resistência é sempre lícita e impunível quer se trate de ilegalidade evidente ou dissimulada Constitui ela uma espécie de legítima defesa embora não caiba aqui exigir os requisitos desta descriminante Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 310 era ainda mais contundente ao afirmar Só há resistência contra ato legal se não o for a oposição não é ilícita quer seja a ilegalidade patente quer seja dissimulada 433 Resistência contra ato legal taxatividade Na realidade diante do texto do nosso Código Penal prescrevendo que a resistência operase contra ato legal é inadmissível no atual Estado Democrático de Direito que se pretenda sustentar que se configura o crime de resistência quando se opõe a ato não manifestamente ilegal No entanto nosso Código Penal que optou pela fórmula liberal a despeito de ter sido elaborado durante regime autoritário não distingue nem qualifica a legalidade do ato o que impede que se possa exigir que se distinga entre legalidade manifesta e legalidade duvidosa Nesse caso não há tipicidade no ato de resistir Aparentar ser legal não transforma nenhum ato ilegal em legal e permanecerá com a característica de ilegalidade A única forma para validar aquela interpretação teria sido o legislador ter optado por outra fórmula na definição do crime de resistência como por exemplo oporse à execução de ato não manifestamente ilegal No entanto não foi esse o caminho seguido A violência enfim quando autorizada pela lei e exercida no estrito limite de sua necessidade evidentemente não constitui crime Aliás o próprio Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 417 ardoroso defensor da correção do velho diploma legal reconhecia Em face do nosso Estatuto Penal não padece dúvida que a oposição vi aut minis para eximir a si próprio ou a terceiro dentro dos limites da necessidade à sujeição a um ato ilegal da autoridade constitui autêntica legítima defesa art 21 434 Ilegalidade e injustiça do ato distinção Convém registrar em definitivo que a ilegalidade do ato não se confunde com sua injustiça Legalidade e justiça são coisas diversas Se o ato encontrase fundamentado na lei e as formalidades legais foram observadas não tem legitimidade o cidadão para oporse a ele alegando sua injustiça Nesse sentido arrematava Hungria Não se deve porém confundir a ilegalidade material do ato oficial com a injustiça da decisão de que este deriva Uma vez que o ato seja regular na sua forma e se funde in thesi em preceito legal já não é permitida a resistência 44 Elemento subjetivo informador da conduta O elemento subjetivo geral é o dolo constituído pela vontade livre e consciente de resistir a ato legal de autoridade competente É necessário que o sujeito ativo tenha consciência da legalidade do ato e da competência de quem o executa seja o funcionário ou seu auxiliar o auxiliar só pode agir na presença e na companhia do funcionário 441 Elemento subjetivo especial do tipo O elemento subjetivo especial do tipo é representado pelo especial fim de agir para impedir a execução do ato legal A ausência dessa finalidade especial impedir a realização do ato funcional descaracteriza a resistência podendo surgir residualmente outra infração penal como por exemplo lesões corporais constrangimento ilegal ameaça etc De forma elogiável já a seu tempo Hungria reconhecia a importância do animus como orientador da ação ao destacar que Até mesmo o fato de quem vacuis manibus afasta de si o executor do ato ou seu assistente traduzindo apenas um gesto instintivo de autodefesa sem intenção positiva de ofender não constitui a vis característica da resistência Ao contrário se é manifesto o animus oppugnandi a simples pulsatio caedere pugnis sin dolore basta para que se apresente a violência integrante do crime resistência ativa simples o que é óbvio desde que pressuposto do dito animus a resistência configurase com a simples ameaça Não há previsão de modalidade culposa 5 Consumação e tentativa Consumase o crime de resistência com a efetiva oposição à prática de ato legal no momento e no lugar em que pratica a violência ou ameaça independentemente de onde o ato ilegal seria realizado É irrelevante que o agente obtenha êxito em seu fim pretendido qual seja o de impedir a realização do ato legal Consumase com a simples prática da violência ou ameaça independentemente da realização ou não do ato funcional Aliás a não realização do ato que teoricamente tratandose de crime formal representaria o simples exaurimento do crime é elemento qualificador do crime elevando sua reprovação social A tentativa é teoricamente admissível especialmente porque o ato de resistir pode facilmente ser objeto de fracionamento 6 Forma qualificada não realização do ato Como o crime é formal o efetivo impedimento da prática do ato legal representaria simples exaurimento do crime sem qualquer alteração na sua definição legal podendo apenas ser considerado esse aspecto quando da operação de dosagem de pena art 59 consequências do crime Contudo em razão da natureza do bem jurídico protegido o legislador considerou que o desvalor da ação e do resultado é agravado com a não realização do ato resistido configurandose portanto a maior reprovação pessoal O crime por conseguinte é qualificado 1º quando a resistência se exaure ou seja quando o agente consegue efetivamente impedir a execução do ato funcional Em outros termos o funcionário não consegue superar a resistência que lhe opõe o agente e o ato em razão da resistência não se executa Nessa hipótese modificase a pena cominada não apenas qualitativa reclusão mas quantitativamente um a três anos Contudo para que se reconheça a qualificadora é indispensável que o ato legal deixe de ser praticado por força exclusiva da violenta ou ameaçadora oposição do sujeito ativo Se no entanto a não realização do ato decorrer da inoperância ou inépcia do funcionário a qualificadora não é admissível 7 Resistência e concurso com outro crime violento cúmulo material de penas Constatase que a violência além de integrar como elementar a descrição típica do crime de resistência é punida autonomamente quando constitui crime em si mesma O 2º determina com efeito que as penas são aplicáveis sem prejuízo das correspondentes à violência De plano convém destacar que a violência vis corporalis e vis compulsiva constitui elementar típica do crime de resistência logo a cumulação de penas determinada em dito preceito não pode estar referindose a todo e qualquer tipo de violência sob pena de incorrer em bis in idem Em segundo lugar essa previsão legal estaria disciplinando concurso de crimes entre resistência e outro crime violento e em caso positivo a que espécie de concurso estarse ia referindo Ou por fim essa forma de cominação de pena referese somente ao sistema de aplicação de penas cúmulo material e não a concurso de crimes propriamente São questões aparentemente simples mas que demandam algum cuidado reflexivo como ocorre em muitos outros dispositivos por nós já examinados 71 Violência crime autônomo Destacamos de plano que essa previsão somente é aplicável quando a violência empregada constituir autonomamente crime caso contrário não haverá para ela outra pena cominada pois não passará de simples elementar típica do crime em exame Nesse tipo penal portanto somente a violência que constituir em si mesma crime excederá a mera função de elementar constitutiva do crime de resistência Nessa hipótese a pena deste será cumulada com a pena correspondente à infração penal constituída isoladamente pela violência Esse crime resistência praticado com o emprego de violência que constitua em si mesma crime configura certamente concurso de crimes O texto legal não sugere que se trate de concurso material não sendo permitida portanto interpretação desse gênero Não se pode esquecer por outro lado que o que caracteriza o concurso material de crimes não é a pluralidade de infrações como ocorreria na hipótese em exame mas sim a pluralidade de condutas que em princípio não ocorre na ação única de oporse à execução de ato legal 72 Lesões corporais ou morte Quando da violência praticada no ato de resistir resultarem lesões corporais ou morte haverá a aplicação cumulativa das penas correspondentes à resistência e as decorrentes de dita violência lesões corporais ou homicídio Somente nessas hipóteses haverá aplicação cumulativa de penas O fato de determinarse a aplicação cumulativa de penas não significa que se esteja reconhecendo aquela espécie de concurso mas apenas que se adota o sistema do cúmulo material de penas que é outra coisa Com efeito o que caracteriza o concurso material de crimes não é a soma ou cumulação de penas como prevê o dispositivo em exame mas a pluralidade de condutas pois no concurso formal impróprio isto é naquele cuja conduta única produz dois ou mais crimes resultantes de desígnios autônomos as penas também são aplicadas cumulativamente Na verdade concurso de crimes e sistema de aplicação de penas são institutos inconfundíveis o primeiro relacionase à teoria da pena e o segundo à teoria do crime Por isso a confusão é injustificável No entanto a despeito de tudo o que acabamos de expor nada impede que concretamente possa ocorrer concurso material do crime de resistência com outros crimes violentos como acontece com quaisquer outras infrações desde que é claro haja pluralidade de condutas e pluralidade de crimes mas aí observese já não será mais o caso de unidade de ação ou omissão caracterizadora do concurso formal 8 Resistência desacato e desobediência As ofensas proferidas ou a negativa em acompanhar o policial em abrir a porta ou outros casos de indisciplina não são suficientes para a tipificação do delito de resistência podendo conforme o caso caracterizar desacato art 331 do CP ou desobediência art 330 A resistência absorve o crime do art 132 do CP a desobediência art 330 do CP e as contravenções inscritas nos arts 19 21 e 62 da Lei das Contravenções Penais Vide a Lei n 157952 art 4º I em se tratando de ato próprio das Comissões Parlamentares de Inquérito 9 Pena e ação penal As penas cominadas são de detenção de dois meses a dois anos e multa Para a forma qualificada cominase pena de reclusão de um a três anos Em qualquer dos casos resistência simples ou qualificada prevê a lei penal o cúmulo material sistema da aplicação das penas do crime de resistência e daquele que a violência in concreto produzir seja lesão corporal ou homicídio eventualmente praticados pelo sujeito ativo 2º A contravenção de vias de fato fica naturalmente absorvida A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Delito de Resistência Art 329 caput do Código Penal As provas demonstram a prática do delito de resistência estando presentes todos os requisitos do tipo penal tendo ocorrido oposição à execução de ato legal com emprego de força física contra funcionário competente para executála também presente o elemento subjetivo do tipo consistente no especial fim de oporse à execução de ato legal O depoimento de policiais são válidos e eficientes para fundamentar juízo condenatório pois até prova em contrário se trata de pessoas idôneas cujas declarações retratam a verdade Adequada a substituição da pena privativa de liberdade por multa por atendidos os requisitos legais TJRS Recurso Crime 71001554062 Rel Ângela Maria Silveira j 1732008 Resistência Art 329 do CPB Consunção Delito não absorvido pelo crime de roubo qualificado Condenação TJRS Recurso Crime 71001557198 Rel Nara Leonor Castro Garcia j 1122008 Para a caracterização do crime de resistência previsto no art 329 do Código Penal não basta ameaça ou violência contra o funcionário competente para a execução sendo indispensável que o ato cuja execução foi resistida encontre apoio na legalidade de modo que se a prisão em flagrante foi realizada fora das condições descritivas do art 302 I a IV do Código de Processo Penal impossível a concretização do delito no mundo fenomênico TJMG Apelação 1071306065422 30011 Rel Judimar Biber j 782007 O delito de lesão corporal leve é autônomo frente ao crime de resistência ao teor do 2º do art 329 do Código Penal STJ HC 36175SP Rel Min Paulo Medina j 2452005 Desobediência Art 330 Desobedecer a ordem legal de funcionário público Pena detenção de 15 quinze dias a 6 seis meses e multa D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias A criminalização dessa conduta consta da legislação brasileira desde nosso Código Criminal de 1830 desobedecer ao empregado público em ato de exercício de suas funções ou não cumprir as suas ordens legais O Código Penal de 1890 por sua vez atribuiu ao mesmo crime uma abrangência maior ao reconhecer a desobediência na simples transgressão de ordens ou provimentos legais emanados de autoridade competente acrescentando ainda que estariam compreendidos na previsão legal aqueles que infringirem preceitos proibitivos de editais das autoridades e dos quais tiveram conhecimento art 135 e parágrafo único 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração Pública especialmente sua moralidade e probidade administrativa Protegese na verdade a probidade de função pública sua respeitabilidade bem como a integridade de seus funcionários Objetivase especificamente garantir o prestígio e a dignidade da máquina pública relativamente ao cumprimento de determinações legais expedidas por seus agentes Heleno Cláudio Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 457 com sua sensibilidade críticoliberal já destacava que é esta sem dúvida uma disposição perigosa e autoritária seguindo no particular as reservas de Carrara para quem em princípio é muito discutível salvo absoluta necessidade de Justiça que se possa reconhecer um verdadeiro delito na simples desobediência a uma ordem que nos causa dano e dor 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo já que se trata de crime comum pode ser qualquer pessoa inclusive funcionário público desde que não se encontre no exercício de suas funções Relacionandose porém às suas próprias atribuições funcionais a desobediência poderá configurar o crime de prevaricação observadas as demais elementares típicas Sujeito passivo é o Estado União Estado Distrito Federal e Municípios como o verdadeiro titular do interesse atingido pela ação delituosa secundariamente podese considerar também como sujeito passivo o funcionário autor da ordem desobedecida 4 Tipo objetivo adequação típica A conduta incriminada consiste em desobedecer ordem legal de funcionário público que significa descumprir desobedecer desatender dita ordem É necessário que se trate de ordem e não de mero pedido ou solicitação e que essa ordem dirijase expressamente a quem tenha o dever jurídico de obedecêla deve outrossim a ordem revestirse de legalidade formal e substancial Ademais o expedidor ou executor da ordem há de ser funcionário público mas este na espécie entendese aquele que o é no sentido estrito do direito administrativo como pontificava Nélson Hungria Em outras palavras a ordem deve emanar de funcionário competente para emitila não sendo funcionário competente não se poderá falar em crime por carecer de legalidade em seu aspecto formal Se o agente não é responsável pela efetivação do ato que acaso não cumprido poderá ensejar o crime de desobediência sua omissão ou não atendimento é absolutamente atípico pois não tem o dever legal de executálo O crime de desobediência somente se configura se a ordem legal for endereçada diretamente a quem tem o dever legal de cumprila Não se pode falar em desobediência se o destinatário da ordem não tiver tal dever é necessário que o conteúdo da ordem esteja fundado em lei emanada de funcionário público competente para emitila agindo nos limites de suas atribuições legais A justiça ou injustiça da decisão no entanto além de ser irrelevante à tipificação do fato não legitima a sua desobediência 41 Desobediência praticada por funcionário público Os dirigentes de entidade integrante da Administração Pública direta ou indireta no exercício de suas funções não cometem o crime de desobediência pois essa infração penal pressupõe a atuação criminosa do particular contra a Administração Pública Em outros termos funcionário público no exercício de suas funções não pratica crime de desobediência embora configure falta administrativa e como mencionamos dependendo das demais elementares poderá responder por prevaricação art 319 Contudo a simples condição ou qualidade de funcionário público não impede que o indivíduo possa ser sujeito ativo desse crime desde que não o pratique no exercício de sua função 411 Desobediência à ordem judicial É indispensável que se identifique com precisão qual é a ordem desobedecida e em que esta consiste tratandose de elementar típica implícita do tipo penal sob pena de configurarse inadequação típica A desobediência relativa à decisão judicial sobre perda ou suspensão de direito caracteriza o crime do art 359 do CP onde referida conduta será examinada Se o descumprimento da ordem emanada de funcionário público é acompanhado de violência ou ameaça o delito é o do art 329 do CP 42 Desobediência e cominação de sanções civis ou administrativas atipicidade Quando a lei extrapenal comina sanção civil ou administrativa e não prevê cumulação com o art 330 do CP inexiste crime de desobediência Sempre que houver cominação específica para o eventual descumprimento de decisão judicial de determinada sanção doutrina e jurisprudência têm entendido com acerto que se trata de conduta atípica pois o ordenamento jurídico procura solucionar o eventual descumprimento de tal decisão no âmbito do próprio direito privado Na verdade a sanção administrativojudicial afasta a natureza criminal de eventual descumprimento da ordem judicial Com efeito se pela desobediência for cominada em lei específica penalidade civil ou administrativa não se pode falar em crime a menos que tal norma ressalve expressamente a aplicação do art 330 do CP Essa interpretação é adequada ao princípio da intervenção mínima do direito penal sempre invocado como ultima ratio Solução idêntica ocorre com as decisões judiciais que cominem suas próprias sanções no âmbito do direito privado como sói acontecer nas antecipações de tutela liminares ou ações civis públicas com apenas uma diferença o Judiciário ao cominar sanções civis ou administrativas nesses casos não pode ressalvar a aplicação cumulativa da pena correspondente ao crime de desobediência por faltarlhe legitimidade legislativa Essa sanção administrativojudicial afasta a natureza criminal de eventual descumprimento da decisão referida e a manutenção ou acréscimo do caráter penal a esse descumprimento não é atribuição do Poder Judiciário 421 Orientação jurisprudencial A jurisprudência majoritariamente também adota essa orientação acertadamente digase de passagem O próprio Supremo Tribunal Federal já se manifestou Não se configura sequer em tese o delito de desobediência quando a lei comina para o ato penalidade civil ou administrativa stf rhc Rel Celio Borja RT 6134130 O Tribunal Regional Federal da 4ª Região por meio da então 2ª Turma examinando exatamente o mesmo tema assim se manifestou in verbis 1 2 Versando o artigo 359 do Código Penal sobre desobediência à decisão judicial especifica o artigo que tal conduta deve se dar sobre perda ou suspensão de direito artigo 92 do Código Penal A decisão judicial a que se refere esse tipo penal portanto diz com decisão advinda de autoridade judicial que detenha competência para aplicar sanção penal Inviável a pretendida emendatio libelli ao caso concreto artigo 330 para artigo 359 Prevendo a decisão da Justiça Laboral descumprida pelo Paciente unicamente pena pecuniária para o seu descumprimento impossível cogitarse da prática de ilícito penal mormente do crime de desobediência grifo acrescentado 3 Ordem concedida determinandose o imediato trancamento da ação penal Os outros Tribunais Regionais Federais também têm adotado essa mesma orientação 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de desobedecer ordem legal de funcionário público competente para emitila Desnecessário enfatizar que o sujeito ativo deve ter conhecimento de que se trata de funcionário público e que a ordem que está a desobedecer é legal sob pena de incorrer em erro de tipo Não há necessidade de qualquer elemento subjetivo especial do injusto sendo ademais irrelevante a motivação do agente Quando o agente atua na dúvida caracterizase inquestionavelmente o dolo eventual que é suficiente para a tipificação subjetiva Não há previsão da modalidade culposa 6 Consumação e tentativa Consumase o crime de desobediência com a efetiva ação ou omissão do sujeito passivo isto é no momento e no lugar em que se concretiza o descumprimento da ordem legal Tratandose contudo da forma omissiva consumase o crime após o decurso do prazo para o cumprimento da ordem ou mais precisamente no exato momento de sua expiração A tentativa somente é possível na forma comissiva O crime omissivo próprio não admite a forma tentada conforme demonstramos quando examinamos os crimes omissivos 7 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de detenção de quinze dias a seis meses e multa É admissível a transação penal que constitui direito público subjetivo do autor do fato independentemente da interpretação em sentido contrário do Ministério Público A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A O crime de desobediência art 330 do CPB sempre pressupõe a presença de ordem inequívoca emitida por Funcionário Público comunicada ao seu destinatário de forma legal e uma vez caracterizado o delito não se elide pelo ulterior cumprimento da determinação judicial art 219 do CPP STJ HC 86429SP Rel Min Napoleão Nunes Maia Filho j 1392007 O art 129 VIII da Constituição de 88 não autoriza o Ministério Público quebrar diretamente o sigilo bancário das pessoas físicas ou jurídicas Não comete o crime de desobediência o gerente de instituição bancária que se recusa a fornecer ao Ministério Público dados bancários tidos por sigilosos TRF 1ª Região HC 200701000017100MA Rel Tourinho Neto j 2622007 O Eg Superior Tribunal de Justiça notadamente a Col Quinta Turma contrariando parte da doutrina assentou entendimento segundo o qual é possível a prática do crime de desobediência por funcionário público no exercício de suas funções STJ HC 30390AL Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 322004 I A autoridade coatora mormente quando destinatária específica e de atuação necessária que deixa de cumprir ordem judicial proveniente de mandado de segurança pode ser sujeito ativo do delito de desobediência art 330 do CP A determinação aí não guarda relação com a vinculação interna de cunho funcionaladministrativo e o seu descumprimento ofende de forma penalmente reprovável o princípio da autoridade objeto da tutela jurídica II A recusa da autoridade coatora em cumprir a ordem judicial pode por força de atipia relativa se restar entendido como dedução evidente a de satisfação de interesse ou sentimento pessoal configurar também o delito de prevaricação art 319 do CP Só a atipia absoluta de plano detectável é que ensejaria o reconhecimento da falta de justa causa STJ HC 12008CE Rel Min Félix Fischer j 632001 Desacato Art 331 Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos ou multa D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias As Ordenações Filipinas puniam Livro V Título 50 especialmente as injúrias feitas aos julgadores ou a seus oficiais O Código Criminal de 1830 considerava agravadas a calúnia e a injúria quando fossem cometidas contra qualquer depositário ou agente da autoridade pública em razão de seu ofício arts 231 e 237 O Código Penal de 1890 por sua vez recepcionou essa infração penal atribuindolhe o nomen juris de desacato punindo a conduta de desacatar qualquer autoridade ou funcionário público em exercício de suas funções ofendendoo diretamente por palavras ou atos ou faltando à consideração devida e à obediência hierárquica art 134 Considerava no entanto qualificado se a infração fosse praticada em sessão pública ou dentro de repartição pública Finalmente o atual Código Penal de 1940 ampliou o alcance da tipificação penal para abranger as ofensas proferidas contra funcionário público no exercício da função como também em razão dela 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração Pública especialmente sua moralidade e probidade administrativa Protegese na verdade a probidade de função pública sua respeitabilidade bem como a integridade de seus funcionários Objetivase especificamente garantir o prestígio e a dignidade da máquina pública relativamente ao cumprimento de determinações legais expedidas por seus agentes É considerado crime pluriofensivo atingindo tanto a honra do funcionário como o prestígio da Administração Pública Nessa linha argumentativa é insuperável a síntese de Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 317 O bem jurídico considerado é a dignidade o prestígio o respeito devido à função pública É o Estado diretamente interessado em que aquele seja protegido e tutelado por ser indispensável à atividade e à dinâmica da administração pública 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa que desacata o funcionário no exercício da função ou em razão dela admitimos inclusive outro funcionário público que exerça ou não a mesma função do ofendido tenha ou não a mesma hierarquia desde que não se encontre no exercício de suas funções É irrelevante que o funcionário público identifiquese ou não como tal o decisivo na nossa visão é que in concreto não esteja agindo como funcionário isto é que não se encontre no exercício de suas funções nem em razão dela Para nós é vazia e ultrapassada a discussão sobre a possibilidade de um superior hierárquico poder praticar desacato em relação a funcionário subalterno ou viceversa Ignoram os antigos defensores da orientação contrária que o bem jurídico tutelado não é o funcionário propriamente mas a função pública e a própria Administração as quais estão portanto acima das sutilezas da hierarquia funcional que é ocasional e circunstancial Sujeitos passivos são o Estado União Estadosmembros Distrito Federal e Municípios e de modo secundário o funcionário público desacatado 4 Tipo objetivo adequação típica A ação tipificada consiste em desacatar ou seja desrespeitar ofender menosprezar funcionário público no exercício da função ou em razão dela Segundo Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 424 a ofensa constitutiva do desacato é qualquer palavra ou ato que redunde em vexame humilhação desprestígio ou irreverência ao funcionário É a grosseira falta de acatamento podendo consistir em palavras injuriosas difamatórias ou caluniosas vias de fato agressão física ameaças gestos obscenos gritos agudos etc O crime de desacato significa menosprezo ao funcionário público e por extensão à própria função pública por ele exercida Reclama por isso elemento subjetivo voltado para a desconsideração para a humilhação Não se confunde apenas com o vocábulo grosseiro que em si mesmo restringese à falta de educação ou de nível cultural quando desacompanhado do fim especial de ultrajar 41 Desacato e resistência O desacato não se confunde com o crime de resistência uma vez que nesta a violência ou ameaça que segundo o texto legal não precisam ser graves endereçadas a funcionário público objetivam a não realização de ato legal enquanto naquele a violência ou ameaça eventuais que não são elementares deste crime dirigidas a funcionário público têm a finalidade de desprestigiálo Por outro lado os impropérios proferidos contra o agente público têm a mesma finalidade de menosprezar o funcionário eou a função pública além de constituírem a essência desse crime enquanto no crime de resistência não passam de simples modus operandi caracterizador da violência ou ameaça sem qualquer finalidade menosprezante do funcionário Os elementos subjetivos de um e outro crime são inconfundíveis O máximo que se poderá admitir havendo violência ou ameaça e desacato será a absorção de um pelo outro mas jamais concurso de crimes como eventualmente a jurisprudência tem admitido 411 Ofensa praticada na presença do ofendido É condição essencial do crime de desacato a presença do ofendido Mesmo no caso de ofensa oral o funcionário deve ser atingido diretamente Não é necessário porém que a ofensa seja irrogada facie ad faciem bastando que próximo ao ofendido seja por este percebida É indispensável que o funcionário encontrese no local onde a ofensa é proferida pois repetindo fazse necessário que esta seja cometida na sua presença No entanto não é conditio sine qua non que o desacatado veja o ofensor e perceba o ato ofensivo sendo suficiente que possa tomar conhecimento direta e imediatamente da ofensa como por exemplo tendoa ouvido Razão pela qual o crime de desacato não pode ser cometido por telefone fax telegrama ou carta O Código Penal Rocco apenas para mencionar e evitar comparações inadequadas equipara essas situações à presença do funcionário público Se o ato se realiza na ausência deste o sujeito ativo poderá responder pelo delito de injúria majorada arts 140 e 141 II do CP mas jamais por desacato No entanto a publicidade da ofensa não é elemento constitutivo do tipo incriminado Assim como é irrelevante a presença de outras pessoas para o aperfeiçoamento da ofensa também a ausência de terceiro que dela tome conhecimento não impede que ele se realize 42 No exercício da função ou em razão dela Diz a lei desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela No primeiro caso no momento da ofensa o funcionário está realizando um ato de seu ofício no segundo embora o funcionário não esteja praticando ato oficial algum a ofensa contra ele é proferida em razão da função Já na Exposição de Motivos do Código Penal de 1940 o Ministro Francisco Campos destacava O desacato se verifica não só quando o funcionário se acha no exercício da função seja ou não o ultraje infligido propter officium senão também quando se acha extra officium desde que a ofensa seja propter officium Devese no entanto analisar com muito cuidado essa elementar normativa para que se possa atribuirlhe corretamente seu verdadeiro significado Encontrase no exercício da função quando o funcionário realiza qualquer ato de ofício inerente ao cargo que ocupa sendo indiferente que ocorra na sede da repartição ou em local outro como por exemplo o oficial de justiça que cumpre um mandado de despejo em determinado endereço residencial O exercício da função não se limita ao localsede em que administrativamente está situada a repartição pública respectiva Enfim a insistência de que é irrelevante a motivação ou o propósito do desacato e de que pode inclusive ser por desavenças particulares deixa todas essas questões dogmáticas sem respostas pelo menos sem respostas dogmaticamente fundamentadas 421 Relação causal no exercício da função ou em razão dela Considerando que a finalidade da norma penal é tutelar a função pública e por extensão a Administração Pública considerando que o tipo penal exige como elemento subjetivo especial o propósito de depreciar a função pública e secundariamente o próprio funcionário e ainda considerando que o ofensor deve ter consciência da condição de funcionário do ofendido e de que se encontra no exercício da função ou em razão dela devese entender que no exercício da função significa que a ofensa irrogada necessita obrigatoriamente relacionar se a fato inerente à função do ofendido isto é que a motivação do sujeito ativo represente sua insatisfação com a prática ou postura do ofendido no exercício de dita função pública O nexo de causalidade ao contrário do que entendia a velha doutrina não pode ser simplificado em ocasional e causal será sempre um nexo funcional causalcircunstancial quando no exercício da função e puramente causal quando for em razão dela É sintomática a denominação de nexo funcional mas será sempre funcional nunca pessoal ou particular tanto no exercício como em razão da função pública exercida Chega às raias do absurdo a interpretação de que em razão da função deve existir um vínculo funcional e que no exercício da função esse vínculo seja desnecessário Ora isso não resiste a um raciocínio lógico protegese o prestígio o decoro e a dignidade da função pública que é o bem jurídico tutelado pretendese evitar seu malferimento essa é razão da reprovação da conduta como então admitir que na hipótese alternativa secundária e indireta em razão dela exijase um vínculo causal enquanto no exercício da função se dispense esse vínculo Onde está a logicidade do argumento 422 Desacato e resistência O desacato por exemplo não se confunde com o crime de resistência uma vez que nesta a violência ou ameaça endereçadas a funcionário público objetivam a não realização de ato legal enquanto naquele a violência ou ameaça eventuais não são elementares desse crime dirigidas a funcionário público têm a finalidade de desprestigiálo de depreciar a função pública Somente assim se poderá entender aquela parte da lição de Hungria segundo a qual o elemento subjetivo do crime é a intenção ultrajante dolo específico propósito de depreciar ou vexar o que distingue o desacato da resistência ainda quando exercido mediante violência ou intimidação sabendo o agente que o ofendido reveste a qualidade de funcionário público e que se acha no exercício da função Essa afirmação absolutamente correta registrese é no entanto incompatível com a possibilidade de a ofensa irrogada poder ser motivada por desavença particular Na verdade convém destacar no exercício da função deve ser apreciado sob o aspecto objetivo numa relação existente entre a função exercida e a causa da ofensa uma relação diríamos de causa e efeito entre o exercício da função e o descontentamento do ofensor com a forma com que o ofendido a exerce 423 Desacato ambiente hostil e seus fundamentos políticos Por formação sempre tivemos grandes dificuldades em aceitar os fundamentos políticos sociológicos e jurídicos da justificativa arbitrária e prepotente e da receptividade passiva com que doutrina e jurisprudência têm contemplado ao longo do tempo a configuração das hipóteses corriqueiras do crime de desacato Parecenos antes de tudo uma flagrante negação de cidadania a proteção falaciosa do prestígio idoneidade e probidade da Administração Pública atributos que deveriam ser demonstrados e justificados por seus atos e pelos resultados que oferece à coletividade ao contrário de numa postura arrogante e despótica calála e impedila de exercitar a saudável crítica democrática exigindo o atendimento de suas sempre prometidas e nunca atendidas expectativas funcionais Resistimos certamente às tradicionais prisões em flagrante que normalmente ocorrem em choques com a polícia e eventualmente em recintos do Poder Judiciário Não estamos por certo defendendo a anarquia total o desrespeito à estrutura públicoadministrativa e tampouco a subversão à ordem estamos apenas sugerindo maiores cautelas no exame dessa figura típica levando em consideração as circunstâncias muito peculiares em que normalmente ocorre e particularmente perante quais autoridades sua incidência é maior A praxis demonstra sobretudo a necessidade de levar em consideração o estado emocional do suposto ofensor suas condições pessoais classe social grau de cultura estado de lucidez desespero pessoal os quais podem fragilizar seu equilíbrio emocional que não pode simplesmente ser desconsiderado Fazse oportuno invocar aqui o magistério de Rudolf von Ihering A luta pelo direito trad João Vasconcelos p 93 que sentenciava quando o arbítrio e a ilegalidade se aventuram audaciosamente a levantar a cabeça é sempre um sinal certo de que aqueles que tinham por missão defender a lei não cumpriram o seu dever 424 Desacato forçado pela ação da autoridade Não raro nos casos de desacato existe a provocação da autoridade geralmente policial na maioria das vezes propositalmente para encobrir alguma arbitrariedade forçando o pseudodesacato A jurisprudência pelo menos tem procurado suavizar as arbitrariedades que ocorrem nos discutíveis desacatos perante agentes policiais ou judiciais decidindo que a repulsa à provocação da autoridade não constitui desacato punível seguindo no particular o velho magistério de Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 427 não haverá crime quando o funcionário tenha dado causa ao ultraje de modo que este se apresente como uma repulsa justificada tal como no caso de resistência à execução de ordens ilegais ou executadas com desnecessária violência Nesses casos vamos mais longe com Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 322 quem primeiramente ofendeu a dignidade da função foi o servidor público que não pode dessarte exigir seja ela respeitada É sintomático que os casos de desacato são quase que somente com autoridades policiais e por vezes judiciais mas nessa hipótese em bem menor quantidade As polícias militares são useiras e vezeiras nessa farsa principalmente no policiamento de rua ou de trânsito com a agravante de que as testemunhas do flagrante são outros policiais ou seja os mesmos parceiros de tarefa independentemente de o fato ter acontecido em meio a outras pessoas lugar populoso ou no interior de alguma casa noturna Testemunhos como esses devem ser recebidos sempre com muita reserva sendo absolutamente insuficientes se não vierem corroborados com outros meios de provas 425 Crítica sem propósito de ofender atipicidade Nessa linha para concluir esse tema é sempre pertinente invocar a sensibilidade de Manzini que profetizava os funcionários públicos e os empregados encarregados de serviço público devem realmente ser respeitados mas a lei não exige que sejam venerados como pessoas sagradas e intocáveis de modo que se tenha como delituosa a simples reprovação de seus atos expressa por modo não injurioso Por isso a doutrina com amplo respaldo jurisprudencial tem sustentado que não constitui crime a crítica ou censura dura incisiva e enérgica a atuação de órgãos ou de agentes públicos A crítica irrogada pelo indivíduo sem o propósito de ofender relativamente ao serviço prestado pela Administração Pública não configura o crime de desacato É um direito do cidadão fiscalizar e criticar a qualidade do serviço público prestado de forma insatisfatória aliás nada incomum nos dias de hoje a despeito da escorchante cobrança de impostos que asfixia a todos sem a correspondente prestação de serviços públicos à altura 426 Embriaguez e desacato incompatibilidade A embriaguez tem sido reconhecida pela jurisprudência é incompatível com o crime de desacato recomendandose por isso mesmo redobrada cautela no exame casuístico para constatar o nível da embriaguez e a indispensável presença do elemento subjetivo especial do injusto qual seja o propósito de ofender de depreciar enfim de desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo do crime de desacato é o dolo representado pela vontade consciente de praticar a conduta descrita no tipo É necessário que o sujeito ativo tenha consciência que está diante de funcionário público e que este se encontra no exercício de suas funções ou em razão dela O erro portanto tanto sobre a qualidade de funcionário público quanto sobre encontrarse no exercício de sua função constitui erro de tipo que afasta a tipificação do crime de desacato podendo dependendo das circunstâncias caracterizar outra infração penal nesse caso contra a honra pessoal Por isso o particular que devolve a provocação de funcionário público como mencionamos anteriormente não comete desacato posto que não pretende desprestigiálo ou à sua função pública mas apenas responder à agressão que considera injusta e indevida 51 Elemento subjetivo especial do injusto A configuração do crime de desacato exige elemento subjetivo especial do injusto consistente na vontade deliberada de desprestigiar a função pública exercida pelo ofendido isto é no propósito de depreciar a função pública exercida pelo sujeito passivo Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 465 já sustentava que o especial fim de agir consiste na vontade consciente de praticar a ação ou proferir a palavra injuriosa com o propósito de ofender ou desrespeitar o funcionário a quem se dirige É este fim que distingue o desacato da resistência nos casos em que materialmente as ações se confundem 6 Consumação e tentativa Consumase o crime de desacato com a prática efetiva pelo sujeito ativo da ofensa ou da manifestação ou exteriorização oral ofensiva palavra Em outras palavras consumase o desacato no lugar e no momento em que o sujeito ativo pratica a ofensa ou profere as palavras injuriosas na presença do ofendido São irrelevantes em princípio as consequências da ação delituosa isto é que o funcionário tenhase sentido ofendido ou que tenha resultado abalado o prestígio ou o decoro da função exercida Há em hipóteses como essas oportunidade para se aplicar seguramente o princípio da insignificância No entanto caso o funcionário e por extensão a própria função pública tenha sido efetivamente depreciado ou menosprezado no exercício da função é irrelevante sua indiferença pois se trata de crime de ação pública que restara configurado Ademais não está em jogo somente a integridade moral do funcionário mas também e principalmente a dignidade e o prestígio da função que desempenha 61 Tentativa e absorção de infrações menores A tentativa é teoricamente admissível embora por vezes de difícil caracterização Será inadmissível contudo quando o desacato for praticado oralmente como ocorre via de regra nos crimes contra a honra O desacato absorve as vias de fato a lesão corporal leve a ameaça a difamação e a injúria pela aplicação do princípio da consunção Em se tratando porém de crime mais grave como a lesão corporal de natureza grave ou a calúnia há concurso formal 7 Pena e ação penal As penas cominadas alternativamente são de detenção de seis meses a dois anos ou multa É aplicável a transação penal considerandose que se integra perfeitamente na definição legal de infração de menor potencial ofensivo art 61 da Lei n 909995 combinado com as disposições da Lei n 102592001 A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Ameaça e desacato Arts 331 e 147 do Código Penal Concurso material É dos Juizados Especiais Criminais a competência para os delitos de menor potencial ofensivo independentemente de os crimes estarem ou não sujeitos a concurso material Desacato O fato do réu emocionalmente alterado por ver o filho doente e pela forma de abordagem reclamar e até ofender os policiais que no caso atuavam como agentes de assistência social por chamado de saúde não configura o delito de desacato previsto no art 331 do Código Penal que pressupõe o ânimo e intenção de atingir e denegrir a autoridade pública Ameaça Provas insuficientes da ocorrência do delito consagrandose o princípio do in dubio pro reo Condenação baseada em indícios impondose a reforma pela absolvição TJRS Recurso Crime 71001569532 Rel Alberto Delgado Neto j 3132008 Desacato Art 331 do Código Penal Validade do depoimento de policiais O conjunto probatório demonstra a efetiva prática do delito pelo acusado que desacatou os policiais no exercício de suas funções utilizandose de expressões depreciativas sendo as palavras proferidas em demérito aos serviços da administração pública restando caracterizado o delito tornando impositiva a condenação Os depoimentos de agentes policiais são válidos e suficientes para ensejar condenação TJRS Recurso Crime 71001569326 Rel Ângela Maria Silveira j 1732008 Desacato Comete o delito previsto no art 331 do Código Penal quem diz para policial militar no exercício da função que ninguém iria lhe prender pois a polícia não prendia ninguém pois vexa humilha e desprestigia os funcionários públicos Condenação mantida TJRS Apelação Crime 70022340251 Rel Constantino Lisbôa de Azevedo j 2122008 No crime de desacato para a perfeita subsunção da conduta ao tipo o que se perquire é se a agressão ofensiva à honra eou dignidade do agente público foi a ele dirigida em razão da função pública exercida ou seja buscase a motivação a causa da conduta reprovável estabelecendose o nexo causal Na hipótese dos autos não houve desacato ao Magistrado em razão da função jurisdicional tendo sido as ofensas a ele dirigidas em caráter pessoal decorrentes de sua atitude como passageiro de companhia aérea inexistindo portanto a subsunção da conduta descrita ao tipo insculpido no art 331 do Código Penal o que evidentemente não autoriza a persecução criminal STJ HC 21228PI Rel Min Laurita Vaz j 202 2003 Tráfico de influência Art 332 Solicitar exigir cobrar ou obter para si ou para outrem vantagem ou promessa de vantagem a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público no exercício da função Pena reclusão de 2 dois a 5 cinco anos e multa Parágrafo único A pena é aumentada da metade se o agente alega ou insinua que a vantagem é também destinada ao funcionário Caput e parágrafo único com redação determinada pela Lei n 9127 de 16 de novembro de 1995 D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Nosso Código Penal de 1940 disciplinou a exploração de prestígio em duas oportunidades a primeira entre os crimes contra a Administração em geral quando praticado contra qualquer funcionário público art 332 a outra dentre os crimes contra a Administração da Justiça quando relacionarse a funcionários a ela vinculados art 357 Finalmente a Lei n 9127 de 16 de novembro de 1995 deu nova redação ao tipo do antigo delito de exploração de prestígio Originalmente o texto do Código Penal de 1940 tinha a seguinte redação Obter para si ou para outrem vantagem ou promessa de vantagem a pretexto de influir em funcionário público no exercício da função Pena reclusão de um a cinco anos e multa A Lei n 9127 de 16 de novembro de 1995 no entanto conferiu a atual redação ao texto legal elevando a pena para dois a cinco anos de reclusão majorandoa de metade na hipótese do parágrafo único que na redação original era elevada em um terço 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração Pública como em todos os demais crimes elencados no Título XI do Código Penal Dos Crimes Contra a Administração Pública mas neste dispositivo no particular aspecto de prestígio confiança e respeito perante a coletividade que é exposta ao descrédito pela ação fraudadora do trapaceiro Gabandose de gozar de prestígio vangloriandose de desfrutar de influência perante a Administração Pública lesa o bom nome o conceito e o prestígio que esta deve ter junto à comunidade difundindo a ideia de que tudo se resolve segundo a importância ou influência de quem desfruta de poder É impecável no particular a concisão de Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 325 é a venda de fumo de fumaça que o agente realiza iludindo o comprador mas desacreditando a administração O bem jurídico tutelado é pois o bom nome o prestígio e a confiança de que a administração pública não pode abrir mão Nessa linha é bom recordar a sábia lição de Carrara Apud Paulo José da Costa Jr Comentários ao Código Penal p 55 que pontificava O direito violado que se protege com a punição da venda de fumaça é unicamente a justiça pública Os prejudicados em tal caso a lei os ouve como testemunhas mas os considera com desprezo Esta não aceita o contrato odiando ambos os contratantes Não se vinga da ofensa deles mas da ofensa da justiça 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa inclusive o funcionário público desde que não esteja no exercício de suas funções normais não o configurando por exemplo a influência exercida por superior hierárquico afora o fato de que sua influência sobre o subalterno não é pretextada é real ela existe No polo ativo contudo não pode deixar de ser considerada a participação decisiva de uma terceira pessoa qual seja a beneficiária da venda do prestígio que é parte diretamente interessada no resultado da ação e no mínimo concorre de qualquer modo para a sua prática art 29 do CP Não ignoramos o entendimento francamente majoritário da doutrina clássica que procuraremos refutar mais adiante há inegavelmente uma relação triangular envolvendo sujeito ativo beneficiário e supostamente funcionário público este pelo menos em tese Sujeito passivo é o Estado União Estado Distrito Federal e Municípios já que se tutela o interesse público lato sensu Não incide nessa infração penal a equiparação prevista no art 327 1º do CP O próprio funcionário público iludido ou ludibriado que arcará no mínimo com o dano moral decorrente de sua propalada infidelidade funcional também é secundariamente sujeito passivo dessa infração penal 4 Tipo objetivo adequação típica As condutas típicas alternativamente incriminadas são representadas pelos verbos nucleares solicitar pedir rogar procurar exigir reclamar ordenar que seja pago cobrar exigir o pagamento de algo ou obter angariar conseguir receber adquirir para si ou para outrem vantagem ou promessa de vantagem a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público no exercício da função Ou seja segundo a doutrina a lei incrimina a bazófia o gáudio ou a jactância de influir na prática de ato de servidor público quando tal prestígio não existe Age o vendedor de ilusões como corretor de pseudocorrupção fraudando de um lado o adquirente beneficiário pelo menos teoricamente que nada recebe em troca da vantagem ou promessa de vantagem e de outro deprecia a Administração Pública que é exposta ao descrédito e ainda desmoraliza o suposto funcionário venal especialmente na forma qualificada O crime não deixa de ser ao menos em tese uma modalidade sui generis de estelionato pois como sentenciava Magalhães Noronha o agente ilude e frauda o pretendente ao ato ou providência governamental alegando um prestígio que não possui e assegurando lhe um êxito que não está a seu alcance Com efeito estão presentes a fraude a vantagem pessoal e o correspondente prejuízo alheio agravado pelo envolvimento de uma entidade pública que constitui causa especial de aumento de pena art 171 3º 41 Tráfico de influência e exploração de prestígio A expressão tráfico de influência é sem dúvida mais abrangente que a anterior exploração de prestígio pois este consiste na superioridade pessoal baseada no bom êxito ou no valor individual Agora fazse necessário com efeito que o agente exerça sua influência sobre ato praticado por funcionário público e não sobre o animus deste como outrora era sugerido pela redação anterior Há um ato fraudulento visto que a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público no exercício da função vem a ser o artifício utilizado para a obtenção da vantagem ou promessa de vantagem É porém imprescindível que o sujeito ativo se atribua prestígio junto a funcionário público pois caso contrário o fato não ofende a Administração Pública e poderá constituir apenas estelionato ou dependendo das circunstâncias outro crime 42 Obtenção de vantagem a pretexto de influir A vantagem ou promessa de vantagem é solicitada ou exigida com a nova versão típica a pretexto de influir em ato de funcionário público Realmente o crime de tráfico de influência pressupõe que a vantagem de que se cogita seja postulada a pretexto de influir esse podese afirmar é o móvel do crime Em regra afirmava Magalhães Noronha existirá como no estelionato uso de ardis ou artifícios mas sendo suficiente a simples mentira a afirmação do sujeito ativo Pode também o delito ocorrer com o silêncio dele como sói acontecer no caso em que malinformado o pretendente a um fato dirigeselhe supondoo influente e ele silencia aceitando a vantagem ou sua promessa Claro que o silêncio é ratificação do que aquele supõe Tratandose efetivamente de pretexto de influir na verdade o funcionário público é o grande injustiçado da história porque desmerecidamente passa por desonesto e corrupto Por isso é pertinente invocarse o magistério de Manzini Tratado de Derecho Penal Buenos Aires Editora Ediar 1961 v 3 t 8 p 24950 que afirmava tratarse de um dos mais vis e odiosos crimes não só porque promove o descrédito dos órgãos públicos em geral como também ofende insidiosamente a honra dos homens honestos que permanecem alheios pelo menos durante um certo tempo da torpe especulação que o velhaco fez valendose de seu nome 43 Absorção do crime de estelionato O tráfico de influência em qualquer de suas modalidades absorve o crime de estelionato Na hipótese de efetivo acordo entre o agente e o funcionário público verificase o crime de corrupção arts 333 e 317 do CP Com efeito se eventualmente faltar alguma das elementares do crime especial ora em exame subsiste o estelionato No entanto se resultar ao final configurado o crime de corrupção este absorverá o tráfico de influência Nessa hipótese poderá dependendo das demais elementares o funcionário responder por corrupção passiva 44 Objeto material vantagem ou promessa dela Objeto material do crime é a vantagem ou promessa desta Pode ser de qualquer natureza material moral ou inclusive sexual ainda que não patrimonial bem como para o próprio sujeito ativo ou para terceira pessoa outrem Assim punese o tráfico de influência ou seja o comércio de influência poder ascendência ou predomínio que alguém exerce sobre outrem ou mais precisamente no caso alardeia que exerce capaz de estenderse em cadeia É indiferente ademais que o objeto da mediação seja justo ou injusto legal ou ilegal A forma de sua obtenção ou o meio utilizado é fraudulento e nisso no pretexto de influir reside a essência caracterizadora da ilicitude comportamental 5 Responsabilidade penal do beneficiáriovítima do tráfico de influência 51 A pretexto de influir duplo sentido Desejamos chamar a atenção para um aspecto do qual discordamos do entendimento adotado pela doutrina tradicional quais sejam o papel e a possível responsabilidade penal do beneficiáriovítima do tráfico de influência Na verdade a falsidade a burla ou dubiedade da locução a pretexto de influir pode também ter outro significado igualmente dúbio e obscuro enfim pode encerrar um duplo sentido pode ser efetivamente fantasioso ou falso o pretexto como sempre foi interpretado mas por outro lado não se deve afastar com segurança absoluta a possibilidade de que a expressão a pretexto de influir tenha o significado de pretender disfarçar a influência que efetivamente tem e em vez de afirmála sugerese apenas sua possibilidade deixando certa dúvida Em outros termos a pretexto de influir pode ter sentido duplo ambos falsos pretextar que tem o que não se tem que é a interpretação feita pela doutrina tradicional ou pretextar que não tem o que se tem apenas para não escancarar por exemplo o seu verdadeiro poder de fogo simulando na primeira hipótese e dissimulando na segunda mas sempre pretextando como refere o dispositivo legal 52 Gozar de influência ou pretextar gozála Se o sujeito ativo realmente goza de influência junto a funcionário público e sem proclamála apenas pretextando desenvolve atividade junto àquele não comete o crime em apreço podendo entretanto dependendo das circunstâncias praticar outro como por exemplo a corrupção ativa A denúncia criminal pois há de conter expressamente esse elemento sem o que não tem condições de fundamentar validamente uma ação penal Porém se realmente gozar de influência e proclamála ao interessadobeneficiário ambos responderão pelo crime de corrupção ativa e o funcionário se admiti la conscientemente pela corrupção passiva Nesses dois aspectos a doutrina tradicional também sempre esteve de acordo Como vemos é demasiadamente tênue a distinção entre a configuração da corrupção ativa e o tráfico de influência alicerçandose por vezes em insustentável subjetivismo que procuramos combater Para prosseguirmos nessa nossa reflexão é indispensável que se revisitem alguns institutos dogmáticos tais como teoria monística crime putativo erro jurídico penal dentre outros precisando seus conceitos e analisando a aplicabilidade ou não de cada um diante da orientação assumida praticamente pela unanimidade da doutrina nacional como já destacamos 53 Relação triangular entre sujeito ativo funcionário público e beneficiário da influência Começamos lembrando que a configuração típica do crime tráfico de influência exige pelo menos em tese o envolvimento de três pessoas alguém 1 um sujeito qualquer funcionário ou não solicita exige cobra ou obtém de outra pessoa 2 que é o beneficiário qualquer vantagem ou promessa a pretexto de influir na prática de ato de funcionário público 3 no exercício da função A pergunta que se impõe é afinal quem responde e quem não responde pela lesão à imagem e ao prestígio da Administração Pública Como não estamos satisfeitos com o entendimento consagrado na doutrina nacional faremos algumas considerações mais detidas sobre o assunto Para melhor compreensão deste tema recomendamos consultar nosso Tratado de Direito penal v 5 531 Entendimento da doutrina tradicional Não nos convence o entendimento sedimentado na doutrina nacional desde as primeiras ideias de Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 428 que professava ao contrário do que entende Magalhães Drumond ob cit pág 348 o interessado não responde pelo crime ut art 25 Não pode ser copartícipe do crime de obter vantagem ou promessa de vantagem etc precisamente aquele que dá ou promete a vantagem Magalhães Noronha Direito Penal t 2 p 325 também analisando o polo passivo dessa infração penal afirmava Secundariamente é também vítima o comprador de prestígio mas prestígio vão fraudulento e inexistente É ele que sofre prejuízo concreto ou material com a vantagem obtida pelo vendedor de fumo Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 468 por sua vez sustentava a pessoa que dá ou promete a vantagem ao agente é lesada e será sujeito passivo secundário embora não aja de boa fé Na mesma trilha Paulo José da Costa Jr Comentários ao Código Penal p 514150 adverte de mais a mais devese considerar que comprador de fumaça é vítima de um engano de um verdadeiro estelionato E que a norma visa a impedir o descrédito da administração que não deriva da sua ação mas do sujeito agente Damásio de Jesus Direito Penal v 2 p 228 também concebe o beneficiário como sujeito passivo do tráfico de influência manifestandose nos seguintes termos Sujeito passivo principal é o Estado De forma secundária a pessoa que compra o prestígio que entrega ou promete a vantagem na ilusão de concretizar um interesse ilegítimo Ele supõe que em concurso está cometendo um delito de corrupção com o funcionário Na verdade está participando de uma farsa Há por parte do comprador do prestígio delito putativo pensa que está realizando corrupção ativa Na doutrina atual Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 543 segue o mesmo caminho como se pode constatar secundariamente figura como sujeito passivo aquele que após ser ludibriado pelo agente dálhe ou prometelhe a vantagem já que incide sobre ele o prejuízo material decorrente da vantagem obtida pelo agente Apesar da conduta do sujeito secundário não é ele punido por se tratar de crime putativo Guilherme de Souza Nucci Código Penal comentado p 1024 mesmo reconhecendo que há o envolvimento de três pessoas silencia sobre a responsabilidade penal do pagador da vantagem 54 Responsabilidade do beneficiário do tráfico Ora a responsabilidade do beneficiário é exatamente concorrer diretamente para o crime de tráfico de influência exploração de prestígio sem cuja participação sequer crime existiria sendo portanto indissociável a sua decisiva contribuição na ação do vendedor de fumaça sendo verdadeiro parceiro na empreitada de beneficiarse da suposta venalidade de funcionário público Não se pode ignorar que o beneficiário da pretextada influência atualmente em regra não é um ingênuo que entra de graça na história pelo contrário é um autêntico corruptor que busca também a sua vantagem por meios não ortodoxos digamos assim numa espécie de fraude bilateral há em verdade uma troca de vantagens entre o executor da suposta influência e o beneficiário desta este dá a vantagem prometida ao agente em troca do favor funcional almejado que outra coisa não é que também vantagem devida ou indevida não importa obtida através de meios ilícitos Na realidade o tráfico de influência é um misto de estelionato qualificado e corrupção ativapassiva cujo resultado influência nem sequer precisa concretizarse com exceção da nova modalidade de exigir No tráfico de influência só há um perdedor a Administração Pública pois se trata no mínimo da conhecida fraude bilateral salvo se como refere Hungria se trate de um rematado ignorante cuja prova deverá ser feita por quem a aproveite nessa hipótese evidentemente o beneficiárioignorante é vítima da astúcia do sujeito ativo não respondendo por crime algum Mas convém realçar nesse meio não existe ignorante ou ingênuo pois não sobreviveria e segundo velho ditado popular quem corre menos voa tanto que todos concordam Noronha Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 429 e Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 468 concretizandose o favor o crime é de corrupção pelo qual também responderá o dito beneficiário Nesse caso qual seria a diferença do elemento subjetivo do beneficiário tendo conseguido ou não o favordo funcionário público Nenhuma pois não há diferença no dolo do crime consumado e do crime tentado não existindo um dolo especial de tentativa Por isso se o beneficiário for realmente o rematado ignorante de que falava Hungria não deverá responder por crime algum independentemente de se concretizar o favor prometido nem por corrupção pois não agiu com dolo no entanto não o sendo que certamente é a regra o beneficiário concorre direta e ativamente para a prática do crime de tráfico de influência nos termos do art 29 do CP 55 Outros equívocos da doutrina tradicional Equivocada também é a afirmação de que quem dá ou se despoja da vantagem não pode ser punido independentemente da contraprestação a que no caso objetiva pois não encontra correspondente no direito brasileiro pelo contrário quem oferece ou promete vantagem a funcionário público responde pelo crime de corrupção ativa art 333 Portanto fácil é observar que ninguém dá nada gratuitamente nem na corrupção nem no tráfico de influência pois há a espera da contraprestação No mesmo sentido é duplamente equivocada a afirmação solitária de Paulo José da Costa Jr de que como acontece na concussão quem dá a vantagem ou a promete não é punido pela falta de previsão normativa em primeiro lugar na concussão ninguém dá ou promete vantagem alguma pelo contrário nesse crime a vítima é extorquida pelo funcionário corrupto que exige a vantagem indevida nela a vítima é constrangida a pagar a propina para não sofrer a ameaça do funcionário venal a exemplo do crime de extorsão art 158 em segundo lugar é falaciosa a afirmativa de que o beneficiário que dá ou promete a vantagem não é punido pela falta de previsão normativa pois também não tem amparo legal essa conclusão Que previsão Costa Jr estaria querendo uma individual para cada crime de concurso necessário E faríamos o quê com a adoção da teoria monística da ação inclusive mantida na Reforma Penal de 1984 Inverteríamos a ordem natural das coisas e a exceção passaria a ser a regra geral ou seja o concorrente nos crimes de concurso necessário não responderia por nada sempre que não viesse expressamente previsto como ocorre nos crimes de corrupção aborto consensual bigamia etc Logicamente Costa Jr não se deu conta de que a previsão normativa geral para toda a Parte Especial do Código Penal ressalvadas as exceções como dissemos expressamente previstas existe e também está contida no art 29 que disciplina o concurso eventual de pessoas do mesmo estatuto penal Apontaria ainda um terceiro equívoco do mesmo autor pela contradição contida na mesma frase na qual consta em seu início o reconhecimento de que o crime é plurissubjetivo concurso necessário sendo aliás o único dos autores apontados a fazer tal afirmação Mais uma razão tratarse de crime de concurso necessário para impedir que se afirme não haver previsão normativa para a punição do concorrente beneficiário da conduta incriminada Aliás para punir os autores dos crimes de concurso necessário é absolutamente desnecessária a previsão do art 29 que disciplina o concurso eventual de pessoas pois esse tipo de autoria dos crimes plurissubjetivos integra a própria definição da infração penal sendo os penalmente responsáveis por seu cometimento independentemente da norma de extensão contida no mencionado art 29 Ademais a conclusão de Costa Jr deveria ser exatamente o inverso a partir do momento que reconhece tratarse de crime de concurso necessário ou seja deveria concluir pela punição do comprador de ilusões exatamente por tratarse de crime plurissubjetivo Divergem vendedor de prestígio e comprador beneficiário apenas num ponto a ação do corretor de influência objetiva a vantagem ou promessa dela ao passo que o comprador visa o favor legal decorrente do exercício de influência Tratase inegavelmente de um crime de dupla subjetividade ativa 56 Lobistas neologismo dos exploradores de prestígio Por fim não se pode ignorar a aglomeração e confluência dos atuais lobistas que mutatis mutandis são os modernos exploradores de prestígio ou os verdadeiros autores do crime de tráfico de influência A prevalecer a tese da irresponsabilidade penal de quem dá paga ou promete vantagem para beneficiarse de influência ou suposta influência perante a Administração Pública estarseá assegurando a impunidade da mais autêntica disfarçada e sofisticada forma de corrupção aperfeiçoada e burilada pelo uso de interposta pessoa que pretexta influência ou seja o atual lobista com os modernos neologismos tais como valores não contabilizados corretores lobistas intermediários corretores despachantes publicitários políticos mercadores de favores públicos etc visto que os verdadeiros corruptores mãos limpas não colocam a mãonamassa no velho estilo sinhozinho malta famoso personagem novelesco de Dias Gomes Dá para crer que nos tempos atuais alguém nesse meio seja ingênuo ou inocente ou como dizia Hungria um rematado ignorante No creemos en las brujas pero que las hay las hay Tanto que o próprio Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 427 na sua sagacidade já advertia É de se reconhecer que num ou noutro caso quando não haja torpeza bilateral isto é quando o interessado ao invés de consciente da malícia de seu propósito não passa de um crédulo ignorante se apresenta uma species de estelionato consumado ou tentado transladada E quem acreditaria na ausência de torpeza bilateral na atualidade nesse tipo de conduta 57 A impunibilidade do pseudocrime putativo erro jurídico penal A segunda premissa equivocada de nossos doutrinadores clássicos referese à afirmação de que o iludido beneficiário participaria de um crime putativo que por tudo é impunível Afinal de que crime putativo estamos falando Nossa concepção de crime putativo é um pouco diferente da que exsurge da afirmação dos penalistas referidos com efeito o crime putativo só existe na imaginação do agente Há no crime putativo um erro de proibição às avessas o agente imagina proibida uma conduta permitida No entanto quando o sujeito imagina que está praticando ou participando de um crime quando na realidade tratase de outro crime como ocorre no tráfico de influência definido no art 332 do CP não se configura o instituto conhecido como crime putativo Por isso preliminarmente já se pode concluir que o simples fato de o beneficiário imaginar que está participando de um crime de corrupção quando na verdade concorre para um crime de tráfico de influência não é suficiente para afastarlhe a punibilidade Há dois aspectos fundamentais nessa premissa sustentada pelos penalistas ora questionados que exigem maior reflexão em primeiro lugar há um erro de valoração ou de interpretacão em segundo lugar o agente pensa que está cometendo um crime quando na realidade concorre para outro diretamente Isso por si só perguntase seria suficiente para gerar a impunidade lembrando que desde o início pretendeu fazer uma troca com o agente ou seja dar uma vantagem em troca de um favor qual seja a influência na prática de um ato da Administração Pública 571 A discutível escusabilidade de determinados erros punibilidade do pagador da influência Parecenos claro que o beneficiário do tráfico de influência pode como regra incorrer em erro induzido ou não Fazse necessário por isso que se examinem a natureza efeitos e extensão de pelo menos alguns tipos de erros jurídicopenais e por fim que se identifique em que espécie de erro pode incorrer dito beneficiário Ocorre nesta hipótese e se for o caso um erro de subsunção enganase quanto ao enquadramento legal da conduta por erro supõe que sua ação não se ajusta ao tipo legal Isso não interfere na ilicitude respondendose pelo ato praticado Com efeito o suposto erro que incorreria o comprador de fumaça seria imaginar que concorreria para um crime de corrupção quando na realidade participa de um crime de exploração de prestígio Qual é a diferença em termos de censurabilidade Imaginar que participa de determinado crime quando in concreto o crime é outro não o exime da responsabilidade e tampouco transforma em crime putativo como imaginava a velha doutrina Não há nenhuma diferença pois tem consciência de que participa de algo proibido que em algum lugar do direito é considerado ilícito orientado pela simples consciência profana do injusto pois como lecionava Binding é suficiente para afastar o erro de proibição Mutatis mutandis é o que ocorre com quem pretendendo participar de um crime de corrupção contribui com o crime de exploração de prestígio sua conduta continua típica antijurídica e ilícita não lhe aproveitando qualquer causa excludente ou dirimente pelo erro Fácil concluir portanto que ainda que aja incorrido em erro esse erro é evitável e por conseguinte inescusável afora o fato mais concreto ainda de que se trata de erro de subsunção imaginava que concorria para um crime de corrupção ao invés de tráfico de influência que como demonstramos é sempre inescusável Por tudo isso aqui mais do que nunca merece acolhida a tese sustentada por Muñoz Conde e Hassemer da adoção de uma teoria do erro orientada às consequências preocupada com os efeitos empíricos mais que normativos da aplicação da norma no quotidiano onde o que realmente importa é a relevância ou não do erro independentemente da sua conceituação 6 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo consistente na vontade consciente dirigida à obtenção de vantagem ou promessa de vantagem a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público no exercício da função O elemento subjetivo especial do tipo está representado pela finalidade especial de destinarse a vantagem ou sua promessa para o próprio agente ou para terceiro Não é necessário que o agente tenha como objetivo atingir a Administração Pública ou o próprio funcionário embora essa consequência seja inerente à ação incriminada 7 Consumação e tentativa Consumase o crime no lugar e no momento em que o agente solicita exige ou cobra a vantagem ou promessa de vantagem para agir Consumase em outros termos com a mera solicitação exigência ou cobrança da vantagem ou promessa desta para influir em funcionário público no exercício da função independentemente de outro resultado Acreditamos que nem mesmo na conduta de obter seja necessário o efetivo recebimento da vantagem para que o crime possa ser consumado na medida em que o tipo penal se satisfaz com a simples promessa de vantagem e convenhamos obter promessa de vantagem representa algo que estará por acontecer e não que tenha efetivamente ocorrido O ato do funcionário não pode ser passado pois é impossível influir em algo que já ocorreu sendo irrelevante contudo que tal ato seja lícito ou ilícito pois o texto legal não faz essa distinção e tampouco sugere que se possa fazêla 71 Recebimento da vantagem prometida exaurimento O recebimento efetivo por parte do sujeito ativo da vantagem prometida representará somente o exaurimento do crime que poderá apenas influir na dosagem in concreto da pena aplicada Contudo se o funcionário sobre o qual a influência foi exercitada também receber a vantagem prometida ou parte dela estarseá inegavelmente diante do crime de corrupção Essa convém acrescentar é uma razão a mais para discordarmos da impunibilidade do pagador da vantagem pois o elemento subjetivo da sua participação no cometimento do crime continua o mesmo com o mesmo conteúdo e os mesmos elementos direcionado ao mesmo fim qual seja objetivar contar com a suposta influência do sujeito ativo junto a ato de funcionário público Por isso nunca estivemos convencidos de sua propagada inocência A tentativa é admissível embora de difícil configuração pois em várias de suas formas será possível o fracionamento do iter criminis 8 Forma majorada Tratandose de crime formal como regra não exige a efetiva produção de resultado No entanto o legislador preocupouse sobremodo com a importância e integridade do bem jurídico protegido qual seja com a Administração Pública em geral e próprio funcionário em particular Por isso havendo alegação ou insinuação de que a vantagem destinase também ao funcionário aumenta a reprovação pessoal Realmente nessa hipótese o desvalor da ação é bem superior ao da simples insinuação de influência junto a funcionário público justificandose consequentemente a causa especial de aumento de pena parágrafo único Prevista no parágrafo único ocorre se o agente alega ou insinua que a vantagem de natureza moral ou material também é destinada ao funcionário público 9 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de reclusão de dois a cinco anos e multa A causa de aumento de pena inserta no parágrafo único comina igual pena aumentada da metade A previsão anterior era de pena de um a cinco anos de reclusão e multa com a majorante de apenas um terço A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A O crime de tráfico de influência previsto no artigo 332 do Código Penal com a redação dada pela Lei n 9127 de 1995 se caracteriza para os fins cogitados pela conduta de solicitar para si vantagem a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público no exercício da função A conduta do Recorrido se limitou à proposta da quantia de R 25000000 duzentos e cinquenta mil reais como contraprestação dos seus serviços advocatícios Tal fato só por só não caracteriza o ilícito penal previsto no art 332 do Código Penal que para sua consumação exige o dolo específico de influir com especial fim de agir STJ REsp 662706DF Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 16122004 Crime de tráfico de influência Art 332 do CP Cometimento na esfera municipal Na espécie o delito foi praticado na seara municipal não se inserindo a hipótese em nenhum dos incisos do art 109 da Constituição Federal para que a competência seja dirimida em favor do juízo federal Conflito conhecido declarandose a competência do juízo estadual onde fora inicialmente proposta a ação STJ Conflito de Competência 42119MT Rel Min José Arnaldo da Fonseca j 962004 Corrupção ativa Art 333 Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público para determinálo a praticar omitir ou retardar ato de ofício Pena reclusão de 2 dois a 12 doze anos e multa Pena com redação dada pela Lei n 10763 de 12 de novembro de 2003 Parágrafo único A pena é aumentada de um terço se em razão da vantagem ou promessa o funcionário retarda ou omite ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O nosso Código Criminal do Império 1830 seguiu a orientação de equiparar as duas formas de corrupção que foi mantida no Código Penal de 1890 Finalmente o Código Penal de 1940 afastouse de seu inspirador o Código Penal Rocco 1930 disciplinando a corrupção ativa e passiva como crimes autônomos e independentes afastando lhes a natureza de crime bilateral 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração Pública especialmente sua moralidade e probidade administrativa Protegemse na verdade a probidade da função pública sua respeitabilidade bem como a integridade de seus funcionários O bem jurídico tutelado pela proibição da corrupção é o regular funcionamento da Administração Pública É indispensável uma relação entre a conduta proibida e o bem jurídico penalmente protegido O julgamento a respeito torna imprescindível portanto uma referência ao conteúdo ofensivo do fato concreto sob pena de se proceder a uma inversão tipológica desviando a atenção de uma lesão representada pela compra de um ato ato de ofício para uma simples dádiva liberal do cidadão sem qualquer contrapartida que como dissemos constitui conduta atípica no ordenamento jurídicobrasileiro 21 A moralidade da Administração Pública e o princípio da insignificância A tipicidade penal exige a ofensa de alguma gravidade aos bens jurídicos protegidos pois nem sempre qualquer ofensa a esses bens ou interesses é suficiente para configurar o injusto típico Segundo esse princípio conhecido como princípio da bagatela é imperativa uma efetiva proporcionalidade entre a gravidade da conduta que se pretende punir e a drasticidade da intervenção estatal Amiúde condutas que se amoldam a determinado tipo penal sob o ponto de vista formal não apresentam nenhuma relevância material Nessas circunstâncias pode se afastar liminarmente a tipicidade penal porque na verdade o bem jurídico não chegou a ser lesado A irrelevância ou insignificância de determinada conduta deve ser aferida não apenas em relação à importância do bem juridicamente atingido moralidade e funcionamento da Administração Pública mas especialmente em relação ao grau de sua intensidade isto é pela extensão da lesão produzida Em síntese a insignificância da ofensa afasta a tipicidade Mas essa insignificância só pode ser valorada por meio da consideração global da ordem jurídica e não somente em particular relativamente ao bem atingido 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa independentemente de condição ou qualidade pessoal Nada impede que o sujeito ativo também seja funcionário público desde que não aja como tal isto é no exercício de suas funções ou em razão delas Na verdade o funcionário público agindo como particular pode efetivamente funcionar como sujeito ativo do crime de corrupção ativa em relação a outro funcionário Sujeito passivo é o EstadoAdministração União Estado Distrito Federal e Município Convém destacar que embora o funcionário público estritamente considerado ou o assemelhado seja o destinatário da ação do sujeito ativo não figura como sujeito passivo desse tipo penal por isso se tem afirmado que aqui não incide o alcance da norma contida no art 327 e 1º que só tem aplicação quando o sujeito ativo revestese da qualidade de funcionário público 4 Tipo objetivo adequação típica A conduta típica alternativamente prevista consiste em oferecer apresentar colocar à disposição ou prometer obrigarse a dar vantagem indevida de qualquer natureza material ou moral a funcionário público para determinálo a praticar realizar omitir deixar de praticar ou retardar atrasar ato de ofício incluído na esfera de competência do funcionário Segundo a disciplina do nosso Código Penal de 1940 a corrupção nem sempre é crime bilateral ou seja nem sempre pressupõe a existência de um pactum sceleris entre corruptor e corrupto pois qualquer das duas modalidades ativa ou passiva consideramse consumadas independentemente da aceitação recíproca consumase a passiva com a simples solicitação da vantagem indevida pelo funcionário corrupto mesmo que não seja aceita pelo extraneus a ativa com a simples oferta ou promessa de dita vantagem pelo extraneus corruptor sendo irrelevante que o funcionário público a recuse Tratase de um tipo especial que se compõe de elementos objetivos subjetivos e normativos que exige além de dolo um elemento subjetivo especial do injusto Para que se configure o tipo penal todos esses elementos devem constar no fato concretizado pelo agente A ausência de qualquer deles afasta a tipicidade da conduta Para sua melhor compreensão faremos a decomposição analítica desse tipo penal destacando suas elementares 41 Oferecer vantagem indevida A vantagem indevida constitui o objeto material da ação tipificada representa o conteúdo da oferta que em outros termos é o preço do funcionário corrupto Como a lei preferiu não definila como vantagem patrimonial ela será relevante quando for suficiente para corromper o funcionário levandoo a praticar ou não um ato visando uma retribuição que pode não ser econômica sem que nem por isso deixe de traficar com a função Enfim para caracterizar vantagem indevida é preciso que a ação traduza comércio da função isto é deve existir mercancia da função pública É fundamental que a ação seja inequívoca demonstrando segundo Magalhães Noronha o propósito do agente Essa inequivocidade deve necessariamente estar presente no caso concreto uma vez que a dação do sujeito ativo não pode ter outro propósito que não o de comprar a prática de ato de ofício O próprio Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 261 lembranos Cumpre todavia notar que nem toda dádiva ou presente importa corrupção Assim como não se compreende que alguém presenteie um magistrado com um automóvel ou uma casa de alguns milhares de cruzeiros não se pode pensar em corrupção com uma garrafa de vinho ou uma cesta de frutas 42 A funcionário público O destinatário da vantagem indevida é o funcionário público O direito penal considera funcionário público quem embora transitoriamente ou sem remuneração exerce cargo emprego ou função pública O emprego público por sua vez é o serviço temporário com contrato em regime especial ou de conformidade com o disposto na Consolidação das Leis do Trabalho O conceito de funcionário público fornecido pelo art 327 caput do CP se estende a toda a legislação penal extravagante Nosso Código Penal em seu art 327 adotou a noção extensiva e deu maior elasticidade ao conceito de funcionário público Isto é não exige para a caracterização de funcionário público o exercício profissional ou permanente da função pública Basta o indivíduo exercer ainda que temporariamente e sem remuneração cargo emprego ou função pública Não há por que fazer a distinção para fins de aplicação do conceito extensivo de funcionário público entre sujeito ativo e sujeito passivo do delito Isso porque o art 327 emite um nítido comando geral ainda que inserido no Capítulo I do Código Penal que deve ser aplicado a todas as hipóteses contempladas no ordenamento penal contidas ou não no Código Penal Assim inseremse no conceito de funcionário público todos aqueles que embora transitoriamente e sem remuneração venham a exercer cargo emprego ou função pública ou seja todos aqueles que de qualquer forma exerçamna tendo em vista a ampliação do conceito de funcionário público para fins penais A Lei n 9983 de 14 de julho de 2000 acrescentou o 1º ao art 327 que equipara a funcionário público quem exerce o cargo emprego ou função em entidade paraestatal nos seguintes termos Equiparase a funcionário público quem exerce cargo emprego ou função em entidade paraestatal e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública Esse dispositivo equiparou a funcionário público para fins penais quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada 43 Para determinálo a praticar ato de ofício O crime de corrupção ativa somente se aperfeiçoa quando a promessa ou oferta de vantagem indevida tem por objetivo que funcionário público no exercício de sua função pratique omita ou retarde ato de ofício E não é podese afirmar ato de ofício o praticado contra as normas vigentes ou a sistemática habitual Quando determinado ato pode ser realizado por qualquer do povo à evidência não se trata de ato de ofício Com efeito para a configuração do crime de corrupção ativa exigese que o ato cuja ação ou omissão é pretendida esteja compreendido nas específicas atribuições funcionais do servidor público visado Se o ato não é da competência do funcionário poderseá identificar qualquer outro crime mas com certeza não o de corrupção ativa O crime não se caracteriza sem a oferta de vantagem explícita Para que se configure a corrupção ativa é indispensável que a oferta ou promessa sejam feitas espontaneamente pelo agente e ao contrário da corrupção passiva antes da prática do ato pelo funcionário público Se a oferta ou promessa for motivada por exigência haverá o crime de concussão art 316 do CP e não corrupção ativa 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo geral é o dolo constituído pela vontade consciente de oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público para praticar retardar ou omitir a prática de ato de ofício Essa infração penal exige também o elemento subjetivo especial do tipo representado pelo especial fim de agir isto é para determinálo a praticar omitir ou retardar ato de ofício O fundamento real de todo o crime é a concretização da vontade num fato externo já que crime não é somente a vontade má mas a vontade má concretizada num fato pois o tipo subjetivo abrange todos os aspectos subjetivos da descrição típica de conduta proibida que concretamente produzem o tipo objetivo Esses aspectos subjetivos por sua vez são o dolo e os elementos subjetivos do tipo Dolo é a consciência e vontade de realização da conduta descrita em um tipo penal ou na expressão de Welzel Dolo em sentido técnico penal é somente a vontade de ação orientada à realização do tipo de um delito E o dolo constituise de dois elementos um volitivo que é a vontade de realizar a conduta típica e um cognitivo que é o conhecimento do fato constitutivo da ação típica Em outros termos a essência do dolo deve estar na vontade não de violar a lei mas de realizar a ação Esse elemento volitivo deve estar presente na ação realizada pelo sujeito ativo Mas a vontade deve abranger a ação os meios utilizados o resultado e o nexo causal Todos esses elementos que integram o tipo objetivo devem ser abrangidos pelo dolo sob pena de não se configurar o tipo subjetivo Na verdade a vontade de realização do tipo objetivo pressupõe a possibilidade de influir no curso causal pois tudo o que estiver fora da possibilidade de influência concreta do agente pode ser desejado ou esperado mas não significa querer realizálo Somente pode ser objeto da norma jurídica algo que o agente possa realizar ou omitir Para a configuração do dolo exigese ainda a consciência daquilo que se pretende praticar dos meios a empregar do resultado e do nexo causal Essa consciência deve ser atual isto é deve estar presente no momento da ação quando ela está sendo realizada É insuficiente a potencial consciência das circunstâncias objetivas do tipo já que prescindir dela equivale a destruir a linha divisória entre dolo e culpa convertendo aquele em mera ficção Na verdade a vontade pressupõe uma previsão isto é a representação na medida em que é impossível querer algo conscientemente senão o que se previu ou representou em nossa mente pelo menos em parte A previsão sem vontade é algo completamente inexpressivo indiferente ao direito penal e a vontade sem previsão é absolutamente impossível No dolo direto o agente quer o resultado representado como fim de sua ação A vontade do agente é dirigida à realização do fato típico O objeto do dolo direto é o fim proposto os meios escolhidos e até os efeitos colaterais representados como necessários à realização do fim pretendido Não se pode ignorar que a previsão isto é a representação deve abranger correta e completamente todos os elementos essenciais do tipo sejam eles descritivos normativos ou subjetivos Enfim a consciência deve abranger a realização dos elementos descritivos e normativos do nexo causal e do evento delitos materiais da lesão ao bem jurídico dos elementos da autoria e da participação Por isso quando o processo intelectualvolitivo não atinge um dos componentes da ação descrita na lei o dolo não se aperfeiçoa 51 Elemento subjetivo especial do tipo A evolução dogmática do direito nos revela que determinado ato poderá ser justo ou injusto dependendo da intenção com que o agente o pratica Um comportamento pode ser justo ou injusto segundo seu aspecto interno isto é de acordo com a intenção com que é praticado Assim por exemplo quando o ginecologista toca a região genital da paciente com fins terapêuticos exercita legitimamente sua nobre profissão de médico se o faz no entanto com intenções voluptuárias sua conduta é ilícita Outro exemplo alguém empresta seu veículo à autoridade policial para facilitar o atendimento de uma vítima e não para obter qualquer benefício muito menos para exigir a prática de ato de ofício Para que o empréstimo efetuado configurasse o elemento subjetivo especial exigiria uma finalidade ou intenção adicional de obter um resultado ulterior a prática de ato de ofício ou ulterior atividade distintos da realização do tipo penal isto é exigiria um agir com ânimo de obter a prática de um ato de ofício que não existiu As intenções especiais integram a estrutura subjetiva de determinados tipos penais exigindo do autor a persecução de um objetivo compreendido no tipo Faz parte do tipo de injusto uma finalidade transcendente um especial fim de agir por exemplo para si ou para outrem art 157 com o fim de obter art 159 em proveito próprio ou alheio art 180 etc ou como diz o art 333 para determinálo a praticar ato de ofício Mas esse fim especial deve existir antes de o ato de ofício ter sido praticado caso contrário não há como exigir a prática de um ato que já se tenha realizado 6 Consumação e tentativa Consumase o crime com o efetivo conhecimento pelo funcionário do oferecimento ou promessa de vantagem indevida Tratandose de crime de mera conduta é despicienda a existência da vantagem pois se consuma apenas com a oferta isto é com o simples oferecer ainda que a oferta não seja aceita Punese indiferentemente quando se tratar de oferta ou promessa dirigida ao funcionário por interposta pessoa A tentativa é admissível apenas na hipótese de oferta escrita 7 Figura majorada parágrafo único À semelhança da previsão do 1º do art 317 corrupção passiva se o funcionário público em razão da vantagem ou promessa dela retarda ou omite ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional a pena é majorada em um terço Não deixa de ser uma espécie de punição pelo exaurimento do crime Entretanto se o funcionário pratica ato de ofício de natureza legal sem violar o dever funcional não incide na forma qualificada e sim no caput do art 333 do CP Essa antinomia do texto legal gerou pequena polêmica entre Magalhães Drumond Comentários ao Código Penal p 352 e Nélson Hungria que a rigor falaram de coisas diferentes Para o primeiro tal dispositivo importa na declaração de impunibilidade por incriminação da realização de ato de ofício determinado por promessa ou oferta de vantagem mas que não se tenha verificado com infração de dever funcional Hungria de forma contundente contesta essa crítica sustentando Há um flagrante equívoco em semelhante raciocínio É de toda evidência que se à oferta ou promessa aceita se segue a prática do visado ato não contrário ao dever funcional o fato se enquadra no caput do art 333 pois se este incrimina o simples ato da oferta ou promessa para induzir ou aliciar o funcionário à prática do ato de ofício ainda que não contrário ao dever funcional é claro que incrimina a hipótese em que aceita a oferta ou promessa pelo funcionário vem a ser efetivamente praticado esse ato É indiscutível o grande equívoco de Magalhães Drumond para a tipificação do caput do art 333 é irrelevante a infração de dever funcional e a própria aceitação da vantagem ou promessa para configurar a aplicação da causa de aumento paradoxalmente somente se houver infringência de tal dever justificando a perplexidade na medida em que o exaurimento do crime somente fundamenta maior sanção penal se houver a infringência de dever funcional Por outro lado a majorante se configura desde que haja omissão ou retardamento de ato de ofício em razão da vantagem ou promessa dela Para essa hipótese omissiva não há exigência expressa de infringência de dever funcional embora em regra o retardamento ou omissão de ato de ofício implique em princípio a violação do dever funcional salvo se houver alguma justificativa razoável 8 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de reclusão de dois a doze anos e multa O parágrafo único prevê a mesma pena majorada em um terço A partir de 13 de novembro de 2003 a pena privativa de liberdade foi elevada para dois a doze anos de reclusão Lei n 107632003 mantida cumulativamente a de multa Essa pena como sempre é irretroativa sendo aplicável somente aos fatos praticados após a sua vigência Repetese o equívoco políticolegislativo contido na infração similar do art 317 qual seja o exagerado distanciamento entre o mínimo e o máximo deixando margem muito grande ao poder discricionário do julgador na dosagem de pena A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Corrupção Ativa Art 333 CP Crime Formal Por se tratar de crime formal basta para sua consumação a simples oferta ou promessa de vantagem indevida com o intuito de que o funcionário público pratique omita ou retarde ato de ofício Portanto pouco importa para sua caracterização o fato de o réu não estar na posse do dinheiro ou da pistola Não há qualquer impedimento legal que se tome o testemunho dos policias militares não sendo considerados enquanto policiais suspeitos ou impedidos A considerar ainda que não existem provas objetivas e concretas de que o policial esteja acusando o réu de maneira infundada Apelo improvido TJRS Apelação 70021620455 Rel José Eugênio Tedesco j 19122007 Art 333 do CP A mesma tese que autorizou o recebimento da denúncia pela Corte Estadual qual seja a participação dos denunciados num esquema ilícito de colaboração para com um fundo comum de recursos destinados à distribuição de propina a servidores públicos e o recebimento por parte de determinados servidores dentre eles um Promotor de Justiça e um Juiz de Direito de dinheiro proveniente daquele fundo determina a existência de um efetivo concurso entre os acusados da prática de corrupção ativa STJ HC 47004RJ Rel Min Paulo Medina j 6122005 O crime de corrupção ativa previsto no art 333 do Código Penal pode ser praticado dentre outras formas por meio de palavras atos ou gestos a oferta ou promessa não precisa ser clara e direta podendo ser subentendida à vista das circunstâncias e do contexto em que realizada Configura em tese o crime de corrupção ativa a conduta do agente que diretamente interessado em investigação criminal realizada em inquérito policial dirigese ao Departamento de Criminalística da Polícia Federal e depois de dizer ao perito como queria ver elaborado o laudo fornece seus endereços e coloca à disposição do expert tudo o que precisar para a realização do trabalho O tipo do art 333 do Código Penal não exige senão que a vantagem oferecida ou prometida ao funcionário público seja indevida Assim para a configuração do crime de corrupção ativa não é mister seja especificada pelo agente corruptor qual seria a vantagem oferecida ou prometida bastando que transmita ao funcionário público a ideia de que lhe será propiciada em troca da violação ao dever de ofício alguma vantagem indevida TRF3ª Região HC 200403000070881 Rel Nelton dos Santos j 3032004 Contrabando ou descaminho Art 334 Importar ou exportar mercadoria proibida ou iludir no todo ou em parte o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada pela saída ou pelo consumo de mercadoria Pena reclusão de 1 um a 4 quatro anos 1º Incorre na mesma pena quem a pratica navegação de cabotagem fora dos casos permitidos em lei b pratica fato assimilado em lei especial a contrabando ou descaminho c vende expõe à venda mantém em depósito ou de qualquer forma utiliza em proveito próprio ou alheio no exercício de atividade comercial ou industrial mercadoria de procedência estrangeira que introduziu clandestinamente no País ou importou fraudulentamente ou que sabe ser produto de introdução clandestina no território nacional ou de importação fraudulenta por parte de outrem d adquire recebe ou oculta em proveito próprio ou alheio no exercício de atividade comercial ou industrial mercadoria de procedência estrangeira desacompanhada de documentação legal ou acompanhada de documentos que sabe serem falsos 2º Equiparase às atividades comerciais para os efeitos deste artigo qualquer forma de comércio irregular ou clandestino de mercadorias estrangeiras inclusive o exercido em residências 3º A pena aplicase em dobro se o crime de contrabando ou descaminho é praticado em transporte aéreo D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Na legislação brasileira o Código Criminal do Império 1830 tipificava o crime de contrabando art 177 como integrante Dos crimes contra o tesouro público e a propriedade pública inserto na segunda parte do seu Título VI O Código Penal de 1890 por sua vez prescrevia o crime de contrabando art 265 no Título VII que tratava Dos crimes contra a Fazenda Pública Por fim o legislador de 1940 seguindo as codificações anteriores manteve a criminalizacão de contrabando e descaminho no mesmo dispositivo legal art 334 tratandoos como se tivessem o mesmo significado ignorando a realidade das coisas inclusive o desvalor de ação uma vez que uma coisa é importar ou exportar coisa proibida e outra absolutamente distinta é praticar a mesma conduta somente tendo como objeto coisa lícita permitida 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido como em todas as infrações penais constantes do Título XI do Código Penal Parte Especial é a Administração Pública no plano genérico O bem jurídico tutelado específico no entanto a despeito de todos os fundamentos que se têm procurado atribuir à criminalização do contrabando ou descaminho é acima de tudo a salvaguarda dos interesses do erário público diretamente atingido pela evasão de renda resultante dessas operações clandestinas ou fraudulentas Num plano secundário não se pode negar visase também proteger a moralidade pública com a repressão de importação e exportação de mercadoria proibida que podem inclusive produzir lesão à saúde pública à higiene etc e não deixa de proteger igualmente a indústria e a economia nacionais como um todo com o fortalecimento de barreiras alfandegárias Não se discute que o crime de contrabando ou descaminho ofende relevantes interesses públicos não apenas da Administração Pública como também do erário público e da própria soberania nacional e considerando a tendência moderna de criminalizar cada vez mais a fraude fiscal é absolutamente improvável que as legislações contemporâneas deixem de criminalizar o contrabando ou descaminho como se chegou a defender ao longo dos séculos XIX e XX 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa inclusive funcionário público desde que não tenha a função fiscalizadora aduaneira pois nesse caso infringiria seu dever funcional e sua conduta tipificaria a conduta descrita no art 318 do CP de facilitar a prática de contrabando ou descaminho porque em decorrência da função tem o especial dever funcional de impedilo Em síntese o funcionário público que concorre para o crime de contrabando ou descaminho se infringir seu dever funcional específico responde pelo crime do art 318 facilitação do crime se não o infringir responde como coautor ou partícipe do contrabando ou descaminho art 334 Nada impede que possa ocorrer a figura do concurso eventual de pessoas seja com outra pessoa qualquer seja com o funcionário público desde que logicamente não tenha o dever funcional fiscalizatório O fato de eventualmente concorrerem mais de três pessoas na prática desse crime como de qualquer outro ao contrário da atual mania nacional não configura por si só o crime de quadrilha ou bando especialmente quando for praticado por representantes legais de pessoas jurídicas que normalmente são administradas por pessoas em número superior a três Sujeito passivo é o Estado representado pela União Estados membros Distrito Federal ou Municípios e especialmente o erário público e a Receita Federal que são fraudados em sua integridade orçamentáriofiscal 4 Tipo objetivo adequação típica O caput deste artigo apresenta duas figuras típicas distintas quais sejam o contrabando e o descaminho que o legislador insistiu em dar lhes tratamento penal idêntico a contrabando consiste em importar fazer entrar no País ou exportar dele fazer sair mercadoria proibida b descaminho iludir no todo ou em parte o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada pela saída ou pelo consumo de mercadoria Na primeira hipótese significa trazer mercadoria de fora para dentro do País ou levar para fora dele o objeto é mercadoria proibida e configura o contrabando próprio Na segunda o descaminho que é a importação ou exportação de mercadoria permitida o objeto é frustrar total ou parcialmente o pagamento de direito ou imposto que caracteriza o contrabando impróprio Com efeito segundo a doutrina iludir traduz a ideia de enganar mascarar a realidade simular dissimular enfim o agente se vale de expediente para dar impressão na espécie de não praticar conduta tributável Há pois uma espécie sui generis podese dizer acrescentamos nós de meio fraudulento forçando um pouco o sentido dessa expressão Este por sua vez pode ocorrer tanto por ação como por omissão Na primeira hipótese exemplificando o agente procura demonstrar que determinada mercadoria é outra e não aquela ou que tem outras propriedades que não as verdadeiras para incidir carga tributária menor etc na segunda omissiva o agente indagado pelo agente alfandegário se traz consigo objeto ou mercadoria tributável finge que não entendeu deixa de responder ou simplesmente não toma a iniciativa de expor sua mercadoria tributável Tanto em um caso como no outro a intenção de iludir é evidente Há pois configuração nítida do propósito de não efetuar o pagamento do tributo alfandegário 41 Contrabando natureza e forma O contrabando além de poder lesar o erário público caso de proibição relativa v g pode ofender a saúde a moral a higiene e até a indústria nacional A materialidade do crime de contrabando em síntese consiste na importação ou exportação de mercadoria proibida A proibição da comercialização de determinada mercadoria no caso de importar ou exportar pode ser absoluta ou relativa a proibição absoluta via de regra leva em consideração a natureza da mercadoria ou sua finalidade específica sendo absolutamente impedida sua importação ou exportação a relativa por sua vez poderia ser mais bem definida como condicionada pois é submetida a determinados acontecimentos contingenciais ou à satisfação de certas condições e normalmente a proibição relativa é temporária como ocorre por exemplo com a importação de veículos estrangeiros para estimular a indústria nacional com a restrição na importação de certos produtos de origem animal em razão de contaminações químicas ou mesmo o contágio de certas doenças como a febre da vaca louca europeia ou a gripe asiática de frangos etc 42 Descaminho natureza e forma O descaminho por sua vez é fundamentalmente um ilícito de natureza fiscal lesando somente o erário público particularmente a aduana nacional constituindo numa linguagem não técnica um contrabando contra o fisco A simples introdução no território nacional de mercadoria estrangeira sem pagamento dos direitos alfandegários independentemente de qualquer prática ardilosa visando iludir a fiscalização tipifica o crime de descaminho Temos certa resistência interpretativa em admitir em respeito ao princípio da tipicidade estrita a expressão fraude ou fraudulenta na definição do crime de descaminho porque o legislador brasileiro é claro quando quer usando literalmente a expressão fraude ou fraudulenta artifício ardil ou qualquer outro meio fraudulento ao contrário do que faz na tipificação do descaminho referindose somente a iludir o pagamento Há inegavelmente grande diferença pelo menos em termos de gravidade do meio empregado nessa hipótese que se satisfaz por exemplo com a simples omissão que convenhamos tecnicamente não se confunde com fraude alguma No descaminho destaca a segunda parte do caput do art 334 a ilisão do pagamento de direito ou imposto pode ser no todo ou em parte isto é a omissão do pagamento devido pode ser total ou parcial Contudo o não pagamento total ausência absoluta do pagamento de qualquer valor ou parcial pagamento de valor inferior ao devido configura igualmente o crime de descaminho de sorte que a sua omissão total ou parcial deverá ser objeto de valoração tão somente quando da fixação da pena 5 Crimes equiparados a contrabando ou descaminho No 1º do art 334 com redação determinada pela Lei n 472965 determinase a aplicação das mesmas penas previstas para o contrabando e descaminho a prática de navegação de cabotagem fora dos casos permitidos em lei b pratica fato assimilado em lei especial a contrabando ou descaminho c vende expõe à venda mantém em depósito ou de qualquer forma utiliza em proveito próprio ou alheio no exercício de atividade comercial ou industrial mercadoria de procedência estrangeira que introduziu clandestinamente no País ou importou fraudulentamente ou que sabe ser produto de introdução clandestina no território nacional ou de importação fraudulenta por parte de outrem d adquire recebe ou oculta em proveito próprio ou alheio no exercício de atividade comercial ou industrial mercadoria de procedência estrangeira desacompanhada de documentação legal ou acompanhada de documentos que sabe serem falsos 51 Prática de navegação de cabotagem fora dos casos permitidos em lei A navegação de cabotagem circunscrevese ao território nacional e tem como objetivo a comunicação e o comércio entre os portos do País abrangendo os rios que correm em seu território sendo privativa dos navios nacionais A Lei n 943297 encarregouse de definila como a navegação realizada entre portos ou pontos do território brasileiro utilizando a via marítima ou esta e as vias navegáveis interiores art 2º IX complementando a norma penal em branco contida no Código Penal 52 Prática de fato assemelhado em lei especial a contrabando ou descaminho A concepção de fato assemelhado a contrabando ou descaminho não se confunde com seu sentido vernacular simplesmente mas se refere a fatos que juridicamente são tratados similarmente a contrabando ou descaminho Regis Prado enfatiza esse aspecto em outros termos com irreparável precisão o alcance normativo refere se a outros fatos que normas especiais equiparam a contrabando Os exemplos sugeridos pela doutrina multiplicamse é a equiparação feita pelo Decretolei n 28867 em relação às mercadorias saídas da Zona Franca ou pela Lei n 490765 que equipara a contrabandista o transportador ou responsável pela violação dos elementos de segurança do cofre de carga Merece ser destacado que nenhum dos diplomas legais mencionados Decretolei n 28867 e Lei n 490765 comina a respectiva sanção penal limitandose a equipararem as ações incriminadas a contrabando ou descaminho assumindo a condição de leis complementadoras da norma penal em branco caso contrário isto é se cominassem as respectivas sanções penais seria impossível adequaremse ao dispositivo sub examen e constituiriam leis especiais que deveriam ser aplicadas autonomamente No art 334 em sua redação original no seu 1º constava somente a previsão de a prática de navegação de cabotagem fora dos casos permitidos em lei e b prática de fato assemelhado em lei especial a contrabando ou descaminho No entanto a Lei n 4729 de 14 de julho de 1965 que definia o crime de sonegação fiscal no seu art 5º alterou o art 334 do CP acrescentou outros crimes equiparados a contrabando ou descaminho alíneas c e d no seu 1º e no 2º ampliou em razão deles o conceito de atividade comercial Finalmente a Lei n 472965 transformou o antigo 2º em 3º no qual consta a majorante pelo contrabando operar via transporte aéreo 53 Uso comercial ou industrial de mercadoria importada clandestina ou fraudulentamente ou que sabe ser produto de contrabando ou descaminho O objeto material dessas condutas é a mercadoria estrangeira introduzida clandestina ou fraudulentamente no País Introdução clandestina é o ingresso de mercadoria estrangeira sem passar pela alfândega importação fraudulenta por sua vez referese ao descaminho praticado pelo agente via alfândega Tratase nessa hipótese de crime próprio pois pressupõe que o sujeito ativo seja comerciante ou industrialista ao exigir que as condutas criminalizadas sejam praticadas no exercício de atividade comercial ou industrial No exercício de atividade comercial ou industrial exige habitualidade visto que é impossível exercer qualquer atividade representada por ato único 531 Vendedores ambulantes possíveis sujeitos ativos O legislador não deixou dúvida quanto à natureza das atividades comercial e industrial ao ampliar os seus conceitos no 2º determinando que equiparase às atividades comerciais para os efeitos deste artigo qualquer forma de comércio irregular ou clandestino de mercadorias estrangeiras inclusive o exercido em residências Essa previsão legal tem endereço certo nessa ampliação da atividade comercial contida no parágrafo referido o legislador equiparou o vendedor ambulante camelôs ou os popularmente conhecidos como muambeiros do Paraguai ao comerciante regularmente estabelecido A consequência atinge em cheio os ambulantes impede que estes mesmo não sendo comerciantes regularmente estabelecidos não podem beneficiarse com interpretações benéficas e restritivas por não serem comerciantes e tampouco exercerem a atividade comercial nos termos da lei Respondem igualmente bastando que o façam com a habitualidade requerida pelo verbo exercer como adverte Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 567 abrangendo não só aqueles que exercem atividade comercial pública sem a devida autorização legal como também aqueles que praticam tal atividade furtivamente inclusive em residências para não serem localizados pelos agentes do poder público Nesse sentido a despeito da abrangência do 2º não alcança qualquer pessoa que eventualmente adquire em sua residência mercadoria de procedência estrangeira irregular ou clandestina nos termos previstos na alínea c do 1º Com efeito pretendese punir aquele que com habitualidade exerce o comércio como diz a lei mesmo clandestino ou irregular 532 Conflito aparente de normas A primeira parte descrita na alínea c referese ao proveito conseguido pelo agente com o contrabando ou descaminho que praticou nessa hipótese o sujeito ativo responde unicamente pelo crime descrito do art 334 1º c afastada a incidência cumulativa do caput pela aplicação também cumulativa dos princípios da especialidade e da consunção o primeiro porque a previsão do parágrafo é especial em relação ao caput o segundo porque se trata efetivamente de progressão criminosa começando com a importação igualmente criminosa e prossegue com o aproveitamento do produto obtido Na segunda parte da mesma alínea c o contrabando ou descaminho não é praticado pelo agente que no entanto sabe que se trata de mercadoria estrangeira introduzida clandestinamente ou importada fraudulentamente Essa previsão legal configura uma modalidade especial de receptação tratada no entanto como contrabando ou descaminho afasta consequentemente pelo mesmo princípio da especialidade a previsão do art 180 do CP 54 Elemento normativo no exercício de atividade comercial ou industrial O desejo de ser mais drástico e mais abrangente por vezes pode ao mesmo tempo tornar a previsão legal mais restritiva Foi o que ocorreu nesse caso pois nada impede que o agente pratique qualquer das condutas elencadas nas duas alíneas sem fazêlo no entanto no exercício de atividade comercial ou industrial regular ou irregular Tais condutas não se amoldariam dessa forma à figura de contrabando ou descaminho equiparado tornandose por consequência figura atípica Na verdade no 2º do art 334 o legislador traz uma figura de equiparação qualquer forma de comércio irregular ou clandestino de mercadorias estrangeiras ampliando a abrangência dos crimes próprios contidos nas alíneas c e d do mencionado 1º Incorpora assim ao conceito de atividade comercial qualquer forma de comércio irregular ou clandestino inclusive o exercido em residência A pretensão do legislador foi inquestionavelmente alargar a incidência do contrabando ou descaminho equiparado em relação às atividades comerciais de compra venda depósito ou ocultação de mercadorias de procedência estrangeira introduzida clandestina ou fraudulentamente no País ou com documentação irregular realizadas não apenas em comércio regular mas também em qualquer forma de comércio irregular ou clandestino de mercadorias estrangeiras inclusive o exercido em residências Com essa previsão naqueles crimes próprios que exigem a condição especial de ser comerciante ou industrial alargase o tipo para admitir como sujeito ativo também aquele que pratica comércio irregular e até clandestino Contudo constatase mais uma vez um lapso do legislador que ao ampliar a abrangência desse crime próprio esqueceuse de incluir quem exerce atividade industrial irregular ou clandestina como fizera em relação à atividade comercial 2º Assim quem praticar qualquer das condutas descritas no 1º c ou d mas no exercício de atividade industrial em caráter irregular ou clandestino não incorrerá nas sanções do contrabando ou descaminho equiparado ora sub examen assim se o agente praticar qualquer das condutas contidas nas duas alíneas referidas no exercício de atividade industrial em caráter irregular ou clandestino sua atividade será atípica Mas a previsão legal das alíneas tal como é limitase ao exercício de atividade comercial ou industrial a atividade comercial mesmo irregular ou clandestina e a industrial regular fora dessa hipótese ou seja quando o agente não se encontrar no exercício dessas atividades as mesmas condutas não se tipificarão 55 Receptação de produto de contrabando ou descaminho Essas ações enfim seriam normalmente puníveis como o crime de receptação previsto lá no Título Dos crimes contra o patrimônio pois pressupõem a introdução ilegal de mercadoria estrangeira no País quer com documentos falsos quer sem documentação legal Ademais referidas ações devem ser praticadas no exercício de atividades comerciais ou industriais em proveito próprio ou de outrem Há com efeito um conflito aparente de normas com o disposto no art 181 1º do CP que deve naturalmente ser afastado pelo princípio da especialidade 6 Contrabando e descaminho distinção fática e semelhança jurídica Contrabando e descaminho são coisas absolutamente distintas embora o Código Penal os trate como se fossem idênticas Com efeito contrabando é a importação ou exportação de mercadoria proibida relativa ou absolutamente Descaminho por sua vez é a importação ou exportação de mercadorias permitidas que o agente omite evita ou burla na alfândega o recolhimento dos direitos e impostos devidos entrada saída ou consumo O contrabando atenta teoricamente contra a moral saúde higiene segurança pública etc enquanto o descaminho viola as obrigações aduaneiras tributos aduaneiros Constatase enfim que o Código que equiparou institutos que têm conteúdos distintos tutela bens jurídicos diversos e que têm objetos materiais e significados igualmente diferentes mas que por opção políticocriminal produzem as mesmas consequências jurídicopenais Por isso é dessa forma que se deve abordar contrabando importação ou exportação de mercadoria proibida e descaminho importação ou exportação de mercadoria permitida sem o pagamento dos tributos alfandegários Com efeito enquanto o descaminho na essência constitui uma violação fiscal típica da relação fiscocontribuinte o contrabando configurando entrada ou saída de mercadoria proibida não contém qualquer natureza fiscaltributária ou em outros termos a importação ou exportação de mercadoria proibida constitui um fato ilícito e não a violação de uma norma geradora de tributos Tais modalidades distinguemse precisamente porque enquanto no descaminho a omissão ao pagamento dos tributos aduaneiros é na essência crime de sonegação fiscal lato sensu um ilícito de natureza tributária pois atenta diretamente contra o erário público no contrabando propriamente dito a exportação ou importação de determinada mercadoria proibida não se enquadra entre os delitos de natureza tributária Ou seja proibida a exportação ou a importação de determinada mercadoria o seu ingresso ou sua saída das fronteiras nacionais configuram um fato ilícito e não um ato gerador de tributos Márcia Dometilla L de Carvalho Crimes de contrabando e descaminho São Paulo Saraiva 1983 p 4 61 Distinção entre contrabando ou descaminho e crimes contra a ordem tributária Com efeito com o crime de descaminho deixase de recolher todos os tributos que lhe são inerentes tais como o imposto de importação e exportação II e IE o imposto de produtos industrializados IPI substituto do antigo imposto de consumo pois via de regra o objeto material do descaminho é produto industrializado e o imposto sobre a circulação de mercadorias e serviços ICMS Constatase que o descaminho a despeito de implicar direta e simultaneamente sonegação automática de inúmeros impostos é tipificado e classificado como crime contra a Administração Pública por opção políticocriminal do legislador e não como crime contra a ordem tributária que tecnicamente não constituiria nenhum disparate se houvesse opção legislativa em atribuirlhe essa natureza Em sentido semelhante embora com argumentação um pouco distinta reforça nosso entendimento o magistério de Luiz Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 5612 Os postos aduaneiros conhecidos também por barreiras alfandegárias fiscalizam o cumprimento das obrigações fiscais daqueles que exercem atividades econômicas entre dois ou mais países de forma que a fraude do descaminho visando ao não recolhimento do tributo grifo acrescentado bem como a prática do contrabando se fazem por rotas desviantes de tais barreiras utilizandose muitas vezes os criminosos de barcos aviões e caminhões para passar com os produtos por rios campos de pouso e estradas não fiscalizadas No entanto tratandose de descaminho ou contrabando emoldurado como está no art 334 tal norma é especial em relação às outras existentes na seara de infrações contra a ordem tributária pois o que define sua especialidade é a natureza do bem jurídico tutelado contra a Administração Pública dispensandolhe tratamento especial diferente peculiar específico em relação aos demais crimes fazendários que são regulados por leis genéricas da Ordem Tributária Realmente o fato de serem leis extravagantes não se lhes acrescenta por si só a qualidade de especial em relação à norma codificada pelo contrário significa tão somente que se trata de normas complementares a exemplo de milhares de outras de todos conhecidas que denunciam não mais que a incapacidade no mundo globalizado de o Código Penal abranger todas as condutas ilícitas nas mais diversas áreas da atividade humana Havendo contudo lei específica disciplinando diferentemente a importação ou exportação de mercadoria proibida isto é de contrabando stricto sensu como ocorre por exemplo com o tráfico ilícito de entorpecentes disciplinado pela Lei n 113432006 esta prevalecerá sobre a norma do art 334 do Código Penal Na verdade a própria lei penal por vezes proíbe a importação ou exportação de determinados objetos ou de certas mercadorias configurando também nessas hipóteses crime autônomo distinto do contrabando ora sub examen como ocorre por exemplo com a importação ou exportação de escrito ou objeto obsceno art 234 ou moeda falsa art 289 1º ficando afastado o tradicional crime de contrabando pela aplicação do princípio da especialidade 7 Aplicação analógica do art 34 da Lei n 924995 no crime de descaminho A Lei n 472965 em seu art 2º dispunha que Extinguese a punibilidade dos crimes previstos nesta lei quando o agente promover o recolhimento do tributo devido antes de ter início na esfera administrativa a ação fiscal própria Sob essa ótica a possibilidade de o pagamento do tributo extinguir a punibilidade dos crimes de sonegação fiscal exigia que o recolhimento teria de ser prévio à instauração da ação fiscal o que na prática a inviabilizava pois deveria basicamente coincidir com a descoberta formal da sonegação O conhecido Decretolei n 157 de 10 de fevereiro de 1967 em seu art 18 passou a assegurar a extinção da punibilidade pelo pagamento do tributo dos crimes previstos na Lei n 472965 se mesmo iniciada a ação fiscal o agente promover o recolhimento dos tributos e multas devidos de acordo com o Decretolei n 6266 ou depositar os respectivos valores antes do julgamento do referido processo art 18 Em seu 2º foi mais longe determinando a extinção da punibilidade quando se tratar de imputação penal de natureza diversa da Lei n 472965 desde que o pagamento do tributo devido nos termos do caput do art 18 ocorra antes de iniciada a ação penal Esse diploma legal na verdade como afirma Andrei Zenkner Schmidt Andrei Schmidt Exclusão da punibilidade em crimes de sonegação fiscal Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 p 86 ampliou a possibilidade de o pagamento ocorrer logo após o julgamento da autoridade administrativa de primeira instância Tal regra propiciava que o contribuinte só efetuasse o pagamento após exercitar pelo menos em primeiro grau administrativo a sua defesa técnica flexibilizandose assim as possibilidades de exclusão da punibilidade O Decretolei n 288 de 28 de fevereiro de 1967 por sua vez equiparou ao descaminho que definiu como contrabando a saída de mercadorias da Zona Franca de Manaus sem autorização legal expedida pelas autoridades competentes ou seja sem o pagamento dos tributos quando o valor ultrapassar a cota que cada viajante pode trazer livremente nos seguintes termos Será considerada contrabando a saída de mercadorias da Zona Franca sem a autorização legal expedida pelas autoridades competentes art 39 Essa equiparação a contrabando de saída de mercadorias da Zona Franca sem autorização legal levou o Supremo Tribunal Federal orientado pelos princípios da razoabilidade proporcionalidade e isonomia a estender a extinção da punibilidade pelo pagamento do tributo devido ao crime de contrabando ou descaminho editando a Súmula 560 com o seguinte enunciado A extinção da punibilidade pelo pagamento do tributo devido estendese ao crime de contrabando ou descaminho por força do art 18 2º do Decretolei n 15767 O legislador brasileiro no entanto sempre ávido e diligente na busca de meios eficazes de rechear as Arcas do Tesouro para usar uma expressão de Basileu Garcia não concebendo o pagamento do tributo de descaminho como fonte próspera de arrecadação proibiu através da Lei n 691081 que o pagamento do tributo extinga a punibilidade do crime de contrabando ou descaminho nos termos previstos pela Lei n 4729 e Decretolei n 15767 impedindo a aplicação da Súmula 560 do STF antes citada No entanto posteriormente o art 14 da Lei n 813790 na sua redação original ampliou a exclusão da punibilidade possibilitando pela vez primeira o pagamento do tributo sonegado até o recebimento da denúncia na ação penal nos seguintes termos Extinguese a punibilidade dos crimes definidos nos arts 1º a 3º quando o agente promover o pagamento do tributo ou contribuição social inclusive acessórios antes do recebimento da denúncia que também acabou sendo revogada pela Lei n 838391 art 98 No ano de 1995 porém a Lei n 9249 recriou a possibilidade de exclusão da punibilidade pelo pagamento do tributo desde que promovido antes do recebimento da denúncia Extinguese a punibilidade dos crimes definidos na Lei n 813790 de 27 de dezembro de 1990 e na Lei n 4729 de 14 de julho de 1965 quando o agente promover o pagamento do tributo ou contribuição social inclusive acessórios antes do recebimento da denúncia 71 Extinção da punibilidade do descaminho pelo pagamento do tributo devido Analisando com muita propriedade todo esse aparato legislativo além de outras leis igualmente de natureza tributária Andrei Schmidt Exclusão da punibilidade em crimes de sonegação fiscal p 88 conclui Conjugandose todo este emaranhado legislativo chegamos a uma primeira conclusão não definitiva frisese a respeito do tratamento desta modalidade de exclusão da punibilidade para os delitos de sonegação fiscal Considerandose que diversas são as modalidades de tributos e contribuições sociais bem como o fato de as contribuições previdenciárias terem recebido um tratamento diferenciado no Código Penal podese afirmar o seguinte a o pagamento de qualquer tributo sonegado menos a contribuição previdenciária exclui a punibilidade se realizado antes do recebimento da denúncia na forma do art 34 da Lei n 924995 b se o tributo sonegado for a contribuição previdenciária na modalidade apropriação indébita art 168A a extinção da punibilidade só ocorre obrigatoriamente se o pagamento for prévio ao início da ação fiscal art 168A 2º sendo discricionária a extinção se precedente ao oferecimento da denúncia art 168A 3º I c se o tributo sonegado for a contribuição previdenciária na modalidade supressão ou redução art 337A a extinção da punibilidade ocorre obrigatoriamente se a ação fiscal é precedida de confissão e declarações necessárias pelo contribuinte independentemente do pagamento da exação Nesse contexto a unidade e harmonia do sistema jurídico como um todo recomendam a aplicação do mesmo tratamento a todas as modalidades de sonegação fiscal lato sensu E como afirmamos inicialmente no descaminho ao contrário do contrabando há um ilícito fiscal com a omissão ou supressão de tributo sendo portanto perfeitamente possível estenderlhe o benefício insculpido no art 34 da Lei n 9249 como chegou a entender no passado nossa Corte Suprema Com efeito a partir de 1970 o Supremo Tribunal Federal passou a entender que em razão do disposto no art 18 2º do Decretolei n 15767 e principalmente do Decretolei n 28867 que a extinção da punibilidade pelo pagamento do tributo também se aplicaria ao crime de contrabando ou descaminho como já destacamos acabando por sumular esse entendimento de 1976 Súmula 560 que acabou inviabilizada pela Lei n 691081 72 Analogia in bonam partem e tratamento isonômico Atualmente o entendimento jurisprudencial tem sido francamente desfavorável à aplicação do art 34 da Lei n 924995 ao crime de descaminho ressalvada uma ou outra decisão isolada No entanto como enfatiza Andrei Schmidt Exclusão da punibilidade em crimes de sonegação fiscal p 122 boa parte dos fundamentos utilizados para negarse a aplicação analógica do art 34 da Lei n 924995 ao art 334 do CPB valese das mesmas hipóteses à época da edição da Lei n 691081 De nada vale argumentar contudo que esta lei prejudicou a aplicação da Súmula 560 do STF se em 1995 foi editada a Lei n 9249 conferindo novo tratamento à matéria Assim é que eventual argumentação acerca da aplicação desta lei ao art 334 do CPB não pode levar em consideração a revogação de uma Súmula ocorrida há mais de 20 anos A pergunta que se há de fazer na verdade é a seguinte é possível a aplicação da analogia in bonam partem entre uma lei extravagante e o Código Penal A resposta é evidentemente afirmativa posto não existir razão alguma lógica política ou jurídica para afastar essa espécie de analogia pelo simples fato de tratarse de diplomas legais codificados e não codificados especialmente num país como o nosso em que viceja diariamente quantidade insuportável de novas leis disciplinando contraditoriamente as mesmas áreas de diversas matérias ou diversas matérias das mesmas áreas e viceversa São equivocados como observa Andrei Schmidt os argumentos que partem da ideia de que a diversidade de bens impediria a analogia pois esse aspecto por si só não poderia impedir a colmatação da lacuna legal mesmo porque o sistema tributário encontrase inserto nos crimes contra a administração como ocorre com as previsões dos arts 168A 337A e do próprio art 334 que disciplina o contrabando ou descaminho que tratam ainda que lato sensu de crime de sonegação fiscal 721 Irrelevância da diversidade de bens jurídicos Enfim o argumento da diferença de bens jurídicos protegidos é absolutamente inconsistente pois como demonstramos em tópicos anteriores deste capítulo na essência a criminalização do descaminho objetiva tutelar acima de tudo a salvaguarda dos interesses do erário público diretamente atingido pela evasão de renda resultante dessas operações clandestinas ou fraudulentas Com isso fazemos coro com a conclusão de Andrei Schmidt Exclusão da punibilidade em crimes de sonegação fiscal p 1223 tratase pois de norma que regula a sonegação fiscal de tributos devidos na importação de mercadorias de acesso permitido em nosso País ao contrário do contrabando onde a mercadoria é proibida Assim trata se de modalidade específica de sonegação fiscal que afasta a incidência da Lei n 813790 pela simples razão de haver norma especial a respeito do assunto art 334 do CPB Concluindo como o crime de descaminho viola de modo geral o sistema tributário nacional não há razão alguma voltamos a repetir para impedir a aplicação analógica do art 34 da Lei n 924995 como forma de restabelecer o princípio da isonomia onde existe a mesma razão fundamental prevalece a mesma regra de direito assegurando se a aplicação do disposto no art 34 da Lei n 924995 a todos os crimes fiscais inclusive ao descaminho Rui Stoco et al Código Penal e sua interpretação jurisprudencial p 2115 8 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo do contrabando ou descaminho é constituído pelo dolo consistente na vontade livre e consciente de importar ou exportar mercadoria proibida ou de iludir total ou parcialmente o pagamento de direito ou tributo devido Nenhuma outra conduta é exigida na hipótese de descaminho sendo suficiente para caracterizar a conduta descrita no tipo penal que não se declare na alfândega a mercadoria excedente à cota permitida consciente de que ultrapassa o valor permitido Tanto no contrabando quanto no descaminho é desnecessário qualquer elemento subjetivo especial do injusto sendo irrelevante para sua configuração a presença ou ausência de alguma motivação especial No entanto as figuras equiparadas constantes das alíneas c e d do 1º exigem a presença dos elementos subjetivos do tipo em proveito próprio ou alheio bem como o conhecimento pelo sujeito ativo da introdução clandestina ou da falsidade documental 81 Erro de tipo escusável ou inescusável No crime de contrabando se o agente ignora que se trata de mercadoria proibida erra sobre um elemento constitutivo do tipo que por isso mesmo não é abrangido completamente pelo dolo logo incorre em erro de tipo que exclui o dolo e como não há previsão de modalidade culposa para o crime de contrabando o fato tornase atípico No entanto se um indivíduo vindo do exterior porta importa determinada quantidade de haxixe imaginando que não seja proibido porque por exemplo é liberado em determinados países europeus incorre em erro de proibição Contudo devese fazer um segundo julgamento isto é uma segunda avaliação sobre a evitabilidade ou inevitabilidade de dito erro ou seja se referido erro é escusável ou inescusável Se por exemplo referido indivíduo for um holandês ou sueco em cujos países o uso consumo e transporte de haxixe ou maconha é permitido o erro pode ser justificável ou no mínimo sustentável no entanto se tal indivíduo for um brasileiro ou outro qualquer em cujo país de origem não tenha a mesma liberalidade o erro é injustificável e portanto não pode ser escusado devendo responder pelo crime de tráfico de entorpecentes normalmente 9 Consumação e tentativa Consumase o crime de contrabando quando a mercadoria proibida ingressa no País importação ou quando ultrapassa a zona alfandegária deixando o território nacional exportação Nesse momento está consumado o crime de contrabando O descaminho via aduana consumase com a liberação da mercadoria sem o pagamento do tributo devido se no entanto a entrada ou saída da mercadoria ocorre em local distinto da aduana o crime se consuma com a entrada da mercadoria no País ou com sua saída do território nacional Se o sujeito ativo usar de algum ardil para liberar a mercadoria iludindo os fiscais consumase o crime no momento em que retomar a posse da mercadoria sem o correspondente pagamento devido De qualquer sorte tanto o contrabando quanto o descaminho quando realizados regularmente através da alfândega somente com a liberação da mercadoria e entrega ao destinatário poderseá ter como consumada a importação ou exportação A tentativa é teoricamente admissível pois é perfeitamente possível fracionar o iter criminis tanto do contrabando quanto do descaminho Em termos bem esquemáticos é perfeitamente possível tentar importar ou exportar mercadoria proibida ou tentar liberar mercadorias permitidas sem pagar as correspondentes obrigações alfandegárias sendo inviabilizada por circunstâncias alheias à vontade do agente No entanto não nos parece possível reconhecer a tentativa de contrabando ou descaminho quando a mercadoria é apreendida na aduana mesmo antes de transpor as barreiras alfandegárias Poderseá estar inclusive diante de um crime impossível dependendo das circunstâncias ou ainda de meros atos preparatórios Acreditamos que confisco e multa no plano administrativo resolvem satisfatoriamente a infração fiscal 10 Figura majorada contrabando em transporte aéreo Aplicase a pena em dobro quando o contrabando ou descaminho é praticado em transporte aéreo 3º Teoricamente a justificativa para essa majorante é a maior dificuldade de controle do transporte aéreo de mercadorias feito por essa via Evidentemente que o legislador quando editou essa majorante por certo a estava destinando à importação ou exportação clandestina sem controle alfandegário Em situações como essas efetivamente o combate ao contrabando ou descaminho fica enormemente dificultado sendo razoável que se procure cominarlhe sanção penal mais rigorosa Contudo a mesma racionalidade interpretativa leva à conclusão de que tal majorante é inaplicável quando o contrabando ou descaminho ocorre através dos chamados voos regulares ou de aviões de carreira que são objetos de fiscalização alfandegária permanente Esse entendimento é reforçado pelo de Luiz Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 568 No entanto a majorante só alcança os delitos perpetrados em aeronaves clandestinas já que os voos regulares de carreira não são incluídos aqui posto serem objeto de fiscalização alfandegária permanente Estamos pois de pleno acordo 11 Descaminho limite fiscal e princípio da insignificância O Superior Tribunal de Justiça já decidiu que O ingresso irregular de mercadorias estrangeiras em quantidade ínfima por pessoas excluídas do mercado de trabalho que se dedicam ao comércio formiga não tem repercussão na seara penal à míngua de efetiva lesão do bem jurídico tutelado enquadrandose a hipótese no princípio da insignificância Esse entendimento adotado pelo STJ com absoluto acerto digase de passagem parte do velho adágio latino minima non curat praetor A tipicidade penal exige a ofensa de alguma gravidade aos bens jurídicos protegidos pois nem sempre qualquer ofensa a esses bens ou interesses é suficiente para configurar o injusto típico Segundo esse princípio é imperativa a efetiva proporcionalidade entre a gravidade da conduta que se pretende punir e a drasticidade da intervenção estatal Frequentemente condutas que se amoldam a determinado tipo penal sob o ponto de vista formal não apresentam nenhuma relevância material Nessas circunstâncias podese afastar liminarmente a tipicidade penal porque em verdade o bem jurídico não chega a ser lesado Ante o exposto não será por certo a introdução de qualquer quantidade de mercadoria sem o correspondente pagamento dos tributos alfandegários que tipificará uma infração penal se não apresentar real relevância material pois não estará lesando o bem jurídico tutelado Em matéria tributária a própria Receita Federal oferece os parâmetros para o critério da insignificância quando por exemplo fixa um valor mínimo como piso para justificar a execução fiscal ou a própria inscrição em dívida ativa Sobre a figura típica do descaminho ainda releva notar o tratamento tributário aplicado à bagagem cujos bens abrangidos por este conceito não estão sujeitos à incidência de impostos Imposto de Importação e Imposto sobre Produtos Industrializados Portanto é atípica a introdução de mercadorias estrangeiras em quantidade ou qualidade submetidas ao limite de isenção tributária fixado pelo regulamento fazendário específico 12 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é a reclusão de um a quatro anos Para a forma majorada que alguns doutrinadores falam em figura qualificada embora não apresente novos limites mínimo e máximo da pena cominada a pena aplicase em dobro A ação penal como em todos os crimes contra a Administração Pública é de natureza pública incondicionada e é da competência da Justiça Federal porque o imposto a ser recolhido destinase à União afora o fato de que na maioria das vezes tais ocorrências acontecem em região alfandegária com a fiscalização de agentes federais Nesse sentido ademais consta da Súmula 151 A competência para o processo e julgamento por crime de contrabando ou descaminho definese pela prevenção do Juízo Federal do lugar da apreensão dos bens J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Súmula 151 do STJ A competência para o processo e julgamento por crime de contrabando ou descaminho definese pela prevenção do Juízo Federal do lugar da apreensão dos bens Nos termos da jurisprudência da Corte Suprema o princípio da insignificância é reconhecido sendo capaz de tornar atípico o fato denunciado não sendo adequado considerar circunstâncias alheias às do delito para afastálo No cenário dos autos não parece razoável concluir com base em dois episódios que o réu faça da prática do descaminho o seu modo de vida Habeas corpus concedido de ofício para cassar o título judicial condenatório formado contra o réu STF RE 550761RS Rel Min Menezes Direito j 27112007 Na medida em que ninguém discorda que o princípio da insignificância interfere com a tipicidade material é evidente que apenas a inexpressividade do prejuízo ou dano deve interessar para fins de reconhecimento ou não do crime de bagatela abstraindose de discussão outras circunstâncias personalidade do agente antecedentes habitualidade ou continuidade delituosa índice de culpabilidade etc Mercadorias descaminhadas cigarros no valor total de R 750000 sete mil e quinhentos reais sobre os quais incidiria a carga fiscal Insignificância Portaria n 49 de 1º de abril de 2004 do Ministro da Fazenda autorizando 1º a não inscrição como dívida ativa da União de débitos com a Fazenda Nacional de valor até R 100000 e 2º o não ajuizamento das execuções fiscais de débitos até R 1000000 In casu que havendo o concurso de três agentes o valor das mercadorias ilegalmente internadas para fins de aplicação do princípio da insignificância deve ser considerado individualmente ou seja no valor de R 250000 dois mil e quinhentos reais para cada um TRF3ª Região RESE 200361240015681 Rel Johonsom Di Salvo j 6112007 Se o valor dos produtos que o agente introduziu no País é inferior a US 30000 trezentos dólares americanos a conduta é atípica porquanto respeitada a cota de isenção do pagamento do II e do IPI fixada no art 155 inciso III alínea b do Decreto n 45432002 e no art 6º inciso III alínea b da INSRF n 11798 alterado pela INSRF n 538 de 2042005 Para o reconhecimento do crime de bagatela devese considerar tão somente o valor da afetação ao bem jurídico tutelado pela norma incriminadora apresentandose irrelevantes circunstâncias de caráter eminentemente subjetivo especialmente aquelas relacionadas à vida pregressa e ao comportamento social do agente Precedentes do STF STJ e 4ª Seção do TRF4R TRF4ª Região RESE 200771170007533 Rel Paulo Afonso Brum Vaz j 276 2007 Constatado o pronto pagamento do tributo antes mesmo da lavratura do auto de infração se para alguns não se faz possível falarse em extinção de punibilidade em delitos previstos no art 334 do Código Penal não se faz possível afirmar a ocorrência de dolo ou dolo eventual Levandose em consideração a objetividade jurídica do tipo penal relativo ao descaminho não seria absurda a aplicação da analogia in bonam partem da norma prevista no art 34 da Lei 924995 Precedentes jurisprudências TRF3ª Região Apelação 200261040111396SP Rel Luiz Stefanini j 632007 O simples fato de a mercadoria importada não apontar no rótulo seu país de origem não configura a conduta prevista no artigo 334 caput do Código Penal TRF3ª Região RESE 199961040040327 Rel Cotrim Guimarães j 5122006 Simples Laudo de Homologação de Termo de Guarda Fiscal não é instrumento apto a demonstrar a procedência estrangeira dos produtos internados Isto porque se mostra necessário o laudo técnicocientífico que deve descrever o material apreendido com exame da sua procedência estrangeira o que contudo não é feito pelo Termo de Apreensão e Guarda Fiscal elaborado por agentes da Secretaria da Receita Federal Materialidade do delito de descaminho não demonstrada TRF3ª Região Apelação 199903990000405SP Rel Suzana Camargo j 1962006 Impedimento perturbação ou fraude de concorrência Art 335 Impedir perturbar ou fraudar concorrência pública ou venda em hasta pública promovida pela administração federal estadual ou municipal ou por entidade paraestatal afastar ou procurar afastar concorrente ou licitante por meio de violência grave ameaça fraude ou oferecimento de vantagem Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos ou multa além da pena correspondente à violência Parágrafo único Incorre na mesma pena quem se abstém de concorrer ou licitar em razão da vantagem oferecida Prejudicado este artigo pelo disposto nos arts 93 e 95 da Lei n 8666 de 21 de junho de 1993 licitações e contratos da Administração Pública D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias A Lei n 8666 de 21 de junho de 1993 disciplinou as licitações e os contratos da Administração Pública Nos arts 90 93 95 96 e 98 da referida lei foi exaustivamente regulamentada toda a matéria que era objeto de proteção do art 335 do Código Penal de 1940 encontrando se segundo a doutrina mais autorizada revogado tacitamente nos termos do art 2º 1º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro A arrematação judicial no entanto que tem objeto jurídico distinto continua sendo tutelada penalmente pela disposição contida no art 358 do Código Penal que será oportunamente objeto de nossas considerações Por essas razões mantemos a título meramente informativo as sintéticas considerações constantes deste nosso Código Penal comentado 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração Pública especialmente sua moralidade e probidade administrativa tutelando a regularidade e seriedade das licitações e concorrências públicas Protegese na verdade a probidade de função pública sua respeitabilidade bem como a integridade de seus funcionários 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa licitante ou mesmo qualquer estranho à concorrência ou hasta pública Não se afasta nem mesmo o funcionário público diretamente envolvido ou não nos respectivos procedimentos desde que não ocorra a hipótese descrita no art 326 do CP Sujeito passivo é o Estado União Estadosmembros Distrito Federal e Municípios e secundariamente também são sujeitos passivos os diretamente interessados na licitação 4 Tipo objetivo adequação típica São duas as condutas típicas previstas a impedir obstar perturbar embaraçar ou fraudar usar artifício ardil ou qualquer meio enganoso a fim de induzir ou manter alguém em erro concorrência ou venda em hasta pública promovida pela Administração Federal estadual ou municipal ou entidade paraestatal b afastar ou procurar afastar concorrente ou licitante por meio de violência física grave ameaça prenúncio de causar mal sério fraude artifício ou ardil para induzir ou manter alguém em erro ou oferecimento de vantagem de natureza material ou moral Salientase que afastar o competidor não é apenas ocasionar o seu distanciamento ou ausência para não concorrer ou licitar senão também a sua abstenção de formular proposta ou a retirada desta ou a desistência de fazer lanço embora presente no local onde se realiza a competição 41 Concorrência ou venda em hasta pública distinção Concorrência é a modalidade de licitação própria para contratos de grande valor em que se admite a participação de quaisquer interessados cadastrados ou não que satisfaçam as condições do edital convocados com antecedência mínima de 30 dias com ampla publicidade pelo órgão oficial e pela imprensa particular A venda em hasta pública é o leilão 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo geral é o dolo consistente na vontade consciente de praticar qualquer das condutas descritas especialmente na primeira parte do dispositivo Relativamente à segunda parte é exigido o elemento subjetivo especial de afastar concorrente ou licitante do certame através de violência grave ameaça fraude ou oferecimento de vantagem 6 Consumação e tentativa Consumase o delito com o efetivo impedimento perturbação ou fraude à concorrência ou à venda em hasta pública não é necessário que haja o efetivo afastamento do interessado pois o Código equipara ao afastamento a figura tentada afastar ou procurar afastar o concorrente ou licitante A tentativa é admissível apenas na primeira modalidade pois na segunda como dissemos a tentativa é equiparada à consumação O parágrafo único trata da corrupção passiva digamos uma modalidade privilegiada do concorrente ou licitante que se consuma com a abstenção da proposta ao lanço não se admitindo a figura da tentativa 7 Pena e ação penal As penas cominadas alternativamente são de detenção de seis meses a dois anos ou multa além da pena correspondente à violência cúmulo material A ação penal é pública incondicionada Inutilização de edital ou de sinal Art 336 Rasgar ou de qualquer forma inutilizar ou conspurcar edital afixado por ordem de funcionário público violar ou inutilizar selo ou sinal empregado por determinação legal ou por ordem de funcionário público para identificar ou cerrar qualquer objeto Pena detenção de 1 um mês a 1 um ano ou multa D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias As legislações mais antigas poucas tipificavam a inutilização de edital como contravenção penal que foi a linha seguida pelos códigos italianos do século passado e deste inspiradores mais próximos da legislação brasileira sendo destacado por Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 485 o seguinte O vigente código italiano entendase o Código Rocco de 1930 elaborado sob o regime fascista e preocupado em reforçar o princípio de autoridade contemplouo apenas como contravenção art 664 seguindo assim ao anterior direito italiano cód Zanardelli art 446 e Regulamento Toscano de Polícia Punitiva de 1853 art 22 Os Códigos Penais brasileiros anteriores de 1830 Imperial e de 1890 primeiro republicano desconheciam a criminalização em epígrafe A criminalização relativa à inutilização de sinal inclusive constante da segunda parte do art 336 tem como precedente o Código Penal de Napoleão 1810 que também acabou influenciando vários outros códigos como o toscano sardo e os italianos Zanardelli e Rocco 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração Pública especialmente o desenvolvimento regular da atividade administrativa resguardandoa de práticas impuras desonestas e fraudulentas desacreditandoa perante a coletividade Protegese na verdade a probidade da função pública sua respeitabilidade bem como a integridade de seus funcionários nos mais diversos setores especialmente na seara fiscalizatória Têmse em consideração de um lado o edital documento público necessário e indispensável à realização de vários atos administrativos garantidor de publicidade igualmente de outro lado considerase selo e sinal que também são garantias de identidade inviolabilidade e intangibilidade de determinadas atividades objetos valores ou coisas de interesse da Administração Pública 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa independentemente de qualidade ou condição alguma pode inclusive ser funcionário público não se excluindo o próprio encarregado de fixar o edital selo ou sinal agindo nesse caso com infringência de seu dever funcional prejudicando não só os interesses da Administração Pública como também de eventual interessado diretamente atingido Sujeito passivo é o Estado União Estadosmembros Distrito Federal e Municípios secundariamente o eventual prejudicado diretamente com qualquer das condutas praticadas pelo sujeito ativo 4 Tipo objetivo adequação típica O art 336 descreve duas condutas típicas em relação ao edital a rasgar cortar dilacerar destroçar ou de qualquer forma inutilizar tornar inútil imprestável ao fim a que se destina ou b conspurcar sujar manchar borrar edital afixado por ordem de funcionário público Ou seja o edital administrativo ou judicial deve emanar de funcionário público competente na forma da lei o simples vício formal no objeto material é suficiente para afastar a tipicidade da conduta Referidas condutas podem ser cometidas de qualquer forma e por qualquer meio rasuras pichações cortes dilacerações etc tratandose portanto de crime de forma livre São descritas igualmente duas condutas em relação a selo ou sinal a violar romper ou b inutilizar tornar inútil ou seja o mesmo significado adotado em relação a edital devassar selo ou sinal empregado por determinação legal ou por ordem de funcionário público para identificar individualizar ou cerrar lacrar fechar qualquer objeto Selo ou sinal pode ser de qualquer natureza e assumir qualquer formato lacre chumbado papel arame etc É indispensável no caso de selo ou papel que tais objetos sejam apostos por determinação legal ou por ordem de funcionário competente O objeto material de que se cogita nesse tipo penal é edital selo ou sinal que consiste comumente pelo menos a assinatura carimbo ou sinete da autoridade competente se fixa por meio de cola tachas cosedura lacre arame etc em fechaduras gavetas portas janelas bocas de vasos frascos sacos ou caixas em suma na abertura de algum continente para garantia oficial de integridade do respectivo conteúdo Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 442 41 Local de afixação do edital Embora a lei não se refira ao local onde possa estar afixado o edital público ou acessível ao público deve ser diz a praxe no lugar de costume porque sendo afixado em outro local ou em lugar impróprio não será alcançado pela tutela penal Não há crime se o edital selo ou sinal não tiverem mais utilidade edital com prazo vencido objeto já descerrado etc ou se estiverem estragados sem serventia Poderá haver concurso material do presente delito com crimes de furto art 155 do CP violação de domicílio art 150 do CP entre outros Admitese mais que isso é direito do autor do fato segundo o art 98 I da Constituição Federal a transação penal nos termos da Lei n 909995 em razão da pena abstratamente cominada inferior a dois anos 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de praticar qualquer das condutas nucleares conhecendo todos os elementos constitutivos que integram a descrição típica isto é tendo consciência de que o edital foi fixado ou que o selo ou sinal foram empregados por ordem de funcionário público ou ainda que os dois últimos foram utilizados por determinação legal Essa consciência representa aquela necessidade de o dolo abranger todos os elementos constitutivos do tipo penal Não há por outro lado a necessidade de qualquer elemento subjetivo especial do injusto e tampouco há previsão de modalidade culposa assim resultando de eventual imprudência ou negligência do agente a danificação ou inutilização de edital selo ou sinal públicos tais condutas serão atípicas 6 Consumação e tentativa Consumase o crime de inutilização de edital ou de sinal com a realização de qualquer das condutas incriminadoras independentemente da produção de outro resultado Havendo a destruição de mais de um edital selo ou sinal poderá configurar qualquer das modalidades de concurso de crimes material formal ou de continuidade delitiva dependendo das demais elementares No entanto com a realização simultânea ou sequencial de todas as condutas descritas no tipo em relação ao mesmo objeto edital selo ou sinal o crime permanece único por se tratar de crime de ação múltipla ou de conteúdo variado Na conduta de violar não é necessário que o sujeito ativo tome conhecimento do conteúdo do material que o selo ou o sinal protegem sendo suficiente a ação com essa finalidade o eventual conhecimento representará apenas o exaurimento do crime sem qualquer consequência a mais A tentativa é teoricamente admissível sempre que ocorrer fracionamento do seu iter criminis por razões alheias à vontade do agente 7 Pena e ação penal As penas cominadas alternativamente são de detenção de um mês a um ano ou multa resultando daí a imposição constitucional da transação penal desde que satisfeitos os demais requisitos legais A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Art 336 do Código Penal Prescrição Se desde a data dos fatos até hoje transcorreram mais de dois anos sem que fosse recebida a peça acusatória há que se reconhecer a extinção da punibilidade pelo advento da prescrição da pretensão punitiva com fundamento nos arts 107 IV e 109 V ambos do CP tendo em vista que a pena máxima in abstracto para o crime de inutilização de edital ou sinal é de um ano de detenção STJ HC 74259CE Rel Min Félix Fischer j 1682007 Subtração ou inutilização de livro ou documento Art 337 Subtrair ou inutilizar total ou parcialmente livro oficial processo ou documento confiado à custódia de funcionário em razão de ofício ou de particular em serviço público Pena reclusão de 2 dois a 5 cinco anos se o fato não constitui crime mais grave D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O legislador brasileiro de 1940 inspirouse no Código Penal italiano de 1930 que adotava no entanto uma tipificação mais abrangente art 351 que a nossa Os italianos já contam com a criminalização desse comportamento nos Códigos sardo art 298 e Zanardelli art 202 A própria natureza subsidiária dessa infração penal foi herdada dessa precedente legislação italiana na medida em que a legislação brasileira anterior Código Criminal de 1830 e Código Republicano de 1890 ignoraram a disciplina dessa infração penal 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração Pública especialmente o funcionamento regular da atividade administrativa resguardando de forma particular a custódia oficial de livros processos e documentos confiados a funcionário público ou particular em serviço público Protegese na verdade a probidade da função pública sua respeitabilidade bem como a integridade de seus funcionários nos mais diversos setores especialmente na seara cartorialdocumental merecedora por si só de especial atenção do administrador público 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa independentemente de qualidade ou condição alguma pode inclusive ser funcionário público não se excluindo inclusive o próprio funcionário encarregado da custódia do objeto material livro oficial processo ou documento agindo nesse caso com infringência de seu dever funcional prejudicando não só os interesses da Administração Pública como também de eventual interessado diretamente atingido Sujeito passivo é o Estado União Estadosmembros Distrito Federal e Municípios e secundariamente o eventual prejudicado diretamente com qualquer das condutas praticadas pelo sujeito ativo 4 Tipo objetivo adequação típica Os núcleos do tipo são os verbos subtrair e inutilizar Subtrair é retirar e tem mais especificamente todo o significado traduzido na consideração que fizemos a respeito desse verbo quando examinamos os crimes de furto e roubo no volume terceiro do nosso Tratado de Direito Penal para onde remetemos o leitor inutilizar por sua vez é tornar inútil imprestável ao fim a que se destina conforme descrevemos na análise do tipo anterior Comungamos quanto à subtração com o magistério de Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 358 quando afirma a ocultação e a substituição são subtrações Em ambas há tirada da coisa de seu lugar próprio numa se impedindo que ela apareça e noutra substituindoa comportamentos posteriores à subtração e que visam antes à eficácia desta Evidentemente que essa concepção de Noronha é inaplicável aos crimes contra o patrimônio porque nestes como já sustentamos subtrair não é a simples retirada da coisa do lugar em que se encontrava é necessário a posteriori sujeitála ao poder de disposição do agente A finalidade deste é dispor da coisa com animus definitivo para si ou para outrem Exatamente por não exigir esse fim especial de apoderarse da coisa subtraída para si ou para outrem próprio dos crimes contra o patrimônio é que está autorizada aquela interpretação mais abrangente sustentada por Magalhães Noronha a que nos referimos 41 Objeto material livro oficial processo ou documento A subtração ou inutilização tem como objeto material livro oficial processo ou documento de natureza pública ou particular confiado à custódia guarda legal de funcionário em razão de ofício ou de particular em serviço público A inutilização pode ser segundo o texto legal total completa abrangente ou parcial basta que parcela do todo seja inutilizada para satisfazer a vontade do legislador pois será suficiente para neutralizar ou dificultar a finalidade do objeto material ainda que parcialmente inutilizado Neutralizar total ou parcialmente equivale em outros termos a equiparar a consumação da ação com sua tentativa pelo menos aquela conhecida como tentativa perfeita Subtrair parcialmente porém é uma questão mais complicada considerandose a natureza dos objetos materiais das condutas incriminadas livro oficial processo ou documento No entanto deixa claro o desvelo oficial na proteção de ditos objetos e admitase não será necessário muito esforço para entender que a subtração ou inutilização de parte entendase de algumas folhas será possível como subtração parcial por exemplo de livros e processo sem qualquer afronta ao princípio da tipicidade estrita Em relação a documento pode ser eventualmente um pouco mais complicado Por exemplo se dito documento constituirse de folha única ou de instrumento unitário ou se por qualquer razão for indivisível não será possível sua subtração parcial mas isso não chega a ser um problema especial pois como é comum na seara jurídica a casuística merecerá análise e interpretação adequada Diferenciase do crime do art 305 do CP porque neste o objeto material é o documento público ou particular destinado à prova de uma relação jurídica atuando o sujeito ativo em benefício próprio ou de outrem ou em prejuízo alheio Distinguese também do delito previsto no art 314 do CP Neste o agente é funcionário público que tem guarda do objeto material em razão do cargo Configurase o crime descrito no art 356 do CP se o sujeito ativo é advogado ou procurador atuando nessa qualidade observadas as demais essentialia deliti 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de praticar qualquer das condutas descritas no tipo penal tendo consciência de que se trata de objeto material que se encontra sob a custódia de funcionário público em razão de ofício ou de particular em serviço público Não há previsão ou necessidade de qualquer elemento subjetivo especial do tipo sendo irrelevante para configurar essa infração penal a eventual motivação do agente ressalvada a hipótese de poder configurar crime mais grave No entanto eventual erro sobre a existência da custódia ou sobre encontrarse o funcionário no exercício da função ou o particular em serviço público constitui erro de tipo e como tal afasta a tipicidade da conduta ante a ausência de previsão da modalidade culposa que torna irrelevante a evitabilidade ou inevitabilidade do erro bastando que de erro efetivamente se trate não é demais recordar que o erro de tipo evitável exclui somente o dolo remanescendo a responsabilidade penal pela modalidade culposa quando há tal previsão 6 Consumação e tentativa Consumase o crime com a subtração ou inutilização de livro oficial processo ou documento confiado à custódia de funcionário em razão de ofício ou de particular em serviço público sem a necessidade da superveniência de qualquer dano concreto ao interesse penalmente tutelado Admitese a figura da tentativa em qualquer das modalidades de condutas incriminadas basta que o sujeito passivo tendo iniciado qualquer das ações quer de subtração quer de inutilização seja interrompido por causas estranhas ao seu querer 7 Pena e ação penal A pena cominada é de reclusão de dois a cinco anos se o fato não constituir crime mais grave tratandose por conseguinte de crime expressamente subsidiário Assim sempre que a conduta reprovada apresentar algum elemento distinto que integre figura penal mais grave encontrando melhor adequação típica será esse o dispositivo que deverá prevalecer como por exemplo pode ocorrer com a previsão do art 305 do Código Penal cuja sanção respectiva é consideravelmente superior A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Inutilização de documento art 337 CP A conduta do acusado de atear fogo em talonário de autuação por infração de trânsito subtraído e inutilizado por terceiro definese como post factum impunível mantendose a absolvição com fulcro no art 386 III do CPP TJRS Apelação 70015647704 Rel José Eugênio Tedesco j 137 2006 Comete o delito previsto no art 337 do CP o agente que subtrai documentos confiados à custódia de particular em serviço público TJRS Apelação Crime 70006258438 Rel Constantino Lisbôa de Azevedo j 1262003 Delito de subtração ou inutilização de livro ou documento Comete este delito tipificado no art 337 do Código Penal acusado que como parte interessada no juízo cível dirigese ao escritório de advogado da parte adversa solicita ver autos de processo judicial que tendoos em mãos subtrai afastandose rapidamente do local sem jamais proceder a devolução TJRS Apelação 70000632497 Rel Carlos Cini Marchionatti j 1662000 Sonegação de contribuição previdenciária Art 337A Suprimir ou reduzir contribuição social previdenciária e qualquer acessório mediante as seguintes condutas I omitir de folha de pagamento da empresa ou de documento de informações previsto pela legislação previdenciária segurados empregado empresário trabalhador avulso ou trabalhador autônomo ou a este equiparado que lhe prestem serviços II deixar de lançar mensalmente nos títulos próprios da contabilidade da empresa as quantias descontadas dos segurados ou as devidas pelo empregador ou pelo tomador de serviços III omitir total ou parcialmente receitas ou lucros auferidos remunerações pagas ou creditadas e demais fatos geradores de contribuições sociais previdenciárias Pena reclusão de 2 dois a 5 cinco anos e multa 1º É extinta a punibilidade se o agente espontaneamente declara e confessa as contribuições importâncias ou valores e presta as informações devidas à previdência social na forma definida em lei ou regulamento antes do início da ação fiscal 2º É facultado ao juiz deixar de aplicar a pena ou aplicar somente a de multa se o agente for primário e de bons antecedentes desde que I Vetado II o valor das contribuições devidas inclusive acessórios seja igual ou inferior àquele estabelecido pela previdência social administrativamente como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas execuções fiscais 3º Se o empregador não é pessoa jurídica e sua folha de pagamento mensal não ultrapassa R 151000 um mil quinhentos e dez reais o juiz poderá reduzir a pena de um terço até a metade ou aplicar apenas a de multa 4º O valor a que se refere o parágrafo anterior será reajustado nas mesmas datas e nos mesmos índices do reajuste dos benefícios da previdência social Caput parágrafos e incisos criados pela Lei n 9983 de 14 de julho de 2000 D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Tratase de mais um dispositivo criado pela Lei n 9983 de 14 de julho de 2000 com o objetivo de fechar o cerco contra a sonegação de tributos no País particularmente daqueles relacionados à previdência social a exemplo do art 168A que se refere à apropriação indébita previdenciária A contribuição social previdenciária referida no art 337A encontrase disciplinada nos arts 22 e 23 da Lei n 821291 O acessório contido no mesmo dispositivo legal referese à multa à atualização monetária e aos juros legalmente cominados 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido são as fontes de custeio da seguridade social particularmente os direitos relativos à saúde à previdência e à assistência social art 194 da CF ou sinteticamente a seguridade social Objetivase fundamentalmente combater a criminalidade contra a tributação previdenciária como mais uma medida para fortalecer a Previdência Social e por extensão a assistência aos desamparados que constitui verdadeiro direito social assegurado na Constituição Federal de 1988 art 6º cumulativamente essa norma penal protege também o patrimônio público da própria Previdência Social que sofre diretamente o dano decorrente da sonegação fiscal da referida contribuição social previdenciária 3 Sujeitos do crime Sujeitos ativos são comerciante industrial titular de firma individual sócios solidários gerentes diretores ou administradores que efetivamente hajam participado da administração da empresa concorrendo efetivamente para a prática de qualquer das condutas criminalizadas Não basta constar no contrato social como sócio ou diretor Sujeito passivo é o Estado representado pelo INSS Instituto Nacional do Seguro Social que é o órgão encarregado da seguridade social 4 Tipo objetivo adequação típica As contribuições previdenciárias disciplinadas neste art 337A abrangem as relativas ao custeio da seguridade social nos termos do art 195 da CF88 ou seja a contribuição do segurado empregado empregado doméstico trabalhador avulso e contribuinte individual e facultativo arts 20 e 21 da Lei n 821291 a contribuição previdenciária a cargo da empresa art 22 da Lei n 821291 a contribuição do empregador doméstico art 24 da Lei n 821291 a contribuição do produtor rural e pescador art 25 da Lei n 821291 a contribuição sobre a receita de concursos de prognósticos art 26 da Lei n 821291 além de todas as demais contribuições que tenham decorrido da previsão contida no 4º do art 195 da Constituição Federal As condutas tipificadas são suprimir excluir eliminar deixar de pagar ou reduzir diminuir descontar ou recolher menos que o devido contribuição previdenciária e qualquer acessório Qualquer das duas condutas suprimir ou reduzir deve ser conjugada com aquelas descritas nos três incisos do artigo em exame A impropriedade do legislador deve ser corrigida pela interpretação do aplicador da lei suprimir deve ser entendido como deixar de pagar ou de recolher a contribuição devida pois o contribuinte não suprime tributos não tem essa atribuição que é exclusiva do legislador Contribuição previdenciária é espécie de tributo subordinandose consequentemente aos mesmos princípios que regem o direito tributário O legislador preferiu distinguir em três incisos distintos as modalidades de supressão e redução de contribuições sociais previdenciárias a omissão em folha de pagamento ou outro documento previdenciário b omissão de lançamentos de outros descontos previdenciários c omissão de receitas lucros ou remunerações pagas ou creditadas 41 Omissão em folha de pagamento ou outro documento previdenciário Omissão não inclusão de segurados empregado empresário trabalhador avulso ou equiparado ou similar da folha de pagamento de empresa ou em documento de informações previsto pela legislação previdenciária de todos os segurados ou seus serviços Dessa omissão resulta a sonegação da contribuição previdenciária O agente deixa de constar da folha de pagamento da guia de recolhimento ou de documento de informações exigidas pela lei previdenciária art 225 IV do Dec n 304899 Essa conduta omissiva como adverte Regis Prado assemelhase à falsidade ideológica descrita no art 299 do Código Penal dela distinguindose porque nessa infração penal a falsidade cometida constitui o meio utilizado para se obter o resultado pretendido qual seja a supressão ou redução da contribuição previdenciária Os elementos normativos contidos no tipo penal tais como empregado segurado empresa trabalhador avulso etc estão todos na legislação previdenciária Leis n 99832000 821291 e Dec n 304899 os quais complementam o dispositivo penal que constitui norma penal em branco não havendo necessidade de emitirmos conceituações neste estudo O art 95 a da Lei n 821291 criminalizava a simples omissão na folha de pagamento agora exigese expressamente a supressão ou redução da contribuição devida causando prejuízo à Previdência Social Em outros termos a descrição típica exige a superveniência de um resultado que é representado pela supressão ou redução da contribuição social previdenciária Tratase em realidade de substancial modificação do antigo art 95 a da Lei n 821291 que considerava crime a simples omissão na folha de pagamento sendo exigível agora a efetiva supressão ou redução da contribuição constituindo crime de resultado Nesse sentido destaca Regis Prado frisese contudo que o tipo legal faz menção tão somente à omissão em lançar o número correto de segurados na folha de pagamento ou na guia de forma que a falsidade por omissão quando o agente insere declaração falsa v g de que o seu empregado recebe um salário menor do que o devido encontrará tipicidade no inciso III que reprime dentre outras condutas a omissão referente às remunerações pagas 42 Omissão de lançamentos de outros descontos previdenciários A conduta descrita no inciso II do art 337A consiste na omissão de lançamento nos títulos próprios da contabilidade da empresa dos valores ou quantias descontadas dos segurados ou devidas pelo empregador ou pelo tomador dos serviços O sujeito ativo deixa de lançar mensalmente na contabilidade da empresa os valores que descontou dos segurados ou devidos pelo empregador ou tomador de serviços Dessa forma sonega a contribuição devida essa omissão equivale à figura descrita no art 95 b da Lei n 821291 A contribuição devida pela empresa vem determinada pelos arts 22 e 23 da Lei n 821291 Tomador de serviços é a empresa que recebe o serviço de outra que recebe a denominação de cedente que realiza a função conhecida como terceirização da atividade desempenhada 43 Omissão de receitas lucros ou remunerações pagas ou creditadas A supressão ou sonegação nessa hipótese produzse pela omissão de receitas ou lucros auferidos remunerações pagas ou creditadas ou demais fatos geradores de contribuições sociais previdenciárias A omissão pode ser total ou parcial Essa figura equivale àquela anteriormente prevista no art 95 c da Lei n 821291 A natureza tributária das contribuições previdenciárias isto é das contribuições devidas à seguridade social art 195 da CF pacificou se na jurisprudência do STF a partir do voto do Rel Min Moreira Alves no julgamento do Recurso Extraordinário n 146733SP sendo regidas portanto pelas normas tributárias e dentro de seus próprios limites Em outros termos toda matéria relativa a contribuições previdenciárias a exemplo de qualquer norma referente à matéria fiscal deve adequarse aos limites formais e substanciais estabelecidos pelo Sistema Tributário Nacional Dessa forma as contribuições previdenciárias devem ser consideradas como espécies de contribuições sociais submetendose consequentemente aos princípios gerais do direito tributário e por óbvio respeitando as suas peculiaridades Sua regulamentação e disciplina devem observar o Sistema Tributário Nacional regido pela Constituição Federal arts 145162 que vincula a legislação infraconstitucional aos limites estabelecidos relativamente à matéria Significa em outros termos que a liberdade do legislador infraconstitucional em relação às contribuições previdenciárias normas tributárias e por extensão as penaistributárias também está vinculada ao texto constitucional 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo geral é o dolo representado pela vontade consciente de não pagar à Previdência Social as contribuições devidas por qualquer das modalidades descritas nos três incisos Acreditamos ser indispensável o elemento subjetivo especial do injusto representado pelo especial fim de fraudar a Previdência Social Em sentido contrário Guilherme de Souza Nucci Código Penal comentado p 1037 adota respeitável entendimento afirmando Cremos haver a exigência como em todo delito de natureza fiscal do elemento subjetivo específico que é a vontade de fraudar a previdência deixando de pagar a contribuição Não há previsão de modalidade culposa 6 Consumação e tentativa Consumase o crime de sonegação de contribuição previdenciária em qualquer de suas modalidades com a supressão ou redução efetiva da sonegação total ou parcial da contribuição devida Consumase enfim no momento em que a guia de informação exigida pelo Decreto n 304899 é apresentada ao órgão previdenciário com a omissão dos dados necessários apontados pelo legislador Embora seja de difícil configuração passamos a admitir a possibilidade em tese de verificarse a figura tentada 7 Causas extintivas da punibilidade com ou sem pagamento A apropriação indébita e a sonegação de contribuição previdenciária apresentam regimes jurídicos distintos quanto aos efeitos dos respectivos pagamentos Quanto à primeira apropriação indébita previdenciária o legislador a disciplinou expressamente art 168 A 2º extinguindo a punibilidade quanto à segunda sonegação previdenciária omitiuse Ante essa omissão devese examinar a aplicabilidade do disposto no art 34 da Lei n 924995 conforme já vinha admitindo o próprio STF 71 Causa extintiva de punibilidade sem pagamento dos tributos devidos O 1º prevê a extinção da punibilidade desde que o agente declare confesse a dívida e preste as informações devidas à Previdência Por lacuna no texto legal não há exigência do pagamento É inadmissível interpretação extensiva ou analogia in malam partem sendo inviável a invocação do disposto no 2º do art 168A Assim segundo o texto legal nessa infração o sonegador livrase da ação penal sem pagar o débito somente com a declaração a confissão da dívida e a prestação das informações devidas espontaneamente antes do início da ação fiscal Com a edição da Lei n 99832000 o legislador não foi muito feliz ao estabelecer que para o crime de supressão ou redução de contribuições previdenciárias o agente deve confessar e declarar espontaneamente os valores devidos a título de contribuição previdenciária antes do início da ação fiscal 1º Contrariando todas as outras disposições semelhantes em matéria tributária por esse texto legal para a concessão desse benefício legal não é necessário o pagamento do tributo basta que o agente confesse e declare os valores devidos Assim para a extinção da punibilidade penal na hipótese dessa infração penal basta que o agente confesse e declare os valores devidos para que o Estado não possa sequer instaurar a persecução penal 72 Perdão judicial ou aplicação alternativa da pena de multa O 2º a exemplo do art 168A 3º cria uma hipótese sui generis perdão judicial ou multa As hipóteses são alternativas perdão judicial ou pena de multa mas os requisitos são cumulativos As operadoras do art 59 deverão recomendar uma ou outra das alternativas São necessários os seguintes requisitos 1 Primário aquele que nunca sofreu qualquer condenação irrecorrível réu não reincidente na linguagem da Reforma Penal de 1984 é aquele que não é primário mas já desapareceram os efeitos da reincidência art 64 I do CP 2 Bons antecedentes quem não tem comprovadamente antecedentes negativos isto é não tem condenação irrecorrível fora das hipóteses da reincidência 3 Pequeno valor da dívida o valor do débito previdenciário contribuição e acessórios não deve ser superior ao mínimo exigido pela própria previdência social para ajuizamento de execução fiscal A exigência do pagamento integral do débito após o início da ação fiscal e antes do recebimento da denúncia foi vetada 2º I Assim basta que se trate de débito de pouca monta para se justificar o perdão judicial ou a pena de multa desde que o agente seja primário e detentor de bons antecedentes O veto não afastou o perdão judicial apenas lhe diminuiu as exigências ao suprimir a necessidade de pagamento e o respectivo período em que deveria ocorrer Há necessidade de que o valor do débito previdenciário contribuição e acessórios não seja superior ao mínimo exigido pela própria previdência social para ajuizamento de execução fiscal O perdão judicial nos termos postos é praticamente inócuo pois se limita a valores ínfimos desde que não sejam suficientes para justificar sua cobrança judicial que já foi definido em até 1000 UFIR Lei n 944197 art 1º Se o fisco não tem interesse em cobrar judicialmente o crédito tributário não há igualmente fundamento para a imposição de sanções criminais Prevê a nova lei assim o cabimento do perdão judicial ou da pena de multa isoladamente A nosso juízo em termos tributáriofiscais configurase em sede criminal o princípio da insignificância excluindose a própria tipicidade 8 Aplicação do art 34 da Lei n 934995 analogia in bonam partem O 2º criou uma espécie sui generis de perdão judicial ou se preferirem uma extinção de punibilidade discricionária desde que segundo constava do projeto de lei fossem satisfeitas para agentes primários e bons antecedentes duas condições I tenha promovido após o início da ação fiscal e antes de oferecida a denúncia o pagamento da contribuição social previdenciária mesmo que parcelada inclusive acessórios ou II o valor das contribuições devidas inclusive acessórios seja igual ou inferior àquele estabelecido pela previdência social administrativamente como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas execuções fiscais Previsão legal como essa não apresentaria problema algum na medida em que se inseriria no sistema tradicional a exemplo de outras previsões constantes nas leis tributárias examinadas no capítulo do crime de contrabando ou descaminho No entanto o inciso I do parágrafo citado foi vetado pelo Presidente da República sob o fundamento de que basicamente a redação permitiria o entendimento de que o simples parcelamento já levaria à extinção da punibilidade do crime A supressão do texto pelo veto presidencial pode levar a duas interpretações que sintetizamos no seguinte a o veto a despeito da justificativa expressa foi motivado pela previsão do 1º que permite a mesma extinção com a simples confissão e declaração do agente tornandose desnecessária e supérflua a condição estabelecida no inciso revogado b o pagamento da contribuição previdenciária suprimida ou reduzida mesmo que integral e antes do recebimento da denúncia não exclui mais a punibilidade dessa modalidade de crime pois o agente ou já teria feito uso da faculdade contida no 1º confessado e declarado ou se não o fez teria sido alcançado pela preclusão e portanto o pagamento posterior não teria efeito extintivo algum 81 Isonomia no tratamento penal tributário No entanto não se pode evitar a contextualização sob a égide de um Estado Democrático de Direito que assegura a isonomia disciplina o tratamento uniforme do sistema tributário além de proibir textualmente a instituição de tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente art 150 II da CF88 ressalvadas as hipóteses que a própria Constituição prescrever v g art 195 9º da CF88 Uma vez aplicada essa limitação às alterações legislativas em matéria penaltributária chegaremos à conclusão de que os limites da exclusão da punibilidade nos delitos de supressão ou redução de contribuição previdenciária enunciados no art 337A do Código Penal sujeitaramse a uma incoerência jurídica em face das demais modalidades de sonegação fiscal com a égide da Lei n 99832000 Ademais como destaca Andrei Zenkner Schmidt Extinção da punibilidade em crimes de sonegação fiscal p 115 a grande maioria dos incisos do art 337A descrevem condutas idênticas às narradas no art 1º da Lei n 813790 caso em que a tipificação legal da conduta depende do tipo de tributo suprimido ou reduzido se contribuição previdenciária art 337A demais casos de tributos incluídas as demais hipóteses de contribuições sociais art 1º da Lei n 813790 E conclui Schmidt com acerto destacando a grande antinomia gerada pelo veto presidencial dependendo da natureza do tributo havendo supressão ou redução de PIS ou COFINS p ex o autor pode quitar a dívida até o recebimento da denúncia e verse livre da ação penal se a supressão ou redução do tributo disser respeito contudo à contribuição previdenciária este efeito não ocorrerá Por todas essas razões concluímos fazendo coro com Andrei Schmidt sustentando a aplicabilidade do art 34 da Lei n 924995 justificandose a aplicação da analogia in bonam partem Nem se afirme acerca disso que o veto ao inc I do 1º do art 337A impossibilitaria esta solução na medida em que a vontade do legislador encontra seu limite na interpretação sistemática e constitucional do ordenamento jurídico ou seja pouco importa que as razões do veto tenham sido de expresso impedimento à exclusão da punibilidade com o pagamento da contribuição previdenciária suprimida ou reduzida já que esta solução iria de encontro à unidade do Sistema Tributário Nacional Em síntese podese concluir não há qualquer impedimento à admissibilidade do reconhecimento da extinção da punibilidade no crime de sonegação de contribuição previdenciária art 337A nos termos do art 34 da Lei n 924995 9 Causa de diminuição de pena O texto legal prevê uma causa especial de diminuição de pena desde que a sonegação de contribuição previdenciária não tenha sido praticada por intermédio de pessoa jurídica isto é quando se trata de contribuinte individual pessoa física e a sua folha de pagamento não ultrapasse R 151000 pode ser reduzida a pena de um terço até metade ou aplicarse somente a pena de multa Para essa hipótese são irrelevantes a primariedade e os antecedentes do agente Esse valor será sempre reajustado na mesma data e nos mesmos índices que os benefícios previdenciários receberem reajustes consoante disposição expressa do 4º do artigo em exame Estando satisfeitos os requisitos legais mencionados a redução da pena aplicada é impositiva tratandose de um direito público subjetivo do acusado que não pode ser sonegado pelo Judiciário 10 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de reclusão de dois a cinco anos e multa com a redução possível da figura privilegiada 3º A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A confissão da dívida já basta para a invocação da excludente de punibilidade previsão contida no art 337A do Código Penal TRF1ª Região RESE 200241000045740 Rel Olindo Menezes j 782007 Nos crimes de sonegação e apropriação indébita previdenciária por serem crimes formais não exigem para sua consumação a ocorrência de resultado naturalístico consistente em dano para a previdência restando caracterizado com a simples supressão ou redução do desconto da contribuição o não esgotamento da via administrativa não é condição de procedibilidade existindo nesse caso total independência das esferas administrativa e penal STJ HC 49035RJ Rel Min Laurita Vaz j 1942007 Capítulo IIA Dos Crimes Praticados por Particular contra a Administração Pública Estrangeira Corrupção ativa em transação comercial internacional Art 337B Prometer oferecer ou dar direta ou indiretamente vantagem indevida a funcionário público estrangeiro ou a terceira pessoa para determinálo a praticar omitir ou retardar ato de ofício relacionado à transação comercial internacional Pena reclusão de 1um a 8 oito anos e multa Parágrafo único A pena é aumentada de 13 um terço se em razão da vantagem ou promessa o funcionário público estrangeiro retarda ou omite o ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional Artigo acrescentado pela Lei n 10467 de 11 de junho de 2002 D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias e fundamentos político constitucionais A Constituição Federal do Brasil de 1988 em seu art 4º IX contempla dentre outros princípios de cooperação internacional o da cooperação entre os povos para o progresso da humanidade admitindo como incluso o interesse da lisura e probidade administrativa nas transações comerciais internacionais Em 1994 a United States Information Agency e a United States Office of Government promoveram em Washington DC a Primeira Conferência Internacional de Ética Governamental com representantes dos governos de todos os continentes Tratouse de reunião preparatória da Cúpula de Presidentes das Américas realizada em dezembro do mesmo ano em Miami Os governantes presentes nessa Conferência Internacional denominada Cúpula de Miami assumiram o compromisso de combater a corrupção internacional Após algumas reuniões preparatórias e muitas negociações um projeto inicial foi transformado em março de 1996 na Convenção Interamericana contra a Corrupção firmada por 22 Estados americanos cujo objetivo é promover e fortalecer os mecanismos de combate à corrupção além de promover facilitar e regular a cooperação entre os Estados na busca desse objetivo Essa Convenção Interamericana foi fundamental para que em 1997 fosse firmada em Paris a Convenção sobre o Combate à Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais A exemplo do que ocorre com o estudo de bens jurídicopenais que deve partir da Constituição Federal a partir da adesão do Brasil ao combate da corrupção internacional devese seguir o mesmo caminho em matéria de estudo da corrupção de funcionários estrangeiros Na verdade mais do que complementar nossa Carta Magna a edição da Lei n 10467 de 11 de junho de 2002 objetivou dar efetividade ao Decreto n 3678 de 30 de novembro de 2000 que promulgou a Convenção sobre o Combate à Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em transações comerciais concluída em Paris em 17 de dezembro de 1997 Com esse novo diploma legal o legislador brasileiro consagrou mais uma exceção aos postulados da teoria monística adotada pelo Código Penal brasileiro aliás como já fazia em relação à corrupção ativa e passiva Assim o corruptor autor do fato em território nacional brasileiro ou estrangeiro responde pelo crime descrito no art 337B ao passo que o funcionário público estrangeiro responderá pela corrupção passiva em seu país isto é onde praticou sua conduta delitiva 2 Novo crime antecedente ao de lavagem de dinheiro A Lei n 104672002 incluiu o oitavo crime como antecedente ao de lavagem de dinheiro Lei n 961398 VIII praticado por particular contra a administração pública estrangeira arts 337B 337C e 337D A edição desse diploma legal resgata o compromisso internacional assumido pela autoridade brasileira deslocando os aríetes do direito penal interno para a criminalidade internacional fora dos domínios da soberania brasileira bem ao gosto do imperialismo bushiano 3 Bem jurídico protegido O bem jurídico tutelado a despeito de o tipo penal encontrarse topograficamente situado no título que disciplina os crimes contra a Administração Pública é a boafé a regularidade a lealdade a moralidade a transparência e a equidade do comércio internacional A infração penal não atinge a Administração Pública brasileira considerandose que o funcionário corrupto ou corrompido é estrangeiro estranho portanto à nossa Administração Por outro lado o Brasil não tem legitimidade para pretender proteger penal ou civilmente a integridade moralidade ou dignidade da Administração Pública de outros países Nenhum país pode avocar o direito de proteger juridicamente a Administração Pública de outro Posto isso enfim podese concluir que esse novo capítulo IIA tratando Dos Crimes Praticados por Particular contra a Administração Pública Estrangeira não deveria ter sido incluído no Título XI da Parte Especial do Código Penal que se ocupa dos Crimes contra a Administração Pública deveria a rigor ter recebido um novo título destinado a disciplinar a criminalidade internacional no qual poderia ser inserto esse capítulo 4 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa independentemente de qualidade ou condição especial O próprio funcionário público nacional que nessa hipótese age como cidadão comum em nome particular buscando satisfazer seus interesses pessoais ou de terceiros tratandose pois de crime comum Sujeito passivo é a pessoa física ou jurídica lesada pela transação comercial realizada com violação da boafé da moralidade e lealdade que devem orientar essas operações igualmente a própria coletividade internacional mediatamente também sofre as consequências do apodrecimento moral das relações comerciais internacionais particularmente da Administração Pública 5 Tipo objetivo adequação típica A conduta típica alternativamente prevista consiste em prometer obrigarse a dar comprometerse a dar vantagem oferecer apresentar colocar à disposição ou dar transferir a propriedade vantagem indevida de qualquer natureza material ou moral a funcionário público para determinálo a praticar realizar omitir deixar de praticar ou retardar atrasar ato de ofício incluído na esfera de competência do funcionário A oferta ou promessa ou doação ainda que feitas indiretamente admitem vários meios de execução Será indireta a prática de qualquer das condutas quando o agente valerse de interposta pessoa ou de dissimulação para conseguir seu intento É necessário que o corrompido seja funcionário público estrangeiro sob pena de não tipificar essa modalidade do crime de corrupção independentemente de o corrompido encontrarse ou não em território nacional Não configura contudo corrupção o oferecimento a funcionário público estrangeiro de pequenos regalos sem o propósito de corrompêlo faltando além do elemento subjetivo orientador da conduta idoneidade objetiva da vantagem a qual nessas circunstâncias não pode ser considerada indevida que é o objeto material dessa infração penal 51 Ato de ofício relacionado à transação comercial internacional Se o ato pretendido pelo sujeito passivo não se adequar ao rol daqueles que integram a atribuição do funcionário público estrangeiro corrompido a conduta não se amolda ao descrito nesse tipo penal Nada impede que referida conduta possa adequarse a outro tipo penal como por exemplo tráfico de influência Não basta portanto que se trate de funcionário público estrangeiro é indispensável que tenha atribuição para praticar ato relativo a transação comercial internacional isto é que se trate de funcionário competente para a prática do ato pretendido pelo corruptor Não tipifica essa infração penal se o sujeito ativo promete oferece ou dá vantagem a funcionário público estrangeiro para livrarse de ato ilegal por este praticado já que sendo ilegal não satisfaz a exigência do elemento normativo ato de ofício ou então que o funcionário público corrompido não seja competente para a prática do ato de ofício do qual o agente pretende beneficiarse 6 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo geral é o dolo representado pela vontade consciente de prometer oferecer ou dar vantagem indevida a funcionário público estrangeiro para praticar omitir ou retardar ato de ofício relacionado à transação comercial estrangeira ou praticálo com infringência de dever funcional Faz parte desse tipo de injusto uma finalidade transcendente isto é exigese também o elemento subjetivo especial do tipo representado pelo especial fim de agir ou seja para determinálo a praticar omitir ou retardar ato de ofício Mas esse fim especial convém que se destaque deve existir antes de o ato de ofício ser praticado ou seja no momento da ação do agente corruptor contemporâneo à ação realizada pois por razões lógicas e também cronológicas não há como se exigir ou desejar a prática de um ato que já se tenha realizado 7 Consumação e tentativa Prometer e oferecer são crimes de mera atividade consumandose com a simples promessa ou oferta desde que chegue ao efetivo conhecimento do funcionário público estrangeiro do oferecimento ou promessa de vantagem indevida A tentativa nessas duas modalidades somente é admissível na hipótese de promessa e oferta escrita Dar a terceira modalidade de conduta tipificada configura crime material exigindo a efetiva concessão da vantagem material ou moral ao funcionário público estrangeiro Nessa forma de conduta a tentativa é perfeitamente possível independentemente do meio utilizado pelo agente 8 Causa de aumento de pena Essa majorante não deixa de ser uma forma de punir mais severamente o exaurimento do crime se em razão da vantagem ou promessa o funcionário retarda ou omite ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional O simples atraso ou retardamento da transação comercial estrangeira ou sua prática com infringência do dever funcional por si sós não caracterizam nem materializam a infração penal ou seu exaurimento Na realidade é indispensável uma relação causal entre a ação do agente corruptor e o retardamento ou omissão de ato de ofício ou a infringência do dever funcional ou seja é necessário que o suborno seja a causa da conduta do funcionário corrompido sob pena de consagrarse autêntica responsabilidade penal objetiva 9 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de reclusão de um a oito anos e multa exatamente os mesmos limites que eram cominados ao crime de corrupção ativa art 333 O parágrafo único prevê a mesma pena do caput acrescida da majoração de um terço A ação penal é pública incondicionada Tráfico de influência em transação comercial internacional Art 337C Solicitar exigir cobrar ou obter para si ou para outrem direta ou indiretamente vantagem ou promessa de vantagem a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público estrangeiro no exercício de suas funções relacionado a transação comercial internacional Pena reclusão de 2 dois a 5 cinco anos e multa Parágrafo único A pena é aumentada da metade se o agente alega ou insinua que a vantagem é também destinada a funcionário estrangeiro Artigo acrescentado pela Lei n 10467 de 11 de junho de 2002 D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Esse dispositivo segue a orientação adotada pelo legislador que motivou a inclusão do capítulo que criticamos no artigo anterior pelo que merece que se lhe enderece as mesmas críticas Não somos contra a tipificação apenas destacamos a impropriedade de sua topografia legislativa Como já destacamos no capítulo anterior os crimes de corrupção ativa e tráfico de influência em transação comercial internacional foram incluídos pela Lei n 104672002 de forma inadequada no Título XI da Parte Especial do Código Penal que trata dos Crimes contra a Administração Pública Pela terceira vez neste mesmo Código o legislador tipifica uma modalidade de tráfico de influência agora internacional sinal dos tempos antes nacional praticado por particular contra a Administração Pública em geral art 332 e por fim contra a Administração da Justiça na forma de exploração de prestígio art 357 2 Bem jurídico tutelado O bem jurídico tutelado é a boafé a regularidade a lealdade a moralidade a transparência e a equidade do comércio internacional A infração penal não atinge a Administração Pública brasileira considerandose que o funcionário corrupto ou corrompido é estrangeiro estranho portanto à nossa Administração Como destaca Damásio de Jesus estamos na verdade diante de um novo bem jurídico a lealdade no comércio internacional interesse que pertence a todos os países e cuja proteção penal punindo seus nacionais cabe a eles próprios individualmente e por intermédio de suas legislações internas 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa independente de qualidade ou condição especial O próprio funcionário público nacional que nessa hipótese age como cidadão comum em nome particular buscando satisfazer seus interesses pessoais ou de terceiros tratase pois de crime comum Sujeito passivo é a pessoa física ou jurídica lesada pela transação comercial realizada com violação da boafé da moralidade e da lealdade que devem orientar essas operações A própria coletividade internacional mediatamente também sofre as consequências do apodrecimento moral das relações comerciais internacionais 4 Tipo objetivo adequação típica As condutas típicas alternativamente incriminadas são representadas pelo verbo solicitar pedir rogar procurar exigir ordenar que seja pago cobrar exigir pagamento ou obter angariar conseguir receber adquirir para si ou para outrem vantagem ou promessa de vantagem a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público estrangeiro no exercício da função Ou seja a lei incrimina a bazófia a gabolice ou jactância de influir em servidor público estrangeiro quando tal prestígio não existe Esse é o sentido que se pode extrair da locução a pretexto de influir Não é necessário que se trate de pessoa determinada ou que dito funcionário seja devidamente identificado e individualizado para o beneficiárioiludido podendo inclusive tratarse de funcionário incompetente para a prática do ato visado no entanto se for identificado o funcionário público é indispensável que seja estrangeiro caso contrário não se configurará essa infração penal poderá ser outra 41 Objeto material vantagem ou promessa dela Objeto material é a vantagem ou promessa desta que pode ser de qualquer natureza material moral sexual ainda que não patrimonial A vantagem qualquer proveito ou benefício de natureza material moral ou até imaterial pode ser para o próprio agente ou para terceiro Assim punese o tráfico de influência ou seja o comércio ou o negócio de influência poder ascendência ou predomínio que alguém exerce sobre outrem capaz de estenderse em cadeia internacional 42 Postular vantagem a pretexto de influir O sujeito ativo afirma ter influência sobre determinado funcionário público estrangeiro e promete usála para obter benefício em favor de terceiro em troca de vantagem ou promessa de vantagem É irrelevante que a vantagem seja devida ou indevida Fazse necessário que o agente pretexte o exercício de influência sobre ato praticado por funcionário público como destaca o tipo penal e não sobre o ânimo deste Há um ato fraudulento e a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público estrangeiro no exercício da função vem a ser o artifício utilizado É porém necessário que o agente se arrogue prestígio junto a funcionário público estrangeiro pois caso contrário o fato não ofende a Administração Pública internacional e poderá constituir apenas outra infração penal Se no entanto a pessoa realmente goza de influência e sem alardeála ou proclamála desenvolver atividade junto àquele não comete o crime em apreço podendo entretanto dependendo das circunstâncias praticar outro 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é o dolo consistente na vontade livre e consciente de solicitar exigir cobrar ou obter vantagem ou promessa de vantagem a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público estrangeiro no exercício da função É ainda indispensável a presença do elemento subjetivo especial do injusto representado pela finalidade de obter para si ou para outrem a vantagem ou promessa de vantagem a pretexto de influir em ato praticado por funcionário estrangeiro Não há previsão de modalidade culposa 6 Consumação e tentativa Consumase o crime com a mera solicitação exigência ou cobrança solicitar exigir e cobrar da vantagem ou promessa desta para influir em funcionário público no exercício da função independentemente de outro resultado por se tratar de crime de mera atividade Na modalidade de obter no entanto como se trata de crime de resultado este somente se consuma com o recebimento efetivo da vantagem ou com a promessa concreta de recebêla Tratase como já referimos no início deste capítulo de um tipo penal similar àquele descrito no art 332 tráfico de influência dele distinguindose somente pelo princípio da especialidade A tentativa é admissível embora de difícil configuração Na modalidade obter o crime é material consumandose somente com o efetivo recebimento da vantagem pretendida A tentativa nessa hipótese é perfeitamente possível 7 Causa de aumento de pena Prevista no parágrafo único ocorre se o agente alega ou insinua que a vantagem de natureza moral ou material também é destinada ao funcionário público A razão da punição mais severa reside no maior desprestígio causado à Administração Pública pela alegação de suborno de um funcionário representando maior desvalor da ação e do próprio resultado Para a configuração dessa causa de aumento é irrelevante que a pessoa enganada acredite que a vantagem ou promessa dela destine se efetivamente ao funcionário público como alegado pelo sujeito ativo bastando a alegação ou insinuação pelo autor dessa destinação Alegar ou insinuar com efeito são os verbos utilizados na descrição dessa causa de aumento Contudo comprovandose que a vantagem efetivamente destinase ao funcionário público produzirseá alteração na tipificação da conduta de todos os envolvidos estarseá por certo diante do crime de corrupção em suas formas ativa e passiva e não mais do tráfico de influência 8 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de reclusão de dois a cinco anos e multa A causa de aumento de pena inserta no parágrafo único comina igual pena aumentada da metade A ação penal é pública incondicionada 9 Conceituação penal de funcionário público caput Diversamente da conceituação conferida pelo direito administrativo o direito penal considera funcionário público quem embora transitoriamente ou sem remuneração exerce cargo emprego ou função pública em entidades estatais ou em representações diplomáticas de país estrangeiro As definições de cargo emprego e função pública são as mesmas que elencamos quando do exame do conceito de funcionário público à luz do disposto no art 327 do CP Entidades estatais por sua vez são pessoas jurídicas de direito público que integram a Administração Pública com poderes políticos jurídicos e administrativos Representações diplomáticas integram o corpo diplomático de um país 10 Equiparação e causa de aumento de pena Preceitua o parágrafo único que se equipara a funcionário público estrangeiro quem exerce cargo emprego ou função em empresas controladas direta ou indiretamente pelo Poder Público de país estrangeiro ou em organizações públicas internacionais v g ONU OMS FMI Funcionário público estrangeiro Art 337D Considerase funcionário público estrangeiro para os efeitos penais quem ainda que transitoriamente ou sem remuneração exerce cargo emprego ou função pública em entidades estatais ou em representações diplomáticas de país estrangeiro Parágrafo único Equiparase a funcionário público estrangeiro quem exerce cargo emprego ou função em empresas controladas diretamente ou indiretamente pelo Poder Público de país estrangeiro ou em organizações públicas internacionais Art 337D acrescentado pela Lei n 10467 de 11 de junho de 2002 D O U T R I N A 1 Conceituação penal de funcionário público caput Diversamente da conceituação conferida pelo direito administrativo o direito penal considera funcionário público quem embora transitoriamente ou sem remuneração exerce cargo emprego ou função pública em entidades estatais ou em representações diplomáticas de país estrangeiro As definições de cargo emprego e função pública são as mesmas que elencamos quando do exame do conceito de funcionário público à luz do disposto no art 327 do CP Entidades estatais por sua vez são pessoas jurídicas de direito público que integram a Administração Pública com poderes políticos jurídicos e administrativos Representações diplomáticas integram o corpo diplomático de um país 2 Equiparação e causa de aumento de pena Preceitua o parágrafo que se equipara a funcionário público estrangeiro quem exerce o cargo emprego ou função em empresas controladas direta ou indiretamente pelo Poder Público de país estrangeiro ou em organizações públicas internacionais v g ONU OMS FMI Capítulo III Dos Crimes contra a Administração da Justiça Reingresso de estrangeiro expulso Art 338 Reingressar no território nacional o estrangeiro que dele foi expulso Pena reclusão de 1 um a 4 quatro anos sem prejuízo de nova expulsão após o cumprimento da pena D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Nossos dois primeiros Códigos Penais Criminal do Império de 1830 e o primeiro Penal Republicano de 1890 desconheceram a figura típica reingresso de estrangeiro expulso que o legislador brasileiro buscando inspiração no Código Penal suíço criou com o Decreto n 4247 de 1921 ratificado pela Consolidação das Leis Penais 1932 sendo mantido pelo legislador de 1940 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração da Justiça especialmente a moralidade e a probidade das decisões jurisdicionais No entanto à locução Administração da Justiça deve ser conferida uma abrangência maior para ser entendida em seu sentido teleológico e não apenas como uma atividade jurisdicional do Estado isto é apenas pretendendo proteger a eficácia da decisão expulsória do estrangeiro Com efeito pretendese proteger a justiça em seu sentido mais amplo abrangendo tudo o que a ela se referir visando a atingir os fins que lhes são inerentes e não apenas à atividade jurisdicional Como sustentava Noronha Direito Penal v 2 p 361 os crimes aqui considerados são fatos que não atentam apenas contra a instituição da Justiça mas também contra a função atingindoa no seu prestígio e eficácia atributos que lhe são absolutamente indispensáveis Tutelase enfim a atuação e o desenvolvimento regular da instituição protegendose contra ações que atentem contra sua atividade autoridade e moralidade que lhe são inerentes 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo é somente o estrangeiro regularmente expulso do País pela autoridade competente tratandose por conseguinte de crime de mão própria Pode o nacional figurar como sujeito ativo por meio do instituto do concurso eventual de pessoas Sujeito passivo é o Estado através de sua Administração Pública sendo mais especificamente a Administração da Justiça que é diretamente interessada em preservar o respeito e o cumprimento das decisões dos entes públicos e autoridades públicas 4 Tipo objetivo adequação típica O núcleo do tipo é o verbo reingressar que significa entrar novamente reentrar ingressar de novo perfectibilizandose a conduta típica no exato momento em que o expulso reingressa ao território nacional Pressuposto para a configuração do crime em tela é que o estrangeiro tenha sido regularmente expulso do território nacional entendido este em seu conceito jurídico O conceito de território nacional em sentido jurídico deve ser entendido como âmbito espacial sujeito ao poder soberano do Estado O território nacional efetivo ou real compreende a superfície terrestre solo e subsolo as águas territoriais fluviais lacustres e marítimas e o espaço aéreo correspondente Entendese ainda como sendo território nacional por extensão ou flutuante as embarcações e as aeronaves por força de uma ficção jurídica Em sentido estrito território abrange solo e subsolo contínuo e com limites reconhecidos águas interiores mar territorial plataforma continental e respectivo espaço aéreo 41 Só reingressa quem saiu do território Para configurar o reingresso contudo não basta que tenha sido expulso sendo necessário que tenha saído do território nacional pois somente assim se poderá falar em reingresso expulso o estrangeiro do País ele reingressa ilicitamente em nosso território consumandose de imediato a ação de reingressar entrar novamente com a instantaneidade que o verbo nuclear sugere os seus efeitos estes sim são permanentes Assim a simples permanência do estrangeiro no território nacional após ter sido expedido o decreto de expulsão não tipifica o crime sub examen Não caracteriza o presente delito a conduta do estrangeiro que embora legalmente expulso permanece no território nacional independentemente da duração dessa permanência pois não se configura o ato de reingressar A autorização da autoridade consular competente exclui a tipificação desse crime Com efeito não é atribuição do Judiciário examinar a conveniência e oportunidade da expulsão basta constatar sua existência e sua regularidade formal 42 Expulsão de estrangeiro pressuposto do crime de reingresso O Estado tem o direito e o poder de expulsar e manter a expulsão do estrangeiro que dela se faça merecedor e para assegurar tal poder criminaliza e pune o reingresso no País de estrangeiro expulso Diríamos até que se trata de um ato de soberania nacional A deportação e a expulsão que têm significados distintos são medidas administrativas de polícia com a finalidade comum de obrigar o estrangeiro a deixar o território nacional A primeira consiste na saída compulsória do estrangeiro para o país de sua nacionalidade ou procedência ou para outro que consinta em recebêlo art 58 do EE Verificase a deportação nos casos de entrada ou estada irregular de estrangeiro art 57 do EE O deportado pode reingressar no território nacional sob certas condições art 64 Ocorre a expulsão quando o estrangeiro atentar de qualquer forma contra a segurança nacional a ordem política ou social a tranquilidade ou moralidade pública e a economia popular ou cujo procedimento o torne nocivo à conveniência e aos interesses nacionais É passível também de expulsão o estrangeiro que a praticar fraude a fim de obter a sua entrada ou permanência no Brasil b havendo entrado no território nacional com infração à lei dele não se retirar no prazo que lhe for determinado para fazêlo não sendo aconselhável a deportação c entregarse à vadiagem ou à mendicância ou d desrespeitar proibição especialmente prevista em lei para estrangeiro art 65 do EE 421 Natureza da expulsão pena ou medida preventiva A expulsão não é pena mas medida preventiva de polícia Constitui medida administrativa adotada pelo Estado com suporte no poder político e fundamentada no legítimo direito de defesa da soberania nacional Cabe ao Presidente da República deliberar sobre a conveniência e a oportunidade da expulsão art 66 do EE O art 75 do Estatuto do Estrangeiro arrola as causas impeditivas da expulsão O Decreto n 98961 de 15 de fevereiro de 1990 dispõe sobre a expulsão de estrangeiro condenado por tráfico de entorpecentes e drogas afins Por fim o cumprimento da pena não pode servir de pretexto ou desculpa para evitar a expulsão do estrangeiro devendo prevalecer o interesse nacional se houver esse interesse o estrangeiro pode ser autorizado 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade de reingressar ao território brasileiro ciente de que foi expulso e de que não pode a este retornar isto é o sujeito ativo deve ter conhecimento de todos os elementos constitutivos do tipo penal O desconhecimento de algum desses elementos como por exemplo ignorando a existência formalidade ou expedição do decreto de expulsão configura erro de tipo que exclui o dolo Não se exige qualquer elemento subjetivo especial do tipo sendo inclusive irrelevante o motivo e não há previsão de modalidade culposa 6 Consumação e tentativa Consumase o crime no momento e no lugar em que o estrangeiro expulso reingressa ao território nacional mesmo que nele permaneça por pouco tempo No entanto crime não há se o estrangeiro apenas desobedecendo ao decreto expulsório permanece no Brasil Se o estrangeiro imagina que seu reingresso foi autorizado quando na verdade continua proibido incorrerá em erro de proibição cuja evitabilidade determinará sua consequência normal art 21 A tentativa é teoricamente admissível quando por exemplo adota os procedimentos operacionais de ingresso junto às autoridades de fronteira e é surpreendido em situação irregular 7 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é de reclusão de um mês a quatro anos sem prejuízo de nova expulsão após o cumprimento da pena A ação penal é pública incondicionada de competência da Justiça Federal art 109 X da CF J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Constitui crime permanente a conduta delituosa prevista no art 338 do CP de reingresso de estrangeiro expulso aplicandose as regras de fixação de competência previstas nos arts 71 e 83 do CPP STJ Conflito de Competência 40338RS Rel Min Arnaldo Esteves Lima j 2322005 Denunciação caluniosa Art 339 Dar causa à instauração de investigação policial de processo judicial instauração de investigação administrativa inquérito civil ou ação de improbidade administrativa contra alguém imputandolhe crime de que o sabe inocente Caput com redação determinada pela Lei n 10028 de 19 de outubro de 2000 Pena reclusão de 2 dois a 8 oito anos e multa 1º A pena é aumentada de sexta parte se o agente se serve de anonimato ou de nome suposto 2º A pena é diminuída de metade se a imputação é de prática de contravenção D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias No direito brasileiro o Código Criminal do Império de 1830 incluiu a denunciação caluniosa entre os crimes contra a honra art 235 e a exemplo da legislação da época impunha à denunciação caluniosa a mesma pena que era cominada ao crime objeto da acusação caluniosa numa espécie de princípio da lei de talião O Código Penal de 1890 embora adotando o mesmo princípio punitivo incluiu a denunciação caluniosa entre os crimes contra a fé pública art 264 O Código Penal de 1940 finalmente reformulou a concepção sobre a denunciação caluniosa inserindoa entre os crimes praticados contra a Administração da Justiça e cominandolhe pena autônoma sem qualquer vínculo com a acusação do ofensor A Lei n 100282000 ao dar nova redação ao art 339 do Código Penal incluiu as condutas dar causa à instauração de investigação administrativa inquérito civil ou ação de improbidade administrativa 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a boa e regular Administração da Justiça que necessariamente é atingida por eventuais falsas imputações que originem a instauração de qualquer das investigações mencionadas no tipo penal Tutelase igualmente a honra objetiva da pessoa ofendida embora não se confunda com o crime de calúnia crime contra a honra apresentando inclusive considerável superioridade do desvalor da conduta aqui incriminada pois não atinge somente sua reputação pessoal mas também e fundamentalmente a sua liberdade pela ameaça do processo criminal que se instaura cuja sanção é bastante grave 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo é qualquer pessoa Nada impede que qualquer autoridade pública também possa ser sujeito ativo desse tipo penal especialmente aquelas que de modo geral integram a persecução criminal tais como magistrados membros do Ministério Público e delegados de polícia que podem como qualquer outra autoridade também praticar o crime de denunciação criminosa Em se tratando porém de imputação da prática de crime de exclusiva iniciativa privada e de ação pública condicionada sujeito ativo somente pode ser o titular do direito de queixa ou de representação uma vez que segundo o Código de Processo Penal art 5º 4º e 5º a autoridade policial depende da autorização daquele para iniciar suas investigações Fora dessa hipótese o ofensor pode responder pelo crime de calúnia crime contra a honra Sujeitos passivos são prioritariamente a pessoa atingida em sua honra pela denunciação caluniosa independentemente da ordem de preferência Não esquecendo voltamos a repetir que o Estado no sistema brasileiro é sempre sujeito passivo por isso quando o particular é atingido quernos parecer que assume a primazia na condição de sujeito passivo ficando no plano secundário o Estado 4 Direito de petição exercício regular de direito O direito de petição como garantia constitucional surgiu na Carta Magna inglesa de 1689 Bill of Rights Couture afirmava que o direito de petição foi originariamente um direito privado logo adquirindo caráter público de garantias inserto nas Constituições Quem delata apresenta notitia criminis e pede abertura de inquérito policial ou sindicância exerce um direito art 5º II e 1º e 5º do CPP e se exerce direito não pode praticar crime pode eventualmente até cometer erro de avaliação ou equívoco mas a ocorrência de qualquer destes se demonstrada afasta o elemento subjetivo configurando a chamada verdade subjetiva ou a conhecida boafé 41 A verdade subjetiva é suficiente para afastar o dolo Com efeito a existência de verdade subjetiva é suficiente para afastar o dolo no crime de denunciação caluniosa quando o agente por exemplo acredita sinceramente na verdade dos fatos na licitude dos fins há uma oposição ao dolo Em outros termos a verdade subjetiva do agente elimina o dolo da imputação Consequentemente se houver erro escusável ou invencível de parte do agente não existirá denunciação caluniosa Na verdade o elemento subjetivo que compõe a estrutura do tipo penal assume importância transcendental na definição da conduta típica É por meio do animus agendi que se consegue identificar e qualificar a atividade comportamental do agente Somente conhecendo e identificando a intenção vontade e consciência do agente se poderá classificar um comportamento como típico Sintetizando quando por exemplo o denunciante relata os fatos perante a autoridade competente e somente perante esta configura circunstância que por si só afasta o animus offendendi O exercício do direito de petição é óbvio não constitui infração penal Efetivamente o crime de denunciação caluniosa não se confunde com a conduta de quem solicita à polícia que apure e investigue determinado delito fornecendolhe os elementos de que dispõe Por outro lado não se pode perder de vista que o direito tem como uma de suas garantias o tecnicismo ou seja os termos jurídicos têm sentido técnico preciso e muito bem delimitado sendo vedado darselhes sentido diverso especialmente para criminalizar alguma conduta Assim por exemplo quando se afirma que determinada autoridade pública cometeu abuso de autoridade não significa necessariamente que se lhe esteja imputando a prática do crime de abuso de autoridade ou de abuso de poder 42 Abuso de autoridade e abuso de poder distinção Efetivamente usamse em geral as expressões abuso de poder e abuso de autoridade com o sentido ambivalente de descumprimento de normas administrativas disciplinares penais e civis Autoridades e poderes constituídos com frequência incorrem nesses abusos tanto que os Tribunais Superiores encontramse abarrotados de ações judiciais contra o Poder Público Não significa contudo que na maioria desses casos tenha havido crime de abuso de autoridade ainda que o abuso de poder ou de autoridade lato sensu tenha existido Não se pode esquecer o princípio da tipicidade pois só é crime aquele fato que a lei define como tal Assim somente aquele fato ou aquela conduta adequada a alguma moldura descrita na lei apresentará a indispensável adequação típica Não é logicamente o caso de ameaçar requisitar instauração de inquérito policial ou delatar à autoridade competente fato que na avaliação do agente ainda que tecnicamente equivocada constitua crime Por isso quem em sua verdade subjetiva acredita que está sendo objeto indevidamente de constrangimento ilegal e achandose injustiçado ou ameaçado procura sob sua ótica o respaldo legal encaminhando à autoridade competente polícia Ministério Público ou Poder Judiciário notitia criminis à evidência não comete crime de denunciação caluniosa não divulga não comenta e não afirma nada a ninguém limitandose a buscar aquilo que julga ser seu direito de cidadão ofendido faltalhe o animus offendendi logo não comete crime 5 Tipo objetivo adequação típica A conduta incriminada consiste em dar causa motivar originar fazer nascer a instauração de investigação policial de processo judicial de investigação administrativa inquérito civil ou ação de improbidade administrativa Lei n 100282000 contra alguém imputandolhe crime de que o sabe inocente São três portanto os requisitos necessários para a caracterização do delito a sujeito passivo determinado b imputação de crime c conhecimento da inocência do acusado Para a ocorrência do crime de denunciação caluniosa não basta a imputação de crime mas é indispensável que em decorrência de tal ação seja instaurada investigação policial judicial cível administrativa ou de improbidade administrativa Antes do advento da Lei n 100282000 que deu nova redação ao art 339 simples sindicância ou mero expediente administrativo não se equiparavam à elementar objetiva do tipo que se limitava a investigação policial e processo judicial Assim ainda que a eventual sindicância ou inquérito administrativo decorresse de denúncia ilícita o princípio da reserva legal impede a extensão analógica da norma a esses casos 51 Fato definido como crime Para se configurar o crime cumpre no entanto destacar a indispensabilidade de que a imputação se refira a fato definido como crime sendo penalmente irrelevante a imputação de ilícito de qualquer outra natureza civil administrativo constitucional etc Mas para o início da ação penal por crime de denunciação caluniosa tornase imprescindível pelo menos o arquivamento do inquérito objeto do fato imputado a outrem A instauração de investigação constitui apenas um elemento objetivo do crime importante necessário mas insuficiente para consumálo Essa infração penal exige também e ao mesmo tempo a presença de um elemento normativo representado pela expressão de que o sabe inocente é em outros termos a consciência atual da inocência do imputado quer por não ter sido o autor do fato quer porque o crime não existiu 52 Indispensabilidade da inocência do sujeito ativo É necessário que o sujeito passivo seja realmente inocente resultando efetivamente prejudicado isto é acabe sendo investigado ou processado sem justa causa restando afinal arquivado o procedimento ou absolvido com fundamento nos incisos I estar provada a inexistência do fato ou IV não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal e excepcionalmente no inciso V existir circunstância que exclua o crime ou isente o réu de pena como por exemplo naquelas hipóteses dos arts 142 do CP e 7º 2º da Lei n 890694 todos do art 386 do Código de Processo Penal A hipótese do inciso II do mesmo dispositivo embora não exclua por completo demanda maior exame de prova enquanto pressuposto daquele crime Somente a partir desses pressupostos se poderá começar a pensar na possibilidade de denunciação caluniosa devendo reunir seus demais requisitos legais Porém se houver sido extinta a punibilidade por qualquer de suas causas se a absolvição tiver decorrido de alguma excludente de criminalidade ou dirimente de culpabilidade não se poderá falar em denunciação caluniosa É indispensável que o arquivamento ou absolvição tenha como fundamento a falsidade da imputação com o conhecimento do imputante Mas para iniciar a ação ou investigação pelo crime de denunciação criminosa é indispensável a conclusão definitiva da investigação ou absolvição trânsita em julgado como um mínimo de garantia da Administração da Justiça 53 Espontaneidade da denunciação caluniosa A denunciação caluniosa feita de forma direta ou indireta tem como caráter essencial a espontaneidade isto é deve ser da exclusiva iniciativa do denunciante Não haverá crime quando exemplificava Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 463 a falsa acusação é feita por um réu em sua defesa no curso do interrogatório apresentandose no caso apenas o crime e calúnia em atenção aliás até certo limite ao ignoscendum ei qui qualiter sanguinem suum redimere voluit ou por alguma testemunha ao depor na polícia ou em juízo nesta última hipótese o crime a reconhecer poderá ser o de testemunho falso Cumpre destacar que o sujeito ativo pode causar a instauração de qualquer dos procedimentos referidos diretamente ou por interposta pessoa além de poder utilizar qualquer meio sem qualquer formalidade podendo fazêlo por escrito ou oralmente 6 Novidades da Lei n 100282000 investigação administrativa inquérito civil ou ação de improbidade administrativa Essa lei de 19 de outubro de 2000 acrescentou ao caput as elementares de dar causa à instauração de investigação administrativa inquérito civil ou ação de improbidade administrativa Antes dessa lei somente dar causa à instauração de investigação policial ou de processo judicial tipificava esse crime Assim ficou extremamente abrangente a nova tipificação da denunciação caluniosa É bem verdade que quando da edição do atual Código Penal 1940 as duas formas tradicionais de persecutio criminis eram as constantes da redação original do caput do dispositivo em exame Também é verdade que se desejasse o legislador poderia ter incluído nesse tipo as condutas que dessem causa à instauração de inquérito judicial e investigação administrativa Assim a rigor produto da modernidade jurídica são somente o inquérito civil e a ação de improbidade administrativa pois a inclusão da investigação administrativa faz parte da política criminalizadora exacerbada que dominou a última década do século XX 61 Conflito aparente de leis A Lei de Improbidade Administrativa Lei n 842992 já criminalizava o ato de representar por improbidade administrativa contra agente público ou terceiro beneficiário sabidamente inocente art 19 Agora com a nova redação do art 339 incluindo dar causa à instauração de ação de improbidade administrativa podese questionar se afinal teria sido revogada aquela previsão do art 19 da Lei n 842992 A nosso juízo diversos aspectos distinguem profundamente as duas previsões legais que têm finalidades e abrangências diferenciadas Inicialmente convém registrar que a previsão muito mais restrita do art 19 da Lei de Improbidade Administrativa tipifica tão somente representar por ato de improbidade administrativa que nem sequer tem natureza criminal nem a representação nem o ato de improbidade administrativa apenas esse ato de representar nas circunstâncias é criminalizado Por outro lado a conduta criminalizada no art 339 é muito mais abrangente na medida em que dar causa à instauração de ação de improbidade administrativa tem um alcance impossível de ser atingido pelo ato de representar poderseia dizer que representar não deixa de ser uma espécie do gênero dar causa à instauração que pode assumir as mais diversas formas de manifestar se tais como comunicação oral da ocorrência do fato telefonema fonograma telegrama fax ou bilhete comunicando à autoridade competente a existência de crime etc A segunda grande diferença e a mais importante referese à natureza da finalidade da comunicação ou representação a Lei de Improbidade Administrativa objetiva somente representar contra ato de natureza puramente administrativa enquanto na nova previsão do Código Penal o fato objeto da investigação deverá necessariamente ter natureza criminal crime ou contravenção penal O art 19 daquela lei não fazia essa exigência de que a imputação fosse de crime como exige o Código Penal 62 Improbidade administrativa e princípio da fragmentariedade Com efeito nem todo ato de improbidade administrativa constitui crime em razão do caráter fragmentário do direito penal que exige tipicidade estrita Assim nada impede que alguém atribua falsamente a algum agente público a prática de ato de improbidade administrativa que no entanto não seja tipificado como crime Nesse caso esse alguém incorre na previsão do art 19 da Lei n 842992 contudo quando a representação de qualquer forma imputar falsamente a prática de ato de improbidade administrativa que ao mesmo tempo seja definido como crime incorrerá na previsão do art 339 do Código Penal com a redação determinada pela Lei n 100282000 Em sentido semelhante é a orientação de Damásio de Jesus ao manifestarse contra a revogação do art 19 in verbis Cremos que não pois as duas disposições podem coexistir pacificamente de acordo com duas regras 1ª quando o denunciante atribui falsamente à vítima ato de improbidade que configura infração administrativa porém não configura crime aplicase o art 19 da Lei n 842992 Ex ato praticado com desvio de finalidade art 11 I da Lei n 842992 2ª quando a denunciação incide sobre ato que além de atentar contra a probidade administrativa constitui também delito aplicase o art 319 do CP Ex art 10 VIII da Lei n 842992 em que a fraude em arrematação judicial além de configurar ato de improbidade encontra se definida como crime art 358 do CP 63 Lacuna legal comissão parlamentar de inquérito Por fim dar causa à instauração de Comissão Parlamentar de Inquérito CPI mesmo imputando falsamente a prática de crime não tipifica a denunciação caluniosa por falta de previsão legal 7 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo geral é o dolo representado pela vontade consciente de provocar a investigação policial judicial administrativa civil ou de improbidade É absolutamente indispensável que o sujeito ativo saiba que o imputado é inocente Segundo a doutrina majoritária esse tipo penal somente admite dolo direto em razão de exigir que o sujeito ativo tenha conhecimento de que a vítima é inocente Se a falsidade da imputação isto é a inocência do imputado é elemento integrante ou condição essencial da denunciação caluniosa impõese que o dolo no caso abranja necessariamente a consciência dessa falsidade ou seja a consciência efetiva da inocência do imputado É inclusive insuficiente a dúvida sobre a veracidade ou inveracidade do fato imputado e quem agir nessa circunstância ainda que pratique uma conduta temerária não recomendável moralmente censurável não configura o crime de denunciação caluniosa que exige consciência atual da inocência do acusado pela falta de dolo direto Estará igualmente afastado o dolo quando o agente incorrer em erro invencível sobre a correspondência entre o conteúdo da imputação e a realidade fática A verdade subjetiva putativa do fato imputado afasta o dolo sem o qual não se pode falar em ação tipificada como crime 71 Admissibilidade de dolo eventual É necessário que a imputação seja objetiva e subjetivamente falsa de que o sabe inocente Em outros termos é indispensável que a imputação do sujeito ativo não encontre nenhum respaldo na verdade dos fatos e que ademais o sujeito ativo tenha certeza da inocência do imputado isto é daquele a quem atribui a prática de crime A simples dúvida a falta de certeza sobre a inocência do imputado ao contrário do que afirmava a doutrina nacional não exclui a culpabilidade mas impede a própria configuração da denunciação caluniosa ou seja afasta a própria tipicidade da imputação A natureza imperativa do verbo imputar afasta a possibilidade de dolo eventual Contudo a despeito de o agente saber que o imputado é inocente mesmo sem querer efetivamente pode assumir o risco de dar causa à instauração de qualquer dos procedimentos referidos do tipo penal em exame A eventualidade do dolo não está na ciência da inocência do imputado que existe mas no dar causa à instauração do procedimento contido na lei Assim por exemplo agiria com dolo eventual quem sabendo que o sujeito passivo é inocente não comunica a autoridade competente mas segreda a terceiros divulga propaga na coletividade que o indigitado praticou determinado crime de ação pública tomando ciência dessa divulgação a autoridade competente instaura o procedimento devido comprovando ao final que o imputado é inocente Não se pode negar que nessa hipótese sabendo da inocência de outrem e mesmo sem desejar a efetiva instauração da investigação oficial com sua ação deu causa à instauração da investigação referida no tipo do art 339 Não se trata convenhamos de dolo direto contudo não se pode afirmar que dolo não houve e que a conduta é atípica ou restaria apenas residualmente o crime contra a honra Na realidade esse comportamento nas circunstâncias imaginadas configura dolo eventual e tipificada está a infração do art 339 contra a Administração da Justiça Por tudo isso sustentamos a admissibilidade de dolo eventual no crime de denunciação caluniosa ainda que infrequente 72 Elemento normativo de que o sabe inocente A mera possibilidade de conhecimento de qualquer elemento do tipo é insuficiente para configurar o dolo direto ou eventual Na realidade a previsão isto é o conhecimento deve abranger todos os elementos objetivos e normativos da descrição típica E esse conhecimento deve ser atual real concreto e não meramente presumido Agora a consciência do ilícito essa sim pode ser potencial mas já será objeto de análise somente da culpabilidade que também é predicado do crime Constar do texto legal a atualidade ou potencialidade do conhecimento de elementares normalmente representadas pelas expressões sabe ou deve saber ou como neste caso de que o sabe inocente é uma erronia intolerável visto que a ciência penal encarregouse de sua elaboração interpretativo dogmática Enfim concluindo a expressão de que o sabe inocente não é indicativa de dolo e tampouco de culpa mas constitui tão somente uma elementar normativa que a nosso juízo ante o atual estágio dogmático de dolo e da culpabilidade é absolutamente desnecessária Com efeito a elementar de que o sabe inocente representa somente a exigência de que o sujeito ativo tenha consciência atual efetiva real do estado de inocência do imputado não satisfazendo esse tipo penal a mera potencial consciência dessa condição do sujeito passivo 8 Consumação e tentativa Consumase o crime de denunciação caluniosa com a instauração da investigação policial administrativa civil pública de improbidade administrativa ou com a propositura da competente ação penal A tentativa é teoricamente admissível Aliás o próprio Supremo Tribunal Federal já se manifestou afirmando que o delito de denunciação caluniosa não se consuma enquanto não tenha sido pelo menos formalizado o inquérito policial Consumase enfim no lugar e no momento em que qualquer dos procedimentos referidos no tipo penal for instaurado A tentativa embora de difícil configuração é teoricamente possível Assim por exemplo quando o sujeito ativo denuncia o fato à autoridade competente que em razão da pronta comprovação da inocência do acusado não toma qualquer iniciativa não realiza nenhuma diligência enfim não instaura o procedimento devido ou seja o sujeito ativo fez tudo o que lhe competia para concretizar uma denunciação caluniosa a qual no entanto por circunstâncias alheias a sua vontade não se consuma 9 Figura majorada 1º Quando para a realização da conduta típica o agente servese de anonimato ou de nome suposto a pena é majorada de um sexto Essa majoração se justifica pela maior dificuldade que tal circunstância cria para a identificação do autor da imputação falsa Destacamos a distinção que fazemos entre majorantes e qualificadoras quando examinamos as figuras majoradas do crime de aborto 10 Forma privilegiada ou minorada 2º Verificase quando ao sujeito passivo é imputada a prática de contravenção A rigor a nosso juízo a imputação de simples prática de contravenção deveria ser descriminalizada para pelo menos manter a simetria com o crime de calúnia que só criminaliza a imputação falsa de crime sendo atípica a mera imputação de contravenção penal Em todo o caso pelo menos se determina a redução obrigatória de metade da pena aplicada 11 Concurso de crimes e conflito aparente de normas O saudoso desembargador paranaense Luiz Viel estabeleceu com precisão e cientificidade a distinção entre calúnia denunciação caluniosa e falso testemunho nos seguintes termos O tipo da calúnia exige uma rica composição subjetiva a ciência direta certa de que a imputação da realização de crime seja falsa O agente sabe que é mentira e assim dolosamente calunia Mas se alguém representa para que a autoridade policial instaure inquérito policial contra certa pessoa imputandolhe a autoria de crime de que o sabe inocente o crime cometido é o de denunciação caluniosa CP art 339 E se alguém inquirido em inquérito policial depõe atribuindo a certa pessoa falsamente a prática de crime comete falso testemunho CP art 342 O bem jurídico tutelado nos dois casos é a correta administração da Justiça cujos órgãos são dolosamente mal informados com o propósito de induzilos a processar condenar alguém por crime não cometido É o uso dos órgãos estatais investigação judiciários não simplesmente para ofender a honra mas para privar da liberdade grosso modo uma espécie de cárcere privado qualificado com autoria mediata Não fica por conseguinte a ofensa à honra como expressão delitiva autônoma ou autonomizável Ou há a delatio criminis falsa ou depoimento falso ou nada 111 Denunciação caluniosa e calúnia A denunciação caluniosa absorve a calúnia pelo princípio da consunção e dela se distingue porque naquela a imputação falsa de fato definido como crime é levada ao conhecimento da autoridade motivando a instauração de investigação policial ou de processo judicial Aliás essa distinção foi muito bem destacada pelo Ministro Francisco de Assis Toledo nos seguintes termos Expressões contidas em requerimento para instauração de inquérito policial reputadas caluniosas Não se pode pretender que ao noticiar fato criminoso a vítima cometa crime contra a honra se não extravasa da narrativa art 5º 1º a do CPP Havendo imputação falsa o crime será em tese o de denunciação caluniosa de ação penal pública não o de calúnia de ação penal privada 112 Denunciação caluniosa e crimes contra a honra A diferença fundamental enfim está na natureza do bem jurídico tutelado nos crimes contra a honra o bem jurídico é a honra do indivíduo e na denunciação caluniosa é a boa administração da justiça A denunciação caluniosa diferenciase igualmente da comunicação falsa de crime ou contravenção precisamente porque nesta não há acusação contra pessoa alguma e também no delito de autoacusação falsa porque em tal crime o denunciado não é pessoa diversa do denunciante mas este próprio 12 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de reclusão de dois a oito anos e multa Na forma majorada a pena é aumentada de sexta parte e na privilegiada diminuída de metade A natureza da ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A denunciação caluniosa deve ser objetivamente falsa isto é deve estar em contradição com a verdade dos fatos e o denunciante deve estar plenamente ciente de tal contradição Impossível falar em denunciação caluniosa se a imputação a outrem não é totalmente destituída de razão TJMG Apelação 1002404503818 90011 Rel Márcia Milanez j 782007 Elemento subjetivo do tipo consciência da inocência do acusado A acusação por crime de denunciação caluniosa deve conter um lastro probatório mínimo no sentido de demonstrar que a instauração de investigação policial processo judicial investigação administrativa inquérito civil ou ação de improbidade administrativa teve por única motivação o interesse de atribuir crime a uma pessoa que se sabe ser inocente STF RHC 85023TO Rel Min Joaquim Barbosa j 852007 A instauração de sindicância administrativa no âmbito da Corregedoria do Ministério Público para apurar falta disciplinar de Promotor de Justiça ainda que resultante de comportamento penalmente típico atribuído ao agente não é suficiente à incidência do tipo do art 339 do Código Penal que requisita instauração de investigação policial ou instauração de procedimento judicial civil ou administrativo STJ HC 32018MG Rel Min Félix Fischer j 1242005 Comunicação falsa de crime ou de contravenção Art 340 Provocar a ação de autoridade comunicandolhe a ocorrência de crime ou de contravenção que sabe não se ter verificado Pena detenção de 1 um a 6 seis meses ou multa D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Os antecedentes da comunicação falsa de crime ou contravenção não são muito distantes na medida em que foi desconhecida do direito antigo inclusive do direito medieval Chegou inicialmente a ser confundida com a denunciação caluniosa recebendo posteriormente a distinção necessária no Código Penal toscano 1853 Os Códigos Penais italianos Zanardelli 1889 e Rocco 1930 também criminalizaram essa figura típica Os códigos penais brasileiros anteriores 1830 e 1890 no entanto não recepcionaram a comunicação falsa de crime ou contravenção reservando essa iniciativa ao nosso Código Penal de 1940 que o disciplinou entre os crimes praticados contra a Administração da Justiça 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração Pública especialmente sua moralidade e probidade administrativa perante à coletividade tutelase o interesse público no sentido de que a justiça não seja desviada em razão de denúncias falsas e aberrantes procurando evitar o desvio de rota do Poder Público com gastos desnecessários insegurança social e perturbação de pessoas inocentes Protegese em verdade a probidade de função pública sua respeitabilidade bem como a integridade de seus funcionários 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa não lhe sendo exigida nenhuma qualidade ou condição pessoal ou funcional Sujeito passivo é o Estado que é o titular do bem jurídico ofendido a Administração Pública lato sensu especificado na Administração da Justiça 4 Tipo objetivo adequação típica Punese a conduta de quem provoca motiva dá causa a ação de autoridade policial ou judiciária comunicando a ocorrência de infração penal crime ou contravenção que sabe não ter acontecido Essa comunicação poderá ser feita de várias maneiras podendo o agente valerse de meios escritos orais inclusive do anonimato desde que idôneas a provocar a ação investigatória da autoridade pública O tipo penal deixa claro a necessidade de que o sujeito ativo saiba que o fato comunicado à autoridade competente não aconteceu A elementar típica sabe que não se verificou não se confunde com um indicativo de dolo ou culpa como pensava a antiga doutrina nacional como demonstramos no capítulo anterior pelo contrário está apenas exigindo nesse tipo de infração penal a consciência atual real e efetiva da inocorrência do fato comunicado Aliás a ação de quem comunica à autoridade competente uma infração penal encontrandose em dúvida sobre sua efetiva ocorrência não se reveste sequer da elementar normativa falsa podendo quando muito ser temerária imprudente ou afoita mas não falsa Na verdade cabe à autoridade policial ao iniciar as investigações tomar as cautelas que o comunicante não teve e que talvez nem lhe fossem exigidas deixandose levar pelo afã de contribuir para com a Justiça 41 Pretendese evitar a máfé Nem sempre as autoridades investigam fatos verdadeiros reais e concretos caso contrário se assim fosse havendo a confissão de um suposto autor seria desnecessário procederse às investigações Por vez com efeito investigase exatamente para constar a veracidade ou não da própria existência do crime inclusive não raro torcendo para que não tenha ocorrido em razão dos danos que pode produzir O que o legislador pretendeu com o dispositivo em exame é evitar exatamente a máfé do cidadão a deliberada ação de levar a máquina pública a desvirtuarse de seus fins específicos com as consequências que produz e até por isso nem sequer previu a modalidade culposa no que digase de passagem andou bem o legislador de então 42 Irrelevância dos motivos determinantes Os motivos determinantes da conduta do agente são a priori irrelevantes para a configuração do crime de denunciação falsa Contudo dependendo da finalidade que motivou a denunciação pode tipificar outra infração penal como por exemplo alegar falsamente que foi vítima de furto para justificar o recebimento do seguro configurando nessa hipótese uma modalidade de estelionato art 171 2º V 43 Comunicação falsa de infração penal e denunciação caluniosa Convém destacar que a comunicação falsa de infração penal não se confunde com a infração anteriormente analisada denunciação caluniosa nesta o sujeito ativo indica determinada pessoa suposta como autora da infração penal naquela o sujeito ativo não indica ninguém como autor da infração que afirma ter ocorrido Na comunicação falsa de infração penal o agente sabe que infração não houve na denunciação caluniosa sabe que o imputado não praticou o crime que denuncia Distintas pois são as infrações penais como diferentes são os bens jurídicos ofendidos 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo geral do crime é o dolo representado pela vontade de comunicar a ocorrência sobre a qual tem consciência de que não se verificou É insuficiente a dúvida do agente sobre a efetiva ocorrência da infração que denuncia pois o tipo penal é incisivo na exigência de que o agente saiba que o fato que comunica não ocorreu Como não há previsão da modalidade culposa faltando o conhecimento pleno de que a comunicação é falsa a conduta praticada pelo agente é atípica constituindo nessas circunstâncias um indiferente penal Exigese também a presença do elemento subjetivo especial do tipo consistente no especial fim de provocar a ação da autoridade sem causa Pelos mesmos fundamentos expostos no tópico anterior passamos a admitir pelo menos em tese a possibilidade de dolo eventual 6 Consumação e tentativa Consumase o crime de comunicação falsa de crime ou contravenção com a ação da autoridade motivada pela comunicação de crime ou contravenção isto é consumase quando e onde a autoridade promove qualquer diligência para apurar a falsa infração penal Admitese teoricamente a tentativa embora in concreto seja de difícil configuração 7 Pena e ação penal As penas cominadas alternativamente são de detenção de um a seis meses ou multa Corretamente ao contrário de alguns códigos penais alienígenas v g português e italiano não comina pena distinta quando a falsidade da comunicação refirase a crime ou a contravenção pois o bem jurídico protegido não se altera A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Art 340 Crime caracterizado Comete o delito de comunicação falsa de crime o agente que noticia a ocorrência de delito que sabe não ter se verificado TJRS Apelação 70021871595 Rel Gaspar Marques Batista j 22112007 Art 340 Comunicação da ocorrência de furto declarando em depoimento ter sido vítima de roubo sabendo que tal crime não havia ocorrido e conhecendo o autor o vendedor ao qual não tinha acertado a compra é de ser mantida a condenação TJRS Recurso Crime 71001275874 Rel Alberto Delgado Neto j 2562007 Não importa a quem tenha sido feita a comunicação falsa de crime para que se configure o crime do CP art 340 O que conta e se dessa comunicação falsa houve alguma providência para apurar Aí definese a competência em função do lugar onde se iniciaram formalmente as averiguações STJ Conflito de Competência 4552SP Rel Min Édson Vidigal j 21101993 Autoacusação falsa Art 341 Acusarse perante a autoridade de crime inexistente ou praticado por outrem Pena detenção de 3 três meses a 2 dois anos ou multa D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias A criminalização da conduta de autoacusarse falsamente surge no Código Penal italiano de 1889 Zanardelli como simulação subjetiva em oposição à simulação objetiva tendo sido ignorada na legislação anterior à unificação italiana Na legislação brasileira o Código Criminal de 1830 e o Código Penal de 1890 ignoraram o crime de autoacusarse falsamente embora tenha constado do Projeto Alcântara Machado art 180 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração Pública particularmente seu prestígio e probidade administrativa perante a coletividade tutela se a exemplo do crime de comunicação falsa de crime o interesse público no sentido de que a justiça não seja obstada ou desvirtuada em decorrência de denúncias falsas e aberrantes procurando evitar o desvio de rota do Poder Público com gastos desnecessários insegurança social e a perturbação de pessoas inocentes Protegese igualmente a probidade de função pública sua respeitabilidade bem como a integridade de seus funcionários 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa não lhe sendo exigida nenhuma qualidade ou condição pessoal ou funcional desde que não tenha sido autor coautor ou partícipe do crime objeto da autoacusação falsa devendo ficar enfim afastada qualquer possibilidade de participação no fato delituoso Sujeito passivo é o Estado que é o titular do bem jurídico ofendido a Administração Pública lato sensu especificado na Administração da Justiça 4 Tipo objetivo adequação típica A conduta punível consiste em acusarse isto é imputarse crime inexistente ou praticado por outrem A falsidade da autoacusação reside na inexistência do fato delituoso ou assertiva de não têlo cometido Em termos bem esquemáticos o crime de que o agente se autoacusa deve ser inexistente isto é que não aconteceu ou mais precisamente que o sujeito ativo não o praticou pois o fato em si mesmo até pode ter sido cometido mas por outrem segundo menciona o próprio caput Nessa hipótese é indispensável que o sujeito ativo não tenha de qualquer forma concorrido para o crime caso contrário em vez de praticar autoacusação falsa estaria na verdade confessando a prática efetiva de um crime mediante concurso de pessoas 41 Autoacusação perante a autoridade É imprescindível que o agente o faça perante a autoridade policial ou judicial e que o escopo da autoacusação seja crime e não mera contravenção que não consta do texto legal pois quando o legislador deseja a ela se referir o faz expressamente Não é necessário que o agente quando se autoacusa esteja têteàtête com a autoridade podendo fazêlo por carta telegrama fax ou qualquer outro meio de comunicação desde que tenha idoneidade para transmitir a acusação Autoridade só pode ser a competente isto é aquela que tem atribuição para investigar para apurar a existência de crime e respectiva autoria ou pelo menos determinar que se proceda a tal investigação Em síntese essa autoridade a que se refere o texto legal é a autoridade policial judicial ou órgão do Ministério Público 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade de autoacusarse falsamente tendo consciência de não haver praticado o crime ou de que foi outro que o praticou Desnecessário registrar que a autoacusação deve ser voluntária embora não seja necessária a espontaneidade visto que se for forçada motivada ou extorquida pela autoridade fica afastado o dolo indispensável para a configuração típica A nosso juízo não há exigência de elemento subjetivo especial do tipo 51 Irrelevância da motivação da autoacusação A motivação determinante da conduta do agente é irrelevante para a configuração do crime de autoacusação falsa É indistintamente criminoso atribuirse o crime praticado por outrem por piedade compaixão ódio ou amor como também o é autoacusarse de determinado crime para livrarse de outro mais grave como por exemplo assumir a autoria de um crime menor como álibi quando na mesma hora cometeu outro mais grave em lugar distinto Mesmo que pratique o crime para beneficiar cônjuge ascendente descendente ou irmão por pura falta de previsão legal não terá qualquer causa de diminuição de pena embora possa e deva ser considerado na dosimetria da pena Em outros termos a motivação altruística do agente ou mesmo seu grau de parentesco para com o verdadeiro autor do crime objeto de autoacusação falsa não altera sua tipificação 6 Consumação e tentativa Consumase o crime com o conhecimento pela autoridade da autoacusação falsa no lugar e no momento em que tal conhecimento ocorrer Realmente o crime somente se completa com a ciência da autoridade pois como reconhecia Noronha alguém somente pode acusarse se o fizer perante outrem A tentativa é admissível caso a conduta seja realizada por escrito pois se trata de crime plurissubsistente podendo ser fracionada A retratação do agente não extingue a punibilidade do delito funcionando tão somente como uma circunstância atenuante genérica 7 Pena e ação penal As penas cominadas alternativamente são de detenção de três meses a dois anos ou multa É um dos crimes que apresenta a maior elasticidade da pena cominada permitindo uma dosagem adequada nas situações as mais diversas possíveis A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Autoacusação falsa Condenação mantida A reconstituição probatória demonstra que o apelante assumiu a culpa por um crime que não praticou cometendo por conseguinte o delito do art 341 caput do CP TJRS Apelação 70020241709 Rel Aristides Pedroso de Albuquerque Neto j 982007 Falso testemunho ou falsa perícia Art 342 Fazer afirmação falsa ou negar ou calar a verdade como testemunha perito contador tradutor ou intérprete em processo judicial ou administrativo inquérito policial ou em juízo arbitral Pena reclusão de 1 um a 3 três anos e multa 1º As penas aumentamse de um sexto a um terço se o crime é praticado mediante suborno ou se cometido com o fim de obter prova destinada a produzir efeito em processo penal ou em processo civil em que for parte entidade da administração pública direta ou indireta 2º O fato deixa de ser punível se antes da sentença no processo em que ocorreu o ilícito o agente se retrata ou declara a verdade Caput e 1º e 2º com redação determinada pela Lei n 10268 de 28 de agosto de 2001 O mesmo diploma legal suprimiu o 3º D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias A Lei n 10268 de 28 de agosto de 2001 alterou a versão original do crime de falso testemunho ou falsa perícia bem como da corrupção ativa de testemunha e perito Tratandose de lei nova incriminadora aplicase exclusivamente a fatos ocorridos a partir de 29 de agosto de 2001 data de sua publicação Referido diploma legal acrescentou o contador entre os sujeitos ativos desses crimes A previsão original do Código Penal continua sendo aplicada a todos os fatos praticados sob sua vigência sem as novidades trazidas pela Lei n 102682001 ressalvada a qualificadora que era prevista no antigo 1º duplicando a pena Nesse caso aplicase a nova previsão majorante retroativamente por ser mais benéfica conjugandose duas leis distintas sobre o mesmo fato extraindoselhes os dispositivos mais benéficos Aproveitouse referido diploma legal para precisar a linguagem que utilizava processo policial para inquérito policial Contudo olvidouse de incluir inquérito parlamentar administrativo e judicial que evidentemente não se confundem com o inquérito policial 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração Pública em sentido lato a exemplo dos crimes previstos no Título XI da Parte Especial do Código Penal especialmente na hipótese a moralidade respeitabilidade e probidade de sua função específica de administrar a justiça O falso testemunho ou falsa perícia fragiliza a segurança idoneidade e eficácia da relevante função estatal de distribuição de justiça atingindo a pureza limpidez imparcialidade e probidade da instrução probatória cuja finalidade é propiciar uma decisão final justa 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa que como testemunha perito tradutor ou intérprete realize a ação descrita no tipo penal desde que não esteja legalmente impedido ou dispensado de fazêlo Em termos esquemáticos sujeito ativo é quem chamado a depor na forma legal presta testemunho falso seja fazendo afirmação falsa seja negando ou calando a verdade São igualmente sujeitos ativos perito contador tradutor e intérprete considerando que o Código Penal de 1940 englobou em um mesmo dispositivo legal o falso testemunho e a falsa perícia com a única diferença de que a infração cometida por estes é a falsa perícia Sujeitos passivos do crime de falso testemunho ou de falsa perícia são a Administração Pública Administração da Justiça representada pelo Estado no seu legítimo interesse de desenvolver regularmente a atividade judiciária na busca infatigável de distribuir adequadamente justiça e se ocorrer o eventual ofendido lesado ou prejudicado pelo crime de falso testemunho ou falsa perícia 4 Tipo objetivo adequação típica São três as modalidades de conduta previstas no crime de falso testemunho ou falsa perícia afirmar falsamente negar ou calar a verdade Em outros termos o crime de falso testemunho pode ser praticado de três formas quais sejam afirmandose uma falsidade negandose a verdade ou calandose o que se sabe Vejamos a fazer afirmação falsa ou seja dizer uma coisa positivamente distinta da verdade o sujeito ativo assegura garante ou afirma uma inverdade diz que é certo o que não é Em outras palavras na afirmação falsa o agente faz declaração diversa da que corresponderia in concreto a sua percepção dos fatos havendo no dizer de Manzini Tratado de Derecho Penal v 5 p 772 uma disformidade positiva entre a declaração e a ciência da testemunha que finge uma impressão sensorial que não sentiu ou altera a que sentiu Há nessa modalidade uma ação afirmativa isto é positiva b negar a verdade negar um fato que sabe ou conhece ou seja negar um fato verdadeiro dizer que é errado o que sabe que é certo o sujeito ativo nega o que sabe nega a percepção de fatos que teve conhecimento direto ou nas palavras de Guilherme Nucci Código Penal comentado p 1065 negar a verdade é não reconhecer a existência de algo verdadeiro ou recusarse a admitir a realidade Afirmar o falso e negar o verdadeiro representam duas formas distintas positivas comissivas de faltar com a verdade c calar a verdade silenciar ou ocultar o que sabe Calar significa ficar em silêncio ou não querer responder constituindo uma forma de omissão de falsidade negativa Nessa modalidade não há afirmação nem negação o sujeito silencia sobre o fato ou recusase a responder violando segundo a doutrina igualmente o dever da verdade havendo o que os autores têm denominado de reticência Com efeito calandose isto é deixando de declarar o que sabe a testemunha afronta um duplo dever quais sejam de falar a verdade e de colaborar com a Administração da Justiça 41 Recusarse a responder e recusarse a prestar depoimento Precisase porém atentar que se recusar a responder perguntas do magistrado não se confunde com recusarse a prestar depoimento Na primeira hipótese recusar a responder pode não significa que seja automático configurar falso testemunho na modalidade de calar se efetivamente tiver conhecimento e com o silêncio ocultar o que sabe ou seja como sempre ocorre em direito penal é necessário que haja uma relação de causa e efeito na segunda recusarse a depor não pode configurar falso testemunho não passando de absurda presunção proscrita pelo direito penal da culpabilidade caracteriza ao contrário simples rebeldia mera desobediência que não configura sequer crime pela ausência das elementares típicas e tem como consequência a condução sob vara nos termos do Código de Processo Penal art 218 Por isso não constitui falso testemunho a negação ou recusa em prestar depoimento Recusarse a depor enfim não é o mesmo que cometer falso testemunho que exige como pressuposto um depoimento pois somente por meio deste se pode cometer aquele 42 Modalidades de falso testemunho positiva negativa e omissiva O legislador na definição do falso testemunho equiparou as três modalidades positiva negativa e omissiva atribuindo o mesmo significado a afirmar algo falso negar fato verdadeiro ou ocultar fato de que se tem conhecimento A falsidade coibida pelo tipo penal no entanto não é a contradição entre o depoimento da testemunha e a realidade fática mas entre o depoimento e o conhecimento que a testemunha tem dos fatos ou seja é o contraste entre o depoimento e a verdade subjetiva da testemunha em relação aos fatos Falso é o depoimento que não corresponde qualitativa ou quantitativamente ao que a testemunha viu sabe conhece percebeu ou ouviu O critério da falsidade do testemunho não depende da relação entre o dito e a realidade mas da relação entre o dito e o conhecimento que a testemunha tem dessa realidade 43 Limites do depoimento testemunhal O tipo penal não perdeu de vista que a testemunha somente depõe sobre fatos sendolhe vedada a exteriorização de opiniões ou apreciações pessoais sobre aqueles art 213 do CPP tendolhe o legislador atribuído exclusivamente a função de narrar ou transmitir à autoridade processante fatos pretéritos que viu sabe ou conhece Falsas avaliações ou apreciações equivocadas sobre as qualidades pessoais do acusado ou da vítima ainda que dolosas não caracterizam falso testemunho pois seu compromisso e sua função são relatar fatos como fatos enquanto fatos sem adjetivação Na verdade eventuais perguntas dirigidas à testemunha relativamente a sua impressão pessoal sobre os fatos ou sobre o acusado podem ser altamente lesivas à ampla defesa podendo ser objeto de impugnação impedindo que sejam consideradas pelo julgador Quem incorre em falso testemunho transgride a obrigação de dizer a verdade e essa obrigação da testemunha situase em pontos ou aspectos essenciais e não meramente acidentais acessórios ou secundários que por isso mesmo não têm maior influência no julgamento final deixando consequentemente de apresentar a potencialidade lesiva exigida para configurar o crime 44 Falsidade sobre fato juridicamente relevante A falsidade do testemunho no entanto não é a que recai sobre qualquer fato mas somente a que incide sobre fato juridicamente relevante e evidentemente desde que tenha pertinência com o objeto do processo de que cuida Por isso como adverte Paulo José da Costa Jr Comentários ao Código Penal p 554 se a falsidade consistir em circunstâncias inócuas se versar super accidentalibus ou fatos estranhos à matéria probante não se apresenta o delito Com efeito desaparece a ratio da incriminação se a falsidade incidir sobre fatos acidentais secundários sem potencialidade para influir sobre o futuro julgamento ou alheios ao thema probandum Sem potencialidade lesiva o falso testemunho será um ato imoral antiético mas não antijurídico A falsidade que incide sobre circunstância ou fato juridicamente irrelevante não afeta a prova nem atinge o interesse tutelado pela lei É indispensável em outros termos que o fato falso afirmado negado ou silenciado seja juridicamente relevante isto é seja considerado na apreciação final do julgador apresentando por isso mesmo potencialidade lesiva para poder adequarse à descrição típica do dispositivo em exame 45 Teorias sobre conteúdo e essência da falsidade Duas teorias antagônicas pretendem definir o conteúdo e a essência da falsidade Para a teoria objetiva há falso testemunho quando o relatado pela testemunha não corresponde à realidade para a teoria subjetiva no entanto a falsidade reside na contradição entre o que a testemunha sabe viu ou conhece e aquilo que declara A primeira hipótese referese ao que ocorreu efetivamente a segunda ao que a testemunha sabe ou pensa que sabe Naquela o dito pela testemunha não foi o que aconteceu nesta contraria o que a testemunha conhece A teoria subjetiva é a predominante desde o magistério de Carrara que ensinava o critério da falsidade do testemunho não depende da relação entre o dito e a realidade das coisas mas sim da relação entre o dito e a ciência da testemunha Em síntese para a orientação dominante que adota a teoria subjetiva falso testemunho é a divergência entre o depoimento da testemunha e o conhecimento que esta tem dos fatos Dessa forma configurase o falso testemunho por exemplo quando a testemunha declara falsamente que viu um fato que efetivamente aconteceu mas que esta não viu O fato é verdadeiro mas a declaração de têlo visto é falsa ou seja há divergência entre o que afirma a testemunha e o que ela realmente viu Em outras palavras a falsidade não reside na contradição entre a realidade fática verdade objetiva e a afirmação da testemunha mas entre o seu depoimento e o conhecimento que tem dos fatos verdade subjetiva Por isso é atípica a conduta da testemunha que declara o que sabe verdade subjetiva embora seja divergente do que efetivamente ocorreu A prática repetida ou sucessiva pelo agente em um mesmo processo de afirmação falsa não correspondente à sua verdade subjetiva não configura concurso de crimes em qualquer de suas modalidades material formal ou continuado pois há um único crime falso testemunho 46 Falsidade sobre a qualificação pessoal atipicidade da conduta Outra questão controvertida referese à falsidade que recai sobre qualificação pessoal da testemunha que por exemplo omite ser ascendente ou descendente de alguma das partes do processo alterando dados tais como nome idade estado civil relação de parentesco etc Para alguns a qualificação é uma formalidade essencial que pode influir no valor probante do depoimento e ao ofender diversos interesses em litígio atenta contra a administração da justiça Para outros essas questões pessoais não se vinculam aos fatos objeto da causa não integrando portanto o objeto da proteção penal Finalmente para uma terceira orientação não há crime porque na qualificação da testemunha não há propriamente depoimento em sentido estrito Seguindo o primeiro entendimento Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 478 sustentava que semelhante falsidade pode influir talvez decisivamente sobre o julgamento dado o prestígio de insuspeição que assumirá a testemunha Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 554 a despeito de reconhecer a possibilidade de a omissão de parentesco poder influir na credibilidade do testemunho sustenta contrariamente a Hungria que não se trata porém de fatos da causa e sim de condição pessoal da testemunha motivo pelo qual Manzini não admite que possa haver em tal caso o crime de falso testemunho Concluindo a falsidade de um depoimento somente pode referirse a fatos e não à qualidade ou condição pessoal da testemunha que ademais não é objeto da investigação processualprocedimental 47 Inverdades na qualificação pessoal da testemunha Ora a despeito da importância indiscutível da qualificação pessoal da testemunha embora constituam informações úteis e até necessárias tais declarações não integram o depoimento propriamente dito sobre a integridade na qual recai a tutela penal O falso testemunho tem relação com o objeto da prova que é sua finalidade e não com o questionário preliminar destinado a identificar a testemunha Aliás essa assertiva fica tão evidente no quotidiano forense quando os magistrados primeiro determinam através do funcionário encarregado que se proceda à qualificação da testemunha com todos os seus dados pessoais por termo em separado da qual nem sequer o magistrado toma parte após em ato independente separado procedese à assentada ou tomada das declarações da testemunha que só então presta o compromisso de falar a verdade sobre os fatos da causa e não sobre sua qualificação pessoal 48 A paradoxal condição de imputado travestida na de testemunha O acusado não apenas tem direito ao silêncio como inclusive o de faltar com a verdade em sua própria defesa A condição de acusado exclui ipso facto a de testemunha Nesse sentido é incensurável o magistério de Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 861 quando afirma a condição de imputado exclui a de testemunha Além de ser parte no processo penal não tem a obrigação de dizer a verdade limite da punibilidade de uma declaração falsa No delito em foco a condição de testemunha em sentido material é elemento do tipo penal E tal condição não possui o imputado ainda que declare como testemunha Quem é investigado tem assegurado pela Constituição não apenas o direito ao silêncio mas fundamentalmente o direito de não produzir prova contra si mesmo Por isso quem é investigado ainda que dissimuladamente pela autoridade investiganteprocessante como sói acontecer nas Comissões Parlamentares de Inquérito e por vezes nas Investigações procedidas pelo Ministério Público que fraudam a relação processual procurando impor ao investigado o compromisso de dizer a verdade a quem é potencialmente investigado pretendendo extorquir declarações sob a ameaça do crime de falso testemunho eventual declaração que não corresponda à realidade fazendo afirmação falsa negando ou calando a verdade não tipifica o crime de falso testemunho pois o compromisso prestado é materialmente inválido por contraporse ao texto constitucional O investigado além de ser parte no processo não tem a obrigação de dizer a verdade pois poderá estar produzindo prova contra si mesmo No crime de falso testemunho a condição de testemunha no seu aspecto material é elementar do tipo e o investigadoprocessado certamente não possui essa condição Consequentemente se o investigadotestemunha falsear a verdade em suas declarações sua conduta será absolutamente atípica 49 Falsidade da conduta da autoridade altamente censurável Falso na verdade nessas condições não são as declarações do investigado por não corresponder à realidade dos fatos mas é a conduta da autoridade processante que além de antiética e imoral é também antijurídica tendo sido objeto invariavelmente de concessões de ordem de habeas corpus por nossa Corte Suprema para assegurar direito que nossos parlamentares deveriam não apenas conhecer e respeitar mas principalmente defender A única forma de coibir essa odiosa praxe que se instalou no parlamento nacional é criminalizar essa conduta fraudulenta de autoridades que forçam os investigados a prestar compromisso quando sabidamente ou dissimuladamente são objeto da investigação 410 Limite espacial do falso testemunho judicial e extrajudicial O falso testemunho deve ser praticado em processo judicial civil trabalhista ou criminal em inquérito policial mero procedimento inquisitório préprocessual em boa hora corrigido o texto original processo policial pela Lei n 102682001 em processo administrativo instrumento para apurar e punir infrações funcionais perante a autoridade administrativa em juízo arbitral instituição cuja função é solucionar conflitos que lhe são confiados fora do âmbito do Poder Judiciário ainda pouco utilizado no direito brasileiro ou em inquérito parlamentar procedido por Comissão Parlamentar Lei n 157952 A previsão do Código Penal de 1940 é mais abrangente que aquela prevista no Código Penal de 1890 que se limitava a criminalizar o falso praticado em juízo Por último a Lei n 157952 estendeu a tipificação da prática dessa infração penal na Comissão Parlamentar de Inquérito art 4º II 5 Compromisso legal de dizer a verdade testemunha não compromissada Toda pessoa pode ser testemunha de acordo com o art 202 do CPP contudo nem toda pessoa tem o dever jurídico de depor art 206 do CPP Ademais o art 207 do mesmo diploma legal proíbe de depor quando não desobrigadas pelo interessado as pessoas que em razão de função ministério ofício ou profissão devem guardar segredo Temse questionado a possibilidade de testemunha não compromissada arts 206 e 208 do CPP poder cometer o crime de falso testemunho A corrente majoritária tem sustentado que como o juramento ou compromisso não é pressuposto do crime resulta indiferente tratarse de testemunha numerária ou testemunha informante A corrente minoritária no entanto a qual nos filiamos sustenta a impossibilidade de as testemunhas não compromissadas meros informantes praticarem falso testemunho ante a inexistência do compromisso legal de dizer a verdade em razão do vínculo que as prende a uma das partes e que as torna desmerecedoras da mesma credibilidade das demais isto é das testemunhas numerárias Em síntese para a primeira orientação é desnecessário o compromisso para a caracterização do crime de falso testemunho ou falsa perícia considerandose que todos têm o dever de dizer a verdade em juízo além de que o compromisso não mais integra esse crime de falso como ocorria no Código Penal de 1890 para a segunda é indispensável o compromisso pois sua ausência transforma quem seria testemunha em mero informante devendo o juiz valorar adequadamente suas declarações informante não presta depoimento mas declarações ou informações usando seu livre convencimento na apreciação de todo o contexto probatório 51 Falso testemunho independe do compromisso de falar a verdade A doutrina majoritária com efeito tem procurado demonstrar ao longo do tempo que como o legislador de 1940 eliminou o juramento ou o compromisso de dizer a verdade por parte da testemunha como pressuposto do crime de falso testemunho não distinguindo testemunha compromissada e não compromissada também esta comete o crime de perjúrio isto é aquela que por alguma razão é dispensada do compromisso de dizer a verdade ascendente descendente afim em linha reta irmão ou cônjuge do acusado art 206 do CPP pois segundo Hungria não pode prestar impunemente testemunho falso Em sentido semelhante manifestava se Noronha Direito Penal v 2 p 379 argumentando que não estão dispensadas de dizer a verdade já que por seus depoimentos pode o juiz firmar a convicção o que lhe é perfeitamente lícito em face do princípio inconcusso consagrado pelo Código de Processo do livre convencimento Observese também que a lei penal não distingue ao se referir à testemunha Por outro lado seria inútil permitirlhes o depoimento Na mesma linha adverte Paulo José da Costa Jr Comentários ao Código Penal p 553 Tais testemunhas ditas informantes se resolverem depor deverão dizer a verdade ficando igualmente sujeitas às penas do falso testemunho Poderseá entretanto sustentar com mais propriedade que estando elas desobrigadas de prestar compromisso CPP podem falsear a verdade Segue a mesma trilha Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 862 afirmando Assim sendo independentemente de terem prestado compromisso legal tanto podem praticar o crime a testemunha numerária como a informante Aliás convém salientar dado o princípio do livre convencimento do juiz que rege nosso Direito Processual Penal arts 157 e 182 CPP arts 131 e 436 CPC pode o juiz fundamentar sua sentença no depoimento de testemunha compromissada ou não compromissada 52 Sem compromisso não há crime de falso testemunho Em sentido contrário no entanto a nosso juízo acertadamente Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 513 com a perspicácia de sempre pontificava Em relação à testemunha é indispensável que tenha prestado o compromisso legal art 203 do CPP pois somente neste caso surge o dever da verdade Não pratica crime a testemunha que é mero informante RT 492287 508354 No mesmo sentido Guilherme de Souza Nucci Código Penal comentado p 1069 jovem e talentoso magistrado brasileiro destaca Entretanto se ao contrário a ela expressamente não deferir o compromisso deixando claro tratarse de meras declarações não há como punir o sujeito que mentiu Sem o compromisso não se pode exigir que o depoente fale a verdade mesmo porque as pessoas que estão imunes à promessa de dizer a verdade são justamente as que não têm condições emocionais de fazêlo ou por conta de deficiência mental ou falta de maturidade terminam não narrando a verdade Como se pode exigir do pai do réu eximido da obrigação de depor art 206 CPP que conte a verdade do que aconteceu mesmo sabendo que o filho pode ir graças ao seu depoimento para a cadeia 521 A melhor orientação doutrinária Sem sombra de dúvidas a melhor orientação é essa defendida por Heleno Cláudio Fragoso e muito bem sustentada por Guilherme de Souza Nucci com argumentos sólidos lógicos e jurídicos que enfraquecem qualquer argumento em sentido contrário Excepcionalmente diz o art 206 in fine quando por outra forma não for possível obter ou integrar a prova do fato e de suas circunstâncias pode o magistrado determinar a inquirição dessas pessoas embora sem lhes deferir o compromisso art 208 Qual a razão afinal da dispensa do compromisso Qual é o fundamento ético e jurídico do dever de declarar a verdade Será o livre convencimento do juiz como fundamentam os doutrinadores citados anteriormente ou O dever da verdade será um dever público isto é um dever genérico ou será um dever especial a ponto de a testemunha assumir o compromisso declarandoo formalmente de fazêlo Por fim porque as testemunhas que como tal comparecem aos autos devem prestar compromisso da verdade e as pessoas desobrigadas de depor quando por indispensável necessidade recolhese suas declarações não prestam tal compromisso Seguramente deve haver uma razão para aquelas serem obrigadas a se comprometerem com a verdade e estas as informantes não caso contrário todas deveriam assumir o mesmo compromisso Se as consequências fossem as mesmas de quem presta compromisso e de quem não o presta não haveria razão alguma para que dele fosse dispensado valendo lembrar ademais a velha e pertinente lição de que a lei não tem palavras inúteis e acrescentaríamos muito menos comandos ou sanções inúteis ou sem sentido 53 Testemunha versus declarante ou informante Ora toda a construção legislativa está muito clara no sentido de que o legislador diferenciou testemunha do mero declarante ou informante O valor probante da testemunha é um e o resultado das declarações obtidas pelo juiz de meros informantes ou declarantes é recebido e avaliado sempre com muita reserva pelo julgador ou seja não tem o mesmo valor probatório da testemunha porque não são testemunhas porque não têm a obrigação e o compromisso com a verdade não estão sujeitas às consequências do falso testemunho porque estão emocionalmente vinculados a uma das partes porque por própria natureza humana e pelos laços familiares não podem ser imparciais e racionalmente neutras no desenrolar do processo como é dever da testemunha Com efeito o dever da verdade não é genérico mas especial e não decorre automaticamente da lei que obrigaria a todos mas decorre do compromisso individual daquelas pessoas que podem e são obrigadas a depor como testemunhas Fosse o dever da verdade uma obrigação universal decorrente da lei seria desnecessário o compromisso obrigatório da testemunha E a obrigação de uns prestarem compromisso a outros não comprova diversidade de função e de responsabilidades A dispensa do compromisso significa exatamente que o legislador reconheceu a impossibilidade de delas exigir a fidelidade à verdade admitindo a dificuldade que os vínculos familiares naturalmente acarretam ao ser humano Tanto que a advertência prevista no art 210 parte final do CPP destinase somente às testemunhas compromissadas devendo o juiz advertilas das penas cominadas ao falso testemunho 54 Vítima não é testemunha é parte interessada Convém registrar que a vítima também não presta compromisso de dizer a verdade pois não pode ser obrigada a prestar declarações a vítima não presta depoimento em juízo contra os seus interesses violentando suas próprias convicções ou mesmo seu legítimo direito de sentirse injustiçada pelo acusado seu ofensor Ora a vítima é tão informante não é testemunha quanto aquelas pessoas desobrigadas a que nos referimos anteriormente ademais a vítima nem integra o capítulo relativo à testemunha Naturalmente o magistrado no processo de valoração e avaliação do contexto probatório fará a apreciação das declarações dos informantes com redobrada cautela e as confrontará com o acervo probatório constante dos autos e por certo não perderá de vista que ditas declarações têm natureza subsidiária em relação à prova propriamente dita 55 Entendimento contraditório de Hungria No entanto incompreensivelmente o mesmo Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 4845 adotava entendimento diverso em relação às pessoas proibidas de depor art 207 do CP que resolvessem fazêlo nos termos seguintes Assim se qualquer dessas pessoas embora não desobrigadas deixarse inquirir mas deturpando ou negando a verdade ou deixando de revelar tudo quanto sabe não cometerá o crime em exame senão se for o caso o de violação de segredo profissional art 154 As primeiras familiares do acusado art 206 têm a faculdade de não depor e as últimas são proibidas de fazêlo sigilo profissional que são digamos graus diversos de vedações No entanto não vemos razão alguma para aquelas falseando a verdade incorrerem em crime de falso testemunho ao passo que estas não nenhum fundamento lógico ou jurídico autorizaria essa interpretação distinta Embora na nossa concepção ao contrário do que sustentava Hungria é de que nem aquelas nem estas respondem por crime de falso testemunho exatamente porque são dispensadas do compromisso de dizer a verdade e quando se decidir ou precisar ouvi las o juiz receberá suas declarações com as cautelas devidas isto é valorandoas como informações e não como testemunhos legais como ocorre também na hipótese por exemplo de testemunha contraditada e que tenha sido admitida a contradita Logicamente também não podem ser acusadas do crime de falso testemunho quando admitidos a depor os doentes mentais ou com desenvolvimento mental incompleto e os menores arts 26 e 27 do CP em razão da natural inimputabilidade 6 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade de fazer afirmação falsa de negar ou calar a verdade Além da consciência da ação que pratica e de suas consequências é necessário que o sujeito ativo tenha ciência de que está praticando uma falsidade seja em relação ao testemunho seja em relação à perícia Tanto o falso testemunho quanto a falsa perícia admitem o dolo eventual segundo entendimento majoritário da doutrina nacional com o que não estamos de acordo A nosso juízo é necessário um elemento subjetivo especial do tipo qual seja o especial fim de causar prejuízo a alguém ou à simples administração da justiça O fim especial de obter prova em processo criminal que seria um elemento subjetivo especial do injusto qualifica o crime tornandoo mais desvalioso e consequentemente mais penalizado 7 Consumação e tentativa Consumase o crime de falso testemunho com o encerramento do ato processual do depoimento e a respectiva assinatura da testemunha do tradutor ou intérprete a falsa perícia com a entrega do laudo que traz em seu bojo a falsidade pericial Para sua tipificação é irrelevante que a falsidade tenha ou não influído na decisão proferida no processo A tentativa embora de difícil configuração é teoricamente admissível na falsa perícia mas impossível no falso testemunho salvo quando o testemunho for prestado por escrito art 221 1º do CPP crime plurissubsistente 8 Substituição de qualificadora por majorantes O 1º anterior previa uma pena de dois a seis anos quando a finalidade da ação fosse obter prova destinada a processo penal ou seja cominava o dobro daquela prevista para o caput Pela nova lei aquela qualificadora passa a constituir majorante obrigatória que autoriza a elevação da pena aplicada entre um sexto e um terço Essa majorante verificase quando o crime é cometido com o fim de obter prova destinada a produzir efeito em processo penal que no sentido do texto legal abrange tanto a ação quanto o inquérito penal A razão de ser dessa qualificadora é a importância dos bens jurídicos tutelados pela lei penal que pairam acima de todos os demais A majorante do emprego de suborno constante do anterior 2º também foi incluída no 1º que assim passou a contemplar duas figuras praticado mediante suborno ou com o fim de obter prova destinada a processo penal A segunda majorante que alguns doutrinadores denominam qualificadora ocorre quando o crime é praticado mediante suborno entendido este como recompensa oferta ou qualquer outra vantagem de cunho patrimonial 9 Retratação do falso testemunho ou falsa perícia Há hipóteses legais em que a retratação exime o réu de pena Esses casos são os de calúnia difamação falso testemunho e falsa perícia Pela retratação o agente reconsidera a afirmação anterior e assim procura impedir o dano que poderia resultar da sua falsidade Retratação é o ato de desdizer de retirar o que se disse de admitir a inverdade e corrigila Retratação não se confunde com negação do fato ou negativa de autoria pois pressupõe o reconhecimento de uma afirmação confessadamente errada inverídica Negar o fato calúnia difamação ou falso testemunho não é retratarse É indispensável que o agente se desdiga isto é retire expressamente o que afirmara Pela retratação o agente reconsidera a afirmação anterior e assim procura impedir o dano que poderia resultar da sua falsidade A retratação ou declaração da verdade exclui a punibilidade na falsa perícia ou no falso testemunho A declaração da verdade é o meio de corrigir o silêncio com o qual o agente a ocultou ou a mentira com a qual a falseou art 342 3º Nessa hipótese a retratação deve ser completa e ocorrer antes da publicação da sentença no processo em que ocorreu a falsidade A retratação nos crimes contra a honra por sua vez somente é admitida na calúnia e difamação sendo inadmitida na injúria 91 Limites dos efeitos decorrentes da retratação Os efeitos decorrentes da retratação são limitados à área criminal não havendo nenhum reflexo no plano indenizatório por exemplo O próprio Código Penal encarregase de definir a natureza jurídica da retratação ao relacionála como causa extintiva da punibilidade art 107 VI Admitimos que foram razões puramente de política criminal que levaram o legislador de 1940 a optar por atribuir o efeito extintivo da punibilidade à retratação cabal e definitiva levada a efeito antes da sentença Nesse sentido aceitamos o entendimento de Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 26 segundo o qual A retratação é uma espécie de arrependimento eficaz art 13 que se opera após o eventus sceleris A punição efetivamente é a consequência natural da realização da ação típica antijurídica e culpável No entanto após a prática do fato delituoso podem ocorrer causas que impeçam a aplicação ou execução da sanção respectiva não é a ação porém que se extingue mas o ius puniendi do Estado ou em outros termos como dizia o Min Francisco Campos O que se extingue antes de tudo nos casos enumerados no art 108 do projeto é o próprio direito de punir por parte do Estado Dáse como diz Maggiore uma renúncia uma abdicação uma derrelição do direito de punir do Estado Devese dizer portanto com acerto que o que cessa é a punibilidade do fato em razão de contingências ou por motivos vários de conveniência ou oportunidade Exposição de Motivos De observar porém que o crime como fato isto é como ilícito penal permanece gerando todos os demais efeitos civis pois uma causa posterior não pode apagar o que já se realizou no tempo e no espaço não impede por exemplo a propositura de ação reparatória cível art 67 II do CPP 92 Não exigência formal para a retratação Não há exigência de qualquer formalidade para a validade da retratação É suficiente que seja por escrito nos autos deve ser completa cabal isto é abrangendo tudo o que o ofensor disse contra o ofendido e incondicional Sua incondicionalidade justificase por ser ato unilateral e produzir efeitos independentemente da aceitação da vítima Pode ser feita pelo próprio ofensor ou por seu procurador com poderes especiais para esse fim 93 Incomunicabilidade da retratação A retratação é uma circunstância subjetiva de caráter pessoal que não se comunica aos demais participantes na hipótese de concurso de pessoas Em se tratando de concurso de crimes falso testemunho e calúnia por exemplo a retratação produz seus efeitos somente em relação ao crime ou fato a que se refere isso significa que havendo dois crimes o agente pode retratarse em relação a um e manter a imputação em relação a outro sem que isso sirva para invalidar a retratação e essa individualização tampouco pode ser entendida como retratação parcial condicional ou incompleta pois esses atributos são exigíveis em relação a cada fato em particular capazes de configurar uma unidade delitiva A previsão legal enfatizando permite que a retratação possa ser feita somente até antes da publicação da sentença embora haja decisão admitindo sua realização até antes do julgamento do recurso Na verdade retratação proferida após a publicação da sentença mesmo recorrível é absolutamente ineficaz para fins de extinção da punibilidade Deverá no máximo ser considerada na dosimetria penal 10 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de reclusão de um mês a três anos e multa O 1º comina pena de reclusão de dois a seis anos e multa o 2º prevê aumento de um terço das penas elencadas no caput do artigo A partir de 29 de agosto de 2001 a qualificadora do 1º foi substituída por uma majorante que eleva a pena aplicada de um sexto a um terço sendo nesse particular retroativa Lei n 102682001 por representar menor gravidade que a previsão anterior A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A É possível a participação no delito de falso testemunho Precedentes desta Corte e do Pretório Excelso A retratação de um dos acusados tendo em vista a redação do art 342 2º do Código Penal estendese aos demais corréus ou partícipes STJ HC 36287SP Rel Min Félix Fischer j 1752005 Falso testemunho Retratação A retratação do agente de crime de falso testemunho antes da sentença final extingue a punibilidade TJRS Apelação 70006528145 Rel Gaspar Marques Batista j 1482003 Falso testemunho art 342 do CP Coautoria Participação Advogado que instrui testemunha a prestar depoimento inverídico nos autos de reclamação trabalhista Conduta que contribuiu moralmente para o crime fazendo nascer no agente a vontade delitiva Art 29 do CP Possibilidade de coautoria Relevância do objeto jurídico tutelado pelo art 342 do CP a administração da justiça no tocante à veracidade das provas e ao prestígio e seriedade da sua coleta Relevância robustecida quando o partícipe é advogado figura indispensável à administração da justiça art 133 da CF Circunstâncias que afastam o entendimento de que o partícipe só responde pelo crime do art 343 do CP STF RHC 81327SP Rel Min Ellen Gracie j 11122001 Art 343 Dar oferecer ou prometer dinheiro ou qualquer outra vantagem a testemunha perito contador tradutor ou intérprete para fazer afirmação falsa negar ou calar a verdade em depoimento perícia cálculos tradução ou interpretação Pena reclusão de 3 três a 4 quatro anos e multa Parágrafo único As penas aumentamse de um sexto a um terço se o crime é cometido com o fim de obter prova destinada a produzir efeito em processo penal ou em processo civil em que for parte entidade da administração pública direta ou indireta Caput e parágrafo único com redação determinada pela Lei n 10268 de 28 de agosto de 2001 D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias A corrupção ativa de testemunhas e peritos tradicionalmente recebeu a mesma pena do crime de falso testemunho ou falsa perícia No Brasil o Código Criminal do Império 1830 criminalizava o falso testemunho ou a falsa perícia mas abstevese de prever como crime autônomo a corrupção ativa de testemunha ou perito O Código Penal de 1890 incluiu o falso testemunho entre os crimes contra a fé pública art 261 e em separado equiparava à testemunha o perito intérprete ou arbitrador aplicandolhe as mesmas sanções do falso testemunho art 262 O Código Penal de 1940 deu o mesmo tratamento ao falso testemunho e à falsa perícia reunindoos em um mesmo dispositivo legal art 342 Distinguiu contudo a corrupção ativa de testemunhas e peritos atribuindolhe a condição de crime autônomo diverso tanto do falso testemunho ou falsa perícia como também da corrupção ativa e passiva 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a administração da justiça especialmente a idoneidade e probidade de uma das funções mais relevantes do Estado o falso testemunho ou falsa perícia mediante suborno macula idoneidade e eficácia dessa relevante função estatal de distribuição de justiça atingindo a pureza limpidez imparcialidade e probidade da instrução probatória cuja finalidade é propiciar uma decisão final justa e imparcial 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa independentemente da presença de qualquer qualidade ou condição especial tratandose portanto de crime comum O destinatário do suborno ou propina deverá esse sim ostentar a qualidade ou condição de testemunha perito contador tradutor ou intérprete para que possa atender o desejo do sujeito ativo qual seja fazer afirmação falsa negar ou calar a verdade em depoimento perícia cálculos tradução ou interpretação Sujeitos passivos do crime de falso testemunho ou de falsa perícia mediante suborno são a Administração Pública Administração da Justiça representada pelo Estado no seu legítimo interesse de desenvolver regularmente a atividade judiciária na busca infatigável de distribuir adequadamente justiça e se ocorrer o eventual ofendido lesado ou prejudicado pelo crime de falso testemunho ou falsa perícia 4 Tipo objetivo adequação típica A conduta típica alternativamente prevista consiste em dar entregar conceder presentear oferecer apresentar colocar à disposição ou prometer obrigarse a dar dinheiro ou qualquer outra utilidade vantagem indevida de qualquer natureza material ou moral a testemunha perito contador tradutor ou intérprete para fazer afirmação falsa negar ou calar a verdade em depoimento perícia cálculos tradução ou interpretação A oferta ou promessa ainda que feitas indiretamente admitem vários meios de execução Tratase de um tipo especial que se compõe de elementos objetivos subjetivos e normativos o qual exige além de dolo um elemento subjetivo especial do injusto Para que se configure o tipo penal todos esses elementos devem constar do fato concretizado pelo agente A ausência de qualquer deles afasta a tipicidade da conduta Para sua melhor compreensão faremos a decomposição analítica deste tipo penal destacando suas elementares Poderá o agente valerse de diversos meios de execução palavras escritos gestos etc destinados a obter falsidade de testemunha ou perito sobre fato ou circunstância relevante na decisão da causa Se a testemunha perito tradutor ou intérprete aceita efetivamente a oferta ou promessa pratica o delito do art 342 1º do CP No entanto se o corrompido for funcionário público o crime tipificado é o previsto no art 333 do CP 41 Objeto material dinheiro ou qualquer outra vantagem O objeto material do delito é o dinheiro ou qualquer outra vantagem oferecida a testemunha perito contador tradutor ou intérprete que constitui o conteúdo da oferta que é digamos o preço da testemunha venal ou do servidor corrupto É fundamental que a ação seja idônea inequívoca demonstrando o real propósito do agente Essa inequivocidade deve necessariamente estar presente no caso concreto uma vez que a dação oferta ou promessa do sujeito ativo não pode ter outro propósito que não o de comprar a falsidade do testemunho ou da perícia No entanto convém destacar que nem toda dádiva ou presente importa corrupção Assim como não se compreende que alguém presenteie um magistrado com um automóvel ou uma casa de alguns milhares de reais não se pode pensar em corrupção com uma garrafa de vinho ou uma cesta de frutas ou de chocolates especialmente não acompanhados do propósito de corromper 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo geral é o dolo representado pela vontade consciente de dar oferecer ou prometer dinheiro ou qualquer outra vantagem a testemunha perito contador tradutor ou intérprete É necessário o elemento subjetivo especial do tipo consistente na finalidade de obter da testemunha perito contador tradutor ou intérprete afirmação falsa negação ou omissão da verdade Tratase de um especial fim de agir ou seja o agente deve buscar um resultado compreendido no tipo mas que não precisa necessariamente ser atingido 6 Consumação e tentativa Consumase o crime de corrupção ativa de testemunha ou perito com a dação oferta ou promessa de dinheiro ou qualquer outra vantagem material ou moral crime de mera atividade É irrelevante que a oferta ou promessa seja aceita pela testemunha perito contador tradutor ou intérprete É igualmente desnecessário que qualquer deles faça afirmação falsa negue ou cale a verdade em depoimento perícia cálculo tradução ou interpretação Se o crime não deixa de configurar se mesmo quando a propina é repelida com muito mais razão apresentarseá no caso em que aceito o suborno o aceitante abstém se de prestar o testemunho falso ou falsear a perícia tradução ou interpretação A tentativa é admissível apenas na hipótese de o agente utilizarse de meio escrito para a prática do delito No mesmo sentido é o magistério de Regis Prado que sentencia a tentativa é inadmissível salvo se a proposta for feita por escrito e ocorrer sua interceptação ou apreensão pela autoridade antes que a testemunha ou perito dela tenha ciência 7 Figura majorada qualificadora versus majorante A redação original do dispositivo em exame apresentava uma figura qualificada que foi substituída a partir de 2001 por uma causa de aumento A redação anterior duplicava a pena mínima e máxima tratandose portanto de verdadeira qualificadora A partir da Lei n 102682001 essa qualificadora passa a constituir majorante prevendo a elevação da pena aplicada entre um sexto e um terço mas agora quando se destinar a produzir prova em processo penal ou processo civil nessa hipótese em que for parte entidade da Administração Pública direta ou indireta Essa majorante aplicase somente em parte retroativamente aplicase o percentual de majoração não se aplica retroativamente a majorante relativa ao processo civil porque constitui novatio legis in pejus 8 Lei n 102682001 irretroatividade ultratividade e inconstitucionalidade Os acréscimos trazidos pela Lei n 102682001 contador e cálculos aplicamse somente a fatos praticados a partir de 29 de agosto de 2001 sendo alcançados pela irretroatividade A previsão original continua sendo aplicada a todos os fatos praticados sob sua vigência ressalvada a qualificadora que era prevista no antigo parágrafo único cuja pena era duplicada Nesse caso aplicase a nova previsão majorante retroativamente por ser mais benéfica conjugandose duas leis distintas sobre o mesmo fato extraindose lhes os dispositivos mais benéficos 9 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente eram de reclusão de um mês a três anos e multa A figura majorada previa a aplicação da pena em dobro Essa sanção contudo passou a ser de três a quatro anos de reclusão a partir de 29 de agosto de 2001 Lei n 10268 e a majorante foi reduzida passando a ser de um sexto a um terço A ação penal é pública incondicionada A sanção cominada de um a três anos de reclusão além da multa no Código Penal foi elevada para de três a quatro anos sem qualquer fundamento políticojurídico violando os princípios da proporcionalidade e da individualização da pena A cominação de pena nos limites mínimo e máximo de três a quatro anos viola o princípio da individualização da pena caracterizando verdadeira tarifação penal taxatividade absoluta das penas eliminada pelo Código Napoleônico de 1810 Esses parâmetros três a quatro anos impedem a individualização judicial da pena consagrada no texto constitucional Ademais é desproporcional a elevação do mínimo de um para três anos e no próprio art 342 que é similar foram mantidos os limites de um a três anos No caso concreto devese declarar essa inconstitucionalidade e aplicar o limite mínimo da cominação anterior J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Corrupção ativa de testemunha Pratica o delito contemplado no art 343 caput do CP quem oferece recompensa à testemunha para que esta preste declaração falsa em processocrime TJRS Apelação 70022032668 Rel Constantino Lisbôa de Azevedo j 2822008 Art 140 3º Injúria racial Art 343 Corrupção de testemunha Réu que lança ofensas contra as vítimas em razão da cor e posteriormente oferece quantia em dinheiro à testemunha para não depor contra ele no processo O crime previsto no art 343 do CP somente se consubstancia quando a pessoa a quem é oferecido dinheiro ou vantagem detém a condição de testemunha o que não se verifica nos autos uma vez que a suposta testemunha sequer tinha sido arrolada no processo Caso de absolvição TJRS Apelação 70009269317 Rel Ivan Leomar Bruxel j 98 2007 Suborno de testemunha Infração de mera conduta Desimporta o resultado o tipo infracional previsto pelo art 343 do Código Penal exige a prática de apenas um de seus verbos nucleares para sua configuração Havendo indícios de tal prática impõe se o processamento do feito TJRS Apelação 70018560896 Rel Ricardo Raupp Ruschel j 1432007 Coação no curso do processo Art 344 Usar de violência ou grave ameaça com o fim de favorecer interesse próprio ou alheio contra autoridade parte ou qualquer outra pessoa que funciona ou é chamada a intervir em processo judicial policial ou administrativo ou em juízo arbitral Pena reclusão de 1 um a 4 quatro anos e multa além da pena correspondente à violência D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O Código Criminal de 1830 desconhecia completamente esta infração penal e o Código Penal de 1890 limitavase a punir o uso de violência ou ameaça contra juiz ou jurado art 113 O Projeto Alcântara Machado já previa referida infração penal art 192 Finalmente o Código Penal de 1940 ampliou a prescrição do projeto referido para abranger como sujeito passivo qualquer pessoa que funcione ou for chamada a intervir em processo judicial policial ou administrativo ou em juízo arbitral 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração Pública ou mais especificamente protegese a probidade da função judicial sua respeitabilidade bem como a integridade de seus funcionários a exemplo dos artigos anteriores Tutelase o interesse de que a justiça não seja obstada ou desvirtuada por qualquer fator estranho ao seu desenvolvimento válido e regular assegurando acima de tudo a imparcialidade de suas decisões Protegese igualmente a respeitabilidade e a integridade de seus funcionários 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa tenha ou não interesse pessoal na demanda que se encontra em andamento não sendo exigida nenhuma outra qualidade ou condição especial Tratandose de crime comum não apresenta restrição alguma ao concurso eventual de pessoas Sujeito passivo é prioritariamente qualquer pessoa que intervenha ou seja chamada a intervir em processo judicial policial ou administrativo ou em juízo arbitral como autoridade parte perito jurado escrivão ou testemunha ou ainda a qualquer outro título que sofra a violência ou grave ameaça praticada pelo sujeito ativo secundariamente o Estado sempre titular do bem jurídico ofendido a Administração Pública lato sensu e mais especificamente a Administração da Justiça 4 Tipo objetivo adequação típica A conduta típica consiste em usar de violência física ou grave ameaça promessa de mal sério justo ou injusto com potencialidade intimidatória com o fim de favorecer interesse próprio ou alheio de natureza material ou moral contra autoridade juiz promotor de justiça delegado de polícia parte autor réu etc ou qualquer outra pessoa que funciona ou é chamada a intervir testemunha perito intérprete etc em processo judicial policial ou administrativo ou em juízo arbitral 41 Violência força física O termo violência empregado no texto legal significa a força física material a vis corporalis com a finalidade de vencer de intimidar o coagido A violência poderá ser imediata quando usada diretamente contra o próprio coagido e mediata quando utilizada contra terceiro ou coisa a que este tenha relação ou afeição especial ou esteja diretamente vinculado Não é necessário que a violência usada seja irresistível bastando que seja idônea para constranger o coato com a finalidade de privilegiar interesse próprio ou alheio No entanto se for resistível e o resultado da ação do coato constituir crime este também responderá por ele nos termos do art 22 do CP embora com pena atenuada art 65 III c Enfim essa interpretação assegura que não seja invocada levianamente a coação no curso do processo para justificar impropriamente infrações que atinjam a gravidade de crime 42 Grave ameaça ou vis compulsiva Grave ameaça por sua vez constitui forma típica da violência moral é a vis compulsiva que exerce uma força intimidativa inibitória anulando ou minando a vontade e o querer do coato procurando assim intimidálo com o objetivo de favorecer interesse próprio ou alheio Na verdade a ameaça grave a exemplo da violência física também pode perturbar escravizar ou violentar a vontade da pessoa tornandoa viciada A violência moral pode materializarse em gestos palavras atos escritos ou qualquer outro meio simbólico mas somente a ameaça grave isto é aquela ameaça que efetivamente imponha medo receio temor ao coato e que lhe seja de capital importância opondose à sua liberdade de agir e de querer 43 Desnecessidade de resistência efetiva Não é necessário que o coato oponha resistência efetiva contra a coação ou procure superála por outros meios é suficiente que usando violência ou grave ameaça tenha sido violentada a sua liberdade interna com o fim de satisfazer interesse do coator ou de terceiro É indispensável no entanto a relação de causalidade entre o uso da violência ou grave ameaça e a possível submissão do coato à vontade do coator que na verdade não precisa ocorrer pois a ação deste isto é o favorecimento de interesse do coator ou de terceiro é somente o elemento subjetivo do injusto que por isso mesmo não precisa realizarse sendo suficiente que seja o móvel da ação típica 44 Coação objetivando pretensão legítima Se a coação visar pretensão legítima do sujeito ativo poderá caracterizar o crime do art 345 Na verdade se a finalidade pretendida pelo sujeito ativo pode ser obtida em juízo regularmente se preferiu conseguila coativamente a tipificação de sua conduta deslocase para o crime de exercício arbitrário das próprias razões art 345 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo geral é o dolo que é representado pela vontade e a consciência de constranger a vítima através de violência ou grave ameaça a fazer o que a lei não determina ou não fazer o que ela manda A consciência abrange a ilegitimidade da ação dos meios escolhidos violência ou grave ameaça e a relação de causalidade entre a coação e o fim pretendido pelo sujeito ativo favorecer interesse próprio ou alheio sendo irrelevantes os motivos determinantes com exceção daqueles que excluem a antijuridicidade da conduta 51 Elemento subjetivo especial interesse próprio ou alheio O elemento subjetivo especial do tipo é constituído pelo especial fim de agir qual seja o fim de favorecer interesse próprio ou alheio Não havendo esse fim especial a violência ou grave ameaça o crime não será o de coação no curso do processo mas outro qualquer ou pelo menos aquele que resultar da violência ou grave ameaça vias de fato ameaça lesões corporais etc Embora não haja especificação legal sobre em que deve consistir o interesse próprio ou alheio a ser favorecido entendemos que deve necessariamente estar vinculado ao processo qualquer dos relacionados no texto legal como exemplificava Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 492 pode consistir por exemplo em impedir a decisão da autoridade ou força a emitila em tal ou qual sentido em obrigar testemunha ou perito a depor ou opinar falsamente em coagir representante do Ministério Público a não oferecer denúncia em obstar que o escrivão da causa providencie para a publicação de um edital Se a coação for praticada para satisfazer pretensão legítima ou se a violência for praticada no exercício da função ou em razão dela poderá configurar exercício arbitrário das próprias razões art 345 ou violência arbitrária art 322 de acordo com as demais circunstâncias 6 Consumação e tentativa Consumase o crime de coação no curso do processo no momento em que é empregada ou usada da violência ou grave ameaça independentemente de conseguir o sujeito ativo o resultado pretendido ou de a vítima resultar amedrontada Basta que a ameaça seja suficientemente grave para intimidar ainda que in concreto a vítima não se intimide Se a finalidade pretendida pelo sujeito passivo for atingida representará somente o exaurimento do crime cuja circunstância poderá ser considerada na dosagem da pena Admitese teoricamente a tentativa pois a despeito de tratarse de crime formal sua execução admite fracionamento constituindo crime plurissubsistente 7 Concurso com crimes praticados com violência Determina o preceito secundário a cominação da respectiva sanção além da pena correspondente à violência Assim eventuais lesões corporais são punidas como crime autônomo conforme expressa disposição do tipo em exame A ameaça contudo é absorvida pelo crime tipificado neste dispositivo A reiteração da ameaça com a mesma finalidade constitui crime único 71 Sistema de aplicação de penas cúmulo material Concluindo a disposição do preceito secundário do art 344 não criou uma espécie sui generis de concurso material mas adotou tão somente o sistema do cúmulo material de aplicação de penas a exemplo do que fez em relação ao concurso formal impróprio art 70 2ª parte Assim quando a violência usada na prática do crime de coação no curso do processo constituir em si mesma outro crime havendo unidade de ação e pluralidade de crimes estarseá diante de concurso formal impróprio de crimes Aplicase nesse caso por expressa determinação legal o sistema de aplicação de pena do cúmulo material independentemente da existência ou não de desígnios autônomos Na verdade a aplicação cumulativa de penas mesmo sem a presença de desígnios autônomos constitui uma exceção à aplicação de penas prevista para o concurso formal impróprio No entanto a despeito de tudo o que acabamos de expor nada impede que concretamente possa ocorrer concurso material como acontece com quaisquer outras infrações penais do crime de coação no curso do processo com outros crimes violentos desde que é claro haja pluralidade de condutas e pluralidade de crimes mas aí observese já não será mais o caso de unidade de ação ou omissão caracterizadora do concurso formal 72 Dupla criminalização da violência Concluindo nessas hipóteses isto é quando a violência constituir em si mesma crime aplicase cumulativamente a pena correspondente a essa violência independentemente de o concurso de crimes ser material ou formal como procuramos demonstrar Por fim tem inteira aplicação aqui as considerações críticas que fizemos ao examinarmos o art 352 evasão mediante violência contra a pessoa a respeito da dupla criminalização da violência que é elementar típica do crime na linha desenvolvida por Salo de Carvalho 8 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de reclusão de um a quatro anos e multa além da pena correspondente à violência no entanto como temos demonstrado reiteradamente não significa que haja necessariamente concurso material de crimes mas sim que haverá a aplicação do sistema do cúmulo material de penas independentemente da existência de desígnios autônomos Circunstâncias particulares que ocorrerem na realização da coação estão fora do tipo mas poderão influir na dosimetria da pena ou até mesmo excluir a sua tipicidade A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Coação no curso do processo Decisão prolatada Elementar do tipo penal ausente Absolvição Verificado que a ameaça perpetrada pelo réu contra a vítima ocorreu depois de prolatada a sentença no processo em que ambos eram partes não está configurado o delito do art 344 pois uma das elementares do tipo é processo em curso TJRS Apelação 70022493373 Rel Gaspar Marques Batista j 2122008 Comete o delito previsto no tipo do art 344 do CP o agente que usa de violência ou grave ameaça contra parte chamada a intervir em feito judicial A pena de multa não pode ser afastada pois integra o preceito secundário do tipo penal de forma cumulativa Eventual impossibilidade de pagamento é questão a ser dirimida em 1ª instância no juízo cível conforme estabelecido no art 51 do Código Penal TJRS Apelação 70022319768 Rel Gaspar Marques Batista j 2122008 Art 344 CP Demonstrado o dolo do apelante de conscientemente ameaçar a vítima para intimidála em razão de seu testemunho no processo em que é acusado resta caracterizado o delito de coação no curso do processo TJRS Apelação 70021999420 Rel José Eugênio Tedesco j 2122008 Exercício arbitrário das próprias razões Art 345 Fazer justiça pelas próprias mãos para satisfazer pretensão embora legítima salvo quando a lei o permite Pena detenção de 15 quinze dias a 1 um mês ou multa além da pena correspondente à violência Parágrafo único Se não há emprego de violência somente se procede mediante queixa D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias No direito romano e no direito medieval podemse encontrar resquícios do exercício arbitrário das próprias razões embora com conteúdo distinto não deixavam de ter a mesma finalidade de impedir que o cidadão pudesse fazer justiça pelas próprias mãos Os códigos italianos também recepcionaram a proteção legal dessa objetividade jurídica Na legislação brasileira essa infração penal foi desconhecida do Código Criminal de 1830 e do Código Penal de 1890 embora tenha sido lembrada pelo Projeto Alcântara Machado que não chegou a transformarse em lei Portanto o Código Penal de 1940 inaugurou no Brasil a criminalização do ato de fazer justiça pelas próprias mãos com a previsão contida no art 345 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração da Justiça na sua função essencial qual seja a incumbência de exercitar o monopólio assumido pelo Estado de resolver os conflitos sociais distribuindo justiça Protegese em verdade a probidade da função judicial sua respeitabilidade bem como a integridade de seus funcionários Quando o particular arvorase em julgador dos seus próprios interesses coloca se acima da lei e despreza o poder jurisdicional ao qual é atribuída a missão de dar a cada um o que é seu 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo é qualquer pessoa independentemente de qualidade ou condição especial contudo tratandose de funcionário público que também pode ser sujeito ativo devese analisar com mais cuidado porque encontrandose no exercício de suas funções ou agindo em razão delas pode configurar outro crime principalmente se houver violação de dever funcional Sujeito passivo prioritariamente é o indivíduo que sofre a ação ou seus efeitos e secundariamente como sujeito passivo formal o Estado que sofre o descrédito no exercício de um de seus poderes institucionais aquele cujo mister é a solução de conflitos e distribuir justiça 4 Tipo objetivo adequação típica A conduta incriminada consiste em fazer justiça pelas próprias mãos ou seja valerse de qualquer meio de execução violência física ameaça fraude recursos não violentos subterfúgios etc tendente à satisfação de uma pretensão legítima ou ilegítima suscetível de apreciação pela autoridade judiciária A despeito da referência à violência contida no parágrafo único ao definir a natureza da ação penal não é elemento constitutivo do crime que pode ser praticado por qualquer meio inclusive por fraude tratandose portanto de crime de forma livre 41 Necessidade da existência de uma pretensão A existência de uma pretensão constitui pressuposto indispensável da ação incriminada sendo irrelevante que a ela corresponda efetivamente um direito sendo suficiente que o sujeito ativo acredite de boafé que realmente o possui Esse aspecto deflui da elementar contida na descrição típica embora legítima que exige interpretação contextualizada em primeiro lugar podese sustentar que essa forma alternativa de referirse à legitimidade da pretensão está sugerindo a admissibilidade inclusive de pretensão ilegítima em segundo lugar a elementar embora legítima estaria admitindo alternativamente tanto pretensão legítima quanto ilegítima indistintamente e por fim em terceiro lugar essa locução exige na verdade que a pretensão seja subjetivamente legítima ainda que objetivamente isso não se confirme Em outros termos é necessário que o agente esteja convencido de que sua pretensão tem respaldo legal estando por conseguinte legitimado a defendêla Evidentemente essa terceira orientação é a correta embora permaneça a divergência interpretativa sobre o grau ou nível da ilegitimidade Nessa análise não se pode ignorar as condições pessoais do sujeito ativo devendose considerar seu nível cultural formação pessoal educação ambiente em que foi criado e sua capacidade intelectual para que se possa valorar adequadamente sua capacidade de avaliar a legitimidade ou não de sua pretensão 42 Natureza do direito objeto da pretensão É irrelevante a natureza do direito objeto da pretensão podendo ser de direito real propriedade servidão usufruto direito obrigacional posse mútuo contratos diversos ou de família pátrio poder coabitação tutela desde que o agente acredite ser seu legítimo titular O objeto da ação arbitrária coisa direito ou gênero deve encontrarse na posse ou gozo de outrem isto é de pessoa diversa do agente pois somente assim se pode reivindicar Ademais pode ser direito próprio ou de terceiro nesse caso desde que o faça como representante legal ou procurador A expressão salvo quando a lei o permite constitui elemento normativo do tipo referente à ausência de uma causa de justificação lato sensu que se presente exclui a tipicidade da conduta Parece nos exagerada a expressão de Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 524 de que se exclui a antijuridicidade nos casos em que a lei permite a violência privada pois seria extremamente reduzida essa possibilidade como o desforço imediato para a retomada da posse ou propriedade a legítima defesa a retorsão imediata nos crimes contra a honra etc 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo da ação é o dolo constituído pela vontade consciente de fazer justiça pelas próprias mãos com a convicção de que sua pretensão é legítima isto é subjetivamente lícita Se o agente agir consciente de que sua pretensão não é legítima não se pode falar de exercício arbitrário das próprias razões porque antecipadamente o próprio agente reconhece que razão não tem Nesse caso o crime será outro e não este Exige o elemento subjetivo especial do tipo representado pelo especial fim de agir qual seja para satisfazer pretensão sua Ao contrário do que afirmam alguns autores essa finalidade especial do tipo não é integrada pelo fim de afrontar a justiça que aliás pode até nem ter feito parte da avaliação do agente quando optou pela conduta arbitrária 6 Consumação e tentativa Existem duas posições sobre a consumação a consumase com a satisfação da pretensão pelo agente b consumase com o emprego dos meios de execução ainda que a pretensão não seja satisfeita Acompanhamos a segunda orientação sustentando que o crime se consuma com a simples conduta do agente empregando o meio arbitrário com o fim de satisfazer sua pretensão independentemente do êxito de sua diligência Criticando essa concepção Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 524 advertia não nos parece este o melhor entendimento já que o crime é fazer justiça pelas próprias mãos e não se pode dizer que faz justiça quem apenas tenta fazêla Não lhe assiste razão contudo pois Fragoso estava ignorando que o resultado da ação não era objeto do dolo e apenas representava o fim pretendido pelo agente isto é o elemento subjetivo especial do injusto para satisfazer pretensão e como tal não precisa realizarse para que o crime se consume sendo suficiente que tenha sido o móvel da ação A tentativa é admissível pois se trata de crime plurissubsistente que comporta fracionamento de sua fase executória 7 Concurso com crime resultante de violência sistema do cúmulo material Determina o preceito secundário a cominação da respectiva sanção além da pena correspondente à violência Assim eventuais lesões corporais são punidas como crime autônomo conforme expressa disposição do tipo em exame A ameaça contudo é absorvida pelo crime tipificado nesse dispositivo A reiteração da ameaça com a mesma finalidade constitui crime único Discordamos como já demonstramos da afirmação de que há sempre concurso material do presente crime com a violência física a que vier dar causa lesão corporal ou homicídio Na verdade há sempre o cúmulo material das penas aplicáveis sistema de aplicação de pena mas a espécie de concurso dependerá da unidade ou diversidade de ações praticadas Tudo o que sustentamos no capítulo anterior a respeito da aplicação cumulativa da pena tem inteira aplicação neste artigo deixando por isso de repetilo neste espaço 8 Pena e ação penal As penas cominadas alternativamente são de detenção de quinze dias a um mês ou multa além da pena correspondente à violência adotandose o sistema de aplicação de penas do cúmulo material a exemplo do que ocorre com o concurso formal impróprio e com o concurso material de crimes A ação penal será pública incondicionada na hipótese de emprego de violência física contra a pessoa Se não houver emprego de violência física à pessoa a ação será de iniciativa privada somente se procedendo mediante queixa que deve observar o prazo decadencial J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Exercício arbitrário das próprias razões Art 345 do Código Penal Desclassificação Impossibilidade Para o crime de exercício arbitrário das próprias razões é necessária que a pretensão do agente seja legítima ou que a suponha legítima neste caso amparada por convincente engano e cuja satisfação poderseia postular em juízo A conduta praticada pelo réu e seu comparsa mediante o emprego de grave ameaça não se reveste de qualquer justificativa jurídica a abonar tivessem agido no exercício das próprias razões Pelo contrário demonstram o agir com animus furandi ajustandose perfeitamente naquela descrita no art 157 2º I e II do Código Penal TJRS Apelação 70018148809 Rel Roque Miguel Fank j 882007 Absorção do delito de porte ilegal de arma de fogo pelo de exercício arbitrário das próprias razões Impossibilidade De acordo com o princípio da consunção haverá a relação de absorção quando uma das condutas típicas for meio necessário ou fase normal de preparação ou execução do delito de alcance mais amplo sendo portanto incabível o reconhecimento da absorção de um crime mais grave pelo mais leve Precedentes do STF e do STJ STJ REsp 878897SP Rel Min Félix Fischer j 1532007 Exercício arbitrário das próprias razões Não restando configurado o delito de fazer justiça pelas próprias mãos simplesmente pelo fato de que tinham os querelados a composse do imóvel ocupado pelo querelante a absolvição do réu é medida que se impõe TJRS Recurso Crime 71001074012 Rel Alberto Delgado Neto j 123 2007 Art 346 Tirar suprimir destruir ou danificar coisa própria que se acha em poder de terceiro por determinação judicial ou convenção Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos e multa D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O Código Criminal de 1830 e o Código Penal de 1890 não previram a incriminação do fato objeto do art 346 que foi introduzido pelo Código Penal de 1940 com defeituosa redação como advertia Magalhães Drumond Comentários ao Código Penal p 384 que acertadamente sugeria o seguinte texto Tirar suprimir destruir ou danificar coisa própria de cuja detenção se achar privado por determinação judicial ou convenção E acrescentava Drumond Desnecessárias sempre as palavras que se acha em poder de terceiro bradantemente excessivas enquanto à hipótese da tirada de vez que somente a outrem se pode tirar qualquer coisa 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido a exemplo do artigo anterior é a Administração da Justiça na sua função essencial qual seja a incumbência de exercitar o monopólio assumido pelo Estado de resolver os conflitos sociais distribuindo justiça Quando o particular arvorase em justiceiro dos seus próprios interesses colocase acima da lei e despreza o poder jurisdicional ao qual é atribuída a missão de solucionar os conflitos sociais e dar a cada um o que é seu 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa desde que in concreto detenha a condição especial de ser o proprietário dono ou possuidor da coisa objeto material das condutas tipificadas a qual como diz o texto legal deve ser sua contudo tratandose de funcionário público que também pode ser sujeito ativo devese analisar com mais cuidado porque encontrandose no exercício de suas funções ou agindo em razão delas pode configurar outro crime principalmente se houver violação de dever funcional Sujeito passivo direto e imediato é a pessoa com quem se encontra a coisa objeto material das ações incriminadas pois é quem sofre diretamente o dano ou lesão consequente à ação realizada indevidamente e secundariamente também é sujeito passivo o Estado via Administração da Justiça que sofre o descrédito no exercício desse poder institucional ao ser descumprida sua decisão e sendo violado seu monopólio de solucionar conflitos e distribuir justiça 4 Tipo objetivo adequação típica O proprietário da coisa pode ser privado de sua detenção por determinação judicial ou voluntariamente dela abrir mão Desejando retomála isto é investirse novamente em sua posse material deverá procurar obter nova determinação judicial revocatória da anterior ou por meios legais procurar converter a convenção em outra que lhe devolva a detenção São os seguintes núcleos alternativamente previstos a tirar fazer sair do lugar retirar sacar arrancar extrair extirpar despir descalçar colher privar de arrecadar b suprimir fazer desaparecer eliminar c destruir inutilizar aniquilar d danificar estragar causar dano O objeto material é a coisa própria isto é pertencente ao próprio sujeito ativo de natureza móvel ou imóvel que se acha em poder de terceiro por determinação judicial depósito de coisa penhorada ou arrestada ou convenção locação comodato etc Tratase temos termos bem esquemáticos de uma modalidade especial de exercício arbitrário das próprias razões art 345 razão pela qual rejeitamos o nomen juris adotado por Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 498 seguido pela doutrina tradicional 41 Objeto material coisa própria Ao contrário dos crimes de furto e de roubo além daqueles descritos nos arts 163 164 168 e 169 todos do CP que têm como objeto material a coisa alheia nesta infração penal é indispensável que se trate de coisa própria ou seja que a coisa pertença ao sujeito ativo e que circunstancialmente ou não se encontre em poder de terceiro seja por determinação judicial liminar penhora guarda fiel depositário etc seja por convenção isto é por acordo contrato convênio enfim por deliberação bilateral entre as partes A condição coisa própria é elemento normativo indispensável à tipificação dessa modalidade especial de exercício arbitrário das próprias razões ao contrário do crime de furto cujo elemento normativo exigido é a coisa alheia É absolutamente necessário que se comprove que a coisa objeto material da ação incriminada pertence ao sujeito ativo ou seja que a coisa é sua sendo irrelevante que se identifique a natureza do direito vinculativo deste se real ou obrigacional é suficiente que se comprove nos autos que não se trata de coisa alheia e tampouco de res nullius res derelicta ou res desperdita caso contrário o crime não será este podendo dependendo das demais elementares caracterizar crime contra o patrimônio desobediência à decisão judicial art 359 na modalidade de exercer direito ou qualquer outra infração que o casuísmo poderá demonstrar 42 Furto de coisa própria ou modalidade especial de exercício arbitrário das próprias razões desinteligência histórica a ser superada dogmaticamente Afinal será furto subtrair coisa própria de cuja detenção encontra se privado por determinação judicial ou convenção E a tipicidade estrita que exige a presença da elementar normativa alheia para a configuração típica desse crime segundo nosso Código Penal art 155 como fica Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 4989 sustentando tratarse de crime contra o patrimônio e não modalidade do exercício arbitrário das próprias razões afirmava Não se trata como já foi equivocadamente entendido de uma variante do crime de exercício arbitrário das próprias razões previsto no artigo anterior Já aqui não há pretensão alguma legítima ou supostamente tal a fazer valer por parte do agente E prosseguia Hungria quanto à primeira modalidade do crime subtração de coisa própria na legítima posse de terceiro o que se apresenta é o furtum possessionis que o Código de 90 artigo 332 incluía na família do furto Logo adiante completava Hungria nos demais casos o que se identifica é o dano em coisa própria de que terceiro está na posse legítima podendo ser objeto material nessa modalidade até mesmo coisa móvel Invocou Hungria dois argumentos para justificar sua equivocada interpretação a houve omissão do nomen juris desse dispositivo b se constituísse modalidade do art 345 seria de rigor o parágrafo e não um artigo distinto Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 394 com sua perspicácia de sempre contestava Hungria com os seguintes argumentos a omissão não pode ser aceita facilmente sob pena de se dizer não ter tido o Código revisor Com efeito apenas dois artigos antes no 343 vemos definida modalidade de falso testemunho ou falsa perícia sem nomen juris Omissão também Omitiuse igualmente o título nos crimes capitulados nos arts 247 295 308 310 e 343 E logo adiante acrescentava Noronha Depois por que iria a lei equiparar o dano e o furto da coisa própria Não seria de elementar técnica a consideração em disposições distintas 43 Furto de coisa própria heresia técnicojurídica A pobreza dogmática dessa construção mitológica de Hungria torna difícil aceitar que tenha sido produto de sua reconhecida genialidade científica reunindo em um mesmo tipo penal os crimes de furto e de dano entidades absolutamente distintas agredindo todo o tecnicismo metodológico do Código Penal de 1940 cantado e decantado como exemplo de técnica e harmonia por especialistas nacionais e estrangeiros O legislador de 1940 foi extremamente cauteloso na distribuição por títulos capítulos e secções das objetividades jurídicas merecedoras da tutela penal Admitirse que no art 346 o legislador quis proteger o crime de furto de coisa própria que se encontra legitimamente em poder de outrem no Título XI da Parte Especial que se ocupa Dos crimes contra a Administração Pública desprezando o Título II especificamente destinado aos crimes contra o patrimônio seria uma heresia técnica sem similar em todo esse festejado Código Penal Desarrazoada portanto a insistência de Hungria em defender o indefensável a despeito da autoridade que ostenta por todos os méritos sempre reconhecida deslocar crimes contra o patrimônio furto e dano para o Título dos Crimes contra a Administração Pública somente a necessidade que sentia de defender a qualquer custo o Código Penal de 1940 pode justificar tamanho equívoco do insuperável Hungria 44 Atipicidade do furto de coisa própria Como já deixamos claro no tópico anterior nosso Código Penal não admite furto de coisa própria assim como considera atípico dano em bens próprios ressalvada a hipótese do art 171 2º V como evidencia a elementar normativa coisa alheia constante dos arts 155 e 163 conforme destacamos no volume 3º do nosso Tratado de Direito Penal Quando examinamos o crime de furto ressaltamos a impossibilidade de o proprietário ser sujeito ativo do crime de furto de coisa própria por faltar a característica de alheia na coisa cujo domínio lhe pertence Temos grandes dificuldades dogmáticas em aceitar a orientação de Hungria ler no texto legal o que o legislador não escreveu no marco de um direito penal garantista em um Estado Democrático de Direito Afinal de plano devese reiterar que o direito penal somente se legitima quando objetiva proteger bens ou interesses jurídicos definidos e a partir daí exatamente começa nossa grande dificuldade A figura do crime de furto desde o direito romano tem como objetividade jurídica a proteção do patrimônio posse propriedade detenção etc de igual sorte o verbo nuclear representativo desse crime tem sido sistematicamente subtrair Por fim dentro da harmonia adotada pelo Código Penal de 1940 todos os crimes contra o patrimônio têm sede própria qual seja o Título II de sua Parte Especial Da mesma forma o crime de dano cujo objeto material é igualmente coisa alheia sendo igualmente atípico causar dano em coisa própria 45 Elementares típicas e anatomia do Código definidoras da objetividade jurídica A infração penal descrita no art 346 do Código Penal com efeito está inserta no Título XI que disciplina os Crimes contra a Administração Pública mais especificamente aqueles que forem praticados contra a Administração da Justiça Ora nenhum desses crimes tem como objetividade jurídica principal o patrimônio alheio e especialmente o próprio Já por esse aspecto eventual furto de coisa própria por si só deve ser afastado da moldura descrita no art 346 que tem outra finalidade protetiva Por outro lado nos crimes de furto inclusive de coisa comum e de roubo o verbo nuclear subtrair tem forma livre não estabelecendo meio forma ou modo de ser executado adquirindo sentido específico qual seja de apossamento da res furtiva Assim os verbos tirar suprimir destruir ou danificar são inadequados ou impróprios para significar subtração de coisa móvel própria ou alheia Ademais o especial fim de agir típico do crime de furto tampouco se faz presente na figura descrita no art 346 que como afirma Noronha constitui modalidade de exercício arbitrário das próprias razões O fato de não existir a rubrica lateral com o nomen juris do tipo penal não causa nenhuma estranheza na medida em que existem inúmeros dispositivos com essa técnica sem que a omissão permita atribuir a proteção de bens jurídicos estranhos ao próprio capítulo ou título a que pertençam Por fim os estudiosos do Código Penal são unânimes em reconhecer que se trata de um diploma legal metódico harmonioso e coerente Pelo menos não se lhe tem atribuído ao longo de sua existência nenhum paradoxo como seria deslocar um tipo penal protegendo um bem jurídico fora daquele Título que lhe foi cientificamente reservado Que seria de nosso diploma legal se nos onze Títulos de sua Parte Especial pudessem ser encontrados aqui e acolá tipos penais disciplinando e protegendo bens jurídicos distintos de suas rubricas Certamente não teria recebido o reconhecimento internacional como um dos melhores Códigos Penais da primeira metade do século XX 46 Tipo penal que não exige elemento subjetivo especial Quanto ao elemento subjetivo verificamos que as condutas descritas no art 346 não exigem elemento subjetivo especial satisfazendose com o dolo constituído pela vontade de praticar qualquer delas consciente de que o objeto material está na posse legítima da vítima por determinação judicial ou convenção Ao passo que no crime de furto o elemento subjetivo é constituído pelo dolo e pelo especial fim de agir que é seu elemento subjetivo especial O dolo é representado pela vontade consciente de subtrair coisa alheia isto é que pertença a outrem elementar essa indispensável O elemento subjetivo especial do tipo por sua vez é representado pelo fim especial de apoderarse da coisa subtraída para si ou para outrem A ausência desse animus apropriativo finalidade de apossamento desnatura a figura do crime de furto 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo dessa modalidade de infração penal é o dolo representado pela vontade consciente de praticar qualquer das condutas descritas no tipo penal São irrelevantes os motivos ou os fins que levam à prática do crime sendo necessário e suficiente que o sujeito ativo tenha consciência de que o objeto material coisa própria encontrase na posse legítima da vítima por determinação judicial ou convenção O desconhecimento da existência de determinação judicial ou mesmo de convenção configura erro de tipo que exclui o dolo e como não há previsão de modalidade culposa a ação não configura essa infração penal por carência de tipicidade Não há exigência de qualquer elemento subjetivo especial do tipo penal que se existir poderá inclusive desnaturar essa infração penal dependendo das circunstâncias que podem acrescerlhe particularidades de outras infrações penais 6 Consumação e tentativa Ocorre a consumação dessa modalidade especial de exercício arbitrário das próprias razões com a ação de tirar suprimir destruir ou danificar o objeto material isto é de coisa própria cuja detenção encontrase em poder de terceiro por determinação judicial ou convenção A tentativa é teoricamente admissível considerandose que se trata de crime plurissubsistente admitindo fracionamento em seu iter 7 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de detenção de seis meses a dois anos e multa ao contrário da pena cominada ao crime de furto que é de um a quatro anos de reclusão e multa O crime do art 346 repetindo é uma modalidade especial de exercício arbitrário das próprias razões porém apenado mais severamente que aquele A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Código Penal art 346 Crime de mão própria Réu que não é legítimo proprietário do bem em virtude da decisão proferida na esfera cível não pode ser sujeito ativo do delito Atipicidade da conduta TJRS Apelação 70000624171 Rel Maria da Graça Carvalho Mottin j 2772000 Fraude processual Art 347 Inovar artificiosamente na pendência de processo civil ou administrativo o estado de lugar de coisa ou de pessoa com o fim de induzir a erro o juiz ou o perito Pena detenção de 3 três meses a 2 dois anos e multa Parágrafo único Se a inovação se destina a produzir efeito em processo penal ainda que não iniciado as penas aplicam se em dobro D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Nossos diplomas legais anteriores Código Criminal de 1830 e Código Penal de 1890 não conheceram a figura penal fraude processual que teria surgido posteriormente com o Código Penal italiano de 1930 art 347 o qual como um todo foi o grande inspirador do legislador brasileiro de 1940 O natimorto Código Penal de 1969 a exemplo do anterior também recepcionou essa figura típica sem lhe imprimir nova roupagem 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é mais uma vez a Administração da Justiça Protegese mais especificamente a probidade da função judicial sua respeitabilidade bem como a integridade de seus funcionários a exemplo dos artigos anteriores Tutelase o interesse de que a justiça não seja desvirtuada por qualquer fator estranho ao seu desenvolvimento válido e regular assegurando a lisura de suas decisões 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo do crime de fraude processual pode ser qualquer pessoa tendo ou não interesse pessoal no processo não sendo exigida nenhuma qualidade ou condição especial Qualquer pessoa que inove artificiosamente alterando o estado de lugar coisa ou pessoa com o objetivo de favorecer qualquer dos litigantes Por isso a inovação pode ser feita pela parte réu órgão do Ministério Público por qualquer terceiro interessado ou não no processo por funcionário público e pelo próprio advogado se efetivamente concorrer para a fraude Nesse sentido estamos de acordo com Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 528 quando afirma que não praticará o crime o advogado que não participar da fraude praticada pelo cliente pois a simples conivência somente o exporá a medidas disciplinares Sujeito passivo é prioritariamente qualquer pessoa que seja prejudicada pela conduta artificiosa do sujeito ativo inovando no processo secundariamente o Estado sempre titular do bem jurídico ofendido a Administração Pública lato sensu e mais especificamente a Administração da Justiça 4 Tipo objetivo adequação típica A conduta típica consiste em inovar mudar alterar artificiosamente mediante artifício ou ardil o estado de lugar de coisa ou de pessoa enunciação taxativa com o fim de induzir a erro o juiz ou perito Inovar artificiosamente o estado de lugar de coisa ou de pessoa quer dizer promover ardilosamente mudanças modificações ou transformações materiais extrínsecas ou intrínsecas capaz de transformar a importância probatória que lugar coisa ou pessoa anteriormente tinham isto é modificar o estado desses objetos materiais que são numerus clausus sem a concorrência de causas naturais Inovase por exemplo o estado de lugar quando se abre um caminho para simular uma servidão de passagem o estado de coisa quando se eliminam vestígios de sangue numa peça indiciária da autoria de um homicídio para fazer crer que se trata de suicídio o estado de pessoa quando se alteram mediante operação plástica determinados sinais característicos de um indivíduo procurado pela justiça Em outros termos é indispensável que a ação de inovar seja capaz de mudar o sentido probatório de lugar coisa ou pessoa e que não seja somente uma modificação grosseira sem potencialidade isto é sem idoneidade suficiente para induzir o juiz ou o perito em erro 41 Inovação artificiosa versus inovação fraudulenta Inovar artificiosamente com o fim de induzir juiz ou perito em erro significa fazêlo por meio de artifício pois indubitavelmente tem o objetivo de enganar alguém no caso juiz ou perito Artifício é toda simulação ou dissimulação idônea para induzir uma pessoa em erro levandoa à percepção de uma falsa aparência da realidade O texto legal ao contrário do que faz em outras oportunidades não incluiu alternativas a artificiosamente tais como fraude ardil ou qualquer outro meio fraudulento Por essa razão apresentasenos inadequado falar em conduta fraudulenta ou ardilosa pois exigiria maior rigor técnico na apuração da adequação típica do comportamento realizado pois ardil é a trama a astúcia uma forma de esperteza um estratagema para o agente conseguir iludir usando de certa dissimulação para passar despercebido e conseguir seu objetivo de inovar fraude por sua vez é gênero posto que mais abrange qualquer meio capaz de enganar o destinatário de ação realizada aspecto esse que o legislador deixa muito claro ao equiparar artifício e ardil a qualquer outro meio fraudulento quando tipifica o crime de estelionato art 171 caput do CP 42 Limites interpretativos de inovação artificiosa Neste dispositivo porém o legislador não quis dar à conduta de inovar toda essa amplitude restringindoa à forma ardilosa que não significa como é sabido qualquer outro meio fraudulento considerandose como gostavam de dizer nossos clássicos que a lei penal não tem palavras inúteis Aliás o próprio Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 501 já dava interpretação semelhante embora não o dissesse expressamente como se pode observar da seguinte passagem a fraude operase com a artificiosa inovação alteração modificação substituição deformação ou subversão relativamente ao estado de lugar de coisa ou de pessoa enumeração taxativa Artificiosamente aqui sem equiparála a ardil ou a qualquer outro meio fraudulento se satisfez o legislador com uma conduta do agente irregular anormal desproposital inadequada e imprópria no curso do processo isto é não condizente com a ética processual com a finalidade de induzir em erro o juiz ou o perito que nem exigiu que atingisse o nível de ardil ou qualquer outro meio fraudulento Em outras palavras na ótica do legislador a inovação artificiosa isto é não natural na pendência de processo para induzir em erro juiz ou perito é tão grave que não necessita revestir das características de meio fraudulento Aliás fraude ou ardil não exigíveis representariam uma simples progressão negativa da conduta artificiosamente inovadora no processo Por tudo isso concluindo embora não exigíveis fraude ou ardil na inovação do processo também tem o condão de tipificar a conduta incriminada de inovar 43 Interpretação restritiva limites do arbítrio judicial Nessa nossa concepção não olvidamos que a interpretação em matéria penalrepressiva deve ser sempre restritiva e somente nesse sentido negativo é que se pode admitir o arbítrio judicial sem ser violada a taxatividade do princípio da reserva legal A seguinte expressão de Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 179 ilustra bem esse raciocínio não pode ser temido o arbitrium judicis quando destinado a evitar pro libertate a excessiva amplitude prática de uma norma penal No entanto no caso do dispositivo em exame não está sendo ampliado o sentido de uma norma penal repressiva mas pelo contrário é a exigência legal que se satisfaz com conduta menos grave para a tipificação criminosa logo se com o menos já se configura a fraude processual com o mais representará somente maior desvalor na conduta realizada No entanto em qualquer caso é indispensável que o Ministério Público na denúncia identifique claramente em que consiste a dita fraude processual sob pena de inépcia da inicial que dificulta a ampla defesa 44 Inovação artificiosa idoneidade indispensável Por fim é indispensável que o meio artificioso utilizado pelo agente seja suficientemente idôneo para enganar o juiz ou o perito para induzilos em erro A inidoneidade do ato praticado no entanto pode ser relativa ou absoluta sendo relativamente inidôneo o meio artificioso para enganar ou juiz ou perito pode configurarse a tentativa de fraude processual no entanto se a inidoneidade for absoluta tratarseá de crime impossível por absoluta ineficácia do meio empregado art 17 5 Elementar normativa na pendência de processo civil ou administrativo É pressuposto do crime de fraude processual a pendência de processo civil administrativo ou seja é condição sine qua non que esteja em curso um processo dessa natureza não importando a fase em que se encontre de conhecimento execução ou mesmo recursal Em termos bem esquemáticos para que se possa inovar na pendência de processo civil ou administrativo é indispensável que haja processo em curso ou seja já instaurado e tão importante quanto ainda não se tenha encerrado E embora não conste do caput do artigo também é criminalizada a inovação em processo penal ainda que não iniciado segundo determina o parágrafo único cominando as sanções em dobro Processo penal não iniciado soa meio estranho para os iniciados demonstrando mais uma vez uma elementar falta de técnica pois não é dado ao legislador ignorar que o procedimento investigatóriocriminal somente recebe a denominação processo penal após ter sido iniciada a ação penal propriamente dita antes disso não existe processo mas simples procedimento investigatório inquisitorial Assiste razão nesse sentido à proverbial crítica de Magalhães Drumond Comentários ao Código Penal p 3867 sugerindo que no parágrafo único se pusesse em vez de processo penal processo criminal ou processocrime de vez que na terminologia de direito judiciário se distingue perfeitamente sem possibilidade de virem a confundirse de novo as expressões processo criminal ou mais usualmente processocrime ação feito demanda visando a aplicação de Direito Penal e processo penal conjunto de normas para os processoscrime É processocrime qualquer feito relativo a crime em concreto 51 Inovação antes de iniciado o processo penal Por fim com a ressalva de ser possível a prática de inovação mesmo antes de iniciado o processo penal o tipo penal está admitindo que ela possa ocorrer ainda na fase de investigação policial inquérito policial No entanto como se destina a produzir efeito em futuro processo penal fazse necessário que se aguarde a conclusão do inquérito pois se seu destino for o arquivamento não chegou a existir processo penal e como tal não se poderá falar de fraude processual se processo não houve 52 Induzimento do juiz ou perito em erro Induzir tem o significado de o agente incutir ou persuadir alguém com sua ação Induzir significa suscitar o surgimento de uma ideia tomar a iniciativa intelectual fazer surgir no pensamento de alguém uma ideia até então inexistente Por meio da indução o indutor anula a vontade de alguém Mutatis mutandis aplicamse os mesmos conceitos para o caso de fraude processual Erro é a falsa representação ou avaliação equivocada da realidade A vítima supõe por erro tratarse de uma realidade quando na verdade está diante de outra faz em razão do erro um juízo equivocado da relação proposta pelo agente A conduta artificiosa do sujeito leva o juiz ou perito a incorrer em erro O agente coloca o juiz ou perito numa situação enganosa fazendo parecer realidade o que efetivamente não é ou seja em razão do artifício utilizado pelo agente é levado ao erro No entanto nesta figura se por alguma razão para a qual o agente não tenha concorrido o juiz ou perito já se encontrar em erro o seu silêncio ou simples omissão em não alterar os fatos não tipifica a fraude processual que é crime comissivo e por conseguinte exige o cometimento de uma conduta ativa pois ninguém induz ninguém a nada sem agir Na verdade o sujeito ativo do crime de fraude processual não é garantidor com dever de impedir que o juiz incorra em erro desde que para ele não tenha concorrido 6 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo geral é o dolo representado pela vontade de praticar inovação artificiosamente na pendência de processo civil administrativo ou penal com a consciência de que altera o estado de lugar de coisa ou de pessoa Exigese a presença do elemento subjetivo especial do tipo representado pela vontade consciente de inovar artificiosamente em processo civil administrativo ou penal com o especial fim de induzir em erro o juiz ou o perito Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 529 sustentava a propósito da idoneidade da ação ardilosa que por esse motivo se afirma que o fim de agir tem aqui igualmente um sentido objetivo Sendo o fim especial do tipo induzir em erro o juiz ou o perito é irrelevante que atinja essa finalidade bastando que ela seja o móvel da conduta do agente 7 Consumação e tentativa Consumase o crime de fraude processual no lugar e no momento em que se completa com idoneidade a ação de inovar artificiosa mesmo que o juiz ou perito não seja induzido em erro É necessário que a ação tenha idoneidade suficiente para induzir em erro isto é para enganar para ludibriar sob pena de não se aperfeiçoar a fraude processual podendo configurar crime impossível por impropriedade do meio A tentativa é teoricamente admissível pois apesar de ser crime formal também é plurissubsistente possibilitando o fracionamento de sua fase executória 8 Figura majorada Verificase quando a inovação se destina a produzir efeito em processo penal ainda que não iniciado parágrafo único Contudo destinandose a produzir efeito em futuro processo penal devese aguardar o resultado final das investigações preliminares inquérito policial visto que se por alguma razão não redundar em processo penal não se consumará o crime No entanto se o processo penal no qual a inovação artificiosa pretende induzir em erro for condicionado ao oferecimento de queixa representação ou requisição o crime só existirá se realizada tal condição de procedibilidade Na verdade é mais que isso porque como a inovação descrita no parágrafo único destinase a produzir efeito em futuro processo penal é indispensável que se aguarde a conclusão do inquérito pois se seu destino for o arquivamento não chega a existir processo penal e dessa forma não se poderá falar de fraude processual se processo não houve 9 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de detenção de três meses a dois anos e multa Na forma majorada as penas aplicamse em dobro porque na hora de punir e só nessa hora tanto o legislador como a grande maioria dos operadores do direito consideram o processo criminal mais relevante A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Fraude Processual Parágrafo único do art 347 do Código Penal Caracterização A préexistência de processo em andamento não é requisito necessário à configuração do delito descrito no parágrafo único do art 347 do Código Penal na medida em que o próprio dispositivo prevê aumento de pena para os casos em que o processo ainda não tenha iniciado Desnecessária qualquer interpretação do dispositivo legal quanto à questão STJ AgRg nos EDcl no Ag 711502SP Rel Min Gilson Dipp j 163 2006 Fraude Processual Policial Civil A conduta em tese perpetrada pelo ora Paciente policial civil que enxerta na cena do crime talão de cheques objeto de furto na clara tentativa de ajudar outros colegas policiais que cometeram brutal homicídio contra vítima inocente é grave mormente tendose em consideração como destacou o Parquet a sua condição de agente público cujo cargo traz consigo o dever de zelar pela investigação criminal Desrespeitou assim o dever inerente às suas funções elevando o grau de reprovabilidade da conduta Motivação idônea A circunstância funcional do ora Paciente levada em conta pelo Parquet não integra o tipo penal em tela art 347 parágrafo único do Código Penal STJ HC 40511RS Rel Min Laurita Vaz j 6122005 Favorecimento pessoal Art 348 Auxiliar a subtrairse à ação de autoridade pública autor de crime a que é cominada pena de reclusão Pena detenção de 1 um a 6 seis meses e multa 1º Se ao crime não é cominada pena de reclusão Pena detenção de 15 quinze dias a 3 três meses e multa 2º Se quem presta o auxílio é ascendente descendente cônjuge ou irmão do criminoso fica isento de pena D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Nosso Código Criminal imperial 1830 considerava cúmplice quem desse asilo ou prestasse sua casa para reunião de assassinos ou roubadores tendo conhecimento de que cometem ou pretendem cometer tais crimes art 6º 2º O Código Penal de 1890 limitouse a reproduzir a disposição do diploma legal anterior art 21 40 Por fim observando rigorosa e coerente técnica o Código de 1940 distinguiu os crimes de receptação e favorecimento tratandoos como crimes autônomos ignorando definitivamente o anacronismo do passado confundindo em uma mesma figura típica crimes praticados em momentos distintos O Código Penal espanhol de 1995 finalmente atendeu a uma velha reivindicação da doutrina penal daquele país disciplinando como crime autônomo o encobrimento art 451 deixando finalmente de configurar uma espécie de participação no crime de outrem 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é mais uma vez a Administração da Justiça especialmente o seu papel de guardião da estabilidade da ordem social e da solução dos conflitos da coletividade Tutelase o interesse de que a justiça não seja frustrada em seus fins de prestar jurisdição particularmente na esfera criminal visando assegurar o cumprimento de suas decisões 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo do crime de favorecimento pessoal pode ser qualquer pessoa tendo ou não interesse pessoal no processo não sendo exigida nenhuma qualidade ou condição especial desde que não tenha contribuído de alguma forma coautor ou partícipe no crime anterior pois nessa hipótese teria concorrido para o crime nos moldes do art 29 e seus parágrafos Aliás nada impede que a própria vítima do crime anterior possa auxiliar seu algoz a furtarse à ação da autoridade pública isto é ser sujeito ativo desse crime Sujeito passivo é o Estado sempre titular do bem jurídico ofendido a Administração Pública lato sensu e mais especificamente a Administração da Justiça 4 Pressupostos do favorecimento e punibilidade do crime precedente É pressuposto do delito que o sujeito ativo do favorecimento não seja partícipe do crime principal ao qual é cominada a pena de reclusão e que o auxílio tenha sido prestado após o seu momento consumativo mesmo que se trate de crime permanente ou progressivo Devese tratar destaca o texto legal de crime ação típica antijurídica e culpável e não de simples contravenção com cominação de pena privativa de liberdade e não simplesmente aplicada destacase que embora ainda não havia no direito brasileiro crime com cominação exclusiva de pena alternativa sua aplicação passou a ser possível com a previsão constitucional art 98 I e a Lei dos Juizados Especiais Lei n 909995 Aliás a atual Lei antidroga inaugura a tipificação de crimes com cominação somente de penas restritivas de direitos 41 Punibilidade do crime precedente A punibilidade do crime precedente é outro pressuposto do crime de favorecimento pessoal sendo indispensável que seja punível à época do favorecimento embora não seja necessário que já tenha sido reconhecido por sentença criminal e tampouco que o próprio criminoso já esteja sendo perseguido Na realidade o favorecimento tanto pode ocorrer antes como depois do julgamento do crime precedente concepção apropriada para a época em que o Código Penal de 1940 foi editado em plena ditadura militar No entanto na nossa ótica no atual estágio de um Estado Democrático de Direito é impossível pretender julgar esse crime bem como o similar favorecimento real antes do julgamento do crime precedente uma vez que não se pode falar em favorecimento pessoal sem a confirmação da punibilidade daquele Logo se para o crime anterior precedente houve extinção de punibilidade exclusão de ilicitude irresponsabilidade inimputabilidade penal imunidade penal absoluta não se configura o favorecimento No caso de excludente não se pode falar em crime havendo extinção de punibilidade não há por que o indivíduo subtrairse à autoridade pública nos demais casos há isenção de pena 42 Autoridade pública abrangência Autoridade pública para efeitos desse tipo penal devese entender autoridade competente com atribuição específica vinculada à persecução penal tais como policial judicial oficial de justiça função delegada ou qualquer outra que tenha legitimidade para buscar o autor do crime Não nos parece contudo que o órgão do Ministério Público possa ser incluído nesse rol por falecerlhe tal atribuição salvo melhor juízo 5 Tipo objetivo adequação típica Punese a conduta de quem auxilia favorece autor de crime doloso ou culposo consumado ou tentado a subtrairse escapar esquivarse à ação de autoridade pública policial judiciária ou administrativa Auxiliar significa dar asilo ou fuga isto é impedir ou dificultar que a autoridade pública prenda ou mantenha preso autor de crime como diz o texto legal tentado ou consumado doloso ou culposo Qualquer ajuda do sujeito ativo para evitar ou dificultar a captura do autor do crime precedente materializa o crime de favorecimento pessoal ocultação facilitação de fuga oferecimento de abrigo empréstimo de veículo etc De várias formas ou por vários meios podese verificar a ação segundo exemplificava Noronha desviando a atenção da autoridade para outro fato provocando desordem sarilho etc ocultando o criminoso fornecendolhe condução ajudandoo a disfarçarse etc seja a subtração definitiva ou temporária 51 Auxiliar ou verbo núcleo do tipo O verbo nuclear do tipo penal descrito no art 348 auxiliar a subtrairse assume conotação completamente distinta daquela que tem quando se refere à participação em sentido estrito art 29 do CP Não se trata de participação no sentido de atividade acessória secundária como ocorre no instituto da participação stricto sensu mas de atividade principal nuclear típica representando a conduta proibida lesiva direta do bem jurídico Administração da Justiça Por isso quem realizar a conduta contida nesse verbo qual seja a de auxiliar o sujeito ativo de outro crime precedente a subtrairse à ação de autoridade pública não será partícipe mas autor do crime de favorecimento pessoal visto que sua ação concretizada na dicção do verbo nuclear não será acessória mas principal única executória e essencialmente típica E essa tipicidade não decorre de sua natureza acessória própria da adequação típica mediata mas de sua definição legal caracterizadora de conduta proibida ao contrário do que ocorre com quem auxilia a prática de qualquer crime que por ele responde como mero partícipe Auxiliar é ajudar favorecer ou facilitar a alguém no caso autor de um crime anterior punido com prisão Auxiliar nesse caso tem a mesma função típica que a da definição do crime de suicídio com a diferença de que nessa hipótese realizase a conduta de dar a morte a quem voluntariamente a deseja Assim auxilia por exemplo quem dá ao suicida o revólver ou o veneno quem ensina ou mostra o modo de usar a arma quem impede a intervenção de pessoa que poderia frustrar o ato de desespero etc No entanto o auxílio no crime de favorecimento ao contrário somente pode ocorrer após a consumação do crime anterior sem que tenha havido antes promessa ou acordo de auxílio sob pena de não se configurar este crime pois o sujeito ativo transformarseia em partícipe daquele crime precedente praticado pelo dito autor 52 Crime de forma livre qualquer meio ou forma de execução Por derradeiro qualquer que seja o meio ou forma utilizado pelo sujeito ativo do crime de favorecimento pessoal é indispensável a presença de dois requisitos eficácia causal e consciência de auxiliar na subtração de autor de crime à ação de autoridade competente É insuficiente a exteriorização da vontade de auxiliar não basta realizar a atividade descrita no tipo penal se esta não contribuir efetivamente para a fuga do autor de crime Por outro lado é indispensável saber que auxilia na subtração à autoridade pública de autor de crime punível com prisão reclusão ou detenção mesmo que este desconheça ou até recuse o auxílio O sujeito ativo precisa em outros termos ter consciência e vontade de que com sua ação favorece a subtração do autor do crime à ação da autoridade pública Enfim auxiliar que teoricamente representaria mera atividade de partícipe no crime de favorecimento pessoal constitui o núcleo do tipo penal Assim quem de qualquer modo auxiliar o autor de crime punível com prisão reclusão ou detenção a subtrairse fugir da autoridade competente não será partícipe mas autor do crime de favorecimento pessoal Nada impede no entanto que alguém desempenhe a atividade de partícipe instigando induzindo ou auxiliando o sujeito ativo a realizar a conduta descrita no tipo isto é a prestar auxílio ao autor do crime nas condições descritas no tipo penal Mas nessa hipótese não estará desenvolvendo sua ação diretamente relacionada ao beneficiário do auxílio mas sim em relação ao autor material do favorecimento pessoal que o executará Não se pode esquecer ademais que o partícipe não pratica a conduta descrita pelo preceito primário da norma penal mas realiza uma atividade secundária que contribui estimula ou favorece a execução da conduta proibida Não realiza atividade propriamente executiva 53 Favorecimento pessoal mediante omissão imprópria A questão sobre a possibilidade da prática deste crime favorecimento pessoal auxiliar a subtrairse sob a forma omissiva parecenos resolvida com o sentido do próprio verbo nuclear que exige um fazer uma atividade positiva um realizar algo embora o nosso Código Penal mesmo com a reforma da Parte Geral em 1984 continue adotando a teoria da equivalência das condições que não distingue causa e condição Com efeito para que se admita a ação de auxiliar mediante omissão é indispensável a existência do dever jurídico de evitar que alguém se subtraia à ação da autoridade pública mas aí já estaríamos no âmbito do crime comissivo por omissão art 13 2º do CP pois deixar de impedir um evento que se tem o dever jurídico de evitar é sem sombra de dúvida uma forma de auxiliar contribuir concorrer etc para a ocorrência de tal evento Diante do art 13 do CP que não distingue causa e condição não há como negar essa possibilidade Devese analisar esse tema à luz da doutrina relativa aos crimes omissivos impróprios em que a figura do agente garantidor ocupa especial relevo Nesses crimes o garante não tem simplesmente o dever de agir mas a obrigação de fazêlo para evitar que determinado resultado ocorra 6 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo do crime de favorecimento pessoal é o dolo representado pela vontade consciente de auxiliar o infrator a subtrairse da ação da autoridade pública É indispensável que o sujeito ativo tenha consciência da situação em que se encontra o favorecido embora não lhe seja exigido saber de que crime é acusado Se o sujeito ativo desconhece a situação do favorecido ou ignora que é responsável por crime anterior ou que é buscado pela autoridade pública incorre em erro de tipo cuja evitabilidade ou inevitabilidade deve ser examinada casuisticamente Não se exige segundo entendimento majoritário qualquer elemento subjetivo especial do injusto embora acompanhemos o entendimento de Guilherme Nucci Código Penal comentado p 1083 no sentido de existir ínsito no tipo o elemento subjetivo específico consistente na vontade de ludibriar a autoridade pública 7 Consumação e tentativa Consumase o favorecimento pessoal no lugar e no momento em que o sujeito ativo auxilia efetivamente o favorecido ou em outras palavras ocorre a consumação com a simples ação de prestar auxílio independentemente da produção do resultado pretendido qual seja a efetiva subtração à ação da autoridade pública aliás não vemos como necessária à consumação do crime que o resultado do auxílio se concretize em favor do favorecido tratandose por conseguinte de crime formal A tentativa é teoricamente admissível ante a possibilidade de fracionamento de sua fase executória principalmente a tentativa imperfeita isto é quando o agente é interrompido durante a realização do auxílio que estava se materializando 8 Escusa absolutória sua extensão 2º Tratase de escusa absolutória considerada espécie do gênero causas especiais de isenção de pena contida no 2º que embora se aproximem conceitualmente das condições objetivas de punibilidade com estas não se confundem como destaca Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 719 nota 23 as escusas absolutórias antecipamse ao momento consumativo do delito isto é excluem a imposição de pena ab initio as condições objetivas de punibilidade ao contrário são acontecimentos futuros e incertos Enquanto as condições objetivas de punibilidade são estruturadas de forma positiva ou seja seu advento fundamenta a punibilidade do delito as escusas absolutórias são formuladas de modo negativo são condições negativas de punibilidade do crime sua presença afasta a punibilidade do crime Embora nas duas hipóteses o crime encontrese perfeito e acabado apenas por razões de política criminal sua punibilidade fica afastada 81 Equiparação constitucional do parentesco Com efeito é isento de pena o sujeito ativo que é ascendente descendente cônjuge ou irmão do autor do crime precedente enumeração taxativa Ao contrário do que preconizava Hungria a seu tempo é irrelevante que se trate de filho ou pai adotivo ou mesmo de irmão nas mesmas circunstâncias ante a nova realidade constitucional que impede qualquer discriminação dessa natureza Mais que isso acreditamos que a partir do reconhecimento da união estável como forma de união legítima também para fins de escusas absolutórias devemse estender os efeitos penais ao companheiro como tal legalmente reconhecido sob pena de infringirse preconceituosamente direito assegurado pela atual Constituição Federal A isenção de pena justificase em razão dos laços de especial afeto que ligam os membros de uma mesma família Merecia aplausos o Código suíço da época art 305 que autorizava o perdão judicial quando as relações entre o agente e o favorecido fossem muito estreitas a ponto de tornar escusável a conduta daquele 9 Autor de crime a culpabilidade não é mero pressuposto da pena A tipicidade a antijuridicidade e a culpabilidade são predicados de um substantivo que é a conduta humana definida como crime Não nos convence o entendimento dominante na doutrina brasileira segundo o qual a culpabilidade devia ser tratada como mero pressuposto da pena e não mais como integrante da teoria do delito Assumindo essa orientação Damásio de Jesus Direito Penal v 2 p 133 e 396 pioneiramente passou a definir o crime como a ação típica e antijurídica admitindo a culpabilidade somente como mero pressuposto da pena tendo sido seguido acriticamente até o início dos anos noventa pela doutrina nacional Seguindo a reflexão que desenvolvemos quando tratamos do crime de receptação perguntamos a seria possível a imposição de sanção a uma ação típica que não fosse antijurídica b poderseia sancionar uma ação antijurídica que não se adequasse a uma descrição típica c a sanção penal penas e medidas não é uma consequência jurídica do crime d a tipicidade e a antijuridicidade não seriam também pressupostos da pena Ora na medida em que a sanção penal é consequência jurídica do crime este com todos os seus elementos é pressuposto daquela Assim não somente a culpabilidade mas igualmente a tipicidade e a antijuridicidade são pressupostos da pena que é sua consequência Aliás nesse sentido o saudoso Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 216 depois de afirmar que crime é o conjunto dos pressupostos da pena esclarecia Crime é assim o conjunto de todos os requisitos gerais indispensáveis para que possa ser aplicável a sanção penal A análise revela que tais requisitos são a conduta típica antijurídica e culpável 10 Pena e ação penal As penas são cominadas de acordo com a gravidade do crime praticado pelo favorecido crime precedente dependendo da espécie de pena privativa de liberdade reclusão ou detenção São cominadas cumulativamente detenção de um a seis meses e multa quando o crime precedente era punido com reclusão para a figura privilegiada no caso de detenção são cominadas detenção de quinze dias a três meses e multa A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Comete o delito previsto no art 348 do CP o agente que auxilia condenado por crime de reclusão e com mandado de prisão expedido concedendolhe abrigo em sua residência com o fim de ocultálo das autoridades policiais TJRS Apelação 70022123889 Rel Constantino Lisbôa de Azevedo j 632008 A conduta descrita denúncia não se amolda ao tipo penal descrito no art 348 do Código Penal o auxílio prestado pelo paciente ao suposto assaltante não objetivava sua fuga mas sim para que recebesse atendimento médico Ordem concedida para trancar a ação penal movida em desfavor do paciente pelo crime previsto no art 348 do Código Penal STJ HC 46209BA Rel Min Hélio Quaglia Barbosa j 305 2006 Favorecimento real Art 349 Prestar a criminoso fora dos casos de coautoria ou de receptação auxílio destinado a tornar seguro o proveito do crime Pena detenção de 1 um a 6 seis meses e multa D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias No Código Criminal do Império 1830 o favorecimento real foi disciplinado como cumplicidade art 6º 1º sem maiores inovações ao entendimento forjado antes da Idade Média O Código Penal de 1890 não foi mais feliz que seu antecessor pois manteve a orientação pretérita considerandoo cumplicidade art 21 3º além de equiparálo à receptação A consideração como crime autônomo e a distinção do crime de receptação veio somente com o Código Penal de 1940 sob a inspiração do Código Penal Rocco de 1930 que o situou entre os crimes contra a Administração da Justiça Teve seu alcance ampliado para abranger não apenas o produto do crime como a receptação mas todo e qualquer proveito deste independentemente da sua natureza patrimonial ou não 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é exatamente o mesmo do artigo anterior ou seja mais uma vez a Administração da Justiça especialmente o seu papel de guardiã da estabilidade da ordem social e da solução dos conflitos da coletividade Tutelase o interesse de que a justiça não seja frustrada em seus fins de prestar jurisdição particularmente na esfera criminal visando assegurar o cumprimento de suas decisões Nesse sentido destaca Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 714 a prestação de auxílio a criminoso contrasta portanto com o desenvolvimento satisfatório da atividade da potestade judicial pública e com a execução das providências de seus órgãos além de dificultar a subordinação dos particulares a suas funções Concretamente no favorecimento real o interesse tutelado é que não seja prestada ao criminoso uma colaboração que venha a tornar definitiva a vantagem ou proveito conquistado com o crime Por outro lado no favorecimento real não é lesado necessariamente qualquer interesse processual ao contrário do que pode ocorrer com o favorecimento pessoal 3 Objeto material produto ou proveito de crime O objeto material do crime de favorecimento real a exemplo da receptação deve ser produto ou proveito de crime isto é há de ser o resultado mediato ou imediato de um fato definido como crime É irrelevante que tal produto tenha sido substituído por outro Embora se reconheça certa controvérsia na doutrina a verdade é que perante nosso Código Penal que se refere apenas a proveito do crime inegavelmente a coisa subrogada representando proveito do crime também pode ser objeto tanto de favorecimento real quanto de receptação visto que a ilicitude do produto do crime precedente não desaparece evidentemente com a substituição por qualquer outra coisa diretamente obtida com aquele Objeto material do favorecimento real ao contrário do que ocorre com o crime de receptação não se limita à coisa móvel podendo o proveito do crime por conseguinte recair sobre imóvel Os direitos reais ou pessoais igualmente tampouco podem ser objeto de receptação pois direitos não se confundem com coisa afora os títulos ou documentos que os constituem ou representam no entanto também podem ser objeto de favorecimento proveito do crime como simples proveito do crime 4 Sujeitos do crime Sujeito ativo do crime de favorecimento real a exemplo do favorecimento pessoal também pode ser qualquer pessoa tendo ou não interesse pessoal no processo não sendo exigida nenhuma qualidade ou condição especial desde que não tenha contribuído de alguma forma coautor ou partícipe no crime anterior pois nessa hipótese teria concorrido para o crime nos moldes do art 29 e seus parágrafos Aliás nada impede que a própria vítima do crime anterior possa auxiliar seu algoz a furtarse à ação da autoridade pública isto é ser sujeito ativo desse crime Sujeito passivo será sempre o do crime do qual advém o proveito do favorecimento real ou em outros termos o sujeito passivo do crime de favorecimento real é o mesmo sujeito passivo do crime anterior secundariamente é também o Estado sempre titular do bem jurídico ofendido a Administração Pública lato sensu mais especificamente a Administração da Justiça 5 Tipo objetivo adequação típica A conduta incriminada consiste em prestar a criminoso fora dos casos de coautoria art 29 do CP ou de receptação art 180 do CP auxílio direto ou indireto material ou moral destinado a tornar seguro o proveito do crime Caracterizase o favorecimento real em outros termos pelo auxílio prestado a criminoso após a prática do crime está excluída a contravenção com o fim de tornar seguro o seu proveito A conduta do sujeito ativo prestar auxílio fora dos casos de coautoria e de receptação direcionase para um objeto determinado pelo próprio tipo penal não para um objeto qualquer mas um objeto que deve apresentar uma peculiaridade muito particular que é o fato de tratarse de proveito do crime precedente Essa procedência criminosa do objeto do favorecimento real define sua natureza acessória dependente parasitária de outro crime aquele que o antecede que é seu pressuposto sem este não se pode falar em crime de favorecimento real Aliás em sua tipificação legal consta a elementar auxílio destinado a tornar seguro o proveito do crime isso significa que necessariamente o favorecimento real deve ser precedido de outro crime Na verdade embora seja irrelevante a identidade ou responsabilidade penal do autor do fato criminoso anterior é indispensável que se comprove a existência material do crime de que adveio o proveito que deve ser tornado seguro 51 A condenação do crime precedente É irrelevante a inexistência de condenação do crime precedente ao contrário do que se chegou a afirmar no passado sendo suficiente a comprovação de sua existência algo que pode ser feito no próprio processo que investiga o favorecimento real Nesse sentido podese afirmar que o favorecimento real goza de relativa autonomia isto é ele não existe por si só sendo fruto de uma infração penal à qual está ontologicamente vinculado Assim a mencionada independência do favorecimento real repousa tão só em sua punibilidade que realmente não depende da punibilidade do crime precedente 52 Natureza dos crimes precedentes Não é necessário que o crime precedente seja contra o patrimônio no entanto é indispensável que o pressuposto dele crime anterior proporcione ao seu sujeito ativo proveito que o favorecimento encarregase de assegurar Favorecimento real é a exemplo da receptação o crime que produz a manutenção ou consolidação do proveito obtido com a prática criminosa anterior realizada por outrem A elementar proveito do crime é mais ampla que produto do crime abrangendo além deste vantagem de qualquer natureza assim como o preço do crime isto é a recompensa patrimonial ou não dada ou prometida para o cometimento do crime precedente No entanto a exemplo do que ocorre no crime de receptação o auxílio não pode ser prestado ou prometido antes ou durante o crime anterior pressuposto do favorecimento real porque nessa hipótese estarse ia diante de concurso de pessoas coautoria ou participação desnaturando consequentemente a característica mais elementar do favorecimento real que é exatamente a assistência ao criminoso após a prática do crime visando tornar seguro o seu proveito Os instrumentos do crime instrumenta sceleris não se confundem com o produto do crime A ocultação daqueles contudo com a finalidade de desviar ou despistar a perseguição do autor do crime poderá configurar o favorecimento pessoal art 348 53 Elementar negativa do tipo fora dos casos de coautoria ou de receptação A elementar fora dos casos de coautoria ou de receptação faz parte da estrutura típica do crime de favorecimento real como uma característica negativa do tipo Consequentemente a eventual caracterização de uma ou de outra afasta a tipicidade do favorecimento real que para configurarse exige que não se trate de coautoria e tampouco de receptação Fazse necessária no entanto uma consideração mais detalhada do sentido e alcance da locução coautoria que pode ser decisiva para delinear a própria tipicidade da conduta descrita no art 349 Com efeito o Código Penal de 1940 utilizava a terminologia coautoria art 25 para definir o concurso eventual de delinquentes Mas na verdade coautoria é apenas uma espécie do gênero codelinquência que também pode apresentarse sob a forma de participação Consciente desse equívoco o Código Penal de 1969 utilizou a expressão concurso de agentes que abrangeria as duas espécies referidas de concurso de pessoas A reforma de 1984 considerou porém que concurso de agentes como sustentamos ao examinar na Parte Geral o concurso de pessoas não era a terminologia mais adequada por ser extremamente abrangente e poder compreender inclusive fenômenos naturais pois agentes físicos também podem produzir transformações no mundo exterior Na visão da reforma concurso de pessoas é a melhor forma para definir a reunião de pessoas para o cometimento de um crime adequandose melhor à natureza das coisas Enfim a expressão coautoria no art 349 deve ser interpretada como concurso de pessoas para abranger também a participação em sentido estrito que como afirmamos é espécie do gênero e a interpretação não contraria o princípio da tipicidade estrita pois representa apenas a atualização do sentido técnicodogmático que foi emprestado à referida expressão como demonstramos quando tratamos do concurso eventual de pessoas 54 Receptação similitude com o favorecimento real A receptação podese dizer numa linguagem figurada é uma espécie de irmã siamesa do favorecimento real se ocorrer afasta a configuração deste por expressa determinação legal elementar negativa do tipo Com efeito tanto a receptação quanto o favorecimento real que em muito se aproximam são posteriores ao crime praticado pelo favorecido sendo recomendável por isso mesmo redobrada atenção no estabelecimento da linha divisória entre ambos como nas duas infrações penais há o conhecimento por parte do sujeito ativo da prática do crime precedente a essência da diferença reside na causa sceleris enquanto na receptação o sujeito ativo é levado ao cometimento da infração penal para satisfazer interesse econômico próprio ou de terceiro lucri faciendi causa e não do autor do crime antecedente no favorecimento real a motivação da conduta típica resumese ao proveito exclusivo do autor do crime precedente amoris vel pietati causa que pode ou não ser econômico Na receptação ademais a conduta do agente é dirigida à coisa produto do crime enquanto no favorecimento real embora a ação também possa recair sobre coisa não é esta que se objetiva visto que se destina a auxiliar a pessoa autora do crime precedente mesmo que o faça indiretamente naquela por outro lado objetivase exclusivamente vantagem de natureza econômica neste o proveito assegurado pode ser de qualquer natureza patrimonial ou não 6 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo geral é o dolo representado pela vontade de prestar auxílio a criminoso fora dos casos de receptação e de concurso de pessoas coautoria ou participação Exigese igualmente o elemento subjetivo especial do injusto representado pela finalidade de beneficiar ou socorrer o autor do crime precedente isto é de tornar seguro o proveito do crime em benefício exclusivo deste No entanto se o fim especial do sujeito ativo for a obtenção de lucro ou vantagem econômica em proveito próprio ou alheio excluído o autor do crime configurase a receptação Exatamente nessa finalidade especial diversa reside a essência da delimitação conceitualdogmática entre receptação e favorecimento real Com efeito o elemento subjetivo especial do injusto exigido pela receptação é constituído pelo fim específico de obter vantagem em proveito próprio ou alheio 61 Ausência de previsão da modalidade culposa Por fim não há previsão de modalidade culposa do crime de favorecimento real ao contrário da receptação por essa razão se o sujeito ativo por exemplo desconhece a origem criminosa isto é que se trata de proveito de crime mesmo que por desatenção falta de cautela ou pura negligência em face de indícios em sentido contrário não comete crime algum repetindo desde que a sua conduta seja orientada tão somente pelo fim especial de favorecer ou auxiliar o autor do crime que o agente ignora sem visar proveito próprio ou alheio 7 Consumação e tentativa Consumase o crime de favorecimento real com a prestação do auxílio destinado a tornar seguro o proveito do crime não sendo necessário ao contrário do que ocorre no favorecimento pessoal que tal objetivo seja efetivamente alcançado É suficiente que o fim especial seja tornar seguro o proveito delituoso Na síntese de Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 535 consumase o crime no momento e no lugar em que o auxílio idôneo for prestado pelo agente ainda que a pessoa beneficiada não tenha conseguido o objetivo visado A tentativa é teoricamente admissível tratandose de crime plurissubsistente que possibilita o fracionamento de sua fase executória 8 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de detenção de um a seis meses e multa Contrariamente ao critério adotado no favorecimento pessoal não levou em consideração a gravidade do crime praticado pelo favorecido para cominar a pena aplicável ao favorecimento real A ação penal é pública incondicionada podendo ser intentada desde que satisfeitos os seus pressupostos J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Furto Apelação criminal Desclassificação para favorecimento real Inadmissibilidade O agente que dá cobertura ao companheiro para que este realize a subtração não executa o delito previsto no art 349 CP mas é partícipe do crime patrimonial TJRS Apelação 70020855748 Rel Mário Rocha Lopes Filho j 1710 2007 Demonstrado que o réu sabia da origem ilícita do automóvel ou dela ao menos devia saber e que o escondeu na garagem de sua residência inconteste resta a incidência da sanção prevista no art 349 do Código Penal pois no mínimo prestava auxílio no sentido de tornar seguro o produto do crime de roubo antes perpetrado TJRS Apelação 70005649165 Rel Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak j 213 2003 Art 349A Ingressar promover intermediar auxiliar ou facilitar a entrada de aparelho telefônico de comunicação móvel de rádio ou similar sem autorização legal em estabelecimento prisional Pena detenção de 3 três meses a 1 um ano Artigo incluído pela Lei n 12012 de 6 de agosto de 2009 D O U T R I N A 1 Considerações preliminares Tratase da repetição da equivocada política de fabricação de leis ad hoc como solução mágica de históricas políticas equivocadas em relação ao sistema penitenciário nacional Não se pode ignorar a existência de outra norma penal basicamente com o mesmo objetivo qual seja o de vedar o acesso do detento aos aparelhos celulares art 319A que até o momento não tem dado o menor resultado Podese vislumbrar desde logo que o almejado êxito do novo diploma legal pode não ser diferente quer por sua estrutura tipológica quer por sua topografia inadequada ou mesmo por sua finalidade questionável Ademais o uso indevido ou sem autorização legal de celular ou similar nas prisões constitui falta grave art 50 VII da Lei n 721084 A Lei n 114662007 que entrou em vigor no dia 293 2007 acrescentou o inciso VII ao art 50 da Lei de Execução Penal Lei n 721084 estabelecendo que constitui falta grave no cumprimento de pena privativa de liberdade ter o preso em sua posse utilizar ou fornecer aparelho telefônico de rádio ou similar que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo com todas as repercussões que lhe são inerentes perda do tempo remido pelo trabalho regressão de regime prisional etc demonstrando a desnecessidade de uma nova tipificação dessa natureza 2 Bem jurídico tutelado Ao examinarmos o tipo descrito no art 319A prevaricação imprópria que disciplina a proibição de ingresso de celulares nos estabelecimentos prisionais criminalizando a omissão do Diretor da Penitenciária tivemos grande dificuldade em definir ou encontrar o bem jurídico tutelado por esse dispositivo legal A situação aqui neste art 349A não é muito diferente embora se possa admitir que a finalidade de assegurar o cumprimento regular da execução penal sem comunicação com o mundo exterior e principalmente sem comandar ou participar da prática de crimes possa ser identificada com o bem jurídico ora tutelado 3 Sujeitos ativo e passivo do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa não se exigindo nenhuma qualidade ou condição especial Nada impede que servidores do próprio sistema penitenciário bem como agentes policiais também possam ser sujeito ativo dessa infração penal não sendo excluído ninguém Como as condutas de usar ou portar os aparelhos telefônicos celulares ou similares no interior de estabelecimento prisional não foram criminalizadas resulta claro que os detentos não são os destinatários da proibição constante do dispositivo sub examen Dessa forma os destinatários imediatos da norma proibitiva parecemnos ser os visitantes os advogados e os agentes públicos que eventualmente possam introduzir o aparelho nos estabelecimentos prisionais Sujeito passivo é o EstadoAdministração União Estado Distrito Federal e excepcionalmente Município que é o responsável direto pela administração penitenciária nacional O Estado é sempre sujeito passivo secundário de todos os crimes naquela linha de que a lei penal tutela em primeiro lugar o interesse da ordem jurídica geral da qual aquele é o titular Em alguns crimes como este no entanto o próprio Estado surge como sujeito passivo particular individual representando a coletividade 4 Tipo objetivo adequação típica Punemse as condutas de ingressar promover intermediar auxiliar ou facilitar a entrada de aparelho telefônico de comunicação móvel de rádio ou similar em estabelecimento prisional sem autorização legal A despeito de tratarse de descrição de ação múltipla com cinco nucleares não há significativa amplitude na incriminação pretendida considerandose que referidos verbos têm basicamente o mesmo significado qual seja o de introduzir aparelhos celulares ou similares no interior das casas prisionais Em outros termos os núcleos do tipo ingressar promover intermediar auxiliar ou facilitar objetivam coibir a introdução de aparelho telefônico móvel ou similar no estabelecimento prisional Nesse particular portanto não há qualquer dificuldade não exigindo por consequência maior esforço interpretativo quanto ao significado de cada conduta tipificada com exceção da representada pelo vocábulo auxiliar por seu histórico significado de acessoriedade conforme veremos adiante 41 A real conotação do verbo auxiliar Com efeito auxiliar significa ajudar colaborar favorecer contribuir ou facilitar de qualquer modo o ingresso de aparelho telefônico ou similar em estabelecimento prisional Aliás auxiliar e facilitar são verbos que têm basicamente o mesmo significado podendo ser empregado um pelo outro sem nenhum prejuízo de abrangência semântica Qualquer ajuda do sujeito ativo para o ingresso de aparelho de comunicação móvel configura a conduta de auxiliar ou facilitar contida no tipo penal sub examen O verbo auxiliar contido nesse tipo penal tem conotação completamente distinta daquela inserta no instituto da participação em sentido estrito art 29 do CP que representa mera atividade secundária acessória própria de partícipe Não se trata com efeito de participação no sentido de conduta acessória como ocorre no instituto da participação stricto sensu mas de atividade principal nuclear típica representando uma das formas de conduta proibida lesiva direta do bem jurídico tutelado no art 349A Por isso quem realizar a conduta contida nesse verbo qual seja a de auxiliar a introduzir o objeto material da ação proibida não será mero partícipe mas autor do crime ora tipificado considerandose que sua ação não será acessória mas principal executória e essencialmente típica E essa tipicidade não decorre de sua natureza acessória própria da adequação típica mediata mas de sua definição legal caracterizadora de conduta proibida ao contrário do que ocorre com quem auxilia a prática de qualquer crime que por ele responde como mero partícipe 42 Eficácia causal e consciência de auxiliar Por derradeiro qualquer que seja o meio ou forma utilizada pelo sujeito ativo do crime é indispensável a presença de dois requisitos eficácia causal e consciência de auxiliar na introdução do aparato móvel de comunicação no estabelecimento prisional sendo insuficiente por conseguinte a simples exteriorização da vontade de auxiliar O sujeito ativo precisa ter em outros termos consciência e vontade de que com sua ação favorece a introdução do objeto material no estabelecimento prisional Auxiliar que teoricamente representaria mera atividade de partícipe no crime de introdução sem autorização legal de aparelho de telefonia celular constitui o núcleo do tipo penal Assim quem de qualquer modo auxiliar na introdução do referido material não será mero partícipe mas coautor do crime de que ora comentamos Nada impede no entanto que alguém desempenhe a atividade de partícipe instigando induzindo menos auxiliando o sujeito ativo a realizar qualquer das condutas descritas no tipo responderá como partícipe Não se pode esquecer ademais que o partícipe não pratica a conduta descrita pelo preceito primário da norma penal mas realiza uma atividade secundária acessória que estimula ou incentiva a execução da conduta proibida Não realiza atividade propriamente executiva 43 Atipicidade das condutas de usar e portar Usar ou portar aparelhos celulares no interior das prisões não constituem condutas típicas embora qualquer detento possa incorrer nas mesmas proibições se praticar as condutas contidas no art 349A ora sub examen Por outro lado não está afastada a possibilidade de participação em sentido estrito desde que seja na modalidade de instigação ou induzimento visto que auxiliar nessa hipótese poderá caracterizar a própria autoria no caso coautoria e não simples participação em sentido estrito art 29 do CP Causa perplexidade o conteúdo desse novo texto legal relativamente ao tratamento dado ao detento isto é a sua exclusão basicamente como sujeito ativo dessa infração penal com a não inclusão das condutas de usar ou portar entre as condutas proibidas Afinal o que teria havido com o legislador se a finalidade da nova lei segundo o apregoado pelos precedentes legislativos é exatamente coibir o uso de telefone celular no interior das prisões Curiosamente punese a entrada do celular no presídio mas a sua utilização ainda que com propósitos delituosos é ignorada 44 Participação do detento ou recluso Para um diploma legal que pretende coibir o uso de celulares pelos detentos no interior do sistema prisional como já destacamos é incompreensível que tenha sido omitida a criminalização do uso e do porte de tais aparelhos não que defendamos tal criminalização pelo contrário achamos desnecessário todo esse tipo penal No entanto mesmo preso circunscrito nos limites geográficos da penitenciária pode qualquer recluso provisório ou não participar da promoção intermediação ou auxílio da entrada de aparelho telefônico móvel ou similar sem autorização legal em estabelecimento prisional não necessariamente naquele em que se encontra respondendo por esse crime Em síntese o tipo penal decorrente da Lei n 120122009 art 349 A do CP não pune a posse o porte ou a utilização de aparelho de telefonia celular pelos reclusos no interior de estabelecimento prisional No entanto a prática de qualquer dessas condutas no interior de estabelecimento prisional configura falta grave no cumprimento de pena privativa de liberdade art 50 VII da LEP 45 Elementar normativa sem autorização legal A elementar normativa constante do tipo penal sem autorização legal é elemento sui generis do fato típico de dupla valoração dogmática na medida em que é ao mesmo tempo caracterizador da ilicitude fazendo com que tipicididade e antijuridicidade se confundam Cumpre destacar desde logo que os elementos normativos do tipo não se confundem com os elementos jurídicos normativos da ilicitude Enquanto aqueles são elementos constitutivos do tipo penal estes embora integrem a descrição do crime referemse à ilicitude e assim sendo constituem elementos sui generis do fato típico na medida em que são ao mesmo tempo caracterizadores da ilicitude Esses elementos normativos especiais da ilicitude geralmente são representados por expressões como indevidamente injustamente sem justa causa sem licença da autoridade sem permissão legal em desacordo com a legislação etc 46 Existência de autorização legal Significa em outros termos que havendo autorização legal a conduta não se amolda à proibição constante no tipo em exame Por essa razão é que por exemplo estão autorizados a ingressar no estabelecimento portando seus celulares funcionários do sistema prisional autoridades judiciais advogados sem que suas condutas se adaptem à proibição constante no tipo penal No entanto a locução sem autorização legal tem sentido próprio e específico referindose especificamente a diplomas legais em sentido estrito quais sejam aqueles que são produtos do Poder Legislativo não o abrangendo por conseguinte resoluções portarias circulares etc 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo do crime de inserção de aparelho telefônico móvel ou similar na prisão é o dolo constituído pela vontade consciente de por qualquer meio promover a entrada desses aparelhos para uso dos detentos no interior do sistema prisional É indispensável que o agente tenha vontade e consciência de descumprir a proibição constante do artigo sub examen É necessário como temos repetido que o dolo abranja todos os elementos constitutivos do tipo penal sob pena de configurarse o erro de tipo que por ausência de dolo ou por dolo defeituoso afasta a tipicidade salvo se se tratar de simulacro de erro 51 Elemento subjetivo especial Curiosamente no entanto a despeito da pretensão do legislador de equiparar a nova figura penal ao crime de favorecimento real não há uma exigência expressa do elemento subjetivo especial do tipo representado pelo especial fim de agir constante desse tipo penal No entanto essa necessidade está implícita a exemplo do que ocorre com o crime de injúria aliás é a única forma de distinguir da conduta daqueles que ingressam licitamente no sistema prisional com seu aparelho celular para uso próprio v g funcionários autoridades advogados determinados visitantes etc 52 Finalidade especial implícita No entanto mesmo que o legislador não tenha dito expressamente somente haverá a incidência desse tipo penal quando a finalidade da conduta for fazer chegar o objeto material telefone celular ou similar às mãos daqueles que cumprem pena ou se encontram custodiados em estabelecimento prisional Exatamente esse fim especial implícito no art 349A impede que aquele que simplesmente ingressa ou tenta ingressar no estabelecimento penal como advogados autoridades funcionários ou qualquer outro visitante trazendo consigo aparelho telefônico celular para seu uso incorra nas sanções desse tipo penal Em outros termos essa norma proibitiva não atinge os funcionários da administração penitenciária os advogados ou quem quer que trabalhe ou se encontre nas dependências do estabelecimento penal que portem ou tragam consigo aparelho celular para uso pessoal por faltarlhes o elemento subjetivo especial de destinálo aos detentos 53 Não há previsão de modalidade culposa Por fim não há previsão de modalidade culposa do crime de favorecimento real ao contrário da receptação por essa razão se o sujeito ativo por exemplo desconhece a origem criminosa isto é que se trata de proveito de crime mesmo que por desatenção falta de cautela ou pura negligência em face de indícios em sentido contrário não comete crime algum repetindo desde que a sua conduta seja orientada tão somente pelo fim especial de favorecer ou auxiliar o autor do crime que o agente ignora sem visar proveito próprio ou alheio 6 Consumação e tentativa Consumase qualquer das condutas contidas no tipo penal em exame com sua efetiva entrada de aparelho telefônico de comunicação móvel de rádio ou similar em estabelecimento prisional sem autorização legal Tratandose de figuras que teoricamente podem ser interrompidas é admissível em princípio a modalidade tentada embora de difícil comprovação 7 Classificação doutrinária A inserção de aparelho celular móvel ou similar em estabelecimento do sistema prisional classificase como crime comum que não exige nenhuma qualidade ou condição especial do sujeito qual seja a de diretor de penitenciária formal que não exige resultado naturalístico para sua consumação bastando a simples abstenção da conduta devida de forma livre que pode ser praticado por qualquer forma escolhida pelo agente comissivo todas as condutas elencadas no tipo exigem a prática de uma ação positiva não havendo espaço para a forma omissiva instantâneo cuja execução não se alonga no tempo não havendo demora entre a ação e o resultado unissubjetivo que pode ser praticado por um agente apenas o que não impede a possibilidade da figura do concurso eventual de pessoas unissubsistente praticado com um único ato não admitindo fracionamento 8 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é a pena privativa de liberdade na modalidade de detenção de três meses a um ano sem qualquer modalidade de majorante ou qualificadora A ação penal por sua vez é pública incondicionada podendo ser intentada desde que satisfeitos os seus pressupostos pelo representante do Parquet Por se tratar de infração penal de menor potencial ofensivo submetese ao procedimento dos Juizados Especiais Criminais nos termos do disposto no art 61 da Lei n 9099 de 26 de setembro de 1995 com redação determinada pelo art 1º da Lei n 11313 de 286 2006 e no art 394 1º III do CPP com a redação da Lei n 11719 de 2062008 pois a pena máxima cominada não é superior a dois anos Exercício arbitrário ou abuso de poder Art 350 Ordenar ou executar medida privativa de liberdade individual sem as formalidades legais ou com abuso de poder Pena detenção de 1 um mês a 1 um ano Parágrafo único Na mesma pena incorre o funcionário que I ilegalmente recebe e recolhe alguém a prisão ou a estabelecimento destinado a execução de pena privativa de liberdade ou de medida de segurança II prolonga a execução de pena ou de medida de segurança deixando de expedir em tempo oportuno ou de executar imediatamente a ordem de liberdade III submete pessoa que está sob sua guarda ou custódia a vexame ou a constrangimento não autorizado em lei IV efetua com abuso de poder qualquer diligência D O U T R I N A 1 Considerações especiais Existem divergências na doutrina e na jurisprudência no tocante à revogação deste artigo pela Lei n 489865 regulamenta o direito de representação e o processo de responsabilidade administrativa civil e penal nos casos de abuso de autoridade São duas as correntes que se digladiam cada uma delas se posicionando da seguinte forma 1 Entendem que ocorreu abrogação com revogação completa do art 350 do CP pela Lei n 489865 arts 3º e 4º Gilberto Passos de Freitas e Wladimir Passos de Freitas Na jurisprudência vide RT 489354 504379 520466 394267 e 556322 2 Defendem a existência de derrogação com a revogação do art 350 caput e inciso III pelo art 4º a e b da Lei n 489865 Damásio E de Jesus e Paulo José da Costa Jr Na jurisprudência vide RT 592344 472392 e 537299 RTJ 54304 56131 e 62266 JTACrimSP 81182 Segundo esclarece Rui Stoco Código Penal e sua interpretação jurisprudencial p 48 a tendência jurisprudencial é no sentido de que o art 350 do CP está absorvido pela Lei n 489865 J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Erro material na sentença Condenação pela prática de abuso de poder Aplicação da pena relativa ao crime de violência arbitrária Havendo erro material relevante impõese a concessão de ofício de habeas corpus a fim de que a pena aplicada ao recorrente seja aquela relativa ao crime previsto no art 350 do Código Penal o único dispositivo legal segundo a sentença violado por ele STJ REsp 494374MG Rel Min Paulo Gallotti j 1732005 Fuga de pessoa presa ou submetida a medida de segurança Art 351 Promover ou facilitar a fuga de pessoa legalmente presa ou submetida a medida de segurança detentiva Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos 1º Se o crime é praticado a mão armada ou por mais de uma pessoa ou mediante arrombamento a pena é de reclusão de 2 dois a 6 seis anos 2º Se há emprego de violência contra pessoa aplicase também a pena correspondente à violência 3º A pena é de reclusão de 1 um a 4 quatro anos se o crime é praticado por pessoa sob cuja custódia ou guarda está o preso ou o internado 4º No caso de culpa do funcionário incumbido da custódia ou guarda aplicase a pena de detenção de 3 três meses a 1 um ano ou multa D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O Código Penal de 1940 a final segue a orientação assumida pelo Código Penal anterior 1890 distanciandose no particular do Código Penal Rocco o seu grande inspirador na imensa maioria de todos os seus fundamentos identificandose mais com o anterior código italiano o Zanardelli 1889 Assim o Código Penal de 1940 disciplina a promoção ou facilitação de fuga art 351 e a evasão mediante violência à pessoa art 352 com apurada técnica legislativocientífica como procurara fazer em toda a sua extensão codificadora a despeito de um ou outro equívoco compreensível ante a grandiosidade da obra 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é mais uma vez a Administração da Justiça especialmente o seu papel de guardiã da segurança pública da ordem e da solução dos conflitos sociais Tutelase o interesse de que a justiça não seja frustrada em seus fins de prestar jurisdição particularmente na esfera criminal visando assegurar o cumprimento de suas decisões No mesmo sentido Fragoso reconhecia que a fuga de pessoa legalmente detida lesa a autoridade de decisão judicial ou administrativa ou mesmo o interesse de repressão à criminalidade 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa inclusive funcionário público com exceção do preso ou daquele submetido à medida de segurança detentiva Neste crime a eventual instigação ou induzimento do indivíduo preso ou detido para que outrem lhe facilite ou promova sua fuga não o torna partícipe de dita infração penal porque é impunível o anseio natural de reconquista da liberdade perdida Por outro lado se o funcionário encarregado da guarda ou custódia do preso concorrer para a fuga do preso ou detento o crime será qualificado em razão da violação de dever funcional 3º Sujeito passivo é o Estado sempre titular do bem jurídico ofendido a Administração Pública lato sensu mais especificamente a Administração da Justiça e eventualmente quando for o caso a pessoa contra a qual a violência for praticada 4 Tipo objetivo adequação típica Os núcleos do tipo alternativamente indicados são os seguintes a promover provocar dar causa b facilitar favorecer colaborar Punese a conduta de quem promove ou facilita a fuga de pessoa legalmente presa em flagrante delito ou por ordem judicial ou submetida a medida de segurança detentiva art 96 I do CP Enfim promove a fuga quem com ou sem conhecimento do beneficiário toma as medidas necessárias que oportunizam a evasão de pessoa que se encontra privada de sua liberdade pena ou medida de segurança detentiva ou a facilita quem lhe fornece os meios instrumentos adequados ao empreendimento para que aquele por si mesmo liberte se podendo inclusive facilitála com orientações conselhos ou informações úteis e até mesmo quando no exercício funcional omite se na vigilância que lhe cabe como guarda carcereiro ou policial 41 Promoção ou facilitação de fuga e favorecimento pessoal Não se confunde evidentemente a promoção ou facilitação da fuga de pessoa privada da liberdade art 351 com o auxílio a criminoso em liberdade favorecimento pessoal para eximirse à ação da autoridade pública art 348 visto que são situações absolutamente distintas Por outro lado o popular que efetuando a prisão em flagrante delito conforme lhe faculta o art 301 do CPP logo depois por qualquer razão ou sem razão alguma solta o infrator não comete crime pois além de não ser legalmente obrigado a mantêlo preso não tem o dever funcional tampouco tinha o dever legal de prendêlo ao contrário da autoridade pública competente exerceu apenas direito que o ordenamento jurídico assegura a qualquer do povo ao passo que a autoridade policial e seus agentes tem o dever de prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito art 301 do CPP 42 Facilitar fuga de pessoa legalmente presa É necessário que a ação de promover ou facilitar a fuga seja praticada contra pessoa legalmente presa ou submetida à medida de segurança detentiva A legalidade da prisão ou da medida de segurança é elemento normativo do tipo constituindo pressuposto desse tipo penal Por outro lado tal legalidade funciona também como indicativo da ausência de uma causa de justificação que se presente exclui a tipicidade da conduta aqui descrita É irrelevante que a prisão decorra de crime flagrante preventiva ou decorrente de decisão condenatória prisão civil ou administrativa e tampouco ganha importância o fato de a ilegalidade existir desde o início da privação de liberdade ou sobrevir no curso desta É igualmente indiferente o local onde se encontra o indivíduo preso ou detido dentro ou fora de estabelecimentos penitenciários cadeia pública ou hospital de custódia e tratamento psiquiátrico sendo impositivo e definitivo que a restrição de liberdade tenha fundamento legal e haja sido determinada por autoridade competente Contudo não se pode confundir legalidade da prisão com a justiça desta visto que nesse tipo penal o legislador referese à legalidade formal a qual por óbvio não se confunde com justiça substancial que pode e deve ser questionada pelos meios jurídicos próprios Enfim a ilegalidade da prisão ou internação afasta a adequação típica de qualquer das condutas insertas no dispositivo ora em exame por faltarlhe a elementar constitutiva do tipo penal legalmente presa ou submetida a medida de segurança No entanto é indiferente que o preso ou detido já se encontre recolhido no estabelecimento adequado ou ainda esteja a ele sendo conduzido ou então transferido de um para outro estabelecimento ou até para alguma solenidade formal ou informal audiência identificação reconhecimento vistoria inspeção ou outra finalidade qualquer mas sempre custodiado por funcionário próprio 43 Liberdade de meios formas ou modos de condutas incriminadas De modo geral são indiferentes os meios formas ou modos pelos quais as condutas incriminadas podem ser cometidas ressalvadas as hipóteses que constituem qualificadoras conforme veremos adiante Com efeito tratase de crime de forma livre podendo ser cometido por qualquer meio inclusive de informações que possibilitem por exemplo a superação de eventual obstáculo que possa existir permitindo chegar à fuga ou evasão do criminoso Finalmente se a promoção ou facilitação da fuga é realizada por funcionário público mediante corrupção responderá pelo crime do art 351 do CP e não pelo crime de corrupção passiva art 317 do CP em razão do princípio da especialidade 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de promover ou facilitar a fuga de pessoa submetida a prisão ou a medida de segurança detentiva consciente da legalidade de uma ou outra Os motivos e os fins que orientam a conduta do agente são irrelevantes para a tipificação desta infração penal Não há exigência de qualquer elemento subjetivo especial do tipo O desconhecimento por parte do sujeito ativo da legalidade da prisão constitui erro de tipo impedindo a formação regular do dolo que assim não abrange por completo todas as elementares da descrição típica A evitabilidade do erro in concreto pode levar o sujeito ativo a responder pela modalidade culposa quando se tratar de funcionário público nos termos do 3º no entanto se quem incorrer na mesma modalidade de erro for particular ou outro funcionário não vinculado à função de guarda ou custódia de preso a evitabilidade do erro será irrelevante pela ausência de previsão da modalidade culposa não respondendo por crime algum A inevitabilidade do erro de tipo como ocorre em qualquer infração penal que vicia irreparavelmente o dolo afasta a punibilidade do crime a qualquer título doloso ou culposo Por fim punese a modalidade culposa nos termos do 4º deste artigo somente para a hipótese de funcionário incumbido da custódia ou guarda do preso ou detento 6 Consumação e tentativa Consumase o crime de promoção ou facilitação da fuga de pessoa presa ou submetida a medida de segurança no lugar e no momento em que a evasão se efetiva reconquistando o preso a sua liberdade ainda que seja apenas temporariamente A tentativa é teoricamente admissível Discordamos por óbvio do entendimento de Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 543 quando afirma que se a ação for praticada em relação a mais de uma pessoa haverá concurso material pois haverá tantos crimes quantas sejam as pessoas que empreendam a fuga Embora não seja normal na história de Fragoso um dos maiores dogmáticos brasileiros há um erro crasso em sua construção pois o que caracteriza o concurso material de crimes não é a pluralidade de resultados fuga de várias pessoas mas de ações praticadas pelo sujeito ativo que o ilustre penalista coloca no singular 7 Formas qualificadas à mão armada pluralidade de pessoas ou mediante arrombamento O modus operandi no crime de promoção ou facilitação de fuga pode apresentar particularidades que representam maior gravidade na violação do bem jurídico tutelado produzindo alarma social de grande vulto tornando a conduta mais censurável e por isso mesmo merecedora de elevada reprovabilidade quer pelo maior desvalor da ação à mão armada pluralidade de pessoas violação de dever funcional quer pelo maior desvalor do resultado mediante arrombamento rompimento de obstáculo Indiscutivelmente é superior a gravidade do injusto pois não só o desvalor da ação como também os efeitos naturais da infração são maiores do que a hipótese descrita no caput Essas particularidades podem assumir diversos graus de intensidade recebendo de acordo com sua gravidade a qualificação de agravantes majorantes ou qualificadoras Observando o princípio da reserva legal optamos por estabelecer taxativamente aquelas circunstâncias que por sua gravidade tornam o crime qualificado que a rigor constituem novos tipos penais derivados mas autônomos com novos parâmetros sancionatórios bem mais graves distintos da figura fundamental contida no caput 71 Graduação do injusto penal e reprovabilidade A graduação do injusto penal observa sua maior ou menor danosidade que ora é representada como dissemos pelo desvalor da ação ora pelo desvalor do resultado Inegavelmente a reprovabilidade é mais grave para quem utiliza meios excepcionais para superar obstáculos defensivos arrombamento ou se organiza para essa finalidade duas ou mais pessoas ou ainda trai a confiança que o Estado lhe depositara ou por fim utilizase de armas cujos efeitos lesivos podem até ser fatais A presença de apenas uma delas é suficiente para qualificar o crime mudando sua capitulação e substancialmente sua punição eventual concurso de duas ou mais qualificadoras não modifica a pena abstratamente cominada contudo deve ser considerada na medida da pena concretizada ou seja uma delas a nosso juízo a mais grave ou a mais bem comprovada nos autos servirá para estabelecer a penabase fixando o marco do tipo penal derivado enquanto as demais devem ser trabalhadas na operação dosimétrica da pena visando encontrar seu resultado definitivo Vejamos cada uma delas individualmente 72 Se o crime é praticado à mão armada Segundo a dicção do texto legal se o crime é praticado à mão armada é necessário o emprego efetivo de arma sendo insuficiente o simples portar A tipificação legal se o crime é praticado à mão armada significa o emprego de arma e empregála traduz uso efetivo concreto real isto é a utilização da arma no cometimento da violência em outros termos isso quer dizer que não basta que o infrator apenas tenha arma A inidoneidade lesiva da arma de brinquedo ver em nosso Tratado nossa crítica à revogada Súmula 174 descarregada ou simplesmente à mostra que pode ser suficiente para caracterizar a ameaça tipificadora do roubo por exemplo não tem o mesmo efeito nem para qualificar o roubo a despeito do que pretendia a revogada Súmula 174 do STJ nem para qualificar a promoção ou facilitação de fuga de quem está legalmente preso ou detido O fundamento dessa qualificadora reside exatamente na maior probabilidade de dano que o emprego de arma revólver faca punhal etc pode representar e não no temor maior sentido por supostos agentes públicos Por isso é necessário que a arma apresente idoneidade ofensiva qualidade inexistente em arma descarregada defeituosa ou mesmo de brinquedo Enfim a potencialidade lesiva e o perigo que uma arma verdadeira apresenta não existem nos instrumentos antes referidos Pelas mesmas razões não admitimos a caracterização dessa qualificadora com o uso de arma inapta a produzir disparos isto é inidônea para o fim a que se destina 73 Se o crime é praticado por mais de uma pessoa A outra qualificadora se o crime é praticado por mais de uma pessoa trata da concorrência de duas ou mais pessoas na prática do crime ainda que qualquer delas seja inimputável É indispensável a nosso juízo a participação efetiva na execução material do crime Há a necessidade com efeito da presença in loco dos concorrentes se o crime é praticado por mais de uma pessoa diz o texto legal ou seja é indispensável a concreta participação na fase executória do crime É irrelevante que algum dos participantes seja inimputável ou isento de pena pela mesma razão é indiferente que apenas um seja identificado O art 29 caput do CP afirma que quem de qualquer modo concorre para o crime incide nas penas a ele cominadas A contrario sensu está afirmando implicitamente que não o comete quem de qualquer modo concorre para o crime Nesse sentido é precisa a crítica de Weber Martins Batista que merece ser transcrita in verbis O Código Penal não comete a heresia de consagrar expressa ou implicitamente que comete o crime quem de qualquer forma concorre para ele O que está na lei corretamente é que incide nas penas cominadas ao crime expressão com que implicitamente se afirma que não o comete quem de qualquer modo concorre para ele Comete o crime ninguém afirma de outro modo quem participa materialmente de sua execução Não fora isso e seria desnecessária a norma de extensão do art 29 do Código Penal 731 Diferenças entre a qualificadora e o concurso de pessoas Enfim todos os que concorrem moral ou materialmente para o crime são punidos pelo Código Penal art 29 caput mas a qualificadora somente se configurará quando o crime for cometido por duas ou mais pessoas que necessariamente devem encontrarse no local do crime pois só será cometido por mais de uma pessoa se participarem da fase executória do crime Somente assim se pode fazer presente a maior temibilidade e eficiência da delinquência coletiva que seria o fundamento da maior punibilidade Com efeito se o legislador visa no caso punir mais gravemente a soma de esforços na prática do crime parecenos evidente que o preceito deva ser interpretado teleologicamente como endereçado à hipótese de cooperação de agentes na fase de execução do crime 74 Se o crime é praticado mediante arrombamento O arrombamento por sua vez consiste no rompimento deslocamento ou supressão de obstáculo visando facilitar a fuga do preso ou detento Arrombar é romper arrebentar cortar serrar perfurar deslocar ou forçar de qualquer modo o obstáculo com ou sem dano à substância da coisa Há destruição quando ocorre a demolição o aniquilamento ou o desaparecimento de eventual obstáculo que de alguma forma sirva de proteção ao objeto da subtração A ausência de previsão legal dos meios modos ou formas de produzir o arrombamento ou rompimento autoriza a utilização de quaisquer deles manuais ou mecânicos desde que idôneos para o fim proposto A violência à coisa na verdade é o meio empregado para garantir a fuga que aliás pode ser anterior ou contemporânea a ela indiferentemente desde que logicamente se realize com essa finalidade Assim o arrombamento praticado para assegurar a fuga também qualifica o crime mesmo que o evadido já se encontre fora do estabelecimento não constituirá crime autônomo 75 Com violação de dever funcional encarregado de custódia ou guarda de preso ou interno O 3º traz um crime próprio qualificado em razão da condição especial do agente pessoa sob cuja custódia ou guarda está o preso ou internado Há nesta última qualificadora 3º uma hipótese de violação de dever inerente à função exercida pessoa que tem a guarda ou custódia de preso ou internado cuja transgressão aumenta o desvalor da ação não apenas pela maior facilidade ou pelo menor risco para a prática do crime mas fundamentalmente por frustrar a expectativa e a confiança que a Administração Pública confiou a seu representante legal que supõe um sentimento interior de credibilidade representando um vínculo subjetivo de respeito e responsabilidade decorrente de especial relação funcional exatamente a razão pela qual assume a função que exerce justificandose assim o aumento da reprovabilidade pessoal do injusto Por fim não basta a existência de uma relação funcional entre o sujeito ativo e a função de guarda ou custódia mas é necessário que aquele se tenha valido desse vínculo com a função para praticar o crime ou dele abusado para a execução criminosa ou seja deve caracterizar em outras palavras a velha relação de causa e efeito Realmente se o funcionário no seu período de folga fora do exercício de sua atividade funcional guarda ou custódia de presos incorporase a outros para a prática do crime ou o realiza sozinho sem qualquer aproveitamento de sua função não se configura a nosso juízo dita qualificadora 751 Incomunicabilidade de qualificadora de caráter pessoal Esta última qualificadora é de caráter pessoal e como tal em princípio é incomunicável aos demais participantes de uma mesma infração penal art 30 contudo na hipótese ela constitui elementar do crime qualificado incidindo na ressalva do mesmo art 30 que determina nesses casos a comunicabilidade das elementares típicas independentemente de sua natureza objetiva ou subjetiva Convém destacar no entanto que a comunicabilidade não apenas de elementares subjetivas mas de qualquer natureza somente existe se o participante conhecer essa circunstância antes da prática delituosa caso contrário ela não terá sido abrangida por dolo resultando incomunicável não por sua natureza subjetiva mas pelo desconhecimento do agente que em relação à elementar não agiu com dolo 8 Forma culposa negligência no exercício de dever funcional Tratase de crime próprio que somente pode ser praticado pelo funcionário público incumbido da custódia ou guarda do preso ou internado 4º Quando resultar da desatenção do sujeito ativo relativamente às normas de cuidado objetivo exigíveis no exercício da função de custódia ou guarda configurará crime culposo Com efeito a observância do dever objetivo de cuidado isto é a diligência devida no atendimento atenção procedimentos e todas as demais cautelas que a perigosa atividade desenvolvida exige de quem guarda ou custodia presos ou internos constituem o elemento fundamental do tipo de injusto culposo cuja análise preliminar mais que requisito representa um pressuposto no exame da culpa Na dúvida sobre a necessidade de adotar determinadas cautelas impõese a sua adoção ou a abstenção da realização da conduta pois quem se arrisca nessas hipóteses age com imprudência e sobrevindo um resultado típico tornase autor de um crime culposo no caso de concorrer para a evasão de preso ou internado conforme o caso No entanto é indispensável que se investigue o que teria sido in concreto para o agente o dever de objetivo cuidado E como segunda indagação devese questionar se a ação do agente correspondeu a esse comportamento adequado Somente nessa segunda hipótese quando negativa surge a reprovabilidade da conduta numa espécie podese dizer de relação de causa e efeito entre a ação descuidada do agente e a ocorrência in concreto do fato qual seja a fuga dos custodiados por aquele 9 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é de detenção de seis meses a dois anos As formas qualificadas 1º e 3º preveem pena de reclusão de dois a seis anos e reclusão de um a quatro anos respectivamente Para a forma culposa aplicase alternativamente a pena de detenção de três meses a um ano ou multa A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Guarda que aceita vantagem e facilita a fuga de preso comete só o crime do art 351 do CP e não também o de corrupção passiva em vista do princípio da especialidade O Código Penal nos delitos de fuga e evasão de preso determina expressamente a aplicação cumulativa da pena correspondente à violência exercida contra a pessoa Concurso material de infrações reconhecido entre o crime de facilitação de fuga e os delitos de sequestro e lesão corporal leve contra vítimas distintas TJMG Apelação 106110200136980011 Rel Paulo Cezar Dias j 63 2007 Fuga de pessoa presa Individualização da pena Alegação de resposta penal inadequada Ausência de prejuízo Denegação É certo que a disposição do 2º do artigo 351 do Código Penal caracteriza concurso material ex vi legis a determinar que o Juiz para além da pena prevista para o ilícito de promoção ou facilitação de fuga de pessoa presa imponha em cúmulo material as penas correspondentes à violência contra pessoa empregada como meio de execução daquele delito STJ HC 33515SP Rel Min Hamilton Carvalhido j 1462005 Evasão mediante violência contra a pessoa Art 352 Evadirse ou tentar evadirse o preso ou o indivíduo submetido a medida de segurança detentiva usando de violência contra a pessoa Pena detenção de 3 três meses a 1 um ano além da pena correspondente à violência D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Na legislação brasileira o Código Criminal de 1830 punia somente a evasão que fosse praticada com violência contra o carcereiro ou guarda art 126 O Código Penal de 1890 basicamente reproduziu as mesmas disposições do anterior art 132 Finalmente nosso Código Penal de 1940 embora tenha tido como seu grande inspirador o Código Penal Rocco 1930 não seguiu nesse aspecto sua orientação limitandose a criminalizar a evasão somente quando praticada com violência à pessoa 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é novamente a Administração da Justiça Tutelase o interesse de que a justiça não seja frustrada em seus fins de prestar jurisdição particularmente na esfera criminal visando assegurar o cumprimento de suas decisões A lei que não admite oposição ou insubordinação contra as decisões judiciais redobra sua insatisfação quando o indivíduo ao desobedecêla ainda usa de violência contra a pessoa Protegese enfim a Administração da Justiça objetivando impedir qualquer forma de rebelião contra a disciplina coercitiva imposta pelo Estado visando a prevenção e repressão pública 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo somente pode ser a pessoa presa ou submetida a medida de segurança detentiva sendo possível o concurso eventual de pessoas inclusive com a participação de funcionário público encarregado ou não da custódia de presos Sujeitos passivos são o Estado sempre titular do bem jurídico ofendido a Administração Pública lato sensu mais especificamente no caso a Administração da Justiça e evidentemente a pessoa contra a qual a violência for praticada pelo sujeito ativo 4 Tipo objetivo adequação típica A conduta incriminada consiste em evadirse ou tentar evadirse fugir escapar o preso qualquer que seja a natureza da prisão penal civil ou administrativa ou o indivíduo submetido a medida de segurança detentiva art 96 do CP usando de violência física não bastando a grave ameaça ou a violência contra a coisa contra a pessoa como por exemplo o preso que para fugir serra as grades da cela Contrariamente à previsão do Código Penal brasileiro o atual Código Penal espanhol Ley Orgánica n 1095 tipifica a conduta de evasão mediante violência admitindo também a ameaça intimidación isto é a violência moral e a violência à coisa fuerza en las cosas nos seguintes termos Los sentenciados o presos que se fugaren del lugar en que estén recluídos haciendo uso de violencia o intimidación en las personas o fuerza en las cosas o tomando parte en motín art 469 41 Fuga extramuros tipicidade Para Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 520 se a fuga ocorre extramuros eximindose violentamente o agente ao poder de quem o conduz ou transporta o crime será o de resistência art 329 sem prejuízo igualmente das penas correspondentes à violência Não lhe assiste razão pois a restrição à liberdade do indivíduo não se limita ao interior dos estabelecimentos destinados à privação de liberdade como à primeira vista pode parecer pois mesmo extramuros pode o indivíduo por razões as mais variadas continuar custodiado por agentes públicos responsáveis por sua guarda sendo possível portanto evadirse ou tentar evadirse usando de violência contra a pessoa A tese de Hungria apresenta algumas falhas técnicas como se pode notar em primeiro lugar quem foge não oferece resistência aproximandose mais da desobediência em segundo lugar o exemplo citado adequase perfeitamente à descrição contida no art 352 e não no dispositivo referido por Hungria pois o indivíduo nesse exemplo não opõe resistência à sua prisão já se encontra preso ou submetido a medida de segurança detentiva portanto usando de violência para eximirse da custódia de quem o conduz evadese ou tenta evadirse como diz o art 352 Na verdade evadirse significa etimologicamente fugir de um lugar fechado mas juridicamente equivale a subtrairse à restrição de sua liberdade 42 Crime de resistência e evasão de presídio Em síntese se o indivíduo opõese à sua prisão mediante violência há resistência no entanto se faz uso da violência contra a pessoa depois de preso ou submetido à internação tipificase o crime de evasão art 352 Portanto a evasão a nosso juízo pode darse intra ou extramuros sendo indispensável contudo a legalidade da prisão ou internação para que se tipifique a conduta como adverte Salo de Carvalho Pena e garantia 2 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 p 230 para a caracterização da figura típica a conduta deve ser direcionada contra prisão legal sua ilegalidade constitui circunstância discriminante sic do fato não podendo ser confundida com o tipo penal resistência regulado no art 329 do CP Por fim uma coisa no entanto é absolutamente certa é impossível evadirse para dentro dos estabelecimentos ao contrário do que alguém menos avisado chegou a sustentar no STJ referindose a evasão de divisas 43 Legalidade da prisão ou medida de segurança A legalidade da prisão ou da medida de segurança podese dizer é elemento prejudicial constituindo pressuposto do crime A eventual ilegalidade seja da prisão seja da internação afasta não apenas a ilicitude mas a própria tipicidade da conduta No entanto o sujeito ativo preso ou internado mesmo assim responderá pela violência empregada no que exceder dos meios necessários à repulsa da ilegalidade sofrida Por outro lado é irrelevante que a prisão decorra de crime flagrante preventiva ou decorrente de decisão condenatória de prisão civil ou administrativa e tampouco ganha importância o fato de a ilegalidade existir desde o início da privação de liberdade ou sobrevir no curso desta como adverte Salo de Carvalho Pena e garantia p 230 a prisão inicialmente legítima pode tornarse ilegal com o transcurso do prazo de sua duração caracterizando assim a atipia da evasão É igualmente indiferente o local onde se encontra o indivíduo preso ou internado dentro ou fora de estabelecimentos penitenciários como já destacamos cadeia pública ou hospital de custódia e tratamento psiquiátrico sendo impositivo e definitivo que a restrição de liberdade tenha fundamento legal e haja sido determinada por autoridade competente 44 Punição cumulativa da elementar típica violência bis in idem Constatase de plano que a exemplo do crime de roubo e de tantos outros a violência constitui elementar típica do crime de evasão violenta de estabelecimento prisional mas neste tipo penal ao contrário do que ocorre com o roubo aqui tomado como paradigma apenas para exemplificar o legislador ignora toda a estrutura do próprio Código Penal e menospreza toda uma longa evolução políticodogmática do direito penal infringindo princípios elementares como ne bis in idem proporcionalidade razoabilidade dentre tantos outros e determina a punição cumulativa aplicação do sistema do cúmulo material de penas do crime de evasão mediante violência contra a pessoa e da configuração necessária e indispensável de sua elementar típica violência na medida em que sem esta esse crime não se configura 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo do crime de evasão mediante violência contra a pessoa é o dolo representado pela vontade consciente de evadirse praticando violência contra a pessoa A doutrina de modo geral tem sustentado a desnecessidade de algum elemento subjetivo especial do injusto discordando a nosso juízo com razão Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 547 que exigia o antigo dolo específico Assim não nos parece desarrazoada a sugestão de Guilherme Nucci Código Penal comentado p 1091 quando ventila a possibilidade de admitirse ainda que implicitamente o especial fim de escapar da prisão legal valendose de violência Com efeito motivações diversas podem levar o preso ou interno a evadirse do estabelecimento mesmo usando de violência sem que a finalidade da ação realmente seja a evasão podendo por exemplo desejar somente comparecer ao enterro de sua mãe Por isso estamos de acordo com a necessidade do especial fim de evadir da segregação em que se encontra o sujeito ativo 6 Consumação e tentativa Consumase o crime com o emprego da violência física contra a pessoa e a realização de atividade tendente à evasão do preso ou internado A tentativa em termos de direito positivo é inadmissível visto que a forma tentada é equiparada ao crime consumado embora devam ser distinguidas no momento da dosimetria da pena Pertinente transcrever aqui parte da contundente e procedente crítica de Salo de Carvalho Pena e garantia p 234 à equiparação punitiva de crime tentado e crime consumado nos seguintes termos embora pacífico o entendimento doutrinário das correntes humanistas acerca do minus da tentativa em relação ao delito consumado o legislador equiparou no caso de evasão mediante violência as duas condutas seguindo rumos da tradição legislativa autoritária v g os crimes contra a segurança nacional Lei n 717083 Assim de duvidosa constitucionalidade a equiparação das penas em decorrência da lesão ao princípio da razoabilidade 7 Pena e ação penal As penas cominadas são de detenção de três meses a um ano além da pena correspondente à violência Como o tipo penal equipara evadir e tentar evadirse punindo ambas com os mesmos limites abstratos mínimo e máximo ao dosar a pena devemse observar as diferenças do desvalor do resultado entre uma e outra figura em observância ao indeclinável princípio da proporcionalidade A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Delito de evasão mediante violência contra a pessoa Para a configuração do tipo descrito no art 352 do CP é desnecessário o cometimento de lesões corporais bastando o emprego de violência física contra pessoa TJRS Apelação 70008679748 Rel Gaspar Marques Batista j 1282004 Arrebatamento de preso Art 353 Arrebatar preso a fim de maltratálo do poder de quem o tenha sob custódia ou guarda Pena reclusão de 1 um a 4 quatro anos além da pena correspondente à violência D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O Código Criminal do Império 1830 prescrevia o crime de arrebatamento de presos nos seguintes termos fazer arrombamento ou acometer qualquer prisão com força para maltratar os presos art 127 Essa orientação foi acolhida pelo Código Penal de 1890 que se limitou a reproduzir a previsão do estatuto penal anterior art 133 que incriminava somente o arrebatamento realizado mediante arrombamento ou acometimento de prisão O Código Penal em vigor 1940 no entanto ampliou a proibição dessa conduta admitindo sua tipificação não apenas quando o sujeito passivo encontrase recolhido a algum estabelecimento prisional mas em qualquer local desde que seja arrebatado de quem o tenha sob guarda ou custódia 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é também aqui a Administração da Justiça Tutelase o interesse de que a justiça não seja frustrada em seus fins de prestar jurisdição particularmente na esfera criminal visando assegurar o cumprimento de suas decisões e o arrebatamento de presos constitui um atentado contra a dignidade da Administração da Justiça Tutelase igualmente a integridade física de quem se encontra sob proteção oficial da instituição justiça como destacava Magalhães Drumond Comentários ao Código Penal p 4012 se se arrebata o preso à autoridade que o custodia ou guarda prescindese dessa autoridade negaselhe a investidura investese contra o Estado desconhecese a ordem jurídica É a proclividade para o caos político senão a sua verificação imediata 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo do crime de arrebatamento de preso pode ser qualquer pessoa tendo ou não interesse pessoal em algum processo não sendo exigida nenhuma qualidade ou condição especial Aliás nada impede que a própria vítima do crime pelo qual o indivíduo encontrase preso possa ser sujeito ativo do arrebatamento ou pelo menos que possa concorrer na forma do art 29 do CP Sujeito passivo prioritariamente na nossa avaliação será sempre a vítima da violência praticada pelo sujeito ativo ou seja sujeito passivo é o preso arrebatado para ser maltratado tanto que a violência é punida como crime autônomo Não nos parece adequado o entendimento majoritário nesse caso de que a vítima efetiva da violência que pode até chegar à morte não seja considerada como sujeito passivo imediato do crime secundariamente é o Estado sempre titular do bem jurídico ofendido Administração Pública lato sensu mais especificamente na hipótese a Administração da Justiça 4 Tipo objetivo adequação típica A conduta típica consiste em arrebatar arrancar retirar com violência preso do poder de quem o tenha sob custódia ou guarda oficial de justiça carcereiro etc a fim de maltratálo os maustratos têm variada casuística indo desde as vias de fato vexatórias até o extremo do linchamento que ultimamente tem ocorrido com certa e alarmante frequência Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 521 Em outros termos arrebatar significa retirar com violência tomar de assalto isto é violentamente pessoa que se encontra presa punindose também o crime que a violência configurar É irrelevante a legalidade ou não da prisão para caracterizar o crime em tela que é mais uma razão de se defender que a vítima do linchamento é o sujeito passivo imediato e não o Estado contrariamente ao que ocorre com os crimes descritos nos dois dispositivos anteriores promoção ou facilitação de fuga art 351 e evasão mediante violência à pessoa art 352 cuja legalidade da prisão constitui pressuposto das ações tipificadas nada justifica portanto a violência vingativa ou simplesmente irracional do agressor a alguém que já se encontra privado de sua liberdade por determinação do próprio Estado A irrelevância da legalidade da prisão para a tipificação do crime de arrebatamento de preso devese ao fato de que o fim especial do sujeito ativo é maltratar o preso e não salválo de uma prisão ilegal ou injusta Por isso a ilegalidade da prisão não afasta a tipicidade tampouco a antijuridicidade da conduta 41 Irrelevância da natureza da prisão criminal civil ou administrativa É indiferente que a prisão decorra de crime flagrante temporária preventiva decorrente de pronúncia ou de decisão condenatória de prisão civil ou administrativa É igualmente indiferente o local onde se encontra o indivíduo preso dentro ou fora de estabelecimento penitenciário cadeia pública etc ou mesmo sendo conduzido em via pública contudo é indispensável que ele se encontre sob custódia ou guarda ficando em segundo plano a legalidade formal de dita custódia ou guarda que posteriormente apurada não legitima a violência do arrebatamento isto é não lhe afasta a tipicidade 42 Lacuna arrebatamento de pessoa submetida à medida de segurança O crime do art 353 pune o arrebatamento de preso consequentemente ao contrário da previsão contida no artigo anterior não abrange a pessoa submetida a medida de segurança detentiva ou seja o arrebatamento de pessoa internada para tratamento não tipifica o crime descrito neste artigo que por isso mesmo caracteriza uma lacuna da tipificação em exame que não pode ser suprida por analogia in malam partem 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo geral é o dolo representado pela vontade de arrebatar pessoa presa consciente de que o retira do poder de quem o tenha sob guarda ou custódia Exigese no entanto o elemento subjetivo especial do tipo representado pelo especial fim de agir qual seja o de maltratar o preso independentemente de atingir tal pretensão Tratase de um daqueles tipos penais em que ao lado do dolo pode figurar uma série de características subjetivas que o integram ou o fundamentam Como o próprio Welzel Derecho Penal alemán p 83 esclarecia ao lado do dolo como momento geral e pessoalsubjetivo daquele que produz e configura a ação como acontecimento dirigido a um fim apresentamse frequentemente no tipo especiais momentos subjetivos que dão colorido num determinado sentido ao conteúdo éticosocial da ação Assim por exemplo o tomar uma coisa alheia é uma atividade dirigida a um fim por imperativo do dolo no entanto seu sentido éticosocial será inteiramente distinto se aquela atividade tiver como fim o uso passageiro ou se tiver o desígnio de apropriação 51 Relevância da motivação da conduta finalidade especial A ideologia subjetivadora na elaboração do preceito primário da norma penal além de inadequada é extremamente perigosa pois esses estados anímicos como ser egoísta cruel ou malvado dentre outros podem existir independentemente da relevância da lesão objetiva de bens jurídicos tutelados E nessas circunstâncias quando a conduta é penalmente relevante a tipificação desses estados anímicos pode conduzir à punição do ânimo que é inadmissível no direito penal da culpabilidade No entanto no tipo penal em exame arrebatamento de preso o fim especial da ação assume importância transcendental para a reprovabilidade pessoal do injusto sem violar o sagrado princípio da reserva legal estrita porque revela sobremodo a gravidade do desvalor da ação do sujeito ativo maltratar o preso que não torna menos grave e quiçá irrelevante penalmente se dito arrebatamento tiver outra motivação ou outro fundamento sociopolítico que não o de maltratar o preso afora o fato da desumanidade que a conduta tipificada traz em seu bojo 6 Consumação e tentativa Consumase o crime com o efetivo arrebatamento do preso isto é com a sua retirada violenta do poder de quem o tenha sob custódia ou guarda mesmo que os maustratos acabem não sendo impostos Se no entanto ocorrerem os maustratos haverá o exaurimento do crime não alterando a tipificação da conduta e sua influência circunscreverseá ao cálculo da pena A tentativa é teoricamente admissível tratandose como se trata de crime plurissubsistente cujos atos executórios podem ser fracionados 7 Pena e ação penal As penas cominadas são cumulativamente de reclusão de um a quatro anos Há aplicação cumulativa sistema do cúmulo material de penas entre a pena do presente crime e a correspondente à violência homicídio ou lesão corporal contra a pessoa Admitese a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada igual a um ano A ação penal é pública incondicionada Motim de presos Art 354 Amotinaremse presos perturbando a ordem ou disciplina da prisão Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos além da pena correspondente à violência D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O disposto no art 311 do Código Penal suíço teria sido a fonte inspiradora do Código Penal brasileiro de 1940 que tipificou a conduta de amotinaremse os presos perturbando a ordem e a disciplina da prisão excluindo os internados pacientes de medidas de segurança por não possuírem a plena capacidade de ser culpáveis Por conseguinte a legislação brasileira anterior Código Criminal de 1830 e Código Penal de 1890 não tipificou o crime de motim de presos como reconhece expressamente a Exposição de Motivos inciso 84 do diploma legal de 1940 embora o Projeto de Virgílio de Sá Pereira e o Projeto Alcântara Machado previssem a criminalização do amotinamento de presos 2 Aspectos políticocriminais da conflitividade carcerária Os motins carcerários são os fatos que mais dramaticamente evidenciam as deficiências da pena privativa de liberdade É o acontecimento que causa maior impacto e o que permite à sociedade tomar consciência infelizmente por pouco tempo das condições desumanas em que a vida carcerária se desenvolve O motim uma erupção de violência e agressividade que comove os cidadãos serve para lembrar à comunidade que o encarceramento do delinquente apenas posterga o problema Ele rompe o muro de silêncio que a sociedade levanta ao redor do cárcere Infelizmente pouco depois de desaparecido o conflito carcerário a sociedade volta a construir o muro de silêncio e de indiferença que se manterá até que outro acontecimento dramático comova transitoriamente a consciência social Esse ciclo fatal cuja interrupção é muito difícil é um dos fatores que mais influem para que a problemática carcerária não encontre solução satisfatória na maior parte das sociedades O exemplo mais eloquente da conflitividade carcerária foi o massacre do Carandiru ocorrido na Casa de Detenção em São Paulo no ano de 1992 quando a Polícia Militar executou cento e onze reclusos totalmente desarmados A grande conflitividade existente no meio carcerário cuja expressão mais genuína é o motim tem origem em uma multiplicidade de fatores Provavelmente as deficientes condições materiais em que se desenvolve a vida carcerária sejam o fator mais importante Contudo para entender melhor o problema devemse analisar outros fatores 21 A clássica prisão de segurança máxima Em geral os reclusos vivem em condições de amontoamento havendo poucas condições de as autoridades penitenciárias realizarem adequada supervisão e vigilância interna A clássica prisão fechada cria um ambiente propício para a existência de relações e comportamentos homossexuais São frequentes as rivalidades étnicas ou entre grupos distintos Todas essas condições favorecem um elevado índice de conflitividade razão pela qual a maior parte dos motins carcerários se produz nas prisões fechadas O problema se agrava consideravelmente quando se trata de macroprisões onde a tensão aumenta e explode geralmente em violência e frustração Por isso não se pode ignorar a extraordinária importância que tem o desenho arquitetônico de uma prisão 22 As graves deficiências do regime penitenciário A imensa maioria dos protestos reivindicatórios massivos produzidos na prisão tem sua origem nas deficiências efetivas do regime penitenciário As deficiências são tão graves que qualquer pessoa que conheça certos detalhes da vida carcerária fica profundamente comovida Na maior parte dos sistemas penitenciários podem ser encontradas as seguintes deficiências 1ª Falta de orçamento Infelizmente nos orçamentos públicos o financiamento do sistema penitenciário não é considerado necessidade prioritária salvo quando acabam de ocorrer graves motins carcerários 2ª Pessoal técnico despreparado Em muitos países a situação se agrava porque o pessoal não tem garantia de emprego ou uma carreira organizada predominando a improvisação e o empirismo Nessas condições é impossível desenvolver um bom relacionamento com os internos 3ª Nas prisões predomina a ociosidade e não há um programa de tratamento que permita pensar na possibilidade de o interno ser efetivamente ressocializado A superpopulação das prisões a alimentação deficiente o mau estado das instalações o pessoal técnico despreparado a falta de orçamento todos esses fatores convertem a prisão em um castigo desumano A maior parte das rebeliões que nelas ocorrem é causada pelas deploráveis condições materiais em que a vida carcerária se desenvolve Sempre que ocorrem esses conflitos graves os internos fazem reivindicações que refletem as condições desumanas em que se desenvolve a pena privativa de liberdade 3 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é outra vez a Administração da Justiça protegendo como advertia Heleno Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 549 a ordem e a disciplina como elementos de regularidade administrativa da prisão Tutelase o interesse de que a justiça seja respeitada em seus fins de prestar jurisdição especialmente na seara criminal que precisa garantir o cumprimento de suas decisões O ordenamento jurídico que não admite insubordinação contra as decisões judiciais redobra sua insatisfação quando o indivíduo além de desobedecêla ainda usa de violência contra a pessoa Protegese enfim a Administração da Justiça objetivando impedir qualquer forma de rebelião e principalmente o amotinamento de presos 4 Sujeitos do crime Sujeitos ativos somente podem ser as pessoas presas crime próprio sendo indispensável a pluralidade de sujeitos ativos configurando crime de concurso necessário Em respeito ao princípio da tipicidade estrita está excluído do presente tipo penal o internado submetido a medida de segurança visto que o texto legal a exemplo do artigo anterior somente tem em vista o preso Sujeitos passivos são o Estado via Administração da Justiça e quando houver a pessoa lesada pela violência física praticada pelo sujeito ativo Nessa hipótese o Estado passa a ser sujeito passivo mediato 5 Tipo objetivo adequação típica O verbo amotinarse significa levantarse de forma rebelde e violenta contra a administração da casa prisional dando origem ao movimento conhecido por motim de presos Motim é revolta coletiva de considerável número de encarcerados alterando gravemente a ordem ou disciplina do estabelecimento prisional através de violência contra seus funcionários e instalações Nesse sentido Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 549 emitia o seguinte conceito O motim no sentido legal é a reunião de várias pessoas no mesmo lugar para uma ação pessoal conjunta e violenta em relação a um fim comum Embora o texto legal não decline o número mínimo dos sujeitos ativos ao contrário do que faz em alguns tipos penais como na quadrilha ou bando a doutrina tem entendido que se trata de crime coletivo ou multitudinário sendo necessário para o seu aperfeiçoamento um número significativo de presos como requer o verbo nuclear amotinaremse presos segundo denuncia sua forma verbal Por essa razão a reunião mesmo movida por revolta violenta de dois ou três presos é insuficiente para caracterizar o amotinamento que é um ajuntamento tumultuário de presos perturbando a ordem e a disciplina prisional segundo a legislação brasileira 51 A natureza militante da violência contra funcionários e agentes públicos Com efeito a ação de amotinarse deve ter necessariamente a natureza militante de violência indiscriminada contra os funcionários e agentes públicos ou mesmo de violência contra a coisa isto é contra as instalações as edificações ou o mobiliário do estabelecimento prisional perturbando a ordem disciplina e por extensão a segurança da prisão Eventuais atitudes coletivas de desrespeito desobediência ou simples irreverência sem o caráter de violência militante não tipificam o crime de amotinarse descrito no artigo ora em exame Os agentes ativos do motim convém repetir somente podem ser os presos que atuam de maneira a perturbar a ordem ou disciplina da prisão Por isso a eventual adesão de um ou outro preso a um movimento de rebeldia ou greve dos funcionários prisionais não configura o crime de motim tampouco tipificaria o crime de motim de presos a reunião de um ou dois destes com pessoas estranhas aos encarcerados tais como familiaresvisitantes funcionários ou guardas embora possa concorrer para a prática de amotinamento na forma do concurso eventual de pessoas art 29 do CP Condutas como essas que não reúnam as elementares tipificadoras do crime de motim de presos podem no entanto caracterizar rebelião prisional que seria a desordem indisciplina e impedimento ou inviabilização parcial das atividades normais do estabelecimento prisional que dependendo das circunstâncias poderá evoluir para o motim que seria uma espécie de estágio mais avançado desses movimentos coletivos de rebeldia prisional 6 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade de amotinaremse os presos com a consciência de perturbar a ordem e a disciplina e de que se trata de movimento coletivo violento Não há exigência de elemento subjetivo especial do tipo É irrelevante que o fundamento do motim seja a reivindicação de pretensões justas ou injustas ou que objetive a evasão dos presos a vingança contra funcionários e técnicos ou apenas chamar a atenção para o estado deplorável do sistema prisional Os motivos determinantes do motim contudo devem ser evidentemente valorados no momento do cálculo da pena concretizada na sentença Nessa valoração no entanto não se pode olvidar como destaca com propriedade Salo de Carvalho Pena e garantia p 225 que o fenômeno da conflitividade carcerária fugas rebeliões e motins tem como principal fato gerador a violação por parte das agências formais de controle da legalidade estatal A sede do exame desse aspecto sociojurídico situase na culpabilidade mais precisamente no seu elemento exigibilidade de conduta diversa pois como destaca Salo de Carvalho Pena e garantia p 2234 mesmo assim ciente das consequências do ato sedicioso a massa carcerária acaba por encontrar em condutas ilícitas fugas rebeliões e motins a única maneira eficaz de romper com o silêncio totalitário dos muros prisionais Logo embora todos esses aspectos referidos não afastem aquela exigibilidade de conduta diversa por certo a tornará menos grave militando por conseguinte em favor dos infratores possibilitando que se lhe atribua menor grau de censura 7 Consumação e tentativa Consumase o crime de motim de presos com a perturbação efetiva da ordem ou disciplina do estabelecimento prisional isto é desde que se manifestem os primeiros atos do motim sendo irrelevante a permanência da perturbação desde que referidos atos caracterizem violência organizadamente indiscriminada O não acatamento de uma ordem a vaia mesmo coletiva podem configurar transgressões disciplinares mas certamente não caracterizam o crime de motim de presos A tentativa é teoricamente admissível pois além de crime material tratase de infração penal plurissubsistente cuja fase executória admite fracionamento 8 Pena e ação penal As penas cominadas são de detenção de seis meses a dois anos além da pena correspondente à violência quando constituir em si mesma crime autônomo aplicase nesse caso o sistema do cúmulo material entre a pena cominada ao crime de amotinarse e a correspondente à violência homicídio ou lesões corporais contra a pessoa não configurando necessariamente concurso material de crimes ao contrário do que afirmava Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 428 Contudo se houver evasão decorrente do próprio amotinamento haverá concurso formal com o crime do art 352 somente para quem se evadir A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A A adesão ao movimento coletivo de greve de fome não se confunde com participação em motim porque feita sem violências contra os funcionários internos e depredações contra o prédio prisional ou suas instalações características deste instituto não incidindo a regra do art 354 CP É ilógico que o mesmo ordenamento jurídico que reconhece a greve de fome pacífica e de caráter reivindicatório como manifestação do âmbito da liberdade individual acabe por classificála como transgressão disciplinar de natureza grave suscetível de punição como a regressão de regime prisional Agravo provido por maioria TJRS Agravo 70020720181 Rel Aramis Nassif j 2982007 Patrocínio infiel Art 355 Trair na qualidade de advogado ou procurador o dever profissional prejudicando interesse cujo patrocínio em juízo lhe é confiado Pena detenção de 6 seis meses a 3 três anos e multa Patrocínio simultâneo ou tergiversação Parágrafo único Incorre na pena deste artigo o advogado ou procurador judicial que defende na mesma causa simultânea ou sucessivamente partes contrárias D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Nosso Código Criminal do Império 1830 não tratou do crime de patrocínio infiel Já o Código Penal de 1890 disciplinouo como uma modalidade de prevaricação nos 3º e 4º de seu art 209 ambas figuras recepcionadas respectivamente pelos arts 355 e 356 com ligeiras modificações Inova portanto o Código Penal de 1940 ao dar essa fisionomia à definição da presente infração penal 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é o interesse no funcionamento regular da Administração da Justiça Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 431 elucidava a objetividade jurídica deste dispositivo legal destacando que a tutela do interesse privado realizase sobretudo como reflexo da tutela do interesse público tanto que nem sempre o consentimento da parte ao fato do advogado ou consultor técnico pode excluir o caráter de ilegitimidade 3 Sujeitos do crime Sujeitos ativos são o advogado isto é o bacharel em direito regularmente inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil art 3º da Lei n 890694 e o procurador judicial que pode ser interpretado como o advogado público compreendendose como tais os advogados dos membros da AdvocaciaGeral da União da Procuradoria da Fazenda Nacional das Defensorias Públicas Procuradorias e Consultorias Jurídicas dos Estados Municípios Distrito Federal Autarquias e demais entidades da administração indireta e fundacional art 3º 1º É perfeitamente admissível a participação de terceiros incluindose os estagiários nos termos definidos pelo concurso de pessoas art 29 Sujeitos passivos são em primeiro plano como sustentamos a parte prejudicada o cliente pelo patrocínio infiel simultâneo ou pela tergiversação secundariamente o Estado que é o titular da Administração da Justiça 4 Tipo objetivo adequação típica O caput do art 355 tipifica o patrocínio infiel que consiste em trair ser infiel aos deveres profissionais na qualidade de advogado ou procurador o dever profissional prejudicando interesse o prejuízo deve ser efetivo de natureza material ou moral desde que se refira a interesse legítimo cujo patrocínio em juízo lhe é confiado Com efeito patrocínio infiel consiste na ação de enganar o cliente no patrocínio de causa fraudandolhe a expectativa de defender seu interesse em juízo É infiel no patrocínio de causa judicial o advogado que no exercício profissional não se conduz como deveria fazêlo na defesa do interesse legítimo que lhe é confiado pelo cliente causando lhe prejuízo O dever de fidelidade encontrase delineado no Estatuto da OAB nos seguintes termos Art 33 O advogado obrigase a cumprir rigorosamente os deveres consignados no Código de Ética e Disciplina Parágrafo único O Código de Ética e Disciplina regula os deveres do advogado para com a comunidade o cliente o outro profissional e ainda a publicidade a recusa do patrocínio o dever de assistência jurídica o dever geral de urbanidade e os respectivos procedimentos disciplinares 41 Defesa de interesses de partes contrárias No parágrafo único a conduta incriminada é a defesa de interesses na mesma causa entendida em sentido amplo de partes contrárias titulares de interesses antagônicos de forma simultânea patrocínio simultâneo ou sucessiva tergiversação Na primeira o agente toma para si a defesa ao mesmo tempo de interesses contrários de partes litigantes e na segunda após ter abandonado ou ter sido dispensado por uma das partes assume o patrocínio da parte contrária São portanto duas figuras distintas patrocínio simultâneo e patrocínio sucessivo de partes contrárias sendo pressuposto portanto em qualquer das duas modalidades que a ação ocorra em relação à mesma causa No patrocínio simultâneo o agente defende interesses opostos por si ou por interposta pessoa configurando a hipótese de concurso de pessoas no patrocínio sucessivo tergiversação o sujeito ativo troca de lado passando a patrocinar a causa da parte contrária sendo insuficiente porém o simples recebimento de mandato é necessário que efetivamente atue na defesa de interesse da parte adversa A infidelidade profissional na ótica do Código Penal fazse presente em qualquer dessas modalidades de condutas Partes contrárias enfim devem ser entendidas no âmbito do art 355 pessoas com interesses divergentes antagônicos opostos na mesma relação jurídico processual mesmo que não figurem concretamente como partes no processo judicial Assim por exemplo o denunciado e o lesado são partes contrárias num processo criminal mesmo que este não se tenha habilitado como assistente do Ministério Público 42 Limites do patrocínio infiel somente em relação a interesse legítimo No entanto convém registrar o patrocínio infiel somente pode ocorrer em relação a interesse legítimo porque contrariar pretensão ilegal não tem a proteção do ordenamento jurídico e muito menos na esfera penal não se podendo falar sequer de infração ético administrativa Na verdade a ilegitimidade do interesse pretendido é incompatível com o prejuízo requerido pelo tipo penal pois o que se protege em primeiro plano é o cumprimento do dever profissional e não a pretensão da parte ao outorgar o mandato e não é defensável sustentar dever ético de honrar mandato que objetive interesse ilegítimo Ademais é elemento constitutivo do tipo o prejuízo do cliente vítima da infidelidade profissional do advogado Em decorrência dessa infidelidade deve produzirse um dano um prejuízo ou lesão efetiva aos interesses confiados ao profissional A ausência de prejuízo patrimonial ou moral que é uma exigência típica impede a configuração do crime sendo insuficiente a simples possibilidade de sua ocorrência Nessa hipótese a conduta do agente que nem por isso deixa de ser infiel somente poderá ser reprovada no plano ético ficando afastada a censura criminal por falta de adequação típica No entanto é insuficiente a ocorrência de prejuízo sendo indispensável que decorra de infringência de dever profissional 43 Somente em relação à causa judicial independentemente de sua natureza É indispensável que as condutas incriminadas refiramse a causa judicial independentemente de sua natureza civil criminal trabalhista etc e mesmo que sejam praticadas fora do processo desde que à causa judicial se refira como por exemplo fazendo acordo transigindo negociando etc em prejuízo de seu cliente A atuação extrajudicial com efeito não vinculada a causa judicial não basta para a configuração do presente delito uma vez que a elementar típica como já destacamos exige que a infidelidade esteja vinculada a patrocínio confiado em juízo O abandono pelo advogado de processo criminal no entanto não caracteriza o crime do art 355 do CP sujeitandoo tão somente à multa prevista no art 265 do CPP além da responsabilidade ética perante seu órgão de classe OAB Vide a Lei n 890694 Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil e o art 133 da CF Mas haverá patrocínio infiel por exemplo na conduta de quem não recorre de decisão contrária quando deveria fazêlo não evita a decadência ou prescrição podendo fazêlo em benefício do constituinte perde o prazo recursal por negligência ou incompetência profissional etc 44 Consequência do consentimento do interessado Por fim o consentimento do interessado em tese exclui não apenas a antijuridicidade do fato mas também a própria tipicidade quando se tratar evidentemente de interesse disponível É desnecessária a existência de mandato formal sendo suficiente que o profissional habilitado postule em juízo em nome do cliente presumindose que patrocínio lhe tenha sido confiado pelo cliente e aceito por este É igualmente irrelevante que o patrocínio seja remunerado ou gratuito contratado pela parte ou nomeado pelo juiz ou mesmo que se trate de defensor público 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de agir de forma infiel no patrocínio da causa judicial ou de patrocinar defesas antagônicas no mesmo processo judicial Todos os elementos constitutivos do tipo devem necessariamente ser abrangidos pelo dolo do sujeito ativo inclusive com a consciência de causar prejuízo ao cliente A proveniência de dano decorrente de culpa do profissional por negligência imperícia ou imprudência desde que não constitua erro ou omissão grosseiros não tipifica o crime ante a ausência de previsão de modalidade culposa Não afasta contudo a possibilidade de caracterizar infração éticodisciplinar 6 Consumação e tentativa Consumase o crime de patrocínio infiel com o prejuízo oriundo da traição mesmo que não seja definitivo É necessária uma relação de causa e efeito entre a conduta do sujeito ativo e o prejuízo causado ao cliente sujeito passivo da infração penal o crime de patrocínio simultâneo ou tergiversação por sua vez consumase com a realização de ato processual destinado a beneficiar a parte contrária A tentativa é admissível na modalidade comissiva do patrocínio infiel e no patrocínio simultâneo mas é praticamente incabível na tergiversação 7 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de detenção de seis meses a três anos e multa Admitese a suspensão do processo em razão de a pena mínima abstratamente cominada não ser superior a um ano art 89 da Lei n 909995 A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Comete o crime de patrocínio infiel o agente que requer a desistência e arquivamento de ação julgada procedente prejudicando interesse de seu constituinte TJRS Apelação 70021834205 Rel Gaspar Marques Batista j 612 2007 Para a caracterização do delito previsto no art 355 1º do Código Penal fazse necessário o dolo de executar o patrocínio infiel inocorrendo crime se não houver provas da intenção deliberada do procurador em prejudicar o interesse do cliente TJRS HC 70019138502 Rel Gaspar Marques Batista j 352007 Patrocínio infiel descaracterização Na espécie não há justa causa para a ação penal fundada que está no parágrafo único do art 355 do Código Penal A tempo e a hora os advogados a par de não terem praticado atos de ordem processual renunciaram aos poderes a eles conferidos por procuração tendoo feito um dia após a outorga do mandato e um dia antes da data do fato supostamente delituoso STJ HC 60266RS Rel Min Nilson Naves j 1782006 Para a caracterização do delito previsto no art 355 do Código Penal fazse necessária a traição do dever profissional De outro lado o prejuízo causado deve ser efetivo não bastando simples potencialidade de dano TJRS Apelação 70012890315 Rel Gaspar Marques Batista j 20102005 Sonegação de papel ou objeto de valor probatório Art 356 Inutilizar total ou parcialmente ou deixar de restituir autos documento ou objeto de valor probatório que recebeu na qualidade de advogado ou procurador Pena detenção de 6 seis meses a 3 três anos e multa D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias O nosso primeiro Código Penal republicano de 1890 já se preocupava em criminalizar advogado ou procurador que extraviasse ou subtraísse documentos que lhe fossem confiados e não devidamente restituídos A Consolidação das Leis Penais criminalizava a conduta de advogado ou procurador judicial que subtraísse ou extraviasse dolosamente documentos de qualquer espécie que lhe tivessem sido confiados e deixasse de restituir autos que houvesse recebido com vista ou em confiança art 209 n 4º O Projeto Alcântara Machado por sua vez previa que danificar ou não restituir autos documentos ou objetos de valor probatório que lhe tenham vindo ao poder em razão do ofício art 186 III O atual Código Penal cuja parte especial remonta aos idos de 1940 seguiu em linhas gerais a previsão legal anterior como veremos a seguir 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido continua sendo a Administração da Justiça e especialmente segundo Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 434 a sua atuação normal e regular que não pode coexistir com a ação molesta e nociva do advogado que incide sobre elementos probatórios Esse objeto jurídico encontrase reforçado a partir da vigência da atual Constituição Federal 1988 que passou a considerar o advogado indispensável à administração da justiça art 133 Incriminase outra modalidade de infração ao dever profissional de advogado ou procurador judicial 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo é a exemplo do artigo anterior o advogado ou procurador judicial que nessa condição recebe o objeto material da infração penal autos documento ou objeto de valor probatório tratandose por conseguinte de crime próprio Sujeitos passivos são o Estado e a pessoa eventualmente prejudicada pela inutilização ou sonegação do objeto material descrito no tipo penal 4 Tipo objetivo adequação típica As condutas tipificadas alternativamente são inutilizar e deixar de restituir autos documento ou objeto de valor probatório a inutilizar total ou parcialmente é tornar inútil ou imprestável o objeto material ao fim a que se destina A inutilização pode ser segundo o texto legal total completa abrangente ou parcial basta que parcela do todo seja inutilizada para satisfazer a vontade do legislador pois será suficiente para neutralizar ou dificultar a finalidade do objeto material ainda que seja parcialmente inutilizado Inutilizar ademais total ou parcialmente equivale a equiparar a consumação da ação com sua tentativa pelo menos aquela conhecida como tentativa perfeita b deixar de restituir por sua vez é não devolver sonegar ou reter os mesmos objetos na hipótese do presente artigo recebidos na condição ou qualidade de advogado ou procurador Subtração inutilização ou mesmo sonegação de documentos são figuras usadas diversas vezes pelo legislador brasileiro na Parte Especial do Código Os dois verbos nucleares deste dispositivo inutilizar e deixar de restituir indicam mais uma vez o mau uso de tais objetos apenas no caso em exame realizado pelos profissionais mencionados lesando interesse da Administração da Justiça 41 Objeto material autos documento ou objeto de valor probatório O objeto material é representado pelos autos documento ou objeto de valor probatório que devem ser entregues ao advogado ou procurador exatamente em razão dessa qualidade Segundo a doutrina por autos se diz conjunto de peças petições instrumentos de mandato articulados termos elementos instrutivos arrazoados sentença etc que integram um processo seja cível seja penal Documento é o papel escrito especial ou eventualmente destinado à prova de fato juridicamente relevante Objeto de valor probatório é todo aquele que serve ou se pretende que possa servir de elemento de convicção acerca dos fatos em que qualquer das partes no processo funda sua pretensão No entanto em se tratando de autos processuais retirados em carga por advogado art 7º XVI da Lei n 890694 devidamente habilitado devem ser observadas as disposições do Estatuto da OAB Devese preliminarmente notificar validamente o profissional para que devolva referidos autos no prazo fixado Não sendo observada ou atendida essa notificação a partir daí estará configurada a infração penal Aliás nesse sentido Heleno Cláudio Fragoso Lições de Direito Penal v 1 p 556 há mais de trinta anos já destacava que os tribunais têm entendido que no caso de não devolução de autos de processo por advogados é indispensável a intimação prévia pelo juiz para que se configure a falta de restituição Antes dessa providência a não devolução dos autos constitui a infração disciplinar prevista no art 34 XXII do diploma legal referido cuja competência para conhecêla e julgála é da entidade de classe 42 Extravio sonegação ou inutilização de livro ou documento art 314 Distinguese do delito previsto no art 314 do CP extravio sonegação ou inutilização de livro ou documento porque neste o agente é funcionário público que tem guarda do objeto material livro oficial ou documento em razão do cargo Nesta figura do art 356 no entanto o sujeito ativo é advogado ou procurador que age nessa condição e com essa qualidade observadas as demais essentialia deliti e ainda nesta infração do art 356 o objeto material do crime tem uma finalidade especial que no art 314 não há qual seja a finalidade probatória a exemplo da exigência do art 255 do Código Penal argentino Esse dispositivo do Código Penal argentino é sempre citado pela doutrina nacional como similar ao art 314 do nosso Código Penal no entanto referido dispositivo também guarda muita semelhança com o disposto no art 356 especialmente se observarmos a finalidade probatória exigida pelo Código Penal argentino bem como os possíveis sujeitos ativos dessa infração penal destoando da previsão do art 314 do diploma legal pátrio 43 Supressão de documento art 305 A sonegação de papel ou objeto de valor probatório art 356 diferenciase também da sonegação de papel ou objeto de valor probatório do crime do art 305 do CP supressão de documento porque neste o objeto material é o documento público ou particular destinado à prova de uma relação jurídica atuando o sujeito ativo em benefício próprio ou de outrem ou em prejuízo alheio Há enfim uma relação de especialidade entre os crimes descritos nos arts 356 305 e 314 todos do CP se a inutilização ou não restituição for de autos documento ou objeto de valor probatório realizada por advogado que recebe nessa condição a infração será a do art 356 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de inutilizar total ou parcialmente ou deixar de restituir autos documento ou objeto de valor probatório praticar qualquer das condutas descritas no tipo penal Tratandose de um tipo especial cuja consumação tem um marco antecipado 24 horas após a intimação para devolver os autos a cartório no caso de advogado ou procurador art 196 do CPC caracterizase o dolo quando esgotado o prazo judicialmente concedido via mandado de intimação deixa o sujeito ativo deliberadamente de devolver o processo ou documento no prazo determinado São irrelevantes os eventuais motivos que levam à prática do crime não sendo exigido qualquer elemento subjetivo especial do tipo penal Não há tampouco previsão de modalidade culposa Eventual culpa se ocorrer poderá no máximo configurar a falta administrativa inserta no art 34 XXII da Lei n 890694 EOAB 6 Consumação e tentativa Consumase o delito com a efetiva inutilização do objeto material e consequente perda de seu valor probatório ou na modalidade de sonegação com a recusa do agente em restituir os autos na forma da legislação processual vigente ou com a não devolução do documento ou objeto de valor probatório após o decurso de período juridicamente relevante no caso em 24 horas consoante determinação do Código de Processo Civil art 196 Aliás nesse sentido já se manifestaram nossos dois Tribunais Superiores nos termos seguintes Em tese a infração do art 356 do CP de 1940 considerase configurada na modalidade de retenção dos autos a partir do decurso do prazo de 24 horas após a intimação do retentor consoante dispõe o art 196 do CPC STF RT 60540910 O delito previsto no art 356 do CP somente se consuma pelo não atendimento da intimação do juiz para restituir os autos STJ RT 616402 Apenas a inutilização admite a ocorrência de tentativa A não restituição constitui conduta omissiva própria e como tal não se pode afirmar a priori a possibilidade de configurarse a figura tentada 7 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de detenção de seis meses a três anos e multa Admitese a suspensão condicional do processo em razão da pena mínima abstratamente cominada não superior a um ano vide art 89 da Lei n 909995 Lei dos Juizados Especiais A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Sonegação de papel ou objeto de valor probatório Em que pese a justificativa do acusado consubstanciada na alteração de local de escritório profissional a retenção de autos de inventário por quase quatro anos configura a típica conduta descrita no art 356 do Código Penal mormente se o advogado restou inerte às provocações judiciais durante todo período Dolo caracterizado Condenação TJRS Apelação 70021336680 Rel José Eugênio Tedesco j 19122007 Sonegação de papel ou objeto de valor probatório Pratica o crime contemplado no art 356 do CP o advogado que deixa de restituir documento sendo necessária expedição de mandado de busca e apreensão para tanto TJRS Apelação 70017464728 Rel Gaspar Marques Batista j 23112006 Não se vislumbra nenhuma ofensa ao princípio da especialidade a corroborar a tese de desclassificação do crime previsto no art 337 para o estatuído no art 356 ambos do Código Penal na medida em que o simples fato de o agente do delito ser advogado não tem o condão de afastar a incidência do disposto no art 337 do Código Penal Além disso o art 356 do Código Penal pressupõe que o agente receba os autos na qualidade de advogado o que não ocorreu no caso STJ HC 34863PR Rel Min Laurita Vaz j 1952005 Exploração de prestígio Art 357 Solicitar ou receber dinheiro ou qualquer outra utilidade a pretexto de influir em juiz jurado órgão do Ministério Público funcionário de justiça perito tradutor intérprete ou testemunha Pena reclusão de 1 um a 5 cinco anos e multa Parágrafo único As penas aumentamse de um terço se o agente alega ou insinua que o dinheiro ou utilidade também se destina a qualquer das pessoas referidas neste artigo D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias Nosso Código Penal de 1940 disciplinou a exploração de prestígio em duas oportunidades na primeira entre os crimes contra a administração pública em geral quando é praticado contra qualquer funcionário público art 332 na outra entre os crimes contra a Administração da Justiça quando se relacionar a funcionários a ela vinculados art 357 O legislador brasileiro seguiu a legislação italiana como destaca Nilo Batista Parecer sobre a equivocada capitulação de exploração de prestígio inédito afirmando decidiu o legislador italiano criar entre os delitos contra a Administração Pública que ocupam o título II da Parte Especial de seu código mais precisamente entre os crimes dos particulares contra a Administração Pública que constitui o capítulo II desse título II uma figura geral do crime que na rubrica batizou de Millantato credito que caberia traduzir por prestígio ostentado Ao mesmo tempo decidiu também criar entre os delitos contra a Administração da Justiça que ocupam o título III da Parte Especial de seu código uma figura especial voltada para o ambiente judiciário Daí provieram os artigos 346 e 382 do Código Rocco 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a Administração Pública como em todos os demais crimes que integram o Título XI do Código Penal mas neste dispositivo tutelase diretamente a Administração da Justiça no particular aspecto de prestígio confiança e respeito perante a coletividade que é exposta ao descrédito pela ação fraudadora do sujeito ativo Gabandose de gozar de prestígio vangloriandose de desfrutar de influência perante a Administração da Justiça juiz órgão do Ministério Público jurado perito etc lesa o bom nome o conceito e o prestígio que esta deve ter junto à comunidade difundindo a ideia de que tudo se resolve segundo a importância de quem desfruta de influência perante o poder O bem jurídico tutelado é o interesse da administração da justiça prejudicada em sua dignidade e prestígio pela corrupção de seus servidores inculcada pelo delinquente seja invocando ascendência criminosa junto a eles seja proclamando sua venalidade 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa inclusive funcionário público desde que não esteja no exercício de suas funções normais não o configurando por exemplo a influência exercida por superior hierárquico afora o fato de que sua influência sobre o subalterno não é pretextada é real ela existe No polo ativo contudo não pode deixar de ser considerada a participação decisiva de uma terceira pessoa qual seja a beneficiária da venda do prestígio que é parte diretamente interessada no resultado da ação e no mínimo concorre de qualquer modo para a sua prática art 29 do CP a exemplo do que sustentamos quando examinamos o art 332 tráfico de influência Sujeito passivo é o Estado mais especificamente a Administração da Justiça O próprio funcionário público iludido ou ludibriado que arcará no mínimo com o dano moral decorrente de sua infidelidade funcional também é secundariamente sujeito passivo dessa infração penal 4 Tipo objetivo adequação típica As condutas típicas alternativamente incriminadas são representadas pelos verbos nucleares solicitar pedir rogar procurar ou receber aceitar em pagamento obter conseguir dinheiro ou qualquer outra utilidade de cunho moral ou material a pretexto de influir em juiz jurado órgão do Ministério Público funcionário da justiça perito tradutor intérprete ou testemunha enumeração taxativa Solicitar indica a iniciativa do agente este propõe a traficância sendo desnecessária a sua aceitação por parte do beneficiário ou presumível comprador receber é um estágio mais avançado do processo já pressupondo acordo de vontade entre comprador e vendedor do prestígio pois há um pagamento Tratase na realidade de uma fraude de um engodo aqui a exemplo do que ocorre com a previsão do art 332 a lei incrimina a gabolice a jactância de influir nas pessoas que servem à justiça juiz jurado Ministério Público etc quando tal prestígio não existe Age o vendedor de ilusões como corretor de pseudocorrupção fraudando de um lado o adquirentebeneficiário pelo menos teoricamente que nada recebe em troca do pagamento e de outro deprecia a Administração da Justiça que é exposta ao descrédito e ainda desmoraliza o suposto funcionário venal 41 Tráfico de influência e exploração de prestígio Ao contrário do que ocorre com o crime de tráfico de influência art 332 o tipo penal de exploração de prestígio art 357 não criminaliza a conduta de obter para si ou para outrem vantagem ou promessa de vantagem mas tão somente solicitar ou receber dinheiro ou qualquer outra utilidade embora com finalidade semelhante qual seja a pretexto de influir lá em ato de funcionário público qualquer funcionário enquanto aqui especialização em juiz jurado órgão do Ministério Público funcionário da justiça etc e é exatamente essa finalidade distinta que assegura igualmente a diferença de bem jurídico naquele é a Administração Pública lato sensu e neste a Administração da Justiça Ademais o nomen juris tráfico de influência é sem dúvida mais abrangente que exploração de prestígio pois o prestígio consiste na superioridade pessoal baseada no bom êxito ou no valor individual apregoado pelo falsário Nesse caso fazse necessário com efeito que o agente exerça pretensamente sua influência sobre juiz jurado ou funcionário da justiça e não apenas sobre o animus destes como sugere a redação do texto legal A exploração de prestígio como também o tráfico de influência art 332 que são para usar uma linguagem figurada irmãos siameses em qualquer de suas modalidades absorve o crime de estelionato 42 Modalidade sui generis de estelionato O crime deste art 357 exploração de prestígio não deixa de ser ao menos em tese uma modalidade sui generis de estelionato pois o sujeito ativo ilude e frauda o pretendente à influência perante as autoridades mencionadas no dispositivo legal alegando um prestígio que não possui e assegurandolhe um êxito que não está a seu alcance Na realidade estão presentes a fraude a vantagem pessoal e o correspondente prejuízo alheio Nesse sentido adverte Damásio de Jesus Direito Penal v 2 p 364 a solicitação ou o recebimento de dinheiro ou qualquer outra utilidade deve ter por fundamento a desculpa fantasiosa de que o sujeito vai influenciar as pessoas mencionadas na figura típica Tratase na verdade de uma fraude de uma mentira Se efetivamente a utilidade ou o dinheiro se destina às pessoas enumeradas há crime de corrupção ativa ou passiva CP arts 317 e 333 Com efeito há um ato fraudulento sendo que a pretexto de influir nas autoridades que o texto legal menciona vem a ser o artifício utilizado para a obtenção do dinheiro ou qualquer outra utilidade É no entanto imprescindível que o agente arroguese prestígio junto a tais funcionários pois caso contrário o fato não ofende a Administração da Justiça e poderá constituir apenas estelionato ou dependendo das circunstâncias outro crime Nesse sentido era também a conclusão de Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 437 na verdade o delito é fraude ou estelionato porque o comprador é iludido entretanto justificadamente a lei deu prevalência aos interesses da justiça relegando a plano secundário os daquele cujo comportamento pouco recomenda 43 Dinheiro ou outra utilidade solicitados a pretexto de influir O dinheiro ou qualquer outra utilidade é solicitado ou recebido a pretexto de influir em juiz jurado etc Realmente o crime de exploração de prestígio pressupõe que o dinheiro ou utilidade de que se cogita seja postulado a pretexto de influir esse podese afirmar é o móvel do crime De um modo geral haverá como no estelionato o emprego de ardis ou artifícios embora seja suficiente a simples mentira a afirmação do sujeito ativo de que pode influir Na verdade o objeto material do crime é o dinheiro ou qualquer outra utilidade de cunho material ou moral isto é ainda que não patrimonial Assim punese a exploração de prestígio ou seja o comércio de influência poder ascendência ou predomínio que alguém exerce sobre autoridade ou mais precisamente no caso alardeia que exerce capaz de estenderse em cadeia É indiferente por outro lado que o objeto da mediação seja justo ou injusto legal ou ilegal A forma de sua obtenção o meio utilizado é fraudulento e nisso no pretexto de influir reside a sua essência caracterizadora da ilicitude comportamental Ademais a majorante parágrafo único com a locução se o agente alega ou insinua deixa claro que o fato não é do conhecimento do funcionário 44 Exploração de prestígio ou corrupção Na hipótese de existir ou ocorrer acordo entre o sujeito ativo e o funcionário da justiça juiz jurado órgão do Ministério Público etc verificase o crime de corrupção arts 333 e 317 do CP Na hipótese de o dinheiro ou utilidade destinarse de fato às pessoas referidas verificase corrupção passiva e ativa arts 333 e 317 do CP Ademais se eventualmente faltarem algumas das elementares do crime especial ora em exame pode subsistir o crime de estelionato No entanto se resultar ao final configurado o crime de corrupção este absorverá o exploração de prestígio Nessa hipótese dependendo das demais elementares o funcionário responderá por corrupção passiva 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de solicitar ou receber dinheiro ou qualquer outra utilidade pretextando ter influência perante servidor da justiça juiz jurado órgão do Ministério Público funcionário da justiça perito tradutor intérprete ou testemunha É indispensável a nosso juízo o elemento subjetivo especial do tipo representado pela finalidade especial de influir nos funcionários mencionados na descrição típica 6 Consumação e tentativa Consumase o delito com a solicitação ou recebimento na modalidade de solicitar o crime consumase no momento e no lugar em que é efetuado o pedido do dinheiro ou de qualquer outra utilidade pelo sujeito ativo independentemente de a vítima aceitar tal pedido na modalidade de receber como crime material consumase o crime somente com o efetivo recebimento do dinheiro ou qualquer outra utilidade mencionada no texto legal A tentativa depende do meio de execução selecionado pelo agente na modalidade de solicitar é impossível a tentativa ressalvada a hipótese de solicitação feita por escrito na de receber tratandose de crime plurissubsistente admitese o fracionamento em sua fase executória 7 Figura majorada Configurase causa de aumento nos termos do parágrafo único se o sujeito ativo alega ou insinua que o dinheiro ou utilidade também se destina a qualquer das pessoas referidas no caput A razão da incidência da majorante reside no maior desvalor da ação do agente que alega ou insinua ser corrupto um funcionário da justiça Qualquer das duas condutas também amplia o desvalor do resultado ante a grave consequência com a depreciação e o desprestígio de funcionários da justiça agravando a reprovabilidade social do injusto justificando se a considerável elevação da sanção penal É desnecessário que o interessado acredite na alegação ou insinuação feita pelo sujeito ativo 8 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de detenção de seis meses a três anos e multa Considerandose que a pena cominada em seu mínimo legal não é superior a um ano é admissível a suspensão condicional do processo art 89 da Lei n 909995 A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Exploração de prestígio majorada O delito do art 357 do Código Penal é de mera atividade ou simples conduta bastando que o agente solicite o dinheiro para que se consume TJRS Revisão Criminal 70005824248 Rel Antônio Carlos Netto de Mangabeira j 582005 Exploração de prestígio Evidenciada a inexistência de materialidade da conduta uma vez que a única prova do suposto fato constitui a palavra da vítima por ela mesma infirmada cabível o trancamento da ação penal por falta de justa causa STJ HC 30966SP Rel Min Paulo Medina j 2742004 O crime de exploração de prestígio exige à sua configuração apenas a obtenção de vantagem ou promessa desta junto a funcionário público no exercício da função Dispensável a identificação expressa do servidor STJ REsp 76211PE Rel Min Edson Vidigal j 3061999 Violência ou fraude em arrematação judicial Art 358 Impedir perturbar ou fraudar arrematação judicial afastar ou procurar afastar concorrente ou licitante por meio de violência grave ameaça fraude ou oferecimento de vantagem Pena detenção de 2 dois meses a 1 um ano ou multa além da pena correspondente à violência D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias As condutas incriminadas no art 358 assemelhamse àquelas contidas no art 335 ambos os artigos do Código Penal impedimento perturbação ou fraude de concorrência com a diferença de que neste se tutela o patrimônio da Administração Pública federal estadual ou municipal ao passo que naquele protegese o interesse da Administração da Justiça em arrematação judicial promovida pelo particular O art 335 no entanto foi parcialmente revogado pelos arts 93 e 95 da Lei n 866693 permanecendo em vigor somente a conduta relativa à hasta pública 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é mais uma vez a Administração da Justiça protegese mais especificamente a probidade da função judicial sua respeitabilidade Tutelase o interesse de que a justiça não seja desvirtuada por qualquer fator estranho ao seu desenvolvimento válido e regular assegurando a lisura de suas decisões especialmente em sua fase terminal executória como é a arrematação judicial Esta figura penal assemelhase àquela descrita no art 335 com a diferença de que nesse dispositivo tutelase o patrimônio da Administração Pública ao passo que no art 358 protegese a Administração da Justiça e o patrimônio do particular que se encontra sujeito à arrematação judicial 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo do crime de violência ou fraude em arrematação judicial pode ser qualquer pessoa tendo ou não interesse pessoal no processo ou na arrematação não sendo exigida qualidade ou condição especial pode ser qualquer pessoa seja ou não arrematante isto é qualquer terceiro interessado ou não no processo pode inclusive ser funcionário público e o próprio procurador da parte se efetivamente concorrer para a violência ou fraude No entanto não praticará o crime o advogado que não participar da fraude ou violência cometida pelo cliente e eventual simples conivência somente o exporá a medidas disciplinares Sujeito passivo é prioritariamente qualquer pessoa que seja prejudicada pela conduta violenta ou fraudulenta do sujeito ativo em relação à arrematação judicial secundariamente o Estado sempre titular do bem jurídico ofendido Administração Pública lato sensu mais especificamente na hipótese a Administração da Justiça 4 Tipo objetivo adequação típica As condutas descritas neste artigo são semelhantes às do crime previsto no art 335 do CP impedimento perturbação ou fraude de concorrência protegese aqui no entanto a arrematação judicial hasta pública determinada pelo juiz mas promovida por particular e não a concorrência ou venda em hasta pública que se refere ao patrimônio público O tipo penal dividese em duas partes distintas na primeira enumera as condutas e os meios que buscam inviabilizar arrematação judicial ou pelo menos perturbar a sua realização na segunda o objetivo é afastar os pretendentes à própria arrematação judicial 41 Impedimento da arrematação judicial As condutas descritas na primeira parte são a impedir obstar obstruir ou impossibilitar perturbar embaraçar confundir atrapalhar ou fraudar usar de artifício ardil ou qualquer meio enganoso idôneo para induzir ou manter alguém em erro arrematação judicial que é o objeto material visado tutelado Essas condutas ao contrário daquelas previstas no art 335 limitamse à arrematação judicial por isso o tipo penal está inserto no capítulo que trata dos crimes contra a Administração da Justiça 42 Afastamento do concorrente ou licitante As condutas criminalizadas na segunda parte do dispositivo objetivam por sua vez afastar os concorrentes à arrematação judicial mediante as condutas que enumera afastar ou procurar afastar concorrente ou licitante por meio de violência física grave ameaça prenúncio de causar mal sério fraude artifício ou ardil para induzir ou manter alguém em erro ou oferecimento de vantagem de natureza material ou moral Salientese que afastar o concorrente ou licitante arrematante não é apenas ocasionar o seu distanciamento ou ausência para não concorrer ou licitar mas também conseguir sua abstenção de formular proposta ou a retirada desta ou a desistência de fazer lanço embora presente no local onde se realiza a competição Em outros termos afastar aqui não significa deslocar o pretendente no espaço mas sim alijálo da arrematação judicial levandoo a absterse ou desistir de participar do pleito 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de praticar qualquer das condutas descritas no dispositivo em exame ou seja de impedir perturbar ou fraudar arrematação judicial ou de afastar ou procurar afastar concorrente ou licitante por meio de violência grave ameaça fraude ou oferecimento de vantagem Não se exige qualquer elemento subjetivo especial do tipo e não é prevista a modalidade culposa É admissível no entanto o dolo eventual 6 Consumação e tentativa Consumase o crime de violência ou fraude em arrematação judicial na primeira modalidade com o efetivo impedimento perturbação ou fraude Na segunda modalidade a consumação ocorre com o emprego do meio executório violência grave ameaça fraude ou oferecimento de vantagem mesmo não aceita tendente a afastar concorrente ou licitante A violência exigida pelo tipo penal é aquela dirigida ao arrematante ou seu familiar estando excluída por conseguinte a violência à coisa A tentativa é admissível a nosso juízo em qualquer de suas modalidades ao menos teoricamente 7 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de detenção de dois meses a um ano ou multa além da pena correspondente à violência quando constituir em si mesma crime Aplicase aqui a mesma crítica endereçada à punição cumulativa da elementar violência desenvolvida ao examinar o crime contido no art 352 evasão mediante violência contra a pessoa A ação penal é pública incondicionada Desobediência a decisão judicial sobre perda ou suspensão de direito Art 359 Exercer função atividade direito autoridade ou múnus de que foi suspenso ou privado por decisão judicial Pena detenção de 3 três meses a 2 dois anos ou multa D O U T R I N A 1 Considerações introdutórias No passado os diplomas legais italianos Código Zanardelli 1889 e Código Penal Rocco 1930 disciplinavam nos arts 234 e 389 respectivamente o crime previsto no art 359 do nosso Código Penal de 1940 A legislação brasileira pretérita Código Criminal do Império 1830 e Código Penal de 1890 não recepcionaram essa figura típica que tampouco constou da Consolidação das Leis Penais O Projeto Alcântara Machado no entanto apresentou o seguinte texto Exercer direito função cargo profissão ou atividade econômica de que tiver sido suspenso durante o tempo em que vigorar a suspensão ou de que tiver sido privado em consequência de decisão judicial 2 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido a exemplo dos dispositivos anteriores é a Administração da Justiça objetivando assegurar o efetivo cumprimento das decisões jurisdicionais particularmente aquelas proferidas na seara criminal Convém destacar no entanto que a tipificação constante do dispositivo em exame objetivava originariamente coibir a desobediência de decisão judicial que impunha as denominadas penas acessórias as quais foram excluídas pela Reforma Penal de 1984 Lei n 720984 3 Sujeitos do crime Sujeito ativo somente pode ser aquele que foi suspenso ou privado por decisão judicial de exercer função atividade direito autoridade ou múnus público ou privado ressalvada evidentemente a hipótese da participação que é alcançada mediante a ampliação da adequação típica na forma do concurso eventual de pessoas Sujeito passivo é o Estado sempre titular do bem jurídico ofendido Administração Pública lato sensu mais especificamente na hipótese a Administração da Justiça O Estado na concepção clássica é sempre sujeito passivo de qualquer crime como temos reiteradamente insistido 4 Objeto da proteção legal penas acessórias ou efeitos da condenação A velha doutrina clássica professava que o art 359 com a redação que é mantida até hoje incriminava o descumprimento das penas acessórias que nosso Código Penal de 1940 em sua versão original consagrava em sua Parte Geral art 67 I e II Era exatamente esse o magistério de Nélson Hungria Comentários ao Código Penal v 7 p 531 o qual pedimos vênia para transcrever na íntegra Vêse para logo que se trata de assegurar penalmente o cumprimento das penas acessórias previstas no art 67 incs I e II quer quando aplicadas definitivamente art 70 quer quando provisoriamente art 71 Sôbre sic quais sejam a função a atividade genus de que são species a profissão o ofício e o ministério o direito a autoridade ou múnus a que se refere o dispositivo em exame consultemse os artigos 67 I e 69 incs I a V Conforme expressamente declara o texto legal é preciso que a privação ou suspensão de que se cuida decorra de decisão judicial Não era outro o magistério de Magalhães Noronha Direito Penal v 2 p 439 que sentenciava Cogitase aqui especificamente da observância de decisão judicial referente a pena acessória como ocorre no Código da Itália dizendo MANZINI que se tem em vista que os particulares se sujeitem às limitações da capacidade jurídica que são inerentes às penas acessórias de interdição de função pública e da interdição ou suspensão do exercício de uma profissão ou de uma arte ou que são próprias da suspensão provisória do exercício de funções públicas ou de uma profissão ou arte Na mesma linha de seus contemporâneos Paulo José da Costa Jr Comentários ao Código Penal p 613 também reconhece que a finalidade do dispositivo era assegurar o cumprimento das penas acessórias sustentando no entanto que como tais penas não foram acolhidas pela Reforma Penal de 1984 poderia ter aplicação para garantir o cumprimento dos efeitos extrapenais art 92 da condenação com os seguintes argumentos O legislador de 84 não formulou nesse caso nenhum tipo especial de sanção punitiva para o exercício de função atividade ou direito de que o agente ficou permanentemente privado como consequência da condenação que lhe foi imposta Nessa hipótese não há dúvida de que a conduta do condenado se ajusta perfeitamente ao modelo do art 359 que sob este prisma não foi derrogado pela Lei 720984 Postas essas considerações é inevitável a seguinte interrogação afinal o art 359 continua em vigor ou foi tacitamente revogado pela Reforma Penal de 1984 que não recepcionou as penas acessórias 41 Dispositivo revogado pela Reforma Penal Lei n 720984 Ora acabamos de constatar que a Reforma Penal de 1984 excluiu do cenário jurídico nacional as então denominadas penas acessórias comprovamos igualmente que era unânime o entendimento da doutrina clássica de que ditas penas constituíam o objeto da proteção da norma proibitiva insculpida no referido art 359 é natural portanto que a perda de seu objeto material suprimido por diploma legal posterior Lei n 720984 produza sua revogação tácita Nessa linha argumentativa temos dificuldade em aceitar que via interpretação se possa determinar a substituição do objeto material da tutela penal especialmente se tivermos em conta que as penas acessórias não se confundem com as modernas penas restritivas de direito ou mesmo com os efeitos extrapenais que são reflexos mediatos e não automáticos da condenação penal Vejamos sucintamente cada uma dessas duas hipóteses 42 Inaplicabilidade nas penas restritivas de direitos O descumprimento das penas restritivas de direito previstas no art 47 do CP não configura o delito em tese visto que a rebeldia injustificada acarreta a conversão da interdição temporária de direitos em pena privativa de liberdade ou seja essa desobediência à decisão judicial tem expressamente prevista a sua própria consequência direta e imediata Nesse sentido a previsão legal é de uma clareza meridiana A pena restritiva de direitos convertese em privativa de liberdade quando ocorrer o descumprimento injustificado da restrição imposta art 44 4º 1ª parte com redação determinada pela Lei n 9714 de 25111998 Admitir portanto o descumprimento de pena criminal consequência direta e imediata de condenação penal como configurador de conduta descrita no art 359 do CP significa admitir a possibilidade de dupla punição para uma mesma infringência legal Assim o disposto neste artigo é afastado pelo princípio da especialidade em prol da conversão prevista no art 44 4º ora mencionado que ademais é consequência muito mais grave do que a submissão ao aqui prescrito que pode ser resolvido via transação penal 43 Discutível aplicabilidade nos efeitos específicos da condenação penal A situação segundo entendimento majoritário da doutrina atual é completamente distinta quando se está diante do descumprimento dos efeitos extrapenais contidos no art 92 do CP para os quais não há cominação específica de sanção penal ou administrativa que ademais são secundários e reflexos da decisão condenatória Nesses casos a conduta de condenado que venha a exercer sem autorização qualquer dos direitos referidos no art 92 do Código Penal dos quais foi suspenso ou privado amoldase à descrição contida no art 359 Regis Prado Curso de Direito Penal brasileiro p 801 Costa Jr Comentários ao Código Penal p 613 Essa interpretação não nos parece a mais sustentável na medida em que viola os princípios da reserva legal e da tipicidade estrita Os efeitos específicos ou extrapenais da condenação art 92 do CP não se confundem com as penas de interdição temporária de direitos subespécies das restritivas de direitos art 47 A diferença substancial consiste em que estas são sanções penais consequências diretas do crime e substituem a pena privativa de liberdade pelo mesmo tempo de sua duração art 55 aqueles são consequências reflexas de natureza extrapenal e são permanentes Esses efeitos da condenação dependentes de motivação na sentença em síntese são os seguintes 431 Efeitos extrapenais da condenação a Perda de cargo função pública ou mandato eletivo Essa previsão não se destina exclusivamente aos chamados crimes funcionais arts 312 a 347 do CP mas a qualquer crime que um funcionário público cometer com violação de deveres que a sua condição de funcionário impõe cuja pena de prisão aplicada seja igual ou superior a um ano ou então a qualquer crime praticado por funcionário público cuja pena aplicada seja superior a quatro anos de prisão A perda de mandato eletivo também poderá constituir efeito específico da condenação e não se confunde com a proibição do exercício de mandato que constitui pena restritiva de direitos art 47 I Reabilitado o condenado poderá vir a exercer novo mandato porém não aquele que perdeu A reabilitação no entanto não permite a reintegração na situação anterior Poderá na verdade habilitarse novamente a exercer atividade pública mas outra não a anterior da qual foi eliminado definitivamente b Incapacidade para o exercício de pátrio poder tutela ou curatela Qualquer crime doloso praticado contra filho tutelado ou curatelado sujeito à reclusão poderá acarretar a incapacidade uma vez que a lei não a condiciona ao abuso do exercício ou à incompatibilidade do condenado com o exercício desse munus Basta que o crime doloso praticado tenha cominada pena de reclusão ainda que afinal a pena aplicada venha a ser de outra natureza Na verdade o Código Penal presume iuris et iure manifesta incompatibilidade quando o agente é condenado por crime doloso ao qual seja cominada pena de reclusão Exige os seguintes requisitos a prática de crime doloso sujeito à reclusão contra filho tutelado ou curatelado e b incapacidade devidamente motivada na sentença A incapacidade ora examinada não exige como requisito o abuso do pátrio poder tutela ou curatela presumindo simplesmente a incompatibilidade para o seu exercício No entanto a exigência da prática de crimes dolosos puníveis com reclusão torna a referida incapacidade inaplicável aos crimes contra a assistência familiar arts 244 a 247 puníveis com detenção com exceção dos previstos no art 245 1º e 2º do CP c Inabilitação para dirigir veículo utilizado em crime doloso A inabilitação para dirigir veículos não se confunde com a proibição temporária pena restritiva aplicável aos autores de crimes culposos no trânsito art 47 III do CP Nos crimes culposos o veículo é usado como meio para fins lícitos deslocarse de um lugar para outro sobrevindo o crime não desejado Nos crimes dolosos ao contrário é usado para fins ilícitos isto é como meio para realizar o crime justificandose a sua inabilitação como efeito que é permanente Os efeitos específicos da condenação finalmente objetivam afastar o condenado da situação criminógena impedindo que se oportunizem as condições que provavelmente poderiam leválo à reincidência reforça a proteção dos bens jurídicos violados e previne a reiteração da conduta delituosa No entanto como já destacamos não se confundem com penas principais ou acessórias e como reconhecia a velha doutrina o Código Penal não cominou qualquer sanção para seu eventual descumprimento 5 Tipo objetivo adequação típica A conduta tipificada é exercer que significa desempenhar executar praticar qualquer das atividades contidas no tipo penal Exercer tem o significado tradicional de habitualidade No entanto a habitualidade é na hipótese do dispositivo em exame afastada pelo fato de que a prática de um único ato já caracteriza a violação da proibição imposta É pressuposto do crime que o agente exerça função atividade direito autoridade ou múnus de que já foi suspenso ou privado por decisão judicial transitada em julgado entendida esta como exclusivamente a de natureza penal isto é o sujeito ativo volta a desempenhar função atividade direito autoridade ou múnus de que estava suspenso ou privado tais como segundo a doutrina majoritária as hipóteses expressamente elencadas no art 92 do CP Evidentemente que a decisão judicial referida no tipo penal em exame é somente a sentença de natureza criminal e não a civil que tem outros efeitos outra natureza e seu descumprimento produz outras consequências reparáveis no mesmo âmbito do direito privado Deixamos registrados esses comentários apenas a título informativo pois repetindo na nossa concepção o art 359 foi tacitamente revogado pela Reforma Penal de 1984 6 Tipo subjetivo adequação típica O tipo subjetivo é constituído pelo dolo que é representado pela vontade consciente de desobedecer ordem judicial Desnecessário enfatizar que o sujeito ativo deve ter pleno conhecimento de todos os elementos constitutivos do tipo especialmente da existência de decisão judicial a que com sua conduta contraria Não é necessário que o sujeito ativo seja movido pela finalidade específica de descumprir a decisão judicial isto é dispensa a presença do especial fim de agir que configuraria elemento subjetivo especial do tipo penal 7 Consumação e tentativa Consumase o crime no lugar e no momento em que o sujeito ativo desobedecer a proibição imposta com o exercício de função atividade direito autoridade ou múnus de que foi suspenso por decisão judicial isto é praticando qualquer ação que constitua efetivo exercício da atividade a que está obrigado a absterse A tentativa é teoricamente admissível 8 Pena e ação penal As penas cominadas cumulativamente são de detenção de três meses a dois anos ou multa É perfeitamente possível e até recomendável a transação penal considerandose que se trata de infração penal de menor potencial ofensivo com pena não superior a dois anos A ação penal é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Desobediência a decisão judicial sobre suspensão de direito Lesões corporais Comete os delitos previstos no art 359 e art 129 do CP o agente que desobedece a ordem judicial de afastamento do lar conjugal e ofende a integridade corporal da ex esposa Condenação mantida TJRS Apelação 70022223234 Rel Constantino Lisbôa de Azevedo j 2412008 Incêndio Autoria e materialidade Prova suficiente Desobediência a ordem judicial Absorção Dano Desclassificação Descabimento Constatada a existência de potencialidade lesiva para a vida a integridade ou ao patrimônio de outrem a condenação pelo delito de incêndio é medida imperativa Por via de consequência improspera o pleito de desclassificação para o delito de dano Fica absorvido pelo incêndio o crime de desobediência a ordem judicial pois no caso imprescindível para a consumação daquele TJRS Apelação 70021108972 Rel José Eugênio Tedesco j 8112007 Capítulo IV Dos Crimes contra as Finanças Públicas Capítulo IV acrescentado pela Lei n 10028 de 19 de outubro de 2000 D O U T R I N A 1 Pressuposto dos crimes contra as finanças O art 37 da CF estabelece que a administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União dos Estados do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade impessoalidade publicidade e eficiência Enfim a improbidade administrativa disciplinada pela Lei n 842992 ampliada e reforçada pela LC n 101 responsabilidade fiscal constitui pressuposto dos crimes contra as finanças públicas 2 Fundamentos constitucionais Além do citado art 37 da CF os seguintes art 165 dispõe que leis estabelecerão o plano plurianual as diretrizes orçamentárias e o orçamento anual art 167 que fixa as vedações e proibições referentes à gestão pública das receitas e despesas a LC n 101 de 4 de maio de 2000 complementa o arcabouço constitucional disciplinando a responsabilidade fiscal 3 Criminalização de infrações administrativas Harmonizando e complementando o sistema jurídico a Lei n 100282000 acrescentou ao Código Penal um novo capítulo ao último Título da Parte Especial com os arts 359A a 359H criando novos tipos penais objetivando proteger a Administração Pública particularmente em relação às suas finanças ver Damásio de Jesus Código Penal anotado 11 ed São Paulo Saraiva 2001 4 Bem jurídico e injusto penal O bem jurídico constitui a base da estrutura e interpretação dos tipos penais no entanto não pode identificarse simplesmente com a ratio legis mas deve possuir um sentido social próprio anterior à norma penal e em si mesmo decidido caso contrário não seria capaz de servir a sua função sistemática de parâmetro e limite do preceito penal e de contrapartida das causas de justificação na hipótese de conflito de valorações A proteção de bem jurídico como fundamento de um Direito Penal liberal oferece um critério material extremamente importante e seguro na construção dos tipos penais porque assim será possível distinguir o crime das simples atitudes interiores de um lado e de outro lado dos fatos materiais não lesivos de bem algum No atual estágio da teoria do delito devese partir do ponto de vista de que no tipo somente se admitem aqueles elementos que fundamentam o conteúdo material do injusto O tipo tem a finalidade precípua de identificar o bem jurídico protegido pelo legislador Se uma concepção liberal concede ao Direito Penal uma função protetora de bens e interesses uma concepção social em sentido amplo pode por sua vez adotar uma concepção predominantemente imperialista e portanto reguladora de vontades e atitudes internas como ocorreu por exemplo com o nacionalsocialismo alemão A primeira concepção destaca a importância do bem jurídico a segunda apoiase na infração de dever na desobediência na rebeldia da vontade individual contra a vontade coletiva Agora se um Estado Social pretende ser também um Estado de Direito terá de outorgar proteção penal à ordem de valores constitucionalmente assegurados rechaçando os postulados funcionalistas protetores de determinado status quo 5 Responsabilidade fiscal e improbidade administrativa crimes A partir da Lei de Improbidade Administrativa Lei n 842992 com a edição da Lei de Responsabilidade Fiscal LC n 1012000 e complementada pela Lei n 100282000 que criou novos tipos penais crimes contra as finanças públicas tornamse efetivos os princípios constitucionais da Administração Pública art 37 da CF Princípios constitucionais disciplinados em lei ordinária e lei complementar acabam sendo tipificados como crimes ver Rui Stoco Improbidade administrativa e os crimes de responsabilidade fiscal Bol IBCCrim n 99 fev 2001 p 25 6 Sanções decorrentes de improbidade administrativa A legislação específica prevê sanções de natureza política suspensão de direitos políticos art 37 4º da CF e art 12 I da Lei n 842992 administrativa perda de cargo e função pública proibição de contratar com poder público etc art 12 I da Lei n 842992 civil ressarcimento de dano e multa civil art 12 I da Lei n 842992 pecuniária multa aplicável por Tribunal de Contas a chefes de Poderes e ocupantes de cargos de direção art 5º da Lei n 100282000 e penal prisão multa e penas restritivas de direitos Lei n 100282000 que criou o último capítulo do CP e deu nova redação à Lei n 107950 e ao Declei n 20167 Por tudo isso eventual sentença penal condenatória por crimes da Lei n 100282000 embora constitua título executivo no cível art 63 do CPP não abrange as demais sanções aqui referidas 7 Cumulação de sanções e bis in idem inconstitucionalidade Todas as sanções supramencionadas penal civil administrativa e política em tese podem ser aplicadas cumulativamente pela prática do mesmo fato na medida em que são independentes e não se excluem ver Rui Stoco Improbidade administrativa e os crimes de responsabilidade fiscal Boletim cit p 25 A princípio essa soma de penas pelo mesmo fato revestese da pecha de inconstitucional 8 Abrangência do disposto no art 63 do CPP A previsão do art 63 do CPP não autoriza a imposição da perda de cargo público suspensão do seu exercício perda dos direitos políticos imposição de pena pecuniária etc Apenas segundo referido artigo a condenação tornará certa a obrigação de indenizar os danos produzidos pelo crime Demais sanções dependerão de ação própria no juízo cível 9 Penas alternativas na Lei n 100282000 Sempre que estiverem satisfeitos os requisitos exigidos pelo art 44 do CP devem ser aplicadas as penas restritivas de direitos previstas no CP Lei n 971498 em caráter substitutivo independentemente da previsão da Lei de Improbidade Administrativa 10 Pena de multa Pelas mesmas razões quando a pena aplicada não for superior a um ano será possível substituíla por pena de multa somente art 44 2º do CP desde que os requisitos objetivos e subjetivos se façam presentes 11 Efeitos da condenação art 92 I a do CP Somente quando o crime for praticado com abuso de poder ou com violação de dever para com a Administração Pública o agente poderá perder cargo função pública ou mandato eletivo independentemente de ação civil de improbidade administrativa 12 Efeitos da condenação art 92 I b do CP Esses efeitos serão inaplicáveis a condenações por crimes contra as finanças públicas pois nenhuma das novas infrações tem pena superior a quatro anos Nessa hipótese para condenação superior a quatro anos seria irrelevante o abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública 13 Coisa julgada extensão A condenação criminal afora a obrigação de indenizar arts 91 I do CP e 63 do CPP não faz coisa julgada extrapenal para abranger as demais sanções civil administrativa ou política Para as consequências administrativa civil e política a legislação estabeleceu mecanismos especiais para apurar a improbidade administrativa ver Rui Stoco Improbidade administrativa Boletim cit p 4 14 Efeitos extrapenais da condenação Sanções política administrativa civil e até pecuniária Lei n 842992 somente com ação própria no juízo cível poderseá apurar a responsabilidade do agente público a multa também de 30 dos vencimentos anuais do agente público somente pode ser aplicada pelo Tribunal de Contas respectivo Exigem ações próprias nas quais a sentença penal condenatória não tem aplicação automática 15 Excessiva punição dos agentes públicos Pelo mesmo fato o agente público poderá em condenação criminal sofrer pena de prisão ou multa perder cargo função atividade ou mandato eletivo lei criminal poderá ser punido com perda de bens ou valores acrescidos a seu patrimônio ressarcimento de dano perda de função pública suspensão de direitos políticos multa civil até três vezes ao acréscimo patrimonial proibição de contratar com o Poder Público 16 Ausência de modalidade culposa As infrações disciplinadas na Lei n 100282000 que acrescentou novo capítulo ao CP não preveem a punição de nenhuma modalidade culposa Assim somente poderão ser punidas quando praticadas dolosamente ou seja quando praticadas com vontade e consciência de descumprir as normas que disciplinam a gestão fiscal e as finanças públicas Desnecessário repetir que o Direito Penal da culpabilidade não admite responsabilidade objetiva 17 Leis penais em branco Leis penais em branco são as de conteúdo incompleto vago lacunoso que necessitam ser complementadas por outras normas jurídicas geralmente de natureza extrapenal Na linguagem figurada de Binding a lei penal em branco é um corpo errante em busca de sua alma Como conclui Luiz Regis Prado portanto na lei penal em branco o comportamento proibido vem apenas enunciado ou indicado sendo a parte integradora elemento indispensável à conformação da tipicidade Nos novos crimes incluídos no CP quais sejam contra as finanças públicas o legislador abusou do expediente de utilizarse da norma penal em branco que embora admitida dentro de certos limites vulnera o princípio da taxatividade da tipicidade assim ocorre nos arts 359A 359B 359D 359E 359F 359G e 359H Teoricamente apenas o art 359C evitou o recurso da norma penal em branco 18 Novatio legis criminalizadora irretroatividade Novatio legis incriminadora ao contrário da abolitio criminis considera crime fato anteriormente não incriminado sendo portanto irretroativa não podendo ser aplicada a fatos praticados antes da sua vigência 20102000 segundo o velho aforisma nullum crimen sine praevia lege hoje erigido a dogma constitucional art 5º XXXIX da CF e art 1º do CP Nessas circunstâncias o autor do fato não praticou crime algum uma vez que no momento da execução sua conduta era indiferente para o Direito Penal Ora como aqui se trata de criminalização de novas condutas à evidência não retroage para atingir fatos praticados antes de 20 de outubro de 2000 ainda que referidos fatos já constituíssem ilícitos administrativos LC n 1012000 19 Suspensão condicional do processo Todas as novas figuras incluídas no capítulo Dos crimes contra as finanças públicas Lei n 100282000 admitem em tese a suspensão condicional do processo desde que satisfeitos os demais requisitos na medida em que nenhuma de suas penas ultrapassa em seu limite mínimo um ano de privação de liberdade art 89 da Lei n 909995 Contratação de operação de crédito Art 359A Ordenar autorizar ou realizar operação de crédito interno ou externo sem prévia autorização legislativa Pena reclusão de 1 um a 2 dois anos Parágrafo único Incide na mesma pena quem ordena autoriza ou realiza operação de crédito interno ou externo I com inobservância de limite condição ou montante estabelecido em lei ou em resolução do Senado Federal II quando o montante da dívida consolidada ultrapassa o limite máximo autorizado por lei Artigo acrescentado pela Lei n 10028 de 19 de outubro de 2000 D O U T R I N A Antecedentes legislativos arts 29 III e 32 a 39 todos da LC n 1012000 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a probidade administrativa relativamente às operações realizadas no âmbito das finanças públicas da União Estados Distrito Federal e Municípios Protegese o princípio da legalidade administrativa punindose criminalmente condutas praticadas sem a observância legal 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo Sujeito ativo somente poderá ser um agente público funcionário público lato sensu No entanto somente poderá cometer esse tipo penal quem possui atribuição legal para ordenar autorizar ou realizar operação de crédito interno ou externo Se o funcionário que emitir o ato administrativo ordem autorização ou ele próprio realizar a operação não tiver atribuição legal para tanto referido ato será passível de anulação pelo próprio Poder Público Essa falta de atribuição legal torna a conduta praticada atípica Devese destacar que pode ser sujeito ativo tanto o agente público que emite o ato administrativo isto é que ordena ou autoriza a operação de crédito como aquele funcionário subordinado que a realiza Tratandose do Presidente da República ver art 10 da Lei n 107950 e quando referirse ao Prefeito Municipal ver art 1º XX do Declei n 20167 ambos alterados pela Lei n 100282000 ver Damásio de Jesus Código Penal anotado 11 ed 22 Sujeito passivo Sujeitos passivos serão União Estados Distrito Federal ou Municípios relativamente ao erário público isto é à Receita Pública nas respectivas searas 3 Tipo objetivo adequação típica As condutas tipificadas são ordenar autorizar e realizar operação de crédito constituindo crime de conteúdo variado Ordenar significa mandar determinar a realização de operação de crédito sem a existência de autorização legislativa nessa hipótese a manifestação do agente público é imperativa e a autoridade pública agente público tem legitimidade isto é atribuição legal para a prática da conduta ou como afirma Damásio a iniciativa é do mandanteCódigo Penal anotado 11 ed autorizar é permitir aprovar conceder autorização para a prática do ato ao contrário da conduta ordenar na modalidade de autorizar a iniciativa da celebração da operação de crédito pode ter partido de outrem embora não necessariamente Para Damásio nessa hipótese o agente não tem a iniciativa da ação Código Penal anotado 11 ed realizar é efetivar concretizar executar ou celebrar operação de crédito Em regra quem realiza a operação de crédito não é aquele agente que tem atribuição para ordenála ou autorizála No entanto é irrelevante que aquele que ordena ou autoriza tal operação também a realize pois se trata de crime de ação múltipla 31 Sem prévia autorização legislativa Em termos genéricos a operação de crédito deve ser em tese lícita concretamente contudo é realizada sem a existência específica de autorização legislativa Esse elemento normativo autorização legislativa anterior constitui uma espécie de condição do procedimento administrativo do agente público sem o qual sua conduta não pode ser realizada sob pena de cometer crime Em outros termos a existência de autorização legislativa torna o fato atípico 32 Autorização legislativa e autorização legal Autorização legislativa não se confunde com autorização legal Alguns órgãos públicos não têm seus atos condicionados à autorização legislativa como autarquias empresas públicas ou o Poder Judiciário o Ministério Público etc Essas instituições órgãos ou entidades públicas em regra têm suas atividades atos e ações disciplinados em lei e não apenas em autorização legislativa 33 Operação de crédito Segundo definição da Lei Complementar n 1012000 operação de crédito é o compromisso financeiro assumido em razão de mútuo abertura de crédito emissão e aceite de título aquisição financiada de bens recebimento antecipado de valores provenientes da venda a termo de bens e serviços arrendamento mercantil e outras operações assemelhadas inclusive com o uso de derivativos financeiros art 29 III Tratase como se percebe de norma penal em branco 34 Interno ou externo elementar típica É irrelevante para a tipificação do crime que a operação creditícia seja celebrada com organismo nacional ou internacional Ademais as condutas tipificadas não se limitam aos entes federativos abrangendo outros órgãos entidades ou instituições alheios aos Poderes instituídos 4 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de ordenar autorizar ou realizar operação de crédito interno ou externo sem prévia autorização É indispensável que o sujeito ativo tenha conhecimento da inexistência de autorização legislativa O dolo deve abranger a ação o fim proposto os meios escolhidos e o fim pretendido A previsão elemento cognitivo do dolo deve abranger correta e completamente todos os elementos essenciais do tipo sejam eles descritivos normativos ou subjetivos Enfim o dolo deve abranger também o conhecimento dos chamados elementos negativos do tipo ex sem prévia autorização legislativa Não existe dolo restrito Não há previsão de qualquer fim especial 5 Consumação e tentativa 51 Consumação Consumase o crime em qualquer de suas modalidades com a ordem autorização ou mesmo realização de operação de crédito sem prévia autorização legislativa As modalidades de ordenar e autorizar constituem crimes formais na medida em que é desnecessária a produção do resultado realização da operação de crédito para consumaremse Damásio classificaas como crimes de mera conduta A modalidade de realizar configura crime material pois somente se consuma com a efetiva celebração da mencionada operação de crédito 52 Tentativa Nas duas primeiras figuras ordenar e autorizar acreditamos com Damásio de Jesus que efetivamente é inadmissível a tentativa pois a ação de autorizar ou de ordenar não admite fracionamentos tratandose de crimes unissubsistentes Antes da ação ordenatória ou autorizatória quaisquer outros atos assumem a natureza de meros atos preparatórios que são impuníveis Na figura de realizar como crime material que admite fracionamento a tentativa é perfeitamente possível 6 Operação de crédito além do limite O caput pune a operação de crédito realizada sem prévia autorização legal O parágrafo único por sua vez pune a operação de crédito que ultrapassa o limite permitido Na verdade as condutas tipificadas são as mesmas ordenar autorizar e realizar Nestas hipóteses o sujeito ativo está autorizado a proceder à operação de crédito apenas se excede ultrapassando o limite permitido 61 Inobservância do limite condição ou montante Neste caso o sujeito ativo está devidamente autorizado por lei ou Resolução do Senado Federal para celebrar a operação de crédito Contudo exorbita os limites legais inobservando limite condição ou montante estabelecido A previsão regulamentar existe Lei ou Resolução mas os parâmetros fixados são ultrapassados tipificando se a conduta delituosa 62 Inobservância do limite da dívida consolidada O inciso II do parágrafo único referese à dívida consolidada cujo limite é autorizado por lei na hipótese do inciso I contrariamente limite condição ou montante são fixados tanto por lei quanto por Resolução do Senado Federal Tipifìcase qualquer das condutas descritas no caput quando o montante da dívida consolidada ultrapassar o limite fixado em lei Esta infração somente pode ser praticada por administradores do plano estadual em razão da definição de dívida consolidada ente da Federação 63 Definição legal de dívida consolidada Dívida consolidada é o montante total apurado sem duplicidade das obrigações financeiras do ente da federação assumidas em virtude de leis contratos convênios ou tratados e da realização de operação de crédito para amortização em prazo superior a doze meses art 29 I da LC n 1012000 Inscrição de despesas não empenhadas em restos a pagar Art 359B Ordenar ou autorizar a inscrição em restos a pagar de despesa que não tenha sido previamente empenhada ou que exceda limite estabelecido em lei Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos Artigo acrescentado pela Lei n 10028 de 19 de outubro de 2000 D O U T R I N A Antecedente legislativo o art 42 da LC n 1012000 atendendo ao disposto no art 37 da CF proíbe o administrador público de assumir obrigações financeiras sem a existência de correspondentes recursos para honrálas Essa previsão objetiva impedir que se perpetuem os débitos públicos repassandose às gestões futuras dificultando a boa administração dos novos mandatários 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a probidade administrativa e a estrita regularidade da Administração Pública particularmente em relação às operações realizadas no âmbito das finanças públicas da União Estados Distrito Federal e Municípios 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo Como se trata de crime próprio sujeito ativo só poderá ser um agente público funcionário público lato sensu No entanto somente poderá cometer esse tipo penal quem possuir atribuição legal para praticar as condutas incriminadas quais sejam ordenar ou autorizar inscrição em restos a pagar irregularmente ou seja sem estar devidamente empenhados ou exceder os limites legalmente autorizados Somente pode ser sujeito ativo o titular de Poder ou órgão referido no art 20 da LC n 1012000 art 42 Se o funcionário que praticar qualquer das condutas incriminadas não tiver atribuição legal o comportamento será atípico 22 Sujeito passivo Sujeitos passivos serão a União os Estados o Distrito Federal ou os Municípios segundo as respectivas searas lesadas 3 Tipo objetivo adequação típica As condutas tipificadas são ordenar e autorizar que constituem crime de ação múltipla Ordenar significa mandar determinar a inscrição em restos a pagar de despesa que não tenha sido previamente empenhada ou que exceda imperativo definitivo incontestável ação própria de quem faz prevalecer sua vontade na hipótese o sujeito passivo tem legitimidade isto é atribuição legal para ordenar a prática administrativa autorizar tem o sentido de permitir aprovar conceder autorização para a prática do ato ao contrário da conduta ordenar na modalidade de autorizar a iniciativa da inscrição pode ter partido de outrem embora não necessariamente Significa que o executor da inscrição em restos a pagar não tem autoridade para decidir e assim a autorização é condição indispensável para que a inscrição seja feita Há duas formas de realizar as condutas a despesa não empenhada previamente b despesa que exceda o limite estabelecido em lei 31 Despesa não empenhada previamente Tratase de um princípio administrativofinanceiro cuja infringência foi elevada à condição de crime nenhuma despesa pública pode ser paga sem o prévio empenho pelo mesmo fundamento a inscrição em restos a pagar necessita do prévio empenho Não se trata da existência ou inexistência de recursos para honrar a obrigação no ano seguinte que também é uma exigência da LC n 1012000 mas tão somente da necessidade da formalidade de proceder ao empenho respectivo Ademais não tem qualquer relação com o mandado do autor pois mesmo que continue no exercício seguinte é indispensável o empenho prévio para poder inscrever despesas em restos a pagar 32 Que exceda limite estabelecido em lei Esta hipótese ocorre quando há o empenho prévio ao contrário da anterior mas a inscrição da despesa em restos a pagar excede o limite estabelecido em lei A formalidade do empenho foi satisfeita mas é inscrita despesa além do permitido configurando o crime em sua segunda modalidade Essa proibição fundamentase na necessidade de assegurar a regularidade do exercício fiscal do Estado devendose respeitar os limites das despesas roladas para o exercício seguinte Constatase enfim que é lícito inscrever despesas em restos a pagar desde que observados esses dois elementos normativos 4 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de ordenar ou autorizar a inscrição em restos a pagar de despesa que não foi previamente empenhada ou que exceder o limite legalmente estabelecido É necessário que o sujeito ativo tenha conhecimento de que a despesa não foi prévia e devidamente empenhada ou que a despesa a despeito de empenhada ultrapassa o limite estabelecido em lei Desconhecendo qualquer dessas circunstâncias a conduta será atípica Não se pode esquecer que o dolo deve abranger correta e completamente todos os elementos constitutivos do tipo sejam descritivos normativos ou subjetivos Não há previsão de qualquer fim especial do agir 5 Consumação e tentativa 51 Consumação Consumase o crime quando a ordem ou autorização é executada ou seja quando se opera efetivamente a inscrição de despesa em restos a pagar Enquanto não for atendida a ordem ou autorização não se produz qualquer efeito É uma questão de tipicidade estrita A existência do empenho ou mesmo a definição do limite autorizado muitas vezes depende de exame prévio e a ordem ou autorização pode ser genérica abrangente encerrandose quando atingir o limite estabelecido em lei ou devendo ser executada após a realização do devido empenho 52 Tentativa Pela nossa definição de consumação fica clara a possibilidade de tentativa embora de difícil comprovação Parecenos perfeitamente possível o fracionamento da ação tipificada tratandose de crime plurissubsistente Damásio de Jesus não admite nesse caso a tentativa Código Penal anotado 11 ed 6 Distinção do crime anterior Os verbos nucleares ordenar e autorizar são os mesmos do tipo anterior contudo a impossibilidade da tentativa naquela infração fundamentase na existência do elemento normativo sem prévia autorização legislativa Tratase de tipo anormal cujo elemento normativo compõese de atividades complexas que necessariamente passam pelo âmbito decisório do sujeito ativo ao passo que neste dispositivo quem realiza os empenhos ou controla concretamente os limites estabelecidos em lei não é necessariamente o sujeito ativo 61 Interpretação garantista Admitir a consumação do crime com a simples ordem ou autorização da inscrição de restos a pagar na forma descrita no tipo implica a punição da simples infringência de dever pura abstração normativa com dolo presumido não se pode esquecer que a modalidade culposa é impunível enquanto admitir a consumação somente quando se opera efetivamente a inscrição de despesa em restos a pagar configura uma interpretação garantista constitucional no marco do Direito Penal da culpabilidade 7 Desistência voluntária Se depois de ordenada ou autorizada a inscrição de despesas em restos a pagar nas condições descritas no tipo o sujeito ativo revoga ou anula o ato anterior antes que se tenha operado a efetiva inscrição configurase a desistência voluntária nos termos do art 15 do CP que em nosso entendimento exclui a tipicidade 8 Conflito aparente de normas O sujeito ativo que ordenar ou autorizar a inscrição de despesas não empenhadas em restos a pagar art 359B poderá ser o mesmo que não ordene ou não autorize o cancelamento de restos a pagar art 359F À evidência que não poderá responder por fazer e por não fazer a mesma coisa ferindo o ne bis in idem A duplicidade da proibição tem um fundamento objetivam destinatários diferentes Quem praticou a conduta comissiva art 359B responderá apenas por ela 81 Exceção à teoria monística Sucessão de mandatários por exemplo quem deixa o cargo pode responder pela inscrição de despesas não empenhadas em restos a pagar art 359B quem assume pode responder por não ter determinado o cancelamento do montante de restos a pagar art 359 F inscrito em valor superior ao permitido legalmente Esses dois dispositivos assemelhamse à corrupção ativa e passiva oferecer receber neste caso fazer e não desfazer Ou seja não há concurso de pessoas entre os dois sujeitos ativos a menos que haja o vínculo subjetivo entre ambos quando então responderão pelos dois crimes hipótese de conluio 9 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é detenção de seis meses a dois anos A ação penal é de natureza pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Prefeito municipal Crime contra as finanças públicas Assunção de obrigação no último ano do mandato ou legislatura O art 359C do CP que entrou em vigor no dia 19 de outubro de 2000 não se aplica aos fatos ocorridos naquele ano pois é indispensável para a total tipificação do delito que os dois últimos quadrimestres do ano façam parte do contexto Ação julgada improcedente TJRS Processo Crime 70007340383 Rel Constantino Lisbôa de Azevedo j 642006 A denúncia que imputa crime tipificado no art 359B ou C do Código Penal não especificando qual a obrigação que o prefeito ordenou ou autorizou assumir data e circunstâncias da assunção simples existência de restos a pagar sem indicar a despesa não empenhada não deve ser recebida por vício formal e por deficiência na descrição dos fatos puníveis Denúncia não recebida por maioria Insuficiência dos requisitos do art 41 do CPP TJRS Processo Crime 70005295365 Rel Gaspar Marques Batista j 19122002 Assunção de obrigação no último ano do mandato ou legislatura Art 359C Ordenar ou autorizar a assunção de obrigação nos 2 dois últimos quadrimestres do último ano do mandato ou legislatura cuja despesa não possa ser paga no mesmo exercício financeiro ou caso reste parcela a ser paga no exercício seguinte que não tenha contrapartida suficiente de disponibilidade de caixa Pena reclusão de 1 um a 4 quatro anos Artigo acrescentado pela Lei n 10028 de 19 de outubro de 2000 D O U T R I N A Antecedentes legislativos arts 42 e 20 da LC n 1012000 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido como gênero é a Administração Pública Especificamente no entanto protegese o equilíbrio das contas públicas especialmente em relação à sucessão dos mandatários titulares dos Poderes Públicos nesse sentido ver Damásio de Jesus Código Penal anotado 11 ed Luiz Flávio Gomes e Alice Bianchini Crimes de responsabilidade fiscal Lei 1002800 Este dispositivo ao contrário do anterior procura precaver a Administração Pública contra os excessos tradicionais de final de mandato que impedem as novas administrações de colocarem em prática imediatamente seu plano de governo O artigo anterior referese ao fim do exercício fiscal independentemente de tratarse de fim de mandato ou não 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo Sujeito ativo é a autoridade titular de mandato Como todos os demais crimes deste novo capítulo do CP tratase de crime próprio mas este é especialíssimo na medida em que não basta ser funcionário público mas deve ser titular de mandato eletivo ou não com poderes decisórios em nome da Instituição ou Poder Público que representa Assim sujeitos ativos são o Presidente da República do Senado da Câmara de Assembleias Legislativas de Câmaras de Vereadores de Tribunais etc o Governador do Estado os ProcuradoresGerais de Justiça da República dos Estados AdvogadoGeral da União DefensorGeral da União DefensorGeral do Estado do Município etc arts 42 e 20 2º da Lei n 1012000 Tratandose de mandatos sujeito ativo pode ser o eventual substituto legal 22 Sujeito passivo Sujeito passivo imediato por sua vez é a Administração Pública que pode ser representada pela União pelo Estado Distrito Federal ou Município Pode ser ademais outros órgãos ou instituições públicas tais como Poder Legislativo Poder Judiciário Ministério Público cujos representantes máximos são detentores de mandatos e gozam de poderes decisórios quanto a orçamentos despesas e finanças públicas e seus respectivos âmbitos Nada impede que mediatamente sejam atingidos terceiros que também seriam sujeitos passivos 3 Tipo objetivo adequação típica As condutas tipificadas são ordenar e autorizar que constituem crime de ação múltipla representado pelos mesmos verbos do tipo anterior Ordenar aqui como lá significa mandar determinar a inscrição em restos a pagar de despesa que não tenha sido previamente empenhada ou que exceda limite estabelecido em lei o verbo ordenar traz em seu bojo um cunho imperativo definitivo incontestável ação própria de quem faz prevalecer sua vontade na hipótese o sujeito passivo tem poder para ordenar a assunção de obrigação Autorizar igualmente significa permitir aprovar conceder permissão para assumir obrigação ao contrário da conduta ordenar na modalidade de autorizar a iniciativa de assumir obrigação pode ter partido de outrem funcionário encarregado embora não necessariamente Significa nesta modalidade que o executor da assunção da obrigação não tem autoridade para decidir para assumir esse compromisso e assim a autorização de quem tem poder é condição indispensável para que a obrigação seja assumida Há duas hipóteses em que essa obrigação não pode ser assumida nos últimos oito meses de mandato a quando a despesa não possa ser paga no mesmo exercício financeiro b quando havendo restos a pagar não haja previsão de disponibilidade de caixa suficiente para o exercício seguinte Na determinação da disponibilidade de caixa por determinação legal o administrador deve considerar os encargos e as despesas comprometidas a serem resgatados até o final do exercício art 42 parágrafo único da Lei n 1012000 Na verdade a criminalização da assunção de obrigação em final de mandato complementa o disposto no art 42 da LC n 1012000 31 Despesa não paga no mesmo exercício financeiro O dispositivo criminaliza a criação de despesa para ser resgatada pela próxima administração Objetivase moralizar as administrações públicas que ao longo do tempo têmse mostrado perdulárias especialmente quando os encargos são empurrados para os sucessores Todo administrador probo deve assumir em tese obrigação que possa honrar durante o lapso temporal de seu mandato Aqueles projetos no entanto que demandem maior diluição no tempo não podem ser elaborados ou implementados praticamente no final do mandado ou legislatura do sujeito ativo nos dois últimos quadrimestres do último ano Objetivase impedir que o administrador por quaisquer razões acabe inviabilizando ou pelo menos dificultando a próxima administração em razão do endividamento precedente Era essa política orçamentária irresponsável que criava débitos impagáveis para a Administração Pública 32 Indisponibilidade de caixa para o exercício seguinte Na realidade pelo texto legal não há uma proibição absoluta de assumir obrigação em fim de mandato que não possa ser restada no mesmo exercício Com efeito a lei admite ainda que implicitamente a assunção de obrigação mesmo nos últimos dois quadrimestres cujo adimplemento não se complete no mesmo exercício isto é permite que parcelas dessa obrigação possam ficar para serem resgatadas no próximo mandato sob uma condição desde que tenha contrapartida suficiente de disponibilidade de caixa Assim não será a simples assunção de obrigação cujo resgate parcial venha a operarse no exercício seguinte que tipificará a conduta incriminada mas sim a ausência de contrapartida suficiente de disponibilidade em caixa Enfim como destaca Damásio de Jesus tutelase a regularidade e o equilíbrio das contas públicas em relação à sucessão de administradores de mandato Damásio de Jesus Código Penal anotado 11 ed 33 Contrapartida suficiente de disponibilidade de caixa Afinal qual é o verdadeiro sentido e a real extensão dessa elementar contida no final do artigo em exame Para impedir a tipificação do crime será suficiente que no vencimento da obrigação no novo exercício haja dinheiro em caixa produto de receita corrente Ou será necessário que essa disponibilidade em caixa tenha origem mais remota isto é seja produto de previsão orçamentária anterior Não se pode perder de vista a finalidade desta lei moralizar a Administração Pública e assegurar o equilíbrio das contas públicas por isso o vocábulo contrapartida suficiente tem um sentido especial não basta que no dia do vencimento da obrigação haja numerário em caixa a receita corrente provavelmente tem destinação orçamentária prevista cujo comprometimento não pode ser desviado Assim a contrapartida exigida pela lei não se refere evidentemente a disponibilidade de caixa do novo orçamento sendo necessário que juntamente com a inscrição em restos a pagar desde que devidamente empenhado seja prevista a fonte de custeio 4 Assunção de obrigação antes dos dois últimos quadrimestres A contrario sensu a assunção de obrigação em período anterior aos dois últimos quadrimestres do último ano do mandato ou legislatura mesmo que não possa ser paga no mesmo exercício financeiro ou que reste parcela para o exercício seguinte sem suficiente disponibilidade de caixa não constituirá o presente crime Poderá haver outras consequências mas não configurarão este tipo penal a despeito da presença das duas elementares antes referidas pois lhe falta a elementar temporal os últimos quatro meses de mandato ou legislatura A alternativa para o administrador quando for necessário o investimento deverá priorizar o pagamento de todas as obrigações assumidas nos dois últimos quadrimestres do fim do mandato deixando se for o caso inadimplidas obrigações assumidas antes do período mencionado A ausência do requisito temporal dois últimos quadrimestres tornará a assunção dessa obrigação uma conduta penalmente atípica 41 Mandato ou legislatura Como o texto legal fala em mandato ou legislatura inclusive no nomen iuris limita o contingente de destinatários da proibição legal que necessariamente precisam ostentar a condição especial de quem exerce mandato ou cumpre legislatura Assim qualquer outra autoridade pública ou funcionário somente poderá responder por este crime se for alcançado pelo instituto do concurso de pessoas nos termos do art 29 do CP 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de assumir obrigação geradora de despesa que necessite ser cumprida total ou parcialmente no próximo mandato ou legislatura O dolo deve abranger correta e completamente todos os elementos constitutivos do tipo sejam descritivos normativos ou subjetivos É necessário que o sujeito ativo tenha conhecimento em primeiro lugar de que já se encontra no período depurador das finanças públicas últimos oito meses de mandato em segundo lugar deve ter consciência de que a obrigação a assumir não pode ser resgatada no mesmo exercício ou que eventual saldo a ser honrado no exercício seguinte não tem contrapartida suficiente de disponibilidade de caixa Não há previsão de qualquer fim especial de agir 51 Erro de tipo irrelevância da evitabilidade O desconhecimento de qualquer dessas circunstâncias caracterizará erro de tipo Esse tipo de erro como determina a Parte Geral do CP exclui o dolo e por extensão a tipicidade art 20 caput No entanto para estes crimes contra as finanças públicas a evitabilidade ou inevitabilidade do erro é irrelevante na medida em que não há previsão da modalidade culposa Assim independentemente da natureza do erro haverá exclusão da tipicidade 6 Consumação e tentativa 61 Consumação Consumase o crime quando a ordem ou autorização é efetivamente executada ou seja quando a obrigação é realmente assumida dentro do período proibido Enquanto não for cumprida a ordem ou autorização não se produz qualquer efeito isto é não há qualquer lesividade ao patrimônio público e sem lesividade não se pode falar em crime a ausência de lesividade impede a caracterização da tipicidade material ou tipicidade estrita Ademais devese ter presente que a lei está criminalizando um comportamento complexo isto é uma ação ordenar ou autorizar que encerra em seu bojo uma prognose a previsão de que durante o exercício haverá suficiente disponibilidade financeira para honrar a obrigação autorizada E se houver erro de avaliação ou seja se a prognose embora provável não se confirmar por fatores aleatórios poderseá considerar tipificado o comportamento Tais fatores constituirão excludentes de tipicidade ou apenas afastarão a culpabilidade pela inexigibilidade de outra conduta Ou quem sabe justificarão a conduta excluindo sua antijuridicidade Enfim são múltiplos aspectos que demandarão muita reflexão e certamente criarão insegurança jurídica e poderão dar causa a muitas injustiças esse condicionamento futuro para tipificar criminalmente um comportamento afronta as garantias dogmáticas penais que não podem ser ignoradas 62 Tentativa Pela nossa definição de consumação deixamos claro que admitimos a possibilidade de tentativa embora de difícil comprovação Parece nos perfeitamente possível o fracionamento da ação tipificada tratandose de crime plurissubsistente que admite não apenas o fracionamento da ação mas que depende de acontecimentos futuros para configurarse como é a comprovação da existência ou inexistência da possibilidade de pagamento ou de que no próximo exercício haverá a contrapartida necessária para honrálo Damásio de Jesus não admite nesse caso a tentativa Código Penal anotado 11 ed 7 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é reclusão de um a quatro anos Pelos requisitos objetivos é teoricamente admissível a substituição por pena restritiva de direitos igualmente é admissível a suspensão condicional do processo nos termos do art 89 da Lei n 909995 A ação penal como os demais crimes contra as finanças é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Prefeito municipal Crime contra as finanças públicas Assunção de obrigação no último ano do mandato ou legislatura O art 359C do CP que entrou em vigor no dia 19 de outubro de 2000 não se aplica aos fatos ocorridos naquele ano pois é indispensável para a total tipificação do delito que os dois últimos quadrimestres do ano façam parte do contexto Ação julgada improcedente TJRS Processo Crime 70007340383 Rel Constantino Lisbôa de Azevedo j 642006 A denúncia que imputa crime tipificado no art 359B ou C do Código Penal não especificando qual a obrigação que o prefeito ordenou ou autorizou assumir data e circunstâncias da assunção simples existência de restos a pagar sem indicar a despesa não empenhada não deve ser recebida por vício formal e por deficiência na descrição dos fatos puníveis Denúncia não recebida por maioria Insuficiência dos requisitos do art 41 do CPP TJRS Processo Crime 70005295365 Rel Gaspar Marques Batista j 19122002 Ordenação de despesa não autorizada Art 359D Ordenar despesa não autorizada por lei Pena reclusão de 1 um a 4 quatro anos Artigo acrescentado pela Lei n 10028 de 19 de outubro de 2000 D O U T R I N A Antecedentes legislativos os arts 15 16 e 17 todos da LC n 1012000 constantes do Capítulo IV relacionam as despesas que referida lei considera não autorizadas 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido como gênero é a Administração Pública Especificamente no entanto protegese o orçamento público sob a ótica do princípio da legalidade dos encargos e despesas públicas que o moderno direito administrativoconstitucional tem procurado vincular 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo Sujeito ativo tratandose de crime próprio deve ser funcionário público com poder e atribuição para ordenar despesas Somente poderá cometer este crime quem possui atribuição legal para ordenar despesa o denominado tradicionalmente ordenador de despesas Não abrange ao contrário do previsto no art 359A quem apenas realiza isto é quem cumpre ou executa a ordem expedida pelo sujeito ativo próprio o ordenador de despesas Nesse caso à evidência o funcionário que executa a ordem deverá ter sua conduta examinada à luz do art 22 segunda parte do CP ou seja à luz do princípio da obediência hierárquica veja nosso Manual de Direito Penal v 1 Parte Geral Neste artigo a limitação do sujeito ativo não é tão restrita como ocorre nos dois dispositivos anteriores na hipótese do art 359B somente pode ser sujeito ativo o titular de Poder ou órgão referido no art 20 da LC n 1012000 art 42 ao passo que no caso do art 359 C o sujeito ativo deve ser titular de mandato eletivo ou não com poderes decisórios em nome da Instituição ou Poder Público que representa ver anotações sob a mesma rubrica nos dois dispositivos citados 22 Sujeito passivo Sujeitos passivos serão União Estados Distrito Federal ou Municípios relativamente ao erário público isto é a Receita Pública nas respectivas searas 3 Tipo objetivo adequação típica A conduta nuclear do tipo está representada pelo verbo ordenar que para não ser repetitivo tem o mesmo sentido empregado nos três dispositivos anteriores arts 359A B e C Para a configuração do crime no entanto é necessária a existência de lei disciplinando a gestão financeira e principalmente estabelecendo as vedações Em verdade essa lei já existe ou seja há a LC n 1012000 que em seus arts 15 16 e 17 constantes no Capítulo IV relacionam as despesas que a lei considera não autorizadas os arts 18 a 24 do mesmo capítulo complementam as vedações Nada impede evidentemente que as leis orçamentárias próprias lei orçamentária anual plano plurianual e lei de diretrizes orçamentárias estabeleçam novas proibições A LC n 1012000 quando disciplina a geração de despesa estabelece que segundo Damásio de Jesus a ação governamental que resulte no aumento de despesa deve ser acompanhada de declaração de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias Damásio de Jesus Código Penal anotado 11 ed É absolutamente irrelevante que o autor do crime se beneficie ou não com a ordenação de despesa não autorizada por lei 31 Despesa não autorizada por lei Tratase de elemento normativo que estabelece exatamente a ilicitude da operação A falta de autorização legal não constitui mera irregularidade administrativa como sustentam alguns mas representa um elemento constitutivo do tipo cuja ausência ou seja a existência de autorização legal afasta a tipicidade da conduta Na verdade devese destacar que os elementos normativos do tipo não se confundem com os elementos jurídiconormativos da ilicitude Enquanto aqueles são elementos constitutivos do tipo penal estes embora integrem a descrição do crime referemse à ilicitude e assim sendo constituem elementos sui generis do fato típico v g alheia honesta etc na medida em que são ao mesmo tempo caracterizadores da ilicitude Esses elementos normativos especiais da ilicitude normalmente são representados por expressões como indevidamente injustamente sem justa causa sem licença da autoridade sem autorização legal ou mesmo não autorizada por lei etc Em síntese como o dolo deve abranger todos os elementos que compõem a figura típica e se as características especiais do dever jurídico forem um elemento determinante da tipicidade concreta a nosso juízo o erro sobre elas deve ser tratado como erro de tipo e aí logicamente excluindo a tipicidade Por fim com o vocábulo despesa não autorizada por lei devese entender despesa legalmente proibida sob pena de inverterse o princípio elementar de qualquer Estado Democrático de Direito segundo o qual tudo o que não está proibido é permitido 32 Despesa justificada embora não autorizada por lei Não se pode perder de vista que a probidade e a moralidade administrativa exigem presentemente respeito absoluto à legalidade administrativa aliás esse é o fundamento desse emaranhado de leis embretadoras dos administradores públicos No entanto esta como qualquer outra conduta criminosa pode beneficiarse de uma excludente de criminalidade particularmente do estado de necessidade desde que seus requisitos estejam presentes Discordamos nesse particular da orientação adotada por Luiz Flávio Gomes e Alice Bianchini quando afirmam que a inexistência de autorização constitui tão somente indício de irregularidade havendo necessidade para se criminalizar a conduta que se verifique diretamente a existência de uma lesão não justificada ao bem jurídico Luiz Flávio Gomes e Alice Bianchini Crimes de responsabilidade fiscal cit Com efeito uma lesão justificada a qualquer bem jurídico penalmente tutelado constitui excludente de criminalidade deslegitimandose como afirmam a possibilidade de se punir criminalmente referida conduta Na realidade ante o atual ordenamento jurídico com o advento da CF de 1988 e das Leis n 866693 1012000 e 100282000 a inexistência de autorização legal constitui indício de antijuridicidade que pode à evidência ser afastada por uma causa de justificação art 23 do CP Por outro lado eventuais dificuldades administrativoorçamentárias podem socorrer ao administrador probo e honesto mesmo que não se revistam da condição de causas de justificação penalmente falando mas circunstancialmente tornando inexigível comportamento diverso eliminando nesse caso a reprovabilidade da ação configurando causa supralegal de exclusão da culpabilidade 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade livre e consciente de ordenar despesa não autorizada por lei Já que não existe dolo restrito este deve abranger correta e completamente todos os elementos constitutivos do tipo e especialmente ter consciência de que a despesa que ordena não é autorizada por lei O eventual desconhecimento da inexistência de autorização legal caracteriza erro de tipo que exclui o dolo e por extensão a tipicidade art 20 caput No entanto como já afirmamos para estes crimes contra as finanças públicas a evitabilidade ou inevitabilidade do erro é irrelevante na medida em que não há previsão da modalidade culposa Assim independentemente da natureza do erro de tipo haverá exclusão da tipicidade 5 Consumação e tentativa 51 Consumação Consumase o crime que para nós é formal quando a ordem é efetivamente executada ou seja quando a despesa ordenada é realmente assumida pelo Poder Público contrariando previsão legal Enquanto não for cumprida a ordem não se produz qualquer efeito isto é não há qualquer lesividade ao patrimônio público e sem lesividade não se pode falar em crime a ausência desta impede a caracterização da tipicidade material ou tipicidade estrita 52 Tentativa Em nossa concepção tratase de crime formal Assim coerente com nossa definição de consumação admitimos a possibilidade de tentativa embora de difícil comprovação Parecenos perfeitamente possível o fracionamento da ação tipificada tratandose de crime plurissubsistente que admite o fracionamento da ação Damásio de Jesus não admite nesse caso a tentativa por considerálo crime de mera conduta e unissubsistente Código Penal anotado 11 ed Luiz Flávio Gomes e Alice Bianchini por outro lado admitem como nós a tentativa quando exemplificam o agente público ordena a despesa não autorizada e por circunstâncias alheias a sua vontade a ordem não é cumprida responde pelo crime na forma tentada Luiz Flávio Gomes e Alice Bianchini Crimes de responsabilidade fiscal cit 6 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é reclusão de um a quatro anos Pelos requisitos objetivos é teoricamente admissível a substituição por pena restritiva de direitos igualmente é admissível a suspensão condicional do processo nos termos do art 89 da Lei n 909995 A ação penal como nos demais crimes contra as finanças é pública incondicionada J U R I S P R U D Ê N C I A S E L E C I O N A D A Ação penal originária Ordenação de despesa não autorizada por lei Princípio da irretroatividade aplicação Art 359D do Cód Penal norma penal em branco Norma integradora falta Crime não ocorrência Denúncia rejeição A lei penal incriminadora não tem efeito retroativo Assim porque à data da prática dos atos por um dos acusados não existia lei que tipificasse sua conduta como crime nem deveria ter sido oferecida denúncia em relação a ele O art 359D segundo o qual é crime ordenar despesa não autorizada por lei consiste em norma penal em branco uma vez que o rol das despesas permitidas e das não autorizadas haverá de constar de outros textos legais entre os quais por exemplo o da Lei de Responsabilidade Fiscal Lei Complementar n 1012000 Se na peça acusatória inexiste referência à norma integradora falha é a denúncia Ademais quando devidamente explicável a despesa deslegitimase a possibilidade de punição da conduta ao menos no âmbito penal A inexistência de autorização de despesa em lei constitui tão somente indício de irregularidade Para se criminalizar a conduta é necessária a existência de lesão não justificada ao bem jurídico isto é às finanças públicas o que no caso não ocorreu O fato narrado evidentemente não constitui crime STJ Apn 389ES Rel Min Nilson Naves j 1532006 Prestação de garantia graciosa Art 359E Prestar garantia em operação de crédito sem que tenha sido constituída contragarantia em valor igual ou superior ao valor da garantia prestada na forma da lei Pena detenção de 3 três meses a 1 um ano Artigo acrescentado pela Lei n 10028 de 19 de outubro de 2000 D O U T R I N A Antecedentes legislativos arts 29 IV 40 e seus parágrafos ambos da LC n 1012000 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a segurança das operações de crédito celebradas pelo Poder Público que para garantila exige contragarantia de eventual garantia exigida A validade da garantia é condicionada à existência de contragarantia em valor igual ou superior Para imprimir caráter coercitivo à necessidade de contragarantia e impedir ações graciosas dos gestores públicos em operações de crédito criminalizouse a prestação de garantia sem a correspondente contragarantia em valor igual ou superior 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo Sujeito ativo é somente autoridade pública com poderes decisórios em nome do ente federativo União Distrito Federal Estados e Municípios e respectivos órgãos empresas ou autarquias que celebrem operações de crédito interna ou externa 22 Sujeito passivo Sujeito passivo por sua vez é a Administração Pública que pode ser representada pela União pelo Estado Distrito Federal ou Município ou seus órgãos de administração direta e indireta 3 Tipo objetivo adequação típica A conduta nuclear está representada pelo verbo prestar que tem o sentido de oferecer conceder dar em A concessão de garantia em operações de crédito é legalmente permitida art 40 caput da LC n 1012000 O sujeito ativo que conceder garantia incorre no crime se o fizer sem prevenirse de possíveis riscos que a operação de crédito pode trazer ou seja nos termos da lei sem exigir contragarantia de adimplência da obrigação nesse sentido Damásio de Jesus Código Penal anotado 11 ed Assim somente haverá tipicidade se o sujeito passivo prestar garantia sem exigir contragarantia em valor não inferior à concedida A norma objetiva impedir garantias graciosas ou de favor sem assegurar o patrimônio público A simples ausência de contragarantia quando foi prestada garantia exigida em operação de crédito é suficiente para caracterizar o crime desde que o administrador saiba dessa exigência e conscientemente a omita na medida em que a ausência de contragarantia coloca em risco o patrimônio público que a lei complementar e este tipo penal pretendem proteger em sentido contrário Luiz Flávio Gomes e Alice Bianchini Crimes de responsabilidade fiscal cit Para Damásio de Jesus mesmo provando que a contragarantia era dispensável na operarão de crédito o fato permanece típico Damásio de Jesus Código Penal anotado 11 ed 31 Concessão de garantia de operação de crédito Garantia é o compromisso de adimplir obrigação financeira ou contratual assumida por ente da Federação ou entidade a ele vinculada art 29 IV da LC n 1012000 A concessão dessa garantia em operação de crédito interno ou externo é autorizada pelo art 40 caput da lei complementar referida No entanto referida garantia estará condicionada à oferta de contragarantia em valor igual ou superior e à adimplência da entidade que pleiteála art 40 1º 32 Contragarantia de operação de crédito Operação de crédito é no mínimo celebrada entre duas partes Se uma delas exige da outra determinada garantia ora para manterse o equilíbrio relacional nada mais justo que admitir a exigência de contragarantia É uma espécie de seguro e contrasseguro 33 De valor igual ou superior A precaução do legislador visando proteger as operações de crédito celebradas pelos organismos públicos e particularmente o patrimônio público dado em garantia chega à minúcia de estabelecer o valor da contragarantia que não pode ser inferior à garantia prestada 34 Na forma da lei Que lei Afinal que lei dá a forma e as condições em que a contragarantia deve ser exigida A LC n 1012000 disciplina a contragarantia no art 40 1º I e II e 2º Enfim o art 40 e seus oito parágrafos dois foram vetados estabelecem condições situações vedações exceções à obtenção de garantias 35 Contragarantia exigida por ente federativo superior A contragarantia exigida pela União dos Estados ou Municípios ou pelos Estados dos Municípios pode consistir na vinculação de receitas tributárias diretamente arrecadadas e provenientes de transferências constitucionais Essas receitas tributárias vinculadas podem ser retidas e utilizadas para liquidar a dívida vencida art 40 1º II da LC n 1012000 36 Ausência de garantia dispensa contragarantia É criminalizada a prestação de garantia em operação de crédito sem contragarantia Contudo se não houver prestação de garantia será desnecessária criminalmente falando a exigência de contragarantia ainda que haja risco de inadimplência do contratante Aliás a própria lei complementar não a exige Nessas circunstâncias o administrador que arriscar a celebração de operação de crédito praticará uma conduta atípica 4 Garantia sem condicionar à adimplência atipicidade É tipificada a prestação de garantia sem constituir contragarantia em valor igual ou superior Contudo pela Lei Complementar n 1012000 a prestação de garantia também é condicionada à adimplência da entidade que a pleitear art 40 1º 2ª parte Esta segunda exigência no entanto não foi incluída como elementar do tipo penal em exame Assim a eventual prestação de garantia sem condicionála à adimplência da entidade que pleiteála embora inválida por inobservância legal será atípica pois o tipo penal a ela não se refere 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de prestar garantia em operação de crédito sem constituir contragarantia em valor não inferior ao da garantia prestada É necessário que o sujeito ativo saiba das condições determinadas pela lei complementar e conheça os valores da garantia para poder exigir contragarantia em valor não inferior Não há exigência de elemento subjetivo especial do injusto 6 Consumação e tentativa 61 Consumação Consumase o crime quando o sujeito ativo presta efetivamente a garantia em operação de crédito sem exigir a contragarantia exigida por lei É desnecessário que a contragarantia seja préconstituída isto é prestada antes É como afirma Damásio comum a circunstância de a contragarantia em contrato administrativo ser constituída no mesmo momento da garantia 62 Tentativa Admitimos a possibilidade de tentativa que ocorre por exemplo quando o sujeito ativo determina a prestação de garantia sem exigir contragarantia mas por circunstâncias alheias à sua vontade sua determinação não é cumprida Nesse sentido concordam Luiz Flávio e Alice Bianchini Crimes de responsabilidade fiscal cit Damásio de Jesus não admite a tentativa Código Penal anotado 11 ed 7 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é detenção de três meses a um ano A natureza da ação penal é pública incondicionada Não cancelamento de restos a pagar Art 359F Deixar de ordenar de autorizar ou de promover o cancelamento do montante de restos a pagar inscrito em valor superior ao permitido em lei Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos Artigo acrescentado pela Lei n 10028 de 19 de outubro de 2000 D O U T R I N A Antecedente legislativo art 1º 1º da Lei Complementar n 1012000 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a gestão fiscal responsável representada pela estrita regularidade da Administração Pública particularmente em relação às operações realizadas no âmbito das finanças públicas da União Estados Distrito Federal e Municípios 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo Como se trata de crime próprio sujeito ativo só poderá ser um agente público funcionário público lato sensu que deve possuir atribuição legal para praticar as condutas incriminadas quais sejam deixar de ordenar de autorizar ou de promover o cancelamento do montante de restos a pagar inscrito em valor superior ao permitido em lei Se o funcionário que deixar de praticar qualquer das condutas incriminadas não tiver atribuição legal o comportamento será atípico Desnecessário afirmar que o sujeito ativo do crime tipificado no art 359B ordenar ou autorizar a inscrição em restos a pagar não pode ser sujeito ativo de qualquer das ações descritas neste dispositivo art 359F para evitarse o bis in idem Para aquele que ordena ou autoriza a inscrição em restos a pagar nos termos descritos naquele dispositivo o não cancelamento de restos a pagar tipificado neste artigo constitui post factum impunível Enfim a obrigação de cancelamento de inscrição irregular deve necessariamente recair em pessoa diversa daquela que ordenou ou autorizou a inscrição indevida 22 Sujeito passivo Sujeitos passivos serão a União os Estados o Distrito Federal ou os Municípios segundo as respectivas searas lesadas incluindose os Poderes Instituições ou órgãos respectivos 3 Tipo objetivo adequação típica As condutas tipificadas são deixar de ordenar de autorizar e de promover o cancelamento de restos a pagar inscritos além do limite legalmente permitido Ordenar e autorizar têm o mesmo significado já examinado nos dispositivos anteriores o diferencial contudo neste artigo reside justamente no seu caráter negativo ou melhor dito na forma omissiva em que os verbos nucleares são empregados ou seja deixar de fazêlo Por seu turno promover tem o sentido de executar realizar ou operacionalizar a atividade ordenada ou autorizada no caso em exame o cancelamento da inscrição de restos a pagar o comportamento criminalizado porém é omissivo próprio isto é deixar de ordenar autorizar ou promover o cancelamento referido Com efeito as condutas criminalizadas podem apresentarse sob três modalidades deixar de ordenar deixar de autorizar e deixar de promover 31 Deixar de ordenar O sujeito ativo tem poder ou atribuição para determinar o cancelamento mas não o faz omitese descumprindo dever funcional aqui elevado agora à condição de crime omissivo próprio A ordem omitida evitaria a lesão ao erário público anulando o montante de restos a pagar inscrito em valor superior ao legalmente permitido nesse sentido Damásio de Jesus Código Penal anotado 2001 Nessa hipótese o administrador deve determinar que um subordinado efetue o cancelamento mas nada impede que ele próprio o promova 32 Deixar de autorizar Funcionário subordinado ao administrador pode necessitar de autorização para promover o cancelamento da inscrição indevida de restos a pagar pois embora tenha atribuição para realizar o cancelamento não tem competência decisória para tanto dependendo de autorização de outrem Nessa hipótese segundo Damásio já há iniciativa de corrigir o desvio por parte de terceira pessoa Código Penal anotado 11 ed Quernos parecer contudo que não necessariamente deva já existir iniciativa de outrem pois nada impede que embora inexista tal iniciativa ainda assim o sujeito ativo não autorize tal cancelamento quando a decisão se apresente necessária Enfim configurase o tipo quando a situação fática exista e o administrador competente omita a autorização quando podia e devia dála 33 Deixar de promover Ao contrário das condutas de não ordenar e não autorizar na modalidade de não promover a decisão de não efetuar o cancelamento dos restos a pagar nos termos definidos pode ter partido de outrem isto é de quem tem poder ou atribuição para ordenar ou autorizar o cancelamento embora não necessariamente Nesse caso o encarregado de executar a ordem ou autorização se submete aos princípios que regem a obediência hierárquica definida no art 22 segunda parte do CP e se não for manifestamente ilegal somente quem deu a ordem ou autorização responderá pelo crime Significa ademais que o encarregado de executar o ato de cancelar ou melhor de não cancelar não promove não tem autoridade para decidir e assim a ordem ou autorização é condição indispensável para que o cancelamento se proceda Contudo responderá pelo crime isoladamente quando a despeito da ordem ou autorização emanada de autoridade competente não efetuar o cancelamento por sua omissão pois nesse caso deixa de promover o cancelamento como refere o texto legal Concluindo na modalidade de não promover pode ser sujeito ativo tanto quem tem atribuição para ordenar ou autorizar o cancelamento dos restos a pagar como quem tem apenas atribuição para promovêlo isto é para cumprir a determinação 4 Inscrição não superior ao limite permitido atipicidade O não cancelamento de restos a pagar cujo limite não ultrapasse ao permitido em lei mesmo que não tenha sido previamente empenhada não tipificará este crime pois a omissão somente é criminalizada quando a inscrição for superior ao legalmente permitido Nesse particular há uma lacuna na lei que é aliás exageradamente minuciosa e detalhista Poderá constituir infração administrativa fiscal contábil mas não constituirá crime Enfim qualquer outra irregularidade que não seja exceder o valor permitido em lei não tipificará este crime 5 Tipo subjetivo adequação típica O elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de se abster da conduta devida isto é de não ordenar não autorizar ou não promover o cancelamento de restos a pagar inscritos em valor superior ao legalmente permitido É indispensável que o sujeito ativo tenha conhecimento da existência da inscrição irregular de restos a pagar nos termos deste artigo Eventual desconhecimento desse fato torna a omissão atípica É irrelevante para a configuração típica a existência de algum fim especial Não há por outro lado previsão de modalidade culposa 51 Erro de tipo e erro de proibição Ninguém ignora que se trata de uma proibição nova e fundamentada em um emaranhado de leis novas e complexas que tornam difícil sua interpretação inclusive pelos operadores do direito O administrador público pode não determinar o cancelamento da inscrição de restos a pagar acima do limite legal por desconhecer que tem o dever de tomar essa providência Nesse caso incorre em erro de proibição Mas pode igualmente ter conhecimento desse dever legal pode ter consciência da inscrição de restos a pagar mas pode ignorar que essa inscrição ultrapassa o limite legalmente permitido Nessa hipótese ignorar que a inscrição de restos a pagar ultrapassa o limite permitido em lei configura erro de tipo 6 Consumação e tentativa A consumação deste crime que é omissivo próprio constitui verdadeira vexata questio pois é simplificar demais afirmar simplistamente que este crime consumase com a simples conduta negativa Sabido é que o crime omissivo próprio consumase no lugar e no momento em que a ação devida não se realiza A questão fundamental é afinal em que momento tal crime se consuma ou seja quando o sujeito ativo passa a ter o dever de agir quando assume o cargo ou função ou quando toma conhecimento da existência da situação fáticojurídica da existência de montante de restos a pagar inscrito em limite superior ao permitido por lei À evidência que a responsabilidade penal não pode ser presumida e ademais não se responde por algo que não se conhece consequentemente essa responsabilidade não pode ser automática decorrente da simples assunção do cargo ou função pois configuraria autêntica responsabilidade objetiva que foi proscrita do direito penal da culpabilidade Esse momento consumativo por evidente está completamente afastado por ser dogmaticamente insustentável Resta a segunda alternativa ou seja o administrador tem o dever jurídico de agir a partir do momento em que toma conhecimento da existência de restos a pagar inscritos em valor superior ao legalmente permitido Mas essa constatação ainda não resolve de todo a questão de quando ocorre o momento consumativo que tratando de crime omissivo ocorre quando deve agir e voluntariamente isto é podendo e devendo deixa de fazêlo A questão reside na dificuldade de identificar afinal em que momento da administração o sujeito ativo toma conhecimento dos fatos que pode ocorrer no primeiro dia no primeiro mês quem sabe no final do primeiro ano etc A solução dessa dificuldade será encontrada na prova que segundo os penalistas passa a ser um problema de processo penal Com a devida vênia em termos de crime omissivo é problema de direito material pois define não só o momento consumativo do crime como a sua própria configuração Enfim o problema está posto a dúvida levantada e a cautela recomendada A tentativa tratandose de crime omissivo próprio pela simples definição de sua consumação exsurge como inadmissível Se o agente deixa passar o momento em que devia agir consumase o crime se ainda pode agir não se pode falar em crime Até o momento em que a atividade do agente ainda é eficaz a ausência desta não constitui crime Se nesse momento a atividade devida não se realiza consuma se o crime Enfim como dissemos o crime omissivo próprio consuma se no lugar e no momento em que a atividade devida tinha de ser realizada 7 Conflito aparente de normas O sujeito ativo que não ordene ou não autorize o cancelamento de restos a pagar art 359F poderá ser o mesmo que ordena ou autoriza a inscrição de despesas não empenhadas em restos a pagar art 359 B À evidência que não poderá responder por fazer e por não fazer a mesma coisa ferindo o ne bis in idem A duplicidade da proibição tem um fundamento objetivam destinatários diferentes Quem praticou a conduta comissiva art 359B responderá apenas por ela somente poderá responder pela conduta omissiva art 359F quem não tiver sido autor da primeira 71 Exceção à teoria monística Sucessão de mandatários por exemplo quem deixa o cargo pode responder pela inscrição de despesas não empenhadas em restos a pagar art 359B quem assume pode responder por não ter determinado o cancelamento do montante de restos a pagar art 359 F inscrito em valor superior ao legalmente permitido Esses dois dispositivos assemelhamse à corrupção ativa e passiva oferecer receber neste caso fazer e não desfazer que não deixam de configurar as duas faces de uma mesma moeda Pela teoria adotada pelo Código Penal monística ou unitária deveriam responder pelo mesmo crime mas como o legislador preferiu disciplinálos em crimes distintos configura mais uma exceção à mencionada teoria ou seja não há concurso de pessoas entre os dois sujeitos ativos a menos que haja o vínculo subjetivo entre ambos quando então responderão pelos dois crimes hipótese de conluio 8 Pena e ação penal A pena isoladamente cominada é detenção de seis meses a dois anos A ação penal é de natureza pública incondicionada Aumento de despesa total com pessoal no último ano do mandato ou legislatura Art 359G Ordenar autorizar ou executar ato que acarrete aumento de despesa total com pessoal nos 180 cento e oitenta dias anteriores ao final do mandato ou da legislatura Pena reclusão de 1 um a 4 quatro anos Artigo acrescentado pela Lei n 10028 de 19 de outubro de 2000 D O U T R I N A Antecedentes legislativos arts 18 19 21 e 42 da Lei Complementar n 1012000 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a moralidade regularidade e equilíbrio das contas públicas nos âmbitos federal estadual e municipal Procurase impedir que o administrador público em final de mandato conceda benesses aos servidores públicos com fins eleitoreiros criando e atribuindo o ônus de seu cumprimento ao sucessor 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo Sujeito ativo é somente autoridade com mandato Tratase de crime próprio que exige especial condição pessoal na medida em que não basta ser funcionário público mas deve ser titular de mandato eletivo ou não com poderes decisórios em nome da Instituição ou Poder Público que representa Assim sujeito ativo é o Presidente da República do Senado da Câmara de Assembleias Legislativas de Câmaras de Vereadores de Tribunais etc o Governador do Estado os ProcuradoresGerais de Justiça da República dos Estados Advogado Geral da União DefensorGeral da União DefensorGeral do Estado do Município etc arts 42 e 20 2º da Lei n 1012000 Tratandose de mandatos sujeito ativo pode ser o eventual substituto legal Neste tipo penal sujeito ativo pode ser outra espécie de funcionário público que não o detentor de mandato quando a figura típica for a modalidade de executar Nessa hipótese normalmente o executor será um subordinado em regra o chamado ordenador de despesas que põe em prática a determinação superior revestida de ordem ou de autorização Contudo nada impede que o executor seja o próprio administrador isto é aquele que tem poder ou atribuição para ordenar ou autorizar a prática de ato que acarrete aumento de despesa com pessoal 22 Sujeito passivo Sujeito passivo por sua vez é a Administração Pública que pode ser representada pela União pelo Estado Distrito Federal ou Município Pode ser ademais outros órgãos ou instituições públicas tais como Poder Legislativo Poder Judiciário Ministério Público etc cujos representantes máximos são detentores de mandatos e gozam de poderes decisórios quanto a orçamentos despesas e finanças públicas em seus respectivos âmbitos 3 Tipo objetivo adequação típica As condutas tipificadas estão representadas pelos verbos nucleares ordenar autorizar e executar Os dois primeiros já tiveram seus sentidos e significados examinados em dispositivos anteriores para onde remetemos o leitor a fim de evitarmos a repetição enfadonha Executar significa realizar pôr em prática cumprir ordem ou autorização de superior promovendo ato que importe em aumento de despesa com pessoal nos últimos seis meses de mandato ou legislatura Quem ordena e autoriza em regra é a mesma autoridade ao passo que quem executa normalmente é outro funcionário embora possa ser realizada por quem tem poder ou atribuição para ordenar ou autorizar Procuramos evitar o termo mandante quando nos referimos ao sujeito ativo que ordena ou autoriza em razão de seu sentido técnicojurídico específico no campo do concurso de pessoas particularmente disciplinado pelas teorias do domínio do fato e da autoria mediata vide a respeito nosso Manual de Direito Penal Parte Geral 31 Despesa total com pessoal Despesa total com pessoal é o somatório dos gastos do ente da Federação com os ativos os inativos e os pensionistas relativos a mandatos eletivos cargos funções ou empregos civis militares e de membros de Poder com quaisquer espécies remuneratórias tais como vencimentos e vantagens fixas e variáveis subsídios proventos da aposentadoria reformas e pensões inclusive adicionais gratificações horas extras e vantagens pessoais de qualquer natureza bem como encargos sociais e contribuições recolhidas pelo ente às entidades de previdência art 18 da LC n 1012000 32 Elementar temporal A vedação criminal do acréscimo de despesa total com pessoal circunscrevese aos últimos seis meses de mandato ou de legislatura Esse aspecto não oferece nenhuma dificuldade Uma coisa é ordenar ou autorizar o aumento de despesa e outra é concretizar esse aumento de despesa isto é disponibilizar os recursos para honrar esse ônus O período seis meses a nosso juízo referese ao dispêndio efetivo ou seja desencaixe que o Tesouro faz para cumprir o ato administrativo anterior Assim está vedada a velha prática de alguns demagogos administradores que concediam aumentos e vantagens a servidores para vigorar no futuro a partir de determinada data particularmente em mandatos ou legislaturas futuras Mesmo que o ato concessivo tenha sido praticado antes do período depurador ainda assim tipificará conduta proibida neste dispositivo O eventual aumento de despesa total com pessoal fora do período proibido mesmo que infrinja outras normas administrativas ou fiscais não tipifica este crime 33 Executar obediência hierárquica O cumprimento de ordem legal não apresenta nenhuma conotação de ilicitude mesmo que configure alguma conduta típica ao contrário constitui causa de sua exclusão Quando a ordem for ilegal mas não manifestamente o subordinado que a cumpre não agirá com culpabilidade por ter avaliado incorretamente a ordem recebida incorrendo numa espécie de erro de proibição Agora se cumprir ordem manifestamente ilegal tanto o superior hierárquico quanto o subordinado são puníveis O subordinado não tem a obrigação de cumprir ordens ilegais Tem obrigação de cumprir ordens inconvenientes inoportunas mas não ilegais Não tem o direito como subordinado de discutir a oportunidade ou conveniência de uma ordem Mas a ilegalidade mais que o direito tem o dever de apontá la e negarse a cumprir ordem manifestamente ilegal 4 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de aumentar a despesa total com pessoal nos últimos seis meses de mandato ou legislatura Como não se admite dolo restrito parcial ou limitado este deve abranger completamente todos os elementos constitutivos do tipo e especialmente ter consciência de que aumenta a despesa nos últimos seis meses de mandato ou legislatura 41 Erro de tipo O eventual desconhecimento de que do ato que pratica acarretará aumento de despesa total com pessoal ou de que esse aumento se produzirá nos últimos seis meses do mandato ou legislatura ou de que já se encontra nesse período configura erro de tipo que exclui o dolo e por extensão a tipicidade art 20 caput do CP 5 Consumação e tentativa 51 Consumação Consumase o crime quando o ato ordenado ou autorizado é efetivamente executado no período proibido de seis meses de final de mandato Enquanto não for cumprida a ordem ou autorização não se produz qualquer efeito isto é não há qualquer lesividade ao patrimônio público e sem lesividade não se pode falar em crime A simples violação de dever norma puramente abstrata não pode constituir crime pois não há tipicidade material A modalidade de executar é crime material e somente se consuma com a efetiva realização do ato ordenado por quem tem atribuição para tal Tratase de crime formal nas figuras de ordenar ou autorizar cujo resultado não integra o tipo penal como ocorre nos crimes materiais o que não quer dizer que não exista pois o reflexo do aumento no orçamento público configura esse resultado 52 Tentativa Em nossa concepção é perfeitamente admissível a tentativa embora seja de difícil comprovação Parecenos possível o fracionamento da ação tipificada tratandose de crime plurissubsistente assim por exemplo quando a ordem ou autorização não é executada por circunstâncias alheias à vontade do agente configurase a forma tentada Quanto à figura de executar não há qualquer dúvida sobre a possibilidade de tentativa uma vez que se trata de crime material cuja ação pode facilmente ser dividida em vários atos Damásio de Jesus não admite nesse caso a tentativa nas modalidades de ordenar e autorizar pois as considera crimes de mera conduta Código Penal anotado 11 ed admitindoa contudo na modalidade de executar 6 Semelhanças e diferenças com o disposto no art 359C O art 359C criminaliza a conduta de ordenar ou autorizar assunção de obrigação nos dois últimos quadrimestres oito meses do mandato ou legislatura enquanto este dispositivo criminaliza o aumento de despesa com pessoal nos últimos seis meses do mandato ou legislatura Naquele dispositivo proíbese a assunção de obrigação cuja despesa não possa ser liquidada no mesmo exercício financeiro ou eventual resto a pagar no exercício seguinte não tenha contrapartida suficiente de disponibilidade de caixa ao passo que neste artigo punese o aumento de pessoal independentemente de poder ser resgatado no mesmo exercício no mesmo sentido Luiz Flávio Gomes e Alice Bianchini Crimes de responsabilidade fiscal cit Com efeito aumento de despesa com pessoal não se limita ao exercício na medida em que é constitucionalmente proibido reduzir vencimentos de servidores Assim os aumentos com servidores perpetuamse para o futuro onerando inevitavelmente os próximos exercícios financeiros Por outro lado a proibição constante do art 359C é abrangente genérica englobando toda e qualquer despesa enquanto a criminalização deste artigo 359G é restrita específica limitandose à despesa com pessoal Por fim o prazo depurador do primeiro dispositivo é de oito meses dois quadrimestres enquanto o do segundo é seis meses cento e oitenta dias Significa dizer que embora já esteja proibida a assunção de obrigação a ser resgatada no ano seguinte a partir do oitavo último mês será possível efetuar gastos com pessoal antes de ingressar no sexto mês E não há nisso nenhum paradoxo na medida em que a especificidade dos encargos acaba autorizando essa praxis 7 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é reclusão de um a quatro anos A natureza da ação penal é pública incondicionada Oferta pública ou colocação de títulos no mercado Art 359H Ordenar autorizar ou promover a oferta pública ou a colocação no mercado financeiro de títulos da dívida pública sem que tenham sido criados por lei ou sem que estejam registrados em sistema centralizado de liquidação e de custódia Pena reclusão de 1 um a 4 quatro anos Artigo acrescentado pela Lei n 10028 de 19 de outubro de 2000 D O U T R I N A Antecedentes legislativos arts 29 II 30 e parágrafos e toda a Seção IV do Capítulo VII da LC n 1012000 1 Bem jurídico tutelado Bem jurídico protegido é a lisura da dívida pública mobiliária nas respectivas áreas federal estadual e municipal Criminalizase a movimentação ilegal de títulos da dívida pública quer por não existirem legalmente não foram criados por lei quer por não estarem devidamente registrados em sistema centralizado de liquidação e custódia 2 Sujeitos do crime 21 Sujeito ativo Sujeito ativo é somente autoridade pública com poderes decisórios em nome do ente federativo Neste tipo penal sujeito ativo pode ser outra espécie de funcionário público quando a figura típica for a modalidade de promover que em tese é subordinado com a função de executar a ordem ou autorização do sujeito ativo das outras figuras delitivas 22 Sujeito passivo Sujeito passivo imediato por sua vez é a Administração Pública que pode ser representada pela União pelo Estado Distrito Federal ou Município Pode ser ademais sujeito passivo mediato qualquer terceiro prejudicado com a compra de títulos irregulares que certamente causarão prejuízos consideráveis 3 Tipo objetivo adequação típica As condutas criminalizadas estão representadas pelos verbos ordenar autorizar e promover Os dois primeiros já foram exaustivamente examinados e definidos sendo desnecessário repetir Promover no entanto significa realizar executar levar a efeito isto é cumprir a ordem ou autorização do superior Quem ordena e autoriza em regra é a mesma autoridade ao passo que quem promove ou executa normalmente é outro funcionário embora possa ser o mesmo sujeito ativo que tem poder ou atribuição para ordenar ou autorizar O sujeito ativo pode praticar o crime realizando qualquer das três condutas tipificadas por meio de oferta pública ou colocação no mercado financeiro de títulos da dívida pública que não tenham sido criados por lei ou que não tenham sido registrados no sistema centralizado de liquidação e custódia Para nós o sujeito ativo que ordena é o mesmo que autoriza isto é um mesmo agente pode praticar qualquer das duas condutas que dependendo das circunstâncias pode assumir a natureza de ordem ou de autorização a diversidade de formas de condutas procura ampliar a abrangência das ações que possivelmente podem ser realizadas sem qualquer conotação com a espécie ou natureza do sujeito ativo que nessas modalidades será sempre quem tiver poder ou atribuição para decidir a comercialização dos títulos mobiliários da dívida pública em sua área de atuação federal estadual ou municipal 4 Controle jurídico ou legislativo O controle a nosso juízo não é legislativo mas jurídico na medida em que a comercialização de títulos da dívida pública por este dispositivo está condicionada a sua criação por lei Com efeito o controle do comércio e títulos da dívida pública pelo menos na seara criminal não está condicionado a resoluções legislativas quer da esfera federal quer estadual ou mesmo municipal Portanto o controle é jurídico e não legislativo 5 Tipo subjetivo adequação típica Elemento subjetivo é o dolo representado pela vontade consciente de comercializar títulos da dívida pública legalmente inexistentes ou sem o devido registro no sistema centralizado de liquidação e custódia Como não existe dolo presumido é indispensável que o sujeito ativo saiba que o título que comercializa não foi criado por lei ou que a despeito de legalmente existente não foi registrado no sistema centralizado de liquidação e de custódia O eventual desconhecimento de que os títulos não foram legalmente criados ou de que não se encontram devidamente registrados no órgão próprio torna a conduta atípica já que tais elementares típicas não foram abrangidas pelo dolo É irrelevante para a tipificação deste crime a existência eventual de algum fim especial na medida em que o tipo não exige nenhum elemento subjetivo especial do injusto Não há previsão de modalidade culposa 51 Erro de tipo Se o sujeito ativo pratica qualquer das figuras tipificadas neste dispositivo imaginando que os títulos estão em situação regular isto é que foram legalmente criados e que estão regularmente inscritos no órgão próprio quando concretamente nenhuma dessas circunstâncias existe incorre em erro de tipo pois seu dolo não abrangeu essas ausências que imaginava existentes 52 Erro de proibição Se o sujeito ativo pratica qualquer das condutas ignorando que eles deveriam ser criados por lei ou desconhecendo que não basta ser legalmente criados mas que ainda necessitam ser devidamente inscritos no órgão próprio desconhecendo enfim essa exigência legal incorre em erro de proibição que pode ser evitável ou inevitável 6 Consumação e tentativa 61 Consumação Consumase o crime quando o ato ordenado ou autorizado é efetivamente executado isto é quando se operacionaliza a oferta pública ou colocação no mercado financeiro dos títulos da dívida pública inexistentes legalmente ou não regularmente inscritos no órgão próprio Enquanto não for cumprida a ordem ou autorização não se produz qualquer efeito isto é não há qualquer lesão ao patrimônio público e sem lesão não se pode falar em crime A simples inobservância de dever norma puramente abstrata não pode constituir crime pois não há tipicidade material A modalidade de promover constitui crime material e somente se consuma com a efetiva colocação dos títulos no mercado financeiro As figuras de ordenar ou autorizar constituem crimes formais o resultado não integra o tipo penal ao contrário do que ocorre com os crimes materiais o que não quer dizer que não exista 62 Tentativa Em nossa concepção nas figuras de ordenar e autorizar é admissível a tentativa embora seja de difícil comprovação É possível o fracionamento dessas ações tipificadas tratandose de crime plurissubsistente assim por exemplo quando a ordem ou autorização não é cumprida por circunstâncias alheias à vontade do agente configurase a forma tentada Quanto à figura de promover não há qualquer dificuldade sobre a possibilidade de tentativa uma vez que se trata de crime material cuja ação pode facilmente ser dividida em vários atos Damásio de Jesus não admite nesse caso a tentativa nas modalidades de ordenar e autorizar Código Penal anotado 11 ed admitindoa contudo na modalidade de promover 7 Pena e ação penal A pena cominada isoladamente é reclusão de um a quatro anos A natureza da ação penal aliás como de resto de todos os crimes contra as finanças públicas é pública incondicionada DISPOSIÇÕES FINAIS Art 360 Ressalvada a legislação especial sobre os crimes contra a existência a segurança e a integridade do Estado e contra a guarda e o emprego da economia popular os crimes de imprensa e os de falência os de responsabilidade do Presidente da República e dos Governadores ou Interventores e os crimes militares revogamse as disposições em contrário Art 361 Este Código entrará em vigor no dia 1º de janeiro de 1942 Rio de Janeiro 7 de dezembro de 1940 119º da Independência e 52º da República Getúlio Vargas Francisco Campos SÚMULAS DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL 1 É vedada a expulsão de estrangeiro casado com brasileira ou que tenha filho brasileiro dependente da economia paterna 18 Pela falta residual não compreendida na absolvição pelo juízo criminal é admissível a punição administrativa do servidor público 145 Não há crime quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação 146 A prescrição da ação penal regulase pela pena concretizada na sentença quando não há recurso da acusação 147 A prescrição de crime falimentar começa a correr da data em que deveria estar encerrada a falência ou do trânsito em julgado da sentença que a encerrar ou que julgar cumprida a concordata 245 A imunidade parlamentar não se estende ao corréu sem essa prerrogativa 246 Comprovado não ter havido fraude não se configura o crime de emissão de cheque sem fundos 298 O legislador ordinário só pode sujeitar civis à Justiça Militar em tempo de paz nos crimes contra a segurança externa do País ou as instituições militares 310 Quando a intimação tiver lugar na sextafeira ou a publicação com efeito de intimação for feita nesse dia o prazo judicial terá início na segundafeira imediata salvo se não houver expediente caso em que começará no primeiro dia útil que se seguir 362 A condição de ter o clube sede própria para a prática de jogo lícito não o obriga a ser proprietário do imóvel em que tem sede 420 Não se homologa sentença proferida no estrangeiro sem prova de trânsito em julgado 421 Não impede a extradição a circunstância de ser o extraditando casado com brasileira ou ter filho brasileiro 422 A absolvição criminal não prejudica a medida de segurança quando couber ainda que importe privação da liberdade 496 São válidos porque salvaguardados pelas disposições constitucionais transitórias da Constituição Federal de 1967 os Decretosleis expedidos entre 24 de janeiro e 15 de março de 1967 497 Quando se tratar de crime continuado a prescrição regulase pela pena imposta na sentença não se computando o acréscimo decorrente da continuação 498 Compete à Justiça dos Estados em ambas as instâncias o processo e o julgamento dos crimes contra a economia popular 499 Não obsta à concessão do sursis condenação anterior à pena de multa 521 O foro competente para o processo e julgamento dos crimes de estelionato sob a modalidade da emissão dolosa de cheque sem provisão de fundos é o do local onde se deu a recusa do pagamento pelo sacado 522 Salvo ocorrência de tráfico para o exterior quando então a competência será da Justiça Federal compete à Justiça dos Estados o processo e julgamento dos crimes relativos a entorpecentes 525 A medida de segurança não será aplicada em segunda instância quando só o réu tenha recorrido 554 O pagamento de cheque emitido sem provisão de fundos após o recebimento da denúncia não obsta ao prosseguimento da ação penal 592 Nos crimes falimentares aplicamse as causas interruptivas da prescrição previstas no Código Penal 594 Os direitos de queixa e de representação podem ser exercidos independentemente pelo ofendido ou por seu representante legal 601 Os arts 3º II e 55 da Lei Complementar n 4081 Lei Orgânica do Ministério Público não revogaram a legislação anterior que atribui a iniciativa para a ação penal pública no processo sumário ao juiz ou à autoridade policial mediante portaria ou auto de prisão em flagrante 604 A prescrição pela pena em concreto é somente da pretensão executória da pena privativa de liberdade 605 Não se admite continuidade delitiva nos crimes contra a vida 608 No crime de estupro praticado mediante violência real a ação penal é pública incondicionada 609 É pública incondicionada a ação penal por crime de sonegação fiscal 610 Há crime de latrocínio quando o homicídio se consuma ainda que não realize o agente a subtração de bens da vítima 611 Transitada em julgado a sentença condenatória compete ao juízo das execuções a aplicação da lei mais benigna 640 É cabível recurso extraordinário contra decisão proferida por juiz de primeiro grau nas causas de alçada ou por turma recursal de juizado especial cível e criminal 654 A garantia da irretroatividade da lei prevista no art 5º XXXVI da Constituição da República não é invocável pela entidade estatal que a tenha editado 655 A exceção prevista no art 100 caput da Constituição em favor dos créditos de natureza alimentícia não dispensa a expedição de precatório limitandose a isentálos da observância da ordem cronológica dos precatórios decorrentes de condenações de outra natureza 673 O art 125 4º da Constituição não impede a perda da graduação de militar mediante procedimento administrativo 690 Compete ao Supremo Tribunal Federal o julgamento de habeas corpus contra decisão de turma recursal de juizados especiais criminais 691 Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do Relator que em habeas corpus requerido a tribunal superior indefere a liminar 692 Não se conhece de habeas corpus contra omissão de relator de extradição se fundado em fato ou direito estrangeiro cuja prova não constava dos autos nem foi ele provocado a respeito 693 Não cabe habeas corpus contra decisão condenatória a pena de multa ou relativo a processo em curso por infração penal a que a pena pecuniária seja a única cominada 694 Não cabe habeas corpus contra a imposição da pena de exclusão de militar ou de perda de patente ou de função pública 695 Não cabe habeas corpus quando já extinta a pena privativa de liberdade 696 Reunidos os pressupostos legais permissivos da suspensão condicional do processo mas se recusando o Promotor de Justiça a propôla o Juiz dissentindo remeterá a questão ao Procurador Geral aplicandose por analogia o art 28 do Código de Processo Penal 697 A proibição de liberdade provisória nos processos por crimes hediondos não veda o relaxamento de prisão processual por excesso de prazo 698 Não se estende aos demais crimes hediondos a admissibilidade de progressão no regime de execução da pena aplicada ao crime de tortura 699 O prazo para interposição de agravo em processo penal é de cinco dias de acordo com a Lei n 803890 não se aplicando o disposto a respeito nas alterações da Lei n 895094 ao Código de Processo Civil 700 É de cinco dias o prazo para interposição de agravo contra decisão do juiz da execução penal 701 No mandado de segurança impetrado pelo Ministério Público contra decisão proferida em processo penal é obrigatória a citação do réu como litisconsorte passivo 702 A competência do Tribunal de Justiça para julgar Prefeitos restringese aos crimes de competência da Justiça comum estadual nos demais casos a competência originária caberá ao respectivo tribunal de segundo grau 703 A extinção do mandato do Prefeito não impede a instauração de processo pela prática dos crimes previstos no art 1º do Decretolei n 20167 704 Não viola as garantias do juiz natural da ampla defesa e do devido processo legal a atração por continência ou conexão do processo do corréu ao foro por prerrogativa de função de um dos denunciados 705 A renúncia do réu ao direito de apelação manifestada sem a assistência do defensor não impede o conhecimento da apelação por este interposta 706 É relativa a nulidade decorrente da inobservância da competência penal por prevenção 707 Constitui nulidade a falta de intimação do denunciado para oferecer contrarrazões ao recurso interposto da rejeição da denúncia não a suprindo a nomeação de defensor dativo 708 É nulo o julgamento da apelação se após a manifestação nos autos da renúncia do único defensor o réu não foi previamente intimado para constituir outro 709 Salvo quando nula a decisão de primeiro grau o acórdão que provê o recurso contra a rejeição da denúncia vale desde logo pelo recebimento dela 710 No processo penal contamse os prazos da data da intimação e não da juntada aos autos do mandado ou da carta precatória ou de ordem 711 A lei penal mais grave aplicase ao crime continuado ou ao crime permanente se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência 712 É nula a decisão que determina o desaforamento de processo da competência do Júri sem audiência da defesa 713 O efeito devolutivo da apelação contra decisões do Júri é adstrito aos fundamentos da sua interposição 714 É concorrente a legitimidade do ofendido mediante queixa e do Ministério Público condicionada à representação do ofendido para a ação penal por crime contra a honra de servidor público em razão do exercício de suas funções 715 A pena unificada para atender ao limite de trinta anos de cumprimento determinado pelo art 75 do Código Penal não é considerada para a concessão de outros benefícios como o livramento condicional ou regime mais favorável de execução 716 Admitese a progressão de regime de cumprimento de pena ou a aplicação imediata de regime menos severo nela determinada antes do trânsito em julgado da sentença condenatória 717 Não impede a progressão de regime de execução da pena fixada em sentença não transitada em julgado o fato de o réu se encontrar em prisão especial 718 A opinião do julgador sobre a gravidade em abstrato do crime não constitui motivação idônea para a imposição de regime mais severo do que o permitido segundo a pena aplicada 719 A imposição do regime de cumprimento mais severo do que a pena aplicada permitir exige motivação idônea 720 O art 309 do Código de Trânsito Brasileiro que reclama decorra do fato perigo de dano derrogou o art 32 da Lei das Contravenções Penais no tocante à direção sem habilitação em vias terrestres 721 A competência constitucional do Tribunal do Júri prevalece sobre o foro por prerrogativa de função estabelecido exclusivamente pela Constituição estadual 722 São da competência legislativa da União a definição dos crimes de responsabilidade e o estabelecimento das respectivas normas de processo e julgamento 723 Não se admite a suspensão condicional do processo por crime continuado se a soma da pena mínima da infração mais grave com o aumento mínimo de um sexto for superior a um ano SÚMULAS VINCULANTES 1 Ofende a garantia constitucional do ato jurídico perfeito a decisão que sem ponderar as circunstâncias do caso concreto desconsidera a validez e a eficácia de acordo constante de termo de adesão instituído pela Lei Complementar n 1102001 2 É inconstitucional a lei ou ato normativo estadual ou distrital que disponha sobre sistemas de consórcios e sorteios inclusive bingos e loterias 3 Nos processos perante o Tribunal de Contas da União asseguramse o contraditório e a ampla defesa quando da decisão puder resultar anulação ou revogação de ato administrativo que beneficie o interessado excetuada a apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria reforma e pensão 4 Salvo nos casos previstos na Constituição o salário mínimo não pode ser usado como indexador de base de cálculo de vantagem de servidor público ou de empregado nem ser substituído por decisão judicial 5 A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição 6 Não viola a Constituição o estabelecimento de remuneração inferior ao salário mínimo para as praças prestadoras de serviço militar inicial 7 A norma do 3º do artigo 192 da Constituição revogada pela Emenda Constitucional n 402003 que limitava a taxa de juros reais a 12 ao ano tinha sua aplicação condicionada à edição de lei complementar 8 São inconstitucionais o parágrafo único do art 5º do Decretolei n 15691977 e os arts 45 e 46 da Lei n 82121991 que tratam de prescrição e decadência de crédito tributário 9 O disposto no art 127 da Lei n 72101984 Lei de Execução Penal foi recebido pela ordem constitucional vigente e não se lhe aplica o limite temporal previsto no caput do art 58 10 Viola a cláusula de reserva de plenário CF art 97 a decisão de órgão fracionário de Tribunal que embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público afasta sua incidência no todo ou em parte 11 Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia por parte do preso ou de terceiros justificada a excepcionalidade por escrito sob pena de responsabilidade disciplinar civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado 12 A cobrança de taxa de matrícula nas universidades públicas viola o disposto no art 206 IV da Constituição Federal 13 A nomeação de cônjuge companheiro ou parente em linha reta colateral ou por afinidade até o terceiro grau inclusive da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção chefia ou assessoramento para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou ainda de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos Poderes da União dos Estados do Distrito Federal e dos Municípios compreendido o ajuste mediante designações recíprocas viola a Constituição Federal 14 É direito do defensor no interesse do representado ter acesso amplo aos elementos de prova que já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária digam respeito ao exercício do direito de defesa 15 O cálculo de gratificações e outras vantagens do servidor público não incide sobre o abono utilizado para se atingir o salário mínimo 16 Os arts 7º IV e 39 3º redação da EC n 1998 da Constituição referemse ao total da remuneração percebida pelo servidor público 17 Durante o período previsto no parágrafo 1º do art 100 da Constituição não incidem juros de mora sobre os precatórios que nele sejam pagos 18 A dissolução da sociedade ou do vínculo conjugal no curso do mandato não afasta a inelegibilidade prevista no 7º do art 14 da Constituição Federal 19 A taxa cobrada exclusivamente em razão dos serviços públicos de coleta remoção e tratamento ou destinação de lixo ou resíduos provenientes de imóveis não viola o art 145 II da Constituição Federal 20 A Gratificação de Desempenho de Atividade Técnico Administrativa GDATA instituída pela Lei n 104042002 deve ser deferida aos inativos nos valores correspondentes a 375 trinta e sete vírgula cinco pontos no período de fevereiro a maio de 2002 e nos termos do art 5º parágrafo único da Lei n 104042002 no período de junho de 2002 até a conclusão dos efeitos do último ciclo de avaliação a que se refere o art 1º da Medida Provisória n 1982004 a partir da qual passa a ser de 60 sessenta pontos 21 É inconstitucional a exigência de depósito ou arrolamento prévios de dinheiro ou bens para admissibilidade de recurso administrativo 22 A Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar as ações de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente de trabalho propostas por empregado contra empregador inclusive aquelas que ainda não possuíam sentença de mérito em primeiro grau quando da promulgação da Emenda Constitucional n 4504 23 A Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar ação possessória ajuizada em decorrência do exercício do direito de greve pelos trabalhadores da iniciativa privada 24 Não se tipifica crime material contra a ordem tributária previsto no art 1º incisos I a IV da Lei n 813790 antes do lançamento definitivo do tributo 25 É ilícita a prisão civil de depositário infiel qualquer que seja a modalidade do depósito 26 Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime hediondo ou equiparado o juízo da execução observará a inconstitucionalidade do art 2º da Lei n 8072 de 25 de julho de 1990 sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche ou não os requisitos objetivos e subjetivos do benefício podendo determinar para tal fim de modo fundamentado a realização de exame criminológico 27 Compete à Justiça estadual julgar causas entre consumidor e concessionária de serviço público de telefonia quando a ANATEL não seja litisconsorte passiva necessária assistente nem opoente 28 É inconstitucional a exigência de depósito prévio como requisito de admissibilidade de ação judicial na qual se pretenda discutir a exigibilidade de crédito tributário 29 É constitucional a adoção no cálculo do valor de taxa de um ou mais elementos da base de cálculo própria de determinado imposto desde que não haja integral identidade entre uma base e outra 31 É inconstitucional a incidência do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza ISS sobre operações de locação de bens móveis 32 O ICMS não incide sobre alienação de salvados de sinistro pelas seguradoras SÚMULAS DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 9 A exigência de prisão provisória para apelar não ofende a garantia constitucional da presunção de inocência 17 Quando o falso se exaure no estelionato sem mais potencialidade lesiva é por este absorvido 18 A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória da extinção da punibilidade não subsistindo qualquer efeito condenatório 24 Aplicase ao crime de estelionato em que figure como vítima entidade autárquica da Previdência Social a qualificadora do 3º do art 171 do Código Penal 38 Compete à Justiça Estadual Comum na vigência da Constituição de 1988 o processo por contravenção penal ainda que praticada em detrimento de bens serviços ou interesse da União ou de suas entidades 40 Para obtenção dos benefícios de saída temporária e trabalho externo considerase o tempo de cumprimento da pena no regime fechado 48 Compete ao juízo do local da obtenção da vantagem ilícita processar e julgar crime de estelionato cometido mediante falsificação de cheque 51 A punição do intermediador no jogo do bicho independe da identificação do apostador ou do banqueiro 73 A utilização de papelmoeda grosseiramente falsificado configura em tese o crime de estelionato da competência da Justiça Estadual 74 Para efeitos penais o reconhecimento da menoridade do réu requer prova por documento hábil 90 Compete à Justiça Estadual Militar processar e julgar o policial militar pela prática do crime militar e à Comum pela prática do crime comum simultâneo àquele 96 O crime de extorsão consumase independentemente da obtenção da vantagem indevida 104 Compete à Justiça Estadual o processo e julgamento dos crimes de falsificação e uso de documento falso relativo a estabelecimento particular de ensino 107 Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar crime de estelionato praticado mediante falsificação das guias de recolhimento das contribuições previdenciárias quando não ocorrente lesão à autarquia federal 108 A aplicação de medidas socioeducativas ao adolescente pela prática de ato infracional é de competência exclusiva do juiz 122 Compete à Justiça Federal o processo e julgamento unificado dos crimes conexos de competência federal e estadual não se aplicando a regra do art 78 II a do Código de Processo Penal 140 Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar crime em que o indígena figure como autor ou vítima 147 Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes praticados contra funcionário público federal quando relacionados com o exercício da função 151 A competência para o processo e julgamento por crime de contrabando ou descaminho definese pela prevenção do Juízo Federal do lugar da apreensão dos bens 164 O prefeito municipal após a extinção do mandato continua sujeito a processo por crime previsto no art 1º do Decretolei n 201 de 27 de fevereiro de 1967 165 Compete à Justiça Federal processar e julgar crime de falso testemunho cometido no processo trabalhista 171 Cominadas cumulativamente em lei especial penas privativa de liberdade e pecuniária é defeso a substituição da prisão por multa 172 Compete à Justiça Comum processar e julgar militar por crime de abuso de autoridade ainda que praticado em serviço 186 Nas indenizações por ato ilícito os juros compostos somente são devidos por aquele que praticou o crime 191 A pronúncia é causa interruptiva da prescrição ainda que o Tribunal do Júri venha a desclassificar o crime 192 Compete ao Juízo das Execuções Penais do Estado a execução das penas impostas a sentenciados pela Justiça Federal Militar ou Eleitoral quando recolhidos a estabelecimentos sujeitos à administração estadual 200 O Juízo Federal competente para processar e julgar acusado de crime de uso de passaporte falso é o do lugar onde o delito se consumou 203 Não cabe recurso especial contra decisão proferida por órgão de segundo grau dos Juizados Especiais 208 Compete à Justiça Federal processar e julgar prefeito municipal por desvio de verba sujeita a prestação de contas perante órgão federal 209 Compete à Justiça Estadual processar e julgar prefeito por desvio de verba transferida e incorporada ao patrimônio municipal 220 A reincidência não influi no prazo da prescrição da pretensão punitiva 231 A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal 234 A participação de membro do Ministério Público na fase investigatória criminal não acarreta o seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia 241 A reincidência penal não pode ser considerada como circunstância agravante e simultaneamente como circunstância judicial 243 O benefício da suspensão do processo não é aplicável em relação às infrações penais cometidas em concurso material concurso formal ou continuidade delitiva quando a pena mínima cominada seja pelo somatório seja pela incidência da majorante ultrapassar o limite de um 01 ano 244 Compete ao foro local da recusa processar e julgar o crime de estelionato mediante cheque sem provisão de fundos 265 É necessária a oitiva do menor infrator antes de decretarse a regressão da medida socioeducativa 267 A interposição do recurso sem efeito suspensivo contra decisão condenatória não obsta a expedição de mandado de prisão 269 É admissível a adoção do regime prisional semiaberto aos reincidentes condenados a pena igual ou inferior a 4 quatro anos se favoráveis as circunstâncias judiciais 329 O Ministério Público tem legitimidade para propor ação civil pública em defesa do patrimônio público 330 É desnecessária a resposta preliminar de que trata o art 514 do Código de Processo Penal na ação penal instruída por inquérito policial 337 É cabível a suspensão condicional do processo na desclassificação do crime e na procedência parcial da pretensão punitiva 338 A prescrição penal é aplicável nas medidas socioeducativas 341 A frequência a curso de ensino formal é causa de remição de parte do tempo de execução de pena sob regime fechado ou semiaberto 342 No procedimento para aplicação de medida socioeducativa é nula a desistência de outras provas em face da confissão do adolescente 347 O conhecimento de recurso de apelação do réu independe de sua prisão