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Sérgio Haddad Maria Clara Di Pierro 108 MaiJunJulAgo 2000 Nº 14 Introdução No passado como no presente a educação de jovens e adultos sempre compreendeu um conjunto muito di verso de processos e práticas formais e informais rela cionadas à aquisição ou ampliação de conhecimentos básicos de competências técnicas e profissionais ou de habilidades socioculturais Muitos desses processos se desenvolvem de modo mais ou menos sistemático fora de ambientes escolares realizandose na família nos locais de trabalho nos espaços de convívio sociocultu ral e lazer nas instituições religiosas e nos dias atuais também com o concurso dos meios de informação e co municação à distância Qualquer tentativa de historiar um universo tão plural de práticas formativas implicaria sério risco de fracasso pois a educação de jovens e adul tos compreendida nessa acepção ampla estendese por quase todos os domínios da vida social O texto que segue aborda alguns dos processos sis temáticos e organizados de formação geral de pessoas jovens e adultas no Brasil conferindo especial atenção à educação escolar A análise não abrange portanto o vasto âmbito das práticas de qualificação profissional de teleducação nem a diversidade de experiências de formação sociocultural e política das pessoas jovens e adultas que se realizam fora de processos de escolariza ção e que na pesquisa educacional brasileira vêm sen do abordadas pelos estudos de educação popular O ar tigo também não tem a pretensão de compreender todos os níveis e modalidades de ensino privilegiando a edu cação básica realizada por meios presenciais e no seu interior as etapas iniciais da escolarização O texto oferece uma rápida visão panorâmica do tema ao longo dos cinco séculos da história posteriores à chegada dos portugueses às terras brasileiras mas de tém o olhar sobretudo na segunda metade do século XX em que o pensamento pedagógico e as políticas públicas de educação escolar de jovens e adultos adquiriram a identidade e feições próprias a partir das quais é possí vel e necessário pensar seu desenvolvimento futuro Colônia e Império A ação educativa junto a adolescentes e adultos no Brasil não é nova Sabese que já no período colonial os religiosos exerciam sua ação educativa missionária em Escolarização de jovens e adultos Sérgio Haddad Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Maria Clara Di Pierro Organização nãogovernamental Ação Educativa Escolarização de jovens e adultos Revista Brasileira de Educação 109 grande parte com adultos Além de difundir o evange lho tais educadores transmitiam normas de comporta mento e ensinavam os ofícios necessários ao funciona mento da economia colonial inicialmente aos indígenas e posteriormente aos escravos negros Mais tarde se encarregaram das escolas de humanidades para os colo nizadores e seus filhos Com a desorganização do sistema de ensino pro duzido pela expulsão dos jesuítas do Brasil em 1759 so mente no Império voltaremosa encontrar informações so bre ações educativas no campo da educação de adultos No campo dos direitos legais a primeira Constitui ção brasileira de 1824 firmou sob forte influência eu ropéia a garantia de uma instrução primária e gratuita para todos os cidadãos portanto também para os adul tos Pouco ou quase nada foi realizado neste sentido du rante todo o período imperial mas essa inspiração iluminista tornouse semente e enraizouse definitiva mente na cultura jurídica manifestandose nas Consti tuições brasileiras posteriores O direito que nasceu com a norma constitucional de 1824 estendendo a garantia de uma escolarização básica para todos não passou da intenção legal A implantação de uma escola de quali dade para todos avançou lentamente ao longo da nossa história É verdade também que tem sido interpretada como direito apenas para as crianças Essa distância entre o proclamado e o realizado foi agravada por outros fatores Em primeiro lugar por que no período do Império só possuía cidadania uma pequena parcela da população pertencente à elite eco nômica à qual se admitia administrar a educação pri mária como direito do qual ficavam excluídos negros indígenas e grande parte das mulheres Em segundo porque o ato adicional de 1834 ao delegar a responsa bilidade por essa educação básica às Províncias re servou ao governo imperial os direitos sobre a educa ção das elites praticamente delegando à instância administrativa com menores recursos o papel de edu car a maioria mais carente O pouco que foi realizado deveuse aos esforços de algumas Províncias tanto no ensino de jovens e adultos como na educação das crian ças e adolescentes Neste último caso chegaríamos em 1890 com o sistema de ensino atendendo apenas 250 mil crianças em uma população total estimada em 14 milhões Ao final do Império 82 da população com idade superior a cinco anos era analfabeta Desta forma as preocupações liberais expressas na legislação desse período acabaram por não se consubs tanciar condicionadas que estavam pela estrutura so cial vigente Nas palavras de Celso Beisiegel no Brasil na colônia e mesmo depois nas primei ras fases do Império é a posse da propriedade que deter mina as limitações de aplicação das doutrinas liberais e são os interesses radicados na propriedade dos meios de produ ção colonial que estabelecem os conteúdos específicos dessas doutrinas no país O que há realmente peculiar no liberalismo no Brasil durante este período e nestas circuns tâncias é mesmo a estreiteza das faixas de população abrangidas nos benefícios consubstanciados nas formulações universais em que os interesses dominantes se exprimem Beisiegel 1974 p 43 Primeira República A Constituição de 1891 primeiro marco legal da República brasileira consagrou uma concepção de fe deralismo em que a responsabilidade pública pelo ensi no básico foi descentralizada nas Províncias e Municí pios À União reservouse o papel de animador dessas atividades assumindo uma presença maior no ensino secundário e superior Mais uma vez garantiuse a for mação das elites em detrimento de uma educação para as amplas camadas sociais marginalizadas quando no vamente as decisões relativas à oferta de ensino elemen tar ficaram dependentes da fragilidade financeira das Províncias e dos interesses das oligarquias regionais que as controlavam politicamente A nova Constituição republicana estabeleceu tam bém a exclusão dos adultos analfabetos da participação pelo voto isto em um momento em que a maioria da população adulta era iletrada Apesar do descompromisso da União em relação ao ensino elementar o período da Primeira República se caracterizou pela grande quantidade de reformas edu cacionais que de alguma maneira procuraram um prin cípio de normatização e preocuparamse com o estado precário do ensino básico Porém tais preocupações Sérgio Haddad Maria Clara Di Pierro 110 MaiJunJulAgo 2000 Nº 14 pouco efeito prático produziram uma vez que não havia dotação orçamentária que pudesse garantir que as pro postas legais resultassem numa ação eficaz O censo de 1920 realizado 30 anos após o estabelecimento da Re pública no país indicou que 72 da população acima de cinco anos permanecia analfabeta Até esse período a preocupação com a educação de jovens e adultos praticamente não se distinguia como fonte de um pensamento pedagógico ou de políticas edu cacionais específicas Isso só viria a ocorrer em meados da década de 1940 Havia uma preocupação geral com a educação das camadas populares normalmente inter pretada como instrução elementar das crianças No entanto já a partir da década de 1920 o movi mento de educadores e da população em prol da amplia ção do número de escolas e da melhoria de sua qualida de começou a estabelecer condições favoráveis à implementação de políticas públicas para a educação de jovens e adultos Os renovadores da educação passaram a exigir que o Estado se responsabilizasse definitiva mente pela oferta desses serviços Além do mais os pre cários índices de escolarização que nosso país manti nha quando comparados aos de outros países da América Latina ou do resto no mundo começavam a fazer da educação escolar uma preocupação permanente da po pulação e das autoridades brasileiras Essa inflexão no pensamento políticopedagógico ao final da Primeira República está associada aos processos de mudança so cial inerentes ao início da industrialização e à acelera ção da urbanização no Brasil Nossas elites que já haviam se adiantado no esta belecimento constitucional do direito à educação para todos sem propiciar as condições necessárias para sua realização viam agora esse direito unido a um dever que cada brasileiro deveria assumir perante a so ciedade ao direito de educação que já se afirmara nas leis do Brasil com as garantias do ensino primário gratuito para to dos os cidadãos virá agora associarse da mesma forma como ocorrera em outros países a noção de um dever do futuro ci dadão para com a sociedade um dever educacional de prepa rarse para o exercício das responsabilidades da cidadania Beisiegel 1974 p 63 Período de Vargas A Revolução de 1930 é um marco na reformulação do papel do Estado no Brasil Ao contrário do federalis mo que prevalecera até aquele momento reforçando os interesses das oligarquias regionais agora era a Nação como um todo que estava sendo reafirmada A inclinação ao fortalecimento e à mudança de pa pel do Estado central manifestase de maneira inequí voca na Constituição de 1934 Aí já se configurava uma nova concepção que superando a idéia de um Estado de Direito entendido apenas como o Estado destinado à salvaguarda das garantias indivi duais e dos direitos subjetivos para pensarse no Estado aberto para a problemática econômica de um lado e para a problemá tica educacional e cultural de outro Ferraz et al 1984 p 651 Nos aspectos educacionais a nova Constituição propôs um Plano Nacional de Educação fixado coor denado e fiscalizado pelo governo federal determinan do de maneira clara as esferas de competência da União dos estados e municípios em matéria educacional vin culou constitucionalmente uma receita para a manuten ção e o desenvolvimento do ensino reafirmou o direito de todos e o dever do Estado para com a educação esta beleceu uma série de medidas que vieram confirmar este movimento de entregar e cobrar do setor público a res ponsabilidade pela manutenção e pelo desenvolvimento da educação Foi somente ao final da década de 1940 que a edu cação de adultos veio a se firmar como um problema de política nacional mas as condições para que isso viesse a ocorrer foram sendo instaladas já no período anterior O Plano Nacional de Educação de responsabilidade da União previsto pela Constituição de 1934 deveria in cluir entre suas normas o ensino primário integral gra tuito e de freqüência obrigatória Esse ensino deveria ser extensivo aos adultos Pela primeira vez a educação de jovens e adultos era reconhecida e recebia um trata mento particular Com a criação em 1938 do INEP Instituto Nacio nal de Estudos Pedagógicos e através de seus estudos e pesquisas instituiuse em 1942 o Fundo Nacional do Ensino Primário Através dos seus recursos o fundo Escolarização de jovens e adultos Revista Brasileira de Educação 111 deveria realizar um programa progressivo de ampliação da educação primária que incluísse o Ensino Supletivo para adolescentes e adultos Em 1945 o fundo foi re gulamentado estabelecendo que 25 dos recursos de cada auxílio deveriam ser aplicados num plano geral de Ensino Supletivo destinado a adolescentes e adultos anal fabetos Ao mesmo tempo fatos transcorridos no âmbito das relações internacionais ampliaram as dimensões desse movimento em prol de uma educação de jovens e adul tos Criada em novembro de 1945 logo após a 2a Guer ra Mundial a UNESCO denunciava ao mundo as pro fundas desigualdades entre os países e alertava para o papel que deveria desempenhar a educação em especial a educação de adultos no processo de desenvolvimento das nações categorizadas como atrasadas Em 1947 foi instalado o Serviço de Educação de Adultos SEA como serviço especial do Departamento Nacional de Educação do Ministério da Educação e Saúde que tinha por finalidade a reorientação e coorde nação geral dos trabalhos dos planos anuais do ensino supletivo para adolescentes e adultos analfabetos Uma série de atividades foi desenvolvida a partir da criação desse órgão integrando os serviços já existentes na área produzindo e distribuindo material didático mobilizan do a opinião pública bem como os governos estaduais e municipais e a iniciativa particular O movimento em favor da educação de adultos que nasceu em 1947 com a coordenação do Serviço de Edu cação de Adultos e se estendeu até fins da década de 1950 denominouse Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos CEAA Sua influência foi significativa princi palmente por criar uma infraestrutura nos estados e mu nicípios para atender à educação de jovens e adultos pos teriormente preservada pelas administrações locais1 Duas outras campanhas ainda foram organizadas pelo Ministério da Educação e Cultura uma em 1952 a Cam panha Nacional de Educação Rural e outra em 1958 a Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo Ambas tiveram vida curta e pouco realizaram O Estado brasileiro a partir de 1940 aumentou suas atribuições e responsabilidades em relação à educação de adolescentes e adultos Após uma atuação fragmen tária localizada e ineficaz durante todo o período colo nial Império e Primeira República ganhou corpo uma política nacional com verbas vinculadas e atuação es tratégica em todo o território nacional Tal ação do Estado pode ser entendida no quadro de expansão dos direitos sociais de cidadania em res posta à presença de amplas massas populares que se urbanizavam e pressionavam por mais e melhores con dições de vida Os direitos sociais presentes anterior mente nas propostas liberais concretizavamse agora em políticas públicas até como estratégia de incorporação dessas massas urbanas em mecanismos de sustentação política dos governos nacionais A extensão das oportunidades educacionais por parte do Estado a um conjunto cada vez maior da popu lação servia como mecanismo de acomodação de ten sões que cresciam entre as classes sociais nos meios ur banos nacionais Atendia também ao fim de prover qualificações mínimas à força de trabalho para o bom desempenho aos projetos nacionais de desenvolvimento propostos pelo governo federal Agora mais do que as características de desenvolvimento das potencialidades individuais e portanto como ação de promoção indivi dual a educação de adultos passava a ser condição ne cessária para que o Brasil se realizasse como nação de senvolvida Estas duas faces do sentido político da educação ganham evidência com o fortalecimento do Estado nacional brasileiro edificado a partir de 1930 Os esforços empreendidos durante as décadas de 1940 e 1950 fizeram cair os índices de analfabetismo das pessoas acima de cinco anos de idade para 467 no ano de 1960 Os níveis de escolarização da população brasi leira permaneciam no entanto em patamares reduzidos quando comparadas à média dos países do primeiro mun do e mesmo de vários dos vizinhos latinoamericanos De 59 a 64 um período de luzes para aEducação de adultos Os primeiros anos da década de 1960 até 1964 quando o golpe militar ocorreu constituíram um mo 1 Sobre a Campanha de Adolescentes e Adultos veja Beiseigel 1974 Sérgio Haddad Maria Clara Di Pierro 112 MaiJunJulAgo 2000 Nº 14 mento bastante especial no campo da educação de jo vens e adultos2 Já em 1958 quando da realização do II Congresso Nacional de Educação de Adultos no Rio de Janeiro ain da no contexto da CEAA percebiase uma grande preo cupação dos educadores em redefinir as características específicas e um espaço próprio para essa modalidade de ensino Reconheciase que a atuação dos educadores de adultos apesar de organizada como subsistema próprio reproduzia de fato as mesmas ações e características da educação infantil Até então o adulto nãoescolarizado era percebido como um ser imaturo e ignorante que de veria ser atualizado com os mesmos conteúdos formais da escola primária percepção esta que reforçava o pre conceito contra o analfabeto Paiva 1973 p 209 Na verdade o Congresso repercutia uma nova forma do pen sar pedagógico com adultos Já no Seminário Regional preparatório ao Congresso realizado no Recife e com a presença do professor Paulo Freire discutiase a indispensabilidade da consciência do processo de desenvolvimento por parte do povo e da emersão deste povo na vida pública nacional como interferente em todo o trabalho de elaboração participação e decisão responsáveis em todos os momentos da vida pública sugeriam os pernambucanos a revisão dos transplantes que agiram sobre o nosso sistema edu cativo a organização de cursos que correspondessem à reali dade existencial dos alunos o desenvolvimento de um traba lho educativo com o homem e não para o homem a criação de grupos de estudo e de ação dentro do espírito de autogo verno o desenvolvimento de uma mentalidade nova no educa dor que deveria passar a sentirse participante no trabalho de soerguimento do país propunham finalmente a renovação dos métodos e processos educativos substituindo o discurso pela discussão e utilizando as modernas técnicas de educação de grupos com a ajuda de recursos audiovisuais Paiva 1973 p 210 Estes temas acabaram por prevalecer posteriormente no II Congresso marcando um novo momento no pensar dos educadores confrontando velhas idéias e preconceitos marcava o Congresso o início de um novo período na educação de adultos no Brasil aquele que se caracterizou pela intensa busca de maior eficiência metodológica e por ino vações importantes neste terreno pela reintrodução da refle xão sobre o social no pensamento pedagógico brasileiro e pe los esforços realizados pelos mais diversos grupos em favor da educação da população adulta para a participação na vida po lítica da Nação Paiva 1973 p 210 Esse quadro de renovação pedagógica deve ser con siderado dentro das condições gerais de turbulência do processo político daquele momento histórico Diversos grupos buscavam junto às camadas populares formas de sustentação política para suas propostas A educação sem dúvida alguma e de maneira privilegiada era a prá tica social que melhor se oferecia a tais mecanismos não só por sua face pedagógica mas também e princi palmente por suas características de prática política A economia brasileira crescia internacionalizan dose O processo de substituições das importações rea lizado no período de Getúlio manteve um fluxo de capi tais internacionais concentrado no fortalecimento da indústria de base Agora o modelo desenvolvimentista do governo Kubistschek abriu o mercado nacional para produtos duráveis das empresas transnacionais A pro posta desse governo de um desenvolvimento acelerado cinqüenta anos em cinco acabou ocorrendo para lela à crescente perda do controle da economia pela bur guesia nacional As contradições desse modelo se agravaram com os governos JânioJango A imposição de uma política desenvolvimentista baseada no capital internacional de racionalidade diferenciada daquela capaz de ser absor vida pela economia brasileira acabou por trazer dese quilíbrios econômicos internos de difícil administração Intensificavamse mobilizações políticas dos setores médios de parte das camadas populares A questão da democracia da participação política e a disputa pelos votos ocupavam boa parte do tempo social O padrão de consumo que havia sido forjado pelo desenvolvimentis mo já não podia realizarse em virtude da crescente in segurança no emprego e da perda do poder aquisitivo dos salários Ampliaramse o clima de insatisfação e as manifestações populares 2 Importante trabalho de revisão histórica desse período é o de Paiva 1973 Escolarização de jovens e adultos Revista Brasileira de Educação 113 Foi dentro dessa conjuntura que os diversos traba lhos educacionais com adultos passaram a ganhar pre sença e importância Buscavase por meio deles apoio político junto aos grupos populares As diversas propos tas ideológicas principalmente a do nacionaldesenvol vimentismo a do pensamento renovador cristão e a do Partido Comunista acabaram por ser pano de fundo de uma nova forma de pensar a educação de adultos Ele vada agora à condição de educação política através da prática educativa de refletir o social a educação de adul tos ia além das preocupações existentes com os aspec tos pedagógicos do processo ensinoaprendizagem Ao mesmo tempo e de forma contraditória no contexto da ação de legitimação de propostas políticas junto aos se tores populares criaramse as condições para o desen volvimento e o fortalecimento de alternativas autôno mas e próprias desses setores ao provocar a necessidade permanente da explicitação dos seus interesses bem como das condições favoráveis à sua organização mo bilização e conscientização É dentro dessa perspectiva que devemos conside rar os vários acontecimentos campanhas e programas no campo da educação de adultos no período que vai de 1959 até 1964 Foram eles entre outros o Movimento de Educação de Base da Conferência Nacional dos Bis pos do Brasil estabelecido em 1961 com o patrocínio do governo federal o Movimento de Cultura Popular do Recife a partir de 1961 os Centros Populares de Cultu ra órgãos culturais da UNE a Campanha De Pé no Chão Também se Aprende a Ler da Secretaria Municipal de Educação de Natal o Movimento de Cultura Popular do Recife e finalmente em 1964 o Programa Nacional de Alfabetização do Ministério da Educação e Cultura que contou com a presença do professor Paulo Freire Gran de parte desses programas estava funcionando no âmbi to do Estado ou sob seu patrocínio Apoiavamse no mo vimento de democratização de oportunidades de escolarização básica dos adultos mas também represen tavam a luta política dos grupos que disputavam o apa relho do Estado em suas várias instâncias por legitima ção de ideais via prática educacional Nesses anos as características próprias da educa ção de adultos passaram a ser reconhecidas conduzindo à exigência de um tratamento específico nos planos pe dagógico e didático À medida que a tradicional rele vância do exercício do direito de todo cidadão de ter acesso aos conhecimentos universais uniuse à ação conscientizadora e organizativa de grupos e atores so ciais a educação de adultos passou a ser reconhecida também como um poderoso instrumento de ação políti ca Finalmente foilhe atribuída uma forte missão de resgate e valorização do saber popular tornando a edu cação de adultos o motor de um movimento amplo de valorização da cultura popular O período militar O golpe militar de 1964 produziu uma ruptura po lítica em função da qual os movimentos de educação e cultura populares foram reprimidos seus dirigentes per seguidos seus ideais censurados O Programa Nacio nal de Alfabetização foi interrompido e desmantelado seus dirigentes presos e os materiais apreendidos A Se cretaria Municipal de Educação de Natal foi ocupada os trabalhos da Campanha De Pé no Chão foram in terrompidos e suas principais lideranças foram presas A atuação do Movimento de Educação de Base da CNBB foi sendo tolhida não só pelos órgãos de repressão mas também pela própria hierarquia católica transforman dose na década de 1970 muito mais em um instrumento de evangelização do que propriamente de educação po pular As lideranças estudantis e os professores univer sitários que estiveram presentes nas diversas práticas foram cassados nos seus direitos políticos ou tolhidos no exercício de suas funções A repressão foi a resposta do Estado autoritário à atuação daqueles programas de educação de adultos cujas ações de natureza política contrariavam os interesses impostos pelo golpe militar A ruptura política ocorrida com o movimento de 64 tentou acabar com as práticas educativas que auxiliavam na explicitação dos interes ses populares O Estado exercia sua função de coerção com fins de garantir a normalização das relações so ciais Sob a denominação de educação popular entre tanto diversas práticas educativas de reconstituição e reafirmação dos interesses populares inspiradas pelo mesmo ideário das experiências anteriores persistiram Sérgio Haddad Maria Clara Di Pierro 114 MaiJunJulAgo 2000 Nº 14 sendo desenvolvidas de modo disperso e quase que clan destino no âmbito da sociedade civil Algumas delas ti veram previsível vida curta outras subsistiram durante o período autoritário No plano oficial enquanto as ações repressivas ocorriam alguns programas de caráter conservador fo ram consentidos ou mesmo incentivados como a Cruza da de Ação Básica Cristã ABC Nascido no Recife o programa ganhou caráter nacional tentando ocupar os espaços deixados pelos movimentos de cultura popular Dirigida por evangélicos norteamericanos a Cruzada servia de maneira assistencialista aos interesses do re gime militar tornandose praticamente um programa semioficial A partir de 1968 porém uma série de crí ticas à condução da Cruzada foi se acumulando e ela foi progressivamente se extinguindo nos vários estados en tre os anos de 1970 e 1971 Na verdade este setor da educação a escolariza ção básica de jovens e adultos não poderia ser aban donado por parte do aparelho do Estado uma vez que tinha nele um dos canais mais importantes de mediação com a sociedade Perante as comunidades nacional e in ternacional seria difícil conciliar a manutenção dos bai xos níveis de escolaridade da população com a proposta de um grande país como os militares propunhamse cons truir Havia ainda a necessidade de dar respostas a um direito de cidadania cada vez mais identificado como legítimo mediante estratégias que atendessem também aos interesses hegemônicos do modelo socioeconômico implementado pelo regime militar As respostas vieram com a fundação do MOBRAL Movimento Brasileiro de Alfabetização em 1967 e posteriormente com a implantação do En sino Supletivo em 1971 quando da promulgação da Lei Federal 5692 que reformulou as diretrizes de ensino de primeiro e segundo graus O MOBRAL O Movimento Brasileiro de Alfabetização foi cria do pela Lei 5379 de 15 de dezembro de 1967 como Fundação MOBRAL fruto do trabalho realizado por um grupo interministerial que buscou uma alternativa ao trabalho da Cruzada ABC programa de maior ex tensão apoiado pelo Estado em função das críticas que vinha recebendo3 Em 1969 o MOBRAL começa a se distanciar da proposta inicial mais voltada aos aspectos pedagógi cos pressionado pelo endurecimento do regime militar Lançouse então em uma campanha de massa desvin culandose de propostas de caráter técnico muitas delas baseadas na experiência dos seus funcionários no perío do anterior a 64 Passou a se configurar como um pro grama que por um lado atendesse aos objetivos de dar uma resposta aos marginalizados do sistema escolar e por outro atendesse aos objetivos políticos dos gover nos militares buscavase ampliar junto às camadas populares as bases sociais de legitimidade do regime no momento em que esta se estreitava junto às classes médias em face do AI5 não devendo ser descartada a hipótese de que tal movimento tenha sido pensado também como instrumento de obtenção de in formações sobre o que se passava nos municípios do interior do país e na periferia das cidades e de controle sobre a popula ção Ou seja como instrumento de segurança interna Paiva 1982 p 99 A presidência do MOBRAL foi entregue ao econo mista Mário Henrique Simonsen A partir das suas arti culações criaramse mecanismos para seu financiamento e procurouse vender a idéia do MOBRAL junto à sociedade civil Os recursos foram obtidos com a opção voluntária para o MOBRAL de 1 do Imposto de Ren da devido pelas empresas complementada com 24 da renda líquida da Loteria Esportiva Com isso disporia o MOBRAL de recursos amplos e ágeis de caráter extra orçamentário Com esse instrumento o economista Simonsen e o então ministro da Educação coronel Jarbas Passarinho passaram a propagandear o MOBRAL junto aos empre sários convencidos que estavam de que o programa li vraria o país da chaga do analfabetismo e simultanea mente realizaria uma ação ideológica capaz de assegurar a estabilidade do status quo permitindo às empresas 3 Sobre o MOBRAL veja Paiva 1981 e 1982 publicado em quatro etapas pela revista Síntese Escolarização de jovens e adultos Revista Brasileira de Educação 115 contar com amplos contingentes de força de trabalho alfabetizada Paiva 1982 p 100 O MOBRAL foi implantado com três característi cas básicas A primeira delas foi o paralelismo em re lação aos demais programas de educação Seus recur sos financeiros também independiam de verbas orçamentárias A segunda característica foi a organi zação operacional descentralizada através de Comis sões Municipais espalhadas por quase todos os muni cípios brasileiros e que se encarregaram de executar a campanha nas comunidades promovendoas recrutan do analfabetos providenciando salas de aula profes sores e monitores Eram formadas pelos chamados re presentantes das comunidades os setores sociais da municipalidade mais identificados com a estrutura do governo autoritário as associações voluntárias de ser viços empresários e parte dos membros do clero A terceira característica era a centralização de dire ção do processo educativo através da Gerência Pedagó gica do MOBRAL Central encarregada da organizaçãoda programação da execução e da avaliação do processo educativo como também do treinamento de pessoal para todas as fases de acordo com as diretrizes que eram estabelecidas pela Secretaria Executiva O planejamento e a produção de material didático foram entregues a em presas privadas que reuniram equipes pedagógicas para este fim e produziram um material de caráter nacional apesar da conhecida diversidade de perfis lingüísticos ambientais e socioculturais das regiões brasileiras Entre o MOBRAL Central e as Comissões Muni cipais encontravamse os Coordenadores Estaduais que se encarregavam dos convênios municipais responsa bilizandose pela assistência técnica epela orientação estratégica Os Coordenadores Regionais foram insti tuídos em 1972 para harmonizar os programas esta duais na mesma região com vistas à orientação do MOBRAL Central Paiva 1982 A função desses co ordenadores e supervisores era a de garantir que as orien tações gerais do Movimento se implantassem Para tan to procurouse firmar uma homogeneidade de atitudes através de encontros e treinamentos desses supervisores é no quadro da difusão ideológica que se pode en tender os tão discutidos encontros de supervisores trazidos de todas as partes do país e reunidos às centenas no Hotel Nacio nal do Rio de Janeiro numa aparente demonstração de des perdício de recursos Tais encontros serviam para reforçar os laços de lealdade para com a direção do movimento explican dose deste modo a distribuição entre eles de fotos autografa das do presidente do MOBRAL e a condução das atividades em clima festivo com declarações públicas dos que pela pri meira vez viam o mar ou viajavam de avião ou visitavam o Rio de Janeiro Escreve claramente Arlindo Lopes Correia sobre a função dos supervisores são eles que mantêm intacta a ideo logia e a mística da organização possibilitando ao movimen to servir como agente da segurança interna do regime Paiva 1982 p 101 As três características convergiam para criar uma estrutura adequada ao objetivo político de implantação de uma campanha de massa com controle doutrinário descentralização com uma base conservadora para ga rantir a amplitude do trabalho centralização dos objeti vos políticos e controle vertical pelos supervisores paralelismo dos recursos e da estrutura institucional garantindo mobilidade e autonomia A atuação do MOBRAL inicialmente foi dividida em dois programas o Programa de Alfabetização im plantado em 1970 e o PEI Programa de Educação Integrada correspondendo a uma versão compactada do curso de 1a a 4a séries do antigo primário que se segui riam ao curso de alfabetização Posteriormente uma série de outros programas foi implementadaos pelo MOBRAL Além dos convênios com as Comissões Municipais e com as Secretarias de Educação o MOBRAL firmou também convênios com outras instituições privadas de caráter confessional ou não e órgãos governamentais Isto ocorreu por exemplo com o Departamento de Edu cação Básica de Adultos um dos departamentos da Cru zada Evangélica de Alfabetização com o Movimento de Educação de Base da CNBB com o SENAC e o SENAI com o Serviço de Radiodifusão Educativa do Ministério de Educação e Cultura através do Projeto Minerva com o Centro Brasileiro de TV Educativa FCBTVE com a Fundação Padre Anchieta dentre outros Estávamos em 1970 auge do controle autoritário pelo Estado O MOBRAL chegava com a promessa de acabar em dez anos com o analfabetismo classificado como vergonha nacional nas palavras do presidente Sérgio Haddad Maria Clara Di Pierro 116 MaiJunJulAgo 2000 Nº 14 militar Médici Chegou imposto sem a participação dos educadores e de grande parte da sociedade As argumen tações de caráter pedagógico não se faziam necessárias Havia dinheiro controle dos meios de comunicação si lêncio nas oposições intensa campanha de mídia Foi o período de intenso crescimento do MOBRAL Em 1973 o Conselho Federal de Educação reco nheceu a equivalência do PEI ao antigo ensino primário e no ano seguinte foi concedida ao MOBRAL autori zação para expedir certificados referendados pelas Se cretarias Municipais ou Estaduais de Educação No en tanto em 1976 com a possibilidade de o PEI firmar convênios com escolas particulares não houve mais ne cessidade do referendo Observase assim uma progres siva autonomização do MOBRAL em relação às Secre tarias de Educação O Movimento colocavase fora do controle dos organismos públicos estaduais e munici pais de administração do ensino no que concerne à pró pria execução do Programa de Educação Integrada O MOBRAL foi criticado pelo pouco tempo desti nado à alfabetização e pelos critérios empregados na verificação de aprendizagem Mencionavase que para evitar a regressão seria necessária uma continuidade dos estudos em educação escolar integrada e não em pro gramas voltados a outros tipos de interesses como por exemplo formação rápida de recursos humanos Criti cavase também o paralelismo da gestão e do financia mento do MOBRAL em relação ao Departamento de Ensino Supletivo e ao orçamento do MEC Punhase em dúvida ainda a confiabilidade dos indicadores produzi dos pelo MOBRAL Em 1974 o engenheiro Arlindo Lopes Correia as sumiu a direção do MOBRAL com a responsabilidade de defender o programa e assegurar sua continuidade formulando justificativas técnicas em resposta à avalanche de críticas que recaíam sobre o órgão Bus cou argumentos para a sua configuração pedagógica e política tentando legitimar o trabalho da instituição pe rante a opinião pública nacional e internacional O MOBRAL ao final da década de 1970 passaria por modificações nos seus objetivos ampliando para outros campos de trabalho desde a educação comuni tária até a educação de crianças em um processo de permanente metamorfose que visava a sua sobrevivên cia diante dos cada vez mais claros fracassos nos objeti vos iniciais de superar o analfabetismo no Brasil O Ensino Supletivo Uma parcela significativa do projeto educacional do regime militar foi consolidada juridicamente na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de número 5692 de 11 de agosto de 1971 Foi no capítulo IV dessa LDB que o Ensino Supletivo foi regulamentado mas seus fundamentos e características são mais bem desen volvidos e explicitados em dois outros documentos o Parecer do Conselho Federal de Educação n 699 pu blicado em 28 de julho de 1972 de autoria de Valnir Chagas que tratou especificamente do Ensino Supleti vo e o documento Política para o Ensino Supletivo produzido por um grupo de trabalho e entregue ao mi nistro da Educação em 20 de setembro de 1972 cujo relator é o mesmo Valnir Chagas Considerado no Parecer 699 como o maior desa fio proposto aos educadores brasileiros na Lei 5692 o Ensino Supletivo visou se constituir em uma nova con cepção de escola em uma nova linha de escolariza ção nãoformal pela primeira vez assim entendida no Brasil e sistematizada em capítulo especial de uma lei de diretrizes nacionais e segundo Valnir Chagas po deria modernizar o Ensino Regular por seu exemplo de monstrativo e pela interpenetração esperada entre os dois sistemas Quando do encaminhamento do Projeto de Lei ao Presidente da República em 30 de março de 1971 a Exposição de Motivos do ministro Jarbas Passarinho concedia ao Ensino Supletivo importância significativa por suprir a escolarização regular e promover crescen te oferta de educação continuada A Lei atenderia ao duplo objetivo de recuperar o atraso dos que não pude ram realizar a sua escolarização na época adequada complementando o êxito empolgante do MOBRAL que vinha rápida e drasticamente vencendo o analfabetismo no Brasil e germinar a educação do futuro essa edu cação dominada pelos meios de comunicação em que a escola será principalmente um centro de comunidade para sistematização de conhecimentos antes que para sua transmissão Escolarização de jovens e adultos Revista Brasileira de Educação 117 Três princípios ou idéiasforça foram estabele cidos por esses documentos que conformam as caracte rísticas do Ensino Supletivo O primeiro foi a definição do Ensino Supletivo como um subsistema integrado in dependente do Ensino Regular porém com este intima mente relacionado compondo o Sistema Nacional de Educação e Cultura O segundo princípio foi o de colo car o Ensino Supletivo assim como toda a reforma edu cacional do regime militar voltado para o esforço do desenvolvimento nacional seja integrando pela alfa betização a mãodeobra marginalizada seja forman do a força de trabalho A terceira idéiaforça foi a de que o Ensino Supletivo deveria ter uma doutrina e uma metodologia apropriadas aos grandes números carac terísticos desta linha de escolarização Neste sentido se contrapôs de maneira radical às experiências anterio res dos movimentos de cultura popular que centraram suas características e metodologia sobre o grupo social definido por sua condição de classe Portanto o Ensino Supletivo se propunha a recupe rar o atraso reciclar o presente formando uma mãode obra que contribuísse no esforço para o desenvolvimen to nacional através de um novo modelo de escola Na visão dos legisladores o Ensino Supletivo nas ceu para reorganizar o antigo exame de madureza4 que facilitava a certificação e propiciava uma pressão por vagas nos graus seguintes em especial no universitário Segundo o Parecer 699 era necessária também a am pliação da oferta de formação profissional para uma clientela já engajada na força de trabalho ou a ela desti nada a curto prazo Por fim foram agregados cursos fundados na concepção de educação permanente bus cando responder aos objetivos de uma escolarização menos formal e mais aberta Para cumprir esses objetivos de repor a escolariza ção regular formar mãodeobra e atualizar conhecimen tos o Ensino Supletivo foi organizado em quatro funções Suplência Suprimento Aprendizagem e qua lificação A Suplência tinha como objetivo suprir a escolarização regular para os adolescentes e adultos que não a tenham seguido ou concluído na idade própria através de cursos e exames Lei 5692 artigo 22 a O Suprimento tinha por finalidade proporcionar median te repetida volta à escola estudos de aperfeiçoamento ou atualização para os que tenham seguido o ensino re gular no todo ou em parte Lei 5692 artigo 24 b A Aprendizagem correspondia à formação metódica no tra balho e ficou a cargo basicamente do SENAI e do SENAC A Qualificação foi a função encarregada da profissionalização que sem ocuparse com a educação geral atenderia ao objetivo prioritário de formação de recursos humanos para o trabalho O funcionamento dessas quatro modalidades deveria se realizar tomando por base duas intenções atribuir uma clara prioridade aos cursos e exames que visassem à formação e ao aper feiçoamento para o trabalho e a liberdade de organiza ção evitandose assim que o Ensino Supletivo resultas se um simulacro do Ensino Regular Tanto a legislação como os documentos de apoio recomendaram que os professores do ensino supletivo recebessem formação específica para essa modalidade de ensino aproveitandose para tanto os estudos e pes quisas que seriam desenvolvidos Enquanto isto não fosse realizado deverseiam aproveitar os professores do En sino Regular que mediante cursos de aperfeiçoamento seriam adaptados ao Ensino Supletivo O Ensino Supletivo foi apresentado à sociedade como um projeto de escola do futuro e elemento de um sistema educacional compatível com a modernização socioeconômica observada no país nos anos 70 Não se tratava de uma escola voltada aos interesses de uma de terminada classe como propunham os movimentos de cultura popular mas de uma escola que não se distin guia por sua clientela pois a todos devia atender em uma dinâmica de permanente atualização Dentro dessa lógica a questão metodológica se ateve às soluções de massa à racionalização dos meios aos grandes números a serem atendidos e que desafiavam o dirigente que se propusesse a educar toda uma sociedade Colocandose esse desafio o Ensino Supletivo se propu nha priorizar soluções técnicas deslocandose do enfren tamento do problema político da exclusão do sistema es colar de grande parte da sociedade Propunhase realizar uma oferta de escolarização neutra que a todos serviria 4 Veja sobre o histórico dos exames de madureza o trabalho de Haddad 1991 Sérgio Haddad Maria Clara Di Pierro 118 MaiJunJulAgo 2000 Nº 14 Foi neste sentido a mensagem do presidente da Re pública Emílio G Médici ao Congresso Nacional quan do do encaminhamento da nova Lei em 20 de junho de 1971 ao justificar as reformas como uma abertura para que possa qualquer do povo na razão dos seus predicados genéticos desenvolver a própria personalidade e atin gir na escala social a posição a que tenha jus A posi ção social de cada um seria determinada por sua condi ção genética e pelo esforço empreendido em aproveitar as oportunidades educacionais oferecidas pelo Estado O Ensino Supletivo por sua flexibilidade seria a nova oportunidade dos que perderam a possibilidade de escolarização em outras épocas ao mesmo tempo em que seria a chance de atualização para os que gostariam de acompanhar o movimento de modernização da nova sociedade que se implantava dentro da lógica de Brasil Grande da era Médici O sentido político da educação de adultos no período militar Em meados de 1972 a Secretaria Geral do Minis tério da Educação e Cultura expediu o documento Adult Education in Brazil destinado à III Conferência Inter nacional de Educação de Adultos convocada pela UNESCO para Tóquio Nele traduzia o sentido da edu cação de adultos no contexto brasileiro em especial de pois da criação do MOBRAL e do Ensino Supletivo Sua introdução afirmava ser recente a preocupação com a educação como elemento prioritário dos projetos para o desenvolvimento e que havia também uma atitude nova no sentido de encarála como rendoso investimen to Tais preocupações segundo o documento haviam sido realçadas pela presença dos militares no poder a partir de 1964 e se refletiam através dos seus planos de desenvolvimento e dos Planos Setoriais de Educação Os compromissos com a educação objetivavam a for mação de uma infraestrutura adequada de recursos hu manos apropriada às nossas necessidades socioeconô micas políticas e culturais Para implementação de tais objetivos o Estado brasileiro se propunha a criar e implementar um sistema de educação permanente no qual a educação de adultos situavase na linha de fren te das operações por ser poderosa arma capaz de ace lerar o desenvolvimento o progresso social e a expan são ocupacional O discurso e os documentos legais dos governos militares procuraram unir as perspectivas de democrati zação de oportunidades educacionais com a intenção de colocar o sistema educacional a serviço do modelo de desenvolvimento Ao mesmo tempo por meio da coer ção procuraram manter a ordem econômica e políti ca Inicialmente a atitude do governo autoritário foi a de reprimir todos os movimentos de cultura popular nas cidos no período anterior ao de 64 uma vez que os pro cessos educativos por eles desencadeados poderiam le var a manifestações populares capazes de desestabilizar o regime Posteriormente com o MOBRAL e o Ensino Supletivo os militares buscaram reconstruir através da educação sua mediação com os setores populares Por outro lado as reformas educacionais propicia ram que os serviços de educação de adultos fossem es tendidos ainda que apenas no plano formal aos níveis do ensino fundamental e médio Ampliaramse também as possibilidades de acesso à formação profissional Desta forma a educação de adultos passou a compor o mito da sociedade democrática brasileira em um regime de exceção Esse mito foi traduzido em uma linguagem na qual a oferta dos serviços educacionais para os jo vens e adultos das camadas populares era a nova chance individual de ascensão social em uma época de mila gre econômico O sistema educacional se encarregaria de corrigir as desigualdades produzidas pelo modo de produção Desse modo o Estado cumpria sua função de assegurar a coesão das classes sociais A dimensão formal e os limites dessa democratiza ção de oportunidades ficavam explícitos na medida em que o Estado ao não assumir a responsabilidade pela gra tuidade e pela expansão da oferta deixou a educação de jovens e adultos ao sabor dos interesses do ensino privado5 O Ensino Supletivo concebido pelos documentos legais deveria estruturarse em um Departamento no Ministério da Educação e Cultura o Departamento de Ensino Supletivo DESu Esse Departamento teria uma 5 Sobre o Ensino Supletivo no período militar veja a tese de doutorado de Haddad 1991 e a dissertação de mestrado de Vargas 1984 Escolarização de jovens e adultos Revista Brasileira de Educação 119 Direção Geral com o objetivo de coordenar o desenvol vimento de todas as atividades de educação de adultos em nível nacional visando sobretudo à sua expansão integrada com outras agências Apesar da intenção centralizadora no âmbito fede ral sempre existiram certa dispersão e certo paralelismo entre os órgãos responsáveis pelo Ensino Supletivo Como vimos o MOBRAL gozou durante todo o perío do da sua existência de grande autonomia No campo da teleducação faltou coordenação e houve conflitos entre diferentes órgãos conflitos estes que por vezes se es tendiam a diferentes ministérios Os programas federais decorrentes da criação do Ensino Supletivo ficaram a cargo do Departamento do Ensino Supletivo do MEC DESU de 1973 ano de sua criação até 1979 quando o órgão foi transformado em Subsecretaria de Ensino Supletivo SESU e subordina do à Secretaria de Ensino de 1o e 2o Graus SEPS Os principais programas de âmbito federal desenvolvidos nesse período todos eles relativos à modalidade de Su plência referiamse ao aperfeiçoamento dos exames su pletivos e à difusão da metodologia de ensino personali zado com apoio de módulos didáticos realizada por meio da criação de Centros de Ensino Supletivo ao lado de programas de ensino à distância via rádio e televisão Foi no âmbito estadual que o ensino supletivo se firmou reinando no entanto a diversidade na sua ofer ta A Lei Federal propôs que o Ensino Supletivo fosse regulamentado pelos respectivos Conselhos Estaduais de Educação Isso criou uma grande variedade tanto de for mas de organização como de nomenclaturas nos diver sos programas ofertados pelos estados Em praticamen te todas as unidades da Federação foram criados órgãos específicos para o Ensino Supletivo dentro das Secreta rias de Educação cuja intervenção privilegiada era no ensino de 1o e 2o graus sendo raras as iniciativas no campo da alfabetização de adultos Na esfera municipal ao contrário raramente fo ram criados órgãos específicos responsáveis pela suplên cia exceção feita às capitais dos estados mais populo sos Regra geral a ação dos municípios no campo da Suplência se resumiu aos convênios mantidos pelas pre feituras com o MOBRAL para o desenvolvimento de programas de alfabetização Em alguns casos raros en contramos prefeituras que assumiram programas pró prios de educação de adultos e em alguns casos mais raros ainda encontramos aquelas que atendiam de 5a a 8a séries do 1o grau e do 2o grau A Educação de Jovens e Adultos EJA e a redemocratização da sociedade brasileira após 1985 Os anos imediatamente posteriores à retomada do governo nacional pelos civis em 1985 representaram um período de democratização das relações sociais e das ins tituições políticas brasileiras ao qual correspondeu um alargamento do campo dos direitos sociais Foi um mo mento histórico em que antigos e novos movimentos so ciais e atores da sociedade civil que haviam emergido e se desenvolvido ao final dos anos 70 ocuparam espaços crescentes na cena pública adquiriram organicidade e institucionalidade renovando as estruturas sindicais e associativas preexistentes ou criando novas formas de organização modalidades de ação e meios de expressão Nesse período a ação da sociedade civil organizada direcionou as demandas educacionais que foi capaz de legitimar publicamente às instituições políticas da demo cracia representativa em especial aos partidos ao parla mento e às normas jurídicolegais Esse processo resultou na promulgação da Constituição Federal de 1988 e seus desdobramentos nas constituições dos estados e nas leis orgânicas dos municípios instrumentos jurídicos nos quais materializouse o reconhecimento social dos direitos das pessoas jovens e adultas à educação fundamental com a conseqüente responsabilização do Estado por sua oferta pública gratuita e universal A história da educação de jovens e adultos do período da redemocratização entre tanto é marcada pela contradição entre a afirmação no plano jurídico do direito formal da população jovem e adulta à educação básica de um lado e sua negação pe las políticas públicas concretas de outro A Nova República6 O primeiro governo civil pós64 marcou simboli camente a ruptura com a política de educação de jovens 6 Sobre levantamento histórico da educação de jovens e adultos no período pósregime militar veja tese de doutorado de Di Pierro 2000 Sérgio Haddad Maria Clara Di Pierro 120 MaiJunJulAgo 2000 Nº 14 e adultos do período militar com a extinção do MO BRAL cuja imagem pública ficara profundamente iden tificada com a ideologia e as práticas do regime autori tário Estigmatizado como modelo de educação domesticadora e de baixa qualidade o MOBRAL já não encontrava no contexto inaugural da Nova República condições políticas de acionar com eficácia os mecanis mos de preservação institucional que utilizara no perío do precedente motivo pelo qual foi substituído ainda em 1985 pela Fundação Nacional para Educação de Jo vens e Adultos Educar Apesar de ter herdado do MOBRAL funcionários estruturas burocráticas concepções e práticas político pedagógicas a Fundação Educar incorporou muitas das inovações sugeridas pela Comissão que em princípios de 1986 formulou suas diretrizes políticopedagógicas O paralelismo anteriormente existente foi rompido por meio da subordinação da Fundação Educar à Secretaria de Ensino de 1o e 2o Graus do MEC A Educar assumiu a responsabilidade de articular em conjunto o subsistema de ensino supletivo a política nacional de educação de jovens e adultos cabendolhe fomentar o atendimento nas séries iniciais do ensino de 1o grau promover a formação e o aperfeiçoamento dos educadores produzir material didático supervisionar e avaliar as atividades A diretriz de descentralização fez com que a Funda ção assumisse o papel de órgão de fomento e apoio técni co privilegiando a modalidade de ação indireta em apoio aos municípios estados e organizações da sociedade ci vil O objetivo era induzir que as atividades diretas da Fundação fossem progressivamente absorvidas pelos sis temas de ensino supletivo estaduais e municipais Assim as Comissões Municipais do MOBRAL foram dissolvi das e as prefeituras municipais herdeiras das suas ativi dades de ensino passaram a constituir os principais par ceiros conveniados à Fundação ao lado de empresas e organizações civis de natureza variada A Educar mante ve uma estrutura nacional de pesquisa e produção de ma teriais didáticos bem como coordenações estaduais res ponsáveis pela gestão dos convênios e assistência técnica aos parceiros que passaram a deter maior autonomia para definir seus projetos políticopedagógicos Se em muitos sentidos a Fundação Educar repre sentou a continuidade do MOBRAL devemse compu tar como mudanças significativas a sua subordinação à estrutura do MEC e a transformação em órgão de fo mento e apoio técnico em vez de instituição de execu ção direta Houve uma relativa descentralização das suas atividades e a Fundação apoiou técnica e financeiramente algumas iniciativas inovadoras de educação básica de jovens e adultos conduzidas por prefeituras municipais ou instituições da sociedade civil De fato com o processo de redemocratização polí tica do país a reorganização partidária a promoção de eleições diretas nos níveis subnacionais de governo e a liberdade de expressão e organização dos movimentos sociais urbanos e rurais alargaram o campo para a expe rimentação e a inovação pedagógica na educação de jo vens e adultos As práticas pedagógicas informadas pelo ideário da educação popular que até então eram desen volvidas quase que clandestinamente por organizações civis ou pastorais populares das igrejas retomaram vi sibilidade nos ambientes universitários e passaram a in fluenciar também programas públicos e comunitários de alfabetização e escolarização de jovens e adultos Esse processo de revitalização do pensamento e das práticas de educação de jovens e adultos refletiuse na Assembléia Nacional Constituinte Nenhum feito no ter reno institucional foi mais importante para a educação de jovens e adultos nesse período que a conquista do direito universal ao ensino fundamental público e gra tuito independentemente de idade consagrado no Arti go 208 da Constituição de 1988 Além dessa garantia constitucional as disposições transitórias da Carta Mag na estabeleceram um prazo de dez anos durante os quais os governos e a sociedade civil deveriam concentrar es forços para a erradicação do analfabetismo e a univer salização do ensino fundamental objetivos aos quais de veriam ser dedicados 50 dos recursos vinculados à educação dos três níveis de governo A vigência desses mecanismos somada à descen tralização das receitas tributárias em favor dos estados e municípios e à vinculação constitucional de recursos para o desenvolvimento e a manutenção do ensino cons tituiu a base para que nos anos subseqüentes pudesse vir a ocorrer uma significativa expansão e melhoria do atendimento público na escolarização de jovens e adul tos O fato de a Organização das Nações Unidas haver Escolarização de jovens e adultos Revista Brasileira de Educação 121 declarado 1990 como o Ano Internacional da Alfabeti zação e convocado para essa data a Conferência Mun dial de Educação para Todos reforçava essa expectativa que entretanto acabou não se confirmando A educação de jovens e adultos em três planos e duas leis de educação Uma das medidas adotadas em março de 1990 logo no início do governo Fernando Collor de Mello foi a extinção da Fundação Educar Esse ato fez parte de um extenso rol de iniciativas que visavam ao en xugamento da máquina administrativa e à retirada de subsídios estatais simultâneas à implementação de um plano heterodoxo de ajuste das contas públicas e con trole da inflação Nesse mesmo pacote de medidas foi suprimido o mecanismo que facultava às pessoas jurí dicas direcionar voluntariamente 2 do valor do im posto de renda devido às atividades de alfabetização de adultos recursos esses que conformavam o fundo que nas duas décadas anteriores financiara o MOBRAL e a Fundação Educar A extinção da Educar surpreendeu os órgãos públi cos as entidades civis e outras instituições conveniadas que a partir daquele momento tiveram que arcar sozi nhas com a responsabilidade pelas atividades educati vas anteriormente mantidas por convênios com a Fun dação A medida representa um marco no processo de descentralização da escolarização básica de jovens e adultos pois embora não tenha sido negociada entre as esferas de governo representou a transferência direta de responsabilidade pública dos programas de alfabeti zação e pósalfabetização de jovens e adultos da União para os municípios Desde então a União já não partici pa diretamente da prestação de serviços educativos en quanto a participação relativa dos municípios na matrí cula do ensino básico de jovens e adultos tendeu ao crescimento contínuo concentrandose nas séries iniciais do ensino fundamental ao passo que os Estados que ainda respondem pela maior parte do alunado concen tram as matrículas do segundo segmento do ensino fun damental e do ensino médio Nos dois anos que antecederam o impeachment do presidente Collor seu governo prometeu colocar em mo vimento um Programa Nacional de Alfabetização e Ci dadania PNAC que salvo algumas ações isoladas não transpôs a fronteira das intenções Tendo mobilizado representações da sociedade civil e instâncias subnacionais de governo em sua elaboração o PNAC prometia dentre outras medidas substituir a atuação da extinta Fundação Educar por meio da transferência de recursos federais para que instituições públicas priva das e comunitárias promovessem a alfabetização e a ele vação dos níveis de escolaridade dos jovens e adultos Desacreditado como o governo que o propôs o PNAC foi abandonado no mandatotampão exercido do vice presidente Itamar Franco Em 1993 o governo federal desencadeou mais um processo de consulta participativa com vistas à formu lação de outro plano de política educacional cuja exis tência era requisito para que o Brasil na condição de um dos nove países que mais contribuem para o elevado número de analfabetos no planeta pudesse ter acesso prioritário a créditos internacionais vinculados aos com promissos assumidos na Conferência Mundial de Edu cação para Todos Concluído em 1994 às vésperas do final daquele governo o Plano Decenal fixou metas de prover oportunidades de acesso e progressão no ensino fundamental a 37 milhões de analfabetos e 46 milhões de jovens e adultos pouco escolarizados Eleito para a Presidência da República em 1994 e reeleito em 1998 o governo de Fernando Henrique Car doso colocou de lado o Plano Decenal e priorizou a im plementação de uma reforma políticoinstitucional da educação pública que compreendeu diversas medidas dentre as quais a aprovação de uma emenda constitucio nal quase que simultaneamente à promulgação da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional LDB A nova LDB 9394 aprovada pelo Congresso em fins de 1996 foi relatada pelo senador Darcy Ribeiro e não tomou por base o projeto que fora objeto de nego ciações ao longo dos oito anos de tramitação da matéria e portanto desprezou parcela dos acordos e consensos estabelecidos anteriormente A seção dedicada à educa ção básica de jovens e adultos resultou curta e pouco inovadora seus dois artigos reafirmam o direito dos jo vens e adultos trabalhadores ao ensino básico adequado às suas condições peculiares de estudo e o dever do poder Sérgio Haddad Maria Clara Di Pierro 122 MaiJunJulAgo 2000 Nº 14 público em oferecêlo gratuitamente na forma de cursos e exames supletivos A única novidade dessa seção da Lei foi o rebaixamento das idades mínimas para que os candidatos se submetam aos exames supletivos fixadas em 15 anos para o ensino fundamental e 18 anos para o ensino médio A verdadeira ruptura introduzida pela nova LDB com relação à legislação anterior reside na aboli ção da distinção entre os subsistemas de ensino regular e supletivo integrando organicamente a educação de jovens e adultos ao ensino básico comum A flexibilida de de organização do ensino e a possibilidade de acele ração dos estudos deixaram de ser atributos exclusivos da educação de jovens e adultos e foram estendidas ao ensino básico em seu conjunto Maior integração aos sistemas de ensino de um lado certa indeterminação do públicoalvo e diluição das especificidades psicopeda gógicas de outro parecem ser os resultados contraditó rios da nova LDB sobre a configuração recente da edu cação básica de jovens e adultos A Constituição e a Lei de Diretrizes e Bases pre vêem que o Executivo federal elabore e submeta ao Congresso planos plurianuais de educação Mais espe cíficas as Disposições Transitórias da nova LDB deter minaram que a União encaminhasse ao Congresso um Plano Nacional de Educação de duração decenal con soante a Declaração Mundial de Educação Para Todos Esse foi o impulso para que em meados de 1997 o MEC desse início a um processo de consultas que resultou em um Projeto de Plano Nacional de Educação PNE apre sentado em fevereiro de 1998 à Câmara dos Deputados Simultânea e paralelamente à iniciativa do Executivo uma articulação de organizações estudantis sindicais e científicotécnicas de educadores fez convergir para o II Congresso Nacional de Educação Belo Horizonte nov 1997 um conjunto de propostas para a educação deno minado O PNE da sociedade brasileira também con vertidos em projeto de lei Embora no corpo principal os dois projetos de lei fossem substancialmente diversos e por vezes francamente conflitivos entre si as propostas relativas à educação de jovens e adultos não chegavam a ser de todo divergentes diferindo sobretudo na abrangência das metas quantitativas e dos montantes de financiamento Em fins de 1999 o relator da matéria emi tiu um parecer que adere ao paradigma da educação con tinuada ao largo da vida entendida como direito de ci dadania motor de desenvolvimento econômico e social e instrumento de combate à pobreza Desde esse ponto de vista os desafios relativos à educação de jovens e adultos seriam três resgatar a dívida social representa da pelo analfabetismo erradicandoo treinar o imenso contingente de jovens e adultos para a inserção no mer cado de trabalho e criar oportunidades de educação per manente O substitutivo apresentado pelo relator assi nala que o analfabetismo e os baixos níveis de escolarização não podem ser sanados apenas pela dinâ mica demográfica sendo necessário agir tanto sobre o estoque de jovens e adultos analfabetos e pouco esco larizados como sobre a reprodução desses fenômenos junto às novas gerações indicando ainda a necessidade de políticas focalizadas dirigidas à região Nordeste à população feminina etnias indígenas e afrodescenden tes Pondera ser insuficiente prover alfabetização e for mação equivalente às séries iniciais insistindo que o direito constitucional e as exigências sociais de conhe cimento impõem como mínima a escolarização equiva lente ao ensino fundamental completo Ao formular os objetivos entretanto foram mantidas as mesmas metas quantitativas propostas no PL do Executivo restritas à alfabetização e às quatro séries iniciais do ensino fun damental Aprovado nas comissões do Congresso o PNE até maio de 2000 ainda aguardava votação em plenário A reforma educacional e o FUNDEF A reforma educacional iniciada em 1995 veio sendo implementada sob o imperativo de restrição do gasto pú blico de modo a cooperar com o modelo de ajuste estru tural e a política de estabilização econômica adotados pelo governo federal Tem por objetivos descentralizar os en cargos financeiros com a educação racionalizando e redistribuindo o gasto público em favor do ensino funda mental obrigatório Essas diretrizes de reforma educacio nal implicaram que o MEC mantivesse a educação bási ca de jovens e adultos na posição marginal que ela já ocupava nas políticas públicas de âmbito nacional refor çando as tendências à descentralização do financiamento e da produção dos serviços Escolarização de jovens e adultos Revista Brasileira de Educação 123 O principal instrumento da reforma foi a aprova ção da Emenda Constitucional 1496 que suprimiu das Disposições Transitórias da Constituição de 1988 o ar tigo que comprometia a sociedade e os governos a erradicar o analfabetismo e universalizar o ensino fun damental até 1998 desobrigando o governo federal de aplicar com essa finalidade a metade dos recursos vin culados à educação o que implicaria elevar o gasto edu cacional global A nova redação dada ao Artigo 60 das Disposições Transitórias da Constituição criou em cada um dos estados o Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério FUNDEF um mecanismo engenhoso pelo qual a maior parte dos recursos públicos vinculados à educação foi reunida em cada unidade ederada em um Fundo contábil posterior mente redistribuído entre as esferas de governo estadual e municipal proporcionalmente às matrículas registradas no ensino fundamental regular nas respectivas redes de ensino Nesse novo arranjo do regime de colaboração entre as esferas de governo a União deveria cumprir a função supletiva e redistributiva complementando os Fundos daqueles Estados cuja arrecadação não assegu rava o valor mínimo por aluno ao ano fixado em decre to presidencial anualmente com base na previsão da re ceita e das matrículas A lei obrigou estados e municípios a implementar planos de carreira para o magistério apli car pelo menos 60 dos recursos do Fundo na remune ração dos docentes em efetivo exercício e na habilitação de professores leigos e instituir conselhos de controle e acompanhamento nos quais têm assento autoridades edu cacionais representantes das famílias e dos professo res No contexto fiscal e tributário brasileiro esse mecanismo induziu à municipalização do ensino funda mental e foi acionado com base no suposto de que o investimento mais eficaz dos recursos municipais nesse nível de ensino daria maior liberdade aos estados para investir no ensino médio e à União para investir no ensi no superior Essa redistribuição dos encargos educacio nais entre as esferas de governo realizada sem uma am pliação dos recursos públicos para o setor deixou larga margem de dúvida sobre as possibilidades de seguir ex pandindo o sistema público de ensino de modo a atender ao novo perfil demográfico da população e cobrir os ele vados déficits de vagas reduzindo os dramáticos índi ces de evasão e repetência que caracterizam o sistema educacional melhorando a qualidade da educação e as condições de trabalho do magistério A operacionalização do dispositivo constitucional que criou o FUNDEF exigiu regulamentação adicional Embora tenha sido aprovada por unanimidade do Con gresso a Lei 942496 recebeu vetos do presidente um dos quais impediu que as matrículas registradas no en sino fundamental presencial de jovens e adultos fossem computadas para efeito dos cálculos dos fundos medida que focalizou o investimento público no ensino de crian ças e adolescentes de 7 a 14 anos e desestimulou o setor público a expandir o ensino fundamental de jovens e adultos Ao estabelecer o padrão de distribuição dos recur sos públicos estaduais e municipais em favor do ensino fundamental de crianças e adolescentes o FUNDEF deixou parcialmente a descoberto o financiamento de três segmentos da educação básica a educação infantil o ensino médio e a educação básica de jovens e adultos Com a aprovação da Lei 9424 o ensino de jovens e adultos passou a concorrer com a educação infantil no âmbito municipal e a com o ensino médio no âmbito estadual pelos recursos públicos não capturados pelo FUNDEF Como a cobertura escolar nestes dois níveis de ensino é deficitária e a demanda social explícita por eles muito maior a expansão do financiamento da educa ção básica de jovens e adultos condição para a expansão da matrícula e melhoria de qualidade experimentou difi culdades ainda maiores que aquelas já observadas no pas sado Três programas federais de educação de jovens e adultos A década de 1990 tem sido marcada pela relativi zação nos planos cultural jurídico e político dos direitos educativos das pessoas jovens e adultas conquis tados no momento anterior7 A continuidade do processo de democratização que implicava transpor para as polí ticas públicas efetivas os direitos educacionais conquis 7 Sobre o tema veja artigo de Haddad 1997 Sérgio Haddad Maria Clara Di Pierro 124 MaiJunJulAgo 2000 Nº 14 tados formalmente no plano jurídico foi obstada pela crise de financiamento e pela reforma do Estado As políticas de estabilização monetária e ajuste macroeco nômico condicionaram a expansão do gasto social pú blico às metas de equilíbrio fiscal o que implicou a re definição de papéis das esferas central e subnacionais de governo das instituições privadas e das organiza ções da sociedade civil na prestação dos serviços so ciais Consolidaramse a tendência à descentralização do financiamento e dos serviços bem como a posição marginal ocupada pela educação básica de jovens e adul tos nas prioridades de política educacional Um dos fatos associados a esse processo é o recuo do Ministério da Educação no exercício de suas funções de coordenação ação supletiva e redistributiva na pro visão da educação básica de jovens e adultos Na verdade o governo federal não se retirou totalmente da provisão desses serviços pois outras instâncias governamentais acabaram por tomar a iniciativa ou acolher demandas de segmentos organizados da sociedade civil assumin do para si a tarefa de promover programas de alfabeti zação e elevação da escolaridade da população jovem e adulta Tudo indica que a combinação de dois proces sos a capacidade diferencial de expressão pública das demandas educativas por parte de determinados segmen tos da sociedade civil de um lado e as diferenciações internas do aparato burocrático público de outro pos sibilitou a promoção do deslocamento dos programas de formação de pessoas adultas dos organismos de gestão educacional para outros setores da administração de que resultou a atual dispersão dos programas federais De fato ao longo da segunda metade dos anos 90 foram concebidos e tiveram início três programas federais de formação de jovens e adultos de baixa renda e escolari dade que guardam entre si pelo menos dois traços co muns nenhum deles é coordenado pelo Ministério da Educação e todos são desenvolvidos em regime de par ceria envolvendo diferentes instâncias governamentais organizações da sociedade civil e instituições de ensino e pesquisa O Programa Alfabetização Solidária PAS foi idea lizado em 1996 pelo Ministério da Educação mas é co ordenado pelo Conselho da Comunidade Solidária or ganismo vinculado à Presidência da República que desenvolve ações sociais de combate à pobreza Com o objetivo declarado de desencadear um movimento de solidariedade nacional para reduzir as disparidades re gionais e os índices de analfabetismo significativamen te até o final do século o PAS consiste num programa de alfabetização inicial com apenas cinco meses de du ração destinado prioritariamente ao público juvenil e aos municípios e periferias urbanas em que se encon tram os índices mais elevados de analfabetismo do país Implementado desde 1997 o Programa teve uma expan são rápida que parece estar associada à engenhosa parce ria envolvendo o cofinanciamento pelo MEC empresas e doadores individuais a mobilização de infraestrutu ra alfabetizandos e alfabetizadores por parte dos go vernos municipais e a capacitação e a supervisão peda gógica dos educadores realizadas por estudantes e docentes de universidades públicas e privadas A Coor denação afirma que nos três primeiros anos de funcio namento o PAS chegou a 866 municípios e atendeu 776 mil alunos dos quais menos de um quinto adquiriu a capacidade de ler e escrever pequenos textos resultado atribuído pelas universidades ao tempo demasiadamen te curto previsto para a alfabetização Manejando um conceito operacional de alfabetismo muito estreito o PAS corre o risco de redundar em mais uma campanha fra cassada de alfabetização se não conseguir assegurar que os egressos tenham oportunidades de prosseguir estudos nas redes públicas de ensino o que é dificultado pela orientação da política educacional mais geral que direciona e focaliza os recursos somente para o ensino de crianças e adolescentes O Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária PRONERA guarda a singularidade de ser um programa do governo federal gestado fora da arena go vernamental uma articulação do Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras CRUB com o Movimen to dos Trabalhadores Rurais Sem Terra MST foi ca paz de introduzir uma proposta de política pública de educação de jovens e adultos no meio rural no âmbito das ações governamentais da reforma agrária Coorde nado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária INCRA vinculado ao Ministério Extraordi nário da Política Fundiária MEPF o Programa foi de lineado em 1997 e operacionalizado a partir de 1998 Escolarização de jovens e adultos Revista Brasileira de Educação 125 envolvendo a parceria entre o governo federal respon sável pelo financiamento universidades responsáveis pela formação dos educadores e sindicatos ou movi mentos sociais do campo responsáveis pela mobiliza ção dos educandos e educadores O alvo principal do PRONERA é a alfabetização inicial de trabalhadores rurais assentados que se encontram na condição de anal fabetismo absoluto aos quais oferece cursos com um ano letivo de duração mas seu componente mais inova dor é aquele pelo qual as universidades parceiras pro porcionam a formação dos alfabetizadores e a elevação de sua escolaridade básica Mesmo sem dispor de fonte estável de financiamento o PRONERA vem subsistin do aos riscos de descontinuidade em 1999 chegou a 55 mil alfabetizandos e pelo menos 25 mil monitores nas 27 unidades da Federação Coordenado pela Secretaria de Formação e Desen volvimento Profissional do Ministério do Trabalho SEFORMTb o Plano Nacional de Formação do Tra balhador PLANFOR não é um programa de ensino fundamental ou médio destinandose à qualificação pro fissional da população economicamente ativa entendi da como formação complementar e não substitutiva à educação básica Desde sua concepção em 1995 a SEFORMTb delineou um perfil de formação requerido pelo mercado de trabalho que ao lado das competências técnicas específicas e habilidades de gestão compreen de a educação básica dos trabalhadores motivo pelo qual comportam iniciativas destinadas à elevação da escola ridade de jovens e adultos do campo e da cidade Finan ciado com recursos do Fundo de Amparo ao Trabalha dor FAT o PLANFOR é operado descentralizadamente por uma rede heterogênea de parceiros públicos e priva dos de formação profissional composta por secretarias de educação e outros órgãos públicos estaduais e muni cipais instituições do Sistema S organizações não governamentais sindicatos patronais e de trabalhadores escolas de empresas e fundações universidades e insti tutos de pesquisa O financiamento e a articulação des sa malha difusa de agentes de formação profissional fo ram parcialmente descentralizados mediante assinatura de convênios com os estados nos quais a coordenação foi atribuída às secretarias de trabalho e emprego A par ticipação dos segmentos sociais e agentes de formação na gestão da política foi assegurada pela constituição de comissões deliberativas nas instâncias estadual e muni cipal que se somaram ao Conselho Deliberativo do FAT de âmbito nacional O Plano visou ampliar e diversifi car a oferta de educação profissional com vistas a quali ficar e requalificar anualmente 20 da PEA por inter médio dos Planos Estaduais de Qualificação PEQs e as Parcerias Nacionais e Regionais Entre 1996 e 1998 quase 60 dos cinco milhões de trabalhadores atendi dos pelo PLANFOR receberam cursos em habilidades básicas mas o baixo nível de escolaridade dos cursistas continuou a ser apontado como obstáculo à eficácia do Programa Contraditoriamente vem ocorrendo uma es cassa articulação entre a política nacional de formação profissional consubstanciada no PLANFOR e as redes estaduais e municipais de ensino que constituem os prin cipais agentes públicos na oferta de oportunidades de edu cação básica de jovens e adultos Desafios presentes e futuros Democratização da educação e superação do analfabetismo Ao longo da segunda metade deste século houve um importante movimento de ampliação da oferta de vagas no ensino público no nível fundamental que trans formou a escola pública brasileira em uma instituição aberta a amplas camadas da população superando em parte o caráter elitista que a caracterizava no início do século quando apenas alguns poucos privilegiados ti nham acesso aos estudos Neste momento em que se ini cia um novo século porém essa oferta de vagas ainda se mostra insuficiente pois um grande número de crian ças e adolescentes não está estudando A ampliação da oferta escolar não foi acompanha da de uma melhoria das condições do ensino de modo que hoje temos mais escolas mas sua qualidade é mui to ruim A má qualidade do ensino combinase à situa ção de pobreza extrema em que vive uma parcela im portante da população para produzir um contingente numeroso de crianças e adolescentes que passam pela escola sem lograr aprendizagens significativas e que submetidas a experiências penosas de fracasso e repe Sérgio Haddad Maria Clara Di Pierro 126 MaiJunJulAgo 2000 Nº 14 tência escolar acabam por abandonar os estudos Te mos agora um novo tipo de exclusão educacional antes as crianças não podiam freqüentar a escola por ausên cia de vagas hoje ingressam na escola mas não apren dem e dela são excluídas antes de concluir os estudos com êxito Essa nova modalidade de exclusão educacional que acompanhou a ampliação do ensino público acabou pro duzindo um elevado contingente de jovens e adultos que apesar de terem passado pelo sistema de ensino nele realizaram aprendizagens insuficientes para utilizar com autonomia os conhecimentos adquiridos em seu diaa dia O resultado desse processo é que no conjunto da população assistese à gradativa substituição dos anal fabetos absolutos por um numeroso grupo de jovens e adultos cujo domínio precário da leitura da escrita e do cálculo vem sendo tipificado como analfabetismo fun cional De fato ao longo do século XX o percentual de analfabetos absolutos no conjunto da população veio declinando continuamente alcançando na metade dos anos 90 um patamar próximo a 15 dos jovens e adul tos brasileiros Em 1996 entretanto quase um terço da população com mais de 14 anos não havia concluído sequer quatro anos de estudos e aqueles que não haviam completado o ensino obrigatório de oito anos represen tavam mais de dois terços da população nessa faixa etária Pesquisa recente mostrou que são necessários mais de quatro anos de escolarização bemsucedida para que um cidadão adquira as habilidades e competências cognitivas que caracterizam um sujeito plenamente al fabetizado diante das às exigências da sociedade con temporânea o que coloca na categoria de analfabetos funcionais aproximadamente a metade da população jo vem e adulta brasileira8 Esses dados demonstram que o desafio da expan são do atendimento na educação de jovens e adultos já não reside apenas na população que jamais foi à escola mas se estende àquela que freqüentou os bancos escola res mas neles não obteve aprendizagens suficientes para participar plenamente da vida econômica política e cul tural do país e seguir aprendendo ao longo da vida Cada vez tornase mais claro que as necessidades básicas de aprendizagem dessa população só podem ser satisfeitas por uma oferta permanente de programas que sendo mais ou menos escolarizados necessitam institucionalidade e continuidade superando o modelo dominante nas cam panhas emergenciais e iniciativas de curto prazo que recorrem a mãodeobra voluntária e recursos humanos nãoespecializados características da maioria dos pro gramas que marcaram a história da educação de jovens e adultos no Brasil A estruturação tardia do sistema público de ensino brasileiro suas mazelas e os equívocos das políticas edu cacionais não parecem suficientes porém para esclare cer as causas da persistência de elevados índices de anal fabetismo absoluto e funcional e de uma média de anos de estudos inferior àquela de países latinoamericanos com níveis equivalentes de desenvolvimento econômi co Essa descontinuidade entre as dimensões econômica e cultural da modernização tornase compreensível quan do percebemos a estreita associação entre a incidência da pobreza e as restrições ao acesso à educação A his tória brasileira nos oferece claras evidências de que as margens da inclusão ou da exclusão educacional foram sendo construídas simétrica e proporcionalmente à ex tensão da cidadania política e social em íntima relação com a participação na renda e o acesso aos bens econô micos A tese corrente que converte associações positi vas em nexos causais afirmando que a elevação da es colaridade promove o acesso ao trabalho e melhora a distribuição da renda é apenas uma meiaverdade ele vada à condição de certeza com base em certa dose de ingenuidade sociológica e otimismo pedagógico A in versão dessa mesma equação nos leva a crer ser impro vável a elevação da escolaridade da população sem a simultânea ampliação de oportunidades de trabalho transformação do perfil da distribuição da renda e de participação política da maioria dos brasileiros Os jovens e a nova identidade da educação de adultos Estreitamente relacionado ao tópico anterior emer ge um segundo desafio para a educação de jovens e adul 8 Veja Haddad 1997 e Ribeiro 1999 Escolarização de jovens e adultos Revista Brasileira de Educação 127 tos representado pelo perfil crescentemente juvenil dos alunos em seus programas grande parte dos quais são adolescentes excluídos da escola regular Há uma ou duas décadas a maioria dos educandos de programas de alfa betização e de escolarização de jovens e adultos eram pessoas maduras ou idosas de origem rural que nunca tinham tido oportunidades escolares A partir dos anos 80 os programas de escolarização de adultos passaram a acolher um novo grupo social constituído por jovens de origem urbana cuja trajetória escolar anterior foi mal sucedida O primeiro grupo vê na escola uma perspecti va de integração sociocultural o segundo mantém com ela uma relação de tensão e conflito aprendida na expe riência anterior Os jovens carregam consigo o estigma de alunosproblema que não tiveram êxito no ensino regular e que buscam superar as dificuldades em cursos aos quais atribuem o caráter de aceleração e recupera ção Esses dois grupos distintos de trabalhadores de baixa renda encontramse nas classes dos programas de esco larização de jovens e adultos e colocam novos desafios aos educadores que têm que lidar com universos muito distintos nos planos etários culturais e das expectativas em relação à escola Assim os programas de educação escolar de jovens e adultos que originalmente se estruturaram para democratizar oportunidades formativas a adultos trabalhadores vêm perdendo sua identidade na medida em que passam a cumprir funções de acelera ção de estudos de jovens com defasagem sérieidade e regularização do fluxo escolar O direito à educação e o papel do Estado na oferta de ensino aos jovens e adultos Nesse breve histórico pudemos constatar que a responsabilidade pela oferta de escolarização de jovens e adultos no Brasil sempre foi compartilhada por órgãos públicos e por organizações societárias A partir de 1940 o setor público particularmente o governo federal as sumiu o papel de protagonista da oferta educacional dirigida à população adulta tomando a iniciativa de pro mover programas próprios e acionar mecanismos de indução e controle sobre outros níveis de governo Foi assim com as campanhas de alfabetização da década de 1950 com o MOBRAL ou com a Lei 5692 de 1971 que institucionalizou o Ensino Supletivo O ponto alto do movimento de reconhecimento do direito de todos à escolarização e da correspondente responsabilização do setor público pela oferta gratuita de ensino aos jovens e adultos ocorreu com a aprovação da Constituição em 1988 As políticas educacionais dos anos 90 porém fo ram delineando uma transição na direção do esvaziamen to do direito social à educação básica em qualquer idade ao qual correspondeu um movimento da fronteira que de limita as responsabilidades do Estado e da sociedade na provisão dos serviços de educação de jovens e adultos Premida pelas políticas de ajuste das contas públi cas a reforma educacional implementada pelo governo federal na segunda metade dos anos 90 acabou por fo calizar recursos no ensino fundamental de crianças e adolescentes de 7 a 14 anos em detrimento de outros níveis de ensino e grupos etários como as crianças pe quenas e os jovens e adultos com baixa escolaridade O que se observa ao final dos anos 90 na ação do governo federal é uma pulverização de projetos de alfabetização e elevação de escolaridade em diversos ministérios com a renúncia do Ministério da Educação em assumir res ponsabilidades pelo atendimento direto e exercer o pa pel de liderança coordenação e indução dos governos subnacionais Ao mesmo tempo o Conselho da Comu nidade Solidária assumiu a iniciativa de reproduzir ve lhos modelos ineficazes de campanhas emergenciais de alfabetização de jovens e adultos implementando o Pro grama Alfabetização Solidária com recursos de doação de empresas e indivíduos ficando a responsabilidade pelo financiamento de um direito básico da cidadania ao sa bor da filantropia ou da boa vontade da sociedade civil Observase assim que o ensino fundamental de jovens e adultos perde terreno como atendimento educa cional público de caráter universal e passa a ser com preendido como política compensatória coadjuvante no combate às situações de extrema pobreza cuja amplitu de pode estar condicionada às oscilações dos recursos doados pela sociedade civil sem que uma política arti culada possa atender de modo planejado ao grande de safio de superar o analfabetismo e elevar a escolaridade da maioria da população Por outro lado o veto presidencial à contagem das matrículas no ensino fundamental de jovens e adultos Sérgio Haddad Maria Clara Di Pierro 128 MaiJunJulAgo 2000 Nº 14 para efeito dos cálculos do FUNDEF representou a trans ferência aos estados e municípios da responsabilidade de responder à crescente pressão de demanda sem que lhes fossem oferecidas as condições de atendêla de maneira satisfatória Esse é um dos motivos pelos quais estados e municípios têm procurado alternativas de re dução dos custos para satisfação da demanda por edu cação de adultos seja mediante o incentivo a iniciativas de organizações da sociedade civil seja recorrendo aos meios de ensino à distância mesmo quando essas alter nativas metodológicas não produzem os resultados es perados nos níveis de aprendizagem permanência pro gressão e conclusão de estudos A difusão das parcerias e o debate sobre serviços públicos nãoestatais Ao mesmo tempo em que as políticas educacionais constrangem o papel dos organismos governamentais na provisão de oportunidades de formação para jovens e adultos crescem a visibilidade e a importância relati va das iniciativas da sociedade civil difundindose as práticas de parceria envolvendo universidades movi mentos sociais organizações nãogovernamentais as sociações comunitárias sindicatos de trabalhadores fun dações privadas organismos empresariais e órgãos públicos das três esferas de governo no desenvolvimento de projetos de alfabetização elevação de escolaridade eou de formação profissional A disseminação de dis tintas práticas de parceria configura um terreno de ex perimentação de diferentes concepções do que possam vir a ser num contexto de reforma do Estado os servi ços públicos nãoestatais A educação continuada ao longo da vida Um movimento em sentido oposto ao esvaziamento do direito dos jovens e adultos à escolaridade básica vem sendo observado em países desenvolvidos da Europa América do Norte e Sudeste Asiático onde a população adulta passa a dispor de oportunidades crescentes de formação geral profissional e atualização permanente A extrema valorização da educação nas sociedades pós industriais está relacionada à aceleração da velocidade de produção de novos conhecimentos e difusão de infor mações que tornaram a formação continuada um valor fundamental para a vida dos indivíduos e um requisito para o desenvolvimento dos países perante a sistemas econômicos globalizados e competitivos O paradigma de educação continuada emergente nessas regiões con cebe como espaços educativos múltiplas dimensões da vida social inclusive os ambientes urbano e de traba lho as associações civis os meios de comunicação e as demais instituições e aparelhos culturais Nesse marco as instituições escolares respondem por apenas uma par cela da formação permanente dos indivíduos que se apro priam de conhecimentos veiculados por outros sistemas de informação e difusão cultural O Brasil que ingressa no século XXI está integra do cultural tecnológica e economicamente a essas so ciedades pósindustriais e comporta dentro de si reali dades tão desiguais que fazem com que as possibilidades e os desafios da educação permanente também estejam colocados para extensas parcelas de nossa população O desafio maior entretanto será en contrar os caminhos para fazer convergir as metodolo gias e práticas da educação continuada em favor da superação de problemas do século XIX como a uni versalização da alfabetização SÉRGIO HADDAD é doutor em Educação professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo presidente da Asso ciação Brasileira de Organizações NãoGovernamentais ABONG e secretário executivo de Ação Educativa assessoria pesquisa e in formação Email acaoeducaoriginetcombr MARIA CLARA DI PIERRO é doutora em Educação e asses sora da organização nãogovernamental Ação Educativa Email acaoeducaoriginetcombr Referências bibliográficas ALMEIDA TW coord 1976 Programa de alfabetização fun cional na região nordeste subsídios para avaliação Rio de Ja neiro MECMOBRAL AMORIM JR 1978 O adulto analfabeto e a necessidade de alfabetização Belo Horizonte sed 27 p relatório de pes quisa Escolarização de jovens e adultos Revista Brasileira de Educação 129 AVELAR RF 1981 A aquisição do código escrito o desempe nho dos alunos do Programa de Alfabetização Funcional do Mobral Dissertação de Mestrado Porto Alegre PUCRS 245 p BANDEIRA MSD sd Áreas de resistência ao programa de alfa betização funcional MobralSepes 179 p relatório de pesquisa BARRETO Elba S de Sá 1986 Ensino Supletivo em São Paulo entre ricas experiências e pobres resultados São Paulo FCC 148 p BEISIEGEL Celso de Rui 1974 Estado e educação popular São Paulo Pioneira 1984 Educação e sociedade no Brasil após 1930 In FAUSTO Bóris História Geral da Civilização Brasileira São Paulo Difel 1988 Política educacional e programas de alfabeti zação Idéias São Paulo n 1 p 1622 1993 Considerações a propósito de um projeto educa cional São Paulo em Perspectiva São Paulo v 7 n1 p 3849 1997 Considerações sobre a política da União para a educação de jovens e adultos analfabetos Revista Brasileira de Educação São Paulo n 4 p 2634 1999 Questões da atualidade na educação popu lar ensino fundamental de jovens e adultos analfabetos ou pou co escolarizados São Paulo FEUSP texto apresentado em mesa redonda na 22a Reunião Anual da ANPEd Caxambu set 1984 O Parecer do Conselho Estadual de Educa ção 7284 São Paulo mim p 123143 CASTRO CM et al 1980 O enigma do supletivo Brasília MEC 220 p COMISSÃO para Elaboração de Diretrizes Políticopedagógicas para a Fundação Educar 1986 Fundação Educar Diretrizes Políti coPedagógicas Brasília COMISSÃO Nacional do Ano Internacional da Alfabetização 1989 Educar e libertar Sl 36 p COMISSÃO Nacional de Educação de Jovens e Adultos 1994 Re comendações Brasília CONFERENCIA Internacional de Educación de Adultos V 1997 Hamburgo 1418 de julio Declaración de Hamburgo sobre la Educación de Adultos y Plan de Acción para el Futuro Hambur go UIEUNESCO 26 p CONGRESSO Nacional de Educação 2o 1997 Belo Horizonte nov Plano Nacional de Educação proposta da sociedade brasi leira Sl sed 73 p apresentado à Câmara dos Deputados pelo Deputado Ivan Valente como PL 415598 CUNHA LA 1977 Educação e desenvolvimento social no Bra sil Rio de Janeiro Francisco Alves CUNHA L A GÓES M de 1985 O Golpe na Educação Rio de Janeiro Zahar DAUSTER T et al 1981 O cavalo dos outros resumo do estudo sobre a categoria social educação e os alunos do programa de alfabetização funcional do Mobral Tecnologia Educacional Rio de Janeiro v 10 n 40 p 1622 maijun DI PIERRO MC 2000 As políticas públicas de educação bási ca de jovens e adultos no Brasil do período 19851999 Tese de Doutorado em Educação PUC SP 314 p DRAIBE Sônia M coord 1999 Análise qualitativa dos pro gramas inovadores do Comunidade Solidária relatório síntese Campinas NEPPUNICAMP p 58103 ENCONTRO LatinoAmericano sobre Educação de Jovens e Adul tos Trabalhadores Olinda PE 1993 1994 Anais Brasília INEP 381p FERRARI AR 1987 Escola e produção do analfabetismo no Brasil Educação e Realidade Porto Alegre v 12 n 2 p 8196 FERRAZ Esther de Figueiredo REALE Miguel et al 1984 Edu cação e cultura na Constituição Brasileira Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos Brasília v 65 n 151 p 654684 setdez FLETCHER PR 1983 Mobral e a alfabetização a promessa a experiência e alguma evidência de seus resultados Rio de Janei ro IPEACNRH 58 p GALHEIGO AM 1984 O planejamento curricular como meca nismo de democratização do ensino estudo exploratório do caso dos cursos de suplência do município do Rio de Janeiro Disserta ção de Mestrado em Educação Rio de Janeiro PUC 153 p HADDAD S et al 1989 O Ensino Supletivo Função Suplência no Brasil indicações de uma pesquisa Revista Brasileira de Estu dos Pedagógicos Brasília v 70 n 166 p 34670 setdez HADDAD Sérgio DI PIERRO Maria Clara 1994 Diretrizes de política nacional de educação de jovens e adultos consolidação de documentos 19851994 São Paulo CEDI Ação Educativa ago FREITAS MV 1988 Diagnóstico dos estudos e pesquisas sobre cursos supletivos função suplência via rádio televisão e correspondência São Paulo CEDI 159 p Sérgio Haddad Maria Clara Di Pierro 130 MaiJunJulAgo 2000 Nº 14 SIQUEIRA MC Di P 1988 Diagnósticos dos estudos e pesquisas sobre política estrutura e funcionamento do ensino supletivo na função suplência relatório final São Paulo CEDI HADDAD Sérgio 1979 Promoção de programas de alfabetiza ção pósalfabetização e educação de adultos em vinculação com instituições de ensino superior no país São Paulo CRESALCCEDI 1987 Ensino Supletivo no Brasil o estado da arte Brasília INEPREDUC 136 p 1991 Estado e educação de adultos 19641985 Tese de Doutorado Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo 1997 A educação de pessoas jovens e adultas e a nova LDB In BRZEZINSKI I org LDB interpretada diver sos olhares se entrecruzam São Paulo Cortez coord 1997 Alfabetismo funcional na cidade de São Paulo São Paulo Ação Educativa 285 p e anexos mimeo LIMA NETO Newton coord 1998 Avaliação do Plano Nacio nal de Formação Profissional Relatório de Análise das Avalia ções dos PEQs97 versão final parte I São Carlos FAIUFSCar LOVISOLO Hugo 1988 A educação de adultos entre dois mode los Cadernos de Pesquisa São Paulo n 67 p 2340 LUCE Maria Beatriz FÁVERO Osmar HADDAD Sérgio 1992 A contribuição das Comissões Estaduais do PNAC subsídios para uma avaliação sl 33 p MAFRA MS 1980 Conhecendo os Centros de Estudos Supleti vos Brasília MECSEPS 64 p MARCHEZAN Nelson 1999 Relatório sobre o Plano Nacional de Educação versão preliminar para análise dos Membros da Comissão de Educação Cultura e Desporto Brasília Câmara dos Deputados MARSHALL TH 1987 Cidadania classe social e status Rio de Janeiro Zahar MEC SEPS 1983 Revitalização dos Centros de Estudos Supleti vos Brasília MECSEPS 31 p MENDONÇA TNJ 1985 Movimento Brasileiro de Alfabetiza ção subsídios para uma leitura crítica do discurso oficial Disser tação de Mestrado em Educação Goiânia UFGO 186 p ODONNEL G 1981 Anotações para uma Teoria do Estado In Revista de Cultura e Política n 3 e 4 São Paulo CEDEC 1990 Análise do autoritarismo burocrático Rio de Janeiro Paz e Terra PAIVA VP 1973 Educação popular e educação de adultos São Paulo Edições Loyola 19811982 MOBRAL um desacerto autoritário I II e III Rio de Janeiro Síntese Ibrades n 2324 1994 Anos 90 as novas tarefas da educação dos adul tos na América Latina In Encontro Latinoamericano sobre edu cação de jovens e adultos trabalhadores Olinda 1993 Anais Brasília INEP p 2140 PARECER N 69972 CFE de 1o e 2o graus aprovado em 6772 POSTHUMA Anne Caroline sd Transformando o sistema bra sileiro de formação profissional o primeiro quadriênio do PLANFOR Brasília MTbSEFOR PRAXEDES L 1983 A problemática dos cursos de suplência no estado de São Paulo legislação e prática Mestrado em Edu cação São Paulo USP 1983 2 v REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS 1973 Rio de Janeiro INEP v 59 n 131 p 363568 RIBEIRO Vera Maria Masagão 1999 Alfabetismo e atitudes pes quisa com jovens e adultos Campinas Papirus São Paulo Ação Educativa 255 p ROMANELLLI O de O 1978 História da Educação no Brasil 19301973 Petrópolis Vozes ROMÃO José Eustáquio 1995 Educação de jovens e adultos pro blemas e perspectivas In GADOTTI Moacir ROMÃO JE orgs Educação de jovens e adultos teoria prática e proposta São Paulo Cortez IPF p 3652 1999 Educação de jovens e adultos cenário e pers pectivas São Paulo IPF 1999 36 p Cadernos de EJA 5 SÃO PAULO Estado Secretaria da Educação Coordenadoria de Estu dos e Normas Pedagógicas 1977 Ensino Supletivo Legislação Federal e Estadual por Ivo Giannella e outros São Paulo SECENP SAVIANI D 1987 Política e educação no Brasil São Paulo Cortez SILVA Camila Croso GIL I Juca Pirama Camargo DI PIERRO Maria Clara 1999 Avaliando o primeiro ano de implantação do FUNDEF Observatório da Cidadania Rio de Janeiro n 3 p 167172 VARGAS Sonia Maria de 1984 A atuação do Departamento de Ensino Supletivo do MEC no período 19731979 Diseração de Mestrado PUCRJ ResumosAbstracts Revista Brasileira de Educação 193 component of the Elementary School system It gives a special emphasis to those decisive moments in that transformation which mark conflicts among projects for a society formative concepts and innovative pedagogical alternatives The principal objective is to understand the meaning assigned to it by different groups andor classes in the quest for democratizing education in our society meanings which were translated into public policies or in their absence Leonor Maria Tanuri História da formação de professores Tomando por base trabalhos historiográficos produzidos sobre a Es cola Normal em diversos estados brasi leiros o presente trabalho procura recu perar a história percorrida por essa instituição da perspectiva da ação do Estado ou seja da política educacional por ele desenvolvida Nascidas no sécu lo XIX ao nível de modestas escolas primárias e centradas sobretudo no con teúdo a ser ensinado as escolas normais foram aos poucos incorporando um con teúdo didáticopedagógico O ideário escolanovista as marcaria definitiva mente deslocando a ênfase de seu cur rículo para as denominadas ciências da educação O artigo aborda questões re lativas a consolidação e expansão das escolas normais como instituições for madoras do magistério para a escola primária evolução de sua organização geral e curricular definida a partir dos anos 30 em nível médio até as mudan ças introduzidas pela Lei 939496 que elevou a formação do professor das sé ries iniciais ao nível superior History of Elementary School Teachers Education in Brazil This paper deals with the history of the Brazilian training college for elementary school teachers from the viewpoint of State educational policy and having as sources historiographical works on elementary school teachers training colleges of several States Founded in 19th century those institutions initially showed a rather modest feature of elementary schools themselves with emphasis on the content to be taught With time however they progressively incorporated a didaticpedagogical content New School movement ideas influenced them decisively changing the emphasis of their curricula to the sciences of education The article examines questions related to consolidation and expansion of that College evolution of its general and curricular organization which has reached the secondary level from the 1930s onwards until the National Education Law 939496 when a higher education level was required to elementary teachers Luiz Antônio Cunha O ensino industrialmanufatureiro no Brasil O artigo apresenta a origem e o desen volvimento do ensino de ofícios para trabalhadores das manufaturas e indús trias no Brasil desde o século XVIII A tese central é a de que os preconceitos contra o trabalho manual representam o mais importante determinante da desva lorização das escolas profissionais as sim como do sistema educacional dual no país Desde 1942 o SENAI desem penhou um novo papel na formação da força de trabalho industrial brasileira em termos de recrutamento de alunos pedagogia gestão e financiamento Nos anos recentes todavia essa instituição perdeu a hegemonia conquistada no campo educacional e prepara um con junto de importantes decisões para se prevenir dos conflitos com o Estado e os sindicatos de trabalhadores Industrialmanufacturing education in Brazil The article presents the origin and the development of the training of works for manufactures and factories in Brazil since eighteenth century Its central thesis is that the prejudices against manual work represent the main determinant of the underevaluation of the professional schools as well as the dual educational system within the country Since 1942 SENAI performed a new role in the brazilian industrial labor force training in terms of students recruitment pedagogy management and financing Nevertheless in the recent years that institution has lost the hegemony acquired in educational field and pre pares a package of importants decisions in order to prevent conflicts with State and labores syndicates Sérgio Haddad e Maria Clara Di Pierro Escolarização de jovens e adultos O artigo aborda os processos sistemáti cos e organizados de formação geral de pessoas jovens e adultas no Brasil sob a ótica das políticas públicas Oferece uma visão panorâmica do tema ao lon go dos quinhentos anos de história bra sileira dedicando especial atenção à segunda metade do século XX em que o pensamento pedagógico e as políticas de educação escolar de jovens e adul tos adquiriram identidade e feições próprias Analisa o sentido político que a ditadura militar conferiu à alfa betização de adultos e ao ensino suple tivo nos anos 70 as diversas configura ções assumidas pelas políticas públicas de educação escolar de jovens e adultos ao longo do processo de redemocratização dos anos 80 assim como a posição marginal conferida a essa modalidade de ensino pela refor ma educacional dos anos 90 O ensaio indica como desafios a redefinição dos papéis do poder público e da sociedade na democratização de oportunidades de alfabetização escolarização básica e educação continuada para que possam responder às crescentes necessidades ResumosAbstracts 194 MaiJunJulAgo 2000 Nº 14 formativas da juventude e das pessoas adultas no Brasil contemporâneo Youth and adults schooling The article covers the systematic and organized processes of general education offered to youth and adults carried out in Brazil in the light of public policies It offers an overview of this theme throughout the five hundred years of Brazilian history and dedicates special attention to the last half of the 20th century in which pedagogical tenets and school education policies for youth and adults take on specific features It analyses the political meaning that the military dictatorship imputed to adult literacy programs and post literacy education in the 70s the several designs taken on by youth and adult school education public policies throughout the process of re democratization in the 80s as well as the marginal position that has been given to this type of education in the 90s The essay indicates as a challenge the redefinition of public sector and society rules in democratizing opportunities for literacy basic schooling and continued education in order to respond to the growing formative needs of young and adult people in contemporary Brazil Ana Waleska PC Mendonça A universidade no Brasil Este artigo se propõe a traçar uma visão panorâmica da história do ensino supe rior no Brasil tendo como foco de aná lise a universidade como uma institui ção historicamente construída e privilegiando o período que vai dos anos 20 aos anos 60 ao longo dos quais a universidade se institucionaliza entre nós e assume a sua configuração atual The university in Brazil The article presents an overall view of the history of higher education in Brazil focusing on the university as a historically constructed institution and emphasizing the period from 1920s to 1960s in which the Brazilian university became established as an institution and took on its present form