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Direito Penal
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1 ISSN 15188280 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS UNIJUS UNIJUS REVISTA JURÍDICA R Jur UNIJUS Uberaba MG V7 N1 p 1246 Nov 2004 2 ViceReitora Profa Elsie Barbosa PróReitor de Pesquisa e PósGraduação Prof José Bento Alves Universidade de Uberaba Revista Jurídica UNIJUS Universidade de Uberaba Ministério Públi co do Estado de Minas Gerais Vol 1 n1 1998 Uberaba MG UNIUBE 1998 v ISSN 15188280 1 Direito I Universidade de Uberaba II Ministério Público do Estado de Minas Gerais CDD 340 PróReitor de Ensino Superior Profa Inara Barbosa Pena Elias Diretor do Curso de Direito Prof Carlos Roberto Marsiglia de Figueiredo Ministério Público do Estado de Minas Gerais Núcleo de Estudos Jurídicos de Uberaba Coordenadora Sandra Maria da Silva Promotora de Justiça REVISTA JURÍDICA UNIJUS Produção da Universidade de Uberaba em parceria com o Ministério Público do Estado de Minas Gerais Núcleo de Estudos Jurídicos de Uberaba Editoração e publicação pela UNIUBE Periodicidade semestral Os trabalhos apresentados exprimem conceitos da responsabilidade dos seus autores coin cidentes ou não com os pontos de vista da coordenação da Revista Qualquer parte desta publicação pode ser reproduzida desde que citada a fonte Catalogação elaborada pelo Setor de Referência da Biblioteca Central da UNIUBE Reitor Dr Marcelo Palmério 35 A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL Sumário 1 Do posicionamento do nexo de causalidade no conceito analítico de crime 2 A teoria da equiva lência dos antecedentes e o método da eliminação hipotética 3 Dos fundamentos históricos da teoria da imputação objetiva 4 Da moderna teoria da imputação objetiva 41 Da criação de um risco proibido 42 Do consentimento do 1 Juíza Federal Substituta da 2a Vara da Subseção Judiciária de Uberaba Docente da Universidade de Uberaba no Curso de Direito nas disciplinas Teoria Geral do Direito Penal I e II no período de Agosto2003 a Julho2004 ofendido 43 Do resultado situado no âmbito do risco provocado pela conduta 44 Da posi ção Günther Jakobs 5 Da aplicação da teoria da imputação objetiva 51 Da análise crítica da teoria da imputação objetiva 52 Das conseqü ências da aplicação da imputação objetiva in con creto Cláudia Aparecida Salge1 EMENTA As inúmeras falhas na utilização da teoria da equivalência dos antecedentes adotada pelo art 13 caput do Código Penal levam à reflexão acerca do problema do nexo de causalidade no âmbito do Direito Penal Sobre o tema a teoria da imputação objetiva enceta aspectos relevantes que merecem um estudo mais acurado a fim de promover soluções adequadas às situações fáticas não alcançadas pela denominada teoria da conditio sine qual non 1 Do posicionamento do nexo de causalidade no conceito analítico de crime O crime sob o aspecto analítico pode ser fragmentado em três estratos distintos tipicidade ilicitude e culpabilidade que são indispensáveis para que o fato tenha repercussão na seara do Direito Penal Na realidade o crime existe como um todo como um fato único apenas para efeito didático fazse necessário o seccionamento do delito a fim de facilitar o reconhecimento do fato humano passível de responsabilização criminal Considerado de maneira singela como fato humano que lesa ou expõe a perigo de lesão bens jurídicos penalmente tutelados o crime pressupõe uma conduta comissiva ação ou omissiva omissão Por sua vez a conduta humana sob o prisma da teoria finalista elaborada por HANS WELZEL e adotada pelo Código Penal Brasileiro deve ser direcionada ao dano efetivo ao bem jurídico protegido pela norma penal nos casos de delitos dolosos ou para a causação de um resultado danoso nas hipóteses de delitos culposos Em obediência ao princípio da legalidade preconizado pela Constituição Federal Brasileira art 5o inciso XXXIX e pelo Código Penal art 1o a descrição hipotética de uma conduta considerada criminosa constitui o fato típico o qual segundo DAMÁSIO E DE JESUS se decompõe nos seguintes elementos a conduta humana dolosa ou culposa b resultado c o nexo de causalidade material entre a conduta comissiva e o resultado d enquadramento do fato material conduta resultado e nexo causal a uma norma penal incriminadora tipicidade 36 A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL Como elemento primário do fato típico a conduta para a teoria finalista da ação trata da ação ou omissão humana consciente e dirigida a uma determinada finalidade ou seja o resultado Encarado como objetivo precípuo da conduta o resultado pode ser analisado tanto sob o aspecto da teoria naturalística considerado como uma modificação do mundo exterior provocada pelo comportamento humano ou sob o aspecto da teoria jurídica em que se tem a afetação de um interesse protegido pela norma penal como por exemplo a vida o patrimônio a honra dentre outros Nesta última análise todos os delitos possuem resultado inclusive os crimes denominados formais que não exigem a ocorrência do resultado naturalístico e os de mera conduta que não possuem resultado sob o aspecto físico O vínculo que liga um resultado a uma conduta é conhecido como nexo de causalidade ou nexo causal que se traduz em um elemento objetivo do tipo penal Para a responsabilização do agente é imprescindível a verificação do nexo de causalidade entre o resultado e o seu comportamento sem o que não há que se falar em fato típico 2 A Teoria da equivalência dos antecedentes e o método da eliminação hipotética Para tratar da questão atinente ao nexo de causalidade que nos interessa mais especificamente neste estudo o Código Penal Brasileiro adotou em seu art 13 caput a teoria da equivalência dos antecedentes cuja finalidade segundo PAULO JOSÉ DA COSTA JÚNIOR é a de regular os dois momentos da atividade do julgador verificação do elo causal entre conduta evento e valoração desse nexo em relação ao Direito2 Consoante a teoria da conditio sine qua non equivalência dos antecedentes que considera como causa a ação sem a qual o resultado não teria ocorrido para a verificação do nexo de causalidade fazse necessária a utilização do método de eliminação hipotética elaborado por Thyrén Esse método impõe que para se aferir se um fator é causa de um resultado basta mentalmente de forma objetiva sem qualquer valoração excluílo da cadeia causal se com sua exclusão o resultado ainda teria sido produzido não pode ser considerado causa ao contrário se com sua exclusão o resultado desaparece tal fator deve ser considerado causa Suponhamos que arrimados nas lições de DAMÁSIO E DE JESUS A tenha matado B O fato típico do homicídio possui uma série de condutas antecedentes como a fabricação do revólver sua aquisição pelo comerciante a compra pelo agente etc Excluindose p ex a fabricação da arma o resultado não teria ocorrido Logo o fabrico da arma é considerado causa3 Ora não há plausibilidade nenhuma em se atribuir ao fabricante ou ao comerciante de armas de fogo a responsabilidade pelos atos ilícitos praticados com os aludidos artefatos posto que esse raciocínio poderia levar inclusive à absurda responsabilização dos pais do assassino pela sua concepção mediante um inocente ato de amor A principal crítica levantada pelos estudiosos do Direito no tocante à aplicação da teoria da equivalência dos antecedentes é exatamente neste sentido ou seja a operação denominada regressus ad infinitum segundo a qual se inserem na cadeia causal indivíduos que não contribuíram efetivamente para a ocorrência do resultado como no exemplo 2 Do nexo causal São Paulo Malheiros Ed 1996 p 102 lembrado por MIGUEL REALE JÚNIOR Teoria do Delito São Paulo Revista dos Tribunais 1998 p 178 n 24 citado por DAMÁSIO E DE JESUS in Imputação Objetiva Ed Saraiva 2a edição 2002 p 6 3 In ob cit p 67 37 4 Direito Penal Parte Geral São Paulo Ed Saraiva 2004 p 340341 5 JESÚS Damásio E de in ob cit p 23 supramencionado o fabricante e o comerciante da arma utilizada para a prática criminosa Esses indivíduos somente são excluídos da responsabilidade penal pelo fato delituoso em face da aplicação do nexo normativo qual seja mediante a verificação da existência ou não de dolo ou culpa stricto sensu em suas condutas operação esta que se efetua após a constatação do nexo objetivo Ausente um dos elementos subjetivos da conduta intencionalidade afastase a responsabilidade criminal evitando assim os absurdos jurídicos de chegarse até mesmo a responsabilizar os pais do criminoso assim como o fabricante de automóveis pelos delitos culposos no trânsito Na realidade percebese que a teoria da equivalência dos antecedentes se constitui em mera constatação objetiva do liame existente entre o resultado e as suas respectivas causas sendo que esse vínculo se fundamenta exclusivamente no campo das ciências físicas como um raciocínio matemático relacionado às ciências exatas flagrantemente destoante da intencionalidade da conduta que requer a teoria finalista da ação elaborada por WELZEL e adotada pelo Código Penal Brasileiro Ademais a teoria adotada pelo art 13 caput do Código Penal por estabelecer uma relação meramente física entre a conduta e o resultado deixa de regular os denominados crimes formais e de mera conduta que independem da provocação de um resultado naturalístico Denotase claramente que a teoria da conditio sine qua non possui um elo profundo com a teoria naturalista ou causal da ação que exige apenas para a configuração da responsabilização penal o vínculo objetivo entre a conduta do agente e o resultado olvidando o elemento intencional da ação Apresentase portanto a teoria da equivalência dos antecedentes incapaz de solucionar questões complexas que povoam o mundo jurídico atual tais como a dupla causalidade alternativa autoria colateral a dupla causalidade concomitante em que nenhuma das condutas sozinha poderia provocar o resultado mas somadas atingem o desiderato final na hipótese em que o resultado ocorreria de qualquer modo p ex o médico que desliga os aparelhos que mantêm vivo um paciente terminal com danos cerebrais irreversíveis acelerando a sua morte os desvios dos cursos causais p ex o ladrão principiante trêmulo e inseguro que aponta um estilete para a vítima um homenzarrão e anuncia o assalto a vítima se apavora sofre um enfarto e morre Todas essas situações bem lembradas por EDILSON MOUGENOT BONFIM e FERNANDO CAPEZ4 não conseguem ser solucionadas com a utilização do art 13 caput do CP requerendo a evolução do pensamento jurídico no tocante ao nexo de causalidade 3 Dos fundamentos históricos da teoria da imputação objetiva Diante das constantes e justificadas críticas apontadas pelos estudiosos em relação ao absolutismo caracterizado pela utilização da conditio sine qua non na Alemanha logo após a Segunda Grande Guerra Mundial foram lançadas as primeiras bases da teoria da imputação objetiva cuja finalidade era a de substituir o nexo causal puramente material pela relação jurídica normativa entre a conduta e o resultado5 O que se pretende portanto com a teoria da imputação objetiva é na realidade abandonar a relação de causalidade como único vínculo entre a ação e o resultado e passar analisar o nexo causal também sob o aspecto jurídico Cumpre todavia lembrar que os A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL 38 6 PRADO Luiz Régis e CARVALHO Erika Mendes de in Teorias da Imputação Objetiva do Resultado São Paulo Ed RT 2002 p 18 7 MORALES Diego Medina Derecho y Libertad La teoria de la imputabilidad em Aristóteles Cuadernos de Política Criminal n 55 p 134 e ss apud Luiz Régis Prado in ob cit p 1920 8 WELZEL Hans La dottrina giusnaturalistica di Samuel Pufendorf Um contribut alla storia delle idee dei secoli XVII e XVIII p 119 e ss citado por Luiz Regis Prado in ob cit P 2122 9 HEGEL Georg Princípios da filosofia do direito p 110 apud Luiz Régis Prado in ob cit p 2730 pilares fundamentais da teoria da imputação objetiva vêm de tempos remotos eis que já na obra de PLATÃO A República é possível vislumbrar nuances relacionadas à matéria em comento Na referida obra o aspecto positivo das leis tornase relevante na oportunidade que a lei deve exercer especialmente no âmbito penal uma função imperativa função esta que se relaciona sob o ponto de vista filosófico com o início da noção de imputação a lei como definidora da imputabilidade do ato A imputação então passa a ter uma idéia de produção de algo de acordo com determinada norma6 ARISTÓTELES por sua vez desenvolveu com maior clareza os princípios da imputação tomando como cerne as categorias ontológicas estrutura da ação humana Segundo o seu raciocínio uma conduta somente pode ser imputável se estiver no âmbito de controle de seu autor do qual se poderia esperar um comportamento diverso É o que denomina de liberdade natural ou livre determinação de agir Somente os atos que estão sob o domínio da vontade podem ser suscetíveis de imputação7 SAMUEL PUFENDORF em seqüência aos trabalhos de Aristóteles reelaborou a doutrina de imputação sobre as bases já lançadas Os estudos por ele empreendidos levaram a um conceito de imputação que pela primeira vez surgia na ciência do Direito Penal ao afirmar que apenas os resultados que dependam da vontade humana ou que sejam domináveis por ela podem ser imputáveis ao homem como obra sua Os principais fundamentos de sua teoria são no sentido de que o homem como ser racional diferente dos demais animais é capaz de dominar e dirigir os seus movimentos através de suas decisões Por sua vez essa capacidade encontra os seus limites nos princípios que regem a conduta humana uma vez que o homem ao integrar a natureza pode intervir nos processos causais e conduzilos de acordo com suas próprias intenções Pufendorf utilizouse de duas expressões a saber a imputativitas e a imputatio A primeira imputativitas significa que a ação pertencerá ao agente quando representar a sua livre autodeterminação consciência e vontade enquanto que a segunda imputatio refere se às operações judiciais realizadas para comprovar a ocorrência dos elementos que compõem a imputativitas e para proceder à valoração do evento A valoração do ocorrido demanda a distinção dos entia physica que se relacionam aos objetos de natureza física regidos pela lei natural dos entia moralia que pertencem ao mundo da cultura conferindo direção e sentido às ações livres do homem ao estabelecer critérios para ajustar a liberdade de ação juízo de valoração8 No início do século XIX GEORG HEGEL elaborou um princípio que serviu de fundamento para a moderna teoria da imputação objetiva ao afirmar que um fato somente pode ser imputado como responsabilidade da vontade de seu autor A dominação da vontade é pressuposto para a imputação e o juízo de imputação trata de um juízo teleológico e não causal9 A inovação trazida por Hegel em relação à doutrina desenvolvida por Pufendorf é no sentido de que a imputação não se sobrepõe à responsabilidade não se confundindo com a culpabilidade ao contrário do que afirmava este último que entendia a ação como vontade livre realizada por um sujeito A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL 39 imputável A deficiência encontrada no conceito de Hegel reside nos delitos culposos cujos resultados não se encontram no âmbito da vontade do agente Em direção oposta aos estudos de Aristóteles Punfendorf e Hegel surge a doutrina de KARL LARENZ que defende a tese de que o critério fundamental para atribuir um fato a alguém se encontra no denominado juízo de imputação explicando que a imputação corresponde à tentativa de delimitar um fato próprio de um acontecimento puramente fortuito servindo meramente para determinar se o acontecimento é obra ou não do sujeito10 Larenz busca com sua teoria baseada em aspectos objetivos englobar além dos fatos conhecidos e desejados pelo sujeito dolosos também os que poderiam ser mas não foram abarcados por sua vontade culposos Para Larenz a imputação se subsume na possibilidade de previsão e domínio dos cursos causais e é designada objetiva porque a mencionada possibilidade de previsão não é considerada com base na capacidade e na ciência do sujeito ativo in concreto mas consoante um critério geral e objetivo o do homem inteligente e prudente homem comum Atualmente na Espanha e Alemanha a doutrina da imputação objetiva procura elaborar critérios normativos cuja finalidade precípua é a de atribuir determinado resultado a uma conduta ativa ou omissiva RICHARD HONIG é considerado o precursor desse pensamento jurídico justificando a imputação objetiva não como imputação do comportamento mas sim como imputação do resultado Para Honig não se trata de aferir a causalidade mas de atribuirlhe valor sendo portanto imputáveis os resultados que podem ser finalmente vislumbrados por seu autor finalidade objetiva11 A relevância para a imputação objetiva sob os critérios de Honig é saber se o sujeito possuía condições de com seu comportamento realizar ou evitar o resultado afastando por conseguinte os eventos produzidos fortuitamente requer previsibilidade e direção da vontade humana 4 Da moderna teoria da imputação objetiva Com o avanço dos estudos elaborados em torno da teoria da imputação objetiva chegouse no início da década de 70 a uma concepção moderna sobre a matéria elaborada por CLAUS ROXIN Fundamentando suas conclusões em critérios normativos para responsabilização de delitos materiais dolosos e culposos Roxin pretendia contribuir para a reformulação da teoria da imputação objetiva desvinculada do dogma causal A partir de então formulouse o princípio do risco segundo o qual para aferir a responsabilidade do agente pelo resultado o importante é verificar se a conduta criou ou não um risco juridicamente relevante de lesão típica de um bem jurídico penalmente tutelado12 Sustenta Roxin que somente é imputável ao agente o resultado que pode ser finalmente previsto e dirigido por sua vontade pugnando pela realização de um curso causal dominável pelo elemento volitivo em perfeita consonância com a teoria finalista da ação A vontade portanto seria dirigida à criação de um risco juridicamente relevante a um bem jurídico protegido pela norma penal Partindose da premissa de que a teoria da imputação objetiva requer a criação de um risco juridicamente desaprovado coligese que para a existência de um fato típico fazemse necessários os seguintes requisitos a conduta criadora de um risco para a ocorrência do resultado e este risco deve ser proibido b o resultado naturalístico deve se encontrar no âmbito do risco 10 MELIÁ Cancio e GONZÁLEZ Suárez apud Luiz Regis Prado in ob cit p 3031 11 Citado por Luiz Régis Prado in ob cit p 3435 12 Idem p 64 A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL 40 provocado pela conduta 41 Da criação de um risco proibido Como seres humanos integrantes de uma coletividade todos nós corremos diariamente riscos que podem ou não provocar algum dano a bens jurídicos protegidos pelo Direito Penal Entretanto o risco ensejador da imputação objetiva de um resultado ao seu autor não trata de qualquer risco excluindose do âmbito da norma penal os denominados riscos permitidos ou tolerados pelo convívio social Riscos toleráveis são os aceitos socialmente como normais e inerentes ao desenvolvimento da coletividade tais como os veículos automotores que embora perigosos se manejados de maneira inadequada são necessários ao transporte de pessoas e objetos essenciais à sociedade Não se pode assim atribuir ao fabricante de veículos a responsabilidade pelos acidentes e mortes provocadas pelo mau uso dos automóveis pois tais infortúnios se consideram riscos tolerados Sopesando no caso em exame os benefícios advindos com o uso dos automóveis e os perigos trazidos com sua utilização num critério de custo benefício a sociedade é quem deve decidir pela tolerabilidade dos riscos assumindoos como imprescindíveis ao conseqüente progresso ou pela assunção de menos perigo mas com estagnação da evolução social Entrementes segundo EDILSON MOUGENOT BONFIM e FERNANDO CAPEZ o que deve ser feito é cobrar de cada um de acordo com o papel social que representa cujos limites serão estabelecidos pela aspiração geral dos membros da coletividade13 Se o autor embora tendo provocado um resultado lesivo se tiver conduzido de maneira a criar uma situação de risco tolerável ou permitido não há como se lhe imputar tal resultado Ao contrário se o autor com sua conduta tiver provocado um risco juridicamente proibido ou ainda se tiver aumentado o risco permitido então o resultado poderá serlhe imputado A teor dos ensinamentos de GÜNTHER JAKOBS a mera causação do resultado mesmo na modalidade dolosa não é suficiente para aferir a imputação ao agente eis que se o Direito Penal tivesse por fim eliminar todo e qualquer risco resultante do contato social mediante a prevenção geral e especial previsão in abstracto e aplicação efetiva da sanção penal a sociedade ficaria completamente paralisada14 Aqui se estabelece uma íntima ligação entre a teoria da imputação objetiva e o princípio da adequação social elaborado por WELZEL tomandose por base a circunstância de que um fato socialmente adequado corresponde a um comportamento permitido e tolerado não correspondendo a um risco proibido o que leva à atipicidade da conduta adotada pelo agente O que fundamenta a aceitação social de determinadas condutas é o fato de se tratar de uma relação denominada contatos sociais em que cada um dos envolvidos espera do outro o cumprimento de seu papel social Distanciandose de seu papel social o agente engendra um risco proibido não tolerado pela ordem jurídica Por outro lado há que se verificar que as relações sociais se fundamentam no princípio da confiança em que cada um dos membros da sociedade ao adotar condutas em conformidade com as regras jurídicas de comportamento mantendose em seu papel social possui o direito de esperar do outro que proceda da mesma forma Sob esse aspecto ninguém é obrigado a fiscalizar o comportamento alheio a fim de eliminar quaisquer riscos de lesão cabendo a cada 13 In ob cit p 352 14 Apud Edilson M Bonfim e Fernando Capez in ob cit p 354 A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL 41 um a responsabilidade por suas próprias condutas É o que se depreende do exemplo mencionado por EDILSON BONFIM e CAPEZ o médico confia que o auxiliar vá lhe passar um bisturi esterilizado se isso não ocorre e o paciente morre por infecção o cirurgião não criou um risco proibido e não responderá assim pelo resultado15 42 Do consentimento do ofendido Impende considerar ainda que a aquiescência do titular do bem jurídico ofendido em participar do evento danoso aderindo ao comportamento do agente é capaz de afastar a imputação objetiva do resultado Ao contrário do posicionamento adotado pela doutrina tradicional que enfrenta a questão do consentimento do ofendido como causa supralegal de exclusão da ilicitude atuando sobre o segundo elemento do crime a teoria da imputação objetiva trabalha a matéria no âmbito do próprio tipo penal tornando atípica a conduta do agente por considerar que o resultado se origina de um risco permitido Ante o consentimento válido do ofendido a ação passa a se desenvolver sob a égide de um risco perfeitamente tolerado pela sociedade como representação do livre arbítrio no contexto social sendo incapaz de lesar o bem jurídico penalmente tutelado Tal raciocínio se justifica pelo fato de que segundo HIRSCH todo aquele que concorda com um comportamento perigoso assume conscientemente o risco de uma lesão eliminando a antinormatividade da conduta do outro que devidamente autorizado pelo interessado realizou a conduta perigosa a qual acabou por provocar a lesão a bem jurídico16 Para o fim de afastar a proibição do risco o consentimento do ofendido não deve necessariamente abranger a lesão sendo suficiente que o titular do bem jurídico consciente do perigo consinta na adoção por parte do agente de um comportamento contrário às normas do dever de cuidado Retornase assim ao cálculo do custo benefício em que o ofendido é capaz de sopesar os riscos e os benefícios advindos com a conduta do agente optando pela situação de perigo Nessa linha de raciocínio ao mencionarem o exemplo lembrado por ANTÔNIO LUIS CHAVES DE CAMARGO in Imputação Objetiva EDILSON BONFIM e FERNANDO CAPEZ estabelecem em que situações podese considerar o consentimento do ofendido como causa de exclusão do risco proibido a saber O Tribunal Supremo alemão no ano de 1984 num denominado caso de seringa absolveu o autor de um crime culposo porque havia cedido heroína a um viciado que a injetou causandolhe a morte Ficou patenteado que a heroína tem um risco intrínseco que é do conhecimento da vítima e esta se colocou em perigo afastando a imputação do autor que lhe cedeu a droga para ser injetada17 Para alguns autores como SCHAFFSTEIN não importa se o bem jurídico se encontra ou não dentro da esfera de disponibilidade de seu titular uma vez que este não está consentindo na lesão em si mesma mas somente na situação criadora do risco Neste sentido é possível a disponibilidade da vida humana consoante a citação de MANUEL DA COSTA ANDRADE18 Há que se falar inclusive em situações nas quais a vítima deixa de adotar as cautelas devidas de autoproteção e com seu comportamento descuidado colocase em circunstâncias de perigo afastando a responsabilidade do autor da conduta pelo resultado provocado É o caso citado por 15 In ob cit p 357358 16 Apud Edilson M Bonfim e Fernando Capez in ob cit p 359360 17 Idem p 361 18 In Consentimento e acordo em Direito Penal cit Por Edilson Bonfim e Fernando Capez in ob cit p 359 A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL 42 EDILSON BONFIM e CAPEZ em que um lutador de judô ainda não recuperado de uma lesão na vértebra insiste em participar de uma competição e ao receber um golpe normal de seu adversário sofre uma queda e vem a falecer em virtude das lesões sofridas19 Não há portanto que se falar em responsabilização penal do autor do golpe que não criou e nem incrementou nenhum risco anormal para a vítima Urge assinalar ademais que se o autor se comportou de forma a reduzir o risco de lesão acaba por adotar um comportamento em conformidade com a norma o que leva à atipicidade de sua conduta É o que ocorre portanto com o agente que afasta uma pedra que foi arremessada em direção à cabeça da vítima projetandoa para o braço diminuindo com seu comportamento a gravidade da lesão à integridade física do ofendido Nesse caso o agente não responde pela lesão eis que a sua ação protegeu o bem jurídico tutelado pela norma penal 43 Do resultado situado no âmbito do risco provocado pela conduta Em que pese à existência da provocação de um risco proibido para a configuração da imputação objetiva é inexorável que o resultado naturalístico se encontre dentro da linha de desdobramento causal da conduta adotada pelo agente estando sob o seu domínio causal Não se admitem em sede de imputação objetiva os denominados desvios causais considerados como interferências não previstas no desenvolvimento da cadeia de causalidade rompendo o nexo e a responsabilização do agente pelo resultado físico DAMÁSIO E DE JESUS referindo se à questão como âmbito ou extensão da tutela penal ou alcance do tipo fornece exaustivamente exemplos de situações em que ocorre a ruptura do nexo causal em razão dessas interferências citando ainda GÜNTHER JAKOBS ao creditar o resultado ao infortúnio da vítima ou mala suerte O Professor DAMÁSIO menciona ainda um exemplo fornecido por MANUEL CANCIO MELIÁ em que um motorista conduzindo um caminhão por uma rodovia recolhe uma jovem que estava fazendo autostop propondolhe relações sexuais A moça se nega Ele insiste Ela lhe pede que estacione o veículo caso contrário vai jogarse para fora do caminhão em movimento Ele se nega Ela abre a porta e se lança no asfalto ferindo se gravemente20 sendo a hipótese correspondente a fatos reais As soluções possíveis são apresentadas por MANUEL CANCIO MELIÁ que traça as seguintes recomendações citadas por DAMÁSIO DE JESUS a na situação em que o comportamento da vítima se constitui em reação grosseira ante a conduta do motorista que não colocava em risco sério a nenhum bem jurídico a ela pertencente o agente não responde pelas lesões b ao contrário se a conduta do motorista gerou uma situação de iminente risco sexual à vítima ocorre a imputação objetiva do resultado ao agente Neste sentido é possível a adoção do pensamento de CLAUS ROXIN ao afirmar que a imputação objetiva vai além da atribuição do resultado naturalístico à conduta buscando estabelecer os requisitos para unir o resultado jurídico lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico ao comportamento do agente com a aferição da violação do interesse tutelado pela norma penal o que pode ser aplicado tanto nos crimes materiais com resultado naturalístico como nos formais e de mera conduta os quais embora dispensem o resultado físico possuem resultado normativo Mediante a constatação da criação 19 In ob cit p 361 20 In ob cit p 91 A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL 43 por parte do agente de uma situação de risco proibido bem como de uma afetação do bem jurídico tutelado pela norma penal situado no âmbito do risco provocado pelo comportamento apurase a existência de imputação objetiva Somente depois é que se passa à segunda fase da apuração do nexo de causalidade a partir do que se verifica a presença de dolo ou culpa na conduta do agente nexo normativo É forçoso assim concluir que a teoria da imputação objetiva passa a significar o enquadramento da conduta ao tipo legal sob o aspecto objetivo V GOMEZ BENITEZ Causalidad imputación objetiva y delitos cualificados por el resultado apud EDILSON BONFIM e FERNANDO CAPEZ21 44 Da posição de Günther Jakobs Dentre os estudiosos da moderna teoria da imputação objetiva GÜNTHER JAKOBS adota um posicionamento peculiar entendendoa como uma teoria do tipo objetivo No contexto elaborado por Jakobs o Direito Penal se ocupa da interação das relações sociais concebendo o injusto como expressão de sentido perturbação social incompatível com a norma22 Neste aspecto só é possível determinar a conexão entre uma conduta não permitida e o seu respectivo resultado se a hipótese se configurar uma modificação planificada do mundo isto é como algo planejado pelo agente A partir da dogmática de Jakobs o princípio específico da imputação objetiva consiste na ordenação normativa do mundo fundado em relações de competência em que a representação de cada comportamento depende de seu contexto social ou seja tornase mister traçar os limites entre as condutas socialmente adequadas e os comportamentos reprovados pelo meio social Sob este prisma a imputação objetiva passa a consistir na interpretação de um comportamento sendo definida com base em critérios eminentemente objetivos considerandose que apenas os comportamentos perigosos ex ante podem ser penalmente valorados As normas funcionam como modelos ou consoante a designação de Jakobs standards de comportamento que servem para orientar as condutas dos membros da sociedade e a valoração das condutas se faz mediante a análise do cumprimento ou não por parte do sujeito do seu papel social O conteúdo axiológico dos comportamentos depende em qualquer hipótese da finalidade atribuída ao Direito Penal em um determinado contexto social e não de categorias préjurídicas A finalidade principal da imputação objetiva do comportamento consiste em imputar ao respectivo agente os desvios de sua atuação com relação às expectativas que se inserem ao portador de um papel social Isso quer dizer que não interessam as capacidades pessoais de quem atua mas sim as capacidades em potencial do portador de um papel cuja acepção se resume em um sistema de posições delimitadas de maneira normativa ocupadas por indivíduos aos quais Jakobs denomina intercambiáveis 23 No primeiro nível da análise ou seja acerca da imputação de comportamentos Jakobs propõe quatro critérios básicos a saber a o risco permitido estado normal de interação social respeitados os limites individuais de liberdade estatuídos coletivamente b o princípio da confiança c a proibição de regresso limitadora do âmbito de participação punível a teor da imputação objetiva com base em critérios objetivonormativos e d a competência da vítima Quanto à imputação do resultado que corresponde ao segundo estrato de sua 21 In ob cit p 365 22 Apud Luiz Regis Prado in ob cit p 109 23 JAKOBS Günther A imputação objetiva no Direito Penal Trad André Luis Callegari RT 2000 p 20 A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL 44 análise Jakobs não obteve o mesmo êxito experimentado no primeiro nível de seus estudos A sua definição de risco corresponde ao conjunto de condições explicativas de um acontecimento o que visa vincular a realização de riscos ao nível de imputação do comportamento Por sua vez a função que todo sistema de imputação penal deve cumprir na sociedade é no sentido de possibilitar a orientação no mundo social organizando e garantindo que cada um de seus membros adote comportamentos essenciais24 Jakobs pugna ainda por uma concepção extensiva de autoria considerando que tanto autores quanto partícipes se apresentam como criadores de uma mesma unidade de sentido adotando um critério quantitativo e não qualificativo posto que a responsabilidade de todos os intervenientes no fato delituoso seria idêntica25 Sinteticamente podese concluir que a relevância jurídicopenal de um comportamento sob o enfoque de Jakobs manifestase através do denominado tipo objetivo expressando uma vertente objetiva do injusto mediante a constatação de uma perturbação social Sérias críticas se insurgiram em relação à teoria da imputação objetiva como teoria do tipo objetivo erigida por Jakobs e dentre as mais contundentes se destaca a argumentação de que seu fundamento teórico se estabelece na teoria do sistema social HANS HIRSCH um estudioso cético com relação à questão da fundamentação da culpabilidade sobre fins preventivos gerais como pretende Jakobs salienta que dentro dessa concepção a pena estaria a serviço do exercício de fidelidade ao Direito ou seja teria como fim a chamada prevenção geral positiva26 ROXIN por seu turno observa que a teoria de Jakobs funcionalismo sistêmico parte de um pressuposto básico qual seja o de que as sociedades devem estar organizadas funcionalmente Se tal desiderato se concretiza na realidade a função do Direito Penal se encontra claramente definida Ao contrário nas sociedades estruturadas de modo disfuncional a missão do Direito Penal deve ser estabelecida 5 Da aplicação da teoria da imputação objetiva Para DAMÁSIO E DE JESUS imputação objetiva significa atribuir a alguém a realização de uma conduta criadora de um relevante risco juridicamente proibido e a produção de um resultado jurídico27 Segundo ainda o renomado Professor no futuro a teoria da imputação objetiva poderá ser aplicada em todos os tipos de delitos sejam dolosos ou culposos e de qualquer natureza materiais formais ou de mera conduta Todavia ressalta que na atualidade a imputação objetiva é utilizada pela doutrina e pela jurisprudência estrangeira apenas em relação aos delitos de ação e resultado A opinião do Professor Damásio traduzse na adequação da teoria da imputação objetiva para solucionar problemas relativos a a crimes contra as relações de consumo em que se constata a responsabilidade penal pelo produto o livre comércio e a criação de risco juridicamente proibido recaindo sobre bens jurídicos do consumidor dentre outros b crimes de trânsito bem jurídico direção normal e anormal em estado de embriaguez direção normal sem habilitação legal racha com resultado de morte ou lesões corporais participação da vítima como excludente da 24 Idem p 113 25 JAKOBS Günther Prólogo à obra La imputación objetiva em Derecho Penal p 11 apud Luiz Régis Prado in ob cit p 112 26 HIRSCH Hans Joachim El desarrollo de la dogmática penal después de Welzel Obras completas t I p 2829 apud Luiz Régis Prado in ob cit p 120 27 In ob cit p 34 A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL 45 tipicidade c armas de fogo princípio da ofensividade guarda e posse sem registro no âmbito da residência particular d transmissão de doenças como a AIDS e crimes de tóxicos objetividade jurídica princípio da ofensividade fornecimento de entorpecente com resultado letal overdose porte e posse de droga para o próprio consumo f delitos relativos à atividade médicocirúrgica problemas concernentes ao dever de cuidado limites da liberdade científica do médico consentimento do paciente ou de seus familiares erro médico erro profissional g crimes contra as relações de trabalho responsabilidade penal do empregador segurança do trabalho h delitos ocorridos nas dependências carcerárias responsabilidade dos agentes penitenciários em relação aos detentos i responsabilidade hospitalar infecções hospitalares j crimes tributários provocados por conduta criadora de risco relevante e juridicamente desaprovado no interior da empresa l violência policial m crimes comuns contra a honra tipos penais definidos no Código Penal e na Lei de Imprensa28 51 Da análise crítica da teoria da imputação objetiva Conforme se depreende da concepção finalista assim como dos doutrinadores clássicos a teoria da imputação objetiva apresenta pontos críticos que obstam a sua utilização prática merecendo um estudo mais profícuo a fim de sanar as suas deficiências Segundo a corrente doutrinária divergente a teoria da imputação objetiva carece de determinação de conceitos tais como o risco desaprovado realização de risco e fim ou âmbito de proteção o que fere o garantismo penal por desobediência ao princípio da legalidade lex certa A teoria da imputação objetiva para os críticos atribui uma excessiva relevância ao desvalor do resultado ocupando inclusive o espaço destinado ao dolo O que se argumenta a propósito é que estando o dolo presente na conduta como elemento subjetivo implícito e conseqüentemente inserido no tipo penal a sua ausência já conduz à atipicidade da conduta não havendo necessidade de se recorrer à imputação objetiva para excluir a tipicidade do fato Diante de tal raciocínio é possível inferir que a consideração da ausência do dolo resolve determinados problemas que a teoria da imputação objetiva remete ao terreno do risco como ocorre nos denominados perigos normais da vida social29 Faltariam também na teoria da imputação objetiva conceitos adequados ao crime culposo posto que a imputação objetiva não fez mais do que ao mencionar a denominada criação de risco juridicamente proibido adotar o critério da inobservância do dever de cuidado objetivo necessário o que corresponde ao elemento normativo da figura típica do delito na modalidade culposa Por fim assinalase que a conversão do risco em resultado jurídico é questão relacionada à ilicitude e não à tipicidade eis que a afetação jurídica do bem protegido pela norma penal através da lesão ou ameaça de lesão é matéria afeta à ilicitude do fato e não ao tipo penal Diante das críticas formuladas os defensores da teoria da imputação objetiva insurgiramse contra os argumentos ventilados em seu desfavor primeiramente no que concerne à ausência de conceitos claros e precisos Neste ponto aduzem que expressões como risco permitido risco proibido ou juridicamente desaprovado 28 In ob cit p 157158 29 FRISCH Wolfgang Tipo penal e imputación objetiva Madrid Colex 1995 p 64 apud Damásio E de Jesus in ob cit p 158 159 A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL 46 âmbito de proteção da norma revelam na realidade os elementos normativos do tipo como já adotado pela doutrina clássica e finalista mulher honesta fraudulentamente indevidamente dentre outros Ressaltam estes estudiosos que o dolo do tipo jamais recebeu tratamento uniforme alertando que a culpa stricto sensu inobservância do cuidado objetivo cuida de um conceito aberto que necessita de uma valoração a ser apreciada pelo julgador mediante a comparação entre a provável atuação do chamado homem médio na mesma situação fática em que se encontra o autor do fato delitivo Afastam em seguida a alegação de que a teoria da imputação objetiva estaria ocupando o espaço do dolo esclarecendo que a imputação objetiva não cuida especificamente do dolo bastando a representação do sujeito ativo em relação à situação concreta para o fim de se enquadrar a conduta provocadora do risco juridicamente proibido em determinado tipo penal A verificação da presença ou não do dolo resta postergada portanto Refutam a idéia de que toda afetação jurídica pertence à ilicitude posto que se assim fosse a simples criação do risco tornaria típica qualquer conduta mesmo que se tratasse de risco permitido livrando o agente da persecução penal somente quando da análise do segundo elemento integrante do crime ilicitude Assim condutas socialmente aceitas tais como furar as orelhas fazer uma tatuagem as práticas desportivas dentre tantas seriam consideradas típicas demandando a constatação da ilicitude para serem consideradas crimes ou não 52 Das conseqüências da aplicação da imputação objetiva in concreto Consoante os ensinamentos do Professor DAMÁSIO30 arrimado nos estudos de MANUEL A ABANTO VÁSQUEZ CARLOS SUÁREZ GONZÁLEZ e MANUEL CANCIO MELIÁ inseremse inúmeras vantagens com a aplicação da teoria da imputação objetiva Inicialmente enfatiza que o dogma de causalidade teoria da equivalência dos antecedentes utilizado pelo Código Penal abarca somente os denominados delitos materiais que possuem um resultado naturalístico deixando de regular os crimes formais e de mera conduta Ao contrário a imputação objetiva por estar relacionada à ocorrência de um resultado jurídico lesão ou exposição de perigo a lesão a bem jurídico protegido pela norma penal é passível de aplicação em qualquer espécie de delitos porquanto todos possuem resultado normativo Outro aspecto a ser objeto de crítica no tocante à relação de causalidade material se apresenta quando a questão se refere à tentativa e aos crimes omissivos aos quais os conceitos atuais não se encontram adequados posto que se ocupam apenas de um vínculo causal entre a conduta do agente e o resultado material Por outro lado a imputação objetiva pode ser amplamente utilizada no âmbito dos delitos consumados ou tentados comissivos ou omissivos em que não existe ação positivamente considerada mas apenas um deixar de agir quando lhe era devido Servem ainda as regras da imputação objetiva para regular a ocorrência dos delitos culposos bem como a matéria atinente ao concurso de pessoas mais especificamente a participação A aplicação da teoria da imputação objetiva possibilita que ausente o nexo de causalidade material o fato seja considerado atípico impedindo dessa forma a instauração desnecessária de um inquérito policial e o conseqüente ajuizamento da ação penal o que traria inúmeros benefícios à Polícia e aos órgãos do Poder Judiciário desonerandoos de procedimentos e 30 In ob cit p 160 A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL 47 diligências dispensáveis Argumenta ainda o Professor DAMÁSIO no que tange a questões tais como o risco permitido o consentimento e a participação do ofendido ações a próprio risco a violência esportiva as intervenções médicas e cirúrgicas os ofendículos as quais na doutrina clássica possuem solução na seara do exercício regular de direito ou de causa excludente da ilicitude que são consideradas pela imputação objetiva como situações de atipicidade da conduta liberando o agente prima facie Registrese que a imputação objetiva permite que somente as condutas que ex ante se mostram perigosas sejam consideradas desvaloradas perante o Direito Penal ao contrário do que ocorre com relação à doutrina clássica em que essa apreciação é levada a efeito em momento posterior ex post Por fim salienta DAMÁSIO que a adoção da imputação objetiva não significa que a teoria finalista da ação desenvolvida por WELZEL esteja relegada ao esquecimento sustentando que ambas podem perfeitamente coexistir uma vez que muitas regras métodos e critérios da imputação objetiva possuem fundamentação no finalismo como é o caso da inobservância do dever de cuidado objetivo que equivale à realização de conduta criadora de um risco juridicamente desaprovado LUIZ RÉGIS PRADO por sua vez aduz que por fixar os seus critérios apenas no âmbito do tipo objetivo a exemplo da concepção causal da ação31 a imputação objetiva não logra aferir o sentido social do fato submetido à sua apreciação haja vista que somente após constatar a realização do tipo objetivo preocupase em investigar a presença ou não do elemento subjetivo do tipo ou seja do dolo Alerta o renomado autor que a imputação objetiva poderia servir como uma forma de ampliação da punibilidade cujo alcance seria ainda maior do que a criticada causalidade Uma das críticas mais contundentes formuladas por LUIZ RÉGIS PRADO é no sentido da utilização do critério instituído por GÜNTHER JAKOBS ao estabelecer que o que confere sentido social a um comportamento é a função concretamente desempenhada pelo indivíduo no meio social32 Pondera que na conduta não se pode prescindir do elemento cognitivo pois o que modifica a valoração de um comportamento é precipuamente o conhecimento de maneira que o dolo consciência e vontade é o elemento que atribui um sentido social a uma ação Abstraindose de críticas e argumentos favoráveis à aplicação da teoria da imputação objetiva certo é que como qualquer teoria na esfera do Direito Penal enseja o desenvolvimento de novos estudos no sentido de adequar os seus conceitos e institutos ao ordenamento jurídico brasileiro antes de sua efetiva utilização Não se pode abandonar o finalismo consoante o entendimento do Professor DAMÁSIO porque o Direito Penal lida com comportamentos humanos e como tal não há como relegar a segundo plano o elemento subjetivo da conduta qual seja o dolo conhecimento e vontade e a culpa stricto sensu previsibilidade e ausência de dever de cuidado objetivo na causação de um resultado danoso Ademais cumpre ressaltar que conforme se extrai das lições de LUIZ RÉGIS PRADO não se vislumbra coerência ao admitir que por exemplo um taxista que leva o seu cliente a um banco sem ter ciência de que ele irá promover um assalto receba o mesmo tratamento penal que um outro taxista que conduz o seu cliente até uma instituição bancária tendo conhecimento de suas intenções criminosas33 Criticando a postura de JAKOBS 31 In ob cit p 159 32 In ob cit p 160 A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL 48 LUIZ RÉGIS PRADO afirma que no exemplo supracitado em que pese ambos os taxistas estejam cumprindo as suas respectivas funções normativas papel social os seus comportamentos devem sofrer tratamento distinto uma vez que o sentido social de uma conduta depende fundamentalmente da concorrência de dois fatores a saber em primeiro lugar o sujeito fazendo uso de sua capacidade intelectual deve ter aceitado o possível sentido que os elementos objetivos causais apresentam no mundo físico em segundo lugar deve ter apreendido o sentido éticosocial do ato e através de suas capacidades volitivas externas dirigido sua ação nesse sentido Luis Gracia Martin Proyeto Docente y de Investigación en Derecho Penal p 24534 Outrossim é forçoso reconhecer que a teoria da equivalência das condições adotada pelo art 13 caput do Código Penal é ineficaz para solucionar várias modalidades de crimes em especial os delitos formais de mera conduta os omissivos os tentados dentre outros reclamando uma premente mudança na matéria relacionada ao nexo de causalidade na seara criminal Resta concluir que o Direito Penal encontrase em constante evolução a fim de acompanhar o desenvolvimento do ser humano e de seu meio social e por este motivo a teoria da imputação objetiva não deve ser olvidada mas sim aprimorada para a sua adaptação ao ordenamento jurídico vigente e adequação de seus institutos com vistas a auxiliar a Ciência Penal no cumprimento de seu papel primordial qual seja o de regular o comportamento do homem como forma de controle social 6 Bibliografia BONFIM Edilson Mougenot e CAPEZ Fernando Direito Penal Parte Geral Ed Saraiva 2004 São Paulo JAKOBS Günther A Imputação Objetiva no Direito Penal Tradução de André Luís Callegari Ed RT 2000 São Paulo JESUS Damásio E Imputação Objetiva Ed Saraiva 2a edição 2002 São Paulo PRADO Luiz Régis e CARVALHO Érika Mendes de Teorias da Imputação Objetiva do Resultado Uma aproximação crítica a seus fundamentos Ed RT 2002 São Paulo 33 In ob cit p 160 34 In ob cit p 162 A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL
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1 ISSN 15188280 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS UNIJUS UNIJUS REVISTA JURÍDICA R Jur UNIJUS Uberaba MG V7 N1 p 1246 Nov 2004 2 ViceReitora Profa Elsie Barbosa PróReitor de Pesquisa e PósGraduação Prof José Bento Alves Universidade de Uberaba Revista Jurídica UNIJUS Universidade de Uberaba Ministério Públi co do Estado de Minas Gerais Vol 1 n1 1998 Uberaba MG UNIUBE 1998 v ISSN 15188280 1 Direito I Universidade de Uberaba II Ministério Público do Estado de Minas Gerais CDD 340 PróReitor de Ensino Superior Profa Inara Barbosa Pena Elias Diretor do Curso de Direito Prof Carlos Roberto Marsiglia de Figueiredo Ministério Público do Estado de Minas Gerais Núcleo de Estudos Jurídicos de Uberaba Coordenadora Sandra Maria da Silva Promotora de Justiça REVISTA JURÍDICA UNIJUS Produção da Universidade de Uberaba em parceria com o Ministério Público do Estado de Minas Gerais Núcleo de Estudos Jurídicos de Uberaba Editoração e publicação pela UNIUBE Periodicidade semestral Os trabalhos apresentados exprimem conceitos da responsabilidade dos seus autores coin cidentes ou não com os pontos de vista da coordenação da Revista Qualquer parte desta publicação pode ser reproduzida desde que citada a fonte Catalogação elaborada pelo Setor de Referência da Biblioteca Central da UNIUBE Reitor Dr Marcelo Palmério 35 A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL Sumário 1 Do posicionamento do nexo de causalidade no conceito analítico de crime 2 A teoria da equiva lência dos antecedentes e o método da eliminação hipotética 3 Dos fundamentos históricos da teoria da imputação objetiva 4 Da moderna teoria da imputação objetiva 41 Da criação de um risco proibido 42 Do consentimento do 1 Juíza Federal Substituta da 2a Vara da Subseção Judiciária de Uberaba Docente da Universidade de Uberaba no Curso de Direito nas disciplinas Teoria Geral do Direito Penal I e II no período de Agosto2003 a Julho2004 ofendido 43 Do resultado situado no âmbito do risco provocado pela conduta 44 Da posi ção Günther Jakobs 5 Da aplicação da teoria da imputação objetiva 51 Da análise crítica da teoria da imputação objetiva 52 Das conseqü ências da aplicação da imputação objetiva in con creto Cláudia Aparecida Salge1 EMENTA As inúmeras falhas na utilização da teoria da equivalência dos antecedentes adotada pelo art 13 caput do Código Penal levam à reflexão acerca do problema do nexo de causalidade no âmbito do Direito Penal Sobre o tema a teoria da imputação objetiva enceta aspectos relevantes que merecem um estudo mais acurado a fim de promover soluções adequadas às situações fáticas não alcançadas pela denominada teoria da conditio sine qual non 1 Do posicionamento do nexo de causalidade no conceito analítico de crime O crime sob o aspecto analítico pode ser fragmentado em três estratos distintos tipicidade ilicitude e culpabilidade que são indispensáveis para que o fato tenha repercussão na seara do Direito Penal Na realidade o crime existe como um todo como um fato único apenas para efeito didático fazse necessário o seccionamento do delito a fim de facilitar o reconhecimento do fato humano passível de responsabilização criminal Considerado de maneira singela como fato humano que lesa ou expõe a perigo de lesão bens jurídicos penalmente tutelados o crime pressupõe uma conduta comissiva ação ou omissiva omissão Por sua vez a conduta humana sob o prisma da teoria finalista elaborada por HANS WELZEL e adotada pelo Código Penal Brasileiro deve ser direcionada ao dano efetivo ao bem jurídico protegido pela norma penal nos casos de delitos dolosos ou para a causação de um resultado danoso nas hipóteses de delitos culposos Em obediência ao princípio da legalidade preconizado pela Constituição Federal Brasileira art 5o inciso XXXIX e pelo Código Penal art 1o a descrição hipotética de uma conduta considerada criminosa constitui o fato típico o qual segundo DAMÁSIO E DE JESUS se decompõe nos seguintes elementos a conduta humana dolosa ou culposa b resultado c o nexo de causalidade material entre a conduta comissiva e o resultado d enquadramento do fato material conduta resultado e nexo causal a uma norma penal incriminadora tipicidade 36 A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL Como elemento primário do fato típico a conduta para a teoria finalista da ação trata da ação ou omissão humana consciente e dirigida a uma determinada finalidade ou seja o resultado Encarado como objetivo precípuo da conduta o resultado pode ser analisado tanto sob o aspecto da teoria naturalística considerado como uma modificação do mundo exterior provocada pelo comportamento humano ou sob o aspecto da teoria jurídica em que se tem a afetação de um interesse protegido pela norma penal como por exemplo a vida o patrimônio a honra dentre outros Nesta última análise todos os delitos possuem resultado inclusive os crimes denominados formais que não exigem a ocorrência do resultado naturalístico e os de mera conduta que não possuem resultado sob o aspecto físico O vínculo que liga um resultado a uma conduta é conhecido como nexo de causalidade ou nexo causal que se traduz em um elemento objetivo do tipo penal Para a responsabilização do agente é imprescindível a verificação do nexo de causalidade entre o resultado e o seu comportamento sem o que não há que se falar em fato típico 2 A Teoria da equivalência dos antecedentes e o método da eliminação hipotética Para tratar da questão atinente ao nexo de causalidade que nos interessa mais especificamente neste estudo o Código Penal Brasileiro adotou em seu art 13 caput a teoria da equivalência dos antecedentes cuja finalidade segundo PAULO JOSÉ DA COSTA JÚNIOR é a de regular os dois momentos da atividade do julgador verificação do elo causal entre conduta evento e valoração desse nexo em relação ao Direito2 Consoante a teoria da conditio sine qua non equivalência dos antecedentes que considera como causa a ação sem a qual o resultado não teria ocorrido para a verificação do nexo de causalidade fazse necessária a utilização do método de eliminação hipotética elaborado por Thyrén Esse método impõe que para se aferir se um fator é causa de um resultado basta mentalmente de forma objetiva sem qualquer valoração excluílo da cadeia causal se com sua exclusão o resultado ainda teria sido produzido não pode ser considerado causa ao contrário se com sua exclusão o resultado desaparece tal fator deve ser considerado causa Suponhamos que arrimados nas lições de DAMÁSIO E DE JESUS A tenha matado B O fato típico do homicídio possui uma série de condutas antecedentes como a fabricação do revólver sua aquisição pelo comerciante a compra pelo agente etc Excluindose p ex a fabricação da arma o resultado não teria ocorrido Logo o fabrico da arma é considerado causa3 Ora não há plausibilidade nenhuma em se atribuir ao fabricante ou ao comerciante de armas de fogo a responsabilidade pelos atos ilícitos praticados com os aludidos artefatos posto que esse raciocínio poderia levar inclusive à absurda responsabilização dos pais do assassino pela sua concepção mediante um inocente ato de amor A principal crítica levantada pelos estudiosos do Direito no tocante à aplicação da teoria da equivalência dos antecedentes é exatamente neste sentido ou seja a operação denominada regressus ad infinitum segundo a qual se inserem na cadeia causal indivíduos que não contribuíram efetivamente para a ocorrência do resultado como no exemplo 2 Do nexo causal São Paulo Malheiros Ed 1996 p 102 lembrado por MIGUEL REALE JÚNIOR Teoria do Delito São Paulo Revista dos Tribunais 1998 p 178 n 24 citado por DAMÁSIO E DE JESUS in Imputação Objetiva Ed Saraiva 2a edição 2002 p 6 3 In ob cit p 67 37 4 Direito Penal Parte Geral São Paulo Ed Saraiva 2004 p 340341 5 JESÚS Damásio E de in ob cit p 23 supramencionado o fabricante e o comerciante da arma utilizada para a prática criminosa Esses indivíduos somente são excluídos da responsabilidade penal pelo fato delituoso em face da aplicação do nexo normativo qual seja mediante a verificação da existência ou não de dolo ou culpa stricto sensu em suas condutas operação esta que se efetua após a constatação do nexo objetivo Ausente um dos elementos subjetivos da conduta intencionalidade afastase a responsabilidade criminal evitando assim os absurdos jurídicos de chegarse até mesmo a responsabilizar os pais do criminoso assim como o fabricante de automóveis pelos delitos culposos no trânsito Na realidade percebese que a teoria da equivalência dos antecedentes se constitui em mera constatação objetiva do liame existente entre o resultado e as suas respectivas causas sendo que esse vínculo se fundamenta exclusivamente no campo das ciências físicas como um raciocínio matemático relacionado às ciências exatas flagrantemente destoante da intencionalidade da conduta que requer a teoria finalista da ação elaborada por WELZEL e adotada pelo Código Penal Brasileiro Ademais a teoria adotada pelo art 13 caput do Código Penal por estabelecer uma relação meramente física entre a conduta e o resultado deixa de regular os denominados crimes formais e de mera conduta que independem da provocação de um resultado naturalístico Denotase claramente que a teoria da conditio sine qua non possui um elo profundo com a teoria naturalista ou causal da ação que exige apenas para a configuração da responsabilização penal o vínculo objetivo entre a conduta do agente e o resultado olvidando o elemento intencional da ação Apresentase portanto a teoria da equivalência dos antecedentes incapaz de solucionar questões complexas que povoam o mundo jurídico atual tais como a dupla causalidade alternativa autoria colateral a dupla causalidade concomitante em que nenhuma das condutas sozinha poderia provocar o resultado mas somadas atingem o desiderato final na hipótese em que o resultado ocorreria de qualquer modo p ex o médico que desliga os aparelhos que mantêm vivo um paciente terminal com danos cerebrais irreversíveis acelerando a sua morte os desvios dos cursos causais p ex o ladrão principiante trêmulo e inseguro que aponta um estilete para a vítima um homenzarrão e anuncia o assalto a vítima se apavora sofre um enfarto e morre Todas essas situações bem lembradas por EDILSON MOUGENOT BONFIM e FERNANDO CAPEZ4 não conseguem ser solucionadas com a utilização do art 13 caput do CP requerendo a evolução do pensamento jurídico no tocante ao nexo de causalidade 3 Dos fundamentos históricos da teoria da imputação objetiva Diante das constantes e justificadas críticas apontadas pelos estudiosos em relação ao absolutismo caracterizado pela utilização da conditio sine qua non na Alemanha logo após a Segunda Grande Guerra Mundial foram lançadas as primeiras bases da teoria da imputação objetiva cuja finalidade era a de substituir o nexo causal puramente material pela relação jurídica normativa entre a conduta e o resultado5 O que se pretende portanto com a teoria da imputação objetiva é na realidade abandonar a relação de causalidade como único vínculo entre a ação e o resultado e passar analisar o nexo causal também sob o aspecto jurídico Cumpre todavia lembrar que os A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL 38 6 PRADO Luiz Régis e CARVALHO Erika Mendes de in Teorias da Imputação Objetiva do Resultado São Paulo Ed RT 2002 p 18 7 MORALES Diego Medina Derecho y Libertad La teoria de la imputabilidad em Aristóteles Cuadernos de Política Criminal n 55 p 134 e ss apud Luiz Régis Prado in ob cit p 1920 8 WELZEL Hans La dottrina giusnaturalistica di Samuel Pufendorf Um contribut alla storia delle idee dei secoli XVII e XVIII p 119 e ss citado por Luiz Regis Prado in ob cit P 2122 9 HEGEL Georg Princípios da filosofia do direito p 110 apud Luiz Régis Prado in ob cit p 2730 pilares fundamentais da teoria da imputação objetiva vêm de tempos remotos eis que já na obra de PLATÃO A República é possível vislumbrar nuances relacionadas à matéria em comento Na referida obra o aspecto positivo das leis tornase relevante na oportunidade que a lei deve exercer especialmente no âmbito penal uma função imperativa função esta que se relaciona sob o ponto de vista filosófico com o início da noção de imputação a lei como definidora da imputabilidade do ato A imputação então passa a ter uma idéia de produção de algo de acordo com determinada norma6 ARISTÓTELES por sua vez desenvolveu com maior clareza os princípios da imputação tomando como cerne as categorias ontológicas estrutura da ação humana Segundo o seu raciocínio uma conduta somente pode ser imputável se estiver no âmbito de controle de seu autor do qual se poderia esperar um comportamento diverso É o que denomina de liberdade natural ou livre determinação de agir Somente os atos que estão sob o domínio da vontade podem ser suscetíveis de imputação7 SAMUEL PUFENDORF em seqüência aos trabalhos de Aristóteles reelaborou a doutrina de imputação sobre as bases já lançadas Os estudos por ele empreendidos levaram a um conceito de imputação que pela primeira vez surgia na ciência do Direito Penal ao afirmar que apenas os resultados que dependam da vontade humana ou que sejam domináveis por ela podem ser imputáveis ao homem como obra sua Os principais fundamentos de sua teoria são no sentido de que o homem como ser racional diferente dos demais animais é capaz de dominar e dirigir os seus movimentos através de suas decisões Por sua vez essa capacidade encontra os seus limites nos princípios que regem a conduta humana uma vez que o homem ao integrar a natureza pode intervir nos processos causais e conduzilos de acordo com suas próprias intenções Pufendorf utilizouse de duas expressões a saber a imputativitas e a imputatio A primeira imputativitas significa que a ação pertencerá ao agente quando representar a sua livre autodeterminação consciência e vontade enquanto que a segunda imputatio refere se às operações judiciais realizadas para comprovar a ocorrência dos elementos que compõem a imputativitas e para proceder à valoração do evento A valoração do ocorrido demanda a distinção dos entia physica que se relacionam aos objetos de natureza física regidos pela lei natural dos entia moralia que pertencem ao mundo da cultura conferindo direção e sentido às ações livres do homem ao estabelecer critérios para ajustar a liberdade de ação juízo de valoração8 No início do século XIX GEORG HEGEL elaborou um princípio que serviu de fundamento para a moderna teoria da imputação objetiva ao afirmar que um fato somente pode ser imputado como responsabilidade da vontade de seu autor A dominação da vontade é pressuposto para a imputação e o juízo de imputação trata de um juízo teleológico e não causal9 A inovação trazida por Hegel em relação à doutrina desenvolvida por Pufendorf é no sentido de que a imputação não se sobrepõe à responsabilidade não se confundindo com a culpabilidade ao contrário do que afirmava este último que entendia a ação como vontade livre realizada por um sujeito A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL 39 imputável A deficiência encontrada no conceito de Hegel reside nos delitos culposos cujos resultados não se encontram no âmbito da vontade do agente Em direção oposta aos estudos de Aristóteles Punfendorf e Hegel surge a doutrina de KARL LARENZ que defende a tese de que o critério fundamental para atribuir um fato a alguém se encontra no denominado juízo de imputação explicando que a imputação corresponde à tentativa de delimitar um fato próprio de um acontecimento puramente fortuito servindo meramente para determinar se o acontecimento é obra ou não do sujeito10 Larenz busca com sua teoria baseada em aspectos objetivos englobar além dos fatos conhecidos e desejados pelo sujeito dolosos também os que poderiam ser mas não foram abarcados por sua vontade culposos Para Larenz a imputação se subsume na possibilidade de previsão e domínio dos cursos causais e é designada objetiva porque a mencionada possibilidade de previsão não é considerada com base na capacidade e na ciência do sujeito ativo in concreto mas consoante um critério geral e objetivo o do homem inteligente e prudente homem comum Atualmente na Espanha e Alemanha a doutrina da imputação objetiva procura elaborar critérios normativos cuja finalidade precípua é a de atribuir determinado resultado a uma conduta ativa ou omissiva RICHARD HONIG é considerado o precursor desse pensamento jurídico justificando a imputação objetiva não como imputação do comportamento mas sim como imputação do resultado Para Honig não se trata de aferir a causalidade mas de atribuirlhe valor sendo portanto imputáveis os resultados que podem ser finalmente vislumbrados por seu autor finalidade objetiva11 A relevância para a imputação objetiva sob os critérios de Honig é saber se o sujeito possuía condições de com seu comportamento realizar ou evitar o resultado afastando por conseguinte os eventos produzidos fortuitamente requer previsibilidade e direção da vontade humana 4 Da moderna teoria da imputação objetiva Com o avanço dos estudos elaborados em torno da teoria da imputação objetiva chegouse no início da década de 70 a uma concepção moderna sobre a matéria elaborada por CLAUS ROXIN Fundamentando suas conclusões em critérios normativos para responsabilização de delitos materiais dolosos e culposos Roxin pretendia contribuir para a reformulação da teoria da imputação objetiva desvinculada do dogma causal A partir de então formulouse o princípio do risco segundo o qual para aferir a responsabilidade do agente pelo resultado o importante é verificar se a conduta criou ou não um risco juridicamente relevante de lesão típica de um bem jurídico penalmente tutelado12 Sustenta Roxin que somente é imputável ao agente o resultado que pode ser finalmente previsto e dirigido por sua vontade pugnando pela realização de um curso causal dominável pelo elemento volitivo em perfeita consonância com a teoria finalista da ação A vontade portanto seria dirigida à criação de um risco juridicamente relevante a um bem jurídico protegido pela norma penal Partindose da premissa de que a teoria da imputação objetiva requer a criação de um risco juridicamente desaprovado coligese que para a existência de um fato típico fazemse necessários os seguintes requisitos a conduta criadora de um risco para a ocorrência do resultado e este risco deve ser proibido b o resultado naturalístico deve se encontrar no âmbito do risco 10 MELIÁ Cancio e GONZÁLEZ Suárez apud Luiz Regis Prado in ob cit p 3031 11 Citado por Luiz Régis Prado in ob cit p 3435 12 Idem p 64 A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL 40 provocado pela conduta 41 Da criação de um risco proibido Como seres humanos integrantes de uma coletividade todos nós corremos diariamente riscos que podem ou não provocar algum dano a bens jurídicos protegidos pelo Direito Penal Entretanto o risco ensejador da imputação objetiva de um resultado ao seu autor não trata de qualquer risco excluindose do âmbito da norma penal os denominados riscos permitidos ou tolerados pelo convívio social Riscos toleráveis são os aceitos socialmente como normais e inerentes ao desenvolvimento da coletividade tais como os veículos automotores que embora perigosos se manejados de maneira inadequada são necessários ao transporte de pessoas e objetos essenciais à sociedade Não se pode assim atribuir ao fabricante de veículos a responsabilidade pelos acidentes e mortes provocadas pelo mau uso dos automóveis pois tais infortúnios se consideram riscos tolerados Sopesando no caso em exame os benefícios advindos com o uso dos automóveis e os perigos trazidos com sua utilização num critério de custo benefício a sociedade é quem deve decidir pela tolerabilidade dos riscos assumindoos como imprescindíveis ao conseqüente progresso ou pela assunção de menos perigo mas com estagnação da evolução social Entrementes segundo EDILSON MOUGENOT BONFIM e FERNANDO CAPEZ o que deve ser feito é cobrar de cada um de acordo com o papel social que representa cujos limites serão estabelecidos pela aspiração geral dos membros da coletividade13 Se o autor embora tendo provocado um resultado lesivo se tiver conduzido de maneira a criar uma situação de risco tolerável ou permitido não há como se lhe imputar tal resultado Ao contrário se o autor com sua conduta tiver provocado um risco juridicamente proibido ou ainda se tiver aumentado o risco permitido então o resultado poderá serlhe imputado A teor dos ensinamentos de GÜNTHER JAKOBS a mera causação do resultado mesmo na modalidade dolosa não é suficiente para aferir a imputação ao agente eis que se o Direito Penal tivesse por fim eliminar todo e qualquer risco resultante do contato social mediante a prevenção geral e especial previsão in abstracto e aplicação efetiva da sanção penal a sociedade ficaria completamente paralisada14 Aqui se estabelece uma íntima ligação entre a teoria da imputação objetiva e o princípio da adequação social elaborado por WELZEL tomandose por base a circunstância de que um fato socialmente adequado corresponde a um comportamento permitido e tolerado não correspondendo a um risco proibido o que leva à atipicidade da conduta adotada pelo agente O que fundamenta a aceitação social de determinadas condutas é o fato de se tratar de uma relação denominada contatos sociais em que cada um dos envolvidos espera do outro o cumprimento de seu papel social Distanciandose de seu papel social o agente engendra um risco proibido não tolerado pela ordem jurídica Por outro lado há que se verificar que as relações sociais se fundamentam no princípio da confiança em que cada um dos membros da sociedade ao adotar condutas em conformidade com as regras jurídicas de comportamento mantendose em seu papel social possui o direito de esperar do outro que proceda da mesma forma Sob esse aspecto ninguém é obrigado a fiscalizar o comportamento alheio a fim de eliminar quaisquer riscos de lesão cabendo a cada 13 In ob cit p 352 14 Apud Edilson M Bonfim e Fernando Capez in ob cit p 354 A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL 41 um a responsabilidade por suas próprias condutas É o que se depreende do exemplo mencionado por EDILSON BONFIM e CAPEZ o médico confia que o auxiliar vá lhe passar um bisturi esterilizado se isso não ocorre e o paciente morre por infecção o cirurgião não criou um risco proibido e não responderá assim pelo resultado15 42 Do consentimento do ofendido Impende considerar ainda que a aquiescência do titular do bem jurídico ofendido em participar do evento danoso aderindo ao comportamento do agente é capaz de afastar a imputação objetiva do resultado Ao contrário do posicionamento adotado pela doutrina tradicional que enfrenta a questão do consentimento do ofendido como causa supralegal de exclusão da ilicitude atuando sobre o segundo elemento do crime a teoria da imputação objetiva trabalha a matéria no âmbito do próprio tipo penal tornando atípica a conduta do agente por considerar que o resultado se origina de um risco permitido Ante o consentimento válido do ofendido a ação passa a se desenvolver sob a égide de um risco perfeitamente tolerado pela sociedade como representação do livre arbítrio no contexto social sendo incapaz de lesar o bem jurídico penalmente tutelado Tal raciocínio se justifica pelo fato de que segundo HIRSCH todo aquele que concorda com um comportamento perigoso assume conscientemente o risco de uma lesão eliminando a antinormatividade da conduta do outro que devidamente autorizado pelo interessado realizou a conduta perigosa a qual acabou por provocar a lesão a bem jurídico16 Para o fim de afastar a proibição do risco o consentimento do ofendido não deve necessariamente abranger a lesão sendo suficiente que o titular do bem jurídico consciente do perigo consinta na adoção por parte do agente de um comportamento contrário às normas do dever de cuidado Retornase assim ao cálculo do custo benefício em que o ofendido é capaz de sopesar os riscos e os benefícios advindos com a conduta do agente optando pela situação de perigo Nessa linha de raciocínio ao mencionarem o exemplo lembrado por ANTÔNIO LUIS CHAVES DE CAMARGO in Imputação Objetiva EDILSON BONFIM e FERNANDO CAPEZ estabelecem em que situações podese considerar o consentimento do ofendido como causa de exclusão do risco proibido a saber O Tribunal Supremo alemão no ano de 1984 num denominado caso de seringa absolveu o autor de um crime culposo porque havia cedido heroína a um viciado que a injetou causandolhe a morte Ficou patenteado que a heroína tem um risco intrínseco que é do conhecimento da vítima e esta se colocou em perigo afastando a imputação do autor que lhe cedeu a droga para ser injetada17 Para alguns autores como SCHAFFSTEIN não importa se o bem jurídico se encontra ou não dentro da esfera de disponibilidade de seu titular uma vez que este não está consentindo na lesão em si mesma mas somente na situação criadora do risco Neste sentido é possível a disponibilidade da vida humana consoante a citação de MANUEL DA COSTA ANDRADE18 Há que se falar inclusive em situações nas quais a vítima deixa de adotar as cautelas devidas de autoproteção e com seu comportamento descuidado colocase em circunstâncias de perigo afastando a responsabilidade do autor da conduta pelo resultado provocado É o caso citado por 15 In ob cit p 357358 16 Apud Edilson M Bonfim e Fernando Capez in ob cit p 359360 17 Idem p 361 18 In Consentimento e acordo em Direito Penal cit Por Edilson Bonfim e Fernando Capez in ob cit p 359 A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL 42 EDILSON BONFIM e CAPEZ em que um lutador de judô ainda não recuperado de uma lesão na vértebra insiste em participar de uma competição e ao receber um golpe normal de seu adversário sofre uma queda e vem a falecer em virtude das lesões sofridas19 Não há portanto que se falar em responsabilização penal do autor do golpe que não criou e nem incrementou nenhum risco anormal para a vítima Urge assinalar ademais que se o autor se comportou de forma a reduzir o risco de lesão acaba por adotar um comportamento em conformidade com a norma o que leva à atipicidade de sua conduta É o que ocorre portanto com o agente que afasta uma pedra que foi arremessada em direção à cabeça da vítima projetandoa para o braço diminuindo com seu comportamento a gravidade da lesão à integridade física do ofendido Nesse caso o agente não responde pela lesão eis que a sua ação protegeu o bem jurídico tutelado pela norma penal 43 Do resultado situado no âmbito do risco provocado pela conduta Em que pese à existência da provocação de um risco proibido para a configuração da imputação objetiva é inexorável que o resultado naturalístico se encontre dentro da linha de desdobramento causal da conduta adotada pelo agente estando sob o seu domínio causal Não se admitem em sede de imputação objetiva os denominados desvios causais considerados como interferências não previstas no desenvolvimento da cadeia de causalidade rompendo o nexo e a responsabilização do agente pelo resultado físico DAMÁSIO E DE JESUS referindo se à questão como âmbito ou extensão da tutela penal ou alcance do tipo fornece exaustivamente exemplos de situações em que ocorre a ruptura do nexo causal em razão dessas interferências citando ainda GÜNTHER JAKOBS ao creditar o resultado ao infortúnio da vítima ou mala suerte O Professor DAMÁSIO menciona ainda um exemplo fornecido por MANUEL CANCIO MELIÁ em que um motorista conduzindo um caminhão por uma rodovia recolhe uma jovem que estava fazendo autostop propondolhe relações sexuais A moça se nega Ele insiste Ela lhe pede que estacione o veículo caso contrário vai jogarse para fora do caminhão em movimento Ele se nega Ela abre a porta e se lança no asfalto ferindo se gravemente20 sendo a hipótese correspondente a fatos reais As soluções possíveis são apresentadas por MANUEL CANCIO MELIÁ que traça as seguintes recomendações citadas por DAMÁSIO DE JESUS a na situação em que o comportamento da vítima se constitui em reação grosseira ante a conduta do motorista que não colocava em risco sério a nenhum bem jurídico a ela pertencente o agente não responde pelas lesões b ao contrário se a conduta do motorista gerou uma situação de iminente risco sexual à vítima ocorre a imputação objetiva do resultado ao agente Neste sentido é possível a adoção do pensamento de CLAUS ROXIN ao afirmar que a imputação objetiva vai além da atribuição do resultado naturalístico à conduta buscando estabelecer os requisitos para unir o resultado jurídico lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico ao comportamento do agente com a aferição da violação do interesse tutelado pela norma penal o que pode ser aplicado tanto nos crimes materiais com resultado naturalístico como nos formais e de mera conduta os quais embora dispensem o resultado físico possuem resultado normativo Mediante a constatação da criação 19 In ob cit p 361 20 In ob cit p 91 A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL 43 por parte do agente de uma situação de risco proibido bem como de uma afetação do bem jurídico tutelado pela norma penal situado no âmbito do risco provocado pelo comportamento apurase a existência de imputação objetiva Somente depois é que se passa à segunda fase da apuração do nexo de causalidade a partir do que se verifica a presença de dolo ou culpa na conduta do agente nexo normativo É forçoso assim concluir que a teoria da imputação objetiva passa a significar o enquadramento da conduta ao tipo legal sob o aspecto objetivo V GOMEZ BENITEZ Causalidad imputación objetiva y delitos cualificados por el resultado apud EDILSON BONFIM e FERNANDO CAPEZ21 44 Da posição de Günther Jakobs Dentre os estudiosos da moderna teoria da imputação objetiva GÜNTHER JAKOBS adota um posicionamento peculiar entendendoa como uma teoria do tipo objetivo No contexto elaborado por Jakobs o Direito Penal se ocupa da interação das relações sociais concebendo o injusto como expressão de sentido perturbação social incompatível com a norma22 Neste aspecto só é possível determinar a conexão entre uma conduta não permitida e o seu respectivo resultado se a hipótese se configurar uma modificação planificada do mundo isto é como algo planejado pelo agente A partir da dogmática de Jakobs o princípio específico da imputação objetiva consiste na ordenação normativa do mundo fundado em relações de competência em que a representação de cada comportamento depende de seu contexto social ou seja tornase mister traçar os limites entre as condutas socialmente adequadas e os comportamentos reprovados pelo meio social Sob este prisma a imputação objetiva passa a consistir na interpretação de um comportamento sendo definida com base em critérios eminentemente objetivos considerandose que apenas os comportamentos perigosos ex ante podem ser penalmente valorados As normas funcionam como modelos ou consoante a designação de Jakobs standards de comportamento que servem para orientar as condutas dos membros da sociedade e a valoração das condutas se faz mediante a análise do cumprimento ou não por parte do sujeito do seu papel social O conteúdo axiológico dos comportamentos depende em qualquer hipótese da finalidade atribuída ao Direito Penal em um determinado contexto social e não de categorias préjurídicas A finalidade principal da imputação objetiva do comportamento consiste em imputar ao respectivo agente os desvios de sua atuação com relação às expectativas que se inserem ao portador de um papel social Isso quer dizer que não interessam as capacidades pessoais de quem atua mas sim as capacidades em potencial do portador de um papel cuja acepção se resume em um sistema de posições delimitadas de maneira normativa ocupadas por indivíduos aos quais Jakobs denomina intercambiáveis 23 No primeiro nível da análise ou seja acerca da imputação de comportamentos Jakobs propõe quatro critérios básicos a saber a o risco permitido estado normal de interação social respeitados os limites individuais de liberdade estatuídos coletivamente b o princípio da confiança c a proibição de regresso limitadora do âmbito de participação punível a teor da imputação objetiva com base em critérios objetivonormativos e d a competência da vítima Quanto à imputação do resultado que corresponde ao segundo estrato de sua 21 In ob cit p 365 22 Apud Luiz Regis Prado in ob cit p 109 23 JAKOBS Günther A imputação objetiva no Direito Penal Trad André Luis Callegari RT 2000 p 20 A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL 44 análise Jakobs não obteve o mesmo êxito experimentado no primeiro nível de seus estudos A sua definição de risco corresponde ao conjunto de condições explicativas de um acontecimento o que visa vincular a realização de riscos ao nível de imputação do comportamento Por sua vez a função que todo sistema de imputação penal deve cumprir na sociedade é no sentido de possibilitar a orientação no mundo social organizando e garantindo que cada um de seus membros adote comportamentos essenciais24 Jakobs pugna ainda por uma concepção extensiva de autoria considerando que tanto autores quanto partícipes se apresentam como criadores de uma mesma unidade de sentido adotando um critério quantitativo e não qualificativo posto que a responsabilidade de todos os intervenientes no fato delituoso seria idêntica25 Sinteticamente podese concluir que a relevância jurídicopenal de um comportamento sob o enfoque de Jakobs manifestase através do denominado tipo objetivo expressando uma vertente objetiva do injusto mediante a constatação de uma perturbação social Sérias críticas se insurgiram em relação à teoria da imputação objetiva como teoria do tipo objetivo erigida por Jakobs e dentre as mais contundentes se destaca a argumentação de que seu fundamento teórico se estabelece na teoria do sistema social HANS HIRSCH um estudioso cético com relação à questão da fundamentação da culpabilidade sobre fins preventivos gerais como pretende Jakobs salienta que dentro dessa concepção a pena estaria a serviço do exercício de fidelidade ao Direito ou seja teria como fim a chamada prevenção geral positiva26 ROXIN por seu turno observa que a teoria de Jakobs funcionalismo sistêmico parte de um pressuposto básico qual seja o de que as sociedades devem estar organizadas funcionalmente Se tal desiderato se concretiza na realidade a função do Direito Penal se encontra claramente definida Ao contrário nas sociedades estruturadas de modo disfuncional a missão do Direito Penal deve ser estabelecida 5 Da aplicação da teoria da imputação objetiva Para DAMÁSIO E DE JESUS imputação objetiva significa atribuir a alguém a realização de uma conduta criadora de um relevante risco juridicamente proibido e a produção de um resultado jurídico27 Segundo ainda o renomado Professor no futuro a teoria da imputação objetiva poderá ser aplicada em todos os tipos de delitos sejam dolosos ou culposos e de qualquer natureza materiais formais ou de mera conduta Todavia ressalta que na atualidade a imputação objetiva é utilizada pela doutrina e pela jurisprudência estrangeira apenas em relação aos delitos de ação e resultado A opinião do Professor Damásio traduzse na adequação da teoria da imputação objetiva para solucionar problemas relativos a a crimes contra as relações de consumo em que se constata a responsabilidade penal pelo produto o livre comércio e a criação de risco juridicamente proibido recaindo sobre bens jurídicos do consumidor dentre outros b crimes de trânsito bem jurídico direção normal e anormal em estado de embriaguez direção normal sem habilitação legal racha com resultado de morte ou lesões corporais participação da vítima como excludente da 24 Idem p 113 25 JAKOBS Günther Prólogo à obra La imputación objetiva em Derecho Penal p 11 apud Luiz Régis Prado in ob cit p 112 26 HIRSCH Hans Joachim El desarrollo de la dogmática penal después de Welzel Obras completas t I p 2829 apud Luiz Régis Prado in ob cit p 120 27 In ob cit p 34 A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL 45 tipicidade c armas de fogo princípio da ofensividade guarda e posse sem registro no âmbito da residência particular d transmissão de doenças como a AIDS e crimes de tóxicos objetividade jurídica princípio da ofensividade fornecimento de entorpecente com resultado letal overdose porte e posse de droga para o próprio consumo f delitos relativos à atividade médicocirúrgica problemas concernentes ao dever de cuidado limites da liberdade científica do médico consentimento do paciente ou de seus familiares erro médico erro profissional g crimes contra as relações de trabalho responsabilidade penal do empregador segurança do trabalho h delitos ocorridos nas dependências carcerárias responsabilidade dos agentes penitenciários em relação aos detentos i responsabilidade hospitalar infecções hospitalares j crimes tributários provocados por conduta criadora de risco relevante e juridicamente desaprovado no interior da empresa l violência policial m crimes comuns contra a honra tipos penais definidos no Código Penal e na Lei de Imprensa28 51 Da análise crítica da teoria da imputação objetiva Conforme se depreende da concepção finalista assim como dos doutrinadores clássicos a teoria da imputação objetiva apresenta pontos críticos que obstam a sua utilização prática merecendo um estudo mais profícuo a fim de sanar as suas deficiências Segundo a corrente doutrinária divergente a teoria da imputação objetiva carece de determinação de conceitos tais como o risco desaprovado realização de risco e fim ou âmbito de proteção o que fere o garantismo penal por desobediência ao princípio da legalidade lex certa A teoria da imputação objetiva para os críticos atribui uma excessiva relevância ao desvalor do resultado ocupando inclusive o espaço destinado ao dolo O que se argumenta a propósito é que estando o dolo presente na conduta como elemento subjetivo implícito e conseqüentemente inserido no tipo penal a sua ausência já conduz à atipicidade da conduta não havendo necessidade de se recorrer à imputação objetiva para excluir a tipicidade do fato Diante de tal raciocínio é possível inferir que a consideração da ausência do dolo resolve determinados problemas que a teoria da imputação objetiva remete ao terreno do risco como ocorre nos denominados perigos normais da vida social29 Faltariam também na teoria da imputação objetiva conceitos adequados ao crime culposo posto que a imputação objetiva não fez mais do que ao mencionar a denominada criação de risco juridicamente proibido adotar o critério da inobservância do dever de cuidado objetivo necessário o que corresponde ao elemento normativo da figura típica do delito na modalidade culposa Por fim assinalase que a conversão do risco em resultado jurídico é questão relacionada à ilicitude e não à tipicidade eis que a afetação jurídica do bem protegido pela norma penal através da lesão ou ameaça de lesão é matéria afeta à ilicitude do fato e não ao tipo penal Diante das críticas formuladas os defensores da teoria da imputação objetiva insurgiramse contra os argumentos ventilados em seu desfavor primeiramente no que concerne à ausência de conceitos claros e precisos Neste ponto aduzem que expressões como risco permitido risco proibido ou juridicamente desaprovado 28 In ob cit p 157158 29 FRISCH Wolfgang Tipo penal e imputación objetiva Madrid Colex 1995 p 64 apud Damásio E de Jesus in ob cit p 158 159 A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL 46 âmbito de proteção da norma revelam na realidade os elementos normativos do tipo como já adotado pela doutrina clássica e finalista mulher honesta fraudulentamente indevidamente dentre outros Ressaltam estes estudiosos que o dolo do tipo jamais recebeu tratamento uniforme alertando que a culpa stricto sensu inobservância do cuidado objetivo cuida de um conceito aberto que necessita de uma valoração a ser apreciada pelo julgador mediante a comparação entre a provável atuação do chamado homem médio na mesma situação fática em que se encontra o autor do fato delitivo Afastam em seguida a alegação de que a teoria da imputação objetiva estaria ocupando o espaço do dolo esclarecendo que a imputação objetiva não cuida especificamente do dolo bastando a representação do sujeito ativo em relação à situação concreta para o fim de se enquadrar a conduta provocadora do risco juridicamente proibido em determinado tipo penal A verificação da presença ou não do dolo resta postergada portanto Refutam a idéia de que toda afetação jurídica pertence à ilicitude posto que se assim fosse a simples criação do risco tornaria típica qualquer conduta mesmo que se tratasse de risco permitido livrando o agente da persecução penal somente quando da análise do segundo elemento integrante do crime ilicitude Assim condutas socialmente aceitas tais como furar as orelhas fazer uma tatuagem as práticas desportivas dentre tantas seriam consideradas típicas demandando a constatação da ilicitude para serem consideradas crimes ou não 52 Das conseqüências da aplicação da imputação objetiva in concreto Consoante os ensinamentos do Professor DAMÁSIO30 arrimado nos estudos de MANUEL A ABANTO VÁSQUEZ CARLOS SUÁREZ GONZÁLEZ e MANUEL CANCIO MELIÁ inseremse inúmeras vantagens com a aplicação da teoria da imputação objetiva Inicialmente enfatiza que o dogma de causalidade teoria da equivalência dos antecedentes utilizado pelo Código Penal abarca somente os denominados delitos materiais que possuem um resultado naturalístico deixando de regular os crimes formais e de mera conduta Ao contrário a imputação objetiva por estar relacionada à ocorrência de um resultado jurídico lesão ou exposição de perigo a lesão a bem jurídico protegido pela norma penal é passível de aplicação em qualquer espécie de delitos porquanto todos possuem resultado normativo Outro aspecto a ser objeto de crítica no tocante à relação de causalidade material se apresenta quando a questão se refere à tentativa e aos crimes omissivos aos quais os conceitos atuais não se encontram adequados posto que se ocupam apenas de um vínculo causal entre a conduta do agente e o resultado material Por outro lado a imputação objetiva pode ser amplamente utilizada no âmbito dos delitos consumados ou tentados comissivos ou omissivos em que não existe ação positivamente considerada mas apenas um deixar de agir quando lhe era devido Servem ainda as regras da imputação objetiva para regular a ocorrência dos delitos culposos bem como a matéria atinente ao concurso de pessoas mais especificamente a participação A aplicação da teoria da imputação objetiva possibilita que ausente o nexo de causalidade material o fato seja considerado atípico impedindo dessa forma a instauração desnecessária de um inquérito policial e o conseqüente ajuizamento da ação penal o que traria inúmeros benefícios à Polícia e aos órgãos do Poder Judiciário desonerandoos de procedimentos e 30 In ob cit p 160 A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL 47 diligências dispensáveis Argumenta ainda o Professor DAMÁSIO no que tange a questões tais como o risco permitido o consentimento e a participação do ofendido ações a próprio risco a violência esportiva as intervenções médicas e cirúrgicas os ofendículos as quais na doutrina clássica possuem solução na seara do exercício regular de direito ou de causa excludente da ilicitude que são consideradas pela imputação objetiva como situações de atipicidade da conduta liberando o agente prima facie Registrese que a imputação objetiva permite que somente as condutas que ex ante se mostram perigosas sejam consideradas desvaloradas perante o Direito Penal ao contrário do que ocorre com relação à doutrina clássica em que essa apreciação é levada a efeito em momento posterior ex post Por fim salienta DAMÁSIO que a adoção da imputação objetiva não significa que a teoria finalista da ação desenvolvida por WELZEL esteja relegada ao esquecimento sustentando que ambas podem perfeitamente coexistir uma vez que muitas regras métodos e critérios da imputação objetiva possuem fundamentação no finalismo como é o caso da inobservância do dever de cuidado objetivo que equivale à realização de conduta criadora de um risco juridicamente desaprovado LUIZ RÉGIS PRADO por sua vez aduz que por fixar os seus critérios apenas no âmbito do tipo objetivo a exemplo da concepção causal da ação31 a imputação objetiva não logra aferir o sentido social do fato submetido à sua apreciação haja vista que somente após constatar a realização do tipo objetivo preocupase em investigar a presença ou não do elemento subjetivo do tipo ou seja do dolo Alerta o renomado autor que a imputação objetiva poderia servir como uma forma de ampliação da punibilidade cujo alcance seria ainda maior do que a criticada causalidade Uma das críticas mais contundentes formuladas por LUIZ RÉGIS PRADO é no sentido da utilização do critério instituído por GÜNTHER JAKOBS ao estabelecer que o que confere sentido social a um comportamento é a função concretamente desempenhada pelo indivíduo no meio social32 Pondera que na conduta não se pode prescindir do elemento cognitivo pois o que modifica a valoração de um comportamento é precipuamente o conhecimento de maneira que o dolo consciência e vontade é o elemento que atribui um sentido social a uma ação Abstraindose de críticas e argumentos favoráveis à aplicação da teoria da imputação objetiva certo é que como qualquer teoria na esfera do Direito Penal enseja o desenvolvimento de novos estudos no sentido de adequar os seus conceitos e institutos ao ordenamento jurídico brasileiro antes de sua efetiva utilização Não se pode abandonar o finalismo consoante o entendimento do Professor DAMÁSIO porque o Direito Penal lida com comportamentos humanos e como tal não há como relegar a segundo plano o elemento subjetivo da conduta qual seja o dolo conhecimento e vontade e a culpa stricto sensu previsibilidade e ausência de dever de cuidado objetivo na causação de um resultado danoso Ademais cumpre ressaltar que conforme se extrai das lições de LUIZ RÉGIS PRADO não se vislumbra coerência ao admitir que por exemplo um taxista que leva o seu cliente a um banco sem ter ciência de que ele irá promover um assalto receba o mesmo tratamento penal que um outro taxista que conduz o seu cliente até uma instituição bancária tendo conhecimento de suas intenções criminosas33 Criticando a postura de JAKOBS 31 In ob cit p 159 32 In ob cit p 160 A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL 48 LUIZ RÉGIS PRADO afirma que no exemplo supracitado em que pese ambos os taxistas estejam cumprindo as suas respectivas funções normativas papel social os seus comportamentos devem sofrer tratamento distinto uma vez que o sentido social de uma conduta depende fundamentalmente da concorrência de dois fatores a saber em primeiro lugar o sujeito fazendo uso de sua capacidade intelectual deve ter aceitado o possível sentido que os elementos objetivos causais apresentam no mundo físico em segundo lugar deve ter apreendido o sentido éticosocial do ato e através de suas capacidades volitivas externas dirigido sua ação nesse sentido Luis Gracia Martin Proyeto Docente y de Investigación en Derecho Penal p 24534 Outrossim é forçoso reconhecer que a teoria da equivalência das condições adotada pelo art 13 caput do Código Penal é ineficaz para solucionar várias modalidades de crimes em especial os delitos formais de mera conduta os omissivos os tentados dentre outros reclamando uma premente mudança na matéria relacionada ao nexo de causalidade na seara criminal Resta concluir que o Direito Penal encontrase em constante evolução a fim de acompanhar o desenvolvimento do ser humano e de seu meio social e por este motivo a teoria da imputação objetiva não deve ser olvidada mas sim aprimorada para a sua adaptação ao ordenamento jurídico vigente e adequação de seus institutos com vistas a auxiliar a Ciência Penal no cumprimento de seu papel primordial qual seja o de regular o comportamento do homem como forma de controle social 6 Bibliografia BONFIM Edilson Mougenot e CAPEZ Fernando Direito Penal Parte Geral Ed Saraiva 2004 São Paulo JAKOBS Günther A Imputação Objetiva no Direito Penal Tradução de André Luís Callegari Ed RT 2000 São Paulo JESUS Damásio E Imputação Objetiva Ed Saraiva 2a edição 2002 São Paulo PRADO Luiz Régis e CARVALHO Érika Mendes de Teorias da Imputação Objetiva do Resultado Uma aproximação crítica a seus fundamentos Ed RT 2002 São Paulo 33 In ob cit p 160 34 In ob cit p 162 A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA E O NEXO DE CAUSALIDADE NO DIREITO PENAL