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Titulo O arcoíris na sala de aula Processos de organização de turmas Reflexões críticas Autor Luiza Cortesão Colecção Cadernos de Organização e Gestão Curricular ISBN 9728353448 Editora Instituto de Inovação Educacional ÍNDICE INTRODUÇÃO1 I IGUALDADE DE OPORTUNIDADE FACE À EDUCAÇÃO UMA MIRAGEM 4 II ORGANIZAÇÃO DAS TURMAS UM PROCESSO INÓCUO 7 III ORGANIZAÇÃO DE TURMAS E GESTÃO DA HETEROGENEIDADE 11 IV CONSIDERAÇÕES FINAIS 16 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS17 ANEXO ALGUNS LIVROS E ARTIGOS RELATIVOS A PRÁTICAS DOCENTES ATENTAS À HETEROGENEIDADE18 1 INTRODUÇÃO No seu livro Sociologie de lEcole Alain Beaudot reúne um conjunto de textos de diferentes autores com os quais procura fazer uma análise em diferentes perspectivas da instituição escolar E termina quase insolitamente com um texto sobre a escola um belo e poético texto de Georges Jean Lêlo é mergulhar através da memória e dos sentidos na escola de agora e de outrora na escola em que trabalhamos mas sobretudo na escola da nossa infância A mim com este texto Georges Jean pegoume pela mão e fomos juntos à minha escola primária oficial uma escola escura e húmida de uma rua do Porto onde como em muitas escolas reinava uma curiosa mistura de risos e de medos de brincadeiras e de rotinas de monotonia de aquisições imperiosas de aprendizagens nunca esquecidas de mnemónicas de recitações em coro Com ele voltei a ouvir o sussurro dos pés que deslizam no chão luzidio das galochas que batem no chão dos corredores Com ele recordei os cheiros uma mistura de cheiros de tinta de giz de humidade dos corpos fechados em espaços exíguos porque o frio não convidava a abrir a janela e porque os fumos da fábrica do outro lado da rua eram às vezes pouco agradáveis com ele revi os espaços de uma casa de três andares numa rua estreita com muitas crianças arrumadas em velhas carteiras duplas de tampo inclinado voltadas para o estrado simbolicamente mais alto em que a professora se sentava numa grande secretária de madeira castanha com tampo de oleado escuro E lá mais acima na parede revi com ele o crucifixo ladeado pelos dois quadros com as fotografias dos chefes cujo brilho reluzente dos vidros húmidos que as resguardavam despertava em mim uma atenção desconfiada Com ele ainda recordei o momento dos recreios em que se eleva esta inimitável música concreta de choques gritos de andorinhas no Céu de Verão com subtis variações ligadas às estações as brincadeiras que não se sabe bem porquê mudam cada mês em cada semana1 Aqui talvez pelas semelhanças evidentes as memórias tornaramse mais recentes e ligaramse sem interrupções a outras escolas onde trabalhei e em que como nesta a música concreta dos recreios se mantém constante E as recordações fixaramse naqueles momentos tão carregados de significado em que o grito estridente da campainha que anuncia o intervalo é instantaneamente seguido de uma enorme explosão que tudo abafa de gritos de corridas de encontrões de brincadeiras que imediatamente se organizam de grupos que se formam de conversas apressadas mais ou menos secretas que se travam desta mistura de afectos de violência de prazer de arrogância de timidez e de simples alegria que instantaneamente povoa os corredores e os recreios Como é que aquela massa de alunos que se mantivera cinquenta minutos mais ou menos quieta e ordeira com comportamentos mais ou menos normalizados se transforma instantaneamente numa pequena multidão fervilhante de energia que se afirma de mil e uma maneiras diferentes pela heterogeneidade pela imprevisibilidade Cada turma é como que uma garrafa de vinho espumoso que se mantém com um aspecto homogéneo encarcerado pelo vidro em que foi guardado aparentemente tranquilo mas também inacessível e que quando salta a rolha se desdobra numa 1 Jean G 1981 p 159 2 súbita torrente de espuma e se revela como um líquido cujas características são bem fáceis de apreciar podese então sentir a sua doçura o seu corpo o seu aroma o picante que o gás lhe empresta Do mesmo modo os alunos mantidos tranquilos na sala formam um todo aparentemente homogéneo a cujo conhecimento é difícil aceder Porém libertos pelo toque da campainha transformamse também numa saudável torrente fervilhante de uma energia que estava oculta porque reprimida As suas características manifestamse então de uma forma bem explícita abrindose oferecendose à possibilidade de se deixar conhecer Pode assim admitirse que conhecer os alunos seria mais fácil se em vez de reprimidos de domesticados de homogeneizados estivessem activos nas aulas usufruindo de um espaço simbólico maior para manifestar os seus gostos as suas iniciativas os seus interesses possibilidade essa que habitualmente só podem gozar em momentos não ligados a actividades curriculares Ora acontece que o mesmo professor que os manteve tranquilos normalizados na sala de aula também porque tem necessidade de descansar sobretudo se trabalha com este tipo de preocupações frequentemente não está entre os alunos interagindo com eles com alegria com afecto durante os recreios Aliás até pode estar lá presente e só conseguir prolongar a relação homogeneizadora que tem habitualmente na sala de aula Assim sendo na sua actividade docente pode esforçarse e às vezes até pode transmitir a alguns os conhecimentos curricularmente considerados como importantes mas não terá grande possibilidade de estabelecer uma relação autêntica e de comunicar realmente com todos em grande parte por não ter conseguido aceder ao conhecimento da diversidade presente nos seus alunos Verificandose ser difícil o conhecimento por parte dos professores das características reais dos alunos com que trabalham tornase interessante que nos detenhamos agora sobre algumas questões que poderão contribuir e também ser uma consequência desta situação Que razões poderão estar por detrás do facto de o sistema e dentro dele a maioria dos professores ser tão pouco sensível tão pouco aberto ou mesmo hostil aos problemas relacionados com a heterogeneidade na sala de aula Por que ocorrerá esta tendência de procurar normalizar a riqueza da heterogeneidade no molde do aluno médio ou de cliente tipo não deixando espaço para a emergência de manifestações da sua real heterogeneidade Que custos representam para a relação educativa esta leitura homogeneizante da heterogeneidade da diversidade cultural através do vidro da normalização Pensase que uma reflexão prévia sobre este tipo de questões permitirá que se aborde de forma um pouco mais profunda o problema que constitui o objecto fundamental da análise deste texto Como é que o processo escolhido para organizar as turmas poderá interferir com esta problemática 3 É que a heterogeneidade e a diversidade cultural existem mesmo na população que acede à escola O mundo é realmente um arcoíris de culturas como afirma Boaventura Sousa Santos autor que também chama a atenção e isto é muito importante para quanto a consciencialização da existência das diferentes cores do arcoíris por outras palavras a consciência da heterogeneidade do mosaico multicultural em que vivemos nos facultará a visão enriquecedora e estimulante da incompletude da nossa cultura Ora é importante notar que admitindose isto se assume que a heterogeneidade que está presente numa turma poderá ser lida como fonte potencial de uma riqueza que importa rentabilizar e não como um obstáculo à realização de actividades de ensinoaprendizagem Assumese que essa rentabilização será feita no sentido de contribuir para que a igualdade de acesso à educação seja acompanhada de uma maior igualdade de sucesso Estas afirmações porque polémicas e que são afinal hipóteses de trabalho constituem o objecto de análise do texto que se segue 4 I IGUALDADE DE OPORTUNIDADE FACE À EDUCAÇÃO UMA MIRAGEM Desde a constituição da República ao texto da lei de bases do Sistema Educativo a inúmeros textos mais ou menos oficiais que têm sido produzidos afirma se constante e oficialmente de forma bem explícita a importância de garantir aos cidadãos uma igualdade de oportunidades face à educação Esta preocupação tem vindo progressivamente a ser atendida através de diferentes medidas tomadas medidas essas que tentam contribuir para que tenha lugar uma igualdade de acesso à escola que assim se foi transformando no que se designa por escola de massas De facto muitas mais crianças adolescentes e jovens entram e permanecem algum tempo pelo menos no Sistema Educativo E é também indiscutível que os grupos socioculturais de origem desses alunos são muito mais diversificados No entanto como tem sido amplamente referido em diferentes situações múltiplos trabalhos foram também demonstrando que essa igualdade de acesso que a escola de massas tenta oferecer não é geralmente acompanhada de uma igualdade de sucesso dos alunos que a frequentam Mas o que de mais perturbador revelaram essas pesquisas é que o sucesso acontece de modo desigual nos diferentes grupos socioculturais que constituem a população escolar Sobretudo a nível de ensino básico mas também nos outros graus de ensino verificase claramente que de uma forma muito acentuada quem tem mais sucesso na escola são sobretudo os alunos da classe média e classe média alta Os professores aliás sabemno desde há muito através daquele saber de experiência feito que tão pouco reconhecido e valorizado é Ora se de início muitos trabalhos atribuíam este facto só às condições sociais deficientes em que vivem as crianças que maioritariamente não têm sucesso na escola em breve se começou a apontar outro tipo de causas que poderiam estar também na origem deste problema admitiuse que poderá também ter influência o tipo de socialização que as crianças têm na família no bairro e no grupo de pares com quem brincam diariamente os professores também sabiam isto e diziam entre si com melancolia os pais são analfabetos ou quase não compreendem a importância da escola nem o que se passa cá dentro e estão longe do que aqui se pede aos alunos É pois bem natural que eles não sejam bons alunos Mais recentemente porém começou a olharse para esta questão de uma outra maneira em vez de se pensar que a causa dos problemas residia sobretudo no facto de as crianças com insucesso serem as que tinham nascido e se tinham desenvolvido em meios sócioculturalmente desfavorecidos facto que lhes tornava difícil atingir os saberes e culturas veiculadas pela escola teoria do handicap sociocultural começou a pensarse que talvez a própria escola tivesse algumas responsabilidades no processo É que a escola oferece habitualmente um tipo único de processo de ensino mesmo que a população escolar seja bem heterogénea quanto às origens sociais geográficas étnicas etc A escola a educação constróise e funciona habitualmente para o alunotipo o tal clienteideal pelo que a presença a participação de grupos com comportamentos diferentes é por vezes muito perturbadora do seu funcionamento A distância entre as propostas as exigências da escola e o tipo e nível de saberes e interesses dos alunos é demasiado grande As linguagens e os interesses divergem demasiadamente Assim se poderá em parte explicar o pesado insucesso que acontece 5 na escola actual nos meios rurais nos meios suburbanos nos alunos ciganos cabo verdeanos angolanos guineenses etc etc E no entanto cada um destes grupos de crianças é detentor de saberes de tradições específicas que os outros grupos não têm Todos se posicionam face aos problemas do quotidiano de uma maneira própria Não pode portanto deixar de se pensar como será enriquecedor para todos que o outrodiferente em vez de ser considerado estranho ou ignorante seja lido como alguém que tem muito a desvendar para os restantes elementos do grupo que tem uma contribuição própria para a resolução de questões de aprendizagem com que se defrontam Talvez em parte porque a consciência da heterogeneidade dos alunos assusta e incomoda por ser uma fonte de desafio a que é difícil e trabalhoso dar resposta talvez porque todos nós fomos socializados desde há longos anos a olhar os alunos como devendo ser todos idênticos em termos de comportamentos e saberes Cortesão L Pacheco N 1192 uma boa parte dos professores está afectada de uma dificuldade de se dar conta de ver as cores do arcoíris sociocultural presente na sua sala de aula Sofre daquilo que em trabalhos anteriores se designou por daltonismo cultural Cortesão L Stoer S 1993 e vê a turma nos tons cinzentos da normalidade Assim sendo tudo o que é diferente poderá passar a ser olhado como anormal mesmo como errado Ora o olhar daltónico e o simbólico vidro organizativo da normalização a que atrás se fez referência e que à semelhança do vidro de garrafa que contém o vinho espumoso aprisiona os alunos em gruposturmas que deverão ser homogéneas estes dois factores associamse fazendo com que se torne mais difícil usufruir da riqueza da diferença na relação professoraluno Dificultam aquela relação que nasce do conhecimento mútuo da valorização do outrodiferente do diálogo autêntico professor e aluno do entendimento de interesses da compreensão da aceitação de ignorância de dificuldades de medos de problemas e também da valorização de saberes de cada um E sobretudo o olhar daltónico e o vidro organizativo da normalização constituem um impedimento para o crescimento sócio moral e o correspondente estímulo intelectual que poderá ocorrer nas redes de colaboração interajuda solidariedade que se podem estabelecer entre diferentes Os alunos não poderão também consciencializar a incompletude da sua cultura Ao contrário desta situação o professor que conhece os seus alunos que se dá conta da diversidade poderá recorrer a propostas flexíveis e variadas de ensino aprendizagem para que os diferentes grupos de alunos com diferentes características diferentes saberes tenham possibilidade de usufruir do processo de aprendizagem em curso Os bons professores também instintivamente de certo modo sabem isto e mudam a maneira de ensinar conforme o tipo de dificuldades e interesses e saberes que conseguem detectar nos seus alunos Reparese no entanto que este último tipo de preocupação e até de práticas já do conhecimento de alguns professores corresponde a uma significativa alteração teórica e portanto a uma adopção de propostas de ensinoaprendizagem de natureza diferente teoria sócioinstitucional Ele corresponde a um posicionamento em que 6 se aceita a existência da heterogeneidade e numa atitude positiva se procura conviver e tirar partido dela as opções feitas ao nível do processo de ensinoaprendizagem são pilotadas pela identificação dos tipos de aluno presente na sala de aula a escola adaptase também ao aluno em vez de forçar exclusivamente o aluno a adaptarse à acção pedagógica aos valores e normas que informam habitualmente o funcionamento da escola E realmente o que através de trabalhos que têm vindo a ser realizados parece ser possível constatar é que quando estas preocupações informam o processo de ensinoaprendizagem acontece geralmente que o sucesso escolar é mais generalizado menos limitado aos grupos socioculturais mais privilegiados que frequentam a escola Assim sendo poderá admitirse que uma adequada gestão da heterogeneidade constituída através do posicionamento do professor e também da organização de turmas poderá contribuir para um maior sucesso escolar dos diferentes tipos de alunos e portanto para uma maior aproximação do que se designa por escola democrática numa escola em que esta gestão não é feita em que a diversidade não é valorizada e rentabilizada sobrevivem claramente com mais facilidade os alunos que pela sua origem sóciocultural estão naturalmente mais próximos dos saberes dos valores e das normas que vigoram e que são importantes na escola E arbitrariamente esta situação é lida como sendo resultante de estes alunos serem detentores de mais qualidades possuidores de mais mérito escola meritocrática Este tipo de considerações poderá contribuir para fundamentar opções para consciencializar até que ponto decisões que se tomam a nível da forma como o trabalho na escola se organiza poderão ter efeitos muito importantes no significado e nos resultados de todo o processo Mas o que se reveste de especial melindre é o facto de acontecer que decisões tomadas com a melhor das intenções poderem contribuir para afastar do Sistema Educativo alunos que os professores por princípio gostavam de ajudar a progredir Este pode ser entre outros o caso do modo como se organizam as turmas 7 II ORGANIZAÇÃO DAS TURMAS UM PROCESSO INÓCUO Os professores que trabalham em escolas sabem bem que com frequência há turmas que são referidas como boas que há turmas médias que são as que se consideram normais e também turmas problema Esta situação é tão frequente tão familiar que quase se torna difícil identificar como situação problemática a existência de turmas de diferentes qualidades E no entanto é muito importante tentar descobrir porque razão se juntaram na mesma classe tantos alunos bons ou tantos alunos maus mesmo que não tenha havido a intenção de agrupar na mesma sala pessoas com características semelhantes É desafiante descobrir por que se agiu de forma a reduzir a riqueza da heterogeneidade Esta questão sugere que talvez seja interessante proceder a uma listagem de algumas das diferentes formas a que se recorre para organizar uma turma e tentar interpretar os significados de cada uma delas Passando em revista algumas dessas formas a que se lança mão para agrupar os alunos sobretudo mas não só as dos primeiros anos de cada instituição poderá referirse que é frequente organizar as turmas em função A das prioridades expressas pelos encarregados de educação que primeiro apresentam os seus pedidos na escola B da idade dos alunos juntando os que têm aproximadamente a mesma idade C da zona de origem atendendo portanto a relações de vizinhança ou de amizade D dos grupos que vêm de outras escolas e que têm ligações fortes que não querem quebrar E do tipo de percurso académico anterior êxitos repetências etc F dos grupos sociais e étnicos G das opções que fazem relativamente à frequência de algumas disciplinas H Ao conversar com professores e com instituições que adoptaram ou adoptam um ou até mais do que um destes processos poderá verificarse que em todos os casos é possível geralmente legitimar essas opções através de argumentos aparentemente muito válidos É felizmente pouco frequente que as razões que presidem à organização das turmas sejam exclusivamente orientadas de modo a que conscientemente se queira somente privilegiar alunos que por razões várias à partida parecem apresentarse em melhores condições de progredir melhor no sistema ou ainda para que um dado professor fique com um grupo de alunos que dê menos trabalho e mais rendimento Distanciarse do empenhamento da solidariedade para com alguns grupos de crianças e adolescentes cujo desenvolvimento tanto depende dos professores é uma situação que acontece é certo mas não é felizmente prática corrente O que acontece com mais facilidade é optarse por certos critérios de 8 organização sem que se tenha consciência dos efeitos uniformizadores e selectivos que eles poderão ter Ora isto pode ser evidenciado se se reflectir um pouco sobre cada uma das formas de organização da turma a que atrás se fez referência Mas para proceder a esta análise é também preciso ter presente que se os alunos que têm mais sucesso são habitualmente os que foram socializados na família e na comunidade com níveis socioculturais idênticos aos que prevalecem na escola também é verdade que na relação escolaencarregado de educação ocorre de modo semelhante o mesmo tipo de problema há pais que estudaram outros que não Sobretudo no Ensino Básico há pais que por origem social partilham os valores da escola Assim sendo eles conhecem as suas regras de funcionamento e estão conscientes de quanto as múltiplas aprendizagens mais ou menos explícitas que a escola exige são outros tantos passaportes necessários para progredir no Sistema Educativo e para ajudar a aceder a uma dada profissão e ao mercado de emprego em que estão interessados Mas também há pais que vivem na urgência de resolver o imediato o quotidiano pressionados por dificuldades de toda a ordem que não fazem planos a longo prazo de cujos horizontes de expectativas estão mesmo ausentes inúmeras opções de vida possíveis para outros Há grupos em que não existe normalmente qualquer pressão social para ir à escola é o caso de muitos ciganos por exemplo Há pais que não usam no quotidiano o mesmo tipo de linguagem que os professores utilizam na escola linguagem essa que é também usada para escrever os documentos que lá circulam Há pais que se exprimem de outras formas e para quem a linguagem da escola é dificilmente inteligível Pais que se sentem à vontade quando vão tratar de questões que querem discutir nas instituições educativas que os seus filhos frequentam que sabem as regras que aí vigoram e se mexem com facilidade neste ambiente Há pais que se sentem desconfortáveis até inferiorizados na escola não tendo o àvontade para exprimir e muito menos exigir coisas que às vezes desejariam para os seus filhos Há pais que simplesmente não vão à escola muitas vezes porque ela representa um universo demasiado distante do seu para que nem sequer lhes apeteça lá ir O que atrás se disse constitui simplesmente um pequeno conjunto de exemplos de condições que fazem com que a capacidade de gestão e afirmação dos próprios interesses e a própria consciência de quais são esses interesses esteja desigualmente distribuída pelos diferentes tipos de pais É certo que também há pais que apesar de pertencerem a níveis culturais próximos dos que a escola aceita por razões várias não se interessam muito por o que se passa a nível educacional com os seus filhos Mas estes são em número menos significativo Considerando tudo isto poderá verse que não se pode analisar os efeitos para os alunos das opções tomadas a nível da organização de turmas sem se tomar também em linha de conta características dos encarregados de educação Considerese então o caso A atrás mencionado em que se refere a possibilidade de se organizarem turmas atendendo aos pedidos que primeiro são apresentados na escola Neste caso não será difícil verificar que se está a responder sobretudo aos interesses de pais que sabem quando é que a escola começa a organizar as turmas que sabem qual é o horário que mais lhes convém e que sabem que por exemplo as turmas da manhã são as que têm normalmente professores com mais experiência Tratase sobretudo como é evidente dos pais de classe média ou média alta Assim 9 sendo ao organizar algumas turmas com alunos destes grupos e outras turmas com crianças de grupos socioculturais cujos pais aparecem na escola de uma forma geral mais tardiamente e que pertencem a grupos que não partilham a cultura da escola estáse a recorrer a um critério muito selectivo No entanto até parece justo atender a solicitações de quem se manifesta primeiro Se como é referido no caso B se atender a critérios de idade estará muito provavelmente a juntarse os alunos que tiveram percursos escolares idênticos de sucesso ou de insucesso Ora como vimos esse sucesso ou insucesso é desigualmente distribuído nos diferentes grupos socioculturais Se se atender à idade em que pela primeira vez os alunos entram na escola vários estudos evidenciaram de forma inequívoca que os pais cuja cultura é próxima da da escola e pelas razões já atrás discutidas têm maior tendência a inscrever os seus filhos logo que a lei o permite Ora essa pressa em matricular as crianças na escola não é partilhada por todos os grupos socioculturais minoritários Daí resulta que sobretudo no Ensino Básico as turmas organizadas com alunos mais novinhos são geralmente constituídas por crianças oriundas de meios mais favorecidos e as organizadas com alunos mais velhos reúnem predominantemente os que pertencem a grupos mais desfavorecidos No entanto este tipo de critério poderá ser defendido por professores e escolas animados das melhores intenções atendendo a que podem ocorrer e por vezes ocorrem certos problemas ao juntar por exemplo crianças pequenas com adolescentes ou até jovens cujos problemas interesses e comportamentos são tão diversificados Ao atender à zona ou à escola de origem caso C e D é evidente que com grande probabilidade se tende a manter reunidos alunos dos mesmos grupos socioculturais Todos sabemos que há zonas das cidades onde predominam bairros degradados outras onde há sobretudo apartamentos de luxo ou vivendas etc A escolha por zona de origem tende a manter na escola esta distribuição No entanto esta opção para organizar as turmas poderá ser feita em nome do desejo de não quebrar solidariedades e amizades já estabelecidas procurando não introduzir mais um abalo à já traumática experiência de mudança de instituição Atender ao tipo de percurso académico anterior caso E também contribuirá para juntar na mesma turma grupos com origens socioculturais e com origem de classe semelhantes Não será difícil perceber isto se se atender a que em grande parte e pelas razões atrás expostas o sucesso ou insucesso se distribuem de modo diferente nas crianças de meios socioculturais diferentes Assim sendo as turmas acabarão por ser organizadas muito em função da classe social de origem Atender aos grupos sociais a dificuldades de aprendizagem e até a etnias caso F muito provavelmente poderá contribuir para manter estes grupos fechados sobre si mesmo reforçando situações de sucesso mas também de insucesso estimulando a autoconfiança de uns inferiorizando e destruindo a autoimagem de outros os minoritários Mas até isto pode ser feito de um modo bem intencionado em nome de uma tentativa de proteger os grupos até mesmo os grupos minoritários e de permitir que as redes de solidariedade que às vezes existem no interior deles funcionem também no interior da escola Além disso afigurase a muitos professores que sobretudo em casos mais extremos é mais fácil abordar as especificidades destes grupos e proporcionarlhes uma melhor aprendizagem se eles estiverem reunidos na 10 mesma classe É assim que na melhor das intenções se vê em algumas escolas organizar turmas de ciganos de cabo verdianos de alunos com necessidades educativas especiais ou de crianças oriundas de bairros degradados alegando que assim o professor se pode dedicar mais a ajudálos a ultrapassar as suas dificuldades Reparese como a teoria do handicap sociocultural informa esta forma de actuar Até mesmo em anos um pouco mais adiantados o recurso às opções que os alunos fazem para organizar as turmas e que parece ser um critério tão neutro tem alguns reflexos na constituição de grupos homogéneos embora seja uma opção que se possa justificar em função da organização dos horários Senão reparese por exemplo com frequência verificase que os que escolhem o francês como segunda língua são na generalidade os filhos de emigrantes em países francófonos E estes constituem como é evidente um grupo social bastante homogéneo Assim pode verse que bastou passar em revista alguns dos critérios usados na organização de turmas para se compreender que nenhum deles é neutro Embora seja possível encontrar razões que tentam legitimar cada um desses critérios é importante que se consciencialize que todos podem ter claros efeitos de segregação social São além disso critérios sempre homogeneizantes cujos efeitos como se viu são mais ou menos defensáveis mas a que é necessário estar atento Sobretudo se se encarar a heterogeneidade como se tem vindo a tentar evidenciar como uma fonte de desenvolvimento e enriquecimento mútuo É aliás de salientar que os critérios adiantados oficialmente para organizar as turmas já tomam em consideração embora de forma prudente muitas destas questões V Documento de Lançamento do Ano Lectivo LAL M E 19931994 Constituição de Turmas Módulo 4 Tema 5 pp 85 a 91 Afirmase por exemplo em relação à idade que não devem constituirse turmas apenas com alunos de 10 11 12 e 13 anos acrescentando no entanto em atenção aos problemas que daí podem decorrer que também não se deve incluir numa turma alunos de níveis etários diferenciados Afirmase também que se deve proceder à integração de alunos reprovados e retidos em turmas de alunos do mesmo nível etário e que não se devem concentrar alguns reprovados numa mesma turma Aconselhase ainda que o número de alunos do sexo feminino e sexo masculino deve ser sensivelmente igual Estas recomendações parecem revelar uma certa preocupação oficial de evitar a constituição de turmas rotuláveis e de promover alguma mistura de alunos com características de certo modo diferentes 11 III ORGANIZAÇÃO DE TURMAS E GESTÃO DA HETEROGENEIDADE De acordo com o que foi anteriormente discutido poderá admitirse que na generalidade os critérios a que se recorre para organização das classes podem constituir um significativo contributo para uma maior ou menor homogeneização do tipo sociocultural dos gruposturma Uma vez consciencializada esta situação e tal como foi já sugerido na introdução deste trabalho duas questões se levantam Terá realmente lugar como pensam algumas escolas e alguns professores uma maior facilidade e uma maior rentabilidade a nível do processo de apendizagem quando se trabalha com grupos homogéneos ou pelo contrário a variedade presente no grupo classe poderá constituir uma fonte de riqueza para a concepção e concretização desse mesmo processo Se como pensam outras escolas e outros professores se admite que a heterogeneidade se pode apresentar como situação potencialmente mais rica para o processo de ensinoaprendizagem como gerir essa heterogeneidade Será que essa gestão é possível nas condições em que actualmente trabalham os professores nos diferentes níveis de ensino E estarão as escolas e os professores preparados para este tipo de trabalho As respostas que poderão tentar adiantarse a estes dois tipos de problema são de natureza diferente A primeira está de certo modo relacionada com o posicionamento ideológico que se assume face à educação A segunda depende da resposta dada à primeira mas também em boa parte da combatividade e imaginação da escola e dos professores bem como de decisões a tomar a nível das opções metodológicas que se irão fazer E aqui é necessário ainda considerar a importância de poderem ser tomadas algumas decisões a nível organizativo decisões essas que dependem sobretudo de instâncias mais centrais do Ministério e que se fossem consideradas constituiriam como se verá adiante um significativo impulso para que a heterogeneidade seja aceite e rentabilizada na prática educativa Quanto às opções educativasideológicas a que atrás se fez referência é importante notar que sobretudo ao nível do Ensino Básico se o que se pretende é essencialmente que os alunos dominem conteúdos curricularmente considerados como relevantes se o objectivo único é que eles vençam as barreiras construídas pelos processos de avaliação normativa e sumativa sobretudo se se admitir como aceitável que essa aquisição de saberes seja conseguida predominantemente pelos grupos que sócioculturalmente estão à partida mais próximos da cultura que domina na escola então é talvez possível admitirse que se queira tentar trabalhar com grupos homogéneos Mas nem isto constitui uma opção que se faça com segurança pois que procedendo assim à partida se excluem os alunos da possibilidade de aprender e de se enriquecer com o outrodiferente Se porém a par dos saberes curriculares se está igualmente interessado em desenvolvimentos vários do tipo sócioafectivo tais como a capacidade de trabalhar em grupo a solidariedade a interajuda a aceitação do outrodiferente a consciência 12 de que ninguém sabe tudo da incompletudo da nossa cultura de que se falava na introdução se não se aceita com certa passividade que grupos de alunos tenham a sua autoestima e a sua autoconfiança por vezes gravemente afectadas por estarem reunidos em turmas reconhecidas como sendo as dos alunos mais fracos mais problemáticos2 então será de tentar trabalhar com turmas heterogéneas e tentar usufruir da riqueza contida nessa heterogeneidade mesmo com todas as dificuldades que isso possa acarretar Não se pode além disso esquecer quanto o clima de interajuda de abertura afectiva que é possível criar numa sala de aula com alunos diferentes pode ser fundamental mesmo para o desenvolvimento cognitivo de todos até dos mais desenvolvidos Os trabalhos ultimamente muito em voga que valorizam a relação entre o afecto e a cognição também parecem poder apoiar esta afirmação Como se poderá facilmente ver esta opção será feita tal como atrás se afirmou bastante em função de posicionamento de base face à educação O que acontece muito frequentemente é que os professores mesmo que situandose ideologicamente na segunda opção se angustiam face ao trabalho a desenvolver quando têm de lidar com grupos muito heterogéneos porque se a diversidade é muito grande a tarefa a enfrentar é realmente difícil E há medo de não dar a atenção devida aos alunos mais desenvolvidos há medo de não ajudar de forma adequada os que tem mais dificuldades É verdade que se a heterogeneidade é mesmo muito grande é real a dificuldade de atender a todos sobretudo se se considerar que muitas vezes os professores trabalham em turmas com muitos alunos que o material não é suficiente que os programas são com frequência desajustados e sobretudo demasiado longos Às vezes lutar contra tudo isto surge face a alguns professores empenhados como constituindo um conjunto de problemas quase intransponível Eles pensam com angústia que não conseguem responder com o seu trabalho ao nível dos seus critérios de exigência do seu desejo de atender de desenvolver todos os tipos de alunos que têm na sua frente Porém ao discutir este tipo de problemas é importante considerar que se está a analisar um processo situado num complexo sistema em que as interacções são muito grandes e as questões de poder são muito significativas Não é pois de esperar que um elemento desse sistema isoladamente resolva integralmente todos os problemas existentes Nesse sentido é de salientar que a escola e os professores veriam as suas dificuldades de gestão da heterogeneidade muito diminuídas se fossem tomadas algumas medidas por exemplo ao construir escolas e ao estabelecer espaços para as diferentes actividades3 Outras medidas mais simples já constituem até uma rotina em alguns países e algumas delas até já foram objecto de experiências em Portugal4 Uma das medidas que seria possível tomar consistiria em organizar os horários de forma que à mesma hora duas turmas tenham a mesma disciplina Isto permitirá que essas duas turmas se juntem e os trabalhos com este grupo maior sejam geridos de forma articulada por dois professores Deste modo é mais fácil no interior do grupoturma 2 Recordemse também das experiências de Rosenthal que evidenciaram quanto o que se espera de bom ou de mal de um aluno acaba por ter influência no aproveitamento e no desenvolvimento que esse aluno vai ter Rosenthal R 1968 3 Mas é importante notar que às vezes esses espaços mais amplos existem e não são devidamente rentabilizados Outras vezes também acontece como é o caso de muitas escolas de área aberta do Ensino Básico que eles são mesmo destruídos 4 V Revista Rumos da Porto Editora de Fevereiro 97 em que vem descrita uma experiência destas 13 organizar os trabalhos de forma mais variada mais diferenciada mais criativa de modo a poder responder melhor aos diferentes tipos de alunos presentes A colaboração entre professores a articulação a nível dos planos de trabalho a gestão de materiais produzidos e postos à disposição de todos o empenhamento em projectos comuns são também alguns dos exemplos que podem contribuir para que este tipo de problemas se vá resolvendo Não cabe no âmbito deste texto uma discussão suficientemente alargada deste tipo de problemas Há muitas publicações que apresentam e analisam metodologias possíveis de utilizar e que poderão ajudar mais eficazmente o professor no seu trabalho bem como dispositivos pedagógicos a que poderão recorrer Cortesão L e Stoer S 1996 Nesse sentido organizouse no anexo um conjunto de indicações bibliográficas que poderão ser úteis Mas é muito importante salientar que enquanto o sistema não adopta algumas medidas gerais de organização a urgência dos problemas a enfrentar valoriza especialmente as práticas e as atitudes dos professores e das escolas que tentam não marginalizar logo à partida alguns dos seus alunos Mesmo antes de o sistema tomar essas medidas as escolas ao organizar os horários e os professores ao discutirem entre si e ao estruturarem as suas actividades ao trabalharem com os alunos já poderão fazer alguma coisa Sobretudo se se for instalando a consciência de que segregar os alunos organizálos por grupos de nível é um contributo para que os melhores sejam cada vez melhores e os que têm mais dificuldade tenham cada vez mais dificuldades No entanto só para não deixar esta questão suspensa permitindo que depois das questões ventiladas a angústia dos professores seja ainda maior poderão sugerir se algumas linhas embora muito gerais de orientação metodológica Recordandose como se disse no início deste texto que o toque libertador da campainha que anuncia os intervalos ao permitir a explosão de energias e a exibição de actividades múltiplas dos alunos permite também que seja possível descobrir com mais facilidade diferentes características das crianças e dos adolescentes não visíveis até então será fácil admitir que qualquer estratégia que devolva aos alunos a possibilidade de estarem activos poderá contribuir para que seja mais fácil colher dados sobre eles Poderá portanto facilitar o estabelecimento de uma mais profunda relação com aquele professor que se interessa pelos seus alunos que deseja debruçar se sobre eles e que sente ser importante passar do nível do simples reconhecimento da sua presença para o conhecimento de quem eles são Assim sendo não será muito polémico admitir que o ensino expositivo mesmo que se trate de uma excelente explicação por parte do professor não favorece o conhecimento do aluno e a relação professoraluno O professor dirigese à turma em geral dirigese portanto a uma entidade passiva e abstracta que corresponde quando muito a um pequeno grupo presente na sala e que tradicionalmente se teima em considerar como correspondendo a todos os que estão presentes Mas muitos dos que lá estão não pertencem a esse grupo e são assim alienados de forma mais ou menos violenta do processo de aprendizagem Por isso muitos professores sentem a necessidade de quebrar de tempos a tempos a exposição com perguntas feitas aos alunos ou então solicitam aos alunos que os interrogam se não entenderem alguma coisa Fundamentalmente o efeito desta estratégia reside em tentar revitalizar a ligação ameaçada pela distância que tem lugar 14 em situações de exposição visa de certo modo comunicar com o outrodiferente que não entende de imediato a mensagem do professor Mas é preciso notar que este tipo de actuação vai quase só favorecer quem é capaz quem tem coragem de perguntar e que são sobretudo os que dominam razoavelmente os códigos de comunicação que vigoram na escola A actividade produtiva dos alunos não é aliás fácil de conseguir senão através de um trabalho que se lhes apresenta como minimamente interessante Assim sendo o professor tem de descobrir formas de abordar as questões que sejam mais estimulantes do que a simples explicação das matérias Não se trata de motivar artificialmente os alunos Tratase de descobrir modos de ir ao encontro de um potencial que está lá dentro de cada aluno às vezes bem oculto por detrás do desinteresse de aparentes incapacidades ou até de comportamentos perturbadores Por isso se tem defendido que o professor tem de ser um pouco um investigador que olha atentamente os seus alunos com um olhar não daltónico Cortesão L e Stoer S 1996 Tem de ser um professor que tenta ler nos diferentes comportamentos nos interesses desinteresses nas aprendizagens nas dificuldades tomando tudo isto como indicadores preciosos para que seja possível pilotar as suas propostas de ensinoaprendizagem estabelecer o necessário contacto intelectual e afectivo com os alunos e produzir materiais e estratégias adequadas aquela situação aqueles alunos os dispositivos pedagógicos Cortesão L e Stoer S 1996 Isto é aliás o que uma boa avaliação formativa pode oferecer ao trabalho do professor Cortesão L 1995 O trabalho desenvolvido através de pequenos projectos em que a iniciativa é muito dada aos alunos os pequenos trabalhos de pesquisa na aula ou na escola o recurso a simples consultas bibliográficas feitas no grupo turma ou na biblioteca para desenvolver um tema dado os debates organizados sobre temáticas importantes com alunos preparados para o efeito ou até com convidados exteriores à escola a utilização de actividades espontâneas dos alunos por exemplo os jogos como suporte para abordar as matérias previstas no currículo o recurso a histórias pessoais ou a genealogias como referências que concretizam e dão sentido a aprendizagens várias previstas no currículo a organização de campanhas encabeçadas por alunos por exemplo sobre problemas do meio que solicitam intervenção a organização de exposições são alguns exemplos de situações permitem abordar os conteúdos programáticos e que simultaneamente favorecem a actividade o empenhamento portanto o desenvolvimento e o relacionamento entre todos São além disso situações que pondo o aluno em actividade permitem ao professor que o conheça um pouco melhor E sobretudo são situações em que alunos diferentes podem rentabilizar diferentes saberes diferentes capacidades descobrindo por vezes em si potencialidades até então ignoradas São portanto também situações que permitem gerir e rentabilizar a heterogeneidade muito mais difícil de atender numa turma que se deseje passiva Todas estas actividades lucrariam evidentemente em ser feitas num clima de interdisciplinaridade lucrariam em ser contempladas no plano de actividades da escola o que para além do entendimento entre professores será muito facilitado por uma conveniente organização de horários Mas podem em ponto pequeno ser feitas mesmo só no interior da sala de aula a propósito dos conteúdos programáticos que têm de ser abordados E evidentemente são actividades a desenvolver sobretudo no 15 E Secundário também aproveitando a Área Escola que tão pouco rentabilizada é habitualmente e que tão rica poderia ser 16 IV CONSIDERAÇÕES FINAIS De tudo o que até aqui foi afirmado o que eventualmente poderá ser mais relevante para se poder enfrentar com lucidez o problema da organização de turmas será talvez que qualquer que seja o critério escolhido para fazer essa organização ele terá muito provavelmente efeitos não esperados que poderão contribuir para a constituição de turmas sócioculturalmente homogéneas a heterogeneidade dos alunos que é frequentemente tida pelo professor como um problema é na realidade uma riqueza que importa aprender a rentabilizar Mas para isso é preciso conhecer realmente os alunos Se estas duas premissas forem aceites como válidas poderá aceitarse também que a opção residirá na constituição deliberada de turmas heterogéneas embora seja talvez prudente que essa heterogeneidade não seja excessiva por exemplo em termos de idades demasiado díspares Assim sendo o investimento terá de fazerse no sentido de se aprender a gerir e a rentabilizar essa heterogeneidade Por tal razão como já atrás se disse se junta uma lista com a indicação de alguns livros e textos que poderão apoiar o professor nesse sentido Tudo isto poderá parecer difícil mas é apesar de tudo possível em maior ou menor grau Para além de medidas gerais que poderão ser decididas a nível central do Sistema depende em boa parte da forma como a escola se consegue organizar da relação que se vai criando Depende ainda da alegria da imaginação da argúcia da atenção de todos especialmente dos professores Depende também em boa parte do professor se posicionar como mero funcionário executante de orientações do sistema educativo ou de se considerar também como agente de intervenção sociocultural que procura gerir a sua margem de manobra e a articula com orientações que recebe do Centro Depende da escola se considerar um espaço que pertence estrutural e funcionalmente a um sistema mais vasto que portanto tem de se limitar a agir como é habitual agirem as instituições periféricas que se limitam a executar ordens ou de se posicionar como instituição que apesar de tudo tem um espaço de manobra que lhe permite certa autonomia funcional e que pode tentar inventar dentro de certos limites soluções mais interessantes mais adequadas para problemas que considera serem cruciais Para além disso o professor é também por essência alguém que deseja abordar com imaginação o seu trabalho sem o que cairá numa rotina que lhe torna a sua vida profissional bem menos interessante Ser um agente pertencer a uma instituição que criativa e corajosamente colabora no crescimento no desenvolvimento de um leque mais alargado de crianças de adolescentes ou de jovens que contribua mesmo que pouco para que haja maior justiça social é um desafio que justifica estar se na profissão 17 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Campos B P 1996 Editorial Inovação 9 12 56 Cortesão L e Pacheco N 1992 Interculturalismo e Realidade Portuguesa Inovação 4 23 3334 Cortesão L 1995 Avaliação Formativa que desafios Porto Ed Asa Cortesão L e Stoer S 1996 A interculturalidade e a Educação Escolar Inovação 9 12 3551 Cortesão L e Stoer S 1997a InvestigaçãoAcção e Formação de Professores para uma Educação InterMulticultural In M R Santos A Carvalho org Correspondência Escolar As Classes de Descoberta Lisboa EdGulbenkian no prelo Cortesão L e Stoer S 1997b InvestigaçãoAcção e a Produção de Conhecimento no Âmbito de uma Formação de Professores para a Educação InterMulticultural Educação Sociedade e Culturas 6 1997 Jean G 1981 Écoles In A Beaudot Sociologie de LEcole Paris Dunod Rosenthal R e Jacobson L 1968 Pygmalion in the Classroom New York Holt Rineart and Winston 18 ANEXO ALGUNS LIVROS E ARTIGOS RELATIVOS A PRÁTICAS DOCENTES ATENTAS À HETEROGENEIDADE Araújo H C e Stoer S 1993 Genealogias nas Escolas A capacidade de nos surpreender Porto Ed Afrontamento Situado no que muitas vezes hoje se distingue como o triângulo disciplinar Antropologia História Sociologia este livro propõese como dispositivo pedagógico Baseado no que é denominado o processo das genealogias tornase surpreendente a sua capacidade de ao mesmo tempo 1 envolver professores alunos e pais num projecto de investigação que alarga o âmbito da educação escolar e 2 promover não só a compreensão da diversidade cultural mas também a valorização daquelas culturas que se afastam da norma imposta pela escola oficial Tendo como objectivos principais a dar a conhecer a experiência pedagógica e de investigação das genealogias construídas na escola de Viatodos b divulgar a metodologia das genealogias como instrumentoprocesso didáctico c promover uma escola para todos A relevância e a utilidade deste livro no âmbito da Reforma Educativa em processo tornamse imediatamente evidentes O dispositivo pedagógico constituído pelo processo das genealogias assumese como central ao projecto educativo de cada escola potencializando um aproveitamento aprofundado e enriquecedor tanto da ÁreaEscola como da formação contínua Araújo H C e Stoer S 1993 extracto do texto da contracapa Bellém J et al 1993 Apoios Educativos Acabam Reprovações Lisboa Ed Fragmentos col Educar Este livro reúne planificações metodologias e exemplos de instrumentos de trabalho que poderão ser utilizados em actividades de ensinoaprendizagem de diferentes áreas disciplinares Tratase de materiais que visam proporcionar uma diferenciação do ensino a nível do 1o e 2o ciclos do Ensino Básico Cortesão I e Malafaia R 1999 Olhar e Melhorar a Escola Porto Ed Asa Com este pequeno livro pretendem as autoras contribuir para que os professores possam de algum modo ajudar os alunos e sentiremse bem na Escola o que não só facilitará o seu sucesso como os ajudará a terem mais saúde no sentido lato tal como a concebe a O M S Saúde estado de completo bem estar físico mental e social 19 Baseadas na Pirâmide de Maslow dão sugestões para o embelezamento da Escola para o rastreio de perturbações de ordem física tantas vezes causa de insucesso escolar Propõem actividades que sensibilizem a comunidade escolar para a importância da alimentação racional Finalmente apresentam um conjunto de textos cuja discussão com os alunos poderá contribuir para o seu desenvolvimento sóciomoral extracto do texto da contracapa Cortesão L Amaral M T Carvalho J M I Casa Nova M J Lopes P Monteiro E Ortet M J e Pestana I 1995 E Agora Tu Dizias Que Jogos e Brincadeiras Como Dispositivos Pedagógicos Porto Ed Afrontamento Sugerimoslhe que use este livro em primeiro lugar para ter prazer com ele Folheieo veja os desenhos e fotografias as descrições dos jogos e recue através dele até ao tempo em que se alvoraçava com a cabracega competia através da macaca em que se divertia e emocionava com as escondidas em que punha toda a sua habilidade força e sedução no jogo do bombarqueiro Folheieo e veja como as crianças de hoje têm tantas coisas em comum com a criança que outrora o leitor também foi como elas também se divertem representam se exercitam e deleitam tal como noutros tempos todos nós fizemos Mas estudeo também porque através dele talvez agora como educador e ou como professor encontre neste texto sugestões de algumas formas de entender melhor os seus alunos e os grupos a que pertencem e formas de lhes oferecer um ensino que vá mais ao encontro das suas características interesses e necessidades E também porque talvez encontre nele algumas sugestões de modos de fortalecer uma relação de cooperação com as famílias dos alunos ajudando ao mesmo tempo os estudantes e seus familiares e compreender que os saberes de que são portadores são também importantes para a escola Cortesão L et al Texto da contracapa Cortesão L com colaboração de Fátima Antunes Carlos Ferreira Teresa Novais e Adriano Silva 1994 Quotidianos Marginais Desvendados pelas Crianças Educação Sociedade e Culturas 1 6387 Este trabalho pretende contribuir para evidenciar como histórias contadas por crianças constituem de entre outros um material interessante para tentar aceder a uma compreensão de característica que informam o quotidiano dessas mesmas crianças No presente caso tratase de um grupo de meninos brancos e ciganos que vivem em bairros degradados em situação quase de guetto sóciocultural Notese que o facto de identificar e compreender algumas características sócioculturais dos grupos com que trabalho constitue o primeiro passo para que o professor consiga imaginar formas de ensinoaprendizagem adequadas a esses grupos 20 Cortesão L 1995 Avaliação Formativa como Desafios Porto Ed Asa Procurase numa primeira parte analisar brevemente o conceito de avaliação formativa fazendose também uma sucinta referência a alguns princípios e quadros teóricos que tem informado este tipo de avaliação através de uma muito rápida discussão da evolução histórica sofrida no contexto epistemológico das ciências de educação Procurase ainda analisar a validade da prática de avaliação formativa no quotidiano da sala de aula Num segundo texto abordamse de forma muito pragmática alguns problemas que se levantam a propósito da prática deste tipo de avaliação na sala de aula Com ele procurase analisar como se poderão concretizar situações de avaliação formativa nas condições de trabalho com que um professor se defronta Cortesão L e Torres M A 1995 Avaliação Pedagógica Mudança na Escola Mudança na Avaliação Porto Porto Editora 4a Ed Insucesso do aluno da escola ou da sociedade Mais do que atribuir responsabilidades em maior ou menor grau ao aluno à escola ou à sociedade é importante consciencializar toda a gama de factores que contribuem para que o insucesso escolar não ocorra entre nós de forma tão dramática É importante ainda ter consciência de que a Escola tem a sua quotaparte de responsabilidade e que neste campo todos nós professores podemos fazer algo que contribua para minorar o problema Não mais podemos encarar o insucesso escolar em termos fatalistas de alunos dotados ou não dotados Também não nos podemos permitir dizer que o insucesso escolar é somente o resultado de uma fatalidade social face à qual nada nos resta senão cruzar os braços Se é importante a consciência do peso que tem toda a gama de factores que vindos do meio incidem sobre o aluno é vital a consciência de que os educadores têm uma palavra a dizer uma acção a desenvolver no projecto de transcendente importância de ajudar os alunos a desenvolveremse E neste campo nenhuma oportunidade se pode perder e é preciso actuar depressa Nesta perspectiva a Avaliação Pedagógica surge como um conjunto de atitudes e práticas críticas e renovadoras que ultrapassam de longe o acto de classificar e que permitem à Escola assumirse não só como mais humana mas também como instituição com alguma capacidade de intervenção no processo social Cortesão L e Torres M A Texto da contracapa Garcia R L 1996 A Formação da Professora Alfabetizadora S Paulo Cortez O grupo de pesquisa coordenado por Regina Leite Garcia vem actuando junto às professoras alfabetizadoras numa perspectiva oposta à da desqualificação do magistério Partem da convicção de uma capacidade e compromisso das professoras apesar de tudo e de todos Se não por que continuariam no magistério recebendo salários imorais sujeitas a péssimas condições de trabalho e desacreditadas socialmente 21 Este grupo de pesquisadoras questiona a possibilidade de se salvar a escola colocando antenas parabólicas e enviando Kits pedagógicos para todas as escolas do país como se a formação continuada de professores e professoras pudesse ser garantida por aparelhos de televisão e de vídeo Sua discussão sobre a formação de professoras no caso alfabetizadoras parte de outros postulados teórico epistemológicos e teóricopráticos Sua proposta é pelo menos instigante Há que ler o livro para concordar ou discordar Mas há que lêlo Garcia R L org 1996 Texto da contracapa Leite C 1996 O Multiculturalismo na Educação Escolar Que Estratégias numa Mudança Curricular Inovação 9 12 63 81 A partir da análise de reacções de professores à mudança que lhes é proposta ou que com eles é negociada defendese o investimento numa formação de professores que faça deles participantes activos no currículo por forma a encontrarem respostas pedagógicas à diversidade cultural Leite E Malpique M e Santos M A R 1990 Trabalho de Projecto Porto Ed Afrontamento Muito será dito sobre o trabalho de Projecto ao longo deste livro mas gostaríamos de evidenciar já alguns dos aspectos significativos da introdução desta metodologia na Escola Assim A transmissão do conhecimento na aprendizagem escolar dá lugar à construção pessoal do saber de forma dinâmica interactiva dando ao aluno mais autonomia mais responsabilidade permitindolhe encontrar o seu próprio caminho no labirinto do saber Os alunos não só são activos na sua formação mas o saber vai responder a necessidades profundas que advêm de respostas ou vias de respostas aos problemas formulados e definidos pelos próprios grupos A teoria e a prática o sensível e o intelectual são desenvolvidos de forma integrada Estimulamse atitudes investigativas como observar questionar reflectir sobre os dados colhidos Criamse hábitos de trabalho aprendese a planificar a gerir o tempo a gerir os imprevistos Aprendese a ser imaginativo solidário implicado ter opiniões a criticar a ser atento ao mundo que nos cerca 22 Na relação EscolaComunidade a exterioridade recíproca cede à interacção O trabalho de campo inerente a esta metodologia alarga o espaço escolar e como tal abremse novos horizontes Trabalhar em Projecto é dar ao professor um estatuto diferente na relação educativa é exigirlhe uma visão mais sistémica do conhecimento um papel mais democrático nas suas relações com o saber e o poder é ser estimulador de aquisição e procura do saber motivador de aprendizagem é ensinar a aprender O Projecto é projéctil está em movimento mexe no estabelecido acorda o adormecido provoca rupturas Leite E Malpique M e Ribeiro dos Santos M 1989 p 6 Neves M C e Martins M 1994 Descobrindo a Linguagem Escrita Uma experiência de aprendizagem da leitura e da Escrita numa Escola de Intervenção Prioritária Lisboa Escolar Editora Este livro contém sugestões para aprendizagem da leitura e da escrita nos primeiros anos de escolaridade através de metodologias que possam tornar estas aprendizagens significativas para os alunos Ministério de EducaçãoD G E B S 1992 Materiais de Apoio aos Novos Programas Leitura e Escrita 1o ano 1o ciclo Fevereiro de 1992 Este livro contém uma colectânea de textos e de um conjunto de sugestões metodológicas para que atendendo à diversidade cultural se possam desencadear aprendizagens de leitura e da escrita no Ensino Básico 1º ano Ministério de EducaçãoD G E B S 1992 Materiais de Apoio aos Novos Programas Leitura e Escrita 2o ano 1o ciclo Este livro reúne um conjunto de textos bem como várias sugestões metodológicas para que respeitando preocupações relativas à diversidade cultural se possam desenvolver actividades de leitura e escrita no Ensino Básico Perrenound P 1995 Ofício de Aluno e Sentido de Trabalho Escolar Porto Porto Editora O presente livro é composto por um conjunto de textos alguns inéditos da autoria de um dos mais importantes sociólogos da educação Philippe Perrenoud O leitor poderá apreciar uma nova maneira de abordar as práticas pedagógicas a formação de professores e a profissão docente A pertinência destas temáticas na situação educativa actual impõese de forma evidente Texto da contracapa 23 Perrenoud P 1993 Práticas pedagógicas profissão docente e formação perspectiva sociológica Lisboa D QuixoteI I E Seria absurdo pedir aos professores para renunciarem a ser actores que procuram defender os seus interesses e a renunciarem também a esperar atingir os seus objectivos numa relação pedagógica muitas vezes difícil de viver conflitual e esgotante Mas o paradoxo do educador é o de servirse do seu poder para emancipar o aprendente Na medida em que se proclama defensor deste paradoxo o professor está condenado a compreender e sem dúvida a aceitar que os alunos não podem existir individual e colectivamente senão praticando à sua maneira o ofício de aluno adoptando tácticas defensivas jogando com as regras enganando uma instituição e os adultos que têm do seu lado o saber e a lei os meios e a instituição Compreender melhor as suas escolhas e proporlhes diferentes formas didácticas um outro contrato pedagógico uma outra forma de comunicar é muito bom Mas com a condição de se renunciar a acreditar que isso reduzirá de uma vez por todas a sua alteridade que a educação deixará de ser um combate Perrenoud Ph 1994 p 228 UNESCO 1995 Necessidades Especiais na Sala de Aula Conjunto de materiais para formação de professores Lisboa I I E O objectivo deste material é ajudar os professores a serem mais eficazes na resposta a dar às diferenças entre os alunos Mel Ainscow Zeichner K M 1993 A Formação reflexiva de Professores Ideias e Práticas Educação 73112 Lisboa Os textos seleccionados sublinham a importância de preparar professores que assumam uma atitude reflexiva em relação ao seu ensino e às condições sociais que o influenciam A defesa de uma perspectiva dos professores como práticos reflexivos leva o autor a rejeitar uma visão das abordagens de cima para baixo das reformas educativas nas quais os professores aplicam passivamente planos desenvolvidos por outros actores sociais institucionais eou políticos