O Ensino Religioso em uma Escola Estadual: Um Relato de Experiência

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS CCH CIÊNCIAS DA RELIGIÃO LUCAS WELLINGTON MARTINS DE SOUZA O ENSINO RELIGIOSO EM UMA ESCOLA ESTADUAL DA CIDADE DE LAGOA DOS PATOS MG UM RELATO DE EXPERIÊNCIA MONTES CLAROS 2023 LUCAS WELLINGTON MARTINS DE SOUZA O ENSINO RELIGIOSO EM UMA ESCOLA ESTADUAL DA CIDADE DE LAGOA DOS PATOS MG UM RELATO DE EXPERIÊNCIA Projeto parcial de relato de experiência apresentado ao curso de Ciências da Religião da Universidade Estadual de Montes Claros UNIMONTES como exigência da disciplina TCC II ministrada pela Prof Dr Heiberle Hirsgberg Horácio MONTES CLAROS 2023 RESUMO Considerando a comum negligência acerca da cultura afro no contexto educacional e as possíveis consequências sociais dessa ausência esse relato de experiência objetiva analisar a ausência do ensino sobre a cultura Afro na Escola Estadual Raimundo Nonato da Fonseca no município de Lagoa dos Patos MG Inicialmente foi realizada uma revisão da história do ensino religioso no Brasil ressaltando a influência da catequização dos jesuítas durante o período pré e colonial na instauração e manutenção do ensino religioso nas escolas É importante ressaltar que a Base Nacional Comum Curricular BNCC afirma que o ensino religioso deve ser de oferta obrigatória e de matrícula facultativa além de tratar de forma diversificada esse assunto Durante a vivência na Escola Estadual de Lagoa dos Patos MG notouse a ausência da cultura afro durante o ensino religioso na medida em que o foco era nas religiões cristãs com viés europeu faltando também literatura afrobrasileira nas indicações de leitura A partir disso foram realizadas entrevistas com alunos e professores nas quais foi percebida a falta de conhecimento dos docentes acerca do assunto e a ausência de representatividade afirmada pelos discentes afrodescendentes Diante disso ações foram propostas a fim de promover a inclusão da cultura afro nessa instituição Como principal conclusão destacase a necessidade de produção de mais estudos sobre o tema a fim de identificar melhor essa problemática e consequentemente buscar e criar ações que garantam a diversidade no ensino religioso na prática uma vez que apenas os escritos não são suficientes para assegurar isso Palavraschave Ensino religioso Cultura Afro Educação Alunos afrodescendentes 1 INTRODUÇÃO O presente relato de experiência tem como objetivo analisar a ausência do ensino sobre a cultura Afro na Escola Estadual Raimundo Nonato da Fonseca no município de Lagoa dos Patos Minas Gerais A cultura Afro é extremamente rica e diversa permeada por uma história de resistência contribuições significativas para a sociedade e expressões culturais únicas No entanto é preocupante constatar que essa riqueza cultural muitas vezes é negligenciada no contexto educacional o que pode reforçar estereótipos e perpetuar a invisibilidade da história e da identidade Afrodescendente Como afirma Paulo Freire conceituado educador e pensador a educação não transforma o mundo Educação muda pessoas Pessoas transformam o mundo FREIRE 1970 Nesse sentido é crucial que as escolas assumam o compromisso de promover uma educação inclusiva e antirracista que valorize todas as culturas presentes na sociedade incluindo a cultura Afro A falta de ensino sobre a cultura Afro pode ter consequências negativas tanto para os estudantes afrodescendentes quanto para a sociedade como um todo A invisibilidade cultural pode gerar baixa autoestima falta de representatividade e perpetuação de preconceitos Além disso a ausência do ensino sobre a cultura Afro limita o conhecimento dos estudantes acerca da história e das contribuições do povo Afrodescendente negligenciando aspectos fundamentais da formação cidadã Portanto este relatório visa contribuir para a reflexão sobre a necessidade de superar a ausência do ensino sobre a cultura afro nas escolas buscando uma educação mais inclusiva antirracista e comprometida com a valorização das diversas identidades culturais presentes em nossa sociedade 2 ENSINO RELIGIOSO NO BRASIL BREVE HISTÓRICO No processo de colonização do Brasil os portugueses exerceram uma grande influência na construção social política cultural e religiosa no Brasil A influência religiosa dos portugueses no período colonial era baseada no cristianismo sobretudo na religião católica que foi base para a educação no qual era ministrada pelos Jesuítas As escolas jesuítas a partir do ensino religioso buscava transmitir os costumes e a cultura portuguesa a fim de que aquela sociedade que estava se formando principalmente pelos indígenas e negros pagãos se convertessem a religião cristã A partir disso o cristianismo enraíza suas ideologias e influência na educação brasileira como método essencial do ensino entretanto Junqueira 2015 discorrem que no regime republicano a reformulação do sistema educacional brasileiro buscou enfatizar a diversidade cultural religiosa a partir de uma perspectiva positivista a qual frisa a população como heterogênea portanto surge a formação do Estado Laico Após esse período para ministrar o Ensino religioso era preciso em escolas específicas já que por meio da laicização o Estado foi separado da Igreja Contudo o catolicismo ainda era muito forte e sua resistência quanto ao Ensino Religioso nas escolas promoveu pressões para que o Estado pudesse retornar ao ensino haja vista em Minas Gerais que em 1929 foi assegurada por lei a permissão do ensino nas escolas públicas Por conseguinte no governo de Getúlio Vargas o Ensino Religioso volta às escolas porém de maneira facultativa Na ditadura Militar a reaproximação do Estado e igreja se intensifica e apesar da relação intrínseca com o ensino dos preceitos morais o ensino religioso não obteve espaço como disciplina obrigatória BORIN 2018 Ainda que o ensino religioso após esse período tenha um papel facultativo nas escolas públicas brasileiras a religiosidade no ambiente escolar especificamente a religião católica foi colocada como uma forma de fortalecer a identidade nacional e moral o que não respeitava a laicidade e consequentemente a diversidade religiosa do país No entanto em 1988 a Constituição Federal Brasileira e o período de redemocratização foi aprovado a Lei 9394 que são as diretrizes e bases que regem a educação brasileira a qual modifica o ensino do Brasil e consequentemente o ensino religioso Apesar das alterações essa lei regulamenta o ensino até hoje 21 ENSINO RELIGIOSO NO PERÍODO COLONIALJESUÍTA O Ensino Religioso no Brasil desde os primeiros anos de colonização percorre um caminho no qual levanta discussões sobretudo a respeito do ensino como disciplina e como é considerado em alguns casos desde a evangelização indígena até a atualidade como um artifício de impor a ideologias cristã e colonial Dessa forma o Ensino Religioso no Período Colonial foi crucial para estabelecer o catolicismo no país em que fez parte de um dos objetivos dos projetos portugueses para o Brasil A educação baseada na proposta dos jesuítas foi um passo importante para a união do Estado Coroa Portuguesa e para a religião desde a colonização brasileira a fim de que propagassem o catolicismo em novas terras A Companhia de Jesus foi um instrumento que teve sucesso na colonização em virtude do seu objetivo nas missões de evangelizar e catequizar contudo no Brasil seu intuito foi além desses Segundo Shigunov Neto e Maciel 2008 o projeto educacional Jesuíta não era apenas um projeto de catequização mas sim um projeto bem mais amplo um projeto de transformação social pois tinha como função propor e implementar mudanças radicais na cultura indígena brasileira Além da ação catequizada os jesuítas desenvolveram e expandiram o sistema educacional naquele primeiro período de Brasil colônia O padre Manuel de Nóbrega foi um precursor As escolas e colégios jesuítas formavam os sacerdotes para educar os mamelucos e os filhos de colonos como também os filhos dos escravos nascidos nas fazendas da Companhia de Jesus no entanto a educação passou a ser privilégio apenas para os descendentes dos colonizadores Inicialmente os padres jesuítas dedicaramse à catequização e à conversão do gentio à fé católica mas com o passar dos anos começaram a se dedicar também ao ensino dos filhos dos colonos e demais membros da Colônia atingindo num último estágio até a formação da burguesia urbana constituída principalmente pelos filhos dos donos de engenho Esses jovens que após o término de seus estudos no Brasil partem para estudarem na Universidade de Coimbra vão impulsionar muito mais tarde o espírito nacionalista Por meio de seu ensino e sua metodologia os jesuítas exerceram grande influência sobre a embrionária sociedade brasileira constituída pelos filhos da classe burguesa SHIGUNOV NETO MACIEL 2008 p 180 O método de ensino era a partir de um manual instituído por Inácio de Loyola que ditava quais práticas os padres jesuítas deviam seguir chamado Ratio Studiorum De acordo com Ferreira Junior e Bittar 1999 o processo de ensinoaprendizagem era baseado na concepção mnemônica de ensino e entre suas consequências foi o sadismo pedagógico que se manifestava nas suas metodologias através de castigos corporais Esse método era um manual que instituído por Inácio Loyola ditava quais regras e prescrições práticas deveriam ser seguidas pelos padres jesuítas nas aulas 22 ENSINO RELIGIOSO NA REPÚBLICAERA VARGAS No período Republicano foi assegurado a liberdade religiosa apesar de que o Governo ainda tinha relações com a igreja católica permitia que fosse cultuado outras crenças Tal atitude reformulou a sociedade que antes seguia por ações religiosas ligadas em maior parte no catolicismo e consequentemente causou revoltas Na educação não foi diferente pois o governo considerou leigo o ensino ministrado nos estabelecimentos públicos BRASIL 1891 declarando que as instituições seguissem a partir da laicidade Segundo Ceccherti e Santos 2016 no campo da educação sob a égide do ensino laico a questão da exclusão do ensino confessional das instituições estatais se tornou um dos temas mais polêmicos Ademais nenhum assunto que estivesse ligado à religião deveria ser integrado no ensino entretanto os fiéis da Igreja reivindicavam e apontavam a atitude como um movimento contra a moral e os valores cristãos As disputas em torno da noção de laicidade e quanto à exclusão ou permanência do ER marcaram as constituintes estaduais realizadas no final do século XIX assim como as que resultaram nas Cartas Magnas exaradas no século seguinte Neste plano geraram movimentos prós e contra os quais deram origem a distintos encaminhamentos em âmbito regional estadual e nacional Fato é que com a consolidação da República juridicamente o ER foi excluído da instrução pública No entanto isso não significou que diferentes unidades da federação adotassem essa orientação CECCHERTI SANTOS 2016 p 136 Alguns estados não adotaram o modelo da laicidade já que flexibilizaram o ensino haja vista Minas Gerais que não adotou o ensino laico em virtude da sociedade predominantemente católica O embate provocou discussões ao ponto de indicarem uma revisão constitucional a fim de que o Ensino da Religião tivesse espaço Com o fim da República após o golpe de estado em 1930 Getúlio Vargas assume a presidência que viu na educação uma solução para os problemas nacionais e como um instrumento de transformação social MEDEIROS 2020 p 837 Em contrapartida Getúlio Vargas naquela época se considerava um governante populista apesar da sua política autoritária e centralizadora a fim de que buscar maior aceitação em grupos que poderiam favorecer sua política sendo assim estreitou uma aliança com a Igreja Católica como um dos seus artifícios já que a instituição reunia um grande número de fiéis Logo ao que foi proposto no período imperial de tornar o ensino religioso como facultativo a era Vargas retoma essa oferta A ideia reproduzida foi a presença do ensino religioso nas escolas públicas com sutis diferenças Enquanto a Carta de 1934 estabelecia que a escola pública tinha a obrigatoriedade de ofertar o ensino religioso a Carta de 1937 transformou o ensino religioso nas escolas públicas em possibilidade A flexibilidade dada pelo Texto Maior de 1937 foi mais intensa as escolas poderiam oferecer e os professores por sua vez não eram obrigados a ofertar Como a educação profissional voltada para o mercado de trabalho industrial ocupava posição estratégica no projeto de desenvolvimento nacional da Era Vargas apenas aquela foi isenta da influência do ensino religioso nas escolas públicas permanecendo a possibilidade de oferta no ensino primário no secundário e no curso Normal ROCHA 2013 p 2013 O Ensino Religioso na Era Vargas apesar do ideário em reformular a educação e colocála como facultativa após gerar polêmicas o governo acabou oficializando a oferta dentro do horário e facultativa pois a partir da Constituição de 1934 no artigo 153 o Ensino Religioso passou a ser de frequência facultativa e ministrado de acordo com os princípios da confissão religiosa do aluno manifestada pelos pais ou responsáveis e constituída matéria dos horários nas escolas públicas primárias secundárias e normais BRASIL 1934 p 1 23 BNCC E O ENSINO RELIGIOSO Discutir o percurso do Ensino Religioso no Brasil devese considerar a partir dos seus contextos históricos as suas oscilações quanto as sucessivas fases de sua legalização pois aos longos dos anos foram marcados em obrigatoriedade e de modo facultativo este que considerando a diversidade religiosa e a prática da laicidade do Estado Através da queda do Estado Novo surge a elaboração das Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional pelas legislações constituintes no qual o Ensino Religioso é contemplado no currículo escolar de 1996 que modificando a partir levantamentos e discussões entre a Igreja Católica a bancada Evangélica em 2017 os ministros do STF e observaram a constitucionalidade dos artigo 33 Logo o STF 2017 afirmaram a constitucionalidade do ensino religioso confessional como disciplina facultativa dos horários normais das escolas o traz uma incoerência a própria LDB que discorre sobre a não confessionalidade Em consequência desse acontecimento surgem discussões convergentes ao mesmo tema a questão do Ensino Religioso da Base Nacional Comum Curricular A princípio a BNCC é um documento normativo que reúne diretrizes que norteiam a organização curricular da Educação Básica Portanto é um documento de caráter normativo que define o conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais que todos os alunos devem desenvolver ao longo das etapas e modalidades da Educação Básica de modo a que tenham assegurados seus direitos de aprendizagem e desenvolvimento em conformidade com o que preceitua o Plano Nacional de Educação PNE Este documento normativo aplicase exclusivamente à educação escolar tal como a define o 1º do Artigo 1º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional LDB Lei nº 93941996 e está orientado pelos princípios éticos políticos e estéticos que visam à formação humana integral e à construção de uma sociedade justa democrática e inclusiva como fundamentado nas Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica DCNBRASIL 2018 p 7 Dessa forma a BNCC implementa conteúdos que serão abordados na educação básica com os conhecimentos que deverão ser ensinados e aprendidos pelos alunos Para a implementação do Ensino Religioso na BNCC os embates não foram diferentes ao que a disciplina percorreu durante seu percurso educacional uma vez que por se tratar de um assunto que constrói embates acerca do tema Segundo Gomes 2021 vários diálogos seguidos de audiência e petições comentadas pelo Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso FONAPER que teve como objetivo convencer os membros da CNE quanto aos propósitos da disciplina O Ensino Religioso é um componente curricular de oferta obrigatória mas de matrícula facultativa De acordo com a BNCC 2018 a disciplina deve tratar de conhecimentos religiosos através de suposições éticas e científicas sem limitar a nenhuma crença ou religião Inicialmente o Ensino Religioso aparece na área de ciências humanas o que causou novas disputas epistemológicas no campo das Ciências Humanas Consequentemente na segunda versão o Ensino Religioso foi retirado de Ciências Humanas e colocado como área própria BAPTISTA SIQUEIRA 2020 p 53 O ER foi institucionalizado do ponto de vista político como uma atividade de ensino necessária justificada por razões pedagógicas porém tratando seus conteúdos como exceção conteúdo a serem definidos Isso pressupõe a compreensão de que não há uma definição já elaborada e disponível para ser traduzida curricularmente o que dispensa por isso mesmo a necessidade de uma legitimação epistemológica Em termos técnicos o contexto do ensino dispensa portanto os contextos da pesquisa e da justificação da ação científica como ocorre na dinâmica de construção e de legitimação das ciências em geral PASSOS 2015 p 36 Por conseguinte diante o contexto da ciência da religião não se pode analisar como um estudo isolado uma vez que no sentido epistemológico as ciências são intrínsecas Ou seja por essa interdependência Junqueira 2015 p 46 sugere que no Ensino Religioso a aplicação para o cotidiano da sala de aula dos resultados dessa Ciência possibilitando aos estudantes da educação básica compreensão das culturas das diferentes continuidades que formam determinado país nação Em consonância com a BNCC a transposição didática deve ser tratada de uma forma que tenha sentido para os estudantes Portanto ao repensar o Ensino da Religião no qual tenha sentido para o aluno devese considerar dentre a dimensão humana relacionando com outras ciências haja vista na perspectiva antropológica o ser humano por ser um ser de sentido está buscando e construindo sentido e a religião nesse caso faz parte de um dessa construção BAPTISTA 2015 Nessa perspectiva é importante considerar que a sociedade é construída através da diversidade e o aluno dentro da sua individualidade deve ser respeitado quanto a sua alteridade 3 CURRÍCULO ESTADUAL DE MINAS GERAIS O Currículo de Referência de Minas Gerais em conformidade com as competências da BNCC e com o componente curricular do Ensino Religioso tem como finalidade o conhecimento religioso através de pressupostos éticos e científicos e sobretudo as diversas culturas e tradições religiosas Sendo assim esse ensino como componente curricular de Minas Gerais busca construir por meio do estudo dos conhecimentos religiosos e das filosofias de vida perspectivas de sentido altitudes de reconhecimento e respeito às alteridades MINAS GERAIS 2015 p 876 atendendo portanto a igualdade e equidade como valores importantes As competências sugeridas pelos currículos a ciências da religião são destacadas como uma possibilidade de superar os paradigmas que foram construídos ao longo do tempo o Ensino Religioso com a proposta de catequizar o aluno sem respeitar a diversidade religiosa de cada uma A partir disso o Currículo de Referência de Minas Gerais orienta que a Proporcionar a aprendizagem dos conhecimentos religiosos culturais e estéticos a partir das manifestações religiosas percebidas na realidade dos educandos b Propiciar conhecimentos sobre o direito à liberdade de consciência e de crença no constante propósito de promoção dos direitos humanos c Desenvolver competências e habilidades que contribuam para o diálogo entre perspectivas religiosas e seculares de vida exercitando o respeito à liberdade de concepções e o pluralismo de ideias de acordo com a Constituição Federal d Contribuir para que os educandos construam seus sentidos pessoais de vida a partir de valores princípios éticos e da cidadania MG MINAS GERAIS 2015 p 875 Levando em consideração a historicidade de Minas Gerais e a tradução cristã que foi estabelecida principalmente da forma em que o Ensino religioso foi abordado por muito tempo pelo caráter confessional hoje é relevante a forma em que o ensino é colocado para que promova o respeito muito a tolerâncias e o diálogo entre as tradições religiosas No entanto para isso é responsabilidade das escolas e professores planejar e implementar o ensino religioso de acordo com os princípios da laicidade e respeito a pluralidade religiosa Portanto as práticas científicas e pedagógicas devem ser socialmente construídas pois busca de uma fundamentação epistemológica para o Ensino Religioso é nada mais que um passo dado na recuperação do que constitui um déficit histórico PASSOS 2015 p 43 Logo pela perspectiva da construção de uma aprendizagem significativa para que as aulas não sejam e três ensinar religião e fazer proselitismo Por fim é perceptível que na concepção do Currículo Referência de Minas Gerais o educando é colocado como centro e sujeito do processo educativo mas que na prática essas considerações devem ser incluídas na didática 4 RELATO DE EXPERIÊNCIA DO ENSINO RELIGIOSO EM UMA ESCOLA ESTADUAL DE LAGOA DOS PATOS MG Durante o período de estágio entre 2019 e 2021 foram realizadas observações na Escola Estadual Raimundo Nonato instituição que atende alunos do ensino fundamental e médio localizada no município de Lagoa dos Patos em Minas Gerais e que contempla alunos do meio rural e urbano com diversidade étnicoracial significativa No entanto foi constatada a ausência do ensino sobre a cultura Afro O ensino da cultura Afro é fundamental para promover a valorização da diversidade e combater o racismo estrutural presente em nossa sociedade Conforme afirmado por Kabengele Munanga o reconhecimento e valorização da cultura Afro é um passo importante na construção de uma sociedade mais justa e igualitária MUNANGA 1999 Ao incorporar essa temática no currículo escolar é possível contribuir para o fortalecimento da identidade Afrodescendente estimular a autoestima dos estudantes e promover o respeito à pluralidade cultural Durante o estágio na Escola Raimundo Nonato foram registradas diversas atividades desenvolvidas na tentativa de abordar a cultura Afro no contexto escolar Contudo constatouse uma lacuna significativa nesse aspecto As aulas de Ensino Religioso por exemplo focavam majoritariamente nas religiões cristãs com viés europeu deixando de lado a contribuição e a influência da cultura Afro na formação do país Além disso a literatura indicada nas disciplinas de língua portuguesa apresentava uma escassa representatividade da literatura Afrobrasileira A ausência do ensino sobre a cultura Afro tem impactos negativos tanto para os estudantes Afrodescendentes quanto para o conjunto da comunidade escolar De acordo com Nilma Lino Gomes a invisibilidade das contribuições dos povos Afrodescendentes na construção da sociedade brasileira reforça estereótipos e perpetua desigualdades GOMES 2005 A falta de conhecimento acerca da história das tradições e da importância da cultura Afro pode gerar a desvalorização da identidade Afrodescendente prejudicar a autoestima dos estudantes e perpetuar a exclusão social Com o objetivo de compreender melhor a situação e obter diferentes perspectivas foram realizadas entrevistas com professores e alunos Durante essas entrevistas foi possível constatar que muitos professores tinham pouca formação específica sobre a cultura Afro e enfrentavam dificuldades para abordar o tema de forma adequada Além disso os alunos Afrodescendentes manifestaram a falta de representatividade e identificação com o currículo e os materiais utilizados na escola Foi realizada uma análise dos materiais didáticos utilizados nas aulas como livros didáticos apostilas e recursos digitais Verificouse que a representatividade da cultura Afrobrasileira era mínima ou inexistente A maioria dos materiais privilegiava a história e a cultura eurocêntricas deixando de lado a contribuição e a influência da cultura Afro na formação do país Diante da ausência de materiais didáticos representativos foi realizada uma pesquisa para encontrar materiais alternativos que abordassem a cultura Afro de forma adequada e inclusiva Foram selecionados livros vídeos documentários e recursos digitais que poderiam complementar o currículo e enriquecer as aulas proporcionando uma visão mais ampla e precisa da cultura Afro Com base nas análises realizadas e nas reflexões decorrentes do estágio foram propostas ações para promover a inclusão da cultura Afro na escola Estadual Raimundo Nonato Algumas das propostas incluem revisão curricular para incluir conteúdos relacionados à cultura Afro em diferentes disciplinas capacitação e formação dos professores sobre a história e cultura Afrobrasileira parcerias com instituições e grupos locais ligados à cultura Afro para enriquecer as atividades escolares e atualização dos materiais didáticos utilizados incorporando obras e recursos que representem a diversidade étnicoracial 5 CIÊNCIAS DA RELIGIÃO UMA EXPERIÊNCIA TEÓRICO E PRÁTICA PARA O ENSINO RELIGIOSO Durante o estágio realizado na Escola Estadual Raimundo Nonato o tema da ausência do ensino na cultura Afro foi de extrema relevância e despertou em mim uma consciência ainda mais eficaz sobre a importância da inclusão e representatividade na educação Através das atividades desenvolvidas pude vivenciar experiências enriquecedoras e me deparei com desafios significativos Uma das experiências mais marcantes foi a oportunidade de observar as aulas e interagir com os professores e alunos Durante as entrevistas pude ouvir relatos dos alunos Afrodescendentes sobre a falta de identificação com o currículo e a ausência de referências à sua cultura alguns alunos mencionaram inclusive o receio quanto ao tema religiosidade afro Isso reforçou ainda mais a importância de uma educação inclusiva que valorize a diversidade étnicoracial e promova o respeito à cultura Afro Ao analisar os materiais didáticos utilizados constatei a falta de representatividade da cultura Afro e a predominância de uma perspectiva eurocêntrica Isso ressalta a necessidade urgente de revisão curricular e da inclusão de conteúdos relacionados à cultura Afro em diferentes disciplinas No entanto também enfrentei algumas dificuldades ao longo do estágio Uma delas foi a resistência por parte de alguns professores em abordar a temática religiões Afro seja por falta de conhecimento insegurança ou por não considerarem esse tema relevante para o currículo Superar essas barreiras exigiu paciência diálogo e a apresentação de argumentos embasados em referências teóricas No que diz respeito à vida acadêmica os conhecimentos adquiridos durante o curso de Ciências da Religião foram fundamentais para o desempenho das atividades de estágio As disciplinas Ciências da Religião e Eurocentrismo Estudos Culturais PósColonialistas Temas Transversais Cosmovisão das Religiões Kardecismo e AfroBrasileira e outras que abordaram questões de diversidade cultural história e educação antirracista me proporcionaram embasamento teórico e ferramentas para compreender e analisar criticamente a situação encontrada na escola Além de importantes eventos realizados no decorrer do curso como por exemplo o FEPEG Fórum de Ensino Pesquisa e Extensão da Universidade Estadual de Montes Claros I Seminário Nacional sobre relações étnicas e raciais no contexto socioeducacional brasileiro Unimontes e o Fórum de Biotemas na Educação Básica Em termos de aproveitamento do estágio considero que houve avanços significativos O relatório evidencia a identificação das lacunas na abordagem da cultura Afro na Escola Estadual Raimundo Nonato a compreensão dos impactos dessa ausência e a proposição de ações concretas para promover a inclusão Como sugestão ressalto a importância de investir em formação continuada para os professores proporcionando a eles conhecimentos e recursos para abordar a cultura Afro de forma adequada e inclusiva Além disso seria valioso estabelecer parcerias com instituições e grupos locais ligados à cultura Afro enriquecendo as atividades escolares e ampliando as perspectivas dos alunos Em suma o estágio foi uma experiência enriquecedora para minha formação acadêmica e pessoal Contribuiu para minha conscientização sobre a importância do ensino da cultura Afro e reforçou meu compromisso em promover uma educação mais inclusiva e antirracista Espero que as reflexões e propostas apresentadas neste relatório possam contribuir para transformações efetivas na Escola Estadual Raimundo Nonato e em outras instituições educacionais visando a valorização e respeito à diversidade cultural presente em nossa sociedade 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS Diante disso o objetivo de analisar a ausência do ensino sobre a cultura Afro na Escola Raimundo Nonato da Fonseca foi atingido de forma que a hipótese inicial acerca da negligência desses costumes no ensino religioso foi confirmada Isso porque notouse a predominância das religiões cristãs nas aulas dessa disciplina bem como a falta de literatura afrobrasileira como material de apoio Essa prática vista nessa instituição vai contra a diversidade defendida pela BNCC e pelo Currículo Estadual de Minas Gerais Como consequência deixase de fortalecer a identidade afrodescendente de estimular a autoestima dos discentes e de promover respeito à pluralidade cultural A partir da negligência notada foram propostas ações visando uma educação mais inclusiva antirracista e que valoriza as diferentes identidades culturais presentes no Brasil Por fim destacase a necessidade e possibilidade de produzir mais estudos acerca do tema a fim de identificar a inclusão ou não da cultura afro no ensino religioso nas escolas de outras cidades e estados Além disso esse relato de experiência também evidencia a necessidade de construir ações que garantam na prática a diversidade no ensino religioso impedindo que apenas religiões cristãs sejam abordadas nas escolas REFERÊNCIAS BAPTISTA Paulo Agostinho N Ciências da Religião e Ensino Religioso o desafio histórico da formação docente de uma área de conhecimento REVER revista de estudos da religião São Paulo v 15 n 2 p 107125 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