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A ANÁLISE DA CAPACIDADE CIVIL À LUZ DO ESTATUTO DO DEFICIENTE INCLUSÃO PROTEÇÃO OU DESPROTEÇÃO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA The analysis of civil capacity in the light of the statute of deficiency inclusion protection or lack of protection of the dignity of the human person Revista dos Tribunais vol 9892018 p 83 124 Mar 2018 DTR201810306 Cláudia Mara de Almeida Rabelo Viegas Doutora e Mestre em Direito Privado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Gama Filho Especialista em Educação à Distância pela PUC Minas Especialista em Direito Público Ciências Criminais pelo Complexo Educacional Damásio de Jesus Bacharel em Administração de Empresas e Direito pela Universidade FUMEC Coordenadora do Curso de Direito da UNIESP Faculdade de Belo Horizonte Professora de Direito da PUC Minas e UniESP Proftutora do Conselho Nacional de Justiça CNJ Servidora Pública Federal do TRT MG Assistente do Desembargador Corregedor claudiamaraviegasyahoocombr João Paulo de Carvalho Cruz Bacharel em Direito pela UniESP Faculdade de Belo Horizonte 2º Sargento da Polícia Militar de Minas Gerais jpdihotmailcom Área do Direito Civil Direitos Humanos Resumo Buscase no presente estudo analisar as alterações nos institutos da capacidade e incapacidade civil promovidas pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência Lei 131462015 verificando especialmente as implicações promovidas na vida das pessoas em situação de vulnerabilidade O referido diploma legal sob o argumento de proporcionar um tratamento mais digno às pessoas portadoras de deficiência limitou a incapacidade absoluta apenas aos menores de 16 anos de idade restringindose os efeitos da incapacidade relativa aos demais sobretudo àqueles indivíduos que não exprimem a vontade transitória ou permanentemente reconhecendo desse modo a relativa incapacidade sem levar em conta a situação fática da pessoa humana Diante de tal contexto e partindo da premissa de que a teoria das incapacidades até então conferiu tratamento adequado e diferenciado às pessoas em posição jurídica vulnerável pretendese por meio de estudo investigativo bibliográfico e discursivo demonstrar a impropriedade de se impor uma condição jurídica de incapacidade relativa sem contudo considerar a condição fática da pessoa humana Desse modo quer se investigar se a imposição indiscriminada da capacidade civil promovida pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência resulta em prejuízo para as pessoas em situação de vulnerabilidade e também em conflito jurídiconormativo Palavraschave Capacidade civil Incapacidade Vulnerabilidade Desproteção Conflito normativo Abstract This study aims to analyze the changes in the institutes of capacity and civil incapacity promoted by the Statute of the Person with Disability Law 13146 2015 especially checking the implications promoted in the lives of people in situations of vulnerability Said law on the grounds of providing a more dignified treatment to persons with disabilities limited absolute incapacity only to those under 16 years of age restricting the effects of incapacity relative to others especially to individuals who do not express the will transient or permanently thus recognizing the relative incapacity without taking into account the factual situation of the human person In view of such a context and based on the premise that the theory of disabilities so far has given adequate and differentiated treatment to people in a vulnerable legal position it is intended through a bibliographical and discursive research study to demonstrate the impropriety of imposing a condition of relative incapacity without however considering A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 1 the factual condition of the human person In this way it is sought to investigate whether the indiscriminate imposition of civil capacity promoted by the Disability Statute results in damage to people in situations of vulnerability and also in legalnormative conflict Keywords Civil Capacity Inability Vulnerability Deprotection Normative conflict Sumário 1Introdução 2A capacidade civil 3A incapacidade 4A desproteção 5Os conflitos do estatuto da pessoa com deficiência com o ordenamento pátrio e os reflexos nos hipossuficientes 6Conclusão 7Referências 1Introdução Em 6 de julho de 2015 foi publicada a Lei 13146 que institui o Estatuto da Pessoa com Deficiência diploma legal que tem por base a orientação para sua criação proveniente da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu protocolo facultativo assinados em Nova Iorque em 30 de março de 2007 ratificados no Brasil em 9 de julho de 2008 por meio do Decreto Legislativo 186 Traduzindo o objetivo de não discriminação inclusão social e equiparação de oportunidades às pessoas com deficiência o referido Estatuto veio à tona com o objetivo precípuo de assegurar e promover em condições de igualdade o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoas com deficiência Com o argumento de buscar a igualdade para promover a dignidade da pessoa humana o diploma legal proporcionou modificações substanciais no ordenamento jurídico brasileiro sobretudo na teoria das capacidades do Direito Civil Brasileiro Nessa senda pretendese investigar se as mudanças promovidas pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência causaram desamparo às pessoas em situação de extrema vulnerabilidade sobretudo àquelas que não exprimem vontade O estudo se justifica pois na contramão da realidade fática o ordenamento jurídico passou a tratar tais indivíduos como relativamente incapazes apenas à prática de certos atos sendo que na realidade não têm condições de praticar ato algum Tal situação deixa evidente que o véu da inclusão pode gerar a desproteção perdendo o indivíduo que não exprime sua vontade às prerrogativas legais de proteção relacionadas à incapacidade absoluta prescrição etc 2A capacidade civil A personalidade jurídica é a aptidão genérica para titularizar direitos e contrair obrigações em outras palavras é o atributo para ser sujeito de direito A capacidade civil da pessoa decorre de sua personalidade ou seja uma vez adquirida a personalidade jurídica o indivíduo se capacita a ser titular de direitos e obrigações Para Marcos Bernardes de Mello1 capacidade jurídica é a aptidão que o ordenamento jurídico atribui às pessoas em geral e a certos entes em particular estes formados por grupos de pessoas ou universalidades patrimoniais para serem titulares de uma situação jurídica Apesar de similares e interligados devido à capacidade civil do indivíduo decorrer da sua própria personalidade jurídica tais institutos diferemse e não devem ser entendidos como sinônimos Carlos Roberto Gonçalves2 alerta que embora se interpenetrem tais atributos não se confundem uma vez que a capacidade pode sofrer limitação A personalidade é ampla e irrestrita ao passo que a capacidade civil se mostra limitada à análise de discernimento devendose levar em conta se o indivíduo possui ou não condições para praticar autonomamente os atos da vida civil Seguindo essa linha o instituto da capacidade se divide em capacidade de gozo ou de direito atributo inerente A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 2 a todo o ser humano que nasceu com vida no Brasil e a capacidade de fato ou de exercício a aptidão do indivíduo para praticar por ele mesmo os atos da vida civil sendo em regra adquirida aos 18 anos ou por meio da emancipação Entretanto como não são todas as pessoas que reúnem condições para tal poderá o indivíduo ter sua capacidade de fato ou de exercício limitada como é o caso dos relativamente incapazes ou até mesmo não a possuir como os absolutamente incapazes Assim como a personalidade o instituto da legitimação muito se assemelha à capacidade no entanto não se confundem A legitimação é exigida apenas para prática de alguns atos jurídicos que necessitam de capacidade especial para que o indivíduo possa realizálos mesmo que seja detentor de capacidade civil Como exemplo vejase o cônjuge casado em regime de comunhão de bens que pretende alienar o imóvel do casal Não obstante seja capaz civilmente necessita da outorga do outro cônjuge para praticar o ato pretendido nos termos do art 1647 do CC02 LGL20024003in verbis Ressalvado o disposto no art 1648 nenhum dos cônjuges pode sem autorização do outro exceto no regime da separação absoluta I alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis Destacase por fim que ordenamento jurídico brasileiro adotou a regra a capacidade do indivíduo como regra adquirida pelo critério objetivo da lei 18 anos de idade e emancipação Portanto somente haverá limitação ou ausência de capacidade nas hipóteses expressamente elencadas no rol taxativo do CC02 LGL2002400 arts 3º e 4º inexistindo aplicação da teoria dos intervalos lúcidos 21Capacidade X imputabilidade Importante para esse estudo distinguir a capacidade civil da imputabilidade pois conquanto sejam institutos diversos que vigoram inclusive em áreas distintas por vezes são confundidos A capacidade civil conforme já dito é a aptidão para o indivíduo praticar por si os atos da vida civil ou os atos da vida privada disciplinada no Código civil de 2002 quem a possui e as consequências dos atos praticados em caso de incapacidade A imputabilidade por sua vez pertence à esfera do Direito Penal e se refere à aptidão do indivíduo para que lhe seja imputado um fato típico e antijurídico e suas consequências Segundo Rogerio Greco4 a imputabilidade é a possibilidade de se atribuir imputar o fato típico e ilícito ao agente A imputabilidade é a regra a inimputabilidade a exceção são os casos de acometimento de doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado mental que retira do indivíduo a capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou o caso de ter o indivíduo menos de 18 anos expressamente dispostos nos arts 26 e 27 do Decretolei 2848 de 7 de dezembro de 1940 Código Penal LGL194025 nesses casos temse portanto a inimputabilidade A referida norma assim dispõe Art 26 É isento de pena o agente que por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado era ao tempo da ação ou da omissão inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento Art 27 Os menores de 18 dezoito anos são penalmente inimputáveis ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial Cabe destacar que o Estatuto da Pessoa com Deficiência alterou os institutos da capacidade e das incapacidades proporcionando mudanças significativas no ordenamento jurídico brasileiro todavia não alterou os institutos da imputabilidade e da inimputabilidade circunstância que importa em sério conflito que será tratado em seguida A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 3 3A incapacidade Sendo a capacidade de fato a aptidão para praticar atos da vida civil de modo autônomo quando um indivíduo possui limitações em sua capacidade o ordenamento o considera como incapaz Contudo essa limitação carece de cautela O indivíduo ao nascer com vida adquire a personalidade com isso tornase titular de direitos e deveres na ordem jurídica em outras palavras um sujeito de direitos Entretanto não obstante isso algumas pessoas não possuem as condições necessárias para exercer per si os seus direitos Historicamente o instituto das capacidades adota a premissa moderna na definição da incapacidade reconhecendoa a partir da falta ou da limitação do discernimento do indivíduo e não a partir de uma classe ou de uma simples condição a qual a pessoa possua como ocorria no Código de 1916 Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho6 lecionam Em linha de princípio cumpre mencionar mais uma vez que a previsão legal da incapacidade traduz a falta de aptidão para praticar pessoalmente atos da vida civil Encontrase nessa situação a pessoa a quem falte capacidade de fato ou de exercício ou seja que esteja impossibilitada de manifestar real e juridicamente a sua vontade Hodiernamente há duas formas ou espécies de incapacidade total ou absoluta e parcial ou relativa no entanto nem sempre foi assim No regramento anterior a incapacidade era estabelecida por Lei e a capacidade do indivíduo definida a partir da sua classe e condição social Nessa lógica legislativa seria incapaz a pessoa que se enquadrasse das hipóteses legais ainda que possuísse plena condição para praticar qualquer ato jurídico Por adotar um posicionamento moderno acerca do instituto das capacidades os critérios presentes no regramento vigente para o reconhecimento da incapacidade do indivíduo se prendem à maturidade e ao discernimento do ser humano e não mais à sua classe ou condição social Assim pela visão moderna do Código a capacidade do indivíduo é a regra e a incapacidade uma exceção em outras palavras presumese que todo indivíduo é capaz Acerca dos critérios estabelecidos para o reconhecimento da incapacidade Carlos Roberto Gonçalves7 leciona Com o intuito de protegêlas tendo em vista as suas naturais deficiências decorrentes na maior parte da idade da saúde e do desenvolvimento mental e intelectual a lei não lhes permite o exercício pessoal de direitos exigindo que sejam representadas ou assistidas nos atos jurídicos em geral A incapacidade absoluta apenas é reconhecida a partir do critério de idade do indivíduo e assim dispõe o art 3º do referido diploma legal8 São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil os menores de 16 dezesseis anos Nessa senda independentemente da condição de saúde discernimento ou entendimento do indivíduo caso possua menos de 16 anos de idade ele é absolutamente incapaz Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho9 definem os menores de 16 anos como menores impúberes e argumenta que são absolutamente incapazes porque o legislador os considera pessoas imaturas para atuar na órbita do direito Excetuandose o critério da idade menor que 16 anos os demais critérios importam apenas em incapacidade relativa ou seja não há a possibilidade de uma pessoa que possua mais de 16 anos de idade ser absolutamente incapaz O art 4º do CC0210 assim dispõe sobre a incapacidade relativa Art 4º São incapazes relativamente a certos atos ou à maneira de os exercer A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 4 I os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos II os ébrios habituais e os viciados em tóxico III aqueles que por causa transitória ou permanente não puderem exprimir sua vontade IV os pródigos Parágrafo único A capacidade dos indígenas será regulada por legislação especial Verificase pois que o critério da idade também é determinante para a incapacidade relativa ou seja até completar 16 anos o indivíduo é tido como absolutamente incapaz devido a sua idade e imaturidade Lado outro dos 16 anos aos 18 anos o indivíduo é tratado como menor púbere e por ser um pouco mais maduro poderá praticar os atos jurídicos acompanhado do seu assistente em face da ausência de capacidade plena Certo é que o discernimento sempre foi considerado para classificar a incapacidade dos indivíduos havendo também o importante critério da saúde e desenvolvimento mental completo e incompleto fatos ignorados pelo Estatuto da Pessoa com deficiência que tratou o ser humano de forma objetiva sem considerar a subjetividade humana Sobre os critérios da saúde e do desenvolvimento mental e intelectual Carlos Roberto11 leciona O atual Código valendose de subsídios da ciência médicopsiquiátrica incluiu os ébrios habituais os toxicômanos e os deficientes mentais de discernimento reduzido no rol dos relativamente incapazes Somente são assim considerados porém os alcoólatras ou dipsômanos os que têm impulsão irresistível para beber e os toxicômanos isto é os viciados no uso e dependentes de substâncias alcoólicas ou entorpecentes Os usuários eventuais que por efeito transitório dessas substâncias ficarem impedidos de exprimir plenamente sua vontade estão elencados no art 4º III do aludido estatuto Dos ensinamentos do autor é possível distinguir a incapacidade dos ébrios habituais e dos viciados em tóxicos da incapacidade daqueles que são usuários eventuais A diferença entre elas está no momento de lucidez Enquanto estiver embriagado ou sob os efeitos das substancias entorpecentes tanto aqueles que são dependentes quanto os usuários eventuais estão em situação de incapacidade por não conseguirem externar sua vontade de forma livre Mas no momento de lucidez ou seja quando não estiver sob os efeitos de entorpecentes ou embriagado o usuário eventual possui plena capacidade enquanto que os ébrios habituais e os viciados em tóxicos permanecem relativamente incapazes devido à influência de sua dependência O inciso terceiro também pelos critérios da saúde e do desenvolvimento mental e intelectual define a incapacidade relativa para aqueles que por causa transitória ou permanente não puderem exprimir sua vontade O referido dispositivo traz uma disposição genérica de incapacidade assim qualquer patologia que impeça o indivíduo de manifestar sua vontade independentemente de haver ou não uma doença importa na sua incapacidade relativa Caso a incapacidade do indivíduo seja decorrente de alguma deficiência este será considerado incapaz apenas para a prática dos atos de natureza patrimonial ou negocial conforme determina o art 85 do Estatuto da Pessoa com Deficiência A prodigalidade por sua vez é definida por Carlos Roberto Gonçalves12 não como um estado de alienação mental propriamente dito mas como um desvio de personalidade a partir do qual o indivíduo gasta e dissipa seu patrimônio imoderadamente colocandose em risco de miséria A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 5 Nesse sentido a interdição do pródigo somente o priva de praticar sem assistência os atos de natureza patrimonial continuando plenamente capaz para os demais atos pessoais que sejam de mera administração nos termos que se extrai do art 1782 do CC02 LGL2002400 Os indígenas por fim não têm sua capacidade regulada pelo Código Civil LGL2002400 sendo regidos pela Lei 6001 de 1973 o Estatuto do Índio o qual distingue os indígenas em três categorias os índios isolados os índios em vias de integração e os índios integrados Por determinação do Estatuto do Índio os índios e as comunidades indígenas ainda não integradas ficam sujeitas ao regime tutelar definido no próprio estatuto A tutela do indígena cabe à União e os atos praticados pelo indígena não integrado sem a devida assistência são nulos Ocorre que caso o indígena revele consciência e conhecimento acerca do ato praticado e o ato praticado não lhe seja prejudicial não se aplica a nulidade ao caso 31A função jurídica do instituto da incapacidade e os meios de proteção Os institutos das capacidades e das incapacidades desde o Direito Romano ocupam importante espaço no ordenamento jurídico tendo como função jurídica a proteção daqueles considerados hipossuficientes ou seja daquelas pessoas em situação de vulnerabilidade por não conseguirem expressar sua vontade no exercício de seus direitos ou por não terem a real dimensão ou discernimento acerca dos atos a serem praticados ou mesmo das consequências jurídicas que deles resultam Nessa perspectiva cabe ao regramento Civil brasileiro disciplinar as relações jurídicas de ordem predominantemente privada e de natureza patrimonial mas também as existenciais ou seja o instituto das incapacidades não visa a proteção do ato jurídico em si sua função precípua é promover proteção ao indivíduo hipossuficiente de modo a possibilitar a prática de atos de forma digna A incapacidade civil não se presume Uma vez que a capacidade civil do indivíduo é regra no ordenamento jurídico brasileiro a incapacidade civil precisa ser reconhecida em juízo após um criterioso processo a partir do qual resulta uma sentença declaratória que define os termos da curatela Nesse sentido a incapacidade não é atribuída ao indivíduo mas sim reconhecida Carlos Roberto Gonçalves13 por sua vez dispõe que há realmente um sistema de proteção dos incapazes no Código Civil LGL2002400 e sobre esse sistema o autor ainda alerta Para os absolutamente incapazes a proteção é incondicional Os maiores de 16 anos porém já tendo discernimento suficiente para manifestar a sua vontade devem em contrapartida para merecêla proceder de forma correta Dos ensinamentos de Carlos Roberto se extrai que aqueles que estejam em situação de vulnerabilidade necessitam e recebem a devida proteção legal mas o ordenamento não coaduna com a máfé Homenageando a boafé entre as partes o art 166 I do CC02 LGL2002400 estabelece que o ato jurídico praticado pelo absolutamente incapaz sem a devida representação é nulo de pleno direito Diante de um ato praticado por uma pessoa que não tem o discernimento necessário para compreender as consequências deste ato com outra em plena capacidade presumese a máfé daquele que é capaz Neste sentido a proteção do absolutamente incapaz é incondicional e basta demonstrar a incapacidade absoluta do indivíduo para a nulidade do ato por ele praticado Para o ato praticado pelo relativamente incapaz sem a devida assistência o ordenamento estabelece a anulabilidade contudo diferentemente do que ocorre na hipótese do absolutamente incapaz por possuir certo discernimento a proteção do relativamente incapaz é condicionada O relativamente incapaz precisa demonstrar que agiu de boafé que houve um erro escusável e que a outra parte agiu de máfé para A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 6 que o ato seja anulado em sua proteção Além disso a incapacidade absoluta pode ser arguida por qualquer interessado ao passo que a relativa só pode ser arguida pelo próprio incapaz ou pelo seu representante legal Diante disso Carlos Roberto Gonçalves14 diz que importante proteção jurídica dos hipossuficientes realizase por meio da representação e da assistência que lhes dá a necessária segurança quer em relação à sua pessoa quer em relação ao seu patrimônio possibilitando o exercício de seus direitos A representação garante ao absolutamente incapaz a possibilidade do exercício dos direitos ainda que este não consiga expressar sua vontade pois o representante atua em nome do incapaz A assistência por sua vez garante que o relativamente incapaz atue de forma segura na vida civil Para a assistência fazse necessária a participação do relativamente incapaz Por possuir algum discernimento ele manifesta a própria vontade e seu assistente apenas lhe auxilia fornecendo as informações e esclarecimentos necessários ao correto entendimento do ato a ser praticado Além da representação e da assistência garantidas pelos institutos do poder familiar da tutela e da curatela o sistema de proteção dos hipossuficientes é composto por outras medidas tutelares como as que estão contidas nos institutos da prescrição e da nulidade Pelo sistema de proteção dos incapazes temse a convergência dos institutos tutelares em prol do melhor interesse do representado ou assistido senão vejamos O incapaz pode se achar representado ou assistido sob o poder familiar sob a tutela ou sob a curatela mas esses institutos não são absolutos e conforme já mencionado eles devem atender o melhor interesse do incapaz Havendo conflito de interesses entre o menor e quem o representa ou o assiste serlheá concedido um curador especial conforme dispõe o art 1692 do CC02 LGL2002400 Além disso o ordenamento ainda estabelece limites ao exercício da representação ou da assistência ao hipossuficiente O art 1749 concomitantemente com o art 1781 do mesmo diploma legal proíbe o representante ou assistente de adquirir bens do incapaz por si ou por interposta pessoa bem como de dispor dos bens do incapaz a título gratuito ou constituirse cessionário de crédito ou de direito contra o incapaz Além dos atos proibidos o art 1748 concomitantemente com o art 1781 do referido Código também dispõe que os atos de pagar dívida aceitar herança ou doações transigir vender bens ou propor ações bem como nelas exercer defesa em assistência ou representação do incapaz dependem de autorização do juiz Compondo o sistema de proteção dos incapazes há também os institutos da nulidade e da anulabilidade Portanto os atos praticados com alguma falha ou excesso no exercício da representação ou da assistência são reputados nulos ou anuláveis Conforme já demonstrado anteriormente o ato jurídico praticado pelo absolutamente incapaz sem a devida representação é nulo de pleno direito Como a incapacidade absoluta é tida por ausência total de discernimento ou maturidade para a prática do ato jurídico se o incapaz atuou sozinho o ato por ele praticado é inválido não convalesce pelo decurso do tempo e não pode ser confirmado Acerca da anulabilidade anteriormente também já foi demonstrado que o ato praticado com incapacidade relativa do agente sem a devida assistência importa na sua anulabilidade Mas a hipótese prevista no art 171 do CC02 LGL2002400 não é a única pois o caput do próprio dispositivo dispõe que há outras hipóteses previstas em lei Como exemplo de previsão legal da anulabilidade pode ser citado o negócio jurídico que é concluído pelo representante em conflito de interesses com o representado A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 7 previsto no art 119 do CC02 LGL2002400 Por possuir certo discernimento o ato praticado pelo relativamente incapaz sem a devida assistência pode ser confirmado Assim o ato só será invalidado se houver a manifestação do incapaz ou de seu curador Ocorre que devido à possibilidade de confirmação o direito de requerer a anulação do negócio praticado pelo relativamente incapaz sem assistência decai em quatro anos a contar do dia em que cessar a incapacidade Assim para garantir a proteção dos hipossuficientes a norma ainda impede que corra a prescrição e a decadência contra os incapazes para que estes não venham a perder nenhum direito por negligência de seus representantes Entretanto este benefício é previsto apenas para os absolutamente incapazes conforme dispõe o art 198 I do CC02 LGL2002400 Portanto diante das previsões legais acerca da incapacidade não há como duvidar do caráter protetivo que nutre o instituto das incapacidades 32A pessoa com deficiência nos termos da Lei 131462015 A Lei 131462015 andou bem ao conferir capacidade aos portadores de deficiência garantindo no art 84 o direito de exercer sua capacidade civil em igualdade de condições com as demais pessoas Acerca desta alteração Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho15 comentam A pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física mental intelectual ou sensorial nos termos do art 2º não deve ser mais tecnicamente considerada civilmente incapaz na medida em que os arts 6º e 84 do mesmo diploma deixam claro que a deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa Outra alteração não menos importante veio à tona por meio dos arts 115 e 116 do Estatuto que instituíram a Tomada de Decisão Apoiada disciplinada pelo art 1783A do Código Civil de 200216in verbis Art1783A A tomada de decisão apoiada é o processo pelo qual a pessoa com deficiência elege pelo menos 2 duas pessoas idôneas com as quais mantenha vínculos e que gozem de sua confiança para prestarlhe apoio na tomada de decisão sobre atos da vida civil fornecendolhes os elementos e informações necessários para que possa exercer sua capacidade Esse processo não corresponde a uma interdição e confere mais autonomia à pessoa que ache em situação de vulnerabilidade uma vez que ela é quem requer o apoio é ela quem elege seus apoiadores bem como é ela quem estabelece os limites e a duração do apoio Além disso mesmo com o acordo de Tomada de Decisão Apoiada em vigor a pessoa apoiada pode solicitar o fim desse acordo a qualquer tempo O Estatuto alterou também os termos da interdição Apesar de retirar os portadores de deficiência do rol de incapacidades e confirmar a plena capacidade civil deles o Estatuto estabelece que quando necessário como medida protetiva extraordinária o portador de deficiência pode ser submetido à curatela Mas esta deve ser proporcional às necessidades e às circunstâncias de cada caso bem como deve durar o menor tempo possível Discorrendo acerca das alterações Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho17 ainda explanam Em verdade o que o Estatuto pretendeu foi homenageando o princípio da dignidade da pessoa humana fazer com que a pessoa com deficiência deixasse de ser rotulada como incapaz para ser considerada em uma perspectiva constitucional isonômica dotada de plena capacidade legal ainda que haja a necessidade de adoção de institutos assistenciais específicos como a tomada de decisão apoiada e extraordinariamente a A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 8 curatela para a prática de atos na vida civil Ocorre que mesmo sendo submetidos à curatela para os portadores de deficiência conforme dispõe o art 85 do Estatuto a curatela afeta apenas a prática dos atos de natureza patrimonial e negocial independentemente do grau de discernimento que estes possuam Sobre os limites da curatela o 1º do art 8518 ainda alerta A definição da curatela não alcança o direito ao próprio corpo à sexualidade ao matrimônio à privacidade à educação à saúde ao trabalho e ao voto No processo de interdição também houve mudanças a partir do Estatuto Pelo regramento anterior a pessoa que se encontrava em situação de vulnerabilidade não podia requerer a própria curatela pois o art 1768 do CC02 LGL2002400 estabelecia que apenas os pais ou tutores o cônjuge ou qualquer parente e o ministério público poderiam promover a interdição Assim prestigiando a autonomia da pessoa em situação de vulnerabilidade o Estatuto alterou o art 1768 do CC0219 e incluiu a própria pessoa como legitimada ativa no processo de interdição Contudo apesar da nova redação do art 1768 conferir mais autonomia à pessoa em situação de vulnerabilidade a Lei 131052015 que dispõe o Código de Processo Civil LGL20151656 brasileiro o revogou expressamente A inovação vigorou por um minúsculo período iniciando em janeiro de 2016 com a vigência do Estatuto da Pessoa com Deficiência e findando em março do mesmo ano com a vigência do Código de Processo Civil de 2015 4A desproteção Como visto a partir da vigência do Estatuto da Pessoa com Deficiência apenas os menores de 16 anos são absolutamente incapazes O art 114 do referido diploma modificou o art 3º do CC02 LGL2002400 revogou os incisos II e III impedindo com isso o reconhecimento da incapacidade absoluta dos que por enfermidade ou deficiência mental não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos bem como dos que mesmo por causa transitória não puderem exprimir sua vontade Na contramão da teoria das incapacidades o Estatuto da Pessoa com deficiência tratou o ser humano de forma objetiva sem considerar a sua subjetividade ignorando a situação fática de ausência de discernimento Tal circunstância merece cuidado pois a vida do ser humano ficará nas mãos de terceiro que na prática será seu representante e não seu assistente como prevê a lei No entanto os efeitos jurídicos da prática dos atos civis ou a sua inércia recairão sobre um relativamente incapaz que não possui qualquer grau de capacidade e não está protegido pelo véu da incapacidade absoluta Não se pode ignorar que a função jurídica do instituto das incapacidades é a proteção daqueles que estejam em uma situação de vulnerabilidade No entanto ao modificar o rol de incapacidades e impedir que a situação de incapacidade seja reconhecida o Estatuto impede também que uma pessoa que esteja em situação de hipossuficiência goze da proteção legal estabelecida para os incapazes Nesse sentido leciona Carlos Roberto Gonçalves20 Pretendeu o legislador com essas inovações impedir que a pessoa deficiente seja considerada e tratada como incapaz tendo em vista os princípios constitucionais da igualdade e da dignidade humana Todavia têm elas sido objeto de pesadas críticas formuladas pela doutrina pelo fato principalmente de desproteger aqueles que merecem a proteção legal Assim apesar de buscarem a inclusão e dignidade da pessoa portadora de Deficiência as alterações promovidas pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência causaram em alguns aspectos a desproteção daqueles que são hipossuficientes 41A ofensa à dignidade A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 9 A dignidade é um atributo inalienável e irrenunciável inerente a todo ser humano Por ser uma característica intrínseca à pessoa ela pode e deve ser reconhecida respeitada promovida e protegida mas não pode ser criada concedida ou retirada Para uma compreensão jurídiconormativa da dignidade da pessoa humana Ingo Wolfgang Sarlet21 aponta como referencial normativo o art I da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 194822 o qual dispõe que Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade DUDH O referido autor ainda buscando a definição para dignidade também expõe a manifestação do Tribunal Constitucional da Espanha23 segundo o qual a dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que leva consigo a pretensão ao respeito por parte dos demais Após o seu referencial tendo a autonomia e o direito de autodeterminação da pessoa como elemento nuclear da dignidade da pessoa humana Ingo Wolfgang Sarlet24 assim constrói sua definição Temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade implicando neste sentido um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável além de propiciar e promover sua participação ativa e corresponsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos Essa definição feita por Ingo Wolfgang Sarlet apesar de extraída de uma obra do ano de 2004 mostrase bastante atual e em muito se assemelha à definição feita por Alexandre de Moraes em 2016 Alexandre25 assim define a dignidade A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas constituindose um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar de modo que somente excepcionalmente possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos e a busca ao Direito à Felicidade No ordenamento pátrio além de ser um atributo inerente ao ser humano a dignidade da pessoa humana é também um princípio fundamental que alicerça todo o sistema dos direitos fundamentais e se encontra esculpido no art 1º III da CF88 LGL19883 Constituição da República Federativa do Brasil Entretanto mesmo estando expressamente disposto diante da sua dimensão relacional não há como concentrar na sua definição tudo aquilo que compõe o seu âmbito de proteção ou de incidência Por conseguinte temse uma definição aberta mas objetiva Como o Direito exerce um papel fundamental na promoção da dignidade das pessoas é necessário que o ordenamento jurídico acompanhe os anseios da sociedade para evoluir no sentido de garantir uma vida cada vez mais digna às pessoas Na evolução do Direito a transição do Código Civil de 1916 para o de 2002 representa um marco importante sobre a busca de um tratamento mais digno aos portadores de deficiência O texto legal de 1916 definia os loucos de todos os gêneros como absolutamente incapazes Mas o texto de 2002 passou a reconhecer a incapacidade absoluta naqueles que por enfermidade ou deficiência mental não tiverem o necessário discernimento para a prática dos atos da vida civil Nesse sentido a causa da incapacidade deixou de ser a doença pura e simplesmente para ser avaliada a partir do A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 10 discernimento para a prática dos atos da vida civil A mudança ocorrida na transição dos referidos códigos promove indubitavelmente a dignidade da pessoa humana por retirar um dispositivo que impunha a incapacidade ao indivíduo e instituir outro que apenas estabelece uma forma de reconhecer a incapacidade caso o indivíduo a possua Em 2015 houve outro marco importante Buscando mais dignidade aos portadores de deficiência foi instituída a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência Tendo por base a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência que fora ratificada por meio do Decreto Legislativo 186 em 2008 essa norma se destina a assegurar e a promover a essas pessoas o exercício dos seus direitos e das suas liberdades fundamentais em condição de igualdade Visando à inclusão social e à cidadania das pessoas com deficiência o Estatuto promoveu profundas alterações no ordenamento jurídico brasileiro com o intuito de proporcionar a participação efetiva e a não discriminação dessas pessoas Conforme demonstrado no item 32 desse trabalho o rol das incapacidades foi substancialmente alterado e todas as disposições que faziam menção aos portadores de deficiência foram retiradas do texto legal Além disso aqueles que por causa transitória ou permanente não puderem exprimir sua vontade saíram do rol de incapacidade absoluta e passaram a compor o rol de incapacidade relativa e assim restou apenas o menor de 16 anos no rol absolutamente incapaz Sob uma análise superficial as alterações aparentam uma mudança meramente textual Mas não há dúvidas de que a retirada do texto que citava diretamente o portador de deficiência no rol de incapacidade promoveu a dignificação do tratamento a essas pessoas nos moldes do que ocorreu na transição do Código de 1916 para o de 2002 Sob a ótica de Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho26 a partir da referida mudança a incapacidade deixará de ser tratada como uma consequência quase inafastável da deficiência conforme ocorreu no Brasil por um longo período Entretanto o princípio da dignidade da pessoa humana é muito amplo e abrange mais que o direito a um tratamento igualitário Sobre a amplitude do referido princípio Kildare Gonçalves Carvalho27 leciona O princípio abrange não só os direitos individuais mas também os de natureza econômica social e cultural pois no Estado Democrático de Direito a liberdade não é apenas negativa entendida como ausência de constrangimento mas liberdade positiva que consiste na remoção de impedimentos econômicos sociais e políticos que possam embaraçar a plena realização da personalidade humana Ao refletir sobre a lição de Kildare Gonçalves constatase que apesar de promover a dignidade por um lado por outro as modificações promovidas pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência também violam o referido princípio Portanto alguns aspetos das modificações ocorridas carecem de uma profunda analise Apesar de algumas alterações demonstrarem um tratamento mais digno em primeira análise elas podem ao mesmo tempo suprimir direitos e garantias essenciais às pessoas Como a dignidade da pessoa humana remonta também à ideia de proteção e desenvolvimento da pessoa ao impedir a proteção de quem dela necessite a alteração promovida pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência conflita com o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana O direito à autodeterminação consagrado por esse princípio não depende do cumprimento literal da expressão para ser efetivado A autonomia da pessoa deve ser A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 11 considerada em abstrato uma vez que seu objetivo é proporcionar condições para que ela exerça os seus direitos seja diretamente assistida ou representada Portanto impor capacidade ignorando a situação de vulnerabilidade da pessoa é tão aviltante quanto retirála de uma pessoa em plenas condições uma vez que não importa em conferir autonomia a ela mas sim em desprotegêla e acentuar mais ainda a sua vulnerabilidade fato que certamente não promove a dignidade da pessoa humana 42A desigualdade Conforme demonstrado o princípio da dignidade da pessoa humana é fundamento de todo o ordenamento pátrio por conseguinte o direito à igualdade também encontra nele o seu fundamento Dessa forma o tratamento desigual além de violar um direito fundamental ofende também a própria dignidade de uma pessoa Cumprindo os preceitos da Declaração Universal dos Direitos Humanos a Constituição Federal LGL1988328 dispõe em seu art 5º que todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza garantindose aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida à liberdade à igualdade à segurança e à propriedade Portanto o direito a igualdade encontrase expressamente consagrado no texto constitucional Além de estar previsto como um direito fundamental às pessoas a igualdade constitui também um princípio informador de todo o ordenamento pátrio A aplicação do referido preceito constitucional mostrase bastante complexa Em que pese ser fácil a sua materialização a partir de uma interpretação literal do texto constitucional o resultado não cumpre a finalidade do referido princípio Pela interpretação literal basta conferir as mesmas condições a todas as pessoas indistintamente Apesar de ser um tratamento igualitário essa interpretação confere apenas a igualdade formal às pessoas ou seja esse entendimento resulta em uma mera aparência de igualdade Ocorre que em um Estado Democrático garantidor dos Direitos Humanos deve haver uma igualdade real e não uma mera formalidade Portanto a igualdade consagrada pelo princípio da isonomia no ordenamento jurídico brasileiro é a igualdade material Para conquistála é necessária uma interpretação sistemática da norma Segundo Pedro Lenza29 Essa busca por uma igualdade substancial muitas vezes idealista reconheçase eternizase na sempre lembrada com emoção Oração aos Moços de Rui Barbosa inspirada na lição secular de Aristóteles devendose tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida de suas desigualdades Portanto na igualdade material a partir da ideia de isonomia deve ser buscado o mesmo resultado para todas as pessoas ainda que os meios para esse resultado não sejam os mesmos a depender das condições em que cada pessoa se encontre No entanto mesmo a partir de uma interpretação sistemática a materialização do direito à igualdade não é uma tarefa simples A complexidade reside principalmente na definição de um limite para o tratamento diferenciado Em outras palavras quando e até que ponto uma pessoa pode ser tratada de forma diferente na promoção da isonomia Alexandre de Moraes30 aborda em sua obra que o princípio da igualdade possui em si uma tríplice finalidade limitadora Assim dispõe o ilustre autor A tríplice finalidade limitadora do princípio da igualdade limitação ao legislador ao intérpreteautoridade pública e ao particular O legislador no exercício de sua função constitucional de edição normativa não poderá A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 12 afastarse do princípio da igualdade sob pena de flagrante inconstitucionalidade Assim normas que criem diferenciações abusivas arbitrárias sem qualquer finalidade lícita serão incompatíveis com a Constituição Federal LGL19883 O intérpreteautoridade pública não poderá aplicar as leis e atos normativos aos casos concretos de forma a criar ou aumentar desigualdades arbitrárias Ressaltese que em especial o Poder Judiciário no exercício de sua função jurisdicional de dizer o direito ao caso concreto deverá utilizar os mecanismos constitucionais no sentido de dar uma interpretação única e igualitária às normas jurídicas Finalmente o particular não poderá pautarse por condutas discriminatórias preconceituosas ou racistas sob pena de responsabilidade civil e penal nos termos da legislação em vigor Concluise portanto que o tratamento desigual não importa necessariamente em desigualdade Mas pela própria função limitadora do princípio da igualdade as regras para o tratamento diferenciado devem ser definidas em lei A condição de disparidade deve ser reconhecida pelo ordenamento jurídico para que condições diferenciadas possam ser definidas Em outras palavras só pode receber um tratamento diferente aqueles que possuem uma posição jurídica também diferente obviamente reconhecida no próprio ordenamento Entretanto a previsão legal das regras para o tratamento diferenciado não encerra o problema É necessário também que o dispositivo normativo cumpra os preceitos consagrados na constituição Saber até que ponto o tratamento desigual não gera inconstitucionalidade é uma grande dificuldade que paira nesse ponto Para a solução dessa incógnita Pedro Lenza31 aponta os parâmetros adotados por Celso Antônio Bandeira de Mello Celso Antônio Bandeira de Mello32 dispõe que para se verificar o respeito ou o desrespeito ao princípio da igualdade três questões devem ser observadas quais sejam a a primeira diz com o elemento tomado como fator de desigualação b a segunda reportase à correlação lógica abstrata existente entre o fator erigido em critério de discrímen e a disparidade estabelecida no tratamento jurídico diversificado c a terceira atina à consonância desta correlação lógica com os interesses absorvidos no sistema constitucional e destarte juridicizados Esclarecendo melhor sobre essas três questões Celso Antônio Bandeira de Mello33 dispõe que para avaliar se há ou não violação ao princípio da igualdade fazse necessário analisar o critério discriminatório definido a justificativa racional e lógica para atribuir o tratamento jurídico específico em face do traço desigualador decorrente da desigualdade proclamada e por fim avaliar se a correlação entre os dois pontos anteriores estão em sintonia com os preceitos constitucionais Para o autor somente a partir desses três aspectos que é possível a correta análise do problema podendo a violação da isonomia ocorrer em qualquer deles Assim avaliando as modificações ocorridas no instituto das incapacidades com base nas disposições acerca do direito à igualdade bem como nos preceitos do princípio da isonomia resta evidente o conflito normativo A modificação ocorrida promoveu apenas uma igualdade formal para as pessoas que se encontram em situação de vulnerabilidade Ao ignorar a existência de uma distinção fática impondo a mesma condição jurídica às pessoas que estejam em situação de vulnerabilidade e às que não estejam os preceitos constitucionais acerca do princípio da isonomia sofrem severa violação A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 13 A violação ao referido princípio se dá porque ao impedir que seja reconhecida a incapacidade absoluta em alguém que tenha mais de 16 anos e lhe impor a mesma condição jurídica de uma pessoa em plenas condições aqueles que estão em situação de vulnerabilidade não podem receber a necessária proteção do ordenamento Caso essas pessoas recebam a proteção da qual necessitem também haverá violação ao princípio da isonomia Haja vista que dar tratamento diferenciado às pessoas que estão na mesma condição jurídica também viola o direito à igualdade 43Os prejuízos Ao analisar criteriosamente as disposições sobre as mudanças promovidas pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência em conjunto com a função jurídica do instituto das incapacidades constatase que houve grande prejuízo para as pessoas que se encontram em situação de vulnerabilidade para o exercício dos seus direitos Conforme visto independentemente da condição fática em que uma pessoa se encontre não há mais a possibilidade de se reconhecer a sua incapacidade absoluta Por conseguinte mesmo não possuindo condições para manifestar de forma segura e plena a sua vontade essas pessoas não gozam mais da proteção que possui o absolutamente incapaz em institutos como a representação a nulidade a prescrição e a decadência Todos esses institutos serão analisados adiante com o objetivo de verificar as mudanças ocorridas bem como as consequências resultantes Iniciando pelo instituto da representação O CC02 LGL2002400 estabelece em seu art 115 que os poderes para representar são conferidos pela lei ou pelo próprio representado Mas diante do foco do presente trabalho apenas será tratado acerca da representação legal pois é esta que se aplica aos incapazes O art 120 do mesmo diploma estabelece que os requisitos da representação legal bem como os seus efeitos são os estabelecidos na própria norma Em outras palavras a norma estabelece quando alguém precisa ser representado e de que forma essa representação deve ocorrer A representação legal pode ocorrer por meio da representação propriamente dita na qual o representante pratica os atos em nome do representado buscando materializar os direitos deste Ou pode ocorrer por meio da assistência na qual o assistente apenas proporciona um suporte ou uma ajuda para que o assistido possa praticar pessoalmente os atos em busca da materialização dos seus direitos A incapacidade é um fato para o qual o ordenamento estabelece a representação legal O menor que seja incapaz tem sua representação legal definida pela tutela Já o maior que seja incapaz a tem definida pela curatela O Estatuto da Pessoa com Deficiência não alterou o instituto da tutela Mas o instituto da curatela foi substancialmente alterado Para melhor esclarecimento cabe destacar os dizeres de Paulo Nader34 ao definir a curatela Podemos afirmar sem a pretensão de alcançar todos os ângulos de abrangência do objeto de cognição que a curatela é um instituto de Direito Privado formado por normas de ordem pública destinado a amparar pessoa maior ou menor púbere que em razão de enfermidade mental ou deficiências outras de saúde não possui condições de gerir sua pessoa e bens ou apenas estes dotandoa de curador pessoa que zelará por seus interesses suprindolhe a incapacidade A curatela importa em cuidado e proteção de uma pessoa que seja maior de idade ou emancipada mas que não pode se autodeterminar por conta de uma incapacidade Entretanto a partir das alterações ocorridas a abrangência da proteção desse instituto foi limitada Uma pessoa maior de 16 anos não pode mais ter sua incapacidade absoluta reconhecida portanto por meio da curatela não há mais representação do curatelado A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 14 há apenas assistência Para as pessoas que possuem discernimento reduzido ou outro tipo de limitação que não impeça a manifestação da vontade delas a assistência é suficiente para alcançar os objetivos da curatela Isso porque essas pessoas necessitam apenas de um apoio haja vista que ainda que parcialmente elas conseguem participar do ato Entretanto para aquelas que não podem ou não conseguem expressar sua vontade a assistência não é suficiente para atingir tal intento Conforme já mencionado na assistência há apenas um suporte por parte do curador portanto a manifestação da vontade e a prática do ato devem ocorrer por conta do próprio curatelado A manifestação da vontade é um elemento crucial para a constituição de um ato jurídico e dada a sua importância será tratada adiante em um tópico específico desse trabalho item 51 Sobre esse ponto de inconsistência cabe destacar as palavras de Flavio Tartuce35 O ilustre autor assim dispõe Fica a dúvida se não seria interessante retomar alguma previsão a respeito de maiores absolutamente incapazes especialmente para as pessoas que não têm qualquer condição de exprimir vontade e que não são necessariamente pessoas deficientes Reiterese que o presente autor entende que sim havendo proposição nesse sentido no citado Projeto de Lei 7572015 com o nosso apoio e parecer Citese novamente e a esse propósito a pessoa que se encontra em coma profundo sem qualquer condição de exprimir o que pensa No atual sistema será enquadrada como relativamente incapaz o que parece não ter sentido jurídico Diante do que foi exposto não restam dúvidas de que as alterações ocorridas no instituto da curatela resultaram em prejuízo para aqueles que não possuem condições de manifestar de forma plena sua vontade Ao retirar dessas pessoas a condição protetiva da representação que lhes supriam a incapacidade as referidas alterações também impedem que essas pessoas materializem seus direitos Agora sobre a nulidade O ordenamento pátrio define no campo do Direito Civil o regramento acerca dos fatos e dos atos jurídicos Sendo assim quando estes ocorrem com desrespeito aos preceitos legais eles não podem ter validade Para Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho36 a nulidade se caracteriza como uma sanção pela ofensa a determinados requisitos legais não devendo produzir efeito jurídico em função do defeito que carrega em seu âmago Nesse sentido o instituto da nulidade tem como objetivo impedir a propagação de atos ou fatos contrários aos preceitos legais Mas para atingir o nível de agressão à norma o ordenamento estabelece gradações de invalidade Quando há violação de norma de ordem pública de natureza cogente carregando em si vício considerado grave o ato é nulo de pleno direito ou seja a nulidade é absoluta Lado outro caso haja violação de norma de ordem privada carregando em si vício considerado leve o ato tem apenas uma nulidade relativa ou seja é um ato anulável Ao fazer a gradação da invalidade o ordenamento define quais são as causas que importam em nulidade bem como as que importam em anulabilidade Diante de sua gravidade o ato nulo independe de manifestação para ter sua invalidade reconhecida Portanto uma vez constatado o vício grave e de ordem pública ele é despido desde sua origem de qualquer validade no âmbito jurídico Esse vício nem mesmo pelo decurso do tempo se convalida podendo nos termos dos arts 168 e 169 do CC02 LGL2002400 qualquer pessoa e a qualquer tempo arguir a invalidade de um ato nulo A sentença que reconhece a invalidade de um ato nulo tem natureza declaratória efeitos erga omnes e ex tunc Conforme disciplinado pelos arts 177 e 178 do CC02 LGL2002400 o ato anulável A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 15 por sua vez depende de manifestação para ser invalidado O interessado deve demandar demonstrando a existência do vício leve deve comprovar a guarda da boafé durante a prática do ato e por fim pleitear a invalidação do referido ato Por possuir um vício leve pode ser confirmado pelas partes ou pode ser convalidado pelo decurso do tempo Portanto caso o interessado não busque a invalidação do ato anulável ou não o faça dentro do prazo estabelecido na lei o ato tornarseá plenamente válido Além disso da ação anulatória resulta uma sentença constitutiva negativa Em outras palavras a invalidade se dá somente a partir da sentença prolatada E diferentemente do caso de nulidade absoluta os seus efeitos são inter partes Apesar do efeito ex tunc da sentença de invalidação de um ato anulável apresentado por Pablo Stolze no quadro comparativo existem duas correntes acerca deste fato Sobre os efeitos da sentença no tempo Flavio Tartuce37 assim dispõe Tradicionalmente sempre se apontou que os seus efeitos seriam ex nunc não retroativos ou somente a partir do trânsito em julgado da decisão Essa tese estaria confirmada pelo art 177 do atual Código O que poderia parecer pacífico em doutrina e jurisprudência não é tão pacífico assim Isso porque há posicionamento orientando que os efeitos da sentença na ação anulatória negócio anulável também seriam retroativos ex tunc parciais com fundamento no art 182 da atual codificação Flavio Tartuce38 adota o segundo posicionamento e dispõe que outros doutrinadores como Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho citando Humberto Theodoro Júnior e Ovídio Baptista também adotam tal posicionamento Mas pela visão clássica ainda prevalece a premissa de efeitos ex nunc da ação anulatória de ato anulável Além da problemática sobre a retroação ou não dos efeitos da sentença de invalidação há outro ponto a ser analisado Há que saber se o ato praticado pelo incapaz antes da interdição pode ser invalidado Para a incapacidade relativa o entendimento é pacífico O vício da incapacidade relativa só se faz presente no ato praticado após a sentença interdição e sem a devida assistência do curador No caso de incapacidade absoluta há duas correntes De um lado como a capacidade civil é a regra adotada pelo ordenamento seguindo a literalidade do art 1773 do CC02 LGL2002400 artigo revogado pela Lei 13105 de 16 de março de 2015 somente se opera os efeitos da curatela após a sentença Ou seja assim como na incapacidade relativa só estaria viciado o ato praticado após a interdição Lado outro como a sentença de interdição apenas declara a incapacidade e diante da carência por proteção dos absolutamente incapazes se restar comprovado que a causa de incapacidade absoluta já existia durante a prática do ato esse é inválido ainda que praticado antes da interdição Entretanto como só se reconhece incapacidade absoluta ao menor de 16 anos esse entendimento não pode mais ser aplicado Ao comparar as formas de invalidade constatase que além de o ato anulável depender de um esforço maior para sua invalidação os efeitos da sentença de anulação podem variar retroagindo ou não a depender da corrente adotada Nesse sentido ao analisar o instituto da nulidade sob as premissas das modificações promovidas pelo Estatuto do Deficiente depreendese que também houve prejuízo para as pessoas que se encontre em situação de vulnerabilidade nesse ponto Ao impedir o reconhecimento da incapacidade absoluta de alguém que seja maior de 16 A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 16 anos por conseguinte impedindoo também está de gozar da proteção da nulidade Ainda que seja possível a invalidação do ato praticado pelo relativamente incapaz sem a devida assistência por ser anulável essa hipótese é mais dispendiosa Portanto reconhecer nulidade absoluta ao ato praticado por alguém que não tenha as condições necessárias à plena manifestação da sua vontade ou não tenha consciência dela proporciona mais proteção que o reconhecimento de mera anulabilidade Por fim sobre a prescrição e a decadência A prescrição e a decadência são institutos previstos no ordenamento pátrio os quais têm como finalidade a estabilidade e a segurança jurídica O ordenamento confere às pessoas titulares de direitos o poder para gozálos de forma plena assim caso esses direitos sejam desrespeitados ou violados o ordenamento também confere ao titular do direito violado poderes para pleitear em juízo a defesa de seus direitos Esse poder denominase pretensão Entretanto para que haja segurança e estabilidade nas relações jurídicas os atos necessitam de definição Como a aquisição e a extinção de direitos sofrem grande influência pelo decurso do tempo o titular de um direito precisa exercêlo para estabilizar a relação jurídica portanto o exercício do direito ou da pretensão não podem ficar pendentes por tempo indefinido Acerca da prescrição há no campo teórico uma discussão a respeito das suas consequências Por um lado parte da doutrina defende que a prescrição importa na perda do direito de ação Paulo Nader39 segue essa linha e define a prescrição como sendo a perda do direito de ação em decorrência da inércia do seu titular durante lapso temporal superior ao estabelecido em lei Lado outro há quem defenda que a prescrição importa na perda do próprio direito Orlando Gomes40 defende esse posicionamento e dispõe que a prescrição é o modo pelo qual um direito se extingue em virtude da inércia durante certo lapso de tempo do seu titular que em consequência fica sem ação para assegurálo Por fim há o entendimento que a prescrição importa apenas na perda da pretensão Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho41 defendem esse entendimento e dispõem que a prescrição é a perda da pretensão de reparação do direito violado em virtude da inércia do seu titular no prazo previsto pela lei A última corrente apresentada mostrase mais coerente ao ordenamento pátrio A prescrição não pode resultar na perda do direito de ação por vedação constitucional prevista no art 5º XXXV da Carta Magna A prescrição também não resulta na perda do direito porque ela não impede o cumprimento da obrigação Caso alguém cumpra uma obrigação prescrita esse cumprimento é válido Portanto a perda da pretensão de reparação do direito violado é a opção que encontra amparo no ordenamento jurídico brasileiro Sobre a decadência o entendimento é pacífico Paulo Nader42 ao definila dispõe que decadência ou caducidade representa a morte de um direito subjetivo em face da inércia de seu titular que optou por não ajuizar uma ação constitutiva no prazo de lei Os dois institutos embora similares não se confundem Em uma resumida comparação a prescrição está voltada para os deveres obrigações e as responsabilidades que decorrem do desrespeito às regras sejam elas ditadas pelas partes ou pela ordem jurídica Ou seja está relacionada com os direitos subjetivos próprio das pretensões pessoais Já a decadência está associada aos direitos potestativos e às ações constitutivas portanto ela tem relação com um estado de sujeição Diante do que fora apresentado é possível perceber a seriedade das consequências impostas ao titular de direitos por não exercêlos ou defendêlos nos prazos legais Assim pela gravidade das implicações da prescrição e da decadência o ordenamento estabelece que em algumas situações os prazos prescricionais bem como os A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 17 decadenciais não poderão correr O CC0243 define quais são as causas impeditivas e suspensivas da prescrição dispondoas em um rol taxativo O referido diploma assim dispõe Art 197 Não corre a prescrição I entre os cônjuges na constância da sociedade conjugal II entre ascendentes e descendentes durante o poder familiar III entre tutelados ou curatelados e seus tutores ou curadores durante a tutela ou curatela Art 198 Também não corre a prescrição I contra os incapazes de que trata o art 3º II contra os ausentes do País em serviço público da União dos Estados ou dos Municípios III contra os que se acharem servindo nas Forças Armadas em tempo de guerra Art 199 Não corre igualmente a prescrição I pendendo condição suspensiva II não estando vencido o prazo III pendendo ação de evicção Diante o objeto de estudo do presente trabalho aqui será abordada apenas a causa prevista no item I do art 198 Ao definir que não corre a prescrição contra os absolutamente incapazes o legislador optou por resguardar aqueles que não possuem as condições necessárias para diligenciar em exercício ou em defesa de seus direitos em detrimento da segurança ou estabilidade jurídica Cabe ressaltar ainda que apesar de não haver como regra causas que impedem ou suspendem a decadência essa também não corre contra os absolutamente incapazes Portanto mais uma vez a alteração das disposições acerca da incapacidade proporcionada pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência prejudica aqueles que carecem de proteção Mesmo que o prazo decadencial para anular um ato praticado por um relativamente incapaz tenha início a partir do fim da incapacidade outras situações podem resultar em prejuízo Uma pessoa que não consiga exprimir sua vontade ou que não possua condições para exprimila de forma plena mas que seja maior de 16 anos não consegue mais a interrupção ou a suspensão do prazo prescricional Assim caso essa pessoa possua um crédito que precise ser executado ou sofra o esbulho de um bem e a causa incapacitante perdure por tempo superior ao prazo prescricional ela estará prejudicada Como não pode exercer pessoalmente os atos necessários à materialização dos seus direitos e nem pode mais usufruir de um representante para atuar em seu nome além de não poder impedir ou suspender a prescrição o decurso do tempo e a inércia resultarão em perda de direitos Nesses termos o crédito não poderá ser exigido e o bem esbulhado será usucapido 5Os conflitos do estatuto da pessoa com deficiência com o ordenamento pátrio e os reflexos nos hipossuficientes O ordenamento jurídico compõe um sistema complexo e extenso sofrendo alterações constantemente A sociedade é algo mutável está em constante evolução e modificação portanto para acompanhar a evolução da sociedade e seus anseios o conjunto A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 18 normativo também precisa ser modificado Contudo com cautela Nesse contexto o Estatuto da Pessoa com Deficiência objetivando a promoção da dignidade e inclusão social das pessoas portadoras de deficiência promoveu significativas modificações normativas Entretanto alguns pontos estão em conflito com o ordenamento pátrio mais precisamente no tocante à necessidade da manifestação da vontade para os atos jurídicos à necessidade de discernimento para gozo dos direitos sexuais e por fim em relação às consequências patrimoniais a partir do casamento ou da união estável 51Os atos jurídicos e a manifestação da vontade A vida em sociedade exige a inteiração entre as pessoas Ocorre que dessa inteiração surgem relações que têm implicações no âmbito jurídico seja na criação de uma obrigação ou no nascimento ou na extinção de um direito Esses eventos com implicações jurídicas são denominados fatos jurídicos Segundo Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho44 fato jurídico é todo acontecimento natural ou humano que determine a ocorrência de efeitos constitutivos modificativos ou extintivos de direitos e obrigações na órbita do direito Em complemento a sua definição o referido autor ainda dispõe que o fato jurídico se divide em três espécies distintas Uma delas é o fato jurídico em sentido estrito Essa espécie independe da intervenção humana para sua ocorrência assim basta que o evento previsto na norma ocorra no mundo fático A outra é o atofato jurídico Nessa espécie apesar de se fazer necessária a atuação da pessoa não importa para a norma se houve ou não manifestação de vontade em praticálo para que ocorram implicações no âmbito jurídico Por fim o ato ou negócio jurídico Nessa espécie destacase a ação direta da pessoa seja por definição legal seja pela autonomia privada para que ocorram implicações no âmbito jurídico Ela tem como elemento essencial a manifestação da vontade Ao disciplinar acerca dos atos ou negócios jurídicos o ordenamento estabelece que estes devem passar por três planos de análise sendo eles o plano de existência o plano de validade e por fim o plano de eficácia Nesse sentido só produzirá seus efeitos plenamente o ato ou negócio que cumprir essas três etapas No plano de existência há quatro elementos quais sejam agente manifestação da vontade objeto e forma Esses elementos são essenciais ou seja são constitutivos do ato jurídico Tamanha é sua essencialidade que a falta de algum desses elementos não resulta em vício ou em invalide do ato ele sequer chega a existir em âmbito jurídico No plano da validade há uma complementação dos elementos analisados no plano de existência Esse plano só é analisado após o ato atender aos requisitos necessários para existir Para ser valido o ato dever ter agente capaz manifestação da vontade livre e de boafé objeto lícito possível determinado ou determinável e forma prescrita ou não defesa em lei Portanto caso falte ao ato alguma das adjetivações dos elementos de validade ele estará viciado e será classificado como nulo ou anulável Por fim o plano de eficácia Nessa etapa cumpre analisar se no ato pende algum elemento acidental de declaração como a condição o termo ou o encargo Assim caso algum desses elementos acidentais de declaração ainda esteja pendente mesmo que exista e seja válido o ato só produzirá seus efeitos quando for cumprida a condição o termo ou o encargo Diante do que dispõe o ordenamento acerca do ato ou negócio jurídico dúvidas não restam de que o elemento subjetivo da vontade ou melhor da manifestação da vontade compõe a essência do referido ato Sobre a essencialidade desse elemento cabe A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 19 destaque às lições de Carlos Roberto Gonçalves45 A vontade é pressuposto básico do negócio jurídico e é imprescindível que se exteriorize Do ponto de vista do direito somente vontade que se exterioriza é considerada suficiente para compor suporte fático de negócio jurídico aquela que permanece interna como acontece como a reserva mental não serve a esse desiderato pois que de difícil senão impossível apuração A declaração de vontade é assim o instrumento da sua manifestação Por se tratar de é um elemento de caráter subjetivo que se revela por meio da declaração esta portanto e não aquela constitui requisito de existência do negócio jurídico Em outras palavras não há como constituir um ato ou negócio jurídico sem a manifestação da vontade de quem o está praticando Portanto nesse ponto o Estatuto da Pessoa com Deficiência conflita com o ordenamento Para aquelas pessoas que não possuem condições de externar sua vontade ou não consigam demonstrála de forma plena a manifestação da sua vontade deve ocorrer sob a proteção de institutos como a representação ou a assistência Ou seja quem não consegue manifestar sua vontade ou não possui qualquer discernimento acerca dessa manifestação precisa se valer de uma pessoa que pratique o ato em seu nome Entretanto conforme demonstrado no item 43 desse trabalho uma pessoa maior de 16 anos não pode mais se valer da representação uma vez que não pode mais ter sua incapacidade absoluta reconhecida pelo ordenamento Sobre essa mudança asseveram Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho46 De repente o novo diploma converteu aqueles que eram absolutamente incapazes em relativamente capazes Sinceramente não nos convence tratar essas pessoas sujeitas a uma causa temporária ou permanente impeditiva da manifestação da vontade como aquele que esteja em estado de coma no rol dos relativamente incapazes Se não podem exprimir vontade alguma a incapacidade não poderia ser considerada meramente relativa O referido Estatuto impôs uma condição formal de autonomia às pessoas em situação de vulnerabilidade todavia estas continuam em condição fática que lhes impedem de expressar a vontade de forma plena não existindo possibilidade de estas pessoas constituírem um ato jurídico pessoalmente tampouco por interposta pessoa que as representem Nesses termos ao contrário de conferir autonomia às pessoas em situação de vulnerabilidade ao imporlhes a capacidade civil relativa a referida norma promoveu a limitação deles As referidas mudanças obstam que essas pessoas constituam um ato ou negócio jurídico uma vez que não podem atuar sozinhas e a assistência não é suficiente nos casos em que não possam manifestar a vontade Destacase que semelhante ao conflito resultante das modificações dos institutos da capacidade e da incapacidade civil frente a essencialidade da manifestação da vontade para os atos jurídicos o Estatuto da Pessoa com Deficiência conforme disposto a seguir também conflita com o ordenamento pátrio ao estender aos direitos sexuais a capacidade imposta às pessoas que estejam em situação de vulnerabilidade 52Os direitos sexuais e o conflito com o Direito Penal Em um Estado democrático de direito é indubitável que todas as pessoas sejam titulares de direitos Entretanto para que o indivíduo possa exercêlos pessoalmente fazse necessária a existência de alguns requisitos que demonstre a aptidão para tal Os direitos sexuais não se excetuam a essa disposição portanto as modificações ocorridas A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 20 nesse ponto também conflitam com o ordenamento pátrio Nos termos do Estatuto da Pessoa com Deficiência ainda que uma pessoa seja submetida à curatela esta será limitada aos atos de natureza patrimonial e negocial Portanto a pessoa independentemente de sua condição fática é plenamente capaz para os atos de natureza existencial Sobre este assunto o Estatuto47 assim dispõe Art 85 A curatela afetará tão somente os atos relacionados aos direitos de natureza patrimonial e negocial 1º A definição da curatela não alcança o direito ao próprio corpo à sexualidade ao matrimônio à privacidade à educação à saúde ao trabalho e ao voto Entretanto apesar de objetivar maior autonomia às pessoas que possuam algum tipo de incapacidade a disposição feita pela Lei 131462015 carece de uma análise mais detalhada Isso porque como já dito anteriormente toda alteração deve ser analisada no sistema como um todo Inicialmente as disposições do referido Estatuto aparentam uma mudança ocorrida apenas no âmbito do direito civil pois conforme demonstrado no item 23 desse trabalho a capacidade civil ou capacidade jurídica e a imputabilidade disciplinada no âmbito do Direito Penal não se confundem Apesar de coincidirem alguns critérios de definição dos institutos a relação não passa disso coincidência Portanto são institutos completamente distintos Sendo assim as modificações ocorridas no instituto da capacidade e incapacidade civil em nada modificaram a imputabilidade ou a inimputabilidade Mas apesar de não incidir diretamente as modificações promovidas pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência em certo ponto conflitam com o Direito Penal Ao dispor que as pessoas que estejam em situação de vulnerabilidade ou seja aquelas que não têm condições de expressar sua vontade ou não podem fazêlo plenamente podem decidir sobre seus direitos sexuais bem como sobre o próprio corpo o Estatuto da Pessoa com Deficiência vai de encontro com a norma penal brasileira por ser com ela incompatível É incontestável que algumas pessoas são mais propensas a serem ludibriadas ou seduzidas seja por decorrência da ingenuidade seja por ausência de compreensão Assim são mais susceptíveis de serem convencidas por outras pessoas a fazer algo que não corresponda à sua real vontade ou algo do qual não tenha compreensão do seu real sentido ou de suas consequências Nesse sentido diante da situação de vulnerabilidade que essas pessoas se encontram e da necessidade de uma maior proteção o Código Penal LGL1940248 assim dispõe Art 217A Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 catorze anos Pena reclusão de 8 oito a 15 quinze anos 1º Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que por enfermidade ou deficiência mental não tem o necessário discernimento para a prática do ato ou que por qualquer outra causa não pode oferecer resistência O dispositivo busca proteger aqueles que estejam em situação de vulnerabilidade Portanto quem praticar qualquer ato libidinoso ou tiver conjunção carnal com uma pessoa definida como vulnerável pelo Direito Penal comete o crime de estupro de vulnerável Mas atenção deve ser dispensada aos critérios de análise de vulnerabilidade A norma penal ao verificar a condição de vulnerabilidade para a tipificação do referido crime se volta para os critérios da inimputabilidade e não para os critérios da A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 21 incapacidade civil Exceção feita ao critério etário que no tipo penal do estupro de vulnerável a idade foi reduzida para menos de 14 anos Entretanto assim como na inimputabilidade a simples existência da enfermidade ou doença não define a condição de vulnerabilidade para a tipificação do crime de estupro de vulnerável O que se avalia é o discernimento sobre a conduta Sobre a vulnerabilidade prevista no tipo penal do estupro de vulnerável leciona Rogério Greco49 Além do critério biológico enfermidade ou deficiência mental para que a vítima seja considerada como pessoa vulnerável não poderá ter o necessário discernimento para a prática do ato critério psicológico tal como ocorre em relação aos inimputáveis previstos pelo art 26 caput do Código Penal LGL19402 Ocorre que a norma civil a partir da mudança operada pelo referido Estatuto confere autonomia sobre os direitos sexuais às pessoas independentemente da condição fática em que elas se encontrem Mas a norma penal por sua vez analisa a condição fática em que essas pessoas se encontram para definir se há ou não condições de autonomia O tipo penal do estupro de vulnerável tutela a dignidade sexual daqueles que estejam em situação de vulnerabilidade uma vez que eles têm dificuldade em discernir ou entender por completo sobre a prática do ato sexual Portanto o bem jurídico tutelado nesse caso difere um pouco da hipótese do estupro simples Cezar Roberto Bitencourt50 assim dispõe Nos crimes constantes dos demais capítulos do mesmo Título a dignidade sexual é o bem jurídico mediato considerando que cada um desses tipos tem seu próprio bem jurídico imediato Na realidade na hipótese de crime sexual contra vulnerável não se pode falar em liberdade sexual como bem jurídico protegido pois se reconhece que não há a plena disponibilidade do exercício dessa liberdade que é exatamente o que caracteriza sua vulnerabilidade Nesse sentido havendo de fato a condição de vulnerabilidade e a ocorrência da conjunção carnal ou da prática do ato libidinoso haverá também o crime pois a autonomia conferida pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência no âmbito civil não afasta a tipicidade do Estupro de Vulnerável Como já mencionado o tipo penal não tem o objetivo de discriminar ou denegrir O seu objetivo é dar proteção às pessoas que por sua condição fática estejam mais susceptíveis a sofrer violação de seus direitos fato que caracteriza sua situação de vulnerabilidade Nesse ponto cabe replicar as brilhantes palavras de Rogério Greco51 É importante ressaltar que não se pode proibir que alguém acometido de uma enfermidade ou deficiência mental tenha uma vida sexual normal tampouco punir aquele que com ele teve algum tipo de ato sexual consentido O que a lei proíbe é que se mantenha conjunção carnal ou pratique outro ato libidinoso com alguém que tenha alguma enfermidade ou deficiência mental que não possua o necessário discernimento para a prática do ato sexual No mesmo sentido são as lições de Guilherme de Sousa Nucci52 Não se pode olvidar neste contexto que pessoas enfermas ou doentes mentais com base no princípio da dignidade da pessoa humana têm direito quando possível à vida sexual saudável Sentem necessidade e desejo e podem manter relacionamentos estáveis inclusive conforme o caso Diante do exposto a vulnerabilidade não é definida a partir de uma doença ou deficiência pura e simplesmente É necessária a análise da condição fática em que a pessoa se encontre e por isso a imposição formal de autonomia não afasta a vulnerabilidade A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 22 Portanto as alterações promovidas pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência criaram um conflito entre a norma penal e a norma civil Isso porque se alguém que esteja em situação de vulnerabilidade exerce seus direitos sexuais quem com ela praticar o ato sexual comete o crime de estupro de vulnerável 6Conclusão Após análise e apontamentos acerca das alterações da teoria das capacidades dúvidas não restam sobre a finalidade do Estatuto da Pessoa com Deficiência Todavia apesar de buscar a inclusão social a participação em condições de igualdade e a cidadania para a promoção da dignidade dos portadores de deficiência o Estatuto desconsidera a condição fática das pessoas e por conseguinte apresenta alguns pontos de inconsistência A alteração do rol das incapacidades ao retirar as disposições que faziam referência direta à deficiência como causa de incapacidade indubitavelmente alcança os objetivos propostos pelo estatuto Entretanto a exclusão da possibilidade de se reconhecer a incapacidade absoluta de alguém que seja maior de 16 anos de idade resgata uma situação jurídica já superada na qual a capacidade jurídica da pessoa é imposta ou retirada pela norma fato que resulta em retrocesso A inconsistência jurídica presente nas modificações promovidas pelo referido estatuto fica ainda mais latente quando se analisa a situação em que se encontram as pessoas que não podem ou não conseguem externar sua vontade após as alterações Diante da essencialidade da manifestação da vontade para os atos da vida civil a imposição de capacidade ainda que relativa a uma pessoa que não possa manifestar sua vontade não encontra respaldo jurídico Conforme demonstrado o instituto das incapacidades tem função jurídica protetiva Para isso o referido instituto coloca as pessoas que estejam em situação de vulnerabilidade em uma condição jurídica diferenciada para que recebam proteção legal Nesse sentido a imposição de capacidade ao indivíduo em situação de vulnerabilidade obsta que ele receba a proteção da qual necessita Isso porque uma vez que não exista uma condição fática de vulnerabilidade reconhecida em Lei não pode haver uma posição jurídica diferenciada o que impede o gozo da proteção legal Pelo Princípio da Isonomia buscase a igualdade material nas relações jurídicas O respeito à situação fática do indivíduo mostrase determinante para a materialização desse princípio Portanto ao desconsiderar a condição fática das pessoas e impor uma condição jurídica igual a todas elas as disposições do referido Estatuto ferem esse princípio Como consequência as pessoas que necessitam de proteção restam desguarnecidas e prejudicadas por não gozarem da proteção de institutos como a representação para a expressão plena da sua vontade bem como a nulidade ou impedimento e suspenção da prescrição e da decadência em defesa de seus direitos Diante de tais prejuízos evidenciase que as mudanças promovidas pelas disposições do Estatuto da Pessoa com Deficiência também ferem o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana Além da desproteção das pessoas em situação de vulnerabilidade há outro conflito normativo a partir da impossibilidade de se reconhecer a incapacidade absoluta de alguém que seja maior de 16 anos de idade Por ser a manifestação da vontade de forma livre e consciente um requisito essencial à constituição do ato ou negócio jurídico as mudanças promovidas pelo referido Estatuto impedem que as pessoas não tenham condições de manifestar sua vontade ou fazêlo de forma consciente constituam um ato ou negócio jurídico Isso porque a assistência não é suficiente para suprir a condição fática de incapacidade e a pessoa em situação de vulnerabilidade que é maior de 16 anos de idade não pode mais ser representada A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 23 Por serem estas disposições incompatíveis com o ordenamento pátrio é necessária uma adequação normativa a fim de extinguir a imposição e possibilitar o reconhecimento da condição fática de capacidade ou incapacidade do indivíduo para viabilizar a proteção legal da qual precisa Também há um conflito normativo na autonomia para o exercício dos direitos sexuais Ao desconsiderar a condição fática da pessoa e imporlhe a autonomia para decidir sobre seus direitos sexuais as mudanças promovidas pelo Estatuto põem a norma civil em conflito com a norma penal Pois se uma pessoa em situação de vulnerabilidade usa sua autonomia e exerce seus direitos sexuais quem pratica com ela o ato sexual comete o crime de estupro de vulnerável uma vez que a capacidade civil para exercer os direitos sexuais não afasta a tipificação penal Portanto esse ponto também carece de uma adequação normativa A norma civil deve nos moldes do que ocorre na norma penal considerar a condição fática da pessoa para reconhecer ou não a capacidade para exercer os direitos sexuais Por fim no presente trabalho constatase que o Estatuto da Pessoa com Deficiência apresenta contradição em suas próprias disposições A referida norma restringe a prática de atos de natureza patrimonial ou negocial pela pessoa submetida à curatela sem a assistência do seu curador Entretanto a mesma norma impõe autonomia à pessoa e a capacita para contrair matrimônio ou constituir união estável de forma livre Ocorre que o casamento e a união estável também possuem efeitos patrimoniais e a referida norma não disciplina esses efeitos no caso do casamento ou união estável contraído por pessoas em situação de vulnerabilidade Dessa forma essas pessoas ficam à mercê da própria sorte o que acentua ainda mais a sua vulnerabilidade Assim esse ponto necessita de uma adequação normativa a fim de proteger os que estejam em situação de vulnerabilidade Deve haver uma limitação dos efeitos patrimoniais no casamento bem como na união estável constituído por uma pessoa que esteja em situação de vulnerabilidade Concluise portanto que o Estatuto da Pessoa com Deficiência não atingiu por completo os objetivos propostos e em algumas situações suas próprias disposições violam direitos das pessoas em situação de vulnerabilidade 7Referências ANGHER Anne Joyce Org Vade Mecum acadêmico de direito 22 ed São Paulo Rideel 2016 Série Vade Mecum BITENCOURT Cezar Roberto Tratado de direito penal parte especial 4 ed São Paulo Saraiva 2010 v 4 CAPEZ Fernando Curso de direito penal parte especial dos crimes contra a dignidade sexual a dos crimes contra a administração pública arts 213 a 359H 8 ed São Paulo Saraiva 2010 v 3 CARVALHO Felipe Quintella Machado de Teixeira de Freitas e a história da teoria das capacidades no Direito Civil brasileiroDissertação Mestrado em Direito Universidade Federal de Minas Gerais Belo Horizonte 2013 CARVALHO Kildare Gonçalves Direito constitucional 11 ed Belo Horizonte Del Rey 2005 CUNHA Rogério Sanches Manual de direito penal parte geral arts 1º ao 120 I 4 ed Salvador JusPodivm 2016 DINIZ Maria Helena Curso de direito civil brasileiro direito de família 18 ed São Paulo Saraiva 2002 v 5 A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 24 FARIAS Cristiano Chaves de ROSENVALD Nelson Curso de direito civil famílias 6 ed Salvador JusPodivm 2014 FIUZA Cesar Direito civil curso completo 9 ed Belo Horizonte Del Rey 2006 FREITAS Augusto Teixeira de Nova apostila à censura do senhor Alberto de Moraes Carvalho sobre o Projeto do Código Civil LGL2002400 Português Rio de Janeiro Tipografia Universal de Laemmert 1859 FREITAS Augusto Teixeira de Esboço de Código Civil LGL2002400 Rio de Janeiro Tipografia Universal de Laemmert 1860 GAGLIANO Pablo Stolze PAMPLONA FILHO Rodolfo Manual de direito civil São Paulo Saraiva 2017 v único GAIO Institutas do jurisconsulto Gaio Trad J Cretella Jr e Agnes Cretella São Paulo Ed RT 2004 GOMES Orlando Introdução ao direito civil 11 ed Rio de Janeiro Forense 1995 GONÇALVES Carlos Roberto Direito civil brasileiro parte geral 10 ed São Paulo Saraiva 2012 v 1 GONÇALVES Carlos Roberto In LENZA Pedro Coord Direito civil esquematizado1 parte geral obrigações e contratos 6 ed São Paulo Saraiva 2016 GRECO Rogério Curso de direito penalparte especial 14 ed Niterói Impetus 2017 v 3 GRECO Rogério Curso de direito penalparte geral 19 ed Niterói Impetus 2017 v I LENZA Pedro Direito constitucional esquematizado 19 ed São Paulo Saraiva 2015 LOUREIRO Lourenço Trigo de Instituições de Direito Civil brasileiro extraídas das Instituições de Direito Civil lusitano do exímio Jurisconsulto português Paschoal José de Mello Freire na parte compatível com as Instituições da nossa cidade e aumentadas nos lugares competentes com a substância das Leis Brasileiras Recife Tipografia da Viúva Roma Filhos 1851 MELLO Celso Antônio Bandeira de Conteúdo jurídico do princípio da igualdade São Paulo Malheiros 1993 MELLO Marcos Bernardes de Achegas para uma teoria das capacidades em direito Revista de Direito Privado São Paulo julset 2000 MORAES Alexandre de Direito constitucional 32 ed São Paulo Atlas 2016 NADER Paulo Curso de direito civil parte geral 10 ed Rio de Janeiro Forense 2016 v 1 NADER Paulo Curso de direito civil direito de família Rio de Janeiro Forense 2016v 5 NUCCI Guilherme de Souza Curso de direito penal parte especial arts 213 a 361 do Código Penal LGL19402 Rio de Janeiro Forense 2017PACELLI Eugênio CALLEGARI André Manual de direito penal parte geral 2 ed São Paulo Atlas 2016 PEREIRA Caio Mário da Silva Instituições de direito civil Atual Tânia da Silva Pereira 25 ed Rio de Janeiro Forense 2017 v 5 RIBAS Antônio Joaquim Curso de direito civil brasileiro Rio de Janeiro Tipografia Universal de Laemmert 1865 A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 25 SARLET Ingo Wolfgang Algumas notas em torno da relação entre o princípio da dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais na ordem constitucional brasileira In BALDI César Augusto Org Direitos humanos na sociedade cosmopolita Rio de Janeiro Renovar 2004 TARTUCE Flávio Manual de direito civil 6 ed rev atual e ampl Rio de Janeiro Forense São Paulo Método 2016 p 305306 TARTUCE Flávio Direito civil Direito de Família12 ed Rio de Janeiro Forense 2017v 5 1 MELLO Marcos Bernardes de Achegas para uma teoria das capacidades em direito Revista de Direito Privado São Paulo julset 2000 p 17 2 GONÇALVES Carlos Roberto In LENZA Pedro Coord Direito civil esquematizado 1 parte geral obrigações e contratos 6 ed São Paulo Saraiva 2016 p 125 3 ANGHER Anne Joyce Org Vade Mecum Acadêmico de Direito Brasil Código Civil Lei 10406 de 10 de janeiro de 2002 22 ed São Paulo Rideel 2016 Série Vade Mecum p 221 4 GRECO Rogério Curso de direito penal parte geral 19 ed Niterói Impetus 2017 v I p 530 5 ANGHER Anne Joyce Org Vade Mecum acadêmico de direito Brasil CódigoPenal Decretolei 2848 de 7 de dezembro de 1940 22 ed São Paulo Rideel 2016 p 360 6 GAGLIANO Pablo Stolze PAMPLONA FILHO Rodolfo Manual de direito civil São Paulo Saraiva 2017 v único p 49 7 GONÇALVES Carlos Roberto In LENZA Pedro Coord Direito civil esquematizado 1 parte geral obrigações e contratos 6 ed São Paulo Saraiva 2016 p 135 8 ANGHER Anne Joyce Org Vade Mecum acadêmico de direito Brasil Código civil Lei 10406 de 10 de janeiro de 2002 22 ed São Paulo Rideel 2016 p 149 9 GAGLIANO Pablo Stolze PAMPLONA FILHO Rodolfo Manual de direito civil São Paulo Saraiva 2017 v único p 52 10 ANGHER Anne Joyce Org Vade Mecum acadêmico de direito Brasil Código civil Lei 10406 de 10 de janeiro de 2002 22 ed São Paulo Rideel 2016 p 149 11 GONÇALVES Carlos Roberto In LENZA Pedro Coord Direito civil esquematizado 1 parte geral obrigações e contratos 6 ed São Paulo Saraiva 2016 p 140 12 GONÇALVES Carlos Roberto Direito civil esquematizado 1 parte geral obrigações e contratos 6 ed In LENZA Pedro Coord São Paulo Saraiva 2016 p 141 13 GONÇALVES Carlos Roberto In LENZA Pedro Coord Direito civil esquematizado 1 parte geral obrigações e contratos 6 ed São Paulo Saraiva 2016 p 139 14 GONÇALVES Carlos Roberto In LENZA Pedro Coord Direito civil esquematizado 1 parte geral obrigações e contratos 6 ed São Paulo Saraiva 2016 p 147 15 GAGLIANO Pablo Stolze PAMPLONA FILHO Rodolfo Manual de direito civil São A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 26 Paulo Saraiva 2017 v único p 50 16 ANGHER Anne Joyce Org Vade Mecum acadêmico de direito Brasil Código Civil Lei 10406 de 10 de janeiro de 2002 22 ed São Paulo Rideel 2016 p 226 227 17 GAGLIANO Pablo Stolze PAMPLONA FILHO Rodolfo Manual de direito civil São Paulo Saraiva 2017 v único p 51 18 Brasil Lei 13146 de 6 de julho de 2015 Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência Estatuto da Pessoa com Deficiência Diário Oficial da União Brasília 7 de julho de 2015 19 ANGHER Anne Joyce Org Vade Mecum acadêmico de direito Brasil Código civil Lei 10406 de 10 de janeiro de 2002 22 ed São Paulo Rideel 2016 p 226 20 GONÇALVES Carlos Roberto In LENZA Pedro Coord Direito civil esquematizado 1 parte geral obrigações e contratos 6 ed São Paulo Saraiva 2016 p 136 21 SARLET Ingo Wolfgang Algumas notas em torno da relação entre o princípio da dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais na ordem constitucional brasileira In BALDI César Augusto Org Direitos humanos na sociedade cosmopolita Rio de Janeiro Renovar 2004 p 562 22 ANGHER Anne Joyce Org Vade Mecum acadêmico de direito Organização das Nações Unidas Declaração universal dos direitos humanos 22 ed São Paulo Rideel 2016 p 1942 23 Decisão extraída da obra de Francisco Rubio Llorente Org Derechos Fundamentales y Principios Constitucionales Barcelona Ariel p 72 Apud SARLET Ingo Wolfgang Algumas notas em torno da relação entre o princípio da dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais na ordem constitucional brasileira In BALDI César Augusto Org Direitos humanos na sociedade cosmopolita Rio de Janeiro Renovar 2004 p 562563 24 SARLET Ingo Wolfgang Algumas notas em torno da relação entre o princípio da dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais na ordem constitucional brasileira In BALDI César Augusto Org Direitos humanos na sociedade cosmopolita Rio de Janeiro Renovar 2004 p 573 25 MORAES Alexandre de Direito constitucional 32 ed São Paulo Atlas 2016 p 74 26 GAGLIANO Pablo Stolze PAMPLONA FILHO Rodolfo Manual de direito civil São Paulo Saraiva 2017 v único p 51 27 CARVALHO Kildare Gonçalves Direito constitucional 11 ed Belo Horizonte Del Rey 2005 p 384 28 BRASIL Constituição 1988 Constituição da República Federativa do Brasil Brasília Senado 1988 29 LENZA Pedro Direito constitucional esquematizado 19 ed São Paulo Saraiva 2015 p 1647 30 MORAES Alexandre de Direito constitucional 32 ed São Paulo Atlas 2016 p 99100 31 LENZA Pedro Direito constitucional esquematizado 19 ed São Paulo Saraiva A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 27 2015 p 1648 32 MELLO Celso Antônio Bandeira de Conteúdo jurídico do princípio da igualdade São Paulo Malheiros 1993 p 21 33 MELLO Celso Antônio Bandeira de Conteúdo jurídico do princípio da igualdade São Paulo Malheiros 1993 p 2122 34 NADER Paulo Curso de direito civil direito de família Rio de Janeiro Forense 2016 v 5 p 876 35 TARTUCE Flávio Direito civil Direito de Família 12 ed Rio de Janeiro Forense 2017 v 5 p 395 36 GAGLIANO Pablo Stolze PAMPLONA FILHO Rodolfo Manual de direito civil São Paulo Saraiva 2017 v único p 160 37 TARTUCE Flávio Manual de direito civil 6 ed rev atual e ampl Rio de Janeiro Forense São Paulo Método 2016 p 305 38 TARTUCE Flávio Manual de direito civil 6 ed rev atual e ampl Rio de Janeiro Forense São Paulo Método 2016 p 305306 39 NADER Paulo Curso de direito civil parte geral 10 ed Rio de Janeiro Forense 2016 v 1 p 632 40 GOMES Orlando Introdução ao Direito Civil 11 ed Rio de Janeiro Forense 1995 p 496 41 GAGLIANO Pablo Stolze PAMPLONA FILHO Rodolfo Manual de direito civil São Paulo Saraiva 2017 v único p 188 42 NADER Paulo Curso de direito civil parte geral 10 Rio de Janeiro Forense 2016 v 1 p 632 43 ANGHER Anne Joyce Org Vade Mecum acadêmico de direito Brasil Código civil Lei 10406 de 10 de janeiro de 2002 22 ed São Paulo Rideel 2016 p 157 44 GAGLIANO Pablo Stolze PAMPLONA FILHO Rodolfo Manual de direito civil São Paulo Saraiva 2017 v único p 127 45 GONÇALVES Carlos Roberto Direito civil esquematizado 1 parte geral obrigações e contratos 6 ed In LENZA Pedro Coord São Paulo Saraiva 2016 p 316 46 GAGLIANO Pablo Stolze PAMPLONA FILHO Rodolfo Manual de direito civil São Paulo Saraiva 2017 v único p 56 47 BRASIL Lei 13146 de 6 de julho de 2015 Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência Estatuto da Pessoa com Deficiência Diário Oficial da União Brasília 7 de julho de2015 48 ANGHER Anne Joyce Org Vade Mecum acadêmico de direito Brasil Código penal Decretolei 2848 de 7 de dezembro de 1940 22 ed São Paulo Rideel 2016 p 377 49 GRECO Rogério Curso de Direito Penal parte especial 14 ed Niterói Impetus 2017 v 3 p 149 50 BITENCOURT Cezar Roberto Tratado de direito penal parte especial 4 ed São A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 28 Paulo Saraiva 2010 v 4 p 93 51 GRECO Rogério Curso de Direito Penal parte especial 14 ed Niterói Impetus 2017 v 3 p 150 52 NUCCI Guilherme de Souza Curso de direito penal parte especial arts 213 a 361 do Código Penal Rio de Janeiro Forense 2017 p 142 A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 29
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A ANÁLISE DA CAPACIDADE CIVIL À LUZ DO ESTATUTO DO DEFICIENTE INCLUSÃO PROTEÇÃO OU DESPROTEÇÃO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA The analysis of civil capacity in the light of the statute of deficiency inclusion protection or lack of protection of the dignity of the human person Revista dos Tribunais vol 9892018 p 83 124 Mar 2018 DTR201810306 Cláudia Mara de Almeida Rabelo Viegas Doutora e Mestre em Direito Privado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Gama Filho Especialista em Educação à Distância pela PUC Minas Especialista em Direito Público Ciências Criminais pelo Complexo Educacional Damásio de Jesus Bacharel em Administração de Empresas e Direito pela Universidade FUMEC Coordenadora do Curso de Direito da UNIESP Faculdade de Belo Horizonte Professora de Direito da PUC Minas e UniESP Proftutora do Conselho Nacional de Justiça CNJ Servidora Pública Federal do TRT MG Assistente do Desembargador Corregedor claudiamaraviegasyahoocombr João Paulo de Carvalho Cruz Bacharel em Direito pela UniESP Faculdade de Belo Horizonte 2º Sargento da Polícia Militar de Minas Gerais jpdihotmailcom Área do Direito Civil Direitos Humanos Resumo Buscase no presente estudo analisar as alterações nos institutos da capacidade e incapacidade civil promovidas pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência Lei 131462015 verificando especialmente as implicações promovidas na vida das pessoas em situação de vulnerabilidade O referido diploma legal sob o argumento de proporcionar um tratamento mais digno às pessoas portadoras de deficiência limitou a incapacidade absoluta apenas aos menores de 16 anos de idade restringindose os efeitos da incapacidade relativa aos demais sobretudo àqueles indivíduos que não exprimem a vontade transitória ou permanentemente reconhecendo desse modo a relativa incapacidade sem levar em conta a situação fática da pessoa humana Diante de tal contexto e partindo da premissa de que a teoria das incapacidades até então conferiu tratamento adequado e diferenciado às pessoas em posição jurídica vulnerável pretendese por meio de estudo investigativo bibliográfico e discursivo demonstrar a impropriedade de se impor uma condição jurídica de incapacidade relativa sem contudo considerar a condição fática da pessoa humana Desse modo quer se investigar se a imposição indiscriminada da capacidade civil promovida pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência resulta em prejuízo para as pessoas em situação de vulnerabilidade e também em conflito jurídiconormativo Palavraschave Capacidade civil Incapacidade Vulnerabilidade Desproteção Conflito normativo Abstract This study aims to analyze the changes in the institutes of capacity and civil incapacity promoted by the Statute of the Person with Disability Law 13146 2015 especially checking the implications promoted in the lives of people in situations of vulnerability Said law on the grounds of providing a more dignified treatment to persons with disabilities limited absolute incapacity only to those under 16 years of age restricting the effects of incapacity relative to others especially to individuals who do not express the will transient or permanently thus recognizing the relative incapacity without taking into account the factual situation of the human person In view of such a context and based on the premise that the theory of disabilities so far has given adequate and differentiated treatment to people in a vulnerable legal position it is intended through a bibliographical and discursive research study to demonstrate the impropriety of imposing a condition of relative incapacity without however considering A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 1 the factual condition of the human person In this way it is sought to investigate whether the indiscriminate imposition of civil capacity promoted by the Disability Statute results in damage to people in situations of vulnerability and also in legalnormative conflict Keywords Civil Capacity Inability Vulnerability Deprotection Normative conflict Sumário 1Introdução 2A capacidade civil 3A incapacidade 4A desproteção 5Os conflitos do estatuto da pessoa com deficiência com o ordenamento pátrio e os reflexos nos hipossuficientes 6Conclusão 7Referências 1Introdução Em 6 de julho de 2015 foi publicada a Lei 13146 que institui o Estatuto da Pessoa com Deficiência diploma legal que tem por base a orientação para sua criação proveniente da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu protocolo facultativo assinados em Nova Iorque em 30 de março de 2007 ratificados no Brasil em 9 de julho de 2008 por meio do Decreto Legislativo 186 Traduzindo o objetivo de não discriminação inclusão social e equiparação de oportunidades às pessoas com deficiência o referido Estatuto veio à tona com o objetivo precípuo de assegurar e promover em condições de igualdade o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoas com deficiência Com o argumento de buscar a igualdade para promover a dignidade da pessoa humana o diploma legal proporcionou modificações substanciais no ordenamento jurídico brasileiro sobretudo na teoria das capacidades do Direito Civil Brasileiro Nessa senda pretendese investigar se as mudanças promovidas pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência causaram desamparo às pessoas em situação de extrema vulnerabilidade sobretudo àquelas que não exprimem vontade O estudo se justifica pois na contramão da realidade fática o ordenamento jurídico passou a tratar tais indivíduos como relativamente incapazes apenas à prática de certos atos sendo que na realidade não têm condições de praticar ato algum Tal situação deixa evidente que o véu da inclusão pode gerar a desproteção perdendo o indivíduo que não exprime sua vontade às prerrogativas legais de proteção relacionadas à incapacidade absoluta prescrição etc 2A capacidade civil A personalidade jurídica é a aptidão genérica para titularizar direitos e contrair obrigações em outras palavras é o atributo para ser sujeito de direito A capacidade civil da pessoa decorre de sua personalidade ou seja uma vez adquirida a personalidade jurídica o indivíduo se capacita a ser titular de direitos e obrigações Para Marcos Bernardes de Mello1 capacidade jurídica é a aptidão que o ordenamento jurídico atribui às pessoas em geral e a certos entes em particular estes formados por grupos de pessoas ou universalidades patrimoniais para serem titulares de uma situação jurídica Apesar de similares e interligados devido à capacidade civil do indivíduo decorrer da sua própria personalidade jurídica tais institutos diferemse e não devem ser entendidos como sinônimos Carlos Roberto Gonçalves2 alerta que embora se interpenetrem tais atributos não se confundem uma vez que a capacidade pode sofrer limitação A personalidade é ampla e irrestrita ao passo que a capacidade civil se mostra limitada à análise de discernimento devendose levar em conta se o indivíduo possui ou não condições para praticar autonomamente os atos da vida civil Seguindo essa linha o instituto da capacidade se divide em capacidade de gozo ou de direito atributo inerente A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 2 a todo o ser humano que nasceu com vida no Brasil e a capacidade de fato ou de exercício a aptidão do indivíduo para praticar por ele mesmo os atos da vida civil sendo em regra adquirida aos 18 anos ou por meio da emancipação Entretanto como não são todas as pessoas que reúnem condições para tal poderá o indivíduo ter sua capacidade de fato ou de exercício limitada como é o caso dos relativamente incapazes ou até mesmo não a possuir como os absolutamente incapazes Assim como a personalidade o instituto da legitimação muito se assemelha à capacidade no entanto não se confundem A legitimação é exigida apenas para prática de alguns atos jurídicos que necessitam de capacidade especial para que o indivíduo possa realizálos mesmo que seja detentor de capacidade civil Como exemplo vejase o cônjuge casado em regime de comunhão de bens que pretende alienar o imóvel do casal Não obstante seja capaz civilmente necessita da outorga do outro cônjuge para praticar o ato pretendido nos termos do art 1647 do CC02 LGL20024003in verbis Ressalvado o disposto no art 1648 nenhum dos cônjuges pode sem autorização do outro exceto no regime da separação absoluta I alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis Destacase por fim que ordenamento jurídico brasileiro adotou a regra a capacidade do indivíduo como regra adquirida pelo critério objetivo da lei 18 anos de idade e emancipação Portanto somente haverá limitação ou ausência de capacidade nas hipóteses expressamente elencadas no rol taxativo do CC02 LGL2002400 arts 3º e 4º inexistindo aplicação da teoria dos intervalos lúcidos 21Capacidade X imputabilidade Importante para esse estudo distinguir a capacidade civil da imputabilidade pois conquanto sejam institutos diversos que vigoram inclusive em áreas distintas por vezes são confundidos A capacidade civil conforme já dito é a aptidão para o indivíduo praticar por si os atos da vida civil ou os atos da vida privada disciplinada no Código civil de 2002 quem a possui e as consequências dos atos praticados em caso de incapacidade A imputabilidade por sua vez pertence à esfera do Direito Penal e se refere à aptidão do indivíduo para que lhe seja imputado um fato típico e antijurídico e suas consequências Segundo Rogerio Greco4 a imputabilidade é a possibilidade de se atribuir imputar o fato típico e ilícito ao agente A imputabilidade é a regra a inimputabilidade a exceção são os casos de acometimento de doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado mental que retira do indivíduo a capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou o caso de ter o indivíduo menos de 18 anos expressamente dispostos nos arts 26 e 27 do Decretolei 2848 de 7 de dezembro de 1940 Código Penal LGL194025 nesses casos temse portanto a inimputabilidade A referida norma assim dispõe Art 26 É isento de pena o agente que por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado era ao tempo da ação ou da omissão inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento Art 27 Os menores de 18 dezoito anos são penalmente inimputáveis ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial Cabe destacar que o Estatuto da Pessoa com Deficiência alterou os institutos da capacidade e das incapacidades proporcionando mudanças significativas no ordenamento jurídico brasileiro todavia não alterou os institutos da imputabilidade e da inimputabilidade circunstância que importa em sério conflito que será tratado em seguida A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 3 3A incapacidade Sendo a capacidade de fato a aptidão para praticar atos da vida civil de modo autônomo quando um indivíduo possui limitações em sua capacidade o ordenamento o considera como incapaz Contudo essa limitação carece de cautela O indivíduo ao nascer com vida adquire a personalidade com isso tornase titular de direitos e deveres na ordem jurídica em outras palavras um sujeito de direitos Entretanto não obstante isso algumas pessoas não possuem as condições necessárias para exercer per si os seus direitos Historicamente o instituto das capacidades adota a premissa moderna na definição da incapacidade reconhecendoa a partir da falta ou da limitação do discernimento do indivíduo e não a partir de uma classe ou de uma simples condição a qual a pessoa possua como ocorria no Código de 1916 Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho6 lecionam Em linha de princípio cumpre mencionar mais uma vez que a previsão legal da incapacidade traduz a falta de aptidão para praticar pessoalmente atos da vida civil Encontrase nessa situação a pessoa a quem falte capacidade de fato ou de exercício ou seja que esteja impossibilitada de manifestar real e juridicamente a sua vontade Hodiernamente há duas formas ou espécies de incapacidade total ou absoluta e parcial ou relativa no entanto nem sempre foi assim No regramento anterior a incapacidade era estabelecida por Lei e a capacidade do indivíduo definida a partir da sua classe e condição social Nessa lógica legislativa seria incapaz a pessoa que se enquadrasse das hipóteses legais ainda que possuísse plena condição para praticar qualquer ato jurídico Por adotar um posicionamento moderno acerca do instituto das capacidades os critérios presentes no regramento vigente para o reconhecimento da incapacidade do indivíduo se prendem à maturidade e ao discernimento do ser humano e não mais à sua classe ou condição social Assim pela visão moderna do Código a capacidade do indivíduo é a regra e a incapacidade uma exceção em outras palavras presumese que todo indivíduo é capaz Acerca dos critérios estabelecidos para o reconhecimento da incapacidade Carlos Roberto Gonçalves7 leciona Com o intuito de protegêlas tendo em vista as suas naturais deficiências decorrentes na maior parte da idade da saúde e do desenvolvimento mental e intelectual a lei não lhes permite o exercício pessoal de direitos exigindo que sejam representadas ou assistidas nos atos jurídicos em geral A incapacidade absoluta apenas é reconhecida a partir do critério de idade do indivíduo e assim dispõe o art 3º do referido diploma legal8 São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil os menores de 16 dezesseis anos Nessa senda independentemente da condição de saúde discernimento ou entendimento do indivíduo caso possua menos de 16 anos de idade ele é absolutamente incapaz Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho9 definem os menores de 16 anos como menores impúberes e argumenta que são absolutamente incapazes porque o legislador os considera pessoas imaturas para atuar na órbita do direito Excetuandose o critério da idade menor que 16 anos os demais critérios importam apenas em incapacidade relativa ou seja não há a possibilidade de uma pessoa que possua mais de 16 anos de idade ser absolutamente incapaz O art 4º do CC0210 assim dispõe sobre a incapacidade relativa Art 4º São incapazes relativamente a certos atos ou à maneira de os exercer A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 4 I os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos II os ébrios habituais e os viciados em tóxico III aqueles que por causa transitória ou permanente não puderem exprimir sua vontade IV os pródigos Parágrafo único A capacidade dos indígenas será regulada por legislação especial Verificase pois que o critério da idade também é determinante para a incapacidade relativa ou seja até completar 16 anos o indivíduo é tido como absolutamente incapaz devido a sua idade e imaturidade Lado outro dos 16 anos aos 18 anos o indivíduo é tratado como menor púbere e por ser um pouco mais maduro poderá praticar os atos jurídicos acompanhado do seu assistente em face da ausência de capacidade plena Certo é que o discernimento sempre foi considerado para classificar a incapacidade dos indivíduos havendo também o importante critério da saúde e desenvolvimento mental completo e incompleto fatos ignorados pelo Estatuto da Pessoa com deficiência que tratou o ser humano de forma objetiva sem considerar a subjetividade humana Sobre os critérios da saúde e do desenvolvimento mental e intelectual Carlos Roberto11 leciona O atual Código valendose de subsídios da ciência médicopsiquiátrica incluiu os ébrios habituais os toxicômanos e os deficientes mentais de discernimento reduzido no rol dos relativamente incapazes Somente são assim considerados porém os alcoólatras ou dipsômanos os que têm impulsão irresistível para beber e os toxicômanos isto é os viciados no uso e dependentes de substâncias alcoólicas ou entorpecentes Os usuários eventuais que por efeito transitório dessas substâncias ficarem impedidos de exprimir plenamente sua vontade estão elencados no art 4º III do aludido estatuto Dos ensinamentos do autor é possível distinguir a incapacidade dos ébrios habituais e dos viciados em tóxicos da incapacidade daqueles que são usuários eventuais A diferença entre elas está no momento de lucidez Enquanto estiver embriagado ou sob os efeitos das substancias entorpecentes tanto aqueles que são dependentes quanto os usuários eventuais estão em situação de incapacidade por não conseguirem externar sua vontade de forma livre Mas no momento de lucidez ou seja quando não estiver sob os efeitos de entorpecentes ou embriagado o usuário eventual possui plena capacidade enquanto que os ébrios habituais e os viciados em tóxicos permanecem relativamente incapazes devido à influência de sua dependência O inciso terceiro também pelos critérios da saúde e do desenvolvimento mental e intelectual define a incapacidade relativa para aqueles que por causa transitória ou permanente não puderem exprimir sua vontade O referido dispositivo traz uma disposição genérica de incapacidade assim qualquer patologia que impeça o indivíduo de manifestar sua vontade independentemente de haver ou não uma doença importa na sua incapacidade relativa Caso a incapacidade do indivíduo seja decorrente de alguma deficiência este será considerado incapaz apenas para a prática dos atos de natureza patrimonial ou negocial conforme determina o art 85 do Estatuto da Pessoa com Deficiência A prodigalidade por sua vez é definida por Carlos Roberto Gonçalves12 não como um estado de alienação mental propriamente dito mas como um desvio de personalidade a partir do qual o indivíduo gasta e dissipa seu patrimônio imoderadamente colocandose em risco de miséria A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 5 Nesse sentido a interdição do pródigo somente o priva de praticar sem assistência os atos de natureza patrimonial continuando plenamente capaz para os demais atos pessoais que sejam de mera administração nos termos que se extrai do art 1782 do CC02 LGL2002400 Os indígenas por fim não têm sua capacidade regulada pelo Código Civil LGL2002400 sendo regidos pela Lei 6001 de 1973 o Estatuto do Índio o qual distingue os indígenas em três categorias os índios isolados os índios em vias de integração e os índios integrados Por determinação do Estatuto do Índio os índios e as comunidades indígenas ainda não integradas ficam sujeitas ao regime tutelar definido no próprio estatuto A tutela do indígena cabe à União e os atos praticados pelo indígena não integrado sem a devida assistência são nulos Ocorre que caso o indígena revele consciência e conhecimento acerca do ato praticado e o ato praticado não lhe seja prejudicial não se aplica a nulidade ao caso 31A função jurídica do instituto da incapacidade e os meios de proteção Os institutos das capacidades e das incapacidades desde o Direito Romano ocupam importante espaço no ordenamento jurídico tendo como função jurídica a proteção daqueles considerados hipossuficientes ou seja daquelas pessoas em situação de vulnerabilidade por não conseguirem expressar sua vontade no exercício de seus direitos ou por não terem a real dimensão ou discernimento acerca dos atos a serem praticados ou mesmo das consequências jurídicas que deles resultam Nessa perspectiva cabe ao regramento Civil brasileiro disciplinar as relações jurídicas de ordem predominantemente privada e de natureza patrimonial mas também as existenciais ou seja o instituto das incapacidades não visa a proteção do ato jurídico em si sua função precípua é promover proteção ao indivíduo hipossuficiente de modo a possibilitar a prática de atos de forma digna A incapacidade civil não se presume Uma vez que a capacidade civil do indivíduo é regra no ordenamento jurídico brasileiro a incapacidade civil precisa ser reconhecida em juízo após um criterioso processo a partir do qual resulta uma sentença declaratória que define os termos da curatela Nesse sentido a incapacidade não é atribuída ao indivíduo mas sim reconhecida Carlos Roberto Gonçalves13 por sua vez dispõe que há realmente um sistema de proteção dos incapazes no Código Civil LGL2002400 e sobre esse sistema o autor ainda alerta Para os absolutamente incapazes a proteção é incondicional Os maiores de 16 anos porém já tendo discernimento suficiente para manifestar a sua vontade devem em contrapartida para merecêla proceder de forma correta Dos ensinamentos de Carlos Roberto se extrai que aqueles que estejam em situação de vulnerabilidade necessitam e recebem a devida proteção legal mas o ordenamento não coaduna com a máfé Homenageando a boafé entre as partes o art 166 I do CC02 LGL2002400 estabelece que o ato jurídico praticado pelo absolutamente incapaz sem a devida representação é nulo de pleno direito Diante de um ato praticado por uma pessoa que não tem o discernimento necessário para compreender as consequências deste ato com outra em plena capacidade presumese a máfé daquele que é capaz Neste sentido a proteção do absolutamente incapaz é incondicional e basta demonstrar a incapacidade absoluta do indivíduo para a nulidade do ato por ele praticado Para o ato praticado pelo relativamente incapaz sem a devida assistência o ordenamento estabelece a anulabilidade contudo diferentemente do que ocorre na hipótese do absolutamente incapaz por possuir certo discernimento a proteção do relativamente incapaz é condicionada O relativamente incapaz precisa demonstrar que agiu de boafé que houve um erro escusável e que a outra parte agiu de máfé para A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 6 que o ato seja anulado em sua proteção Além disso a incapacidade absoluta pode ser arguida por qualquer interessado ao passo que a relativa só pode ser arguida pelo próprio incapaz ou pelo seu representante legal Diante disso Carlos Roberto Gonçalves14 diz que importante proteção jurídica dos hipossuficientes realizase por meio da representação e da assistência que lhes dá a necessária segurança quer em relação à sua pessoa quer em relação ao seu patrimônio possibilitando o exercício de seus direitos A representação garante ao absolutamente incapaz a possibilidade do exercício dos direitos ainda que este não consiga expressar sua vontade pois o representante atua em nome do incapaz A assistência por sua vez garante que o relativamente incapaz atue de forma segura na vida civil Para a assistência fazse necessária a participação do relativamente incapaz Por possuir algum discernimento ele manifesta a própria vontade e seu assistente apenas lhe auxilia fornecendo as informações e esclarecimentos necessários ao correto entendimento do ato a ser praticado Além da representação e da assistência garantidas pelos institutos do poder familiar da tutela e da curatela o sistema de proteção dos hipossuficientes é composto por outras medidas tutelares como as que estão contidas nos institutos da prescrição e da nulidade Pelo sistema de proteção dos incapazes temse a convergência dos institutos tutelares em prol do melhor interesse do representado ou assistido senão vejamos O incapaz pode se achar representado ou assistido sob o poder familiar sob a tutela ou sob a curatela mas esses institutos não são absolutos e conforme já mencionado eles devem atender o melhor interesse do incapaz Havendo conflito de interesses entre o menor e quem o representa ou o assiste serlheá concedido um curador especial conforme dispõe o art 1692 do CC02 LGL2002400 Além disso o ordenamento ainda estabelece limites ao exercício da representação ou da assistência ao hipossuficiente O art 1749 concomitantemente com o art 1781 do mesmo diploma legal proíbe o representante ou assistente de adquirir bens do incapaz por si ou por interposta pessoa bem como de dispor dos bens do incapaz a título gratuito ou constituirse cessionário de crédito ou de direito contra o incapaz Além dos atos proibidos o art 1748 concomitantemente com o art 1781 do referido Código também dispõe que os atos de pagar dívida aceitar herança ou doações transigir vender bens ou propor ações bem como nelas exercer defesa em assistência ou representação do incapaz dependem de autorização do juiz Compondo o sistema de proteção dos incapazes há também os institutos da nulidade e da anulabilidade Portanto os atos praticados com alguma falha ou excesso no exercício da representação ou da assistência são reputados nulos ou anuláveis Conforme já demonstrado anteriormente o ato jurídico praticado pelo absolutamente incapaz sem a devida representação é nulo de pleno direito Como a incapacidade absoluta é tida por ausência total de discernimento ou maturidade para a prática do ato jurídico se o incapaz atuou sozinho o ato por ele praticado é inválido não convalesce pelo decurso do tempo e não pode ser confirmado Acerca da anulabilidade anteriormente também já foi demonstrado que o ato praticado com incapacidade relativa do agente sem a devida assistência importa na sua anulabilidade Mas a hipótese prevista no art 171 do CC02 LGL2002400 não é a única pois o caput do próprio dispositivo dispõe que há outras hipóteses previstas em lei Como exemplo de previsão legal da anulabilidade pode ser citado o negócio jurídico que é concluído pelo representante em conflito de interesses com o representado A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 7 previsto no art 119 do CC02 LGL2002400 Por possuir certo discernimento o ato praticado pelo relativamente incapaz sem a devida assistência pode ser confirmado Assim o ato só será invalidado se houver a manifestação do incapaz ou de seu curador Ocorre que devido à possibilidade de confirmação o direito de requerer a anulação do negócio praticado pelo relativamente incapaz sem assistência decai em quatro anos a contar do dia em que cessar a incapacidade Assim para garantir a proteção dos hipossuficientes a norma ainda impede que corra a prescrição e a decadência contra os incapazes para que estes não venham a perder nenhum direito por negligência de seus representantes Entretanto este benefício é previsto apenas para os absolutamente incapazes conforme dispõe o art 198 I do CC02 LGL2002400 Portanto diante das previsões legais acerca da incapacidade não há como duvidar do caráter protetivo que nutre o instituto das incapacidades 32A pessoa com deficiência nos termos da Lei 131462015 A Lei 131462015 andou bem ao conferir capacidade aos portadores de deficiência garantindo no art 84 o direito de exercer sua capacidade civil em igualdade de condições com as demais pessoas Acerca desta alteração Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho15 comentam A pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física mental intelectual ou sensorial nos termos do art 2º não deve ser mais tecnicamente considerada civilmente incapaz na medida em que os arts 6º e 84 do mesmo diploma deixam claro que a deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa Outra alteração não menos importante veio à tona por meio dos arts 115 e 116 do Estatuto que instituíram a Tomada de Decisão Apoiada disciplinada pelo art 1783A do Código Civil de 200216in verbis Art1783A A tomada de decisão apoiada é o processo pelo qual a pessoa com deficiência elege pelo menos 2 duas pessoas idôneas com as quais mantenha vínculos e que gozem de sua confiança para prestarlhe apoio na tomada de decisão sobre atos da vida civil fornecendolhes os elementos e informações necessários para que possa exercer sua capacidade Esse processo não corresponde a uma interdição e confere mais autonomia à pessoa que ache em situação de vulnerabilidade uma vez que ela é quem requer o apoio é ela quem elege seus apoiadores bem como é ela quem estabelece os limites e a duração do apoio Além disso mesmo com o acordo de Tomada de Decisão Apoiada em vigor a pessoa apoiada pode solicitar o fim desse acordo a qualquer tempo O Estatuto alterou também os termos da interdição Apesar de retirar os portadores de deficiência do rol de incapacidades e confirmar a plena capacidade civil deles o Estatuto estabelece que quando necessário como medida protetiva extraordinária o portador de deficiência pode ser submetido à curatela Mas esta deve ser proporcional às necessidades e às circunstâncias de cada caso bem como deve durar o menor tempo possível Discorrendo acerca das alterações Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho17 ainda explanam Em verdade o que o Estatuto pretendeu foi homenageando o princípio da dignidade da pessoa humana fazer com que a pessoa com deficiência deixasse de ser rotulada como incapaz para ser considerada em uma perspectiva constitucional isonômica dotada de plena capacidade legal ainda que haja a necessidade de adoção de institutos assistenciais específicos como a tomada de decisão apoiada e extraordinariamente a A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 8 curatela para a prática de atos na vida civil Ocorre que mesmo sendo submetidos à curatela para os portadores de deficiência conforme dispõe o art 85 do Estatuto a curatela afeta apenas a prática dos atos de natureza patrimonial e negocial independentemente do grau de discernimento que estes possuam Sobre os limites da curatela o 1º do art 8518 ainda alerta A definição da curatela não alcança o direito ao próprio corpo à sexualidade ao matrimônio à privacidade à educação à saúde ao trabalho e ao voto No processo de interdição também houve mudanças a partir do Estatuto Pelo regramento anterior a pessoa que se encontrava em situação de vulnerabilidade não podia requerer a própria curatela pois o art 1768 do CC02 LGL2002400 estabelecia que apenas os pais ou tutores o cônjuge ou qualquer parente e o ministério público poderiam promover a interdição Assim prestigiando a autonomia da pessoa em situação de vulnerabilidade o Estatuto alterou o art 1768 do CC0219 e incluiu a própria pessoa como legitimada ativa no processo de interdição Contudo apesar da nova redação do art 1768 conferir mais autonomia à pessoa em situação de vulnerabilidade a Lei 131052015 que dispõe o Código de Processo Civil LGL20151656 brasileiro o revogou expressamente A inovação vigorou por um minúsculo período iniciando em janeiro de 2016 com a vigência do Estatuto da Pessoa com Deficiência e findando em março do mesmo ano com a vigência do Código de Processo Civil de 2015 4A desproteção Como visto a partir da vigência do Estatuto da Pessoa com Deficiência apenas os menores de 16 anos são absolutamente incapazes O art 114 do referido diploma modificou o art 3º do CC02 LGL2002400 revogou os incisos II e III impedindo com isso o reconhecimento da incapacidade absoluta dos que por enfermidade ou deficiência mental não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos bem como dos que mesmo por causa transitória não puderem exprimir sua vontade Na contramão da teoria das incapacidades o Estatuto da Pessoa com deficiência tratou o ser humano de forma objetiva sem considerar a sua subjetividade ignorando a situação fática de ausência de discernimento Tal circunstância merece cuidado pois a vida do ser humano ficará nas mãos de terceiro que na prática será seu representante e não seu assistente como prevê a lei No entanto os efeitos jurídicos da prática dos atos civis ou a sua inércia recairão sobre um relativamente incapaz que não possui qualquer grau de capacidade e não está protegido pelo véu da incapacidade absoluta Não se pode ignorar que a função jurídica do instituto das incapacidades é a proteção daqueles que estejam em uma situação de vulnerabilidade No entanto ao modificar o rol de incapacidades e impedir que a situação de incapacidade seja reconhecida o Estatuto impede também que uma pessoa que esteja em situação de hipossuficiência goze da proteção legal estabelecida para os incapazes Nesse sentido leciona Carlos Roberto Gonçalves20 Pretendeu o legislador com essas inovações impedir que a pessoa deficiente seja considerada e tratada como incapaz tendo em vista os princípios constitucionais da igualdade e da dignidade humana Todavia têm elas sido objeto de pesadas críticas formuladas pela doutrina pelo fato principalmente de desproteger aqueles que merecem a proteção legal Assim apesar de buscarem a inclusão e dignidade da pessoa portadora de Deficiência as alterações promovidas pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência causaram em alguns aspectos a desproteção daqueles que são hipossuficientes 41A ofensa à dignidade A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 9 A dignidade é um atributo inalienável e irrenunciável inerente a todo ser humano Por ser uma característica intrínseca à pessoa ela pode e deve ser reconhecida respeitada promovida e protegida mas não pode ser criada concedida ou retirada Para uma compreensão jurídiconormativa da dignidade da pessoa humana Ingo Wolfgang Sarlet21 aponta como referencial normativo o art I da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 194822 o qual dispõe que Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade DUDH O referido autor ainda buscando a definição para dignidade também expõe a manifestação do Tribunal Constitucional da Espanha23 segundo o qual a dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que leva consigo a pretensão ao respeito por parte dos demais Após o seu referencial tendo a autonomia e o direito de autodeterminação da pessoa como elemento nuclear da dignidade da pessoa humana Ingo Wolfgang Sarlet24 assim constrói sua definição Temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade implicando neste sentido um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável além de propiciar e promover sua participação ativa e corresponsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos Essa definição feita por Ingo Wolfgang Sarlet apesar de extraída de uma obra do ano de 2004 mostrase bastante atual e em muito se assemelha à definição feita por Alexandre de Moraes em 2016 Alexandre25 assim define a dignidade A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas constituindose um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar de modo que somente excepcionalmente possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos e a busca ao Direito à Felicidade No ordenamento pátrio além de ser um atributo inerente ao ser humano a dignidade da pessoa humana é também um princípio fundamental que alicerça todo o sistema dos direitos fundamentais e se encontra esculpido no art 1º III da CF88 LGL19883 Constituição da República Federativa do Brasil Entretanto mesmo estando expressamente disposto diante da sua dimensão relacional não há como concentrar na sua definição tudo aquilo que compõe o seu âmbito de proteção ou de incidência Por conseguinte temse uma definição aberta mas objetiva Como o Direito exerce um papel fundamental na promoção da dignidade das pessoas é necessário que o ordenamento jurídico acompanhe os anseios da sociedade para evoluir no sentido de garantir uma vida cada vez mais digna às pessoas Na evolução do Direito a transição do Código Civil de 1916 para o de 2002 representa um marco importante sobre a busca de um tratamento mais digno aos portadores de deficiência O texto legal de 1916 definia os loucos de todos os gêneros como absolutamente incapazes Mas o texto de 2002 passou a reconhecer a incapacidade absoluta naqueles que por enfermidade ou deficiência mental não tiverem o necessário discernimento para a prática dos atos da vida civil Nesse sentido a causa da incapacidade deixou de ser a doença pura e simplesmente para ser avaliada a partir do A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 10 discernimento para a prática dos atos da vida civil A mudança ocorrida na transição dos referidos códigos promove indubitavelmente a dignidade da pessoa humana por retirar um dispositivo que impunha a incapacidade ao indivíduo e instituir outro que apenas estabelece uma forma de reconhecer a incapacidade caso o indivíduo a possua Em 2015 houve outro marco importante Buscando mais dignidade aos portadores de deficiência foi instituída a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência Tendo por base a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência que fora ratificada por meio do Decreto Legislativo 186 em 2008 essa norma se destina a assegurar e a promover a essas pessoas o exercício dos seus direitos e das suas liberdades fundamentais em condição de igualdade Visando à inclusão social e à cidadania das pessoas com deficiência o Estatuto promoveu profundas alterações no ordenamento jurídico brasileiro com o intuito de proporcionar a participação efetiva e a não discriminação dessas pessoas Conforme demonstrado no item 32 desse trabalho o rol das incapacidades foi substancialmente alterado e todas as disposições que faziam menção aos portadores de deficiência foram retiradas do texto legal Além disso aqueles que por causa transitória ou permanente não puderem exprimir sua vontade saíram do rol de incapacidade absoluta e passaram a compor o rol de incapacidade relativa e assim restou apenas o menor de 16 anos no rol absolutamente incapaz Sob uma análise superficial as alterações aparentam uma mudança meramente textual Mas não há dúvidas de que a retirada do texto que citava diretamente o portador de deficiência no rol de incapacidade promoveu a dignificação do tratamento a essas pessoas nos moldes do que ocorreu na transição do Código de 1916 para o de 2002 Sob a ótica de Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho26 a partir da referida mudança a incapacidade deixará de ser tratada como uma consequência quase inafastável da deficiência conforme ocorreu no Brasil por um longo período Entretanto o princípio da dignidade da pessoa humana é muito amplo e abrange mais que o direito a um tratamento igualitário Sobre a amplitude do referido princípio Kildare Gonçalves Carvalho27 leciona O princípio abrange não só os direitos individuais mas também os de natureza econômica social e cultural pois no Estado Democrático de Direito a liberdade não é apenas negativa entendida como ausência de constrangimento mas liberdade positiva que consiste na remoção de impedimentos econômicos sociais e políticos que possam embaraçar a plena realização da personalidade humana Ao refletir sobre a lição de Kildare Gonçalves constatase que apesar de promover a dignidade por um lado por outro as modificações promovidas pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência também violam o referido princípio Portanto alguns aspetos das modificações ocorridas carecem de uma profunda analise Apesar de algumas alterações demonstrarem um tratamento mais digno em primeira análise elas podem ao mesmo tempo suprimir direitos e garantias essenciais às pessoas Como a dignidade da pessoa humana remonta também à ideia de proteção e desenvolvimento da pessoa ao impedir a proteção de quem dela necessite a alteração promovida pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência conflita com o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana O direito à autodeterminação consagrado por esse princípio não depende do cumprimento literal da expressão para ser efetivado A autonomia da pessoa deve ser A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 11 considerada em abstrato uma vez que seu objetivo é proporcionar condições para que ela exerça os seus direitos seja diretamente assistida ou representada Portanto impor capacidade ignorando a situação de vulnerabilidade da pessoa é tão aviltante quanto retirála de uma pessoa em plenas condições uma vez que não importa em conferir autonomia a ela mas sim em desprotegêla e acentuar mais ainda a sua vulnerabilidade fato que certamente não promove a dignidade da pessoa humana 42A desigualdade Conforme demonstrado o princípio da dignidade da pessoa humana é fundamento de todo o ordenamento pátrio por conseguinte o direito à igualdade também encontra nele o seu fundamento Dessa forma o tratamento desigual além de violar um direito fundamental ofende também a própria dignidade de uma pessoa Cumprindo os preceitos da Declaração Universal dos Direitos Humanos a Constituição Federal LGL1988328 dispõe em seu art 5º que todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza garantindose aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida à liberdade à igualdade à segurança e à propriedade Portanto o direito a igualdade encontrase expressamente consagrado no texto constitucional Além de estar previsto como um direito fundamental às pessoas a igualdade constitui também um princípio informador de todo o ordenamento pátrio A aplicação do referido preceito constitucional mostrase bastante complexa Em que pese ser fácil a sua materialização a partir de uma interpretação literal do texto constitucional o resultado não cumpre a finalidade do referido princípio Pela interpretação literal basta conferir as mesmas condições a todas as pessoas indistintamente Apesar de ser um tratamento igualitário essa interpretação confere apenas a igualdade formal às pessoas ou seja esse entendimento resulta em uma mera aparência de igualdade Ocorre que em um Estado Democrático garantidor dos Direitos Humanos deve haver uma igualdade real e não uma mera formalidade Portanto a igualdade consagrada pelo princípio da isonomia no ordenamento jurídico brasileiro é a igualdade material Para conquistála é necessária uma interpretação sistemática da norma Segundo Pedro Lenza29 Essa busca por uma igualdade substancial muitas vezes idealista reconheçase eternizase na sempre lembrada com emoção Oração aos Moços de Rui Barbosa inspirada na lição secular de Aristóteles devendose tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida de suas desigualdades Portanto na igualdade material a partir da ideia de isonomia deve ser buscado o mesmo resultado para todas as pessoas ainda que os meios para esse resultado não sejam os mesmos a depender das condições em que cada pessoa se encontre No entanto mesmo a partir de uma interpretação sistemática a materialização do direito à igualdade não é uma tarefa simples A complexidade reside principalmente na definição de um limite para o tratamento diferenciado Em outras palavras quando e até que ponto uma pessoa pode ser tratada de forma diferente na promoção da isonomia Alexandre de Moraes30 aborda em sua obra que o princípio da igualdade possui em si uma tríplice finalidade limitadora Assim dispõe o ilustre autor A tríplice finalidade limitadora do princípio da igualdade limitação ao legislador ao intérpreteautoridade pública e ao particular O legislador no exercício de sua função constitucional de edição normativa não poderá A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 12 afastarse do princípio da igualdade sob pena de flagrante inconstitucionalidade Assim normas que criem diferenciações abusivas arbitrárias sem qualquer finalidade lícita serão incompatíveis com a Constituição Federal LGL19883 O intérpreteautoridade pública não poderá aplicar as leis e atos normativos aos casos concretos de forma a criar ou aumentar desigualdades arbitrárias Ressaltese que em especial o Poder Judiciário no exercício de sua função jurisdicional de dizer o direito ao caso concreto deverá utilizar os mecanismos constitucionais no sentido de dar uma interpretação única e igualitária às normas jurídicas Finalmente o particular não poderá pautarse por condutas discriminatórias preconceituosas ou racistas sob pena de responsabilidade civil e penal nos termos da legislação em vigor Concluise portanto que o tratamento desigual não importa necessariamente em desigualdade Mas pela própria função limitadora do princípio da igualdade as regras para o tratamento diferenciado devem ser definidas em lei A condição de disparidade deve ser reconhecida pelo ordenamento jurídico para que condições diferenciadas possam ser definidas Em outras palavras só pode receber um tratamento diferente aqueles que possuem uma posição jurídica também diferente obviamente reconhecida no próprio ordenamento Entretanto a previsão legal das regras para o tratamento diferenciado não encerra o problema É necessário também que o dispositivo normativo cumpra os preceitos consagrados na constituição Saber até que ponto o tratamento desigual não gera inconstitucionalidade é uma grande dificuldade que paira nesse ponto Para a solução dessa incógnita Pedro Lenza31 aponta os parâmetros adotados por Celso Antônio Bandeira de Mello Celso Antônio Bandeira de Mello32 dispõe que para se verificar o respeito ou o desrespeito ao princípio da igualdade três questões devem ser observadas quais sejam a a primeira diz com o elemento tomado como fator de desigualação b a segunda reportase à correlação lógica abstrata existente entre o fator erigido em critério de discrímen e a disparidade estabelecida no tratamento jurídico diversificado c a terceira atina à consonância desta correlação lógica com os interesses absorvidos no sistema constitucional e destarte juridicizados Esclarecendo melhor sobre essas três questões Celso Antônio Bandeira de Mello33 dispõe que para avaliar se há ou não violação ao princípio da igualdade fazse necessário analisar o critério discriminatório definido a justificativa racional e lógica para atribuir o tratamento jurídico específico em face do traço desigualador decorrente da desigualdade proclamada e por fim avaliar se a correlação entre os dois pontos anteriores estão em sintonia com os preceitos constitucionais Para o autor somente a partir desses três aspectos que é possível a correta análise do problema podendo a violação da isonomia ocorrer em qualquer deles Assim avaliando as modificações ocorridas no instituto das incapacidades com base nas disposições acerca do direito à igualdade bem como nos preceitos do princípio da isonomia resta evidente o conflito normativo A modificação ocorrida promoveu apenas uma igualdade formal para as pessoas que se encontram em situação de vulnerabilidade Ao ignorar a existência de uma distinção fática impondo a mesma condição jurídica às pessoas que estejam em situação de vulnerabilidade e às que não estejam os preceitos constitucionais acerca do princípio da isonomia sofrem severa violação A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 13 A violação ao referido princípio se dá porque ao impedir que seja reconhecida a incapacidade absoluta em alguém que tenha mais de 16 anos e lhe impor a mesma condição jurídica de uma pessoa em plenas condições aqueles que estão em situação de vulnerabilidade não podem receber a necessária proteção do ordenamento Caso essas pessoas recebam a proteção da qual necessitem também haverá violação ao princípio da isonomia Haja vista que dar tratamento diferenciado às pessoas que estão na mesma condição jurídica também viola o direito à igualdade 43Os prejuízos Ao analisar criteriosamente as disposições sobre as mudanças promovidas pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência em conjunto com a função jurídica do instituto das incapacidades constatase que houve grande prejuízo para as pessoas que se encontram em situação de vulnerabilidade para o exercício dos seus direitos Conforme visto independentemente da condição fática em que uma pessoa se encontre não há mais a possibilidade de se reconhecer a sua incapacidade absoluta Por conseguinte mesmo não possuindo condições para manifestar de forma segura e plena a sua vontade essas pessoas não gozam mais da proteção que possui o absolutamente incapaz em institutos como a representação a nulidade a prescrição e a decadência Todos esses institutos serão analisados adiante com o objetivo de verificar as mudanças ocorridas bem como as consequências resultantes Iniciando pelo instituto da representação O CC02 LGL2002400 estabelece em seu art 115 que os poderes para representar são conferidos pela lei ou pelo próprio representado Mas diante do foco do presente trabalho apenas será tratado acerca da representação legal pois é esta que se aplica aos incapazes O art 120 do mesmo diploma estabelece que os requisitos da representação legal bem como os seus efeitos são os estabelecidos na própria norma Em outras palavras a norma estabelece quando alguém precisa ser representado e de que forma essa representação deve ocorrer A representação legal pode ocorrer por meio da representação propriamente dita na qual o representante pratica os atos em nome do representado buscando materializar os direitos deste Ou pode ocorrer por meio da assistência na qual o assistente apenas proporciona um suporte ou uma ajuda para que o assistido possa praticar pessoalmente os atos em busca da materialização dos seus direitos A incapacidade é um fato para o qual o ordenamento estabelece a representação legal O menor que seja incapaz tem sua representação legal definida pela tutela Já o maior que seja incapaz a tem definida pela curatela O Estatuto da Pessoa com Deficiência não alterou o instituto da tutela Mas o instituto da curatela foi substancialmente alterado Para melhor esclarecimento cabe destacar os dizeres de Paulo Nader34 ao definir a curatela Podemos afirmar sem a pretensão de alcançar todos os ângulos de abrangência do objeto de cognição que a curatela é um instituto de Direito Privado formado por normas de ordem pública destinado a amparar pessoa maior ou menor púbere que em razão de enfermidade mental ou deficiências outras de saúde não possui condições de gerir sua pessoa e bens ou apenas estes dotandoa de curador pessoa que zelará por seus interesses suprindolhe a incapacidade A curatela importa em cuidado e proteção de uma pessoa que seja maior de idade ou emancipada mas que não pode se autodeterminar por conta de uma incapacidade Entretanto a partir das alterações ocorridas a abrangência da proteção desse instituto foi limitada Uma pessoa maior de 16 anos não pode mais ter sua incapacidade absoluta reconhecida portanto por meio da curatela não há mais representação do curatelado A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 14 há apenas assistência Para as pessoas que possuem discernimento reduzido ou outro tipo de limitação que não impeça a manifestação da vontade delas a assistência é suficiente para alcançar os objetivos da curatela Isso porque essas pessoas necessitam apenas de um apoio haja vista que ainda que parcialmente elas conseguem participar do ato Entretanto para aquelas que não podem ou não conseguem expressar sua vontade a assistência não é suficiente para atingir tal intento Conforme já mencionado na assistência há apenas um suporte por parte do curador portanto a manifestação da vontade e a prática do ato devem ocorrer por conta do próprio curatelado A manifestação da vontade é um elemento crucial para a constituição de um ato jurídico e dada a sua importância será tratada adiante em um tópico específico desse trabalho item 51 Sobre esse ponto de inconsistência cabe destacar as palavras de Flavio Tartuce35 O ilustre autor assim dispõe Fica a dúvida se não seria interessante retomar alguma previsão a respeito de maiores absolutamente incapazes especialmente para as pessoas que não têm qualquer condição de exprimir vontade e que não são necessariamente pessoas deficientes Reiterese que o presente autor entende que sim havendo proposição nesse sentido no citado Projeto de Lei 7572015 com o nosso apoio e parecer Citese novamente e a esse propósito a pessoa que se encontra em coma profundo sem qualquer condição de exprimir o que pensa No atual sistema será enquadrada como relativamente incapaz o que parece não ter sentido jurídico Diante do que foi exposto não restam dúvidas de que as alterações ocorridas no instituto da curatela resultaram em prejuízo para aqueles que não possuem condições de manifestar de forma plena sua vontade Ao retirar dessas pessoas a condição protetiva da representação que lhes supriam a incapacidade as referidas alterações também impedem que essas pessoas materializem seus direitos Agora sobre a nulidade O ordenamento pátrio define no campo do Direito Civil o regramento acerca dos fatos e dos atos jurídicos Sendo assim quando estes ocorrem com desrespeito aos preceitos legais eles não podem ter validade Para Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho36 a nulidade se caracteriza como uma sanção pela ofensa a determinados requisitos legais não devendo produzir efeito jurídico em função do defeito que carrega em seu âmago Nesse sentido o instituto da nulidade tem como objetivo impedir a propagação de atos ou fatos contrários aos preceitos legais Mas para atingir o nível de agressão à norma o ordenamento estabelece gradações de invalidade Quando há violação de norma de ordem pública de natureza cogente carregando em si vício considerado grave o ato é nulo de pleno direito ou seja a nulidade é absoluta Lado outro caso haja violação de norma de ordem privada carregando em si vício considerado leve o ato tem apenas uma nulidade relativa ou seja é um ato anulável Ao fazer a gradação da invalidade o ordenamento define quais são as causas que importam em nulidade bem como as que importam em anulabilidade Diante de sua gravidade o ato nulo independe de manifestação para ter sua invalidade reconhecida Portanto uma vez constatado o vício grave e de ordem pública ele é despido desde sua origem de qualquer validade no âmbito jurídico Esse vício nem mesmo pelo decurso do tempo se convalida podendo nos termos dos arts 168 e 169 do CC02 LGL2002400 qualquer pessoa e a qualquer tempo arguir a invalidade de um ato nulo A sentença que reconhece a invalidade de um ato nulo tem natureza declaratória efeitos erga omnes e ex tunc Conforme disciplinado pelos arts 177 e 178 do CC02 LGL2002400 o ato anulável A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 15 por sua vez depende de manifestação para ser invalidado O interessado deve demandar demonstrando a existência do vício leve deve comprovar a guarda da boafé durante a prática do ato e por fim pleitear a invalidação do referido ato Por possuir um vício leve pode ser confirmado pelas partes ou pode ser convalidado pelo decurso do tempo Portanto caso o interessado não busque a invalidação do ato anulável ou não o faça dentro do prazo estabelecido na lei o ato tornarseá plenamente válido Além disso da ação anulatória resulta uma sentença constitutiva negativa Em outras palavras a invalidade se dá somente a partir da sentença prolatada E diferentemente do caso de nulidade absoluta os seus efeitos são inter partes Apesar do efeito ex tunc da sentença de invalidação de um ato anulável apresentado por Pablo Stolze no quadro comparativo existem duas correntes acerca deste fato Sobre os efeitos da sentença no tempo Flavio Tartuce37 assim dispõe Tradicionalmente sempre se apontou que os seus efeitos seriam ex nunc não retroativos ou somente a partir do trânsito em julgado da decisão Essa tese estaria confirmada pelo art 177 do atual Código O que poderia parecer pacífico em doutrina e jurisprudência não é tão pacífico assim Isso porque há posicionamento orientando que os efeitos da sentença na ação anulatória negócio anulável também seriam retroativos ex tunc parciais com fundamento no art 182 da atual codificação Flavio Tartuce38 adota o segundo posicionamento e dispõe que outros doutrinadores como Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho citando Humberto Theodoro Júnior e Ovídio Baptista também adotam tal posicionamento Mas pela visão clássica ainda prevalece a premissa de efeitos ex nunc da ação anulatória de ato anulável Além da problemática sobre a retroação ou não dos efeitos da sentença de invalidação há outro ponto a ser analisado Há que saber se o ato praticado pelo incapaz antes da interdição pode ser invalidado Para a incapacidade relativa o entendimento é pacífico O vício da incapacidade relativa só se faz presente no ato praticado após a sentença interdição e sem a devida assistência do curador No caso de incapacidade absoluta há duas correntes De um lado como a capacidade civil é a regra adotada pelo ordenamento seguindo a literalidade do art 1773 do CC02 LGL2002400 artigo revogado pela Lei 13105 de 16 de março de 2015 somente se opera os efeitos da curatela após a sentença Ou seja assim como na incapacidade relativa só estaria viciado o ato praticado após a interdição Lado outro como a sentença de interdição apenas declara a incapacidade e diante da carência por proteção dos absolutamente incapazes se restar comprovado que a causa de incapacidade absoluta já existia durante a prática do ato esse é inválido ainda que praticado antes da interdição Entretanto como só se reconhece incapacidade absoluta ao menor de 16 anos esse entendimento não pode mais ser aplicado Ao comparar as formas de invalidade constatase que além de o ato anulável depender de um esforço maior para sua invalidação os efeitos da sentença de anulação podem variar retroagindo ou não a depender da corrente adotada Nesse sentido ao analisar o instituto da nulidade sob as premissas das modificações promovidas pelo Estatuto do Deficiente depreendese que também houve prejuízo para as pessoas que se encontre em situação de vulnerabilidade nesse ponto Ao impedir o reconhecimento da incapacidade absoluta de alguém que seja maior de 16 A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 16 anos por conseguinte impedindoo também está de gozar da proteção da nulidade Ainda que seja possível a invalidação do ato praticado pelo relativamente incapaz sem a devida assistência por ser anulável essa hipótese é mais dispendiosa Portanto reconhecer nulidade absoluta ao ato praticado por alguém que não tenha as condições necessárias à plena manifestação da sua vontade ou não tenha consciência dela proporciona mais proteção que o reconhecimento de mera anulabilidade Por fim sobre a prescrição e a decadência A prescrição e a decadência são institutos previstos no ordenamento pátrio os quais têm como finalidade a estabilidade e a segurança jurídica O ordenamento confere às pessoas titulares de direitos o poder para gozálos de forma plena assim caso esses direitos sejam desrespeitados ou violados o ordenamento também confere ao titular do direito violado poderes para pleitear em juízo a defesa de seus direitos Esse poder denominase pretensão Entretanto para que haja segurança e estabilidade nas relações jurídicas os atos necessitam de definição Como a aquisição e a extinção de direitos sofrem grande influência pelo decurso do tempo o titular de um direito precisa exercêlo para estabilizar a relação jurídica portanto o exercício do direito ou da pretensão não podem ficar pendentes por tempo indefinido Acerca da prescrição há no campo teórico uma discussão a respeito das suas consequências Por um lado parte da doutrina defende que a prescrição importa na perda do direito de ação Paulo Nader39 segue essa linha e define a prescrição como sendo a perda do direito de ação em decorrência da inércia do seu titular durante lapso temporal superior ao estabelecido em lei Lado outro há quem defenda que a prescrição importa na perda do próprio direito Orlando Gomes40 defende esse posicionamento e dispõe que a prescrição é o modo pelo qual um direito se extingue em virtude da inércia durante certo lapso de tempo do seu titular que em consequência fica sem ação para assegurálo Por fim há o entendimento que a prescrição importa apenas na perda da pretensão Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho41 defendem esse entendimento e dispõem que a prescrição é a perda da pretensão de reparação do direito violado em virtude da inércia do seu titular no prazo previsto pela lei A última corrente apresentada mostrase mais coerente ao ordenamento pátrio A prescrição não pode resultar na perda do direito de ação por vedação constitucional prevista no art 5º XXXV da Carta Magna A prescrição também não resulta na perda do direito porque ela não impede o cumprimento da obrigação Caso alguém cumpra uma obrigação prescrita esse cumprimento é válido Portanto a perda da pretensão de reparação do direito violado é a opção que encontra amparo no ordenamento jurídico brasileiro Sobre a decadência o entendimento é pacífico Paulo Nader42 ao definila dispõe que decadência ou caducidade representa a morte de um direito subjetivo em face da inércia de seu titular que optou por não ajuizar uma ação constitutiva no prazo de lei Os dois institutos embora similares não se confundem Em uma resumida comparação a prescrição está voltada para os deveres obrigações e as responsabilidades que decorrem do desrespeito às regras sejam elas ditadas pelas partes ou pela ordem jurídica Ou seja está relacionada com os direitos subjetivos próprio das pretensões pessoais Já a decadência está associada aos direitos potestativos e às ações constitutivas portanto ela tem relação com um estado de sujeição Diante do que fora apresentado é possível perceber a seriedade das consequências impostas ao titular de direitos por não exercêlos ou defendêlos nos prazos legais Assim pela gravidade das implicações da prescrição e da decadência o ordenamento estabelece que em algumas situações os prazos prescricionais bem como os A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 17 decadenciais não poderão correr O CC0243 define quais são as causas impeditivas e suspensivas da prescrição dispondoas em um rol taxativo O referido diploma assim dispõe Art 197 Não corre a prescrição I entre os cônjuges na constância da sociedade conjugal II entre ascendentes e descendentes durante o poder familiar III entre tutelados ou curatelados e seus tutores ou curadores durante a tutela ou curatela Art 198 Também não corre a prescrição I contra os incapazes de que trata o art 3º II contra os ausentes do País em serviço público da União dos Estados ou dos Municípios III contra os que se acharem servindo nas Forças Armadas em tempo de guerra Art 199 Não corre igualmente a prescrição I pendendo condição suspensiva II não estando vencido o prazo III pendendo ação de evicção Diante o objeto de estudo do presente trabalho aqui será abordada apenas a causa prevista no item I do art 198 Ao definir que não corre a prescrição contra os absolutamente incapazes o legislador optou por resguardar aqueles que não possuem as condições necessárias para diligenciar em exercício ou em defesa de seus direitos em detrimento da segurança ou estabilidade jurídica Cabe ressaltar ainda que apesar de não haver como regra causas que impedem ou suspendem a decadência essa também não corre contra os absolutamente incapazes Portanto mais uma vez a alteração das disposições acerca da incapacidade proporcionada pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência prejudica aqueles que carecem de proteção Mesmo que o prazo decadencial para anular um ato praticado por um relativamente incapaz tenha início a partir do fim da incapacidade outras situações podem resultar em prejuízo Uma pessoa que não consiga exprimir sua vontade ou que não possua condições para exprimila de forma plena mas que seja maior de 16 anos não consegue mais a interrupção ou a suspensão do prazo prescricional Assim caso essa pessoa possua um crédito que precise ser executado ou sofra o esbulho de um bem e a causa incapacitante perdure por tempo superior ao prazo prescricional ela estará prejudicada Como não pode exercer pessoalmente os atos necessários à materialização dos seus direitos e nem pode mais usufruir de um representante para atuar em seu nome além de não poder impedir ou suspender a prescrição o decurso do tempo e a inércia resultarão em perda de direitos Nesses termos o crédito não poderá ser exigido e o bem esbulhado será usucapido 5Os conflitos do estatuto da pessoa com deficiência com o ordenamento pátrio e os reflexos nos hipossuficientes O ordenamento jurídico compõe um sistema complexo e extenso sofrendo alterações constantemente A sociedade é algo mutável está em constante evolução e modificação portanto para acompanhar a evolução da sociedade e seus anseios o conjunto A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 18 normativo também precisa ser modificado Contudo com cautela Nesse contexto o Estatuto da Pessoa com Deficiência objetivando a promoção da dignidade e inclusão social das pessoas portadoras de deficiência promoveu significativas modificações normativas Entretanto alguns pontos estão em conflito com o ordenamento pátrio mais precisamente no tocante à necessidade da manifestação da vontade para os atos jurídicos à necessidade de discernimento para gozo dos direitos sexuais e por fim em relação às consequências patrimoniais a partir do casamento ou da união estável 51Os atos jurídicos e a manifestação da vontade A vida em sociedade exige a inteiração entre as pessoas Ocorre que dessa inteiração surgem relações que têm implicações no âmbito jurídico seja na criação de uma obrigação ou no nascimento ou na extinção de um direito Esses eventos com implicações jurídicas são denominados fatos jurídicos Segundo Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho44 fato jurídico é todo acontecimento natural ou humano que determine a ocorrência de efeitos constitutivos modificativos ou extintivos de direitos e obrigações na órbita do direito Em complemento a sua definição o referido autor ainda dispõe que o fato jurídico se divide em três espécies distintas Uma delas é o fato jurídico em sentido estrito Essa espécie independe da intervenção humana para sua ocorrência assim basta que o evento previsto na norma ocorra no mundo fático A outra é o atofato jurídico Nessa espécie apesar de se fazer necessária a atuação da pessoa não importa para a norma se houve ou não manifestação de vontade em praticálo para que ocorram implicações no âmbito jurídico Por fim o ato ou negócio jurídico Nessa espécie destacase a ação direta da pessoa seja por definição legal seja pela autonomia privada para que ocorram implicações no âmbito jurídico Ela tem como elemento essencial a manifestação da vontade Ao disciplinar acerca dos atos ou negócios jurídicos o ordenamento estabelece que estes devem passar por três planos de análise sendo eles o plano de existência o plano de validade e por fim o plano de eficácia Nesse sentido só produzirá seus efeitos plenamente o ato ou negócio que cumprir essas três etapas No plano de existência há quatro elementos quais sejam agente manifestação da vontade objeto e forma Esses elementos são essenciais ou seja são constitutivos do ato jurídico Tamanha é sua essencialidade que a falta de algum desses elementos não resulta em vício ou em invalide do ato ele sequer chega a existir em âmbito jurídico No plano da validade há uma complementação dos elementos analisados no plano de existência Esse plano só é analisado após o ato atender aos requisitos necessários para existir Para ser valido o ato dever ter agente capaz manifestação da vontade livre e de boafé objeto lícito possível determinado ou determinável e forma prescrita ou não defesa em lei Portanto caso falte ao ato alguma das adjetivações dos elementos de validade ele estará viciado e será classificado como nulo ou anulável Por fim o plano de eficácia Nessa etapa cumpre analisar se no ato pende algum elemento acidental de declaração como a condição o termo ou o encargo Assim caso algum desses elementos acidentais de declaração ainda esteja pendente mesmo que exista e seja válido o ato só produzirá seus efeitos quando for cumprida a condição o termo ou o encargo Diante do que dispõe o ordenamento acerca do ato ou negócio jurídico dúvidas não restam de que o elemento subjetivo da vontade ou melhor da manifestação da vontade compõe a essência do referido ato Sobre a essencialidade desse elemento cabe A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 19 destaque às lições de Carlos Roberto Gonçalves45 A vontade é pressuposto básico do negócio jurídico e é imprescindível que se exteriorize Do ponto de vista do direito somente vontade que se exterioriza é considerada suficiente para compor suporte fático de negócio jurídico aquela que permanece interna como acontece como a reserva mental não serve a esse desiderato pois que de difícil senão impossível apuração A declaração de vontade é assim o instrumento da sua manifestação Por se tratar de é um elemento de caráter subjetivo que se revela por meio da declaração esta portanto e não aquela constitui requisito de existência do negócio jurídico Em outras palavras não há como constituir um ato ou negócio jurídico sem a manifestação da vontade de quem o está praticando Portanto nesse ponto o Estatuto da Pessoa com Deficiência conflita com o ordenamento Para aquelas pessoas que não possuem condições de externar sua vontade ou não consigam demonstrála de forma plena a manifestação da sua vontade deve ocorrer sob a proteção de institutos como a representação ou a assistência Ou seja quem não consegue manifestar sua vontade ou não possui qualquer discernimento acerca dessa manifestação precisa se valer de uma pessoa que pratique o ato em seu nome Entretanto conforme demonstrado no item 43 desse trabalho uma pessoa maior de 16 anos não pode mais se valer da representação uma vez que não pode mais ter sua incapacidade absoluta reconhecida pelo ordenamento Sobre essa mudança asseveram Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho46 De repente o novo diploma converteu aqueles que eram absolutamente incapazes em relativamente capazes Sinceramente não nos convence tratar essas pessoas sujeitas a uma causa temporária ou permanente impeditiva da manifestação da vontade como aquele que esteja em estado de coma no rol dos relativamente incapazes Se não podem exprimir vontade alguma a incapacidade não poderia ser considerada meramente relativa O referido Estatuto impôs uma condição formal de autonomia às pessoas em situação de vulnerabilidade todavia estas continuam em condição fática que lhes impedem de expressar a vontade de forma plena não existindo possibilidade de estas pessoas constituírem um ato jurídico pessoalmente tampouco por interposta pessoa que as representem Nesses termos ao contrário de conferir autonomia às pessoas em situação de vulnerabilidade ao imporlhes a capacidade civil relativa a referida norma promoveu a limitação deles As referidas mudanças obstam que essas pessoas constituam um ato ou negócio jurídico uma vez que não podem atuar sozinhas e a assistência não é suficiente nos casos em que não possam manifestar a vontade Destacase que semelhante ao conflito resultante das modificações dos institutos da capacidade e da incapacidade civil frente a essencialidade da manifestação da vontade para os atos jurídicos o Estatuto da Pessoa com Deficiência conforme disposto a seguir também conflita com o ordenamento pátrio ao estender aos direitos sexuais a capacidade imposta às pessoas que estejam em situação de vulnerabilidade 52Os direitos sexuais e o conflito com o Direito Penal Em um Estado democrático de direito é indubitável que todas as pessoas sejam titulares de direitos Entretanto para que o indivíduo possa exercêlos pessoalmente fazse necessária a existência de alguns requisitos que demonstre a aptidão para tal Os direitos sexuais não se excetuam a essa disposição portanto as modificações ocorridas A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 20 nesse ponto também conflitam com o ordenamento pátrio Nos termos do Estatuto da Pessoa com Deficiência ainda que uma pessoa seja submetida à curatela esta será limitada aos atos de natureza patrimonial e negocial Portanto a pessoa independentemente de sua condição fática é plenamente capaz para os atos de natureza existencial Sobre este assunto o Estatuto47 assim dispõe Art 85 A curatela afetará tão somente os atos relacionados aos direitos de natureza patrimonial e negocial 1º A definição da curatela não alcança o direito ao próprio corpo à sexualidade ao matrimônio à privacidade à educação à saúde ao trabalho e ao voto Entretanto apesar de objetivar maior autonomia às pessoas que possuam algum tipo de incapacidade a disposição feita pela Lei 131462015 carece de uma análise mais detalhada Isso porque como já dito anteriormente toda alteração deve ser analisada no sistema como um todo Inicialmente as disposições do referido Estatuto aparentam uma mudança ocorrida apenas no âmbito do direito civil pois conforme demonstrado no item 23 desse trabalho a capacidade civil ou capacidade jurídica e a imputabilidade disciplinada no âmbito do Direito Penal não se confundem Apesar de coincidirem alguns critérios de definição dos institutos a relação não passa disso coincidência Portanto são institutos completamente distintos Sendo assim as modificações ocorridas no instituto da capacidade e incapacidade civil em nada modificaram a imputabilidade ou a inimputabilidade Mas apesar de não incidir diretamente as modificações promovidas pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência em certo ponto conflitam com o Direito Penal Ao dispor que as pessoas que estejam em situação de vulnerabilidade ou seja aquelas que não têm condições de expressar sua vontade ou não podem fazêlo plenamente podem decidir sobre seus direitos sexuais bem como sobre o próprio corpo o Estatuto da Pessoa com Deficiência vai de encontro com a norma penal brasileira por ser com ela incompatível É incontestável que algumas pessoas são mais propensas a serem ludibriadas ou seduzidas seja por decorrência da ingenuidade seja por ausência de compreensão Assim são mais susceptíveis de serem convencidas por outras pessoas a fazer algo que não corresponda à sua real vontade ou algo do qual não tenha compreensão do seu real sentido ou de suas consequências Nesse sentido diante da situação de vulnerabilidade que essas pessoas se encontram e da necessidade de uma maior proteção o Código Penal LGL1940248 assim dispõe Art 217A Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 catorze anos Pena reclusão de 8 oito a 15 quinze anos 1º Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que por enfermidade ou deficiência mental não tem o necessário discernimento para a prática do ato ou que por qualquer outra causa não pode oferecer resistência O dispositivo busca proteger aqueles que estejam em situação de vulnerabilidade Portanto quem praticar qualquer ato libidinoso ou tiver conjunção carnal com uma pessoa definida como vulnerável pelo Direito Penal comete o crime de estupro de vulnerável Mas atenção deve ser dispensada aos critérios de análise de vulnerabilidade A norma penal ao verificar a condição de vulnerabilidade para a tipificação do referido crime se volta para os critérios da inimputabilidade e não para os critérios da A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 21 incapacidade civil Exceção feita ao critério etário que no tipo penal do estupro de vulnerável a idade foi reduzida para menos de 14 anos Entretanto assim como na inimputabilidade a simples existência da enfermidade ou doença não define a condição de vulnerabilidade para a tipificação do crime de estupro de vulnerável O que se avalia é o discernimento sobre a conduta Sobre a vulnerabilidade prevista no tipo penal do estupro de vulnerável leciona Rogério Greco49 Além do critério biológico enfermidade ou deficiência mental para que a vítima seja considerada como pessoa vulnerável não poderá ter o necessário discernimento para a prática do ato critério psicológico tal como ocorre em relação aos inimputáveis previstos pelo art 26 caput do Código Penal LGL19402 Ocorre que a norma civil a partir da mudança operada pelo referido Estatuto confere autonomia sobre os direitos sexuais às pessoas independentemente da condição fática em que elas se encontrem Mas a norma penal por sua vez analisa a condição fática em que essas pessoas se encontram para definir se há ou não condições de autonomia O tipo penal do estupro de vulnerável tutela a dignidade sexual daqueles que estejam em situação de vulnerabilidade uma vez que eles têm dificuldade em discernir ou entender por completo sobre a prática do ato sexual Portanto o bem jurídico tutelado nesse caso difere um pouco da hipótese do estupro simples Cezar Roberto Bitencourt50 assim dispõe Nos crimes constantes dos demais capítulos do mesmo Título a dignidade sexual é o bem jurídico mediato considerando que cada um desses tipos tem seu próprio bem jurídico imediato Na realidade na hipótese de crime sexual contra vulnerável não se pode falar em liberdade sexual como bem jurídico protegido pois se reconhece que não há a plena disponibilidade do exercício dessa liberdade que é exatamente o que caracteriza sua vulnerabilidade Nesse sentido havendo de fato a condição de vulnerabilidade e a ocorrência da conjunção carnal ou da prática do ato libidinoso haverá também o crime pois a autonomia conferida pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência no âmbito civil não afasta a tipicidade do Estupro de Vulnerável Como já mencionado o tipo penal não tem o objetivo de discriminar ou denegrir O seu objetivo é dar proteção às pessoas que por sua condição fática estejam mais susceptíveis a sofrer violação de seus direitos fato que caracteriza sua situação de vulnerabilidade Nesse ponto cabe replicar as brilhantes palavras de Rogério Greco51 É importante ressaltar que não se pode proibir que alguém acometido de uma enfermidade ou deficiência mental tenha uma vida sexual normal tampouco punir aquele que com ele teve algum tipo de ato sexual consentido O que a lei proíbe é que se mantenha conjunção carnal ou pratique outro ato libidinoso com alguém que tenha alguma enfermidade ou deficiência mental que não possua o necessário discernimento para a prática do ato sexual No mesmo sentido são as lições de Guilherme de Sousa Nucci52 Não se pode olvidar neste contexto que pessoas enfermas ou doentes mentais com base no princípio da dignidade da pessoa humana têm direito quando possível à vida sexual saudável Sentem necessidade e desejo e podem manter relacionamentos estáveis inclusive conforme o caso Diante do exposto a vulnerabilidade não é definida a partir de uma doença ou deficiência pura e simplesmente É necessária a análise da condição fática em que a pessoa se encontre e por isso a imposição formal de autonomia não afasta a vulnerabilidade A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 22 Portanto as alterações promovidas pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência criaram um conflito entre a norma penal e a norma civil Isso porque se alguém que esteja em situação de vulnerabilidade exerce seus direitos sexuais quem com ela praticar o ato sexual comete o crime de estupro de vulnerável 6Conclusão Após análise e apontamentos acerca das alterações da teoria das capacidades dúvidas não restam sobre a finalidade do Estatuto da Pessoa com Deficiência Todavia apesar de buscar a inclusão social a participação em condições de igualdade e a cidadania para a promoção da dignidade dos portadores de deficiência o Estatuto desconsidera a condição fática das pessoas e por conseguinte apresenta alguns pontos de inconsistência A alteração do rol das incapacidades ao retirar as disposições que faziam referência direta à deficiência como causa de incapacidade indubitavelmente alcança os objetivos propostos pelo estatuto Entretanto a exclusão da possibilidade de se reconhecer a incapacidade absoluta de alguém que seja maior de 16 anos de idade resgata uma situação jurídica já superada na qual a capacidade jurídica da pessoa é imposta ou retirada pela norma fato que resulta em retrocesso A inconsistência jurídica presente nas modificações promovidas pelo referido estatuto fica ainda mais latente quando se analisa a situação em que se encontram as pessoas que não podem ou não conseguem externar sua vontade após as alterações Diante da essencialidade da manifestação da vontade para os atos da vida civil a imposição de capacidade ainda que relativa a uma pessoa que não possa manifestar sua vontade não encontra respaldo jurídico Conforme demonstrado o instituto das incapacidades tem função jurídica protetiva Para isso o referido instituto coloca as pessoas que estejam em situação de vulnerabilidade em uma condição jurídica diferenciada para que recebam proteção legal Nesse sentido a imposição de capacidade ao indivíduo em situação de vulnerabilidade obsta que ele receba a proteção da qual necessita Isso porque uma vez que não exista uma condição fática de vulnerabilidade reconhecida em Lei não pode haver uma posição jurídica diferenciada o que impede o gozo da proteção legal Pelo Princípio da Isonomia buscase a igualdade material nas relações jurídicas O respeito à situação fática do indivíduo mostrase determinante para a materialização desse princípio Portanto ao desconsiderar a condição fática das pessoas e impor uma condição jurídica igual a todas elas as disposições do referido Estatuto ferem esse princípio Como consequência as pessoas que necessitam de proteção restam desguarnecidas e prejudicadas por não gozarem da proteção de institutos como a representação para a expressão plena da sua vontade bem como a nulidade ou impedimento e suspenção da prescrição e da decadência em defesa de seus direitos Diante de tais prejuízos evidenciase que as mudanças promovidas pelas disposições do Estatuto da Pessoa com Deficiência também ferem o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana Além da desproteção das pessoas em situação de vulnerabilidade há outro conflito normativo a partir da impossibilidade de se reconhecer a incapacidade absoluta de alguém que seja maior de 16 anos de idade Por ser a manifestação da vontade de forma livre e consciente um requisito essencial à constituição do ato ou negócio jurídico as mudanças promovidas pelo referido Estatuto impedem que as pessoas não tenham condições de manifestar sua vontade ou fazêlo de forma consciente constituam um ato ou negócio jurídico Isso porque a assistência não é suficiente para suprir a condição fática de incapacidade e a pessoa em situação de vulnerabilidade que é maior de 16 anos de idade não pode mais ser representada A análise da capacidade civil à luz do estatuto do deficiente inclusão proteção ou desproteção da dignidade da pessoa humana Página 23 Por serem estas disposições incompatíveis com o ordenamento pátrio é necessária uma adequação normativa a fim de extinguir a imposição e possibilitar o reconhecimento da condição fática de capacidade ou incapacidade do indivíduo para viabilizar a proteção legal da qual precisa Também há um conflito normativo na autonomia para o exercício dos direitos sexuais Ao desconsiderar a condição fática da pessoa e imporlhe a autonomia para decidir sobre seus direitos sexuais as mudanças promovidas pelo Estatuto põem a norma civil em conflito com a norma penal Pois se uma pessoa em situação de vulnerabilidade usa sua autonomia e exerce seus direitos sexuais quem pratica com ela o ato sexual comete o crime de estupro de vulnerável uma vez que a capacidade civil para exercer os direitos sexuais não afasta a tipificação penal Portanto esse ponto também carece de uma adequação normativa A norma civil deve nos moldes do que ocorre na norma penal considerar a condição fática da pessoa para reconhecer ou não a capacidade para exercer os direitos sexuais Por fim no presente trabalho constatase que o Estatuto da Pessoa com Deficiência apresenta contradição em suas próprias disposições A referida norma restringe a prática de atos de natureza patrimonial ou negocial pela pessoa submetida à curatela sem a assistência do seu curador Entretanto a mesma norma impõe autonomia à pessoa e a capacita para contrair matrimônio ou constituir união estável de forma livre Ocorre que o casamento e a união estável também possuem efeitos patrimoniais e a referida norma não disciplina esses efeitos no caso do casamento ou união estável contraído por pessoas em situação de vulnerabilidade Dessa forma essas pessoas ficam à mercê da própria sorte o que acentua ainda mais a sua vulnerabilidade Assim esse ponto necessita de uma adequação normativa a fim de proteger os que estejam em situação de vulnerabilidade Deve haver uma limitação dos efeitos patrimoniais no casamento bem como na união estável constituído por uma pessoa que esteja em situação de vulnerabilidade Concluise portanto que o Estatuto da Pessoa com Deficiência não atingiu por completo os objetivos propostos e em algumas situações suas próprias disposições violam direitos das pessoas em situação de vulnerabilidade 7Referências ANGHER Anne Joyce Org Vade Mecum acadêmico de direito 22 ed São Paulo Rideel 2016 Série Vade Mecum BITENCOURT Cezar Roberto Tratado de direito penal parte especial 4 ed São Paulo Saraiva 2010 v 4 CAPEZ Fernando Curso 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