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A ERA DO CAPITAL 18481875 ERIC HOBSBAWM 3a edição No Smoking A ERA DO CAPITAL ERIC J HOBSBAWM A ERA DO CAPITAL 18481875 Tradução de Luciano Costa Neto Digitalização Argo Para Marlene Andrew e Julia Sumário Nota do Tradutor 15 Prefácio 17 Introdução 21 PRIMEIRA PARTE PRELÚDIO REVOLUCIONÁRIO 1 A Primavera dos Povos 29 SEGUNDA PARTE DESENVOLVIMENTO 2 A Grande Expansão 49 3 O Mundo Unificado 67 4 Conflitos e Guerras 87 5 A Construção das Nações 101 6 As Forças da Democracia 117 7 Perdedores 135 8 Vencedores 153 9 A Sociedade em Processo de Mudança 173 TERCEIRA PARTE RESULTADOS 10 A Terra 189 11 Os Homens se Põem a Caminho 207 12 A Cidade a Indústria a Classe Trabalhadora 221 13 O Mundo Burguês 241 14 Ciência Religião Ideologia 261 15 As Artes 287 16 Conclusão 311 Tabelas 317 Notas 327 Leitura Complementar 337 7 Ilustrações entre as páginas 160 e 161 1 A Colméia Britânica por Cruickshank Foto Radio Times Hulton Pic ture Library 2 Alfred Krupp águaforte Foto Mansell Collection 3 Alfred Príncipe de Windischgrätz Osterreichisches Nationalbiblio thek 4 Camponês com Pá JF Millet Foto Weidenfeld and Nicolson Arc hives 5 Dr e Sra Worsley Foto Radio Times Hulton Picture Library 6 Capatazes na Exposição Internacional de 1862 Foto Victoria and Albert Museum 7 Criados cerca de 1860 Foto Victoria and Albert Museum 8 O engenhoso guincho a vapor do Sr Ashton Foto Victoria and Albert Museum 9 A Escala de Arte Exeter Foto Victoria and Albert Museum 10 GF Watts Foto Radio Times Hulton Picture Library 11 Cartaz para a Polca da Demolição de Johann Strauss Strauss Collec tion Foto Robert Rogers 12 Construção da ferrovia subterrânea de Londres gravura Foto Mary Evans Picture Library 13 Scarisbrick Hall Lancashire Foto A F Kersting 14 Prefeitura de Halifax ilustração de Builder 1860 por Charles Barry Foto Weidenfeld and Nicolson Archives 15 Sobre Londres de Trem de Gustave Doré Foto Mansell Collection 16 Manchester vista da Ponte Blackfriars 1859 fotografia de George Grundy Foto Manchester Public Libraries 17 Paris Boulevard Sébastopol Foto Radio Times Hulton Picture Li brary 18 Praça da Opera Cairo Foto Radio Times Hulton Picture Library 19 A Opera de Paris 1860 Foto AF Kersting 20 Paris Boulevard des Italiens 1864 Foto Radio Times Hulton Picture Library 21 O Castelo de Cardiff interior Foto Edwin Smith 22 Salão do Hotel Paiva Paris do Un Hotel Célebre sous le Second Empi re Foto Sirot 8 23 Sala de estar da Rainha Vitória Castelo de Windsor Foto reproduzida por Gentil Permissão de Sua Majestade a Rainha copyright reserved 24 Cortando o Assado fotografia estereoscópica cerca de 1860 Foto Victoria and Albert Museum 25 Sala em Lincoln Court ilustração do Illustrflted Times 1861 Foto Weidenfeld and Nicolsorí Archives 26 Opera de Paris interior impresso Foto Archives Photographiques Paris 27 Exposição Internacional de PaYis 1867 Foto Victoria and Albert Museum 28 Salão em Paris 1867 Foto RogerViollet 29 A Academia do Sr Williams cerca de 1865 Foto Lewisham Local History Library 30 Carro dormitório da Estrada de Ferro Union Pacific 1869 Foto Radio Times Hulton Picture Library 31 Estação Ferroviária de Charing Cross 1864 impresso Foto Science Museum Londres 32 A Rainha Vitória o Príncipe Albert e os filhos em torno da árvore de Natal gravura Foto The Illustrated London News 33 Canhão Krupp na Exposição Internacional de Paris em 1867 impresso Foto Weidenfeld and Nicolson Archives 34 Jovem lendo cerca de 1865 Foto Victoria and Albert Museum 35 Os irmãos Corrie os três irmãos King acompanhados de Brown e Woodruff 1865 Foto Barnardo Photo Library 36 Reunião para o chá no jardim cerca de 1865 Foto Victoria and Albert Museum 37 Le Déjeuner sur THerbe de Manet Museu do Louvre Paris Foto Bulloz 38 The Dinner Hour Wigan de Eyre Crowe City Art Gallery Man chester 39 Fore Street Lambeth York Wharf cerca de 1860 Foto Victoria and Albert Museum 40 Oficial britânico na Índia cerca de 1870 Foto Radio Times Hulton Picture Library 41 O Ultimo do Rebanho de WW Hoopper cerca de 1877 Foto Ro yal Geographical Society 42 Napoleão III caricatura Foto Victoria and Albert Museum 43 Charles Darwin Foto National Portrait Gallery Londres 44 Príncipe Otto von Bismarck caricatura Foto Mansell Collection 45 Lev Nikolaevitch Tolstoi 1868 Foto Novosti Press Agency 46 Gustave Coubert fotografia de Nadar Foto Mansell Collection 47 Fyodor Mikhailovitch Dostoievsky fotografia de VG Perov Foto Novosti Press Agency 48 Giuseppe Garibaldi gravura de W Holl Foto RB Fleming 49 Abraham Lincoln Foto Weidenfeld and Nicolson Archives 9 50 Karl Marx Foto Mansell Collection 51 Honoré Daumier Foto Mansell Collection 52 Charles Dickens lendo para suas filhas Foto Victoria and Albert Mu seum 53 Richard Wagner 1865 Foto Mansell Collection 54 Emigrantes em Cork seguindo para a América 1851 gravura Foto Ra dio Times Hulton Picture Library 55 Descarregando mercadorias perto da alfândega de Calcutá Foto índia Office 56 Cartaz da ceifadeira McCormick Foto International Harvester Compa ny of Great Britain 57 Cabana de colonos no Rio de Ia Maneis Foto Radio Times Hulton Picture Library 58 Trabalhadores coolies hindus colocando trilhos Fotos Weidenfeld and Nicolson Archives 59 Thomas Brassley caricatura de Ape Foto Mansell Collection 60 A Ponte de DeviFs Gate Estrada de Ferro Union Pacific Foto Radio Times Hulton Picture Library 61 Leilão de escravos na Virgínia cerca de 1860 impresso Foto Mansell Collection 62 Plantação de açúcar Guiana Foto Weidenfeld and Nicolson Ar chives 63 O Porto de Londres de Um Espelho Completo de Locais Famosos de Países Bárbaros de Yoshitora Foto Victoria and Albert Museum 64 Chegada de Henry Morton Stanley a uma aldeia africana desenhada por ele mesmo Foto Radio Times Hulton Picture Library 65 Grand Barricade du Chateau dEau 1848 Bibliotheque Nationale Pa ris Foto RogerViollet 66 Cena de barricada de Jules David 1848 Foto RogerViollet 67 Louise Michel gravura de Nash Foto Mary Evans Picture Library 68 Cora Pearl fotografia de Anatole Pouguet Foto Sirot 69 Ataque às barricadas Paris 1871 Foto Editions Robert Laffont 70 Greve em Le Creusot 1870 Bibliotheque Nationale Paris Foto Bul loz 71 A fábrica Iron and Steel Barrow Foto Weidenfel and Nicolson Arc hives 72 Emblema da Amalgamated Society of Engineers Weidenfeld and Ni colson Archives 73 Impressora do Daily Telegraph Foto Mansell Collection 74 Le Bureau de Coton à Ia Nouvelle Orléans de Degas Pau Museum Foto Bulloz 75 Nova Orléans cerca de 1870 Foto Radio Times Hulton Picture Li brary 10 76 A Guerra Civil Americana fotografia de William Brady Foto Mansell Collection 77 Ataque à aldeia de Chaleira Preta impresso do Harpers Weekly 1868 Foto The Kansas State Historical Society Topeka 78 O Pobre sem Casa ilustração do Punch 1859 Foto Weidenfeld and Nicolson Archives Mapas entre as páginas 321 e 326 1 O Mundo em 1847 2 O Mundo por volta de 1880 3 1847 Escravidão e Servidão no Mundo Ocidental 4 1880 Escravidão e Servidão no Mundo Ocidental 5 Um Mundo em Movimento 6 Cultura Ocidental em 18471875 Opera 11 Nota do Tradutor De acordo com a orientação do autor definida no prefácio de não so brecarregar a obra procuramos reduzir as notas de tradução a um mínimo indispensável como por exemplo em relação ao Chartist Movement ou as Com Laws que o autor se refere por inúmeras vezes através do texto Man tivemos as palavras em outras línguas européias no seu original mas forne cemos tradução entre parênteses àquelas em alemão Mantivemos igualmen te o original quando se trata de expressões dentro de um contexto cultural americano ex cowboy A liberdade com que o autor emprega palavras e expressões em outros idiomas que não o inglês autorizounos a agir de for ma equivalente na tradução ex expert Expressamos nosso reconhecimento ao Prof Hobsbawm que por cor respondência elucidou algumas dúvidas sobre o texto original para efeitos de tradução Stanford março de 1977 L C N A ERA DO CAPITAL 13 Prefácio Este livro pretende existir de forma autônoma assim como os demais volumes da História da Civilização da qual ele é apenas uma parte Ocorre porém que o volume que cronologicamente o pre cede na série foi escrito pelo mesmo autor Entretanto A Era do Ca pital pode vir a ser lido por pessoas que conhecem A Era das Revolu ções 17891848 assim como por pessoas que não o conhecem Aos primeiros apresento as minhas excusas por incluir aqui e ali mate rial que já lhes é familiar com o objetivo de proporcionar a necessá ria informação prévia para os últimos Tentei reduzir tal duplicação a um mínimo e fazêla tolerável pela sua distribuição através do texto Ó livro pode espero ser lido independentemente Mesmo assim ele não deveria pedir do leitor nada além de uma instrução geral adequa da pois é deliberadamente dirigido ao leitor nãoespecializado No entanto um conhecimento elementar da história européia será sempre uma vantagem Parto do pressuposto que num caso de emergência os leitores possam entender e continuar a leitura sem nenhum conhe cimento prévio sobre a Queda da Bastilha ou as Guerras Napoleôni cas mas um tal conhecimento certamente ajudará O período que o livro abarca é relativamente curto mas sua di mensão geográfica é extensa Escrever sobre o mundo de 1789 a 1848 em termos de Europa em outras palavras quase que sobre a Ingla terra e França não é irreal Porém já que o tema mais importante do período após 1848 é a expansão da economia capitalista a todo o pla neta a conseqüência inevitável é a impossibilidade de escrever uma história puramente européia e seria absurdo escrever esta história sem dar uma atenção especial aos outros continentes O tratamento que concedo dividese em três partes As revoluções de 1848 formam um prelúdio a uma seção sobre os principais desenvolvimentos do pe ríodo Estes últimos eu os discuto numa perspectiva duplamente con tinental e onde necessário global ao invés de tentar apreendêlo a través de séries de histórias nacionais fechadas Os capítulos estão divididos por temas e não cronologicamente mas os principais subpe ríodos a década de 1850 calma mas expansionista os anos mais turbulentos de 1860 a ascensão e o colapso do início de 1870 são Coleção publicada pela Weidenfeld Nicolson Inglaterra 14 porém claramente discerníveis A terceira parte consiste em uma série de cortes diacrônicos sobre a economia sociedade e cultura desta é poca do século XIX sob estudo Não posso considerarme um expert sobre todo o imenso mate rial deste livro mas apenas de minúsculas parcelas e precisei confi ar quase que inteiramente em material de informações de segunda ou mesmo de terceira mão Mas isso seria impossível de evitar Uma e normidade já foi escrita sobre o século XIX e a cada ano que passa acrescentase ao pico da montanha uma massa de publicações especi alizadas que escurecem o céu da história Como o campo dos histori adores ampliase para incluir praticamente todos os aspectos da vida pelos quais nós do final do século XX temos interesse a quantidade de informação que precisa ser absorvida é demasiado grande mesmo para o mais enciclopédico e erudito dos scholars Ainda que se tome todas as precauções tornase freqüentemente necessário no contexto de uma vasta síntese reduzir passagens a um ou dois parágrafos a uma linha a apenas uma menção ou mesmo lamentavelmente omiti las E é necessário basearse cada vez mais no trabalho de outros Infelizmente foi impossível seguir a admirável convenção que determina que os estudiosos identifiquem criteriosamente suas fontes e especialmente suas dívidas a outros Em primeiro lugar duvido que pudesse identificar todas as sugestões e idéias que tomei emprestado de forma tão livre de algum artigo ou livro conversação ou discussão Posso apenas pedir àqueles que pilhei conscientemente ou não que perdoem minha falta de cortesia Em segundo lugar a tentativa de fa zêlo teria sobrecarregado o livro com um pouco recomendável apara to de conhecimento Pois já que o objeto desta obra não é fazer um sumário dos fatos conhecidos o que implicaria em um guia para lei tores indicandolhes leitura mais detalhada para os diversos tópicos mas sim traçar uma síntese histórica geral fornecer o sentido dos a nos 184875 e descobrir ali as raízes de nosso mundo contemporâneo creio que foi bastante razoável agir desta maneira Entretanto há um guia geral de leitura suplementar ao fim do volume que inclui algu mas das obras que achei mais úteis e às quais gostaria de reconhecer meu débito As referências foram quase que inteiramente reduzidas a algu mas fontes de citações quadros estatísticos e alguns outros números assim como algumas declarações que gerassem controvérsias ou fos sem surpreendentes Muitos dos números esparsos de fontes primárias ou do valiosíssimo compêndio Dictionary of Statistics de Mulhall não foram identificados Referências a obras literárias por exemplo no velas russas que existem em várias edições estão apenas intitula das referências aos escritos de Marx e Engels que são importantes estudiosos deste período estão identificadas pelo título mais conheci do da obra ou pela data da carta volume e página da edição standard existente Karl Marx e Friederich Engels Werke East Berlin 1956 15 71 de agora em diante Werke Sigurd Zienau e Francis Haskell gentilmente corrigiram meus capítulos sobre as ciências e as artes e reviram alguns de meus erros Charles Curwen respondeu minhas perguntas sobre a China Assumo porém total responsabilidade por minhas omissões ou enganos WR Rodgers Carmem Claudin e Maria Moisá ajudaramme enormemente como assistentes de pesquisa por inúmeras vezes Andrew Hobsbawm e Julia Hobsbawm ajudaramme a selecionar as ilustrações assim como Julia Brown Reconheço também minha dívida a meu editor de texto Susan Loden EJH Charred remains of a structure Two individuals are engaged in manual labor crushing objects on a surface 17 Introdução Por volta de 1860 uma nova palavra entrou no vocabulário eco nômico e político do mundo capitalismo Portanto parece apro priado chamar o presente volume A Era do Capital um título que também faz lembrar a todos nós que a mais importante obra do mais formidável crítico do capitalismo O Capital de Karl Murx 1867 foi publicada nesta época O triunfo global do capitalismo é o tema mais importante da história nas décadas que sucederam 1848 Foi o triunfo de uma sociedade que acreditou que o crescimento econômico repou sava na competição da livre iniciativa privada no sucesso de comprar tudo no mercado mais barato inclusive trabalho e vender no mais caro Uma economia assim baseada e portanto repousando natural mente nas sólidas fundações de uma burguesia composta daqueles cu ja energia mérito e inteligência elevouos a tal posição deveria as sim se acreditava não somente criar um mundo de plena distribui ção material mas também de crescente felicidade oportunidade hu mana e razão de avanço das ciências e das artes numa palavra um mundo de contínuo e acelerado progresso material e moral Os pou cos obstáculos ainda remanescentes no caminho do livre desenvolvi mento da economia privada seriam levados de roldão As instituições do mundo ou mais precisamente daquelas partes do mundo ainda não desembaraçadas da tiraríia das tradições e superstições ou do fato ín feiíz de não possuírem peie branca preferivelmente originária da Eu ropa Central ou do Norte gradualmente se aproximariam do modelo internacional de uma naçãoestado definida territorialmente com uma constituição garantindo a propriedade e os direitos civis assem bléias representativas e governos eleitos responsáveis por elas e onde possível uma participação do povo comum na política dentro de limi tes tais que garantissem a ordem social burguesa e evitassem o risco de ser derrubada Traçar o desenvolvimento inicial desta sociedade não é a tarefa deste livro É suficiente lembrar que esta sociedade já havia comple tado seu aparecimento histórico tanto na frente econômica como na Sua origem talvez preceda 1848 como foi sugerido em A Era das Revoluções Introdu ção mas uma pesquisa mais detalhada sugere que raramente tenha ocorrido antes de 1849 ou tenha ganho amplo uso antes da década de 1860 18 frente políticaideológica sessenta anos antes de 1848 Os anos de 1789 a 1848 os quais já discuti num volume prévio A Era das Re voluções ver prefácio livro o qual os leitores terão referências uma ou outra vez foram dominados por uma dupla revolução a Revolu ção Industrial iniciada e largamente confinada à Inglaterra e a trans formação política associada e largamente confinada à França Ambas implicaram o triunfo de uma nova sociedade mas se ela deveria ser a sociedade do capitalismo liberal triunfante ou aquilo que um histori ador francês chamou os burgueses conquistadores pareceu sempre mais incerto para os contemporâneos do que para nós Atrás dos ideó logos políticos burgueses estavam as massas prontas para transfor mar revoluções moderadamente liberais em revoluções sociais Por baixo e em volta dos empresários capitalistas os pobres proletários descontentes e sem lugar que agitavam e se insurgiam Os anos de 1830 e 1840 foram uma era de crises cuja saída apenas os otimistas ousavam predizer Portanto o dualismo da revolução de 1789 a 1848 dá à história deste período unidade e simetria É fácil num certo sentido ler e es crever sobre este assunto pois parece possuir tema e forma claros as sim como seus limites cronológicos parecem tão precisamente defini dos quanto é possível no que diz respeito a assuntos humanos Com a revolução de 1848 que abre este volume a antiga simetria quebrouse a forma modificouse A revolução política recuou a revolução indus trial avançou Mil novecentos e quarenta e oito a famosa primavera dos povos foi a primeira e última revolução européia no sentido qua se literal a realização momentânea dos sonhos da esquerda os pesade los da direita a derrubada virtualmente simultânea de velhos regimes da Europa continental a oeste dos impérios russo e turco de Copenha gue a Palermo de Brasov a Barcelona Foi esperada e prevista Pareceu ser a conseqüência e o produto lógico da era das duas revoluções Tudo falhou universalmente rapidamente e apesar de isto não ter sido reconhecido por muitos anos pelos refugiados políticos de forma definitiva Desde então não iria mais ocorrer nenhuma revolu ção social geral do tipo buscado antes de 1848 nos países avança dos do mundo O centro de gravidade destes movimentos revolucio nários sociais e depois dos regimes socialistas e comunistas do sécu lo XX iria ter seu lugar em regiões marginais e atrasadas enquanto que no período que este livro lida movimentos deste tipo iriam per manecer episódicos arcaicos e subdesenvolvidos A súbita vasta e aparentemente inesgotável expansão da economia capitalista mundial forneceu alternativas políticas aos países avançados A revolução industrial inglesa havia engolido a revolução política francesa A história de nosso período é portanto desequilibrada Ela é pri mariamente a do maciço avanço da economia do capitalismo indus trial em escala mundial da ordem social que o representa das idéias e credos que pareciam legitimálo e ratificálo na razão ciência pro 19 gresso e liberalismo E a era da burguesia triunfante mesmo que a burguesia européia ainda hesitasse em assumir um papel político pú blico Para isso e talvez apenas para isso a era das revoluções ain da não havia terminado As classes médias da Europa ficaram as sustadas e permaneceram assustadas com o povo democracia ainda era vista como sendo o prelúdio rápido e certeiro para ò socialismo Os homens que oficialmente presidiam os interesses da vitoriosa or dem burguesa no seu momento de triunfo eram nobres do campo prussianos profundamente reacionários uma imitação de imperador na França e uma sucessão de proprietários aristocráticos na Inglaterra O medo da revolução era real a insegurança básica estava entranha da Bem para o fim de nosso período o único exemplo de revolução num país avançado uma insurreição em Paris quase que localizada e de vida curta produziu um grande banho de sangue incompara velmente superior a 1848 e uma enxurrada de nervosas trocas de in formações diplomáticas Já nesse tempo os dirigentes dos estados a vançados da Europa com maior ou menor relutância começaram a reconhecer não apenas que democracia isto é uma constituição parlamentar baseada em sufrágio universal era inevitável como tam bém viria a ser provavelmente um aborrecimento inofensivo politi camente Esta descoberta já havia sido feita de há muito pelos diri gentes dos Estados Unidos Os anos de 1848 até meados da década de 1870 não foram portan to um período que inspire leitores que apreciam o espetáculo de um drama com heróis no sentido comum Suas guerras e este período viu consideravelmente mais guerras que os 30 precedentes e os 40 subse qüentes eram ou pequenas operações decididas por superioridade or ganizacional ou tecnológica como a maioria das campanhas européias fora da Europa e as guerras rápidas e decisivas através das quais o Im pério Alemão estabeleceuse entre 1864 e 1871 ou então massacres mal conduzidos como a Guerra da Criméia entre 1854 e 1856 A maior das guerras deste período a Guerra Civil Americana foi ganha em úl tima análise pelo peso do poder econômico e dos recursos superiores O Sul derrotado possuía o melhor exército e os melhores generais Os exemplos ocasionais de heroísmo romântico e colorido apareceram como Garibaldi com suas madeixas ao vento e sua camisa vermelha mas eram exceção Não havia também muita dramaturgia na política onde o critério de sucesso veio a ser definido por Walter Bagehot como o fato de se possuir opiniões comuns e habilidades incomuns Napo leão III considerou visivelmente o manto de seu grande tio o primeiro Napoleão inconfortável para usar Lincoln e Bismarck cujas imagens públicas beneficiaramse pela dureza de suas faces e pela beleza de su as prosas foram indiscutivelmente grandes homens mas suas realiza ções foram conseguidas pelos seus dons de políticos e diplomatas co mo as de Cavour na Itália baseados inteiramente naquilo que agora consideramos os seus carismas 20 O drama mais óbvio deste período foi econômico e tecnológico o ferro derramandose em milhões de toneladas pelo mundo estradas de ferro cortando continentes cabos submarinos atravessando o A tlântico a construção do Canal de Suez as grandes cidades como Chicago surgidas do solo virgem do MeioOeste americano os imen sos fluxos migratórios Era o drama do poder europeu e norte americano com o mundo a seus pés Mas aqueles que exploraram es te mundo conquistado eram se excluirmos o pequeno número de a ventureiros e pioneiros homens sóbrios em roupas sóbrias espalhan do respeitabilidade e um sentimento de superioridade racial junta mente com fábricas de gás estradas de ferro e empréstimos Era o drama do progresso a palavrachave da época maciço iluminado seguro de si mesmo satisfeito mas acima de tudo inevi tável Quase nenhum dos homens com poder e influência em todos os acontecimentos no mundo ocidental desejou pôrlhe um freio Apenas alguns pensadores e talvez um maior número de críticos intuitivos te nham previsto que este avanço inevitável iria produzir um mundo bem diferente daquele que se esperava talvez exatamente o seu opos to Nenhum deles nem Marx que havia imaginado uma revolução social em 1848 e para uma década depois esperou uma mudança súbita Mesmo em meados de 1860 suas expectativas eram para lon go prazo O drama do progresso é uma metáfora Mas para duas espé cies de pessoas era uma realidade literal Para milhões de pobres transportados para um novo mundo freqüentemente através de fron teiras e oceanos isto significou uma mudança de vida cataclísmica Para os indivíduos do mundo fora do capitalismo que eram agora a tingidos e sacudidos por ele significou a escolha entre uma resistên cia passiva em termos de suas antigas tradições e formas de ser ou en tão um traumático processo de tomada das armas do Ocidente para voltálas contra os conquistadores a compreensão e a manipulação do progresso por eles mesmos O mundo deste período da história foi um mundo de vitoriosos e vítimas Seu drama consistiu nas dificuldades não dos primeiros mas primariamente dos últimos O historiador não pode ser objetivo sobre o período que é seu te ma Nisto ele difere para sua vantagem intelectual dos ideólogos mais típicos que acreditam que o progresso da tecnologia ciências positiva e sociedade faz com que seja possível ver seu presente com a indiscutível imparcialidade do cientista natural cujos métodos eles acreditam erroneamente compreender O autor deste livro não pode ocultar uma certa aversão talvez uma certa reserva em relação à era a qual se refere mesmo que diminuída pela admiração por suas titâ nicas realizações materiais e pelo esforço para compreender mesmo aquilo que não o agrada Ele não compartilha da nostálgica busca pela certeza da autoconfiança dos burgueses de meados do século XIX que atrai a muitos dos que buscam explicações para a crise do mundo 21 ocidental um século depois Suas simpatias dirigemse àqueles que poucos deram ouvidos há um século Em nenhum caso a certeza e a autoconfiança estavam erradas O triunfo burguês foi breve e tempo rário No momento que pareceu completo provou não ser monolítico mas pleno de fissuras No início da década de 1870 a expansão eco nômica e o liberalismo pareciam irresistíveis No fim da mesma dé cada já não o eram mais Este marco divisório define o fim da era que este livro retrata Diferente da revolução de 1848 que forma um ponto de partida este final não é marcado por nenhuma data universal Se alguma data fos se escolhida esta data seria 1873 o equivalente vitoriano à débâcle de Wall Street em 1929 Daí em diante começou o que um observador contemporâneo chamou uma curiosa perturbação e depressão sem precedentes do comércio e indústria que os contemporâneos chama ram A Grande Depressão e que usualmente é datada 187396 Sua mais notável peculiaridade escreveu o mesmo observador tem si do sua universalidade atingindo nações que tinham estado envolvidas em guer ras da mesma forma que as que se abstiveram as que tinham uma moeda está vel e aquelas que tinham uma moeda instável as que viviam sob um sistema de livre troca e aquelas cujas trocas sofriam alguma forma de restrição Tem si do doloroso em antigas comunidades como a Inglaterra e a Alemanha e igual mente na Austrália África do Sul e Califórnia que representam as novas tem sido uma calamidade demasiado pesada para os habitantes de Newfoundland e Labrador e das ensolaradas plantações de açúcar do Caribe e não tem enrique cido aqueles dos centros do comércio mundial que geralmente ganham mais quando os negócios flutuam e são mais incertos Assim escreveu um eminente norteamericano no mesmo ano em que sob a inspiração de Karl Marx a Internacional Trabalhista e Socialista foi fundada A Depressão iniciou uma nova era e pode por tanto fornecer uma data conclusiva para a antiga2 Building interior appearing severely damaged debris and broken structural elements on the floor and walls Primeira Parte PRELÚDIO REVOLUCIONÁRIO Exterior scene showing a consumer marketplace or event with various banners and advertisements including Shop Cheaper Limited Offer and brand logos 25 Primeiro Capítulo A PRIMAVERA DOS POVOS Por favor leia os jornais com bastante atenção agora eles valem a pena ser lidos Esta Revolução mudará a forma do planeta assim deve e precisa Vive la Republique O poeta George Weerth à sua mãe 11 de março de 18481 Realmente se eu fosse mais jovem e tivesse mais dinheiro o que in felizmente não sou e não tenho imigraria para a América hoje Não por covardia pois pessoalmente sou tão pouco atingido quanto posso atingilos mas por causa do desgosto pela podridão moral que usan do as palavras de Shakespeare eleva o mau cheiro ao céu O poeta Joseph von Eichendorff a um correspondente 1º de agosto de 1849 2 I No início de 1848 o eminente pensador político francês Alexis de Tocqueville tomou a tribuna na Câmara dos Deputados para ex pressar sentimentos que muitos europeus partilhavam Nós dormi mos sobre um vulcão Os senhores não percebem que a terra treme mais uma vez Sopra o vento das revoluções a tempestade está no horizonte Mais ou menos no mesmo momento dois exilados ale mães Karl Marx com trinta anos e Friedrich Engels com vinte e oito divulgavam os princípios da revolução proletária para provocar aqui lo que Tocqueville estava alertando seus colegas no programa que ambos tinham traçado algumas semanas antes para a Liga Comunista Alemã e que tinha sido publicado anonimamente em Londres por volta de 24 de fevereiro de 1848 sob o título alemão de Manifesto do Partido Comunista para ser publicado em inglês francês ale mão italiano flamengo e dinamarquês Em poucas semanas ou no caso do Manifesto em poucas horas as esperanças e temores dos pro Foi também traduzido em polonês e sueco no mesmo ano mas é justo dizer que suas re verberações políticas fora dos pequenos grupos de revolucionários alemães foram insignifi cantes até que foi republicado no início da década de 1870 26 fetas pareceram estar na iminência da realização A monarquia fran cesa tinha sido derrubada por uma insurreição a república proclama da e a revolução européia tinha iniciado Tem havido um bom número de grandes revoluções na história do mundo moderno e certamente a maioria bem sucedidas Mas nun ca houve uma que tivesse se espalhado tão rápida e amplamente se alastrando como fogo na palha por sobre fronteiras países e mesmo oceanos Na França o centro natural e detonador das revoluções eu ropéias Ver A Era das Revoluções capítulo 6 a república foi pro clamada em 24 de fevereiro Por volta de 2 de março a revolução ha via ganho o sudoeste alemão em 6 de março a Bavária 11 de março Berlim 13 de março Viena e quase imediatamente a Hungria em 18 de março Milão e em seguida a Itália onde uma revolta independen te havia tomado a Sicília Nesta época o mais rápido serviço de in formação acessível a qualquer pessoa os serviços do banco Roths child não podia trazer notícias de Paris a Viena em menos de cinco dias Em poucas semanas nenhum governo ficou de pé numa área da Europa que hoje é ocupada completa ou parcialmente por dez esta dos sem contar as repercussões em um bom número de outros Além disso 1848 foi a primeira revolução potencialmente global cuja in fluência direta pode ser detectada na insurreição de 1848 em Pernam buco Brasil e poucos anos depois na remota Colômbia Num certo sentido foi o paradigma de um tipo de revolução mundial com o qual dali em diante rebeldes poderiam sonhar e que em raros mo mentos como no apósguerra das duas conflagrações mundiais eles pensaram poder reconhecer De fato explosões simultâneas continen tais ou mundiais são extremamente raras 1848 na Europa foi a única a afetar tanto as partes desenvolvidas quando as atrasadas do conti nente Foi ao mesmo tempo a mais ampla e a menos bem sucedida deste tipo de revoluções No breve período de seis meses de sua ex plosão sua derrota universal era seguramente previsível dezoito me ses depois todos os regimes que derrubara foram restaurados com a exceção da República Francesa que por seu lado estava mantendo todas as distâncias possíveis em relação à revolução à qual devia sua própria existência As revoluções de 1848 portanto possuem uma curiosa relação com o conteúdo deste livro Mas pela sua ocorrência e pelo medo de sua recorrência a história da Europa nos 25 anos seguintes seria mui to diferente 1848 estava bem longe de ser o ponto crítico quando a Europa falhou em mudar O que a Europa falhou foi em mudar de uma forma revolucionária Já que tal não ocorreu o ano da revolução permanece sozinho uma abertura mas não a ópera principal uma en França Alemanha Ocidental Alemanha Oriental Áustria Itália Tchecoslováquia Iugos lávia Hungria parte da Polônia e Romênia Os efeitos políticos da revolução também po dem ser vistos como sérios na Bélgica Suíça e Dinamarca 27 tra da cujo estilo arquitetônico não leva exatamente ao que se espera quando se passa através do portão II A revolução triunfou através de todo o centro do continente eu ropeu mas não na sua periferia Isto inclui países demasiadamente re motos ou isolados em sua história para serem diretamente atingidos de alguma maneira por exemplo a Península Ibérica Suécia e Gré cia demasiadamente atrasados para possuir a estratificação social politicamente explosiva da zona revolucionária por exemplo Rússia e o Império Otomano mas também os únicos países já industrializa dos cujo jogo político já estava sendo feito de acordo com regras di ferentes como a Inglaterra e a Bélgica Mesmo assim a zona revolu cionária consistindo essencialmente da França e da Confederação Alemã do Império Austríaco com seus limites no sudeste europeu e da Itália era suficientemente heterogênea para incluir regiões tão atra sadas e diferentes como Calábria e Transilvânia tão desenvolvidas como a Uhr e a Saxônia tão alfabetizadas como a Prússia e iletradas como a Sicília tão remotas uma para a outra como Kiel e Palermo Perpignan e Bucarest A maioria destes lugares era dirigida por aquilo que podemos chamar de monarcas ou príncipes absolutos mas a França já era um reino constitucional e burguês e a única república significativa do continente a Confederação Helvética já havia inicia do o ano da revolução com uma breve guerra civil no final de 1847 Os estados atingidos pela revolução variam em tamanho dos 35 mi lhões da França para os poucos milhares em principados de ópera bu fa da Alemanha central em status de poderosos estados do mundo a províncias ou satélites dirigidos por estrangeiros em estrutura de es tados uniformemente centralizados a conglomerados perdidos Acima de tudo a história estrutura econômica e social e a política dividiram a zona revolucionária em duas partes cujos extre mos pareciam ter pouco em comum Suas estruturas sociais diferiam fundamentalmente exceto por aquela prevalência substancial e prati camente universal dos homens do campo sobre os homens da cidade das pequenas cidades sobre as grandes um fato facilmente verificá vel pois a população urbana e especialmente as grandes cidades eram desproporcionalmente proeminentes em política No oeste campo neses eram legalmente livres e grandes estados relativamente pouco importantes no Leste eles eram ainda servos e a propriedade da terra continuava largamente concentrada nas mãos da nobreza rural ver capítulo 10 mais adiante No Oeste a classe média significava banqueiros locais comerciantes empresários capitalistas profissio Dos delegados ao préparlamento alemão da região de Uhr 45 representavam grandes cidades 24 pequenas cidades e apenas 10 o campo onde 73 da população vivia 3 28 nais liberais e oficiais mais velhos incluindo professores se bem que alguns destes tenderiam a se sentir membros de um estrato mais alto haute bourgeoisie prontos para competir com a nobreza pro prietária pelo menos nos gastos A leste o estrato urbano equivalente consistia largamente de grupos nacionais distintos da população nati va tais como os alemães e os judeus O equivalente real da classe média era o setor do país de nobres inferiores educados eou preocu pados com negócios um estrato que era surpreendentemente grande em algumas áreas A zona central da Prússia ao Norte até a Itália central e do norte ao Sul que era num sentido o coração da zona re volucionária combinou de várias formas as características das regi ões relativamente desenvolvidas e atrasadas Politicamente a zona revolucionária era igualmente heterogê nea Excetuandose a França o que estava em jogo não era meramen te o conteúdo político e social destes estados mas sua forma ou mes mo existência Os alemães tomaram o caminho de construir uma A lemanha deveria ser unitária ou federal de um punhado de prin cipados germânicos de vários tamanhos e características Os italianos tentaram fazer o que o chanceler austríaco Metternich arrogantemen te mas não inacuradamente descreveu como sendo uma mera ex pressão geográfica uma Itália unida Ambos com a visão limitada dos nacionalistas incluíram em seus projetos povos que não se senti am alemães ou italianos como os tchecos Os alemães italianos e praticamente todos os movimentos nacionais envolvidos na revolu ção exceto os franceses viramse lutando contra o grande império multinacional dos Habsburgos que espalhavase pela Alemanha e Itá lia também incluindo os tchecos húngaros uma parte substancial de poloneses romenos iugoslavos e outros povos eslavos Alguns des tes ou pelo menos seus portavozes viam o Império como uma solu ção menos ruim do que serem absorvidos por algum nacionalismo expansionista como o dos alemães ou o dos húngaros Se a Áustria não existisse parece ter dito o professor Palacki portavoz dos tche cos seria preciso inventála Através da zona revolucionária diver sas dimensões operavam simultaneamente Os radicais confessadamente tinham uma simples solução uma república democrática unitária e centralizada da Alemanha Itália Hungria ou o país que ocorresse ser constituído de acordo com os princípios da Revolução Francesa sobre as ruínas de todos os reis e príncipes e que empunhasse sua versão da bandeira tricolor que usada no modelo francês era o modelo básico de uma bandeira nacional Os moderados por seu turno estavam emaranhados numa teia de cálculos complexos baseados essencialmente no medo à democracia que eles acreditavam ser equivalente à revolução social Aonde as massas ainda não houvessem desalojado os príncipes seria pouco esperto encorajá las a minar a ordem social e onde o tivessem feito seria desejável reti rálas das ruas e desmantelar as barricadas que eram os símbolos es 29 senciais de 1848 Portanto a questão era quais os príncipes paralisados mas não depostos pela revolução que poderiam ser persuadidos a apoi ar a boa causa Como deveria exatamente ser criada uma Alemanha ou Itália liberais sob que forma constitucional e sob os auspícios de quem Poderia este plano conter igualmente o rei da Prússia e o impe rador da Áustria como os grandesalemães moderados pensavam não confundir com os democratas radicais que eram por definição grandesalemães de um tipo diferente ou precisaria ser pequeno alemão i e excluir a Áustria Moderados do mesmo tipo no Império dos Habsburgos praticaram o jogo de maquinar constituições federais e multinacionais o que só viria a cessar com o desaparecimento do impé rio em 1918 Onde ação ou guerra revolucionária irrompessem não ha via muito tempo para especulações constitucionais Onde não irrom pessem como na maior parte da Alemanha davaselhes a maior im portância Visto que a maior proporção de moderados liberais ali con sistiam de professores e funcionários civis 68 dos deputados na as sembléia de Frankfurt eram funcionários públicos 12 pertenciam às profissões livres os debates deste parlamento de vida curta trans formaramse num paradigma de inteligente futilidade As revoluções de 1848 portanto requerem um detalhado estudo por estado povo região para o que este livro hão é o lugar No entan to elas tiveram muito em comum não apenas pelo fato de terem ocor rido quase simultaneamente mas também por que seus destinos esta vam cruzados todas possuíam um estilo e sentimento comuns uma atmosfera curiosamente românticoutópica e uma retórica similar para o que os franceses inventaram a palavra quarentehuitard Qualquer historiador reconhecea imediatamente as barbas as gravatas esvoa çantes os chapéus dos militantes as bandeiras tricolores as barricadas o sentido inicial de libertação de imensa esperança e confusão otimista Era a primavera dos povos e como a primavera não durou Preci samos agora olhar brevemente suas características comuns Em primeiro lugar todas foram vitoriosas e derrotadas rapida mente e na maioria dos casos totalmente Nos primeiros poucos me ses todos os governos na zona revolucionária foram derrubados ou re duzidos à impotência Todos entraram em colapso ou recuaram vir tualmente sem resistência Portanto num período relativamente curto a revolução tinha perdido a iniciativa quase que em todos os lugares na França pelo fim de abril no resto da Europa revolucionária du rante o verão apesar de que o movimento guardou alguma capacida de para contraatacar em Viena Hungria e Itália Na França o pri meiro marco da contraofensiva conservadora foi a eleição de abril com sufrágio universal Esta apesar de eleger apenas uma minoria de monarquistas enviou para Paris uma grande quantidade de conserva dores eleitos pelos votos de um campesinato politicamente mais i nexperiente do que reacionário e para o qual a esquerda de mentali dade urbana ainda não tinha um apelo Aliás por volta de 1849 as regiões republicanas e esquerdistas do campo na França familiares 30 para os estudantes da política francesa já tinham surgido por exem plo a região provençal e ali a mais amarga resistência à abolição da república em 1851 teve lugar O segundo marco foi o isolamento e derrota dos trabalhadores revolucionários em Paris batidos na insur reição de junho ver mais adiante Na Huropa central o ponto decisivo veio quando o exército dos Habsburgos com sua liberdade de manobra aumentada pela fuga do imperador em maio conseguiu reagruparse derrotar em junho uma insurreição radical em Praga não sem o apoio da classe média mo derada da Tchecoslováquia e Alemanha e em seguida reconquistar as terras da Bohemia que eram o coração econômico do império e logo após recuperar o controle da Itália do norte Uma tardia e rápida revolução nos principados do Danúbio foi esmagada pela intervenção russa e turca Entre o verão e o fim do ano os velhos regimes retomaram o poder na Alemanha e na Áustria embora tenha sido necessário recu perar a cidade de Viena cada vez mais revolucionária pela força das armas em outubro com um custo de mais de 4 mil vidas Depois dis so o rei da Prússia teve suficiente coragem para restabelecer sua au toridade por sobre os berlinenses sem maior problema e o resto da Alemanha exceto por alguma oposição no sudoeste rapidamente en trou na linha deixando o Parlamento alemão ou melhor a Assem bléia Constitucional eleita nos esperançosos dias da primavera assim como a Assembléia prussiana radical e outras entregues a suas dis cussões esperando por seu fechamento Por volta do inverno apenas duas regiões ainda estavam nas mãos da revolução partes da Itália e a Hungria Terminaram por ser reconquistadas em seguida a uma re tomada mais modesta da ação revolucionária na primavera de 1849 em meados daquele ano Depois da capitulação dos húngaros e dos venezianos em agosto de 1849 a revolução estava morta Com a única exceção na França to dos os antigos comandos foram restaurados no poder em alguns ca sos como no Império dos Habsburgos inclusive com mais força do que antes e os revolucionários espalharamse no exílio Mais uma vez com a exceção da França virtualmente todas as mudanças institu cionais todos os sonhos políticos e sociais da primavera de 1848 foram varridos e mesmo na França a república teria apenas mais dois anos e meio de vida Ocorrera uma e apenas uma modificação irreversível importante a abolição da escravatura no Império dos Habsburgos Ex cetuandose esta última apesar de ser visivelmente uma importante realização 1848 aparece como a revolução da moderna história da Eu ropa que combinou a maior promessa a maior extensão o maior suces so inicial imediato e o mais rápido e retumbante fracasso Num certo sentido lembra outro fenômeno de massa da década de 1840 o movi 31 mento cartista na Inglaterra Os objetivos específicos do Cartismo fo ram eventualmente atingidos mas não revolucionariamente ou num contexto revolucionário Suas grandes aspirações não chegaram a ser perdidas mas a ação que deveria têlas levado à frente era completa mente diferente da de 1848 Não é um acidente que o documento da quele ano que viria a ter o mais duradouro e significativo efeito na his tória mundial tenha sido o Manifesto Comunista Todas estas revoluções têm algo mais em comum que contribuiu largamente para o seu fracasso Elas foram de fato ou enquanto anteci pação imediata revoluções sociais dos trabalhadores pobres Portanto elas assustaram os moderados liberais a quem elas mesmas deram po der e proeminência e mesmo alguns dos políticos mais radicais pe lo menos tanto quanto os conservadores que apoiavam os antigos regi mes O conde Cavour de Piedmont futuro arquiteto da Itália Unida pôs seu dedo nesta fraqueza alguns anos antes 1846 Se a ordem social chegar a ser genuinamente ameaçada se os grandes princípios sobre os quais ela repousa vierem a estar dian te de um sério risco então muitos dos mais decididos oposicio nistas os mais entusiásticos republicanos serão temos certeza os primeiros a aliaremse aos flancos do partido conservador 4 Portanto aqueles que fizeram a revolução eram inquestionavel mente os trabalhadores pobres Foram eles que morreram nas barrica das urbanas em Berlim havia apenas 15 representantes das classes educadas e 30 mestresartesãos entre os 300 mortos das lutas de mar ço em Milão apenas 12 estudantes trabalhadores de colarinho bran co ou proprietários entre os 350 mortos na insurreição Foi sua fome que alimentou as demonstrações que se transformaram em revolu ções O campo nas regiões ocidentais da revolução estava relativa mente calmo enquanto que o sudoeste alemão viu muito mais a in surreição campesina do que é comumente lembrado mas em outros lugares o medo da revolta no campo era suficientemente agudo para transformarse em realidade apesar de que ninguém precisaria usar muita imaginação em áreas como a Itália do sul onde os camponeses por todos os lados marcharam espontaneamente com bandeiras e tambores por sobre os grandes estados Mas o medo por si só era su ficiente para concentrar totalmente as mentes dos proprietários da ter Movimento trabalhista inglês peta reforma parlamentar teve seu nome baseado na Carta do Povo um programa elaborado pelo radical londrino William Lovett em maio de 1838 Continha seis reivindicações sufrágio universal igualdade dos distritos eleitorais voto se creto eleição anual do Parlamento pagamentos aos parlamentares e abolição da qualifica ção de proprietário para os candidatos Foi o primeiro movimento nacional trabalhista que nasceu do protesto contra as injustiças sociaisda nova ordem industrial na Inglaterra O movimento foi abalado com o esmagamento de uma revolta em Newport e o banimento de seus líderes para a Austrália Quando a economia saiu da depressão o movimento perdeu sua força Mais tarde todas as reivindicações foram transformadas em leis com a exceção da eleição anual do Parlamento N T 32 ra Aterrorizados pelos falsos rumores de uma grande insurreição es crava sob a liderança do poeta Sándor Petöfi 182349 a Dieta Hún gara uma Assembléia constituída esmagadoramente por proprietá rios votou a imediata abolição da escravatura logo em 15 de março mas mesmo alguns dias antes o governo imperial procurando isolar os revolucionários de uma base rural já havia decretado a imediata abolição da escravatura na Galícia a abolição do trabalho forçado e outras obrigações feudais nas terras tchecas Não havia dúvida que a ordem social estava em perigo O perigo não era igualmente agudo em todos os lugares Cam poneses poderiam ser e eram comprados pelos governos conser vadores É improvável que a classe média alemã incluindo os confi antes homens de negócios da Uhr estivessem desesperadamente as sustados por uma perspectiva de comunismo proletário ou mesmo poder proletário que tinha pouca importância exceto em Colônia onde Marx tinha instalado seu quartelgeneral e em Berlim onde um tipógrafo comunista Stefan Born organizara um movimento ope rário de razoável importância Porém da mesma forma como as classes médias européias dos anos 1840 julgaram ter reconhecido a forma de seus problemas sociais futuros na chuva e fumaça de Lanca shire assim também pensaram ter reconhecido uma outra forma do futuro atrás das barricadas de Paris o grande antecipador e exporta dor de revoluções E a revolução de fevereiro não tinha sido feita a penas pelo proletariado mas era uma revolução social consciente Seu objetivo não era meramente uma república mas a república so cial e democrática Seus líderes eram socialistas e comunistas Seu governo provisório incluiu um trabalhador genuíno um mecânico conhecido por Alberto Por alguns dias houve dúvidas se sua bandeira seria a tricolor ou a bandeira vermelha da revolta social Exceto onde questões tais corno autonomia nacional ou indepen dência estavam em jogo a oposição moderada dos anos de 1840 não desejou nem se dedicou seriamente à revolução e mesmo na questão nacional os moderados preferiram negociação e diplomacia ao invés de confrontação Eles teriam preferido mais sem dúvida mas estavam preparados para negociar concessões que poderseia razoavelmente argumentar mesmo o mais estúpido dos absolutistas como o tzar mais cedo ou mais tarde seria forçado a conceder ou mudanças internacio nais que mais cedo ou mais tarde viriam certamente a ser aceitas pela oligarquia dos superpoderes que decidiam nestas questões Arrasta dos para a revolução pela força dos pobres eou pelo exemplo de Paris eles naturalmente tentaram transformar uma inesperadamente boa situ ação para extrair a maior vantagem Portanto em última análise eles estavam certamente e desde o começo muito mais assustados pelo pe rigo de sua própria esquerda do que pelos velhos regimes Quando as barricadas subiram em Paris todos os liberais moderados e como ob servou Cavour uma razoável proporção de radicais passaram a ser conservadores em potencial Como a opinião moderada mais ou menos 33 rapidamente mudava de lado ou desertava os trabalhadores e os intran sigentes entre os radicais democratas ficavam isolados ou o que era mais fatal ficavam diante de uma união de conservadores e ex moderados aliados ao velho regime o partido da ordem como os franceses chamaram 1848 fracassou porque ficou evidenciado que a confrontação decisiva não era entre os velhos regimes e as forças do progresso unidas mas entre ordem e revolução social Sua con frontação crucial não foi a de fevereiro em Paris mas a de junho em Paris quando os trabalhadores manobrados para uma insurreição isola da foram derrotados e massacrados Eles lutaram e morreram brava mente Cerca de 1500 caíram na luta das ruas dois terços dos mortos do lado do governo É característica da ferocidade do ódio que os ricos nutrem pelos pobres o fato de que uns 3 mil foram trucidados depois da derrota enquanto outros 12 mil foram aprisionados a maioria deporta da para campos de trabalho na Argélia Por seu turno a revolução de fevereiro em Paris custara apenas 370 vidas6 Portanto a revolução manteve seu ímpeto somente onde os radi cais eram suficientemente fortes e suficientemente ligados com o mo vimento popular para empurrar os moderados para frente ou fazêla sem eles Isto era mais provável de ocorrer em países onde a questão crucial era a libertação nacional um objetivo que requer a contínua mobilização das massas Eis por que a revolução durou mais na Itália e sobretudo na Hungria Na França a unidade nacional e a indepen dência não estavam em questão O nacionalismo alemão estava preo cupado com a unificação de numerosos estados separados o que era porém impedido não pela dominação alienígena mas exceto por al guns interesses particularistas pela atitude de dois superpoderes que se consideravam a si próprios alemães Prússia e Áustria As aspira ções nacionais eslavas entraram em conflito logo de início com as das nações revolucionárias como as dos alemães e magiares e calaram se dali em diante se não chegaram mesmo a apoiar a contra revolução Mesmo a esquerda tcheca olhou o Império dos Habsbur gos como uma proteção à absorção por uma Alemanha nacional Os poloneses não tomaram nenhuma parte importante nesta revolução Na Itália os moderados unidos na retaguarda do antiaustríaco rei de Piedmont e com as fileiras engrossadas depois da insurreição de Milão pelos principados menores tomaram a dianteira na luta con tra o opressor enquanto não perdiam de vista os republicanos e a re volução social Graças â fraqueza militar dos estados italianos à hesi tação de Piedmont e talvez acima de tudo à recusa de apelar aos franceses que dariam apoio acreditavase à causa republicana eles foram duramente derrotados pelo exército austríaco em Custozza no mês de julho Pode ser notado de passagem que o grande republica no G Mazzini 180572 com seu infalível instinto para o que era politicamente fútil opôgse a um pedido de ajuda aos franceses A derrota desacreditou os moderados e passou a liderança da libertação nacional aos radicais que tomaram o poder em diversos estados itali 34 anos durante o outono para finalmente conseguir instalar uma repú blica romana em 1849 dando a Mazzini ampla oportunidade para re tórica Veneza sob o governo de um advogado sensível Daniele Manin 180457 já havia se tornado uma república independente fi cando fora dos distúrbios até que foi inevitavelmente reconquistada pelos austríacos mais tarde até do que os húngaros no final de a gosto de 1849 Os radicais não foram uma ameaça militar para a Áustria quando eles fizeram com que Piedmont declarasse guerra novamente em 1849 os austríacos os venceram facilmente em Nova ra no mês de março Além disso apesar de mais determinados a ex pulsar os austríacos e unificar a Itália eles partilhavam de modo ge ral do medo dos moderados pela revolução social Mesmo Mazzini com todo o seu zelo pelo homem comum preferia que este confinasse seus interesses a questões espirituais detestava socialismo e opunha se a qualquer interferência com a propriedade privada Depois deste fracasso inicial a revolução italiana viveu do tempo dos outros Iro nicamente entre aqueles que suprimiramna estavam os exércitos da França que reconquistou Roma em junho A expedição romana era uma tentativa de assegurar a influência diplomática francesa mais uma vez na península contra a Áustria Também teve a vantagem ex tra de ser popular entre os católicos apoio este que o regime pós revolucionário confiava receber Diferentemente da Itália a Hungria já era uma entidade política mais ou menos unificada as terras da coroa de Santo Estevão com uma constituição eficiente um nãonegligenciávei grau de autonomia e quase todos os elementos de um estado soberano exceto indepen dência Sua fraqueza era que a aristocracia magiar que governava es ta vasta e esmagadora área governava não somente o campesinato da grande planície mas também uma população da qual talvez uns 60 consistisse de croatas sérvios eslovacos romenos e ucranianos sem mencionar uma substancial minoria alemã Estes povos camponeses não eram antipáticos a uma revolução que libertasse os escravos mas sentiam antagonismo pela recusa demonstrada inclusive por alguns radicais de Budapest em fazer qualquer concessão no sentido de reco nhecer suas diferenças nacionais em relação aos magiares Os repre sentantes destas minorias eram hostilizados por uma feroz política de magiarização que objetivava incorporar algumas regiões fronteiriças ainda de alguma forma autônomas num estado magiar centralizado e unitário A Corte em Viena seguindo a habitual máxima imperialista divide e impera ofereceulhes apoio Viria a ser o exército croata sob o comando do barão de Jellacic um amigo de Gaj o pioneiro do nacionalismo iugoslavo quem comandaria o assalto a Viena e a Hungria revolucionárias Apesar disso na área que hoje aproximadamente contém a Hun gria a revolução conseguiu manter o apoio de massa do povo magi ar por razões nacionais e sociais Os camponeses consideravam ter 35 recebido sua liberdade não do imperador mas da revolucionária Dieta Húngara Esta foi a única parte da Europa onde a derrota da revolução foi seguida de algo parecido a uma guerrilha rural que o famoso ban dido Sándor Rósza manteve por vários anos Quando a revolução es tourou a Dieta consistindo de uma Câmara alta de moderados magna tas comprometidos e de uma Câmara baixa dominada por nobres rurais e advogados radicais teve apenas que trocar protestos exigindo ação Tal veio rapidamente a ocorrer sob a liderança de um hábil advogado jornalista e orador Louis Kossuth 180294 que viria a se tornar a personalidade revolucionária internacionalmente mais famosa de 1848 Por razões práticas a Hungria sob um governo de coalizão moderado radical relutantemente autorizado por Viena era um estado autônomo pelo menos até que os Habsburgos estivessem em condições de recon quistála Depois da batalha de Custozza eles pensaram que já estavam e cancelando as leis da reforma húngara de março e invadindo em se guida o país colocaram os húngaros diante da alternativa de capitula ção ou radicalização Conseqüentemente sob a liderança de Kossuth a Hungria virou a mesa depondo o imperador apesar de formalmente não proclamar a república em abril de 1849 O apoio popular e a lide rança militar de Görgei permitiu aos húngaros fazer face ao exército austríaco Eles só vieram a ser derrotados quando Viena em desespero apelou para a derradeira arma da reação as forças russas Isso foi deci sivo Em 13 de agosto a parcela remanescente do exército húngaro ca pitulou não para o comando austríaco mas para o russo Sozinha en tre as revoluções de 1848 a húngara não caiu e nem de longe pareceu cair devido a sua fraqueza interna mas pela esmagadora intervenção externa É evidente que as chances do país em evitar a conquista eram nulas depois que todo o resto ruíra Havia alguma alternativa para esta débâcle geral Quase que certamente não Dos principais grupos sociais envolvidos na revolu ção a burguesia como já vimos descobriu que preferia a ordem à chance de pôr em prática todo o seu programa quando diante da a meaça à propriedade Diante do confronto com a revolução verme lha os moderados liberais e os conservadores marchavam ombro a ombro Os notáveis na França quer dizer as pessoas de respeito influentes e ricas que dirigiam as questões políticas daquela nação deram fim a sua longa e antiga luta entre os partidários dos Bourbons dos Orleans mesmo dos que apoiavam a república e adquiriram uma consciência de classe nacional através de um emergente e novo par tido da ordem As figuraschave na monarquia restaurada dos Habs burgos viriam a ser o ministro do Interior Alexander Bach 180667 um antigo moderado liberal oposicionista e o magnata do comércio e navios K von Bruck 17981860 figurachave no porto de Trieste Os banqueiros e comerciantes da região da Uhr que falavam pelo li beralismo burguês prussiano teriam preferido uma monarquia consti tucional limitada desde que confortavelmente estabelecida como os 36 pilares de uma Prússia restaurada onde todos os eventos viessem a prescindir de um sufrágio democrático De volta os regimes conser vadores restaurados estavam bem preparados para fazer concessões ao liberalismo econômico legal e até cultural dos homens de negó cios desde que isto não significasse um recuo político Como vere mos mais tarde os anos reacionários de 1850 viriam a ser em termos econômicos um período de sistemática liberalização Em 184849 os moderados liberais fizeram então duas importantes descobertas na Europa ocidental que revoluções eram perigosas e que algumas de suas mais substanciais exigências especialmente nos assuntos eco nômicos poderiam vir a ser atingidas sem elas A burguesia cessara então de ser uma força revolucionária O grande corpo de radicais da baixa classe média artesãos des contentes pequenos proprietários etc e mesmo agricultores cujos portavozes e líderes eram intelectuais especialmente jovens e margi nais formavam uma força revolucionária significativa mas dificil mente uma alternativa política Eles alinhavamse em geral com a esquerda democrática A esquerda alemã pedia novas eleições pois seu radicalismo fizera grande estardalhaço em muitas áreas no final de 1848 e início de 1849 apesar de então já não mais dominar as grandes cidades que haviam sido reconquistadas pela reação Na França os democratas radicais conseguiram 2 milhões de votos em 1849 contra 3 milhões para os monarquistas e 800 mil para os mode rados Os intelectuais forneceram seus ativistas mas apenas em Viena a Legião Acadêmica de estudantes chegou a formar efetivamente tropas de choque para combate Chamar 1848 de a revolução dos in telectuais é um erro Eles não eram mais importantes nesta revolução que em quaisquer das outras que ocorreram assim como esta em paí ses relativamente atrasados onde o melhor do estrato médio consistia de pessoas caracterizadas por sua escolarização e comando da palavra escrita graduados de todos os tipos jornalistas professores funcio nários Mas não havia dúvida de que os intelectuais eram proeminen tes poetas tais como Petöfi na Hungria Herwegh e Freiligrath na A lemanha que pertencia ao corpo editorial da Neue Rheinische Zei tung Victor Hugo e o consistente moderado Lamartine na França os professores franceses ainda que suspeitos para os governos perma neceram quietos sob a monarquia de julho e supõese terem feito frente com a ordem em 1848 acadêmicos em grande número na Alemanha a maioria no lado moderado médicos como C G Jacoby 180451 na Prússia Adolf Fischhof 181693 na Áustria cientistas como F V Raspail 17941878 na França e uma vasta quantidade de jornalistas e publicistas dos quais Kossuth era entre todos o mais celebrado e Marx provava ser o mais formidável Como indivíduos tais homens podiam exercer um papel decisivo como membros de um estado social específico ou como membros de uma pequenaburguesia radical não o podiam O radicalismo dos pe quenos que tinha expressão na exigência de uma constituição demo 37 crática de estado fosse constitucional ou republicana fornecendolhes a maioria para si e seus aliados camponeses assim como um governo democrático local que lhes desse controle sob a propriedade municipal e sobre uma série de funções atualmente exercidas pelos burocratas 7 era suficientemente genuíno mesmo com uma crise secular numa das mãos e uma depressão econômica temporária na outra proporcionan do um gosto um pouco amargo O radicalismo dos intelectuais possuía raízes um pouco menos profundas Tinha sua base largamente como descobriuse depois na inabilidade da nova sociedade burguesa de an tes de 1848 em produzir suficiente número de postos de status adequa do para os educados que produzia em quantidade sem precedentes e cuja recompensa salarial era bem mais modesta que suas ambições O que aconteceu com todos aqueles estudantes radicais de 1848 nos anos prósperos de 1850 e 1860 Eles continuaram a herança da tradição fa miliar e finalmente se acomodaram E havia inúmeras possibilidades de acomodarse especialmente depois da retirada da velha nobreza e da diversificação das formas de fazer dinheiro que a burguesia ligada ao comércio produzia para aqueles cujas qualificações eram primariamen te escolaridade Em 1842 10 dos professores de liceus franceses ori ginavamse dos notáveis mas por volta de 1877 nenhum Em 1868 a França produziu poucos graduados secundários bacheliers a mais que nos anos de 1830 mas um número muito maior podia seguir carreira nos bancos comércio no bemsucedido jornalismo e depois de 1870 na política profissional8 Além disso quando diante da revolução vermelha mesmo os ra dicais democratas tendiam a cair na retórica dilacerados entre sua ge nuína simpatia pelo povo e seu sentido de propriedade e dinheiro Diferentes da burguesia liberal eles não mudaram de lado Apenas vacilaram mas nunca muito distantes da direita No que diz respeito aos trabalhadores pobres faltavalhes orga nização liderança e talvez acima de tudo a conjuntura histórica para fornecer uma alternativa política Suficientemente fortes para fazer o projeto de uma revolução social parecer real e ameaçador eles eram porém demasiadamente fracos para fazer algo mais do que ameaçar seus inimigosSuas forças eram desproporcionalmente efetivas pois estavam concentrados em massas famintas nos lugares mais sensíveis ou seja as cidades maiores especialmente as capitais Tudo isto trazia certa fraqueza encoberta em primeiro lugar sua deficiência numérica eles não eram sempre maioria nas cidades ge ralmente considerandose mesmo uma modesta minoria da população e em segundo lugar sua imaturidade política e ideológica Entre e les os estratos mais ativistas e politicamente conscientes consistiam de artesãos préindustriais usando o termo na forma que os ingleses contemporâneos o entendem referindose a trabalhadores tais como artífices artesãos trabalhadores manuais especializados em oficinas nãomecânicas etc Atirados na revolução social seus alvos enquan to massa eram distintamente mais modestos na Alemanha como o 38 impressor comunista Stefan Born descobriu em Berlim Os pobres e os trabalhadores nãoespecializados das cidades e fora da Inglaterra o proletariado industrial e mineiro como um todo não haviam ainda desenvolvido uma ideologia política para si Na zona industrial do norte da França mesmo o republicanismo teve dificuldades em im porse até quase o final da segunda república 1848 viu Lille e Rou baix exclusivamente preocupadas com seus problemas econômicos dirigindo seus tumultos não contra reis ou burgueses mas contra os ainda mais famintos trabalhadores belgas imigrantes Onde os plebeus urbanos ou mais raramente os novos proletá rios encontravamse sob a influência da ideologia jacobinista socia lista ou democráticorepublicana ou como em Viena de estudantes ativistas tornavamse uma força política pelo menos como geradores de motins Sua participação em eleições ainda era baixa e imprevisí vel diferente daqueles trabalhadores rurais pauperizados que na Sa xônia ou Inglaterra eram altamente radicalizados Paradoxalmente fora de Paris isto era raro na França jacobina enquanto que na Ale manha a Liga Comunista de Marx fornecia os elementos de uma rede nacional para a extremaesquerda Fora deste raio de influência os trabalhadores pobres eram politicamente insignificantes Evidentemente não deveríamos subestimar o potencial do pro letariado de 1848 mesmo que jovem e imaturo como força social começando como estava a ter sua consciência enquanto classe Em certo sentido aliás seu potencial revolucionário era maior do que se ria subseqüentemente O duro conhecimento do pauperismo e da crise antes de 1848 havia encorajado poucos a acreditar que o capitalismo poderia ou iria trazer condições decentes de vida ou se trouxesse se elas iriam durar A juventude e a fraqueza da classe trabalhadora ain da emergindo da massa dos trabalhadores pobres mestres artesãos independentes e pequenos comerciantes evitou porém uma concen tração exclusiva em reivindicações econômicas o que só ocorria en tre os mais ignorantes e isolados As reivindicações políticas sem as quais nenhuma revolução é feita nem mesmo a mais puramente soci al delas foram feitas no contexto da situação O objetivo popular em 1848 a república democrática e social era simultaneamente social e político Mas mesmo a experiência trabalhista acrescentada de no vos elementos institucionais baseados na prática de sindicatos e da ação cooperativa não foi suficiente para criar elementos novos e po derosos como os sovietes da revolução russa Além disso organização ideologia e liderança eram lamenta velmente pouco desenvolvidas Mesmo a mais elementar das formas o sindicato era restrito a umas poucas centenas ou no melhor dos ca sos uns poucos milhares de membros Freqüentemente mesmo as so ciedades dos trabalhadores especializados pioneiros em sindicalismo apareceram pela primeira vez durante a revolução os impressores na Alemanha os chapeleiros na França Os socialistas e comunistas or ganizados eram ainda mais limitados em número umas poucas dú 39 zias no máximo umas poucas centenas Portanto 1848 foi a primeira revolução na qual socialistas ou mais precisamente comunistas pois socialismo pré1848 era um movimento largamente apolítico para construir utopias cooperativas apareceram na frente da cena desde o inicio Era o ano não apenas de Kossuth A LedruRollin 180774 e Mazzini mas de Karl Marx 181883 Louis Blanc 181182 e L A Blanqui 180581 o severo rebelde que saiu de uma vida na prisão apenas quando libertado pelas revoluções de Bakunine e mesmo de Proudhon Mas o que significava socialismo para os seus seguidores além de um nome para uma classe trabalhadora autoconsciente com suas próprias aspirações a uma sociedade diferente do capitalismo e baseada na sua derrubada Mesmo seu inimigo não estava claramente definido Falavase muito de classe trabalhadora e mesmo de pro letariado mas durante a revolução nada sobre capitalismo De fato quais eram as perspectivas políticas de uma classe traba lhadora mesmo que socialista O próprio Karl Marx não acreditou que a revolução estivesse na agenda Mesmo na França o proletariado de Paris ainda era incapaz de ir além da república burguesa de outra forma que não fosse na idéia na imaginação Suas necessidades imediatas e confessadas desviavaos da vontade de derrubar a burguesia e nem eles possuíam os instrumentos para tal efetuar O máximo que poderia ser atingido seria uma república burguesa que trouxesse à luz a verdadeira natureza da futura luta a confrontação entre a burguesia e o proletari ado e fixasse na lembrança dos trabalhadores que sua posição como classe ficara mais insuportável e que seu antagonismo com a burguesia tornarase mais agudo9 Seria numa primeira instância uma república democrática numa segunda uma transição de uma revolução burguesa incompleta para uma revolução proletáriapopular e finalmente uma ditadura do proletariado ou como na frase que talvez tenha derivado de Blanqui é que refletiu a temporária proximidade dos dois grandes re volucionários no imediato pós1848 a revolução permanente Mas diferente de Lênin em 1917 Marx não concebeu a substituição da revo lução burguesa por uma proletária até depois da derrota de 1848 e en tão quando formulou uma perspectiva comparável a de Lênin não a manteve por muito tempo Não haveria uma segunda edição de 1848 na Europa central e do norte A classe operária como ele cedo reconhe ceu teria de seguir um caminho diferente Portanto as revoluções de 1848 surgiram e quebraramse como uma grande onda deixando pouco exceto mito e promessa Elas de veriam ter sido revoluções burguesas mas a burguesia fugiu delas Elas poderiam terse reforçado umas às outras sob a liderança da França prevenindo ou adiando a restauração dos velhos governos e mantendo à distância o tzar Mas a burguesia francesa preferiu a esta bilidade social em casa aos prêmios e perigos de ser uma vez mais la grande nation e por razões análogas os líderes moderados da revo lução hesitaram em pedir a intervenção francesa Nenhuma outra for 40 ça social poderia ter sido forte suficientemente para darlhes coerên cia e ímpeto exceto nos casos especiais onde havia luta pela inde pendência contra um poder politicamente dominante e mesmo isso falhou já que as lutas nacionais ficaram isoladas e em todos os ca sos fracas demais para fazer frente aos poderosos de antes Os gran des e característicos personagens de 1848 representaram seus papéis de heróis no palco da Europa por poucos meses para depois desapa recerem para sempre com a exceção de Garibaldi que viria a ter um momento ainda mais glorioso doze anos mais tarde Kossuth e Maz zini viveram o resto de suas vidas no exílio pouco contribuindo dire tamente para a conquista por seus países da autonomia e unificação apesar de terem um lugar garantido nos seus panteões nacionais Le druRollin e Raspail nunca mais vieram a ter um outro momento de celebridade como na segunda república e os eloqüentes professores do parlamento de Frankfurt retiraramse para seus gabinetes Dos passionais exilados de 1850 formando grandes planos e governos ri vais no exílio do fog de Londres nada sobreviveu salvo a obra dos mais isolados e atípicos Marx e Engels Ainda assim 1848 não foi meramente um breve episódio histó rico sem conseqüências Se as mudanças que 1848 realizou não foram nem as que os revolucionários intentaram nem mesmo facilmente de finíveis em termos de regimes políticos leis e instituições elas foram pelo menos bem profundas Marcaram o fim pelo menos na Europa ocidental da política da tradição das monarquias que acreditavam que seus povos exceto os descontentes da classe média aceitavam acolhiam mesmo com prazer a regra do direito divino que apontava dinastias para presidir sobre sociedades hierarquicamente estratifica das tudo sancionado pela tradição religiosa na crença dos direitos e deveres patriarcais dos que eram superiores social e economicamente Como o poeta Grillparzer ele mesmo de forma alguma um revolucio nário escreveu ironicamente sobre presumivelmente Metternich Aqui jaz sua celebridade esquecida O legítimo famoso Dom Quixote Quem revirando a verdade e o fato julgouse esperto E acabou acreditando nas suas próprias mentiras Um velho louco que deve ter sido um patife na juventude Não podia mais reconhecer a verdade10 Dali em diante as forças do conservadorismo privilégio e ri queza teriam que defenderse de outras formas Mesmo os pesados e ignorantes camponeses da Itália do sul na grande primavera de 1848 cessaram de patrocinar o absolutismo como haviam feito 50 anos an tes Quando eles marcharam para ocupar a terra raramente expressa ram hostilidade à constituição Os defensores da ordem social precisaram aprender a política do povo Esta foi a maior inovação trazida pelas revoluções de 1848 41 Mesmo os mais arquireacionários dos junkers prussianos descobri ram naquele ano que precisavam de um jornal que pudesse influen ciar a opinião pública conceito em si próprio ligado ao liberalis mo e incompatível com a hierarquia tradicional O mais inteligente dos arquireacionários prussianos de 1848 Otto von Bismarck 1815 98 mais tarde demonstraria sua lúcida compreensão da natureza da política na sociedade burguesa e seu magistral domínio das suas téc nicas Porém as inovações políticas mais significativas deste tipo o correram na França Ali a derrota da insurreição da classe trabalhadora em junho ha via deixado um poderoso partido da ordem capaz de derrotar a re volução social mas não de conseguir o apoio das massas ou mesmo daqueles conservadores que não desejavam que em função da defesa de sua ordem necessitassem se comprometer com aquele preciso tipo de moderado republicanismo que estava então no poder O povo estava ainda demasiado mobilizado para permitir uma limitação nas eleições somente após 1850 uma substancial parte da vil multidão quer dizer um terço da França dois terços de Paris foi excluída do voto Entretanto em dezembro de 1848 os franceses não elegeram um moderado para a nova presidência da república mas também não elegeram um radical Não havia candidato monarquista O vence dor por maioria esmagadora 55 milhões em 74 milhões de votos foi Luís Napoleão sobrinho do grande imperador Apesar de ter de monstrado mais tarde ser um político notavelmente astuto Napoleão deu a impressão quando assumiu o governo no final de setembro na da mais ter qae um nome prestigiado e o apoio de uma devotada a mante inglesa Evidentemente ele não era um revolucionário no sen tido social mas também não era um conservador seus seguidores chegaram mesmo a fazer algumas brincadeiras com seu interesse na juventude pelo Saintsimonismo Ver Cap 3 parte II mais adiante e alegaram ter ele alguma simpatia pelos pobres Mas basicamente ele venceu porque os camponeses votaram solidamente no slogan A baixo as taxas abaixo os ricos abaixo a república viva o imperador em outras palavras como Marx analisou os trabalhadores votaram nele contra a república dos ricos pois na percepção deles Luís Napo leão significava a deposição de Cavaignac que havia derrotado a in surreição de junho a demissão do republicanismo burguês a recupe ração da vitória de junho 11 e a pequenaburguesia porque ele pare cia não alinharse com a grande burguesia A eleição de Luís Napoleão significou que mesmo a democracia do sufrágio universal aquela instituição identificada com a revolução era compatível com a manutenção da ordem social Mesmo uma mas sa esmagadora de descontentes não estava destinada a eleger gover nantes dedicados a derrubar a sociedade As grandes lições desta Morgado membro da classe dominante na Prússia N T 42 experiência não foram imediatamente apreendidas pois Luís Napole ão cedo aboliu a república e proclamouse imperador apesar de nun ca esquecer as vantagens políticas de um bemconduzido sufrágio u niversal que veio a reintroduzir Ele viria a ser o primeiro dos chefes de estado modernos que governaria não apenas baseado na força das armas mas também com aquela espécie de demagogia e de relações públicas tão mais facilmente operadas do alto do estado do que de qualquer outro lugar Sua experiência demonstra não apenas que a ordem social podia aparecer como uma força capaz de atrair a es querda mas também uma era ou um país onde os cidadãos tinham sido mobilizados para participar na política As revoluções de 1848 deixaram claro que a classe média liberalismo democracia política nacionalismo e mesmo as classes trabalhadoras eram daquele mo mento em diante presenças permanentes no panorama político A derrota das revoluções poderia temporariamente tirálos do cenário mas quando reapareciam determinavam as ações mesmo daqueles es tadistas que tinham menos simpatias por eles Segunda Parte DESENVOLVIMENTO Velocity Distance x Time Time taken to cover a distance Average velocity Average velocity total distance divided by total time taken Displacement Displacement Time Displacement Time Distance Time 45 Segundo Capítulo A GRANDE EXPANSÃO Aqui aquele que é poderoso nas armas da paz capital e maquinaria usaas para proporcionar conforto e alegria para o público do qual ele é um servidor tornandose portanto rico enquanto enriquece a outros com suas mercadorias William Whewell 1852 1 Um povo pode atingir bemestar material sem táticas subversivas se ele for dócil trabalhador e se esforçar sempre para melhorar Dos estatutos da Société contre LIgnorance de ClermontFerrand 1869 2 A área inabitada do mundo expandese rapidamente Novas comuni dades isto é novos mercados diariamente surgem nas outrora de sertas regiões no Novo Mundo no Oeste e nas terras tradicionalmen te férteis do Velho Mundo no Leste Philoponos 1850 3 I Poucos observadores em 1849 poderiam ter predito que 1848 iria ser a última revolução geral no ocidente As reivindicações políti cas do liberalismo radicalismo democrático e nacionalismo apesar de excluírem a república social viriam a ser gradualmente realiza das nos 70 anos seguintes na maioria dos países desenvolvidos sem maiores distúrbios internos e a estrutura social da parte desenvolvida do continente iria provar a si mesma ser capaz de resistir às explosões catastróficas do século XX pelo menos até o presente 1974 A ra zão principal para isso reside na transformação e expansão econômica extraordinárias dos anos entre 1848 e o início da década de 1870 que é o assunto principal deste capítulo Foi o período no qual o mundo tornouse capitalista e uma minoria significativa de países desenvol vidos transformouse em economias industriais Esta era de desmedido avanço econômico começou com um bo om que viria a ser o mais espetacular ocorrido até então e sobretudo por ter sido temporariamente impedido pelos eventos de 1848 As revo luções haviam sido precipitadas pela última e talvez maior das crises Título original The Great Boom NT 46 econômicas do tipo antigo O novo mundo do ciclo do comércio que apenas os socialistas haviam reconhecido como o ritmo básico e modo de operação da economia capitalista tinha seu tipo próprio de flutua ções econômicas e suas próprias dificuldades Porém em meados da década de 1840 embora a difusa e incerta era do desenvolvimento ca pitalista desse a impressão de estar chegando a um fim ao contrário o grande salto para a frente estava apenas por começar 184748 viu um severo tropeço do ciclo do comércio provavelmente agravado por pro blemas remanescentes mais antigos De qualquer modo de um ponto de vista puramente capitalista era apenas uma depressão aguda naquilo que já parecia uma tumultuada economia de negócios James de Roths child que olhava a situação econômica de 1848 com bastante compla cência era um homem de negócios sensível mas profeta político bem pobre O pior do pânico parecia ter passado e as perspectivas a longo prazo eram mais róseas Porém embora a produção industrial tivesse se recuperado bem rapidamente mesmo depois da virtual paralisia dos meses revolucionários a atmosfera geral permanecia incerta O que seguiu foi tão extraordinário que não foi possível detectar um precedente Nunca por exemplo as exportações inglesas cresceram tão rapidamente do que nos primeiros sete anos de 1850 O algodão in glês aumentou sua taxa de crescimento sobre as décadas anteriores En tre 1850 e 1860 a taxa duplicou Em números absolutos a performance é ainda mais impressionante entre 1820 e 1850 estas exportações cresceram em 1 100 milhões de jardas mas na década entre 1850 e 1860 elas cresceram consideravelmente mais que 1 300 milhões O número das máquinas de algodão cresceu de 100 mil entre 181921 e 184446 e dobrou daí até 18504 E estamos aqui lidando com uma grande indústria de há muito estabelecida e mais do que isso que aca bava de perder terreno nos mercados europeus nesta década devido à rapidez do desenvolvimento das indústrias locais Para onde olharmos evidências similares da grande expansão podem ser encontradas A ex portação de ferro da Bélgica mais que duplicou entre 1851 e 1857 Na Prússia um quarto de século antes de 185067 companhias tinham sido fundadas com um capital total de 45 milhões de táleres mas em 1851 57 115 companhias similares tinhamse estabelecido excluindo com panhias de estradas de ferro com um capital total de 1145 milhões quase todas elas nos anos eufóricos entre 1853 e 1857 5 Não é mais necessário continuar a reproduzir estas estatísticas mas os homens de negócios da época divulgavamnas com avidez O que fez este boom tão satisfatório para os homens de negócios famintos de lucros foi a combinação de capital barato e um rápido au mento nos preços Depressões do tipo de ciclo de comércio sempre significaram preços baixos em todos os acontecimentos do século XIX Expansões eram inflacionárias Mesmo assim o aumento de cer ca de um terço dos níveis de preços ingleses entre 184850 e 1857 foi notavelmente grande Os lucros aparentemente à espera de produtores e 47 comerciantes apresentavamse irresistíveis Num certo momento deste período inacreditável a taxa de lucro do capital do credit mobilier de Paris a companhia financeira que era o símbolo da expansão capitalista no período ver capítulo 12 mais adiante chegou a 50 E os homens de negócios não eram os únicos a lucrar Como já foi sugerido o em prego cresceu aos saltos tanto na Europa como no resto do mundo pa ra onde homens e mulheres migravam então em quantidades enormes ver capítulo 11 mais adiante Não sabemos atualmente muito sobre taxas de desemprego mas mesmo na Europa um exemplo de evidência é decisivo O grande aumento no custo dos cereais isto é o principal elemento no custo de vida entre 1853 e 1855 não precipitou mais tu multos em parte alguma salvo em regiões atrasadas como o norte da Itália Piedmont e Espanha onde talvez tenha contribuído para a revo lução de 1854 A alta taxa de emprego e a presteza em conceder au mentos salariais onde fosse necessário apagaram o descontentamento popular Mas para os capitalistas as amplas provisões de trabalho então chegando ao mercado eram relativamente baratas A conseqüência política deste boom era de longo alcance Pro porcionou aos governos sacudidos pela revolução um espaço para respirar de valor inestimável e por outro lado destroçou os ânimos dos revolucionários Numa palavra a política estava em estado de hi bernação Na Inglaterra o cartismo passou à história e o fato de que sua morte tenha sido mais prolongada do que historiadores normal mente supõem não a fez menos definitiva Mesmo Ernest Jones 181969 seu líder mais persistente desistiu de reviver um movi mento independente das classes trabalhadoras no final da década de 1850 A reforma parlamentar cessou de preocupar os políticos ingle ses por algum tempo deixandoos livres para dançar seus complica dos passos de bale parlamentar Mesmo os radicais de classe média Cobden e Bright eram agora uma minoria isolada na política Para as monarquias restauradas do continente e para o filho in desejado da Revolução Francesa o Segundo Império de Napoleão III o espaço para respirar era ainda mais vital Para Napoleão este espaço proporcionou maiorias eleitorais genuínas e comoventes que deram colorido à sua aspiração de ser um imperador democrático Para as velhas monarquias e principados deu tempo para a recuperação polí tica e a legitimação da estabilidade e prosperidade que era então poli ticamente mais relevante que a legitimidade de suas dinastias Tam bém proporcionoulhes lucros sem a necessidade de consultar as sembléias representativas e deixou os exilados políticos a roerem su as unhas e a se atacarem mutuamente com selvageria num exílio sem esperanças Por todo aquele tempo deixouos fracos nos assuntos in ternacionais mas fortes internamente Mesmo o Império dos Habs burgos que já havia sido restaurado em 1849 graças à intervenção do exército russo era agora capaz de pela primeira e única vez na histó ria administrar todos os seus territórios incluindo os húngaros re 48 calcitrantes num único regime absolutista centralizado e burocráti co Este período de calma chegou ao fim com a depressão de 1857 Economicamente falando tratavase apenas de uma interrupção da era de ouro do crescimento capitalista que continuou numa escala até maior na década de 1860 e atingiu seu clímax em 187173 Politica mente transformou a situação Confessadamente desapontou as es peranças dos revolucionários que esperavam um novo 1848 apesar de admitirem que as massas haviamse tornado letárgicas em resul tado desta prolongada prosperidade7 Mas a política reanimouse Em pouco tempo todas as velhas questões da política liberal voltaram à agenda a unificação nacional da Alemanha e da Itália a reforma constitucional liberdades civis e o resto Onde a expansão econômica de 185157 havia tomado lugar num vácuo político prolongando a derrota e a exaustão de 184849 depois de 1859 ela coincidiu com uma intensa e crescente atividade política Por outro lado apesar de interrompida por diversos fatores externos como a Guerra Civil Ame ricana de 186165 a década de 1860 foi do ponto de vista econômi co relativamente estável A depressão de ciclo de comércio seguinte que ocorreu de acordo com o gosto e a região em algum período en tre 1866 e 1868 não chegou a ser tão concentrada global ou dramáti ca como a de 185758 Em resumo a política ganhou novo ânimo num período de expansão mas não era mais a política da revolução II Se a Europa estivesse vivendo a era dos príncipes barrocos teria então sido soterrada por máscaras espetaculares procissões e óperas distribuindo representações alegóricas do triunfo econômico e pro gresso industrial aos pés de seus governantes De fato o mundo triun fante do capitalismo teve seu equivalente A era de sua vitória global foi iniciada e pontilhada pelos gigantescos rituais de autocongratula ção as grandes exibições internacionais cada uma delas encaixada num principesco monumento à riqueza e ao progresso técnico o Pa lácio de Cristal em Londres 1851 a Rotonda maior que São Pedro em Roma em Viena cada qual exibindo o número crescente e varia do de manufaturas cada uma delas atraindo turistas nacionais e es trangeiros em quantidades astronômicas Quatorze mil firmas exibi ram em Londres em 1851 a moda tinha sido condignamente inaugu rada no lar do capitalismo 24 mil em Paris em 1855 29 mil em Londres em 1862 50 mil em Paris em 1867 Justiça seja feita a maior delas todas foi a Feira do Centenário de Filadélfia em 1876 nos Estados Unidos com a presença do Imperador e da Imperatriz do Brasil cabeças coroadas da época curvadas diante dos produtos da indústria e de 130 mil cidadãos Eles eram os primeiros dos dez mi lhões que pagaram tributo naquela ocasião ao progresso da época Quais eram as razões para este progresso Por que a expansão e 49 conômica foi tão acelerada neste período A pergunta precisaria real mente ser feita inversamente O que nos choca retrospectivamente so bre a primeira metade do século XIX é o contraste entre o enorme e crescente potencial produtivo da industrialização capitalista e sua ina bilidade bem patente em aumentar sua base Poderia crescer dramati camente mas parecia incapaz de expandir o mercado para seus produ tos proporcionar saídas lucrativas para seu capital acumulado ter por si só a capacidade de gerar emprego a uma taxa comparável ou com sa lários adequados É instrutivo lembrar que mesmo no final da década de 1840 observadores inteligentes e beminformados na Alemanha no clímax da explosão industrial naquele país admitiam como o fa zem atualmente nos países subdesenvolvidos que nenhuma indus trialização poderia fornecer emprego para a vasta e crescente popula ção em excesso dos pobres Revolucionários tinham tido a esperança de que isso viesse a ser definitivo mas mesmo homens de negócios te meram que isso pudesse vir a estrangular seu sistema industrial Ver 4 Era das Revoluções capítulo 16 Por duas razões estas esperanças ou medos provaram ser infun dados Em primeiro lugar a economia industrial nos seus primórdios descobriu graças largamente à pressão da busca de lucro da acumu lação do capital o que Marx chamou sua suprema realização a es trada de ferro Em segundo lugar e parcialmente devido à estrada de ferro o vapor e o telégrafo que finalmente representaram os meios de comunicação adequados aos meios de produção 8 o espaço geo gráfico da economia capitalista poderia repentinamente multiplicar se na medida em que a intensidade das transações comerciais aumen tasse O mundo inteiro tornouse parte desta economia Esta criação de um único mundo expandido é talvez a mais importante manifesta ção do nosso período ver capítulo 3 adiante Olhando retrospecti vamente meio século depois H M Hyndman simultaneamente um homem de negócios vitoriano e um marxista apesar de atípico em ambos os papéis corretamente comparou os dez anos de 1847 a 1857 com a era das grandes descobertas geográficas e as conquistas de Colombo Vasco da Gama Cortez e Pizarro Apesar de nenhuma descoberta dramática ter tido lugar e com exceções relativamente menores poucas conquistas formais terem sido realizadas por con quistadores militares por razões práticas um mundo econômico intei ramente novo somouse ao antigo e integrouse nele Isto era particularmente crucial para o desenvolvimento econô mico e forneceu a base para a gigantesca expansão nas exportações em mercadorias capital e homens que teve um papel tão importante na expansão daquele que era ainda o maior país capitalista a Inglater ra A economia de consumo de massa ainda repousava no futuro ex ceto talvez nos Estados Unidos O mercado doméstico dos pobres a inda não engrossado por camponeses e pequenos artesãos era desde nhado como base para qualquer avanço econômico espetacular que fosse O capitalismo tinha agora o mundo inteiro a seu dispor e a ex 50 pansão simultânea do comércio e dos investimentos internacionais dá bem a medida do entusiasmo que teve em capturálo O comércio mundial entre 1800 e 1840 não tinha chegado a duplicar Entre 1850 e 1870 cresceu de 260 Qualquer coisa vendável era negociada mesmo aquelas que sofriam direta resistência do país comprador co mo o caso do ópio da Índia britânica exportado para a China que do brou em quantidade e triplicou de preço O número médio de caixas de ópio de Bengala exportadas anualmente em 184449 era de 43 mil e em 186974 87 mil Por volta de 1875 um bilhão de libras es terlinas tinham sido investidas no exterior pela Inglaterra três quar tas partes deste montante desde 1850 enquanto o investimento ex terno francês decuplicava entre 1850 e 1880 Observadores da época com seus olhos fixos em aspectos me nos fundamentais da economia certamente apontariam um outro fa tor as grandes descobertas de ouro na Califórnia Austrália e outros lugares depois de 1848 ver capítulo 3 mais adiante Estas descober tas multiplicaram os meios de pagamento disponíveis para a econo mia mundial e removeram o que muitos homens de negócios acharam ser uma escassez de meios de pagamento paralisante abaixaram a taxa de juros e encorajaram a expansão do crédito Em sete anos a disponibilidade mundial de ouro aumentou de seis a sete vezes assim como a quantidade de impressões de moedas de ouro emitidas pela Inglaterra França e Estados Unidos cresceu de uma média anual de 49 milhões de libras em 184849 para 281 milhões de libras por ano entre 1850 e 1856 O papel da barra de ouro na economia mundial continua a ser até hoje um assunto de discussão apaixonada debate este que não devemos abordar Sua ausência entretanto não deve ter trazido tantos inconvenientes quanto foi imaginado pelos observado res da época outros meios de pagamento como cheques uma grande novidade faturas etc estavam em expansão e a uma taxa conside rável Porém três aspectos da nova disponibilidade de ouro pratica mente não levantavam controvérsias Em primeiro lugar ajudaram talvez de forma decisiva a produ zir aquela situação relativamente rara entre cerca de 1810 e o fim do século XIX uma era de aumento de preços ou de inflação moderada porém flutuante Basicamente a maior parte deste século foi defla cionária devido grandemente à persistente tendência da tecnologia em baratear produtos manufaturados e das recémabertas fontes de matériasprimas e alimentos que barateavam mesmo que mais inter mitentemente os produtos primários Deflação a longo termo isto é pressão nas margens de lucro não fizeram muito mal aos homens de negócios porque estes fabricaram e venderam uma quantidade muito mais vasta Porém até pouco depois do fim de nosso período não fez aos trabalhadores muito bem já que ou o custo de vida não caía na mesma razão ou seus salários eram demasiado magros para permitir lhes algum benefício De outro lado a inflação indiscutivelmente au mentou as margens de lucro e assim fazendo encorajou os negócios 51 Nosso período foi basicamente um interlúdio inflacionário num sécu lo deflacionário Segundo a disponibilidade de barras de ouro em largas quantida des ajudou a estabelecer aquele standard monetário estável e seguro baseado na libra esterlina fixada com paridade no ouro sem o qual como a experiência das décadas de 1930 e 1970 viria demonstrar o co mércio mundial tornase mais difícil complexo e imprevisível Tercei ro os caçadores de ouro abriram eles mesmos novas áreas sobretudo no Pacífico para intensa atividade econômica Assim fazendo eles criaram mercados a partir do nada como Engels tristemente colocou para Marx E em meados da década de 1870 Califórnia Austrália e ou tras zonas auríferas já não eram nada negligenciáveis Elas continham para mais de três milhões de habitantes com mais dinheiro na mão que qualquer outra população comparável em tamanho Observadores da época também teriam dado ênfase à contribui ção de um outro fator a liberação da iniciativa privada engenho com o qual todos concordam o progresso da indústria ganhou força Nun ca houve um consenso mais esmagador entre economistas ou polí ticos e administradores inteligentes no que toca à receita para o cres cimento de sua época o liberalismo econômico As barreiras institucionais sobreviventes ao livre movimento dos fatores de produção à livre iniciativa ou a qualquer coisa que conce bivelmente pudesse vir a tolher sua operacionalidade lucrativa caíram diante de uma ofensiva mundial O que torna esta suspensão geral de barreiras tão extraordinária é que ela não estava limitada aos estados onde o liberalismo político era triunfante ou mesmo influente Se ti nha sido mais drástica nas monarquias absolutas restauradas e princi pados da Europa que na Inglaterra França ou Países Baixos era por que ali muito mais havia a ser levado de roldão O controle das corpo rações sobre a produção artesanal que tinha permanecido forte na A lemanha deu lugar a Gewerbefreiheit liberdade para iniciar e prati car qualquer forma de comércio na Áustria em 1859 e na maior parte da Alemanha na primeira metade da década de 1860 Foi final mente estabelecida de forma completa na Federação do Norte da A lemanha 1869 e no Império alemão para o descontentamento de numerosos artesãos que deveriam conseqüentemente tornarse de forma crescente hostis ao liberalismo chegando a proporcionar uma base política para movimentos de extremadireita a partir de 1870 A Suécia que havia abolido as taxas em 1846 estabeleceu completa li berdade em 1864 a Dinamarca aboliu a velha legislação de taxas em 1849 e 1857 a Rússia que na sua maior parte não havia conhecido um sistema de taxas removeu os últimos vestígios do que havia em uma das cidades alemães da sua província báltica 1866 apesar de ter continuado por razões políticas a restringir o direito dos judeus de praticar comércio e negócios a uma área específica Esta liquidação legal dos períodos medieval e mercantilista não 52 foi limitada a uma legislação profissional As leis contra a usura caíram por terra na Inglaterra Holanda Bélgica e norte da Alemanha entre 1854 e 1867 O controle severo que o governo exercia sobre a mi neração incluindo a operação de minas foi virtualmente suspenso como por exemplo na Prússia entre 1851 e 1865 e portanto sujeito à permissão governamental qualquer empresário poderia então reclamar os direitos para explorar qualquer mineral que viesse a achar e condu zir as explorações da forma que melhor lhe aprouvesse Similarmente a formação de companhias de negócios de então ficou muito mais livre do controle burocrático A Inglaterra e a França conduziram estas mo dificações enquanto a Alemanha só veio a estabelecer medidas simila res por volta da década de 1870 A lei comercial foi então adaptada à atmosfera que prevalecia de florescente expansão comercial Mas de alguma forma a tendência mais impressionante era o movimento em direção à total liberdade de comércio Abertamente a penas a Inglaterra havia abandonado o protecionismo de forma total mantendo taxas alfandegárias pelo menos teoricamente apenas por razões fiscais Portanto exceto pela eliminação ou redução de res trições etc nas vias navegáveis internacionais como o Danúbio 1857 e o tráfico entre a Dinamarca e a Suécia além da simplificação do sis tema monetário internacional pela criação de grandes zonas monetárias por exemplo a União Monetária Latina da França Bélgica Suíça e I tália em 1865 uma série de tratados de livre comércio cortaram substancialmente as barreiras de tarifas entre as nações industriais líde res na década de 1860 Mesmo a Rússia 1863 e a Espanha 1868 li garamse de certa forma ao movimento Apenas os Estados Unidos cu ja indústria apoiavase grandemente num mercado interno protegido e era pobre em exportações permaneceu um bastião do protecionismo mas mesmo assim mostrou alguma modificação no começo da década de 1870 Podemos mesmo dar mais um passo Até aquele momento mes mo as mais audaciosas e seguras economias capitalistas haviam hesi tado em repousar inteiramente no livre mercado com o qual estavam teoricamente comprometidas principalmente no que diz respeito à re lação entre patrões e empregados Mesmo neste campo sensível mo tivações nãoeconômicas foram evitadas Na Inglaterra a lei do Se nhor e do Empregado foi modificada estabelecendose igualdade de tratamento no que toca ao rompimento de contrato entre ambas as partes O que a primeira vista é mais surpreendente entre 1867 e 1875 todos os significativos obstáculos legais aos sindicatos traba lhistas e ao direito de greve foram abolidos com um impressionante pouco estardalhaço ver capítulo 6 mais adiante Muitos outros paí ses ainda hesitaram em conceder tal liberdade à organização traba lhista apesar do que Napoleão III relaxou a proibição legal sobre os sindicatos de forma bastante significativa Mesmo assim a situação geral nos países desenvolvidos tendia então para transformarse na 53 quilo que havia sido descrito no Gewerbeordnunq alemão de 1869 As relações entre aqueles que independentemente praticam um ne gócio e seus trabalhadores assistentes ou aprendizes são determina das por contrato livre Apenas o mercado regulava a compra e venda da força de trabalho como para qualquer outra coisa Indiscutivelmente este vasto processo de liberalização encora jou a iniciativa privada assim como a liberalização do comércio aju dou a expansão econômica mas não devemos esquecer que muito da liberalização formal não era realmente necessária Algumas formas de livre movimento internacional que hoje são controladas sobretudo as do capital e trabalho isto é migração eram em 1848 tomadas como dadas no mundo desenvolvido de forma que não eram sequer discu tidas ver capítulo II mais adiante Por outro lado a questão do lugar que as mudanças institucionais ou legais tomam no desenvolvimento é demasiadamente complexa para a fórmula simplista do século XIX liberalização cria progresso econômico A era de expansão já tinha começado antes mesmo que as corn laws tivessem sido revogadas na Inglaterra em 1846 Não há dúvida que a liberalização trouxe todo o tipo de resultados especificamente positivos Tanto que Copenhague começou a desenvolverse mais rapidamente como cidade depois da abolição das leis que desencorajavam os navios mercantes de entrar no Báltico 1857 Mas até onde o movimento global para liberalizar era uma causa concomitante ou conseqüência da expansão econômi ca fica aberto para discussão A única coisa certa é que quando ou tras bases para o desenvolvimento capitalista faziam sentir sua falta a liberalização não resolvia tudo por si mesma Nenhum lugar liberali zou mais do que a República de Nova Granada Colômbia entre 1848 e 1854 mas quem afirmaria que as grandes esperanças de pros peridade de seus chefes de estado foram realizadas imediatamente se é que foram realizadas Todavia na Europa estas mudanças indicaram uma profunda e grande confiança no liberalismo econômico que parecia ser justifica do por uma geração Dentro de cada país isto não era tão surpreen dente já que a iniciativa capitalista privada florescia tão claramente Corn laws Na história inglesa as leis regulando a importação e exportação de trigo embora haja registros que mencionem a imposição de tais restrições desde o século XII e las só vieram a tornarse politicamente importantes no final do século XVII e inícios do XIX diante da falta crescente do produto devido ao aumento populacional da Inglaterra e aos bloqueios impostos pelas guerras napoleônicas As Leis do Trigo foram finalmente re vogadas em 1846 um triunfo para os produtores cuja expansão havia sido dificultada pela proteção ao cereal contra os interesses dos senhores da terra Desde 1822 esta proteção era persistentemente impopular De 1839 a 1846 a AntiCorn Law Leaque operando de Man chester sob a direção de Richard Cobden mobilizou as classes médias e os industriais con tra os senhores da terra e depois que o primeiroministro Sir Robert Peel passou a represen tar os interesses da Leaque e a safra da batata na Irlanda foi um fracasso 1845 todas as Leis do Trigo foram revogadas cessando a agitação N T 54 Enfim mesmo a liberdade de contrato para os trabalhadores incluin do a tolerância de sindicatos suficientemente fortes para se estabele cerem pelo poder de barganha de seus associados pouco parecia a meaçar os lucros já que o exército industrial de reserva como Marx o chamou consistindo basicamente de massas de camponeses exartesãos e outros habitantes das cidades e regiões industriais man tinha os salários a um nível satisfatoriamente modesto ver os capítu los 11 e 12 mais adiante O entusiasmo pelo comércio livre interna cional é à primeira vista mais surpreendente exceto entre os ingleses para os quais significou acima de tudo que lhes era livremente per mitido encorajar países subdesenvolvidos a vender seus próprios pro dutos basicamente alimentos e matériasprimas barato e em gran de quantidade de forma a conseguir as divisas necessárias para com prar as manufaturas inglesas Mas por que os rivais da Inglaterra com a exceção dos Estados Unidos aceitaram este arranjo aparentemente desfavorável Para os países subdesenvolvidos que não procuravam competir industrial mente isto era evidentemente atraente os estados do sul dos Estados Unidos por exemplo estavam bastantes contentes de ter um mercado ilimitado para seu algodão na Inglaterra e portanto ficaram fortemen te ligados ao comércio livre até serem conquistados pelo norte É um exagero dizer que o comércio livre internacional progrediu porque neste breve momento a utopia liberal genuinamente empolgou até governos mesmo que somente com a força daquilo que acreditavam ser uma inevitabilidade histórica mas não há dúvida que eles esta vam muito influenciados pelos argumentos econômicos que pareciam ter a força de leis naturais Porém convicção intelectual é raramente mais forte que o interesse próprio Mas o fato é que a maior parte das economias em vias de industrialização podiam ver neste período duas vantagens no livre comércio Em primeiro lugar a expansão geral do comércio mundial que era realmente muito espetacular comparada ao período de antes de 1840 beneficiou a todos mesmo que beneficiasse desproporcionalmente à Inglaterra Tanto um comércio de exportação grande e sem impedimentos quanto uma fonte de alimentos e maté riasprimas igualmente grande e sem impedimentos eram evidente mente desejáveis Se alguns interesses específicos pudessem ser afe tados de forma adversa havia outros que a liberalização compensava Em segundo lugar qual fosse a futura rivalidade entre as economias capitalistas nesta etapa de industrialização a vantagem de poder utili zar o equipamento as fontes e o knowhow da Inglaterra era bastante útil Para tomar apenas um exemplo ilustrado pelo quadro seguinte o ferro para estradas de ferro e maquinaria cujas exportações au mentaram na Inglaterra não inibiu a industrialização de outros países mas pelo contrário facilitoua 55 EXPORTAÇÃO DE FERRO E AÇO PARA ESTRADAS DE FERRO E MAQUINARIA total qüinqüenal em milhares de toneladas ferro e aço p estradas de ferro maquinaria 184549 1291 49184650 185054 2846 86 185660 2333 177 186165 2067 227 186670 3809 249 187075 4040 441 Fonte B R Mitchell P Leane Abstract of Históricol Statistics Cambridge 1962 pp 1467 III A economia capitalista recebeu portanto simultaneamente o que não quer dizer acidentalmente um número de estímulos extremamente poderosos Qual foi o resultado Expansão econômica é mais conveni entemente medida em estatística e a sua mais característica medida do século XIX era a força a vapor já que a força a vapor era a típica forma de força e seus produtos associados carvão e ferro Meados do século XIX eram fundamentalmente a era da fumaça e do vapor A produção de carvão já era de longa data medida em milhões de toneladas mas agora chegava a ser medida em dezenas de milhões para países indivi dualmente e em centenas de milhões para o mundo Cerca de metade deste carvão um pouco mais no início de nosso período vinha do produtor incomparavelmente maior a Inglaterra A produção de ferro ali havia atingido a ordem da magnitude de milhões na década de 1830 era de 25 milhões de toneladas em 1850 Por volta de 1870 a França Alemanha e os Estados Unidos produziam cada um entre um e dois mi lhões de toneladas enquanto a Inglaterra ainda a oficina do mundo permanecia bem na frente com 6 milhões ou seja metade da produção mundial Naqueles 20 anos a produção mundial de carvão multiplicou se por duas vezes e meia a produção de ferro multiplicouse por quatro vezes A força total de vapor porém multiplicouse por quatro vezes e meia subindo de uma estimativa de 4 milhões HP em 1850 para cerca de 185 milhões de HP em 1870 Estes números brutais indicam um pouco mais além de que a in dustrialização estava em processo O fato significativo era que o pro gresso estava agora geograficamente muito mais espalhado apesar de muito desigual A presença de estradas de ferro e numa escala me nor máquinas a vapor introduzia então o poder mecânico em todos 56 os continentes e em países nãoindustrializados A chegada da estrada de ferro ver capítulo 3 mais adiante era em si mesmo um símbolo revolucionário já que a construção do planeta como uma economia única era de várias formas o aspecto mais espetacular e de maior al cance da industrialização Mas a máquina fixa por si própria fez progressos dramáticos na fábrica e na mina Na Suíça foram instala das 34 máquinas em 1850 mas em 1870 havia quase mil na Áustria o número subiu de 671 1852 para 9160 1875 aumentando de mais de 15 vezes os HP Para comparação um país europeu realmen te atrasado como Portugal ainda tinha umas poucas 70 máquinas tota lizando 1200 HP em 1873 O total da força a vapor da Holanda mul tiplicouse por trinta vezes Havia algumas regiões industriais menores e algumas economi as industriais européias como a Suécia haviam começado de pouco o processo de industrialização em forma ampla Mas o fato mais signi ficativo era o desenvolvimento desigual dos centros mais importantes No começo de nosso período a Inglaterra e a Bélgica eram os únicos países onde a indústria tinha se desenvolvido de forma intensiva e ambos permaneceram os mais altamente industrializados per capita O consumo de aço destes países por habitante em 1850 era respecti vamente de 170 libras e 90 libras comparadas às 56 libras dos Esta dos Unidos 37 na França e 27 na Alemanha A Bélgica era uma eco nomia pequena mas relativamente importante em 1873 já produzia uma vez e meia mais ferro que seu vizinho muito maior a França A Inglaterra evidentemente era o país industrial par excellence e como já vimos conseguiu manter sua posição relativa apesar de que sua capacidade produtiva de força a vapor havia começado a declinar se riamente Em 1850 a Inglaterra possuía bem mais de um terço de to da a força a vapor mas já na década de 1870 possuía apenas uma quarta parte ou menos 900 mil HP de um total de 41 milhões de HP Em números absolutos os Estados Unidos já estavam um pouco mais na frente por volta de 1850 e deixaram a Inglaterra bem atrás em 1870 com mais do dobro da força a vapor que a velha Inglaterra mas mesmo assim a expansão industrial americana apesar de extraordiná ria era menos sensacional que a da Alemanha A força a vapor fixa desta última era extremamente modesta em 1850 talvez 40 mil HP no todo muito menos que 10 das dos ingleses e em 1870 era de 900 mil HP o mesmo que a Inglaterra e muito superior à francesa A industrialização da Alemanha era um fato histórico de impor tância maior Bem distintas de sua importância econômica suas im plicações políticas eram de longo alcance Em 1850 a federação ale mã tinha tantos habitantes quanto a França mas sua capacidade in dustrial era incomparavelmente menor Em 1871 um império alemão unido já era mais populoso que a França e muito mais poderoso eco nomicamente E desde que o poder político e militar passou a se ba sear de forma crescente no potencial industrial capacidade tecnológi ca e knowhow as conseqüências políticas do desenvolvimento indus 57 trial tornaramse bem mais sérias do que antes As guerras de 1860 demonstraram isto ver capítulo 4 mais adiante Daquele momento em diante nenhum estado poderia manter seu lugar no clube dos su perpoderes sem aquelas bases Os produtos característicos da era vieram a ser o ferro e o carvão e seu símbolo mais espetacular a estrada de ferro que os combinava Têxteis o mais típico produto da primeira fase de industrialização cresceu comparativamente menos O consumo de algodão na década de 1850 era cerca de 60 maior do que na década de 1840 mas perma neceu estático na década de 1860 porque a indústria tinha sido parali sada pela Guerra Civil Americana e cresceu por volta de 50 na dé cada seguinte de 1870 A produção de lã em 1870 era o dobro da de l840 Mas a produção de carvão e ferro havia quintuplicado enquanto pela primeira vez tornavase possível a produção em massa de aço Du rante este período as inovações tecnológicas na indústria do ferro e do aço tiveram um papel análogo ao das inovações na indústria têxtil da era precedente No continente europeu exceto na Bélgica onde sempre prevaleceu o carvão mineral substituiu o carvão de lenha como prin cipal combustível na década de 1850 Por toda parte novos processos o conversor de Bessemer 1856 o alto forno SiemensMartin 1864 tornaram possível a manufatura de aço barato que vinha quase que substituir o ferro forjado Porém sua importância estava no futuro Em 1870 apenas 15 do ferro acabado produzido na Alemanha menos do produzido 10 na Inglaterra terminava por se transformar em aço Nosso período ainda não era a idade do aço nem mesmo ainda a era dos armamentos que deram ao novo material um ímpeto significativo Era a idade do ferro Porém mesmo tendo tornado possível a tecnologia revolucioná ria do futuro a nova indústria pesada não era particularmente revo lucionária senão em escala Em termos globais a Revolução Industri al da década de 1870 ainda estava impulsionada pelo ímpeto gerado pelas inovações técnicas de 17601840 Mesmo assim as décadas do meado do século desenvolveram duas formas de indústria baseada numa tecnologia ainda mais revolucionária a química e na medida em que dizia respeito a comunicações a elétrica Com pequenas exceções as principais invenções técnicas da pri meira fase industrial não exigiram conhecimento científico muito avan çado Felizmente para a Inglaterra elas estavam dentro da possibilidade de compreensão de homens práticos experientes e com bom senso co mo George Stephenson o grande construtor de estradas de ferro A par tir da metade o século as coisas se modificaram O telégrafo estava li gado bem de perto à ciência acadêmica através de homens como C Wheatstone 180275 de Londres e William Thompson Lord Kelvin 18241907 de Glasgow As tintas artificiais da indústria um triunfo de síntese de massa química apesar de seu primeiro produto a cor vio leta claro não ser aclamado mundialmente por suas qualidades estéti cas nasceu de um laboratório dentro de uma fábrica 58 Assim também ocorreu com os explosivos e a fotografia Pelo menos uma das inovações cruciais na produção de aço o processo GilchristThomas básico veio através da educação universitária Como testemunham as novelas de Júlio Verne 18281905 o profes sor tornouse uma figura industrial mais importante do que nunca não foi ao grande L Pasteur 182295 que os produtores de vinho na França foram procurar para resolver um difícil problema Acima de tudo o laboratório de pesquisa tornouse parte integrante do desen volvimento industrial Na Europa ele permaneceu ligado a universi dades ou instituições similares a de Ernst Abbe em Iena desenvol veu as famosas peças de fabricação Zeiss mas nos Estados Unidos o laboratório puramente comercial já havia aparecido no limiar das companhias telegráficas Cedo seriam famosas através de Thomas Alva Edison 18471931 Uma conseqüência significativa desta penetração da indústria pela ciência era que dali em diante o sistema educacional tornarase crucial para o desenvolvimento da indústria Os pioneiros da primeira fase in dustrial Inglaterra e Bélgica não estavam entre os povos mais alfabeti zados e seus sistemas de educação avançada ou tecnológica se exce tuarmos o escocês estavam longe de serem bons Daquele momento em diante era quase impossível que um país onde faltasse educação de massa e instituições de educação avançada viesse a se tornar uma eco nomia moderna e viceversa países pobres e retrógrados que conta vam com um bom sistema educacional encontraram facilidade para i niciar o desenvolvimento como por exemplo a Suécia O valor prático de uma boa educação primária para uma tecno logia científica econômica e militar é evidente Não foi outra a razão da facilidade com que a Prússia derrotou os franceses em 187071 se não a alfabetização muito superior de seus soldados Por outro lado o que o desenvolvimento econômico precisava em nível mais elevado não era tanto originalidade científica e sofisticação estas poderiam ser emprestadas mas a capacidade de compreender e manipular ci ência desenvolvimento mais do que pesquisa As universidades e Taxa de analfabetismo em alguns países europeus homens Inglaterra 1875 17 Suécia 1875 1 França 1875 18 Dinamarca 185960 3 Bélgica 1875 23 Itália 1875 52 Escócia 1875 9 Áustria 1875 42 Suíça 1879 6 Rússia 1875 79 Alemanha 1875 2 Espanha 1877 63 Maridos récémcasados analfabetos Recrutas analfabetos Fonte CM Cipolla Literacy and Development in the West Harmondwsorth 1969 Tabela I Apêndice II III 59 academias técnicas americanas que ombreavam com o nível de Cambridge ou a Polvtechnique eram economicamente superiores às britânicas porque proporcionavam uma educação sistemática para en genheiros como ainda não se pensava fazer na Inglaterra Até 1898 a única forma de tornarse um engenheiro profissional na Inglaterra era por aprendizagem Os americanos eram também superiores aos fran ceses porque produziam em massa engenheiros de nível adequado ao invés de produzir uns poucos superiormente inteligentes e de grande cultura como na França Os alemães neste aspecto confiavam nas suas excelentes escolas secundárias em lugar de suas universidades e pela década de 1850 iniciouse como pioneira a Realschule uma es cola secundária nãoclássica de orientação técnica Quando em 1867 os notoriamente industriais educados da região da Uhr rece beram convite para contribuir para o qüinquagésimo aniversário da universidade de Bonn todos os industriais com uma única exceção recusaram alegando que os eminentes industriais locais não tiveram uma alta educação wissenschaftlich acadêmica e não iriam dar coisa semelhante a seus filhos10 Apesar disso a tecnologia tinha uma base científica e é surpre endente como as inovações de um punhado de pioneiros científicos desde que concebidas em termos facilmente conversíveis em maqui naria fossem tão rápida e amplamente adotados Novas matérias primas freqüentemente encontráveis apenas fora da Europa atingi ram a partir daí uma significação que só viria a se tornar evidente no período subseqüente do imperialismo Desse modo petróleo já havia atraído a atenção dos engenhosos ianques como um combustível con veniente para lâmpadas mas rapidamente encontrou novos usos atra vés do processamento químico Em 1859 apenas dois mil barris ha viam sido produzidos mas por volta de 1874 quase 11 milhões de barris a maioria proveniente de Pensilvânia e Nova York já davam meios a John D Rockfeller 18391937 para estabelecer um cerco à nova indústria pelo controle de seu transporte através de sua Standard Oil Company Apesar disso tudo estas inovações parecem mais significativas quando vistas em retrospecto do que no seu próprio tempo Pelo final da década de 1860 um expert ainda pensava que os únicos metais que tinham um futuro econômico importante eram aqueles conhecidos dos antigos ferro cobre estanho chumbo mercúrio ouro e prata Man ganes níquel cobalto e alumínio ele concluía não parecem in clinados a ter um papel tão importante quanto seus antecessores O crescimento das importações de borracha pela Inglaterra de 7600 cwt em 1850 para 159 mil cwt em 1876 era realmente notável mas as quantidades viriam a ser desprezíveis pelos padrões de vinte anos cwt abreviatura de hundredweight que quer dizer peso de 112 libras Eqüivale no sistema decimal a 508024 kg NT 60 mais tarde Os usos mais comuns deste material ainda quase que to talmente coletado em forma bruta na América do Sul ainda eram em coisas tais como roupas a prova dágua e elástico Em 1876 havia exatamente 200 telefones trabalhando na Europa e 380 nos Estados Unidos e na Exposição Internacional de Viena a operação de uma bomba dágua movida a eletricidade ainda era uma grande novidade Olhando para trás podemos observar que a ruptura estava bem pró xima o mundo estava prestes a entrar na era da luz e força elétricas do aço e ligas de aço do telefone e fonógrafo das turbinas e máqui nas a explosão Mas tudo isso ainda não havia acontecido em meados da década de 1870 A maior inovação industrial excetuandose os campos científi cos acima mencionados foi provavelmente a produção em massa de maquinaria que tinha sido construída virtualmente à mão como as locomotivas e os navios o são até hoje A maior parte do avançona engenharia de produção de massa veio dos Estados Unidos pioneiro do revólver Colt rifle Winchester relógios produzidos em massa máquina de costura e através dos matadouros de Cincinatti e Chica go na década de 1860 as modernas linhas de montagem isto é o transporte mecânico do objeto de produção de uma operação à se guinte A essência da máquina produzida pela máquina que implica va no desenvolvimento de máquinasoperatrizes automáticas ou semi automáticas era que vinha a ser demandada em quantidades estandar tizadas muito superiores a qualquer outra máquina isto é por indi víduos e não por firmas ou instituições O mundo inteiro em 1875 ti nha talvez 62 mil locomotivas mas o que era esta demanda compara da aos 400 mil relógios de pulso produzidos nos Estados Unidos em um único ano 1855 ou os rifles demandados pelos 3 milhões de sol dados Federais e Confederados entre 1861 e 1865 na Guerra Civil Americana Conseqüentemente os produtos mais claramente tenden tes a seguir a linha de produção em massa eram aqueles que pudes sem ser usados por um número muito grande de pequenos produtores como fazendeiros e costureiras as máquinas de costura em escritó rios a máquina de escrever bens de consumo como relógios mas acima de tudo as pequenas armas e munição de guerra Estes produ tos eram de alguma forma especializados e atípicos Tudo isto assus tava os europeus que já percebiam por volta de 1860 a superiorida de tecnológica dos Estados Unidos na produção em massa mas que ainda não tinham percebido o homem prático pois pensavam que os americanos não iriam se preocupar em inventar máquinas para produzir artigos inferiores se havia na Europa uma fonte de artesãos preparados e versáteis Sobretudo não foi uma autoridade francesa que disse já em 1900 que a França poderia talvez não ser capaz de ombrear com outros países na indústria de produção de massa mas poderia manter facilmente sua posição na indústria onde habilidade talento e destreza fossem decisivos a manufatura de automóveis 61 IV Os homens de negócios olhando à sua volta para o mundo no começo de 1870 podiam transpirar confiança para não dizer compla cência Mas seria tal fato justificado Mesmo que a gigantesca expan são da economia mundial agora firmemente sustentada na industriali zação de numerosos países e com um denso e genuinamente global dilúvio de mercadorias capital e homens continuasse ou mesmo fos se acelerada o efeito das injeções específicas de energia que havia recebido na década de 1840 não iria durar muito O novo mundo a berto à empresa capitalista continuaria a crescer mas não seria mais absolutamente novo Realmente logo que os seus produtos como trigo e outros cereais dos campos americanos e das estepes russas começaram a ser derramados no velho mundo como ocorreu nas dé cadas de 1870 e 1880 tal fato iria romper e colocar fora do lugar a agricultura tanto dos velhos como dos novos países Por uma geração inteira a construção das ferrovias pelo mundo foi em frente Mas o que aconteceria quando as ferrovias se tornassem menos universais devido a que a maior parte delas já havia sido construída O potencial tecnológico da primeira Revolução Industrial a inglesa do algodão carvão ferro e máquinas a vapor parecia suficientemente vasto Uma geração que começasse a explorar este potencial mais adequadamente poderia ser perdoada por julgálo inexaurível Mas isso não ocorreu e já em 1870 os limites deste tipo de tecnologia eram visíveis O que i ria ocorrer se viesse a ser exaurido Com o mundo entrando na década de 1870 estas sombrias refle xões pareciam absurdas Mas na verdade o processo de expansão e ra como todos agora reconhecem curiosamente catastrófico Violen tas quedas algumas vezes dramáticas e globais sucediam booms es tratosféricos até que os preços descessem suficientemente para dissi par os mercados retraídos e limpar o campo de empresas falidas para que então os homens de negócios recomeçassem o investimento e a expansão renovando desta forma o ciclo Foi em 1860 depois da primeira destas quedas mundiais que os economistas acadêmicos na pessoa de um brilhante doutor francês Clement Juglar 18191905 reconheceram e mediram a periodicidade deste ciclo do comércio até então considerado apenas por socialistas e outros elementos hete rodoxos Portanto por mais dramáticas que fossem estas interrupções na expansão elas eram temporárias Nunca foi tão alta a euforia entre estes homens de negócios quanto no começo da década de 1870 du rante o famoso Gründerjahre anos da promoção comercial na Ale manha período no qual os projetos mais absurdos e evidentemente fraudulentos de companhias encontraram dinheiro fácil para seus ob jetivos Eram os dias como um jornalista vienense descreveu em que companhias existiam para transportar a aurora boreal em oleodutos 62 para a Praça de Santo Estevão e para vender produção em massa de botas para os nativos das ilhas dos mares do sul 12 Então veio a derrocada Mesmo para o gosto de um período que apreciava booms brilhantes e coloridos foi bastante dramática 21000 milhas de estradas de ferro americanas entraram em colapso e falência as ações na bolsa alemã caíram em 60 entre a alta e 1877 e mais característico quase metade dos altos fornos nos grandes produtores de ferro pararam O dilúvio de imigrantes para o Novo Mundo foi reduzido para um modesto rio Entre 1865 e 1873 anual mente mais de 200 mil chegavam no porto de Nova York mas em 1877 apenas 63 mil o fizeram Mas diferente das outras quedas du rante o século esta não parecia chegar a um fim Já tarde em 1889 um estudo alemão descrevendose a si mesmo como uma introdução aos estudos econômicos para dirigentes e homens de negócios ob servava que desde a queda da bolsa em 1883 a palavra crise tem constantemente com apenas algumas breves interrupções estado pre sente na cabeça de todos 13 E isso na Alemanha o país cuja expan são econômica neste período continuava a ser espetacular Historiado res têm duvidado da existência daquilo que tem sido chamado A Grande Depressão de 1873 a 1896 que evidentemente não foi tão dramática quando a de 1929 a 1934 quando a economia capitalista mundial chegou a entrar em colapso No entanto observadores da é poca não tinham dúvida de que o grande boom havia sido seguido por uma grande depressão Uma nova era na história tanto política quanto econômica abre se com a depressão da década de 1870 Esta era encontrase fora dos limites deste volume apesar do que podemos ressaltar de passagem que minou ou destruiu as fundações do liberalismo de meados do sé culo XIX que parecia tão fortemente estabelecido O período do final da década de 1840 até meados da década de 1870 iria provar não ser contrariamente ao desejo convencional de alguns o modelo de cresci mento econômico desenvolvimento político progresso intelectual e realização cultural que iria apesar de tudo terminar por sobreviver com algumas melhoras no futuro indefinido mas ao invés de tudo is so uma espécie de interlúdio Entretanto suas realizações globais e ram de qualquer forma extremamente surpreendentes Nesta era o capitalismo industrial tornouse uma genuína economia mundial e o globo estava transformado dali em diante de uma expressão geográ fica em uma constante realidade operacional História daliem diante passava a ser história mundial 63 Terceiro Capítulo O MUNDO UNIFICADO II A burguesia pelo rápido desenvolvimento de todos os instrumentos de produção pelos meios de comunicação imensamente facilitados arrasta todas as nações mesmo as mais bárbaras para a civiliza ção Em uma palavra cria um mundo a sua própria imagem K Marx e F Engels 1848 1 Como o comércio a educação e toda a rápida divulgação de pen samento e conhecimento seja pelo telégrafo ou pelo vapor tudo mudaram mal posso acreditar que o grande Criador prepare o mundo para se tornar uma nação falando um único idioma uma realização que fará com que os exércitos e os navios não sejam mais necessários Presidente Ulysses S Grant 1873 2 Você precisava ter ouvido tudo que ele disse eu preparavame para viver numa montanha em algum lugar no Egito ou na Améri ca E então Stoltz observou friamente Você pode chegar no Egito em duas semanas e na América em três Mas quem vai para a América ou o Egito Os ingleses certamente mas este é o jeito que o bom Deus os fêz e além disso eles não têm onde morar no seu próprio país Mas quem de nós iria sonhar em viajar para lá Alguns desesperados talvez cujas vidas não valem nada para si mesmos I Goncharov 1859 3 I Quando escrevemos a história mundial dos períodos preceden tes estamos na realidade fazendo uma soma das histórias das diversas partes do globo que de fato elas haviam tomado conhecimento umas das outras porém superficial e marginalmente exceto quando os ha bitantes de uma região conquistaram ou colonizaram uma outra co mo os europeus ocidentais fizeram com as Américas É perfeitamente possível escrever a história antiga da África com apenas uma referên cia casual ao Extremo Oriente com exceto a costa ocidental e o Ca 64 bo pouca referência a Europa mas não sem persistente referência ao mundo islâmico O que acontecia na China era até o século XVIII ir relevante aos dirigentes políticos da Europa exceção feita aos russos mas não a alguns de seus grupos específicos de comerciantes o que acontecia no Japão estava fora do conhecimento direto de todos ex ceto de um punhado de mercadores holandeses que tinham tido per missão para ali manter um entreposto entre o século XVI e meados do século XIX Inversamente a Europa era para o Império Celeste apenas uma região de bárbaros felizmente bastante longínqua para não colocar nenhum problema como por exemplo especificar o grau de sua fiel subserviência ao Imperador apesar de levantar alguns pro blemas de administração para os funcionários responsáveis por alguns portos Por esta razão mesmo entre algumas regiões onde havia razo ável interação muito podia ser posto de lado sem grande inconveni ência Para quem na Europa ocidental mercadores ou estadistas era importante saber o que se passava nas montanhas da Macedônia Se a Líbia fosse inteiramente engolida por algum cataclisma natural que real diferença isso faria para alguém mesmo para o Império O tomano do qual era tecnicamente uma parte ou entre os mercadores do Levante de várias nações A falta de interdependência entre as várias partes do globo não era simplesmente uma questão de ignorância apesar do que fora da região em questão e freqüentemente dentro dela a ignorância do in terior ainda era considerável Mesmo em 1848 imensas áreas de vá rios continentes estavam marcadas em branco inclusive nos melhores mapas europeus principalmente no que diz respeito a África Ásia central o interior da América do Sul e partes da América do Norte e Austrália sem mencionar os quase totalmente inexplorados Ártico e Antártico Os mapas que fossem desenhados por qualquer outro car tógrafo teriam mostrado espaços ainda maiores do desconhecido para isso os funcionários chineses mercadores e coureurs de bois de cada interior dos continentes conheciam bem mais sobre algumas áreas fossem grandes ou pequenas do que os europeus mesmo que a soma global de seus conhecimentos geográficos fosse bem mais exígua Conseqüentemente a adição meramente aritmética de tudo que um expert conhecesse sobre o mundo seria um mero exercício acadêmi co Não era uma coisa de se encontrar de fato não era mesmo em termos de conhecimento geográfico um mundo Ignorância era mais um sintoma que uma causa da falta de uni dade no mundo Refletia simultaneamente a falta de relações diplo máticas políticas e administrativas que eram demasiado tênues A Bíblia de referência diplomática genealógica e política o Almanach de Gotha apesar de cuidadoso em reportar o pouco que fosse conhe cido sobre as excolônias que tinham se tornado repúblicas nas Amé ricas não incluía a Pérsia antes de 1859 China antes de 1861 Japão antes de 1863 Libéria antes de 1868 e Marrocos antes de 1871 O reino do Sião entrou apenas em 1880 Refletia também a fraqueza 65 dos laços econômicos É verdade que o mercado mundial aquela précondição crucial e característica da sociedade capitalista estava já por longo tempo e desenvolvendo O comércio internacional isto é a soma total de todas as exportações e importações de todos os países dentro da competência das estatísticas econômicas européias daquele período havia ultrapassado o dobro em valor entre 1720 e 1780 No período da Revolução Dual 17801840 tinha mais que triplicado notandose que este crescimento substancial era modesto em compa ração a nosso período de estudo Por volta de 1870 o valor do comér cio externo para cada cidadão do Reino Unido França Alemanha Áustria e Escandinávia era entre quatro e cinco vezes o que havia si do em 1830 para cada holandês e belga três vezes maior e mesmo para cada cidadão dos Estados Unidos um país para o qual o comér cio externo era de importância marginal bem mais do dobro No de correr da década de 1870 uma quantidade anual de cerca de 88 mi lhões de toneladas de mercadorias foi trocada entre as nações mais importantes comparadas com as 20 milhões de 1840 31 milhões de toneladas de carvão atravessaram os mares comparadas a 14 milhão 112 milhões de toneladas de trigo comparadas a menos de 2 mi lhões 6 milhões de toneladas de ferro comparadas a um milhão e mesmo antecipando o século XX 14 milhão de toneladas de pe tróleo que era desconhecido do comércio internacional em 1840 Vamos medir a rede das trocas econômicas entre partes do mun do mais precisamente As exportações britânicas para a Turquia e o Oriente Médio cresceram de 35 milhões de libras em 1848 para um máximo de 16 milhões em 1870 para a Ásia de 7 milhões para 41 milhões em 1875 para as Américas Central e do Sul de 6 milhões para 25 milhões em 1872 para a índia de perto de 5 milhões para 24 milhões em 1875 para a Austrália de 15 milhão para mais de 20 mi lhões em 1875 Em outras palavras em 35 anos o valor das trocas entre a mais industrializada das economias e as regiões mais atrasadas ou remotas do mundo havia se multiplicado por seis Isso evidente mente não é muito impressivo pelo que temos hoje em dia mas o vo lume em números absolutos ultrapassava tudo que podia ter sido pre visto anteriormente A rede que unia as várias regiões do mundo visi velmente apertava Definir precisamente quanto o processo contínuo de exploração que gradualmente preencheu os espaços vazios nos mapas estava in terligado com o crescimento do mercado mundial é uma questão complexa Parte era subproduto da política externa parte produto de entusiasmo missionário parte de curiosidade científica e para o fim de nosso período parte de iniciativa jornalística e editorial Portanto nem J Richardson 17871865 H Barth 182165 e A Overweg 182252 que tinham sido enviados pelo Ministério de Relações Ex teriores britânico para explorar a África central em 1849 nem o gran de David Livingstone 181373 que cruzou o coração daquele que ainda era conhecido como o continente escuro de 1840 a 1873 pa 66 trocinado pelo cristianismo calvinista nem Henry Morton Stanley 18411904 o jornalista do New York Herald que foi descobrir o pa radeiro de Livingstone não ele especialmente nem S W Baker 182192 e J H Speke 182764 cujos interesses eram mais pura mente geográficos ou aventureiros estavam ou poderiam estar desin formados da dimensão econômica de suas viagens Como um monse nhor francês com interesses missionários colocou O bom Deus não precisa de nenhum homem e a propagação do Evangelho ocorre sem ajuda humana entretanto redunda ria em glória para o comércio europeu se tal viesse trazer aju da na tarefa de superar as barreiras que impedem o caminho da evangelizacão4 Explorar significava não apenas conhecer mas desenvolver trazer o desconhecido e por definição os bárbaros e atrasados para a luz da civilização e do progresso vestir a imoralidade da nudez selvagem com camisas e calças com uma providencial e beneficente manufatu ra de Bolton e Roubaix levar as mercadorias de Birmingham que i nevitavelmente arrastavam a civilização para onde quer que fossem Realmente o que chamamos de exploradores de meados do século XIX eram apenas alguns subgrupos bem conhecidos mas nu mericamente pouco importantes de um número muito maior de ho mens que abriram o planeta ao conhecimento Eram os que viajavam em áreas onde o desenvolvimento econômico e o lucro eram ainda in suficientemente atraentes para fazer substituir o explorador pelo co merciante europeu explorador de minérios o construtor de estradas de ferro e telégrafo e mais tarde se o clima provasse adequado o co lono branco Exploradores dominaram a cartografia do interior da África porque o continente para o Oeste estava desprovido de qual quer óbvia razão econômica entre a abolição do tráfico negreiro e a dupla descoberta de um lado de pedras preciosas e metais no sul e de outro lado do valor econômico de certos produtos primários que só podiam crescer ou ser cultivados em climas tropicais estando ain da muito longe da produção sintética Nada ali era de grande signifi cação ou promessa até a década de 1870 mas parecia inconcebível que um continente tão vasto e tão subutilizado não viesse mais cedo ou mais tarde a provar ser uma fonte de riqueza e lucro Afinal as exportações britânicas para a África ao sul do Sahara tinham aumen tado em cerca de 15 milhão de libras no final de 1840 para cerca de 5 milhões em 1871 vieram a dobrar na década de 1870 para atingir 10 milhões no começo de 1880 o que de forma alguma podia ser considerado como pouco promissor Os exploradores também do minaram a abertura da Austrália porque o deserto interior era vasto vazio e até meados do século XX desprovidos de óbvias fontes de exploração econômica Por outro lado os oceanos do mundo cessa ram exceto o Ártico o Antártico atraiu pouca atenção neste perío do de preocupar os exploradores O incentivo ali era largamente 67 econômico a busca de uma passagem praticável NorteOeste e Nor teEste para navios entre o Atlântico e o Pacífico que pudesse como os vôos transpolares de nossos dias economizar um bom tempo e portanto dinheiro A busca do Pólo Norte não era neste período de sejada com grande persistência A grande extensão das rotas de na vios e sobretudo a colocação dos grandes cabos submarinos implica vam naquilo que pode ser chamado propriamente de exploração O mundo em 1875 era portanto mais conhecido do que nunca fora antes Mesmo em nível nacional mapas detalhados a maior par te iniciados por razões militares podiam ser agora encontrados na maioria dos países desenvolvidos a publicação do empreendimento pioneiro neste setor os mapas da Inglaterra da Ordnance Survey mas não ainda da Escócia e Irlanda tinha sido completada em 1862 Porém mais importante que o mero conhecimento as mais remotas partes do mundo estavam agora começando a ser interligadas por meios de comunicação que não tinham precedentes pela regularidade pela capacidade de transportar vastas quantidades de mercadorias e número de pessoas e acima de tudo pela velocidade a estrada de fer ro o barco a vapor o telégrafo Por volta de 1872 os meios de comunicação tinham chegado ao triunfo previsto por Júlio Verne a possibilidade de fazer a volta ao mundo em 80 dias evitando os inúmeros contratempos que perturba ram o indomável Phileas Fogg Os leitores podem recordar a rota do imperturbável viajante Ele foi de trem e barco a vapor através da Eu ropa de Londres a Brindisi e em seguida de barco através do recém aberto Canal de Suez uma estimativa de sete dias A viagem de barco de Suez a Bombaim iria tomarlhe 30 dias A viagem de trem de Bom baim a Calcutá deveria se não fosse a falha em completar um trecho do caminho tomarlhe três dias Dali em diante pelo mar para Hong Kong Yokohama e através do Pacífico até São Francisco era ainda um longo caminho de 41 dias Então com a estrada de ferro transamerica na que acabava de ser completada em 1869 somente os perigos ainda não completamente dominados representados pelas hordas de bisões e os índios estavam entre o viajante e uma viagem normal de sete dias para Nova York O resto da viagem o Atlântico para atingir Liverpool e o trem para Londres não teria causado problemas se não fosse a ne cessidade do suspense ficcional Aliás um agente de viagens america no ofereceu uma voltaaomundo similar não muito depois Quanto teria durado esta viagem a Phileas Fogg em 1848 Ela teria de ter sido feita quase que inteiramente por via marítima pois nenhuma estrada de ferro atravessava nenhum continente e nem mesmo existiam no resto do mundo exceto nos Estados Unidos onde elas não avançavam terra a dentro mais de 200 milhas Os barcos a vela mais rápidos tomariam pelo menos uma média de 110 dias para uma viagem até Cantão por volta de 1870 quando já estavam no má ximo da perfeição técnica não poderiam nunca fazêla em menos de 90 dias mas sabiase que já tinham feito em até 150 dias Podemos 68 dificilmente imaginar uma circunavegação por volta de 1848 que contando com a maior sorte possível fosse feita em muito menos que 11 meses ou seja quatro vezes mais do que Phileas Fogg sem contar o tempo despendido em portos Este progresso no tempo despendido em viagens de longa dis tância era relativamente modesto especialmente por causa do pouco avanço observado nas velocidades marítimas O tempo médio gasto por um vapor transatlântico entre Liverpool e Nova York em 1851 era de 14 a 12 dias e meio era substancialmente o mesmo em 1873 embora a linha White Star orgulhosamente garantisse poder encurtá lo para 10 dias5 Exceto onde a própria distância fosse encurtada co mo no caso do canal de Suez Fogg não poderia esperar fazer melhor do que um viajante em 1848 A verdadeira transformação deuse em terra através das estradas de ferro e assim mesmo não pelo aumento da velocidade tecnicamente possível das locomotivas mas pela extra ordinária extensão da construção de linhas de estradas de ferro As locomotivas de 1848 eram de fato mais lentas que as de 1870 mas já atingiam Holyhead a partir de Londres em oito horas e meia ou seja três horas e meia a mais do que em 1974 Em 1865 entretanto Sir William Wilde pai do famoso Oscar e um notável pescador pode ria sugerir a seus leitores londrinos um fimdesemana em Connemara para pescaria Todavia a locomotiva tal como existia em 1830 era uma máquina de extraordinária eficiência Mas o que não existia fora da Inglaterra em 1848 era algo parecido a uma rede ferroviária II O período que este livro trata viu a construção de tais redes ferro viárias quase que por toda a Europa nos Estados Unidos e mesmo em uns poucos outros lugares do mundo Os quadros seguintes o primeiro apresentando uma visão geral e o segundo ligeiramente mais detalhado falam por si mesmos Em 1845 fora da Europa o único país subde senvolvido a possuir uma milha que fosse de estrada de ferro era Cu ba Em 1855 havia linhas em todos os cinco continentes apesar de na América do Sul Brasil Chile Peru serem dificilmente visíveis Em 1865 a Nova Zelândia Argélia México e África do Sul já tinham suas primeiras estradas de ferro e por volta de 1875 enquanto Brasil Ar gentina Peru e Egito tinham perto de mil milhas ou mais de trilhos Ceilão Java Japão e mesmo o remoto Taiti já tinham adquirido suas primeiras linhas Enquanto isso por volta de 1875 o mundo possuía 62 mil locomotivas 112 mil vagões de passageiros meio milhão de va gões de carga transportando como era estimado 1371 milhões de pas sageiros e 715 milhões de toneladas de mercadorias ou em outras pa lavras nove vezes mais do que era carregado anualmente por via marí tima média naquela década A época que estudamos era em termos quantitativos a primeira autêntica idade das estradas de ferro 69 70 A construção de grandes troncos ferroviários naturalmente ga nhou a maior parte da publicidade Era realmente o maior conjunto de obras públicas existente e um dos mais sensacionais feitos da enge nharia conhecido até então na história Quando as ferrovias deixaram a topografia inexata da Inglaterra suas realizações técnicas passaram a ser até mais sensacionais A ferrovia do Sul de Viena e Trieste atra vessava o passo de Semmering a uma altura de quase 3 mil pés em 1854 em 1871 trilhos atravessando os Alpes atingiam elevações de até 4500 pés em 1869 a Union Pacific atingia 8600 pés atravessando as Rochosas e em 1874 o triunfo do conquistador Henry Meiggs 1811 77 a Estrada de Ferro Central do Peru corria lentamente a uma altura de 15840 pés Assim como atingiam os picos elas perfuravam as mon tanhas transformando em anãs as modestas passagens das primeiras es tradas de ferro inglesas O primeiro dos grandes túneis dos Alpes o do Monte Cenis tinha sido iniciado em 1857 e completado em 1870 e su as sete milhas e meia foram percorridas pelo primeiro trem postal sub traindo 24 horas da distância até Brindisi um expediente utilizado por Philleas Fogg como lembramos E impossível não partilhar a sensação de excitação autoconfian ça e orgulho que empolgava os que viveram através desta época he róica dos engenheiros como quando a estrada de ferro ligou pela primeira vez o Passo de Calais ao Mediterrâneo ou como quando tornouse possível viajar de trem para Sevilha Moscou Brindisi e também quando os trilhos de ferro percorreram o caminho do Oeste através das pradarias e montanhas norteamericanas através do sub continente indiano na década de 1860 descendo o vale do Nilo e va rando o interior da América Latina na década de 1870 Como podemos negar admiração por estas tropas de choque da industrialização que construíram tudo isso aos exércitos de campone ses freqüentemente organizados de forma cooperativa que com pá e picareta moveram terra e pedras numa quantidade inimaginável aos capatazes profissionais ingleses e irlandeses que construíram linhas longe de seus países aos maquinistas e mecânicos de Newcastle ou Bolton que partiram para longe para construir as novas linhas de ferro da Argentina ou Nova Gales do Sul Como podemos não nos emo cionar com os exércitos de coolies que deixaram seus ossos ao longo de cada milha de trilhos Hoje o belo filme Pather Panchali de Sat yadjit Ray baseado numa novela bengalesa do séculoXIX nos per mite recapturar a maravilha da primeira máquina a vapor um maciço dragão de ferro a própria força do mundo industrial irresistível e ins piradora fazendo seu caminho onde nada previamente havia passado exceto mulas e carroças Também não podemos deixar de nos tocar pelos homens duros com chapéus que organizaram e presidiram estas vastas transformações do panorama humano material e espiritual Thomas Brassey 180570 coolies trabalhador hindu ou chinês NT 71 que chegou a empregar oito mil homens em cinco continentes foi a penas o mais conhecido destes empreendedores A lista de suas em presas pelo mundo afora eqüivale às honras de batalhas de campanha dos generais em dias menos luminosos Prato e Pistoia Lions e Avi nhão a estrada de ferro norueguesa a Jutlândia o grande tronco do Canadá Bilbao e Miranda Bengala do Leste Maurício Queensland Argentina central Lemberg e Czernowitz estrada de ferro de Delhi Boca e Barracas Varsóvia e Terespol as docas de Callao O romance da indústria uma frase que gerações de oradores públicos iria gastar e fazer perder seu sentido original cercava até banqueiros financistas empreendedores que apenas proviam o di nheiro para a construção das estradas Homens como George Hudson 180071 ou Barthel Strousberg 182384 estouraram na bancarrota assim como antes na riqueza e proeminência social Seus colapsos tornaramse pontos de referência na história econômica Nenhuma tolerância entretanto pode ser concedida aos genuínos robber barons tais como ôs homens de estrada de ferro americanos Jim Fisk 1834 72 Jay Gould 183692 Commodore Vanderbilt 17941877 etc que apenas compraram e exploraram as estradas de ferro existentes as sim como qualquer outra coisa sobre a qual pudessem pôr as mãos E difícil negar admiração mesmo pelos escroques mais evidentes entre os construtores de estradas Henry Meiggs era sem dúvida um aventureiro desonesto tendo deixado atrás de si uma estrada de contas nãopagas subornos e despesas luxuosas ao longo de todo o lado ocidental dos continentes americanos mais freqüentemente nos centros de vilania e exploração como São Francisco e Panamá do que entre respeitáveis homens de negócios Mas pode alguém que tenha visto a Estrada de Ferro Central do Peru negar a grandeza da concepção e realização desta imaginação romântica e marota Esta combinação de romantismo empreendimento e finança era talvez mais dramaticamente colocada pela seita francesa dos Saintsi monistas Estes apóstolos da industrialização transformaramse espe cialmente depois do fracasso da revolução de 1848 de um grupo de crentes que os colocou nos livros de história como os socialistas utó picos em um dinâmico e corajoso grupo de empreendedores conhe cidos como capitães de indústria mas acima de tudo como constru tores de rede de comunicações Eles não eram os únicos a sonhar com um mundo ligado pelo comércio e tecnologia Estados improváveis como centros de comércio global como por exemplo o Império dos Habsburgos sem acesso ao mar produziram o Austrian Lloyd de Tri este cujos navios antecipando o ainda nãoconstruído canal de Suez chamavamse Bombay e Calcutta E foi um saintsimoniano F M de Lesseps 180594 que construiu o canal de Suez e planejou o canal do Panamá para seu azar mais tarde Robber Baron Barão Medieval NT 72 Os irmãos ísaac e Émile Pereire iriamse tornar conhecidos sobre tudo como financistas aventurosos que se fizeram sozinhos no império de Napoleão III O próprio Émile havia supervisionado a construção da primeira estrada de ferro francesa em 1837 vivendo num apartamento sobre as obras e apostando na demonstração da superioridade do novo meio de transporte Durante o segundo império os Pereire iriam cons truir linhas de estradas de ferro por todo o continente num duelo titâni co com o mais conservador dos Rothschild que veio a arruinálos 1869 Outro saintsimoniano P F Talabot 17891885 construiu en tre outras coisas as linhas do sudeste francês as docas de Marselha e as linhas húngaras além de comprar as balsas ultrapassadas pela ruína do comércio fluvial no Ródano esperando usálas numa frota comercial ao longo do Danúbio em direção ao Mar Negro um projeto vetado pelo Império dos Habsburgos Tais homens pensavam em termos de continentes e oceanos Para eles o mundo era um única coisa interli gado por trilhos de ferro e máquinas a vapor pois seus horizontes co merciais eram como seus sonhos sobre o mundo Para tais homens destino história e lucro eram uma e a mesma coisa De um ponto de vista global a rede de troncos ferroviários per manecia suplementar à de navegação internacional Tal como existia na Ásia Austrália África e América Latina a ferrovia considerada do ponto de vista econômico era basicamente um meio de ligar alguma área produtora de bens primários a um porto do qual estes bens poderi am ser enviados para as zonas industriais e urbanas do mundo O trans porte marítimo como já vimos não se tornou notavelmente rápido em nosso período Sua lentidão técnica é indicada pelo fato hoje bem co nhecido de que o transporte marítimo a vela havia continuado a man terse frente ao navio a vapor de forma surpreendente graças aos pro gressos tecnológicos menos dramáticos mas substanciais na sua própria eficiência O vapor tinhase expandido extraordinariamente de cerca de 14 do transporte mundial em 1840 para 49 em 1870 mas a vela ainda estava ligeiramente na frente Somente na década de 1870 e so bretudo na de 1880 é que saiu fora do páreo Pelo final desta última década a vela tinha sido reduzida para aproximadamente 25 do transporte global O triunfo do barco a vapor era essencialmente o da marinha mercante britânica ou melhor da economia britânica que es tava por detrás dele Em 1840 e 1850 barcos britânicos fizeram apro ximadamente um quarto da tonelagem a vapor nominal do mundo em 1870 perto de um terço em 1880 mais da metade Em outras palavras entre 1850 e 1880 a tonelagem a vapor britânica cresceu por volta de 1600 e a do resto do mundo por 440 Isso era razoavelmente natu ral Se alguma carga fosse e viesse a ser despachada de Callao Shangai ou Alexandria a probabilidade era de que fosse destinada para a Grã Bretanha E muitos navios estavam carregados 1250 milhões de tone ladas 900 mil inglesas passaram através do canal de Suez em 1874 no primeiro ano de operação haviam passado menos de meio milhão O tráfego regular através do Atlântico Norte era ainda maior 58 milhões 73 de toneladas entraram pelos três principais portos da costa leste dos Es tados Unidos em 1875 Trilhos e navios transportavam mercadorias e pessoas Porém a transformação tecnológica mais sensacional de nosso período estava na comunicação de mensagens através do telégrafo elétrico Este in vento revolucionário parece que estava pronto para ser descoberto em meados da década de 1830 Em 183637 fora inventado quase que si multaneamente por um número de diferentes pesquisadores dos quais Cooke e Wheatstone foram os mais imediatamente bem sucedidos Em poucos anos era aplicado nas estradas de ferro e o que era mais importante planos de linhas submarinas já eram considerados por volta de 1840 não se tornando porém praticáveis antes de 1847 quando então o grande Faraday sugeriu isolar os cabos com guta percha Em 1853 um austríaco Gintl e dois anos mais tarde ou troStark demonstraram que duas mensagens poderiam ser enviadas pelo mesmo fio nas duas direções no final da década de 1850 um sistema para enviar duas mil palavras era adotado pela American Te legraph Company em 1860 Wheatstone patenteava um telégrafo au tomático ancestral dos telégrafos modernos e Telex A Inglaterra e os Estados Unidos já estavam aplicando esta nova invenção por volta de 1840 um dos primeiros exemplos de uma tecno logia desenvolvida por cientistas e que dificilmente poderia ter sido desenvolvida sem base numa sofisticada teoria científica As partes de senvolvidas da Europa adotaramno rapidamente nos anos seguintes a 1848 Áustria e Prússia em 1849 Bélgica em 1850 França em 1851 Holanda e Suíça em 1852 Suécia em 1853 Dinamarca em 1854 A Noruega Espanha Portugal Rússia e Grécia introduziramno na se gunda metade da década de 1850 Itália Rumânia e Turquia na década de 1860 As linhas familiares do telégrafo e os pólos multiplicaramse 2 mil milhas em 1849 no continente europeu 15 mil em 1854 42 mil em 1859 80 mil em 1864 111 mil em 1869 O mesmo ocorreu com as mensagens Em 1852 menos de 250 mil foram enviadas em todos os seis países continentais onde havia sido introduzido mas em 1869 a França e a Alemanha enviaram cada uma mais de 6 milhões a Áustria mais de 4 milhões Bélgica Itália e Rússia mais de 2 milhões e mesmo a Turquia e Romênia entre 600 mil e 700 mil cada uma 6 Entretanto o desenvolvimento mais significativo era a constru ção de cabos submarinos pioneiros através do Passo de Calais no iní cio da década de 1850 DoverCalais 1851 RamsgateOstend 1853 em distâncias cada vez maiores Um cabo pelo Atlântico Norte havia sido proposto em meados da década de 1840 e veio a ser instalado em 185758 quebrandose devido à precariedade da instalação e do iso lamento A segunda tentativa com o célebre Great Western o maior navio do mundo como navio instalador de cabos foi bem sucedida em 1865 A partir daí sucederamse as instalações de cabos interna cionais que em cinco ou seis anos virtualmente enlaçaram o globo 74 Em 1870 cabos estavam sendo instalados entre Singapura e Batavia MadrasPenang PenangSingapura SuezAden AdenBombaim PenzâncioLisboa LisboaGibraltar GibraltarMalta Malta Alexandria MarselhaBône EmdenTeerã por terra BôneMalta SalcombeBrest Beachy HeadHavre Santiago de CubaJamaica e outro par de linhas através do Mar do Norte Em 1872 era possível te legrafar de Londres para Tóquio e Adelaide Em 1871 o resultado do Derby era enviado de Londres para Calcutá em não menos de 5 mi nutos apesar de que a notícia era consideravelmente menos excitante que o feito em si O que eram os oitenta dias de Phileas Fogg compa rados a isso Tal rapidez de comunicação não era apenas sem prece dentes ou mesmo sem comparação possível Para a maioria das pes soas em 1848 estaria completamente fora da imaginação A construção deste sistema telegráfico mundial combinava ele mentos políticos e comerciais com a importante exceção dos Estados Unidos o telégrafo interno era ou tornouse quase que inteiramente estatal e mesmo a GrãBretanha nacionalizouo adjudicandoo ao Post Office em 1869 Por outro lado os cabos submarinos permane ceram quase que inteiramente sob a reserva da iniciativa privada que os havia construído mesmo que o mapa mostrasse sua substancial importância estratégica sobretudo para o Império Britânico Eles e ram realmente da maior importância para o governo não apenas por razões militares e de segurança mas para a administração como tes temunham os inúmeros telegramas enviados por países como a Rús sia Áustria e Turquia cujo tráfico comercial e privado pouco teriam no justificado Tanto maior o território tanto mais útil para as autori dades que dispunham então de meios rápidos de comunicação com seus mais remotos postos avançados Os homens de negócios obviamente usaram intensamente o telé grafo mas os cidadãos comuns cedo descobriram seu uso a maioria das vezes evidentemente para ligações urgentes e dramáticas com parentes Por volta de 1869 60 de todos os telegramas belgas eram privados Mas o uso mais significativo da invenção não pode ser me dido meramente pelo número de mensagens O telégrafo transformou as notícias como Julius Reuter 181699 entrevira quando fundou sua agência telegráfica em AixlaChapelle em 1851 Entrou mais tarde no mercado inglês com o qual Reuter então se associou em 1858 Do ponto de vista jornalístico a Idade Média terminou em 1860 quando as notícias internacionais passaram a poder ser envia das livremente de um número suficientemente grande de lugares no mundo para atingir a mesa do cafédamanhã no dia seguinte Novi dades não eram mais medidas em dias ou no caso de lugares remotos em semanas ou meses mas em horas ou mesmo em minutos Elegante clube inglês que patrocinava famosas corridas de cavalo N T 75 Esta aceleração extraordinária na velocidade das comunicações teve um resultado paradoxal Aumentando o abismo entre os lugares acessíveis à nova tecnologia e o resto intensificou o atraso relativo daquelas partes do mundo onde o cavalo o boi a mula o homem ou o barco ainda determinavam a velocidade do transporte Numa época em que Nova York podia telegrafar a Tóquio numa questão de minu tos ou horas tornouse mais espantoso que as imensas disponibilida des do New York Herald não fossem suficientes para obter uma carta de David Livingstone do centro da África em menos de oito ou nove meses 187172 e mais espantoso ainda o Times de Londres poder reproduzir aquela mesma carta no dia seguinte à sua publicação em Nova York A selvageria do Oeste Selvagem e a escuridão do continente escuro eram devidos parcialmente a estes contrastes Assim se explicava a extraordinária paixão do público pelo explo rador e o homem que passou a ser chamado de viajante tout court isto é a pessoa que viajava até ou além das fronteiras da tecnologia fo ra da área onde a cabine de comando do vapor o compartimento dor mitório do wagonlit ambas invenções do nosso período o hotel e a pension cuidava do turista Phileas Fogg viajou nesta fronteira O in teresse de seu empreendimento residia simultaneamente na demons tração de que por um lado os trilhos o vapor e o telégrafo pratica mente enlaçavam o globo e por outro lado que ainda havia uma mar gem de incerteza assim como algumas lacunas remanescentes que evi tavam que viagens através do mundo se tornassem uma rotina Entretanto os viajantes cujos relatórios eram mais avidamente lidos eram aqueles que enfrentavam as incertezas do desconhecido com nenhuma ajuda suplementar da tecnologia moderna exceto aquela que pudesse ser carregada nos ombros de nativos Eram os explora dores e os missionários especialmente os que penetraram no interior da África os aventureiros especialmente os que se aventuraram nos terri tórios incertos do Islã os naturalistas caçadores de borboletas e pássa ros nas selvas da América do Sul ou nas ilhas do Pacífico Nossa época era como os editores cedo descobriram o início de uma idade de ouro feita de viajantes de poltrona seguindo nos livros Burton e Speke Stanley e Livingstone através das matas e da floresta virgem III Portanto a intrincada rede da economia internacional trazia mesmo as áreas geograficamente mais remotas para ter relações dire tas com o resto do mundo O que contava não era apenas velocidade embora uma crescente intensidade do tráfico também trouxesse uma maior demanda por rapidez mas o nível da repercussão Isso pode ser vividamente ilustrado pelo exemplo de um acontecimento econô mico que simultaneamente abriu nosso período e como tem sido ar 76 gumento largamente determinou sua forma a descoberta do ouro na Califórnia e logo depois na Austrália Em janeiro de 1848 um indivíduo chamado James Marshall descobriu ouro no que parecia ser uma vasta jazida em Sutters Mill perto de Sacramento na Califórnia uma extensão ao norte do México que havia sido anexada aos Estados Unidos de pouco área que não tinha nenhuma significação econômica exceto para uns poucos fazen deiros e donos de rancho mexicanoamericanos pescadores comuns e de baleia que usavam o conveniente porto da baía de São Francisco onde florescia uma pequena cidade de 812 habitantes brancos Já que este território fazia face ao Pacífico e estava separado do resto dos Estados Unidos por grandes cadeias de montanhas deserto e planície suas atrações e evidente riqueza natural não eram de imediata rele vância para empresas capitalistas sendo porém reconhecidas A cor rida ao ouro rapidamente mudou esta situação Notícias fragmentárias deste evento foram filtradas para o resto dos Estados Unidos em se tembro e outubro daquele ano despertando porém pouco interesse até serem confirmadas pelo presidente Polk em sua mensagem presiden cial de dezembro Desde então a corrida ao ouro passou a ser identifi cada com os Fortyniners Pelo final de 1849 a população da Cali fórnia havia saltado de 14 mil para aproximadamente 100 mil e em 1852 para 500 mil São Francisco já era então uma cidade de quase 35 mil No final de 1849 cerca de 540 navios aportaram naquela ci dade metade oriunda de portos europeus metade americanos e em 1 850 1 150 navios ali deixaram quase meia tonelada em mercadorias Os efeitos econômicos deste súbito desenvolvimento na Califór nia e a partir de 1851 na Austrália foram muito debatidos mas ob servadores da época não tinham dúvida sobre sua importância Engels observou dolorosamente a Marx em 1852 A Califórnia e a Austrália são dois casos nãoprevistos no Manifesto Comunista a criação de grandes e novos mercados a partir do nada Precisamos rever isso 7 Em que medida estes eventos foram responsáveis pela expansão nor teamericana pelo boom mundial ver capítulo 2 mais atrás ou pela súbita explosão da emigração em massa ver capítulo 11 mais adian te não precisamos decidir aqui O que estava claro de qualquer ma neira é que acontecimentos localizados a milhares de milhas distan tes da Europa tinham na opinião de competentes observadores um efeito imediato e de longo alcance naquele continente A interdepen dência da economia mundial não poderia ser melhor demonstrada Que tais corridas do ouro iriam afetar as metrópoles da Europa e a costa leste dos Estados Unidos assim como os financistas e comer ciantes de visão global não chega a ser surpreendente Sua repercus são em outras partes do globo geograficamente remotas é porém mais inesperada apesar de se levar em conta que na prática a Califórnia era apenas accessível por mar onde as distâncias não são um obstáculo particularmente sério à comunicação Os marinheiros dos navios da rota do Pacífico desertavam para tentar a sorte nos campos auríferos 77 e mesmo os habitantes de São Francisco fizeram coisa semelhante as sim que as notícias ali chegaram A febre do ouro espalhouse rapida mente através dos oceanos Em agosto de 1849 200 navios abando nados por suas tripulações vagavam nas águas seus cascos sendo u sados para construção de casas Nas ilhas Sandwich Havaí China e Chile marinheiros ouviram as notícias capitães espertos como os mercadores ingleses na costa oeste da América do Sul recusaram a tentação lucrativa de seguir para o Norte Frete e salários de mari nheiros dispararam com os preços de qualquer coisa exportável para a Califórnia e nada era nãoexportável Pelo final de 1849 o congresso chileno observando que a maior parte do transporte marítimo nacio nal estava sendo dirigido para a Califórnia onde era então imobiliza do por deserções autorizou navios estrangeiros a praticar o tráfico costeiro de cabotagem temporariamente A Califórnia pela primeira vez criou uma rede de comércio ligando as costas do Pacífico atra vés do qual cereais chilenos café e cacau mexicano batatas e outros alimentos da Austrália açúcar e arroz da China e mesmo depois de 1854 algumas importações do Japão foram transportadas para os Estados Unidos Não era àtoa que o Bankers Magazine de Boston havia predito em 1850 que não seria nada temerário antecipar uma extensão parcial desta influência de comércio até ao Japão8 Mais significativo de nosso ponto de vista a mobilidade de pes soas era maior que o comércio A imigração de chilenos peruanos e nativos das ilhas do Pacífico9 apesar de chamar a atenção no estágio inicial não era de maior importância numérica Em 1860 a Califórnia tinha cerca de 2400 latinoamericanos além dos mexicanos e menos de 350 oriundos das ilhas do Pacífico Por outro lado um dos resul tados mais extraordinários desta descoberta maravilhosa foi o impulso que deu às empresas do Império Celestial Os chineses até então as mais impassíveis e domésticas criaturas do universo haviam começado uma nova vida na Califórnia nas minas e vieram para a Califórnia aos milhares Em 1849 havia 76 chineses pelo final de 1850 4 mil em 1852 não menos de 20 mil e por volta de 1876 havia cerca de 111 mil ou seja 25 de todos os habitantes não californianos do estado Eles trouxeram consigo seu preparo inteligência e espírito comercial e in cidentalmente introduziram na civilização ocidental um dos mais po derosos produtos culturais do Leste o restaurante chinês que já flores cia em 1850 Oprimidos odiados ridicularizados e de vez em quando linchados 88 foram assassinados na baixa de 1862 eles mostraram a capacidade usual deste grande povo em sobreviver e prosperar até que o Chinese Restriction Act de 1882 clímax de uma longa agitação raci al pôs um fim naquilo que tinha sido o primeiro exemplo na história de uma imigração de massa voluntária e atraída por razões econômicas de uma sociedade oriental para uma ocidental Por outro lado o estímulo da corrida do ouro atingiu apenas as fontes tradicionais de migração para a costa oeste entre elas a britâ 78 nica irlandesa e alemã que formavam a grande maioria além dos mexicanos Estes vieram sobretudo pelo mar exceto alguns norteamericanos especialmente os do Texas Arkansas Missouri Wisconsin e Iowa estados com uma migração desproporcionalmente pesada para a Cali fórnia que presumivelmente vieram por terra uma viagem incômoda que tomava 3 a 4 meses de costa A rota mais importante que os corre dores em busca do ouro percorriam era a que ligava a Europa à São Francisco costa oeste dos Estados Unidos via Terra do Fogo percor rendo 16 a 17 mil milhas através do mar Londres Liverpool Ham burgo Bremen Le Havre e Bordéus já tinham linhas diretas na década de 1850 O interesse em diminuir esta viagem de 4 ou 5 meses assim como de fazêla mais segura era prioritário Os veleiros construídos pelos armadores de Boston e Nova York para o tráfico de chá entre Cantão e Londres podiam agora carregar uma mercadoria diferente Apenas dois destes haviam feito a volta da América do Sul antes da corrida do ouro mas na segunda metade de 1851 24 de 34 mil tonela das atingiram São Francisco diminuindo a distância de Boston para a costa oeste em 100 dias de viagem ou mesmo em alguns casos para 80 Inevitavelmente uma rota mais curta em tempo pedia para ser construída O istmo do Panamá mais uma vez tornouse naquilo que já havia sido nos tempos coloniais espanhóis o ponto principal de trans porte entre navios pelo menos até que fosse construído um canal hi pótese que foi imediatamente considerada pelo tratado anglo americano de BulwerClayton de 1850 e que começou enfrentando a oposição americana a ser planejado pelo dissidente saintsimoniano francês de Lesseps recémvitorioso em Suez na década de 1870 O go verno dos Estados Unidos incrementou um serviço postal através do istmo do Panamá portanto tornando possível o estabelecimento de um serviço de vapor regular mensal entre Nova York e o lado do Caribe e da cidade do Panamá para São Francisco e Oregon O esquema inicia do em 1848 essencialmente por motivos políticos e imperialistas tor nouse comercialmente mais que viável com a corrida do ouro O Pa namá tornouse o que sempre tem sido uma cidadepropriedade ameri cana onde futuros robber barons como Comodore Vanderbilt e W Ralston 182889 fundador do banco da Califórnia faziam suas nego ciatas A economia de tempo era tão grande que o istmo cedo se trans formou num ponto vital na cabotagem internacional através dele Sou thampon podia ser ligada a Sydney em 58 dias e o ouro descoberto no começo da década de 1850 naquele outro grande centro aurífero a Austrália para não mencionar os metais preciosos mais antigos do México e Peru fez por ali seu caminho para a Europa e a costa leste norteamericana Somado ao ouro californiano talvez 60 milhões de dólares anuais devem ter sido transportados através do Panamá Ne nhum espanto que a primeira estrada de ferro tenha já em 1855 atra vessado o istmo Ela havia sido planejada por uma companhia francesa mas caracteristicamente construída por uma americana 79 Estes eram os resultados visíveis e quase imediatos de aconteci mentos ocorridos num dos mais remotos cantos do mundo Nenhum espanto que os observadores vissem o mundo econômico não apenas como um complexo interligado onde cada parte era sensível ao que acontecia nas outras e através do qual dinheiro mercadorias e ho mens moviamse silenciosamente e com crescente rapidez obedecen do ao irresistível estímulo da oferta e demanda ganhos e perdas e com a ajuda da moderna tecnologia Se mesmo os mais preguiçosos porque menos econômicos destes homens respondiam a tais estí mulos en masse a imigração britânica para a Austrália pulou de 20 mil para quase 90 mil em um ano depois que ouro foi ali descoberto então nada nem ninguém poderia resistir Obviamente ainda havia muitas partes do globo mesmo na Europa mais ou menos isoladas desta movimentação Mas havia alguma dúvida de que cedo ou tarde seriam arrastadas para dentro do torvelinho IV Hoje estamos mais familiarizados do que os homens de meados do século XIX com este desenho totalizante do planeta em um único mundo Mas há uma diferença substancial entre o processo que nós vivenciamos hoje e o do período que este livro abarca O que é mais impressionante neste aspecto mais adiante no século XX é a padro nização que vai bem além da puramente econômica e tecnológica Neste particular nosso mundo é bem mais massivamente padronizado que aquele de Phileas Fogg mas apenas porque há mais máquinas instalações produtivas e negócios As estradas de ferro telégrafos e navios de 1870 não eram menos identificáveis como modelos da era onde ocorriam do que os automóveis e aeroportos de 1970 O que pouco ocorria então era a padronização internacional interlingüística da cultura que hoje distribui os mesmos filmes tipos de música pro gramas de televisão e mesmo estilos de vida através do mundo Os modelos do mundo desenvolvido eram copiados pelos mais atrasa dos em um punhado de versões dominantes os ingleses através de seu império nos Estados Unidos e com menos ênfase no continente europeu os franceses na América Latina no Levante e partes da Eu ropa oriental os alemães e austríacos através da Europa central e ori ental na Escandinávia e um pouco nos Estados Unidos Um certo es tilo comum visual o interior burguês superlotado de móveis o barro co público dos teatros e óperas podiam ser vistos onde europeus ou colonos descendentes de europeus tivessem se estabelecido ver capí tulo 13 mais adiante Entretanto com a exceção dos Estados Unidos e Austrália onde altos salários democratizaram o mercado e por tanto o estilo de vida das classes economicamente mais modestas es ta característica permaneceu confinada a uns poucos 80 Não há dúvida de que os profetas burgueses de meados do século XIX olhavam para a frente procurando um mundo único e mais ou me nos padronizado onde todos os governos teriam o conhecimento das verdades da economia política e do liberalismo levadas através do pla neta por missionários impessoais mais poderosos que aqueles da cris tandade ou do islamismo um mundo refeito à imagem da burguesia talvez mesmo onde eventualmente as diferenças nacionais viessem a desaparecer O desenvolvimento das comunicações já pedia novas for mas de coordenação internacionais e organismos padronizados a In ternational Telegraph Union de 1865 a Universal Postal Union de 1875 a International Metereological Organization de 1878 todas ain da existentes hoje Já colocava também para fins limitados e resolvi do pelo International Signals Code de 1871 o problema de uma lin guagem padronizada internacional Em poucos anos tentativas de cri ar línguas cosmopolitas artificiais tornaramse moda iniciada com a es tranha Volapük Worldspeak engendrada por um alemão em 1880 Nenhuma destas vingou nem mesmo a mais promissora Esperanto outro produto da década de 1880 O movimento trabalhista também encontravase no processo de estabelecer uma organização global que iria tirar conclusões da crescente unificação do planeta a Internacio nal ver capítulo 6 mais adiante Que a Cruz Vermelha Internacional 1860 filha também de nosso período pertença a este grupo é mais duvidoso pois ela era baseada na mais extrema forma de falta de inter nacionalismo isto é guerra entre estados Mesmo assim padronização e unificação internacionais neste sentido permaneceram frágeis e parciais De certa forma o nascimen to de novas nações e novas culturas com base democrática isto é u sando idiomas separados ao invés de línguas internacionais de mino rias cultas fazia esta padronização mais difícil Escritores de reputa ção européia ou mundial alcançaram esta dimensão graças a tradu ções E enquanto era significativo que por volta de 1875 leitores de alemão francês sueco holandês espanhol dinamarquês italiano português tcheco e húngaro fossem capazes de desfrutar de algumas das obras de Dickens assim como búlgaros russos finlandeses ser vocroatas armênios e leitores de iídiche o foram antes do final do século era também significativo que este processo resultasse numa crescente divisão lingüística Fossem quais fossem as perspectivas a longo prazo era aceito pelos observadores liberais da época que a curto ou médio prazo o desenvolvimento terminaria por criar nações diferentes e rivais ver capítulo 5 mais adiante O máximo que se po deria então desejar é que estas nações comungassem o mesmo tipo de instituições economia e credos A unidade do mundo implicava na sua divisão O sistema mundial do capitalismo era uma estrutura de eco nomias nacionais rivais O triunfo mundial do liberalismo ficava na conversão de todos os povos pelo menos os que eram vistos como ci vilizados Não havia dúvida que os campeões do progresso de nosso 81 período estavam confiantes de que isso viria a acontecer mais cedo ou mais tarde Mas esta confiança tinha bases razoavelmente inseguras Eles tinham boas razões quando apontavam para a rede cada vez mais desenvolvida de comunicações globais cujo resultado mais tan gível era um vasto aumento no tráfico de trocas internacionais mer cadorias e pessoas comércio e migração que serão considerados se paradamente ver capítulo 11 mais adiante Mas mesmo no plano in ternacional de negócios a unificação global não era uma vantagem indiscutível pois ela criava uma economia mundial onde todas as par tes estavam de tal modo dependentes umas das outras que um empur rão numa delas ameaçava inevitavelmente pôr todas as outras em movimento Disto era ilustração clássica a crise internacional Como foi sugerido dois tipos maiores de flutuação econômica afetavam a sorte do mundo na década de 1840 o antigo ciclo agrário baseado nos azares das colheitas e do gado e o novo ciclo do comér cio parte essencial do mecanismo da economia capitalista Em 1840 o primeiro destes ainda era dominante no mundo embora seus efeitos tendessem a ser mais regionais que globais já que mesmo as mais amplas formas de uniformização o clima epidemias humanas de animais ou plantas raramente ocorriam simultaneamente em todas as partes do mundo Economias industrializadas já eram dominadas pelo ciclo do comércio pelo menos a partir do final das guerras napoleô nicas mas isso afetava na prática apenas a Inglaterra talvez a Bélgica e os pequenos setores de outras economias ligadas ao sistema interna cional Crises que não vieram ao lado de distúrbios agrários como por exemplo as de 1826 1837 ou 183942 estremeceram a Inglaterra a costa leste dos Estados Unidos e Hamburgo deixando entretanto a maior parte da Europa relativamente sem problemas Dois processos se apresentaram depois de 1848 para mudar este estado de coisas Em primeiro lugar a crise do ciclo do comércio tor nouse genuinamente mundial A de 1857 que começou com um co lapso bancário em Nova York era provavelmente a primeira crise mundial do tipo moderno Isto talvez não fosse acidental Karl Marx observara que as comunicações haviam trazido as duas maiores fontes de distúrbios comerciais Índia e América para bem mais perto da Europa Dos Estados Unidos a crise passou para a Inglaterra então para a Alemanha do Norte depois para a Escandinávia de volta para Hamburgo deixando uma trilha de bancarrotas e desemprego en quanto atravessava oceanos em direção à América do Sul A depres são de 1873 que começou em Viena espalhouse na direção oposta com muito maior amplitude Seus efeitos a longo prazo viriam a ser como veremos muito mais profundos como era de se esperar Em segundo lugar pelo menos nos países em vias de industrialização as antigas flutuações agrárias tinham perdido bastante do seu efeito tan to pelo transporte de massa de alimentos que diminuíam carências locais e tendiam a igualar preços como porque os efeitos sociais de 82 tais carências estavam agora contornados pela oferta suficiente de empregos gerados pelo setor industrial da economia Uma série de más colheitas ainda poderia afetar a agricultura mas não mais o resto do pa ís Além disso com a economia mundial estreitando seu cerco mesmo os azares da agricultura dependiam muito menos das flutuações da na tureza que dos preços do mercado mundial como as grandes depres sões agrárias das décadas de 1870 e 1880 viriam a demonstrar Todas estas manifestações afetavam apenas aquele setor do mundo que já estava mergulhado na economia internacional Já que vastas áreas e populações virtualmente toda a Ásia e África a maior parte da América Latina e mesmo partes substanciais da Europa a inda existiam fora de qualquer economia que não fosse a da pura tro ca local e longe de portos estradas de ferro e telégrafo deveríamos não exagerar a unificação do mundo completada no período de 1848 a 1875 Afinal como um eminente cronista da época colocou A eco nomia mundial está apenas nos seus primórdios mas também acres centando com toda a correção mesmo estes primórdios nos permi tem imaginar sua futura importância já que neste estágio presente re presentam uma transformação genuinamente espantosa da produtivi dade da humanidade Se fôssemos considerar apenas uma região como por exemplo a costa sul do Mediterrâneo e norte da África por volta de 1870 tudo o que dissemos só poderseia aplicar ao Egito e às modestas porções da Argélia colonizada pelos franceses O Marro cos só veio a conceder a estrangeiros a liberdade de comerciar através de seu território em 1862 Tunísia nem sequer pensava na idéia pre ferindo incrementar seu vagaroso progresso por meio de empréstimos até 1865 Foi por volta desta época que um produto do crescimento do comércio mundial o chá foi encontrado ao sul da cordilheira dos Atlas em Ouargla Timbuctu e Tafilet apesar de ser ainda um artigo de alto luxo uma onça custava o equivalente ao salário mensal de um soldado marroquino Até a segunda metade do século não se viu o crescimento característico da população do mundo moderno ocorren do nos países islâmicos enquanto que ao contrário através dos países saharianos assim como na Espanha a combinação tradicional de fo me e epidemias em 186769 que devastou a índia pelo mesmo perío do vinha a ser pela sua grande importância econômica social e polí tica maior que qualquer manifestação associada com a ascensão do capitalismo mundial embora talvez como na Argélia intensificada por este 83 Quarto Capítulo CONFLITOS E GUERRA E a história inglesa fala alto para reis Se caminhardes à frente das idéias de vosso século estas idéias vos acompanharão e sustentarão Se caminhardes atrás delas elas vos arrastarão Se caminhardes contra elas elas o derrubarão Napoleão III A velocidade com a qual o instinto militar desenvolveuse nesta na ção de proprietários de navios mercadores e comerciantes é bem conhecida O Baltimore Gun Club tinha apenas um interesse a destruição da humanidade por motivos filantrópicos e o desenvolvi mento de armamentos que eles olhavam como instrumentos de civi lização Júlio Verne 1865 2 I Para o historiador a grande expansão da década de 1850 marca a fundação de uma economia industrial global e de uma única história mundial Para os dirigentes de meados do século XIX na Europa co mo vimos proporcionou uma oportunidade para tomar fôlego durante a qual os problemas que nem as revoluções de 1848 nem a sua su pressão resolveram chegaram a ser esquecidos ou mesmo mitigados pela prosperidade e administração sadia De fato os problemas soci ais agora pareciam mais contornáveis em virtude da grande expansão da adoção de política e instituições adequadas ao desenvolvimento capitalista irrestrito e da abertura de válvulas de escape pleno em prego e imigração suficientemente amplas para reduzir as pressões do descontentamento da massa Mas os problemas políticos permane ceram e pelo final da década de 1850 estava claro que não podiam ser evitados por muito mais tempo Estes problemas eram para cada governo essencialmente questões de política doméstica mas devido a natureza peculiar dos sistemas de estado europeus a leste da linha da Holanda à Suíça questões domésticas e internacionais apresentavam se como inextricavelmente interligadas Liberalismo e democracia ra 84 dical ou pelo menos o desejo por direitos e representação não podiam ser separados na Alemanha ou Itália no Império dos Habsburgos ou mesmo no Império Otomano e nas fronteiras do Império Russo das ambições por autonomia nacional independência ou unificação E isto poderia como efetivamente viria a ocorrer nos casos da Alemanha I tália ou do Império dos Habsburgos produzir conflitos internacionais Pois bem longe dos interesses de outras potências em qualquer modificação substancial nas fronteiras do continente a unificação da Itália implicava na expulsão do Império dos Habsburgos ao qual a maior parte do norte da Itália pertencia A unificação da Alemanha le vantava três questões que Alemanha exatamente era para ser unifica da como se jamais as duas maiores potências que eram membros da Confederação Germânica Prússia e Áustria deveriam integrála e o que iria acontecer com os numerosos outros principados que iam de médios reinos a pequenos territórios de ópera bufa E ambas como vimos implicavam diretamente na natureza e fronteiras do Império dos Habsburgos Na prática ambas as unificações implicavam enfim em guerras Felizmente para os dirigentes europeus tal mistura de proble mas domésticos e internacionais tinha cessado de ser explosiva ou melhor a derrota da revolução seguida pela grande expansão haviam lhes tirado a força Falando em termos gerais a partir do final da dé cada de 1850 estes governos encontraramse novamente diante de a gitação política doméstica provocada por uma classe média liberal e alguns democratas radicais eventualmente mesmo por alguma força emergente do movimento operário Alguns deles especialmente quando como a Rússia na guerra da Criméia 185456 e o Império dos Habsburgos na Guerra Italiana de 185960 vieram a ser derrota dos encontravamse agora mais vulneráveis que antes para fazer fa ce ao descontentamento popular Entretanto estas novas agitações não eram revolucionárias exceto em um ou dois lugares onde pude ram ser isoladas ou contidas O episódio característico destes anos era a confrontação entre um parlamento prussiano fortemente liberal e leito em 1861 e o rei da Prússia com sua aristocracia ambos sem a mais remota intenção de abdicar de seus propósitos O governo da Prússia sabendo perfeitamente que a ameaça liberal era meramente retórica provocou uma confrontação e simplesmente chamou o mais A Confederação Germânica incluía a menor parte do Império dos Habsburgos a maior parte da Prússia assim como HolsteinLauenburg que também pertencia a Di namarca e Luxemburgo e que também tinha raízes nãogermânicas Não incluía o en tão Schleswig dinamarquês Por outro lado a União Alfandegária Alemã Zollve rein originalmente formada em 1834 por volta de meados da década de 1850 incluía toda a Prússia mas nenhuma parte da Áustria Também deixava de fora Hamburgo Bremen e uma grande parte da Alemanha do Norte Mecklenburg e Holstein Lauenburg assim como o Schleswig As complicações de tal situação poderiam ser bem imaginadas 85 rude conservador disponível Otto von Bismarck para o cargo de primeiroministro para governar desafiando a recusa do parlamento em votar taxas Ele o fez sem dificuldades Mais que isso a coisa mais significativa a respeito da década de 1860 foi que não apenas governos mantinham quase sempre a inicia tiva e quase nunca perdiam senão momentaneamente o controle da situação que podiam sempre manipular mas também que podiam sempre conceder as reivindicações de suas oposições populares em todos os acontecimentos a oeste da Rússia Esta foi uma década de re formas liberalização política mesmo de algumas concessões ao que era chamado as forças da democracia Na Inglaterra Escandinávia e nos Países Baixos onde houvesse constituições parlamentares o elei torado estava com os governos O British Reform Act de 1867 fazia acreditar que havia colocado o poder eleitoral nas mãos dos eleitores da classe operária Na França onde o governo de Napoleão III tinha visivelmente perdido seu voto urbano por volta de 1863 conseguiu eleger apenas um dos quinze deputados de Paris mais e mais tenta tivas eram feitas para liberalizar o sistema imperial Mas esta mu dança de temperamento é ainda mais espantosa junto às monarquias nãoparlamentares A monarquia dos Habsburgos depois de 1860 simplesmente de sistiu de tentar governar como se seus governados não tivessem opi niões políticas Daí em diante concentrou seus esforços em encontrar alguma coalizão de forças entre suas numerosas e díspares nacionali dades uma qualquer que fosse suficientemente forte para manter o resto politicamente imóvel apesar de todas agora receberem certas concessões educacionais e lingüísticas ver capítulo 5 adiante Até 1879 foilhe fácil encontrar sua base mais conveniente entre os libe rais classemédia de sua fatia da população de língua alemã Mas a monarquia não foi capaz de manter um controle eficiente sobre os Magiares que conseguiram algo não muito distante de uma indepen dência o Compromisso de 1867 que transformou o Império na Mo narquia Dual AustroHúngara Mas ainda mais surpreendente foi o que aconteceu na Alemanha Em 1862 Bismarck tornouse primeiro ministro da Prússia num programa de manutenção da tradicional mo narquia prussiana e sua aristocracia contra o liberalismo democracia e nacionalismo germânico Em 1871 o mesmo chefe de estado aparecia como chanceler do Império Germânico unido por suas próprias forças com um parlamento confessadamente de pouca importância eleito por voto masculino universal e repousando no entusiástico apoio dos libe rais moderadosalemães Bismarck não era de forma alguma um libe ral e longe de um nacionalista alemão no sentido político ver capítulo 5 adiante Era apenas suficientemente inteligente para perceber que o mundo dos junkers prussianos não poderia mais ser preservado apenas com a manutenção do conflito contra o liberalismo e o nacionalismo mas precisava trazêlos ambos para o seu próprio lado Isto implicava repetir o que o líder conservador inglês Benjamin Disraeli 180481 86 ao introduzir o Reform Act de 1867 descrevia como surpreender os Whigs banhandose e fugindo com suas próprias roupas A política dos dirigentes da década de 1860 estava portanto de terminada por três considerações Primeiro eles se encontravam nu ma situação de mudança política e econômica que não podiam con trolar mas a qual precisavam se adaptar A única escolha e os che fes de estado reconheciamna bem claramente era seguir na direção do vento ou utilizar seus conhecimentos de navegação para pôr seus navios em outra direção O vento em si era um fato da natureza Se gundo eles precisavam determinar que concessões às novas forças poderiam ser feitas sem ameaçar o sistema social ou em casos es peciais as estruturas políticas cuja defesa era de responsabilidade destes governantes e o ponto além do qual eles não podiam mais seguir com segurança Mas em terceiro lugar eles tinham a sorte de poder tomar ambas as decisões em circunstâncias que lhes permitiam uma considerável iniciativa campo para manipulação e que lhes fazi am capazes em alguns casos até de agir com virtual liberdade para controlar o curso dos acontecimentos Os chefes de estado que figuram com maior proeminência nas histórias tradicionais da Europa deste período eram por conseguinte aqueles que de forma mais sistemática combinavam controle político com diplomacia e controle da máquina do governo como Bismarck na Prússia conde Camillo Cavour 181061 em Piedmont e Napole ãoIII ou aqueles mais capazes de manejar o difícil processo de aber tura controlada de um sistema de dominação de classe alta como por exemplo o liberal W E Gladstone 180998 e o conservador Dis raeli na Inglaterra E os mais bem sucedidos foram aqueles que sou beram virar as novas e antigas forças políticas nãooficiais para sua própria vantagem aprovassem elas a política destes governantes ou não Napoleão III caiu em 1870 porque não conseguiu fazêlo Mas dois homens provaram ser incomumente eficientes nesta difícil ope ração o moderado liberal Cavour e o conservador Bismarck Ambos eram políticos extraordinariamente lúcidos fato refleti do na despretensiosa claridade do estilo de Cavour e no impressio nante domínio da prosa germânica por Bismarck uma personalidade por demais grandiosa e complexa Ambos eram profundamente anti revolucionários e sem nenhuma simpatia pelas forças políticas cujos programas entretanto eles seguiram e cumpriram exceto quanto às suas implicações democráticas e revolucionárias Ambos tiveram cui dado em separar unidade nacional de influência popular Cavour pela insistência em transformar o novo reino italiano num prolongamento de Piedmont até o ponto de recusar renumerar o título do rei Vitorio Emanuel II de Savóia em Vitorio Emanuel I da Itália Bismarck pela construção do novo império germânico através da supremacia da Prússia Mas ambos eram suficientemente flexíveis para integrar a oposição em seus respectivos sistemas garantindo porém a impossi bilidade de que estas oposições viessem a ganhar controle 87 Ambos enfrentaram problemas imensamente complexos de tá tica internacional e no caso de Cavour de política nacional Bis marck que não precisava de ajuda externa e não se preocupava com oposição interna só podia considerar uma Alemanha unificada que não fosse nem democrática nem demasiado grande que não pudesse ser dominada pela Prússia Isto implicava a exclusão da Áustria que ele obteve por meio de duas rápidas guerras brilhantemente conduzi das em 1864 e 1866 e a paralisia do país que ele conseguiu fomen tando e alimentando a autonomia da Hungria dentro do Império dos Habsburgos 1867 simultaneamente com a preservação da Áustria para a qual dali em diante ele iria dedicar alguns belos presentes di plomáticos Isto porque se a monarquia dos Habsburgos entrasse em colapso com todas as suas nacionalidades seria impossível evitar que os austríacos alemães viessem a se unir com a Alemanha portanto abalando a supremacia da Prússia tão cuidadosamente construída Is so foi de fato o que aconteceu depois de 1918 e um dos resultados colaterais da grande Alemanha de Hitler 193845 foi o total desa parecimento da Prússia Hoje nem sequer seu nome sobreviveu ex ceto nos livros de história Isso também implicava fazer a suprema cia da Prússia mais digerível que a austríaca para os estados menos germânicos e mais antiPrússia o que Bismarck conseguiu com uma guerra igualmente brilhante na sua concepção e condução contra a França em 187071 Cavour por seu turno precisava mobilizar um aliado França para expulsar a Áustria da Itália mas terminou por ser imobilizado por esta iniciativa quando o processo de unificação foi bem além do que Napoleão III esperava Mais grave Cavour encon trouse diante de uma Itália dividida com a metade superior unificada sob controle do Estado e a metade inferior unificada pela guerra re volucionária liderada militarmente por aquele frustrado Fidel Castro do século XIX o chefe guerrilheiro de camisa vermelha Giuseppe Garibaldi 180782 Rápido pensar veloz conversação e brilhantes manobras foram necessárias para persuadir Garibaldi a entregar o po der ao rei o que veio a fazer em 1860 As operações destes chefes de estado ainda inspiram admiração por seu brilhantismo técnico Entretanto o que os fazia tão surpreen dentes não era apenas talento pessoal mas a amplitude pouco usual de ação de que dispunham graças à falta de um sério perigo revolu cionário e a existência de rivalidade internacional a um nível incon trolável As ações de movimentos nãooficiais ou populares demasi ado fracos para conseguir alguma coisa por si próprios ou fracassa ram ou tornaramse subordinados a mudanças decididas de cima Os liberais alemães radicais democratas e revolucionários sociais contri buíram pouco exceto para aplaudir ou condenar o processo de unifi cação germânica A esquerda italiana como já vimos teve um papel maior A expedição siciliana de Garibaldi que rapidamente conquis tou o sul da Itália perturbou Cavour mas embora sendo uma con quista significativa seria impossível determinar qualquer ulterior 88 conseqüência dada a situação criada por Cavour e Napoleão Em ne nhum momento a esquerda italiana conseguiu concretizar a república democrática italiana que era vista como o complemento essencial à unidade A pequena nobreza húngara moderada conseguiu autonomia para seu país sob o véu de Bismarck mas os radicais ficaram desa pontados Kossuth continuou a viver no exílio e lá morreu As rebeli ões dos povos balcânicos na década de 1870 vieram resultar numa es pécie de independência para a Bulgária 1878 mas apenas na medida em que isso interessava às grandes potências os bosnianos que co meçaram suas insurreições em 187576 apenas trocaram a domina ção turca por uma provavelmente superior administração dos Habs burgos Por outro lado como veremos revoluções independentes terminaram mal ver capítulo 9 adiante Mesmo a espanhola de 1868 que chegou a produzir uma fugaz república radical em 1873 termi nou com um rápido retorno à monarquia Não diminuímos os méritos dos grandes dirigentes políticos da década de 1860 ao dizer que suas respectivas tarefas foram grande mente facilitadas porque podiam introduzir mudanças constitucionais de maior magnitude sem drásticas conseqüências políticas e menos ainda porque podiam iniciar e terminar guerras quase que pela livre vontade Neste período tanto a ordem doméstica quanto a internacio nal podiam ser consideravelmente modificadas com um risco político comparativamente pequeno II Eis por que os 30 anos que sucederam 1848 foram um período de mudanças mais espetaculares ao nível de relações internacionais que domésticas No tempo das revoluções ou melhor depois da der rota de Napoleão ver A Era das Revoluções capítulo 5 os governos das grandes potências tiveram o maior cuidado em evitar conflitos de maior importância entre si já que a experiência havia mostrado que grandes guerras e revoluções caminham juntas Agora que as revolu ções de 1848 tinham vindo e partido este motivo para constrangi mento diplomático tornarase de importância secundária A geração posterior a 1848 foi uma era de guerras e não de revoluções Algumas delas foram de fato o produto de tensões internas ou de fenômenos revolucionários ou quaserevolucionários Estes as grandes guerras civis da China 185164 e dos Estados Unidos 186165 não fa zem parte exatamente da presente discussão exceto no que diz respei to aos aspectos técnicos e diplomáticos das guerras deste período Vamos considerálas separadamente ver capítulos 7 e 8 mais adian te Aqui estamos interessados principalmente nas tensões e mudan ças internas dentro do sistema de relações internacionais sem esque cer o curioso intercâmbio entre as políticas internacional e doméstica 89 Se fôssemos perguntar a um especialista que ainda estivesse vivo do sistema internacional pré1848 sobre problemas de política externa vamos dizer Visconde Palmerston que foi o Secretário de Estado Bri tânico bem antes das revoluções e continuou a dirigir a pasta com al gumas interrupções até sua morte em 1865 ele nos teria explicado da seguinte forma as únicas questões internacionais que contavam eram as relações entre as cinco grandes potências européias cujos conflitos pudessem resultar em guerras de maior importância os seja Inglaterra Rússia França Áustria e Prússia ver A Era das Revolu ções capítulo 5 O único estado além destes com suficiente ambição e poder para ser levado em conta os Estados Unidos era desprezível já que confinava seus interesses a outros continentes e nenhuma po tência européia tinha ambições vivas nas Américas que não fossem econômicas e estas eram do interesse de empresários privados não de governos De fato em 1867 a Rússia vendia o Alaska aos Estados Unidos por uns poucos 7 milhões de dólares e mais o suborno de al guns congressistas americanos para convencer o Congresso a aceitar aquilo que era universalmente considerado uma coleção de rochas geleiras e tundra ártica As potências européias ou melhor aquelas que contavam Inglaterra por causa de sua riqueza e armada Rússia por causa de sua extensão e exército e França por causa de seu ta manho exército e reconhecida e respeitada história militar tinham ambições e razões para desconfiança mútua mas não além da linha do compromisso diplomático Por mais de 30 anos depois da derrota de Napoleão em 1815 nenhuma das grandes potências havia usado armas entre si limitando suas operações militares à supressão da sub versão doméstica ou internacional a vários conflitos locais nem para se expandirem no resto atrasado do mundo Havia entretanto uma fonte de atrito o bastante constante sur gindo sobretudo da combinação entre uma lenta desintegração do Im pério Otomano do qual vários elementos nãoturcos estavam aptos a se libertar e das ambições conflitantes da Rússia e Inglaterra no Me diterrâneo oriental o atual Oriente Médio e a área entre a fronteira leste da Rússia e a fronteira oeste do Império Britânico da índia Da mesma forma que os ministros das relações exteriores dos países de cisivos não estavam preocupados com nenhum distúrbio grave no sis tema internacional através de revoluções eles se sentiam porém a meaçados com aquilo que era chamado A questão do Leste Mesmo assim não se havia ainda perdido o controle As revoluções de 1848 provaramno pois mesmo que três entre as cinco grandes potências ti vessem sido convulsionadas por elas o sistema internacional emergiu praticamente intocado como tal E também com a exceção parcial da França o mesmo ocorreu com os sistemas políticos internos de todos As décadas subseqüentes viriam a ser bastante diferentes Em primeiro lugar o poder considerado pelo menos pelos britânicos como potencialmente o mais instável a França reapareceu da revolu ção como um império populista sob outro Napoleão e o que era mais 90 estranho o medo de um retorno ao Jacobinismo de 1793 não mais de tinha esta possibilidade Napoleão apesar de divulgar ocasionalmente que Império significa Paz especializouse em intervenções interna cionais expedições militares a Síria 1860 em conjunto com a Ingla terra sobre a China 185865 e mesmo enquanto os Estados Uni dos estavam ocupados de outra forma uma aventura no México 186367 onde o satélite francês que foi o Imperador Maximiliano 186467 não sobreviveu por muito mais tempo à Guerra Civil Ame ricana Não havia nada particularmente francês nestes exercícios de banditismo exceto talvez pelo reconhecimento por parte de Napoleão do valor eleitoral da glória imperial A França era apenas suficiente mente forte para tomar parte nesta razzia do mundo nãoeuropeu en quanto a Espanha por exemplo não o era mais apesar de suas gran diosas ambições em recuperar parte de sua perdida influência imperi al na América Latina Enquanto as ambições francesas estivessem si tuadas bem longe não afetavam particularmente o sistema de poder europeu mas quando elas tomavam lugar onde as potências européias estivessem exercitando sua rivalidade vinham trazer perturbação ao que já era um equilíbrio bastante delicado O primeiro dos mais importantes resultados desta perturbação foi a Guerra da Criméia 185456 o acontecimento mais próximo a uma guerra geral européia entre 1815 e 1914 Não havia nada de novo ou inesperado na situação que transformouse numa carnificina inter nacional importante e notoriamente incompetente entre a Rússia de um lado Inglaterra França e Turquia do outro e na qual estimase que mais de 600 mil pessoas tenham perecido sendo que 500 mil de las por doença 22 das tropas inglesas 30 das francesas e cerca de metade das russas Nem antes nem depois disso podese dizer que a política russa de dividir a Turquia ou de transformála num satélite neste caso a primeira hipótese tenha procurado demandado ou le vado a uma guerra entre as potências Mas antes e durante a fase se guinte da desintegração turca na década de 1870 o conflito entre po tências deuse essencialmente como um jogo entre dois poderosos e velhos contendores Inglaterra e Rússia os outros não desejando ou não podendo intervir de outra forma que não fosse simbólica Mas na década de 1850 havia um outro contendor a França cujos estilo e es tratégia eram acima de tudo imprevisíveis Há pouca dúvida de que alguém quisesse realmente tal guerra que foi liquidada sem ter resul tado em nenhuma modificação substancial na Questão do Leste as sim que as potências puderam desvencilharse do imbróglio O que ocorreu foi que o mecanismo de diplomacia da Questão do Leste criada para pequenas confrontações ruiu temporariamente e ao cus to de umas poucas centenas de milhares de vidas Os resultados diplomáticos diretos da guerra foram temporários ou insignificantes embora a Romênia formada pela união de dois principados do Danúbio e nominalmente sob suserania turca até 1878 tenha se tornado de fado independente Os resultados políticos 91 de longo alcance foram mais sérios Na Rússia a rígida crosta da au tocracia tzarista de Nicolau I 182555 já sob pressão crescente ra chou Uma era de crise reformas e mudanças começara ali culmi nando na emancipação dos servos 1861 e na emergência de um mo vimento revolucionário russo no final da década de 1860 O mapa po lítico do resto da Europa viria em breve a ser transformado processo este facilitado se não tornado possível pelas alterações do sistema de poder internacional precipitadas pelo episódio da Criméia Como já as sinalamos um reino unido da Itália surgiu nos anos 185870 uma A lemanha unida em 186271 incidentalmente levando ao colapso o Se gundo Império de Napoleão na França e a Comuna de Paris 187071 além de que a Áustria tinha sido excluída da Alemanha e profundamen te reestruturada Em resumo com a exceção da Inglaterra todas as po tências européias foram substancialmente em muitos casos até terri torialmente modificadas entre 1856 e 1871 e um novo grande estado como cedo viria a ser reconhecido tinha sido fundado a Itália Muitas destas alterações derivavam direta ou indiretamente das unificações políticas da Alemanha e da Itália Fosse qual fosse o ím peto original destes movimentos pela unificação o processo viria a ser levado a cabo por governos constituídos em outras palavras atra vés da força militar Como na famosa frase de Bismarck a questão da unificação tinha sido solucionada com sangue e ferro Em 12 anos a Europa passou por quatro guerras importantes França Savóia e os i talianos contra a Áustria 185859 Prússia e Áustria contra a Dina marca 1864 Prússia e Itália contra a Áustria 1866 Prússia e os es tados germânicos contra a França 1871 Todas foram relativamente breves e pelos padrões das grandes carnificinas na Criméia e nos Es tados Unidos nenhuma excepcionalmente custosa apesar do que cer ca de 160 mil pereceram na guerra francoprussa a maior parte do la do francês Mas todas ajudaram a fazer do período da história euro péia de que trata este volume um interlúdio guerreiro naquele que de outra forma seria um século incomumente pacífico entre 1815 e 1914 Mesmo assim apesar de que a guerra era bastante comum neste mun do entre 1848 e 1871 o medo de uma guerra geral medo este que o século XX tem vivido virtualmente sem interrupção desde a primeira década do século ainda não assustava os cidadãos do mundo burguês Isso só começou a ocorrer lentamente depois de 1871 Guerras entre es tados ainda podiam ser deliberadamente iniciadas e terminadas por go vernos uma situação brilhantemente explorada por Bismarck Apenas sobre guerras civis não se tinha tal controle assim como em relação aos relativamente poucos conflitos que degeneraram em genuínas guerras entre povos como a guerra entre o Paraguai e seus vizinhos 186470 transformada num destes episódios de carnificina e destruição incontro láveis com os quais o nosso próprio século está tão familiarizado Nin guém sabe ao certo a extensão das perdas nas guerras de Taiping mas temse dito que algumas províncias chinesas até hoje não conseguiram recuperar sua população de antes das guerras 92 A Guerra Civil Americana matou mais de 630 mil soldados e o total de mortos feridos e desaparecidos ficou entre 33 e 40 do con junto de forças unionistas e confederadas A Guerra do Paraguai ma tou 330 mil até onde as estatísticas latinoamericanas possam ter al gum significado reduzindo a população de sua vítima principal para cerca de 200 mil dos quais 30 mil eram homens Por onde for que se observe a década de 1860 foi uma década de sangue O que fez com que este período da história fosse relativamente tão sangrento Em primeiro lugar o próprio processo de expansão capitalista global que multiplicava as tensões no mundo nãoeuropeu as ambições do mundo industrial e os conflitos diretos e indiretos dali surgidos Assim foi a Guerra Civil Americana sejam quais forem su as origens políticas quando o norte industrializado venceu o sul agrá rio ou como poderia ser dito em outras palavras a transferência do sul americano do império informal da Inglaterra da qual a indústria do algodão era o pendente econômico para a nova e definitiva eco nomia industrial dos Estados Unidos Podese considerar esta transfe rência como um passo precoce mas gigantesco no caminho que no século XX levaria a totalidade das Américas da dependência britâni ca para a dependência americana A Guerra do Paraguai pode ser vis ta como parte da integração da bacia do Rio da Prata na economia mundial da Inglaterra Argentina Uruguai e Brasil suas faces e eco nomias voltadas para o Atlântico forçaram o Paraguai a perder sua autosuficiência conseguida na única área na América Latina onde os índios resistiram ao estabelecimento de brancos de forma efetiva gra ças talvez à original dominação jesuíta ver capítulo 7 mais adiante O restante dos índios que resistiram à conquista branca foram empur rados para a fronteira desta conquista Apenas no norte da bacia do Prata os povoados indígenas permaneceram sólidos e o guarani ao invés de português ou espanhol permaneceu como o idioma de facto para comunicação entre nativos e colonos A rebelião de Taiping e sua supressão são inseparáveis da rápida penetração de armas e capi tal ocidental no Império Celestial desde a primeira Guerra do Ópio 183942 ver capítulo 7 mais adiante Em segundo lugar como já vimos especialmente na Europa foi graças a recuperação da guerra como um instrumento normal de política governamental já que não mais se acreditava que a guerra devia ser evitada por medo da conseqüente revolução e já que estava também convencido corretamente de que os mecanismos de poder eram capazes de mantêlas nos limites desejados A rivalidade econô mica não levava além de atritos locais numa era de expansão onde parecia haver lugar para todos Mais ainda nesta era clássica de libe ralismo econômico a competição comercial estava mais próxima de independência frente a qualquer apoio governamental do que nunca antes ou depois Ninguém neste período nem mesmo Marx contra riamente a uma suposição corrente entendeu as guerras européias como basicamente econômicas na sua origem 93 Em terceiro lugar estas guerras agora podiam ser promovidas com a nova tecnologia do capitalismo Já que esta tecnologia através da câmera e do telégrafo também havia transformado a cobertura das guerras na imprensa trazendo sua realidade mais vividamente diante do público literato mas exceto pela fundação da Cruz Vermelha In ternacional em 1860 e a Convenção de Genebra de 1864 isto resultou em pouca coisa Nosso século não viria a produzir melhores controles sobre suas horríveis matanças As guerras asiáticas e latino americanas permaneceram substancialmente prétecnológicas exce ção feita às pequenas incursões de forças européias A Guerra da Criméia com sua incompetência característica falhou em usar ade quadamente a tecnologia já existente Mas as guerras da década de 1860 já iriam empregar a estrada de ferro para mobilização e trans porte adequados e o telégrafo disponível para rápidas comunicações Também nesta época foram desenvolvidos os barcos de guerra e suas derivações a artilharia pesada as armas de guerra de produção em massa incluindo a metralhadora Gatling 1361 assim como os mo dernos explosivos passaram a ser usados a dinamite foi inventada em 1866 trazendo conseqüências significativas para o desenvolvi mento das economias industriais Portanto todos estavam mais prepa rados e próximos dos massacres das guerras modernas do que em qualquer época anterior A Guerra Civil Americana mobilizou 25 mi lhões de homens de uma população de digamos 33 milhões O res tante das guerras do mundo industrial permaneceu como conflitos de pequenas proporções pois mesmo os 17 milhões mobilizados em 187071 na guerra francogermânica representaram menos de 25 dos 77 ou mais milhões de habitantes dos dois países ou seja 8 dos 22 milhões capazes de empunhar armas Ainda é importante notar que de meados da década de 1860 em diante gigantescas batalhas envol vendo mais de 300 mil homens deixaram de ser incomuns Sadowa em 1866 Gravelotte e Sedan em 1870 Apenas uma batalha deste tipo o correu durante todo o período das guerras napoleônicas Leipzig em 1813 Mesmo a batalha de Solferino na Guerra Italiana de 1859 foi maior que todas as batalhas napoleônicas com exceção de uma Já observamos os subprodutos domésticos destas iniciativas e guerras entre governos Mas a longo prazo suas conseqüências inter nacionais ainda viriam a ser mais dramáticas Pois no período que es tudamos o sistema internacional foi fundamentalmente alterado muito mais profundamente que os observadores da época chegaram a reconhecer Apenas um aspecto disto permaneceu inalterado a ex traordinária superioridade do mundo desenvolvido sobre o subdesen volvido que era sublinhada ver capítulo 8 mais adiante pela carreira do único país nãobranco que neste período conseguiu imitar o Oeste ou seja o Japão A tecnologia moderna colocava qualquer governo que não a dispusesse a mercê de qualquer outro que a possuísse Por outro lado ás relações entre as potências foram transforma das Por meio século depois da derrota de Napoleão apenas um país 94 era essencialmente industrial e capitalista dispondo de uma genuína política global isto é uma armada global a Inglaterra Na Europa ha via dois países com exércitos potencialmente decisivos apesar de que sua força era essencialmente nãocapitalista a Rússia com sua vasta e fisicamente vigorosa população e a França com a possibilidade e a tradição de mobilização de massa revolucionária A Áustria e a Prús sia não eram de importância políticomilitar comparável Nas Améri cas havia apenas um poder sem rival os Estados Unidos que como já vimos não se aventurava na área da real rivalidade entre potências Esta área não incluía antes da década de 1850 o Extremo Oriente Mas entre 1848 e 1871 ou mais precisamente durante a década de 1860 três fatos ocorreram Primeiro a expansão da industrialização produziu outras potências essencialmente industriais e capitalistas a lém da Inglaterra os Estados Unidos a Prússia Alemanha e muito antes disso a França tendo o Japão se somado mais tarde Segundo o progresso da industrialização fez com que de forma crescente a ri queza e a capacidade industrial viessem a ser os fatores decisivos no poderio internacional diminuindo assim a posição relativa da Rússia e da França e aumentando a da Prússia Alemanha Terceiro a emer gência como potências independentes de dois estados extraeuropeus os Estados Unidos unidos sob o norte na Guerra Civil e o Japão sis tematicamente embarcando na modernização da Restauração Meiji de 1868 criavam pela primeira vez a possibilidade de um conflito global entre potências A tendência crescente de homens de negócios e governos europeus em expandir suas atividades alémmar e de en volveremse facilmente com outros poderes em áreas tais como o Ex tremo Oriente e o Oriente MédioEgito reforçava esta possibilidade Fora da Europa estas mudanças na estrutura de poder não produ ziam ainda grandes conseqüências Mas dentro da Europa fizeramse imediatamente sentir A Rússia como a Guerra da Criméia mostrara tinha cessado de ser potencialmente decisiva no continente europeu Assim como a França o que havia sido demonstrado pela guerra francoprussiana Por outro lado a Alemanha um novo poder que combinava uma impressionante força industrial e tecnológica com uma população substancialmente maior que qualquer outro estado eu ropeu exceto a Rússia tornouse a nova força decisiva nesta parte do mundo e assim permaneceria até 1945 A Áustria na redecorada ver são de uma Monarquia Dual AustroHúngara 1867 permaneceu a quilo que havia sido por já tanto tempo uma grande potência ape nas no tamanho e na conveniência internacional apesar de mais forte que a recémunificada Itália cuja grande população e ambições di plomáticas davam também direito a requerer ser tratada como partici pante no jogo do poder De mais a mais a estrutura formal internacional passou a diver gir da estrutura real A política internacional tornouse política mun dial na qual pelo menos duas potências nãoeuropéias iriam intervir de fato embora isso não fosse evidente até o século XX Mais ainda 95 estes países tornaramse uma espécie de oligopólio de potências capi talistas industriais exercendo um monopólio sobre o mundo mas competindo entre si embora isto não se tornasse evidente até a era do imperialismo depois do fim de nosso período Por volta de 1875 tudo isso era dificilmente discernível Mas as fundações da nova es trutura de poder foram estabelecidas na década de 1860 incluindo o medo de uma guerra geral européia que começava a preocupar os ob servadores da cena internacional na década de 1870 De fato tal guer ra não iria acontecer nos 40 anos seguintes um período mais longo do que o século XX poderia imaginar para si mesmo Nossa própria ge ração que pode olhar para trás no momento que escrevemos e ver quase 30 anos sem guerras entre as grandes ou mesmo médias potên cias sabe melhor do que ninguém que a ausência de guerra pode ser muito bem combinada com o seu temor permanente Apesar dos con flitos a era do triunfo liberal tinha sido estável Não mais o seria de pois de 1875 Com a exceção do conflito entre os Estados Unidos e a China na Coréia em 195053 num tempo em que a China não era considerada uma potência de maior envergadura PRIMARY DATA SECONDARY DATA PRIMARY DATA SECONDARY DATA 97 Quinto Capítulo A CONSTRUÇÃO DAS NAÇÕES Mas o que é uma nação Por que a Holanda é uma nação en quanto Hanover e o GrãoDucado de Parma não o são Ernest Renan 188211 O que é nacional Quando ninguém entende uma palavra da língua que você fala Johann Nestroy 18622 Se um grande povo não acredita que a verdade deva ser encontrada em si mesma se não acredita que ele sozinho se complete a si mes mo e esteja destinado a levantarse e salvar a todo o resto pela sua verdade imediatamente transformase em material etnográfico e não mais em um grande povo Uma nação que perde esta fé deixa de ser uma nação F Dostoiewsky 1871723 NAÇÕES Reunir aqui todos os povos Gustave Flaubert 18524 I Se as políticas doméstica e internacional estavam intimamente ligadas entre si neste período o traço que as ligava mais obviamente era o que chamamos de nacionalismo mas os meados do século XIX ainda o conheciam como o princípio de nacionalidade Sobre o que girava a política internacional entre os anos de 1848 e 1870 A historiografia tradicional ocidental tem pouca dúvida a este respeito era sobre a criação de uma Europa de naçõesestados Talvez haja considerável dúvida sobre a relação entre esta faceta da era e outras que estavam evidentemente em conexão com ela tais como o pro gresso econômico liberalismo talvez até democracia mas nenhuma sobre o papel central da nacionalidade E realmente como poderia haver Mesmo significando outras coisas 1848 a primavera dos povos foi claramente e sobretudo em termos internacionais uma afirmação de nacionalidade ou me lhor de nacionalidades rivais Alemães italianos húngaros polone ses romenos e o resto afirmaram seu direito de serem estados inde 98 pendentes e unidos embraçando todos os membros de suas nações con tra governos opressores como fizeram os tchecos croatas dinamar queses e outros embora com crescente apreensão sobre aspirações re volucionárias por parte das nações maiores que pareciam excessiva mente dispostas a sacrifícios neste particular A França já era um estado independente nacional mas não menos nacionalista por causa disso As revoluções haviam fracassado mas a política européia dos 25 anos seguintes continuaria a ser dominada pelas mesmas aspira ções Como vimos anteriormente estes objetivos já haviam sido atin gidos de uma forma ou de outra fosse por meios nãorevolucionários ou apenas marginalmente revolucionários A França retornou à cari catura de uma grande nação sob a caricatura de um grande Napole ão a Itália e a Alemanha foram unificadas sob os reinos de Savóia e da Prússia a Hungria atingiu virtualmente uma organização domésti ca pelo Compromisso de 1867 a Romênia tornouse um estado pelo amalgamento de dois principados danubianos Somente a Polônia que não teve uma adequada participação na revolução de 1848 fra cassou em conseguir independência ou autonomia através da insurrei ção de 1863 No extremo oeste da Europa como no extremo sudeste o pro blema nacional veio a se impor Os fenianos na Irlanda levantaramse sob a forma de uma insurreição radical apoiados pelos milhões de compatriotas empurrados para os Estados Unidos pela fome e ódio aos ingleses A crise endêmica do multinacional Império Otomano tomou a forma de revoltas por parte dos diversos povos cristãos que tinham sido dominados por tanto tempo nos Bálcãs A Grécia e a Sér via já eram independentes apesar de muito menores do que achavam que deveriam ser A Romênia conseguiu uma espécie de independên cia pelo final da década de 1850 Insurreições populares no início da década de 1870 precipitaram ainda uma outra crise turca nacional e internacional que viria a fazer da Bulgária um país independente pelo final da década acelerando a balcanização dos Bálcãs A assim chamada Questão do Leste aquela permanente preocupação dos chanceleres agora se tornava basicamente uma questão de como re desenhar o mapa da Turquia européia entre um número incerto de es tados de tamanho duvidoso que se acreditava representarem na ções estatutos ao qual reclamavam E um pouco mais ao Norte os problemas internos do Império dos Habsburgos eram de forma cada vez mais patente as questões de suas nacionalidades constituintes muitas das quais e potencialmente todas levantavam pedidos que iam de uma tênue autonomia nacional à secessão Mesmo fora da Europa a construção de nações era dramatica mente visível O que era a Guerra Civil Americana senão a tentativa de manter a unidade da nação americana frente à destruição O que era a Restauração Meiji senão o aparecimento de uma nova e orgu lhosa nação no Japão Parecia quase impossível negar que o na tionmaking como Walter Bagehot 182677 chamou este processo 99 estava tomando lugar através de todo o mundo e era uma característi ca dominante da era Tão evidente que a natureza do fenômeno praticamente não foi investigada A nação era dada Como Bagehot colocou Não po demos imaginar aqueles para os quais isto é uma dificuldade sabe mos do que se trata quando vocês não nos perguntam mas não con seguimos explicála ou definila rapidamente 5 e poucos pensavam que precisavam Certamente os ingleses sabiam o que era ser inglês os franceses alemães ou russos certamente não tinham dúvidas do que fosse sua identidade coletiva Na era da construção de nações a creditavase que isso implicava a transformação desejada lógica e necessária de nações em estadonações soberanos com um territó rio coerente definido pela área ocupada pelos membros da nação que por sua vez era definida por sua história cultura comum compo sição étnica e com crescente importância a língua Mas implicar em tudo isso não é muito lógico Se por um lado é inegável e tão velho quanto a história o fato de existirem grupos distintos de homens dife renciandose a si mesmos de outros grupos por uma variedade de cri térios por outro lado não é certo que estes mesmos critérios fossem aquilo que o século XIX entendia por nacionalidade Menos ainda dizer que o fato de estarem organizados em estados territoriais do tipo do século XIX coincidia com o conceito de nação Estas eram fe nômenos históricos recentes embora alguns estados territorialmente mais antigos Inglaterra França Espanha Portugal e talvez até a Rússia pudessem ser definidos como estadonações sem que isso fosse totalmente absurdo Mesmo como um programa geral as aspi rações de formar estadonações a partir de estados que não fossem nações era um produto da Revolução Francesa Precisamos portanto separar bem claramente entre a formação de nações e nacionalis mos de um lado na medida em que isso ocorreu durante nosso perí odo e a criação de estadonações de outro O problema não era apenas analítico mas também prático Pois a Europa deixando de lado o resto do mundo estava dividida eviden temente em nações cujas aspirações em fundar estados não deixava pelo certo ou pelo errado nenhuma dúvida e em nações a cerca das quais havia uma boa dose de incerteza quanto a aspirações semelhan tes O melhor guia para o primeiro tipo era o fato político a história institucional ou a história cultural das tradições A França Inglaterra Espanha e Rússia eram inegavelmente nações porque possuíam es tados identificados com os franceses ingleses etc Hungria e Polônia eram nações porque havia existido um reino húngaro como entidade separada mesmo quando dentro do Império dos Habsburgos e um estado polonês que também havia existido de há muito até sua destru ição no final do século XVIII A Alemanha era uma nação por força de que seus numerosos principados apesar de nunca unidos em um único estado territorial terem constituído outrora o então chamado Sagrado Império Romano da Nação Germânica e formado por outro 100 lado a Federação Germânica mas também porque todos os alemães de educação elevada partilhavam a mesma língua escrita e literatura A Itália apesar de nunca ter sido uma entidade política enquanto tal possuía talvez a mais antiga das literaturas comuns à sua própria elite Nenhum inglês alemão ou francês pode ler as obras do século XIV escritas nos seus países sem estudar antes um bom pedaço de um idi oma diferente Mas todos os italianos de boa educação hoje lêem Dante com menos dificuldades que pessoas de língua inglesa moder na em relação a Shakespeare E assim por diante O critério histórico de nacionalidade implicava portanto a im portância decisiva das instituições e da cultura das classes dominantes ou elites de educação elevada supondoas identificadas ou pelo me nos não muito obviamente incompatíveis com o povo comum Mas o argumento ideológico para o nacionalismo era bem diferente e muito mais radical democrático e revolucionário Apoiavase no fato de que o que fosse que a história ou a cultura pudessem dizer os irlan deses eram irlandeses e não ingleses os tchecos eram tchecos e não alemães os finlandeses não eram russos e nenhum povo deveria ser explorado ou dirigido por outro Argumentos históricos poderiam ser encontrados ou inventados para explicar esta posição sempre se po de encontrálos mas essencialmente o movimento tcheco não ficou apenas na aspiração de restaurar a Coroa de São Venceslau assim como o movimento irlandês não ficou fixado na Revogação da União de 1801 A base deste senso separatista não era necessariamente ét nica na acepção de diferenças rapidamente identificáveis como apa rência física ou mesmo de idioma Durante nosso período o movi mento dos irlandeses muitos dos quais já falavam inglês dos norue gueses cuja língua literária não era muito diferente do dinamarquês ou dos finlandeses cujos nacionalistas eram bilingües falando sueco e finlandês não criaram um caso fundamentalmente lingüístico para si mesmos Se chegava a ser cultural não se tratava da alta cultura que muitos destes povos não chegavam a ter em grande quantidade mas sim da cultura oral canções baladas épicos etc os hábitos e formas de vida dos folks do povo comum em outras palavras pa ra um entendimento prático do campesinato O primeiro estágio deste renascimento nacional era invariavelmente o de encontrar recupe rar e sentir orgulho desta herança de folclore ver A Era das Revolu ções capítulo 14 Mas isso não era político em si Aqueles que inicia ram este movimento eram freqüentemente ou não membros de ele vada cultura da classe dirigente ou elite estrangeira como os pastores luteranos alemães ou os senhores com preocupações intelectuais no Báltico que colecionavam o folclore e antigüidades do campesinato latvio ou estoniano Os irlandeses não eram nacionalistas porque a creditassem em duendes Por que eles eram nacionalistas e até onde eles eram nacionalis tas vamos discutir mais adiante O ponto significativo aqui é que a típica nação a histórica ou semihistórica era também uma peque 101 na nação e isto colocava o nacionalismo do século XIX diante de um dilema que tem sido raramente reconhecido Pois os grandes de fensores da naçãoestado entendiamse não apenas como nacional mas também como progressista isto é capaz de uma economia tecnologia organização de estado e força militar viáveis ou em ou tras palavras que precisava ser territorialmente grande Terminava por ser na realidade a unidade natural do desenvolvimento da so ciedade burguesa moderna liberal e progressista Unificação as sim como independência era o princípio básico e onde argumentos históricos para unificação não existissem como era o caso da Ale manha e Itália esta era quando possível formulada como um pro grama Não havia evidência de que os estados balcânicos tivessemse sentido algum dia parte de uma mesma nação mas os ideólogos na cionalistas que apareceram na primeira metade do século pensavam em termos de uma Illiria unindo serbos croatas eslovacos bosnia nos macedônios e outros que até hoje demonstram que seu naciona lismo iugoslavo existe em conflito com seus sentimentos como croa tas slovacos etc O mais eloqüente e típico dos defensores da Europa das nacio nalidades Giuseppe Mazzini 180572 propôs um mapa de sua Eu ropa ideal em 1857 6 consistia de 11 uniões deste tipo Claramente sua concepção de naçãoestado era bem diferente da de Woodrow Wilson que presidiu a única criação sistemática sobre o papel de um mapa europeu seguindo princípios nacionais em Versalhes 191920 Sua Europa consistia em 26 ou incluindo a Irlanda 27 estados sobe ranos e pelo critério Wilsoniano casos poderiam ser levantados em pelo menos algumas outras situações O que deveria acontecer com as pequenas nações Elas deveriam ser integradas completamente de forma federal ou outra qualquer com ou sem uma quantidade ainda indeterminada de autonomia às naçõesestados viáveis Mas Mazzini parecia não se dar conta de que um homem que propusesse unir a Suí ça a Savóia Tirol alemão Caríntia e Slovênia ficava numa posição difícil para criticar por exemplo o Império dos Habsburgos por pas sar por cima do princípio nacional O argumento mais simples daqueles que identificavam nações estados com o progresso era negar o caráter de nações reais aos po vos pequenos e atrasados ou então argumentar que o progresso iria reduzilos a meras idiossincrasias dentro das grandes nações reais ou mesmo leválos a um desaparecimento de facto por assimilação a algum Kulturvolk Isso não parecia fora da realidade Depois de tudo a participação como membro na Alemanha não impedia os mecken burgueses de falar em seu dialeto que era mais próximo do holandês que do altoalemão e que nenhum bávaro conseguia entender como também não evitava que os eslavos lusatianos não aceitassem como ainda discutem um estado basicamente alemão A existência dos bre ves e uma parte dos bascos catalães e flamengos para não mencio nar aqueles que se comunicam em provençal ou na Langue doc pare 102 cia perfeitamente compatível com a nação francesa da qual faziam parte e os alsacianos criaram um problema apenas porque uma outra grande naçãoestado a Alemanha disputavaos Além disso havia exemplos de pequenos grupos lingüísticos cujas elites de instrução elevada olhavam para frente sem remorsos em relação ao desapare cimento de seus próprios idiomas Muitos gauleses em meados do sé culo XIX estavam resignados a isto e alguns viam mesmo com pra zer este processo na medida em que facilitasse a penetração do pro gresso numa região atrasada Havia um forte elemento de diferenciação e talvez um mais for te de patrocínio especial em tais argumentos Algumas nações as maiores as avançadas as estabelecidas incluindo certamente a própria nação do ideólogo estavam destinadas pela história a preva lecer ou se o ideólogo preferisse uma conceituação darwinista a se rem vitoriosas na luta pela existência e outras não Todavia isso não deve ser entendido como simplesmente uma conspiração de parte de algumas nações para oprimir outras embora portavozes das nações desprezadas não devessem ser repreendidos por pensar assim Pois o argumento era dirigido não apenas contra as línguas e culturas regio nais das nações como também contra intrusos também não pretendia seu desaparecimento mas apenas seu rebaixamento da qualidade de língua para a de dialeto Cavour não negou aos habitantes da Sa vóia o direito de falar sua própria língua mais próxima do francês do que do italiano numa Itália unificada ele mesmo falavaa por razoes domésticas Ele e outros italianos nacionalistas apenas insistiam em que deveria haver somente uma língua e um meio de instrução ofici ais em outras palavras o italiano e que as outras deveriam sumir e vaporarse da melhor forma que pudessem Da maneira como as coi sas seguiam nem os sicilianos nem os sardenhos insistiram na sua nacionalidade separada portanto seus problemas poderiam ser redefi nidos na melhor das hipóteses como regionalismo Este fenômeno apenas se tornou politicamente significativo uma vez que um pequeno povo reclamou pela sua nacionalidade como os tchecos fizeram em 1848 quando seus portavozes recusaram o convite dos liberais ale mães para tomar parte no parlamento de Frankfurt Os alemães não negaram que eles fossem tchecos Apenas entenderam o que era cor reto que todos os tchecos de boa cultura liam e escreviam alemão partilhavam da alta cultura alemã e que portanto incorretamente e ram alemães O fato de que a elite tcheca também falasse tcheco e partilhasse da cultura do povo simples local parecia ser politicamente irrelevante como as atitudes do povo simples em geral e do campesi nato em particular Diante das aspirações nacionais de povos pequenos os ideólo gos de uma Europa nacional tinham três escolhas diante de si eles podiam negar legitimidade ou existência a tais movimentos podiam reduzilos a movimentos de autonomia regional ou podiam aceitálos como fatos indiscutíveis porém intragáveis Os alemães tenderam pa 103 ra a primeira hipótese com povos como os eslovenos e os húngaros com os eslovacos Esta atitude precisa ser diferenciada daquela dos revolucionários sociais que não deram maior importância ao naciona lismo pelo menos em nosso período e que portanto tiveram uma visão puramente operacional do fenômeno Para Marx os naciona lismos húngaro e polonês eram bons porque mobilizavam do lado da revolução e os nacionalismos tcheco e croata ruins porque objetiva mente estavam do lado da contrarevolução Mas não podemos negar que houvesse um elemento de nacionalismo de grandenação nesses pontos de vista de forma bem acentuada entre os revolucionários al tamente chauvinistas franceses como os blanquistas e difícil de ser negado mesmo em Friederich Engels Cavour e Mazzini assumiram a segunda hipótese com respeito ao movimento irlandês Nada pode ser mais paradoxal do que o fracasso em entender do ponto de vista nacionalista um movimento nacional cuja base de massa era de tal forma evidente Políticos de todas as correntes foram constrangidos a assumir a terceira hipótese com respeito aos tchecos cujo movimento nacional apesar de não pretender total independência não podia mais ser posto de lado após 1848 Quando possível evidentemente não se dava nenhuma importância a tais movimentos Nenhum estrangeiro iria preocuparse com o fato de que a maioria dos velhos estados na cionais não fosse outra coisa senão estados multinacionais como por exemplo Inglaterra França ou Espanha pois ou gauleses esco ceses bretões catalães etc não colocavam nenhum problema interna cional e com a possível exceção dos catalães nenhum problema sig nificativo nas políticas de seus próprios países II Havia uma diferença fundamental entre o movimento para fun dar estadonações e nacionalismo O primeiro era um programa pa ra construir um artifício político que reclamava basearse no último Não há dúvida de que muitos daqueles que se consideravam ale mães por alguma razão achavam que isso não implicava necessaria mente num único estado alemão um estado alemão de algum tipo es pecífico ou mesmo um estado onde todos os alemães vivessem dentro de uma área determinada como uma canção nacional dizia entre os rios Meuse a Oeste e Nieman a Leste as ilhas da Dinamarca o cintu rão ao Norte e o rio Adige ao Sul Bismarck por exemplo teria ne gado que sua rejeição a este programa da grande Alemanha signifi cava que ele não era menos alemão que um junker prussiano e fun cionário do estado Ele era alemão mas não um alemão nacionalista provavelmente nem mesmo um nacionalista pequenoalemão por convicção embora tenha unificado o país excluindo as áreas do Im pério Austríaco que tivessem pertencido ao Santo Império Romano mas incluindo as áreas tomadas pela Prússia aos poloneses que nunca 104 tinham feito parte do Império Romano Um caso extremo de diver gência entre nacionalismo e naçãoestado era a Itália a maior parte da qual tinha sido unificada sob o rei da Sabóia em 185960 1866 e 1870 Não havia precedente histórico posterior a Roma antiga para uma única administração de toda a área compreendida entre os Alpes e a Sicília que Metternich havia descrito com grande precisão como uma mera expressão geográfica No momento da unificação em 1860 estimouse que não mais de 25 de seus habitantes falava a língua italiana no diaadia o resto falando idiomas de tal forma dife rentes que professores enviados pelo estado italiano para a Sicília na década de 1860 foram confundidos com ingleses7 Provavelmente uma percentagem bem maior mas ainda uma modesta minoria teria se sentido naquela data como italianos Não é de admirar que Massi mo dAzeglio 17921866 tivesse exclamado em 1860 Fizemos a Itália agora precisamos fazer os italianos De qualquer maneira fosse qual fosse sua natureza ou progra ma movimentos representando a idéia nacional cresceram e multi plicaramse Eles não representavam freqüentemente ou normal mente aquilo que o século XX viria a entender como a extrema ver são de um programa nacional ou seja a necessidade de um estado to talmente independente homogêneo territorial e lingüisticamente lai co provavelmente republicanoparlamentar para cada povo O Sio nismo pelo extremismo mesmo de suas reivindicações ilustra de forma clara este fato pois implicava tomar um território inventar uma língua e laicizar as estruturas políticas de um povo cuja unidade histórica tinha consistido exclusivamente na prática de uma religião comum Entretanto todos implicavam algumas modificações políti cas mais ou menos ambiciosas o que os fazia nacionalistas Preci samos agora examinar estes últimos com cuidado para evitar tanto o anacronismo de uma compreensão tardia dos fatos como a tentação de confundir as idéias dos líderes nacionalistas mais vociferantes com as idéias de fato aceitas pelos seus seguidores Não deveríamos também passar por cima sem dar atenção para a substancial diferença entre velhos e novos nacionalismos os pri meiros incluindo não apenas as nações históricas sem um estado mas também aquelas que há longo tempo o possuíam Quão britâni cos os britânicos se sentiam Não muito apesar da inexistência nesta época de qualquer movimento autonomista gaulês ou escocês Imi grantes ingleses para os Estados Unidos tinham orgulho de sua nacio nalidade portanto sentindo relutância em se tornarem cidadãos ame ricanos mas imigrantes escoceses ou gauleses não tinham tal lealda de Eles permaneciam orgulhosos escoceses ou gauleses escolhendo a cidadania inglesa ou americana e naturalizavamse sem maiores pro blemas Em que medida os franceses sentiamse membros de la gran de nation Não sabemos mas estatísticas referentes à evasão ao ser viço militar no início do século sugerem que certas regiões a oeste e ao sul para não mencionar o caso especial dos corsos olhavam o 105 serviço militar compulsório mais como uma imposição do que como um dever nacional do cidadão francês Os alemães como sabemos tinham opiniões diferentes quanto ao tamanho natureza e estrutura do futuro estado unificado alemão mas quantos entre eles estavam deci didamente interessados na unificação alemã Pelo menos não os camponeses alemães segundo um consenso geral nem mesmo na re volução de 1848 quando a questão nacional dominou a política Estes eram países onde o nacionalismo de massa e o patriotismo não podi am ter suaexistência negada mas todavia demonstravam de forma clara como era imprudente tomar por certa a sua universalidade e homogeneidade Na maior parte das outras nações especialmente as emergentes só a mitificação e a propaganda tomariamnos por certos em meados do século XIX Nestas o movimento nacional tendia a tornarse po lítico após sua fase sentimental e folclórica com a emergência de grupos mais ou menos expressivos dedicados à idéia nacional pu blicando jornais e literatura nacionais organizando sociedades na cionais tentando estabelecer instituições educacionais e culturais e engajandose em várias atividades francamente políticas Mas de for ma geral neste ponto o movimento ainda era carente de um apoio de cisivo por parte da massa da população Consistia basicamente de um extrato social intermediário entre as massas e a burguesia ou a aristo cracia existentes se tanto especialmente os literatos professores camadas inferiores do clero alguns pequenos comerciantes e artesãos urbanos e aquela espécie de homens que tinham conseguido subir ao ponto máximo possível para os filhos de um campesinato subordina do numa sociedade hierárquica Eventualmente os estudantes de al gumas faculdades seminários ou colégios com orientação nacional forneciam a estes grupos um ativo corpo de militantes Evidentemen te nas nações históricas que demandavam apenas a remoção da dominação estrangeira para surgirem como estados a elite local pe quena nobreza na Hungria e Polônia burocratas classemédia na No ruega proporcionava quadros mais imediatamente políticos e às ve zes uma base maior para a emergência de nacionalismo ver A Era Revoluções capítulo 7 No todo esta fase de nacionalismo termina entre 1848 e a década de 1860 na Europa central ocidental e setentri onal embora muitos dos pequenos povos bálticos e eslavos estives sem apenas começando a entrar no período Por razões óbvias as camadas mais tradicionais atrasadas ou pobres de cada povo eram as últimas a serem envolvidas em tais mo vimentos trabalhadores empregados e camponeses que seguiam o caminho traçado pela bemeducada elite A fase de nacionalismo de massa que vinha normalmente sob a influência de organizações da camada média de nacionalistas liberaisdemocratas exceto quando contrabalançada pela influência de partidos independentes trabalhis tas e socialistas estava de alguma forma relacionada com desenvol vimento econômico e político Nas terras tchecas esta movimentação 106 começou com a revolução de 1848 desapareceu nos anos absolutistas da década de 1850 mas cresceu enormemente durante o rápido pro gresso econômico da década de 1860 quando as condições políticas passaram a ser mais favoráveis Uma burguesia nativa tcheca tinha então adquirido suficiente força econômica para fundar um banco na cional tcheco e mesmo instituições custosas tais como o Teatro Na cional de Praga inaugurado provisoriamente em 1862 Mais próxi mo de nosso interesse organizações culturais de massa como os clu bes de ginástica Sokol 1862 cobriam então os campos e as campa nhas políticas depois do Compromisso AustroHúngaro foram condu zidas por meio de uma série de grandes comícios a céu aberto uns 140 com uma estimativa de participação em terno de um milhão e meio no período 186871 8 que aliás ilustram tanto a novidade como o internacionalismo cultural de movimentos de massa nacionais Percebendo a falta de um nome adequado para tais atividades os t checos inicialmente tomaram emprestado o termo meeting do movi mento irlandês que tentaram imitar O termo meeting também seria tomado de empréstimo para reuniões de massa de classe trabalhadora pelos franceses e espanhóis mas a esta altura provavelmente por in fluência inglesa Logo um nome adequadamente tradicional viria a ser encontrado recuandose no tempo até os Hussitas do século XV um exemplo natural da militância nacional tcheca o tabor e por sua vez este nome viria a ser adotado pelos nacionalistas croatas para suas reuniões de massa embora os Hussitas não tivessem nenhuma relevância histórica para estes últimos Este tipo de nacionalismo de massa era novo e bem diferente do nacionalismo de elite ou de classe média dos movimentos italianos e alemão E existia ainda há tempos outra forma de nacionalismo de massa mais tradicional revolucionário e independente das classes mé dias locais mesmo que a razão disso fosse a pouca importância econô mica e política destas últimas Mas poderíamos chamar de naciona listas as rebeliões dos camponeses e montanheses contra a lei do es trangeiro quando os revoltosos eram unidos apenas pela consciência da opressão xenofobia e uma ligação profunda com a tradição antiga com a fé e um vago sentido de identidade étnica Somente quando estas re beliões mostravam de uma ou outra forma alguma conexão com mo vimentos nacionalistas modernos Se esta ligação existiu no sudeste eu ropeu onde tais movimentos destruíram muito do Império Turco parti cularmente na década de 1870 Bósnia Bulgária é um problema a ser debatido mas é indiscutível que elas produziram estados independentes Romênia Bulgária que reclamavam ser nacionais Na melhor das hi póteses podemos falar de um protonacionalismo como entre os ro menos conscientes da diferença de sua língua dos vizinhos eslavos a lemães e húngaros e cônscios de um certo eslavismo que diversos in telectuais e políticos tentaram desenvolver entre eles sob a forma de uma ideologia de Panslavismo neste período Panslavismo era ofereci do tanto aos políticos conservadores e imperiais da Rússia quanto aos 107 povos eslavos do Império dos Habsburgos com o objetivo de formar uma grande nação ao invés de várias pequenas nações inviáveis Este Panslavismo era combatido fortemente pela esquerda que via nele uma extensão da influência russa considerada o centro da reação in ternacional Um desses movimentos entretanto era indiscutivelmente nacio nal o irlandês A Irmandade Republicana Irlandesa Fenians com o ainda sobrevivente Exército Republicano Irlandês IRA era o des cendente linear das fraternidades do período pré1848 e o de vida mais longa O apoio rural de massa a políticos nacionalistas não era em si nada de novo pois a combinação irlandesa de conquista estrangeira pobreza opressão c uma classe senhorial na sua grande maioria ingle saprotestante imposta sobre um campesinato irlandêscatólico mo bilizava mesmo os nomes politizados Na primeira metade do século os líderes deste movimento de massa tinham pertencido à pequena classe média irlandesa e seus objetivos apoiados pela única organi zação efetiva de caráter nacional a Igreja eram conseguir uma mo derada acomodação com os ingleses A novidade em relação aos Feni anos que primeiro apareceram como tais no final da década de 1850 era que eles eram completamente independentes dos moderados da classe média e que seu apoio vinha inteiramente das classes populares mesmo apesar da aberta hostilidade da Igreja de partes do campesi nato assim como eram os primeiros a colocar um programa de total independência da Inglaterra a ser obtida por meio da insurreição arma da Embora o nome da organização derivasse de heróica mitologia da antiga Irlanda sua ideologia era bem pouco tradicional mesmo que seu nacionalismo laico e anticlerical não pudesse esconder que para a mas sa dos fenianos irlandeses o critério de nacionalidade fosse e ainda se ja a fé católica A concentração exclusiva no objetivo de conseguir uma República Irlandesa através da luta armada substituiu um progra ma social econômico e mesmo de política doméstica e a legenda he róica de rebeldes armados e mártires tem sido muito grande até hoje para aqueles que desejassem formular tais programas Esta é a tradição republicana que sobrevive na década de 1970 e que reapareceu na guerra civil do Ulster no IRA Provisório A rapidez com a qual os fenianos aliaramse com revolucionários socialistas e com que estes reconheceram o caráter revolucionário do Fenianismo não deveria en corajar ilusões sobre esta questão Marx apoiouos decididamente e mantinha correspondência com líderes fenianos Mas não deveríamos também subestimar a novidade e a significa ção histórica de um movimento cujo suporte financeiro vinha da massa dos trabalhadores irlandeses levados para os Estados Unidos pela fome o ódio aos ingleses e cujos recrutas vinham dos proletários imigrantes para a América e Inglaterra não havia quase trabalhadores industriais no que é hoje a República Irlandesa e de jovens camponeses vindos dos antigos baluartes do terrorismo agrário irlandês cuja estrutura era formada destes mesmos camponeses e do estrato mais baixo da elite 108 urbana dos trabalhadores que dedicaram a vida à insurreição Tudo is so antecipa os movimentos revolucionários nacionais dos países subde senvolvidos no século XX Faltavalhes o melhor da organização do trabalhismo socialista ou talvez apenas a inspiração de uma ideologia socialista que viria transformar a combinação de liberação nacional e transformação social numa força formidável no século XX Não havia socialismo em nenhuma parte e os fenianos que também eram revolu cionários sociais especialmente Michael Davitt 18461906 conse guiram apenas tornar explícito diante da Land League o que havia sjdo sempre implícito ou seja a relação entre nacionalismo de massa e des contentamento agrário e isto somente após o fim de nosso período du rante a Grande Depressão Agrária do final da década de 1870 e na dé cada seguinte Fenianismo era nacionalismo de massa na época do tri unfante liberalismo Podia fazer pouco exceto rejeitar a Inglaterra e re clamar total independência para um povo oprimido através da revolu ção esperando que isso viesse a resolver todos os problemas de pobre za e exploração Isso não foi sequer conseguido efetivamente pois ape sar da abnegação e heroísmo dos fenianos suas insurreições 1867 e invasões por exemplo do Canadá a partir dos Estados Unidos foram realizadas com notável ineficiência e os dramáticos coups consegui dos comuns em tais operações conseguiram pouco mais do que a pu blicidade normal em alguns casos má publicidade Eles geraram a for ça que iria conseguir independência para a maior parte da Irlanda Cató lica mas a partir do momento em que não geraram mais nada além dis so deixaram o futuro da Irlanda para os moderados classemédia os ri cos fazendeiros e os mercadores das pequenas cidades de um pequeno país agrário que iriam tomar posse da herança dos fenianos Embora o caso irlandês fosse único não há dúvida de que em nosso período o nacionalismo tornouse uma força de massa pelo menos nos países povoados por brancos Mesmo assim o Manifesto Comunista era mais realista do que é comumente considerado ao di zer que os trabalhadores não tem pátria O nacionalismo avançou na classe operária pari passu com a consciência política fosse porque a tradição revolucionária era nacional como na França fosse porque os líderes e ideólogos dos novos movimentos trabalhistas estivessem profundamente envolvidos na questão nacional como em todos os lugares em 1848 A alternativa para a consciência política nacional não era na prática o internacionalismo proletário mas uma cons ciência subpolítica que operava numa escala ainda menor que o da naçãoestado Eram poucos os homens e mulheres da esquerda políti ca que escolheram claramente entre lealdades nacionais ou suprana cionais como a causa internacional do proletariado O internaciona lismo da esquerda na prática significava solidariedade e apoio para aqueles que lutavam pela mesma causa em outras nações e no caso de refugiados políticos a presteza em participar na luta no lugar que se encontrassem Mas como os exemplos de Garibaldi Cluseret e da 109 Comuna de Paris que ajudou os fenianos na América provaram isso não era incompatível com uma passional profissão de fé nacionalista Também podia significar uma recusa em aceitar as definições do in teresse nacional impostas por governos ou outras instâncias Mesmo os socialistas franceses e alemães que em 1870 juntaramse ao pro testo contra a guerra fraticida FrancoPrussiana não eram insensí veis ao nacionalismo da maneira como eles o viam A Comuna de Paris tinhase apoiado tanto no patriotismo jacobino de Paris como nos slogans de emancipação social assim como os marxistas alemães socialdemocratas de Liebknecht e Bebei tinhamse apoiado no apelo ao nacionalismo radicaldemocrático de 1848 contra a versão prussi ana do programa nacional O que os trabalhadores alemães ressentiam era mais a reação do que o patriotismo alemão e um dos aspectos mais inaceitáveis da reação era que chamava os sociaisdemocratas de vaterlandlose Gesellen companheiros sem pátria desta forma ne gandolhes o direito de serem tanto trabalhadores como bons alemães E evidentemente era quase impossível para a consciência política não estar de uma forma ou de outra definida nacionalmente O prole tariado como a burguesia existia apenas conceitualmente como um fato internacional Na realidade existia como um agregado de grupos definidos pelos seus estados nacionais ou diferenças lingüísti casétnicas ingleses franceses ou em estados multinacionais ale mães húngaros ou eslavos E na medida em que estado e nação coincidiam na ideologia daqueles que estabeleciam instituições e do minavam a sociedade civil política em termos de estado implicava política em termos de nação III Mesmo assim malgrado poderosos sentimentos e lealdades na cionais na medida em que nações transformavamse em estados a nação não era algo espontâneo mas um produto Também não era historicamente nova pois expressava características que membros de grupos humanos muito antigos tinham em comum ou aquilo que os unia contra estrangeiros Precisava portanto ser construída Daí a importância crucial das instituições que podiam impor uniformidade nacional que eram principalmente o estado especialmente a educa ção do estado emprego do estado e nos países que adotavam serviço militar obrigatório serviço militar França Alemanha Itália Bélgica e ÁustriaHungria Os sistemas educacionais dos países desenvolvi dos expandiramse substancialmente durante este período em todos os níveis O número de estudantes universitários permaneceu entre tanto bastante modesto por parâmetros atuais Omitindo estudantes de teologia a Alemanha tinha a dianteira no final da década de 1870 com quase 17 mil seguida de longe pela Itália e França com 9 a 10 mil cada e Áustria com 8 mil 9 Das 18 novas universidades fundadas 110 entre 1849 e 1875 nove eram fora da Europa cinco nos Estados Uni dos duas na Austrália uma em Argel e outra em Tóquio cinco eram na Europa Oriental Jassy Bucareste Odessa Zagreb e Czernowitz Duas modestas fundações encontravamse na Inglaterra Estas univer sidades cresceram sob pressão nacionalista e nos Estados Unidos tais instituições de educação superior estavam num processo de multipli cação A educação secundária cresceu com as classes médias embora como a alta burguesia para a qual esta educação estava destinada te nham permanecido muito mais instituições de elite exceto ainda nos Estados Unidos onde a high school pública começou sua carreira de triunfo democrático Em 1850 havia apenas 100 delas na nação inteira Na França a proporção de alunos sob educação secundária cresceu de 1 em 35 1842 para 1 em 20 1864 mas graduados se cundários formavam apenas 1 em 55 ou 60 em 1860 embora fosse bem melhor que os 1 para 93 de 1840 Mas o maior avanço ocorreu nas escolas primárias cujo objeti vo era não apenas o de transmitir rudimentos da língua ou aritmética mas talvez mais do que isso impor os valores da sociedade moral patriotismo a seus alunos Este era o setor da educação que havia si do previamente negligenciado pela estado laico e seu crescimento es tava intimamente ligado com o avanço das massas na política como testemunham a instalação da sistema de educação primária do estado na Inglaterra três anos depois do Reform Act de 1867 e a vasta ex pansão do sistema na primeira década da Terceira República na Fran ça O progresso era realmente espantoso entre 1840 e 1880 a popula ção da Europa cresceu em 33 mas o número de seus filhos na esco la cresceu em 145 Mesmo na bemeducada Prússia o número de escolas primárias cresceu de mais de 50 entre 1843 a 1871 Mas não era apenas devido ao atraso da Itália que o mais rápido cresci mento de população escolar tenha ocorrido ali 460 Nos 15 anos que seguiram à unificação o número de escolas primárias dobrou De fato para as novas naçõesestados estas instituições eram de importância crucial pois apenas através delas a língua nacional ge ralmente construída antes através de esforços privados podia trans formarse na língua escrita e falada do povo pelo menos para algu mas finalidades Por exemplo a mass media neste momento a im prensa só podia transformarse em tal quando uma massa alfabeti zada em número suficiente fosse criada Era portanto também de im portância crucial a luta dos movimentos nacionais para conseguir a autonomia cultural isto é controlar a parte relativa nas instituições do Estado como por exemplo conseguir instrução escolar e uso ad ministrativo para suas respectivas línguas A disputa não era tal que afetasse os analfabetos que aprendiam seus dialetos em família nem as minorias que assimilavam en bloc a língua dominante da classe di rigente Os judeus europeus estavam satisfeitos em guardar suas lín guas nativas o lidiche derivado do alemão medieval e o Ladino de rivado do espanhol medieval como uma MameLoschen língua ma 111 terna para uso doméstico comunicandose com seus vizinhos em qualquer língua que fosse necessária e no caso de se transformarem em burgueses abandonando este velho idioma por aquele que fosse usado pela aristocracia e classe média contíguas fosse ela inglesa francesa polonesa russa húngara mas especialmente alemã Um movimento para desenvolver tanto o lidiche como o Ladino numa língua literária normal desenvolveuse a partir do meio do século e foi mais tarde retomado pelos movimentos revolucionários marxistas judeus e não pelo nacionalismo judeusionismo Mas os judeus neste momento não eram nacionalistas e seu fracasso em dar importância a uma língua nacional assim como o fracasso em possuir um territó rio nacional levou muitos a duvidar se realmente deveriam se consti tuir numa nação Por outro lado a disputa era vital para as classes médias e elites emergentes de povos atrasados ou subalternos Eram elas que particularmente sentiam o acesso privilegiado a postos im portantes e de prestígio que tinham os nativos da língua oficial mesmo quando como no caso dos tchecos seu bilingüismo compul sório lhes dava vantagem sobre os alemães monoglotas na Bohemia Por que deveria um croata aprender italiano língua de uma pequena minoria para tornarse um oficial da marinha austríaca E portanto na medida em que estadonações eram formados postos públicos e profissões da civilização progressista se multiplica vam a educação escolar se tornava mais geral e acima de tudo a mi gração urbanizava povos rurais todos estes ressentimentos encontra vam uma ressonância geral crescente Pois escolas e instituições ao imporem uma língua de instrução impunham também uma cultura uma nacionalidade Em áreas de povoamento homogêneo isso não ti nha importância a constituição austríaca de 1867 reconhecia educa ção elementar na língua do país Mas por que deveriam os eslova cos ou tchecos que haviam imigrado para cidades alemães tornarse alemães como preço de serem alfabetizados Eles reclamavam o di reito a escolas próprias mesmo quando fossem minorias E por que deveriam os tchecos e eslovacos de Praga ou Ljubljana Laibach tendo reduzido os alemães de uma maioria a uma pequena minoria confrontar nomes de ruas e regulamentos municipais numa língua es trangeira A política da metade austríaca do Império dos Habsburgos era demasiado complexa para que o governo tivesse tempo para pen sar multinacionalmente Mas o que pensar se outros governos usavam a educação poderosa arma para formar as nações que pretendiam magiarizar germanizar ou italianizar sistematicamente O paradoxo do nacionalismo era que ao formar sua própria nação automatica mente criava contranacionalismos para aqueles que a partir de então eram forçados à escolha entre assimilação ou inferioridade A era do liberalismo não entendeu este paradoxo Realmente não entendia este princípio de nacionalidade que aprovava conside rava mesmo personificar e em vários casos apoiava ativamente Ob servadores da época estavam certos em supor que nações e naciona 112 lismo eram ainda malformados e maleáveis A nação americana por exemplo baseavase na idéia de que ao migrar através do oceano muitos milhões de europeus iriam rapidamente abandonar qualquer lealdade política a suas pátrias e qualquer demanda de status oficial para suas línguas ou culturas nativas Os Estados Unidos ou Brasil ou Argentina não viriam a ser multinacionais mas pelo contrário absorveriam os imigrantes na própria nação E no nosso período exa tamente isto veio a acontecer quando as comunidades imigrantes não perderam sua identidade nacional no meltingpot do novo mundo mas permaneceram ou tornaramse mesmo conscientes e orgulhosos irlandeses alemães suecos italianos etc As comunidades de imi grantes podiam ser forças nacionais importantes nos seus países de origem como os irlandeses americanos o eram na política da Irlanda mas nos Estados Unidos eles eram de maior importância apenas para eleições municipais Os alemães de Praga somente por sua existên cia levantaram os mais importantes problemas para o Império dos Habsburgos nada disso ocorreu em relação aos alemães de Cincinnati ou Milwaukee nos Estados Unidos O nacionalismo portanto parecia manejável na estrutura do li beralismo burguês e compatível com ele Um mundo de nações viria a ser acreditavase um mundo liberal e um mundo liberal seria feito de nações O futuro viria a mostrar que a relação entre os dois não era tão simples assim 113 Sexto Capítulo AS FORÇAS DA DEMOCRACIA A burguesia deveria saber que junto com ela as forças da demo cracia cresceram durante o Segundo Império Ela encontrará estas forças tão solidamente estabelecidas que seria loucura recomeçar uma guerra contra elas Henri Allain Targé 1868 1 Assim como o progresso da democracia é o resultado do desenvol vimento geral social uma sociedade avançada ao mesmo tempo que detém uma grande parte de poder político deve proteger o Es tado dos excessos democráticos Se estes últimos predominarem em algum momento deverão ser prontamente reprimidos Sir T Erskine May 1877 2 I Se o nacionalismo era uma força histórica reconhecida por go vernos democracia ou a crescente participação do homem comum nas questões do estado era outra Os dois eram uma única coisa na medida em que movimentos nacionalistas neste período tornaramse movimentos de massa e certamente a esta altura praticamente todos os líderes radicais nacionalistas supunham estes dois conceitos como sendo idênticos Entretanto como já vimos uma grande parte do po vo comum como os camponeses ainda não havia sido atingida pelo nacionalismo mesmo em países onde sua participação em política era levada a sério enquanto outras principalmente as novas classes tra balhadoras eram praticamente requisitadas para seguir movimentos que pelo menos em teoria punha um interesse de classe internacional acima de filiações nacionais Em todos estes casos do ponto de vista das classes dirigentes o fato importante era não que as massas acre ditassem em alguma coisa mas que seus credos agora contavam na política Eles eram por definição numerosos ignorantes e perigosos muito perigosos precisamente devido à sua ignorante tendência para acreditar em seus próprios olhos que lhes diziam que aqueles que os governavam davam muito pouca atenção a suas misérias e a lógica simplista que lhes sugeria que já que eles formavam a grande maioria do povo o governo deveria basicamente servirlhes em seus interesses 114 Tornavase portanto cada dia mais claro nos países desenvol vidos e industrializados do Oeste que mais cedo ou mais tarde os sis temas políticos teriam que abrir espaço para estas forças Além disso também tornavase claro que o liberalismo que formava a ideologia básica do mundo burguês não tinha defesas teóricas contra esta con tingência Sua forma característica de organização política era o go verno representativo através de assembléias eleitas representando não como nos estados feudais interesses sociais ou coletividades mas agregados de indivíduos de status legalmente iguais Interesse pró prio ou mesmo um certo senso comum dizia àqueles que se encon travam por cima que nem todos os homens eram igualmente capazes de decidir as grandes questões do governo os analfabetos menos que os graduados em universidades os supersticiosos menos que os escla recidos os pobres menos que aqueles que haviam provado sua capa cidade de comportamento racional pela acumulação de propriedade Entretanto longe da falta de convicção que tais argumentos levanta vam entre os que estavam por cima com a exceção dos mais conser vadores eles tinham duas fraquezas maiores A igualdade legal não podia fazer tais distinções em teoria O que era consideravelmente mais importante tornavase mais e mais difícil de realizar na prática já que mobilidade social e progresso educacional ambos essenciais à sociedade burguesa obscureciam a divisão entre as camadas médias e as camadas inferiores Onde deveria ser traçada a Tinha entre a gran de e crescente massa de respeitáveis trabalhadores e as baixas clas ses médias que adotavam muito dos valores e comportamentos da burguesia Por onde passasse esta linha ao incluir um grande número deles era possível que assimilasse um corpo substancial de cidadãos que não apoiava várias das idéias as quais o liberalismo burguês o lhava como essenciais ao progresso da sociedade e que bem poderi am oporse a elas de forma passional Além disso e de forma mais decisiva as revoluções de 1848 tinham mostrado como as massas po diam irromper no círculo fechado dos dirigentes da sociedade e o progresso da sociedade industrial fez com que sua pressão fosse cons tantemente maior mesmo em períodos nãorevolucionários A década de 1850 deu a muitos dos dirigentes um espaço para respirar Por mais de uma década eles não tiveram seriamente que se preocupar com tais problemas na Europa Entretanto havia um país em que os relógios políticos e constitucionais não podiam ser sim plesmente atrasados Na França onde três revoluções já haviam co meçado a exclusão das massas da política parecia uma tarefa utópica elas deveriam então ser dirigidas O chamado Segundo Império de Luís Napoleão Napoleão III tornouse então uma espécie de labora tório de um tipo de política mais moderno embora as peculiaridades de seu caráter tenham algumas vezes obscurecido suas formas de con trole político Tal experimento estava ao gosto embora talvez menos ao talento do personagem enigmático que estava a sua frente 115 Napoleão III foi notavelmente sem sorte nas suas relações públi cas Ele foi suficientemente infeliz para unir contra si os mais podero sos talentos polêmicos de seu tempo e as investidas combinadas de Karl Marx e Victor Hugo são suficientes sozinhas para enterrar sua memória sem contar o espírito não menos mordaz de alguns talento sos jornalistas Além disso ele foi notoriamente mal sucedido nos seus empreendimentos políticos internacionais e mesmo domésticos Um Hitler pôde sobreviver à unânime reprovação da opinião mundial já que é inegável que este homem terrível e psicopata realizou coisas extraordinárias no caminho de uma catástrofe provavelmente inevitá vel pelo menos em manter o apoio de seu povo até o fim Napoleão III não era nem tão extraordinário nem tão louco O homem que era manobrado por Cavour e Bismark o homem cujo apoio político tinha afundado perigosamente mesmo antes que seu império se desintegras se após algumas semanas de guerra o homem que transformou Bo napartismo de uma força política de maior importância na França em uma anedota histórica entrou inevitavelmente na História como Na poleão o Pequeno Ele nem sequer representou bem seu papel A quela figura reticente saturnina mas freqüentemente charmosa com grandes bigodes doentio horrorizado pelas batalhas que ele mesmo e a grandeza francesa iriam detonar só parecia imperial exofficio Ele era essencialmente um político político de segundo nível e como se veria mais tarde mal sucedido Mas o destino e seu passado viriam trazerlhe um papel inteiramente novo para representar Como pretendente imperial antes de 1848 embora sua pretensão genealó gica em ser um Bonaparte levantasse dúvidas 2 teve que pensar em termos nãotradicionais Cresceu em um mundo de agitadores nacio nalistas ele mesmo ligandose aos Carbonari e de Sainsimonianos Desta experiência tirou uma fé segura talvez excessiva na inevitabi lidade de forças históricas tais como nacionalismo e democracia e uma certa heterodoxia acerca de problemas sociais e métodos políti cos que vieram a ajudarlhe muito mais tarde A revolução deulhe a chance de apresentar o nome de Bonaparte para a presidência sendo eleito por uma grande maioria mas por uma imensa variedade de mo tivos Ele não precisou de votos para permanecer no poder nem de pois do golpe de estado de 1851 para declararse imperador mas se não tivesse sido eleito antes nem toda sua capacidade para intriga te ria persuadido os generais ou quem quer que tivesse poder e ambi ção para apoiálo Era portanto o primeiro dirigente de um grande país com a exceção dos Estados Unidos a chegar ao poder através do sufrágio masculino universal e nunca o esqueceu Ele continuou a operar desta forma primeiro como um César plebiscitário mais ou menos como o general de Gaulle a assembléia representativa eleita sendo bem insignificante e depois de 1860 com a parafernália usual do parlamentarismo Sendo um indivíduo persuadido das verdades históricas de seu tempo provavelmente não acreditou que ele mesmo também pudesse resistir à força da história 116 A atitude de Napoleão III em relação à política eleitoral era ambí gua e isso é que a faz interessante Como parlamentarista ele jogou aquilo que era então o jogo normal da política quer dizer obteve uma maioria suficiente de uma assembléia de indivíduos eleitos agrupados em vagas alianças com vagas etiquetas que não devem ser confundidas com os modernos partidos políticos Portanto políticos sobreviventes da Monarquia de Julho 183048 como Adolphe Thiers 17971877 e futuros luminares da Terceira República como Jules Favre 1809 80 Jules Ferry 183293 e Gambetta 183882 recuperaram ou fize ram seus nomes na década de 1860 Ele não foi muito bemsucedido neste jogo especialmente quando decidiu instalar um firme controle burocrático sobre as eleições e a imprensa Por outro lado enquanto um candidato eleitoral guardava em reserva outra vez como o general de Gaulle só que este último talvez com maior sucesso a arma do plebis cito Ratificou seu triunfo em 1852 com uma esmagadora vitória ple biscitária provavelmente autêntica apesar do considerável controle de 78 milhões de votos contra 024 milhões com 2 milhões de absten ções e mesmo em 1870 na véspera do colapso podia ainda recuperar se de uma situação parlamentar em deterioração com uma maioria de 74 milhões contra 16 milhão Este apoio popular era politicamente desorganizado exceto é claro quando através de pressões burocráticas Diferente dos líderes populares modernos Napoleão III não teve nenhum movimento mas evidentemente como chefe do estado ele dificilmente precisaria de um Seu apoio também não era homogêneo Pessoalmente talvez tivesse preferido o apoio dos progressistas o voto jacobino republicano que sempre ficou de fora acontecesse o que acontecesse nas cidades e o da classe operária cujo significado social e político ele apreciava ainda mais que os liberais ortodoxos Entretanto embo ra ele recebesse de quando em vez o apoio de importantes portavozes deste grupo como o anarquista PierreJoseph Proudhon 180965 e tenha seriamente se esforçado para conciliar e domesticar o cresci mento do movimento trabalhista na década de 1860 tendo legaliza do as greves em 1864 fracassou em quebrar a tradicional e lógica afinidade que o movimento trabalhista tinha com a esquerda Na prá tica apoiouse no elemento conservador e especialmente no campesi nato principalmente nos dois terços do oeste do país Para estes ele era um Napoleão um governo estável e antirevolucionário seguro contra as ameaças à propriedade e se eram católicos o defensor do Papa em Roma uma situação da qual Napoleão teria apreciado em se desvencilhar por razões diplomáticas mas que não podia fazêlo por razões domésticas Mas sua forma de governar era ainda mais significativa Karl Marx observou com sua argúcia habitual a natureza de sua relação com o campesinato francês incapazes de impor seu interesse de classe em nome próprio fosse a través de um parlamento ou de uma convenção Não podiamse repre 117 sentar precisavam ser representados Seu representante precisa ao mesmo tempo aparecer como o líder uma autoridade sobre eles e co mo um poder governamental ilimitado que protegeos de outras classes e envialhes o sol e a chuva de cima A influência política dos campo neses portanto encontra sua expressão final no poder executivo subor dinando a sociedade a si mesmo 3 Napoleão era o poder executivo Muitos políticos do século XX nacionalistas populistas e no sentido mais perigoso fascistas iri am redescobrir a forma de relação que ele inaugurou com as massas incapazes de impor seu interesse de classe em nome próprio Ainda descobririam que havia outras camadas da população similares neste aspecto ao campesinato pósrevolucionário francês Com a exceção da Suíça cuja constituição revolucionária per manece até hoje nenhum outro estado europeu operava na base do sufrágio universal masculino na década de 1850 O Nationalrat suí ço era escolhido por todos os homens maiores de 20 anos sem quali ficação de propriedade mas a segunda Câmara era escolhida pelos cantões Devese assinalar que mesmo nos Estados Unidos nomi nalmente democrático a participação eleitoral era bem inferior à francesa em 1860 Lincoln foi eleito por menos da metade dos 47 milhões de votos de uma população de tamanho incomparavelmente maior Algumas assembléias representativas geralmente sem grande poder ou influência exceto na Inglaterra Escandinávia Holanda Bél gica Espanha e Sabóia invariavelmente elegiam de forma bastante in direta com restrições mais ou menos rigorosas relativas a qualificações de idade ou propriedade tanto para votantes como para candidatos Quase invariavelmente as assembléias eleitas desta forma eram flan queadas e cerceadas em sua ação por câmaras mais conservadoras a maioria delas indicadas ou compostas de membros hereditários ou ex officio A Inglaterra com mais ou menos 1 milhão de eleitores entre 275 milhões de habitantes era sem dúvida bem menos restritiva que por exemplo a Bélgica com aproximadamente 60 mil de 47 milhões mas nenhuma delas era nem pretendia ser democrática O reaparecimento da pressão popular na década de 1860 fez com que fosse impossível manter uma política do tipo isolada Pelo final de nosso período somente a Rússia tzarista e a Turquia Imperial mantinhamse como simples autocracias na Europa enquanto por outro lado o sufrágio universal não era mais prerrogativa de regimes surgidos de revoluções O novo império alemão usouo para eleger seu Reichstaq embora mais por razões decorativas Muito poucos es tados nesta década escaparam de alguma forma de aumentar suas franquias e os problemas que tinham preocupado apenas a minoria de países nos quais o voto tinha real significado a escolha entre votar por listas ou Por candidatos geometria eleitoral na constituição de eleitorados sociais ou geográficos controles que as câmaras maiores poderiam exercer sobre as câmaras menores direitos reservados ao Executivo etc agora preocupavam todos os governos Mas ainda 118 eram pouco agudos O Second Reform Act na Inglaterra mesmo du plicando o número de eleitores ainda deixavaos como 8 da popu lação enquanto no recémunificado Reino da Itália eram apenas 1 Mesmo assim algumas mudanças haviamse verificado e outras po diam apenas ser adiadas Estes avanços em direção a governos representativos levanta vam dois problemas bastantes diferentes em política os das classes e massas para usar o jargão inglês da época isto é aqueles das classes altas e médias e o problema do pobre que havia permanecido por longo tempo alienado do processo oficial da política Entre eles estava a camada intermediária pequenos comerciantes artesãos e outros pequenos burgueses proprietários camponeses etc que na qualidade de proprietários já estavam pelo menos em parte envolvi dos em representatividade política tal como ela havia existido até en tão Nem as velhas aristocracias da terra ou hereditárias nem a nova burguesia tinham a força dos números mas diferente da aristocracia a burguesia precisava deles Pois enquanto ambas tinham pelo menos nas suas camadas mais elevadas riqueza e a forma de poder pessoal e influência nas suas comunidades que fazia de seus membros automa ticamente pelo menos pessoas importantes em potencial isto é pessoas de conseqüência política somente as aristocracias estavam firmemente entrincheiradas em instituições que as salvaguardavam do voto em Câmaras dos Lordes ou câmaras similares ou por meio de representação mais ou menos desproporcional como no caso do su frágio de classe das Dietas da Prússia e da Áustria Além disso nas monarquias que eram ainda a forma prevalecente de governo a aris tocracia encontrava apoio político sistemático como classe As burguesias por outro lado escoravamse na sua riqueza na sua indispensabilidade e no destino histórico que fazia delas e de suas idéias as fundações dos estados modernos deste período Entretan to o que as transformavam em força no interior dos sistemas políticos era a habilidade para mobilizar o apoio dos nãoburgueses que pos suíam número e portanto votos Tirarlhes isto como aconteceu na Suécia no final da década de 1860 e iria acontecer em todos os luga res mais tarde com o crescimento de verdadeira política de massa re duziaos a uma minoria eleitoralmente impotente pelo menos na polí tica de âmbito nacional Em políticas municipais iriam se manter me lhor Daí a importância crucial para a burguesia em manter o apoio ou a hegemonia sobre a pequena burguesia as classes trabalhadoras e mais raramente sobre o campesinato Falando de forma ampla neste período da história ela não foi bemsucedida Em sistemas polí ticos representativos os Liberais normalmente o clássico partido das classes do comércio urbano e industrial estavam geralmente no poder com apenas algumas interrupções ocasionais Na Inglaterra assim ocorreu entre 1846 e 1874 na Holanda durante pelo menos 20 anos depois de 1848 na Bélgica de 1857 a 1870 na Dinamarca mais ou menos até o choque da derrota em 1864 Na Áustria e na Alemanha 119 eles eram o maior apoio formal dos governos entre a metade da déca da de 1860 até o final da década de 1870 Entretanto como a pressão vinha de baixo uma ala radical mais democrática progressista republicana tendia a se separar deles on de já não fosse mais ou menos independente Na Escandinávia parti dos camponeses separaramse como a esquerda Venstre em 1848 Dinamarca e durante a década de 1860 Noruega ou o grupo de pressão agrário anticidade Suécia 1867 Na Prússia Alemanha os democratas radicais com sua base no sudoeste nãoindustrial recusa ramse a seguir os nacionaisliberais burgueses em sua aliança com Bismark depois de 1866 embora alguns deles tendessem a se aliar aos socialdemocratas marxistas antiPrússia Na Itália os republica nos permaneceram na oposição enquanto os moderados tornaramse dominantes do novo reino unificado Na França a burguesia há muito não conseguia mais comandar sozinha ou mesmo sob a bandeira libe ral e seus candidatos buscavam apoio popular através de rótulos cada vez mais inflamados Reforma e Progressista davam lugar a Re publicano e este a Radical e na Terceira República a Radical Socialista cada qual ocultando uma nova geração dos mesmos bar bados Sólon rapidamente mudando para posições moderadas depois de seus triunfos eleitorais com a esquerda Somente na Inglaterra os radicais permaneceram uma ala permanente do Partido Liberal pro vavelmente porque aí praticamente não existiam enquanto classe os camponeses e a pequena burguesia que permitiram aos radicais esta belecerem sua independência política alhures De qualquer forma por razões práticas o liberalismo permane ceu no poder pois representava a única política econômica que se a creditava fazer sentido para o desenvolvimento Manchesterismo como os alemães chamavam assim como aceitavase quase que u niversalmente ser o representante da ciência razão história e pro gresso para aqueles que tivessem qualquer idéia que fosse sobre esses assuntos Neste sentido quase todo chefe de estado e funcionário pú blico nas décadas de 1850 e 1860 era um liberal fosse qual fosse sua filiação ideológica assim como hoje ninguém o é mais Os pró prios radicais não tinham alternativa viável ao liberalismo Em qual quer situação juntarse com a genuína oposição contra o liberalismo era impensável para eles talvez mesmo impossível Ambos faziam parte da esquerda A genuína oposição a direita veio daqueles que resistiam às forças da história Na Europa poucos realmente desejavam um re torno ao passado como nos dias dos românticos reacionários de de pois de 1815 Tudo o que queriam era interromper ou pelo menos di minuir o ameaçador progresso do presente um objetivo racionaliza do por intelectuais que viam a necessidade de ordem e progresso Portanto o conservadorismo era capaz de atrair de vez em quando al guns grupos da burguesia liberal que sentia que mais progresso podia trazer uma vez mais a revolução para perto Naturalmente tais parti 120 dos conservadores atraíam o apoio de grupos especiais cujos interes ses imediatos iam de encontro com a política liberal prevalecente por exemplo agrários e protecionistas ou grupos que se opunham aos li berais por razões que não diziam respeito ao seu liberalismo como por exemplo os belgas flamengos que se ressentiam de uma burgue sia essencialmente afrancesada predominando culturalmente Sem dúvida também especialmente na sociedade rural rivalidades locais ou de família eram naturalmente assimiladas dentro de uma dicotomia ideológica que dizia pouco respeito a ela mesma O Coronel Aurelia no Buendía no romance de Garcia Marquez Cem anos de solidão organizou o primeiro dos seus 32 levantes liberais no interior da Co lômbia não porque fosse um liberal ou soubesse o significado de tal palavra mas porque sentiase ultrajado por um oficial local que por acaso representava um governo conservador Talvez haja uma razão lógica ou histórica em por que os açougueiros vitorianos foram pre dominantemente conservadores uma ligação com a agricultura e os donos de armazém em grande parte liberais uma ligação com o co mércio exterior mas nada disso foi estabelecido e talvez o que pre cise de explicação seja não estes fatos mas por que estes dois tipos onipresentes de lojistas tenham sistematicamente se recusado a parti lhar as mesmas opiniões fossem quais fossem Mas o conservantismo essencialmente estava com aqueles que ficavam com a tradição a velha e ordeira sociedade costumes e ne nhuma modificação em oposição a tudo que fosse novo Dai a impor tância crucial da posição das igrejas oficiais organizações ameaçadas por tudo aquilo que o liberalismo defendia e ainda capazes de mobili zar forças imensas contra ele como por exemplo a inserção de uma quinta coluna no centro do poder burguês através da piedade e tradi cionalismo das viúvas e filhas a permanência de um controle clerical sobre as cerimônias de nascimento casamento e morte e um controle sobre um grande setor da educação Estes controles eram vigorosa mente contestados e forneceram um bom número de razões para a disputa política entre conservadores e liberais em vários países Todas as igrejas oficiais eram ipso facto conservadoras embora apenas a maior delas a Católica Romana tenha formulado sua posi ção de aberta hostilidade à crescente tendência liberal Em 1864 o Papa Pio IX definiu suas posições no Syllabus of Errors Esta encícli ca condenou de forma igualmente implacável 80 erros incluindo naturalismo que negava a ação de Deus sobre os homens e o mun do racionalismo o uso da razão sem referência a Deus raciona lismo moderado uma recusa de supervisão eclesiástica por parte da ciência e da filosofia indiferentismo escolha livre de religião ou mesmo ausência dela educação laica a separação da Igreja e do Es tado e em geral erro nº 80 a idéia de que o Pontífice Romano po de e deve reconciliarse e chegar a bom termo com o progresso o li beralismo e a civilização moderna Inevitavelmente a linha entre di reita e esquerda tornouse em grande parte a divisão entre clericalistas 121 e anticlericalistas os últimos sendo na maior parte francamente des crentes nos países católicos mas também principalmente na Ingla terra crentes de religiões minoritárias ou independentes da igreja do Estado ver capítulo 14 mais adiante A posição das igrejas de Esta do onde fossem religiões minoritárias era anômala Os católicos ho landeses encontravamse do lado liberal contra os calvinistas predo minantes e os alemães incapazes de se aliarem fosse com a direita protestante fosse com a esquerda liberal do império bismarckiano formaram um Partido de Centro na década de 1870 O que era novo em política de classe neste período era sobre tudo a emergência da burguesia liberal como uma força no contexto de uma política mais ou menos constitucionalista com o declínio do absolutismo principalmente na Alemanha ÁustriaHungria e Itália uma área cobrindo cerca de um terço da população da Europa Apro ximadamente um terço da população do continente ainda vivia sob governos nos quais não tinha participação O progresso da imprensa periódica fora da Inglaterra e Estados Unidos ela ainda se dirigia sobretudo a leitores burgueses ilustra esta mudança de forma viva entre 1862 e 1873 o número de periódicos na Áustria sem Hungria aumentou de 345 para 866 A abertura permanecia de tal forma restrita na maioria dos casos que não se colocava a moderna questão de política de massa De fato freqüentemente os representantes da classe média podiam tomar o lu gar do povo real que diziam representar Poucos casos chegaram a ser tão extremos como Nápoles ou Palermo no começo da década de 1870 quando 375 e 44 dos candidatos estavam nas listas porque eram graduados de alguma forma Mas mesmo na Prússia o triunfo dos liberais em 1863 parece menos impressionante se for lembrado que 67 do voto da cidade que os elegeu representavam realmente apenas 25 do voto urbano já que dois terços do eleitorado não se deu ao trabalho de ir às urnas nas cidades 4 Representaram estes es plêndidos triunfos do liberalismo na década de 1860 nestes países de franquias limitadas e apatia popular algo além da opinião de uma minoria de respeitáveis burgueses citadinos Na Prússia Bismarck pelo menos pensava que não e conse qüentemente resolveu o conflito constitucional entre a Dieta Liberal e a monarquia simplesmente governando sem referência ao parlamento Já que ninguém sustentava os liberais exceto a burguesia e a burgue sia era incapaz ou não desejava mobilizar nenhuma força genuína armada ou política toda conversa sobre o Grande Parlamento de 1640 ou os Estados Gerais de 1789 era apenas fumaça Por outro lado o que deu aos liberais poder real em alguns países atrasados apesar de sua posição minoritária era a existência de agricultores que domina vam suas respectivas regiões virtualmente sem controle governamen tal ou de funcionários prontos a fazer pronunciamentos no interes se liberal Era o caso em diversos países ibéricos Bismarck percebia porém que no sentido mais literal da palavra uma revolução bur 122 guesa era uma impossibilidade já que seria uma revolução de ver dade apenas se a burguesia fosse mobilizada e em nenhum caso ho mens de negócios ou professores pareciam estar inclinados a levantar barricadas Isto não o impediu porém de aplicar o programa econô mico legal e ideológico da burguesia liberal desde que pudesse ser combinado com a predominância da aristocracia agrária numa mo narquia prussiana protestante Ele não quis arrastar os liberais para uma aliança de desespero com as massas e de qualquer forma o pro grama da burguesia era o programa óbvio para um estado europeu moderno e se não era óbvio pelo menos parecia inevitável Como sabemos ele foi brilhantemente bem sucedido A burguesia liberal aceitou a oferta do programa sem o poder político não tinha muita opção e transferiuse em 1866 para o Partido Liberal Nacional que foi a base para as manobras políticas domésticas de Bismarck du rante todo o resto de nosso período Bismarck e outros conservadores sabiam que fossem o que fos sem as massas não eram certamente liberais no sentido em que os ho mens de negócios urbanos o eram Conseqüentemente eles sentiram que às vezes podiam segurar os liberais mediante a ameaça de aumen tar as franquias Podiam mesmo terminar por fazêlo como Benja mim Disraeli o fez em 1867 e os católicos belgas mais modestamente em 1870 O erro foi supor que as massas eram conservadoras no sen tido que eles atribuíam à palavra Não há dúvida de que a maioria do campesinato na maior parte da Europa ainda era tradicionalista pron to a apoiar a igreja o rei ou o imperador e a seus superiores hierár quicos de forma automática especialmente contra os malignos desíg nios dos homens de cidade Mesmo na França grandes regiões do o este e do sul continuaram a votar durante a Terceira República nos que apoiavam a dinastia dos Bourbons Sem dúvida também como Walter Bagehot teórico da democracia inócua destacou depois do Reform Act de 1867 havia muitos incluindo trabalhadores cujo comportamento político era dirigido para a defesa do melhor da so ciedade Mas a partir do momento em que as massas entraram na ce na política inevitavelmente passaram a agir mais cedo ou mais tarde como atores e não mais como extras na multidão do fundo de um quadro E enquanto os camponeses atrasados ainda podiam ser consi derados seguros os crescentes setores industriais e urbanos não mais o podiam O que estes últimos queriam não era o liberalismo clássico e portanto não eram bemvindos aos dirigentes conservado res especialmente àqueles devotados a uma política econômica e so cial essencialmente liberal Isso viria a se tornar evidente durante a depressão econômica e a incerteza que acompanharam o colapso da expansão liberal em 1873 123 II O primeiro e mais perigoso grupo a estabelecer sua identidade separada e definir seu papel na política foi o novo proletariado cujo número fora multiplicado por 20 anos de industrialização O movimento trabalhista não tinha sido tão destruído ou decapi tado pelo fracasso das revoluções de 1848 e pela subseqüente década de expansão econômica Os vários teóricos de um novo futuro social que haviam transformado a agitação da década de 1840 no espectro do comunismo tendo fornecido ao proletariado uma perspectiva po lítica alternativa tanto para os conservadores como para os liberais ou radicais estavam na prisão como Auguste Blanqui no exílio como Karl Marx e Louis Blanc esquecidos como Constantin Pecqueur 180187 ou como Etienne Cabet 17881857 somando todas estas situações Alguns haviam feito as pazes com o novo regime como P J Proudhon fez com Napoleão III O período não era muito propí cio para os que acreditavam na iminência do socialismo Marx e En gels que mantiveram alguma esperança no renascimento revolucio nário por um ou dois anos depois de 1849 transferiram depois estas esperanças para a grande crise seguinte a de 1857 e resignaramse então por um longo período Enquanto talvez seja um exagero dizer que o socialismo tenha desaparecido por completo mesmo na Ingla terra provavelmente ninguém era socialista em 1860 que não o tivesse sido em 1848 Podemos talvez agradecer a este intervalo de isolamen to forçado da política que permitiu a Karl Marx amadurecer suas teo rias e estabelecer as fundações de O Capital mas ele mesmo não pen sava assim Nesse meio tempo as organizações políticas sobreviven tes da ou dedicada à classe operária tinham entrado em colapso como a Liga Comunista em 1852 ou tinhamse tornado gradualmente insignificantes como o Cartismo inglês Entretanto no nível mais modesto de luta econômica e autopro teção organizações da classe operária sobreviveram e só podiam crescer Isto apesar de que com a notável embora parcial exceção da Inglaterra sindicatos e greves eram legalmente proibidos em toda a Europa embora Sociedades de Amizade Sociedades de Ajuda Mú tua e cooperativas no continente geralmente para produção na In glaterra geralmente para lojas fossem bastantes comuns Não se po de dizer que tivessem florescido muito na Itália 1862 a média de membros de tais Sociedades de Ajuda Mútua em Piedmont onde e ram mais fortes era um pouco inferior a 505 Somente na Inglaterra Austrália e curiosamente nos Estados Unidos sindicatos de traba lhadores tinham significado real sendo que nos últimos dois casos geralmente transportados como idéia na bagagem dos imigrantes in gleses com organização e consciência de classe Na Inglaterra não apenas os hábeis artesãos das indústrias pro dutoras de máquinas assim como artesãos de ocupações mais antigas e até trabalhadores do algodão mantinham poderosos sindicatos lo 124 cais ligados de forma mais ou menos efetiva em nível nacional e em um ou dois casos A Amalgamated Society of Engineers 1852 e a Amalgamated Society of Carpenters and Joiners 1860 tendo coor denado financeiramente senão estrategicamente sociedades nacio nais Formavam uma minoria nãonegligenciável e entre os especia lizados em alguns casos uma maioria Além disso forneciam uma base sobre a qual o sindicalismo podia ser rapidamente expandido Nos Estados Unidos eram talvez mais poderosos embora viessem a se mostrar ineficientes para agüentar o impacto de uma industrializa ção realmente rápida pelo final do século Entretanto eram menos po derosos que no paraíso do trabalho organizado as colônias australia nas onde os trabalhadores da construção civil conseguiram o Dia de Oito Horas já em 1856 logo seguidos por outras profissões Sem dú vida em nenhum outro lugar era a posição de barganha do trabalha dor mais forte que nesta economia subpovoada e dinâmica onde as corridas ao ouro da década de 1850 envolveram milhares aumentan do os salários daqueles que ficaram Observadores sensíveis não esperavam que esta relativa pouca importância do movimento trabalhista durasse De fato a partir de 1860 ficou claro que o proletariado estava voltando à cena como a outra dramatis personae da década de 1840 embora num estado de espírito menos turbulento Emergiu com rapidez imprevista para ser logo seguido pela ideologia a partir de então identificada com seus movimentos o socialismo Este processo de emergência era um curi oso amálgama de ação política e industrial de vários tipos de radica lismo do democrático ao anárquico de lutas de classes alianças de classe e concessões governamentais ou capitalistas Mas acima de tu do era internacional não apenas porque como no recrudescimento do liberalismo ocorresse em vários países simultaneamente mas porque era inseparável da solidariedade internacional das classes tra balhadoras da solidariedade internacional da esquerda radical uma herança do período pré1848 Era organizado pela Associação Inter nacional dos Trabalhadores a Primeira Internacional de Karl Marx 186472 A verdade de que os trabalhadores não tem pátria como o Manifesto Comunista colocava pode ser debatida certamente os trabalhadores radicais organizados da França e Inglaterra eram patrio tas à sua maneira a tradição revolucionária francesa sendo notoria mente nacionalista ver capítulo 5 acima Mas numa economia onde os fatores de produção moviamse livremente mesmo os sindicatos ingleses nãoideológicos viam a necessidade de impedir empregado res de importar furagreves de fora Na Inglaterra a Internacional emergiu de uma combinação de agitação para reforma eleitoral com uma série de campanhas por solidariedade internacional com Gari baldi e a esquerda italiana em 1864 com Abraham Lincoln e o Norte na Guerra Civil Americana 186165 com os infelizes poloneses em 1863 acreditandose corretamente que todos estes iriam reforçar o movimento trabalhista pelo menos na sua forma mais política sindi 125 calista E o mero contato organizado entre trabalhadores de um país e de outro só podia ter repercussões nos seus respectivos movimentos como Napoleão III verificaria depois de ter permitido aos trabalhado res franceses enviar uma grande delegação a Londres na ocasião de uma exposição internacional em 1862 A Internacional fundada em Londres e rapidamente passada às mãos capazes de Karl Marx começou como uma curiosa combinação de líderes sindicalistas ingleses insulares e liberalradicais mistura dos ideologicamente com militantes sindicalistas franceses bem mais esquerdistas e um staff de velhos revolucionários do continente de vi sões bem variadas Suas batalhas ideológicas iriam eventualmente ar ruinála Já que foram suficientemente revistas por muitos outros his toriadores não há necessidade de nos determos muito neste aspecto Falando de forma geral a primeira grande luta entre os puros isto é os liberais ou radicalliberais sindicalistas e aqueles com perspec tivas mais ambiciosas de transformação social foi ganha pelos socia listas embora Marx tivesse o cuidado de manter os ingleses fora das lutas do continente Em seguida Marx e seus seguidores confronta ram e derrotaram os seguidores do mutualismo de Proudhon arte sãos antiintelectuais e com uma consciência de classe militante para depois enfrentar o desafio de Michel Bakunin 181476 e sua aliança anarquista Incapaz de manter controle sobre a Internacional por mais tempo Marx condenoua ao transferir seus escritórios para Nova York Entretanto por este tempo a base da grande mobilização da classe trabalhadora da qual a Internacional era parte e de certa forma coordenadora já havia de qualquer forma se estabelecido Portanto como se veria as idéias de Marx haviam triunfado Na década de 1860 tudo isso ainda não era imediatamente pre visível Havia apenas um movimento marxista de massa trabalhadora ou pelo menos socialista aquele que tinha se desenvolvido na Ale manha depois de 1863 De fato se excetuarmos o abortado National Labor Reform Party of the United States 1872 uma extensão polí tica da ambiciosa National Labor Union 186672 que era filiado ao IWMA havia apenas um movimento político trabalhista operando em escala nacional independente dos partidos burgueses ou pe quenoburgueses Esta era a realização de Ferdinand Lassalle 182565 um agitador brilhante que caiu vítima de uma vida privada bem colorida morreu de ferimentos recebidos em um duelo por causa de uma mulher e que era visto como um seguidor de Karl Marx na medida em que seguia qualquer um A Associação Geral dos Traba lhadores Alemães de Lassalle Allgemeiner Deutscher Arbeiterverein 1863 era oficialmente radicaldemocrata e não socialista sendo seu slogan imediato o sufrágio universal mas tinha uma passional cons ciência de classe e um sentimento antiburguês e apesar de suas di mensões modestas no início organizouse como um partido de massa moderno Marx não a recebeu muito bem de início apoiando uma or ganização rival sob a liderança de dois discípulos mais chegados ou 126 pelo menos mais aceitáveis o jornalista Wilhelm Liebknecht e o jo vem bemdotado August Bebel Esta organização baseada na Alema nha central embora oficialmente mais socialista paradoxalmente se guiu uma política menos intransigente de aliança com a esquerda de mocrática antiPrússia dos velhos combatentes de 1848 Os Lassal leanos um movimento quase que inteiramente prussiano pensaram essencialmente em termos de uma solução prussiana para o problema alemão Já que esta solução era a que prevalecia claramente depois de 1866 estas diferenças sentidas de forma passional na década da uni ficação alemã cessaram de ser importantes Os marxistas juntamente com a ala lassaleana que insistia no caráter proletário do movimento formaram um Partido Social Democrático em 1869 e fundiramse de finitivamente em 1875 com os lassaleanos mais tarde verificouse que os lassaleanos foram de fato absorvidos formando o poderoso Partido Social Democrata da Alemanha SPD O fato importante é que ambos os movimentos estavam de algu ma forma ligados a Marx a quem olhavam principalmente depois da morte de Lassalle como fonte de inspiração teórica e profeta Ambos emanciparamse da democracia radicalliberal e passaram a funcionar como movimentos trabalhistas independentes E ambos com o sufrá gio universal concedido por Bismarck ao norte da Alemanha em 1866 e a toda a Alemanha em 1871 ganharam apoio de massa ime diato e tiveram seus líderes eleitos para o parlamento Em Barmen lugar natal de Frederick Engels 34 votaram em socialistas em 1867 51 em 1871 Mas se a Internacional não inspirava partidos operários signifi cativos os dois alemães não eram sequer oficialmente filiados a ela estava associada por outro lado ao aparecimento do trabalhismo em um razoável número de países sob a forma de um maciço movimento industrial e sindical que a Internacional ajudou sistematicamente a formar pelo menos a partir de 1866 Em que medida esta ajuda foi realmente decisiva não é claro Entretanto particularmente a partir de 1868 tais lutas começaram a convergir com este crescimento já que os líderes destes movimentos tenderam de forma crescente a se sentir atraídos pela Internacional inclusive para militarem na organização Uma onda de greves e agitação trabalhista espalhouse pelo continen te atingindo até a Espanha e a Rússia em 1870 houve greves em São Petersburgo Atingiram a Alemanha e a França em 1868 Bélgica em 1869 guardando sua força por alguns anos ÁustriaHungria logo depois chegando finalmente à Itália em 1871 onde alcançou seu ponto culminante em 187274 e à Espanha no mesmo ano Neste mesmo período a onda de greves estava no seu ponto máximo na In glaterra em 187173 Novos sindicatos espalharamse Eles deram à Internacional as suas massas para ilustrar apenas com o exemplo austríaco aqueles que a apoiavam cresceram em número de 10 mil em Viena para 35 mil entre 1869 e 1872 de 5 mil nas terras tchecas para quase 17 mil 127 de 2 mil na Styria e Carinthia para quase 10 mil somente na Styria6 Isso não parece muito comparado a cifras posteriores mas represen tava um poder ainda maior de mobilização os sindicatos na Alema nha aprenderam a tomar decisões sobre greves somente em comícios de massa representando também aqueles que não estavam organiza dos que certamente assustava governos especialmente em 1871 quando a época de maior apelo popular da Internacional coincidiu com a Comuna de Paris ver capítulo 9 mais adiante Alguns governos e pelo menos seções da burguesia ficaram a preensivos com o crescimento do trabalhismo no início da década de 1860 O liberalismo estava demasiadamente comprometido com a or todoxia do laissezfaire econômico para se preocupar seriamente com unia política de reforma social embora alguns dos democratas radi cais alertados para o perigo de perder o apoio do proletariado estives sem preparados até para este sacrifício e em países onde o manches terismo não tinha sido totalmente vitorioso alguns funcionários e in telectuais viam tais reformas como mais e mais necessárias Na Ale manha sob o impacto do crescimento do movimento socialista um curioso grupo chamado Professores Socialistas Kathedersozialis ten formou em 1872 a influente Sociedade para a Política Social Verein für Sozialpoliíik que advogava a reforma social como uma alternativa para ou melhor um profilático contra a luta de classes marxista O termo socialista diferente do mais inflamado comu nista podia ainda ser usado de forma vaga por qualquer um que re comendasse ação econômica do Estado e reforma social e foi muito usado neste sentido até o crescimento generalizado de movimentos socialista de trabalhadores na década de 1880 Porém mesmo aqueles que viam a interferência pública no me canismo de mercado livre como um caminho certo para a ruína esta vam agora convencidos de que as atividades e as organizações traba lhistas deveriam ser reconhecidas para que fossem controladas Como vimos alguns dos mais demagógicos políticos como Napoleão III ou Disraeli estavam bem alertados sobre o potencial eleitoral da classe operária Na década de 1860 a lei foi modificada para permitir uma certa e limitada organização trabalhista bem como algumas greves em alguns países da Europa ou para ser mais exato abrir espaço na teoria do mercado livre para a barganha livre e coletiva de trabalhado res Entretanto a posição legal dos sindicatos permanecia bastante in certa Apenas na Inglaterra era grande o peso político da classe operá ria e de seus movimentos por consenso comum aceitavase que ele formava a maior parte da população para produzir após alguns anos de transição 186775 um sistema virtualmente completo de reco nhecimento legal de tal forma favorável ao sindicalismo que desde então tentativas periódicas ocorreram para tirar a liberdade que eles haviam recebido O objetivo destas reformas era diretamente prevenir o surgimen to do trabalhismo como uma força política independente ou mais a 128 inda revolucionária Essa tática foi bem sucedida em países onde já estavam estabelecidos os movimentos trabalhistas nãopolíticos ou li beralradicais Onde o poder do trabalhismo organizado ainda era for te como na Inglaterra e na Austrália partidos trabalhistas indepen dentes só viriam a aparecer muito mais tarde e menos então viriam a permanecer essencialmente nãosocialistas Mas como vimos na maior parte da Europa o movimento trabalhista emergiu no período da Internacional em grande parte sob a orientação dos socialistas e o movimento trabalhista viria a ser politicamente a ela identificado e mais especialmente ao marxismo Na Dinamarca onde a Associação Internacional dos Trabalhadores havia sido fundada em 1871 com o objetivo de organizar greves formaramse sindicatos independentes depois da dissolução da Internacional em 1873 a maioria dos quais reuniuse mais tarde em uma liga social democrata Esta era a reali zação mais significativa da Internacional Havia tornado o trabalhis mo independente e socialista Mas por outro lado não o havia feito insurreicional Apesar do terror que inspirava a governos a Internacional não planejou a revo lução imediata O próprio Marx apesar de não menos revolucionário do que antes não considerou a revolução como um projeto sério na quele momento E mesmo sua atitude em relação à única tentativa de fazer revolução proletária a Comuna de Paris foi bastante cuidadosa Não acreditou que ela tivesse a mínima chance de sucesso O melhor que poderia ter feito seria conseguir uma barganha com o governo de Versalhes Depois de seu fim inevitável ele escreveu um obituário nos termos mais comoventes mas o objetivo deste magnífico panfleto A Guerra Civil na França era dar indicações aos revolucionários no futuro e nisto ele foi bem sucedido Entretanto a Internacional isto é Marx permaneceu em silêncio enquanto a Comuna ocorria Duran te a década de 1860 ele trabalhou em perspectiva a longo prazo e permaneceu modesto em outras a curto termo Ele teria ficado satis feito com o estabelecimento pelo menos nos países industrializados de movimentos trabalhistas politicamente independentes onde fosse legalmente possível e organizados como movimentos de massa para a conquista do poder político e também emancipados da influência intelectual do liberalradicalismo incluindo o simples republicanis mo ou o nacionalismo assim como em relação ao tipo de ideologia esquerdista anarquismo mutualismo etc que ele via com certa ra zão como um retrocesso Ele não pedia nem sequer que tais movi mentos fossem marxistas e mesmo diante das circunstâncias isso teria sido utópico já que Marx não tinha virtualmente seguidores ex ceto na Alemanha e entre alguns poucos emigrados Ele não esperava também que o capitalismo fosse entrar em colapso ou estivesse cor rendo o perigo imediato de ser derrubado Esperava meramente reali zar os primeiros passos na organização dos exércitos que iriam en frentar a longa campanha contra o bemfortificado inimigo 129 No início da década de 1870 parecia que o movimento havia fracassado em atingir mesmo estes modestos objetivos O trabalhismo britânico permanecia firmemente nas mãos dos liberais submetido a líderes fracos e corruptos incapazes de conseguir representação par lamentar suficiente a partir de sua força eleitoral agora decisiva O movimento francês estava em ruínas como conseqüência da Comuna de Paris e entre estas ruínas nenhum sinal de nada melhor que os ob soletos blanquismo sansculotismo e mutualismo A grande onda de agitação trabalhista de 187375 deixou atrás de si alguns sindicatos ligeiramente mais fortes e em alguns casos mesmo até mais fracos em relação a onda de 186668 A própria Internacional cindiuse ten do sido incapaz de eliminar a influência da esquerda obsoleta cujo fracasso era por demais evidente A Comuna estava morta e a outra única revolução européia a espanhola chegava rapidamente a um ponto sem saída em torno de 1874 os Bourbons estavam de volta à Espanha adiando a República Espanhola por quase 60 anos Somente na Alemanha havia ocorrido um avanço sensível Uma nova perspec tiva revolucionária se bem que difícil ainda de entrever podia ser discernida nos países subdesenvolvidos e a partir de 1870 Marx pas sou a colocar algumas esperanças na Rússia Mas o movimento deste tipo imediatamente mais interessante porque capaz de perturbar a In glaterra o bastião do capitalismo mundial também tinha entrado em colapso O movimento feniano na Irlanda estava aparentemente em ruínas ver capítulo 5 Um estado de espírito de retraimento e desapontamento tomou conta dos últimos anos de vida de Marx Ele escreveu comparativa mente pouco e permaneceu politicamente mais ou menos inativo O principal do material postumamente publicado por Engels como O Capital vols II e II e as Teorias da MaisValia tinham na realida de sido escritos antes da publicação do Vol I em 1867 Dos escritos de Marx mais importantes excetuandose algumas cartas apenas a Crítica do Programa de Gotha 1875 é posterior à queda da Comu na Porém agora podemos constatar que duas realizações da década de 1860 foram permanentes Daquele momento em diante os movi mentos da massa trabalhadora haveriam de ser organizados indepen dentes políticos e socialistas A influência da esquerda socialista pré marxista havia sido quebrada E em conseqüência a estrutura da po lítica iria ser constantemente modificada A maioria destas modificações não iria ser evidente até o final da década de 1880 quando a Internacional renasceu agora como uma frente comum de partidos de massa a maioria marxista Mas mesmo na década de 1870 pelo menos um país teve que enfrentar o novo E também os Randglossen zu Adolph Wagners Lehrbuch der politischen Okonomie es critas em 187980 publicadas em MarxEngels Werke XIX Berlin 1962 e por Harper Row Publ New York 1975 em Carver Karl Marx Text on Method NT 130 problema a Alemanha Ali o voto socialista 102 mil em 1871 co meçou a crescer novamente com uma força aparentemente inexorá vel depois de uma rápida queda 340 mil em 1874 e meio milhão em 1877 Ninguém sabia o que fazer com essa força Massas que não permaneciam passivas e que não se prestavam a seguir a liderança dos superiores tradicionais da burguesia e cujos líderes não podiam ser assimilados não entravam no esquema da política Bismarck que fazia o jogo do parlamentarismo liberal para seus próprios fins tão bem ou mesmo melhor do que qualquer outro não podia pensar em outra coisa senão proibir a atividade socialista pela força da lei 131 Sétimo Capítulo PERDEDORES Uma imitação dos costumes europeus incluindo a perigosa arte de emprestar tem sido ultimamente modificada mas nas mãos dos dirigentes orientais a civilização do Oeste não frutifica e ao invés de restaurar um estado vacilante parece ameaçálo com uma mais rápida ruína Sir T Erksine May 18771 O mundo de Deus não dá autoridade para a moderna ternura pela vida humana E necessário que em todas as terras do Leste se es tabeleça medo e terror ao Governo Então e apenas então seus benefícios serão apreciados J W Kaye 18702 I Na luta pela existência que forneceu a metáfora básica do pen samento econômico político social e biológico do mundo burguês somente os mais capazes sobreviveriam sendo sua capacitação comprovada não apenas pela sobrevivência mas também pela domi nação A maior parte da população mundial tornouse vítima daqueles cuja superioridade econômica tecnológica e conseqüentemente mili tar era inquestionável e parecia indestrutível as economias e estados da Europa central e do norte e os países estabelecidos alhures por seus imigrantes especialmente os Estados Unidos Com as três exce ções mais importantes da Índia Indonésia e partes da África do Nor te poucos deles se tornaram ou foram colônias formais em nosso pe ríodo de estudo Podemos deixar de lado as áreas de colonização an glosaxônica como a Austrália Nova Zelândia e Canadá que embora não sendo formalmente independentes eram tratados de forma clara mente diversa das áreas habitadas por nativos um termo em si neu tro mas que adquiria uma forte conotação de inferioridade Estas exceções não eram negligenciáveis a Índia sozinha possuía 14 da população mundial em 1871 Mesmo assim a independência política do resto contava pouco Economicamente estavam a mercê do capita lismo desde que estivessem a seu alcance De um ponto de vista mili 132 tar sua inferioridade era evidente O barco de guerra e a força expe dicionária pareciam ser todopoderosos Na realidade não eram tão decisivos assim quando por exem plo europeus ameaçavam governos fracos ou tradicionais Estes po vos tinham muito daquilo que os administradores ingleses gostavam de chamar não sem admiração de raça militar sendo capazes de derrotar forças européias em batalhas terrestres embora nunca no mar Os turcos tinham uma merecida reputação de soldados e de fato a habilidade destes últimos em derrotar e massacrar não apenas os re beldes ao sultão mas para enfrentar o mais perigoso dos adversários o exército russo preservou o Império Otomano face às rivalidades en tre as potências européias e pelo menos atrasou sua desintegração Os soldados britânicos tratavam os sikhs e pathans na Índia e os zulus na África assim como os franceses aos bérberes do norte da África com respeito considerável Mais uma vez a experiência mostrava que as forças expedicionárias eram severamente perturbadas pela irregular guerra de guerrilhas especialmente em áreas montanhosas onde fal tava aos estrangeiros apoio local Os russos lutaram por décadas con tra este tipo de resistência no Cáucaso e os ingleses desistiram da tentativa de controlar o Afeganistão diretamente contentandose em supervisionar a fronteira norte com a índia Por último a ocupação permanente de extensos países por uma pequena minoria de conquis tadores estrangeiros era muito difícil e cara e dada a capacidade dos países desenvolvidos em impor sua vontade e interesses sem precisar da presença físicomilitar a tentativa não parecia ser compensadora E ninguém acreditava que pudesse ser feita mesmo que necessário A maior parte do mundo não estava portanto numa posição de determinar seu próprio destino Poderia na melhor das hipóteses rea gir às forças externas que pressionavam com vigor cada vez maior Este mundo de vítimas consistia em quatro setores mais importantes Primeiro havia os impérios nãoeuropeus sobreviventes ou grandes reinos independentes do mundo islâmico e da Ásia o Império Otoma no Pérsia China Japão e uns outros menores como o Marrocos Bur ma Sião e Vietnã Os maiores dentre estes sobreviveram embora com a exceção do Japão que será considerado separadamente ver ca pítulo 8 mais adiante minados de forma crescente pelas novas for ças do capitalismo do século XIX os menores foram ocupados pelo final de nosso período com a exceção do Sião que sobreviveu como um estadotampão entre zonas de influência inglesa e francesa Se gundo havia as antigas colônias da Espanha e Portugal nas Américas agora estados nominalmente independentes Em terceiro lugar havia a África ao sul do Sahara sobre o que não há muito o que dizer pois não atraía a atenção neste período Finalmente havia as vítimas já formalmente colonizadas ou ocupadas sobretudo na Ásia Todos enfrentavam o problema fundamental de qual seria a ati tude diante de uma conquista formal ou informal pelo Oeste Que os brancos eram demasiado fortes para serem meramente rejeitados isso 133 era evidente Os índios maias das selvas do Yucatan puderam expul sálos em 1847 retornando ao antigo modo de vida como resultado da Guerra Racial até que no século XX o sisal e a goma de mas car os trouxeram de volta à órbita da civilização ocidental Mas o ca so deles era excepcional pois o Yucatan era isolado o poder branco mais próximo era fraco México e os ingleses dos quais uma colô nia era fronteiriça aos maias não os desencorajaram Mas para a maioria dos povos politicamente organizados do mundo não capitalista a dúvida não era se o mundo da civilização branca podia ser evitado mas como seria a reação a seu impacto copiálo resistir à sua influência ou uma combinação de ambos Dos setores dependentes do mundo dois já haviam sofrido compulsoriamente a ocidentalização pela dominação européia ou estavam em pleno processo as antigas colônias das Américas e as a tuais nas diversas partes do mundo A América Latina tinha emergido do status colonial espanhol e português como um agregado de estados tecnicamente soberanos nos quais instituições e leis liberais de classe média do tipo conhecido do século XIX inglês e francês foram impostas por sobre a herança ins titucional portuguesa e espanhola do passado sobretudo um colorido catolicismo romano passional e profundamente enraizado caracterís tico da população local que era índia mixada e em grande parte a fricana na zona do Caribe assim como na costa do Brasil O imperia lismo do mundo capitalista não iria fazer uma tentativa sistemática para evangelizar suas vítimas Estes eram países agrícolas e virtual mente inacessíveis para um remoto mercado mundial na medida em que estivessem fora do alcance de rios portos ou mulas Deixando de lado a área de plantações escravas e as tribos do interior inaccessível ou das remotas fronteiras do extremo norte e sul estes países eram habitados principalmente por camponeses em comunidades autôno mas em relação direta de servitude com os proprietários de vastas á reas de terra ou mais raramente independentes Estes países eram dominados pela riqueza de grandes proprietários de terras cuja posi ção tinha sido notavelmente reforçada pela abolição do colonialismo espanhol Eram também dominados pelos homens armados que os senhores da terra podiam mobilizar Estes formavam a base dos cau dillos que a frente de seus exércitos tornaramse tão familiares no cenário político latinoamericano Basicamente os países do conti nente eram quase todos oligarquias Na prática isto significava que o poder nacional e os estados nacionais eram fracos salvo se uma re pública fosse muito pequena ou um ditador suficientemente feroz pa ra instilar pelo menos terror temporário nos mais remotos cidadãos Estes países estavam em contato com a economia mundial através dos estrangeiros que dominavam a importação e exportação assim como o transporte com a exceção do Chile que tinha uma florescente frota própria Em nosso período estes estrangeiros eram principalmente os ingleses embora alguns franceses e americanos pudessem também 134 ser percebidos A sorte dos governos dependia da percentagem que levavam sobre este tráfico exterior e do sucesso em aumentar emprés timos mais uma vez sobretudo dos ingleses As primeiras décadas depois da independência viram regressão econômica e demográfica em muitas áreas com exceções notáveis como o Brasil que havia se separado pacificamente de Portugal sob um imperador local evitando assim conflitos e guerra civil e o Chile isolado na sua faixa temperada pelo Pacífico As reformas liberais instituídas pelos novos regimes a maior acumulação de repúblicas no mundo têm como ainda até hoje pouca importância prática Em alguns estados maiores e conseqüentemente mais importantes como a Argentina do ditador Rosas 183552 dominavam oligarcas educa dos no país olhando para dentro e hostis a inovações A impressio nante expansão mundial do capitalismo no nosso período iria mudar tudo isso Em primeiro lugar ao norte do istmo do Panamá viria a ocorrer uma intervenção por parte dos países desenvolvidos bem maior e mais direta desde os tempos de Espanha e Portugal México a vítima maior perdeu vários territórios para os Estados Unidos como resulta do da agressão americana de 1847 Em segundo lugar a Europa e em medida menor os Estados Unidos descobriram mercadorias valiosas para importar da grande região subdesenvolvida guano do Peru ta baco de Cuba e de outras áreas algodão do Brasil e de outros lugares especialmente durante a Guerra Civil Americana café depois de 1840 sobretudo do Brasil nitratos do Peru etc Vários destes eram produtos de boom temporário passíveis de declínio tão rápido quanto a ascensão a era do guano no Peru tinha começado antes de 1848 e não sobreviveu â década de 1870 Somente após esta década a Amé rica Latina desenvolveu produtos relativamente estáveis de exporta ção que iriam durar como tal até as décadas intermediárias de nosso século atual ou mesmo até hoje O investimento de capital estrangei ro começava a desenvolver a infraestrutura do continente estradas de ferro instalações portuárias utilidades públicas mesmo a imigra ção européia aumentou substancialmente na maior parte em Cuba Brasil e sobretudo nas áreas temperadas do estuário do Rio da Prata Aproximadamente 250 mil europeus instalaramse no Brasil entre 1855 e 1874 enquanto que mais de 800 mil foram para a Argentina e Uruguai no mesmo período Este desenvolvimento fortaleceu as mãos da minoria de latino americanos devotados à modernização do continente tão pobre quan to rico em potencialidade e recursos um mendigo sentado em cima de ouro como um viajante italiano descreveu o Peru Os estrangei ros mesmo quando ameaçadores como no México eram um perigo menor comparado ao formidável componente de inércia nativa repre sentado pela soma de um campesinato tradicionalista senhores da ter ra antiquados e sem visão e sobretudo a Igreja Ou melhor se estas características não fossem superadas em primeiro lugar as chances de 135 reagir aos estrangeiros seriam poucas E elas não poderiam ser supera das por simples modernização ou europeização como se pretendia As ideologias do progresso que envolviam latinoamericanos cultos não eram apenas aquelas do liberalismo dos francomações ou benthamitas iluminados que tinham sido tão populares no movi mento de independência Na década de 1840 várias formas de socia lismo utópico tinham capturado intelectuais prometendo não apenas perfeição social mas desenvolvimento econômico e de 1870 em dian te o positivismo de Augusto Comte penetrou profundamente no Brasil cujo lema nacional ainda é o comtiano Ordem e Progresso e no México em escala menor Portanto o liberalismo clássico ainda prevalecia A combinação da revolução de 1848 com a expansão ca pitalista mundial deu aos liberais sua chance Eles trouxeram a destru ição real da antiga ordem legal colonial As duas reformas mais signi ficativas foram a liquidação sistemática de qualquer propriedade da terra que não fosse propriedade privada e sobretudo um feroz anticle ricarismo que chegou a abolir os privilégios de propriedade da igreja Os extremos deste anticlericalismo foram atingidos no México sob o presidente Benito Juarez 180672 onde a Igreja e o Estado foram separados dízimos abolidos padres forçados a prestar um juramento de lealdade funcionários públicos proibidos de assistir serviços reli giosos e as terras eclesiásticas vendidas Entretanto outros países fo ram apenas um pouco menos militantes A tentativa de transformar a sociedade via modernização institu cional imposta através do poder político fracassou essencialmente porque não tinha o suporte de uma independência econômica Os li berais eram uma elite educada e urbana num continente rural e na medida em que tivessem um genuíno poder político ele repousava em generais não muito fiéis e em clãs de proprietários de terras que por razões que tinham apenas uma remota conexão com John Stuart Mill ou Darwin escolheram a filiação daquele lado Do ponto de vis ta social e econômico muito pouco havia mudado na América Latina até a década de 1870 exceto que o poder dos senhores da terra tinha aumentado e o dos camponeses enfraquecido E na medida em que ti nhase transformado sob o impacto do mercado mundial o resultado era subordinar a velha economia à demanda do comércio importação exportação operado através de uns poucos grandes portos ou capitais e controlado por estrangeiros A única exceção de importância eram as terras do Rio da Prata onde a maciça imigração européia iria pro duzir uma população inteiramente nova com uma estrutura social in teiramente nãotradicional A América Latina neste período sob es tudo tomou o caminho da ocidentalização na sua forma burguesa liberal com grande zelo e ocasionalmente grande brutalidade de uma forma mais virtual que qualquer outro país no mundo com a exceção do Japão mas os resultados foram desapontadores Deixando de lado as áreas habitadas por normalmente recentes colonos europeus e sem uma grande população nativa Austrália Ca 136 nadá os impérios coloniais das potências européias consistiam em umas poucas regiões onde uma maioria ou minoria de colonos bran cos coexistia com uma população indígena de razoável importância África do Sul Argélia Nova Zelândia e um grande número de re giões sem uma população européia significativa ou permanente Co lônias do colono branco viriam criar mais tarde o mais intratável problema de colonialismo embora em nosso período de estudo não ti vessem grande importância internacional De qualquer forma o pro blema das populações nativas era o de como resistir ao avanço dos colonos brancos e embora os Zulus os maori e os bérberes fossem bem fornidos em armas eles não conseguiam mais do que sucesso lo cais As colônias de população indígena mais sólida levantaram pro blemas mais sérios já que a escassez de brancos fez com que fosse essencial usar nativos em grande número para administrar assim co mo utilizar as instituições existentes para esta administração pelo menos ao nível local Em outras palavras os colonizadores estavam diante do problema de criar um corpo de nativos assimilados para to mar o lugar do homem branco e também de depender das instituições tradicionais dos países geralmente longe de atender a seus interesses Por outro lado os povos indígenas confrontavam o desafio da ociden talização como algo muito mais complexo do que mera resistência II A índia de longe a maior colônia ilustra as complexidades e paradoxos desta situação A mera existência de dominação estrangeira em si mesma não colocava maiores problemas aqui já que vastas re giões do subcontinente tinham sido no curso de sua história conquis tadas e reconquistadas por vários tipos de estrangeiros a maioria da Ásia central cuja legitimidade havia sido suficientemente estabelecida pelo poder efetivo Que os dominadores atuais tivessem pele mais clara que os afghans e uma linguagem administrativa um pouco mais incom preensível que o persa clássico não chegou a levantar maiores proble mas que eles não procurassem conversões para sua religião peculiar com um zelo excessivo para tristeza dos missionários era uma con quista política Entretanto as mudanças que eles provocaram delibera damente ou em conseqüência de sua curiosa ideologia e atividade eco nômica sem precedentes eram mais profundas e perturbadoras que qualquer outra coisa que tivesse atravessado o Passo de Khyber Eles eram simultaneamente revolucionários e limitados Os in gleses esforçaramse para inserir um processo de ocidentalização em alguns casos mesmo de assimilação não apenas porque práticas locais como a cremação de viúvas suttee ultrajava realmente muito deles mas sobretudo por causa das necessidades mesmas da adminis tração e da economia Ambas destruíam a estrutura social e econômi ca existentes mesmo quando tal não era a intenção Portanto após 137 longos debates T B Macaulay 180059 e sua famosa Minuta 1835 estabeleceu um sistema de educação puramente inglês para os poucos indianos nos quais o British Raj tinha interesse oficial ou seja os administradores subalternos Uma pequena elite anglicizada emergiu às vezes tão distante das massas indianas a ponto de perder fluência em sua própria língua vernacular ou de anglicizar os próprios nomes embora nem o mais assimilado dos indianos viesse a ser tra tado como inglês pelos ingleses Por outro lado os ingleses recusa ramse ou fracassaram na tentativa de ocidentalização porque em primeiro lugar os indianos eram enfim um povo dominado cuja fun ção não era a de competir com o capitalismo inglês e em segundo lu gar por causa dos riscos políticos da excessiva interferência em práti cas populares e também pela notável discrepância entre o número de ingleses e os aproximadamente 190 milhões de indianos 1871 tão grande a ponto de parecer insuperável pelo menos por parte do pe queno número de administradores ingleses A literatura extremamente capaz produzida pelos homens que dominaram ou tiveram experiên cia com a índia no século XIX e que contribuíram decisivamente para o desenvolvimento de disciplinas como a sociologia antropolo gia social e história comparativa ver capítulo 14 mais adiante faz parte de uma série de variações em torno do tema da incompatibilida de numérica e da impotência A ocidentalização viria eventualmente produzir a liderança as ideologias e os programas da luta de libertação indiana cujos líderes culturais e políticos surgiriam dos flancos daqueles que haviam cola borado com os ingleses beneficiadose desta dominação na qualidade de uma burguesia compradora ou em outras palavras iniciando sua modernização pela imitação do Oeste Isso produziu o início de uma classe de industrialistas locais cujos interesses viriam produzir con flitos com a política econômica metropolitana É necessário ressaltar que neste período a elite ocidentalizada via nos britânicos um mode lo e a abertura de novas possibilidades O nacionalista anônimo no Mukherjees Magazine Calcutá 1873 era ainda uma figura isolada quando escreveu Maravilhados pelo brilho artificial em torno de les os nativos aceitavam os pontos de vista de seus superiores e neles depositavam sua fé como se fossem um Veda comercial Mas dia após dia a luz da inteligência limpalhes o fog de suas mentes3 Na medida em que havia resistência aos britânicos enquanto britâni cos ela vinha dos tradicionalistas e era mesmo muda com uma im portante exceção numa época em que como o nacionalista B G Tilak mais tarde lembraria o povo estava primeiramente maravilha do pela disciplina dos britânicos Estradas de ferro telégrafo estra das escolas impressionavam o povo Distúrbios haviam cessado e o povo podia aproveitar a calma e a paz o povo começou a dizer que mesmo um cego podia viajar em segurança de Benares a Rameshwar com ouro amarrado numa vara4 138 A importante exceção foi o grande levante de 185758 no norte da planície indiana conhecido na tradição histórica inglesa como o Motim indiano um ponto crucial na história da administração bri tânica que tem sido apontado retrospectivamente como um prelúdio ao movimento nacional indiano Era o último sinal de reação do norte da Índia contra a imposição do domínio inglês direto e finalmente fez ruir a velha East Índia Company Este curioso sobrevivente do colo nialismo de empresa privada absorvido de forma crescente no apara to de estado inglês vinha finalmente ser substituído definitivamente por ele A política de anexação sistemática de territórios indianos me ramente dependentes associada ao regime do vicerei Lord Dalhousie 184756 e especialmente a anexação em 1856 do Reino de Oudh última relíquia do Império Mughal terminou por provocar a explo são A rapidez e a falta de tato das mudanças impostas ou entendidas pelo nativos como iminentes precipitaramna O pretexto foi a intro dução de cartuchos de graxa que os soldados do exército bengalês viam como uma deliberada provocação de sua sensibilidade religiosa O estabelecimento de missionários era um dos principais motivos da fúria popular Embora o levante tenha começado como um motim do exército bengalês os de Bombaim e Madras permaneceram quietos transformouse numa insurreição popular de maior importância na planície do norte sob a liderança dos nobres e príncipes tradicionais na tentativa de restaurar o Império Mughal As tensões econômicas como as oriundas das mudanças efetuadas pelos ingleses na taxa de terra a principal fonte de renda pública tiveram certamente sua im portância mas até onde este fato isolado poderia produzir uma tal re volta é bastante duvidoso Os homens rebelaramse contra aquilo que eles acreditavam ser uma destruição rápida e rude de sua forma de vi da por uma sociedade estrangeira O Motim foi esmagado num banho de sangue mas ensinou aos ingleses a ter cuidado Por razões práticas a política de anexações cessou exceto nas fronteiras ocidental e oriental do subcontinente As grandes áreas da Índia ainda não ocupadas por administração direta foram deixadas para a administração de príncipes locais marionetes controlados pelos ingleses embora oficialmente respeitados e consi derados e estes por seu turno transformaramse nos pilares do regi me que lhes garantia riqueza poder local e status Desenvolveuse uma tendência acentuada para buscar apoio nos elementos mais con servadores deste país os proprietários de terras e especialmente a po derosa minoria muçulmana seguindo a antiga regra imperial Divide e Impera Com o passar do tempo esta mudança de política tornou se mais do que o reconhecimento da resistência da Índia tradicional à dominação estrangeira Tornouse um contrapeso ao lento desenvol vimento da resistência da nova elite indiana classemédia produtos da sociedade colonial em alguns casos seus servidores Pois fossem quais fossem as políticas aplicadas no império indiano sua realidade econômica e política continuava a enfraquecer e alquebrar as forças 139 da tradição e reforçar as forças da inovação intensificando o conflito entre estas últimas e os ingleses Após o final do regime da Company o crescimento de uma nova comunidade de ingleses expatriados a companhados de suas mulheres que enfatizavam de forma crescente seus sentimentos segregacionistas e de superioridade racial aumentou a fricção social com a nova camada de classe média As tensões eco nômicas dos últimos 30 anos do século XIX ver capítulo 16 mais a diante multiplicaram argumentos antiimperialistas Pelo final da dé cada de 1880 o Congresso Nacional Indiano o principal veículo do nacionalismo indiano e partido dirigente da Índia independente já existia No século XX as massas indianas viriam seguir a direção ide ológica do novo nacionalismo III O Levante Indiano de 185758 não foi a única rebelião colonial de massa do passado contra o presente Dentro do império francês o grande levante argelino de 1871 precipitado tanto pela retirada das tropas francesas durante a Guerra FrancoPrussiana como pela imi gração em massa de alsacianos e lorrainianos para a Argélia depois de 1871 constituise num fenômeno análogo Porém a magnitude destas rebeliões era limitada pois as principais vítimas da sociedade ociden tal capitalista não eram colônias conquistadas mas sociedades e esta dos enfraquecidos embora nominalmente independentes O destino de dois destes pode ser reunido em nosso período de estudo Egito e China Egito um principado virtualmente independente embora formal mente ainda dentro do Império Muçulmano estava predestinado a ser vítima de sua riqueza agrária e de sua situação estratégica A primeira destas transformouo numa economia de exportação agrária suprindo o mundo capitalista com trigo e especialmente algodão cujas vendas cresceram dramaticamente Já no início da década de 1860 a exporta ção representava 70 da renda auferida pelo país e durante o grande boom da década de 1860 quando os fornecimentos americanos foram interrompidos pela Guerra Civil até os camponeses se beneficiaram embora metade deles tivesse contraído doenças parasitárias devido ao aumento da irrigação Esta vasta expansão levou o comércio egípcio decididamente para dentro do sistema internacional britânico atraindo levas de homens de negócios e aventureiros prontos a conce der crédito ao Khedive Ismail Desta forma o Khedive esperava transformar o Egito num poder moderno e imperial e reconstruir o Cairo tendo como padrão as linhas imperiais de Paris de Napoleão II I que fornecia o modelo básico de paraíso para dirigentes deste tipo O segundo fator a situação estratégica atraia os interesses das potên cias ocidentais e seus capitalistas especialmente os ingleses cuja po sição como potência mundial passoua depender de forma definitiva 140 da construção do Canal de Suez A cultura mundial pode ficar modes tamente agradecida ao Khedive por ter encomendado a Aida de Verdi 1871 cuja premiére teve lugar na nova ópera do Khedive para ce lebrar a abertura do Canal mas o custo de tudo isso para o povo egíp cio viria a ser excessivo O Egito estava portanto integrado na economia européia como um fornecedor de produtos agrários Os banqueiros através dos pa shas extorquiam o povo egípcio e quando o Khedive e seus pashas não mais podiam pagar os juros dos empréstimos que haviam aceita do com tanto entusiasmo em 1876 eles totalizavam quase metade da receita para aquele ano os estrangeiros impuseram controle 5 Os europeus teriam talvez ficado contentes apenas em explorar um Egito independente mas o colapso do boom econômico assim com o da es trutura política e administrativa do governo do Khedive minado pe las forças econômicas e tentações que os dirigentes egípcios não en tendiam nem conseguiam manejar tornava esta independência difí cil Os ingleses cuja posição era mais forte e cujos interesses estavam envolvidos de forma muito mais crucial emergiram como os novos dirigentes do país na década de 1880 Entretanto a incomum abertura do Egito ao Oeste tinha criado uma nova elite de senhores da terra intelectuais funcionários civis e militares que dirigiram o movimento nacional de 187982 diretamen te contra o Khedive e os estrangeiros No curso do século XIX o ve lho grupo dirigente turco ou turcocircassiano tinha sido egipcianiza do ao mesmo tempo em que vários egípcios haviam galgado posições de riqueza e influência O árabe substituiu o turco como língua ofici al reforçando a já poderosa posição do Egito como centro da vida in telectual islâmica O notável pioneiro da ideologia islâmica moderna o persa Jamal addin Al Afghani encontrou um público entusiástico entre os intelectuais egípcios durante sua influente estadia no país 187179 O ponto importante em Al Afghani assim como seus dis cípulos egípcios era que não advogava uma simples reação islâmica negativa contra o Oeste Sua própria ortodoxia religiosa tem sido re almente questionada ele tornouse um franco maçom em 1875 em bora fosse realista o bastante para saber que as convicções religiosas do mundo islâmico não deviam ser sacudidas e eram na realidade uma força política de grande magnitude Seu apelo era por uma revi talização do Islã que permitisse ao mundo muçulmano absorver a ci ência moderna e copiar o Oeste demonstrar enfim que o Islã de fato absorvia a ciência moderna parlamentos e exércitos nacionais6 O movimento antiimperialista no Egito olhava para frente e não para trás Enquanto os pashas do Egito imitavam o tentador exemplo de Paris de Napoleão III a maior das revoluções do século XIX ocorria no maior dos impérios nãoeuropeus a chamada rebelião Taiping da China 185066 Ela tem sido ignorada por historiadores eurocen 141 tristas embora Marx estivesse suficientemente bem informado sobre ela para escrever em 1853 Talvez o próximo levante do povo euro peu dependa muito mais do que agora ocorre no Império Celestial do que qualquer outra causa política Era a maior das rebeliões não a penas porque a China cuja metade do atual território era controlada pelos Taipings continha talvez 400 milhões de habitantes de longe o estado mais populoso do mundo mas também por causa da escala ex traordinária de ferocidade que ocorreu nas guerras civis no país Pro vavelmente 20 milhões de chineses morreram neste período Estas convulsões eram de várias formas o produto direto do impacto oci dental na China Provavelmente sozinha entre os grandes impérios tradicionais do mundo a China possuía uma tradição revolucionária popular ide ológica e prática Ideologicamente seus intelectuais e seu povo toma vam a permanência e centralização de seu império como um dado e xistiria sempre sob um único imperador salvo por alguns períodos ocasionais de divisão seria sempre administrada por intelectuais burocratas que tivessem passado pelos grandes exames nacionais do serviço civil introduzidos aproximadamente dois mil anos antes e somente abandonados quando o império estava próximo do desapare cimento definitivo em 1910 Portanto a história deste país era a de uma sucessão de dinastias cada qual passando acreditavase por um ciclo de ascensão crise e transcendência ganhando é perdendo o mandato do Céu que legitimava sua absoluta autoridade Neste pro cesso de mudança de uma dinastia para outra a insurreição popular derivada do banditismo social os levantes camponeses as atividades das sociedades secretas populares e até a rebelião de grande magnitu de eram conhecidas e esperadas para desempenhar seus respectivos papéis No entanto as próprias ocorrências destas agitações eram uma clara indicação de que o mandato do Céu estava por acabar A per manência da China centro da civilização mundial era conseguida a través da repetição contínua do ciclo de mudanças de dinastia que in cluía este elemento revolucionário A dinastia Manchu imposta por conquistadores do Norte em meados do século XVII havia substituído a dinastia Ming que havia por seu turno através de revolução popular derrubado a dinastia Mongol no século XIV Embora na primeira metade do século XIX o regime Manchu parecesse funcionar sem maiores problemas com in teligência e eficiência apesar de se dizer que havia uma grande quantidade de corrupção já se percebiam sinais de crise e rebelião desde a década de 1790 Malgrado quaisquer outras razões que pos sam ser apontadas o fato é que o extraordinário aumento da popula ção do país no século precedente cujas causas ainda não estão clara mente elucidadas havia começado a criar pressões econômicas agu das O número de chineses parece haver subido de perto de 140 mi lhões em 1741 para cerca de 400 milhões em 1834 O novo elemento dramático na situação chinesa era a conquista ocidental que havia 142 derrotado o Império na primeira Guerra do Ópio 183942 O choque desta capitulação diante de uma modesta força naval inglesa foi e norme pois tinha revelado a fragilidade do sistema imperial e mes mo setores da opinião pública fora das poucas áreas imediatamente afetadas devem ter tomado consciência do fato Conseqüentemente houve um aumento marcante e imediato nas atividades das várias for ças de oposição notavelmente as poderosas e profundamente enrai zadas sociedades secretas como a Tríade do sul da China dedicada à derrubada da dinastia estrangeira Manchu e a restauração da Ming A administração imperial havia instituído forças de milícia contra os in gleses desta forma ajudando a distribuir armas pela população civil Só faltava uma fagulha para produzir a explosão Esta fagulha apareceu sob a forma de um profeta obcecado tal vez psicopata e líder messiânico Hung HsiuChuan 181364 um dos fracassados no exame para o Serviço Civil imperial e logo em segui da um descontente político Depois de seu fracasso no exame ele e videntemente teve um colapso nervoso que se transformou em con versão religiosa Por volta de 184748 fundou uma Sociedade dos que veneram Deus na província de Kwangsi e teve rapidamente co mo seguidores camponeses e mineiros homens da grande população chinesa de nômades empobrecidos membros de várias minorias na cionais e de velhas sociedades secretas Havia porém uma novidade significativa na sua pregação Hung tinha sido influenciado pela leitu ra de textos cristãos tinha até convivido com um missionário ameri cano em Cantão e portanto assimilado elementos ocidentais signifi cativos numa mistura de idéias antiManchu heréticoreligiosas e re volucionárias A rebelião estourou em 1850 em Kwangsi e espalhou se tão rapidamente que um Reino Celestial de Paz Universal pôde ser proclamado no ano seguinte com Hung como o supremo Rei Ce lestial Era indubitavelmente um regime de revolução social cujo maior apoio baseavase nas massas populares e dominado por idéias igualitárias taoístas budistas e cristãs Teocraticamente organizada na base de uma pirâmide de unidades familiares aboliu a propriedade privada a terra sendo distribuída apenas para uso não para proprie dade estabeleceu a igualdade entre os sexos proibiu tabaco ópio e álcool introduziu um novo calendário incluindo a semana de sete di as e várias outras reformas culturais não esquecendo de abaixar as taxas Pelo final de 1853 os Taipings eram pelo menos um milhão de ativos militantes que controlavam a maior parte do sul e do leste chi nês tendo capturado Nanking embora sem conseguir mais pela falta de cavalaria adentrarse ao norte A China estava dividida e mesmo aquelas partes que não se encontravam sob o regime de Taiping esta vam sendo convulsionadas por graves insurreições tais como as do Nien uma revolta dos camponeses rebeldes do norte não suprimida até 1868 além da rebelião da minoria nacional Miao em Kweichow e de outras minorias no sudoeste e noroeste 146 143 A revolução Taiping não se manteve e realmente não se espera va que se mantivesse Suas inovações radicais alienavam moderados tradicionalistas e aqueles que tinham propriedades a perder e esses não eram apenas os ricos O fracasso de seus líderes em guiarse pelas suas próprias regras puritanas enfraqueceram seu apelo popular e profundas divisões desenvolveramse rapidamente na liderança Após 1856 encontravase na defensiva e em 1864 a capital Taiping de Nanking era recapturada O governo imperial recuperouse mas o preço que pagou por tal recuperação era pesado e viria provarse fa tal Isso também ilustrava as complexidades do impacto do Ocidente Paradoxalmente os dirigentes da China eram menos propensos a adotar inovações ocidentais que os rebeldes plebeus habituados de longa data a viver num mundo ideológico onde as idéias nãooficiais vinham de fontes estrangeiras como o budismo Para os intelectuais burocratas confucianos que governavam o Império o que não fosse chinês era bárbaro Havia mesmo resistência à tecnologia que obvia mente fazia os bárbaros invencíveis Mesmo em 1867 o Grande Se cretário Wo Jen alertou o trono de que o estabelecimento de um colé gio para ensinar astronomia e matemática iria fazer do povo proséli to do estrangeirismo e resultaria no colapso da retidão e na difusão da iniqüidade7 e a resistência à construção de estradas de ferro e coisas semelhantes permaneceu considerável Por razões óbvias um partido modernizante desenvolveuse mas podese adivinhar que eles prefeririam manter a China inalterada meramente acrescentando a capacidade de produzir armamentos ocidentais Suas tentativas pa ra desenvolver tal produção na década de 1860 não foram por esta ra zão muito bem sucedidas A enfraquecida administração imperial viase diante da escolha entre diferentes graus de concessão ao Oeste Frente a uma revolução social de magnitude sentia relutância em mobilizar a enorme força da xenofobia popular chinesa contra os in vasores Realmente a derrubada do governo de Taiping parecia ao Império de longe o problema mais urgente e para este objetivo a aju da dos estrangeiros era se não essencial pelo menos desejável sua boa vontade então indispensável Portanto a China Imperial viuse rapidamente na completa dependência de estrangeiros Um triunvi rato anglofrancoamericano já controlava a alfândega de Shangai desde 1854 mas depois da segunda Guerra do ópio 185658 e do saque de Peking 1860 que terminou numa completa capitulação um inglês foi indicado para assistir a administração de toda a recei ta da alfândega chinesa Neste período não apenas a Inglaterra mas também a França Rússia e os Estados Unidos receberam concessões Vários portos foram abertos mercadores estrangeiros receberam li berdade de movimento e imunidades diante da lei chinesa havia li berdade de ação para os missionários estrangeiros mercado livre in cluindo navegação livre nas águas fluviais pesadas indenizações de guerra etc Na prática Robert Hart que foi Inspetor Geral da Alfân dega Chinesa de 1863 até 1909 era o chefe da economia chinesa e 144 embora ele chegasse a inspirar confiança aos governos chineses e a identificarse com o país na realidade o arranjo implicava na inteira subordinação do governo imperial aos interesses dos ocidentais De fato quando chegou o ponto crítico os ocidentais preferiram arrastar os Manchus até sua derrubada que teria produzido ou um re gime militante nacionalista revolucionário ou o que é mais provável anarquia e um vazio político que o Oeste estava relutante em preen cher A simpatia inicial da parte de alguns estrangeiros pelos elemen tos aparentemente cristãos dos Taiping rapidamente evaporouse Por outro lado o Império chinês recuperouse da crise de Taiping a través de uma combinação de concessões ao Oeste um retorno ao conservadorismo e uma erosão fatal de seu poder central Os verda deiros vitoriosos na China eram os velhos intelectuaisburocratas Di ante do perigo mortal a dinastia Manchu e a aristocracia aproxima ramse da elite chinesa concedendolhe muito de seu antigo poder Os melhores dos intelectuaisadministradores homens como Li HungChang 18231901 salvaram o Império quando Peking esta va sem poder instituindo exércitos provinciais baseados em recursos provinciais Agindo desta forma eles anteciparam o próximo colapso da China numa coleção de regiões sob senhores da guerra indepen dentes O grande e antigo Império da China iria a partir de então vi ver a custa dos outros De uma forma ou de outra portanto as sociedades e estados ví timas do mundo capitalista com a exceção do Japão a ser considera do separadamente ver capítulo 8 mais adiante fracassaram em che gar a um bom entendimento com este último Seus dirigentes e elites cedo se convenceram que uma simples recusa em aceitar o estilo dos ocidentais era impraticável e se praticável teria meramente perpetu ado sua fraqueza Os que viviam nas colônias conquistadas domina das ou administradas pelo Oeste não tinham muita escolha seus des tinos eram determinados por seus conquistadores Os outros estavam divididos entre seguir uma política de resistência ou colaborar com concessões entre uma sincera ocidentalização ou alguma forma de reforma que lhes permitisse adquirir a ciência e a tecnologia do Oeste sem perder concomitantemente suas próprias culturas e instituições No todo as antigas colônias dos estados europeus nas Américas opta ram por uma incondicional imitação do Oeste a cadeia das antigas monarquias que iam do Marrocos no Atlântico à China no Pacífico eram partidários de alguma versão de reforma quando não podiam i solarse completamente da expansão ocidental Os casos da China e do Egito são nas suas particularidades típi cos desta escolha Ambos eram estados independentes com base em antigas civilizações e uma cultura nãoeuropéia minados pela pene tração do comércio e finanças ocidentais aceitas com boa ou má von tade e sem poder para resistir às forças militares e navais do Oeste 145 mesmo que modestamente mobilizadas As potências capitalistas nes te estágio não estavam interessadas particularmente em ocupação e administração na medida em que seus cidadãos tivessem total liber dade em fazer o que bem entendessem incluindo privilégios extra territoriais Tais cidadãos vieram encontrarse de forma crescente envolvidos nas questões internas de tais países apenas quando os go vernos locais começaram a se desintegrar diante do impacto ociden tal assim como também devido à rivalidade entre os poderes ociden tais Os dirigentes da China e do Egito rejeitaram uma política de re sistência nacional preferindo onde tivessem a opção uma depen dência em relação ao Oeste que lhes mantivesse o poder político pró prio Neste período relativamente poucos entre os que nestes países queriam a resistência através da regeneração nacional favoreciam a ocidentalização Em lugar disso eles optavam por uma forma de re forma ideológica que lhes permitisse encarnar o que quer que fosse que tivesse feito o Oeste tão formidável dentro de seus próprios sis temas culturais IV Tais políticas fracassaram O Egito verseia cedo sob controle direto de seus conquistadores e a China tornouse ainda mais sem sa ída na via da desintegração Já que os regimes existentes e seus diri gentes tinham optado pela dependência ocidental era improvável que os reformadores nacionais pudessem ser bem sucedidos já que a re volução era a précondição para o sucesso De fato os maiores entre os velhos impérios independentes nãoocidentais viriam a ser derru bados ou transformados por revoluções no começo do século XX Turquia Irã e China Mas ainda não era tempo para isso Portanto o que é hoje chamado o Terceiro Mundo ou os paí ses subdesenvolvidos estavam à mercê do Oeste vítimas perdidas Mas esta subordinação não traria nenhuma compensação para estes países Como já vimos havia os que nos países atrasados acredita vam que isto ocorresse A ocidentalização era a única solução e isso não implicava apenas aprender e copiar os estrangeiros mas aceitar sua aliança contra as forças locais do tradicionalismo isto é sua do minação aí o preço tinha que ser pago E um engano ver estes pas sionais modernizadores à luz dos posteriores movimentos naciona listas considerandoos como simples traidores ou agentes do imperia lismo estrangeiro Eles podiam apenas sustentar o ponto de vista de que os estrangeiros longe da invencibilidade iriam ajudálos a criar uma sociedade capaz de resistir ao Oeste A elite mexicana da década de 1860 era próestrangeira porque havia perdido as esperanças no país 8 Tais argumentos eram também usados por revolucionários oci dentais Marx viu de forma positiva a vitória americana sobre o Mé xico na guerra de 1847 porque ela trazia progresso histórico e criava 146 as condições para o desenvolvimento do capitalismo quer dizer para as condições de derrubada do próprio capitalismo Sua posição no que toca à missão britânica na Índia expressa em 1853 é conhecida Consideravaa com uma dupla missão o aniquilamento da antiga sociedade asiática e o estabelecimento das fundações materiais da so ciedade ocidental na índia Realmente ele acreditava que Os indianos não terão os frutos dos novos elementos da sociedade es palhados entre eles pela burguesia inglesa até que na GrãBretanha as atuais classes dominantes tenham sido suplantadas pelo proletariado industrial ou até que os hindus tenham se fortalecido suficientemente para livrarse dos ingleses de vez No entanto apesar do sangue e sujeira miséria e degradação para o que a burguesia arrastava os povos do mundo ele via estas conquistas como positivas e progressistas Portanto sejam quais forem as últimas perspectivas e os histo riadores modernos são bem menos otimistas que Marx em 1850 no presente imediato os resultados mais evidentes da conquista ocidental foram a perda de um velho mundo sem o ganho de um novo que a crescentou uma forma peculiar de melancolia à miséria presente dos hindus 9 assim como para outros povos vítimas do Oeste Os ganhos eram difíceis de se discernir neste período e as perdas demasiado evi dentes Do lado positivo havia os barcos a vapor estradas de ferro e telégrafos além de pequenos focos de intelectuais educados no Oci dente Havia comunicação material e cultural Havia também cres cimento na produção para exploração em algumas áreas embora não ainda em grandes proporções Havia uma substituição de ordem por desordem pública segurança por insegurança em algumas áreas que ficaram sob controle colonial direto Mas apenas o otimismo congêni to iria argumentar que estes benefícios contrabalançavam o lado ne gativo neste período O contraste mais óbvio entre os mundos desenvolvidos e subde senvolvidos era e ainda é aquele entre pobreza e riqueza No primei ro pessoas ainda morriam de fome mas segundo o que o século XIX considerava em números pequenos digamos uma média de 500 por ano na Inglaterra Na Índia eles morriam aos milhões um em dez na população de Orissa durante a grande epidemia de fome de 186566 algo entre uma quarta parte e uma terça parte da população de Rajpu tana em 186870 três e meio milhões ou 15 da população em Ma dras um milhão ou 20 da população em Mysore durante a grande fome de 187688 a pior de todas na história da índia do século XIX 10 Na China não é fácil separar a catástrofe da fome de numerosas outras catástrofes do período mas a de 1849 parece ter custado 14 milhões de vidas enquanto outras 20 milhões devem ter morrido en tre 1854 e 186411 Partes de Java foram varridas por uma terrível fo me em 184850 O final da década de 1860 e princípios da de 1870 viram uma epidemia de fome no cinturão dos países que ia da Índia à 147 Espanha12 A população muçulmana da Argélia caiu em 20 entre 1861 e 1872 l3 A Pérsia cuja população total era estimada entre 6 e 7 milhões em meados da década de 1870 parece ter perdido entre 15 e 2 milhões na grande epidemia de fome de 18717314 É difícil dizer se a situação era pior na primeira metade do século e talvez o fosse na Índia e na China ou meramente a mesma Em qualquer caso o con traste com os países desenvolvidos no mesmo período era dramático mesmo se concedermos que como parece ser verdade para o mundo islâmico a era dos movimentos demográficos tradicionais e catastró ficos já dava lugar lentamente a um novo modelo populacional na se gunda metade do século Em resumo o principal dos povos do Terceiro Mundo não pare cia se beneficiar de forma significativa do progresso extraordinário e sem precedentes do Oeste Se eles percebiam este fato como sendo algo mais do que uma mera quebra de seus antigos modos de vida era mais comum um exemplo possível do que uma realidade O pro gresso não pertencia ao mundo que conheciam e muitos duvidavam se isso era desejável Mas aqueles que resistiram em nome da tradição foram derrotados O dia daqueles que resistiriam com as armas do progresso ainda não havia chegado Classification of Solids on the basis of Physical State Appearance of Solids Hardness Solubility of Solids Crystalline Solids Amorphous Solids Crystalline Solids Amorphous Solids 149 Oitavo Capítulo VENCEDORES Que classes e camadas da sociedade tornarseão agora os verdadeiros representantes da cultura darnosão nossos intelectuais artistas e poetas nossas personalidades criativas Ou será que tudo vai se transformar em um grande negócio como na América Jakob Burjhardt 1868711 A administração do Japão tornouse esclarecida e progressista a experi ência européia ali é aceita como um guia estrangeiros são empregados em seu serviço e os hábitos e idéias estão dando caminho para a civiliza ção ocidental Sir T Erskine May 1877 2 I Nunca portanto os europeus dominaram o mundo de forma tão completa e inquestionável como em nosso período de estudo de 1848 a 1875 Para ser mais preciso nunca brancos de origem européia do minaram com menos desafio pois o mundo da economia e do poder capitalista incluía pelo menos um estado nãoeuropeu ou melhor uma federação os Estados Unidos da América Os Estados Unidos ainda não tinham uma participação maior nas questões mundiais e portanto os estadistas europeus davamlhes apenas atenção intermi tente salvo no que envolvesse seus interesses nas duas regiões do mundo nas quais os Estados Unidos estavam diretamente interessa dos ou seja os continentes americanos e o Oceano Pacífico masv com a exceção da Inglaterra cujas perspectivas eram consisten tem ente globais nenhum outro estado estava constantemente envolvido nestas duas áreas A liberação da América Latina tinha removido to das as colônias européias de sua parte continental exceção feita às Guianas que davam aos ingleses algum açúcar aos franceses uma colônia penal para criminosos perigosos e aos holandeses uma lem brança de seus antigos laços com o Brasil As ilhas do Caribe exce tuandose a ilha de Hispaniola que consistia na república negra do Haiti e na República Dominicana finalmente emancipada da domina ção espanhola e da preponderância haitiana permaneceram posses sões coloniais da Espanha Cuba e Porto Rico Inglaterra França 150 Holanda e Dinamarca Exceto pela Espanha que desejava uma res tauração parcial de seu império americano nenhum dos estados euro peus dava muita importância a suas possessões no Caribe Somente no continente norteamericano uma importante presença européia permaneceu até 1875 a vasta mas subdesenvolvida e grandemente vazia dependência britânica do Canadá separado dos Estados Unidos por uma longa fronteira aberta uma linha reta das margens do lago Ontário até o Oceano Pacífico As áreas em disputa de cada lado des ta linha eram ajustadas pacificamente se bem que através de com plicada barganha diplomática na maioria das vezes em favor dos Estados Unidos no decorrer do século Quanto às margens asiáticas do Oceano Pacífico somente o extremo oriente russo da Sibéria a co lônia britânica de HongKong e a base na Malásia marcavam a pre sença direta das grandes potências européias embora os franceses es tivessem começando a ocupação da Indochina As relíquias do colo nialismo espanhol e português e os holandeses no que é hoje a Indo nésia não levantavam problemas internacionais A expansão territorial dos Estados Unidos não causava portanto maior alvoroço nas chancelarias européias Uma grande parte do su doeste do continente Califórnia Arizona Utah e partes do Colorado e Novo México foi cedida pelo México depois de uma guerra desas trada em 184853 A Rússia vendeu o Alaska em 1867 estes e outros antigos territórios do Oeste foram transformados em estados da União quando se tornaram suficientemente interessantes do ponto de vista econômico ou accessíveis a Califórnia em 1850 Oregon em 1859 Nevada em 1864 enquanto que no centro do país Minesota Kansas Wisconsin e Nebraska adquiriram estatuto de estado entre 1858 e 1867 Além disso as ambições territoriais americanas não iam além deste ponto embora os estados escravistas do sul desejassem uma ex pansão da sociedade escrava às grandes ilhas do Caribe e expressas sem mesmo ambições maiores em relação à América Latina O tipo básico de dominação americana era o de controle indireto já que ne nhuma potência estrangeira aparecia como um desafiante efetivamen te direto eram governos fracos e apenas nominalmente independen tes que sabiam que precisavam ficar do lado do gigante do Norte Somente no final do século durante a moda internacional do imperia lismo iriam os Estados Unidos quebrar por pouco tempo esta tradição estabelecida Pobre México iria observar o presidente Porfirio Diaz 18281915 tão longe de Deus e tão perto dos Estados Unidos e mesmo os estados latinoamericanos que se achavam mais perto do TodoPoderoso verificaram de forma cada vez mais consciente que neste mundo era sobre Washington que eles deveriam manter o olho alerta O ocasional aventureirismo norteamericano tentou estabelecer poder direto nas estreitas pontes de terra que separavam o Oceano A tlântico do Oceano Pacífico mas nada realmente ocorreu até que o canal do Panamá viesse a ser construído sendo ocupado por forças americanas em uma pequena república independente destacada para 151 esta finalidade de um grande estado sulamericano a Colômbia Mas isso seria mais tarde A maior parte do mundo e especialmente a Europa estava aten ta aos Estados Unidos porque neste período 184875 vários milhões de europeus haviam emigrado para lá e porque sua grande extensão territorial e extraordinário progresso fizeramno rapidamente o mila gre técnico do planeta Tratavase como os americanos foram os primeiros a reconhecêlo da terra dos superlativos Onde no mundo poderseia encontrar uma cidade como Chicago que tinha uns mo destos 30 mil habitantes em 1850 e veio a se tornar o sexto maior centro urbano do mundo com mais de 1 milhão de habitantes em ape nas 40 anos Ali encontravamse as maiores estradas de ferro do mundo atravessando inigualáveis distâncias em suas rotas transconti nentais e nenhum outro país excedia o total em milhas construídas 49168 em 1870 Nenhum milionário parecia mais selfmade que os dos Estados Unidos e se ainda não eram os mais ricos embora cedo viessem a ser eram pelo menos em maior número Em nenhum lu gar os jornais eram mais aventurosamente jornalísticos políticos mais corruptos nenhum país mais ilimitado em suas possibilidades A América ainda era o Novo Mundo a sociedade aberta num país aberto onde o imigrante sem um centavo podia como se acredi tava fazerse a si mesmo o selfmade man e desta forma construir uma república igualitária e democrática a única de tamanho e impor tância no mundo em 1870 A imagem dos Estados Unidos como uma alternativa revolucionária política às monarquias do Velho Mundo com sua aristocracia e sujeição era talvez mais viva que nunca pelo menos fora de suas fronteiras A imagem da América como um lugar onde a pobreza não tivesse vez de esperança pessoal através do enri quecimento individual substituiu a velha imagem européia O Novo Mundo confrontava crescentemente a Europa não como a nova soci edade mas como a sociedade dos novos ricos E dentro do Estados Unidos o sonho revolucionário estava lon ge de desaparecer A imagem da república era a de uma terra de i gualdade democracia talvez de liberdade anárquica oportunidade i limitada tudo isto mais tarde sendo chamado de destino manifesto da nação Ninguém pode ter uma idéia correta dos Estados Unidos no século XIX ou em relação a esta específica questão no século XX sem apreciar este componente utópico embora obscurecido de forma cada vez maior e transformado num dinamismo econômico e tecnoló gico complacente exceto em momentos de crise Era por origem uma utopia agrária de fazendeiros livres e independentes numa terra livre Nunca chegou a bom termo com o mundo das grandes cidades e da grande indústria e não se reconciliava com a dominação destes úl timos em nosso período Mesmo num centro tão típico da indústria americana como a cidade têxtil de Peterson Nova Jersey o ethos do comércio ainda não era dominante Durante a greve de 1877 os fa zendeiros reclamaram amargamente e com razão de que o prefeito 152 republicano os políticos democráticos a imprensa os tribunais e a opinião pública não os havia apoiado3 A grande maioria dos americanos ainda era rural em 1860 ape nas 16 vivia em cidades de mais de 8 mil habitantes A utopia rural na sua forma mais literal o solo livre podia mobilizar mais poder político do que nunca principalmente no seio da população crescente do meiooeste Ela contribuiu para a formação do Partido Republica no e para sua orientação antiescravista pois embora o programa de uma república sem classes de fazendeiros livres não tivesse nada a ver com a escravidão e pouco interesse no negro excluía a escravi dão Atingiu seu maior triunfo com o Homestead Act de 1862 que oferecia a qualquer filho de família americana maior de 21 anos 160 acres grátis depois de 5 anos de residência contínua ou compra por US 125 depois de seis meses Não é preciso acrescentar que esta u topia fracassou Entre 1862 e 1890 menos de 400 mil famílias se be neficiaram do Homestead Act enquanto a população como um todo cresceu em 32 milhões sendo que os estados da costa do Pacífico em mais de 10 milhões Somente as estradas de ferro que receberam so mas enormes de terras públicas para poder recuperar as perdas de construção e operação com os lucros da especulação imobiliária venderam mais terras a 5 dólares do que tudo que havia sido vendido sob o Act Os verdadeiros beneficiários da terra livre eram os especu ladores financistas e intermediários capitalistas Nas últimas décadas do século pouco se ouvia do bucólico sonho de liberdade da terra Seja qual for a forma que escolhermos para olhar a transforma ção dos Estados Unidos se o final de um sonho revolucionário ou o início de uma era o fato é tal que aconteceu na época 184875 A mi tologia em si mesma testemunha a importância desta época com os dois temas mais profundos e eternos da história americana localizados na cultura popular a Guerra Civil e o Oeste Ambos estão intimamen te interligados já que foi a abertura do Oeste ou mais exatamente su as partes sul e central que precipitou o conflito entre os estados da República entre os que representavam os colonos livres e o despontar do capitalismo do Norte e os da sociedade escravista do Sul Foi o conflito KansasNebraska de 1854 sobre a introdução do escravismo no centro do país que viria precipitar a formação do Partido Republi cano Este elegeria Abraham Lincoln 180965 presidente em 1860 um acontecimento que levaria à secessão dos Estados Confederados do Sul em 1861 Virgínia Carolinas do Norte e do Sul Geórgia A labama Flórida Mississipi Louisiana Tenessee Arkansas Alguns estados fronteiriços hesitaram mas não se separaram da União Mary land West Virgínia Kentucki Missouri e Kansas A expansão da colonização para o Oeste não era coisa nova Ti nha apenas sido dramaticamente acelerada em nosso período pelas es tradas de ferro a primeira delas tendo chegado e atravessado o Mis sissipi em 185456 e pelo desenvolvimento da Califórnia ver capí tulo 3 Depois de 1849 o Oeste cessou de ser uma espécie de fron 153 teira do infinito e tornouse um espaço vazio de planície deserto e montanha suspensos entre duas áreas em rápido desenvolvimento o Leste e a costa do Pacífico As primeiras linhas transcontinentais fo ram construídas simultaneamente para o Leste a partir do Pacífico e para o Oeste do Mississipi encontrandose em algum lugar em Utah De fato a região entre o Mississipi e a Califórnia o Oeste Selva gem permaneceu bastante vazia em nosso período diferindo do rit mo do centro já bastante populoso cultivado e mesmo industrializa do Estimavase que o total de trabalho para a instalação de fazendas na vasta área da planície no período entre 1850 e 1880 era pouco mais que o despendido para tal fim no mesmo período no sudoeste ou nos estados do Atlântico4 As pradarias a oeste do Mississipi estavam sendo lentamente co lonizadas por fazendeiros o que implicava na remoção por transfe rência forçada dos índios incluindo aqueles já transferidos por legis lação precedente e pelo massacre do búfalo sobre o que a economia dos índios repousava Sua exterminação começou em 1867 no mes mo ano em que o Congresso estabeleceu as mais importantes reservas indígenas Por volta de 1883 13 milhões haviam sido mortos As montanhas nunca se transformaram numa área importante de coloni zação agrícola Elas eram e permaneceram uma fronteira dos minei ros com uma população ávida por metais preciosos sobretudo prata dos quais o Comstock Lode em Nevada 1859 provou ser o maior Produziu 300 milhões de dólares em vinte anos fez fortunas espeta culares para uma meia dúzia de homens uma quantidade semelhante de milionários um número um pouco maior de pequenas mas expres sivas acumulações de riqueza para os padrões da época antes de desa parecer deixando atrás de si uma Virgínia City vazia povoada pelos fantasmas dos mineiros irlandeses assombrando o Union Hall e a O pera House Corridas semelhantes ocorreram em Colorado Idaho e Montana5 Demograficamente não tinham muita importância Em 1870 o Colorado admitido como estado em 1876 tinha menos do que 40 mil habitantes O sudoeste permanecia essencialmente campo isto é cowboy e terras As grandes hordas de bois uns 4 milhões entre 1865 e 1879 eram levadas no transporte ferroviário para os grandes matadouros de Chicago O tráfego deu origem portanto a estabelecimentos em Mis souri Kansas e Nebraska como Abilene e Dodge City de vivida re putação em milhares de Westerns6 O Oeste Selvagem é um mito tão poderoso que se torna difícil analisálo com algum realismo O único fato histórico mais ou menos preciso é que ele durou pouco tempo entre a Guerra Civil e o colapso da exploração mineira em 1880 A designação selvagem não era de vida aos índios que estavam prontos a viver em paz com os brancos exceto talvez no extremo sudoeste onde tribos como os Apaches 187186 e os mexicanos Yaqui 18751926 lutaram as últimas de várias guerras centenárias para manter suas respectivas independên 154 cias em relação aos brancos Era devido às instituições ou melhor à falta de instituições efetivas de governo e lei nos Estados Unidos Não haveria Oeste Selvagem no Canadá onde até as corridas do ouro eram menos anárquicas e onde os Sioux que combateram e der rotaram Custer nos Estados Unidos antes de serem massacrados ali viviam calmamente A anarquia ou para usar um termo mais neutro a paixão pela autonomia individual com armas era talvez exagerada pelo sonho de liberdade e do ouro que arrastava homens para o Oeste Para além da fronteira das fazendas de colonos e cidades não havia famílias em 1870 Virgínia City tinha dois homens para cada mulher e apenas 10 de crianças Ê verdade que o mito do Oeste degradou até este sonho O mesmo sonho de liberdades não se aplicava aos ín dios ou aos chineses que eram aproximadamente um terço da popu lação de Idaho em 1870 No sudoeste racista o Texas pertencia à Confederação certamente não se aplicava aos negros E embora muito daquilo que olhamos hoje como Western derivasse dos mexi canos que talvez tenham fornecido mais cowboys que qualquer outro grupo7 também não se aplicava a estes Era um sonho de brancos po bres que esperavam substituir a empresa privada do mundo burguês pelo jogo ouro e armas Se não há nada de muito obscuro sobre a abertura para o Oes te a natureza e as origens da Guerra Civil Americana 186165 le vam a uma discussão sem fim entre os historiadores Esta disputa gira em torno do tipo de sociedade escravista que havia nos estados do Sul e sua possível compatibilidade com o capitalismo dinâmico e em ex pansão do Norte Seria de fato uma sociedade escravista dado que os negros eram sempre uma minoria mesmo no Deep South e conside rando que a maioria dos escravos trabalhava não na clássica plantação de grandes dimensões mas num pequeno número de fazendas bran cas ou então como domésticos Não se pode negar que a escravidão era a instituição central da sociedade do Sul ou que esta questão fos se a causa principal da disputa e rompimento entre os estados do Nor te e do Sul A verdadeira questão é saber por que isto levou à seces são e à guerra civil ao invés de alguma forma de coexistência Apesar de tudo embora não houvesse dúvida de que grande parte da popula ção do Norte detestava a escravidão o abolicionismo militante por si só não era suficientemente forte para determinar a política da União E o capitalismo do Norte quaisquer que fossem os sentimentos pri vados dos homens de negócios bem poderia ter achado possível e conveniente chegar a um bom termo com o Sul escravista e explorá lo assim como os centros de negócios internacionais fazem hoje com o apartheid da África do Sul Termo genérico norteamericano que identifica a região constituída pelos estados seces sionistas durante a guerra civil NT 155 Evidentemente as sociedades escravistas incluindo a do Sul es tavam com os dias contados Nenhuma delas sobreviveu o período de 1848 a 1890 nem mesmo Cuba e Brasil ver capítulo 10 mais adian te Elas estavam isoladas fisicamente pela abolição do tráfico ne greiro que havia florescido na década de 1850 e também isoladas moralmente pelo consenso geral do liberalismo burguês que olhava as como contrárias à marcha da história moralmente indesejáveis e economicamente ineficientes É difícil imaginar a sobrevivência do Sul como uma sociedade escravista no século XX e mais ainda a so brevivência da servidão na Europa do Leste mesmo se como acredi tam algumas escolas de historiadores considerarmos ambas econo micamente viáveis como sistemas de produção Mas o que trouxe o Sul para uma situação uma crise na década de 1850 foi um problema específico a dificuldade de coexistência com um capitalismo dinâmi co no Norte e um dilúvio de migração para o Oeste Em termos puramente econômicos o Norte não estava muito pre ocupado com o Sul uma região agrária praticamente não envolvida em industrialização Tempo população recursos e produção estavam do lado do Norte As principais disputas eram políticas O Sul uma virtual semicolônia dos ingleses para os quais supria a maior parte do algodão de que a indústria inglesa necessitava achava vantajoso o mercado li vre enquanto a indústria do Norte estava firme e militantemente com prometida de longa data com tarifas protecionistas e incapaz de impô las de forma adequada por causa dos estados do Sul que representa vam é preciso lembrar quase metade dos estados em 1850 A indús tria do Norte estava certamente mais preocupada com uma nação do ponto de vista do comércio metade livre e metade protecionista do que metade escrava e metade livre O Sul fez o que pôde para compensar as vantagens do Norte ao cortálo de seu hinterland tentando desta forma estabelecer uma área de tráfego e comunicações voltada para o Sul e baseada no sistema fluvial do Mississipi ao invés de voltada para o A tlântico a leste adiantandoas desta forma na expansão para o Oeste Isso era bastante natural já que seus brancos pobres haviam de longa data explorado e aberto aquela região Mas a grande superioridade econômica do Norte significava que o Sul precisava insistir com rigidez redobrada na sua força política impor suas reivindicações nos termos mais formais por exemplo in sistindo na aceitação oficial da escravidão nos novos territórios do Oeste realçar a autonomia dos estados direitos dos estados contra o governo nacional exercer seu veto na política nacional desencorajar o desenvolvimento econômico do Norte etc De fato o Sul foi um obstáculo ao Norte quando prosseguiu com sua política expansionista em direção ao Oeste Os únicos objetivos dos sulistas eram políticos já que dado que não iria ou não poderia derrotar o Norte no jogo pró prio do desenvolvimento capitalista a corrente da história estava con tra eles Toda melhoria em transporte reforçava as ligações do Oeste com o Atlântico Basicamente o sistema de estradas de ferro corria de 156 Leste a Oeste sem nenhuma linha importante entre o Norte e Sul A lém disso os homens que povoavam o Oeste viessem do Norte ou do Sul não eram proprietários de escravos mas brancos pobres e livres atraídos pelo solo livre ouro e aventura A extensão formal da escra vidão aos novos territórios e estados era portanto crucial para o Sul e os conflitos crescentes entre os dois lados na década de 1850 giravam sobretudo em torno desta questão Ao mesmo tempo a escravidão era irrelevante para o Oeste e de fato a expansão para o Oeste talvez te nha enfraquecido o sistema escravista Não lhes dava maior força do que a que os líderes do Sul esperavam quando planejaram a anexação de Cuba e a criação de um império de plantação no Caribe do Sul Em resumo o Norte estava numa posição de unificar o continente que o Sul não tinha Agressivos em postura o recurso real dos sulistas esta vam em abandonar a luta e separarse da União e isso foi o que fi zeram quando a eleição de Abraham Lincoln de Illinois em 1860 de monstrou que haviam perdido o MeioOeste A Guerra Civil durou cinco anos Em termos de destruição e mortes era de longe a maior guerra em que qualquer país desenvol vido haviase envolvido em nosso período embora relativamente perca um pouco do brilho diante da Guerra do Paraguai na América do Sul e fique muito atrás das Guerras Taiping na China Os estados do Norte embora notavelmente inferiores em performance militar venceram por causa de sua vasta preponderância em homens capaci dade e tecnologia Afinal eles tinham mais de 70 da população total nos Estados Unidos mais de 80 dos homens em idade militar e mais de 90 da produção industrial O triunfo do Norte também era o do capitalismo americano e o dos Estados Unidos moderno Mas embora a escravidão fosse abolida não era o triunfo do Negro fosse escravo ou livre Depois de alguns anos de Reconstrução isto é democratização forçada o Sul retornou ao controle dos brancos con servadores sulistas isto é racistas As tropas de ocupação do Norte foram finalmente retiradas em 1877 Em certo sentido os sulistas ha viam atingido seus objetivos os republicanos do Norte que mantive ram o controle da presidência pela maior parte do tempo de 1860 a 1932 não podiam ganhar no Sul solidamente democrata que desta forma guardou uma autonomia substancial O Sul por outro lado a través de seu voto em bloco podia exercer alguma influência nacio nal já que seu apoio era essencial para o sucesso do outro grande par tido o Democrata De fato o Sul permaneceu agrário pobre atrasado e ressentido os brancos ressentindo a nunca esquecida derrota os ne gros a franqueza e rudeza da subordinação reimposta pelos brancos O capitalismo americano desenvolveuse com impressionante e dramática rapidez depois da Guerra Civil que talvez tenha atrasado temporariamente seu desenvolvimento embora isto também tenha fornecido consideráveis oportunidades para gigantescos homens de negócios corretamente apelidados de robber barons barões medie vais Este avanço extraordinário forma a terceira grande corrente da 157 história dos Estados Unidos em nosso período Diferente da Guerra Civil e do Oeste Selvagem a era dos Robber Barons não se tornou parte da mitologia americana exceto como componente da demono logia dos democratas e populistas mas ainda é hoje parte da realidade americana Os Robber Barons ainda são uma parte identificável no cenário dos negócios Várias tentativas têm sido feitas para defender ou reabilitar os homens que mudaram o vocabulário da língua ingle sa quando a Guerra Civil estourou a palavra millionaire ainda era escrita em caracteres italicizados mas quando o maior robber da pri meira geração Cornelius Vanderbilt morreu em 1877 sua fortuna de 100 milhões de dólares requeriu a cunhagem de um novo termo mul timillionaire Temse argumentado que muitos dos grandes capitalis tas americanos foram na realidade inovadores criativos sem os quais os triunfos da industrialização americana que eram realmente expressivos não teriam sido obtidos tão rapidamente A riqueza des tes não era portanto obtida a partir de banditismo econômico mas graças à generosidade com que a sociedade reconhecia os seus ben feitores Tais argumentos não podem ser aplicados a todos os robber barons pois até a consciência dos apologistas recua diante de escro ques tais como Jim Fisk ou Jay Gould mas seria falta de sensibilidade negar que um número de magnatas deste período realizou contribuições positivas algumas vezes importantes para o desenvolvimento da eco nomia industrial moderna ou o que não é exatamente a mesma coisa para as operações de um sistema de empresas capitalistas Porém tais argumentos estão fora do ponto principal Eles me ramente encontram outra maneira de dizer o óbvio ou melhor dizen do que os Estado Unidos do século XIX eram uma economia capita lista na qual o dinheiro uma boa quantidade de dinheiro iria ser feito entre outras formas pelo desenvolvimento e racionalização dos recursos produtivos de um país vasto e em rápido crescimento inse rido numa economia mundial em acelerada expansão Três coisas dis tinguem a era dos robber barons americanos das outras florescentes economias capitalistas do mesmo período que também produziram suas gerações de milionários às vezes igualmente ávidos A primeira característica distintiva era a total falta de qualquer forma de controle sobre trocas comerciais feitas com rudeza ou es croqueria assim como as possibilidades realmente espetaculares de corrupção em âmbito local e nacional especialmente nos anos pós Guerra Civil Praticamente não existia aquilo que se poderia chamar de governo dentro dos padrões europeus nos Estados Unidos e a margem de ação para os ricos poderosos e inescrupulosos era pratica mente ilimitada De fato a expressão robber barons deveria ter sua ênfase na segunda palavra e não na primeira pois como num reino medieval fraco os homens não olhavam para a lei mas para a sua própria força e quem era mais forte numa sociedade capitalista do que os ricos Os Estados Unidos sozinho entre os estados do mundo burguês era um país de justiça privada e forças armadas privadas 158 Entre 1850 e 1889 esquadrões Vigilante mataram 530 trangresso res da lei ou acusados de tal ou seja 6 em cada 7 de todas as vitimas da história completa deste fenômeno caracteristicamente americano que vai de 1760 a 19098 Dos 326 movimentos Vigilante registrados 230 atuaram neste período Em 1865 e 1866 toda estrada de ferro mina de carvão grande forno ou laminadora na Pensylvania recebeu autorização para empregar quantos homens armados quisesse para a gir conforme julgassem necessário embora em outros estados xerifes e outros funcionários deviam indicar formalmente os membros destas polícias privadas E foi durante este período que a mais notória destas forças particulares de detetives e pistoleiros os Pinkertons ganha ram sua sombria reputação primeiro na luta contra criminosos e de pois contra o trabalhismo A segunda característica específica desta era pioneira do big busi ness americano big money e big power era que a maior parte daqueles que o praticavam diferentes da maioria dos grandes empreendedores do Velho Mundo pareciam estar sempre obcecados pela construção tecnológica em si mesma sem se julgarem aparentemente comprome tidos com nenhuma forma especial de fazer dinheiro Tudo o que que riam era maximizar os lucros mas ocorreu que a maioria deles termi nou por conseguilo através do grande fazedor de dinheiro desta época as estradas de ferro Cornelius Vanderbilt tinha apenas uns poucos 10 ou 20 milhões de dólares antes de entrar no negócio das estradas de fer ro que lhe trouxe uns 8090 milhões de dólares em 16 anos Não é tão surpreendente já que homens da turma da Califórnia Collis P Hun tington 18211900 Leland Stanford 182493 Charles Crocker 182288 e Mark Hopkins 181378 podiam sem modéstia pagar o triplo do custo da construção da Central Pacific Railroad e escroques como Fisk e Gould podiam amealhar milhões com transações fraudu lentas e saques abertos sem colocar um único vagãodormitório sobre trilhos ou preparar a partida de uma única locomotiva Poucos dos milionários da primeira geração fizeram sua carrei ras em um único ramo de atividade Huntington começou vendendo material pesado para mineiros da corrida do ouro em Sacramento Talvez seus fregueses incluíssem o magnata da carne Philip Armour 18321901 que tentou a sorte nas minas antes de entrar no negócio de armazéns em Milwaukee que permitiulhe fazer fortuna no decor rer da Guerra Civil Jim Fisk trabalhou em circo garçom de hotel mascate e vendedor ambulante antes de descobrir as possibilidades de contratos de guerra e depois a bolsa de valores Jay Gould foi por seu turno cartógrafo e mercador de peles antes de descobrir o que se podia fazer com estradas de ferro Andrew Carnegie 18351919 não concentrou suas energias no ferro até completar 40 anos Começou como telegrafista continuou como executivo de estradas de ferro sua renda já feita através de investimentos cujo valor crescia rapida mente entrou em petróleo que iria ser o campo escolhido por John D Rockefeller que começou a vida como atendente e livreiro em O 159 hio enquanto gradualmente seguiu em direção à indústria que iria dominar Todos estes homens eram especuladores e estavam prontos para seguir em direção do dinheiro grosso onde quer que ele se en contrasse Nenhum deles tinha ou poderia ter escrúpulos de forma ex cessiva numa era e numa economia onde fraude suborno calúnia e se necessário revólveres eram aspectos normais da competição To dos eram homens duros e todos olhariam as questões concernentes à honestidade de suas atividades como sendo consideravelmente menos relevantes para seus negócios do que sua esperteza Não era por acaso que o darwinismo social explicava de forma dogmática que aque les que subiam ao topo de tudo eram os melhores porque eram os mais capazes de sobreviver na selva humana teoria que se transfor mou na teologia nacional do final do século XIX nos Estados Unidos A terceira característica dos robber barons será bem óbvia mas tem sido supervalorizada pela mitologia do capitalismo americano uma proporção considerável deles eram selfmade men e não possuíam competidores em riqueza e posição social Claro apesar da proeminên cia de vários selfmade multimilionários apenas 42 dos homens de negócios deste período que entraram no Dictionary of American Biography vinham das classes médias ou baixas Os nascidos entre 1820 e 1849 foram contados Os cálculos são de C Wright Mills Muitos vinham de famílias do comércio ou profissionais liberais Ape nas 8 da elite industrial da década de 1870 eram filhos de pais de classe operária9 Ainda para efeitos de comparação é interessante re cordar que dos 189 milionários ingleses que morreram entre 1858 e 1879 aproximadamente 70 vinham de uma descendência de pelo me nos uma geração e provavelmente várias de riqueza sendo mais de 50 deles proprietários de terras10 Evidentemente a América possuía seus Astors e Vanderbilts herdeiros de dinheiro antigo e o maior de seus financistas J P Morgan 18371913 era um banqueiro de se gunda geração cuja família tornouse rica na qualidade de uma das maiores intermediárias em trazer capital inglês para os Estados Unidos Mas o que atraía a atenção eram fato aliás bem compreensível as car reiras dos jovens que simplesmente viam a oportunidade apanhavam na e enfrentavam todos os desafios homens que estavam imbuídos a cima de tudo pelo imperativo capitalista da acumulação As oportunida des eram realmente colossais para homens preparados para seguir a ló gica da obtenção do lucro em lugar da lógica de viver e que possuíam competência suficiente energia rudeza e ambição As distrações eram mínimas Não havia uma velha nobreza para seduzir os homens com tí tulos e nem o exemplo tentador da vida descontraída de uma aristo cracia agrária A política era antes algo para se comprar do que para se praticar exceto evidentemente como outro meio de fazer dinheiro Em certo sentido portanto os robber barons sentiamse repre sentantes da América como nenhum outro grupo ou pessoa E não es tavam enganados Os nomes dos maiores milionários Morgan Roc kefeller entraram no domínio do mito e esta era a razão por que ao 160 lado de mitos de origem bem diferente pistoleiros e xerifes do Oeste eles eram provavelmente os únicos nomes de indivíduos americanos deste período com a exceção de Abraham Lincoln bem conhecidos no exterior exceto entre aqueles que diziam ter um especial interesse na história dos Estados Unidos E os grandes capitalistas impuseram seu selo ao país Antigamente escreveu o National Labor Tribune em 1874 os homens na América podiam ser seus próprios dirigen tes Ninguém podia ou devia tornarse dominador Mas agora estes sonhos não se realizam A classe operária deste país repentinamen te descobriu que o capital é tão rígido como uma monarquia absolu ta II De todos os países nãoeuropeus apenas um foi bemsucedido em encontrar e derrotar o Ocidente no terreno inimigo Este país foi o Japão para uma certa surpresa dos Observadores da época Para eles era talvez o menos conhecido de todos os países desenvolvidos já que havia sido virtualmente fechado ao contato direto com o Oeste no século XVII mantendo apenas um único ponto de mútua observação por onde os holandeses tinham recebido permissão para manter um comércio em escala restrita Em meados do século XIX o país não parecia ao Oeste diferente de qualquer outro paísoriental ou em ou tras palavras estava igualmente destinado ao atraso econômico e à in ferioridade militar para tornarse vítima do capitalismo Commodore Perry dos Estados Unidos cujas ambições no Pacífico iam bem mais longe dos interesses de seus barcos caçadores de baleias que haviam sido recentemente 1851 objeto de uma grande obra de criação ar tística da América do século XIX Moby Dick de Herman Melville forçou os japoneses à abertura de certos portos em 185354 com o método usual de ameaças navais Os ingleses e mais tarde as forças unidas ocidentais em 1862 bombardearam o Japão com frivolidade e a impunidade habituais a cidade de Kagoshima foi atacada como uma simples retaliação pelo assassinato de um único inglês Não pa recia de forma alguma que em apenas meio século o Japão seria uma potência mundial capaz de derrotar uma potência européia numa guer ra de maiores proporções usando apenas uma das mãos e que em três quartos de século estaria perto de rivalizar com a marinha inglesa me nos ainda que na década de 1970 alguns observadores esperassem o Japão ultrapassar a economia dos Estados Unidos em alguns anos Historiadores talvez tenham se surpreendido menos diante das realizações japonesas do que deveriam Eles apontaram para o fato de que de muitos ângulos o Japão embora inteiramente diferente na sua tradição cultural era surpreendentemente análogo ao Oeste na estru tura social O país possuía algo muito próximo a uma ordem feudal da 161 Europa medieval uma nobreza agrária hereditária camponeses semi servis e um corpo de mercadoresempreendedores e financistas cerca dos por um corpo incomumente ativo de artífices todos assentados numa crescente urbanização Diferente de Europa as cidades não e ram independentes nem os mercadores livre mas a crescente concen tração da nobreza os samurais nas cidades faziaos depender de forma crescente do setor nãoagrário da população e o desenvolvi mento sistemático de uma economia nacional fechada fora do mer cado externo criou um corpo de empreendedores essencial para a formação de um mercado nacional intimamente ligado ao governo Os Mitsui por exemplo ainda hoje uma das maiores forças no capi talismo japonês começaram como produtores de sakê aguardente de arroz no início do século XVII tornaramse financistas e em 1673 estabeleceramse em Edo Tóquio como lojistas fundando filiais em Kioto e Osaka Por volta de 1680 eles estavam ativamente jogados naquilo que a Europa teria chamado de mercado de ações tornando se logo depois agentes financeiros da família imperial e do Shogunate os dirigentes de facto do país assim como do diversos clãs feudais mais importantes Os Sumitomo também ainda hoje proeminentes começaram no comércio de drogas e equipamentos pesado em Kioto e logo transformaramse em grandes mercadores no comércio do co bre No final do século XVIII agiam como administradores regionais do monopólio do cobre e exploravam minas Não é impossível que o Japão deixado a si mesmo tivesse evo luído por si só na direção da economia capitalista embora a questão não possa ser jamais resolvida O que é fora de qualquer dúvida é que o Japão estava mais disposto a imitar o Oeste que muitos outros paí ses nãoeuropeus e mais capaz também de fazêlo A China era ple namente capaz de derrotar os ocidentais no próprio terreno deles pelo menos na medida em que possuía o conhecimento técnico sofistica ção intelectual educação experiência administrativa e a capacidade para o comércio requerida para a tarefa Mas a China era demasiada mente gigantesca demasiado autosuficiente demasiado acostumada a se considerar o centro da civilização para que a incursão de uma le va de perigosos e narigudos bárbaros por mais avançados tecnica mente que fossem viesse a sugerir imediatamente a liquidação e o abandono de seus antigos meios A China não queria imitar o Oeste Os homens cultos do México queriam imitar o capitalismo liberal como exemplificado pelos Estados Unidos mesmo que fosse apenas para obter um meio de resistência ao vizinho do Norte Mas o peso de uma tradição com a qual eles eram demasiadamente fracos para rom per ou destruir tornava impossível tal propósito Igreja e campesinato índio ou hispanizado num modelo medieval tudo isso era muito para eles e eles eram muito poucos A vontade era maior que a capacida de Mas o Japão possuía ambas A elite japonesa sabia que seu país era um entre muitos que confrontavam os perigos da conquista ou su jeição que já havia aliás sofrido no curso de sua longa história Era 162 mais para usar a fraseolagia européia da época uma nação poten cial do que um império ecumênico Ao mesmo tempo possuía a ca pacidade técnica e outras além do pessoal necessário para uma eco nomia do século XIX E o que talvez fosse mais importante a elite japonesa possuía um aparato de estado e uma estrutura social capazes de controlar o movimento de uma sociedade inteira Transformar o país do alto sem arriscar resistência passiva desintegração ou revolu ção é extremamente difícil Os dirigentes japoneses estavam na posição histórica excepcional de serem capazes de mobilizar o mecanismo tra dicional da obediência social para os propósitos de uma repentina radi cal mas controlada ocidentalização sem maior resistência que a de uma dissidência samurai espalhada e uma rebelião camponesa O problema de enfrentar o Oeste havia preocupado os japoneses por algumas décadas e a vitória inglesa sobre a China na primeira Guerra do Ópio 183942 demonstrou a capacidade e a possibilidade dos métodos do Ocidente Se a própria China não podia resistirlhes não estariam os ocidentais predestinados a vencer em todas as partes A descoberta do ouro na Califórnia aquele evento crucial na história do mundo em nosso período trouxe os Estados Unidos de forma de finitiva ao Pacífico colocando o Japão diretamente no centro das in vestidas ocidentais com vistas a abrir seus mercados da mesma forma que as Guerras do Ópio haviam aberto os da China A resis tência direta era inócua como o demonstraram as fracas tentativas de organizála Meras concessões e evasões diplomáticas não eram senão expedientes temporários A necessidade de reforma tanto pela ado ção das técnicas relevantes do Oeste e como através de restauração ou criação da vontade de afirmação nacional era vigorosamente de batida pelos funcionários superiores e os intelectuais Mas o que veio a ser a Restauração Meiji de 1868 isto é uma drástica revolução do alto foi o evidente fracasso do sistema militar feudalburocrático dos Shoguns em resolver a crise Em 185354 os dirigentes do país estavam divididos e em dúvida diante do que fazer Pela primeira vez o governo formalmente pediu a opinião e o conselho dos daimyo ou lordes feudais a maioria dos quais foi a favor de resistência ou con temporização Desta forma demonstravam sua inabilidade em agir de forma efetiva e suas contramedidas militares foram ineficientes e custaram o bastante para drenar as finanças e confundir o sistema administrativo do país Enquanto a burocracia revelava sua in competência e as frações dos nobres desentendiamse dentro do Sho gunate a segunda derrota da China em mais uma Guerra do Ópio 185758 sublinhou a fraqueza do Japão diante do oeste Mas as no vas concessões aos estrangeiros e a crescente desintegração da estru tura política doméstica produziu uma contrareação entre jovens inte lectuais samurais que em 186063 iniciaram contra estrangeiros e lí deres impopulares uma destas levas de terror e assassinatos que pon tuam a história japonesa Desde a década de 1840 ativistas patrióti cos tinham iniciado estudos militares e ideológicos nas províncias e 163 em algumas escolas de esgrima em Edo Tóquio onde passaram a ficar sob a influência de alguns filósofos voltando depois para suas províncias feudais han com os dois slogans Expulsar os bárbaros e venerar o Imperador Ambos os slogans eram lógicos o Japão precisava evitar cair vítima dos estrangeiros e dado o fracasso do Shogunate era natural que a atenção conservadora se voltasse para a alternativa política tradicional sobrevivente o teoricamente todo poderoso mas praticamente impotente Trono Imperial A reforma conservadora ou revolução do alto teria praticamente que tomar a forma de uma restauração do poder imperial contra Shogunate A rea ção estrangeira ao terrorismo dos extremistas como por exemplo o bombardeamento de Kagoshima pelos ingleses apenas intensificou a crise doméstica e minou o já desgastado regime Em janeiro de 1868 após a morte do velho imperador e a indicação do novo Shogun a restauração imperial foi finalmente proclamada com a força de al gumas poderosas prefeituras dissidentes e estabelecida após uma cur ta guerra civil A Restauração Meiji havia sido realizada Se isto tivesse sido apenas uma reação conservadora xenófoba teria sido comparativamente insignificante As grandes forças feudais do oeste japonês especialmente Satsuma e Choshu cujas forças der rubaram o velho sistema tradicionalmente hostilizavam a Casa de Tokugawa que monopolizava o Shogunate Nem o seu poderio nem o tradicionalismo militante dos jovens extremistas eram um programa em si e os homens que então passaram a ter a sorte do Japão nas mãos predominantemente jovens samurais em média 30 anos em 1868 não representavam as forças sociais da revolução social embo ra tivessem claramente chegado ao poder numa época em que as ten sões econômicas e sociais eram especialmente agudas e refletiam tan to em um número de levantes camponeses localizados e não muito marcadamente políticos como também a ascensão de ativistas cam poneses e de classe média Mas entre 1853 e 1868 o núcleo principal dos jovens samurais ativistas sobreviventes muitos dos mais xenófo bos morreram em ações terroristas tinha reconhecido que seu objeti vo salvar o país pedia uma ocidentalização sistemática Muitos deles em 1868 tinham contactado os estrangeiros muitos haviam viajado ao exterior Todos reconheciam que preservar implicava transformar O paralelismo entre o Japão e a Prússia tem sido freqüentemente levantado Em ambos os países o capitalismo tinha sido formalmente instituído não por revolução burguesa mas por revolução de cima efetuada por uma velha ordem aristocráticoburocrática que reconhe cia que sua sobrevivência não podia ser assegurada de outra forma Em ambos os países os regimes econômicos e políticos subseqüentes guardaram importantes características da velha ordem uma disciplina obediente e ética além do respeito que estava presente nas classes médias e mesmo no novo proletariado eventualmente ajudando o ca pitalismo a resolver os problemas da disciplina do trabalho uma forte dependência da economia de iniciativa privada em relação à ajuda e 164 supervisão do estado burocrático e um não menos persistente milita rismo que iriase tomar mais tarde um formidável poder na guerra encarnando um passional e mesmo patológico extremismo da direita política Mas há diferenças Na Alemanha a burguesia liberal era for te consciente de si mesmo como classe e uma força política indepen dente Como as revoluções de 1848 tinham demonstrado a revolu ção burguesa era uma genuína possibilidade O caminho prussiano para o capitalismo passava através de uma burguesia relutante em fa zer uma revolução burguesa e um estado Junker preparado para dar lhe muito do que ela queria sem uma revolução pelo preço da preser vação do controle político nas mãos da aristocracia agrária e da mo narquia burocrática Os Junkers não iniciaram esta mudança Eles me ramente graças a Bismarck se asseguraram de que não seriam engo lidos no processo No Japão por outro lado a iniciativa a direção e o pessoal da revolução de cima veio dos próprios setores feudais A burguesia japonesa ou seu equivalente teve uma participação apenas na medida em que a existência de uma camada de homens de negó cios e empreendedores tornava praticável a instalação de uma econo mia capitalista nos termos ocidentais A Restauração Meiji não pode ser vista em nenhum sentido real como uma revolução burguesa mesmo que abortada embora possa ser vista como equivalente fun cional de parte de uma tal revolução Isso faz com que o radicalismo das mudanças introduzidas apa reça de forma ainda mais impressionante As velhas províncias feu dais foram abolidas e substituídas por uma administração centralizada estatal que então adquiriu uma nova moeda decimal e definiu uma política financeira através da inflação de empréstimos públicos base ados num sistema bancário inspirado pelo American Federal Reserve e em 1873 de uma taxação adequada da terra Devese lembrar que em 1868 o governo central não possuía nenhuma renda independente baseandose temporariamente na ajuda das províncias feudais que i riam logo ser abolidas em empréstimos forçados e na dependência dos Tokugawa exShoguns Esta reforma financeira implicava uma reforma social radical o Regulamento da Propriedade da Terra 1873 que estabelecia compromisso individual e não comunal em relação às taxas definindo portanto direitos de propriedade individu ais com o conseqüente direito de venda Os antigos direitos feudais já em declínio no que dizia respeito à terra cultivada caíram mais a inda de importância Enquanto a alta nobreza e uns poucos samurais eminentes guardavam alguma terra em montanhas e florestas o go verno tomou posse sobre a propriedade comunal os camponeses tor naramse inquilinos de ricos proprietários de terras e os nobres e os samurais perderam sua base econômica Em troca receberam com pensação e ajuda governamental mas mesmo antes que estas provas sem ser inadequadas para muitos deles a mudança de situação tinha sido demasiado profunda Iria ainda se tornar mais drástica pela Lei do Serviço Militar de 1873 que como no modelo prussiano introdu 165 ziu o serviço militar obrigatório Sua conseqüência maior foi de fundo igualitário na medida em que abolia os últimos vestígios de separa ção e distinção de status dos samurais como classe Entretanto a re sistência tanto dos camponeses como dos samurais diante das novas medidas houve uma média de talvez 30 levantes camponeses por ano entre 1869 e 1874 e uma importante rebelião samurai em 1877 foi aniquilada sem maiores dificuldades Não era o objetivo do novo regime abolir a aristocracia e distin ções de classe embora estas últimas fossem simplificadas e moderni zadas Uma nova aristocracia tinha mesmo sido estabelecida Ao mesmo tempo a ocidentalização implicava a abolição das antigas po sições uma sociedade na qual a riqueza a cultura e a influência polí tica determinavam mais do que o nascimento trazendo portanto ge nuínas tendências igualitárias desfavoráveis para o samurai mais po bre que recusava o trabalho comum favoráveis para o povo simples que passava a ser a partir de 1870 autorizado a usar nomes de famí lia e a escolher livremente tanto a profissão como o lugar de residên cia Para os dirigentes japoneses diferentemente da sociedade ociden tal burguesa tais questões constituíam não um programa em si mas instrumentos para atingir o programa de renascimento nacional Eles eram necessários e portanto precisavam ser criados E eram também aceitáveis para os homens da velha sociedade em parte por causa da enorme carga de ideologia tradicional em servir ao estado que traziam ou mais concretamente a necessidade de reformar o estado Eles não eram bemvindos aos camponeses tradicionalistas e samurais es pecialmente aqueles para os quais o novo Japão na realidade não iria melhorar o futuro Entretanto o radicalismo das mudanças introduzi das no espaço de alguns anos por homens formados na velha socieda de e pertencentes à orgulhosa classe da aristocracia militar ainda é um fenômeno único e extraordinário A força motriz era a ocidentalização O Oeste possuía claramen te o segredo do sucesso e portanto a todo custo precisava ser imita do A perspectiva de tomar de roldão todos os valores e instituições de uma outra sociedade era talvez menos impensável para os japone ses do que para muitas outras civilizações pois eles já haviamno ex perimentado uma vez com a China mas mesmo assim ainda era uma idéia assustadora traumática e problemática Pois ela não podia ser realizada com empréstimos provisórios seletivos ou controlados especialmente tratandose de uma sociedade tão diferente da japonesa como a ocidental Daí a exagerada paixão com a qual muitos dos par tidários da ocidentalização se atiraram à tarefa Para alguns parecia implicar no abandono de tudo aquilo que fosse japonês já que todo o passado era necessariamente atrasado e bárbaro a simplificação ou talvez mesmo o abandono da língua japonesa a renovação da origem genética inferior japonesa pela miscigenação com a origem genética ocidental superior uma sugestão baseada na recémdigerida teoria do racismo socialdarwinista que tinha aliás apoio nas altas esferas 166 do país l2 Surgiam costumes e cortes de cabelo ocidentais hábitos a limentares os japoneses não comiam carne eram adotados com o mesmo zelo que a tecnologia estilo arquitetônico e idéias ocidentais 13 A ocidentalização não iria implicar até na adoção de ideologias que eram fundamentais ao progresso ocidental incluindo mesmo o cristia nismo Não implicaria também no abandono de todas as antigas insti tuições incluindo o imperador Por outro lado a ocidentalização iria colocar um dilema ainda maior já que o Ocidente não era um único sistema coerente mas um complexo de idéias e instituições rivais Quais delas iriam os japone ses escolher Em termos práticos a escolha não era difícil O modelo inglês servia naturalmente como um guia para estradas de ferro telé grafo obras públicas indústria têxtil e muito dos métodos de comér cio O modelo francês inspirava a reforma legal e inicialmente a re forma militar até que o modelo prussiano veio a prevalecer a Mari nha evidentemente seguiu o exemplo inglês As universidades devi am muito ao exemplo alemão e americano e a educação primária a inovação na agricultura e os serviços postais aos Estados Unidos Por volta de 187576 cerca de 500 a 600 especialistas estrangeiros e mais tarde em 1890 3 mil aproximadamente estavam empregados sob supervisão japonesa Mas politicamente e ideologicamente a es colha era mais difícil Como iria o Japão escolher entre os sistemas rivais dos estados burguesesliberais França e Inglaterra e a mo narquia prussianogermânica mais autoritária Acima de tudo como iria escolher entre o Ocidente Intelectual representado pelos missio nários que tinham um grande e surpreendente apelo entre os desori entados samurais prontos para transferir sua lealdade tradicional de um senhor de Terra para um senhor nos Céus e o Ocidente represen tado pela ciência agnóstica Herbert Spencer e Charles Darwin Ou entre as escolas religiosas e laicas No espaço de duas décadas apareceu uma reação contra os ex tremos da ocidentalização parcialmente com a ajuda da tradição crí tica ocidental do liberalismo como a alemã que ajudou a inspirar a constituição de 1889 em grande parte uma reação neotradicionalista que iria virtualmente inventar uma nova religião do estado centrada no culto ao imperador o culto Shinto Foi esta combinação de neo tradicionalismo e modernização seletiva como exemplificada pelo é dito imperial educacional de 1890 que prevaleceu Mas as tensões entre aqueles para os quais a ocidentalização implicava revolução fundamental e os outros para quem significava apenas um Japão forte permaneceram sem solução A revolução não iria ocorrer mas a transformação do Japão num formidável poder moderno tornouse re alidade Economicamente as realizações do Japão permaneceram mo destas na década de 1870 baseadas quase que inteiramente numa e conomia de mercantilismo de estado que contrastava de forma estra nha com a ideologia oficial de liberalismo econômico As atividades 167 militares do novo exército eram ainda dirigidas inteiramente contra os recalcitrantes inimigos do velho Japão e em 1873 planejouse uma guerra contra a Coréia evitada apenas porque os membros mais sen síveis do Meiji acreditavam que a transformação interna deveria pre ceder a aventura externa Portanto o Oeste continuava a subestimar a significação da transformação do Japão Observadores ocidentais não conseguiam entender este estranho país Alguns quase nada viam nele além de um esteticismo exótico e cativante e mulheres elegantes e subservientes que confirmavam tão diretamente a superioridade masculina e assim pensavase ociden tal a terra de Pinkerton e Madame Butterfly Outros estavam tão convencidos da inferioridade nãoocidental que simplesmente não vi am nada relevante Os japoneses são uma raça alegre e ficam con tentes com pouco não parecendo capazes de realizar muito escreveu o Japan Herald em 188114 Até o final da Segunda Guerra Mundial a crença que do ponto de vista tecnológico os japoneses só podiam produzir imitações baratas dos produtos ocidentais fazia parte da mi tologia ocidental Porém já havia alguns observadores mais capazes muitos deles americanos que observavam a impressionante eficiên cia da agricultura japonesa as técnicas dos artesãos a potencialidade dos soldados Já em 1878 um general americano previu que graças a eles o país estava destinado a assumir uma parte importante da histó ria mundial 15 Logo que os japoneses provaram que podiam vencer guerras as idéias dos ocidentais sobre eles tornaramse bem menos satisfatórias Mas no final de nosso período eles ainda eram vistos como a prova viva de que a civilização ocidental burguesa estava tri unfante e era superior a todas as outras e nesta época mesmo os ja poneses bem instruídos não teriam discordado Addictive coculture of human keratinocytes and human dermal fibroblasts 169 Nono Capítulo A SOCIEDADE EM PROCESSO DE MUDANÇA De acordo com os comunistas De cada um de acordo com suas capa cidades para cada um de acordo com suas necessidades Em outras palavras ninguém deve lucrar por sua própria força capacidade ou indústria mas devese submeter às vontades dos fracos estúpidos e vadios Sir Thomas Erskine May 1877 O governo está passando das mãos daqueles que possuem alguma coi sa para as mãos daqueles que não possuem nada das mãos daqueles com um interesse material na preservação da sociedade para aqueles que não se preocupam de nenhuma maneira com a ordem estabilidade e conservação Talvez na grande lei da mudança na Terra para nos sas sociedades modernas os trabalhadores são o que os bárbaros fo ram para as sociedades da antigüidade os agentes convulsivos da dis solução e destruição Os Gongourts durante a Comuna de Paris Assim como o capitalismo e a sociedade burguesa triunfaram os projetos que lhes eram alternativos recuaram apesar do apareci mento da política popular e dos movimentos trabalhistas Estes proje tos não poderiam parecer menos promissores do que em 187273 Po rém em poucos anos apenas o futuro daquela sociedade que havia triunfado tão espetacularmente mais uma vez parecia incerto e obscu ro e movimentos destinados a substituíla ou derrubála novamente precisavam ser levados a sério Precisamos portanto considerar ago ra estes movimentos de mudança social e política radicais na forma em que eles existiram no terço final do século XIX Isto não é apenas escrever história com a capacidade de saber previamente o que vai ocorrer mais tarde embora não haja uma boa razão por que o histori ador deva despojarse de sua capacidade mais importante em troca da qual qualquer inventor daria seus olhos e dentes ou seja o conheci mento do que de fato acontecerá depois E também escrever história 170 como os da época a viam Os ricos e poderosos raramente são tão confiantes em si mesmos que não temam um fim da sua dominação E o que é mais importante a lembrança da revolução ainda estava perto e era forte Qualquer pessoa de 40 anos em 1868 tinha vivido a maior das revoluções européias ainda adolescente Qualquer pessoa com 50 anos havia vivido as revoluções de 1830 como criança e as de 1848 como adulto Italianos espanhóis poloneses e outros haviam vivido insurreições revoluções ou eventos com um forte componente insur reicional como o movimento de liberação de Garibaldi no Sul da Itá lia no decorrer dos últimos 15 anos Não devemos ficar surpresos de que o medo ou a esperança da revolução fossem fortes e vivos Agora sabemos que não iriam ser de maior conseqüência nos anos após 1848 De fato escrever sobre a revolução social nestas dé cadas é semelhante a escrever sobre serpentes na Inglaterra elas exis tem mas não como uma parcela significativa da fauna A revolução européia tão próxima talvez tão real no grande ano de esperança e desapontamento desapareceu de vista Marx e Engels tinham co mo sabemos depositado esperanças no seu reaparecimento nos anos imediatamente subseqüentes Eles olharam seriamente para uma nova explosão geral em seqüência à e conseqüência da grande depressão global econômica de 1857 Quando isto não aconteceu eles não a es peraram mais num futuro previsível e certamente não mais na forma de um outro 1848 É naturalmente bastante errôneo supor que Marx transformarase numa espécie de socialdemocrata gradualista no sentido moderno do termo ou mesmo que esperasse que a transição para o socialismo quando viesse a ocorrer se desse pacificamente Mesmo nos países onde os trabalhadores pudessem se tornar capazes de tomar o poder pacificamente através da vitória eleitoral ele men cionou os Estados Unidos Inglaterra e talvez a Holanda esta tomada do poder e a subseqüente destruição da velha política e das institui ções que ele via como essencial iria provavelmente pensava levar a uma violenta resistência por parte dos antigos dirigentes E nisso ele era sem dúvida bastante realista Governos e classes dirigentes pode riam estar prontos a aceitar um governo trabalhista que não ameaças se sua dominação mas não havia razão para supor especialmente de pois da sanguinária supressão da Comuna de Paris que eles estives sem preparados a aceitar um que o fizesse Entretanto as perspectivas de revolução e não apenas a socia listas nos países desenvolvidos da Europa não eram mais um assunto da prática política e como já vimos Marx descartavaas mesmo na França O futuro imediato dos países capitalistas europeus residia na organização de partidos da classe operária independentes e de massa cujas demandas políticas a curto prazo não eram revolucionárias Quando Marx ditou o programa dos socialdemocratas alemães Go tha 1875 para um entrevistador americano ele deixou de lado a úni ca cláusula que entrevia um futuro socialista o estabelecimento de cooperativas de produção socialistasob o controle democrático da 171 classe operária como uma mera concessão tática aos lassalleanos O socialismo ele observou será o resultado do movimento Mas isto será uma questão de tempo educação e do desenvolvimento de novas formas de sociedade3 Este futuro remoto e imprevisível poderia ser significativamente adiantado mais pelo desenvolvimento nas margens do que no centro da sociedade burguesa A partir do final da década de 1860 Marx co meçou seriamente a conceber a estratégia de uma perspectiva indireta para a derrubada da sociedade burguesa por três vias duas das quais se tornariam proféticas e uma errada revolução colonial Rússia e os Estados Unidos A primeira destas tornouse parte de seus cálculos a través do surgimento do movimento revolucionário irlandês ver capí tulo 5 mais acima A Inglaterra era então decisiva para o futuro da revolução proletária porque era a metrópole do capital o dirigente do mercado mundial e ao mesmo tempo o único país onde as condi ções materiais de tal revolução tinhamse desenvolvido até um certo grau de maturidade Portanto o objetivo principal da Internacional precisava ser o de acelerar a revolução inglesa e a única forma de fa zêlo era conseguir a independência irlandesa A revolução irlandesa ou de forma mais geral a revolução dos povos oprimidos era vista não apenas por si mesma mas como um possível impulsionador da revolução nos países burgueses centrais coma o calcanhar de Aquiles do capitalismo metropolitano O papel reservado à Rússia era talvez mais ambicioso A partir da década de 1860 como veremos uma revolução russa não era ape nas uma possibilidade mas uma probabilidade talvez mesmo uma certeza Mas enquanto em 1848 tal contingência seria bem recebida apenas na medida em que removeria uma grande pedra do caminho da vitória de uma revolução ocidental agora tornavase significativa por si mesma Uma revolução russa poderia de fato dar o sinal para uma revolução proletária no Ocidente de tal forma que ambas se complementariam como Marx e Engels colocaram no prefácio de uma nova edição russa do Manifesto Comunista5 Mais ainda pode ria concebivelmente embora Marx nunca se tenha claramente com prometido com esta hipótese levar a uma transição direta da Rússia de um comunalismo de aldeias a um desenvolvimento comunista passando por cima do desenvolvimento de um capitalismo maduro Como Marx previu de forma correta uma Rússia revolucionária mu daria as perspectivas de revolução em todos os lugares O papel reservado aos Estados Unidos era menos central Seu maior efeito era negativo alquebrar por força de seu desenvolvimen to maciço o monopólio industrial da Europa Ocidental e em particu lar da Inglaterra e abalar por força também de sua exportação agrí cola as bases da grande e pequena propriedade agrária na Europa Es ta era sem dúvida uma afirmação correta Mas iria contribuir positi vamente para o triunfo da revolução Na década de 1870 Márx e En gels esperavam realisticamente uma crise no sistema político dos Es 172 tados Unidos já que a crise agrária iria enfraquecer os fazendeiros a base de toda a Constituição e o crescente domínio da política por parte dos especuladores e grandes empresários iria provocar um sen timento de repulsa entre os cidadãos Também sublinhavam as ten dências para a formação de um movimento proletário de massa Tal vez não esperassem muito destas tendências embora Marx expressas se algum otimismo nos Estados Unidos o povo é mais resoluto que na Europatudo amadurece mais rapidamente6 Portanto estavam enganados ao considerar os Estados Unidos e a Rússia como os dois grandes países que haviam sido omitidos do Manifesto Comunista o desenvolvimento futuro de ambos iria ser bem diferente As idéias de Marx carregam o peso de seus triunfos póstumos No seu tempo elas não representavam uma força política séria embo ra por volta de 1875 dois sintomas de sua subseqüente influência já fossem visíveis um poderoso Partido Social Democrata Alemão e uma penetração dramática de suas idéias inesperado para ele mas não retrospectivamente na intelligentzia russa ver mais adiante nes te mesmo capítulo No final da década de 1860 e começos da de 1870 o doutor vermelho era algumas vezes acusado de ser respon sável pelas atividades da Internacional ver capítulo 6 da qual ele era sem dúvida a figura mais formidável e a eminência parda Entre tanto como já vimos a Internacional não era de forma alguma um movimento marxista ou mesmo um movimento que contivesse mais do que um punhado de seguidores de Marx a maioria deles alemães emigres de sua própria geração Consistia de uma série de grupos es querdistas unidos basicamente e talvez exclusivamente pelo fato de que todos pretendiam organizar os trabalhadores e com substancial sucesso embora nem sempre Suas idéias representavam os remanes centes de 1848 ou mesmo de 1789 transformadas entre 1830 e 1848 algumas antecipações do reformismo trabalhista e uma subvariedade peculiar de sonho revolucionário o anarquismo Em certo sentido todas as teorias de revolução eram naquele tempo e tinham de ser tentativas de se chegar a um bom termo com a experiência de 1848 Isso se aplica tanto a Marx como a Bakunin à Comuna de Paris e aos populistas russos que discutiremos mais adi ante Alguém poderia dizer que todos vinham do fermento dos anos 183048 não tivesse uma das cores pré48 desaparecido para sempre do espectro da esquerda o socialismo utópico As correntes utópicas maiores haviam cessado de existir enquanto tais O saintsimonismo tinha cortado suas ligações com a esquerda Haviase transformado no Positivismo de Augusto Comte 17981857 e numa juvenil ex periência levada a termo por um grupo de capitalistas aventureiros na maioria franceses Os seguidores de Robert Owen 17711858 ti nham voltado suas energias intelectuais para o espiritualismo e o lai cismo e suas energias práticas para o modesto campo das lojas coo perativas Fourier Cabet e outros inspiradores das comunidades co munistas sobretudo na terra da liberdade e das oportunidades extra 173 ordinárias foram esquecidos O slogan de Horace Greeley 181172 Vá para o Oeste jovem provou ser mais bemsucedido que os de Fourier O socialismo utópico não sobreviveu a 1848 Por outro lado o produto da Grande Revolução Francesa sobre viveu Este produto ia dos republicanos radicais democratas às vezes enfatizando a libertação nacional outras o interesse em problemas so ciais aos jacobinos comunistas com o selo de L A Blanqui que apa recia breve e intermitentemente da prisão quando uma revolução na França o libertava provisoriamente Esta esquerda tradicional não ha via aprendido nada Alguns de seus extremistas na Comuna de Paris não podiam pensar em nada de melhor do que reproduzir exatamente os acontecimentos da Grande Revolução O blanquismo organizado de forma determinada e conspiratória sobreviveu na França e teve um papel crucial na Comuna mas seria seu canto do cisne Nunca mais iria ter um papel de importância significativa e perderseia nas tendências contraditórias do novo movimento socialista francês O radicalismo democrático era mais resistente porque seu pro grama apresentava tanto uma expressão genuína das aspirações do homem comum lojistas professores camponeses um componen te essencial das aspirações dos trabalhadores como um slogan conve niente para os políticos liberais que pediam seus votos Liberdade i gualdade e fraternidade podem não ser slogans muito precisos mas as pessoas pobres e modestas confrontadas com os ricos e poderosos sa biam seu significado Quando o programa oficial do radicalismo de mocrático foi realizado numa república com base no sufrágio univer sal igual e incondicional como nos Estados Unidos a necessidade do povo em exercer poder real contra os ricos e corruptos manteve a paixão democrática bem viva Mas é claro o radicalismo democráti co era uma realidade em poucos lugares mesmo no campo modesto do governo local E ainda neste período a democracia radical não era mais um s logan revolucionário em si mas um meio não automático para atin gir um fim A república revolucionária era a república social a de mocracia revolucionária a democracia social título adotado de forma crescente pelos partidos marxistas Isto não era tão óbvio entre os nacionalistas revolucionários como os mazzinistas na Itália já que o vencedor da independência e da unificação numa base de republi canismo democrático iria eles acreditavam resolver de alguma for ma todos os outros problemas O nacionalismo real era automatica mente democrático e social e se não o fosse não era real Mas mes mo os mazzinistas não negavam a libertação social e Garibaldi decla ravase mesmo um socialista qualquer que fosse o seu entendimento do termo Depois dos desapontamentos da unificação ou republica nismo os dirigentes do novo movimento socialista iriam surgir dentre os antigos republicanos radicais O anarquismo embora podendo ter sua origem traçada no fer mento revolucionário da década de 1840 é muito mais claramente um 174 produto do período posterior a 1848 ou mais precisamente da década de 1860 Seus dois fundadores políticos eram P J Proudhon um francês pintor autodidata além de volumoso escritor que praticamen te não tomou parte em nenhuma agitação política e Miguel Bakunin um peripatético aristocrata russo que se jogava na agitação em todas as oportunidades que aparecessem Um pedigree intelectual para o anarquismo poderia ser realmente desenhado mas tem pouco a ver com o desenvolvimento do atual movimento anarquista Ambos des de cedo atraíram a desfavorável atenção de Marx e embora admi randoo despertaram sua hostilidade A teoria assistemática precon ceituosa e profundamente nãoliberal de Proudhon ele era antifemi nista e antisemita tendo seguidores na extrema direita não tem grande interesse em si mesma mas contribuiu com dois temas do pensamento anarquista uma crença em pequenos grupos de ajuda mú tua formados de produtores ao invés de fábricas desumanizadas e um ódio a governos em si mesmos a qualquer governo Este era um apelo profundo a pequenos artesãos independentes trabalhadores especiali zados autônomos que resistiam à proletarização homens que não havi am esquecido uma infância camponesa ou provinciana nas regiões às margens do industrialismo desenvolvido Era a estes homens e em tais regiões que o anarquismo tinha força de apelo mais forte entre os relo joeiros suíços da Federação de Jura iriase encontrar as origens dos mais devotados anarquistas da Primeira Internacional Bakunin acrescentou pouco a Proudhon como pensador exceto uma indiscutível paixão pela revolução imediata a paixão da des truição dizia é simultaneamente uma paixão criadora um peri goso entusiasmo pelo potencial revolucionário de criminosos e margi nais da sociedade aliado a algumas poderosas intuições Ele não era um grande pensador mas um profeta agitador e apesar do descrédi to por parte dos anarquistas em relação à organização e disciplina onde viam a ensombrecedora presença e tirania do estado um orga nizador conspiratório formidável Nesta qualidade ele espalhou o a narquismo pela Itália Suíça e através de discípulos Espanha orga nizando também o que viria a ser a divisão da Internacional em 1870 72 E nesta qualidade ele virtualmente criou um movimento anarquis ta para os proudonistas franceses na forma de um corpo teórico onde se encontrava uma modalidade bem pouco desenvolvida de sindica lismo ajuda mútua e cooperativismo sendo que politicamente não muito revolucionário Não que o anarquismo fosse uma força maior pelo final de nosso período Mas havia estabelecido alguma base na França e Suíça francesa alguns núcleos de influência na Itália e aci ma de tudo havia feito grandes progressos na Espanha onde os arte sãos e trabalhadores da Catalunha e os trabalhadores rurais de Anda luzia receberam com prazer o novo Testamento Ali floresceu com a crença nativa de que pequenas cidades e oficinas poderiam conduzir se perfeitamente se a superestrutura do estado e os ricos fossem sim 175 plesmente removidos e que o ideal de um país constituído de cidades autônomas era facilmente realizável De fato o movimento cantonis ta durante a República Espanhola de 187374 tentou realmente reali zálo e seu principal ideólogo F Pi y Margall 18241901 iria ser adotado no panteão anarquista juntamente com Bakunin Proudhon e Herbert Spencer O anarquismo era tanto uma revolta do passado préindustrial contra o presente quanto filho do mesmo presente Rejeitava a tradi ção embora a natureza intuitiva a espontânea tanto do pensamento como do movimento forçassem a guardála talvez mesmo enfatizá la assim como a um número de elementos tradicionais tais como o antisemitismo ou mais realmente a xenofobia Ambos ocorreram em Proudhon e Bakunin Simultaneamente o anarquismo detestava de forma passional a religião e as igrejas e defendia as causas do progresso incluindo a ciência e a tecnologia da razão e talvez acima de tudo do iluminismo e da educação E já que rejeitava qualquer autoridade encontravase curiosamente convergindo para um ponto comum com o ultraindividualismo do laissezfaire burguês Ideolo gicamente Spencer que iria escrever Man Against the State era tão anarquista quanto Bakunin A única coisa que o anarquismo não con seguia prever era o futuro sobre o qual nada tinha a dizer salvo que só podia acontecer depois da revolução O anarquismo não tem grande importância política fora da Es panha e diznos respeito apenas como uma imagem distorcida do pe ríodo O movimento revolucionário mais interessante da época seria outro bem diferente o populismo russo Não era e nunca tornouse um movimento de massa e seus atos de terrorismo mais dramáticos culminando no assassinato do Tzar Alexandre II 1881 ocorreram após o fim de nosso período Mas é o ancestral tanto de uma impor tante família de movimentos nos países atrasados do século XX como do bolchevismo russo Oferece também um ligação direta entre o re volucionarismo das décadas de 1830 e 1840 e o de 1917 uma liga ção bem mais direta poderseia argumentar que a Comuna de Paris Além disso já que era um movimento composto quase que inteira mente de intelectuais num país onde praticamente toda a vida intelec tual séria era necessariamente política viria a ser imediatamente pro jetado como movimento no cenário da literatura global através dos geniais escritores da época Turgenev 17891871 e Dostoievsky 182181 Até os observadores ocidentais da época ouviram falar dos nihilistas e confundiramnos com o anarquismo de Bakunin Isto era compreensível já que este último estava presente no movimento russo assim como em todos os outros movimentos revolucionários e temporariamente foi confundido com um personagem tipicamente dostoievskiano vida e literatura estando muito próximas na Rússia o jovem advogado de crença quase que patológica no terror e na vio lência Sergei Gennadevitch Nechaev Mas o populismo russo não era de forma alguma anarquista 176 Que a Rússia deveria ter uma revolução não era questionado seriamente por ninguém na Europa desde os liberais mais moderados até a esquerda O regime político do país uma autocracia sob Nicolau I 18251855 era de forma patente um anacronismo e não podia a longo prazo resistir Mantinhase no poder pela falta de algo como uma classe média e acima de tudo pela existência de uma tradicional lealdade ou passividade de um campesinato atrasado e em grande par te servil que aceitava o domínio da nobreza porque esta era a vontade de Deus porque o Tzar representava a Santa Rússia e também por que eles eram deixados bastante a vontade e em paz para conduzir seus próprios modestos negócios através das poderosas comunidades de vila cuja existência atraiu a atenção de observadores russos e es trangeiros desde a década de 1840 Eles não estavam porém satisfei tos À parte sua pobreza e a coerção dos senhores eles nunca aceita ram o direito da nobreza à terra o camponês pertencia ao senhor mas a terra pertencia aos camponeses pois apenas eles a cultivavam Eles eram somente inativos ou incapazes de fazer alguma coisa Se aban donassem a passividade e se insurgissem as coisas ficariam difíceis para o tzar e as classes dominantes na Rússia E se sua rebelião fosse capitalizada pela esquerda ideológica e política o resultado não seria certamente uma simples repetição dos grandes levantes dos séculos XVII e XVIII os Pugachevshchina que assustaram os governantes russos mas uma revolução social Depois da guerra da Criméia uma revolução russa parecia não mais apenas desejável mas cada vez mais provável Esta era a maior inovação da década de 1860 O regime que por mais reacionário e ineficiente que pudesse parecer tinha aparecido até então como está vel e poderoso externamente imune tanto à revolução continental de 1848 como capaz de fazer marchar seus exércitos contra ela em 1849 revelavase agora internamente instável e externamente mais fraco do que parecia Suas maiores fraquezas eram políticas e econômicas e aí reformas de Alexandre II 185581 poderiam ser vistas mais como um sintoma do que remédio para estas fraquezas Na realidade como veremos no capítulo 10 seguinte a emancipação dos servos 1861 criara as condições para um campesinato revolucionário enquanto que as reformas administrativas jurídicas e outras do tzar 186470 fracassaram em remover as fraquezas da autocracia tzarista ou mes mo em compensar a aceitação tradicional que agora se encontrava ameaçada A revolução na Rússia não era mais um projeto utópico Dada a fraqueza da burguesia e naquele momento do novo proletariado industrial apenas uma camada social exígua mas articu lada existia que pudesse levar a agitação política e na década de 1860 veio a adquirir consciência própria uma associação com radica lismo político e um nome a inteltigentzia Sua própria exigüidade talvez tenha ajudado a este grupo de pessoas de educação superior a se sentir uma força coerente mesmo em 1897 os instruídos consis tiam em não mais que uns 100 mil homens e qualquer coisa acima de 177 6 mil mulheres em toda a Rússia7 Os números eram pequenos mas cresciam rapidamente Moscou em 1840 possuía pouco mais que 1200 educadores doutores advogados e pessoas ativas nas artes em geral mas por volta de 1882 já contava com 5 mil professores 2 mil doutores 500 advogados e 1500 nas artes Mas o que é significati vo em relação a eles é que não se juntavam nem à classe dos negó cios que no século XIX praticamente não requeria qualificação aca dêmica exceto na Alemanha talvez apenas um certificado de co nhecimentos sociais nem se ligavam com o maior empregador de in telectuais a burocracia Dos 333 graduados de S Petersburgo em 184850 apenas 96 entraram no serviço civil Duas coisas distinguiam a intelligentsia russa das outras cama das de intelectuais o reconhecimento enquanto grupo social especial e um radicalismo político orientado mais socialmente que nacional mente A primeira distinguiaos dos intelectuais ocidentais que eram rapidamente absorvidos na classe média predominante e na ideologia liberal ou democrática vigente Excetuandose o boêmio literário e ar tístico ver capítulo 15 mais adiante que era uma subcultura aceita ou pelo menos tolerada não havia nenhum grupo significativo de dis sidentes e a boêmia dissidente era política apenas marginalmente Mesmo as universidades tão revolucionárias em 1848 tornaramse politicamente conformistas Por que deveriam ser diferentes os inte lectuais na era do triunfo burguês A segunda característica distintiva era a diferença em relação aos intelectuais dos povos emergentes eu ropeus cujas energias políticas estavam ligadas quase que exclusiva mente ao nacionalismo isto é à luta para a construção de uma socie dade liberal burguesa própria na qual pudessem ser integrados A in telligentsia russa não podia seguir a primeira alternativa já que a Rússia não era de forma patente uma sociedade burguesa e já que o sistema tzarista havia feito mesmo do mais moderado liberalismo um slogan de revolução política As reformas do tzar Alexandre II na dé cada de 1860 libertação dos servos mudanças educacionais e jurí dicas e o estabelecimento de um certo governo local para a nobreza os zemstvos de 1864 e as cidades 1870 eram todas demasiada mente hesitantes e limitadas para mobilizar o entusiasmo potencial dos reformistas de forma permanente e de qualquer maneira esta fase de reformas durou pouco Também não seguiu a seguinte alternativa não tanto porque a Rússia já fosse uma sociedade independente ou lhe faltasse orgulho nacional mas porque os slogans do nacionalismo russo Santa Rússia panslavismo etc eram usados pelo tzar pela igreja e por tudo o que fosse reacionário O personagem de Tolstoi 18281910 em Guerra e Paz Pierre Bezuhov de certa forma o mais russo dos personagens do romance era obrigado a procurar idéias cosmopolitas mesmo a defender Napoleão o invasor porque não es tava contente com a Rússia tal como ela era e seus sobrinhos e netos espirituais a intelligentsia das décadas de 850 e 1860 iriam ser for çados a fazer o mesmo 178 Eles eram e enquanto nativos do que era par excellence o país atrasado da Europa não poderiam ser outra coisa modernizantes isto é ocidentalizantes Mas por outro lado eles não podiam ser apenas ocidentalizantes já que o liberalismo ocidental e o capitalismo da época não ofereciam um modelo viável para a Rússia seguir e porque a única força de massa potencialmente revolucionária na Rússia era o campesinato O resultado veio a ser o populismo que segurava esta contradição numa balança tensa Visto desta forma o populismo lança muita luz sobre os movimentos revolucionários do Terceiro Mundo de meados do século XX O rápido progresso do capitalismo na Rússia posterior ao período que analisamos que implicava no rá pido crescimento de um proletariado industrial organizado ul trapassaria as incertezas da era populista e o colapso da fase heróica do populismo de 1868 a 1881 e encorajaria reconsiderações teóri cas Os marxistas que surgiam das ruínas do populismo eram pelo menos em teoria ocidentalizantes puros A Rússia argumentavam i ria seguir o mesmo caminho do Ocidente gerando as mesmas forças de mudança política e social uma burguesia que iria estabelecer uma república democrática um proletariado que iria cavar a cova da quela Mas mesmo alguns marxistas cedo se tornaram conscientes durante a revolução de 1905 de que esta perspectiva era irreal A burguesia russa iria ser muito fraca para assumir seu papel histórico e o proletariado com o apoio da força irresistível do campesinato iria derrubar igualmente o tzarismo e o capitalismo russo imaturo tudo is to dirigido pelos revolucionários profissionais Os populistas eram modernizantes A Rússia de seus sonhos era nova uma Rússia de progresso educação e produção revolucionária mas socialista e não capitalista Seria baseada na mais antiga e tra dicional das instituições russas a obshchina ou vila comunal que iria tornarse ancestral direto e modelo da sociedade socialista O tempo e os intelectuais populistas da década de 1870 perguntaram a Marx cu jas teorias haviam assimilado se ele pensava que tal fosse possível e Marx lutou consigo mesmo diante desta atraente mas de acordo com suas teorias implausível proposição concluindo hesitantemente que talvez pudesse Por outro lado a Rússia precisava rejeitar as tradições da Europa ocidental incluindo as formas de seu liberalismo e doutri nas liberais porque o país não possuía tais tradições Pois mesmo aquele aspecto do populismo que possuía as ligações aparentemente mais diretas com o espírito revolucionário de 17891848 era em certo sentido diferente e novo Os homens e mulheres que agora juntavamse em conspirações secretas para derrubar o tzarismo através de insurreição e terror eram mais do que os herdeiros dos Jacobinos ou dos revolucionários profis sionais que descendiam destes últimos Eles iriam quebrar todas as li gações com a sociedade para se dedicar totalmente ao povo e à sua revolução para penetrar no seio do povo e expressar sua vontade Ha via uma intensidade nãoromântica uma totalidade de autosacrifício 179 acerca de sua dedicação que não tinha paralelo no Ocidente Eles es tavam mais próximos de Lênin que de Buonarroti E vieram encontrar a maior parte de seus membros como em muitos dos movimentos similares posteriores entre os estudantes especialmente os mais no vos e pobres que estavam entrando na universidade deixando de se limitar aos filhos da nobreza Os ativistas do novo movimento revolucionário eram de fato gente nova em lugar dos filhos da nobreza De 924 pessoas presas ou exiladas entre 1873 e 1877 apenas 279 vinham de famílias nobres 117 de funcionários nãonobres 33 de comerciantes 68 eram judeus 92 vinham daquilo que se poderia chamar melhor de pequena burguesia urbana meshchane 138 eram nominalmente camponeses presumivelmente de meios urbanos similares e não menos de 197 eram filhos de padres O número de mulheres entre eles era particular mente surpreendente Não menos de 15 dos aproximadamente 1600 propagandistas presos no período acima eram mulheres O movimento inicialmente oscilou entre um terrorismo meio anárquico de pequenos grupos sob a influência de Bakunin e Nechaev e os defensores de e ducação política de massa do povo Mas o que veio eventualmente a prevalecer foi a organização conspiratória secreta centralizada e ri gidamente disciplinada de afinidade Jacobinablanquista elitista na prática fosse qual fosse a teoria e que antecipou os bolcheviques O populismo é significativo não pelo que tenha realizado que foi praticamente nada nem pelos números que veio a mobilizar que pouco excederam a mil pessoas sua importância reside no fato de que marca o início de uma história contínua de agitação revolucionária russa que em 50 anos iria derrubar o tzarismo e instalar o primeiro regime na história mundial dedicado à construção do socialismo Eles eram sintomas da crise que entre 1848 e 1870 rapidamente e para a maioria dos observadores ocidentais inesperadamente transformou a Rússia tzarista de um dos pilares do reacionarismo mundial num gi gante claudicante certamente a ser derrubado revolucionariamente Mas eles eram mais do que isso Formaram o laboratório químico no qual as mais importantes idéias revolucionárias do século XIX iriam ser testadas combinadas e desenvolvidas Não há dúvida de que isto se deve em certa medida à boa sorte cujas razões são bem misteri osas de que o populismo tenha coincidido com uma das mais bri lhantes e impressionantes explosões de criação cultural e intelectual da história do mundo Países atrasados procurando entrar na moder nidade são geralmente copiadores e sem originalidade nas suas idéias embora nem tanto na sua prática intelectuais brasileiros e mexicanos apanharam de forma não crítica Auguste Comte intelectuais espa nhóis voltaramse neste mesmo período para um obscuro filósofo a lemão de segunda categoria do início do século XIX Karl Krause que transformaram num batalhador pelo iluminismo anticlerical A esquerda russa não estava apenas em contato com o que de melhor e mais avançado havia no pensamento da época assimilandoo estu 180 dantes em Kazan liam O Capital mesmo antes do livro ser traduzido para o russo mas imediatamente adaptava o pensamento social dos países avançados e eram reconhecidamente capazes de fazêlo Al guns de seus maiores nomes guardam uma reputação basicamente na cional N Chernishevsky 182889 V Belinsky 181148 N Do brolyubov 183661 e mesmo de certa forma o esplêndido Alexan dre Herzen 181270 Outros influenciaram o que talvez tenha se dado uma ou duas décadas depois a sociologia a antropologia e a historiografia dos países ocidentais como por exemplo P Vinogra dov 18541925 na Inglaterra V Lutchisky 18771949 e N Karei ev 18501936 na França O próprio Marx apreciou de forma imedia ta as realizações intelectuais de seus leitores russos e não apenas porque eram o seu primeiro público intelectual Até agora temos considerado os revolucionários sociais E as re voluções A maior delas em nosso período era virtualmente desco nhecida aos observadores da época e certamente sem conexão com as ideologias do Ocidente a de Taiping ver capítulo 7 As mais fre qüentes as da América Latina pareciam consistir na maioria das ve zes em pronunciamentos golpes militares ou secessões regionais que não modificavam a forma do país As européias ou eram fracas sos como a insurreição polonesa de 1863 absorvida por um libera lismo moderado ou como a conquista revolucionária da Sicília e do sul da Itália por Garibaldi em 1860 ou então de significado puramen te nacional como as revoluções espanholas de 1854 e 186874 A primeira destas revoluções espanholas era como a revolução colom biana do início da década de 1850 um efeito retardado dos aconteci mentos de 1848 O mundo ibérico estava geralmente fora do ritmo do resto da Europa A segunda pareceu a observadores da época em meio à agitação política e à Internacional pressagiar um novo round de revoluções européias Mas não haveria um novo 1848 Haveria a penas a Comuna de Paris em 1871 A Comuna de Paris era como a maior parte da história revolu cionária de nosso período importante não apenas por aquilo que rea lizou como por aquilo que anunciou era mais formidável como um símbolo de que como um fato Sua história verdadeira é obscurecida pelo mito enormemente poderoso que gerou tanto na França como através de Karl Marx no movimento socialista internacional um mi to que reverbera até hoje principalmente na República Popular da Chinal0 Ela foi extraordinária heróica dramática e trágica mas em termos concretos foi breve e na opinião da maioria dos observadores condenada um governo insurreicional de trabalhadores em uma única cidade cuja realização maior foi o fato de ser realmente um governo mesmo que durasse menos de dois meses Lênin depois de outubro de 1917 iria contar os dias até a data em que pôde triunfantemente dizer já duramos mais do que a Comuna Porém os historiadores de veriam resistir à tentação de reduzila retrospectivamente Se não chegou a ameaçar seriamente a ordem burguesa pelo menos aterrori 181 zou a todos pela sua mera existência Se na sua vida e morte foi cer cada por pânico e histeria especialmente na imprensa internacional que acusavaa de instituir o comunismo expropriar os ricos e parti lhar suas mulheres de terror massacre generalizado caos anarquia ou o que mais provocasse pesadelos nas classes respeitáveis tudo não é necessário dizer arquitetado pela Internacional Mais importan te os próprios governos sentiram a necessidade de entrar em ação contra a ameaça internacional à ordem e à civilização Excetuandose a colaboração internacional entre polícias e uma tendência vista co mo mais escandalosa ontem do que seria hoje em negar a comunar dos fugitivos o status protetor de refugiados políticos o chanceler austríaco apoiado por Bismarck homem não dado a reações de pâ nico sugeriu a formação da ContraInternacional Capitalista O me do da revolução era um fato maior na constituição da Liga dos Três Imperadores de 1873 Alemanha Áustria Rússia vista como uma nova Santa Aliança contra o radicalismo europeu que tem ameaçado todos os tronos e instituições embora o rápido declínio da Interna cional tivesse feito este objetivo menos urgente na época em que foi finalmente instituída O fato significativo sobre este nervosismo era que os governos agora temiam não a revolução social em geral mas a revolução proletária Os marxistas que viam a Comuna essencial mente como um movimento proletário estavam na berlinda dos go vernos e da opinião pública respeitável da época E de fato a Comuna era uma insurreição operária e se uma palavra descreve homens e mulheres a meio caminho entre povo e proletariado ao invés de trabalhadores de fábricas esta palavra também serviria para os ativistas dos movimentos trabalhistas em ou tros lugares neste período12 Os 36 mil comunardos aprisionados e ram um corte transversal na população trabalhadora de Paris 8 de trabalhadores de colarinho branco 7 de funcionários 10 de pe quenos lojistas e similares mas o resto esmagadoramente operários da construção civil metalurgia trabalho em geral seguidos pelos mais tradicionalmente especializados carpintaria artigos de luxo impressão tecidos que também forneciam um número despropor cional ao pessoal dirigente e evidentemente os eternos radicais sapa teiros Mas podiase dizer que a Comuna fosse uma revolução socia lista Quase que certamente sim embora seu socialismo fosse essen cialmente o sonho pré 1848 de cooperativas autônomas ou unidades corporativas de produtores agora reclamando intervenção governa mental radical e sistemática Seus resultados práticos foram mais mo destos mas isso não foi culpa sua Pois a Comuna foi um regime sitiado o filho da guerra e do cer co de Paris a resposta à capitulação O avanço dos prussianos em 1870 quebrou o pescoço do império de Napoleão III Os moderados republicanos que o derrubaram continuaram a guerra sem vontade e desistiram ao perceber que a única resistência possível implicava a mobilização revolucionária das massas um novo jacobismo e outra 182 república social Em Paris sitiada e abandonada pelo governo e pela burguesia o poder de fato havia caído nas mãos dos prefeitos dos ar rondissements distritos e da Guarda Nacional isto é na prática os setores populares e operários A tentativa de desarmar a Guarda Na cional depois da capitulação que provocou a revolução tomou a forma de uma organização municipal independente de Paris a Co muna Mas a Comuna foi quase que imediatamente sitiada pelo go verno nacional então localizado em Versalhes o exército vitorioso alemão que cercava Paris contendose para não intervir Os dois me ses da Comuna foram um período praticamente de guerra contínua contra as esmagadoras forças de Versalhes quase duas semanas de pois de sua proclamação em 18 de março havia perdido a iniciativa Por volta de 21 de maio o inimigo havia entrado em Paris e a semana final meramente demonstrou que o povo trabalhador de Paris podia morrer tão arduamente como havia vivido Os de Versalhes talvez te nham perdido 1100 em mortos e desaparecidos e a Comuna talvez tenha executado uma centena de reféns Quem saberá dizer quantos comunardos foram mortos durante a luta Milhares foram massacrados posteriormente os de Versalhes admitiram 17 mil mas este número não pode ser mais do que a meta de da verdade Mais de 43 mil foram feitos prisioneiros 10 mil foram sentenciados dos quais pelo menos metade foi enviada para o exílio penal na Nova Caledônia o resto para a prisão Esta era a vingança do povo respeitável Daquele momento em diante um rio de sangue correu entre os trabalhadores de Paris e as classes melhores E daí em diante também os revolucionários sociais aprenderam o que os esperava se não conseguissem manter o poder Terceira Parte RESULTADOS Effects of iodine concentration variation on the skin and liver of Balbc mice 185 Décimo Capítulo A TERRA Assim que o índio passar a ganhar três reales por dia não irá trabalhar mais do que a metade da semana pois então estará recebendo os mes mos nove reales que recebe atualmente Quando você tiver mudado tudo terá voltado à estaca zero a liberdade aquela verdadeira liberdade que não quer nem taxas nem regulamentos nem medidas para desenvolver a agricultura aquele maravilhoso laissezfaire que é a última palavra em economia política Um proprietário de terras mexicano 18651 O preconceito que existia contra todas as classes populares ainda existe em relação aos camponeses Eles não recebem a educação da classe mé dia daí suas diferenças a falta de consideração pelos seus compatriotas o vigoroso desejo de escapar da opressão deste desdém geral Daí por tanto a decadência dos velhos costumes a corrupção e a deterioração de nossa raça Um jornal de Mantua 1856 2 I Em 1848 a população do mundo mesmo da Europa ainda con sistia sobretudo de homens do campo Mesmo na Inglaterra a primei ra economia industrial a cidade não era mais numerosa do que o campo até 1851 e neste ano ultrapassavao por pouco 51 Em ne nhum outro lugar exceto França Bélgica Saxônia Prússia e Estados Unidos mais de 1 da população vivia em cidades de 10 mil ou mais habitantes Por meados e pelo final da década de 1870 a situação ha via substancialmente se modificado mas com algumas poucas exce ções a população rural ainda prevalecia em grande número sobre a urbana Portanto de longe a maior parte da humanidade e os destinos da vida ainda dependiam do que acontecesse na e com a terra O que acontecesse na terra por sua vez dependia de fatores e conômicos técnicos e demográficos que consideradas todas as pecu liaridades locais operavam em escala mundial ou pelo menos em grandes zonas geográficoclimáticas assim como de fatores institu cionais sociais políticos legais etc que diferiam de forma profunda 186 entre si mesmo quando as linhas gerais do desenvolvimento mundial operavam através deles Geograficamente as planícies norte americanas os pampas sulamericanos as estepes do sul da Rússia e da Hungria eram passíveis de comparação grandes campos em zonas mais ou menos temperadas adequadas ao cultivo em larga escala de cereais Todas elas desenvolveram o que era do ponto de vista da e conomia mundial o mesmo tipo de agricultura tornandose grandes exportadoras de trigo Mas do ponto de vista social político e legal havia uma grande diferença entre as planícies norteamericanas de socupadas em grande parte exceção feita a algumas tribos indígenas que viviam da caça e as européias já ocupadas em pequena escala por uma população voltada para a agricultura entre os fazendeiros li vres do Novo Mundo e os camponeses servos do Velho Mundo entre as formas de libertação camponesa depois de 1848 na Hungria e as formas subseqüentes na Rússia entre os grandes ranchos da Argenti na e entre os nobres senhores da terra na Europa oriental entre os sis temas legais a administração e as políticas da terra dos vários países em questão Para o historiador é igualmente ilegítimo olhar apenas o que tinham em comum sem ver aquilo em que se diferenciavam O que uma parte crescente da agricultura tinha em comum por todo o mundo era uma sujeição à economia industrial mundial Suas demandas multiplicavam o mercado comercial para produtos agríco las a maior parte alimentos e matériasprimas para a indústria as sim como alguns produtos industriais de menor importância tanto internamente através do rápido crescimento das cidades como inter nacionalmente Sua tecnologia tornava possível trazer regiões outrora inaccessíveis de forma efetiva para as fronteiras maiores do mercado mundial através da estrada de ferro e do vapor As convulsões sociais que sucederam a transferência da agricultura para um modelo capita lista ou pelo menos comercializado em larga escala fizeram com que os homens perdessem os laços tradicionais com a terra de seus ances trais especialmente quando estes descobriram que não ganhavam pra ticamente nada dela ou pelo menos muito pouco para manterem suas famílias Simultaneamente a demanda insaciável de trabalho por par te das novas indústrias e ocupações urbanas a diferença crescente en tre o campo atrasado e a cidade avançada com seus estabelecimentos industriais atraíamnos de qualquer maneira Em nosso período ve mos o crescimento enorme e simultâneo do comércio dos produtores agrícolas uma extensão impressionante das áreas sob uso agrícola e pelo menos nos países afetados diretamente pelo desenvolvimento ca pitalista mundial uma grande debandada da terra Por duas razões este processo tornouse particularmente maciço durante nosso período de estudo Ambos são aspectos do extraordiná rio crescimento e aprofundamento da economia mundial que forma o tema básico da história desta época A tecnologia tornou possível a abertura de áreas geograficamente remotas ou inaccessíveis à produ ção para exportação mais especialmente as planícies do centro dos 187 Estados Unidos e do sudeste russo Em 184453 a Rússia exportou a nualmente cerca de 115 milhões de hectolitros de trigo e na segunda metade da década de 1870 entre 47 e 89 milhões Os Estados Unidos que haviam exportado pouco na década de 1840 uns 5 milhões de hectolitros agora vendiam para o exterior mais de 100 milhões 3 Si multaneamente encontramos as primeiras tentativas para desenvolver algumas áreas do alémmar como produtores especializados em certos produtos para o mundo desenvolvido indigo e juta em Bengala ta baco na Colômbia café no Brasil e Venezuela sem falar no algodão do Egito etc Estes substituíam ou suplementavam os produtos de expor tação tradicional do mesmo tipo o açúcar do Caribe e o Brasil o al godão dos estados sulistas da América cujo tráfico tinha sido paralisa do pela Guerra Civil de 186165 No todo com algumas exceções como o algodão egípcio e a juta indiana estas especializações econô micas provaram ser provisórias ou então onde permanentes não se desenvolveram em escala comparável à do século XX Este último mo delo de agricultura de mercado mundial não se estabeleceu antes do pe ríodo de economia mundial imperialista de 18701930 Produtos de rá pida expansão subiam e caíam as áreas que forneciam o local de tais exportações em nosso período mais tarde estagnariam ou seriam aban donadas Portanto se o Brasil era o maior produtor de café o estado de São Paulo identificado de forma predominante com este produto em nosso século representava naquela época apenas uma quarta parte da produção do Rio e uma quinta parte de todo o país Portanto um comércio internacional de produtos agrícolas esta va agora sendo normalmente por razões óbvias levado a extremas especializações ou mesmo à monocultura nas regiões de exportação A tecnologia tornavao possível pois afinal os grandes meios de transportes através de grandes distâncias praticamente não existiam antes da década de 1840 Simultaneamente a tecnologia acompanha va visivelmente a demanda ou esperava mesmo antecipála Isto era mais evidente nas planícies selvagens do sudoeste americano e em vários lugares da América do Sul onde o gado multiplicavase virtu almente sem esforço humano acompanhado por gaúchos llaneros vaqueiros e cowboys e atraía a atenção de todos os fazedores de di nheiro que viam nisso um meio de enriquecer O Texas levou alguns animais para Nova Orleães e depois de 1849 para a Califórnia mas era a promessa do grande mercado do Norte que apressava os donos de ranchos em explorar estes longos caminhos que se tornaram parte do romance do Oeste Selvagem ligando o remoto sudoeste com as estradas de ferro mais próximas e através delas com o gigantesco centro que era Chicago cujos matadouros foram abertos em 1865 Os animais eram transportados em dezenas de milhares antes da Guerra Civil em centenas de milhares nos 20 anos seguintes até que a inau guração da rede ferroviária completa trouxe o clássico período do O este Selvagem que era essencialmente uma economia de pecuária a um fim na década de 1880 Entretanto um outro método de utilizar a 188 pecuária já estava sendo explorado a preservação da carne através dos métodos tradicionais de salgar e secar por alguma forma de con centração os extratos de liebig começaram a ser produzidos em 1863 por enlatamento e finalmente pela solução decisiva da refrigeração Portanto embora Boston recebesse alguma carne congelada no final da década de 1860 e Londres alguma da Austrália a partir de 1865 este tipo de comércio não se desenvolveu de fato até o final de nosso perío do Não é acidental que os dois grandes pioneiros americanos Swift e Armour não tenham se estabelecido em Chicago antes de 1875 O elemento dinâmico no desenvolvimento agrícola era portanto a demanda a crescente demanda por alimentos por parte das regiões ur banas e industriais do mundo a crescente demanda destes mesmos se tores por trabalho e como ligação entre dois a economia de rápida ex pansão que fez crescer o consumo básico das massas e portanto sua demanda per capita Pois com a construção de uma genuína economia global capitalista novos mercados surgiram do nada como notaram Marx e Engels enquanto os mais antigos cresceram dramaticamente Pela primeira vez desde a Revolução Industrial a capacidade da nova economia capitalista em proporcionar emprego emparelhouse com a capacidade de multiplicar a produção ver capítulo 12 mais adiante Em conseqüência para tomar um exemplo o consumo de chá per ca pita da Inglaterra triplicou entre 1844 e 1876 e o consumo de açúcar per capita cresceu de 17 para 60 libras neste mesmo período4 A agricultura mundial dividiase de forma crescente em duas partes uma dominada pelo mercado capitalista nacional ou interna cional a outra grandemente dependente dele Isto não significa que nada fosse comprado ou vendido no setor independente embora seja provável que uma boa proporção do produto da agricultura campone sa fosse consumida pelos próprios camponeses ou comerciada dentro dos estreitos limites de um sistema local de trocas Porém há uma di ferença substancial entre o tipo de economia agrícola na qual as ven das para fora são marginais ou opcionais e o tipo em que as riquezas dependem deste mercado externo para colocar de outra forma entre aqueles perseguidores pelo espectro de uma má colheita e uma subse qüente epidemia de fome e aqueles perseguidos pelo oposto de tudo isso a superprodução ou a súbita competição e um colapso nos pre ços Pela década de 1870 uma parte suficiente da agricultura mundial estava na segunda posição e portanto capaz de provocar depressão agrária em dimensões mundiais de forma politicamente explosiva Do ponto de vista econômico o setor tradicional da agricultura era uma força negativa era imune às flutuações dos grandes merca dos ou resistia a seu impacto da melhor maneira que pudesse Onde fosse forte mantinha homens e mulheres ligados à terra até onde a terra pudesse darlhes um meio de vida ou se desfazia de sua popula ção em excesso por via da migração sazonais como as que partiram do centro da França em direção a Paris As secas mortíferas do sertão nordestino brasileiro provocaram um êxodo periódico de homens fa 189 mintos e as notícias de que a seca havia terminado traziaos de volta novamente para a paisagem agreste e cheia de cactus onde nenhum brasileiro civilizado se aventurava salvo em alguma expedição mi litar contra algum messias do interior Havia áreas nos Cárpatos nos Bálcãs no oeste russo na Escandinávia e na Espanha para ficarmos apenas no mais desenvolvido dos continentes onde a economia mundial portanto o resto do mundo moderno fosse sob forma mate rial ou mental não significava muito Em 1931 os habitantes da Po lésia quando perguntados pelos censores poloneses acerca de sua na cionalidade não entenderam direito a pergunta Eles responderam somos daqui mesmo ou somos locais5 O setor de mercado era mais complexo já que sua fortuna depen dia tanto da natureza do mercado em alguns casos do mecanismo de distribuição do grau de especialização dos produtores como de estru tura social da agricultura Num extremo poderia haver a virtual mono culturalização das novas áreas agrícolas imposta por uma orientação em direção a um remoto mercado mundial e intensificada se não mes mo criada pelo mecanismo característico de firmas de comércios es trangeiras nas grandes cidades portuárias que controlavam este co mércio de exportação os tradicionais gregos que dirigiam o comércio do milho russo através de Odessa os Bunges Borns de Hamburgo que estavam para preencher a mesma função nos países da Bacia do Prata de Buenos Aires e Montevidéu Onde tais exportações eram pro duzidas por grandes países como era usual nas plantações tropicais a çúcar algodão etc o tipo de especialização era completo Geralmente em tais casos a identidade de interesses produzia uma estreita simbiose entre os grandes produtores fossem nativos ou estrangeiros as gran des firmas de comércio e os interesses compradores dos portos de ex portaçãoimportação e também a política dos estados representando os mercados europeus e seus fornecedores A aristocracia escravista do sul dos Estados Unidos os estancieros da Argentina e os grandes ranchos de carneiros da Austrália eram tão entusiasticamente devotados ao livre comércio e à livre empresa como os ingleses dos quais dependiam já que suas rendas baseavamse exclusivamente na venda livre do produto de seus países obtendo em retorno aquilo que seus fregueses pudessem fornecer em produtos nãoagrícolas No outro extremo o crescimento das áreas urbanas multiplicou a demanda por uma variedade de alimentos para cuja produção as pe quenas dimensões das unidades agrárias não proporcionavam nenhu ma vantagem especial e de nenhuma forma comparável com aquelas que o cultivo intensivo e a tecnologia proporcionavam Os que produ ziam produtos alimentícios mais duráveis tinham que se preocupar mais com a competição dos mercados nacional e mundial do que a queles que vendiam produtos perecíveis como ovos legumes frutas ou mesmo carne fresca ou qualquer outro alimento perecível que não pudesse ser transportado por grandes distâncias A grande de pressão agrária das décadas de 1870 e 1880 foi portanto uma depres 190 são de produtos duráveis Fazendas mistas e agricultura camponesa especialmente a dos camponeses ricos com espírito empresarial flo resciam em tais situações Esta era uma razão porque as previsões de ruína que tinham sido feitas para o campesinato falharam neste estágio mesmo que pare cendo verdadeiras em alguns dos países mais industrializados e de senvolvidos Era fácil definir que uma unidade camponesa era inviá vel quando menor que um determinado tamanho e quantidade de re cursos que variavam com o solo clima e tipo de produção Era po rém muito mais difícil mostrar que a economia de grandes unidades era superior às médias ou mesmo pequenas especialmente quando a maior parte da demanda de trabalho de tais unidades podia ser suprida pelo trabalho virtualmente gratuito de grandes famílias camponesas O campesinato sofria uma constante erosão por uma proletarização da queles cujos rendimentos eram demasiado pequenos para sustentálos O crescimento da economia capitalista transformou a agricultura com sua demanda maciça Não é portanto surpreendente que nosso período tenha visto um crescimento da quantidade de terra posta em uso agrícola sem mencionar o aumento na produção através de me lhorias na produtividade O que não é geralmente reconhecido é quão vasta era a extensão da terra agrícola Tomando as estatísticas dis poníveis do mundo como um todo entre 1840 e 1880 esta área cres ceu da metade de 500 para 750 milhões de acres6 Metade deste au mento ocorreu na América onde a área agrícola triplicou neste perío do quintuplicou na Austrália e cresceu duas vezes e meia no Cana dá Ali tomou sobretudo a forma de um simples avanço geográfico da agricultura pelo interior Entre 1849 e 1877 a produção de trigo avançou nove graus de longitude nos Estados Unidos sobretudo na década de 1860 É importante lembrar porém que a região a oeste do Mississipi ainda era comparativamente subdesenvolvida Entretanto embora menos imediatamente visível porque distri buído dentro e em volta da área cultivada os números para a Europa são igualmente impressionantes A Suécia dobrou sua área de produ ção entre 1840 e 1880 a Itália e a Dinamarca expandiramna por mais da metade a Rússia Alemanha e Hungria por uma terça parte7 Na I tália do Sul e nas ilhas cerca de 600 mil hectares de árvores desapa receram entre 1860 e 1911 8 Numas poucas regiões privilegiadas in cluindo o Egito e a índia a irrigação em larga escala também foi sig nificativa embora uma fé simplista e fervorosa na tecnologia tenha produzido efeitos secundários desastrosos e imprevistos então e ago ra9 Somente na Inglaterra a agricultura havia conquistado todo o pa ís Ali a área cresceu em menos de 5 Seria tedioso multiplicar as estatísticas da crescente produtivida de e produção agrícolas Mais interessante é descobrir até onde estas eram devidas à industrialização e se usavam os mesmos métodos e tecnologia que estavam transformando a indústria Antes da década de 1840 a resposta teria sido numa escala bem pequena Mesmo du 191 rante nosso período uma grande parte da agricultura estava sendo conduzida por meios que eram familiares há 100 ou talvez há 200 anos antes o que era bastante natural já que grandes resultados podi am ser conseguidos pela generalização dos melhores métodos conhe cidos pelas fazendas préindustriais As terras virgens da América fo ram esvaziadas a ferro e fogo como na Idade Média explosivos fo ram usados para derrubar árvores Para fins de produtividade a subs tituição do arado de madeira pelo de aço e a segadeira pela foice fo ram mais importantes que a aplicação da força do vapor que nunca se adaptou à vida da fazenda por ser basicamente imóvel As colheitas foram a grande exceção pois consistiam em uma série de operações que requeriam um grande número de trabalhadores temporários e com a crescente falta de trabalhadores os salários já altos aumenta ram A maior inovação colheita com máquinas estava confinada quase que exclusivamente aos Estados Unidos onde o trabalho era escasso e os campos extensos Mas em geral a aplicação da criativi dade à agricultura aumentou sensivelmente Entre 1849 e 1851 uma média anual de 191 patentes agrícolas foram pedidas nos Estados U nidos em 185961 1282 em 186971 não menos de 3217 10 Portanto as fazendas permaneceram visivelmente o que tinham sempre sido na maior parte do mundo mais prósperas nas áreas de senvolvidas onde se investia mais em melhorias prédios etc pare cendo um centro de negócios em muitos lugares mas nunca trans formadas de modo a não mais serem reconhecidas No entanto a pro dução industrial agora contribuía de forma importante para o capital na agricultura assim como a ciência moderna através da química or gânica de origem germânica Fertilizadores industriais potássio ni tratos não eram ainda usados em larga escala as importações da In glaterra de nitrato chileno ainda não tinham atingido a soma de 60 mil toneladas em 1870 Por outro lado um extenso comércio desenvol veuse para benefício temporário das finanças peruanas e lucro per manente de algumas firmas inglesas e francesas com o fertilizador natural guano 12 milhões de toneladas foram exportadas entre 1850 e 1880 quando então o boom do guano entrou em colapso um tráfico impossível de se imaginar antes da era de transporte de massa global 11 II As forças econômicas que moviam a agricultura faziamno na quelas áreas que eram accessíveis à mudança eram as forças da ex pansão A função da expansão na economia moderna não era apenas a de suprir alimentos e matériaprima em quantidades crescentes mas também a de proporcionar o mais importante reservatório de força de trabalho para ocupações nãoagrícolas Sua terceira grande função a de proporcionar o capital para o desenvolvimento urbano e industrial 192 dificilmente poderia ocorrer em países agrários onde as outras fontes de renda para governos e ricos eram escassas embora pudesse suprir ainda que de forma ineficiente e inadequada Os obstáculos vinham de três fontes os próprios camponeses seus superiores econômicos políticos e sociais e o peso inteiro das sociedades tradicionais institucionalizadas onde a agricultura pré industrial era o coração e o corpo da sociedade Todos os três obstá culos estavam destinados a serem vítimas do capitalismo embora como já vimos nem o campesinato nem a hierarquia social que esco ravase nos seus ombrosestivesse em qualquer perigo imediato de co lapso Na realidade os três fenômenos interligados eram teoricamente incompatíveis com o capitalismo e portanto tendentes a entrar em conflito com este último Para o capitalismo a terra era um fator de produção e uma mer cadoria peculiar apenas pela sua imobilidade e quantidade limitada embora como tenha ocorrido as grandes aberturas de novas terras deste período fizeram com que estas limitações parecessem aparente mente insignificantes para a época O problema do que fazer com a queles que detinham este monopólio natural portanto mantendo uma espécie de pedágio sobre o resto da economia parecia relativa mente superável A agricultura era uma indústria como qualquer outra para ser conduzida por princípios de obtenção de lucro o fa zendeiro um empresário O mundo rural como um todo era um mer cado uma fonte de trabalho uma fonte de capital Não havia meio de reconciliar esta perspectiva com a dos cam poneses ou senhores da terra para os quais a terra não era apenas uma fonte de grande lucro mas a própria estrutura de vida onde as rela ções entre os homens e a terra e entre si em termos da terra não eram opcionais mas obrigatórias Mesmo a nível de governo e pensamento político onde as leis da economia poderiam ser mais aceitas o con flito era grande A propriedade tradicional da terra podia ser econo micamente indesejável mas não era ela o cimento da estrutura social que desabaria em anarquia e revolução caso desaparecesse A políti ca inglesa da terra na Índia viuse com graves problemas diante deste dilema Economicamente talvez fosse mais simples se não houvesse campesinato mas não era ele uma garantia da estabilidade social e a espinha dorsal dos exércitos de muitos governos Num tempo onde o capitalismo estava arruinando suas classes trabalhadoras de forma tão evidente podia um estado prescindir de um reservatório de saudáveis homens do campo para recrutar para as cidades Conseqüentemente o capitalismo poderia somente vir a minar as bases agrárias da estabilidade política especialmente às margens ou dentro da periferia dependente do Ocidente desenvolvido Econo micamente como vimos a transição para a produção de mercado e especialmente a exportação de monocultura rompia as relações soci ais tradicionais e desestabilizava a economia Politicamente a mo dernização implicava para aqueles que desejavam sofrer o processo 193 uma colisão frontal com o principal apoio do tradicionalismo a soci edade agrária ver capítulos 7 e 8 As classes dirigentes da Inglaterra onde senhores da terra e camponeses précapitalistas haviam desapa recido e as da Alemanha e França onde um modus vivendi com o campesinato fora estabelecido na base de um florescente e onde ne cessário protegido mercado interno podiam portanto confiar na le aldade do campo Mas em outros lugares não o podiam Na Itália e na Espanha na Rússia e nos Estados Unidos na China e na América La tina era mais provável que se transformassem em regiões de fermen to social e explosão ocasional Por uma razão ou por outra três tipos de empreendimento agrá rio estavam sob particular pressão a plantação escrava o estado ser vil e a economia camponesa tradicional nãocapitalista O primeiro foi liquidado dentro de nosso período pela abolição da escravidão nos Estados Unidos e na maior parte da América Latina com a exceção do Brasil e de Cuba onde estava com os dias contados E nestes últi mos abolida oficialmente em 1889 Na prática pelo final do nosso pe ríodo a escravidão havia recuado para as partes mais atrasadas do O riente Médio e da Ásia onde não tinha mais um papel significativo na agricultura O estado servil foi formalmente liquidado na Europa en tre 1848 e 1868 embora o campesinato pobre e especialmente os semterra nas regiões dos grandes países da Europa do sul e do leste tivessem permanecido num estado semiservil visto que permanece ram sujeitos a uma esmagadora coerção nãoeconômica Onde os camponeses tivessem direitos legais ou civis inferiores aos usufruídos pelos ricos e poderosos qualquer que fosse a teoria poderiam sofrer coerção nãoeconômica como na Wallachia Andaluzia e Sicília Serviços de trabalho compulsório não haviam sido abolidos em mui tos países sulamericanos mas pelo contrário intensificados Portan to poderseia dificilmente falar da extinção da servidão naquele con tinente A persistência de tais obrigações descritas em termos lo cais como vanaconas huasipungos etc não devem ser confundidas com arranjos funcionalmente similares como servidão por dívida da mesma forma que a importação de trabalho onde o trabalhador deve o transporte ao senhor não deve ser confundida com a escravidão Am bas estas formas aceitam a abolição da escravidão e servidão formais como dadas e procuram recriálas dentro da estrutura de um contrato tecnicamente livre Contudo a servidão parece ter sido confinada de forma crescente aos camponeses índios explorados por senhores nãoíndios O terceiro tipo mantevese como já vimos As razões para esta liquidação geral das formas précapitalistas isto é nãoeconômicas de dependência agrária são complexas Em alguns casos fatores políticos foram obviamente decisivos No Impé rio dos Habsburgos em 1848 e na Rússia em 1861 não foi tanto a impopularidade da servidão no campesinato que determinou a eman cipação embora tivesse sido um dos fatores mas o medo de uma re volução nãocamponesa que viesse adquirir uma força decisiva atra 194 vés da mobilização do descontentamento camponês A rebelião cam ponesa era uma possibilidade constante como demonstrada pelos le vantes agrários na Galícia em 1846 na Itália do sul em 1848 na Sicí lia em 1860 e na Rússia nos anos subseqüentes à guerra da Criméia Mas não eram as rebeliões cegas dos camponeses que assustavam os governos elas duravam pouco e seriam aniquiladas a ferro e fogo mesmo pelos liberais como na Sicília 12 mas a mobilização do des contentamento camponês reforçando um desafio político à autoridade central Os Habsburgos tentaram portanto isolar os vários movimen tos de autonomia nacional de suas bases camponesas e o tzar russo fez o mesmo na Polônia Sem apoio do campesinato os movimentos liberaisradicais eram insignificantes nos países agrários ou pelo me nos contornáveis Tanto os Habsburgos como os Romanov sabiam bem disso e agiram conseqüentemente Porém insurreição e revolução por camponeses ou outros ex plicam alguma coisa sobre a emancipação dos servos mas nada sobre a abolição da escravidão Pois diferente da insurreição dos servos a rebelião escrava era relativamente incomum circunscrita aos Esta dos Unidos 13 e nunca no século XIX considerada uma ameaça po lítica muito séria Seria então a pressão para a abolição da servidão e a escravidão de origem econômica Certamente em alguma medida É bem sabido que historiadores econométricos argumentam retros pectivamente que a agricultura servil ou escrava era de fato mais proveitosa ou até mais eficiente que a agricultura orientada pelo tra balho livre O argumento tem sido elaborado para a escravidão mas não na mesma medida para a servidão l4 Isto é perfeitamente possí vel e os argumentos são realmente fortes Porém é inegável que os observadores da época operando com métodos da época e critérios de contabilidade concluíssem que era inferior embora evidentemente não possamos dizer até onde o justificável horror em relação à escra vidão e à servidão fizeram estas conclusões tendenciosas E mais Thomas Brassey o empresário das estradas de ferro falando a voz do senso comum dos negócios observou sobre a servidão que a produ ção na Rússia servil era a metade da inglesa e da saxônica e inferior a qualquer outro país europeu e sobre a escravidão que esta era obvi amente inferior do ponto de vista da produtividade do que do traba lho livre e mais cara do que as pessoas normalmente pensavam tendo em vista o preço de compra e manutenção do escravo 15 O cônsul bri tânico em Pernambuco admitese que fazendo um relatório para um governo passionalmente antiescravista assinalou que o senhor escra vo perdia 12 de juros do capital que poderia empregar ao invés de comprar escravos Erradas ou não estas opiniões eram comuns fora dos ambientes de senhores de escravos Na realidade a escravidão estava de forma patente em declínio e não apenas por razões humanitárias O final efetivo do tráfico es cravo deuse por pressão da Inglaterra que cortou de fato o suprimen to de escravos o que aumentou seu preço A importação de africanos 195 para o Brasil caiu de 54 mil em 1849 para virtualmente zero em mea dos da década de 1850 O tráfico interno negreiro embora muito usa do em argumentos abolicionistas parece não ter tido um papel impor tante Mas a mudança do trabalho escravo para o nãoescravo era es pantosa Em 1872 a população de cor no Brasil era três vezes mais numerosa do que a população escrava e mesmo entre negros puros os dois grupos eram quase iguais em número Em Cuba por volta de 1877 o número de escravos havia caído de 400 mil para 200 mil 16 Possivelmente mesmo nas áreas mais tradicionais do cultivo escravo a mecanização a partir de meados do século diminuiu a demanda por trabalho no processamento do produto embora nas grandes economi as açucareiras como Cuba produzisse um correspondente crescimen to na necessidade de braços no campo Entretanto dada a crescente competição do açúcar de beterraba europeu e o potencial extrema mente alto do componente de trabalho manual na produção da cana deaçúcar a pressão para abaixar os custos do trabalho era considerá vel Mas poderia a economia de plantação escrava agüentar o duplo custo de investir pesadamente na mecanização e nas despesas com os escravos Tais cálculos encorajaram a substituição pelo menos em Cuba de escravos não exatamente por trabalhadores livres mas por trabalhadores endividados sendo estes trabalhadores trazidos de en tre os índios Maias do Yucatan vítimas da Guerra Racial ver capítu lo 7 ou da então recémaberta China Porém parecia não haver dúvida de que a escravidão como modo de exploração estava em de clínio na América Latina mesmo antes de ser abolida e que o pro blema econômico em relação a esta forma de trabalho apareceu de forma cada vez mais forte a partir de 1850 Quanto à servidão o problema econômico em relação a ela era simultaneamente geral e específico Em termos gerais parecia claro que a permanência de camponeses imobilizados inibia o desenvolvi mento da indústria que era vista como demandando trabalho livre A abolição da servidão iria portanto ser uma précondição necessária para a mobilidade de trabalho livre Além disso como poderia a agri cultura servil ser economicamente racional se para citar um defensor russo da servidão na década de 1850 ela impedia a possibilidade de estabelecer o custo de produção sem qualquer precisão 17 A agricul tura servil também impedia o ajuste racional adequado ao mercado Mais especificamente tanto o desenvolvimento de um mercado inter no para uma variedade de alimentos e matériasprimas agrícolas quanto o de um mercado externo sobretudo para o trigo minaram a servidão Na parte norte da Rússia que nunca foi muito adequada ao cultivo extensivo do trigo fazendas de camponeses deslocaram a produção de cânhamo fibras e outras intensivas lavouras enquanto manufaturas proporcionaram outro tipo de mercado para o campesi Onde o trabalhador deve ao senhor o preço de seu transporte NT 196 nato O número de servos efetuando serviços de trabalho já uma mi noria caiu Servia para pagar aos senhores da terra a comutação de serviços para uma orientação de mercado No sul vazio onde as este pes virgens transformavamse em campos de trigo a servidão não era de grande importância O que os senhores da terra precisavam para a expansão da economia de exportação era de melhores transportes crédito trabalho livre e máquinas A servidão sobreviveu na Rússia como na Romênia sobretudo nas áreas de produção de sementes com uma densa população camponesa onde os senhores podiam compen sar sua fraqueza competitiva com o aumento de serviços ou esperar cortar pelo mesmo método mesmo que temporariamente os preços no mercado de exportação Entretanto a abolição do trabalho nãolivre não pode ser anali sada simplesmente em termos de cálculo econômico As forças da so ciedade burguesa opunhamse à escravidão e à servidão não apenas porque acreditavam que estas fossem economicamente indesejáveis nem por razões morais mas também porque estas formas pareciam incompatíveis com uma sociedade de mercado baseado na busca livre do interesse individual Por outro lado proprietários de escravos e se nhores da terra apoiavam o sistema porque este parecialhes a coluna dorsal daquela sociedade e de suas classes Talvez achassem mesmo impossível suas próprias existências sem escravos ou servos que de finiam o próprio status da classe Os senhores da terra russos não se revoltavam contra o tzar e nem poderiam porque este lhes propor cionava a única legitimação possível contra um campesinato que se por um lado estava profundamente convencido de que a terra perten cia a quem nela trabalhava por outro lado acreditava na sua subordi nação hierárquica aos representantes de Deus e do imperador Mas os senhores se opunham à emancipação de forma bastante decidida Ela era imposta de fora ou de cima e por uma força superior De fato se a aboliçãoemancipação tivesse sido apenas o produ to de forças econômicas não teriam produzido os resultados insatisfa tórios que produziram tanto nos Estados Unidos como na Rússia As áreas nas quais a escravidão ou a servidão tinham sido de importância marginal ou genuinamente nãoeconômica por exemplo no norte e no sul da Rússia ou nos estados fronteiriços e no sudoeste dos Esta dos Unidos ajustaramse rapidamente à sua liquidação Mas nas á reas centrais do velho sistema os problemas eram muito mais difíceis de serem enfrentados Portanto nas províncias russas da terra negra distintas da Ucrânia e das fronteiras das estepes a agricultura capi talista desenvolveuse devagar dívidas de trabalho permaneceram até meados da década de 1880 enquanto a expansão da lavoura ficava em geral bastante mais atrasada em relação às plantações de semente no sul Em resumo os benefícios puramente econômicos do final da economia de coerção física permanecem em debate Nas antigas economias escravistas isto não pode ser explicado no campo político já que o Sul tinha sido conquistado e a antiga aris 197 tocracia da terra perdera temporariamente o poder adquirindoo de novo porém logo depois Na Rússia os interesses da classe proprie tária de terras eram evidentemente cuidadosamente considerados e salvaguardados O problema neste caso era que a emancipação não produzia uma solução agrária satisfatória nem para a nobreza nem para o campesinato nem para os projetos de uma genuína agricultura capitalista Em ambas as áreas a resposta dependia de qual seria a melhor forma de agricultura especialmente agricultura de larga esca la sob condições capitalistas Há duas formas principais de agricultura capitalista que Lênin chamou respectivamente de caminho prussiano e caminho ameri cano no primeiro caso grandes fazendas operadas por proprietários empresários capitalistas com trabalho alugado no segundo fa zendeiros comerciais independentes de extensão variada também ope rando com trabalho alugado onde necessário embora numa escala muito menor Ambas implicavam uma economia de mercado mas mesmo antes do triunfo do capitalismo a maioria das grandes fazen das operavam como unidades produtivas para vender uma grande proporção de sua produção enquanto a maioria das propriedades camponesas sendo primariamente para consumo próprio não o fazi am Portanto a vantagem das grandes fazendas e plantações para o desenvolvimento econômico não residia tanto na superioridade técni ca maior produtividade etc mas sobretudo na sua capacidade pouco comum em gerar excedente agrícola para o mercado Onde o campe sinato permaneceu precomercial como em grande parte na Rússia e entre os escravos emancipados das Américas que retornaram à a gricultura de subsistência camponesa a fazenda manteve esta vanta gem mas onde faltavam as antigas vantagens do trabalho compulsório proporcionadas pela escravidão e servidão a fazenda sentia agora mais dificuldade em obter trabalho salvo quando os antigos escravos ou ser vos fossem desprovidos de terra ou a possuíssem em tão pouca quanti dade que eram obrigados a se transformar em trabalhadores alugados e que não houvesse um trabalho mais atraente como alternativa Mas no todo os exescravos adquiriram alguma terra embora não os 40 acres e uma mula com que sonhavam e os exservos embora perdendo alguma terra para os senhores especialmente nas regiões de agricultura comercial em expansão permaneceram cam poneses Aliás a sobrevivência e mesmo o recrudescimento da velha comuna de cidade com seus arranjos de periódica distribuição equitativa de terra salvaguardou a economia camponesa Daí a cres cente tendência dos senhores da terra para alugar as propriedades re pondo assim os produtos que eles mesmo encontravam mais dificul dade em produzir Mas se o caminho prussiano não era seguido sistematicamen te por outro lado o caminho americano também não o era Este dependia da criação de um grande corpo de fazendeiros empresários cultivando essencialmente produtos de venda imediata Um tamanho 198 mínimo de propriedade era necessário para tal variando com as cir cunstâncias Portanto no sul dos Estados Unidos depois da Guerra Civil a experiência tem mostrado que é duvidoso se algum lucro pode ser obtido por um cultivador cuja produção anual é menor que 50 fardos Um homem que não consiga produzir 8 ou 10 fardos no mínimo praticamente não tem objetivo na vida e nada para viver Uma grande parte do campesinato permaneceu portanto dependente da cultura de subsistência em suas propriedade se estas o permitis sem e quando não dependia do trabalho em outro local como com plemento Dentro do campesinato desenvolveuse um bom número de fazendeiros comerciais eles eram de importância substancial na Rússia na década de 1880 mas diferenças de classe ocorriam por vários fatores racismo nos Estados Unidos a persistência da comu nidade de pequenas vilas na Rússia Portanto nem a abolição nem a emancipação produziram um re sultado satisfatório do ponto de vista capitalista para o problema agrá rio e é duvidoso que isto pudesse ter ocorrido salvo se as condições para o desenvolvimento de uma agricultura capitalista já estivessem presentes como nas áreas marginais da economia servilescravista do Texas ou na Europa na Bohemia e Hungria Nestas áreas podemos ver os caminhos prussiano ou americano em ação As grandes fa zendas de nobres algumas vezes ajudadas pelas injeções de capital fi nanceiro na forma de pagamentos de compensação pela perda de servi ços de trabalho transformaramse em empresas capitalistas Nas terras tchecas eles detinham 43 das cervejarias 65 das fazendas de açúcar e 60 das destilarias no começo da década de 1870 Ali floresceram com a concentração da lavoura intensiva não apenas grandes fazendas com trabalho alugado mas também grandes sítios camponeses que começavam a competir com as fazendas Na Hungria estes últimos permaneceram dominantes e a totalidade dos servos sem terra obtive ram liberdade sem receber enfim nenhuma terra 19 Nas antigas áreas centrais de coerção física como na Rússia e na Romênia onde a servidão durou mais tempo o campesinato tinha sido deixado como uma massa bastante homogênea exceto quando divididos por raça ou nacionalidade e descontente talvez mesmo re volucionária A incapacidade para ação devida à opressão racial ou à dependência por não possuírem terras mantinhaos quietos como os negros rurais do sul dos Estados Unidos ou os trabalhadores das pla nícies Húngaras Por outro lado o campesinato tradicional espe cialmente quando organizado comunalmente transformouse numa força formidável A Grande Depressão da década de 1870 abriu uma era de agitação rural e revolução camponesa Poderia este processo ter sido evitado por uma forma mais ra cional de emancipação É duvidoso Pois encontramos resultados muito similares naquelas regiões onde a tentativa de criar as condi ções para a agricultura capitalista tinha sido efetuada não por um édi 199 to global abolindo a economia de coerção mas pelo processo mais geral da imposição pela lei do liberalismo burguês transformando to da propriedade agrária em propriedade individual e transformando a terra numa mercadoria de venda livre como qualquer outro objeto Na teoria este processo já havia sido amplamente aplicado na primeira metade do século ver A Era das Revoluções capítulo 8 mas na prá tica veio a ser imensamente reforçado depois de 1850 pelo triunfo do liberalismo Isto significava primeiro e acima de tudo a quebra das antigas organizações comunais e a distribuição ou a alienação da terra de posse coletiva ou da terra de instituições nãoeconômicas como as da Igreja Isto viria a ser efetuado de maneira mais dramática e rude na América Latina por exemplo no México no período de Ju arez na década de 1860 ou na Bolívia sob o ditador Melgarejo 1866 71 mas também ocorreu em grande escala na Espanha depois da re volução de 1854 na Itália depois da unificação do país sob as institu ições liberais de Piedmont e onde mais o liberalismo econômico e legal tivesse triunfado E o liberalismo avançava mesmo nos lugares onde os governos não lhe eram muito simpático As autoridades fran cesas tomaram algumas providências para salvaguardar a propriedade comunal entre seus súditos muçulmanos na Argélia e mesmo Napo leão III achou inconcebível que a propriedade individual como direito sobre a terra não fosse estabelecida formalmente entre os membros da comunidade muçulmana onde possível e oportuno uma medida que veio a ter o efeito de permitir a europeus a possibilidade de comprálas pela primeira vez Entretanto ainda não era o convite à liquidação pela expropriação efetuada pela Lei de 1873 depois da grande insurreição de 1871 que veio propor a imediata transferência da propriedade nati va para o status legal francês uma medida que beneficiou a quase nin guém exceto aos homens de negócios e especuladores europeus 20 Com ou sem apoio oficial os muçulmanos perderam suas terras para os colonos brancos ou para as companhias de terras A ambição teve um papel em tais expropriações por parte dos go vernos pelos lucros em vendas de terra ou outras rendas por parte dos senhores da terra colonos ou especuladores o fato de adquirir barato fazendas e propriedades Mas seria injusto negar aos legisladores a sin ceridade da convicção de que a transformação da terra numa mer cadoria livremente alienável e a transformação em propriedade privada de relíquias comunais eclesiásticas ou outras obsolescências de um passado irracional iriam no todo proporcionar uma base para um de senvolvimento agrícola satisfatório Mas não era injusto de forma al guma em relação ao campesinato que em sua totalidade se recusou a se transformar em uma florescente classe de fazendeiros comerciais mesmo quando tinham a chance de conseguilo A maioria não tinha esta chance já que não podia comprar a terra posta no mercado ou mesmo compreender os complexos processos legais que levaram à sua desapropriação Talvez a medida não tenha reforçado o latifúndio em 200 si o termo é ambíguo e profundamente imbuído de mitologia política mas onde tivesse trazido reforços não era ao camponês de economia de subsistência velho ou novo O maior efeito da liberalização viria a ser o aprofundamento do descontentamento camponês A novidade deste descontentamento era que agora podia ser mo bilizado pela esquerda política De fato exceto em partes do sul da Europa não iria ainda ser mobilizado Na Sicília e no sul da Itália a revolução camponesa de 1860 ligouse a Garibaldi uma grande figu ra de camisa vermelha que parecia de todas as formas o libertador do povo e cuja crença em uma república radicaldemocrática laica e mesmo vagamente socialista não parecia de todo incompatível com a crença em santos na Virgem no Papa e fora da Itália no rei Bour bon No sul da Espanha o republicanismo e a Internacional na sua forma bakuninista cresceram rapidamente nenhuma cidade andaluza entre 1870 e 1874 deixou de ter sua sociedade de trabalhadores 21 Na França é claro o republicanismo a forma principal da esquerda já estava bem estabelecido em algumas áreas rurais depois de 1848 e teve o apoio da maioria moderadamente depois de 1871 Talvez uma esquerda revolucionária tenha surgido na Irlanda com os fenia nos na década de 1860 para irromper na formidável Land league do final da década de 1870 e inícios da de 1880 Havia evidentemente mesmo na Europa muitos países e pra ticamente todos fora deste continente onde a esquerda revolucioná ria ou não falhou em provocar qualquer impacto no campesinato como os populistas russos iriam descobrir ver capítulo 9 quando se decidiram a ir ao povo na década de 1870 De fato enquanto a es querda permanecesse urbana laica ou mesmo militantemente anticle rical e sem interesse nos problemas do campo o campesinato iria continuar nutrindo suspeita e hostilidade em relação a ela O sucesso rural dos militantes anarquistas anticristãos na Espanha ou republica nos na França era excepcional Mesmo assim pelo menos na Europa a antiquada insurreição rural pela Igreja pelo rei e contra as cidades ímpias e liberais tornaramse escassas Mesmo a segunda guerra car lista na Espanha 187276 foi uma questão muito mais geral que a primeira da década de 1830 e virtualmente confinouse às províncias bascas Como o grande boom da década de 1860 e inícios da de 1870 abriu caminho para a depressão agrária das décadas de 1870 e 1880 o campesinato não podia mais ser tomado com um elemento conserva dor na política Mas em que medida a vida no campo foi transformada pelas for ças do Novo Mundo Não é fácil julgar pelo ponto de vista do século XX já que a vida rural foi mais transformada neste período do que em qualquer época anterior desde a invenção da agricultura Olhando retrospectivamente os caminhos de homens e mulheres no campo em meados do século XIX parecem fixados numa antiga tradição de mu dança a passos de tartaruga Evidentemente tratase de uma ilusão mas a natureza exata destas mudanças é agora difícil de discernir ex 201 ceto talvez entre os colonos do Oeste Americano prontos para mudar de fazenda e produto de acordo com as perspectivas de preços ou lu cros especulativos equipados com máquinas e comprando novidades através do catálogo postal Mas havia de qualquer forma mudanças no campo Havia a es trada de ferro Havia com crescente freqüência a escola primária en sinando a língua nacional uma nova e segunda língua para a maioria dos filhos de camponeses e conjuntamente com a administração na cional e a política fragmentando suas personalidades Por volta de 1875 o uso de apelidos pelos quais as pessoas eram conhecidas e i dentificadas nas vilas de Bray na Normandia havia praticamente de saparecido Isto era devido inteiramente aos professores que não per mitiam que as crianças usassem nas escolas outra coisa que não fosse seus nomes próprios22 Talvez não tivessem exatamente desaparecido mas retroagido com o dialeto local para o submundo privado e não oficial da cultura nãoliterária E a divisão mesma entre os alfabetiza dos e analfabetos no campo era uma poderosa força de mudança Em 1849 era natural que a política camponesa na Morávia tomasse a for ma de um boato de que o líder revolucionário húngaro Kossuth era o filho do imperador camponês Joseph II descendente do antigo rei Svatopluk e prestes a invadir o país a frente de um grande exército23 Mas já por volta de 1875 a política na Tchecoslováquia especial mente no campo era conduzida em termos mais sofisticados e aque les que esperavam a salvação nacional através de herdeiros de impe radores populares antigos ou modernos talvez se sentissem um pouco embaraçados em admitilo Aquela forma de pensar confinava se mais e mais a países analfabetos como a Rússia onde os populis tas revolucionários nesta mesma época tentaram sem sucesso or ganizar uma revolução camponesa através de um pretendente popu lar ao trono do tzar24 Poucos países eram relativamente alfabetizados exceto partes da Europa central e ocidental principalmente as protestantes e a América do Norte Mas mesmo entre os atrasados e tradicionais dois tipos de pessoas do campo eram os maiores pilares das antigas formas os velhos e as mulheres cujas histórias de viúvas passavam de geração em geração e ocasionalmente para benefício dos homens da cidade para colecionadores de folclore e canções populares E é ain da um paradoxo do período que freqüentemente ou não a mudança tenha sido trazida para a vida do campo através das mulheres Algu mas vezes na Inglaterra meninas do campo tornaramse mais instru ídas que meninos isto parece ter acontecido pela década de 1850 Certamente nos Estados Unidos eram as mulheres que representavam as formas civilizadas aprendizado através de livros higiene casas limpas e mobília segundo o modelo e sobriedade da cidade Os que empurravam os filhos para serem melhores do que eles mesmos e ram mais as mães do que os pais Mas talvez o mais poderoso agente de tal modernização fosse a migração de jovens camponesas para o 202 serviço doméstico nas casas das classes médias urbanas Tanto para homens como para mulheres o grande processo de melhorar era ine vitavelmente um processo de minar as antigas formas e aprender as novas Para isso voltamos agora nossa atenção 203 DécimoPrimeiro Capítulo OS HOMENS DE PÕEM A CAMINHO Perguntamos onde estava seu marido Ele está na América O que é que ele faz lá Ele conseguiu um emprego como Tzar Mas como pode um judeu ser Tzar Tudo é possível na América ela respondeu Scholem Alejchem1 1900 Disseramme que os irlandeses estão tirando o serviço doméstico dos ne gros por toda parte Aqui isso é universal não se encontra prati camente em lugar nenhum um empregado que não seja irlandês A H Clough para Thomas Carlyle Boston 1853 2 I A metade do século XIX marca o começo da maior migração dos povos na História Seus detalhes exatos mal podem ser medidos pois as estatísticas oficiais tais como eram então são falhas em capturar to dos os movimentos de homens e mulheres dentro dos países ou entre estados o êxodo rural em direção às cidades a migração entre regiões e de cidade para cidade o cruzamento de oceanos e a penetração em zonas de fronteiras todo este fluxo de homens e mulheres movendose em todas as direções torna difícil uma especificação Entretanto uma forma dramática desta migração pode ser aproximadamente docu mentada Entre 1846 e 1875 uma quantidade bem superior a 9 milhões de pessoas deixou a Europa e a grande maioria seguiu para os Estados Unidos 3 Isto equivalia a mais de 4 vezes a população de Londres em 1851 No meio século precedente tal movimentação não deve ter sido superior a um milhão e meio de pessoas no todo Movimentos populacionais e industrialização andam juntos já que o desenvolvimento econômico moderno do mundo pede mudan ças substanciais junto aos povos e por outro lado facilita tais movi mentos tornandoos tecnicamente baratos e mais simples através de comunicações novas e melhores assim como evidentemente permite ao mundo manter uma população bem maior A enorme expansão das 204 massas em nosso período não era nem inesperada nem sem preceden tes muito modestos Era certamente previsível nas décadas de 1830 e 1840 Porém o que parecia ser uma corrente viva transformouse su bitamente numa torrente Antes de 1845 somente em um ano ocorreu que mais de 100 mil passageiros tivessem chegado aos Estados Uni dos Mas entre 1846 e 1850 uma média anual de mais de 250 mil deixou a Europa e nos cinco anos subseqüentes uma média anual de 350 mil somente em 1854 não menos que 428 mil chegaram aos Es tados Unidos e embora os números flutuassem segundo as condições econômicas dos países de origem e de destino o fluxo continuou nu ma escala ainda maior do que antes Entretanto por maior que fossem tais migrações elas ainda eram modestas em relação às cifras posteriores Na década de 1880 entre 700 mil e 800 mil europeus emigraram em média cada ano e nos anos posteriores a 1900 entre 1 e 14 milhão por ano Assim entre 1900 e 1910 um número consideravelmente maior de pessoas emigrou para os Estados Unidos do que durante o período inteiro que este livro estuda A mais evidente limitação às migrações era geográfica Deixan do de lado as relíquias do tráfico negreiro já então ilegal e pratica mente estrangulado pela marinha britânica o maior número de mi grantes internacionais era formado de europeus ou mais precisamente neste período europeus ocidentais e alemães Os chineses já estavam certamente se movimentando nas fronteiras do norte de seu império para além da região do povo Han e para as regiões do sul nas penín sulas e ilhas do sudeste asiático mas não se pode imaginar em que número Talvez fosse modesto Em 1871 havia talvez uns 120 mil na Malásia 4 Os indianos começaram depois de 1852 a emigrar pouco a pouco para a vizinha Birmânia O vazio deixado pelo banimento do tráfico escravo estava sendo de certa forma preenchido pelo trans porte de trabalho endividado sobretudo proveniente da Índia e da China 125 mil chineses seguiram para Cuba entre 1853 e 18745 Eles iriam criar as diásporas indianas da Guiana e Trinidad das ilhas dos Oceanos Pacífico e Indico e do Caribe britânico Chineses aventurei ros já estavam sendo atraídos ver capítulo 3 em algum número para as regiões pioneiras da parte americana do Pacífico que iriam pro porcionar aos jornalistas locais algumas brincadeiras sobre lavanderi as cozinheiros eles inventaram o restaurante chinês em São Francis co durante a corrida do ouro e criar demagogos locais com slogans de exclusividade racial A frota mercante em rápido crescimento em todo o mundo deixava então um depósito de pequenas populações de cor nos portos internacionais mais importantes O recrutamento de tropas coloniais sobretudo pelos franceses que esperavam através disso suplantar a superioridade demográfica dos alemães uma ques tão discutida com ansiedade na década de 1860 trouxe alguns outros pela primeira vez para uma região européia Mesmo entre os europeus a migração de massa intercontinental estava confinada aos povos de relativamente poucos países neste pe 205 ríodo sobretudo ingleses irlandeses e alemães e a partir de 1860 no ruegueses e suecos os dinamarqueses nunca emigraram na mesma medida cujo pequeno número esconde o imenso vazio demográfico que deixavam Desta forma a Noruega enviou dois terços de seu au mento populacional para os Estados Unidos superados apenas pelos desafortunados irlandeses que enviaram todo o seu aumento popula cional para fora o país perdeu consistentemente em população em to das as décadas depois da grande epidemia de fome de 184647 Por outro lado embora os ingleses e os alemães tenham mandado apenas aproximadamente 10 de seu aumento populacional para fora em números absolutos isso significava muito Entre 1851 e 1880 cerca de 53 milhões deixaram as Ilhas Britânicas 35 milhões para os Es tados Unidos 1 milhão para a Austrália meio milhão para o Canadá de longe a maior migração transoceânica no mundo Os italianos do sul e sicilianos que iriam tornarse um dilúvio nas grandes cidades das Américas praticamente ainda não haviam começado a sair de suas pequenas e pobres vilas os europeus orien tais católicos ou ortodoxos permaneciam grandemente sedentários e apenas os judeus iam para cidades provinciais para depois seguir em direção às grandes cidades Os camponeses russos mal haviam come çado a emigrar para os grandes espaços abertos da Sibéria antes de 1880 embora tivessem seguido em grande número para as estepes da Rússia européia cuja colonização tinha sido mais ou menos comple tada por volta de 1880 Os poloneses mal haviam começado a povoar as minas de Ruhr antes de 1890 embora os tchecos já estivessem se deslocando para o sul de Viena O grande período da emigração esla va judaica e italiana para as Américas começaria em 1880 Já que a maioria dos europeus era de origem rural assim eram os emigrantes O século XIX foi uma gigantesca máquina para elevar os homens do campo A maioria deles foi para as cidades ou a qual quer preço para fora do ambiente tradicional rural em busca do me lhor caminho que pudessem encontrar em mundos estranhos assusta dores mas sobretudo promissores onde se dizia que o pavimento das cidades era leito de ouro embora alguns emigrantes não encontras sem mais do que algum cobre Não é exatamente verdade que as cor rentes migratórias fossem todas iguais Alguns pequenos grupos de migrantes sobretudo alemães e escandinavos que seguiram para a região dos Grandes Lagos nos Estados Unidos ou os colonos escoce ses no Canadá trocaram um meio agrícola rural pobre por um me lhor somente 10 dos emigrantes para os Estados Unidos em 1880 foram para a agricultura e a maioria não como fazendeiros possi velmente devido ao preço dos equipamentos necessários6 Se a redistribuição dos homens do campo através do globo não pode ser negligenciada é contudo menos surpreendente do que o ê xodo da agricultura Migração e urbanização andavam juntas e na se gunda metade do século XIX os países mais associados a este proces so Estados Unidos Austrália Argentina tinham uma taxa de con 206 centração urbana não superada em nenhum lugar exceto na Inglaterra e nus partes industrializadas da Alemanha Em 1890 as 20 maiores cidades do mundo incluíam cinco nas Américas e uma na Austrália Homens e mulheres transferiramse para as cidades embora talvez com certeza na Inglaterra cada vez mais oriundos de outras cidades Se a transferência se dava dentro do próprio país isto não levan tava nenhum problema novo de técnica Na maioria dos casos eles não iam muito longe ou se fossem os caminhos para a cidade já ha viam sido percorridos por vizinhos Novos rumos eram às vezes aber tos pela tecnologia tais como a estrada de ferro que trouxe os bretões à Paris para perder sua fé como no provérbio na estação de Mont parnasse e para preencher os bordéis da cidade com seus habitantes mais característicos Garotas da Bretanha substituíram as de Lorraine como as prostitutas mais familiares As mulheres migrantes entre países tornaramse em sua maioria empregadas domésticas até que se casassem com um compatriota ou passassem para alguma ocupação urbana A migração de famílias ou mesmo de casais era incomum Os homens seguiam o comércio tradi cional de suas regiões ao se transferirem para as cidades no caso de serem especializados sua própria profissão ou então se comercian tes alguma forma de pequeno comércio sobretudo de alimentos ou bebidas Além destes casos eles encontravam emprego sobretudo nas duas grandes ocupações que não requeriam nenhuma especialização particular estranha a homens do campo ou seja construção e trans porte Em Berlim em 1885 81 dos homens engajados no suprimen to de alimentos 835 dos envolvidos em construção e mais de 85 daqueles em transporte tinham nascido fora da cidade7 Se eles não tinham muita sorte nos empregos mais especializados exceto quando aprendizes por outro lado estavam em melhor situação do que os mais pobres nascidos na própria cidade O pior dos quarteirões pobres era habitado mais freqüentemente pelos nativos do que pelos emi grantes No nosso período ainda não havia muita alternativa de traba lho fabril na maioria das grandes capitais A maior parte desta estrita produção industrial encontravase nas cidades médias embora crescendo rapidamente ou mesmo so bretudo nas minas e em algumas espécies têxteis nas vilas e peque nas cidades Ali não havia uma demanda comparável para mulheres imigrantes exceto nos têxteis e os empregos para os imigrantes ho mens eram quase que por definição não especializados e mal pagos Migrações através de fronteiras e oceanos levantavam proble mas mais complexos e isso não era de nenhuma forma devido ao fato de os imigrantes não entenderam a língua do país Na realidade a maior parte dos imigrantes aqueles das Ilhas Britânicas não tinham dificuldades lingüísticas significativas embora alguns migrantes in ternos a tivessem como por exemplo dentro dos impérios multina cionais da Europa central e oriental Entretanto fora a língua a emi gração sem dúvida aumentou de forma aguda a questão da origem na cional dos indivíduos ver também capítulo 5 Se alguém permane 207 cesse num país novo deveria ser obrigado a romper as ligações com o antigo A questão não se levantava na transferência para as colônias do Estado onde era possível manter as nacionalidades inglesa ou francesa fosse na Nova Zelândia ou na Argélia pensando no velho país como o lar Levantava problemas mais agudos porém nos Es tados Unidos que recebia imigrantes mas impunha que estes se trans formassem rapidamente em cidadãos americanos falando inglês já que qualquer cidadão racional não poderia desejar outra coisa senão ser americano De fato a maioria deles assim o fez Uma mudança de cidadania não implicava evidentemente um divórcio em relação ao velho país Bem ao contrário O imigrante típi co largado em um lugar estranho que o havia recebido de forma sufi cientemente fria voltavase naturalmente para o único agrupamento humano que lhe era familiar e que podia ajudálo a companhia dos compatriotas A América que havialhe ensinado as primeiras frases formais em inglês Ouço a sirene Preciso andar depressa não era uma sociedade mas um meio de fazer dinheiro Podiase ler numa bro chura da International Harvest Corporation feita para ensinar inglês aos trabalhadores poloneses as frases subseqüentes da primeira lição Ouço a sirene de cinco minutos É hora de ir para a fábrica Apanho meu cartão no portão e entrego no departamento Mudo minhas roupas e fico pronto para trabalhar Toca a primeira sirene do início do trabalho Como meu almoço É proibido comer antes disso Aprontome para ir para o trabalho Trabalho até que a sirene toque novamente Deixo meu lugar limpo e bem arrumado Preciso ir para a casa 8 A primeira geração de imigrantes por mais zelosa que fosse ao tentar aprender as técnicas da nova vida terminava por viver num gueto autoimposto apoiandose nas velhas tradições e nas memórias do antigo país que tinha abandonado tão prontamente Mesmo os ri cos financistas judeus de Nova York os Guggenheims Kuhns Sachs Seligmanns e Lehmajins que tinham o que o dinheiro podia comprar nos Estados Unidos não eram americanos da forma que os Wer theimsteins em Viena consideravamse austríacos os Bleichroeders em Berlim consideravamse prussianos e mesmo os internacionais Rothschilds em Londres e Paris consideravamse ingleses e franceses Eles permaneceram tanto alemães como americanos Falavam escre viam e pensavam em alemão freqüentemente enviavam seus próprios filhos para serem educados no antigo país juntavamse e apoiavam financeiramente associações germânicas9 Mas a emigração levantou muito mais dificuldades materiais e lementares Os homens precisavam descobrir aonde ir e o que fazer ao chegar no novo lugar Eles precisavam ir para Minesota de algum 208 remoto fiorde norueguês para o condado de Green Lake ou Wiscon sin da Pomerânia ou Brandemburgo para Chicago de alguma vila em Kerry O custo em si mesmo não era uma dificuldade insuperável embora as condições de viagem para emigrantes através do oceano fossem famigeradas especialmente nos anos posteriores à epidemia de fome na Irlanda se não assassinas Em 1885 a passagem de um emi grante de Hamburgo para Nova York custava 7 dólares As tarifas e ram baixas não apenas porque consideravase que este tipo de passa geiro não necessitava ou merecia melhores acomodações do que ani mais mas afortunadamente necessitando menos espaço ou porque faltassem melhorias nas comunicações mas também por razões eco nômicas Emigrantes eram carga Provavelmente para a maioria das pessoas o custo da viagem para o porto final de embarque Le Ha vre Bremen Hamburgo e sobretudo Liverpool era bem maior que a travessia em si Mesmo assim este dinheiro não estava ao alcance dos mais po bres entre todos embora estas somas pudessem ser facilmente eco nomizadas e enviadas da América ou Austrália com seus altos salá rios para os parentes nos antigos países De fato tais pagamentos e ram parte da vasta soma de remessas para o exterior de imigrantes que estranhos às altas formas de gastos de seus novos países podiam economizar bastante Os irlandeses sozinhos enviaram de volta entre 1 e 7 milhões de libras esterlinas anualmente no começo da década de 1850 10 Entretanto quando o parente não podia ajudar uma varie dade de intermediários com interesse financeiros entrava em ação Onde havia uma grande demanda por trabalho de um lado uma popu lação ignorante das condições no país escolhido de outro e uma longa distância pelo meio o agente ou contratador florescia Tais indivíduos faziam seus lucros acumulando gado humano nas mãos das companhias de navegação ansiosas para encher seus navios para enviálo às autoridades públicas e companhias de estra das de ferro interessadas em povoar seus territórios vazios para pro prietários de minas donos de siderúrgicas e outros empregadores de trabalho primário que necessitavam de braços Os agentes eram pagos pelos empregadores e pelos centavos de homens e mulheres que tal vez fossem forçados a atravessar metade de um continente estranho antes de embarcar para cruzar o Atlântico da Europa central para o Havre ou através do Mar do Norte via Inglaterra para Liverpool Po demos deduzir que eles geralmente exploravam a pobreza e a igno rância embora os extremos do contrato de trabalho e servidão de dí vida fossem talvez incomuns neste período exceto entre os indianos e os chineses enviados para plantações Em geral tais intermediários não sofriam nenhum controle exceto alguma supervisão quanto às condições sanitárias a bordo depois das terríveis epidemias do final da década de 1840 Eles tinham a opinião pública dos influentes por detrás A burguesia de meados do século XIX ainda acreditava que a Europa era superpovoada por pobres Quanto maior quantidade fosse 209 embarcada para fora melhor para todos eles porque melhorariam su as condições e melhor para os que ficassem porque o mercado de trabalho seria aliviado Sociedades beneficentes até sindicatos traba lharam para arranjar subsídios para a emigração de seus clientes ou membros como o único meio prático de lidar com o pauperismo e o desemprego Parecia uma boa justificativa o fato de que em nosso período os países em processo de industrialização mais rápida fos sem ao mesmo tempo os maiores exportadores de homens como a Inglaterra e a Alemanha O argumento era hoje se sabe errado Dan do um balanço a economia dos países que despachavam homens teria se beneficiado mais se tivesse empregado estes recursos humanos ao invés de expulsálos Por outro lado as economias do Novo Mundo beneficiaramse enormemente com o êxodo do Velho Mundo E tam bém os imigrantes O pior período de sua pobreza e exploração nos Estados Unidos parece ter ocorrido depois do final de nosso período Por que pessoas emigravam Sobretudo por razões econômicas quer dizer porque eram pobres Apesar das perseguições políticas de pois de 1848 refugiados políticos ou ideológicos formavam apenas uma pequena fração da emigração de massa mesmo em 184954 em bora houvesse um tempo em que radicais controlaram metade da im prensa em língua alemã nos Estados Unidos onde eles aproveitavam para denunciar seu país de refúgio 11 Seu ardor entretanto rapidamen te esmaeceu assim como a maioria dos imigrantes nãoideológicos que transferiram suas energias revolucionárias para a campanha anti escravista A fuga de seitas religiosas procurando maior liberdade pa ra prosseguir em suas atividades freqüentemente peculiares era pro vavelmente menos significativa que no meioséculo precedente já que os governos vitorianos não tinham uma posição muito forte em ortodoxia como tal embora não achassem desagradável se livrarem dos mórmons ingleses ou dinamarqueses cuja tendência à poligamia causava problemas Mesmo na Europa oriental as ativas campanhas antisemitas que iriam estimular a emigração de massa dos judeus ainda era coisa para o futuro As pessoas emigravam para escapar às más condições em casa ou para procurar melhores no exterior Tem havido uma longa e inú til discussão sobre este ponto Não há dúvida de que pobres tendiam a emigrar mais do que ricos e que eles tenderiam a fazêlo mais ainda se as condições tradicionais de vida viessem a se tornar difíceis ou impossíveis Portanto na Noruega artesãos emigraram mais do que trabalhadores de fábrica mais tarde foi a vez dos pescadores quando a vela deu lugar ao vapor Há igualmente pouca dúvida de que neste período quando a idéia de jogar fora o antigo era ainda estranha e as sustadora para a maioria das pessoas alguma forma de força cata clísmica ainda era necessária para leválos ao desconhecido Um tra balhador de fazenda em Kent escrevendo da Nova Zelândia agrade ceu aos fazendeiros por havêlo expulsado por causa de uma greve já 210 que agora ele se encontrava muito melhor ele não teria pensado em partir de outra maneira Entretanto como a emigração maciça tornavase parte integran te da experiência do povo comum em que cada criança do condado de Kildare tinha algum primo tio ou irmão já na Austrália ou nos Es tados Unidos a partida se tornou uma opção normal e não necessa riamente irreversível baseada numa escolha de perspectivas e não meramente uma força do destino Se chegassem notícias de que havia sido descoberto ouro na Austrália ou que empregos abundavam e e ram bem pagos nos Estados Unidos a emigração aumentava Inver samente caiu nos anos depois de 1873 quando a economia dos Esta dos Unidos encontrouse em depressão aguda Portanto não pode ha ver dúvida de que a primeira grande onda de emigração de nosso pe ríodo 184554 foi essencialmente uma fuga da fome ou pressão da população na terra basicamente na Irlanda e na Alemanha que forne ceu 80 de todos os emigrantes transatlânticos nestes anos Nem era a emigração necessariamente permanente Emigrantes em que proporção não sabemos sonhavam em fazer sua fortuna no exterior e depois voltar para casa ricos e respeitados Uma grande proporção entre 30 e 40 realmente o fez embora na maioria das vezes pela razão oposta porque não tinham gostado do Novo Mundo ou tinham tido dificuldades em lá se estabelecer Outros emigraram novamente Na medida em que as comunicações revolucionarizavam se o mercado de trabalho especialmente para trabalhadores especia lizados expandiase até abarcar todo o mundo industrializado A lista dos líderes sindicais ingleses deste período estava cheia de homens que haviam trabalhado no exterior nos Estados Unidos ou em outro lugar qualquer já que teriam podido trabalhar tanto em Newcastle como em BarrowinFurness dado às suas qualidades profissionais Portanto agora se tornava possível fazer emigração através dos ocea nos por estação do ano ou temporariamente De fato o aumento maciço da emigração continha uma quanti dade considerável de movimento nãopermanente temporário por estações ou meramente nômade Nada em si havia de novo nestes movimentos Todos estes viajantes eram familiares antes da Revolu ção Industrial Porém a rápida extensão mundial da nova economia iria pedir e portanto criar novos tipos de tais viajantes Consideremos o símbolo desta extensão a estrada de ferro Seus donos cobriam o globo e com eles o pessoal de maioria inglesa ou irlandesa composto de gerentes trabalhadores especializados e elite proletária algumas vezes estabelecendose para sempre seus filhos tornandose os angloargentinos da geração seguinte ou então mo vendose de país para país como muitos dos homens ligados ao pe tróleo hoje em dia Já que estradas de ferro eram construídas em qualquer lugar não se podia confiar necessariamente na força de tra balho local mas em lugar disso desenvolver um corpo de trabalha dores nômades que ainda caracteriza os grandes projetos de constru 211 ção através do mundo Na maioria dos países industriais estes eram recrutados entre homens marginais e sem lugar fixo prontos para tra balhar duro por um bom pagamento mesmo em más condições e be ber ou jogar o dinheiro ganho também de forma dura pensando pou co no futuro Pois assim como para o marinheiro há sempre um outro navio para estes trabalhadores ambulantes haveria também sempre um outro grande projeto de construção quando o atual tivesse termi nado Homens livres nas fronteiras da indústria chocando o respeitá vel de todas as classes heróis de um folclore de masculinidade não oficial eles assumiam o mesmo tipo de papel que os marinheiros e mineiros de fronteiras embora recebendo mais que os primeiros sem porém ter a esperança de fortuna dos últimos Nas sociedades agrárias mais tradicionais estes construtores móveis formavam uma importante ponte entre a vida rural e industri al Organizados em grupos ou times regulares liderados por um capi tão eleito que negociava termos e partilhava das negociações dos con tratos camponeses pobres da Itália Croácia ou Irlanda atravessariam continentes ou mesmo oceanos para fornecer trabalho aos construto res de cidades fábricas ou estradas de ferro Tais migrações desen volveramse nas planícies húngaras a partir da década de 1850 Os menos organizados dentre estes camponeses freqüentemente ofereci am uma eficiência superior e maior disciplina ou docilidade e a disposição para trabalhar por salários baixos Não é suficiente entretanto chamar a atenção para o crescimen to daquilo que Marx denominou a cavalaria ligeira do capitalismo sem observar concomitantemente uma diferença significativa entre os países desenvolvidos ou mais precisamente entre o Velho e Novo Mundo A expansão econômica produziu uma fronteira em todos os lugares Algumas vezes uma comunidade mineira tal como em Gel senkirchen na Alemanha que cresceu de 3500 habitantes para qua se 96 mil entre 1858 e 1895 era um Novo Mundo comparável a Buenos Aires ou Pensilvânia como centro industriais Mas no Velho Mundo em geral a necessidade de uma população móvel foi obtida sem que todavia se criasse mais do que uma população flutuante com parativamente modesta exceto nos grandes portos e nos centros tradi cionais como as grandes cidades Isto talvez tenha acontecido porque seus membros possuíam algum sentido de comunidade ligandoos a uma sociedade estruturada Foi nas regiões escassamente povoadas ou além das fronteiras da colonização no alémmar onde grupos de tra balhadores ambulantes eram mais necessitados que tais grupos de in divíduos flutuantes fizeram sentir sua presença como comunidade ou pelo menos foram mais visíveis O Velho Mundo estava cheio de viajantes e aventureiros mas nenhum deles atraiu a atenção como os cowboys americanos de nosso período embora seus equivalentes na Austrália os itinerantes fazendeiros de ovelhas e outros trabalhadores rurais do hinterland também tenham produzido um poderoso mito lo cal 212 II A forma característica de viagem para o pobre era a migração Para a classe média e os ricos era mais e mais turismo essencialmen te um produto da estrada de ferro barco a vapor e até onde a inven ção de nosso período o cartão postal também é uma parte essencial do processo da nova magnitude e rapidez das comunicações postais Estas foram sistematizadas internacionalmente com o estabelecimen to da International Postal Union em 1869 Homens pobres nas cida des viajavam por necessidade mas raramente por prazer salvo quan do era a pé as autobiografias dos artesãos vitorianos estão repletas de titânicas caminhadas campestres e por períodos restritos Ho mens pobres no campo nunca viajavam somente por prazer combi nando prazer com negócios nos mercados e feiras A aristocracia via java muito por razões nãoutilitárias mas de uma forma que nada tem em comum com o turismo moderno Famílias nobres partiam das ca sas na cidade para as casas de campo regularmente nas estações com um cortejo de empregados e veículos de bagagem como se fossem pequenos exércitos Aliás o pai do príncipe Kropotkin dava à sua mulher e à criadagem ordens específicas dentro de uma tradição mili tar Eles poderiam também se estabelecer em algum centro adequado de vida social por algum tempo como aquela família latino americana como atesta o Guide de Paris de 1867 que desembarcou com 18 vagões de bagagem O Grand Tour dos jovens nobres ainda não implicava no Grand Hotel do turismo da era capitalista em parte porque esta instituição ainda estava se desenvolvendo mais ou me nos em conexão com as estradas de ferro e em parte também porque estes nobres desdenhavam parar em hotéis de passagem O capitalismo industrial produziu duas novas formas de viagens de prazer turismo e viagens de verão para a burguesia e pequenas excursões mecanizadas para as massas em alguns países como a In glaterra Ambas eram os resultados diretos da aplicação do vapor no transporte já que pela primeira vez na história viagens regulares e seguras eram possíveis para grandes quantidades de pessoas e baga gem e por qualquer tipo de terreno ou mar Diferente das diligências que poderiam ter seu caminho interrompido por bandoleiros em regi ões remotas as locomotivas eram imunes desde o princípio exceto no Oeste Americano mesmo em áreas notoriamente pouco seguras como na Espanha e nos Bálcãs As viagens de um dia para as massas se excluirmos as excur sões em navios tinham nascido na década de 1850 para ser mais preciso na Grande Exibição de 1851 que atraiu um vasto número de visitantes para suas maravilhas em Londres um tráfico encorajado pelas estradas de ferro com bilhetes a preços especiais e organizado pelos membros de inúmeras sociedades locais e comunidades O pró prio Thomas Cook cujo nome iria tornarse sinônimo de turismo or ganizado nos 25 anos seguintes tinha começado sua carreira fazendo 213 tais arranjos e mais tarde desenvolvendoos em um grande negócio a partir de 1851 As numerosas exposições internacionais ver capítulo 2 traziam cada uma seu exército de visitantes e a reconstrução de capitais encorajou cidades provincianas a exibir suas maravilhas Pouco mais precisa ser dito sobre o turismo neste período Permane ceu confinado a pequenas viagens extenuantes para o padrão con temporâneo trazendo na sua bagagem uma florescente indústria me nor a dos souvenirs Em geral as estradas de ferro de qualquer ma neira na Inglaterra tinham pouco interesse nas viagens de terceira classe embora o governo obrigasseas a fornecer pelo menos um mí nimo Porém em 1872 as estradas de ferro inglesas iriam obter 50 de suas passagens neste nível Aliás na medida em que viagens regu lares de terceiraclasse aumentavam o tráfico de excursão em trens especiais tornavase menos importante A classe média porém viajava com mais seriedade A forma mais importante de tais viagens em termos quantitativos era prova velmente a da viagem de verão da família ou para os mais ricos uma estação de águas Este período viu um grande desenvolvimento de tais lugares na costa da Inglaterra nas montanhas do continente Embora Biarritz já fosse bastante famosa na década de 1860 graças ao patrocínio de Napoleão III e a pinturas impressionistas que de monstravam um interesse visível nas praias da Normandia a burgue sia do continente ainda não se sentia comprometida com a água sal gada e o sol Em meados da década de 1860 um boom de férias clas semédias já transformava partes da costa britânica com lugares para passeios na beira do mar piers e outros embelezamentos que torna ram possível a proprietários de terras obter lucros insuspeitados de faixas de terra antes sem nenhum valor Estes eram fenômenos de classe média e de baixa classe média No total as regiões de lazer da classe operária não se tornaram muito significativas até a década de 1880 quando então a nobreza certamente não consideraria uma esta dia em Bournemouth onde o poeta francês Verlaine passaria uma temporada ou Ventnor onde Turgenev e Karl Marx foram tomar um pouco de ar como uma atividade propícia para o verão As estações de água do continente as inglesas não tinham atin gido tal proeminência eram bem mais estilizadas proporcionando portanto hotéis de luxo e os divertimentos necessários para clientela tão distinta como cassinos e bordéis de alta classe Vichy Spa Ba denBaden AixlesBaines mas sobretudo todas as grandes estações de águas da monarquia dos Habsburgos Gastein Marienbad Karls bad etc eram para a Europa do século XIX o que Bath havia sido pa ra a Inglaterra do século XVIII lugares da moda para passear justifi cados pela desculpa de beber alguma água mineral de gosto desagra dável ou de imergir em alguma forma líquida sob o controle benevo lente de algum médico O status destes lugares era determinado pelo papel desempenhado na diplomacia do período Napoleão III encon 214 trou Bismarck em Biarritz e Cavour em Plombières e uma convenção foi encerrada em Gastein Entretanto o fígado era um grande nivela dor e as estações de águas minerais atraíram uma boa quantidade de ricos nãoaristocráticos e profissionais de classe média cujas tendên cias para comer e beber demasiadamente eram reforçadas pela pros peridade Afinal Dr Kugelmann recomendou Karlsbad para um membro tão pouco típico da classe média como Karl Marx que cui dadosamente registrouse como homem de meios privados para evi tar identificação até que descobriu que como Dr Marx ele poderia e conomizar uma Kurtaxe12 mais ou menos elevada Na década de 1840 poucos destes lugares haviam saído da simplicidade rural Em 1858 o Murrays Guide descrevia Mariembad como um lugar comparativa mente recente e indicava que Gastein tinha apenas 200 quartos para hóspedes Mas na década de 1860 todos estes lugares floresciam Sommerfrische férias de verão e Kurort estação de águas e ram para os burgueses coisas normais a França e a Itália tradiciona listas confirmam hoje que o descanso anual era então uma instituição burguesa Para os mais delicados um sol tépido era indicado isto quer dizer invernos no Mediterrâneo A Cote dAzur havia sido des coberta pelo Lorde Brougham o político radical cuja estátua ainda domina a vista em Cannes e embora os nobres russos viessem a se tornar seus clientes mais lucrativos o nome Promenade des Anglais em Cannes ainda indica quem abriu esta nova fronteira do rico lazer Monte Carlio construiu seu Hotel de Paris em 1866 Depois da aber tura do Canal de Suez e especialmente depois da construção da es trada de ferro ao longo do Nilo o Egito tornouse o lugar para aque les cuja saúde desaconselhava os outonos e invernos do Norte com binando as vantagens climáticas o exotismo os monumentos de anti gas civilizações com a dominação européia O incansável Baedeker editou seu primeiro guia para este país em 1877 Ir para o Mediterrâneo no verão exceto com o objetivo de pro curar arte e arquitetura ainda era visto como loucura até no início do século XX era do culto ao sol e das peles bronzeadas Somente al guns lugares como a baía de Nápoles e Capri estabelecidos graças ao patrocínio da Imperatriz da Rússia eram considerados toleráveis na estação quente A modéstia dos preços locais na década de 1870 indica uma era de início de turismo Americanos ricos saudáveis ou doentes ou melhor suas esposas e filhas faziam fila nos centros da cultura européia embora no final de nosso período os milionários já estivessem começando a estabelecer seu estilo de residência de ve rão Xanadus construídos ao longo da costa da Nova Inglaterra Os ri cos nos países quentes tomaram o caminho das montanhas Precisamos entretanto distinguir duas formas de passeio o mais longo verão ou inverno e o tour que tornavase cada vez mais prático e rápido Como sempre as maiores atrações eram as paisa gens românticas e os monumentos da cultura mas pela década de 1860 os ingleses pioneiros como sempre exportavam sua paixão 215 pelo exercício físico para as montanhas da Suíça onde mais tarde en contrariam o esqui como esporte de inverno O Clube Alpino foi fun dado em 1858 e Edward Whymper escalou o Matterhorn em 1865 Por razões de certa forma obscuras tais atividades extenuantes cerca das de um cenário inspirador atraíam particularmente intelectuais a profissionais liberais anglosaxões a ponto do alpinismo juntarse ao costume de fazer longas caminhadas como hábito característico dos acadêmicos de Cambridge altos funcionários professores de escolas privadas filósofos e economistas para surpresa de intelectuais lati nos mas não tanto dos alemães Quanto aos viajantes menos ativos seus passos eram guiados por Thomas Cook e os sólidos guias do pe ríodo sendo que o pioneiro Murrays Guides começava a ser obscu recido por aquelas bíblias do turismo os Baedekers alemães então publicados em diversas línguas Estes tours não eram baratos No início da década de 1870 uma viagem de seis semanas para duas pessoas de Londres via Bélgica Vale do Reno Suíça e França talvez o itinerário turístico mais co mum custava cerca de 85 libras ou aproximadamente 20 da renda anual de uma pessoa recebendo 8 libras por semana que seria o salá rio de um respeitável empregado doméstico naqueles dias13 Tal soma tomaria mais de três quartas partes do salário anual de um bempago operário especializado britânico É evidente que o turista que era ob jeto das estradas de ferro hotéis guias turísticos etc pertencia à con fortável classe média Estes eram os homens e mulheres que sem dú vida reclamavam do custo das casas desocupadas em Nice que havia subido entre 1858 e 1876 de 64 libras para 100 por ano e salário de empregados domésticos que tinha igualmente subido de 810 libras para o escândalo de 2430 por ano 14 Mas estas também eram as pes soas que é seguro dizer podiam pagar tais preços Estava então o mundo da década de 1870 dominado por migra ções viagens e fluxo demográfico É fácil esquecer que a maioria das pessoas deste planeta ainda vivia e morria no lugar onde havia nasci do e que toda esta movimentação não era maior ou diferente do que havia sido antes da Revolução Industrial Havia certamente mais gen te no mundo que se parecia com os franceses 88 dos quais em 1861 vivia no département de nascimento no département de Lot 97 vivia ainda na parish de nascimento do que com populações mais móveis e migratórias 15 E portanto as pessoas que iam sendo gradu almente arrancadas de suas tradições habituavamse a viver de uma forma em que viam coisas que seus pais nunca haviam feito e eles mesmos não esperavam fazer Pelo final de nosso período os imi grantes formavam uma substancial maioria não apenas em países co mo a Austrália e cidades como Nova York e Chicago mas em Esto colmo Christiania atualmente Oslo Budapeste Berlim e Roma en tre 55 e 60 assim como Paris e Viena 6516 As cidades e as no vas áreas industriais eram cada vez mais os magnetos que os atraí am Que tipo de vida os esperava ali Mechanisms and Limitations of Antigen Presentation by Endothelial Cells 217 DécimoSegundo Capítulo A CIDADE A INDÚSTRIA A CLASSE TRABALHADORA Agora eles fazem até o nosso pão diário Com vapor e com turbina E muito em breve a nossa própria conversa Vamos empurrála com uma máquina Em Trautenau há duas igrejas Uma para os ricos e outra para os pobres Nem mesmo na sepultura É o pobre desgraçado seu igual Poema in Trautenau Wochenblatt 1869 1 Nos velhos tempos se alguém chamasse um artesão de trabalhador ele seria levado certamente a uma briga Mas agora disseram aos artesãos que os trabalhadores estão no topo do Estado e portanto todos insistem em ser trabalhadores M May 18482 A questão da pobreza é a mesma que a da morte doença inverno ou qualquer outro fenômeno natural Não sei qual delas é possível de im pedir William Makepeace Thackeray 18483 I Dizer que os novos migrantes chegaram ou que novas gerações então nasceram num mundo de indústria e tecnologia é bastante ób vio mas não muito esclarecedor em si Que tipo de mundo era este Era em primeiro lugar um mundo que não consistia apenas de fábricas empregadores e proletários ou que tivesse sido transforma do pelo enorme progresso de seu setor industrial Por mais espantosas que fossem estas medidas em si mesmas não são adequadas para me dir o impacto do capitalismo Em 1866 Reichenberg Liberec o cen tro têxtil da Bohemia ainda tinha metade de sua produção total atra vés de trabalho manual embora estes dependessem de alguma forma de algumas grandes fábricas Era uma região sem dúvida menos a vançada em organização industrial que Lancashire onde os últimos dentre os trabalhadores manuais foram absorvidos por alguma outra 218 forma de trabalho na década de 1850 No ponto culminante do boom do açúcar do início da década de 1870 apenas 40 mil trabalhadores foram empregados na indústria açucareira Mas este fato mede menos o impacto da nova indústria de açúcar do que o fato de quantidade de acres ocupados na sua produção haver sido multiplicada no campo da Bohemia por vinte vezes entre 185354 4800 hectares e 187273 123 800 hectares4 O número dos passageiros nas linhas de estradas de ferro na Inglaterra quase que dobrou entre 1848 e 1854 de 58 para 108 milhões enquanto que a receita das companhias de carga multiplicouse em duas vezes e meia e isto é mais significativo que o percentual preciso de mercadorias industriais ou viagens de negó cios ocultadas por estes números E ainda o trabalho industrial em si mesmo na sua estrutura e organização característica além da urbanização vida nas cidades que cresciam rapidamente eram certamente as formas mais dramáti cas da nova vida nova porque mesmo a continuação pura e simples de alguma ocupação local escondia mudanças de longo alcance Al guns anos depois do fim de nosso período 1887 o professor alemão Ferdinand Toennies formulou a distinção entre Gemeinschaft comuni dade e Gesellschaft uma sociedade de indivíduos gêmeos hoje fami liares a qualquer estudante de sociologia A distinção é similar a outras feitas por observadores da época entre jargões criados para denomi naras sociedades tradicionais e modernas por exemplo a fórmula de Sir Henry Maine reduzindo o progresso da sociedade ao percurso do status ao contrato O ponto a observar entretanto é que Toennies baseou sua análise não na diferença entre comunidade camponesa e so ciedade urbanizada mas entre a cidade antiquada ea metrópole ca pitalista essencialmente uma cidade comercial e na medida em que o comércio domina o trabalho produtivo uma cidadefábrica5 Este no vo ambiente e sua estrutura são o objeto do presente capítulo A cidade era sem dúvida o mais impressionante símbolo exterior do mundo industrial exceção feita à estrada de ferro A urbanização cresceu rapidamente depois de 1850 Na primeira metade do século somente a Inglaterra tinha tido uma taxa anual de urbanização supe rior a 020 pontos representando a mudança do ponto percentual no nível da população urbana entre o primeiro e último censo do perío do dividido pelo número de anos6 embora a Bélgica praticamente atingisse aquele nível Mas entre 1850 e 1890 até a AustroHungria Noruega e Irlanda urbanizavamse àquela taxa sendo que a Bélgica e os Estados Unidos entre 030 e 040 Prússia Austrália e Argentina entre 040 e 050 Inglaterra e País de Gales além da Saxônia a mais de 050 por ano Dizer que a concentração de pessoas em cidades era o mais impressionante fenômeno social do atual século 7 era dizer o óbvio Para os nossos padrões ainda era modesta pelo final do sécu lo pouco mais de uma dúzia de países havia atingido à taxa de con centração urbana da Inglaterra e País de Gales em 1801 Porém todos exceto Escócia e Holanda já haviam atingido este nível desde 1850 219 A cidade industrial típica era neste período uma cidade de tama nho médio mesmo por padrões atuais embora como ocorresse na Europa central e oriental algumas cidades que tendiam a ser muito grandes também se tornaram centros maiores de produção por e xemplo Berlim Viena e São Petersburgo Oldham tinha 83 mil habi tantes em 1871 Barmen 75 mil Roubaix 65 mil Mas as antigas cida des industriais de maior reputação geralmente não atraíam as novas formas de produção e conseqüentemente a nova região industrial tí pica tomava em geral a forma de pequenas vilas que se transforma vam em pequenas cidades que depois se desenvolviam transforman dose em grandes cidades Poucos de seus habitantes estavam a uma distância do campo superior a uma caminhada Até a década de 1870 as grandescidades da Alemanha industrial do ocidente tais como Colônia e Dusseldorf alimentavamse com os mantimentos trazidos ao mercado semanal pelos camponeses das regiões circunvizinhas 8 Em certo sentido o choque da industrialização residia precisamente no grande contraste entre as habitações escuras monótonas repletas de gente e as fazendas coloridas circunvizinhas como em Sheffield por exemplo Isso é o que tornava possível que trabalhadores em áreas em processo de industrialização embora tal fenômeno diminuísse rapi damente permanecessem meioagricultores Até depois de 1900 os mineiros na Bélgica tiravam férias na estação certa se necessário a través de uma greve de batatas para ir tomar conta de suas planta ções de batatas Mesmo na Inglaterra do norte os desempregados na zona urbana podiam facilmente voltar ao trabalho nas fazendas pró ximas em época de verão 9 A grande cidade quer dizer um povoamento de mais de 200 mil incluindo um punhado de cidades metropolitanas de mais de meio milhão não era exatamente um centro industrial embora pu desse contar um bom número de fábricas mas mais precisamente um centro de comércio transporte administração e uma multiplicidade de serviços que uma grande concentração de pessoas atraía A maio ria de seus habitantes era de fato composta de trabalhadores de um tipo ou de outro incluindo um grande número de empregados domés ticos quase que um entre cinco habitantes de Londres 1851 mas uma proporção bem inferior em Paris 10 E ainda estas mesmas di mensões garantiam que estas cidades também contivessem uma boa porcentagem de classe média e baixa classe média digamos entre 20 e 23 tanto em Londres como em Paris Tais cidades cresceram com extraordinária rapidez Viena cres ceu de mais de 400 mil em 1846 para 700 mil em 1880 Berlim de 378 mil 1X49 para quase um milhão 1875 Paris de 1 para 19 mi lhão e Londres de 25 para 39 milhões 185181 embora estes nú meros percam o brilho diante de alguns outros de alémmar Chicago ou Melbourne Mas a forma imagem e estrutura mesma da cidade havia mudado tanto sob pressão para construção e planejamento poli 220 ticamente motivada sobretudo em Paris e Viena como pela fome de lucro das construtoras Ambas não recebiam bem a presença dos po bres nas cidades que eram a maioria da população embora reconhe cessem que eram um mal necessário Para os planejadores de cidades os pobres eram uma ameaça pública suas concentrações potencialmente capazes de se desenvol ver em distúrbios deveriam ser impedidas e cortadas por avenidas e bulevares que levariam os pobres dos bairros populosos a procurar habitações em lugares menos perigosos Esta também era a política das estradas de ferro que fazia suas linhas passarem através destes bairros onde os custos eram menores e os protestos negligenciáveis Para os construtores os pobres eram um mercado que não dava lucro comparado ao dos ricos com suas lojas especializadas e distritos de comércio e também às sólidas casas e apartamentos para a classe média Quando os pobres não ocupavam os distritos centrais das ci dades abandonados pelas classes mais elevadas seus lugares eram construídos por empresários especuladores ou pelos construtores dos grandes blocos de aluguel conhecidos na Alemanha como barra cões de aluguel Mietskasernen Das casas populares construídas em Glasgow entre 1866 e 1874 75 eram de um ou dois quartos a penas e mesmo assim foram rapidamente ocupadas Quem diz cidade de meados do século XIX diz superpovoada e cortiço e quanto mais rápido a cidade crescesse pior era em su perpopulação Apesar da reforma sanitária e do pequeno planejamen to que ali havia o problema da superpopulação talvez tenha crescido neste período sem que a saúde tenha melhorado quando não piorou decididamente As maiores melhorias neste setor só começaram a o correr no final de nosso período As cidades ainda devoravam suas populações embora as cidades inglesas na qualidade de mais antigas da era industrial estivessem próximas de se reproduzirem a si mes mas isto é crescer sem a constante e maciça transfusão de sangue re presentada pela imigração Dar mais atenção às necessidades dos pobres em si não chegaria a dobrar o número dos arquitetos londrinos em 20 anos de pouco mais de 1 mil para 2 mil na década de 1830 eles deveriam perfazer menos de uma centena embora a construção de casas populares vi esse a se transformar num negócio bastante lucrativo Era na reali dade uma época de boom na arquitetura e na construção para a burguesia Sua história foi escrita em relação a Paris por Emile Zola A época iria assistir a construção de casas em lugares caros que au mentavam constantemente de preço e conseqüentemente o nascimen to do elevador depois seguido da construção dos primeiros arra nhacéus nos Estados Unidos E importante lembrar que no momento em que os negócios de Manhattan começaram a atingir os céus o se tor leste de Nova York era provavelmente o mais populoso cortiço do mundo ocidental com mais de 520 pessoas por acre Ninguém cons truía arranhacéus para eles talvez para sorte deles 221 Paradoxalmente tanto mais a classe média crescia e florescia drenando recursos para seu próprio sistema habitacional escritórios lo jas que eram tão características do desenvolvimento da época e seus prestigiosos edifícios relativamente menos recursos eram dedicados aos bairros da classe operária exceto nas formas mais gerais de despe sas públicas ruas esgotos iluminação e utilidades públicas A única forma de empresa privada incluindo construção que se dirigia basi camente ao mercado de massa exceção feita ao mercado e pequena lo ja era a taverna que transformouse no elaborado ginpalace da In glaterra das décadas de 1860 e 1870 e seu corolário o teatro e o mu sichall Pois na medida em que as pessoas se tornavam urbanizadas as antigas tradições e práticas que haviam trazido do campo ou da ci dade préindustrial tornavamse irrelevantes ou impraticáveis II A grande cidade era um portento embora só contivesse uma mi noria da população A grande empresa industrial era ali ainda pouco significativa De fato pelos padrões modernos o tamanho de tais em presas não era muito expressivo embora tendesse a aumentar Na dé cada de 1850 uma fábrica com 300 trabalhadores na Inglaterra podia ser ainda considerada muito grande e em 1871 uma fábrica de teci dos inglesa empregava normalmente 180 pessoas 12 A indústria pe sada tão característica de nosso período era muito maior do que isso e tendia a desenvolver as concentrações de capital que controlavam cidades ou regiões inteiras mobilizando vastos exércitos de trabalho sob seu comando Companhias de estradas de ferro eram gigantescos empreendi mentos mesmo quando construídas e dirigidas em condições de livre iniciativa e competição como normalmente não o eram Na época em que o sistema ferroviário inglês haviase estabilizado no final da dé cada de 1860 cada metro de trilho entre a fronteira escocesa as mon tanhas Pennine o mar e o Rio Humber era controlado pela North Eastern Railway Minas de carvão eram ainda na maioria dos casos empreendimentos individuais e freqüentemente pequenos embora as dimensões de alguns grandes desastres operacionais dêem alguma i déia da escala em que operavam 145 mortos em Risca em 1860 178 em Ferndaleem 1867 140 em Swaithe Yorkshire 110 em Mons Bélgica em 1875 e 200 em High Blantyre Escócia em 1877 De forma crescente e em especial na Alemanha a combinação do hori zontal com o vertical produziu aqueles impérios industriais que con trolavam a vida de milhares A empresa conhecida desde 1873 como Gutehoffnungshütte A G era sem dúvida a maior da Ruhr mas já havia então se estendido de siderurgia para minas de carvão produ zindo praticamente todas as 215 mil toneladas de ferro e a metade das 415 mil toneladas de carvão que a Ruhr inteira requeria e havia se 222 diversificado em transporte construção de pontes navios e uma grande variedade de máquinas 13 Não deve causar admiração o fato de que os Krupp em Essen cresceram de 72 trabalhadores em 1848 para quase 12 mil em 1873 ou que Schneider na França tivesse atingido 12500 em 1870 de for ma que mais da metade da população da cidade de Creusot trabalhava nos seus fornos e maquinaria diversa14 A indústria pesada produziu a região industrial da mesma forma que produziu a companhia que en globava cidades onde o destino de homens e mulheres dependia do humor e boavontade de um único gerente atrás do qual estava a for ça da lei e do poder do Estado olhando esta autoridade como neces sária e benfazeja Pois fosse pequena ou grande era o gerente e não a autorida de impessoal da companhia que dirigia os negócios e até a compa nhia era identificada com um único homem e não com um corpo de diretores Na maioria das mentes das pessoas e na realidade capita lismo ainda significava um único homem uma única família um úni co negócio a coordenar Este fato mesmo veio a gerar alguns sérios problemas para a estrutura das empresas Eles diziam respeito ao for necimento de capital e a forma de administrálo A empresa característica da primeira metade do século tinha es magadoramente sido financiada de forma privada por exemplo com recursos familiares e sofrido expansão através de reinvestimento dos lucros embora isto possa também querer dizer que com a maior parte do capital comprometido desta maneira a firma talvez necessitasse de uma boa quantidade de crédito para suas operações correntes Mas o tamanho e o custo crescentes de empreendimentos tais como estradas de ferro atividades metalúrgicas e outras que requeriam um grande empate de capital inicial tornavam isso mais difícil especialmente em países que estavam entrando em processo de industrialização não dis pondo de grandes acumulações de capital privado para investimento É verdade que em alguns países tais reservatórios de capital já eram dis poníveis suficientemente não apenas para suas próprias necessidades mas também ansiosos para serem exportados com uma adequada taxa de juros para o resto da economia mundial Os ingleses investiram no exterior neste período como nunca antes ou em termos relativos desde então Assim também o fizeram os franceses provavelmente em detri mento de suas próprias indústrias que cresceram a uma taxa inferior às suas rivais inglesas Mas mesmo na Inglaterra e na França novas for mas de mobilizar estes recursos ou de canalizálos convenientemente para as empresas precisavam ser encontradas Nosso período foi assim um tempo fértil para experimentos na mobilização de capital para o desenvolvimento industrial Com a no tável exceção da Inglaterra a maioria das transações de uma forma ou de outra envolvia os bancos direta ou indiretamente ou eram fei tas através da forma da moda o crédit mobilier uma espécie de com panhia industrial financeira que olhava os bancos ortodoxos como in 223 suficientemente preparados para ou desinteressados em o financia mento industrial competindo com eles Os irmãos Pereire estes dinâ micos industrialistas inspirados pelas idéias de SaintSimon e desfru tando de algum apoio de Napoleão III desenvolveram o modelo pro tótipo desta invenção Eles se espalharam por toda a Europa compe tindo com seus raivosos rivais os Rothschilds que não gostaram da idéia mas foram obrigados a seguila e como freqüentemente acon tece em períodos de grande expansão da economia em que financistas sentemse heróis e o dinheiro corre eram muito imitados especial mente na Alemanha Crédits mobiliers era a sensação pelo menos até que os Rothschilds venceram a batalha contra os Pereires e como também freqüentemente acontece em períodos de grande expansão econômica alguns operadores se aventuraram um pouco longe de mais atravessando a tênue fronteira que separa o otimismo nos negó cios e a fraude Entretanto uma variedade de outras soluções com ob jetivos similares estava também sendo desenvolvida especialmente o banco de investimento ou banque daffaires E evidentemente as bol sas de valores agora comerciando principalmente com as ações das empresas comerciais e de transporte floresciam como nunca Em 1856 a Bolsa de Paris sozinha apresentava uma lista de 33 compa nhias de estradas de ferro e canais 38 companhias de mineração 11 portuárias 7 de transportes urbanos 11 de gás e 42 de vários empre endimentos industriais indo de têxteis a ferro galvanizado e borracha com um valor total de cinco e meio milhões de francosouro 15 Em quanto realmente eram requeridas estas vastas mobilizações de capital Em que medida eram elas eficazes Industriais em geral nunca apreciaram muito os financistas e os primeiros tentaram sempre ter o mínimo possível de negócios a tratar com bancos Lille es creveu um observador em 1869 não é uma cidade capitalista é antes de tudo um grande centro industrial e comercial 16 onde os homens aplicavam seus lucros de volta nos negócios não brincavam com eles e onde todos esperavam nunca ter de pedir emprestado a bancos Ne nhum industrial gostava de ficar a mercê de credores Mas às vezes precisavam fazêlo Krupp cresceu tão rapidamente entre 1855 e 1866 que ficou sem capital Há um elegante modelo histórico segundo o qual quanto mais atrasada a economia e quanto mais tardio o início da industrialização maior a dependência nos métodos de mobilização de recursos e poupança em larga escala Nos países desenvolvidos oci dentais recursos privados e mercado de capital eram bastante adequa dos Na Europa central os bancos e instituições similares tinham que atuar muito na qualidade de sistemáticos desenvolvedores da história Mais a Leste Sul e alémmar os governos tinham que apoiarse em si mesmos geralmente com a ajuda de investimento estrangeiro fosse pa ra garantir capital ou talvez mais corretamente fazer com que os in vestidores tivessem seus dividendos garantidos ou pelo menos pensas sem que tinham dividendos que iriam sozinhos mobilizar o dinheiro Fosse qual fosse a validade desta teoria não há dúvida de que em nosso 224 período os bancos e instituições similares tinham um papel muito mais relevante como atores do desenvolvimento e direção da indústria na Alemanha o grande recémchegado industrial do que em qualquer outro país no Ocidente Se eles apenas pretendiam como os crédits mobiliers ou se eles eram realmente eficazes no papel é uma questão um pouco obscura Provavelmente eles não eram particularmente pre parados para tal até que os grandes industriais então reconhecendo a necessidade de um financiamento muito mais elaborado do que nos ve lhos dias colonizaram os grandes bancos como fizeram de forma cres cente na Alemanha a partir da década de 1870 As finanças não afetaram muito a organização dos negócios mas talvez tenham influenciado na sua política O problema da dire ção era mais complicado Para o modelo básico da empresa individual ou em mãos de uma única família a autocracia patriarcal familiar es te era um problema irrelevante nas indústrias da segunda metade do século XIX O melhor aprendizado é aquele proporcionado pela pa lavra que sai da boca dizia um manual alemão em 1868 deixem o empreendedor dar o exemplo por si mesmo onipresente e sempre ac cessível cujas ordens sejam reforçadas pelo exemplo pessoal que seus empregados têm constantemente diante dos olhos 17 Este con selho adequado a artesãos ou fazendeiros era válido na medida em que a instrução era um aspecto essencial da gerência nos novos países em vias de industrialização Até homens com os conhecimentos bási cos dê artesãos preferentemente em metais precisavam aprender a habilidade do trabalhador especializado de fábrica A grande maioria dos trabalhadores especializados dos Krupp parece ter sido treinada no trabalho desta maneira Somente na Inglaterra podiam os empre gadores confiar no suprimento de trabalhadores deste tipo que já ti nham experiência industrial O paternalismo de tantos empreendi mentos no continente devia alguma coisa a esta longa associação en tre os trabalhadores e as firmas onde tinham crescido e de onde de pendiam Mas os senhores dos trilhos minas e siderúrgicas não podi am olhar paternalmente por cima dos ombros de seus empregados to do o tempo e certamente não o fizeram A alternativa e complemento à instrução era o comando Mas nem a autocracia da família nem as pequenas operações da indústria especializada e comércio supriam a necessidade de direção para as grandes organizações capitalistas Portanto a iniciativa privada na sua forma mais irrestrita e anárquica tendeu para os únicos modelos disponíveis de gerência em grande escala o militar e o burocrático As companhias de estradas de ferro com suas pirâmides de trabalha dores uniformizados e disciplinados possuindo segurança de traba lho promoção por antigüidade e até mesmo pensões são um exemplo extremo O apelo exercido pelos títulos militares que ocorria livre mente entre os primeiros executivos ingleses de estradas de ferro e os executivos dos grandes portos não era apenas devido ao orgulho em relação às hierarquias de soldados e oficiais como era o caso dos a 225 lemães mas à inabilidade da iniciativa privada em determinar uma forma específica de gerência para os grandes negócios Havia vanta gens evidentes do ponto de vista organizacional Não resolvia o pro blema da manutenção do trabalho de forma leal diligente e modesta Tudo estava muito bem para países onde uniformes estavam na moda e eles certamente não estavam na Inglaterra e nos Estados Unidos encorajando entre os trabalhadores as virtudes militares dos soldados e entre elas sem dúvida a de ser mal pago Sou um soldado um soldado da indústria E como você tenho minha bandeira Meu trabalho tem enriquecido a pátria Vou te dizer meu destino é glorioso 18 Assim cantava um poeta em Lille França Mas mesmo este pa triotismo era um pouco demasiado A era do capital encontrou dificuldades em acertar os termos com este problema A insistência da burguesia na lealdade disciplina e modesta satisfação não podia realmente esconder que sua verdadei ra percepção de que o que fazia os trabalhadores trabalharem era algo bem diferente Mas o que era então Na teoria eles deveriam trabalhar para deixar de serem trabalhadores logo que possível entrando então no universo burguês Como EB colocou nas Songs for English Work men to Sing em 1867 Trabalhem rapazes trabalhem e fiquem satisfeitos Desde que vocês tenham o suficiente para comprar um refeição O homem em que vocês podem confiar Ficará rico mais e mais Somente se puser seus ombros na roda Mas embora esta esperança pudesse ser suficiente para alguns que tivessem conseguido subir e sair da classe operária era perfeita mente evidente que a maioria dos trabalhadores permaneceria traba lhador por toda a vida e de fato o sistema econômico requeria deles exatamente isso A promessa do marechaldecampo não tinha a in tenção de promover todos os soldados a marechais Se a promoção não era um incentivo adequado seria então o di nheiro Entretanto era um axioma dos empregadores de meados do século XIX que os salários precisavam ser mantidos o mais baixo possível embora empreendedores inteligentes com experiência inter nacional como Thomas Brassey o construtor de estradas de ferro começassem a apontar para o fato de que o trabalho do operário in glês bem pago era de fato mais barato que o do abissalmente mal pa go coolie já que a produtividade do primeiro era muito superior Mas tais paradoxos não eram suficientes para convencer homens de negó cios crescidos dentro da teoria econômica do wagefund acreditando ser ela uma demonstração científica de que aumentar salários era im 226 possível e que os sindicatos estavam portanto condenados ao fracas so A ciência tornouse um pouco mais flexível a partir de 1870 quando o trabalhismo organizado começou a parecer um ator perma nente na cena industrial ao invés de aparecer apenas como um extra A grande autoridade em economia John Stuart Mill 180673 que chegou a simpatizar pessoalmente com o trabalhismo modificou sua posição na questão em 1869 depois do que a teoria do wagefund perderia sua autoridade canônica Mas não haveria ainda mudanças nos princípios de negócios Poucos empregadores tinham a intenção de pagar mais do que precisavam Além disso economia a parte nos países do Velho Mundo a classe média acreditava que os trabalhadores deveriam ser pobres não apenas porque sempre tinham sido mas também porque a inferio ridade econômica era um índice adequado de inferioridade de classe Se como aconteceu ocasionalmente por exemplo no grande boom de 187273 alguns trabalhadores chegassem a receber suficiente mente para se darem ao luxo de desfrutar dos privilégios que os em pregadores olhavam como seus direitos naturais a indignação que is to levantava era sincera e vinha do fundo do coração O que é que mineiros tinham a ver com pianos de cauda e champagne Em países com carência de trabalhadores hierarquia social subdesenvolvida e uma população operária truculenta e democrática as coisas poderiam ser diferentes mas na Inglaterra e na Alemanha França e Império dos Habsburgos diferente da Austrália e dos Estados Unidos o máximo adequado para a classe trabalhadora era uma quantidade suficiente de comida boa e decente preferivelmente sem muita bebida um lugar modesto para vida social vestimenta adequada para proteger a moral e saúde e conforto sem arriscar uma tendência à imitação dos melho res na escala social Esperavase que o progresso capitalista viesse eventualmente trazer os trabalhadores próximo a este ideal e infeliz mente o que não implicava em aumentar salários muitos ainda esta vam abaixo deste nível Portanto era desnecessário indesejável e pe rigoso aumentar salários além daquele limite De fato as teorias econômicas e os princípios aceitos do libera lismo de classe média não iam muito bem juntos Em certo sentido as teorias triunfaram Em nosso período a relação de salário iria ser crescentemente transformada em uma relação de mercado Conse qüentemente vimos o capitalismo inglês da década de 1860 abando nar formas de compulsão nãoeconômica de trabalho tais como os Master e Servants Acts que puniam com cadeia quebras de contratos por trabalhadores contratos de longo termo tais como o annual bond dos mineiros de carvão do Norte enquanto a duração média de contratos era diminuída o período médio de pagamento gradualmente reduzido para uma semana ou mesmo um dia ou uma hora fazendo portanto a barganha no mercado muito mais sensível e flexível Por outro lado as classes médias teriam ficado chocadas se os trabalhado res pedissem de fato por um tipo de vida que elas tinham como dado 227 e mais ainda se eles viessem a conseguilo Desigualdade de vida e expectativas cresciam com o sistema Isso limitava os incentivos econômicos que os patrões estavam preparados para conceder Eles desejavam ligar salários à produção por vários sistemas de piecework que parece haverem se espalhado durante nosso período e assinalar que os trabalhadores deviam agra decer por ter afinal algum trabalho já que havia um grande exército industrial de reserva do lado de fora esperando por aqueles empregos Pagamentos contra resultados tinham algumas vantagens evi dentes Marx chamoua a melhor forma de retribuição por salários pa ra o capitalismo Fornecia um incentivo genuíno para o trabalhador intensificar o seu trabalho e conseqüentemente aumentar sua produ tividade uma garantia contra a negligência em geral uma solução pa ra reduzir a conta de salários em tempos de depressão assim como um método adequado para reduzir os custos do trabalho e impedir que salários aumentassem mais do que era necessário e conveniente Também dividia os trabalhadores entre si já que o que recebiam po dia variar enormemente dentro do mesmo estabelecimento ou dife rentes tipos de trabalho poderiam ser pagos através de formas intei ramente diferentes Algumas vezes os especializados faziam o papel de subempregadores pagos por produção contratando então assisten tes nãoespecializados por um mínimo e controlando o que estes pro duziam O problema era que o trabalho por empreitada sofria alguma resistência especialmente por parte dos especializados já que era um arranjo muito complexo e obscuro não apenas para os trabalhadores mas também para os empregadores que não tinham na maioria das vezes idéias das normas de produção que deveriam ser estipuladas Também não era fácil de ser aplicado em algumas ocupações Os trabalhadores tentaram remover estas desvantagens reintroduzindo o conceito de um salário básico previsível e impossível de ser compri mido que seria um salário padrão determinado através dos sindica tos ou de práticas informais Os empregadores estavam próximos da remoção destas idéias por aquele processo que os partidários da in dústria americanos iriam chamar de gerência científica scientific management mas no nosso período eles ainda tinham problemas em lidar com esta solução Talvez isto tenha levado a uma ênfase maior no outro incentivo econômico Se um único fator dominava a vida dos trabalhadores do século XIX este fator era a insegurança Eles não sabiam no princí pio da semana quanto iriam levar para casa na sextafeira Eles não sabiam quanto tempo iria durar o emprego presente ou se viessem a perdêlo quando voltariam a encontrar um novo trabalho e em que condições Eles não sabiam que acidentes ou doenças iriam afetálos e embora soubessem que algum dia no meio da vida talvez 40 anos para os trabalhadores nãoespecializados talvez 50 para os especiali zados iriam se tornar incapazes para o trabalho pleno e adulto não sabiam o que iria acontecer então entre este momento e a morte Di 228 versa era a insegurança dos camponeses à mercê de periódicas e para ser honesto mais assassinas catástrofes tais como secas e fo me mas capazes de prever com maior precisão como um homem ou uma mulher pobre passaria a maioria dos dias da vida do nascimento até a morte A primeira era uma imprevisibilidade mais profunda a pesar do fato de que a maioria dos trabalhadores era empregada por longos períodos de suas vidas por um único empregador Não havia certeza no trabalho mesmo para os mais especializados durante a queda de 185758 o número de trabalhadores na indústria de enge nharia em Berlim caiu em quase uma terça parte20 Não existia nada que correspondesse à moderna segurança social exceto caridade e re admissão no serviço mas algumas vezes nem isso Para o mundo do liberalismo insegurança era o preço a pagar por progresso e liberdade sem mencionar riqueza e tornavase tolerável pela contínua expansão econômica Segurança deveria ser comprada pelo menos algumas vezes não por homens e mulheres livres mas como a terminologia inglesa especificava muito bem por em pregados cuja liberdade era bastante limitada empregados domés ticos empregados de estradas de ferro servidores civis etc Na reali dade o maior grupo entre estes os empregados domésticos urbanos não desfrutavam da segurança das famílias da nobreza tradicional mas freqüentemente viamse diante da insegurança na sua pior forma de missão imediata sem uma carta de recomendação do antigo senhor para futuros empregadores Pois o mundo dos burgueses estabelecidos tam bém era considerado como sendo basicamente inseguro um estado de guerra onde a qualquer momento eles poderiam ser as vítimas da com petição fraude ou desastre econômico embora os homens de negócios que eram vulneráveis a esse ponto talvez formassem apenas uma pe quena minoria das classes médias e a penalidade do fracasso raramente era o trabalho manual menos ainda o trabalho de casa A expansão e conômica mitigava esta constante insegurança Não há muita evidência de que salários reais na Europa tenham começado a aumentar antes do final da década de 1860 mas mesmo antes que o sentimento geral de que os tempos melhoravam passasse a ser uma certeza nos países de senvolvidos o contraste com as décadas desesperadas e sofridas de 1830 e 1840 era palpável Nem o aumento súbito no custo de vida nos anos 185354 nem a catástrofe financeira de 1858 trouxeram distúrbios sociais sérios A verdade é que o grande boom econômico havia forne cido emprego em casa e para os imigrantes afora numa escala sem precedentes Não havia evidentemente falta de trabalho já que os exér citos de reserva da população rural em casa e fora estavam agora pela primeira vez avançando en masse sobre os mercados de trabalho So mente o fato de que a competição destes últimos não reverteu as condi ções da classe operária sugere que o ímpeto e a escala desta expansão econômica eram realmente imensos A classe operária porém muito diferente da classe média via a insegurança como uma coisa muito mais constante e real Ela não ti 229 nha reservas significativas Aqueles que podiam viver de economias por algumas semanas eram considerados privilegiados 21 Até os salá rios dos especializados eram modestos Em tempos normais um ope rário em Preston que com seus sete filhos empregados ganhasse 4 li bras por semanas numa semana de pleno emprego teria sido objeto de inveja de seus vizinhos Mas não foram precisas muitas semanas da epidemia de fome em Lancashire devida a interrupção do supri mento de algodão dos Estados Unidos por causa da Guerra Civil para reduzir esta mesma família à miséria O caminho normal ou mesmo inevitável da vida passava por estes abismos nos quais o trabalhador e sua família iriam provavelmente cair o nascimento de crianças a ve lhice e a impossibilidade de continuar o trabalho Em Preston 52 de todas as famílias operárias com crianças abaixo da idade de trabalho trabalhando em pleno serviço num ano de comércio memorável 1851 poderia esperar viver abaixo da linha de miséria 22 A idade avançada era uma catástrofe para ser esperada com estoicismo um declínio na capacidade de produção a partir dos 40 quando a força fí sica começava a decair especialmente para os menos especializados seguida de pobreza Para a classe média os meados do século XIX foram a idade de ouro das pessoas em idade madura quando os ho mens atingiam o ponto culminante de suas carreiras renda e atividade e o declínio fisiológico ainda não haviase tornado muito óbvio Para os oprimidos trabalhadores de ambos os sexos e mulheres de todas as classes a flor da vida só aparecia na juventude Nem incentivos econômicos nem insegurança forneciam um mecanismo geral realmente efetivo para manter o trabalho no seu ponto máximo o primeiro porque sua amplitude era limitada o últi mo porque sua obtenção parecia tão impossível como a previsão do tempo As classes médias achavam este argumento de difícil compre ensão Por que deveriam ser exatamente os melhores mais capazes e sóbrios trabalhadores aqueles com maior tendência a formar sindica tos já que eles eram precisamente os que mereciam os melhores salá rios e o emprego mais regular Mas os sindicatos eram de fato com postos e liderados por estes homens embora a mitologia burguesa visse os sindicatos como multidões de estúpidos e desencaminhados instigados por agitadores que não conseguiriam obter uma melhor forma de vida de outra maneira Certamente não havia nenhum misté rio nisso Os trabalhadores que eram objeto de competição entre em pregadores não eram apenas aqueles que tinham força de barganha para fazer a existência de sindicatos possível mas também aqueles mais conscientes de que o mercado sozinho não lhes garantia nem segurança nem aquilo a que eles pensavam ter direito Entretanto desde que eles não se organizassem e algumas ve zes mesmo quando chegavam a fazêlo os trabalhadores proporcio navam a seus empregadores uma solução para o controle do trabalho na sua esmagadora maioria eles gostavam de trabalhar e suas expecta tivas eram espantosamente modestas Os nãoespecializados ou re 230 cémchegados do interior eram orgulhosos de sua força vindo de um meio onde o trabalho pesado era o critério do valor de uma pessoa e onde mulheres eram escolhidas não pela aparência mas pela potencia lidade para o trabalho Minha experiência tem mostrado declarou um superintendente de siderurgia americano em 1875 que os ale mães irlandeses suecos e aquilo que eu chamo de Buckwheats jovens americanos do campo criteriosamente misturados produzem a força mais efetiva e tratável que se possa encontrar 23 Por outro lado os especializados eram sensíveis aos incentivos nãocapitalistas do orgulho e conhecimento de suas especializações Até as máquinas deste período de ferro e bronze limpas e polidas com o toque do amor em condições perfeitas de funcionamento de pois de um século são um vivo exemplo disso O catálogo sem fim dos objetos dispostos nas exposições internacionais embora horríveis do ponto de vista estético eram monumentos para orgulho daqueles que os construíram Estes homens não aceitavam muito bem as or dens e supervisão e estavam freqüentemente fora de qualquer contro le efetivo exceto pelo coletivo que eram suas oficinas Eles também recusavam métodos para fazer com que seus serviços fossem feitos mais rapidamente ou que rebaixassem o respeito devido ao trabalho Mas se eles não trabalhavam nem mais ou nem mais rapidamente do que o que o trabalho pedia eles não trabalhavam nem menos nem com menor vigor ninguém precisava oferecerlhes maiores incenti vos para que dessem do seu melhor Um dia justo de trabalho por um dia justo de pagamento dizia o refrão e se eles esperavam que o pa gamento os satisfizesse esperavam também que o trabalho tornasse a todos satisfeitos inclusive a eles mesmos Evidentemente esta visão nãocapitalista do trabalho beneficia va mais aos empregadores que aos operários Ê necessário observar que os compradores no mercado de trabalho operavam segundo o princípio de comprar no mercado mais barato e vender no mais caro embora às vezes ignorantes dos métodos de avaliação corretos Mas os vendedores não estavam geralmente pedindo o salário máximo que o mercado pudesse agüentar e oferecendo em troca a quantidade mí nima de trabalho que pudessem Estes últimos estavam apenas bus cando uma forma decente de ganhar a vida Eles estavam apenas ten tando melhorar um pouco Em resumo embora naturalmente não fos sem insensíveis às diferenças entre salários altos e baixos eles esta vam comprometidos mais com a vida humana do que com transações econômicas III Mas é possível falarmos dos trabalhadores como uma catego ria única ou como uma classe O que havia em comum entre grupos de pessoas freqüentemente tão diferentes no meio origem social formação situação econômica ou mesmo até na língua e costumes 231 Nem mesmo a pobreza pois embora para os padrões da classe média todos tivessem baixas rendas exceto em paraísos do trabalho como a Austrália na década de 1850 onde os trabalhadores em composição de jornais ganhavam até 18 libras por semana 24 pelos padrões dos pobres havia uma grande diferença entre os artesãos bem pagos ou menos regularmente empregados que usavam uma cópia das vesti mentas da classe média nos domingos ou mesmo no caminho para o trabalho e os trabalhadores famintos que nem sabiam quando recebe riam a próxima refeição ou a de sua família Todos estavam realmen te unidos através de um sentido comum do trabalho manual e da ex ploração e de forma crescente pelo destino de serem operários Eles estavam unidos pela crescente segregação da sociedade burguesa cu ja riqueza crescia dramaticamente enquanto a situação dos trabalha dores permanecia precária uma burguesia que se tornava mais e mais inflexível na admissão dos que vinham de baixo Pois havia uma real diferença entre as modestas conquistas de conforto que um trabalha dor bemsucedido ou mesmo um extrabalhador pudessem conseguir e as brutais acumulações de riqueza Os trabalhadores foram empur rados para uma consciência comum não apenas pela polarização soci al mas nas cidades pelo menos por um estilo comum de vida no qual a taverna a igreja do trabalhador como um burguês liberal chamoua tinha um papel central e por um estilo comum de pen samento Os menos conscientes tendiam a ser tacitamente laicizados os mais conscientes radicalizavamse os que apoiaram a Internacional na década de 1860 os futuros seguidores dos socialistas Os dois fenôme nos estavam interligados pois a religião tradicional tinha sido sempre um liame de unidade social dentro do ritual de afirmação da comunida de Mas as procissões e cerimônias comuns atrofiaramse em Lille du rante o Segundo Império Os trabalhadores especializados de Viena cuja piedade e ingênua alegria na pompa católica Lé Play havia notado na década de 1850 tornaramse indiferentes a estas coisas Em menos de duas gerações haviam transferido sua fé para o socialismo Os grupos heterogêneos dos trabalhadores pobres sem dúvida tenderam a se tornar parte do proletariado nas cidades e regiões in dustriais A importância crescente dos sindicatos na década de 1860 registrou bem esta circunstância e a existência mesma para não mencionar a força da Internacional teria sido impossível sem ela Porem os trabalhadores pobres não eram apenas o conjunto de gru pos disparatados Eles haviam especialmente nos anos desesperados da primeira metade do século fundidose numa massa homogênea de descontentes e oprimidos Esta homogeneidade estava agora sendo perdida A era do capitalismo liberal estável e florescente oferecia à classe operária a possibilidade de melhorar sua barganha coletiva a través de organização coletiva Mas aqueles que permaneciam mera mente a miscelânea de pobres não podiam esperar muito dos sindi catos e menos ainda das Sociedades de Ajuda Mútua Sindicatos e ram especialmente organizações que favoreciam minorias embora 232 greves pudessem ocasionalmente mobilizar as massas Além disso o capitalismo oferecia ao trabalhador individual perspectivas diferentes de melhorias em termos burgueses que porções maiores da popula ção trabalhadora eram incapazes ou estavam sem vontade de obter Uma fissura portanto apareceu dentro daquilo que se transfor mava de forma crescente na classe operária Ela separava os tra balhadores dos pobres ou de outra forma os respeitáveis dos sem respeito Em termos políticos ver capítulo 6 separava pessoas como o artesão inteligente aos quais os radicais de classe média in gleses estavam ansiosos para dar o voto das massas enraivecidas que eles estavam ainda determinados a excluir Nenhum termo é mais difícil de analisar que respeitabilidade na classe operária de meados do século XIX pois expressava simulta neamente a penetração de standards e valores da classe média e tam bém as atitudes sem as quais o amorpróprio da classe operária não teria sido possível de ser criado assim como um movimento de luta coletiva impossível de construir sobriedade sacrifício o adiamento da gratificação Se o movimento dos trabalhadores tivesse sido cla ramente revolucionário ou pelo menos radicalmente segregado do mundo da classe média como havia sido antes de 1848 e voltaria a sêlo na era da Segunda Internacional a distinção teria sido suficien temente clara Porém no nosso período a linha entre melhoria indi vidual e coletiva entre imitar a classe média e combatêla com as próprias armas era difícil de traçar Onde devemos situar William Marcroft 182294 Ele poderia ser facilmente apresentado como um modesto exemplo da ajudaasimesmo de Samuel Smiles o filho ilegítimo de um empregado de fazenda e uma tecelã sem nenhuma educação que começou como um trabalhador na indústria têxtil pas sando a capataz numa firma de engenharia até que em 1861 estabe leceuse de forma independente como um dentista morrendo com 15 mil libras acumuladas o que não era nada negligenciável um radical liberal por toda a vida e advogado da moderação Mas seu lugar mo desto na história também é devido à sua paixão igualmente por toda a vida pela produção cooperativa isto é socialismo através de aju daasimesmo ao qual ele dedicou todos os seus dias Por outro la do William Allan 18374 era sem dúvida nenhuma um seguidor da luta de classe e nas palavras de seu obituário em questões sociais ele inclinavase para a escola de Robert Owen Portanto este trabalhador radical formado na escola revolucionária de antes de 1848 iria deixar sua marca na história do trabalhismo como o cauteloso moderado e a cima de tudo eficiente administrador do maior dos sindicatos de traba lhadores especializados do novo modelo a Amalgamated Society of Engineers era um anglicano convicto e em política um liberal consis tente não dado a nenhum tipo de politicagem 26 O fato é que o trabalhador capaz e inteligente especialmente se especializado oferecia tanto o principal esteio do controle social de classe média e de disciplina industrial no trabalho como também os 233 melhores indivíduos para a autodefesa coletiva dos trabalhadores Ele fornecia o primeiro porque o capitalismo estável próspero e em ex pansão precisava dele proporcionandolhe perspectivas de melhoria modesta Estas não pareciam mais provisórias ou temporárias Mas ele também fornecia o segundo porque com a possível exceção dos Estados Unidos aquela terra que parecia prometer ao pobre um meio pessoal de livrarse de uma pobreza que se arrastava por toda a vida de sair da classe operária e a cada cidadão igualdade diante de todos as classes trabalhadoras sabiam que o mercado livre liberal por si só não lhes daria os direitos ou lhes supriria as necessidades Eles preci savam se organizar e lutar A aristocracia do trabalho inglesa uma camada peculiar a este país onde a classe de pequenos produtores in dependentes lojistas etc era relativamente insignificante como era também a baixa classe dos whitecollar e burocratas menores ajudou a transformar o Partido Liberal num partido de apelo genuinamente de massa Ao mesmo tempo formava o coração do movimento sindi cal incomumente poderoso Na Alemanha mesmo os trabalhadores mais respeitáveis eram empurrados para as fileiras do proletariado pela distância que os separava da burguesia e pela força das classes intermediárias Ali o homem que mergulhava nas associações de me lhoria Bildungsvereine na década de 1860 havia mil destes clubes em 1863 2 mil em 1872 somente na Baviera afastavase rapida mente do liberalismo de classe média destas associações embora não tanto da cultura de classe média que ali lhe fora inculcada Outros como ele iriam se transformar no pessoal dirigente do novo movi mento socialdemocrata especialmente depois do fim de nosso perío do Mas eles eram trabalhadores respeitáveis e levaram o bom e o mau lado de sua respeitabilidade para o partido de Lassalle e Marx Somente onde a revolução parecia ser a única solução plausível para as condições dos trabalhadores pobres ou onde como na França a tradição de insurreição e república social revolucionária era a tradição política dominante do povo trabalhador a respeitabilidade era um fator relativamente insignificante ou confinado às classes médias e àqueles que desejavam identificarse com elas E os outros Embora fossem objeto de muito mais interesse que as classes trabalhadoras respeitáveis bem menos nesta geração do que antes de 1848 ou depois de 1880 deles sabemos muito pouco exceto pela pobreza e abandono a que estavam relegados Não ex pressavam opiniões publicamente e raramente eram requisitados mesmo Por aquelas organizações sindicais políticas ou outras que se preocupassem em chegar até eles Mesmo o Exército da Salvação criado tendo especificamente estes setores pobres nãorespeitáveis em mente não conseguiu tornarse mais do que uma atração de entre tenimento público com seus uniformes bandas e hinos e uma fonte útil de caridade De fato para a maioria dos nãoespecializados as organizações que começavam a dar expressão ao movimento traba lhista dos respeitáveis eram inatingíveis Grandes levantes de cunho 234 político tal como o Cartismo ná década de 1840 podiam recrutálos os vendedores de mercado descritos por Henry Mayhew eram todos cartistas Grandes revoluções poderiam inspirar talvez apenas bre vemente até os mais oprimidos e apolíticos as prostitutas de Paris foram decididamente a favor da Comuna em 1871 Mas a era do tri unfo burguês não eram precisamente uma era de revoluções ou mes mo de movimentos de massas políticos Bakunin não estava talvez in teiramente errado ao supor que o espírito de uma insurreição pelo me nos potencial estava talvez mais entre os marginais e o subproletariado embora estivesse bastante enganado ao vêlos como base para um mo vimento revolucionário A miscelânea dos pobres apoiou a Comuna mas seus ativistas eram os especializados e artesãos as seções mais marginais entre os pobres os adolescentes estavam pouco represen tados entre eles Os adultos especialmente aqueles suficientemente ve lhos para ter mesmo que falha uma memória a cerca de 1848 eram os revolucionários característicos de 1871 A linha que dividia os trabalhadores pobres entre militantes po tenciais do movimento trabalhista e o resto não era cortante mas cer tamente existia Associação a formação livre e consciente de so ciedades democráticas para melhorias e defesa social era a fórmula mágica da época liberal através dela até os movimentos trabalhistas que iriam abandonar o liberalismo se desenvolveriam28 Aqueles que quisessem e pudessem efetivamente associarse deveriam dar os ombros e desprezar os que não quisessem ou pudessem e não apenas as mulheres que estavam virtualmente excluídas do mundo das for malidades dos clubes e de suas propostas de associados As fronteiras daqueles setores da classe operária que iriam ser reconhecidos como forças sociais e políticas coincidia com o mundo dos clubes Socie dades de Ajuda Mútua ordens fraternas de beneficência clubes de esportes e ginástica e mesmo associações religiosas voluntárias num extremo e associações políticas e de trabalho ao outro Estas últimas cobriam uma parte variada mas substancial da classe operária talvez uns 40 no final de nosso período Mas deixava muitos de fora Estes eram os objetos e não os sujeitos da era liberal Ê difícil olhando retrospectivamente formar uma idéia equi librada das condições de todos estes trabalhadores Em um aspecto a lista dos países onde havia cidades e indústrias modernas era agora muito maior e conseqüentemente o nível de desenvolvimento indus trial que representavam Portanto generalizações não são fáceis e seu valor é circunscrito mesmo se nos limitarmos e precisamos fazêlo aos países relativamente desenvolvidos em oposição aos atrasados as classes trabalhadoras urbanas em distinção aos setores camponeses e agrários O problema é determinar um meio termo entre de um la do a violenta pobreza que ainda dominava a vida da maior parte dos trabalhadores pobres o meio físico e moral repulsivo que cercava muitos deles e de outro a melhoria geral das condições e perspecti vas que havia ocorrido desde a década de 1840 Portavozes satisfei 235 tos de parte da burguesia tendiam a dar maior ênfase a estas melhori as embora ninguém pudesse negar o que Sir Robert Giffen 1837 1900 olhando para o meio século da história inglesa de 1883 cha mou de um resíduo ainda não desenvolvido ou que as melhorias mesmo quando medidas por um ideal baixo ainda são muito peque nas ou então que ninguém pode contemplar as condições das mas sas populares sem desejar alguma coisa como uma revolução para que elas melhorem29 Reformadores sociais menos satisfeitos embo ra não negando as melhorias no caso da elite de trabalhadores cujas qualificações relativamente escassas punhamnos numa condição de vendedores privilegiados no mercado de trabalho davam um retra to menos cor de rosa Sobram ainda escrevia Miss Edith Simcox no começo da década de 1880 uns dez milhões de trabalhadores de cidades incluindo todos os mecânicos e trabalhadores cujas vidas não estão ameaçadas pela miséria Nenhuma linha precisa pode ser traçada entre os trabalhadores que podem ser contados entre os pobres e aqueles que estão fora há um fluxo cons tante e exceto aqueles que sofrem de má remuneração crônica artesãos as sim como mercadorias estão todos constantemente mergulhando com cul pa ou não nas profundezas da miséria Não e fácil julgar quantos dentre es tes dez milhões pertencem à próspera aristocracia das classes trabalhadoras aquela camada com a qual os políticos entram em contato e da qual saem aqueles que a sociedade apressadamente acolhe como trabalhadores repre sentativos Eu confesso que deveria estimar que apenas um pouco mais de dois milhões de trabalhadores especializados representando uma popu lação de cinco milhões esteja vivendo habitualmente com alguma facilida de e segurança de qualquer espécie Os outros cinco milhões incluem os trabalhadores e operários menos especializados homens e mulheres cujo salário máximo lhes proporciona as necessidades e decência mínimas da existência e para os quais por conseguinte qualquer azar significa miséria uma queda rápida na penúria 30 Mas mesmo estas impressões bem informadas e evidentes eram um tanto otimistas por duas razões Primeiro porque como pesqui sas sociais que começaram a ser feitas a partir do final da década de 1880 deixam claro os trabalhadores pobres que formavam aproxi madamente 40 da classe operária de Londres pouco desfrutavam das decências mínimas da existência mesmo pelos padrões austeros aplicados para os setores mais baixos Segundo porque o estado de alguma facilidade e segurança de qualquer espécie representava de masiado pouco A jovem Beatrix Potter vivendo anonimamente entre os operários têxteis de Bacu não teve dúvida de que tivesse partilha do das vidas da confortável classe operária dissidentes e colabo radores uma comunidade fechada excluindo os nãorespeitáveis e marginais cercada pelo bemestar geral e bem remunerado sendo as casas bem decoradas e mobiladas e as refeições excelentes E 236 mesmo esta observadora perspicaz iria descrever estes mesmos indi víduos quase sem perceber o que estava descrevendo como pare cendo vítimas de excesso de trabalho físico nos períodos de grande comércio comendo e dormindo muito pouco fisicamente exaustos para esforços intelectuais a mercê de muitas chances de esgotamen to significando falta de conforto físico A profunda e simples fé pu ritana destes homens e mulheres era como ela via uma resposta ao medo das vidas gastas e fracassadas Vida em Cristo e esperança em outro mundo trazem facilidade e refi namento na mera luta pela existência acalmando a busca desenfreada pe las boas coisas desta vida com uma outra existência e fazendo do fra casso um meio de atingir a graça ao invés de uma busca incansável pe lo sucesso31 Este não é o quadro de famintos prestes a se rebelarem nos seus cortiços mas também não é um quadro de homens e mulheres me lhores muito melhores do que eram há cinqüenta anos atrás e me nos ainda de uma classe que tinha tido o benefício material dos últi mos cinqüenta anos Giffen como economistas satisfeitos e igno rantes mantinham Era um quadro de pessoas com algum respeito e segurança cujas expectativas eram enormemente modestas mas conscientes de que poderia ser bem pior que se lembravam de tem pos quando eram bem mais pobres e que estavam freqüentemente perseguidas pelos aspectos da miséria como entendiam o termo O pauperismo estava sempre próximo Ninguém deve usar muito de uma coisa boa porque senão gastase dinheiro com muita facilidade disse um dos hospedeiros de Beatrix Potter colocando o cigarro que ela havialhe oferecido em cima da lareira depois de uma ou duas ba foradas guardando para a noite seguinte Aquele que esquecer que esta era a forma pela qual homens e mulheres pensavam sobre os bens de suas vidas naqueles dias não será certamente a pessoa indi cada para julgar a pequena mas genuína melhoria que a grande ex pansão capitalista trouxe para uma parte substancial das classes traba lhadoras no nosso período E a distância que as separava do mundo burguês era imensa e intransponível 237 DécimoTerceiro Capítulo O MUNDO BURGUÊS Você sabe que pertencemos a um século em que os homens são valoriza dos apenas pelo que são Todos os dias algum chefe pouco enérgico ou sério é forçado a descer os degraus da sociedade que parecia pertencer lhe de forma permanente e algum balconista inteligente e esperto toma lhe o lugar Mme MotteBossut a seu filho 1856 1 Com seus rebentos a volta eles aquecemse no calor de seu sorriso Uma inocência infantil e alegre ilumina suas faces contentes Ele é sagrado eles o honram ele é adorável eles o adoram Ele é seguro eles o estimam ele ê firme eles o temem Seus amigos são os mais excelentes entre os homens Ele retorna à casa bemordenada Martin Tupper 1876 2 I Precisamos olhar agora a sociedade burguesa Os fenômenos mais superficiais são às vezes os mais profundos Comecemos nossa análise desta sociedade que atingiu seu apogeu neste período pela aparência das roupas que seus membros usavam pelos interiores que os cercavam As roupas fazem o homem dizia um ditado alemão e nenhuma época seguiu mais a risca tal idéia do que a época em que a mobilidade social poderia de fato colocar numerosas pessoas dentro de uma situação histórica inteiramente nova para desempenhar papéis sociais novos e superiores e portanto tendo que usar as roupas a propriadas Não havia muito que o austríaco Nestroy havia escrito sua farsa descontraída e um pouco amarga The Talisman 1840 onde as aventuras da vida de um pobre ruivo são dramaticamente alteradas pela aquisição e subseqüente perda de uma peruca preta O lar era a quintessência do mundo burguês pois nele e apenas nele podiam os problemas e contradições daquela sociedade serem esquecidos e arti ficialmente eliminados Ali e somente ali os burgueses e mais ainda os pequenos burgueses podiam manter a ilusão de uma alegria har moniosa e hierárquica cercada pelos objetos materiais que a demons 238 travam e faziamna possível a vida de sonho que encontrou sua ex pressão culminante no ritual doméstico sistematicamente criado e de senvolvido para este fim a celebração do Natal O jantar de Natal celebrado por Dickens a árvore de Natal inventada na Alemanha mas rapidamente aclimatada na Inglaterra graças ao patrocínio real a canção de Natal mais conhecida através da Stille Nacht alemã simboliza ao mesmo tempo o frio do mundo do lado de fora o calor do círculo familiar do lado de dentro e o contraste entre os dois A impressão mais imediata do interior burguês de meados do sé culo é a de ser demasiadamente repleto e oculto uma massa de obje tos freqüentemente escondidos por cortinas toldos tecidos e papéis de parede e sempre muito elaborados fosse o que fosse Nenhum quadro sem uma rebuscada moldura nenhuma cadeira sem tecido de proteção nenhuma peça de tecido sem borla nenhuma peça de ma deira sem o toque do torno mecânico nenhuma superfície sem algum tecido ou objeto repousando em cima Isto era sem dúvida um sinal de riqueza e status a bela austeridade dos interiores Biedermayer re fletia mais a severidade das finanças burguesas das províncias ale mães do que um gosto inato e a mobília dos quartos dos empregados por seu lado era deserta Objetos expressavam seu custo e no tempo em que a maioria dos objetos domésticos era produzida ainda por processos manuais a elaboração era um índice adequado para expres sar o valor de objetos caros O custo também comprava conforto que era tanto visível como desfrutável Mesmo assim os objetos eram mais do que meramente utilitários ou símbolos de status e sucesso Tinham valor em si mesmo como expressões de personalidade como sendo o programa e a realidade da vida burguesa e mesmo como transformadores do homem No lar tudo isso era expresso e concen trado Daí a sua grande acumulação Estes objetos como as casas que os continham eram sólidos um termo usado caracteristicamente para melhor elogiar uma empresa de comércio Eram construídos para durar para sempre e duraram Ao mesmo tempo precisavam expressar as aspirações mais altas e espirituais da vida através de sua beleza salvo quando as expressa vam através de sua mera existência como os livros e os instrumentos musicais que permaneciam surpreendentemente funcionais no seu design exceto por alguns floreados exteriores ou quando faziam par te do mundo das utilidades domésticas como peças para a cozinha ou bagagem Beleza significava decoração já que a simples construção das casas da burguesia ou os objetos que as mobilizavam não eram su ficientemente grandiosos para oferecer apoio espiritual ou moral em si mesmos como as grandes estradas de ferro e navios a vapor A parte de fora das casas permanecia funcional a questão era relativa ao interior na medida em que pertencessem ao mundo burguês como ocorria com os novos carrosdormitórios Pullman 1865 e os salões e quartos de primeira classe dos navios a vapor que tinham décor Beleza portanto significava decoração uma coisa aplicada à superfície dos objetos 239 Esta dualidade entre solidez e beleza expressava uma grande di visão entre o material e o ideal o corpóreo e o espiritual muito típica do mundo burguês já que espírito e idéia dependiam da matéria e po diam ser expressos somente através da matéria ou pelo menos através do dinheiro que pudesse comprála Nada era mais espiritual do que a música mas a forma característica em que ela entrava no lar burguês era o piano um aparato excessivamente grande rebuscado e caro mesmo quando reduzido para o benefício de uma camada mais mo desta aspirante a valores burgueses às dimensões mais manuseáveis de um piano de parede pianino Nenhum interior burguês era com pleto sem ele todas as filhas diletas da burguesia eram obrigadas a praticar escalas sem fim naquele instrumento A ligação entre moral espiritualidade e miséria tão óbvia nas sociedades nãoburguesas não tinha sido inteiramente eliminada Era geralmente reconhecido que a busca exclusiva de coisas mais eleva das era nãoremunerada exceto no que toca a algumas artes mais vendáveis mas mesmo assim a prosperidade era para ser alcançada somente nos anos maduros o estudante pobre ou o jovem artista na qualidade de professor particular ou de convidado para o jantar de do mingo eram reconhecidamente uma parte subalterna da família bur guesa e seguramente naquelas partes do mundo onde a cultura fosse altamente respeitada Mas a conclusão definitiva era de que não havia uma contribuição entre a busca de sucesso material e espiritual mas que um era a base necessária para o outro Como o romancista E M Forster colocou no período áureo da burguesia Entravam os divi dendos elevavamse grandiosos pensamentos O destino mais certo para um filósofo era o de nascer filho de banqueiros como George Lukacs A glória do ensino alemão o Privatgelehrter professor parti cular era depender de renda própria Era correto que o pobre profes sor judeu casasse com a filha do comerciante local mais rico já que era impensável que uma comunidade com ensino respeitável remune rasse seus luminares apenas com elogios Esta dualidade de matéria e espírito implicava uma hipocrisia que observadores nãosimpáticos ao mundo burguês consideravam uma característica fundamental deste mundo Em nenhum outro as pecto era isso mais óbvio no sentido literal de ser visível do que em questões de sexo Isso não quer dizer que o burguês homem de mea dos do século XIX ou aqueles que aspiravam ser como ele fossem simplesmente desonestos pregando uma moralidade e deliberada mente praticando outra embora evidentemente o hipócrita consciente seja mais facilmente encontrável onde a diferença entre a moralidade oficial e as demandas da natureza humana sejam separada por uma distância abissal e esta sociedade o era Certamente Henry Ward Be eches o grande pregador novaiorquino do puritanismo deveria ter e vitado manter tumultuados casos de amor extraconjugais ou então ter escolhido uma carreira que não lhe demandasse ser um advogado tão proeminente da moderação sexual embora ninguém possa deixar de 240 simpatizar com a má sorte que o ligou em meados da década de 1870 com a bela feminista e advogada do amorlivre Victoria Woo dhull uma senhora cujas convicções tornavam difícil manter uma vi da privada Esta esplêndida mulher uma de duas irmãs igualmente a traentes e emancipadas deu a Marx alguns momentos de irritação por causa de seus esforços para converter a seção americana da Interna cional num órgão de propagação de amorlivre e espiritualismo As duas irmãs saíramse muito bem de suas relações com Commodore Vanderbilt que tomava conta de seus interesses financeiros Mais tarde casouse bem e morreu na atmosfera da respeitabilidade na In glaterra em Bredons Norton Worcestershire 3 Mas é um puro ana cronismo pensar como vários escritores recentes do The other Vic torians tem feito que a moralidade sexual oficial da época fosse uma mera fachada Em primeiro lugar esta hipocrisia não era simplesmen te uma mentira exceto talvez entre aqueles cujas preferências sexuais fossem tão irresistíveis quanto publicamente inadmissíveis como por exemplo políticos proeminentes dependendo de votos puritanos ou respeitáveis negociantes homossexuais em cidades provincianas Mas era menos hipócrita nos países por exemplo na maioria dos católi cos onde um comportamento francamente duplo era aceito castidade para mulheres solteiras e fidelidade para as casadas a caça livre de todas as mulheres exceto talvez filhas casadoiras das classes médias e altas por todos os jovens burgueses solteiros e uma infidelidade to lerada para os casados Aqui as regras do jogo eram perfeitamente en tendidas incluindo a necessidade de uma certa discrição nos casos onde a estabilidade da família ou da propriedade burguesa pudesse ser ameaçada paixão como qualquer italiano da classe média ainda conhece é uma coisa a mãe dos meus filhos é outra bem diferente A hipocrisia entrava neste tipo de comportamento apenas pelo fato de que as mulheres deveriam permanecer totalmente fora do jogo quer dizer na ignorância do que os homens e outras mulheres faziam Nos países protestantes esperavase que a moralidade das restrições sexuais e da fidelidade atingisse os dois sexos mas o próprio fato de que isto era percebido mesmo por aqueles que quebravamna levava os não exatamente à hipocrisia mas ao tormento pessoal É bastante ilegítimo tratar uma pessoa em tal situação como um mero trapaceiro Mais do que isso a moral burguesa era consideravelmente apli cada na verdade talvez tenha se tornado muito mais efetiva a partir do momento em que a massa das classes trabalhadoras respeitáveis passou a adotar os valores da cultura hegemônica e que as classes médias baixas que seguiam a burguesia por definição cresceram em número Tais questões resistiam mesmo ao intenso interesse do mun do burguês nas estatísticas morais desmentindo todas as tentativas de medir a extensão da prostituição A única tentativa adequada de medir infecções venéreas que evidentemente tinham uma forte cone xão com algumas formas de sexo extraconjugal revelou pouco exce to que na Prússia era muito maior na megalópole Berlim do que em 241 qualquer outra província tendendo normalmente a diminuir de acor do com o tamanho das cidades e vilas e que atingia o ponto máximo nas cidades com portos guarnições e institutos de educação isto é com alta concentração de jovens solteiros longe de suas casas Não há razão para supor que o membro vitoriano médio da classe média bai xa classe média ou respeitável classe operária na Inglaterra vitori ana ou nos Estados Unidos não conseguisse viver de acordo com seus princípios de fidelidade sexual As jovens americanas que sur preendiam cínicos homens experimentados na Paris de Napoleão III com a liberdade que os pais lhes permitiam de saírem sozinhas e em companhia de jovens americanos são uma evidência tão forte sobre a moralidade sexual quanto as reportagens jornalísticas do espectro do vício na Londres vitoriana talvez até mais forte 4 É inteiramente ile gítimo aplicar standards pósfreudianos num mundo préfreudiano ou entender que o comportamento sexual de então devesse ser como o nosso Pelos padrões modernos aqueles monastérios leigos as uni versidades de Oxford e Cambridge pareceriam casos literários de pa tologia sexual O que pensaríamos hoje de um Lewis Carroll cuja paixão era fotografar menininhas nuas Pelos padrões vitorianos os vícios maiores eram certamente a gula e não a luxúria e a tendência sentimental de muitos professores por jovens rapazes quase que cer tamente o termo é revelador platônica seria colocada entre as esquisitices de educadores inveterados Foi nesta época que a expres são to make love na língua inglesa tornouse sinônimo de ato se xual O mundo burguês era perseguido pelo sexo mas não necessari amente pela promiscuidade sexual a nemesis característica do mito burguês como o romancista Thomas Mann viu tão claramente acom panhava uma única queda do estado de graça como a sífilis do compo sitor Adrian Leverkuchn em Dr Faustus O próprio extremismo de seu medo reflete uma ingenuidade prevalecente ou melhor inocência A força dos padrões morais nos países protestantes foi revelada pelo comportamento dos senhores de escravos em relação a suas escravas Contrariamente ao que se poderia esperar e também em relação ao e thos dominante nos países católicosmediterrâneos não há nada de melhor do que um tamarindo doce ou uma mulata virgem dizia um di tado cubano parece que a extensão de miscigenação ou mesmo de fi lhos ilegítimos no Sul rural e escravo foi bastante pequena 5 Esta inocência entretanto nos permite ver o poderoso elemento sexual no mundo burguês de forma clara nas suas roupas uma ex traordinária combinação de tentação e interdição O burguês vitoriano era coberto por tecidos deixando pouca coisa publicamente visível exceto a face e mesmo isso nos trópicos Em casos extremos como nos Estados Unidos até objetos que lembrassem o corpo como os pés das mesas podiam vir a ser ocultos Ao mesmo tempo e nunca tanto quanto nas décadas de 1860 e 1870 todas as características se xuais secundárias eram enfatizadas grotescamente cabelos e barbas nos homens cabelos seios e ancas nas mulheres aumentadas para 242 proporções gigantescas através de enchimentos postiços culsde Paris etc O efeito de choques do famoso quadro de Manet Déjeuner sur lHerbe 1863 deriva precisamente do contraste entre a enorme respeitabilidade das roupas dos homens e a nudez das mulheres A verdadeira obsessão com a qual a civilização burguesa insistia que a mulher era essencialmente um ser espiritual implicava que os homens não o eram e também que a óbvia atração física entre os sexos não ca bia dentro do sistema de valores Sucesso era incompatível com prazer como o folclore do esporte ainda assume ao sentenciar jogadores à abstenção sexual temporária antes do grande jogo ou da grande luta De forma mais geral a civilização apoiavase na repressão das urgências sexuais O maior dos psicólogos da burguesia Sigmund Freud fez des ta proposição a pedra de toque de suas teorias embora gerações poste riores tenham lido nele uma chamada pela abolição da repressão Mas por que era este aspecto visto de forma tão passional e até patológica tão contrastante com o ideal de moderação e juste milieu que definia as ambições e papéis sociais das classes médias6 Nos de graus mais baixos das aspirações da classe média a resposta é fácil Somente esforços heróicos poderiam elevar um homem e uma mulher pobres ou mesmo seus filhos para fora da desmoralização colocan doos no lugar firme da respeitabilidade e acima de tudo definir ali as suas posições Para os membros dos Alcoólatras Anônimos não havia solução de compromisso era ou a total abstinência ou o colapso completo De fato o movimento pela total abstinência do álcool que floresceu nos países protestantes e puritanos ilustra esta questão de forma clara Não era efetivamente um movimento para abolir ou mesmo para limitar o alcoolismo de massa mas para definir e separar a classe dos indivíduos que tivessem demonstrado pela força pessoal de seu caráter que eram distintos dos pobres nãorespeitáveis O puri tanismo sexual preenchia a mesma função Mas este era um fenôme no burguês apenas na medida em que refletia a hegemonia da res peitabilidade burguesa Como as leituras de Samuel Smiles ou a prá tica de outras formas de ajudaasimesmo aquilo substituía o suces so burguês ao invés de preparar para ele Ao nível do artesão ou fun cionário respeitável a abstinência era freqüentemente a única gratifi cação Em termos materiais dava apenas compensações modestas O problema do puritanismo sexual burguês é mais complexo A crença de que o burguês de meados do século XIX era incomumente vigoroso e portanto obrigado a construir defesas incomumente impe netráveis contra a tentação da carne não é convincente o que fazia as tentações tão tentadoras era precisamente o extremismo dos padrões morais aceitos que tornavam a queda igualmente dramática como o caso do católicopuritano conde Muffat em Nana de Emile Zola a novela par excellence da prostituição em Paris na década de 1860 Evidentemente o problema era também de certa forma econômico como veremos A família não era meramente a unidade social bási ca da sociedade burguesa mas também a unidade básica do sistema 243 de propriedade e das empresas de comércio ligada com outras unida des similares através de um sistema de trocas mulhermais propriedade o dote do casamento em que as mulheres deveriam por estrita convenção derivada de uma tradição préburguesa ser virgines inlactae Qualquer coisa que enfraquecesse esta unidade familiar era inadmissível e nada a enfraquecia mais do que a paixão física des controlada que introduzia herdeiros e noivas inadequados isto é economicamente indesejáveis separava maridos de mulheres e des perdiçava recursos comuns Mas as tensões eram mais que econômicas Elas eram particu larmente fortes em nosso período quando a moral da abstinência moderação e contenção entrava dramaticamente em conflito com a realidade do sucesso burguês Os burgueses não viviam mais numa economia familiar de escassez ou num nível social remotamente lon ge das tentações da alta sociedade O problema era mais o de gastar que o de economizar Não apenas os burgueses ociosos tornavamse mais e mais numerosos em Colônia o número de rentiers pagando imposto de renda cresceu de 162 em 1854 para 600 em 1874 7 como de que outra forma exceto gastar poderiam os bemsucedidos bur gueses demonstrar o seu sucesso tendo ou não poder político enquan to classe A palavra parvenu novorico automaticamente tornouse sinônimo do gastador destemperado Se estes burgueses tentavam al cançar o estilo de vida da aristocracia ou então como os conscientes Krupp e outros magnatas da Ruhr construir castelos e impérios feudais paralelos e até mais impressionantes que aqueles dos Junkers cujos tí tulos haviam recusado precisavam gastar e de uma forma que inevita velmente fazia com que seu estilo de vida se parecesse mais próximo ao da aristocracia nãopuritana e as mulheres mais ainda Antes da dé cada de 1850 isto havia sido um problema relativamente de poucas famílias em alguns países como a Alemanha praticamente nenhuma Mas agora transformavase no problema de toda uma classe A burguesia como classe encontrava enorme dificuldade em combinar aquisições e despesas de uma forma moralmente satisfató ria da mesma maneira que era incapaz de resolver o problema mate rial equivalente de como garantir uma sucessão de homens de negó cios igualmente dinâmicos e capazes dentro de uma mesma família um fato que aumentava o papel das filhas que podiam trazer sangue novo para dentro do complexo de negócios Dos quatro filhos do banqueiro Friedrich Wichelhaus em Wuppertal 181086 apenas Robert nascido em 1836 permaneceu banqueiro Os outros três nascidos em 1831 1842 e 1846 terminaram como fazendeiros e um acadêmico mas ambas as filhas nascidas em 1829e 1838 casaram se com industriais inclusive um membro da família de Engels8 A coisa mais importante pela qual os burgueses lutavam o lucro cessa va de ser uma motivação adequada assim que trazia riqueza em quan tidade adequada No final do século a burguesia descobriu pelo me nos uma fórmula temporária para combinar aquisições e despesas a 244 través da compra de antiguidades Estas décadas finais antes da catás trofe de 1914 iriam ser o Indian summer a belle époque da vida bur guesa lamentada de forma retrospectiva por seus sobreviventes Mas em nosso período as contradições estavam talvez no seu ponto mais agudo esforço e prazer coexistiam mas esbarravamse E a sexuali dade era uma das vítimas do conflito a hipocrisia um dos vencedores II Sufocada por roupas paredes e objetos ali estava a família bur guesa a instituição mais misteriosa de nossa época Pois se é fácil descobrir ou indicar as conexões entre puritanismo e capitalismo como testemunha uma grande literatura especializada as conexões entre a família do século XIX e a sociedade burguesa permanecem obscuras De fato o aparente conflito entre as duas tem sido raramen te até percebido Por que deveria uma sociedade dedicada a uma eco nomia de obtenção de lucro livre iniciativa competitiva esforços do indivíduo isolado igualdade de direitos oportunidades e liberdade por que enfim deveria ela apoiarse numa instituição que negava to dos estes ideais Sua unidade básica a casa de uma única família era uma auto cracia patriarcal e um microcosmo da espécie de sociedade que a bur guesia como classe ou seus portavozes teóricos denunciava e des truía uma hierarquia de dependência pessoal Ali firmemente estava e dirigia o pai marido senhor Trazendo prosperidade como guardião guia e juiz9 Abaixo dele continuando a citar o Grande Filósofo Martin Tupper estavam o bom anjo da casa a mãe esposa e amante 10 cu jo trabalho para o grande Ruskin era I Agradar as pessoas II Alimentálas de forma agradável III Vestilas IV Mantêlas em ordem V Fazêlas aprender 11 uma tarefa para a qual curiosamente ela não precisava demonstrar possuir nem inteligência nem conhecimento Isto não era assim ape nas porque sua nova função de esposa burguesa admirar a capacida de do marido burguês e mantêlo em paz e conforto conflitasse com as velhas funções de dirigir o lar mas também porque sua inferiori dade em relação ao homem precisava ser demonstrada Tem ela saber É precioso mas tome cuidado para que ela não se exceda 245 Pois as mulheres precisam ser dominadas e a verdadeira dominação é da mente 12 Entretanto este ser atraente ignorante e idiota era requisitado para exercer também dominação não sobre as crianças cujo senhor era ainda o pater famílias mas sobre os criados cuja presença distin guia os burgueses dos que lhes eram socialmente inferiores Definia se uma lady pelo fato de que era alguém que não trabalhava mas dava ordens para outra pessoa fazêlo13 sua superioridade estando es tabelecida por esta relação Os empregados eram cada vez mais mu lheres entre 1841 e 1881 a percentagem de homens no serviço do méstico na Inglaterra caiu de 20 para 12 portanto a casa ideal bur guesa consistia em um senhor dominando um número de mulheres hierarquicamente dispostas já que os filhos homens tendiam a deixar o lar ao crescerem ou então entre as classes altas inglesas logo que chegavam a idade de ir para o colégio interno Mas a doméstica embora recebendo salário o que a igualava ao trabalhador cujo emprego definia o homem burguês na economia era essencialmente bem diferente deste mesmo trabalhador já que ela ou mais raramente ele mantinha uma ligação com o empregador maior que a de meramente receber um salário pois era uma ligação muito mais pessoal e de fato de forma prática uma ligação de dependência total Tudo na sua vida era estritamente prescrito e controlado já que vivia num quarto magramente mobiliado Desde o uniforme que usa va até a cartatestemunho de boa conduta e caráter sem a qual era impossível conseguir novo emprego tudo simbolizava uma relação de poder e dominação Isto não excluía relações pessoais próximas se desiguais às que haviam nas sociedades escravas Talvez até encora jasse embora não deva ser esquecido que para cada babá ou jardinei ro que viviam suas vidas inteiras a serviço de uma única família havia uma centena de meninas do interior que passavam brevemente através da casa para a gravidez o casamento ou outro emprego sendo trata das apenas como uma outra instância daquele problema de emprega das que preenchia as conversas das patroas O ponto crucial era o de que a estrutura da família burguesa estava em direta contradição com a sociedade burguesa Dentro dela a liberdade a oportunidade o nexo do dinheiro e a busca do lucro individual não eram a regra Poderia ser argumentado que tal ocorria porque o anarquismo social hobbesiano que formava o modelo teórico da economia bur guesa não dava nenhuma base para nenhum tipo de organização so cial incluindo a família E de fato era um contraste deliberado com o mundo de fora um oásis de paz num mundo de guerra le repos du guerrier Você sabe escreveu a mulher de um industrial francês a seus filhos em 1856 que vivemos numa época em que os homens têm seu valor determinado apenas por seus próprios esforços Todo dia que passa o bravo e esperto assistente toma o lugar do senhor cuja negligência e 246 falta de seriedade deslocao do lugar que lhe parecia ser atribuído permanentemente Que batalha escreveu seu marido encurralado em competição com industriais têxteis ingleses Muitos morrerão na luta muitos mais se rão seriamente feridos A metáfora da guerra vinha naturalmente aos lábios dos homens quando discutiam suas lutas pela existência ou a sobrevivência dos melhores da mesma forma como a metáfo ra da paz quando descreviam seus lares o acolhedor lugar da felici dade o lugar onde a ambição do coração encontrava sua paz já que nunca podia encontrála no mundo exterior desde que nunca po dia ser satisfeita l5 Mas pode também ser que a desigualdade essencial sobre a qual o capitalismo se apoiava encontrasse uma expressão necessária na família burguesa Precisamente porque não era baseada em desigual dades coletivas institucionalizadas e tradicionais a dependência pre cisava ser uma relação individual Já que a superioridade era algo tão incerto para o indivíduo ela precisava tomar uma forma em que fosse permanente e segura Já que sua expressão essencial era o dinheiro que expressa meramente a relação de troca outras formas de expres são que demonstrassem a dominação de pessoas sobre pessoas preci savam suplementála Não havia evidentemente nada de novo na es trutura da família patriarcal baseada na subordinação da mulher e fi lhos Mas onde poderíamos esperar que a sociedade burguesa logica mente quebrasse a instituição ou a transformasse como ela iria de fato se desintegrar mais tarde a fase clássica da sociedade burguesa reforçoua e exageroua Até onde este patriarcado burguês ideal representava acura damente a realidade é outra história Um historiador fez um sumário adequado do burguês típico de Lille como um homem que teme a Deus mas mais ainda à sua mulher e lê o Echo du Nord 16 A exis tência e o reforço do tipoideal da família burguesa deste período é significativo É suficiente para explicar o início de um movimento feminista sistemático entre as mulheres da classe média deste perío do pelo menos nos países anglosaxônicos ou protestantes A casa burguesa entretanto era meramente o núcleo de uma co nexão familiar mais ampla dentro da qual o indivíduo operava os Rothschilds os Krupps ou igualmente os Forstyes que fizeram muito da história econômica e social do século XIX um assunto es sencialmente dinástico Mas embora uma enorme quantidade de ma terial sobre tais famílias tenha sido acumulada desde o século passa Citado em L Trénard Un Industriel roubásien du XIX siécle Reme du Nord 50 1968 pag 38 O texto do trecho desta carta parece ser o mesmo da epígrafe do capítulo A tradu ção do francês para o inglês difere em pouca coisa mas mantivemos as duas versões na tra dução portuguesaNT 247 do nem os antropólogos sociais nem os livros genealógicos uma o cupação aristocrática deramlhe suficiente atenção específica para tornar fácil uma generalização com alguma base que seja sobre tais grupos familiares Em que medida se promoviam a partir das classes mais baixas Não em grande número embora em teoria nada lhes impedisse Dos chefes de oficina ingleses em 1865 89 vinham de famílias de classe média 7 da classe média baixa incluindo pequenos lojistas arte sãos independentes etc e apenas 4 de trabalhadores especializados ou menos ainda nãoespecializados A maior parte dos manufa tores têxteis do norte da França no mesmo período eram igualmente filhos daquilo que poderseia chamar de camada média os fundado res da empresa capitalista no sudoeste alemão não eram sempre ne cessariamente ricos mas o número daqueles com longa experiência familiar em negócios e freqüentemente nas indústrias que iriam se desenvolver é significativo protestantes suíçoalsacianos corno os Koechlin Geigy ou Sarrasin judeus nascidos nas finanças de peque nos negócios Homens de cultura sobretudo filhos de pastores pro testantes ou funcionários civis modificaramse mas não alteraram seu status de classe média com o advento da empresa capitalista18 As carreiras do mundo burguês estavam de fato abertas ao talento mas as famílias com um certo grau de educação propriedade e ligações sociais entre outras certamente começavam com uma enorme vanta gem relativa pelo menos a de poder estabelecer relações de casamen to com outras do mesmo status social da mesma linha de negócios ou com recursos que podiam ser combinados entre si As vantagens de uma família grande ou de um grupo fechado de famílias era certamente substancial Dentro dos negócios garantia ca pital talvez contatos proveitosos e sobretudo gerentes de confiança Os Lefebvres de Lille em 1851 financiaram os negócios de lã de um cunhado Amedée Prouvost Siemens e Halske a famosa firma elétri ca estabelecida em 1847 obteve seu capital inicial de um primo e os três irmãos Werner Carl e William tomaram conta respectivamente das filiais de Berlim São Petersburgo e Londres A história dos negó cios do século XíX está repleta de tais alianças familiares e interpene trações Elas demandavam um grande número de filhos e filhas dis poníveis mas deles não havia carência e portanto diferente do cam pesinato francês que requeria que um e apenas um filho tomasse conta dos negócios da família não havia nenhum controle na quantidade de filhos exceto entre as famílias dos pobres e das classes médias baixas Mas como eram organizados estes clãs Como operavam Em que ponto deixavam de representar grupos de família e se transforma vam num grupo social coerente numa burguesia local ou mesmo como talvez no caso dos banqueiros protestantes e judeus numa re de mais espalhada da qual as alianças de família formavam apenas um aspecto Não podemos responder estas questões ainda 248 III O que em outras palavras queremos dizer com burguesia como classe neste período As definições econômicas políticas e so ciais diferiam de alguma forma mas ainda eram suficientemente pró ximas umas das outras para causar relativamente pouca dificuldade Portanto economicamente a quintessência do burguês era um capitalista isto é o possuidor de capital ou aquele que recebia ren da derivada de tal fonte ou um empresário em busca de lucro ou to das estas coisas juntas E de fato o burguês característico ou o membro da classe média de nosso período incluía poucas pessoas que não entrassem numa destas categorias As 150 famílias principais de Bordeaux em 1848 incluíam 90 homens de negócios comerciantes banqueiros lojistas etc embora poucos industriais 45 possuidores de alguma propriedade e rentiers e 15 membros de profissões liberais que eram naqueles dias variedades da empresa privada Havia entre eles uma ausência total de executivos assalariados que formavam o maior grupo dentro das 450 famílias mais ricas de Bordeaux em 196019 Podemos acrescentar que embora a propriedade da terra ou melhor de propriedades urbanas permanecesse uma fonte importante de renda especialmente dentro da pequena e média burguesia em áreas de pouca industrialização esta fonte diminuía aos poucos de im portância Mesmo na Bordeaux nãoindustrial formava apenas 40 da riqueza deixada por herança em 1873 23 das maiores fortunas en quanto que na Lille industrial no mesmo ano formava apenas 3120 O aspecto da política burguesa era naturalmente diferente de al guma forma pelo menos na medida em que a política é uma atividade especializada e que consome tempo além de não atrair a todos igual mente ou que para a qual nem todos têm as mesmas qualificações De qualquer maneira neste período o número de burgueses que pra ticava a política burguesa chegava a impressionar Na segunda meta de do século XIX entre 25 e 40 dos membros do Conselho Federal Suíço consistia de negociantes ou rentiers 20 a 30 dos membros do Conselho eram barões federais que dirigiam os bancos estradas de ferro e indústrias uma percentagem maior que no século XX Outros 15 consistiam de profissionais liberais isto é advogados embora 50 de todos os membros do Conselho tivessem diplomas em Direi to uma espécie de standard educacional que dava qualificação para a vida pública e a administração na maioria dos países Outros 20 a 30 consistiam de figuras públicas profissionais prefeitos juízes do campo e outros magistrados21 O Grupo Liberal na Câmara Belga de meados do século tinha 83 de seus membros burgueses 16 e ram homens de negócios 16 proprietaires 15 rentiers 18 ad ministradores profissionais e 42 de profissões liberais isto é advo gados e uns poucos médicos 22 Assim ocorria e talvez até em maior escala na política das cidades dominadas como eram naturalmente pelas notabilidades burguesas normalmente liberais do lugar Se os 249 escalões mais elevados do poder eram em grande parte ocupados por grupos mais idosos tradicionalmente estabelecidos a partir de 1830 França e 1848 Alemanha a burguesia tomou de assalto e conquis tou os escalões intermediários do poder político como conselhos mu nicipais prefeituras conselhos distritais etc e manteveos sob controle até o surgimento da política de massa nas últimas décadas do século A partir de 1830 Lille foi governada por prefeitos que eram proeminentes homens de negócios 23 Na Inglaterra as grandes cidades estavam noto riamente nas mãos da oligarquia dos homens de negócios locais Socialmente as definições não eram tão claras embora a classe média incluísse todos os grupos acima descritos desde que fossem abastados e bem estabelecidos homens de negócios proprietários profissionais liberais e os escalões mais altos da administração que eram evidentemente um grupo numericamente bem pequeno fora das cidades principais A dificuldade está em definir os limites altos e baixos desta camada dentro da hierarquia de status social assim como levar em conta a marcada heterogeneidade dos membros dentro destes limites havia pelo menos uma estratificação interna aceita em grande moyenne e petite bourgeoisie a última mergulhando dentro do que seria de faceto o limite da classe No topo da escala a burguesia era mais ou menos diferenciada da aristocracia alta ou baixa dependendo parcialmente da exclusivi dade social e legal deste grupo ou pela sua própria consciência de classe Nenhum burguês poderia transformarse num verdadeiro aris tocrata na Rússia ou na Prússia e mesmo nos lugares onde títulos de baixa nobreza fossem distribuídos livremente como no Império dos Habsburgos nenhum conde Chotek ou Auersperg embora pronto pa ra juntarse aos diretores de uma empresa comercial consideraria um barão von Wertheimstein qualquer coisa além de um banqueiro de classe média ou judeu A Inglaterra estava sozinha em aceitar siste maticamente embora ainda de forma modesta neste período homens de negócios na aristocracia preferindo banqueiros e financistas an tes de industriais Por outro lado até 1870 e mesmo depois ainda havia industriais alemães que se recusavam a permitir que seus sobrinhos se tornassem oficiais da reserva como sendo algo inadequado a jovens daquela classe ou que seus filhos insistissem em fazer o serviço militar na in fantaria ou engenharia ao invés de escolher a cavalaria mais social mente exclusiva Mas é preciso acrescentar que quando os lucros co meçaram a rolar e eles eram bastante substanciais em nosso período a tentação das condecorações títulos casamentos com a nobreza e em geral o estilo da vida aristocrática tornouse irresistível para os ricos Os produtores ingleses inconformados iriam se transferir para a Igreja da Inglaterra e no norte da França o Voltaireanismo mal oculto de antes de 1850 iria se transformar no fervoroso catolicismo de depois de 1870 24 250 No outro extremo a linha divisória era bem mais claramente e conômica embora os homens de negócios pelo menos na Inglaterra viessem a traçar uma linha demarcatória entre eles mesmos e os vendedores que ofereciam suas mercadorias diretamente ao público como lojistas pelo menos até que a venda a varejo viesse a mostrar que poderia trazer milhões àqueles que a praticavam O artesão inde pendente e o pequeno lojista claramente pertenciam à baixa classe média ou Mittelstand que tinha pouco em comum com a burguesia ex ceto a aspiração ao status social desta última O camponês rico não era um burguês nem o era o funcionário whitecollar Entretanto havia em meados do século XIX um reservatório suficientemente grande do ve lho tipo de produtor ou vendedor de pequena mercadoria economica mente independente e mesmo de trabalhadores especializados ou capa tazes para que a linha divisória fosse nebulosa alguns prosperariam e pelo menos nas suas localidades seriam aceitos como burgueses Uma das principais características da burguesia como classe era que consistia num corpo de pessoas com poder e influência indepen dente do poder e influência derivados de nascimento ou status Para pertencer a ela um homem tinha que ser alguém uma pessoa que contasse como indivíduo por causa da sua riqueza capacidade de co mandar outros homens ou de influenciálos de alguma forma Portan to a forma clássica da política burguesa era como já vimos inteira mente diferente da política de massa daqueles abaixo dela incluindo a pequena burguesia O recurso clássico do burguês em apuros ou com razão para reclamações era exercer ou pedir influência pessoal ter uma palavra com o prefeito o deputado o ministro o velho com panheiro de escola ou universidade o contato na indústria A Euro pa burguesa cresceu cheia de sistemas informais de proteção mútua redes de velhos amigos ou máfias amigos de amigos entre os quais aqueles saídos das mesmas instituições educacionais eram natu ralmente muito mais importantes especialmente se fossem institui ções universitárias que produziam ligações nacionais ao invés de me ramente locais Na Inglaterra entretanto as chamadas public schools que se desenvolveram rapidamente neste período reuniram os filhos da burguesia de diferentes partes do país numa idade ainda menor Na França alguns dos grandes lycées de Paris talvez tenham servido a um fim similar de qualquer forma para os intelectuais Uma destas redes a francomaçonaria serviu a um objetivo ainda mais importan te sobretudo nos países católicos pois foi usada de fato como a ci mentação ideológica da burguesia liberal para a sua dimensão política ou mesmo como na Itália como virtualmente a única organização permanente e nacional da classe 25 O burguês individual que se via chamado a comentar sobre assuntos públicos sabia que uma carta ao The Times ou ao Neue Freie Presse atingiria não apenas uma grande parte de sua classe e as decisões a serem tomadas mas o que era mais importante ela seria impressa com a força de sua afirmação enquanto indivíduo A burguesia como classe não organizou movimentos de 251 massa mas grupos de pressão Seu modelo na política não era o Car tismo mas a AntiCornLaw League Evidentemente o grau em que um burguês era notabilidade variava enormemente da grande bourgeoisie cujo campo de ação era nacional ou mesmo internacional às figuras mais modestas que eram pessoas importantes em Aussig ou Groningen Krupp esperava e re cebeu mais consideração que Theodor Boeninger de Duisburg que a administração regional apenas recomendara para o título de Conse lheiro Comercial Kommerzienrat porque era rico industrial capaz ativo na vida pública e religiosa e havia apoiado o governo nas elei ções para os conselhos municipal e distrital Portanto ambos cada qual a seu modo eram pessoas que contavam Se esnobismo dividia milionários dos ricos e estes por seu turno dos meramente confortá veis o que era natural numa classe cuja verdadeira essência era ele varse mais alto na escala do conforto individual esta divisão não chegava a destruir a consciência de grupo que transformou o meio da sociedade na classe média ou burguesia Apoiavase em pressupostos comuns credos comuns formas de ação comuns A burguesia de nosso período era esmagadoramente li beral não necessariamente num sentido partidário embora como já vimos os partidos liberais prevalecessem mas num sentido ideológi co Acreditava no capitalismo empresa privada competitiva tecnolo gia ciência e razão Acreditava no progresso numa certa forma de governo representativo numa certa quantidade de liberdades e direi tos civis desde que estes fossem compatíveis com a regra da lei e com o tipo de ordem que mantivesse os pobres no seu lugar Acredi tava mais na cultura que na religião em casos extremos substituindo a freqüência ritual à igreja pela ida à ópera teatro e concertos Acre ditava na carreira aberta ao empreendimento e talento e as próprias vidas de seus membros provavam estes méritos Como já vimos nes te tempo a fé tradicional e puritana nas virtudes da moderação e abs tenção encontrava dificuldades no caminho de sua realização mas es te fracasso não era muito lamentado Se a sociedade alemã viesse a entrar em colapso algum dia escreveu um cronista em 1855 seria porque as classes médias tinham começado a procurar aparência e lu xo sem buscar contrabalançar isso com o sentido burguês para o tra balho com o respeito pelas forças espirituais da vida com o esforço de identificar ciência idéia e talento com o desenvolvimento progres sivo do Terceiro Estado 26 Talvez o sentido da luta pela existência uma seleção natural na qual vitória ou mesmo sobrevivência prova vam tanto a capacitação quanto as qualidades essencialmente morais que sozinhas poderiam proporcionar esta capacitação reflita a adap tação da antiga ética burguesa a uma nova situação Darwinismo so cial ou de outra forma não era apenas uma ciência mas também uma ideologia mesmo antes de ser formulada Ser burguês não era apenas ser superior mas implicava também ter demonstrado as qualidades morais equivalentes às antigas qualidades puritanas 252 Mas antes de qualquer outra coisa significava superioridade O burguês não era apenas independente um homem a quem ninguém exceto o Estado ou Deus dava ordens mas que determinavaas a si mesmo Não era apenas um empregador empresário ou capitalista mas socialmente um senhor um lord Fabrikherr um patron ou chef O monopólio do comando na casa no negócio na fábrica era fundamental para sua própria definição e seu reconhecimento formal fosse nominal ou real é um elemento essencial em todas as disputas industriais deste período Mas eu também sou o Diretor das Minas quer dizer o dirigente chef de uma grande população de tra balhadores Represento o princípio da autoridade e preciso fazêla respeitada na minha própria pessoa tal tem sido sempre meu objetivo consciente em minhas relações com as classes trabalhadoras 27 So mente os membros das profissões liberais ou o artista ou o intelectual que não fosse essencialmente um empregador ou alguém com subor dinados não se definiam como master Mesmo aqui o princípio da autoridade estava longe de ser ausente fosse a partir do comporta mento do professor universitário tradicional do continente do médico autocrático do regente ou do pintor cheio de caprichos Se Krupp comandava seus exércitos de trabalhadores Richard Wagner esperava subserviência total de suas platéias Dominação implica inferioridade Mas a burguesia de meados do século XIX estava dividida quanto à natureza daquela inferiorida de das classes baixas inferioridade sobre a qual não havia desacordo embora tentativas tenham sido feitas para distinguir dentro da massa subalterna entre aqueles que se poderia esperar uma ascensão para pelo menos a condição de baixa classe média e outros para os quais não havia redenção possível Já que o sucesso era devido ao mérito pessoal o fracasso era claramente devido à falta de mérito A ética tradicional burguesa puritana ou laica havia determinado que isso era devido mais à fraqueza moral ou espiritual do que à falta de inte ligência pois era evidente que cérebro não era uma necessidade in dispensável para o sucesso nos negócios Isso não implicava necessa riamente em antiintelectualismo embora na Inglaterra e nos Estados Unidos esta atitude fosse bem difundida na medida em que o triunfo em negócios era sobretudo dos homens pobremente ilustrados que usavam o empiricismo e o senso comum Samuel Smiles colocou esta questão de forma simples A experiência a ser obtida através de livros embora freqüentemente valiosa é da natureza do aprender enquanto que a experiência ganha da vida real é da natureza da sabedoria e uma pequena loja da última vale muito mais que um estoque da primeira 28 Mas uma classificação simplista em moralmente superiores e in feriores embora adequada para distinguir os respeitáveis da massa trabalhadora bêbada e licenciosa não mais era de forma geral ade 253 quada exceto para a baixa classe média pois as antigas virtudes não mais eram visivelmente aplicáveis para a burguesia afluente e bemsucedida A ética da abstinência e do esforço praticamente não podia mais ser aplicada ao sucesso dos milionários americanos das décadas de 1860 e 1870 ou mesmo ao rico produtor aposentado nu ma casa de campo com todo o conforto e menos ainda para seus pa rentes rentiers àqueles cujo ideal era nas palavras de Ruskin que a vida deveria ser vivida num mundo agradavelmente ondu lante sustentado por toda parte com ferro e carvão Para cada ban co agradável deve existir uma bela mansão um parque de ta manho moderado um grande jardim e estufas uma carruagem a gradável para passeios Na casa devem viver o gentleman inglês com sua graciosa esposa e sua bela família ele sempre capaz de fornecer o boudoir e as jóias para a esposa e belos vestidos de sa lão para as filhas e instrumentos de caça para os filhos e caça nos Highlands para si mesmo 29 Daí a crescente importância das teorias alternativas da superiori dade biológica de classe que tanto atravessa o Weltanschauung bur guês do século XIX Superioridade era o resultado da seleção natural transmitida geneticamente ver capítulo 14 O burguês era senão de uma espécie diferente pelo menos de uma raça superior um nível mais alto na evolução humana diferente dos níveis mais baixos que permaneciam no equivalente cultural ou histórico da infância ou no máximo adolescência De senhor à raça superior era apenas um passo portanto o di reito de dominar a inquestionável superioridade do burguês como es pécie implicava não apenas inferioridade mas idealmente uma inferi oridade aceita nas relações entre homens e mulheres que mais uma vez simbolizavam muito sobre a visão burguesa do mundo Os traba lhadores como as mulheres deveriam ser leais e satisfeitos Se não o fossem era devido àquela figura crucial do universo social da bur guesia o agitador de fora Embora nada fosse mais óbvio a olho nu que o fato de que os membros dos sindicatos eram sempre os melho res trabalhadores os mais inteligentes os mais preparados o mito do agitador de fora explorando as mentes simples mas basicamente operativas dos trabalhadores era indestrutível A conduta dos traba lhadores é deplorável escreveu um gerente de minas francês em 1869 no processo de violenta repressão a uma espécie de greve que o livro Germinal de Zola nos deu um retrato tão vivo mas é preciso terse em conta que eles foram apenas vítimas de agitadores 30 Para ser mais preciso o militante operário ativo ou o líder potencial preci sava por definição ser um agitador já que não podia ser classifi cado dentro do estereótipo de obediência boçalidade e estupidez Quando em 1859 nove dos melhores operários mineiros de Seaton Delaval seis deles metodistas primitivos e dois deles dados à pre dica foram enviados à prisão por dois meses depois de uma greve 254 à qual eles tinham se oposto o gerente da mina deixou este ponto bem claro Sei que eles são homens respeitáveis e é por isso que eu os ponho na prisão Não adianta nada prender aqueles que não sentem31 Tal atitude refletia a determinação em decapitar as classes menos favo recidas quando elas não perdiam seus líderes potenciais espontanea mente através da absorção por parte da classe média Mas também re fletia um grau considerável de confiança Estávamos longe daqueles proprietários de fábricas da década de 1830 vivendo em terror constan te de algo como uma insurreição escrava ver A Era das Revoluções epígrafe ao capítulo 11 Quando agora os donos de fábricas falavam do perigo do comunismo espreitando atrás de qualquer limitação do di reito absoluto de admitir e despedir eles não se referiam à revolução social mas meramente ao fato de que o direito de propriedade e o direi to de dominação eram indissociáveis e uma sociedade burguesa iria perderse completamente a partir do momento em que qualquer interfe rência em relação à propriedade fosse permitida32 Portanto a reação de medo e ódio foi bem mais histérica quando o espectro da revolução so cial irrompeu mais uma vez dentro do confiante mundo capitalista Os massacres dos Communards de Paris ver capítulo 9 o testemunham de forma contundente IV Uma classe de senhores sim Uma classe dirigente A resposta é mais complexa A burguesia não era evidentemente uma classe diri gente no sentido em que o velho tipo de senhor da terra o era cuja posição proporcionavalhe de jure ou de facto o direito de governo por sobre os habitantes de seu território O burguês normalmente ope rava dentro de uma rede de poder de governo e administração que não era de sua propriedade pelo menos fora dos prédios que ocupasse meu lar é meu castelo Somente em áreas muito distantes da auto ridade do Estado como em campos remotos de mineração ou onde o próprio Estado fosse fraco como nos Estados Unidos podiam os se nhores burgueses exercer aquele tipo de comando direto fosse atra vés do comando sobre as forças locais da autoridade pública por e xércitos privados como os homens de Pinkerton ou pela criação de grupos armados como os Vigilantes para manter a ordem Além disso em nosso período era bastante excepcional o caso de estados onde a burguesia houvesse conquistado o controle político formal ou não precisasse partilhálo com elites políticas pregressas Na maioria dos países a burguesia embora bem definida realmente não controla va ou exercia o poder político exceto talvez nos níveis subalternos ou municipais O que ela realmente exerceu foi hegemonia e foi o que determi nou de forma crescente a sua política Não havia alternativa para o 255 capitalismo como método de desenvolvimento econômico e neste pe ríodo isto implicava a realização do programa econômico e institu cional da burguesia liberal com variações locais assim como a po sição crucial da burguesia dentro do Estado Mesmo para os socialis tas a via para o triunfo proletário passava através de um capitalismo completasse desenvolvido Antes de 1848 havia parecido por um momento que sua crise de transição poderia também ser sua crise final pelo menos na Inglaterra mas na década de 1850 ficou claro que seu período maior de crescimento havia apenas começado Era indestrutível no seu bastião principal Inglaterra e em outros lugares as perspectivas de revolução social paradoxalmente pareciam depender mais do que nunca dos projetos da burguesia doméstica ou estrangeira ao criar o capitalismo triunfante que faria possível sua derrubada Em certo senti do tanto Marx que recebeu bem a conquista da Índia pela Inglaterra e metade do México pelos Estados Unidos como historicamente pro gressista no seu tempo quanto os elemento progressistas no México ou na Índia que procuravam aliança com os Estados Unidos ou o Rajá britânico contra seus próprios tradicionalistas reconheciam a mesma situação global Em relação aos dirigentes dos regimes conservadores antiburgueses e antiliberais da Europa fosse em Viena Berlim ou São Petesburgo eles reconheciam que a alternativa para o desenvolvimento econômico capitalista era o atraso e o conseqüente enfraquecimento O problema destes últimos era como fazer crescer o capitalismo e com ele a burguesia sem a contrapartida de um regime político burguêsliberal A simples rejeição da sociedade burguesa e de suas idéias não era mais possível A única organização que resolveu combater esta tendência sem tréguas a Igreja Católica conseguiu apenas isolarse A encíclica Syllabus of Errors de 1864 e o Concilio do Vaticano demonstraram pelo seu extremismo na rejeição de tudo que caracterizava o século XIX que estavam inteiramente na defensiva A partir da década de 1870 o monopólio do programa burguês na sua forma liberal começou a desagregarse Mas no nosso pe ríodo era imbatível Em questões econômicas mesmo os dirigentes absolutistas da Europa central e do leste foram forçados a abolir a ser vidão e desmantelar o aparato tradicional do controle econômico esta tal assim como os privilégios corporativos Em questão políticas es tes mesmos dirigentes chegaram a um bom termo com os liberais burgueses mais moderados e embora nominalmente com o tipo bur guês de instituições representativas Culturalmente era o estilo bur guês de vida que prevalecia por sobre o aristocrático inclusive atra vés de uma retirada geral da velha aristocracia do mundo da cultura como esta palavra era então entendida eles se tornaram seja não o fossem os bárbaros de Matthew Arnold 182288 Depois de 1850 é difícil pensar em reis que fossem grandes patronos das artes exceto loucos como Ludwig II da Baviera 186486 ou em magnatas nobres que fossem colecionadores importantes de objetos de arte An tes de 1848 as certezas da burguesia ainda eram ameaçadas pelo me 256 do da revolução social Depois de 1870 elas seriam mais uma vez minadas sobretudo pelo medo dos movimentos da classe operária em expansão Mas no período intermediário eles triunfaram fora de qual quer dúvida ou ameaça A era julgou Bismarck que não tinha simpa tia pela sociedade burguesa era uma de interesses materiais Inte resses econômicos eram uma força elementar Acredito que o a vanço das questões econômicas no desenvolvimento interno progride e não pode ser interrompida 33 Mas o que representava esta força e lementar neste período senão o capitalismo e o mundo feito pela e para a burguesia 257 DécimoQuarto Capítulo CIÊNCIA RELIGIÃO IDEOLOGIA Nossa aristocracia é mais bela do que as classes médias do melhor de suas mulheres mas ah que pena que a primogenitura destrua a Seleção Natural Charles Darwin 1864 1 É freqüente hoje em dia que pessoas queiram mostrar quão inteli gente são pelo grau de emancipação em relação à Bíblia e ao Cate cismo F Schaubach sobre a literatura popular 1863 2 John Stuart Mill não vai conseguir nada em reclamar o sufrágio para os negros e as mulheres Tais conclusões são os resultados inevitá veis das premissas de onde ele partiu e sua reductio ad ab surdum Anthropological Review 1866 3 I A sociedade burguesa de nosso período estava confiante e orgu lhosa de seus sucessos Em nenhum outro campo da vida humana isso era mais evidente que no avanço do conhecimento da ciência Ho mens cultos deste período não estavam apenas orgulhosos de suas ci ências mas preparados para subordinar todas as outras formas de ati vidade intelectual a elas Em 1861 o estatístico e economista Cournot observou que o fato de acreditar em verdades filosóficas saiu tanto de moda que nem o público nem nenhuma academia se dispõe a re ceber mais obras deste tipo exceto como produtos de puro academi cismo ou curiosidade histórica4 Não era de fato um bom período para filósofos Mesmo no seu reduto tradicional Alemanha não ha via ninguém de estatura comparável para suceder às grandes figuras do passado O próprio Hegel saíra de moda no seu país natal e o mo do pelo qual os medíocres que agora davam o tom para o povo ale mão tratavam o grande filósofo alemão fez com que Marx em 1860 se declarasse um discípulo daquele grande pensador5 As duas gran des correntes filosóficas subordinavamse elas mesmas à ciência o positivismo francês associada com a escola do curioso Augusto 258 Comte e o empirismo inglês associado com John Stuart Mill sem mencionar o medíocre pensador cuja influência era então maior do que qualquer outro no mundo Herbert Spencer 18201903 A base dupla da filosofia positiva de Augusto Comte era a imutabilidade das leis da natureza e a impossibilidade de qualquer conhecimento in finito ou absoluto Na medida em que não foi além da excêntrica Re ligião da Humanidade comtiana o positivismo foi pouco mais do que uma justificação filosófica do método convencional das ciências experimentais e da mesma forma para a maior parte dos da época Mill foi nas palavras de Taine o homem que abriu o caminho certo da indução e do experimento Portanto esta perspectiva estava ex plicitamente baseada em Comte e Spencer numa visão histórica do progresso evolucionista O método positivo ou científico era ou seri a o triunfo do último dos estágios através dos quais a humanidade precisava passar na terminologia de Comte os estágios teológico metafísico e científico cada qual com suas instituições próprias das quais Mill e Spencer pelo menos concordavam o liberalismo numa compreensão larga do termo era a expressão mais adequada Alguém poderia dizer com algum exagero que sob este ponto de vista o pro gresso da ciência fazia a filosofia redundante exceto como uma espé cie de laboratório intelectual assistindo ao cientista Além disso com tal confiança nos métodos da ciência não é de se surpreender que os homens instruídos da segunda metade do sécu lo XIX estivessem tão impressionados com suas conquistas De fato às vezes chegaram a pensar que estas conquistas não eram apenas im pressionantes mas também finais William Thompson Lord Kelvin o celebro físico pensava que todos os problemas básicos da física ha viam sido resolvidos e só alguns problemas menores ainda precisavam ser solucionados Ele estava como sabemos redondamente enganado Entretanto o erro era significativo e compreensível Em ciência como na sociedade há períodos revolucionários e nãorevolucioná rios e enquanto o século XX é revolucionário em ambas mais ainda que a era das revoluções 17891848 o período de que trata este livro não foi com algumas exceções revolucionário em nenhuma das duas Isto não quer dizer que todos os homens convencionais de inte ligência e habilidade pensassem que a ciência ou a sociedade tives sem resolvido todos os problemas embora em alguns aspectos parti culares como os que diziam respeito ao tipo básico de economia e o tipo básico do universo físico alguns dos mais capazes dentre eles sentissem que os problemas mais substanciais tivessem sido solucio nados Mas isto quer dizer com absoluta certeza que estes homens não tinham dúvidas sérias sobre a direção que estavam seguindo ou deveriam seguir assim como em relação aos métodos teóricos ou prá ticos de lá chegar Ninguém duvidava do progresso tanto material como intelectual já que parecia tão óbvio para ser negado Este era 259 sem dúvida o conceito dominante da época embora houvesse uma divisão fundamental entre aqueles que pensavam que o progresso se ria mais ou menos contínuo e linear e aqueles como Marx que sabi am que ele precisaria e iria ser descontínuo e contraditório Dúvidas poderiam surgir apenas sobre questões de gosto maneiras e moral onde a simples acumulação quantitativa não fornecia um guia certo Não havia dúvida de que os homens em 1860 sabiam mais do que nunca em relação a períodos anteriores mas a questão de que eles fossem melhores não podia ser demonstrada com a mesma facilida de Mas estas eram questões que preocupavam teólogos cuja reputa ção intelectual não era muito alta filósofos e artistas que eram ad mirados mas aproximadamente da mesma forma com que homens ri cos admiram os diamantes que podem comprar para suas mulheres e críticos sociais da esquerda ou da direita que não gostavam do tipo de sociedade em que viviam ou em que eram forçados a viver Entre pessoas cultas em 1860 estes eram uma minoria Embora o progresso maciço fosse possível em todos os ramos do conhecimento parecia evidente que alguns estavam mais adiantados mais bem formados que outros Parecia que a física estava mais madura que a química e que já havia deixado para trás o estágio de progresso efervescente e explosivo dentro do qual a ciência estava ainda tão visi velmente engajada A química por seu turno mesmo a química orgâ nica estava muito mais adiantada do que as ciências sobre a vida que pareciam estar começando a tomar impulso naquela era de excitante progresso De fato se uma única teoria científica deva representar o avanço das ciências naturais em nosso período e era de fato reconheci da como crucial esta teoria é a da evolução e se uma única figura do minou a imagem pública da ciência esta foi a do indivíduo de aparência simiesca Charles Darwin 180982 O estranho abstrato e logicamente fantástico mundo dos matemáticos permaneceu de certa forma isolado tanto do público geral como do científico talvez mais do que antes já que seu maior contato com a física através da tecnologia física pare cia neste estágio ter menor utilidade para as abstrações avançadas e aventurosas que nos grandes dias da construção da mecânica do espa ço O cálculo sem o qual as realizações da engenharia e das comunica ções do período não teriam sido possíveis estava então bem mais atrás da móvel fronteira da matemática Esta questão e talvez melhor repre sentada pelo maior matemático denosso período Georg Bernhard Ri emann 182666 cuja tese universitária de 1854 Sobre as hipóteses que são subjacentes à geometria publicada em 1868 não pode ser omitida de uma discussão sobre a ciência do século XIX da mesma maneira que os Principia de Newton não podem sêlo sobre o século XVII Ela estabeleceu os fundamentos da topologia a geometria dife rencial a teoria do espaçotempo e a gravitação Riemann chegou a propor uma teoria de física compatível com a moderna teoria dos quan ta Porém estes e outros desenvolvimentos altamente originais da ma 260 temática não tiveram seu lugar até a nova era revolucionária da física que iria começar somente no final do século Entretanto em nenhuma das ciências naturais parecia haver algu ma dúvida séria sobre a direção geral na qual o conhecimento avança va ou sobre a estrutura básica conceituai ou metodológica sobre a qual estava baseada Descobertas não faltavam teorias às vezes novas mas não inesperadas Mesmo a teoria darwinista da evolução impres sionava não porque o conceito de evolução fosse novo era familiar havia décadas mas porque fornecia pela primeira vez um modelo de explanação satisfatório para a origem das décadas e o fez em ter mos que eram inteiramente conhecidos até para nãocientistas já que refletiam os conceitos mais familiares da economia liberal a compe tição De fato um número pouco comum de grandes cientistas escre veu uma terminologia que os permitia rapidamente a popularização alguns até excessivamente tais como Darwin Pasteur os fisiologis tas Claude Bernard 181378 e Rudolf Virchow 18211902 e Hel mholtz 1821 4 sem mencionar os físicos William Thompson e Lord Kelvin Os modelos básicos ou paradigmas das teorias cientí ficas pareciam firmes embora grandes cientistas como James Clerk Maxwell 183179 formulassem suas versões com a precaução ins tintiva que as fizessem compatíveis com outras teorias posteriores que surgissem baseadas em modelos diferentes No interior das ciências naturais havia pouco daquela confronta ção passional que ocorre quando há um impasse não de hipóteses di ferentes mas de diferentes formas de olhar o mesmo problema isto é quando um lado propõe não apenas uma resposta diferente mas que pensa que o outro lado é inaceitável impensável Tal impasse ocor reu no mundo pequeno e remoto das matemáticas quando H Kronec ker 18391914 atacou K Wierstrass 18151897 R Dedekind 18311916 e G Cantor 18451918 na questão da matemática do infinito Tais Methodenstreite batalhas de métodos dividiam tam bém o mundo dos cientistas sociais mas na medida em que entravam nas ciências naturais mesmo as biológicas na sensível questão da evolução refletiam uma intrusão de preferências ideológicas em lu gar de debates profissionais Não há nenhuma razão científica con vincente para que elas não ocorressem Portanto aqueles cientistas vi torianos mais típicos como William Thompson Lord Kelvin típico na sua combinação entre grande poder teórico convencional enorme fertilidade tecnológica e conseqüente sucesso nos negócios estavam claramente descontentes com a matemática de Clerk Maxwell e sua teoria eletromagnética da luz vista por muitos como o ponto de parti da para a física moderna Portanto como ele conseguiu reformulála em termos de seu próprio tipo de matemática de engenharia o que não é não chegou a discutir a questão Além disso Thompson de monstrou para sua própria satisfação que baseado nas leis da física conhecidas o sol não poderia ser mais velho que 500 milhões de a nos e que portanto o tempo requerido pela evolução geológica e bio 261 lógica na Terra era impossível Na qualidade de cristão ortodoxo ele recebeu muito bem esta conclusão Realmente de acordo com a físi ca de 1864 ele estava correto seria apenas a descoberta das forças desconhecidas da energia nuclear que permitiria aos cientistas supor uma vida muito mais longa para o sol e conseqüentemente para a Ter ra Mas Thompson não se preocupava com o fato de que a física pu desse estar incompleta ou se entrava em conflito com a geologia acei ta ou ainda se os geólogos estavam simplesmente adiante da física O debate talvez nem tivesse ocorrido se o desenvolvimento das ciências tivesse sido levado em consideração Portanto o mundo da ciência andava para frente nos seus próprios trilhos intelectuais e o seu progresso interior parecia como o das fer rovias oferecer a perspectiva da colocação de mais trilhos do mesmo tipo em novos territórios Os céus pareciam conter pouco daquilo que teria surpreendido velhos astrônomos afora uma série de novas obser vações através de telescópios mais poderosos ou instrumentos de medi ção melhores ambos desenvolvimentos alemães e o uso da nova téc nica de fotografia assim como da análise espectroscópica pela primei ra vez aplicada à luz das estrelas em 1861 que viria a transformarse num instrumento de pesquisa extremamente poderoso As ciências físicas tinhamse desenvolvido dramaticamente no meioséculo precedente quando fenômenos aparentemente disparata dos como o calor e a energia foram unificados pelas leis da termodi nâmica enquanto que a eletricidade o magnetismo e mesmo a luz convergiam para um único modelo analítico A termodinâmica não avançou muito em nosso período embora Thompson tivesse comple tado o processo da reconciliação das novas doutrinas sobre o calor com as antigas da mecânica em 1851 The dynamical equivalent of Heat O espantoso modelo matemático da teoria eletromagnética da luz formulada pelo ancestral da moderna física teórica James Clerk Mawwell em 1862 era profunda e nãoacabada Deixava o caminho aberto para a descoberta do elétron Portanto Maxwell talvez porque nunca tenha conseguido fazer uma exposição adequada daquilo que ele mesmo descrevia como estranha teoria só viria a ser feito em 19416 fracassou em convencer os seus contemporâneos mais céle bres como Thompson e Helmholtz ou mesmo o brilhante austríaco Ludwig Boltzmann 18441906 cuja intervenção em 1868 pratica mente lançou a mecânica estatística como um campo de conhecimen to Provavelmente a física de meados do século XIX não era tão espe tacular quanto dos períodos precedentes e subseqüente mas seu de senvolvimento teórico era bastante expressivo Portanto a teoria ele tromagnética e as leis da termodinâmica pareciam entre elas citando Bernal implicar uma certa finalidade mútua 7 De qualquer forma os ingleses liderados por Thompson e mesmo outros físicos que havi am desenvolvido sua capacidade criativa na termodinâmica estavam atraídos pela idéia de que o homem ainda não havia adquirido um co nhecimento definitivo das leis da natureza embora Helmholtz ou 262 Boltzmann não estivessem bem convencidos Talvez a impressionan te fertilidade tecnológica da física do modelo mecânico tornasse a ilu são da finalidade mais tentadora Não havia certamente tal finalidade em vista no que toca à se gunda grande ciência natural talvez a mais florescente de todo o sé culo XIX a química Sua expansão era dramática especialmente na Alemanha não apenas porque seu uso industrial parecesse não ter fim de fertilizantes a produtos médicos e explosivos Os químicos es tavam a caminho de formarem mais da metade dos profissionais en gajados nas ciências 8 As fundações da química como uma ciência madura haviam sido estabelecidas nos últimos 30 anos do século XVIII Ela havia florescido desde então e continuou desenvolvendo se numa excitante fonte de idéias e descobertas em nosso período Os processos elementares básicos da química eram conhecidos e os instrumentos analíticos essenciais disponíveis a existência de um número limitado de elementos químicos compostos de diferentes nú meros de unidades básicas átomos e componentes de elementos compostos de unidade de moléculas multiatômicas além de alguma idéia das leis destas combinações dariam a partida para os grandes avanços nas atividades dos químicos a análise e síntese de várias substâncias O campo especial da química orgânica já florescia neste tempo embora estivesse confinada às propriedades a maioria delas eram úteis na produção de materiais derivados de fontes que um dia haviam sido orgânicas como o carvão Ainda estava a um longo ca minho da bioquímica isto é a compreensão de como estas substân cias funcionavam no organismo vivo Assim mesmo os modelos da química permaneciam bastante imperfeitos mas avanços substanciais na compreensão destes vieram a ser feitos no nosso período Eles i luminaram a estrutura dos componentes químicos que ate então havi am sido vistos apenas em termos quantitativos isto é o número de átomos numa molécula Tornouse então possível determinar o correto número de cada tipo de átomo numa molécula através da Lei de Avogrado de 1811 já existente que um químico patriota italiano fez com que fosse objeto das atenções durante um simpósio em 1860 sobre a questão o ano da unidade italiana Além disso mais um empréstimo frutífero da física Pasteur descobriu em 1848 que substâncias quimicamente idênticas poderiam ser fisicamente diferentes por exemplo girando ou não gi rando no plano da luz polarizada Destas descobertas seguiuse entre outras coisas que as moléculas têm uma forma no espaço tridimensi onal e o brilhante químico alemão Kekülé 182996 na situação bastante vitoriana de um passageiro sentado no segundo andar de um ônibus londrino em 1865 imaginou o primeiro dos modelos comple xos estruturais moleculares o famoso anel de seis átomos de carbono cada qual com um átomo de hidrogênio ligado Poderseia dizer que a concepção arquitetônica ou de engenharia de um modelo que até en 263 tão tinha sido conhecido pela sua forma escrita C6 H6 a mera con tagem dos átomos era a fórmula química Talvez ainda mais sensacional fosse a generalização maior no campo da química produzida por este período a Tabela Periódica dos Elementos 1869 de Mendeleev 18341907 Graças à solução dos problemas do peso atômico e de sua valência o número de ligações que o átomo de um elemento possui com outros elementos a teoria atômica negligenciada de alguma forma depois de haver florescido no começo do século XIX veio à tona novamente depois de 1860 e simultaneamente a tecnologia na construção do espectroscópio 1859 permitiu que vários novos elementos fossem descobertos Além disso a década de 1860 foi um grande período de padronização e mensura mento Entre outras coisas a fixação das unidades familiares das me didas elétricas volt ampere watt e ohm Várias tentativas foram en tão feitas para reclassificar os elementos químicos de acordo com a valência e o peso atômico A de Mendeleev e a do alemão German Lotar Meyer 183095 baseavase no fato de que as propriedades dos elementos variavam de forma periódica com seus respectivos pesos atômicos A Tabela de Mendeleev parecia à primeira vista concluir o estudo da teoria atômica pelo estabelecimento de um limite à existên cia de tipos fundamentalmente diferentes de matéria De fato trata vase de encontrar a interpretação completa num novo conceito de matéria não mais feita de átomos imutáveis mas de relações relativa mente provisórias de umas poucas partículas fundamentais elas mesmas sujeitas a mudanças e transformações Mas Mendeleev co mo Clerk Maxwell via suas conclusões como a última palavra em uma velha discussão ao invés de a primeira num novo debate A biologia ficava bem atrás das ciências físicas agrilhoada não apenas pelo conservadorismo dos dois grupos maiores de homens in teressados na sua aplicação prática mas também pelos fazendeiros e especialmente pelos médicos Retrospectivamente o maior dos pri meiros fisiologistas é Claude Bernard cujo trabalho fornece a base para toda a fisiologia moderna assim como a bioquímica e que além de tudo escreveu uma das melhores análises dos processos da ciência jamais escritos a sua Introdução ao Estudo da Medicina Experi mental 1865 Entretanto embora reconhecido especialmente no seu país natal a França suas descobertas não foram imediatamente apli cadas e sua influência foi conseqüentemente inferior a de seu compa triota Louis Pasteur que se tornou juntamente com Darwin talvez o cientista de meados do século XIX mais conhecido do grande públi co Pasteur foi atraído para o campo da bacteriologia do qual tornou se o grande pioneiro juntamente com Robert Koch 18431910 um doutor alemão através da química industrial mais precisamente a análise de por que a cerveja e o vinagre às vezes estragavam por ra zões que a analise química não conseguia revelar Tanto as técnicas da bacteriologia o microscópio a preparação de culturas e lâminas etc e sua aplicabilidade imediata a erradicação de doenças em a 264 nimais e homens fizeram a nova disciplina accessível compreensí vel e atraente Técnicas como antissépticos desenvolvidas por Lister 18271912 por volta de 1865 pasteurização ou outros métodos de preservação de produtos orgânicos do contágio de micróbios assim como a isolação estavam à mão e os argumentos e resultados eram suficientemente palpáveis para derrubar mesmo a ferrenha hostilidade da comunidade médica O estudo da bactéria iria fornecer à biologia um approach extremamente útil para a natureza da vida mas neste período não levantou nenhuma questão teórica que o mais convencio nal dos cientistas não pudesse imediatamente reconhecer O mais significativo e dramático avanço na biologia pouco tinha a ver na época com o estudo da estrutura física e química da vida e seu mecanismo A teoria da evolução pela seleção natural ia bem mais longe dos limites da biologia e nisto reside sua importância Ela ratificava o triunfo da história sobre todas as ciências embora histó ria neste sentido fosse normalmente confundida pelos da época com progresso Além disso ao trazer o próprio homem para dentro do esquema da evolução biológica abolia a linha divisória entre ciências naturais humanas ou sociais Portanto todo o cosmos ou pelo menos todo o sistema solar precisavam ser concebidos como um processo de mudança histórica constante O sol e os planetas estavam no centro desta história e portanto como os geólogos já haviam estabelecido ver A Era das Revoluções capítulo 15 também estava a Terra Coi sas vivas eram então incluídas neste processo embora a questão de que a vida tivesse evoluído da nãovida permanecesse sem solução e sobretudo por razões ideológicas extremamente delicada O grande Pasteur acreditava que havia demonstrado que não poderia evoluir desta forma Darwin trouxe não apenas os animais mas também o homem para o esquema evolucionista A dificuldade para a ciência de meados do século XIX não resi dia na admissão de tal historicização do universo nada era mais fá cil de conceber numa era de mudanças históricas tão esmagadoramen te óbvias e maciças mas de combinála com as operações unifor mes contínuas e nãorevolucionárias das leis naturais permanentes Um descrédito em relação a revoluções sociais não estava ausente de suas considerações assim como um descrédito da religião tradicional cujos textos estavam comprometidos com mudança descontínua criação e interferência na regularidade da natureza milagres Entretanto parecia também que neste estágio a ciência dependia de uniformidade e invariância O reducionismo parecia ser essencial Somente pensadores revolucionários como Marx achavam fácil con ceber situações onde dois mais dois não fosse mais igual a quatro mas que pudesse ser igual a outra coisa no seu lugar A grande conquista dos geólogos havia sido a explicação de como a operação das mesmas forças exatamente visíveis hoje podia explicar a enorme variedade do que podia ser observado na Terra ina nimada passado e presente A grande conquista da seleção natural era 265 poder explicar a grande variedade das espécies inclusive o homem Este sucesso era tentador e ainda tenta pensadores a negar ou mini mizar os processos inteiramente diferentes ou novos que governam a mudança histórica e que reduzem as mudanças nas sociedades hu manas a regras da evolução biológica com importantes conseqüên cias e às vezes intenções políticas socialdarwinismo A socie dade na qual os cientistas ocidentais viviam e todos os cientistas pertenciam ao mundo ocidental mesmo aqueles situados nas margens da Rússia combinavam estabilidade e mudança assim como suas teorias revolucionárias Eles eram apesar de tudo dramáticos ou mesmo traumáticos já que pela primeira vez investiam em direção a uma confrontação deli berada e militante com as forças da tradição o conservadorismo e es pecialmente a religião Eles aboliram o status especial que os homens haviam concebido para si mesmos há milênios atrás Como conceber que o homem criado à imagem de Deus não fosse nada mais que um macaco modificado Diante da escolha entre macacos e anjos os o positores de Darwin tomaram o lado dos anjos A força desta resis tência demonstra a força do tradicionalismo e da religião organizada mesmo entre os grupos mais emancipados e instruídos das populações ocidentais pois a discussão estava limitada aos altamente cultos Mas o que é igualmente ou talvez mais espantoso é a disposição dos evo lucionistas de publicamente desafiar as forças da tradição e seu tri unfo relativamente rápido Havia existido muitos evolucionistas na primeira metade do século mas entre eles os biólogos tinham lidado com a questão com extremo cuidado e mesmo algum medo pessoal O próprio Darwin retraiuse em algumas idéias que havia concebido Isso não era devido ao fato de que a evidência da descendência do homem de macacos agora era demasiadamente esmagadora para que qualquer resistência lhe fosse oposta mas como terminou por su ceder ela acumulouse rapidamente na década de 1850 O crânio de tipo simiesco do Homem de Neanderthal 1856 não podia ser nega do Mas a evidência havia sido suficientemente forte mesmo antes de 1848 Era devido sim à feliz conjuntura de dois fatos ao rápido a vanço da burguesia liberal e progressista e à ausência de revolu ções O desafio às forças da tradição cresceram e ficaram mais fortes mas não mais pareciam implicar em mudanças sociais O próprio Darwin ilustra esta combinação Um burguês homem da esquerda moderadamente liberal e inquestionavelmente pronto para confrontar as forças do conservadorismo e da religião a partir do final da década de 1850 embora nunca antes disso ele polidamente rejeitou o ofere cimento de Karl Marx que queria dedicarlhe o segundo volume do Capital Ele não era apesar de tudo um revolucionário A sorte do darwinismo portanto dependia não tanto do seu su cesso em convencer o público científico isto é dos méritos evidentes de A Origem das Espécies mas da conjuntura política e ideológica do tempo e do país Iria ser evidentemente adotada de imediato pela ex 266 trema esquerda que havia de fato há muito tempo atrás fornecido um poderoso componente do pensamento evolucionista Alfred Russel Wallace 18231913 que aliás descobriu a teoria da seleção natural independentemente de Darwin e partilhou esta glória com ele vinha da tradição de ciência e radicalismo que teve um papel tão importante no começo do século XIX e que achava a história natural tão nor mal Formado no meio do cartismo permaneceu um homem da ex trema esquerda que voltou à política mais tarde na vida dando apoio militante à nacionalização da terra e mesmo ao socialismo enquanto mantinha sua crença em outras teorias características da ideologia plebéia e heterodoxa como a frenologia e o espiritualismo ver pró ximo capítulo Marx imediatamente colocou a Origem de Darwin como a base das ciências naturais do nosso ponto de vista 9 e a so cial democracia tornouse fortemente e para alguns discípulos de Marx como Kautski de maneira excessiva darwinista Esta evidente afinidade entre socialistas e darwinismo biológico não impediu que as classes médias liberais dinâmicas e progressistas também o acolhessem de braços abertos O darwinismo triunfou rapi damente na Inglaterra e na confiante atmosfera liberal da Alemanha na década da unificação Na França onde a classe média preferia a estabilidade do império napoleônico e os intelectuais de esquerda não sentiam nenhuma necessidade de importação de idéias nãofranceses e portanto atrasadas o darwinismo não avançou rapidamente até o fi nal do império e a derrota na Comuna de Paris Na Itália seus defen sores estavam mais nervosos por causa das implicações social revolucionárias do que por causa dos rompantes papais mas de qual quer forma ainda suficientemente confiantes em si mesmos Nos Es tados Unidos não apenas triunfou rapidamente mas cedo transfor mouse na ideologia do capitalismo militante Por outro lado a oposi ção à evolução darwinista mesmo entre cientistas veio dos social mente conservadores II A evolução liga as ciências naturais às ciências humanas ou so ciais embora o último termo seja anacrônico Porém a necessidade de uma ciência específica e geral da sociedade distinta das várias disciplinas relevantes já tratando com assuntos humanos era pela primeira vez sentida A British Association for the Promotion of So cial Science 1857 tinha meramente o modesto objetivo de aplicar métodos científicos às reformas sociais Entretanto a sociologia ter mo inventado por Auguste Comte em 1839 e popularizado por Her bert Spencer que escreveu um livro prematuro sobre os princípios desta e de numerosas outras ciências em 1876 era muito falada Pelo final de nosso período ainda não havia produzido nem uma disciplina reconhecida nem um assunto de pesquisa acadêmica Por outro lado 267 o amplo mas cognoscível campo da antropologia emergia rapidamen te como uma ciência reconhecida saindo da filosofia direito etnolo gia literatura de viagem do estudo da língua e do Folclore e das ci ências médicas via o então popular assunto da antropologia física que levou à moda de medir e colecionar os crânios de vários povos A primeira pessoa a ensinála oficialmente foi provavelmente Quatre fages em 1855 na cadeira que existia para esta matéria no Museu Na cional de Paris A fundação da Sociedade Antropológica de Paris 1859 foi seguida por um repentino interesse na década de 1860 quando associações similares foram fundadas em Londres Madri Moscou Florença e Berlim A psicologia outro termo cunhado re centemente desta vez por John Stuart Mill ainda estava ligada à filo sofia A Bain e seu livro Mental and Moral Science 1868 ainda combinavaa com a ética mas recebia cada vez mais uma orientação experimental com W Wundt 18321920 que havia sido assistente do grande Hemholtz Era inquestionavelmente uma disciplina aceita pela década de 1870 pelo menos nas universidades alemães Esta ma téria também atingia os campos da sociologia e da antropologia e em 1859 um jornal era fundado ligandoa com a lingüística 10 Pelos padrões das ciências positivas e especialmente as expe rimentais os resultados destas novas ciências não impressionavam muito embora três pudessem clamar resultados sistemáticos e genuí nos como ciências antes de 1848 economia estatística e lingüística ver A Era das Revoluções capítulo 15 A ligação entre economia e matemática tornouse então direta com A A Cournot 180177 e L Walras 18341910 ambos franceses e a aplicação da estatística aos fenômenos sociais já estava suficientemente avançada para estimular sua aplicação às ciências físicas Pelo menos isto é o que era defendi do pelos estudantes das origens da mecânica estatística iniciada por Clerk Maxwell Por conseguinte a estatística social floresceu como nunca antes seus praticantes encontrando emprego público à vontade Congressos internacionais estatísticos passaram a ocorrer a partir de 1853 e o estatuto científico da matéria foi então reconhecido pela e leição do célebre e admirável Dr William Farr 180783 para a Ro yal Society A lingüística como veremos seguiria uma linha diferen te de desenvolvimento Mas no total estes resultados não eram excepcionais A escola econômica utilitarista desenvolvida simultaneamente na Inglaterra Áustria e França por volta de 1870 era formalmente elegante e sofis ticada mas sem dúvida consideravelmente mais limitada que a velha economia política ou mesmo a recalcitrante escola histórica eco nômica dos alemães e desta forma uma abordagem menos realística aos problemas econômicos Diferente das ciências naturais numa so ciedade liberal as ciências sociais não tinham nem mesmo o estímulo ao progresso tecnológico Já que o modelo básico da economia pare cia perfeitamente satisfatório não deixava nenhum grande problema a resolver tais como o do crescimento possível colapso econômico ou 268 distribuição de renda Na medida em que estes problemas não estives sem ainda resolvidos as operações automáticas da economia de mer cado sobre as quais as análises então se concentravam iriam resol vêlos desde que não estivessem fora de solução humana De qual quer maneira as coisas estavam progredindo e melhorando uma situ ação que fazia difícil que as mentes dos economistas se concentras sem em aspectos mais profundos de sua ciência As reservas que os pensadores burgueses tinham sobre seu mundo eram de natureza mais social e política que econômica espe cialmente onde o perigo de revolução não estava esquecido como na França ou estava emergindo com o crescimento do movimento traba lhista como na Alemanha Mas se os pensadores alemães que nunca engoliram direito teorias liberais extremas estavam como os conser vadores em todos os lugares preocupados com o fato de que a socie dade produzida pelo capitalismo liberal mostravase perigosa e instá vel por outro lado pouco tinham a propor exceto reformas sociais preventivas A imagem básica do sociólogo era a imagem biológica de um organismo social a cooperação funcional de todos os grupos na sociedade muito diferente da luta de classes Era no fundo o anti go conservadorismo vestido com roupa do século XIX e aliás difícil de se combinar com a outra imagem biológica do século que propu nha mudança e progresso a evolução Era de fato uma base melhor para propaganda do que para ciência Portanto o único pensador do período que desenvolveu uma te oria compreensível da estrutura e mudança social que ainda impõe respeito foi o revolucionário social Karl Marx que desfruta da admi ração ou pelo menos do respeito de economistas historiadores e so ciólogos Esta é uma realização admirável já que seus contemporâ neos exceto alguns economistas estão agora esquecidos mesmo pe los homens mais instruídos Mas o que é mais espantoso não é tanto o fato de que Auguste Comte ou Herbert Spencer fossem apesar de tu do pessoas de alguma estatura intelectual reconhecida mas que os homens que eram então olhados como os Aristóteles do mundo mo derno praticamente tenham desaparecido de vez Eles eram no seu tempo incomparavelmente mais famosos e influentes que Marx cujo Capital foi descrito em 1875 por um especialista anônimo alemão como a obra de um autodidata ignorante do progresso dos últimos 25 anos 11 Pois nesta época no Ocidente Marx era levado a sério apenas dentro do movimento trabalhista internacional e especialmente pelo crescente movimento socialista de seu próprio país e mesmo assim sua influência ali era superficial Entretanto os intelectuais de uma Rússia cada vez mais revolucionária liamno avidamente A primeira edição alemã do Capital 1867 mil cópias levou cinco anos para vender mas em 1872 as primeiras mil cópias da edição russa esgota ramse em menos de dois meses O problema com o qual Marx se defrontava era o mesmo que ou tros cientistas sociais tentavam enfrentar a natureza e mecânica da 269 transição de uma sociedade précapitalista para uma capitalista e suas específicas formas de operação e tendências de futuro desenvolvimen to Já que suas respostas são relativamente familiares não precisamos recapitulálas aqui embora valha a pena assinalar que Marx resistiu à tendência que em outros lugares cresceu com força sempre maior de separar a análise econômica de seus contextos históricos sociais O problema do desenvolvimento histórico da sociedade do século XIX levou tanto teóricos como inclusive homens práticos a penetrar profun damente no passado remoto Pois tanto dentro dos países capitalistas quanto nos lugares onde a sociedade burguesa em expansão encontrava e destruía outras sociedades o passado vivo e o presente nascente encontravamse em conflito aberto Pensadores alemães viam a ordem hierárquica dos estratos dar lugar em seu próprio país a uma socie dade de classes conflitantes Advogados ingleses especialmente aque les com experiência na Índia contrastavam a antiga sociedade do sta tus com a nova do contrato e viam a transição da primeira para a se gunda como a principal forma do desenvolvimento histórico Escritores russos viviam de fato simultaneamente nos dois mundos o antigo comunalismo dos camponeses que muitos deles conheciam dos longos verões em suas fazendas e o mundo do intelectual ocidentalizado e viajado Para o observador de meados do século XIX toda a história coexistia ao mesmo tempo exceto as antigas civilizações e impérios como a antigüidade clássica que haviam sido literalmente enterrados esperando as pás de H Schliemann 182290 em Tróia e Micenas ou as de Flinders Petrie 18531942 no Egito Poderseia talvez esperar que a disciplina ligada mais de perto ao passado proporcionasse uma contribuição mais importante ao de senvolvimento das ciências sociais mas na realidade a história como um especialização acadêmica foi curiosamente de pouca ajuda Seus praticantes estavam sobretudo interessados com dirigentes batalhas tratados acontecimentos políticos ou instituições políticolegais num mundo politicamente retrospectivo senão com política cotidiana ves tida com roupas históricas Eles elaboraram a metodologia de pesqui sa baseados nos documentos dos arquivos públicos hoje admiravel mente organizados e preservados e seguindo a liderança dos ale mães organizaram suas publicações em torno dos dois pólos da tese acadêmica e da revista especializada para scholars a Historische Zeitschrift foi publicada pela primeira vez em 1858 a Revue Histori que em 1876 a Historical Review inglesa em 1886 e a American His torical Review em 1895 Mas o que eles produziram foi no máximo alguns monumentos permanentes de erudição aos quais ainda hoje recorremos e no mínimo uns gigantescos panfletos que hoje se são lidos é por mero interesse literário A história acadêmica apesar do moderado liberalismo de alguns de seus praticantes tinha uma natural inclinação em preservar o passado e tinha uma atitude de suspeita senão de deploração em relação ao futuro As ciências sociais neste período tinham a inclinação contrária 270 Apesar de tudo se os historiadores acadêmicos seguiam seus ca minhos de erudição a história permanecia como a estrutura básica das novas ciências sociais Isto era particularmente óbvio no florescente e como em tantos outros proeminentemente alemão campo da lingüís tica ou melhor para usar o termo daépoca da filologia O maior inte resse desta ciência residia na reconstituição da evolução histórica das línguas indoeuropéias que talvez porque fossem conhecidas na Ale manha como indoalemãs atraíam ali a atenção nacional quando não nacionalista Esforços para estabelecer uma tipologia evolucionista mais ampla das línguas isto é descobrir as origens e o desenvolvimen to histórico da fala e da linguagem também foram feitos por exemplo H Steinthal 182399 e A Schleicher 182168 mas as árvores das linguagens então construídas permaneciam altamente especulativas e as relações entre os vários genera e species extremamente duvidosas Na realidade com a exceção do hebreu e de alguns dialetos semitas que a traíam estudiosos judeus ou bíblicos e também algum trabalho feito com as línguas finouralianas que por acaso tinham um representante na Europa central a Hungria pouco fora das línguas indoeuropéias havia sido sistematicamente estudado nos países onde a filologia de meados do século XIX havia florescido A escola americana de lin güística baseada no estudo das línguas ameríndias ainda não se tinha desenvolvido Por outro lado os insights fundamentais da primeira metade do século eram agora sistematicamente aplicados e desenvolvi dos na lingüística evolucionista indoeuropéia Os tipos regulares de mudanças sonoras descobertas por Grimm para o alemão eram agora investigados e especificados de forma mais aprofundada métodos de reconstrução de formas de palavras antigamente nãoescritas e a cons trução de modelos das árvores de família lingüísticas eram estabele cidos outros modelos de mudança evolutiva como a teoria das on das de Schmidt eram sugeridos e o uso da analogia especialmente analogia gramatical era desenvolvido já que a filologia não era nada se não fosse comparativa Pela década de 1870 a escola líder de Jung grammatiker Jovens Gramáticos se julgava capaz de reconstruir o In doEuropeu original do qual tantas línguas desde o sânscrito no Leste e o celta no Oeste descendiam e o temível Schleicher chegou a escrever textos neste idioma reconstruído A lingüística moderna tomou um ca minho inteiramente diverso rejeitando os interesses históricos e evolu cionistas de meados do século XIX talvez com violência excessiva e nesta medida o principal desenvolvimento da filologia em nosso perío do produziu princípios conhecidos ao invés de antecipar novos Mas era bem tipicamente uma ciência social evolucionista e pelos padrões da época muito bem sucedida tanto entre especialistas como junto ao grande público Infelizmente entre os últimos apesar dos desmentidos específicos de scholars como F MarxMuller 18231900 de Oxford encorajou a crença no racismo os que falavam as línguas indo européias um conceito puramente lingüístico sendo identificados com a raça ariana 271 O racismo tinha um papel central em outra ciência social que se desenvolvia rapidamente a antropologia uma fusão de duas discipli nas sensivelmente diferentes a antropologia física basicamente de rivada de interesses anatômicos e similares e a etnografia ou a descrição de várias comunidades geralmente atrasadas ou primiti vas Ambas inevitavelmente confrontaram e foram de fato dominadas pelo problema da diferença entre diversos grupos humanos e como estavam calcadas no modelo evolucionista o problema da descen dência do homem assim como os diferentes tipos de sociedade dos quais o mundo burguês parecia sem dúvida o mais elevado Antropo logia física automaticamente levava ao conceito de raça já que as diferenças entre povos brancos amarelos ou pretos negros mongóis caucasianos ou qual fosse a classificação empregada eram indiscu tíveis Isso não implicava em si mesmo nenhuma crença em desigual dade racial superioridade ou inferioridade embora quando combina do com o estudo da evolução do homem na base do fóssil pré histórico certamente a sugerisse Pois os ancestrais mais identificáveis e mais remotos principalmente o Homem de Neanderthal eram claramente mais simiescos e culturamente inferiores que os seus des cobridores Logo se algumas raças existentes poderiam ser demons tradas como estando mais próximas ao macaco do que outras não iria isso provar sua inferioridade O argumento é frágil mas era um apelo natural para aqueles que queriam provar a inferioridade racial por exemplo negros em relação a brancos ou melhor de qualquer um em relação a brancos A for ma de macaco poderia ser discernida pelo olho do preconceito até nos chineses e japoneses como testemunham muitos desenhos da época Mas se a evolução biológica darwinista sugeria uma hierarquia das raças assim o fez o método comparativo aplicado na antropologia cultural da qual Primitive Culture 1871 de E B Tylor é a obra mais Importante Para E B Tylor 18321917 assim como para muitos dos maravilhados pelo progresso que observavam comuni dades e culturas que diferentes dos fósseis humanos não haviam de saparecido estas não eram diferentes por natureza mas representati vas de um estágio anterior da evolução no caminho da civilização moderna Elas eram iguais à infância na vida do indivíduo Isso im plicava uma teoria de estágios Tylor tinha sido influenciado por Comte que ele aplicava com a caução habitual de homens respeitá veis tocando este assunto ainda explosivo à religião Do primitivo animismo uma palavra inventada por ele o caminho levava a reli giões monoteístas mais elevadas e eventualmente para o triunfo da ciência que capaz de explicar ares cada vez maiores da experiência sem recurso ou referência ao espírito iria em cada departamento um após outro substituir a descoberta de uma lei sistemática à ação inde pendente voluntária 12 Nesse ínterim entretanto sobrevivências historicamente modificadas estágios da civilização poderiam ser dis 272 cernidas em qualquer lugar mesmo nas partes evidentemente atrasa das das nações civilizadas por exemplo nas superstições e costumes do campo Portanto o camponês transformarase na ligação entre o selvagem e o civilizado Tylor que pensou a antropologia como es sencialmente uma ciência reformadora não acreditava que isso indi casse qualquer incapacidade dos camponeses em se tornarem membros completos da sociedade civilizada Mas o que seria mais fácil de con cluir do que aqueles que representavam o estágio da infância ou ado lescência no desenvolvimento da civilização eram de fato infantis e precisavam ser tratados como crianças pelos seus pais maduros Assim como o tipo do negro escreveu a Anthropological Review é fetal o tipo do mongol é infantil E de acordo com isto encontramos que o governo literatura e artes deles também são infantis Crianças sem barba cuja vida é uma tarefa e cuja maior virtude consiste numa obediência indiscutível13 Ou como o capitão Osborn colocou de maneira meio naval em 1860 Trateos como crianças Façaos fazer o que sabemos que é melhor para eles como é para nós e todas as dificuldades com a Chi na chegarão a um fim 14 Outras raças eram inferiores porque representavam um estágio anterior da evolução biológica ou da evolução sóciocultural ou en tão de ambas E esta inferioridade era comprovada porque de fato a raça superior era superior pelo critério de sua própria sociedade tecnologicamente mais avançada militarmente mais poderosa mais rica e mais bemsucedida O argumento era tão lisonjeiro quanto conveniente tão conveniente que as classes médias estavam inclina das a tomálo dos aristocratas que haviam por longo tempo se consi derado uma raça superior por razões internas e também internacio nais os pobres eram pobres porque biologicamente inferiores e por outro lado se cidadãos pertenciam às raças inferiores não era de se espantar que eles permanecessem pobres e atrasados O argumento ainda não estava vestido com o aparato da genética moderna que vir tualmente ainda não havia sido inventada os agora celebrados expe rimentos do monje Gregor Mendel 182284 com feijões no jardim de seu monastério moraviano 1865 passaram completamente desa percebidos até que foram redescobertos em 1900 Mas de uma forma primitiva a idéia de que as classes superiores eram um tipo mais ele vado de humanidade desenvolvendo sua superioridade por endoga mia e ameaçada pela mistura com as ordens inferiores e mais ainda pelo rápido aumento numérico destes inferiores era largamente acei ta Por outro lado como a escola sobretudo italiana da antropologia criminal pretendia provar o criminoso o antisocial o desprivilegi ado social pertenciam a uma linhagem humana diferente e inferior da respeitável e podia ser reconhecida como tal pelo mensuramento do crânio e outros métodos simples 273 O racismo atravessa o pensamento de nosso período numa exten são difícil de julgar hoje e nem sempre fácil de compreender Por que por exemplo o horror generalizado da miscigenação e a crença quase universal entre os brancos de que os mestiços herdavam precisamente as piores características das raças de seus pais Exceto pela sua conve niência enquanto legitimização da dominação do branco sobre indiví duos de cor ricos sobre pobres isto talvez seja melhor explicado como um mecanismo através do qual uma sociedade fundamentalmente ine galitária baseada sobre uma ideologia fundamentalmente egalitária ra cionalizava suas desigualdades uma tentativa para justificar e defender aqueles privilégios que a democracia implicitamente nas suas ins tituições precisava inevitavelmente desafiar O liberalismo não tinha nenhuma defesa lógica diante da igualdade e da democracia portanto a barreira ilógica do racismo foi levantada a própria ciência o trunfo do liberalismo podia provar que os homens não eram iguais Mas evidentemente a ciência do nosso período não chegou a pro válo embora alguns cientistas tenham se esforçado bastante A tauto logia darwinista sobrevivência dos melhores sendo que a prova de ser melhor era precisamente a sobrevivência não podia provar que os homens fossem superiores às minhocas já que ambos sobreviviam com sucesso A superioridade era entendida através da redução à e quação de nivelar história evolucionista com progresso E mesmo que a história evolutiva do homem discernisse corretamente o progres so em algumas questões importantes principalmente ciência e tecno logia embora não dando atenção a outras não conseguiu e aliás não poderia fazer do atraso um fato permanente e irreparável Pois ela era baseada na premissa de que os seres humanos pelo menos na sua emergência como homo sapiens eram os mesmos seus comportamen tos obedecendo às mesmas leis uniformes embora em circunstâncias históricas diferentes O inglês era diferente do indoeuropeu original mas não porque os ingleses modernos operassem de uma maneira lin guisticamente diferente das tribos ancestrais da Ásia central O para digma básico da árvore de família que aparece tanto na filologia co mo na antropologia implica o contrário das formas de desigualdade genéticas ou outras quaisquer permanentes Os sistemas de parentesco dos aborígenes australianos habitantes das ilhas do Pacífico e índios i raquianos que os ancestrais da antropologia social moderna como Le wis Morgan 181881 então começavam a estudar seriamente em bora o assunto fosse ainda basicamente mais estudado nas bibliotecas ao que no campo eram vistos como sobreviventes dos estágios an cores da evolução daquilo que se tornara a família do século XIX Mas o ponto principal sobre eles residia em que eram comparáveis diferen tes mas não necessariamente inferiores O darwinismo social e an tropologia racista pertencem não à ciência do século XIX mas à sua política Se olharmos retrospectivamente por sobre as ciências naturais e sociais do período ficaremos espantados com sua impressionante confi ança em si mesmas Isso era mais justificado talvez nas ciências natu 274 rais do que nas sociais mas era um fato igualmente marcante Os físi cos que pensavam haver deixado a seus sucessores pouco mais para fazer do que arranjar pequenas soluções expressavam o mesmo estado de espírito de August Schleicher que tinha certeza de que os arianos haviam se comunicado na mesma língua que eles haviam há pouco re construído Este sentimento não era muito baseado nos resultados os das disciplinas evolucionistas dificilmente eram suscetíveis de falsifica ção mas na crença da infalibilidade do método científico Ciência positiva operando com fatos objetivos e precisos ligados rigida mente por causa e efeito e produzindo leis uniformes e invariantes além de qualquer possível modificação era a chavemestra do univer so e o século XIX a possuía Mais do que isso com o crescimento do mundo do século XIX os estágios anteriores e infantis do homem ca racterizados pela superstição teologia e especulação tinham acabado e o terceiro estágio da ciência positiva de Comte havia chegado E fácil agora achar graça de tal confiança tanto pela adequação dos métodos como pela permanência dos modelos teóricos mas talvez fosse uma re ação um tanto deslocada E se os cientistas sentiam que podiam falar com certeza mais ainda os propagandistas e os ideólogos que tinham ainda mais certeza que as certezas dos cientistas porque eles podiam bem entender o que diziam estes cientistas desde que tal pudesse ser dito sem o recurso à alta matemática Mesmo a física e a química pare ciam estar ao alcance do homem prático digamos um engenheiro civil A Origem das Espécies de Darwim estava inteiramente ao acesso de um advogado bem instruído Nunca mais iria ser tão simples para o senso comum que sabia que o mundo triunfante do progresso liberal capitalista era o melhor dos mundos possíveis mobilizar o universo pa ra confirmar seus próprios preconceitos Os publicistas popularizadores e ideólogos eram agora encon trados através do mundo ocidental onde quer que houvesse uma elite atraída pela modernização Os cientistas e estudiosos originais aqueles que desfrutavam e ainda desfrutam de reputação fora de seus países eram distribuídos de forma mais irregular Na Realida de eles estavam virtualmente confinados a partes da Europa e da América do Norte Na Europa as penínsulas Ibérica e Balcânica permaneceram meio atrasadas neste particular Trabalho de conside rável qualidade e interesse internacional era agora produzido em quantidade significativa na Europa central e do leste e mais curiosa mente na Rússia e esta era provavelmente a mais espantosa mudan ça no mapa acadêmico do mundo ocidental em nosso período em bora nenhuma história da ciência deste período possa ser escrita sem referência a alguns eminentes norteamericanos principalmente o fí sico Willard Gibbs 18391903 Portanto seria difícil negar que di gamos em 1875 o que acontecia nas universidades de Kazan e Kiev era mais significativo do que o que acontecia em Yale ou Princeton Mas a mera distribuição geográfica não pode revelar suficiente mente o que era cada vez mais o fator dominante sobre a vida acadê 275 mica de nosso período em outras palavras a hegemonia dos alemães apoiados pelo fato de diversas universidades usarem aquela língua que incluía as da maior parte da Suíça Império dos Habsburgos e re giões bálticas da Rússia e a poderosa atração que a cultura alemã exercia na Escandinávia e Europa do leste e sudeste Fora do mundo latino e da Inglaterra e mesmo numa certa medida em ambos o mo delo alemão de universidade era geralmente adotado A predominân cia alemã era sobretudo quantitativa em nosso período provavelmen te um número maior de jornais científicos foram publicados nesta lín gua do que em francês e inglês juntos Afora alguns campos das ciên cias naturais como a química e provavelmente a matemática que eles claramente dominavam a qualidade extremamente alta de suas reali zações era menos óbvia porque diferente do início do século XIX não havia neste tempo um gênero especificamente alemão de fi losofia Enquanto que os franceses talvez por razões nacionalistas mantiveram seu próprio estilo embora não a matemática francesa exceto por alguns indivíduos célebres os alemães seguiram outro ca minho Talvez o estilo dos alemães que se tornou dominante no sécu lo XX não tenha emergido como tal até que as ciências tivessem pas sado para a fase da teoria e sistematização que por razões mais ou menos obscuras caíalhes admiravelmente De qualquer maneira as ciências naturais inglesas que desfrutavam de um público expressi vo de especialistas burgueses e mesmo artesãos continuavam a produzir cientistas de renome extraordinário como Thompson e Darwin Exceto na história acadêmica e na lingüística não havia uma tal dominação alemã nas ciências sociais A economia era ainda bastante inglesa embora em retrospectiva possamos detectar alguma obra ana lítica importante na França Itália e Áustria O Império dos Habsbur gos embora de alguma forma parte da cultura alemã seguiu uma tra jetória intelectual bastante diferente A sociologia pelo pouco que valia estava basicamente associada à França e à Inglaterra tendo sido recebida entusiasticamente no mundo latino Na antropologia as co nexões internacionais dos ingleses deramlhes uma vantagem notável A evolução em geral a ponte entre as ciências naturais e sociais tinha seu centro de gravidade na Inglaterra A verdade é que as ciên cias sociais refletiam as préconcepções e problemas do liberalismo burguês na sua forma clássica tal como não eram encontrados na A lemanha onde a sociedade burguesa inseriase dentro do contexto bismarkiano de aristocratas e burocratas O mais eminente cientista social do período Karl Marx trabalhou na Inglaterra fazendo derivar o contexto de sua análise concreta de uma ciência econômica não alemã e a base empírica de sua obra da sociedade burguesa clássica a inglesa embora já a esta época não mais isenta de desafios III 276 A ciência era o centro daquela ideologia laica de progresso quer liberal quer numa medida menor mas de crescente importância socialista que não demanda uma discussão especial pois sua nature za geral deveria por agora ter claramente surgido de sua história Comparada com a ideologia laica a religião no nosso período é de interesse incomparavelmente menor e não merece um tratamento mais prolongado Mas mesmo assim merece alguma atenção não apenas porque ainda formava o idioma no qual a esmagadora maioria da população mundial pensava mas também porque a própria socie dade burguesa apesar de sua crescente laicização estava bastante preocupada em relação às possíveis conseqüências de sua própria au dácia A descrença em Deus tornouse relativamente fácil em meados do século XIX pelo menos no mundo ocidental já que muitas das i déias passíveis de verificação das escrituras judaicocristãs haviam sido minadas ou mesmo desmentidas pelas ciências sociais históricas e sobretudo naturais Se Lyell 17971875 e Darwin estavam certos então o livro da Gênesis estava simplesmente errado no seu sentido li teral e os oponentes intelectuais de Darwin e Lyell estavam visivel mente em debandada O pensamento livre das classes altas era famili ar de longa data pelo menos entre senhores distintos O ateísmo inte lectual e de classe média também não era novo e tornouse militante com a importância crescente do anticlericalismo O pensamento livre da classe operária embora já associado a ideologias revolucionárias tomou uma forma especial tanto porque as velhas ideologias revolu cionárias declinavam deixando atrás apenas seus aspectos políticos menos diretos como também porque as novas ideologias firmemente baseadas numa filosofia materialista ganhavam terreno O movimen to laicizante na Inglaterra derivava diretamente dos velhos movi mentos operários Cartista e Owenita mas agora existia como um cor po independente particularmente atraente a homens e mulheres que reagiam contra uma herança religiosa especialmente intensa Deus es tava não apenas despedido mas sob ferrenho ataque Este ataque militante à religião coincidia mas não era exata mente idêntico à corrente igualmente militante do anticlericalismo que abarcava todas as correntes intelectuais dos liberais moderados aos marxistas e anarquistas Os ataques a igrejas e mais obviamente igrejas oficiais do estado e a Igreja Católica Romana internacional que clamava para si o direito de definir a verdade ou o monopólio de certas funções atingindo o cidadão como casamento enterro e edu cação não implicava ateísmo em si mesmo Nos países contendo mais do que uma religião essa luta poderia ser conduzida pelos mem bros de uma corrente religiosa contra outra Na Inglaterra a luta era basicamente levada pelas seitas nãoconformistas contra a Igreja An glicana na Alemanha Bismarck que entrou numa Kulturkampf luta cultural amarga contra a Igreja Católica Romana em 187071 certa 277 mente não pretendia na qualidade oficial de luterano que a existência de Deus ou a divindade de Jesus estivessem em questão Por outro la do em países com uma única fé monolítica mais obviamente os católi cos o anticlericalismo normalmente implicava rejeição de toda e qual quer religião Havia é certo uma fraca corrente liberal dentro do ca tolicismo que resistia ao cada vez mais rígido ultraconservantismo da hierarquia romana formulada na década de 1860 ver referência anteri or à Syllabus of Errors e oficialmente triunfante no Concilio Vaticano de 1870 com a declaração da infalibilidade papal Entretanto esta pe quena corrente era facilmente assimilada pela Igreja e mesmo apoiada por alguns eclesiásticos que queriam preservar uma relativa autonomia de suas igrejas católicas regionais e que eram provavelmente mais for tes na França Mas o galicanismo não pode ser realmente chamado de liberal no sentido aceito do termo mesmo levando em conta que es tava mais preparado em termos pragmáticos e antiromanos para che gar a um bom termo com os governos laicos modernos e liberais O anticlericalismo era militantemente laico na medida em que pretendia tomar da religião qualquer status oficial na sociedade de sestabelecimento da igreja separação da igreja do Estado deixan doa como uma questão puramente privada Deveria ser transformada em uma ou diversas organizações puramente voluntárias análogas aos clubes de colecionadores de selos somente que em dimensões um pouco maiores Mas isso não era baseado tanto na falsidade da crença em Deus ou qualquer versão particular desta crença mas na crescente capacidade administrativa amplitude e ambição do estado laico mesmo na sua forma mais laissezfaire e liberal que estava decidido a expulsar organizações privadas daquilo que então considerava seu campo de ação Entretanto o anticlericalismo era basicamente políti co porque a certeza passional por detrás de tudo era de que religiões bem estabelecidas eram hostis ao progresso E de fato eram sendo do ponto de vista sociológico e político instituições bastante conservado ras A Igreja Católica Romana tinha aliás uma hostilidade manifesta por tudo aquilo que o século XIX se punha firmemente a favor As seitas ou os heterodoxos poderiam ser liberais ou mesmo revolucioná rios minorias religiosas poderiam ser atraídas pela tolerância liberal mas igrejas ou ortodoxias nunca poderiam sêlo E na medida em que as massas especialmente as massas rurais estavam ainda nas mãos destas forças do obscurantismo tradicionalismo e reacionarismo polí tico seu poder precisava ser destruído para que o progresso continu asse seu curso Conseqüentemente o anticlericalismo era mais mili tante e passional na proporção do atraso do país Na França os po líticos argumentavam sobre o status das escolas católicas mas no México muito mais estava em disputa na luta entre o governo e os padres O progresso a emancipação da tradição tanto para a soci edade como para os indivíduos parecia entretanto implicar uma rup tura militante com as antigas crenças que encontravam expressão pas 278 sional no comportamento dos militantes dos movimentos populares assim como no dos intelectuais da classe média Um livro chamado Moisés ou Darwin iria ser lido por um número maior de trabalhadores socialdemocratas nas bibliotecas dos sindicatos alemães que os escri tos do próprio Marx Progresso educadores emancipadores e ciência logicamente desenvolvida em socialismo científico era a chave para a emancipação intelectual dos grilhões do passado de supersti ções e do presente opressivo Os anarquistas da Europa ocidental que refletiam os instintos espontâneos destes militantes de forma bastante precisa eram selvagemente anticlericais Não é nenhum acidente que na Romagna italiana um ferreiro radical tenha dado o nome de Beni to Mussolini a seu filho em homenagem ao presidente mexicano anti clerical Benito Juarez Apesar de tudo mesmo entre os livrepensadores uma nostalgia pela religião permaneceu Ideólogos da classe média que apreciavam o papel da religião como uma instituição mantenedora de um estado de adequada modéstia entre os pobres e uma garantia da ordem algu mas vezes flertaram com neoreligiões como a religião da humani dade de Comte que substituía os santos por uma seleção de grandes homens para o Panteão embora tais experimentos não tenham sido muito bem sucedidos Mas também havia uma tendência genuína de substituir as consolações da religião pelas da idade da ciência A Ci ência Cristã fundada por Mary Baker Eddy 18211910 que publi cou seus escritos em 1875 indicava uma destas tentativas A impres sionante popularidade do espiritualismo que teve sua primeira voga na década de 1850 é talvez provavelmente devida a essa tendência Suas afinidades políticas e ideológicas se faziam com o progresso a reforma e a esquerda radical e não menos com a emancipação femi nina especialmente nos Estados Unidos que eram o seu centro maior de difusão Mas afora suas outras atrações tinha a vantagem conside rável de colocar a sobrevivência após a morte dentro de um contexto da ciência experimental talvez mesmo como a nova arte da fotogra fia poderia demonstrar no de uma imagem objetiva Quando mila gres não podiam ser mais aceitos e a parapsicologia aumentava seu público potencial Algumas vezes porém não indicava nada mais que a sede humana geral por rituais coloridos que a religião tradicio nal normalmente fornecia de forma tão eficiente A metade do século XIX está plena de rituais laicos inventados especialmente nos países anglosaxônicos onde sindicatos elaboraram complicadas bandeiras e certificados alegóricos Sociedades de Ajuda Mútua cercadas por sua vez com a parafernália da mitologia e do ritualismo nas suas lojas KuKluxKlans e outras ordens políticas menos secretas A mais antiga e sem dúvida a mais influente de todas estas sociedades secre tas ritualizadas e hierarquizadas estava de fato comprometida com o pensamento livre e o anticlericalismo pelo menos afora dos países anglosaxônicos os francomaçons Se o número de seus adeptos 279 cresceu neste período não sabemos embora seja provável certamente sua importância política cresceu Mas se mesmo os livrepensadores reclamavam pelo menos al gum consolo espiritual do tipo tradicional eles pareciam por outro lado estar perseguindo um inimigo em debandada Pois como os escritos vitorianos da década de 1860 eloqüentemente testemunham o indivíduo com fé tinha dúvidas especialmente se fosse intelectu al A religião estava sem dúvida em declínio não meramente entre in telectuais mas nas grandes cidades onde a pressão comunitáriapara a prática religiosa e a moralidade era pouco sentida E portanto as décadas de meados do século XIX não chegaram a ver um declínio de religião de massa comparável ao caminho intelec tual tomado pela teologia O centro das classes médias anglo saxônicas permaneceu religioso em geral praticantes ou pelo menos hipócritas Dos grandes milionários americanos apenas um Andrew Carnegie propagandeava falta de fé A taxa de expansão das seitas protestantes nãooficiais decaiu mas pelo menos na Inglaterra a consciência nãoconformista que representavam tornouse politica mente muito mais influente na medida em que se tornava mais classe média A religião não chegou a declinar no meio das novas comuni dades de imigrantes no resto do mundo na Austrália o percentual de freqüência à Igreja no meio da população de mais de 15 anos aumen tou de 365 em 1850 para quase 59 em 187C e estacionou em tor no de 40 nas últimas décadas do século 15 Os Estados Unidos a despeito de Col Ingersoll o célebre ateu 183399 era um país sem Deus numa medida muito maior que a França Na medida em que as classes médias estavam em questão o de clínio da religião era como vimos inibido não apenas pela tradição e fracasso em larga escala do racionalismo liberal em fornecer um substituto coletivo para o ritual e a fé religiosa exceto talvez através da arte ver capítulo seguinte mas também pela relutância em a bandonar um pilar de estabilidade moralidade e ordem social tão va lioso talvez tão indispensável Na medida em que as massas estavam em questão a expansão da religião pode ter sido devido sobretudo àqueles fatores geográficos sobre os quais a Igreja Católica gostava de apoiarse para os seus maiores triunfos as migrações de massa de homens e mulheres de regiões mais tradicionais para as novas cida des regiões e continentes e a alta taxa de fertilidade dos pobres com paradas a dos nãocrentes corrompidos pelo progresso Não há evi dência de que os irlandeses tenham se tornado mais religiosos em nosso período mas há alguma certeza de que as migrações enfraque ceram sua fé embora sua dispersão e sua taxa de natalidade fizessem com que a Igreja Católica crescesse de forma relativa e absoluta atra vés da cristandade E além disso não haviam forças dentro da própria religião para revivêla e dispersála Certamente neste estágio os missionários cristãos não eram no tavelmente bemsucedidos fosse ao lidar com o proletariado perdido 280 em casa ou ainda menos ao tentar converter indivíduos de religiões rivais pelo mundo afora Considerando as despesas substanciais en tre 1871 e 1877 os ingleses sozinhos contribuíram com 8 milhões de libras para as missões 16 os resultados foram bastante modestos O Cristianismo de todas e quaisquer denominações fracassou em tornar se um competidor sério em relação à única religião realmente em ex pansão o Islamismo Este continuava a espalharse de forma irresistí vel sem o benefício de uma organização missionária dinheiro ou o apoio das grandes potências através da África e partes da Ásia sem dúvida ajudado não apenas por seu igualitarismo mas também pela consciência da superioridade dos valores em relação aos conquistado res europeus Nenhum missionário conseguiu jamais abrir uma brecha dentro da população maometana Conseguiram apenas entrar um pou co dentro de algumas nãoislâmicas já que faltava ainda aos missio nários a grande arma da penetração cristã ou seja a conquista coloni al direta ou pelo menos a conversão oficial de governantes que trazi am seus cidadãos com eles como aconteceu em Madagascar que de clarouse uma ilha cristã em 1869 O Cristianismo fez alguns avanços no sul da índia sobretudo no meio da camada mais baixa do sistema de castas apesar da falta de entusiasmo do governo na Indochina em seqüência à conquista francesa mas nada de significativo na Áfri ca até que o imperialismo multiplicasse o número de missionários de uns 3 mil protestantes em meados da década de 1880 para talvez uns 18 mil em 1900 e pusesse um poder material bem mais persuasi vo atrás do poder espiritual do Redentor 17 Portanto nos melhores dias do liberalismo a ação missionária talvez tenha perdido algum ímpeto Somente uns três ou quatro novos centros católicos missioná rios foram abertos na África em cada uma das décadas entre 1850 e 1880 comparado com seis na década de 1840 14 na de 1880 e 17 na de 1890 18 O Cristianismo era mais efetivo quando alguns elementos da religião eram absorvidos pela ideologia religiosa local sob a forma de cultos nativistas sincréticos O movimento Taiping na China ver capítulo 7 foi de longe o maior e o mais influente de tais fenômenos Mas dentro do Cristianismo havia sinais de um contraataque em relação ao avanço da laicização Nem tanto no mundo protestante onde a formação e expansão de novas seitas nãooficiais parecia ter perdido muito do dinamismo que possuía antes de 1848 com a pos sível exceção dos negros na América anglosaxônica da mesma forma que os católicos O culto do milagre em Lurdes na França que começou com a visão de uma pequena pastora em 1858 expandiuse com enorme rapidez talvez espontaneamente no começo mas logo depois com ativo apoio eclesiástico Por volta de 1875 uma filial de Lurdes era aberta na Bélgica De forma menos dramática o anticleri calismo provocou um movimento substancial de evangelização entre os crentes e um reforço maior da influência clerical Na América La tina a população rural havia sido em larga escala cristã sem a presen ça de padres até depois de 1860 a igreja no México havia sido sobre 281 tudo urbana Contra o anticlericalismo oficial a Igreja sistematica mente capturou ou reproselitizou o campo Em certo sentido diante da ameaça da reforma laica a Igreja reagiu da mesma forma como havia feito no século XVI com a ContraReforma O Catolicismo a gora totalmente intransigente recusando qualquer acomodação com as forças do progresso industrialização e liberalismo tornouse uma força muito mais poderosa depois do Concilio Vaticano de 1870 do que antes mas ao custo de abandonar muito do seu terreno aos ad versários Fora da cristandade as religiões apoiavamse sobretudo na força do tradicionalismo para resistir à erosão da era liberal ou à confronta ção com o Ocidente Tentativas para liberalizálas eram bem vistas por burguesias semiassimiladas como a Reforma Judaica que surgiu no final da década de 1860 execradas pelos ortodoxos e desprezadas pelos agnósticos As forças da tradição ainda eram esmagadoramente poderosas e freqüentemente reforçadas pela resistência ao progres so e à expansão européia Como já vimos o Japão chegou a criar uma nova religião de estado o shintoísmo a partir de elementos tra dicionais em grande parte com propósitos antieuropeus ver capítulo 8 Mesmo os ocidentalistas e revolucionários do Terceiro Mundo iri am aprender que o caminho mais fácil para ser bem sucedido como político entre as massas era adquirir o papel ou pelo menos o prestí gio de um monje budista ou de um santo hindu E portanto apesar de que o número dos francamente descrentes permanecesse relativamen te pequeno em nosso período afinal mesmo na Europa a metade feminina da raça humana não era praticamente afetada pelo agnosti cismo eles dominavam um mundo essencialmente laico Tudo que a religião poderia fazer contra eles era recuar para trás de suas vastas e poderosas fortificações e prepararse para um cerco muito longo A Europa e os Estados Unidos Países e Recursos 184750 187680 população em milhões força a vapor 000 HP número de cidades acima de 50 mil população em milhões força a vapor 000 HP número de cidades acima de 50 mil Reino Unido 27 1290 32 377 7600 482 França 341 370 14 369 3707 295 Alemanha 117 92 17 477 5120 287 Prússia Baíeria Saxónia Hannover Wirtemberg Baden 32 ou estados entre 002 e 009 Áustria Rússia 8 70 4 857 1740 26 Áustria com Hungría 13 100 2 371 1560 120 Duas Sicilias 4 278 500 134 Sardenha 2 Estados Papáis continua 317 283 DécimoQuinto Capítulo AS ARTES Precisamonos convencer definitivamente que nossa história hoje é feita pelos mesmos seres humanos que também fizeram um dia as o bras da arte grega Mas tendo aceito este ponto nossa tarefa é então descobrir o que é que transformou estes seres humanos de forma tão fundamental que agora só conseguimos produzir o que sai das in dústrias de luxo onde antes criavamse obras de arte Richard Wagner 1 Por que você escreve em versos Ninguém dá importância a isso a gora Na nossa era de maturidade cética e independência republi cana o verso é uma forma aposentada Preferimos a prosa que em virtude de sua liberdade de movimento está mais de acordo com os instintos da democracia Eugene Pelletan deputado francês 1877 2 I Se o triunfo da sociedade burguesa parecia congênito à ciência tal não ocorria da mesma forma com as artes O reconhecimento de valor em relação às artes criativas é sempre muito subjetivo mas não se pode praticamente negar que a era da revolução dual 17891848 viu extra ordinárias realizações de homens e mulheres de dons bastante notáveis A segunda metade do século XIX especialmente as décadas que são o objeto deste livro não dão uma impressão equivalente exceto em um ou dois países atrasados sendo de longe o mais notável deles a Rússia Isto não quer dizer que as realizações criativas deste período fossem medío cres embora ao rever aqueles criadores cuja obra maior ou a aclamação pública ocorreram entre 1848 e a década de 1870 precisamos lembrar que muitos deles já eram pessoas maduras e com uma expressiva produ ção antes de 1848 Afinal para mencionar apenas três dos mais inques tionavelmente importantes Charles Dickens 181270 já estava na metade de sua ouvre Honoré Daumier 180879 tinha sido um ativo ar tista gráfico desde a revolução de 1830 e mesmo Richard Wagner 181383 já tinha várias óperas atrás de si Lohengrin foi produzida em 1851 Porém não há dúvida de que a literatura de prosa e especialmen 284 te o romance floresceu de forma admirável graças principalmente à continuada glória dos ingleses e dos franceses e à nova glória dos rus sos Na história da pintura houve claramente um admirável e grandioso período graças quase que exclusivamente aos franceses Na música a era de Wagner e Brahms é inferior apenas em comparação com a era precedente de Mozart Beethoven e Schubert Porém se olharmos mais de perto a cena criativa verificase que ela é bem menos inspirada Já vimos como se distribuía geografica mente Para a Rússia tratavase de uma era espantosamente triunfante na música e sobretudo na literatura para não mencionar as ciências natu rais e sociais Uma década como a de 1870 que viu os pontos cul minantes de Dostoievsky e Tolstoi P Tchaikovsky 184093 M Mus sorgsky 183581 e o balé imperial clássico não teme nenhum tipo de comparação A França e a Inglaterra como vimos mantiveram um nível bastante elevado sobretudo na literatura da prosa mas também na pintu ra e poesia Na poesia inglesa a obra de Tennyson Browning e outros é menos impressionante que a dos grandes românticos da era das revo luções na França com a obra de Baudelaire e Rimbaud ocorreu o con trário Os Estados Unidos embora ainda contribuindo de forma insigni ficante no campo das artes visuais e da música já começa a estabelecer se como uma força literária com Melville 181991 Hawthorne 1804 64 e Whitman 181991 no leste e com uma nova geração de escrito res populistas emergindo do jornalismo no oeste entre os quais Mark Twain 18351910 iria ser o mais expressivo Mesmo assim numa comparação global esta era uma realização de nível provinciano e de várias formas menos importante e ainda menos influente internacio nalmente do que a obra criativa que era produzida por algumas peque nas nações que afirmavam suas nacionalidades Curiosamente um bom número de escritores americanos menores da primeira metade do século fizeram mais de uma viagem ao exterior Os compositores dos tchecos A Dvorak 18411904 S Smetana 182484 acharam mais simples conseguir aceitação internacional que os escritores daquele povo isola dos por uma língua que poucos de fora conheciam ou se incomodavam em aprender Dificuldades lingüísticas também localizaram a reputa ção de escritores de algumas outras regiões alguns dos quais ocupam uma posiçãochave na história literária de seus respectivos povos por exemplo os holandeses e os flamengos Somente os escandinavos con seguiram captar um público maior talvez devido ao fato de que seu re presentante mais célebre Henrik Ibsen 18281906 que atingiu a ma turidade exatamente no término de nosso período tenha escolhido es crever peças para o teatro Contra tudo isso precisamos observar um declínio visível e de certa forma espetacular na qualidade das melhores obras daqueles dois centros de atividade criativa os povos de língua germânica e os italianos Talvez possa haver alguma discussão sobre música mas na Itália não há quase nada além de Verdi 18131901 cuja carreira es tava bem estabelecida desde antes de 1848 e na AustroAlemanha 285 entre os compositores reconhecidos apenas Brahms 183397 e Bruckner 182496 surgiram essencialmente neste período Wagner já sendo virtualmente maduro Mesmo assim estes nomes são sufici entemente impressivos especialmente Wagner um gênio absoluto e fenômeno cultural apesar de ter um caráter vil Mas qualquer relutância em aceitar inferioridade das artes destes dois povos deve permanecer restrita inteiramente à música Não há dúvida quanto à inferioridade li terária e das artes visuais em relação às do período anterior a 1848 Tomando as diversas artes separadamente a queda geral de ní vel é igualmente óbvia em algumas sendo que em outras a superiori dade em relação ao período precedente é inegável A literatura flores ceu como já vimos através do meio conveniente dos romances Po dem ser vistos como o gênero que achou uma forma possível de adap tarse àquela sociedade burguesa cuja ascensão e crises formavam o assunto preferido dos escritores Tentativas foram feitas para salvar a reputação da arquitetura do século XIX mas há de qualquer forma algumas realizações expressivas Entretanto quando se considera a orgia de construções na qual a próspera sociedade burguesa atirouse a partir da década de 1850 estas não são nem grandiosas nem particu larmente numerosas Paris reconstruída por Haussman impressiona por seu planejamento mas não pelos edifícios que guarnecem suas esquinas e bulevares Viena que aspirou a obrasprimas mais pesso ais foi apenas duvidosamente bemsucedida Roma do rei Vittorio Emmanuel cujo nome está provavelmente ligado com um maior nú mero de peças de má arquitetura do que qualquer outro soberano é um desastre Comparados com as extraordinárias realizações do di gamos neoclassicismo o derradeiro estilo unificado de arquitetura antes do triunfo da moderna ortodoxia do século XX os edifícios da segunda segunda metade do século XIX são mais capazes de de mandar desculpas do que admiração universal Isto não se aplica evi dentemente às obras dos engenheiros brilhantes e imaginativos em bora tudo tendesse a ser escondido atrás de fachadas fine art Mesmos os entusiastas têm até bem recentemente encontrado di ficuldades em dizer muito a favor da pintura deste período A obra que tem se tornado uma parte permanente do museu do século XX é quase sem exceção francesa sobreviventes da era das revoluções como Daumier e G Courbet 181977 a escola de Barbizon e o grupo a vantgarde dos Impressionistas um rótulo indiscriminado que não pre cisamos analisar detidamente no momento que surgiu na década de 1860 Esta façanha é de fato muito impressionante e um período que viu o surgimento de E Manet 183283 E Degas 18341917 e o jo vem P Cézanne 18391906 não precisa se preocupar com sua repu tação Mesmo assim estes pintores não eram apenas atípicos em rela ção ao que era posto sobre telas em quantidades cada vez maiores neste tempo mas também muito suspeitos à arte respeitável e ao gosto do público Sobre a arte oficial acadêmica ou sobre a popular o máximo que pode ser razoavelmente dito é que não era uniforme em caráter 286 que seus padrões de técnica eram altos e que alguns méritos modestos podem ser redescobertos aqui e ali A maior parte era e é horrível Pode ser que a escultura de meados e fins do século XIX ampla mente dispostos em inumeráveis obras monumentais mereça um pouco mais de atenção do que se lhe tem dado normalmente afinal produziu o jovem Rodin 18401917 Entretanto qualquer coleção de obras plásticas vitorianas en masse como ainda podem ser vistas nas casas dos ricos Bengalis constituiuse numa visão tremendamente de pressiva II Esta era de alguma forma uma situação tragicômica Poucas sociedades valorizaram tanto as obras dos gênios criadores em si mesmo virtualmente uma invenção burguesa como fenômeno social ver A Era das Revoluções capítulo XIV do que a burguesa do século XIX Poucas estavam prontas a gastar dinheiro tão livremente com as artes e em termos puramente quantitativos nenhuma sociedade pre cedente comprou tanto como a quantidade de livros velhos e novos objetos materiais quadros esculturas estruturas decoradas de madei ra e bilhetes para representações teatrais ou musicais Apenas o cres cimento da população colocaria esta afirmação fora de disputa So bretudo e paradoxalmente poucas sociedades tinham estado tão con vencidas de que viviam numa era dourada das artes criadoras O gosto deste período não era nada se não fosse contemporâneo como era de fato natural para uma geração que acreditava no progres so universal e constante Herr Ahrens 180581 um industrial do norte da Alemanha mudouse para o clima culturalmente mais propí cio de Viena por volta dos seus 50 anos e começou a colecionar qua dros modernos ao invés de obras de velhos mestres e isto era típico como fenômeno3 Os Bolckow ferro Holloway patente das pílulas e Mendel algodão que competiam entre si para aumentar os preços das pinturas a óleo na Inglaterra fizeram afortunados pintores acadê micos da época4 Os jornalistas que registravam orgulhosamente a abertura e o custo total destes gigantescos edifícios públicos que co meçaram a desfigurar a imagem das cidades depois de 1848 genuina mente acreditavam que estavam celebrando uma nova Renascença fi nanciada por príncipes industriais comparáveis aos Medici Enfim a conclusão mais evidente que os historiadores podem tirar do final do século XIX é que a mera aplicação de dinheiro não é capaz de garan tir uma idade de ouro para as artes Mais ainda a quantidade de dinheiro gasta era impressionante por quaisquer padrões exceto os da capacidade produtiva sem prece dentes do capitalismo Entretanto estas quantidades não mais eram gastas pelas mesmas pessoas A revolução burguesa era vitoriosa mesmo no campo característico da atividade dos príncipes e da no 287 breza Nenhuma das grandes reconstruções de cidades entre 1850 e 1875 colocou como ponto dominante da paisagem um palácio real ou imperial nem mesmo um complexo de palácios aristocráticos Onde a burguesia fosse fraca como na Rússia o tzar e os grãoduques podi am ainda ser os patronos principais em caráter individual mas mesmo assim o papel deles em tais países parece ter sido bem menos central do que fora antes da Revolução Francesa Em outros lugares um príncipe menor ocasional e excêntrico como Ludwig II da Baviera ou a marquesa de Hertford poderiam colocar toda a paixão em comprar arte e artistas mas no total cavalos jogo e mulheres eram mais capa zes de pôlos em dívidas do que a patronagem das artes Quem pagava então pelas artes Governos e outras entidades públicas a burguesia e este ponto merece atenção uma seção cada vez mais significativa das ordens menores para os quais os proces sos industriais e tecnológicos faziam com que os produtos das mentes criativas se tornassem accessíveis em quantidades cada vez maiores e a preços cada vez menores Autoridades públicas laicas eram quase os únicos fregueses para os edifícios gigantescos e monumentais cujo propósito era compro var a riqueza e esplendor da era em geral e da cidade em particular Seus propósitos eram raramente utilitários Na era do laissezfaire os edifícios governamentais não eram injustificadamente conspícuos Normalmente não eram religiosos exceto nos países católicos ou quando construídos para uso interno pelos grupos minoritários reli giosos como os judeus e os nãoconformistas ingleses que desejavam registrar sua riqueza e satisfação crescentes A paixão pela restaura ção e acabamento das grandes igrejas e catedrais da Idade Média que varreu a Europa de meados do século como uma doença contagiosa era mais cívica que espiritual Mesmo nas monarquias mais esplêndi das pertencia mais ao público do que à corte coleções imperiais e ram agora museus as óperas abriam suas bilheterias Eram na reali dade os símbolos característicos da glória e da cultura pois mesmo as titânicas prefeituras que os dirigentes das cidades mandavam cons truir eram de longe muito maiores do que requeriam as modestas ne cessidades da administração municipal Os meticulosos homens de negócios de Leeds deliberadamentw rejeitaram os cálculos utilitários na construção de seus prédios O que era uns poucos milhares a mais quando a meta a fixar era de que no ardor das disputas mercantis os habitantes de Leeds não se esqueceram de cultivar a percepção do be lo e um gosto pelas belas artes De fato gastaram 122 mil libras ou cerca de três vezes mais que a estimativa original equivalente a mais de 1 do total em renda para o Reino Unido inteiro no ano de sua i nauguração 18585 Um exemplo pode ilustrar o caráter geral de tais edifícios A ci dade de Viena derrubou suas velhas fortificações na década de 1850 e encheu o espaço vazio nas décadas subseqüentes com um magnífico bulevar circular cercado de edifícios públicos O que eram estes edifí 288 cios Um deles representava o comércio a bolsa de valores outro a religião a Votivkirche três deles universidades três outros de im portância civil e questões públicas a prefeitura o palácio da justiça e o parlamento e não menos de oito representavam as artes teatros museus academias etc As demandas da burguesia eram individualmente mais modes tas coletivamente bem maiores Sua patronagem enquanto indivíduos não era talvez tão importante como iria ser na última geração antes de 1914 quando os milionários dos Estados Unidos aumentaram os pre ços de certas obras de arte a um nível mais alto do que nunca ou des de então Mesmo no final do nosso período os robber barons esta vam ainda muitos ocupados na espoliação geral para poderem exibir de coração os frutos de seu banditismo Era portanto evidente parti cularmente a partir da década de 1860 que havia muito dinheiro so brando A década de 1850 produziu apenas um artigo de mobília francesa do século XVI11 o símbolo de status internacional de um rico interior que tenha passado de 1 mil libras num leilão a de 1860 oito a de 1870 14 incluindo um lote que atingiu 30 mil libras artigos como um vaso de Sèvres um símbolo de status bastante similar che gou a 1 mil libras três vezes mais na década de 1850 sete vezes mais na de 1860 e 11 vezes na de 18706 Um punhado de príncipes competidores é suficiente para fazer a fortuna de pintores e mar chands mas mesmo um público numericamente modesto é capaz de manter uma produção artística substancial se lhe fornecer uma boa sa ída O teatro e numa certa medida a música clássica concertos pro vavam esta afirmação A ópera e o bale clássico então como agora sustentavamse como subsídios do governo ou de ricos a procura de status nem sempre ignorantes das facilidades de acesso a belas baila rinas e cantoras O teatro florescia pelo menos financeiramente O mesmo ocorria com os editores de livros caros e sólidos para um mercado limitado cujas dimensões são talvez indicadas pela circula ção do Times de Londres que andava entre 50 mil e 60 mil nas déca das de 1850 e 1860 atingindo 100 mil em algumas poucas ocasiões es peciais Quem poderia reclamar quando o livro Traveis de Livingstone 1857 vendeu 30 mil exemplares numa edição de um guinéu em seis anos 7 De qualquer maneira as necessidades domésticas e de comér cio da burguesia fizeram a fortuna de inúmeros arquitetos que construí ram e reconstruíram áreas substanciais das cidades para aquela classe O mercado burguês era novo apenas na medida em que agora era especialmente grande e cada vez mais próspero Por outro lado os meados do século produziram um fenômeno realmente revolucioná rio pela primeira vez graças à tecnologia e à ciência alguns tipos de obras criativas tornaramse tecnicamente passíveis de reprodução ba rata e numa dimensão sem precedentes Apenas um destes processos chegava de fato a competir com o ato da criação artística em si mes ma em outras palavras a fotografia que nasceu na década de 1850 Como veremos seus efeitos na pintura foram imediatos e profundos 289 O resto apenas trouxe versões de qualidade inferior de produtos indi viduais ao alcance do público de massa escrita através da multipli cação de edições baratas estimuladas principalmente pelas estradas de ferro os seriados principais eram chamados tipicamente de biblio tecas ambulantes ou de viagem retratos através de gravação em ferro em que os novos processos de eletrogravação 1845 tornaram possível a produção em grandes quantidades sem perda de detalhes ou refinamentos assim como através do desenvolvimento do jorna lismo literatura autoditatismo etc Que tais novidades tenham apa recido nas décadas de 1830 e 1840 não diminui a importância de sua expansão quantitativa a partir de 1850 O enorme significativo econômico deste nascente mercado de massa é freqüentemente subestimado As rendas dos principais pinto res impressionantes mesmos pelos padrões modernos Millais tinha uma média de 20 a 25 mil libras anuais de libras esterlinas vitorianas entre 1868 e 1874 eram baseadas sobretudo nas gravuras de dois guinéus em molduras de 5 shillings que Gambart Flatou e outros marchands lançavam A Railway Station de Frith 1860 conseguiu 4500 libras em tais direitos subsidiários e mais 750 libras por direitos de exibição 8 Em 1853 E BulwerLytton 180373 um escritor que não negligenciava assuntos de finanças vendeu 10 anos de direito pa ra edições baratas de romances que ele já havia escrito para Routled ges Railway Library por 20 mil libras9 Com a única exceção de Un cle Toms Cabin A cabana do pai Tomás 1852 de Harriet Beecher Stowe que deve ter vendido 15 milhão em um ano apenas no Impé rio Britânico o mercado de massas para as artes não pode ser compa rado com o dos tempos atuais Apesar disso ele existia e sua impor tância é inegável Duas observações precisam ser feitas sobre isso A primeira é realçar a desvalorização da produção tradicional que era mais direta mente afetada pelo avanço da reprodução mecânica Em uma geração isso iria produzir especialmente na Inglaterra a pátria da industriali zação uma reação políticoideológica do movimento art sand crafts em larga escala socialista cujas raízes antiindustrialistas implíci taamente anticapitalistas podem ser encontradas através da firma de desenho de William Morris de 1860 e com os pintores prérafaelitas da década de 1850 Estes últimos dizem respeito à natureza do públi co que influenciava os artistas Era evidentemente não apenas uma clientela aristocrática ou burguesa como a que naturalmente determi nava o conteúdo do que era apresentado no West End londrino ou na região dos teatros de Paris Era também um público de massa da mo desta classe média e outras incluindo trabalhadores especializados que aspiravam à respeitabilidade e à cultura As artes de nossa época eram em todos os sentidos populares como os técnicos de propagan da de massa da década de 1880 sabiam quando compravam algumas das mais lamentáveis e caras pinturas para nelas afixar seus anúncios 290 As artes eram prósperas e assim também eram os talentos criati vos que tinham apelo junto ao público e eles eram de todas as for mas claramente os piores É um mito afirmar que os melhores talen tos do período eram normalmente deixados à míngua e na boêmia por filistinos que não sabiam apreciálos Podemos certamente descobrir aqueles que por várias razões resistiram ou tentaram chocar o públi co burguês ou simplesmente falharam em atrair compradores a mai oria na França G Flaubert 182180 os primeiros simbolistas e os impressionistas mas também em outros lugares Entretanto era mais freqüente que os homens e mulheres cuja fama tenha passado pelo teste de sobreviver um século fossem pessoas cujas reputações na época iam do muito respeito à idolatria e cuja renda ia de classe mé dia confortável até o fabuloso A família de Tolstoi iria viver confor tavelmente da renda de algumas novelas quando o grande homem dis tribuiu suas fazendas Charles Dickens sobre o qual estamos bem in formados quanto à situação financeira recebia por volta de 10 mil li bras anuais em quase todos os anos a partir de 1848 até a década de 1860 quando sua renda anual cresceu atingindo 33 mil libras em 1868 a maior parte vindo do circuito americano de leitura 10 Cento e cin qüenta mil dólares seria uma renda substancial hoje em dia mas por volta de 1870 punha uma pessoa na classe dos muito ricos Por força disso o artista tinha que chegar a um bom termo com o mercado E mesmo aqueles que não chegaram a ficar ricos eram respeitados Dic kens W Thackeray 181163 George Eliot 181980 Tennyson 180992 Victor Hugo 180285 Zola 18401902 Tolstoi Dostoi evsky Turgenev Wagner Verdi Brahms Liszt 181186 Dvorak Tchaikovsky Mark Twain Henrik Ibsen estes são nomes de pessoas que em vida não sentiram falta de sucesso e reconhecimento III E mais do que isso ele e ela neste período muito mais rara mente que na primeira metade do século desfrutava não apenas da possibilidade de conforto material mas especialmente de estima Na sociedade aristocrática e monárquica o artista tinha sido quando mui to um ornamentador ou ornamento da corte ou palazzo uma valiosa peça da propriedade e na pior alternativa alguns daqueles caros for necedores de serviços e artigos de luxo como cabelereiros e costurei ros que a moda demandava Para a sociedade burguesa ele represen tava o gênio que era uma versão nãofinanceira da empresa indivi dual o ideal que complementava e coroava o sucesso material e de forma mais geral os valores espirituais da vida Não há como compreender as artes do final do século XIX sem este sentido da necessidade social delas deverem agir como fornece doras do conteúdo espiritual da mais materialista das civilizações Po 291 derseia até dizer que eles tomavam o lugar das religiões tradicionais entre os cultos e emancipados isto é as classes médias bemsucedidas suplementadas evidentemente pelos espetáculos inspiradores da natu reza quer dizer paisagens Isso era mais evidente entre os povos de língua germânica que tinham passado a considerar a cultura como seu monopólio especial numa época em que os ingleses haviam tomado conta do econômico e os franceses se apossado do político Ali óperas e teatros tornaramse templos onde homens e mulheres cultuavam de votadamente mas nem sempre apreciando de fato as obras do repertório clássico e onde as crianças eram formalmente iniciadas na escola pri mária pelo Guilherme Tell de Schiller para avançar eventualmente den tro dos mistérios adultos do Fausto de Goethe O gênio desagradável de Richard Wagner tinha uma clara compreensão desta função quando construiu sua catedral em Bayreuth 187276 onde os piedosos pere grinos vêm até hoje assistir em religiosa exaltação por longas horas e diversos dias e ainda proibidos das frivolidades do aplauso ao neopa ganismo do mestre alemão Wagner mostrava assim uma clara compre ensão não apenas em perceber a conexão entre sacrifício e exaltação re ligiosa mas também em entender a importância das artes como porta doras da nova religião laica do nacionalismo Pois o que mais exceto os exércitos poderia expressar melhor este conceito ilusório de nação do que os símbolos da arte primitiva como nas bandeiras e hinos e laborada e profunda como naquelas escolas nacionais de música que se tornaram tão intimamente identificadas com as nações de nosso perío do no seu momento de aquisição de uma consciência coletiva inde pendência ou unificação um Verdi no Risorgimento italiano um Dvorak ou Smetana entre os tchecos Nem todos os países empurraram a exaltação religiosa das artes até o ponto que esta atingiu na Europa central e mais especificamente entre as classes médias judias na maior parte da Europa e dos Esta dos Unidos culturalmente alemãs ou germanizadas O que as artes e principalmente a música clássica devem ao patrocínio desta pequena e rica comunidade tão profundamente imbuída de cultura no final de século XIX é incalculável Em geral os capitalistas da primeira ge ração eram filisteus embora suas mulheres se esforçassem o quanto podiam para ter algum interesse em coisas mais elevadas O único milionário americano que tinha uma genuína paixão pelas coisas do espírito ocorria também ser o único livre pensador anticlerical era Andrew Carnegie que não podia esquecer a tradição de seu pai re belde e culto Fora da Alemanha talvez na Áustria havia banqueiros que desejavam ver seus filhos transformados em compositores ou maestros talvez porque não tivessem uma alternativa de vêlos como ministros ou premiers A substituição da religião pela exaltação em relação à natureza e às artes era característica apenas de setores inte lectuais das classes médias como aqueles que iriam formar mais tar de o Bloomsburv inglês homens e mulheres com renda privada pro veniente de heranças raramente envolvidos em negócios 292 Apesar de tudo mesmo nas sociedades burguesas mais filistéias talvez com a exceção dos Estados Unidos as artes ocupavam um lugar especial de respeito e estima Os grandes símbolos coletivos de status do teatro e da ópera cresceram nos centros das capitais o foco do pla nejamento das cidades como em Paris 1860 e Viena 1869 visível em catedrais como em Dresden 1869 invariavelmente gigantescas e monumentalmente elaboradas como em Barcelona a partir de 1862 e Palermo a partir de 1875 Os museus e as galerias públicas de arte surgiram ou foram ampliadas reconstruídas e transformadas como também as grandes bibliotecas nacionais o salão de leitura do Museu Britânico foi construído em 185257 a Bibliothèque Nationale recons truída em 185475 De forma mais geral o número das grandes biblio tecas diferente das universidades multiplicouse de forma fenomenal na Europa e mais modestamente nos Estados Unidos Em 1848 havia cerca de 400 com talvez 17 milhões de volumes na Europa por volta de 1880 havia quase 12 vezes mais com quase o dobro de volumes A Áustria Rússia Itália Bélgica e Holanda multiplicaram o número de suas bibliotecas por 10 a Inglaterra quase a mesma coisa mesmo Es panha e Portugal quase 4 vezes e os Estados Unidos menos de 3 vezes Por outro lado os Estados Unidos quase que quadruplicaram o nú mero de seus livros um fato superado apenas pela Suíça 11 As estantes das casas burguesas encheramse com elaboradas obras encadernadas dos clássicos nacionais e internacionais Os visi tantes de galerias e museus multiplicaramse a exibição da Royal Academy em 1848 atraiu talvez uns 90 mil visitantes mas pelo final da década de 1870 atraía quase 400 mil Por esta época os vernissa ges haviamse tornado moda entre a alta classe um sinal seguro do sta tus social ascendente da pintura assim como as préestréias teatrais londrinas que começavam a competir com as parisienses depois de 1870 em ambos os casos com efeitos desastrosos sobre as artes objetos destes eventos Os turistas burgueses praticamente não podiam evitar aquela peregrinação sem fim aos andares do Louvre Uffizi e San Mar co Os próprios artistas mesmo os duvidosos artistas de teatro e líricos tornaramse respeitados e respeitáveis candidatos adequados para se tornarem sirs ou portadores de outros títulos nobiliárquicos Eles não precisavam nem mesmo se conformar aos ditames dos burgueses nor mais já que as gravatas chapéus e outros elementos da indumentária eram razoavelmente caros Aqui também Richard Wagner mostrou uma impecável percepção do público burguês mesmo seus escândalos tornaramse parte de sua imagem criativa Gladstone no final da dé cada de 1860 foi o primeiro primeiroministro a convidar luminares das artes e da vida intelectual para seus jantares oficiais Mas divertiase realmente com as artes aquele público burguês que as patrocinava e aplaudia A questão é anacrônica É verdade que havia algumas formas de criação artística que mantinham uma relação direta com um público que elas apenas pretendiam entreter Sobretu do havia a música ligeira que talvez sozinha entre as artes teve sua 293 idade de ouro em nosso período A palavra opereta apareceu pela primeira vez em 1856 e a década de 1865 e 1875 iria ver o ponto culminante das realizações de Jacques Offenbach 181980 Johann Strauss 182599 a Valsa do Danúbio Azul data de 1867 Die Fledermaus de 1874 a Cavalaria Ligeira de Suppé 182095 e os sucessos de Gilbert e Sullivan 18361911 18421900 Até que o pe so da arte culta caísse de forma bruta sobre ela a ópera manteve seu rapport com um público que buscava diretamente entretenimento Rigoletto II Trovatore LM Traviata obras posteriores a 1848 e o palco comercial multiplicou seus dramas e farsas intrincadas dos quais apenas o último tipo sobreviveu ao tempo Labiche 181588 Meilhac 183197 Halévy 18341908 Mas tais diversões eram aceitas como culturalmente inferiores como os vários girlshows que Paris havia lançado na década de 1850 com os quais eles tinham muito em comum A construção do Folies Bergère secundou a da Ópera e se deu muito antes da Comédie Française 12 Arte culta de verdade não era uma questão de mero entretenimento ou mesmo algo que pudesse ser isolado como uma apreciação estética A arte pela arte era ainda um fenômeno minoritário mesmo entre os artistas românticos uma reação contra o ardente compromis so político e social da era das revoluções intensificado pelos amargos resultados de 1848 o movimento que havia arrastado tantos espíritos criativos O esteticismo não iria se tornar uma moda burguesa até o fi nal da década de 1870 e 1880 Os artistas criativos eram sábios pro fetas mestres moralistas fontes da verdade O esforço era o preço pago pelos seus rendimentos vindos de uma burguesia pronta a acre ditar que tudo que tinha valor financeiro ou espiritual requeria abs tenção de prazer As artes eram parte deste esforço humano O cultivo das artes coroavao IV Qual era a natureza desta verdade Aqui precisamos destacar a arquitetura das outras artes pois faltavalhe o tema que dava às outras a aparência de unidade De fato a coisa mais característica acerca da arquitetura é o desaparecimento daqueles estilos morais ideológicosestéticos aceitos que tinham sempre deixado sua marca em outras épocas O ecletismo comandava Como Pietro Selvático observou já em 1850 na sua Storia dellArte del Disegno não havia um estilo único de beleza Cada estilo era adaptado a uma função Portanto dos edifícios ao longo da Ringstrasse vienense à igreja o estilo era naturalmente gótico o parlamento grego a prefeitura uma combinação de renascença com gótico a bolsa de valores como mui tas outras oeste período um classicismo opulento os museus e a uni versidade alta renascença o Burgtheater e a Opera o que melhor pode 294 ser descrito como Segundo Império no qual elementos ecléticos da renascença predominavam A necessidade de pompa e esplendor normalmente encontrava a alta renascença e o gótico tardio mais adequados como idioma Bar roco e rococó foram desprezados até o século XX A renascença i dade dos príncipes mercadores era naturalmente o estilo que mais ca ía aos homens que se viam a si mesmos como sucessores destes prín cipes mas outras reminiscências eram também aceitas livremente Por conseguinte os nobres da terra da Silésia que se tornaram milio nários capitalistas graças ao carvão de suas fazendas e seus colegas mais burgueses invadiram toda a história da arquitetura de vários sé culos O Schloss castelo do banqueiro von Eichborn 1857 é clara mente prussianoneoclássico um estilo mais favorecido pelos ricos burgueses do final de nosso período O gótico com sua sugestão con junta de glória do burgo medieval e de fama dos cavaleiros tentava aos mais aristocráticos e afluentes como em Koppitz 1859 e Mie chowitz 1858 A experiência de Paris de Napoleão III na qual mili onários silesianos mais conhecidos como o príncipe Henckel von Donnersmarck deixaram sua marca quando não apenas por seu ca samento com uma das cortesãs mais famosas La Paiva sugeria natu ralmente modelos maiores de esplendor pelo menos aos príncipes de Hohenlohe e Pless A renascença italiana holandesa e alemã do norte forneciam modelos igualmente aceitáveis ao menos grandioso sozi nhas ou combinadas13 Mesmo os motivos menos previsíveis aparece ram Os ricos judeus de nosso período demonstraram uma preferência pelo estilo islâmicomouro para suas sinagogas cada vez mais opulen tas uma afirmação com eco nas novelas de Disraeli da aristocracia oriental que não precisava competir com a ocidental 14 e talvez este seja o único exemplo de um uso deliberado de modelos não ocidentais nas artes da burguesia ocidental até a irrupção da moda japonesa no final da década de 1870 e na de 1880 Em resumo a arquitetura não expressava nenhum tipo de ver dade mas apenas a autoconfiança da sociedade que a construía e es te sentido de imensa e indiscutível fé no destino burguês é que torna expressivos seus melhores exemplos Era uma linguagem de símbolos sociais Daí o deliberado encobrimento do que era realmente novo e interessante nela a magnífica tecnologia e técnicas de engenharia que mostrava sua face em público apenas em raras ocasiões quando o que era para ser simbolizado era o progresso técnico em si mesmo no Crystal Palace de 1851 a Rotunda da exibição de Viena de 1873 mais tarde a Torre Eiffel 1889 De outra forma mesmo o glorioso funcional dos edifícios utilitaristas era disfarçado como nas estações das estradas de ferro alucinadamente ecléticas como a de London Bridge 1862 gótica como a de St Pancras Londres 1868 renas cença com a de Südbahnhof em Viena 186973 Entretanto nume rosas outras importantes estações sobreviveram afortunadamente ao gosto luxuriante da nova era Só as pontes eram gloriosas na beleza 295 de sua engenharia mesmo isso talvez um pouco pesado agora dada à abundância e ao baixo preço do ferro embora este fenômeno curi oso a ponte suspensa gótica Tower Bridge Londres já aparecesse no horizonte E portanto do ponto de vista técnico atrás daquelas fa chadas góticas as coisas mais modernas originais e imaginativas es tavam acontecendo A decoração dos apartamentos Segundo Império em Paris já começava a esconder aquela avançada invenção original e sensacional o elevador ou ascensor para passageiros Talvez a úni ca peça que era uma justificativa tourdeforce da imaginação técnica e à qual os arquitetos raramente resistiam mesmo nos edifícios com fachadas públicas artísticas era a gigantesca cúpula como nos mercados salões de leitura de bibliotecas arcadas de comércio como a Galeria Victor Emmanuel em Milão De outra forma nenhuma era escondeu de forma tão persistente seus próprios méritos A arquitetura não tinha uma verdade própria porque não tinha significado que pudesse ser expresso em palavras As outras artes ti nham porque seu sentido assim permitia Nada é mais surpreendente para as gerações de meados do século XX educadas em dogmas crí ticos bem diferentes que a crença de meados do século XIX na qual a forma da arte não era importante que o conteúdo valia tudo Seria er rado concluir daí a simples subordinação das outras artes à literatura embora se acreditasse que seu conteúdo pudesse ser expresso em pa lavras com vários graus de adequação e embora a literatura fosse de fato a chave artística do período Se cada quadro contava uma histó ria e freqüentemente a música também esse era afinal o tempo ca racterístico das óperas música de bale e suítes descritivas a nota programática estava destinada a ser proeminente Seria mais ver dadeiro dizer que se esperava que cada arte fosse expressiva também em termos de outras que o ideal da obra total de arte o Gesamt kunstwerk do qual Wagner como usualmente fezse o portavoz u nia elas todas Mas as artes em que o sentido podia ser expresso de forma precisa isto é em palavras ou imagens representativas tinham vantagem sobre as outras que não podiam Era mais fácil transformar uma história numa ópera Carmen ou mesmo quadros numa composi ção Quadros de uma Exposição de Mussorgsky do que transformar uma composição musical num quadro ou mesmo em poesia lírica A questão do que se trata era portanto não apenas legítima mas fundamental para qualquer julgamento das artes de meados do século A resposta era geralmente realidade e vida Realismo era o termo que mais comumente vinha aos lábios dos observadores da época e posteriores acerca deste período e sempre quando lidando com a literatura ou as artes visuais Nenhum termo poderia ser mais ambíguo Implicava uma tentativa de descrever representar ou de qualquer modo encontrar um equivalente preciso de fatos imagens idéias sentimentos paixões em caso extremo o exemplo especifi camente musical do Leitmotiv wagneriano cada um deles represen tando uma pessoa situação ou ação ou suas recriações musicais do 296 êxtase sexual Tristan und Isolde 1865 Mas qual é esta realidade assim representada a vida exatamente como a arte deveria ser A burguesia de meados do século estava dividida num dilema que seu triunfo fazia ainda mais agudo A imagem de si mesma a qual aspira va não podia representar toda a realidade na medida em que a reali dade fosse de pobreza exploração e miséria materialismo paixões e aspirações cuja existência ameaçasse uma estabilidade que apesar de toda confiança que a burguesia tinha em si mesma era sentida como sendo precária Havia para citar um adágio do New York Times uma diferença entre as notícias e all the news thats fit to print as notícias adequadas para publicação Por outro lado numa sociedade dinâmica e progressista a realidade era afinal nãoestática Não iria então o rea lismo representar não o presente necessariamente imperfeito mas a si tuação melhor à qual os homens aspiravam e que já estava seguramen te sendo criada A arte tinha uma dimensão futura Wagner como sempre dizia representála Em resumo as imagens do real e do como a vida na arte divergiam cada vez mais dasimagens estilizadas e sentimentalizadas Na melhor das hipóteses a versão burguesa de re alismo era cuidadosamente seleta como o famoso Angelus de JF Millet 181475 no qual a pobreza e o trabalho duro pareciam mais aceitáveis pela piedade obediente dos pobres na pior das hipóteses transformavase no sentimentalismo do retrato de família Nas artes representativas havia três formas de escapar a este di lema Uma era insistir em representar toda a realidade incluindo o desagradável ou o perigoso O realismo transformavase então em naturalismo ou verismo Isso normalmente implicava uma cons ciência social crítica da sociedade burguesa como Courbert na pintu ra Zola e Flaubert na literatura ou mesmo obras que não tinham tal intenção crítica deliberada como a obraprima de Bizet 183875 a ópera das classes baixas Carmen 1875 que eram percebidas pelo público e pela crítica como se fossem políticas A alternativa era a bandonar totalmente qualquer realidade fosse cortando as ligações entre arte e vida ou mais especificamente vida contemporânea arte pela arte ou então pela escolha da abordagem visionária como no Bateau Ivre de 1871 do jovem revolucionário Rimbaud ou ainda a fantasia evasiva dos humoristas como Edward Lear 181288 e Le wis Carroll 183298 na Inglaterra Wilhelm Busch 18321908 na Alemanha Mas na medida em que o artista não se retirasse ou avan çasse para a fantasia deliberada as imagens básicas ainda eram en tendidas como sendo como a vida E neste ponto as artes visuais ti veram um choque traumático profundo a competição da tecnologia através da fotografia A fotografia inventada na década de 1820 e divulgada publica mente na França na década seguinte tornouse um meio para se tra balhar na reprodução em massa da realidade de nosso período e foi rapidamente desenvolvida num negócio comercial na França da déca da de 1850 em grande parte por membros da bohème artística sem sucesso como Nadar 18201911 para quem por exemplo viria a 297 trazer sucesso artístico e financeiro e para todos os outros pequenos empreendedores que entraram num negócio relativamente barato As insaciáveis demandas da burguesia especialmente a pequena burgue sia cheia de aspirações por retratos baratos forneceu a base de seu sucesso A fotografia inglesa permaneceu por muito mais tempo nas mãos de cavalheiros e damas que praticavamna por razões experi mentais ou como hobby Era automaticamente óbvio que ela destruía o monopólio do artista representativo Um crítico conservador obser vou já em 1850 que ela ameaçava seriamente a existência de vários ramos da arte tais como as gravuras litogravura e alguns tipos de re tratos 15 Como poderiam estes competir com a completa reprodução da natureza exceto na cor com um método que transcrevia os pró prios fatos numa imagem direta tudo de forma científica A foto grafia substituía então a arte Os neoclassicistas e os então românti cos reacionários inclinavamse em acreditar que sim e que tal era in desejável J A D Ingres 17801867 viaa com uma invasão impró pria do progresso industrial no domínio da arte Charles Baudelaire 182167 de um ponto de vista bastante diferente pensava o mesmo Qual o homem merecedor do nome de artista que genuíno amante das artes iria confundir a indústria com a arte 16 O papel correto de fotografia para ambos era o de ser uma técnica subordinada e neutra análoga à impressão na literatura Mas curiosamente os realistas que estavam mais diretamente ameaçados por ela não eram uniformemente hostis Aceitavam o pro gresso e a ciência Não era a pintura de Manet como observou Zola como as suas próprias novelas inspiradas pelo método científico de Claude Bernard ver capítulo 16 E portanto mesmo quando de fendiam a fotografia resistiam a identificar como arte a reprodução exata e naturalista que suas teorias pareciam implicar Nem dese nho nem cor nem a exatidão da representação argumentava o críti co naturalista Francis Wey constituem o artista é a mens divina a inspiração divina O que faz o pintor não é a mão mas o cérebro a mão apenas obedece l8 A fotografia era útil porque podia ajudar o pintor a ir além de uma simples e mecânica cópia dos objetos Duvi dosos entre o idealismo e o realismo do mundo burguês os realistas também rejeitavam a fotografia mas com um certo embaraço O debate era passional mas foi resolvido através daquela inven ção característica da sociedade burguesa o direito de propriedade A lei francesa que protegia a propriedade artística especialmente con tra plágios sob a lei da Grande Revolução 1793 deixava os produ tos industriais sujeitos à proteção muito mais vaga do artigo 1382 do Código Civil Todos os fotógrafos argumentavam que os modestos fregueses que compravam seus produtos estavam comprando não a penas imagens baratas e reconhecíveis mas também os valores espiri tuais da arte Simultaneamente os fotógrafos que não conheciam ce lebridades de forma suficientes para tirar seus valiosos retratos não podiam resistir à tentação de piratear cópias o que implicava que as 298 fotografias originais não estavam legalmente protegidas como a arte Os tribunais foram chamados para decidir quando os senhores Mayer e Pierson processavam uma firma rival por piratear as fotografias do conde Cavour e Lord Palmerston No decorrer de 1862 o caso percor reu todos os tribunais até a Corte de Cassação que decidiu que a fo tografia era afinal uma arte já que esta era a única maneira de pro teger efetivamente seu copyright Mas podiam tais eram as comple xidades que a tecnologia introduzia no mundo das artes as leis na sua majestade falar de uma só maneira O que ocorreria quando as demandas de propriedade entrassem em conflito com as da moralida de como aconteceu quando inevitavelmente os fotógrafos descobri ram as possibilidades comerciais do corpo feminino especialmente na forma de fácil divulgação do cartãodevisitas Que estes nus fotográficos de forma feminina em quaisquer posições provocativas aos olhos em sua nudez total eram obsce nos não havia dúvida uma lei assim já os havia declarado em 1850 Mas como seus sucessores do século XX os fotógrafos de garotas de meados do século XIX podiam inutilmente neste período refutar os argumentos da moralidade com os da arte a arte radical do realis mo Tecnologia comércio e a avantgarde formavam uma aliança underground contrapondose à aliança oficial do dinheiro com os va lores espirituais O ponto de vista oficial prevalecia com dificuldade Condenando tal fotógrafo o promotor público também condenava aquela escola de pintura que se chamava realista e suprimia a bele zaque substituía as graciosas ninfas da Grécia e Itália por ninfas de uma raça desconhecida até então tristemente notória nas margens do Sena 20 Este discurso foi registrado em Le Moniteur de la Photo graphie de 1863 o ano do Déjeuner sur 1Herbe de Manet O realismo era portanto ambíguo e contraditório Seus proble mas podiam ser evitados apenas ao preço da trivialização do artista acadêmico que pintava o que era aceitável e vendável deixando as relações entre ciência e imaginação fato e ideal progresso e valores eternos e o resto se arranjarem por si O artista sério fosse crítico da sociedade burguesa ou suficientemente lógico para levála a sério es tava numa posição mais difícil e a década de 1860 iniciaria uma fase de desenvolvimento que se mostrou ser não apenas difícil mas insolú vel Com o realismo programático isto é naturalista de Courbet a história da pintura ocidental complexa mas coerente desde a Renas cença italiana chegava a seu fim O historiador alemão da arte Hilde brand concluiu caracteristicamente seu estudo da pintura do século XIX com Courbet nesta década O que veio depois ou melhor o que já es tava surgindo simultaneamente com os Impressionistas não podia ser ligado tão facilmente ao passado eles antecipavam o futuro O dilema fundamental do realismo era ao mesmo tempo o do conteúdo e da técnica e também as relações entre ambos Na medida em que se discutia o conteúdo o problema não era apenas o de esco lher o comum ao invés do nobre e distinto os tópicos intocados 299 pelos artistas respeitáveis contra os que formavam o centro das acade mias como francamente os artistas políticos de esquerda como o Courbet revolucionário e comunardo estavam inclinados a fazêlo 21 Portanto eram todos os artistas que tomavam a sério o realismo já que precisavam pintar o que os olhos viam que eram coisas ou me lhor impressões aos sentidos e não idéias qualidades ou julgamentos de valores Olympia certamente não era uma Venus idealizada mas nas palavras de Zola sem dúvida algum modelo que Manet copiou tal como era na sua nudez juvenil22 e o que era mais chocante e coava formalmente a famosa Venus de Tiziano Mas fosse ou não fosse uma atitude política o realismo não podia pintar Venus mas apenas garotas nuas assim como não podia pintar a majestade mas apenas pessoas com coroas e esta é a razão por que o Kaulbach da proclamação de Guilherme I como imperador alemão em 1871 tem um efeito consideravelmente inferior aos ikons de David ou Ingres sobre Napoleão I Mas embora o realismo parecesse politicamente radical porque estava mais à vontade com os assuntos populares ele de fato limitava talvez mesmo tornasse impossível a arte comprometida política ou ideologicamente que havia dominado o período anterior a 1848 pois pintura política não existe sem idéias e julgamentos A pintura políti ca mais comum da primeira metade do século foi certamente elimina da da arte séria ou seja a pintura histórica em rápido declínio a partir da metade do século O realismo naturalista de Courbet o republica no democrata e socialista não fornecia a base de uma arte politica mente revolucionária nem mesmo na Rússia onde uma técnica natu ralista estava subordinada a um relato de histórias pelos Percchizhni ki alunos do teórico revolucionário Chernishevski tornandose indis tinguível exceto pelo conteúdo da pintura acadêmica Marcava o fim de uma tradição não o início de uma nova A revolução na arte e a arte da revolução começaram então a di vergir apesar dos esforços dos teóricos e propagandistas como o qua rantehuitard Théophile Thoré 180769 e o radical Emile Zola no sentido de juntálas Os Impressionistas foram importantes não pelos motivos populares que retratavam danças populares visões das ci dades e as cenas das ruas teatros corridas e bordéis da sociedade burguesa mas por suas inovações de método Mas estas eram sim plesmente tentativas de continuar a representação da realidade o que os olhos vêem através de técnicas análogas à fotografia e tomadas emprestadas a ela assim como ao eterno progresso das ciências Isto também implicava o abandono dos códigos convencionais de pintura O que é que os olhos realmente viam quando a luz caía sobre obje tos Certamente não os sinais de código aceitos para um céu azul nu vens brancas e traços de fisionomia Portanto a tentativa de fazer um realismo mais científico inevitavelmente removiao do senso co mum até que as novas técnicas em si tornaramse um código conven cional Como acontece de fato hoje lemos estes códigos sem dificulda 300 des quando admiramos Manet A Renoir 18411919 Degas C Mo net 18401926 ou C Pisarro 18301903 No seu tempo eles eram incompreensíveis um jarro de tinta atirado na cara do público como Ruskin exclamaria sobre James MacNeill Whistler 18341903 Este problema se mostraria temporário mas outros dois aspectos da nova arte iriam ser mais difíceis de se lidar Primeiro trazia a pin tura diante dos inevitáveis limites de seu caráter científico Por e xemplo o Impressionismo logicamente não implicava somente em pinturas mas num filme colorido e de preferência tridimensional ca paz de reproduzir o constante movimento de luz e objetos As séries de quadros de Monet da fachada da catedral de Rouen foram tão lon ge quanto possível nesta direção através de tintas e pincéis mas não muito longe Mas se a busca pela ciência na arte não encontrava uma solução definitiva então tudo o que se havia conseguido tinha sido a destruição de um código de comunicação visual convencional e ge ralmente aceito que não havia sido substituído pela realidade ou nenhum outro código equivalente e em seu lugar encontravase uma multiplicidade de convenções possíveis e iguais Em última análise mas as décadas de 1860 e 1870 estavam ainda longe de chegar a esta conclusão talvez não houvesse meio de escolher entre as visões sub jetivas de nenhum indivíduo e quando este ponto estava para ser des coberto a busca da perfeita objetividade do concreto visual veio a ser transformada no triunfo da perfeita subjetividade O caminho era ten tador pois se a ciência era um dos valores básicos da sociedade bur guesa o individualismo e a competição eram outros Os cânones do treinamento e padrões acadêmicos nas artes estavam algumas vezes inconscientemente substituindo os critérios de perfeição e corre ção pelo novo de originalidade abrindo caminho para a sua pró pria eventual superação Segundo se a arte era análoga à ciência ela partilhava então também a característica do progresso que com algumas qualifica ções igualava novo ou último a superior Isso não levantava maiores dificuldades com a ciência pois qualquer estudante em 1875 entendia evidentemente melhor de física do que Newton ou Faraday Isso não é verdade nas artes Courbet era melhor do que digamos Baron Gros não porque ele tivesse aparecido mais tarde ou fosse um realista mas porque tinha mais talento Além disso a palavra pro gresso em si mesma era ambígua já que podia ser e era aplicada i gualmente a qualquer mudança historicamente observada O pro gresso podia ou não ser um fato mas progressista era uma decla ração de intenção política O revolucionário nas artes poderia ser fa cilmente confundido com o revolucionário na política especialmente por mentes desvairadas como a de P J Proudhon e ambas podiam por sua vez ser confundidas com outra coisa muito diferente moder nidade uma palavra usada pela primeira vez em 1849 Ser contemporâneo neste sentido também tinha implicações de mudança e inovação técnica assim como de motivos Por essa ra 301 zão como Baudelaire observou com acuidade o prazer de representar o presente vem não apenas de sua possível beleza mas também de seu caráter essencial de ser o presente portanto cada presente precisa encontrar sua forma própria de expressão já que nenhum ou tro poderia expressálo adequadamente Isso poderia ou não ser pro gresso na medida de uma melhora objetiva mas era certamente progresso na medida em que os meios de apreensão de todo o pas sado precisavam dar lugar aos meios de apreensão do tempo presente que eram melhores porque eram contemporâneos As artes precisa vam portanto renovarse constantemente E assim fazendo inevita velmente cada sucessão de inovadores iria pelo menos temporari amente perder a massa dos tradicionalistas filisteus aqueles aos quais faltava aquilo que o jovem Rimbaud 185491 que formulou tanto dos elementos deste futuro nas artes chamou a visão Em re sumo começamos a nos encontrar naquele mundo hoje familiar da avantgarde embora o termo ainda não fosse corrente Não é aci dente que a genealogia retrospectiva das artes avantgarde normal mente não nos conduza além do Segundo Império na França para Baudelaire e Flaubert na literatura e para os Impressionistas na pintu ra Historicamente é em grande medida um mito mas sua localização no tempo é importante Marca o colapso da tentativa de produzir uma arte intelectualmente consistente embora constantemente crítica com a sociedade burguesa uma arte assumindo as realidades físicas do mundo capitalista do progresso e da ciência natural da forma que era concebida pelo positivismo V Este colapso afetava mais as camadas marginais do mundo bur guês que seu centro estudantes e jovens intelectuais escritores e ar tistas com aspirações a bohème em geral daqueles que se recusavam embora temporariamente a adotar umaespécie de respeitabilidade burguesa e se misturavam rapidamente aos que eram incapazes de fa zêlo ou cujo tipo de Vida impediaos de fazer Os distritos cada vez mais especializados das grandes cidades onde todos se encontravam o Quartier Latin ou Montmartre tornaramse os centros de tais a vantgardes e jovens rebeldes provincianos como o garoto Rimbaud que lendo avidamente pequenas revistas ou poesia heterodoxa em lu gares como Charleville eram atraídos para tais lugares Eles forneci am para os produtores e consumidores aquilo que iria ser chamado um século depois underground ou contracultura e que não era de forma alguma um mercado negligenciável embora ainda incapaz de dar à avantgarde um meio de vida O desejo crescente da burguesia em acercarse das artes multiplicou os candidatos em abraçálas es tudantes de arte aspirantes a escritores etc O livro Scenes of Bohe mian Life de Henry Murger 1851 produziu uma voga enorme para o 302 que poderia ser chamado o equivalente da sociedade burguesa da fête champeíre do século XVIII o paraíso laico do mundo ocidental e o centro da arte com o qual a Itália não mais podia competir Talvez houvesse na segunda metade do século entre 10 e 20 mil pessoas em Paris denominandose a si mesmos de artistas 23 Embora alguns movimentos revolucionários deste período esti vessem praticamente confinados ao milieu do Quartier Latin por exemplo os blanquistas e embora os anarquistas viessem a identifi car o mero fato de pertencer à contracultura com revolução a avant garde como tal não tinha uma linha política específica ou nenhuma linha de todo Entre os pintores os da extremaesquerda Pisarro e Monet fugiram para Londres em 1870 para evitar tomar parte na guerra francoprussiana enquanto Cézanne no seu refúgio de provín cia francamente não tinha interesse nos pontos de vista políticos de seu maior amigo o novelista radical Zola Manet e Degas burgueses de renda privada e Renoir calmamente foram para a guerra e evita ram a Comuna de Paris Courbet tomou uma parte demasiado pública nela Uma paixão por gravuras japonesas um dos subprodutos mais significativos da abertura do mundo ao capitalismo unia os Impres sionistas o feroz republicano Clemenceau prefeito de Montmartre sob a Comuna e os irmãos Goncourt que eram histericamente anti comunardos Eles estavam unidos como os Românticos de antes de 1848 apenas por um desagrado comum em relação à burguesia e seus regimes políticos naquela altura o Segundo Império o reino da mediocridade da hipocrisia e do lucro Até 1848 estes Quartiers Latins espirituais da sociedade burgue sa tinham esperança em uma revolução republicana ou social e tal vez até com todo o ódio possível uma certa admiração relutante pelo dinamismo dos mais ativos robber barons do capitalismo que faziam seu caminho através das barreiras da tradicional sociedade aristocráti ca A Educação Sentimental 1869 de Flaubert é a história daquela esperança nos corações dos jovens da década de 1840 e de seu duplo desapontamento pela própria revolução de 1848 e pela era subseqüen te na qual a burguesia triunfou a preço de abandonar até mesmo os ideais de sua própria revolução Liberdade Igualdade e Fraternida de Em certo sentido o romantismo de 183048 era a principal vítima desta desilusão Seu realismo visionário transformouse em realismo científico ou positivo mantendo talvez desenvolvendo o ele mento de criticismo social ou pelo menos de escândalo mas perdendo a visão Este processo por seu turno ocasionou a arte pela arte ou as preocupações com as formalidades da linguagem estilo e técnica Todos têm inspiração o velho poeta Gautier 181172 disse a um jovem Todo burguês é movido pela aurora e pelo pôrdosol O poe ta tem a habilidade de um artesão24 Quando uma nova forma de arte visionária viria surgir no meio da geração que havia vivido a infância em 1848 ou mesmo não era ainda nascida Arthur Rimbaud escreveu sua obra principal em 187173 Isidore Ducasse o conde de Lautré 303 amont 184670 publicou seus Chantsde Maldororem 1869 ela se ria esotérica irracionalista e fossem quais fossem as intenções de seus criadores apolítica Como o colapso do sonho de 1848 e a vitória da realidade da França do Segundo Império da Alemanha de Bismarck da Inglaterra Palmerstoniana e Gladstoniana e da Itália de Vittorio Emmanuel as artes ocidentais burguesas a começar pela pintura e poesia bifurca ramse naquelas com apelo ao público de massa e naquelas outras di rigidas apenas a uma minoria bem definida Elas não eram tão margi nais em relação à sociedade burguesa quanto pode fazer crer a histó ria mitológica da avantgarde mas no todo é inegável que os pintores e poetas que chegaram à maturidade entre 1848 e o final de nosso pe ríodo e que até hoje admiramos tinham um apelo indiferente ao mer cado de sua época e quando eram famosos o eram por causar escân dalos Courbet e os Impressionistas Baudelaire e Rimbaud os pré rafaelitas A C Swinburne 18371909 Dante Gabriel Rossetti 1828 82 Mas este não é exatamente o caso em relação a todas as artes nem mesmo a todas as que dependiam inteiramente do patrocínio burguês com a exceção do drama falado do período Isto é talvez devido ao fato de que as dificuldades que cercavam o realismo nas artes visuais e ram mais fáceis de serem enfrentadas em algumas outras VI A música praticamente não era afetada já que nenhum realismo representativo é de fato possível naquela arte e qualquer tentativa de introduzir realismo ali precisava ser necessariamente metafórica ou dependente de palavras ou drama A não ser no caso da fusão wagne riana da Gesamtkunstwerk a arte total de suas obras ou na modesta canção o realismo na música significava a representação de emoções identificáveis incluindo como no Tristan de Wagner 1865 as conhecidas emoções do sexo Mais comumente como nas florescen tes escolas nacionais de compositores Smetana e Dvorak na Bohe mia Tchaikovsky Rinsky Korsakov 18441908 Mussorgsky etc na Rússia E Grieg 18431907 na Noruega e evidentemente os ale mães mas não os austríacos elas eram as emoções do nacionalis mo para o qual existiam símbolos convenientes na forma de motivos oriundos da música folclórica etc Mas como já foi sugerido a músi ca séria floresceu não tanto porque sugeria o mundo real mas porque sugeria as coisas dos espírito e portanto fornecia entre outras coisas uma substituição para a rebelião como sempre fornecera um podero so adjunto a ela Se pretendia ser tocada precisava exercer alguma forma de apelo aos patrões ou ao mercado Nesta medida a música podia oporse ao mundo burguês apenas de dentro o que era uma ta refa fácil já que os Próprios burgueses não percebiam direito quando 304 estavam sendo criticados eles poderiam até sentir que suas próprias aspirações e a glória de sua cultura estavam ali sendo expressas Por tanto a música floresceu em um idioma mais ou menos tradicional mente romântico Seu maior militante vanguardista Richard Wagner também era sua figura pública mais célebre já que foi bem sucedido em convencer graças à patronagem do rei louco Ludwig da Baviera as autoridades culturais financeiramente em melhor situação assim como os membros burgueses de seu público que eles mesmos perten ciam àquela elite espiritual bem superior às massas filistéias e que só eles merecem a arte do futuro A literatura de prosa e especialmente a arte formal característi ca da era burguesa a novela floresceu exatamente pela razão oposta As palavras podiam diferentemente das notas musicais representar a vida real assim como idéias e diferentemente das artes visuais a técnica literária não reclamava para si a capacidade de imitála O realismo na novela não colocava portanto contradições imediatas e insolúveis tais como a fotografia introduziu em relação à pintura Al gumas novelas podiam pretender uma verdade rigorosamente docu mentária mais do que outras algumas poderiam desejar estender seus assuntos e campos vistos como impróprios ou inadequados para rece ber a atenção pública ambos ocorriam em relação aos naturalistas franceses mas quem poderia negar que mesmo os mais subjetivos es creviam histórias sobre o mundo presente e mesmo sobre a sociedade da época Não há nenhum novelista deste período cuja obra não possa ser transformada em novela de televisão Daí a popularidade e a flexi bilidade da novela como um genre e suas realizações extraordinárias Com algumas poucas exceções Wagner na música alguns pintores franceses e talvez alguma poesia as maiores realizações de nossa épo ca foram novelas russas inglesas francesas talvez mesmo se inclu irmos Moby Dick de Hermann Melville americanas E com a exceção de Melville as maiores novelas dos grandes novelistas receberam reco nhecimento imediato e às vezes até mesmo foram compreendidas O grande potencial da novela residia na sua amplitude os temas mais vastos e ambiciosos estavam dentro do campo de alcance do ro mancista Guerra e Paz 1869 tentou a Tolstoi Crime e Cativo 1866 a Dostoievsky Pais e Filhos 1862 a Turgenev A novela ten tava apreender a realidade de uma sociedade inteira embora fato bas tante curioso as tentativas deliberadas de fazêlo em nosso período através de seriados em conexão segundo o modelo de Scott ou Bal zac não atraíssem os grandes talentos mesmo Zola somente veio dar início ao seu gigantesco retrato retrospectivo do Segundo Império a série dos RougonMacquart em 1871 PerezGaldós 18431920 seus Episódios Nacionales em 1873 Gustav Freytag 181695 num nível mais baixo seu Die Ahnen Os Ancestrais em 1872 O suces so destes esforços titânicos variavam fora da Rússia onde eram quase que uniformemente bemsucedidos portanto nenhuma era que possui os talentos de um Dickens maduro Flaubert George Eliot Thacke 305 ray e Gottfríed Keller 181990 precisa temer qualquer competição Mas o que era característico da novela e tornoua a forma de arte típi ca de nosso período era que seus esforços mais ambiciosos foram ob tidos não através do mito e da técnica como o Anel de Wagner mas através da descrição simples da vida cotidiana Não atacava de assalto os paraísos da criação mas caminhava inexoravelmente em direção a ela Por esta razão permitiase quase sem nada a perder ser traduzi da Pelo menos um grande novelista de nosso período tornouse uma figura de projeção internacional Charles Dickens Entretanto seria injusto confinar a discussão das artes na era do triunfo burguês aos mestres e às obrasprimas especialmente aquelas confinadas a um público minoritário Este era como já vimos um pe ríodo da arte para as massas através da tecnologia da reprodução que tornava a multiplicação ilimitada das imagens um fato possível o ca samento entre tecnologia e comunicações que produziu o jornal de massa e o periódico especialmente a revista ilustrada e a educação de massa que fez a todos capazes de se transformarem num público As obras de arte da época que eram de fato bastantes conhecidas quer dizer conhecidas fora da minoria culta eram com raras ex ceções aquelas das quais Charles Dickens é talvez a figura mais im portante Mas Dickens escreveu como jornalista suas novelas eram publicadas em capítulos e portouse como um ator conhecido de muitos milhares graças a suas leituras de palco focalizando cenas dra máticas de seus livros A literatura que vendia mais amplamente era o jornal popular que atingia circulações sem precedentes de 250 mil ou mesmo meio milhão de exemplares na Inglaterra e nos Estados Unidos A pinturas que iriamse encontrar nas paredes dos trens do Oeste americano ou nas casas de campo na Europa eram gravuras tais como o Monarch of the Glen de Landseer ou seu equivalente nacio nal ou então retratos de Lincoln Garibaldi ou Gladstone As compo sições que entravam na consciência popular eram as árias de Verdi in terpretadas pelos organistas populares italianos ou aqueles pequenos excertos de Wagner que podiam ser adaptados à música para casa mentos mas não as próprias óperas Mas isso em si mesmo implicava uma revolução cultural Com o triunfo da cidade e da indústria uma divisão cada vez maior se inter punha entre de um lado os setores modernos das massas quer dizer os urbanizados os instruídos aqueles que aceitavam o conteúdo da cultura hegemônica a da sociedade burguesa e de outro lado os setores tradicionais cada vez mais minados Divisão mais e mais aguda porque a herança do passado rural se tornava de forma cada vez maior irrelevante para o tipo de vida da classe operária urbana nas décadas de 1860 e 1870 os operários industriais da Bohemia para ram de se expressar através de canções folclóricas e passaram para a canção do musichall e baladas que falavam de uma vida que tinha pouco ou nada em comum com a de seus pais Este era o vazio que os 306 ancestrais da música popular e do showbusiness começaram a preen cher para aqueles que tinham ambições culturais modestas Na Ingla terra a era na qual os musichalls multiplicaramse nas cidades tam bém foi a era na qual sociedades corais e bandas de música operária com um repertório de clássicos populares da alta cultura multiplica ramse nas comunidades industriais Mas é característico que nestas décadas o curso da cultura corresse em uma só direção da classe média para baixo pelo menos na Europa Mesmo aquilo que iria se transformar na mais característica forma da cultura proletária os es portes de massa em nosso período era determinado como por e xemplo na Association Football pelos jovens da classe média que fundaram os clubes e organizavam as competições Só no final da dé cada de 1870 e início da de 1880 iriam estes esportes ser capturados e seguros pela classe operária Mas mesmo as formas de cultura rural mais tradicionais estavam minadas nem tanto pelas migrações mas sobretudo pela educação A partir do momento em que a educação primária tornouse accessível às massas a cultura tradicional inevitavelmente cessou de ser basica mente oral e face a face e dividiuse em uma cultura superior ou do minante para os instruídos e outra inferior ou dominada para os anal fabetos A educação e a burocracia nacional transformaram mesmo as vilas em uma assembléia esquizofrênica de indivíduos divididos en tre os apelidos através dos quais eles eram conhecidos de seus vizi nhos Paquito e os nomes oficiais da escola e do estado através dos quais eles eram conhecidos pela autoridade Francisco Gonzales Lo pez As gerações tornaramse de fato bilíngües As numerosas ten tativas de salvar a velha linguagem para a literatura sob a forma de uma literatura de dialeto diziam respeito mais a uma nostalgia ro mântica de classe média populismo ou naturalismo A maior exce ção era o contraataque populistademocrático na alta cultura nesta altura estrangeira pelos escritores humoristas e jornalistas do sul e oeste dos Estados Unidos que sistematicamente usavam a linguagem falada como base dentre estes o maior monumento é o Huckleberry Finn de Mark Twain 1884 Pelos nossos padrões este declínio ainda era modesto Mas era significativo pois durante estes anos ainda não era visivelmente com pensado pelo desenvolvimento do que se poderia chamar de uma con tracultura urbana ou proletária No campo nunca iria haver um tal fe nômeno A hegemonia da cultura oficial inevitavelmente identifica da com a classe média triunfante era dominante em relação às massas subalternas E neste período pouco poderia mitigar tal sujeição 307 DécimoSexto Capítulo CONCLUSÃO Façase o que quiser o destino tem sempre a última palavra nas questões humanas Há uma tirania real para todos Segundo os prin cípios do Progresso o destino já devia ter sido abolido há muito tempo atrás Johann Nestroy autor teatral cômico vienense 1850 1 A era do triunfo liberal começou com uma revolução derrotada e terminou numa depressão prolongada A primeira é um sinal divisó rio mais conveniente para marcar o início ou o fim de um período his tórico do que a segunda mas a história não consulta a conveniência dos historiadores embora alguns dentre eles não estejam prevenidos a respeito deste ponto As exigências de construção dramáticas talvez sugiram a conclusão deste livro com um acontecimento adequada mente espetacular a proclamação da Unidade Alemã e a Comuna de Paris em 1871 ou mesmo a grande queda da bolsa de 1873 mas as necessidades da construção dramática e as da realidade freqüente mente não são as mesmas O caminho termina não com a visão de um ponto culminante ou de uma catarata mas sobre a paisagem menos facilmente identificável de um sistema fluvial um tempo qualquer entre 1871 e 1879 Se precisamos definir uma data escolhamos uma que simbolize a metade da década de 1870 sem associála a ne nhum evento formidável que a sobrecarregue desnecessariamente di gamos 1875 A nova era que iria se seguir à era do triunfo liberal seria bastan te diferente Economicamente iria se desligar rapidamente da compe tição sem barreiras das empresas privadas da abstenção governamen tal em relação a interferências e daquilo que os alemães chamavam Manchesterismus a ortodoxia do livre comércio da Inglaterra vitori ana para passar às grandes corporações industriais cartéis trustes monopólios grande intervenção governamental e às mais diferentes ortodoxias de política econômica mas não necessariamente de teoria econômica A era do individualismo encerrase em 1870 lamentada pelo advogado inglês A V Dicey e a idade do coletivismo come çava e embora a maior parte do que ele sombriamente apontava co mo os avanços do coletivismo nos pareça hoje insignificante em certo sentido ele tinha razão 308 A economia capitalista mudou de quatro formas significativas Em primeiro lugar entramos agora numa nova era tecnológica não mais determinada pelas invenções e métodos da primeira Revolução Industrial uma era de novas fontes de poder eletricidade e petróleo turbinas e motor a explosão de nova maquinaria baseada em novos materiais ferro ligas metais nãoferrosos de indústrias baseadas em novas ciências tais como a indústria em expansão da química or gânica Em segundo lugar entramos também agora cada vez mais na economia de mercado de consumo doméstico iniciada nos Estados Unidos desenvolvida na Europa ainda modestamente pela crescente renda das massas mas sobretudo pelo substancial aumento demográ fico dos países desenvolvidos De 1870 a 1910 a população da Euro pa cresceu de 290 para 435 milhões a dos Estados Unidos de 385 pa ra 92 milhões Em outras palavras entramos no período da produção de massa incluindo alguns bens de consumo duráveis Em terceiro lugar e de certa forma este foi o desenvolvimento mais decisivo uma reviravolta paradoxal teve lugar A era do triun fo liberal tinha sido aquela era de facto do monopólio industrial in glês dentro do qual com algumas notáveis exceções os lucros eram assegurados sem muita dificuldade pela competição de pequenas e médias empresas A era pósliberal caracterizavase por uma compe tição internacional entre economias industriais nacionais rivais a in glesa a alemã a norteamericana uma competição acirrada pelas di ficuldades que as firmas dentro de cada uma destas economias en frentavam no período de depressões para fazer lucros adequados A competição levava portanto à concentração econômica controle de mercado e manipulação Para citar um excelente historiador O crescimento econômico era agora também luta econômica lu ta que servia para separar os fortes dos fracos desencorajar uns e estimular outros favorecer as novas nações famintas às expensas das velhas O otimismo acerca de um futuro de progresso infinito dava lugar à incerteza e um sentimento de agonia no sentido tra dicional da palavra Tudo isto fortalecia e por seu turno era forta lecido pelas crescentes rivalidades políticas as duas formas de competição fundindose naquele surto final de fome por terri tórios e na caça por esferas de influência que tem sido chamada de Novo Imperialismo 2 O mundo entrou no período do imperialismo no sentido maior da palavra que inclui as mudanças na estrutura da organização eco nômica como por exemplo o capitalismo monopolista mas tam bém em seu sentido menor uma nova integração dos países subde senvolvidos enquanto dependências em uma economia mundial do minada pelos países desenvolvidos Além da rivalidade que levou as potências a dividir o globo entre reservas formais ou informais pa ra seus próprios negócios entre mercados e exportações de capital tal processo também era devido à crescente nãodisponibilidade de 309 matériasprimas na maioria dos próprios países desenvolvidos por razões geológicas ou climáticas As novas indústrias tecnológicas demandavam tais matérias petróleo borracha metais nãoferrosos Pelo final do século a Malásia era conhecida como produtora de esta nho a Rússia Índia e Chile por seu manganês a Nova Caledônia pelo níquel A nova economia de consumo demandava quantidades cres centes não apenas de matérias produzidas nos países desenvolvidos por exemplo cereais e carne mas também daquelas que não podia produzir por exemplo bebidas e frutas tropicais e subtropicais e ó leo vegetal para sabão A banana republic tornouse parte da eco nomia capitalista da mesma forma que a colônia produtora de esta nho borracha ou cacau Numa escala global esta dicotomia entre áreas desenvolvidas e subdesenvolvidas teoricamente complementares embora não nova em si mesma começou a tomar uma forma reconhecidamente moder na O desenvolvimento da nova forma de desenvolvimentodependên cia iria continuar com apenas breves interrupções até a queda geral na década de 1930 e forma a quarta grande mudança na economia mun dial Politicamente o final da era liberal significa literalmente o que as palavras querem dizer Na Inglaterra os LiberaisWhig no sentido amplo de que não era ConservadoresTory tinham permanecido com o poder com duas breves exceções através de todo o período entre 1848 e 1874 Nos últimos 25 anos do século eles iriam ficar no poder por apenas 8 anos Na Alemanha e na Áustria os liberais cessaram na década de 1870 de ser a base parlamentar principal dos governos até onde estes governos realmente precisavam de uma base parlamentar Eles estavam minados não apenas pela derrota de sua ideologia de mercado livre e por governos relativamente inativos mas também pe la democratização da política eleitoral ver capítulo 6 que destruiu a ilusão de que seu programa representava a vontade das massas Por um lado a depressão contava a favor da pressão protecionista de al gumas indústrias e dos interesses nacionais agrários A tendência em relação à liberdade de comércio foi revertida na Rússia e na Áustria em 187475 na Espanha em 1877 na Alemanha em 1879 e pratica mente em todos os lugares exceto na Inglaterra e mesmo ali o livre comércio estava sob pressão a partir da década de 1880 Por outro la do as demandas vindas de baixo por proteção contra os capitalistas por segurança social por medidas públicas contra o desemprego e um salário mínimo por parte dos trabalhadores tornaramse audíveis e po liticamente eficazes As classes melhores fosse a antiga nobreza hierárquica ou a nova burguesia não podiam mais falar pelas ordens subalternas ou o que é mais importante confiar no seu apoio não compensado Um novo estado cada vez mais forte e intervencionista e dentro dele um novo tipo de política desenvolveramse a partir de então re cebidos com melancolia pelos pensadores antidemocráticos A ver 310 são moderna dos Direitos do Homem pensava o historiador Jacob Burckhardt em 1870 inclui o direito ao trabalho e à subsistência Pois os homens não desejam mais deixar os assuntos mais vitais para a sociedade porque eles querem o impossível e imaginam que tal só pode vir a ser obtido com garantia sob compulsão do estado 3 O que os perturbava não era a utópica demanda como consideravam por parte dos pobres para viver decentemente mas a capacidade dos po bres de impor tais demandas As massas querem sua paz e sua paga Se elas o conseguirem através de uma república ou de uma monar quia apoiarão qualquer uma delas Se não sem muito barulho irão apoiar a primeira constituição que lhes prometer o que querem 4 E o estado não mais controlado pela autonomia moral e pela legitimidade que a tradição lhe atribuía na crença de que as leis da economia não podiam ser quebradas iria se tornar na prática um Leviathan cada vez mais poderoso embora em teoria um instrumento para atingir os ob jetivos das massas Pelos padrões modernos o crescimento do papel e das funções do Estado permaneceu bem modesto embora seus gastos isto é suas atividades tenham crescido per capita em praticamente todo o mundo durante nosso período muito como resultado do violento aumento da dívida pública exceto naqueles bastiões do liberalismo da paz e da empresa privada nãosubsidiada Inglaterra Holanda Bélgica e Dina marca Este aumento nos gastos públicos era muito mais marcado nos países em desenvolvimento que estavam no processo de constru ção da infraestrutura de suas economias os Estados Unidos Cana dá Austrália e Argentina através da importação de capital Mesmo assim os gastos sociais com a exceção talvez da educação permane ceram bem negligenciáveis Por outro lado três novas tendências e mergiam na política das tensões confusas da nova era de depressão econômica que em quase todos os lugares tornouse uma era de agi tação social e descontentamento A primeira tendência e quase que aparentemente nova era a emergência de partidos e movimentos de classe operária geralmente com uma orientação socialista isto é cada vez mais marxista dos quais o Partido SocialDemocrata Alemão era o pioneiro ê o exemplo mais expressivo Embora os governos e as classes médias da época olhassem para eles como muito perigosos na realidade eles partilha vam os valores e princípios do iluminismo racionalista sobre o qual o liberalismo se apoiava A segunda tendência não partilhava desta he rança e aliás opunhase decididamente a ela Partidos demagógicos antiliberais e antisocialistas surgiram nas décadas de 1880 e 1890 tanto da sombra de suas antigas raízes liberais como os nacionalis tas alemães pangermânicos e antisemitas que se tornaram os ances trais do hitlerismo como sob a proteção das igrejas até então politi camente inativas como o movimento socialcristão na Áustria Por várias razões entre as quais a posição ultrareacionária do Vaticano sob Pio IX 184678 talvez seja a mais importante a Igreja Católica 311 perdeu a chance de utilizar seu enorme potencial em política de massa de forma efetiva exceto em alguns poucos países ocidentais nos quais era uma minoria obrigada a se organizar como um grupo de pressão como o Partido de Centro na Alemanha da década de Í870 A terceira tendência era a emancipação dos partidos e movi mentos nacionalistas de massa de sua antiga identificação ideológica com o radicalismo liberal Alguns movimentos pela autonomia nacio nal ou independência tendiam a passar pelo menos teoricamente pa ra o lado do socialismo especialmente nos casos em que a classe ope rária tinha um papel importante em seus respectivos países mas era um socialismo mais nacional do que internacional como entre os chama dos Socialistas do Povo Tcheco ou então o Partido Socialista Polonês e o elemento nacional tendia a prevalecer sobre o socialista Outros se dirigiam para uma ideologia baseada no sangue solo língua o que pu desse enfim ser considerado uma tradição étnica e nada mais Tal processo não iria abalar o tipo básico de política dos estados desenvolvidos que haviam surgido na década de 1860 uma tendência mais ou menos gradual e relutante em direção a um constitucionalis mo democrático Mesmo assim o surgimento da política de massa nãoliberal ainda que teoricamente aceitável assustava governos Antes de aprenderem a manejar o novo sistema eles tendiam sobre tudo durante a Grande Depressão algumas vezes a cair em pânico ou coerção A Terceira República não iria readmitir os sobreviventes do massacre dos comunardos na política novamente antes do início da década de 1880 Bismarck que sabia como manejar os liberais bur gueses mas não sabia lidar nem com um partido socialista de massa nem com um partido católico de massa pôs os socialdemocratas na ilegalidade em 1879 Gladstone escorregou para a coerção na Irlanda Entretanto isso iria se constituir mais em uma fase temporária do que em uma tendência permanente A estrutura da política burguesa onde existia não seria encurralada no seu pontolimite até bem para dentro do século XX Embora nosso período deságüe nos momentos perturbados da Grande Depressão seria errôneo pintar um quadro muito carregado nas cores Diferente de 1930 as dificuldades econômicas eram tão complexas que os historiadores têm mesmo duvidado se o termo de pressão é justificado como uma descrição dos 20 anos que se segui ram após o final deste volume Eles estão errados mas suas dúvidas são suficientes para nos alertar em relação a um tratamento excessi vamente dramático Nem do ponto de vista econômico nem do políti co a estrutura do mundo capitalista de meados do século entrou em colapso Entrou numa nova fase mas mesmo sob a forma de um libe ralismo político e econômico vagarosamente modificado tinha toda via um campo bastante amplo para agir Seria diferente nos países pobres atrasados subdesenvolvidos e dominados ou então aqueles situados como a Rússia simultaneamente no mundo dos vitoriosos e das vítimas Ali a Grande Depressão iria abrir uma era de revolução 312 iminente Mas para a primeira ou as duas primeiras gerações posterio res a 1875 o mundo da burguesia triunfante parecia permanecer bas tante solido Talvez tivesse um pouco menos de autoconfiança do que antes e suas afirmações sobre esta confiança talvez um pouco menos seguras talvez um pouco mais preocupada a respeito de seu próprio futuro Talvez tenha ficado um pouco mais perturbada pela débâcle de suas antigas certezas intelectuais que especialmente depois da década de 1880 pensadores artistas e cientistas sublinhavam com suas novas incursões dentro dos novos e perturbadores territórios da mente Mas o progresso continuava indubitavelmente sob a forma de sociedades burgueses capitalistas e num sentido geral liberais A Grande Depressão era apenas um interlúdio Não havia afinal cres cimento econômico avanço científico e técnico melhorias e paz Não iria o século XX ser uma versão mais gloriosa e bemsucedida do século XIX Nós sabemos que não iria ser 184750 187680 população em milhões força a vapor 000 HP n umero de cidades acima de 50 mil população em milhões força a vapor 000 HP número de cidades acima de 50 mil Toscana 15 20 2 166 470 71 3 ou e stados centrou 01 a 05 8 41 25 Espanha 123 0 4 49 310 125 Portugal 37 0 1 39 110 266 Suécia incluindo Noruega 35 0 5 58 130 295 Dinamarca 14 10 7 23 610 355 Holanda 30 70 7 230 461 Bélgica 43 0 1 28 1877 Suiça 24 0 1 0 423 Império Otomano 10 aprox 0 0 14 0 0 07 Grécia 05 aprox 0 50 Sérbia 232 1680 7 502 9110 477 România 7 Estados Unidos Partes do núcleo Austríaco contadas na Confederação Germânica até 1866 Guimar os ou reduções significativas de território ou população entre 184776 Apenas o território europeu 318 empty Tabela 2 I Densidade da rede ferroviária 1880 km por mil país mais de 1000 Bélgica mais de 750 Reino Unido mais de 500 Suíça Alemanha Holanda 250499 França Dinamarca ÁustriaHungria Itália 100249 Suécia Espanha Portugal Romênia EUA Cuba 5099 Turquia Chile Nova Zelândia Trinidad Victória Java 1049 Noruega Finlândia Rússia Canadá Uruguai Argentina Costa Rica Jamaica Índia Ceilão Tasmânia Gales do Sul Austrália do Sul Colônia do Cabo Argélia Egito Tunísia II Estradas de ferro e navios a vapor 183076 km de estradas de ferro toneladas de navios a vapor 1831 332 32000 1841 8591 105121 1846 17424 139973 1851 38022 263679 1856 68148 575928 1861 106886 803003 1866 145114 1423232 1871 235375 1939089 1876 309641 3293072 F X von Neumann Spallart Übersichten der Weltwirtschaft Stuttgart 1880 pp 335 ff III Tráfego marítimo mundial Distribuição geográfica da tonelagem 1879 Área Tonelagem total Europa Mar Ártico 61 Mar do Norte 5536 Báltico 1275 Atlântico incluindo o Mar da Irlanda e o Passo de Calais 4553 Mediterrâneo Ocidental 1356 Mediterrâneo Oriental incluindo o Adriático 604 Mar Negro 188 Resto do mundo América do Norte 3783 América do Sul 138 Ásia 700 Austrália e Pacífico 359 A N Kiaer Statistique Internationale de la Navigation Maritime Christiania 1880 1881 319 Tabela 3 Produção mundial de ouro e prata 183075 000 Kilos ouro prata 183140 203 5964 184150 548 7804 185155 1975 8861 185160 2061 9050 186165 1982 11011 186670 1919 13391 187175 1707 19694 NeumannSpallart op cit 1880 p 250 Tabela 4 Agricultura Mundial 184087 Valor da produção em libras Número da força empregada 000 1840 1887 1840 1887 Inglaterra 218 251 3400 2460 França 269 460 6950 6450 Alemanha 170 424 6400 8120 Rússia 248 563 15000 22700 Áustria 205 331 7500 10680 Itália 114 204 3600 5390 Espanha 102 173 2000 2720 Portugal 18 31 700 870 Suécia 16 49 550 850 Noruega 8 17 250 380 Dinamarca 16 35 280 420 Holanda 20 39 600 840 Bélgica 30 55 900 980 Suíça 12 19 300 440 Turquia etc 98 194 2000 2900 Europa 1544 2845 50430 66320 Estados Unidos 184 776 2550 9000 Canadá 12 56 300 800 Austrália 6 62 100 630 Argentina 5 42 200 600 Uruguai 1 10 50 100 M Mulhall A dictionary of Statistics London 1892 p 11 320 O Mundo em 1847 JAPÃO FILIPINAS E SPANHOLAS ORIENTAIS HOLANDESAS INDIA Reinos da Índia de habiatantes CEILAO de habitantes IMPERIO RUSSO IMPERIO CHINES IMPERIO PERSA OTOMANO REINO UNIDO FRANCA PRUSSIA HABSBURGO SUICA ESPANHA IMPERIO OTOMANO CANADA ESPANHOLA MEXICO Cuba Espanhola milhares de habitantes milhares de habitantes milhares de habitantes milhares de habitantes milhares de habitantes milhares de habitantes milhares de habitantes milhares de habitantes 0 1000 2000 3000 4000 5000 Regiões Portuguesas Países com mais de 10 milhões de habitantes Uniao Alfandegaria Alental 1854 O Mundo por volta de 1880 CELILAO da de habitantes 40 milhões INDIAS ORIENTAIS 40 milhões da habitantes 70 milhões da habitantes HILIPINAS ESPANHOLA 54 milhões CHINA 400 milhões Rússia ESTADO LIVRE DE ORANGE OTOMANO TURQUIA 1847 Escravidão e Servidão no Mundo Ocidental Escravidão em 1847 Servidão em 1847 Trabalho assalariado e servidão 0 1000 2000 3000 4000 5000 milhares 25 MÁQUINAS A VAPOR 20 15 10 5 0 1850 1880 Resto do Mundo EUA Europa 1880 Escravidão e Servidão no Mundo Ocidental MILHAS DE ESTRADAS DE FERRO POR CONTINENTE Resto do Mundo 100 50 Á frica América América do Norte Ásia Europa Estradas de ferro em 1850 Estradas de ferro em 1880 milhares de milhas Escravidão em 1880 Servidão em 1880 Áreas de trabalho assalariado 1000 2000 3000 4000 5000 milhas PERU CUBA GUANA TRINIDAD NATAL MAURITIUS CANOVA CALDERNO F I J I PORÇÃO RELATIVA DE EMIGRANTES EUROPEUS Cultura Ocidental em 18471875 Opera 323 Notas Introdução 1 Ver J Dubois Le vocabulaire politique et social en France de 1869 à 1872 Paris 1963 2 D A Wells Recent Economic Changes Nova York 1889 p1 CAPÍTULO I 1 P Goldammer ed 1848 Augenzeugen der Revolution Berlim Ocidental 1973 p 58 2 Goldammer op cit p 666 3 K Repgen Marzbewegung und Maiwahlen des Revolutionsjahres 1848 in Rheinland Bonn 1955 p 118 4 Rinascità II 1848 Raccolta di Saggi e Testimonianze Roma 1948 5 RHoppe J Kuczynski EineAnalyse der Mãrzgefallenen 1848 in Berlin Jahrbuch für Wirtschaftsgeschichte 1964 IV pp 200 76 D Cantimori in F Fejtõ ed 1848 Opening of an Era 1948 6 Roger Ikof Insurrection ouvrière de juin 1848 Paris 1936 7 Karl Marx FrEflgelsAddress to the Communist League março de 1850 Werke VII p 247 8 Paul Gerbod La condition univèrsitaire en France au I9e siècle Paris 1965 9 Karl Marx Class Struggles in France 18481850 Werke VII pp 301 10 Franz Grillparzer Werke Munique 1960 I p 137 11 Marx Class Struggles in France Werke VII p 44 CAPITULO 2 1 Citado em Ideas and Beliefs of the Victorians Londres 1949 p 51 2 Devo esta referência ao prof Sanford Elwitt 3 Philoponos The Great Exhibition of1851 or the Weallh of lhe World in its Workshops Londres 1850 p 120 4 T Ellison The Cotton Trade ofGreal Britain Londres 1866 pp 63 e 66 5 Horst Thieme Statistische Materialien zur Konzessionierung der Aktienge sellschaften in Preussen bis 1867 Jahrbuch für Wirtschaftsgeschichte II 1960 p 285 6 J Bouvíer F Furet M Gilet L Mouvement du profil en France au 19e siècle Hague 1955 p 444 7 Engels a Marx 5 de novembro de 1857 Werke XXIX p 211 8 Marx a Danielson 10 de abril de 1879 Werke XXXIV pp 3705 9 F S Turner British Opium Policy and its Resulls to Índia and China Lon dres 1876 p 305 10 F Zunkel Industriebürgertum in Westdeutschland em H U Wehler ed Moderne Deutsche Sozialgeschichte ColôniaBerlim 1966 p 323 11 L Simonin Mines and Miners or Vnderground Life Londres 1868 p 290 12 Daniel Spitzer Gezammelte Schriften Munique e Leipizig II 1912 p 60 324 13 J Kuczynski Geschicht der Lage der Arbeiler unter dem Kapitalismus Ber lim Ocidental 1961 XII p 29 CAPITULO 3 1 K Marx F Engels Manifesto of the Communist Party Londres 1848 2 U S Grant Inaugural Message to Congress 1873 3 I Goncharov Oblomov 1859 4 J Laffey Racines de 1imperialisme français en ExtrèmeOrient Revue dHistoire Modernet Contemporaine XVI abriljunho de 1969 p 285 5 Muitas destas informações são tiradas de W S Lindsay History of Merchant Shipping 4 vols Londres 1876 6 Sir James Anderson Statistics of Telegraphy Londres 1872 7 Engels a Marx 24 de agosto de 1852 Werke XXVIII p 118 8 Bankers Magazine V Boston 18501 p 11 9 Bankers Magazine IX Londres 1849 p 545 10 Bankers Magazine V Boston 18501 p 11 11 NeumannSpallart Ubersichten der Weltwirst mhaft Suttgart 1880 p 7 CAPÍTULO 4 1 Prince Napoléon Louis Bonaparte Fragments Historiques 1688 et 1830 Pa ris 1841 p 125 2 Jules Verne From the Earth to the Moon 1865 CAPITULO 5 1 Ernest Renan What is a Nation em A Zimmern ed Modern Political Doctrines Oxford 1939 pp 1912 2 Johann Nestroy Haeuptling Abendwind 1862 3 Shatov em F Dostoievsky The Possessed 18712 4 Gustave Flaubert Dictionnaire des idées recues c 1852 5 Walter Bagehot Physics and Politics Londres 1873 pp 201 6 Citado em D Mack Smith Risorgimenlo Italiano Bari 1968 p 422 7 Tullio de Mauro Storia Lingüística dèllItália Vnita Bari 1963 8 J Koralka Social problems in the Czech and Slovak national movements em Commission Internationale dHistoire des Mouvements Sociaux et des Stru cutures Sociales Mouvements Nationaux dlndépendance et Classes Populaires Paris 1971 l p 62 9 J Conrad Die Frequenzverhãltnisse der Universitâten der hauptsãchlichsten Kulturlander Jahrbücher für Nationalõkonomie und Statistik 1891 3rd ser I pp 376ff 10 Sintome em dívida com Dr R Anderson por estas informações CAPÍTULO 6 1 H A Targé Les Déficits Paris 1868 p 25 2 Sir T Erskine May Democracy in Europe Londres 1877 I p lxxi 3 Karl Marx The Eighteenth Brumaire of Louis Bonaparte Werke VIII pp 1989 4 G Procacci Le elezioni dei 1874 e 1opposizione meridionale Milão 1956 p 60 W Gagel Die Wahlrechtsfrage in der Geschichte der deutschen Liberalen Parteien 18481918 Dusseldorf 1958 p 28 5 J Ward Workmen and Wages ai Home and Abroad Londres 1868 p 284 6 J Deutsch Geschichte der õterreichischen Gewerkschaftsbewegung Viena 1908 pp 734 Herbert Steiner Die internationale Arbeiterassoziation und die österr Ar beiterbewegung WegundZiel Viena Sondernummer Jãnner 1965 pp 8990 325 CAPITULO 7 1 Erskine May op cit I p29 2 J W Kaye A History of the Sepoy War in índia 1870 II pp 4023 3 Bipan Chandra Rise and Growth of Economic Nationalism in Índia Deli 1966 p 2 4 Chandra op cit 5 E R J Owen Cotton and the Egyptian Economy 18201914 Oxford 1969 p 156 6 Nikki Keddie An Islamic Response to Imperialism Los Angels 1968 p 18 7 Hu Shene Imperialism and Chinese Politics Pekin 1955 p 92 8 Jean A Meyer em Amoles E 5 C 25 3 1970 pp 7967 9 Karl Marx British Rule in índia New Daily Tribune 25 de junho de 1853 Werke IX p 129 10 B M Bhatia Famines in índia Londres 1967 pp 6897 11 Ta Chen Chinese Migration with Special Reference to Labour Conditions US Bureau of Labor Statistics Washington 1923 12 N Sanchez Albornoz Le Cycle vital annuel en Espagne 18631900 Ànna les E S C 24 6 novembrodezembro de 1969 M Emerit Le Maroc et lEurope jusquen 1885 Annales E S C 20 3 maiojunho de 1965 13 P LeroyBeaulieu LAlgérie et Ia Tunisie 2nd ed Paris 1897 p 53 14 Almanach de Gotha 1876 CAPÍTULO 8 1 Jacob Burhardt Reflections on History Londres 1943 p 170 2 Erskine May op cit I p 25 3 Herbert G Gutman Social Status and Social Mobility in Nineteenth Century America The Industrial City Paterson New Jersey mimeo 1964 4 Martin J Primack Farm construction as a use of farm labor in the United States 18501910 Journal of Economic History xxv 1965 p 114 ff 5 Rodman Wilson Paul Mining Fronliers of the Far West Nova York 1963 pp 5781 6 Joseph G McGoy Historie Sketches of the Caule Trade ofthe West and South wesl Kansas City 1874 Glendale Califórnia 1940 O autor aponta Albilene como um centro de gado sendo que em 1871 tornouse o maior deles 7 Charles Howard Shinn em Mining Camps A Study in American Frontier Government ed R W Paul Nova York Evanston e Londres 1965 capítulo XXIV pp 456 8 Hugh Dacis Granam Ted Gur eds The History of Violence in America New York 1969 capítulo 5 especialmente p 175 9 W Miller ed Men in Business Cambridge Mass 1952 p 202 10 Sinto me em dívida com Dr William Rubinstein de Johns Hopkins University pelas in formações nas quais este ponto de vista está baseado 11 Herbert G Gutman Work Culture and Society in Industrializing America 18151919 American Historical Review 78 3 1973 p 569 12 John Whitney Hall Das Japanische Kaiserreich Frankfurt 1968 p 282 13 Nakagawa Reiichiro Henry Rosovsky The Case ofthe Dying Kimono Business History Review XXXVII 1963 pp 5980 14 V G Kiernan The Lords of Human Kind Londres 1972 p 188 15 Kiernan op cit p 193 CAPÍTULO 9 1 Erskine May op cit I pp lxvvi 2 Journaux des Frères Goncourt Paris 1956 II p 753 3 Werke XXXIV pp 51011 4 Werke XXXII p 669 5 Werke XIX p296 6 Werke XXXIV p 512 326 7 M Pushkin The professions and the intelligentsia in nineteenthcentury Rússia University of Birmingham Hislorical Journal XII I 1969 pp 72 ff 8 Hugh Seton Watson Imperial Rússia 18611917 Oxford 1967 pp 4223 9 A Ardao Positivism in Latin America Journal of the History ofldeas XXIV 4 1963 p 519 assinala que uma constituição Comtiana foi imposta no estado do Rio Grande do Sul Brasil 10 G Haupt La Commune comme symbole et comme exemple Mouvement Social 79 abriljunho de 1972 pp 20526 11 Samuel Bernstein Essays in Política and lntellectual History Nova York 1955 capítulo XX The First International and a New Holly Alliance espe cialmente pp 1945 e 197 12 J Rougerie Paris Libre 1871 Paris 1971 pp 25663 CAPITULO 10 1 Citado em Jean Meyer Problemas campesinos y revueltas agrárias 1821 1910México 1973 p 93 2 Citado em R Giusti Lagricoltura ei contadini nel Mantovano 18481866 Mo on the Metallurgy of Iron Londres 1872 p 227 o suprimento diário de um único 3 NeumannSpallart op cit p 65 4 Mitchell Deane Abstract of Histórica Statistics Cambridge 1962 pp 3567 5 M Hroch Die Vorkämpfer der nationalen Bewegung bei den kleinen Völkern Europas Praga 1968 p 168 6 Agriculture em Mulhall op cit p 1 7 I Wellman Histoiré rurale de Ia Hongrie Annales E S C 23 6 1968 p 1203 Mulhall loc cit 8 E Sereni Storia del paesaggio agrário italiano Bari 1962 pp 3512 O de florestamento industrial também não deve ser negligenciado A grande quanti dade de combustível requerida pelos fornos do Lago Superior já causou uma impressão definitiva nas matas circunvizinhas escreveu H Bauermann em 1868 A Treatise on the Metallurgy of Iron Londres 1872 p 227 o suprimento diário de um único forno requeria a devastação de um acre de floresta 9 Elizabeth Whitcombe Agrarian Conditions in Northern índia I 18601900 Berkeley Los Angeles e Londres 1972 pp 7585 discute de forma crítica as conseqüências da engenharia de irrigação em larga escala nas Províncias unidas 10 Irwin Feller Inventive activity in agriculture 18371900 Journal of Eco nomic History XXII 1962 p 576 11 Charles McQueen Peruvian Public Finance Washington 1926 pp 56 O Guano supria 75 das rendas de todos os tipos do governo peruano em 18616 80 em 186975 Heraclio Bonilla Guano y burguesia en ei Peru Lima 1974 pp 1389 citando Shane Hunt 12 Ver G Verga Liberty pequena história baseada no levante de Bronte que está entre os discutidos por D Mack Smith em The peasants revolt in Sicily in 1860 em Studi in Onore di Gino Luzzatto Milão 1950 pp 20140 13 E D Genovese In Red and Black Marxian Explorations in Southern and AfroAmerican History Harmondsworth 1971 pp 1314 14 Para a mais elaborada versão deste argumento ver R W Fogel S Enger mann Time on the Cross Boston e Londres 1974 15 Th Brassey Works and Wages Practically Illustrated Londres 1872 16 H Klein The Coloured Freedmen in Brazilian Slave Society Journal of Social History 3 I 1969 pp 36 Júlio Le Riverend Historia econômica de Cu ba Havana 1956 p 160 17 P Lyashchenko A History of the Russian National Economy Nova York 1949 p 365 18 D Wells Recent Economic Changes Nova York 1889 p 100 19 J Varga Typen und Probleme des bauerlichen Grundbesitzes 17671849 Budapeste 1965 citado em Annales E S C 23 5 1968 p 1165 327 20 A Giraut L Milliot Príncipes de Colonisation et de Législation Colonille LAlgérie Paris 1938 pp 383 e 386 21 José Termes Ardevol El Movimiento Obrero en Espana La Primera internacional 118641881 Barcelona 1965 Apêndice Sociedades Obreras creadas en 18701874 22 A Dubuc Les sobriquets dans le Pays de Bray en 1875 Annales de Nor mandie agosto de l952 pp 2812 23 Jaroslav Purs Die Entwicklung des Kapitalismus in der Landwirtschaft der böhmischen Lander 18491879 Jahrbuch für Wirtschaftsgeschichte 1963 III p 40 24 Franco Venturi Les Intellectuels le peuple et la revolution Histoiré du popu lisme russe au XIX siècle Paris 1972 II pp 9468 Este livro magnífico cuja tradução em língua inglesa foi feita de uma de suas primeiras edições Roots of Revolution Londres 1960 é um trabalhochave nesta questão CAPITULO 11 1 Scholem Alejchen Aus den nahen Osten Berlim 1922 2 F Mulhauser Correspondence of Arthur Hugh Clough Oxford 1957 II p 396 3 I Ferenczi ed F Willcox International Migrations Vol 1 Statistics Nation al Bureau of Economic Research Nova York 1929 4 Ta Chen Chinese Migration with Special Referencefo Lrbor Conditions Unit ed States Bureau of Labor Statistics Washington 1923 p 82 5 S W Mintz Cuba Terre et Esclaves Etudes Rurales 48 1972 p 143 6 R Mayo Smith Emigration and Immigration A Study in Social Science Lon dres 1890 p 94 7 A F Weber The Growth of Cities in the Nineteenth Century Nova York 1899 p 374 8 Herbert Gutman Work Culture and Society in industrializing America 1815 1919 American History Review 78 3 de junho de 1973 p 533 9 Barry E Suplee A Business Elite GermanJewish Financiers in Nineteenth Century New York Business History Review XXXI 1957 pp 14378 10 Ferenczi ed Willcox op cit Vol II p 270n 11 Carl F Wittke We who built America Nova York 1939 p 193 12 Egon Erwin Kisch Karl Marx in Karlsband Berlim Ocidental 1968 13 C T Bidwell The Cost of Living Abroad Londres 1876 apêndice A Suíça foi o principal objeto desta viagem 14 Bidwell op cit p 16 15 Georg v Mayr Statistik und Gesellschaftslehre II Bevoelkerungsstatistik 2 Liéferung Tübingen 1922 p 176 16 E G Ravenstein The Laws of Migration Journal of the Royal Statistical Society 52 1889 p 285 CAPÍTULO 12 1 Purs The working class movement in the Czech lands Histórica 1965 p 70 2 M May Die Arbeitsfrage 1848 citado em R Engelsing Zur politschen Bil dung der deutschen Unterschichten 17891863 Hist Ztschr 206 2 abril de 1968 p 356 3 Letters and Private Papers of W M Thackeray ed Gordon N Ray II 356 Londres 1945 4 J Purs The industrial revolution in the Czech Lands Histórica II 1960 pp 210 e 220 5 Citado em H J Dyos M Wolff eds The Victorian City Londres e Bos ton 1973 I p 110 6 Dyos Wolff op cit I p 5 7 A F Weber 1898 citado em Dyos e Wolff op cit I p 7 8 HCroon Die Versorgung der Staedte des Ruhrgebietes im 19U20 Jahrhun dert mimeo International Congress of Economic History 1965 p 2 328 9 L HenneauxDepooter Misères et Luttes Sociales dans le Hainaut 186096 Bruxelas 1959 p 117 Dyos Wolff op cit p 134 10 Dyos Wolff op cil I p 424 11 Dyos Wolff op cit I p 326 12 J H Clapham An Economic History of Modem Britain Cambridge 1932 II pp 11617 13 Erich Maschke Es entsleht ein Konzern Tubingern 1969 14 R Ehrenberg KruppSludien ThünenArchiv II Jena 19069 p 203 C Fohlen The Fontana Economic History of Europe 4 The Emergence of Industrial Societies Londres 1973 I p 60 J P Rioux La Révolution Industrielle Paris 1971 p 163 15 P J Proudhon Manuel du Spéculateur à Ia Bourse Paris 1857 pp 429 ff 16 B Gille The Fontana Economic History of Europe 3 The Industrial Révo lution Londres 1973 p 278 17 J Kocka Industrielles Management Konzeptionen und Modellevor 1914 Vierteljahrschrift für Sozial und Wirtschaftsgesch 563 outubro de 1969 p 336 citando de Emminghaus Allgemeine Gewerbeslehre 18 P Pierrard Poesie et chanson à Lille sous le 2e Empire Revue du Nord 46 1964 p 400 19 G D H Cole Raymond Postgate The Common People Londres 1946 p 368 20 H Mottek Wittschaftsgeschidhte Deutschlands Berlim Ocidental 1973 II p 235 21 E Waugh Home Life of lhe Lancashire Factory Folk during the Cotton Fa mine Londres 1867 p 13 22 M Anderson Familv Structure in Nineteenth Century Lancashire Cambridge 1973 p 31 23 O Handlin ed Immigrations as a Factor in American History Englewood Cliffs 1959 pp 667 24 J Hagan C Fisher Piecework and some of its consequences in the print ing and coal mining industries ir ustralia 18501930 Labour History 25 no vembro de 1973 p 26 25 E Schwiedland Kleingewrbe uber Hausindustrie in Osterreich Leipizig 1894 II pp 2645 e 2845 26 J Saville J Beüamy eds Dictionary of Labour Biographv I p 17 27 Engelsing op cit p 364 28 Rudolf Braun Soziaicr u kulíureller Wandel in einem landliehen Indu slriegebiet im 19 u 20 Jahrhundcrí HrlcnbachZurique e Stultgart 1965 p 139 usa este termo especificamente para o período Seus inestimáveis livros ver também Industrialisierung und 1olkslebin não podem ser recomendados tão bem 29 Industrial Remunennion Conference Londres 1885 p 27 30 Industrial Remunerarion Conference pp 8990 31 Beatrice Webb My Appremiceship Harmondsworth 1938 pp 189 e 195 32 Industrial Remunerqfion Conference pp 27 e 30 CAPlTULO 13 1 Citado em L Trenard Un Industriei roubaisien du XIX siècle Revue du Nord 50 1968 p 38 2 Murtin Tupper Proverbial Philosophy 1876 3 Ver Ernanie Sachs The Terrible Siren Nova York 1928 especialmente pp 1745 4 A liberdade de visitar garotas americanas é ressaltada na seção relevante do capítulo sobre estrangeiros em Paris no soberbo Paris Guide 1867 2 vols 5 Sobre Cuba Verena Martinez Alier Elopement and seduction in 19th centurv Cuba Past and Present 53 maio de 1972 sobre América do Sul E Genovese Roll Jordan Roll Nova York 1974 pp 41330 e R W Fogel Stanley Enger mann op cit 6 De Maxims for Revolutionists em Man and Supermun Um homem mode radamente honesto com uma mulher moderadamente encantadora ambos beber 329 rões moderados numa casa moderadamente saudável esta é a verdadeira unida de da classe média 7 Zunkel op cit p 320 8 Zunkel op cit p 526 n 59 9 Tupper op cit Of Home p 361 10 Tupper loc cit p 362 11 John Ruskin Fors Clarigera em E T Cook A Wedderburn eds Col lected Works Londres e Nova York 190312 vol 27 carta 34 12 Tupper op cit Of Marriage p 118 13 Minha opinião é que se uma mulher é obrigada a trabalhar imediatamente embora ela possa ser cristã ou bem nascida ela perde a posição peculiar que o termo lady convencionalmente designa Carta ao Englishwomans Journal VIII 1866 p 59 14 Trénard op cit pp 38 e 42 15 Tupper op cit Of Joy p 133 16 J LambertDansette Le Patronat du Nord Sa période triomphante em Bulle tin de la Société dhistoíre moderne et contemporaine 14 Série 18 1971 p 12 17 Charlotte Erickson British Industrialists Steel and Hosiery 18501950 Cambridge 1959 18 H Kellenbenz Unternehmertum in Südwestdeutschland Tradition 104 agosto de 1965 pp 183 ff 19 C Pucheu Les Grands Notables de 1Agglomération Bordelaise du milieu du XIXe siècle à nos jours Revue dhistoire économique et sociale 45 1967 p 493 20 P Guillaume La Fortune Bordelaise au milieu du XIX siècle Revue dhis toire écnomique et sociale 43 1965 pp 331 332 e 351 21 E Gruner Quelques reflexions sur 1élite politique dans la Conféderation Hel vetique depuis 1848 Revue dhistoire économique et sociale 44 1966 pp 145 ff 22 B Verhaegen Legroupe Liberal à Ia Chanibre Belge 18471852 Revue Belge de Philogie et dhisloire 47 1969 34 pp 1176 ff 23 LambertDansette op cit p 9 24 LambertDansette op cit p 8 VE Chancellor ed Master and Artisan in Victorian England Londres 1969 p 7 25 Serge Hutin Les FrancsMaçons Paris 1960 pp 103 ff e 114 ff P Che vallier Histoire de la Francmaçonnerie françaiseII Paris 1574 Para o mundo Ibérico o julgamento A Livre massonaria deste período não era senão a conspi ração universal da classe média revolucionária contra a tirania feudal monárqui ca e divina Era a Internacional desta classe citado em íris M Zavala Masones Comuneros y Carbonarios Madri 1971 p 192 26 T Mundt Die neuen Bestrebungen zu einer wirtschaftlichen Reform der un teren Volksklassen 1855 citado em Zunkel op cit p 327 27 Rolande Trempé Contribution à 1étude de la psychologie patronale le comportement des administrateurs de la Societé des Mines de Carmaux 1856 1914 Mouvement Social 43 1963 p 66 28 John Ruskin Modem Painters citado em W E Houghton The Viclorian Frame of Mind Newhaven 1957 p 116 Samuel Smiles Self Help 859 capítulo II pp 35960 29 John Ruskin Traffic The Crown of Wild Olives 1866 Works 18 p 453 30 Trempé op cit p 73 31 W L Burn The Age of Equipoise Londres 1964 p 244 n 32 H Ashworth em 18534 citado em Burn op cit p 243 33 H U Wehler Bismark und der Imperialismus ColôniaBerlin 1969 p 431 CAPITULO 14 1 Francis Darwin A Seward eds More Letters of Charles Darwin Nova York 1903 II p 34 2 Citado em Engelsing op cit p 361 330 3 Anihropological Review IV 1866 p 115 4 P Benaerts et ai Nalionalité et Nationalisme Paris 1968 p 623 5 Karl Marx Capital I postescrito à segunda edição 6 Em Electromagnetic Theory de Julius Stratton do MIT Dr S Zienau com quem me encontro em dívida pelas referências que faço às ciências físicas in formame que isto veio num momento propício para o esforço de guerra anglo saxão no campo do radar 7 J D Bernal Science in History Londres 1969 II p 568 8 Bernal op cit 9 Marx a Engels 19 de dezembro de 1860 Werke XXX p 131 10 H Steinthal M Lazarus Zietschriftfür Volkerpsychologie und Sprachwissenchaft 11 F Mehring Karl Marx The Story of his Life Londres 1936 p 383 12 E B Tylor The Religion of Savages Fortnightly Review VI 1866 p 83 13 Anthropological Review IV 1866 p 120 14 Kiernan op cit p 159 15 W Philips Religious profession and practice in New South Wales 1850 1900 Historical Studies outubro de 1972 p 388 16 Haydris Dictionary of Dates 1889 ed artigo Missions 17 Eugene Stock A Short Handbook of Missions Londres 1904 p 97 As esta tísticas neste manual parcial e influente são tiradas de J S Dennis Centennial Survey of joreign Missions Nova York e Chicago 1902 18 Catholic Encyclopedia artigo Missions África CAPITULO 15 1 R Wagner Kunst und Klima Gesammelte Schriften Leipzig 1907 III p 214 2 Citado em E Dowden Studies in Literature 17891877 Londres 1892 p 404 3 Th v Frimmel Lexicon der Winer Gemãldesammlungen AL 191314 arti go Ahrens 4 G Reitlinger The EconomicsofTaste Londres 1961 capítulo 6 Eu tenho con fiado bastante neste valioso trabalho que traz ao estudo da arte um realismo fi nanceiro adequado a nosso período 5 Asa Briggs Victorian Citties Londres 1963 pp 164 e 183 6 Reitlinger op cit 7 R D Altick The English Cammon Reader Chicago 1963 pp 355 e 388 8 Reitlinger op cit 9 F A Mumby The House of Routledge Londres 1934 10 M V Stokes Charles Dickens A Customer of Coutts Co The Dicken sian 68 1972 pp 1730 Estou em dívida com Michael Slater por esta referência 11 Mulhall op cit artigo Libraries Uma nota especial deveria ser feita sobre o movimento da livraria pública britânica Dezenove cidades instalaram tais livra rias nos anos 1850 1 1 na década de 1860 51 nos anos 1870 W A Munford Edward Edwards Londres 1963 12 T Zeldin France 18481945 Oxford 1974 I p 310 13 G Grundmann Schlösser und Villen des 19 Jahrhunderts von Unter nehmern in Schlesien Tradition 10 4 agosto de 1965 pp 14962 14 R Wischnitzer The Architecture ofthe European Synagogue Filadélfia 1964 capítulo 10 especialmente pp 196 e 2026 15 Gisèle Freund Photographie und bürgerliche Gesellschafl Munique 1968 p 92 16 Freund op cit pp 946 17 Citado em Linda Nochlin ed Realism and Tradition in An Englewood Cliffs 1966 pp 71 e 74 18 Gisèle Freund Photographie et Société Paris 1974 p 77 19 Freund op cit 1968 p III 20 Freund op cit 1968 pp 11213 21 Sobre a questão das artes e da revolução neste período ver T J Clark The Absolute Bourgeois Londres 1973 e Image of lhe People Gustave Coubert 331 Londres 1973 1973 22 Nochlin op cit p 77 23 Mesmo num centro de menor importância como a Bohemia Munique o Münchner Kunstverein tinha cerca de 4500 membros em meados da década de 1879 P Drey Die wirtschaftlichen Grundlagen der Malkunst Versuch einer Kunstökonomie Stuttíart e Berlim 1910 24 Na arte o artesão é quase tudo Inspiração sim inspiração é uma coisa mui to bela mas um tanto banal é desta forma universal Todo burguês é mais ou menos afetado por uma aurora ou pôr do sol Ele tem uma certa dose de inspira ção Citado em Dowden op cit p 405 CAPÍTULO 16 1 Johann Nestroy Sie Sollen Ihn Nicht Haben 1850 2 D S Landes The Unbound Prometheus Cambridge 1969 pp 2401 3 Burckhardt op cit p 116 4 Burckhardt op cit p 171 Um Mundo em Movimento 333 LEITURA COMPLEMENTAR Com algumas poucas exceções as notas abaixo referemse ape nas a livros e livros em língua inglesa Isto não quer dizer que sejam os melhores disponíveis embora freqüentemente o sejam Tratase de uma concessão à ignorância de línguas estrangeiras da maioria dos leitores de língua inglesa através do mundo A bibliografia do período é tão vasta que não é possível uma tentativa de cobrir todos os aspectos relacionados mesmo que seleti vamente e as escolhas sugeridas são de cunho pessoal às vezes mesmo fortuitas Guias para leitura da maioria dos tópicos estão con tidos em A Guide to Historical Literature periodicamente revisto e editado pela American Historical Association A bibliografia existen te na Cambridge Econamic History of Europe vol VI é maior do que seu título sugere A Bibliography of Modern History 1968 de J Ro ach ed também pode ser consultada com alguma cautela A maio ria dos livros relacionados abaixo também contém referências biblio gráficas em notas de pé de página ou separadamente Entre as obras gerais de referência histórica a Encyclopedia of World History de W Langer fornece as principais datas assim como Chronology of the Modern World 1966 de Neville Williams Annals of European Civilization 150019001949 de Alfred Mayer trata das artes e das ciências A Dictionary of Statistics de M Mulhall 1892 ainda é o melhor compêndio para números Para referência geral so bre o século XIX a décimaprimeira edição da Encyclopaedia Britan nica ainda disponível em boas bibliotecas de universidades é incom paravelmente superior às suas sucessoras assim como a Encyclopaedia of lhe Social Sciences 1931 é para nossas finalidades superior a edição posterior de 1968 Compêndios biográficos e obras de referência em assuntos especiais são demasiadamente numerosos para serem mencionados Entre os atlas históricos o Grosser Historiseher Welta tlas 1957 de J Engel et al o Atlas of World History 1957 de Rand McNally e o Penguin Historical Atlas 1974 são recomendados An Introduction to Contemporary History de G Barraclough 1967 e The Triumph ofthe Middle Classes 1966 de C Morazé este último com mapas excepcionalmente bem feitos podem servir como introdução à história global O elegante e erudito The Lords of the Human Kind 19691972 de V G Kiernan analisa as atitudes eu 334 ropéias em relação ao mundo exterior Os dois livros New Cambrid ge Modern Historv vol X J P T Bury ed The Zenith of European Power 18391870 e as duas partes da Cambridge Economic History Vol VI The Industrial Revolutions and After vão além da Europa Ambos podem ser consultados constantemente com bom proveito Para análises mais estritamente sobre a Europa The Ascendancy of Europe 18151914 1972 de M S Anderson e The Age of Revoluti on Europe 17891848 1962 de E J Hobsbawm vão além do conti nente Liberal Europe 18481875 1974 de W E Mosse cobre exa tamente o mesmo período do presente livro Political and Social U pheaval 18321852 de William L Langer 1969 com a bibliografia é de longe o melhor dos volumes cronologicamente relevantes da série The Rise of Modern Europe editada pelo mesmo autor De obras gerais em campos mais especializados The Fontana E conomic History of Europe de C Cipolla ed 1973 vols 3 4i 4ii são extremamente úteis mas sem dúvida a melhor introdução à história e conômica do período é o soberbo The Unbound Prometheus 1969 de D S Landes um desenvolvimento da contribuição deste autor à Cam bridge Economic History Os importantes volumes de A History of Te chnology de C Singer et al são para referência The Culture of Western Europe the nineteenth and twentieth centuries 1963 de G L Mosse é uma adequada introdução a este assunto Science in History 1965 de J D Bernal é brilhante mas as seções sobre o nosso período não devem ser tomadas de forma acrítica Nem deveriam ser as seções de The Soci al History of Art de A Hauser 1952 Vários volumes da Penguin His tory of Art cobrem o século XIX European Society in Upheaval 1975 ed de Peter Stearns é uma tentativa talvez prematura de cobrir a histó ria social do continente Duas obras de C Cipolla The Economic Histo ry of World Population 1962 e Literacy and Development in the West 1969 são breves e úteis introduções The Growth ofCities in the 19tn Century 1889 e reimpressões de A F Weber tem sido um inestimável compêndio desde sua publicação original Nem todos os países possuem uma história nacional de tamanho adequado e de fácil acesso em língua inglesa para o nosso período A Inglaterra por exemplo não tem embora The Origin of Modern En glish Society 17801880 1969 de H Perkin e Midvictorin Britain 185075 1971 de Geoffrey Best são bons em história social e An Economic History of Modern Britain II 18501880 1932 de J H Clapham ainda é excepcional A melhor história da França é ainda de longe a Nouvelle Histoire de la France Contemporaine vols 8 e 9 de M Agulhon 1848 ou 1apprentissage de la Republique de Alain Plessis De La fête imperiale au mur desFêdéres ambos de 1973 e sem tradução inglesa A History of Modern Germany 18401945 de Hajo Holborn 1970 é bom mas para o nosso período Restoration Revolution Reaction Economics and Politics in Germany 18151871 1958 de T S Hamerow e Social Foundations of German Unificati on 1969 do mesmo autor são altamente relevantes The Habsburg 335 Empire 17901918 1969 de C A Macartney e o expressivo Spain 18081939 1966 de Raymond Carr contém ambos a maior parte do que precisamos saber sobre estes países e The Scandinavian Countri es 17201865 2 vols 1943 de B J Hovde mais do que isso Histórias da Rússia refletem opiniões francamente discordantes Imperial Rússia 18011917 1967 de Hugh Seton Watson está repleto de informações assim como A History of the Russian National Economy 1949 de P Lyashchenko History of the Italian People II1973 de G Procacci é uma boa introdução embora um tanto comprimida Italy A Modern History 1959 de D Mack Smith é uma obra antiga feita pelo maior especialista deste período da história italiana The Balkans since 1453 1958 de L S Stravianos é uma visão geral muito boa Para o mundo nãoeuropeua maioria dos leitores talvez precise não de histórias do período mas de introduções gerais a regiões às quais não são familiares Para a China isso pode ser encontrado em China Readings I de Franz Schurmann e O Schell eds o volume Imperial China 1967 para o Japão no The Japan Reader I o volu me Imperial Japan 18001945 1973 de J Livingston J Moore e F Oldfhather eds para o mundo islâmico Unity and Variety in Mus lim Civilization 1955 de G von Grunebaum ed para a América Latina alguma coisa de Readings in Latin American History II since 1810 1966 de Lewis Hanke ed para a Índia Agrarian Conditions in Northern Índia I The United Provinces under British Rule 1972 de Elizabeth Whitcombe para o Egito Cotton and The Egyptian E conomy 18201914 1969 de E R J Owen Para os principais even tos nos seus respectivos países The Taiping Rebellion 1966 de M Franz e The Meiji Restoration 1972 de W G Beasley A bibliografia para a história americana é interminável Qual quer história geral será adequada para aqueles totalmente estranhos em relação a este país como por exemplo The Making of American Society I to 1877 1972 de E C Rozwenc suplementada pela Ency clopaedia of American History 1965 de R B Morris Todas estão atrasadas em relação aos progressos da pesquisa O tema principal do presente livro é a criação de um único mundo sob a hegemonia capitalista Para este processo de exploração ver A History of Geographical Discovery and Exploration 1931 de J N L Baker para pó mapas ver Memoirs of Hydrography II vai de 1830 a 80 de Cdr L S Dawnson RN reimpresso em 1969 para o transporte uma breve introdução por M Robbins The Ralway Age 1962 e uma exuberante e triunfante crônica por W S Lindsay History of Merchant Shipping 4 vols 1876 A expansão da colonização e dos empreendi mentos é inseparável da história das migrações ver capítulo 11 ver Migration and Economic Growth 1954 de Brinley Thomas para o la do humano The Immigrant in American History 1940 de M Hansen e Invisible Immigrants The Adaptatiori of English and Scottish immi grants in 19th century America 1972 de C Erickson enquanto que A New System of Slavery 1974 de Hugh Tinker trata da exportação de 336 trabalho endividado Para as fronteiras em expansão Westward Expan sion de R A Billington 1949 e Mining Froníiers of the Far West 1963 de Rodman Wilson Paul Para os empreendimentos capitalistas fora da Europa o esplêndido Bankers and Pashas International Finance and Modern Imperialism in Egypt 1958 de D S Landes The Migration of British Capital to 1875 J 927 de L H Jenks Europe The Worlds Banker 1930 de H Feis The Life and Labours of Mr Brassey 1872 reimpresso 1969 de A T Helps e Henry Meiggs A Yankee Pi zarro 1946 de W Stewart Os dois últimos volumes tratam dos titãs da construção ferroviária Uma olhada interessante nas atitudes da época é The Political and Social Ideas of Jules Verne 1972 de Jean Chesne aux sobre o autor de A Volta ao Mundo em Oitenta Dias A história da burguesia classechave de nosso período ainda espera para ser bem es crita pelo menos em inglês e em uma forma adequadamente accessível Victorian People 1955 de Asa Briggs é uma útil introdução mas o me lhor guia ainda é a série de novelas dos RougonMacquart de Émile Zola que analisa a sociedade do Segundo Império Francês e cuja auten ticidade documentária é bem alta Ver também a introdução de Mario Praz para The Nineteenth Cenlury World 1968 de G S Métraux e F Crouzet eds Entre as monografias devese mencionar La Bourgeoisie Parisienne 18151848 versão reduzida 1970 de Adeline Daumard Les Grands Nolables en France 2 vols 1964 de A Tudesq adequado pa ra o estudo da formação da consciência política no período da revolução de 1848 assim como Industriebürgertum in Westdeutschland de F Zunkel incluído em Modern Deutsche Sozialgeschichte 1966 de H U Wehler ed Para as aspirações da baixa classe média e de certa forma adequado para as demais classes Self Help 1859 e numerosas edições subseqüentes de Samuel Smiles The Age of Equipoise 1964 de W L Burn é um excelente corte transversal da sociedade burguesa inglesa e France 18481945 vol I 1974 de T Zeldin um guia bastante razoável para a sociedade burguesa francesa incluindo família e sexo The For mation of the British Liberal Party 185768 1972 é bem estimulante Embora haja excelentes livros sobre a cidade do século XIX a lém do volume de A F Weber como por exemplo Victorian Cities 1963 de Asa Briggs e o enciclopédico The Victorian City vols 1973 de H J Dyos e M Wolff eds guias gerais para o mundo dos trabalhadores manuais diferente das histórias de suas organizações são bastante escassos Useful Toil 1974 de John Burnett ed edita autobiografias de trabalhadores ingleses com introduções adequadas e London Labour and the London Poor 4 vols originalmente 1861 62 de Henry Mayhew é uma reportagem de gênio sobre a maior das cidades ocidentais Labouring Men 1964 de E J Hobsbawm con tém alguns estudos relevantes Numerosos estudos valiosos para alguns países em particular especialmente a França permanecem infelizmente sem tradução inglesa Poderseia escolher Les Ouvriers en Greve 187190 vol 2 1974 de Michelle Perrot Les Mineurs de Carmaux 1971 de Rolande Trempé e Sozialer und kultureller Wandel in einem 337 ländlichen Industriegebiet 1965 de Rudolf Braun cuja importância é bem maior que a restrita base de pesquisa Suíça poderia sugerir O maciço Geschichte der lage der Arbeiter unter dem Kapitalismus 40 vols 196072 de J Kuczynski deve ser mencionado os vols 2 3 e 18 19 20 tratam sobre os trabalhadores alemães deste período Além das obras gerais já mencionadas a terra a agricultura e a sociedade agrária podem ser estudadas em Peasants and Peasant So cieties 1971 de T Shanin ed Lord and Peasant in Rússia 1961 de Jerome Blum Rural Rússia under the Old Regime 1932 de Geroid T Robinson English Landed Society in the 19th Century 1963 de F M L Thompson e The Farmers Last Frontier 1945 de F A Shannon Pa ra a questão muito debatida do último período da escravidão ver The World the Slaveholders made 1969 de Eugene G Genovese assim como Roll Jordan Roll the World the Slaves Made 1974 do mesmo autor e também Time on the Cross 2 vols 1974 de R W Fogel e S Engermann uma obra controvertida Para a menos conhecida econo mia do trabalho endividado Sugar without Slaves 1972 de Alan A damson La Terre de Zola combina acuidade e preconceito urbano con tra camponeses Para os camponeses desenraizados Immigralion as a Factor in American History 1959 de O Handlin ed The Strugglefor Mastery in Europe 18481918 1954 de A J P Taylor The European Powers and the German Question 1848 1871 de W E Mosse 1969 poderão servir para introduzir a história das relações internacionais A History of Milistarism 1938 de A Vagts The Rise of Rail Power in War and Conquest 1915de E A Pratt e Nineteenth Century Military Techniques de H Nickerson editado no Journal of World History IV 195758 para a história das guerras The FrancoPrussian War 1962 de Michael Howard é uma monografia exemplar Para as atitudes da época em torno das duas grandes alternativas em disputa os governos populares ou nacionais ver Physics and Po litics 1873 de Walter Bagehot e The British Constitution 1872 nu merosas edições A historiografia e discussão do nacionalismo não é satisfatória What is a Nation de Ernest Renan editado em Modern Political Doctrines de A Zimmern ed 1939 é um ponto de parti da O melhor livro é Die Vorkämpfer der Nationalen Bewegung bei den Kleinen Völkern Europas Praga 1968 de M Hroch ver tam bém a Commission Internationale dHistoire des Mouvements Soci aux et des Structures Sociales editado em Mouvements Nationaux dIndépendance et Classes Populaires aux 19th et 20th siécles vol I 1971 Sobre a extensão do voto na Inglaterra em 1867 Before the Socialists 1965 capítulos IIIIV de Royden Harrison para a Ale manha o artigo de G Mayer Die Trennung der proletarischen von der bürgelichen Demokratie in Deutschland 186370 editado no Grünbergs Archiv II 1911 páginas 167 Ver também as obras de J R Vincent T S Hamerow e T Zeldin The Political System of Na poleon III 1958 Para as revoluções do período The Revolution of 338 1854 in Spanish History 1966 de V G Kiernan The Federal Repu blic in Spain 186874 1962 de C A M Hennessy e entre à vasta li teratura sobre a Comuna de Paris incluindo a famosa obra de Marx A Guerra Civil na França o livro de J Rougerie Paris Libre 1871 1971 Political and Social Upheaval 183252 1969 de W L Lan ger e The 1848 Revolution 1974 de Peter Stearns podem introduzir os leitores nas grandes revoluções de nosso período sobre as quais Marx escreveu duas pequenas obras na época As Lutas de Classe na França e O Dezoito Brumário de Luís Bonaparte e Engels uma obra Revolução e ContraRevolução na Alemanha e A de Tocqueville algumas extraordinárias passagens em suas Memórias O maior de todos os combatentes da liberdade do período é o assunto de Garibal di 1974 de J Ridley e os revolucionários russos são revistos numa obra clássica de F Venturi Roots of Revolution 1960 From Wealth to Welfare The Evolution of Liberalism 1963 de H K Girvetz descreve os sentidos em constante mudança da ideolo gia burguesa dominante Virgin Land 1957 de Henry Nash Smith é um excelente guia para a ideologia do radicalismo que encontrou sua expressão mais pura nas fronteiras para isso ver também Free Soil Free Labor Free Men 1970 de Eric Foner The Origens of Socia lism 1969 de G Lichtheim é a melhor introdução a este assunto A History of Socialist Thought II Marxism and Anarchism 18501890 1954 de G D H Cole é ainda o mais accessível dos livros que tra tam sobre esta questão de forma geral Para uma crítica nãosocialista do capitalismo ver talvez a maior das obras contemporâneas Reflexi ons on World History 1945 de J Bufckhärdt A History of Econo mic Thought de E Roll é concisa e inteligente afastandose de edição em edição das posições radicais que o autor defendia a princípio Eu ropean Positivism in the 19th Century 1963 trata de uma corrente ideológica mais ou menos central em nosso período Karl Marx The Story ofHis Life1936 de Franz Mehring é preferível a outras intro duções à vida e obra de Marx pois Mehring procura refletir aquilo que Marx quis fazer entender para a sua geração imediata de discípu los e seguidores A History of the Warfare of Sciente and Theology 1896 de A D White é valiosa para consulta pelas mesmas razões Sobre o darwinismo Evolution and Society A Study in Victorian So cial Theory 1966 de J Burrow e a introdução deste mesmo autor à edição da Penguin de The Origin of Species 1968 Social Darwinism in American Thought 1955 de R Hofstadter e Physics and Politics 1873 de W Bagehot A History of European Thought in the 19th Century 4 vols 18961914 de J T Mertz permanece essencial para um estudo da ci ência do século XIX The Life of William Thompson 2 vols 1910 de S P Thompson trata de uma figura central Science and Industry in the 19th Century 1953 de J D Bernal é uma brilhante monografia Science and History do mesmo autor foi mencionada mais acima A Hundred Years of Chemistry 1948 é um tratamento conveniente de 339 uma ciência crucial Para as artes além das obras gerais mencionadas The Economics of Taste I e II 1961 1963 de G Reitlinger discute a natureza do mercado das artes The Absolute Bourgeois e Image of the People Í 1973 ambos de T J Clark discutem arte e revolução Realism 1971 de Linda Nochlin explicase pelo titulo ver também a obra desta autora The Invention of the AvantGarde France 1830 1880 editado em Art News Annual 34 assim como o livro de Gisèle Freund Photographie und bürgerliche Gesellschaft 1968 O artigo de Walter Benjamin Paris Capital of the 19th Century publicado em New Left Review 48 1968 é breve mas profundo Studies in Europe an Realism 1950 de George Lukács é a obra de um notável crítico da prosa e Main Currents in Nineteenth Century Literature 6 vols 190105 de Georg Brandes fornece uma visão quase que da época Aspects of Wagner 1972 de Bryan Magee defende um grande mas desagradável compositor Sobre a crise que conclui nosso período Grosse Depression und Bismarckzeit 1967 de Hans Rosenberg e Recent Economic Changes 1889 de David Wells Uma obra geral de interesse bastante considerável pode ser men cionada como conclusão Social Origins of Dictatorship and Demo cracy 1967 Penguin 1973 de Barrington Moore
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A ERA DO CAPITAL 18481875 ERIC HOBSBAWM 3a edição No Smoking A ERA DO CAPITAL ERIC J HOBSBAWM A ERA DO CAPITAL 18481875 Tradução de Luciano Costa Neto Digitalização Argo Para Marlene Andrew e Julia Sumário Nota do Tradutor 15 Prefácio 17 Introdução 21 PRIMEIRA PARTE PRELÚDIO REVOLUCIONÁRIO 1 A Primavera dos Povos 29 SEGUNDA PARTE DESENVOLVIMENTO 2 A Grande Expansão 49 3 O Mundo Unificado 67 4 Conflitos e Guerras 87 5 A Construção das Nações 101 6 As Forças da Democracia 117 7 Perdedores 135 8 Vencedores 153 9 A Sociedade em Processo de Mudança 173 TERCEIRA PARTE RESULTADOS 10 A Terra 189 11 Os Homens se Põem a Caminho 207 12 A Cidade a Indústria a Classe Trabalhadora 221 13 O Mundo Burguês 241 14 Ciência Religião Ideologia 261 15 As Artes 287 16 Conclusão 311 Tabelas 317 Notas 327 Leitura Complementar 337 7 Ilustrações entre as páginas 160 e 161 1 A Colméia Britânica por Cruickshank Foto Radio Times Hulton Pic ture Library 2 Alfred Krupp águaforte Foto Mansell Collection 3 Alfred Príncipe de Windischgrätz Osterreichisches Nationalbiblio thek 4 Camponês com Pá JF Millet Foto Weidenfeld and Nicolson Arc hives 5 Dr e Sra Worsley Foto Radio Times Hulton Picture Library 6 Capatazes na Exposição Internacional de 1862 Foto Victoria and Albert Museum 7 Criados cerca de 1860 Foto Victoria and Albert Museum 8 O engenhoso guincho a vapor do Sr Ashton Foto Victoria and Albert Museum 9 A Escala de Arte Exeter Foto Victoria and Albert Museum 10 GF Watts Foto Radio Times Hulton Picture Library 11 Cartaz para a Polca da Demolição de Johann Strauss Strauss Collec tion Foto Robert Rogers 12 Construção da ferrovia subterrânea de Londres gravura Foto Mary Evans Picture Library 13 Scarisbrick Hall Lancashire Foto A F Kersting 14 Prefeitura de Halifax ilustração de Builder 1860 por Charles Barry Foto Weidenfeld and Nicolson Archives 15 Sobre Londres de Trem de Gustave Doré Foto Mansell Collection 16 Manchester vista da Ponte Blackfriars 1859 fotografia de George Grundy Foto Manchester Public Libraries 17 Paris Boulevard Sébastopol Foto Radio Times Hulton Picture Li brary 18 Praça da Opera Cairo Foto Radio Times Hulton Picture Library 19 A Opera de Paris 1860 Foto AF Kersting 20 Paris Boulevard des Italiens 1864 Foto Radio Times Hulton Picture Library 21 O Castelo de Cardiff interior Foto Edwin Smith 22 Salão do Hotel Paiva Paris do Un Hotel Célebre sous le Second Empi re Foto Sirot 8 23 Sala de estar da Rainha Vitória Castelo de Windsor Foto reproduzida por Gentil Permissão de Sua Majestade a Rainha copyright reserved 24 Cortando o Assado fotografia estereoscópica cerca de 1860 Foto Victoria and Albert Museum 25 Sala em Lincoln Court ilustração do Illustrflted Times 1861 Foto Weidenfeld and Nicolsorí Archives 26 Opera de Paris interior impresso Foto Archives Photographiques Paris 27 Exposição Internacional de PaYis 1867 Foto Victoria and Albert Museum 28 Salão em Paris 1867 Foto RogerViollet 29 A Academia do Sr Williams cerca de 1865 Foto Lewisham Local History Library 30 Carro dormitório da Estrada de Ferro Union Pacific 1869 Foto Radio Times Hulton Picture Library 31 Estação Ferroviária de Charing Cross 1864 impresso Foto Science Museum Londres 32 A Rainha Vitória o Príncipe Albert e os filhos em torno da árvore de Natal gravura Foto The Illustrated London News 33 Canhão Krupp na Exposição Internacional de Paris em 1867 impresso Foto Weidenfeld and Nicolson Archives 34 Jovem lendo cerca de 1865 Foto Victoria and Albert Museum 35 Os irmãos Corrie os três irmãos King acompanhados de Brown e Woodruff 1865 Foto Barnardo Photo Library 36 Reunião para o chá no jardim cerca de 1865 Foto Victoria and Albert Museum 37 Le Déjeuner sur THerbe de Manet Museu do Louvre Paris Foto Bulloz 38 The Dinner Hour Wigan de Eyre Crowe City Art Gallery Man chester 39 Fore Street Lambeth York Wharf cerca de 1860 Foto Victoria and Albert Museum 40 Oficial britânico na Índia cerca de 1870 Foto Radio Times Hulton Picture Library 41 O Ultimo do Rebanho de WW Hoopper cerca de 1877 Foto Ro yal Geographical Society 42 Napoleão III caricatura Foto Victoria and Albert Museum 43 Charles Darwin Foto National Portrait Gallery Londres 44 Príncipe Otto von Bismarck caricatura Foto Mansell Collection 45 Lev Nikolaevitch Tolstoi 1868 Foto Novosti Press Agency 46 Gustave Coubert fotografia de Nadar Foto Mansell Collection 47 Fyodor Mikhailovitch Dostoievsky fotografia de VG Perov Foto Novosti Press Agency 48 Giuseppe Garibaldi gravura de W Holl Foto RB Fleming 49 Abraham Lincoln Foto Weidenfeld and Nicolson Archives 9 50 Karl Marx Foto Mansell Collection 51 Honoré Daumier Foto Mansell Collection 52 Charles Dickens lendo para suas filhas Foto Victoria and Albert Mu seum 53 Richard Wagner 1865 Foto Mansell Collection 54 Emigrantes em Cork seguindo para a América 1851 gravura Foto Ra dio Times Hulton Picture Library 55 Descarregando mercadorias perto da alfândega de Calcutá Foto índia Office 56 Cartaz da ceifadeira McCormick Foto International Harvester Compa ny of Great Britain 57 Cabana de colonos no Rio de Ia Maneis Foto Radio Times Hulton Picture Library 58 Trabalhadores coolies hindus colocando trilhos Fotos Weidenfeld and Nicolson Archives 59 Thomas Brassley caricatura de Ape Foto Mansell Collection 60 A Ponte de DeviFs Gate Estrada de Ferro Union Pacific Foto Radio Times Hulton Picture Library 61 Leilão de escravos na Virgínia cerca de 1860 impresso Foto Mansell Collection 62 Plantação de açúcar Guiana Foto Weidenfeld and Nicolson Ar chives 63 O Porto de Londres de Um Espelho Completo de Locais Famosos de Países Bárbaros de Yoshitora Foto Victoria and Albert Museum 64 Chegada de Henry Morton Stanley a uma aldeia africana desenhada por ele mesmo Foto Radio Times Hulton Picture Library 65 Grand Barricade du Chateau dEau 1848 Bibliotheque Nationale Pa ris Foto RogerViollet 66 Cena de barricada de Jules David 1848 Foto RogerViollet 67 Louise Michel gravura de Nash Foto Mary Evans Picture Library 68 Cora Pearl fotografia de Anatole Pouguet Foto Sirot 69 Ataque às barricadas Paris 1871 Foto Editions Robert Laffont 70 Greve em Le Creusot 1870 Bibliotheque Nationale Paris Foto Bul loz 71 A fábrica Iron and Steel Barrow Foto Weidenfel and Nicolson Arc hives 72 Emblema da Amalgamated Society of Engineers Weidenfeld and Ni colson Archives 73 Impressora do Daily Telegraph Foto Mansell Collection 74 Le Bureau de Coton à Ia Nouvelle Orléans de Degas Pau Museum Foto Bulloz 75 Nova Orléans cerca de 1870 Foto Radio Times Hulton Picture Li brary 10 76 A Guerra Civil Americana fotografia de William Brady Foto Mansell Collection 77 Ataque à aldeia de Chaleira Preta impresso do Harpers Weekly 1868 Foto The Kansas State Historical Society Topeka 78 O Pobre sem Casa ilustração do Punch 1859 Foto Weidenfeld and Nicolson Archives Mapas entre as páginas 321 e 326 1 O Mundo em 1847 2 O Mundo por volta de 1880 3 1847 Escravidão e Servidão no Mundo Ocidental 4 1880 Escravidão e Servidão no Mundo Ocidental 5 Um Mundo em Movimento 6 Cultura Ocidental em 18471875 Opera 11 Nota do Tradutor De acordo com a orientação do autor definida no prefácio de não so brecarregar a obra procuramos reduzir as notas de tradução a um mínimo indispensável como por exemplo em relação ao Chartist Movement ou as Com Laws que o autor se refere por inúmeras vezes através do texto Man tivemos as palavras em outras línguas européias no seu original mas forne cemos tradução entre parênteses àquelas em alemão Mantivemos igualmen te o original quando se trata de expressões dentro de um contexto cultural americano ex cowboy A liberdade com que o autor emprega palavras e expressões em outros idiomas que não o inglês autorizounos a agir de for ma equivalente na tradução ex expert Expressamos nosso reconhecimento ao Prof Hobsbawm que por cor respondência elucidou algumas dúvidas sobre o texto original para efeitos de tradução Stanford março de 1977 L C N A ERA DO CAPITAL 13 Prefácio Este livro pretende existir de forma autônoma assim como os demais volumes da História da Civilização da qual ele é apenas uma parte Ocorre porém que o volume que cronologicamente o pre cede na série foi escrito pelo mesmo autor Entretanto A Era do Ca pital pode vir a ser lido por pessoas que conhecem A Era das Revolu ções 17891848 assim como por pessoas que não o conhecem Aos primeiros apresento as minhas excusas por incluir aqui e ali mate rial que já lhes é familiar com o objetivo de proporcionar a necessá ria informação prévia para os últimos Tentei reduzir tal duplicação a um mínimo e fazêla tolerável pela sua distribuição através do texto Ó livro pode espero ser lido independentemente Mesmo assim ele não deveria pedir do leitor nada além de uma instrução geral adequa da pois é deliberadamente dirigido ao leitor nãoespecializado No entanto um conhecimento elementar da história européia será sempre uma vantagem Parto do pressuposto que num caso de emergência os leitores possam entender e continuar a leitura sem nenhum conhe cimento prévio sobre a Queda da Bastilha ou as Guerras Napoleôni cas mas um tal conhecimento certamente ajudará O período que o livro abarca é relativamente curto mas sua di mensão geográfica é extensa Escrever sobre o mundo de 1789 a 1848 em termos de Europa em outras palavras quase que sobre a Ingla terra e França não é irreal Porém já que o tema mais importante do período após 1848 é a expansão da economia capitalista a todo o pla neta a conseqüência inevitável é a impossibilidade de escrever uma história puramente européia e seria absurdo escrever esta história sem dar uma atenção especial aos outros continentes O tratamento que concedo dividese em três partes As revoluções de 1848 formam um prelúdio a uma seção sobre os principais desenvolvimentos do pe ríodo Estes últimos eu os discuto numa perspectiva duplamente con tinental e onde necessário global ao invés de tentar apreendêlo a través de séries de histórias nacionais fechadas Os capítulos estão divididos por temas e não cronologicamente mas os principais subpe ríodos a década de 1850 calma mas expansionista os anos mais turbulentos de 1860 a ascensão e o colapso do início de 1870 são Coleção publicada pela Weidenfeld Nicolson Inglaterra 14 porém claramente discerníveis A terceira parte consiste em uma série de cortes diacrônicos sobre a economia sociedade e cultura desta é poca do século XIX sob estudo Não posso considerarme um expert sobre todo o imenso mate rial deste livro mas apenas de minúsculas parcelas e precisei confi ar quase que inteiramente em material de informações de segunda ou mesmo de terceira mão Mas isso seria impossível de evitar Uma e normidade já foi escrita sobre o século XIX e a cada ano que passa acrescentase ao pico da montanha uma massa de publicações especi alizadas que escurecem o céu da história Como o campo dos histori adores ampliase para incluir praticamente todos os aspectos da vida pelos quais nós do final do século XX temos interesse a quantidade de informação que precisa ser absorvida é demasiado grande mesmo para o mais enciclopédico e erudito dos scholars Ainda que se tome todas as precauções tornase freqüentemente necessário no contexto de uma vasta síntese reduzir passagens a um ou dois parágrafos a uma linha a apenas uma menção ou mesmo lamentavelmente omiti las E é necessário basearse cada vez mais no trabalho de outros Infelizmente foi impossível seguir a admirável convenção que determina que os estudiosos identifiquem criteriosamente suas fontes e especialmente suas dívidas a outros Em primeiro lugar duvido que pudesse identificar todas as sugestões e idéias que tomei emprestado de forma tão livre de algum artigo ou livro conversação ou discussão Posso apenas pedir àqueles que pilhei conscientemente ou não que perdoem minha falta de cortesia Em segundo lugar a tentativa de fa zêlo teria sobrecarregado o livro com um pouco recomendável apara to de conhecimento Pois já que o objeto desta obra não é fazer um sumário dos fatos conhecidos o que implicaria em um guia para lei tores indicandolhes leitura mais detalhada para os diversos tópicos mas sim traçar uma síntese histórica geral fornecer o sentido dos a nos 184875 e descobrir ali as raízes de nosso mundo contemporâneo creio que foi bastante razoável agir desta maneira Entretanto há um guia geral de leitura suplementar ao fim do volume que inclui algu mas das obras que achei mais úteis e às quais gostaria de reconhecer meu débito As referências foram quase que inteiramente reduzidas a algu mas fontes de citações quadros estatísticos e alguns outros números assim como algumas declarações que gerassem controvérsias ou fos sem surpreendentes Muitos dos números esparsos de fontes primárias ou do valiosíssimo compêndio Dictionary of Statistics de Mulhall não foram identificados Referências a obras literárias por exemplo no velas russas que existem em várias edições estão apenas intitula das referências aos escritos de Marx e Engels que são importantes estudiosos deste período estão identificadas pelo título mais conheci do da obra ou pela data da carta volume e página da edição standard existente Karl Marx e Friederich Engels Werke East Berlin 1956 15 71 de agora em diante Werke Sigurd Zienau e Francis Haskell gentilmente corrigiram meus capítulos sobre as ciências e as artes e reviram alguns de meus erros Charles Curwen respondeu minhas perguntas sobre a China Assumo porém total responsabilidade por minhas omissões ou enganos WR Rodgers Carmem Claudin e Maria Moisá ajudaramme enormemente como assistentes de pesquisa por inúmeras vezes Andrew Hobsbawm e Julia Hobsbawm ajudaramme a selecionar as ilustrações assim como Julia Brown Reconheço também minha dívida a meu editor de texto Susan Loden EJH Charred remains of a structure Two individuals are engaged in manual labor crushing objects on a surface 17 Introdução Por volta de 1860 uma nova palavra entrou no vocabulário eco nômico e político do mundo capitalismo Portanto parece apro priado chamar o presente volume A Era do Capital um título que também faz lembrar a todos nós que a mais importante obra do mais formidável crítico do capitalismo O Capital de Karl Murx 1867 foi publicada nesta época O triunfo global do capitalismo é o tema mais importante da história nas décadas que sucederam 1848 Foi o triunfo de uma sociedade que acreditou que o crescimento econômico repou sava na competição da livre iniciativa privada no sucesso de comprar tudo no mercado mais barato inclusive trabalho e vender no mais caro Uma economia assim baseada e portanto repousando natural mente nas sólidas fundações de uma burguesia composta daqueles cu ja energia mérito e inteligência elevouos a tal posição deveria as sim se acreditava não somente criar um mundo de plena distribui ção material mas também de crescente felicidade oportunidade hu mana e razão de avanço das ciências e das artes numa palavra um mundo de contínuo e acelerado progresso material e moral Os pou cos obstáculos ainda remanescentes no caminho do livre desenvolvi mento da economia privada seriam levados de roldão As instituições do mundo ou mais precisamente daquelas partes do mundo ainda não desembaraçadas da tiraríia das tradições e superstições ou do fato ín feiíz de não possuírem peie branca preferivelmente originária da Eu ropa Central ou do Norte gradualmente se aproximariam do modelo internacional de uma naçãoestado definida territorialmente com uma constituição garantindo a propriedade e os direitos civis assem bléias representativas e governos eleitos responsáveis por elas e onde possível uma participação do povo comum na política dentro de limi tes tais que garantissem a ordem social burguesa e evitassem o risco de ser derrubada Traçar o desenvolvimento inicial desta sociedade não é a tarefa deste livro É suficiente lembrar que esta sociedade já havia comple tado seu aparecimento histórico tanto na frente econômica como na Sua origem talvez preceda 1848 como foi sugerido em A Era das Revoluções Introdu ção mas uma pesquisa mais detalhada sugere que raramente tenha ocorrido antes de 1849 ou tenha ganho amplo uso antes da década de 1860 18 frente políticaideológica sessenta anos antes de 1848 Os anos de 1789 a 1848 os quais já discuti num volume prévio A Era das Re voluções ver prefácio livro o qual os leitores terão referências uma ou outra vez foram dominados por uma dupla revolução a Revolu ção Industrial iniciada e largamente confinada à Inglaterra e a trans formação política associada e largamente confinada à França Ambas implicaram o triunfo de uma nova sociedade mas se ela deveria ser a sociedade do capitalismo liberal triunfante ou aquilo que um histori ador francês chamou os burgueses conquistadores pareceu sempre mais incerto para os contemporâneos do que para nós Atrás dos ideó logos políticos burgueses estavam as massas prontas para transfor mar revoluções moderadamente liberais em revoluções sociais Por baixo e em volta dos empresários capitalistas os pobres proletários descontentes e sem lugar que agitavam e se insurgiam Os anos de 1830 e 1840 foram uma era de crises cuja saída apenas os otimistas ousavam predizer Portanto o dualismo da revolução de 1789 a 1848 dá à história deste período unidade e simetria É fácil num certo sentido ler e es crever sobre este assunto pois parece possuir tema e forma claros as sim como seus limites cronológicos parecem tão precisamente defini dos quanto é possível no que diz respeito a assuntos humanos Com a revolução de 1848 que abre este volume a antiga simetria quebrouse a forma modificouse A revolução política recuou a revolução indus trial avançou Mil novecentos e quarenta e oito a famosa primavera dos povos foi a primeira e última revolução européia no sentido qua se literal a realização momentânea dos sonhos da esquerda os pesade los da direita a derrubada virtualmente simultânea de velhos regimes da Europa continental a oeste dos impérios russo e turco de Copenha gue a Palermo de Brasov a Barcelona Foi esperada e prevista Pareceu ser a conseqüência e o produto lógico da era das duas revoluções Tudo falhou universalmente rapidamente e apesar de isto não ter sido reconhecido por muitos anos pelos refugiados políticos de forma definitiva Desde então não iria mais ocorrer nenhuma revolu ção social geral do tipo buscado antes de 1848 nos países avança dos do mundo O centro de gravidade destes movimentos revolucio nários sociais e depois dos regimes socialistas e comunistas do sécu lo XX iria ter seu lugar em regiões marginais e atrasadas enquanto que no período que este livro lida movimentos deste tipo iriam per manecer episódicos arcaicos e subdesenvolvidos A súbita vasta e aparentemente inesgotável expansão da economia capitalista mundial forneceu alternativas políticas aos países avançados A revolução industrial inglesa havia engolido a revolução política francesa A história de nosso período é portanto desequilibrada Ela é pri mariamente a do maciço avanço da economia do capitalismo indus trial em escala mundial da ordem social que o representa das idéias e credos que pareciam legitimálo e ratificálo na razão ciência pro 19 gresso e liberalismo E a era da burguesia triunfante mesmo que a burguesia européia ainda hesitasse em assumir um papel político pú blico Para isso e talvez apenas para isso a era das revoluções ain da não havia terminado As classes médias da Europa ficaram as sustadas e permaneceram assustadas com o povo democracia ainda era vista como sendo o prelúdio rápido e certeiro para ò socialismo Os homens que oficialmente presidiam os interesses da vitoriosa or dem burguesa no seu momento de triunfo eram nobres do campo prussianos profundamente reacionários uma imitação de imperador na França e uma sucessão de proprietários aristocráticos na Inglaterra O medo da revolução era real a insegurança básica estava entranha da Bem para o fim de nosso período o único exemplo de revolução num país avançado uma insurreição em Paris quase que localizada e de vida curta produziu um grande banho de sangue incompara velmente superior a 1848 e uma enxurrada de nervosas trocas de in formações diplomáticas Já nesse tempo os dirigentes dos estados a vançados da Europa com maior ou menor relutância começaram a reconhecer não apenas que democracia isto é uma constituição parlamentar baseada em sufrágio universal era inevitável como tam bém viria a ser provavelmente um aborrecimento inofensivo politi camente Esta descoberta já havia sido feita de há muito pelos diri gentes dos Estados Unidos Os anos de 1848 até meados da década de 1870 não foram portan to um período que inspire leitores que apreciam o espetáculo de um drama com heróis no sentido comum Suas guerras e este período viu consideravelmente mais guerras que os 30 precedentes e os 40 subse qüentes eram ou pequenas operações decididas por superioridade or ganizacional ou tecnológica como a maioria das campanhas européias fora da Europa e as guerras rápidas e decisivas através das quais o Im pério Alemão estabeleceuse entre 1864 e 1871 ou então massacres mal conduzidos como a Guerra da Criméia entre 1854 e 1856 A maior das guerras deste período a Guerra Civil Americana foi ganha em úl tima análise pelo peso do poder econômico e dos recursos superiores O Sul derrotado possuía o melhor exército e os melhores generais Os exemplos ocasionais de heroísmo romântico e colorido apareceram como Garibaldi com suas madeixas ao vento e sua camisa vermelha mas eram exceção Não havia também muita dramaturgia na política onde o critério de sucesso veio a ser definido por Walter Bagehot como o fato de se possuir opiniões comuns e habilidades incomuns Napo leão III considerou visivelmente o manto de seu grande tio o primeiro Napoleão inconfortável para usar Lincoln e Bismarck cujas imagens públicas beneficiaramse pela dureza de suas faces e pela beleza de su as prosas foram indiscutivelmente grandes homens mas suas realiza ções foram conseguidas pelos seus dons de políticos e diplomatas co mo as de Cavour na Itália baseados inteiramente naquilo que agora consideramos os seus carismas 20 O drama mais óbvio deste período foi econômico e tecnológico o ferro derramandose em milhões de toneladas pelo mundo estradas de ferro cortando continentes cabos submarinos atravessando o A tlântico a construção do Canal de Suez as grandes cidades como Chicago surgidas do solo virgem do MeioOeste americano os imen sos fluxos migratórios Era o drama do poder europeu e norte americano com o mundo a seus pés Mas aqueles que exploraram es te mundo conquistado eram se excluirmos o pequeno número de a ventureiros e pioneiros homens sóbrios em roupas sóbrias espalhan do respeitabilidade e um sentimento de superioridade racial junta mente com fábricas de gás estradas de ferro e empréstimos Era o drama do progresso a palavrachave da época maciço iluminado seguro de si mesmo satisfeito mas acima de tudo inevi tável Quase nenhum dos homens com poder e influência em todos os acontecimentos no mundo ocidental desejou pôrlhe um freio Apenas alguns pensadores e talvez um maior número de críticos intuitivos te nham previsto que este avanço inevitável iria produzir um mundo bem diferente daquele que se esperava talvez exatamente o seu opos to Nenhum deles nem Marx que havia imaginado uma revolução social em 1848 e para uma década depois esperou uma mudança súbita Mesmo em meados de 1860 suas expectativas eram para lon go prazo O drama do progresso é uma metáfora Mas para duas espé cies de pessoas era uma realidade literal Para milhões de pobres transportados para um novo mundo freqüentemente através de fron teiras e oceanos isto significou uma mudança de vida cataclísmica Para os indivíduos do mundo fora do capitalismo que eram agora a tingidos e sacudidos por ele significou a escolha entre uma resistên cia passiva em termos de suas antigas tradições e formas de ser ou en tão um traumático processo de tomada das armas do Ocidente para voltálas contra os conquistadores a compreensão e a manipulação do progresso por eles mesmos O mundo deste período da história foi um mundo de vitoriosos e vítimas Seu drama consistiu nas dificuldades não dos primeiros mas primariamente dos últimos O historiador não pode ser objetivo sobre o período que é seu te ma Nisto ele difere para sua vantagem intelectual dos ideólogos mais típicos que acreditam que o progresso da tecnologia ciências positiva e sociedade faz com que seja possível ver seu presente com a indiscutível imparcialidade do cientista natural cujos métodos eles acreditam erroneamente compreender O autor deste livro não pode ocultar uma certa aversão talvez uma certa reserva em relação à era a qual se refere mesmo que diminuída pela admiração por suas titâ nicas realizações materiais e pelo esforço para compreender mesmo aquilo que não o agrada Ele não compartilha da nostálgica busca pela certeza da autoconfiança dos burgueses de meados do século XIX que atrai a muitos dos que buscam explicações para a crise do mundo 21 ocidental um século depois Suas simpatias dirigemse àqueles que poucos deram ouvidos há um século Em nenhum caso a certeza e a autoconfiança estavam erradas O triunfo burguês foi breve e tempo rário No momento que pareceu completo provou não ser monolítico mas pleno de fissuras No início da década de 1870 a expansão eco nômica e o liberalismo pareciam irresistíveis No fim da mesma dé cada já não o eram mais Este marco divisório define o fim da era que este livro retrata Diferente da revolução de 1848 que forma um ponto de partida este final não é marcado por nenhuma data universal Se alguma data fos se escolhida esta data seria 1873 o equivalente vitoriano à débâcle de Wall Street em 1929 Daí em diante começou o que um observador contemporâneo chamou uma curiosa perturbação e depressão sem precedentes do comércio e indústria que os contemporâneos chama ram A Grande Depressão e que usualmente é datada 187396 Sua mais notável peculiaridade escreveu o mesmo observador tem si do sua universalidade atingindo nações que tinham estado envolvidas em guer ras da mesma forma que as que se abstiveram as que tinham uma moeda está vel e aquelas que tinham uma moeda instável as que viviam sob um sistema de livre troca e aquelas cujas trocas sofriam alguma forma de restrição Tem si do doloroso em antigas comunidades como a Inglaterra e a Alemanha e igual mente na Austrália África do Sul e Califórnia que representam as novas tem sido uma calamidade demasiado pesada para os habitantes de Newfoundland e Labrador e das ensolaradas plantações de açúcar do Caribe e não tem enrique cido aqueles dos centros do comércio mundial que geralmente ganham mais quando os negócios flutuam e são mais incertos Assim escreveu um eminente norteamericano no mesmo ano em que sob a inspiração de Karl Marx a Internacional Trabalhista e Socialista foi fundada A Depressão iniciou uma nova era e pode por tanto fornecer uma data conclusiva para a antiga2 Building interior appearing severely damaged debris and broken structural elements on the floor and walls Primeira Parte PRELÚDIO REVOLUCIONÁRIO Exterior scene showing a consumer marketplace or event with various banners and advertisements including Shop Cheaper Limited Offer and brand logos 25 Primeiro Capítulo A PRIMAVERA DOS POVOS Por favor leia os jornais com bastante atenção agora eles valem a pena ser lidos Esta Revolução mudará a forma do planeta assim deve e precisa Vive la Republique O poeta George Weerth à sua mãe 11 de março de 18481 Realmente se eu fosse mais jovem e tivesse mais dinheiro o que in felizmente não sou e não tenho imigraria para a América hoje Não por covardia pois pessoalmente sou tão pouco atingido quanto posso atingilos mas por causa do desgosto pela podridão moral que usan do as palavras de Shakespeare eleva o mau cheiro ao céu O poeta Joseph von Eichendorff a um correspondente 1º de agosto de 1849 2 I No início de 1848 o eminente pensador político francês Alexis de Tocqueville tomou a tribuna na Câmara dos Deputados para ex pressar sentimentos que muitos europeus partilhavam Nós dormi mos sobre um vulcão Os senhores não percebem que a terra treme mais uma vez Sopra o vento das revoluções a tempestade está no horizonte Mais ou menos no mesmo momento dois exilados ale mães Karl Marx com trinta anos e Friedrich Engels com vinte e oito divulgavam os princípios da revolução proletária para provocar aqui lo que Tocqueville estava alertando seus colegas no programa que ambos tinham traçado algumas semanas antes para a Liga Comunista Alemã e que tinha sido publicado anonimamente em Londres por volta de 24 de fevereiro de 1848 sob o título alemão de Manifesto do Partido Comunista para ser publicado em inglês francês ale mão italiano flamengo e dinamarquês Em poucas semanas ou no caso do Manifesto em poucas horas as esperanças e temores dos pro Foi também traduzido em polonês e sueco no mesmo ano mas é justo dizer que suas re verberações políticas fora dos pequenos grupos de revolucionários alemães foram insignifi cantes até que foi republicado no início da década de 1870 26 fetas pareceram estar na iminência da realização A monarquia fran cesa tinha sido derrubada por uma insurreição a república proclama da e a revolução européia tinha iniciado Tem havido um bom número de grandes revoluções na história do mundo moderno e certamente a maioria bem sucedidas Mas nun ca houve uma que tivesse se espalhado tão rápida e amplamente se alastrando como fogo na palha por sobre fronteiras países e mesmo oceanos Na França o centro natural e detonador das revoluções eu ropéias Ver A Era das Revoluções capítulo 6 a república foi pro clamada em 24 de fevereiro Por volta de 2 de março a revolução ha via ganho o sudoeste alemão em 6 de março a Bavária 11 de março Berlim 13 de março Viena e quase imediatamente a Hungria em 18 de março Milão e em seguida a Itália onde uma revolta independen te havia tomado a Sicília Nesta época o mais rápido serviço de in formação acessível a qualquer pessoa os serviços do banco Roths child não podia trazer notícias de Paris a Viena em menos de cinco dias Em poucas semanas nenhum governo ficou de pé numa área da Europa que hoje é ocupada completa ou parcialmente por dez esta dos sem contar as repercussões em um bom número de outros Além disso 1848 foi a primeira revolução potencialmente global cuja in fluência direta pode ser detectada na insurreição de 1848 em Pernam buco Brasil e poucos anos depois na remota Colômbia Num certo sentido foi o paradigma de um tipo de revolução mundial com o qual dali em diante rebeldes poderiam sonhar e que em raros mo mentos como no apósguerra das duas conflagrações mundiais eles pensaram poder reconhecer De fato explosões simultâneas continen tais ou mundiais são extremamente raras 1848 na Europa foi a única a afetar tanto as partes desenvolvidas quando as atrasadas do conti nente Foi ao mesmo tempo a mais ampla e a menos bem sucedida deste tipo de revoluções No breve período de seis meses de sua ex plosão sua derrota universal era seguramente previsível dezoito me ses depois todos os regimes que derrubara foram restaurados com a exceção da República Francesa que por seu lado estava mantendo todas as distâncias possíveis em relação à revolução à qual devia sua própria existência As revoluções de 1848 portanto possuem uma curiosa relação com o conteúdo deste livro Mas pela sua ocorrência e pelo medo de sua recorrência a história da Europa nos 25 anos seguintes seria mui to diferente 1848 estava bem longe de ser o ponto crítico quando a Europa falhou em mudar O que a Europa falhou foi em mudar de uma forma revolucionária Já que tal não ocorreu o ano da revolução permanece sozinho uma abertura mas não a ópera principal uma en França Alemanha Ocidental Alemanha Oriental Áustria Itália Tchecoslováquia Iugos lávia Hungria parte da Polônia e Romênia Os efeitos políticos da revolução também po dem ser vistos como sérios na Bélgica Suíça e Dinamarca 27 tra da cujo estilo arquitetônico não leva exatamente ao que se espera quando se passa através do portão II A revolução triunfou através de todo o centro do continente eu ropeu mas não na sua periferia Isto inclui países demasiadamente re motos ou isolados em sua história para serem diretamente atingidos de alguma maneira por exemplo a Península Ibérica Suécia e Gré cia demasiadamente atrasados para possuir a estratificação social politicamente explosiva da zona revolucionária por exemplo Rússia e o Império Otomano mas também os únicos países já industrializa dos cujo jogo político já estava sendo feito de acordo com regras di ferentes como a Inglaterra e a Bélgica Mesmo assim a zona revolu cionária consistindo essencialmente da França e da Confederação Alemã do Império Austríaco com seus limites no sudeste europeu e da Itália era suficientemente heterogênea para incluir regiões tão atra sadas e diferentes como Calábria e Transilvânia tão desenvolvidas como a Uhr e a Saxônia tão alfabetizadas como a Prússia e iletradas como a Sicília tão remotas uma para a outra como Kiel e Palermo Perpignan e Bucarest A maioria destes lugares era dirigida por aquilo que podemos chamar de monarcas ou príncipes absolutos mas a França já era um reino constitucional e burguês e a única república significativa do continente a Confederação Helvética já havia inicia do o ano da revolução com uma breve guerra civil no final de 1847 Os estados atingidos pela revolução variam em tamanho dos 35 mi lhões da França para os poucos milhares em principados de ópera bu fa da Alemanha central em status de poderosos estados do mundo a províncias ou satélites dirigidos por estrangeiros em estrutura de es tados uniformemente centralizados a conglomerados perdidos Acima de tudo a história estrutura econômica e social e a política dividiram a zona revolucionária em duas partes cujos extre mos pareciam ter pouco em comum Suas estruturas sociais diferiam fundamentalmente exceto por aquela prevalência substancial e prati camente universal dos homens do campo sobre os homens da cidade das pequenas cidades sobre as grandes um fato facilmente verificá vel pois a população urbana e especialmente as grandes cidades eram desproporcionalmente proeminentes em política No oeste campo neses eram legalmente livres e grandes estados relativamente pouco importantes no Leste eles eram ainda servos e a propriedade da terra continuava largamente concentrada nas mãos da nobreza rural ver capítulo 10 mais adiante No Oeste a classe média significava banqueiros locais comerciantes empresários capitalistas profissio Dos delegados ao préparlamento alemão da região de Uhr 45 representavam grandes cidades 24 pequenas cidades e apenas 10 o campo onde 73 da população vivia 3 28 nais liberais e oficiais mais velhos incluindo professores se bem que alguns destes tenderiam a se sentir membros de um estrato mais alto haute bourgeoisie prontos para competir com a nobreza pro prietária pelo menos nos gastos A leste o estrato urbano equivalente consistia largamente de grupos nacionais distintos da população nati va tais como os alemães e os judeus O equivalente real da classe média era o setor do país de nobres inferiores educados eou preocu pados com negócios um estrato que era surpreendentemente grande em algumas áreas A zona central da Prússia ao Norte até a Itália central e do norte ao Sul que era num sentido o coração da zona re volucionária combinou de várias formas as características das regi ões relativamente desenvolvidas e atrasadas Politicamente a zona revolucionária era igualmente heterogê nea Excetuandose a França o que estava em jogo não era meramen te o conteúdo político e social destes estados mas sua forma ou mes mo existência Os alemães tomaram o caminho de construir uma A lemanha deveria ser unitária ou federal de um punhado de prin cipados germânicos de vários tamanhos e características Os italianos tentaram fazer o que o chanceler austríaco Metternich arrogantemen te mas não inacuradamente descreveu como sendo uma mera ex pressão geográfica uma Itália unida Ambos com a visão limitada dos nacionalistas incluíram em seus projetos povos que não se senti am alemães ou italianos como os tchecos Os alemães italianos e praticamente todos os movimentos nacionais envolvidos na revolu ção exceto os franceses viramse lutando contra o grande império multinacional dos Habsburgos que espalhavase pela Alemanha e Itá lia também incluindo os tchecos húngaros uma parte substancial de poloneses romenos iugoslavos e outros povos eslavos Alguns des tes ou pelo menos seus portavozes viam o Império como uma solu ção menos ruim do que serem absorvidos por algum nacionalismo expansionista como o dos alemães ou o dos húngaros Se a Áustria não existisse parece ter dito o professor Palacki portavoz dos tche cos seria preciso inventála Através da zona revolucionária diver sas dimensões operavam simultaneamente Os radicais confessadamente tinham uma simples solução uma república democrática unitária e centralizada da Alemanha Itália Hungria ou o país que ocorresse ser constituído de acordo com os princípios da Revolução Francesa sobre as ruínas de todos os reis e príncipes e que empunhasse sua versão da bandeira tricolor que usada no modelo francês era o modelo básico de uma bandeira nacional Os moderados por seu turno estavam emaranhados numa teia de cálculos complexos baseados essencialmente no medo à democracia que eles acreditavam ser equivalente à revolução social Aonde as massas ainda não houvessem desalojado os príncipes seria pouco esperto encorajá las a minar a ordem social e onde o tivessem feito seria desejável reti rálas das ruas e desmantelar as barricadas que eram os símbolos es 29 senciais de 1848 Portanto a questão era quais os príncipes paralisados mas não depostos pela revolução que poderiam ser persuadidos a apoi ar a boa causa Como deveria exatamente ser criada uma Alemanha ou Itália liberais sob que forma constitucional e sob os auspícios de quem Poderia este plano conter igualmente o rei da Prússia e o impe rador da Áustria como os grandesalemães moderados pensavam não confundir com os democratas radicais que eram por definição grandesalemães de um tipo diferente ou precisaria ser pequeno alemão i e excluir a Áustria Moderados do mesmo tipo no Império dos Habsburgos praticaram o jogo de maquinar constituições federais e multinacionais o que só viria a cessar com o desaparecimento do impé rio em 1918 Onde ação ou guerra revolucionária irrompessem não ha via muito tempo para especulações constitucionais Onde não irrom pessem como na maior parte da Alemanha davaselhes a maior im portância Visto que a maior proporção de moderados liberais ali con sistiam de professores e funcionários civis 68 dos deputados na as sembléia de Frankfurt eram funcionários públicos 12 pertenciam às profissões livres os debates deste parlamento de vida curta trans formaramse num paradigma de inteligente futilidade As revoluções de 1848 portanto requerem um detalhado estudo por estado povo região para o que este livro hão é o lugar No entan to elas tiveram muito em comum não apenas pelo fato de terem ocor rido quase simultaneamente mas também por que seus destinos esta vam cruzados todas possuíam um estilo e sentimento comuns uma atmosfera curiosamente românticoutópica e uma retórica similar para o que os franceses inventaram a palavra quarentehuitard Qualquer historiador reconhecea imediatamente as barbas as gravatas esvoa çantes os chapéus dos militantes as bandeiras tricolores as barricadas o sentido inicial de libertação de imensa esperança e confusão otimista Era a primavera dos povos e como a primavera não durou Preci samos agora olhar brevemente suas características comuns Em primeiro lugar todas foram vitoriosas e derrotadas rapida mente e na maioria dos casos totalmente Nos primeiros poucos me ses todos os governos na zona revolucionária foram derrubados ou re duzidos à impotência Todos entraram em colapso ou recuaram vir tualmente sem resistência Portanto num período relativamente curto a revolução tinha perdido a iniciativa quase que em todos os lugares na França pelo fim de abril no resto da Europa revolucionária du rante o verão apesar de que o movimento guardou alguma capacida de para contraatacar em Viena Hungria e Itália Na França o pri meiro marco da contraofensiva conservadora foi a eleição de abril com sufrágio universal Esta apesar de eleger apenas uma minoria de monarquistas enviou para Paris uma grande quantidade de conserva dores eleitos pelos votos de um campesinato politicamente mais i nexperiente do que reacionário e para o qual a esquerda de mentali dade urbana ainda não tinha um apelo Aliás por volta de 1849 as regiões republicanas e esquerdistas do campo na França familiares 30 para os estudantes da política francesa já tinham surgido por exem plo a região provençal e ali a mais amarga resistência à abolição da república em 1851 teve lugar O segundo marco foi o isolamento e derrota dos trabalhadores revolucionários em Paris batidos na insur reição de junho ver mais adiante Na Huropa central o ponto decisivo veio quando o exército dos Habsburgos com sua liberdade de manobra aumentada pela fuga do imperador em maio conseguiu reagruparse derrotar em junho uma insurreição radical em Praga não sem o apoio da classe média mo derada da Tchecoslováquia e Alemanha e em seguida reconquistar as terras da Bohemia que eram o coração econômico do império e logo após recuperar o controle da Itália do norte Uma tardia e rápida revolução nos principados do Danúbio foi esmagada pela intervenção russa e turca Entre o verão e o fim do ano os velhos regimes retomaram o poder na Alemanha e na Áustria embora tenha sido necessário recu perar a cidade de Viena cada vez mais revolucionária pela força das armas em outubro com um custo de mais de 4 mil vidas Depois dis so o rei da Prússia teve suficiente coragem para restabelecer sua au toridade por sobre os berlinenses sem maior problema e o resto da Alemanha exceto por alguma oposição no sudoeste rapidamente en trou na linha deixando o Parlamento alemão ou melhor a Assem bléia Constitucional eleita nos esperançosos dias da primavera assim como a Assembléia prussiana radical e outras entregues a suas dis cussões esperando por seu fechamento Por volta do inverno apenas duas regiões ainda estavam nas mãos da revolução partes da Itália e a Hungria Terminaram por ser reconquistadas em seguida a uma re tomada mais modesta da ação revolucionária na primavera de 1849 em meados daquele ano Depois da capitulação dos húngaros e dos venezianos em agosto de 1849 a revolução estava morta Com a única exceção na França to dos os antigos comandos foram restaurados no poder em alguns ca sos como no Império dos Habsburgos inclusive com mais força do que antes e os revolucionários espalharamse no exílio Mais uma vez com a exceção da França virtualmente todas as mudanças institu cionais todos os sonhos políticos e sociais da primavera de 1848 foram varridos e mesmo na França a república teria apenas mais dois anos e meio de vida Ocorrera uma e apenas uma modificação irreversível importante a abolição da escravatura no Império dos Habsburgos Ex cetuandose esta última apesar de ser visivelmente uma importante realização 1848 aparece como a revolução da moderna história da Eu ropa que combinou a maior promessa a maior extensão o maior suces so inicial imediato e o mais rápido e retumbante fracasso Num certo sentido lembra outro fenômeno de massa da década de 1840 o movi 31 mento cartista na Inglaterra Os objetivos específicos do Cartismo fo ram eventualmente atingidos mas não revolucionariamente ou num contexto revolucionário Suas grandes aspirações não chegaram a ser perdidas mas a ação que deveria têlas levado à frente era completa mente diferente da de 1848 Não é um acidente que o documento da quele ano que viria a ter o mais duradouro e significativo efeito na his tória mundial tenha sido o Manifesto Comunista Todas estas revoluções têm algo mais em comum que contribuiu largamente para o seu fracasso Elas foram de fato ou enquanto anteci pação imediata revoluções sociais dos trabalhadores pobres Portanto elas assustaram os moderados liberais a quem elas mesmas deram po der e proeminência e mesmo alguns dos políticos mais radicais pe lo menos tanto quanto os conservadores que apoiavam os antigos regi mes O conde Cavour de Piedmont futuro arquiteto da Itália Unida pôs seu dedo nesta fraqueza alguns anos antes 1846 Se a ordem social chegar a ser genuinamente ameaçada se os grandes princípios sobre os quais ela repousa vierem a estar dian te de um sério risco então muitos dos mais decididos oposicio nistas os mais entusiásticos republicanos serão temos certeza os primeiros a aliaremse aos flancos do partido conservador 4 Portanto aqueles que fizeram a revolução eram inquestionavel mente os trabalhadores pobres Foram eles que morreram nas barrica das urbanas em Berlim havia apenas 15 representantes das classes educadas e 30 mestresartesãos entre os 300 mortos das lutas de mar ço em Milão apenas 12 estudantes trabalhadores de colarinho bran co ou proprietários entre os 350 mortos na insurreição Foi sua fome que alimentou as demonstrações que se transformaram em revolu ções O campo nas regiões ocidentais da revolução estava relativa mente calmo enquanto que o sudoeste alemão viu muito mais a in surreição campesina do que é comumente lembrado mas em outros lugares o medo da revolta no campo era suficientemente agudo para transformarse em realidade apesar de que ninguém precisaria usar muita imaginação em áreas como a Itália do sul onde os camponeses por todos os lados marcharam espontaneamente com bandeiras e tambores por sobre os grandes estados Mas o medo por si só era su ficiente para concentrar totalmente as mentes dos proprietários da ter Movimento trabalhista inglês peta reforma parlamentar teve seu nome baseado na Carta do Povo um programa elaborado pelo radical londrino William Lovett em maio de 1838 Continha seis reivindicações sufrágio universal igualdade dos distritos eleitorais voto se creto eleição anual do Parlamento pagamentos aos parlamentares e abolição da qualifica ção de proprietário para os candidatos Foi o primeiro movimento nacional trabalhista que nasceu do protesto contra as injustiças sociaisda nova ordem industrial na Inglaterra O movimento foi abalado com o esmagamento de uma revolta em Newport e o banimento de seus líderes para a Austrália Quando a economia saiu da depressão o movimento perdeu sua força Mais tarde todas as reivindicações foram transformadas em leis com a exceção da eleição anual do Parlamento N T 32 ra Aterrorizados pelos falsos rumores de uma grande insurreição es crava sob a liderança do poeta Sándor Petöfi 182349 a Dieta Hún gara uma Assembléia constituída esmagadoramente por proprietá rios votou a imediata abolição da escravatura logo em 15 de março mas mesmo alguns dias antes o governo imperial procurando isolar os revolucionários de uma base rural já havia decretado a imediata abolição da escravatura na Galícia a abolição do trabalho forçado e outras obrigações feudais nas terras tchecas Não havia dúvida que a ordem social estava em perigo O perigo não era igualmente agudo em todos os lugares Cam poneses poderiam ser e eram comprados pelos governos conser vadores É improvável que a classe média alemã incluindo os confi antes homens de negócios da Uhr estivessem desesperadamente as sustados por uma perspectiva de comunismo proletário ou mesmo poder proletário que tinha pouca importância exceto em Colônia onde Marx tinha instalado seu quartelgeneral e em Berlim onde um tipógrafo comunista Stefan Born organizara um movimento ope rário de razoável importância Porém da mesma forma como as classes médias européias dos anos 1840 julgaram ter reconhecido a forma de seus problemas sociais futuros na chuva e fumaça de Lanca shire assim também pensaram ter reconhecido uma outra forma do futuro atrás das barricadas de Paris o grande antecipador e exporta dor de revoluções E a revolução de fevereiro não tinha sido feita a penas pelo proletariado mas era uma revolução social consciente Seu objetivo não era meramente uma república mas a república so cial e democrática Seus líderes eram socialistas e comunistas Seu governo provisório incluiu um trabalhador genuíno um mecânico conhecido por Alberto Por alguns dias houve dúvidas se sua bandeira seria a tricolor ou a bandeira vermelha da revolta social Exceto onde questões tais corno autonomia nacional ou indepen dência estavam em jogo a oposição moderada dos anos de 1840 não desejou nem se dedicou seriamente à revolução e mesmo na questão nacional os moderados preferiram negociação e diplomacia ao invés de confrontação Eles teriam preferido mais sem dúvida mas estavam preparados para negociar concessões que poderseia razoavelmente argumentar mesmo o mais estúpido dos absolutistas como o tzar mais cedo ou mais tarde seria forçado a conceder ou mudanças internacio nais que mais cedo ou mais tarde viriam certamente a ser aceitas pela oligarquia dos superpoderes que decidiam nestas questões Arrasta dos para a revolução pela força dos pobres eou pelo exemplo de Paris eles naturalmente tentaram transformar uma inesperadamente boa situ ação para extrair a maior vantagem Portanto em última análise eles estavam certamente e desde o começo muito mais assustados pelo pe rigo de sua própria esquerda do que pelos velhos regimes Quando as barricadas subiram em Paris todos os liberais moderados e como ob servou Cavour uma razoável proporção de radicais passaram a ser conservadores em potencial Como a opinião moderada mais ou menos 33 rapidamente mudava de lado ou desertava os trabalhadores e os intran sigentes entre os radicais democratas ficavam isolados ou o que era mais fatal ficavam diante de uma união de conservadores e ex moderados aliados ao velho regime o partido da ordem como os franceses chamaram 1848 fracassou porque ficou evidenciado que a confrontação decisiva não era entre os velhos regimes e as forças do progresso unidas mas entre ordem e revolução social Sua con frontação crucial não foi a de fevereiro em Paris mas a de junho em Paris quando os trabalhadores manobrados para uma insurreição isola da foram derrotados e massacrados Eles lutaram e morreram brava mente Cerca de 1500 caíram na luta das ruas dois terços dos mortos do lado do governo É característica da ferocidade do ódio que os ricos nutrem pelos pobres o fato de que uns 3 mil foram trucidados depois da derrota enquanto outros 12 mil foram aprisionados a maioria deporta da para campos de trabalho na Argélia Por seu turno a revolução de fevereiro em Paris custara apenas 370 vidas6 Portanto a revolução manteve seu ímpeto somente onde os radi cais eram suficientemente fortes e suficientemente ligados com o mo vimento popular para empurrar os moderados para frente ou fazêla sem eles Isto era mais provável de ocorrer em países onde a questão crucial era a libertação nacional um objetivo que requer a contínua mobilização das massas Eis por que a revolução durou mais na Itália e sobretudo na Hungria Na França a unidade nacional e a indepen dência não estavam em questão O nacionalismo alemão estava preo cupado com a unificação de numerosos estados separados o que era porém impedido não pela dominação alienígena mas exceto por al guns interesses particularistas pela atitude de dois superpoderes que se consideravam a si próprios alemães Prússia e Áustria As aspira ções nacionais eslavas entraram em conflito logo de início com as das nações revolucionárias como as dos alemães e magiares e calaram se dali em diante se não chegaram mesmo a apoiar a contra revolução Mesmo a esquerda tcheca olhou o Império dos Habsbur gos como uma proteção à absorção por uma Alemanha nacional Os poloneses não tomaram nenhuma parte importante nesta revolução Na Itália os moderados unidos na retaguarda do antiaustríaco rei de Piedmont e com as fileiras engrossadas depois da insurreição de Milão pelos principados menores tomaram a dianteira na luta con tra o opressor enquanto não perdiam de vista os republicanos e a re volução social Graças â fraqueza militar dos estados italianos à hesi tação de Piedmont e talvez acima de tudo à recusa de apelar aos franceses que dariam apoio acreditavase à causa republicana eles foram duramente derrotados pelo exército austríaco em Custozza no mês de julho Pode ser notado de passagem que o grande republica no G Mazzini 180572 com seu infalível instinto para o que era politicamente fútil opôgse a um pedido de ajuda aos franceses A derrota desacreditou os moderados e passou a liderança da libertação nacional aos radicais que tomaram o poder em diversos estados itali 34 anos durante o outono para finalmente conseguir instalar uma repú blica romana em 1849 dando a Mazzini ampla oportunidade para re tórica Veneza sob o governo de um advogado sensível Daniele Manin 180457 já havia se tornado uma república independente fi cando fora dos distúrbios até que foi inevitavelmente reconquistada pelos austríacos mais tarde até do que os húngaros no final de a gosto de 1849 Os radicais não foram uma ameaça militar para a Áustria quando eles fizeram com que Piedmont declarasse guerra novamente em 1849 os austríacos os venceram facilmente em Nova ra no mês de março Além disso apesar de mais determinados a ex pulsar os austríacos e unificar a Itália eles partilhavam de modo ge ral do medo dos moderados pela revolução social Mesmo Mazzini com todo o seu zelo pelo homem comum preferia que este confinasse seus interesses a questões espirituais detestava socialismo e opunha se a qualquer interferência com a propriedade privada Depois deste fracasso inicial a revolução italiana viveu do tempo dos outros Iro nicamente entre aqueles que suprimiramna estavam os exércitos da França que reconquistou Roma em junho A expedição romana era uma tentativa de assegurar a influência diplomática francesa mais uma vez na península contra a Áustria Também teve a vantagem ex tra de ser popular entre os católicos apoio este que o regime pós revolucionário confiava receber Diferentemente da Itália a Hungria já era uma entidade política mais ou menos unificada as terras da coroa de Santo Estevão com uma constituição eficiente um nãonegligenciávei grau de autonomia e quase todos os elementos de um estado soberano exceto indepen dência Sua fraqueza era que a aristocracia magiar que governava es ta vasta e esmagadora área governava não somente o campesinato da grande planície mas também uma população da qual talvez uns 60 consistisse de croatas sérvios eslovacos romenos e ucranianos sem mencionar uma substancial minoria alemã Estes povos camponeses não eram antipáticos a uma revolução que libertasse os escravos mas sentiam antagonismo pela recusa demonstrada inclusive por alguns radicais de Budapest em fazer qualquer concessão no sentido de reco nhecer suas diferenças nacionais em relação aos magiares Os repre sentantes destas minorias eram hostilizados por uma feroz política de magiarização que objetivava incorporar algumas regiões fronteiriças ainda de alguma forma autônomas num estado magiar centralizado e unitário A Corte em Viena seguindo a habitual máxima imperialista divide e impera ofereceulhes apoio Viria a ser o exército croata sob o comando do barão de Jellacic um amigo de Gaj o pioneiro do nacionalismo iugoslavo quem comandaria o assalto a Viena e a Hungria revolucionárias Apesar disso na área que hoje aproximadamente contém a Hun gria a revolução conseguiu manter o apoio de massa do povo magi ar por razões nacionais e sociais Os camponeses consideravam ter 35 recebido sua liberdade não do imperador mas da revolucionária Dieta Húngara Esta foi a única parte da Europa onde a derrota da revolução foi seguida de algo parecido a uma guerrilha rural que o famoso ban dido Sándor Rósza manteve por vários anos Quando a revolução es tourou a Dieta consistindo de uma Câmara alta de moderados magna tas comprometidos e de uma Câmara baixa dominada por nobres rurais e advogados radicais teve apenas que trocar protestos exigindo ação Tal veio rapidamente a ocorrer sob a liderança de um hábil advogado jornalista e orador Louis Kossuth 180294 que viria a se tornar a personalidade revolucionária internacionalmente mais famosa de 1848 Por razões práticas a Hungria sob um governo de coalizão moderado radical relutantemente autorizado por Viena era um estado autônomo pelo menos até que os Habsburgos estivessem em condições de recon quistála Depois da batalha de Custozza eles pensaram que já estavam e cancelando as leis da reforma húngara de março e invadindo em se guida o país colocaram os húngaros diante da alternativa de capitula ção ou radicalização Conseqüentemente sob a liderança de Kossuth a Hungria virou a mesa depondo o imperador apesar de formalmente não proclamar a república em abril de 1849 O apoio popular e a lide rança militar de Görgei permitiu aos húngaros fazer face ao exército austríaco Eles só vieram a ser derrotados quando Viena em desespero apelou para a derradeira arma da reação as forças russas Isso foi deci sivo Em 13 de agosto a parcela remanescente do exército húngaro ca pitulou não para o comando austríaco mas para o russo Sozinha en tre as revoluções de 1848 a húngara não caiu e nem de longe pareceu cair devido a sua fraqueza interna mas pela esmagadora intervenção externa É evidente que as chances do país em evitar a conquista eram nulas depois que todo o resto ruíra Havia alguma alternativa para esta débâcle geral Quase que certamente não Dos principais grupos sociais envolvidos na revolu ção a burguesia como já vimos descobriu que preferia a ordem à chance de pôr em prática todo o seu programa quando diante da a meaça à propriedade Diante do confronto com a revolução verme lha os moderados liberais e os conservadores marchavam ombro a ombro Os notáveis na França quer dizer as pessoas de respeito influentes e ricas que dirigiam as questões políticas daquela nação deram fim a sua longa e antiga luta entre os partidários dos Bourbons dos Orleans mesmo dos que apoiavam a república e adquiriram uma consciência de classe nacional através de um emergente e novo par tido da ordem As figuraschave na monarquia restaurada dos Habs burgos viriam a ser o ministro do Interior Alexander Bach 180667 um antigo moderado liberal oposicionista e o magnata do comércio e navios K von Bruck 17981860 figurachave no porto de Trieste Os banqueiros e comerciantes da região da Uhr que falavam pelo li beralismo burguês prussiano teriam preferido uma monarquia consti tucional limitada desde que confortavelmente estabelecida como os 36 pilares de uma Prússia restaurada onde todos os eventos viessem a prescindir de um sufrágio democrático De volta os regimes conser vadores restaurados estavam bem preparados para fazer concessões ao liberalismo econômico legal e até cultural dos homens de negó cios desde que isto não significasse um recuo político Como vere mos mais tarde os anos reacionários de 1850 viriam a ser em termos econômicos um período de sistemática liberalização Em 184849 os moderados liberais fizeram então duas importantes descobertas na Europa ocidental que revoluções eram perigosas e que algumas de suas mais substanciais exigências especialmente nos assuntos eco nômicos poderiam vir a ser atingidas sem elas A burguesia cessara então de ser uma força revolucionária O grande corpo de radicais da baixa classe média artesãos des contentes pequenos proprietários etc e mesmo agricultores cujos portavozes e líderes eram intelectuais especialmente jovens e margi nais formavam uma força revolucionária significativa mas dificil mente uma alternativa política Eles alinhavamse em geral com a esquerda democrática A esquerda alemã pedia novas eleições pois seu radicalismo fizera grande estardalhaço em muitas áreas no final de 1848 e início de 1849 apesar de então já não mais dominar as grandes cidades que haviam sido reconquistadas pela reação Na França os democratas radicais conseguiram 2 milhões de votos em 1849 contra 3 milhões para os monarquistas e 800 mil para os mode rados Os intelectuais forneceram seus ativistas mas apenas em Viena a Legião Acadêmica de estudantes chegou a formar efetivamente tropas de choque para combate Chamar 1848 de a revolução dos in telectuais é um erro Eles não eram mais importantes nesta revolução que em quaisquer das outras que ocorreram assim como esta em paí ses relativamente atrasados onde o melhor do estrato médio consistia de pessoas caracterizadas por sua escolarização e comando da palavra escrita graduados de todos os tipos jornalistas professores funcio nários Mas não havia dúvida de que os intelectuais eram proeminen tes poetas tais como Petöfi na Hungria Herwegh e Freiligrath na A lemanha que pertencia ao corpo editorial da Neue Rheinische Zei tung Victor Hugo e o consistente moderado Lamartine na França os professores franceses ainda que suspeitos para os governos perma neceram quietos sob a monarquia de julho e supõese terem feito frente com a ordem em 1848 acadêmicos em grande número na Alemanha a maioria no lado moderado médicos como C G Jacoby 180451 na Prússia Adolf Fischhof 181693 na Áustria cientistas como F V Raspail 17941878 na França e uma vasta quantidade de jornalistas e publicistas dos quais Kossuth era entre todos o mais celebrado e Marx provava ser o mais formidável Como indivíduos tais homens podiam exercer um papel decisivo como membros de um estado social específico ou como membros de uma pequenaburguesia radical não o podiam O radicalismo dos pe quenos que tinha expressão na exigência de uma constituição demo 37 crática de estado fosse constitucional ou republicana fornecendolhes a maioria para si e seus aliados camponeses assim como um governo democrático local que lhes desse controle sob a propriedade municipal e sobre uma série de funções atualmente exercidas pelos burocratas 7 era suficientemente genuíno mesmo com uma crise secular numa das mãos e uma depressão econômica temporária na outra proporcionan do um gosto um pouco amargo O radicalismo dos intelectuais possuía raízes um pouco menos profundas Tinha sua base largamente como descobriuse depois na inabilidade da nova sociedade burguesa de an tes de 1848 em produzir suficiente número de postos de status adequa do para os educados que produzia em quantidade sem precedentes e cuja recompensa salarial era bem mais modesta que suas ambições O que aconteceu com todos aqueles estudantes radicais de 1848 nos anos prósperos de 1850 e 1860 Eles continuaram a herança da tradição fa miliar e finalmente se acomodaram E havia inúmeras possibilidades de acomodarse especialmente depois da retirada da velha nobreza e da diversificação das formas de fazer dinheiro que a burguesia ligada ao comércio produzia para aqueles cujas qualificações eram primariamen te escolaridade Em 1842 10 dos professores de liceus franceses ori ginavamse dos notáveis mas por volta de 1877 nenhum Em 1868 a França produziu poucos graduados secundários bacheliers a mais que nos anos de 1830 mas um número muito maior podia seguir carreira nos bancos comércio no bemsucedido jornalismo e depois de 1870 na política profissional8 Além disso quando diante da revolução vermelha mesmo os ra dicais democratas tendiam a cair na retórica dilacerados entre sua ge nuína simpatia pelo povo e seu sentido de propriedade e dinheiro Diferentes da burguesia liberal eles não mudaram de lado Apenas vacilaram mas nunca muito distantes da direita No que diz respeito aos trabalhadores pobres faltavalhes orga nização liderança e talvez acima de tudo a conjuntura histórica para fornecer uma alternativa política Suficientemente fortes para fazer o projeto de uma revolução social parecer real e ameaçador eles eram porém demasiadamente fracos para fazer algo mais do que ameaçar seus inimigosSuas forças eram desproporcionalmente efetivas pois estavam concentrados em massas famintas nos lugares mais sensíveis ou seja as cidades maiores especialmente as capitais Tudo isto trazia certa fraqueza encoberta em primeiro lugar sua deficiência numérica eles não eram sempre maioria nas cidades ge ralmente considerandose mesmo uma modesta minoria da população e em segundo lugar sua imaturidade política e ideológica Entre e les os estratos mais ativistas e politicamente conscientes consistiam de artesãos préindustriais usando o termo na forma que os ingleses contemporâneos o entendem referindose a trabalhadores tais como artífices artesãos trabalhadores manuais especializados em oficinas nãomecânicas etc Atirados na revolução social seus alvos enquan to massa eram distintamente mais modestos na Alemanha como o 38 impressor comunista Stefan Born descobriu em Berlim Os pobres e os trabalhadores nãoespecializados das cidades e fora da Inglaterra o proletariado industrial e mineiro como um todo não haviam ainda desenvolvido uma ideologia política para si Na zona industrial do norte da França mesmo o republicanismo teve dificuldades em im porse até quase o final da segunda república 1848 viu Lille e Rou baix exclusivamente preocupadas com seus problemas econômicos dirigindo seus tumultos não contra reis ou burgueses mas contra os ainda mais famintos trabalhadores belgas imigrantes Onde os plebeus urbanos ou mais raramente os novos proletá rios encontravamse sob a influência da ideologia jacobinista socia lista ou democráticorepublicana ou como em Viena de estudantes ativistas tornavamse uma força política pelo menos como geradores de motins Sua participação em eleições ainda era baixa e imprevisí vel diferente daqueles trabalhadores rurais pauperizados que na Sa xônia ou Inglaterra eram altamente radicalizados Paradoxalmente fora de Paris isto era raro na França jacobina enquanto que na Ale manha a Liga Comunista de Marx fornecia os elementos de uma rede nacional para a extremaesquerda Fora deste raio de influência os trabalhadores pobres eram politicamente insignificantes Evidentemente não deveríamos subestimar o potencial do pro letariado de 1848 mesmo que jovem e imaturo como força social começando como estava a ter sua consciência enquanto classe Em certo sentido aliás seu potencial revolucionário era maior do que se ria subseqüentemente O duro conhecimento do pauperismo e da crise antes de 1848 havia encorajado poucos a acreditar que o capitalismo poderia ou iria trazer condições decentes de vida ou se trouxesse se elas iriam durar A juventude e a fraqueza da classe trabalhadora ain da emergindo da massa dos trabalhadores pobres mestres artesãos independentes e pequenos comerciantes evitou porém uma concen tração exclusiva em reivindicações econômicas o que só ocorria en tre os mais ignorantes e isolados As reivindicações políticas sem as quais nenhuma revolução é feita nem mesmo a mais puramente soci al delas foram feitas no contexto da situação O objetivo popular em 1848 a república democrática e social era simultaneamente social e político Mas mesmo a experiência trabalhista acrescentada de no vos elementos institucionais baseados na prática de sindicatos e da ação cooperativa não foi suficiente para criar elementos novos e po derosos como os sovietes da revolução russa Além disso organização ideologia e liderança eram lamenta velmente pouco desenvolvidas Mesmo a mais elementar das formas o sindicato era restrito a umas poucas centenas ou no melhor dos ca sos uns poucos milhares de membros Freqüentemente mesmo as so ciedades dos trabalhadores especializados pioneiros em sindicalismo apareceram pela primeira vez durante a revolução os impressores na Alemanha os chapeleiros na França Os socialistas e comunistas or ganizados eram ainda mais limitados em número umas poucas dú 39 zias no máximo umas poucas centenas Portanto 1848 foi a primeira revolução na qual socialistas ou mais precisamente comunistas pois socialismo pré1848 era um movimento largamente apolítico para construir utopias cooperativas apareceram na frente da cena desde o inicio Era o ano não apenas de Kossuth A LedruRollin 180774 e Mazzini mas de Karl Marx 181883 Louis Blanc 181182 e L A Blanqui 180581 o severo rebelde que saiu de uma vida na prisão apenas quando libertado pelas revoluções de Bakunine e mesmo de Proudhon Mas o que significava socialismo para os seus seguidores além de um nome para uma classe trabalhadora autoconsciente com suas próprias aspirações a uma sociedade diferente do capitalismo e baseada na sua derrubada Mesmo seu inimigo não estava claramente definido Falavase muito de classe trabalhadora e mesmo de pro letariado mas durante a revolução nada sobre capitalismo De fato quais eram as perspectivas políticas de uma classe traba lhadora mesmo que socialista O próprio Karl Marx não acreditou que a revolução estivesse na agenda Mesmo na França o proletariado de Paris ainda era incapaz de ir além da república burguesa de outra forma que não fosse na idéia na imaginação Suas necessidades imediatas e confessadas desviavaos da vontade de derrubar a burguesia e nem eles possuíam os instrumentos para tal efetuar O máximo que poderia ser atingido seria uma república burguesa que trouxesse à luz a verdadeira natureza da futura luta a confrontação entre a burguesia e o proletari ado e fixasse na lembrança dos trabalhadores que sua posição como classe ficara mais insuportável e que seu antagonismo com a burguesia tornarase mais agudo9 Seria numa primeira instância uma república democrática numa segunda uma transição de uma revolução burguesa incompleta para uma revolução proletáriapopular e finalmente uma ditadura do proletariado ou como na frase que talvez tenha derivado de Blanqui é que refletiu a temporária proximidade dos dois grandes re volucionários no imediato pós1848 a revolução permanente Mas diferente de Lênin em 1917 Marx não concebeu a substituição da revo lução burguesa por uma proletária até depois da derrota de 1848 e en tão quando formulou uma perspectiva comparável a de Lênin não a manteve por muito tempo Não haveria uma segunda edição de 1848 na Europa central e do norte A classe operária como ele cedo reconhe ceu teria de seguir um caminho diferente Portanto as revoluções de 1848 surgiram e quebraramse como uma grande onda deixando pouco exceto mito e promessa Elas de veriam ter sido revoluções burguesas mas a burguesia fugiu delas Elas poderiam terse reforçado umas às outras sob a liderança da França prevenindo ou adiando a restauração dos velhos governos e mantendo à distância o tzar Mas a burguesia francesa preferiu a esta bilidade social em casa aos prêmios e perigos de ser uma vez mais la grande nation e por razões análogas os líderes moderados da revo lução hesitaram em pedir a intervenção francesa Nenhuma outra for 40 ça social poderia ter sido forte suficientemente para darlhes coerên cia e ímpeto exceto nos casos especiais onde havia luta pela inde pendência contra um poder politicamente dominante e mesmo isso falhou já que as lutas nacionais ficaram isoladas e em todos os ca sos fracas demais para fazer frente aos poderosos de antes Os gran des e característicos personagens de 1848 representaram seus papéis de heróis no palco da Europa por poucos meses para depois desapa recerem para sempre com a exceção de Garibaldi que viria a ter um momento ainda mais glorioso doze anos mais tarde Kossuth e Maz zini viveram o resto de suas vidas no exílio pouco contribuindo dire tamente para a conquista por seus países da autonomia e unificação apesar de terem um lugar garantido nos seus panteões nacionais Le druRollin e Raspail nunca mais vieram a ter um outro momento de celebridade como na segunda república e os eloqüentes professores do parlamento de Frankfurt retiraramse para seus gabinetes Dos passionais exilados de 1850 formando grandes planos e governos ri vais no exílio do fog de Londres nada sobreviveu salvo a obra dos mais isolados e atípicos Marx e Engels Ainda assim 1848 não foi meramente um breve episódio histó rico sem conseqüências Se as mudanças que 1848 realizou não foram nem as que os revolucionários intentaram nem mesmo facilmente de finíveis em termos de regimes políticos leis e instituições elas foram pelo menos bem profundas Marcaram o fim pelo menos na Europa ocidental da política da tradição das monarquias que acreditavam que seus povos exceto os descontentes da classe média aceitavam acolhiam mesmo com prazer a regra do direito divino que apontava dinastias para presidir sobre sociedades hierarquicamente estratifica das tudo sancionado pela tradição religiosa na crença dos direitos e deveres patriarcais dos que eram superiores social e economicamente Como o poeta Grillparzer ele mesmo de forma alguma um revolucio nário escreveu ironicamente sobre presumivelmente Metternich Aqui jaz sua celebridade esquecida O legítimo famoso Dom Quixote Quem revirando a verdade e o fato julgouse esperto E acabou acreditando nas suas próprias mentiras Um velho louco que deve ter sido um patife na juventude Não podia mais reconhecer a verdade10 Dali em diante as forças do conservadorismo privilégio e ri queza teriam que defenderse de outras formas Mesmo os pesados e ignorantes camponeses da Itália do sul na grande primavera de 1848 cessaram de patrocinar o absolutismo como haviam feito 50 anos an tes Quando eles marcharam para ocupar a terra raramente expressa ram hostilidade à constituição Os defensores da ordem social precisaram aprender a política do povo Esta foi a maior inovação trazida pelas revoluções de 1848 41 Mesmo os mais arquireacionários dos junkers prussianos descobri ram naquele ano que precisavam de um jornal que pudesse influen ciar a opinião pública conceito em si próprio ligado ao liberalis mo e incompatível com a hierarquia tradicional O mais inteligente dos arquireacionários prussianos de 1848 Otto von Bismarck 1815 98 mais tarde demonstraria sua lúcida compreensão da natureza da política na sociedade burguesa e seu magistral domínio das suas téc nicas Porém as inovações políticas mais significativas deste tipo o correram na França Ali a derrota da insurreição da classe trabalhadora em junho ha via deixado um poderoso partido da ordem capaz de derrotar a re volução social mas não de conseguir o apoio das massas ou mesmo daqueles conservadores que não desejavam que em função da defesa de sua ordem necessitassem se comprometer com aquele preciso tipo de moderado republicanismo que estava então no poder O povo estava ainda demasiado mobilizado para permitir uma limitação nas eleições somente após 1850 uma substancial parte da vil multidão quer dizer um terço da França dois terços de Paris foi excluída do voto Entretanto em dezembro de 1848 os franceses não elegeram um moderado para a nova presidência da república mas também não elegeram um radical Não havia candidato monarquista O vence dor por maioria esmagadora 55 milhões em 74 milhões de votos foi Luís Napoleão sobrinho do grande imperador Apesar de ter de monstrado mais tarde ser um político notavelmente astuto Napoleão deu a impressão quando assumiu o governo no final de setembro na da mais ter qae um nome prestigiado e o apoio de uma devotada a mante inglesa Evidentemente ele não era um revolucionário no sen tido social mas também não era um conservador seus seguidores chegaram mesmo a fazer algumas brincadeiras com seu interesse na juventude pelo Saintsimonismo Ver Cap 3 parte II mais adiante e alegaram ter ele alguma simpatia pelos pobres Mas basicamente ele venceu porque os camponeses votaram solidamente no slogan A baixo as taxas abaixo os ricos abaixo a república viva o imperador em outras palavras como Marx analisou os trabalhadores votaram nele contra a república dos ricos pois na percepção deles Luís Napo leão significava a deposição de Cavaignac que havia derrotado a in surreição de junho a demissão do republicanismo burguês a recupe ração da vitória de junho 11 e a pequenaburguesia porque ele pare cia não alinharse com a grande burguesia A eleição de Luís Napoleão significou que mesmo a democracia do sufrágio universal aquela instituição identificada com a revolução era compatível com a manutenção da ordem social Mesmo uma mas sa esmagadora de descontentes não estava destinada a eleger gover nantes dedicados a derrubar a sociedade As grandes lições desta Morgado membro da classe dominante na Prússia N T 42 experiência não foram imediatamente apreendidas pois Luís Napole ão cedo aboliu a república e proclamouse imperador apesar de nun ca esquecer as vantagens políticas de um bemconduzido sufrágio u niversal que veio a reintroduzir Ele viria a ser o primeiro dos chefes de estado modernos que governaria não apenas baseado na força das armas mas também com aquela espécie de demagogia e de relações públicas tão mais facilmente operadas do alto do estado do que de qualquer outro lugar Sua experiência demonstra não apenas que a ordem social podia aparecer como uma força capaz de atrair a es querda mas também uma era ou um país onde os cidadãos tinham sido mobilizados para participar na política As revoluções de 1848 deixaram claro que a classe média liberalismo democracia política nacionalismo e mesmo as classes trabalhadoras eram daquele mo mento em diante presenças permanentes no panorama político A derrota das revoluções poderia temporariamente tirálos do cenário mas quando reapareciam determinavam as ações mesmo daqueles es tadistas que tinham menos simpatias por eles Segunda Parte DESENVOLVIMENTO Velocity Distance x Time Time taken to cover a distance Average velocity Average velocity total distance divided by total time taken Displacement Displacement Time Displacement Time Distance Time 45 Segundo Capítulo A GRANDE EXPANSÃO Aqui aquele que é poderoso nas armas da paz capital e maquinaria usaas para proporcionar conforto e alegria para o público do qual ele é um servidor tornandose portanto rico enquanto enriquece a outros com suas mercadorias William Whewell 1852 1 Um povo pode atingir bemestar material sem táticas subversivas se ele for dócil trabalhador e se esforçar sempre para melhorar Dos estatutos da Société contre LIgnorance de ClermontFerrand 1869 2 A área inabitada do mundo expandese rapidamente Novas comuni dades isto é novos mercados diariamente surgem nas outrora de sertas regiões no Novo Mundo no Oeste e nas terras tradicionalmen te férteis do Velho Mundo no Leste Philoponos 1850 3 I Poucos observadores em 1849 poderiam ter predito que 1848 iria ser a última revolução geral no ocidente As reivindicações políti cas do liberalismo radicalismo democrático e nacionalismo apesar de excluírem a república social viriam a ser gradualmente realiza das nos 70 anos seguintes na maioria dos países desenvolvidos sem maiores distúrbios internos e a estrutura social da parte desenvolvida do continente iria provar a si mesma ser capaz de resistir às explosões catastróficas do século XX pelo menos até o presente 1974 A ra zão principal para isso reside na transformação e expansão econômica extraordinárias dos anos entre 1848 e o início da década de 1870 que é o assunto principal deste capítulo Foi o período no qual o mundo tornouse capitalista e uma minoria significativa de países desenvol vidos transformouse em economias industriais Esta era de desmedido avanço econômico começou com um bo om que viria a ser o mais espetacular ocorrido até então e sobretudo por ter sido temporariamente impedido pelos eventos de 1848 As revo luções haviam sido precipitadas pela última e talvez maior das crises Título original The Great Boom NT 46 econômicas do tipo antigo O novo mundo do ciclo do comércio que apenas os socialistas haviam reconhecido como o ritmo básico e modo de operação da economia capitalista tinha seu tipo próprio de flutua ções econômicas e suas próprias dificuldades Porém em meados da década de 1840 embora a difusa e incerta era do desenvolvimento ca pitalista desse a impressão de estar chegando a um fim ao contrário o grande salto para a frente estava apenas por começar 184748 viu um severo tropeço do ciclo do comércio provavelmente agravado por pro blemas remanescentes mais antigos De qualquer modo de um ponto de vista puramente capitalista era apenas uma depressão aguda naquilo que já parecia uma tumultuada economia de negócios James de Roths child que olhava a situação econômica de 1848 com bastante compla cência era um homem de negócios sensível mas profeta político bem pobre O pior do pânico parecia ter passado e as perspectivas a longo prazo eram mais róseas Porém embora a produção industrial tivesse se recuperado bem rapidamente mesmo depois da virtual paralisia dos meses revolucionários a atmosfera geral permanecia incerta O que seguiu foi tão extraordinário que não foi possível detectar um precedente Nunca por exemplo as exportações inglesas cresceram tão rapidamente do que nos primeiros sete anos de 1850 O algodão in glês aumentou sua taxa de crescimento sobre as décadas anteriores En tre 1850 e 1860 a taxa duplicou Em números absolutos a performance é ainda mais impressionante entre 1820 e 1850 estas exportações cresceram em 1 100 milhões de jardas mas na década entre 1850 e 1860 elas cresceram consideravelmente mais que 1 300 milhões O número das máquinas de algodão cresceu de 100 mil entre 181921 e 184446 e dobrou daí até 18504 E estamos aqui lidando com uma grande indústria de há muito estabelecida e mais do que isso que aca bava de perder terreno nos mercados europeus nesta década devido à rapidez do desenvolvimento das indústrias locais Para onde olharmos evidências similares da grande expansão podem ser encontradas A ex portação de ferro da Bélgica mais que duplicou entre 1851 e 1857 Na Prússia um quarto de século antes de 185067 companhias tinham sido fundadas com um capital total de 45 milhões de táleres mas em 1851 57 115 companhias similares tinhamse estabelecido excluindo com panhias de estradas de ferro com um capital total de 1145 milhões quase todas elas nos anos eufóricos entre 1853 e 1857 5 Não é mais necessário continuar a reproduzir estas estatísticas mas os homens de negócios da época divulgavamnas com avidez O que fez este boom tão satisfatório para os homens de negócios famintos de lucros foi a combinação de capital barato e um rápido au mento nos preços Depressões do tipo de ciclo de comércio sempre significaram preços baixos em todos os acontecimentos do século XIX Expansões eram inflacionárias Mesmo assim o aumento de cer ca de um terço dos níveis de preços ingleses entre 184850 e 1857 foi notavelmente grande Os lucros aparentemente à espera de produtores e 47 comerciantes apresentavamse irresistíveis Num certo momento deste período inacreditável a taxa de lucro do capital do credit mobilier de Paris a companhia financeira que era o símbolo da expansão capitalista no período ver capítulo 12 mais adiante chegou a 50 E os homens de negócios não eram os únicos a lucrar Como já foi sugerido o em prego cresceu aos saltos tanto na Europa como no resto do mundo pa ra onde homens e mulheres migravam então em quantidades enormes ver capítulo 11 mais adiante Não sabemos atualmente muito sobre taxas de desemprego mas mesmo na Europa um exemplo de evidência é decisivo O grande aumento no custo dos cereais isto é o principal elemento no custo de vida entre 1853 e 1855 não precipitou mais tu multos em parte alguma salvo em regiões atrasadas como o norte da Itália Piedmont e Espanha onde talvez tenha contribuído para a revo lução de 1854 A alta taxa de emprego e a presteza em conceder au mentos salariais onde fosse necessário apagaram o descontentamento popular Mas para os capitalistas as amplas provisões de trabalho então chegando ao mercado eram relativamente baratas A conseqüência política deste boom era de longo alcance Pro porcionou aos governos sacudidos pela revolução um espaço para respirar de valor inestimável e por outro lado destroçou os ânimos dos revolucionários Numa palavra a política estava em estado de hi bernação Na Inglaterra o cartismo passou à história e o fato de que sua morte tenha sido mais prolongada do que historiadores normal mente supõem não a fez menos definitiva Mesmo Ernest Jones 181969 seu líder mais persistente desistiu de reviver um movi mento independente das classes trabalhadoras no final da década de 1850 A reforma parlamentar cessou de preocupar os políticos ingle ses por algum tempo deixandoos livres para dançar seus complica dos passos de bale parlamentar Mesmo os radicais de classe média Cobden e Bright eram agora uma minoria isolada na política Para as monarquias restauradas do continente e para o filho in desejado da Revolução Francesa o Segundo Império de Napoleão III o espaço para respirar era ainda mais vital Para Napoleão este espaço proporcionou maiorias eleitorais genuínas e comoventes que deram colorido à sua aspiração de ser um imperador democrático Para as velhas monarquias e principados deu tempo para a recuperação polí tica e a legitimação da estabilidade e prosperidade que era então poli ticamente mais relevante que a legitimidade de suas dinastias Tam bém proporcionoulhes lucros sem a necessidade de consultar as sembléias representativas e deixou os exilados políticos a roerem su as unhas e a se atacarem mutuamente com selvageria num exílio sem esperanças Por todo aquele tempo deixouos fracos nos assuntos in ternacionais mas fortes internamente Mesmo o Império dos Habs burgos que já havia sido restaurado em 1849 graças à intervenção do exército russo era agora capaz de pela primeira e única vez na histó ria administrar todos os seus territórios incluindo os húngaros re 48 calcitrantes num único regime absolutista centralizado e burocráti co Este período de calma chegou ao fim com a depressão de 1857 Economicamente falando tratavase apenas de uma interrupção da era de ouro do crescimento capitalista que continuou numa escala até maior na década de 1860 e atingiu seu clímax em 187173 Politica mente transformou a situação Confessadamente desapontou as es peranças dos revolucionários que esperavam um novo 1848 apesar de admitirem que as massas haviamse tornado letárgicas em resul tado desta prolongada prosperidade7 Mas a política reanimouse Em pouco tempo todas as velhas questões da política liberal voltaram à agenda a unificação nacional da Alemanha e da Itália a reforma constitucional liberdades civis e o resto Onde a expansão econômica de 185157 havia tomado lugar num vácuo político prolongando a derrota e a exaustão de 184849 depois de 1859 ela coincidiu com uma intensa e crescente atividade política Por outro lado apesar de interrompida por diversos fatores externos como a Guerra Civil Ame ricana de 186165 a década de 1860 foi do ponto de vista econômi co relativamente estável A depressão de ciclo de comércio seguinte que ocorreu de acordo com o gosto e a região em algum período en tre 1866 e 1868 não chegou a ser tão concentrada global ou dramáti ca como a de 185758 Em resumo a política ganhou novo ânimo num período de expansão mas não era mais a política da revolução II Se a Europa estivesse vivendo a era dos príncipes barrocos teria então sido soterrada por máscaras espetaculares procissões e óperas distribuindo representações alegóricas do triunfo econômico e pro gresso industrial aos pés de seus governantes De fato o mundo triun fante do capitalismo teve seu equivalente A era de sua vitória global foi iniciada e pontilhada pelos gigantescos rituais de autocongratula ção as grandes exibições internacionais cada uma delas encaixada num principesco monumento à riqueza e ao progresso técnico o Pa lácio de Cristal em Londres 1851 a Rotonda maior que São Pedro em Roma em Viena cada qual exibindo o número crescente e varia do de manufaturas cada uma delas atraindo turistas nacionais e es trangeiros em quantidades astronômicas Quatorze mil firmas exibi ram em Londres em 1851 a moda tinha sido condignamente inaugu rada no lar do capitalismo 24 mil em Paris em 1855 29 mil em Londres em 1862 50 mil em Paris em 1867 Justiça seja feita a maior delas todas foi a Feira do Centenário de Filadélfia em 1876 nos Estados Unidos com a presença do Imperador e da Imperatriz do Brasil cabeças coroadas da época curvadas diante dos produtos da indústria e de 130 mil cidadãos Eles eram os primeiros dos dez mi lhões que pagaram tributo naquela ocasião ao progresso da época Quais eram as razões para este progresso Por que a expansão e 49 conômica foi tão acelerada neste período A pergunta precisaria real mente ser feita inversamente O que nos choca retrospectivamente so bre a primeira metade do século XIX é o contraste entre o enorme e crescente potencial produtivo da industrialização capitalista e sua ina bilidade bem patente em aumentar sua base Poderia crescer dramati camente mas parecia incapaz de expandir o mercado para seus produ tos proporcionar saídas lucrativas para seu capital acumulado ter por si só a capacidade de gerar emprego a uma taxa comparável ou com sa lários adequados É instrutivo lembrar que mesmo no final da década de 1840 observadores inteligentes e beminformados na Alemanha no clímax da explosão industrial naquele país admitiam como o fa zem atualmente nos países subdesenvolvidos que nenhuma indus trialização poderia fornecer emprego para a vasta e crescente popula ção em excesso dos pobres Revolucionários tinham tido a esperança de que isso viesse a ser definitivo mas mesmo homens de negócios te meram que isso pudesse vir a estrangular seu sistema industrial Ver 4 Era das Revoluções capítulo 16 Por duas razões estas esperanças ou medos provaram ser infun dados Em primeiro lugar a economia industrial nos seus primórdios descobriu graças largamente à pressão da busca de lucro da acumu lação do capital o que Marx chamou sua suprema realização a es trada de ferro Em segundo lugar e parcialmente devido à estrada de ferro o vapor e o telégrafo que finalmente representaram os meios de comunicação adequados aos meios de produção 8 o espaço geo gráfico da economia capitalista poderia repentinamente multiplicar se na medida em que a intensidade das transações comerciais aumen tasse O mundo inteiro tornouse parte desta economia Esta criação de um único mundo expandido é talvez a mais importante manifesta ção do nosso período ver capítulo 3 adiante Olhando retrospecti vamente meio século depois H M Hyndman simultaneamente um homem de negócios vitoriano e um marxista apesar de atípico em ambos os papéis corretamente comparou os dez anos de 1847 a 1857 com a era das grandes descobertas geográficas e as conquistas de Colombo Vasco da Gama Cortez e Pizarro Apesar de nenhuma descoberta dramática ter tido lugar e com exceções relativamente menores poucas conquistas formais terem sido realizadas por con quistadores militares por razões práticas um mundo econômico intei ramente novo somouse ao antigo e integrouse nele Isto era particularmente crucial para o desenvolvimento econô mico e forneceu a base para a gigantesca expansão nas exportações em mercadorias capital e homens que teve um papel tão importante na expansão daquele que era ainda o maior país capitalista a Inglater ra A economia de consumo de massa ainda repousava no futuro ex ceto talvez nos Estados Unidos O mercado doméstico dos pobres a inda não engrossado por camponeses e pequenos artesãos era desde nhado como base para qualquer avanço econômico espetacular que fosse O capitalismo tinha agora o mundo inteiro a seu dispor e a ex 50 pansão simultânea do comércio e dos investimentos internacionais dá bem a medida do entusiasmo que teve em capturálo O comércio mundial entre 1800 e 1840 não tinha chegado a duplicar Entre 1850 e 1870 cresceu de 260 Qualquer coisa vendável era negociada mesmo aquelas que sofriam direta resistência do país comprador co mo o caso do ópio da Índia britânica exportado para a China que do brou em quantidade e triplicou de preço O número médio de caixas de ópio de Bengala exportadas anualmente em 184449 era de 43 mil e em 186974 87 mil Por volta de 1875 um bilhão de libras es terlinas tinham sido investidas no exterior pela Inglaterra três quar tas partes deste montante desde 1850 enquanto o investimento ex terno francês decuplicava entre 1850 e 1880 Observadores da época com seus olhos fixos em aspectos me nos fundamentais da economia certamente apontariam um outro fa tor as grandes descobertas de ouro na Califórnia Austrália e outros lugares depois de 1848 ver capítulo 3 mais adiante Estas descober tas multiplicaram os meios de pagamento disponíveis para a econo mia mundial e removeram o que muitos homens de negócios acharam ser uma escassez de meios de pagamento paralisante abaixaram a taxa de juros e encorajaram a expansão do crédito Em sete anos a disponibilidade mundial de ouro aumentou de seis a sete vezes assim como a quantidade de impressões de moedas de ouro emitidas pela Inglaterra França e Estados Unidos cresceu de uma média anual de 49 milhões de libras em 184849 para 281 milhões de libras por ano entre 1850 e 1856 O papel da barra de ouro na economia mundial continua a ser até hoje um assunto de discussão apaixonada debate este que não devemos abordar Sua ausência entretanto não deve ter trazido tantos inconvenientes quanto foi imaginado pelos observado res da época outros meios de pagamento como cheques uma grande novidade faturas etc estavam em expansão e a uma taxa conside rável Porém três aspectos da nova disponibilidade de ouro pratica mente não levantavam controvérsias Em primeiro lugar ajudaram talvez de forma decisiva a produ zir aquela situação relativamente rara entre cerca de 1810 e o fim do século XIX uma era de aumento de preços ou de inflação moderada porém flutuante Basicamente a maior parte deste século foi defla cionária devido grandemente à persistente tendência da tecnologia em baratear produtos manufaturados e das recémabertas fontes de matériasprimas e alimentos que barateavam mesmo que mais inter mitentemente os produtos primários Deflação a longo termo isto é pressão nas margens de lucro não fizeram muito mal aos homens de negócios porque estes fabricaram e venderam uma quantidade muito mais vasta Porém até pouco depois do fim de nosso período não fez aos trabalhadores muito bem já que ou o custo de vida não caía na mesma razão ou seus salários eram demasiado magros para permitir lhes algum benefício De outro lado a inflação indiscutivelmente au mentou as margens de lucro e assim fazendo encorajou os negócios 51 Nosso período foi basicamente um interlúdio inflacionário num sécu lo deflacionário Segundo a disponibilidade de barras de ouro em largas quantida des ajudou a estabelecer aquele standard monetário estável e seguro baseado na libra esterlina fixada com paridade no ouro sem o qual como a experiência das décadas de 1930 e 1970 viria demonstrar o co mércio mundial tornase mais difícil complexo e imprevisível Tercei ro os caçadores de ouro abriram eles mesmos novas áreas sobretudo no Pacífico para intensa atividade econômica Assim fazendo eles criaram mercados a partir do nada como Engels tristemente colocou para Marx E em meados da década de 1870 Califórnia Austrália e ou tras zonas auríferas já não eram nada negligenciáveis Elas continham para mais de três milhões de habitantes com mais dinheiro na mão que qualquer outra população comparável em tamanho Observadores da época também teriam dado ênfase à contribui ção de um outro fator a liberação da iniciativa privada engenho com o qual todos concordam o progresso da indústria ganhou força Nun ca houve um consenso mais esmagador entre economistas ou polí ticos e administradores inteligentes no que toca à receita para o cres cimento de sua época o liberalismo econômico As barreiras institucionais sobreviventes ao livre movimento dos fatores de produção à livre iniciativa ou a qualquer coisa que conce bivelmente pudesse vir a tolher sua operacionalidade lucrativa caíram diante de uma ofensiva mundial O que torna esta suspensão geral de barreiras tão extraordinária é que ela não estava limitada aos estados onde o liberalismo político era triunfante ou mesmo influente Se ti nha sido mais drástica nas monarquias absolutas restauradas e princi pados da Europa que na Inglaterra França ou Países Baixos era por que ali muito mais havia a ser levado de roldão O controle das corpo rações sobre a produção artesanal que tinha permanecido forte na A lemanha deu lugar a Gewerbefreiheit liberdade para iniciar e prati car qualquer forma de comércio na Áustria em 1859 e na maior parte da Alemanha na primeira metade da década de 1860 Foi final mente estabelecida de forma completa na Federação do Norte da A lemanha 1869 e no Império alemão para o descontentamento de numerosos artesãos que deveriam conseqüentemente tornarse de forma crescente hostis ao liberalismo chegando a proporcionar uma base política para movimentos de extremadireita a partir de 1870 A Suécia que havia abolido as taxas em 1846 estabeleceu completa li berdade em 1864 a Dinamarca aboliu a velha legislação de taxas em 1849 e 1857 a Rússia que na sua maior parte não havia conhecido um sistema de taxas removeu os últimos vestígios do que havia em uma das cidades alemães da sua província báltica 1866 apesar de ter continuado por razões políticas a restringir o direito dos judeus de praticar comércio e negócios a uma área específica Esta liquidação legal dos períodos medieval e mercantilista não 52 foi limitada a uma legislação profissional As leis contra a usura caíram por terra na Inglaterra Holanda Bélgica e norte da Alemanha entre 1854 e 1867 O controle severo que o governo exercia sobre a mi neração incluindo a operação de minas foi virtualmente suspenso como por exemplo na Prússia entre 1851 e 1865 e portanto sujeito à permissão governamental qualquer empresário poderia então reclamar os direitos para explorar qualquer mineral que viesse a achar e condu zir as explorações da forma que melhor lhe aprouvesse Similarmente a formação de companhias de negócios de então ficou muito mais livre do controle burocrático A Inglaterra e a França conduziram estas mo dificações enquanto a Alemanha só veio a estabelecer medidas simila res por volta da década de 1870 A lei comercial foi então adaptada à atmosfera que prevalecia de florescente expansão comercial Mas de alguma forma a tendência mais impressionante era o movimento em direção à total liberdade de comércio Abertamente a penas a Inglaterra havia abandonado o protecionismo de forma total mantendo taxas alfandegárias pelo menos teoricamente apenas por razões fiscais Portanto exceto pela eliminação ou redução de res trições etc nas vias navegáveis internacionais como o Danúbio 1857 e o tráfico entre a Dinamarca e a Suécia além da simplificação do sis tema monetário internacional pela criação de grandes zonas monetárias por exemplo a União Monetária Latina da França Bélgica Suíça e I tália em 1865 uma série de tratados de livre comércio cortaram substancialmente as barreiras de tarifas entre as nações industriais líde res na década de 1860 Mesmo a Rússia 1863 e a Espanha 1868 li garamse de certa forma ao movimento Apenas os Estados Unidos cu ja indústria apoiavase grandemente num mercado interno protegido e era pobre em exportações permaneceu um bastião do protecionismo mas mesmo assim mostrou alguma modificação no começo da década de 1870 Podemos mesmo dar mais um passo Até aquele momento mes mo as mais audaciosas e seguras economias capitalistas haviam hesi tado em repousar inteiramente no livre mercado com o qual estavam teoricamente comprometidas principalmente no que diz respeito à re lação entre patrões e empregados Mesmo neste campo sensível mo tivações nãoeconômicas foram evitadas Na Inglaterra a lei do Se nhor e do Empregado foi modificada estabelecendose igualdade de tratamento no que toca ao rompimento de contrato entre ambas as partes O que a primeira vista é mais surpreendente entre 1867 e 1875 todos os significativos obstáculos legais aos sindicatos traba lhistas e ao direito de greve foram abolidos com um impressionante pouco estardalhaço ver capítulo 6 mais adiante Muitos outros paí ses ainda hesitaram em conceder tal liberdade à organização traba lhista apesar do que Napoleão III relaxou a proibição legal sobre os sindicatos de forma bastante significativa Mesmo assim a situação geral nos países desenvolvidos tendia então para transformarse na 53 quilo que havia sido descrito no Gewerbeordnunq alemão de 1869 As relações entre aqueles que independentemente praticam um ne gócio e seus trabalhadores assistentes ou aprendizes são determina das por contrato livre Apenas o mercado regulava a compra e venda da força de trabalho como para qualquer outra coisa Indiscutivelmente este vasto processo de liberalização encora jou a iniciativa privada assim como a liberalização do comércio aju dou a expansão econômica mas não devemos esquecer que muito da liberalização formal não era realmente necessária Algumas formas de livre movimento internacional que hoje são controladas sobretudo as do capital e trabalho isto é migração eram em 1848 tomadas como dadas no mundo desenvolvido de forma que não eram sequer discu tidas ver capítulo II mais adiante Por outro lado a questão do lugar que as mudanças institucionais ou legais tomam no desenvolvimento é demasiadamente complexa para a fórmula simplista do século XIX liberalização cria progresso econômico A era de expansão já tinha começado antes mesmo que as corn laws tivessem sido revogadas na Inglaterra em 1846 Não há dúvida que a liberalização trouxe todo o tipo de resultados especificamente positivos Tanto que Copenhague começou a desenvolverse mais rapidamente como cidade depois da abolição das leis que desencorajavam os navios mercantes de entrar no Báltico 1857 Mas até onde o movimento global para liberalizar era uma causa concomitante ou conseqüência da expansão econômi ca fica aberto para discussão A única coisa certa é que quando ou tras bases para o desenvolvimento capitalista faziam sentir sua falta a liberalização não resolvia tudo por si mesma Nenhum lugar liberali zou mais do que a República de Nova Granada Colômbia entre 1848 e 1854 mas quem afirmaria que as grandes esperanças de pros peridade de seus chefes de estado foram realizadas imediatamente se é que foram realizadas Todavia na Europa estas mudanças indicaram uma profunda e grande confiança no liberalismo econômico que parecia ser justifica do por uma geração Dentro de cada país isto não era tão surpreen dente já que a iniciativa capitalista privada florescia tão claramente Corn laws Na história inglesa as leis regulando a importação e exportação de trigo embora haja registros que mencionem a imposição de tais restrições desde o século XII e las só vieram a tornarse politicamente importantes no final do século XVII e inícios do XIX diante da falta crescente do produto devido ao aumento populacional da Inglaterra e aos bloqueios impostos pelas guerras napoleônicas As Leis do Trigo foram finalmente re vogadas em 1846 um triunfo para os produtores cuja expansão havia sido dificultada pela proteção ao cereal contra os interesses dos senhores da terra Desde 1822 esta proteção era persistentemente impopular De 1839 a 1846 a AntiCorn Law Leaque operando de Man chester sob a direção de Richard Cobden mobilizou as classes médias e os industriais con tra os senhores da terra e depois que o primeiroministro Sir Robert Peel passou a represen tar os interesses da Leaque e a safra da batata na Irlanda foi um fracasso 1845 todas as Leis do Trigo foram revogadas cessando a agitação N T 54 Enfim mesmo a liberdade de contrato para os trabalhadores incluin do a tolerância de sindicatos suficientemente fortes para se estabele cerem pelo poder de barganha de seus associados pouco parecia a meaçar os lucros já que o exército industrial de reserva como Marx o chamou consistindo basicamente de massas de camponeses exartesãos e outros habitantes das cidades e regiões industriais man tinha os salários a um nível satisfatoriamente modesto ver os capítu los 11 e 12 mais adiante O entusiasmo pelo comércio livre interna cional é à primeira vista mais surpreendente exceto entre os ingleses para os quais significou acima de tudo que lhes era livremente per mitido encorajar países subdesenvolvidos a vender seus próprios pro dutos basicamente alimentos e matériasprimas barato e em gran de quantidade de forma a conseguir as divisas necessárias para com prar as manufaturas inglesas Mas por que os rivais da Inglaterra com a exceção dos Estados Unidos aceitaram este arranjo aparentemente desfavorável Para os países subdesenvolvidos que não procuravam competir industrial mente isto era evidentemente atraente os estados do sul dos Estados Unidos por exemplo estavam bastantes contentes de ter um mercado ilimitado para seu algodão na Inglaterra e portanto ficaram fortemen te ligados ao comércio livre até serem conquistados pelo norte É um exagero dizer que o comércio livre internacional progrediu porque neste breve momento a utopia liberal genuinamente empolgou até governos mesmo que somente com a força daquilo que acreditavam ser uma inevitabilidade histórica mas não há dúvida que eles esta vam muito influenciados pelos argumentos econômicos que pareciam ter a força de leis naturais Porém convicção intelectual é raramente mais forte que o interesse próprio Mas o fato é que a maior parte das economias em vias de industrialização podiam ver neste período duas vantagens no livre comércio Em primeiro lugar a expansão geral do comércio mundial que era realmente muito espetacular comparada ao período de antes de 1840 beneficiou a todos mesmo que beneficiasse desproporcionalmente à Inglaterra Tanto um comércio de exportação grande e sem impedimentos quanto uma fonte de alimentos e maté riasprimas igualmente grande e sem impedimentos eram evidente mente desejáveis Se alguns interesses específicos pudessem ser afe tados de forma adversa havia outros que a liberalização compensava Em segundo lugar qual fosse a futura rivalidade entre as economias capitalistas nesta etapa de industrialização a vantagem de poder utili zar o equipamento as fontes e o knowhow da Inglaterra era bastante útil Para tomar apenas um exemplo ilustrado pelo quadro seguinte o ferro para estradas de ferro e maquinaria cujas exportações au mentaram na Inglaterra não inibiu a industrialização de outros países mas pelo contrário facilitoua 55 EXPORTAÇÃO DE FERRO E AÇO PARA ESTRADAS DE FERRO E MAQUINARIA total qüinqüenal em milhares de toneladas ferro e aço p estradas de ferro maquinaria 184549 1291 49184650 185054 2846 86 185660 2333 177 186165 2067 227 186670 3809 249 187075 4040 441 Fonte B R Mitchell P Leane Abstract of Históricol Statistics Cambridge 1962 pp 1467 III A economia capitalista recebeu portanto simultaneamente o que não quer dizer acidentalmente um número de estímulos extremamente poderosos Qual foi o resultado Expansão econômica é mais conveni entemente medida em estatística e a sua mais característica medida do século XIX era a força a vapor já que a força a vapor era a típica forma de força e seus produtos associados carvão e ferro Meados do século XIX eram fundamentalmente a era da fumaça e do vapor A produção de carvão já era de longa data medida em milhões de toneladas mas agora chegava a ser medida em dezenas de milhões para países indivi dualmente e em centenas de milhões para o mundo Cerca de metade deste carvão um pouco mais no início de nosso período vinha do produtor incomparavelmente maior a Inglaterra A produção de ferro ali havia atingido a ordem da magnitude de milhões na década de 1830 era de 25 milhões de toneladas em 1850 Por volta de 1870 a França Alemanha e os Estados Unidos produziam cada um entre um e dois mi lhões de toneladas enquanto a Inglaterra ainda a oficina do mundo permanecia bem na frente com 6 milhões ou seja metade da produção mundial Naqueles 20 anos a produção mundial de carvão multiplicou se por duas vezes e meia a produção de ferro multiplicouse por quatro vezes A força total de vapor porém multiplicouse por quatro vezes e meia subindo de uma estimativa de 4 milhões HP em 1850 para cerca de 185 milhões de HP em 1870 Estes números brutais indicam um pouco mais além de que a in dustrialização estava em processo O fato significativo era que o pro gresso estava agora geograficamente muito mais espalhado apesar de muito desigual A presença de estradas de ferro e numa escala me nor máquinas a vapor introduzia então o poder mecânico em todos 56 os continentes e em países nãoindustrializados A chegada da estrada de ferro ver capítulo 3 mais adiante era em si mesmo um símbolo revolucionário já que a construção do planeta como uma economia única era de várias formas o aspecto mais espetacular e de maior al cance da industrialização Mas a máquina fixa por si própria fez progressos dramáticos na fábrica e na mina Na Suíça foram instala das 34 máquinas em 1850 mas em 1870 havia quase mil na Áustria o número subiu de 671 1852 para 9160 1875 aumentando de mais de 15 vezes os HP Para comparação um país europeu realmen te atrasado como Portugal ainda tinha umas poucas 70 máquinas tota lizando 1200 HP em 1873 O total da força a vapor da Holanda mul tiplicouse por trinta vezes Havia algumas regiões industriais menores e algumas economi as industriais européias como a Suécia haviam começado de pouco o processo de industrialização em forma ampla Mas o fato mais signi ficativo era o desenvolvimento desigual dos centros mais importantes No começo de nosso período a Inglaterra e a Bélgica eram os únicos países onde a indústria tinha se desenvolvido de forma intensiva e ambos permaneceram os mais altamente industrializados per capita O consumo de aço destes países por habitante em 1850 era respecti vamente de 170 libras e 90 libras comparadas às 56 libras dos Esta dos Unidos 37 na França e 27 na Alemanha A Bélgica era uma eco nomia pequena mas relativamente importante em 1873 já produzia uma vez e meia mais ferro que seu vizinho muito maior a França A Inglaterra evidentemente era o país industrial par excellence e como já vimos conseguiu manter sua posição relativa apesar de que sua capacidade produtiva de força a vapor havia começado a declinar se riamente Em 1850 a Inglaterra possuía bem mais de um terço de to da a força a vapor mas já na década de 1870 possuía apenas uma quarta parte ou menos 900 mil HP de um total de 41 milhões de HP Em números absolutos os Estados Unidos já estavam um pouco mais na frente por volta de 1850 e deixaram a Inglaterra bem atrás em 1870 com mais do dobro da força a vapor que a velha Inglaterra mas mesmo assim a expansão industrial americana apesar de extraordiná ria era menos sensacional que a da Alemanha A força a vapor fixa desta última era extremamente modesta em 1850 talvez 40 mil HP no todo muito menos que 10 das dos ingleses e em 1870 era de 900 mil HP o mesmo que a Inglaterra e muito superior à francesa A industrialização da Alemanha era um fato histórico de impor tância maior Bem distintas de sua importância econômica suas im plicações políticas eram de longo alcance Em 1850 a federação ale mã tinha tantos habitantes quanto a França mas sua capacidade in dustrial era incomparavelmente menor Em 1871 um império alemão unido já era mais populoso que a França e muito mais poderoso eco nomicamente E desde que o poder político e militar passou a se ba sear de forma crescente no potencial industrial capacidade tecnológi ca e knowhow as conseqüências políticas do desenvolvimento indus 57 trial tornaramse bem mais sérias do que antes As guerras de 1860 demonstraram isto ver capítulo 4 mais adiante Daquele momento em diante nenhum estado poderia manter seu lugar no clube dos su perpoderes sem aquelas bases Os produtos característicos da era vieram a ser o ferro e o carvão e seu símbolo mais espetacular a estrada de ferro que os combinava Têxteis o mais típico produto da primeira fase de industrialização cresceu comparativamente menos O consumo de algodão na década de 1850 era cerca de 60 maior do que na década de 1840 mas perma neceu estático na década de 1860 porque a indústria tinha sido parali sada pela Guerra Civil Americana e cresceu por volta de 50 na dé cada seguinte de 1870 A produção de lã em 1870 era o dobro da de l840 Mas a produção de carvão e ferro havia quintuplicado enquanto pela primeira vez tornavase possível a produção em massa de aço Du rante este período as inovações tecnológicas na indústria do ferro e do aço tiveram um papel análogo ao das inovações na indústria têxtil da era precedente No continente europeu exceto na Bélgica onde sempre prevaleceu o carvão mineral substituiu o carvão de lenha como prin cipal combustível na década de 1850 Por toda parte novos processos o conversor de Bessemer 1856 o alto forno SiemensMartin 1864 tornaram possível a manufatura de aço barato que vinha quase que substituir o ferro forjado Porém sua importância estava no futuro Em 1870 apenas 15 do ferro acabado produzido na Alemanha menos do produzido 10 na Inglaterra terminava por se transformar em aço Nosso período ainda não era a idade do aço nem mesmo ainda a era dos armamentos que deram ao novo material um ímpeto significativo Era a idade do ferro Porém mesmo tendo tornado possível a tecnologia revolucioná ria do futuro a nova indústria pesada não era particularmente revo lucionária senão em escala Em termos globais a Revolução Industri al da década de 1870 ainda estava impulsionada pelo ímpeto gerado pelas inovações técnicas de 17601840 Mesmo assim as décadas do meado do século desenvolveram duas formas de indústria baseada numa tecnologia ainda mais revolucionária a química e na medida em que dizia respeito a comunicações a elétrica Com pequenas exceções as principais invenções técnicas da pri meira fase industrial não exigiram conhecimento científico muito avan çado Felizmente para a Inglaterra elas estavam dentro da possibilidade de compreensão de homens práticos experientes e com bom senso co mo George Stephenson o grande construtor de estradas de ferro A par tir da metade o século as coisas se modificaram O telégrafo estava li gado bem de perto à ciência acadêmica através de homens como C Wheatstone 180275 de Londres e William Thompson Lord Kelvin 18241907 de Glasgow As tintas artificiais da indústria um triunfo de síntese de massa química apesar de seu primeiro produto a cor vio leta claro não ser aclamado mundialmente por suas qualidades estéti cas nasceu de um laboratório dentro de uma fábrica 58 Assim também ocorreu com os explosivos e a fotografia Pelo menos uma das inovações cruciais na produção de aço o processo GilchristThomas básico veio através da educação universitária Como testemunham as novelas de Júlio Verne 18281905 o profes sor tornouse uma figura industrial mais importante do que nunca não foi ao grande L Pasteur 182295 que os produtores de vinho na França foram procurar para resolver um difícil problema Acima de tudo o laboratório de pesquisa tornouse parte integrante do desen volvimento industrial Na Europa ele permaneceu ligado a universi dades ou instituições similares a de Ernst Abbe em Iena desenvol veu as famosas peças de fabricação Zeiss mas nos Estados Unidos o laboratório puramente comercial já havia aparecido no limiar das companhias telegráficas Cedo seriam famosas através de Thomas Alva Edison 18471931 Uma conseqüência significativa desta penetração da indústria pela ciência era que dali em diante o sistema educacional tornarase crucial para o desenvolvimento da indústria Os pioneiros da primeira fase in dustrial Inglaterra e Bélgica não estavam entre os povos mais alfabeti zados e seus sistemas de educação avançada ou tecnológica se exce tuarmos o escocês estavam longe de serem bons Daquele momento em diante era quase impossível que um país onde faltasse educação de massa e instituições de educação avançada viesse a se tornar uma eco nomia moderna e viceversa países pobres e retrógrados que conta vam com um bom sistema educacional encontraram facilidade para i niciar o desenvolvimento como por exemplo a Suécia O valor prático de uma boa educação primária para uma tecno logia científica econômica e militar é evidente Não foi outra a razão da facilidade com que a Prússia derrotou os franceses em 187071 se não a alfabetização muito superior de seus soldados Por outro lado o que o desenvolvimento econômico precisava em nível mais elevado não era tanto originalidade científica e sofisticação estas poderiam ser emprestadas mas a capacidade de compreender e manipular ci ência desenvolvimento mais do que pesquisa As universidades e Taxa de analfabetismo em alguns países europeus homens Inglaterra 1875 17 Suécia 1875 1 França 1875 18 Dinamarca 185960 3 Bélgica 1875 23 Itália 1875 52 Escócia 1875 9 Áustria 1875 42 Suíça 1879 6 Rússia 1875 79 Alemanha 1875 2 Espanha 1877 63 Maridos récémcasados analfabetos Recrutas analfabetos Fonte CM Cipolla Literacy and Development in the West Harmondwsorth 1969 Tabela I Apêndice II III 59 academias técnicas americanas que ombreavam com o nível de Cambridge ou a Polvtechnique eram economicamente superiores às britânicas porque proporcionavam uma educação sistemática para en genheiros como ainda não se pensava fazer na Inglaterra Até 1898 a única forma de tornarse um engenheiro profissional na Inglaterra era por aprendizagem Os americanos eram também superiores aos fran ceses porque produziam em massa engenheiros de nível adequado ao invés de produzir uns poucos superiormente inteligentes e de grande cultura como na França Os alemães neste aspecto confiavam nas suas excelentes escolas secundárias em lugar de suas universidades e pela década de 1850 iniciouse como pioneira a Realschule uma es cola secundária nãoclássica de orientação técnica Quando em 1867 os notoriamente industriais educados da região da Uhr rece beram convite para contribuir para o qüinquagésimo aniversário da universidade de Bonn todos os industriais com uma única exceção recusaram alegando que os eminentes industriais locais não tiveram uma alta educação wissenschaftlich acadêmica e não iriam dar coisa semelhante a seus filhos10 Apesar disso a tecnologia tinha uma base científica e é surpre endente como as inovações de um punhado de pioneiros científicos desde que concebidas em termos facilmente conversíveis em maqui naria fossem tão rápida e amplamente adotados Novas matérias primas freqüentemente encontráveis apenas fora da Europa atingi ram a partir daí uma significação que só viria a se tornar evidente no período subseqüente do imperialismo Desse modo petróleo já havia atraído a atenção dos engenhosos ianques como um combustível con veniente para lâmpadas mas rapidamente encontrou novos usos atra vés do processamento químico Em 1859 apenas dois mil barris ha viam sido produzidos mas por volta de 1874 quase 11 milhões de barris a maioria proveniente de Pensilvânia e Nova York já davam meios a John D Rockfeller 18391937 para estabelecer um cerco à nova indústria pelo controle de seu transporte através de sua Standard Oil Company Apesar disso tudo estas inovações parecem mais significativas quando vistas em retrospecto do que no seu próprio tempo Pelo final da década de 1860 um expert ainda pensava que os únicos metais que tinham um futuro econômico importante eram aqueles conhecidos dos antigos ferro cobre estanho chumbo mercúrio ouro e prata Man ganes níquel cobalto e alumínio ele concluía não parecem in clinados a ter um papel tão importante quanto seus antecessores O crescimento das importações de borracha pela Inglaterra de 7600 cwt em 1850 para 159 mil cwt em 1876 era realmente notável mas as quantidades viriam a ser desprezíveis pelos padrões de vinte anos cwt abreviatura de hundredweight que quer dizer peso de 112 libras Eqüivale no sistema decimal a 508024 kg NT 60 mais tarde Os usos mais comuns deste material ainda quase que to talmente coletado em forma bruta na América do Sul ainda eram em coisas tais como roupas a prova dágua e elástico Em 1876 havia exatamente 200 telefones trabalhando na Europa e 380 nos Estados Unidos e na Exposição Internacional de Viena a operação de uma bomba dágua movida a eletricidade ainda era uma grande novidade Olhando para trás podemos observar que a ruptura estava bem pró xima o mundo estava prestes a entrar na era da luz e força elétricas do aço e ligas de aço do telefone e fonógrafo das turbinas e máqui nas a explosão Mas tudo isso ainda não havia acontecido em meados da década de 1870 A maior inovação industrial excetuandose os campos científi cos acima mencionados foi provavelmente a produção em massa de maquinaria que tinha sido construída virtualmente à mão como as locomotivas e os navios o são até hoje A maior parte do avançona engenharia de produção de massa veio dos Estados Unidos pioneiro do revólver Colt rifle Winchester relógios produzidos em massa máquina de costura e através dos matadouros de Cincinatti e Chica go na década de 1860 as modernas linhas de montagem isto é o transporte mecânico do objeto de produção de uma operação à se guinte A essência da máquina produzida pela máquina que implica va no desenvolvimento de máquinasoperatrizes automáticas ou semi automáticas era que vinha a ser demandada em quantidades estandar tizadas muito superiores a qualquer outra máquina isto é por indi víduos e não por firmas ou instituições O mundo inteiro em 1875 ti nha talvez 62 mil locomotivas mas o que era esta demanda compara da aos 400 mil relógios de pulso produzidos nos Estados Unidos em um único ano 1855 ou os rifles demandados pelos 3 milhões de sol dados Federais e Confederados entre 1861 e 1865 na Guerra Civil Americana Conseqüentemente os produtos mais claramente tenden tes a seguir a linha de produção em massa eram aqueles que pudes sem ser usados por um número muito grande de pequenos produtores como fazendeiros e costureiras as máquinas de costura em escritó rios a máquina de escrever bens de consumo como relógios mas acima de tudo as pequenas armas e munição de guerra Estes produ tos eram de alguma forma especializados e atípicos Tudo isto assus tava os europeus que já percebiam por volta de 1860 a superiorida de tecnológica dos Estados Unidos na produção em massa mas que ainda não tinham percebido o homem prático pois pensavam que os americanos não iriam se preocupar em inventar máquinas para produzir artigos inferiores se havia na Europa uma fonte de artesãos preparados e versáteis Sobretudo não foi uma autoridade francesa que disse já em 1900 que a França poderia talvez não ser capaz de ombrear com outros países na indústria de produção de massa mas poderia manter facilmente sua posição na indústria onde habilidade talento e destreza fossem decisivos a manufatura de automóveis 61 IV Os homens de negócios olhando à sua volta para o mundo no começo de 1870 podiam transpirar confiança para não dizer compla cência Mas seria tal fato justificado Mesmo que a gigantesca expan são da economia mundial agora firmemente sustentada na industriali zação de numerosos países e com um denso e genuinamente global dilúvio de mercadorias capital e homens continuasse ou mesmo fos se acelerada o efeito das injeções específicas de energia que havia recebido na década de 1840 não iria durar muito O novo mundo a berto à empresa capitalista continuaria a crescer mas não seria mais absolutamente novo Realmente logo que os seus produtos como trigo e outros cereais dos campos americanos e das estepes russas começaram a ser derramados no velho mundo como ocorreu nas dé cadas de 1870 e 1880 tal fato iria romper e colocar fora do lugar a agricultura tanto dos velhos como dos novos países Por uma geração inteira a construção das ferrovias pelo mundo foi em frente Mas o que aconteceria quando as ferrovias se tornassem menos universais devido a que a maior parte delas já havia sido construída O potencial tecnológico da primeira Revolução Industrial a inglesa do algodão carvão ferro e máquinas a vapor parecia suficientemente vasto Uma geração que começasse a explorar este potencial mais adequadamente poderia ser perdoada por julgálo inexaurível Mas isso não ocorreu e já em 1870 os limites deste tipo de tecnologia eram visíveis O que i ria ocorrer se viesse a ser exaurido Com o mundo entrando na década de 1870 estas sombrias refle xões pareciam absurdas Mas na verdade o processo de expansão e ra como todos agora reconhecem curiosamente catastrófico Violen tas quedas algumas vezes dramáticas e globais sucediam booms es tratosféricos até que os preços descessem suficientemente para dissi par os mercados retraídos e limpar o campo de empresas falidas para que então os homens de negócios recomeçassem o investimento e a expansão renovando desta forma o ciclo Foi em 1860 depois da primeira destas quedas mundiais que os economistas acadêmicos na pessoa de um brilhante doutor francês Clement Juglar 18191905 reconheceram e mediram a periodicidade deste ciclo do comércio até então considerado apenas por socialistas e outros elementos hete rodoxos Portanto por mais dramáticas que fossem estas interrupções na expansão elas eram temporárias Nunca foi tão alta a euforia entre estes homens de negócios quanto no começo da década de 1870 du rante o famoso Gründerjahre anos da promoção comercial na Ale manha período no qual os projetos mais absurdos e evidentemente fraudulentos de companhias encontraram dinheiro fácil para seus ob jetivos Eram os dias como um jornalista vienense descreveu em que companhias existiam para transportar a aurora boreal em oleodutos 62 para a Praça de Santo Estevão e para vender produção em massa de botas para os nativos das ilhas dos mares do sul 12 Então veio a derrocada Mesmo para o gosto de um período que apreciava booms brilhantes e coloridos foi bastante dramática 21000 milhas de estradas de ferro americanas entraram em colapso e falência as ações na bolsa alemã caíram em 60 entre a alta e 1877 e mais característico quase metade dos altos fornos nos grandes produtores de ferro pararam O dilúvio de imigrantes para o Novo Mundo foi reduzido para um modesto rio Entre 1865 e 1873 anual mente mais de 200 mil chegavam no porto de Nova York mas em 1877 apenas 63 mil o fizeram Mas diferente das outras quedas du rante o século esta não parecia chegar a um fim Já tarde em 1889 um estudo alemão descrevendose a si mesmo como uma introdução aos estudos econômicos para dirigentes e homens de negócios ob servava que desde a queda da bolsa em 1883 a palavra crise tem constantemente com apenas algumas breves interrupções estado pre sente na cabeça de todos 13 E isso na Alemanha o país cuja expan são econômica neste período continuava a ser espetacular Historiado res têm duvidado da existência daquilo que tem sido chamado A Grande Depressão de 1873 a 1896 que evidentemente não foi tão dramática quando a de 1929 a 1934 quando a economia capitalista mundial chegou a entrar em colapso No entanto observadores da é poca não tinham dúvida de que o grande boom havia sido seguido por uma grande depressão Uma nova era na história tanto política quanto econômica abre se com a depressão da década de 1870 Esta era encontrase fora dos limites deste volume apesar do que podemos ressaltar de passagem que minou ou destruiu as fundações do liberalismo de meados do sé culo XIX que parecia tão fortemente estabelecido O período do final da década de 1840 até meados da década de 1870 iria provar não ser contrariamente ao desejo convencional de alguns o modelo de cresci mento econômico desenvolvimento político progresso intelectual e realização cultural que iria apesar de tudo terminar por sobreviver com algumas melhoras no futuro indefinido mas ao invés de tudo is so uma espécie de interlúdio Entretanto suas realizações globais e ram de qualquer forma extremamente surpreendentes Nesta era o capitalismo industrial tornouse uma genuína economia mundial e o globo estava transformado dali em diante de uma expressão geográ fica em uma constante realidade operacional História daliem diante passava a ser história mundial 63 Terceiro Capítulo O MUNDO UNIFICADO II A burguesia pelo rápido desenvolvimento de todos os instrumentos de produção pelos meios de comunicação imensamente facilitados arrasta todas as nações mesmo as mais bárbaras para a civiliza ção Em uma palavra cria um mundo a sua própria imagem K Marx e F Engels 1848 1 Como o comércio a educação e toda a rápida divulgação de pen samento e conhecimento seja pelo telégrafo ou pelo vapor tudo mudaram mal posso acreditar que o grande Criador prepare o mundo para se tornar uma nação falando um único idioma uma realização que fará com que os exércitos e os navios não sejam mais necessários Presidente Ulysses S Grant 1873 2 Você precisava ter ouvido tudo que ele disse eu preparavame para viver numa montanha em algum lugar no Egito ou na Améri ca E então Stoltz observou friamente Você pode chegar no Egito em duas semanas e na América em três Mas quem vai para a América ou o Egito Os ingleses certamente mas este é o jeito que o bom Deus os fêz e além disso eles não têm onde morar no seu próprio país Mas quem de nós iria sonhar em viajar para lá Alguns desesperados talvez cujas vidas não valem nada para si mesmos I Goncharov 1859 3 I Quando escrevemos a história mundial dos períodos preceden tes estamos na realidade fazendo uma soma das histórias das diversas partes do globo que de fato elas haviam tomado conhecimento umas das outras porém superficial e marginalmente exceto quando os ha bitantes de uma região conquistaram ou colonizaram uma outra co mo os europeus ocidentais fizeram com as Américas É perfeitamente possível escrever a história antiga da África com apenas uma referên cia casual ao Extremo Oriente com exceto a costa ocidental e o Ca 64 bo pouca referência a Europa mas não sem persistente referência ao mundo islâmico O que acontecia na China era até o século XVIII ir relevante aos dirigentes políticos da Europa exceção feita aos russos mas não a alguns de seus grupos específicos de comerciantes o que acontecia no Japão estava fora do conhecimento direto de todos ex ceto de um punhado de mercadores holandeses que tinham tido per missão para ali manter um entreposto entre o século XVI e meados do século XIX Inversamente a Europa era para o Império Celeste apenas uma região de bárbaros felizmente bastante longínqua para não colocar nenhum problema como por exemplo especificar o grau de sua fiel subserviência ao Imperador apesar de levantar alguns pro blemas de administração para os funcionários responsáveis por alguns portos Por esta razão mesmo entre algumas regiões onde havia razo ável interação muito podia ser posto de lado sem grande inconveni ência Para quem na Europa ocidental mercadores ou estadistas era importante saber o que se passava nas montanhas da Macedônia Se a Líbia fosse inteiramente engolida por algum cataclisma natural que real diferença isso faria para alguém mesmo para o Império O tomano do qual era tecnicamente uma parte ou entre os mercadores do Levante de várias nações A falta de interdependência entre as várias partes do globo não era simplesmente uma questão de ignorância apesar do que fora da região em questão e freqüentemente dentro dela a ignorância do in terior ainda era considerável Mesmo em 1848 imensas áreas de vá rios continentes estavam marcadas em branco inclusive nos melhores mapas europeus principalmente no que diz respeito a África Ásia central o interior da América do Sul e partes da América do Norte e Austrália sem mencionar os quase totalmente inexplorados Ártico e Antártico Os mapas que fossem desenhados por qualquer outro car tógrafo teriam mostrado espaços ainda maiores do desconhecido para isso os funcionários chineses mercadores e coureurs de bois de cada interior dos continentes conheciam bem mais sobre algumas áreas fossem grandes ou pequenas do que os europeus mesmo que a soma global de seus conhecimentos geográficos fosse bem mais exígua Conseqüentemente a adição meramente aritmética de tudo que um expert conhecesse sobre o mundo seria um mero exercício acadêmi co Não era uma coisa de se encontrar de fato não era mesmo em termos de conhecimento geográfico um mundo Ignorância era mais um sintoma que uma causa da falta de uni dade no mundo Refletia simultaneamente a falta de relações diplo máticas políticas e administrativas que eram demasiado tênues A Bíblia de referência diplomática genealógica e política o Almanach de Gotha apesar de cuidadoso em reportar o pouco que fosse conhe cido sobre as excolônias que tinham se tornado repúblicas nas Amé ricas não incluía a Pérsia antes de 1859 China antes de 1861 Japão antes de 1863 Libéria antes de 1868 e Marrocos antes de 1871 O reino do Sião entrou apenas em 1880 Refletia também a fraqueza 65 dos laços econômicos É verdade que o mercado mundial aquela précondição crucial e característica da sociedade capitalista estava já por longo tempo e desenvolvendo O comércio internacional isto é a soma total de todas as exportações e importações de todos os países dentro da competência das estatísticas econômicas européias daquele período havia ultrapassado o dobro em valor entre 1720 e 1780 No período da Revolução Dual 17801840 tinha mais que triplicado notandose que este crescimento substancial era modesto em compa ração a nosso período de estudo Por volta de 1870 o valor do comér cio externo para cada cidadão do Reino Unido França Alemanha Áustria e Escandinávia era entre quatro e cinco vezes o que havia si do em 1830 para cada holandês e belga três vezes maior e mesmo para cada cidadão dos Estados Unidos um país para o qual o comér cio externo era de importância marginal bem mais do dobro No de correr da década de 1870 uma quantidade anual de cerca de 88 mi lhões de toneladas de mercadorias foi trocada entre as nações mais importantes comparadas com as 20 milhões de 1840 31 milhões de toneladas de carvão atravessaram os mares comparadas a 14 milhão 112 milhões de toneladas de trigo comparadas a menos de 2 mi lhões 6 milhões de toneladas de ferro comparadas a um milhão e mesmo antecipando o século XX 14 milhão de toneladas de pe tróleo que era desconhecido do comércio internacional em 1840 Vamos medir a rede das trocas econômicas entre partes do mun do mais precisamente As exportações britânicas para a Turquia e o Oriente Médio cresceram de 35 milhões de libras em 1848 para um máximo de 16 milhões em 1870 para a Ásia de 7 milhões para 41 milhões em 1875 para as Américas Central e do Sul de 6 milhões para 25 milhões em 1872 para a índia de perto de 5 milhões para 24 milhões em 1875 para a Austrália de 15 milhão para mais de 20 mi lhões em 1875 Em outras palavras em 35 anos o valor das trocas entre a mais industrializada das economias e as regiões mais atrasadas ou remotas do mundo havia se multiplicado por seis Isso evidente mente não é muito impressivo pelo que temos hoje em dia mas o vo lume em números absolutos ultrapassava tudo que podia ter sido pre visto anteriormente A rede que unia as várias regiões do mundo visi velmente apertava Definir precisamente quanto o processo contínuo de exploração que gradualmente preencheu os espaços vazios nos mapas estava in terligado com o crescimento do mercado mundial é uma questão complexa Parte era subproduto da política externa parte produto de entusiasmo missionário parte de curiosidade científica e para o fim de nosso período parte de iniciativa jornalística e editorial Portanto nem J Richardson 17871865 H Barth 182165 e A Overweg 182252 que tinham sido enviados pelo Ministério de Relações Ex teriores britânico para explorar a África central em 1849 nem o gran de David Livingstone 181373 que cruzou o coração daquele que ainda era conhecido como o continente escuro de 1840 a 1873 pa 66 trocinado pelo cristianismo calvinista nem Henry Morton Stanley 18411904 o jornalista do New York Herald que foi descobrir o pa radeiro de Livingstone não ele especialmente nem S W Baker 182192 e J H Speke 182764 cujos interesses eram mais pura mente geográficos ou aventureiros estavam ou poderiam estar desin formados da dimensão econômica de suas viagens Como um monse nhor francês com interesses missionários colocou O bom Deus não precisa de nenhum homem e a propagação do Evangelho ocorre sem ajuda humana entretanto redunda ria em glória para o comércio europeu se tal viesse trazer aju da na tarefa de superar as barreiras que impedem o caminho da evangelizacão4 Explorar significava não apenas conhecer mas desenvolver trazer o desconhecido e por definição os bárbaros e atrasados para a luz da civilização e do progresso vestir a imoralidade da nudez selvagem com camisas e calças com uma providencial e beneficente manufatu ra de Bolton e Roubaix levar as mercadorias de Birmingham que i nevitavelmente arrastavam a civilização para onde quer que fossem Realmente o que chamamos de exploradores de meados do século XIX eram apenas alguns subgrupos bem conhecidos mas nu mericamente pouco importantes de um número muito maior de ho mens que abriram o planeta ao conhecimento Eram os que viajavam em áreas onde o desenvolvimento econômico e o lucro eram ainda in suficientemente atraentes para fazer substituir o explorador pelo co merciante europeu explorador de minérios o construtor de estradas de ferro e telégrafo e mais tarde se o clima provasse adequado o co lono branco Exploradores dominaram a cartografia do interior da África porque o continente para o Oeste estava desprovido de qual quer óbvia razão econômica entre a abolição do tráfico negreiro e a dupla descoberta de um lado de pedras preciosas e metais no sul e de outro lado do valor econômico de certos produtos primários que só podiam crescer ou ser cultivados em climas tropicais estando ain da muito longe da produção sintética Nada ali era de grande signifi cação ou promessa até a década de 1870 mas parecia inconcebível que um continente tão vasto e tão subutilizado não viesse mais cedo ou mais tarde a provar ser uma fonte de riqueza e lucro Afinal as exportações britânicas para a África ao sul do Sahara tinham aumen tado em cerca de 15 milhão de libras no final de 1840 para cerca de 5 milhões em 1871 vieram a dobrar na década de 1870 para atingir 10 milhões no começo de 1880 o que de forma alguma podia ser considerado como pouco promissor Os exploradores também do minaram a abertura da Austrália porque o deserto interior era vasto vazio e até meados do século XX desprovidos de óbvias fontes de exploração econômica Por outro lado os oceanos do mundo cessa ram exceto o Ártico o Antártico atraiu pouca atenção neste perío do de preocupar os exploradores O incentivo ali era largamente 67 econômico a busca de uma passagem praticável NorteOeste e Nor teEste para navios entre o Atlântico e o Pacífico que pudesse como os vôos transpolares de nossos dias economizar um bom tempo e portanto dinheiro A busca do Pólo Norte não era neste período de sejada com grande persistência A grande extensão das rotas de na vios e sobretudo a colocação dos grandes cabos submarinos implica vam naquilo que pode ser chamado propriamente de exploração O mundo em 1875 era portanto mais conhecido do que nunca fora antes Mesmo em nível nacional mapas detalhados a maior par te iniciados por razões militares podiam ser agora encontrados na maioria dos países desenvolvidos a publicação do empreendimento pioneiro neste setor os mapas da Inglaterra da Ordnance Survey mas não ainda da Escócia e Irlanda tinha sido completada em 1862 Porém mais importante que o mero conhecimento as mais remotas partes do mundo estavam agora começando a ser interligadas por meios de comunicação que não tinham precedentes pela regularidade pela capacidade de transportar vastas quantidades de mercadorias e número de pessoas e acima de tudo pela velocidade a estrada de fer ro o barco a vapor o telégrafo Por volta de 1872 os meios de comunicação tinham chegado ao triunfo previsto por Júlio Verne a possibilidade de fazer a volta ao mundo em 80 dias evitando os inúmeros contratempos que perturba ram o indomável Phileas Fogg Os leitores podem recordar a rota do imperturbável viajante Ele foi de trem e barco a vapor através da Eu ropa de Londres a Brindisi e em seguida de barco através do recém aberto Canal de Suez uma estimativa de sete dias A viagem de barco de Suez a Bombaim iria tomarlhe 30 dias A viagem de trem de Bom baim a Calcutá deveria se não fosse a falha em completar um trecho do caminho tomarlhe três dias Dali em diante pelo mar para Hong Kong Yokohama e através do Pacífico até São Francisco era ainda um longo caminho de 41 dias Então com a estrada de ferro transamerica na que acabava de ser completada em 1869 somente os perigos ainda não completamente dominados representados pelas hordas de bisões e os índios estavam entre o viajante e uma viagem normal de sete dias para Nova York O resto da viagem o Atlântico para atingir Liverpool e o trem para Londres não teria causado problemas se não fosse a ne cessidade do suspense ficcional Aliás um agente de viagens america no ofereceu uma voltaaomundo similar não muito depois Quanto teria durado esta viagem a Phileas Fogg em 1848 Ela teria de ter sido feita quase que inteiramente por via marítima pois nenhuma estrada de ferro atravessava nenhum continente e nem mesmo existiam no resto do mundo exceto nos Estados Unidos onde elas não avançavam terra a dentro mais de 200 milhas Os barcos a vela mais rápidos tomariam pelo menos uma média de 110 dias para uma viagem até Cantão por volta de 1870 quando já estavam no má ximo da perfeição técnica não poderiam nunca fazêla em menos de 90 dias mas sabiase que já tinham feito em até 150 dias Podemos 68 dificilmente imaginar uma circunavegação por volta de 1848 que contando com a maior sorte possível fosse feita em muito menos que 11 meses ou seja quatro vezes mais do que Phileas Fogg sem contar o tempo despendido em portos Este progresso no tempo despendido em viagens de longa dis tância era relativamente modesto especialmente por causa do pouco avanço observado nas velocidades marítimas O tempo médio gasto por um vapor transatlântico entre Liverpool e Nova York em 1851 era de 14 a 12 dias e meio era substancialmente o mesmo em 1873 embora a linha White Star orgulhosamente garantisse poder encurtá lo para 10 dias5 Exceto onde a própria distância fosse encurtada co mo no caso do canal de Suez Fogg não poderia esperar fazer melhor do que um viajante em 1848 A verdadeira transformação deuse em terra através das estradas de ferro e assim mesmo não pelo aumento da velocidade tecnicamente possível das locomotivas mas pela extra ordinária extensão da construção de linhas de estradas de ferro As locomotivas de 1848 eram de fato mais lentas que as de 1870 mas já atingiam Holyhead a partir de Londres em oito horas e meia ou seja três horas e meia a mais do que em 1974 Em 1865 entretanto Sir William Wilde pai do famoso Oscar e um notável pescador pode ria sugerir a seus leitores londrinos um fimdesemana em Connemara para pescaria Todavia a locomotiva tal como existia em 1830 era uma máquina de extraordinária eficiência Mas o que não existia fora da Inglaterra em 1848 era algo parecido a uma rede ferroviária II O período que este livro trata viu a construção de tais redes ferro viárias quase que por toda a Europa nos Estados Unidos e mesmo em uns poucos outros lugares do mundo Os quadros seguintes o primeiro apresentando uma visão geral e o segundo ligeiramente mais detalhado falam por si mesmos Em 1845 fora da Europa o único país subde senvolvido a possuir uma milha que fosse de estrada de ferro era Cu ba Em 1855 havia linhas em todos os cinco continentes apesar de na América do Sul Brasil Chile Peru serem dificilmente visíveis Em 1865 a Nova Zelândia Argélia México e África do Sul já tinham suas primeiras estradas de ferro e por volta de 1875 enquanto Brasil Ar gentina Peru e Egito tinham perto de mil milhas ou mais de trilhos Ceilão Java Japão e mesmo o remoto Taiti já tinham adquirido suas primeiras linhas Enquanto isso por volta de 1875 o mundo possuía 62 mil locomotivas 112 mil vagões de passageiros meio milhão de va gões de carga transportando como era estimado 1371 milhões de pas sageiros e 715 milhões de toneladas de mercadorias ou em outras pa lavras nove vezes mais do que era carregado anualmente por via marí tima média naquela década A época que estudamos era em termos quantitativos a primeira autêntica idade das estradas de ferro 69 70 A construção de grandes troncos ferroviários naturalmente ga nhou a maior parte da publicidade Era realmente o maior conjunto de obras públicas existente e um dos mais sensacionais feitos da enge nharia conhecido até então na história Quando as ferrovias deixaram a topografia inexata da Inglaterra suas realizações técnicas passaram a ser até mais sensacionais A ferrovia do Sul de Viena e Trieste atra vessava o passo de Semmering a uma altura de quase 3 mil pés em 1854 em 1871 trilhos atravessando os Alpes atingiam elevações de até 4500 pés em 1869 a Union Pacific atingia 8600 pés atravessando as Rochosas e em 1874 o triunfo do conquistador Henry Meiggs 1811 77 a Estrada de Ferro Central do Peru corria lentamente a uma altura de 15840 pés Assim como atingiam os picos elas perfuravam as mon tanhas transformando em anãs as modestas passagens das primeiras es tradas de ferro inglesas O primeiro dos grandes túneis dos Alpes o do Monte Cenis tinha sido iniciado em 1857 e completado em 1870 e su as sete milhas e meia foram percorridas pelo primeiro trem postal sub traindo 24 horas da distância até Brindisi um expediente utilizado por Philleas Fogg como lembramos E impossível não partilhar a sensação de excitação autoconfian ça e orgulho que empolgava os que viveram através desta época he róica dos engenheiros como quando a estrada de ferro ligou pela primeira vez o Passo de Calais ao Mediterrâneo ou como quando tornouse possível viajar de trem para Sevilha Moscou Brindisi e também quando os trilhos de ferro percorreram o caminho do Oeste através das pradarias e montanhas norteamericanas através do sub continente indiano na década de 1860 descendo o vale do Nilo e va rando o interior da América Latina na década de 1870 Como podemos negar admiração por estas tropas de choque da industrialização que construíram tudo isso aos exércitos de campone ses freqüentemente organizados de forma cooperativa que com pá e picareta moveram terra e pedras numa quantidade inimaginável aos capatazes profissionais ingleses e irlandeses que construíram linhas longe de seus países aos maquinistas e mecânicos de Newcastle ou Bolton que partiram para longe para construir as novas linhas de ferro da Argentina ou Nova Gales do Sul Como podemos não nos emo cionar com os exércitos de coolies que deixaram seus ossos ao longo de cada milha de trilhos Hoje o belo filme Pather Panchali de Sat yadjit Ray baseado numa novela bengalesa do séculoXIX nos per mite recapturar a maravilha da primeira máquina a vapor um maciço dragão de ferro a própria força do mundo industrial irresistível e ins piradora fazendo seu caminho onde nada previamente havia passado exceto mulas e carroças Também não podemos deixar de nos tocar pelos homens duros com chapéus que organizaram e presidiram estas vastas transformações do panorama humano material e espiritual Thomas Brassey 180570 coolies trabalhador hindu ou chinês NT 71 que chegou a empregar oito mil homens em cinco continentes foi a penas o mais conhecido destes empreendedores A lista de suas em presas pelo mundo afora eqüivale às honras de batalhas de campanha dos generais em dias menos luminosos Prato e Pistoia Lions e Avi nhão a estrada de ferro norueguesa a Jutlândia o grande tronco do Canadá Bilbao e Miranda Bengala do Leste Maurício Queensland Argentina central Lemberg e Czernowitz estrada de ferro de Delhi Boca e Barracas Varsóvia e Terespol as docas de Callao O romance da indústria uma frase que gerações de oradores públicos iria gastar e fazer perder seu sentido original cercava até banqueiros financistas empreendedores que apenas proviam o di nheiro para a construção das estradas Homens como George Hudson 180071 ou Barthel Strousberg 182384 estouraram na bancarrota assim como antes na riqueza e proeminência social Seus colapsos tornaramse pontos de referência na história econômica Nenhuma tolerância entretanto pode ser concedida aos genuínos robber barons tais como ôs homens de estrada de ferro americanos Jim Fisk 1834 72 Jay Gould 183692 Commodore Vanderbilt 17941877 etc que apenas compraram e exploraram as estradas de ferro existentes as sim como qualquer outra coisa sobre a qual pudessem pôr as mãos E difícil negar admiração mesmo pelos escroques mais evidentes entre os construtores de estradas Henry Meiggs era sem dúvida um aventureiro desonesto tendo deixado atrás de si uma estrada de contas nãopagas subornos e despesas luxuosas ao longo de todo o lado ocidental dos continentes americanos mais freqüentemente nos centros de vilania e exploração como São Francisco e Panamá do que entre respeitáveis homens de negócios Mas pode alguém que tenha visto a Estrada de Ferro Central do Peru negar a grandeza da concepção e realização desta imaginação romântica e marota Esta combinação de romantismo empreendimento e finança era talvez mais dramaticamente colocada pela seita francesa dos Saintsi monistas Estes apóstolos da industrialização transformaramse espe cialmente depois do fracasso da revolução de 1848 de um grupo de crentes que os colocou nos livros de história como os socialistas utó picos em um dinâmico e corajoso grupo de empreendedores conhe cidos como capitães de indústria mas acima de tudo como constru tores de rede de comunicações Eles não eram os únicos a sonhar com um mundo ligado pelo comércio e tecnologia Estados improváveis como centros de comércio global como por exemplo o Império dos Habsburgos sem acesso ao mar produziram o Austrian Lloyd de Tri este cujos navios antecipando o ainda nãoconstruído canal de Suez chamavamse Bombay e Calcutta E foi um saintsimoniano F M de Lesseps 180594 que construiu o canal de Suez e planejou o canal do Panamá para seu azar mais tarde Robber Baron Barão Medieval NT 72 Os irmãos ísaac e Émile Pereire iriamse tornar conhecidos sobre tudo como financistas aventurosos que se fizeram sozinhos no império de Napoleão III O próprio Émile havia supervisionado a construção da primeira estrada de ferro francesa em 1837 vivendo num apartamento sobre as obras e apostando na demonstração da superioridade do novo meio de transporte Durante o segundo império os Pereire iriam cons truir linhas de estradas de ferro por todo o continente num duelo titâni co com o mais conservador dos Rothschild que veio a arruinálos 1869 Outro saintsimoniano P F Talabot 17891885 construiu en tre outras coisas as linhas do sudeste francês as docas de Marselha e as linhas húngaras além de comprar as balsas ultrapassadas pela ruína do comércio fluvial no Ródano esperando usálas numa frota comercial ao longo do Danúbio em direção ao Mar Negro um projeto vetado pelo Império dos Habsburgos Tais homens pensavam em termos de continentes e oceanos Para eles o mundo era um única coisa interli gado por trilhos de ferro e máquinas a vapor pois seus horizontes co merciais eram como seus sonhos sobre o mundo Para tais homens destino história e lucro eram uma e a mesma coisa De um ponto de vista global a rede de troncos ferroviários per manecia suplementar à de navegação internacional Tal como existia na Ásia Austrália África e América Latina a ferrovia considerada do ponto de vista econômico era basicamente um meio de ligar alguma área produtora de bens primários a um porto do qual estes bens poderi am ser enviados para as zonas industriais e urbanas do mundo O trans porte marítimo como já vimos não se tornou notavelmente rápido em nosso período Sua lentidão técnica é indicada pelo fato hoje bem co nhecido de que o transporte marítimo a vela havia continuado a man terse frente ao navio a vapor de forma surpreendente graças aos pro gressos tecnológicos menos dramáticos mas substanciais na sua própria eficiência O vapor tinhase expandido extraordinariamente de cerca de 14 do transporte mundial em 1840 para 49 em 1870 mas a vela ainda estava ligeiramente na frente Somente na década de 1870 e so bretudo na de 1880 é que saiu fora do páreo Pelo final desta última década a vela tinha sido reduzida para aproximadamente 25 do transporte global O triunfo do barco a vapor era essencialmente o da marinha mercante britânica ou melhor da economia britânica que es tava por detrás dele Em 1840 e 1850 barcos britânicos fizeram apro ximadamente um quarto da tonelagem a vapor nominal do mundo em 1870 perto de um terço em 1880 mais da metade Em outras palavras entre 1850 e 1880 a tonelagem a vapor britânica cresceu por volta de 1600 e a do resto do mundo por 440 Isso era razoavelmente natu ral Se alguma carga fosse e viesse a ser despachada de Callao Shangai ou Alexandria a probabilidade era de que fosse destinada para a Grã Bretanha E muitos navios estavam carregados 1250 milhões de tone ladas 900 mil inglesas passaram através do canal de Suez em 1874 no primeiro ano de operação haviam passado menos de meio milhão O tráfego regular através do Atlântico Norte era ainda maior 58 milhões 73 de toneladas entraram pelos três principais portos da costa leste dos Es tados Unidos em 1875 Trilhos e navios transportavam mercadorias e pessoas Porém a transformação tecnológica mais sensacional de nosso período estava na comunicação de mensagens através do telégrafo elétrico Este in vento revolucionário parece que estava pronto para ser descoberto em meados da década de 1830 Em 183637 fora inventado quase que si multaneamente por um número de diferentes pesquisadores dos quais Cooke e Wheatstone foram os mais imediatamente bem sucedidos Em poucos anos era aplicado nas estradas de ferro e o que era mais importante planos de linhas submarinas já eram considerados por volta de 1840 não se tornando porém praticáveis antes de 1847 quando então o grande Faraday sugeriu isolar os cabos com guta percha Em 1853 um austríaco Gintl e dois anos mais tarde ou troStark demonstraram que duas mensagens poderiam ser enviadas pelo mesmo fio nas duas direções no final da década de 1850 um sistema para enviar duas mil palavras era adotado pela American Te legraph Company em 1860 Wheatstone patenteava um telégrafo au tomático ancestral dos telégrafos modernos e Telex A Inglaterra e os Estados Unidos já estavam aplicando esta nova invenção por volta de 1840 um dos primeiros exemplos de uma tecno logia desenvolvida por cientistas e que dificilmente poderia ter sido desenvolvida sem base numa sofisticada teoria científica As partes de senvolvidas da Europa adotaramno rapidamente nos anos seguintes a 1848 Áustria e Prússia em 1849 Bélgica em 1850 França em 1851 Holanda e Suíça em 1852 Suécia em 1853 Dinamarca em 1854 A Noruega Espanha Portugal Rússia e Grécia introduziramno na se gunda metade da década de 1850 Itália Rumânia e Turquia na década de 1860 As linhas familiares do telégrafo e os pólos multiplicaramse 2 mil milhas em 1849 no continente europeu 15 mil em 1854 42 mil em 1859 80 mil em 1864 111 mil em 1869 O mesmo ocorreu com as mensagens Em 1852 menos de 250 mil foram enviadas em todos os seis países continentais onde havia sido introduzido mas em 1869 a França e a Alemanha enviaram cada uma mais de 6 milhões a Áustria mais de 4 milhões Bélgica Itália e Rússia mais de 2 milhões e mesmo a Turquia e Romênia entre 600 mil e 700 mil cada uma 6 Entretanto o desenvolvimento mais significativo era a constru ção de cabos submarinos pioneiros através do Passo de Calais no iní cio da década de 1850 DoverCalais 1851 RamsgateOstend 1853 em distâncias cada vez maiores Um cabo pelo Atlântico Norte havia sido proposto em meados da década de 1840 e veio a ser instalado em 185758 quebrandose devido à precariedade da instalação e do iso lamento A segunda tentativa com o célebre Great Western o maior navio do mundo como navio instalador de cabos foi bem sucedida em 1865 A partir daí sucederamse as instalações de cabos interna cionais que em cinco ou seis anos virtualmente enlaçaram o globo 74 Em 1870 cabos estavam sendo instalados entre Singapura e Batavia MadrasPenang PenangSingapura SuezAden AdenBombaim PenzâncioLisboa LisboaGibraltar GibraltarMalta Malta Alexandria MarselhaBône EmdenTeerã por terra BôneMalta SalcombeBrest Beachy HeadHavre Santiago de CubaJamaica e outro par de linhas através do Mar do Norte Em 1872 era possível te legrafar de Londres para Tóquio e Adelaide Em 1871 o resultado do Derby era enviado de Londres para Calcutá em não menos de 5 mi nutos apesar de que a notícia era consideravelmente menos excitante que o feito em si O que eram os oitenta dias de Phileas Fogg compa rados a isso Tal rapidez de comunicação não era apenas sem prece dentes ou mesmo sem comparação possível Para a maioria das pes soas em 1848 estaria completamente fora da imaginação A construção deste sistema telegráfico mundial combinava ele mentos políticos e comerciais com a importante exceção dos Estados Unidos o telégrafo interno era ou tornouse quase que inteiramente estatal e mesmo a GrãBretanha nacionalizouo adjudicandoo ao Post Office em 1869 Por outro lado os cabos submarinos permane ceram quase que inteiramente sob a reserva da iniciativa privada que os havia construído mesmo que o mapa mostrasse sua substancial importância estratégica sobretudo para o Império Britânico Eles e ram realmente da maior importância para o governo não apenas por razões militares e de segurança mas para a administração como tes temunham os inúmeros telegramas enviados por países como a Rús sia Áustria e Turquia cujo tráfico comercial e privado pouco teriam no justificado Tanto maior o território tanto mais útil para as autori dades que dispunham então de meios rápidos de comunicação com seus mais remotos postos avançados Os homens de negócios obviamente usaram intensamente o telé grafo mas os cidadãos comuns cedo descobriram seu uso a maioria das vezes evidentemente para ligações urgentes e dramáticas com parentes Por volta de 1869 60 de todos os telegramas belgas eram privados Mas o uso mais significativo da invenção não pode ser me dido meramente pelo número de mensagens O telégrafo transformou as notícias como Julius Reuter 181699 entrevira quando fundou sua agência telegráfica em AixlaChapelle em 1851 Entrou mais tarde no mercado inglês com o qual Reuter então se associou em 1858 Do ponto de vista jornalístico a Idade Média terminou em 1860 quando as notícias internacionais passaram a poder ser envia das livremente de um número suficientemente grande de lugares no mundo para atingir a mesa do cafédamanhã no dia seguinte Novi dades não eram mais medidas em dias ou no caso de lugares remotos em semanas ou meses mas em horas ou mesmo em minutos Elegante clube inglês que patrocinava famosas corridas de cavalo N T 75 Esta aceleração extraordinária na velocidade das comunicações teve um resultado paradoxal Aumentando o abismo entre os lugares acessíveis à nova tecnologia e o resto intensificou o atraso relativo daquelas partes do mundo onde o cavalo o boi a mula o homem ou o barco ainda determinavam a velocidade do transporte Numa época em que Nova York podia telegrafar a Tóquio numa questão de minu tos ou horas tornouse mais espantoso que as imensas disponibilida des do New York Herald não fossem suficientes para obter uma carta de David Livingstone do centro da África em menos de oito ou nove meses 187172 e mais espantoso ainda o Times de Londres poder reproduzir aquela mesma carta no dia seguinte à sua publicação em Nova York A selvageria do Oeste Selvagem e a escuridão do continente escuro eram devidos parcialmente a estes contrastes Assim se explicava a extraordinária paixão do público pelo explo rador e o homem que passou a ser chamado de viajante tout court isto é a pessoa que viajava até ou além das fronteiras da tecnologia fo ra da área onde a cabine de comando do vapor o compartimento dor mitório do wagonlit ambas invenções do nosso período o hotel e a pension cuidava do turista Phileas Fogg viajou nesta fronteira O in teresse de seu empreendimento residia simultaneamente na demons tração de que por um lado os trilhos o vapor e o telégrafo pratica mente enlaçavam o globo e por outro lado que ainda havia uma mar gem de incerteza assim como algumas lacunas remanescentes que evi tavam que viagens através do mundo se tornassem uma rotina Entretanto os viajantes cujos relatórios eram mais avidamente lidos eram aqueles que enfrentavam as incertezas do desconhecido com nenhuma ajuda suplementar da tecnologia moderna exceto aquela que pudesse ser carregada nos ombros de nativos Eram os explora dores e os missionários especialmente os que penetraram no interior da África os aventureiros especialmente os que se aventuraram nos terri tórios incertos do Islã os naturalistas caçadores de borboletas e pássa ros nas selvas da América do Sul ou nas ilhas do Pacífico Nossa época era como os editores cedo descobriram o início de uma idade de ouro feita de viajantes de poltrona seguindo nos livros Burton e Speke Stanley e Livingstone através das matas e da floresta virgem III Portanto a intrincada rede da economia internacional trazia mesmo as áreas geograficamente mais remotas para ter relações dire tas com o resto do mundo O que contava não era apenas velocidade embora uma crescente intensidade do tráfico também trouxesse uma maior demanda por rapidez mas o nível da repercussão Isso pode ser vividamente ilustrado pelo exemplo de um acontecimento econô mico que simultaneamente abriu nosso período e como tem sido ar 76 gumento largamente determinou sua forma a descoberta do ouro na Califórnia e logo depois na Austrália Em janeiro de 1848 um indivíduo chamado James Marshall descobriu ouro no que parecia ser uma vasta jazida em Sutters Mill perto de Sacramento na Califórnia uma extensão ao norte do México que havia sido anexada aos Estados Unidos de pouco área que não tinha nenhuma significação econômica exceto para uns poucos fazen deiros e donos de rancho mexicanoamericanos pescadores comuns e de baleia que usavam o conveniente porto da baía de São Francisco onde florescia uma pequena cidade de 812 habitantes brancos Já que este território fazia face ao Pacífico e estava separado do resto dos Estados Unidos por grandes cadeias de montanhas deserto e planície suas atrações e evidente riqueza natural não eram de imediata rele vância para empresas capitalistas sendo porém reconhecidas A cor rida ao ouro rapidamente mudou esta situação Notícias fragmentárias deste evento foram filtradas para o resto dos Estados Unidos em se tembro e outubro daquele ano despertando porém pouco interesse até serem confirmadas pelo presidente Polk em sua mensagem presiden cial de dezembro Desde então a corrida ao ouro passou a ser identifi cada com os Fortyniners Pelo final de 1849 a população da Cali fórnia havia saltado de 14 mil para aproximadamente 100 mil e em 1852 para 500 mil São Francisco já era então uma cidade de quase 35 mil No final de 1849 cerca de 540 navios aportaram naquela ci dade metade oriunda de portos europeus metade americanos e em 1 850 1 150 navios ali deixaram quase meia tonelada em mercadorias Os efeitos econômicos deste súbito desenvolvimento na Califór nia e a partir de 1851 na Austrália foram muito debatidos mas ob servadores da época não tinham dúvida sobre sua importância Engels observou dolorosamente a Marx em 1852 A Califórnia e a Austrália são dois casos nãoprevistos no Manifesto Comunista a criação de grandes e novos mercados a partir do nada Precisamos rever isso 7 Em que medida estes eventos foram responsáveis pela expansão nor teamericana pelo boom mundial ver capítulo 2 mais atrás ou pela súbita explosão da emigração em massa ver capítulo 11 mais adian te não precisamos decidir aqui O que estava claro de qualquer ma neira é que acontecimentos localizados a milhares de milhas distan tes da Europa tinham na opinião de competentes observadores um efeito imediato e de longo alcance naquele continente A interdepen dência da economia mundial não poderia ser melhor demonstrada Que tais corridas do ouro iriam afetar as metrópoles da Europa e a costa leste dos Estados Unidos assim como os financistas e comer ciantes de visão global não chega a ser surpreendente Sua repercus são em outras partes do globo geograficamente remotas é porém mais inesperada apesar de se levar em conta que na prática a Califórnia era apenas accessível por mar onde as distâncias não são um obstáculo particularmente sério à comunicação Os marinheiros dos navios da rota do Pacífico desertavam para tentar a sorte nos campos auríferos 77 e mesmo os habitantes de São Francisco fizeram coisa semelhante as sim que as notícias ali chegaram A febre do ouro espalhouse rapida mente através dos oceanos Em agosto de 1849 200 navios abando nados por suas tripulações vagavam nas águas seus cascos sendo u sados para construção de casas Nas ilhas Sandwich Havaí China e Chile marinheiros ouviram as notícias capitães espertos como os mercadores ingleses na costa oeste da América do Sul recusaram a tentação lucrativa de seguir para o Norte Frete e salários de mari nheiros dispararam com os preços de qualquer coisa exportável para a Califórnia e nada era nãoexportável Pelo final de 1849 o congresso chileno observando que a maior parte do transporte marítimo nacio nal estava sendo dirigido para a Califórnia onde era então imobiliza do por deserções autorizou navios estrangeiros a praticar o tráfico costeiro de cabotagem temporariamente A Califórnia pela primeira vez criou uma rede de comércio ligando as costas do Pacífico atra vés do qual cereais chilenos café e cacau mexicano batatas e outros alimentos da Austrália açúcar e arroz da China e mesmo depois de 1854 algumas importações do Japão foram transportadas para os Estados Unidos Não era àtoa que o Bankers Magazine de Boston havia predito em 1850 que não seria nada temerário antecipar uma extensão parcial desta influência de comércio até ao Japão8 Mais significativo de nosso ponto de vista a mobilidade de pes soas era maior que o comércio A imigração de chilenos peruanos e nativos das ilhas do Pacífico9 apesar de chamar a atenção no estágio inicial não era de maior importância numérica Em 1860 a Califórnia tinha cerca de 2400 latinoamericanos além dos mexicanos e menos de 350 oriundos das ilhas do Pacífico Por outro lado um dos resul tados mais extraordinários desta descoberta maravilhosa foi o impulso que deu às empresas do Império Celestial Os chineses até então as mais impassíveis e domésticas criaturas do universo haviam começado uma nova vida na Califórnia nas minas e vieram para a Califórnia aos milhares Em 1849 havia 76 chineses pelo final de 1850 4 mil em 1852 não menos de 20 mil e por volta de 1876 havia cerca de 111 mil ou seja 25 de todos os habitantes não californianos do estado Eles trouxeram consigo seu preparo inteligência e espírito comercial e in cidentalmente introduziram na civilização ocidental um dos mais po derosos produtos culturais do Leste o restaurante chinês que já flores cia em 1850 Oprimidos odiados ridicularizados e de vez em quando linchados 88 foram assassinados na baixa de 1862 eles mostraram a capacidade usual deste grande povo em sobreviver e prosperar até que o Chinese Restriction Act de 1882 clímax de uma longa agitação raci al pôs um fim naquilo que tinha sido o primeiro exemplo na história de uma imigração de massa voluntária e atraída por razões econômicas de uma sociedade oriental para uma ocidental Por outro lado o estímulo da corrida do ouro atingiu apenas as fontes tradicionais de migração para a costa oeste entre elas a britâ 78 nica irlandesa e alemã que formavam a grande maioria além dos mexicanos Estes vieram sobretudo pelo mar exceto alguns norteamericanos especialmente os do Texas Arkansas Missouri Wisconsin e Iowa estados com uma migração desproporcionalmente pesada para a Cali fórnia que presumivelmente vieram por terra uma viagem incômoda que tomava 3 a 4 meses de costa A rota mais importante que os corre dores em busca do ouro percorriam era a que ligava a Europa à São Francisco costa oeste dos Estados Unidos via Terra do Fogo percor rendo 16 a 17 mil milhas através do mar Londres Liverpool Ham burgo Bremen Le Havre e Bordéus já tinham linhas diretas na década de 1850 O interesse em diminuir esta viagem de 4 ou 5 meses assim como de fazêla mais segura era prioritário Os veleiros construídos pelos armadores de Boston e Nova York para o tráfico de chá entre Cantão e Londres podiam agora carregar uma mercadoria diferente Apenas dois destes haviam feito a volta da América do Sul antes da corrida do ouro mas na segunda metade de 1851 24 de 34 mil tonela das atingiram São Francisco diminuindo a distância de Boston para a costa oeste em 100 dias de viagem ou mesmo em alguns casos para 80 Inevitavelmente uma rota mais curta em tempo pedia para ser construída O istmo do Panamá mais uma vez tornouse naquilo que já havia sido nos tempos coloniais espanhóis o ponto principal de trans porte entre navios pelo menos até que fosse construído um canal hi pótese que foi imediatamente considerada pelo tratado anglo americano de BulwerClayton de 1850 e que começou enfrentando a oposição americana a ser planejado pelo dissidente saintsimoniano francês de Lesseps recémvitorioso em Suez na década de 1870 O go verno dos Estados Unidos incrementou um serviço postal através do istmo do Panamá portanto tornando possível o estabelecimento de um serviço de vapor regular mensal entre Nova York e o lado do Caribe e da cidade do Panamá para São Francisco e Oregon O esquema inicia do em 1848 essencialmente por motivos políticos e imperialistas tor nouse comercialmente mais que viável com a corrida do ouro O Pa namá tornouse o que sempre tem sido uma cidadepropriedade ameri cana onde futuros robber barons como Comodore Vanderbilt e W Ralston 182889 fundador do banco da Califórnia faziam suas nego ciatas A economia de tempo era tão grande que o istmo cedo se trans formou num ponto vital na cabotagem internacional através dele Sou thampon podia ser ligada a Sydney em 58 dias e o ouro descoberto no começo da década de 1850 naquele outro grande centro aurífero a Austrália para não mencionar os metais preciosos mais antigos do México e Peru fez por ali seu caminho para a Europa e a costa leste norteamericana Somado ao ouro californiano talvez 60 milhões de dólares anuais devem ter sido transportados através do Panamá Ne nhum espanto que a primeira estrada de ferro tenha já em 1855 atra vessado o istmo Ela havia sido planejada por uma companhia francesa mas caracteristicamente construída por uma americana 79 Estes eram os resultados visíveis e quase imediatos de aconteci mentos ocorridos num dos mais remotos cantos do mundo Nenhum espanto que os observadores vissem o mundo econômico não apenas como um complexo interligado onde cada parte era sensível ao que acontecia nas outras e através do qual dinheiro mercadorias e ho mens moviamse silenciosamente e com crescente rapidez obedecen do ao irresistível estímulo da oferta e demanda ganhos e perdas e com a ajuda da moderna tecnologia Se mesmo os mais preguiçosos porque menos econômicos destes homens respondiam a tais estí mulos en masse a imigração britânica para a Austrália pulou de 20 mil para quase 90 mil em um ano depois que ouro foi ali descoberto então nada nem ninguém poderia resistir Obviamente ainda havia muitas partes do globo mesmo na Europa mais ou menos isoladas desta movimentação Mas havia alguma dúvida de que cedo ou tarde seriam arrastadas para dentro do torvelinho IV Hoje estamos mais familiarizados do que os homens de meados do século XIX com este desenho totalizante do planeta em um único mundo Mas há uma diferença substancial entre o processo que nós vivenciamos hoje e o do período que este livro abarca O que é mais impressionante neste aspecto mais adiante no século XX é a padro nização que vai bem além da puramente econômica e tecnológica Neste particular nosso mundo é bem mais massivamente padronizado que aquele de Phileas Fogg mas apenas porque há mais máquinas instalações produtivas e negócios As estradas de ferro telégrafos e navios de 1870 não eram menos identificáveis como modelos da era onde ocorriam do que os automóveis e aeroportos de 1970 O que pouco ocorria então era a padronização internacional interlingüística da cultura que hoje distribui os mesmos filmes tipos de música pro gramas de televisão e mesmo estilos de vida através do mundo Os modelos do mundo desenvolvido eram copiados pelos mais atrasa dos em um punhado de versões dominantes os ingleses através de seu império nos Estados Unidos e com menos ênfase no continente europeu os franceses na América Latina no Levante e partes da Eu ropa oriental os alemães e austríacos através da Europa central e ori ental na Escandinávia e um pouco nos Estados Unidos Um certo es tilo comum visual o interior burguês superlotado de móveis o barro co público dos teatros e óperas podiam ser vistos onde europeus ou colonos descendentes de europeus tivessem se estabelecido ver capí tulo 13 mais adiante Entretanto com a exceção dos Estados Unidos e Austrália onde altos salários democratizaram o mercado e por tanto o estilo de vida das classes economicamente mais modestas es ta característica permaneceu confinada a uns poucos 80 Não há dúvida de que os profetas burgueses de meados do século XIX olhavam para a frente procurando um mundo único e mais ou me nos padronizado onde todos os governos teriam o conhecimento das verdades da economia política e do liberalismo levadas através do pla neta por missionários impessoais mais poderosos que aqueles da cris tandade ou do islamismo um mundo refeito à imagem da burguesia talvez mesmo onde eventualmente as diferenças nacionais viessem a desaparecer O desenvolvimento das comunicações já pedia novas for mas de coordenação internacionais e organismos padronizados a In ternational Telegraph Union de 1865 a Universal Postal Union de 1875 a International Metereological Organization de 1878 todas ain da existentes hoje Já colocava também para fins limitados e resolvi do pelo International Signals Code de 1871 o problema de uma lin guagem padronizada internacional Em poucos anos tentativas de cri ar línguas cosmopolitas artificiais tornaramse moda iniciada com a es tranha Volapük Worldspeak engendrada por um alemão em 1880 Nenhuma destas vingou nem mesmo a mais promissora Esperanto outro produto da década de 1880 O movimento trabalhista também encontravase no processo de estabelecer uma organização global que iria tirar conclusões da crescente unificação do planeta a Internacio nal ver capítulo 6 mais adiante Que a Cruz Vermelha Internacional 1860 filha também de nosso período pertença a este grupo é mais duvidoso pois ela era baseada na mais extrema forma de falta de inter nacionalismo isto é guerra entre estados Mesmo assim padronização e unificação internacionais neste sentido permaneceram frágeis e parciais De certa forma o nascimen to de novas nações e novas culturas com base democrática isto é u sando idiomas separados ao invés de línguas internacionais de mino rias cultas fazia esta padronização mais difícil Escritores de reputa ção européia ou mundial alcançaram esta dimensão graças a tradu ções E enquanto era significativo que por volta de 1875 leitores de alemão francês sueco holandês espanhol dinamarquês italiano português tcheco e húngaro fossem capazes de desfrutar de algumas das obras de Dickens assim como búlgaros russos finlandeses ser vocroatas armênios e leitores de iídiche o foram antes do final do século era também significativo que este processo resultasse numa crescente divisão lingüística Fossem quais fossem as perspectivas a longo prazo era aceito pelos observadores liberais da época que a curto ou médio prazo o desenvolvimento terminaria por criar nações diferentes e rivais ver capítulo 5 mais adiante O máximo que se po deria então desejar é que estas nações comungassem o mesmo tipo de instituições economia e credos A unidade do mundo implicava na sua divisão O sistema mundial do capitalismo era uma estrutura de eco nomias nacionais rivais O triunfo mundial do liberalismo ficava na conversão de todos os povos pelo menos os que eram vistos como ci vilizados Não havia dúvida que os campeões do progresso de nosso 81 período estavam confiantes de que isso viria a acontecer mais cedo ou mais tarde Mas esta confiança tinha bases razoavelmente inseguras Eles tinham boas razões quando apontavam para a rede cada vez mais desenvolvida de comunicações globais cujo resultado mais tan gível era um vasto aumento no tráfico de trocas internacionais mer cadorias e pessoas comércio e migração que serão considerados se paradamente ver capítulo 11 mais adiante Mas mesmo no plano in ternacional de negócios a unificação global não era uma vantagem indiscutível pois ela criava uma economia mundial onde todas as par tes estavam de tal modo dependentes umas das outras que um empur rão numa delas ameaçava inevitavelmente pôr todas as outras em movimento Disto era ilustração clássica a crise internacional Como foi sugerido dois tipos maiores de flutuação econômica afetavam a sorte do mundo na década de 1840 o antigo ciclo agrário baseado nos azares das colheitas e do gado e o novo ciclo do comér cio parte essencial do mecanismo da economia capitalista Em 1840 o primeiro destes ainda era dominante no mundo embora seus efeitos tendessem a ser mais regionais que globais já que mesmo as mais amplas formas de uniformização o clima epidemias humanas de animais ou plantas raramente ocorriam simultaneamente em todas as partes do mundo Economias industrializadas já eram dominadas pelo ciclo do comércio pelo menos a partir do final das guerras napoleô nicas mas isso afetava na prática apenas a Inglaterra talvez a Bélgica e os pequenos setores de outras economias ligadas ao sistema interna cional Crises que não vieram ao lado de distúrbios agrários como por exemplo as de 1826 1837 ou 183942 estremeceram a Inglaterra a costa leste dos Estados Unidos e Hamburgo deixando entretanto a maior parte da Europa relativamente sem problemas Dois processos se apresentaram depois de 1848 para mudar este estado de coisas Em primeiro lugar a crise do ciclo do comércio tor nouse genuinamente mundial A de 1857 que começou com um co lapso bancário em Nova York era provavelmente a primeira crise mundial do tipo moderno Isto talvez não fosse acidental Karl Marx observara que as comunicações haviam trazido as duas maiores fontes de distúrbios comerciais Índia e América para bem mais perto da Europa Dos Estados Unidos a crise passou para a Inglaterra então para a Alemanha do Norte depois para a Escandinávia de volta para Hamburgo deixando uma trilha de bancarrotas e desemprego en quanto atravessava oceanos em direção à América do Sul A depres são de 1873 que começou em Viena espalhouse na direção oposta com muito maior amplitude Seus efeitos a longo prazo viriam a ser como veremos muito mais profundos como era de se esperar Em segundo lugar pelo menos nos países em vias de industrialização as antigas flutuações agrárias tinham perdido bastante do seu efeito tan to pelo transporte de massa de alimentos que diminuíam carências locais e tendiam a igualar preços como porque os efeitos sociais de 82 tais carências estavam agora contornados pela oferta suficiente de empregos gerados pelo setor industrial da economia Uma série de más colheitas ainda poderia afetar a agricultura mas não mais o resto do pa ís Além disso com a economia mundial estreitando seu cerco mesmo os azares da agricultura dependiam muito menos das flutuações da na tureza que dos preços do mercado mundial como as grandes depres sões agrárias das décadas de 1870 e 1880 viriam a demonstrar Todas estas manifestações afetavam apenas aquele setor do mundo que já estava mergulhado na economia internacional Já que vastas áreas e populações virtualmente toda a Ásia e África a maior parte da América Latina e mesmo partes substanciais da Europa a inda existiam fora de qualquer economia que não fosse a da pura tro ca local e longe de portos estradas de ferro e telégrafo deveríamos não exagerar a unificação do mundo completada no período de 1848 a 1875 Afinal como um eminente cronista da época colocou A eco nomia mundial está apenas nos seus primórdios mas também acres centando com toda a correção mesmo estes primórdios nos permi tem imaginar sua futura importância já que neste estágio presente re presentam uma transformação genuinamente espantosa da produtivi dade da humanidade Se fôssemos considerar apenas uma região como por exemplo a costa sul do Mediterrâneo e norte da África por volta de 1870 tudo o que dissemos só poderseia aplicar ao Egito e às modestas porções da Argélia colonizada pelos franceses O Marro cos só veio a conceder a estrangeiros a liberdade de comerciar através de seu território em 1862 Tunísia nem sequer pensava na idéia pre ferindo incrementar seu vagaroso progresso por meio de empréstimos até 1865 Foi por volta desta época que um produto do crescimento do comércio mundial o chá foi encontrado ao sul da cordilheira dos Atlas em Ouargla Timbuctu e Tafilet apesar de ser ainda um artigo de alto luxo uma onça custava o equivalente ao salário mensal de um soldado marroquino Até a segunda metade do século não se viu o crescimento característico da população do mundo moderno ocorren do nos países islâmicos enquanto que ao contrário através dos países saharianos assim como na Espanha a combinação tradicional de fo me e epidemias em 186769 que devastou a índia pelo mesmo perío do vinha a ser pela sua grande importância econômica social e polí tica maior que qualquer manifestação associada com a ascensão do capitalismo mundial embora talvez como na Argélia intensificada por este 83 Quarto Capítulo CONFLITOS E GUERRA E a história inglesa fala alto para reis Se caminhardes à frente das idéias de vosso século estas idéias vos acompanharão e sustentarão Se caminhardes atrás delas elas vos arrastarão Se caminhardes contra elas elas o derrubarão Napoleão III A velocidade com a qual o instinto militar desenvolveuse nesta na ção de proprietários de navios mercadores e comerciantes é bem conhecida O Baltimore Gun Club tinha apenas um interesse a destruição da humanidade por motivos filantrópicos e o desenvolvi mento de armamentos que eles olhavam como instrumentos de civi lização Júlio Verne 1865 2 I Para o historiador a grande expansão da década de 1850 marca a fundação de uma economia industrial global e de uma única história mundial Para os dirigentes de meados do século XIX na Europa co mo vimos proporcionou uma oportunidade para tomar fôlego durante a qual os problemas que nem as revoluções de 1848 nem a sua su pressão resolveram chegaram a ser esquecidos ou mesmo mitigados pela prosperidade e administração sadia De fato os problemas soci ais agora pareciam mais contornáveis em virtude da grande expansão da adoção de política e instituições adequadas ao desenvolvimento capitalista irrestrito e da abertura de válvulas de escape pleno em prego e imigração suficientemente amplas para reduzir as pressões do descontentamento da massa Mas os problemas políticos permane ceram e pelo final da década de 1850 estava claro que não podiam ser evitados por muito mais tempo Estes problemas eram para cada governo essencialmente questões de política doméstica mas devido a natureza peculiar dos sistemas de estado europeus a leste da linha da Holanda à Suíça questões domésticas e internacionais apresentavam se como inextricavelmente interligadas Liberalismo e democracia ra 84 dical ou pelo menos o desejo por direitos e representação não podiam ser separados na Alemanha ou Itália no Império dos Habsburgos ou mesmo no Império Otomano e nas fronteiras do Império Russo das ambições por autonomia nacional independência ou unificação E isto poderia como efetivamente viria a ocorrer nos casos da Alemanha I tália ou do Império dos Habsburgos produzir conflitos internacionais Pois bem longe dos interesses de outras potências em qualquer modificação substancial nas fronteiras do continente a unificação da Itália implicava na expulsão do Império dos Habsburgos ao qual a maior parte do norte da Itália pertencia A unificação da Alemanha le vantava três questões que Alemanha exatamente era para ser unifica da como se jamais as duas maiores potências que eram membros da Confederação Germânica Prússia e Áustria deveriam integrála e o que iria acontecer com os numerosos outros principados que iam de médios reinos a pequenos territórios de ópera bufa E ambas como vimos implicavam diretamente na natureza e fronteiras do Império dos Habsburgos Na prática ambas as unificações implicavam enfim em guerras Felizmente para os dirigentes europeus tal mistura de proble mas domésticos e internacionais tinha cessado de ser explosiva ou melhor a derrota da revolução seguida pela grande expansão haviam lhes tirado a força Falando em termos gerais a partir do final da dé cada de 1850 estes governos encontraramse novamente diante de a gitação política doméstica provocada por uma classe média liberal e alguns democratas radicais eventualmente mesmo por alguma força emergente do movimento operário Alguns deles especialmente quando como a Rússia na guerra da Criméia 185456 e o Império dos Habsburgos na Guerra Italiana de 185960 vieram a ser derrota dos encontravamse agora mais vulneráveis que antes para fazer fa ce ao descontentamento popular Entretanto estas novas agitações não eram revolucionárias exceto em um ou dois lugares onde pude ram ser isoladas ou contidas O episódio característico destes anos era a confrontação entre um parlamento prussiano fortemente liberal e leito em 1861 e o rei da Prússia com sua aristocracia ambos sem a mais remota intenção de abdicar de seus propósitos O governo da Prússia sabendo perfeitamente que a ameaça liberal era meramente retórica provocou uma confrontação e simplesmente chamou o mais A Confederação Germânica incluía a menor parte do Império dos Habsburgos a maior parte da Prússia assim como HolsteinLauenburg que também pertencia a Di namarca e Luxemburgo e que também tinha raízes nãogermânicas Não incluía o en tão Schleswig dinamarquês Por outro lado a União Alfandegária Alemã Zollve rein originalmente formada em 1834 por volta de meados da década de 1850 incluía toda a Prússia mas nenhuma parte da Áustria Também deixava de fora Hamburgo Bremen e uma grande parte da Alemanha do Norte Mecklenburg e Holstein Lauenburg assim como o Schleswig As complicações de tal situação poderiam ser bem imaginadas 85 rude conservador disponível Otto von Bismarck para o cargo de primeiroministro para governar desafiando a recusa do parlamento em votar taxas Ele o fez sem dificuldades Mais que isso a coisa mais significativa a respeito da década de 1860 foi que não apenas governos mantinham quase sempre a inicia tiva e quase nunca perdiam senão momentaneamente o controle da situação que podiam sempre manipular mas também que podiam sempre conceder as reivindicações de suas oposições populares em todos os acontecimentos a oeste da Rússia Esta foi uma década de re formas liberalização política mesmo de algumas concessões ao que era chamado as forças da democracia Na Inglaterra Escandinávia e nos Países Baixos onde houvesse constituições parlamentares o elei torado estava com os governos O British Reform Act de 1867 fazia acreditar que havia colocado o poder eleitoral nas mãos dos eleitores da classe operária Na França onde o governo de Napoleão III tinha visivelmente perdido seu voto urbano por volta de 1863 conseguiu eleger apenas um dos quinze deputados de Paris mais e mais tenta tivas eram feitas para liberalizar o sistema imperial Mas esta mu dança de temperamento é ainda mais espantosa junto às monarquias nãoparlamentares A monarquia dos Habsburgos depois de 1860 simplesmente de sistiu de tentar governar como se seus governados não tivessem opi niões políticas Daí em diante concentrou seus esforços em encontrar alguma coalizão de forças entre suas numerosas e díspares nacionali dades uma qualquer que fosse suficientemente forte para manter o resto politicamente imóvel apesar de todas agora receberem certas concessões educacionais e lingüísticas ver capítulo 5 adiante Até 1879 foilhe fácil encontrar sua base mais conveniente entre os libe rais classemédia de sua fatia da população de língua alemã Mas a monarquia não foi capaz de manter um controle eficiente sobre os Magiares que conseguiram algo não muito distante de uma indepen dência o Compromisso de 1867 que transformou o Império na Mo narquia Dual AustroHúngara Mas ainda mais surpreendente foi o que aconteceu na Alemanha Em 1862 Bismarck tornouse primeiro ministro da Prússia num programa de manutenção da tradicional mo narquia prussiana e sua aristocracia contra o liberalismo democracia e nacionalismo germânico Em 1871 o mesmo chefe de estado aparecia como chanceler do Império Germânico unido por suas próprias forças com um parlamento confessadamente de pouca importância eleito por voto masculino universal e repousando no entusiástico apoio dos libe rais moderadosalemães Bismarck não era de forma alguma um libe ral e longe de um nacionalista alemão no sentido político ver capítulo 5 adiante Era apenas suficientemente inteligente para perceber que o mundo dos junkers prussianos não poderia mais ser preservado apenas com a manutenção do conflito contra o liberalismo e o nacionalismo mas precisava trazêlos ambos para o seu próprio lado Isto implicava repetir o que o líder conservador inglês Benjamin Disraeli 180481 86 ao introduzir o Reform Act de 1867 descrevia como surpreender os Whigs banhandose e fugindo com suas próprias roupas A política dos dirigentes da década de 1860 estava portanto de terminada por três considerações Primeiro eles se encontravam nu ma situação de mudança política e econômica que não podiam con trolar mas a qual precisavam se adaptar A única escolha e os che fes de estado reconheciamna bem claramente era seguir na direção do vento ou utilizar seus conhecimentos de navegação para pôr seus navios em outra direção O vento em si era um fato da natureza Se gundo eles precisavam determinar que concessões às novas forças poderiam ser feitas sem ameaçar o sistema social ou em casos es peciais as estruturas políticas cuja defesa era de responsabilidade destes governantes e o ponto além do qual eles não podiam mais seguir com segurança Mas em terceiro lugar eles tinham a sorte de poder tomar ambas as decisões em circunstâncias que lhes permitiam uma considerável iniciativa campo para manipulação e que lhes fazi am capazes em alguns casos até de agir com virtual liberdade para controlar o curso dos acontecimentos Os chefes de estado que figuram com maior proeminência nas histórias tradicionais da Europa deste período eram por conseguinte aqueles que de forma mais sistemática combinavam controle político com diplomacia e controle da máquina do governo como Bismarck na Prússia conde Camillo Cavour 181061 em Piedmont e Napole ãoIII ou aqueles mais capazes de manejar o difícil processo de aber tura controlada de um sistema de dominação de classe alta como por exemplo o liberal W E Gladstone 180998 e o conservador Dis raeli na Inglaterra E os mais bem sucedidos foram aqueles que sou beram virar as novas e antigas forças políticas nãooficiais para sua própria vantagem aprovassem elas a política destes governantes ou não Napoleão III caiu em 1870 porque não conseguiu fazêlo Mas dois homens provaram ser incomumente eficientes nesta difícil ope ração o moderado liberal Cavour e o conservador Bismarck Ambos eram políticos extraordinariamente lúcidos fato refleti do na despretensiosa claridade do estilo de Cavour e no impressio nante domínio da prosa germânica por Bismarck uma personalidade por demais grandiosa e complexa Ambos eram profundamente anti revolucionários e sem nenhuma simpatia pelas forças políticas cujos programas entretanto eles seguiram e cumpriram exceto quanto às suas implicações democráticas e revolucionárias Ambos tiveram cui dado em separar unidade nacional de influência popular Cavour pela insistência em transformar o novo reino italiano num prolongamento de Piedmont até o ponto de recusar renumerar o título do rei Vitorio Emanuel II de Savóia em Vitorio Emanuel I da Itália Bismarck pela construção do novo império germânico através da supremacia da Prússia Mas ambos eram suficientemente flexíveis para integrar a oposição em seus respectivos sistemas garantindo porém a impossi bilidade de que estas oposições viessem a ganhar controle 87 Ambos enfrentaram problemas imensamente complexos de tá tica internacional e no caso de Cavour de política nacional Bis marck que não precisava de ajuda externa e não se preocupava com oposição interna só podia considerar uma Alemanha unificada que não fosse nem democrática nem demasiado grande que não pudesse ser dominada pela Prússia Isto implicava a exclusão da Áustria que ele obteve por meio de duas rápidas guerras brilhantemente conduzi das em 1864 e 1866 e a paralisia do país que ele conseguiu fomen tando e alimentando a autonomia da Hungria dentro do Império dos Habsburgos 1867 simultaneamente com a preservação da Áustria para a qual dali em diante ele iria dedicar alguns belos presentes di plomáticos Isto porque se a monarquia dos Habsburgos entrasse em colapso com todas as suas nacionalidades seria impossível evitar que os austríacos alemães viessem a se unir com a Alemanha portanto abalando a supremacia da Prússia tão cuidadosamente construída Is so foi de fato o que aconteceu depois de 1918 e um dos resultados colaterais da grande Alemanha de Hitler 193845 foi o total desa parecimento da Prússia Hoje nem sequer seu nome sobreviveu ex ceto nos livros de história Isso também implicava fazer a suprema cia da Prússia mais digerível que a austríaca para os estados menos germânicos e mais antiPrússia o que Bismarck conseguiu com uma guerra igualmente brilhante na sua concepção e condução contra a França em 187071 Cavour por seu turno precisava mobilizar um aliado França para expulsar a Áustria da Itália mas terminou por ser imobilizado por esta iniciativa quando o processo de unificação foi bem além do que Napoleão III esperava Mais grave Cavour encon trouse diante de uma Itália dividida com a metade superior unificada sob controle do Estado e a metade inferior unificada pela guerra re volucionária liderada militarmente por aquele frustrado Fidel Castro do século XIX o chefe guerrilheiro de camisa vermelha Giuseppe Garibaldi 180782 Rápido pensar veloz conversação e brilhantes manobras foram necessárias para persuadir Garibaldi a entregar o po der ao rei o que veio a fazer em 1860 As operações destes chefes de estado ainda inspiram admiração por seu brilhantismo técnico Entretanto o que os fazia tão surpreen dentes não era apenas talento pessoal mas a amplitude pouco usual de ação de que dispunham graças à falta de um sério perigo revolu cionário e a existência de rivalidade internacional a um nível incon trolável As ações de movimentos nãooficiais ou populares demasi ado fracos para conseguir alguma coisa por si próprios ou fracassa ram ou tornaramse subordinados a mudanças decididas de cima Os liberais alemães radicais democratas e revolucionários sociais contri buíram pouco exceto para aplaudir ou condenar o processo de unifi cação germânica A esquerda italiana como já vimos teve um papel maior A expedição siciliana de Garibaldi que rapidamente conquis tou o sul da Itália perturbou Cavour mas embora sendo uma con quista significativa seria impossível determinar qualquer ulterior 88 conseqüência dada a situação criada por Cavour e Napoleão Em ne nhum momento a esquerda italiana conseguiu concretizar a república democrática italiana que era vista como o complemento essencial à unidade A pequena nobreza húngara moderada conseguiu autonomia para seu país sob o véu de Bismarck mas os radicais ficaram desa pontados Kossuth continuou a viver no exílio e lá morreu As rebeli ões dos povos balcânicos na década de 1870 vieram resultar numa es pécie de independência para a Bulgária 1878 mas apenas na medida em que isso interessava às grandes potências os bosnianos que co meçaram suas insurreições em 187576 apenas trocaram a domina ção turca por uma provavelmente superior administração dos Habs burgos Por outro lado como veremos revoluções independentes terminaram mal ver capítulo 9 adiante Mesmo a espanhola de 1868 que chegou a produzir uma fugaz república radical em 1873 termi nou com um rápido retorno à monarquia Não diminuímos os méritos dos grandes dirigentes políticos da década de 1860 ao dizer que suas respectivas tarefas foram grande mente facilitadas porque podiam introduzir mudanças constitucionais de maior magnitude sem drásticas conseqüências políticas e menos ainda porque podiam iniciar e terminar guerras quase que pela livre vontade Neste período tanto a ordem doméstica quanto a internacio nal podiam ser consideravelmente modificadas com um risco político comparativamente pequeno II Eis por que os 30 anos que sucederam 1848 foram um período de mudanças mais espetaculares ao nível de relações internacionais que domésticas No tempo das revoluções ou melhor depois da der rota de Napoleão ver A Era das Revoluções capítulo 5 os governos das grandes potências tiveram o maior cuidado em evitar conflitos de maior importância entre si já que a experiência havia mostrado que grandes guerras e revoluções caminham juntas Agora que as revolu ções de 1848 tinham vindo e partido este motivo para constrangi mento diplomático tornarase de importância secundária A geração posterior a 1848 foi uma era de guerras e não de revoluções Algumas delas foram de fato o produto de tensões internas ou de fenômenos revolucionários ou quaserevolucionários Estes as grandes guerras civis da China 185164 e dos Estados Unidos 186165 não fa zem parte exatamente da presente discussão exceto no que diz respei to aos aspectos técnicos e diplomáticos das guerras deste período Vamos considerálas separadamente ver capítulos 7 e 8 mais adian te Aqui estamos interessados principalmente nas tensões e mudan ças internas dentro do sistema de relações internacionais sem esque cer o curioso intercâmbio entre as políticas internacional e doméstica 89 Se fôssemos perguntar a um especialista que ainda estivesse vivo do sistema internacional pré1848 sobre problemas de política externa vamos dizer Visconde Palmerston que foi o Secretário de Estado Bri tânico bem antes das revoluções e continuou a dirigir a pasta com al gumas interrupções até sua morte em 1865 ele nos teria explicado da seguinte forma as únicas questões internacionais que contavam eram as relações entre as cinco grandes potências européias cujos conflitos pudessem resultar em guerras de maior importância os seja Inglaterra Rússia França Áustria e Prússia ver A Era das Revolu ções capítulo 5 O único estado além destes com suficiente ambição e poder para ser levado em conta os Estados Unidos era desprezível já que confinava seus interesses a outros continentes e nenhuma po tência européia tinha ambições vivas nas Américas que não fossem econômicas e estas eram do interesse de empresários privados não de governos De fato em 1867 a Rússia vendia o Alaska aos Estados Unidos por uns poucos 7 milhões de dólares e mais o suborno de al guns congressistas americanos para convencer o Congresso a aceitar aquilo que era universalmente considerado uma coleção de rochas geleiras e tundra ártica As potências européias ou melhor aquelas que contavam Inglaterra por causa de sua riqueza e armada Rússia por causa de sua extensão e exército e França por causa de seu ta manho exército e reconhecida e respeitada história militar tinham ambições e razões para desconfiança mútua mas não além da linha do compromisso diplomático Por mais de 30 anos depois da derrota de Napoleão em 1815 nenhuma das grandes potências havia usado armas entre si limitando suas operações militares à supressão da sub versão doméstica ou internacional a vários conflitos locais nem para se expandirem no resto atrasado do mundo Havia entretanto uma fonte de atrito o bastante constante sur gindo sobretudo da combinação entre uma lenta desintegração do Im pério Otomano do qual vários elementos nãoturcos estavam aptos a se libertar e das ambições conflitantes da Rússia e Inglaterra no Me diterrâneo oriental o atual Oriente Médio e a área entre a fronteira leste da Rússia e a fronteira oeste do Império Britânico da índia Da mesma forma que os ministros das relações exteriores dos países de cisivos não estavam preocupados com nenhum distúrbio grave no sis tema internacional através de revoluções eles se sentiam porém a meaçados com aquilo que era chamado A questão do Leste Mesmo assim não se havia ainda perdido o controle As revoluções de 1848 provaramno pois mesmo que três entre as cinco grandes potências ti vessem sido convulsionadas por elas o sistema internacional emergiu praticamente intocado como tal E também com a exceção parcial da França o mesmo ocorreu com os sistemas políticos internos de todos As décadas subseqüentes viriam a ser bastante diferentes Em primeiro lugar o poder considerado pelo menos pelos britânicos como potencialmente o mais instável a França reapareceu da revolu ção como um império populista sob outro Napoleão e o que era mais 90 estranho o medo de um retorno ao Jacobinismo de 1793 não mais de tinha esta possibilidade Napoleão apesar de divulgar ocasionalmente que Império significa Paz especializouse em intervenções interna cionais expedições militares a Síria 1860 em conjunto com a Ingla terra sobre a China 185865 e mesmo enquanto os Estados Uni dos estavam ocupados de outra forma uma aventura no México 186367 onde o satélite francês que foi o Imperador Maximiliano 186467 não sobreviveu por muito mais tempo à Guerra Civil Ame ricana Não havia nada particularmente francês nestes exercícios de banditismo exceto talvez pelo reconhecimento por parte de Napoleão do valor eleitoral da glória imperial A França era apenas suficiente mente forte para tomar parte nesta razzia do mundo nãoeuropeu en quanto a Espanha por exemplo não o era mais apesar de suas gran diosas ambições em recuperar parte de sua perdida influência imperi al na América Latina Enquanto as ambições francesas estivessem si tuadas bem longe não afetavam particularmente o sistema de poder europeu mas quando elas tomavam lugar onde as potências européias estivessem exercitando sua rivalidade vinham trazer perturbação ao que já era um equilíbrio bastante delicado O primeiro dos mais importantes resultados desta perturbação foi a Guerra da Criméia 185456 o acontecimento mais próximo a uma guerra geral européia entre 1815 e 1914 Não havia nada de novo ou inesperado na situação que transformouse numa carnificina inter nacional importante e notoriamente incompetente entre a Rússia de um lado Inglaterra França e Turquia do outro e na qual estimase que mais de 600 mil pessoas tenham perecido sendo que 500 mil de las por doença 22 das tropas inglesas 30 das francesas e cerca de metade das russas Nem antes nem depois disso podese dizer que a política russa de dividir a Turquia ou de transformála num satélite neste caso a primeira hipótese tenha procurado demandado ou le vado a uma guerra entre as potências Mas antes e durante a fase se guinte da desintegração turca na década de 1870 o conflito entre po tências deuse essencialmente como um jogo entre dois poderosos e velhos contendores Inglaterra e Rússia os outros não desejando ou não podendo intervir de outra forma que não fosse simbólica Mas na década de 1850 havia um outro contendor a França cujos estilo e es tratégia eram acima de tudo imprevisíveis Há pouca dúvida de que alguém quisesse realmente tal guerra que foi liquidada sem ter resul tado em nenhuma modificação substancial na Questão do Leste as sim que as potências puderam desvencilharse do imbróglio O que ocorreu foi que o mecanismo de diplomacia da Questão do Leste criada para pequenas confrontações ruiu temporariamente e ao cus to de umas poucas centenas de milhares de vidas Os resultados diplomáticos diretos da guerra foram temporários ou insignificantes embora a Romênia formada pela união de dois principados do Danúbio e nominalmente sob suserania turca até 1878 tenha se tornado de fado independente Os resultados políticos 91 de longo alcance foram mais sérios Na Rússia a rígida crosta da au tocracia tzarista de Nicolau I 182555 já sob pressão crescente ra chou Uma era de crise reformas e mudanças começara ali culmi nando na emancipação dos servos 1861 e na emergência de um mo vimento revolucionário russo no final da década de 1860 O mapa po lítico do resto da Europa viria em breve a ser transformado processo este facilitado se não tornado possível pelas alterações do sistema de poder internacional precipitadas pelo episódio da Criméia Como já as sinalamos um reino unido da Itália surgiu nos anos 185870 uma A lemanha unida em 186271 incidentalmente levando ao colapso o Se gundo Império de Napoleão na França e a Comuna de Paris 187071 além de que a Áustria tinha sido excluída da Alemanha e profundamen te reestruturada Em resumo com a exceção da Inglaterra todas as po tências européias foram substancialmente em muitos casos até terri torialmente modificadas entre 1856 e 1871 e um novo grande estado como cedo viria a ser reconhecido tinha sido fundado a Itália Muitas destas alterações derivavam direta ou indiretamente das unificações políticas da Alemanha e da Itália Fosse qual fosse o ím peto original destes movimentos pela unificação o processo viria a ser levado a cabo por governos constituídos em outras palavras atra vés da força militar Como na famosa frase de Bismarck a questão da unificação tinha sido solucionada com sangue e ferro Em 12 anos a Europa passou por quatro guerras importantes França Savóia e os i talianos contra a Áustria 185859 Prússia e Áustria contra a Dina marca 1864 Prússia e Itália contra a Áustria 1866 Prússia e os es tados germânicos contra a França 1871 Todas foram relativamente breves e pelos padrões das grandes carnificinas na Criméia e nos Es tados Unidos nenhuma excepcionalmente custosa apesar do que cer ca de 160 mil pereceram na guerra francoprussa a maior parte do la do francês Mas todas ajudaram a fazer do período da história euro péia de que trata este volume um interlúdio guerreiro naquele que de outra forma seria um século incomumente pacífico entre 1815 e 1914 Mesmo assim apesar de que a guerra era bastante comum neste mun do entre 1848 e 1871 o medo de uma guerra geral medo este que o século XX tem vivido virtualmente sem interrupção desde a primeira década do século ainda não assustava os cidadãos do mundo burguês Isso só começou a ocorrer lentamente depois de 1871 Guerras entre es tados ainda podiam ser deliberadamente iniciadas e terminadas por go vernos uma situação brilhantemente explorada por Bismarck Apenas sobre guerras civis não se tinha tal controle assim como em relação aos relativamente poucos conflitos que degeneraram em genuínas guerras entre povos como a guerra entre o Paraguai e seus vizinhos 186470 transformada num destes episódios de carnificina e destruição incontro láveis com os quais o nosso próprio século está tão familiarizado Nin guém sabe ao certo a extensão das perdas nas guerras de Taiping mas temse dito que algumas províncias chinesas até hoje não conseguiram recuperar sua população de antes das guerras 92 A Guerra Civil Americana matou mais de 630 mil soldados e o total de mortos feridos e desaparecidos ficou entre 33 e 40 do con junto de forças unionistas e confederadas A Guerra do Paraguai ma tou 330 mil até onde as estatísticas latinoamericanas possam ter al gum significado reduzindo a população de sua vítima principal para cerca de 200 mil dos quais 30 mil eram homens Por onde for que se observe a década de 1860 foi uma década de sangue O que fez com que este período da história fosse relativamente tão sangrento Em primeiro lugar o próprio processo de expansão capitalista global que multiplicava as tensões no mundo nãoeuropeu as ambições do mundo industrial e os conflitos diretos e indiretos dali surgidos Assim foi a Guerra Civil Americana sejam quais forem su as origens políticas quando o norte industrializado venceu o sul agrá rio ou como poderia ser dito em outras palavras a transferência do sul americano do império informal da Inglaterra da qual a indústria do algodão era o pendente econômico para a nova e definitiva eco nomia industrial dos Estados Unidos Podese considerar esta transfe rência como um passo precoce mas gigantesco no caminho que no século XX levaria a totalidade das Américas da dependência britâni ca para a dependência americana A Guerra do Paraguai pode ser vis ta como parte da integração da bacia do Rio da Prata na economia mundial da Inglaterra Argentina Uruguai e Brasil suas faces e eco nomias voltadas para o Atlântico forçaram o Paraguai a perder sua autosuficiência conseguida na única área na América Latina onde os índios resistiram ao estabelecimento de brancos de forma efetiva gra ças talvez à original dominação jesuíta ver capítulo 7 mais adiante O restante dos índios que resistiram à conquista branca foram empur rados para a fronteira desta conquista Apenas no norte da bacia do Prata os povoados indígenas permaneceram sólidos e o guarani ao invés de português ou espanhol permaneceu como o idioma de facto para comunicação entre nativos e colonos A rebelião de Taiping e sua supressão são inseparáveis da rápida penetração de armas e capi tal ocidental no Império Celestial desde a primeira Guerra do Ópio 183942 ver capítulo 7 mais adiante Em segundo lugar como já vimos especialmente na Europa foi graças a recuperação da guerra como um instrumento normal de política governamental já que não mais se acreditava que a guerra devia ser evitada por medo da conseqüente revolução e já que estava também convencido corretamente de que os mecanismos de poder eram capazes de mantêlas nos limites desejados A rivalidade econô mica não levava além de atritos locais numa era de expansão onde parecia haver lugar para todos Mais ainda nesta era clássica de libe ralismo econômico a competição comercial estava mais próxima de independência frente a qualquer apoio governamental do que nunca antes ou depois Ninguém neste período nem mesmo Marx contra riamente a uma suposição corrente entendeu as guerras européias como basicamente econômicas na sua origem 93 Em terceiro lugar estas guerras agora podiam ser promovidas com a nova tecnologia do capitalismo Já que esta tecnologia através da câmera e do telégrafo também havia transformado a cobertura das guerras na imprensa trazendo sua realidade mais vividamente diante do público literato mas exceto pela fundação da Cruz Vermelha In ternacional em 1860 e a Convenção de Genebra de 1864 isto resultou em pouca coisa Nosso século não viria a produzir melhores controles sobre suas horríveis matanças As guerras asiáticas e latino americanas permaneceram substancialmente prétecnológicas exce ção feita às pequenas incursões de forças européias A Guerra da Criméia com sua incompetência característica falhou em usar ade quadamente a tecnologia já existente Mas as guerras da década de 1860 já iriam empregar a estrada de ferro para mobilização e trans porte adequados e o telégrafo disponível para rápidas comunicações Também nesta época foram desenvolvidos os barcos de guerra e suas derivações a artilharia pesada as armas de guerra de produção em massa incluindo a metralhadora Gatling 1361 assim como os mo dernos explosivos passaram a ser usados a dinamite foi inventada em 1866 trazendo conseqüências significativas para o desenvolvi mento das economias industriais Portanto todos estavam mais prepa rados e próximos dos massacres das guerras modernas do que em qualquer época anterior A Guerra Civil Americana mobilizou 25 mi lhões de homens de uma população de digamos 33 milhões O res tante das guerras do mundo industrial permaneceu como conflitos de pequenas proporções pois mesmo os 17 milhões mobilizados em 187071 na guerra francogermânica representaram menos de 25 dos 77 ou mais milhões de habitantes dos dois países ou seja 8 dos 22 milhões capazes de empunhar armas Ainda é importante notar que de meados da década de 1860 em diante gigantescas batalhas envol vendo mais de 300 mil homens deixaram de ser incomuns Sadowa em 1866 Gravelotte e Sedan em 1870 Apenas uma batalha deste tipo o correu durante todo o período das guerras napoleônicas Leipzig em 1813 Mesmo a batalha de Solferino na Guerra Italiana de 1859 foi maior que todas as batalhas napoleônicas com exceção de uma Já observamos os subprodutos domésticos destas iniciativas e guerras entre governos Mas a longo prazo suas conseqüências inter nacionais ainda viriam a ser mais dramáticas Pois no período que es tudamos o sistema internacional foi fundamentalmente alterado muito mais profundamente que os observadores da época chegaram a reconhecer Apenas um aspecto disto permaneceu inalterado a ex traordinária superioridade do mundo desenvolvido sobre o subdesen volvido que era sublinhada ver capítulo 8 mais adiante pela carreira do único país nãobranco que neste período conseguiu imitar o Oeste ou seja o Japão A tecnologia moderna colocava qualquer governo que não a dispusesse a mercê de qualquer outro que a possuísse Por outro lado ás relações entre as potências foram transforma das Por meio século depois da derrota de Napoleão apenas um país 94 era essencialmente industrial e capitalista dispondo de uma genuína política global isto é uma armada global a Inglaterra Na Europa ha via dois países com exércitos potencialmente decisivos apesar de que sua força era essencialmente nãocapitalista a Rússia com sua vasta e fisicamente vigorosa população e a França com a possibilidade e a tradição de mobilização de massa revolucionária A Áustria e a Prús sia não eram de importância políticomilitar comparável Nas Améri cas havia apenas um poder sem rival os Estados Unidos que como já vimos não se aventurava na área da real rivalidade entre potências Esta área não incluía antes da década de 1850 o Extremo Oriente Mas entre 1848 e 1871 ou mais precisamente durante a década de 1860 três fatos ocorreram Primeiro a expansão da industrialização produziu outras potências essencialmente industriais e capitalistas a lém da Inglaterra os Estados Unidos a Prússia Alemanha e muito antes disso a França tendo o Japão se somado mais tarde Segundo o progresso da industrialização fez com que de forma crescente a ri queza e a capacidade industrial viessem a ser os fatores decisivos no poderio internacional diminuindo assim a posição relativa da Rússia e da França e aumentando a da Prússia Alemanha Terceiro a emer gência como potências independentes de dois estados extraeuropeus os Estados Unidos unidos sob o norte na Guerra Civil e o Japão sis tematicamente embarcando na modernização da Restauração Meiji de 1868 criavam pela primeira vez a possibilidade de um conflito global entre potências A tendência crescente de homens de negócios e governos europeus em expandir suas atividades alémmar e de en volveremse facilmente com outros poderes em áreas tais como o Ex tremo Oriente e o Oriente MédioEgito reforçava esta possibilidade Fora da Europa estas mudanças na estrutura de poder não produ ziam ainda grandes conseqüências Mas dentro da Europa fizeramse imediatamente sentir A Rússia como a Guerra da Criméia mostrara tinha cessado de ser potencialmente decisiva no continente europeu Assim como a França o que havia sido demonstrado pela guerra francoprussiana Por outro lado a Alemanha um novo poder que combinava uma impressionante força industrial e tecnológica com uma população substancialmente maior que qualquer outro estado eu ropeu exceto a Rússia tornouse a nova força decisiva nesta parte do mundo e assim permaneceria até 1945 A Áustria na redecorada ver são de uma Monarquia Dual AustroHúngara 1867 permaneceu a quilo que havia sido por já tanto tempo uma grande potência ape nas no tamanho e na conveniência internacional apesar de mais forte que a recémunificada Itália cuja grande população e ambições di plomáticas davam também direito a requerer ser tratada como partici pante no jogo do poder De mais a mais a estrutura formal internacional passou a diver gir da estrutura real A política internacional tornouse política mun dial na qual pelo menos duas potências nãoeuropéias iriam intervir de fato embora isso não fosse evidente até o século XX Mais ainda 95 estes países tornaramse uma espécie de oligopólio de potências capi talistas industriais exercendo um monopólio sobre o mundo mas competindo entre si embora isto não se tornasse evidente até a era do imperialismo depois do fim de nosso período Por volta de 1875 tudo isso era dificilmente discernível Mas as fundações da nova es trutura de poder foram estabelecidas na década de 1860 incluindo o medo de uma guerra geral européia que começava a preocupar os ob servadores da cena internacional na década de 1870 De fato tal guer ra não iria acontecer nos 40 anos seguintes um período mais longo do que o século XX poderia imaginar para si mesmo Nossa própria ge ração que pode olhar para trás no momento que escrevemos e ver quase 30 anos sem guerras entre as grandes ou mesmo médias potên cias sabe melhor do que ninguém que a ausência de guerra pode ser muito bem combinada com o seu temor permanente Apesar dos con flitos a era do triunfo liberal tinha sido estável Não mais o seria de pois de 1875 Com a exceção do conflito entre os Estados Unidos e a China na Coréia em 195053 num tempo em que a China não era considerada uma potência de maior envergadura PRIMARY DATA SECONDARY DATA PRIMARY DATA SECONDARY DATA 97 Quinto Capítulo A CONSTRUÇÃO DAS NAÇÕES Mas o que é uma nação Por que a Holanda é uma nação en quanto Hanover e o GrãoDucado de Parma não o são Ernest Renan 188211 O que é nacional Quando ninguém entende uma palavra da língua que você fala Johann Nestroy 18622 Se um grande povo não acredita que a verdade deva ser encontrada em si mesma se não acredita que ele sozinho se complete a si mes mo e esteja destinado a levantarse e salvar a todo o resto pela sua verdade imediatamente transformase em material etnográfico e não mais em um grande povo Uma nação que perde esta fé deixa de ser uma nação F Dostoiewsky 1871723 NAÇÕES Reunir aqui todos os povos Gustave Flaubert 18524 I Se as políticas doméstica e internacional estavam intimamente ligadas entre si neste período o traço que as ligava mais obviamente era o que chamamos de nacionalismo mas os meados do século XIX ainda o conheciam como o princípio de nacionalidade Sobre o que girava a política internacional entre os anos de 1848 e 1870 A historiografia tradicional ocidental tem pouca dúvida a este respeito era sobre a criação de uma Europa de naçõesestados Talvez haja considerável dúvida sobre a relação entre esta faceta da era e outras que estavam evidentemente em conexão com ela tais como o pro gresso econômico liberalismo talvez até democracia mas nenhuma sobre o papel central da nacionalidade E realmente como poderia haver Mesmo significando outras coisas 1848 a primavera dos povos foi claramente e sobretudo em termos internacionais uma afirmação de nacionalidade ou me lhor de nacionalidades rivais Alemães italianos húngaros polone ses romenos e o resto afirmaram seu direito de serem estados inde 98 pendentes e unidos embraçando todos os membros de suas nações con tra governos opressores como fizeram os tchecos croatas dinamar queses e outros embora com crescente apreensão sobre aspirações re volucionárias por parte das nações maiores que pareciam excessiva mente dispostas a sacrifícios neste particular A França já era um estado independente nacional mas não menos nacionalista por causa disso As revoluções haviam fracassado mas a política européia dos 25 anos seguintes continuaria a ser dominada pelas mesmas aspira ções Como vimos anteriormente estes objetivos já haviam sido atin gidos de uma forma ou de outra fosse por meios nãorevolucionários ou apenas marginalmente revolucionários A França retornou à cari catura de uma grande nação sob a caricatura de um grande Napole ão a Itália e a Alemanha foram unificadas sob os reinos de Savóia e da Prússia a Hungria atingiu virtualmente uma organização domésti ca pelo Compromisso de 1867 a Romênia tornouse um estado pelo amalgamento de dois principados danubianos Somente a Polônia que não teve uma adequada participação na revolução de 1848 fra cassou em conseguir independência ou autonomia através da insurrei ção de 1863 No extremo oeste da Europa como no extremo sudeste o pro blema nacional veio a se impor Os fenianos na Irlanda levantaramse sob a forma de uma insurreição radical apoiados pelos milhões de compatriotas empurrados para os Estados Unidos pela fome e ódio aos ingleses A crise endêmica do multinacional Império Otomano tomou a forma de revoltas por parte dos diversos povos cristãos que tinham sido dominados por tanto tempo nos Bálcãs A Grécia e a Sér via já eram independentes apesar de muito menores do que achavam que deveriam ser A Romênia conseguiu uma espécie de independên cia pelo final da década de 1850 Insurreições populares no início da década de 1870 precipitaram ainda uma outra crise turca nacional e internacional que viria a fazer da Bulgária um país independente pelo final da década acelerando a balcanização dos Bálcãs A assim chamada Questão do Leste aquela permanente preocupação dos chanceleres agora se tornava basicamente uma questão de como re desenhar o mapa da Turquia européia entre um número incerto de es tados de tamanho duvidoso que se acreditava representarem na ções estatutos ao qual reclamavam E um pouco mais ao Norte os problemas internos do Império dos Habsburgos eram de forma cada vez mais patente as questões de suas nacionalidades constituintes muitas das quais e potencialmente todas levantavam pedidos que iam de uma tênue autonomia nacional à secessão Mesmo fora da Europa a construção de nações era dramatica mente visível O que era a Guerra Civil Americana senão a tentativa de manter a unidade da nação americana frente à destruição O que era a Restauração Meiji senão o aparecimento de uma nova e orgu lhosa nação no Japão Parecia quase impossível negar que o na tionmaking como Walter Bagehot 182677 chamou este processo 99 estava tomando lugar através de todo o mundo e era uma característi ca dominante da era Tão evidente que a natureza do fenômeno praticamente não foi investigada A nação era dada Como Bagehot colocou Não po demos imaginar aqueles para os quais isto é uma dificuldade sabe mos do que se trata quando vocês não nos perguntam mas não con seguimos explicála ou definila rapidamente 5 e poucos pensavam que precisavam Certamente os ingleses sabiam o que era ser inglês os franceses alemães ou russos certamente não tinham dúvidas do que fosse sua identidade coletiva Na era da construção de nações a creditavase que isso implicava a transformação desejada lógica e necessária de nações em estadonações soberanos com um territó rio coerente definido pela área ocupada pelos membros da nação que por sua vez era definida por sua história cultura comum compo sição étnica e com crescente importância a língua Mas implicar em tudo isso não é muito lógico Se por um lado é inegável e tão velho quanto a história o fato de existirem grupos distintos de homens dife renciandose a si mesmos de outros grupos por uma variedade de cri térios por outro lado não é certo que estes mesmos critérios fossem aquilo que o século XIX entendia por nacionalidade Menos ainda dizer que o fato de estarem organizados em estados territoriais do tipo do século XIX coincidia com o conceito de nação Estas eram fe nômenos históricos recentes embora alguns estados territorialmente mais antigos Inglaterra França Espanha Portugal e talvez até a Rússia pudessem ser definidos como estadonações sem que isso fosse totalmente absurdo Mesmo como um programa geral as aspi rações de formar estadonações a partir de estados que não fossem nações era um produto da Revolução Francesa Precisamos portanto separar bem claramente entre a formação de nações e nacionalis mos de um lado na medida em que isso ocorreu durante nosso perí odo e a criação de estadonações de outro O problema não era apenas analítico mas também prático Pois a Europa deixando de lado o resto do mundo estava dividida eviden temente em nações cujas aspirações em fundar estados não deixava pelo certo ou pelo errado nenhuma dúvida e em nações a cerca das quais havia uma boa dose de incerteza quanto a aspirações semelhan tes O melhor guia para o primeiro tipo era o fato político a história institucional ou a história cultural das tradições A França Inglaterra Espanha e Rússia eram inegavelmente nações porque possuíam es tados identificados com os franceses ingleses etc Hungria e Polônia eram nações porque havia existido um reino húngaro como entidade separada mesmo quando dentro do Império dos Habsburgos e um estado polonês que também havia existido de há muito até sua destru ição no final do século XVIII A Alemanha era uma nação por força de que seus numerosos principados apesar de nunca unidos em um único estado territorial terem constituído outrora o então chamado Sagrado Império Romano da Nação Germânica e formado por outro 100 lado a Federação Germânica mas também porque todos os alemães de educação elevada partilhavam a mesma língua escrita e literatura A Itália apesar de nunca ter sido uma entidade política enquanto tal possuía talvez a mais antiga das literaturas comuns à sua própria elite Nenhum inglês alemão ou francês pode ler as obras do século XIV escritas nos seus países sem estudar antes um bom pedaço de um idi oma diferente Mas todos os italianos de boa educação hoje lêem Dante com menos dificuldades que pessoas de língua inglesa moder na em relação a Shakespeare E assim por diante O critério histórico de nacionalidade implicava portanto a im portância decisiva das instituições e da cultura das classes dominantes ou elites de educação elevada supondoas identificadas ou pelo me nos não muito obviamente incompatíveis com o povo comum Mas o argumento ideológico para o nacionalismo era bem diferente e muito mais radical democrático e revolucionário Apoiavase no fato de que o que fosse que a história ou a cultura pudessem dizer os irlan deses eram irlandeses e não ingleses os tchecos eram tchecos e não alemães os finlandeses não eram russos e nenhum povo deveria ser explorado ou dirigido por outro Argumentos históricos poderiam ser encontrados ou inventados para explicar esta posição sempre se po de encontrálos mas essencialmente o movimento tcheco não ficou apenas na aspiração de restaurar a Coroa de São Venceslau assim como o movimento irlandês não ficou fixado na Revogação da União de 1801 A base deste senso separatista não era necessariamente ét nica na acepção de diferenças rapidamente identificáveis como apa rência física ou mesmo de idioma Durante nosso período o movi mento dos irlandeses muitos dos quais já falavam inglês dos norue gueses cuja língua literária não era muito diferente do dinamarquês ou dos finlandeses cujos nacionalistas eram bilingües falando sueco e finlandês não criaram um caso fundamentalmente lingüístico para si mesmos Se chegava a ser cultural não se tratava da alta cultura que muitos destes povos não chegavam a ter em grande quantidade mas sim da cultura oral canções baladas épicos etc os hábitos e formas de vida dos folks do povo comum em outras palavras pa ra um entendimento prático do campesinato O primeiro estágio deste renascimento nacional era invariavelmente o de encontrar recupe rar e sentir orgulho desta herança de folclore ver A Era das Revolu ções capítulo 14 Mas isso não era político em si Aqueles que inicia ram este movimento eram freqüentemente ou não membros de ele vada cultura da classe dirigente ou elite estrangeira como os pastores luteranos alemães ou os senhores com preocupações intelectuais no Báltico que colecionavam o folclore e antigüidades do campesinato latvio ou estoniano Os irlandeses não eram nacionalistas porque a creditassem em duendes Por que eles eram nacionalistas e até onde eles eram nacionalis tas vamos discutir mais adiante O ponto significativo aqui é que a típica nação a histórica ou semihistórica era também uma peque 101 na nação e isto colocava o nacionalismo do século XIX diante de um dilema que tem sido raramente reconhecido Pois os grandes de fensores da naçãoestado entendiamse não apenas como nacional mas também como progressista isto é capaz de uma economia tecnologia organização de estado e força militar viáveis ou em ou tras palavras que precisava ser territorialmente grande Terminava por ser na realidade a unidade natural do desenvolvimento da so ciedade burguesa moderna liberal e progressista Unificação as sim como independência era o princípio básico e onde argumentos históricos para unificação não existissem como era o caso da Ale manha e Itália esta era quando possível formulada como um pro grama Não havia evidência de que os estados balcânicos tivessemse sentido algum dia parte de uma mesma nação mas os ideólogos na cionalistas que apareceram na primeira metade do século pensavam em termos de uma Illiria unindo serbos croatas eslovacos bosnia nos macedônios e outros que até hoje demonstram que seu naciona lismo iugoslavo existe em conflito com seus sentimentos como croa tas slovacos etc O mais eloqüente e típico dos defensores da Europa das nacio nalidades Giuseppe Mazzini 180572 propôs um mapa de sua Eu ropa ideal em 1857 6 consistia de 11 uniões deste tipo Claramente sua concepção de naçãoestado era bem diferente da de Woodrow Wilson que presidiu a única criação sistemática sobre o papel de um mapa europeu seguindo princípios nacionais em Versalhes 191920 Sua Europa consistia em 26 ou incluindo a Irlanda 27 estados sobe ranos e pelo critério Wilsoniano casos poderiam ser levantados em pelo menos algumas outras situações O que deveria acontecer com as pequenas nações Elas deveriam ser integradas completamente de forma federal ou outra qualquer com ou sem uma quantidade ainda indeterminada de autonomia às naçõesestados viáveis Mas Mazzini parecia não se dar conta de que um homem que propusesse unir a Suí ça a Savóia Tirol alemão Caríntia e Slovênia ficava numa posição difícil para criticar por exemplo o Império dos Habsburgos por pas sar por cima do princípio nacional O argumento mais simples daqueles que identificavam nações estados com o progresso era negar o caráter de nações reais aos po vos pequenos e atrasados ou então argumentar que o progresso iria reduzilos a meras idiossincrasias dentro das grandes nações reais ou mesmo leválos a um desaparecimento de facto por assimilação a algum Kulturvolk Isso não parecia fora da realidade Depois de tudo a participação como membro na Alemanha não impedia os mecken burgueses de falar em seu dialeto que era mais próximo do holandês que do altoalemão e que nenhum bávaro conseguia entender como também não evitava que os eslavos lusatianos não aceitassem como ainda discutem um estado basicamente alemão A existência dos bre ves e uma parte dos bascos catalães e flamengos para não mencio nar aqueles que se comunicam em provençal ou na Langue doc pare 102 cia perfeitamente compatível com a nação francesa da qual faziam parte e os alsacianos criaram um problema apenas porque uma outra grande naçãoestado a Alemanha disputavaos Além disso havia exemplos de pequenos grupos lingüísticos cujas elites de instrução elevada olhavam para frente sem remorsos em relação ao desapare cimento de seus próprios idiomas Muitos gauleses em meados do sé culo XIX estavam resignados a isto e alguns viam mesmo com pra zer este processo na medida em que facilitasse a penetração do pro gresso numa região atrasada Havia um forte elemento de diferenciação e talvez um mais for te de patrocínio especial em tais argumentos Algumas nações as maiores as avançadas as estabelecidas incluindo certamente a própria nação do ideólogo estavam destinadas pela história a preva lecer ou se o ideólogo preferisse uma conceituação darwinista a se rem vitoriosas na luta pela existência e outras não Todavia isso não deve ser entendido como simplesmente uma conspiração de parte de algumas nações para oprimir outras embora portavozes das nações desprezadas não devessem ser repreendidos por pensar assim Pois o argumento era dirigido não apenas contra as línguas e culturas regio nais das nações como também contra intrusos também não pretendia seu desaparecimento mas apenas seu rebaixamento da qualidade de língua para a de dialeto Cavour não negou aos habitantes da Sa vóia o direito de falar sua própria língua mais próxima do francês do que do italiano numa Itália unificada ele mesmo falavaa por razoes domésticas Ele e outros italianos nacionalistas apenas insistiam em que deveria haver somente uma língua e um meio de instrução ofici ais em outras palavras o italiano e que as outras deveriam sumir e vaporarse da melhor forma que pudessem Da maneira como as coi sas seguiam nem os sicilianos nem os sardenhos insistiram na sua nacionalidade separada portanto seus problemas poderiam ser redefi nidos na melhor das hipóteses como regionalismo Este fenômeno apenas se tornou politicamente significativo uma vez que um pequeno povo reclamou pela sua nacionalidade como os tchecos fizeram em 1848 quando seus portavozes recusaram o convite dos liberais ale mães para tomar parte no parlamento de Frankfurt Os alemães não negaram que eles fossem tchecos Apenas entenderam o que era cor reto que todos os tchecos de boa cultura liam e escreviam alemão partilhavam da alta cultura alemã e que portanto incorretamente e ram alemães O fato de que a elite tcheca também falasse tcheco e partilhasse da cultura do povo simples local parecia ser politicamente irrelevante como as atitudes do povo simples em geral e do campesi nato em particular Diante das aspirações nacionais de povos pequenos os ideólo gos de uma Europa nacional tinham três escolhas diante de si eles podiam negar legitimidade ou existência a tais movimentos podiam reduzilos a movimentos de autonomia regional ou podiam aceitálos como fatos indiscutíveis porém intragáveis Os alemães tenderam pa 103 ra a primeira hipótese com povos como os eslovenos e os húngaros com os eslovacos Esta atitude precisa ser diferenciada daquela dos revolucionários sociais que não deram maior importância ao naciona lismo pelo menos em nosso período e que portanto tiveram uma visão puramente operacional do fenômeno Para Marx os naciona lismos húngaro e polonês eram bons porque mobilizavam do lado da revolução e os nacionalismos tcheco e croata ruins porque objetiva mente estavam do lado da contrarevolução Mas não podemos negar que houvesse um elemento de nacionalismo de grandenação nesses pontos de vista de forma bem acentuada entre os revolucionários al tamente chauvinistas franceses como os blanquistas e difícil de ser negado mesmo em Friederich Engels Cavour e Mazzini assumiram a segunda hipótese com respeito ao movimento irlandês Nada pode ser mais paradoxal do que o fracasso em entender do ponto de vista nacionalista um movimento nacional cuja base de massa era de tal forma evidente Políticos de todas as correntes foram constrangidos a assumir a terceira hipótese com respeito aos tchecos cujo movimento nacional apesar de não pretender total independência não podia mais ser posto de lado após 1848 Quando possível evidentemente não se dava nenhuma importância a tais movimentos Nenhum estrangeiro iria preocuparse com o fato de que a maioria dos velhos estados na cionais não fosse outra coisa senão estados multinacionais como por exemplo Inglaterra França ou Espanha pois ou gauleses esco ceses bretões catalães etc não colocavam nenhum problema interna cional e com a possível exceção dos catalães nenhum problema sig nificativo nas políticas de seus próprios países II Havia uma diferença fundamental entre o movimento para fun dar estadonações e nacionalismo O primeiro era um programa pa ra construir um artifício político que reclamava basearse no último Não há dúvida de que muitos daqueles que se consideravam ale mães por alguma razão achavam que isso não implicava necessaria mente num único estado alemão um estado alemão de algum tipo es pecífico ou mesmo um estado onde todos os alemães vivessem dentro de uma área determinada como uma canção nacional dizia entre os rios Meuse a Oeste e Nieman a Leste as ilhas da Dinamarca o cintu rão ao Norte e o rio Adige ao Sul Bismarck por exemplo teria ne gado que sua rejeição a este programa da grande Alemanha signifi cava que ele não era menos alemão que um junker prussiano e fun cionário do estado Ele era alemão mas não um alemão nacionalista provavelmente nem mesmo um nacionalista pequenoalemão por convicção embora tenha unificado o país excluindo as áreas do Im pério Austríaco que tivessem pertencido ao Santo Império Romano mas incluindo as áreas tomadas pela Prússia aos poloneses que nunca 104 tinham feito parte do Império Romano Um caso extremo de diver gência entre nacionalismo e naçãoestado era a Itália a maior parte da qual tinha sido unificada sob o rei da Sabóia em 185960 1866 e 1870 Não havia precedente histórico posterior a Roma antiga para uma única administração de toda a área compreendida entre os Alpes e a Sicília que Metternich havia descrito com grande precisão como uma mera expressão geográfica No momento da unificação em 1860 estimouse que não mais de 25 de seus habitantes falava a língua italiana no diaadia o resto falando idiomas de tal forma dife rentes que professores enviados pelo estado italiano para a Sicília na década de 1860 foram confundidos com ingleses7 Provavelmente uma percentagem bem maior mas ainda uma modesta minoria teria se sentido naquela data como italianos Não é de admirar que Massi mo dAzeglio 17921866 tivesse exclamado em 1860 Fizemos a Itália agora precisamos fazer os italianos De qualquer maneira fosse qual fosse sua natureza ou progra ma movimentos representando a idéia nacional cresceram e multi plicaramse Eles não representavam freqüentemente ou normal mente aquilo que o século XX viria a entender como a extrema ver são de um programa nacional ou seja a necessidade de um estado to talmente independente homogêneo territorial e lingüisticamente lai co provavelmente republicanoparlamentar para cada povo O Sio nismo pelo extremismo mesmo de suas reivindicações ilustra de forma clara este fato pois implicava tomar um território inventar uma língua e laicizar as estruturas políticas de um povo cuja unidade histórica tinha consistido exclusivamente na prática de uma religião comum Entretanto todos implicavam algumas modificações políti cas mais ou menos ambiciosas o que os fazia nacionalistas Preci samos agora examinar estes últimos com cuidado para evitar tanto o anacronismo de uma compreensão tardia dos fatos como a tentação de confundir as idéias dos líderes nacionalistas mais vociferantes com as idéias de fato aceitas pelos seus seguidores Não deveríamos também passar por cima sem dar atenção para a substancial diferença entre velhos e novos nacionalismos os pri meiros incluindo não apenas as nações históricas sem um estado mas também aquelas que há longo tempo o possuíam Quão britâni cos os britânicos se sentiam Não muito apesar da inexistência nesta época de qualquer movimento autonomista gaulês ou escocês Imi grantes ingleses para os Estados Unidos tinham orgulho de sua nacio nalidade portanto sentindo relutância em se tornarem cidadãos ame ricanos mas imigrantes escoceses ou gauleses não tinham tal lealda de Eles permaneciam orgulhosos escoceses ou gauleses escolhendo a cidadania inglesa ou americana e naturalizavamse sem maiores pro blemas Em que medida os franceses sentiamse membros de la gran de nation Não sabemos mas estatísticas referentes à evasão ao ser viço militar no início do século sugerem que certas regiões a oeste e ao sul para não mencionar o caso especial dos corsos olhavam o 105 serviço militar compulsório mais como uma imposição do que como um dever nacional do cidadão francês Os alemães como sabemos tinham opiniões diferentes quanto ao tamanho natureza e estrutura do futuro estado unificado alemão mas quantos entre eles estavam deci didamente interessados na unificação alemã Pelo menos não os camponeses alemães segundo um consenso geral nem mesmo na re volução de 1848 quando a questão nacional dominou a política Estes eram países onde o nacionalismo de massa e o patriotismo não podi am ter suaexistência negada mas todavia demonstravam de forma clara como era imprudente tomar por certa a sua universalidade e homogeneidade Na maior parte das outras nações especialmente as emergentes só a mitificação e a propaganda tomariamnos por certos em meados do século XIX Nestas o movimento nacional tendia a tornarse po lítico após sua fase sentimental e folclórica com a emergência de grupos mais ou menos expressivos dedicados à idéia nacional pu blicando jornais e literatura nacionais organizando sociedades na cionais tentando estabelecer instituições educacionais e culturais e engajandose em várias atividades francamente políticas Mas de for ma geral neste ponto o movimento ainda era carente de um apoio de cisivo por parte da massa da população Consistia basicamente de um extrato social intermediário entre as massas e a burguesia ou a aristo cracia existentes se tanto especialmente os literatos professores camadas inferiores do clero alguns pequenos comerciantes e artesãos urbanos e aquela espécie de homens que tinham conseguido subir ao ponto máximo possível para os filhos de um campesinato subordina do numa sociedade hierárquica Eventualmente os estudantes de al gumas faculdades seminários ou colégios com orientação nacional forneciam a estes grupos um ativo corpo de militantes Evidentemen te nas nações históricas que demandavam apenas a remoção da dominação estrangeira para surgirem como estados a elite local pe quena nobreza na Hungria e Polônia burocratas classemédia na No ruega proporcionava quadros mais imediatamente políticos e às ve zes uma base maior para a emergência de nacionalismo ver A Era Revoluções capítulo 7 No todo esta fase de nacionalismo termina entre 1848 e a década de 1860 na Europa central ocidental e setentri onal embora muitos dos pequenos povos bálticos e eslavos estives sem apenas começando a entrar no período Por razões óbvias as camadas mais tradicionais atrasadas ou pobres de cada povo eram as últimas a serem envolvidas em tais mo vimentos trabalhadores empregados e camponeses que seguiam o caminho traçado pela bemeducada elite A fase de nacionalismo de massa que vinha normalmente sob a influência de organizações da camada média de nacionalistas liberaisdemocratas exceto quando contrabalançada pela influência de partidos independentes trabalhis tas e socialistas estava de alguma forma relacionada com desenvol vimento econômico e político Nas terras tchecas esta movimentação 106 começou com a revolução de 1848 desapareceu nos anos absolutistas da década de 1850 mas cresceu enormemente durante o rápido pro gresso econômico da década de 1860 quando as condições políticas passaram a ser mais favoráveis Uma burguesia nativa tcheca tinha então adquirido suficiente força econômica para fundar um banco na cional tcheco e mesmo instituições custosas tais como o Teatro Na cional de Praga inaugurado provisoriamente em 1862 Mais próxi mo de nosso interesse organizações culturais de massa como os clu bes de ginástica Sokol 1862 cobriam então os campos e as campa nhas políticas depois do Compromisso AustroHúngaro foram condu zidas por meio de uma série de grandes comícios a céu aberto uns 140 com uma estimativa de participação em terno de um milhão e meio no período 186871 8 que aliás ilustram tanto a novidade como o internacionalismo cultural de movimentos de massa nacionais Percebendo a falta de um nome adequado para tais atividades os t checos inicialmente tomaram emprestado o termo meeting do movi mento irlandês que tentaram imitar O termo meeting também seria tomado de empréstimo para reuniões de massa de classe trabalhadora pelos franceses e espanhóis mas a esta altura provavelmente por in fluência inglesa Logo um nome adequadamente tradicional viria a ser encontrado recuandose no tempo até os Hussitas do século XV um exemplo natural da militância nacional tcheca o tabor e por sua vez este nome viria a ser adotado pelos nacionalistas croatas para suas reuniões de massa embora os Hussitas não tivessem nenhuma relevância histórica para estes últimos Este tipo de nacionalismo de massa era novo e bem diferente do nacionalismo de elite ou de classe média dos movimentos italianos e alemão E existia ainda há tempos outra forma de nacionalismo de massa mais tradicional revolucionário e independente das classes mé dias locais mesmo que a razão disso fosse a pouca importância econô mica e política destas últimas Mas poderíamos chamar de naciona listas as rebeliões dos camponeses e montanheses contra a lei do es trangeiro quando os revoltosos eram unidos apenas pela consciência da opressão xenofobia e uma ligação profunda com a tradição antiga com a fé e um vago sentido de identidade étnica Somente quando estas re beliões mostravam de uma ou outra forma alguma conexão com mo vimentos nacionalistas modernos Se esta ligação existiu no sudeste eu ropeu onde tais movimentos destruíram muito do Império Turco parti cularmente na década de 1870 Bósnia Bulgária é um problema a ser debatido mas é indiscutível que elas produziram estados independentes Romênia Bulgária que reclamavam ser nacionais Na melhor das hi póteses podemos falar de um protonacionalismo como entre os ro menos conscientes da diferença de sua língua dos vizinhos eslavos a lemães e húngaros e cônscios de um certo eslavismo que diversos in telectuais e políticos tentaram desenvolver entre eles sob a forma de uma ideologia de Panslavismo neste período Panslavismo era ofereci do tanto aos políticos conservadores e imperiais da Rússia quanto aos 107 povos eslavos do Império dos Habsburgos com o objetivo de formar uma grande nação ao invés de várias pequenas nações inviáveis Este Panslavismo era combatido fortemente pela esquerda que via nele uma extensão da influência russa considerada o centro da reação in ternacional Um desses movimentos entretanto era indiscutivelmente nacio nal o irlandês A Irmandade Republicana Irlandesa Fenians com o ainda sobrevivente Exército Republicano Irlandês IRA era o des cendente linear das fraternidades do período pré1848 e o de vida mais longa O apoio rural de massa a políticos nacionalistas não era em si nada de novo pois a combinação irlandesa de conquista estrangeira pobreza opressão c uma classe senhorial na sua grande maioria ingle saprotestante imposta sobre um campesinato irlandêscatólico mo bilizava mesmo os nomes politizados Na primeira metade do século os líderes deste movimento de massa tinham pertencido à pequena classe média irlandesa e seus objetivos apoiados pela única organi zação efetiva de caráter nacional a Igreja eram conseguir uma mo derada acomodação com os ingleses A novidade em relação aos Feni anos que primeiro apareceram como tais no final da década de 1850 era que eles eram completamente independentes dos moderados da classe média e que seu apoio vinha inteiramente das classes populares mesmo apesar da aberta hostilidade da Igreja de partes do campesi nato assim como eram os primeiros a colocar um programa de total independência da Inglaterra a ser obtida por meio da insurreição arma da Embora o nome da organização derivasse de heróica mitologia da antiga Irlanda sua ideologia era bem pouco tradicional mesmo que seu nacionalismo laico e anticlerical não pudesse esconder que para a mas sa dos fenianos irlandeses o critério de nacionalidade fosse e ainda se ja a fé católica A concentração exclusiva no objetivo de conseguir uma República Irlandesa através da luta armada substituiu um progra ma social econômico e mesmo de política doméstica e a legenda he róica de rebeldes armados e mártires tem sido muito grande até hoje para aqueles que desejassem formular tais programas Esta é a tradição republicana que sobrevive na década de 1970 e que reapareceu na guerra civil do Ulster no IRA Provisório A rapidez com a qual os fenianos aliaramse com revolucionários socialistas e com que estes reconheceram o caráter revolucionário do Fenianismo não deveria en corajar ilusões sobre esta questão Marx apoiouos decididamente e mantinha correspondência com líderes fenianos Mas não deveríamos também subestimar a novidade e a significa ção histórica de um movimento cujo suporte financeiro vinha da massa dos trabalhadores irlandeses levados para os Estados Unidos pela fome o ódio aos ingleses e cujos recrutas vinham dos proletários imigrantes para a América e Inglaterra não havia quase trabalhadores industriais no que é hoje a República Irlandesa e de jovens camponeses vindos dos antigos baluartes do terrorismo agrário irlandês cuja estrutura era formada destes mesmos camponeses e do estrato mais baixo da elite 108 urbana dos trabalhadores que dedicaram a vida à insurreição Tudo is so antecipa os movimentos revolucionários nacionais dos países subde senvolvidos no século XX Faltavalhes o melhor da organização do trabalhismo socialista ou talvez apenas a inspiração de uma ideologia socialista que viria transformar a combinação de liberação nacional e transformação social numa força formidável no século XX Não havia socialismo em nenhuma parte e os fenianos que também eram revolu cionários sociais especialmente Michael Davitt 18461906 conse guiram apenas tornar explícito diante da Land League o que havia sjdo sempre implícito ou seja a relação entre nacionalismo de massa e des contentamento agrário e isto somente após o fim de nosso período du rante a Grande Depressão Agrária do final da década de 1870 e na dé cada seguinte Fenianismo era nacionalismo de massa na época do tri unfante liberalismo Podia fazer pouco exceto rejeitar a Inglaterra e re clamar total independência para um povo oprimido através da revolu ção esperando que isso viesse a resolver todos os problemas de pobre za e exploração Isso não foi sequer conseguido efetivamente pois ape sar da abnegação e heroísmo dos fenianos suas insurreições 1867 e invasões por exemplo do Canadá a partir dos Estados Unidos foram realizadas com notável ineficiência e os dramáticos coups consegui dos comuns em tais operações conseguiram pouco mais do que a pu blicidade normal em alguns casos má publicidade Eles geraram a for ça que iria conseguir independência para a maior parte da Irlanda Cató lica mas a partir do momento em que não geraram mais nada além dis so deixaram o futuro da Irlanda para os moderados classemédia os ri cos fazendeiros e os mercadores das pequenas cidades de um pequeno país agrário que iriam tomar posse da herança dos fenianos Embora o caso irlandês fosse único não há dúvida de que em nosso período o nacionalismo tornouse uma força de massa pelo menos nos países povoados por brancos Mesmo assim o Manifesto Comunista era mais realista do que é comumente considerado ao di zer que os trabalhadores não tem pátria O nacionalismo avançou na classe operária pari passu com a consciência política fosse porque a tradição revolucionária era nacional como na França fosse porque os líderes e ideólogos dos novos movimentos trabalhistas estivessem profundamente envolvidos na questão nacional como em todos os lugares em 1848 A alternativa para a consciência política nacional não era na prática o internacionalismo proletário mas uma cons ciência subpolítica que operava numa escala ainda menor que o da naçãoestado Eram poucos os homens e mulheres da esquerda políti ca que escolheram claramente entre lealdades nacionais ou suprana cionais como a causa internacional do proletariado O internaciona lismo da esquerda na prática significava solidariedade e apoio para aqueles que lutavam pela mesma causa em outras nações e no caso de refugiados políticos a presteza em participar na luta no lugar que se encontrassem Mas como os exemplos de Garibaldi Cluseret e da 109 Comuna de Paris que ajudou os fenianos na América provaram isso não era incompatível com uma passional profissão de fé nacionalista Também podia significar uma recusa em aceitar as definições do in teresse nacional impostas por governos ou outras instâncias Mesmo os socialistas franceses e alemães que em 1870 juntaramse ao pro testo contra a guerra fraticida FrancoPrussiana não eram insensí veis ao nacionalismo da maneira como eles o viam A Comuna de Paris tinhase apoiado tanto no patriotismo jacobino de Paris como nos slogans de emancipação social assim como os marxistas alemães socialdemocratas de Liebknecht e Bebei tinhamse apoiado no apelo ao nacionalismo radicaldemocrático de 1848 contra a versão prussi ana do programa nacional O que os trabalhadores alemães ressentiam era mais a reação do que o patriotismo alemão e um dos aspectos mais inaceitáveis da reação era que chamava os sociaisdemocratas de vaterlandlose Gesellen companheiros sem pátria desta forma ne gandolhes o direito de serem tanto trabalhadores como bons alemães E evidentemente era quase impossível para a consciência política não estar de uma forma ou de outra definida nacionalmente O prole tariado como a burguesia existia apenas conceitualmente como um fato internacional Na realidade existia como um agregado de grupos definidos pelos seus estados nacionais ou diferenças lingüísti casétnicas ingleses franceses ou em estados multinacionais ale mães húngaros ou eslavos E na medida em que estado e nação coincidiam na ideologia daqueles que estabeleciam instituições e do minavam a sociedade civil política em termos de estado implicava política em termos de nação III Mesmo assim malgrado poderosos sentimentos e lealdades na cionais na medida em que nações transformavamse em estados a nação não era algo espontâneo mas um produto Também não era historicamente nova pois expressava características que membros de grupos humanos muito antigos tinham em comum ou aquilo que os unia contra estrangeiros Precisava portanto ser construída Daí a importância crucial das instituições que podiam impor uniformidade nacional que eram principalmente o estado especialmente a educa ção do estado emprego do estado e nos países que adotavam serviço militar obrigatório serviço militar França Alemanha Itália Bélgica e ÁustriaHungria Os sistemas educacionais dos países desenvolvi dos expandiramse substancialmente durante este período em todos os níveis O número de estudantes universitários permaneceu entre tanto bastante modesto por parâmetros atuais Omitindo estudantes de teologia a Alemanha tinha a dianteira no final da década de 1870 com quase 17 mil seguida de longe pela Itália e França com 9 a 10 mil cada e Áustria com 8 mil 9 Das 18 novas universidades fundadas 110 entre 1849 e 1875 nove eram fora da Europa cinco nos Estados Uni dos duas na Austrália uma em Argel e outra em Tóquio cinco eram na Europa Oriental Jassy Bucareste Odessa Zagreb e Czernowitz Duas modestas fundações encontravamse na Inglaterra Estas univer sidades cresceram sob pressão nacionalista e nos Estados Unidos tais instituições de educação superior estavam num processo de multipli cação A educação secundária cresceu com as classes médias embora como a alta burguesia para a qual esta educação estava destinada te nham permanecido muito mais instituições de elite exceto ainda nos Estados Unidos onde a high school pública começou sua carreira de triunfo democrático Em 1850 havia apenas 100 delas na nação inteira Na França a proporção de alunos sob educação secundária cresceu de 1 em 35 1842 para 1 em 20 1864 mas graduados se cundários formavam apenas 1 em 55 ou 60 em 1860 embora fosse bem melhor que os 1 para 93 de 1840 Mas o maior avanço ocorreu nas escolas primárias cujo objeti vo era não apenas o de transmitir rudimentos da língua ou aritmética mas talvez mais do que isso impor os valores da sociedade moral patriotismo a seus alunos Este era o setor da educação que havia si do previamente negligenciado pela estado laico e seu crescimento es tava intimamente ligado com o avanço das massas na política como testemunham a instalação da sistema de educação primária do estado na Inglaterra três anos depois do Reform Act de 1867 e a vasta ex pansão do sistema na primeira década da Terceira República na Fran ça O progresso era realmente espantoso entre 1840 e 1880 a popula ção da Europa cresceu em 33 mas o número de seus filhos na esco la cresceu em 145 Mesmo na bemeducada Prússia o número de escolas primárias cresceu de mais de 50 entre 1843 a 1871 Mas não era apenas devido ao atraso da Itália que o mais rápido cresci mento de população escolar tenha ocorrido ali 460 Nos 15 anos que seguiram à unificação o número de escolas primárias dobrou De fato para as novas naçõesestados estas instituições eram de importância crucial pois apenas através delas a língua nacional ge ralmente construída antes através de esforços privados podia trans formarse na língua escrita e falada do povo pelo menos para algu mas finalidades Por exemplo a mass media neste momento a im prensa só podia transformarse em tal quando uma massa alfabeti zada em número suficiente fosse criada Era portanto também de im portância crucial a luta dos movimentos nacionais para conseguir a autonomia cultural isto é controlar a parte relativa nas instituições do Estado como por exemplo conseguir instrução escolar e uso ad ministrativo para suas respectivas línguas A disputa não era tal que afetasse os analfabetos que aprendiam seus dialetos em família nem as minorias que assimilavam en bloc a língua dominante da classe di rigente Os judeus europeus estavam satisfeitos em guardar suas lín guas nativas o lidiche derivado do alemão medieval e o Ladino de rivado do espanhol medieval como uma MameLoschen língua ma 111 terna para uso doméstico comunicandose com seus vizinhos em qualquer língua que fosse necessária e no caso de se transformarem em burgueses abandonando este velho idioma por aquele que fosse usado pela aristocracia e classe média contíguas fosse ela inglesa francesa polonesa russa húngara mas especialmente alemã Um movimento para desenvolver tanto o lidiche como o Ladino numa língua literária normal desenvolveuse a partir do meio do século e foi mais tarde retomado pelos movimentos revolucionários marxistas judeus e não pelo nacionalismo judeusionismo Mas os judeus neste momento não eram nacionalistas e seu fracasso em dar importância a uma língua nacional assim como o fracasso em possuir um territó rio nacional levou muitos a duvidar se realmente deveriam se consti tuir numa nação Por outro lado a disputa era vital para as classes médias e elites emergentes de povos atrasados ou subalternos Eram elas que particularmente sentiam o acesso privilegiado a postos im portantes e de prestígio que tinham os nativos da língua oficial mesmo quando como no caso dos tchecos seu bilingüismo compul sório lhes dava vantagem sobre os alemães monoglotas na Bohemia Por que deveria um croata aprender italiano língua de uma pequena minoria para tornarse um oficial da marinha austríaca E portanto na medida em que estadonações eram formados postos públicos e profissões da civilização progressista se multiplica vam a educação escolar se tornava mais geral e acima de tudo a mi gração urbanizava povos rurais todos estes ressentimentos encontra vam uma ressonância geral crescente Pois escolas e instituições ao imporem uma língua de instrução impunham também uma cultura uma nacionalidade Em áreas de povoamento homogêneo isso não ti nha importância a constituição austríaca de 1867 reconhecia educa ção elementar na língua do país Mas por que deveriam os eslova cos ou tchecos que haviam imigrado para cidades alemães tornarse alemães como preço de serem alfabetizados Eles reclamavam o di reito a escolas próprias mesmo quando fossem minorias E por que deveriam os tchecos e eslovacos de Praga ou Ljubljana Laibach tendo reduzido os alemães de uma maioria a uma pequena minoria confrontar nomes de ruas e regulamentos municipais numa língua es trangeira A política da metade austríaca do Império dos Habsburgos era demasiado complexa para que o governo tivesse tempo para pen sar multinacionalmente Mas o que pensar se outros governos usavam a educação poderosa arma para formar as nações que pretendiam magiarizar germanizar ou italianizar sistematicamente O paradoxo do nacionalismo era que ao formar sua própria nação automatica mente criava contranacionalismos para aqueles que a partir de então eram forçados à escolha entre assimilação ou inferioridade A era do liberalismo não entendeu este paradoxo Realmente não entendia este princípio de nacionalidade que aprovava conside rava mesmo personificar e em vários casos apoiava ativamente Ob servadores da época estavam certos em supor que nações e naciona 112 lismo eram ainda malformados e maleáveis A nação americana por exemplo baseavase na idéia de que ao migrar através do oceano muitos milhões de europeus iriam rapidamente abandonar qualquer lealdade política a suas pátrias e qualquer demanda de status oficial para suas línguas ou culturas nativas Os Estados Unidos ou Brasil ou Argentina não viriam a ser multinacionais mas pelo contrário absorveriam os imigrantes na própria nação E no nosso período exa tamente isto veio a acontecer quando as comunidades imigrantes não perderam sua identidade nacional no meltingpot do novo mundo mas permaneceram ou tornaramse mesmo conscientes e orgulhosos irlandeses alemães suecos italianos etc As comunidades de imi grantes podiam ser forças nacionais importantes nos seus países de origem como os irlandeses americanos o eram na política da Irlanda mas nos Estados Unidos eles eram de maior importância apenas para eleições municipais Os alemães de Praga somente por sua existên cia levantaram os mais importantes problemas para o Império dos Habsburgos nada disso ocorreu em relação aos alemães de Cincinnati ou Milwaukee nos Estados Unidos O nacionalismo portanto parecia manejável na estrutura do li beralismo burguês e compatível com ele Um mundo de nações viria a ser acreditavase um mundo liberal e um mundo liberal seria feito de nações O futuro viria a mostrar que a relação entre os dois não era tão simples assim 113 Sexto Capítulo AS FORÇAS DA DEMOCRACIA A burguesia deveria saber que junto com ela as forças da demo cracia cresceram durante o Segundo Império Ela encontrará estas forças tão solidamente estabelecidas que seria loucura recomeçar uma guerra contra elas Henri Allain Targé 1868 1 Assim como o progresso da democracia é o resultado do desenvol vimento geral social uma sociedade avançada ao mesmo tempo que detém uma grande parte de poder político deve proteger o Es tado dos excessos democráticos Se estes últimos predominarem em algum momento deverão ser prontamente reprimidos Sir T Erskine May 1877 2 I Se o nacionalismo era uma força histórica reconhecida por go vernos democracia ou a crescente participação do homem comum nas questões do estado era outra Os dois eram uma única coisa na medida em que movimentos nacionalistas neste período tornaramse movimentos de massa e certamente a esta altura praticamente todos os líderes radicais nacionalistas supunham estes dois conceitos como sendo idênticos Entretanto como já vimos uma grande parte do po vo comum como os camponeses ainda não havia sido atingida pelo nacionalismo mesmo em países onde sua participação em política era levada a sério enquanto outras principalmente as novas classes tra balhadoras eram praticamente requisitadas para seguir movimentos que pelo menos em teoria punha um interesse de classe internacional acima de filiações nacionais Em todos estes casos do ponto de vista das classes dirigentes o fato importante era não que as massas acre ditassem em alguma coisa mas que seus credos agora contavam na política Eles eram por definição numerosos ignorantes e perigosos muito perigosos precisamente devido à sua ignorante tendência para acreditar em seus próprios olhos que lhes diziam que aqueles que os governavam davam muito pouca atenção a suas misérias e a lógica simplista que lhes sugeria que já que eles formavam a grande maioria do povo o governo deveria basicamente servirlhes em seus interesses 114 Tornavase portanto cada dia mais claro nos países desenvol vidos e industrializados do Oeste que mais cedo ou mais tarde os sis temas políticos teriam que abrir espaço para estas forças Além disso também tornavase claro que o liberalismo que formava a ideologia básica do mundo burguês não tinha defesas teóricas contra esta con tingência Sua forma característica de organização política era o go verno representativo através de assembléias eleitas representando não como nos estados feudais interesses sociais ou coletividades mas agregados de indivíduos de status legalmente iguais Interesse pró prio ou mesmo um certo senso comum dizia àqueles que se encon travam por cima que nem todos os homens eram igualmente capazes de decidir as grandes questões do governo os analfabetos menos que os graduados em universidades os supersticiosos menos que os escla recidos os pobres menos que aqueles que haviam provado sua capa cidade de comportamento racional pela acumulação de propriedade Entretanto longe da falta de convicção que tais argumentos levanta vam entre os que estavam por cima com a exceção dos mais conser vadores eles tinham duas fraquezas maiores A igualdade legal não podia fazer tais distinções em teoria O que era consideravelmente mais importante tornavase mais e mais difícil de realizar na prática já que mobilidade social e progresso educacional ambos essenciais à sociedade burguesa obscureciam a divisão entre as camadas médias e as camadas inferiores Onde deveria ser traçada a Tinha entre a gran de e crescente massa de respeitáveis trabalhadores e as baixas clas ses médias que adotavam muito dos valores e comportamentos da burguesia Por onde passasse esta linha ao incluir um grande número deles era possível que assimilasse um corpo substancial de cidadãos que não apoiava várias das idéias as quais o liberalismo burguês o lhava como essenciais ao progresso da sociedade e que bem poderi am oporse a elas de forma passional Além disso e de forma mais decisiva as revoluções de 1848 tinham mostrado como as massas po diam irromper no círculo fechado dos dirigentes da sociedade e o progresso da sociedade industrial fez com que sua pressão fosse cons tantemente maior mesmo em períodos nãorevolucionários A década de 1850 deu a muitos dos dirigentes um espaço para respirar Por mais de uma década eles não tiveram seriamente que se preocupar com tais problemas na Europa Entretanto havia um país em que os relógios políticos e constitucionais não podiam ser sim plesmente atrasados Na França onde três revoluções já haviam co meçado a exclusão das massas da política parecia uma tarefa utópica elas deveriam então ser dirigidas O chamado Segundo Império de Luís Napoleão Napoleão III tornouse então uma espécie de labora tório de um tipo de política mais moderno embora as peculiaridades de seu caráter tenham algumas vezes obscurecido suas formas de con trole político Tal experimento estava ao gosto embora talvez menos ao talento do personagem enigmático que estava a sua frente 115 Napoleão III foi notavelmente sem sorte nas suas relações públi cas Ele foi suficientemente infeliz para unir contra si os mais podero sos talentos polêmicos de seu tempo e as investidas combinadas de Karl Marx e Victor Hugo são suficientes sozinhas para enterrar sua memória sem contar o espírito não menos mordaz de alguns talento sos jornalistas Além disso ele foi notoriamente mal sucedido nos seus empreendimentos políticos internacionais e mesmo domésticos Um Hitler pôde sobreviver à unânime reprovação da opinião mundial já que é inegável que este homem terrível e psicopata realizou coisas extraordinárias no caminho de uma catástrofe provavelmente inevitá vel pelo menos em manter o apoio de seu povo até o fim Napoleão III não era nem tão extraordinário nem tão louco O homem que era manobrado por Cavour e Bismark o homem cujo apoio político tinha afundado perigosamente mesmo antes que seu império se desintegras se após algumas semanas de guerra o homem que transformou Bo napartismo de uma força política de maior importância na França em uma anedota histórica entrou inevitavelmente na História como Na poleão o Pequeno Ele nem sequer representou bem seu papel A quela figura reticente saturnina mas freqüentemente charmosa com grandes bigodes doentio horrorizado pelas batalhas que ele mesmo e a grandeza francesa iriam detonar só parecia imperial exofficio Ele era essencialmente um político político de segundo nível e como se veria mais tarde mal sucedido Mas o destino e seu passado viriam trazerlhe um papel inteiramente novo para representar Como pretendente imperial antes de 1848 embora sua pretensão genealó gica em ser um Bonaparte levantasse dúvidas 2 teve que pensar em termos nãotradicionais Cresceu em um mundo de agitadores nacio nalistas ele mesmo ligandose aos Carbonari e de Sainsimonianos Desta experiência tirou uma fé segura talvez excessiva na inevitabi lidade de forças históricas tais como nacionalismo e democracia e uma certa heterodoxia acerca de problemas sociais e métodos políti cos que vieram a ajudarlhe muito mais tarde A revolução deulhe a chance de apresentar o nome de Bonaparte para a presidência sendo eleito por uma grande maioria mas por uma imensa variedade de mo tivos Ele não precisou de votos para permanecer no poder nem de pois do golpe de estado de 1851 para declararse imperador mas se não tivesse sido eleito antes nem toda sua capacidade para intriga te ria persuadido os generais ou quem quer que tivesse poder e ambi ção para apoiálo Era portanto o primeiro dirigente de um grande país com a exceção dos Estados Unidos a chegar ao poder através do sufrágio masculino universal e nunca o esqueceu Ele continuou a operar desta forma primeiro como um César plebiscitário mais ou menos como o general de Gaulle a assembléia representativa eleita sendo bem insignificante e depois de 1860 com a parafernália usual do parlamentarismo Sendo um indivíduo persuadido das verdades históricas de seu tempo provavelmente não acreditou que ele mesmo também pudesse resistir à força da história 116 A atitude de Napoleão III em relação à política eleitoral era ambí gua e isso é que a faz interessante Como parlamentarista ele jogou aquilo que era então o jogo normal da política quer dizer obteve uma maioria suficiente de uma assembléia de indivíduos eleitos agrupados em vagas alianças com vagas etiquetas que não devem ser confundidas com os modernos partidos políticos Portanto políticos sobreviventes da Monarquia de Julho 183048 como Adolphe Thiers 17971877 e futuros luminares da Terceira República como Jules Favre 1809 80 Jules Ferry 183293 e Gambetta 183882 recuperaram ou fize ram seus nomes na década de 1860 Ele não foi muito bemsucedido neste jogo especialmente quando decidiu instalar um firme controle burocrático sobre as eleições e a imprensa Por outro lado enquanto um candidato eleitoral guardava em reserva outra vez como o general de Gaulle só que este último talvez com maior sucesso a arma do plebis cito Ratificou seu triunfo em 1852 com uma esmagadora vitória ple biscitária provavelmente autêntica apesar do considerável controle de 78 milhões de votos contra 024 milhões com 2 milhões de absten ções e mesmo em 1870 na véspera do colapso podia ainda recuperar se de uma situação parlamentar em deterioração com uma maioria de 74 milhões contra 16 milhão Este apoio popular era politicamente desorganizado exceto é claro quando através de pressões burocráticas Diferente dos líderes populares modernos Napoleão III não teve nenhum movimento mas evidentemente como chefe do estado ele dificilmente precisaria de um Seu apoio também não era homogêneo Pessoalmente talvez tivesse preferido o apoio dos progressistas o voto jacobino republicano que sempre ficou de fora acontecesse o que acontecesse nas cidades e o da classe operária cujo significado social e político ele apreciava ainda mais que os liberais ortodoxos Entretanto embo ra ele recebesse de quando em vez o apoio de importantes portavozes deste grupo como o anarquista PierreJoseph Proudhon 180965 e tenha seriamente se esforçado para conciliar e domesticar o cresci mento do movimento trabalhista na década de 1860 tendo legaliza do as greves em 1864 fracassou em quebrar a tradicional e lógica afinidade que o movimento trabalhista tinha com a esquerda Na prá tica apoiouse no elemento conservador e especialmente no campesi nato principalmente nos dois terços do oeste do país Para estes ele era um Napoleão um governo estável e antirevolucionário seguro contra as ameaças à propriedade e se eram católicos o defensor do Papa em Roma uma situação da qual Napoleão teria apreciado em se desvencilhar por razões diplomáticas mas que não podia fazêlo por razões domésticas Mas sua forma de governar era ainda mais significativa Karl Marx observou com sua argúcia habitual a natureza de sua relação com o campesinato francês incapazes de impor seu interesse de classe em nome próprio fosse a través de um parlamento ou de uma convenção Não podiamse repre 117 sentar precisavam ser representados Seu representante precisa ao mesmo tempo aparecer como o líder uma autoridade sobre eles e co mo um poder governamental ilimitado que protegeos de outras classes e envialhes o sol e a chuva de cima A influência política dos campo neses portanto encontra sua expressão final no poder executivo subor dinando a sociedade a si mesmo 3 Napoleão era o poder executivo Muitos políticos do século XX nacionalistas populistas e no sentido mais perigoso fascistas iri am redescobrir a forma de relação que ele inaugurou com as massas incapazes de impor seu interesse de classe em nome próprio Ainda descobririam que havia outras camadas da população similares neste aspecto ao campesinato pósrevolucionário francês Com a exceção da Suíça cuja constituição revolucionária per manece até hoje nenhum outro estado europeu operava na base do sufrágio universal masculino na década de 1850 O Nationalrat suí ço era escolhido por todos os homens maiores de 20 anos sem quali ficação de propriedade mas a segunda Câmara era escolhida pelos cantões Devese assinalar que mesmo nos Estados Unidos nomi nalmente democrático a participação eleitoral era bem inferior à francesa em 1860 Lincoln foi eleito por menos da metade dos 47 milhões de votos de uma população de tamanho incomparavelmente maior Algumas assembléias representativas geralmente sem grande poder ou influência exceto na Inglaterra Escandinávia Holanda Bél gica Espanha e Sabóia invariavelmente elegiam de forma bastante in direta com restrições mais ou menos rigorosas relativas a qualificações de idade ou propriedade tanto para votantes como para candidatos Quase invariavelmente as assembléias eleitas desta forma eram flan queadas e cerceadas em sua ação por câmaras mais conservadoras a maioria delas indicadas ou compostas de membros hereditários ou ex officio A Inglaterra com mais ou menos 1 milhão de eleitores entre 275 milhões de habitantes era sem dúvida bem menos restritiva que por exemplo a Bélgica com aproximadamente 60 mil de 47 milhões mas nenhuma delas era nem pretendia ser democrática O reaparecimento da pressão popular na década de 1860 fez com que fosse impossível manter uma política do tipo isolada Pelo final de nosso período somente a Rússia tzarista e a Turquia Imperial mantinhamse como simples autocracias na Europa enquanto por outro lado o sufrágio universal não era mais prerrogativa de regimes surgidos de revoluções O novo império alemão usouo para eleger seu Reichstaq embora mais por razões decorativas Muito poucos es tados nesta década escaparam de alguma forma de aumentar suas franquias e os problemas que tinham preocupado apenas a minoria de países nos quais o voto tinha real significado a escolha entre votar por listas ou Por candidatos geometria eleitoral na constituição de eleitorados sociais ou geográficos controles que as câmaras maiores poderiam exercer sobre as câmaras menores direitos reservados ao Executivo etc agora preocupavam todos os governos Mas ainda 118 eram pouco agudos O Second Reform Act na Inglaterra mesmo du plicando o número de eleitores ainda deixavaos como 8 da popu lação enquanto no recémunificado Reino da Itália eram apenas 1 Mesmo assim algumas mudanças haviamse verificado e outras po diam apenas ser adiadas Estes avanços em direção a governos representativos levanta vam dois problemas bastantes diferentes em política os das classes e massas para usar o jargão inglês da época isto é aqueles das classes altas e médias e o problema do pobre que havia permanecido por longo tempo alienado do processo oficial da política Entre eles estava a camada intermediária pequenos comerciantes artesãos e outros pequenos burgueses proprietários camponeses etc que na qualidade de proprietários já estavam pelo menos em parte envolvi dos em representatividade política tal como ela havia existido até en tão Nem as velhas aristocracias da terra ou hereditárias nem a nova burguesia tinham a força dos números mas diferente da aristocracia a burguesia precisava deles Pois enquanto ambas tinham pelo menos nas suas camadas mais elevadas riqueza e a forma de poder pessoal e influência nas suas comunidades que fazia de seus membros automa ticamente pelo menos pessoas importantes em potencial isto é pessoas de conseqüência política somente as aristocracias estavam firmemente entrincheiradas em instituições que as salvaguardavam do voto em Câmaras dos Lordes ou câmaras similares ou por meio de representação mais ou menos desproporcional como no caso do su frágio de classe das Dietas da Prússia e da Áustria Além disso nas monarquias que eram ainda a forma prevalecente de governo a aris tocracia encontrava apoio político sistemático como classe As burguesias por outro lado escoravamse na sua riqueza na sua indispensabilidade e no destino histórico que fazia delas e de suas idéias as fundações dos estados modernos deste período Entretan to o que as transformavam em força no interior dos sistemas políticos era a habilidade para mobilizar o apoio dos nãoburgueses que pos suíam número e portanto votos Tirarlhes isto como aconteceu na Suécia no final da década de 1860 e iria acontecer em todos os luga res mais tarde com o crescimento de verdadeira política de massa re duziaos a uma minoria eleitoralmente impotente pelo menos na polí tica de âmbito nacional Em políticas municipais iriam se manter me lhor Daí a importância crucial para a burguesia em manter o apoio ou a hegemonia sobre a pequena burguesia as classes trabalhadoras e mais raramente sobre o campesinato Falando de forma ampla neste período da história ela não foi bemsucedida Em sistemas polí ticos representativos os Liberais normalmente o clássico partido das classes do comércio urbano e industrial estavam geralmente no poder com apenas algumas interrupções ocasionais Na Inglaterra assim ocorreu entre 1846 e 1874 na Holanda durante pelo menos 20 anos depois de 1848 na Bélgica de 1857 a 1870 na Dinamarca mais ou menos até o choque da derrota em 1864 Na Áustria e na Alemanha 119 eles eram o maior apoio formal dos governos entre a metade da déca da de 1860 até o final da década de 1870 Entretanto como a pressão vinha de baixo uma ala radical mais democrática progressista republicana tendia a se separar deles on de já não fosse mais ou menos independente Na Escandinávia parti dos camponeses separaramse como a esquerda Venstre em 1848 Dinamarca e durante a década de 1860 Noruega ou o grupo de pressão agrário anticidade Suécia 1867 Na Prússia Alemanha os democratas radicais com sua base no sudoeste nãoindustrial recusa ramse a seguir os nacionaisliberais burgueses em sua aliança com Bismark depois de 1866 embora alguns deles tendessem a se aliar aos socialdemocratas marxistas antiPrússia Na Itália os republica nos permaneceram na oposição enquanto os moderados tornaramse dominantes do novo reino unificado Na França a burguesia há muito não conseguia mais comandar sozinha ou mesmo sob a bandeira libe ral e seus candidatos buscavam apoio popular através de rótulos cada vez mais inflamados Reforma e Progressista davam lugar a Re publicano e este a Radical e na Terceira República a Radical Socialista cada qual ocultando uma nova geração dos mesmos bar bados Sólon rapidamente mudando para posições moderadas depois de seus triunfos eleitorais com a esquerda Somente na Inglaterra os radicais permaneceram uma ala permanente do Partido Liberal pro vavelmente porque aí praticamente não existiam enquanto classe os camponeses e a pequena burguesia que permitiram aos radicais esta belecerem sua independência política alhures De qualquer forma por razões práticas o liberalismo permane ceu no poder pois representava a única política econômica que se a creditava fazer sentido para o desenvolvimento Manchesterismo como os alemães chamavam assim como aceitavase quase que u niversalmente ser o representante da ciência razão história e pro gresso para aqueles que tivessem qualquer idéia que fosse sobre esses assuntos Neste sentido quase todo chefe de estado e funcionário pú blico nas décadas de 1850 e 1860 era um liberal fosse qual fosse sua filiação ideológica assim como hoje ninguém o é mais Os pró prios radicais não tinham alternativa viável ao liberalismo Em qual quer situação juntarse com a genuína oposição contra o liberalismo era impensável para eles talvez mesmo impossível Ambos faziam parte da esquerda A genuína oposição a direita veio daqueles que resistiam às forças da história Na Europa poucos realmente desejavam um re torno ao passado como nos dias dos românticos reacionários de de pois de 1815 Tudo o que queriam era interromper ou pelo menos di minuir o ameaçador progresso do presente um objetivo racionaliza do por intelectuais que viam a necessidade de ordem e progresso Portanto o conservadorismo era capaz de atrair de vez em quando al guns grupos da burguesia liberal que sentia que mais progresso podia trazer uma vez mais a revolução para perto Naturalmente tais parti 120 dos conservadores atraíam o apoio de grupos especiais cujos interes ses imediatos iam de encontro com a política liberal prevalecente por exemplo agrários e protecionistas ou grupos que se opunham aos li berais por razões que não diziam respeito ao seu liberalismo como por exemplo os belgas flamengos que se ressentiam de uma burgue sia essencialmente afrancesada predominando culturalmente Sem dúvida também especialmente na sociedade rural rivalidades locais ou de família eram naturalmente assimiladas dentro de uma dicotomia ideológica que dizia pouco respeito a ela mesma O Coronel Aurelia no Buendía no romance de Garcia Marquez Cem anos de solidão organizou o primeiro dos seus 32 levantes liberais no interior da Co lômbia não porque fosse um liberal ou soubesse o significado de tal palavra mas porque sentiase ultrajado por um oficial local que por acaso representava um governo conservador Talvez haja uma razão lógica ou histórica em por que os açougueiros vitorianos foram pre dominantemente conservadores uma ligação com a agricultura e os donos de armazém em grande parte liberais uma ligação com o co mércio exterior mas nada disso foi estabelecido e talvez o que pre cise de explicação seja não estes fatos mas por que estes dois tipos onipresentes de lojistas tenham sistematicamente se recusado a parti lhar as mesmas opiniões fossem quais fossem Mas o conservantismo essencialmente estava com aqueles que ficavam com a tradição a velha e ordeira sociedade costumes e ne nhuma modificação em oposição a tudo que fosse novo Dai a impor tância crucial da posição das igrejas oficiais organizações ameaçadas por tudo aquilo que o liberalismo defendia e ainda capazes de mobili zar forças imensas contra ele como por exemplo a inserção de uma quinta coluna no centro do poder burguês através da piedade e tradi cionalismo das viúvas e filhas a permanência de um controle clerical sobre as cerimônias de nascimento casamento e morte e um controle sobre um grande setor da educação Estes controles eram vigorosa mente contestados e forneceram um bom número de razões para a disputa política entre conservadores e liberais em vários países Todas as igrejas oficiais eram ipso facto conservadoras embora apenas a maior delas a Católica Romana tenha formulado sua posi ção de aberta hostilidade à crescente tendência liberal Em 1864 o Papa Pio IX definiu suas posições no Syllabus of Errors Esta encícli ca condenou de forma igualmente implacável 80 erros incluindo naturalismo que negava a ação de Deus sobre os homens e o mun do racionalismo o uso da razão sem referência a Deus raciona lismo moderado uma recusa de supervisão eclesiástica por parte da ciência e da filosofia indiferentismo escolha livre de religião ou mesmo ausência dela educação laica a separação da Igreja e do Es tado e em geral erro nº 80 a idéia de que o Pontífice Romano po de e deve reconciliarse e chegar a bom termo com o progresso o li beralismo e a civilização moderna Inevitavelmente a linha entre di reita e esquerda tornouse em grande parte a divisão entre clericalistas 121 e anticlericalistas os últimos sendo na maior parte francamente des crentes nos países católicos mas também principalmente na Ingla terra crentes de religiões minoritárias ou independentes da igreja do Estado ver capítulo 14 mais adiante A posição das igrejas de Esta do onde fossem religiões minoritárias era anômala Os católicos ho landeses encontravamse do lado liberal contra os calvinistas predo minantes e os alemães incapazes de se aliarem fosse com a direita protestante fosse com a esquerda liberal do império bismarckiano formaram um Partido de Centro na década de 1870 O que era novo em política de classe neste período era sobre tudo a emergência da burguesia liberal como uma força no contexto de uma política mais ou menos constitucionalista com o declínio do absolutismo principalmente na Alemanha ÁustriaHungria e Itália uma área cobrindo cerca de um terço da população da Europa Apro ximadamente um terço da população do continente ainda vivia sob governos nos quais não tinha participação O progresso da imprensa periódica fora da Inglaterra e Estados Unidos ela ainda se dirigia sobretudo a leitores burgueses ilustra esta mudança de forma viva entre 1862 e 1873 o número de periódicos na Áustria sem Hungria aumentou de 345 para 866 A abertura permanecia de tal forma restrita na maioria dos casos que não se colocava a moderna questão de política de massa De fato freqüentemente os representantes da classe média podiam tomar o lu gar do povo real que diziam representar Poucos casos chegaram a ser tão extremos como Nápoles ou Palermo no começo da década de 1870 quando 375 e 44 dos candidatos estavam nas listas porque eram graduados de alguma forma Mas mesmo na Prússia o triunfo dos liberais em 1863 parece menos impressionante se for lembrado que 67 do voto da cidade que os elegeu representavam realmente apenas 25 do voto urbano já que dois terços do eleitorado não se deu ao trabalho de ir às urnas nas cidades 4 Representaram estes es plêndidos triunfos do liberalismo na década de 1860 nestes países de franquias limitadas e apatia popular algo além da opinião de uma minoria de respeitáveis burgueses citadinos Na Prússia Bismarck pelo menos pensava que não e conse qüentemente resolveu o conflito constitucional entre a Dieta Liberal e a monarquia simplesmente governando sem referência ao parlamento Já que ninguém sustentava os liberais exceto a burguesia e a burgue sia era incapaz ou não desejava mobilizar nenhuma força genuína armada ou política toda conversa sobre o Grande Parlamento de 1640 ou os Estados Gerais de 1789 era apenas fumaça Por outro lado o que deu aos liberais poder real em alguns países atrasados apesar de sua posição minoritária era a existência de agricultores que domina vam suas respectivas regiões virtualmente sem controle governamen tal ou de funcionários prontos a fazer pronunciamentos no interes se liberal Era o caso em diversos países ibéricos Bismarck percebia porém que no sentido mais literal da palavra uma revolução bur 122 guesa era uma impossibilidade já que seria uma revolução de ver dade apenas se a burguesia fosse mobilizada e em nenhum caso ho mens de negócios ou professores pareciam estar inclinados a levantar barricadas Isto não o impediu porém de aplicar o programa econô mico legal e ideológico da burguesia liberal desde que pudesse ser combinado com a predominância da aristocracia agrária numa mo narquia prussiana protestante Ele não quis arrastar os liberais para uma aliança de desespero com as massas e de qualquer forma o pro grama da burguesia era o programa óbvio para um estado europeu moderno e se não era óbvio pelo menos parecia inevitável Como sabemos ele foi brilhantemente bem sucedido A burguesia liberal aceitou a oferta do programa sem o poder político não tinha muita opção e transferiuse em 1866 para o Partido Liberal Nacional que foi a base para as manobras políticas domésticas de Bismarck du rante todo o resto de nosso período Bismarck e outros conservadores sabiam que fossem o que fos sem as massas não eram certamente liberais no sentido em que os ho mens de negócios urbanos o eram Conseqüentemente eles sentiram que às vezes podiam segurar os liberais mediante a ameaça de aumen tar as franquias Podiam mesmo terminar por fazêlo como Benja mim Disraeli o fez em 1867 e os católicos belgas mais modestamente em 1870 O erro foi supor que as massas eram conservadoras no sen tido que eles atribuíam à palavra Não há dúvida de que a maioria do campesinato na maior parte da Europa ainda era tradicionalista pron to a apoiar a igreja o rei ou o imperador e a seus superiores hierár quicos de forma automática especialmente contra os malignos desíg nios dos homens de cidade Mesmo na França grandes regiões do o este e do sul continuaram a votar durante a Terceira República nos que apoiavam a dinastia dos Bourbons Sem dúvida também como Walter Bagehot teórico da democracia inócua destacou depois do Reform Act de 1867 havia muitos incluindo trabalhadores cujo comportamento político era dirigido para a defesa do melhor da so ciedade Mas a partir do momento em que as massas entraram na ce na política inevitavelmente passaram a agir mais cedo ou mais tarde como atores e não mais como extras na multidão do fundo de um quadro E enquanto os camponeses atrasados ainda podiam ser consi derados seguros os crescentes setores industriais e urbanos não mais o podiam O que estes últimos queriam não era o liberalismo clássico e portanto não eram bemvindos aos dirigentes conservado res especialmente àqueles devotados a uma política econômica e so cial essencialmente liberal Isso viria a se tornar evidente durante a depressão econômica e a incerteza que acompanharam o colapso da expansão liberal em 1873 123 II O primeiro e mais perigoso grupo a estabelecer sua identidade separada e definir seu papel na política foi o novo proletariado cujo número fora multiplicado por 20 anos de industrialização O movimento trabalhista não tinha sido tão destruído ou decapi tado pelo fracasso das revoluções de 1848 e pela subseqüente década de expansão econômica Os vários teóricos de um novo futuro social que haviam transformado a agitação da década de 1840 no espectro do comunismo tendo fornecido ao proletariado uma perspectiva po lítica alternativa tanto para os conservadores como para os liberais ou radicais estavam na prisão como Auguste Blanqui no exílio como Karl Marx e Louis Blanc esquecidos como Constantin Pecqueur 180187 ou como Etienne Cabet 17881857 somando todas estas situações Alguns haviam feito as pazes com o novo regime como P J Proudhon fez com Napoleão III O período não era muito propí cio para os que acreditavam na iminência do socialismo Marx e En gels que mantiveram alguma esperança no renascimento revolucio nário por um ou dois anos depois de 1849 transferiram depois estas esperanças para a grande crise seguinte a de 1857 e resignaramse então por um longo período Enquanto talvez seja um exagero dizer que o socialismo tenha desaparecido por completo mesmo na Ingla terra provavelmente ninguém era socialista em 1860 que não o tivesse sido em 1848 Podemos talvez agradecer a este intervalo de isolamen to forçado da política que permitiu a Karl Marx amadurecer suas teo rias e estabelecer as fundações de O Capital mas ele mesmo não pen sava assim Nesse meio tempo as organizações políticas sobreviven tes da ou dedicada à classe operária tinham entrado em colapso como a Liga Comunista em 1852 ou tinhamse tornado gradualmente insignificantes como o Cartismo inglês Entretanto no nível mais modesto de luta econômica e autopro teção organizações da classe operária sobreviveram e só podiam crescer Isto apesar de que com a notável embora parcial exceção da Inglaterra sindicatos e greves eram legalmente proibidos em toda a Europa embora Sociedades de Amizade Sociedades de Ajuda Mú tua e cooperativas no continente geralmente para produção na In glaterra geralmente para lojas fossem bastantes comuns Não se po de dizer que tivessem florescido muito na Itália 1862 a média de membros de tais Sociedades de Ajuda Mútua em Piedmont onde e ram mais fortes era um pouco inferior a 505 Somente na Inglaterra Austrália e curiosamente nos Estados Unidos sindicatos de traba lhadores tinham significado real sendo que nos últimos dois casos geralmente transportados como idéia na bagagem dos imigrantes in gleses com organização e consciência de classe Na Inglaterra não apenas os hábeis artesãos das indústrias pro dutoras de máquinas assim como artesãos de ocupações mais antigas e até trabalhadores do algodão mantinham poderosos sindicatos lo 124 cais ligados de forma mais ou menos efetiva em nível nacional e em um ou dois casos A Amalgamated Society of Engineers 1852 e a Amalgamated Society of Carpenters and Joiners 1860 tendo coor denado financeiramente senão estrategicamente sociedades nacio nais Formavam uma minoria nãonegligenciável e entre os especia lizados em alguns casos uma maioria Além disso forneciam uma base sobre a qual o sindicalismo podia ser rapidamente expandido Nos Estados Unidos eram talvez mais poderosos embora viessem a se mostrar ineficientes para agüentar o impacto de uma industrializa ção realmente rápida pelo final do século Entretanto eram menos po derosos que no paraíso do trabalho organizado as colônias australia nas onde os trabalhadores da construção civil conseguiram o Dia de Oito Horas já em 1856 logo seguidos por outras profissões Sem dú vida em nenhum outro lugar era a posição de barganha do trabalha dor mais forte que nesta economia subpovoada e dinâmica onde as corridas ao ouro da década de 1850 envolveram milhares aumentan do os salários daqueles que ficaram Observadores sensíveis não esperavam que esta relativa pouca importância do movimento trabalhista durasse De fato a partir de 1860 ficou claro que o proletariado estava voltando à cena como a outra dramatis personae da década de 1840 embora num estado de espírito menos turbulento Emergiu com rapidez imprevista para ser logo seguido pela ideologia a partir de então identificada com seus movimentos o socialismo Este processo de emergência era um curi oso amálgama de ação política e industrial de vários tipos de radica lismo do democrático ao anárquico de lutas de classes alianças de classe e concessões governamentais ou capitalistas Mas acima de tu do era internacional não apenas porque como no recrudescimento do liberalismo ocorresse em vários países simultaneamente mas porque era inseparável da solidariedade internacional das classes tra balhadoras da solidariedade internacional da esquerda radical uma herança do período pré1848 Era organizado pela Associação Inter nacional dos Trabalhadores a Primeira Internacional de Karl Marx 186472 A verdade de que os trabalhadores não tem pátria como o Manifesto Comunista colocava pode ser debatida certamente os trabalhadores radicais organizados da França e Inglaterra eram patrio tas à sua maneira a tradição revolucionária francesa sendo notoria mente nacionalista ver capítulo 5 acima Mas numa economia onde os fatores de produção moviamse livremente mesmo os sindicatos ingleses nãoideológicos viam a necessidade de impedir empregado res de importar furagreves de fora Na Inglaterra a Internacional emergiu de uma combinação de agitação para reforma eleitoral com uma série de campanhas por solidariedade internacional com Gari baldi e a esquerda italiana em 1864 com Abraham Lincoln e o Norte na Guerra Civil Americana 186165 com os infelizes poloneses em 1863 acreditandose corretamente que todos estes iriam reforçar o movimento trabalhista pelo menos na sua forma mais política sindi 125 calista E o mero contato organizado entre trabalhadores de um país e de outro só podia ter repercussões nos seus respectivos movimentos como Napoleão III verificaria depois de ter permitido aos trabalhado res franceses enviar uma grande delegação a Londres na ocasião de uma exposição internacional em 1862 A Internacional fundada em Londres e rapidamente passada às mãos capazes de Karl Marx começou como uma curiosa combinação de líderes sindicalistas ingleses insulares e liberalradicais mistura dos ideologicamente com militantes sindicalistas franceses bem mais esquerdistas e um staff de velhos revolucionários do continente de vi sões bem variadas Suas batalhas ideológicas iriam eventualmente ar ruinála Já que foram suficientemente revistas por muitos outros his toriadores não há necessidade de nos determos muito neste aspecto Falando de forma geral a primeira grande luta entre os puros isto é os liberais ou radicalliberais sindicalistas e aqueles com perspec tivas mais ambiciosas de transformação social foi ganha pelos socia listas embora Marx tivesse o cuidado de manter os ingleses fora das lutas do continente Em seguida Marx e seus seguidores confronta ram e derrotaram os seguidores do mutualismo de Proudhon arte sãos antiintelectuais e com uma consciência de classe militante para depois enfrentar o desafio de Michel Bakunin 181476 e sua aliança anarquista Incapaz de manter controle sobre a Internacional por mais tempo Marx condenoua ao transferir seus escritórios para Nova York Entretanto por este tempo a base da grande mobilização da classe trabalhadora da qual a Internacional era parte e de certa forma coordenadora já havia de qualquer forma se estabelecido Portanto como se veria as idéias de Marx haviam triunfado Na década de 1860 tudo isso ainda não era imediatamente pre visível Havia apenas um movimento marxista de massa trabalhadora ou pelo menos socialista aquele que tinha se desenvolvido na Ale manha depois de 1863 De fato se excetuarmos o abortado National Labor Reform Party of the United States 1872 uma extensão polí tica da ambiciosa National Labor Union 186672 que era filiado ao IWMA havia apenas um movimento político trabalhista operando em escala nacional independente dos partidos burgueses ou pe quenoburgueses Esta era a realização de Ferdinand Lassalle 182565 um agitador brilhante que caiu vítima de uma vida privada bem colorida morreu de ferimentos recebidos em um duelo por causa de uma mulher e que era visto como um seguidor de Karl Marx na medida em que seguia qualquer um A Associação Geral dos Traba lhadores Alemães de Lassalle Allgemeiner Deutscher Arbeiterverein 1863 era oficialmente radicaldemocrata e não socialista sendo seu slogan imediato o sufrágio universal mas tinha uma passional cons ciência de classe e um sentimento antiburguês e apesar de suas di mensões modestas no início organizouse como um partido de massa moderno Marx não a recebeu muito bem de início apoiando uma or ganização rival sob a liderança de dois discípulos mais chegados ou 126 pelo menos mais aceitáveis o jornalista Wilhelm Liebknecht e o jo vem bemdotado August Bebel Esta organização baseada na Alema nha central embora oficialmente mais socialista paradoxalmente se guiu uma política menos intransigente de aliança com a esquerda de mocrática antiPrússia dos velhos combatentes de 1848 Os Lassal leanos um movimento quase que inteiramente prussiano pensaram essencialmente em termos de uma solução prussiana para o problema alemão Já que esta solução era a que prevalecia claramente depois de 1866 estas diferenças sentidas de forma passional na década da uni ficação alemã cessaram de ser importantes Os marxistas juntamente com a ala lassaleana que insistia no caráter proletário do movimento formaram um Partido Social Democrático em 1869 e fundiramse de finitivamente em 1875 com os lassaleanos mais tarde verificouse que os lassaleanos foram de fato absorvidos formando o poderoso Partido Social Democrata da Alemanha SPD O fato importante é que ambos os movimentos estavam de algu ma forma ligados a Marx a quem olhavam principalmente depois da morte de Lassalle como fonte de inspiração teórica e profeta Ambos emanciparamse da democracia radicalliberal e passaram a funcionar como movimentos trabalhistas independentes E ambos com o sufrá gio universal concedido por Bismarck ao norte da Alemanha em 1866 e a toda a Alemanha em 1871 ganharam apoio de massa ime diato e tiveram seus líderes eleitos para o parlamento Em Barmen lugar natal de Frederick Engels 34 votaram em socialistas em 1867 51 em 1871 Mas se a Internacional não inspirava partidos operários signifi cativos os dois alemães não eram sequer oficialmente filiados a ela estava associada por outro lado ao aparecimento do trabalhismo em um razoável número de países sob a forma de um maciço movimento industrial e sindical que a Internacional ajudou sistematicamente a formar pelo menos a partir de 1866 Em que medida esta ajuda foi realmente decisiva não é claro Entretanto particularmente a partir de 1868 tais lutas começaram a convergir com este crescimento já que os líderes destes movimentos tenderam de forma crescente a se sentir atraídos pela Internacional inclusive para militarem na organização Uma onda de greves e agitação trabalhista espalhouse pelo continen te atingindo até a Espanha e a Rússia em 1870 houve greves em São Petersburgo Atingiram a Alemanha e a França em 1868 Bélgica em 1869 guardando sua força por alguns anos ÁustriaHungria logo depois chegando finalmente à Itália em 1871 onde alcançou seu ponto culminante em 187274 e à Espanha no mesmo ano Neste mesmo período a onda de greves estava no seu ponto máximo na In glaterra em 187173 Novos sindicatos espalharamse Eles deram à Internacional as suas massas para ilustrar apenas com o exemplo austríaco aqueles que a apoiavam cresceram em número de 10 mil em Viena para 35 mil entre 1869 e 1872 de 5 mil nas terras tchecas para quase 17 mil 127 de 2 mil na Styria e Carinthia para quase 10 mil somente na Styria6 Isso não parece muito comparado a cifras posteriores mas represen tava um poder ainda maior de mobilização os sindicatos na Alema nha aprenderam a tomar decisões sobre greves somente em comícios de massa representando também aqueles que não estavam organiza dos que certamente assustava governos especialmente em 1871 quando a época de maior apelo popular da Internacional coincidiu com a Comuna de Paris ver capítulo 9 mais adiante Alguns governos e pelo menos seções da burguesia ficaram a preensivos com o crescimento do trabalhismo no início da década de 1860 O liberalismo estava demasiadamente comprometido com a or todoxia do laissezfaire econômico para se preocupar seriamente com unia política de reforma social embora alguns dos democratas radi cais alertados para o perigo de perder o apoio do proletariado estives sem preparados até para este sacrifício e em países onde o manches terismo não tinha sido totalmente vitorioso alguns funcionários e in telectuais viam tais reformas como mais e mais necessárias Na Ale manha sob o impacto do crescimento do movimento socialista um curioso grupo chamado Professores Socialistas Kathedersozialis ten formou em 1872 a influente Sociedade para a Política Social Verein für Sozialpoliíik que advogava a reforma social como uma alternativa para ou melhor um profilático contra a luta de classes marxista O termo socialista diferente do mais inflamado comu nista podia ainda ser usado de forma vaga por qualquer um que re comendasse ação econômica do Estado e reforma social e foi muito usado neste sentido até o crescimento generalizado de movimentos socialista de trabalhadores na década de 1880 Porém mesmo aqueles que viam a interferência pública no me canismo de mercado livre como um caminho certo para a ruína esta vam agora convencidos de que as atividades e as organizações traba lhistas deveriam ser reconhecidas para que fossem controladas Como vimos alguns dos mais demagógicos políticos como Napoleão III ou Disraeli estavam bem alertados sobre o potencial eleitoral da classe operária Na década de 1860 a lei foi modificada para permitir uma certa e limitada organização trabalhista bem como algumas greves em alguns países da Europa ou para ser mais exato abrir espaço na teoria do mercado livre para a barganha livre e coletiva de trabalhado res Entretanto a posição legal dos sindicatos permanecia bastante in certa Apenas na Inglaterra era grande o peso político da classe operá ria e de seus movimentos por consenso comum aceitavase que ele formava a maior parte da população para produzir após alguns anos de transição 186775 um sistema virtualmente completo de reco nhecimento legal de tal forma favorável ao sindicalismo que desde então tentativas periódicas ocorreram para tirar a liberdade que eles haviam recebido O objetivo destas reformas era diretamente prevenir o surgimen to do trabalhismo como uma força política independente ou mais a 128 inda revolucionária Essa tática foi bem sucedida em países onde já estavam estabelecidos os movimentos trabalhistas nãopolíticos ou li beralradicais Onde o poder do trabalhismo organizado ainda era for te como na Inglaterra e na Austrália partidos trabalhistas indepen dentes só viriam a aparecer muito mais tarde e menos então viriam a permanecer essencialmente nãosocialistas Mas como vimos na maior parte da Europa o movimento trabalhista emergiu no período da Internacional em grande parte sob a orientação dos socialistas e o movimento trabalhista viria a ser politicamente a ela identificado e mais especialmente ao marxismo Na Dinamarca onde a Associação Internacional dos Trabalhadores havia sido fundada em 1871 com o objetivo de organizar greves formaramse sindicatos independentes depois da dissolução da Internacional em 1873 a maioria dos quais reuniuse mais tarde em uma liga social democrata Esta era a reali zação mais significativa da Internacional Havia tornado o trabalhis mo independente e socialista Mas por outro lado não o havia feito insurreicional Apesar do terror que inspirava a governos a Internacional não planejou a revo lução imediata O próprio Marx apesar de não menos revolucionário do que antes não considerou a revolução como um projeto sério na quele momento E mesmo sua atitude em relação à única tentativa de fazer revolução proletária a Comuna de Paris foi bastante cuidadosa Não acreditou que ela tivesse a mínima chance de sucesso O melhor que poderia ter feito seria conseguir uma barganha com o governo de Versalhes Depois de seu fim inevitável ele escreveu um obituário nos termos mais comoventes mas o objetivo deste magnífico panfleto A Guerra Civil na França era dar indicações aos revolucionários no futuro e nisto ele foi bem sucedido Entretanto a Internacional isto é Marx permaneceu em silêncio enquanto a Comuna ocorria Duran te a década de 1860 ele trabalhou em perspectiva a longo prazo e permaneceu modesto em outras a curto termo Ele teria ficado satis feito com o estabelecimento pelo menos nos países industrializados de movimentos trabalhistas politicamente independentes onde fosse legalmente possível e organizados como movimentos de massa para a conquista do poder político e também emancipados da influência intelectual do liberalradicalismo incluindo o simples republicanis mo ou o nacionalismo assim como em relação ao tipo de ideologia esquerdista anarquismo mutualismo etc que ele via com certa ra zão como um retrocesso Ele não pedia nem sequer que tais movi mentos fossem marxistas e mesmo diante das circunstâncias isso teria sido utópico já que Marx não tinha virtualmente seguidores ex ceto na Alemanha e entre alguns poucos emigrados Ele não esperava também que o capitalismo fosse entrar em colapso ou estivesse cor rendo o perigo imediato de ser derrubado Esperava meramente reali zar os primeiros passos na organização dos exércitos que iriam en frentar a longa campanha contra o bemfortificado inimigo 129 No início da década de 1870 parecia que o movimento havia fracassado em atingir mesmo estes modestos objetivos O trabalhismo britânico permanecia firmemente nas mãos dos liberais submetido a líderes fracos e corruptos incapazes de conseguir representação par lamentar suficiente a partir de sua força eleitoral agora decisiva O movimento francês estava em ruínas como conseqüência da Comuna de Paris e entre estas ruínas nenhum sinal de nada melhor que os ob soletos blanquismo sansculotismo e mutualismo A grande onda de agitação trabalhista de 187375 deixou atrás de si alguns sindicatos ligeiramente mais fortes e em alguns casos mesmo até mais fracos em relação a onda de 186668 A própria Internacional cindiuse ten do sido incapaz de eliminar a influência da esquerda obsoleta cujo fracasso era por demais evidente A Comuna estava morta e a outra única revolução européia a espanhola chegava rapidamente a um ponto sem saída em torno de 1874 os Bourbons estavam de volta à Espanha adiando a República Espanhola por quase 60 anos Somente na Alemanha havia ocorrido um avanço sensível Uma nova perspec tiva revolucionária se bem que difícil ainda de entrever podia ser discernida nos países subdesenvolvidos e a partir de 1870 Marx pas sou a colocar algumas esperanças na Rússia Mas o movimento deste tipo imediatamente mais interessante porque capaz de perturbar a In glaterra o bastião do capitalismo mundial também tinha entrado em colapso O movimento feniano na Irlanda estava aparentemente em ruínas ver capítulo 5 Um estado de espírito de retraimento e desapontamento tomou conta dos últimos anos de vida de Marx Ele escreveu comparativa mente pouco e permaneceu politicamente mais ou menos inativo O principal do material postumamente publicado por Engels como O Capital vols II e II e as Teorias da MaisValia tinham na realida de sido escritos antes da publicação do Vol I em 1867 Dos escritos de Marx mais importantes excetuandose algumas cartas apenas a Crítica do Programa de Gotha 1875 é posterior à queda da Comu na Porém agora podemos constatar que duas realizações da década de 1860 foram permanentes Daquele momento em diante os movi mentos da massa trabalhadora haveriam de ser organizados indepen dentes políticos e socialistas A influência da esquerda socialista pré marxista havia sido quebrada E em conseqüência a estrutura da po lítica iria ser constantemente modificada A maioria destas modificações não iria ser evidente até o final da década de 1880 quando a Internacional renasceu agora como uma frente comum de partidos de massa a maioria marxista Mas mesmo na década de 1870 pelo menos um país teve que enfrentar o novo E também os Randglossen zu Adolph Wagners Lehrbuch der politischen Okonomie es critas em 187980 publicadas em MarxEngels Werke XIX Berlin 1962 e por Harper Row Publ New York 1975 em Carver Karl Marx Text on Method NT 130 problema a Alemanha Ali o voto socialista 102 mil em 1871 co meçou a crescer novamente com uma força aparentemente inexorá vel depois de uma rápida queda 340 mil em 1874 e meio milhão em 1877 Ninguém sabia o que fazer com essa força Massas que não permaneciam passivas e que não se prestavam a seguir a liderança dos superiores tradicionais da burguesia e cujos líderes não podiam ser assimilados não entravam no esquema da política Bismarck que fazia o jogo do parlamentarismo liberal para seus próprios fins tão bem ou mesmo melhor do que qualquer outro não podia pensar em outra coisa senão proibir a atividade socialista pela força da lei 131 Sétimo Capítulo PERDEDORES Uma imitação dos costumes europeus incluindo a perigosa arte de emprestar tem sido ultimamente modificada mas nas mãos dos dirigentes orientais a civilização do Oeste não frutifica e ao invés de restaurar um estado vacilante parece ameaçálo com uma mais rápida ruína Sir T Erksine May 18771 O mundo de Deus não dá autoridade para a moderna ternura pela vida humana E necessário que em todas as terras do Leste se es tabeleça medo e terror ao Governo Então e apenas então seus benefícios serão apreciados J W Kaye 18702 I Na luta pela existência que forneceu a metáfora básica do pen samento econômico político social e biológico do mundo burguês somente os mais capazes sobreviveriam sendo sua capacitação comprovada não apenas pela sobrevivência mas também pela domi nação A maior parte da população mundial tornouse vítima daqueles cuja superioridade econômica tecnológica e conseqüentemente mili tar era inquestionável e parecia indestrutível as economias e estados da Europa central e do norte e os países estabelecidos alhures por seus imigrantes especialmente os Estados Unidos Com as três exce ções mais importantes da Índia Indonésia e partes da África do Nor te poucos deles se tornaram ou foram colônias formais em nosso pe ríodo de estudo Podemos deixar de lado as áreas de colonização an glosaxônica como a Austrália Nova Zelândia e Canadá que embora não sendo formalmente independentes eram tratados de forma clara mente diversa das áreas habitadas por nativos um termo em si neu tro mas que adquiria uma forte conotação de inferioridade Estas exceções não eram negligenciáveis a Índia sozinha possuía 14 da população mundial em 1871 Mesmo assim a independência política do resto contava pouco Economicamente estavam a mercê do capita lismo desde que estivessem a seu alcance De um ponto de vista mili 132 tar sua inferioridade era evidente O barco de guerra e a força expe dicionária pareciam ser todopoderosos Na realidade não eram tão decisivos assim quando por exem plo europeus ameaçavam governos fracos ou tradicionais Estes po vos tinham muito daquilo que os administradores ingleses gostavam de chamar não sem admiração de raça militar sendo capazes de derrotar forças européias em batalhas terrestres embora nunca no mar Os turcos tinham uma merecida reputação de soldados e de fato a habilidade destes últimos em derrotar e massacrar não apenas os re beldes ao sultão mas para enfrentar o mais perigoso dos adversários o exército russo preservou o Império Otomano face às rivalidades en tre as potências européias e pelo menos atrasou sua desintegração Os soldados britânicos tratavam os sikhs e pathans na Índia e os zulus na África assim como os franceses aos bérberes do norte da África com respeito considerável Mais uma vez a experiência mostrava que as forças expedicionárias eram severamente perturbadas pela irregular guerra de guerrilhas especialmente em áreas montanhosas onde fal tava aos estrangeiros apoio local Os russos lutaram por décadas con tra este tipo de resistência no Cáucaso e os ingleses desistiram da tentativa de controlar o Afeganistão diretamente contentandose em supervisionar a fronteira norte com a índia Por último a ocupação permanente de extensos países por uma pequena minoria de conquis tadores estrangeiros era muito difícil e cara e dada a capacidade dos países desenvolvidos em impor sua vontade e interesses sem precisar da presença físicomilitar a tentativa não parecia ser compensadora E ninguém acreditava que pudesse ser feita mesmo que necessário A maior parte do mundo não estava portanto numa posição de determinar seu próprio destino Poderia na melhor das hipóteses rea gir às forças externas que pressionavam com vigor cada vez maior Este mundo de vítimas consistia em quatro setores mais importantes Primeiro havia os impérios nãoeuropeus sobreviventes ou grandes reinos independentes do mundo islâmico e da Ásia o Império Otoma no Pérsia China Japão e uns outros menores como o Marrocos Bur ma Sião e Vietnã Os maiores dentre estes sobreviveram embora com a exceção do Japão que será considerado separadamente ver ca pítulo 8 mais adiante minados de forma crescente pelas novas for ças do capitalismo do século XIX os menores foram ocupados pelo final de nosso período com a exceção do Sião que sobreviveu como um estadotampão entre zonas de influência inglesa e francesa Se gundo havia as antigas colônias da Espanha e Portugal nas Américas agora estados nominalmente independentes Em terceiro lugar havia a África ao sul do Sahara sobre o que não há muito o que dizer pois não atraía a atenção neste período Finalmente havia as vítimas já formalmente colonizadas ou ocupadas sobretudo na Ásia Todos enfrentavam o problema fundamental de qual seria a ati tude diante de uma conquista formal ou informal pelo Oeste Que os brancos eram demasiado fortes para serem meramente rejeitados isso 133 era evidente Os índios maias das selvas do Yucatan puderam expul sálos em 1847 retornando ao antigo modo de vida como resultado da Guerra Racial até que no século XX o sisal e a goma de mas car os trouxeram de volta à órbita da civilização ocidental Mas o ca so deles era excepcional pois o Yucatan era isolado o poder branco mais próximo era fraco México e os ingleses dos quais uma colô nia era fronteiriça aos maias não os desencorajaram Mas para a maioria dos povos politicamente organizados do mundo não capitalista a dúvida não era se o mundo da civilização branca podia ser evitado mas como seria a reação a seu impacto copiálo resistir à sua influência ou uma combinação de ambos Dos setores dependentes do mundo dois já haviam sofrido compulsoriamente a ocidentalização pela dominação européia ou estavam em pleno processo as antigas colônias das Américas e as a tuais nas diversas partes do mundo A América Latina tinha emergido do status colonial espanhol e português como um agregado de estados tecnicamente soberanos nos quais instituições e leis liberais de classe média do tipo conhecido do século XIX inglês e francês foram impostas por sobre a herança ins titucional portuguesa e espanhola do passado sobretudo um colorido catolicismo romano passional e profundamente enraizado caracterís tico da população local que era índia mixada e em grande parte a fricana na zona do Caribe assim como na costa do Brasil O imperia lismo do mundo capitalista não iria fazer uma tentativa sistemática para evangelizar suas vítimas Estes eram países agrícolas e virtual mente inacessíveis para um remoto mercado mundial na medida em que estivessem fora do alcance de rios portos ou mulas Deixando de lado a área de plantações escravas e as tribos do interior inaccessível ou das remotas fronteiras do extremo norte e sul estes países eram habitados principalmente por camponeses em comunidades autôno mas em relação direta de servitude com os proprietários de vastas á reas de terra ou mais raramente independentes Estes países eram dominados pela riqueza de grandes proprietários de terras cuja posi ção tinha sido notavelmente reforçada pela abolição do colonialismo espanhol Eram também dominados pelos homens armados que os senhores da terra podiam mobilizar Estes formavam a base dos cau dillos que a frente de seus exércitos tornaramse tão familiares no cenário político latinoamericano Basicamente os países do conti nente eram quase todos oligarquias Na prática isto significava que o poder nacional e os estados nacionais eram fracos salvo se uma re pública fosse muito pequena ou um ditador suficientemente feroz pa ra instilar pelo menos terror temporário nos mais remotos cidadãos Estes países estavam em contato com a economia mundial através dos estrangeiros que dominavam a importação e exportação assim como o transporte com a exceção do Chile que tinha uma florescente frota própria Em nosso período estes estrangeiros eram principalmente os ingleses embora alguns franceses e americanos pudessem também 134 ser percebidos A sorte dos governos dependia da percentagem que levavam sobre este tráfico exterior e do sucesso em aumentar emprés timos mais uma vez sobretudo dos ingleses As primeiras décadas depois da independência viram regressão econômica e demográfica em muitas áreas com exceções notáveis como o Brasil que havia se separado pacificamente de Portugal sob um imperador local evitando assim conflitos e guerra civil e o Chile isolado na sua faixa temperada pelo Pacífico As reformas liberais instituídas pelos novos regimes a maior acumulação de repúblicas no mundo têm como ainda até hoje pouca importância prática Em alguns estados maiores e conseqüentemente mais importantes como a Argentina do ditador Rosas 183552 dominavam oligarcas educa dos no país olhando para dentro e hostis a inovações A impressio nante expansão mundial do capitalismo no nosso período iria mudar tudo isso Em primeiro lugar ao norte do istmo do Panamá viria a ocorrer uma intervenção por parte dos países desenvolvidos bem maior e mais direta desde os tempos de Espanha e Portugal México a vítima maior perdeu vários territórios para os Estados Unidos como resulta do da agressão americana de 1847 Em segundo lugar a Europa e em medida menor os Estados Unidos descobriram mercadorias valiosas para importar da grande região subdesenvolvida guano do Peru ta baco de Cuba e de outras áreas algodão do Brasil e de outros lugares especialmente durante a Guerra Civil Americana café depois de 1840 sobretudo do Brasil nitratos do Peru etc Vários destes eram produtos de boom temporário passíveis de declínio tão rápido quanto a ascensão a era do guano no Peru tinha começado antes de 1848 e não sobreviveu â década de 1870 Somente após esta década a Amé rica Latina desenvolveu produtos relativamente estáveis de exporta ção que iriam durar como tal até as décadas intermediárias de nosso século atual ou mesmo até hoje O investimento de capital estrangei ro começava a desenvolver a infraestrutura do continente estradas de ferro instalações portuárias utilidades públicas mesmo a imigra ção européia aumentou substancialmente na maior parte em Cuba Brasil e sobretudo nas áreas temperadas do estuário do Rio da Prata Aproximadamente 250 mil europeus instalaramse no Brasil entre 1855 e 1874 enquanto que mais de 800 mil foram para a Argentina e Uruguai no mesmo período Este desenvolvimento fortaleceu as mãos da minoria de latino americanos devotados à modernização do continente tão pobre quan to rico em potencialidade e recursos um mendigo sentado em cima de ouro como um viajante italiano descreveu o Peru Os estrangei ros mesmo quando ameaçadores como no México eram um perigo menor comparado ao formidável componente de inércia nativa repre sentado pela soma de um campesinato tradicionalista senhores da ter ra antiquados e sem visão e sobretudo a Igreja Ou melhor se estas características não fossem superadas em primeiro lugar as chances de 135 reagir aos estrangeiros seriam poucas E elas não poderiam ser supera das por simples modernização ou europeização como se pretendia As ideologias do progresso que envolviam latinoamericanos cultos não eram apenas aquelas do liberalismo dos francomações ou benthamitas iluminados que tinham sido tão populares no movi mento de independência Na década de 1840 várias formas de socia lismo utópico tinham capturado intelectuais prometendo não apenas perfeição social mas desenvolvimento econômico e de 1870 em dian te o positivismo de Augusto Comte penetrou profundamente no Brasil cujo lema nacional ainda é o comtiano Ordem e Progresso e no México em escala menor Portanto o liberalismo clássico ainda prevalecia A combinação da revolução de 1848 com a expansão ca pitalista mundial deu aos liberais sua chance Eles trouxeram a destru ição real da antiga ordem legal colonial As duas reformas mais signi ficativas foram a liquidação sistemática de qualquer propriedade da terra que não fosse propriedade privada e sobretudo um feroz anticle ricarismo que chegou a abolir os privilégios de propriedade da igreja Os extremos deste anticlericalismo foram atingidos no México sob o presidente Benito Juarez 180672 onde a Igreja e o Estado foram separados dízimos abolidos padres forçados a prestar um juramento de lealdade funcionários públicos proibidos de assistir serviços reli giosos e as terras eclesiásticas vendidas Entretanto outros países fo ram apenas um pouco menos militantes A tentativa de transformar a sociedade via modernização institu cional imposta através do poder político fracassou essencialmente porque não tinha o suporte de uma independência econômica Os li berais eram uma elite educada e urbana num continente rural e na medida em que tivessem um genuíno poder político ele repousava em generais não muito fiéis e em clãs de proprietários de terras que por razões que tinham apenas uma remota conexão com John Stuart Mill ou Darwin escolheram a filiação daquele lado Do ponto de vis ta social e econômico muito pouco havia mudado na América Latina até a década de 1870 exceto que o poder dos senhores da terra tinha aumentado e o dos camponeses enfraquecido E na medida em que ti nhase transformado sob o impacto do mercado mundial o resultado era subordinar a velha economia à demanda do comércio importação exportação operado através de uns poucos grandes portos ou capitais e controlado por estrangeiros A única exceção de importância eram as terras do Rio da Prata onde a maciça imigração européia iria pro duzir uma população inteiramente nova com uma estrutura social in teiramente nãotradicional A América Latina neste período sob es tudo tomou o caminho da ocidentalização na sua forma burguesa liberal com grande zelo e ocasionalmente grande brutalidade de uma forma mais virtual que qualquer outro país no mundo com a exceção do Japão mas os resultados foram desapontadores Deixando de lado as áreas habitadas por normalmente recentes colonos europeus e sem uma grande população nativa Austrália Ca 136 nadá os impérios coloniais das potências européias consistiam em umas poucas regiões onde uma maioria ou minoria de colonos bran cos coexistia com uma população indígena de razoável importância África do Sul Argélia Nova Zelândia e um grande número de re giões sem uma população européia significativa ou permanente Co lônias do colono branco viriam criar mais tarde o mais intratável problema de colonialismo embora em nosso período de estudo não ti vessem grande importância internacional De qualquer forma o pro blema das populações nativas era o de como resistir ao avanço dos colonos brancos e embora os Zulus os maori e os bérberes fossem bem fornidos em armas eles não conseguiam mais do que sucesso lo cais As colônias de população indígena mais sólida levantaram pro blemas mais sérios já que a escassez de brancos fez com que fosse essencial usar nativos em grande número para administrar assim co mo utilizar as instituições existentes para esta administração pelo menos ao nível local Em outras palavras os colonizadores estavam diante do problema de criar um corpo de nativos assimilados para to mar o lugar do homem branco e também de depender das instituições tradicionais dos países geralmente longe de atender a seus interesses Por outro lado os povos indígenas confrontavam o desafio da ociden talização como algo muito mais complexo do que mera resistência II A índia de longe a maior colônia ilustra as complexidades e paradoxos desta situação A mera existência de dominação estrangeira em si mesma não colocava maiores problemas aqui já que vastas re giões do subcontinente tinham sido no curso de sua história conquis tadas e reconquistadas por vários tipos de estrangeiros a maioria da Ásia central cuja legitimidade havia sido suficientemente estabelecida pelo poder efetivo Que os dominadores atuais tivessem pele mais clara que os afghans e uma linguagem administrativa um pouco mais incom preensível que o persa clássico não chegou a levantar maiores proble mas que eles não procurassem conversões para sua religião peculiar com um zelo excessivo para tristeza dos missionários era uma con quista política Entretanto as mudanças que eles provocaram delibera damente ou em conseqüência de sua curiosa ideologia e atividade eco nômica sem precedentes eram mais profundas e perturbadoras que qualquer outra coisa que tivesse atravessado o Passo de Khyber Eles eram simultaneamente revolucionários e limitados Os in gleses esforçaramse para inserir um processo de ocidentalização em alguns casos mesmo de assimilação não apenas porque práticas locais como a cremação de viúvas suttee ultrajava realmente muito deles mas sobretudo por causa das necessidades mesmas da adminis tração e da economia Ambas destruíam a estrutura social e econômi ca existentes mesmo quando tal não era a intenção Portanto após 137 longos debates T B Macaulay 180059 e sua famosa Minuta 1835 estabeleceu um sistema de educação puramente inglês para os poucos indianos nos quais o British Raj tinha interesse oficial ou seja os administradores subalternos Uma pequena elite anglicizada emergiu às vezes tão distante das massas indianas a ponto de perder fluência em sua própria língua vernacular ou de anglicizar os próprios nomes embora nem o mais assimilado dos indianos viesse a ser tra tado como inglês pelos ingleses Por outro lado os ingleses recusa ramse ou fracassaram na tentativa de ocidentalização porque em primeiro lugar os indianos eram enfim um povo dominado cuja fun ção não era a de competir com o capitalismo inglês e em segundo lu gar por causa dos riscos políticos da excessiva interferência em práti cas populares e também pela notável discrepância entre o número de ingleses e os aproximadamente 190 milhões de indianos 1871 tão grande a ponto de parecer insuperável pelo menos por parte do pe queno número de administradores ingleses A literatura extremamente capaz produzida pelos homens que dominaram ou tiveram experiên cia com a índia no século XIX e que contribuíram decisivamente para o desenvolvimento de disciplinas como a sociologia antropolo gia social e história comparativa ver capítulo 14 mais adiante faz parte de uma série de variações em torno do tema da incompatibilida de numérica e da impotência A ocidentalização viria eventualmente produzir a liderança as ideologias e os programas da luta de libertação indiana cujos líderes culturais e políticos surgiriam dos flancos daqueles que haviam cola borado com os ingleses beneficiadose desta dominação na qualidade de uma burguesia compradora ou em outras palavras iniciando sua modernização pela imitação do Oeste Isso produziu o início de uma classe de industrialistas locais cujos interesses viriam produzir con flitos com a política econômica metropolitana É necessário ressaltar que neste período a elite ocidentalizada via nos britânicos um mode lo e a abertura de novas possibilidades O nacionalista anônimo no Mukherjees Magazine Calcutá 1873 era ainda uma figura isolada quando escreveu Maravilhados pelo brilho artificial em torno de les os nativos aceitavam os pontos de vista de seus superiores e neles depositavam sua fé como se fossem um Veda comercial Mas dia após dia a luz da inteligência limpalhes o fog de suas mentes3 Na medida em que havia resistência aos britânicos enquanto britâni cos ela vinha dos tradicionalistas e era mesmo muda com uma im portante exceção numa época em que como o nacionalista B G Tilak mais tarde lembraria o povo estava primeiramente maravilha do pela disciplina dos britânicos Estradas de ferro telégrafo estra das escolas impressionavam o povo Distúrbios haviam cessado e o povo podia aproveitar a calma e a paz o povo começou a dizer que mesmo um cego podia viajar em segurança de Benares a Rameshwar com ouro amarrado numa vara4 138 A importante exceção foi o grande levante de 185758 no norte da planície indiana conhecido na tradição histórica inglesa como o Motim indiano um ponto crucial na história da administração bri tânica que tem sido apontado retrospectivamente como um prelúdio ao movimento nacional indiano Era o último sinal de reação do norte da Índia contra a imposição do domínio inglês direto e finalmente fez ruir a velha East Índia Company Este curioso sobrevivente do colo nialismo de empresa privada absorvido de forma crescente no apara to de estado inglês vinha finalmente ser substituído definitivamente por ele A política de anexação sistemática de territórios indianos me ramente dependentes associada ao regime do vicerei Lord Dalhousie 184756 e especialmente a anexação em 1856 do Reino de Oudh última relíquia do Império Mughal terminou por provocar a explo são A rapidez e a falta de tato das mudanças impostas ou entendidas pelo nativos como iminentes precipitaramna O pretexto foi a intro dução de cartuchos de graxa que os soldados do exército bengalês viam como uma deliberada provocação de sua sensibilidade religiosa O estabelecimento de missionários era um dos principais motivos da fúria popular Embora o levante tenha começado como um motim do exército bengalês os de Bombaim e Madras permaneceram quietos transformouse numa insurreição popular de maior importância na planície do norte sob a liderança dos nobres e príncipes tradicionais na tentativa de restaurar o Império Mughal As tensões econômicas como as oriundas das mudanças efetuadas pelos ingleses na taxa de terra a principal fonte de renda pública tiveram certamente sua im portância mas até onde este fato isolado poderia produzir uma tal re volta é bastante duvidoso Os homens rebelaramse contra aquilo que eles acreditavam ser uma destruição rápida e rude de sua forma de vi da por uma sociedade estrangeira O Motim foi esmagado num banho de sangue mas ensinou aos ingleses a ter cuidado Por razões práticas a política de anexações cessou exceto nas fronteiras ocidental e oriental do subcontinente As grandes áreas da Índia ainda não ocupadas por administração direta foram deixadas para a administração de príncipes locais marionetes controlados pelos ingleses embora oficialmente respeitados e consi derados e estes por seu turno transformaramse nos pilares do regi me que lhes garantia riqueza poder local e status Desenvolveuse uma tendência acentuada para buscar apoio nos elementos mais con servadores deste país os proprietários de terras e especialmente a po derosa minoria muçulmana seguindo a antiga regra imperial Divide e Impera Com o passar do tempo esta mudança de política tornou se mais do que o reconhecimento da resistência da Índia tradicional à dominação estrangeira Tornouse um contrapeso ao lento desenvol vimento da resistência da nova elite indiana classemédia produtos da sociedade colonial em alguns casos seus servidores Pois fossem quais fossem as políticas aplicadas no império indiano sua realidade econômica e política continuava a enfraquecer e alquebrar as forças 139 da tradição e reforçar as forças da inovação intensificando o conflito entre estas últimas e os ingleses Após o final do regime da Company o crescimento de uma nova comunidade de ingleses expatriados a companhados de suas mulheres que enfatizavam de forma crescente seus sentimentos segregacionistas e de superioridade racial aumentou a fricção social com a nova camada de classe média As tensões eco nômicas dos últimos 30 anos do século XIX ver capítulo 16 mais a diante multiplicaram argumentos antiimperialistas Pelo final da dé cada de 1880 o Congresso Nacional Indiano o principal veículo do nacionalismo indiano e partido dirigente da Índia independente já existia No século XX as massas indianas viriam seguir a direção ide ológica do novo nacionalismo III O Levante Indiano de 185758 não foi a única rebelião colonial de massa do passado contra o presente Dentro do império francês o grande levante argelino de 1871 precipitado tanto pela retirada das tropas francesas durante a Guerra FrancoPrussiana como pela imi gração em massa de alsacianos e lorrainianos para a Argélia depois de 1871 constituise num fenômeno análogo Porém a magnitude destas rebeliões era limitada pois as principais vítimas da sociedade ociden tal capitalista não eram colônias conquistadas mas sociedades e esta dos enfraquecidos embora nominalmente independentes O destino de dois destes pode ser reunido em nosso período de estudo Egito e China Egito um principado virtualmente independente embora formal mente ainda dentro do Império Muçulmano estava predestinado a ser vítima de sua riqueza agrária e de sua situação estratégica A primeira destas transformouo numa economia de exportação agrária suprindo o mundo capitalista com trigo e especialmente algodão cujas vendas cresceram dramaticamente Já no início da década de 1860 a exporta ção representava 70 da renda auferida pelo país e durante o grande boom da década de 1860 quando os fornecimentos americanos foram interrompidos pela Guerra Civil até os camponeses se beneficiaram embora metade deles tivesse contraído doenças parasitárias devido ao aumento da irrigação Esta vasta expansão levou o comércio egípcio decididamente para dentro do sistema internacional britânico atraindo levas de homens de negócios e aventureiros prontos a conce der crédito ao Khedive Ismail Desta forma o Khedive esperava transformar o Egito num poder moderno e imperial e reconstruir o Cairo tendo como padrão as linhas imperiais de Paris de Napoleão II I que fornecia o modelo básico de paraíso para dirigentes deste tipo O segundo fator a situação estratégica atraia os interesses das potên cias ocidentais e seus capitalistas especialmente os ingleses cuja po sição como potência mundial passoua depender de forma definitiva 140 da construção do Canal de Suez A cultura mundial pode ficar modes tamente agradecida ao Khedive por ter encomendado a Aida de Verdi 1871 cuja premiére teve lugar na nova ópera do Khedive para ce lebrar a abertura do Canal mas o custo de tudo isso para o povo egíp cio viria a ser excessivo O Egito estava portanto integrado na economia européia como um fornecedor de produtos agrários Os banqueiros através dos pa shas extorquiam o povo egípcio e quando o Khedive e seus pashas não mais podiam pagar os juros dos empréstimos que haviam aceita do com tanto entusiasmo em 1876 eles totalizavam quase metade da receita para aquele ano os estrangeiros impuseram controle 5 Os europeus teriam talvez ficado contentes apenas em explorar um Egito independente mas o colapso do boom econômico assim com o da es trutura política e administrativa do governo do Khedive minado pe las forças econômicas e tentações que os dirigentes egípcios não en tendiam nem conseguiam manejar tornava esta independência difí cil Os ingleses cuja posição era mais forte e cujos interesses estavam envolvidos de forma muito mais crucial emergiram como os novos dirigentes do país na década de 1880 Entretanto a incomum abertura do Egito ao Oeste tinha criado uma nova elite de senhores da terra intelectuais funcionários civis e militares que dirigiram o movimento nacional de 187982 diretamen te contra o Khedive e os estrangeiros No curso do século XIX o ve lho grupo dirigente turco ou turcocircassiano tinha sido egipcianiza do ao mesmo tempo em que vários egípcios haviam galgado posições de riqueza e influência O árabe substituiu o turco como língua ofici al reforçando a já poderosa posição do Egito como centro da vida in telectual islâmica O notável pioneiro da ideologia islâmica moderna o persa Jamal addin Al Afghani encontrou um público entusiástico entre os intelectuais egípcios durante sua influente estadia no país 187179 O ponto importante em Al Afghani assim como seus dis cípulos egípcios era que não advogava uma simples reação islâmica negativa contra o Oeste Sua própria ortodoxia religiosa tem sido re almente questionada ele tornouse um franco maçom em 1875 em bora fosse realista o bastante para saber que as convicções religiosas do mundo islâmico não deviam ser sacudidas e eram na realidade uma força política de grande magnitude Seu apelo era por uma revi talização do Islã que permitisse ao mundo muçulmano absorver a ci ência moderna e copiar o Oeste demonstrar enfim que o Islã de fato absorvia a ciência moderna parlamentos e exércitos nacionais6 O movimento antiimperialista no Egito olhava para frente e não para trás Enquanto os pashas do Egito imitavam o tentador exemplo de Paris de Napoleão III a maior das revoluções do século XIX ocorria no maior dos impérios nãoeuropeus a chamada rebelião Taiping da China 185066 Ela tem sido ignorada por historiadores eurocen 141 tristas embora Marx estivesse suficientemente bem informado sobre ela para escrever em 1853 Talvez o próximo levante do povo euro peu dependa muito mais do que agora ocorre no Império Celestial do que qualquer outra causa política Era a maior das rebeliões não a penas porque a China cuja metade do atual território era controlada pelos Taipings continha talvez 400 milhões de habitantes de longe o estado mais populoso do mundo mas também por causa da escala ex traordinária de ferocidade que ocorreu nas guerras civis no país Pro vavelmente 20 milhões de chineses morreram neste período Estas convulsões eram de várias formas o produto direto do impacto oci dental na China Provavelmente sozinha entre os grandes impérios tradicionais do mundo a China possuía uma tradição revolucionária popular ide ológica e prática Ideologicamente seus intelectuais e seu povo toma vam a permanência e centralização de seu império como um dado e xistiria sempre sob um único imperador salvo por alguns períodos ocasionais de divisão seria sempre administrada por intelectuais burocratas que tivessem passado pelos grandes exames nacionais do serviço civil introduzidos aproximadamente dois mil anos antes e somente abandonados quando o império estava próximo do desapare cimento definitivo em 1910 Portanto a história deste país era a de uma sucessão de dinastias cada qual passando acreditavase por um ciclo de ascensão crise e transcendência ganhando é perdendo o mandato do Céu que legitimava sua absoluta autoridade Neste pro cesso de mudança de uma dinastia para outra a insurreição popular derivada do banditismo social os levantes camponeses as atividades das sociedades secretas populares e até a rebelião de grande magnitu de eram conhecidas e esperadas para desempenhar seus respectivos papéis No entanto as próprias ocorrências destas agitações eram uma clara indicação de que o mandato do Céu estava por acabar A per manência da China centro da civilização mundial era conseguida a través da repetição contínua do ciclo de mudanças de dinastia que in cluía este elemento revolucionário A dinastia Manchu imposta por conquistadores do Norte em meados do século XVII havia substituído a dinastia Ming que havia por seu turno através de revolução popular derrubado a dinastia Mongol no século XIV Embora na primeira metade do século XIX o regime Manchu parecesse funcionar sem maiores problemas com in teligência e eficiência apesar de se dizer que havia uma grande quantidade de corrupção já se percebiam sinais de crise e rebelião desde a década de 1790 Malgrado quaisquer outras razões que pos sam ser apontadas o fato é que o extraordinário aumento da popula ção do país no século precedente cujas causas ainda não estão clara mente elucidadas havia começado a criar pressões econômicas agu das O número de chineses parece haver subido de perto de 140 mi lhões em 1741 para cerca de 400 milhões em 1834 O novo elemento dramático na situação chinesa era a conquista ocidental que havia 142 derrotado o Império na primeira Guerra do Ópio 183942 O choque desta capitulação diante de uma modesta força naval inglesa foi e norme pois tinha revelado a fragilidade do sistema imperial e mes mo setores da opinião pública fora das poucas áreas imediatamente afetadas devem ter tomado consciência do fato Conseqüentemente houve um aumento marcante e imediato nas atividades das várias for ças de oposição notavelmente as poderosas e profundamente enrai zadas sociedades secretas como a Tríade do sul da China dedicada à derrubada da dinastia estrangeira Manchu e a restauração da Ming A administração imperial havia instituído forças de milícia contra os in gleses desta forma ajudando a distribuir armas pela população civil Só faltava uma fagulha para produzir a explosão Esta fagulha apareceu sob a forma de um profeta obcecado tal vez psicopata e líder messiânico Hung HsiuChuan 181364 um dos fracassados no exame para o Serviço Civil imperial e logo em segui da um descontente político Depois de seu fracasso no exame ele e videntemente teve um colapso nervoso que se transformou em con versão religiosa Por volta de 184748 fundou uma Sociedade dos que veneram Deus na província de Kwangsi e teve rapidamente co mo seguidores camponeses e mineiros homens da grande população chinesa de nômades empobrecidos membros de várias minorias na cionais e de velhas sociedades secretas Havia porém uma novidade significativa na sua pregação Hung tinha sido influenciado pela leitu ra de textos cristãos tinha até convivido com um missionário ameri cano em Cantão e portanto assimilado elementos ocidentais signifi cativos numa mistura de idéias antiManchu heréticoreligiosas e re volucionárias A rebelião estourou em 1850 em Kwangsi e espalhou se tão rapidamente que um Reino Celestial de Paz Universal pôde ser proclamado no ano seguinte com Hung como o supremo Rei Ce lestial Era indubitavelmente um regime de revolução social cujo maior apoio baseavase nas massas populares e dominado por idéias igualitárias taoístas budistas e cristãs Teocraticamente organizada na base de uma pirâmide de unidades familiares aboliu a propriedade privada a terra sendo distribuída apenas para uso não para proprie dade estabeleceu a igualdade entre os sexos proibiu tabaco ópio e álcool introduziu um novo calendário incluindo a semana de sete di as e várias outras reformas culturais não esquecendo de abaixar as taxas Pelo final de 1853 os Taipings eram pelo menos um milhão de ativos militantes que controlavam a maior parte do sul e do leste chi nês tendo capturado Nanking embora sem conseguir mais pela falta de cavalaria adentrarse ao norte A China estava dividida e mesmo aquelas partes que não se encontravam sob o regime de Taiping esta vam sendo convulsionadas por graves insurreições tais como as do Nien uma revolta dos camponeses rebeldes do norte não suprimida até 1868 além da rebelião da minoria nacional Miao em Kweichow e de outras minorias no sudoeste e noroeste 146 143 A revolução Taiping não se manteve e realmente não se espera va que se mantivesse Suas inovações radicais alienavam moderados tradicionalistas e aqueles que tinham propriedades a perder e esses não eram apenas os ricos O fracasso de seus líderes em guiarse pelas suas próprias regras puritanas enfraqueceram seu apelo popular e profundas divisões desenvolveramse rapidamente na liderança Após 1856 encontravase na defensiva e em 1864 a capital Taiping de Nanking era recapturada O governo imperial recuperouse mas o preço que pagou por tal recuperação era pesado e viria provarse fa tal Isso também ilustrava as complexidades do impacto do Ocidente Paradoxalmente os dirigentes da China eram menos propensos a adotar inovações ocidentais que os rebeldes plebeus habituados de longa data a viver num mundo ideológico onde as idéias nãooficiais vinham de fontes estrangeiras como o budismo Para os intelectuais burocratas confucianos que governavam o Império o que não fosse chinês era bárbaro Havia mesmo resistência à tecnologia que obvia mente fazia os bárbaros invencíveis Mesmo em 1867 o Grande Se cretário Wo Jen alertou o trono de que o estabelecimento de um colé gio para ensinar astronomia e matemática iria fazer do povo proséli to do estrangeirismo e resultaria no colapso da retidão e na difusão da iniqüidade7 e a resistência à construção de estradas de ferro e coisas semelhantes permaneceu considerável Por razões óbvias um partido modernizante desenvolveuse mas podese adivinhar que eles prefeririam manter a China inalterada meramente acrescentando a capacidade de produzir armamentos ocidentais Suas tentativas pa ra desenvolver tal produção na década de 1860 não foram por esta ra zão muito bem sucedidas A enfraquecida administração imperial viase diante da escolha entre diferentes graus de concessão ao Oeste Frente a uma revolução social de magnitude sentia relutância em mobilizar a enorme força da xenofobia popular chinesa contra os in vasores Realmente a derrubada do governo de Taiping parecia ao Império de longe o problema mais urgente e para este objetivo a aju da dos estrangeiros era se não essencial pelo menos desejável sua boa vontade então indispensável Portanto a China Imperial viuse rapidamente na completa dependência de estrangeiros Um triunvi rato anglofrancoamericano já controlava a alfândega de Shangai desde 1854 mas depois da segunda Guerra do ópio 185658 e do saque de Peking 1860 que terminou numa completa capitulação um inglês foi indicado para assistir a administração de toda a recei ta da alfândega chinesa Neste período não apenas a Inglaterra mas também a França Rússia e os Estados Unidos receberam concessões Vários portos foram abertos mercadores estrangeiros receberam li berdade de movimento e imunidades diante da lei chinesa havia li berdade de ação para os missionários estrangeiros mercado livre in cluindo navegação livre nas águas fluviais pesadas indenizações de guerra etc Na prática Robert Hart que foi Inspetor Geral da Alfân dega Chinesa de 1863 até 1909 era o chefe da economia chinesa e 144 embora ele chegasse a inspirar confiança aos governos chineses e a identificarse com o país na realidade o arranjo implicava na inteira subordinação do governo imperial aos interesses dos ocidentais De fato quando chegou o ponto crítico os ocidentais preferiram arrastar os Manchus até sua derrubada que teria produzido ou um re gime militante nacionalista revolucionário ou o que é mais provável anarquia e um vazio político que o Oeste estava relutante em preen cher A simpatia inicial da parte de alguns estrangeiros pelos elemen tos aparentemente cristãos dos Taiping rapidamente evaporouse Por outro lado o Império chinês recuperouse da crise de Taiping a través de uma combinação de concessões ao Oeste um retorno ao conservadorismo e uma erosão fatal de seu poder central Os verda deiros vitoriosos na China eram os velhos intelectuaisburocratas Di ante do perigo mortal a dinastia Manchu e a aristocracia aproxima ramse da elite chinesa concedendolhe muito de seu antigo poder Os melhores dos intelectuaisadministradores homens como Li HungChang 18231901 salvaram o Império quando Peking esta va sem poder instituindo exércitos provinciais baseados em recursos provinciais Agindo desta forma eles anteciparam o próximo colapso da China numa coleção de regiões sob senhores da guerra indepen dentes O grande e antigo Império da China iria a partir de então vi ver a custa dos outros De uma forma ou de outra portanto as sociedades e estados ví timas do mundo capitalista com a exceção do Japão a ser considera do separadamente ver capítulo 8 mais adiante fracassaram em che gar a um bom entendimento com este último Seus dirigentes e elites cedo se convenceram que uma simples recusa em aceitar o estilo dos ocidentais era impraticável e se praticável teria meramente perpetu ado sua fraqueza Os que viviam nas colônias conquistadas domina das ou administradas pelo Oeste não tinham muita escolha seus des tinos eram determinados por seus conquistadores Os outros estavam divididos entre seguir uma política de resistência ou colaborar com concessões entre uma sincera ocidentalização ou alguma forma de reforma que lhes permitisse adquirir a ciência e a tecnologia do Oeste sem perder concomitantemente suas próprias culturas e instituições No todo as antigas colônias dos estados europeus nas Américas opta ram por uma incondicional imitação do Oeste a cadeia das antigas monarquias que iam do Marrocos no Atlântico à China no Pacífico eram partidários de alguma versão de reforma quando não podiam i solarse completamente da expansão ocidental Os casos da China e do Egito são nas suas particularidades típi cos desta escolha Ambos eram estados independentes com base em antigas civilizações e uma cultura nãoeuropéia minados pela pene tração do comércio e finanças ocidentais aceitas com boa ou má von tade e sem poder para resistir às forças militares e navais do Oeste 145 mesmo que modestamente mobilizadas As potências capitalistas nes te estágio não estavam interessadas particularmente em ocupação e administração na medida em que seus cidadãos tivessem total liber dade em fazer o que bem entendessem incluindo privilégios extra territoriais Tais cidadãos vieram encontrarse de forma crescente envolvidos nas questões internas de tais países apenas quando os go vernos locais começaram a se desintegrar diante do impacto ociden tal assim como também devido à rivalidade entre os poderes ociden tais Os dirigentes da China e do Egito rejeitaram uma política de re sistência nacional preferindo onde tivessem a opção uma depen dência em relação ao Oeste que lhes mantivesse o poder político pró prio Neste período relativamente poucos entre os que nestes países queriam a resistência através da regeneração nacional favoreciam a ocidentalização Em lugar disso eles optavam por uma forma de re forma ideológica que lhes permitisse encarnar o que quer que fosse que tivesse feito o Oeste tão formidável dentro de seus próprios sis temas culturais IV Tais políticas fracassaram O Egito verseia cedo sob controle direto de seus conquistadores e a China tornouse ainda mais sem sa ída na via da desintegração Já que os regimes existentes e seus diri gentes tinham optado pela dependência ocidental era improvável que os reformadores nacionais pudessem ser bem sucedidos já que a re volução era a précondição para o sucesso De fato os maiores entre os velhos impérios independentes nãoocidentais viriam a ser derru bados ou transformados por revoluções no começo do século XX Turquia Irã e China Mas ainda não era tempo para isso Portanto o que é hoje chamado o Terceiro Mundo ou os paí ses subdesenvolvidos estavam à mercê do Oeste vítimas perdidas Mas esta subordinação não traria nenhuma compensação para estes países Como já vimos havia os que nos países atrasados acredita vam que isto ocorresse A ocidentalização era a única solução e isso não implicava apenas aprender e copiar os estrangeiros mas aceitar sua aliança contra as forças locais do tradicionalismo isto é sua do minação aí o preço tinha que ser pago E um engano ver estes pas sionais modernizadores à luz dos posteriores movimentos naciona listas considerandoos como simples traidores ou agentes do imperia lismo estrangeiro Eles podiam apenas sustentar o ponto de vista de que os estrangeiros longe da invencibilidade iriam ajudálos a criar uma sociedade capaz de resistir ao Oeste A elite mexicana da década de 1860 era próestrangeira porque havia perdido as esperanças no país 8 Tais argumentos eram também usados por revolucionários oci dentais Marx viu de forma positiva a vitória americana sobre o Mé xico na guerra de 1847 porque ela trazia progresso histórico e criava 146 as condições para o desenvolvimento do capitalismo quer dizer para as condições de derrubada do próprio capitalismo Sua posição no que toca à missão britânica na Índia expressa em 1853 é conhecida Consideravaa com uma dupla missão o aniquilamento da antiga sociedade asiática e o estabelecimento das fundações materiais da so ciedade ocidental na índia Realmente ele acreditava que Os indianos não terão os frutos dos novos elementos da sociedade es palhados entre eles pela burguesia inglesa até que na GrãBretanha as atuais classes dominantes tenham sido suplantadas pelo proletariado industrial ou até que os hindus tenham se fortalecido suficientemente para livrarse dos ingleses de vez No entanto apesar do sangue e sujeira miséria e degradação para o que a burguesia arrastava os povos do mundo ele via estas conquistas como positivas e progressistas Portanto sejam quais forem as últimas perspectivas e os histo riadores modernos são bem menos otimistas que Marx em 1850 no presente imediato os resultados mais evidentes da conquista ocidental foram a perda de um velho mundo sem o ganho de um novo que a crescentou uma forma peculiar de melancolia à miséria presente dos hindus 9 assim como para outros povos vítimas do Oeste Os ganhos eram difíceis de se discernir neste período e as perdas demasiado evi dentes Do lado positivo havia os barcos a vapor estradas de ferro e telégrafos além de pequenos focos de intelectuais educados no Oci dente Havia comunicação material e cultural Havia também cres cimento na produção para exploração em algumas áreas embora não ainda em grandes proporções Havia uma substituição de ordem por desordem pública segurança por insegurança em algumas áreas que ficaram sob controle colonial direto Mas apenas o otimismo congêni to iria argumentar que estes benefícios contrabalançavam o lado ne gativo neste período O contraste mais óbvio entre os mundos desenvolvidos e subde senvolvidos era e ainda é aquele entre pobreza e riqueza No primei ro pessoas ainda morriam de fome mas segundo o que o século XIX considerava em números pequenos digamos uma média de 500 por ano na Inglaterra Na Índia eles morriam aos milhões um em dez na população de Orissa durante a grande epidemia de fome de 186566 algo entre uma quarta parte e uma terça parte da população de Rajpu tana em 186870 três e meio milhões ou 15 da população em Ma dras um milhão ou 20 da população em Mysore durante a grande fome de 187688 a pior de todas na história da índia do século XIX 10 Na China não é fácil separar a catástrofe da fome de numerosas outras catástrofes do período mas a de 1849 parece ter custado 14 milhões de vidas enquanto outras 20 milhões devem ter morrido en tre 1854 e 186411 Partes de Java foram varridas por uma terrível fo me em 184850 O final da década de 1860 e princípios da de 1870 viram uma epidemia de fome no cinturão dos países que ia da Índia à 147 Espanha12 A população muçulmana da Argélia caiu em 20 entre 1861 e 1872 l3 A Pérsia cuja população total era estimada entre 6 e 7 milhões em meados da década de 1870 parece ter perdido entre 15 e 2 milhões na grande epidemia de fome de 18717314 É difícil dizer se a situação era pior na primeira metade do século e talvez o fosse na Índia e na China ou meramente a mesma Em qualquer caso o con traste com os países desenvolvidos no mesmo período era dramático mesmo se concedermos que como parece ser verdade para o mundo islâmico a era dos movimentos demográficos tradicionais e catastró ficos já dava lugar lentamente a um novo modelo populacional na se gunda metade do século Em resumo o principal dos povos do Terceiro Mundo não pare cia se beneficiar de forma significativa do progresso extraordinário e sem precedentes do Oeste Se eles percebiam este fato como sendo algo mais do que uma mera quebra de seus antigos modos de vida era mais comum um exemplo possível do que uma realidade O pro gresso não pertencia ao mundo que conheciam e muitos duvidavam se isso era desejável Mas aqueles que resistiram em nome da tradição foram derrotados O dia daqueles que resistiriam com as armas do progresso ainda não havia chegado Classification of Solids on the basis of Physical State Appearance of Solids Hardness Solubility of Solids Crystalline Solids Amorphous Solids Crystalline Solids Amorphous Solids 149 Oitavo Capítulo VENCEDORES Que classes e camadas da sociedade tornarseão agora os verdadeiros representantes da cultura darnosão nossos intelectuais artistas e poetas nossas personalidades criativas Ou será que tudo vai se transformar em um grande negócio como na América Jakob Burjhardt 1868711 A administração do Japão tornouse esclarecida e progressista a experi ência européia ali é aceita como um guia estrangeiros são empregados em seu serviço e os hábitos e idéias estão dando caminho para a civiliza ção ocidental Sir T Erskine May 1877 2 I Nunca portanto os europeus dominaram o mundo de forma tão completa e inquestionável como em nosso período de estudo de 1848 a 1875 Para ser mais preciso nunca brancos de origem européia do minaram com menos desafio pois o mundo da economia e do poder capitalista incluía pelo menos um estado nãoeuropeu ou melhor uma federação os Estados Unidos da América Os Estados Unidos ainda não tinham uma participação maior nas questões mundiais e portanto os estadistas europeus davamlhes apenas atenção intermi tente salvo no que envolvesse seus interesses nas duas regiões do mundo nas quais os Estados Unidos estavam diretamente interessa dos ou seja os continentes americanos e o Oceano Pacífico masv com a exceção da Inglaterra cujas perspectivas eram consisten tem ente globais nenhum outro estado estava constantemente envolvido nestas duas áreas A liberação da América Latina tinha removido to das as colônias européias de sua parte continental exceção feita às Guianas que davam aos ingleses algum açúcar aos franceses uma colônia penal para criminosos perigosos e aos holandeses uma lem brança de seus antigos laços com o Brasil As ilhas do Caribe exce tuandose a ilha de Hispaniola que consistia na república negra do Haiti e na República Dominicana finalmente emancipada da domina ção espanhola e da preponderância haitiana permaneceram posses sões coloniais da Espanha Cuba e Porto Rico Inglaterra França 150 Holanda e Dinamarca Exceto pela Espanha que desejava uma res tauração parcial de seu império americano nenhum dos estados euro peus dava muita importância a suas possessões no Caribe Somente no continente norteamericano uma importante presença européia permaneceu até 1875 a vasta mas subdesenvolvida e grandemente vazia dependência britânica do Canadá separado dos Estados Unidos por uma longa fronteira aberta uma linha reta das margens do lago Ontário até o Oceano Pacífico As áreas em disputa de cada lado des ta linha eram ajustadas pacificamente se bem que através de com plicada barganha diplomática na maioria das vezes em favor dos Estados Unidos no decorrer do século Quanto às margens asiáticas do Oceano Pacífico somente o extremo oriente russo da Sibéria a co lônia britânica de HongKong e a base na Malásia marcavam a pre sença direta das grandes potências européias embora os franceses es tivessem começando a ocupação da Indochina As relíquias do colo nialismo espanhol e português e os holandeses no que é hoje a Indo nésia não levantavam problemas internacionais A expansão territorial dos Estados Unidos não causava portanto maior alvoroço nas chancelarias européias Uma grande parte do su doeste do continente Califórnia Arizona Utah e partes do Colorado e Novo México foi cedida pelo México depois de uma guerra desas trada em 184853 A Rússia vendeu o Alaska em 1867 estes e outros antigos territórios do Oeste foram transformados em estados da União quando se tornaram suficientemente interessantes do ponto de vista econômico ou accessíveis a Califórnia em 1850 Oregon em 1859 Nevada em 1864 enquanto que no centro do país Minesota Kansas Wisconsin e Nebraska adquiriram estatuto de estado entre 1858 e 1867 Além disso as ambições territoriais americanas não iam além deste ponto embora os estados escravistas do sul desejassem uma ex pansão da sociedade escrava às grandes ilhas do Caribe e expressas sem mesmo ambições maiores em relação à América Latina O tipo básico de dominação americana era o de controle indireto já que ne nhuma potência estrangeira aparecia como um desafiante efetivamen te direto eram governos fracos e apenas nominalmente independen tes que sabiam que precisavam ficar do lado do gigante do Norte Somente no final do século durante a moda internacional do imperia lismo iriam os Estados Unidos quebrar por pouco tempo esta tradição estabelecida Pobre México iria observar o presidente Porfirio Diaz 18281915 tão longe de Deus e tão perto dos Estados Unidos e mesmo os estados latinoamericanos que se achavam mais perto do TodoPoderoso verificaram de forma cada vez mais consciente que neste mundo era sobre Washington que eles deveriam manter o olho alerta O ocasional aventureirismo norteamericano tentou estabelecer poder direto nas estreitas pontes de terra que separavam o Oceano A tlântico do Oceano Pacífico mas nada realmente ocorreu até que o canal do Panamá viesse a ser construído sendo ocupado por forças americanas em uma pequena república independente destacada para 151 esta finalidade de um grande estado sulamericano a Colômbia Mas isso seria mais tarde A maior parte do mundo e especialmente a Europa estava aten ta aos Estados Unidos porque neste período 184875 vários milhões de europeus haviam emigrado para lá e porque sua grande extensão territorial e extraordinário progresso fizeramno rapidamente o mila gre técnico do planeta Tratavase como os americanos foram os primeiros a reconhecêlo da terra dos superlativos Onde no mundo poderseia encontrar uma cidade como Chicago que tinha uns mo destos 30 mil habitantes em 1850 e veio a se tornar o sexto maior centro urbano do mundo com mais de 1 milhão de habitantes em ape nas 40 anos Ali encontravamse as maiores estradas de ferro do mundo atravessando inigualáveis distâncias em suas rotas transconti nentais e nenhum outro país excedia o total em milhas construídas 49168 em 1870 Nenhum milionário parecia mais selfmade que os dos Estados Unidos e se ainda não eram os mais ricos embora cedo viessem a ser eram pelo menos em maior número Em nenhum lu gar os jornais eram mais aventurosamente jornalísticos políticos mais corruptos nenhum país mais ilimitado em suas possibilidades A América ainda era o Novo Mundo a sociedade aberta num país aberto onde o imigrante sem um centavo podia como se acredi tava fazerse a si mesmo o selfmade man e desta forma construir uma república igualitária e democrática a única de tamanho e impor tância no mundo em 1870 A imagem dos Estados Unidos como uma alternativa revolucionária política às monarquias do Velho Mundo com sua aristocracia e sujeição era talvez mais viva que nunca pelo menos fora de suas fronteiras A imagem da América como um lugar onde a pobreza não tivesse vez de esperança pessoal através do enri quecimento individual substituiu a velha imagem européia O Novo Mundo confrontava crescentemente a Europa não como a nova soci edade mas como a sociedade dos novos ricos E dentro do Estados Unidos o sonho revolucionário estava lon ge de desaparecer A imagem da república era a de uma terra de i gualdade democracia talvez de liberdade anárquica oportunidade i limitada tudo isto mais tarde sendo chamado de destino manifesto da nação Ninguém pode ter uma idéia correta dos Estados Unidos no século XIX ou em relação a esta específica questão no século XX sem apreciar este componente utópico embora obscurecido de forma cada vez maior e transformado num dinamismo econômico e tecnoló gico complacente exceto em momentos de crise Era por origem uma utopia agrária de fazendeiros livres e independentes numa terra livre Nunca chegou a bom termo com o mundo das grandes cidades e da grande indústria e não se reconciliava com a dominação destes úl timos em nosso período Mesmo num centro tão típico da indústria americana como a cidade têxtil de Peterson Nova Jersey o ethos do comércio ainda não era dominante Durante a greve de 1877 os fa zendeiros reclamaram amargamente e com razão de que o prefeito 152 republicano os políticos democráticos a imprensa os tribunais e a opinião pública não os havia apoiado3 A grande maioria dos americanos ainda era rural em 1860 ape nas 16 vivia em cidades de mais de 8 mil habitantes A utopia rural na sua forma mais literal o solo livre podia mobilizar mais poder político do que nunca principalmente no seio da população crescente do meiooeste Ela contribuiu para a formação do Partido Republica no e para sua orientação antiescravista pois embora o programa de uma república sem classes de fazendeiros livres não tivesse nada a ver com a escravidão e pouco interesse no negro excluía a escravi dão Atingiu seu maior triunfo com o Homestead Act de 1862 que oferecia a qualquer filho de família americana maior de 21 anos 160 acres grátis depois de 5 anos de residência contínua ou compra por US 125 depois de seis meses Não é preciso acrescentar que esta u topia fracassou Entre 1862 e 1890 menos de 400 mil famílias se be neficiaram do Homestead Act enquanto a população como um todo cresceu em 32 milhões sendo que os estados da costa do Pacífico em mais de 10 milhões Somente as estradas de ferro que receberam so mas enormes de terras públicas para poder recuperar as perdas de construção e operação com os lucros da especulação imobiliária venderam mais terras a 5 dólares do que tudo que havia sido vendido sob o Act Os verdadeiros beneficiários da terra livre eram os especu ladores financistas e intermediários capitalistas Nas últimas décadas do século pouco se ouvia do bucólico sonho de liberdade da terra Seja qual for a forma que escolhermos para olhar a transforma ção dos Estados Unidos se o final de um sonho revolucionário ou o início de uma era o fato é tal que aconteceu na época 184875 A mi tologia em si mesma testemunha a importância desta época com os dois temas mais profundos e eternos da história americana localizados na cultura popular a Guerra Civil e o Oeste Ambos estão intimamen te interligados já que foi a abertura do Oeste ou mais exatamente su as partes sul e central que precipitou o conflito entre os estados da República entre os que representavam os colonos livres e o despontar do capitalismo do Norte e os da sociedade escravista do Sul Foi o conflito KansasNebraska de 1854 sobre a introdução do escravismo no centro do país que viria precipitar a formação do Partido Republi cano Este elegeria Abraham Lincoln 180965 presidente em 1860 um acontecimento que levaria à secessão dos Estados Confederados do Sul em 1861 Virgínia Carolinas do Norte e do Sul Geórgia A labama Flórida Mississipi Louisiana Tenessee Arkansas Alguns estados fronteiriços hesitaram mas não se separaram da União Mary land West Virgínia Kentucki Missouri e Kansas A expansão da colonização para o Oeste não era coisa nova Ti nha apenas sido dramaticamente acelerada em nosso período pelas es tradas de ferro a primeira delas tendo chegado e atravessado o Mis sissipi em 185456 e pelo desenvolvimento da Califórnia ver capí tulo 3 Depois de 1849 o Oeste cessou de ser uma espécie de fron 153 teira do infinito e tornouse um espaço vazio de planície deserto e montanha suspensos entre duas áreas em rápido desenvolvimento o Leste e a costa do Pacífico As primeiras linhas transcontinentais fo ram construídas simultaneamente para o Leste a partir do Pacífico e para o Oeste do Mississipi encontrandose em algum lugar em Utah De fato a região entre o Mississipi e a Califórnia o Oeste Selva gem permaneceu bastante vazia em nosso período diferindo do rit mo do centro já bastante populoso cultivado e mesmo industrializa do Estimavase que o total de trabalho para a instalação de fazendas na vasta área da planície no período entre 1850 e 1880 era pouco mais que o despendido para tal fim no mesmo período no sudoeste ou nos estados do Atlântico4 As pradarias a oeste do Mississipi estavam sendo lentamente co lonizadas por fazendeiros o que implicava na remoção por transfe rência forçada dos índios incluindo aqueles já transferidos por legis lação precedente e pelo massacre do búfalo sobre o que a economia dos índios repousava Sua exterminação começou em 1867 no mes mo ano em que o Congresso estabeleceu as mais importantes reservas indígenas Por volta de 1883 13 milhões haviam sido mortos As montanhas nunca se transformaram numa área importante de coloni zação agrícola Elas eram e permaneceram uma fronteira dos minei ros com uma população ávida por metais preciosos sobretudo prata dos quais o Comstock Lode em Nevada 1859 provou ser o maior Produziu 300 milhões de dólares em vinte anos fez fortunas espeta culares para uma meia dúzia de homens uma quantidade semelhante de milionários um número um pouco maior de pequenas mas expres sivas acumulações de riqueza para os padrões da época antes de desa parecer deixando atrás de si uma Virgínia City vazia povoada pelos fantasmas dos mineiros irlandeses assombrando o Union Hall e a O pera House Corridas semelhantes ocorreram em Colorado Idaho e Montana5 Demograficamente não tinham muita importância Em 1870 o Colorado admitido como estado em 1876 tinha menos do que 40 mil habitantes O sudoeste permanecia essencialmente campo isto é cowboy e terras As grandes hordas de bois uns 4 milhões entre 1865 e 1879 eram levadas no transporte ferroviário para os grandes matadouros de Chicago O tráfego deu origem portanto a estabelecimentos em Mis souri Kansas e Nebraska como Abilene e Dodge City de vivida re putação em milhares de Westerns6 O Oeste Selvagem é um mito tão poderoso que se torna difícil analisálo com algum realismo O único fato histórico mais ou menos preciso é que ele durou pouco tempo entre a Guerra Civil e o colapso da exploração mineira em 1880 A designação selvagem não era de vida aos índios que estavam prontos a viver em paz com os brancos exceto talvez no extremo sudoeste onde tribos como os Apaches 187186 e os mexicanos Yaqui 18751926 lutaram as últimas de várias guerras centenárias para manter suas respectivas independên 154 cias em relação aos brancos Era devido às instituições ou melhor à falta de instituições efetivas de governo e lei nos Estados Unidos Não haveria Oeste Selvagem no Canadá onde até as corridas do ouro eram menos anárquicas e onde os Sioux que combateram e der rotaram Custer nos Estados Unidos antes de serem massacrados ali viviam calmamente A anarquia ou para usar um termo mais neutro a paixão pela autonomia individual com armas era talvez exagerada pelo sonho de liberdade e do ouro que arrastava homens para o Oeste Para além da fronteira das fazendas de colonos e cidades não havia famílias em 1870 Virgínia City tinha dois homens para cada mulher e apenas 10 de crianças Ê verdade que o mito do Oeste degradou até este sonho O mesmo sonho de liberdades não se aplicava aos ín dios ou aos chineses que eram aproximadamente um terço da popu lação de Idaho em 1870 No sudoeste racista o Texas pertencia à Confederação certamente não se aplicava aos negros E embora muito daquilo que olhamos hoje como Western derivasse dos mexi canos que talvez tenham fornecido mais cowboys que qualquer outro grupo7 também não se aplicava a estes Era um sonho de brancos po bres que esperavam substituir a empresa privada do mundo burguês pelo jogo ouro e armas Se não há nada de muito obscuro sobre a abertura para o Oes te a natureza e as origens da Guerra Civil Americana 186165 le vam a uma discussão sem fim entre os historiadores Esta disputa gira em torno do tipo de sociedade escravista que havia nos estados do Sul e sua possível compatibilidade com o capitalismo dinâmico e em ex pansão do Norte Seria de fato uma sociedade escravista dado que os negros eram sempre uma minoria mesmo no Deep South e conside rando que a maioria dos escravos trabalhava não na clássica plantação de grandes dimensões mas num pequeno número de fazendas bran cas ou então como domésticos Não se pode negar que a escravidão era a instituição central da sociedade do Sul ou que esta questão fos se a causa principal da disputa e rompimento entre os estados do Nor te e do Sul A verdadeira questão é saber por que isto levou à seces são e à guerra civil ao invés de alguma forma de coexistência Apesar de tudo embora não houvesse dúvida de que grande parte da popula ção do Norte detestava a escravidão o abolicionismo militante por si só não era suficientemente forte para determinar a política da União E o capitalismo do Norte quaisquer que fossem os sentimentos pri vados dos homens de negócios bem poderia ter achado possível e conveniente chegar a um bom termo com o Sul escravista e explorá lo assim como os centros de negócios internacionais fazem hoje com o apartheid da África do Sul Termo genérico norteamericano que identifica a região constituída pelos estados seces sionistas durante a guerra civil NT 155 Evidentemente as sociedades escravistas incluindo a do Sul es tavam com os dias contados Nenhuma delas sobreviveu o período de 1848 a 1890 nem mesmo Cuba e Brasil ver capítulo 10 mais adian te Elas estavam isoladas fisicamente pela abolição do tráfico ne greiro que havia florescido na década de 1850 e também isoladas moralmente pelo consenso geral do liberalismo burguês que olhava as como contrárias à marcha da história moralmente indesejáveis e economicamente ineficientes É difícil imaginar a sobrevivência do Sul como uma sociedade escravista no século XX e mais ainda a so brevivência da servidão na Europa do Leste mesmo se como acredi tam algumas escolas de historiadores considerarmos ambas econo micamente viáveis como sistemas de produção Mas o que trouxe o Sul para uma situação uma crise na década de 1850 foi um problema específico a dificuldade de coexistência com um capitalismo dinâmi co no Norte e um dilúvio de migração para o Oeste Em termos puramente econômicos o Norte não estava muito pre ocupado com o Sul uma região agrária praticamente não envolvida em industrialização Tempo população recursos e produção estavam do lado do Norte As principais disputas eram políticas O Sul uma virtual semicolônia dos ingleses para os quais supria a maior parte do algodão de que a indústria inglesa necessitava achava vantajoso o mercado li vre enquanto a indústria do Norte estava firme e militantemente com prometida de longa data com tarifas protecionistas e incapaz de impô las de forma adequada por causa dos estados do Sul que representa vam é preciso lembrar quase metade dos estados em 1850 A indús tria do Norte estava certamente mais preocupada com uma nação do ponto de vista do comércio metade livre e metade protecionista do que metade escrava e metade livre O Sul fez o que pôde para compensar as vantagens do Norte ao cortálo de seu hinterland tentando desta forma estabelecer uma área de tráfego e comunicações voltada para o Sul e baseada no sistema fluvial do Mississipi ao invés de voltada para o A tlântico a leste adiantandoas desta forma na expansão para o Oeste Isso era bastante natural já que seus brancos pobres haviam de longa data explorado e aberto aquela região Mas a grande superioridade econômica do Norte significava que o Sul precisava insistir com rigidez redobrada na sua força política impor suas reivindicações nos termos mais formais por exemplo in sistindo na aceitação oficial da escravidão nos novos territórios do Oeste realçar a autonomia dos estados direitos dos estados contra o governo nacional exercer seu veto na política nacional desencorajar o desenvolvimento econômico do Norte etc De fato o Sul foi um obstáculo ao Norte quando prosseguiu com sua política expansionista em direção ao Oeste Os únicos objetivos dos sulistas eram políticos já que dado que não iria ou não poderia derrotar o Norte no jogo pró prio do desenvolvimento capitalista a corrente da história estava con tra eles Toda melhoria em transporte reforçava as ligações do Oeste com o Atlântico Basicamente o sistema de estradas de ferro corria de 156 Leste a Oeste sem nenhuma linha importante entre o Norte e Sul A lém disso os homens que povoavam o Oeste viessem do Norte ou do Sul não eram proprietários de escravos mas brancos pobres e livres atraídos pelo solo livre ouro e aventura A extensão formal da escra vidão aos novos territórios e estados era portanto crucial para o Sul e os conflitos crescentes entre os dois lados na década de 1850 giravam sobretudo em torno desta questão Ao mesmo tempo a escravidão era irrelevante para o Oeste e de fato a expansão para o Oeste talvez te nha enfraquecido o sistema escravista Não lhes dava maior força do que a que os líderes do Sul esperavam quando planejaram a anexação de Cuba e a criação de um império de plantação no Caribe do Sul Em resumo o Norte estava numa posição de unificar o continente que o Sul não tinha Agressivos em postura o recurso real dos sulistas esta vam em abandonar a luta e separarse da União e isso foi o que fi zeram quando a eleição de Abraham Lincoln de Illinois em 1860 de monstrou que haviam perdido o MeioOeste A Guerra Civil durou cinco anos Em termos de destruição e mortes era de longe a maior guerra em que qualquer país desenvol vido haviase envolvido em nosso período embora relativamente perca um pouco do brilho diante da Guerra do Paraguai na América do Sul e fique muito atrás das Guerras Taiping na China Os estados do Norte embora notavelmente inferiores em performance militar venceram por causa de sua vasta preponderância em homens capaci dade e tecnologia Afinal eles tinham mais de 70 da população total nos Estados Unidos mais de 80 dos homens em idade militar e mais de 90 da produção industrial O triunfo do Norte também era o do capitalismo americano e o dos Estados Unidos moderno Mas embora a escravidão fosse abolida não era o triunfo do Negro fosse escravo ou livre Depois de alguns anos de Reconstrução isto é democratização forçada o Sul retornou ao controle dos brancos con servadores sulistas isto é racistas As tropas de ocupação do Norte foram finalmente retiradas em 1877 Em certo sentido os sulistas ha viam atingido seus objetivos os republicanos do Norte que mantive ram o controle da presidência pela maior parte do tempo de 1860 a 1932 não podiam ganhar no Sul solidamente democrata que desta forma guardou uma autonomia substancial O Sul por outro lado a través de seu voto em bloco podia exercer alguma influência nacio nal já que seu apoio era essencial para o sucesso do outro grande par tido o Democrata De fato o Sul permaneceu agrário pobre atrasado e ressentido os brancos ressentindo a nunca esquecida derrota os ne gros a franqueza e rudeza da subordinação reimposta pelos brancos O capitalismo americano desenvolveuse com impressionante e dramática rapidez depois da Guerra Civil que talvez tenha atrasado temporariamente seu desenvolvimento embora isto também tenha fornecido consideráveis oportunidades para gigantescos homens de negócios corretamente apelidados de robber barons barões medie vais Este avanço extraordinário forma a terceira grande corrente da 157 história dos Estados Unidos em nosso período Diferente da Guerra Civil e do Oeste Selvagem a era dos Robber Barons não se tornou parte da mitologia americana exceto como componente da demono logia dos democratas e populistas mas ainda é hoje parte da realidade americana Os Robber Barons ainda são uma parte identificável no cenário dos negócios Várias tentativas têm sido feitas para defender ou reabilitar os homens que mudaram o vocabulário da língua ingle sa quando a Guerra Civil estourou a palavra millionaire ainda era escrita em caracteres italicizados mas quando o maior robber da pri meira geração Cornelius Vanderbilt morreu em 1877 sua fortuna de 100 milhões de dólares requeriu a cunhagem de um novo termo mul timillionaire Temse argumentado que muitos dos grandes capitalis tas americanos foram na realidade inovadores criativos sem os quais os triunfos da industrialização americana que eram realmente expressivos não teriam sido obtidos tão rapidamente A riqueza des tes não era portanto obtida a partir de banditismo econômico mas graças à generosidade com que a sociedade reconhecia os seus ben feitores Tais argumentos não podem ser aplicados a todos os robber barons pois até a consciência dos apologistas recua diante de escro ques tais como Jim Fisk ou Jay Gould mas seria falta de sensibilidade negar que um número de magnatas deste período realizou contribuições positivas algumas vezes importantes para o desenvolvimento da eco nomia industrial moderna ou o que não é exatamente a mesma coisa para as operações de um sistema de empresas capitalistas Porém tais argumentos estão fora do ponto principal Eles me ramente encontram outra maneira de dizer o óbvio ou melhor dizen do que os Estado Unidos do século XIX eram uma economia capita lista na qual o dinheiro uma boa quantidade de dinheiro iria ser feito entre outras formas pelo desenvolvimento e racionalização dos recursos produtivos de um país vasto e em rápido crescimento inse rido numa economia mundial em acelerada expansão Três coisas dis tinguem a era dos robber barons americanos das outras florescentes economias capitalistas do mesmo período que também produziram suas gerações de milionários às vezes igualmente ávidos A primeira característica distintiva era a total falta de qualquer forma de controle sobre trocas comerciais feitas com rudeza ou es croqueria assim como as possibilidades realmente espetaculares de corrupção em âmbito local e nacional especialmente nos anos pós Guerra Civil Praticamente não existia aquilo que se poderia chamar de governo dentro dos padrões europeus nos Estados Unidos e a margem de ação para os ricos poderosos e inescrupulosos era pratica mente ilimitada De fato a expressão robber barons deveria ter sua ênfase na segunda palavra e não na primeira pois como num reino medieval fraco os homens não olhavam para a lei mas para a sua própria força e quem era mais forte numa sociedade capitalista do que os ricos Os Estados Unidos sozinho entre os estados do mundo burguês era um país de justiça privada e forças armadas privadas 158 Entre 1850 e 1889 esquadrões Vigilante mataram 530 trangresso res da lei ou acusados de tal ou seja 6 em cada 7 de todas as vitimas da história completa deste fenômeno caracteristicamente americano que vai de 1760 a 19098 Dos 326 movimentos Vigilante registrados 230 atuaram neste período Em 1865 e 1866 toda estrada de ferro mina de carvão grande forno ou laminadora na Pensylvania recebeu autorização para empregar quantos homens armados quisesse para a gir conforme julgassem necessário embora em outros estados xerifes e outros funcionários deviam indicar formalmente os membros destas polícias privadas E foi durante este período que a mais notória destas forças particulares de detetives e pistoleiros os Pinkertons ganha ram sua sombria reputação primeiro na luta contra criminosos e de pois contra o trabalhismo A segunda característica específica desta era pioneira do big busi ness americano big money e big power era que a maior parte daqueles que o praticavam diferentes da maioria dos grandes empreendedores do Velho Mundo pareciam estar sempre obcecados pela construção tecnológica em si mesma sem se julgarem aparentemente comprome tidos com nenhuma forma especial de fazer dinheiro Tudo o que que riam era maximizar os lucros mas ocorreu que a maioria deles termi nou por conseguilo através do grande fazedor de dinheiro desta época as estradas de ferro Cornelius Vanderbilt tinha apenas uns poucos 10 ou 20 milhões de dólares antes de entrar no negócio das estradas de fer ro que lhe trouxe uns 8090 milhões de dólares em 16 anos Não é tão surpreendente já que homens da turma da Califórnia Collis P Hun tington 18211900 Leland Stanford 182493 Charles Crocker 182288 e Mark Hopkins 181378 podiam sem modéstia pagar o triplo do custo da construção da Central Pacific Railroad e escroques como Fisk e Gould podiam amealhar milhões com transações fraudu lentas e saques abertos sem colocar um único vagãodormitório sobre trilhos ou preparar a partida de uma única locomotiva Poucos dos milionários da primeira geração fizeram sua carrei ras em um único ramo de atividade Huntington começou vendendo material pesado para mineiros da corrida do ouro em Sacramento Talvez seus fregueses incluíssem o magnata da carne Philip Armour 18321901 que tentou a sorte nas minas antes de entrar no negócio de armazéns em Milwaukee que permitiulhe fazer fortuna no decor rer da Guerra Civil Jim Fisk trabalhou em circo garçom de hotel mascate e vendedor ambulante antes de descobrir as possibilidades de contratos de guerra e depois a bolsa de valores Jay Gould foi por seu turno cartógrafo e mercador de peles antes de descobrir o que se podia fazer com estradas de ferro Andrew Carnegie 18351919 não concentrou suas energias no ferro até completar 40 anos Começou como telegrafista continuou como executivo de estradas de ferro sua renda já feita através de investimentos cujo valor crescia rapida mente entrou em petróleo que iria ser o campo escolhido por John D Rockefeller que começou a vida como atendente e livreiro em O 159 hio enquanto gradualmente seguiu em direção à indústria que iria dominar Todos estes homens eram especuladores e estavam prontos para seguir em direção do dinheiro grosso onde quer que ele se en contrasse Nenhum deles tinha ou poderia ter escrúpulos de forma ex cessiva numa era e numa economia onde fraude suborno calúnia e se necessário revólveres eram aspectos normais da competição To dos eram homens duros e todos olhariam as questões concernentes à honestidade de suas atividades como sendo consideravelmente menos relevantes para seus negócios do que sua esperteza Não era por acaso que o darwinismo social explicava de forma dogmática que aque les que subiam ao topo de tudo eram os melhores porque eram os mais capazes de sobreviver na selva humana teoria que se transfor mou na teologia nacional do final do século XIX nos Estados Unidos A terceira característica dos robber barons será bem óbvia mas tem sido supervalorizada pela mitologia do capitalismo americano uma proporção considerável deles eram selfmade men e não possuíam competidores em riqueza e posição social Claro apesar da proeminên cia de vários selfmade multimilionários apenas 42 dos homens de negócios deste período que entraram no Dictionary of American Biography vinham das classes médias ou baixas Os nascidos entre 1820 e 1849 foram contados Os cálculos são de C Wright Mills Muitos vinham de famílias do comércio ou profissionais liberais Ape nas 8 da elite industrial da década de 1870 eram filhos de pais de classe operária9 Ainda para efeitos de comparação é interessante re cordar que dos 189 milionários ingleses que morreram entre 1858 e 1879 aproximadamente 70 vinham de uma descendência de pelo me nos uma geração e provavelmente várias de riqueza sendo mais de 50 deles proprietários de terras10 Evidentemente a América possuía seus Astors e Vanderbilts herdeiros de dinheiro antigo e o maior de seus financistas J P Morgan 18371913 era um banqueiro de se gunda geração cuja família tornouse rica na qualidade de uma das maiores intermediárias em trazer capital inglês para os Estados Unidos Mas o que atraía a atenção eram fato aliás bem compreensível as car reiras dos jovens que simplesmente viam a oportunidade apanhavam na e enfrentavam todos os desafios homens que estavam imbuídos a cima de tudo pelo imperativo capitalista da acumulação As oportunida des eram realmente colossais para homens preparados para seguir a ló gica da obtenção do lucro em lugar da lógica de viver e que possuíam competência suficiente energia rudeza e ambição As distrações eram mínimas Não havia uma velha nobreza para seduzir os homens com tí tulos e nem o exemplo tentador da vida descontraída de uma aristo cracia agrária A política era antes algo para se comprar do que para se praticar exceto evidentemente como outro meio de fazer dinheiro Em certo sentido portanto os robber barons sentiamse repre sentantes da América como nenhum outro grupo ou pessoa E não es tavam enganados Os nomes dos maiores milionários Morgan Roc kefeller entraram no domínio do mito e esta era a razão por que ao 160 lado de mitos de origem bem diferente pistoleiros e xerifes do Oeste eles eram provavelmente os únicos nomes de indivíduos americanos deste período com a exceção de Abraham Lincoln bem conhecidos no exterior exceto entre aqueles que diziam ter um especial interesse na história dos Estados Unidos E os grandes capitalistas impuseram seu selo ao país Antigamente escreveu o National Labor Tribune em 1874 os homens na América podiam ser seus próprios dirigen tes Ninguém podia ou devia tornarse dominador Mas agora estes sonhos não se realizam A classe operária deste país repentinamen te descobriu que o capital é tão rígido como uma monarquia absolu ta II De todos os países nãoeuropeus apenas um foi bemsucedido em encontrar e derrotar o Ocidente no terreno inimigo Este país foi o Japão para uma certa surpresa dos Observadores da época Para eles era talvez o menos conhecido de todos os países desenvolvidos já que havia sido virtualmente fechado ao contato direto com o Oeste no século XVII mantendo apenas um único ponto de mútua observação por onde os holandeses tinham recebido permissão para manter um comércio em escala restrita Em meados do século XIX o país não parecia ao Oeste diferente de qualquer outro paísoriental ou em ou tras palavras estava igualmente destinado ao atraso econômico e à in ferioridade militar para tornarse vítima do capitalismo Commodore Perry dos Estados Unidos cujas ambições no Pacífico iam bem mais longe dos interesses de seus barcos caçadores de baleias que haviam sido recentemente 1851 objeto de uma grande obra de criação ar tística da América do século XIX Moby Dick de Herman Melville forçou os japoneses à abertura de certos portos em 185354 com o método usual de ameaças navais Os ingleses e mais tarde as forças unidas ocidentais em 1862 bombardearam o Japão com frivolidade e a impunidade habituais a cidade de Kagoshima foi atacada como uma simples retaliação pelo assassinato de um único inglês Não pa recia de forma alguma que em apenas meio século o Japão seria uma potência mundial capaz de derrotar uma potência européia numa guer ra de maiores proporções usando apenas uma das mãos e que em três quartos de século estaria perto de rivalizar com a marinha inglesa me nos ainda que na década de 1970 alguns observadores esperassem o Japão ultrapassar a economia dos Estados Unidos em alguns anos Historiadores talvez tenham se surpreendido menos diante das realizações japonesas do que deveriam Eles apontaram para o fato de que de muitos ângulos o Japão embora inteiramente diferente na sua tradição cultural era surpreendentemente análogo ao Oeste na estru tura social O país possuía algo muito próximo a uma ordem feudal da 161 Europa medieval uma nobreza agrária hereditária camponeses semi servis e um corpo de mercadoresempreendedores e financistas cerca dos por um corpo incomumente ativo de artífices todos assentados numa crescente urbanização Diferente de Europa as cidades não e ram independentes nem os mercadores livre mas a crescente concen tração da nobreza os samurais nas cidades faziaos depender de forma crescente do setor nãoagrário da população e o desenvolvi mento sistemático de uma economia nacional fechada fora do mer cado externo criou um corpo de empreendedores essencial para a formação de um mercado nacional intimamente ligado ao governo Os Mitsui por exemplo ainda hoje uma das maiores forças no capi talismo japonês começaram como produtores de sakê aguardente de arroz no início do século XVII tornaramse financistas e em 1673 estabeleceramse em Edo Tóquio como lojistas fundando filiais em Kioto e Osaka Por volta de 1680 eles estavam ativamente jogados naquilo que a Europa teria chamado de mercado de ações tornando se logo depois agentes financeiros da família imperial e do Shogunate os dirigentes de facto do país assim como do diversos clãs feudais mais importantes Os Sumitomo também ainda hoje proeminentes começaram no comércio de drogas e equipamentos pesado em Kioto e logo transformaramse em grandes mercadores no comércio do co bre No final do século XVIII agiam como administradores regionais do monopólio do cobre e exploravam minas Não é impossível que o Japão deixado a si mesmo tivesse evo luído por si só na direção da economia capitalista embora a questão não possa ser jamais resolvida O que é fora de qualquer dúvida é que o Japão estava mais disposto a imitar o Oeste que muitos outros paí ses nãoeuropeus e mais capaz também de fazêlo A China era ple namente capaz de derrotar os ocidentais no próprio terreno deles pelo menos na medida em que possuía o conhecimento técnico sofistica ção intelectual educação experiência administrativa e a capacidade para o comércio requerida para a tarefa Mas a China era demasiada mente gigantesca demasiado autosuficiente demasiado acostumada a se considerar o centro da civilização para que a incursão de uma le va de perigosos e narigudos bárbaros por mais avançados tecnica mente que fossem viesse a sugerir imediatamente a liquidação e o abandono de seus antigos meios A China não queria imitar o Oeste Os homens cultos do México queriam imitar o capitalismo liberal como exemplificado pelos Estados Unidos mesmo que fosse apenas para obter um meio de resistência ao vizinho do Norte Mas o peso de uma tradição com a qual eles eram demasiadamente fracos para rom per ou destruir tornava impossível tal propósito Igreja e campesinato índio ou hispanizado num modelo medieval tudo isso era muito para eles e eles eram muito poucos A vontade era maior que a capacida de Mas o Japão possuía ambas A elite japonesa sabia que seu país era um entre muitos que confrontavam os perigos da conquista ou su jeição que já havia aliás sofrido no curso de sua longa história Era 162 mais para usar a fraseolagia européia da época uma nação poten cial do que um império ecumênico Ao mesmo tempo possuía a ca pacidade técnica e outras além do pessoal necessário para uma eco nomia do século XIX E o que talvez fosse mais importante a elite japonesa possuía um aparato de estado e uma estrutura social capazes de controlar o movimento de uma sociedade inteira Transformar o país do alto sem arriscar resistência passiva desintegração ou revolu ção é extremamente difícil Os dirigentes japoneses estavam na posição histórica excepcional de serem capazes de mobilizar o mecanismo tra dicional da obediência social para os propósitos de uma repentina radi cal mas controlada ocidentalização sem maior resistência que a de uma dissidência samurai espalhada e uma rebelião camponesa O problema de enfrentar o Oeste havia preocupado os japoneses por algumas décadas e a vitória inglesa sobre a China na primeira Guerra do Ópio 183942 demonstrou a capacidade e a possibilidade dos métodos do Ocidente Se a própria China não podia resistirlhes não estariam os ocidentais predestinados a vencer em todas as partes A descoberta do ouro na Califórnia aquele evento crucial na história do mundo em nosso período trouxe os Estados Unidos de forma de finitiva ao Pacífico colocando o Japão diretamente no centro das in vestidas ocidentais com vistas a abrir seus mercados da mesma forma que as Guerras do Ópio haviam aberto os da China A resis tência direta era inócua como o demonstraram as fracas tentativas de organizála Meras concessões e evasões diplomáticas não eram senão expedientes temporários A necessidade de reforma tanto pela ado ção das técnicas relevantes do Oeste e como através de restauração ou criação da vontade de afirmação nacional era vigorosamente de batida pelos funcionários superiores e os intelectuais Mas o que veio a ser a Restauração Meiji de 1868 isto é uma drástica revolução do alto foi o evidente fracasso do sistema militar feudalburocrático dos Shoguns em resolver a crise Em 185354 os dirigentes do país estavam divididos e em dúvida diante do que fazer Pela primeira vez o governo formalmente pediu a opinião e o conselho dos daimyo ou lordes feudais a maioria dos quais foi a favor de resistência ou con temporização Desta forma demonstravam sua inabilidade em agir de forma efetiva e suas contramedidas militares foram ineficientes e custaram o bastante para drenar as finanças e confundir o sistema administrativo do país Enquanto a burocracia revelava sua in competência e as frações dos nobres desentendiamse dentro do Sho gunate a segunda derrota da China em mais uma Guerra do Ópio 185758 sublinhou a fraqueza do Japão diante do oeste Mas as no vas concessões aos estrangeiros e a crescente desintegração da estru tura política doméstica produziu uma contrareação entre jovens inte lectuais samurais que em 186063 iniciaram contra estrangeiros e lí deres impopulares uma destas levas de terror e assassinatos que pon tuam a história japonesa Desde a década de 1840 ativistas patrióti cos tinham iniciado estudos militares e ideológicos nas províncias e 163 em algumas escolas de esgrima em Edo Tóquio onde passaram a ficar sob a influência de alguns filósofos voltando depois para suas províncias feudais han com os dois slogans Expulsar os bárbaros e venerar o Imperador Ambos os slogans eram lógicos o Japão precisava evitar cair vítima dos estrangeiros e dado o fracasso do Shogunate era natural que a atenção conservadora se voltasse para a alternativa política tradicional sobrevivente o teoricamente todo poderoso mas praticamente impotente Trono Imperial A reforma conservadora ou revolução do alto teria praticamente que tomar a forma de uma restauração do poder imperial contra Shogunate A rea ção estrangeira ao terrorismo dos extremistas como por exemplo o bombardeamento de Kagoshima pelos ingleses apenas intensificou a crise doméstica e minou o já desgastado regime Em janeiro de 1868 após a morte do velho imperador e a indicação do novo Shogun a restauração imperial foi finalmente proclamada com a força de al gumas poderosas prefeituras dissidentes e estabelecida após uma cur ta guerra civil A Restauração Meiji havia sido realizada Se isto tivesse sido apenas uma reação conservadora xenófoba teria sido comparativamente insignificante As grandes forças feudais do oeste japonês especialmente Satsuma e Choshu cujas forças der rubaram o velho sistema tradicionalmente hostilizavam a Casa de Tokugawa que monopolizava o Shogunate Nem o seu poderio nem o tradicionalismo militante dos jovens extremistas eram um programa em si e os homens que então passaram a ter a sorte do Japão nas mãos predominantemente jovens samurais em média 30 anos em 1868 não representavam as forças sociais da revolução social embo ra tivessem claramente chegado ao poder numa época em que as ten sões econômicas e sociais eram especialmente agudas e refletiam tan to em um número de levantes camponeses localizados e não muito marcadamente políticos como também a ascensão de ativistas cam poneses e de classe média Mas entre 1853 e 1868 o núcleo principal dos jovens samurais ativistas sobreviventes muitos dos mais xenófo bos morreram em ações terroristas tinha reconhecido que seu objeti vo salvar o país pedia uma ocidentalização sistemática Muitos deles em 1868 tinham contactado os estrangeiros muitos haviam viajado ao exterior Todos reconheciam que preservar implicava transformar O paralelismo entre o Japão e a Prússia tem sido freqüentemente levantado Em ambos os países o capitalismo tinha sido formalmente instituído não por revolução burguesa mas por revolução de cima efetuada por uma velha ordem aristocráticoburocrática que reconhe cia que sua sobrevivência não podia ser assegurada de outra forma Em ambos os países os regimes econômicos e políticos subseqüentes guardaram importantes características da velha ordem uma disciplina obediente e ética além do respeito que estava presente nas classes médias e mesmo no novo proletariado eventualmente ajudando o ca pitalismo a resolver os problemas da disciplina do trabalho uma forte dependência da economia de iniciativa privada em relação à ajuda e 164 supervisão do estado burocrático e um não menos persistente milita rismo que iriase tomar mais tarde um formidável poder na guerra encarnando um passional e mesmo patológico extremismo da direita política Mas há diferenças Na Alemanha a burguesia liberal era for te consciente de si mesmo como classe e uma força política indepen dente Como as revoluções de 1848 tinham demonstrado a revolu ção burguesa era uma genuína possibilidade O caminho prussiano para o capitalismo passava através de uma burguesia relutante em fa zer uma revolução burguesa e um estado Junker preparado para dar lhe muito do que ela queria sem uma revolução pelo preço da preser vação do controle político nas mãos da aristocracia agrária e da mo narquia burocrática Os Junkers não iniciaram esta mudança Eles me ramente graças a Bismarck se asseguraram de que não seriam engo lidos no processo No Japão por outro lado a iniciativa a direção e o pessoal da revolução de cima veio dos próprios setores feudais A burguesia japonesa ou seu equivalente teve uma participação apenas na medida em que a existência de uma camada de homens de negó cios e empreendedores tornava praticável a instalação de uma econo mia capitalista nos termos ocidentais A Restauração Meiji não pode ser vista em nenhum sentido real como uma revolução burguesa mesmo que abortada embora possa ser vista como equivalente fun cional de parte de uma tal revolução Isso faz com que o radicalismo das mudanças introduzidas apa reça de forma ainda mais impressionante As velhas províncias feu dais foram abolidas e substituídas por uma administração centralizada estatal que então adquiriu uma nova moeda decimal e definiu uma política financeira através da inflação de empréstimos públicos base ados num sistema bancário inspirado pelo American Federal Reserve e em 1873 de uma taxação adequada da terra Devese lembrar que em 1868 o governo central não possuía nenhuma renda independente baseandose temporariamente na ajuda das províncias feudais que i riam logo ser abolidas em empréstimos forçados e na dependência dos Tokugawa exShoguns Esta reforma financeira implicava uma reforma social radical o Regulamento da Propriedade da Terra 1873 que estabelecia compromisso individual e não comunal em relação às taxas definindo portanto direitos de propriedade individu ais com o conseqüente direito de venda Os antigos direitos feudais já em declínio no que dizia respeito à terra cultivada caíram mais a inda de importância Enquanto a alta nobreza e uns poucos samurais eminentes guardavam alguma terra em montanhas e florestas o go verno tomou posse sobre a propriedade comunal os camponeses tor naramse inquilinos de ricos proprietários de terras e os nobres e os samurais perderam sua base econômica Em troca receberam com pensação e ajuda governamental mas mesmo antes que estas provas sem ser inadequadas para muitos deles a mudança de situação tinha sido demasiado profunda Iria ainda se tornar mais drástica pela Lei do Serviço Militar de 1873 que como no modelo prussiano introdu 165 ziu o serviço militar obrigatório Sua conseqüência maior foi de fundo igualitário na medida em que abolia os últimos vestígios de separa ção e distinção de status dos samurais como classe Entretanto a re sistência tanto dos camponeses como dos samurais diante das novas medidas houve uma média de talvez 30 levantes camponeses por ano entre 1869 e 1874 e uma importante rebelião samurai em 1877 foi aniquilada sem maiores dificuldades Não era o objetivo do novo regime abolir a aristocracia e distin ções de classe embora estas últimas fossem simplificadas e moderni zadas Uma nova aristocracia tinha mesmo sido estabelecida Ao mesmo tempo a ocidentalização implicava a abolição das antigas po sições uma sociedade na qual a riqueza a cultura e a influência polí tica determinavam mais do que o nascimento trazendo portanto ge nuínas tendências igualitárias desfavoráveis para o samurai mais po bre que recusava o trabalho comum favoráveis para o povo simples que passava a ser a partir de 1870 autorizado a usar nomes de famí lia e a escolher livremente tanto a profissão como o lugar de residên cia Para os dirigentes japoneses diferentemente da sociedade ociden tal burguesa tais questões constituíam não um programa em si mas instrumentos para atingir o programa de renascimento nacional Eles eram necessários e portanto precisavam ser criados E eram também aceitáveis para os homens da velha sociedade em parte por causa da enorme carga de ideologia tradicional em servir ao estado que traziam ou mais concretamente a necessidade de reformar o estado Eles não eram bemvindos aos camponeses tradicionalistas e samurais es pecialmente aqueles para os quais o novo Japão na realidade não iria melhorar o futuro Entretanto o radicalismo das mudanças introduzi das no espaço de alguns anos por homens formados na velha socieda de e pertencentes à orgulhosa classe da aristocracia militar ainda é um fenômeno único e extraordinário A força motriz era a ocidentalização O Oeste possuía claramen te o segredo do sucesso e portanto a todo custo precisava ser imita do A perspectiva de tomar de roldão todos os valores e instituições de uma outra sociedade era talvez menos impensável para os japone ses do que para muitas outras civilizações pois eles já haviamno ex perimentado uma vez com a China mas mesmo assim ainda era uma idéia assustadora traumática e problemática Pois ela não podia ser realizada com empréstimos provisórios seletivos ou controlados especialmente tratandose de uma sociedade tão diferente da japonesa como a ocidental Daí a exagerada paixão com a qual muitos dos par tidários da ocidentalização se atiraram à tarefa Para alguns parecia implicar no abandono de tudo aquilo que fosse japonês já que todo o passado era necessariamente atrasado e bárbaro a simplificação ou talvez mesmo o abandono da língua japonesa a renovação da origem genética inferior japonesa pela miscigenação com a origem genética ocidental superior uma sugestão baseada na recémdigerida teoria do racismo socialdarwinista que tinha aliás apoio nas altas esferas 166 do país l2 Surgiam costumes e cortes de cabelo ocidentais hábitos a limentares os japoneses não comiam carne eram adotados com o mesmo zelo que a tecnologia estilo arquitetônico e idéias ocidentais 13 A ocidentalização não iria implicar até na adoção de ideologias que eram fundamentais ao progresso ocidental incluindo mesmo o cristia nismo Não implicaria também no abandono de todas as antigas insti tuições incluindo o imperador Por outro lado a ocidentalização iria colocar um dilema ainda maior já que o Ocidente não era um único sistema coerente mas um complexo de idéias e instituições rivais Quais delas iriam os japone ses escolher Em termos práticos a escolha não era difícil O modelo inglês servia naturalmente como um guia para estradas de ferro telé grafo obras públicas indústria têxtil e muito dos métodos de comér cio O modelo francês inspirava a reforma legal e inicialmente a re forma militar até que o modelo prussiano veio a prevalecer a Mari nha evidentemente seguiu o exemplo inglês As universidades devi am muito ao exemplo alemão e americano e a educação primária a inovação na agricultura e os serviços postais aos Estados Unidos Por volta de 187576 cerca de 500 a 600 especialistas estrangeiros e mais tarde em 1890 3 mil aproximadamente estavam empregados sob supervisão japonesa Mas politicamente e ideologicamente a es colha era mais difícil Como iria o Japão escolher entre os sistemas rivais dos estados burguesesliberais França e Inglaterra e a mo narquia prussianogermânica mais autoritária Acima de tudo como iria escolher entre o Ocidente Intelectual representado pelos missio nários que tinham um grande e surpreendente apelo entre os desori entados samurais prontos para transferir sua lealdade tradicional de um senhor de Terra para um senhor nos Céus e o Ocidente represen tado pela ciência agnóstica Herbert Spencer e Charles Darwin Ou entre as escolas religiosas e laicas No espaço de duas décadas apareceu uma reação contra os ex tremos da ocidentalização parcialmente com a ajuda da tradição crí tica ocidental do liberalismo como a alemã que ajudou a inspirar a constituição de 1889 em grande parte uma reação neotradicionalista que iria virtualmente inventar uma nova religião do estado centrada no culto ao imperador o culto Shinto Foi esta combinação de neo tradicionalismo e modernização seletiva como exemplificada pelo é dito imperial educacional de 1890 que prevaleceu Mas as tensões entre aqueles para os quais a ocidentalização implicava revolução fundamental e os outros para quem significava apenas um Japão forte permaneceram sem solução A revolução não iria ocorrer mas a transformação do Japão num formidável poder moderno tornouse re alidade Economicamente as realizações do Japão permaneceram mo destas na década de 1870 baseadas quase que inteiramente numa e conomia de mercantilismo de estado que contrastava de forma estra nha com a ideologia oficial de liberalismo econômico As atividades 167 militares do novo exército eram ainda dirigidas inteiramente contra os recalcitrantes inimigos do velho Japão e em 1873 planejouse uma guerra contra a Coréia evitada apenas porque os membros mais sen síveis do Meiji acreditavam que a transformação interna deveria pre ceder a aventura externa Portanto o Oeste continuava a subestimar a significação da transformação do Japão Observadores ocidentais não conseguiam entender este estranho país Alguns quase nada viam nele além de um esteticismo exótico e cativante e mulheres elegantes e subservientes que confirmavam tão diretamente a superioridade masculina e assim pensavase ociden tal a terra de Pinkerton e Madame Butterfly Outros estavam tão convencidos da inferioridade nãoocidental que simplesmente não vi am nada relevante Os japoneses são uma raça alegre e ficam con tentes com pouco não parecendo capazes de realizar muito escreveu o Japan Herald em 188114 Até o final da Segunda Guerra Mundial a crença que do ponto de vista tecnológico os japoneses só podiam produzir imitações baratas dos produtos ocidentais fazia parte da mi tologia ocidental Porém já havia alguns observadores mais capazes muitos deles americanos que observavam a impressionante eficiên cia da agricultura japonesa as técnicas dos artesãos a potencialidade dos soldados Já em 1878 um general americano previu que graças a eles o país estava destinado a assumir uma parte importante da histó ria mundial 15 Logo que os japoneses provaram que podiam vencer guerras as idéias dos ocidentais sobre eles tornaramse bem menos satisfatórias Mas no final de nosso período eles ainda eram vistos como a prova viva de que a civilização ocidental burguesa estava tri unfante e era superior a todas as outras e nesta época mesmo os ja poneses bem instruídos não teriam discordado Addictive coculture of human keratinocytes and human dermal fibroblasts 169 Nono Capítulo A SOCIEDADE EM PROCESSO DE MUDANÇA De acordo com os comunistas De cada um de acordo com suas capa cidades para cada um de acordo com suas necessidades Em outras palavras ninguém deve lucrar por sua própria força capacidade ou indústria mas devese submeter às vontades dos fracos estúpidos e vadios Sir Thomas Erskine May 1877 O governo está passando das mãos daqueles que possuem alguma coi sa para as mãos daqueles que não possuem nada das mãos daqueles com um interesse material na preservação da sociedade para aqueles que não se preocupam de nenhuma maneira com a ordem estabilidade e conservação Talvez na grande lei da mudança na Terra para nos sas sociedades modernas os trabalhadores são o que os bárbaros fo ram para as sociedades da antigüidade os agentes convulsivos da dis solução e destruição Os Gongourts durante a Comuna de Paris Assim como o capitalismo e a sociedade burguesa triunfaram os projetos que lhes eram alternativos recuaram apesar do apareci mento da política popular e dos movimentos trabalhistas Estes proje tos não poderiam parecer menos promissores do que em 187273 Po rém em poucos anos apenas o futuro daquela sociedade que havia triunfado tão espetacularmente mais uma vez parecia incerto e obscu ro e movimentos destinados a substituíla ou derrubála novamente precisavam ser levados a sério Precisamos portanto considerar ago ra estes movimentos de mudança social e política radicais na forma em que eles existiram no terço final do século XIX Isto não é apenas escrever história com a capacidade de saber previamente o que vai ocorrer mais tarde embora não haja uma boa razão por que o histori ador deva despojarse de sua capacidade mais importante em troca da qual qualquer inventor daria seus olhos e dentes ou seja o conheci mento do que de fato acontecerá depois E também escrever história 170 como os da época a viam Os ricos e poderosos raramente são tão confiantes em si mesmos que não temam um fim da sua dominação E o que é mais importante a lembrança da revolução ainda estava perto e era forte Qualquer pessoa de 40 anos em 1868 tinha vivido a maior das revoluções européias ainda adolescente Qualquer pessoa com 50 anos havia vivido as revoluções de 1830 como criança e as de 1848 como adulto Italianos espanhóis poloneses e outros haviam vivido insurreições revoluções ou eventos com um forte componente insur reicional como o movimento de liberação de Garibaldi no Sul da Itá lia no decorrer dos últimos 15 anos Não devemos ficar surpresos de que o medo ou a esperança da revolução fossem fortes e vivos Agora sabemos que não iriam ser de maior conseqüência nos anos após 1848 De fato escrever sobre a revolução social nestas dé cadas é semelhante a escrever sobre serpentes na Inglaterra elas exis tem mas não como uma parcela significativa da fauna A revolução européia tão próxima talvez tão real no grande ano de esperança e desapontamento desapareceu de vista Marx e Engels tinham co mo sabemos depositado esperanças no seu reaparecimento nos anos imediatamente subseqüentes Eles olharam seriamente para uma nova explosão geral em seqüência à e conseqüência da grande depressão global econômica de 1857 Quando isto não aconteceu eles não a es peraram mais num futuro previsível e certamente não mais na forma de um outro 1848 É naturalmente bastante errôneo supor que Marx transformarase numa espécie de socialdemocrata gradualista no sentido moderno do termo ou mesmo que esperasse que a transição para o socialismo quando viesse a ocorrer se desse pacificamente Mesmo nos países onde os trabalhadores pudessem se tornar capazes de tomar o poder pacificamente através da vitória eleitoral ele men cionou os Estados Unidos Inglaterra e talvez a Holanda esta tomada do poder e a subseqüente destruição da velha política e das institui ções que ele via como essencial iria provavelmente pensava levar a uma violenta resistência por parte dos antigos dirigentes E nisso ele era sem dúvida bastante realista Governos e classes dirigentes pode riam estar prontos a aceitar um governo trabalhista que não ameaças se sua dominação mas não havia razão para supor especialmente de pois da sanguinária supressão da Comuna de Paris que eles estives sem preparados a aceitar um que o fizesse Entretanto as perspectivas de revolução e não apenas a socia listas nos países desenvolvidos da Europa não eram mais um assunto da prática política e como já vimos Marx descartavaas mesmo na França O futuro imediato dos países capitalistas europeus residia na organização de partidos da classe operária independentes e de massa cujas demandas políticas a curto prazo não eram revolucionárias Quando Marx ditou o programa dos socialdemocratas alemães Go tha 1875 para um entrevistador americano ele deixou de lado a úni ca cláusula que entrevia um futuro socialista o estabelecimento de cooperativas de produção socialistasob o controle democrático da 171 classe operária como uma mera concessão tática aos lassalleanos O socialismo ele observou será o resultado do movimento Mas isto será uma questão de tempo educação e do desenvolvimento de novas formas de sociedade3 Este futuro remoto e imprevisível poderia ser significativamente adiantado mais pelo desenvolvimento nas margens do que no centro da sociedade burguesa A partir do final da década de 1860 Marx co meçou seriamente a conceber a estratégia de uma perspectiva indireta para a derrubada da sociedade burguesa por três vias duas das quais se tornariam proféticas e uma errada revolução colonial Rússia e os Estados Unidos A primeira destas tornouse parte de seus cálculos a través do surgimento do movimento revolucionário irlandês ver capí tulo 5 mais acima A Inglaterra era então decisiva para o futuro da revolução proletária porque era a metrópole do capital o dirigente do mercado mundial e ao mesmo tempo o único país onde as condi ções materiais de tal revolução tinhamse desenvolvido até um certo grau de maturidade Portanto o objetivo principal da Internacional precisava ser o de acelerar a revolução inglesa e a única forma de fa zêlo era conseguir a independência irlandesa A revolução irlandesa ou de forma mais geral a revolução dos povos oprimidos era vista não apenas por si mesma mas como um possível impulsionador da revolução nos países burgueses centrais coma o calcanhar de Aquiles do capitalismo metropolitano O papel reservado à Rússia era talvez mais ambicioso A partir da década de 1860 como veremos uma revolução russa não era ape nas uma possibilidade mas uma probabilidade talvez mesmo uma certeza Mas enquanto em 1848 tal contingência seria bem recebida apenas na medida em que removeria uma grande pedra do caminho da vitória de uma revolução ocidental agora tornavase significativa por si mesma Uma revolução russa poderia de fato dar o sinal para uma revolução proletária no Ocidente de tal forma que ambas se complementariam como Marx e Engels colocaram no prefácio de uma nova edição russa do Manifesto Comunista5 Mais ainda pode ria concebivelmente embora Marx nunca se tenha claramente com prometido com esta hipótese levar a uma transição direta da Rússia de um comunalismo de aldeias a um desenvolvimento comunista passando por cima do desenvolvimento de um capitalismo maduro Como Marx previu de forma correta uma Rússia revolucionária mu daria as perspectivas de revolução em todos os lugares O papel reservado aos Estados Unidos era menos central Seu maior efeito era negativo alquebrar por força de seu desenvolvimen to maciço o monopólio industrial da Europa Ocidental e em particu lar da Inglaterra e abalar por força também de sua exportação agrí cola as bases da grande e pequena propriedade agrária na Europa Es ta era sem dúvida uma afirmação correta Mas iria contribuir positi vamente para o triunfo da revolução Na década de 1870 Márx e En gels esperavam realisticamente uma crise no sistema político dos Es 172 tados Unidos já que a crise agrária iria enfraquecer os fazendeiros a base de toda a Constituição e o crescente domínio da política por parte dos especuladores e grandes empresários iria provocar um sen timento de repulsa entre os cidadãos Também sublinhavam as ten dências para a formação de um movimento proletário de massa Tal vez não esperassem muito destas tendências embora Marx expressas se algum otimismo nos Estados Unidos o povo é mais resoluto que na Europatudo amadurece mais rapidamente6 Portanto estavam enganados ao considerar os Estados Unidos e a Rússia como os dois grandes países que haviam sido omitidos do Manifesto Comunista o desenvolvimento futuro de ambos iria ser bem diferente As idéias de Marx carregam o peso de seus triunfos póstumos No seu tempo elas não representavam uma força política séria embo ra por volta de 1875 dois sintomas de sua subseqüente influência já fossem visíveis um poderoso Partido Social Democrata Alemão e uma penetração dramática de suas idéias inesperado para ele mas não retrospectivamente na intelligentzia russa ver mais adiante nes te mesmo capítulo No final da década de 1860 e começos da de 1870 o doutor vermelho era algumas vezes acusado de ser respon sável pelas atividades da Internacional ver capítulo 6 da qual ele era sem dúvida a figura mais formidável e a eminência parda Entre tanto como já vimos a Internacional não era de forma alguma um movimento marxista ou mesmo um movimento que contivesse mais do que um punhado de seguidores de Marx a maioria deles alemães emigres de sua própria geração Consistia de uma série de grupos es querdistas unidos basicamente e talvez exclusivamente pelo fato de que todos pretendiam organizar os trabalhadores e com substancial sucesso embora nem sempre Suas idéias representavam os remanes centes de 1848 ou mesmo de 1789 transformadas entre 1830 e 1848 algumas antecipações do reformismo trabalhista e uma subvariedade peculiar de sonho revolucionário o anarquismo Em certo sentido todas as teorias de revolução eram naquele tempo e tinham de ser tentativas de se chegar a um bom termo com a experiência de 1848 Isso se aplica tanto a Marx como a Bakunin à Comuna de Paris e aos populistas russos que discutiremos mais adi ante Alguém poderia dizer que todos vinham do fermento dos anos 183048 não tivesse uma das cores pré48 desaparecido para sempre do espectro da esquerda o socialismo utópico As correntes utópicas maiores haviam cessado de existir enquanto tais O saintsimonismo tinha cortado suas ligações com a esquerda Haviase transformado no Positivismo de Augusto Comte 17981857 e numa juvenil ex periência levada a termo por um grupo de capitalistas aventureiros na maioria franceses Os seguidores de Robert Owen 17711858 ti nham voltado suas energias intelectuais para o espiritualismo e o lai cismo e suas energias práticas para o modesto campo das lojas coo perativas Fourier Cabet e outros inspiradores das comunidades co munistas sobretudo na terra da liberdade e das oportunidades extra 173 ordinárias foram esquecidos O slogan de Horace Greeley 181172 Vá para o Oeste jovem provou ser mais bemsucedido que os de Fourier O socialismo utópico não sobreviveu a 1848 Por outro lado o produto da Grande Revolução Francesa sobre viveu Este produto ia dos republicanos radicais democratas às vezes enfatizando a libertação nacional outras o interesse em problemas so ciais aos jacobinos comunistas com o selo de L A Blanqui que apa recia breve e intermitentemente da prisão quando uma revolução na França o libertava provisoriamente Esta esquerda tradicional não ha via aprendido nada Alguns de seus extremistas na Comuna de Paris não podiam pensar em nada de melhor do que reproduzir exatamente os acontecimentos da Grande Revolução O blanquismo organizado de forma determinada e conspiratória sobreviveu na França e teve um papel crucial na Comuna mas seria seu canto do cisne Nunca mais iria ter um papel de importância significativa e perderseia nas tendências contraditórias do novo movimento socialista francês O radicalismo democrático era mais resistente porque seu pro grama apresentava tanto uma expressão genuína das aspirações do homem comum lojistas professores camponeses um componen te essencial das aspirações dos trabalhadores como um slogan conve niente para os políticos liberais que pediam seus votos Liberdade i gualdade e fraternidade podem não ser slogans muito precisos mas as pessoas pobres e modestas confrontadas com os ricos e poderosos sa biam seu significado Quando o programa oficial do radicalismo de mocrático foi realizado numa república com base no sufrágio univer sal igual e incondicional como nos Estados Unidos a necessidade do povo em exercer poder real contra os ricos e corruptos manteve a paixão democrática bem viva Mas é claro o radicalismo democráti co era uma realidade em poucos lugares mesmo no campo modesto do governo local E ainda neste período a democracia radical não era mais um s logan revolucionário em si mas um meio não automático para atin gir um fim A república revolucionária era a república social a de mocracia revolucionária a democracia social título adotado de forma crescente pelos partidos marxistas Isto não era tão óbvio entre os nacionalistas revolucionários como os mazzinistas na Itália já que o vencedor da independência e da unificação numa base de republi canismo democrático iria eles acreditavam resolver de alguma for ma todos os outros problemas O nacionalismo real era automatica mente democrático e social e se não o fosse não era real Mas mes mo os mazzinistas não negavam a libertação social e Garibaldi decla ravase mesmo um socialista qualquer que fosse o seu entendimento do termo Depois dos desapontamentos da unificação ou republica nismo os dirigentes do novo movimento socialista iriam surgir dentre os antigos republicanos radicais O anarquismo embora podendo ter sua origem traçada no fer mento revolucionário da década de 1840 é muito mais claramente um 174 produto do período posterior a 1848 ou mais precisamente da década de 1860 Seus dois fundadores políticos eram P J Proudhon um francês pintor autodidata além de volumoso escritor que praticamen te não tomou parte em nenhuma agitação política e Miguel Bakunin um peripatético aristocrata russo que se jogava na agitação em todas as oportunidades que aparecessem Um pedigree intelectual para o anarquismo poderia ser realmente desenhado mas tem pouco a ver com o desenvolvimento do atual movimento anarquista Ambos des de cedo atraíram a desfavorável atenção de Marx e embora admi randoo despertaram sua hostilidade A teoria assistemática precon ceituosa e profundamente nãoliberal de Proudhon ele era antifemi nista e antisemita tendo seguidores na extrema direita não tem grande interesse em si mesma mas contribuiu com dois temas do pensamento anarquista uma crença em pequenos grupos de ajuda mú tua formados de produtores ao invés de fábricas desumanizadas e um ódio a governos em si mesmos a qualquer governo Este era um apelo profundo a pequenos artesãos independentes trabalhadores especiali zados autônomos que resistiam à proletarização homens que não havi am esquecido uma infância camponesa ou provinciana nas regiões às margens do industrialismo desenvolvido Era a estes homens e em tais regiões que o anarquismo tinha força de apelo mais forte entre os relo joeiros suíços da Federação de Jura iriase encontrar as origens dos mais devotados anarquistas da Primeira Internacional Bakunin acrescentou pouco a Proudhon como pensador exceto uma indiscutível paixão pela revolução imediata a paixão da des truição dizia é simultaneamente uma paixão criadora um peri goso entusiasmo pelo potencial revolucionário de criminosos e margi nais da sociedade aliado a algumas poderosas intuições Ele não era um grande pensador mas um profeta agitador e apesar do descrédi to por parte dos anarquistas em relação à organização e disciplina onde viam a ensombrecedora presença e tirania do estado um orga nizador conspiratório formidável Nesta qualidade ele espalhou o a narquismo pela Itália Suíça e através de discípulos Espanha orga nizando também o que viria a ser a divisão da Internacional em 1870 72 E nesta qualidade ele virtualmente criou um movimento anarquis ta para os proudonistas franceses na forma de um corpo teórico onde se encontrava uma modalidade bem pouco desenvolvida de sindica lismo ajuda mútua e cooperativismo sendo que politicamente não muito revolucionário Não que o anarquismo fosse uma força maior pelo final de nosso período Mas havia estabelecido alguma base na França e Suíça francesa alguns núcleos de influência na Itália e aci ma de tudo havia feito grandes progressos na Espanha onde os arte sãos e trabalhadores da Catalunha e os trabalhadores rurais de Anda luzia receberam com prazer o novo Testamento Ali floresceu com a crença nativa de que pequenas cidades e oficinas poderiam conduzir se perfeitamente se a superestrutura do estado e os ricos fossem sim 175 plesmente removidos e que o ideal de um país constituído de cidades autônomas era facilmente realizável De fato o movimento cantonis ta durante a República Espanhola de 187374 tentou realmente reali zálo e seu principal ideólogo F Pi y Margall 18241901 iria ser adotado no panteão anarquista juntamente com Bakunin Proudhon e Herbert Spencer O anarquismo era tanto uma revolta do passado préindustrial contra o presente quanto filho do mesmo presente Rejeitava a tradi ção embora a natureza intuitiva a espontânea tanto do pensamento como do movimento forçassem a guardála talvez mesmo enfatizá la assim como a um número de elementos tradicionais tais como o antisemitismo ou mais realmente a xenofobia Ambos ocorreram em Proudhon e Bakunin Simultaneamente o anarquismo detestava de forma passional a religião e as igrejas e defendia as causas do progresso incluindo a ciência e a tecnologia da razão e talvez acima de tudo do iluminismo e da educação E já que rejeitava qualquer autoridade encontravase curiosamente convergindo para um ponto comum com o ultraindividualismo do laissezfaire burguês Ideolo gicamente Spencer que iria escrever Man Against the State era tão anarquista quanto Bakunin A única coisa que o anarquismo não con seguia prever era o futuro sobre o qual nada tinha a dizer salvo que só podia acontecer depois da revolução O anarquismo não tem grande importância política fora da Es panha e diznos respeito apenas como uma imagem distorcida do pe ríodo O movimento revolucionário mais interessante da época seria outro bem diferente o populismo russo Não era e nunca tornouse um movimento de massa e seus atos de terrorismo mais dramáticos culminando no assassinato do Tzar Alexandre II 1881 ocorreram após o fim de nosso período Mas é o ancestral tanto de uma impor tante família de movimentos nos países atrasados do século XX como do bolchevismo russo Oferece também um ligação direta entre o re volucionarismo das décadas de 1830 e 1840 e o de 1917 uma liga ção bem mais direta poderseia argumentar que a Comuna de Paris Além disso já que era um movimento composto quase que inteira mente de intelectuais num país onde praticamente toda a vida intelec tual séria era necessariamente política viria a ser imediatamente pro jetado como movimento no cenário da literatura global através dos geniais escritores da época Turgenev 17891871 e Dostoievsky 182181 Até os observadores ocidentais da época ouviram falar dos nihilistas e confundiramnos com o anarquismo de Bakunin Isto era compreensível já que este último estava presente no movimento russo assim como em todos os outros movimentos revolucionários e temporariamente foi confundido com um personagem tipicamente dostoievskiano vida e literatura estando muito próximas na Rússia o jovem advogado de crença quase que patológica no terror e na vio lência Sergei Gennadevitch Nechaev Mas o populismo russo não era de forma alguma anarquista 176 Que a Rússia deveria ter uma revolução não era questionado seriamente por ninguém na Europa desde os liberais mais moderados até a esquerda O regime político do país uma autocracia sob Nicolau I 18251855 era de forma patente um anacronismo e não podia a longo prazo resistir Mantinhase no poder pela falta de algo como uma classe média e acima de tudo pela existência de uma tradicional lealdade ou passividade de um campesinato atrasado e em grande par te servil que aceitava o domínio da nobreza porque esta era a vontade de Deus porque o Tzar representava a Santa Rússia e também por que eles eram deixados bastante a vontade e em paz para conduzir seus próprios modestos negócios através das poderosas comunidades de vila cuja existência atraiu a atenção de observadores russos e es trangeiros desde a década de 1840 Eles não estavam porém satisfei tos À parte sua pobreza e a coerção dos senhores eles nunca aceita ram o direito da nobreza à terra o camponês pertencia ao senhor mas a terra pertencia aos camponeses pois apenas eles a cultivavam Eles eram somente inativos ou incapazes de fazer alguma coisa Se aban donassem a passividade e se insurgissem as coisas ficariam difíceis para o tzar e as classes dominantes na Rússia E se sua rebelião fosse capitalizada pela esquerda ideológica e política o resultado não seria certamente uma simples repetição dos grandes levantes dos séculos XVII e XVIII os Pugachevshchina que assustaram os governantes russos mas uma revolução social Depois da guerra da Criméia uma revolução russa parecia não mais apenas desejável mas cada vez mais provável Esta era a maior inovação da década de 1860 O regime que por mais reacionário e ineficiente que pudesse parecer tinha aparecido até então como está vel e poderoso externamente imune tanto à revolução continental de 1848 como capaz de fazer marchar seus exércitos contra ela em 1849 revelavase agora internamente instável e externamente mais fraco do que parecia Suas maiores fraquezas eram políticas e econômicas e aí reformas de Alexandre II 185581 poderiam ser vistas mais como um sintoma do que remédio para estas fraquezas Na realidade como veremos no capítulo 10 seguinte a emancipação dos servos 1861 criara as condições para um campesinato revolucionário enquanto que as reformas administrativas jurídicas e outras do tzar 186470 fracassaram em remover as fraquezas da autocracia tzarista ou mes mo em compensar a aceitação tradicional que agora se encontrava ameaçada A revolução na Rússia não era mais um projeto utópico Dada a fraqueza da burguesia e naquele momento do novo proletariado industrial apenas uma camada social exígua mas articu lada existia que pudesse levar a agitação política e na década de 1860 veio a adquirir consciência própria uma associação com radica lismo político e um nome a inteltigentzia Sua própria exigüidade talvez tenha ajudado a este grupo de pessoas de educação superior a se sentir uma força coerente mesmo em 1897 os instruídos consis tiam em não mais que uns 100 mil homens e qualquer coisa acima de 177 6 mil mulheres em toda a Rússia7 Os números eram pequenos mas cresciam rapidamente Moscou em 1840 possuía pouco mais que 1200 educadores doutores advogados e pessoas ativas nas artes em geral mas por volta de 1882 já contava com 5 mil professores 2 mil doutores 500 advogados e 1500 nas artes Mas o que é significati vo em relação a eles é que não se juntavam nem à classe dos negó cios que no século XIX praticamente não requeria qualificação aca dêmica exceto na Alemanha talvez apenas um certificado de co nhecimentos sociais nem se ligavam com o maior empregador de in telectuais a burocracia Dos 333 graduados de S Petersburgo em 184850 apenas 96 entraram no serviço civil Duas coisas distinguiam a intelligentsia russa das outras cama das de intelectuais o reconhecimento enquanto grupo social especial e um radicalismo político orientado mais socialmente que nacional mente A primeira distinguiaos dos intelectuais ocidentais que eram rapidamente absorvidos na classe média predominante e na ideologia liberal ou democrática vigente Excetuandose o boêmio literário e ar tístico ver capítulo 15 mais adiante que era uma subcultura aceita ou pelo menos tolerada não havia nenhum grupo significativo de dis sidentes e a boêmia dissidente era política apenas marginalmente Mesmo as universidades tão revolucionárias em 1848 tornaramse politicamente conformistas Por que deveriam ser diferentes os inte lectuais na era do triunfo burguês A segunda característica distintiva era a diferença em relação aos intelectuais dos povos emergentes eu ropeus cujas energias políticas estavam ligadas quase que exclusiva mente ao nacionalismo isto é à luta para a construção de uma socie dade liberal burguesa própria na qual pudessem ser integrados A in telligentsia russa não podia seguir a primeira alternativa já que a Rússia não era de forma patente uma sociedade burguesa e já que o sistema tzarista havia feito mesmo do mais moderado liberalismo um slogan de revolução política As reformas do tzar Alexandre II na dé cada de 1860 libertação dos servos mudanças educacionais e jurí dicas e o estabelecimento de um certo governo local para a nobreza os zemstvos de 1864 e as cidades 1870 eram todas demasiada mente hesitantes e limitadas para mobilizar o entusiasmo potencial dos reformistas de forma permanente e de qualquer maneira esta fase de reformas durou pouco Também não seguiu a seguinte alternativa não tanto porque a Rússia já fosse uma sociedade independente ou lhe faltasse orgulho nacional mas porque os slogans do nacionalismo russo Santa Rússia panslavismo etc eram usados pelo tzar pela igreja e por tudo o que fosse reacionário O personagem de Tolstoi 18281910 em Guerra e Paz Pierre Bezuhov de certa forma o mais russo dos personagens do romance era obrigado a procurar idéias cosmopolitas mesmo a defender Napoleão o invasor porque não es tava contente com a Rússia tal como ela era e seus sobrinhos e netos espirituais a intelligentsia das décadas de 850 e 1860 iriam ser for çados a fazer o mesmo 178 Eles eram e enquanto nativos do que era par excellence o país atrasado da Europa não poderiam ser outra coisa modernizantes isto é ocidentalizantes Mas por outro lado eles não podiam ser apenas ocidentalizantes já que o liberalismo ocidental e o capitalismo da época não ofereciam um modelo viável para a Rússia seguir e porque a única força de massa potencialmente revolucionária na Rússia era o campesinato O resultado veio a ser o populismo que segurava esta contradição numa balança tensa Visto desta forma o populismo lança muita luz sobre os movimentos revolucionários do Terceiro Mundo de meados do século XX O rápido progresso do capitalismo na Rússia posterior ao período que analisamos que implicava no rá pido crescimento de um proletariado industrial organizado ul trapassaria as incertezas da era populista e o colapso da fase heróica do populismo de 1868 a 1881 e encorajaria reconsiderações teóri cas Os marxistas que surgiam das ruínas do populismo eram pelo menos em teoria ocidentalizantes puros A Rússia argumentavam i ria seguir o mesmo caminho do Ocidente gerando as mesmas forças de mudança política e social uma burguesia que iria estabelecer uma república democrática um proletariado que iria cavar a cova da quela Mas mesmo alguns marxistas cedo se tornaram conscientes durante a revolução de 1905 de que esta perspectiva era irreal A burguesia russa iria ser muito fraca para assumir seu papel histórico e o proletariado com o apoio da força irresistível do campesinato iria derrubar igualmente o tzarismo e o capitalismo russo imaturo tudo is to dirigido pelos revolucionários profissionais Os populistas eram modernizantes A Rússia de seus sonhos era nova uma Rússia de progresso educação e produção revolucionária mas socialista e não capitalista Seria baseada na mais antiga e tra dicional das instituições russas a obshchina ou vila comunal que iria tornarse ancestral direto e modelo da sociedade socialista O tempo e os intelectuais populistas da década de 1870 perguntaram a Marx cu jas teorias haviam assimilado se ele pensava que tal fosse possível e Marx lutou consigo mesmo diante desta atraente mas de acordo com suas teorias implausível proposição concluindo hesitantemente que talvez pudesse Por outro lado a Rússia precisava rejeitar as tradições da Europa ocidental incluindo as formas de seu liberalismo e doutri nas liberais porque o país não possuía tais tradições Pois mesmo aquele aspecto do populismo que possuía as ligações aparentemente mais diretas com o espírito revolucionário de 17891848 era em certo sentido diferente e novo Os homens e mulheres que agora juntavamse em conspirações secretas para derrubar o tzarismo através de insurreição e terror eram mais do que os herdeiros dos Jacobinos ou dos revolucionários profis sionais que descendiam destes últimos Eles iriam quebrar todas as li gações com a sociedade para se dedicar totalmente ao povo e à sua revolução para penetrar no seio do povo e expressar sua vontade Ha via uma intensidade nãoromântica uma totalidade de autosacrifício 179 acerca de sua dedicação que não tinha paralelo no Ocidente Eles es tavam mais próximos de Lênin que de Buonarroti E vieram encontrar a maior parte de seus membros como em muitos dos movimentos similares posteriores entre os estudantes especialmente os mais no vos e pobres que estavam entrando na universidade deixando de se limitar aos filhos da nobreza Os ativistas do novo movimento revolucionário eram de fato gente nova em lugar dos filhos da nobreza De 924 pessoas presas ou exiladas entre 1873 e 1877 apenas 279 vinham de famílias nobres 117 de funcionários nãonobres 33 de comerciantes 68 eram judeus 92 vinham daquilo que se poderia chamar melhor de pequena burguesia urbana meshchane 138 eram nominalmente camponeses presumivelmente de meios urbanos similares e não menos de 197 eram filhos de padres O número de mulheres entre eles era particular mente surpreendente Não menos de 15 dos aproximadamente 1600 propagandistas presos no período acima eram mulheres O movimento inicialmente oscilou entre um terrorismo meio anárquico de pequenos grupos sob a influência de Bakunin e Nechaev e os defensores de e ducação política de massa do povo Mas o que veio eventualmente a prevalecer foi a organização conspiratória secreta centralizada e ri gidamente disciplinada de afinidade Jacobinablanquista elitista na prática fosse qual fosse a teoria e que antecipou os bolcheviques O populismo é significativo não pelo que tenha realizado que foi praticamente nada nem pelos números que veio a mobilizar que pouco excederam a mil pessoas sua importância reside no fato de que marca o início de uma história contínua de agitação revolucionária russa que em 50 anos iria derrubar o tzarismo e instalar o primeiro regime na história mundial dedicado à construção do socialismo Eles eram sintomas da crise que entre 1848 e 1870 rapidamente e para a maioria dos observadores ocidentais inesperadamente transformou a Rússia tzarista de um dos pilares do reacionarismo mundial num gi gante claudicante certamente a ser derrubado revolucionariamente Mas eles eram mais do que isso Formaram o laboratório químico no qual as mais importantes idéias revolucionárias do século XIX iriam ser testadas combinadas e desenvolvidas Não há dúvida de que isto se deve em certa medida à boa sorte cujas razões são bem misteri osas de que o populismo tenha coincidido com uma das mais bri lhantes e impressionantes explosões de criação cultural e intelectual da história do mundo Países atrasados procurando entrar na moder nidade são geralmente copiadores e sem originalidade nas suas idéias embora nem tanto na sua prática intelectuais brasileiros e mexicanos apanharam de forma não crítica Auguste Comte intelectuais espa nhóis voltaramse neste mesmo período para um obscuro filósofo a lemão de segunda categoria do início do século XIX Karl Krause que transformaram num batalhador pelo iluminismo anticlerical A esquerda russa não estava apenas em contato com o que de melhor e mais avançado havia no pensamento da época assimilandoo estu 180 dantes em Kazan liam O Capital mesmo antes do livro ser traduzido para o russo mas imediatamente adaptava o pensamento social dos países avançados e eram reconhecidamente capazes de fazêlo Al guns de seus maiores nomes guardam uma reputação basicamente na cional N Chernishevsky 182889 V Belinsky 181148 N Do brolyubov 183661 e mesmo de certa forma o esplêndido Alexan dre Herzen 181270 Outros influenciaram o que talvez tenha se dado uma ou duas décadas depois a sociologia a antropologia e a historiografia dos países ocidentais como por exemplo P Vinogra dov 18541925 na Inglaterra V Lutchisky 18771949 e N Karei ev 18501936 na França O próprio Marx apreciou de forma imedia ta as realizações intelectuais de seus leitores russos e não apenas porque eram o seu primeiro público intelectual Até agora temos considerado os revolucionários sociais E as re voluções A maior delas em nosso período era virtualmente desco nhecida aos observadores da época e certamente sem conexão com as ideologias do Ocidente a de Taiping ver capítulo 7 As mais fre qüentes as da América Latina pareciam consistir na maioria das ve zes em pronunciamentos golpes militares ou secessões regionais que não modificavam a forma do país As européias ou eram fracas sos como a insurreição polonesa de 1863 absorvida por um libera lismo moderado ou como a conquista revolucionária da Sicília e do sul da Itália por Garibaldi em 1860 ou então de significado puramen te nacional como as revoluções espanholas de 1854 e 186874 A primeira destas revoluções espanholas era como a revolução colom biana do início da década de 1850 um efeito retardado dos aconteci mentos de 1848 O mundo ibérico estava geralmente fora do ritmo do resto da Europa A segunda pareceu a observadores da época em meio à agitação política e à Internacional pressagiar um novo round de revoluções européias Mas não haveria um novo 1848 Haveria a penas a Comuna de Paris em 1871 A Comuna de Paris era como a maior parte da história revolu cionária de nosso período importante não apenas por aquilo que rea lizou como por aquilo que anunciou era mais formidável como um símbolo de que como um fato Sua história verdadeira é obscurecida pelo mito enormemente poderoso que gerou tanto na França como através de Karl Marx no movimento socialista internacional um mi to que reverbera até hoje principalmente na República Popular da Chinal0 Ela foi extraordinária heróica dramática e trágica mas em termos concretos foi breve e na opinião da maioria dos observadores condenada um governo insurreicional de trabalhadores em uma única cidade cuja realização maior foi o fato de ser realmente um governo mesmo que durasse menos de dois meses Lênin depois de outubro de 1917 iria contar os dias até a data em que pôde triunfantemente dizer já duramos mais do que a Comuna Porém os historiadores de veriam resistir à tentação de reduzila retrospectivamente Se não chegou a ameaçar seriamente a ordem burguesa pelo menos aterrori 181 zou a todos pela sua mera existência Se na sua vida e morte foi cer cada por pânico e histeria especialmente na imprensa internacional que acusavaa de instituir o comunismo expropriar os ricos e parti lhar suas mulheres de terror massacre generalizado caos anarquia ou o que mais provocasse pesadelos nas classes respeitáveis tudo não é necessário dizer arquitetado pela Internacional Mais importan te os próprios governos sentiram a necessidade de entrar em ação contra a ameaça internacional à ordem e à civilização Excetuandose a colaboração internacional entre polícias e uma tendência vista co mo mais escandalosa ontem do que seria hoje em negar a comunar dos fugitivos o status protetor de refugiados políticos o chanceler austríaco apoiado por Bismarck homem não dado a reações de pâ nico sugeriu a formação da ContraInternacional Capitalista O me do da revolução era um fato maior na constituição da Liga dos Três Imperadores de 1873 Alemanha Áustria Rússia vista como uma nova Santa Aliança contra o radicalismo europeu que tem ameaçado todos os tronos e instituições embora o rápido declínio da Interna cional tivesse feito este objetivo menos urgente na época em que foi finalmente instituída O fato significativo sobre este nervosismo era que os governos agora temiam não a revolução social em geral mas a revolução proletária Os marxistas que viam a Comuna essencial mente como um movimento proletário estavam na berlinda dos go vernos e da opinião pública respeitável da época E de fato a Comuna era uma insurreição operária e se uma palavra descreve homens e mulheres a meio caminho entre povo e proletariado ao invés de trabalhadores de fábricas esta palavra também serviria para os ativistas dos movimentos trabalhistas em ou tros lugares neste período12 Os 36 mil comunardos aprisionados e ram um corte transversal na população trabalhadora de Paris 8 de trabalhadores de colarinho branco 7 de funcionários 10 de pe quenos lojistas e similares mas o resto esmagadoramente operários da construção civil metalurgia trabalho em geral seguidos pelos mais tradicionalmente especializados carpintaria artigos de luxo impressão tecidos que também forneciam um número despropor cional ao pessoal dirigente e evidentemente os eternos radicais sapa teiros Mas podiase dizer que a Comuna fosse uma revolução socia lista Quase que certamente sim embora seu socialismo fosse essen cialmente o sonho pré 1848 de cooperativas autônomas ou unidades corporativas de produtores agora reclamando intervenção governa mental radical e sistemática Seus resultados práticos foram mais mo destos mas isso não foi culpa sua Pois a Comuna foi um regime sitiado o filho da guerra e do cer co de Paris a resposta à capitulação O avanço dos prussianos em 1870 quebrou o pescoço do império de Napoleão III Os moderados republicanos que o derrubaram continuaram a guerra sem vontade e desistiram ao perceber que a única resistência possível implicava a mobilização revolucionária das massas um novo jacobismo e outra 182 república social Em Paris sitiada e abandonada pelo governo e pela burguesia o poder de fato havia caído nas mãos dos prefeitos dos ar rondissements distritos e da Guarda Nacional isto é na prática os setores populares e operários A tentativa de desarmar a Guarda Na cional depois da capitulação que provocou a revolução tomou a forma de uma organização municipal independente de Paris a Co muna Mas a Comuna foi quase que imediatamente sitiada pelo go verno nacional então localizado em Versalhes o exército vitorioso alemão que cercava Paris contendose para não intervir Os dois me ses da Comuna foram um período praticamente de guerra contínua contra as esmagadoras forças de Versalhes quase duas semanas de pois de sua proclamação em 18 de março havia perdido a iniciativa Por volta de 21 de maio o inimigo havia entrado em Paris e a semana final meramente demonstrou que o povo trabalhador de Paris podia morrer tão arduamente como havia vivido Os de Versalhes talvez te nham perdido 1100 em mortos e desaparecidos e a Comuna talvez tenha executado uma centena de reféns Quem saberá dizer quantos comunardos foram mortos durante a luta Milhares foram massacrados posteriormente os de Versalhes admitiram 17 mil mas este número não pode ser mais do que a meta de da verdade Mais de 43 mil foram feitos prisioneiros 10 mil foram sentenciados dos quais pelo menos metade foi enviada para o exílio penal na Nova Caledônia o resto para a prisão Esta era a vingança do povo respeitável Daquele momento em diante um rio de sangue correu entre os trabalhadores de Paris e as classes melhores E daí em diante também os revolucionários sociais aprenderam o que os esperava se não conseguissem manter o poder Terceira Parte RESULTADOS Effects of iodine concentration variation on the skin and liver of Balbc mice 185 Décimo Capítulo A TERRA Assim que o índio passar a ganhar três reales por dia não irá trabalhar mais do que a metade da semana pois então estará recebendo os mes mos nove reales que recebe atualmente Quando você tiver mudado tudo terá voltado à estaca zero a liberdade aquela verdadeira liberdade que não quer nem taxas nem regulamentos nem medidas para desenvolver a agricultura aquele maravilhoso laissezfaire que é a última palavra em economia política Um proprietário de terras mexicano 18651 O preconceito que existia contra todas as classes populares ainda existe em relação aos camponeses Eles não recebem a educação da classe mé dia daí suas diferenças a falta de consideração pelos seus compatriotas o vigoroso desejo de escapar da opressão deste desdém geral Daí por tanto a decadência dos velhos costumes a corrupção e a deterioração de nossa raça Um jornal de Mantua 1856 2 I Em 1848 a população do mundo mesmo da Europa ainda con sistia sobretudo de homens do campo Mesmo na Inglaterra a primei ra economia industrial a cidade não era mais numerosa do que o campo até 1851 e neste ano ultrapassavao por pouco 51 Em ne nhum outro lugar exceto França Bélgica Saxônia Prússia e Estados Unidos mais de 1 da população vivia em cidades de 10 mil ou mais habitantes Por meados e pelo final da década de 1870 a situação ha via substancialmente se modificado mas com algumas poucas exce ções a população rural ainda prevalecia em grande número sobre a urbana Portanto de longe a maior parte da humanidade e os destinos da vida ainda dependiam do que acontecesse na e com a terra O que acontecesse na terra por sua vez dependia de fatores e conômicos técnicos e demográficos que consideradas todas as pecu liaridades locais operavam em escala mundial ou pelo menos em grandes zonas geográficoclimáticas assim como de fatores institu cionais sociais políticos legais etc que diferiam de forma profunda 186 entre si mesmo quando as linhas gerais do desenvolvimento mundial operavam através deles Geograficamente as planícies norte americanas os pampas sulamericanos as estepes do sul da Rússia e da Hungria eram passíveis de comparação grandes campos em zonas mais ou menos temperadas adequadas ao cultivo em larga escala de cereais Todas elas desenvolveram o que era do ponto de vista da e conomia mundial o mesmo tipo de agricultura tornandose grandes exportadoras de trigo Mas do ponto de vista social político e legal havia uma grande diferença entre as planícies norteamericanas de socupadas em grande parte exceção feita a algumas tribos indígenas que viviam da caça e as européias já ocupadas em pequena escala por uma população voltada para a agricultura entre os fazendeiros li vres do Novo Mundo e os camponeses servos do Velho Mundo entre as formas de libertação camponesa depois de 1848 na Hungria e as formas subseqüentes na Rússia entre os grandes ranchos da Argenti na e entre os nobres senhores da terra na Europa oriental entre os sis temas legais a administração e as políticas da terra dos vários países em questão Para o historiador é igualmente ilegítimo olhar apenas o que tinham em comum sem ver aquilo em que se diferenciavam O que uma parte crescente da agricultura tinha em comum por todo o mundo era uma sujeição à economia industrial mundial Suas demandas multiplicavam o mercado comercial para produtos agríco las a maior parte alimentos e matériasprimas para a indústria as sim como alguns produtos industriais de menor importância tanto internamente através do rápido crescimento das cidades como inter nacionalmente Sua tecnologia tornava possível trazer regiões outrora inaccessíveis de forma efetiva para as fronteiras maiores do mercado mundial através da estrada de ferro e do vapor As convulsões sociais que sucederam a transferência da agricultura para um modelo capita lista ou pelo menos comercializado em larga escala fizeram com que os homens perdessem os laços tradicionais com a terra de seus ances trais especialmente quando estes descobriram que não ganhavam pra ticamente nada dela ou pelo menos muito pouco para manterem suas famílias Simultaneamente a demanda insaciável de trabalho por par te das novas indústrias e ocupações urbanas a diferença crescente en tre o campo atrasado e a cidade avançada com seus estabelecimentos industriais atraíamnos de qualquer maneira Em nosso período ve mos o crescimento enorme e simultâneo do comércio dos produtores agrícolas uma extensão impressionante das áreas sob uso agrícola e pelo menos nos países afetados diretamente pelo desenvolvimento ca pitalista mundial uma grande debandada da terra Por duas razões este processo tornouse particularmente maciço durante nosso período de estudo Ambos são aspectos do extraordiná rio crescimento e aprofundamento da economia mundial que forma o tema básico da história desta época A tecnologia tornou possível a abertura de áreas geograficamente remotas ou inaccessíveis à produ ção para exportação mais especialmente as planícies do centro dos 187 Estados Unidos e do sudeste russo Em 184453 a Rússia exportou a nualmente cerca de 115 milhões de hectolitros de trigo e na segunda metade da década de 1870 entre 47 e 89 milhões Os Estados Unidos que haviam exportado pouco na década de 1840 uns 5 milhões de hectolitros agora vendiam para o exterior mais de 100 milhões 3 Si multaneamente encontramos as primeiras tentativas para desenvolver algumas áreas do alémmar como produtores especializados em certos produtos para o mundo desenvolvido indigo e juta em Bengala ta baco na Colômbia café no Brasil e Venezuela sem falar no algodão do Egito etc Estes substituíam ou suplementavam os produtos de expor tação tradicional do mesmo tipo o açúcar do Caribe e o Brasil o al godão dos estados sulistas da América cujo tráfico tinha sido paralisa do pela Guerra Civil de 186165 No todo com algumas exceções como o algodão egípcio e a juta indiana estas especializações econô micas provaram ser provisórias ou então onde permanentes não se desenvolveram em escala comparável à do século XX Este último mo delo de agricultura de mercado mundial não se estabeleceu antes do pe ríodo de economia mundial imperialista de 18701930 Produtos de rá pida expansão subiam e caíam as áreas que forneciam o local de tais exportações em nosso período mais tarde estagnariam ou seriam aban donadas Portanto se o Brasil era o maior produtor de café o estado de São Paulo identificado de forma predominante com este produto em nosso século representava naquela época apenas uma quarta parte da produção do Rio e uma quinta parte de todo o país Portanto um comércio internacional de produtos agrícolas esta va agora sendo normalmente por razões óbvias levado a extremas especializações ou mesmo à monocultura nas regiões de exportação A tecnologia tornavao possível pois afinal os grandes meios de transportes através de grandes distâncias praticamente não existiam antes da década de 1840 Simultaneamente a tecnologia acompanha va visivelmente a demanda ou esperava mesmo antecipála Isto era mais evidente nas planícies selvagens do sudoeste americano e em vários lugares da América do Sul onde o gado multiplicavase virtu almente sem esforço humano acompanhado por gaúchos llaneros vaqueiros e cowboys e atraía a atenção de todos os fazedores de di nheiro que viam nisso um meio de enriquecer O Texas levou alguns animais para Nova Orleães e depois de 1849 para a Califórnia mas era a promessa do grande mercado do Norte que apressava os donos de ranchos em explorar estes longos caminhos que se tornaram parte do romance do Oeste Selvagem ligando o remoto sudoeste com as estradas de ferro mais próximas e através delas com o gigantesco centro que era Chicago cujos matadouros foram abertos em 1865 Os animais eram transportados em dezenas de milhares antes da Guerra Civil em centenas de milhares nos 20 anos seguintes até que a inau guração da rede ferroviária completa trouxe o clássico período do O este Selvagem que era essencialmente uma economia de pecuária a um fim na década de 1880 Entretanto um outro método de utilizar a 188 pecuária já estava sendo explorado a preservação da carne através dos métodos tradicionais de salgar e secar por alguma forma de con centração os extratos de liebig começaram a ser produzidos em 1863 por enlatamento e finalmente pela solução decisiva da refrigeração Portanto embora Boston recebesse alguma carne congelada no final da década de 1860 e Londres alguma da Austrália a partir de 1865 este tipo de comércio não se desenvolveu de fato até o final de nosso perío do Não é acidental que os dois grandes pioneiros americanos Swift e Armour não tenham se estabelecido em Chicago antes de 1875 O elemento dinâmico no desenvolvimento agrícola era portanto a demanda a crescente demanda por alimentos por parte das regiões ur banas e industriais do mundo a crescente demanda destes mesmos se tores por trabalho e como ligação entre dois a economia de rápida ex pansão que fez crescer o consumo básico das massas e portanto sua demanda per capita Pois com a construção de uma genuína economia global capitalista novos mercados surgiram do nada como notaram Marx e Engels enquanto os mais antigos cresceram dramaticamente Pela primeira vez desde a Revolução Industrial a capacidade da nova economia capitalista em proporcionar emprego emparelhouse com a capacidade de multiplicar a produção ver capítulo 12 mais adiante Em conseqüência para tomar um exemplo o consumo de chá per ca pita da Inglaterra triplicou entre 1844 e 1876 e o consumo de açúcar per capita cresceu de 17 para 60 libras neste mesmo período4 A agricultura mundial dividiase de forma crescente em duas partes uma dominada pelo mercado capitalista nacional ou interna cional a outra grandemente dependente dele Isto não significa que nada fosse comprado ou vendido no setor independente embora seja provável que uma boa proporção do produto da agricultura campone sa fosse consumida pelos próprios camponeses ou comerciada dentro dos estreitos limites de um sistema local de trocas Porém há uma di ferença substancial entre o tipo de economia agrícola na qual as ven das para fora são marginais ou opcionais e o tipo em que as riquezas dependem deste mercado externo para colocar de outra forma entre aqueles perseguidores pelo espectro de uma má colheita e uma subse qüente epidemia de fome e aqueles perseguidos pelo oposto de tudo isso a superprodução ou a súbita competição e um colapso nos pre ços Pela década de 1870 uma parte suficiente da agricultura mundial estava na segunda posição e portanto capaz de provocar depressão agrária em dimensões mundiais de forma politicamente explosiva Do ponto de vista econômico o setor tradicional da agricultura era uma força negativa era imune às flutuações dos grandes merca dos ou resistia a seu impacto da melhor maneira que pudesse Onde fosse forte mantinha homens e mulheres ligados à terra até onde a terra pudesse darlhes um meio de vida ou se desfazia de sua popula ção em excesso por via da migração sazonais como as que partiram do centro da França em direção a Paris As secas mortíferas do sertão nordestino brasileiro provocaram um êxodo periódico de homens fa 189 mintos e as notícias de que a seca havia terminado traziaos de volta novamente para a paisagem agreste e cheia de cactus onde nenhum brasileiro civilizado se aventurava salvo em alguma expedição mi litar contra algum messias do interior Havia áreas nos Cárpatos nos Bálcãs no oeste russo na Escandinávia e na Espanha para ficarmos apenas no mais desenvolvido dos continentes onde a economia mundial portanto o resto do mundo moderno fosse sob forma mate rial ou mental não significava muito Em 1931 os habitantes da Po lésia quando perguntados pelos censores poloneses acerca de sua na cionalidade não entenderam direito a pergunta Eles responderam somos daqui mesmo ou somos locais5 O setor de mercado era mais complexo já que sua fortuna depen dia tanto da natureza do mercado em alguns casos do mecanismo de distribuição do grau de especialização dos produtores como de estru tura social da agricultura Num extremo poderia haver a virtual mono culturalização das novas áreas agrícolas imposta por uma orientação em direção a um remoto mercado mundial e intensificada se não mes mo criada pelo mecanismo característico de firmas de comércios es trangeiras nas grandes cidades portuárias que controlavam este co mércio de exportação os tradicionais gregos que dirigiam o comércio do milho russo através de Odessa os Bunges Borns de Hamburgo que estavam para preencher a mesma função nos países da Bacia do Prata de Buenos Aires e Montevidéu Onde tais exportações eram pro duzidas por grandes países como era usual nas plantações tropicais a çúcar algodão etc o tipo de especialização era completo Geralmente em tais casos a identidade de interesses produzia uma estreita simbiose entre os grandes produtores fossem nativos ou estrangeiros as gran des firmas de comércio e os interesses compradores dos portos de ex portaçãoimportação e também a política dos estados representando os mercados europeus e seus fornecedores A aristocracia escravista do sul dos Estados Unidos os estancieros da Argentina e os grandes ranchos de carneiros da Austrália eram tão entusiasticamente devotados ao livre comércio e à livre empresa como os ingleses dos quais dependiam já que suas rendas baseavamse exclusivamente na venda livre do produto de seus países obtendo em retorno aquilo que seus fregueses pudessem fornecer em produtos nãoagrícolas No outro extremo o crescimento das áreas urbanas multiplicou a demanda por uma variedade de alimentos para cuja produção as pe quenas dimensões das unidades agrárias não proporcionavam nenhu ma vantagem especial e de nenhuma forma comparável com aquelas que o cultivo intensivo e a tecnologia proporcionavam Os que produ ziam produtos alimentícios mais duráveis tinham que se preocupar mais com a competição dos mercados nacional e mundial do que a queles que vendiam produtos perecíveis como ovos legumes frutas ou mesmo carne fresca ou qualquer outro alimento perecível que não pudesse ser transportado por grandes distâncias A grande de pressão agrária das décadas de 1870 e 1880 foi portanto uma depres 190 são de produtos duráveis Fazendas mistas e agricultura camponesa especialmente a dos camponeses ricos com espírito empresarial flo resciam em tais situações Esta era uma razão porque as previsões de ruína que tinham sido feitas para o campesinato falharam neste estágio mesmo que pare cendo verdadeiras em alguns dos países mais industrializados e de senvolvidos Era fácil definir que uma unidade camponesa era inviá vel quando menor que um determinado tamanho e quantidade de re cursos que variavam com o solo clima e tipo de produção Era po rém muito mais difícil mostrar que a economia de grandes unidades era superior às médias ou mesmo pequenas especialmente quando a maior parte da demanda de trabalho de tais unidades podia ser suprida pelo trabalho virtualmente gratuito de grandes famílias camponesas O campesinato sofria uma constante erosão por uma proletarização da queles cujos rendimentos eram demasiado pequenos para sustentálos O crescimento da economia capitalista transformou a agricultura com sua demanda maciça Não é portanto surpreendente que nosso período tenha visto um crescimento da quantidade de terra posta em uso agrícola sem mencionar o aumento na produção através de me lhorias na produtividade O que não é geralmente reconhecido é quão vasta era a extensão da terra agrícola Tomando as estatísticas dis poníveis do mundo como um todo entre 1840 e 1880 esta área cres ceu da metade de 500 para 750 milhões de acres6 Metade deste au mento ocorreu na América onde a área agrícola triplicou neste perío do quintuplicou na Austrália e cresceu duas vezes e meia no Cana dá Ali tomou sobretudo a forma de um simples avanço geográfico da agricultura pelo interior Entre 1849 e 1877 a produção de trigo avançou nove graus de longitude nos Estados Unidos sobretudo na década de 1860 É importante lembrar porém que a região a oeste do Mississipi ainda era comparativamente subdesenvolvida Entretanto embora menos imediatamente visível porque distri buído dentro e em volta da área cultivada os números para a Europa são igualmente impressionantes A Suécia dobrou sua área de produ ção entre 1840 e 1880 a Itália e a Dinamarca expandiramna por mais da metade a Rússia Alemanha e Hungria por uma terça parte7 Na I tália do Sul e nas ilhas cerca de 600 mil hectares de árvores desapa receram entre 1860 e 1911 8 Numas poucas regiões privilegiadas in cluindo o Egito e a índia a irrigação em larga escala também foi sig nificativa embora uma fé simplista e fervorosa na tecnologia tenha produzido efeitos secundários desastrosos e imprevistos então e ago ra9 Somente na Inglaterra a agricultura havia conquistado todo o pa ís Ali a área cresceu em menos de 5 Seria tedioso multiplicar as estatísticas da crescente produtivida de e produção agrícolas Mais interessante é descobrir até onde estas eram devidas à industrialização e se usavam os mesmos métodos e tecnologia que estavam transformando a indústria Antes da década de 1840 a resposta teria sido numa escala bem pequena Mesmo du 191 rante nosso período uma grande parte da agricultura estava sendo conduzida por meios que eram familiares há 100 ou talvez há 200 anos antes o que era bastante natural já que grandes resultados podi am ser conseguidos pela generalização dos melhores métodos conhe cidos pelas fazendas préindustriais As terras virgens da América fo ram esvaziadas a ferro e fogo como na Idade Média explosivos fo ram usados para derrubar árvores Para fins de produtividade a subs tituição do arado de madeira pelo de aço e a segadeira pela foice fo ram mais importantes que a aplicação da força do vapor que nunca se adaptou à vida da fazenda por ser basicamente imóvel As colheitas foram a grande exceção pois consistiam em uma série de operações que requeriam um grande número de trabalhadores temporários e com a crescente falta de trabalhadores os salários já altos aumenta ram A maior inovação colheita com máquinas estava confinada quase que exclusivamente aos Estados Unidos onde o trabalho era escasso e os campos extensos Mas em geral a aplicação da criativi dade à agricultura aumentou sensivelmente Entre 1849 e 1851 uma média anual de 191 patentes agrícolas foram pedidas nos Estados U nidos em 185961 1282 em 186971 não menos de 3217 10 Portanto as fazendas permaneceram visivelmente o que tinham sempre sido na maior parte do mundo mais prósperas nas áreas de senvolvidas onde se investia mais em melhorias prédios etc pare cendo um centro de negócios em muitos lugares mas nunca trans formadas de modo a não mais serem reconhecidas No entanto a pro dução industrial agora contribuía de forma importante para o capital na agricultura assim como a ciência moderna através da química or gânica de origem germânica Fertilizadores industriais potássio ni tratos não eram ainda usados em larga escala as importações da In glaterra de nitrato chileno ainda não tinham atingido a soma de 60 mil toneladas em 1870 Por outro lado um extenso comércio desenvol veuse para benefício temporário das finanças peruanas e lucro per manente de algumas firmas inglesas e francesas com o fertilizador natural guano 12 milhões de toneladas foram exportadas entre 1850 e 1880 quando então o boom do guano entrou em colapso um tráfico impossível de se imaginar antes da era de transporte de massa global 11 II As forças econômicas que moviam a agricultura faziamno na quelas áreas que eram accessíveis à mudança eram as forças da ex pansão A função da expansão na economia moderna não era apenas a de suprir alimentos e matériaprima em quantidades crescentes mas também a de proporcionar o mais importante reservatório de força de trabalho para ocupações nãoagrícolas Sua terceira grande função a de proporcionar o capital para o desenvolvimento urbano e industrial 192 dificilmente poderia ocorrer em países agrários onde as outras fontes de renda para governos e ricos eram escassas embora pudesse suprir ainda que de forma ineficiente e inadequada Os obstáculos vinham de três fontes os próprios camponeses seus superiores econômicos políticos e sociais e o peso inteiro das sociedades tradicionais institucionalizadas onde a agricultura pré industrial era o coração e o corpo da sociedade Todos os três obstá culos estavam destinados a serem vítimas do capitalismo embora como já vimos nem o campesinato nem a hierarquia social que esco ravase nos seus ombrosestivesse em qualquer perigo imediato de co lapso Na realidade os três fenômenos interligados eram teoricamente incompatíveis com o capitalismo e portanto tendentes a entrar em conflito com este último Para o capitalismo a terra era um fator de produção e uma mer cadoria peculiar apenas pela sua imobilidade e quantidade limitada embora como tenha ocorrido as grandes aberturas de novas terras deste período fizeram com que estas limitações parecessem aparente mente insignificantes para a época O problema do que fazer com a queles que detinham este monopólio natural portanto mantendo uma espécie de pedágio sobre o resto da economia parecia relativa mente superável A agricultura era uma indústria como qualquer outra para ser conduzida por princípios de obtenção de lucro o fa zendeiro um empresário O mundo rural como um todo era um mer cado uma fonte de trabalho uma fonte de capital Não havia meio de reconciliar esta perspectiva com a dos cam poneses ou senhores da terra para os quais a terra não era apenas uma fonte de grande lucro mas a própria estrutura de vida onde as rela ções entre os homens e a terra e entre si em termos da terra não eram opcionais mas obrigatórias Mesmo a nível de governo e pensamento político onde as leis da economia poderiam ser mais aceitas o con flito era grande A propriedade tradicional da terra podia ser econo micamente indesejável mas não era ela o cimento da estrutura social que desabaria em anarquia e revolução caso desaparecesse A políti ca inglesa da terra na Índia viuse com graves problemas diante deste dilema Economicamente talvez fosse mais simples se não houvesse campesinato mas não era ele uma garantia da estabilidade social e a espinha dorsal dos exércitos de muitos governos Num tempo onde o capitalismo estava arruinando suas classes trabalhadoras de forma tão evidente podia um estado prescindir de um reservatório de saudáveis homens do campo para recrutar para as cidades Conseqüentemente o capitalismo poderia somente vir a minar as bases agrárias da estabilidade política especialmente às margens ou dentro da periferia dependente do Ocidente desenvolvido Econo micamente como vimos a transição para a produção de mercado e especialmente a exportação de monocultura rompia as relações soci ais tradicionais e desestabilizava a economia Politicamente a mo dernização implicava para aqueles que desejavam sofrer o processo 193 uma colisão frontal com o principal apoio do tradicionalismo a soci edade agrária ver capítulos 7 e 8 As classes dirigentes da Inglaterra onde senhores da terra e camponeses précapitalistas haviam desapa recido e as da Alemanha e França onde um modus vivendi com o campesinato fora estabelecido na base de um florescente e onde ne cessário protegido mercado interno podiam portanto confiar na le aldade do campo Mas em outros lugares não o podiam Na Itália e na Espanha na Rússia e nos Estados Unidos na China e na América La tina era mais provável que se transformassem em regiões de fermen to social e explosão ocasional Por uma razão ou por outra três tipos de empreendimento agrá rio estavam sob particular pressão a plantação escrava o estado ser vil e a economia camponesa tradicional nãocapitalista O primeiro foi liquidado dentro de nosso período pela abolição da escravidão nos Estados Unidos e na maior parte da América Latina com a exceção do Brasil e de Cuba onde estava com os dias contados E nestes últi mos abolida oficialmente em 1889 Na prática pelo final do nosso pe ríodo a escravidão havia recuado para as partes mais atrasadas do O riente Médio e da Ásia onde não tinha mais um papel significativo na agricultura O estado servil foi formalmente liquidado na Europa en tre 1848 e 1868 embora o campesinato pobre e especialmente os semterra nas regiões dos grandes países da Europa do sul e do leste tivessem permanecido num estado semiservil visto que permanece ram sujeitos a uma esmagadora coerção nãoeconômica Onde os camponeses tivessem direitos legais ou civis inferiores aos usufruídos pelos ricos e poderosos qualquer que fosse a teoria poderiam sofrer coerção nãoeconômica como na Wallachia Andaluzia e Sicília Serviços de trabalho compulsório não haviam sido abolidos em mui tos países sulamericanos mas pelo contrário intensificados Portan to poderseia dificilmente falar da extinção da servidão naquele con tinente A persistência de tais obrigações descritas em termos lo cais como vanaconas huasipungos etc não devem ser confundidas com arranjos funcionalmente similares como servidão por dívida da mesma forma que a importação de trabalho onde o trabalhador deve o transporte ao senhor não deve ser confundida com a escravidão Am bas estas formas aceitam a abolição da escravidão e servidão formais como dadas e procuram recriálas dentro da estrutura de um contrato tecnicamente livre Contudo a servidão parece ter sido confinada de forma crescente aos camponeses índios explorados por senhores nãoíndios O terceiro tipo mantevese como já vimos As razões para esta liquidação geral das formas précapitalistas isto é nãoeconômicas de dependência agrária são complexas Em alguns casos fatores políticos foram obviamente decisivos No Impé rio dos Habsburgos em 1848 e na Rússia em 1861 não foi tanto a impopularidade da servidão no campesinato que determinou a eman cipação embora tivesse sido um dos fatores mas o medo de uma re volução nãocamponesa que viesse adquirir uma força decisiva atra 194 vés da mobilização do descontentamento camponês A rebelião cam ponesa era uma possibilidade constante como demonstrada pelos le vantes agrários na Galícia em 1846 na Itália do sul em 1848 na Sicí lia em 1860 e na Rússia nos anos subseqüentes à guerra da Criméia Mas não eram as rebeliões cegas dos camponeses que assustavam os governos elas duravam pouco e seriam aniquiladas a ferro e fogo mesmo pelos liberais como na Sicília 12 mas a mobilização do des contentamento camponês reforçando um desafio político à autoridade central Os Habsburgos tentaram portanto isolar os vários movimen tos de autonomia nacional de suas bases camponesas e o tzar russo fez o mesmo na Polônia Sem apoio do campesinato os movimentos liberaisradicais eram insignificantes nos países agrários ou pelo me nos contornáveis Tanto os Habsburgos como os Romanov sabiam bem disso e agiram conseqüentemente Porém insurreição e revolução por camponeses ou outros ex plicam alguma coisa sobre a emancipação dos servos mas nada sobre a abolição da escravidão Pois diferente da insurreição dos servos a rebelião escrava era relativamente incomum circunscrita aos Esta dos Unidos 13 e nunca no século XIX considerada uma ameaça po lítica muito séria Seria então a pressão para a abolição da servidão e a escravidão de origem econômica Certamente em alguma medida É bem sabido que historiadores econométricos argumentam retros pectivamente que a agricultura servil ou escrava era de fato mais proveitosa ou até mais eficiente que a agricultura orientada pelo tra balho livre O argumento tem sido elaborado para a escravidão mas não na mesma medida para a servidão l4 Isto é perfeitamente possí vel e os argumentos são realmente fortes Porém é inegável que os observadores da época operando com métodos da época e critérios de contabilidade concluíssem que era inferior embora evidentemente não possamos dizer até onde o justificável horror em relação à escra vidão e à servidão fizeram estas conclusões tendenciosas E mais Thomas Brassey o empresário das estradas de ferro falando a voz do senso comum dos negócios observou sobre a servidão que a produ ção na Rússia servil era a metade da inglesa e da saxônica e inferior a qualquer outro país europeu e sobre a escravidão que esta era obvi amente inferior do ponto de vista da produtividade do que do traba lho livre e mais cara do que as pessoas normalmente pensavam tendo em vista o preço de compra e manutenção do escravo 15 O cônsul bri tânico em Pernambuco admitese que fazendo um relatório para um governo passionalmente antiescravista assinalou que o senhor escra vo perdia 12 de juros do capital que poderia empregar ao invés de comprar escravos Erradas ou não estas opiniões eram comuns fora dos ambientes de senhores de escravos Na realidade a escravidão estava de forma patente em declínio e não apenas por razões humanitárias O final efetivo do tráfico es cravo deuse por pressão da Inglaterra que cortou de fato o suprimen to de escravos o que aumentou seu preço A importação de africanos 195 para o Brasil caiu de 54 mil em 1849 para virtualmente zero em mea dos da década de 1850 O tráfico interno negreiro embora muito usa do em argumentos abolicionistas parece não ter tido um papel impor tante Mas a mudança do trabalho escravo para o nãoescravo era es pantosa Em 1872 a população de cor no Brasil era três vezes mais numerosa do que a população escrava e mesmo entre negros puros os dois grupos eram quase iguais em número Em Cuba por volta de 1877 o número de escravos havia caído de 400 mil para 200 mil 16 Possivelmente mesmo nas áreas mais tradicionais do cultivo escravo a mecanização a partir de meados do século diminuiu a demanda por trabalho no processamento do produto embora nas grandes economi as açucareiras como Cuba produzisse um correspondente crescimen to na necessidade de braços no campo Entretanto dada a crescente competição do açúcar de beterraba europeu e o potencial extrema mente alto do componente de trabalho manual na produção da cana deaçúcar a pressão para abaixar os custos do trabalho era considerá vel Mas poderia a economia de plantação escrava agüentar o duplo custo de investir pesadamente na mecanização e nas despesas com os escravos Tais cálculos encorajaram a substituição pelo menos em Cuba de escravos não exatamente por trabalhadores livres mas por trabalhadores endividados sendo estes trabalhadores trazidos de en tre os índios Maias do Yucatan vítimas da Guerra Racial ver capítu lo 7 ou da então recémaberta China Porém parecia não haver dúvida de que a escravidão como modo de exploração estava em de clínio na América Latina mesmo antes de ser abolida e que o pro blema econômico em relação a esta forma de trabalho apareceu de forma cada vez mais forte a partir de 1850 Quanto à servidão o problema econômico em relação a ela era simultaneamente geral e específico Em termos gerais parecia claro que a permanência de camponeses imobilizados inibia o desenvolvi mento da indústria que era vista como demandando trabalho livre A abolição da servidão iria portanto ser uma précondição necessária para a mobilidade de trabalho livre Além disso como poderia a agri cultura servil ser economicamente racional se para citar um defensor russo da servidão na década de 1850 ela impedia a possibilidade de estabelecer o custo de produção sem qualquer precisão 17 A agricul tura servil também impedia o ajuste racional adequado ao mercado Mais especificamente tanto o desenvolvimento de um mercado inter no para uma variedade de alimentos e matériasprimas agrícolas quanto o de um mercado externo sobretudo para o trigo minaram a servidão Na parte norte da Rússia que nunca foi muito adequada ao cultivo extensivo do trigo fazendas de camponeses deslocaram a produção de cânhamo fibras e outras intensivas lavouras enquanto manufaturas proporcionaram outro tipo de mercado para o campesi Onde o trabalhador deve ao senhor o preço de seu transporte NT 196 nato O número de servos efetuando serviços de trabalho já uma mi noria caiu Servia para pagar aos senhores da terra a comutação de serviços para uma orientação de mercado No sul vazio onde as este pes virgens transformavamse em campos de trigo a servidão não era de grande importância O que os senhores da terra precisavam para a expansão da economia de exportação era de melhores transportes crédito trabalho livre e máquinas A servidão sobreviveu na Rússia como na Romênia sobretudo nas áreas de produção de sementes com uma densa população camponesa onde os senhores podiam compen sar sua fraqueza competitiva com o aumento de serviços ou esperar cortar pelo mesmo método mesmo que temporariamente os preços no mercado de exportação Entretanto a abolição do trabalho nãolivre não pode ser anali sada simplesmente em termos de cálculo econômico As forças da so ciedade burguesa opunhamse à escravidão e à servidão não apenas porque acreditavam que estas fossem economicamente indesejáveis nem por razões morais mas também porque estas formas pareciam incompatíveis com uma sociedade de mercado baseado na busca livre do interesse individual Por outro lado proprietários de escravos e se nhores da terra apoiavam o sistema porque este parecialhes a coluna dorsal daquela sociedade e de suas classes Talvez achassem mesmo impossível suas próprias existências sem escravos ou servos que de finiam o próprio status da classe Os senhores da terra russos não se revoltavam contra o tzar e nem poderiam porque este lhes propor cionava a única legitimação possível contra um campesinato que se por um lado estava profundamente convencido de que a terra perten cia a quem nela trabalhava por outro lado acreditava na sua subordi nação hierárquica aos representantes de Deus e do imperador Mas os senhores se opunham à emancipação de forma bastante decidida Ela era imposta de fora ou de cima e por uma força superior De fato se a aboliçãoemancipação tivesse sido apenas o produ to de forças econômicas não teriam produzido os resultados insatisfa tórios que produziram tanto nos Estados Unidos como na Rússia As áreas nas quais a escravidão ou a servidão tinham sido de importância marginal ou genuinamente nãoeconômica por exemplo no norte e no sul da Rússia ou nos estados fronteiriços e no sudoeste dos Esta dos Unidos ajustaramse rapidamente à sua liquidação Mas nas á reas centrais do velho sistema os problemas eram muito mais difíceis de serem enfrentados Portanto nas províncias russas da terra negra distintas da Ucrânia e das fronteiras das estepes a agricultura capi talista desenvolveuse devagar dívidas de trabalho permaneceram até meados da década de 1880 enquanto a expansão da lavoura ficava em geral bastante mais atrasada em relação às plantações de semente no sul Em resumo os benefícios puramente econômicos do final da economia de coerção física permanecem em debate Nas antigas economias escravistas isto não pode ser explicado no campo político já que o Sul tinha sido conquistado e a antiga aris 197 tocracia da terra perdera temporariamente o poder adquirindoo de novo porém logo depois Na Rússia os interesses da classe proprie tária de terras eram evidentemente cuidadosamente considerados e salvaguardados O problema neste caso era que a emancipação não produzia uma solução agrária satisfatória nem para a nobreza nem para o campesinato nem para os projetos de uma genuína agricultura capitalista Em ambas as áreas a resposta dependia de qual seria a melhor forma de agricultura especialmente agricultura de larga esca la sob condições capitalistas Há duas formas principais de agricultura capitalista que Lênin chamou respectivamente de caminho prussiano e caminho ameri cano no primeiro caso grandes fazendas operadas por proprietários empresários capitalistas com trabalho alugado no segundo fa zendeiros comerciais independentes de extensão variada também ope rando com trabalho alugado onde necessário embora numa escala muito menor Ambas implicavam uma economia de mercado mas mesmo antes do triunfo do capitalismo a maioria das grandes fazen das operavam como unidades produtivas para vender uma grande proporção de sua produção enquanto a maioria das propriedades camponesas sendo primariamente para consumo próprio não o fazi am Portanto a vantagem das grandes fazendas e plantações para o desenvolvimento econômico não residia tanto na superioridade técni ca maior produtividade etc mas sobretudo na sua capacidade pouco comum em gerar excedente agrícola para o mercado Onde o campe sinato permaneceu precomercial como em grande parte na Rússia e entre os escravos emancipados das Américas que retornaram à a gricultura de subsistência camponesa a fazenda manteve esta vanta gem mas onde faltavam as antigas vantagens do trabalho compulsório proporcionadas pela escravidão e servidão a fazenda sentia agora mais dificuldade em obter trabalho salvo quando os antigos escravos ou ser vos fossem desprovidos de terra ou a possuíssem em tão pouca quanti dade que eram obrigados a se transformar em trabalhadores alugados e que não houvesse um trabalho mais atraente como alternativa Mas no todo os exescravos adquiriram alguma terra embora não os 40 acres e uma mula com que sonhavam e os exservos embora perdendo alguma terra para os senhores especialmente nas regiões de agricultura comercial em expansão permaneceram cam poneses Aliás a sobrevivência e mesmo o recrudescimento da velha comuna de cidade com seus arranjos de periódica distribuição equitativa de terra salvaguardou a economia camponesa Daí a cres cente tendência dos senhores da terra para alugar as propriedades re pondo assim os produtos que eles mesmo encontravam mais dificul dade em produzir Mas se o caminho prussiano não era seguido sistematicamen te por outro lado o caminho americano também não o era Este dependia da criação de um grande corpo de fazendeiros empresários cultivando essencialmente produtos de venda imediata Um tamanho 198 mínimo de propriedade era necessário para tal variando com as cir cunstâncias Portanto no sul dos Estados Unidos depois da Guerra Civil a experiência tem mostrado que é duvidoso se algum lucro pode ser obtido por um cultivador cuja produção anual é menor que 50 fardos Um homem que não consiga produzir 8 ou 10 fardos no mínimo praticamente não tem objetivo na vida e nada para viver Uma grande parte do campesinato permaneceu portanto dependente da cultura de subsistência em suas propriedade se estas o permitis sem e quando não dependia do trabalho em outro local como com plemento Dentro do campesinato desenvolveuse um bom número de fazendeiros comerciais eles eram de importância substancial na Rússia na década de 1880 mas diferenças de classe ocorriam por vários fatores racismo nos Estados Unidos a persistência da comu nidade de pequenas vilas na Rússia Portanto nem a abolição nem a emancipação produziram um re sultado satisfatório do ponto de vista capitalista para o problema agrá rio e é duvidoso que isto pudesse ter ocorrido salvo se as condições para o desenvolvimento de uma agricultura capitalista já estivessem presentes como nas áreas marginais da economia servilescravista do Texas ou na Europa na Bohemia e Hungria Nestas áreas podemos ver os caminhos prussiano ou americano em ação As grandes fa zendas de nobres algumas vezes ajudadas pelas injeções de capital fi nanceiro na forma de pagamentos de compensação pela perda de servi ços de trabalho transformaramse em empresas capitalistas Nas terras tchecas eles detinham 43 das cervejarias 65 das fazendas de açúcar e 60 das destilarias no começo da década de 1870 Ali floresceram com a concentração da lavoura intensiva não apenas grandes fazendas com trabalho alugado mas também grandes sítios camponeses que começavam a competir com as fazendas Na Hungria estes últimos permaneceram dominantes e a totalidade dos servos sem terra obtive ram liberdade sem receber enfim nenhuma terra 19 Nas antigas áreas centrais de coerção física como na Rússia e na Romênia onde a servidão durou mais tempo o campesinato tinha sido deixado como uma massa bastante homogênea exceto quando divididos por raça ou nacionalidade e descontente talvez mesmo re volucionária A incapacidade para ação devida à opressão racial ou à dependência por não possuírem terras mantinhaos quietos como os negros rurais do sul dos Estados Unidos ou os trabalhadores das pla nícies Húngaras Por outro lado o campesinato tradicional espe cialmente quando organizado comunalmente transformouse numa força formidável A Grande Depressão da década de 1870 abriu uma era de agitação rural e revolução camponesa Poderia este processo ter sido evitado por uma forma mais ra cional de emancipação É duvidoso Pois encontramos resultados muito similares naquelas regiões onde a tentativa de criar as condi ções para a agricultura capitalista tinha sido efetuada não por um édi 199 to global abolindo a economia de coerção mas pelo processo mais geral da imposição pela lei do liberalismo burguês transformando to da propriedade agrária em propriedade individual e transformando a terra numa mercadoria de venda livre como qualquer outro objeto Na teoria este processo já havia sido amplamente aplicado na primeira metade do século ver A Era das Revoluções capítulo 8 mas na prá tica veio a ser imensamente reforçado depois de 1850 pelo triunfo do liberalismo Isto significava primeiro e acima de tudo a quebra das antigas organizações comunais e a distribuição ou a alienação da terra de posse coletiva ou da terra de instituições nãoeconômicas como as da Igreja Isto viria a ser efetuado de maneira mais dramática e rude na América Latina por exemplo no México no período de Ju arez na década de 1860 ou na Bolívia sob o ditador Melgarejo 1866 71 mas também ocorreu em grande escala na Espanha depois da re volução de 1854 na Itália depois da unificação do país sob as institu ições liberais de Piedmont e onde mais o liberalismo econômico e legal tivesse triunfado E o liberalismo avançava mesmo nos lugares onde os governos não lhe eram muito simpático As autoridades fran cesas tomaram algumas providências para salvaguardar a propriedade comunal entre seus súditos muçulmanos na Argélia e mesmo Napo leão III achou inconcebível que a propriedade individual como direito sobre a terra não fosse estabelecida formalmente entre os membros da comunidade muçulmana onde possível e oportuno uma medida que veio a ter o efeito de permitir a europeus a possibilidade de comprálas pela primeira vez Entretanto ainda não era o convite à liquidação pela expropriação efetuada pela Lei de 1873 depois da grande insurreição de 1871 que veio propor a imediata transferência da propriedade nati va para o status legal francês uma medida que beneficiou a quase nin guém exceto aos homens de negócios e especuladores europeus 20 Com ou sem apoio oficial os muçulmanos perderam suas terras para os colonos brancos ou para as companhias de terras A ambição teve um papel em tais expropriações por parte dos go vernos pelos lucros em vendas de terra ou outras rendas por parte dos senhores da terra colonos ou especuladores o fato de adquirir barato fazendas e propriedades Mas seria injusto negar aos legisladores a sin ceridade da convicção de que a transformação da terra numa mer cadoria livremente alienável e a transformação em propriedade privada de relíquias comunais eclesiásticas ou outras obsolescências de um passado irracional iriam no todo proporcionar uma base para um de senvolvimento agrícola satisfatório Mas não era injusto de forma al guma em relação ao campesinato que em sua totalidade se recusou a se transformar em uma florescente classe de fazendeiros comerciais mesmo quando tinham a chance de conseguilo A maioria não tinha esta chance já que não podia comprar a terra posta no mercado ou mesmo compreender os complexos processos legais que levaram à sua desapropriação Talvez a medida não tenha reforçado o latifúndio em 200 si o termo é ambíguo e profundamente imbuído de mitologia política mas onde tivesse trazido reforços não era ao camponês de economia de subsistência velho ou novo O maior efeito da liberalização viria a ser o aprofundamento do descontentamento camponês A novidade deste descontentamento era que agora podia ser mo bilizado pela esquerda política De fato exceto em partes do sul da Europa não iria ainda ser mobilizado Na Sicília e no sul da Itália a revolução camponesa de 1860 ligouse a Garibaldi uma grande figu ra de camisa vermelha que parecia de todas as formas o libertador do povo e cuja crença em uma república radicaldemocrática laica e mesmo vagamente socialista não parecia de todo incompatível com a crença em santos na Virgem no Papa e fora da Itália no rei Bour bon No sul da Espanha o republicanismo e a Internacional na sua forma bakuninista cresceram rapidamente nenhuma cidade andaluza entre 1870 e 1874 deixou de ter sua sociedade de trabalhadores 21 Na França é claro o republicanismo a forma principal da esquerda já estava bem estabelecido em algumas áreas rurais depois de 1848 e teve o apoio da maioria moderadamente depois de 1871 Talvez uma esquerda revolucionária tenha surgido na Irlanda com os fenia nos na década de 1860 para irromper na formidável Land league do final da década de 1870 e inícios da de 1880 Havia evidentemente mesmo na Europa muitos países e pra ticamente todos fora deste continente onde a esquerda revolucioná ria ou não falhou em provocar qualquer impacto no campesinato como os populistas russos iriam descobrir ver capítulo 9 quando se decidiram a ir ao povo na década de 1870 De fato enquanto a es querda permanecesse urbana laica ou mesmo militantemente anticle rical e sem interesse nos problemas do campo o campesinato iria continuar nutrindo suspeita e hostilidade em relação a ela O sucesso rural dos militantes anarquistas anticristãos na Espanha ou republica nos na França era excepcional Mesmo assim pelo menos na Europa a antiquada insurreição rural pela Igreja pelo rei e contra as cidades ímpias e liberais tornaramse escassas Mesmo a segunda guerra car lista na Espanha 187276 foi uma questão muito mais geral que a primeira da década de 1830 e virtualmente confinouse às províncias bascas Como o grande boom da década de 1860 e inícios da de 1870 abriu caminho para a depressão agrária das décadas de 1870 e 1880 o campesinato não podia mais ser tomado com um elemento conserva dor na política Mas em que medida a vida no campo foi transformada pelas for ças do Novo Mundo Não é fácil julgar pelo ponto de vista do século XX já que a vida rural foi mais transformada neste período do que em qualquer época anterior desde a invenção da agricultura Olhando retrospectivamente os caminhos de homens e mulheres no campo em meados do século XIX parecem fixados numa antiga tradição de mu dança a passos de tartaruga Evidentemente tratase de uma ilusão mas a natureza exata destas mudanças é agora difícil de discernir ex 201 ceto talvez entre os colonos do Oeste Americano prontos para mudar de fazenda e produto de acordo com as perspectivas de preços ou lu cros especulativos equipados com máquinas e comprando novidades através do catálogo postal Mas havia de qualquer forma mudanças no campo Havia a es trada de ferro Havia com crescente freqüência a escola primária en sinando a língua nacional uma nova e segunda língua para a maioria dos filhos de camponeses e conjuntamente com a administração na cional e a política fragmentando suas personalidades Por volta de 1875 o uso de apelidos pelos quais as pessoas eram conhecidas e i dentificadas nas vilas de Bray na Normandia havia praticamente de saparecido Isto era devido inteiramente aos professores que não per mitiam que as crianças usassem nas escolas outra coisa que não fosse seus nomes próprios22 Talvez não tivessem exatamente desaparecido mas retroagido com o dialeto local para o submundo privado e não oficial da cultura nãoliterária E a divisão mesma entre os alfabetiza dos e analfabetos no campo era uma poderosa força de mudança Em 1849 era natural que a política camponesa na Morávia tomasse a for ma de um boato de que o líder revolucionário húngaro Kossuth era o filho do imperador camponês Joseph II descendente do antigo rei Svatopluk e prestes a invadir o país a frente de um grande exército23 Mas já por volta de 1875 a política na Tchecoslováquia especial mente no campo era conduzida em termos mais sofisticados e aque les que esperavam a salvação nacional através de herdeiros de impe radores populares antigos ou modernos talvez se sentissem um pouco embaraçados em admitilo Aquela forma de pensar confinava se mais e mais a países analfabetos como a Rússia onde os populis tas revolucionários nesta mesma época tentaram sem sucesso or ganizar uma revolução camponesa através de um pretendente popu lar ao trono do tzar24 Poucos países eram relativamente alfabetizados exceto partes da Europa central e ocidental principalmente as protestantes e a América do Norte Mas mesmo entre os atrasados e tradicionais dois tipos de pessoas do campo eram os maiores pilares das antigas formas os velhos e as mulheres cujas histórias de viúvas passavam de geração em geração e ocasionalmente para benefício dos homens da cidade para colecionadores de folclore e canções populares E é ain da um paradoxo do período que freqüentemente ou não a mudança tenha sido trazida para a vida do campo através das mulheres Algu mas vezes na Inglaterra meninas do campo tornaramse mais instru ídas que meninos isto parece ter acontecido pela década de 1850 Certamente nos Estados Unidos eram as mulheres que representavam as formas civilizadas aprendizado através de livros higiene casas limpas e mobília segundo o modelo e sobriedade da cidade Os que empurravam os filhos para serem melhores do que eles mesmos e ram mais as mães do que os pais Mas talvez o mais poderoso agente de tal modernização fosse a migração de jovens camponesas para o 202 serviço doméstico nas casas das classes médias urbanas Tanto para homens como para mulheres o grande processo de melhorar era ine vitavelmente um processo de minar as antigas formas e aprender as novas Para isso voltamos agora nossa atenção 203 DécimoPrimeiro Capítulo OS HOMENS DE PÕEM A CAMINHO Perguntamos onde estava seu marido Ele está na América O que é que ele faz lá Ele conseguiu um emprego como Tzar Mas como pode um judeu ser Tzar Tudo é possível na América ela respondeu Scholem Alejchem1 1900 Disseramme que os irlandeses estão tirando o serviço doméstico dos ne gros por toda parte Aqui isso é universal não se encontra prati camente em lugar nenhum um empregado que não seja irlandês A H Clough para Thomas Carlyle Boston 1853 2 I A metade do século XIX marca o começo da maior migração dos povos na História Seus detalhes exatos mal podem ser medidos pois as estatísticas oficiais tais como eram então são falhas em capturar to dos os movimentos de homens e mulheres dentro dos países ou entre estados o êxodo rural em direção às cidades a migração entre regiões e de cidade para cidade o cruzamento de oceanos e a penetração em zonas de fronteiras todo este fluxo de homens e mulheres movendose em todas as direções torna difícil uma especificação Entretanto uma forma dramática desta migração pode ser aproximadamente docu mentada Entre 1846 e 1875 uma quantidade bem superior a 9 milhões de pessoas deixou a Europa e a grande maioria seguiu para os Estados Unidos 3 Isto equivalia a mais de 4 vezes a população de Londres em 1851 No meio século precedente tal movimentação não deve ter sido superior a um milhão e meio de pessoas no todo Movimentos populacionais e industrialização andam juntos já que o desenvolvimento econômico moderno do mundo pede mudan ças substanciais junto aos povos e por outro lado facilita tais movi mentos tornandoos tecnicamente baratos e mais simples através de comunicações novas e melhores assim como evidentemente permite ao mundo manter uma população bem maior A enorme expansão das 204 massas em nosso período não era nem inesperada nem sem preceden tes muito modestos Era certamente previsível nas décadas de 1830 e 1840 Porém o que parecia ser uma corrente viva transformouse su bitamente numa torrente Antes de 1845 somente em um ano ocorreu que mais de 100 mil passageiros tivessem chegado aos Estados Uni dos Mas entre 1846 e 1850 uma média anual de mais de 250 mil deixou a Europa e nos cinco anos subseqüentes uma média anual de 350 mil somente em 1854 não menos que 428 mil chegaram aos Es tados Unidos e embora os números flutuassem segundo as condições econômicas dos países de origem e de destino o fluxo continuou nu ma escala ainda maior do que antes Entretanto por maior que fossem tais migrações elas ainda eram modestas em relação às cifras posteriores Na década de 1880 entre 700 mil e 800 mil europeus emigraram em média cada ano e nos anos posteriores a 1900 entre 1 e 14 milhão por ano Assim entre 1900 e 1910 um número consideravelmente maior de pessoas emigrou para os Estados Unidos do que durante o período inteiro que este livro estuda A mais evidente limitação às migrações era geográfica Deixan do de lado as relíquias do tráfico negreiro já então ilegal e pratica mente estrangulado pela marinha britânica o maior número de mi grantes internacionais era formado de europeus ou mais precisamente neste período europeus ocidentais e alemães Os chineses já estavam certamente se movimentando nas fronteiras do norte de seu império para além da região do povo Han e para as regiões do sul nas penín sulas e ilhas do sudeste asiático mas não se pode imaginar em que número Talvez fosse modesto Em 1871 havia talvez uns 120 mil na Malásia 4 Os indianos começaram depois de 1852 a emigrar pouco a pouco para a vizinha Birmânia O vazio deixado pelo banimento do tráfico escravo estava sendo de certa forma preenchido pelo trans porte de trabalho endividado sobretudo proveniente da Índia e da China 125 mil chineses seguiram para Cuba entre 1853 e 18745 Eles iriam criar as diásporas indianas da Guiana e Trinidad das ilhas dos Oceanos Pacífico e Indico e do Caribe britânico Chineses aventurei ros já estavam sendo atraídos ver capítulo 3 em algum número para as regiões pioneiras da parte americana do Pacífico que iriam pro porcionar aos jornalistas locais algumas brincadeiras sobre lavanderi as cozinheiros eles inventaram o restaurante chinês em São Francis co durante a corrida do ouro e criar demagogos locais com slogans de exclusividade racial A frota mercante em rápido crescimento em todo o mundo deixava então um depósito de pequenas populações de cor nos portos internacionais mais importantes O recrutamento de tropas coloniais sobretudo pelos franceses que esperavam através disso suplantar a superioridade demográfica dos alemães uma ques tão discutida com ansiedade na década de 1860 trouxe alguns outros pela primeira vez para uma região européia Mesmo entre os europeus a migração de massa intercontinental estava confinada aos povos de relativamente poucos países neste pe 205 ríodo sobretudo ingleses irlandeses e alemães e a partir de 1860 no ruegueses e suecos os dinamarqueses nunca emigraram na mesma medida cujo pequeno número esconde o imenso vazio demográfico que deixavam Desta forma a Noruega enviou dois terços de seu au mento populacional para os Estados Unidos superados apenas pelos desafortunados irlandeses que enviaram todo o seu aumento popula cional para fora o país perdeu consistentemente em população em to das as décadas depois da grande epidemia de fome de 184647 Por outro lado embora os ingleses e os alemães tenham mandado apenas aproximadamente 10 de seu aumento populacional para fora em números absolutos isso significava muito Entre 1851 e 1880 cerca de 53 milhões deixaram as Ilhas Britânicas 35 milhões para os Es tados Unidos 1 milhão para a Austrália meio milhão para o Canadá de longe a maior migração transoceânica no mundo Os italianos do sul e sicilianos que iriam tornarse um dilúvio nas grandes cidades das Américas praticamente ainda não haviam começado a sair de suas pequenas e pobres vilas os europeus orien tais católicos ou ortodoxos permaneciam grandemente sedentários e apenas os judeus iam para cidades provinciais para depois seguir em direção às grandes cidades Os camponeses russos mal haviam come çado a emigrar para os grandes espaços abertos da Sibéria antes de 1880 embora tivessem seguido em grande número para as estepes da Rússia européia cuja colonização tinha sido mais ou menos comple tada por volta de 1880 Os poloneses mal haviam começado a povoar as minas de Ruhr antes de 1890 embora os tchecos já estivessem se deslocando para o sul de Viena O grande período da emigração esla va judaica e italiana para as Américas começaria em 1880 Já que a maioria dos europeus era de origem rural assim eram os emigrantes O século XIX foi uma gigantesca máquina para elevar os homens do campo A maioria deles foi para as cidades ou a qual quer preço para fora do ambiente tradicional rural em busca do me lhor caminho que pudessem encontrar em mundos estranhos assusta dores mas sobretudo promissores onde se dizia que o pavimento das cidades era leito de ouro embora alguns emigrantes não encontras sem mais do que algum cobre Não é exatamente verdade que as cor rentes migratórias fossem todas iguais Alguns pequenos grupos de migrantes sobretudo alemães e escandinavos que seguiram para a região dos Grandes Lagos nos Estados Unidos ou os colonos escoce ses no Canadá trocaram um meio agrícola rural pobre por um me lhor somente 10 dos emigrantes para os Estados Unidos em 1880 foram para a agricultura e a maioria não como fazendeiros possi velmente devido ao preço dos equipamentos necessários6 Se a redistribuição dos homens do campo através do globo não pode ser negligenciada é contudo menos surpreendente do que o ê xodo da agricultura Migração e urbanização andavam juntas e na se gunda metade do século XIX os países mais associados a este proces so Estados Unidos Austrália Argentina tinham uma taxa de con 206 centração urbana não superada em nenhum lugar exceto na Inglaterra e nus partes industrializadas da Alemanha Em 1890 as 20 maiores cidades do mundo incluíam cinco nas Américas e uma na Austrália Homens e mulheres transferiramse para as cidades embora talvez com certeza na Inglaterra cada vez mais oriundos de outras cidades Se a transferência se dava dentro do próprio país isto não levan tava nenhum problema novo de técnica Na maioria dos casos eles não iam muito longe ou se fossem os caminhos para a cidade já ha viam sido percorridos por vizinhos Novos rumos eram às vezes aber tos pela tecnologia tais como a estrada de ferro que trouxe os bretões à Paris para perder sua fé como no provérbio na estação de Mont parnasse e para preencher os bordéis da cidade com seus habitantes mais característicos Garotas da Bretanha substituíram as de Lorraine como as prostitutas mais familiares As mulheres migrantes entre países tornaramse em sua maioria empregadas domésticas até que se casassem com um compatriota ou passassem para alguma ocupação urbana A migração de famílias ou mesmo de casais era incomum Os homens seguiam o comércio tradi cional de suas regiões ao se transferirem para as cidades no caso de serem especializados sua própria profissão ou então se comercian tes alguma forma de pequeno comércio sobretudo de alimentos ou bebidas Além destes casos eles encontravam emprego sobretudo nas duas grandes ocupações que não requeriam nenhuma especialização particular estranha a homens do campo ou seja construção e trans porte Em Berlim em 1885 81 dos homens engajados no suprimen to de alimentos 835 dos envolvidos em construção e mais de 85 daqueles em transporte tinham nascido fora da cidade7 Se eles não tinham muita sorte nos empregos mais especializados exceto quando aprendizes por outro lado estavam em melhor situação do que os mais pobres nascidos na própria cidade O pior dos quarteirões pobres era habitado mais freqüentemente pelos nativos do que pelos emi grantes No nosso período ainda não havia muita alternativa de traba lho fabril na maioria das grandes capitais A maior parte desta estrita produção industrial encontravase nas cidades médias embora crescendo rapidamente ou mesmo so bretudo nas minas e em algumas espécies têxteis nas vilas e peque nas cidades Ali não havia uma demanda comparável para mulheres imigrantes exceto nos têxteis e os empregos para os imigrantes ho mens eram quase que por definição não especializados e mal pagos Migrações através de fronteiras e oceanos levantavam proble mas mais complexos e isso não era de nenhuma forma devido ao fato de os imigrantes não entenderam a língua do país Na realidade a maior parte dos imigrantes aqueles das Ilhas Britânicas não tinham dificuldades lingüísticas significativas embora alguns migrantes in ternos a tivessem como por exemplo dentro dos impérios multina cionais da Europa central e oriental Entretanto fora a língua a emi gração sem dúvida aumentou de forma aguda a questão da origem na cional dos indivíduos ver também capítulo 5 Se alguém permane 207 cesse num país novo deveria ser obrigado a romper as ligações com o antigo A questão não se levantava na transferência para as colônias do Estado onde era possível manter as nacionalidades inglesa ou francesa fosse na Nova Zelândia ou na Argélia pensando no velho país como o lar Levantava problemas mais agudos porém nos Es tados Unidos que recebia imigrantes mas impunha que estes se trans formassem rapidamente em cidadãos americanos falando inglês já que qualquer cidadão racional não poderia desejar outra coisa senão ser americano De fato a maioria deles assim o fez Uma mudança de cidadania não implicava evidentemente um divórcio em relação ao velho país Bem ao contrário O imigrante típi co largado em um lugar estranho que o havia recebido de forma sufi cientemente fria voltavase naturalmente para o único agrupamento humano que lhe era familiar e que podia ajudálo a companhia dos compatriotas A América que havialhe ensinado as primeiras frases formais em inglês Ouço a sirene Preciso andar depressa não era uma sociedade mas um meio de fazer dinheiro Podiase ler numa bro chura da International Harvest Corporation feita para ensinar inglês aos trabalhadores poloneses as frases subseqüentes da primeira lição Ouço a sirene de cinco minutos É hora de ir para a fábrica Apanho meu cartão no portão e entrego no departamento Mudo minhas roupas e fico pronto para trabalhar Toca a primeira sirene do início do trabalho Como meu almoço É proibido comer antes disso Aprontome para ir para o trabalho Trabalho até que a sirene toque novamente Deixo meu lugar limpo e bem arrumado Preciso ir para a casa 8 A primeira geração de imigrantes por mais zelosa que fosse ao tentar aprender as técnicas da nova vida terminava por viver num gueto autoimposto apoiandose nas velhas tradições e nas memórias do antigo país que tinha abandonado tão prontamente Mesmo os ri cos financistas judeus de Nova York os Guggenheims Kuhns Sachs Seligmanns e Lehmajins que tinham o que o dinheiro podia comprar nos Estados Unidos não eram americanos da forma que os Wer theimsteins em Viena consideravamse austríacos os Bleichroeders em Berlim consideravamse prussianos e mesmo os internacionais Rothschilds em Londres e Paris consideravamse ingleses e franceses Eles permaneceram tanto alemães como americanos Falavam escre viam e pensavam em alemão freqüentemente enviavam seus próprios filhos para serem educados no antigo país juntavamse e apoiavam financeiramente associações germânicas9 Mas a emigração levantou muito mais dificuldades materiais e lementares Os homens precisavam descobrir aonde ir e o que fazer ao chegar no novo lugar Eles precisavam ir para Minesota de algum 208 remoto fiorde norueguês para o condado de Green Lake ou Wiscon sin da Pomerânia ou Brandemburgo para Chicago de alguma vila em Kerry O custo em si mesmo não era uma dificuldade insuperável embora as condições de viagem para emigrantes através do oceano fossem famigeradas especialmente nos anos posteriores à epidemia de fome na Irlanda se não assassinas Em 1885 a passagem de um emi grante de Hamburgo para Nova York custava 7 dólares As tarifas e ram baixas não apenas porque consideravase que este tipo de passa geiro não necessitava ou merecia melhores acomodações do que ani mais mas afortunadamente necessitando menos espaço ou porque faltassem melhorias nas comunicações mas também por razões eco nômicas Emigrantes eram carga Provavelmente para a maioria das pessoas o custo da viagem para o porto final de embarque Le Ha vre Bremen Hamburgo e sobretudo Liverpool era bem maior que a travessia em si Mesmo assim este dinheiro não estava ao alcance dos mais po bres entre todos embora estas somas pudessem ser facilmente eco nomizadas e enviadas da América ou Austrália com seus altos salá rios para os parentes nos antigos países De fato tais pagamentos e ram parte da vasta soma de remessas para o exterior de imigrantes que estranhos às altas formas de gastos de seus novos países podiam economizar bastante Os irlandeses sozinhos enviaram de volta entre 1 e 7 milhões de libras esterlinas anualmente no começo da década de 1850 10 Entretanto quando o parente não podia ajudar uma varie dade de intermediários com interesse financeiros entrava em ação Onde havia uma grande demanda por trabalho de um lado uma popu lação ignorante das condições no país escolhido de outro e uma longa distância pelo meio o agente ou contratador florescia Tais indivíduos faziam seus lucros acumulando gado humano nas mãos das companhias de navegação ansiosas para encher seus navios para enviálo às autoridades públicas e companhias de estra das de ferro interessadas em povoar seus territórios vazios para pro prietários de minas donos de siderúrgicas e outros empregadores de trabalho primário que necessitavam de braços Os agentes eram pagos pelos empregadores e pelos centavos de homens e mulheres que tal vez fossem forçados a atravessar metade de um continente estranho antes de embarcar para cruzar o Atlântico da Europa central para o Havre ou através do Mar do Norte via Inglaterra para Liverpool Po demos deduzir que eles geralmente exploravam a pobreza e a igno rância embora os extremos do contrato de trabalho e servidão de dí vida fossem talvez incomuns neste período exceto entre os indianos e os chineses enviados para plantações Em geral tais intermediários não sofriam nenhum controle exceto alguma supervisão quanto às condições sanitárias a bordo depois das terríveis epidemias do final da década de 1840 Eles tinham a opinião pública dos influentes por detrás A burguesia de meados do século XIX ainda acreditava que a Europa era superpovoada por pobres Quanto maior quantidade fosse 209 embarcada para fora melhor para todos eles porque melhorariam su as condições e melhor para os que ficassem porque o mercado de trabalho seria aliviado Sociedades beneficentes até sindicatos traba lharam para arranjar subsídios para a emigração de seus clientes ou membros como o único meio prático de lidar com o pauperismo e o desemprego Parecia uma boa justificativa o fato de que em nosso período os países em processo de industrialização mais rápida fos sem ao mesmo tempo os maiores exportadores de homens como a Inglaterra e a Alemanha O argumento era hoje se sabe errado Dan do um balanço a economia dos países que despachavam homens teria se beneficiado mais se tivesse empregado estes recursos humanos ao invés de expulsálos Por outro lado as economias do Novo Mundo beneficiaramse enormemente com o êxodo do Velho Mundo E tam bém os imigrantes O pior período de sua pobreza e exploração nos Estados Unidos parece ter ocorrido depois do final de nosso período Por que pessoas emigravam Sobretudo por razões econômicas quer dizer porque eram pobres Apesar das perseguições políticas de pois de 1848 refugiados políticos ou ideológicos formavam apenas uma pequena fração da emigração de massa mesmo em 184954 em bora houvesse um tempo em que radicais controlaram metade da im prensa em língua alemã nos Estados Unidos onde eles aproveitavam para denunciar seu país de refúgio 11 Seu ardor entretanto rapidamen te esmaeceu assim como a maioria dos imigrantes nãoideológicos que transferiram suas energias revolucionárias para a campanha anti escravista A fuga de seitas religiosas procurando maior liberdade pa ra prosseguir em suas atividades freqüentemente peculiares era pro vavelmente menos significativa que no meioséculo precedente já que os governos vitorianos não tinham uma posição muito forte em ortodoxia como tal embora não achassem desagradável se livrarem dos mórmons ingleses ou dinamarqueses cuja tendência à poligamia causava problemas Mesmo na Europa oriental as ativas campanhas antisemitas que iriam estimular a emigração de massa dos judeus ainda era coisa para o futuro As pessoas emigravam para escapar às más condições em casa ou para procurar melhores no exterior Tem havido uma longa e inú til discussão sobre este ponto Não há dúvida de que pobres tendiam a emigrar mais do que ricos e que eles tenderiam a fazêlo mais ainda se as condições tradicionais de vida viessem a se tornar difíceis ou impossíveis Portanto na Noruega artesãos emigraram mais do que trabalhadores de fábrica mais tarde foi a vez dos pescadores quando a vela deu lugar ao vapor Há igualmente pouca dúvida de que neste período quando a idéia de jogar fora o antigo era ainda estranha e as sustadora para a maioria das pessoas alguma forma de força cata clísmica ainda era necessária para leválos ao desconhecido Um tra balhador de fazenda em Kent escrevendo da Nova Zelândia agrade ceu aos fazendeiros por havêlo expulsado por causa de uma greve já 210 que agora ele se encontrava muito melhor ele não teria pensado em partir de outra maneira Entretanto como a emigração maciça tornavase parte integran te da experiência do povo comum em que cada criança do condado de Kildare tinha algum primo tio ou irmão já na Austrália ou nos Es tados Unidos a partida se tornou uma opção normal e não necessa riamente irreversível baseada numa escolha de perspectivas e não meramente uma força do destino Se chegassem notícias de que havia sido descoberto ouro na Austrália ou que empregos abundavam e e ram bem pagos nos Estados Unidos a emigração aumentava Inver samente caiu nos anos depois de 1873 quando a economia dos Esta dos Unidos encontrouse em depressão aguda Portanto não pode ha ver dúvida de que a primeira grande onda de emigração de nosso pe ríodo 184554 foi essencialmente uma fuga da fome ou pressão da população na terra basicamente na Irlanda e na Alemanha que forne ceu 80 de todos os emigrantes transatlânticos nestes anos Nem era a emigração necessariamente permanente Emigrantes em que proporção não sabemos sonhavam em fazer sua fortuna no exterior e depois voltar para casa ricos e respeitados Uma grande proporção entre 30 e 40 realmente o fez embora na maioria das vezes pela razão oposta porque não tinham gostado do Novo Mundo ou tinham tido dificuldades em lá se estabelecer Outros emigraram novamente Na medida em que as comunicações revolucionarizavam se o mercado de trabalho especialmente para trabalhadores especia lizados expandiase até abarcar todo o mundo industrializado A lista dos líderes sindicais ingleses deste período estava cheia de homens que haviam trabalhado no exterior nos Estados Unidos ou em outro lugar qualquer já que teriam podido trabalhar tanto em Newcastle como em BarrowinFurness dado às suas qualidades profissionais Portanto agora se tornava possível fazer emigração através dos ocea nos por estação do ano ou temporariamente De fato o aumento maciço da emigração continha uma quanti dade considerável de movimento nãopermanente temporário por estações ou meramente nômade Nada em si havia de novo nestes movimentos Todos estes viajantes eram familiares antes da Revolu ção Industrial Porém a rápida extensão mundial da nova economia iria pedir e portanto criar novos tipos de tais viajantes Consideremos o símbolo desta extensão a estrada de ferro Seus donos cobriam o globo e com eles o pessoal de maioria inglesa ou irlandesa composto de gerentes trabalhadores especializados e elite proletária algumas vezes estabelecendose para sempre seus filhos tornandose os angloargentinos da geração seguinte ou então mo vendose de país para país como muitos dos homens ligados ao pe tróleo hoje em dia Já que estradas de ferro eram construídas em qualquer lugar não se podia confiar necessariamente na força de tra balho local mas em lugar disso desenvolver um corpo de trabalha dores nômades que ainda caracteriza os grandes projetos de constru 211 ção através do mundo Na maioria dos países industriais estes eram recrutados entre homens marginais e sem lugar fixo prontos para tra balhar duro por um bom pagamento mesmo em más condições e be ber ou jogar o dinheiro ganho também de forma dura pensando pou co no futuro Pois assim como para o marinheiro há sempre um outro navio para estes trabalhadores ambulantes haveria também sempre um outro grande projeto de construção quando o atual tivesse termi nado Homens livres nas fronteiras da indústria chocando o respeitá vel de todas as classes heróis de um folclore de masculinidade não oficial eles assumiam o mesmo tipo de papel que os marinheiros e mineiros de fronteiras embora recebendo mais que os primeiros sem porém ter a esperança de fortuna dos últimos Nas sociedades agrárias mais tradicionais estes construtores móveis formavam uma importante ponte entre a vida rural e industri al Organizados em grupos ou times regulares liderados por um capi tão eleito que negociava termos e partilhava das negociações dos con tratos camponeses pobres da Itália Croácia ou Irlanda atravessariam continentes ou mesmo oceanos para fornecer trabalho aos construto res de cidades fábricas ou estradas de ferro Tais migrações desen volveramse nas planícies húngaras a partir da década de 1850 Os menos organizados dentre estes camponeses freqüentemente ofereci am uma eficiência superior e maior disciplina ou docilidade e a disposição para trabalhar por salários baixos Não é suficiente entretanto chamar a atenção para o crescimen to daquilo que Marx denominou a cavalaria ligeira do capitalismo sem observar concomitantemente uma diferença significativa entre os países desenvolvidos ou mais precisamente entre o Velho e Novo Mundo A expansão econômica produziu uma fronteira em todos os lugares Algumas vezes uma comunidade mineira tal como em Gel senkirchen na Alemanha que cresceu de 3500 habitantes para qua se 96 mil entre 1858 e 1895 era um Novo Mundo comparável a Buenos Aires ou Pensilvânia como centro industriais Mas no Velho Mundo em geral a necessidade de uma população móvel foi obtida sem que todavia se criasse mais do que uma população flutuante com parativamente modesta exceto nos grandes portos e nos centros tradi cionais como as grandes cidades Isto talvez tenha acontecido porque seus membros possuíam algum sentido de comunidade ligandoos a uma sociedade estruturada Foi nas regiões escassamente povoadas ou além das fronteiras da colonização no alémmar onde grupos de tra balhadores ambulantes eram mais necessitados que tais grupos de in divíduos flutuantes fizeram sentir sua presença como comunidade ou pelo menos foram mais visíveis O Velho Mundo estava cheio de viajantes e aventureiros mas nenhum deles atraiu a atenção como os cowboys americanos de nosso período embora seus equivalentes na Austrália os itinerantes fazendeiros de ovelhas e outros trabalhadores rurais do hinterland também tenham produzido um poderoso mito lo cal 212 II A forma característica de viagem para o pobre era a migração Para a classe média e os ricos era mais e mais turismo essencialmen te um produto da estrada de ferro barco a vapor e até onde a inven ção de nosso período o cartão postal também é uma parte essencial do processo da nova magnitude e rapidez das comunicações postais Estas foram sistematizadas internacionalmente com o estabelecimen to da International Postal Union em 1869 Homens pobres nas cida des viajavam por necessidade mas raramente por prazer salvo quan do era a pé as autobiografias dos artesãos vitorianos estão repletas de titânicas caminhadas campestres e por períodos restritos Ho mens pobres no campo nunca viajavam somente por prazer combi nando prazer com negócios nos mercados e feiras A aristocracia via java muito por razões nãoutilitárias mas de uma forma que nada tem em comum com o turismo moderno Famílias nobres partiam das ca sas na cidade para as casas de campo regularmente nas estações com um cortejo de empregados e veículos de bagagem como se fossem pequenos exércitos Aliás o pai do príncipe Kropotkin dava à sua mulher e à criadagem ordens específicas dentro de uma tradição mili tar Eles poderiam também se estabelecer em algum centro adequado de vida social por algum tempo como aquela família latino americana como atesta o Guide de Paris de 1867 que desembarcou com 18 vagões de bagagem O Grand Tour dos jovens nobres ainda não implicava no Grand Hotel do turismo da era capitalista em parte porque esta instituição ainda estava se desenvolvendo mais ou me nos em conexão com as estradas de ferro e em parte também porque estes nobres desdenhavam parar em hotéis de passagem O capitalismo industrial produziu duas novas formas de viagens de prazer turismo e viagens de verão para a burguesia e pequenas excursões mecanizadas para as massas em alguns países como a In glaterra Ambas eram os resultados diretos da aplicação do vapor no transporte já que pela primeira vez na história viagens regulares e seguras eram possíveis para grandes quantidades de pessoas e baga gem e por qualquer tipo de terreno ou mar Diferente das diligências que poderiam ter seu caminho interrompido por bandoleiros em regi ões remotas as locomotivas eram imunes desde o princípio exceto no Oeste Americano mesmo em áreas notoriamente pouco seguras como na Espanha e nos Bálcãs As viagens de um dia para as massas se excluirmos as excur sões em navios tinham nascido na década de 1850 para ser mais preciso na Grande Exibição de 1851 que atraiu um vasto número de visitantes para suas maravilhas em Londres um tráfico encorajado pelas estradas de ferro com bilhetes a preços especiais e organizado pelos membros de inúmeras sociedades locais e comunidades O pró prio Thomas Cook cujo nome iria tornarse sinônimo de turismo or ganizado nos 25 anos seguintes tinha começado sua carreira fazendo 213 tais arranjos e mais tarde desenvolvendoos em um grande negócio a partir de 1851 As numerosas exposições internacionais ver capítulo 2 traziam cada uma seu exército de visitantes e a reconstrução de capitais encorajou cidades provincianas a exibir suas maravilhas Pouco mais precisa ser dito sobre o turismo neste período Permane ceu confinado a pequenas viagens extenuantes para o padrão con temporâneo trazendo na sua bagagem uma florescente indústria me nor a dos souvenirs Em geral as estradas de ferro de qualquer ma neira na Inglaterra tinham pouco interesse nas viagens de terceira classe embora o governo obrigasseas a fornecer pelo menos um mí nimo Porém em 1872 as estradas de ferro inglesas iriam obter 50 de suas passagens neste nível Aliás na medida em que viagens regu lares de terceiraclasse aumentavam o tráfico de excursão em trens especiais tornavase menos importante A classe média porém viajava com mais seriedade A forma mais importante de tais viagens em termos quantitativos era prova velmente a da viagem de verão da família ou para os mais ricos uma estação de águas Este período viu um grande desenvolvimento de tais lugares na costa da Inglaterra nas montanhas do continente Embora Biarritz já fosse bastante famosa na década de 1860 graças ao patrocínio de Napoleão III e a pinturas impressionistas que de monstravam um interesse visível nas praias da Normandia a burgue sia do continente ainda não se sentia comprometida com a água sal gada e o sol Em meados da década de 1860 um boom de férias clas semédias já transformava partes da costa britânica com lugares para passeios na beira do mar piers e outros embelezamentos que torna ram possível a proprietários de terras obter lucros insuspeitados de faixas de terra antes sem nenhum valor Estes eram fenômenos de classe média e de baixa classe média No total as regiões de lazer da classe operária não se tornaram muito significativas até a década de 1880 quando então a nobreza certamente não consideraria uma esta dia em Bournemouth onde o poeta francês Verlaine passaria uma temporada ou Ventnor onde Turgenev e Karl Marx foram tomar um pouco de ar como uma atividade propícia para o verão As estações de água do continente as inglesas não tinham atin gido tal proeminência eram bem mais estilizadas proporcionando portanto hotéis de luxo e os divertimentos necessários para clientela tão distinta como cassinos e bordéis de alta classe Vichy Spa Ba denBaden AixlesBaines mas sobretudo todas as grandes estações de águas da monarquia dos Habsburgos Gastein Marienbad Karls bad etc eram para a Europa do século XIX o que Bath havia sido pa ra a Inglaterra do século XVIII lugares da moda para passear justifi cados pela desculpa de beber alguma água mineral de gosto desagra dável ou de imergir em alguma forma líquida sob o controle benevo lente de algum médico O status destes lugares era determinado pelo papel desempenhado na diplomacia do período Napoleão III encon 214 trou Bismarck em Biarritz e Cavour em Plombières e uma convenção foi encerrada em Gastein Entretanto o fígado era um grande nivela dor e as estações de águas minerais atraíram uma boa quantidade de ricos nãoaristocráticos e profissionais de classe média cujas tendên cias para comer e beber demasiadamente eram reforçadas pela pros peridade Afinal Dr Kugelmann recomendou Karlsbad para um membro tão pouco típico da classe média como Karl Marx que cui dadosamente registrouse como homem de meios privados para evi tar identificação até que descobriu que como Dr Marx ele poderia e conomizar uma Kurtaxe12 mais ou menos elevada Na década de 1840 poucos destes lugares haviam saído da simplicidade rural Em 1858 o Murrays Guide descrevia Mariembad como um lugar comparativa mente recente e indicava que Gastein tinha apenas 200 quartos para hóspedes Mas na década de 1860 todos estes lugares floresciam Sommerfrische férias de verão e Kurort estação de águas e ram para os burgueses coisas normais a França e a Itália tradiciona listas confirmam hoje que o descanso anual era então uma instituição burguesa Para os mais delicados um sol tépido era indicado isto quer dizer invernos no Mediterrâneo A Cote dAzur havia sido des coberta pelo Lorde Brougham o político radical cuja estátua ainda domina a vista em Cannes e embora os nobres russos viessem a se tornar seus clientes mais lucrativos o nome Promenade des Anglais em Cannes ainda indica quem abriu esta nova fronteira do rico lazer Monte Carlio construiu seu Hotel de Paris em 1866 Depois da aber tura do Canal de Suez e especialmente depois da construção da es trada de ferro ao longo do Nilo o Egito tornouse o lugar para aque les cuja saúde desaconselhava os outonos e invernos do Norte com binando as vantagens climáticas o exotismo os monumentos de anti gas civilizações com a dominação européia O incansável Baedeker editou seu primeiro guia para este país em 1877 Ir para o Mediterrâneo no verão exceto com o objetivo de pro curar arte e arquitetura ainda era visto como loucura até no início do século XX era do culto ao sol e das peles bronzeadas Somente al guns lugares como a baía de Nápoles e Capri estabelecidos graças ao patrocínio da Imperatriz da Rússia eram considerados toleráveis na estação quente A modéstia dos preços locais na década de 1870 indica uma era de início de turismo Americanos ricos saudáveis ou doentes ou melhor suas esposas e filhas faziam fila nos centros da cultura européia embora no final de nosso período os milionários já estivessem começando a estabelecer seu estilo de residência de ve rão Xanadus construídos ao longo da costa da Nova Inglaterra Os ri cos nos países quentes tomaram o caminho das montanhas Precisamos entretanto distinguir duas formas de passeio o mais longo verão ou inverno e o tour que tornavase cada vez mais prático e rápido Como sempre as maiores atrações eram as paisa gens românticas e os monumentos da cultura mas pela década de 1860 os ingleses pioneiros como sempre exportavam sua paixão 215 pelo exercício físico para as montanhas da Suíça onde mais tarde en contrariam o esqui como esporte de inverno O Clube Alpino foi fun dado em 1858 e Edward Whymper escalou o Matterhorn em 1865 Por razões de certa forma obscuras tais atividades extenuantes cerca das de um cenário inspirador atraíam particularmente intelectuais a profissionais liberais anglosaxões a ponto do alpinismo juntarse ao costume de fazer longas caminhadas como hábito característico dos acadêmicos de Cambridge altos funcionários professores de escolas privadas filósofos e economistas para surpresa de intelectuais lati nos mas não tanto dos alemães Quanto aos viajantes menos ativos seus passos eram guiados por Thomas Cook e os sólidos guias do pe ríodo sendo que o pioneiro Murrays Guides começava a ser obscu recido por aquelas bíblias do turismo os Baedekers alemães então publicados em diversas línguas Estes tours não eram baratos No início da década de 1870 uma viagem de seis semanas para duas pessoas de Londres via Bélgica Vale do Reno Suíça e França talvez o itinerário turístico mais co mum custava cerca de 85 libras ou aproximadamente 20 da renda anual de uma pessoa recebendo 8 libras por semana que seria o salá rio de um respeitável empregado doméstico naqueles dias13 Tal soma tomaria mais de três quartas partes do salário anual de um bempago operário especializado britânico É evidente que o turista que era ob jeto das estradas de ferro hotéis guias turísticos etc pertencia à con fortável classe média Estes eram os homens e mulheres que sem dú vida reclamavam do custo das casas desocupadas em Nice que havia subido entre 1858 e 1876 de 64 libras para 100 por ano e salário de empregados domésticos que tinha igualmente subido de 810 libras para o escândalo de 2430 por ano 14 Mas estas também eram as pes soas que é seguro dizer podiam pagar tais preços Estava então o mundo da década de 1870 dominado por migra ções viagens e fluxo demográfico É fácil esquecer que a maioria das pessoas deste planeta ainda vivia e morria no lugar onde havia nasci do e que toda esta movimentação não era maior ou diferente do que havia sido antes da Revolução Industrial Havia certamente mais gen te no mundo que se parecia com os franceses 88 dos quais em 1861 vivia no département de nascimento no département de Lot 97 vivia ainda na parish de nascimento do que com populações mais móveis e migratórias 15 E portanto as pessoas que iam sendo gradu almente arrancadas de suas tradições habituavamse a viver de uma forma em que viam coisas que seus pais nunca haviam feito e eles mesmos não esperavam fazer Pelo final de nosso período os imi grantes formavam uma substancial maioria não apenas em países co mo a Austrália e cidades como Nova York e Chicago mas em Esto colmo Christiania atualmente Oslo Budapeste Berlim e Roma en tre 55 e 60 assim como Paris e Viena 6516 As cidades e as no vas áreas industriais eram cada vez mais os magnetos que os atraí am Que tipo de vida os esperava ali Mechanisms and Limitations of Antigen Presentation by Endothelial Cells 217 DécimoSegundo Capítulo A CIDADE A INDÚSTRIA A CLASSE TRABALHADORA Agora eles fazem até o nosso pão diário Com vapor e com turbina E muito em breve a nossa própria conversa Vamos empurrála com uma máquina Em Trautenau há duas igrejas Uma para os ricos e outra para os pobres Nem mesmo na sepultura É o pobre desgraçado seu igual Poema in Trautenau Wochenblatt 1869 1 Nos velhos tempos se alguém chamasse um artesão de trabalhador ele seria levado certamente a uma briga Mas agora disseram aos artesãos que os trabalhadores estão no topo do Estado e portanto todos insistem em ser trabalhadores M May 18482 A questão da pobreza é a mesma que a da morte doença inverno ou qualquer outro fenômeno natural Não sei qual delas é possível de im pedir William Makepeace Thackeray 18483 I Dizer que os novos migrantes chegaram ou que novas gerações então nasceram num mundo de indústria e tecnologia é bastante ób vio mas não muito esclarecedor em si Que tipo de mundo era este Era em primeiro lugar um mundo que não consistia apenas de fábricas empregadores e proletários ou que tivesse sido transforma do pelo enorme progresso de seu setor industrial Por mais espantosas que fossem estas medidas em si mesmas não são adequadas para me dir o impacto do capitalismo Em 1866 Reichenberg Liberec o cen tro têxtil da Bohemia ainda tinha metade de sua produção total atra vés de trabalho manual embora estes dependessem de alguma forma de algumas grandes fábricas Era uma região sem dúvida menos a vançada em organização industrial que Lancashire onde os últimos dentre os trabalhadores manuais foram absorvidos por alguma outra 218 forma de trabalho na década de 1850 No ponto culminante do boom do açúcar do início da década de 1870 apenas 40 mil trabalhadores foram empregados na indústria açucareira Mas este fato mede menos o impacto da nova indústria de açúcar do que o fato de quantidade de acres ocupados na sua produção haver sido multiplicada no campo da Bohemia por vinte vezes entre 185354 4800 hectares e 187273 123 800 hectares4 O número dos passageiros nas linhas de estradas de ferro na Inglaterra quase que dobrou entre 1848 e 1854 de 58 para 108 milhões enquanto que a receita das companhias de carga multiplicouse em duas vezes e meia e isto é mais significativo que o percentual preciso de mercadorias industriais ou viagens de negó cios ocultadas por estes números E ainda o trabalho industrial em si mesmo na sua estrutura e organização característica além da urbanização vida nas cidades que cresciam rapidamente eram certamente as formas mais dramáti cas da nova vida nova porque mesmo a continuação pura e simples de alguma ocupação local escondia mudanças de longo alcance Al guns anos depois do fim de nosso período 1887 o professor alemão Ferdinand Toennies formulou a distinção entre Gemeinschaft comuni dade e Gesellschaft uma sociedade de indivíduos gêmeos hoje fami liares a qualquer estudante de sociologia A distinção é similar a outras feitas por observadores da época entre jargões criados para denomi naras sociedades tradicionais e modernas por exemplo a fórmula de Sir Henry Maine reduzindo o progresso da sociedade ao percurso do status ao contrato O ponto a observar entretanto é que Toennies baseou sua análise não na diferença entre comunidade camponesa e so ciedade urbanizada mas entre a cidade antiquada ea metrópole ca pitalista essencialmente uma cidade comercial e na medida em que o comércio domina o trabalho produtivo uma cidadefábrica5 Este no vo ambiente e sua estrutura são o objeto do presente capítulo A cidade era sem dúvida o mais impressionante símbolo exterior do mundo industrial exceção feita à estrada de ferro A urbanização cresceu rapidamente depois de 1850 Na primeira metade do século somente a Inglaterra tinha tido uma taxa anual de urbanização supe rior a 020 pontos representando a mudança do ponto percentual no nível da população urbana entre o primeiro e último censo do perío do dividido pelo número de anos6 embora a Bélgica praticamente atingisse aquele nível Mas entre 1850 e 1890 até a AustroHungria Noruega e Irlanda urbanizavamse àquela taxa sendo que a Bélgica e os Estados Unidos entre 030 e 040 Prússia Austrália e Argentina entre 040 e 050 Inglaterra e País de Gales além da Saxônia a mais de 050 por ano Dizer que a concentração de pessoas em cidades era o mais impressionante fenômeno social do atual século 7 era dizer o óbvio Para os nossos padrões ainda era modesta pelo final do sécu lo pouco mais de uma dúzia de países havia atingido à taxa de con centração urbana da Inglaterra e País de Gales em 1801 Porém todos exceto Escócia e Holanda já haviam atingido este nível desde 1850 219 A cidade industrial típica era neste período uma cidade de tama nho médio mesmo por padrões atuais embora como ocorresse na Europa central e oriental algumas cidades que tendiam a ser muito grandes também se tornaram centros maiores de produção por e xemplo Berlim Viena e São Petersburgo Oldham tinha 83 mil habi tantes em 1871 Barmen 75 mil Roubaix 65 mil Mas as antigas cida des industriais de maior reputação geralmente não atraíam as novas formas de produção e conseqüentemente a nova região industrial tí pica tomava em geral a forma de pequenas vilas que se transforma vam em pequenas cidades que depois se desenvolviam transforman dose em grandes cidades Poucos de seus habitantes estavam a uma distância do campo superior a uma caminhada Até a década de 1870 as grandescidades da Alemanha industrial do ocidente tais como Colônia e Dusseldorf alimentavamse com os mantimentos trazidos ao mercado semanal pelos camponeses das regiões circunvizinhas 8 Em certo sentido o choque da industrialização residia precisamente no grande contraste entre as habitações escuras monótonas repletas de gente e as fazendas coloridas circunvizinhas como em Sheffield por exemplo Isso é o que tornava possível que trabalhadores em áreas em processo de industrialização embora tal fenômeno diminuísse rapi damente permanecessem meioagricultores Até depois de 1900 os mineiros na Bélgica tiravam férias na estação certa se necessário a través de uma greve de batatas para ir tomar conta de suas planta ções de batatas Mesmo na Inglaterra do norte os desempregados na zona urbana podiam facilmente voltar ao trabalho nas fazendas pró ximas em época de verão 9 A grande cidade quer dizer um povoamento de mais de 200 mil incluindo um punhado de cidades metropolitanas de mais de meio milhão não era exatamente um centro industrial embora pu desse contar um bom número de fábricas mas mais precisamente um centro de comércio transporte administração e uma multiplicidade de serviços que uma grande concentração de pessoas atraía A maio ria de seus habitantes era de fato composta de trabalhadores de um tipo ou de outro incluindo um grande número de empregados domés ticos quase que um entre cinco habitantes de Londres 1851 mas uma proporção bem inferior em Paris 10 E ainda estas mesmas di mensões garantiam que estas cidades também contivessem uma boa porcentagem de classe média e baixa classe média digamos entre 20 e 23 tanto em Londres como em Paris Tais cidades cresceram com extraordinária rapidez Viena cres ceu de mais de 400 mil em 1846 para 700 mil em 1880 Berlim de 378 mil 1X49 para quase um milhão 1875 Paris de 1 para 19 mi lhão e Londres de 25 para 39 milhões 185181 embora estes nú meros percam o brilho diante de alguns outros de alémmar Chicago ou Melbourne Mas a forma imagem e estrutura mesma da cidade havia mudado tanto sob pressão para construção e planejamento poli 220 ticamente motivada sobretudo em Paris e Viena como pela fome de lucro das construtoras Ambas não recebiam bem a presença dos po bres nas cidades que eram a maioria da população embora reconhe cessem que eram um mal necessário Para os planejadores de cidades os pobres eram uma ameaça pública suas concentrações potencialmente capazes de se desenvol ver em distúrbios deveriam ser impedidas e cortadas por avenidas e bulevares que levariam os pobres dos bairros populosos a procurar habitações em lugares menos perigosos Esta também era a política das estradas de ferro que fazia suas linhas passarem através destes bairros onde os custos eram menores e os protestos negligenciáveis Para os construtores os pobres eram um mercado que não dava lucro comparado ao dos ricos com suas lojas especializadas e distritos de comércio e também às sólidas casas e apartamentos para a classe média Quando os pobres não ocupavam os distritos centrais das ci dades abandonados pelas classes mais elevadas seus lugares eram construídos por empresários especuladores ou pelos construtores dos grandes blocos de aluguel conhecidos na Alemanha como barra cões de aluguel Mietskasernen Das casas populares construídas em Glasgow entre 1866 e 1874 75 eram de um ou dois quartos a penas e mesmo assim foram rapidamente ocupadas Quem diz cidade de meados do século XIX diz superpovoada e cortiço e quanto mais rápido a cidade crescesse pior era em su perpopulação Apesar da reforma sanitária e do pequeno planejamen to que ali havia o problema da superpopulação talvez tenha crescido neste período sem que a saúde tenha melhorado quando não piorou decididamente As maiores melhorias neste setor só começaram a o correr no final de nosso período As cidades ainda devoravam suas populações embora as cidades inglesas na qualidade de mais antigas da era industrial estivessem próximas de se reproduzirem a si mes mas isto é crescer sem a constante e maciça transfusão de sangue re presentada pela imigração Dar mais atenção às necessidades dos pobres em si não chegaria a dobrar o número dos arquitetos londrinos em 20 anos de pouco mais de 1 mil para 2 mil na década de 1830 eles deveriam perfazer menos de uma centena embora a construção de casas populares vi esse a se transformar num negócio bastante lucrativo Era na reali dade uma época de boom na arquitetura e na construção para a burguesia Sua história foi escrita em relação a Paris por Emile Zola A época iria assistir a construção de casas em lugares caros que au mentavam constantemente de preço e conseqüentemente o nascimen to do elevador depois seguido da construção dos primeiros arra nhacéus nos Estados Unidos E importante lembrar que no momento em que os negócios de Manhattan começaram a atingir os céus o se tor leste de Nova York era provavelmente o mais populoso cortiço do mundo ocidental com mais de 520 pessoas por acre Ninguém cons truía arranhacéus para eles talvez para sorte deles 221 Paradoxalmente tanto mais a classe média crescia e florescia drenando recursos para seu próprio sistema habitacional escritórios lo jas que eram tão características do desenvolvimento da época e seus prestigiosos edifícios relativamente menos recursos eram dedicados aos bairros da classe operária exceto nas formas mais gerais de despe sas públicas ruas esgotos iluminação e utilidades públicas A única forma de empresa privada incluindo construção que se dirigia basi camente ao mercado de massa exceção feita ao mercado e pequena lo ja era a taverna que transformouse no elaborado ginpalace da In glaterra das décadas de 1860 e 1870 e seu corolário o teatro e o mu sichall Pois na medida em que as pessoas se tornavam urbanizadas as antigas tradições e práticas que haviam trazido do campo ou da ci dade préindustrial tornavamse irrelevantes ou impraticáveis II A grande cidade era um portento embora só contivesse uma mi noria da população A grande empresa industrial era ali ainda pouco significativa De fato pelos padrões modernos o tamanho de tais em presas não era muito expressivo embora tendesse a aumentar Na dé cada de 1850 uma fábrica com 300 trabalhadores na Inglaterra podia ser ainda considerada muito grande e em 1871 uma fábrica de teci dos inglesa empregava normalmente 180 pessoas 12 A indústria pe sada tão característica de nosso período era muito maior do que isso e tendia a desenvolver as concentrações de capital que controlavam cidades ou regiões inteiras mobilizando vastos exércitos de trabalho sob seu comando Companhias de estradas de ferro eram gigantescos empreendi mentos mesmo quando construídas e dirigidas em condições de livre iniciativa e competição como normalmente não o eram Na época em que o sistema ferroviário inglês haviase estabilizado no final da dé cada de 1860 cada metro de trilho entre a fronteira escocesa as mon tanhas Pennine o mar e o Rio Humber era controlado pela North Eastern Railway Minas de carvão eram ainda na maioria dos casos empreendimentos individuais e freqüentemente pequenos embora as dimensões de alguns grandes desastres operacionais dêem alguma i déia da escala em que operavam 145 mortos em Risca em 1860 178 em Ferndaleem 1867 140 em Swaithe Yorkshire 110 em Mons Bélgica em 1875 e 200 em High Blantyre Escócia em 1877 De forma crescente e em especial na Alemanha a combinação do hori zontal com o vertical produziu aqueles impérios industriais que con trolavam a vida de milhares A empresa conhecida desde 1873 como Gutehoffnungshütte A G era sem dúvida a maior da Ruhr mas já havia então se estendido de siderurgia para minas de carvão produ zindo praticamente todas as 215 mil toneladas de ferro e a metade das 415 mil toneladas de carvão que a Ruhr inteira requeria e havia se 222 diversificado em transporte construção de pontes navios e uma grande variedade de máquinas 13 Não deve causar admiração o fato de que os Krupp em Essen cresceram de 72 trabalhadores em 1848 para quase 12 mil em 1873 ou que Schneider na França tivesse atingido 12500 em 1870 de for ma que mais da metade da população da cidade de Creusot trabalhava nos seus fornos e maquinaria diversa14 A indústria pesada produziu a região industrial da mesma forma que produziu a companhia que en globava cidades onde o destino de homens e mulheres dependia do humor e boavontade de um único gerente atrás do qual estava a for ça da lei e do poder do Estado olhando esta autoridade como neces sária e benfazeja Pois fosse pequena ou grande era o gerente e não a autorida de impessoal da companhia que dirigia os negócios e até a compa nhia era identificada com um único homem e não com um corpo de diretores Na maioria das mentes das pessoas e na realidade capita lismo ainda significava um único homem uma única família um úni co negócio a coordenar Este fato mesmo veio a gerar alguns sérios problemas para a estrutura das empresas Eles diziam respeito ao for necimento de capital e a forma de administrálo A empresa característica da primeira metade do século tinha es magadoramente sido financiada de forma privada por exemplo com recursos familiares e sofrido expansão através de reinvestimento dos lucros embora isto possa também querer dizer que com a maior parte do capital comprometido desta maneira a firma talvez necessitasse de uma boa quantidade de crédito para suas operações correntes Mas o tamanho e o custo crescentes de empreendimentos tais como estradas de ferro atividades metalúrgicas e outras que requeriam um grande empate de capital inicial tornavam isso mais difícil especialmente em países que estavam entrando em processo de industrialização não dis pondo de grandes acumulações de capital privado para investimento É verdade que em alguns países tais reservatórios de capital já eram dis poníveis suficientemente não apenas para suas próprias necessidades mas também ansiosos para serem exportados com uma adequada taxa de juros para o resto da economia mundial Os ingleses investiram no exterior neste período como nunca antes ou em termos relativos desde então Assim também o fizeram os franceses provavelmente em detri mento de suas próprias indústrias que cresceram a uma taxa inferior às suas rivais inglesas Mas mesmo na Inglaterra e na França novas for mas de mobilizar estes recursos ou de canalizálos convenientemente para as empresas precisavam ser encontradas Nosso período foi assim um tempo fértil para experimentos na mobilização de capital para o desenvolvimento industrial Com a no tável exceção da Inglaterra a maioria das transações de uma forma ou de outra envolvia os bancos direta ou indiretamente ou eram fei tas através da forma da moda o crédit mobilier uma espécie de com panhia industrial financeira que olhava os bancos ortodoxos como in 223 suficientemente preparados para ou desinteressados em o financia mento industrial competindo com eles Os irmãos Pereire estes dinâ micos industrialistas inspirados pelas idéias de SaintSimon e desfru tando de algum apoio de Napoleão III desenvolveram o modelo pro tótipo desta invenção Eles se espalharam por toda a Europa compe tindo com seus raivosos rivais os Rothschilds que não gostaram da idéia mas foram obrigados a seguila e como freqüentemente acon tece em períodos de grande expansão da economia em que financistas sentemse heróis e o dinheiro corre eram muito imitados especial mente na Alemanha Crédits mobiliers era a sensação pelo menos até que os Rothschilds venceram a batalha contra os Pereires e como também freqüentemente acontece em períodos de grande expansão econômica alguns operadores se aventuraram um pouco longe de mais atravessando a tênue fronteira que separa o otimismo nos negó cios e a fraude Entretanto uma variedade de outras soluções com ob jetivos similares estava também sendo desenvolvida especialmente o banco de investimento ou banque daffaires E evidentemente as bol sas de valores agora comerciando principalmente com as ações das empresas comerciais e de transporte floresciam como nunca Em 1856 a Bolsa de Paris sozinha apresentava uma lista de 33 compa nhias de estradas de ferro e canais 38 companhias de mineração 11 portuárias 7 de transportes urbanos 11 de gás e 42 de vários empre endimentos industriais indo de têxteis a ferro galvanizado e borracha com um valor total de cinco e meio milhões de francosouro 15 Em quanto realmente eram requeridas estas vastas mobilizações de capital Em que medida eram elas eficazes Industriais em geral nunca apreciaram muito os financistas e os primeiros tentaram sempre ter o mínimo possível de negócios a tratar com bancos Lille es creveu um observador em 1869 não é uma cidade capitalista é antes de tudo um grande centro industrial e comercial 16 onde os homens aplicavam seus lucros de volta nos negócios não brincavam com eles e onde todos esperavam nunca ter de pedir emprestado a bancos Ne nhum industrial gostava de ficar a mercê de credores Mas às vezes precisavam fazêlo Krupp cresceu tão rapidamente entre 1855 e 1866 que ficou sem capital Há um elegante modelo histórico segundo o qual quanto mais atrasada a economia e quanto mais tardio o início da industrialização maior a dependência nos métodos de mobilização de recursos e poupança em larga escala Nos países desenvolvidos oci dentais recursos privados e mercado de capital eram bastante adequa dos Na Europa central os bancos e instituições similares tinham que atuar muito na qualidade de sistemáticos desenvolvedores da história Mais a Leste Sul e alémmar os governos tinham que apoiarse em si mesmos geralmente com a ajuda de investimento estrangeiro fosse pa ra garantir capital ou talvez mais corretamente fazer com que os in vestidores tivessem seus dividendos garantidos ou pelo menos pensas sem que tinham dividendos que iriam sozinhos mobilizar o dinheiro Fosse qual fosse a validade desta teoria não há dúvida de que em nosso 224 período os bancos e instituições similares tinham um papel muito mais relevante como atores do desenvolvimento e direção da indústria na Alemanha o grande recémchegado industrial do que em qualquer outro país no Ocidente Se eles apenas pretendiam como os crédits mobiliers ou se eles eram realmente eficazes no papel é uma questão um pouco obscura Provavelmente eles não eram particularmente pre parados para tal até que os grandes industriais então reconhecendo a necessidade de um financiamento muito mais elaborado do que nos ve lhos dias colonizaram os grandes bancos como fizeram de forma cres cente na Alemanha a partir da década de 1870 As finanças não afetaram muito a organização dos negócios mas talvez tenham influenciado na sua política O problema da dire ção era mais complicado Para o modelo básico da empresa individual ou em mãos de uma única família a autocracia patriarcal familiar es te era um problema irrelevante nas indústrias da segunda metade do século XIX O melhor aprendizado é aquele proporcionado pela pa lavra que sai da boca dizia um manual alemão em 1868 deixem o empreendedor dar o exemplo por si mesmo onipresente e sempre ac cessível cujas ordens sejam reforçadas pelo exemplo pessoal que seus empregados têm constantemente diante dos olhos 17 Este con selho adequado a artesãos ou fazendeiros era válido na medida em que a instrução era um aspecto essencial da gerência nos novos países em vias de industrialização Até homens com os conhecimentos bási cos dê artesãos preferentemente em metais precisavam aprender a habilidade do trabalhador especializado de fábrica A grande maioria dos trabalhadores especializados dos Krupp parece ter sido treinada no trabalho desta maneira Somente na Inglaterra podiam os empre gadores confiar no suprimento de trabalhadores deste tipo que já ti nham experiência industrial O paternalismo de tantos empreendi mentos no continente devia alguma coisa a esta longa associação en tre os trabalhadores e as firmas onde tinham crescido e de onde de pendiam Mas os senhores dos trilhos minas e siderúrgicas não podi am olhar paternalmente por cima dos ombros de seus empregados to do o tempo e certamente não o fizeram A alternativa e complemento à instrução era o comando Mas nem a autocracia da família nem as pequenas operações da indústria especializada e comércio supriam a necessidade de direção para as grandes organizações capitalistas Portanto a iniciativa privada na sua forma mais irrestrita e anárquica tendeu para os únicos modelos disponíveis de gerência em grande escala o militar e o burocrático As companhias de estradas de ferro com suas pirâmides de trabalha dores uniformizados e disciplinados possuindo segurança de traba lho promoção por antigüidade e até mesmo pensões são um exemplo extremo O apelo exercido pelos títulos militares que ocorria livre mente entre os primeiros executivos ingleses de estradas de ferro e os executivos dos grandes portos não era apenas devido ao orgulho em relação às hierarquias de soldados e oficiais como era o caso dos a 225 lemães mas à inabilidade da iniciativa privada em determinar uma forma específica de gerência para os grandes negócios Havia vanta gens evidentes do ponto de vista organizacional Não resolvia o pro blema da manutenção do trabalho de forma leal diligente e modesta Tudo estava muito bem para países onde uniformes estavam na moda e eles certamente não estavam na Inglaterra e nos Estados Unidos encorajando entre os trabalhadores as virtudes militares dos soldados e entre elas sem dúvida a de ser mal pago Sou um soldado um soldado da indústria E como você tenho minha bandeira Meu trabalho tem enriquecido a pátria Vou te dizer meu destino é glorioso 18 Assim cantava um poeta em Lille França Mas mesmo este pa triotismo era um pouco demasiado A era do capital encontrou dificuldades em acertar os termos com este problema A insistência da burguesia na lealdade disciplina e modesta satisfação não podia realmente esconder que sua verdadei ra percepção de que o que fazia os trabalhadores trabalharem era algo bem diferente Mas o que era então Na teoria eles deveriam trabalhar para deixar de serem trabalhadores logo que possível entrando então no universo burguês Como EB colocou nas Songs for English Work men to Sing em 1867 Trabalhem rapazes trabalhem e fiquem satisfeitos Desde que vocês tenham o suficiente para comprar um refeição O homem em que vocês podem confiar Ficará rico mais e mais Somente se puser seus ombros na roda Mas embora esta esperança pudesse ser suficiente para alguns que tivessem conseguido subir e sair da classe operária era perfeita mente evidente que a maioria dos trabalhadores permaneceria traba lhador por toda a vida e de fato o sistema econômico requeria deles exatamente isso A promessa do marechaldecampo não tinha a in tenção de promover todos os soldados a marechais Se a promoção não era um incentivo adequado seria então o di nheiro Entretanto era um axioma dos empregadores de meados do século XIX que os salários precisavam ser mantidos o mais baixo possível embora empreendedores inteligentes com experiência inter nacional como Thomas Brassey o construtor de estradas de ferro começassem a apontar para o fato de que o trabalho do operário in glês bem pago era de fato mais barato que o do abissalmente mal pa go coolie já que a produtividade do primeiro era muito superior Mas tais paradoxos não eram suficientes para convencer homens de negó cios crescidos dentro da teoria econômica do wagefund acreditando ser ela uma demonstração científica de que aumentar salários era im 226 possível e que os sindicatos estavam portanto condenados ao fracas so A ciência tornouse um pouco mais flexível a partir de 1870 quando o trabalhismo organizado começou a parecer um ator perma nente na cena industrial ao invés de aparecer apenas como um extra A grande autoridade em economia John Stuart Mill 180673 que chegou a simpatizar pessoalmente com o trabalhismo modificou sua posição na questão em 1869 depois do que a teoria do wagefund perderia sua autoridade canônica Mas não haveria ainda mudanças nos princípios de negócios Poucos empregadores tinham a intenção de pagar mais do que precisavam Além disso economia a parte nos países do Velho Mundo a classe média acreditava que os trabalhadores deveriam ser pobres não apenas porque sempre tinham sido mas também porque a inferio ridade econômica era um índice adequado de inferioridade de classe Se como aconteceu ocasionalmente por exemplo no grande boom de 187273 alguns trabalhadores chegassem a receber suficiente mente para se darem ao luxo de desfrutar dos privilégios que os em pregadores olhavam como seus direitos naturais a indignação que is to levantava era sincera e vinha do fundo do coração O que é que mineiros tinham a ver com pianos de cauda e champagne Em países com carência de trabalhadores hierarquia social subdesenvolvida e uma população operária truculenta e democrática as coisas poderiam ser diferentes mas na Inglaterra e na Alemanha França e Império dos Habsburgos diferente da Austrália e dos Estados Unidos o máximo adequado para a classe trabalhadora era uma quantidade suficiente de comida boa e decente preferivelmente sem muita bebida um lugar modesto para vida social vestimenta adequada para proteger a moral e saúde e conforto sem arriscar uma tendência à imitação dos melho res na escala social Esperavase que o progresso capitalista viesse eventualmente trazer os trabalhadores próximo a este ideal e infeliz mente o que não implicava em aumentar salários muitos ainda esta vam abaixo deste nível Portanto era desnecessário indesejável e pe rigoso aumentar salários além daquele limite De fato as teorias econômicas e os princípios aceitos do libera lismo de classe média não iam muito bem juntos Em certo sentido as teorias triunfaram Em nosso período a relação de salário iria ser crescentemente transformada em uma relação de mercado Conse qüentemente vimos o capitalismo inglês da década de 1860 abando nar formas de compulsão nãoeconômica de trabalho tais como os Master e Servants Acts que puniam com cadeia quebras de contratos por trabalhadores contratos de longo termo tais como o annual bond dos mineiros de carvão do Norte enquanto a duração média de contratos era diminuída o período médio de pagamento gradualmente reduzido para uma semana ou mesmo um dia ou uma hora fazendo portanto a barganha no mercado muito mais sensível e flexível Por outro lado as classes médias teriam ficado chocadas se os trabalhado res pedissem de fato por um tipo de vida que elas tinham como dado 227 e mais ainda se eles viessem a conseguilo Desigualdade de vida e expectativas cresciam com o sistema Isso limitava os incentivos econômicos que os patrões estavam preparados para conceder Eles desejavam ligar salários à produção por vários sistemas de piecework que parece haverem se espalhado durante nosso período e assinalar que os trabalhadores deviam agra decer por ter afinal algum trabalho já que havia um grande exército industrial de reserva do lado de fora esperando por aqueles empregos Pagamentos contra resultados tinham algumas vantagens evi dentes Marx chamoua a melhor forma de retribuição por salários pa ra o capitalismo Fornecia um incentivo genuíno para o trabalhador intensificar o seu trabalho e conseqüentemente aumentar sua produ tividade uma garantia contra a negligência em geral uma solução pa ra reduzir a conta de salários em tempos de depressão assim como um método adequado para reduzir os custos do trabalho e impedir que salários aumentassem mais do que era necessário e conveniente Também dividia os trabalhadores entre si já que o que recebiam po dia variar enormemente dentro do mesmo estabelecimento ou dife rentes tipos de trabalho poderiam ser pagos através de formas intei ramente diferentes Algumas vezes os especializados faziam o papel de subempregadores pagos por produção contratando então assisten tes nãoespecializados por um mínimo e controlando o que estes pro duziam O problema era que o trabalho por empreitada sofria alguma resistência especialmente por parte dos especializados já que era um arranjo muito complexo e obscuro não apenas para os trabalhadores mas também para os empregadores que não tinham na maioria das vezes idéias das normas de produção que deveriam ser estipuladas Também não era fácil de ser aplicado em algumas ocupações Os trabalhadores tentaram remover estas desvantagens reintroduzindo o conceito de um salário básico previsível e impossível de ser compri mido que seria um salário padrão determinado através dos sindica tos ou de práticas informais Os empregadores estavam próximos da remoção destas idéias por aquele processo que os partidários da in dústria americanos iriam chamar de gerência científica scientific management mas no nosso período eles ainda tinham problemas em lidar com esta solução Talvez isto tenha levado a uma ênfase maior no outro incentivo econômico Se um único fator dominava a vida dos trabalhadores do século XIX este fator era a insegurança Eles não sabiam no princí pio da semana quanto iriam levar para casa na sextafeira Eles não sabiam quanto tempo iria durar o emprego presente ou se viessem a perdêlo quando voltariam a encontrar um novo trabalho e em que condições Eles não sabiam que acidentes ou doenças iriam afetálos e embora soubessem que algum dia no meio da vida talvez 40 anos para os trabalhadores nãoespecializados talvez 50 para os especiali zados iriam se tornar incapazes para o trabalho pleno e adulto não sabiam o que iria acontecer então entre este momento e a morte Di 228 versa era a insegurança dos camponeses à mercê de periódicas e para ser honesto mais assassinas catástrofes tais como secas e fo me mas capazes de prever com maior precisão como um homem ou uma mulher pobre passaria a maioria dos dias da vida do nascimento até a morte A primeira era uma imprevisibilidade mais profunda a pesar do fato de que a maioria dos trabalhadores era empregada por longos períodos de suas vidas por um único empregador Não havia certeza no trabalho mesmo para os mais especializados durante a queda de 185758 o número de trabalhadores na indústria de enge nharia em Berlim caiu em quase uma terça parte20 Não existia nada que correspondesse à moderna segurança social exceto caridade e re admissão no serviço mas algumas vezes nem isso Para o mundo do liberalismo insegurança era o preço a pagar por progresso e liberdade sem mencionar riqueza e tornavase tolerável pela contínua expansão econômica Segurança deveria ser comprada pelo menos algumas vezes não por homens e mulheres livres mas como a terminologia inglesa especificava muito bem por em pregados cuja liberdade era bastante limitada empregados domés ticos empregados de estradas de ferro servidores civis etc Na reali dade o maior grupo entre estes os empregados domésticos urbanos não desfrutavam da segurança das famílias da nobreza tradicional mas freqüentemente viamse diante da insegurança na sua pior forma de missão imediata sem uma carta de recomendação do antigo senhor para futuros empregadores Pois o mundo dos burgueses estabelecidos tam bém era considerado como sendo basicamente inseguro um estado de guerra onde a qualquer momento eles poderiam ser as vítimas da com petição fraude ou desastre econômico embora os homens de negócios que eram vulneráveis a esse ponto talvez formassem apenas uma pe quena minoria das classes médias e a penalidade do fracasso raramente era o trabalho manual menos ainda o trabalho de casa A expansão e conômica mitigava esta constante insegurança Não há muita evidência de que salários reais na Europa tenham começado a aumentar antes do final da década de 1860 mas mesmo antes que o sentimento geral de que os tempos melhoravam passasse a ser uma certeza nos países de senvolvidos o contraste com as décadas desesperadas e sofridas de 1830 e 1840 era palpável Nem o aumento súbito no custo de vida nos anos 185354 nem a catástrofe financeira de 1858 trouxeram distúrbios sociais sérios A verdade é que o grande boom econômico havia forne cido emprego em casa e para os imigrantes afora numa escala sem precedentes Não havia evidentemente falta de trabalho já que os exér citos de reserva da população rural em casa e fora estavam agora pela primeira vez avançando en masse sobre os mercados de trabalho So mente o fato de que a competição destes últimos não reverteu as condi ções da classe operária sugere que o ímpeto e a escala desta expansão econômica eram realmente imensos A classe operária porém muito diferente da classe média via a insegurança como uma coisa muito mais constante e real Ela não ti 229 nha reservas significativas Aqueles que podiam viver de economias por algumas semanas eram considerados privilegiados 21 Até os salá rios dos especializados eram modestos Em tempos normais um ope rário em Preston que com seus sete filhos empregados ganhasse 4 li bras por semanas numa semana de pleno emprego teria sido objeto de inveja de seus vizinhos Mas não foram precisas muitas semanas da epidemia de fome em Lancashire devida a interrupção do supri mento de algodão dos Estados Unidos por causa da Guerra Civil para reduzir esta mesma família à miséria O caminho normal ou mesmo inevitável da vida passava por estes abismos nos quais o trabalhador e sua família iriam provavelmente cair o nascimento de crianças a ve lhice e a impossibilidade de continuar o trabalho Em Preston 52 de todas as famílias operárias com crianças abaixo da idade de trabalho trabalhando em pleno serviço num ano de comércio memorável 1851 poderia esperar viver abaixo da linha de miséria 22 A idade avançada era uma catástrofe para ser esperada com estoicismo um declínio na capacidade de produção a partir dos 40 quando a força fí sica começava a decair especialmente para os menos especializados seguida de pobreza Para a classe média os meados do século XIX foram a idade de ouro das pessoas em idade madura quando os ho mens atingiam o ponto culminante de suas carreiras renda e atividade e o declínio fisiológico ainda não haviase tornado muito óbvio Para os oprimidos trabalhadores de ambos os sexos e mulheres de todas as classes a flor da vida só aparecia na juventude Nem incentivos econômicos nem insegurança forneciam um mecanismo geral realmente efetivo para manter o trabalho no seu ponto máximo o primeiro porque sua amplitude era limitada o últi mo porque sua obtenção parecia tão impossível como a previsão do tempo As classes médias achavam este argumento de difícil compre ensão Por que deveriam ser exatamente os melhores mais capazes e sóbrios trabalhadores aqueles com maior tendência a formar sindica tos já que eles eram precisamente os que mereciam os melhores salá rios e o emprego mais regular Mas os sindicatos eram de fato com postos e liderados por estes homens embora a mitologia burguesa visse os sindicatos como multidões de estúpidos e desencaminhados instigados por agitadores que não conseguiriam obter uma melhor forma de vida de outra maneira Certamente não havia nenhum misté rio nisso Os trabalhadores que eram objeto de competição entre em pregadores não eram apenas aqueles que tinham força de barganha para fazer a existência de sindicatos possível mas também aqueles mais conscientes de que o mercado sozinho não lhes garantia nem segurança nem aquilo a que eles pensavam ter direito Entretanto desde que eles não se organizassem e algumas ve zes mesmo quando chegavam a fazêlo os trabalhadores proporcio navam a seus empregadores uma solução para o controle do trabalho na sua esmagadora maioria eles gostavam de trabalhar e suas expecta tivas eram espantosamente modestas Os nãoespecializados ou re 230 cémchegados do interior eram orgulhosos de sua força vindo de um meio onde o trabalho pesado era o critério do valor de uma pessoa e onde mulheres eram escolhidas não pela aparência mas pela potencia lidade para o trabalho Minha experiência tem mostrado declarou um superintendente de siderurgia americano em 1875 que os ale mães irlandeses suecos e aquilo que eu chamo de Buckwheats jovens americanos do campo criteriosamente misturados produzem a força mais efetiva e tratável que se possa encontrar 23 Por outro lado os especializados eram sensíveis aos incentivos nãocapitalistas do orgulho e conhecimento de suas especializações Até as máquinas deste período de ferro e bronze limpas e polidas com o toque do amor em condições perfeitas de funcionamento de pois de um século são um vivo exemplo disso O catálogo sem fim dos objetos dispostos nas exposições internacionais embora horríveis do ponto de vista estético eram monumentos para orgulho daqueles que os construíram Estes homens não aceitavam muito bem as or dens e supervisão e estavam freqüentemente fora de qualquer contro le efetivo exceto pelo coletivo que eram suas oficinas Eles também recusavam métodos para fazer com que seus serviços fossem feitos mais rapidamente ou que rebaixassem o respeito devido ao trabalho Mas se eles não trabalhavam nem mais ou nem mais rapidamente do que o que o trabalho pedia eles não trabalhavam nem menos nem com menor vigor ninguém precisava oferecerlhes maiores incenti vos para que dessem do seu melhor Um dia justo de trabalho por um dia justo de pagamento dizia o refrão e se eles esperavam que o pa gamento os satisfizesse esperavam também que o trabalho tornasse a todos satisfeitos inclusive a eles mesmos Evidentemente esta visão nãocapitalista do trabalho beneficia va mais aos empregadores que aos operários Ê necessário observar que os compradores no mercado de trabalho operavam segundo o princípio de comprar no mercado mais barato e vender no mais caro embora às vezes ignorantes dos métodos de avaliação corretos Mas os vendedores não estavam geralmente pedindo o salário máximo que o mercado pudesse agüentar e oferecendo em troca a quantidade mí nima de trabalho que pudessem Estes últimos estavam apenas bus cando uma forma decente de ganhar a vida Eles estavam apenas ten tando melhorar um pouco Em resumo embora naturalmente não fos sem insensíveis às diferenças entre salários altos e baixos eles esta vam comprometidos mais com a vida humana do que com transações econômicas III Mas é possível falarmos dos trabalhadores como uma catego ria única ou como uma classe O que havia em comum entre grupos de pessoas freqüentemente tão diferentes no meio origem social formação situação econômica ou mesmo até na língua e costumes 231 Nem mesmo a pobreza pois embora para os padrões da classe média todos tivessem baixas rendas exceto em paraísos do trabalho como a Austrália na década de 1850 onde os trabalhadores em composição de jornais ganhavam até 18 libras por semana 24 pelos padrões dos pobres havia uma grande diferença entre os artesãos bem pagos ou menos regularmente empregados que usavam uma cópia das vesti mentas da classe média nos domingos ou mesmo no caminho para o trabalho e os trabalhadores famintos que nem sabiam quando recebe riam a próxima refeição ou a de sua família Todos estavam realmen te unidos através de um sentido comum do trabalho manual e da ex ploração e de forma crescente pelo destino de serem operários Eles estavam unidos pela crescente segregação da sociedade burguesa cu ja riqueza crescia dramaticamente enquanto a situação dos trabalha dores permanecia precária uma burguesia que se tornava mais e mais inflexível na admissão dos que vinham de baixo Pois havia uma real diferença entre as modestas conquistas de conforto que um trabalha dor bemsucedido ou mesmo um extrabalhador pudessem conseguir e as brutais acumulações de riqueza Os trabalhadores foram empur rados para uma consciência comum não apenas pela polarização soci al mas nas cidades pelo menos por um estilo comum de vida no qual a taverna a igreja do trabalhador como um burguês liberal chamoua tinha um papel central e por um estilo comum de pen samento Os menos conscientes tendiam a ser tacitamente laicizados os mais conscientes radicalizavamse os que apoiaram a Internacional na década de 1860 os futuros seguidores dos socialistas Os dois fenôme nos estavam interligados pois a religião tradicional tinha sido sempre um liame de unidade social dentro do ritual de afirmação da comunida de Mas as procissões e cerimônias comuns atrofiaramse em Lille du rante o Segundo Império Os trabalhadores especializados de Viena cuja piedade e ingênua alegria na pompa católica Lé Play havia notado na década de 1850 tornaramse indiferentes a estas coisas Em menos de duas gerações haviam transferido sua fé para o socialismo Os grupos heterogêneos dos trabalhadores pobres sem dúvida tenderam a se tornar parte do proletariado nas cidades e regiões in dustriais A importância crescente dos sindicatos na década de 1860 registrou bem esta circunstância e a existência mesma para não mencionar a força da Internacional teria sido impossível sem ela Porem os trabalhadores pobres não eram apenas o conjunto de gru pos disparatados Eles haviam especialmente nos anos desesperados da primeira metade do século fundidose numa massa homogênea de descontentes e oprimidos Esta homogeneidade estava agora sendo perdida A era do capitalismo liberal estável e florescente oferecia à classe operária a possibilidade de melhorar sua barganha coletiva a través de organização coletiva Mas aqueles que permaneciam mera mente a miscelânea de pobres não podiam esperar muito dos sindi catos e menos ainda das Sociedades de Ajuda Mútua Sindicatos e ram especialmente organizações que favoreciam minorias embora 232 greves pudessem ocasionalmente mobilizar as massas Além disso o capitalismo oferecia ao trabalhador individual perspectivas diferentes de melhorias em termos burgueses que porções maiores da popula ção trabalhadora eram incapazes ou estavam sem vontade de obter Uma fissura portanto apareceu dentro daquilo que se transfor mava de forma crescente na classe operária Ela separava os tra balhadores dos pobres ou de outra forma os respeitáveis dos sem respeito Em termos políticos ver capítulo 6 separava pessoas como o artesão inteligente aos quais os radicais de classe média in gleses estavam ansiosos para dar o voto das massas enraivecidas que eles estavam ainda determinados a excluir Nenhum termo é mais difícil de analisar que respeitabilidade na classe operária de meados do século XIX pois expressava simulta neamente a penetração de standards e valores da classe média e tam bém as atitudes sem as quais o amorpróprio da classe operária não teria sido possível de ser criado assim como um movimento de luta coletiva impossível de construir sobriedade sacrifício o adiamento da gratificação Se o movimento dos trabalhadores tivesse sido cla ramente revolucionário ou pelo menos radicalmente segregado do mundo da classe média como havia sido antes de 1848 e voltaria a sêlo na era da Segunda Internacional a distinção teria sido suficien temente clara Porém no nosso período a linha entre melhoria indi vidual e coletiva entre imitar a classe média e combatêla com as próprias armas era difícil de traçar Onde devemos situar William Marcroft 182294 Ele poderia ser facilmente apresentado como um modesto exemplo da ajudaasimesmo de Samuel Smiles o filho ilegítimo de um empregado de fazenda e uma tecelã sem nenhuma educação que começou como um trabalhador na indústria têxtil pas sando a capataz numa firma de engenharia até que em 1861 estabe leceuse de forma independente como um dentista morrendo com 15 mil libras acumuladas o que não era nada negligenciável um radical liberal por toda a vida e advogado da moderação Mas seu lugar mo desto na história também é devido à sua paixão igualmente por toda a vida pela produção cooperativa isto é socialismo através de aju daasimesmo ao qual ele dedicou todos os seus dias Por outro la do William Allan 18374 era sem dúvida nenhuma um seguidor da luta de classe e nas palavras de seu obituário em questões sociais ele inclinavase para a escola de Robert Owen Portanto este trabalhador radical formado na escola revolucionária de antes de 1848 iria deixar sua marca na história do trabalhismo como o cauteloso moderado e a cima de tudo eficiente administrador do maior dos sindicatos de traba lhadores especializados do novo modelo a Amalgamated Society of Engineers era um anglicano convicto e em política um liberal consis tente não dado a nenhum tipo de politicagem 26 O fato é que o trabalhador capaz e inteligente especialmente se especializado oferecia tanto o principal esteio do controle social de classe média e de disciplina industrial no trabalho como também os 233 melhores indivíduos para a autodefesa coletiva dos trabalhadores Ele fornecia o primeiro porque o capitalismo estável próspero e em ex pansão precisava dele proporcionandolhe perspectivas de melhoria modesta Estas não pareciam mais provisórias ou temporárias Mas ele também fornecia o segundo porque com a possível exceção dos Estados Unidos aquela terra que parecia prometer ao pobre um meio pessoal de livrarse de uma pobreza que se arrastava por toda a vida de sair da classe operária e a cada cidadão igualdade diante de todos as classes trabalhadoras sabiam que o mercado livre liberal por si só não lhes daria os direitos ou lhes supriria as necessidades Eles preci savam se organizar e lutar A aristocracia do trabalho inglesa uma camada peculiar a este país onde a classe de pequenos produtores in dependentes lojistas etc era relativamente insignificante como era também a baixa classe dos whitecollar e burocratas menores ajudou a transformar o Partido Liberal num partido de apelo genuinamente de massa Ao mesmo tempo formava o coração do movimento sindi cal incomumente poderoso Na Alemanha mesmo os trabalhadores mais respeitáveis eram empurrados para as fileiras do proletariado pela distância que os separava da burguesia e pela força das classes intermediárias Ali o homem que mergulhava nas associações de me lhoria Bildungsvereine na década de 1860 havia mil destes clubes em 1863 2 mil em 1872 somente na Baviera afastavase rapida mente do liberalismo de classe média destas associações embora não tanto da cultura de classe média que ali lhe fora inculcada Outros como ele iriam se transformar no pessoal dirigente do novo movi mento socialdemocrata especialmente depois do fim de nosso perío do Mas eles eram trabalhadores respeitáveis e levaram o bom e o mau lado de sua respeitabilidade para o partido de Lassalle e Marx Somente onde a revolução parecia ser a única solução plausível para as condições dos trabalhadores pobres ou onde como na França a tradição de insurreição e república social revolucionária era a tradição política dominante do povo trabalhador a respeitabilidade era um fator relativamente insignificante ou confinado às classes médias e àqueles que desejavam identificarse com elas E os outros Embora fossem objeto de muito mais interesse que as classes trabalhadoras respeitáveis bem menos nesta geração do que antes de 1848 ou depois de 1880 deles sabemos muito pouco exceto pela pobreza e abandono a que estavam relegados Não ex pressavam opiniões publicamente e raramente eram requisitados mesmo Por aquelas organizações sindicais políticas ou outras que se preocupassem em chegar até eles Mesmo o Exército da Salvação criado tendo especificamente estes setores pobres nãorespeitáveis em mente não conseguiu tornarse mais do que uma atração de entre tenimento público com seus uniformes bandas e hinos e uma fonte útil de caridade De fato para a maioria dos nãoespecializados as organizações que começavam a dar expressão ao movimento traba lhista dos respeitáveis eram inatingíveis Grandes levantes de cunho 234 político tal como o Cartismo ná década de 1840 podiam recrutálos os vendedores de mercado descritos por Henry Mayhew eram todos cartistas Grandes revoluções poderiam inspirar talvez apenas bre vemente até os mais oprimidos e apolíticos as prostitutas de Paris foram decididamente a favor da Comuna em 1871 Mas a era do tri unfo burguês não eram precisamente uma era de revoluções ou mes mo de movimentos de massas políticos Bakunin não estava talvez in teiramente errado ao supor que o espírito de uma insurreição pelo me nos potencial estava talvez mais entre os marginais e o subproletariado embora estivesse bastante enganado ao vêlos como base para um mo vimento revolucionário A miscelânea dos pobres apoiou a Comuna mas seus ativistas eram os especializados e artesãos as seções mais marginais entre os pobres os adolescentes estavam pouco represen tados entre eles Os adultos especialmente aqueles suficientemente ve lhos para ter mesmo que falha uma memória a cerca de 1848 eram os revolucionários característicos de 1871 A linha que dividia os trabalhadores pobres entre militantes po tenciais do movimento trabalhista e o resto não era cortante mas cer tamente existia Associação a formação livre e consciente de so ciedades democráticas para melhorias e defesa social era a fórmula mágica da época liberal através dela até os movimentos trabalhistas que iriam abandonar o liberalismo se desenvolveriam28 Aqueles que quisessem e pudessem efetivamente associarse deveriam dar os ombros e desprezar os que não quisessem ou pudessem e não apenas as mulheres que estavam virtualmente excluídas do mundo das for malidades dos clubes e de suas propostas de associados As fronteiras daqueles setores da classe operária que iriam ser reconhecidos como forças sociais e políticas coincidia com o mundo dos clubes Socie dades de Ajuda Mútua ordens fraternas de beneficência clubes de esportes e ginástica e mesmo associações religiosas voluntárias num extremo e associações políticas e de trabalho ao outro Estas últimas cobriam uma parte variada mas substancial da classe operária talvez uns 40 no final de nosso período Mas deixava muitos de fora Estes eram os objetos e não os sujeitos da era liberal Ê difícil olhando retrospectivamente formar uma idéia equi librada das condições de todos estes trabalhadores Em um aspecto a lista dos países onde havia cidades e indústrias modernas era agora muito maior e conseqüentemente o nível de desenvolvimento indus trial que representavam Portanto generalizações não são fáceis e seu valor é circunscrito mesmo se nos limitarmos e precisamos fazêlo aos países relativamente desenvolvidos em oposição aos atrasados as classes trabalhadoras urbanas em distinção aos setores camponeses e agrários O problema é determinar um meio termo entre de um la do a violenta pobreza que ainda dominava a vida da maior parte dos trabalhadores pobres o meio físico e moral repulsivo que cercava muitos deles e de outro a melhoria geral das condições e perspecti vas que havia ocorrido desde a década de 1840 Portavozes satisfei 235 tos de parte da burguesia tendiam a dar maior ênfase a estas melhori as embora ninguém pudesse negar o que Sir Robert Giffen 1837 1900 olhando para o meio século da história inglesa de 1883 cha mou de um resíduo ainda não desenvolvido ou que as melhorias mesmo quando medidas por um ideal baixo ainda são muito peque nas ou então que ninguém pode contemplar as condições das mas sas populares sem desejar alguma coisa como uma revolução para que elas melhorem29 Reformadores sociais menos satisfeitos embo ra não negando as melhorias no caso da elite de trabalhadores cujas qualificações relativamente escassas punhamnos numa condição de vendedores privilegiados no mercado de trabalho davam um retra to menos cor de rosa Sobram ainda escrevia Miss Edith Simcox no começo da década de 1880 uns dez milhões de trabalhadores de cidades incluindo todos os mecânicos e trabalhadores cujas vidas não estão ameaçadas pela miséria Nenhuma linha precisa pode ser traçada entre os trabalhadores que podem ser contados entre os pobres e aqueles que estão fora há um fluxo cons tante e exceto aqueles que sofrem de má remuneração crônica artesãos as sim como mercadorias estão todos constantemente mergulhando com cul pa ou não nas profundezas da miséria Não e fácil julgar quantos dentre es tes dez milhões pertencem à próspera aristocracia das classes trabalhadoras aquela camada com a qual os políticos entram em contato e da qual saem aqueles que a sociedade apressadamente acolhe como trabalhadores repre sentativos Eu confesso que deveria estimar que apenas um pouco mais de dois milhões de trabalhadores especializados representando uma popu lação de cinco milhões esteja vivendo habitualmente com alguma facilida de e segurança de qualquer espécie Os outros cinco milhões incluem os trabalhadores e operários menos especializados homens e mulheres cujo salário máximo lhes proporciona as necessidades e decência mínimas da existência e para os quais por conseguinte qualquer azar significa miséria uma queda rápida na penúria 30 Mas mesmo estas impressões bem informadas e evidentes eram um tanto otimistas por duas razões Primeiro porque como pesqui sas sociais que começaram a ser feitas a partir do final da década de 1880 deixam claro os trabalhadores pobres que formavam aproxi madamente 40 da classe operária de Londres pouco desfrutavam das decências mínimas da existência mesmo pelos padrões austeros aplicados para os setores mais baixos Segundo porque o estado de alguma facilidade e segurança de qualquer espécie representava de masiado pouco A jovem Beatrix Potter vivendo anonimamente entre os operários têxteis de Bacu não teve dúvida de que tivesse partilha do das vidas da confortável classe operária dissidentes e colabo radores uma comunidade fechada excluindo os nãorespeitáveis e marginais cercada pelo bemestar geral e bem remunerado sendo as casas bem decoradas e mobiladas e as refeições excelentes E 236 mesmo esta observadora perspicaz iria descrever estes mesmos indi víduos quase sem perceber o que estava descrevendo como pare cendo vítimas de excesso de trabalho físico nos períodos de grande comércio comendo e dormindo muito pouco fisicamente exaustos para esforços intelectuais a mercê de muitas chances de esgotamen to significando falta de conforto físico A profunda e simples fé pu ritana destes homens e mulheres era como ela via uma resposta ao medo das vidas gastas e fracassadas Vida em Cristo e esperança em outro mundo trazem facilidade e refi namento na mera luta pela existência acalmando a busca desenfreada pe las boas coisas desta vida com uma outra existência e fazendo do fra casso um meio de atingir a graça ao invés de uma busca incansável pe lo sucesso31 Este não é o quadro de famintos prestes a se rebelarem nos seus cortiços mas também não é um quadro de homens e mulheres me lhores muito melhores do que eram há cinqüenta anos atrás e me nos ainda de uma classe que tinha tido o benefício material dos últi mos cinqüenta anos Giffen como economistas satisfeitos e igno rantes mantinham Era um quadro de pessoas com algum respeito e segurança cujas expectativas eram enormemente modestas mas conscientes de que poderia ser bem pior que se lembravam de tem pos quando eram bem mais pobres e que estavam freqüentemente perseguidas pelos aspectos da miséria como entendiam o termo O pauperismo estava sempre próximo Ninguém deve usar muito de uma coisa boa porque senão gastase dinheiro com muita facilidade disse um dos hospedeiros de Beatrix Potter colocando o cigarro que ela havialhe oferecido em cima da lareira depois de uma ou duas ba foradas guardando para a noite seguinte Aquele que esquecer que esta era a forma pela qual homens e mulheres pensavam sobre os bens de suas vidas naqueles dias não será certamente a pessoa indi cada para julgar a pequena mas genuína melhoria que a grande ex pansão capitalista trouxe para uma parte substancial das classes traba lhadoras no nosso período E a distância que as separava do mundo burguês era imensa e intransponível 237 DécimoTerceiro Capítulo O MUNDO BURGUÊS Você sabe que pertencemos a um século em que os homens são valoriza dos apenas pelo que são Todos os dias algum chefe pouco enérgico ou sério é forçado a descer os degraus da sociedade que parecia pertencer lhe de forma permanente e algum balconista inteligente e esperto toma lhe o lugar Mme MotteBossut a seu filho 1856 1 Com seus rebentos a volta eles aquecemse no calor de seu sorriso Uma inocência infantil e alegre ilumina suas faces contentes Ele é sagrado eles o honram ele é adorável eles o adoram Ele é seguro eles o estimam ele ê firme eles o temem Seus amigos são os mais excelentes entre os homens Ele retorna à casa bemordenada Martin Tupper 1876 2 I Precisamos olhar agora a sociedade burguesa Os fenômenos mais superficiais são às vezes os mais profundos Comecemos nossa análise desta sociedade que atingiu seu apogeu neste período pela aparência das roupas que seus membros usavam pelos interiores que os cercavam As roupas fazem o homem dizia um ditado alemão e nenhuma época seguiu mais a risca tal idéia do que a época em que a mobilidade social poderia de fato colocar numerosas pessoas dentro de uma situação histórica inteiramente nova para desempenhar papéis sociais novos e superiores e portanto tendo que usar as roupas a propriadas Não havia muito que o austríaco Nestroy havia escrito sua farsa descontraída e um pouco amarga The Talisman 1840 onde as aventuras da vida de um pobre ruivo são dramaticamente alteradas pela aquisição e subseqüente perda de uma peruca preta O lar era a quintessência do mundo burguês pois nele e apenas nele podiam os problemas e contradições daquela sociedade serem esquecidos e arti ficialmente eliminados Ali e somente ali os burgueses e mais ainda os pequenos burgueses podiam manter a ilusão de uma alegria har moniosa e hierárquica cercada pelos objetos materiais que a demons 238 travam e faziamna possível a vida de sonho que encontrou sua ex pressão culminante no ritual doméstico sistematicamente criado e de senvolvido para este fim a celebração do Natal O jantar de Natal celebrado por Dickens a árvore de Natal inventada na Alemanha mas rapidamente aclimatada na Inglaterra graças ao patrocínio real a canção de Natal mais conhecida através da Stille Nacht alemã simboliza ao mesmo tempo o frio do mundo do lado de fora o calor do círculo familiar do lado de dentro e o contraste entre os dois A impressão mais imediata do interior burguês de meados do sé culo é a de ser demasiadamente repleto e oculto uma massa de obje tos freqüentemente escondidos por cortinas toldos tecidos e papéis de parede e sempre muito elaborados fosse o que fosse Nenhum quadro sem uma rebuscada moldura nenhuma cadeira sem tecido de proteção nenhuma peça de tecido sem borla nenhuma peça de ma deira sem o toque do torno mecânico nenhuma superfície sem algum tecido ou objeto repousando em cima Isto era sem dúvida um sinal de riqueza e status a bela austeridade dos interiores Biedermayer re fletia mais a severidade das finanças burguesas das províncias ale mães do que um gosto inato e a mobília dos quartos dos empregados por seu lado era deserta Objetos expressavam seu custo e no tempo em que a maioria dos objetos domésticos era produzida ainda por processos manuais a elaboração era um índice adequado para expres sar o valor de objetos caros O custo também comprava conforto que era tanto visível como desfrutável Mesmo assim os objetos eram mais do que meramente utilitários ou símbolos de status e sucesso Tinham valor em si mesmo como expressões de personalidade como sendo o programa e a realidade da vida burguesa e mesmo como transformadores do homem No lar tudo isso era expresso e concen trado Daí a sua grande acumulação Estes objetos como as casas que os continham eram sólidos um termo usado caracteristicamente para melhor elogiar uma empresa de comércio Eram construídos para durar para sempre e duraram Ao mesmo tempo precisavam expressar as aspirações mais altas e espirituais da vida através de sua beleza salvo quando as expressa vam através de sua mera existência como os livros e os instrumentos musicais que permaneciam surpreendentemente funcionais no seu design exceto por alguns floreados exteriores ou quando faziam par te do mundo das utilidades domésticas como peças para a cozinha ou bagagem Beleza significava decoração já que a simples construção das casas da burguesia ou os objetos que as mobilizavam não eram su ficientemente grandiosos para oferecer apoio espiritual ou moral em si mesmos como as grandes estradas de ferro e navios a vapor A parte de fora das casas permanecia funcional a questão era relativa ao interior na medida em que pertencessem ao mundo burguês como ocorria com os novos carrosdormitórios Pullman 1865 e os salões e quartos de primeira classe dos navios a vapor que tinham décor Beleza portanto significava decoração uma coisa aplicada à superfície dos objetos 239 Esta dualidade entre solidez e beleza expressava uma grande di visão entre o material e o ideal o corpóreo e o espiritual muito típica do mundo burguês já que espírito e idéia dependiam da matéria e po diam ser expressos somente através da matéria ou pelo menos através do dinheiro que pudesse comprála Nada era mais espiritual do que a música mas a forma característica em que ela entrava no lar burguês era o piano um aparato excessivamente grande rebuscado e caro mesmo quando reduzido para o benefício de uma camada mais mo desta aspirante a valores burgueses às dimensões mais manuseáveis de um piano de parede pianino Nenhum interior burguês era com pleto sem ele todas as filhas diletas da burguesia eram obrigadas a praticar escalas sem fim naquele instrumento A ligação entre moral espiritualidade e miséria tão óbvia nas sociedades nãoburguesas não tinha sido inteiramente eliminada Era geralmente reconhecido que a busca exclusiva de coisas mais eleva das era nãoremunerada exceto no que toca a algumas artes mais vendáveis mas mesmo assim a prosperidade era para ser alcançada somente nos anos maduros o estudante pobre ou o jovem artista na qualidade de professor particular ou de convidado para o jantar de do mingo eram reconhecidamente uma parte subalterna da família bur guesa e seguramente naquelas partes do mundo onde a cultura fosse altamente respeitada Mas a conclusão definitiva era de que não havia uma contribuição entre a busca de sucesso material e espiritual mas que um era a base necessária para o outro Como o romancista E M Forster colocou no período áureo da burguesia Entravam os divi dendos elevavamse grandiosos pensamentos O destino mais certo para um filósofo era o de nascer filho de banqueiros como George Lukacs A glória do ensino alemão o Privatgelehrter professor parti cular era depender de renda própria Era correto que o pobre profes sor judeu casasse com a filha do comerciante local mais rico já que era impensável que uma comunidade com ensino respeitável remune rasse seus luminares apenas com elogios Esta dualidade de matéria e espírito implicava uma hipocrisia que observadores nãosimpáticos ao mundo burguês consideravam uma característica fundamental deste mundo Em nenhum outro as pecto era isso mais óbvio no sentido literal de ser visível do que em questões de sexo Isso não quer dizer que o burguês homem de mea dos do século XIX ou aqueles que aspiravam ser como ele fossem simplesmente desonestos pregando uma moralidade e deliberada mente praticando outra embora evidentemente o hipócrita consciente seja mais facilmente encontrável onde a diferença entre a moralidade oficial e as demandas da natureza humana sejam separada por uma distância abissal e esta sociedade o era Certamente Henry Ward Be eches o grande pregador novaiorquino do puritanismo deveria ter e vitado manter tumultuados casos de amor extraconjugais ou então ter escolhido uma carreira que não lhe demandasse ser um advogado tão proeminente da moderação sexual embora ninguém possa deixar de 240 simpatizar com a má sorte que o ligou em meados da década de 1870 com a bela feminista e advogada do amorlivre Victoria Woo dhull uma senhora cujas convicções tornavam difícil manter uma vi da privada Esta esplêndida mulher uma de duas irmãs igualmente a traentes e emancipadas deu a Marx alguns momentos de irritação por causa de seus esforços para converter a seção americana da Interna cional num órgão de propagação de amorlivre e espiritualismo As duas irmãs saíramse muito bem de suas relações com Commodore Vanderbilt que tomava conta de seus interesses financeiros Mais tarde casouse bem e morreu na atmosfera da respeitabilidade na In glaterra em Bredons Norton Worcestershire 3 Mas é um puro ana cronismo pensar como vários escritores recentes do The other Vic torians tem feito que a moralidade sexual oficial da época fosse uma mera fachada Em primeiro lugar esta hipocrisia não era simplesmen te uma mentira exceto talvez entre aqueles cujas preferências sexuais fossem tão irresistíveis quanto publicamente inadmissíveis como por exemplo políticos proeminentes dependendo de votos puritanos ou respeitáveis negociantes homossexuais em cidades provincianas Mas era menos hipócrita nos países por exemplo na maioria dos católi cos onde um comportamento francamente duplo era aceito castidade para mulheres solteiras e fidelidade para as casadas a caça livre de todas as mulheres exceto talvez filhas casadoiras das classes médias e altas por todos os jovens burgueses solteiros e uma infidelidade to lerada para os casados Aqui as regras do jogo eram perfeitamente en tendidas incluindo a necessidade de uma certa discrição nos casos onde a estabilidade da família ou da propriedade burguesa pudesse ser ameaçada paixão como qualquer italiano da classe média ainda conhece é uma coisa a mãe dos meus filhos é outra bem diferente A hipocrisia entrava neste tipo de comportamento apenas pelo fato de que as mulheres deveriam permanecer totalmente fora do jogo quer dizer na ignorância do que os homens e outras mulheres faziam Nos países protestantes esperavase que a moralidade das restrições sexuais e da fidelidade atingisse os dois sexos mas o próprio fato de que isto era percebido mesmo por aqueles que quebravamna levava os não exatamente à hipocrisia mas ao tormento pessoal É bastante ilegítimo tratar uma pessoa em tal situação como um mero trapaceiro Mais do que isso a moral burguesa era consideravelmente apli cada na verdade talvez tenha se tornado muito mais efetiva a partir do momento em que a massa das classes trabalhadoras respeitáveis passou a adotar os valores da cultura hegemônica e que as classes médias baixas que seguiam a burguesia por definição cresceram em número Tais questões resistiam mesmo ao intenso interesse do mun do burguês nas estatísticas morais desmentindo todas as tentativas de medir a extensão da prostituição A única tentativa adequada de medir infecções venéreas que evidentemente tinham uma forte cone xão com algumas formas de sexo extraconjugal revelou pouco exce to que na Prússia era muito maior na megalópole Berlim do que em 241 qualquer outra província tendendo normalmente a diminuir de acor do com o tamanho das cidades e vilas e que atingia o ponto máximo nas cidades com portos guarnições e institutos de educação isto é com alta concentração de jovens solteiros longe de suas casas Não há razão para supor que o membro vitoriano médio da classe média bai xa classe média ou respeitável classe operária na Inglaterra vitori ana ou nos Estados Unidos não conseguisse viver de acordo com seus princípios de fidelidade sexual As jovens americanas que sur preendiam cínicos homens experimentados na Paris de Napoleão III com a liberdade que os pais lhes permitiam de saírem sozinhas e em companhia de jovens americanos são uma evidência tão forte sobre a moralidade sexual quanto as reportagens jornalísticas do espectro do vício na Londres vitoriana talvez até mais forte 4 É inteiramente ile gítimo aplicar standards pósfreudianos num mundo préfreudiano ou entender que o comportamento sexual de então devesse ser como o nosso Pelos padrões modernos aqueles monastérios leigos as uni versidades de Oxford e Cambridge pareceriam casos literários de pa tologia sexual O que pensaríamos hoje de um Lewis Carroll cuja paixão era fotografar menininhas nuas Pelos padrões vitorianos os vícios maiores eram certamente a gula e não a luxúria e a tendência sentimental de muitos professores por jovens rapazes quase que cer tamente o termo é revelador platônica seria colocada entre as esquisitices de educadores inveterados Foi nesta época que a expres são to make love na língua inglesa tornouse sinônimo de ato se xual O mundo burguês era perseguido pelo sexo mas não necessari amente pela promiscuidade sexual a nemesis característica do mito burguês como o romancista Thomas Mann viu tão claramente acom panhava uma única queda do estado de graça como a sífilis do compo sitor Adrian Leverkuchn em Dr Faustus O próprio extremismo de seu medo reflete uma ingenuidade prevalecente ou melhor inocência A força dos padrões morais nos países protestantes foi revelada pelo comportamento dos senhores de escravos em relação a suas escravas Contrariamente ao que se poderia esperar e também em relação ao e thos dominante nos países católicosmediterrâneos não há nada de melhor do que um tamarindo doce ou uma mulata virgem dizia um di tado cubano parece que a extensão de miscigenação ou mesmo de fi lhos ilegítimos no Sul rural e escravo foi bastante pequena 5 Esta inocência entretanto nos permite ver o poderoso elemento sexual no mundo burguês de forma clara nas suas roupas uma ex traordinária combinação de tentação e interdição O burguês vitoriano era coberto por tecidos deixando pouca coisa publicamente visível exceto a face e mesmo isso nos trópicos Em casos extremos como nos Estados Unidos até objetos que lembrassem o corpo como os pés das mesas podiam vir a ser ocultos Ao mesmo tempo e nunca tanto quanto nas décadas de 1860 e 1870 todas as características se xuais secundárias eram enfatizadas grotescamente cabelos e barbas nos homens cabelos seios e ancas nas mulheres aumentadas para 242 proporções gigantescas através de enchimentos postiços culsde Paris etc O efeito de choques do famoso quadro de Manet Déjeuner sur lHerbe 1863 deriva precisamente do contraste entre a enorme respeitabilidade das roupas dos homens e a nudez das mulheres A verdadeira obsessão com a qual a civilização burguesa insistia que a mulher era essencialmente um ser espiritual implicava que os homens não o eram e também que a óbvia atração física entre os sexos não ca bia dentro do sistema de valores Sucesso era incompatível com prazer como o folclore do esporte ainda assume ao sentenciar jogadores à abstenção sexual temporária antes do grande jogo ou da grande luta De forma mais geral a civilização apoiavase na repressão das urgências sexuais O maior dos psicólogos da burguesia Sigmund Freud fez des ta proposição a pedra de toque de suas teorias embora gerações poste riores tenham lido nele uma chamada pela abolição da repressão Mas por que era este aspecto visto de forma tão passional e até patológica tão contrastante com o ideal de moderação e juste milieu que definia as ambições e papéis sociais das classes médias6 Nos de graus mais baixos das aspirações da classe média a resposta é fácil Somente esforços heróicos poderiam elevar um homem e uma mulher pobres ou mesmo seus filhos para fora da desmoralização colocan doos no lugar firme da respeitabilidade e acima de tudo definir ali as suas posições Para os membros dos Alcoólatras Anônimos não havia solução de compromisso era ou a total abstinência ou o colapso completo De fato o movimento pela total abstinência do álcool que floresceu nos países protestantes e puritanos ilustra esta questão de forma clara Não era efetivamente um movimento para abolir ou mesmo para limitar o alcoolismo de massa mas para definir e separar a classe dos indivíduos que tivessem demonstrado pela força pessoal de seu caráter que eram distintos dos pobres nãorespeitáveis O puri tanismo sexual preenchia a mesma função Mas este era um fenôme no burguês apenas na medida em que refletia a hegemonia da res peitabilidade burguesa Como as leituras de Samuel Smiles ou a prá tica de outras formas de ajudaasimesmo aquilo substituía o suces so burguês ao invés de preparar para ele Ao nível do artesão ou fun cionário respeitável a abstinência era freqüentemente a única gratifi cação Em termos materiais dava apenas compensações modestas O problema do puritanismo sexual burguês é mais complexo A crença de que o burguês de meados do século XIX era incomumente vigoroso e portanto obrigado a construir defesas incomumente impe netráveis contra a tentação da carne não é convincente o que fazia as tentações tão tentadoras era precisamente o extremismo dos padrões morais aceitos que tornavam a queda igualmente dramática como o caso do católicopuritano conde Muffat em Nana de Emile Zola a novela par excellence da prostituição em Paris na década de 1860 Evidentemente o problema era também de certa forma econômico como veremos A família não era meramente a unidade social bási ca da sociedade burguesa mas também a unidade básica do sistema 243 de propriedade e das empresas de comércio ligada com outras unida des similares através de um sistema de trocas mulhermais propriedade o dote do casamento em que as mulheres deveriam por estrita convenção derivada de uma tradição préburguesa ser virgines inlactae Qualquer coisa que enfraquecesse esta unidade familiar era inadmissível e nada a enfraquecia mais do que a paixão física des controlada que introduzia herdeiros e noivas inadequados isto é economicamente indesejáveis separava maridos de mulheres e des perdiçava recursos comuns Mas as tensões eram mais que econômicas Elas eram particu larmente fortes em nosso período quando a moral da abstinência moderação e contenção entrava dramaticamente em conflito com a realidade do sucesso burguês Os burgueses não viviam mais numa economia familiar de escassez ou num nível social remotamente lon ge das tentações da alta sociedade O problema era mais o de gastar que o de economizar Não apenas os burgueses ociosos tornavamse mais e mais numerosos em Colônia o número de rentiers pagando imposto de renda cresceu de 162 em 1854 para 600 em 1874 7 como de que outra forma exceto gastar poderiam os bemsucedidos bur gueses demonstrar o seu sucesso tendo ou não poder político enquan to classe A palavra parvenu novorico automaticamente tornouse sinônimo do gastador destemperado Se estes burgueses tentavam al cançar o estilo de vida da aristocracia ou então como os conscientes Krupp e outros magnatas da Ruhr construir castelos e impérios feudais paralelos e até mais impressionantes que aqueles dos Junkers cujos tí tulos haviam recusado precisavam gastar e de uma forma que inevita velmente fazia com que seu estilo de vida se parecesse mais próximo ao da aristocracia nãopuritana e as mulheres mais ainda Antes da dé cada de 1850 isto havia sido um problema relativamente de poucas famílias em alguns países como a Alemanha praticamente nenhuma Mas agora transformavase no problema de toda uma classe A burguesia como classe encontrava enorme dificuldade em combinar aquisições e despesas de uma forma moralmente satisfató ria da mesma maneira que era incapaz de resolver o problema mate rial equivalente de como garantir uma sucessão de homens de negó cios igualmente dinâmicos e capazes dentro de uma mesma família um fato que aumentava o papel das filhas que podiam trazer sangue novo para dentro do complexo de negócios Dos quatro filhos do banqueiro Friedrich Wichelhaus em Wuppertal 181086 apenas Robert nascido em 1836 permaneceu banqueiro Os outros três nascidos em 1831 1842 e 1846 terminaram como fazendeiros e um acadêmico mas ambas as filhas nascidas em 1829e 1838 casaram se com industriais inclusive um membro da família de Engels8 A coisa mais importante pela qual os burgueses lutavam o lucro cessa va de ser uma motivação adequada assim que trazia riqueza em quan tidade adequada No final do século a burguesia descobriu pelo me nos uma fórmula temporária para combinar aquisições e despesas a 244 través da compra de antiguidades Estas décadas finais antes da catás trofe de 1914 iriam ser o Indian summer a belle époque da vida bur guesa lamentada de forma retrospectiva por seus sobreviventes Mas em nosso período as contradições estavam talvez no seu ponto mais agudo esforço e prazer coexistiam mas esbarravamse E a sexuali dade era uma das vítimas do conflito a hipocrisia um dos vencedores II Sufocada por roupas paredes e objetos ali estava a família bur guesa a instituição mais misteriosa de nossa época Pois se é fácil descobrir ou indicar as conexões entre puritanismo e capitalismo como testemunha uma grande literatura especializada as conexões entre a família do século XIX e a sociedade burguesa permanecem obscuras De fato o aparente conflito entre as duas tem sido raramen te até percebido Por que deveria uma sociedade dedicada a uma eco nomia de obtenção de lucro livre iniciativa competitiva esforços do indivíduo isolado igualdade de direitos oportunidades e liberdade por que enfim deveria ela apoiarse numa instituição que negava to dos estes ideais Sua unidade básica a casa de uma única família era uma auto cracia patriarcal e um microcosmo da espécie de sociedade que a bur guesia como classe ou seus portavozes teóricos denunciava e des truía uma hierarquia de dependência pessoal Ali firmemente estava e dirigia o pai marido senhor Trazendo prosperidade como guardião guia e juiz9 Abaixo dele continuando a citar o Grande Filósofo Martin Tupper estavam o bom anjo da casa a mãe esposa e amante 10 cu jo trabalho para o grande Ruskin era I Agradar as pessoas II Alimentálas de forma agradável III Vestilas IV Mantêlas em ordem V Fazêlas aprender 11 uma tarefa para a qual curiosamente ela não precisava demonstrar possuir nem inteligência nem conhecimento Isto não era assim ape nas porque sua nova função de esposa burguesa admirar a capacida de do marido burguês e mantêlo em paz e conforto conflitasse com as velhas funções de dirigir o lar mas também porque sua inferiori dade em relação ao homem precisava ser demonstrada Tem ela saber É precioso mas tome cuidado para que ela não se exceda 245 Pois as mulheres precisam ser dominadas e a verdadeira dominação é da mente 12 Entretanto este ser atraente ignorante e idiota era requisitado para exercer também dominação não sobre as crianças cujo senhor era ainda o pater famílias mas sobre os criados cuja presença distin guia os burgueses dos que lhes eram socialmente inferiores Definia se uma lady pelo fato de que era alguém que não trabalhava mas dava ordens para outra pessoa fazêlo13 sua superioridade estando es tabelecida por esta relação Os empregados eram cada vez mais mu lheres entre 1841 e 1881 a percentagem de homens no serviço do méstico na Inglaterra caiu de 20 para 12 portanto a casa ideal bur guesa consistia em um senhor dominando um número de mulheres hierarquicamente dispostas já que os filhos homens tendiam a deixar o lar ao crescerem ou então entre as classes altas inglesas logo que chegavam a idade de ir para o colégio interno Mas a doméstica embora recebendo salário o que a igualava ao trabalhador cujo emprego definia o homem burguês na economia era essencialmente bem diferente deste mesmo trabalhador já que ela ou mais raramente ele mantinha uma ligação com o empregador maior que a de meramente receber um salário pois era uma ligação muito mais pessoal e de fato de forma prática uma ligação de dependência total Tudo na sua vida era estritamente prescrito e controlado já que vivia num quarto magramente mobiliado Desde o uniforme que usa va até a cartatestemunho de boa conduta e caráter sem a qual era impossível conseguir novo emprego tudo simbolizava uma relação de poder e dominação Isto não excluía relações pessoais próximas se desiguais às que haviam nas sociedades escravas Talvez até encora jasse embora não deva ser esquecido que para cada babá ou jardinei ro que viviam suas vidas inteiras a serviço de uma única família havia uma centena de meninas do interior que passavam brevemente através da casa para a gravidez o casamento ou outro emprego sendo trata das apenas como uma outra instância daquele problema de emprega das que preenchia as conversas das patroas O ponto crucial era o de que a estrutura da família burguesa estava em direta contradição com a sociedade burguesa Dentro dela a liberdade a oportunidade o nexo do dinheiro e a busca do lucro individual não eram a regra Poderia ser argumentado que tal ocorria porque o anarquismo social hobbesiano que formava o modelo teórico da economia bur guesa não dava nenhuma base para nenhum tipo de organização so cial incluindo a família E de fato era um contraste deliberado com o mundo de fora um oásis de paz num mundo de guerra le repos du guerrier Você sabe escreveu a mulher de um industrial francês a seus filhos em 1856 que vivemos numa época em que os homens têm seu valor determinado apenas por seus próprios esforços Todo dia que passa o bravo e esperto assistente toma o lugar do senhor cuja negligência e 246 falta de seriedade deslocao do lugar que lhe parecia ser atribuído permanentemente Que batalha escreveu seu marido encurralado em competição com industriais têxteis ingleses Muitos morrerão na luta muitos mais se rão seriamente feridos A metáfora da guerra vinha naturalmente aos lábios dos homens quando discutiam suas lutas pela existência ou a sobrevivência dos melhores da mesma forma como a metáfo ra da paz quando descreviam seus lares o acolhedor lugar da felici dade o lugar onde a ambição do coração encontrava sua paz já que nunca podia encontrála no mundo exterior desde que nunca po dia ser satisfeita l5 Mas pode também ser que a desigualdade essencial sobre a qual o capitalismo se apoiava encontrasse uma expressão necessária na família burguesa Precisamente porque não era baseada em desigual dades coletivas institucionalizadas e tradicionais a dependência pre cisava ser uma relação individual Já que a superioridade era algo tão incerto para o indivíduo ela precisava tomar uma forma em que fosse permanente e segura Já que sua expressão essencial era o dinheiro que expressa meramente a relação de troca outras formas de expres são que demonstrassem a dominação de pessoas sobre pessoas preci savam suplementála Não havia evidentemente nada de novo na es trutura da família patriarcal baseada na subordinação da mulher e fi lhos Mas onde poderíamos esperar que a sociedade burguesa logica mente quebrasse a instituição ou a transformasse como ela iria de fato se desintegrar mais tarde a fase clássica da sociedade burguesa reforçoua e exageroua Até onde este patriarcado burguês ideal representava acura damente a realidade é outra história Um historiador fez um sumário adequado do burguês típico de Lille como um homem que teme a Deus mas mais ainda à sua mulher e lê o Echo du Nord 16 A exis tência e o reforço do tipoideal da família burguesa deste período é significativo É suficiente para explicar o início de um movimento feminista sistemático entre as mulheres da classe média deste perío do pelo menos nos países anglosaxônicos ou protestantes A casa burguesa entretanto era meramente o núcleo de uma co nexão familiar mais ampla dentro da qual o indivíduo operava os Rothschilds os Krupps ou igualmente os Forstyes que fizeram muito da história econômica e social do século XIX um assunto es sencialmente dinástico Mas embora uma enorme quantidade de ma terial sobre tais famílias tenha sido acumulada desde o século passa Citado em L Trénard Un Industriel roubásien du XIX siécle Reme du Nord 50 1968 pag 38 O texto do trecho desta carta parece ser o mesmo da epígrafe do capítulo A tradu ção do francês para o inglês difere em pouca coisa mas mantivemos as duas versões na tra dução portuguesaNT 247 do nem os antropólogos sociais nem os livros genealógicos uma o cupação aristocrática deramlhe suficiente atenção específica para tornar fácil uma generalização com alguma base que seja sobre tais grupos familiares Em que medida se promoviam a partir das classes mais baixas Não em grande número embora em teoria nada lhes impedisse Dos chefes de oficina ingleses em 1865 89 vinham de famílias de classe média 7 da classe média baixa incluindo pequenos lojistas arte sãos independentes etc e apenas 4 de trabalhadores especializados ou menos ainda nãoespecializados A maior parte dos manufa tores têxteis do norte da França no mesmo período eram igualmente filhos daquilo que poderseia chamar de camada média os fundado res da empresa capitalista no sudoeste alemão não eram sempre ne cessariamente ricos mas o número daqueles com longa experiência familiar em negócios e freqüentemente nas indústrias que iriam se desenvolver é significativo protestantes suíçoalsacianos corno os Koechlin Geigy ou Sarrasin judeus nascidos nas finanças de peque nos negócios Homens de cultura sobretudo filhos de pastores pro testantes ou funcionários civis modificaramse mas não alteraram seu status de classe média com o advento da empresa capitalista18 As carreiras do mundo burguês estavam de fato abertas ao talento mas as famílias com um certo grau de educação propriedade e ligações sociais entre outras certamente começavam com uma enorme vanta gem relativa pelo menos a de poder estabelecer relações de casamen to com outras do mesmo status social da mesma linha de negócios ou com recursos que podiam ser combinados entre si As vantagens de uma família grande ou de um grupo fechado de famílias era certamente substancial Dentro dos negócios garantia ca pital talvez contatos proveitosos e sobretudo gerentes de confiança Os Lefebvres de Lille em 1851 financiaram os negócios de lã de um cunhado Amedée Prouvost Siemens e Halske a famosa firma elétri ca estabelecida em 1847 obteve seu capital inicial de um primo e os três irmãos Werner Carl e William tomaram conta respectivamente das filiais de Berlim São Petersburgo e Londres A história dos negó cios do século XíX está repleta de tais alianças familiares e interpene trações Elas demandavam um grande número de filhos e filhas dis poníveis mas deles não havia carência e portanto diferente do cam pesinato francês que requeria que um e apenas um filho tomasse conta dos negócios da família não havia nenhum controle na quantidade de filhos exceto entre as famílias dos pobres e das classes médias baixas Mas como eram organizados estes clãs Como operavam Em que ponto deixavam de representar grupos de família e se transforma vam num grupo social coerente numa burguesia local ou mesmo como talvez no caso dos banqueiros protestantes e judeus numa re de mais espalhada da qual as alianças de família formavam apenas um aspecto Não podemos responder estas questões ainda 248 III O que em outras palavras queremos dizer com burguesia como classe neste período As definições econômicas políticas e so ciais diferiam de alguma forma mas ainda eram suficientemente pró ximas umas das outras para causar relativamente pouca dificuldade Portanto economicamente a quintessência do burguês era um capitalista isto é o possuidor de capital ou aquele que recebia ren da derivada de tal fonte ou um empresário em busca de lucro ou to das estas coisas juntas E de fato o burguês característico ou o membro da classe média de nosso período incluía poucas pessoas que não entrassem numa destas categorias As 150 famílias principais de Bordeaux em 1848 incluíam 90 homens de negócios comerciantes banqueiros lojistas etc embora poucos industriais 45 possuidores de alguma propriedade e rentiers e 15 membros de profissões liberais que eram naqueles dias variedades da empresa privada Havia entre eles uma ausência total de executivos assalariados que formavam o maior grupo dentro das 450 famílias mais ricas de Bordeaux em 196019 Podemos acrescentar que embora a propriedade da terra ou melhor de propriedades urbanas permanecesse uma fonte importante de renda especialmente dentro da pequena e média burguesia em áreas de pouca industrialização esta fonte diminuía aos poucos de im portância Mesmo na Bordeaux nãoindustrial formava apenas 40 da riqueza deixada por herança em 1873 23 das maiores fortunas en quanto que na Lille industrial no mesmo ano formava apenas 3120 O aspecto da política burguesa era naturalmente diferente de al guma forma pelo menos na medida em que a política é uma atividade especializada e que consome tempo além de não atrair a todos igual mente ou que para a qual nem todos têm as mesmas qualificações De qualquer maneira neste período o número de burgueses que pra ticava a política burguesa chegava a impressionar Na segunda meta de do século XIX entre 25 e 40 dos membros do Conselho Federal Suíço consistia de negociantes ou rentiers 20 a 30 dos membros do Conselho eram barões federais que dirigiam os bancos estradas de ferro e indústrias uma percentagem maior que no século XX Outros 15 consistiam de profissionais liberais isto é advogados embora 50 de todos os membros do Conselho tivessem diplomas em Direi to uma espécie de standard educacional que dava qualificação para a vida pública e a administração na maioria dos países Outros 20 a 30 consistiam de figuras públicas profissionais prefeitos juízes do campo e outros magistrados21 O Grupo Liberal na Câmara Belga de meados do século tinha 83 de seus membros burgueses 16 e ram homens de negócios 16 proprietaires 15 rentiers 18 ad ministradores profissionais e 42 de profissões liberais isto é advo gados e uns poucos médicos 22 Assim ocorria e talvez até em maior escala na política das cidades dominadas como eram naturalmente pelas notabilidades burguesas normalmente liberais do lugar Se os 249 escalões mais elevados do poder eram em grande parte ocupados por grupos mais idosos tradicionalmente estabelecidos a partir de 1830 França e 1848 Alemanha a burguesia tomou de assalto e conquis tou os escalões intermediários do poder político como conselhos mu nicipais prefeituras conselhos distritais etc e manteveos sob controle até o surgimento da política de massa nas últimas décadas do século A partir de 1830 Lille foi governada por prefeitos que eram proeminentes homens de negócios 23 Na Inglaterra as grandes cidades estavam noto riamente nas mãos da oligarquia dos homens de negócios locais Socialmente as definições não eram tão claras embora a classe média incluísse todos os grupos acima descritos desde que fossem abastados e bem estabelecidos homens de negócios proprietários profissionais liberais e os escalões mais altos da administração que eram evidentemente um grupo numericamente bem pequeno fora das cidades principais A dificuldade está em definir os limites altos e baixos desta camada dentro da hierarquia de status social assim como levar em conta a marcada heterogeneidade dos membros dentro destes limites havia pelo menos uma estratificação interna aceita em grande moyenne e petite bourgeoisie a última mergulhando dentro do que seria de faceto o limite da classe No topo da escala a burguesia era mais ou menos diferenciada da aristocracia alta ou baixa dependendo parcialmente da exclusivi dade social e legal deste grupo ou pela sua própria consciência de classe Nenhum burguês poderia transformarse num verdadeiro aris tocrata na Rússia ou na Prússia e mesmo nos lugares onde títulos de baixa nobreza fossem distribuídos livremente como no Império dos Habsburgos nenhum conde Chotek ou Auersperg embora pronto pa ra juntarse aos diretores de uma empresa comercial consideraria um barão von Wertheimstein qualquer coisa além de um banqueiro de classe média ou judeu A Inglaterra estava sozinha em aceitar siste maticamente embora ainda de forma modesta neste período homens de negócios na aristocracia preferindo banqueiros e financistas an tes de industriais Por outro lado até 1870 e mesmo depois ainda havia industriais alemães que se recusavam a permitir que seus sobrinhos se tornassem oficiais da reserva como sendo algo inadequado a jovens daquela classe ou que seus filhos insistissem em fazer o serviço militar na in fantaria ou engenharia ao invés de escolher a cavalaria mais social mente exclusiva Mas é preciso acrescentar que quando os lucros co meçaram a rolar e eles eram bastante substanciais em nosso período a tentação das condecorações títulos casamentos com a nobreza e em geral o estilo da vida aristocrática tornouse irresistível para os ricos Os produtores ingleses inconformados iriam se transferir para a Igreja da Inglaterra e no norte da França o Voltaireanismo mal oculto de antes de 1850 iria se transformar no fervoroso catolicismo de depois de 1870 24 250 No outro extremo a linha divisória era bem mais claramente e conômica embora os homens de negócios pelo menos na Inglaterra viessem a traçar uma linha demarcatória entre eles mesmos e os vendedores que ofereciam suas mercadorias diretamente ao público como lojistas pelo menos até que a venda a varejo viesse a mostrar que poderia trazer milhões àqueles que a praticavam O artesão inde pendente e o pequeno lojista claramente pertenciam à baixa classe média ou Mittelstand que tinha pouco em comum com a burguesia ex ceto a aspiração ao status social desta última O camponês rico não era um burguês nem o era o funcionário whitecollar Entretanto havia em meados do século XIX um reservatório suficientemente grande do ve lho tipo de produtor ou vendedor de pequena mercadoria economica mente independente e mesmo de trabalhadores especializados ou capa tazes para que a linha divisória fosse nebulosa alguns prosperariam e pelo menos nas suas localidades seriam aceitos como burgueses Uma das principais características da burguesia como classe era que consistia num corpo de pessoas com poder e influência indepen dente do poder e influência derivados de nascimento ou status Para pertencer a ela um homem tinha que ser alguém uma pessoa que contasse como indivíduo por causa da sua riqueza capacidade de co mandar outros homens ou de influenciálos de alguma forma Portan to a forma clássica da política burguesa era como já vimos inteira mente diferente da política de massa daqueles abaixo dela incluindo a pequena burguesia O recurso clássico do burguês em apuros ou com razão para reclamações era exercer ou pedir influência pessoal ter uma palavra com o prefeito o deputado o ministro o velho com panheiro de escola ou universidade o contato na indústria A Euro pa burguesa cresceu cheia de sistemas informais de proteção mútua redes de velhos amigos ou máfias amigos de amigos entre os quais aqueles saídos das mesmas instituições educacionais eram natu ralmente muito mais importantes especialmente se fossem institui ções universitárias que produziam ligações nacionais ao invés de me ramente locais Na Inglaterra entretanto as chamadas public schools que se desenvolveram rapidamente neste período reuniram os filhos da burguesia de diferentes partes do país numa idade ainda menor Na França alguns dos grandes lycées de Paris talvez tenham servido a um fim similar de qualquer forma para os intelectuais Uma destas redes a francomaçonaria serviu a um objetivo ainda mais importan te sobretudo nos países católicos pois foi usada de fato como a ci mentação ideológica da burguesia liberal para a sua dimensão política ou mesmo como na Itália como virtualmente a única organização permanente e nacional da classe 25 O burguês individual que se via chamado a comentar sobre assuntos públicos sabia que uma carta ao The Times ou ao Neue Freie Presse atingiria não apenas uma grande parte de sua classe e as decisões a serem tomadas mas o que era mais importante ela seria impressa com a força de sua afirmação enquanto indivíduo A burguesia como classe não organizou movimentos de 251 massa mas grupos de pressão Seu modelo na política não era o Car tismo mas a AntiCornLaw League Evidentemente o grau em que um burguês era notabilidade variava enormemente da grande bourgeoisie cujo campo de ação era nacional ou mesmo internacional às figuras mais modestas que eram pessoas importantes em Aussig ou Groningen Krupp esperava e re cebeu mais consideração que Theodor Boeninger de Duisburg que a administração regional apenas recomendara para o título de Conse lheiro Comercial Kommerzienrat porque era rico industrial capaz ativo na vida pública e religiosa e havia apoiado o governo nas elei ções para os conselhos municipal e distrital Portanto ambos cada qual a seu modo eram pessoas que contavam Se esnobismo dividia milionários dos ricos e estes por seu turno dos meramente confortá veis o que era natural numa classe cuja verdadeira essência era ele varse mais alto na escala do conforto individual esta divisão não chegava a destruir a consciência de grupo que transformou o meio da sociedade na classe média ou burguesia Apoiavase em pressupostos comuns credos comuns formas de ação comuns A burguesia de nosso período era esmagadoramente li beral não necessariamente num sentido partidário embora como já vimos os partidos liberais prevalecessem mas num sentido ideológi co Acreditava no capitalismo empresa privada competitiva tecnolo gia ciência e razão Acreditava no progresso numa certa forma de governo representativo numa certa quantidade de liberdades e direi tos civis desde que estes fossem compatíveis com a regra da lei e com o tipo de ordem que mantivesse os pobres no seu lugar Acredi tava mais na cultura que na religião em casos extremos substituindo a freqüência ritual à igreja pela ida à ópera teatro e concertos Acre ditava na carreira aberta ao empreendimento e talento e as próprias vidas de seus membros provavam estes méritos Como já vimos nes te tempo a fé tradicional e puritana nas virtudes da moderação e abs tenção encontrava dificuldades no caminho de sua realização mas es te fracasso não era muito lamentado Se a sociedade alemã viesse a entrar em colapso algum dia escreveu um cronista em 1855 seria porque as classes médias tinham começado a procurar aparência e lu xo sem buscar contrabalançar isso com o sentido burguês para o tra balho com o respeito pelas forças espirituais da vida com o esforço de identificar ciência idéia e talento com o desenvolvimento progres sivo do Terceiro Estado 26 Talvez o sentido da luta pela existência uma seleção natural na qual vitória ou mesmo sobrevivência prova vam tanto a capacitação quanto as qualidades essencialmente morais que sozinhas poderiam proporcionar esta capacitação reflita a adap tação da antiga ética burguesa a uma nova situação Darwinismo so cial ou de outra forma não era apenas uma ciência mas também uma ideologia mesmo antes de ser formulada Ser burguês não era apenas ser superior mas implicava também ter demonstrado as qualidades morais equivalentes às antigas qualidades puritanas 252 Mas antes de qualquer outra coisa significava superioridade O burguês não era apenas independente um homem a quem ninguém exceto o Estado ou Deus dava ordens mas que determinavaas a si mesmo Não era apenas um empregador empresário ou capitalista mas socialmente um senhor um lord Fabrikherr um patron ou chef O monopólio do comando na casa no negócio na fábrica era fundamental para sua própria definição e seu reconhecimento formal fosse nominal ou real é um elemento essencial em todas as disputas industriais deste período Mas eu também sou o Diretor das Minas quer dizer o dirigente chef de uma grande população de tra balhadores Represento o princípio da autoridade e preciso fazêla respeitada na minha própria pessoa tal tem sido sempre meu objetivo consciente em minhas relações com as classes trabalhadoras 27 So mente os membros das profissões liberais ou o artista ou o intelectual que não fosse essencialmente um empregador ou alguém com subor dinados não se definiam como master Mesmo aqui o princípio da autoridade estava longe de ser ausente fosse a partir do comporta mento do professor universitário tradicional do continente do médico autocrático do regente ou do pintor cheio de caprichos Se Krupp comandava seus exércitos de trabalhadores Richard Wagner esperava subserviência total de suas platéias Dominação implica inferioridade Mas a burguesia de meados do século XIX estava dividida quanto à natureza daquela inferiorida de das classes baixas inferioridade sobre a qual não havia desacordo embora tentativas tenham sido feitas para distinguir dentro da massa subalterna entre aqueles que se poderia esperar uma ascensão para pelo menos a condição de baixa classe média e outros para os quais não havia redenção possível Já que o sucesso era devido ao mérito pessoal o fracasso era claramente devido à falta de mérito A ética tradicional burguesa puritana ou laica havia determinado que isso era devido mais à fraqueza moral ou espiritual do que à falta de inte ligência pois era evidente que cérebro não era uma necessidade in dispensável para o sucesso nos negócios Isso não implicava necessa riamente em antiintelectualismo embora na Inglaterra e nos Estados Unidos esta atitude fosse bem difundida na medida em que o triunfo em negócios era sobretudo dos homens pobremente ilustrados que usavam o empiricismo e o senso comum Samuel Smiles colocou esta questão de forma simples A experiência a ser obtida através de livros embora freqüentemente valiosa é da natureza do aprender enquanto que a experiência ganha da vida real é da natureza da sabedoria e uma pequena loja da última vale muito mais que um estoque da primeira 28 Mas uma classificação simplista em moralmente superiores e in feriores embora adequada para distinguir os respeitáveis da massa trabalhadora bêbada e licenciosa não mais era de forma geral ade 253 quada exceto para a baixa classe média pois as antigas virtudes não mais eram visivelmente aplicáveis para a burguesia afluente e bemsucedida A ética da abstinência e do esforço praticamente não podia mais ser aplicada ao sucesso dos milionários americanos das décadas de 1860 e 1870 ou mesmo ao rico produtor aposentado nu ma casa de campo com todo o conforto e menos ainda para seus pa rentes rentiers àqueles cujo ideal era nas palavras de Ruskin que a vida deveria ser vivida num mundo agradavelmente ondu lante sustentado por toda parte com ferro e carvão Para cada ban co agradável deve existir uma bela mansão um parque de ta manho moderado um grande jardim e estufas uma carruagem a gradável para passeios Na casa devem viver o gentleman inglês com sua graciosa esposa e sua bela família ele sempre capaz de fornecer o boudoir e as jóias para a esposa e belos vestidos de sa lão para as filhas e instrumentos de caça para os filhos e caça nos Highlands para si mesmo 29 Daí a crescente importância das teorias alternativas da superiori dade biológica de classe que tanto atravessa o Weltanschauung bur guês do século XIX Superioridade era o resultado da seleção natural transmitida geneticamente ver capítulo 14 O burguês era senão de uma espécie diferente pelo menos de uma raça superior um nível mais alto na evolução humana diferente dos níveis mais baixos que permaneciam no equivalente cultural ou histórico da infância ou no máximo adolescência De senhor à raça superior era apenas um passo portanto o di reito de dominar a inquestionável superioridade do burguês como es pécie implicava não apenas inferioridade mas idealmente uma inferi oridade aceita nas relações entre homens e mulheres que mais uma vez simbolizavam muito sobre a visão burguesa do mundo Os traba lhadores como as mulheres deveriam ser leais e satisfeitos Se não o fossem era devido àquela figura crucial do universo social da bur guesia o agitador de fora Embora nada fosse mais óbvio a olho nu que o fato de que os membros dos sindicatos eram sempre os melho res trabalhadores os mais inteligentes os mais preparados o mito do agitador de fora explorando as mentes simples mas basicamente operativas dos trabalhadores era indestrutível A conduta dos traba lhadores é deplorável escreveu um gerente de minas francês em 1869 no processo de violenta repressão a uma espécie de greve que o livro Germinal de Zola nos deu um retrato tão vivo mas é preciso terse em conta que eles foram apenas vítimas de agitadores 30 Para ser mais preciso o militante operário ativo ou o líder potencial preci sava por definição ser um agitador já que não podia ser classifi cado dentro do estereótipo de obediência boçalidade e estupidez Quando em 1859 nove dos melhores operários mineiros de Seaton Delaval seis deles metodistas primitivos e dois deles dados à pre dica foram enviados à prisão por dois meses depois de uma greve 254 à qual eles tinham se oposto o gerente da mina deixou este ponto bem claro Sei que eles são homens respeitáveis e é por isso que eu os ponho na prisão Não adianta nada prender aqueles que não sentem31 Tal atitude refletia a determinação em decapitar as classes menos favo recidas quando elas não perdiam seus líderes potenciais espontanea mente através da absorção por parte da classe média Mas também re fletia um grau considerável de confiança Estávamos longe daqueles proprietários de fábricas da década de 1830 vivendo em terror constan te de algo como uma insurreição escrava ver A Era das Revoluções epígrafe ao capítulo 11 Quando agora os donos de fábricas falavam do perigo do comunismo espreitando atrás de qualquer limitação do di reito absoluto de admitir e despedir eles não se referiam à revolução social mas meramente ao fato de que o direito de propriedade e o direi to de dominação eram indissociáveis e uma sociedade burguesa iria perderse completamente a partir do momento em que qualquer interfe rência em relação à propriedade fosse permitida32 Portanto a reação de medo e ódio foi bem mais histérica quando o espectro da revolução so cial irrompeu mais uma vez dentro do confiante mundo capitalista Os massacres dos Communards de Paris ver capítulo 9 o testemunham de forma contundente IV Uma classe de senhores sim Uma classe dirigente A resposta é mais complexa A burguesia não era evidentemente uma classe diri gente no sentido em que o velho tipo de senhor da terra o era cuja posição proporcionavalhe de jure ou de facto o direito de governo por sobre os habitantes de seu território O burguês normalmente ope rava dentro de uma rede de poder de governo e administração que não era de sua propriedade pelo menos fora dos prédios que ocupasse meu lar é meu castelo Somente em áreas muito distantes da auto ridade do Estado como em campos remotos de mineração ou onde o próprio Estado fosse fraco como nos Estados Unidos podiam os se nhores burgueses exercer aquele tipo de comando direto fosse atra vés do comando sobre as forças locais da autoridade pública por e xércitos privados como os homens de Pinkerton ou pela criação de grupos armados como os Vigilantes para manter a ordem Além disso em nosso período era bastante excepcional o caso de estados onde a burguesia houvesse conquistado o controle político formal ou não precisasse partilhálo com elites políticas pregressas Na maioria dos países a burguesia embora bem definida realmente não controla va ou exercia o poder político exceto talvez nos níveis subalternos ou municipais O que ela realmente exerceu foi hegemonia e foi o que determi nou de forma crescente a sua política Não havia alternativa para o 255 capitalismo como método de desenvolvimento econômico e neste pe ríodo isto implicava a realização do programa econômico e institu cional da burguesia liberal com variações locais assim como a po sição crucial da burguesia dentro do Estado Mesmo para os socialis tas a via para o triunfo proletário passava através de um capitalismo completasse desenvolvido Antes de 1848 havia parecido por um momento que sua crise de transição poderia também ser sua crise final pelo menos na Inglaterra mas na década de 1850 ficou claro que seu período maior de crescimento havia apenas começado Era indestrutível no seu bastião principal Inglaterra e em outros lugares as perspectivas de revolução social paradoxalmente pareciam depender mais do que nunca dos projetos da burguesia doméstica ou estrangeira ao criar o capitalismo triunfante que faria possível sua derrubada Em certo senti do tanto Marx que recebeu bem a conquista da Índia pela Inglaterra e metade do México pelos Estados Unidos como historicamente pro gressista no seu tempo quanto os elemento progressistas no México ou na Índia que procuravam aliança com os Estados Unidos ou o Rajá britânico contra seus próprios tradicionalistas reconheciam a mesma situação global Em relação aos dirigentes dos regimes conservadores antiburgueses e antiliberais da Europa fosse em Viena Berlim ou São Petesburgo eles reconheciam que a alternativa para o desenvolvimento econômico capitalista era o atraso e o conseqüente enfraquecimento O problema destes últimos era como fazer crescer o capitalismo e com ele a burguesia sem a contrapartida de um regime político burguêsliberal A simples rejeição da sociedade burguesa e de suas idéias não era mais possível A única organização que resolveu combater esta tendência sem tréguas a Igreja Católica conseguiu apenas isolarse A encíclica Syllabus of Errors de 1864 e o Concilio do Vaticano demonstraram pelo seu extremismo na rejeição de tudo que caracterizava o século XIX que estavam inteiramente na defensiva A partir da década de 1870 o monopólio do programa burguês na sua forma liberal começou a desagregarse Mas no nosso pe ríodo era imbatível Em questões econômicas mesmo os dirigentes absolutistas da Europa central e do leste foram forçados a abolir a ser vidão e desmantelar o aparato tradicional do controle econômico esta tal assim como os privilégios corporativos Em questão políticas es tes mesmos dirigentes chegaram a um bom termo com os liberais burgueses mais moderados e embora nominalmente com o tipo bur guês de instituições representativas Culturalmente era o estilo bur guês de vida que prevalecia por sobre o aristocrático inclusive atra vés de uma retirada geral da velha aristocracia do mundo da cultura como esta palavra era então entendida eles se tornaram seja não o fossem os bárbaros de Matthew Arnold 182288 Depois de 1850 é difícil pensar em reis que fossem grandes patronos das artes exceto loucos como Ludwig II da Baviera 186486 ou em magnatas nobres que fossem colecionadores importantes de objetos de arte An tes de 1848 as certezas da burguesia ainda eram ameaçadas pelo me 256 do da revolução social Depois de 1870 elas seriam mais uma vez minadas sobretudo pelo medo dos movimentos da classe operária em expansão Mas no período intermediário eles triunfaram fora de qual quer dúvida ou ameaça A era julgou Bismarck que não tinha simpa tia pela sociedade burguesa era uma de interesses materiais Inte resses econômicos eram uma força elementar Acredito que o a vanço das questões econômicas no desenvolvimento interno progride e não pode ser interrompida 33 Mas o que representava esta força e lementar neste período senão o capitalismo e o mundo feito pela e para a burguesia 257 DécimoQuarto Capítulo CIÊNCIA RELIGIÃO IDEOLOGIA Nossa aristocracia é mais bela do que as classes médias do melhor de suas mulheres mas ah que pena que a primogenitura destrua a Seleção Natural Charles Darwin 1864 1 É freqüente hoje em dia que pessoas queiram mostrar quão inteli gente são pelo grau de emancipação em relação à Bíblia e ao Cate cismo F Schaubach sobre a literatura popular 1863 2 John Stuart Mill não vai conseguir nada em reclamar o sufrágio para os negros e as mulheres Tais conclusões são os resultados inevitá veis das premissas de onde ele partiu e sua reductio ad ab surdum Anthropological Review 1866 3 I A sociedade burguesa de nosso período estava confiante e orgu lhosa de seus sucessos Em nenhum outro campo da vida humana isso era mais evidente que no avanço do conhecimento da ciência Ho mens cultos deste período não estavam apenas orgulhosos de suas ci ências mas preparados para subordinar todas as outras formas de ati vidade intelectual a elas Em 1861 o estatístico e economista Cournot observou que o fato de acreditar em verdades filosóficas saiu tanto de moda que nem o público nem nenhuma academia se dispõe a re ceber mais obras deste tipo exceto como produtos de puro academi cismo ou curiosidade histórica4 Não era de fato um bom período para filósofos Mesmo no seu reduto tradicional Alemanha não ha via ninguém de estatura comparável para suceder às grandes figuras do passado O próprio Hegel saíra de moda no seu país natal e o mo do pelo qual os medíocres que agora davam o tom para o povo ale mão tratavam o grande filósofo alemão fez com que Marx em 1860 se declarasse um discípulo daquele grande pensador5 As duas gran des correntes filosóficas subordinavamse elas mesmas à ciência o positivismo francês associada com a escola do curioso Augusto 258 Comte e o empirismo inglês associado com John Stuart Mill sem mencionar o medíocre pensador cuja influência era então maior do que qualquer outro no mundo Herbert Spencer 18201903 A base dupla da filosofia positiva de Augusto Comte era a imutabilidade das leis da natureza e a impossibilidade de qualquer conhecimento in finito ou absoluto Na medida em que não foi além da excêntrica Re ligião da Humanidade comtiana o positivismo foi pouco mais do que uma justificação filosófica do método convencional das ciências experimentais e da mesma forma para a maior parte dos da época Mill foi nas palavras de Taine o homem que abriu o caminho certo da indução e do experimento Portanto esta perspectiva estava ex plicitamente baseada em Comte e Spencer numa visão histórica do progresso evolucionista O método positivo ou científico era ou seri a o triunfo do último dos estágios através dos quais a humanidade precisava passar na terminologia de Comte os estágios teológico metafísico e científico cada qual com suas instituições próprias das quais Mill e Spencer pelo menos concordavam o liberalismo numa compreensão larga do termo era a expressão mais adequada Alguém poderia dizer com algum exagero que sob este ponto de vista o pro gresso da ciência fazia a filosofia redundante exceto como uma espé cie de laboratório intelectual assistindo ao cientista Além disso com tal confiança nos métodos da ciência não é de se surpreender que os homens instruídos da segunda metade do sécu lo XIX estivessem tão impressionados com suas conquistas De fato às vezes chegaram a pensar que estas conquistas não eram apenas im pressionantes mas também finais William Thompson Lord Kelvin o celebro físico pensava que todos os problemas básicos da física ha viam sido resolvidos e só alguns problemas menores ainda precisavam ser solucionados Ele estava como sabemos redondamente enganado Entretanto o erro era significativo e compreensível Em ciência como na sociedade há períodos revolucionários e nãorevolucioná rios e enquanto o século XX é revolucionário em ambas mais ainda que a era das revoluções 17891848 o período de que trata este livro não foi com algumas exceções revolucionário em nenhuma das duas Isto não quer dizer que todos os homens convencionais de inte ligência e habilidade pensassem que a ciência ou a sociedade tives sem resolvido todos os problemas embora em alguns aspectos parti culares como os que diziam respeito ao tipo básico de economia e o tipo básico do universo físico alguns dos mais capazes dentre eles sentissem que os problemas mais substanciais tivessem sido solucio nados Mas isto quer dizer com absoluta certeza que estes homens não tinham dúvidas sérias sobre a direção que estavam seguindo ou deveriam seguir assim como em relação aos métodos teóricos ou prá ticos de lá chegar Ninguém duvidava do progresso tanto material como intelectual já que parecia tão óbvio para ser negado Este era 259 sem dúvida o conceito dominante da época embora houvesse uma divisão fundamental entre aqueles que pensavam que o progresso se ria mais ou menos contínuo e linear e aqueles como Marx que sabi am que ele precisaria e iria ser descontínuo e contraditório Dúvidas poderiam surgir apenas sobre questões de gosto maneiras e moral onde a simples acumulação quantitativa não fornecia um guia certo Não havia dúvida de que os homens em 1860 sabiam mais do que nunca em relação a períodos anteriores mas a questão de que eles fossem melhores não podia ser demonstrada com a mesma facilida de Mas estas eram questões que preocupavam teólogos cuja reputa ção intelectual não era muito alta filósofos e artistas que eram ad mirados mas aproximadamente da mesma forma com que homens ri cos admiram os diamantes que podem comprar para suas mulheres e críticos sociais da esquerda ou da direita que não gostavam do tipo de sociedade em que viviam ou em que eram forçados a viver Entre pessoas cultas em 1860 estes eram uma minoria Embora o progresso maciço fosse possível em todos os ramos do conhecimento parecia evidente que alguns estavam mais adiantados mais bem formados que outros Parecia que a física estava mais madura que a química e que já havia deixado para trás o estágio de progresso efervescente e explosivo dentro do qual a ciência estava ainda tão visi velmente engajada A química por seu turno mesmo a química orgâ nica estava muito mais adiantada do que as ciências sobre a vida que pareciam estar começando a tomar impulso naquela era de excitante progresso De fato se uma única teoria científica deva representar o avanço das ciências naturais em nosso período e era de fato reconheci da como crucial esta teoria é a da evolução e se uma única figura do minou a imagem pública da ciência esta foi a do indivíduo de aparência simiesca Charles Darwin 180982 O estranho abstrato e logicamente fantástico mundo dos matemáticos permaneceu de certa forma isolado tanto do público geral como do científico talvez mais do que antes já que seu maior contato com a física através da tecnologia física pare cia neste estágio ter menor utilidade para as abstrações avançadas e aventurosas que nos grandes dias da construção da mecânica do espa ço O cálculo sem o qual as realizações da engenharia e das comunica ções do período não teriam sido possíveis estava então bem mais atrás da móvel fronteira da matemática Esta questão e talvez melhor repre sentada pelo maior matemático denosso período Georg Bernhard Ri emann 182666 cuja tese universitária de 1854 Sobre as hipóteses que são subjacentes à geometria publicada em 1868 não pode ser omitida de uma discussão sobre a ciência do século XIX da mesma maneira que os Principia de Newton não podem sêlo sobre o século XVII Ela estabeleceu os fundamentos da topologia a geometria dife rencial a teoria do espaçotempo e a gravitação Riemann chegou a propor uma teoria de física compatível com a moderna teoria dos quan ta Porém estes e outros desenvolvimentos altamente originais da ma 260 temática não tiveram seu lugar até a nova era revolucionária da física que iria começar somente no final do século Entretanto em nenhuma das ciências naturais parecia haver algu ma dúvida séria sobre a direção geral na qual o conhecimento avança va ou sobre a estrutura básica conceituai ou metodológica sobre a qual estava baseada Descobertas não faltavam teorias às vezes novas mas não inesperadas Mesmo a teoria darwinista da evolução impres sionava não porque o conceito de evolução fosse novo era familiar havia décadas mas porque fornecia pela primeira vez um modelo de explanação satisfatório para a origem das décadas e o fez em ter mos que eram inteiramente conhecidos até para nãocientistas já que refletiam os conceitos mais familiares da economia liberal a compe tição De fato um número pouco comum de grandes cientistas escre veu uma terminologia que os permitia rapidamente a popularização alguns até excessivamente tais como Darwin Pasteur os fisiologis tas Claude Bernard 181378 e Rudolf Virchow 18211902 e Hel mholtz 1821 4 sem mencionar os físicos William Thompson e Lord Kelvin Os modelos básicos ou paradigmas das teorias cientí ficas pareciam firmes embora grandes cientistas como James Clerk Maxwell 183179 formulassem suas versões com a precaução ins tintiva que as fizessem compatíveis com outras teorias posteriores que surgissem baseadas em modelos diferentes No interior das ciências naturais havia pouco daquela confronta ção passional que ocorre quando há um impasse não de hipóteses di ferentes mas de diferentes formas de olhar o mesmo problema isto é quando um lado propõe não apenas uma resposta diferente mas que pensa que o outro lado é inaceitável impensável Tal impasse ocor reu no mundo pequeno e remoto das matemáticas quando H Kronec ker 18391914 atacou K Wierstrass 18151897 R Dedekind 18311916 e G Cantor 18451918 na questão da matemática do infinito Tais Methodenstreite batalhas de métodos dividiam tam bém o mundo dos cientistas sociais mas na medida em que entravam nas ciências naturais mesmo as biológicas na sensível questão da evolução refletiam uma intrusão de preferências ideológicas em lu gar de debates profissionais Não há nenhuma razão científica con vincente para que elas não ocorressem Portanto aqueles cientistas vi torianos mais típicos como William Thompson Lord Kelvin típico na sua combinação entre grande poder teórico convencional enorme fertilidade tecnológica e conseqüente sucesso nos negócios estavam claramente descontentes com a matemática de Clerk Maxwell e sua teoria eletromagnética da luz vista por muitos como o ponto de parti da para a física moderna Portanto como ele conseguiu reformulála em termos de seu próprio tipo de matemática de engenharia o que não é não chegou a discutir a questão Além disso Thompson de monstrou para sua própria satisfação que baseado nas leis da física conhecidas o sol não poderia ser mais velho que 500 milhões de a nos e que portanto o tempo requerido pela evolução geológica e bio 261 lógica na Terra era impossível Na qualidade de cristão ortodoxo ele recebeu muito bem esta conclusão Realmente de acordo com a físi ca de 1864 ele estava correto seria apenas a descoberta das forças desconhecidas da energia nuclear que permitiria aos cientistas supor uma vida muito mais longa para o sol e conseqüentemente para a Ter ra Mas Thompson não se preocupava com o fato de que a física pu desse estar incompleta ou se entrava em conflito com a geologia acei ta ou ainda se os geólogos estavam simplesmente adiante da física O debate talvez nem tivesse ocorrido se o desenvolvimento das ciências tivesse sido levado em consideração Portanto o mundo da ciência andava para frente nos seus próprios trilhos intelectuais e o seu progresso interior parecia como o das fer rovias oferecer a perspectiva da colocação de mais trilhos do mesmo tipo em novos territórios Os céus pareciam conter pouco daquilo que teria surpreendido velhos astrônomos afora uma série de novas obser vações através de telescópios mais poderosos ou instrumentos de medi ção melhores ambos desenvolvimentos alemães e o uso da nova téc nica de fotografia assim como da análise espectroscópica pela primei ra vez aplicada à luz das estrelas em 1861 que viria a transformarse num instrumento de pesquisa extremamente poderoso As ciências físicas tinhamse desenvolvido dramaticamente no meioséculo precedente quando fenômenos aparentemente disparata dos como o calor e a energia foram unificados pelas leis da termodi nâmica enquanto que a eletricidade o magnetismo e mesmo a luz convergiam para um único modelo analítico A termodinâmica não avançou muito em nosso período embora Thompson tivesse comple tado o processo da reconciliação das novas doutrinas sobre o calor com as antigas da mecânica em 1851 The dynamical equivalent of Heat O espantoso modelo matemático da teoria eletromagnética da luz formulada pelo ancestral da moderna física teórica James Clerk Mawwell em 1862 era profunda e nãoacabada Deixava o caminho aberto para a descoberta do elétron Portanto Maxwell talvez porque nunca tenha conseguido fazer uma exposição adequada daquilo que ele mesmo descrevia como estranha teoria só viria a ser feito em 19416 fracassou em convencer os seus contemporâneos mais céle bres como Thompson e Helmholtz ou mesmo o brilhante austríaco Ludwig Boltzmann 18441906 cuja intervenção em 1868 pratica mente lançou a mecânica estatística como um campo de conhecimen to Provavelmente a física de meados do século XIX não era tão espe tacular quanto dos períodos precedentes e subseqüente mas seu de senvolvimento teórico era bastante expressivo Portanto a teoria ele tromagnética e as leis da termodinâmica pareciam entre elas citando Bernal implicar uma certa finalidade mútua 7 De qualquer forma os ingleses liderados por Thompson e mesmo outros físicos que havi am desenvolvido sua capacidade criativa na termodinâmica estavam atraídos pela idéia de que o homem ainda não havia adquirido um co nhecimento definitivo das leis da natureza embora Helmholtz ou 262 Boltzmann não estivessem bem convencidos Talvez a impressionan te fertilidade tecnológica da física do modelo mecânico tornasse a ilu são da finalidade mais tentadora Não havia certamente tal finalidade em vista no que toca à se gunda grande ciência natural talvez a mais florescente de todo o sé culo XIX a química Sua expansão era dramática especialmente na Alemanha não apenas porque seu uso industrial parecesse não ter fim de fertilizantes a produtos médicos e explosivos Os químicos es tavam a caminho de formarem mais da metade dos profissionais en gajados nas ciências 8 As fundações da química como uma ciência madura haviam sido estabelecidas nos últimos 30 anos do século XVIII Ela havia florescido desde então e continuou desenvolvendo se numa excitante fonte de idéias e descobertas em nosso período Os processos elementares básicos da química eram conhecidos e os instrumentos analíticos essenciais disponíveis a existência de um número limitado de elementos químicos compostos de diferentes nú meros de unidades básicas átomos e componentes de elementos compostos de unidade de moléculas multiatômicas além de alguma idéia das leis destas combinações dariam a partida para os grandes avanços nas atividades dos químicos a análise e síntese de várias substâncias O campo especial da química orgânica já florescia neste tempo embora estivesse confinada às propriedades a maioria delas eram úteis na produção de materiais derivados de fontes que um dia haviam sido orgânicas como o carvão Ainda estava a um longo ca minho da bioquímica isto é a compreensão de como estas substân cias funcionavam no organismo vivo Assim mesmo os modelos da química permaneciam bastante imperfeitos mas avanços substanciais na compreensão destes vieram a ser feitos no nosso período Eles i luminaram a estrutura dos componentes químicos que ate então havi am sido vistos apenas em termos quantitativos isto é o número de átomos numa molécula Tornouse então possível determinar o correto número de cada tipo de átomo numa molécula através da Lei de Avogrado de 1811 já existente que um químico patriota italiano fez com que fosse objeto das atenções durante um simpósio em 1860 sobre a questão o ano da unidade italiana Além disso mais um empréstimo frutífero da física Pasteur descobriu em 1848 que substâncias quimicamente idênticas poderiam ser fisicamente diferentes por exemplo girando ou não gi rando no plano da luz polarizada Destas descobertas seguiuse entre outras coisas que as moléculas têm uma forma no espaço tridimensi onal e o brilhante químico alemão Kekülé 182996 na situação bastante vitoriana de um passageiro sentado no segundo andar de um ônibus londrino em 1865 imaginou o primeiro dos modelos comple xos estruturais moleculares o famoso anel de seis átomos de carbono cada qual com um átomo de hidrogênio ligado Poderseia dizer que a concepção arquitetônica ou de engenharia de um modelo que até en 263 tão tinha sido conhecido pela sua forma escrita C6 H6 a mera con tagem dos átomos era a fórmula química Talvez ainda mais sensacional fosse a generalização maior no campo da química produzida por este período a Tabela Periódica dos Elementos 1869 de Mendeleev 18341907 Graças à solução dos problemas do peso atômico e de sua valência o número de ligações que o átomo de um elemento possui com outros elementos a teoria atômica negligenciada de alguma forma depois de haver florescido no começo do século XIX veio à tona novamente depois de 1860 e simultaneamente a tecnologia na construção do espectroscópio 1859 permitiu que vários novos elementos fossem descobertos Além disso a década de 1860 foi um grande período de padronização e mensura mento Entre outras coisas a fixação das unidades familiares das me didas elétricas volt ampere watt e ohm Várias tentativas foram en tão feitas para reclassificar os elementos químicos de acordo com a valência e o peso atômico A de Mendeleev e a do alemão German Lotar Meyer 183095 baseavase no fato de que as propriedades dos elementos variavam de forma periódica com seus respectivos pesos atômicos A Tabela de Mendeleev parecia à primeira vista concluir o estudo da teoria atômica pelo estabelecimento de um limite à existên cia de tipos fundamentalmente diferentes de matéria De fato trata vase de encontrar a interpretação completa num novo conceito de matéria não mais feita de átomos imutáveis mas de relações relativa mente provisórias de umas poucas partículas fundamentais elas mesmas sujeitas a mudanças e transformações Mas Mendeleev co mo Clerk Maxwell via suas conclusões como a última palavra em uma velha discussão ao invés de a primeira num novo debate A biologia ficava bem atrás das ciências físicas agrilhoada não apenas pelo conservadorismo dos dois grupos maiores de homens in teressados na sua aplicação prática mas também pelos fazendeiros e especialmente pelos médicos Retrospectivamente o maior dos pri meiros fisiologistas é Claude Bernard cujo trabalho fornece a base para toda a fisiologia moderna assim como a bioquímica e que além de tudo escreveu uma das melhores análises dos processos da ciência jamais escritos a sua Introdução ao Estudo da Medicina Experi mental 1865 Entretanto embora reconhecido especialmente no seu país natal a França suas descobertas não foram imediatamente apli cadas e sua influência foi conseqüentemente inferior a de seu compa triota Louis Pasteur que se tornou juntamente com Darwin talvez o cientista de meados do século XIX mais conhecido do grande públi co Pasteur foi atraído para o campo da bacteriologia do qual tornou se o grande pioneiro juntamente com Robert Koch 18431910 um doutor alemão através da química industrial mais precisamente a análise de por que a cerveja e o vinagre às vezes estragavam por ra zões que a analise química não conseguia revelar Tanto as técnicas da bacteriologia o microscópio a preparação de culturas e lâminas etc e sua aplicabilidade imediata a erradicação de doenças em a 264 nimais e homens fizeram a nova disciplina accessível compreensí vel e atraente Técnicas como antissépticos desenvolvidas por Lister 18271912 por volta de 1865 pasteurização ou outros métodos de preservação de produtos orgânicos do contágio de micróbios assim como a isolação estavam à mão e os argumentos e resultados eram suficientemente palpáveis para derrubar mesmo a ferrenha hostilidade da comunidade médica O estudo da bactéria iria fornecer à biologia um approach extremamente útil para a natureza da vida mas neste período não levantou nenhuma questão teórica que o mais convencio nal dos cientistas não pudesse imediatamente reconhecer O mais significativo e dramático avanço na biologia pouco tinha a ver na época com o estudo da estrutura física e química da vida e seu mecanismo A teoria da evolução pela seleção natural ia bem mais longe dos limites da biologia e nisto reside sua importância Ela ratificava o triunfo da história sobre todas as ciências embora histó ria neste sentido fosse normalmente confundida pelos da época com progresso Além disso ao trazer o próprio homem para dentro do esquema da evolução biológica abolia a linha divisória entre ciências naturais humanas ou sociais Portanto todo o cosmos ou pelo menos todo o sistema solar precisavam ser concebidos como um processo de mudança histórica constante O sol e os planetas estavam no centro desta história e portanto como os geólogos já haviam estabelecido ver A Era das Revoluções capítulo 15 também estava a Terra Coi sas vivas eram então incluídas neste processo embora a questão de que a vida tivesse evoluído da nãovida permanecesse sem solução e sobretudo por razões ideológicas extremamente delicada O grande Pasteur acreditava que havia demonstrado que não poderia evoluir desta forma Darwin trouxe não apenas os animais mas também o homem para o esquema evolucionista A dificuldade para a ciência de meados do século XIX não resi dia na admissão de tal historicização do universo nada era mais fá cil de conceber numa era de mudanças históricas tão esmagadoramen te óbvias e maciças mas de combinála com as operações unifor mes contínuas e nãorevolucionárias das leis naturais permanentes Um descrédito em relação a revoluções sociais não estava ausente de suas considerações assim como um descrédito da religião tradicional cujos textos estavam comprometidos com mudança descontínua criação e interferência na regularidade da natureza milagres Entretanto parecia também que neste estágio a ciência dependia de uniformidade e invariância O reducionismo parecia ser essencial Somente pensadores revolucionários como Marx achavam fácil con ceber situações onde dois mais dois não fosse mais igual a quatro mas que pudesse ser igual a outra coisa no seu lugar A grande conquista dos geólogos havia sido a explicação de como a operação das mesmas forças exatamente visíveis hoje podia explicar a enorme variedade do que podia ser observado na Terra ina nimada passado e presente A grande conquista da seleção natural era 265 poder explicar a grande variedade das espécies inclusive o homem Este sucesso era tentador e ainda tenta pensadores a negar ou mini mizar os processos inteiramente diferentes ou novos que governam a mudança histórica e que reduzem as mudanças nas sociedades hu manas a regras da evolução biológica com importantes conseqüên cias e às vezes intenções políticas socialdarwinismo A socie dade na qual os cientistas ocidentais viviam e todos os cientistas pertenciam ao mundo ocidental mesmo aqueles situados nas margens da Rússia combinavam estabilidade e mudança assim como suas teorias revolucionárias Eles eram apesar de tudo dramáticos ou mesmo traumáticos já que pela primeira vez investiam em direção a uma confrontação deli berada e militante com as forças da tradição o conservadorismo e es pecialmente a religião Eles aboliram o status especial que os homens haviam concebido para si mesmos há milênios atrás Como conceber que o homem criado à imagem de Deus não fosse nada mais que um macaco modificado Diante da escolha entre macacos e anjos os o positores de Darwin tomaram o lado dos anjos A força desta resis tência demonstra a força do tradicionalismo e da religião organizada mesmo entre os grupos mais emancipados e instruídos das populações ocidentais pois a discussão estava limitada aos altamente cultos Mas o que é igualmente ou talvez mais espantoso é a disposição dos evo lucionistas de publicamente desafiar as forças da tradição e seu tri unfo relativamente rápido Havia existido muitos evolucionistas na primeira metade do século mas entre eles os biólogos tinham lidado com a questão com extremo cuidado e mesmo algum medo pessoal O próprio Darwin retraiuse em algumas idéias que havia concebido Isso não era devido ao fato de que a evidência da descendência do homem de macacos agora era demasiadamente esmagadora para que qualquer resistência lhe fosse oposta mas como terminou por su ceder ela acumulouse rapidamente na década de 1850 O crânio de tipo simiesco do Homem de Neanderthal 1856 não podia ser nega do Mas a evidência havia sido suficientemente forte mesmo antes de 1848 Era devido sim à feliz conjuntura de dois fatos ao rápido a vanço da burguesia liberal e progressista e à ausência de revolu ções O desafio às forças da tradição cresceram e ficaram mais fortes mas não mais pareciam implicar em mudanças sociais O próprio Darwin ilustra esta combinação Um burguês homem da esquerda moderadamente liberal e inquestionavelmente pronto para confrontar as forças do conservadorismo e da religião a partir do final da década de 1850 embora nunca antes disso ele polidamente rejeitou o ofere cimento de Karl Marx que queria dedicarlhe o segundo volume do Capital Ele não era apesar de tudo um revolucionário A sorte do darwinismo portanto dependia não tanto do seu su cesso em convencer o público científico isto é dos méritos evidentes de A Origem das Espécies mas da conjuntura política e ideológica do tempo e do país Iria ser evidentemente adotada de imediato pela ex 266 trema esquerda que havia de fato há muito tempo atrás fornecido um poderoso componente do pensamento evolucionista Alfred Russel Wallace 18231913 que aliás descobriu a teoria da seleção natural independentemente de Darwin e partilhou esta glória com ele vinha da tradição de ciência e radicalismo que teve um papel tão importante no começo do século XIX e que achava a história natural tão nor mal Formado no meio do cartismo permaneceu um homem da ex trema esquerda que voltou à política mais tarde na vida dando apoio militante à nacionalização da terra e mesmo ao socialismo enquanto mantinha sua crença em outras teorias características da ideologia plebéia e heterodoxa como a frenologia e o espiritualismo ver pró ximo capítulo Marx imediatamente colocou a Origem de Darwin como a base das ciências naturais do nosso ponto de vista 9 e a so cial democracia tornouse fortemente e para alguns discípulos de Marx como Kautski de maneira excessiva darwinista Esta evidente afinidade entre socialistas e darwinismo biológico não impediu que as classes médias liberais dinâmicas e progressistas também o acolhessem de braços abertos O darwinismo triunfou rapi damente na Inglaterra e na confiante atmosfera liberal da Alemanha na década da unificação Na França onde a classe média preferia a estabilidade do império napoleônico e os intelectuais de esquerda não sentiam nenhuma necessidade de importação de idéias nãofranceses e portanto atrasadas o darwinismo não avançou rapidamente até o fi nal do império e a derrota na Comuna de Paris Na Itália seus defen sores estavam mais nervosos por causa das implicações social revolucionárias do que por causa dos rompantes papais mas de qual quer forma ainda suficientemente confiantes em si mesmos Nos Es tados Unidos não apenas triunfou rapidamente mas cedo transfor mouse na ideologia do capitalismo militante Por outro lado a oposi ção à evolução darwinista mesmo entre cientistas veio dos social mente conservadores II A evolução liga as ciências naturais às ciências humanas ou so ciais embora o último termo seja anacrônico Porém a necessidade de uma ciência específica e geral da sociedade distinta das várias disciplinas relevantes já tratando com assuntos humanos era pela primeira vez sentida A British Association for the Promotion of So cial Science 1857 tinha meramente o modesto objetivo de aplicar métodos científicos às reformas sociais Entretanto a sociologia ter mo inventado por Auguste Comte em 1839 e popularizado por Her bert Spencer que escreveu um livro prematuro sobre os princípios desta e de numerosas outras ciências em 1876 era muito falada Pelo final de nosso período ainda não havia produzido nem uma disciplina reconhecida nem um assunto de pesquisa acadêmica Por outro lado 267 o amplo mas cognoscível campo da antropologia emergia rapidamen te como uma ciência reconhecida saindo da filosofia direito etnolo gia literatura de viagem do estudo da língua e do Folclore e das ci ências médicas via o então popular assunto da antropologia física que levou à moda de medir e colecionar os crânios de vários povos A primeira pessoa a ensinála oficialmente foi provavelmente Quatre fages em 1855 na cadeira que existia para esta matéria no Museu Na cional de Paris A fundação da Sociedade Antropológica de Paris 1859 foi seguida por um repentino interesse na década de 1860 quando associações similares foram fundadas em Londres Madri Moscou Florença e Berlim A psicologia outro termo cunhado re centemente desta vez por John Stuart Mill ainda estava ligada à filo sofia A Bain e seu livro Mental and Moral Science 1868 ainda combinavaa com a ética mas recebia cada vez mais uma orientação experimental com W Wundt 18321920 que havia sido assistente do grande Hemholtz Era inquestionavelmente uma disciplina aceita pela década de 1870 pelo menos nas universidades alemães Esta ma téria também atingia os campos da sociologia e da antropologia e em 1859 um jornal era fundado ligandoa com a lingüística 10 Pelos padrões das ciências positivas e especialmente as expe rimentais os resultados destas novas ciências não impressionavam muito embora três pudessem clamar resultados sistemáticos e genuí nos como ciências antes de 1848 economia estatística e lingüística ver A Era das Revoluções capítulo 15 A ligação entre economia e matemática tornouse então direta com A A Cournot 180177 e L Walras 18341910 ambos franceses e a aplicação da estatística aos fenômenos sociais já estava suficientemente avançada para estimular sua aplicação às ciências físicas Pelo menos isto é o que era defendi do pelos estudantes das origens da mecânica estatística iniciada por Clerk Maxwell Por conseguinte a estatística social floresceu como nunca antes seus praticantes encontrando emprego público à vontade Congressos internacionais estatísticos passaram a ocorrer a partir de 1853 e o estatuto científico da matéria foi então reconhecido pela e leição do célebre e admirável Dr William Farr 180783 para a Ro yal Society A lingüística como veremos seguiria uma linha diferen te de desenvolvimento Mas no total estes resultados não eram excepcionais A escola econômica utilitarista desenvolvida simultaneamente na Inglaterra Áustria e França por volta de 1870 era formalmente elegante e sofis ticada mas sem dúvida consideravelmente mais limitada que a velha economia política ou mesmo a recalcitrante escola histórica eco nômica dos alemães e desta forma uma abordagem menos realística aos problemas econômicos Diferente das ciências naturais numa so ciedade liberal as ciências sociais não tinham nem mesmo o estímulo ao progresso tecnológico Já que o modelo básico da economia pare cia perfeitamente satisfatório não deixava nenhum grande problema a resolver tais como o do crescimento possível colapso econômico ou 268 distribuição de renda Na medida em que estes problemas não estives sem ainda resolvidos as operações automáticas da economia de mer cado sobre as quais as análises então se concentravam iriam resol vêlos desde que não estivessem fora de solução humana De qual quer maneira as coisas estavam progredindo e melhorando uma situ ação que fazia difícil que as mentes dos economistas se concentras sem em aspectos mais profundos de sua ciência As reservas que os pensadores burgueses tinham sobre seu mundo eram de natureza mais social e política que econômica espe cialmente onde o perigo de revolução não estava esquecido como na França ou estava emergindo com o crescimento do movimento traba lhista como na Alemanha Mas se os pensadores alemães que nunca engoliram direito teorias liberais extremas estavam como os conser vadores em todos os lugares preocupados com o fato de que a socie dade produzida pelo capitalismo liberal mostravase perigosa e instá vel por outro lado pouco tinham a propor exceto reformas sociais preventivas A imagem básica do sociólogo era a imagem biológica de um organismo social a cooperação funcional de todos os grupos na sociedade muito diferente da luta de classes Era no fundo o anti go conservadorismo vestido com roupa do século XIX e aliás difícil de se combinar com a outra imagem biológica do século que propu nha mudança e progresso a evolução Era de fato uma base melhor para propaganda do que para ciência Portanto o único pensador do período que desenvolveu uma te oria compreensível da estrutura e mudança social que ainda impõe respeito foi o revolucionário social Karl Marx que desfruta da admi ração ou pelo menos do respeito de economistas historiadores e so ciólogos Esta é uma realização admirável já que seus contemporâ neos exceto alguns economistas estão agora esquecidos mesmo pe los homens mais instruídos Mas o que é mais espantoso não é tanto o fato de que Auguste Comte ou Herbert Spencer fossem apesar de tu do pessoas de alguma estatura intelectual reconhecida mas que os homens que eram então olhados como os Aristóteles do mundo mo derno praticamente tenham desaparecido de vez Eles eram no seu tempo incomparavelmente mais famosos e influentes que Marx cujo Capital foi descrito em 1875 por um especialista anônimo alemão como a obra de um autodidata ignorante do progresso dos últimos 25 anos 11 Pois nesta época no Ocidente Marx era levado a sério apenas dentro do movimento trabalhista internacional e especialmente pelo crescente movimento socialista de seu próprio país e mesmo assim sua influência ali era superficial Entretanto os intelectuais de uma Rússia cada vez mais revolucionária liamno avidamente A primeira edição alemã do Capital 1867 mil cópias levou cinco anos para vender mas em 1872 as primeiras mil cópias da edição russa esgota ramse em menos de dois meses O problema com o qual Marx se defrontava era o mesmo que ou tros cientistas sociais tentavam enfrentar a natureza e mecânica da 269 transição de uma sociedade précapitalista para uma capitalista e suas específicas formas de operação e tendências de futuro desenvolvimen to Já que suas respostas são relativamente familiares não precisamos recapitulálas aqui embora valha a pena assinalar que Marx resistiu à tendência que em outros lugares cresceu com força sempre maior de separar a análise econômica de seus contextos históricos sociais O problema do desenvolvimento histórico da sociedade do século XIX levou tanto teóricos como inclusive homens práticos a penetrar profun damente no passado remoto Pois tanto dentro dos países capitalistas quanto nos lugares onde a sociedade burguesa em expansão encontrava e destruía outras sociedades o passado vivo e o presente nascente encontravamse em conflito aberto Pensadores alemães viam a ordem hierárquica dos estratos dar lugar em seu próprio país a uma socie dade de classes conflitantes Advogados ingleses especialmente aque les com experiência na Índia contrastavam a antiga sociedade do sta tus com a nova do contrato e viam a transição da primeira para a se gunda como a principal forma do desenvolvimento histórico Escritores russos viviam de fato simultaneamente nos dois mundos o antigo comunalismo dos camponeses que muitos deles conheciam dos longos verões em suas fazendas e o mundo do intelectual ocidentalizado e viajado Para o observador de meados do século XIX toda a história coexistia ao mesmo tempo exceto as antigas civilizações e impérios como a antigüidade clássica que haviam sido literalmente enterrados esperando as pás de H Schliemann 182290 em Tróia e Micenas ou as de Flinders Petrie 18531942 no Egito Poderseia talvez esperar que a disciplina ligada mais de perto ao passado proporcionasse uma contribuição mais importante ao de senvolvimento das ciências sociais mas na realidade a história como um especialização acadêmica foi curiosamente de pouca ajuda Seus praticantes estavam sobretudo interessados com dirigentes batalhas tratados acontecimentos políticos ou instituições políticolegais num mundo politicamente retrospectivo senão com política cotidiana ves tida com roupas históricas Eles elaboraram a metodologia de pesqui sa baseados nos documentos dos arquivos públicos hoje admiravel mente organizados e preservados e seguindo a liderança dos ale mães organizaram suas publicações em torno dos dois pólos da tese acadêmica e da revista especializada para scholars a Historische Zeitschrift foi publicada pela primeira vez em 1858 a Revue Histori que em 1876 a Historical Review inglesa em 1886 e a American His torical Review em 1895 Mas o que eles produziram foi no máximo alguns monumentos permanentes de erudição aos quais ainda hoje recorremos e no mínimo uns gigantescos panfletos que hoje se são lidos é por mero interesse literário A história acadêmica apesar do moderado liberalismo de alguns de seus praticantes tinha uma natural inclinação em preservar o passado e tinha uma atitude de suspeita senão de deploração em relação ao futuro As ciências sociais neste período tinham a inclinação contrária 270 Apesar de tudo se os historiadores acadêmicos seguiam seus ca minhos de erudição a história permanecia como a estrutura básica das novas ciências sociais Isto era particularmente óbvio no florescente e como em tantos outros proeminentemente alemão campo da lingüís tica ou melhor para usar o termo daépoca da filologia O maior inte resse desta ciência residia na reconstituição da evolução histórica das línguas indoeuropéias que talvez porque fossem conhecidas na Ale manha como indoalemãs atraíam ali a atenção nacional quando não nacionalista Esforços para estabelecer uma tipologia evolucionista mais ampla das línguas isto é descobrir as origens e o desenvolvimen to histórico da fala e da linguagem também foram feitos por exemplo H Steinthal 182399 e A Schleicher 182168 mas as árvores das linguagens então construídas permaneciam altamente especulativas e as relações entre os vários genera e species extremamente duvidosas Na realidade com a exceção do hebreu e de alguns dialetos semitas que a traíam estudiosos judeus ou bíblicos e também algum trabalho feito com as línguas finouralianas que por acaso tinham um representante na Europa central a Hungria pouco fora das línguas indoeuropéias havia sido sistematicamente estudado nos países onde a filologia de meados do século XIX havia florescido A escola americana de lin güística baseada no estudo das línguas ameríndias ainda não se tinha desenvolvido Por outro lado os insights fundamentais da primeira metade do século eram agora sistematicamente aplicados e desenvolvi dos na lingüística evolucionista indoeuropéia Os tipos regulares de mudanças sonoras descobertas por Grimm para o alemão eram agora investigados e especificados de forma mais aprofundada métodos de reconstrução de formas de palavras antigamente nãoescritas e a cons trução de modelos das árvores de família lingüísticas eram estabele cidos outros modelos de mudança evolutiva como a teoria das on das de Schmidt eram sugeridos e o uso da analogia especialmente analogia gramatical era desenvolvido já que a filologia não era nada se não fosse comparativa Pela década de 1870 a escola líder de Jung grammatiker Jovens Gramáticos se julgava capaz de reconstruir o In doEuropeu original do qual tantas línguas desde o sânscrito no Leste e o celta no Oeste descendiam e o temível Schleicher chegou a escrever textos neste idioma reconstruído A lingüística moderna tomou um ca minho inteiramente diverso rejeitando os interesses históricos e evolu cionistas de meados do século XIX talvez com violência excessiva e nesta medida o principal desenvolvimento da filologia em nosso perío do produziu princípios conhecidos ao invés de antecipar novos Mas era bem tipicamente uma ciência social evolucionista e pelos padrões da época muito bem sucedida tanto entre especialistas como junto ao grande público Infelizmente entre os últimos apesar dos desmentidos específicos de scholars como F MarxMuller 18231900 de Oxford encorajou a crença no racismo os que falavam as línguas indo européias um conceito puramente lingüístico sendo identificados com a raça ariana 271 O racismo tinha um papel central em outra ciência social que se desenvolvia rapidamente a antropologia uma fusão de duas discipli nas sensivelmente diferentes a antropologia física basicamente de rivada de interesses anatômicos e similares e a etnografia ou a descrição de várias comunidades geralmente atrasadas ou primiti vas Ambas inevitavelmente confrontaram e foram de fato dominadas pelo problema da diferença entre diversos grupos humanos e como estavam calcadas no modelo evolucionista o problema da descen dência do homem assim como os diferentes tipos de sociedade dos quais o mundo burguês parecia sem dúvida o mais elevado Antropo logia física automaticamente levava ao conceito de raça já que as diferenças entre povos brancos amarelos ou pretos negros mongóis caucasianos ou qual fosse a classificação empregada eram indiscu tíveis Isso não implicava em si mesmo nenhuma crença em desigual dade racial superioridade ou inferioridade embora quando combina do com o estudo da evolução do homem na base do fóssil pré histórico certamente a sugerisse Pois os ancestrais mais identificáveis e mais remotos principalmente o Homem de Neanderthal eram claramente mais simiescos e culturamente inferiores que os seus des cobridores Logo se algumas raças existentes poderiam ser demons tradas como estando mais próximas ao macaco do que outras não iria isso provar sua inferioridade O argumento é frágil mas era um apelo natural para aqueles que queriam provar a inferioridade racial por exemplo negros em relação a brancos ou melhor de qualquer um em relação a brancos A for ma de macaco poderia ser discernida pelo olho do preconceito até nos chineses e japoneses como testemunham muitos desenhos da época Mas se a evolução biológica darwinista sugeria uma hierarquia das raças assim o fez o método comparativo aplicado na antropologia cultural da qual Primitive Culture 1871 de E B Tylor é a obra mais Importante Para E B Tylor 18321917 assim como para muitos dos maravilhados pelo progresso que observavam comuni dades e culturas que diferentes dos fósseis humanos não haviam de saparecido estas não eram diferentes por natureza mas representati vas de um estágio anterior da evolução no caminho da civilização moderna Elas eram iguais à infância na vida do indivíduo Isso im plicava uma teoria de estágios Tylor tinha sido influenciado por Comte que ele aplicava com a caução habitual de homens respeitá veis tocando este assunto ainda explosivo à religião Do primitivo animismo uma palavra inventada por ele o caminho levava a reli giões monoteístas mais elevadas e eventualmente para o triunfo da ciência que capaz de explicar ares cada vez maiores da experiência sem recurso ou referência ao espírito iria em cada departamento um após outro substituir a descoberta de uma lei sistemática à ação inde pendente voluntária 12 Nesse ínterim entretanto sobrevivências historicamente modificadas estágios da civilização poderiam ser dis 272 cernidas em qualquer lugar mesmo nas partes evidentemente atrasa das das nações civilizadas por exemplo nas superstições e costumes do campo Portanto o camponês transformarase na ligação entre o selvagem e o civilizado Tylor que pensou a antropologia como es sencialmente uma ciência reformadora não acreditava que isso indi casse qualquer incapacidade dos camponeses em se tornarem membros completos da sociedade civilizada Mas o que seria mais fácil de con cluir do que aqueles que representavam o estágio da infância ou ado lescência no desenvolvimento da civilização eram de fato infantis e precisavam ser tratados como crianças pelos seus pais maduros Assim como o tipo do negro escreveu a Anthropological Review é fetal o tipo do mongol é infantil E de acordo com isto encontramos que o governo literatura e artes deles também são infantis Crianças sem barba cuja vida é uma tarefa e cuja maior virtude consiste numa obediência indiscutível13 Ou como o capitão Osborn colocou de maneira meio naval em 1860 Trateos como crianças Façaos fazer o que sabemos que é melhor para eles como é para nós e todas as dificuldades com a Chi na chegarão a um fim 14 Outras raças eram inferiores porque representavam um estágio anterior da evolução biológica ou da evolução sóciocultural ou en tão de ambas E esta inferioridade era comprovada porque de fato a raça superior era superior pelo critério de sua própria sociedade tecnologicamente mais avançada militarmente mais poderosa mais rica e mais bemsucedida O argumento era tão lisonjeiro quanto conveniente tão conveniente que as classes médias estavam inclina das a tomálo dos aristocratas que haviam por longo tempo se consi derado uma raça superior por razões internas e também internacio nais os pobres eram pobres porque biologicamente inferiores e por outro lado se cidadãos pertenciam às raças inferiores não era de se espantar que eles permanecessem pobres e atrasados O argumento ainda não estava vestido com o aparato da genética moderna que vir tualmente ainda não havia sido inventada os agora celebrados expe rimentos do monje Gregor Mendel 182284 com feijões no jardim de seu monastério moraviano 1865 passaram completamente desa percebidos até que foram redescobertos em 1900 Mas de uma forma primitiva a idéia de que as classes superiores eram um tipo mais ele vado de humanidade desenvolvendo sua superioridade por endoga mia e ameaçada pela mistura com as ordens inferiores e mais ainda pelo rápido aumento numérico destes inferiores era largamente acei ta Por outro lado como a escola sobretudo italiana da antropologia criminal pretendia provar o criminoso o antisocial o desprivilegi ado social pertenciam a uma linhagem humana diferente e inferior da respeitável e podia ser reconhecida como tal pelo mensuramento do crânio e outros métodos simples 273 O racismo atravessa o pensamento de nosso período numa exten são difícil de julgar hoje e nem sempre fácil de compreender Por que por exemplo o horror generalizado da miscigenação e a crença quase universal entre os brancos de que os mestiços herdavam precisamente as piores características das raças de seus pais Exceto pela sua conve niência enquanto legitimização da dominação do branco sobre indiví duos de cor ricos sobre pobres isto talvez seja melhor explicado como um mecanismo através do qual uma sociedade fundamentalmente ine galitária baseada sobre uma ideologia fundamentalmente egalitária ra cionalizava suas desigualdades uma tentativa para justificar e defender aqueles privilégios que a democracia implicitamente nas suas ins tituições precisava inevitavelmente desafiar O liberalismo não tinha nenhuma defesa lógica diante da igualdade e da democracia portanto a barreira ilógica do racismo foi levantada a própria ciência o trunfo do liberalismo podia provar que os homens não eram iguais Mas evidentemente a ciência do nosso período não chegou a pro válo embora alguns cientistas tenham se esforçado bastante A tauto logia darwinista sobrevivência dos melhores sendo que a prova de ser melhor era precisamente a sobrevivência não podia provar que os homens fossem superiores às minhocas já que ambos sobreviviam com sucesso A superioridade era entendida através da redução à e quação de nivelar história evolucionista com progresso E mesmo que a história evolutiva do homem discernisse corretamente o progres so em algumas questões importantes principalmente ciência e tecno logia embora não dando atenção a outras não conseguiu e aliás não poderia fazer do atraso um fato permanente e irreparável Pois ela era baseada na premissa de que os seres humanos pelo menos na sua emergência como homo sapiens eram os mesmos seus comportamen tos obedecendo às mesmas leis uniformes embora em circunstâncias históricas diferentes O inglês era diferente do indoeuropeu original mas não porque os ingleses modernos operassem de uma maneira lin guisticamente diferente das tribos ancestrais da Ásia central O para digma básico da árvore de família que aparece tanto na filologia co mo na antropologia implica o contrário das formas de desigualdade genéticas ou outras quaisquer permanentes Os sistemas de parentesco dos aborígenes australianos habitantes das ilhas do Pacífico e índios i raquianos que os ancestrais da antropologia social moderna como Le wis Morgan 181881 então começavam a estudar seriamente em bora o assunto fosse ainda basicamente mais estudado nas bibliotecas ao que no campo eram vistos como sobreviventes dos estágios an cores da evolução daquilo que se tornara a família do século XIX Mas o ponto principal sobre eles residia em que eram comparáveis diferen tes mas não necessariamente inferiores O darwinismo social e an tropologia racista pertencem não à ciência do século XIX mas à sua política Se olharmos retrospectivamente por sobre as ciências naturais e sociais do período ficaremos espantados com sua impressionante confi ança em si mesmas Isso era mais justificado talvez nas ciências natu 274 rais do que nas sociais mas era um fato igualmente marcante Os físi cos que pensavam haver deixado a seus sucessores pouco mais para fazer do que arranjar pequenas soluções expressavam o mesmo estado de espírito de August Schleicher que tinha certeza de que os arianos haviam se comunicado na mesma língua que eles haviam há pouco re construído Este sentimento não era muito baseado nos resultados os das disciplinas evolucionistas dificilmente eram suscetíveis de falsifica ção mas na crença da infalibilidade do método científico Ciência positiva operando com fatos objetivos e precisos ligados rigida mente por causa e efeito e produzindo leis uniformes e invariantes além de qualquer possível modificação era a chavemestra do univer so e o século XIX a possuía Mais do que isso com o crescimento do mundo do século XIX os estágios anteriores e infantis do homem ca racterizados pela superstição teologia e especulação tinham acabado e o terceiro estágio da ciência positiva de Comte havia chegado E fácil agora achar graça de tal confiança tanto pela adequação dos métodos como pela permanência dos modelos teóricos mas talvez fosse uma re ação um tanto deslocada E se os cientistas sentiam que podiam falar com certeza mais ainda os propagandistas e os ideólogos que tinham ainda mais certeza que as certezas dos cientistas porque eles podiam bem entender o que diziam estes cientistas desde que tal pudesse ser dito sem o recurso à alta matemática Mesmo a física e a química pare ciam estar ao alcance do homem prático digamos um engenheiro civil A Origem das Espécies de Darwim estava inteiramente ao acesso de um advogado bem instruído Nunca mais iria ser tão simples para o senso comum que sabia que o mundo triunfante do progresso liberal capitalista era o melhor dos mundos possíveis mobilizar o universo pa ra confirmar seus próprios preconceitos Os publicistas popularizadores e ideólogos eram agora encon trados através do mundo ocidental onde quer que houvesse uma elite atraída pela modernização Os cientistas e estudiosos originais aqueles que desfrutavam e ainda desfrutam de reputação fora de seus países eram distribuídos de forma mais irregular Na Realida de eles estavam virtualmente confinados a partes da Europa e da América do Norte Na Europa as penínsulas Ibérica e Balcânica permaneceram meio atrasadas neste particular Trabalho de conside rável qualidade e interesse internacional era agora produzido em quantidade significativa na Europa central e do leste e mais curiosa mente na Rússia e esta era provavelmente a mais espantosa mudan ça no mapa acadêmico do mundo ocidental em nosso período em bora nenhuma história da ciência deste período possa ser escrita sem referência a alguns eminentes norteamericanos principalmente o fí sico Willard Gibbs 18391903 Portanto seria difícil negar que di gamos em 1875 o que acontecia nas universidades de Kazan e Kiev era mais significativo do que o que acontecia em Yale ou Princeton Mas a mera distribuição geográfica não pode revelar suficiente mente o que era cada vez mais o fator dominante sobre a vida acadê 275 mica de nosso período em outras palavras a hegemonia dos alemães apoiados pelo fato de diversas universidades usarem aquela língua que incluía as da maior parte da Suíça Império dos Habsburgos e re giões bálticas da Rússia e a poderosa atração que a cultura alemã exercia na Escandinávia e Europa do leste e sudeste Fora do mundo latino e da Inglaterra e mesmo numa certa medida em ambos o mo delo alemão de universidade era geralmente adotado A predominân cia alemã era sobretudo quantitativa em nosso período provavelmen te um número maior de jornais científicos foram publicados nesta lín gua do que em francês e inglês juntos Afora alguns campos das ciên cias naturais como a química e provavelmente a matemática que eles claramente dominavam a qualidade extremamente alta de suas reali zações era menos óbvia porque diferente do início do século XIX não havia neste tempo um gênero especificamente alemão de fi losofia Enquanto que os franceses talvez por razões nacionalistas mantiveram seu próprio estilo embora não a matemática francesa exceto por alguns indivíduos célebres os alemães seguiram outro ca minho Talvez o estilo dos alemães que se tornou dominante no sécu lo XX não tenha emergido como tal até que as ciências tivessem pas sado para a fase da teoria e sistematização que por razões mais ou menos obscuras caíalhes admiravelmente De qualquer maneira as ciências naturais inglesas que desfrutavam de um público expressi vo de especialistas burgueses e mesmo artesãos continuavam a produzir cientistas de renome extraordinário como Thompson e Darwin Exceto na história acadêmica e na lingüística não havia uma tal dominação alemã nas ciências sociais A economia era ainda bastante inglesa embora em retrospectiva possamos detectar alguma obra ana lítica importante na França Itália e Áustria O Império dos Habsbur gos embora de alguma forma parte da cultura alemã seguiu uma tra jetória intelectual bastante diferente A sociologia pelo pouco que valia estava basicamente associada à França e à Inglaterra tendo sido recebida entusiasticamente no mundo latino Na antropologia as co nexões internacionais dos ingleses deramlhes uma vantagem notável A evolução em geral a ponte entre as ciências naturais e sociais tinha seu centro de gravidade na Inglaterra A verdade é que as ciên cias sociais refletiam as préconcepções e problemas do liberalismo burguês na sua forma clássica tal como não eram encontrados na A lemanha onde a sociedade burguesa inseriase dentro do contexto bismarkiano de aristocratas e burocratas O mais eminente cientista social do período Karl Marx trabalhou na Inglaterra fazendo derivar o contexto de sua análise concreta de uma ciência econômica não alemã e a base empírica de sua obra da sociedade burguesa clássica a inglesa embora já a esta época não mais isenta de desafios III 276 A ciência era o centro daquela ideologia laica de progresso quer liberal quer numa medida menor mas de crescente importância socialista que não demanda uma discussão especial pois sua nature za geral deveria por agora ter claramente surgido de sua história Comparada com a ideologia laica a religião no nosso período é de interesse incomparavelmente menor e não merece um tratamento mais prolongado Mas mesmo assim merece alguma atenção não apenas porque ainda formava o idioma no qual a esmagadora maioria da população mundial pensava mas também porque a própria socie dade burguesa apesar de sua crescente laicização estava bastante preocupada em relação às possíveis conseqüências de sua própria au dácia A descrença em Deus tornouse relativamente fácil em meados do século XIX pelo menos no mundo ocidental já que muitas das i déias passíveis de verificação das escrituras judaicocristãs haviam sido minadas ou mesmo desmentidas pelas ciências sociais históricas e sobretudo naturais Se Lyell 17971875 e Darwin estavam certos então o livro da Gênesis estava simplesmente errado no seu sentido li teral e os oponentes intelectuais de Darwin e Lyell estavam visivel mente em debandada O pensamento livre das classes altas era famili ar de longa data pelo menos entre senhores distintos O ateísmo inte lectual e de classe média também não era novo e tornouse militante com a importância crescente do anticlericalismo O pensamento livre da classe operária embora já associado a ideologias revolucionárias tomou uma forma especial tanto porque as velhas ideologias revolu cionárias declinavam deixando atrás apenas seus aspectos políticos menos diretos como também porque as novas ideologias firmemente baseadas numa filosofia materialista ganhavam terreno O movimen to laicizante na Inglaterra derivava diretamente dos velhos movi mentos operários Cartista e Owenita mas agora existia como um cor po independente particularmente atraente a homens e mulheres que reagiam contra uma herança religiosa especialmente intensa Deus es tava não apenas despedido mas sob ferrenho ataque Este ataque militante à religião coincidia mas não era exata mente idêntico à corrente igualmente militante do anticlericalismo que abarcava todas as correntes intelectuais dos liberais moderados aos marxistas e anarquistas Os ataques a igrejas e mais obviamente igrejas oficiais do estado e a Igreja Católica Romana internacional que clamava para si o direito de definir a verdade ou o monopólio de certas funções atingindo o cidadão como casamento enterro e edu cação não implicava ateísmo em si mesmo Nos países contendo mais do que uma religião essa luta poderia ser conduzida pelos mem bros de uma corrente religiosa contra outra Na Inglaterra a luta era basicamente levada pelas seitas nãoconformistas contra a Igreja An glicana na Alemanha Bismarck que entrou numa Kulturkampf luta cultural amarga contra a Igreja Católica Romana em 187071 certa 277 mente não pretendia na qualidade oficial de luterano que a existência de Deus ou a divindade de Jesus estivessem em questão Por outro la do em países com uma única fé monolítica mais obviamente os católi cos o anticlericalismo normalmente implicava rejeição de toda e qual quer religião Havia é certo uma fraca corrente liberal dentro do ca tolicismo que resistia ao cada vez mais rígido ultraconservantismo da hierarquia romana formulada na década de 1860 ver referência anteri or à Syllabus of Errors e oficialmente triunfante no Concilio Vaticano de 1870 com a declaração da infalibilidade papal Entretanto esta pe quena corrente era facilmente assimilada pela Igreja e mesmo apoiada por alguns eclesiásticos que queriam preservar uma relativa autonomia de suas igrejas católicas regionais e que eram provavelmente mais for tes na França Mas o galicanismo não pode ser realmente chamado de liberal no sentido aceito do termo mesmo levando em conta que es tava mais preparado em termos pragmáticos e antiromanos para che gar a um bom termo com os governos laicos modernos e liberais O anticlericalismo era militantemente laico na medida em que pretendia tomar da religião qualquer status oficial na sociedade de sestabelecimento da igreja separação da igreja do Estado deixan doa como uma questão puramente privada Deveria ser transformada em uma ou diversas organizações puramente voluntárias análogas aos clubes de colecionadores de selos somente que em dimensões um pouco maiores Mas isso não era baseado tanto na falsidade da crença em Deus ou qualquer versão particular desta crença mas na crescente capacidade administrativa amplitude e ambição do estado laico mesmo na sua forma mais laissezfaire e liberal que estava decidido a expulsar organizações privadas daquilo que então considerava seu campo de ação Entretanto o anticlericalismo era basicamente políti co porque a certeza passional por detrás de tudo era de que religiões bem estabelecidas eram hostis ao progresso E de fato eram sendo do ponto de vista sociológico e político instituições bastante conservado ras A Igreja Católica Romana tinha aliás uma hostilidade manifesta por tudo aquilo que o século XIX se punha firmemente a favor As seitas ou os heterodoxos poderiam ser liberais ou mesmo revolucioná rios minorias religiosas poderiam ser atraídas pela tolerância liberal mas igrejas ou ortodoxias nunca poderiam sêlo E na medida em que as massas especialmente as massas rurais estavam ainda nas mãos destas forças do obscurantismo tradicionalismo e reacionarismo polí tico seu poder precisava ser destruído para que o progresso continu asse seu curso Conseqüentemente o anticlericalismo era mais mili tante e passional na proporção do atraso do país Na França os po líticos argumentavam sobre o status das escolas católicas mas no México muito mais estava em disputa na luta entre o governo e os padres O progresso a emancipação da tradição tanto para a soci edade como para os indivíduos parecia entretanto implicar uma rup tura militante com as antigas crenças que encontravam expressão pas 278 sional no comportamento dos militantes dos movimentos populares assim como no dos intelectuais da classe média Um livro chamado Moisés ou Darwin iria ser lido por um número maior de trabalhadores socialdemocratas nas bibliotecas dos sindicatos alemães que os escri tos do próprio Marx Progresso educadores emancipadores e ciência logicamente desenvolvida em socialismo científico era a chave para a emancipação intelectual dos grilhões do passado de supersti ções e do presente opressivo Os anarquistas da Europa ocidental que refletiam os instintos espontâneos destes militantes de forma bastante precisa eram selvagemente anticlericais Não é nenhum acidente que na Romagna italiana um ferreiro radical tenha dado o nome de Beni to Mussolini a seu filho em homenagem ao presidente mexicano anti clerical Benito Juarez Apesar de tudo mesmo entre os livrepensadores uma nostalgia pela religião permaneceu Ideólogos da classe média que apreciavam o papel da religião como uma instituição mantenedora de um estado de adequada modéstia entre os pobres e uma garantia da ordem algu mas vezes flertaram com neoreligiões como a religião da humani dade de Comte que substituía os santos por uma seleção de grandes homens para o Panteão embora tais experimentos não tenham sido muito bem sucedidos Mas também havia uma tendência genuína de substituir as consolações da religião pelas da idade da ciência A Ci ência Cristã fundada por Mary Baker Eddy 18211910 que publi cou seus escritos em 1875 indicava uma destas tentativas A impres sionante popularidade do espiritualismo que teve sua primeira voga na década de 1850 é talvez provavelmente devida a essa tendência Suas afinidades políticas e ideológicas se faziam com o progresso a reforma e a esquerda radical e não menos com a emancipação femi nina especialmente nos Estados Unidos que eram o seu centro maior de difusão Mas afora suas outras atrações tinha a vantagem conside rável de colocar a sobrevivência após a morte dentro de um contexto da ciência experimental talvez mesmo como a nova arte da fotogra fia poderia demonstrar no de uma imagem objetiva Quando mila gres não podiam ser mais aceitos e a parapsicologia aumentava seu público potencial Algumas vezes porém não indicava nada mais que a sede humana geral por rituais coloridos que a religião tradicio nal normalmente fornecia de forma tão eficiente A metade do século XIX está plena de rituais laicos inventados especialmente nos países anglosaxônicos onde sindicatos elaboraram complicadas bandeiras e certificados alegóricos Sociedades de Ajuda Mútua cercadas por sua vez com a parafernália da mitologia e do ritualismo nas suas lojas KuKluxKlans e outras ordens políticas menos secretas A mais antiga e sem dúvida a mais influente de todas estas sociedades secre tas ritualizadas e hierarquizadas estava de fato comprometida com o pensamento livre e o anticlericalismo pelo menos afora dos países anglosaxônicos os francomaçons Se o número de seus adeptos 279 cresceu neste período não sabemos embora seja provável certamente sua importância política cresceu Mas se mesmo os livrepensadores reclamavam pelo menos al gum consolo espiritual do tipo tradicional eles pareciam por outro lado estar perseguindo um inimigo em debandada Pois como os escritos vitorianos da década de 1860 eloqüentemente testemunham o indivíduo com fé tinha dúvidas especialmente se fosse intelectu al A religião estava sem dúvida em declínio não meramente entre in telectuais mas nas grandes cidades onde a pressão comunitáriapara a prática religiosa e a moralidade era pouco sentida E portanto as décadas de meados do século XIX não chegaram a ver um declínio de religião de massa comparável ao caminho intelec tual tomado pela teologia O centro das classes médias anglo saxônicas permaneceu religioso em geral praticantes ou pelo menos hipócritas Dos grandes milionários americanos apenas um Andrew Carnegie propagandeava falta de fé A taxa de expansão das seitas protestantes nãooficiais decaiu mas pelo menos na Inglaterra a consciência nãoconformista que representavam tornouse politica mente muito mais influente na medida em que se tornava mais classe média A religião não chegou a declinar no meio das novas comuni dades de imigrantes no resto do mundo na Austrália o percentual de freqüência à Igreja no meio da população de mais de 15 anos aumen tou de 365 em 1850 para quase 59 em 187C e estacionou em tor no de 40 nas últimas décadas do século 15 Os Estados Unidos a despeito de Col Ingersoll o célebre ateu 183399 era um país sem Deus numa medida muito maior que a França Na medida em que as classes médias estavam em questão o de clínio da religião era como vimos inibido não apenas pela tradição e fracasso em larga escala do racionalismo liberal em fornecer um substituto coletivo para o ritual e a fé religiosa exceto talvez através da arte ver capítulo seguinte mas também pela relutância em a bandonar um pilar de estabilidade moralidade e ordem social tão va lioso talvez tão indispensável Na medida em que as massas estavam em questão a expansão da religião pode ter sido devido sobretudo àqueles fatores geográficos sobre os quais a Igreja Católica gostava de apoiarse para os seus maiores triunfos as migrações de massa de homens e mulheres de regiões mais tradicionais para as novas cida des regiões e continentes e a alta taxa de fertilidade dos pobres com paradas a dos nãocrentes corrompidos pelo progresso Não há evi dência de que os irlandeses tenham se tornado mais religiosos em nosso período mas há alguma certeza de que as migrações enfraque ceram sua fé embora sua dispersão e sua taxa de natalidade fizessem com que a Igreja Católica crescesse de forma relativa e absoluta atra vés da cristandade E além disso não haviam forças dentro da própria religião para revivêla e dispersála Certamente neste estágio os missionários cristãos não eram no tavelmente bemsucedidos fosse ao lidar com o proletariado perdido 280 em casa ou ainda menos ao tentar converter indivíduos de religiões rivais pelo mundo afora Considerando as despesas substanciais en tre 1871 e 1877 os ingleses sozinhos contribuíram com 8 milhões de libras para as missões 16 os resultados foram bastante modestos O Cristianismo de todas e quaisquer denominações fracassou em tornar se um competidor sério em relação à única religião realmente em ex pansão o Islamismo Este continuava a espalharse de forma irresistí vel sem o benefício de uma organização missionária dinheiro ou o apoio das grandes potências através da África e partes da Ásia sem dúvida ajudado não apenas por seu igualitarismo mas também pela consciência da superioridade dos valores em relação aos conquistado res europeus Nenhum missionário conseguiu jamais abrir uma brecha dentro da população maometana Conseguiram apenas entrar um pou co dentro de algumas nãoislâmicas já que faltava ainda aos missio nários a grande arma da penetração cristã ou seja a conquista coloni al direta ou pelo menos a conversão oficial de governantes que trazi am seus cidadãos com eles como aconteceu em Madagascar que de clarouse uma ilha cristã em 1869 O Cristianismo fez alguns avanços no sul da índia sobretudo no meio da camada mais baixa do sistema de castas apesar da falta de entusiasmo do governo na Indochina em seqüência à conquista francesa mas nada de significativo na Áfri ca até que o imperialismo multiplicasse o número de missionários de uns 3 mil protestantes em meados da década de 1880 para talvez uns 18 mil em 1900 e pusesse um poder material bem mais persuasi vo atrás do poder espiritual do Redentor 17 Portanto nos melhores dias do liberalismo a ação missionária talvez tenha perdido algum ímpeto Somente uns três ou quatro novos centros católicos missioná rios foram abertos na África em cada uma das décadas entre 1850 e 1880 comparado com seis na década de 1840 14 na de 1880 e 17 na de 1890 18 O Cristianismo era mais efetivo quando alguns elementos da religião eram absorvidos pela ideologia religiosa local sob a forma de cultos nativistas sincréticos O movimento Taiping na China ver capítulo 7 foi de longe o maior e o mais influente de tais fenômenos Mas dentro do Cristianismo havia sinais de um contraataque em relação ao avanço da laicização Nem tanto no mundo protestante onde a formação e expansão de novas seitas nãooficiais parecia ter perdido muito do dinamismo que possuía antes de 1848 com a pos sível exceção dos negros na América anglosaxônica da mesma forma que os católicos O culto do milagre em Lurdes na França que começou com a visão de uma pequena pastora em 1858 expandiuse com enorme rapidez talvez espontaneamente no começo mas logo depois com ativo apoio eclesiástico Por volta de 1875 uma filial de Lurdes era aberta na Bélgica De forma menos dramática o anticleri calismo provocou um movimento substancial de evangelização entre os crentes e um reforço maior da influência clerical Na América La tina a população rural havia sido em larga escala cristã sem a presen ça de padres até depois de 1860 a igreja no México havia sido sobre 281 tudo urbana Contra o anticlericalismo oficial a Igreja sistematica mente capturou ou reproselitizou o campo Em certo sentido diante da ameaça da reforma laica a Igreja reagiu da mesma forma como havia feito no século XVI com a ContraReforma O Catolicismo a gora totalmente intransigente recusando qualquer acomodação com as forças do progresso industrialização e liberalismo tornouse uma força muito mais poderosa depois do Concilio Vaticano de 1870 do que antes mas ao custo de abandonar muito do seu terreno aos ad versários Fora da cristandade as religiões apoiavamse sobretudo na força do tradicionalismo para resistir à erosão da era liberal ou à confronta ção com o Ocidente Tentativas para liberalizálas eram bem vistas por burguesias semiassimiladas como a Reforma Judaica que surgiu no final da década de 1860 execradas pelos ortodoxos e desprezadas pelos agnósticos As forças da tradição ainda eram esmagadoramente poderosas e freqüentemente reforçadas pela resistência ao progres so e à expansão européia Como já vimos o Japão chegou a criar uma nova religião de estado o shintoísmo a partir de elementos tra dicionais em grande parte com propósitos antieuropeus ver capítulo 8 Mesmo os ocidentalistas e revolucionários do Terceiro Mundo iri am aprender que o caminho mais fácil para ser bem sucedido como político entre as massas era adquirir o papel ou pelo menos o prestí gio de um monje budista ou de um santo hindu E portanto apesar de que o número dos francamente descrentes permanecesse relativamen te pequeno em nosso período afinal mesmo na Europa a metade feminina da raça humana não era praticamente afetada pelo agnosti cismo eles dominavam um mundo essencialmente laico Tudo que a religião poderia fazer contra eles era recuar para trás de suas vastas e poderosas fortificações e prepararse para um cerco muito longo A Europa e os Estados Unidos Países e Recursos 184750 187680 população em milhões força a vapor 000 HP número de cidades acima de 50 mil população em milhões força a vapor 000 HP número de cidades acima de 50 mil Reino Unido 27 1290 32 377 7600 482 França 341 370 14 369 3707 295 Alemanha 117 92 17 477 5120 287 Prússia Baíeria Saxónia Hannover Wirtemberg Baden 32 ou estados entre 002 e 009 Áustria Rússia 8 70 4 857 1740 26 Áustria com Hungría 13 100 2 371 1560 120 Duas Sicilias 4 278 500 134 Sardenha 2 Estados Papáis continua 317 283 DécimoQuinto Capítulo AS ARTES Precisamonos convencer definitivamente que nossa história hoje é feita pelos mesmos seres humanos que também fizeram um dia as o bras da arte grega Mas tendo aceito este ponto nossa tarefa é então descobrir o que é que transformou estes seres humanos de forma tão fundamental que agora só conseguimos produzir o que sai das in dústrias de luxo onde antes criavamse obras de arte Richard Wagner 1 Por que você escreve em versos Ninguém dá importância a isso a gora Na nossa era de maturidade cética e independência republi cana o verso é uma forma aposentada Preferimos a prosa que em virtude de sua liberdade de movimento está mais de acordo com os instintos da democracia Eugene Pelletan deputado francês 1877 2 I Se o triunfo da sociedade burguesa parecia congênito à ciência tal não ocorria da mesma forma com as artes O reconhecimento de valor em relação às artes criativas é sempre muito subjetivo mas não se pode praticamente negar que a era da revolução dual 17891848 viu extra ordinárias realizações de homens e mulheres de dons bastante notáveis A segunda metade do século XIX especialmente as décadas que são o objeto deste livro não dão uma impressão equivalente exceto em um ou dois países atrasados sendo de longe o mais notável deles a Rússia Isto não quer dizer que as realizações criativas deste período fossem medío cres embora ao rever aqueles criadores cuja obra maior ou a aclamação pública ocorreram entre 1848 e a década de 1870 precisamos lembrar que muitos deles já eram pessoas maduras e com uma expressiva produ ção antes de 1848 Afinal para mencionar apenas três dos mais inques tionavelmente importantes Charles Dickens 181270 já estava na metade de sua ouvre Honoré Daumier 180879 tinha sido um ativo ar tista gráfico desde a revolução de 1830 e mesmo Richard Wagner 181383 já tinha várias óperas atrás de si Lohengrin foi produzida em 1851 Porém não há dúvida de que a literatura de prosa e especialmen 284 te o romance floresceu de forma admirável graças principalmente à continuada glória dos ingleses e dos franceses e à nova glória dos rus sos Na história da pintura houve claramente um admirável e grandioso período graças quase que exclusivamente aos franceses Na música a era de Wagner e Brahms é inferior apenas em comparação com a era precedente de Mozart Beethoven e Schubert Porém se olharmos mais de perto a cena criativa verificase que ela é bem menos inspirada Já vimos como se distribuía geografica mente Para a Rússia tratavase de uma era espantosamente triunfante na música e sobretudo na literatura para não mencionar as ciências natu rais e sociais Uma década como a de 1870 que viu os pontos cul minantes de Dostoievsky e Tolstoi P Tchaikovsky 184093 M Mus sorgsky 183581 e o balé imperial clássico não teme nenhum tipo de comparação A França e a Inglaterra como vimos mantiveram um nível bastante elevado sobretudo na literatura da prosa mas também na pintu ra e poesia Na poesia inglesa a obra de Tennyson Browning e outros é menos impressionante que a dos grandes românticos da era das revo luções na França com a obra de Baudelaire e Rimbaud ocorreu o con trário Os Estados Unidos embora ainda contribuindo de forma insigni ficante no campo das artes visuais e da música já começa a estabelecer se como uma força literária com Melville 181991 Hawthorne 1804 64 e Whitman 181991 no leste e com uma nova geração de escrito res populistas emergindo do jornalismo no oeste entre os quais Mark Twain 18351910 iria ser o mais expressivo Mesmo assim numa comparação global esta era uma realização de nível provinciano e de várias formas menos importante e ainda menos influente internacio nalmente do que a obra criativa que era produzida por algumas peque nas nações que afirmavam suas nacionalidades Curiosamente um bom número de escritores americanos menores da primeira metade do século fizeram mais de uma viagem ao exterior Os compositores dos tchecos A Dvorak 18411904 S Smetana 182484 acharam mais simples conseguir aceitação internacional que os escritores daquele povo isola dos por uma língua que poucos de fora conheciam ou se incomodavam em aprender Dificuldades lingüísticas também localizaram a reputa ção de escritores de algumas outras regiões alguns dos quais ocupam uma posiçãochave na história literária de seus respectivos povos por exemplo os holandeses e os flamengos Somente os escandinavos con seguiram captar um público maior talvez devido ao fato de que seu re presentante mais célebre Henrik Ibsen 18281906 que atingiu a ma turidade exatamente no término de nosso período tenha escolhido es crever peças para o teatro Contra tudo isso precisamos observar um declínio visível e de certa forma espetacular na qualidade das melhores obras daqueles dois centros de atividade criativa os povos de língua germânica e os italianos Talvez possa haver alguma discussão sobre música mas na Itália não há quase nada além de Verdi 18131901 cuja carreira es tava bem estabelecida desde antes de 1848 e na AustroAlemanha 285 entre os compositores reconhecidos apenas Brahms 183397 e Bruckner 182496 surgiram essencialmente neste período Wagner já sendo virtualmente maduro Mesmo assim estes nomes são sufici entemente impressivos especialmente Wagner um gênio absoluto e fenômeno cultural apesar de ter um caráter vil Mas qualquer relutância em aceitar inferioridade das artes destes dois povos deve permanecer restrita inteiramente à música Não há dúvida quanto à inferioridade li terária e das artes visuais em relação às do período anterior a 1848 Tomando as diversas artes separadamente a queda geral de ní vel é igualmente óbvia em algumas sendo que em outras a superiori dade em relação ao período precedente é inegável A literatura flores ceu como já vimos através do meio conveniente dos romances Po dem ser vistos como o gênero que achou uma forma possível de adap tarse àquela sociedade burguesa cuja ascensão e crises formavam o assunto preferido dos escritores Tentativas foram feitas para salvar a reputação da arquitetura do século XIX mas há de qualquer forma algumas realizações expressivas Entretanto quando se considera a orgia de construções na qual a próspera sociedade burguesa atirouse a partir da década de 1850 estas não são nem grandiosas nem particu larmente numerosas Paris reconstruída por Haussman impressiona por seu planejamento mas não pelos edifícios que guarnecem suas esquinas e bulevares Viena que aspirou a obrasprimas mais pesso ais foi apenas duvidosamente bemsucedida Roma do rei Vittorio Emmanuel cujo nome está provavelmente ligado com um maior nú mero de peças de má arquitetura do que qualquer outro soberano é um desastre Comparados com as extraordinárias realizações do di gamos neoclassicismo o derradeiro estilo unificado de arquitetura antes do triunfo da moderna ortodoxia do século XX os edifícios da segunda segunda metade do século XIX são mais capazes de de mandar desculpas do que admiração universal Isto não se aplica evi dentemente às obras dos engenheiros brilhantes e imaginativos em bora tudo tendesse a ser escondido atrás de fachadas fine art Mesmos os entusiastas têm até bem recentemente encontrado di ficuldades em dizer muito a favor da pintura deste período A obra que tem se tornado uma parte permanente do museu do século XX é quase sem exceção francesa sobreviventes da era das revoluções como Daumier e G Courbet 181977 a escola de Barbizon e o grupo a vantgarde dos Impressionistas um rótulo indiscriminado que não pre cisamos analisar detidamente no momento que surgiu na década de 1860 Esta façanha é de fato muito impressionante e um período que viu o surgimento de E Manet 183283 E Degas 18341917 e o jo vem P Cézanne 18391906 não precisa se preocupar com sua repu tação Mesmo assim estes pintores não eram apenas atípicos em rela ção ao que era posto sobre telas em quantidades cada vez maiores neste tempo mas também muito suspeitos à arte respeitável e ao gosto do público Sobre a arte oficial acadêmica ou sobre a popular o máximo que pode ser razoavelmente dito é que não era uniforme em caráter 286 que seus padrões de técnica eram altos e que alguns méritos modestos podem ser redescobertos aqui e ali A maior parte era e é horrível Pode ser que a escultura de meados e fins do século XIX ampla mente dispostos em inumeráveis obras monumentais mereça um pouco mais de atenção do que se lhe tem dado normalmente afinal produziu o jovem Rodin 18401917 Entretanto qualquer coleção de obras plásticas vitorianas en masse como ainda podem ser vistas nas casas dos ricos Bengalis constituiuse numa visão tremendamente de pressiva II Esta era de alguma forma uma situação tragicômica Poucas sociedades valorizaram tanto as obras dos gênios criadores em si mesmo virtualmente uma invenção burguesa como fenômeno social ver A Era das Revoluções capítulo XIV do que a burguesa do século XIX Poucas estavam prontas a gastar dinheiro tão livremente com as artes e em termos puramente quantitativos nenhuma sociedade pre cedente comprou tanto como a quantidade de livros velhos e novos objetos materiais quadros esculturas estruturas decoradas de madei ra e bilhetes para representações teatrais ou musicais Apenas o cres cimento da população colocaria esta afirmação fora de disputa So bretudo e paradoxalmente poucas sociedades tinham estado tão con vencidas de que viviam numa era dourada das artes criadoras O gosto deste período não era nada se não fosse contemporâneo como era de fato natural para uma geração que acreditava no progres so universal e constante Herr Ahrens 180581 um industrial do norte da Alemanha mudouse para o clima culturalmente mais propí cio de Viena por volta dos seus 50 anos e começou a colecionar qua dros modernos ao invés de obras de velhos mestres e isto era típico como fenômeno3 Os Bolckow ferro Holloway patente das pílulas e Mendel algodão que competiam entre si para aumentar os preços das pinturas a óleo na Inglaterra fizeram afortunados pintores acadê micos da época4 Os jornalistas que registravam orgulhosamente a abertura e o custo total destes gigantescos edifícios públicos que co meçaram a desfigurar a imagem das cidades depois de 1848 genuina mente acreditavam que estavam celebrando uma nova Renascença fi nanciada por príncipes industriais comparáveis aos Medici Enfim a conclusão mais evidente que os historiadores podem tirar do final do século XIX é que a mera aplicação de dinheiro não é capaz de garan tir uma idade de ouro para as artes Mais ainda a quantidade de dinheiro gasta era impressionante por quaisquer padrões exceto os da capacidade produtiva sem prece dentes do capitalismo Entretanto estas quantidades não mais eram gastas pelas mesmas pessoas A revolução burguesa era vitoriosa mesmo no campo característico da atividade dos príncipes e da no 287 breza Nenhuma das grandes reconstruções de cidades entre 1850 e 1875 colocou como ponto dominante da paisagem um palácio real ou imperial nem mesmo um complexo de palácios aristocráticos Onde a burguesia fosse fraca como na Rússia o tzar e os grãoduques podi am ainda ser os patronos principais em caráter individual mas mesmo assim o papel deles em tais países parece ter sido bem menos central do que fora antes da Revolução Francesa Em outros lugares um príncipe menor ocasional e excêntrico como Ludwig II da Baviera ou a marquesa de Hertford poderiam colocar toda a paixão em comprar arte e artistas mas no total cavalos jogo e mulheres eram mais capa zes de pôlos em dívidas do que a patronagem das artes Quem pagava então pelas artes Governos e outras entidades públicas a burguesia e este ponto merece atenção uma seção cada vez mais significativa das ordens menores para os quais os proces sos industriais e tecnológicos faziam com que os produtos das mentes criativas se tornassem accessíveis em quantidades cada vez maiores e a preços cada vez menores Autoridades públicas laicas eram quase os únicos fregueses para os edifícios gigantescos e monumentais cujo propósito era compro var a riqueza e esplendor da era em geral e da cidade em particular Seus propósitos eram raramente utilitários Na era do laissezfaire os edifícios governamentais não eram injustificadamente conspícuos Normalmente não eram religiosos exceto nos países católicos ou quando construídos para uso interno pelos grupos minoritários reli giosos como os judeus e os nãoconformistas ingleses que desejavam registrar sua riqueza e satisfação crescentes A paixão pela restaura ção e acabamento das grandes igrejas e catedrais da Idade Média que varreu a Europa de meados do século como uma doença contagiosa era mais cívica que espiritual Mesmo nas monarquias mais esplêndi das pertencia mais ao público do que à corte coleções imperiais e ram agora museus as óperas abriam suas bilheterias Eram na reali dade os símbolos característicos da glória e da cultura pois mesmo as titânicas prefeituras que os dirigentes das cidades mandavam cons truir eram de longe muito maiores do que requeriam as modestas ne cessidades da administração municipal Os meticulosos homens de negócios de Leeds deliberadamentw rejeitaram os cálculos utilitários na construção de seus prédios O que era uns poucos milhares a mais quando a meta a fixar era de que no ardor das disputas mercantis os habitantes de Leeds não se esqueceram de cultivar a percepção do be lo e um gosto pelas belas artes De fato gastaram 122 mil libras ou cerca de três vezes mais que a estimativa original equivalente a mais de 1 do total em renda para o Reino Unido inteiro no ano de sua i nauguração 18585 Um exemplo pode ilustrar o caráter geral de tais edifícios A ci dade de Viena derrubou suas velhas fortificações na década de 1850 e encheu o espaço vazio nas décadas subseqüentes com um magnífico bulevar circular cercado de edifícios públicos O que eram estes edifí 288 cios Um deles representava o comércio a bolsa de valores outro a religião a Votivkirche três deles universidades três outros de im portância civil e questões públicas a prefeitura o palácio da justiça e o parlamento e não menos de oito representavam as artes teatros museus academias etc As demandas da burguesia eram individualmente mais modes tas coletivamente bem maiores Sua patronagem enquanto indivíduos não era talvez tão importante como iria ser na última geração antes de 1914 quando os milionários dos Estados Unidos aumentaram os pre ços de certas obras de arte a um nível mais alto do que nunca ou des de então Mesmo no final do nosso período os robber barons esta vam ainda muitos ocupados na espoliação geral para poderem exibir de coração os frutos de seu banditismo Era portanto evidente parti cularmente a partir da década de 1860 que havia muito dinheiro so brando A década de 1850 produziu apenas um artigo de mobília francesa do século XVI11 o símbolo de status internacional de um rico interior que tenha passado de 1 mil libras num leilão a de 1860 oito a de 1870 14 incluindo um lote que atingiu 30 mil libras artigos como um vaso de Sèvres um símbolo de status bastante similar che gou a 1 mil libras três vezes mais na década de 1850 sete vezes mais na de 1860 e 11 vezes na de 18706 Um punhado de príncipes competidores é suficiente para fazer a fortuna de pintores e mar chands mas mesmo um público numericamente modesto é capaz de manter uma produção artística substancial se lhe fornecer uma boa sa ída O teatro e numa certa medida a música clássica concertos pro vavam esta afirmação A ópera e o bale clássico então como agora sustentavamse como subsídios do governo ou de ricos a procura de status nem sempre ignorantes das facilidades de acesso a belas baila rinas e cantoras O teatro florescia pelo menos financeiramente O mesmo ocorria com os editores de livros caros e sólidos para um mercado limitado cujas dimensões são talvez indicadas pela circula ção do Times de Londres que andava entre 50 mil e 60 mil nas déca das de 1850 e 1860 atingindo 100 mil em algumas poucas ocasiões es peciais Quem poderia reclamar quando o livro Traveis de Livingstone 1857 vendeu 30 mil exemplares numa edição de um guinéu em seis anos 7 De qualquer maneira as necessidades domésticas e de comér cio da burguesia fizeram a fortuna de inúmeros arquitetos que construí ram e reconstruíram áreas substanciais das cidades para aquela classe O mercado burguês era novo apenas na medida em que agora era especialmente grande e cada vez mais próspero Por outro lado os meados do século produziram um fenômeno realmente revolucioná rio pela primeira vez graças à tecnologia e à ciência alguns tipos de obras criativas tornaramse tecnicamente passíveis de reprodução ba rata e numa dimensão sem precedentes Apenas um destes processos chegava de fato a competir com o ato da criação artística em si mes ma em outras palavras a fotografia que nasceu na década de 1850 Como veremos seus efeitos na pintura foram imediatos e profundos 289 O resto apenas trouxe versões de qualidade inferior de produtos indi viduais ao alcance do público de massa escrita através da multipli cação de edições baratas estimuladas principalmente pelas estradas de ferro os seriados principais eram chamados tipicamente de biblio tecas ambulantes ou de viagem retratos através de gravação em ferro em que os novos processos de eletrogravação 1845 tornaram possível a produção em grandes quantidades sem perda de detalhes ou refinamentos assim como através do desenvolvimento do jorna lismo literatura autoditatismo etc Que tais novidades tenham apa recido nas décadas de 1830 e 1840 não diminui a importância de sua expansão quantitativa a partir de 1850 O enorme significativo econômico deste nascente mercado de massa é freqüentemente subestimado As rendas dos principais pinto res impressionantes mesmos pelos padrões modernos Millais tinha uma média de 20 a 25 mil libras anuais de libras esterlinas vitorianas entre 1868 e 1874 eram baseadas sobretudo nas gravuras de dois guinéus em molduras de 5 shillings que Gambart Flatou e outros marchands lançavam A Railway Station de Frith 1860 conseguiu 4500 libras em tais direitos subsidiários e mais 750 libras por direitos de exibição 8 Em 1853 E BulwerLytton 180373 um escritor que não negligenciava assuntos de finanças vendeu 10 anos de direito pa ra edições baratas de romances que ele já havia escrito para Routled ges Railway Library por 20 mil libras9 Com a única exceção de Un cle Toms Cabin A cabana do pai Tomás 1852 de Harriet Beecher Stowe que deve ter vendido 15 milhão em um ano apenas no Impé rio Britânico o mercado de massas para as artes não pode ser compa rado com o dos tempos atuais Apesar disso ele existia e sua impor tância é inegável Duas observações precisam ser feitas sobre isso A primeira é realçar a desvalorização da produção tradicional que era mais direta mente afetada pelo avanço da reprodução mecânica Em uma geração isso iria produzir especialmente na Inglaterra a pátria da industriali zação uma reação políticoideológica do movimento art sand crafts em larga escala socialista cujas raízes antiindustrialistas implíci taamente anticapitalistas podem ser encontradas através da firma de desenho de William Morris de 1860 e com os pintores prérafaelitas da década de 1850 Estes últimos dizem respeito à natureza do públi co que influenciava os artistas Era evidentemente não apenas uma clientela aristocrática ou burguesa como a que naturalmente determi nava o conteúdo do que era apresentado no West End londrino ou na região dos teatros de Paris Era também um público de massa da mo desta classe média e outras incluindo trabalhadores especializados que aspiravam à respeitabilidade e à cultura As artes de nossa época eram em todos os sentidos populares como os técnicos de propagan da de massa da década de 1880 sabiam quando compravam algumas das mais lamentáveis e caras pinturas para nelas afixar seus anúncios 290 As artes eram prósperas e assim também eram os talentos criati vos que tinham apelo junto ao público e eles eram de todas as for mas claramente os piores É um mito afirmar que os melhores talen tos do período eram normalmente deixados à míngua e na boêmia por filistinos que não sabiam apreciálos Podemos certamente descobrir aqueles que por várias razões resistiram ou tentaram chocar o públi co burguês ou simplesmente falharam em atrair compradores a mai oria na França G Flaubert 182180 os primeiros simbolistas e os impressionistas mas também em outros lugares Entretanto era mais freqüente que os homens e mulheres cuja fama tenha passado pelo teste de sobreviver um século fossem pessoas cujas reputações na época iam do muito respeito à idolatria e cuja renda ia de classe mé dia confortável até o fabuloso A família de Tolstoi iria viver confor tavelmente da renda de algumas novelas quando o grande homem dis tribuiu suas fazendas Charles Dickens sobre o qual estamos bem in formados quanto à situação financeira recebia por volta de 10 mil li bras anuais em quase todos os anos a partir de 1848 até a década de 1860 quando sua renda anual cresceu atingindo 33 mil libras em 1868 a maior parte vindo do circuito americano de leitura 10 Cento e cin qüenta mil dólares seria uma renda substancial hoje em dia mas por volta de 1870 punha uma pessoa na classe dos muito ricos Por força disso o artista tinha que chegar a um bom termo com o mercado E mesmo aqueles que não chegaram a ficar ricos eram respeitados Dic kens W Thackeray 181163 George Eliot 181980 Tennyson 180992 Victor Hugo 180285 Zola 18401902 Tolstoi Dostoi evsky Turgenev Wagner Verdi Brahms Liszt 181186 Dvorak Tchaikovsky Mark Twain Henrik Ibsen estes são nomes de pessoas que em vida não sentiram falta de sucesso e reconhecimento III E mais do que isso ele e ela neste período muito mais rara mente que na primeira metade do século desfrutava não apenas da possibilidade de conforto material mas especialmente de estima Na sociedade aristocrática e monárquica o artista tinha sido quando mui to um ornamentador ou ornamento da corte ou palazzo uma valiosa peça da propriedade e na pior alternativa alguns daqueles caros for necedores de serviços e artigos de luxo como cabelereiros e costurei ros que a moda demandava Para a sociedade burguesa ele represen tava o gênio que era uma versão nãofinanceira da empresa indivi dual o ideal que complementava e coroava o sucesso material e de forma mais geral os valores espirituais da vida Não há como compreender as artes do final do século XIX sem este sentido da necessidade social delas deverem agir como fornece doras do conteúdo espiritual da mais materialista das civilizações Po 291 derseia até dizer que eles tomavam o lugar das religiões tradicionais entre os cultos e emancipados isto é as classes médias bemsucedidas suplementadas evidentemente pelos espetáculos inspiradores da natu reza quer dizer paisagens Isso era mais evidente entre os povos de língua germânica que tinham passado a considerar a cultura como seu monopólio especial numa época em que os ingleses haviam tomado conta do econômico e os franceses se apossado do político Ali óperas e teatros tornaramse templos onde homens e mulheres cultuavam de votadamente mas nem sempre apreciando de fato as obras do repertório clássico e onde as crianças eram formalmente iniciadas na escola pri mária pelo Guilherme Tell de Schiller para avançar eventualmente den tro dos mistérios adultos do Fausto de Goethe O gênio desagradável de Richard Wagner tinha uma clara compreensão desta função quando construiu sua catedral em Bayreuth 187276 onde os piedosos pere grinos vêm até hoje assistir em religiosa exaltação por longas horas e diversos dias e ainda proibidos das frivolidades do aplauso ao neopa ganismo do mestre alemão Wagner mostrava assim uma clara compre ensão não apenas em perceber a conexão entre sacrifício e exaltação re ligiosa mas também em entender a importância das artes como porta doras da nova religião laica do nacionalismo Pois o que mais exceto os exércitos poderia expressar melhor este conceito ilusório de nação do que os símbolos da arte primitiva como nas bandeiras e hinos e laborada e profunda como naquelas escolas nacionais de música que se tornaram tão intimamente identificadas com as nações de nosso perío do no seu momento de aquisição de uma consciência coletiva inde pendência ou unificação um Verdi no Risorgimento italiano um Dvorak ou Smetana entre os tchecos Nem todos os países empurraram a exaltação religiosa das artes até o ponto que esta atingiu na Europa central e mais especificamente entre as classes médias judias na maior parte da Europa e dos Esta dos Unidos culturalmente alemãs ou germanizadas O que as artes e principalmente a música clássica devem ao patrocínio desta pequena e rica comunidade tão profundamente imbuída de cultura no final de século XIX é incalculável Em geral os capitalistas da primeira ge ração eram filisteus embora suas mulheres se esforçassem o quanto podiam para ter algum interesse em coisas mais elevadas O único milionário americano que tinha uma genuína paixão pelas coisas do espírito ocorria também ser o único livre pensador anticlerical era Andrew Carnegie que não podia esquecer a tradição de seu pai re belde e culto Fora da Alemanha talvez na Áustria havia banqueiros que desejavam ver seus filhos transformados em compositores ou maestros talvez porque não tivessem uma alternativa de vêlos como ministros ou premiers A substituição da religião pela exaltação em relação à natureza e às artes era característica apenas de setores inte lectuais das classes médias como aqueles que iriam formar mais tar de o Bloomsburv inglês homens e mulheres com renda privada pro veniente de heranças raramente envolvidos em negócios 292 Apesar de tudo mesmo nas sociedades burguesas mais filistéias talvez com a exceção dos Estados Unidos as artes ocupavam um lugar especial de respeito e estima Os grandes símbolos coletivos de status do teatro e da ópera cresceram nos centros das capitais o foco do pla nejamento das cidades como em Paris 1860 e Viena 1869 visível em catedrais como em Dresden 1869 invariavelmente gigantescas e monumentalmente elaboradas como em Barcelona a partir de 1862 e Palermo a partir de 1875 Os museus e as galerias públicas de arte surgiram ou foram ampliadas reconstruídas e transformadas como também as grandes bibliotecas nacionais o salão de leitura do Museu Britânico foi construído em 185257 a Bibliothèque Nationale recons truída em 185475 De forma mais geral o número das grandes biblio tecas diferente das universidades multiplicouse de forma fenomenal na Europa e mais modestamente nos Estados Unidos Em 1848 havia cerca de 400 com talvez 17 milhões de volumes na Europa por volta de 1880 havia quase 12 vezes mais com quase o dobro de volumes A Áustria Rússia Itália Bélgica e Holanda multiplicaram o número de suas bibliotecas por 10 a Inglaterra quase a mesma coisa mesmo Es panha e Portugal quase 4 vezes e os Estados Unidos menos de 3 vezes Por outro lado os Estados Unidos quase que quadruplicaram o nú mero de seus livros um fato superado apenas pela Suíça 11 As estantes das casas burguesas encheramse com elaboradas obras encadernadas dos clássicos nacionais e internacionais Os visi tantes de galerias e museus multiplicaramse a exibição da Royal Academy em 1848 atraiu talvez uns 90 mil visitantes mas pelo final da década de 1870 atraía quase 400 mil Por esta época os vernissa ges haviamse tornado moda entre a alta classe um sinal seguro do sta tus social ascendente da pintura assim como as préestréias teatrais londrinas que começavam a competir com as parisienses depois de 1870 em ambos os casos com efeitos desastrosos sobre as artes objetos destes eventos Os turistas burgueses praticamente não podiam evitar aquela peregrinação sem fim aos andares do Louvre Uffizi e San Mar co Os próprios artistas mesmo os duvidosos artistas de teatro e líricos tornaramse respeitados e respeitáveis candidatos adequados para se tornarem sirs ou portadores de outros títulos nobiliárquicos Eles não precisavam nem mesmo se conformar aos ditames dos burgueses nor mais já que as gravatas chapéus e outros elementos da indumentária eram razoavelmente caros Aqui também Richard Wagner mostrou uma impecável percepção do público burguês mesmo seus escândalos tornaramse parte de sua imagem criativa Gladstone no final da dé cada de 1860 foi o primeiro primeiroministro a convidar luminares das artes e da vida intelectual para seus jantares oficiais Mas divertiase realmente com as artes aquele público burguês que as patrocinava e aplaudia A questão é anacrônica É verdade que havia algumas formas de criação artística que mantinham uma relação direta com um público que elas apenas pretendiam entreter Sobretu do havia a música ligeira que talvez sozinha entre as artes teve sua 293 idade de ouro em nosso período A palavra opereta apareceu pela primeira vez em 1856 e a década de 1865 e 1875 iria ver o ponto culminante das realizações de Jacques Offenbach 181980 Johann Strauss 182599 a Valsa do Danúbio Azul data de 1867 Die Fledermaus de 1874 a Cavalaria Ligeira de Suppé 182095 e os sucessos de Gilbert e Sullivan 18361911 18421900 Até que o pe so da arte culta caísse de forma bruta sobre ela a ópera manteve seu rapport com um público que buscava diretamente entretenimento Rigoletto II Trovatore LM Traviata obras posteriores a 1848 e o palco comercial multiplicou seus dramas e farsas intrincadas dos quais apenas o último tipo sobreviveu ao tempo Labiche 181588 Meilhac 183197 Halévy 18341908 Mas tais diversões eram aceitas como culturalmente inferiores como os vários girlshows que Paris havia lançado na década de 1850 com os quais eles tinham muito em comum A construção do Folies Bergère secundou a da Ópera e se deu muito antes da Comédie Française 12 Arte culta de verdade não era uma questão de mero entretenimento ou mesmo algo que pudesse ser isolado como uma apreciação estética A arte pela arte era ainda um fenômeno minoritário mesmo entre os artistas românticos uma reação contra o ardente compromis so político e social da era das revoluções intensificado pelos amargos resultados de 1848 o movimento que havia arrastado tantos espíritos criativos O esteticismo não iria se tornar uma moda burguesa até o fi nal da década de 1870 e 1880 Os artistas criativos eram sábios pro fetas mestres moralistas fontes da verdade O esforço era o preço pago pelos seus rendimentos vindos de uma burguesia pronta a acre ditar que tudo que tinha valor financeiro ou espiritual requeria abs tenção de prazer As artes eram parte deste esforço humano O cultivo das artes coroavao IV Qual era a natureza desta verdade Aqui precisamos destacar a arquitetura das outras artes pois faltavalhe o tema que dava às outras a aparência de unidade De fato a coisa mais característica acerca da arquitetura é o desaparecimento daqueles estilos morais ideológicosestéticos aceitos que tinham sempre deixado sua marca em outras épocas O ecletismo comandava Como Pietro Selvático observou já em 1850 na sua Storia dellArte del Disegno não havia um estilo único de beleza Cada estilo era adaptado a uma função Portanto dos edifícios ao longo da Ringstrasse vienense à igreja o estilo era naturalmente gótico o parlamento grego a prefeitura uma combinação de renascença com gótico a bolsa de valores como mui tas outras oeste período um classicismo opulento os museus e a uni versidade alta renascença o Burgtheater e a Opera o que melhor pode 294 ser descrito como Segundo Império no qual elementos ecléticos da renascença predominavam A necessidade de pompa e esplendor normalmente encontrava a alta renascença e o gótico tardio mais adequados como idioma Bar roco e rococó foram desprezados até o século XX A renascença i dade dos príncipes mercadores era naturalmente o estilo que mais ca ía aos homens que se viam a si mesmos como sucessores destes prín cipes mas outras reminiscências eram também aceitas livremente Por conseguinte os nobres da terra da Silésia que se tornaram milio nários capitalistas graças ao carvão de suas fazendas e seus colegas mais burgueses invadiram toda a história da arquitetura de vários sé culos O Schloss castelo do banqueiro von Eichborn 1857 é clara mente prussianoneoclássico um estilo mais favorecido pelos ricos burgueses do final de nosso período O gótico com sua sugestão con junta de glória do burgo medieval e de fama dos cavaleiros tentava aos mais aristocráticos e afluentes como em Koppitz 1859 e Mie chowitz 1858 A experiência de Paris de Napoleão III na qual mili onários silesianos mais conhecidos como o príncipe Henckel von Donnersmarck deixaram sua marca quando não apenas por seu ca samento com uma das cortesãs mais famosas La Paiva sugeria natu ralmente modelos maiores de esplendor pelo menos aos príncipes de Hohenlohe e Pless A renascença italiana holandesa e alemã do norte forneciam modelos igualmente aceitáveis ao menos grandioso sozi nhas ou combinadas13 Mesmo os motivos menos previsíveis aparece ram Os ricos judeus de nosso período demonstraram uma preferência pelo estilo islâmicomouro para suas sinagogas cada vez mais opulen tas uma afirmação com eco nas novelas de Disraeli da aristocracia oriental que não precisava competir com a ocidental 14 e talvez este seja o único exemplo de um uso deliberado de modelos não ocidentais nas artes da burguesia ocidental até a irrupção da moda japonesa no final da década de 1870 e na de 1880 Em resumo a arquitetura não expressava nenhum tipo de ver dade mas apenas a autoconfiança da sociedade que a construía e es te sentido de imensa e indiscutível fé no destino burguês é que torna expressivos seus melhores exemplos Era uma linguagem de símbolos sociais Daí o deliberado encobrimento do que era realmente novo e interessante nela a magnífica tecnologia e técnicas de engenharia que mostrava sua face em público apenas em raras ocasiões quando o que era para ser simbolizado era o progresso técnico em si mesmo no Crystal Palace de 1851 a Rotunda da exibição de Viena de 1873 mais tarde a Torre Eiffel 1889 De outra forma mesmo o glorioso funcional dos edifícios utilitaristas era disfarçado como nas estações das estradas de ferro alucinadamente ecléticas como a de London Bridge 1862 gótica como a de St Pancras Londres 1868 renas cença com a de Südbahnhof em Viena 186973 Entretanto nume rosas outras importantes estações sobreviveram afortunadamente ao gosto luxuriante da nova era Só as pontes eram gloriosas na beleza 295 de sua engenharia mesmo isso talvez um pouco pesado agora dada à abundância e ao baixo preço do ferro embora este fenômeno curi oso a ponte suspensa gótica Tower Bridge Londres já aparecesse no horizonte E portanto do ponto de vista técnico atrás daquelas fa chadas góticas as coisas mais modernas originais e imaginativas es tavam acontecendo A decoração dos apartamentos Segundo Império em Paris já começava a esconder aquela avançada invenção original e sensacional o elevador ou ascensor para passageiros Talvez a úni ca peça que era uma justificativa tourdeforce da imaginação técnica e à qual os arquitetos raramente resistiam mesmo nos edifícios com fachadas públicas artísticas era a gigantesca cúpula como nos mercados salões de leitura de bibliotecas arcadas de comércio como a Galeria Victor Emmanuel em Milão De outra forma nenhuma era escondeu de forma tão persistente seus próprios méritos A arquitetura não tinha uma verdade própria porque não tinha significado que pudesse ser expresso em palavras As outras artes ti nham porque seu sentido assim permitia Nada é mais surpreendente para as gerações de meados do século XX educadas em dogmas crí ticos bem diferentes que a crença de meados do século XIX na qual a forma da arte não era importante que o conteúdo valia tudo Seria er rado concluir daí a simples subordinação das outras artes à literatura embora se acreditasse que seu conteúdo pudesse ser expresso em pa lavras com vários graus de adequação e embora a literatura fosse de fato a chave artística do período Se cada quadro contava uma histó ria e freqüentemente a música também esse era afinal o tempo ca racterístico das óperas música de bale e suítes descritivas a nota programática estava destinada a ser proeminente Seria mais ver dadeiro dizer que se esperava que cada arte fosse expressiva também em termos de outras que o ideal da obra total de arte o Gesamt kunstwerk do qual Wagner como usualmente fezse o portavoz u nia elas todas Mas as artes em que o sentido podia ser expresso de forma precisa isto é em palavras ou imagens representativas tinham vantagem sobre as outras que não podiam Era mais fácil transformar uma história numa ópera Carmen ou mesmo quadros numa composi ção Quadros de uma Exposição de Mussorgsky do que transformar uma composição musical num quadro ou mesmo em poesia lírica A questão do que se trata era portanto não apenas legítima mas fundamental para qualquer julgamento das artes de meados do século A resposta era geralmente realidade e vida Realismo era o termo que mais comumente vinha aos lábios dos observadores da época e posteriores acerca deste período e sempre quando lidando com a literatura ou as artes visuais Nenhum termo poderia ser mais ambíguo Implicava uma tentativa de descrever representar ou de qualquer modo encontrar um equivalente preciso de fatos imagens idéias sentimentos paixões em caso extremo o exemplo especifi camente musical do Leitmotiv wagneriano cada um deles represen tando uma pessoa situação ou ação ou suas recriações musicais do 296 êxtase sexual Tristan und Isolde 1865 Mas qual é esta realidade assim representada a vida exatamente como a arte deveria ser A burguesia de meados do século estava dividida num dilema que seu triunfo fazia ainda mais agudo A imagem de si mesma a qual aspira va não podia representar toda a realidade na medida em que a reali dade fosse de pobreza exploração e miséria materialismo paixões e aspirações cuja existência ameaçasse uma estabilidade que apesar de toda confiança que a burguesia tinha em si mesma era sentida como sendo precária Havia para citar um adágio do New York Times uma diferença entre as notícias e all the news thats fit to print as notícias adequadas para publicação Por outro lado numa sociedade dinâmica e progressista a realidade era afinal nãoestática Não iria então o rea lismo representar não o presente necessariamente imperfeito mas a si tuação melhor à qual os homens aspiravam e que já estava seguramen te sendo criada A arte tinha uma dimensão futura Wagner como sempre dizia representála Em resumo as imagens do real e do como a vida na arte divergiam cada vez mais dasimagens estilizadas e sentimentalizadas Na melhor das hipóteses a versão burguesa de re alismo era cuidadosamente seleta como o famoso Angelus de JF Millet 181475 no qual a pobreza e o trabalho duro pareciam mais aceitáveis pela piedade obediente dos pobres na pior das hipóteses transformavase no sentimentalismo do retrato de família Nas artes representativas havia três formas de escapar a este di lema Uma era insistir em representar toda a realidade incluindo o desagradável ou o perigoso O realismo transformavase então em naturalismo ou verismo Isso normalmente implicava uma cons ciência social crítica da sociedade burguesa como Courbert na pintu ra Zola e Flaubert na literatura ou mesmo obras que não tinham tal intenção crítica deliberada como a obraprima de Bizet 183875 a ópera das classes baixas Carmen 1875 que eram percebidas pelo público e pela crítica como se fossem políticas A alternativa era a bandonar totalmente qualquer realidade fosse cortando as ligações entre arte e vida ou mais especificamente vida contemporânea arte pela arte ou então pela escolha da abordagem visionária como no Bateau Ivre de 1871 do jovem revolucionário Rimbaud ou ainda a fantasia evasiva dos humoristas como Edward Lear 181288 e Le wis Carroll 183298 na Inglaterra Wilhelm Busch 18321908 na Alemanha Mas na medida em que o artista não se retirasse ou avan çasse para a fantasia deliberada as imagens básicas ainda eram en tendidas como sendo como a vida E neste ponto as artes visuais ti veram um choque traumático profundo a competição da tecnologia através da fotografia A fotografia inventada na década de 1820 e divulgada publica mente na França na década seguinte tornouse um meio para se tra balhar na reprodução em massa da realidade de nosso período e foi rapidamente desenvolvida num negócio comercial na França da déca da de 1850 em grande parte por membros da bohème artística sem sucesso como Nadar 18201911 para quem por exemplo viria a 297 trazer sucesso artístico e financeiro e para todos os outros pequenos empreendedores que entraram num negócio relativamente barato As insaciáveis demandas da burguesia especialmente a pequena burgue sia cheia de aspirações por retratos baratos forneceu a base de seu sucesso A fotografia inglesa permaneceu por muito mais tempo nas mãos de cavalheiros e damas que praticavamna por razões experi mentais ou como hobby Era automaticamente óbvio que ela destruía o monopólio do artista representativo Um crítico conservador obser vou já em 1850 que ela ameaçava seriamente a existência de vários ramos da arte tais como as gravuras litogravura e alguns tipos de re tratos 15 Como poderiam estes competir com a completa reprodução da natureza exceto na cor com um método que transcrevia os pró prios fatos numa imagem direta tudo de forma científica A foto grafia substituía então a arte Os neoclassicistas e os então românti cos reacionários inclinavamse em acreditar que sim e que tal era in desejável J A D Ingres 17801867 viaa com uma invasão impró pria do progresso industrial no domínio da arte Charles Baudelaire 182167 de um ponto de vista bastante diferente pensava o mesmo Qual o homem merecedor do nome de artista que genuíno amante das artes iria confundir a indústria com a arte 16 O papel correto de fotografia para ambos era o de ser uma técnica subordinada e neutra análoga à impressão na literatura Mas curiosamente os realistas que estavam mais diretamente ameaçados por ela não eram uniformemente hostis Aceitavam o pro gresso e a ciência Não era a pintura de Manet como observou Zola como as suas próprias novelas inspiradas pelo método científico de Claude Bernard ver capítulo 16 E portanto mesmo quando de fendiam a fotografia resistiam a identificar como arte a reprodução exata e naturalista que suas teorias pareciam implicar Nem dese nho nem cor nem a exatidão da representação argumentava o críti co naturalista Francis Wey constituem o artista é a mens divina a inspiração divina O que faz o pintor não é a mão mas o cérebro a mão apenas obedece l8 A fotografia era útil porque podia ajudar o pintor a ir além de uma simples e mecânica cópia dos objetos Duvi dosos entre o idealismo e o realismo do mundo burguês os realistas também rejeitavam a fotografia mas com um certo embaraço O debate era passional mas foi resolvido através daquela inven ção característica da sociedade burguesa o direito de propriedade A lei francesa que protegia a propriedade artística especialmente con tra plágios sob a lei da Grande Revolução 1793 deixava os produ tos industriais sujeitos à proteção muito mais vaga do artigo 1382 do Código Civil Todos os fotógrafos argumentavam que os modestos fregueses que compravam seus produtos estavam comprando não a penas imagens baratas e reconhecíveis mas também os valores espiri tuais da arte Simultaneamente os fotógrafos que não conheciam ce lebridades de forma suficientes para tirar seus valiosos retratos não podiam resistir à tentação de piratear cópias o que implicava que as 298 fotografias originais não estavam legalmente protegidas como a arte Os tribunais foram chamados para decidir quando os senhores Mayer e Pierson processavam uma firma rival por piratear as fotografias do conde Cavour e Lord Palmerston No decorrer de 1862 o caso percor reu todos os tribunais até a Corte de Cassação que decidiu que a fo tografia era afinal uma arte já que esta era a única maneira de pro teger efetivamente seu copyright Mas podiam tais eram as comple xidades que a tecnologia introduzia no mundo das artes as leis na sua majestade falar de uma só maneira O que ocorreria quando as demandas de propriedade entrassem em conflito com as da moralida de como aconteceu quando inevitavelmente os fotógrafos descobri ram as possibilidades comerciais do corpo feminino especialmente na forma de fácil divulgação do cartãodevisitas Que estes nus fotográficos de forma feminina em quaisquer posições provocativas aos olhos em sua nudez total eram obsce nos não havia dúvida uma lei assim já os havia declarado em 1850 Mas como seus sucessores do século XX os fotógrafos de garotas de meados do século XIX podiam inutilmente neste período refutar os argumentos da moralidade com os da arte a arte radical do realis mo Tecnologia comércio e a avantgarde formavam uma aliança underground contrapondose à aliança oficial do dinheiro com os va lores espirituais O ponto de vista oficial prevalecia com dificuldade Condenando tal fotógrafo o promotor público também condenava aquela escola de pintura que se chamava realista e suprimia a bele zaque substituía as graciosas ninfas da Grécia e Itália por ninfas de uma raça desconhecida até então tristemente notória nas margens do Sena 20 Este discurso foi registrado em Le Moniteur de la Photo graphie de 1863 o ano do Déjeuner sur 1Herbe de Manet O realismo era portanto ambíguo e contraditório Seus proble mas podiam ser evitados apenas ao preço da trivialização do artista acadêmico que pintava o que era aceitável e vendável deixando as relações entre ciência e imaginação fato e ideal progresso e valores eternos e o resto se arranjarem por si O artista sério fosse crítico da sociedade burguesa ou suficientemente lógico para levála a sério es tava numa posição mais difícil e a década de 1860 iniciaria uma fase de desenvolvimento que se mostrou ser não apenas difícil mas insolú vel Com o realismo programático isto é naturalista de Courbet a história da pintura ocidental complexa mas coerente desde a Renas cença italiana chegava a seu fim O historiador alemão da arte Hilde brand concluiu caracteristicamente seu estudo da pintura do século XIX com Courbet nesta década O que veio depois ou melhor o que já es tava surgindo simultaneamente com os Impressionistas não podia ser ligado tão facilmente ao passado eles antecipavam o futuro O dilema fundamental do realismo era ao mesmo tempo o do conteúdo e da técnica e também as relações entre ambos Na medida em que se discutia o conteúdo o problema não era apenas o de esco lher o comum ao invés do nobre e distinto os tópicos intocados 299 pelos artistas respeitáveis contra os que formavam o centro das acade mias como francamente os artistas políticos de esquerda como o Courbet revolucionário e comunardo estavam inclinados a fazêlo 21 Portanto eram todos os artistas que tomavam a sério o realismo já que precisavam pintar o que os olhos viam que eram coisas ou me lhor impressões aos sentidos e não idéias qualidades ou julgamentos de valores Olympia certamente não era uma Venus idealizada mas nas palavras de Zola sem dúvida algum modelo que Manet copiou tal como era na sua nudez juvenil22 e o que era mais chocante e coava formalmente a famosa Venus de Tiziano Mas fosse ou não fosse uma atitude política o realismo não podia pintar Venus mas apenas garotas nuas assim como não podia pintar a majestade mas apenas pessoas com coroas e esta é a razão por que o Kaulbach da proclamação de Guilherme I como imperador alemão em 1871 tem um efeito consideravelmente inferior aos ikons de David ou Ingres sobre Napoleão I Mas embora o realismo parecesse politicamente radical porque estava mais à vontade com os assuntos populares ele de fato limitava talvez mesmo tornasse impossível a arte comprometida política ou ideologicamente que havia dominado o período anterior a 1848 pois pintura política não existe sem idéias e julgamentos A pintura políti ca mais comum da primeira metade do século foi certamente elimina da da arte séria ou seja a pintura histórica em rápido declínio a partir da metade do século O realismo naturalista de Courbet o republica no democrata e socialista não fornecia a base de uma arte politica mente revolucionária nem mesmo na Rússia onde uma técnica natu ralista estava subordinada a um relato de histórias pelos Percchizhni ki alunos do teórico revolucionário Chernishevski tornandose indis tinguível exceto pelo conteúdo da pintura acadêmica Marcava o fim de uma tradição não o início de uma nova A revolução na arte e a arte da revolução começaram então a di vergir apesar dos esforços dos teóricos e propagandistas como o qua rantehuitard Théophile Thoré 180769 e o radical Emile Zola no sentido de juntálas Os Impressionistas foram importantes não pelos motivos populares que retratavam danças populares visões das ci dades e as cenas das ruas teatros corridas e bordéis da sociedade burguesa mas por suas inovações de método Mas estas eram sim plesmente tentativas de continuar a representação da realidade o que os olhos vêem através de técnicas análogas à fotografia e tomadas emprestadas a ela assim como ao eterno progresso das ciências Isto também implicava o abandono dos códigos convencionais de pintura O que é que os olhos realmente viam quando a luz caía sobre obje tos Certamente não os sinais de código aceitos para um céu azul nu vens brancas e traços de fisionomia Portanto a tentativa de fazer um realismo mais científico inevitavelmente removiao do senso co mum até que as novas técnicas em si tornaramse um código conven cional Como acontece de fato hoje lemos estes códigos sem dificulda 300 des quando admiramos Manet A Renoir 18411919 Degas C Mo net 18401926 ou C Pisarro 18301903 No seu tempo eles eram incompreensíveis um jarro de tinta atirado na cara do público como Ruskin exclamaria sobre James MacNeill Whistler 18341903 Este problema se mostraria temporário mas outros dois aspectos da nova arte iriam ser mais difíceis de se lidar Primeiro trazia a pin tura diante dos inevitáveis limites de seu caráter científico Por e xemplo o Impressionismo logicamente não implicava somente em pinturas mas num filme colorido e de preferência tridimensional ca paz de reproduzir o constante movimento de luz e objetos As séries de quadros de Monet da fachada da catedral de Rouen foram tão lon ge quanto possível nesta direção através de tintas e pincéis mas não muito longe Mas se a busca pela ciência na arte não encontrava uma solução definitiva então tudo o que se havia conseguido tinha sido a destruição de um código de comunicação visual convencional e ge ralmente aceito que não havia sido substituído pela realidade ou nenhum outro código equivalente e em seu lugar encontravase uma multiplicidade de convenções possíveis e iguais Em última análise mas as décadas de 1860 e 1870 estavam ainda longe de chegar a esta conclusão talvez não houvesse meio de escolher entre as visões sub jetivas de nenhum indivíduo e quando este ponto estava para ser des coberto a busca da perfeita objetividade do concreto visual veio a ser transformada no triunfo da perfeita subjetividade O caminho era ten tador pois se a ciência era um dos valores básicos da sociedade bur guesa o individualismo e a competição eram outros Os cânones do treinamento e padrões acadêmicos nas artes estavam algumas vezes inconscientemente substituindo os critérios de perfeição e corre ção pelo novo de originalidade abrindo caminho para a sua pró pria eventual superação Segundo se a arte era análoga à ciência ela partilhava então também a característica do progresso que com algumas qualifica ções igualava novo ou último a superior Isso não levantava maiores dificuldades com a ciência pois qualquer estudante em 1875 entendia evidentemente melhor de física do que Newton ou Faraday Isso não é verdade nas artes Courbet era melhor do que digamos Baron Gros não porque ele tivesse aparecido mais tarde ou fosse um realista mas porque tinha mais talento Além disso a palavra pro gresso em si mesma era ambígua já que podia ser e era aplicada i gualmente a qualquer mudança historicamente observada O pro gresso podia ou não ser um fato mas progressista era uma decla ração de intenção política O revolucionário nas artes poderia ser fa cilmente confundido com o revolucionário na política especialmente por mentes desvairadas como a de P J Proudhon e ambas podiam por sua vez ser confundidas com outra coisa muito diferente moder nidade uma palavra usada pela primeira vez em 1849 Ser contemporâneo neste sentido também tinha implicações de mudança e inovação técnica assim como de motivos Por essa ra 301 zão como Baudelaire observou com acuidade o prazer de representar o presente vem não apenas de sua possível beleza mas também de seu caráter essencial de ser o presente portanto cada presente precisa encontrar sua forma própria de expressão já que nenhum ou tro poderia expressálo adequadamente Isso poderia ou não ser pro gresso na medida de uma melhora objetiva mas era certamente progresso na medida em que os meios de apreensão de todo o pas sado precisavam dar lugar aos meios de apreensão do tempo presente que eram melhores porque eram contemporâneos As artes precisa vam portanto renovarse constantemente E assim fazendo inevita velmente cada sucessão de inovadores iria pelo menos temporari amente perder a massa dos tradicionalistas filisteus aqueles aos quais faltava aquilo que o jovem Rimbaud 185491 que formulou tanto dos elementos deste futuro nas artes chamou a visão Em re sumo começamos a nos encontrar naquele mundo hoje familiar da avantgarde embora o termo ainda não fosse corrente Não é aci dente que a genealogia retrospectiva das artes avantgarde normal mente não nos conduza além do Segundo Império na França para Baudelaire e Flaubert na literatura e para os Impressionistas na pintu ra Historicamente é em grande medida um mito mas sua localização no tempo é importante Marca o colapso da tentativa de produzir uma arte intelectualmente consistente embora constantemente crítica com a sociedade burguesa uma arte assumindo as realidades físicas do mundo capitalista do progresso e da ciência natural da forma que era concebida pelo positivismo V Este colapso afetava mais as camadas marginais do mundo bur guês que seu centro estudantes e jovens intelectuais escritores e ar tistas com aspirações a bohème em geral daqueles que se recusavam embora temporariamente a adotar umaespécie de respeitabilidade burguesa e se misturavam rapidamente aos que eram incapazes de fa zêlo ou cujo tipo de Vida impediaos de fazer Os distritos cada vez mais especializados das grandes cidades onde todos se encontravam o Quartier Latin ou Montmartre tornaramse os centros de tais a vantgardes e jovens rebeldes provincianos como o garoto Rimbaud que lendo avidamente pequenas revistas ou poesia heterodoxa em lu gares como Charleville eram atraídos para tais lugares Eles forneci am para os produtores e consumidores aquilo que iria ser chamado um século depois underground ou contracultura e que não era de forma alguma um mercado negligenciável embora ainda incapaz de dar à avantgarde um meio de vida O desejo crescente da burguesia em acercarse das artes multiplicou os candidatos em abraçálas es tudantes de arte aspirantes a escritores etc O livro Scenes of Bohe mian Life de Henry Murger 1851 produziu uma voga enorme para o 302 que poderia ser chamado o equivalente da sociedade burguesa da fête champeíre do século XVIII o paraíso laico do mundo ocidental e o centro da arte com o qual a Itália não mais podia competir Talvez houvesse na segunda metade do século entre 10 e 20 mil pessoas em Paris denominandose a si mesmos de artistas 23 Embora alguns movimentos revolucionários deste período esti vessem praticamente confinados ao milieu do Quartier Latin por exemplo os blanquistas e embora os anarquistas viessem a identifi car o mero fato de pertencer à contracultura com revolução a avant garde como tal não tinha uma linha política específica ou nenhuma linha de todo Entre os pintores os da extremaesquerda Pisarro e Monet fugiram para Londres em 1870 para evitar tomar parte na guerra francoprussiana enquanto Cézanne no seu refúgio de provín cia francamente não tinha interesse nos pontos de vista políticos de seu maior amigo o novelista radical Zola Manet e Degas burgueses de renda privada e Renoir calmamente foram para a guerra e evita ram a Comuna de Paris Courbet tomou uma parte demasiado pública nela Uma paixão por gravuras japonesas um dos subprodutos mais significativos da abertura do mundo ao capitalismo unia os Impres sionistas o feroz republicano Clemenceau prefeito de Montmartre sob a Comuna e os irmãos Goncourt que eram histericamente anti comunardos Eles estavam unidos como os Românticos de antes de 1848 apenas por um desagrado comum em relação à burguesia e seus regimes políticos naquela altura o Segundo Império o reino da mediocridade da hipocrisia e do lucro Até 1848 estes Quartiers Latins espirituais da sociedade burgue sa tinham esperança em uma revolução republicana ou social e tal vez até com todo o ódio possível uma certa admiração relutante pelo dinamismo dos mais ativos robber barons do capitalismo que faziam seu caminho através das barreiras da tradicional sociedade aristocráti ca A Educação Sentimental 1869 de Flaubert é a história daquela esperança nos corações dos jovens da década de 1840 e de seu duplo desapontamento pela própria revolução de 1848 e pela era subseqüen te na qual a burguesia triunfou a preço de abandonar até mesmo os ideais de sua própria revolução Liberdade Igualdade e Fraternida de Em certo sentido o romantismo de 183048 era a principal vítima desta desilusão Seu realismo visionário transformouse em realismo científico ou positivo mantendo talvez desenvolvendo o ele mento de criticismo social ou pelo menos de escândalo mas perdendo a visão Este processo por seu turno ocasionou a arte pela arte ou as preocupações com as formalidades da linguagem estilo e técnica Todos têm inspiração o velho poeta Gautier 181172 disse a um jovem Todo burguês é movido pela aurora e pelo pôrdosol O poe ta tem a habilidade de um artesão24 Quando uma nova forma de arte visionária viria surgir no meio da geração que havia vivido a infância em 1848 ou mesmo não era ainda nascida Arthur Rimbaud escreveu sua obra principal em 187173 Isidore Ducasse o conde de Lautré 303 amont 184670 publicou seus Chantsde Maldororem 1869 ela se ria esotérica irracionalista e fossem quais fossem as intenções de seus criadores apolítica Como o colapso do sonho de 1848 e a vitória da realidade da França do Segundo Império da Alemanha de Bismarck da Inglaterra Palmerstoniana e Gladstoniana e da Itália de Vittorio Emmanuel as artes ocidentais burguesas a começar pela pintura e poesia bifurca ramse naquelas com apelo ao público de massa e naquelas outras di rigidas apenas a uma minoria bem definida Elas não eram tão margi nais em relação à sociedade burguesa quanto pode fazer crer a histó ria mitológica da avantgarde mas no todo é inegável que os pintores e poetas que chegaram à maturidade entre 1848 e o final de nosso pe ríodo e que até hoje admiramos tinham um apelo indiferente ao mer cado de sua época e quando eram famosos o eram por causar escân dalos Courbet e os Impressionistas Baudelaire e Rimbaud os pré rafaelitas A C Swinburne 18371909 Dante Gabriel Rossetti 1828 82 Mas este não é exatamente o caso em relação a todas as artes nem mesmo a todas as que dependiam inteiramente do patrocínio burguês com a exceção do drama falado do período Isto é talvez devido ao fato de que as dificuldades que cercavam o realismo nas artes visuais e ram mais fáceis de serem enfrentadas em algumas outras VI A música praticamente não era afetada já que nenhum realismo representativo é de fato possível naquela arte e qualquer tentativa de introduzir realismo ali precisava ser necessariamente metafórica ou dependente de palavras ou drama A não ser no caso da fusão wagne riana da Gesamtkunstwerk a arte total de suas obras ou na modesta canção o realismo na música significava a representação de emoções identificáveis incluindo como no Tristan de Wagner 1865 as conhecidas emoções do sexo Mais comumente como nas florescen tes escolas nacionais de compositores Smetana e Dvorak na Bohe mia Tchaikovsky Rinsky Korsakov 18441908 Mussorgsky etc na Rússia E Grieg 18431907 na Noruega e evidentemente os ale mães mas não os austríacos elas eram as emoções do nacionalis mo para o qual existiam símbolos convenientes na forma de motivos oriundos da música folclórica etc Mas como já foi sugerido a músi ca séria floresceu não tanto porque sugeria o mundo real mas porque sugeria as coisas dos espírito e portanto fornecia entre outras coisas uma substituição para a rebelião como sempre fornecera um podero so adjunto a ela Se pretendia ser tocada precisava exercer alguma forma de apelo aos patrões ou ao mercado Nesta medida a música podia oporse ao mundo burguês apenas de dentro o que era uma ta refa fácil já que os Próprios burgueses não percebiam direito quando 304 estavam sendo criticados eles poderiam até sentir que suas próprias aspirações e a glória de sua cultura estavam ali sendo expressas Por tanto a música floresceu em um idioma mais ou menos tradicional mente romântico Seu maior militante vanguardista Richard Wagner também era sua figura pública mais célebre já que foi bem sucedido em convencer graças à patronagem do rei louco Ludwig da Baviera as autoridades culturais financeiramente em melhor situação assim como os membros burgueses de seu público que eles mesmos perten ciam àquela elite espiritual bem superior às massas filistéias e que só eles merecem a arte do futuro A literatura de prosa e especialmente a arte formal característi ca da era burguesa a novela floresceu exatamente pela razão oposta As palavras podiam diferentemente das notas musicais representar a vida real assim como idéias e diferentemente das artes visuais a técnica literária não reclamava para si a capacidade de imitála O realismo na novela não colocava portanto contradições imediatas e insolúveis tais como a fotografia introduziu em relação à pintura Al gumas novelas podiam pretender uma verdade rigorosamente docu mentária mais do que outras algumas poderiam desejar estender seus assuntos e campos vistos como impróprios ou inadequados para rece ber a atenção pública ambos ocorriam em relação aos naturalistas franceses mas quem poderia negar que mesmo os mais subjetivos es creviam histórias sobre o mundo presente e mesmo sobre a sociedade da época Não há nenhum novelista deste período cuja obra não possa ser transformada em novela de televisão Daí a popularidade e a flexi bilidade da novela como um genre e suas realizações extraordinárias Com algumas poucas exceções Wagner na música alguns pintores franceses e talvez alguma poesia as maiores realizações de nossa épo ca foram novelas russas inglesas francesas talvez mesmo se inclu irmos Moby Dick de Hermann Melville americanas E com a exceção de Melville as maiores novelas dos grandes novelistas receberam reco nhecimento imediato e às vezes até mesmo foram compreendidas O grande potencial da novela residia na sua amplitude os temas mais vastos e ambiciosos estavam dentro do campo de alcance do ro mancista Guerra e Paz 1869 tentou a Tolstoi Crime e Cativo 1866 a Dostoievsky Pais e Filhos 1862 a Turgenev A novela ten tava apreender a realidade de uma sociedade inteira embora fato bas tante curioso as tentativas deliberadas de fazêlo em nosso período através de seriados em conexão segundo o modelo de Scott ou Bal zac não atraíssem os grandes talentos mesmo Zola somente veio dar início ao seu gigantesco retrato retrospectivo do Segundo Império a série dos RougonMacquart em 1871 PerezGaldós 18431920 seus Episódios Nacionales em 1873 Gustav Freytag 181695 num nível mais baixo seu Die Ahnen Os Ancestrais em 1872 O suces so destes esforços titânicos variavam fora da Rússia onde eram quase que uniformemente bemsucedidos portanto nenhuma era que possui os talentos de um Dickens maduro Flaubert George Eliot Thacke 305 ray e Gottfríed Keller 181990 precisa temer qualquer competição Mas o que era característico da novela e tornoua a forma de arte típi ca de nosso período era que seus esforços mais ambiciosos foram ob tidos não através do mito e da técnica como o Anel de Wagner mas através da descrição simples da vida cotidiana Não atacava de assalto os paraísos da criação mas caminhava inexoravelmente em direção a ela Por esta razão permitiase quase sem nada a perder ser traduzi da Pelo menos um grande novelista de nosso período tornouse uma figura de projeção internacional Charles Dickens Entretanto seria injusto confinar a discussão das artes na era do triunfo burguês aos mestres e às obrasprimas especialmente aquelas confinadas a um público minoritário Este era como já vimos um pe ríodo da arte para as massas através da tecnologia da reprodução que tornava a multiplicação ilimitada das imagens um fato possível o ca samento entre tecnologia e comunicações que produziu o jornal de massa e o periódico especialmente a revista ilustrada e a educação de massa que fez a todos capazes de se transformarem num público As obras de arte da época que eram de fato bastantes conhecidas quer dizer conhecidas fora da minoria culta eram com raras ex ceções aquelas das quais Charles Dickens é talvez a figura mais im portante Mas Dickens escreveu como jornalista suas novelas eram publicadas em capítulos e portouse como um ator conhecido de muitos milhares graças a suas leituras de palco focalizando cenas dra máticas de seus livros A literatura que vendia mais amplamente era o jornal popular que atingia circulações sem precedentes de 250 mil ou mesmo meio milhão de exemplares na Inglaterra e nos Estados Unidos A pinturas que iriamse encontrar nas paredes dos trens do Oeste americano ou nas casas de campo na Europa eram gravuras tais como o Monarch of the Glen de Landseer ou seu equivalente nacio nal ou então retratos de Lincoln Garibaldi ou Gladstone As compo sições que entravam na consciência popular eram as árias de Verdi in terpretadas pelos organistas populares italianos ou aqueles pequenos excertos de Wagner que podiam ser adaptados à música para casa mentos mas não as próprias óperas Mas isso em si mesmo implicava uma revolução cultural Com o triunfo da cidade e da indústria uma divisão cada vez maior se inter punha entre de um lado os setores modernos das massas quer dizer os urbanizados os instruídos aqueles que aceitavam o conteúdo da cultura hegemônica a da sociedade burguesa e de outro lado os setores tradicionais cada vez mais minados Divisão mais e mais aguda porque a herança do passado rural se tornava de forma cada vez maior irrelevante para o tipo de vida da classe operária urbana nas décadas de 1860 e 1870 os operários industriais da Bohemia para ram de se expressar através de canções folclóricas e passaram para a canção do musichall e baladas que falavam de uma vida que tinha pouco ou nada em comum com a de seus pais Este era o vazio que os 306 ancestrais da música popular e do showbusiness começaram a preen cher para aqueles que tinham ambições culturais modestas Na Ingla terra a era na qual os musichalls multiplicaramse nas cidades tam bém foi a era na qual sociedades corais e bandas de música operária com um repertório de clássicos populares da alta cultura multiplica ramse nas comunidades industriais Mas é característico que nestas décadas o curso da cultura corresse em uma só direção da classe média para baixo pelo menos na Europa Mesmo aquilo que iria se transformar na mais característica forma da cultura proletária os es portes de massa em nosso período era determinado como por e xemplo na Association Football pelos jovens da classe média que fundaram os clubes e organizavam as competições Só no final da dé cada de 1870 e início da de 1880 iriam estes esportes ser capturados e seguros pela classe operária Mas mesmo as formas de cultura rural mais tradicionais estavam minadas nem tanto pelas migrações mas sobretudo pela educação A partir do momento em que a educação primária tornouse accessível às massas a cultura tradicional inevitavelmente cessou de ser basica mente oral e face a face e dividiuse em uma cultura superior ou do minante para os instruídos e outra inferior ou dominada para os anal fabetos A educação e a burocracia nacional transformaram mesmo as vilas em uma assembléia esquizofrênica de indivíduos divididos en tre os apelidos através dos quais eles eram conhecidos de seus vizi nhos Paquito e os nomes oficiais da escola e do estado através dos quais eles eram conhecidos pela autoridade Francisco Gonzales Lo pez As gerações tornaramse de fato bilíngües As numerosas ten tativas de salvar a velha linguagem para a literatura sob a forma de uma literatura de dialeto diziam respeito mais a uma nostalgia ro mântica de classe média populismo ou naturalismo A maior exce ção era o contraataque populistademocrático na alta cultura nesta altura estrangeira pelos escritores humoristas e jornalistas do sul e oeste dos Estados Unidos que sistematicamente usavam a linguagem falada como base dentre estes o maior monumento é o Huckleberry Finn de Mark Twain 1884 Pelos nossos padrões este declínio ainda era modesto Mas era significativo pois durante estes anos ainda não era visivelmente com pensado pelo desenvolvimento do que se poderia chamar de uma con tracultura urbana ou proletária No campo nunca iria haver um tal fe nômeno A hegemonia da cultura oficial inevitavelmente identifica da com a classe média triunfante era dominante em relação às massas subalternas E neste período pouco poderia mitigar tal sujeição 307 DécimoSexto Capítulo CONCLUSÃO Façase o que quiser o destino tem sempre a última palavra nas questões humanas Há uma tirania real para todos Segundo os prin cípios do Progresso o destino já devia ter sido abolido há muito tempo atrás Johann Nestroy autor teatral cômico vienense 1850 1 A era do triunfo liberal começou com uma revolução derrotada e terminou numa depressão prolongada A primeira é um sinal divisó rio mais conveniente para marcar o início ou o fim de um período his tórico do que a segunda mas a história não consulta a conveniência dos historiadores embora alguns dentre eles não estejam prevenidos a respeito deste ponto As exigências de construção dramáticas talvez sugiram a conclusão deste livro com um acontecimento adequada mente espetacular a proclamação da Unidade Alemã e a Comuna de Paris em 1871 ou mesmo a grande queda da bolsa de 1873 mas as necessidades da construção dramática e as da realidade freqüente mente não são as mesmas O caminho termina não com a visão de um ponto culminante ou de uma catarata mas sobre a paisagem menos facilmente identificável de um sistema fluvial um tempo qualquer entre 1871 e 1879 Se precisamos definir uma data escolhamos uma que simbolize a metade da década de 1870 sem associála a ne nhum evento formidável que a sobrecarregue desnecessariamente di gamos 1875 A nova era que iria se seguir à era do triunfo liberal seria bastan te diferente Economicamente iria se desligar rapidamente da compe tição sem barreiras das empresas privadas da abstenção governamen tal em relação a interferências e daquilo que os alemães chamavam Manchesterismus a ortodoxia do livre comércio da Inglaterra vitori ana para passar às grandes corporações industriais cartéis trustes monopólios grande intervenção governamental e às mais diferentes ortodoxias de política econômica mas não necessariamente de teoria econômica A era do individualismo encerrase em 1870 lamentada pelo advogado inglês A V Dicey e a idade do coletivismo come çava e embora a maior parte do que ele sombriamente apontava co mo os avanços do coletivismo nos pareça hoje insignificante em certo sentido ele tinha razão 308 A economia capitalista mudou de quatro formas significativas Em primeiro lugar entramos agora numa nova era tecnológica não mais determinada pelas invenções e métodos da primeira Revolução Industrial uma era de novas fontes de poder eletricidade e petróleo turbinas e motor a explosão de nova maquinaria baseada em novos materiais ferro ligas metais nãoferrosos de indústrias baseadas em novas ciências tais como a indústria em expansão da química or gânica Em segundo lugar entramos também agora cada vez mais na economia de mercado de consumo doméstico iniciada nos Estados Unidos desenvolvida na Europa ainda modestamente pela crescente renda das massas mas sobretudo pelo substancial aumento demográ fico dos países desenvolvidos De 1870 a 1910 a população da Euro pa cresceu de 290 para 435 milhões a dos Estados Unidos de 385 pa ra 92 milhões Em outras palavras entramos no período da produção de massa incluindo alguns bens de consumo duráveis Em terceiro lugar e de certa forma este foi o desenvolvimento mais decisivo uma reviravolta paradoxal teve lugar A era do triun fo liberal tinha sido aquela era de facto do monopólio industrial in glês dentro do qual com algumas notáveis exceções os lucros eram assegurados sem muita dificuldade pela competição de pequenas e médias empresas A era pósliberal caracterizavase por uma compe tição internacional entre economias industriais nacionais rivais a in glesa a alemã a norteamericana uma competição acirrada pelas di ficuldades que as firmas dentro de cada uma destas economias en frentavam no período de depressões para fazer lucros adequados A competição levava portanto à concentração econômica controle de mercado e manipulação Para citar um excelente historiador O crescimento econômico era agora também luta econômica lu ta que servia para separar os fortes dos fracos desencorajar uns e estimular outros favorecer as novas nações famintas às expensas das velhas O otimismo acerca de um futuro de progresso infinito dava lugar à incerteza e um sentimento de agonia no sentido tra dicional da palavra Tudo isto fortalecia e por seu turno era forta lecido pelas crescentes rivalidades políticas as duas formas de competição fundindose naquele surto final de fome por terri tórios e na caça por esferas de influência que tem sido chamada de Novo Imperialismo 2 O mundo entrou no período do imperialismo no sentido maior da palavra que inclui as mudanças na estrutura da organização eco nômica como por exemplo o capitalismo monopolista mas tam bém em seu sentido menor uma nova integração dos países subde senvolvidos enquanto dependências em uma economia mundial do minada pelos países desenvolvidos Além da rivalidade que levou as potências a dividir o globo entre reservas formais ou informais pa ra seus próprios negócios entre mercados e exportações de capital tal processo também era devido à crescente nãodisponibilidade de 309 matériasprimas na maioria dos próprios países desenvolvidos por razões geológicas ou climáticas As novas indústrias tecnológicas demandavam tais matérias petróleo borracha metais nãoferrosos Pelo final do século a Malásia era conhecida como produtora de esta nho a Rússia Índia e Chile por seu manganês a Nova Caledônia pelo níquel A nova economia de consumo demandava quantidades cres centes não apenas de matérias produzidas nos países desenvolvidos por exemplo cereais e carne mas também daquelas que não podia produzir por exemplo bebidas e frutas tropicais e subtropicais e ó leo vegetal para sabão A banana republic tornouse parte da eco nomia capitalista da mesma forma que a colônia produtora de esta nho borracha ou cacau Numa escala global esta dicotomia entre áreas desenvolvidas e subdesenvolvidas teoricamente complementares embora não nova em si mesma começou a tomar uma forma reconhecidamente moder na O desenvolvimento da nova forma de desenvolvimentodependên cia iria continuar com apenas breves interrupções até a queda geral na década de 1930 e forma a quarta grande mudança na economia mun dial Politicamente o final da era liberal significa literalmente o que as palavras querem dizer Na Inglaterra os LiberaisWhig no sentido amplo de que não era ConservadoresTory tinham permanecido com o poder com duas breves exceções através de todo o período entre 1848 e 1874 Nos últimos 25 anos do século eles iriam ficar no poder por apenas 8 anos Na Alemanha e na Áustria os liberais cessaram na década de 1870 de ser a base parlamentar principal dos governos até onde estes governos realmente precisavam de uma base parlamentar Eles estavam minados não apenas pela derrota de sua ideologia de mercado livre e por governos relativamente inativos mas também pe la democratização da política eleitoral ver capítulo 6 que destruiu a ilusão de que seu programa representava a vontade das massas Por um lado a depressão contava a favor da pressão protecionista de al gumas indústrias e dos interesses nacionais agrários A tendência em relação à liberdade de comércio foi revertida na Rússia e na Áustria em 187475 na Espanha em 1877 na Alemanha em 1879 e pratica mente em todos os lugares exceto na Inglaterra e mesmo ali o livre comércio estava sob pressão a partir da década de 1880 Por outro la do as demandas vindas de baixo por proteção contra os capitalistas por segurança social por medidas públicas contra o desemprego e um salário mínimo por parte dos trabalhadores tornaramse audíveis e po liticamente eficazes As classes melhores fosse a antiga nobreza hierárquica ou a nova burguesia não podiam mais falar pelas ordens subalternas ou o que é mais importante confiar no seu apoio não compensado Um novo estado cada vez mais forte e intervencionista e dentro dele um novo tipo de política desenvolveramse a partir de então re cebidos com melancolia pelos pensadores antidemocráticos A ver 310 são moderna dos Direitos do Homem pensava o historiador Jacob Burckhardt em 1870 inclui o direito ao trabalho e à subsistência Pois os homens não desejam mais deixar os assuntos mais vitais para a sociedade porque eles querem o impossível e imaginam que tal só pode vir a ser obtido com garantia sob compulsão do estado 3 O que os perturbava não era a utópica demanda como consideravam por parte dos pobres para viver decentemente mas a capacidade dos po bres de impor tais demandas As massas querem sua paz e sua paga Se elas o conseguirem através de uma república ou de uma monar quia apoiarão qualquer uma delas Se não sem muito barulho irão apoiar a primeira constituição que lhes prometer o que querem 4 E o estado não mais controlado pela autonomia moral e pela legitimidade que a tradição lhe atribuía na crença de que as leis da economia não podiam ser quebradas iria se tornar na prática um Leviathan cada vez mais poderoso embora em teoria um instrumento para atingir os ob jetivos das massas Pelos padrões modernos o crescimento do papel e das funções do Estado permaneceu bem modesto embora seus gastos isto é suas atividades tenham crescido per capita em praticamente todo o mundo durante nosso período muito como resultado do violento aumento da dívida pública exceto naqueles bastiões do liberalismo da paz e da empresa privada nãosubsidiada Inglaterra Holanda Bélgica e Dina marca Este aumento nos gastos públicos era muito mais marcado nos países em desenvolvimento que estavam no processo de constru ção da infraestrutura de suas economias os Estados Unidos Cana dá Austrália e Argentina através da importação de capital Mesmo assim os gastos sociais com a exceção talvez da educação permane ceram bem negligenciáveis Por outro lado três novas tendências e mergiam na política das tensões confusas da nova era de depressão econômica que em quase todos os lugares tornouse uma era de agi tação social e descontentamento A primeira tendência e quase que aparentemente nova era a emergência de partidos e movimentos de classe operária geralmente com uma orientação socialista isto é cada vez mais marxista dos quais o Partido SocialDemocrata Alemão era o pioneiro ê o exemplo mais expressivo Embora os governos e as classes médias da época olhassem para eles como muito perigosos na realidade eles partilha vam os valores e princípios do iluminismo racionalista sobre o qual o liberalismo se apoiava A segunda tendência não partilhava desta he rança e aliás opunhase decididamente a ela Partidos demagógicos antiliberais e antisocialistas surgiram nas décadas de 1880 e 1890 tanto da sombra de suas antigas raízes liberais como os nacionalis tas alemães pangermânicos e antisemitas que se tornaram os ances trais do hitlerismo como sob a proteção das igrejas até então politi camente inativas como o movimento socialcristão na Áustria Por várias razões entre as quais a posição ultrareacionária do Vaticano sob Pio IX 184678 talvez seja a mais importante a Igreja Católica 311 perdeu a chance de utilizar seu enorme potencial em política de massa de forma efetiva exceto em alguns poucos países ocidentais nos quais era uma minoria obrigada a se organizar como um grupo de pressão como o Partido de Centro na Alemanha da década de Í870 A terceira tendência era a emancipação dos partidos e movi mentos nacionalistas de massa de sua antiga identificação ideológica com o radicalismo liberal Alguns movimentos pela autonomia nacio nal ou independência tendiam a passar pelo menos teoricamente pa ra o lado do socialismo especialmente nos casos em que a classe ope rária tinha um papel importante em seus respectivos países mas era um socialismo mais nacional do que internacional como entre os chama dos Socialistas do Povo Tcheco ou então o Partido Socialista Polonês e o elemento nacional tendia a prevalecer sobre o socialista Outros se dirigiam para uma ideologia baseada no sangue solo língua o que pu desse enfim ser considerado uma tradição étnica e nada mais Tal processo não iria abalar o tipo básico de política dos estados desenvolvidos que haviam surgido na década de 1860 uma tendência mais ou menos gradual e relutante em direção a um constitucionalis mo democrático Mesmo assim o surgimento da política de massa nãoliberal ainda que teoricamente aceitável assustava governos Antes de aprenderem a manejar o novo sistema eles tendiam sobre tudo durante a Grande Depressão algumas vezes a cair em pânico ou coerção A Terceira República não iria readmitir os sobreviventes do massacre dos comunardos na política novamente antes do início da década de 1880 Bismarck que sabia como manejar os liberais bur gueses mas não sabia lidar nem com um partido socialista de massa nem com um partido católico de massa pôs os socialdemocratas na ilegalidade em 1879 Gladstone escorregou para a coerção na Irlanda Entretanto isso iria se constituir mais em uma fase temporária do que em uma tendência permanente A estrutura da política burguesa onde existia não seria encurralada no seu pontolimite até bem para dentro do século XX Embora nosso período deságüe nos momentos perturbados da Grande Depressão seria errôneo pintar um quadro muito carregado nas cores Diferente de 1930 as dificuldades econômicas eram tão complexas que os historiadores têm mesmo duvidado se o termo de pressão é justificado como uma descrição dos 20 anos que se segui ram após o final deste volume Eles estão errados mas suas dúvidas são suficientes para nos alertar em relação a um tratamento excessi vamente dramático Nem do ponto de vista econômico nem do políti co a estrutura do mundo capitalista de meados do século entrou em colapso Entrou numa nova fase mas mesmo sob a forma de um libe ralismo político e econômico vagarosamente modificado tinha toda via um campo bastante amplo para agir Seria diferente nos países pobres atrasados subdesenvolvidos e dominados ou então aqueles situados como a Rússia simultaneamente no mundo dos vitoriosos e das vítimas Ali a Grande Depressão iria abrir uma era de revolução 312 iminente Mas para a primeira ou as duas primeiras gerações posterio res a 1875 o mundo da burguesia triunfante parecia permanecer bas tante solido Talvez tivesse um pouco menos de autoconfiança do que antes e suas afirmações sobre esta confiança talvez um pouco menos seguras talvez um pouco mais preocupada a respeito de seu próprio futuro Talvez tenha ficado um pouco mais perturbada pela débâcle de suas antigas certezas intelectuais que especialmente depois da década de 1880 pensadores artistas e cientistas sublinhavam com suas novas incursões dentro dos novos e perturbadores territórios da mente Mas o progresso continuava indubitavelmente sob a forma de sociedades burgueses capitalistas e num sentido geral liberais A Grande Depressão era apenas um interlúdio Não havia afinal cres cimento econômico avanço científico e técnico melhorias e paz Não iria o século XX ser uma versão mais gloriosa e bemsucedida do século XIX Nós sabemos que não iria ser 184750 187680 população em milhões força a vapor 000 HP n umero de cidades acima de 50 mil população em milhões força a vapor 000 HP número de cidades acima de 50 mil Toscana 15 20 2 166 470 71 3 ou e stados centrou 01 a 05 8 41 25 Espanha 123 0 4 49 310 125 Portugal 37 0 1 39 110 266 Suécia incluindo Noruega 35 0 5 58 130 295 Dinamarca 14 10 7 23 610 355 Holanda 30 70 7 230 461 Bélgica 43 0 1 28 1877 Suiça 24 0 1 0 423 Império Otomano 10 aprox 0 0 14 0 0 07 Grécia 05 aprox 0 50 Sérbia 232 1680 7 502 9110 477 România 7 Estados Unidos Partes do núcleo Austríaco contadas na Confederação Germânica até 1866 Guimar os ou reduções significativas de território ou população entre 184776 Apenas o território europeu 318 empty Tabela 2 I Densidade da rede ferroviária 1880 km por mil país mais de 1000 Bélgica mais de 750 Reino Unido mais de 500 Suíça Alemanha Holanda 250499 França Dinamarca ÁustriaHungria Itália 100249 Suécia Espanha Portugal Romênia EUA Cuba 5099 Turquia Chile Nova Zelândia Trinidad Victória Java 1049 Noruega Finlândia Rússia Canadá Uruguai Argentina Costa Rica Jamaica Índia Ceilão Tasmânia Gales do Sul Austrália do Sul Colônia do Cabo Argélia Egito Tunísia II Estradas de ferro e navios a vapor 183076 km de estradas de ferro toneladas de navios a vapor 1831 332 32000 1841 8591 105121 1846 17424 139973 1851 38022 263679 1856 68148 575928 1861 106886 803003 1866 145114 1423232 1871 235375 1939089 1876 309641 3293072 F X von Neumann Spallart Übersichten der Weltwirtschaft Stuttgart 1880 pp 335 ff III Tráfego marítimo mundial Distribuição geográfica da tonelagem 1879 Área Tonelagem total Europa Mar Ártico 61 Mar do Norte 5536 Báltico 1275 Atlântico incluindo o Mar da Irlanda e o Passo de Calais 4553 Mediterrâneo Ocidental 1356 Mediterrâneo Oriental incluindo o Adriático 604 Mar Negro 188 Resto do mundo América do Norte 3783 América do Sul 138 Ásia 700 Austrália e Pacífico 359 A N Kiaer Statistique Internationale de la Navigation Maritime Christiania 1880 1881 319 Tabela 3 Produção mundial de ouro e prata 183075 000 Kilos ouro prata 183140 203 5964 184150 548 7804 185155 1975 8861 185160 2061 9050 186165 1982 11011 186670 1919 13391 187175 1707 19694 NeumannSpallart op cit 1880 p 250 Tabela 4 Agricultura Mundial 184087 Valor da produção em libras Número da força empregada 000 1840 1887 1840 1887 Inglaterra 218 251 3400 2460 França 269 460 6950 6450 Alemanha 170 424 6400 8120 Rússia 248 563 15000 22700 Áustria 205 331 7500 10680 Itália 114 204 3600 5390 Espanha 102 173 2000 2720 Portugal 18 31 700 870 Suécia 16 49 550 850 Noruega 8 17 250 380 Dinamarca 16 35 280 420 Holanda 20 39 600 840 Bélgica 30 55 900 980 Suíça 12 19 300 440 Turquia etc 98 194 2000 2900 Europa 1544 2845 50430 66320 Estados Unidos 184 776 2550 9000 Canadá 12 56 300 800 Austrália 6 62 100 630 Argentina 5 42 200 600 Uruguai 1 10 50 100 M Mulhall A dictionary of Statistics London 1892 p 11 320 O Mundo em 1847 JAPÃO FILIPINAS E SPANHOLAS ORIENTAIS HOLANDESAS INDIA Reinos da Índia de habiatantes CEILAO de habitantes IMPERIO RUSSO IMPERIO CHINES IMPERIO PERSA OTOMANO REINO UNIDO FRANCA PRUSSIA HABSBURGO SUICA ESPANHA IMPERIO OTOMANO CANADA ESPANHOLA MEXICO Cuba Espanhola milhares de habitantes milhares de habitantes milhares de habitantes milhares de habitantes milhares de habitantes milhares de habitantes milhares de habitantes milhares de habitantes 0 1000 2000 3000 4000 5000 Regiões Portuguesas Países com mais de 10 milhões de habitantes Uniao Alfandegaria Alental 1854 O Mundo por volta de 1880 CELILAO da de habitantes 40 milhões INDIAS ORIENTAIS 40 milhões da habitantes 70 milhões da habitantes HILIPINAS ESPANHOLA 54 milhões CHINA 400 milhões Rússia ESTADO LIVRE DE ORANGE OTOMANO TURQUIA 1847 Escravidão e Servidão no Mundo Ocidental Escravidão em 1847 Servidão em 1847 Trabalho assalariado e servidão 0 1000 2000 3000 4000 5000 milhares 25 MÁQUINAS A VAPOR 20 15 10 5 0 1850 1880 Resto do Mundo EUA Europa 1880 Escravidão e Servidão no Mundo Ocidental MILHAS DE ESTRADAS DE FERRO POR CONTINENTE Resto do Mundo 100 50 Á frica América América do Norte Ásia Europa Estradas de ferro em 1850 Estradas de ferro em 1880 milhares de milhas Escravidão em 1880 Servidão em 1880 Áreas de trabalho assalariado 1000 2000 3000 4000 5000 milhas PERU CUBA GUANA TRINIDAD NATAL MAURITIUS CANOVA CALDERNO F I J I PORÇÃO RELATIVA DE EMIGRANTES EUROPEUS Cultura Ocidental em 18471875 Opera 323 Notas Introdução 1 Ver J Dubois Le vocabulaire politique et social en France de 1869 à 1872 Paris 1963 2 D A Wells Recent Economic Changes Nova York 1889 p1 CAPÍTULO I 1 P Goldammer ed 1848 Augenzeugen der Revolution Berlim Ocidental 1973 p 58 2 Goldammer op cit p 666 3 K Repgen Marzbewegung und Maiwahlen des Revolutionsjahres 1848 in Rheinland Bonn 1955 p 118 4 Rinascità II 1848 Raccolta di Saggi e Testimonianze Roma 1948 5 RHoppe J Kuczynski EineAnalyse der Mãrzgefallenen 1848 in Berlin Jahrbuch für Wirtschaftsgeschichte 1964 IV pp 200 76 D Cantimori in F Fejtõ ed 1848 Opening of an Era 1948 6 Roger Ikof Insurrection ouvrière de juin 1848 Paris 1936 7 Karl Marx FrEflgelsAddress to the Communist League março de 1850 Werke VII p 247 8 Paul Gerbod La condition univèrsitaire en France au I9e siècle Paris 1965 9 Karl Marx Class Struggles in France 18481850 Werke VII pp 301 10 Franz Grillparzer Werke Munique 1960 I p 137 11 Marx Class Struggles in France Werke VII p 44 CAPITULO 2 1 Citado em Ideas and Beliefs of the Victorians Londres 1949 p 51 2 Devo esta referência ao prof Sanford Elwitt 3 Philoponos The Great Exhibition of1851 or the Weallh of lhe World in its Workshops Londres 1850 p 120 4 T Ellison The Cotton Trade ofGreal Britain Londres 1866 pp 63 e 66 5 Horst Thieme Statistische Materialien zur Konzessionierung der Aktienge sellschaften in Preussen bis 1867 Jahrbuch für Wirtschaftsgeschichte II 1960 p 285 6 J Bouvíer F Furet M Gilet L Mouvement du profil en France au 19e siècle Hague 1955 p 444 7 Engels a Marx 5 de novembro de 1857 Werke XXIX p 211 8 Marx a Danielson 10 de abril de 1879 Werke XXXIV pp 3705 9 F S Turner British Opium Policy and its Resulls to Índia and China Lon dres 1876 p 305 10 F Zunkel Industriebürgertum in Westdeutschland em H U Wehler ed Moderne Deutsche Sozialgeschichte ColôniaBerlim 1966 p 323 11 L Simonin Mines and Miners or Vnderground Life Londres 1868 p 290 12 Daniel Spitzer Gezammelte Schriften Munique e Leipizig II 1912 p 60 324 13 J Kuczynski Geschicht der Lage der Arbeiler unter dem Kapitalismus Ber lim Ocidental 1961 XII p 29 CAPITULO 3 1 K Marx F Engels Manifesto of the Communist Party Londres 1848 2 U S Grant Inaugural Message to Congress 1873 3 I Goncharov Oblomov 1859 4 J Laffey Racines de 1imperialisme français en ExtrèmeOrient Revue dHistoire Modernet Contemporaine XVI abriljunho de 1969 p 285 5 Muitas destas informações são tiradas de W S Lindsay History of Merchant Shipping 4 vols Londres 1876 6 Sir James Anderson Statistics of Telegraphy Londres 1872 7 Engels a Marx 24 de agosto de 1852 Werke XXVIII p 118 8 Bankers Magazine V Boston 18501 p 11 9 Bankers Magazine IX Londres 1849 p 545 10 Bankers Magazine V Boston 18501 p 11 11 NeumannSpallart Ubersichten der Weltwirst mhaft Suttgart 1880 p 7 CAPÍTULO 4 1 Prince Napoléon Louis Bonaparte Fragments Historiques 1688 et 1830 Pa ris 1841 p 125 2 Jules Verne From the Earth to the Moon 1865 CAPITULO 5 1 Ernest Renan What is a Nation em A Zimmern ed Modern Political Doctrines Oxford 1939 pp 1912 2 Johann Nestroy Haeuptling Abendwind 1862 3 Shatov em F Dostoievsky The Possessed 18712 4 Gustave Flaubert Dictionnaire des idées recues c 1852 5 Walter Bagehot Physics and Politics Londres 1873 pp 201 6 Citado em D Mack Smith Risorgimenlo Italiano Bari 1968 p 422 7 Tullio de Mauro Storia Lingüística dèllItália Vnita Bari 1963 8 J Koralka Social problems in the Czech and Slovak national movements em Commission Internationale dHistoire des Mouvements Sociaux et des Stru cutures Sociales Mouvements Nationaux dlndépendance et Classes Populaires Paris 1971 l p 62 9 J Conrad Die Frequenzverhãltnisse der Universitâten der hauptsãchlichsten Kulturlander Jahrbücher für Nationalõkonomie und Statistik 1891 3rd ser I pp 376ff 10 Sintome em dívida com Dr R Anderson por estas informações CAPÍTULO 6 1 H A Targé Les Déficits Paris 1868 p 25 2 Sir T Erskine May Democracy in Europe Londres 1877 I p lxxi 3 Karl Marx The Eighteenth Brumaire of Louis Bonaparte Werke VIII pp 1989 4 G Procacci Le elezioni dei 1874 e 1opposizione meridionale Milão 1956 p 60 W Gagel Die Wahlrechtsfrage in der Geschichte der deutschen Liberalen Parteien 18481918 Dusseldorf 1958 p 28 5 J Ward Workmen and Wages ai Home and Abroad Londres 1868 p 284 6 J Deutsch Geschichte der õterreichischen Gewerkschaftsbewegung Viena 1908 pp 734 Herbert Steiner Die internationale Arbeiterassoziation und die österr Ar beiterbewegung WegundZiel Viena Sondernummer Jãnner 1965 pp 8990 325 CAPITULO 7 1 Erskine May op cit I p29 2 J W Kaye A History of the Sepoy War in índia 1870 II pp 4023 3 Bipan Chandra Rise and Growth of Economic Nationalism in Índia Deli 1966 p 2 4 Chandra op cit 5 E R J Owen Cotton and the Egyptian Economy 18201914 Oxford 1969 p 156 6 Nikki Keddie An Islamic Response to Imperialism Los Angels 1968 p 18 7 Hu Shene Imperialism and Chinese Politics Pekin 1955 p 92 8 Jean A Meyer em Amoles E 5 C 25 3 1970 pp 7967 9 Karl Marx British Rule in índia New Daily Tribune 25 de junho de 1853 Werke IX p 129 10 B M Bhatia Famines in índia Londres 1967 pp 6897 11 Ta Chen Chinese Migration with Special Reference to Labour Conditions US Bureau of Labor Statistics Washington 1923 12 N Sanchez Albornoz Le Cycle vital annuel en Espagne 18631900 Ànna les E S C 24 6 novembrodezembro de 1969 M Emerit Le Maroc et lEurope jusquen 1885 Annales E S C 20 3 maiojunho de 1965 13 P LeroyBeaulieu LAlgérie et Ia Tunisie 2nd ed Paris 1897 p 53 14 Almanach de Gotha 1876 CAPÍTULO 8 1 Jacob Burhardt Reflections on History Londres 1943 p 170 2 Erskine May op cit I p 25 3 Herbert G Gutman Social Status and Social Mobility in Nineteenth Century America The Industrial City Paterson New Jersey mimeo 1964 4 Martin J Primack Farm construction as a use of farm labor in the United States 18501910 Journal of Economic History xxv 1965 p 114 ff 5 Rodman Wilson Paul Mining Fronliers of the Far West Nova York 1963 pp 5781 6 Joseph G McGoy Historie Sketches of the Caule Trade ofthe West and South wesl Kansas City 1874 Glendale Califórnia 1940 O autor aponta Albilene como um centro de gado sendo que em 1871 tornouse o maior deles 7 Charles Howard Shinn em Mining Camps A Study in American Frontier Government ed R W Paul Nova York Evanston e Londres 1965 capítulo XXIV pp 456 8 Hugh Dacis Granam Ted Gur eds The History of Violence in America New York 1969 capítulo 5 especialmente p 175 9 W Miller ed Men in Business Cambridge Mass 1952 p 202 10 Sinto me em dívida com Dr William Rubinstein de Johns Hopkins University pelas in formações nas quais este ponto de vista está baseado 11 Herbert G Gutman Work Culture and Society in Industrializing America 18151919 American Historical Review 78 3 1973 p 569 12 John Whitney Hall Das Japanische Kaiserreich Frankfurt 1968 p 282 13 Nakagawa Reiichiro Henry Rosovsky The Case ofthe Dying Kimono Business History Review XXXVII 1963 pp 5980 14 V G Kiernan The Lords of Human Kind Londres 1972 p 188 15 Kiernan op cit p 193 CAPÍTULO 9 1 Erskine May op cit I pp lxvvi 2 Journaux des Frères Goncourt Paris 1956 II p 753 3 Werke XXXIV pp 51011 4 Werke XXXII p 669 5 Werke XIX p296 6 Werke XXXIV p 512 326 7 M Pushkin The professions and the intelligentsia in nineteenthcentury Rússia University of Birmingham Hislorical Journal XII I 1969 pp 72 ff 8 Hugh Seton Watson Imperial Rússia 18611917 Oxford 1967 pp 4223 9 A Ardao Positivism in Latin America Journal of the History ofldeas XXIV 4 1963 p 519 assinala que uma constituição Comtiana foi imposta no estado do Rio Grande do Sul Brasil 10 G Haupt La Commune comme symbole et comme exemple Mouvement Social 79 abriljunho de 1972 pp 20526 11 Samuel Bernstein Essays in Política and lntellectual History Nova York 1955 capítulo XX The First International and a New Holly Alliance espe cialmente pp 1945 e 197 12 J Rougerie Paris Libre 1871 Paris 1971 pp 25663 CAPITULO 10 1 Citado em Jean Meyer Problemas campesinos y revueltas agrárias 1821 1910México 1973 p 93 2 Citado em R Giusti Lagricoltura ei contadini nel Mantovano 18481866 Mo on the Metallurgy of Iron Londres 1872 p 227 o suprimento diário de um único 3 NeumannSpallart op cit p 65 4 Mitchell Deane Abstract of Histórica Statistics Cambridge 1962 pp 3567 5 M Hroch Die Vorkämpfer der nationalen Bewegung bei den kleinen Völkern Europas Praga 1968 p 168 6 Agriculture em Mulhall op cit p 1 7 I Wellman Histoiré rurale de Ia Hongrie Annales E S C 23 6 1968 p 1203 Mulhall loc cit 8 E Sereni Storia del paesaggio agrário italiano Bari 1962 pp 3512 O de florestamento industrial também não deve ser negligenciado A grande quanti dade de combustível requerida pelos fornos do Lago Superior já causou uma impressão definitiva nas matas circunvizinhas escreveu H Bauermann em 1868 A Treatise on the Metallurgy of Iron Londres 1872 p 227 o suprimento diário de um único forno requeria a devastação de um acre de floresta 9 Elizabeth Whitcombe Agrarian Conditions in Northern índia I 18601900 Berkeley Los Angeles e Londres 1972 pp 7585 discute de forma crítica as conseqüências da engenharia de irrigação em larga escala nas Províncias unidas 10 Irwin Feller Inventive activity in agriculture 18371900 Journal of Eco nomic History XXII 1962 p 576 11 Charles McQueen Peruvian Public Finance Washington 1926 pp 56 O Guano supria 75 das rendas de todos os tipos do governo peruano em 18616 80 em 186975 Heraclio Bonilla Guano y burguesia en ei Peru Lima 1974 pp 1389 citando Shane Hunt 12 Ver G Verga Liberty pequena história baseada no levante de Bronte que está entre os discutidos por D Mack Smith em The peasants revolt in Sicily in 1860 em Studi in Onore di Gino Luzzatto Milão 1950 pp 20140 13 E D Genovese In Red and Black Marxian Explorations in Southern and AfroAmerican History Harmondsworth 1971 pp 1314 14 Para a mais elaborada versão deste argumento ver R W Fogel S Enger mann Time on the Cross Boston e Londres 1974 15 Th Brassey Works and Wages Practically Illustrated Londres 1872 16 H Klein The Coloured Freedmen in Brazilian Slave Society Journal of Social History 3 I 1969 pp 36 Júlio Le Riverend Historia econômica de Cu ba Havana 1956 p 160 17 P Lyashchenko A History of the Russian National Economy Nova York 1949 p 365 18 D Wells Recent Economic Changes Nova York 1889 p 100 19 J Varga Typen und Probleme des bauerlichen Grundbesitzes 17671849 Budapeste 1965 citado em Annales E S C 23 5 1968 p 1165 327 20 A Giraut L Milliot Príncipes de Colonisation et de Législation Colonille LAlgérie Paris 1938 pp 383 e 386 21 José Termes Ardevol El Movimiento Obrero en Espana La Primera internacional 118641881 Barcelona 1965 Apêndice Sociedades Obreras creadas en 18701874 22 A Dubuc Les sobriquets dans le Pays de Bray en 1875 Annales de Nor mandie agosto de l952 pp 2812 23 Jaroslav Purs Die Entwicklung des Kapitalismus in der Landwirtschaft der böhmischen Lander 18491879 Jahrbuch für Wirtschaftsgeschichte 1963 III p 40 24 Franco Venturi Les Intellectuels le peuple et la revolution Histoiré du popu lisme russe au XIX siècle Paris 1972 II pp 9468 Este livro magnífico cuja tradução em língua inglesa foi feita de uma de suas primeiras edições Roots of Revolution Londres 1960 é um trabalhochave nesta questão CAPITULO 11 1 Scholem Alejchen Aus den nahen Osten Berlim 1922 2 F Mulhauser Correspondence of Arthur Hugh Clough Oxford 1957 II p 396 3 I Ferenczi ed F Willcox International Migrations Vol 1 Statistics Nation al Bureau of Economic Research Nova York 1929 4 Ta Chen Chinese Migration with Special Referencefo Lrbor Conditions Unit ed States Bureau of Labor Statistics Washington 1923 p 82 5 S W Mintz Cuba Terre et Esclaves Etudes Rurales 48 1972 p 143 6 R Mayo Smith Emigration and Immigration A Study in Social Science Lon dres 1890 p 94 7 A F Weber The Growth of Cities in the Nineteenth Century Nova York 1899 p 374 8 Herbert Gutman Work Culture and Society in industrializing America 1815 1919 American History Review 78 3 de junho de 1973 p 533 9 Barry E Suplee A Business Elite GermanJewish Financiers in Nineteenth Century New York Business History Review XXXI 1957 pp 14378 10 Ferenczi ed Willcox op cit Vol II p 270n 11 Carl F Wittke We who built America Nova York 1939 p 193 12 Egon Erwin Kisch Karl Marx in Karlsband Berlim Ocidental 1968 13 C T Bidwell The Cost of Living Abroad Londres 1876 apêndice A Suíça foi o principal objeto desta viagem 14 Bidwell op cit p 16 15 Georg v Mayr Statistik und Gesellschaftslehre II Bevoelkerungsstatistik 2 Liéferung Tübingen 1922 p 176 16 E G Ravenstein The Laws of Migration Journal of the Royal Statistical Society 52 1889 p 285 CAPÍTULO 12 1 Purs The working class movement in the Czech lands Histórica 1965 p 70 2 M May Die Arbeitsfrage 1848 citado em R Engelsing Zur politschen Bil dung der deutschen Unterschichten 17891863 Hist Ztschr 206 2 abril de 1968 p 356 3 Letters and Private Papers of W M Thackeray ed Gordon N Ray II 356 Londres 1945 4 J Purs The industrial revolution in the Czech Lands Histórica II 1960 pp 210 e 220 5 Citado em H J Dyos M Wolff eds The Victorian City Londres e Bos ton 1973 I p 110 6 Dyos Wolff op cit I p 5 7 A F Weber 1898 citado em Dyos e Wolff op cit I p 7 8 HCroon Die Versorgung der Staedte des Ruhrgebietes im 19U20 Jahrhun dert mimeo International Congress of Economic History 1965 p 2 328 9 L HenneauxDepooter Misères et Luttes Sociales dans le Hainaut 186096 Bruxelas 1959 p 117 Dyos Wolff op cit p 134 10 Dyos Wolff op cil I p 424 11 Dyos Wolff op cit I p 326 12 J H Clapham An Economic History of Modem Britain Cambridge 1932 II pp 11617 13 Erich Maschke Es entsleht ein Konzern Tubingern 1969 14 R Ehrenberg KruppSludien ThünenArchiv II Jena 19069 p 203 C Fohlen The Fontana Economic History of Europe 4 The Emergence of Industrial Societies Londres 1973 I p 60 J P Rioux La Révolution Industrielle Paris 1971 p 163 15 P J Proudhon Manuel du Spéculateur à Ia Bourse Paris 1857 pp 429 ff 16 B Gille The Fontana Economic History of Europe 3 The Industrial Révo lution Londres 1973 p 278 17 J Kocka Industrielles Management Konzeptionen und Modellevor 1914 Vierteljahrschrift für Sozial und Wirtschaftsgesch 563 outubro de 1969 p 336 citando de Emminghaus Allgemeine Gewerbeslehre 18 P Pierrard Poesie et chanson à Lille sous le 2e Empire Revue du Nord 46 1964 p 400 19 G D H Cole Raymond Postgate The Common People Londres 1946 p 368 20 H Mottek Wittschaftsgeschidhte Deutschlands Berlim Ocidental 1973 II p 235 21 E Waugh Home Life of lhe Lancashire Factory Folk during the Cotton Fa mine Londres 1867 p 13 22 M Anderson Familv Structure in Nineteenth Century Lancashire Cambridge 1973 p 31 23 O Handlin ed Immigrations as a Factor in American History Englewood Cliffs 1959 pp 667 24 J Hagan C Fisher Piecework and some of its consequences in the print ing and coal mining industries ir ustralia 18501930 Labour History 25 no vembro de 1973 p 26 25 E Schwiedland Kleingewrbe uber Hausindustrie in Osterreich Leipizig 1894 II pp 2645 e 2845 26 J Saville J Beüamy eds Dictionary of Labour Biographv I p 17 27 Engelsing op cit p 364 28 Rudolf Braun Soziaicr u kulíureller Wandel in einem landliehen Indu slriegebiet im 19 u 20 Jahrhundcrí HrlcnbachZurique e Stultgart 1965 p 139 usa este termo especificamente para o período Seus inestimáveis livros ver também Industrialisierung und 1olkslebin não podem ser recomendados tão bem 29 Industrial Remunennion Conference Londres 1885 p 27 30 Industrial Remunerarion Conference pp 8990 31 Beatrice Webb My Appremiceship Harmondsworth 1938 pp 189 e 195 32 Industrial Remunerqfion Conference pp 27 e 30 CAPlTULO 13 1 Citado em L Trenard Un Industriei roubaisien du XIX siècle Revue du Nord 50 1968 p 38 2 Murtin Tupper Proverbial Philosophy 1876 3 Ver Ernanie Sachs The Terrible Siren Nova York 1928 especialmente pp 1745 4 A liberdade de visitar garotas americanas é ressaltada na seção relevante do capítulo sobre estrangeiros em Paris no soberbo Paris Guide 1867 2 vols 5 Sobre Cuba Verena Martinez Alier Elopement and seduction in 19th centurv Cuba Past and Present 53 maio de 1972 sobre América do Sul E Genovese Roll Jordan Roll Nova York 1974 pp 41330 e R W Fogel Stanley Enger mann op cit 6 De Maxims for Revolutionists em Man and Supermun Um homem mode radamente honesto com uma mulher moderadamente encantadora ambos beber 329 rões moderados numa casa moderadamente saudável esta é a verdadeira unida de da classe média 7 Zunkel op cit p 320 8 Zunkel op cit p 526 n 59 9 Tupper op cit Of Home p 361 10 Tupper loc cit p 362 11 John Ruskin Fors Clarigera em E T Cook A Wedderburn eds Col lected Works Londres e Nova York 190312 vol 27 carta 34 12 Tupper op cit Of Marriage p 118 13 Minha opinião é que se uma mulher é obrigada a trabalhar imediatamente embora ela possa ser cristã ou bem nascida ela perde a posição peculiar que o termo lady convencionalmente designa Carta ao Englishwomans Journal VIII 1866 p 59 14 Trénard op cit pp 38 e 42 15 Tupper op cit Of Joy p 133 16 J LambertDansette Le Patronat du Nord Sa période triomphante em Bulle tin de la Société dhistoíre moderne et contemporaine 14 Série 18 1971 p 12 17 Charlotte Erickson British Industrialists Steel and Hosiery 18501950 Cambridge 1959 18 H Kellenbenz Unternehmertum in Südwestdeutschland Tradition 104 agosto de 1965 pp 183 ff 19 C Pucheu Les Grands Notables de 1Agglomération Bordelaise du milieu du XIXe siècle à nos jours Revue dhistoire économique et sociale 45 1967 p 493 20 P Guillaume La Fortune Bordelaise au milieu du XIX siècle Revue dhis toire écnomique et sociale 43 1965 pp 331 332 e 351 21 E Gruner Quelques reflexions sur 1élite politique dans la Conféderation Hel vetique depuis 1848 Revue dhistoire économique et sociale 44 1966 pp 145 ff 22 B Verhaegen Legroupe Liberal à Ia Chanibre Belge 18471852 Revue Belge de Philogie et dhisloire 47 1969 34 pp 1176 ff 23 LambertDansette op cit p 9 24 LambertDansette op cit p 8 VE Chancellor ed Master and Artisan in Victorian England Londres 1969 p 7 25 Serge Hutin Les FrancsMaçons Paris 1960 pp 103 ff e 114 ff P Che vallier Histoire de la Francmaçonnerie françaiseII Paris 1574 Para o mundo Ibérico o julgamento A Livre massonaria deste período não era senão a conspi ração universal da classe média revolucionária contra a tirania feudal monárqui ca e divina Era a Internacional desta classe citado em íris M Zavala Masones Comuneros y Carbonarios Madri 1971 p 192 26 T Mundt Die neuen Bestrebungen zu einer wirtschaftlichen Reform der un teren Volksklassen 1855 citado em Zunkel op cit p 327 27 Rolande Trempé Contribution à 1étude de la psychologie patronale le comportement des administrateurs de la Societé des Mines de Carmaux 1856 1914 Mouvement Social 43 1963 p 66 28 John Ruskin Modem Painters citado em W E Houghton The Viclorian Frame of Mind Newhaven 1957 p 116 Samuel Smiles Self Help 859 capítulo II pp 35960 29 John Ruskin Traffic The Crown of Wild Olives 1866 Works 18 p 453 30 Trempé op cit p 73 31 W L Burn The Age of Equipoise Londres 1964 p 244 n 32 H Ashworth em 18534 citado em Burn op cit p 243 33 H U Wehler Bismark und der Imperialismus ColôniaBerlin 1969 p 431 CAPITULO 14 1 Francis Darwin A Seward eds More Letters of Charles Darwin Nova York 1903 II p 34 2 Citado em Engelsing op cit p 361 330 3 Anihropological Review IV 1866 p 115 4 P Benaerts et ai Nalionalité et Nationalisme Paris 1968 p 623 5 Karl Marx Capital I postescrito à segunda edição 6 Em Electromagnetic Theory de Julius Stratton do MIT Dr S Zienau com quem me encontro em dívida pelas referências que faço às ciências físicas in formame que isto veio num momento propício para o esforço de guerra anglo saxão no campo do radar 7 J D Bernal Science in History Londres 1969 II p 568 8 Bernal op cit 9 Marx a Engels 19 de dezembro de 1860 Werke XXX p 131 10 H Steinthal M Lazarus Zietschriftfür Volkerpsychologie und Sprachwissenchaft 11 F Mehring Karl Marx The Story of his Life Londres 1936 p 383 12 E B Tylor The Religion of Savages Fortnightly Review VI 1866 p 83 13 Anthropological Review IV 1866 p 120 14 Kiernan op cit p 159 15 W Philips Religious profession and practice in New South Wales 1850 1900 Historical Studies outubro de 1972 p 388 16 Haydris Dictionary of Dates 1889 ed artigo Missions 17 Eugene Stock A Short Handbook of Missions Londres 1904 p 97 As esta tísticas neste manual parcial e influente são tiradas de J S Dennis Centennial Survey of joreign Missions Nova York e Chicago 1902 18 Catholic Encyclopedia artigo Missions África CAPITULO 15 1 R Wagner Kunst und Klima Gesammelte Schriften Leipzig 1907 III p 214 2 Citado em E Dowden Studies in Literature 17891877 Londres 1892 p 404 3 Th v Frimmel Lexicon der Winer Gemãldesammlungen AL 191314 arti go Ahrens 4 G Reitlinger The EconomicsofTaste Londres 1961 capítulo 6 Eu tenho con fiado bastante neste valioso trabalho que traz ao estudo da arte um realismo fi nanceiro adequado a nosso período 5 Asa Briggs Victorian Citties Londres 1963 pp 164 e 183 6 Reitlinger op cit 7 R D Altick The English Cammon Reader Chicago 1963 pp 355 e 388 8 Reitlinger op cit 9 F A Mumby The House of Routledge Londres 1934 10 M V Stokes Charles Dickens A Customer of Coutts Co The Dicken sian 68 1972 pp 1730 Estou em dívida com Michael Slater por esta referência 11 Mulhall op cit artigo Libraries Uma nota especial deveria ser feita sobre o movimento da livraria pública britânica Dezenove cidades instalaram tais livra rias nos anos 1850 1 1 na década de 1860 51 nos anos 1870 W A Munford Edward Edwards Londres 1963 12 T Zeldin France 18481945 Oxford 1974 I p 310 13 G Grundmann Schlösser und Villen des 19 Jahrhunderts von Unter nehmern in Schlesien Tradition 10 4 agosto de 1965 pp 14962 14 R Wischnitzer The Architecture ofthe European Synagogue Filadélfia 1964 capítulo 10 especialmente pp 196 e 2026 15 Gisèle Freund Photographie und bürgerliche Gesellschafl Munique 1968 p 92 16 Freund op cit pp 946 17 Citado em Linda Nochlin ed Realism and Tradition in An Englewood Cliffs 1966 pp 71 e 74 18 Gisèle Freund Photographie et Société Paris 1974 p 77 19 Freund op cit 1968 p III 20 Freund op cit 1968 pp 11213 21 Sobre a questão das artes e da revolução neste período ver T J Clark The Absolute Bourgeois Londres 1973 e Image of lhe People Gustave Coubert 331 Londres 1973 1973 22 Nochlin op cit p 77 23 Mesmo num centro de menor importância como a Bohemia Munique o Münchner Kunstverein tinha cerca de 4500 membros em meados da década de 1879 P Drey Die wirtschaftlichen Grundlagen der Malkunst Versuch einer Kunstökonomie Stuttíart e Berlim 1910 24 Na arte o artesão é quase tudo Inspiração sim inspiração é uma coisa mui to bela mas um tanto banal é desta forma universal Todo burguês é mais ou menos afetado por uma aurora ou pôr do sol Ele tem uma certa dose de inspira ção Citado em Dowden op cit p 405 CAPÍTULO 16 1 Johann Nestroy Sie Sollen Ihn Nicht Haben 1850 2 D S Landes The Unbound Prometheus Cambridge 1969 pp 2401 3 Burckhardt op cit p 116 4 Burckhardt op cit p 171 Um Mundo em Movimento 333 LEITURA COMPLEMENTAR Com algumas poucas exceções as notas abaixo referemse ape nas a livros e livros em língua inglesa Isto não quer dizer que sejam os melhores disponíveis embora freqüentemente o sejam Tratase de uma concessão à ignorância de línguas estrangeiras da maioria dos leitores de língua inglesa através do mundo A bibliografia do período é tão vasta que não é possível uma tentativa de cobrir todos os aspectos relacionados mesmo que seleti vamente e as escolhas sugeridas são de cunho pessoal às vezes mesmo fortuitas Guias para leitura da maioria dos tópicos estão con tidos em A Guide to Historical Literature periodicamente revisto e editado pela American Historical Association A bibliografia existen te na Cambridge Econamic History of Europe vol VI é maior do que seu título sugere A Bibliography of Modern History 1968 de J Ro ach ed também pode ser consultada com alguma cautela A maio ria dos livros relacionados abaixo também contém referências biblio gráficas em notas de pé de página ou separadamente Entre as obras gerais de referência histórica a Encyclopedia of World History de W Langer fornece as principais datas assim como Chronology of the Modern World 1966 de Neville Williams Annals of European Civilization 150019001949 de Alfred Mayer trata das artes e das ciências A Dictionary of Statistics de M Mulhall 1892 ainda é o melhor compêndio para números Para referência geral so bre o século XIX a décimaprimeira edição da Encyclopaedia Britan nica ainda disponível em boas bibliotecas de universidades é incom paravelmente superior às suas sucessoras assim como a Encyclopaedia of lhe Social Sciences 1931 é para nossas finalidades superior a edição posterior de 1968 Compêndios biográficos e obras de referência em assuntos especiais são demasiadamente numerosos para serem mencionados Entre os atlas históricos o Grosser Historiseher Welta tlas 1957 de J Engel et al o Atlas of World History 1957 de Rand McNally e o Penguin Historical Atlas 1974 são recomendados An Introduction to Contemporary History de G Barraclough 1967 e The Triumph ofthe Middle Classes 1966 de C Morazé este último com mapas excepcionalmente bem feitos podem servir como introdução à história global O elegante e erudito The Lords of the Human Kind 19691972 de V G Kiernan analisa as atitudes eu 334 ropéias em relação ao mundo exterior Os dois livros New Cambrid ge Modern Historv vol X J P T Bury ed The Zenith of European Power 18391870 e as duas partes da Cambridge Economic History Vol VI The Industrial Revolutions and After vão além da Europa Ambos podem ser consultados constantemente com bom proveito Para análises mais estritamente sobre a Europa The Ascendancy of Europe 18151914 1972 de M S Anderson e The Age of Revoluti on Europe 17891848 1962 de E J Hobsbawm vão além do conti nente Liberal Europe 18481875 1974 de W E Mosse cobre exa tamente o mesmo período do presente livro Political and Social U pheaval 18321852 de William L Langer 1969 com a bibliografia é de longe o melhor dos volumes cronologicamente relevantes da série The Rise of Modern Europe editada pelo mesmo autor De obras gerais em campos mais especializados The Fontana E conomic History of Europe de C Cipolla ed 1973 vols 3 4i 4ii são extremamente úteis mas sem dúvida a melhor introdução à história e conômica do período é o soberbo The Unbound Prometheus 1969 de D S Landes um desenvolvimento da contribuição deste autor à Cam bridge Economic History Os importantes volumes de A History of Te chnology de C Singer et al são para referência The Culture of Western Europe the nineteenth and twentieth centuries 1963 de G L Mosse é uma adequada introdução a este assunto Science in History 1965 de J D Bernal é brilhante mas as seções sobre o nosso período não devem ser tomadas de forma acrítica Nem deveriam ser as seções de The Soci al History of Art de A Hauser 1952 Vários volumes da Penguin His tory of Art cobrem o século XIX European Society in Upheaval 1975 ed de Peter Stearns é uma tentativa talvez prematura de cobrir a histó ria social do continente Duas obras de C Cipolla The Economic Histo ry of World Population 1962 e Literacy and Development in the West 1969 são breves e úteis introduções The Growth ofCities in the 19tn Century 1889 e reimpressões de A F Weber tem sido um inestimável compêndio desde sua publicação original Nem todos os países possuem uma história nacional de tamanho adequado e de fácil acesso em língua inglesa para o nosso período A Inglaterra por exemplo não tem embora The Origin of Modern En glish Society 17801880 1969 de H Perkin e Midvictorin Britain 185075 1971 de Geoffrey Best são bons em história social e An Economic History of Modern Britain II 18501880 1932 de J H Clapham ainda é excepcional A melhor história da França é ainda de longe a Nouvelle Histoire de la France Contemporaine vols 8 e 9 de M Agulhon 1848 ou 1apprentissage de la Republique de Alain Plessis De La fête imperiale au mur desFêdéres ambos de 1973 e sem tradução inglesa A History of Modern Germany 18401945 de Hajo Holborn 1970 é bom mas para o nosso período Restoration Revolution Reaction Economics and Politics in Germany 18151871 1958 de T S Hamerow e Social Foundations of German Unificati on 1969 do mesmo autor são altamente relevantes The Habsburg 335 Empire 17901918 1969 de C A Macartney e o expressivo Spain 18081939 1966 de Raymond Carr contém ambos a maior parte do que precisamos saber sobre estes países e The Scandinavian Countri es 17201865 2 vols 1943 de B J Hovde mais do que isso Histórias da Rússia refletem opiniões francamente discordantes Imperial Rússia 18011917 1967 de Hugh Seton Watson está repleto de informações assim como A History of the Russian National Economy 1949 de P Lyashchenko History of the Italian People II1973 de G Procacci é uma boa introdução embora um tanto comprimida Italy A Modern History 1959 de D Mack Smith é uma obra antiga feita pelo maior especialista deste período da história italiana The Balkans since 1453 1958 de L S Stravianos é uma visão geral muito boa Para o mundo nãoeuropeua maioria dos leitores talvez precise não de histórias do período mas de introduções gerais a regiões às quais não são familiares Para a China isso pode ser encontrado em China Readings I de Franz Schurmann e O Schell eds o volume Imperial China 1967 para o Japão no The Japan Reader I o volu me Imperial Japan 18001945 1973 de J Livingston J Moore e F Oldfhather eds para o mundo islâmico Unity and Variety in Mus lim Civilization 1955 de G von Grunebaum ed para a América Latina alguma coisa de Readings in Latin American History II since 1810 1966 de Lewis Hanke ed para a Índia Agrarian Conditions in Northern Índia I The United Provinces under British Rule 1972 de Elizabeth Whitcombe para o Egito Cotton and The Egyptian E conomy 18201914 1969 de E R J Owen Para os principais even tos nos seus respectivos países The Taiping Rebellion 1966 de M Franz e The Meiji Restoration 1972 de W G Beasley A bibliografia para a história americana é interminável Qual quer história geral será adequada para aqueles totalmente estranhos em relação a este país como por exemplo The Making of American Society I to 1877 1972 de E C Rozwenc suplementada pela Ency clopaedia of American History 1965 de R B Morris Todas estão atrasadas em relação aos progressos da pesquisa O tema principal do presente livro é a criação de um único mundo sob a hegemonia capitalista Para este processo de exploração ver A History of Geographical Discovery and Exploration 1931 de J N L Baker para pó mapas ver Memoirs of Hydrography II vai de 1830 a 80 de Cdr L S Dawnson RN reimpresso em 1969 para o transporte uma breve introdução por M Robbins The Ralway Age 1962 e uma exuberante e triunfante crônica por W S Lindsay History of Merchant Shipping 4 vols 1876 A expansão da colonização e dos empreendi mentos é inseparável da história das migrações ver capítulo 11 ver Migration and Economic Growth 1954 de Brinley Thomas para o la do humano The Immigrant in American History 1940 de M Hansen e Invisible Immigrants The Adaptatiori of English and Scottish immi grants in 19th century America 1972 de C Erickson enquanto que A New System of Slavery 1974 de Hugh Tinker trata da exportação de 336 trabalho endividado Para as fronteiras em expansão Westward Expan sion de R A Billington 1949 e Mining Froníiers of the Far West 1963 de Rodman Wilson Paul Para os empreendimentos capitalistas fora da Europa o esplêndido Bankers and Pashas International Finance and Modern Imperialism in Egypt 1958 de D S Landes The Migration of British Capital to 1875 J 927 de L H Jenks Europe The Worlds Banker 1930 de H Feis The Life and Labours of Mr Brassey 1872 reimpresso 1969 de A T Helps e Henry Meiggs A Yankee Pi zarro 1946 de W Stewart Os dois últimos volumes tratam dos titãs da construção ferroviária Uma olhada interessante nas atitudes da época é The Political and Social Ideas of Jules Verne 1972 de Jean Chesne aux sobre o autor de A Volta ao Mundo em Oitenta Dias A história da burguesia classechave de nosso período ainda espera para ser bem es crita pelo menos em inglês e em uma forma adequadamente accessível Victorian People 1955 de Asa Briggs é uma útil introdução mas o me lhor guia ainda é a série de novelas dos RougonMacquart de Émile Zola que analisa a sociedade do Segundo Império Francês e cuja auten ticidade documentária é bem alta Ver também a introdução de Mario Praz para The Nineteenth Cenlury World 1968 de G S Métraux e F Crouzet eds Entre as monografias devese mencionar La Bourgeoisie Parisienne 18151848 versão reduzida 1970 de Adeline Daumard Les Grands Nolables en France 2 vols 1964 de A Tudesq adequado pa ra o estudo da formação da consciência política no período da revolução de 1848 assim como Industriebürgertum in Westdeutschland de F Zunkel incluído em Modern Deutsche Sozialgeschichte 1966 de H U Wehler ed Para as aspirações da baixa classe média e de certa forma adequado para as demais classes Self Help 1859 e numerosas edições subseqüentes de Samuel Smiles The Age of Equipoise 1964 de W L Burn é um excelente corte transversal da sociedade burguesa inglesa e France 18481945 vol I 1974 de T Zeldin um guia bastante razoável para a sociedade burguesa francesa incluindo família e sexo The For mation of the British Liberal Party 185768 1972 é bem estimulante Embora haja excelentes livros sobre a cidade do século XIX a lém do volume de A F Weber como por exemplo Victorian Cities 1963 de Asa Briggs e o enciclopédico The Victorian City vols 1973 de H J Dyos e M Wolff eds guias gerais para o mundo dos trabalhadores manuais diferente das histórias de suas organizações são bastante escassos Useful Toil 1974 de John Burnett ed edita autobiografias de trabalhadores ingleses com introduções adequadas e London Labour and the London Poor 4 vols originalmente 1861 62 de Henry Mayhew é uma reportagem de gênio sobre a maior das cidades ocidentais Labouring Men 1964 de E J Hobsbawm con tém alguns estudos relevantes Numerosos estudos valiosos para alguns países em particular especialmente a França permanecem infelizmente sem tradução inglesa Poderseia escolher Les Ouvriers en Greve 187190 vol 2 1974 de Michelle Perrot Les Mineurs de Carmaux 1971 de Rolande Trempé e Sozialer und kultureller Wandel in einem 337 ländlichen Industriegebiet 1965 de Rudolf Braun cuja importância é bem maior que a restrita base de pesquisa Suíça poderia sugerir O maciço Geschichte der lage der Arbeiter unter dem Kapitalismus 40 vols 196072 de J Kuczynski deve ser mencionado os vols 2 3 e 18 19 20 tratam sobre os trabalhadores alemães deste período Além das obras gerais já mencionadas a terra a agricultura e a sociedade agrária podem ser estudadas em Peasants and Peasant So cieties 1971 de T Shanin ed Lord and Peasant in Rússia 1961 de Jerome Blum Rural Rússia under the Old Regime 1932 de Geroid T Robinson English Landed Society in the 19th Century 1963 de F M L Thompson e The Farmers Last Frontier 1945 de F A Shannon Pa ra a questão muito debatida do último período da escravidão ver The World the Slaveholders made 1969 de Eugene G Genovese assim como Roll Jordan Roll the World the Slaves Made 1974 do mesmo autor e também Time on the Cross 2 vols 1974 de R W Fogel e S Engermann uma obra controvertida Para a menos conhecida econo mia do trabalho endividado Sugar without Slaves 1972 de Alan A damson La Terre de Zola combina acuidade e preconceito urbano con tra camponeses Para os camponeses desenraizados Immigralion as a Factor in American History 1959 de O Handlin ed The Strugglefor Mastery in Europe 18481918 1954 de A J P Taylor The European Powers and the German Question 1848 1871 de W E Mosse 1969 poderão servir para introduzir a história das relações internacionais A History of Milistarism 1938 de A Vagts The Rise of Rail Power in War and Conquest 1915de E A Pratt e Nineteenth Century Military Techniques de H Nickerson editado no Journal of World History IV 195758 para a história das guerras The FrancoPrussian War 1962 de Michael Howard é uma monografia exemplar Para as atitudes da época em torno das duas grandes alternativas em disputa os governos populares ou nacionais ver Physics and Po litics 1873 de Walter Bagehot e The British Constitution 1872 nu merosas edições A historiografia e discussão do nacionalismo não é satisfatória What is a Nation de Ernest Renan editado em Modern Political Doctrines de A Zimmern ed 1939 é um ponto de parti da O melhor livro é Die Vorkämpfer der Nationalen Bewegung bei den Kleinen Völkern Europas Praga 1968 de M Hroch ver tam bém a Commission Internationale dHistoire des Mouvements Soci aux et des Structures Sociales editado em Mouvements Nationaux dIndépendance et Classes Populaires aux 19th et 20th siécles vol I 1971 Sobre a extensão do voto na Inglaterra em 1867 Before the Socialists 1965 capítulos IIIIV de Royden Harrison para a Ale manha o artigo de G Mayer Die Trennung der proletarischen von der bürgelichen Demokratie in Deutschland 186370 editado no Grünbergs Archiv II 1911 páginas 167 Ver também as obras de J R Vincent T S Hamerow e T Zeldin The Political System of Na poleon III 1958 Para as revoluções do período The Revolution of 338 1854 in Spanish History 1966 de V G Kiernan The Federal Repu blic in Spain 186874 1962 de C A M Hennessy e entre à vasta li teratura sobre a Comuna de Paris incluindo a famosa obra de Marx A Guerra Civil na França o livro de J Rougerie Paris Libre 1871 1971 Political and Social Upheaval 183252 1969 de W L Lan ger e The 1848 Revolution 1974 de Peter Stearns podem introduzir os leitores nas grandes revoluções de nosso período sobre as quais Marx escreveu duas pequenas obras na época As Lutas de Classe na França e O Dezoito Brumário de Luís Bonaparte e Engels uma obra Revolução e ContraRevolução na Alemanha e A de Tocqueville algumas extraordinárias passagens em suas Memórias O maior de todos os combatentes da liberdade do período é o assunto de Garibal di 1974 de J Ridley e os revolucionários russos são revistos numa obra clássica de F Venturi Roots of Revolution 1960 From Wealth to Welfare The Evolution of Liberalism 1963 de H K Girvetz descreve os sentidos em constante mudança da ideolo gia burguesa dominante Virgin Land 1957 de Henry Nash Smith é um excelente guia para a ideologia do radicalismo que encontrou sua expressão mais pura nas fronteiras para isso ver também Free Soil Free Labor Free Men 1970 de Eric Foner The Origens of Socia lism 1969 de G Lichtheim é a melhor introdução a este assunto A History of Socialist Thought II Marxism and Anarchism 18501890 1954 de G D H Cole é ainda o mais accessível dos livros que tra tam sobre esta questão de forma geral Para uma crítica nãosocialista do capitalismo ver talvez a maior das obras contemporâneas Reflexi ons on World History 1945 de J Bufckhärdt A History of Econo mic Thought de E Roll é concisa e inteligente afastandose de edição em edição das posições radicais que o autor defendia a princípio Eu ropean Positivism in the 19th Century 1963 trata de uma corrente ideológica mais ou menos central em nosso período Karl Marx The Story ofHis Life1936 de Franz Mehring é preferível a outras intro duções à vida e obra de Marx pois Mehring procura refletir aquilo que Marx quis fazer entender para a sua geração imediata de discípu los e seguidores A History of the Warfare of Sciente and Theology 1896 de A D White é valiosa para consulta pelas mesmas razões Sobre o darwinismo Evolution and Society A Study in Victorian So cial Theory 1966 de J Burrow e a introdução deste mesmo autor à edição da Penguin de The Origin of Species 1968 Social Darwinism in American Thought 1955 de R Hofstadter e Physics and Politics 1873 de W Bagehot A History of European Thought in the 19th Century 4 vols 18961914 de J T Mertz permanece essencial para um estudo da ci ência do século XIX The Life of William Thompson 2 vols 1910 de S P Thompson trata de uma figura central Science and Industry in the 19th Century 1953 de J D Bernal é uma brilhante monografia Science and History do mesmo autor foi mencionada mais acima A Hundred Years of Chemistry 1948 é um tratamento conveniente de 339 uma ciência crucial Para as artes além das obras gerais mencionadas The Economics of Taste I e II 1961 1963 de G Reitlinger discute a natureza do mercado das artes The Absolute Bourgeois e Image of the People Í 1973 ambos de T J Clark discutem arte e revolução Realism 1971 de Linda Nochlin explicase pelo titulo ver também a obra desta autora The Invention of the AvantGarde France 1830 1880 editado em Art News Annual 34 assim como o livro de Gisèle Freund Photographie und bürgerliche Gesellschaft 1968 O artigo de Walter Benjamin Paris Capital of the 19th Century publicado em New Left Review 48 1968 é breve mas profundo Studies in Europe an Realism 1950 de George Lukács é a obra de um notável crítico da prosa e Main Currents in Nineteenth Century Literature 6 vols 190105 de Georg Brandes fornece uma visão quase que da época Aspects of Wagner 1972 de Bryan Magee defende um grande mas desagradável compositor Sobre a crise que conclui nosso período Grosse Depression und Bismarckzeit 1967 de Hans Rosenberg e Recent Economic Changes 1889 de David Wells Uma obra geral de interesse bastante considerável pode ser men cionada como conclusão Social Origins of Dictatorship and Demo cracy 1967 Penguin 1973 de Barrington Moore