·

Medicina ·

Saúde Pública

Envie sua pergunta para a IA e receba a resposta na hora

Fazer Pergunta

Texto de pré-visualização

936 pinheiro, dias, silveira & silva -doença das pessoas e dos trabalhadores de modo particular. Considera o trabalho como eixo organizador da vida social e, desse modo, determinante das condições de vida e saúde e busca transformar os processos produtivos no sentido de torná-los promotores de saúde e não de adoecimento e morte, em estreita parceria com os trabalhadores. Os conceitos de processo de trabalho, trabalhador, saúde e doença relacionada ao trabalho estruturam o campo e ajudam a compreender os condicionantes sociais, econômicos, tecnológicos e organizacionais das condições de vida e de saúde da população e dos trabalhadores, decorrentes do modelo de desenvolvimento adotado pelo País. A construção do campo da ST no Brasil guarda estreita relação com o movimento de reorganização social e política do País ocorrido nos anos 70-80 e tem como principal característica trazer a discussão da contribuição do trabalho enquanto determinante das condições de vida e saúde para o âmbito da Saúde Coletiva. Dessa forma, rompe com as práticas tradicionais da Saúde Ocupacional, incorpora os trabalhadores como sujeitos e considera a responsabilidade da rede pública de serviços de saúde no cuidado dos trabalhadores. Busca prevenir os problemas que impedem ou dificultam o trabalhador de trabalhar, promover a saúde e empoderar os trabalhadores de modo a assegurar melhores condições de trabalho e manutenção de cuidado à saúde. Estes referenciais cimentaram a aliança entre setores progressistas da sociedade daquele momento histórico: as lideranças do movimento sindical, técnicos dos serviços de saúde e de instituições públicas no âmbito do Trabalho e da Previdência Social e da Academia (Mendes & Dias, 1991). Minayo-Gomez (2011), apresenta interessante síntese sobre a trajetória, e a configuração do campo da ST a partir de breve retrospectiva histórica do processo de formulação teórica e prática do campo, de suas características, limites e impasses. Finalizando, o autor faz indagações instigantes, entre elas, se a ST deve ser considerada um campo ou se seria mais indicado entendê-lo no interior do "campo das relações saúde-trabalho, como proposta da saúde coletiva". Foge aos objetivos deste texto o aprofundamento dessa discussão, entretanto, recomenda-se a leitura do capítulo supracitado, que elucida aspectos importantes sobre essas questões. No senso comum a palavra campo tem sido utilizada para designar os contornos de uma especialidade ou de uma área de conhecimento e de prática. Porém, o conceito sociológico de campo de Bourdieu (1996) implica a concepção de que na construção da realidade social, os agentes se enfrentam e lutam para impor seus interesses e pontos de vista, 937 Saúde do trabalhador que são determinados pela posição que ocupam no que pretendem transformar ou conservar. No campo da ST destaca-se o confronto entre capital e trabalho, que permeia as práticas das organizações sindicais, a atuação dos profissionais responsáveis pelo cuidado dos trabalhadores nos serviços de saúde e em outros espaços institucionais, entre eles a academia. A ST é essencialmente distinta da Saúde Ocupacional (SO). A SO tem como objetivos centrais a garantia da produção e/ou a produtividade da empresa (Vasconcelos & Pignati,2006). No Brasil, os processos produtivos têm se modificado significativamente a partir de meados do século XIX, quando o país deixa de ser apenas produtor e exportador de matérias-primas e tem início a industrialização. Nesse momento, o perfil do trabalho era caracterizado por jornadas extensas, péssimas condições de trabalho e quase nenhuma regulamentação das relações entre empregadores e trabalhadores. A acelerada industrialização ocorrida a partir da Segunda Guerra Mundial, baseada na incorporação tecnológica e na organização e gestão do trabalho de base taylorista-fordista, foi acompanhada da ampliação das lutas dos trabalhadores organizados em sindicatos, por melhores condições de vida e de trabalho e maior regulamentação das condições laborais e das políticas de proteção social por parte do Estado, ainda que de modo desigual para o conjunto do operariado (Rocha & Nunes, 1994). A partir dos anos 70, a introdução de novas tecnologias, com a automação dos processos, da informatização e de novos modelos de gerenciamento da força de trabalho reestruturam a produção. O antigo modelo, fixado no interior da fábrica, limitado por paredes, rígido e sob vigilância direta do patrão ou seus prepostos foi substituído pela flexibilização nos processos, nos mercados de trabalho, nos produtos, nos padrões de consumo e nas bases de circulação, rompendo os limites geográficos. A produção industrial é fragmentada, exige o trabalho em equipe e a diluição do sistema hierárquico. Quebra-se a centralidade das decisões, dominante no esquema fordista, combinando graus variados de coersão e consentimento dos trabalhadores, que passam a contribuir para a inovação dos processos, orientados pela busca de maior competitividade no mercado. Na nova ordem econômica, a flexibilidade também se manifesta sob as formas do trabalho temporário, precário, a bem da ampliação do desemprego estrutural, em um território mutante e fluído, no qual se desenha o perfil dos trabalhadores urbanos — e crescentemente dos rurais nos agronegócios — com reflexos sobre sua vida e sua saúde (Nehemy & Dias, 2010). SAÚDE DO TRABALHADOR Tarcísio Marcos Magalhães Pinheiro Elizabeth Costa Dias Andréa Maria Silveira Jandira Maciel da Silva ESTE CAPÍTULO apresenta os princípios, conceitos básicos e as práticas do campo ou área temática da Saúde do Trabalhador (ST), no marco conceitual da Saúde Coletiva. Tem por objetivo facilitar a aproximação de estudantes de graduação e pós-graduação em Ciências da Saúde e os profissionais dos serviços de saúde, quanto ao papel do trabalho na vida, e na determinação das condições de saúde e doença dos trabalhadores. O texto está organizado em seis eixos temáticos. Inicialmente são apresentadas as bases conceituais do campo das relações Trabalho-Saúde-Doença e discutidos aspectos do cenário atual das transformações do mundo do trabalho e suas consequências sobre os processos produtivos e o perfil dos trabalhadores. A seguir, a descrição do perfil epidemiológico busca responder a pergunta: — como vivem e de que adoecem e morrem os trabalhadores brasileiros, na atualidade? Segue-se breve apresentação sobre as políticas públicas e de proteção social ao trabalhador, a organização da atenção integral à saúde dos trabalhadores no Sistema Único de Saúde (SUS) com a participação e o controle social pelos trabalhadores. Finalizando, são identificados alguns dos desafios, dilemas e perspectivas do campo e apresentadas referências e sugestões de bibliografia complementar e fontes de informação para os que se interessarem por conhecer mais sobre o tema. AS RELAÇÕES TRABALHO-SAÚDE-DOENÇA E A SAÚDE DO TRABALHADOR. A ST é o campo da Saúde Coletiva que tem como objeto de estudo e intervenção as relações produção-consumo e o processo saúde- 938 pinheiro, dias, silveira & silva Também se observa a tendência crescente de transferência do local de trabalho para a residência do trabalhador, como estratégia das em­ presas para ganhar produtividade, com mais qualidade, inovação perma­ nente e redução dos custos (Vieira, 2009). O emprego temporário cresce em importância, sujeito ao ritmo descontínuo e instável do mercado de trabalho, que se desenrola nas teias do tecido urbano, com altos riscos de acidentes (Diniz, Assunção & Lima, 2005). Na zona rural, sazonalmente, as pessoas migram de seu local de origem para trabalhar por períodos variáveis nas grandes plan­ tações. O corte da cana, a colheita do café e da laranja, a produção do carvão são bons exemplos dessas formas de trabalho no País. Pode-se dizer que o trabalho, no atual momento histórico, carac­te­riza-se pela intensificação, em alta demanda/exigência e pouca autono­ mia/controle pelo trabalhador; a diversidade e complementariedade den­tro das cadeias produtivas; a precarização dos vínculos e da proteção social, aumentando a vulnerabilidade dos trabalhadores e a degradação ambiental e da qualidade da vida. Conceitualmente, trabalhadores são: todos os homens e mulheres que exercem atividades para sustento próprio e/ou de seus dependentes, qualquer que seja sua forma de inserção no mercado de trabalho, nos setores formais ou infor­ mais da economia. Estão incluídos nesse grupo os indivíduos que trabalharam ou trabalham como empregados assalariados, traba­ lhadores domésticos, trabalhadores avulsos, trabalhadores agríco­ las, autônomos, servidores públicos, trabalhadores cooperativados e empregadores - particularmente, os proprietários de micro e pequenas unidades de produção. São também considerados traba­ lhadores aqueles que exercem atividades não remuneradas - ha­ bitualmente, em ajuda a membro da unidade domiciliar que tem uma atividade econômica, os aprendizes e estagiários e aqueles que temporária ou definitivamente afastados do mercado de traba­ lho por doença, aposentadoria ou desemprego” (Brasil/MS, 1991). De acordo com dados disponibilizados pelo Instituto Brasileiro de Estatísticas e Geografia (IBGE, 2009), baseados na Pesquisa Nacio­ nal por Amostra de Domicílios (Pnad), em 2009 a População Econo­ micamente Ativa (PEA) no Brasil era de 101.110 milhões de trabalhado­ res, sendo 56.710 milhões de homens 44.401 milhões de mulheres. A População Economicamente Ativa Ocupada (Peao) foi estimada em 939 saúde do trabalhador 92,4 milhões de trabalhadores distribuídos, de acordo com a situação emprego e a contribuição para a Previdência Social como apresen­tado no Quadro 1. Quadro 1. População Economicamente Ativa Ocupada (Peao) no Brasil em 2009. Situação empregatícia tipo de vínculo Número de trabalhadores (milhões) Empregados com carteira de trabalho assinada 54,2 Militares e estatutários 6,6 sem carteira assinada 15,3 Trabalhadores domésticos 7,2 Trabalhadores por conta própria 19,0 Empregadores 4,0 Outros (não remunerados e próprio consumo) 8,0 Total 92,4 Fonte: IBGE/Pnad, 2009. Dos 92,4 milhões de trabalhadores que compõem a Peao, apenas 49,6 milhões de trabalhadores (53,7%) são contribuintes da Previdên­ cia Social, dos quais, 27% são segurados pelo Seguro de Acidentes do Trabalho (SAT) pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). As mudanças nos processos produtivos e as desigualdades de co­bertura pelas políticas de proteção social têm consequências diretas na vida, na saúde e no adoecimento dos trabalhadores. COMO VIVEM E DE QUE ADOECEM E MORREM OS TRABALHADORES NO BRASIL? Os trabalhadores compartilham com os não trabalhadores formas de adoecer e morrer decorrentes do estilo de vida, do sexo, da idade, do perfil genético e de fatores de risco de natureza ambiental aos quais todos se expõem. Entretanto, trabalhadores apresentam doenças e aci­ dentes que são decorrentes dos trabalhos que executam ou executa­ ram e dos ambientes a que estão ou estiveram expostos em função de sua ocupação. Estimar a verdadeira incidência de doenças relacionadas com traba­ lho é importante para o planejamento das ações de prevenção, que in­ clui a identificação dos riscos presentes nos ambientes de trabalho e a identificação e registro de efeitos adversos sobre a saúde das pessoas que trabalham. Um desafio maior é a identificação dos efeitos de longo pra­ zo e suas causas. A Saúde do trabalhador tem oportunidades especiais 940 pinheiro, dias, silveira & silva para desenvolver ações de vigilância e de prevenção — os agravos são preveníveis. Assim, o perfil de adoecimento e morte dos trabalhadores resulta da articulação entre os fatores de risco aos quais se expõem como mem­bros de uma comunidade mais geral, acrescidos daqueles aos quais se expõem no trabalho, tornando este adoecimento e o seu reconheci­mento pelas instituições públicas cada vez mais complexo. As doenças e agravos à saúde relacionados ao trabalho podem ser classificadas em três grandes grupos, como proposto por Schilling (1984), e que estão apresentados na Figura 1 Figura 1. Classificação das doenças segundo sua relação com o trabalho Grupo Exemplo I — Trabalho como causa necessária Intoxicação por chumbo silicose Acidentes de Trabalho II — Trabalho como fator contributivo, mas Doenças osteomusculares não necessário Varizes de membros inferiores Câncer III — Trabalho como provocador de um dis- Asma túrbio latente ou agravador de uma doença já Dermatite de Contato estabelecida Doenças Mentais Fonte: adaptado de Schilling (1984). No grupo I estão os agravos à saúde nos quais o trabalho é condi­ção necessária, raramente sendo encontrados fora das situações de expo­sição não ocupacional. O grupo II abrange as doenças comuns, que têm sua ocorrência, frequência ou evolução modificadas pela situação de trabalho, como ocorre com o câncer de pele em trabalhadores rurais ou a hipertensão arterial em condutores de ônibus urbanos, entre ou­tras. No grupo III estão os agravos nos quais o trabalho é provocador de um distúrbio latente ou agravador de uma doença ou distúrbio preexistente. A caracterização da relação da doença com o trabalho nos grupos II e III é essencialmente de natureza epidemiológica, seja pela observa­ção de excesso de frequência em determinados grupos ocupacionais ou profissões, seja pela ampliação quantitativa ou qualitativa do es­pectro de determinantes causais que podem ser conhecidos a partir do estudo dos ambientes e condições de trabalho. A eliminação desses 941 saúde do trabalhador fatores de risco reduz a incidência ou modifica o curso evolutivo da doença ou agravo à saúde. No Brasil, os dados oficiais sobre a ocorrência de agravos à saúde relacionados ao trabalho são subdimensionados. Os sistemas de infor- mação, sobre saúde e segurança no trabalho (SISST) são parciais, frag- mentados e não se relacionam entre si, situação agravada pelo despre- paro dos profissionais de saúde que pouco valorizam a notificação. A instituição da Renast e em especial o papel que os Centros de Referência em Saúde do Trabalhador (Cerest) vêm desempenhando, para melhorar o reconhecimento e o registro dos agravos à saúde relaciona- dos com o trabalho e a exigência de notificação compulsória de um con- junto de agravos à saúde relacionados com o trabalho, pela Portaria 104, de 25 de janeiro de 2011 (Brasil, 2011a) podem contribuir para minorar o problema. O anexo I da Portaria 104 relaciona 45 doenças, agravos e eventos que devem ser notificados em toda a rede de saúde, pública e privada, entre as quais estão incluídas as intoxicações exógenas de natureza ocupacional, por substâncias químicas, como os agrotóxicos e os metais pesados. Além disso, os acidentes por animais peçonhentos, hepatites virais, tétano, leptospirose, violência doméstica, sexual e outras violências, também fazem parte deste primeiro grupo. No Anexo II estão os agravos cuja notificação deve ocorrer em até 24 horas a partir da suspeita inicial, entre eles a exposição a contaminantes químicos ou acidentes envolvendo radiações ionizantes e não ionizantes, por fontes utilizadas nas diversas atividades industriais ou médicas. No Anexo III, figuram os problemas de saúde que devem ser notificados em unidades sentinelas, que inclui a maioria das doenças e agravos relacionados com o trabalho: acidente com exposição a material biológico; acidente de trabalho com mutila- ção; acidente de trabalho com crianças e adolescentes; acidente de tra- balho fatal; câncer relacionado ao trabalho; dermatoses ocupacionais; Lesões por Esforços Repetitivos/Distúrbios osteomusculares relaciona- dos com o trabalho (LER/Dort); Perda Auditiva Induzida pelo Ruído (Pair); pneumoconioses e transtornos mentais relacionados com o tra- balho. Estes agravos devem ser notificados e registrados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), segundo normas e rotinas definidas pela Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS/MS). O conhecimento do perfil de morbimortalidade dos trabalhado- res brasileiros pode se dar a partir dos registros do Sistema de Infor- mação de Mortalidade (SIM), Sistema de Internação Hospitalar (SIH), Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), e dos dados da Previdência Social. 942 pinheiro, dias, silveira & silva Os dados do SIM e do SIH fornecem, respectivamente, informa- ções sobre óbitos e internações por causas externas, incluindo os aci- dentes de trabalho, e o Sinan registra os agravos e doenças de notifica- ções compulsórias. Nos formulários que alimentam esses sistemas aparecem as variáveis ocupação e ramo de atividade econômica, o que aumenta as possibilidades de estudos sobre os agravos à saúde relacio- nados com o trabalho. Dados disponibilizados pela Coordenação Geral de Saúde do Tra- balhador na página do Ministério da Saúde demonstram que, em de- spesem inúmeras diferenças interestaduais, todas as unidades da federa- ção estão notificando, o que por si só já é bastante positivo. No entanto, o estado de São Paulo responde, sozinho, por cerca de 50% do total das notificações feitas. Chama atenção a tendência de crescimento das notificações, fato este observado entre 2006 a 2008. Em 2009, o núme- ro de casos registrados diminuiu para todos os agravos, à exceção dos cânceres relacionados com o trabalho (Quadro 2). Ainda é muito cedo para conclusões de maior envergadura sobre esta observação, seja pelo curto período de existência e pela pouca tradição na realização da noti- ficação compulsória para este tipo de agravos, seja, também, pelas poucas informações disponibilizadas na página do MS. Quadro 2. Distribuição dos agravos à saúde relacionados com o trabalho de notificação compulsória, Brasil, 2006 a 2009 Agravos | 2006 | 2007 | 2008 | 2009 Intoxicações ocupacionais | 10 | 2.036 | 2.327 | 1.682 Acidentes graves | 1.532 | 19.638 | 29.889 | 19.996 Acidentes biológicos | 669 | 15.221 | 20.495 | 14.512 Dermatoses | 3 | 127 | 271 | 264 Ler/Dort | 223 | 3.187 | 2.728 | 2.451 Pneumoconioses | 4 | 91 | 691 | 83 Pair | 22 | 114 | 180 | 157 Transtornos mentais | 20 | 117 | 158 | 151 Cânceres | 0 | 5 | 11 | 23 Total de notificações | 2.483 | 40.536 | 56.750 | 39.318 Fonte: Sinan/MS; acesso em 15-6-2012. Estudo realizado pelo Centro Colaborador Ufba/ISC-MS/Cosat (CCVISAT, 2012a), a partir de base de dados disponibilizada pelo Sinan em 2009, relativos a acidentes de trabalho graves e os acidentes com material biológico, para 2007 e 2008 e, pelo Caged/MTE que contém registros sobre a População Economicamente Ativa e Ocupada (Peao), e dados divulgados pelo Datasus mostra que o registro com menores 943 saúde do trabalhador de dezoito anos ainda é bastante tímido, apesar do expressivo número de crianças e adolescente que trabalham; importante subdimensiona- mento da magnitude dos óbitos, ante os números da Previdência Social, refletindo nas estimativas epidemiológicas para este evento. Para 2007, a estimativa foi de 0,24 por 100.000 trabalhadores, ten- do por base a Peao, tendo sido de 5,72 por 100.000 trabalhadores ober- tos pelo SAT. A maioria dos óbitos foi entre trabalhadores do sexo mas- culino, entre 49 a 59 anos de idade, sendo sido observada grande concentração entre os sem ou com baixa escolaridade. Também foram registrados óbitos em menores de dezoito anos. Para os dados dispo- níveis, cerca de 50% dos acidentes de trabalho envolveram trabalhado- res da indústria manufatureira, seguidos pela construção civil e comér- cio. Eles aconteceram nos ambientes de trabalho, mas, também, nas vias públicas, expressando os impactos da violência do trânsito. A maioria dos acidentes de trabalho com material biológico, nos dois anos de análise, foi por lesões percutâneas, contato com pele inte- gra, tendo como principal agente, as agulhas. Para o período considera- do, a situação vacinal para a hepatite B (três doses) esteve em torno de 87,0%. Para os autores, os números são sugestivos de grande subnotifi- cação, especialmente no Nordeste, Norte e Centro-Oeste. Também para as intoxicações ocupacionais, observou-se o cresci- mento das notificações entre 2006 e 2008, com decréscimo em 2009. Estudo baseado em dados do Sinan-MS, no período de 2007 a 2011, mostrou o aumento do coeficiente de incidência (CI) das intoxi- cações ocupacionais por agrotóxicos. Em 2007, o CI das intoxicações foi de 1,27 por 1.000 trabalhadores ativos, chegando a 2.88/1.000 em 2009, um aumento da ordem de 126,77%. Para todos os anos do perío- do o coeficiente foi maior entre os homens, mas o aumento relativo foi maior entre as mulheres, que no período cresceu em 178%. Chama nossa atenção, o dado de que apenas 35% das notificações conferem em trabalhadores do setor informal (CCVISAT, 2012b). Os dados do Sistema Nacional de Informações Toxicofarmacológicas (Sinitox) sobre o perfil das intoxicações exógenas de origem ocupacional, no Brasil, chamam atenção para o fato de que do total de 419.866 casos de intoxicações humanas registradas no período de 2006 a 2009, 24.119 casos (5,75%) foram de origem ocupacional. Neste mesmo período, ape- nas 0,69% do total de casos evoluíram para óbito (o que corresponde a 2.933 casos), e em apenas 36 casos a circunstância da intoxicação foi ocupacional. Ou seja, enquanto a letalidade geral foi de 0,69%, a relacio- nada com intoxicação ocupacional foi de 0,0086% (Sinitox, 2012). 944 pinheiro, dias, silveira & silva Na Previdência Social, os acidentes e doenças do trabalho podem ser registrados com ou sem a Comunicação de Acidentes de Trabalho (CAT). Na primeira possibilidade, a CAT é cadastrada no sistema do INSS, porém, o reconhecimento do acidente ou doença do trabalho pode ocorrer sem o registro da CAT. Neste caso, a relação entre o problema de saúde investigado e o trabalho se dá por meio do Nexo Técnico Profissional/Trabalho, Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário (NTEP) ou Nexo Técnico por Doença Equiparada a Acidente do Trabalho (Brasil, 2008). Os dados produzidos pela Previdência Social sobre agravos a saúde relacionados ao trabalho, reconhecidos pelo INSS entre trabalhadores cobertos pelo SAT, são apresentados no Quadro 3 a seguir. No período de 2004 a 2010 o número de contribuintes empregados subiu de 32.200.411 (2004) para 48.700.000 (2010), ou seja, aumentou em 33,9%. No mesmo período os acidentes de trajeto aumentaram 33,3% e os acidentes típicos 9,5% comparando-se 2004 com 2010. As doenças relacionadas ao trabalho tiveram redução de 48%, fato esse que não encontra explicação na melhoria das condições de trabalho do País, mas que talvez seja explicado pela subnotificação. Comparando-se ainda 2004 e 2010 com relação aos óbitos, a redução foi de 4,5%. Quadro 3. Distribuição de agravos relacionados ao trabalho e ao salário entre trabalhadores cobertos pelo Seguro de Acidentes de Trabalho (SAT) do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Brasil, 2004-2010 Ano Número total de acidentes Acidente típico Acidente de trajeto Doenças relacionadas ao trabalho Óbitos Casos sem CAT 2004 465.700 375.171 60.635 30.194 2.839 2005 499.680 398.613 67.971 33.096 2.766 2006 503.890 403.264 73.981 26.645 2.717 2007 659.523 417.036 79.905 22.374 2.845 141.108 2008 755.980 441.925 88.742 20.356 2.757 204.957 2009 733.365 424.948 90.180 19.570 2.790 2010 701.496 414.824 94.789 15.393 2.712 176.290 Fonte: MPAS, 2012. Ainda sobre as informações disponibilizadas pela Previdência Social destaca-se a taxa de mortalidade específica por acidente de trabalho (TMAT) que estima o risco de morte por acidente de trabalho entre trabalhadores cobertos pelo SAT da Previdência Social e indica o acesso aos serviços de urgência/emergência. A taxa expressa as condições de segurança presentes nos ambientes de trabalho, os riscos decorrentes