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Aula 8 Luiz Eduardo Oliveira José Augusto Batista dos Santos AMERICANISMO E EUROPEÍSMO O MITO DOS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA META Apresentar a o modo como os discursos sobre os Estados Unidos fizeram com que emergisse um mito da América do Norte tida como terra da liberdade e das oportunidades OBJETIVOS Ao final desta aula o aluno deverá Compreender de maneira crítica a constituição dos discursos e narrativas sobre os Estados Unidos da América mediante um jogo de exclusões e inclusões Reconhecer e identificar os elementos discursivos constitutivos da mitologia da América como terra da liberdade PRÉREQUISITOS Familiaridade com os períodos formativos da literatura norteamericana Conceitoschave da Teoria da Literatura e da história literária 98 Literatura de Língua Inglesa III O termo americanismo de acordo com Arnavon foi inicialmente empregado com uma conotação negativa pois fazia alusão àquilo que era avesso à civilização leiase Europa e remetiase a uma localização geo gráfica específica que curiosamente não incluía o território das excolônias inglesas Sua primeira aparição data do ano 1846 num artigo intitulado De laméricanisme et dês republiques du sud que como sugere o título fazia referência às repúblicas do sul isto é à América Latina Posteriormente o termo assumiria outras acepções como a que consta do Grand Larousse de La langue française onde é descrito como sendo uma espécie de emulação da maneira de ser dos americanos apud WARDE 2011 p 1 Há no entanto outros sentidos alguns mais recentes do que aqueles acima citados os quais não podem ser esquecidos quando se tem como objetivo uma reflexão mais detida acerca do americanismo Entre os no mes mais evocados para lidar com a matéria está o de Antônio Gramsci 18911937 que dentre outros assuntos dedicouse à discussão desse fenômeno num de seus Cadernos do cárcere Para ele o termo americanismo estava indissociavelmente atrelado a um sistema de produção específico o fordismo o que por si só lhe confere um significado diverso daquele atribuído nos contextos mencionados anteriormente Tal fenômeno pre tendia ser responsável pela elaboração de um novo tipo humano confor me o novo tipo de trabalho e processo produtivo GRAMSCI 2008 p 42 Tamanha era a sua relevância que é possível afirmar que para o autor italiano o desenvolvimento do sistema de produção fordista dependia da disseminação do americanismo Essa interdependência entre americanismo e fordismo tornase mais evidente à medida que Gramsci avança em sua reflexão Segundo ele o novo sistema de produção reclamava também um novo tipo de trabalhador cuja vida deveria se adequar aos novos ritmos e lógicas da fábrica Assim a racionalização ou disciplinarização da vida do operariado contribui para o aumento da produção tornandose portanto uma necessidade inadiável para o desenvolvimento do sistema Daí a importância do fenômeno do americanismo que seria responsável pela mudança de hábitos ou pela cria ção de um novo modo de vida afinado com a nova conjuntura econômica que se estabelecia Tal modo de vida já havia se formado historicamente nos Estados Unidos Aliás ele era característico deste país o que significa dizer que todas as vezes que Gramsci fazia referência ao americanismo não havia dúvida sobre a que nação este termo aludia INTRODUÇÃO 99 AMERICANISMO E EUROPEÍSMO o mito dos Estados Unidos Aula 8 DESENVOLVIMENTO Para explicar o porquê da resistência encontrada pelo americanismo em algumas regiões da Europa Gramsci revela que há uma condição preliminar de cuja existência o americanismo dependia para se instalar e se desenvolver em sua forma mais completa Essa condição consistia na inexistência de classes parasitárias isto é de classes que não possuíssem nenhuma função na esfera produtiva Quanto mais numerosas fossem tais classes mais resistência se criava para a introdução do americanismo A Europa em razão de sua formação histórica possuía tais classes como escreve Gramsci 2008 p 3435 A tradição a civilidade europeia por sua vez distinguese justamente por tais classes criadas pela riqueza e complexidade da história pregressa que deixou um acúmulo de sedimentações passivas graças aos fenômenos de saturação e fossilização do funcionalismo e dos intelectuais do clero e da propriedade da terra do comércio de rapina e do exército a princípio profissional e depois obrigatório mas de todo modo profissional e ofi cialmente Pode se dizer enfim que quanto mais vetusta é a história de um país tanto mais numerosas e onerosas são as sedimentações dessa massa de vagabundos e inúteis que vivem do patrimônio dos avós pensionistas da história econômica O fato de a América não possuir essas particulari dades explica segundo o autor o rápido desenvolvimento do fordismo e a organização da vida social em torno do trabalho produtivo Ou seja as condições históricas eram favoráveis nos Estados Unidos ao estabeleci mento e consolidação desse novo modo de produção Outro traço característico do americanismo apontado por Gramsci consiste na presença de iniciativas puritanas por parte dos industriais americanos que visavam à conservação fora do trabalho de um certo equilíbrio psicofísico que impeça o colapso fisiológico do trabalhador premido pelo novo método de produção GRAMSCI 2008 p 70 Com efeito o modo de vida do novo tipo de trabalhador que o fordismo recla mava deveria como já dito anteriormente adequarse às necessidades do trabalho fordizado Para que fosse efetiva tal adequação precisaria incluir âmbitos da vida privada do operariado inclusive aquelas áreas consideradas impenetráveis como a sexual e que dificilmente se esperaria que fossem tomadas como áreas de interesse dos industriais Em Gramsci o proibicionismo está intimamente associado à racio nalização do trabalho nos Estados Unidos Nesse sentido para que o trabalhador se tornasse compatível com o novo modo de produção era necessário que ele mantivesse sua eficiência física muscular e nervosa por isso a preocupação dos industriais em adotar medidas que proibis sem o consumo de álcool pelo operariado Um trabalhador que gastava seu salário com álcool agredia sua integridade física de tal modo que seu 100 Literatura de Língua Inglesa III vício acabaria afetando sua eficiência na fábrica Semelhantemente a se xualidade dos trabalhadores também se tornou uma área de interesse dos industriais uma vez que o abuso das funções sexuais exauria as energias que deveriam ser conservadas para o trabalho produtivo daí a defesa da monogamia Como escreve o autor parece claro que o novo industria lismo quer a monogamia quer que o homemtrabalhador não desperdice as suas energias na procura desordenada e excitante da satisfação sexual ocasional GRAMSCI 2008 p 73 Assim todas essas iniciativas travestidas de uma moralidade inspirada no puritanismo tradicional longe de visarem promover a espiritualidade dos trabalhadores eram na verdade estratégias através das quais os industriais poderiam racionalizar todos os aspectos da vida do trabalhador de modo que este se tornasse compatível com a nova lógica de produção Em outros termos alguns elementos da ética puritana foram submetidos ao novo mo delo produtivo o que contribuiu para sua própria consolidação O america nismo a que Gramsci se refere possuía traços característicos daquela ética Longe de ser insignificante esse traço cultural de inspiração puritana do americanismo tem suas raízes no protestantismo ascético de orientação calvinista A fim de melhor compreender tal relação parece oportuno tecer algumas considerações acerca da obra do sociólogo alemão Max Weber 18641920 A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo publicada originalmente em forma de artigos entre os anos de 1904 e 1905 Grosso modo nela o autor busca mostrar como e em que medida a ética protestante contribuiu para a formação do que chamou de espírito do capitalismo necessário para a consolidação e desenvolvimento do capitalismo moderno Antonio Gramsci 18911937 foi um filósofo marxista jornalista crítico literário e político italia no Escreveu sobre teoria política sociologia antropologia e linguística Foi membrofundador e secretáriogeral do Partido Comunista da Itália e deputado pelo distrito do Vêneto sendo preso pelo regime fascista de Benito Mussolini Gramsci é reconhecido principalmente pela sua teoria da hegemonia cultural que descreve como o Estado usa nas sociedades ocidentais as instituições culturais para conservar o poder Fontes httpsuploadwikimediaorgwikipediacommons thumbee6Gramscipng200pxGramscipng 101 AMERICANISMO E EUROPEÍSMO o mito dos Estados Unidos Aula 8 Cumpre advertir entretanto que não é o objetivo desse escrito revisitar a análise empreendida por Weber em sua completude mas antes trazer a lume apenas aqueles elementos que se mostram relevantes para uma compreen são mais acurada da relação entre americanismo e protestantismo ascético O entendimento do que viria a ser o espírito do capitalismo em sua acepção weberiana parece ser imperativo visto que ele está de algum modo presente no fenômeno do americanismo Se em Gramsci tal fenômeno é traduzido como um modo de vida vinculado a um sistema de produção capitalista específico em Weber 2004 ele apresenta um elemento consti tutivo importante qual seja uma ética do trabalho que tem suas origens na concepção ascética das correntes protestantes sobretudo do calvinismo muito embora essa referência marcadamente religiosa tenha se apagado com o tempo restando apenas os efeitos por ela produzidos a organização da vida em torno do trabalho produtivo Ao tentar conceituar o termo espírito do capitalismo Weber 2004 p 42 ciente das dificuldades que tal empenho implicava buscou fazê lo inicialmente através da alusão a algumas passagens de documentos que segundo ele foram escritos sob a influência daquele espírito Tais documentos eram o Advice to a Young Tradesman 1748 Conselho a um Jovem Comerciante e Necessary Hints to Those that Would Be Rich 1736 Sugestões Necessárias Àqueles que Querem ser Ricos ambos de Benjamin Franklin Tais escritos foram usados como exemplo ideal para a ilustração do que Weber queria dizer com a expressão acima citada e foram obras de quem curiosamente figura entre os chamados Founding Fathers Pais Fundadores expressão usada para se referir ao grupo de signatários da Declaração de Independência que se consagrou pela suposta importância que tiveram na criação dos Estados Unidos e na Revolução que a prece deu o que segundo Raphael 2006 p 160 digase de passagem nega o protagonismo a quem realmente o merece povo sem o qual a Revolução e tudo que ela significou não teria sido possível Weber evidencia como o trabalho era visto pelos calvinistas Para estes tudo existia para a autoglorificação de deus Desse modo por extensão a vida do cristão também deveria atender a esse fim através do cumprimen to de seus mandamentos no mundo Sendo assim o amor ao próximo assumia uma conotação específica a de que ele devia ser praticado exclu sivamente para a glória de deus e podia ser levado a efeito por meio do trabalho numa profissão WEBER 2004 p 99 Há ainda outro fator que deve ser mencionado para que se compreenda o lugar que o trabalho passou a ocupar na visão calvinista do mundo Esse fator está ligado à principal característica dessa corrente a saber a doutrina da predestinação Tal doutrina afirmava que deus havia desde a fundação do mundo eleito os seus os quais estavam predestinados à salvação Noutros termos significava dizer que parte da humanidade se salvaria e outra parte 102 Literatura de Língua Inglesa III estaria inevitavelmente sentenciada à perdição Afora o coroamento que tal ensinamento significou no processo de desencantamento do mundo visto que repudiava como superstição e sacrilégio todos os meios mágicos de busca da salvação WEBER 2004 p 96 ele também foi responsável pelo aparecimento de uma interrogação que por sua importância passou a ter a primazia na vida dos fieis como ter a certeza da eleição ou do seu estado de graça Para Calvino o fiel deveria contentarse em cumprir os mandamentos de deus e perseverar com a fé verdadeira em Cristo até o fim Somente aí ele tomaria conhecimento de seu estado de graça Dito de outro modo não seria possível ter certeza do seu estado de graça em vida e menos possível ainda seria identificar baseado em sinais externos um eleito pois segundo ele este pode em nada diferir externamente de um nãoeleito Visto que atra vés dessa orientação não era possível alcançar a certeza da eleição surgiram outras Uma delas era que o considerarse eleito tornavase um dever daí a autoconfiança característica dos puritanos A maneira através da qual se poderia alcançar essa autoconfiança e eliminar toda e qualquer dúvida era por meio do trabalho profissional sem descanso WEBER 2004 p 102 Isso se dava porque diferentemente do que acontecia no luteranismo onde a certeza do estado de graça se dava através da unio mystica com a divindade isto é de um sentimento de unidade com o divino que o crente experimentava em sua alma no calvinismo tal certeza poderia ser alcançada através da verificação se deus agia através do indivíduo Ou seja ser uma ferramenta de deus no mundo tornouse uma forma do crente se certificar do seu estado de graça Isso explica porque a vida religiosa do calvinista baseavase na ação ascética em vez da cultura mística do sentimento como era a tendência dos luteranos WEBER 2004 p 102103 Uma das consequências dessa busca incessante pela certeza do estado de graça foi a racionalização da vida do fiel em torno do trabalho profissio nal Não seria exagero afirmar que a doutrina calvinista contribuiu para a formação de uma percepção dentro da qual toda a vida do cristão deveria organizarse em função do trabalho que deveria ser exercido com vistas à glorificação de deus Era desse tipo de disposição mental de que o capi talismo necessitava para se desenvolver e quem ajudou a forjála segundo Weber foi a ética do protestantismo ascético Com efeito são observáveis as relações entre essa ética e o modo de vida característico do americanismo tal como apontou Gramsci o que como se pode ver não se resume às medidas proibicionistas mas abrange também a racionalização de todas as esferas da vida do indivíduo Essa racionalização que se mostrou fundamentalmente necessária para o desenvolvimento do capitalismo moderno já se operava nos lugares onde o calvinismo havia chegado o que revela Weber explica o rápido crescimento de empreendi mentos capitalistas nessas regiões 103 AMERICANISMO E EUROPEÍSMO o mito dos Estados Unidos Aula 8 É possível afirmar portanto que o modo de vida que se tornou ca racterístico do americanismo possui traços do ascetismo protestante Ao contrastar os calvinistas aos luteranos Weber 2004 p 116 faz alusão aos angloamericanos de sua época os quais até mesmo na fisionomia se acham sob o signo da anulação radical da espontaneidade do status natura lis o que causava estranhamento nos alemães entre os quais o luteranismo havia tido mais adesão Em outros termos a racionalização da vida se fazia ver até mesmo fisionomicamente fato que Weber associa à influência do calvinismo na conduta de vida dos habitantes da América do Norte Com o tempo os traços religiosos da ética sobre a qual se fundou essa conduta de vida racionalizada foram apagados transformando a ascese pro testante intramundana em puro utilitarismo WEBER 2004 p 166 o que de certa maneira pode ajudar a explicar o pragmatismo que supostamente se tornou a marca registrada da sociedade norteamericana frequentemente caracterizada por sua exaltação ao trabalho e por ser altamente pragmática TOCQUEVILLE E A MITIFICAÇÃO DOS ESTADOS UNIDOS Temos agora ocasião para fazer referência a outro autor de cuja obra não poderíamos prescindir em uma exposição que tem como objeto a te mática do americanismo Apesar de não tratar do conceito de americanismo em termos específicos visto que nela não se encontra tal denominação sua leitura é de significativa relevância na medida em que contribui para a compreensão de uma das definições atribuídas ao termo no início deste escrito a saber a que consta do Grand Larousse de La langue française que o descreve como sendo a imitação da maneira de ser dos americanos Nela o autor oferece um olhar analítico sobre os costumes e as leis dos angloamericanos o que nos permite entender melhor o que viria ser ou a que se refere a expressão a maneira de ser usada na definição há pouco citada Não menos relevante se mostra essa obra para o entendimento do sentido que ainda será apresentado através do qual o termo em questão também pode ser tomado Há que se destacar também que pela repercussão que provocou inicialmente na França e depois no resto do continente a obra em questão contribuiu significativamente para a construção da imagem dos Estados Unidos na Europa Com efeito seu autor fez conhecer os Estados Unidos às nações europeias e nesse esforço parece ter pintado um quadro no qual as excolônias inglesas são descritas por meio de afirmações por vezes generalizantes e homogeneizantes que embora sejam aplicáveis sob circunstâncias específicas acabam por escamotear as mazelas e apagar as diferenças e contradições que lá se faziam ver criando desse modo uma imagem mitificada dos Estados Unidos que servirá de inspiração para o 104 Literatura de Língua Inglesa III surgimento de um americanismo míope às incongruências daquele país É também nesse sentido que essa obra contribui para deixarmos clara a acepção que queremos atribuir ao termo de que viemos nos ocupando até agora Por essa razão faremos alusão a alguns elementos que nos ajudarão a compreender o que segundo a obra em apreciação tornouse caracterís tico dos Estados Unidos ao mesmo tempo em que apontaremos quando possível as contradições ou apagamentos que alguns deles implicam A obra a que nos referimos se chama A Democracia na América 2005 de Alexis de Tocqueville 18051859 um aristocrata francês Fruto de uma viagem aos Estados Unidos realizada nos idos de 1831 ela consiste como se pode notar a partir de sua leitura num esforço para compreender as causas que concorriam para a manutenção da democracia na América através da análise dos costumes leis e instituições do povo norteamericano É justamente por oferecer uma análise de elementos tão importantes para definição do caráter de um povo que ela nos interessa sobretudo naquilo que se refere aos costumes AlexisCharlesHenri Clérel visconde de Tocqueville dito Alexis de Tocqueville 18051859 foi um pensador político historiador e escritor francês Tornouse célebre por suas análises da Revolução Francesa cuja pertinência foi destacada por François Furet da democracia americana e da evolução das democracias ocidentais em geral Raymond Aron pôs em evidência sua contribuição à socio logia Fonte httpsuploadwikimediaorgwikipediacommonsaaaAlexisdetocquevillejpg Tocqueville também apresenta algumas características das excolônias inglesas que são igualmente importantes para a apreensão do modus vivendi daqueles a quem se referiu sob a denominação de angloamericanos e que de certo modo não estão separadas dos costumes no sentido que ele dá a este termo Antes de mencionarmos tais características no entanto 105 AMERICANISMO E EUROPEÍSMO o mito dos Estados Unidos Aula 8 já cabe aqui uma consideração acerca do caráter excludente da linguagem utilizada pelo autor A expressão angloamericano é empregada com notável regularidade ao longo de sua exposição Entretanto ela parece ser demasiadamente restritiva uma vez que ignora outras comunidades a exemplo da indígena e negra que não apenas dividiram o espaço com os imigrantes como também participaram no caso desta última no processo de formação da própria nação americana É essa ideia de que o povo da América consistia no tipo anglosaxão branco e de orientação protestante que prevalecerá no imaginário das pessoas e dará origem a uma América mitificada como foi o caso do mito da Inglaterra em Portugal segundo demonstrou Oliveira 2014 Dito isto avancemos Uma das características de que falamos acima e que que saltam aos olhos do aristocrata francês é o fato de os Estados Unidos serem essen cialmente democráticos Esse traço definidor segundo diz estava presente desde a fundação das colônias e havia se tornado ainda mais evidente à sua época A igualdade reinava entre os imigrantes escreveu Fazendo referên cia aos primeiros europeus que se estabeleceram na Nova Inglaterra ele afirma que o próprio germe da aristocracia não foi depositado nessa parte da União O povo participava tão ativamente na tomada de decisões que Tocqueville diz que ele reina sobre o mundo político americano como Deus sobre o universo TOCQUEVILLE 2005 p 5668 Esse estado social democrático dos americanos se tornará uma marca da jovem nação que como coloca Furet 2005 p XL era para Tocqueville uma democracia pura um caso sui generis portanto visto que esta se desenvolveu em um continente que não herdou os resquícios dos antigos regimes que vigoraram na Europa e que poderiam lhe opor resistência ou lhe mudar a constituição Diante de tal descrição um leitor não poderia formar outra ideia dos Estados Unidos senão a de que estes constituíam uma nação na qual a de mocracia e a igualdade funcionavam como em nenhuma outra Apesar de ser aplicável sob circunstâncias muito específicas a descrição mais esconde do que revela O princípio de igualdade por exemplo que viria a se tornar uma característica do estado social da América inglesa de modo algum se estendia aos índios os quais eram vistos pelos brancos como obstáculos à colonização não como justos proprietários RAPHAEL 2006 p 265 Nem àqueles vitimados pela escravidão que estavam longe de serem con siderados seus iguais O mesmo pode ser dito em relação à democracia que parecia estar circunscrita a um grupo específico o qual sob o disfarce da palavra povo que se referia ao branco protestante e anglosaxão participava na tomada de decisões Certamente a palavra povo assim como todos quando empregada na obra em questão esconde o fato de que são paradoxalmente mais excludentes do que parecem ser à primeira vista uma vez que não se referem aos grupos acima citados Outro traço que chama a atenção de Tocqueville na forma de governo dos angloamericanos é a descentralização administrativa A União não 106 Literatura de Língua Inglesa III se imiscuía nos negócios que diziam respeito a cada Estado em específico e estes procuravam se manter fora das questões relativas aos condados que por sua vez não interferiam na administração da comuna O mais importante acerca de tal descentralização são os efeitos que ela provocava dentre os quais estava o fortalecimento da cidadania através da participação política dos cidadãos nas decisões locais Desse modo segundo o autor o americano era bastante ativo politicamente visto que participava entusias madamente nas questões referentes à sua comuna Aqui a ponderação em relação à palavra povo feita no parágrafo anterior também se aplica ao termo cidadão cujo caráter restritivo frequentemente passa despercebido ao leitor desavisado Visto desse ângulo a imagem dos Estados Unidos que se pode tirar das descrições de Tocqueville já assume outros traços que se contrapõem àqueles de uma nação cuja forma de governo inspirou o interesse geral de outros países que às vezes ia a entusiasmos tais que se chegava a omitir como se não existissem fatos como a escravidão negra ou o tratamento dispensado aos índios WRIGHT 1978 p 34 Para o autor somente o que era útil interessava ao americano Assim o utilitarismo consiste num dos traços que compõem a feição do espírito americanista Tocqueville diz que os angloamericanos estudam uma ciência como se abraça um ofício e só se interessam pelas aplicações cuja utilidade presente é reconhecida TOCQUEVILLE 2005 p 62 Não se interessam por descobertas teóricas ou ideias demasiado gerais Essa suposta característica também aparece como marca de algumas seitas protestantes sobretudo a dos puritanos em Weber 2005 para quem tal tendência tinha suas raízes na ascese protestante intramundana O exemplo a que ele faz referência é o de Benjamin Franklin para quem até mesmo as virtudes possuíam um cunho utilitarista De acordo com Tocqueville a preocupação com o bemestar social era uma das forças que alimentavam essa disposição utilitarista na época em que realizou sua viagem Em relação a esse aspecto há que se dizer que esse traço utilitarista além de generalizante parece referirse a uma imagem estereotipada do americano descendentes de puritanos ou de outras seitas protestantes posteriormente denominadas peregrinos que supostamente deram origem ao povo norteamericano e a quem se deve o gosto pelo trabalho Tomar o grupo que a história nacional americana batizou de peregrinos como o único tronco de onde brotou o povo que passou a habitar o terri tório dos Estados Unidos é no mínimo bastante limitador embora sirva como um bom motivo de orgulho nacional saber que os primeiros colonos foram homens religiosos e portadores de uma educação desenvolvida Esses grupos minoritários entretanto misturavamse a outros tipos de colonos como aventureiros órfãos negros e africanos Na valorização do trabalho se encontra outro traço daquele espírito Conforme o aristocrata francês o território das colônias especialmente 107 AMERICANISMO E EUROPEÍSMO o mito dos Estados Unidos Aula 8 o norte foi povoado por indivíduos para quem o trabalho possuía uma importância indispensável não apenas no sentido material uma vez que este proporcionava meios para subsistência mas também no sentido espi ritual visto que era desejado por deus como apontou Weber Tocqueville afirma que não se encontravam muitos ricos na América Por essa razão quase todos os americanos têm pois a necessidade de exercer uma pro fissão TOCQUEVILLE 2005 p 61 aqui é desnecessário dizer que nem os índios e menos ainda os escravos estavam entre aqueles todos Os americanos dedicavamse aos estudos primários nos primeiros anos de vida para depois entrarem numa profissão O trabalho era uma condição comum a todos Em relação a esse ponto Gramsci já no século XX ao falar sobre as condições para o desenvolvimento do americanismo de fato diz que nos Estados Unidos dadas as particularidades históricas de sua formação não havia classes parasitárias isto é classes que não exercessem nenhuma função econômica Ora esse fenômeno não escapou à análise de Tocqueville que já o havia observado entre os americanos em meados do século XIX ressalvado o caso dos índios mas estes para todos os efeitos não eram americanos para o autor Não poderíamos avançar nossa exposição sem antes fazer uma con sideração acerca de alguns elementos que Tocqueville aponta como sendo característicos do que chamou de espírito americano Curiosamente o que Weber identificou como traços de uma ética própria de grupos protestantes de inspiração calvinista a valorização do trabalho perseguição da riqueza utilitarismo aparecem em Tocqueville como traços característicos daquele espírito Dito de outro modo o que no primeiro autor é usado para definir grupos sectários específicos no segundo é ampliado para caracterizar o espírito de uma nação inteira No entanto o próprio Tocqueville demonstra que esses traços não estavam presentes em todo o território que passaria a se chamar de Estados Unidos da América Faz isso ao falar das diferenças entre o Norte e o Sul que segundo diz são inconfundíveis Enquanto no Norte mais especificamente na Nova Inglaterra curiosamente a região onde segundo o autor os primeiros habitantes foram os puritanos a va lorização do trabalho era notável no Sul em virtude da precoce introdução da escravidão o ócio se fazia ver mais que o gosto pelo trabalho visto que este era feito pelos escravos A adoção do sistema escravocrata nessa região exerceu enorme influência sobre o caráter as leis e todo futuro do Sul TOCQUEVILLE 2005 p 39 Apenas com as indicações precedentes já é possível visualizar um qua dro com alguns dos elementos que supostamente caracterizariam a maneira de ser do povo angloamericano Como se pode ver muitos deles por seu caráter generalizante e homogeneizante contribuíram para criar uma imagem romantizada da América inglesa Se não se pode afirmar que tais características são de todo inexatas no mínimo devem ser relativizadas e 108 Literatura de Língua Inglesa III postas num contexto em que os apagamentos provocados pela imagem a que dão forma a de uma América da democracia igualdade e liberdade tornemse visíveis novamente O que supostamente é considerado traço constitutivo de um povo bem como sua maneira de ser não estão imunes a idealizações Há ainda outro ponto Tocqueville tenta delinear os traços característicos dos angloamericanos tomandoos por representantes dos Estados Unidos Noutras palavras buscava definir o caráter da própria nação americana através de termos homogeneizantes tais como anglo americano americano e outros a que aludimos anteriormente que sugerem a imagem de uma nação homogênea Esta homogeneidade só é possível se pensarmos numa narrativa nacional que represente a nação como tal conforme sugere Benedict Anderson 2008 quando se refere à nação como sendo uma comunidade imaginada Mas voltemos a falar mais um pouco sobre os supostos traços delineadores do povo norteamericano Poderseia acrescentar ainda a esse quadro de características dos angloamericanos o que Weber 2004 chamou de espírito do capitalismo para exemplo do qual cita Benjamin Franklin que figura entre os chamados Founding Fathers da nação norteamericana Há na realidade evidências de que o próprio utilitarismo a perseguição da riqueza e a valorização do trabalho de que falamos acima estejam relacionados a esse espírito que também parece ser um elemento associado ao caráter nacional dos anglo americanos Conforme o autor ora citado foi esse espírito que contribuiu para o desenvolvimento do capitalismo moderno de que os Estados Unidos se tornaram símbolos e promotores E tais elementos também estão em nosso entender intimamente relacionados ao americanismo A impressão que se tem ao ler A Democracia na América é a de que todos esses elementos que passaram a ser identificados como característicos dos Estados Unidos foram trazidos pelos primeiros imigrantes europeus que povoaram seu território Sendo assim não se trata de algo próprio da América No entanto talvez isso possa ser dito acerca do aspecto que tais elementos assumiram e do modo peculiar como lá eram aplicados O ideal de igualdade por exemplo já era conhecido na Europa mas a maneira como este foi aplicado nos Estados Unidos não se via em nenhuma outra nação europeia inclusive no que se refere ao caráter excludente que tal aplica ção assumiu O mesmo pode ser dito sobre a democracia que enquanto na Europa era difícil mantêla por muito tempo nos Estados Unidos se fortalecia sem encontrar resistências pelo menos para um grupo específico os angloamericanos Disso decorre um fato a que Gramsci fez questão de aludir ao discorrer sobre o americanismo A partir de sua descrição o que está por trás do termo americanismo é na verdade uma extensão do europeísmo Para ele não se trata nesse caso de algo novo engendrado na América mas de um prolongamento orgânico e da intensificação da civilização europeia que 109 AMERICANISMO E EUROPEÍSMO o mito dos Estados Unidos Aula 8 só assumiu uma epiderme nova no clima americano GRAMSCI 2008 p 90 Em Tocqueville é essa a impressão que se tem pelo menos na obra em questão A democracia não havia nascido na América nem o ideal de liberdade ou igualdade mas lá se desenvolveu como em nenhum outro lugar depois que foram levados para o novo mundo pelos imigrantes que participaram da formação do povo norteamericano São nesse sentido tributários da Europa muito embora em alguns aspectos a América tenha se tornado antípoda daquela AMERICANISMO COMO DEVOÇÃO AOS IDEAIS NORTEAMERICANOS Tendo feito considerações precedentes cumpre ainda apresentar outro sentido assumido pelo termo americanismo Ele se encontra em uma obra levada a público em 1921 sob a autoria de George B Lockwood intitula da Americanism O livro consiste num conjunto de editoriais publicados originalmente no jornal The National Republican que cobrem o período da Conferência de Paz em Paris os debates sobre o Tratado de Versalhes no Senado americano e o referendo the solemn referendum proposto pelo então presidente Woodrow Wilson 18561924 Nesse momento buscavase fazer frente à ameaça do internacionalismo e entre as vozes que se opunham a essa tendência internacionalista estava a do referido jornal cuja leitura revela a ruidosa controvérsia entre o americanismo e o internacionalismo que se fazia ouvir à época O que nos interessa na obra citada muito mais que as circunstâncias históricas sob as quais ela foi publicada é o fato de esta conter uma caracterização do americanismo que se aproxima daquela da qual afirmamos ser o resultado de uma visão mitificada dos Estados Unidos Tal caracterização encontrase no primeiro editorial datado de dezembro de 1920 em cujo título se lê Americanism a Neglected Solution of World Problems Americanismo uma Solução para os Problemas do Mundo Negligenciada Lockwood 1921 p 1 tradução nossa referese ao americanismo nos seguintes termos O americanismo não consiste meramente na lealdade a uma terra ou na fidelidade a uma bandeira É mais que isso O americanismo no sentido mais profundo do termo é a devoção às ideias e ideais dos quais nossa república é o distinto exemplo e expoente É justamente a segunda parte da citação que contém o sentido que se aproxima daquele a respeito do qual dizemos ter sido construído sobre uma imagem romantizada daquele país Já mencionamos anteriormente alguns dos ideais e ideias de que os Estados Unidos se tornaram símbolos liberdade igualdade democracia etc mas cumpre enfatizar o tipo de sistema governamental de que a América se tornou o exemplo concreto supostamente bemsucedido a forma de governo republicano federalista 110 Literatura de Língua Inglesa III Sendo assim para Lockwood a devoção aos princípios associados à América anglosaxônica e sobretudo à federação americana é no que consiste o americanismo Este último princípio aliás está expresso no que se tornou o seu lema nacional E pluribus unum isto é de muitos um de vários Estados soberanos cada qual com suas especificidades uma nação É por isso que para Lockwood 1921 p 1 o americanismo é mais que o europeísmo transplantado para um novo continente Para ele a república americana foi fundada sobre novos princípios de governo A concepção de governo da Europa segundo diz difere daquela da América Enquanto na primeira o cidadão era a criatura do Estado na segunda tratavase do inverso a razão de ser do Estado era o dever de servir ao cidadão enquan to a concepção de governo da Europa baseavase no medo a da América assentavase sobre a justiça CONCLUSÃO É possível perceber que o fenômeno do americanismo por extensão os sentidos a ele atribuídos pode apresentarse sob múltiplas formas e de diferentes modos desde a emulação ao que supostamente se consagrou como a maneira de ser dos angloamericanos nos termos expressos acima à devoção simpatia ou mesmo atração pelas ideias e ideais de que os Estados Unidos se tornaram símbolos ou pelo que supostamente eles representam em termos políticos econômicos culturais e até étnicos De um modo ou de outro o que parece haver de comum entre as diferentes formas sob as quais o americanismo se faz ver é o fato de elas estarem sempre associadas a uma representação mitificada dos Estados Unidos Tal representação pode ser assim concebida pois ao mesmo tempo em que revela esconde distorce e até mesmo inventa elementos que passam a compor a imagem daquela nação Essa representação mitificada que tem origem em um passado também mítico é perpetuada através da narrativa nacional que de certo modo serve aos interesses da própria nação pintando um retrato que inspira admiração e patriotismo Em relação ao esse passado mítico Raphael 2006 p 17 assim se expressa referindose aos Estados Unidos Com criatividade mas sem muita exatidão inventamos os americanos um passado que gostaríamos de ter tido Uma representação que pinta um autorretrato elogioso da nação parece ser mais efetiva na tarefa de unir os diferentes bem como de construir sob o olhar dos que estão de fora uma imagem positiva de si mesma Poderíamos acrescentar ainda que o americanismo ao qual nos referi mos se assenta numa representação imaginada no sentido que Anderson 2008 atribuiu a este termo dos Estados Unidos uma vez que estes tal 111 AMERICANISMO E EUROPEÍSMO o mito dos Estados Unidos Aula 8 como todas as outras nações modernas são também segundo esse autor uma comunidade imaginada Sendo assim ao que nos parece apenas um americanismo baseado numa representação de tal natureza pode deixar de ver as contradições e inconsistências que havia naquele país e que como se pode perceber a partir das narrativas nacionais foram parcial ou total mente obliteradas ou ainda propositadamente esquecidas para formar uma imagem não do que eram mas como sugere Raphael do modo como gostariam de ser vistos RESUMO É de conhecimento geral que a proclamação da independência dos Estados Unidos exerceu significativa influência sobre a disseminação da forma de governo republicano bem como sobre a popularização de institui ções políticas características de governos democráticos A nação americana tornouse portanto representante daquele sistema governamental o que explica a sua associação ao americanismo Entre os aspectos que o distin guia das formas de governo da Europa estavam a divisão da autoridade e da responsabilidade a salvaguarda contra tirania tanto de um como a da maioria a independência dos três poderes judiciário legislativo e executivo e seu plano prático para a federação das repúblicas constituintes COMENTÁRIO SOBRE AS ATIVIDADE Esta atividade tem por finalidade principal fazer você construa uma síntese dos principais conteúdos dessa primeira Aula analisando e interpretando criticamente as implicações do termo americanismo bem como o processo de mitificação dos Estados Unidos da América ATIVIDADES Depois de ler o texto desta Aula como você poderia definir com suas próprias palavras o termo americanismo 112 Literatura de Língua Inglesa III PRÓXIMA AULA Entre a Rebeldia e a Alienação a década de 1980 e a massificação do rock no Brasil REFERÊNCIAS ANDERSON Benedict Comunidades Imaginadas São Paulo Companhia das Letras 2008 CHARTIER Roger A História Cultural entre práticas e representações Tradução de Maria Manuela Galhardo Lisboa DIFEL 1987 GRAMSCI Antonio Americanismo e fordismo São Paulo SP Hedra 2008 92 p LOCKWOOD George B Americanism 2ed Washington The Natio nal Republican Publishing Co 1921 Disponível em httpsarchiveorg detailsamericanism00lock Acesso em 15 mar 2016 OLIVEIRA Luiz Eduardo O mito de Inglaterra anglofilia e anglofobia em Portugal 18361986 Lisboa Gradiva 2014 RAPHAEL Ray Mitos sobre a fundação dos Estados Unidos a verda deira história da independência norteamericana Rio de Janeiro Civilização Brasileira 2006 TOQUEVILLE Alexis de A Democracia na América leis e costumes de certas leis e certos costumes políticos que foram naturalmente sugeridos aos americanos por seu estado social democrático Tradução de Eduardo Brandão prefácio bibliografia e cronologia de François Furet Vol I 2ed São Paulo Martins Fontes 2005 Coleção Paidéia WARDE Mirian Jorge Americanismo e educação um ensaio no espelho São Paulo em Perspectiva São Paulo vol 14 no 2 pp 3743 2000 WARDE Mirian Jorge Notas sobre o americanismo dos Estados Unidos de fins do século XIX e início do século XX In SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA 16 2011 São Paulo Anais do XXVI Simpósio Nacional de História ANPUH 2011 WEBER Max A ética protestante e o espírito do capitalismo São Paulo Companhia das Letras 2004 335 p WRIGHT Antônia Fernanda P de A Desafio americano à preponde rância britânica no Brasil 18081850 Rio de Janeiro Conselho Federal de CulturaInstituto Histórico e Geográfico Brasileiro 1972
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Texto de pré-visualização
Aula 8 Luiz Eduardo Oliveira José Augusto Batista dos Santos AMERICANISMO E EUROPEÍSMO O MITO DOS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA META Apresentar a o modo como os discursos sobre os Estados Unidos fizeram com que emergisse um mito da América do Norte tida como terra da liberdade e das oportunidades OBJETIVOS Ao final desta aula o aluno deverá Compreender de maneira crítica a constituição dos discursos e narrativas sobre os Estados Unidos da América mediante um jogo de exclusões e inclusões Reconhecer e identificar os elementos discursivos constitutivos da mitologia da América como terra da liberdade PRÉREQUISITOS Familiaridade com os períodos formativos da literatura norteamericana Conceitoschave da Teoria da Literatura e da história literária 98 Literatura de Língua Inglesa III O termo americanismo de acordo com Arnavon foi inicialmente empregado com uma conotação negativa pois fazia alusão àquilo que era avesso à civilização leiase Europa e remetiase a uma localização geo gráfica específica que curiosamente não incluía o território das excolônias inglesas Sua primeira aparição data do ano 1846 num artigo intitulado De laméricanisme et dês republiques du sud que como sugere o título fazia referência às repúblicas do sul isto é à América Latina Posteriormente o termo assumiria outras acepções como a que consta do Grand Larousse de La langue française onde é descrito como sendo uma espécie de emulação da maneira de ser dos americanos apud WARDE 2011 p 1 Há no entanto outros sentidos alguns mais recentes do que aqueles acima citados os quais não podem ser esquecidos quando se tem como objetivo uma reflexão mais detida acerca do americanismo Entre os no mes mais evocados para lidar com a matéria está o de Antônio Gramsci 18911937 que dentre outros assuntos dedicouse à discussão desse fenômeno num de seus Cadernos do cárcere Para ele o termo americanismo estava indissociavelmente atrelado a um sistema de produção específico o fordismo o que por si só lhe confere um significado diverso daquele atribuído nos contextos mencionados anteriormente Tal fenômeno pre tendia ser responsável pela elaboração de um novo tipo humano confor me o novo tipo de trabalho e processo produtivo GRAMSCI 2008 p 42 Tamanha era a sua relevância que é possível afirmar que para o autor italiano o desenvolvimento do sistema de produção fordista dependia da disseminação do americanismo Essa interdependência entre americanismo e fordismo tornase mais evidente à medida que Gramsci avança em sua reflexão Segundo ele o novo sistema de produção reclamava também um novo tipo de trabalhador cuja vida deveria se adequar aos novos ritmos e lógicas da fábrica Assim a racionalização ou disciplinarização da vida do operariado contribui para o aumento da produção tornandose portanto uma necessidade inadiável para o desenvolvimento do sistema Daí a importância do fenômeno do americanismo que seria responsável pela mudança de hábitos ou pela cria ção de um novo modo de vida afinado com a nova conjuntura econômica que se estabelecia Tal modo de vida já havia se formado historicamente nos Estados Unidos Aliás ele era característico deste país o que significa dizer que todas as vezes que Gramsci fazia referência ao americanismo não havia dúvida sobre a que nação este termo aludia INTRODUÇÃO 99 AMERICANISMO E EUROPEÍSMO o mito dos Estados Unidos Aula 8 DESENVOLVIMENTO Para explicar o porquê da resistência encontrada pelo americanismo em algumas regiões da Europa Gramsci revela que há uma condição preliminar de cuja existência o americanismo dependia para se instalar e se desenvolver em sua forma mais completa Essa condição consistia na inexistência de classes parasitárias isto é de classes que não possuíssem nenhuma função na esfera produtiva Quanto mais numerosas fossem tais classes mais resistência se criava para a introdução do americanismo A Europa em razão de sua formação histórica possuía tais classes como escreve Gramsci 2008 p 3435 A tradição a civilidade europeia por sua vez distinguese justamente por tais classes criadas pela riqueza e complexidade da história pregressa que deixou um acúmulo de sedimentações passivas graças aos fenômenos de saturação e fossilização do funcionalismo e dos intelectuais do clero e da propriedade da terra do comércio de rapina e do exército a princípio profissional e depois obrigatório mas de todo modo profissional e ofi cialmente Pode se dizer enfim que quanto mais vetusta é a história de um país tanto mais numerosas e onerosas são as sedimentações dessa massa de vagabundos e inúteis que vivem do patrimônio dos avós pensionistas da história econômica O fato de a América não possuir essas particulari dades explica segundo o autor o rápido desenvolvimento do fordismo e a organização da vida social em torno do trabalho produtivo Ou seja as condições históricas eram favoráveis nos Estados Unidos ao estabeleci mento e consolidação desse novo modo de produção Outro traço característico do americanismo apontado por Gramsci consiste na presença de iniciativas puritanas por parte dos industriais americanos que visavam à conservação fora do trabalho de um certo equilíbrio psicofísico que impeça o colapso fisiológico do trabalhador premido pelo novo método de produção GRAMSCI 2008 p 70 Com efeito o modo de vida do novo tipo de trabalhador que o fordismo recla mava deveria como já dito anteriormente adequarse às necessidades do trabalho fordizado Para que fosse efetiva tal adequação precisaria incluir âmbitos da vida privada do operariado inclusive aquelas áreas consideradas impenetráveis como a sexual e que dificilmente se esperaria que fossem tomadas como áreas de interesse dos industriais Em Gramsci o proibicionismo está intimamente associado à racio nalização do trabalho nos Estados Unidos Nesse sentido para que o trabalhador se tornasse compatível com o novo modo de produção era necessário que ele mantivesse sua eficiência física muscular e nervosa por isso a preocupação dos industriais em adotar medidas que proibis sem o consumo de álcool pelo operariado Um trabalhador que gastava seu salário com álcool agredia sua integridade física de tal modo que seu 100 Literatura de Língua Inglesa III vício acabaria afetando sua eficiência na fábrica Semelhantemente a se xualidade dos trabalhadores também se tornou uma área de interesse dos industriais uma vez que o abuso das funções sexuais exauria as energias que deveriam ser conservadas para o trabalho produtivo daí a defesa da monogamia Como escreve o autor parece claro que o novo industria lismo quer a monogamia quer que o homemtrabalhador não desperdice as suas energias na procura desordenada e excitante da satisfação sexual ocasional GRAMSCI 2008 p 73 Assim todas essas iniciativas travestidas de uma moralidade inspirada no puritanismo tradicional longe de visarem promover a espiritualidade dos trabalhadores eram na verdade estratégias através das quais os industriais poderiam racionalizar todos os aspectos da vida do trabalhador de modo que este se tornasse compatível com a nova lógica de produção Em outros termos alguns elementos da ética puritana foram submetidos ao novo mo delo produtivo o que contribuiu para sua própria consolidação O america nismo a que Gramsci se refere possuía traços característicos daquela ética Longe de ser insignificante esse traço cultural de inspiração puritana do americanismo tem suas raízes no protestantismo ascético de orientação calvinista A fim de melhor compreender tal relação parece oportuno tecer algumas considerações acerca da obra do sociólogo alemão Max Weber 18641920 A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo publicada originalmente em forma de artigos entre os anos de 1904 e 1905 Grosso modo nela o autor busca mostrar como e em que medida a ética protestante contribuiu para a formação do que chamou de espírito do capitalismo necessário para a consolidação e desenvolvimento do capitalismo moderno Antonio Gramsci 18911937 foi um filósofo marxista jornalista crítico literário e político italia no Escreveu sobre teoria política sociologia antropologia e linguística Foi membrofundador e secretáriogeral do Partido Comunista da Itália e deputado pelo distrito do Vêneto sendo preso pelo regime fascista de Benito Mussolini Gramsci é reconhecido principalmente pela sua teoria da hegemonia cultural que descreve como o Estado usa nas sociedades ocidentais as instituições culturais para conservar o poder Fontes httpsuploadwikimediaorgwikipediacommons thumbee6Gramscipng200pxGramscipng 101 AMERICANISMO E EUROPEÍSMO o mito dos Estados Unidos Aula 8 Cumpre advertir entretanto que não é o objetivo desse escrito revisitar a análise empreendida por Weber em sua completude mas antes trazer a lume apenas aqueles elementos que se mostram relevantes para uma compreen são mais acurada da relação entre americanismo e protestantismo ascético O entendimento do que viria a ser o espírito do capitalismo em sua acepção weberiana parece ser imperativo visto que ele está de algum modo presente no fenômeno do americanismo Se em Gramsci tal fenômeno é traduzido como um modo de vida vinculado a um sistema de produção capitalista específico em Weber 2004 ele apresenta um elemento consti tutivo importante qual seja uma ética do trabalho que tem suas origens na concepção ascética das correntes protestantes sobretudo do calvinismo muito embora essa referência marcadamente religiosa tenha se apagado com o tempo restando apenas os efeitos por ela produzidos a organização da vida em torno do trabalho produtivo Ao tentar conceituar o termo espírito do capitalismo Weber 2004 p 42 ciente das dificuldades que tal empenho implicava buscou fazê lo inicialmente através da alusão a algumas passagens de documentos que segundo ele foram escritos sob a influência daquele espírito Tais documentos eram o Advice to a Young Tradesman 1748 Conselho a um Jovem Comerciante e Necessary Hints to Those that Would Be Rich 1736 Sugestões Necessárias Àqueles que Querem ser Ricos ambos de Benjamin Franklin Tais escritos foram usados como exemplo ideal para a ilustração do que Weber queria dizer com a expressão acima citada e foram obras de quem curiosamente figura entre os chamados Founding Fathers Pais Fundadores expressão usada para se referir ao grupo de signatários da Declaração de Independência que se consagrou pela suposta importância que tiveram na criação dos Estados Unidos e na Revolução que a prece deu o que segundo Raphael 2006 p 160 digase de passagem nega o protagonismo a quem realmente o merece povo sem o qual a Revolução e tudo que ela significou não teria sido possível Weber evidencia como o trabalho era visto pelos calvinistas Para estes tudo existia para a autoglorificação de deus Desse modo por extensão a vida do cristão também deveria atender a esse fim através do cumprimen to de seus mandamentos no mundo Sendo assim o amor ao próximo assumia uma conotação específica a de que ele devia ser praticado exclu sivamente para a glória de deus e podia ser levado a efeito por meio do trabalho numa profissão WEBER 2004 p 99 Há ainda outro fator que deve ser mencionado para que se compreenda o lugar que o trabalho passou a ocupar na visão calvinista do mundo Esse fator está ligado à principal característica dessa corrente a saber a doutrina da predestinação Tal doutrina afirmava que deus havia desde a fundação do mundo eleito os seus os quais estavam predestinados à salvação Noutros termos significava dizer que parte da humanidade se salvaria e outra parte 102 Literatura de Língua Inglesa III estaria inevitavelmente sentenciada à perdição Afora o coroamento que tal ensinamento significou no processo de desencantamento do mundo visto que repudiava como superstição e sacrilégio todos os meios mágicos de busca da salvação WEBER 2004 p 96 ele também foi responsável pelo aparecimento de uma interrogação que por sua importância passou a ter a primazia na vida dos fieis como ter a certeza da eleição ou do seu estado de graça Para Calvino o fiel deveria contentarse em cumprir os mandamentos de deus e perseverar com a fé verdadeira em Cristo até o fim Somente aí ele tomaria conhecimento de seu estado de graça Dito de outro modo não seria possível ter certeza do seu estado de graça em vida e menos possível ainda seria identificar baseado em sinais externos um eleito pois segundo ele este pode em nada diferir externamente de um nãoeleito Visto que atra vés dessa orientação não era possível alcançar a certeza da eleição surgiram outras Uma delas era que o considerarse eleito tornavase um dever daí a autoconfiança característica dos puritanos A maneira através da qual se poderia alcançar essa autoconfiança e eliminar toda e qualquer dúvida era por meio do trabalho profissional sem descanso WEBER 2004 p 102 Isso se dava porque diferentemente do que acontecia no luteranismo onde a certeza do estado de graça se dava através da unio mystica com a divindade isto é de um sentimento de unidade com o divino que o crente experimentava em sua alma no calvinismo tal certeza poderia ser alcançada através da verificação se deus agia através do indivíduo Ou seja ser uma ferramenta de deus no mundo tornouse uma forma do crente se certificar do seu estado de graça Isso explica porque a vida religiosa do calvinista baseavase na ação ascética em vez da cultura mística do sentimento como era a tendência dos luteranos WEBER 2004 p 102103 Uma das consequências dessa busca incessante pela certeza do estado de graça foi a racionalização da vida do fiel em torno do trabalho profissio nal Não seria exagero afirmar que a doutrina calvinista contribuiu para a formação de uma percepção dentro da qual toda a vida do cristão deveria organizarse em função do trabalho que deveria ser exercido com vistas à glorificação de deus Era desse tipo de disposição mental de que o capi talismo necessitava para se desenvolver e quem ajudou a forjála segundo Weber foi a ética do protestantismo ascético Com efeito são observáveis as relações entre essa ética e o modo de vida característico do americanismo tal como apontou Gramsci o que como se pode ver não se resume às medidas proibicionistas mas abrange também a racionalização de todas as esferas da vida do indivíduo Essa racionalização que se mostrou fundamentalmente necessária para o desenvolvimento do capitalismo moderno já se operava nos lugares onde o calvinismo havia chegado o que revela Weber explica o rápido crescimento de empreendi mentos capitalistas nessas regiões 103 AMERICANISMO E EUROPEÍSMO o mito dos Estados Unidos Aula 8 É possível afirmar portanto que o modo de vida que se tornou ca racterístico do americanismo possui traços do ascetismo protestante Ao contrastar os calvinistas aos luteranos Weber 2004 p 116 faz alusão aos angloamericanos de sua época os quais até mesmo na fisionomia se acham sob o signo da anulação radical da espontaneidade do status natura lis o que causava estranhamento nos alemães entre os quais o luteranismo havia tido mais adesão Em outros termos a racionalização da vida se fazia ver até mesmo fisionomicamente fato que Weber associa à influência do calvinismo na conduta de vida dos habitantes da América do Norte Com o tempo os traços religiosos da ética sobre a qual se fundou essa conduta de vida racionalizada foram apagados transformando a ascese pro testante intramundana em puro utilitarismo WEBER 2004 p 166 o que de certa maneira pode ajudar a explicar o pragmatismo que supostamente se tornou a marca registrada da sociedade norteamericana frequentemente caracterizada por sua exaltação ao trabalho e por ser altamente pragmática TOCQUEVILLE E A MITIFICAÇÃO DOS ESTADOS UNIDOS Temos agora ocasião para fazer referência a outro autor de cuja obra não poderíamos prescindir em uma exposição que tem como objeto a te mática do americanismo Apesar de não tratar do conceito de americanismo em termos específicos visto que nela não se encontra tal denominação sua leitura é de significativa relevância na medida em que contribui para a compreensão de uma das definições atribuídas ao termo no início deste escrito a saber a que consta do Grand Larousse de La langue française que o descreve como sendo a imitação da maneira de ser dos americanos Nela o autor oferece um olhar analítico sobre os costumes e as leis dos angloamericanos o que nos permite entender melhor o que viria ser ou a que se refere a expressão a maneira de ser usada na definição há pouco citada Não menos relevante se mostra essa obra para o entendimento do sentido que ainda será apresentado através do qual o termo em questão também pode ser tomado Há que se destacar também que pela repercussão que provocou inicialmente na França e depois no resto do continente a obra em questão contribuiu significativamente para a construção da imagem dos Estados Unidos na Europa Com efeito seu autor fez conhecer os Estados Unidos às nações europeias e nesse esforço parece ter pintado um quadro no qual as excolônias inglesas são descritas por meio de afirmações por vezes generalizantes e homogeneizantes que embora sejam aplicáveis sob circunstâncias específicas acabam por escamotear as mazelas e apagar as diferenças e contradições que lá se faziam ver criando desse modo uma imagem mitificada dos Estados Unidos que servirá de inspiração para o 104 Literatura de Língua Inglesa III surgimento de um americanismo míope às incongruências daquele país É também nesse sentido que essa obra contribui para deixarmos clara a acepção que queremos atribuir ao termo de que viemos nos ocupando até agora Por essa razão faremos alusão a alguns elementos que nos ajudarão a compreender o que segundo a obra em apreciação tornouse caracterís tico dos Estados Unidos ao mesmo tempo em que apontaremos quando possível as contradições ou apagamentos que alguns deles implicam A obra a que nos referimos se chama A Democracia na América 2005 de Alexis de Tocqueville 18051859 um aristocrata francês Fruto de uma viagem aos Estados Unidos realizada nos idos de 1831 ela consiste como se pode notar a partir de sua leitura num esforço para compreender as causas que concorriam para a manutenção da democracia na América através da análise dos costumes leis e instituições do povo norteamericano É justamente por oferecer uma análise de elementos tão importantes para definição do caráter de um povo que ela nos interessa sobretudo naquilo que se refere aos costumes AlexisCharlesHenri Clérel visconde de Tocqueville dito Alexis de Tocqueville 18051859 foi um pensador político historiador e escritor francês Tornouse célebre por suas análises da Revolução Francesa cuja pertinência foi destacada por François Furet da democracia americana e da evolução das democracias ocidentais em geral Raymond Aron pôs em evidência sua contribuição à socio logia Fonte httpsuploadwikimediaorgwikipediacommonsaaaAlexisdetocquevillejpg Tocqueville também apresenta algumas características das excolônias inglesas que são igualmente importantes para a apreensão do modus vivendi daqueles a quem se referiu sob a denominação de angloamericanos e que de certo modo não estão separadas dos costumes no sentido que ele dá a este termo Antes de mencionarmos tais características no entanto 105 AMERICANISMO E EUROPEÍSMO o mito dos Estados Unidos Aula 8 já cabe aqui uma consideração acerca do caráter excludente da linguagem utilizada pelo autor A expressão angloamericano é empregada com notável regularidade ao longo de sua exposição Entretanto ela parece ser demasiadamente restritiva uma vez que ignora outras comunidades a exemplo da indígena e negra que não apenas dividiram o espaço com os imigrantes como também participaram no caso desta última no processo de formação da própria nação americana É essa ideia de que o povo da América consistia no tipo anglosaxão branco e de orientação protestante que prevalecerá no imaginário das pessoas e dará origem a uma América mitificada como foi o caso do mito da Inglaterra em Portugal segundo demonstrou Oliveira 2014 Dito isto avancemos Uma das características de que falamos acima e que que saltam aos olhos do aristocrata francês é o fato de os Estados Unidos serem essen cialmente democráticos Esse traço definidor segundo diz estava presente desde a fundação das colônias e havia se tornado ainda mais evidente à sua época A igualdade reinava entre os imigrantes escreveu Fazendo referên cia aos primeiros europeus que se estabeleceram na Nova Inglaterra ele afirma que o próprio germe da aristocracia não foi depositado nessa parte da União O povo participava tão ativamente na tomada de decisões que Tocqueville diz que ele reina sobre o mundo político americano como Deus sobre o universo TOCQUEVILLE 2005 p 5668 Esse estado social democrático dos americanos se tornará uma marca da jovem nação que como coloca Furet 2005 p XL era para Tocqueville uma democracia pura um caso sui generis portanto visto que esta se desenvolveu em um continente que não herdou os resquícios dos antigos regimes que vigoraram na Europa e que poderiam lhe opor resistência ou lhe mudar a constituição Diante de tal descrição um leitor não poderia formar outra ideia dos Estados Unidos senão a de que estes constituíam uma nação na qual a de mocracia e a igualdade funcionavam como em nenhuma outra Apesar de ser aplicável sob circunstâncias muito específicas a descrição mais esconde do que revela O princípio de igualdade por exemplo que viria a se tornar uma característica do estado social da América inglesa de modo algum se estendia aos índios os quais eram vistos pelos brancos como obstáculos à colonização não como justos proprietários RAPHAEL 2006 p 265 Nem àqueles vitimados pela escravidão que estavam longe de serem con siderados seus iguais O mesmo pode ser dito em relação à democracia que parecia estar circunscrita a um grupo específico o qual sob o disfarce da palavra povo que se referia ao branco protestante e anglosaxão participava na tomada de decisões Certamente a palavra povo assim como todos quando empregada na obra em questão esconde o fato de que são paradoxalmente mais excludentes do que parecem ser à primeira vista uma vez que não se referem aos grupos acima citados Outro traço que chama a atenção de Tocqueville na forma de governo dos angloamericanos é a descentralização administrativa A União não 106 Literatura de Língua Inglesa III se imiscuía nos negócios que diziam respeito a cada Estado em específico e estes procuravam se manter fora das questões relativas aos condados que por sua vez não interferiam na administração da comuna O mais importante acerca de tal descentralização são os efeitos que ela provocava dentre os quais estava o fortalecimento da cidadania através da participação política dos cidadãos nas decisões locais Desse modo segundo o autor o americano era bastante ativo politicamente visto que participava entusias madamente nas questões referentes à sua comuna Aqui a ponderação em relação à palavra povo feita no parágrafo anterior também se aplica ao termo cidadão cujo caráter restritivo frequentemente passa despercebido ao leitor desavisado Visto desse ângulo a imagem dos Estados Unidos que se pode tirar das descrições de Tocqueville já assume outros traços que se contrapõem àqueles de uma nação cuja forma de governo inspirou o interesse geral de outros países que às vezes ia a entusiasmos tais que se chegava a omitir como se não existissem fatos como a escravidão negra ou o tratamento dispensado aos índios WRIGHT 1978 p 34 Para o autor somente o que era útil interessava ao americano Assim o utilitarismo consiste num dos traços que compõem a feição do espírito americanista Tocqueville diz que os angloamericanos estudam uma ciência como se abraça um ofício e só se interessam pelas aplicações cuja utilidade presente é reconhecida TOCQUEVILLE 2005 p 62 Não se interessam por descobertas teóricas ou ideias demasiado gerais Essa suposta característica também aparece como marca de algumas seitas protestantes sobretudo a dos puritanos em Weber 2005 para quem tal tendência tinha suas raízes na ascese protestante intramundana O exemplo a que ele faz referência é o de Benjamin Franklin para quem até mesmo as virtudes possuíam um cunho utilitarista De acordo com Tocqueville a preocupação com o bemestar social era uma das forças que alimentavam essa disposição utilitarista na época em que realizou sua viagem Em relação a esse aspecto há que se dizer que esse traço utilitarista além de generalizante parece referirse a uma imagem estereotipada do americano descendentes de puritanos ou de outras seitas protestantes posteriormente denominadas peregrinos que supostamente deram origem ao povo norteamericano e a quem se deve o gosto pelo trabalho Tomar o grupo que a história nacional americana batizou de peregrinos como o único tronco de onde brotou o povo que passou a habitar o terri tório dos Estados Unidos é no mínimo bastante limitador embora sirva como um bom motivo de orgulho nacional saber que os primeiros colonos foram homens religiosos e portadores de uma educação desenvolvida Esses grupos minoritários entretanto misturavamse a outros tipos de colonos como aventureiros órfãos negros e africanos Na valorização do trabalho se encontra outro traço daquele espírito Conforme o aristocrata francês o território das colônias especialmente 107 AMERICANISMO E EUROPEÍSMO o mito dos Estados Unidos Aula 8 o norte foi povoado por indivíduos para quem o trabalho possuía uma importância indispensável não apenas no sentido material uma vez que este proporcionava meios para subsistência mas também no sentido espi ritual visto que era desejado por deus como apontou Weber Tocqueville afirma que não se encontravam muitos ricos na América Por essa razão quase todos os americanos têm pois a necessidade de exercer uma pro fissão TOCQUEVILLE 2005 p 61 aqui é desnecessário dizer que nem os índios e menos ainda os escravos estavam entre aqueles todos Os americanos dedicavamse aos estudos primários nos primeiros anos de vida para depois entrarem numa profissão O trabalho era uma condição comum a todos Em relação a esse ponto Gramsci já no século XX ao falar sobre as condições para o desenvolvimento do americanismo de fato diz que nos Estados Unidos dadas as particularidades históricas de sua formação não havia classes parasitárias isto é classes que não exercessem nenhuma função econômica Ora esse fenômeno não escapou à análise de Tocqueville que já o havia observado entre os americanos em meados do século XIX ressalvado o caso dos índios mas estes para todos os efeitos não eram americanos para o autor Não poderíamos avançar nossa exposição sem antes fazer uma con sideração acerca de alguns elementos que Tocqueville aponta como sendo característicos do que chamou de espírito americano Curiosamente o que Weber identificou como traços de uma ética própria de grupos protestantes de inspiração calvinista a valorização do trabalho perseguição da riqueza utilitarismo aparecem em Tocqueville como traços característicos daquele espírito Dito de outro modo o que no primeiro autor é usado para definir grupos sectários específicos no segundo é ampliado para caracterizar o espírito de uma nação inteira No entanto o próprio Tocqueville demonstra que esses traços não estavam presentes em todo o território que passaria a se chamar de Estados Unidos da América Faz isso ao falar das diferenças entre o Norte e o Sul que segundo diz são inconfundíveis Enquanto no Norte mais especificamente na Nova Inglaterra curiosamente a região onde segundo o autor os primeiros habitantes foram os puritanos a va lorização do trabalho era notável no Sul em virtude da precoce introdução da escravidão o ócio se fazia ver mais que o gosto pelo trabalho visto que este era feito pelos escravos A adoção do sistema escravocrata nessa região exerceu enorme influência sobre o caráter as leis e todo futuro do Sul TOCQUEVILLE 2005 p 39 Apenas com as indicações precedentes já é possível visualizar um qua dro com alguns dos elementos que supostamente caracterizariam a maneira de ser do povo angloamericano Como se pode ver muitos deles por seu caráter generalizante e homogeneizante contribuíram para criar uma imagem romantizada da América inglesa Se não se pode afirmar que tais características são de todo inexatas no mínimo devem ser relativizadas e 108 Literatura de Língua Inglesa III postas num contexto em que os apagamentos provocados pela imagem a que dão forma a de uma América da democracia igualdade e liberdade tornemse visíveis novamente O que supostamente é considerado traço constitutivo de um povo bem como sua maneira de ser não estão imunes a idealizações Há ainda outro ponto Tocqueville tenta delinear os traços característicos dos angloamericanos tomandoos por representantes dos Estados Unidos Noutras palavras buscava definir o caráter da própria nação americana através de termos homogeneizantes tais como anglo americano americano e outros a que aludimos anteriormente que sugerem a imagem de uma nação homogênea Esta homogeneidade só é possível se pensarmos numa narrativa nacional que represente a nação como tal conforme sugere Benedict Anderson 2008 quando se refere à nação como sendo uma comunidade imaginada Mas voltemos a falar mais um pouco sobre os supostos traços delineadores do povo norteamericano Poderseia acrescentar ainda a esse quadro de características dos angloamericanos o que Weber 2004 chamou de espírito do capitalismo para exemplo do qual cita Benjamin Franklin que figura entre os chamados Founding Fathers da nação norteamericana Há na realidade evidências de que o próprio utilitarismo a perseguição da riqueza e a valorização do trabalho de que falamos acima estejam relacionados a esse espírito que também parece ser um elemento associado ao caráter nacional dos anglo americanos Conforme o autor ora citado foi esse espírito que contribuiu para o desenvolvimento do capitalismo moderno de que os Estados Unidos se tornaram símbolos e promotores E tais elementos também estão em nosso entender intimamente relacionados ao americanismo A impressão que se tem ao ler A Democracia na América é a de que todos esses elementos que passaram a ser identificados como característicos dos Estados Unidos foram trazidos pelos primeiros imigrantes europeus que povoaram seu território Sendo assim não se trata de algo próprio da América No entanto talvez isso possa ser dito acerca do aspecto que tais elementos assumiram e do modo peculiar como lá eram aplicados O ideal de igualdade por exemplo já era conhecido na Europa mas a maneira como este foi aplicado nos Estados Unidos não se via em nenhuma outra nação europeia inclusive no que se refere ao caráter excludente que tal aplica ção assumiu O mesmo pode ser dito sobre a democracia que enquanto na Europa era difícil mantêla por muito tempo nos Estados Unidos se fortalecia sem encontrar resistências pelo menos para um grupo específico os angloamericanos Disso decorre um fato a que Gramsci fez questão de aludir ao discorrer sobre o americanismo A partir de sua descrição o que está por trás do termo americanismo é na verdade uma extensão do europeísmo Para ele não se trata nesse caso de algo novo engendrado na América mas de um prolongamento orgânico e da intensificação da civilização europeia que 109 AMERICANISMO E EUROPEÍSMO o mito dos Estados Unidos Aula 8 só assumiu uma epiderme nova no clima americano GRAMSCI 2008 p 90 Em Tocqueville é essa a impressão que se tem pelo menos na obra em questão A democracia não havia nascido na América nem o ideal de liberdade ou igualdade mas lá se desenvolveu como em nenhum outro lugar depois que foram levados para o novo mundo pelos imigrantes que participaram da formação do povo norteamericano São nesse sentido tributários da Europa muito embora em alguns aspectos a América tenha se tornado antípoda daquela AMERICANISMO COMO DEVOÇÃO AOS IDEAIS NORTEAMERICANOS Tendo feito considerações precedentes cumpre ainda apresentar outro sentido assumido pelo termo americanismo Ele se encontra em uma obra levada a público em 1921 sob a autoria de George B Lockwood intitula da Americanism O livro consiste num conjunto de editoriais publicados originalmente no jornal The National Republican que cobrem o período da Conferência de Paz em Paris os debates sobre o Tratado de Versalhes no Senado americano e o referendo the solemn referendum proposto pelo então presidente Woodrow Wilson 18561924 Nesse momento buscavase fazer frente à ameaça do internacionalismo e entre as vozes que se opunham a essa tendência internacionalista estava a do referido jornal cuja leitura revela a ruidosa controvérsia entre o americanismo e o internacionalismo que se fazia ouvir à época O que nos interessa na obra citada muito mais que as circunstâncias históricas sob as quais ela foi publicada é o fato de esta conter uma caracterização do americanismo que se aproxima daquela da qual afirmamos ser o resultado de uma visão mitificada dos Estados Unidos Tal caracterização encontrase no primeiro editorial datado de dezembro de 1920 em cujo título se lê Americanism a Neglected Solution of World Problems Americanismo uma Solução para os Problemas do Mundo Negligenciada Lockwood 1921 p 1 tradução nossa referese ao americanismo nos seguintes termos O americanismo não consiste meramente na lealdade a uma terra ou na fidelidade a uma bandeira É mais que isso O americanismo no sentido mais profundo do termo é a devoção às ideias e ideais dos quais nossa república é o distinto exemplo e expoente É justamente a segunda parte da citação que contém o sentido que se aproxima daquele a respeito do qual dizemos ter sido construído sobre uma imagem romantizada daquele país Já mencionamos anteriormente alguns dos ideais e ideias de que os Estados Unidos se tornaram símbolos liberdade igualdade democracia etc mas cumpre enfatizar o tipo de sistema governamental de que a América se tornou o exemplo concreto supostamente bemsucedido a forma de governo republicano federalista 110 Literatura de Língua Inglesa III Sendo assim para Lockwood a devoção aos princípios associados à América anglosaxônica e sobretudo à federação americana é no que consiste o americanismo Este último princípio aliás está expresso no que se tornou o seu lema nacional E pluribus unum isto é de muitos um de vários Estados soberanos cada qual com suas especificidades uma nação É por isso que para Lockwood 1921 p 1 o americanismo é mais que o europeísmo transplantado para um novo continente Para ele a república americana foi fundada sobre novos princípios de governo A concepção de governo da Europa segundo diz difere daquela da América Enquanto na primeira o cidadão era a criatura do Estado na segunda tratavase do inverso a razão de ser do Estado era o dever de servir ao cidadão enquan to a concepção de governo da Europa baseavase no medo a da América assentavase sobre a justiça CONCLUSÃO É possível perceber que o fenômeno do americanismo por extensão os sentidos a ele atribuídos pode apresentarse sob múltiplas formas e de diferentes modos desde a emulação ao que supostamente se consagrou como a maneira de ser dos angloamericanos nos termos expressos acima à devoção simpatia ou mesmo atração pelas ideias e ideais de que os Estados Unidos se tornaram símbolos ou pelo que supostamente eles representam em termos políticos econômicos culturais e até étnicos De um modo ou de outro o que parece haver de comum entre as diferentes formas sob as quais o americanismo se faz ver é o fato de elas estarem sempre associadas a uma representação mitificada dos Estados Unidos Tal representação pode ser assim concebida pois ao mesmo tempo em que revela esconde distorce e até mesmo inventa elementos que passam a compor a imagem daquela nação Essa representação mitificada que tem origem em um passado também mítico é perpetuada através da narrativa nacional que de certo modo serve aos interesses da própria nação pintando um retrato que inspira admiração e patriotismo Em relação ao esse passado mítico Raphael 2006 p 17 assim se expressa referindose aos Estados Unidos Com criatividade mas sem muita exatidão inventamos os americanos um passado que gostaríamos de ter tido Uma representação que pinta um autorretrato elogioso da nação parece ser mais efetiva na tarefa de unir os diferentes bem como de construir sob o olhar dos que estão de fora uma imagem positiva de si mesma Poderíamos acrescentar ainda que o americanismo ao qual nos referi mos se assenta numa representação imaginada no sentido que Anderson 2008 atribuiu a este termo dos Estados Unidos uma vez que estes tal 111 AMERICANISMO E EUROPEÍSMO o mito dos Estados Unidos Aula 8 como todas as outras nações modernas são também segundo esse autor uma comunidade imaginada Sendo assim ao que nos parece apenas um americanismo baseado numa representação de tal natureza pode deixar de ver as contradições e inconsistências que havia naquele país e que como se pode perceber a partir das narrativas nacionais foram parcial ou total mente obliteradas ou ainda propositadamente esquecidas para formar uma imagem não do que eram mas como sugere Raphael do modo como gostariam de ser vistos RESUMO É de conhecimento geral que a proclamação da independência dos Estados Unidos exerceu significativa influência sobre a disseminação da forma de governo republicano bem como sobre a popularização de institui ções políticas características de governos democráticos A nação americana tornouse portanto representante daquele sistema governamental o que explica a sua associação ao americanismo Entre os aspectos que o distin guia das formas de governo da Europa estavam a divisão da autoridade e da responsabilidade a salvaguarda contra tirania tanto de um como a da maioria a independência dos três poderes judiciário legislativo e executivo e seu plano prático para a federação das repúblicas constituintes COMENTÁRIO SOBRE AS ATIVIDADE Esta atividade tem por finalidade principal fazer você construa uma síntese dos principais conteúdos dessa primeira Aula analisando e interpretando criticamente as implicações do termo americanismo bem como o processo de mitificação dos Estados Unidos da América ATIVIDADES Depois de ler o texto desta Aula como você poderia definir com suas próprias palavras o termo americanismo 112 Literatura de Língua Inglesa III PRÓXIMA AULA Entre a Rebeldia e a Alienação a década de 1980 e a massificação do rock no Brasil REFERÊNCIAS ANDERSON Benedict Comunidades Imaginadas São Paulo Companhia das Letras 2008 CHARTIER Roger A História Cultural entre práticas e representações Tradução de Maria Manuela Galhardo Lisboa DIFEL 1987 GRAMSCI Antonio Americanismo e fordismo São Paulo SP Hedra 2008 92 p LOCKWOOD George B Americanism 2ed Washington The Natio nal Republican Publishing Co 1921 Disponível em httpsarchiveorg detailsamericanism00lock Acesso em 15 mar 2016 OLIVEIRA Luiz Eduardo O mito de Inglaterra anglofilia e anglofobia em Portugal 18361986 Lisboa Gradiva 2014 RAPHAEL Ray Mitos sobre a fundação dos Estados Unidos a verda deira história da independência norteamericana Rio de Janeiro Civilização Brasileira 2006 TOQUEVILLE Alexis de A Democracia na América leis e costumes de certas leis e certos costumes políticos que foram naturalmente sugeridos aos americanos por seu estado social democrático Tradução de Eduardo Brandão prefácio bibliografia e cronologia de François Furet Vol I 2ed São Paulo Martins Fontes 2005 Coleção Paidéia WARDE Mirian Jorge Americanismo e educação um ensaio no espelho São Paulo em Perspectiva São Paulo vol 14 no 2 pp 3743 2000 WARDE Mirian Jorge Notas sobre o americanismo dos Estados Unidos de fins do século XIX e início do século XX In SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA 16 2011 São Paulo Anais do XXVI Simpósio Nacional de História ANPUH 2011 WEBER Max A ética protestante e o espírito do capitalismo São Paulo Companhia das Letras 2004 335 p WRIGHT Antônia Fernanda P de A Desafio americano à preponde rância britânica no Brasil 18081850 Rio de Janeiro Conselho Federal de CulturaInstituto Histórico e Geográfico Brasileiro 1972