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Teologia Ciência da Religião e Filosofia da Religião Definindo suas Relações Jörg Dierken Resumo Tratase de revisitar o complexo fenômeno da religião à luz das articulações e diferenciações entre teologia filosofia da religião e ciência da religião particularmente no contexto sociocultural da mo dernidade e suas categorias iluministas de racionalidade liberdade e ciência em grandes pensadores tais como Max Weber e Ernst Troeltsch Palavraschave Ciência Filosofia Modernidade Racionalidade Religião Teologia Abstract The essay revisits the complex phenomenon of religion in light of the articulations and differentiations between theology philosophy of religion and religious studies particularly within the social cultural context of modernity and the Enlightenment categories of rationality freedom and science in major thinkers such as Max Weber and Ernst Troeltsch Key Words Modernity Philosophy Rationality Religion Science Theology 1 Diferenciações Disciplinares na Modernidade O pensamento religioso a descrição analítica da religião e a reflexão conceitualcategorial sobre a religião são ativida des imemoriais Já a divisão segundo diferentes disciplinas da ocupação científica com a religião junto com suas respecti vas pretensões concorrentes entre si é um fenômeno da mo dernidade Remontam aos tempos do Antigo Testamento os Trad Prof Dr Luís H Dreher Prof do Departamento de Ciência da Religião da UFJF membro do Núcleo de Pesquisas de Filosofia da Religião Professor na Universidade de Hamburgo Alemanha 10 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Jörg Dierken intentos de compreender a própria fé diante de dissonâncias cognitivas e de justificar a práxis cúltica diante de questio namentos Num momento bastante inicial já se descrevia de forma detalhada a veneração de deuses estrangeiros mesmo se apenas com o objetivo de rejeitála em atitude polêmica E já o cristianismo antigo em seu contato com os mundos im pregnados pela cultura grega interpretou o novo simbolismo religioso transpondoo em formas filosóficas A história do dogma mostra inúmeras transições entre a teologia filosófica a descrição cúltica com fins práticos e a análise categorial dos conteúdos da piedade religiosa tendo este processo uma série de disputas como seu reverso Não obstante a diferenciação formal entre teologia filosofia da religião e ciência da religião teve lugar somente como consequência do Esclarecimento Aufklärung O termo filosofia da religião é usado de forma comprovada des de 17701 As filosofias da religião que a partir daí surgiram em célere sequência retomam a theologia naturalis mais antiga que em parte surgira como complementação em parte como correção crítica à teologia fundada na revelação bíblica For mas antecipadas da filosofia da religião remontam ao deísmo inglês e ao racionalismo francês Em termos de conteúdo o interesse da filosofia da religião nascente originouse em questões relativas à compatibilidade entre o conhecimento racional e a autoridade da revelação bem como naquelas relacionadas com o significado da religião para a condução moralprática da vida acrescentase a isso a partir da his tória imediatamente anterior todo o complexo de questões relativas à pacificação da comunidade social e política diante de antagonismos confessionais violentos Desafios de cunho gnosiológico moral e político desviaram o foco da atenção para a religião praticada pelo homem no aquém do Deus dos 1 Cf Walter JASECHKE Filosofia da Religião In Historisches Wörterbuch der Philosophie cols 748763 Os primeiros autores de filosofias da religião são A F RUCKERS FELDER Philosophie de religione naturali lib duo seu theologiae naturalis pars theoretica de Deo eiusque operibus et pars practica de hominis officio e este mais conhecido S VON STORCHENAU Die Philosophie der Religion 11 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Teologia Ciência da Religião e Filosofia da Religião Definindo suas Relações teólogos os quais na Europa moderna estavam divididos em campos confessionais inimigos A lógica e a validade de tal religião devia ser tematizada e demonstrada com vistas a exigências humanas plausíveis ligadas à interpretação e à condução da vida Ao mesmo tempo uma explicação racional da religião cristã deveria a partir de um interesse apologético clarear a imagem de um cristianismo envolvido em conflitos de poder com caráter confessional A ciência da religião desenvolveuse antes de se passa rem cem anos exatos ou seja na segunda metade do século XIX O senso históricofilológico e o acesso a mundos extra europeus possibilitado pela modernização do comércio e dos transportes levaram a um aumento vertiginoso de conheci mentos empíricos na história das religiões Também aqui é possível distinguir precursores Sobretudo as filosofias da re ligião do assimchamado idealismo alemão e do romantismo através dos impulsos que deram na área da filosofia da histó ria e de sua ênfase no elemento da positividade histórica fi zeram avançar questionamentos de ordem históricoreligiosa Acrescentamse a isso os ganhos metodológicos vinculados às competências filológicohermenêuticas mediadas por uma teologia cuja atenção se dirigia primordialmente a escrituras sagradas Não há dúvida de que desde o começo a ciência da religião compreendeuse como disciplina empírica Questões atinentes à verdade ou inverdade de conteúdos religiosos à compatibilidade da piedade religiosa com a moralidade ou às normas da vida em sociedade eram decididamente deixadas de fora Justamente nisso se achava o elemento especificamente novo e peculiar da ciência da religião por mais que seu sur gimento estivesse entrelaçado em termos históricoculturais com a descoberta da história da religião e com os debates filosóficoreligiosos acerca das possíveis razões validadoras Geltungsgründen da consciência religiosa Estes debates diziam respeito ao mesmo tempo aos conteúdos do cristianismo em relação com outras religiões às influências recíprocas entre 12 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Jörg Dierken religião e cultura e às possibilidades de um quadro categorial adequado para a sondagem dos fenômenos religiosos2 São evidentes as divergências e pretensões de mútua su peração entre as três disciplinas Em sua forma mais veemente elas se pronunciam entre a ciência da religião e a teologia e isso até os tempos mais atuais chegando mesmo a lutas divi sivas no contexto acadêmico e políticosocial Isso se aplica em todo o caso ao contexto de língua alemã no qual tanto a teologia como a ciência da religião se acham inseridas nas universidades A filosofia da religião é antes eclipsada por tais conflitos isso quando não prefere assumir uma distância aristocrática De qualquer modo ela pode ser encontrada no campo de ação tanto de faculdades de teologia como de filo sofia claro que em dimensões modestas Em vista disso nossa atenção irá dirigirse num primeiro momento às divergências e aos pontos de interseção entre ciência da religião e teologia antes que a filosofia da religião volte a ser de novo considera da no campo situado entre as duas primeiras 2 Divergências e Pontos de Interseção Faz parte das determinações fundamentais da ciência da religião o não ser teologia Algo semelhante aplicase na dire ção contrária Os laços de unidade na divergência são indica dos através de algumas palavraschave Entre estas contam na óptica da ciência da religião as seguintes a epoché quanto a convicções de verdade o uso de métodos empíricofenomêni cos a distância de instituições religiosas a visada comparativa de diferentes culturas religiosas com a concomitante absten ção de juízos de valor em suma a descrição neutra quanto à validade em perspectiva externa Os opostos específicos à teologia são os seguintes participação no ponto de vista interno à religião explicação de sua convicção de verdade e justificação diante de 2 Cf Hans G KIPPENBERG Die Entdeckung der Religionsgeschichte Religionswissenschaft und Moderne p 13ss Hans KIPPENBERG Kocku von STUCKRAD Einführung in die Religionswissenschaft p 24ss 13 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Teologia Ciência da Religião e Filosofia da Religião Definindo suas Relações interpelações avaliação normativa de fenômenos religiosos empí ricos e tarefas práticas de formação para membros do clero Ao lado destas linhas divisórias entre teologia e ciência da religião existem naturalmente também pontos ou áreas de interseção em parte subliminares em parte mesmo surpre endentes A ciência da religião baseada na observação beo bachtende Religionswissenschaft por exemplo não é uma forma de crítica da religião embora também possa parcialmente derivarse desta última3 Tampouco a teologia tem por via de regra o objetivo de superar a convicção de verdade religiosa Ela implica porém a crítica de pontos de vista religiosos e não só daqueles de outros4 Além disso foi justamente a teologia acadêmica que contribuiu de maneira decisiva para desenvolver métodos científicoreligiosos como a filologia crí tica e a história da religião Na medida em que a teologia em geral brota de uma necessidade de explicação de convicções de verdade religiosas a qual reage a interpelações e questio namentos alicerçados em demandas justificatórias também ela mantém relação com perspectivas externas A teologia preci sa integrar de algum modo as perspectivas resultantes dos campos de referência em que se constituem aqueles questio namentos Isso vale de maneira exemplar para os standards da ciência moderna Se a teologia quiser sobreviver nessa área ela não pode hoje em dia condescender com um doutrina rismo afastado da reflexão5 Já por essa razão ela cultiva à sua maneira métodos típicos da ciência da religião Além disso uma boa teologia deve ter a pretensão de expor de modo apropriado a religião por ela representada falo aqui 3 É por isso que Hubert Knoblauch fala referindose à sociologia da religião de um nascimento a partir do espírito da crítica da religião Hubert KNOBLAUCH Religionssoziologie p 20ss Algo semelhante se poderia dizer de outras disciplinas científicoreligiosas por exemplo a psicologia da religião 4 No horizonte da teologia situase também a ambiciosa tarefa filosóficoreligiosa de uma crítica da religião enquanto crítica da razão na religião 5 Isso aplicase com a correspondente modificação temática também a outras épocas Se a teologia se recusa a incluir um momento de convencimento ela dificilmente poderá contar com efeitos de longo prazo o mesmo vale para as instituições religiosas 14 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Jörg Dierken pela teologia cristã também a nãocrentes ou a crentes de outras persuasões por mais que ela objetive o fortalecimento da formação de juízo em interesse próprio A teologia avalia questões normativas dadas empiricamente com o surgimento da religião por meio da sondagem crítica de suas razões vali dadoras Mesmo que como a ciência da religião ela descreva fenômenos religiosos para os outros ela o faz por meio de uma explicação da lógica interna destes fenômenos Áreas adicionais de referência mútua das disciplinas dei xam aparecer com mais clareza pontos de interseção e linhas demarcatórias A expansão do cristianismo devido à globaliza ção decorrente da história colonial evocou no contexto da teo logia da missão um interesse por culturas religiosas nãocristãs6 claro que de muitas formas por causa do interesse de uma certificação do cristianismo nas coordenadas entre a neces sidade de inculturação em novos mundos e de delimitação diante de seus ambientes religiosos Por essa razão a ciência da religião estabeleceuse com frequência também dentro da teologia Um processo inverso também ocorreu na medida em que por meio de sua percepção de outras religiões alguns cientistas da religião com formação teológica romperam com a teologia A ocupação científica com a religião não deveria desembocar justamente em profissões em sentido amplo vinculadas ao elemento confessional mas postarse de manei ra neutra diante da práxis cúltica Acrescentese a isso o fato de que sob as condições da secularização as universidades são mantidas por um Estado neutro do ponto de vista das visões de mundo Somente por meio de uma separação semelhante à de coxos que se ajudam na caminhada ou dependendo da perspectiva com base numa percepção integral das tare fas educacionais de uma nação civilizada é que a teologia está integrada nas universidades estatais com incumbências equilibradas num equilíbrio que de fato desce aos mínimos 6 Isso aconteceu porém e na maioria das vezes com um atraso considerável Cf Christoph OCHINGER Wahrnehmung von Fremdheit Zur Verhältnisbestimmung zwischen Religionswissenschaft und Theologie p 5777 esp p 59ss Andreas FELD KELLER Religionswissenschaft innerhalb und außerhalb der Theologie p 7996 15 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Teologia Ciência da Religião e Filosofia da Religião Definindo suas Relações detalhes entre o Estado e as comunidades religiosas Refiro me aqui à situação na Alemanha especialmente no âmbito da cultura anglosaxã há outras tradições Na Alemanha a liberdade de religião numa forma positiva é um direito fun damental o Estado contribui para o exercício deste direito na medida em que se encarrega em suas instituições de uma formação academicamente justificável wissenschaftlich veran twortbar em questões de religião Isso não diz apenas respeito às universidades nas quais membros do clero e professores de religião devem entrar em contato com um pensamento cientí fico esclarecido mas de forma análoga diz também respeito ao ensino religioso em escolas estatais A posição da religião em instituições do Estado suscita inúmeras perguntas no interior das práticas atuais Responder estas perguntas exige dependendo da respectiva função e das respectivas ópticas competências científicoreligiosas ou teoló gicas inclusive com várias sobreposições entre ambas É assim que por exemplo os juristas apelam à competência dos cien tistas da religião a fim de diferenciar pretensões legítimas em termos de direito religioso de outras possivelmente ilegítimas casos como os de membros do Islã que pleiteiam a dispensa de seus filhos da aula coletiva de natação ou da cientologia que almeja privilégios eclesiásticos no sistema de direito tribu tário Simultaneamente dáse o caso de que numa ordem po lítica liberal é justamente a autocompreensão teologicamente articulada das comunidades religiosas que decide acerca de questões de fato religiosas ao passo que o Estado é justamen te quem não o faz nem deve Por isso no caso do ensino re ligioso são determinantes ao lado das diretrizes pedagógicas os princípios das comunidades religiosas Desde a reunificação alemã e a presença de maiores porções da população sem vínculos eclesiais presenciamse tentativas de introduzir uma forma neutra de estudo da religião7 As igrejas resistiram a 7 Religion Ethik und Lebenskunde LER Brandenburg Por trás destes esforços se acham por um lado interesses da crítica da religião representada por antigas elites da atualmente inexistente República Democrática Alemã Por outro tais interesses têm como pano de fundo a dissolução de ambientes religiosos homogêneos 16 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Jörg Dierken elas com estridência Mas também a escalação do pluralismo provocou discussões sobre o tema estudo da religião ao in vés de ensino religioso Até mesmo nos ambientes em que se articula a pedagogia religiosa de confissões estabelecidas intensificase o interesse por outras culturas religiosas Nesse caso porém domina antes o esforço por encontros afetuosos com vistas à boa convivência os contornos das dissensões reli giosas tornamse facilmente indistintos sob a luz suave de um zelo indulgente pela cultura Se mesmo assim surgem conflitos religiosos mais duros buscase compreender com certo transtorno o que uma opi nião pública liberal mal e mal poderia crer Também com isso lucram as ciências da religião Depois do Onze de Setembro as disciplinas até então obscuras da islamologia se acharam sob as luzes da ribalta Mas a islamologia Islamwissenschaft nem pode nem quer fazer aquilo que com frequência se exige para a integração da enorme quantidade de muçulmanos nas socie dades ocidentais e para o desmonte das linhas de confrontação entre civilizações a saber uma teologia islâmica que assuma exigências de modernização a partir de dentro Esperase de um EuroIslã por exemplo que sua teologia chegue a integrar métodos científicoreligiosos clássicos particularmente a crí tica histórica Neste exemplo estão tacitamente presentes os contornos de um modelo de teologia modernocristão mais ainda protestante como se pode deduzir no que tange a uma diferenciação entre religião e direito fé e política consciência e violência De modo inverso para se poder chegar a captar o elemento incompreensível da violência religiosa reivindicam se figuras religiosoteológicas tais como incumbência incon dicionalmente compromissiva anulação das fronteiras entre a vida e a morte e entre o indivíduo e o grupo E apesar do uso de tais figuras querse ainda pensar que a influência de pesquisadores do Islã sobre a vida religiosa muçulmana pode ria continuar limitada É de se supor que os cientistas do Islã vão buscar seu salário e seu pão junto à polícia e aos serviços secretos e não em escolas corânicas 17 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Teologia Ciência da Religião e Filosofia da Religião Definindo suas Relações As sobreposições de que falávamos deixaram suas marcas e pistas em ambas as disciplinas Dificilmente um teólogo sério irá assumir ainda hoje sem algum desas sossego a velha distinção entre a própria religio vera e as religiones falsae dos de fora O famoso dito de Adolf von Harnack Quem não conhece esta religião scil a cristã não conhece nenhuma e quem a conhece junto com sua história conhece a todas8 só é citado agora com um sen timento de vergonha A posição oposta do cientista da re ligião Max Müller Quem conhece apenas uma religião não conhece nenhuma tem bem mais crédito Ela pode ser inteligentemente ligada ao ponto de vista de Harnack sempre que a plausibilidade do que é próprio ao cristia nismo for testada na mensuração exaustiva de alternativas religiosas9 das quais segundo Ernst Troeltsch se tem um número limitado de tipos10 O autoconhecimento à luz da alteridade praticado indiretamente via o que é estranho e articulado com honestidade intelectual enquanto ponto de vista próprio diante de outros possíveis a isso poderia assemelharse hoje em dia um tratamento teológico refle tido das pretensões de verdade do cristianismo não sendo estas mesmas pretensões passíveis de anulação As chances comunicativas de uma tal exposição do próprio ponto de vista são incrementadas por uma descrição levada a efeito pelas ciências da cultura da práxis religiosa empírica Também a paisagem científicoreligiosa passa por trans formações Pertence ao saber introdutório desta disciplina a constatação de que também na pesquisa neutra feita de fora devese levar em conta o ponto de vista interno sem pre ligado à religião dos participantes11 Percebese também a 8 Adolf von HARNACK Die Aufgabe der theologischen Fakultäten p 161189 aqui p 168 9 Em termos sistemáticos esta mensuração corresponde ao passeio pela história tão propagandeado pelo historiador Harnack 10 Cf Ernst TROELTSCH Die Selbständigkeit der Religion p 167 218 aqui p 216s 11 Fritz STOLZ Grundzüge der Religionswissenschaft p 35ss Quanto a este problema cf MCCUTCHEON Russell Ed The Insider Outsider Problem in the Study of Religion 18 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Jörg Dierken medida nada desprezível com que mesmo conceitos científico religiosos pertinentes a religiões particulares de uma esfera cultural nãocristã como por exemplo a do Islã acabam sendo presididos pela óptica dos conflitos religiosos e confes sionais euroamericanos As próprias ciências da religião refle tem além disso as implicações normativas de suas descrições ainda que seja apenas a implicação de que também a epoché em questões normativas não deixa de ser uma posição nor mativa De mais a mais pertence ao saber básico da disciplina científicoreligiosa uma sensibilidade diante do caráter pro blemático de todos os intentos de qualificar fatos como reli giosos A categoria do Sagrado sob cujo signo a fenomeno logia comparativa da religião buscava chegar à essência da religião nisso levando a cabo realizações filológicas notáveis achase agora em segundo plano Tomase agora distância de definições fixas de religião dada sua profusão falta de rigor e relatividade quanto ao ponto de vista A religião tende antes a ser parafraseada meio às apalpadelas por exemplo enquanto um modo de orientação12 Na observação de cultos e ritos de outras esferas culturais colocase em questão a proveni ência do conceito de religião a partir do ambiente de um Ocidente que leva em si as marcas do cristianismo A religião é descrita como parte da cultura em seus artefatos siste mas de comunicação simbólica e formas sociais13 Perspectivas advindas das ciências culturais e especialmente da sociologia forçam sua passagem e avançam14 A religião é acomodada à tensa história cultural da modernidade15 O foco dirigese ao sentido subjetivo em seu significado para a condução de 12 Cf Jacques WAARDENBURG Religionen und Religion Systematische Einführung in die Religi onswissenschaft p 34ss 13 Cf Burkhard GLADIGOW Religionswissenschaft als Kulturwissenschaft p 2439 14 Cp Hans KIPPENBERG Kocku von STUCKRAD Op Cit Alternativas irrefletidas entre uma ciência da religião filológica e outra socialcientífica ou entre uma histór ica e outra orientada pela situação presente são o objeto da crítica de Volkhard KRECH Wohin mit der Religionswissenschaft Zeitschrift für Religions und Geistesge schichte p 97113 aqui p 103 15 Cf Hans KIPPENBER Die Entdeckung der Religionsgeschichte 19 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Teologia Ciência da Religião e Filosofia da Religião Definindo suas Relações vida nos contextos sociais16 Isso é o que deixam transluzir as coordenadas categoriais ou categorialidade die Kategorialität do clássico da ciência da religião Max Weber por mais que a ciência da religião tenha começado suas atividades justamente enquanto teoria históricoempírica Em termos sistemáticos com a rubrica categorialidade desenhase o círculo que engloba a filosofia da religião pois a reflexão acerca de categorias faz parte das competências decisivas da filosofia A filosofia da religião reclama este direito com vistas à sua esfera de aplicação Na mensuração filosófica do campo da religião apresentamse em termos históricos e siste máticos os mais diferentes conceitos norteadores17 Na tradi ção kantiana a religião alcança sua determinação na linha de fuga da moral Já o idealismo e o romantismo deixamse con duzir pelos paradigmas da subjetividade e da consciência em parte por meio de uma vinculação com questões da filosofia da história como em Hegel em parte pela acentuação de uma psicologia das faculdades como ocorre na compreensão do sentimento em Schleiermacher A religião pode ser criticada como incompatível com a vida humana fundada racionalmen te eis aí uma tendência fundamental da crítica da religião de Feuerbach e Marx que se estende até Nietzsche Mas a contestação de validade também é reflexão categorial sobre estruturas de validade No século XX passam ao primeiro pla no conceitos como valor e sentido enquanto paradigmas para 16 Cf quanto a este ponto as diferentes perspectivas Hans KIPPENBERG Kocku von Stuckrad op cit esp p 14 Hartmann TYRELL Volkhard KRECH Huber KNOBLAUCH Religion als Kommunikation Hubert KNOBLAUCH Qualitative Reli gionsforschung Religionsethnographie in der eigenen Gesellschaft 17 O cruzamento entre linhas de desenvolvimento histórico e a presença atual de diferentes posições respectivamente dos tipos que as sucederam a partir daquela história em seu longo desdobramento provém em parte também do fato de que a pesquisa filosóficoreligiosa deixase frequentemente acompanhar da certificação histórica de posições fundamentais Com vistas à época atual é possível constatar um novo interesse pela filosofia da religião Por um lado este interesse vem de mãos dadas com o achado da persistência da religião contra as expectativas da crítica da religião e por outro com a possibilidade de uma ocupação intelectual com a re ligião independentemente da alternativa por tanto tempo predominante de uma contestação polêmica ou de uma afirmação apologética 20 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Jörg Dierken a reflexão sobre a religião sempre referidos à vida humana situada entre a existência individual e a cultura social A axio logia neokantiana a sondagem de horizonte fenomenológica e as análises existenciais de sentido imprimem assim como teorias antropológicas da cultura sua marca sobre o pensa mento filosóficoreligioso Ao passo que estas dito cum grano salis variantes hermenêuticas da filosofia da religião por via de re gra indicam nalgum ponto transições da reflexão metódico categorial sobre a religião para momentos da própria religião tal gesto fica na tradição analítica da filosofia da religião pratica mente imperceptível ao menos quando considerada a partir de seus inícios no positivismo lógico Nesta tradição o foco recai numa descrição críticodistanciada sobre a linguagem e a forma de representação religiosas Consideramse a clareza da forma linguística a coerência dos conteúdos a comunica bilidade funcional para os participantes sob condições defini das Comum às mais diversas tradições filosóficoreligiosas é uma distância diante de teologias eclesiaisconfessionais e suas referências práticas ao culto esta distância colocase como condição de uma análise categorial imparcial que implica a inclusão de um amplo espectro de fenômenos o qual abrange tanto as mais diversas formas de religião como também as in terdependências com esferas da cultura próximas ao religioso tais como a estética e a ciência mas também a política e o di reito É com base nessa distância fundamental e de princípio porém que se acham as diferenças metodológicas realmente marcantes entre um procedimento antes críticodescritivo e aquele procedimento de filosofias da religião que completamente se en volve em questões religiosas de natureza última Com isso parece ressurgir obviamente com algumas refrações a mesma constelação fundamental que se tornou visível na relação entre teologia e ciência da religião Ela se mostra concentrada de forma exemplar na filosofia da religião de Hegel do ano de 1824 a qual principia com uma observação empírica da religião para depois constatar que também a análise categorial da religião seria em última 21 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Teologia Ciência da Religião e Filosofia da Religião Definindo suas Relações análise apenas para os que são religiosos18 As posições de crítica à religião provenientes da escola hegeliana apresen tam inversões correspondentes a este movimento Por outro lado é possível fazer remissão ao desenvolvimento pelo qual passou Wittgenstein desde sua postura de defensor do ideal de sentenças protocolares até àquela de analista de jogos de linguagem religiosos em sua função para os participantes19 Assim como a tradição de análise da linguagem também o pragmatismo conhece um ceticismo diante dos conteúdos teóricos de verdade da religião ao passo que o significado da religião para a prática de vida de seus adeptos tornase em nível categorial em critério de juízo20 É manifesto que tampouco a reflexão filosóficoreligiosa sobre categorias e questões pertinentes à validade da religião está de posse de um acesso privilegiado a seu tema Embora possam ser decompostas em elementos diferenciais mais sutis mostramse na reflexão filosóficoreligiosa com certos deslo camentos tensões e sobreposições similares às notadas entre teologia e ciência da religião É por isso que as disciplinas assim reza minha primeira tese não se deixam delimitar com grande exatidão nem fixarse numa ordenação rigída Elas se referem mutuamente ao modo de uma dialética de fron teiras Isso devese esta minha segunda tese ao seu tema a religião Esta circunstância porém almeja ser objeto de consideração e de uma apreensão cabal em nível metódico categorial Nisso residem e esta é minha terceira tese a função e a capacidade particulares da filosofia da religião Ela situase no horizonte de uma dialética de fronteiras implícita entre teologia e ciência da religião ela eleva esta dialética de forma clara à consciência sem porém poder postarse num ponto de vista superior a tal dialética 18 Cf Georg Wilhelm Friedrich HEGEL Vorlesungen über die Philosophie der Religion parte 1 Einleitung Der Begriff der Religionp 166ss esp 217 19 Cf Ludwig WITTGENSTEIN Tractatus logicophilosophicus Philosophische Unter suchungen In Werkausgabe 20 Cf William JAMES Die Vielfalt der religiösen Erfahrung Eine Studie über die mensch liche Natur 22 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Jörg Dierken A fim de justificar esta tese voltarmeei a seguir à obra de Max Weber enquanto autor clássico da ciência da religião Num segundo momento e no que tange à perspecti va teológica recorrerei particularmenre a Ernst Troeltsch À guisa de conclusão juntarei num feixe comum algumas con sequências para o conceito de religião das ultrapassagens de fronteira por mim expostas com o que será possível iluminar os contornos de um pensamento filosóficoreligioso em sua efetiva execução 3 Observações sobre a Lógica da Ocupação Científica com a Religião o Exemplo de Max Weber A sociologia da religião de Max Weber descreve a reli gião indiretamente como que por desvios A religião é apre ensível como incentivo através de ações de cunho prático ela imprime sua marca sobre o modo de vida do indivíduo e dá forma ao desenvolvimento de comunidades A religião escapa a um acesso direto e mostrase sempre em com e sob formações socioculturais Isso também se aplica à sua realização mais im portante a constituição de formas racionais de pensamento e ação mediante a elaboração de interpretações de mundo que permitem a condução e orientação da vida Estas interpretações do mundo surgem através da instituição do sentido subjetivo Este processo uma vez que não tem um ponto de apoio na naturalidade do mundo acontece de modo espontâneo contingente imediato e nessa mesma medida irracional21 A função de racionalização da religião enquanto sentido é irra cional mas não obstante uma exigência da vida vivida nas formas daquilo que é subjetivo Na medida em que a sociolo gia da religião descreve isso ela toca a fronteira daquilo que lhe é acessível racionalmente A sociologia está em condições de indicar de que modo o sentido e a racionalização funcionam ou operam e que eles do ponto de vista da história da cultura 21 Cf Max WEBER Die Wirtschaftsethik der Weltreligionen In Gesammelte Aufsätze zur Religionssoziologie p 566 23 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Teologia Ciência da Religião e Filosofia da Religião Definindo suas Relações são a uma só vez contingentes e inevitáveis Ela porém não está de posse de um acesso imediato a isso Sua ratio reside na descrição indireta da capacidade racionalizadora do sentido religioso subjetivo Mas com isso ela deixa faticamente em aberto um lugar para a teologia enquanto racionalização mais direta do sentido religioso Tal afirmação pode causar surpresa diante do juízo de Weber acerca da teologia Ciência e teologia compreendi da como caminho para Deus se excluem mutuamente Isso não decorre apenas do desencantamento do mundo22 específico para toda e qualquer ciência mas também da ul trapassabilidade permanente de todos os conhecimentos A ciência não institui sentido algum antes pelo contrário ela o examina e justamente desse modo o aniquila A ciência é um processo enfermiço permanente tanto dos atores com sua paixão dedicada à causa e ao objeto científicos como dos ideais de divindade ligados a todas as formas de sentido e de vida ideais aos quais outros ideais declaram guerra A ci ência somente pode descrever esta luta de deuses por formas de sentido e valores e precisa contentarse com compreender o que é o divino numa ou noutra ordem e contudo ela não é capaz de influenciar o destino o qual permanece supremo na luta dos deuses23 Nem mesmo a pressuposição de toda ciência a saber o juízo de valor interpretativo acerca daquilo que é digno de ser sabido bem como a tomada de posição diante da vida nele implicada podem ser objeto de decisão por meios científicos24 Com isso justamente a ciência que visa ao sentido acaba evocando um problema de vida25 Para Weber este hiato entre ciência e vida entre a institui ção de sentido e a pressão por sua falsificação somente pode ser suportado por meio de uma serenidade heroica Com isso 22Max WEBER Wissenschaft als Beruf In Gesammelte Aufsätze zur Wissenschaftslehre p 594 23Ibid p 604 24Ibid p 599 25Ibid p 604 24 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Jörg Dierken no entanto a ciência implica uma racionalidade contrafática de descoberta de sentido por meio do obscurecimento do sentido Com este paradoxo revelase um limite tangível da ciência Esta última está ciente da luta dos deuses que se le vantam de seus túmulos ela mesma contudo somente pode recomendar uma dietética ascética no trato com as expectati vas de sentido Ela conhece a função das interpretações Deu tungen e constituições de sentido fundadas na esfera subjetiva não disponibiliza porém ela mesma um lugar para o querer e o decidir sobre deuses e valores ínsito ao parasi querer que desde sempre já é forçosamente imposto ao eu enquanto participante da vida descoberta através de formas subjetivas de sentido Isso é o que cada eu respectivo deve fazer por si embora absolutamente nenhum deles tenha ele mesmo o modo de dispor sobre tal querer e decidir A ciência pode no máximo descrever em que medida o querer deve ser querido ou ser objeto da vontade Mas querer é algo que todo e qual quer um precisa ele próprio querer de modo semelhante a como juízos de valor e interpretações de sentido precisam ser realizados autonomamente Uma tal performance autônoma Selbstvollzug na descoberta de sentido faz parte da irracionalidade racional da religião Interpretações de sentido que capacitam à orientação da vida e cuja elaboração é evocada pelo pró prio ato de viver a vida correspondem à salvação religiosa A teologia é apenas uma racionalização intelectual de sua propriedade26 Ela não pode produzir esta posse no máximo cultivála para habitação É isso justamente que vem a ser uma descoberta científico religiosa acerca da teologia diante da irracionalidade racional da religião Com esta descoberta porém a ciência da religião não se transforma em teologia por mais que ela permaneça referida a uma teologia que por sua parte dela se diferencia e viceversa27 Tal dinâmica fica clara de forma exemplar a partir da in terpretação weberiana das representações religiosas de salvação 26 Ibid p 610 27 Podese dizer que a determinação desta relação é de caráter filosóficoreligioso 25 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Teologia Ciência da Religião e Filosofia da Religião Definindo suas Relações e redenção A religião ajustada como é ao aumento e ex pansão da vida e que especialmente em suas formas mágicas coloca toda a esfera do sobrenatural a serviço de finalidades mundanas permite reconhecer como um tipo fundamental de salvação a autodivinização28 Desta faz parte não só o in cremento ativo do poder das ações através da coligação com forças superiores mas também uma participação no Absoluto vivenciada de modo antes passivo a qual dissipa a debilitação causada pelo envolvimento em lutas intramundanas Também esta finalidade salvífica que chega ao limiar do ocaso ou de gradação do eu serve ao prolongamento do interesse de au toconservação Diante de tais tipos mágicos e místicos de sal vação surge como algo mais intrincado o desenho salvífico de uma doação graciosa da parte de um deus inapreensível situ ado além do mundo o qual espera com sucesso obter atenção para si inclusive na contramão de interesses utilitários imedia tos Esta é a forma fundamental que conduz ao racionalismo ocidental A irracionalidade deste deus arbitrário enquanto pressuposto da atuação paradoxal sobre o aquém achase no limite daquilo que é diretamente compreensível Também nes se caso a sociologia da religião de Weber recorre a uma lógica complexa Ela procede como que sub contrario a saber por meio do tema da teodiceia como elemento negativo diante das ideias de salvação Nesta lógica o lado irracional da religião tornase tão apreensível que a partir dele vem a foco a eficá cia racionalizadora da religião Esse processo é documentado pela interpretação weberiana do protestantismo ascético e sua humanidade da vocação A irracionalidade da suposição de um deus ultramundano diferente do mundo e que por conta do aumento do absolutismo de uma graça irresponsabilizável desde sempre já predeterminou duplamente quem entra no gozo da salvação e quem não somente se torna compreensível em termos da história cultural quando logicamente referida a um esforço inseguro com vistas à unidade de sentido 28 Cf Max WEBER Wirtschaft und Gesellschaft p 325 e 245 26 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Jörg Dierken Este esforço é em geral característico para a religião Ele se acha no tipo ocidentalprofético da interpretação to tal do mundo servindo a interesse de uma postura homo geneamente dotada de sentido diante da vida com vistas a uma orientação de vida correspondente mas também se encontra no tipo oriental de uma religiosidade aristocrática dos intelectuais a qual segue uma inclinação interna para a unidade entendida como concordância do mundo ideati vo Gedankenwelt consigo mesmo29 Ambos os tipos fomentam a percepção de diferenças duras como seu reverso Noutras palavras quanto mais forte a unidade tanto mais avultado se revela aquilo que não se ajusta as decepções diante de expectativas de sucesso metodicamente incrementadas e com isso o sofrimento mas também os desvios percebidos como maus do bem que com evidência interna sempre concorda consigo mesmo Este reverso negativo conduz ao problema da teodiceia30 Ele carece de uma integração na economia de sentido Disso encarregamse com seus contornos sempre ru dimentares os planos de salvação e redenção Dentre estes podemse contar a estratégia oriental a rigor livre de estra tégia da dissipação de expectativas e da entrada numa uni dade universal AllEinheit com uma simultânea estabilização de papéis mas também o modelo ocidental do monoteísmo ético que eleva a lida com aquilo que contradiz o sentido a uma tarefa duradoura no aquém entendido como o ladode cá de um deus empurrado para o além ao modo de uma imagem oposta ao mundo A ascese presta seus serviços a esta tarefa também aquela de tipo intramundanoativo como que numa provocação a todo incremento ingênuo de poder religioso Sua atenção a parâmetros indiretos de status salvífico no aquém do mundo escolada como é na irracionalidade do Deus ultramundano não se torna incentivo para uma simples divinização mas pelo contrário para a condução racional da vida no aquém através de uma operosidade pronta a sofrer 29 Ibid p 275 304 e 308 30 Ibid p 314ss 27 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Teologia Ciência da Religião e Filosofia da Religião Definindo suas Relações privações31 A interpretação weberiana do protestantismo ex plicita com um grau máximo de sutileza esta lógica desde o ponto de vista de uma história da cultura32 O nexo descrito nos termos de uma sociologia da reli gião entre religião e orientação de vida acusa várias oposições Nelas está posta uma dialética de fronteiras frente à teologia do lado oposto por assim dizer de uma fronteira bem pouco demarcada Somente tornase um homem de vocação ascético aquele no qual uma carência de certeza salvífica entra em fricção nervosa com a radicalização nos termos de uma teologia da graça do soberano ultramundano em um poder irresponsabilizável de determinação sobre salvos e condena dos E no entanto o discernimento da função da praedestinatio gemina dificilmente fará com que o sociólogo da religião se converta num calvinista De mais a mais em sua condição de geneticista da modernidade o sociólogo já chega tarde demais Também a Coruja de Minerva sociológicoreligiosa começa seu voo ao entardecer E não obstante permanece a problemática da racionalização diante da confrontação com o irracional esta sombra da racionalidade O impulso de ra cionalização não é racional e ele está preso à subjetividade da forma de sentido33 Disso depende também a racionalidade 31 Ibid p 331s 32 Porém com aquela ascese que tem implicações para o protestantismo reage de algum modo sobre Deus dependendo da situação e através da relação com seu instrumento o outro lado de Deus que vai em direção contrária à sua vontade eticamente homogênea em casos extremos reage ao ponto de se chegar a um lado divino abscôndito e condenador intransparente mesmo para Deus Esta irrupção de diferenças internas justamente em concepções de Deus marcadas pela unidade de um Deus apreendido eticamente deixase notar ainda mais à frente como no caso de Weber Há que perguntar com Weber porém de que maneira as possibilidades de integração da perda de sentido dentro de uma prática de vida dotada de senti do possibilidades estas adquiridas através de um hiato na ideia de Deus e que são acompanhadas por esforços contrafáticos de liberdade sedimentamse no agir 33 Com a subjetividade vinculase também o tema da individualidade Isso porque o sentido sempre é sentido para alguém e sentido implica simultaneamente o avanço na direção de uma contextualização e instituição de unidade cada vez maior O sentido se abre a mais sentido e no entanto somente é sentido para alguém Este alguém tam pouco é um outro por menos que um parasi ein Fürsich possa ser somente para si e por mais que ele se transcenda imanentemente enquanto contextualidade de sentido 28 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Jörg Dierken sociológica Por isso mesmo a sociologia da religião mantém livre um lugar para a teologia pelo menos temporariamente Mas justamente por isso uma teologia inteligente não pode esforçarse por ocupar o lugar da primeira O mesmo poderia também valer em sentido contrário 4 Ernst Troeltsch e a Institucionalização de uma Dialética Marcada por Tensões A teologia e a ciência da religião não servem uma para a outra de substitutas mas elas tampouco se complementam de modo meramente exterior Ambas têm em sua lógica pró pria um termo que mantém aberto o lugar para aquilo que se situa do outro lado É justamente por isso que fórmulas como teologia ou ciência da religião mas também teologia como ciência da religião são desacertadas por mais que possam ser postas na mesa em nível político ou jornalístico Faz mais sen tido uma relação sensata que respeite a dialética cheia de tensões entre ambas as disciplinas e suas lógicas e que estabeleça aquela dialética de modo duradouro no discurso Somente desta forma permanece vivo o desafio de esclarecer com o olhar voltado para o outro pontos cegos no próprio campo de visão34 Para a ciência da religião isso significa assumir em seu horizonte a passagem à dimensão da performance subjetiva da vivência e inter pretação marcadas pelo sentido sem contudo desistir da descri ção analítica Pretensões de normatividade de caráter religioso assim como impulsos religiosos à ação são fatos empíricos eles precisam ser descritos empiricamente mas também carecem de ajuizamento ou avaliação normativa Com isso a ocupação científi ca com a religião se entrelaça e se envolve com uma dimensão elementar de seu tema Não por acaso foi justamente o teólogo versado em sociologia da religião Ernst Troeltsch que mostrou seus limites àquela pesquisa sobre a religião que julga poder 34 Isso acontece para ficarmos com esta imagem na medida em que o ângulo visual desse olhar passa por um cruzamento com a própria perspectiva conduzindo a um deslocamento de perspectivas por meio de uma ampliação da perspectiva 29 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Teologia Ciência da Religião e Filosofia da Religião Definindo suas Relações passar sem uma tomada de posição religiosa35 E não obstan te a pesquisa sobre a religião com simultânea tomada de posição religiosa convertese em teologia Porém a fim de que permaneça pesquisa e não seja apenas tomada de posição religiosa sem prestar contas diante de um fórum que urge a intersubjetividade e a objetivação a teologia precisa por seu lado de competência científicoreligiosa Juízos religiosos deveriam darse a todo custo de forma refletida e para isso é imprescindível uma distância momentânea diante da própria performance religiosa Religionsvollzug Em seu aspecto acadê mico tal distância é evocada através da ciência da religião À medida em que a teologia se abre para as questões e os méto dos da ciência da religião ela contribui para um autodistancia mento reflexivo diante do acontecimento religioso em relação ao qual ela na forma de um ajuizamento que toma posição permanece referida Não sem razão Paul Tillich cunhou a fór mula da teologia como ciência normativa da religião36 É claro que esta fórmula não pode ser excessivamente estendida de ser assim ficaria comprometida com a diferença das disciplinas também sua tensão dialética Neste sentido uma teologia com abertura para a ciência da religião é uma forma de esclarecimento prático da religião mediatizado pelo aguçamento da capacidade de julgar A abertura diante de métodos científicoreligiosos caracteriza o desenvolvimento da teologia desde o iluminismo sem dúvida por meio de muitas linhas ziguezagueantes Mas ao passo que os métodos históricofilológicos foram firmemente estabelecidos persiste ainda desde um ponto de vista da ciência da cultura uma demanda a ser atendida 35 Ernst TROELTSCH Die Trennung von Staat und Kirche der staatliche Religionsunterricht und die theologischen Fakultäten p 40 36 Cf Paul TILLICH Über die Idee einer Theologie der Kultur In Gesammelte Werke p 1331 aqui p 14 desde a perspectiva da ciência da religião Joachim Wach con sidera indispensável uma dimensão normativa na compreensão da religião Muito embora este ancestral da tradição da ciência comparada da religião de Chicago compreenda a religião sob a égide de experiências existencialmente significativas da realidade última a qual formalmente corresponde com uma ênfase conteudista na espontaneidade criativa ao Sagrado de Rudolf Otto não deixa de ser o caso que a crítica permanente de todas as formas finitas de manifestação desta realidade faz recordar de Tillich Cf Joachim WACH Vergleichende Religionsforschung p 53ss 30 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Jörg Dierken Se é certo que com a tomada de posição entra no ho rizonte acadêmico a perfomance prática da religião enquanto fenômeno da vida devese simultaneamente perguntar pela di mensão prática de vida das duas disciplinas que se ocupam com a religião Com isso passa a entrar em consideração sua fun ção institucional no contexto da ciência e no arcabouço de instituições da sociedade Neste contexto ambas as disciplinas têm em comum o traço de que de fato tematizam a religião mas não a produzem Por isso sua sensibilidade profissional à religião possibilita uma função crítica na universitas litterarum Tal função crítica garante que a ciência não sofra uma mu tação tornandose religião ou algo parecido Rejeições ideo lógicas que contêm elas próprias religião encontramse em grandes quantidades na ciência não só nos períodos em que predominam uma visão do homem ou uma compreensão do Estado de caráter totalitário Na Alemanha as experiências da época do nacionalsocialismo falam a este respeito com uma linguagem assaz clara De mais a mais a ciência precisa lidar com sua enfermidade de longa duração aquela surgida da superação permanente de seus conhecimentos Mesmo com todo o ímpeto sempre necessário ao pesquisador ela não pode querer abastecer acriticamente com seu combus tível a decolagem para espaços visionários por exemplo aquele da ligação de homem e máquina sem deixarse melancolizar por reservas e assumir a consequente atitude de fincar os pés no chão do aqui e agora Nesse ponto desdo bramentos mais recentes por exemplo aqueles decorrentes da vinculação de medicina e técnica da informação deixam com os ouvidos atentos quem esteja familiarizado com as questões da conditio humana e de seus pontos de profundidade abissal Tanto a teologia como a ciência da religião possuem no mundo acadêmico a função de um regulador crítico Ao mesmo tempo as duas servem numa situação ideal de corretivo mútuo Isso diz respeito a modos de tratar a religião nos quais as próprias disciplinas se transformam assumindo o papel de produtoras de religião Na ciência da religião isso 31 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Teologia Ciência da Religião e Filosofia da Religião Definindo suas Relações se revela por exemplo nos intentos já mais antigos de fun dar novas religiões sobre uma base naturalista37 A ciência da religião também pode converterse em culto do espírito do tempo Zeitgeist por exemplo no recente boom que liga a pes quisa feminista das bruxas com ensaios práticos de rituais38 Algo de semelhante aplicase à teologia Ela pode elevar a se mântica da autoridade do teísmo mais antigo a um sucedâneo cosmovisivo pode degenerar em lírica do amor no âmbito das coisas divinas mas também evitar o problema do simbolismo patriarcal nas tradições bíblicas com a recriação de fontes religiosas justas em relação aos gêneros procedendo a uma nova tradução da Bíblia em linguagem justa só para com isso adentrar a aura benfazeja do politicamente correto39 Ora a pluralidade e a concorrência de teologia e ciência da religião intensificam a atenção crítica E não obstante as duas disciplinas se diferenciam em sua função prática Na teologia vinculamse as tarefas acadêmicas de ser elemento regulador e oferecer um esclarecimento forte no exercício do juízo em assuntos de religião com outras fun ções a saber aquelas de formação e de direção práticoinstitucional para as igrejas Isso se aplica tanto nos casos em que a teolo gia se organiza em seminários confessionais como naqueles em que está situada em universidades privadas ou estatais Também uma teologia ampliada por suplementos da ciência da cultura e da religião dirigese a atos comunicativos de tipo práticoreligioso em comunidades piedosas Ela cumpre funções de formação para o pessoal eclesiástico o que cum grano salis também vale para a capacitação para a docên cia no ensino da religião Foi justamente a partir daqui que Troeltsch abriu o debate Nisso ele retomou a antiga divisão da universidade que a classificava em superior organizada com 37 Cf Friedrich Wilhelm GRAF Die Wiederkehr der Götter Religionen in der modernen Kultur p 231s 38 Este fenômeno corresponde com atraso aos desdobramentos ideológicos do feminismo 39 Aqui tenho em mente a mais recente tradução alemã da Bíblia Bibel in gerechter Sprache 32 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Jörg Dierken vistas ao serviço do Estado ao bemestar temporal à ordem temporal e à salvação eterna e em inferior composta pelas faculdades dedicadas ao conhecimento e à crítica científicos Hoje em dia porém a fundamentação e restrição da teologia enquanto disciplina confessional nas universidades estatais é determinada pela norma fundamental da liberdade de reli gião como elemento do direito constitucional ao menos na Alemanha40 É na teologia assim concebida que se funda menta a função da formação para as instituições religiosas confessionais Tal função formativa conhece a ciência da reli gião no máximo de maneira mediada através de referências a disciplinas teológicas ou pedagógicas Na medida em que não se acham incluídas nestas últimas as ciências da religião por via de regra constituem partes das ciências da cultura41 estabelecidas na faculdade de filosofia42 Do ponto de vista institucional sua referência à vida é mediada pela universi dade Nisso elas assumem em termos de tipos ideais o papel de parceiras de discurso na Disputa das Faculdades a qual enquanto científica deve ser publicamente encenada43 Ora o tema da disputa é a razão na religião Nesta disputa também deve levantar sua voz o outro lado o teológico de não ser assim ela se esvazia Em ter mos sistemáticos o papel da teologia na disputa das facul dades radica no fato de que se trata de um assunto da razão notar a dimensão históricocontingente da religião vinculada à 40 Seria mais exato falar do lado positivoinstitucional da liberdade religiosa que deve ser posto numa relação de equilíbrio com seu lado negativo Cf do presente autor Geäußertes Inneres Das Religionsrecht und die Dialektik der Freiheit In Jörg DIER KEN Selbstbewusstsein individueller Freiheit p 407ss 41 Neste tocante elas exibem uma corresponência com as diferentes dimensões das ciências da cultura quer no caráter históricofilológico das ciências da religião quer a partir de uma ênfase socialcientífica ou ainda como parte dos vários estudos de área ou interdisciplinares por objeto area studies 42 Ou então em suas formas sucessoras cada vez mais diferenciadas A pedagogia que se tornou disciplina independente somente na organização mais recente da univer sidade obviamente ocupa uma posição especial na divisão das faculdades por mais que grandes subdivisões da Faculdade de Filosofia se ocupem de fato com a formação de professores 43 Cf Immanuel KANT Der Streit der Fakultäten In Werkausgabe 33 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Teologia Ciência da Religião e Filosofia da Religião Definindo suas Relações sua prática efetiva prática esta que por sua vez constitui um momento da razão contida na religião como razão que se acha sempre em devir Na condição de outro lado do universal o contingente pertence ao horizonte da razão dialética Esta dialética tornase manifesta nas religiões históricopositivas e não no esperanto de uma pura religião de razão Na medida em que as religiões históricas constituem formas institucionais de criação de comunidade um modelo teológico refletido em termos de teoria social como o de Schleiermacher pode defi nir a teologia enquanto ciência positiva das funções práticas de formação e governo para comunhões eclesiais empíricas Uma vez que o interesse religioso e o espírito científico devem interpenetrarse Schleiermacher herda um motivo da disputa das faculdades de Kant a saber a correção pela crítica44 Ele transforma este motivo kantiano através da divisão nos me nores diferenciais possíveis de limitação mútua em critério da teologia que articula a mediação entre ciência e Igreja Nisso Troeltsch o acompanhou com algumas modificações feitas a partir da herança de Hegel Troeltsch elabora os traços gerais de um modelo de teoria social e cultural que compreende a teologia universitária como coroamento do ensino da reli gião no Estado culturalmente entendido des kulturstaatlichen Religionsunterrichts45 A missão formativa deste ensino da reli gião resulta da relação entre Estado e Igreja que corresponde à postura interna da sociedade diante da vida religiosa46 A partir de um exame histórico da origem das relações moder nas do soberano estado político e de direito com uma plurali dade de igrejas pluralidade que corresponde ao deslocamento 44 Fica em aberto se este motivo se torna patente a partir do ideal cunhado a partir daí do príncipe da Igreja Cf Friedrich SCHLEIERMACHER Kurze Darstellung des theologischen Studiums zum Behuf einleitender Vorlesungen 9 Quanto à herança em termos sistemáticos da Disputa das Faculdades cf a sugestão de Schleiermacher no sentido de tornar permeáveis as fronteiras entre as faculdades para professores universitários F SCHLEIERMACHER Gelegentliche Gedanken über Universitäten im deutschen Sinne In Werke Auswahl in vier Bänden p 533ss aqui p 584s 45 Ernst TROELTSCH Die Trennung von Staat und Kirche der staatliche Religionsunterricht und die theologischen Fakultäten p 6 46 Ibid p 7 34 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Jörg Dierken histórico da religião na direção da revelação na esfera subjetiva Troeltsch acentua as vantagens relativas deste modelo ob viamente onerado por fragilidades de cooperação estatal cultural no sistema de educação em oposição a um laicismo duro e a um culto do Estado ávido por poder mas também em oposição a esforços restauracionistas da parte de uma Igre ja unificada e marcada por pretensões autoritárias47 Dentro desta cooperação o ensino da religião deveria estar prepon derantemente alinhado com uma abordagem histórica mas partindo simultaneamente de um centro fixo48 Algo se melhante vale para as faculdades teológicas Elas são conside radas num paralelo com o estabelecimento de instituições de formação de natureza escolar em assuntos de religião Sem prejuízo da integração desejada de novos ramos de pesquisa na história das religiões as tarefas das faculdades teológicas deveriam manterse intactas nem mesmo uma nova facul dade que servisse de forma mais irredutível ao espírito da ciência poderia constituirse numa abolição fundamental da universidade em sua antiga forma49 Para Troeltsch o fato de que o fortalecimento da perspectiva históricocientífica permite ligar a antiga e a nova faculdade e com isso também no futuro a ciên cia da religião e a comunidade de culto baseiase em que o cristianismo que acha seu centro em torno da fé do viraser pessoa do homem através da devoção e entrega a Deus constitui o mais elevado grau da religião que nos foi dado50 Com isso amarramse os nós problemáticos dos grandes temas da vida de Troeltsch ou seja o caráter abso luto do cristianismo a despeito do relativismo historicista a síntese cultural do europeísmo que visa ao ideal de per sonalidade e a capacidade de comportar a religião também 47 Ibid p 51 Segundo Troeltsch uma separação apenas adia o problema porém não o resolve 48 Ibid p 61 e 60 49 Ibid p 67 50 Ibid p 62 e 68 35 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Teologia Ciência da Religião e Filosofia da Religião Definindo suas Relações do mundo moderno mundo para o qual é significativa uma fé em Deus já livre da semântica da autoridade comunicada na Igreja popular Volkskirche que se tornou elástica É certo que os problemas sutilmente diagnosticados por Troeltsch não se deixam desfazer como um nó górdio E não obstante as diagnoses perspicazes de Troeltsch nem sempre exigem uma adesão para fins terapêuticos já porque apesar da história de rupturas historicamente des crita em última análise tudo se adapta bem demais à mo dernidade Especialmente a pedra de toque central relativa à compreensão da religião e de Deus acaba evocando pergun tas Com Troeltsch seria necessário enfatizar que o modelo políticoinstitucional e metodológicocientífico meticulosa mente equilibrado está ligado a um conceito de religião verídico intersubjetivamente comunicável A religião precisa comprovarse como uma grandeza interligada com a vida do espírito e da cul tura humanos mas que de algum modo também é independente51 Este é um tema clássico da filosofia da religião Pode se mos trar intersubjetivamente que o a priori da religião é a certeza subjetiva para falarmos a linguagem de Troeltsch Contra Troeltsch há que acentuar porém que é insuficiente seu mo delo que combina com o tema da certeza subjetiva de uma relação absoluta com a substância52 entendida como o núcleo do valor de validade ou verdade da religião Nesse seu modelo vem ao primeiro plano apenas o momento da mística denominado por Troeltsch de fenômeno originário de toda religião Corresponde a isso a tese de que segundo ele toda a história deve finalmente confluir com uma vida universal divina göttlichen AllLeben53 Mas uma tal ênfase no tocante ao conceito de religião não é capaz de assimilar aquilo que se acha percebido com toda sensibilidade no historiador 51 De não ser assim outras ciências teriam competência nesse caso ou então uma práxis do trato profissional com patologias 52 Ernst TROELTSCH Das Wesen der Religion und der Religionswissenschaft In Ge sammelte Schriften p 452499 aqui p 494 53 Ibid p 493 cf Ernst TROELTSCH Der Historismus und seine Probleme In Gesam melte Schriften p 87 et passim 36 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Jörg Dierken Troeltsch a improbabilidade do desenvolvimento histórico da validade social última do indivíduo junto com a evidência contingente de interpretações religiosas a este respeito cor respondentes ao caráter inderivável da subjetividade E esse conceito místico de religião não é capaz de integrar aquilo que acentua justamente o modelo troeltschiano da relação EstadoIgreja no qual o poder exterior e a religião interior permanecem estranhos entre si na mesma medida em que não podem prescindir um do outro ou seja o conceito de religião não é capaz de integrar a irracionalidade insuperavelmente en cerrada em sua relação54 Ora uma tal irracionalidade deveria encontrar lugar dentro da racionalidade de um conceito de religião mais abrangente Ela é o tema de uma filosofia da religião no horizonte da dupla dialética de fronteiras entre teologia e ciência da religião Quanto a isso faremos algumas breves considerações finais 5 A Filosofia da Religião a partir da Dialética de Fronteiras e a Multidimensionalidade da Religião O campo de interseção entre teologia e ciência da reli gião dá forma à averiguação de fenômenos que a partir de ópticas diferentes são caracterizados como religião Põese com isso o dilema de ter que manter este conceito como con ceito compreensível e comunicável embora aquilo que seja por ele aludido apareça sempre em meio a uma fragmentação perspectivística Este dilema aponta para o próximo a saber que para ambas as especialidades a religião possui uma pecu liaridade plausível ainda que ela sempre seja praticada somen te em com e sob outras formas culturais Toda a apresentação e compartilhamento da religião se utiliza das formas culturais da linguagem e da comunicação midiática A religião desen volve institucionalizações e formas de criação de comunidade Por um lado elas se separam de outras formas culturais por 54 Cf Ibid p 56s 37 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Teologia Ciência da Religião e Filosofia da Religião Definindo suas Relações outro elas também fazem uso destas como se torna visível exemplarmente na relação de Igreja e Estado mas também de religião e arte Com estes dilemas ligase a exigência decorren te das análises de Troeltsch e Weber aquela de proporcionar um lugar para o que é historicamente contingente e irracio nal justamente se a religião deve constituir um modo adequa do de lidar com estes aspectos Nenhum conceito simples e fixo de religião irá satisfazer completamente estas demandas E contudo o conceito de religião é imprescindível É incumbência da filosofia da religião explorar refle xivamente as diferentes dimensões da religião55 e clarear a categorialidade nela reivindicada Uma vez que a filosofia da religião não dispõe de nenhum acesso privilegiado ao tema da religião ela se liga em aspectos decisivos ao campo de interseção entre a ciência da religião e a teologia bem como às duplas demarcações de fronteira entre ambas Sem fazer referência às descrições empíricas da religião a filosofia da religião se torna vazia De modo inverso ela se torna inane ao não levar em consideração a circunstância significativa para a religião vivida de que os conteúdos de sentido e práticas religiosos podem tornarse evidentes plausíveis ou convin centes sempre apenas para uma perspectiva de participante embora aqui também devam tornarse tais admitidamente com todos os matizes que marcam a transição para a atitude de questionamento e dúvida Contestações críticas da religião constituem o reverso da convicção religiosa com equivalentes pretensões de normatividade e validade Consequentemente a filosofia da religião deve ocuparse com a tensa relação entre empiria e normatividade entre terceira e primeira pessoa bem como com a diferença de perspectivas diversas em meio à pluralidade ao dissenso e ao conflito Isso tudo está posto categorialmente com seu tema Além disso entram no horizonte da filosofia da religião formas culturais adicionais nas circunvizinhanças da religião 55 Cf do autor Jörg DIERKEN Zwischen Relativem und Absolutem Dimensionen des Religionsbegriffs In Selbstbewusstsein individueller Freiheit p 335 38 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Jörg Dierken Isso diz respeito às formas já mencionadas que tangenciam a vida em comum dos homens e sua relação com a natureza às técnicas de comunicação e articulação mas também de expo sição estética de conteúdos de sentido e à reflexão metodica mente controlada sobre o conhecimento e a prática Com isso temse em vista o amplo campo da cultura portanto a socie dade e a história a política e a economia a técnica e a mídia a arte e a ciência Como filosofia a filosofia da religião está envolvida em métodos e conteúdos de outras filosofias que cobrem âmbitos específicos tais como a filosofia da história a filosofia social ou a filosofia da arte Com isso tornamse simultaneamente temáticas as referências implícitas à religião que são cointroduzidas na história na política na arte etc A filosofia da religião é sempre também filosofia da cultura Também isso pertence à categorialidade de seu tema Tão certo quanto o fato de que a filosofia da religião não produz religião é o de que ela nem por isso permanece numa consideração apenas externa Na medida em que ela examina a validade de ideias religiosas discutindo com isso a correção de ações têm lugar passagens à região da religião Estas passagens não são passíveis de refutação Não é coinci dência que com a metafísica e a moral a filosofia verse sobre temas que se acham numa proximidade de fato com conteú dos correspondentes da religião Este nexo entre religião e fi losofia não se funda unicamente na herança histórica da meta física e da moral Tampouco se funda nos começos históricos e portanto contingentes da filosofia em geral com a reflexão crítica e a superação racional de panteões míticoreligiosos Antes o nexo entre religião e filosofia reside no fato de que com as pretensões religiosas de validade e com as incursões na direção da universalidade intersubjetiva vinculamse pre tensões de racionalidade na religião O exame racional destas pretensões pela filosofia conduz a uma semelhança de família com a religião Para dizêlo seguindo Hegel já com o maior exagero possível também a filosofia da religião se converte em culto ou serviço a Deus obviamente na forma que lhe é 39 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Teologia Ciência da Religião e Filosofia da Religião Definindo suas Relações peculiar56 Com Hegel é possível dizer que esta circunstância significa por um lado que a forma específica do culto filosó fico é uma reflexão metodicamente controlada na qual final mente a forma e o conteúdo se interpenetram É óbvio que também a religião faz parte da vida consciente mesmo em suas figuras mais ritualizadas Só que sua reflexividade está de positada dentro duma expressividade contente com e saciada do mundo da vida Por outro lado porém e contra Hegel57 o caráter cúltico da filosofia fundamentase em que tampouco ela possui a razão enquanto tal mas somente a desdobra in diretamente de forma discursiva na referência a algo distinto por exemplo a empiria histórica Isso é o caso justamente e numa medida particular em suas análises feitas do ponto de vista da teoria da religião Com isso a filosofia também está sempre presa às formas finitohistóricas do acontecer da ra zão com o que fica simultaneamente comprometida com a finalidade prática do aumento da transparência esclarecedora No que se refere à religião isso significa que também uma filosofia da religião que se vincule à razão na religião não está em condições de elevarse acima das diferentes dimensões do tema da religião de sorte que a tendência destas dimensões de se moverem em direções opostas Gegenläufigkeit nela se in troduz Mas mesmo acerca disso a filosofia pode saber ainda que numa douta ignorância É isso que revela uma metarrefle xão filosóficoreligiosa sobre o conceito da religião e seu uso Deste modo o conceito da religião é utilizado em pri meiro lugar sempre também em sentido e com intenção prag máticos Neste sentido ele opera como instrumento de busca e meio de entendimento entre pessoas diferentes acerca de fenômenos que são qualificados de modo diverso como reli giosos sendo com isso destacados da alteridade que lhes é própria Tais fenômenos poderiam manifestar um elemento 56 Cf HEGEL Vorlesungen über die Philosophie der Religion esp p 63s 57 Ou pelo menos contra uma leitura promovida também pelo Hegel histórico aquela segundo a qual sua filosofia abrangeria também segundo a forma a totalidade da razão 40 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Jörg Dierken em comum por serem acompanhados por interpretações de sentido que são vivenciadas como evidentes a despeito das alternativas Em tal emprego pragmático a religião se mostra como conceito dotado de uma dinâmica interna de passagem ou transição Além disso a referência de sentido da religião também deve de algum modo proporcionar sentido para aqueles que tematizam tal referência cientificamente numa série de perspectivas diferenciadas A evidência deve poder convencer Einleuchten muss einleuchten können justamente quando diante de alternativas Mas com isso estas alternativas se acham no horizonte quer como alternativas seguidas antes depois ou ao lado quer como alternativas excluídas Assim é que se pode apreender fatos como conversões e sincretismos mas também revelação confissão e convicção A comunicação intersubjetiva e a presença de alternati vas sob a égide da religião implicam que é sempre também inerente ao conceito de religião uma tendência holística di rigida ao que é universal Se nesse ponto se reflete acerca da validade do conceito então esta reflexão acaba por dar ela mesma num vórtice de universalidade a que se vincula toda reflexão A teoria da religião guiada pela reflexão tende por sua lógica interna a uma completude Ganzheit na qual ela mesma está incluída Com este movimento próprio à lógica da reflexão a teoria da religião adquire ela mesma um momento cúltico a saber teóricocontemplativo A figura conclusiva da filosofia hegeliana a autofruição do Espírito é o exemplo mais proeminente disso Com este movimento na direção do momento contempla tivo perdese no entanto a dimensão pragmática do conceito de religião Ela é acentuada quando momentos de posicionamento entram em cena quer por fixação quer por decisão Também isso pertence à religião Um dos lados tornase reconhecível para o outro e com isso também para si mesmo Tal posicio namento é em última análise irracional Sua irracionalidade não se deixa contornar mas apenas racionalizar Se a teoria da religião capta isto ela se relaciona com um elemento oposto 41 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Teologia Ciência da Religião e Filosofia da Religião Definindo suas Relações ao universal Com isso ela passa momentaneamente a uma dimensão que se movimenta em direção contrária e é oposta à religião que se atualiza em termos práticos A religião tem a ver manifestamente com a dinâmica carregada de tensões en tre a tendência para o todo e a acentuação de um elemento próprio ou peculiar inderivável o lugar da religião são as passagens de fronteira entre estes dois aspectos Uma filosofia da religião que presta atenção a passagens de fronteira participa de sua parte e por ra zões categoriais de momentos estruturais religiosos opostos ou de direção contrária gegenläufig e simultaneamente sempre também distanciase por meio da captação dialética da religião Em termos empíricos é possível dizer o mesmo de outra ma neira a filosofia da religião a ciência da religião e a teologia atuam sempre também como partes integrantes da história da religião que elas analisam58 Bem isso se elas sabem o que estão fazendo A característica particular da filosofia da religião é nesse tocante ser saber no fazer Ora tal saber passa de novo ao fazer Assim não a teoria contemplativa mas a prática constitui o horizonte da filosofia da religião Passagens de fronteira são sempre visadas apenas desde um dos dois lados A unidade de completude e aquilo que é próprio ou peculiar pode apresentarse como a coincidentia oppo sitorum para um olhar absoluto desde lugar nenhum Este olhar divino encontrase acima de toda comunicação ainda que seja meramente visual e mesmo que seja apenas a comunicação da troca de olhares Para nós como seres finitos a relação para com a fronteira se coloca de outra maneira Nisso estamos separados do Absoluto e unidos a ele na captação Einsicht desta separação Isso pode tornarse transparente em termos filosóficos O que aí não se torna transparente é se se quer can celar ou fortalecer a diferença para com o Absoluto Pois isto 58 A pergunta pelas transformações históricas da religião e por seu lugar na atualidade determina consequentemente também as diferentes teorias da religião A suposição de que a religião teria que tornarse obsoleta devido à racionalidade funcional da modernidade também teria consequências para o papel prático das teorias da religião com isso elas teriam também elas seu lugar no museu na melhor das hipóteses como lugar de cristalização da memória cultural 42 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Jörg Dierken corresponde ao tipo específico de religião O cristianismo oci dental com seu foco no indivíduo posicionase de outro modo que as ideias de unidade universal do Extremo Oriente o pro testantismo dirigido à consciência do indivíduo de outro modo que o catolicismo que enfatiza a institucionalidade da mediação de Deus e homem Para falar a partir de minha própria pers pectiva é tipicamente protestante tornar o além mediante a diferenciação entre divino e humano em força do aquém A ir racionalidade da religião tornase via seu deslocamento para a relação com Deus simultaneamente em fundamento de possibi lidade da liberdade humanoindividual Mas também é possível que as coisas se deem de outra maneira certamente com outras tantas consequências para o agir e a forma de condução da vida É em torno disso que gira o saber da filosofia da religião Por mais que a filosofia da religião transcenda em tal saber a confissão religiosa particular na mesma medida ela também permanece para obter este saber referida à particularidade contingente desta confissão Tampouco a filosofia da religião que sabe a respeito da diferença entre absoluto e relativo é o absoluto E é justamente este o significado da aplicação prática de sua capacidade reflexiva a si mesma Referências BAIL Ulrike CRÜSEMANN Frank CRÜSEMANN Marlene et alii trad e ed Bibel in gerechter Sprache 3 ed Gütersloh 2006 BOCHINGER Christoph Wahrnehmung von Fremdheit Zur Verhältnisbestimmung zwischen Religionswissenschaft und Theologie in Gebhard Löhr Ed Die Identität der Religionswissenschaften Frankfurt aM 2000 FELDKELLER Andreas Religionswissenschaft innerhalb und außerhalb der Theologie DIERKEN Jörg Selbstbewusstsein individueller Freiheit Tübingen 2005 43 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Teologia Ciência da Religião e Filosofia da Religião Definindo suas Relações GLADIGOW Burkhard Religionswissenschaft als Kulturwissenschaft Editado por Christoph AUFFARTH Jörg RÜPKE Eds Stuttgart 2005 GRAF Friedrich Wilhelm Die Wiederkehr der Götter Religionen in der modernen Kultur München 2004 HARNACK Adolf von Die Aufgabe der theologischen Fakultäten in Reden und Aufsätze v 2 Gießen 2 ed 1906 HEGEL Georg Wilhelm Friedrich Vorlesungen über die Philosophie der Religion Ed Walter Jaeschke Hamburg 1983 JAMES William Die Vielfalt der religiösen Erfahrung Eine Studie über die menschliche Natur Trad Eilert Herms Frankfurt a M Christian Stahlhut 1997 JASECHKE Walter Filosofia da Religião in Historisches Wörterbuch der Philosophie v 8 Basel 1992 cols 748763 KANT Immanuel Der Streit der Fakultäten In Werkausgabe 2 ed v 11 ed Wilhelm Weischedel Frankfurt 1978 KIPPENBERG Hans G Die Entdeckung der Religionsgeschichte Religionswissenschaft und Moderne München 1999 KIPPENBERG Kocku von Stuckrad Einführung in die Religionswissenschaft München 2003 KRECH Volkhard Wohin mit der Religionswissenschaft Zeitschrift für Religions und Geistesgeschichte v 58 2006 MCCUTCHEON Russell Ed The Insider Outsider Problem in the Study of Religion London New York 1998 SCHLEIERMACHER Friedrich Gelegentliche Gedanken über Universitäten im deutschen Sinne In Werke Auswahl in vier Bänden BRAUN Otto BAUER Johannes eds v 4 Leipzig 1927 1928 reimpr Aalen 1981 44 Numen revista de estudos e pesquisa da religião Juiz de Fora v 12 n 1 e 2 p 0944 Jörg Dierken Kurze Darstellung des theologischen Studiums zum Behuf einleitender Vorlesungen Ed Heinrich Scholz reimpr Hildesheim 1977 STOLZ Fritz Grundzüge der Religionswissenschaft Göttingen 1988 TILLICH Paul Über die Idee einer Theologie der Kultur In Gesammelte Werke Renate Albrecht Ed V 9 Die religiöse Substanz der Kultur Stuttgart 1967 TROELTSCH Ernst Das Wesen der Religion und der Religionswissenschaft In Gesammelte Schriften v 2 Tübingen 1922 2 ed Aalen 1981 Der Historismus und seine Probleme In Gesammelte Schriften v 3 Tübingen 1922 2 ed Aalen 1977 Die Selbständigkeit der Religion Teil II Zeitschrift für Theologie und Kirche v 6 1896 Die Trennung von Staat und Kirche der staatliche Religionsunterricht und die theologischen Fakultäten Tübingen 1907 WAARDENBURG Jacques Religionen und Religion Systematische Einführung in die Religionswissenschaft Berlin 1986 WACH Joachim Vergleichende Religionsforschung Stuttgart 1962 WEBER Max Die Wirtschaftsethik der Weltreligionen In Gesammelte Aufsätze zur Religionssoziologie v 1 Wirtschaft und Gesellschaft Tübingen 1921 1972 Wissenschaft als Beruf In Gesammelte Aufsätze zur Wissenschaftslehre Tübingen 7 ed 1988 WITTGENSTEIN Ludwig Tractatus logicophilosophicus 1921 Philosophische Untersuchungen 1953 In Werkausgabe v 1 Frankfurt a M 1984