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Para além das políticas linguísticas língua brasileira de sinais Marianne Rossi Stumpf Ronice Müller de Quadros Introdução As políticas linguísticas brasileiras em relação à língua brasileira de sinais Libras foram instauradas ao longo dos anos a partir dos movimentos sociais políticos impetrados pela Federação Nacional de Educação de Surdos especialmente a partir de 1987 em consonância com as pesquisas que foram sendo desenvolvidas sobre a Libras principalmente a partir da década de 90 Brito 2013 Estes movimentos culminaram com a promulgação da Lei 10436 de 2002 referida pela comunidade surda como a Lei de Libras pois reconhece a Libras como língua nacional das comunidades surdas brasileiras Esta lei foi regulamentada em 2005 pelo Decreto 5626 Esta regulamentação inclui uma série de ações no sentido de implementação da Lei de Libras Entre elas destacamos neste artigo as conquistas em relação à educação de surdos no Brasil e o estabelecimento dos cursos de formação de professores de Libras e tradutores e intérpretes de língua de sinais em nível superior referidos como Letras Libras A educação de surdos no Brasil está legitimada por meio de leis que reconhecem a Libras como língua nacional e estabelece o direito dos surdos de acessarem uma educação bilíngue na qual a Libras é a primeira língua e a Língua Portuguesa é a segunda língua Apesar da legitimação há tensões entre as políticas linguísticas da Libras que foram instauradas desde 2002 e as políticas educacionais que estão pautadas nas propostas de inclusão Paralelamente foram criados cursos de formação superior de professores bilíngues Libras e Língua Portuguesa professores de Libras e tradutores e intérpretes de língua de sinais A criação dos cursos foi estabelecida inicialmente em 2005 pela Universidade Federal de Santa Catarina por meio de projetos especiais com financiamento do governo federal para a sua execução na modalidade a distância incluindo nove instituições públicas federais e estaduais parceiras Em 2009 a Universidade Federal de Goiás e a Universidade Federal de Santa Catarina criam o Curso de Letras Libras presencial dentro do contexto da expansão da universidade brasileira no Programa Reuni Em 2012 o Programa Viver sem Limites consolida o estabelecimento dos Cursos de Letras Libras em todos os estados brasileiros Pelo menos uma universidade federal em cada estado passa a oferecer este curso de forma regular A implementação desta política linguística já tem efeitos significativos na valorização e reconhecimento da Libras em todo território brasileiro Este artigo irá compartilhar esta história e apresentará uma análise dos desdobramentos desta política pública considerando alguns conceitos cruciais que acabam permeando decisões e encaminhamentos a partir de políticas linguísticas e direitos das pessoas surdas os conceitos de diversidade e inclusão Kusters De Meulder Friedner e Emery 2015 1 A Lei de Libras 104362002 o Decreto 56262005 e demais documentos oficiais e o impacto na educação de surdos Durante anos a língua utilizada pelas comunidades surdas brasileiras não foi reconhecida A partir dos movimentos sociais surdos representados pela Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos FENEIS em 2002 a Lei Federal 10436 BRASIL 2002 de abril de 2002 chamada como a Lei de Libras foi promulgada Na sequência uma plano de implementação desta lei é sancionado por meio de um decreto Decreto Federal 5626 BRASIL 2005 de dezembro de 2005 Estes dois documentos oficiais representam um marco importante para o reconhecimento da Língua Brasileira de Sinais Libras e para uma série de ações implementadas desde então no sentido de consolidar o reconhecimento desta língua no Brasil Este marco histórico para a comunidade surda impacta em diferentes aspectos da vida dos surdos brasileiros ou seja mais especificamente no nível educacional e em diferentes domínios da sociedade A Lei de Libras reconhece a língua da comunidade surda brasileira Há na base da lei a concepção de língua como integrante de uma comunidade que representa um grupo social brasileiro Este princípio coletivo é fundamental pois quando discutirmos a questão da inclusão e da diversidade os sentidos desta lei tomam uma força que tem impactado nas decisões que envolvem os surdos neste país Chegar a estes documentos oficiais envolveu um processo coletivo liderado pela FENEIS com representação de várias associações de surdos aliadas aos intelectuais que estavam começando a estudar a Libras no país Brito 2013 1995 Este movimento foi também sendo ampliado por meio de outros documentos organizados pelos próprios surdos Um exemplo importante foi o documento A Educação que nós Surdos queremos em 1999 Este documento é considerado um marco nos movimentos surdos brasileiros elaborado de forma coletiva por ocasião do précongresso V Congresso Latino Americano de Educação Bilíngue para Surdos em 1999 Os surdos se reuniram antes do evento e discutiram quais seriam as questões a serem contempladas na educação de surdos O próprio título do documento indica a forma como foi construído o verbo conjugado na primeira pessoa do plural nós surdos Um documento que representa os anseios dos surdos que participaram da sua elaboração Estes surdos representando surdos intelectuais e lideranças surdas assim como os surdos das comunidades surdas do país A FENEIS endossou o documento e encaminhou formalmente ao Ministério da Educação como uma reivindicação dos surdos do país Neste artigo ao discutir o contexto atual da educação de surdos no Brasil partimos deste documento elaborado a duas décadas atrás para nos inspirar na implementação da educação bilíngue a partir da perspectiva proposta por representantes surdos no sentido de que tenham assegurado o direito de serem educados em sua própria língua e o direito a serem auxiliados por intérpretes em espaços públicos e em meios de comunicações No entanto neste momento em 2021 passados já 20 anos do documento A Educação que nós Surdos queremos 18 anos da promulgação da Lei de Libras 13 anos com o Decreto 56262005 vemos que os direitos dos surdos assegurados até o presente foram pautados na coletividade surda Definitivamente os surdos sabem o que querem Um dos exemplos de desdobramentos do que os surdos querem foram os cursos de Letras Libras que representam uma das implementações do Decreto 56262005 e que se articulam com a educação de surdos Assim estes documentos oficiais tomam forma no contexto de uma educação que está pautada na educação para todos a chamada educação inclusiva Muitos surdos acabam sendo excluídos diante de políticas educacionais que impõem uma visão que mascara o verdadeiro acesso à educação em nome da inclusão mesmo respaldados pela Libras por meio de intérpretes línguas de sinais Vemos portanto uma tensão entre políticas linguísticas e políticas educacionais estabelecida no país A tensão instaurada se debate entre os princípios da educação inclusiva permeada pela visão que quer garantir o acesso individual de todos à educação e a educação que os surdos querem pautada na visão de um grupo sócioculturallinguístico que conta com políticas linguísticas que reconhecem a Libras Temos uma tensão entre uma perspectiva que está pensando no indivíduo surdo que precisa ser incluído na educação e a perspectiva de que os surdos querem ser cidadãos brasileiros reconhecidos como parte de uma comunidade brasileira Como Ladd 2003 afirma é um grupo minoritário que é um pouco de vários grupos minoritários surdos negros surdos brancos surdos indígenas surdos com diferentes gêneros surdos de diferentes classes sociais surdos enquanto deficientes e assim por diante mas que se constitui a partir de uma diferença integram as comunidades surdas que usam uma língua de sinais Nestas tensões instauradas a educação inclusiva é estabelecida como política nacional dentro do Ministério de Educação que integra como metas a promoção da inclusão com uma sociedade que apresenta uma grande diversidade Inclusão e diversidade instaura uma constante provocação ao que se entende por inclusão que reaparece nas tensões instauradas entre as políticas públicas e os anseios da comunidade surda Entre tais tensões o Ministério da Educação a partir da Secretaria de Educação em 2013 solicita à FENEIS indicar um grupo de intelectuais e lideranças surdas para compor uma comissão para elaborar um documento para propor a viabilização da educação bilíngue para surdos na rede pública a partir de uma das indicações previstas no Decreto 56262005 a educação bilíngue para surdos A FENEIS é representada nesta comissão por meio de suas lideranças surdas que também são intelectuais surdos mestres e doutores juntamente com colegas pesquisadores Pela primeira vez os surdos passam a ser autores de um documento que parte do Ministério da Educação1 Este documento foi concluído em 2014 com proposições que colocaram a educação bilíngue dentro da Secretaria de Educação a partir da diversidade considerando a língua usada pelos surdos um dos fios condutores da proposta Relatório sobre a Política Linguística de Educação Bilíngue Língua Brasileira de Sinais e Língua Portuguesa2 Esse relatório apresenta as diretrizes da educação bilíngue a partir da Lei de Libras e do Decreto 56262005 É um documento oficial que reitera os anseios dos surdos já acenados no documento a Educação que nós Surdos queremos A proposta situa a educação de surdos enquanto diversidade linguística com base nos direitos humanos linguísticos que estabelece o direitos das minorias linguísticas de acesso à educação na sua língua bem como do ensino da sua língua e do ensino da segunda língua língua do país no seu processo de escolarização A educação bilíngue proposta vai ainda mais além pois estabelece que a educação de surdos deve acontecer com as crianças surdas com seus pares surdos mesmo quando convivem com seus pares ouvintes A língua de sinais portanto é vista como parte integrante de um grupo social um coletivo no qual a língua se constitui O documento explicita que a educação bilíngue vai promover a identidade linguística da comunidade surda p6 não do indivíduo surdo Assim tira a educação de surdos da perspectiva que tem regido a educação inclusiva num coletivo que invisibiliza os surdos em todos Os surdos não são todos os surdos pertencem a um grupo social que se estabelece a partir da comunidade surda um grupo diverso de todos que instaura uma falsa ideia de igualdade social Segue um trecho do documento que afirma a educação de surdos a partir das lentes dos próprios surdos A Educação Bilíngue de surdos não é compatível com o atendimento oferecido pela Educação Especial pois restringese às questões impostas pelas limitações decorrentes de deficiências 2 Grupo de Trabalho designado pelas Portarias no 10602013 e no 912013 do MECSECADI documento disponível em wwwbibliotecadigitalunicampbrdocumentdown56513 1 Entre estes surdos destacamse as pesquisadoras Ana Regina e Souza Campello Doutora em Educação Professora no Instituto Nacional de Educação de Surdos Marianne Rossi Stumpf Doutora em Informática na Educação Professora da Universidade Federal de Santa Catarina Gladis Perlin Doutora em Educação Professora aposentada da Universidade Federal de Santa Catarina Patrícia Luiza Ferreira Rezende Doutora em Educação Professora do Instituto Nacional de Educação de Surdos Shirley Vihalva Mestre em Linguística Professora da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul Carolina Ferreira Pêgo Mestre em Linguística Professora da Universidade Federal de Santa Catarina Este documento também contou com colaboradores surdos do Instituto Nacional de Educação Professores Paulo André Martins e Valdo Ribeiro da Nóbrega Atualmente Valdo Ribeiro da Nóbrega é Mestre em Linguistica Professor da Universidade Federal da Paraíba de um modo extremamente amplo como se o surdo ele próprio pela surdez fosse dela objeto em si mesmo Considerado como parte de uma comunidade linguísticocultural o estudante surdo requer outro espaço do MEC para implementar uma educação bilíngue regular que atenda as distintas possibilidades de ser surdo Em decorrência surdos com deficiências além da surdez devem ser atendidos em atendimentos especializados organizados com base nos princípios da Educação Bilíngue oferecida em Libras e Português Escrito como segunda língua Relatório sobre a Política Linguística de Educação Bilíngue Libras e Língua Portuguesa 201467 grifos das autoras O documento pautase na educação bilíngue a partir da comunidade surda enquanto comunidade linguísticocultural enquanto grupo social Todas as diretrizes apresentadas foram portanto delineadas considerando as crianças e os jovens surdos entre seus pares surdos com referências surdas em uma ambiente linguísticosocial favorável Neste mesmo ano em 2014 é publicado o Plano Nacional de Educação que inclui uma meta específica sobre a educação de surdos 47 garantir a oferta de educação bilíngue em Língua Brasileira de Sinais Libras como primeira língua e na modalidade escrita da língua portuguesa como segunda língua aosàs alunosas surdos e com deficiência auditiva de zero a dezessete anos em escolas e classes bilíngues e em escolas inclusivas nos termos do art 22 do Decreto nº 5626 de 22 de dezembro de 2005 e dos arts 24 e 30 da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência bem como a adoção do sistema braille de leitura para cegos e surdoscegos PNE 2014 Meta 47 Até chegar ao texto final desta meta a FENEIS teve vários embates com a Secretaria de Educação efeitos da tensão existente ao que os surdos querem e o que a educação inclusiva rege apesar da questão da diversidade estar posta nesta mesma secretaria Durante a elaboração da meta 4 os surdos representados pela FENEIS inseriram a meta 47 incluindo na redação a escola bilíngue e classes bilíngues considerando a Libras como primeira língua e língua de ensino e a Língua Portuguesa como segunda língua de zero a 17 anos de idade A intenção da FENEIS sempre foi garantir uma educação na qual as crianças surdas pudessem acessar a educação com seus pares surdos atrelando o direito linguístico ao direito de se constituir dentro de um grupo social pertencente à comunidade surda No entanto por três vezes houve a tentativa de retirar a questão das escolas bilíngues e classes bilíngues do texto impondo a educação de surdos dentro do sistema da educação inclusiva da forma como está posta ou seja nas escolas regulares de ensino onde a Língua Portuguesa é a língua de instrução e meio de comunicação reiterando o foco na pessoa surda enquanto indivíduo com direito a educação sem considerar o coletivo que é central para os surdos Os surdos sentiramse traídos nas três tentativas de retirada do texto proposto pela FENEIS pois no apagar das luzes eles tentavam retirar do texto proposto a coletividade surda por meio da escola bilíngue ou pelo menos da classe bilíngue A FENEIS publicou uma nota de repúdio diante dos acontecimentos relativos à elaboração do texto do Plano Nacional de Educação especialmente referente à meta 4 deste documento Afirmamos que nenhum outro segmento de deficiência e ou gestores e autoridades públicas podem nos impor a educação que não foi decidida por nós Reiteramos o lema da Convenção Internacional da Pessoa com Deficiência nada sobre nós sem nós O que está por trás desta disputa por palavras O nosso direito de buscar o tipo de educação que mais adequadamente atende às nossas necessidades visuais as escolas e classes bilíngues específicas para surdos Ora por meio desta redação sem consenso o Ministério da Educação quer declarar que escolas e classes bilíngues são sinônimo de escolas comuns contando apenas com a presença de intérprete de Libras Afirmamos que querem esmaecer a nossa conquista e querem ir contra o que estabelece no Decreto 56262005 que escolas bilíngues são uma coisa e escolas comuns da rede regular de ensino são outra coisa cf Artigo 2II Nós surdos precisamos de nossas escolas e classes bilíngues Conclamamos a que os educadores e a sociedade nos ajudem a defender o direito que temos de adquirir a nossa língua em um ambiente linguisticamente favorável o que uma escola comum nunca poderá propiciar FENEIS 2013 A FENEIS então conseguiu manter o texto original sugerido tornandose uma conquista que mais uma vez está pautada na reivindicação dos surdos enquanto grupo social que pertence à comunidade surda Estas tentativas de modificação do texto original evidenciaram a tensão existente entre os surdos e os princípios que regem a educação inclusiva no Brasil A conquista do texto original mantendo as escolas bilíngues e as classes bilíngues para surdos reiteram as diretrizes apresentadas nos documentos oficiais que contaram com a presença dos surdos o documento A Educação que nós Surdos queremos 1999 o Decreto 5626 2005 e o Relatório sobre a Política Linguística de Educação Bilíngue Libras e Língua Portuguesa 2014 Assim neste sentido a legislação brasileira garantiu os direitos linguísticos dos surdos Essa legislação torna possível pensar em uma educação de surdos e nas perspectivas dos surdos entre tantos outros possíveis aspectos que representam as experiências visuais difundem a sua língua e suas experiências por meio de seus relatos que representam verdadeiros desabafos expressando o quanto o mundo passou a ter significado a partir do momento em que puderam se expressar na Libras e a ter escutas em sinais No entanto vigiar é preciso As tensões continuam postas e exigem cautela por parte das comunidades surdas Os representantes surdos continuam o monitoramento e a articulação sobre atividades de formação para as pessoas surdas A FENEIS está filiada à Federação Mundial de Surdos que possui uma agenda quanto aos direitos das pessoas surdas no mundo Esta agenda internacional também subsidia e fortalece as ações da FENEIS Por ocasião da II Conferência Internacional da Federação Mundial de Surdos em Sydney Austrália 2013 foi estabelecida como prioridade do trabalho da Federação Mundial dos Surdos WFD assegurar que os direitos humanos universais sejam realidade para as pessoas surdas em todo o mundo A Convenção das Nações Unidas para os Direitos das Pessoas com Deficiências UNCRPD apresenta uma mudança de paradigma de um modelo de deficiência enquanto doença para um modelo de deficiência enquanto parte dos Direitos Humanos As pessoas surdas têm direitos civis políticos sociais linguísticos econômicos e culturais em base na igualdade a todos Isto requer principalmente o reconhecimento da identidade linguística e cultural das pessoas surdas O princípio de proposições que incluem os anseios de diferentes grupos de que nada sobre nós sem nós é retomado a partir desta convenção novamente o coletivo presente no estabelecimento de políticas A WFD segue defendendo os direitos das pessoas surdas através de 4 políticaschave 1 Reconhecimento da língua de sinais a língua de sinais é a linguagem primeira e natural das pessoas surdas O reconhecimento total das línguas de sinais é primordial na promoção da igualdade para as pessoas surdas 2 Educação As crianças surdas precisam ter acesso à educação para poder contribuir com a sociedade como adultos iguais Elas têm direito a adquirir sua língua primeira e natural a língua de sinais e a aprender em ambientes que respeitem e valorizem a língua de sinais Elas têm direito a educação nos mesmos padrões de qualidade das crianças ouvintes 3 Acessibilidade As pessoas surdas têm direito a participar de todas as áreas da vida quotidiana em bases iguais aos demais em língua de sinais 4 Interpretação de língua de sinais Um fator chave para a acessibilidade é o direito a interpretação em língua de sinais As sociedades devem criar sistemas que proporcionem acesso geral a intérpretes de língua de sinais Somente quando os governos cumprirem suas obrigações dentro da Convenção das Nações Unidas para os Direitos das Pessoas com Deficiências UNCRPD as pessoas surdas terão igualdade de direitos em suas vidas Esta agenda da WFD é tomada pela FENEIS como referencia para a garantia dos direitos dos surdos brasileiros associada ao desenvolvimento das pesquisas sobre a Libras a educação de surdos e os estudos de tradução e interpretação de surdos A FENEIS está alinhada com os ganhos acadêmicos alcançados nas últimas duas décadas empoderando seu discurso político com base científica A própria FENEIS integra pesquisadores surdos e bilíngues garantindo assim um reconhecimento representativo consistente das questões implicadas na vida dos surdos brasileiros entre elas a educação de surdos Um aspecto fundamental da educação multilíngue é o acesso precoce e a exposição frequente a uma língua de sinais natural e completa que inicia o processo de aquisição da linguagem em uma primeira língua e cria a possibilidade do multilinguisimo Grosjean 2008 Johnson et al 1989 Estudos amplos mostraram que a criança surda que possui boas habilidades na primeira língua precocemente tem vantagens acadêmicas a criança surda que sinaliza bem tem melhor desempenho acadêmico do que a criança surda que não tem acesso a língua de sinais independentemente de todos os outros fatores e a maioria dos resultados das pesquisas atribui essas vantagens ao fato de que a criança surda que usa a língua de sinais desde pequena não está em desvantagem linguística Freel et al 2011 Esta descoberta foi replicada com numerosas combinações de línguas de sinais e de línguas faladas incluindo a língua americana de sinais ASL e o inglês Padden Ramsey 2000 Strong e Prinz 2000 Hermans et al 2008 Chamberlain Mayberry 2008 Mayberry et al 2011 Clark et al 2014 língua de sinais britânica BSL e inglês Cormier et al 2012 língua de sinais de Quebec LSQ e língua de sinais francesa LSF Dubuisson et al 2008 e francês língua alemã de sinais DGSF e alemão Mann 2007 língua chilena de sinais LSC e espanhol Alvarado et al 2008 língua de sinais australiana e inglês Trezek et al 2010 língua de sinais israelense e hebraico Miller 2013 língua de sinais aramaica e escrita aramaica e inglês Ludago 2014 e língua de sinais de Hong Kong e cantonês chinês Tang et al 2014 A política de educação bilíngue indicada na meta 47 determina que a educação básica de surdos deve compreender o período de 0 a 17 anos Isso implica em uma aquisição precoce que se inicia no momento em que é confirmada a surdez do bebê A aquisição da língua de sinais assim como a aquisição da língua portuguesa estão previstas nos documentos oficiais e precisam ser implementadas Os movimentos surdos estão produzindo um novo documento objetivando expandir as referências da comunidade surda e garantir os direitos das pessoas surdas no Brasil As lideranças surdas brasileiras estabeleceram um grupo nas redes sociais para discutir a proposição deste novo documento com o objetivo de reafirmar a legislação atual e solicitar implementações emergentes para que os surdos consigam exercer sua cidadania brasileira de forma igualitária Os principais aspectos abordados no documento envolvem o direito de acesso à língua de sinais em diferentes instâncias públicas com a presença de tradutores e intérpretes mas também com a presença dos próprios surdos Novamente há uma reiteração dos direitos das pessoas surdas partindo da diversidade linguística e com uma compreensão diferenciada do que se representa por inclusão Depois retomaremos a questão da diversidade e da inclusão considerando estes documentos oficiais enquanto políticas públicas Na próxima seção será discutido especificamente a implementação do Decreto 5626 por meio da formação de professores de Libras e posteriormente por meio de tradutores e intérpretes de Libras Esses cursos formam profissionais que vão atuar em todos os níveis da educação de surdos portanto uma conquista importante da implementação das políticas linguísticas e educacionais no país 2 Estabelecimento dos cursos de Letras Libras no Brasil O curso de Letras Libras começou a ser oferecido em 2006 pela Universidade Federal de Santa Catarina em parceria com mais oito instituições de ensino superior federais e estaduais Em 2008 o curso passou a ser oferecido incluindo também o bacharelado totalizando dezoito instituições de ensino com turmas de licenciatura e bacharelado No primeiro oferecimento mais de 90 dos alunos eram surdos uma vez que o público alvo foi direcionado para a formação dos instrutores de Libras os quais eram surdos formados pelo Ministério da Educação em parceria com a FENEIS e o Instituto Nacional de Educação de Surdos Estes cursos acabaram portanto formando uma nova comunidade acadêmica em língua de sinais que antes não existia Mais de mil alunos foram formados nestes dois oferecimentos espalhados por todo o território brasileiro Pela primeira vez os surdos transitaram pelas universidades federais e estaduais do país com vagas priorizadas aos surdos com respaldo do Decreto 56262005 A prioridade às vagas aos surdos constituiu uma política afirmativa garantindo o espaço de ensino da Libras aos surdos O objetivo dos primeiros oferecimentos dos cursos estava focado na formação dos instrutores de Libras que já atuavam no ensino da Libras mas sem contar com formação de nível superior Os instrutores de Libras eram surdos formados por meio de cursos de curta duração pela FENEIS Assim os cursos de Letras Libras acabaram sendo uma porta de entrada dos surdos brasileiros para as universidades federais No Brasil as universidades brasileiras são as instituições de ensino de maior reputação e extremamente competitivas Esse fato impulsionou a cultura surda em suas diversas formas de expressão literatura filmes poesia teatro artes plásticas e artes na informática Incentivou a publicação de inúmeros artigos em livros científicos trabalhos de conclusão teses de mestrado e doutorado de autores surdos É importante compreender que até poucos anos todos os discursos sobre os surdos eram controlados concebidos e escritos por pessoas que não eram surdas É recente portanto as participações surdas que demandam cuidado para que o enfoque de nossos trabalhos acadêmicos contemplem os surdos que não fazem parte da elite surda quer seja assim considerada por dominar bem o português escrito ser bilíngue ou fazer parte de uma universidade Os contatos desses acadêmicos com as associações com os grupos esportivos e com as pessoas surdas com carência de habilidades na leitura e escrita são fundamentais para que as narrativas incluam os discursos de resistência e se produzam discursos de libertação mais elaborados O Povo Surdo através dos anos pratica e conhece sua essência mas faltavam registros de surdos enquanto protagonistas reconhecidos academicamente para que a sociedade maior acessasse suas reinvidicações A própria denominação de Cultura Surda é recente No percurso dos movimentos sociais surdos que se tornaram mais evidentes na luta pelo respeito a sua língua essa denominação foi evoluindo enquanto ia incorporando novos conceitos e novos agentes de diferentes lugares Ladd 2003 escreve que a diferença crucial entre as culturas majoritárias e as minoritárias é a de que as primeiras não tem nenhuma obrigação de explicitar as crenças que dirigem suas ações menos ainda tem de justificar sua existência Pelo contrário as segundas não apenas se exige que o façam mas além disso não disponibilizam os recursos materiais ou em grau suficiente para fazêlo por outro lado a dominação da cultura majoritária assegura que são eles quem investiga e analisa ao outro quem arquiva os informes que constituem coletivamente aquilo que o ocidente define como conhecimento 200322 Com a instauração da formação acadêmica dos surdos brasileiros esta lógica é rompida pois surdos devidamente qualificados em diferentes níveis superior graduados mestres e doutores passam a ser protagonistas das discussões sobre políticas linguísticas e educacionais no Brasil Os acadêmicos surdos conquistaram o acesso às universidades brasileiras e fizeram a diferença dentro das salas de aulas demonstrando com seus trabalhos atividades e produções acadêmicas a possibilidade de conceber o ensino de forma diferente Com isso abriramse as portas das universidades brasileiras para os surdos brasileiros As seleções nacionais por meio do Exame Nacional do Ensino Médio Enem para entrada nas universidades passou a contar com provas em Libras garantindo aos surdos realizarem a seleção em pé de igualdade dos candidatos ouvintes Os surdos passaram a integrar as universidades brasileiras em diferentes cursos de formação Porém esses espaços conquistados estão restritos às universidades e não se estendem ainda à educação básica pois nesse nível ainda mantémse a política de inclusão que se debate com as políticas linguísticas da Libras instauradas A educação básica ainda não implementou uma educação bilíngue pautada nas formas surdas de pensar a educação com base na diversidade de forma coletiva 3 Impacto do oferecimento dos cursos de Letras Libras no Brasil Os surdos brasileiros que obtiveram formação foram amplamente absorvidos para atuarem na formação de educadores em todas as universidades brasileiras Isso aconteceu e continua acontecendo porque o Decreto 56262005 obrigou a inclusão de Libras em todos os cursos de formação de professores de todas as áreas do conhecimento bem como nos cursos de fonoaudiologia A presença de surdos na academia favoreceu a formação destes professores em nível de mestrado e doutorado Só na Universidade Federal de Santa Catarina desde 2009 o Programa de Pósgraduação em Linguística já conta com 46 dissertações de mestrado e 25 teses de doutorado defendidas Nos Estudos da Tradução 57 dissertações de mestrado e 18 teses de doutorando defendidas além das que estão em andamento Destes 84 são pesquisadores surdos Somente nesta universidade é possível observar uma evolução na formação de pesquisadores da Libras e dos Estudos da Tradução focados na língua de sinais Atualmente várias universidades brasileiras estão formando outros pesquisadores em todo o país Os primeiros mestres e doutores surdos da Universidade Federal de Santa Catarina participaram ativamente na elaboração das disciplinas do primeiro e segundo oferecimento dos cursos de Letras Libras Esta presença na autoria destes cursos e na proposição das formas de ensinar e aprender dos surdos foi fundamental para garantir que o estes cursos apresentassem a perspectiva surda Todos os materiais foram apresentados em Libras assim como todo o ensino aconteceu na Libras e as avaliações também foram realizadas na Libras Pela primeira vez na universidade pública brasileira a Língua Portuguesa não configurou um fator de exclusão dos surdos pois aos alunos foi viabilizado o ensino em Libras e as avaliações em Libras Desta forma o português deixou de ser um problema na vida das pessoas surdas e passou a ser um aliado Os alunos surdos passaram a usar a Língua Portuguesa com um caráter instrumental enquanto que a Libras era usada para interagir e registrar os conhecimentos das áreas da ciência que faziam parte dos cursos O projeto político pedagógico dos cursos de Letras Libras partia da Libras Os dois primeiros oferecimentos envolveram um total de 1300 alunos dos quais 90 da primeira turma foram de surdos com formação de professores de Libras com o objetivo de oferecer formação em nível superior para os instrutores surdos No segundo oferecimento tivemos o curso de formação de professores com 450 alunos dos quais 80 foram surdos e criamos o curso com o objetivo de formar tradutores e intérpretes de LibrasLíngua Portuguesa também com 450 alunos Neste curso de bacharelado vários intérpretes de Libras que já atuavam nesta atividade foram alunos deste curso pois não contavam com formação específica na área A partir destes dois oferecimentos estabeleceuse os cursos de Letras Libras Licenciatura e Bacharelado em todo o Brasil como cursos regulares de formação de professores eou tradutores e intérpretes de Libras ambos cursos com duração de 4 anos O impacto do oferecimento destes cursos abrange questões importantes na comunidade surda entre eles destacamse os seguintes 1 Valorização e reconhecimento da Libras o fato da língua integrar um currículo de formação em nível superior na área de Letras favoreceu uma nova visão sobre a língua pois assim como as demais línguas que integram os cursos de Letras a Libras passou a integrar o conjunto de línguas que fazem parte dos cursos de formação de línguas do país A valorização e reconhecimento da Libras nos cursos de Letras Libras atribuíram um novo status à língua um status de língua importante no rol de línguas do Brasil 2 Qualificação dos profissionais que já atuavam nas áreas de ensino da Libras e de tradução e interpretação de Libras licenciados e bacharéis respectivamente 3 Potencialização do estabelecimento de redes políticas educacionais e sociais entre os exalunos dos cursos de Letras Libras Quadros Strobel e Masutti 2014 São várias as frentes em que os surdos utilizam as redes estabelecidas em todo o país para a sua organização Atualmente os surdos estão organizando vários tipos de congressos encontros cursos documentos oficiais algumas vezes com grande resistência de muitos ouvintes Por outro lado a atitude é de cooperação e depende do tipo de relação que foi construída entre surdos e ouvintes em cada local e em cada momento Observase diferenças entre as universidades brasileiras O uso das redes sociais é uma estratégia de construção de redes que empoderam os surdos As redes sociais por exemplo foram usadas para realizar uma mobilização do povo surdo em 2011 em Brasília quando mais de quatro mil surdos foram clamar pela não aprovação de um decreto que previa a imposição de um único modelo de educação inclusiva e que previa o fechamento de todas as escolas de surdos do país O resultado desta mobilização resultou na revogação deste decreto portanto uma grande conquista do povo surdo brasileiro Estas mesmas redes estão sendo usadas pelas lideranças surdas para articular um novo documento a ser encaminhado formalmente para as autoridades 4 Difusão da Libras por diferentes mídias entre elas a televisão e a internet Com a formação dos professores de Libras bem como dos intérpretes e tradutores de Libras a presença destes profissionais na mídia têm sido mais evidenciada O fato de contarmos com profissionais qualificados torna possível a contratação de profissionais para atuarem em diferentes programas Entre eles destacamse os debates políticos as vinhetas para apresentação de informações obrigatórias que precisam ser veiculadas na televisão por exemplo a informação quanto a idade de censura do programa a ser veiculado programas específicos assim por diante Também há entrevistas em programas com muita popularidade que inclui pessoas surdas com a presença de intérpretes A mídia portanto tornase uma aliada na difusão da Libras Há também algumas exigências estabelecidas pelo Decreto 56262005 que obriga a veiculação de certos programas em Libras O fato de termos profissionais devidamente formados viabiliza a execução destas exigências legais na mídia difundindo a língua 5 Formação de mestres e doutores surdos é um dos desdobramentos da formação de vários professores surdos no âmbito dos cursos de Letras Libras Vários dos exalunos tornaramse professores nas universidades brasileiras e continuaram seus estudos na área acadêmica A formação de surdos em níveis mais superiores da educação formal viabilizou a autoria surda e o empoderamento dos surdos Estes surdos que contam com qualificação participam ativamente das tomadas de decisão e planejamento das questões nas quais os surdos estão implicados enquanto civis 6 Desenvolvimento de pesquisas incluindo a presença de surdos pesquisadores Os resultados da pesquisas encerradas nas teses artigos em congressos revistas estão sendo publicados No entanto ainda percebemos que será preciso mais agressividade e um programa para descapsular esses resultados de pesquisa E a tarefa é dupla Somos poucos e há muito que fazer Ainda a Libras é pouco descrita e outras línguas de sinais brasileiras totalmente desconhecidas Urge que se formem mais pessoas e que ao mesmo tempo ao lado da produção para o mundo acadêmico se produza também em linguagem acessível para os professores para o leitor comum O conhecimento é a melhor e talvez única forma de se vencer o preconceito E ainda há muitos preconceitos e equívocos com a relação às línguas de sinais Nos últimos anos os trabalhos de pesquisadores brasileiros estão conquistando alguns programas de pósgraduação dando visibilidade à entrada dos alunos surdos avançando nas publicações de resultados importantes de pesquisas contamos com livros artigos e algumas coletâneas de artigos em Linguística e Libras Tradução e Interpretação de LibrasLíngua Portuguesa e Educação de Surdos e outros periódicos nacionais tais como a Revista Leitura Cadernos de Tradução e também o Portal de Libras que reúne uma documentação da Libras httpportallibrasufscbr Esses novos profissionais têm demandado juntamente com suas comunidades surdas uma formação específica que lhes permita concluir a escolarização básica e obter uma formação em magistério de modo que possam exercer uma educação qualificada em benefícios das crianças surdas Essa formação específica está delineada na legislação que trata do direito dos surdos a uma educação bilíngue diferenciada dos demais segmentos da comunidade surda Nessa legislação garantese que os professores possam ter essa formação em serviço ou seja paralelamente à sua atuação em sala de aula e concomitante à sua formação básica Isto pode ser confirmado com o texto da Lei de Libras nº 104362002 e reiterado no Relatório do Grupo de Trabalho designado pelas Portarias nº 10602013 e nº912013 que apresenta subsídios para a Política Linguística de Educação Bilíngue Língua Brasileira de Sinais e Língua Portuguesa A formação de professores de Libras de Língua Portuguesa como L2 de tradutores e intérpretes é fundamental para formar profissionais para atuarem na educação básica Essas formações devem ser garantidas em nível superior licenciatura e bacharelado e enquanto formação continuada para os professores que já estejam atuando na educação básica e superior Os cursos de graduação envolvem a Pedagogia Bilíngue que forma o professor bilíngue de atuar na educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental os cursos de Letras Libras licenciatura que forma professores de Libras para atuar no ensino da Libras na educação básica e nível médio e bacharelado que forma tradutores e intérpretes de Libras e Língua Portuguesa O Curso de Língua Portuguesa como L2 deve ser oferecido para formar os professores que atuarão tanto na educação básica como no nível superior Assim é de se esperar que produzam efeito nas práticas dos sistemas de ensino no que diz respeito à qualificação de seus quadros para atuarem nas escolas bilíngues e as universidades Passo importante neste sentido tem sido dado por várias organizações de professores e vários movimentos de surdos pressionando os sistemas de ensino para a elaboração de propostas e programas de formação não só em nível superior mas também em nível médio e nível básico No caso específico da formação de tradutores e intérpretes a formação apresenta os princípios e pontos básicos que se aplicam a este profissionais indicados pela Convenção da ONU que são os seguintes reconhecer a equivalência do status da língua de sinais e da língua falada respeitar e promover as línguas de sinais reconhecer e apoiar a identidade cultural e linguística dos surdos incluindo línguas de sinais e cultura surda reconhecer a importância para os surdos de sua autonomia e independência individuais incluindo a liberdade de fazer suas próprias escolhas reconhecer que as pessoas surdas devem ter a oportunidade de participar ativamente nos processos de tomada de decisão sobre políticas e programas incluindo aqueles diretamente relacionados a elas respeitar as capacidades em evolução das crianças surdas e respeitar o direito de preservar suas identidades consultar as organizações representativas dos surdos sobre questões que lhes digam respeito Os cursos de Letras Libras representaram um marco importante na formação de professores surdos no Brasil Atualmente está também formando tradutores e intérpretes surdos entre os ouvintes bilíngues É um grande avanço na formação na área de Libras Os impactos observados desdobramse em outras instituições pois servem de referência para todo o Brasil 4 Diversidade e inclusão Como vimos até agora diversidade e inclusão são termos usados amplamente nas propostas educacionais que direcionam as políticas educacionais no Brasil A própria Convenção dos Direitos da Pessoas Deficientes utilizam estes termos para discutir a educação mais especificamente a educação de surdos Os documentos oficiais a legislação vigente que já discutimos até aqui apresentam tais conceitos no entanto de forma individualizada Os documentos oficiais vem tratando da inclusão a partir da educação para todos a partir da compreensão de que cada um deve ter respeitado e acesso garantido a educação O todos e cada um têm sido um problema na educação de surdos O todos acaba dissolvendo as diferenças surdas que são importantes para a sua efetiva inclusão na sociedade e cada um envolve uma compreensão individualizada de cada pessoa e de suas necessidades para ser incluída No entanto no caso dos surdos o todos invisibiliza o todos surdos em favor de todas pessoas na sociedade E cada um foca no indivíduo surdo como aquele que precisa de acesso a comunicação simplificando a questão da língua ao acesso na língua de sinais muitas vezes por meio de um intérprete de língua de sinais Estas compreensões estão imersas em uma educação a partir da diversidade A diversidade como vem sendo compreendida a partir da educação inclusiva então passa a ser vista como a garantia de todos serem incluídas no sistema educacional tendo as suas diversidades respeitadas enquanto pessoas individuais Nesta linha de pensamento a educação inclusiva planeja a educação em todas as escolas públicas com a garantia de acesso a todas diversidades sendo respeitados os direitos de todos de acesso à educação Quando o aluno chega na escola ele é visto como um indivíduo que precisa ter suas necessidades atendidas No caso dos surdos ao chegar na escola a questão da língua é colocada e para isso a recomendação tem sido a garantia da presença do intérprete de língua de sinais para que ele tenha acesso à educação compreendida então como bilíngue Ou seja este aluno surdo terá os conteúdos escolares mediados pelo intérprete de língua de sinais e terá acesso a educação na Língua Portuguesa Essa simplificação tem levado ao fracasso escolar das crianças surdas incluídas nas escolas regulares assim como a sua exclusão da educação e da sociedade Portanto é uma educação inclusiva fracassada Quando analisamos a Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência 2007 o documento estabelece de forma objetiva que a língua de sinais precisa ser garantida enquanto direito humano E mais importante ainda reconhece e explicita que o acesso as pessoas surdas em igualdade de condições com as demais pessoas tenham reconhecidas sua identidade cultural e linguística incluindo as línguas de sinais e a cultura surda As pessoas com deficiência farão jus em igualdade de oportunidades com as demais pessoas a que sua identidade cultural e linguística específica seja reconhecida e apoiada incluindo as línguas de sinais e a cultura surda Artigo 304 grifo da autora Também estabelece que os surdos precisam ter garantido o acesso a diferentes espaços com a presença de intérpretes de língua de sinais Ao reconhecer a identidade cultural e linguística assim como a cultura surda há um reconhecimento do grupo social de surdos Identidade cultura e língua são constituídos na relação entre os seus iguais para se estabelecer o que é comum o que é compartilhado Assim a comunidade surda que envolve o agrupamento de pessoas surdas em espaços comuns que proporcionem interação são fundamentais Compreender diversidade enquanto diferença é fundamental e inclusão a partir do coletivo é garantir a cidadania enquanto direito humano Quadros em elaboração discute estes termos no contexto da educação brasileira a partir das reflexões de Kusterns et al 2015 Kusters et al 2015 discutem as vantagens e desvantagens do uso do termo diversidade para a implementação de políticas voltadas para os surdos Vantagens a Consciência sobre múltiplas diferenças na sociedade b Novas lentes na cultura e humanidade c Diferentes tipos de diferença d Reconhecimento da multiplicidade e interseccionalidade e Evitação do essencialismo e a superespecificação Desvantagens a Nomeia pessoas que estão fora das normas da sociedade b Reforça a ideia de força binária normalanormal c Ofusca exclusão social política e econômica d Muda o foco de atenção de desigualdade para medidas de sentirse bem ao invés de pensar em melhorias reais das condições estruturais A inclusão a partir da compreensão da diversidade surda pode apresentar a perspectiva de incorporar as vantagens do uso do termo diversidade ou seja ter consciência sobre o que significa ser surdo enquanto parte da comunidade surda compreender que a cultura e a humanidade conta com diversas formas de se traduzirem atentar para a língua de sinais enquanto uma língua diferente e possível usada pelos surdos brasileiros das comunidades surdas brasileiras dos grandes centros urbanos brasileiros reconhecer a multiplicidade de culturas e identidades existentes entre elas a identidade e culturas surdas e evitar o essencialismo do igual e a superespecificação do que seria o comum são importantes para a inclusão dos surdos na sociedade brasileira A inclusão neste sentido estabelecida enquanto parte das formas da sociedade interagir com os diferentes grupos sociais que a integram Todos neste sentido precisam ser incluídos mas não individualmente Todos precisam ser incluídos enquanto composição de diferentes grupos socioculturais e linguísticos tornando a inclusão muito mais dinâmica e eclética Considerando os cursos de Letras Libras na Universidade Federal de Santa Catarina a diversidade e a inclusão tiveram outra roupagem que permitiu formas muito mais criativas de garantir o acesso dos surdos à educação superior A diversidade neste contexto foi traduzida pelo reconhecimento da Libras de forma coletiva Esta diversidade presente na concepção e implementação destes cursos foi contemplada com seus autores que também eram surdos Estes surdos mestrandos mestres doutorandos e doutores alunos impactaram de forma acertada as formas de ensinar e aprender a partir da perspectiva surda Todas as equipes que foram formadas para elaborar os materiais e oferecer os cursos integraram pessoas surdas Esta inclusão garantiu a diferença a diversidade Isso foi possível exatamente porque os surdos compreendidos enquanto um coletivo não individualmente integraram todo o processo destes cursos 5 Agenda para o futuro A presença da Libras em encontros científicos congressos reuniões de associações científicas simpósios etc tem aumentado muito nos últimos dez anos Ela tem lugar cativo na Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência SBPC e na Associação Brasileira de Linguística Abralin por meio do Grupo de Trabalho Libras na Associação Nacional de Pesquisas e PósGraduação em Letras e Linguística Anpoll há mais 20 anos um grupo de trabalho que reúne periodicamente pesquisadores da área com a apresentação e discussão de trabalhos e resultados de pesquisa e com discussão de políticas de pesquisa em nível nacional Os cursos de Letras Libras formaram e estão formando vários alunos surdos além de romper com a ideia de que a seleção e a avaliação de alunos perpassa a Língua Portuguesa A compreensão da diversidade surda foi inaugurada por meio de várias ações nos últimos anos inclusive pelo oferecimento dos cursos de Letras Libras que permitem a realização de seleções e avaliações na própria língua de sinais A partir disso várias instâncias começaram a implementar estas ações atentando para a diferença surda o Enem os concursos públicos vários programas de circulação nacional são oferecidos também na Libras Desta forma os surdos começam a ser efetivamente incluídos reconhecido enquanto parte de um grupo social a comunidade surda A Convenção dos Direitos das Pessoas Deficientes passa então a fazer sentido e impactar na vida dos surdos por meio da compreensão da diversidade enquanto diferença de um grupo sociocultural e linguístico que conta com uma língua de sinais identidade e cultura surda A partir disso a compreensão da inclusão necessariamente precisa tomar outra forma buscando ser realizada efetivamente a partir de grupos sociais enquanto parte da comunidade surda Isso significa compreender a educação de surdos a partir do agrupamento de surdos do encontro surdosurdo como base da garantia de acesso à educação com base nos direitos humanos das pessoas surdas Colocamos os principais pontos críticos que devem ser enfrentados para que se possam delinear projeções de desenvolvimento 1 Garantir condições para a implementação da Educação Bilíngue de Surdos a partir da compreensão da diversidade enquanto diferença sociocultural e inclusão como a possibilidade de agrupar os surdos para garantir que a língua de sinais aconteça por meio da interação social e cultural das crianças surdas pares surdos e o contato com referências surdas no âmbito escolar 2 Viabilizar a disseminação da língua de sinais em todos os espaços escolares em especial nas escolas bilíngues para surdos e classes bilíngues 3 Continuar o investimento na formação de pesquisadores e autores surdos 4 Manter reforçar e ampliar o apoio dos órgãos de fomento à pesquisa e à formação 5 Criar bancos de dados que reúnam informações sistematizadas sobre instituições programas de formação projetos de investigações pesquisadores publicações que disseminem as línguas de sinais 6 Criar redes que liguem instituições e pesquisadores de modo a permitir uma troca constante discussões atualizações planejamento de investigações Considerações finais Constatamos que a Educação Bilíngue de Surdos ainda não adquiriu o status de prioridade na agenda política dos governantes pois é evidente a resistência por parte do poder público diante das compreensões equivocadas a respeito do que representa inclusão no contexto de educação brasileira Sabemos da complexidade que envolve a Educação Bilíngue de Surdos e dos desafios a serem enfrentados mas com o atual Plano Nacional de Educação estes desafios precisam ser enfrentados juntamente com as lideranças e intelectuais surdos As representações dos surdos por meio da Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos FENEIS bem como os intelectuais que representam as pesquisas atuais no campo da educação de surdos e linguística das línguas de sinais incluindo mestres e doutores surdos devem ser chamados pelos agentes das políticas públicas para implementar a educação bilíngue no Brasil Inúmeros desafios devem ser superados para que se efetive na prática a escola preconizada pela Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência e a legislação brasileira que prevê a educação bilíngue de modo que as escolas bilíngues de surdos estejam a serviço dessas comunidades surdas brasileiras O grande passo que os agentes educacionais precisam tomar envolve a participação efetiva da comunidade surda para o planejamento desta implementação tanto em relação a educação bilíngue em si como também em todas as questões que envolvem os direitos das pessoas surdas entre eles o acesso aos diferentes espaços sociais por meio da presença de profissionais tradutores e intérpretes de Libras e Língua Portuguesa Também será importante o apoio às ações que envolvam a produção de materiais em Libras que devem partir de um planejamento de corpus da Libras Assim como os materiais que requerem a elaboração de métodos formais de aprendizado de Libras como primeira e segunda língua assim como da Língua Portuguesa adequados para a aquisição de uma segunda língua Sustentamos que se faz necessária a união de surdos e ouvintes para que inovações consistentes por meio de caminhos que não sejam apenas aqueles das discussões das evidências mas por meio de estratégias de negociação postas em prática atentas às diversidades implicadas pela Libras identidades e culturas surdas para se garantir a verdadeira inclusão que permite aos surdos exercerem a cidadania de forma efetiva na sociedade brasileira Referências Annelies Kusters Maartje De Meulder Michele Friedner Steve Emery 2015 On diversity and inclusion Exploring paradigms for achieving Sign Language Peoples rights MMG Working Paper 1502 Allen Colin 2016 WFD Position paper on the language rights of Deaf children no prelo Allen Colin 2018 WFD Position Paper on Inclusive Education httpwfdeaforgnewsresources5june2018wfdpositionpaperinclusiveeducation Brasil Decreto no 5626 de 22 dez 2005 Regulamenta a Lei no 10436 de 24 de abril de 2002 que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais Libras e o art 18 da Lei no 10098 de 19 de dezembro de 2000 Diário Oficial da União Brasília 23 de dez 2005 Brasil Plano Nacional de Educação 20142024 Lei nº 13005 de 25 de junho de 2014 que aprova o Plano Nacional de Educação PNE e dá outras providências Brasília Câmara dos Deputados Edições Câmara 2014 Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência 2007 Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência Decreto Legislativo no 186 de 09 de julho de 2008 Decreto no 6949 de 25 de agosto de 2009 4 ed Revisada e atualizada Brasília Secretaira de Direitos Humanos Secretaia Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência 2011 Disponível em httpwwwpessoacomdeficienciagovbrappsitesdefaultfilespublicacoesconvencaop essoascomdeficienciapdf Cormier K Schembri A Vinson D Orfanidou E 2012 First language acquisition differs from second language acquisition in prelingually deaf signers evidence from sensitivity to grammaticality judgement in British Sign Language Cognition 1241 5065 Ladd Paddy Understanding Deaf Culture In Search of Deafhood Celevedon England Multilingua Matters p 528 2003 FENEIS Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos Nota Sobre Educação de Surdos na Meta 4 do PNE Rio de Janeiro 2013 Freel BL Clark MD Anderson ML Gilbert GL Musyoka MM Hauser PC 2011 Deaf individuals bilingual abilities American Sign Language proficiency reading skills and family characteristics Psychology 2 1823 Grosjean F 2008 Studying bilinguals Oxford UK Oxford University Press Jonhson RE Liddell SK Erting CJ 1989 Unlocking the curriculum Principles for achieving access in deaf education Working Paper 893 Washington DC Gallaudet Research Institute Gallaudet University Ludago TB 2014 Signed language proficiency and reading comprehension skill of deaf children in special and integrated primary schools in Addis Ababa International Journal of Research 17 729751 Miller P 2013 Similarities and differences in the processing of written text by skilled and less skilled readers with prelingual deafness The Journal of Special Education 464 233244 Quadros R M de Stumpf M R 2014 Letras Libras EaD In Ronice Müller de Quadros Org Letras Libras ontem hoje e amanhã 1edFlorianópolis UFSC 2014 v 1 p 935 Quadros R M de Strobel K and Masutti M L 2014 Deaf Gains in Brazil Linguistic Policies and Network Establishment In HDirksen L Bauman and Joseph J Murray editors Deaf Gain Raising the Stakes for Human Diversity University of Minnesota Press Minneapolis London Quadros R M de Stumpf M R 2009 O primeiro curso de graduação em letras língua brasileira de sinais educação a distância In Maria Regina Souza Org Educação Temática Digital 2edCampinas ETD 2009 v 10 p 169185 Quadros R M de Stumpf M R 2015 Sign Language Interpretation and Translation in Brazil Innovative Formal Education In Suzanne Ehrlich and Jemina Napier Org Interpreter Education in the Digital Age Innovation Access and Change 1edWashington Gallaudet University Press 2015 v 8 p 243265 Quadros R M de Libras em 60 horas Editora Parábola em elaboração Padden C Ramsey C 2000 American Sign Language and reading ability in Deaf children In C Chamberlain J Morford R Mayberry Eds Language acquisition by eye pp 165189 Mahway NJ LEA ONU 1948 Declaração Universal dos Direitos do Homem Assembléia Geral das Nações Unidas 12 ONU 1990 Declaração Mundial de Educação para Todos Conferência de Jomtien Tailândia UNICEF UNESCO 1994 Declaração Mundial de Educação para Todos e Plano de Ação para Satisfazer as Necessidades Básicas para Aprendizagem Conferência Mundial para as Necessidades Especiais Salamanca Espanha 1994 Stumpf M R Rangel G M M A Pedagogia da diferença para o surdo In Ana Claudia Balieiro Lodi Ana Dorziat Barbosa de Mélo Eulalia Fernandes Org Letramento bilinguismo e Educação de Surdos 1edPorto Alegre Mediação 2012 v 1 p 113124 Strong M Prinz P 2000 Is American Sign Language skill related to English literacy In Chamberlain C Morford J P Mayberry R editors Eds Language acquisition by eye pp 131142 Mahwah NJ Lawrence Erlbaum Publishers Tang G Lam S Yiu KMC 2014 Language development of deaf children in a sign bilingual and coenrollment environment in Marschark M Tang G Knoors H Bilingualism and Bilingual Deaf Education Oxford Scholarship Online pp 313341 Thoma Adriana da Silva etal Relatório sobre a Política Linguística de Educação Bilíngue Língua Brasileira de Sinais e Língua Portuguesa Disponível em httpwwwbibliotecadigitalunicampbrdocumentdown56513 Acesso em 20 de jul de 2014 Trezek BJ Wang Y Paul PV 2010 Reading and deafness Theory research and practice Clifton Park NY Delmar Cengage Learning
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Para além das políticas linguísticas língua brasileira de sinais Marianne Rossi Stumpf Ronice Müller de Quadros Introdução As políticas linguísticas brasileiras em relação à língua brasileira de sinais Libras foram instauradas ao longo dos anos a partir dos movimentos sociais políticos impetrados pela Federação Nacional de Educação de Surdos especialmente a partir de 1987 em consonância com as pesquisas que foram sendo desenvolvidas sobre a Libras principalmente a partir da década de 90 Brito 2013 Estes movimentos culminaram com a promulgação da Lei 10436 de 2002 referida pela comunidade surda como a Lei de Libras pois reconhece a Libras como língua nacional das comunidades surdas brasileiras Esta lei foi regulamentada em 2005 pelo Decreto 5626 Esta regulamentação inclui uma série de ações no sentido de implementação da Lei de Libras Entre elas destacamos neste artigo as conquistas em relação à educação de surdos no Brasil e o estabelecimento dos cursos de formação de professores de Libras e tradutores e intérpretes de língua de sinais em nível superior referidos como Letras Libras A educação de surdos no Brasil está legitimada por meio de leis que reconhecem a Libras como língua nacional e estabelece o direito dos surdos de acessarem uma educação bilíngue na qual a Libras é a primeira língua e a Língua Portuguesa é a segunda língua Apesar da legitimação há tensões entre as políticas linguísticas da Libras que foram instauradas desde 2002 e as políticas educacionais que estão pautadas nas propostas de inclusão Paralelamente foram criados cursos de formação superior de professores bilíngues Libras e Língua Portuguesa professores de Libras e tradutores e intérpretes de língua de sinais A criação dos cursos foi estabelecida inicialmente em 2005 pela Universidade Federal de Santa Catarina por meio de projetos especiais com financiamento do governo federal para a sua execução na modalidade a distância incluindo nove instituições públicas federais e estaduais parceiras Em 2009 a Universidade Federal de Goiás e a Universidade Federal de Santa Catarina criam o Curso de Letras Libras presencial dentro do contexto da expansão da universidade brasileira no Programa Reuni Em 2012 o Programa Viver sem Limites consolida o estabelecimento dos Cursos de Letras Libras em todos os estados brasileiros Pelo menos uma universidade federal em cada estado passa a oferecer este curso de forma regular A implementação desta política linguística já tem efeitos significativos na valorização e reconhecimento da Libras em todo território brasileiro Este artigo irá compartilhar esta história e apresentará uma análise dos desdobramentos desta política pública considerando alguns conceitos cruciais que acabam permeando decisões e encaminhamentos a partir de políticas linguísticas e direitos das pessoas surdas os conceitos de diversidade e inclusão Kusters De Meulder Friedner e Emery 2015 1 A Lei de Libras 104362002 o Decreto 56262005 e demais documentos oficiais e o impacto na educação de surdos Durante anos a língua utilizada pelas comunidades surdas brasileiras não foi reconhecida A partir dos movimentos sociais surdos representados pela Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos FENEIS em 2002 a Lei Federal 10436 BRASIL 2002 de abril de 2002 chamada como a Lei de Libras foi promulgada Na sequência uma plano de implementação desta lei é sancionado por meio de um decreto Decreto Federal 5626 BRASIL 2005 de dezembro de 2005 Estes dois documentos oficiais representam um marco importante para o reconhecimento da Língua Brasileira de Sinais Libras e para uma série de ações implementadas desde então no sentido de consolidar o reconhecimento desta língua no Brasil Este marco histórico para a comunidade surda impacta em diferentes aspectos da vida dos surdos brasileiros ou seja mais especificamente no nível educacional e em diferentes domínios da sociedade A Lei de Libras reconhece a língua da comunidade surda brasileira Há na base da lei a concepção de língua como integrante de uma comunidade que representa um grupo social brasileiro Este princípio coletivo é fundamental pois quando discutirmos a questão da inclusão e da diversidade os sentidos desta lei tomam uma força que tem impactado nas decisões que envolvem os surdos neste país Chegar a estes documentos oficiais envolveu um processo coletivo liderado pela FENEIS com representação de várias associações de surdos aliadas aos intelectuais que estavam começando a estudar a Libras no país Brito 2013 1995 Este movimento foi também sendo ampliado por meio de outros documentos organizados pelos próprios surdos Um exemplo importante foi o documento A Educação que nós Surdos queremos em 1999 Este documento é considerado um marco nos movimentos surdos brasileiros elaborado de forma coletiva por ocasião do précongresso V Congresso Latino Americano de Educação Bilíngue para Surdos em 1999 Os surdos se reuniram antes do evento e discutiram quais seriam as questões a serem contempladas na educação de surdos O próprio título do documento indica a forma como foi construído o verbo conjugado na primeira pessoa do plural nós surdos Um documento que representa os anseios dos surdos que participaram da sua elaboração Estes surdos representando surdos intelectuais e lideranças surdas assim como os surdos das comunidades surdas do país A FENEIS endossou o documento e encaminhou formalmente ao Ministério da Educação como uma reivindicação dos surdos do país Neste artigo ao discutir o contexto atual da educação de surdos no Brasil partimos deste documento elaborado a duas décadas atrás para nos inspirar na implementação da educação bilíngue a partir da perspectiva proposta por representantes surdos no sentido de que tenham assegurado o direito de serem educados em sua própria língua e o direito a serem auxiliados por intérpretes em espaços públicos e em meios de comunicações No entanto neste momento em 2021 passados já 20 anos do documento A Educação que nós Surdos queremos 18 anos da promulgação da Lei de Libras 13 anos com o Decreto 56262005 vemos que os direitos dos surdos assegurados até o presente foram pautados na coletividade surda Definitivamente os surdos sabem o que querem Um dos exemplos de desdobramentos do que os surdos querem foram os cursos de Letras Libras que representam uma das implementações do Decreto 56262005 e que se articulam com a educação de surdos Assim estes documentos oficiais tomam forma no contexto de uma educação que está pautada na educação para todos a chamada educação inclusiva Muitos surdos acabam sendo excluídos diante de políticas educacionais que impõem uma visão que mascara o verdadeiro acesso à educação em nome da inclusão mesmo respaldados pela Libras por meio de intérpretes línguas de sinais Vemos portanto uma tensão entre políticas linguísticas e políticas educacionais estabelecida no país A tensão instaurada se debate entre os princípios da educação inclusiva permeada pela visão que quer garantir o acesso individual de todos à educação e a educação que os surdos querem pautada na visão de um grupo sócioculturallinguístico que conta com políticas linguísticas que reconhecem a Libras Temos uma tensão entre uma perspectiva que está pensando no indivíduo surdo que precisa ser incluído na educação e a perspectiva de que os surdos querem ser cidadãos brasileiros reconhecidos como parte de uma comunidade brasileira Como Ladd 2003 afirma é um grupo minoritário que é um pouco de vários grupos minoritários surdos negros surdos brancos surdos indígenas surdos com diferentes gêneros surdos de diferentes classes sociais surdos enquanto deficientes e assim por diante mas que se constitui a partir de uma diferença integram as comunidades surdas que usam uma língua de sinais Nestas tensões instauradas a educação inclusiva é estabelecida como política nacional dentro do Ministério de Educação que integra como metas a promoção da inclusão com uma sociedade que apresenta uma grande diversidade Inclusão e diversidade instaura uma constante provocação ao que se entende por inclusão que reaparece nas tensões instauradas entre as políticas públicas e os anseios da comunidade surda Entre tais tensões o Ministério da Educação a partir da Secretaria de Educação em 2013 solicita à FENEIS indicar um grupo de intelectuais e lideranças surdas para compor uma comissão para elaborar um documento para propor a viabilização da educação bilíngue para surdos na rede pública a partir de uma das indicações previstas no Decreto 56262005 a educação bilíngue para surdos A FENEIS é representada nesta comissão por meio de suas lideranças surdas que também são intelectuais surdos mestres e doutores juntamente com colegas pesquisadores Pela primeira vez os surdos passam a ser autores de um documento que parte do Ministério da Educação1 Este documento foi concluído em 2014 com proposições que colocaram a educação bilíngue dentro da Secretaria de Educação a partir da diversidade considerando a língua usada pelos surdos um dos fios condutores da proposta Relatório sobre a Política Linguística de Educação Bilíngue Língua Brasileira de Sinais e Língua Portuguesa2 Esse relatório apresenta as diretrizes da educação bilíngue a partir da Lei de Libras e do Decreto 56262005 É um documento oficial que reitera os anseios dos surdos já acenados no documento a Educação que nós Surdos queremos A proposta situa a educação de surdos enquanto diversidade linguística com base nos direitos humanos linguísticos que estabelece o direitos das minorias linguísticas de acesso à educação na sua língua bem como do ensino da sua língua e do ensino da segunda língua língua do país no seu processo de escolarização A educação bilíngue proposta vai ainda mais além pois estabelece que a educação de surdos deve acontecer com as crianças surdas com seus pares surdos mesmo quando convivem com seus pares ouvintes A língua de sinais portanto é vista como parte integrante de um grupo social um coletivo no qual a língua se constitui O documento explicita que a educação bilíngue vai promover a identidade linguística da comunidade surda p6 não do indivíduo surdo Assim tira a educação de surdos da perspectiva que tem regido a educação inclusiva num coletivo que invisibiliza os surdos em todos Os surdos não são todos os surdos pertencem a um grupo social que se estabelece a partir da comunidade surda um grupo diverso de todos que instaura uma falsa ideia de igualdade social Segue um trecho do documento que afirma a educação de surdos a partir das lentes dos próprios surdos A Educação Bilíngue de surdos não é compatível com o atendimento oferecido pela Educação Especial pois restringese às questões impostas pelas limitações decorrentes de deficiências 2 Grupo de Trabalho designado pelas Portarias no 10602013 e no 912013 do MECSECADI documento disponível em wwwbibliotecadigitalunicampbrdocumentdown56513 1 Entre estes surdos destacamse as pesquisadoras Ana Regina e Souza Campello Doutora em Educação Professora no Instituto Nacional de Educação de Surdos Marianne Rossi Stumpf Doutora em Informática na Educação Professora da Universidade Federal de Santa Catarina Gladis Perlin Doutora em Educação Professora aposentada da Universidade Federal de Santa Catarina Patrícia Luiza Ferreira Rezende Doutora em Educação Professora do Instituto Nacional de Educação de Surdos Shirley Vihalva Mestre em Linguística Professora da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul Carolina Ferreira Pêgo Mestre em Linguística Professora da Universidade Federal de Santa Catarina Este documento também contou com colaboradores surdos do Instituto Nacional de Educação Professores Paulo André Martins e Valdo Ribeiro da Nóbrega Atualmente Valdo Ribeiro da Nóbrega é Mestre em Linguistica Professor da Universidade Federal da Paraíba de um modo extremamente amplo como se o surdo ele próprio pela surdez fosse dela objeto em si mesmo Considerado como parte de uma comunidade linguísticocultural o estudante surdo requer outro espaço do MEC para implementar uma educação bilíngue regular que atenda as distintas possibilidades de ser surdo Em decorrência surdos com deficiências além da surdez devem ser atendidos em atendimentos especializados organizados com base nos princípios da Educação Bilíngue oferecida em Libras e Português Escrito como segunda língua Relatório sobre a Política Linguística de Educação Bilíngue Libras e Língua Portuguesa 201467 grifos das autoras O documento pautase na educação bilíngue a partir da comunidade surda enquanto comunidade linguísticocultural enquanto grupo social Todas as diretrizes apresentadas foram portanto delineadas considerando as crianças e os jovens surdos entre seus pares surdos com referências surdas em uma ambiente linguísticosocial favorável Neste mesmo ano em 2014 é publicado o Plano Nacional de Educação que inclui uma meta específica sobre a educação de surdos 47 garantir a oferta de educação bilíngue em Língua Brasileira de Sinais Libras como primeira língua e na modalidade escrita da língua portuguesa como segunda língua aosàs alunosas surdos e com deficiência auditiva de zero a dezessete anos em escolas e classes bilíngues e em escolas inclusivas nos termos do art 22 do Decreto nº 5626 de 22 de dezembro de 2005 e dos arts 24 e 30 da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência bem como a adoção do sistema braille de leitura para cegos e surdoscegos PNE 2014 Meta 47 Até chegar ao texto final desta meta a FENEIS teve vários embates com a Secretaria de Educação efeitos da tensão existente ao que os surdos querem e o que a educação inclusiva rege apesar da questão da diversidade estar posta nesta mesma secretaria Durante a elaboração da meta 4 os surdos representados pela FENEIS inseriram a meta 47 incluindo na redação a escola bilíngue e classes bilíngues considerando a Libras como primeira língua e língua de ensino e a Língua Portuguesa como segunda língua de zero a 17 anos de idade A intenção da FENEIS sempre foi garantir uma educação na qual as crianças surdas pudessem acessar a educação com seus pares surdos atrelando o direito linguístico ao direito de se constituir dentro de um grupo social pertencente à comunidade surda No entanto por três vezes houve a tentativa de retirar a questão das escolas bilíngues e classes bilíngues do texto impondo a educação de surdos dentro do sistema da educação inclusiva da forma como está posta ou seja nas escolas regulares de ensino onde a Língua Portuguesa é a língua de instrução e meio de comunicação reiterando o foco na pessoa surda enquanto indivíduo com direito a educação sem considerar o coletivo que é central para os surdos Os surdos sentiramse traídos nas três tentativas de retirada do texto proposto pela FENEIS pois no apagar das luzes eles tentavam retirar do texto proposto a coletividade surda por meio da escola bilíngue ou pelo menos da classe bilíngue A FENEIS publicou uma nota de repúdio diante dos acontecimentos relativos à elaboração do texto do Plano Nacional de Educação especialmente referente à meta 4 deste documento Afirmamos que nenhum outro segmento de deficiência e ou gestores e autoridades públicas podem nos impor a educação que não foi decidida por nós Reiteramos o lema da Convenção Internacional da Pessoa com Deficiência nada sobre nós sem nós O que está por trás desta disputa por palavras O nosso direito de buscar o tipo de educação que mais adequadamente atende às nossas necessidades visuais as escolas e classes bilíngues específicas para surdos Ora por meio desta redação sem consenso o Ministério da Educação quer declarar que escolas e classes bilíngues são sinônimo de escolas comuns contando apenas com a presença de intérprete de Libras Afirmamos que querem esmaecer a nossa conquista e querem ir contra o que estabelece no Decreto 56262005 que escolas bilíngues são uma coisa e escolas comuns da rede regular de ensino são outra coisa cf Artigo 2II Nós surdos precisamos de nossas escolas e classes bilíngues Conclamamos a que os educadores e a sociedade nos ajudem a defender o direito que temos de adquirir a nossa língua em um ambiente linguisticamente favorável o que uma escola comum nunca poderá propiciar FENEIS 2013 A FENEIS então conseguiu manter o texto original sugerido tornandose uma conquista que mais uma vez está pautada na reivindicação dos surdos enquanto grupo social que pertence à comunidade surda Estas tentativas de modificação do texto original evidenciaram a tensão existente entre os surdos e os princípios que regem a educação inclusiva no Brasil A conquista do texto original mantendo as escolas bilíngues e as classes bilíngues para surdos reiteram as diretrizes apresentadas nos documentos oficiais que contaram com a presença dos surdos o documento A Educação que nós Surdos queremos 1999 o Decreto 5626 2005 e o Relatório sobre a Política Linguística de Educação Bilíngue Libras e Língua Portuguesa 2014 Assim neste sentido a legislação brasileira garantiu os direitos linguísticos dos surdos Essa legislação torna possível pensar em uma educação de surdos e nas perspectivas dos surdos entre tantos outros possíveis aspectos que representam as experiências visuais difundem a sua língua e suas experiências por meio de seus relatos que representam verdadeiros desabafos expressando o quanto o mundo passou a ter significado a partir do momento em que puderam se expressar na Libras e a ter escutas em sinais No entanto vigiar é preciso As tensões continuam postas e exigem cautela por parte das comunidades surdas Os representantes surdos continuam o monitoramento e a articulação sobre atividades de formação para as pessoas surdas A FENEIS está filiada à Federação Mundial de Surdos que possui uma agenda quanto aos direitos das pessoas surdas no mundo Esta agenda internacional também subsidia e fortalece as ações da FENEIS Por ocasião da II Conferência Internacional da Federação Mundial de Surdos em Sydney Austrália 2013 foi estabelecida como prioridade do trabalho da Federação Mundial dos Surdos WFD assegurar que os direitos humanos universais sejam realidade para as pessoas surdas em todo o mundo A Convenção das Nações Unidas para os Direitos das Pessoas com Deficiências UNCRPD apresenta uma mudança de paradigma de um modelo de deficiência enquanto doença para um modelo de deficiência enquanto parte dos Direitos Humanos As pessoas surdas têm direitos civis políticos sociais linguísticos econômicos e culturais em base na igualdade a todos Isto requer principalmente o reconhecimento da identidade linguística e cultural das pessoas surdas O princípio de proposições que incluem os anseios de diferentes grupos de que nada sobre nós sem nós é retomado a partir desta convenção novamente o coletivo presente no estabelecimento de políticas A WFD segue defendendo os direitos das pessoas surdas através de 4 políticaschave 1 Reconhecimento da língua de sinais a língua de sinais é a linguagem primeira e natural das pessoas surdas O reconhecimento total das línguas de sinais é primordial na promoção da igualdade para as pessoas surdas 2 Educação As crianças surdas precisam ter acesso à educação para poder contribuir com a sociedade como adultos iguais Elas têm direito a adquirir sua língua primeira e natural a língua de sinais e a aprender em ambientes que respeitem e valorizem a língua de sinais Elas têm direito a educação nos mesmos padrões de qualidade das crianças ouvintes 3 Acessibilidade As pessoas surdas têm direito a participar de todas as áreas da vida quotidiana em bases iguais aos demais em língua de sinais 4 Interpretação de língua de sinais Um fator chave para a acessibilidade é o direito a interpretação em língua de sinais As sociedades devem criar sistemas que proporcionem acesso geral a intérpretes de língua de sinais Somente quando os governos cumprirem suas obrigações dentro da Convenção das Nações Unidas para os Direitos das Pessoas com Deficiências UNCRPD as pessoas surdas terão igualdade de direitos em suas vidas Esta agenda da WFD é tomada pela FENEIS como referencia para a garantia dos direitos dos surdos brasileiros associada ao desenvolvimento das pesquisas sobre a Libras a educação de surdos e os estudos de tradução e interpretação de surdos A FENEIS está alinhada com os ganhos acadêmicos alcançados nas últimas duas décadas empoderando seu discurso político com base científica A própria FENEIS integra pesquisadores surdos e bilíngues garantindo assim um reconhecimento representativo consistente das questões implicadas na vida dos surdos brasileiros entre elas a educação de surdos Um aspecto fundamental da educação multilíngue é o acesso precoce e a exposição frequente a uma língua de sinais natural e completa que inicia o processo de aquisição da linguagem em uma primeira língua e cria a possibilidade do multilinguisimo Grosjean 2008 Johnson et al 1989 Estudos amplos mostraram que a criança surda que possui boas habilidades na primeira língua precocemente tem vantagens acadêmicas a criança surda que sinaliza bem tem melhor desempenho acadêmico do que a criança surda que não tem acesso a língua de sinais independentemente de todos os outros fatores e a maioria dos resultados das pesquisas atribui essas vantagens ao fato de que a criança surda que usa a língua de sinais desde pequena não está em desvantagem linguística Freel et al 2011 Esta descoberta foi replicada com numerosas combinações de línguas de sinais e de línguas faladas incluindo a língua americana de sinais ASL e o inglês Padden Ramsey 2000 Strong e Prinz 2000 Hermans et al 2008 Chamberlain Mayberry 2008 Mayberry et al 2011 Clark et al 2014 língua de sinais britânica BSL e inglês Cormier et al 2012 língua de sinais de Quebec LSQ e língua de sinais francesa LSF Dubuisson et al 2008 e francês língua alemã de sinais DGSF e alemão Mann 2007 língua chilena de sinais LSC e espanhol Alvarado et al 2008 língua de sinais australiana e inglês Trezek et al 2010 língua de sinais israelense e hebraico Miller 2013 língua de sinais aramaica e escrita aramaica e inglês Ludago 2014 e língua de sinais de Hong Kong e cantonês chinês Tang et al 2014 A política de educação bilíngue indicada na meta 47 determina que a educação básica de surdos deve compreender o período de 0 a 17 anos Isso implica em uma aquisição precoce que se inicia no momento em que é confirmada a surdez do bebê A aquisição da língua de sinais assim como a aquisição da língua portuguesa estão previstas nos documentos oficiais e precisam ser implementadas Os movimentos surdos estão produzindo um novo documento objetivando expandir as referências da comunidade surda e garantir os direitos das pessoas surdas no Brasil As lideranças surdas brasileiras estabeleceram um grupo nas redes sociais para discutir a proposição deste novo documento com o objetivo de reafirmar a legislação atual e solicitar implementações emergentes para que os surdos consigam exercer sua cidadania brasileira de forma igualitária Os principais aspectos abordados no documento envolvem o direito de acesso à língua de sinais em diferentes instâncias públicas com a presença de tradutores e intérpretes mas também com a presença dos próprios surdos Novamente há uma reiteração dos direitos das pessoas surdas partindo da diversidade linguística e com uma compreensão diferenciada do que se representa por inclusão Depois retomaremos a questão da diversidade e da inclusão considerando estes documentos oficiais enquanto políticas públicas Na próxima seção será discutido especificamente a implementação do Decreto 5626 por meio da formação de professores de Libras e posteriormente por meio de tradutores e intérpretes de Libras Esses cursos formam profissionais que vão atuar em todos os níveis da educação de surdos portanto uma conquista importante da implementação das políticas linguísticas e educacionais no país 2 Estabelecimento dos cursos de Letras Libras no Brasil O curso de Letras Libras começou a ser oferecido em 2006 pela Universidade Federal de Santa Catarina em parceria com mais oito instituições de ensino superior federais e estaduais Em 2008 o curso passou a ser oferecido incluindo também o bacharelado totalizando dezoito instituições de ensino com turmas de licenciatura e bacharelado No primeiro oferecimento mais de 90 dos alunos eram surdos uma vez que o público alvo foi direcionado para a formação dos instrutores de Libras os quais eram surdos formados pelo Ministério da Educação em parceria com a FENEIS e o Instituto Nacional de Educação de Surdos Estes cursos acabaram portanto formando uma nova comunidade acadêmica em língua de sinais que antes não existia Mais de mil alunos foram formados nestes dois oferecimentos espalhados por todo o território brasileiro Pela primeira vez os surdos transitaram pelas universidades federais e estaduais do país com vagas priorizadas aos surdos com respaldo do Decreto 56262005 A prioridade às vagas aos surdos constituiu uma política afirmativa garantindo o espaço de ensino da Libras aos surdos O objetivo dos primeiros oferecimentos dos cursos estava focado na formação dos instrutores de Libras que já atuavam no ensino da Libras mas sem contar com formação de nível superior Os instrutores de Libras eram surdos formados por meio de cursos de curta duração pela FENEIS Assim os cursos de Letras Libras acabaram sendo uma porta de entrada dos surdos brasileiros para as universidades federais No Brasil as universidades brasileiras são as instituições de ensino de maior reputação e extremamente competitivas Esse fato impulsionou a cultura surda em suas diversas formas de expressão literatura filmes poesia teatro artes plásticas e artes na informática Incentivou a publicação de inúmeros artigos em livros científicos trabalhos de conclusão teses de mestrado e doutorado de autores surdos É importante compreender que até poucos anos todos os discursos sobre os surdos eram controlados concebidos e escritos por pessoas que não eram surdas É recente portanto as participações surdas que demandam cuidado para que o enfoque de nossos trabalhos acadêmicos contemplem os surdos que não fazem parte da elite surda quer seja assim considerada por dominar bem o português escrito ser bilíngue ou fazer parte de uma universidade Os contatos desses acadêmicos com as associações com os grupos esportivos e com as pessoas surdas com carência de habilidades na leitura e escrita são fundamentais para que as narrativas incluam os discursos de resistência e se produzam discursos de libertação mais elaborados O Povo Surdo através dos anos pratica e conhece sua essência mas faltavam registros de surdos enquanto protagonistas reconhecidos academicamente para que a sociedade maior acessasse suas reinvidicações A própria denominação de Cultura Surda é recente No percurso dos movimentos sociais surdos que se tornaram mais evidentes na luta pelo respeito a sua língua essa denominação foi evoluindo enquanto ia incorporando novos conceitos e novos agentes de diferentes lugares Ladd 2003 escreve que a diferença crucial entre as culturas majoritárias e as minoritárias é a de que as primeiras não tem nenhuma obrigação de explicitar as crenças que dirigem suas ações menos ainda tem de justificar sua existência Pelo contrário as segundas não apenas se exige que o façam mas além disso não disponibilizam os recursos materiais ou em grau suficiente para fazêlo por outro lado a dominação da cultura majoritária assegura que são eles quem investiga e analisa ao outro quem arquiva os informes que constituem coletivamente aquilo que o ocidente define como conhecimento 200322 Com a instauração da formação acadêmica dos surdos brasileiros esta lógica é rompida pois surdos devidamente qualificados em diferentes níveis superior graduados mestres e doutores passam a ser protagonistas das discussões sobre políticas linguísticas e educacionais no Brasil Os acadêmicos surdos conquistaram o acesso às universidades brasileiras e fizeram a diferença dentro das salas de aulas demonstrando com seus trabalhos atividades e produções acadêmicas a possibilidade de conceber o ensino de forma diferente Com isso abriramse as portas das universidades brasileiras para os surdos brasileiros As seleções nacionais por meio do Exame Nacional do Ensino Médio Enem para entrada nas universidades passou a contar com provas em Libras garantindo aos surdos realizarem a seleção em pé de igualdade dos candidatos ouvintes Os surdos passaram a integrar as universidades brasileiras em diferentes cursos de formação Porém esses espaços conquistados estão restritos às universidades e não se estendem ainda à educação básica pois nesse nível ainda mantémse a política de inclusão que se debate com as políticas linguísticas da Libras instauradas A educação básica ainda não implementou uma educação bilíngue pautada nas formas surdas de pensar a educação com base na diversidade de forma coletiva 3 Impacto do oferecimento dos cursos de Letras Libras no Brasil Os surdos brasileiros que obtiveram formação foram amplamente absorvidos para atuarem na formação de educadores em todas as universidades brasileiras Isso aconteceu e continua acontecendo porque o Decreto 56262005 obrigou a inclusão de Libras em todos os cursos de formação de professores de todas as áreas do conhecimento bem como nos cursos de fonoaudiologia A presença de surdos na academia favoreceu a formação destes professores em nível de mestrado e doutorado Só na Universidade Federal de Santa Catarina desde 2009 o Programa de Pósgraduação em Linguística já conta com 46 dissertações de mestrado e 25 teses de doutorado defendidas Nos Estudos da Tradução 57 dissertações de mestrado e 18 teses de doutorando defendidas além das que estão em andamento Destes 84 são pesquisadores surdos Somente nesta universidade é possível observar uma evolução na formação de pesquisadores da Libras e dos Estudos da Tradução focados na língua de sinais Atualmente várias universidades brasileiras estão formando outros pesquisadores em todo o país Os primeiros mestres e doutores surdos da Universidade Federal de Santa Catarina participaram ativamente na elaboração das disciplinas do primeiro e segundo oferecimento dos cursos de Letras Libras Esta presença na autoria destes cursos e na proposição das formas de ensinar e aprender dos surdos foi fundamental para garantir que o estes cursos apresentassem a perspectiva surda Todos os materiais foram apresentados em Libras assim como todo o ensino aconteceu na Libras e as avaliações também foram realizadas na Libras Pela primeira vez na universidade pública brasileira a Língua Portuguesa não configurou um fator de exclusão dos surdos pois aos alunos foi viabilizado o ensino em Libras e as avaliações em Libras Desta forma o português deixou de ser um problema na vida das pessoas surdas e passou a ser um aliado Os alunos surdos passaram a usar a Língua Portuguesa com um caráter instrumental enquanto que a Libras era usada para interagir e registrar os conhecimentos das áreas da ciência que faziam parte dos cursos O projeto político pedagógico dos cursos de Letras Libras partia da Libras Os dois primeiros oferecimentos envolveram um total de 1300 alunos dos quais 90 da primeira turma foram de surdos com formação de professores de Libras com o objetivo de oferecer formação em nível superior para os instrutores surdos No segundo oferecimento tivemos o curso de formação de professores com 450 alunos dos quais 80 foram surdos e criamos o curso com o objetivo de formar tradutores e intérpretes de LibrasLíngua Portuguesa também com 450 alunos Neste curso de bacharelado vários intérpretes de Libras que já atuavam nesta atividade foram alunos deste curso pois não contavam com formação específica na área A partir destes dois oferecimentos estabeleceuse os cursos de Letras Libras Licenciatura e Bacharelado em todo o Brasil como cursos regulares de formação de professores eou tradutores e intérpretes de Libras ambos cursos com duração de 4 anos O impacto do oferecimento destes cursos abrange questões importantes na comunidade surda entre eles destacamse os seguintes 1 Valorização e reconhecimento da Libras o fato da língua integrar um currículo de formação em nível superior na área de Letras favoreceu uma nova visão sobre a língua pois assim como as demais línguas que integram os cursos de Letras a Libras passou a integrar o conjunto de línguas que fazem parte dos cursos de formação de línguas do país A valorização e reconhecimento da Libras nos cursos de Letras Libras atribuíram um novo status à língua um status de língua importante no rol de línguas do Brasil 2 Qualificação dos profissionais que já atuavam nas áreas de ensino da Libras e de tradução e interpretação de Libras licenciados e bacharéis respectivamente 3 Potencialização do estabelecimento de redes políticas educacionais e sociais entre os exalunos dos cursos de Letras Libras Quadros Strobel e Masutti 2014 São várias as frentes em que os surdos utilizam as redes estabelecidas em todo o país para a sua organização Atualmente os surdos estão organizando vários tipos de congressos encontros cursos documentos oficiais algumas vezes com grande resistência de muitos ouvintes Por outro lado a atitude é de cooperação e depende do tipo de relação que foi construída entre surdos e ouvintes em cada local e em cada momento Observase diferenças entre as universidades brasileiras O uso das redes sociais é uma estratégia de construção de redes que empoderam os surdos As redes sociais por exemplo foram usadas para realizar uma mobilização do povo surdo em 2011 em Brasília quando mais de quatro mil surdos foram clamar pela não aprovação de um decreto que previa a imposição de um único modelo de educação inclusiva e que previa o fechamento de todas as escolas de surdos do país O resultado desta mobilização resultou na revogação deste decreto portanto uma grande conquista do povo surdo brasileiro Estas mesmas redes estão sendo usadas pelas lideranças surdas para articular um novo documento a ser encaminhado formalmente para as autoridades 4 Difusão da Libras por diferentes mídias entre elas a televisão e a internet Com a formação dos professores de Libras bem como dos intérpretes e tradutores de Libras a presença destes profissionais na mídia têm sido mais evidenciada O fato de contarmos com profissionais qualificados torna possível a contratação de profissionais para atuarem em diferentes programas Entre eles destacamse os debates políticos as vinhetas para apresentação de informações obrigatórias que precisam ser veiculadas na televisão por exemplo a informação quanto a idade de censura do programa a ser veiculado programas específicos assim por diante Também há entrevistas em programas com muita popularidade que inclui pessoas surdas com a presença de intérpretes A mídia portanto tornase uma aliada na difusão da Libras Há também algumas exigências estabelecidas pelo Decreto 56262005 que obriga a veiculação de certos programas em Libras O fato de termos profissionais devidamente formados viabiliza a execução destas exigências legais na mídia difundindo a língua 5 Formação de mestres e doutores surdos é um dos desdobramentos da formação de vários professores surdos no âmbito dos cursos de Letras Libras Vários dos exalunos tornaramse professores nas universidades brasileiras e continuaram seus estudos na área acadêmica A formação de surdos em níveis mais superiores da educação formal viabilizou a autoria surda e o empoderamento dos surdos Estes surdos que contam com qualificação participam ativamente das tomadas de decisão e planejamento das questões nas quais os surdos estão implicados enquanto civis 6 Desenvolvimento de pesquisas incluindo a presença de surdos pesquisadores Os resultados da pesquisas encerradas nas teses artigos em congressos revistas estão sendo publicados No entanto ainda percebemos que será preciso mais agressividade e um programa para descapsular esses resultados de pesquisa E a tarefa é dupla Somos poucos e há muito que fazer Ainda a Libras é pouco descrita e outras línguas de sinais brasileiras totalmente desconhecidas Urge que se formem mais pessoas e que ao mesmo tempo ao lado da produção para o mundo acadêmico se produza também em linguagem acessível para os professores para o leitor comum O conhecimento é a melhor e talvez única forma de se vencer o preconceito E ainda há muitos preconceitos e equívocos com a relação às línguas de sinais Nos últimos anos os trabalhos de pesquisadores brasileiros estão conquistando alguns programas de pósgraduação dando visibilidade à entrada dos alunos surdos avançando nas publicações de resultados importantes de pesquisas contamos com livros artigos e algumas coletâneas de artigos em Linguística e Libras Tradução e Interpretação de LibrasLíngua Portuguesa e Educação de Surdos e outros periódicos nacionais tais como a Revista Leitura Cadernos de Tradução e também o Portal de Libras que reúne uma documentação da Libras httpportallibrasufscbr Esses novos profissionais têm demandado juntamente com suas comunidades surdas uma formação específica que lhes permita concluir a escolarização básica e obter uma formação em magistério de modo que possam exercer uma educação qualificada em benefícios das crianças surdas Essa formação específica está delineada na legislação que trata do direito dos surdos a uma educação bilíngue diferenciada dos demais segmentos da comunidade surda Nessa legislação garantese que os professores possam ter essa formação em serviço ou seja paralelamente à sua atuação em sala de aula e concomitante à sua formação básica Isto pode ser confirmado com o texto da Lei de Libras nº 104362002 e reiterado no Relatório do Grupo de Trabalho designado pelas Portarias nº 10602013 e nº912013 que apresenta subsídios para a Política Linguística de Educação Bilíngue Língua Brasileira de Sinais e Língua Portuguesa A formação de professores de Libras de Língua Portuguesa como L2 de tradutores e intérpretes é fundamental para formar profissionais para atuarem na educação básica Essas formações devem ser garantidas em nível superior licenciatura e bacharelado e enquanto formação continuada para os professores que já estejam atuando na educação básica e superior Os cursos de graduação envolvem a Pedagogia Bilíngue que forma o professor bilíngue de atuar na educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental os cursos de Letras Libras licenciatura que forma professores de Libras para atuar no ensino da Libras na educação básica e nível médio e bacharelado que forma tradutores e intérpretes de Libras e Língua Portuguesa O Curso de Língua Portuguesa como L2 deve ser oferecido para formar os professores que atuarão tanto na educação básica como no nível superior Assim é de se esperar que produzam efeito nas práticas dos sistemas de ensino no que diz respeito à qualificação de seus quadros para atuarem nas escolas bilíngues e as universidades Passo importante neste sentido tem sido dado por várias organizações de professores e vários movimentos de surdos pressionando os sistemas de ensino para a elaboração de propostas e programas de formação não só em nível superior mas também em nível médio e nível básico No caso específico da formação de tradutores e intérpretes a formação apresenta os princípios e pontos básicos que se aplicam a este profissionais indicados pela Convenção da ONU que são os seguintes reconhecer a equivalência do status da língua de sinais e da língua falada respeitar e promover as línguas de sinais reconhecer e apoiar a identidade cultural e linguística dos surdos incluindo línguas de sinais e cultura surda reconhecer a importância para os surdos de sua autonomia e independência individuais incluindo a liberdade de fazer suas próprias escolhas reconhecer que as pessoas surdas devem ter a oportunidade de participar ativamente nos processos de tomada de decisão sobre políticas e programas incluindo aqueles diretamente relacionados a elas respeitar as capacidades em evolução das crianças surdas e respeitar o direito de preservar suas identidades consultar as organizações representativas dos surdos sobre questões que lhes digam respeito Os cursos de Letras Libras representaram um marco importante na formação de professores surdos no Brasil Atualmente está também formando tradutores e intérpretes surdos entre os ouvintes bilíngues É um grande avanço na formação na área de Libras Os impactos observados desdobramse em outras instituições pois servem de referência para todo o Brasil 4 Diversidade e inclusão Como vimos até agora diversidade e inclusão são termos usados amplamente nas propostas educacionais que direcionam as políticas educacionais no Brasil A própria Convenção dos Direitos da Pessoas Deficientes utilizam estes termos para discutir a educação mais especificamente a educação de surdos Os documentos oficiais a legislação vigente que já discutimos até aqui apresentam tais conceitos no entanto de forma individualizada Os documentos oficiais vem tratando da inclusão a partir da educação para todos a partir da compreensão de que cada um deve ter respeitado e acesso garantido a educação O todos e cada um têm sido um problema na educação de surdos O todos acaba dissolvendo as diferenças surdas que são importantes para a sua efetiva inclusão na sociedade e cada um envolve uma compreensão individualizada de cada pessoa e de suas necessidades para ser incluída No entanto no caso dos surdos o todos invisibiliza o todos surdos em favor de todas pessoas na sociedade E cada um foca no indivíduo surdo como aquele que precisa de acesso a comunicação simplificando a questão da língua ao acesso na língua de sinais muitas vezes por meio de um intérprete de língua de sinais Estas compreensões estão imersas em uma educação a partir da diversidade A diversidade como vem sendo compreendida a partir da educação inclusiva então passa a ser vista como a garantia de todos serem incluídas no sistema educacional tendo as suas diversidades respeitadas enquanto pessoas individuais Nesta linha de pensamento a educação inclusiva planeja a educação em todas as escolas públicas com a garantia de acesso a todas diversidades sendo respeitados os direitos de todos de acesso à educação Quando o aluno chega na escola ele é visto como um indivíduo que precisa ter suas necessidades atendidas No caso dos surdos ao chegar na escola a questão da língua é colocada e para isso a recomendação tem sido a garantia da presença do intérprete de língua de sinais para que ele tenha acesso à educação compreendida então como bilíngue Ou seja este aluno surdo terá os conteúdos escolares mediados pelo intérprete de língua de sinais e terá acesso a educação na Língua Portuguesa Essa simplificação tem levado ao fracasso escolar das crianças surdas incluídas nas escolas regulares assim como a sua exclusão da educação e da sociedade Portanto é uma educação inclusiva fracassada Quando analisamos a Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência 2007 o documento estabelece de forma objetiva que a língua de sinais precisa ser garantida enquanto direito humano E mais importante ainda reconhece e explicita que o acesso as pessoas surdas em igualdade de condições com as demais pessoas tenham reconhecidas sua identidade cultural e linguística incluindo as línguas de sinais e a cultura surda As pessoas com deficiência farão jus em igualdade de oportunidades com as demais pessoas a que sua identidade cultural e linguística específica seja reconhecida e apoiada incluindo as línguas de sinais e a cultura surda Artigo 304 grifo da autora Também estabelece que os surdos precisam ter garantido o acesso a diferentes espaços com a presença de intérpretes de língua de sinais Ao reconhecer a identidade cultural e linguística assim como a cultura surda há um reconhecimento do grupo social de surdos Identidade cultura e língua são constituídos na relação entre os seus iguais para se estabelecer o que é comum o que é compartilhado Assim a comunidade surda que envolve o agrupamento de pessoas surdas em espaços comuns que proporcionem interação são fundamentais Compreender diversidade enquanto diferença é fundamental e inclusão a partir do coletivo é garantir a cidadania enquanto direito humano Quadros em elaboração discute estes termos no contexto da educação brasileira a partir das reflexões de Kusterns et al 2015 Kusters et al 2015 discutem as vantagens e desvantagens do uso do termo diversidade para a implementação de políticas voltadas para os surdos Vantagens a Consciência sobre múltiplas diferenças na sociedade b Novas lentes na cultura e humanidade c Diferentes tipos de diferença d Reconhecimento da multiplicidade e interseccionalidade e Evitação do essencialismo e a superespecificação Desvantagens a Nomeia pessoas que estão fora das normas da sociedade b Reforça a ideia de força binária normalanormal c Ofusca exclusão social política e econômica d Muda o foco de atenção de desigualdade para medidas de sentirse bem ao invés de pensar em melhorias reais das condições estruturais A inclusão a partir da compreensão da diversidade surda pode apresentar a perspectiva de incorporar as vantagens do uso do termo diversidade ou seja ter consciência sobre o que significa ser surdo enquanto parte da comunidade surda compreender que a cultura e a humanidade conta com diversas formas de se traduzirem atentar para a língua de sinais enquanto uma língua diferente e possível usada pelos surdos brasileiros das comunidades surdas brasileiras dos grandes centros urbanos brasileiros reconhecer a multiplicidade de culturas e identidades existentes entre elas a identidade e culturas surdas e evitar o essencialismo do igual e a superespecificação do que seria o comum são importantes para a inclusão dos surdos na sociedade brasileira A inclusão neste sentido estabelecida enquanto parte das formas da sociedade interagir com os diferentes grupos sociais que a integram Todos neste sentido precisam ser incluídos mas não individualmente Todos precisam ser incluídos enquanto composição de diferentes grupos socioculturais e linguísticos tornando a inclusão muito mais dinâmica e eclética Considerando os cursos de Letras Libras na Universidade Federal de Santa Catarina a diversidade e a inclusão tiveram outra roupagem que permitiu formas muito mais criativas de garantir o acesso dos surdos à educação superior A diversidade neste contexto foi traduzida pelo reconhecimento da Libras de forma coletiva Esta diversidade presente na concepção e implementação destes cursos foi contemplada com seus autores que também eram surdos Estes surdos mestrandos mestres doutorandos e doutores alunos impactaram de forma acertada as formas de ensinar e aprender a partir da perspectiva surda Todas as equipes que foram formadas para elaborar os materiais e oferecer os cursos integraram pessoas surdas Esta inclusão garantiu a diferença a diversidade Isso foi possível exatamente porque os surdos compreendidos enquanto um coletivo não individualmente integraram todo o processo destes cursos 5 Agenda para o futuro A presença da Libras em encontros científicos congressos reuniões de associações científicas simpósios etc tem aumentado muito nos últimos dez anos Ela tem lugar cativo na Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência SBPC e na Associação Brasileira de Linguística Abralin por meio do Grupo de Trabalho Libras na Associação Nacional de Pesquisas e PósGraduação em Letras e Linguística Anpoll há mais 20 anos um grupo de trabalho que reúne periodicamente pesquisadores da área com a apresentação e discussão de trabalhos e resultados de pesquisa e com discussão de políticas de pesquisa em nível nacional Os cursos de Letras Libras formaram e estão formando vários alunos surdos além de romper com a ideia de que a seleção e a avaliação de alunos perpassa a Língua Portuguesa A compreensão da diversidade surda foi inaugurada por meio de várias ações nos últimos anos inclusive pelo oferecimento dos cursos de Letras Libras que permitem a realização de seleções e avaliações na própria língua de sinais A partir disso várias instâncias começaram a implementar estas ações atentando para a diferença surda o Enem os concursos públicos vários programas de circulação nacional são oferecidos também na Libras Desta forma os surdos começam a ser efetivamente incluídos reconhecido enquanto parte de um grupo social a comunidade surda A Convenção dos Direitos das Pessoas Deficientes passa então a fazer sentido e impactar na vida dos surdos por meio da compreensão da diversidade enquanto diferença de um grupo sociocultural e linguístico que conta com uma língua de sinais identidade e cultura surda A partir disso a compreensão da inclusão necessariamente precisa tomar outra forma buscando ser realizada efetivamente a partir de grupos sociais enquanto parte da comunidade surda Isso significa compreender a educação de surdos a partir do agrupamento de surdos do encontro surdosurdo como base da garantia de acesso à educação com base nos direitos humanos das pessoas surdas Colocamos os principais pontos críticos que devem ser enfrentados para que se possam delinear projeções de desenvolvimento 1 Garantir condições para a implementação da Educação Bilíngue de Surdos a partir da compreensão da diversidade enquanto diferença sociocultural e inclusão como a possibilidade de agrupar os surdos para garantir que a língua de sinais aconteça por meio da interação social e cultural das crianças surdas pares surdos e o contato com referências surdas no âmbito escolar 2 Viabilizar a disseminação da língua de sinais em todos os espaços escolares em especial nas escolas bilíngues para surdos e classes bilíngues 3 Continuar o investimento na formação de pesquisadores e autores surdos 4 Manter reforçar e ampliar o apoio dos órgãos de fomento à pesquisa e à formação 5 Criar bancos de dados que reúnam informações sistematizadas sobre instituições programas de formação projetos de investigações pesquisadores publicações que disseminem as línguas de sinais 6 Criar redes que liguem instituições e pesquisadores de modo a permitir uma troca constante discussões atualizações planejamento de investigações Considerações finais Constatamos que a Educação Bilíngue de Surdos ainda não adquiriu o status de prioridade na agenda política dos governantes pois é evidente a resistência por parte do poder público diante das compreensões equivocadas a respeito do que representa inclusão no contexto de educação brasileira Sabemos da complexidade que envolve a Educação Bilíngue de Surdos e dos desafios a serem enfrentados mas com o atual Plano Nacional de Educação estes desafios precisam ser enfrentados juntamente com as lideranças e intelectuais surdos As representações dos surdos por meio da Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos FENEIS bem como os intelectuais que representam as pesquisas atuais no campo da educação de surdos e linguística das línguas de sinais incluindo mestres e doutores surdos devem ser chamados pelos agentes das políticas públicas para implementar a educação bilíngue no Brasil Inúmeros desafios devem ser superados para que se efetive na prática a escola preconizada pela Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência e a legislação brasileira que prevê a educação bilíngue de modo que as escolas bilíngues de surdos estejam a serviço dessas comunidades surdas brasileiras O grande passo que os agentes educacionais precisam tomar envolve a participação efetiva da comunidade surda para o planejamento desta implementação tanto em relação a educação bilíngue em si como também em todas as questões que envolvem os direitos das pessoas surdas entre eles o acesso aos diferentes espaços sociais por meio da presença de profissionais tradutores e intérpretes de Libras e Língua Portuguesa Também será importante o apoio às ações que envolvam a produção de materiais em Libras que devem partir de um planejamento de corpus da Libras Assim como os materiais que requerem a elaboração de métodos formais de aprendizado de Libras como primeira e segunda língua assim como da Língua Portuguesa adequados para a aquisição de uma segunda língua Sustentamos que se faz necessária a união de surdos e ouvintes para que inovações consistentes por meio de caminhos que não sejam apenas aqueles das discussões das evidências mas por meio de estratégias de negociação postas em prática atentas às diversidades implicadas pela Libras identidades e culturas surdas para se garantir a verdadeira inclusão que permite aos surdos exercerem a cidadania de forma efetiva na sociedade brasileira Referências Annelies Kusters Maartje De Meulder Michele Friedner Steve Emery 2015 On diversity and inclusion Exploring paradigms for achieving Sign Language Peoples rights MMG Working Paper 1502 Allen Colin 2016 WFD Position paper on the language rights of Deaf children no prelo Allen Colin 2018 WFD Position Paper on Inclusive Education httpwfdeaforgnewsresources5june2018wfdpositionpaperinclusiveeducation Brasil Decreto no 5626 de 22 dez 2005 Regulamenta a Lei no 10436 de 24 de abril de 2002 que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais Libras e o art 18 da Lei no 10098 de 19 de dezembro de 2000 Diário Oficial da União Brasília 23 de dez 2005 Brasil Plano Nacional de Educação 20142024 Lei nº 13005 de 25 de junho de 2014 que aprova o Plano Nacional de Educação PNE e dá outras providências Brasília Câmara dos Deputados Edições Câmara 2014 Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência 2007 Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência Decreto Legislativo no 186 de 09 de julho de 2008 Decreto no 6949 de 25 de agosto de 2009 4 ed Revisada e atualizada Brasília Secretaira de Direitos Humanos Secretaia Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência 2011 Disponível em httpwwwpessoacomdeficienciagovbrappsitesdefaultfilespublicacoesconvencaop essoascomdeficienciapdf Cormier K Schembri A Vinson D Orfanidou E 2012 First language acquisition differs from second language acquisition in prelingually deaf signers evidence from sensitivity to grammaticality judgement in British Sign Language Cognition 1241 5065 Ladd Paddy Understanding Deaf Culture In Search of Deafhood Celevedon England Multilingua Matters p 528 2003 FENEIS Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos Nota Sobre Educação de Surdos na Meta 4 do PNE Rio de Janeiro 2013 Freel BL Clark MD Anderson ML Gilbert GL Musyoka MM Hauser PC 2011 Deaf individuals bilingual abilities American Sign Language proficiency reading skills and family characteristics Psychology 2 1823 Grosjean F 2008 Studying bilinguals Oxford UK Oxford University Press Jonhson RE Liddell SK Erting CJ 1989 Unlocking the curriculum Principles for achieving access in deaf education Working Paper 893 Washington DC Gallaudet Research Institute Gallaudet University Ludago TB 2014 Signed language proficiency and reading 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bilinguismo e Educação de Surdos 1edPorto Alegre Mediação 2012 v 1 p 113124 Strong M Prinz P 2000 Is American Sign Language skill related to English literacy In Chamberlain C Morford J P Mayberry R editors Eds Language acquisition by eye pp 131142 Mahwah NJ Lawrence Erlbaum Publishers Tang G Lam S Yiu KMC 2014 Language development of deaf children in a sign bilingual and coenrollment environment in Marschark M Tang G Knoors H Bilingualism and Bilingual Deaf Education Oxford Scholarship Online pp 313341 Thoma Adriana da Silva etal Relatório sobre a Política Linguística de Educação Bilíngue Língua Brasileira de Sinais e Língua Portuguesa Disponível em httpwwwbibliotecadigitalunicampbrdocumentdown56513 Acesso em 20 de jul de 2014 Trezek BJ Wang Y Paul PV 2010 Reading and deafness Theory research and practice Clifton Park NY Delmar Cengage Learning