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Relações Internacionais ·
Ciências Políticas
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Robert Jackson Georg S0rensen Introdução às relações internacionais Teorias e abordagens Tradução BÁRBARA DUARTE Revisão técnica ARTHUR ITUASSU Prof de relações internacionais na PUCRio ZAHAR Jorge Zahar Editor Rio de Janeiro Para os nossos estudantes Título original Introduction to International Relations Theories and approaches Tradução autorizada da segunda edição inglesa revista e ampliada publicada em 2003 por Oxford University Press de Oxford Inglaterra Copyright 2003 Robert Jackson e Georg S0rensen Copyright da edição brasileira 2007 Jorge Zahar Editor Ltda rua México 31 sobreloja 20031144 Rio de Janeiro RJ tel 2121080808 fax 21 21080800 email jzezaharcombr site www zaharcom b r Introduction to International Relations 2e was originally published in Englisb in 2003 This translation ispublished by arrangement with Oxford Universiíy Press This edition is notforsale in Portugal Todos os direitos reservados A reprodução n aoautorizada desta publicação no todo ou em parte constitui violação de direitos autorais Lei 961098 Projeto gráfico e composição Printmark Marketing Editorial Capa Sérgio Campante Ilustração Gregor Schuster Zefa Corbis CIPBrasil Catalogaçàonafonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros RJ Jackson Robert H J l Si Introdução às relações internacionais teorias e abordagens Robert Jackson George S0rensen tradução Bárbara Duarte revisão técnica Arthur Ituassu Rio de Janeiro Jorge Zahar Ed 2007 Tradução de Introduction to international relations theories and approaches Inclui bibliografia ISBN 9788571109681 1 Relações internacionais 2 Relações internacionais Filosofia I S0rensen George 1948 II Título CDD 327 064627 CDU327 Sobre este livro Dicas de estudo Para facilitar os capítulos estão estruturados da seguinte forma Resumo cada capítulo começa com um pequeno resumo dos principais pontos Pontoschave cada capítulo termina com uma lista de pontoschave Questões de estudo cada capítulo apresenta uma série de questões de estudo que podem ser usadas para discussões ou temas de trabalhos Orientação para leitura complementar cada capítulo oferece uma orienta ção para uma leitura complementar sobre o assunto tratado O livro permite portanto que os alunos aprendam RI como uma disciplina acadêmica em desenvolvimento em vez de estudar somente os eventos atuais Durante todo o texto enfocamos as teorias e os teóricos Esperamos assim proporcionar um conhecimento básico do núcleo da disciplina de RI por meio da leitura deste manual Nosso livro foi escrito para cursos de nível iniciante mas seu conteúdo e seus debates também servem de auxílio para cursos de nível mais elevado O objetivo básico e prioritário é ajudar os alunos a passar rapidamente do nível iniciante para o superior Para recursos e material extra ver o site do manual em wwwoupcoukbesttextbookspoliticsjacksonsorensen2e Lista de abreviações Berd Banco Europeu para a Reconstrução e o Desenvolvimento G8 Grupo dos Oito Estados Unidos Canadá GrãBretanha Alemanha França Itália Rússia e Japão Gatt Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio IGO Organização intergovernamental FMI Fundo Monetário Internacional EPI Economia política internacional RI Relações internacionais Otan Organização do Tratado do Atlântico Norte ONG Organização nãogovernamental OCDE Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico Opep Organização dos Países Exportadores de Petróleo OSCE Organização para Segurança e Cooperação na Europa TNC Corporação transnacional ONU Organização das Nações Unidas Pnud Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento EUA Estados Unidos OMC Organização Mundial do Comércio UE União européia 1 Por que estudar RI As relações internacionais na vida cotidiana 20 Breve descrição histórica do sistema de Estados 29 O sistema estatal global e a economia mundial 40 As RI e o mundo contem porâneo dos Estados em transição 44 Conclusão 53 Pontoschave 56 Questões 56 Orientação para leitura complementar 57 Web links 57 Resumo Este capítulo apresenta a base históricosocial das relações internacionais ou RI O objetivo é enfatizar a realidade prática das relações internacionais em nossas vidas e associála ao seu estudo acadêmico Essa ligação é feita neste capítulo focando o principal tema histórico das RI os Estados soberanos modernos e as relações internacionais do sistema estatal Três tópicos centrais são discutidos o significado das relações in ternacionais na vida cotidiana e os principais valores providos pelos Estados a evolução histórica do sistema estatal e da economia mundial e o mundo contemporâneo de Es tados em transição Introdução às relações internacionais As relações internacionais na vida cotidiana RI é a abreviatura para o campo acadêmico das relações internacionais e estudálo é importante principalmente porque a população mundial está dividida em co munidades políticas territoriais distintas Estados independentes que influenciam profundamente o modo de vida de todas as pessoas Em conjunto estes Estados formam um sistema internacional de extensão global Atualmente há quase 200 Estados independentes A maioria das pessoas com poucas exceções não apenas vive como também é cidadã de pelo menos um desses países e muito raramente de mais de um deles Praticamente todos nós estamos ligados a um Estado parti cular e por meio deste nos conectamos ao sistema estatal que afeta nossas vidas de maneiras importantes mas que talvez nem tenhamos consciência Os Estados são independentes uns dos outros pelo menos legalmente eles têm soberania No entanto isso não significa que estejam isolados Pelo contrá rio se unem e se influenciam e portanto devem encontrar meios de coexistir e de lidar uns com os outros Ademais estão geralmente incorporados aos mer cados internacionais que geram efeitos sobre as políticas dos governos e sobre a riqueza e o bemestar de seus cidadãos Sendo assim o relacionamento entre Estados é necessário ou seja o isolamento total não é uma opção Quando um país é isolado e excluído do sistema estatal seja devido às ações do seu próprio governo ou de poderes externos o resultado geralmente é o sofrimen to da população local os exemplos mais recentes são Burma Líbia Coréia do Norte Iraque e Irã O sistema estatal é um sistema de relações sociais ou seja relacionamentos entre grupos de seres humanos Assim como na maioria dos outros sistemas sociais as relações internacionais apresentam vantagens e desvantagens para os participantes Em outras palavras RI foca a natureza e as conseqüências dessas interações O sistema estatal é um modo distinto de organizar a vida política mundial cuja origem histórica é bem antiga Já houve sistemas estatais ou semiestatais em diferentes épocas e locais por exemplo na antiga índia Grécia e na Itália renascentista Watson 1992 Contudo o tema das RI surgiu no início da Era Moderna séculos XVI e XVII na Europa quando os Estados soberanos funda mentados em territórios contíguos foram oríginariamente estabelecidos Desde o século XVIII as relações entre tais Estados independentes são chamadas de relações internacionais Nos séculos XIX e XX o sistema estatal foi ampliado Por que estudar RI 2 1 a fim de abranger todo o território global O mundo de Estados é basicamente um mundo territorial é uma forma de organizar politicamente as regiões po voadas do mundo um tipo diferenciado de estruturação política territorial com base em inúmeros governos distintos que são legalmente independentes uns dos outros Nesse sentido o único grande território que não é considerado um Estado é a Antártida administrada por uma associação de Estados Hoje RJ é o estudo do sistema global de Estados a partir de várias perspectivas acadêmicas sendo que as mais importantes serão discutidas no decorrer deste livro Quadro 11 Conceitoschave Soberania estatal qualidade do Estado de ser politicamente independente de todos os outros Estados Sistema estatal relações entre agrupamentos humanos organizados politicamente que ocupam ter ritórios distintos não estão subordinados a nenhum poder ou autoridade superior e desfrutam e exercem um certo grau de independência com relação aos outros Cinco regras básicas de um sistema estatal segurança liberdade ordem justiça e bemestar Principais abordagens tradicionais de RI realismo liberalismo sociedade internacional e EPI O dilema de segurança os Estados são tanto uma fonte de segurança quanto uma ameaça à segurança dos seres humanos Autoridade medieval um arranjo de autoridade política dispersa Autoridade do Estado moderno um arranjo de autoridade política centralizada Hegemonia poder e controle exercidos por um Estado proeminente sobre os outros Estados Balança de poder uma doutrina e um arranjo pelo qual o poder de um Estado ou grupo de Estados é controlado pelo poder compensatório de outros Estados Introdução às relações internacionais Para entender o significado das RI é necessário compreender ávida dentro de um Estado O que isso implica Qual sua importância Como devemos pen sar sobre isso Estas questões principalmente a última são a preocupação central deste livro Os capítulos seguintes tentam responder de várias formas a esta pergunta fundamental Este capítulo aborda o principal tema histórico das RI a evolução do sistema estatal e o mundo contemporâneo de Estados em transição É importante antes de começar a responder a estas questões avaliar nossa vida diária como cidadãos de Estados particulares e nossas expectativas quanto a isso Há no mínimo cinco valores sociais básicos que os Estados suposta mente devem defender segurança liberdade ordem justiça e bemestar Por serem tão fundamentais ao bemestar humano tais valores sociais precisam ser protegidos e garantidos É claro que outras organizações sociais além do Estado podem assumir tal responsabilidade como a família o clã ou as orga nizações étnicas ou religiosas Na Era Moderna contudo o Estado tem sido em geral a principal instituição a cumprir esta função e esperase que o próprio garanta estes valores básicos Por exemplo as pessoas costumam achar que o Estado deve financiar a segurança responsável pela proteção dos cidadãos com relação a ameaças internas e externas Esta é uma preocupação ou um interesse fundamental dos países No entanto a própria existência de Estados independentes afeta o valor da segurança vivemos em um mundo de muitos países quase todos minimamente armados Dessa forma os Estados tanto defendem como ameaçam a segurança das pessoas este paradoxo do sistema estatal é geralmente conhecido como o dilema de segurança Portanto assim corno qualquer outra organização humana os Estados apresentam problemas e soluções Apesar de a maioria dos países ter um comportamento amistoso não amea çador e pacífico alguns deles podem ser hostis e agressivos Nesse contexto com a ausência de um governo mundial para coagilos constituise um desafio básico e antigo para o sistema estatal a segurança nacional Conseqüentemen te para lidar com esta questão a maioria dos Estados possui Forças Armadas Por isso o poder militar é considerado uma condição essencial para que os Estados possam coexistir e se relacionar uns com os outros sem serem in timidados ou subjugados Um fato importante o qual não devemos nunca esquecer é que países desarmados são um fato raro na história do sistema estatal Com o objetivo de aumentar a segurança nacional muitos Estados Por que estudar RI 23 também optam por formar alianças Além disso para garantir que nenhuma grande potência consiga alcançar uma posição hegemônica de dominação total com base na intimidação na coerçao ou no uso absoluto da força é necessário construir e manter uma balança de poder militar A segurança é certamente um dos valores mais fundamentais das relações internacionais Essa abordagem para o estudo da política mundial é típica das teorias realistas das RI Morgenthau 1960 que partem do pressuposto de que as relações dos países podem ser melhor caracterizadas como um mundo no qual os Estados que possuem armas são rivais competidores e de tempos em tempos iniciam guerras in ter estatais O segundo valor básico cuja garantia é responsabilidade dos Estados é a li berdade tanto a pessoal quanto a nacional a independência Uma das razões fundamentais para a constituição dos Estados e para a sustentação dos encar gos instituídos por governos a seus cidadãos tais como impostos e o serviço militar obrigatório é a condição de liberdade nacional ou de independência que os Estados procuram sempre afirmar Não podemos ser livres a não ser que nosso país também seja isso esteve muito claro para os milhares de cidadãos tchecos poloneses dinamarqueses noruegueses belgas e holandeses assim como para os habitantes de outros países invadidos e ocupados pela Alema nha nazista durante a Segunda Guerra Mundial No entanto mesmo quando um país é livre sua população pode não ser mas pelo menos o problema da liberdade está nas próprias mãos dos cidadãos A guerra ameaça e algumas vezes destrói a liberdade A paz pelo contrário promove a liberdade tornando possível a mudança internacional progressiva e a criação de um mundo melhor A paz e a mudança progressiva estão certamente entre os valores mais funda mentais das relações internacionais Essa abordagem sobre a política mundial é típica das teorias liberais das RI Claude 1971 Opera a partir da suposição de que as relações internacionais podem ser melhor caracterizadas corno uni mundo no qual os Estados cooperam entre si com o objetivo de manter a paz e a liberdade além de buscar a mudança progressiva O terceiro e o quarto valores básicos sob responsabilidade dos Estados são a ordem e a justiça Para que os países possam coexistir e interagir com base na estabilidade na certeza e na previsibilidade é fundamental que tenham o interesse comum no estabelecimento e na manutenção da ordem internacional Para isso é obrigatório defender o direito internacional manter compromissos com tratados e cumprir as regras convenções e hábitos da ordem legal inter Introdução às relações internacionais nacional Além disso esperase que aceitem práticas diplomáticas e apoiem as organizações internacionais O direito internacional as relações diplomáticas e as organizações internacionais só podem existir e operar de modo bemsucedi do caso estas expectativas sejam em geral cumpridas pela maioria dos Estados durante a maior parte do tempo Outro dever dos países é defender os direitos humanos Hoje já existe uma estrutura legal internacional de direitos humanos direitos civis políticos sociais e econômicos desenvolvidos desde o término da Segunda Guerra Mundial Certamente a ordem e a justiça estão entre os valores mais fundamentais das relações internacionais Esta abordagem com relação ao estudo da política mundial é típica das teorias da Sociedade Inter nacional das RI Buli 1995 De acordo com esta linha de raciocínio as relações internacionais podem ser melhor caracterizadas como um mundo no qual os Estados são atores socialmente responsáveis e compartilham o interesse de preservar a ordem internacional e promover a justiça internacional O último valor básico que se espera que os Estados defendam é a riqueza e o bemestar socioeconômico da população Os cidadãos acreditam que o seu governo deva adotar políticas apropriadas a fim de incentivar um alto índice de emprego baixa inflação investimento constante fluxo ininterrupto de comér cio e assim por diante Uma vez que as economias nacionais raramente estão isoladas umas das outras a maioria das pessoas também espera que seu país atue no ambiente econômico internacional de forma a elevar ou no mínimo defender e manter o padrão de vida nacional Hoje os Estados investem no planejamento e na implementação de políticas econômicas capazes de manter a estabilidade da economia internacional que é essencial para todos Em geral esse processo envolve políticas econômicas que possam lidar de modo adequado com os mercados internacionais com a política econômica de outros Estados com o investimento externo com as taxas de câmbio com o comércio internacional com a comunicação e com o transporte internacional e outras relações econômicas internacionais que afetam a riqueza e o bemestar nacionais A interdependência econômica o alto grau de dependência econômica mútua entre os países é uma caracterís tica impressionante do sistema estatal contemporâneo Por um lado algumas pessoas consideram tal situação positiva uma vez que a expansão do mercado global pode gerar um aumento da liberdade e da riqueza por meio de mais distribuição especialização eficiência e produtividade Já outros teóricos en tendem a interdependência econômica como algo negativo porque promove Por que estudar RI a desigualdade ao permitir que países ricos e poderosos ou com vantagens financeiras eou tecnológicas dominem países pobres e fracos que não detêm tais vantagens Mas independentemente dessa discussão a riqueza e o bem estar estão entre os valores mais fundamentais das relações internacionais Essa abordagem da política mundial é típica das teorias de EPI economia política internacional Gilpin 1987 Para os defensores dessa corrente de pensamento as relações internacionais podem ser melhor caracterizadas como um mundo fundamentalmente socioeconômico e não simplesmente político e militar A maioria das pessoas parte do pressuposto de que os valores básicos segu rança liberdade ordem justiça e bemestar são naturais e só se conscientizam que algo está errado por exemplo durante uma guerra ou uma depressão quando os Estados individuais perdem o controle da situação Nessas oca siões as pessoas despertam para circunstâncias mais complexas de suas vidas que no diaadia não são percebidas ou ficam em segundo plano ou seja tendem a se conscientizar dos aspectos considerados naturais e da importância destes valores em suas vidas diárias Por exemplo atentamos à segurança na cional quando um poder externo se arma para a guerra ou age de modo hostil contra o nosso país ou um de nossos aliados Em relação à independência nacional e à nossa liberdade como cidadãos nos conscientizamos quando a Quadro 12 Valores e teorias das RI ENFOQUES TEORIAS Segurança Realismo política de poder conflito e guerra Liberdade Liberalismo cooperação paz e progresso Ordem e justiça Sociedade internacional interesses compartilhados regras e instituições Bemestar Teorias de EPI riqueza pobreza igualdade 6 Introdução às relações internacionais paz não é mais garantida Já no que se refere à justiça e à ordem internacional nos tornamos cientes quando alguns Estados principalmente os grandes po deres abusam exploram condenam ou desrespeitam o direito internacional ou os direitos humanos Por fim nos conscientizamos do bemestar nacio nal e do nosso próprio bemestar socioeconômico quando países estrangeiros ou investidores internacionais com base em sua influência econômica preju dicam nosso padrão de vida Durante o século XX houve momentos significativos de expansão da consciência com relação aos principais valores sociais A Primeira Guerra Mundial deixou terrivelmente claro para a maioria das pessoas a capacida de do conflito armado mecanizado moderno entre os grandes poderes de destruir as vidas e as condições de sobrevivência de modo devastador e como é importante reduzir o risco de uma guerra como esta A partir deste reco nhecimento emergiram os primeiros passos significativos no pensamento das RI com foco nas instituições legais efetivas por exemplo a Liga das Nações a fim de impedir a guerra entre grandes potências Já a Grande Depressão demonstrou para a população mundial como os meios econômi cos de vida poderiam ser afetados de modo adverso até mesmo destruídos por meio de condições específicas de mercado não só internas mas também internacionais A Segunda Guerra Mundial não apenas enfatizou a reali dade dos perigos da guerra entre grandes poderes como revelou também a importância de se impedir qualquer potência de escapar do controle assim como a imprudência de seguir uma política de apaziguamento adotada pela GrãBretanha e pela França em relação à Alemanha nazista um pouco antes da guerra e que provocou conseqüências desastrosas para todos in clusive ao povo alemão Após a Segunda Guerra Mundial verificamos também outros momentos de expansão da consciência no que diz respeito à importância fundamental desses valores A crise dos mísseis cubanos de 1962 por exemplo esclareceu os perigos da guerra nuclear para muitas pessoas Os movimentos antico loniais na Ásia e na África dos anos 1950 e 60 e os movimentos dissidentes nas antigas União Soviética e Iugoslávia no final da Guerra Fria demonstra ram claramente quanto a autodeterminação e a independência política ainda eram relevantes Já a inflação global da década de 1970 e do início dos anos 1980 causada por um aumento súbito e dramático nos preços do petróleo pelo cartel da Opep formado por países exportadores de petróleo relembrou Por que estudar RI 27 quanto as interconexões da economia global podem ameaçar o bemestar nacional e pessoal em qualquer lugar do mundo No caso do choque do petróleo de 1970 ficou nítido para inúmeros motoristas norteamericanos europeus e japoneses entre outros que as políticas econômicas do Orien te Médio e de outros importantes países produtores de petróleo têm o poder de aumentar o preço da gasolina ou do petróleo reduzindo seus padrões de vida A Guerra do Golfo 19901 e os conflitos nos Bálcãs em particular na Bósnia 19925 e no Kosovo 1999 foram uma lembrança da importância da ordem internacional e do respeito pelos direitos humanos Em 2001 os ataques a Nova York e Washington despertaram a atenção da população norteamericana e de outros países com relação aos perigos do terrorismo internacional Durante muito tempo acreditouse que a vida dentro de Estados adequada mente organizados e bem administrados é melhor do que a vida fora deles ou na sua ausência O povo judeu por exemplo se dedicou mais de meio século à busca do estabelecimento de um Estado próprio onde estivessem seguros Israel Esse raciocínio prevalecerá enquanto os Estados e o sistema estatal con seguirem conservar esses valores centrais Esse em geral tem sido o caso dos países desenvolvidos especialmente os da Europa ocidental da América do Norte do Japão da Austrália da Nova Zelândia e de alguns outros Com base nesse cenário surgem as teorias convencionais das RI que consideram o sis tema estatal uma valiosa instituição da vida moderna Neste livro as teorias tradicionais das RI apresentadas tendem a adotar esse ponto de vista positivo Reconhecem o significado dos valores básicos apesar de discordarem com re lação à hierarquia deles os realistas por exemplo enfatizam a importância da segurança e da ordem os liberais da liberdade e da justiça e os acadêmicos de EPI a igualdade econômica e o bemestar Mas se os Estados não forem bemsucedidos nesse aspecto o sistema es tatal pode ser facilmente entendido na ótica oposta enfraquecendo em vez de sustentar os valores e as condições sociais básicas Este é o caso de alguns Estados que emergiram do colapso da União Soviética e da Iugoslávia no fim da Guerra Fria Muitos deles falham mais ou menos ao tentar proporcionar ou proteger um padrão mínimo dos cinco valores básicos discutidos anterior mente e uma quantidade menor de Estados não consegue assegurar nenhum deles A situação de vida degradada de inúmeros homens mulheres e crianças nesses países coloca em questão a credibilidade e às vezes até mesmo a legi Introdução às relações internacionais timidade do sistema estatal Esse contexto estimula o argumento de que o sistema internacional promove ou no mínimo tolera o sofrimento humano e sendo assim devese mudálo para que as pessoas em todo o mundo não apenas nos países desenvolvidos possam levar à frente os seus afazeres da vida Essa é a base de teorias de RI mais críticas que consideram o Estado e o sistema estatal uma instituição menos benéfica e mais problemática Neste livro discutiremos as teorias alternativas de RI que tendem a adotar essa visão crítica Para resumir os Estados e o sistema estatal são organizações sociais ba seadas em territórios cuja principal responsabilidade é estabelecer manter e defender valores e condições sociais básicas como a segurança a liberdade a ordem a justiça e o bemestar Essas são as principais razões de sua existência Muitos Estados e certamente todos os países desenvolvidos defendem essas condições e valores pelo menos nos padrões mínimos e muitas vezes em um nível superior Na verdade o dever foi cumprido nos últimos séculos de modo tão bemsucedido que os padrões aumentaram e hoje são mais altos do que nunca Esses países estabeleceram o padrão internacional para todo o mundo No entanto muitos Estados e a maioria dos países subdesenvolvidos ainda não conseguiram cumprir os padrões mínimos e conseqüentemente sua presença no sistema estatal contemporâneo levanta sérias questões não somente sobre estes países mas também sobre o sistema estatal do qual são parte importante Tal situação provocou um debate em RI entre os teóricos tradicionais que aceitam o sistema estatal existente e teóricos radicais que o rejeitam Quadro 13 Pontos de vista do Estado VISÃO TRADICIONAL VISÃO ALTERNATIVA Estados são instituições valiosas Estados e o sistema estatal criam proporcionam segurança liberdade mais problemas do que resolvem ordem justiça e bemestar As pessoas se beneficiam do sistema A maior parte da população mun estatal dial sofre mais que se beneficia do sistema de Estados Por que estudar RI 29 Breve descrição histórica do sistema de Estados Uma vez que os Estados e o sistema estatal são características tão básicas da vida política moderna assumimos com facilidade que são aspectos permanentes sempre estiveram presentes e sempre estarão No entanto esta premissa é falsa E importante enfatizar que o sistema estatal é uma instituição histórica ou seja não foi determinado por Deus nem pela natureza mas configurado por algumas pessoas em uma determinada época é uma organização social Sendo assim como todas as organizações sociais o sistema estatal apresenta vantagens e desvantagens que mudam com o passar do tempo Apesar de a existência humana não depender do sistema de Estados sua estrutura oferece uma série de benefícios que geram altos padrões de vida Nem sempre a população mundial viveu em Estados soberanos Ao longo da maior parte da história humana as pessoas organizaram suas vidas políticas de formas diferentes sendo que o mais comum foi o império político como o romano Nesse sentido no futuro talvez o mundo não esteja estruturado de acordo com um sistema estatal é possível que as pessoas desistam do Estado soberano abandonandoo da mesma maneira que fizeram com muitas outras formas de organização da vida política como as cidadesEstado o feudalismo e o colonialismo entre outros Portanto não é absurdo supor que os Estados e o sistema estatal possam ser finalmente substituídos por um meio melhor e mais avançado de organização da política global Alguns acadêmicos de RI que serão discutidos nos próximos capítulos acreditam que uma certa transformação internacional associada à interdependência entre os Estados a globalização já está em andamento Mas desde um longo tempo o sistema estatal tem sido uma instituição central da política mundial e ainda permanece assim É cer to que a política mundial está em constante mudança e que no passado os Estados e o sistema estatal sempre conseguiram se adaptar às transformações históricas significativas Mas ninguém é capaz de afirmar que o cenário no fu turo continuará o mesmo de hoje As questões sobre o presente e as possíveis mudanças no âmbito internacional serão discutidas no final do capítulo Antes do século XVI quando os Estados começaram a ser instituídos na Europa ocidental eles não eram reconhecidamente soberanos Mas durante os últimos três ou quatro séculos os Estados e o sistema estatal estruturaram as vidas políticas de um número cada vez maior de pessoas em todo o mundo Introdução às relações internacionais tornandose assim universalmente populares Atualmente é possível afirmar que o sistema é global em extensão A era do Estado soberano coincide com a época moderna na qual verificamos a expansão do poder da prosperidade do conhecimento da ciência da tecnologia da alfabetizaçào da urbanização da cidadania da liberdade da igualdade dos direitos etc Se lembrarmos da importância dos Estados e do sistema estatal na configuração dos cinco valores humanos fundamentais discutidos anteriormente perceberemos que é muito provável que isso não seja uma coincidência Fica apenas difícil determinar se eles foram o efeito ou a causa da vida moderna e se terão uma posição na era pósmoderna Estas questões devem ser analisadas mais adiante No entanto sabemos que o sistema estatal e a modernidade estão historica mente ligados De fato coexistem o sistema de junção de Estados territoriais começou a ser estabelecido na Europa no início da Era Moderna E desde en tão o sistema estatal tem sido uma característica central se não determinante da modernidade Embora o Estado soberano tenha surgido na Europa também foi adotado na América do Norte no final do século XVIII e na América do Sul no começo do século XIX em seguida difundiuse pelo mundo em paralelo à própria modernidade E aos poucos a estrutura do Estado sobetano influen ciou todo o mundo A África subsaariana por exemplo permaneceu isolada do sistema estatal ocidental em expansão até o final do século XIX e só constituiu um sistema estatal regional independente após a metade do século XX Nesse contexto uma questão importante é se o término da modernidade determinará também o término do sistema estatal mas discutiremos isso mais adiante Certamente há evidências de sistemas políticos similares aos Estados so beranos bem antes da Era Moderna que muito provavelmente mantinham relações entre si A origem histórica das relações internacionais nesse sentido mais geral é muito antiga e por isso é apenas possível se especular acerca do tema Mas conceitualmente o início das interações entre as organizações po líticas coincide com um período no qual as pessoas começaram a se estabelecer nas terras formando comunidades políticas distintas de base territorial Os primeiros exemplos têm mais de 5 mil anos Nessa época cada grupo político enfrentava o problema inevitável de coe xistir com grupos vizinhos que em função da proximidade não poderiam ser ignorados nem evitados Cada agrupamento político também precisava lidar com grupos que embora afastados eram capazes de afetálos Tal proximida de geográfica deve ter sido considerada uma zona de proximidade política se Por que estudar Ri 3 1 não uma fronteira ou algum cipó de limite Provavelmente o contato entre esses grupos envolveu certas rivalidades disputas ameaças intimidações in tervenções invasões conquistas além de outras interações hostis ou bélicas Mas certamente em alguns momentos talvez em sua maioria prevaleceu o respeito mútuo a cooperação o comércio a conciliação o diálogo e as relações pacíficas e amigáveis Uma forma muito relevante de diálogo entre comunida des políticas autônomas a diplomacia também tem origens antigas há acordos formais registrados entre grupos políticos em 1390 aC e evidências de atividade semidiplomática já em 653 aC Barber 1979 89 Nesse sentido verificamos aqui o protótipo do problema clássico de RJ a guerra e a paz o conflito e a cooperação Além dos diferentes aspectos das relações internacionais enfatizados pelo realismo e pelo liberalismo O relacionamento entre grupos políticos independentes constitui o pro blema essencial das relações internacionais formadas com base na distinção fundamental entre as próprias identidades individuais e a dos outros em um mundo territorial composto por muitas identidades coletivas em contato cons tante Com isso chegamos a uma definição preliminar de sistema estatal definido pelas relações entre agrupamentos humanos organizados politicamente em territórios distintos e que não estão sujeitos a nenhum poder ou autoridade superior desfrutando e exercendo uma certa independência entre eles Por fim as relações internacionais são as interações entre tais grupos independentes A primeira demonstração histórica relativamente clara de um sistema esta tal é a Grécia antiga 500 aC 100 aC conhecida então como Hélade que abrangia um grande número de cidadesEstado Wight 1977 Watson 1992 A Grécia antiga não era um Estadonação como o atual mas mais especifi camente um sistema de cidadesEstado Atenas era a maior e mais famosa porém também havia muitas outras cidadesEstado como Esparta e Corinto que reunidas formaram o primeiro sistema estatal da história ocidental Apesar de haver relações extensas e elaboradas entre as cidadesEstado de Hélade os antigos agrupamentos políticos gregos não eram Estados soberanos moder nos com amplos territórios Comparada à maioria dos Estados modernos a cidadeEstado grega tinha urna população e um território menores as relações interurbanas também não contavam com uma diplomacia estabelecida e não havia nada similar ao direito internacional e às organizações internacionais O sistema estatal de Hélade tinha por base acima de tudo uma linguagem e uma religião comuns Introdução às relações internacionais O antigo sistema estatal grego foi finalmente destruído por impérios vizi nhos mais poderosos e sua população foi transformada em súditos do Império Romano 200 aC 500 dC A medida que conquistavam ocupavam e go vernavam a maioria da Europa e grande parte do Oriente Médio e do norte da África os romanos desenvolveram um império enorme Entretanto em vez de reconhecer as inúmeras comunidades políticas habitantes destas áreas o Império Romano as subordinou Em detrimento das relações internacionais ou semiinternacionais a única opção para as comunidades políticas naquele momento era a submissão a Roma ou a revolta Com o tempo essas comuni dades localizadas na periferia do império começaram a se manifestar como o exército romano não era capaz de conter as rebeliões começou a se retirar e em diversas ocasiões a própria cidade de Roma foi invadida e destruída pelas tribos bárbaras Desse modo o Império Romano finalmente chegou ao fim após muitos séculos de sobrevivência e sucesso político Logo depois da queda do poder romano o império originado na Europa cristã estabeleceuse como organização política predominante desenvolven dose gradualmente durante vários séculos Os dois principais sucessores de Roma na Europa também foram impérios o império católico medieval si tuado em Roma cristandade na Europa ocidental e o Império Bizantino ortodoxo em Constantinopla ou no que hoje é Istambul Bizâncío na Europa oriental e no Oriente Próximo Bizâncio afirmava ser a continuação do Império Romano cristianizado O mundo cristão medieval europeu 500 WGmOMPj6A Quadro 14 O Império Romano Roma emergiu como uma cidadeEstado na Itália central Durante vários sécu los a cidade ampliou sua autoridade e adaptou seus métodos de governo para atrair primeiro a Itália em seguida o Mediterrâneo ocidental e finalmente quase todo o mundo helenístico para um império maior do que qualquer outro já exis tente nesta área Esse feito único e surpreendente somado à transformação cultural ocasionada estabeleceu as fundações da civilização européia Roma ajudou a configurar a opinião e a prática contemporânea e européia sobre o Estado o direito internacional e especialmente o império e a natureza da auto ridade imperial Watson199294 BWKMíKMWa Por que estudar RI 33 1500 foí então dividido geograficamente durante a maior parte do tempo em dois impérios políticoreligiosos Além desses havia outros sistemas po líticos e impérios ainda mais distantes A África do Norte e o Oriente Médio faziam parte de um mundo de civilização islâmica originado na penínsu la árabe nos primeiros anos do século VII Havia também impérios onde hoje é o Irã e a índia O chinês foi o mais antigo dentre os que sobrevive ram e viveu sob dinastias diferentes por aproximadamente 4 mil anos antes do início do século XX Inclusive é possível que ainda exista mas na forma do Estado comunista chinês o qual se assemelha a um império em sua estrutura ideológica e hierarquia política Sendo assim a Idade Média chama atenção por ter sido a era do império e de relações e conflitos entre agrupamentos políticos diferentes Mas o contato entre os impérios era na melhor das hipóteses intermitente a comunicação era lenta e o transporte difícil Con seqüentemente a maioria destas organizações nesta época formava um mundo centrado em si mesmo Podemos falar sobre relações internacionais na Europa ocidental durante a Era Medieval Sim mas com dificuldade porque como já demonstrado a cristandade medieval funcionava mais como um império do que um sistema estatal Embora os Estados existissem não eram independentes nem sobera nos de acordo com o sentido moderno destas palavras Não havia territórios claramente definidos com fronteiras Em suma o mundo medieval não era uma colcha de retalhos geográfica com países distintos representados por co Quadro 15 CidadesEstado e impérios 500 aC 100 aC CidadesEstado gregas 200 aC 500 dC Império Romano 500 1500 Cristandade catól ica Mundo cristão medieval O papa em Roma Cristandade ortodoxa Império Bizantino Constantinopla Outros impérios históricos Islâmico Irã índia China 34 Introdução às relações internacionais rés diferentes mas uma mistura complicada e confusa composta por formas e matizes variados O poder e a autoridade eram organizados sob bases religiosa e política o papa e o imperador eram os líderes de duas hierarquias paralelas e conectadas uma religiosa e outra política Reis e outros governantes não eram completamente independentes e estavam subordinados a estas autoridades superiores e às suas leis E na maioria dos casos os governantes locais tinham certa liberdade com relação ao governo dos reis eram semiautônomos mas não totalmente independentes O fato é que a independência política territo rial conhecida hoje não estava presente na Europa medieval Quadro 16 A comunidade cristã da Europa medieval HIERARQUIA RELIGIOSA HIERARQUIA POLÍTICA Papa t 4 Imperador Arcebispos bispos e outros sacerdotes Padres e outros governantes comuns Cristãos comuns Reis e outros governantes locais semiindependentes Barões e outros governantes locais semiindependentes Pessoas comuns de inúmeras comunidades locais Sabese também que a Era Medieval foi marcada por desordem tumul to conflito e violência cuja origem acreditase é a falta de linhas claras de controle e organização política territorial As guerras ora eram travadas entre civilizações religiosas por exemplo as cruzadas cristãs contra o mundo is lâmico 10961291 ora eram travadas entre reis a Guerra dos Cem Anos entre Inglaterra e França 13371453 No entanto a guerra mais freqüente era feudal local e entre grupos rivais de cavaleiros cujos líderes apresenta vam alguma rixa A autoridade e o poder de se engajar em batalhas não eram Por que estudar RI 3 5 monopolizados pelo Estado diferentemente do que aconteceu mais tarde os reis não eram capazes de controlar os confrontos Nesse primeiro mo mento os direitos e capacidades de fazer a guerra pertenciam aos membros de uma casta distinta os cavaleiros armados e seus líderes e seguidores que combatiam ora em defesa do papa ora do imperador às vezes pelo rei outras por seus governantes e de forma mais regular por eles mesmos Não havia uma distinção clara entre guerra civil e internacional As guerras me dievais eram motivadas principalmente por questões relativas a acertos e erros lutas com o objetivo de defender a fé resolver conflitos sobre herança dinástica punir criminosos ou cobrar impostos entre outras Howard 1976 cl Diferente dos conflitos civis tais guerras raramente estavam associa das às disputas com relação ao controle exclusivo do território ou sobre o Estado ou aos interesses nacionais Na Europa medieval não havia nenhum território com controle exclusivo e nenhuma concepção clara da nação ou do interesse nacional Os valores ligados à condição de Estado soberano foram organizados de maneira diferente nos tempos medievais uma vez que nenhuma organização política tal como o Estado moderno satisfazia a todos estes atributos Em detrimento disso os valores eram administrados por estruturas distintas que operavam em diversos níveis da vida social A segurança por exemplo era pro vida pelos governantes locais e pelos cavaleiros que operavam em castelos e cidades fortificadas A liberdade não era um direito do indivíduo ou da nação mas dos governantes feudais e de seus seguidores e clientes A ordem era res ponsabilidade do imperador embora sua capacidade de imposição fosse bem limitada resultando em uma Europa medieval marcada pela turbulência e pela discórdia em todos os níveis da sociedade Os governantes políticos e líderes religiosos eram responsáveis por garantir a justiça apesar de esta ser bastante desigual aqueles que ocupavam alta posição nas hierarquias política e religiosa tinham acesso mais fácil à justiça do que o resto da população e as cortes varia vam em função da classe social Por não haver polícia a justiça freqüentemente era feita pelas próprias pessoas por meio de vinganças ou represálias O papa além de ser responsável por governar a Igreja por meio de uma hierarquia de bispos e de outros sacerdotes fiscalizava as disputas políticas entre reis e outros governantes nacionais serniindependentes Ademais membros do sacerdócio desempenhavam muitas vezes o papel de consultor mais experiente de reis e de outros governantes seculares Os reis por sua vez assumiam a função de 36 Introdução às relações internacionais defensores da fé como Henrique VIII da Inglaterra e os cavaleiros se consideravam os soldados cristãos O bemestar era associado à segurança e tinha por base laços feudais entre governantes locais e pessoas comuns que recebiam proteção em troca de uma parte do trabalho da colheita e de outros recursos e produtos derivados da economia camponesa local Além disso a moradia dos camponeses em vez de ser fruto de sua livre escolha estava ligada a proprietários feudais que poderiam ser membros da nobreza do sacerdócio ou de ambos No que consiste basicamente a mudança política do período medieval para o moderno A resposta simples é a transformação consolidou a provisão desses valores dentro da estrutura única de uma organização social indepen dente e unificada o Estado soberano No início da Era Moderna européia os governantes se emanciparam da autoridade políticoreligiosa dominan te da cristandade e se libertaram de sua dependência com relação ao poder militar dos barões e de outros líderes feudais locais A partir de então os barões passaram a se subordinar aos reis que se tornaram capazes de desafiar o imperador e o papa e conseqüentemente de defender o Estado soberano contra a desordem interna e a ameaça externa Já os camponeses começaram sua longa jornada em busca da independência com relação aos governantes locais feudais a fim de se tornarem súditos diretos do rei e finalmente se transformarem no povo Em suma o poder e a autoridade estavam concentrados em um único pon to o rei e seu governo O rei passou a governar um território cujas fronteiras eram defendidas contra a interferência externa Assumiu também a autorida de suprema acima de toda a população do país e não precisava mais agir por intermédio de governantes e de lideranças intermediárias Essa transformação política fundamental marca o advento da Era Moderna Um dos principais efeitos da ascensão do Estado moderno foi seu mono pólio sobre os meios de operação militar O rei primeiro estabeleceu a ordem interna e em seguida se tornou o único centro do poder dentro do país Cavaleiros e barões que em tempos passados controlavam os seus próprios exércitos passaram a obedecer às ordens do rei Assim muitos monarcas decidiram investir na expansão de seus territórios estimulando conseqüen temente o desenvolvimento de rivalidades internacionais que muitas vezes resultaram em guerras e na ampliação de alguns países à custa de outros Freqüentemente Espanha França Áustria Inglaterra Dinamarca Suécia Por que estudar RI 3 7 Quadro 17 Autoridade medieval e moderna AUTORIDADE MEDIEVAL DISPERSA AUTORIDADE MODERNA CENTRALIZADA sem soberania soberania Papa Imperador Governo Rei Arcebispo Barão Bispo Padre Cavaleiro Povo Povo Holanda Polônia Rússia Prússia e outros Estados do novo sistema estatal europeu estavam em guerra Algumas foram geradas pela Reforma Protestan te que dividiu profundamente a população cristã européia nos séculos XVI e XVII mas os conflitos eram cada vez mais provocados pela mera existência de Estados independentes cujos governantes recorriam à guerra como um meio de defender seus interesses realizar suas ambições e se possível de expandir suas posses territoriais Nesse sentido a guerra se tornou uma instituição internacional de peso para a resolução de desavenças entre os Estados sobe ranos Sendo assim a mudança política do período medieval para o moderno envolveu basicamente a construção do Estado territorial independente O Estado conquistou território e o transformou em propriedade estatal defi nindo a população da região como súditos e mais tarde como cidadãos Na maioria dos países as igrejas cristãs também passaram a ser controladas pelo governo estatal Claramente não havia espaço dentro dos Estados modernos para a existência de instituições povos ou territórios semiindependentes No sistema internacional moderno o território é consolidado unificado e 3o Introdução às relações internacionais centralizado sob um governo soberano A população estatal por sua vez é leal ao próprio governo e tem a obrigação de obedecer a suas leis este gru po de pessoas inclui bispos assim como barões comerciantes e aristocratas Ou seja todas as organizações a partir da implementação do sistema de Estados modernos passaram a ser subordinadas à autoridade estatal e à lei pública E a origem do familiar mapa do mundo em formato de colcha de retalhos em que cada área de trabalho está sob a jurisdição exclusiva de um Estado particular Todo o território da Europa é dividido desta forma por meio de governos independentes e com o tempo todo o planeta será O entroncamento do final histórico da Era Medieval e do ponto de partida do sistema internacional moderno é freqüentemente identificado com a Guerra dos Trinta Anos 161848 e com a Paz de Vestfália acordo responsável pelo término do conflito Quadro 18 A Guerra dos Trinta Anos 161848 Iniciada como uma revolta da aristocracia protestante contra a autoridade espa nhola na Boêmia a guerra intensificouse rapidamente e com o tempo incluiu todos os tipos de questões Questões de tolerância religiosa estavam na base do conflito Mas já em 1630 a guerra envolvia um emaranhado de interesses conflitantes incluindo os de caráter dinástico religioso e estatal A Europa lutava sua primeira guerra continental Holsti 1991268 Desde a metade do século XVII os Estados eram considerados os únicos sis temas políticos legítimos europeus com base nos próprios territórios distintos nos governos independentes e nos próprios súditos políticos As muitas carac terísticas proeminentes desse sistema estatal emergente podem ser resumidas Primeiramente consistia de Estados contíguos cuja legitimidade e indepen dência foram mutualmente reconhecidas Em segundo este reconhecimento dos Estados não se estendeu além das fronteiras do sistema estatal europeu as organizações excluídas eram vistas em geral como inferiores politicamente e a maioria delas com o tempo foi subordinada ao governo imperial da Europa Em Por que estudar RI 3 9 Quadro 19 A Paz de Vestfália 1648 O acordo vestfaliano legitimou uma comunidade de Estados soberanos Marcou o triunfo do stato o Estado no controle de suas questões internas e na indepen dência externa Essa era a aspiração de príncipes governantes em geral e em especial dos príncipes germânicos ambos protestantes e católicos em relação ao império Sagrado Romano ou Habsburgo Os tratados de Vestfália estabeleceram muitas regras e princípios políticos da nova sociedade de Estados O acordo foi promovido para gerar um estatuto abrangente de toda a Europa Watson1992 186 terceiro as relações entre os Estados europeus estavam sujeitas ao direito inter nacional e às práticas diplomáticas portanto a expectativa era de que os países cumprissem as regras do jogo Por fim havia uma balança de poder entre os Estados membros cujo objetivo era impedir qualquer Estado de romper o con trole e competir pela hegemonia que reestabeleceria na verdade um império sobre o continente Várias potências tentaram impor sua hegemonia política ao continente O Império Habsburgo Áustria arriscou durante a Guerra dos Trinta Anos 161848 mas foi impedido pela coalizão liderada pela França e pela Sué cia Já a tentativa francesa ocorreu sob o regime do rei Luís XIV 16611714 porém falhou por causa da aliança angloholandesa Napoleão 17951815 também tentou mas não conseguiu vencer a GrãBretanha a Rússia a Prússia e a Áustria Em seguida a instauração da balança de poder pósnapoleônica entre os grandes poderes o Concerto da Europa foi sustentada durante a maior parte do período entre 1815 e 1914 A Alemanha por sua vez investiu sob a liderança de Hitler 193945 mas foi derrotada pelos Estados Unidos a União Soviética e a GrãBretanha Portanto durante os últimos 350 anos o sistema estatal europeu conseguiu resistir à principal tendência política da história mundial o ataque realizado por grandes poderes a fim de submeter os mais fracos a sua vontade política e assim restabelecer um império Até o momento de elaboração deste livro ainda não se sabia se a única superpotên cia remanescente da Guerra Fria os Estados Unidos se tornaria um hegemon global 40 Introdução às relações internacionais O sistema estatal global e a economia mundial No entanto na mesma época em que os Estados europeus resistiam ao império na Europa eles construíram vastos impérios no exterior e uma economia mundial por meio da qual controlavam a maioria das comunidades políticas nãoeuropéias localizadas no resto do mundo Ou seja os Estados ocidentais que foram incapazes de dominar uns aos outros conseguiram controlar a maior parte do resto do mundo tanto política como economicamente Tal monitoramento dos tetritórios nâoeuropeus começou no início da antiga Era Moderna no século XVI portanto a mesma época em que o sistema europeu estatal entrou em vigor O controle das organizações políticas externas pelos Estados europeus só terminou na metade do século XX quando os últimos povos nãoeuropeus finalmente se livraram do colonialismo ocidental e adquiriram independência política Vale ressaltar que o fato de os Estados oci dentais nunca terem sido bemsucedidos nas tentativas de dominar uns aos outros mas conseguirem governar a maioria dos outros é muito importante na configuração do sistema internacional moderno A supremacia e a ascendência global do Ocidente são cruciais para entender as RI inclusive nos dias atuais A história da Europa moderna é composta de conflitos econômicos e polí ticos e de guerras entre seus Estados soberanos Os Estados fazem a guerra e a guerra fez e desfez os Estados Tilly 1992 Entretanto as rivalidades de Estado européias não estiveram concentradas apenas na Europa mas onde quer que o poder e as ambições européias pudessem ser projetados com o tempo todo o mundo foi impactado Os Estados europeus entravam em competição uns com os outros para invadir e controlar áreas economicamente desejáveis e militarmente úteis localizadas em outras partes do mundo Para os Estados europeus isso era natural fazia parte do seu direito a idéia de que os povos nàoeuropeus também tinham direito à independência e à autodeterminação só surgiu mais tarde Enormes populações e territórios nãoeuropeus conse qüentemente foram subordinados ao controle dos Estados europeus seja por meio da conquista militar do domínio comercial ou da anexação política A expansão do império ocidental tornou possível pela primeira vez a for mação e o funcionamento de uma economia Parry 1966 e de uma política globais Buli e Watson 1984 Não à toa a ampliação do comércio entre o mun do ocidental e o nãoocidental começou aproximadamente na mesma época Por que estudar RI 41 em que surgiu o Estado moderno na Europa em torno de 1500 Utilizando barcos com munições pesadas e de longa distância usados tanto para trans portar mercadorias quanto para projetar poder político e militar os países europeus ampliaram seu poder para além da Europa Os continentes america nos foram aos poucos atraídos para o sistema de comércio mundial por meio da extração da prata e de outros metais preciosos do comércio de peles e da produção de bens agrícolas realizado em geral em grandes plantações com o uso da mãodeobra escrava Neste mesmo momento o Sudeste da Ásia e em seguida as partes continentais do Sul e do Sudeste da Ásia se encontraram sob o controle e a colonização européia Enquanto os espanhóis os portugueses os holandeses os ingleses e os franceses expandiram seus impérios no exterior os russos seguiram por via terrestre Já no final do século XVIII o império russo com base no comércio de peles se ampliou da Sibéria para o Alasca e para baixo na costa oeste da América do Norte até o Norte da Califórnia Os poderes ocidentais também forçaram a abertura do comércio chinês e japonês embora nenhum dos países fosse colonizado politicamente Grandes territórios do mundo nãoeuropeu foram estabelecidos pelos europeus e mais tarde se tomaram Estados membros independentes do sistema estatal sob o controle da própria população de colonizadores os Estados Unidos os Estados da América Latina o Canadá a Austrália a Nova Zelândia e por um longo tempo a África do Sul O Oriente Médio e a África tropical foram os últimos continentes a serem colonizados pelos europeus Para esclarecer o sistema estatal durante a era do imperialismo político e econômico dos Estados europeus é preciso antes lembrar de algumas questões fundamentais Primeiro os Estados europeus fizeram acordos convenientes com sistemas políticos europeus corno as alianças organizadas pelos bri tânicos e pelos franceses com diferentes tribos de índios isto é nações da América do Norte Em seguida os Estados europeus onde puderam conquis taram e colonizaram os sistemas políticos nãoocidentais e os subordinaram aos seus impérios Um terceiro ponto é o fato de aqueles amplos impérios terem se tornado uma fonte básica de riqueza e de poder dos Estados europeus du rante muitos séculos Isso justifica o fato de o desenvolvimento da Europa ter sido alcançado principalmente com base no controle de extensos territórios nãoeuropeus e por meio da exploração de seus recursos humanos e naturais Em quarto algumas dessas colônias no exterior passaram a ser controladas por populações colonízadoras européias e muitos destes novos Estados coloniza Introdução às relações internacionais dores com o tempo foram aceitos como membros do sistema estatal europeu Esse processo começou no século XVIII com o sucesso da revolução americana contra o Império Britânico que desencadeou a transição de um sistema estatal europeu para um sistema estatal ocidental Finalmente ao longo de toda a era do imperialismo vestfaliano do século XVI até o início do século XX não houve interesse nem vontade de incorporar sistemas políticos nãoocidentais ao sistema estatal com base na igualdade de soberania Só depois da Segunda Guerra Mundial isso passou a ocorrer em uma escala maior Quadro 110 Presidente McKinley sobre o imperialismo norteameri cano nas Filipinas 1899 Quando percebi que as Filipinas uma colônia espanhola haviam caído em nossos colos como resultado da derrota da Espanha para o Exército dos Estados Unidos Eu de fato não sabia Tarde da noite me veio assim 1 que não poderíamos devolvêlas à Espanha seríamos covardes e desonrados 2 que não podería mos transformálas em território francês ou alemão nossos rivais comerciais no Oriente que seria um negócio ruim e sem credibilidade 3 que não poderíamos deixálos por si próprios eles eram inadequados para se autogovernar e logo formariam uma anarquia e um governo ruim na região seria pior do que era na Espanha e 4 não restava outra opção a não ser leválas e inserir as Filipinas no mapa dos Estados Unidos Bridgesetal1969184 O primeiro estágio da globalização do sistema estatal aconteceu via incorpora ção de países nãoocidentais que não estavam sujeitos ao controle político de um Estado ocidental imperial Mesmo escapando da colonização estes Estados eram obrigados a aceitar as regras do sistema estatal ocidental O Império Otomano a Turquia é um exemplo foi forçado a aceitar tais regras por meio do Tratado de Paris em 1854 O Japão é outro que se submeteu às normas ocidentais no século XIX e rapidamente adquiriu a essência organizacional e a configuração consti tucional de um Estado moderno Já no início do século XX o Japão se tornara uma grande potência demonstrando claramente sua força quando derrotou militarmente a Rússia outra grande potência no campo de batalha da guerra Por que estudar Ri 43 russojaponesa de 19045 A China foi obrigada a aceitar as regras do sistema estatal ocidental durante os séculos XIX e início do XX mas o país só foi comple tamente reconhecido como uma potência a partir de 1945 O segundo estágio da globalização do sistema estatal foi provocado pelo movimento anticoloníalísta das colônias ligadas aos impérios ocidentais Nessa luta líderes políticos nativos reivindicaram a descolonização e a independência com base nas idéias de autode terminação européias e norteamericanas Essa revolta contra o Ocidente como Hedley Buli afirmou foi o principal veículo por meio do qual o sistema estatal se expandiu dramaticamente após a Segunda Guerra Mundial Buli e Watson 1984 Em um curto período de vinte anos começando com a independência da índia e do Paquistão em 1947 a maioria das colônias na Ásia e na África se tornou Estado independente e membro das Nações Unidas Quadro 111 A declaração de 1945 do presidente Ho Chi Minh sobre a independência da República do Vietnã Todos os homens são iguais Eles recebem do Criador certos direitos inaliená veis entre estes a vida a liberdade e a busca da felicidade Todos os povos na terra são iguais no nascimento todos têm o direito de viver ser felizes e livres Nós membros do governo provisório representando toda a população do Vietnã declaramos e renovamos aqui nossa declaração de que cortamos todas as re lações com a França e abolimos todos os direitos especiais que os franceses adquiriram de modo ilegal em nossa terra natal Estamos convencidos de que as nações aliadas que reconheceram em Teerã e em São Francisco os princípios da autodeterminação e da igualdade de status não se recusarão a reconhecer a independência do Vietnã Por essas razões nós declaramos ao mundo que o Vietnã tem o direito de ser livre e independente R Bridges et ai196931112 A descolonização européia do Terceiro Mundo triplicou o número de Es tados participantes da ONU de 50 países em 1945 para 160 em 1970 Cerca de 70 da população mundial era formada por cidadãos ou súditos de Estados independentes em 1945 e assim representados no sistema estatal Em 1995 este cálculo era quase de 100 A difusão do controle político e econômico Introdução às relações internacionais europeu para além da Europa demonstrou assim ser uma expansão do sistema estatal que se tornou efetivamente global na segunda metade do século XX A dissolução da União Soviética concomitante à fragmentação da Iugoslávia e da Tchecoslováquía no final da Guerra Fria marcou o estágio final da globa lização do sistema estatal Com isso o número de Estados membros da ONU chegou a ser quase 200 no fim do século XX Atualmente o sistema é uma instituição global que afeta a vida de quase todos na Terra quer percebamos ou não Ou seja as RI são agora mais do que nunca uma disciplina acadêmica universal Ademais isso significa que a política mundial no início do século XXI deve conciliar uma variedade de Estados bem mais heterogêneos em termos de cultura religião língua ide ologia forma de governo capacidade militar complexidade tecnológica níveis de desenvolvimento econômico etc do que antes Essa é uma mudança fun damental para o sistema estatal e um grande desafio para os acadêmicos de RI no desenvolvimento de suas teorias Quadro 11 2 A expansão global do sistema estatal 1 600 Europa sistema europeu 1 700 América do Norte sistema ocidental 1800 América do Sul Japão sistema globalizado 1900 Ásia África Caribe Pacífico sistema global As RI e o inundo contemporâneo dos Estados em transição Muitas das importantes questões do estudo de RI estão ligadas à teoria e à prática da natureza do Estado soberano que como demonstrado é a instituição histórica central da política mundial Mas há também outras questões re levantes que promoveram debates permanentes sobre a esfera de ação das RI Por que estudar RI Em um extremo o foco acadêmico é exclusivamente nos Estados e nas relações entre países mas em um outro extremo as RI abrangem quase tudo associado às relações humanas em todo o mundo E para ter um conhecimento ponderado e equilibrado de RI é essencial estudar essas diferentes perspectivas O motivo de associar as várias teorias de RI aos Estados e ao sistema estatal é garantir que a centralídade histórica deste assunto seja reconhecida Até mesmo os teóricos que buscam ir além do Estado em geral o consideram um ponto de partida fundamental o sistema estatal é a principal referência tanto para as abordagens tradicionais quanto para as novas Os próximos capítulos analisarão como cada tradição de RI tentou compreender o Estado soberano Há debates sobre como devemos conceitualizar o Estado e por isso as diferentes teorias de RI assumem abordagens diversas Nos próximos capítulos apresentaremos de bates contemporâneos sobre o futuro do Estado se a importância central do Estado na política mundial está mudando é por exemplo uma das principais questões do estudo contemporâneo de RI Mas o fato é que os Estados e o siste ma estatal permanecem no núcleo da análise e da discussão acadêmica em RJ No entanto não há dúvidas de que devemos estar alerta ao fato de que o Estado soberano é um conceito teórico contestado Quando perguntamos o que é o Estado e o que é o sistema estatal as respostas vão variar dependen do da abordagem teórica adotada a realista divergirá da liberal que por sua vez será diferente daquela da sociedade internacional e das teorias de EPI Nenhu ma dessas respostas está completamente correta ou totalmente errada porque a verdade é que o Estado é uma entidade complexa e de certo modo confusa e ainda não há um consenso com relação a sua dimensão e seu propósito O sistema estatal não é conseqüentemente um assunto de fácil compreensão e pode ser entendido por meio de muitas formas e ênfases Mas ísso tudo pode ser simplificado Vale a pena refletir sobre o Estado com duas dimensões diferentes sendo que cada uma dividida em duas categorias ex tensas A primeira é o Estado como governo e o Estado como país Visto de dentro o Estado é o governo nacional é a principal autoridade governante no país ou seja possui soberania interna Esse é o aspecto interno do Estado Questões fun damentais com relação ao aspecto interno envolvem relações de Estadosoáedade como o governo administra a sociedade nacional os meios para exercer seu poder e as fontes de sua legitimidade como lida com as demandas e preocupações de indivíduos e grupos que estabelecem a sociedade nacional como gerencia a eco nomia nacional quais suas políticas nacionais e assim por diante 46 Introdução às relações internacionais Visto internacionalmente contudo o Estado não é simplesmente um governo é um território povoado com uma sociedade e um governo nacional Em outras palavras é um país Sob este ângulo tanto o governo quanto a sociedade nacional formam o Estado Se um país é um Estado soberano será em geral reconhecido como independente politicamente Este é o aspecto externo do Estado em que as principais questões envolvem relações interestatais como governos e sociedades de Estados se relacionam e lidam uns com os outros qual a base destas relações interestatais quais as políticas externas de determinados Estados quais são as organizações internacionais dos Estados como as pessoas de países diferentes interagem e se engajam em transações umas com as outras e assim por diante Isso nos leva à segunda dimensão do Estado que divide o aspecto externo da natureza do Estado soberano em duas categorias extensas A primeira é o Estado visto como uma instituição formal ou legal em sua relação com ou tros Estados Nesse sentido é uma entidade reconhecida como soberana ou independente membro de organizações internacionais e detentora de vários direitos e responsabilidades Devemos nos referir a esta primeira categoria como condição jurídica de Estado O reconhecimento é um elemento essencial da condição jurídica de Estado que qualifica os Estados para participarem da sociedade internacional inclusive de serem membros da ONU A ausência de reconhecimento nega isso Nem todo país é reconhecido como independente um exemplo é Quebec uma província do Canadá Para se tornar indepen dente os Estados soberanos já existentes entre estes os mais importantes seriam o Canadá e depois os Estados Unidos devem reconhecêlo como tal A quantidade de países reconhecidos como Estados soberanos é sempre menor do que a de não reconhecidos mas com capacidade de se tornarem um Quadro 11 3 A dimensão externa da condição de Estado Estado como um país Condição de Estado jurídica legal Território governo sociedade Reconhecimento por outros Estados Condição de Estado empírica real Instituições políticas base econômi ca unidade nacional Por que estudar RI 47 dia juridicamente independentes Isso porque a independência é em geral vista como um valor político Mas os países já reconhecidos como Estados soberanos normalmente não estão dispostos a ver novos países reconhecidos porque isso demandaria uma partilha os Estados existentes perderiam território população recursos poder status etc Uma vez que a separação de territórios fosse tida como uma prática aceita a estabilidade internacional estaria ameaçada já que estabe leceria um perigoso precedente capaz de desestabilizar o sistema estatal caso um número crescente de países atualmente subordinados mas com potencial para se tornarem independentes se organizasse para exigir o reconhecimento como Estado soberano Portanto é provável que sempre haja alguém batendo na porta da soberania de Estado mas há uma grande relutância de abrir a porta e deixá lo entrar Isso levaria à desordem do presente sistema estatal especialmente hoje em que não existem mais colônias e todo o território habitado do mundo se delimita ao sistema global de Estados Por isso a condição jurídica de Estado é cuidadosamente racionada pelos Estados soberanos existentes A segunda categoria é o Estado visto como uma organização político econômica importante Nesse sentido considerase o papel dos países no de Quadro 114 Modelos de Estado no sistema estatal global Soberania legal jurídica Sim Condição de Estado empírica real Sim Estados fortes Estados Unidos Dina marca Japão França etc Não Não Taiwan Chechênia Quebec etc QuaseEstados Somália Libéria Sudão etc 48 introdução às relações internacionais senvolvimento de instituições políticas eficientes uma base econômica sólida e um grau substancial de unidade nacional isto é de unidade popular e apoio ao Estado Devemos nos referir a essa segunda categoria como condição empíri ca de Estado Alguns países são bastante fortes uma vez que têm um alto nível de condição empírica de Estado este é o caso da maioria dos Estados no Ocidente Muitos desses são países pequenos como a Suécia a Holanda e Lu xemburgo Um Estado forte no sentido de um alto nível de condição empírica de Estado deve ser de forma diferente da noção de um poder forte no senti do militar Como a Dinamarca alguns Estados fortes não são militarmente poderosos ao contrário de outros símbolos de poder militar como a Rússia que não são Estados fortes O Canadá é o caso atípico de um país bastante desenvolvido com a presença de um governo democrático efetivo mas com uma enorme fraqueza em sua condição de Estado a ameaça de Quebec de se separar Por outro lado os Estados Unidos são um Estado e um poder forte na verdade são o poder mais forte do mundo Quadro 115 Estados fortesfracos poderes fortesfracos PODER FORTE PODER FRACO ESTADO FORTE UE França Japão Dinamarca Suíça Nova Zelândia Cingapura ESTADO FRACO Rússia Iraque Paquistão Somália Libéria Chade etc Essa distinção entre a condição empírica e jurídica de Estado é de fundamen tal importância porque ajuda a entender as próprias diferenças entre os quase 200 Estados independentes e formalmente iguais no mundo atual Os Estados diferem bastante com relação à legitimidade de suas instituições políticas à efetividade de suas organizações governamentais às suas produtividades e rique zas econômicas às suas influências políticas aos seus status e às suas unidades nacionais Nem todos os Estados possuem governos nacionais efetivos Alguns deles tanto grandes quanto pequenos são organizações sólidas e capazes Es tados fortes como a maioria dos Estados no Ocidente Já alguns mícroestados Por que estudar RI 49 localizados em ilhas pequenas no oceano Pacífico são tão pequenos que mal podem arcar com um governo Outros podem ter territórios ou populações ra zoavelmente grandes ou ambos como a Nigéria ou o Congo antigo Zaire mas são tão pobres tão ineficientes e tão corruptos que dificilmente são capazes de funcionar como um governo efetivo Um grande número de Estados espe cialmente no Terceiro Mundo apresenta um baixo grau de condição empírica de Estado Suas instituições são fracas suas bases econômicas são frágeis e pou co desenvolvidas além de terem pouca ou nenhuma unidade nacional Sendo assim podemos nos referir a estes Estados como quaseEstados possuem condição jurídica de Estado mas são extremamente deficientes na condição em pírica Qackson 1990 Se resumirmos as várias distinções feitas até aqui teremos uma idéia do sistema estatal global mostrado no quadro 116 Quadro 116 O sistema estatal global Cinco grandes potências Estados Unidos Rússia China GrãBretanha França Aprox 30 Estados altamente substanciais Europa América do NorteJapào Aprox 75 Estados moderadamente substanciais Ásia e América Latina Aprox 90 quaseEstados insubstanciais África Ásia Caribe Pacífico Inúmeros sistemas políticos territoriais não reconhecidos submergidos nos Es tados existentes Uma das condições mais importantes que esclarece a existência de tantos quaseEstados no Terceiro Mundo é o subdesenvolvimento econômico A po breza e as conseqüentes carências de investimento infraestrutura estradas escolas hospitais etc tecnologia avançada pessoas treinadas e instruídas e outros bens ou recursos socioeconômicos estão entre os principais responsá veis pela situação de fraqueza desses Estados Seus governos e instituições não têm fundação sólida o suficiente Certamente a instabilidade desses Estados é um reflexo da pobreza e do atraso quando comparado aos outros membros do sistema estatal e enquanto estas condições permanecerem a incapacidade deles como Estados provavelmente também será mantida O cenário afeta muito a natureza do sistema estatal e portanto a natureza das nossas teorias de RI 50 Introdução às refações internacionais É possível tirar diferentes conclusões a partir do fato de que a condição empí rica de Estado é muito variável no sistema estatal contemporâneo desde países econômica e tecnologicamente avançados em sua maioria ocidentais até países econômica e tecnologicamente atrasados que na maior parte das vezes são nãoocidentais Os acadêmicos realistas de RI focam principalmente os Estados posicionados no centro do sistema os poderes mais importantes e em especial as grandes potências Consideram os Estados do Terceiro Mundo atores marginais de um sistema de política de poder sempre fundamentado na desigualdade das nações Tucker 1977 Tais Estados marginais ou peri féricos não são capazes de influenciar o sistema de modo significativo Outros acadêmicos de RI em geral os liberais e os teóricos da sociedade internacio nal acreditam que as condições adversas dos quaseEstados são uni problema fundamental para o sistema estatal no que diz respeito às questões de ordem internacional assim como de justiça e de liberdade internacionais Alguns pesquisadores de EPI em especial os marxistas consideram o sub desenvolvimento de países periféricos e as relações desiguais entre o centro e a periferia da economia global o elemento crucial explicatório de suas teorias do sistema internacional moderno Wallerstein 1974 Eles analisam as ligações internacionais entre a pobreza do Terceiro Mundo ou o Sul e o enriqueci mento dos Estados Unidos da Europa e de outras regiões do Norte Para esses teóricos a economia internacional é um sistema mundial geral no qual os Estados capitalistas desenvolvidos do centro avançam à custa dos fracos e sub desenvolvidos da periferia Segundo esses acadêmicos a igualdade legal e a independência política que designamos como condição jurídica de Estado é apenas um pouco mais do que uma fachada educada capaz de encobrir a vulnerabilidade extrema dos países pobres do Terceiro Mundo e o domínio e a exploração exercidos pelos Estados capitalistas ricos do Ocidente sobre eles Os países subdesenvolvidos revelam de modo impressionante as imensas desigualdades empíricas da política mundial contemporânea no entanto é a posse da condição jurídica de Estado refletida na participação no sistema estatal que coloca esta divergência em uma perspectiva mais definida Dessa forma as diferenças são acentuadas e é mais fácil perceber que as populações de alguns Estados os desenvolvidos desfrutam condições de vida bem melhores do que as de outros Estados os subdesenvolvidos O fato de que países subde senvolvidos e desenvolvidos pertencem ao mesmo sistema estatal global suscita questões diferentes do que se os considerássemos membros de sistemas total Por que estudar RI 5 1 mente distintos assim como antes da criação do sistema estatal global É mais fácil avaliar casos de segurança liberdade e progresso ordem e justiça e riqueza e pobreza entre países do mesmo sistema internacional uma vez que dentro de um sistema as mesmas expectativas e padrões gerais se aplicam Portanto se al guns Estados não conseguem satisfazer as expectativas e os padrões comuns por causa de seu subdesenvolvimento isso é um problema internacional e não so mente uma questão nacional ou referente a outra pessoa Essa nova perspectiva é uma grande mudança em relação ao passado quando a maioria dos sistemas políticos nãoocídentais estava de fora do sistema estatal seguindo padrões di ferentes ou era colônia dos poderes imperiais ocidentais que eram responsáveis por eles devido a uma questão de política nacional em vez de externa Quadro 117 Incluídos e excluídos no sistema estatal ANTIGO SISTEMA ESTATAL ATUAL SISTEMA ESTATAL Núcleo pequeno de incluídos todos Quase todos os Estados são incluídos Estados fortes reconhecidos com a condição de Es tado formal ou jurídica Muitos excluídos colônias depen Grandes diferenças entre os incluídos dências etc alguns Estados fortes alguns quase Estados fracos Esses acontecimentos ressaltam a dinâmica do mundo de Estados que está em constante transformação não é estático nem inalterável Nas relações internacionais como em outras esferas das relações humanas nada permanece exatamente igual por muito tempo As relações internacionais mudam para lelo a tudo o maís a política a economia a ciência a tecnologia a educação a cultura e o restante Um caso óbvio e adequado é a inovação tecnológica que desde o início causou um grande efeito sobre as relações internacionais e continua impactandoas de forma imprevisível Durante anos a tecnologia militar nova ou aperfeiçoada influenciou bastante a balança de poder a cor rida armamentista o imperialismo e o colonialismo as alianças militares a 52 Introdução às relações internacionais natureza da guerra entre outros eventos O crescimento econômico permitiu o aumento do orçamento militar promovendo o desenvolvimento de forças militares maiores melhor equipadas e mais efetivas As descobertas científicas possibilitaram a elaboração das novas tecnologias como as de transporte ou de informação que uniram ainda mais o mundo tornando as fronteiras na cionais mais permeáveis A alfabetização a educação em massa e a expansão da qualificação superior capacitaram os governos a aumentar a produção dos Estados e de suas atividades em esferas cada vez mais especializadas da socie dade e da economia É claro que estes fenômenos produzem efeitos opostos pois as pessoas com educação superior não aceitam que digam a elas o que pensar ou fazer A mudan ça de idéias e valores culturais afetou não só a política externa de determinados Estados mas também a configuração e o rumo das relações internacionais Por exemplo as ideologias contra o racismo e o imperialismo articuladas primeiro pelos intelectuais nos países ocidentais finalmente enfraqueceram os impérios estrangeiros ocidentais na Ásia e na África e contribuíram com o processo de descolonização ao tornar a justificativa moral do colonialismo cada vez mais inadequada e com o tempo impossível de ser sustentada Os exemplos do impacto da mudança social sobre as relações internacionais são praticamente intermináveis tanto em quantidade quanto em variedade Contudo isso deve ser suficiente para afirmar que a transformação social in fluencia os Estados e o sistema estatal A relação é sem dúvida reversível o sistema estatal também afeta a política a economia a ciência a tecnologia a educação a cultura e todo o resto Por exemplo afirmase com freqüência que o desenvolvimento de um sistema estatal na Europa foi decisivo para levar este continente à frente de todas as outras regiões durante a Era Moderna A con corrência entre os Estados europeus independentes dentro do próprio sistema estatal competições militar econômica científica e tecnológica impulsio nou o avanço destes Estados frente aos sistemas políticos nãoeuropeus que não foram estimulados pelo mesmo grau de concorrência Um acadêmico cha mou atenção para o fato Os Estados da Europa estavam cercados por reais ou potenciais competidores Se o governo de um deles fosse complacente seu próprio prestígio e segurança militar seriam prejudicados O sistema estatal foi uma garantia contra a estagnação econômica e tecnológica Jones 1981 10426 Não devemos concluir portanto que o sistema estatal simplesmente reage à mudança é também a causa desta dinâmica l Por que estudar RI 53 í As mudanças sociais levantam uma questão ainda mais fundamental Será que deveríamos esperar que com o tempo os Estados mudem tanto de modo a não serem mais Estados no sentido discutido aqui Por exemplo se o pró cesso de globalização econômica continuar e tornar o mundo um único local de mercado e de produção o sistema estatal será então obsoleto Pensamos nas seguintes atividades que devem ultrapassar os Estados comércio e inve timento cada vez maiores aumento da atividade empresarial multinacional ampliação das ações das ONGs organizações nãogovernamentaís elevação da comunicação regional e global crescimento da internet expansão e amplia ção constante das redes de transporte intensificação das viagens e do turismo migração humana maciça poluição ambiental acumulada integração regional ampliada o crescimento das comunidades mercantis expansão global da ciên cia e da tecnologia contínua redução do governo privatização elevada e outras atividades que propulsionam a interdependência através das fronteiras Ou será que os Estados soberanos e o sistema estatal encontrarão formas de se adaptar a estas mudançasimportantes àsim como fizeram durante os últimas 350 anos Algumas destas mudanças foram igualmente fundamentais a revolução científica do século XVII o iluminismo do século XVIII o encontro das civilizações ocidentais e nãoocidentaís durante vários séculos o crescimento do colonialismo e do imperialismo ocidentais a Revolução Industrial dos séculos XVIII e XIX o aumento e a difusão do nacionalismo nos séculos XIX e XX revolução do anti colonialismo e da descolonização no século XX a expansão da educação pública em massa o crescimento do Estado de bemestar entre qutros Estas são algumas das questões mais fundamentais dos estudos contemporâneos das RI e devemos têlas em mente quando especulamos sobre o futuro do sistema estatal Conclusão O sistema estatal é uma instituição histórica formada por pessoas A população do mundo nem sempre viveu em Estados soberanos durante a maior parte da história humana registrada as pessoas viveram sob tipos diferentes de organização política Em épocas medievais a autoridade política era caótica e dispersa assim 54 Introdução às relações internacionais a maioria das pessoas dependia de um grande número de lideranças diferentes algumas delas políticas outras religiosas com diferentes responsabilidades e poderes desde o governante local e do senhorio até o rei em uma distante ci dadecapital desde o padre da paróquia até o papa na Roma longínqua No Estado moderno a autoridade é centralizada em um governo legalmente su premo e a população vive sob leis convencionais estabelecidas pela autoridade O desenvolvimento do Estado moderno passou por um longo caminho em direção ao poder e à autoridade política sistematizada de acordo com as linhas nacionais O sistema estatal foi preferencialmente um sistema estatal europeu Du rante a era do imperialismo ocidental o resto do mundo foi dominado pelos europeus tanto política quanto economicamente Somente com a descoloni zação asiática e africana após a Segunda Guerra Mundial o sistema estatal se tornou uma instituição global A globalização do sistema estatal ampliou muito a variedade de seus Estados membros e conseqüentemente sua diver sidade A diferença mais importante está entre os Estados fortes com um alto nível de condição empírica de Estado e os quaseEstados fracos que apesar da soberania formal apresentam pouca condição substancial de Estado Isto é a descolonização contribuiu para uma profunda divisão interna do sistema estatal entre o Norte rico e o Sul pobre entre países desenvolvidos no centro que dominam o sistema política e economicamente e países subdesenvolvidos nas periferias com influência econômica e política limitada As pessoas quase sempre esperam que os Estados defendam certos valo res essenciais segurança liberdade ordem justiça e bemestar A teoria de RI estuda as formas pelas quais os Estados asseguram ou não estes valores His toricamente o sistema estatal consiste de muitos Estados detentores de armas pesadas incluindo um pequeno número de potências muitas vezes rivais mi Htarmente que já se enfrentaram em guerras Essa realidade do Estado como uma máquina de guerra enfatiza o valor da segurança o ponto de partida para a tradição realista das RI Sendo assim até o momento em que os Estados deixem de ser rivais armados a teoria realista terá uma forte base histórica O término da Guerra Fria apresenta sinais de mudanças prováveis as grandes potências cortaram de forma significativa seus orçamentos militares e redu ziram o tamanho de suas Forças Armadas Por outro lado as potências têm modernizado seus exércitos marinhas e forças aéreas e ainda nem considera ram abandonar suas armas Isso indica que o realismo continuará uma teoria de RI relevante ainda por algum tempo Por que estudar RI 5 5 No entanto também é verdade que a maioria dos Estados coopera uns com os outros de forma quase que regular sem muito drama político em busca de vantagem mútua Nesse sentido os países têm relações diplomáticas co merciais apoiam mercados internacionais trocam conhecimento científico e tecnológico abrem suas portas a investidores empresários turistas e viajan tes estrangeiros Ademais os Estados colaboram de modo a lidar com vários problemas comuns desde o meio ambiente ao tráfico ilegal de drogas por exemplo se comprometem com tratados bilaterais e multilaterais com este propósito Em suma os Estados interagem de acordo com as normas de re ciprocidade A tradição liberal das RI tem por base a idéia de que o Estado moderno ao agir de forma tranqüila e rotineira contribuí estrategicamente para o progresso e a liberdade internacionais Como os Estados defendem a ordem e a justiça no sistema estatal Prin cipalmente por meío das regras do direito internacional das organizações internacionais e da diplomacia Desde 1945 testemunhamos uma enorme ex pansão desses elementos da sociedade internacional Nesse contexto a tradição da sociedade internacional nas RI enfatiza a importância de tais relações inter nacionais Finalmente o sistema estatal também é um sistema socioeconômico a riqueza e o bemestar são uma preocupação central da maioria dos Estados Esse fato é o ponto de partida para as teorias de EPJ em RI Os teóricos dessa linha também discutem as conseqüências da expansão ocidental e a futura incorporação do Terceiro Mundo ao sistema estatal Será que esse processo promove a modernização e o progresso no Terceiro Mundo ou proporciona desigualdade subdesenvolvimento e miséria Essa pergunta também leva a uma questão ainda maior sobre até que ponto vale a pena defender o sistema estatal em vez de substituílo As teorias de RI não apresentam uma resposta única mas a disciplina de RI se baseia na convicção de que os Estados sobe ranos e seu desenvolvimento são de importância crucial para o entendimento de como os valores básicos da vida humana são ou não fornecidos às pessoas em todo o mundo Os capítulos seguintes apresentarão mais a fundo as tradições teóricas das RI Começamos a tarefa introduzindo as RI como uma disciplina acadêmica Ao passo que este capítulo se preocupou com o desenvolvimento atual dos Estados e do sistema estatal o próximo se concentrará em analisar corno o nosso raciocínio sobre os Estados e as suas relações se desenvolveu ao longo do tempo 56 Introdução às relações internacionais Pon toschave A principal razão para se estudar RI é o fato de que toda a população mundial vive em Estados independentes Em conjunto esses Estados for mam o sistema estatal global Os valores essenciais que os Estados devem defender são a segurança a liberdade a ordem a justiça e o bemestar A teoria das RI diz respeito aos efeitos dos Estados e do sistema estatal sob esses valores O sistema de Estados soberanos surgiu na Europa no início da Era Moderna no século XVI A autoridade política medieval estava dispersa a autoridade política moderna é centralizada residindo no governo e no chefe de Estado O sistema estatal foi no começo europeu hoje é global O sistema esta tal global apresenta Estados de tipos bem variados grandes potências e pequenos países Estados substanciais fortes e quaseEstados fracos Há urna ligação entre a expansão do sistema estatal e o estabelecimento de um mercado mundial e uma economia global Alguns países do Ter ceiro Mundo se beneficiaram da integração à economia global outros permanecem pobres e subdesenvolvidos A globalização econômica e outros desenvolvimentos desafiam o Estado soberano Não podemos saber ao certo se o sistema estatal se tornará obso leto ou se os Estados encontrarão formas de se adaptar a novos desafios Questões O que é um Estado Por que precisamos deles O que é um sistema estatal Quando os Estados independentes e o sistema estatal moderno surgi ram Qual a diferença entre um sistema de autoridade política medieval e um moderno Esperamos que os Estados sustentem uma série de valores centrais segurança liberdade ordem justiça e bemestar Eles satisfazem as nossas expectativas Por que estudar RI 57 Quais são os efeitos da integração dos países do Terceiro Mundo à eco nomia global Devemos nos esforçar para preservar o sistema de Estados soberanos Por que ou por que não Explique as principais diferenças entre os Estados substanciais fortes quaseEstados fracos grandes potências e pequenos poderes Por que há tal diversidade no sistema estatal Para material e recursos adicionais consulte o web site do manual em wwwoupcoukbesttextbookspoliticsjacksonsorensen2e Orientação para leitura complementar Buli H e Watson A eds 1984 The ExpansionofInternationalSociety Oxford Clarendon Press Oslander A 1994 The States System ofEurope 16401990 Oxford Clarendon Press Tilly C 1992 Coercion Capitai and European States Oxford Blackwell Wallerstcin I 1974 The Modem WorldSystem Nova York Acadêmica Press Watson A 1992 The Evolution of International Society Londres Routledge Web links httpwwwyaleedulawwebavalonwestphalhtm Texto completo do Tratado de Vestfália de 1648 que estabeleceu a sociedade européia moderna internacional Hospedado pelo Projeto Avalon da Faculdade de Direito de Yale 58 Introdução às relações internacionais httpplatostanfordeduentrieswar Discussão sobre o conceito da guerra e links relacionados a recursos da internet Hospeda do pela Enciclopédia de Filosofia de Stanford httpcarlislewwwarmymilusawcParameters96springcreveldhtm Martin Van Creveld discute The Fate of the State Hospedado pela Faculdade de Guerra do Exército norteamericano httpwwwjeanmonnetp rogramorgpapers0000fi0801 html Jan Zielonka discute se um império neomedieval tem a probabilidade de se desenvolver na Europa Hospedado pelo Centro Jean Monnet da Faculdade de Direito da Universidade de Nova York
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Robert Jackson Georg S0rensen Introdução às relações internacionais Teorias e abordagens Tradução BÁRBARA DUARTE Revisão técnica ARTHUR ITUASSU Prof de relações internacionais na PUCRio ZAHAR Jorge Zahar Editor Rio de Janeiro Para os nossos estudantes Título original Introduction to International Relations Theories and approaches Tradução autorizada da segunda edição inglesa revista e ampliada publicada em 2003 por Oxford University Press de Oxford Inglaterra Copyright 2003 Robert Jackson e Georg S0rensen Copyright da edição brasileira 2007 Jorge Zahar Editor Ltda rua México 31 sobreloja 20031144 Rio de Janeiro RJ tel 2121080808 fax 21 21080800 email jzezaharcombr site www zaharcom b r Introduction to International Relations 2e was originally published in Englisb in 2003 This translation ispublished by arrangement with Oxford Universiíy Press This edition is notforsale in Portugal Todos os direitos reservados A reprodução n aoautorizada desta publicação no todo ou em parte constitui violação de direitos autorais Lei 961098 Projeto gráfico e composição Printmark Marketing Editorial Capa Sérgio Campante Ilustração Gregor Schuster Zefa Corbis CIPBrasil Catalogaçàonafonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros RJ Jackson Robert H J l Si Introdução às relações internacionais teorias e abordagens Robert Jackson George S0rensen tradução Bárbara Duarte revisão técnica Arthur Ituassu Rio de Janeiro Jorge Zahar Ed 2007 Tradução de Introduction to international relations theories and approaches Inclui bibliografia ISBN 9788571109681 1 Relações internacionais 2 Relações internacionais Filosofia I S0rensen George 1948 II Título CDD 327 064627 CDU327 Sobre este livro Dicas de estudo Para facilitar os capítulos estão estruturados da seguinte forma Resumo cada capítulo começa com um pequeno resumo dos principais pontos Pontoschave cada capítulo termina com uma lista de pontoschave Questões de estudo cada capítulo apresenta uma série de questões de estudo que podem ser usadas para discussões ou temas de trabalhos Orientação para leitura complementar cada capítulo oferece uma orienta ção para uma leitura complementar sobre o assunto tratado O livro permite portanto que os alunos aprendam RI como uma disciplina acadêmica em desenvolvimento em vez de estudar somente os eventos atuais Durante todo o texto enfocamos as teorias e os teóricos Esperamos assim proporcionar um conhecimento básico do núcleo da disciplina de RI por meio da leitura deste manual Nosso livro foi escrito para cursos de nível iniciante mas seu conteúdo e seus debates também servem de auxílio para cursos de nível mais elevado O objetivo básico e prioritário é ajudar os alunos a passar rapidamente do nível iniciante para o superior Para recursos e material extra ver o site do manual em wwwoupcoukbesttextbookspoliticsjacksonsorensen2e Lista de abreviações Berd Banco Europeu para a Reconstrução e o Desenvolvimento G8 Grupo dos Oito Estados Unidos Canadá GrãBretanha Alemanha França Itália Rússia e Japão Gatt Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio IGO Organização intergovernamental FMI Fundo Monetário Internacional EPI Economia política internacional RI Relações internacionais Otan Organização do Tratado do Atlântico Norte ONG Organização nãogovernamental OCDE Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico Opep Organização dos Países Exportadores de Petróleo OSCE Organização para Segurança e Cooperação na Europa TNC Corporação transnacional ONU Organização das Nações Unidas Pnud Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento EUA Estados Unidos OMC Organização Mundial do Comércio UE União européia 1 Por que estudar RI As relações internacionais na vida cotidiana 20 Breve descrição histórica do sistema de Estados 29 O sistema estatal global e a economia mundial 40 As RI e o mundo contem porâneo dos Estados em transição 44 Conclusão 53 Pontoschave 56 Questões 56 Orientação para leitura complementar 57 Web links 57 Resumo Este capítulo apresenta a base históricosocial das relações internacionais ou RI O objetivo é enfatizar a realidade prática das relações internacionais em nossas vidas e associála ao seu estudo acadêmico Essa ligação é feita neste capítulo focando o principal tema histórico das RI os Estados soberanos modernos e as relações internacionais do sistema estatal Três tópicos centrais são discutidos o significado das relações in ternacionais na vida cotidiana e os principais valores providos pelos Estados a evolução histórica do sistema estatal e da economia mundial e o mundo contemporâneo de Es tados em transição Introdução às relações internacionais As relações internacionais na vida cotidiana RI é a abreviatura para o campo acadêmico das relações internacionais e estudálo é importante principalmente porque a população mundial está dividida em co munidades políticas territoriais distintas Estados independentes que influenciam profundamente o modo de vida de todas as pessoas Em conjunto estes Estados formam um sistema internacional de extensão global Atualmente há quase 200 Estados independentes A maioria das pessoas com poucas exceções não apenas vive como também é cidadã de pelo menos um desses países e muito raramente de mais de um deles Praticamente todos nós estamos ligados a um Estado parti cular e por meio deste nos conectamos ao sistema estatal que afeta nossas vidas de maneiras importantes mas que talvez nem tenhamos consciência Os Estados são independentes uns dos outros pelo menos legalmente eles têm soberania No entanto isso não significa que estejam isolados Pelo contrá rio se unem e se influenciam e portanto devem encontrar meios de coexistir e de lidar uns com os outros Ademais estão geralmente incorporados aos mer cados internacionais que geram efeitos sobre as políticas dos governos e sobre a riqueza e o bemestar de seus cidadãos Sendo assim o relacionamento entre Estados é necessário ou seja o isolamento total não é uma opção Quando um país é isolado e excluído do sistema estatal seja devido às ações do seu próprio governo ou de poderes externos o resultado geralmente é o sofrimen to da população local os exemplos mais recentes são Burma Líbia Coréia do Norte Iraque e Irã O sistema estatal é um sistema de relações sociais ou seja relacionamentos entre grupos de seres humanos Assim como na maioria dos outros sistemas sociais as relações internacionais apresentam vantagens e desvantagens para os participantes Em outras palavras RI foca a natureza e as conseqüências dessas interações O sistema estatal é um modo distinto de organizar a vida política mundial cuja origem histórica é bem antiga Já houve sistemas estatais ou semiestatais em diferentes épocas e locais por exemplo na antiga índia Grécia e na Itália renascentista Watson 1992 Contudo o tema das RI surgiu no início da Era Moderna séculos XVI e XVII na Europa quando os Estados soberanos funda mentados em territórios contíguos foram oríginariamente estabelecidos Desde o século XVIII as relações entre tais Estados independentes são chamadas de relações internacionais Nos séculos XIX e XX o sistema estatal foi ampliado Por que estudar RI 2 1 a fim de abranger todo o território global O mundo de Estados é basicamente um mundo territorial é uma forma de organizar politicamente as regiões po voadas do mundo um tipo diferenciado de estruturação política territorial com base em inúmeros governos distintos que são legalmente independentes uns dos outros Nesse sentido o único grande território que não é considerado um Estado é a Antártida administrada por uma associação de Estados Hoje RJ é o estudo do sistema global de Estados a partir de várias perspectivas acadêmicas sendo que as mais importantes serão discutidas no decorrer deste livro Quadro 11 Conceitoschave Soberania estatal qualidade do Estado de ser politicamente independente de todos os outros Estados Sistema estatal relações entre agrupamentos humanos organizados politicamente que ocupam ter ritórios distintos não estão subordinados a nenhum poder ou autoridade superior e desfrutam e exercem um certo grau de independência com relação aos outros Cinco regras básicas de um sistema estatal segurança liberdade ordem justiça e bemestar Principais abordagens tradicionais de RI realismo liberalismo sociedade internacional e EPI O dilema de segurança os Estados são tanto uma fonte de segurança quanto uma ameaça à segurança dos seres humanos Autoridade medieval um arranjo de autoridade política dispersa Autoridade do Estado moderno um arranjo de autoridade política centralizada Hegemonia poder e controle exercidos por um Estado proeminente sobre os outros Estados Balança de poder uma doutrina e um arranjo pelo qual o poder de um Estado ou grupo de Estados é controlado pelo poder compensatório de outros Estados Introdução às relações internacionais Para entender o significado das RI é necessário compreender ávida dentro de um Estado O que isso implica Qual sua importância Como devemos pen sar sobre isso Estas questões principalmente a última são a preocupação central deste livro Os capítulos seguintes tentam responder de várias formas a esta pergunta fundamental Este capítulo aborda o principal tema histórico das RI a evolução do sistema estatal e o mundo contemporâneo de Estados em transição É importante antes de começar a responder a estas questões avaliar nossa vida diária como cidadãos de Estados particulares e nossas expectativas quanto a isso Há no mínimo cinco valores sociais básicos que os Estados suposta mente devem defender segurança liberdade ordem justiça e bemestar Por serem tão fundamentais ao bemestar humano tais valores sociais precisam ser protegidos e garantidos É claro que outras organizações sociais além do Estado podem assumir tal responsabilidade como a família o clã ou as orga nizações étnicas ou religiosas Na Era Moderna contudo o Estado tem sido em geral a principal instituição a cumprir esta função e esperase que o próprio garanta estes valores básicos Por exemplo as pessoas costumam achar que o Estado deve financiar a segurança responsável pela proteção dos cidadãos com relação a ameaças internas e externas Esta é uma preocupação ou um interesse fundamental dos países No entanto a própria existência de Estados independentes afeta o valor da segurança vivemos em um mundo de muitos países quase todos minimamente armados Dessa forma os Estados tanto defendem como ameaçam a segurança das pessoas este paradoxo do sistema estatal é geralmente conhecido como o dilema de segurança Portanto assim corno qualquer outra organização humana os Estados apresentam problemas e soluções Apesar de a maioria dos países ter um comportamento amistoso não amea çador e pacífico alguns deles podem ser hostis e agressivos Nesse contexto com a ausência de um governo mundial para coagilos constituise um desafio básico e antigo para o sistema estatal a segurança nacional Conseqüentemen te para lidar com esta questão a maioria dos Estados possui Forças Armadas Por isso o poder militar é considerado uma condição essencial para que os Estados possam coexistir e se relacionar uns com os outros sem serem in timidados ou subjugados Um fato importante o qual não devemos nunca esquecer é que países desarmados são um fato raro na história do sistema estatal Com o objetivo de aumentar a segurança nacional muitos Estados Por que estudar RI 23 também optam por formar alianças Além disso para garantir que nenhuma grande potência consiga alcançar uma posição hegemônica de dominação total com base na intimidação na coerçao ou no uso absoluto da força é necessário construir e manter uma balança de poder militar A segurança é certamente um dos valores mais fundamentais das relações internacionais Essa abordagem para o estudo da política mundial é típica das teorias realistas das RI Morgenthau 1960 que partem do pressuposto de que as relações dos países podem ser melhor caracterizadas como um mundo no qual os Estados que possuem armas são rivais competidores e de tempos em tempos iniciam guerras in ter estatais O segundo valor básico cuja garantia é responsabilidade dos Estados é a li berdade tanto a pessoal quanto a nacional a independência Uma das razões fundamentais para a constituição dos Estados e para a sustentação dos encar gos instituídos por governos a seus cidadãos tais como impostos e o serviço militar obrigatório é a condição de liberdade nacional ou de independência que os Estados procuram sempre afirmar Não podemos ser livres a não ser que nosso país também seja isso esteve muito claro para os milhares de cidadãos tchecos poloneses dinamarqueses noruegueses belgas e holandeses assim como para os habitantes de outros países invadidos e ocupados pela Alema nha nazista durante a Segunda Guerra Mundial No entanto mesmo quando um país é livre sua população pode não ser mas pelo menos o problema da liberdade está nas próprias mãos dos cidadãos A guerra ameaça e algumas vezes destrói a liberdade A paz pelo contrário promove a liberdade tornando possível a mudança internacional progressiva e a criação de um mundo melhor A paz e a mudança progressiva estão certamente entre os valores mais funda mentais das relações internacionais Essa abordagem sobre a política mundial é típica das teorias liberais das RI Claude 1971 Opera a partir da suposição de que as relações internacionais podem ser melhor caracterizadas corno uni mundo no qual os Estados cooperam entre si com o objetivo de manter a paz e a liberdade além de buscar a mudança progressiva O terceiro e o quarto valores básicos sob responsabilidade dos Estados são a ordem e a justiça Para que os países possam coexistir e interagir com base na estabilidade na certeza e na previsibilidade é fundamental que tenham o interesse comum no estabelecimento e na manutenção da ordem internacional Para isso é obrigatório defender o direito internacional manter compromissos com tratados e cumprir as regras convenções e hábitos da ordem legal inter Introdução às relações internacionais nacional Além disso esperase que aceitem práticas diplomáticas e apoiem as organizações internacionais O direito internacional as relações diplomáticas e as organizações internacionais só podem existir e operar de modo bemsucedi do caso estas expectativas sejam em geral cumpridas pela maioria dos Estados durante a maior parte do tempo Outro dever dos países é defender os direitos humanos Hoje já existe uma estrutura legal internacional de direitos humanos direitos civis políticos sociais e econômicos desenvolvidos desde o término da Segunda Guerra Mundial Certamente a ordem e a justiça estão entre os valores mais fundamentais das relações internacionais Esta abordagem com relação ao estudo da política mundial é típica das teorias da Sociedade Inter nacional das RI Buli 1995 De acordo com esta linha de raciocínio as relações internacionais podem ser melhor caracterizadas como um mundo no qual os Estados são atores socialmente responsáveis e compartilham o interesse de preservar a ordem internacional e promover a justiça internacional O último valor básico que se espera que os Estados defendam é a riqueza e o bemestar socioeconômico da população Os cidadãos acreditam que o seu governo deva adotar políticas apropriadas a fim de incentivar um alto índice de emprego baixa inflação investimento constante fluxo ininterrupto de comér cio e assim por diante Uma vez que as economias nacionais raramente estão isoladas umas das outras a maioria das pessoas também espera que seu país atue no ambiente econômico internacional de forma a elevar ou no mínimo defender e manter o padrão de vida nacional Hoje os Estados investem no planejamento e na implementação de políticas econômicas capazes de manter a estabilidade da economia internacional que é essencial para todos Em geral esse processo envolve políticas econômicas que possam lidar de modo adequado com os mercados internacionais com a política econômica de outros Estados com o investimento externo com as taxas de câmbio com o comércio internacional com a comunicação e com o transporte internacional e outras relações econômicas internacionais que afetam a riqueza e o bemestar nacionais A interdependência econômica o alto grau de dependência econômica mútua entre os países é uma caracterís tica impressionante do sistema estatal contemporâneo Por um lado algumas pessoas consideram tal situação positiva uma vez que a expansão do mercado global pode gerar um aumento da liberdade e da riqueza por meio de mais distribuição especialização eficiência e produtividade Já outros teóricos en tendem a interdependência econômica como algo negativo porque promove Por que estudar RI a desigualdade ao permitir que países ricos e poderosos ou com vantagens financeiras eou tecnológicas dominem países pobres e fracos que não detêm tais vantagens Mas independentemente dessa discussão a riqueza e o bem estar estão entre os valores mais fundamentais das relações internacionais Essa abordagem da política mundial é típica das teorias de EPI economia política internacional Gilpin 1987 Para os defensores dessa corrente de pensamento as relações internacionais podem ser melhor caracterizadas como um mundo fundamentalmente socioeconômico e não simplesmente político e militar A maioria das pessoas parte do pressuposto de que os valores básicos segu rança liberdade ordem justiça e bemestar são naturais e só se conscientizam que algo está errado por exemplo durante uma guerra ou uma depressão quando os Estados individuais perdem o controle da situação Nessas oca siões as pessoas despertam para circunstâncias mais complexas de suas vidas que no diaadia não são percebidas ou ficam em segundo plano ou seja tendem a se conscientizar dos aspectos considerados naturais e da importância destes valores em suas vidas diárias Por exemplo atentamos à segurança na cional quando um poder externo se arma para a guerra ou age de modo hostil contra o nosso país ou um de nossos aliados Em relação à independência nacional e à nossa liberdade como cidadãos nos conscientizamos quando a Quadro 12 Valores e teorias das RI ENFOQUES TEORIAS Segurança Realismo política de poder conflito e guerra Liberdade Liberalismo cooperação paz e progresso Ordem e justiça Sociedade internacional interesses compartilhados regras e instituições Bemestar Teorias de EPI riqueza pobreza igualdade 6 Introdução às relações internacionais paz não é mais garantida Já no que se refere à justiça e à ordem internacional nos tornamos cientes quando alguns Estados principalmente os grandes po deres abusam exploram condenam ou desrespeitam o direito internacional ou os direitos humanos Por fim nos conscientizamos do bemestar nacio nal e do nosso próprio bemestar socioeconômico quando países estrangeiros ou investidores internacionais com base em sua influência econômica preju dicam nosso padrão de vida Durante o século XX houve momentos significativos de expansão da consciência com relação aos principais valores sociais A Primeira Guerra Mundial deixou terrivelmente claro para a maioria das pessoas a capacida de do conflito armado mecanizado moderno entre os grandes poderes de destruir as vidas e as condições de sobrevivência de modo devastador e como é importante reduzir o risco de uma guerra como esta A partir deste reco nhecimento emergiram os primeiros passos significativos no pensamento das RI com foco nas instituições legais efetivas por exemplo a Liga das Nações a fim de impedir a guerra entre grandes potências Já a Grande Depressão demonstrou para a população mundial como os meios econômi cos de vida poderiam ser afetados de modo adverso até mesmo destruídos por meio de condições específicas de mercado não só internas mas também internacionais A Segunda Guerra Mundial não apenas enfatizou a reali dade dos perigos da guerra entre grandes poderes como revelou também a importância de se impedir qualquer potência de escapar do controle assim como a imprudência de seguir uma política de apaziguamento adotada pela GrãBretanha e pela França em relação à Alemanha nazista um pouco antes da guerra e que provocou conseqüências desastrosas para todos in clusive ao povo alemão Após a Segunda Guerra Mundial verificamos também outros momentos de expansão da consciência no que diz respeito à importância fundamental desses valores A crise dos mísseis cubanos de 1962 por exemplo esclareceu os perigos da guerra nuclear para muitas pessoas Os movimentos antico loniais na Ásia e na África dos anos 1950 e 60 e os movimentos dissidentes nas antigas União Soviética e Iugoslávia no final da Guerra Fria demonstra ram claramente quanto a autodeterminação e a independência política ainda eram relevantes Já a inflação global da década de 1970 e do início dos anos 1980 causada por um aumento súbito e dramático nos preços do petróleo pelo cartel da Opep formado por países exportadores de petróleo relembrou Por que estudar RI 27 quanto as interconexões da economia global podem ameaçar o bemestar nacional e pessoal em qualquer lugar do mundo No caso do choque do petróleo de 1970 ficou nítido para inúmeros motoristas norteamericanos europeus e japoneses entre outros que as políticas econômicas do Orien te Médio e de outros importantes países produtores de petróleo têm o poder de aumentar o preço da gasolina ou do petróleo reduzindo seus padrões de vida A Guerra do Golfo 19901 e os conflitos nos Bálcãs em particular na Bósnia 19925 e no Kosovo 1999 foram uma lembrança da importância da ordem internacional e do respeito pelos direitos humanos Em 2001 os ataques a Nova York e Washington despertaram a atenção da população norteamericana e de outros países com relação aos perigos do terrorismo internacional Durante muito tempo acreditouse que a vida dentro de Estados adequada mente organizados e bem administrados é melhor do que a vida fora deles ou na sua ausência O povo judeu por exemplo se dedicou mais de meio século à busca do estabelecimento de um Estado próprio onde estivessem seguros Israel Esse raciocínio prevalecerá enquanto os Estados e o sistema estatal con seguirem conservar esses valores centrais Esse em geral tem sido o caso dos países desenvolvidos especialmente os da Europa ocidental da América do Norte do Japão da Austrália da Nova Zelândia e de alguns outros Com base nesse cenário surgem as teorias convencionais das RI que consideram o sis tema estatal uma valiosa instituição da vida moderna Neste livro as teorias tradicionais das RI apresentadas tendem a adotar esse ponto de vista positivo Reconhecem o significado dos valores básicos apesar de discordarem com re lação à hierarquia deles os realistas por exemplo enfatizam a importância da segurança e da ordem os liberais da liberdade e da justiça e os acadêmicos de EPI a igualdade econômica e o bemestar Mas se os Estados não forem bemsucedidos nesse aspecto o sistema es tatal pode ser facilmente entendido na ótica oposta enfraquecendo em vez de sustentar os valores e as condições sociais básicas Este é o caso de alguns Estados que emergiram do colapso da União Soviética e da Iugoslávia no fim da Guerra Fria Muitos deles falham mais ou menos ao tentar proporcionar ou proteger um padrão mínimo dos cinco valores básicos discutidos anterior mente e uma quantidade menor de Estados não consegue assegurar nenhum deles A situação de vida degradada de inúmeros homens mulheres e crianças nesses países coloca em questão a credibilidade e às vezes até mesmo a legi Introdução às relações internacionais timidade do sistema estatal Esse contexto estimula o argumento de que o sistema internacional promove ou no mínimo tolera o sofrimento humano e sendo assim devese mudálo para que as pessoas em todo o mundo não apenas nos países desenvolvidos possam levar à frente os seus afazeres da vida Essa é a base de teorias de RI mais críticas que consideram o Estado e o sistema estatal uma instituição menos benéfica e mais problemática Neste livro discutiremos as teorias alternativas de RI que tendem a adotar essa visão crítica Para resumir os Estados e o sistema estatal são organizações sociais ba seadas em territórios cuja principal responsabilidade é estabelecer manter e defender valores e condições sociais básicas como a segurança a liberdade a ordem a justiça e o bemestar Essas são as principais razões de sua existência Muitos Estados e certamente todos os países desenvolvidos defendem essas condições e valores pelo menos nos padrões mínimos e muitas vezes em um nível superior Na verdade o dever foi cumprido nos últimos séculos de modo tão bemsucedido que os padrões aumentaram e hoje são mais altos do que nunca Esses países estabeleceram o padrão internacional para todo o mundo No entanto muitos Estados e a maioria dos países subdesenvolvidos ainda não conseguiram cumprir os padrões mínimos e conseqüentemente sua presença no sistema estatal contemporâneo levanta sérias questões não somente sobre estes países mas também sobre o sistema estatal do qual são parte importante Tal situação provocou um debate em RI entre os teóricos tradicionais que aceitam o sistema estatal existente e teóricos radicais que o rejeitam Quadro 13 Pontos de vista do Estado VISÃO TRADICIONAL VISÃO ALTERNATIVA Estados são instituições valiosas Estados e o sistema estatal criam proporcionam segurança liberdade mais problemas do que resolvem ordem justiça e bemestar As pessoas se beneficiam do sistema A maior parte da população mun estatal dial sofre mais que se beneficia do sistema de Estados Por que estudar RI 29 Breve descrição histórica do sistema de Estados Uma vez que os Estados e o sistema estatal são características tão básicas da vida política moderna assumimos com facilidade que são aspectos permanentes sempre estiveram presentes e sempre estarão No entanto esta premissa é falsa E importante enfatizar que o sistema estatal é uma instituição histórica ou seja não foi determinado por Deus nem pela natureza mas configurado por algumas pessoas em uma determinada época é uma organização social Sendo assim como todas as organizações sociais o sistema estatal apresenta vantagens e desvantagens que mudam com o passar do tempo Apesar de a existência humana não depender do sistema de Estados sua estrutura oferece uma série de benefícios que geram altos padrões de vida Nem sempre a população mundial viveu em Estados soberanos Ao longo da maior parte da história humana as pessoas organizaram suas vidas políticas de formas diferentes sendo que o mais comum foi o império político como o romano Nesse sentido no futuro talvez o mundo não esteja estruturado de acordo com um sistema estatal é possível que as pessoas desistam do Estado soberano abandonandoo da mesma maneira que fizeram com muitas outras formas de organização da vida política como as cidadesEstado o feudalismo e o colonialismo entre outros Portanto não é absurdo supor que os Estados e o sistema estatal possam ser finalmente substituídos por um meio melhor e mais avançado de organização da política global Alguns acadêmicos de RI que serão discutidos nos próximos capítulos acreditam que uma certa transformação internacional associada à interdependência entre os Estados a globalização já está em andamento Mas desde um longo tempo o sistema estatal tem sido uma instituição central da política mundial e ainda permanece assim É cer to que a política mundial está em constante mudança e que no passado os Estados e o sistema estatal sempre conseguiram se adaptar às transformações históricas significativas Mas ninguém é capaz de afirmar que o cenário no fu turo continuará o mesmo de hoje As questões sobre o presente e as possíveis mudanças no âmbito internacional serão discutidas no final do capítulo Antes do século XVI quando os Estados começaram a ser instituídos na Europa ocidental eles não eram reconhecidamente soberanos Mas durante os últimos três ou quatro séculos os Estados e o sistema estatal estruturaram as vidas políticas de um número cada vez maior de pessoas em todo o mundo Introdução às relações internacionais tornandose assim universalmente populares Atualmente é possível afirmar que o sistema é global em extensão A era do Estado soberano coincide com a época moderna na qual verificamos a expansão do poder da prosperidade do conhecimento da ciência da tecnologia da alfabetizaçào da urbanização da cidadania da liberdade da igualdade dos direitos etc Se lembrarmos da importância dos Estados e do sistema estatal na configuração dos cinco valores humanos fundamentais discutidos anteriormente perceberemos que é muito provável que isso não seja uma coincidência Fica apenas difícil determinar se eles foram o efeito ou a causa da vida moderna e se terão uma posição na era pósmoderna Estas questões devem ser analisadas mais adiante No entanto sabemos que o sistema estatal e a modernidade estão historica mente ligados De fato coexistem o sistema de junção de Estados territoriais começou a ser estabelecido na Europa no início da Era Moderna E desde en tão o sistema estatal tem sido uma característica central se não determinante da modernidade Embora o Estado soberano tenha surgido na Europa também foi adotado na América do Norte no final do século XVIII e na América do Sul no começo do século XIX em seguida difundiuse pelo mundo em paralelo à própria modernidade E aos poucos a estrutura do Estado sobetano influen ciou todo o mundo A África subsaariana por exemplo permaneceu isolada do sistema estatal ocidental em expansão até o final do século XIX e só constituiu um sistema estatal regional independente após a metade do século XX Nesse contexto uma questão importante é se o término da modernidade determinará também o término do sistema estatal mas discutiremos isso mais adiante Certamente há evidências de sistemas políticos similares aos Estados so beranos bem antes da Era Moderna que muito provavelmente mantinham relações entre si A origem histórica das relações internacionais nesse sentido mais geral é muito antiga e por isso é apenas possível se especular acerca do tema Mas conceitualmente o início das interações entre as organizações po líticas coincide com um período no qual as pessoas começaram a se estabelecer nas terras formando comunidades políticas distintas de base territorial Os primeiros exemplos têm mais de 5 mil anos Nessa época cada grupo político enfrentava o problema inevitável de coe xistir com grupos vizinhos que em função da proximidade não poderiam ser ignorados nem evitados Cada agrupamento político também precisava lidar com grupos que embora afastados eram capazes de afetálos Tal proximida de geográfica deve ter sido considerada uma zona de proximidade política se Por que estudar Ri 3 1 não uma fronteira ou algum cipó de limite Provavelmente o contato entre esses grupos envolveu certas rivalidades disputas ameaças intimidações in tervenções invasões conquistas além de outras interações hostis ou bélicas Mas certamente em alguns momentos talvez em sua maioria prevaleceu o respeito mútuo a cooperação o comércio a conciliação o diálogo e as relações pacíficas e amigáveis Uma forma muito relevante de diálogo entre comunida des políticas autônomas a diplomacia também tem origens antigas há acordos formais registrados entre grupos políticos em 1390 aC e evidências de atividade semidiplomática já em 653 aC Barber 1979 89 Nesse sentido verificamos aqui o protótipo do problema clássico de RJ a guerra e a paz o conflito e a cooperação Além dos diferentes aspectos das relações internacionais enfatizados pelo realismo e pelo liberalismo O relacionamento entre grupos políticos independentes constitui o pro blema essencial das relações internacionais formadas com base na distinção fundamental entre as próprias identidades individuais e a dos outros em um mundo territorial composto por muitas identidades coletivas em contato cons tante Com isso chegamos a uma definição preliminar de sistema estatal definido pelas relações entre agrupamentos humanos organizados politicamente em territórios distintos e que não estão sujeitos a nenhum poder ou autoridade superior desfrutando e exercendo uma certa independência entre eles Por fim as relações internacionais são as interações entre tais grupos independentes A primeira demonstração histórica relativamente clara de um sistema esta tal é a Grécia antiga 500 aC 100 aC conhecida então como Hélade que abrangia um grande número de cidadesEstado Wight 1977 Watson 1992 A Grécia antiga não era um Estadonação como o atual mas mais especifi camente um sistema de cidadesEstado Atenas era a maior e mais famosa porém também havia muitas outras cidadesEstado como Esparta e Corinto que reunidas formaram o primeiro sistema estatal da história ocidental Apesar de haver relações extensas e elaboradas entre as cidadesEstado de Hélade os antigos agrupamentos políticos gregos não eram Estados soberanos moder nos com amplos territórios Comparada à maioria dos Estados modernos a cidadeEstado grega tinha urna população e um território menores as relações interurbanas também não contavam com uma diplomacia estabelecida e não havia nada similar ao direito internacional e às organizações internacionais O sistema estatal de Hélade tinha por base acima de tudo uma linguagem e uma religião comuns Introdução às relações internacionais O antigo sistema estatal grego foi finalmente destruído por impérios vizi nhos mais poderosos e sua população foi transformada em súditos do Império Romano 200 aC 500 dC A medida que conquistavam ocupavam e go vernavam a maioria da Europa e grande parte do Oriente Médio e do norte da África os romanos desenvolveram um império enorme Entretanto em vez de reconhecer as inúmeras comunidades políticas habitantes destas áreas o Império Romano as subordinou Em detrimento das relações internacionais ou semiinternacionais a única opção para as comunidades políticas naquele momento era a submissão a Roma ou a revolta Com o tempo essas comuni dades localizadas na periferia do império começaram a se manifestar como o exército romano não era capaz de conter as rebeliões começou a se retirar e em diversas ocasiões a própria cidade de Roma foi invadida e destruída pelas tribos bárbaras Desse modo o Império Romano finalmente chegou ao fim após muitos séculos de sobrevivência e sucesso político Logo depois da queda do poder romano o império originado na Europa cristã estabeleceuse como organização política predominante desenvolven dose gradualmente durante vários séculos Os dois principais sucessores de Roma na Europa também foram impérios o império católico medieval si tuado em Roma cristandade na Europa ocidental e o Império Bizantino ortodoxo em Constantinopla ou no que hoje é Istambul Bizâncío na Europa oriental e no Oriente Próximo Bizâncio afirmava ser a continuação do Império Romano cristianizado O mundo cristão medieval europeu 500 WGmOMPj6A Quadro 14 O Império Romano Roma emergiu como uma cidadeEstado na Itália central Durante vários sécu los a cidade ampliou sua autoridade e adaptou seus métodos de governo para atrair primeiro a Itália em seguida o Mediterrâneo ocidental e finalmente quase todo o mundo helenístico para um império maior do que qualquer outro já exis tente nesta área Esse feito único e surpreendente somado à transformação cultural ocasionada estabeleceu as fundações da civilização européia Roma ajudou a configurar a opinião e a prática contemporânea e européia sobre o Estado o direito internacional e especialmente o império e a natureza da auto ridade imperial Watson199294 BWKMíKMWa Por que estudar RI 33 1500 foí então dividido geograficamente durante a maior parte do tempo em dois impérios políticoreligiosos Além desses havia outros sistemas po líticos e impérios ainda mais distantes A África do Norte e o Oriente Médio faziam parte de um mundo de civilização islâmica originado na penínsu la árabe nos primeiros anos do século VII Havia também impérios onde hoje é o Irã e a índia O chinês foi o mais antigo dentre os que sobrevive ram e viveu sob dinastias diferentes por aproximadamente 4 mil anos antes do início do século XX Inclusive é possível que ainda exista mas na forma do Estado comunista chinês o qual se assemelha a um império em sua estrutura ideológica e hierarquia política Sendo assim a Idade Média chama atenção por ter sido a era do império e de relações e conflitos entre agrupamentos políticos diferentes Mas o contato entre os impérios era na melhor das hipóteses intermitente a comunicação era lenta e o transporte difícil Con seqüentemente a maioria destas organizações nesta época formava um mundo centrado em si mesmo Podemos falar sobre relações internacionais na Europa ocidental durante a Era Medieval Sim mas com dificuldade porque como já demonstrado a cristandade medieval funcionava mais como um império do que um sistema estatal Embora os Estados existissem não eram independentes nem sobera nos de acordo com o sentido moderno destas palavras Não havia territórios claramente definidos com fronteiras Em suma o mundo medieval não era uma colcha de retalhos geográfica com países distintos representados por co Quadro 15 CidadesEstado e impérios 500 aC 100 aC CidadesEstado gregas 200 aC 500 dC Império Romano 500 1500 Cristandade catól ica Mundo cristão medieval O papa em Roma Cristandade ortodoxa Império Bizantino Constantinopla Outros impérios históricos Islâmico Irã índia China 34 Introdução às relações internacionais rés diferentes mas uma mistura complicada e confusa composta por formas e matizes variados O poder e a autoridade eram organizados sob bases religiosa e política o papa e o imperador eram os líderes de duas hierarquias paralelas e conectadas uma religiosa e outra política Reis e outros governantes não eram completamente independentes e estavam subordinados a estas autoridades superiores e às suas leis E na maioria dos casos os governantes locais tinham certa liberdade com relação ao governo dos reis eram semiautônomos mas não totalmente independentes O fato é que a independência política territo rial conhecida hoje não estava presente na Europa medieval Quadro 16 A comunidade cristã da Europa medieval HIERARQUIA RELIGIOSA HIERARQUIA POLÍTICA Papa t 4 Imperador Arcebispos bispos e outros sacerdotes Padres e outros governantes comuns Cristãos comuns Reis e outros governantes locais semiindependentes Barões e outros governantes locais semiindependentes Pessoas comuns de inúmeras comunidades locais Sabese também que a Era Medieval foi marcada por desordem tumul to conflito e violência cuja origem acreditase é a falta de linhas claras de controle e organização política territorial As guerras ora eram travadas entre civilizações religiosas por exemplo as cruzadas cristãs contra o mundo is lâmico 10961291 ora eram travadas entre reis a Guerra dos Cem Anos entre Inglaterra e França 13371453 No entanto a guerra mais freqüente era feudal local e entre grupos rivais de cavaleiros cujos líderes apresenta vam alguma rixa A autoridade e o poder de se engajar em batalhas não eram Por que estudar RI 3 5 monopolizados pelo Estado diferentemente do que aconteceu mais tarde os reis não eram capazes de controlar os confrontos Nesse primeiro mo mento os direitos e capacidades de fazer a guerra pertenciam aos membros de uma casta distinta os cavaleiros armados e seus líderes e seguidores que combatiam ora em defesa do papa ora do imperador às vezes pelo rei outras por seus governantes e de forma mais regular por eles mesmos Não havia uma distinção clara entre guerra civil e internacional As guerras me dievais eram motivadas principalmente por questões relativas a acertos e erros lutas com o objetivo de defender a fé resolver conflitos sobre herança dinástica punir criminosos ou cobrar impostos entre outras Howard 1976 cl Diferente dos conflitos civis tais guerras raramente estavam associa das às disputas com relação ao controle exclusivo do território ou sobre o Estado ou aos interesses nacionais Na Europa medieval não havia nenhum território com controle exclusivo e nenhuma concepção clara da nação ou do interesse nacional Os valores ligados à condição de Estado soberano foram organizados de maneira diferente nos tempos medievais uma vez que nenhuma organização política tal como o Estado moderno satisfazia a todos estes atributos Em detrimento disso os valores eram administrados por estruturas distintas que operavam em diversos níveis da vida social A segurança por exemplo era pro vida pelos governantes locais e pelos cavaleiros que operavam em castelos e cidades fortificadas A liberdade não era um direito do indivíduo ou da nação mas dos governantes feudais e de seus seguidores e clientes A ordem era res ponsabilidade do imperador embora sua capacidade de imposição fosse bem limitada resultando em uma Europa medieval marcada pela turbulência e pela discórdia em todos os níveis da sociedade Os governantes políticos e líderes religiosos eram responsáveis por garantir a justiça apesar de esta ser bastante desigual aqueles que ocupavam alta posição nas hierarquias política e religiosa tinham acesso mais fácil à justiça do que o resto da população e as cortes varia vam em função da classe social Por não haver polícia a justiça freqüentemente era feita pelas próprias pessoas por meio de vinganças ou represálias O papa além de ser responsável por governar a Igreja por meio de uma hierarquia de bispos e de outros sacerdotes fiscalizava as disputas políticas entre reis e outros governantes nacionais serniindependentes Ademais membros do sacerdócio desempenhavam muitas vezes o papel de consultor mais experiente de reis e de outros governantes seculares Os reis por sua vez assumiam a função de 36 Introdução às relações internacionais defensores da fé como Henrique VIII da Inglaterra e os cavaleiros se consideravam os soldados cristãos O bemestar era associado à segurança e tinha por base laços feudais entre governantes locais e pessoas comuns que recebiam proteção em troca de uma parte do trabalho da colheita e de outros recursos e produtos derivados da economia camponesa local Além disso a moradia dos camponeses em vez de ser fruto de sua livre escolha estava ligada a proprietários feudais que poderiam ser membros da nobreza do sacerdócio ou de ambos No que consiste basicamente a mudança política do período medieval para o moderno A resposta simples é a transformação consolidou a provisão desses valores dentro da estrutura única de uma organização social indepen dente e unificada o Estado soberano No início da Era Moderna européia os governantes se emanciparam da autoridade políticoreligiosa dominan te da cristandade e se libertaram de sua dependência com relação ao poder militar dos barões e de outros líderes feudais locais A partir de então os barões passaram a se subordinar aos reis que se tornaram capazes de desafiar o imperador e o papa e conseqüentemente de defender o Estado soberano contra a desordem interna e a ameaça externa Já os camponeses começaram sua longa jornada em busca da independência com relação aos governantes locais feudais a fim de se tornarem súditos diretos do rei e finalmente se transformarem no povo Em suma o poder e a autoridade estavam concentrados em um único pon to o rei e seu governo O rei passou a governar um território cujas fronteiras eram defendidas contra a interferência externa Assumiu também a autorida de suprema acima de toda a população do país e não precisava mais agir por intermédio de governantes e de lideranças intermediárias Essa transformação política fundamental marca o advento da Era Moderna Um dos principais efeitos da ascensão do Estado moderno foi seu mono pólio sobre os meios de operação militar O rei primeiro estabeleceu a ordem interna e em seguida se tornou o único centro do poder dentro do país Cavaleiros e barões que em tempos passados controlavam os seus próprios exércitos passaram a obedecer às ordens do rei Assim muitos monarcas decidiram investir na expansão de seus territórios estimulando conseqüen temente o desenvolvimento de rivalidades internacionais que muitas vezes resultaram em guerras e na ampliação de alguns países à custa de outros Freqüentemente Espanha França Áustria Inglaterra Dinamarca Suécia Por que estudar RI 3 7 Quadro 17 Autoridade medieval e moderna AUTORIDADE MEDIEVAL DISPERSA AUTORIDADE MODERNA CENTRALIZADA sem soberania soberania Papa Imperador Governo Rei Arcebispo Barão Bispo Padre Cavaleiro Povo Povo Holanda Polônia Rússia Prússia e outros Estados do novo sistema estatal europeu estavam em guerra Algumas foram geradas pela Reforma Protestan te que dividiu profundamente a população cristã européia nos séculos XVI e XVII mas os conflitos eram cada vez mais provocados pela mera existência de Estados independentes cujos governantes recorriam à guerra como um meio de defender seus interesses realizar suas ambições e se possível de expandir suas posses territoriais Nesse sentido a guerra se tornou uma instituição internacional de peso para a resolução de desavenças entre os Estados sobe ranos Sendo assim a mudança política do período medieval para o moderno envolveu basicamente a construção do Estado territorial independente O Estado conquistou território e o transformou em propriedade estatal defi nindo a população da região como súditos e mais tarde como cidadãos Na maioria dos países as igrejas cristãs também passaram a ser controladas pelo governo estatal Claramente não havia espaço dentro dos Estados modernos para a existência de instituições povos ou territórios semiindependentes No sistema internacional moderno o território é consolidado unificado e 3o Introdução às relações internacionais centralizado sob um governo soberano A população estatal por sua vez é leal ao próprio governo e tem a obrigação de obedecer a suas leis este gru po de pessoas inclui bispos assim como barões comerciantes e aristocratas Ou seja todas as organizações a partir da implementação do sistema de Estados modernos passaram a ser subordinadas à autoridade estatal e à lei pública E a origem do familiar mapa do mundo em formato de colcha de retalhos em que cada área de trabalho está sob a jurisdição exclusiva de um Estado particular Todo o território da Europa é dividido desta forma por meio de governos independentes e com o tempo todo o planeta será O entroncamento do final histórico da Era Medieval e do ponto de partida do sistema internacional moderno é freqüentemente identificado com a Guerra dos Trinta Anos 161848 e com a Paz de Vestfália acordo responsável pelo término do conflito Quadro 18 A Guerra dos Trinta Anos 161848 Iniciada como uma revolta da aristocracia protestante contra a autoridade espa nhola na Boêmia a guerra intensificouse rapidamente e com o tempo incluiu todos os tipos de questões Questões de tolerância religiosa estavam na base do conflito Mas já em 1630 a guerra envolvia um emaranhado de interesses conflitantes incluindo os de caráter dinástico religioso e estatal A Europa lutava sua primeira guerra continental Holsti 1991268 Desde a metade do século XVII os Estados eram considerados os únicos sis temas políticos legítimos europeus com base nos próprios territórios distintos nos governos independentes e nos próprios súditos políticos As muitas carac terísticas proeminentes desse sistema estatal emergente podem ser resumidas Primeiramente consistia de Estados contíguos cuja legitimidade e indepen dência foram mutualmente reconhecidas Em segundo este reconhecimento dos Estados não se estendeu além das fronteiras do sistema estatal europeu as organizações excluídas eram vistas em geral como inferiores politicamente e a maioria delas com o tempo foi subordinada ao governo imperial da Europa Em Por que estudar RI 3 9 Quadro 19 A Paz de Vestfália 1648 O acordo vestfaliano legitimou uma comunidade de Estados soberanos Marcou o triunfo do stato o Estado no controle de suas questões internas e na indepen dência externa Essa era a aspiração de príncipes governantes em geral e em especial dos príncipes germânicos ambos protestantes e católicos em relação ao império Sagrado Romano ou Habsburgo Os tratados de Vestfália estabeleceram muitas regras e princípios políticos da nova sociedade de Estados O acordo foi promovido para gerar um estatuto abrangente de toda a Europa Watson1992 186 terceiro as relações entre os Estados europeus estavam sujeitas ao direito inter nacional e às práticas diplomáticas portanto a expectativa era de que os países cumprissem as regras do jogo Por fim havia uma balança de poder entre os Estados membros cujo objetivo era impedir qualquer Estado de romper o con trole e competir pela hegemonia que reestabeleceria na verdade um império sobre o continente Várias potências tentaram impor sua hegemonia política ao continente O Império Habsburgo Áustria arriscou durante a Guerra dos Trinta Anos 161848 mas foi impedido pela coalizão liderada pela França e pela Sué cia Já a tentativa francesa ocorreu sob o regime do rei Luís XIV 16611714 porém falhou por causa da aliança angloholandesa Napoleão 17951815 também tentou mas não conseguiu vencer a GrãBretanha a Rússia a Prússia e a Áustria Em seguida a instauração da balança de poder pósnapoleônica entre os grandes poderes o Concerto da Europa foi sustentada durante a maior parte do período entre 1815 e 1914 A Alemanha por sua vez investiu sob a liderança de Hitler 193945 mas foi derrotada pelos Estados Unidos a União Soviética e a GrãBretanha Portanto durante os últimos 350 anos o sistema estatal europeu conseguiu resistir à principal tendência política da história mundial o ataque realizado por grandes poderes a fim de submeter os mais fracos a sua vontade política e assim restabelecer um império Até o momento de elaboração deste livro ainda não se sabia se a única superpotên cia remanescente da Guerra Fria os Estados Unidos se tornaria um hegemon global 40 Introdução às relações internacionais O sistema estatal global e a economia mundial No entanto na mesma época em que os Estados europeus resistiam ao império na Europa eles construíram vastos impérios no exterior e uma economia mundial por meio da qual controlavam a maioria das comunidades políticas nãoeuropéias localizadas no resto do mundo Ou seja os Estados ocidentais que foram incapazes de dominar uns aos outros conseguiram controlar a maior parte do resto do mundo tanto política como economicamente Tal monitoramento dos tetritórios nâoeuropeus começou no início da antiga Era Moderna no século XVI portanto a mesma época em que o sistema europeu estatal entrou em vigor O controle das organizações políticas externas pelos Estados europeus só terminou na metade do século XX quando os últimos povos nãoeuropeus finalmente se livraram do colonialismo ocidental e adquiriram independência política Vale ressaltar que o fato de os Estados oci dentais nunca terem sido bemsucedidos nas tentativas de dominar uns aos outros mas conseguirem governar a maioria dos outros é muito importante na configuração do sistema internacional moderno A supremacia e a ascendência global do Ocidente são cruciais para entender as RI inclusive nos dias atuais A história da Europa moderna é composta de conflitos econômicos e polí ticos e de guerras entre seus Estados soberanos Os Estados fazem a guerra e a guerra fez e desfez os Estados Tilly 1992 Entretanto as rivalidades de Estado européias não estiveram concentradas apenas na Europa mas onde quer que o poder e as ambições européias pudessem ser projetados com o tempo todo o mundo foi impactado Os Estados europeus entravam em competição uns com os outros para invadir e controlar áreas economicamente desejáveis e militarmente úteis localizadas em outras partes do mundo Para os Estados europeus isso era natural fazia parte do seu direito a idéia de que os povos nàoeuropeus também tinham direito à independência e à autodeterminação só surgiu mais tarde Enormes populações e territórios nãoeuropeus conse qüentemente foram subordinados ao controle dos Estados europeus seja por meio da conquista militar do domínio comercial ou da anexação política A expansão do império ocidental tornou possível pela primeira vez a for mação e o funcionamento de uma economia Parry 1966 e de uma política globais Buli e Watson 1984 Não à toa a ampliação do comércio entre o mun do ocidental e o nãoocidental começou aproximadamente na mesma época Por que estudar RI 41 em que surgiu o Estado moderno na Europa em torno de 1500 Utilizando barcos com munições pesadas e de longa distância usados tanto para trans portar mercadorias quanto para projetar poder político e militar os países europeus ampliaram seu poder para além da Europa Os continentes america nos foram aos poucos atraídos para o sistema de comércio mundial por meio da extração da prata e de outros metais preciosos do comércio de peles e da produção de bens agrícolas realizado em geral em grandes plantações com o uso da mãodeobra escrava Neste mesmo momento o Sudeste da Ásia e em seguida as partes continentais do Sul e do Sudeste da Ásia se encontraram sob o controle e a colonização européia Enquanto os espanhóis os portugueses os holandeses os ingleses e os franceses expandiram seus impérios no exterior os russos seguiram por via terrestre Já no final do século XVIII o império russo com base no comércio de peles se ampliou da Sibéria para o Alasca e para baixo na costa oeste da América do Norte até o Norte da Califórnia Os poderes ocidentais também forçaram a abertura do comércio chinês e japonês embora nenhum dos países fosse colonizado politicamente Grandes territórios do mundo nãoeuropeu foram estabelecidos pelos europeus e mais tarde se tomaram Estados membros independentes do sistema estatal sob o controle da própria população de colonizadores os Estados Unidos os Estados da América Latina o Canadá a Austrália a Nova Zelândia e por um longo tempo a África do Sul O Oriente Médio e a África tropical foram os últimos continentes a serem colonizados pelos europeus Para esclarecer o sistema estatal durante a era do imperialismo político e econômico dos Estados europeus é preciso antes lembrar de algumas questões fundamentais Primeiro os Estados europeus fizeram acordos convenientes com sistemas políticos europeus corno as alianças organizadas pelos bri tânicos e pelos franceses com diferentes tribos de índios isto é nações da América do Norte Em seguida os Estados europeus onde puderam conquis taram e colonizaram os sistemas políticos nãoocidentais e os subordinaram aos seus impérios Um terceiro ponto é o fato de aqueles amplos impérios terem se tornado uma fonte básica de riqueza e de poder dos Estados europeus du rante muitos séculos Isso justifica o fato de o desenvolvimento da Europa ter sido alcançado principalmente com base no controle de extensos territórios nãoeuropeus e por meio da exploração de seus recursos humanos e naturais Em quarto algumas dessas colônias no exterior passaram a ser controladas por populações colonízadoras européias e muitos destes novos Estados coloniza Introdução às relações internacionais dores com o tempo foram aceitos como membros do sistema estatal europeu Esse processo começou no século XVIII com o sucesso da revolução americana contra o Império Britânico que desencadeou a transição de um sistema estatal europeu para um sistema estatal ocidental Finalmente ao longo de toda a era do imperialismo vestfaliano do século XVI até o início do século XX não houve interesse nem vontade de incorporar sistemas políticos nãoocidentais ao sistema estatal com base na igualdade de soberania Só depois da Segunda Guerra Mundial isso passou a ocorrer em uma escala maior Quadro 110 Presidente McKinley sobre o imperialismo norteameri cano nas Filipinas 1899 Quando percebi que as Filipinas uma colônia espanhola haviam caído em nossos colos como resultado da derrota da Espanha para o Exército dos Estados Unidos Eu de fato não sabia Tarde da noite me veio assim 1 que não poderíamos devolvêlas à Espanha seríamos covardes e desonrados 2 que não podería mos transformálas em território francês ou alemão nossos rivais comerciais no Oriente que seria um negócio ruim e sem credibilidade 3 que não poderíamos deixálos por si próprios eles eram inadequados para se autogovernar e logo formariam uma anarquia e um governo ruim na região seria pior do que era na Espanha e 4 não restava outra opção a não ser leválas e inserir as Filipinas no mapa dos Estados Unidos Bridgesetal1969184 O primeiro estágio da globalização do sistema estatal aconteceu via incorpora ção de países nãoocidentais que não estavam sujeitos ao controle político de um Estado ocidental imperial Mesmo escapando da colonização estes Estados eram obrigados a aceitar as regras do sistema estatal ocidental O Império Otomano a Turquia é um exemplo foi forçado a aceitar tais regras por meio do Tratado de Paris em 1854 O Japão é outro que se submeteu às normas ocidentais no século XIX e rapidamente adquiriu a essência organizacional e a configuração consti tucional de um Estado moderno Já no início do século XX o Japão se tornara uma grande potência demonstrando claramente sua força quando derrotou militarmente a Rússia outra grande potência no campo de batalha da guerra Por que estudar Ri 43 russojaponesa de 19045 A China foi obrigada a aceitar as regras do sistema estatal ocidental durante os séculos XIX e início do XX mas o país só foi comple tamente reconhecido como uma potência a partir de 1945 O segundo estágio da globalização do sistema estatal foi provocado pelo movimento anticoloníalísta das colônias ligadas aos impérios ocidentais Nessa luta líderes políticos nativos reivindicaram a descolonização e a independência com base nas idéias de autode terminação européias e norteamericanas Essa revolta contra o Ocidente como Hedley Buli afirmou foi o principal veículo por meio do qual o sistema estatal se expandiu dramaticamente após a Segunda Guerra Mundial Buli e Watson 1984 Em um curto período de vinte anos começando com a independência da índia e do Paquistão em 1947 a maioria das colônias na Ásia e na África se tornou Estado independente e membro das Nações Unidas Quadro 111 A declaração de 1945 do presidente Ho Chi Minh sobre a independência da República do Vietnã Todos os homens são iguais Eles recebem do Criador certos direitos inaliená veis entre estes a vida a liberdade e a busca da felicidade Todos os povos na terra são iguais no nascimento todos têm o direito de viver ser felizes e livres Nós membros do governo provisório representando toda a população do Vietnã declaramos e renovamos aqui nossa declaração de que cortamos todas as re lações com a França e abolimos todos os direitos especiais que os franceses adquiriram de modo ilegal em nossa terra natal Estamos convencidos de que as nações aliadas que reconheceram em Teerã e em São Francisco os princípios da autodeterminação e da igualdade de status não se recusarão a reconhecer a independência do Vietnã Por essas razões nós declaramos ao mundo que o Vietnã tem o direito de ser livre e independente R Bridges et ai196931112 A descolonização européia do Terceiro Mundo triplicou o número de Es tados participantes da ONU de 50 países em 1945 para 160 em 1970 Cerca de 70 da população mundial era formada por cidadãos ou súditos de Estados independentes em 1945 e assim representados no sistema estatal Em 1995 este cálculo era quase de 100 A difusão do controle político e econômico Introdução às relações internacionais europeu para além da Europa demonstrou assim ser uma expansão do sistema estatal que se tornou efetivamente global na segunda metade do século XX A dissolução da União Soviética concomitante à fragmentação da Iugoslávia e da Tchecoslováquía no final da Guerra Fria marcou o estágio final da globa lização do sistema estatal Com isso o número de Estados membros da ONU chegou a ser quase 200 no fim do século XX Atualmente o sistema é uma instituição global que afeta a vida de quase todos na Terra quer percebamos ou não Ou seja as RI são agora mais do que nunca uma disciplina acadêmica universal Ademais isso significa que a política mundial no início do século XXI deve conciliar uma variedade de Estados bem mais heterogêneos em termos de cultura religião língua ide ologia forma de governo capacidade militar complexidade tecnológica níveis de desenvolvimento econômico etc do que antes Essa é uma mudança fun damental para o sistema estatal e um grande desafio para os acadêmicos de RI no desenvolvimento de suas teorias Quadro 11 2 A expansão global do sistema estatal 1 600 Europa sistema europeu 1 700 América do Norte sistema ocidental 1800 América do Sul Japão sistema globalizado 1900 Ásia África Caribe Pacífico sistema global As RI e o inundo contemporâneo dos Estados em transição Muitas das importantes questões do estudo de RI estão ligadas à teoria e à prática da natureza do Estado soberano que como demonstrado é a instituição histórica central da política mundial Mas há também outras questões re levantes que promoveram debates permanentes sobre a esfera de ação das RI Por que estudar RI Em um extremo o foco acadêmico é exclusivamente nos Estados e nas relações entre países mas em um outro extremo as RI abrangem quase tudo associado às relações humanas em todo o mundo E para ter um conhecimento ponderado e equilibrado de RI é essencial estudar essas diferentes perspectivas O motivo de associar as várias teorias de RI aos Estados e ao sistema estatal é garantir que a centralídade histórica deste assunto seja reconhecida Até mesmo os teóricos que buscam ir além do Estado em geral o consideram um ponto de partida fundamental o sistema estatal é a principal referência tanto para as abordagens tradicionais quanto para as novas Os próximos capítulos analisarão como cada tradição de RI tentou compreender o Estado soberano Há debates sobre como devemos conceitualizar o Estado e por isso as diferentes teorias de RI assumem abordagens diversas Nos próximos capítulos apresentaremos de bates contemporâneos sobre o futuro do Estado se a importância central do Estado na política mundial está mudando é por exemplo uma das principais questões do estudo contemporâneo de RI Mas o fato é que os Estados e o siste ma estatal permanecem no núcleo da análise e da discussão acadêmica em RJ No entanto não há dúvidas de que devemos estar alerta ao fato de que o Estado soberano é um conceito teórico contestado Quando perguntamos o que é o Estado e o que é o sistema estatal as respostas vão variar dependen do da abordagem teórica adotada a realista divergirá da liberal que por sua vez será diferente daquela da sociedade internacional e das teorias de EPI Nenhu ma dessas respostas está completamente correta ou totalmente errada porque a verdade é que o Estado é uma entidade complexa e de certo modo confusa e ainda não há um consenso com relação a sua dimensão e seu propósito O sistema estatal não é conseqüentemente um assunto de fácil compreensão e pode ser entendido por meio de muitas formas e ênfases Mas ísso tudo pode ser simplificado Vale a pena refletir sobre o Estado com duas dimensões diferentes sendo que cada uma dividida em duas categorias ex tensas A primeira é o Estado como governo e o Estado como país Visto de dentro o Estado é o governo nacional é a principal autoridade governante no país ou seja possui soberania interna Esse é o aspecto interno do Estado Questões fun damentais com relação ao aspecto interno envolvem relações de Estadosoáedade como o governo administra a sociedade nacional os meios para exercer seu poder e as fontes de sua legitimidade como lida com as demandas e preocupações de indivíduos e grupos que estabelecem a sociedade nacional como gerencia a eco nomia nacional quais suas políticas nacionais e assim por diante 46 Introdução às relações internacionais Visto internacionalmente contudo o Estado não é simplesmente um governo é um território povoado com uma sociedade e um governo nacional Em outras palavras é um país Sob este ângulo tanto o governo quanto a sociedade nacional formam o Estado Se um país é um Estado soberano será em geral reconhecido como independente politicamente Este é o aspecto externo do Estado em que as principais questões envolvem relações interestatais como governos e sociedades de Estados se relacionam e lidam uns com os outros qual a base destas relações interestatais quais as políticas externas de determinados Estados quais são as organizações internacionais dos Estados como as pessoas de países diferentes interagem e se engajam em transações umas com as outras e assim por diante Isso nos leva à segunda dimensão do Estado que divide o aspecto externo da natureza do Estado soberano em duas categorias extensas A primeira é o Estado visto como uma instituição formal ou legal em sua relação com ou tros Estados Nesse sentido é uma entidade reconhecida como soberana ou independente membro de organizações internacionais e detentora de vários direitos e responsabilidades Devemos nos referir a esta primeira categoria como condição jurídica de Estado O reconhecimento é um elemento essencial da condição jurídica de Estado que qualifica os Estados para participarem da sociedade internacional inclusive de serem membros da ONU A ausência de reconhecimento nega isso Nem todo país é reconhecido como independente um exemplo é Quebec uma província do Canadá Para se tornar indepen dente os Estados soberanos já existentes entre estes os mais importantes seriam o Canadá e depois os Estados Unidos devem reconhecêlo como tal A quantidade de países reconhecidos como Estados soberanos é sempre menor do que a de não reconhecidos mas com capacidade de se tornarem um Quadro 11 3 A dimensão externa da condição de Estado Estado como um país Condição de Estado jurídica legal Território governo sociedade Reconhecimento por outros Estados Condição de Estado empírica real Instituições políticas base econômi ca unidade nacional Por que estudar RI 47 dia juridicamente independentes Isso porque a independência é em geral vista como um valor político Mas os países já reconhecidos como Estados soberanos normalmente não estão dispostos a ver novos países reconhecidos porque isso demandaria uma partilha os Estados existentes perderiam território população recursos poder status etc Uma vez que a separação de territórios fosse tida como uma prática aceita a estabilidade internacional estaria ameaçada já que estabe leceria um perigoso precedente capaz de desestabilizar o sistema estatal caso um número crescente de países atualmente subordinados mas com potencial para se tornarem independentes se organizasse para exigir o reconhecimento como Estado soberano Portanto é provável que sempre haja alguém batendo na porta da soberania de Estado mas há uma grande relutância de abrir a porta e deixá lo entrar Isso levaria à desordem do presente sistema estatal especialmente hoje em que não existem mais colônias e todo o território habitado do mundo se delimita ao sistema global de Estados Por isso a condição jurídica de Estado é cuidadosamente racionada pelos Estados soberanos existentes A segunda categoria é o Estado visto como uma organização político econômica importante Nesse sentido considerase o papel dos países no de Quadro 114 Modelos de Estado no sistema estatal global Soberania legal jurídica Sim Condição de Estado empírica real Sim Estados fortes Estados Unidos Dina marca Japão França etc Não Não Taiwan Chechênia Quebec etc QuaseEstados Somália Libéria Sudão etc 48 introdução às relações internacionais senvolvimento de instituições políticas eficientes uma base econômica sólida e um grau substancial de unidade nacional isto é de unidade popular e apoio ao Estado Devemos nos referir a essa segunda categoria como condição empíri ca de Estado Alguns países são bastante fortes uma vez que têm um alto nível de condição empírica de Estado este é o caso da maioria dos Estados no Ocidente Muitos desses são países pequenos como a Suécia a Holanda e Lu xemburgo Um Estado forte no sentido de um alto nível de condição empírica de Estado deve ser de forma diferente da noção de um poder forte no senti do militar Como a Dinamarca alguns Estados fortes não são militarmente poderosos ao contrário de outros símbolos de poder militar como a Rússia que não são Estados fortes O Canadá é o caso atípico de um país bastante desenvolvido com a presença de um governo democrático efetivo mas com uma enorme fraqueza em sua condição de Estado a ameaça de Quebec de se separar Por outro lado os Estados Unidos são um Estado e um poder forte na verdade são o poder mais forte do mundo Quadro 115 Estados fortesfracos poderes fortesfracos PODER FORTE PODER FRACO ESTADO FORTE UE França Japão Dinamarca Suíça Nova Zelândia Cingapura ESTADO FRACO Rússia Iraque Paquistão Somália Libéria Chade etc Essa distinção entre a condição empírica e jurídica de Estado é de fundamen tal importância porque ajuda a entender as próprias diferenças entre os quase 200 Estados independentes e formalmente iguais no mundo atual Os Estados diferem bastante com relação à legitimidade de suas instituições políticas à efetividade de suas organizações governamentais às suas produtividades e rique zas econômicas às suas influências políticas aos seus status e às suas unidades nacionais Nem todos os Estados possuem governos nacionais efetivos Alguns deles tanto grandes quanto pequenos são organizações sólidas e capazes Es tados fortes como a maioria dos Estados no Ocidente Já alguns mícroestados Por que estudar RI 49 localizados em ilhas pequenas no oceano Pacífico são tão pequenos que mal podem arcar com um governo Outros podem ter territórios ou populações ra zoavelmente grandes ou ambos como a Nigéria ou o Congo antigo Zaire mas são tão pobres tão ineficientes e tão corruptos que dificilmente são capazes de funcionar como um governo efetivo Um grande número de Estados espe cialmente no Terceiro Mundo apresenta um baixo grau de condição empírica de Estado Suas instituições são fracas suas bases econômicas são frágeis e pou co desenvolvidas além de terem pouca ou nenhuma unidade nacional Sendo assim podemos nos referir a estes Estados como quaseEstados possuem condição jurídica de Estado mas são extremamente deficientes na condição em pírica Qackson 1990 Se resumirmos as várias distinções feitas até aqui teremos uma idéia do sistema estatal global mostrado no quadro 116 Quadro 116 O sistema estatal global Cinco grandes potências Estados Unidos Rússia China GrãBretanha França Aprox 30 Estados altamente substanciais Europa América do NorteJapào Aprox 75 Estados moderadamente substanciais Ásia e América Latina Aprox 90 quaseEstados insubstanciais África Ásia Caribe Pacífico Inúmeros sistemas políticos territoriais não reconhecidos submergidos nos Es tados existentes Uma das condições mais importantes que esclarece a existência de tantos quaseEstados no Terceiro Mundo é o subdesenvolvimento econômico A po breza e as conseqüentes carências de investimento infraestrutura estradas escolas hospitais etc tecnologia avançada pessoas treinadas e instruídas e outros bens ou recursos socioeconômicos estão entre os principais responsá veis pela situação de fraqueza desses Estados Seus governos e instituições não têm fundação sólida o suficiente Certamente a instabilidade desses Estados é um reflexo da pobreza e do atraso quando comparado aos outros membros do sistema estatal e enquanto estas condições permanecerem a incapacidade deles como Estados provavelmente também será mantida O cenário afeta muito a natureza do sistema estatal e portanto a natureza das nossas teorias de RI 50 Introdução às refações internacionais É possível tirar diferentes conclusões a partir do fato de que a condição empí rica de Estado é muito variável no sistema estatal contemporâneo desde países econômica e tecnologicamente avançados em sua maioria ocidentais até países econômica e tecnologicamente atrasados que na maior parte das vezes são nãoocidentais Os acadêmicos realistas de RI focam principalmente os Estados posicionados no centro do sistema os poderes mais importantes e em especial as grandes potências Consideram os Estados do Terceiro Mundo atores marginais de um sistema de política de poder sempre fundamentado na desigualdade das nações Tucker 1977 Tais Estados marginais ou peri féricos não são capazes de influenciar o sistema de modo significativo Outros acadêmicos de RI em geral os liberais e os teóricos da sociedade internacio nal acreditam que as condições adversas dos quaseEstados são uni problema fundamental para o sistema estatal no que diz respeito às questões de ordem internacional assim como de justiça e de liberdade internacionais Alguns pesquisadores de EPI em especial os marxistas consideram o sub desenvolvimento de países periféricos e as relações desiguais entre o centro e a periferia da economia global o elemento crucial explicatório de suas teorias do sistema internacional moderno Wallerstein 1974 Eles analisam as ligações internacionais entre a pobreza do Terceiro Mundo ou o Sul e o enriqueci mento dos Estados Unidos da Europa e de outras regiões do Norte Para esses teóricos a economia internacional é um sistema mundial geral no qual os Estados capitalistas desenvolvidos do centro avançam à custa dos fracos e sub desenvolvidos da periferia Segundo esses acadêmicos a igualdade legal e a independência política que designamos como condição jurídica de Estado é apenas um pouco mais do que uma fachada educada capaz de encobrir a vulnerabilidade extrema dos países pobres do Terceiro Mundo e o domínio e a exploração exercidos pelos Estados capitalistas ricos do Ocidente sobre eles Os países subdesenvolvidos revelam de modo impressionante as imensas desigualdades empíricas da política mundial contemporânea no entanto é a posse da condição jurídica de Estado refletida na participação no sistema estatal que coloca esta divergência em uma perspectiva mais definida Dessa forma as diferenças são acentuadas e é mais fácil perceber que as populações de alguns Estados os desenvolvidos desfrutam condições de vida bem melhores do que as de outros Estados os subdesenvolvidos O fato de que países subde senvolvidos e desenvolvidos pertencem ao mesmo sistema estatal global suscita questões diferentes do que se os considerássemos membros de sistemas total Por que estudar RI 5 1 mente distintos assim como antes da criação do sistema estatal global É mais fácil avaliar casos de segurança liberdade e progresso ordem e justiça e riqueza e pobreza entre países do mesmo sistema internacional uma vez que dentro de um sistema as mesmas expectativas e padrões gerais se aplicam Portanto se al guns Estados não conseguem satisfazer as expectativas e os padrões comuns por causa de seu subdesenvolvimento isso é um problema internacional e não so mente uma questão nacional ou referente a outra pessoa Essa nova perspectiva é uma grande mudança em relação ao passado quando a maioria dos sistemas políticos nãoocídentais estava de fora do sistema estatal seguindo padrões di ferentes ou era colônia dos poderes imperiais ocidentais que eram responsáveis por eles devido a uma questão de política nacional em vez de externa Quadro 117 Incluídos e excluídos no sistema estatal ANTIGO SISTEMA ESTATAL ATUAL SISTEMA ESTATAL Núcleo pequeno de incluídos todos Quase todos os Estados são incluídos Estados fortes reconhecidos com a condição de Es tado formal ou jurídica Muitos excluídos colônias depen Grandes diferenças entre os incluídos dências etc alguns Estados fortes alguns quase Estados fracos Esses acontecimentos ressaltam a dinâmica do mundo de Estados que está em constante transformação não é estático nem inalterável Nas relações internacionais como em outras esferas das relações humanas nada permanece exatamente igual por muito tempo As relações internacionais mudam para lelo a tudo o maís a política a economia a ciência a tecnologia a educação a cultura e o restante Um caso óbvio e adequado é a inovação tecnológica que desde o início causou um grande efeito sobre as relações internacionais e continua impactandoas de forma imprevisível Durante anos a tecnologia militar nova ou aperfeiçoada influenciou bastante a balança de poder a cor rida armamentista o imperialismo e o colonialismo as alianças militares a 52 Introdução às relações internacionais natureza da guerra entre outros eventos O crescimento econômico permitiu o aumento do orçamento militar promovendo o desenvolvimento de forças militares maiores melhor equipadas e mais efetivas As descobertas científicas possibilitaram a elaboração das novas tecnologias como as de transporte ou de informação que uniram ainda mais o mundo tornando as fronteiras na cionais mais permeáveis A alfabetização a educação em massa e a expansão da qualificação superior capacitaram os governos a aumentar a produção dos Estados e de suas atividades em esferas cada vez mais especializadas da socie dade e da economia É claro que estes fenômenos produzem efeitos opostos pois as pessoas com educação superior não aceitam que digam a elas o que pensar ou fazer A mudan ça de idéias e valores culturais afetou não só a política externa de determinados Estados mas também a configuração e o rumo das relações internacionais Por exemplo as ideologias contra o racismo e o imperialismo articuladas primeiro pelos intelectuais nos países ocidentais finalmente enfraqueceram os impérios estrangeiros ocidentais na Ásia e na África e contribuíram com o processo de descolonização ao tornar a justificativa moral do colonialismo cada vez mais inadequada e com o tempo impossível de ser sustentada Os exemplos do impacto da mudança social sobre as relações internacionais são praticamente intermináveis tanto em quantidade quanto em variedade Contudo isso deve ser suficiente para afirmar que a transformação social in fluencia os Estados e o sistema estatal A relação é sem dúvida reversível o sistema estatal também afeta a política a economia a ciência a tecnologia a educação a cultura e todo o resto Por exemplo afirmase com freqüência que o desenvolvimento de um sistema estatal na Europa foi decisivo para levar este continente à frente de todas as outras regiões durante a Era Moderna A con corrência entre os Estados europeus independentes dentro do próprio sistema estatal competições militar econômica científica e tecnológica impulsio nou o avanço destes Estados frente aos sistemas políticos nãoeuropeus que não foram estimulados pelo mesmo grau de concorrência Um acadêmico cha mou atenção para o fato Os Estados da Europa estavam cercados por reais ou potenciais competidores Se o governo de um deles fosse complacente seu próprio prestígio e segurança militar seriam prejudicados O sistema estatal foi uma garantia contra a estagnação econômica e tecnológica Jones 1981 10426 Não devemos concluir portanto que o sistema estatal simplesmente reage à mudança é também a causa desta dinâmica l Por que estudar RI 53 í As mudanças sociais levantam uma questão ainda mais fundamental Será que deveríamos esperar que com o tempo os Estados mudem tanto de modo a não serem mais Estados no sentido discutido aqui Por exemplo se o pró cesso de globalização econômica continuar e tornar o mundo um único local de mercado e de produção o sistema estatal será então obsoleto Pensamos nas seguintes atividades que devem ultrapassar os Estados comércio e inve timento cada vez maiores aumento da atividade empresarial multinacional ampliação das ações das ONGs organizações nãogovernamentaís elevação da comunicação regional e global crescimento da internet expansão e amplia ção constante das redes de transporte intensificação das viagens e do turismo migração humana maciça poluição ambiental acumulada integração regional ampliada o crescimento das comunidades mercantis expansão global da ciên cia e da tecnologia contínua redução do governo privatização elevada e outras atividades que propulsionam a interdependência através das fronteiras Ou será que os Estados soberanos e o sistema estatal encontrarão formas de se adaptar a estas mudançasimportantes àsim como fizeram durante os últimas 350 anos Algumas destas mudanças foram igualmente fundamentais a revolução científica do século XVII o iluminismo do século XVIII o encontro das civilizações ocidentais e nãoocidentaís durante vários séculos o crescimento do colonialismo e do imperialismo ocidentais a Revolução Industrial dos séculos XVIII e XIX o aumento e a difusão do nacionalismo nos séculos XIX e XX revolução do anti colonialismo e da descolonização no século XX a expansão da educação pública em massa o crescimento do Estado de bemestar entre qutros Estas são algumas das questões mais fundamentais dos estudos contemporâneos das RI e devemos têlas em mente quando especulamos sobre o futuro do sistema estatal Conclusão O sistema estatal é uma instituição histórica formada por pessoas A população do mundo nem sempre viveu em Estados soberanos durante a maior parte da história humana registrada as pessoas viveram sob tipos diferentes de organização política Em épocas medievais a autoridade política era caótica e dispersa assim 54 Introdução às relações internacionais a maioria das pessoas dependia de um grande número de lideranças diferentes algumas delas políticas outras religiosas com diferentes responsabilidades e poderes desde o governante local e do senhorio até o rei em uma distante ci dadecapital desde o padre da paróquia até o papa na Roma longínqua No Estado moderno a autoridade é centralizada em um governo legalmente su premo e a população vive sob leis convencionais estabelecidas pela autoridade O desenvolvimento do Estado moderno passou por um longo caminho em direção ao poder e à autoridade política sistematizada de acordo com as linhas nacionais O sistema estatal foi preferencialmente um sistema estatal europeu Du rante a era do imperialismo ocidental o resto do mundo foi dominado pelos europeus tanto política quanto economicamente Somente com a descoloni zação asiática e africana após a Segunda Guerra Mundial o sistema estatal se tornou uma instituição global A globalização do sistema estatal ampliou muito a variedade de seus Estados membros e conseqüentemente sua diver sidade A diferença mais importante está entre os Estados fortes com um alto nível de condição empírica de Estado e os quaseEstados fracos que apesar da soberania formal apresentam pouca condição substancial de Estado Isto é a descolonização contribuiu para uma profunda divisão interna do sistema estatal entre o Norte rico e o Sul pobre entre países desenvolvidos no centro que dominam o sistema política e economicamente e países subdesenvolvidos nas periferias com influência econômica e política limitada As pessoas quase sempre esperam que os Estados defendam certos valo res essenciais segurança liberdade ordem justiça e bemestar A teoria de RI estuda as formas pelas quais os Estados asseguram ou não estes valores His toricamente o sistema estatal consiste de muitos Estados detentores de armas pesadas incluindo um pequeno número de potências muitas vezes rivais mi Htarmente que já se enfrentaram em guerras Essa realidade do Estado como uma máquina de guerra enfatiza o valor da segurança o ponto de partida para a tradição realista das RI Sendo assim até o momento em que os Estados deixem de ser rivais armados a teoria realista terá uma forte base histórica O término da Guerra Fria apresenta sinais de mudanças prováveis as grandes potências cortaram de forma significativa seus orçamentos militares e redu ziram o tamanho de suas Forças Armadas Por outro lado as potências têm modernizado seus exércitos marinhas e forças aéreas e ainda nem considera ram abandonar suas armas Isso indica que o realismo continuará uma teoria de RI relevante ainda por algum tempo Por que estudar RI 5 5 No entanto também é verdade que a maioria dos Estados coopera uns com os outros de forma quase que regular sem muito drama político em busca de vantagem mútua Nesse sentido os países têm relações diplomáticas co merciais apoiam mercados internacionais trocam conhecimento científico e tecnológico abrem suas portas a investidores empresários turistas e viajan tes estrangeiros Ademais os Estados colaboram de modo a lidar com vários problemas comuns desde o meio ambiente ao tráfico ilegal de drogas por exemplo se comprometem com tratados bilaterais e multilaterais com este propósito Em suma os Estados interagem de acordo com as normas de re ciprocidade A tradição liberal das RI tem por base a idéia de que o Estado moderno ao agir de forma tranqüila e rotineira contribuí estrategicamente para o progresso e a liberdade internacionais Como os Estados defendem a ordem e a justiça no sistema estatal Prin cipalmente por meío das regras do direito internacional das organizações internacionais e da diplomacia Desde 1945 testemunhamos uma enorme ex pansão desses elementos da sociedade internacional Nesse contexto a tradição da sociedade internacional nas RI enfatiza a importância de tais relações inter nacionais Finalmente o sistema estatal também é um sistema socioeconômico a riqueza e o bemestar são uma preocupação central da maioria dos Estados Esse fato é o ponto de partida para as teorias de EPJ em RI Os teóricos dessa linha também discutem as conseqüências da expansão ocidental e a futura incorporação do Terceiro Mundo ao sistema estatal Será que esse processo promove a modernização e o progresso no Terceiro Mundo ou proporciona desigualdade subdesenvolvimento e miséria Essa pergunta também leva a uma questão ainda maior sobre até que ponto vale a pena defender o sistema estatal em vez de substituílo As teorias de RI não apresentam uma resposta única mas a disciplina de RI se baseia na convicção de que os Estados sobe ranos e seu desenvolvimento são de importância crucial para o entendimento de como os valores básicos da vida humana são ou não fornecidos às pessoas em todo o mundo Os capítulos seguintes apresentarão mais a fundo as tradições teóricas das RI Começamos a tarefa introduzindo as RI como uma disciplina acadêmica Ao passo que este capítulo se preocupou com o desenvolvimento atual dos Estados e do sistema estatal o próximo se concentrará em analisar corno o nosso raciocínio sobre os Estados e as suas relações se desenvolveu ao longo do tempo 56 Introdução às relações internacionais Pon toschave A principal razão para se estudar RI é o fato de que toda a população mundial vive em Estados independentes Em conjunto esses Estados for mam o sistema estatal global Os valores essenciais que os Estados devem defender são a segurança a liberdade a ordem a justiça e o bemestar A teoria das RI diz respeito aos efeitos dos Estados e do sistema estatal sob esses valores O sistema de Estados soberanos surgiu na Europa no início da Era Moderna no século XVI A autoridade política medieval estava dispersa a autoridade política moderna é centralizada residindo no governo e no chefe de Estado O sistema estatal foi no começo europeu hoje é global O sistema esta tal global apresenta Estados de tipos bem variados grandes potências e pequenos países Estados substanciais fortes e quaseEstados fracos Há urna ligação entre a expansão do sistema estatal e o estabelecimento de um mercado mundial e uma economia global Alguns países do Ter ceiro Mundo se beneficiaram da integração à economia global outros permanecem pobres e subdesenvolvidos A globalização econômica e outros desenvolvimentos desafiam o Estado soberano Não podemos saber ao certo se o sistema estatal se tornará obso leto ou se os Estados encontrarão formas de se adaptar a novos desafios Questões O que é um Estado Por que precisamos deles O que é um sistema estatal Quando os Estados independentes e o sistema estatal moderno surgi ram Qual a diferença entre um sistema de autoridade política medieval e um moderno Esperamos que os Estados sustentem uma série de valores centrais segurança liberdade ordem justiça e bemestar Eles satisfazem as nossas expectativas Por que estudar RI 57 Quais são os efeitos da integração dos países do Terceiro Mundo à eco nomia global Devemos nos esforçar para preservar o sistema de Estados soberanos Por que ou por que não Explique as principais diferenças entre os Estados substanciais fortes quaseEstados fracos grandes potências e pequenos poderes Por que há tal diversidade no sistema estatal Para material e recursos adicionais consulte o web site do manual em wwwoupcoukbesttextbookspoliticsjacksonsorensen2e Orientação para leitura complementar Buli H e Watson A eds 1984 The ExpansionofInternationalSociety Oxford Clarendon Press Oslander A 1994 The States System ofEurope 16401990 Oxford Clarendon Press Tilly C 1992 Coercion Capitai and European States Oxford Blackwell Wallerstcin I 1974 The Modem WorldSystem Nova York Acadêmica Press Watson A 1992 The Evolution of International Society Londres Routledge Web links httpwwwyaleedulawwebavalonwestphalhtm Texto completo do Tratado de Vestfália de 1648 que estabeleceu a sociedade européia moderna internacional Hospedado pelo Projeto Avalon da Faculdade de Direito de Yale 58 Introdução às relações internacionais httpplatostanfordeduentrieswar Discussão sobre o conceito da guerra e links relacionados a recursos da internet Hospeda do pela Enciclopédia de Filosofia de Stanford httpcarlislewwwarmymilusawcParameters96springcreveldhtm Martin Van Creveld discute The Fate of the State Hospedado pela Faculdade de Guerra do Exército norteamericano httpwwwjeanmonnetp rogramorgpapers0000fi0801 html Jan Zielonka discute se um império neomedieval tem a probabilidade de se desenvolver na Europa Hospedado pelo Centro Jean Monnet da Faculdade de Direito da Universidade de Nova York