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PAIDEIA TÓPICOS DE FILOSOFIA E EDUCAÇÃO CURSOS DE GRADUAÇÃO EAD Paideia Tópicos de Filosofia e Educação Prof Ms Artieres Estevão Romeiro Prof Ms Edson Renato Nardi Prof Ms Marcos José Alves Lisboa e Prof Ms Ricardo Bazilio Dalla Vecchia Meu nome é Marcos José Alves Lisboa nasci em Tietê interior de São Paulo cidade que deixei para cursar filosofia Graduação e Pósgraduação na PUC Campinas Em Campinas fui professor de Filosofia na rede particular de ensino No ensino superior lecionei na Universidade Metodista de São Paulo São Bernardo do Campo para as disciplinas Filosofia e Ética e Cidadania para os cursos de Graduação No Centro Universitário Claretiano atuei como docente de filosofia para os cursos de licenciatura em Filosofia Pedagogia e Matemática e coordenador do curso de Licenciatura em Filosofia EaD além de participar como pesquisador do CNPq área de estudo Ética Fenomenológica e Hermenêutica e autor de materiais didáticos para cursos EaD Lógica I Filosofia História da Ciência e do Conhecimento Didática de Filosofia e Introdução à Filosofia Meu nome é Artieres Estevão Romeiro Sou graduado em Filosofia especialista em Metodologia do Ensino Superior especialista em Gestão e Liderança Universitária mestrando em Filosofia da Educação pela Unicamp e membro do grupo de pesquisa Paideia Atualmente sou Coordenador Geral de EaD do Centro Universitário Claretiano Tenho experiência na área de Filosofia e Educação com ênfase em Avaliação de EaD Fundamentos da Educação Ética Estética e Filosofia Alemã Adorno e Schopenhauer Email eadclaretianoedubr Olá amigos Meu nome é Ricardo Bazilio Dalla Vecchia Possuo Graduação em Filosofia e em Letras especialização em Educação e Letras e Mestrado em Filosofia Atualmente desenvolvo minha pesquisa de doutorado em Filosofia no IFCHUnicamp e sou membro do Grupo de Pesquisa CriM do CNPq Possuo experiência em Ensino e Gestão de cursos de Graduação e Pósgraduação em Filosofia assim como em Educação a Distância Email ricfilosofohotmailcom Saudações aos navegantes Meu nome é Edson Renato Nardi sou Filósofo e Educador Físico com mestrado 2010 em Educação pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho Araraquara e atualmente doutorando pela mesma instituição Atualmente atuo na coordenação da graduação em Filosofia no Centro Universitário Claretiano Atuo também na rede pública de ensino do estado de São Paulo como professor efetivo nas disciplinas de Educação Física e Filosofia Possuo uma experiência de aproximadamente 20 anos em escolas públicas na área de Ensino Fundamental e Médio No presente momento tenho focado meus estudos na área de Estética e Escola de Frankfurt Email coordenacaofilosofiaclaretianoedubr Fazemos parte do Claretiano Rede de Educação PAIDEIA TÓPICOS DE FILOSOFIA E EDUCAÇÃO Caderno de Referência de Conteúdo Marcos José Alves Lisboa Artieres Estevão Romeiro Ricardo Bazilio Dalla Vecchia Edson Renato Nardi Batatais Claretiano 2013 Fazemos parte do Claretiano Rede de Educação Ação Educacional Claretiana 2011 Batatais SP Versão dez2013 100 P164 Paideia tópicos de filosofia e educação Artieres Estevão Romeiro et al Batatais SP Claretiano 2013 192 p ISBN 9788567425757 1 Conhecer o ambiente histórico dos pressupostos teóricos da educação na Grécia Antiga visando compreender as características culturais econômicas e sociais e para isso partiremos da Grécia préhomérica século 20 aC até o período clássico século 4º aC 2 Analisar a influência dos sofistas na Grécia antiga e identificar as principais questões ligadas à educação as principais escolas e pensadores bem como os principais conceitos da filosofia antiga no que tange à educação salientando a decisiva função que tiveram na época 3 Desenvolver um olhar crítico diante da realidade educacional atual principalmente compreendendoa como fruto de um processo histórico intrinsecamente vinculado ao pensamento filosófico contemporâneo I Romeiro Artieres Estevão II Nardi Edson Renato III Lisboa Marcos José Alves IV Dalla Vecchia Ricardo Bazilio V Paideia tópicos de filosofia e educação CDD 100 Corpo Técnico Editorial do Material Didático Mediacional Coordenador de Material Didático Mediacional J Alves Preparação Aline de Fátima Guedes Camila Maria Nardi Matos Carolina de Andrade Baviera Cátia Aparecida Ribeiro Dandara Louise Vieira Matavelli Elaine Aparecida de Lima Moraes Josiane Marchiori Martins Lidiane Maria Magalini Luciana A Mani Adami Luciana dos Santos Sançana de Melo Luis Henrique de Souza Patrícia Alves Veronez Montera Rita Cristina Bartolomeu Rosemeire Cristina Astolphi Buzzelli Simone Rodrigues de Oliveira Bibliotecária Ana Carolina Guimarães CRB7 6411 Revisão Cecília Beatriz Alves Teixeira Felipe Aleixo Filipi Andrade de Deus Silveira Paulo Roberto F M Sposati Ortiz Rodrigo Ferreira Daverni Sônia Galindo Melo Talita Cristina Bartolomeu Vanessa Vergani Machado Projeto gráfico diagramação e capa Eduardo de Oliveira Azevedo Joice Cristina Micai Lúcia Maria de Sousa Ferrão Luis Antônio Guimarães Toloi Raphael Fantacini de Oliveira Tamires Botta Murakami de Souza Wagner Segato dos Santos Todos os direitos reservados É proibida a reprodução a transmissão total ou parcial por qualquer forma eou qualquer meio eletrônico ou mecânico incluindo fotocópia gravação e distribuição na web ou o arquivamento em qualquer sistema de banco de dados sem a permissão por escrito do autor e da Ação Educacional Claretiana Claretiano Centro Universitário Rua Dom Bosco 466 Bairro Castelo Batatais SP CEP 14300000 ceadclaretianoedubr Fone 16 36601777 Fax 16 36601780 0800 941 0006 wwwclaretianobtcombr SUMÁRIO CADERNO DE REFERÊNCIA DE CONTEÚDO 1 INTRODUÇÃO 9 2 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO 11 3 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 30 UNIDADE 1 DO ΜῦΘΟΣ AO ΛΟΓΟΣ UMA ANÁLISE DO NASCIMENTO DA FILOSOFIA OCIDENTAL 1 OBJETIVOS 31 2 CONTEÚDOS 32 3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE 32 4 INTRODUÇÃO À UNIDADE 33 5 LEVANTAMENTO HISTÓRICO 35 6 IMPORTÂNCIA DE HOMERO E HESÍODO PARA O NASCIMENTO DA FILOSOFIA 42 7 RELIGIÃO 49 8 MITO 53 9 DO MITO AO LOGOS 60 10 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS 62 11 CONSIDERAÇÕES GERAIS 64 12 EREFERÊNCIAS 65 13 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 66 UNIDADE 2 ANTIGUIDADE CLÁSSICA GREGA E A EDUCAÇÃO 1 OBJETIVOS 69 2 CONTEÚDOS 69 3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE 70 4 INTRODUÇÃO À UNIDADE 71 5 OS GREGOS E A EDUCAÇÃO 72 6 NOBREZA E ARETÉ 77 7 A ARETÉ HOMÉRICA 81 8 A ARETÉ EM HESÍODO 84 9 A PAIDEIA GREGA 86 10 A PAIDEIA EM HESÍODO 92 11 A PAIDEIA NO PERÍODO HOMÉRICO KALOS E AGATHÓS 93 12 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS 96 13 CONSIDERAÇÕES GERAIS 99 14 EREFERÊNCIA 99 15 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 99 Claretiano Centro Universitário UNIDADE 3 FILOSOFIA PRÁTICA OU SOBRE OS SOFISTAS 1 OBJETIVOS 101 2 CONTEÚDOS 102 3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE 102 4 INTRODUÇÃO À UNIDADE 103 5 O SURGIMENTO DOS SOFISTAS 107 6 ANTECEDENTES DO SOFISMO 108 7 A FILOSOFIA SOFISTA 108 8 SOFISTAS OS PRIMEIROS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO 110 9 A REVOLUÇÃO SOFÍSTICA 112 10 A EDUCAÇÃO SOFÍSTICA 116 11 ATUALIDADE E PERTINÊNCIA DOS SOFISTAS PARA A FILOSOFIA E A EDUCAÇÃO 117 12 TEXTO COMPLEMENTAR 119 13 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS 120 14 CONSIDERAÇÕES 121 15 EREFERÊNCIAS 122 16 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 122 UNIDADE 4 EVOLUÇÃO E DESDOBRAMENTOS DO CONCEITO DE PAIDEIA 1 OBJETIVOS 125 2 CONTEÚDOS 126 3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE 126 4 INTRODUÇÃO À UNIDADE 127 5 SÓCRATES 129 6 RECONSTRUÇÃO DO PENSAMENTO SOCRÁTICO 130 7 SÓCRATES O EDUCADOR POR EXCELÊNCIA 134 8 A IMPORTÂNCIA DO CORPO PARA OS GREGOS 137 9 A IMPORTÂNCIA DA OBRA APOLOGIA DE PLATÃO 139 10 POLÍTICA E ÉTICA EDUCACIONAL 140 11 A PAIDEIA SOCRÁTICOPLATÔNICA 142 12 A PAIDEIA ARISTOTÉLICA O HOMEM E A PÓLIS 143 13 DESDOBRAMENTOS DA PAIDEIA GREGA 145 14 TEXTOS COMPLEMENTARES 153 15 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS 155 16 CONSIDERAÇÕES FINAIS 158 17 EREFERÊNCIAS 159 18 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 159 UNIDADE 5 ANÁLISE CRÍTICA DA PAIDEIA CLÁSSICA E SUA IMPORTÂNCIA NA CONTEMPORANEIDADE 1 OBJETIVOS 161 2 CONTEÚDOS 161 3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE 162 4 INTRODUÇÃO À UNIDADE 163 5 UMA NOVA PROPOSTA DE ARETÉ 164 6 AS CRÍTICAS DA PAIDEIA REALIZADAS POR JACQUES DERRIDA 168 7 DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS PARA UMA NOVA PROPOSTA DE PAIDEIA 171 8 A IMPORTÂNCIA DE UMA NOVA PAIDEIA NA CONTEMPORANEIDADE 180 9 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS 185 10 CONSIDERAÇÕES FINAIS 188 11 EREFERÊNCIAS 189 EAD CRC Caderno de Referência de Conteúdo Ementa Conhecer o ambiente histórico dos pressupostos teóricos da Educação na Gré cia Antiga visando compreender as características culturais econômicas e so ciais e para isso partiremos da Grécia préhomérica século 20 aC até o Perí odo Clássico século 4º aC Analisar a influência dos sofistas na Grécia antiga e identificar as principais questões ligadas à Educação as principais escolas e pensadores bem como os principais conceitos da Filosofia antiga no que tange à Educação salientando a decisiva função que tiveram na época Desenvolver um olhar crítico diante da realidade educacional atual principalmente compre endendoa como fruto de um processo histórico intrinsecamente vinculado ao pensamento filosófico contemporâneo 1 INTRODUÇÃO A origem do conceito Paideia está na antiguidade clássica grega É a herança grega dos pressupostos do que hoje denomi namos Educação Infelizmente nos dias atuais costumase atribuir equivocadamente esses fundamentos às contribuições de pensa dores modernos e às vezes contemporâneos das diversas áreas do conhecimento É em virtude dessa visão desfocada da realidade Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 10 pedagógica que nos propomos a examinar com cuidado e atenção esse tema Longe de esgotálo apontaremos algumas pistas para reflexão do docente de Filosofia em formação sobre o processo que deu origem à Educação A obra Paideia a formação do homem grego de Werner Jaeger será nossa leitura obrigatória Evidentemente como já havíamos dito não esgotaremos o assunto dada sua densidade e complexidade Porém cada unidade foi cuidadosamente elaborada para que você tenha subsídios para a devida reflexão sobre o tema Na primeira unidade trataremos da questão da origem da Filosofia É essencial que examinemos sua gênese porque é pela genialidade do povo grego por meio da história que podemos compreender o processo de formação do homem e a elaboração do ideal de Humanidade Você estudará na segunda unidade os conceitos de Paideia Areté ou Excelência Agathós e Aristós Descobrirá a relação exis tente entre nobreza e Areté Na Unidade 3 o sofismo será nosso objeto de reflexão Não poderíamos dispensar esse tema importante dado o modelo de Educação que propunham Quanto à Unidade 4 estudaremos uma das figuras mais po lêmicas do Período Clássico no que se refere à Filosofia e à Edu cação Sócrates Estudaremos assim o conceito de Areté a partir do exame de seu método a evolução desse conceito na obra A República de Platão e por fim algumas contribuições produzi das por Aristóteles discípulo de Platão Logo a seguir ainda nesta unidade iremos apresentar a você alguns dos desdobramentos e agregações que ocorreram ao conceito de Paideia advindas do hu manismo romano a Paideia Christi cristã e a Bildung alemã Por fim na Unidade 5 discutiremos algumas considerações críticas realizadas pelo filósofo Friedrich Nietzsche em relação à proposta socrática e a crítica produzida pelo filósofo pósmoderno Claretiano Centro Universitário 11 Caderno de Referência de Conteúdo Jacques Derrida a todo o arcabouço em que se assenta os ideais de Paideia Logo depois apresentaremos algumas considerações críticas sobre o momento em que vivemos a contemporaneidade para percebermos a importância de pensarmos a necessidade do resgate de um ideal de Paideia Por fim mostraremos duas pro postas de criação de um ideal educativo advindas das considera ções do filósofo alemão Theodor Adorno e as do filósofo america no Mortimer Adler 2 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO Abordagem Geral Prof Ms Edson Renato Nardi Neste tópico apresentamos uma visão geral do que será es tudado neste Caderno de Referência de Conteúdo Aqui você en trará em contato com os assuntos principais deste conteúdo de forma breve e geral e terá a oportunidade de aprofundar essas questões no estudo de cada unidade Desse modo essa Aborda gem Geral visa fornecerlhe o conhecimento básico necessário a partir do qual você possa construir um referencial teórico com base sólida científica e cultural para que no futuro exercício de sua profissão você a exerça com competência cognitiva éti ca e responsabilidade social Vamos começar nossa aventura pela apresentação das ideias e dos princípios básicos que fundamen tam este CRC Ao longo dos próximos meses empreenderemos um diálogo que perpassará pensadores períodos históricos ideários políticos e culturais que terão como um de seus elementos mais importan tes para a temática da Educação tendo como pano de fundo o con ceito de Paideia A escolha deste conteúdo e desta abordagem neste momen to inicial de seu processo educativo não se deram por acaso e ao longo desse estudo três aspectos serão levados em consideração Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 12 O primeiro aspecto referese às razões que o levaram você futuro licenciado à escolha desta abordagem Ao optar por um curso de Licenciatura está implícita a expectativa de ao concluí la obter uma formação que permita exercer adequadamente a profissão de educador profissão esta que proporciona os alicerces da sociedade pois quem a exerce precisa se posicionar diante da realidade e será convidado a ajudar a transformála O segundo aspecto tratará da necessidade de apresentar mos um passeio panorâmico sobre o que se espera deste CRC Por fim o último aspecto tratará de algumas sugestões de condutas e cuidados que você poderia adotar em relação aos as suntos aqui trabalhados para que eles possam ser adequadamente estudados e possam vir a contribuir de fato para a sua formação profissional Com relação ao primeiro aspecto além das expectativas ine rentes à sua opção pela Licenciatura existe também a expectativa de que você venha a se apropriar de conceitos ideias e reflexões que compõe a área da Filosofia e portanto da figura do filósofo ou para lembrar os filósofos clássicos daquele que é amigo da sabedoria Do que foi dito de imediato poderíamos vir a questionar se é possível a junção destas duas expectativas pois em princípio elas apresentamse como distintas uma da outra Indo mais além po deríamos pressupor que ao se enfatizar a Educação em uma das expectativas estaríamos como que apequenando o gigantismo ou a profundidade da Filosofia ou ainda que a excessiva ênfase na apropriação do conhecimento filosófico poderia vir a fazer com que tenhamos um filósofo e amigo da sabedoria em detrimento de um futuro educador Embora não tenhamos condições de saber individualmente qual é a sua expectativa e a de seus demais colegas de caminhada sabemos que este tipo de questionamento é possível e por que Claretiano Centro Universitário 13 Caderno de Referência de Conteúdo não dizer natural pois como mostraremos a você a Filosofia traz em sua gênese o levantamento do ato de questionamento como uma de suas características principais No entanto este CRC neste momento de sua formação pro curará responder exatamente à possibilidade de conciliar essas ex pectativas isso porque buscaremos defender argumentativamen te ao longo de nossos estudos que a Educação está estritamente vinculada à Filosofia e a Filosofia ficaria como que inviabilizada sem que venhamos a lidar com o conceito de Educação Há de se ter claro que não estamos falando de qualquer edu cação estamos falando da educação como Paideia e nesse senti do convidamos você a verificar ao longo das unidades deste CRC que a relação entre Educação e Filosofia na abordagem que apre sentaremos se encontra em profunda simbiose Inicialmente para que você possa perceber a título introdu tório o quanto os contornos da Paideia estão presentes na cultura grega leia a seguir as considerações de Werner Jaeger 2001 p 27 o pesquisador que inspirou a construção deste CRC Dou a público uma obra de investigação histórica acerca de um problema até agora inexplorado a Paidéia a formação do homem grego como base para uma nova consideração de conjunto do fe nômeno grego Conquanto se tenha descrito frequentemente o desenvolvimento do Estado e da sociedade da literatura e da re ligião e filosofia dos gregos ninguém até hoje tentou evidenciar a ação recíproca entre o processo histórico pelo qual se chegou à formação do homem grego e o processo espiritual através do qual os gregos lograram elaborar o seu ideal de humanidade Todavia não foi por ela não ter tido cultores até agora que me devotei a esta tarefa eu o fiz porque julguei ver que da solução deste profundo problema histórico e espiritual estava pendente a inteligência da quela criação educativa ímpar da qual irradia a imorredoura ação dos gregos sobre todos os séculos Quanto ao segundo aspecto o passeio panorâmico pelo CRC devemos dizer que ele se construiu ao longo do tempo elegendo como prioridades propiciar a você o seguinte Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 14 1 Apresentar a relação existente entre Educação e Filoso fia manifestada no conceito de Paideia 2 Estabelecer algumas mudanças que o conceito de Pai deia sofreu ao longo do tempo por intermédio da ação de alguns pensadores e grupos culturais 3 Exemplificar alguns questionamentos críticos tecidos por pensadores a respeito da importância ou pertinên cia do ideário presente na Paideia grega 4 Sugerir algumas possibilidades de criação de novos ali cerces para a criação de uma Paideia na contempora neidade 5 Esboçar uma justificativa da necessidade do resgate de alguns dos elementos existentes na Paideia grega para analisarmos a nossa realidade atual ou ainda melhorar mos algumas situações com os quais nos deparamos na Educação contemporânea Como se percebe os temas que pretendemos tratar neste CRC são relativamente abrangentes e em razão disso considera mos agora necessário apresentar um aspecto que buscará orientá lo neste CRC e que caso seja adequadamente realizado tornará mais exitoso o caminho que traçamos para seus estudos Estamos nos referindo às sugestões de condutas e cuidados que você poderia adotar em relação aos assuntos que serão apre sentados Bem e por onde começar Inicialmente há de se dizer que a primeira sugestão que apresentamos a você se refere aos cuidados que deverá ter ao lidar com conceitos Mas o que são conceitos Cada conceito é uma ideia geral derivada ou inferida de ocorrên cias ou instâncias específicas Dito de outro modo um conceito é uma unidade cognitiva de significado ou ainda uma ideia abstrata ou símbolo mental que expressa uma unidade de significado A Filosofia lida sobretudo com conceitos Na verdade mui tas vezes busca até mesmo elucidar o significado de conceitos ou empreende ainda novas propostas de significado Em razão dis Claretiano Centro Universitário 15 Caderno de Referência de Conteúdo so há de se ter muito cuidado na interpretação e uso dos concei tos pois muitas vezes a ideia que você possui sobre determinado conceito pode ser diversa da proposta em determinado discurso ou usada por determinado autor Tomemos como exemplo o título deste CRC Como você pode perceber usamos a palavra Paideia muitas vezes associandoa a Educação no entanto você verá que o conceito de Educação no decorrer deste estudo apresentará outras formas de abordagem Além disso outros conceitos serão apresentados a você e dentre esses citamos os conceitos de Areté Kalós e Agathós Es ses conceitos são gregos e trazem consigo toda uma especificidade que necessita ser desvendada pois muitas vezes a tradução lite ral dessas palavras para o português não dá conta das especificida des de seu uso e significado na língua grega Diante disso convidamos você a mergulhar nesses concei tos buscar referências em leituras que viermos a sugerir para você ou ainda verificar em outras fontes os conceitos por nós apresen tados Nesse sentido uma boa dica que gostaríamos de lhe apre sentar é a de que você se municie com um bom dicionário de Fi losofia e que faça dele seu companheiro não somente neste CRC mas em todas as outras que virão ao longo deste curso O próximo aspecto que gostaríamos de refletir com você se refere à necessidade de lidar com o contraponto de ideias Embora tenhamos como importante o conceito de Paideia e nos esmere mos para defender as ideias presentes nesse conceito apresen taremos a você considerações críticas sobre ela pois como pre tendemos mostrar ao longo deste e de outros CRCs o exercício da Filosofia nunca deve ter como característica a busca por um ponto final sobre determinado tema isso porque ela mais se assemelha à busca de pontos e vírgulas Dito de outro modo poderíamos dizer que ao longo deste CRC você naturalmente irá encontrar maior afinidade com esse ou Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 16 aquele pensador ou ideia No entanto não desejamos que você tome essa ideia ou pensador como suficiente para todas as inqui rições e respostas pois se assim o fizer correrá o risco de perder algo inerente ao exercício do filosofar Por fim consideramos pertinente convidálo a se manifestar criticamente em relação a este CRC apresentando aprofundamen tos questionando os argumentos enfim fazendo uso de uma au tonomia argumentativa que será essencial ao longo desta Gradua ção e que permitirá a você alçar novas viagens e estabelecer novos destinos quer seja como educador ou como amigo da sabedoria Bem agora o convidamos a analisar conosco alguns dos ele mentos que consideramos centrais e que se encontram em cada uma das unidades deste CRC Unidade 1 Do mito ao logos uma análise do nascimento da Filo sofia ocidental Nesta unidade intentamos discutir com você os alicerces da cultura grega e para isso mostraremos as várias fases históricas pelo qual passou a cultura grega Estudaremos algumas das prin cipais características do período Préhomérico século 20 aC a 12 aC Homérico século 12 aC a 8º aC Arcaico século 8º aC a 6º aC e Clássico século 5º aC a 4º aC Feito isso apresentaremos a você algumas das característi cas que favoreceram aquilo que foi intitulado de milagre grego 1 o desenvolvimento do alfabeto 2 a criação da constituição 3 o surgimento da política 4 a intensa atividade comercial 5 a criação da moeda 6 as grandes navegações Logo a seguir verificaremos algumas das principais caracte rísticas da cultura grega e também vamos lhe oferecer mais deta lhes de um dos principais elementos dessa cultura sua importância Claretiano Centro Universitário 17 Caderno de Referência de Conteúdo para o surgimento da Filosofia o mito grego Buscaremos mostrar a você que os mitos sempre tiveram muita importância para todas as sociedades especialmente na ci vilização grega Unidade 2 Antiguidade clássica grega e a Educação A Unidade 2 amparase nas ideias apresentadas na obra Pai déia a formação do homem grego de Werner Jaeger Nela estu daremos o conceito central que dá nome a este CRC e também de alguns outros conceitos gregos extremamente ligados a ele Bem e quem foi Werner Jaeger 18881961 Foi professor em Harvard e publicou Paidéia em 1933 obra na qual concentrou seus esforços para analisar as ideias e as práticas de Educação no mundo helenístico buscando demonstrar que essas ideias e prá ticas fundamentaram os sistemas educacionais e os sistemas de pensamento da atualidade Veremos os dois grandes sustentácu los da Educação grega manifestados em Homero o educador da nobreza grega e Hesíodo cuja obra tem forte vinculação com a Educação do homem do campo Quais aspectos gostaríamos de salientar a você nesse mo mento No período homérico o conceito de Paideia estava extre mamente vinculado à cultura e à Educação e ambas eram consi deradas a face de uma mesma moeda As virtudes do herói bus cadas pela aristocracia grega ou a Educação em valores e para o trabalho por intermédio da religião e dos mitos em que o homem comum seria educado vinculavamse a esse conceito Há de se destacar que apesar de terem existido grandes sistemas educativos manifestados na tradição oral para Jaeger somente com os gregos surgiu o que podemos verdadeiramente chamar de civilização e perseguição de um ideal Para os gregos o objetivo da Educação era o desenvolvimen to de um tipo elevado de homem Eles acreditavam que a Edu cação abrangia o propósito de todos os esforços humanos e não Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 18 bastasse isso a Educação seria a justificação máxima para a exis tência do indivíduo e da comunidade Nesse processo a cultura seria resultado e parceira da Educação Mas observe que quan do falamos em cultura essa não seria segundo Jaeger somente o ideal antropológico de formas e expressões combinadas de uma nação Para ele na Paideia grega iniciavase a perseguição cons ciente de um ideal um conceito de valor Assim as interrelações entre cultura e Educação acabaram por gerar um ideal de formação do homem Com isso as pessoas apropriaramse do desejo de aquisição desse ideal estabelecido e à medida que seguiam os parâmetros para alcançálo e aproxima vamse desse ideal podiam ver nisso sua realização pessoal Nesta unidade constam os conceitos que comporão todas as nossas discussões futuras ao longo do CRC Dentre estes concei tos destacamos o de Paideia ou seja um ideal educativo vincula do a uma cultura O conceito de Areté referese a um ideal de Ex celência ou virtude os conceitos de Kalós e Agathós sendo esses respectivamente vinculados à ideia de beleza e virtuosidade Você verá que a Kalokagathia grega sofrerá influências e interpretações diferenciadas por parte de Homero e Hesíodo Unidade 3 Filosofia prática ou sobre os sofistas Esta unidade trata de um grupo de filósofos que ao longo do tempo sofreram uma série de ataques em geral injustos e que acabaram por fazer cair no esquecimento uma série de contribui ções da cultura grega ou seja estudaremos a importância dos fi lósofos sofistas e suas ideias Se fossemos utilizar uma conceituação contemporânea para definilos poderíamos dizer que os sofistas seriam aqueles que fazem uso de sofismas ou seja um tipo de argumento especial utilizado para convencer alguém No entanto mostraremos a você que na Grécia antiga os sofistas pertenciam a uma categoria de professores especializados no uso das ferramentas da Filosofia e da retórica com o propósito de ensinar a Areté ou Excelência Claretiano Centro Universitário 19 Caderno de Referência de Conteúdo Um aspecto que consideramos importante para sua análise e que inserimos nesta unidade é a estreita vinculação das mudanças políticas que passava a cidade de Atenas quando do florescimento dos sofistas Veremos que o grande líder grego Péricles em um de seus discursos fazia uso de elementos da Excelência sofística isto é a habilidade discursiva Não buscaremos tratar especificamente da influência do pensamento sofístico nas ideias de Péricles mas argumentaremos que a presença da sofística no apogeu da demo cracia grega sob a liderança de Péricles certamente não se deu por acaso A partir desses elementos esperamos colaborar para que você perceba novas possibilidades de análise dos sofistas execra dos por alguns filósofos Platão Aristóteles etc e elogiados por outros Nietzsche Unidade 4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia Nesta unidade analisaremos algumas personalidades que contribuíram com alicerces mais sólidos na construção da Filoso fia Estamos nos referindo a nomes como Sócrates Platão e Aris tóteles À medida que você se dedicar aos estudos desta unida de verá que a busca pela sabedoria manifestada na célebre frase atribuída a Sócrates uma vida não refletida não vale a pena ser vivida ganhará força e intensidade pois a partir desses filósofos ocorrerá uma forte vinculação de um ideal de Paideia manifesta do na busca de conhecimento Ou seja diferentemente do que se acreditava até então não basta mais ser corajoso ou nobre tal como em Homero ou ainda trabalhador tal como proposto por Hesíodo mas ser portador de Areté buscar a sabedoria ou para lembrarmos Sócrates é virtuoso aquele que sabe que nada sabe e em razão disso sempre está buscando o saber Além disso buscaremos tratar de alguns desdobramentos da Paideia grega em outras culturas e momentos históricos Dessa forma você conhecerá um pouco do conceito de Humanismo a Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 20 apropriação da Paideia em um mundo cristão com o consequente surgimento da Paideia Christi e por fim terá contato com as ma nifestações recentes da Paideia que surgiram com o movimento germanoeuropeu denominado Bildung Unidade 5 Análise crítica da Paideia e sua importância na contemporaneidade Por fim nessa última unidade buscaremos despertar em você algumas reflexões a respeito da Educação na contempora neidade Inicialmente incentivaremos você a reconhecer que em Filosofia sempre haverá o contraditório ou seja uma visão divergente em relação a qualquer tema Para que você possa ava liar essa característica eminentemente filosófica apresentaremos as ideias de dois pensadores que fizeram críticas à Paideia grega Friedrich Nietzsche e Jacques Derrida Com a apresentação das veementes críticas desses pensa dores esperamos incentiválo a repensar tudo aquilo que estudou até o momento Mostraremos a você alguns dos desafios no mun do atual quando iniciarmos uma análise da Educação contempo rânea Para isso apresentaremos algumas considerações a respei to desse tema advindas da corrente filosófica chamada Escola de Frankfurt Ao término da unidade buscaremos lhe apresentar duas possibilidades para que possa refletir a respeito da Educação na atualidade quem sabe servindo isso para o início para uma nova Paideia A primeira alicerçase nas ideias de Theodor Adorno e seu conceito de emancipação e a segunda um pouco menos conheci da manifestase nas ideias do filósofo norteamericano Mortimer Adler e sua proposta para uma Paideia Bem e o que esperamos com isso Ao pensarmos em nossa despedida ao final do estudo deste CRC recorremos a uma frase escrita no século 12 pelo filósofo francês Bernard de Chartres CHARTRE apud MERTON 1993 p 37 e que se caracterizou por afimar que Somos como pigmeus sobre os ombros de gigantes Claretiano Centro Universitário 21 Caderno de Referência de Conteúdo Por gigantes entendemos toda nossa herança filosófica ocidental e em razão dela torcemos para que você se aproprie dos ideais daqueles que nos antecederam e possa perceber o quanto a relação Educação e cultura é importante o quanto estamos carentes de um ideal de construção pessoal a partir de um ideal humano ou de humanidade Enfim esperamos que você descubra uma proposta de Exce lência como diriam os gregos de Areté e que esta possa fazer com que você se anime nesse processo de superação e de realização de uma excelência humana fincada fortemente nos alicerces da Educação Bons estudos Glossário de Conceitos O Glossário de Conceitos permite a você uma consulta rápi da e precisa das definições conceituais possibilitandolhe um bom domínio dos termos técnicocientíficos utilizados na área de co nhecimento dos temas tratados no CRC Paideia Tópicos de Filoso fia e Educação Veja a seguir a definição dos principais conceitos 1 Ágora lugar aberto onde se realizavam as assembleias nas antigas cidadesestados gregas Especificamente no caso de Atenas a ágora acabou tornandose símbolo da democracia grega pois nela participavam aqueles que eram considerados cidadãos atenienses 2 Areté de modo geral corresponde a uma espécie de Ex celência ou seja a necessidade de preenchimento de uma certa função ou objetivo Dito de outro modo se estabelecermos um parâmetro de Excelência e vivermos em busca da construção e aproximação desse parâme tro estamos buscando a construção de nossa Areté Nessa palavra está presente a ideia de que deveríamos viver da melhor forma que poderíamos ou ainda em busca do mais valoroso potencial humano 3 Etnocentrismo conceito muito utilizado contempora neamente pois trata de questões que na atualidade Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 22 ganharam peso e importância quando nos dedicamos a analisar as relações entre culturas e povos diferentes De modo geral podemos dizer que o etnocentrismo se caracteriza por um julgamento de valor esse julga mento de valor é aplicado a outras culturas ou sistemas culturais e ao fazêlo o realizamos a partir de nossos próprios padrões culturais Esses julgamentos de valor se aplicam a várias facetas de manifestações culturais e dentre eles citamos os julgamentos que fazemos a res peito dos costumes de determinada cultura seu com portamento religião linguagem etc Vejamos a seguir a definição apresentada por Costa Filho 2006 p 12 O termo indica uma visão de mundo que considera meu grupo como padrão para o julgamento dos comporta mentos dos outros O que é diferente é rejeitado É ridi cularizado Meu modo de vida é o correto O dos outros está errado Esta postura se origina de um processo de estranhamento comum nos choques entre culturas di ferentes No entanto tornase preconceituosa quando julga um modo de vida superior a outro Sua origem advém da palavra grega etnos e esta palavra tem sido traduzida como povo raça cultura nação etc O criador deste conceito foi o sociólogo Willian Graham Sumner e a definição que apresentou é a que se segue Etnocen trismo é o nome técnico para esta visão das coisas no qual a visão do próprio grupo é o centro de tudo e todos os outros são escalados e classificados com referência a este SUMNER 1973 p 135 4 Humanismo o conceito de Humanismo ou de seus deri vados o de humanidade tem profunda vinculação com os temas que iremos estudar neste CRC Embora faça mos algumas considerações baseadas em Werner Jaeger e que associam o Humanismo à Paideia grega veremos que esse conceito traz consigo peculiaridades que o dis tingue e o aproxima de sua origem semântica na cultura romana Segundo Nicola Abbagnano 2007 p 519 Em sentido mais geral podese entender por Humanismo qualquer tendência filosófica que leve em consideração as possibilidades e portanto as limitações do homem e que com base nisso redimensione os problemas filo sóficos Claretiano Centro Universitário 23 Caderno de Referência de Conteúdo 5 Kalós Kagathos junção de dois adjetivos gregos o pri meiro referese à Kalós beleza e o outro à Agathós vir tuoso ou bom Usado no Período Clássico grego o ter mo Kalokagatkía era utilizado para se referir a um ideal de conduta pelo qual o grego deveria se pautar sobre tudo na esfera militar A expressão grega καλοκαγαθία desempenha um papel importante na formulação de muitas concepções éticas éticosociais e éticopolíticas da Antiguidade Literalmente a qualidade da Kalokaga thía equivale à qualidade beleza e bondade possui καλοκαγαθία quem é καλός κάγαθός belo e bom Nesse contexto ser belo significa primariamente ser nobre no sentido de ser um bom exemplar do próprio tipo ser belo é por assim dizer ser de raça A ex pressão καλός κάγαθός é muitas vezes traduzida como homem honrado ou homem de honra não somen te com o sentido de um homem honrado mas de ser o modelo para todo homem honrado de pertencer às seletas fileiras dos καλοί κάγΐβοι Esse modelo de ho mem honrado nobre e bom é também bom cidadão MORA 1970 p 1042 6 Paideia conceito exercerá a função de núcleo de todas as nossas indagações Inicialmente procuraremos vín culos que a Paideia poderia se ter com o conceito con temporâneo de Educação Apresentar sua conceituação ainda não é tarefa muito fácil porém alguns estudiosos já procuraram fazêlo Para Jaeger 2001 s p na apre sentação de sua obra reconhece que Paideia é difícil de definir como outros conceitos de grande amplitude por exemplo os de Filosofia ou cultura resiste a dei xarse encerrar numa fórmula abstrata Seu conteúdo e significado só se revelam plenamente quando lemos a sua história e lhes seguimos o esforço para conseguirem plasmarse na realidade Na tentativa de conceituar esse termo muitos o inserem no conceito de cultura como Abbagnano 2007 p 225 No significado referente à formação da pessoa huma na individual essa palavra corresponde ainda hoje ao que os gregos chamavam de Paidéia e que os latinos na época de Cícero e Varrão indicavam com a palavra hu Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 24 manitas a Educação do homem como tal ou seja Edu cação devida às boas artes peculiares do homem que o distinguem de todos os outros animais As boas artes eram a poesia a eloqüência a Filosofia etc às quais se atribuía valor essencial para aquilo que o homem é e deve ser portanto para capacidade de formar o homem verdadeiro o homem na sua forma genuína e perfeita Para os gregos a cultura nesse sentido foi a busca e a realização que o homem faz de si isto é da verdadeira natureza humana E teve dois caracteres constitutivos 1ª estreita conexão com a Filosofia na qual se incluíam todas as formas de investigação 2ª estreita conexão com a vida social Em primeiro lugar para os gregos o homem só podia realizarse como tal através do conheci mento de si mesmo e de seu mundo portanto mediante a busca da verdade em todos os domínios que lhe dis sessem respeito Em segundo lugar o homem só podia realizarse como tal na vida em comunidade na pólis A República de Platão é a expressão máxima da estrei ta ligação que os gregos estabeleciam entre a formação dos indivíduos e a vida da comunidade e a afirmação de Aristóteles de que o homem é por natureza um animal político tem o mesmo significado Mas num e noutro as pecto a natureza humana de que se fala não é um dado um fato uma realidade empírica ou material já existen te independentemente do esforço de realização que é a cultura Só existe como fim ou termo do processo de formação cultural é em outros termos uma realidade superior às coisas ou fatos é uma idéia no sentido platô nico um ideal uma forma que os homens devem procu rar realizar e encarnar em si mesmos 7 Panteísmo palavra de origem grega resultado da junção de dois vocábulos pan tudo e theos Deus Segundo Japiassú 2001 p 206 podese dizer que o panteísmo é a concepção segundo a qual tudo o que existe deve sua existência a Deus e em última análise se identifica com Deus Deus é assim um ser imanente ao mundo à natureza e não um ser exterior e transcendente Assim para o panteísta não existiria um deus pessoal com ca racterísticas antropomórficas ou ainda o deus criador tal como prega por exemplo o cristianismo Dentre os Claretiano Centro Universitário 25 Caderno de Referência de Conteúdo grandes pensadores que tiveram uma fundamentação panteísta podemos citar Spinoza e uma de suas frases emblemáticas Deo sive natura Deus está na natureza 8 Falocentrismo termo utilizado com especial ênfase pelo filósofo francês Jacques Derrida e utilizado para se refe rir ao domínio dos valores masculinos ao longo da histó ria ocidental e que tiveram na cultura grega e em seus ideais de Paideia um de seus alicerces principais Dizse que em uma sociedade falocêntrica o falo constitui o va lor fundamental dela 9 Logocentrismo embora neste CRC façamos uso desse termo a partir das considerações do pensador francês Jacques Derrida ele surgiu a partir das considerações do filósofo alemão Ludwig Klages JUSSI 2012 sp De modo geral segundo Klages a postura logocêntrica caracterizase por considerar como superior o logos a palavra ou ainda o ato da fala como sendo superior nos sistemas ou ainda estruturas que utilizamos para co nhecer Esquema dos Conceitoschave Para que você tenha uma visão geral dos conceitos mais im portantes deste estudo apresentamos a seguir Figuras 1 e 2 um Esquema dos Conceitoschave O mais aconselhável é que você mesmo faça o seu esquema de conceitoschave ou até mesmo o seu mapa mental Esse exercício é uma forma de você construir o seu conhecimento ressignificando as informações a partir de suas próprias percepções É importante ressaltar que o propósito desse Esquema dos Conceitoschave é representar de maneira gráfica as relações entre os conceitos por meio de palavraschave partindo dos mais com plexos para os mais simples Esse recurso pode auxiliar você na or denação e na sequenciação hierarquizada dos conteúdos de ensino Com base na teoria de aprendizagem significativa entende se que por meio da organização das ideias e dos princípios em es quemas e mapas mentais o indivíduo pode construir o seu conhe Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 26 cimento de maneira mais produtiva e obter assim ganhos peda gógicos significativos no seu processo de ensino e aprendizagem Aplicado a diversas áreas do ensino e da aprendizagem es colar tais como planejamentos de currículo sistemas e pesquisas em Educação o Esquema dos Conceitoschave baseiase ainda na ideia fundamental da Psicologia Cognitiva de Ausubel que es tabelece que a aprendizagem ocorre pela assimilação de novos conceitos e de proposições na estrutura cognitiva Assim novas ideias e informações são aprendidas uma vez que existem pontos de ancoragem Temse de destacar que aprendizagem não significa ape nas realizar acréscimos na estrutura cognitiva é preciso sobretu do estabelecer modificações para que ela se configure como uma aprendizagem significativa Para isso é importante considerar as entradas de conhecimento e organizar bem os materiais de apren dizagem Além disso as novas ideias e os novos conceitos devem ser potencialmente significativos para todos os sujeitos envolvi dos uma vez que ao fixar esses conceitos nas suas já existentes estruturas cognitivas outros serão também relembrados Nessa perspectiva partindose do pressuposto de que é você o principal agente da construção do próprio conhecimento por meio de sua predisposição afetiva e de suas motivações inter nas e externas o Esquema dos Conceitoschave tem por objetivo tornar significativa a sua aprendizagem transformando o seu co nhecimento sistematizado em conteúdo curricular ou seja esta belecendo uma relação entre aquilo que você acabou de conhecer com o que já fazia parte do seu conhecimento de mundo Utiliza ção de Mapas Conceituais na Educação Claretiano Centro Universitário 27 Caderno de Referência de Conteúdo Figura 1 e 2 Esquemas dos Conceitoschave do Caderno de Referência de Conteúdo Paideia Tópicos de Filosofia e Educação Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 28 Como se pode observar os esquemas oferecem uma visão geral dos conceitos mais importantes deste estudo Ao seguilo será possível transitar entre os principais conceitos deste CRC e descobrir o caminho para construir o seu processo de ensino aprendizagem O Esquema dos Conceitoschave é mais um dos recursos de aprendizagem que vem se somar àqueles disponíveis no ambien te virtual por meio de suas ferramentas interativas bem como àqueles relacionados às atividades didáticopredagógicas realiza das presencialmente no polo Lembrese de que você aluno EaD deve valerse da sua autonomia na construção de seu próprio co nhecimento Questões Autoavaliativas No final de cada unidade você encontrará algumas questões autoavaliativas sobre os conteúdos ali tratados as quais podem ser de múltipla escolha abertas objetivas ou abertas dissertativas Responder discutir e comentar essas questões bem como re lacionálas com a prática do ensino de Filosofia pode ser uma forma de você avaliar o seu conhecimento Assim mediante a resolução de questões pertinentes ao assunto tratado você estará se preparando para a avaliação final que será dissertativa Além disso essa é uma maneira privilegiada de você testar seus conhecimentos e adquirir uma formação sólida para a sua prática profissional Você encontrará ainda no final de cada unidade um gabari to que lhe permitirá conferir as suas respostas sobre as questões autoavaliativas de múltipla escolha As questões de múltipla escolha são as que têm como respos ta apenas uma alternativa correta Por sua vez entendese por questões abertas objetivas as que se referem aos conteúdos matemáticos ou àqueles que exigem uma resposta determinada inalterada Já as questões abertas dissertativas obtêm por res posta uma interpretação pessoal sobre o tema tratado por isso normalmente não há nada relacionado a elas no item Gabarito Claretiano Centro Universitário 29 Caderno de Referência de Conteúdo Você pode comentar suas respostas com o seu tutor ou com seus colegas de turma Bibliografia Básica É fundamental que você use a Bibliografia Básica em seus estudos mas não se prenda só a ela Consulte também as biblio grafias complementares Figuras ilustrações quadros Neste material instrucional as ilustrações fazem parte inte grante dos conteúdos ou seja elas não são meramente ilustra tivas pois esquematizam e resumem conteúdos explicitados no texto Não deixe de observar a relação dessas figuras com os con teúdos do CRC pois relacionar aquilo que está no campo visual com o conceitual faz parte de uma boa formação intelectual Dicas motivacionais O estudo deste CRC convida você a olhar de forma mais apu rada a Educação como processo de emancipação do ser humano É importante que você se atente às explicações teóricas práticas e científicas que estão presentes nos meios de comunicação bem como partilhe suas descobertas com seus colegas pois ao com partilhar com outras pessoas aquilo que você observa permitese descobrir algo que ainda não se conhece aprendendo a ver e a notar o que não havia sido percebido antes Observar é portanto uma capacidade que nos impele à maturidade Você como aluno dos cursos de Graduação na modalidade EaD necessita de uma formação conceitual sólida e consistente Para isso você contará com a ajuda do tutor a distância do tutor presencial e sobretudo da interação com seus colegas Sugeri mos pois que organize bem o seu tempo e realize as atividades nas datas estipuladas Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 30 É importante ainda que você anote as suas reflexões em seu caderno ou no Bloco de Anotações pois no futuro elas pode rão ser utilizadas na elaboração de sua monografia ou de produ ções científicas Leia os livros da bibliografia indicada para que você amplie seus horizontes teóricos Cotejeos com o material didático discuta a unidade com seus colegas e com o tutor e assista às videoaulas No final de cada unidade você encontrará algumas questões autoavaliativas que são importantes para a sua análise sobre os conteúdos desenvolvidos e para saber se estes foram significativos para sua formação Indague reflita conteste e construa resenhas pois esses procedimentos serão importantes para o seu amadure cimento intelectual Lembrese de que o segredo do sucesso em um curso na modalidade a distância é participar ou seja interagir procurando sempre cooperar e colaborar com seus colegas e tutores Caso precise de auxílio sobre algum assunto relacionado a este CRC entre em contato com seu tutor Ele estará pronto para ajudar você 3 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABBAGNANO N Dicionário de Filosofia São Paulo Martins Fontes 2007 COSTA FILHO I C Etnocentrismo comunição e cultura popular Revista da FA7 v 1 2006 JAEGER W Paidéia a formação do homem grego Tradução de Artur M Parreira São Paulo Martins Fontes 2001 JUSSI B Logocentrism and the gathering y Heidegger Derrida and contextual centers of meaning Research in Phenomenology v 42 n 1 p 6791 2012 MERTON R K On the shoulders of giants a Shandean postscript Chicago University of Chicago Press 1993 MORA J F Dicionário de Filosofia Buenos Aires Editorial Sudamericana 1970 SUMNER W G Folkways and Mores In MIZRUCHI E H Org The substance of sociol ogy codes conduc and consequences New York Meredith Corporation 1973 1 EAD Unidade 1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental 1 OBJETIVOS Reconhecer e comentar sobre a importância da origem da Filosofia para a compreensão do fenômeno educacional grego Examinar e comentar sobre a passagem do mito para o logos Contextualizar historicamente a passagem do mito ao logos com ênfase aos séculos precedentes ao século 6º aC quando se convenciona o nascimento da Filosofia tratandose também das hipóteses que envolvem esse momento Analisar as influências de Hesíodo e sobretudo de Ho mero no nascimento da Paideia grega Especular e enumerar as principais características da Pai deia grega desse período Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 32 Analisar e comentar a passagem do mito à Filosofia con siderando alguns conceitos e paradigmas da época Investigar e identificar as principais marcas da Filosofia nascente considerando seu método objeto da análise etc Reconhecer e comentar as principais teses sobre o nas cimento da Filosofia com atenção especial às ideias do gênio grego e da racionalização progressiva 2 CONTEÚDOS Período Préhomérico Período Homérico Período Arcaico Período Clássico Religião Pública Religião dos Mistérios orfismo Mito Do mito ao logos 3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE Antes de iniciar o estudo desta unidade é importante que você leia as orientações a seguir 1 Busque outros comentários sobre o nascimento da Fi losofia e se encontrar algo interessante disponibilizeo para seus colegas na Lista 2 Ler as obras Ilíada e Odisséia de Homero é fundamental para sua formação portanto não deixe de fazêlo 3 Leia os livros indicados no tópico Referências Bibliográfi cas e não se esqueça de que este CRC é apenas um refe rencial de conteúdo Claretiano Centro Universitário 33 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental 4 Caso você se interesse por mitos a obra O poder do mito de Joseph Campbell citada nas referências já pode ser encontrada em DVD O Poder do Mito Documentário Direção de Bill Moyers EUA 2006 5 Caso precise de auxílio sobre algum assunto relacionado a este conteúdo entre em contato com seu tutor Ele estará pronto para ajudálo 6 Se quiser conhecer mais sobre essas teorias consulte a obra de Bulfinch 1999 citada nas Referências bibliográ ficas 4 INTRODUÇÃO À UNIDADE O desenvolvimento do pensamento lógico é certamente um fator único em toda a história da humanidade Graças a ele o homem pôde construir coisas nunca antes imagináveis dentre as quais enfocamos a Filosofia e a Educação Com o advento do pensamento filosófico há uma revolução radical na forma do homem se posicionar diante do mundo e dele mesmo e isso influencia diretamente todas as dimensões de sua existência Nesse primeiro momento cuidaremos da mudança paradig mática decorrente do nascimento da Filosofia para só então nas próximas unidades tratar de questões mais específicas ao univer so da formação educacional Problema originário Por que e como surgiu a Filosofia Ou de forma mais global quais as condições que possibilitaram o advento do pensamento racio nal Agora convidamos você a buscar e fundamentar a respos ta dessas intrigantes questões pensando sempre nas implicações decorrentes Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 34 Ora quando a maioria dos profissionais das chamadas ciên cias humanas resolve iniciar uma pesquisa a primeira atitude to mada é rastrear de forma detalhada as condições de nascimento gênese e estruturação que envolvem seu objeto de estudo Por exemplo um psicólogo ao iniciar o tratamento de algum paciente faz uma investigação cuidadosa de seus anos iniciais do quadro existente em seu nascimento levando em consideração as mais diversas dimensões o que também é feito pelo antropólogo que ao decidir pesquisar sobre determinado grupo começa a re colher todo o material possível sobre as condições que favorece ram aquela formação Contudo o que percebemos é que muitas vezes esse proce dimento é negligenciado e isso ocorre sobretudo no campo da Filosofia Para ilustrar e embasar essa afirmação vamos buscar alguns exemplos em manuais de Filosofia 1 A filosofia surgiu por volta do século 7º ou 6º aC Contrastando com os mitos ela tem por objetivo dar aos fatos uma explicação lógica e racional COTRIM 1989 p 10 2 floresceu precisamente em Mileto colônia grega do litoral da Ásia Menor durante todo o século 6º PADOVANI CASTAGNOLA 1974 p 99 As citações confirmam o que dissemos pois percebemos que na Filosofia muitas análises ocorrem e são aprofundadas sem esse tratamento genealógico inicial Em relação a esses textos é perceptível o tratamento inadequado dado ao surgimento da Fi losofia neles as informações são apresentadas de forma superfi cial e os fatos importantes são omitidos especificamente sobre a contraposição da Filosofia em relação aos mitos a qual é feita de forma simplificadora das questões envolvidas neste tema Desse momento em diante procuraremos examinar com cuidado as diversas facetas que colaboraram para o advento do Claretiano Centro Universitário 35 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental pensamento filosófico levando em conta sua grande influência so bre todo o pensamento posterior Como retomar o nascimento da Filosofia Como estudar esse período tão rico e grandioso em significado Como não cair no erro de analisálo desregradamente Qual caminho seguir e como seguilo Para não cometer os mesmos erros que cometem os manu ais de Filosofia por nós criticados neste tópico traçaremos um itinerário de pesquisa tendo em vista apresentar e em sentido mais específico eleger o instrumental teórico por meio do qual delinearemos nossa análise Optamos pelo seguinte itinerário 1 Contextualização histórica com ênfase aos séculos pre cedentes ao 6º século aC o qual se convenciona para o nascimento da Filosofia tratando também das hipóte ses que envolvem esse momento 2 Análise das influências de Hesíodo e sobretudo Home ro no nascimento da Filosofia e respectivamente da Paideia grega 3 Especulação sobre as principais características da cons ciência mítica 4 Exame da passagem do mito à Filosofia considerando al guns conceitos e paradigmas da época 5 Investigação das principais marcas da Filosofia nascente considerando seu método objeto de análise etc 6 Reconhecimento das principais teses sobre o nascimen to da Filosofia com atenção especial às ideias do gênio grego e da racionalização progressiva 5 LEVANTAMENTO HISTÓRICO Compreendendo a história como um organismo vivo e dire tamente atuante em nossa existência optamos inicialmente por confeccionar uma breve retomada histórica que nos fornecerá os Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 36 instrumentos necessários para nos situarmos no nosso ambiente de análise As principais análises históricas dividem a antiguidade Grega em quatro grandes períodos a saber 1 Préhomérico século 2012 aC 2 Homérico século 128º aC 3 Arcaico século 8º6º aC 4 Clássico século 5º4º aC Convidamos você a conhecer panoramicamente cada um deles Vamos lá Período Préhomérico O Período Préhomérico século 20 aC12 aC foi palco da chegada dos povos que configurariam por definitivo a formação da Grécia dentre eles os aqueus seguidos dos jônios e dos eólios que foram se instalando nas ilhas do mar Egeu e por todo o litoral da Ásia Menor Os aqueus com suas férteis terras construíram diversas ci dades dentre elas a importante cidade de Micenas Com o tempo passaram a estabelecer contato com a população da ilha de Creta que era pioneira nos ramos comercial e marítimo Essas relações possibilitaram uma considerável expansão dos aqueus pois eles passaram a dominar dentre outras coisas a arte da navegação a metalurgia do bronze e o uso da escrita Em aproximadamente 1100 aC os dórios servidos de suas armas de ferro atacaram o povo aqueu ocasionando uma fuga das populações para o interior do continente o que ficou conhe cido como a primeira diáspora grega que deu origem aos génos γένοσ que representavam grandes famílias ou clãs Com o surgi mento dos génos iniciase o Período Homérico Claretiano Centro Universitário 37 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental Período Homérico Esse período foi nomeado homérico porque o que sabe mos dele nos é trazido por intermédio das obras Ilíada e Odisséia atribuídas ao poeta Homero Adiante iremos nos dedicar a anali sar algumas das principais contribuições de Homero para a Paideia e para a Filosofia grega mas antes disso convém contextualizar mos esse período Uma das principais marcas do período além da invasão dos dórios foi a existência do génos Os génos possuíam terras em co mum e sua agricultura era dirigida unicamente à subsistência dos moradores Eles eram liderados pelo homem mais velho do clã em um regime de poder patriarcal Há relatos ainda de que nos génos havia um culto aos antepassados que eram considerados heróis ou descendentes dos deuses gregos Aproximadamente nos quatro séculos que compreendem o Período Homérico uma crise generalizada desencadeouse na estrutura dos génos devido entre outras coisas ao crescimento populacional que gerou a divisão da terra e dos bens Com o crescimento populacional as terras férteis não mais suportavam a demanda gerando uma escassez de alimentos que culminou em vários conflitos pelo direito do uso da terra iniciando um processo de privatização das propriedades Como consequência das sociedades privadas nasceu a de sigualdade social a divisão em classes e o individualismo bem como a escravidão No intuito de se restabelecerem os génos os gregos uniramse em grandes tribos Essas tribos instalaramse em cumes cercandose por ver dadeiras muralhas Esses locais receberam o nome de acrópole em torno da qual se formaram várias cidades dentre elas Atenas Esparta e Tebas A economia começou a crescer e no final do Período Ho mérico com a utilização da escrita e da moeda as cidades ressur Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 38 giram possibilitando a expansão da navegação e a conquista de outras terras Tal fato desencadeou a segunda diáspora grega que signifi cou a expansão dos colonos gregos na Líbia no Egito e no sul da Península Itálica Consequentemente propiciou a implantação do comércio grego originando uma grandiosa rede comercial Com o contínuo desaparecimento da unidade familiar e a migração da população em busca de terras férteis iniciouse a for mação de um novo paradigma político que mediante a união de tribos e vilarejos originou a criação das cidadesestado E o que seriam as cidadesestado De modo geral podemos dizer que essas cidades seriam uma espécie de entidade autôno ma cujo território se manifestava nos limites próximos da própria cidade e estas cidades não compõem parte de outro governo isto porque o governo se dá nestas mesmas cidades Especificamente para o nosso tema em questão convém que citemos as cidades de Atenas e Esparta como referência de cidadesestado que surgiram naquele período Convém dizer ainda que com o surgimento das cidades estado marcase o fim do Período Homérico e o início do Período Arcaico Período Arcaico O Período Arcaico desenvolveuse do século 8 ao século 6º aC Suas principais marcas foram a presença das cidades estado ou pólis ver as figuras 1 2 e 3 que possuíam governos próprios e limites definidos mantendo entre si relações diplo máticas O período é marcado também pelo início da coloniza ção grega nas regiões vizinhas Nesse período surgiu o alfabeto grego que propiciou o apa recimento da Literatura e da Filosofia fortalecendo o sistema cul tural vigente até então Claretiano Centro Universitário 39 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental Mediante essa expansão cultural nasceu o Período Clássico que se estende do século 6º ao século 4º aC Período Clássico O Período Clássico foi um dos mais conturbados da história grega pois ao mesmo tempo em que as cidadesestado atingiam seu auge econômico e cultural eclodiam algumas guerras que as devastavam Nesse sentido sugerimos a você que investigue algu mas dessas guerras e em especial a guerra do Peloponeso 431 aC404 aC pois essa guerra especificamente trouxe uma série de desdobramentos importantes para a discussão filosófica Nesse período emergiram grandes sistemas filosóficos como o platonismo e o aristotelismo além de diversas outras mu danças e expansões no campo artístico e literário Mola propulsora para o nascimento da Filosofia Com a breve retomada histórica apresentada até agora foi possível perceber que a Grécia do século 6º aC no qual se con venciona o nascimento da Filosofia é o resultado de mudanças estruturais que vinham eclodindo desde tempos longínquos Figura 1 Atenas Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 40 Figura 2 Esparta Figura 3 Tebas Após essa contextualização histórica pontuaremos neste tó pico os fatos cruciais que ao longo de todas estas mudanças que Claretiano Centro Universitário 41 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental apresentamos estimularam e impulsionaram a o surgimento da Filosofia grega Os principais fatores são destacados a seguir 1 Desenvolvimento do alfabeto a importância do desen volvimento do alfabeto é a expansão cognitiva que seu uso ocasiona Com ele é favorecida a discursividade marcadamente lógica linear refletidamente estrutura da 2 Criação da constituição a criação de uma constituição instiga a reflexão sobre os postulados axiológicos da existência impulsionando os homens a pensar em pro blemas resoluções hipóteses aporias etc 3 Surgimento da política não que a política tenha nascido por assim dizer nesse período mas certamente nesse momento específico sua presença e importância foram evidenciadas A necessidade de pensar a vida em grupo impele o homem a refletir sobre suas características e sobre suas diferenças com os demais como também de propor paradigmas que abranjam a todos sem contar a troca de opiniões que implica um tratamento cauteloso das ideias O homem passa a se reconhecer como o go vernante da pólis papel que outrora era dos deuses 4 Intensa atividade comercial o desenvolvimento da ati vidade comercial traz consigo além da melhoria econô mica que possibilita o tratamento de diversas questões lembrando que essa melhoria levou ao ócio e esse colaborou para o surgimento do pensamento o inter câmbio de culturas paradigmas enfim uma variedade de coisas que enriquecem e estimulam o pensamento humano 5 Criação da moeda dentre outras coisas essa criação embute uma maneira mais abstrata e generalizada de avaliar e comparar as coisas 6 Grandes navegações marcadamente um povo maríti mo por sua localização privilegiada com o advento das grandes navegações os gregos começam a desmistificar e desbravar o mundo Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 42 Reconhecidas as características históricas é hora de analisar as outras dimensões presentes quando do nascimento da Filosofia Para isso retomaremos o Período Homérico deixando por ora as características históricas de lado para considerar as estrutu ras internas da obra de Hesíodo e Homero como possibilitadoras do surgimento da consciência lógica 6 IMPORTÂNCIA DE HOMERO E HESÍODO PARA O NASCIMENTO DA FILOSOFIA Os poetas gregos Hesíodo e Homero são dois reconhecidos nomes da literatura mundial Suas obras transcendem à simples narração e confabulação de histórias alcançam importância para digmática e pedagógica na história do Ocidente Hesíodo e a vida no campo Embora Hesíodo não tenha suas obras co nhecidas pelo grande público na contempora neidade esse poeta em conjunto com Homero também marcou de forma indelével a formação cultural do povo grego na época clássica Para ini ciar nossa apresentação a respeito desse perso nagem disponibilizamos a seguir uma pequena síntese biográfica e alguns aspectos de sua impor tância para a formação cultural do povo grego Hesíodo personalidade de grande vulto posterior a Homero foi considerado o criador da poesia didática Viveu em Beócia pro vavelmente no final do século VIII ou no começo do século VII aC época de luta entre proprietários de terras e a população excluí da de privilégios trabalhadores agrícolas pastores artesãos Sua obra Teogonia baseiase na compilação análise e ordenação de tradições míticas e procura estabelecer a genealogia dos deuses mostrando como se organiza o mundo divino Em Os trabalhos e os dias esse autor mostra a organização do mundo dos mortais salientando a mão humana o trabalho do homem como princípio para uma existência digna SHIGUNOV NETO NAGEL 2012 p 3 Figura 4 Hesíodo Claretiano Centro Universitário 43 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental Com o intuito de noticiar um breve comentário sobre a vida de Hesíodo devemos recordar que ele é o escritor mais antigo mais antigo do mundo helênico de que temos notícia Escrevia em lín gua jônica embora seja mais provável que sua língua materna fosse uma mistura de dórico e eólio Não diferente dos encargos de muitos homens de sua época Hesíodo era pastor e assim permaneceu até que um dia segundo consta as musas lhe apareceram e lhe ordenaram cantar a raça dos benditos deuses imortais Como mencionado na citação suas obras capitais foram Os tra balhos e os dias e Teogonia A Teogonia é um poema marcadamente permeado por concepções religiosas e teológicas que narra e tenta explicar o nascimento dos heróis e dos deuses do Olimpo As con cepções ali religiosamente afixadas foram levadas a cabo por vários séculos na Grécia e influenciaram diretamente a Filosofia nascente Já em Os trabalhos e os dias Hesíodo expõe a vida campes tre do homem grego como modelo de honestidade e virtude que agradaria até mesmo aos deuses É uma obra de forte intenção pedagógica e moralizante O que percebemos no conjunto da obra hesiodiana é em uma análise mais breve o cuidado com as questões relacionadas aos deuses e à vida cotidiana dos homens com suas privações e destinamentos tudo isso ilustrado pelo ambiente fantástico e mis terioso dos mitos Homero o educador par excellence Certamente você já teve algum contato com alguma obra de Homero quer tenha sido por meio de produções cinematográficas que tratam de alguns dos aspectos presentes em suas duas grandes obras Ilíada e Odisséia ou ainda no contato direto com tais produções Esse poeta é extremamente importante para os alicerçes da cultura grega ou então as rela Figura 5 Homero Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 44 ções existentes entre Filosofia e Educação Seus poemas acabam por fornecer esse contexto quer seja na linguagem ou em alguns aspectos do pensamento que adveio a reflexão filosófica Dentre algumas das informações que colhemos a seu respeito considera mos pertinente apresentar a você a síntese a seguir Situando Homero temos que os dados relativos à existência des se poeta são inexatos no entanto podese supor que nasceu em Esmirna atual Turquia aproximadamente em 850 aC e faleceu na Ilha dos Ios também chamada Nio que fica no arquipélago das Ciclondes no mar de Cândida Atribuise a Homero tanto o títu lo de fundador da poesia épica como o de maior e o mais antigo poeta grego Suas principais obras foram a Ilíada e a Odisseia que descrevem de forma fantástica uma sucessão de acontecimentos da vida grega e oferecem uma interpretação da experiência huma na cujos êxitos são vistos como favores concedidos pelos deuses SHIGUNOV NETO NAGEL 2012 p 2 Para que você possa perceber as razões que levaram os au tores citados anteriomente Shigunov Neto e Nagel a emitir estas considerações sobre Homero basta dizer que os pensadores pré socráticos Parmênides e Empédocles pensadores estes que você lidará ao se dedicar ao estudo da Filosofia antiga fizeram uso da mesma estrutura discursiva para apresentar suas ideias referimo nos a apresentação poética baseada em uma estrutura chamada de hexâmetros Não bastassem esses aspectos há de se ressaltar que Home ro em conjunto com Hesíodo acabou por fornecer ao povo grego a formatação geral de como os seus deuses seriam e quais as rela ções que esses deuses mantinham com os humanos Do que foi dito certamente há de se pensar a respeito de quando se deu a produção dessas obras ou o período em que este poeta viveu Observe e analise algumas considerações a respei to dessas questões apresentadas por Rosen 1997 p 3 tradução nossa Nós não podemos fixar as datas de existência de Homero e Hesí odo com muita certeza mas um consenso geral desenvolvido em décadas recentes é que a atividade dos dois poetas se deram no período entre 750 aC a 650 aC A questão é complicada pelo fato Claretiano Centro Universitário 45 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental de que esses poemas devem ter sido originalmente compostos sem escrita questões de datação tem que enfrentar o problema de perceber quando os textos foram transcritos transformados em escrita Ainda não provavelmente sem coincidência esses pri meiros textos não importa quando eles foram finalmente fixados em sua corrente forma refletem a atividade poética do período em que a introdução do alfabeto parece ter promovido o desenvolvi mento da literatura Como se percebe percebese inclusive uma diferença entre as informações de Rosen 1997 e Shigunov Neto 2012 quanto ao período em que Homero viveu e esta imprecisão demonstra o quanto ainda há de se investigar sobre a vida deste personagem Nesse contexto há de se pensar a respeito de qual dos dois poetas produziu primeiramente algumas de suas obras e nesse sentido Rosen argumenta que algumas abordagens tendem a considerar que ambos foram contemporâneos e que além disso poderiam ter produzido suas obras com o intuito de se diferenciar um do outro No entanto Rosen conclui que Estudiosos modernos geralmente assumem que Homero compôs mais cedo que Hesíodo contudo isto se assenta em pouco mais de que avaliações subjetivas o consenso em favor de uma data anterior de Homero sobrevive mas a questão não está resolvida 1997 p 34 tradução nossa Além disso embora a existência de um único poeta chama do Homero não seja historicamente comprovada o chamado problema homérico a obra que carrega seu nome é de uma riqueza inestimável Poeta das façanhas heroicas e do desbravamento humano Homero é responsável pela formação de uma importante parcela da cultura grega antiga tanto no período que antecede quanto no que sucede o nascedouro da Filosofia Segundo Platão na Repúbli ca 606e Homero foi o educador de toda a Grécia Ainda sobre essa característica pedagógica complementa Jaeger 2003 afirmando que na Grécia havia presente a concep Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 46 ção do poeta como educador de seu povo e Homero seria esse primeiro e maior criador e modelador da humanidade grega Um aspecto interessante em relação à forma como a produ ção homérica era divulgada manifestase no fato de que na Grécia antiga havia o costume de se cantar os poemas que eram trans mitidos hereditariamente ou seja os poemas eram passados de geração após geração por meio da reprodução em canto desses poemas Mais do que uma função de entretenimento esses poe mas cantavam os grandes feitos e as virtudes dos grandes homens e heróis de forma a criar uma consciência receptiva a tal modelo de transmissão Por certo que nós homens e mulheres da era visual não conseguimos captar com toda a carga semântica o que significa vam tais poemas para os gregos mas devemos ter em mente que os gregos possuíam um ouvido altamente calibrado e volitivo para aquelas tradições cantadas A poesia antiga grega diferente de outras poesias criadas nos séculos decorrentes no Ocidente abrangia um campo enorme de dimensões numa confluência entre ética estética etc num orga nismo indissociável tanto que conforme comenta Jaeger 2001 p 66 O pathos do sublime destino heróico do homem lutador é o sopro espiritual da Ilíada O ethos da cultura e da moral aristocrática encontra na Odisséia o poema da sua vida Mas deixemos por ora as homenagens a Homero e vamos analisar algumas características pontuais de sua obra que nos possibilitem entender sua relação com a Filosofia Para isso servirnosemos de Reale 1993 v 1 Optamos por citar três importantes características da obra de Homero que foram imprescindíveis para o surgimento da Filo sofia grega as quais iremos expor em três temas 1 estrutura da imaginação 2 arte da motivação 3 expressão da realidade Vejamos a seguir cada um desses âmbitos separadamente Claretiano Centro Universitário 47 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental Estrutura da imaginação Diferente de outras narrativas de outros povos as obras de Homero não se preocupam apenas em descrever o monstruoso e o disforme pelo contrário a estruturação dos poemas homéricos traz consigo 1 Harmonia 2 Eurritmia 3 Proporção 4 Limite 5 Medida Atributos que dão consistência à obra de Homero e garan tem a ela uma verossimilhança no sentido de ser uma obra que apresenta nexo entre suas partes Cabe frisar que essas características posteriormente se con figurarão como constitutivas da própria estrutura do pensamento grego e por extensão ocidental Arte da motivação Figura 6 Aquiles cura Pátroclo detalhe de vaso datado cerca de 500 aC Aquiles é o herói da Ilíada Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 48 Homero não narra apenas uma sequência de fatos mas bus ca embora em nível fantásticopoético suas razões seus motivos Jaeger apud REALE 1993 p 19 comenta que Homero não conhece a mera aceitação passiva das tradições nem simples narração de fatos mas exclusivamente o desenvolvimento interiormente ne cessário da ação de fase em fase nexo indissolúvel entre causa e efeito Essa busca por razões já é um componente que posterior mente será distendido na Filosofia nascente Expressão da realidade A obra de Homero em seu tratamento mítico e discursivo da realidade preocupase em apresentar a totalidade da existência bem como o papel do ser humano diante do mundo Tanto a expressão da totalidade quanto a definição do papel humano são marcas ímpares da Filosofia Por exemplo o pensa mento moderno ansiando investigar meticulosamente as coisas fatos e fenômenos criou o chamado especialista que se ocupa de uma faceta muito específica de um problema Já os filósofos em especial os antigos buscam conhecer os fatos coisas e fenômenos em sua totalidade de forma a construir uma visão unitária do mundo Com o exposto você observou algumas características da obra de Homero e Hesíodo Vamos agora investigar outros traços importantes para o nascimento da Filosofia Como nos propusemos anteriormente vamos conhecer a religião grega para tentar compreender em que sentido ela cola borou para o nascimento da Filosofia Claretiano Centro Universitário 49 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental 7 RELIGIÃO Na mitologia grega Ganimedes era o responsável por levar a Am brósia comida dos deuses a Zeus assumindo essa função após ser raptado pela águia de Zeus que o leva ao Olimpo Outra característica importante na passagem do mito µῦθος ao logos λογος foi a presença da religião que em seu interesse por explicar e justificar a existência relacionase com a Filosofia Figura 7 Ganimedes e a águia de Zeus escultura de Bertel Thorvaldsen Museu de Cope nhague 1817 Neste sentido Reale 1993 p 2021 comenta Estudiosos afirmaram em várias ocasiões que entre religião e filo sofia existem laços estruturais Hegel dirá até mesmo que a religião exprime pela via representativa a mesma verdade que a filosofia exprime pela via conceitual e isso é verdade seja quando a filo sofia subsume determinados conteúdos da religião seja também quando a filosofia tenta contestar a religião neste ultimo caso a função contestatária permanece sempre alimentada e portanto condicionada pelo termo contestado Pois bem se isso é verdade em geral o foi de modo paradigmático para os gregos Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 50 Fundamentalmente a religião grega apresenta duas vertentes a pública e a dos mistérios Estas vertentes são paradoxais já que o espírito que anima a religião dos mistérios é negador do espírito que anima a religião pública Convidamos você a conhecer essas duas vertentes da reli gião em suas particularidades Religião pública A religião pública possui algumas subdivisões como a natu ralista a antropomórfica e a hierofânica Vamos distinguilas Naturalista De acordo com a vertente naturalista os homens deveriam agir conforme a sua natureza por honra aos deuses ou seja para honrar aos deuses os homens deveriam se esforçar por serem de masiadamente humanos Antropomórfica Os deuses são forças naturais calcadas em formas humanas Eles se zangam brigam divertemse etc Para entender melhor o que são os deuses gregos recorreremos mais uma vez a Reale 1993 p 21 Mas quem são esses deuses São como há tempo se reconheceu acertadamente formas naturais diluídas em formas humanas ide alizadas são aspectos do homem sublimados hipostasiados são forças do homem cristalizadas em belíssimas figuras Em suma os deuses da religião natural grega são homens amplificados e ideali zados são portanto quantitativamente superiores a nós mas não qualitativamente diferentes Por isso a religião grega é certamente uma forma de religião naturalista Por ser apenas em grau diferente dos deuses o homem grego enxergase neles e para elevarse a eles não deve submeterse rege nerarse mas apenas ser ele mesmo autenticarse potencializarse Um exemplo disso é Ulisses ou Odisseu Podemos perceber nele um apelo natural à consciência de si ao cultivo das potencia lidades ao autorreconhecimento Claretiano Centro Universitário 51 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental Figura 8 Vaso grego mostrando Ulisses Odisseu enfrentando as sereias Hierofânica De acordo com a vertente hierofânica todos os eventos são manifestações do divino são obras dos deuses hieros do grego significa sagrado Comenta Reale 1993 p 21 Todos os fenômenos naturais são promovidos por numes os tro vões e os raios são lançados por Zeus do alto do Olimpo as ondas do mar são levantadas pelo tridente de Poseidon o sol é carregado pelo áureo carro de Apolo e assim por diante Ou seja para o homem homérico e para os herdeiros dessa tradição tudo é divino tudo acontece por obra dos deuses desde fenômenos até coisas cotidianas da vida pessoal e social como o destino das cidades e a participação em guerras Religião dos mistérios orfismo Como a religião pública não era comum a todos existia tam bém a religião dos mistérios Limitarnosemos a analisar a ver tente órfica que foi uma das mais influentes na Grécia Não sabemos ao certo de onde a religião órfica provém cer to é que recebe o nome do poeta Orfeu e que é posterior a Home ro e Hesíodo Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 52 Figura 9 Orfeu poeta e músico na mitologia grega Segundo essa vertente o homem possui um princípio divino um demônio caído em um corpo devido a uma culpa originária esse princípio é imortal e mesmo o corpo morrendo ele passa rá por uma série de reencarnações para expiar sua culpa Nesse sentido a vida órfica era a única que poderia pôr fim no ciclo das encarnações Essa vertente era marcadamente dualista por compreender as repartições de corpo e alma Com o orfismo o grego lida diretamente com a ideia de dois princípios em luta enfraquecendo a visão naturalista o ho mem começa a compreender que nem todas as tendências que percebe em si são boas e que algumas devem até ser reprimi das e que é necessário purificar o elemento divino enfraque cendo o corpóreo A religião dos mistérios influenciou decisivamente o pitago rismo o empedoclismo e o platonismo Cabe acrescentar que os gregos não possuíam livros tidos como sagrados ou frutos da reve lação divina como a Bíblia Claretiano Centro Universitário 53 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental Eles não tinham uma dogmática teológica fixa e imodificável portanto não havia e nem poderia haver uma casta sacerdotal que custodiasse os dogmas Isso possibilitou uma maior liberdade para a reflexão filosófica diferente dos orientais e medievais Conhecidas algumas características particulares como a re ligião e as obras de Homero e Hesíodo podemos avançar nossa investigação para o grande cenário em que essas temáticas estão inseridas com efeito o mítico 8 MITO Figura 10 Édipo interrogado pela Esfinge Figura 11 Ânfora ática decorada com Héracles e o touro Minos Figura 12 Aquiles e Ayax jogando os dados Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 54 Todas as perspectivas até agora levantadas formavam uma explicação de mundo capaz de dar sentido de responder às in quietações humanas nas diferentes dimensões Até por volta dos séculos 7º e 6º aC predominava a expli cação mítica O que é o mito Como ela se estrutura Qual sua função Vamos responder a essas perguntas juntos Para iniciar vamos forjar uma definição e analisála para en tão discutir alguns detalhes a saber O mito é uma explicação narrativoalegóricosimbólica intuitivofantásticopedagógica Vamos tomar cada ponto em particular Explicação procura justificar responder satisfazer dar sentido à vida e à existência com seus fatos fenômenos e coisas Narrativoalegóricosimbólico encadeia engenhosamen te uma série de acontecimentos de forma a estabelecer certa dose de verossimilhança para um evento As par tes da criação possuem cenas simbólicas que possuem sentido nas entrelinhas e fixam paradigmas por exemplo a condenação de Prometeu em ter seu fígado devorado diariamente por um abutre por desafiar aos deuses Intuitivo fantástico não se pauta na razão como faz a Ciência e a Filosofia mas na imaginação na intuição na apreensão direta Pedagógico tem uma intenção educacional instrutiva prescritiva Agora que possuímos uma definição de mito convém pensar algumas questões 1 Para que serviam os mitos 2 Por que o homem criava o mito Claretiano Centro Universitário 55 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental 3 O mito é uma história falsa 4 O mito ainda existe Por certo não conseguiremos responder a tais questões com a profundidade e a abrangência necessárias Assim é importante que você procure aprofundar seus estudos pesquisando nas bi bliografias indicadas ou em outras fontes Seguindo o raciocínio de Campbell 1990 em O poder do mito parece que há algo no ser humano que necessita de expli cações originárias definitivas e essas muitas vezes extrapolam o nível de consciência racional O ser humano por sua capacidade reflexiva tem a necessi dade de responder às questões que o inquietam e o mito surge como uma das primeiras respostas como pistas para as potencia lidades espirituais da vida humana Devemos frisar que o mito não é uma mentira já que o con ceito de mentira em suas modernas categorias de entendimento não dá conta de analisar a grandiosidade do mito para o homem antigo Portanto é preciso entender o mito como a resposta que um determinado povo conseguiu formular em uma determinada época resposta que serviu para justificar a existência e isso por ora bastava É interessante observar que mesmo no mundo hodierno al gumas explicações fantásticas ainda sobrevivem como por exem plo algumas histórias religiosas Os mitos porém não sobreviveram intactos Por certo ain da nos servimos deles mas eles não ocupam mais o lugar que ocupavam outrora Com as mudanças que começam a eclodir na Grécia desde o Período Homérico a consciência mítica passa a paulatinamente perder lugar para a consciência racional Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 56 Essas mudanças podem ser percebidas na própria estrutura interna do mito como por exemplo traz o estudo que confeccio na a helenista Jacqueline de Romilly 2012 sobre a evolução nas concepções de deuses Romilly 2012 diagnostica quatro gerações de deuses na Grécia antiga que seguem a seguinte estruturação Todos os povos da Antiguidade procuraram explicar da melhor ma neira possível a origem do Cosmo Universo e a existência dos fenômenos naturais de que dependiam para sobreviver Sumérios egípcios acádios hebreus chineses indianos e gregos entre ou tros consideravam as forças naturais entidades sobrenaturais e poderosas que chamavam de divindades ou deuses Os gregos organizaram as divindades em famílias divinas com todas as virtudes e todos os defeitos das famílias humanas Desen volveram também a partir de modelos orientais genealogias para explicar satisfatoriamente tanto a criação do Universo ou cosmo gonia como a origem dos deuses ou teogonia As divindades gregas podem ser mais ou menos divididas em dois grandes grupos o dos deuses antigos e o dos deuses olímpicos Os deuses olímpicos regem o Universo na época em que vivemos os deuses antigos representam grosso modo as indomadas e poderosas forças criativas que existiam no início dos tempos Em seu poema Teogonia Hesíodo justamente contrasta a ordem e a organização que caracterizavam o reinado de Zeus o rei dos deu ses olímpicos e a desordem que imperada no período precedente Gantz 1996 Muitas divindades antigas são puramente conceituais ou repre sentam forças da natureza ou têm importância meramente ge nealógica Grande parte dessas entidades divinas não têm lendas associadas ao seu nome As diferentes gerações de deuses gregos nos revelam o lento processo de humanização que se instalava na Grécia pois os deu ses paulatinamente deixam suas características naturais e passam a assumir formas mais humanas Ao longo da história ocidental os mitos gregos sempre se fi zeram presentes veja na figura a seguir a obra de Lambert Sustris 15151584 onde se apresenta o Deus grego Ares indo ao encon tro de Vênus Claretiano Centro Universitário 57 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental Figura 13 Deus grego Ares a caminho de seu encontro com Vênus Lambert Sustris 15151584 No entanto ainda falta responder à questão da origem dos mitos o que faremos a seguir Origem da mitologia Para adentrar essa questão optamos por nos fazer a mesma pergunta que se fez Bulfinch 1999 p 352 em seu Livro de Ouro da Mitologia a saber De onde vieram aquelas lendas Têm algum fundamento na verdade ou são apenas sonhos da imaginação A pergunta de Bulfinch é instigante e nos leva a pensar toda a mitologia Tal pergunta já recebeu algumas respostas por diver sos estudiosos cada qual solucionando de maneira diversa tão in trigante problema Veja a seguir algumas teorias para respondêla Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 58 Teoria bíblica A teoria bíblica postula que todas as lendas mitológicas têm sua origem nas narrativas das Escrituras embora os fatos tenham sido distorcidos e alterados Assim Deucalião é apenas um outro nome de Noé Hércules de Sansão Árion de Jonas etc o dragão que guarda os pomos de ouro era a serpente que enganou Eva BULFINCH 1999 p 352 Como fica claro pelo comentário de Bulfinch tal teoria inter preta o mito como releitura e ressimbolização das Escrituras no entanto embora as coincidências existam e possam até mesmo ser bibliograficamente verificáveis devemos tomar o cuidado de não achar que a mitologia está toda justificada e embasada na te ologia o que seria cair em contrassenso Vamos agora conhecer outra teoria a histórica Teoria histórica De acordo com ela todas as personagens mencionadas na mitologia foram seres humanos reais e as lendas e tradições fabulosas a elas relativas são apenas acréscimos e embelezamentos surgidos em épocas poste riores Assim a história de Éolo rei e deus dos ventos teria surgido do fato de Éolo ser o governante de alguma ilha do Mar Tirreno onde reinou com justiça e piedade e ensinou aos nativos o uso da navegação a vela e como predizer pelos sinais atmosféricos as mu danças do tempo e dos ventos BULFINCH 1999 p 353 Diferente da religiosa a teoria histórica concebe que os mi tos como histórias de pessoas que realmente existiram e que por algum fato possivelmente aliado ao poder foram posteriormente glorificadas Passemos agora para a teoria alegórica Teoria alegórica Diferente da religiosa e da histórica essa concepção prevê que Todos os mitos da antiguidade eram alegóricos e simbólicos con tendo alguma verdade moral religiosa ou filosófica ou algum fato Claretiano Centro Universitário 59 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental histórico sob a forma de alegoria mas que com o decorrer do tempo passaram a ser entendidos literalmente Assim Saturno que devora os próprios filhos é a mesma divindade que os gregos chamavam de Cronos que podese dizer na verdade destrói tudo que ele próprio cria BULFINCH 1999 p 353 Como foi possível notar a visão alegórica concebe que os mi tos eram também para os povos antigos alegóricos e simbólicos ou seja eram modos de expressar figurativamente certas coisas fatos e fenômenos entretanto com o tempo passaram a ser lidos literalmente Partamos agora para o reconhecimento da última teoria a física Teoria física A teoria física concebe que Os elementos ar fogo e água foram originalmente objeto de adoração religiosa e as principais divindades eram personifica ções das forças da natureza Foi fácil a transição da personifica ção dos elementos para idéia de seres sobrenaturais dirigindo e governando os diferentes objetos da natureza BULFINCH 1999 p 354 De acordo com tal concepção os elementos naturais é que foram personificados e adornados pela fértil imaginação dos po vos que criavam os mitos Por sua potência e grandeza os elemen tos naturais foram transformados em mitos pelos povos Mas podemos nos perguntar Afinal qual é a melhor teoria Qual delas está correta Qual delas adotar Essas teorias são muito interessantes e importantes para compreender a fundo a mitologia No entanto como estamos pre ocupados em ter uma visão o mais abrangente possível argumen tamos dizendo que cada uma delas guarda sua validade e com preensão e que se vistas isoladamente elas não possibilitariam a visão ampla que fornecem quando vistas em conjunto Essa é nossa opção integrálas para compreender de manei ra mais abrangente e aguda o rico universo da mitologia Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 60 Mas agora vamos convidálos a especular sobre a ruptura entre a consciência do mito µῦθος e do logos λογος 9 DO MITO AO LOGOS Para dar o tom de nossa análise experimente observar o co mentário de Jaeger em sua Paideia Não e fácil traçar a fronteira temporal do momento em que surge o pensamento racional Passaria provavelmente pela epopéia Po ema que narra ações grandiosas homérica No entanto nela é tão estreita a interpenetração do elemento racional e do pensamen to mítico que mal se pode separálos Uma análise da epopéia a partir deste ponto de vista nos mostraria quão cedo o pensamento racional se infiltra no mito e começa a influenciálo O início da filosofia científica não coincide assim nem com o prin cípio do pensamento racional nem com o fim do pensamento míti co Até porque mitogonia autêntica ainda encontramos na filosofia de Platão e na de Aristóteles São exemplos o mito da alma em Platão e em Aristóteles a idéia do amor das coisas pelo motor imóvel do mundo JAEGER 2003 p 191192 Com essas palavras Jaeger tenta custosamente esclarecer o lento e ao mesmo tempo grandioso processo que passou a Grécia quando da mudança da consciência do mito para a do logos Mudança de tal forma grandiosa que além de mudar um complexo modelo de investigação operou uma verdadeira revolu ção paradigmática na Grécia O solo do mito foi lentamente sendo retirado dos fecundos pés gregos que mergulharam em uma náusea coletiva Essa náu sea ao mesmo tempo em que os molestou fez com que eles bus cassem novos paradigmas para gerirem suas vidas Com isso podemos concluir tal como Jaeger 2003 p 192 que devemos encarar a história da filosofia grega como o proces so de racionalização progressiva da concepção religiosa do mundo implícita nos mitos Claretiano Centro Universitário 61 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental Confira o esquema que criamos para ilustrar essa afirmação Figura 14 Esquema da racionalização progressivaComo mostra o esquema lentamente a consciência do logos vai penetrando na esfera mítica até que só ela prevaleça O processo envolve todos os elementos analisados por nós até agora que juntos possibilitaram o surgimento de um pensa mento calcado na explicação racional que desde o início dessa análise procurou fundamentar essa tese Cabe acrescentar que não só é um processo de racionaliza ção da concepção religiosa como sugere Jaeger mas a racionaliza ção de diversos outros elementos possibilitada por uma esfera de grandes acontecimentos Não podemos porém nos esquecer do que Aristóteles co menta em sua Metafísica a saber De fato os homens começaram a filosofar agora como na origem por causa da admiração na medida em que inicialmente ficavam perplexos diante das dificuldades mais simples em seguida pro gredindo pouco a pouco chegaram a enfrentar problemas sempre maiores Ora quem experimenta uma sensação de dúvida e de admiração reconhece que não sabe e é por isso que também aquele que ama o mito é de certo modo filósofo o mito com efei to é constituído por um conjunto de coisas admiráveis De modo que se os homens filosofaram para libertarse da ignorância é evidente que buscavam o conhecimento unicamente em vista do saber e não por alguma utilidade prática E o modo como as coisas se desenvolveram demonstra quando já se possuía praticamente tudo o de que se necessitava para a vida e também para o conforto e para o bemestar então se começou a buscar essa forma de co nhecimento ARISTÓTELES 2002 p 13 Aristóteles chamanos a atenção para a confluência impres cindível entre a Filosofia e o mito que não pode ser ignorada Po demos concluir portanto que com o advento do logos é instaura do um novo paradigma no ocidente que modificará por definitivo suas estruturas mais fundamentais Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 62 O impacto causado pela mudança de consciências influi dire tamente em toda a vida grega e abarca axiologia epistemologia estética gnosiologia enfim a realidade em sua forma total Nasce a Filosofia φιλοσοφια O período que inaugura esse pensamento é chamado de présocrático de temática marcadamente naturalista Perce bemos que Jaeger classificaa como Filosofia científica e não em vão uma vez que quer demonstrar uma nova forma de se posicio nar diante da vida definidamente racional 10 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS Sugerimos que você procure responder discutir e comentar as questões a seguir que tratam da temática desenvolvida nesta unidade A autoavaliação pode ser uma ferramenta importante para você testar seu desempenho Se você encontrar dificuldades em responder a essas questões procure revisar os conteúdos estu dados para sanar as suas dúvidas Esse é o momento ideal para fazer uma revisão desta unidade Lembrese de que na Educação a Distância a construção do conhecimento ocorre de forma coope rativa e colaborativa compartilhe portanto as suas descobertas com os seus colegas Confira a seguir as questões propostas para verificar o seu desempenho no estudo desta unidade 1 Com relação ao período Préhomérico analise as afirmações a seguir I Na ilha de Creta ocorreu um pioneirismo no ramo comercial e marítimo As relações entre cretenses e outros povos resultou do desenvolvimento da navegação da metalurgia do bronze e do uso rudimentar da escrita II Creta era uma ilha repleta de valentes guerreiros que saqueavam as terras vizinhas Isso provocou o desenvolvimento econômico e social daquele povo que usurpou toda produção dos demais povos gerando ambiente propício para surgimento da Filosofia III Os vários genos gregos dominaram o comércio marítimo e expulsaram os povos dórios na primeira diáspora Isso favoreceu o surgimento da Filosofia Claretiano Centro Universitário 63 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental a Somente I está correta b Somente II está correta c Somente III está correta d Somente I e III estão corretas e Todas as afirmações estão corretas 2 Com relação ao Período Homérico analise as afirmações a seguir I Os genos eram grandes famílias que possuíam terras em comum porém com o crescimento das famílias houve a necessidade de privatização das propriedades para assegurar o uso da terra II Como consequência das sociedades privadas nasceu a desigualdade so cial a divisão em classes e o individualismo bem como a escravidão No intuito de se restabelecerem os génos uniramse em grandes tribos III No Período Homérico consolidase o uso da escrita e da moeda sur gem as acrópoles grandes tribos que depois dariam origem a várias ci dades a Somente I está correta b Somente II está correta c Somente III está correta d Somente I e III estão corretas e Todas as afirmativas estão corretas 3 Com relação ao Período Arcaico analise as afirmações a seguir I O Período Arcaico é marcado pelo surgimento das cidadesestado nas cem então as pólis com limites definidos relações diplomáticas II O Período Arcaico caracterizase pelo enfraquecimento comercial da cul tura grega pelas invasões dos povos bárbaros e por estruturas arcaicas de subsistência III Nesse período surgiu o alfabeto grego há a formalização e consolida ção da escrita que propiciou o aparecimento da literatura e da Filosofia fortalecendo o sistema cultural vigente até então a Somente I está correta b Somente II está correta c Somente III está correta d Somente I e III estão corretas e Todas as afirmativas estão corretas 4 Com relação ao Período Clássico analise as alternativas a seguir I É o período em que nasce a Filosofia houve grande número de mudan ças e expansões no campo artístico e literário Esse período é marcado pelo enfraquecimento da pólis e enfraquecimento econômicocultural II Os filósofos preocupavamse com a divisão entre mundo sensível e in teligível Platão é o grande representante dessa preocupação que está presente em todos os filósofos do Período Clássico Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 64 III A consciência reflexiva ou filosófica é impulsionada pelo desenvol vimento do alfabeto pela criação da constituição pelo surgimento da política pela intensa atividade comercial pela criação da moeda e pelas grandes navegações a Somente I está correta b Somente II está correta c Somente III está correta d Somente I e III estão corretas e Todas as afirmativas estão corretas 5 Selecione os adjetivos que compõem o conceito de mito de acordo com o que você estudou nesta unidade O mito é uma explicação a narrativa alegórica simbólica instintiva fantástica pedagógica b fantástica aleatória simbólica filosófica pedagógica formativa c pedagógica aleatória instintiva fanática imaginária irracional d irrefletida inconsciente imaginária educativa intencional demonstra tiva e pedagógica narrativa alegórica simbólica intuitiva fantástica Gabarito 1 a 2 e 3 d 4 c 5 e 11 CONSIDERAÇÕES GERAIS Esta análise teve mais a intenção de apresentar algumas ca racterísticas da passagem do pensamento mítico ao filosófico que propriamente de chegar a alguma conclusão O que percebemos é que parafraseando o filósofo alemão Kant a intuição mítica sem o elemento formador do logos ainda é cega e que a conceituação lógica sem o núcleo vivo da intuição mítica originária parece vazia Claretiano Centro Universitário 65 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental Ver a Grécia de forma lógicoracional é uma maneira de re sumila e até mesmo desapreciála Recordando Nietzsche 1987 p 1819 Os gregos enquanto povo verdadeiramente são justificaram a filo sofia de uma vez para sempre pelo simples fato de terem filosofa do e mais do que todos os outros povos Os gregos souberam começar na altura própria e ensinaram mais claramente do que qualquer outro povo a altura em que se deve começar a filosofar É preciso compreender os gregos como um povo soberano e sensível que conseguiu criar o eu melhor que já houve no oci dente Inventaram de fato os tipos principais do espírito filosó fico aos quais toda a posteridade nada acrescentou de especial NIETZSCHE 1987 p 1820 A Grécia filosófica é um capítulo incomensuravelmente im portante e interessante contudo não é única Concluímos com Nietzsche 1987 p 24 que declama é uma grande desgraça que tenhamos conservado tão pouco des tes primeiros mestres da filosofia e que só nos tenham chegado fragmentos Por causa desta perda aplicamoslhes medidas erra das e somos injustos para com os antigos 12 EREFERÊNCIAS Lista de figuras Figura 1 Atenas Disponível em httpwwwabiyoyocomarticles2969dove dormireadatenehtml Acesso em 18 abr 2012 Figura 2 Esparta Disponível em httpwwwdiariodelviajerocomeuropaestoes esparta Acesso em 18 abr 2012 Figura 3 Tebas Disponível em myoperacom Acesso em 30 jan 2012 Figura 4 Hesíodo Disponível em httpwwwfflchuspbrdhherostraductiones hesiodoindexhtml Acesso em 18 abr 2012 Figura 5 Homero Disponível em httpeducaterraterracombrvoltaire antiga20040514001htm Acesso em 30 jan 2012 Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 66 Figura 6 Aquiles cura Pátroclo detalhe de vaso datado cerca de 500 aC Aquiles é o herói da Ilíada Disponível em httpwwwconscienciaorgiliadahomeroresumo Acesso em 18 abr 2012 Figura 7 Ganimedes e a águia de Zeus escultura de Bertel Thorvaldsen 1817 Disponível em httpwwwpoetanarquistablogspotcombr201203esculturabertel thorvaldsenhtml Acesso em 18 abr 2012 Figura 8 Vaso grego mostrando Ulisses Odisseu enfrentando as sereias Disponível em httpbligigcombrfilosofiasergipe20091029ulisseseocantodassereias Acesso em 18 abr 2012 Figura 9 Orfeu poeta e músico na mitologia grega Disponível em httpwwweducadoresdiaadiaprgovbrmodulesmylinksviewcat phpcid10letterOmin20orderbytitleAshow10 Acesso em 18 abr 2012 Figura 10 Édipo interrogado pela Esfinge Disponível em httpartegriegogaleoncom ceraetaphtml Acesso em 18 abr 2012 Figura 11 Ânfora ática decorada com Héracles e o touro Minos Disponível em http wwwmolinfancomSitioshistoriadelarteWebGreciaRomaindexhtml Acesso em 18 abr 2012 Figura 12 Aquiles e Ayax jogando os dados Disponível em httpwwwfflchuspbrdh herosmithistoriaensaiosmelhoraqueushtml Acesso em 18 abr 2012 Figura 13 Deus grego Ares a caminho de seu encontro com Vênus Lambert Sustris 1515 1584 Disponível em httpwwwgreekgodsinfogreekgodsaresarespaintings php Acesso em 1º jun 2012 Sites pesquisados ROMILLY J Os deuses tudo podem os homens tudo arriscam Disponível em http greciantigaorgarquivoaspnum0084 Acesso em 30 jan 2012 ROSEN R M Homer and Hesiod Disponível em httprepositoryupenneducgiview contentcgiarticle1006contextclassicspapers Acesso em 30 jan 2012 SHIGUNOV NETO A NAGEL L H Transformação social e concepções de homem e tra balho De Homero a Hesíodo Revista Eletrônica de Ciências da Educação v 1 n 1 2002 Disponível em httprevistasfaceclacombrindexphprepedarticleviewFi le483372 Acesso em 30 jan 2012 13 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARISTÓTELES Metafísica Tradução de Marcelo Perine São Paulo Loyola 2002 v 2 BARNES Jonathan Filósofos présocráticos Tradução de Julio Fischer São Paulo Melho ramentos 1997 BULFINCH T O livro de ouro da Mitologia história de deuses e heróis Tradução de David Jardim Júnior 8 ed Rio de Janeiro Ediouro 1999 CAMPBELL J O poder do mito São Paulo Palas Athena 1990 CHAMOUX F A civilização grega Lisboa Edições 70 2003 Claretiano Centro Universitário 67 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental GLOTZ G A cidade grega São PauloRio de Janeiro Difel 1980 GRAVES R Deuses e heróis do Olimpo Tradução de Bárbara Heliodora Rio de Janeiro Xenon 1992 HESÍODO Teogonia a origem dos deuses Tradução de Jaa Torrano São Paulo Iluminuras 1995 Os trabalhos e os dias Introdução tradução e comentários de Mary de Camargo Neves Lafer São Paulo Iluminuras 1991 HIRSCHBERGER J História da Filosofia na Antiguidade São Paulo Herder 1965 KIRK G S Os filósofos présocráticos história crítica em seleção de textos 4 ed Lisboa Fundação Calouste Gulbenkian 1994 JAEGER W Paidéia a formação do homem grego Tradução de Artur M Parreira São Paulo Martins Fontes 2001 NIETZSCHE F A Filosofia na idade trágica dos gregos Tradução de Artur Mourão Lisboa Edições 70 1987 PADOVANI U CASTAGNOLA Luís História da Filosofia 10 ed São Paulo Melhoramentos 1974 PETIT P História antiga Tradução de Pedro Moacyr Campos 6 ed Rio de Janeiro Bertrand Brasil 1989 REALE G História da Filosofia antiga das origens a Sócrates Tradução de Marcelo Perine São Paulo Loyola 1993 v 1 VERNANT JP Mito e pensamento entre os gregos Tradução de Sarian Haiganuch 2 ed São Paulo Paz e Terra 2002 Origens do pensamento grego Tradução de Isis Lana Borges São Paulo Difel 1972 VERNANT JP VIDALNAQUET P Mito e tragédia na Grécia antiga São Paulo Perspectiva 2005 Claretiano Centro Universitário EAD Antiguidade clássica grega e a Educação 2 1 OBJETIVOS Compreender e delimitar o conceito de Areté άρετή de Aristós άριστός Kalós kαλός Agathós άγαθός e de Paideia Reconhecer a relação entre Areté e Nobreza Examinar a proposta de Areté presente nas obras de Ho mero e Hesíodo Reconhecer e examinar a relação entre Estado Educação e Nobreza 2 CONTEÚDOS Areté Aristós Agathós Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 70 Kalós Questão da forma no antropocentrismo do povo grego na Antiguidade Estado Educação e Nobreza no período Homérico 3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE Antes de iniciar o estudo desta unidade é importante que você leia as orientações a seguir 1 Retome as indicações de leitura da primeira unidade Para um melhor entendimento sobre os temas que es tudaremos a seguir é imprescindível que você leia as bi bliografias indicadas na unidade anterior 2 O conceito de Areté é comumente traduzido como vir tude mas por questões de ordem didática trataremos como Excelência 3 Mesmo com ressalvas com relação a dados históricos presentes em filmes sugerimos que você assista aos se guintes procurando observar neles a presença de ideais de Areté Tróia Ação Direção de Wolfgang Petersen EUA 2004 162 min 300 Ação Direção de Zack Snyder EUA 2007 117 min Odisseu e a ilha da neblina Aventura Direção de Terry Ingram Reino Unido e Irlanda do Norte 2008 88 min A Odisséia Aventura Direção de Andrei Konchalovsky EUA e Grécia 1997 165 min 4 Ao longo desta e das demais unidades teremos como grande alicerce argumentativo a obra Paidéia de Werner Jaeger 2001 Em razão da importância desse pesquisador apresentamos a seguir uma breve biografia a seu respeito Claretiano Centro Universitário 71 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação Werner Jaeger 18881961 Jaeger nasceu na pequena cidade de Lobberich Estudou nas universidades de Marburg e de Berlim Foi professor aos 26 anos de idade na Universidade de Basileia e também na Universidade de Kiel Com a ascensão do nazismo mudouse para os Estados Unidos onde foi professor na Universidade de Chicago e em Harvard e escreveu algumas obras fazendo severas críticas ao regime nazista Sua produção intelectual foi variada e importante Dentre alguns de seus trabalhos destacamos o estudo que realizou sobre Gregório de Nicia intitulado Gregorii Nysseni Opera e o estudo que fez a respeito da metafísica aristotélica e que recebeu o título de Studien zur Enstehungsgeschichte der Metaphysik des Aristoteles 1911 No entanto foi através da obra Paideia os Ideais da cultura grega que se firmou como uma referência dentre os estudiosos do classicismo filosófico Por meio desta obra compôs uma análise das práticas e reflexões filosóficas que caracterizavam a educação na antiga Grécia e sua respectiva natureza cultural Especificamente em relação ao termo Paideia foi cunhado por Jaeger para designar a educação e cultura grega Imagem disponível em httpfilosofiacienciaevidauolcombr ESFIEdicoes26artigo1017641asp Acesso em 31 jan 2012 4 INTRODUÇÃO À UNIDADE Você estudou na Unidade 1 as condições que possibilitaram o surgimento do povo grego e além disso o surgimento da Filoso fia grega Agora com base nesses pressupostos vamos iniciar nos sas investigações filosóficas sobre o fenômeno da Educação grega Esse estudo tem por objetivo apenas apontar em linhas ge rais o processo de formação do homem grego Por se tratar de um estudo complexo e muito denso não será possível neste modesto caderno de referência ir além de alguns tópicos que julgamos im portantes para se compreender a Educação atual O processo de formação dos gregos não é somente histórico mas também espiritual no sentido mais amplo dessa palavra con forme a obra Antropologia filosófica de E Cassirer que culminou no conceito do que hoje denominamos Humanidade A cultura grega assim como a romana constitui o berço da civilização ocidental Bastaria por exemplo examinarmos algumas das palavras do vocabulário da língua portuguesa para reconhe Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 72 cermos sua importância tais como democracia autonomia teoria entre outras Todas essas palavras têm origem grecoro mana O idioma grego é por sua estrutura uma língua filosófica A Filosofia foi como já sabemos desenvolvida pelos gregos síntese de sua genialidade e são poucos os que dominam o voca bulário filosófico específico ou seja somente no meio acadêmico podemos ter uma noção um pouco mais ampla do que essa pala vra significa Talvez uma vida inteira não seja suficiente para nos apropriarmos do seu sentido e este caderno tampouco o será Portanto o propósito deste CRC é nos aproximarmos um pouco de seu real significado e apontar o grau de complexidade que lhe é característico sem desmembrálo para não incorrermos na sua banalização e principalmente porque trilhar pela via filo sófica não é a opção mais fácil pois requer sempre muita leitura logo é um caminho para poucos como já havíamos dito anterior mente Por isso não podemos resumir ou mastigar Isso inviabi lizaria o conhecimento e o projeto filosófico Não trataremos os conceitos aqui implicados como nos dicionários mesmos os filosóficos pela simples razão de que o conhecimento oriundo deles é dado e não construído Por isso novamente fazemos referência à importância da leitura Da mes ma forma compreendemos que o ser humano e a Educação são projetos e portanto não estão acabados Utilizaremos como referência principal para a construção desta unidade a obra clássica de Werner Jaeger Paidéia a forma ção do homem grego Além disso examinaremos alguns conceitos importantes como Areté Agathós Aristós e Paideia 5 OS GREGOS E A EDUCAÇÃO Seguindo então pelo caminho apontado por Jaeger fare mos referências concisas baseandonos em sua própria obra e outras necessárias à compreensão do fenômeno educativo dos Claretiano Centro Universitário 73 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação gregos o qual marca de forma decisiva o contexto educacional con temporâneo Logo nas primeiras páginas Jaeger 1995 p 3 afirma sobre Educação Todo povo que atinge um certo grau de desenvolvimento sentese naturalmente inclinado à prática da educação Ela é o princípio por meio do qual a comunidade humana conserva e transmite a sua peculiaridade física e espiritual O que isso quer dizer A Educação seria apenas uma forma de perpetuar culturalmente o modo de ser pensar e agir de uma comunidade Seria apenas a conservação de seu modo de vida isto é sua existência social e espiritual Vejamos o que diz Jaeger 1995 p 34 a respeito disso Uma educação consciente pode até mudar a natureza física do Homem e suas qualidades elevandolhe a capacidade a um nível superior Mas o espírito humano conduz progressivamente à des coberta de si próprio e cria pelo conhecimento do mundo interior e exterior formas melhores de existência humana A natureza do Ho mem na sua dupla estrutura corpórea e espiritual cria condições especiais para a manutenção e transmissão de sua forma particular e exige organizações físicas e espirituais ao conjunto das quais da mos o nome de educação Na educação como o Homem a pratica atua a mesma força vital criadora e plástica que espontaneamen te impele todas as espécies vivas à conservação e propagação do seu tipo É nela porém que essa força atinge o mais alto grau de intensidade através do esforço consciente do conhecimento e da vontade dirigido para a consecução de um fim Como você pôde perceber nesse trecho o autor nos traz novos elementos para pensarmos o que seria então o significado que atribui para Educação Inicialmente ele nos apresenta a ideia de que a Educação pode vir a melhorar nossa natureza física ou seja ela não reproduz pura e simplesmente aquilo que já é e por outro lado ela acabaria por melhorar não somente esse aspecto físico pois por meio dela a própria existência humana viria a ser aprimorada Além disso Jaeger remete a uma energia vital que está pre sente em todos os seres vivos e que faz com que esses manifestem Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 74 em toda a sua plenitude aquilo que são Ora o ser humano dadas as características que possui e em especial a racionalidade acaba por possuir uma peculiaridade que vai além da mera manifestação anímica e segundo esse autor é exatamente na Educação que se manifestaria toda essa complexidade e grandeza humana Isso exposto podemos dizer que é por meio da Educação que temos o aprimoramento de todas as qualidades sejam elas físicas ou espirituais que nos caracterizam como humanos Conceito de Educação Das pistas fornecidas por Jaeger é possível então que realize mos juntos alguns questionamentos O que podemos entender sobre o conceito de Educação Esse conceito coincide com o que você já estudou ante riormente Outras disciplinas que você estudou apontaram para esta direção Para que comecemos a lidar com essas questões considera mos importante que lidemos com outro aspecto e esse se refere ao caráter individual e coletivo da Educação Devemos portanto exa minar a relação os laços entre a comunidade e o indivíduo isto é entre o coletivo e o particular no contexto próprio da Educação pois disso deriva a importância universal dos gregos como educadores Além disso não podemos perder de vista o conceito de cul tura porque é sobre ele que se assenta a estrutura da sociedade tal como é constituída imbuída de valores regras normas cren ças ritos linguagem comportamento nas artes na religião etc E notadamente marcada localizada e condicionada pelas noções de tempo e espaço Analise atentamente algumas indagações que podemos nos fazer relacionadas à Educação e identificação do conceito de cul tura na Grécia Claretiano Centro Universitário 75 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação 1 A Educação pertence a um indivíduo ou à comunidade 2 Para os gregos sua ênfase está na comunidade ou no indivíduo 3 Qual é a relação entre ambos nesse processo 4 Qual é a participação da Educação no crescimento e transformação da sociedade Essas questões representam os primeiros passos para identi ficar a origem do conceito de cultura na Grécia Buscamos a origem a arché o início o começo de tudo ou melhor tomando uma expressão do próprio Jaeger a fonte espi ritual Mas por que empreendermos essa busca essa arqueolo gia Por que os gregos Quais foram os fatores que contribuíram para sua formação para seu destaque em relação a outros povos nos diversos campos do conhecimento das Artes da Literatura e da Filosofia Por que o conceito de cultura é mais amplo do que comumente se fala sobre o conceito de cultura É óbvio que há uma distância entre o modo de vida atual e o do helenismo Estamos situados em um tempo e espaço dife rentes Temos um olhar diferente e isso pode dar margem a in terpretações equivocadas ou distorcidas Não podemos portanto examinálo por linhas ou concepções modernas principalmente no que tange à noção de indivíduo Então temos de pensar como a cultura grega ou em outras palavras um acontecimento está intimamente ligado ao contexto específico Considerando o distanciamento e tudo o que o conceito de cultura implica nós poderíamos entender e explicar esse tema tal como os gregos o fizeram Veja o que diz Jaeger 1995 p 78 a respeito disso Hoje estamos habituados a usar a palavra cultura não no sentido de um ideal próprio da humanidade herdeira da Grécia mas antes numa acepção bem mais comum que a estende a todos os povos da Terra incluindo os primitivos Entendemos assim por cultura a totali dade das manifestações e formas de vida que caracterizam um povo A palavra converteuse num simples conceito antropológico descri tivo Já não significa um alto conceito de valor um ideal consciente Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 76 Segundo Jaeger o positivismo é a corrente filosófica respon sável por essa percepção do conceito de cultura e da multiplicidade de culturas Préhelênicas e outras com base na ótica europeia Ainda segundo o autor é com os gregos que o ideal de cultu ra é estabelecido conscientemente como fundamento da formação integral do homem isto é a ideia de cultura é invenção grega Pre cisamos por essa razão buscar pelo seu sentido originário e essa jornada só é possível por meio de uma imersão em sua história Conforme havíamos estudado na unidade anterior não po demos associar o Ocidente e o Oriente na formação do que hoje denominamos Filosofia A Grécia é sem dúvida o berço da civiliza ção ocidental mas não a ponto de identificarmos a concepção de indivíduo clássica com a moderna Isso seria precipitação Foram os gregos que primeiro situaram o problema da indi vidualidade e a partir deles originaram discussões filosóficas so bre a subjetividade e a personalidade na Europa primeiramente em Roma e depois com o Cristianismo Discutese muito a originalidade e genialidade dos gregos Au tores como o próprio Jaeger admitem que é algo de sua própria natureza Tinham portanto uma concepção inata do conceito de natureza mediante o qual reconheciam as leis existentes nas pró prias coisas na realidade circundante Essa concepção de natureza é todavia orgânica uma vez que as partes são consideradas inte grantes de um todo organizado Por exemplo a arte a linguagem o pensamento os sentimentos as leis a oratória a retórica etc são dotados de princípios comuns Segundo Jaeger 1995 p 11 Até na oratória grega encontramos os mesmos princípios formais que vemos na escultura ou arquitetura Referimonos ao caráter plástico ou arquitetônico de um poema ou de uma obra em prosa Podemos usar ainda como exemplos as obras de Hesíodo e de Homero a fim de entender a percepção que tinham das leis que regem a natureza humana Aristóteles e Platão são outros exem plos caros da Filosofia maior criação do espírito grego Claretiano Centro Universitário 77 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação Jaeger 1995 p 12 diz que o povo grego é filosófico por natureza Acrescentamos que a própria língua grega é filosófica dada a sua estrutura intimamente ligada à arte e à poesia Perguntamos a esse respeito Da percepção das leis que go vernam a natureza humana derivam as normas que orientam a vida do cidadão e a estrutura da sociedade A razão está para o homem assim como a lei para a cidade Com relação à Educação podemos nos apropriar dos mes mos critérios e objetivos A Educação para os gregos pode ser também um processo de construção consciente Qual é a essência da Educação Há um elemento comum a tudo isso uma visão antropocên trica Em que consiste tal concepção Examinemos a arte a reli gião a Filosofia e até o campo da política dos helenos o que há de comum entre esses aspectos A forma humana Por essa razão podemos dizer que o princípio espiritual dos gregos é o Humanismo Humanismo vem de humanitas Pelo menos desde o tempo de Varrão e de Cícero esta palavra teve ao lado da acepção vulgar e primitiva de humanitário que não nos interessa aqui um segundo sentido mais nobre e rigoroso Significou a educação do Homem de acordo com a verdadeira forma humana com o seu autêntico ser Tal é a genuína Paidéia grega considerada modelo por um homem de Estado romano JAEGER 1995 p 14 A forma humana a que nos referimos é a ideia de Homem ou ainda o processo educativo isto é de formação dos gregos que se deu pelo ideal de Homem que elaboraram Pelas razões aqui apresentadas obrigamonos a buscar os fundamentos da Educação na antiguidade clássica 6 NOBREZA E ARETÉ Com o mesmo subtítulo da obra Paidéia a formação do ho mem grego de Werner Jaeger objetivamos revelar a mesma temá tica Tratase da relação entre a nobreza e o conceito de Excelência Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 78 Transcrevemos a seguir um trecho significativo da obra na tentativa de definir e de expressar a essência da Educação Diz o autor A educação é uma função tão natural e universal da comunidade humana que pela sua própria evidência leva muito tempo a atin gir a plena consciência daqueles que a recebem e praticam sendo por isso relativamente tardio o seu primeiro vestígio na tradição literária O seu conteúdo aproximadamente o mesmo em todos os povos é ao mesmo tempo moral e prático Também entre os Gregos foi assim Reveste em parte a forma de mandamentos como honrar os deuses honrar pai e mãe respeitar os estrangei ros consiste por outro lado numa série de preceitos sobre a moda lidade externa e em regras de prudência para a vida transmitidas oralmente pelos séculos afora e apresentase ainda como comuni cação de conhecimentos e aptidões profissionais a cujo conjunto na medida em que é transmissível os Gregos deram o nome de te chne Os preceitos elementares do procedimento correto para com os deuses os pais e os estranhos foram mais tarde incorporados à lei escrita dos Estados Gregos na qual não se fazia distinção entre a moral e o direito e o rico tesouro da sabedoria popular mesclado de regras primitivas de conduta e preceitos de prudência enraiza dos em superstições populares chegava pela primeira vez à luz do dia através da antiqüíssima tradição oral na poesia rural gnômica de Hesíodo JAEGER 1995 p 23 O que podemos inferir da citação sobre os conceitos de Edu cação e do processo de formação do homem São a mesma coisa Educação e formação são sinônimos Primeiramente devemos ter em mente que são termos his toricamente distintos São conceitos cujas origens se divergem Segundo Jaeger Educação é o processo do qual não se tem ainda a plena consciência tanto com relação a quem educa quan to a quem é educado Seu conteúdo é comum tanto para os gregos quanto para os demais povos isto é revestese de caráter moral na forma de mandamentos proibições sanções interditos puni ções etc como honrar pai e mãe honrar os deuses etc Mas como são transmitidos Como é veiculado o conteúdo desse sentido de Educação A resposta é oralmente Claretiano Centro Universitário 79 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação Desse modo com o tempo as regras ou seja as normas ne cessárias para a conservação da comunidade foram incorporadas às leis do Estado Isso ocorreu pelo menos até o século 9º aC aproximada mente quando nasce a literatura grega com as epopeias Ilíada e Odisséia do poeta Homero Vamos refletir mais um pouco com base nos fatos históricos e na etimologia da palavra epopeia Historicamente as epopeias de Homero evocam o marco re ferencial dos ideais educativos entre os gregos Esses ideais corres pondem ao conceito de Areté e somente mediante esse podere mos nos aproximar da significação e da importância da Paideia As obras citadas anteriormente retratam o passado dos reinos egeus um dos povos juntamente com os dórios e jônicos que contri buiu para a formação do que hoje denominamos Grécia Por questões de ordem didática trataremos com detalhes nesse momento o conceito de Areté importantíssimo para a fun damentação da Paideia grega A novidade da Areté grega Inicialmente podemos dizer que Areté e Aristós são palavras que têm a mesma raiz no grego Aristós traduzse por melhor vencedor ou ainda heroísmo coragem valentia Gostarí amos de chamar sua atenção para o fato de que em todos esses significados está presente a ideia de qualidade ou seja uma ca racterística que nos permite afirmar que isso ou aquilo se reveste de elementos positivos que o tornam passíveis de serem elogiados Dito de outro modo podemos dizer que há subjacente a todas as interpretações etimológicas dessa palavra a ideia de Excelência Mas o que se pode entender por Excelência Vejamos as considerações apresentadas por Patrício 2008 p 287 Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 80 Excelente é o que é bom É o que é muito bom É o que é tão bom que não pode ser melhor Ser melhor seria exceder o potencial de ser daquilo que é o sujeito da excelência Excelente é pois o suma mente bom na ordem de ser de determinada coisa coisa ou pes soa ou acção pensamento sentimento desejo ou vontade Por isso se pode dizer com inteiro acerto que excelente é o perfei to o distinto o magnífico É pois a excelência a qualidade do que é excelente perfeito sumo no seu ser Pensemos juntos a ideia de heroísmo Nela temos uma si tuação em que a pessoa acaba por agir de determinada maneira que faz com que a consideremos heroica Ou seja essa pessoa fez algo inusual e ao fazêlo revestiuse de qualidades que nos leva ram a elogiála Nesse sentido consideramos importante outra considera ção apresentada por Patrício 2008 p 287 grifo nosso e essa é A ideia de ser superior a implica a comparação de uma entidade com outra A comparação implica ela própria a excelência na pure za da sua ideia Nesta a excelência de uma entidade é a coincidên cia plena dessa entidade consigo própria Mas há evidentemente a excelência em si É com ela que a excelência de toda a entidade é comparada por ela aferida Há pois entidades mais excelentes do que outras A raiz da excelência é de natureza ontológica A exce lência definese pelo ser não pelo ter Observe que o autor nos informa que existiria uma ideia de Excelência em si a partir da qual se realiza uma comparação ou seja estabelecese um parâmetro para que possamos verificar o quanto o sujeito ou coisa comparada se aproxima dela Assim a Ex celência acaba por ser um processo não nascemos com ela pois não a temos como propriedade mas nos aproximamos dela paulati namente e com tal exercício passamos a vir a ser excelentes Pensemos juntos como isso se aplicaria em nossas vidas Convidamos você a realizar o seguinte exercício analisese e veri fique suas capacidades quais delas você considera importantes e o tornam melhor em algo ou ainda perguntese quais são as qua lidades que se você adquirisse fariam com que viesse a se sentir Claretiano Centro Universitário 81 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação pleno realizado ou para usar os termos com que estamos lidando você se sentiria melhor ou excelente Ao fazer esse exercício você começa a estabelecer uma ideia daquilo que você considera como excelente e valoroso ou para fa zermos uso da terminologia grega você acaba por começar esta belecer qual seria a sua Areté Do que foi dito é possível então que caminhemos um pouco mais e analisemos o desenvolvimento desse significado ao longo da história grega pois como mostraremos a seguir a definição da quilo que seria a Areté sofreu profundas mudanças ao longo do processo de construção da cultura grega antiga Inicialmente podemos dizer que como vimos na Unidade 1 deste CRC o povo grego no período homérico era educado tendo como elemento de referência as produções de Homero e Hesíodo e nesse sentido qual seria as qualidades que estavam presentes nessas obras e em especial na obra de Homero 7 A ARETÉ HOMÉRICA Para darmos conta da Areté nas obras de Homero convida mos você a analisar as seguintes considerações apresentadas por Vilanou É claro que os gregos com Homero à frente inventaram a civi lização européia ao destacar a importância do indivíduo que se definia pela areté quer dizer por sua excelência pessoal Deste modo Homero colocou as bases do humanismo europeu porque suas obras a Ilíada e a Odisséia tem definido a origem de uma vida que destaca um catálogo de virtudes morais e espirituais que teriam como sucedeu com todo o helenismo o objetivo de pro mover a dignidade do ser humano Tanto é assim que a Paideia equivale a um processo educativo que encaminha os homens até a virtude Areté entendida como sinônimo de excelência humana VILANOU 2001 p 3 Nesse trecho além da ênfase à importância de Homero existe também o trato com o conceito de Paideia mas neste Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 82 momento não é necessário que você se dedique a analisar essa vinculação entre Paideia e Areté pois abordaremos essa análise em breve mas que tenha alicerçado a ideia de que Homero com as obras citadas apresenta um catálogo de virtudes ou melhor um catálogo de Excelências Areté que seus personagens devem possuir ou adquirir Bem e o que seria então essa Areté proposta por Homero Vejamos algumas considerações apresentadas por Jaeger 1995 p 28 a respeito dos conceitos de Areté e Aristós usadas naquele período Derivam ambos da mesma raiz regemse por normas certas de conduta alheias ao comum dos homens O código da nobreza ca valheiresca tem assim uma dupla influência na educação grega Dela herdou a ética posterior da cidade como uma das mais altas virtudes a exigência da coragem cuja designação posterior viri lidade recorda claramente a identificação homérica da coragem com a Areté varonil Gostaríamos de chamar sua atenção para algumas palavras chave neste texto tais como nobreza normas de conduta e além disso coragem Na obra homérica é excelente aquele que prima por buscar desenvolver e realizar essas características Contudo há de ter especial cuidado com esses termos pois a forma como eles são usados naquele período divergem radicalmente da for ma como lidamos com esses conceitos na atualidade Tomemos como exemplo o conceito de nobreza para Jaeger 1986 p 20 na proposta homérica homem nobre é aquele que na vida privada como na guerra regese por normas certas de conduta alheias aos comuns dos homens Para que você possa perceber como se manifesta esse pro cesso de superação em relação ao comum dos homens pensemos por exemplo na obra Ilíada Nela temos dois personagens Aqui les e Ulisses e ambos embora adotem posturas diferentes nem por isso deixam de superarse em busca de uma Excelência Espe cificamente em Aquiles temos o guerreiro sublime amante da glória mas que não hesita em sacrificar a vida para não perder a Claretiano Centro Universitário 83 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação honra Como se percebe nesse personagem está presente a co ragem inclusive correndo o risco de perder sua própria vida pois assim agindo ele se mantém honrado Por outro lado temos segundo Jaeger 1986 p 9 a antí tese de Aquiles manifestada no personagem Ulisses que serviria para aqueles a quem a virtude de Aquiles pudesse desencorajar um pouco existia outro modelo aparentemente mais acessível e mais utilizável o fino o engenhoso Ulisses o homem dos mil truques o vivo sempre capaz de safarse de uma dificuldade perfeito exemplo do saber viver e em todo caso de esperteza a virtude heróica é completada pela sabedoria prática Para que você possa entender de que forma esses ideais de Excelência eram valorizados vale dizer que para os nobres desse período ou como diriam os gregos para os Aristós era desejável que se morresse jovem em batalha para que seus feitos e sua co ragem fossem cantados pelos seus pares por outro lado ter uma vida longa poderia significar que a pessoa não buscou a contento sua Areté Quem discordasse de tais ideais eram afrontados e me nosprezados Para exemplificar essa condição vejamos a seguir uma con sideração apresentada por Aristóteles e que a sua maneira iden tifica a plenitude daquele que realiza sua Areté Quem está impregnado de autoestima deseja antes viver um breve período no mais alto gozo a passar uma longa existência em indolente repouso prefere viver só um ano por fim nobre a uma vasta vida por nada escolhe antes executar uma única ação grande e magnífica a fazer uma série de insignificâncias ARISTÓTELES apud JAEGER 2001 p 3536 Como se percebe o entendimento que Jaeger atribui para a palavra Areté advindas da produção homérica não pode ser con fundida com virtude no sentido moral No grego sua significação ultrapassa as preocupações de ordem moral ou ética que esse úl timo poderia engendrar Pode até ser que a Areté tenha algumas vezes essa conotação mas não representa seu sentido originário Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 84 O significado de Areté portanto no uso da linguagem nas obras homéricas ressalta a coragem como principal característica do herói Esta é sua Excelência Muito provavelmente estas informações que estamos lhe apresentando talvez estejam lhe surpreendendo em razão de que na contemporaneidade como veremos em discussões futuras não se prima por muitos desses elementos de Excelência Independen te deste aspecto é importante que frisemos a originalidade e a importância da obra homérica pois ela acaba por apresentar ao indivíduo que a ouve um convite para sua autossuperação a busca por uma Excelência e deposita nesse exercício um sentido para a vida de quem se inicia neste desafio e será avaliado tendo em vista estes parâmetros de Excelência Com os elementos apresentados sobre Homero considera mos possível avançarmos um pouco mais Vamos lidar agora com a proposta de Areté presente na obra de Hesíodo 8 A ARETÉ EM HESÍODO Conforme o que havíamos discutido na Unidade 1 Homero e Hesíodo acabaram por encaminhar a formação cultural do povo grego No entanto há de se apresentar algumas diferenças impor tantes sobre essas duas grandes personalidades Enquanto Homero acabou por contribuir com um ideal de Areté que encontrou ressonância sobretudo na elite grega que via na figura do herói guerreiro um ideal de nobreza que propi ciaria a Excelência Hesíodo acabou por apresentar uma proposta de Excelência voltada para uma população que não tinha no ideal cavalheiresco um parâmetro para suas vidas pois enquanto este ideal era possível apenas para uma pequena parcela da população que podia se dedicar a esses ideais existia outra parcela da popu lação que se dedicava apenas ao trabalho Claretiano Centro Universitário 85 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação Nesse sentido podemos dizer que enquanto em Home ro temos um ideal de Excelência dos nobres Hesíodo acaba por apresentar uma proposta de Excelência volta para aqueles que se dedicam exclusivamente ao trabalho sobretudo no campo Há em Hesíodo um esboço de proposta ética onde é valo roso e bom o indivíduo que trabalha e assim o faz com retitude e por outro lado aquele que se dedica ao ócio ou às injustiças acabaria por se afastar da Excelência Dito de outro modo pode ríamos dizer que em Hesíodo é possível fazer uma releitura de um velho adágio popular de o trabalho dignifica o homem para o trabalho proporciona a Excelência ao homem Em razão disso concordamos com Jaeger apud GOERGEN 2006 p 193 quando afirma que com Hesíodo Não apenas a luta do herói guerreiro contra o inimigo no campo de batalha mas também a silenciosa e renhida luta do homem traba lhar com a terra dura e as adversidades do tempo tem seu heroís mo e gera habilidades que são de valor perene para o ser humano Essa nova proposta de Areté acaba por trazer uma série de questões importantes para pensarmos juntos isto porque segun do Pedro Goergen 2006 p 193 enquanto na proposta Homérica temos um elogio ao herói guerreiro e consequentemente um elo gio à disputa e ao combate ao que os gregos chamam de agonis mo em Hesíodo há uma ênfase a valores tais como a dike justiça em detrimento da Hybris injustiça Com isso há de se considerar uma questão interessante se antes tínhamos o combate físico de candidatos a heróis em Hesíodo temos o combate de ideias em torno de valores Este aspecto é importante pois a discussão des tes valores como veremos em breve irão influenciar sobremanei ra os desdobramentos posteriores da cultura grega pois segundo Goergen 2006 p 193 a dike e a hybris estão presentes lado a lado como duas possibili dades dentre os quais o homem tem que escolher Surgem assim as condições primeiras de liberdade e autonomia do homem oci dental Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 86 O termo dike é utilizado na cultura grega antiga para se referir ao espírito moral de um julgamento justo onde se obedeciam as normas e as regras sociais Atualmente se refere ao conceito de justiça moral O termo hybris foi utilizado na Grécia antiga para se referir as ações do indivíduo que provocam humilhação e vergonha na ví tima e por outro lado gratificação ao autor dos abusos Foi con siderado também um termo legal para se referir a determinados crimes Atualmente é associado a arrogância descontrole etc Um exemplo da abordagem de Hesíodo relativa a estes as pectos pode ser percebido no excerto a seguir apresentado por Jaeger É fácil alcançar a miséria O caminho é desimpedido E ela não mora longe Os deuses imortais porém puseram o suor antes do êxito A senda que a ele conduz é íngreme e comprida e de início penosa No entanto quando tiveres chegado ao cimo tornase fácil apesar de sua aspereza HESÍODO apud JAEGER 1995 p 6869 Com isso consideramos que já existem elementos suficien tes para avançarmos um pouco mais e lidarmos com um elemento extremamente vinculado a Areté e que é o centro de nossa discus são referimonos ao conceito de Paideia 9 A PAIDEIA GREGA No início desta unidade vimos uma série de elementos vin culados ao conceito de Educação Apresentamos de forma um tanto quanto sucinta questões referentes à Educação e formação Educação e cultura indivíduo e sociedade e por fim o homem e a Educação No entanto muitos aspectos de nossa argumentação ficaram como que suspensas no ar pois para tratar adequada mente dos mesmos era necessário que houvesse a apropriação do conceito de Areté e em razão disso lhe foi apresentado o con ceito de Areté em Homero e Hesíodo Claretiano Centro Universitário 87 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação Agora considerando que tenhamos conseguido lidar a con tento com o conceito de Areté podemos finalmente iniciar uma análise do conceito de Paideia Para começarmos analisemos o conceito de Educação Este termo é segundo a etimologia da palavra um substan tivo feminino de origem latina educatio Pode ser traduzido por criar instruir cuidar nutrir produzir tratar É uma ação que se es tende não somente ao ser humano mas também a animais plan tas e ao cultivo da terra É uma ideia bastante abrangente Por outro lado Paideia é a palavra grega que corresponde ao termo latino e implica outro pais paidós isto é crianças Esse termo possui o mesmo radical do verbo paideúo que se traduz por ensinar instruir criar e se aplica de forma tão ampla quanto o vocábulo latino Em grego há ainda outro verbo trophé que se traduz por criação e referese ao período em que a criança está sob os cui dados da mãe ou da família pelo menos até os sete anos A Pai deia corresponde portanto ao período de formação propriamen te dito em que a criança inicia seus estudos primários e nos quais aprenderá a ler escrever e também a música O que a criança aprendia quando estava sob a supervisão e orientação da mãe ou da família A que classe social se refere quando tratamos deste assunto Sabemos que em Atenas por exemplo somente dez por cento da população era considerada cidadã nas decisões políticas As mulheres crianças escravos e estrangeiros não tinham direitos Mas isso tem alguma relação com a Educação Essa Educação se direcionava a todas as crianças sem distinção de classe social po lítica ou econômica Continuemos nossa reflexão Esse caminho será bem sinuo so Vamos lá Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 88 Podemos denominar então seguindo o raciocínio de Jaeger que o entendimento atual do conceito de Educação é bem diferen te do que foi proposto pelos gregos na Antiguidade e portanto fundamento do processo educativo Vamos associar algumas ideias Considere os seguintes fatos Nos dias de hoje uma criança inicia sua vida escolar bem cedo Devido às condições socioeconômicas a maioria das mães precisa trabalhar fora de casa A própria estrutura familiar é diferente A figura paterna já não representa o centro da família Muito frequentemente ocorre a constituição de uma nova família com outros pais que não os biológicos moti vada pela separação divórcio ou desestruturação familiar ocasionada por diversas razões As próprias condições de trabalho atualmente obrigam tan to o pai quanto a mãe a ficar muito tempo fora e longe do convívio com os filhos Não nos esqueçamos de que a figura da mãe é central na Educação do ser humano É ela quem primeiro transfere os con teúdos e bens simbólicos da cultura para o filho ou filha na fase inicial de sua infância O primeiro contato então com a cultura se dá por meio da mãe pelos valores mandamentos que nortea rão sua vida seu comportamento em sociedade Daí que surge um questionamento é a cultura que faz o homem ou é o homem que faz a cultura Parece que por diversos motivos nos perdemos dos pressu postos básicos da Educação Paideia que como já havíamos dito anteriormente foi mérito do povo helênico Jaeger nos ensina que seu registro surgiu somente no século 5º aC na obra Sete contra Tebas de Ésquilo e significava apenas criação de meninos Claretiano Centro Universitário 89 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação Quando nos referirmos à formação distinta historicamente da palavra educação na perspectiva do homem grego da Anti guidade constatase que a Areté está relacionada ao ideal de ho mem que se pretende formar Levados pela significação da palavra formação originaria mente podemos incorrer em equívocos formar no dicionário da língua portuguesa está vinculado à Educação mas já havíamos feito essa observação acerca dos problemas que esse tipo de con sulta pode acarretar Formação no sentido específico da palavra indica o pro cesso de educação ou de civilização e ao mesmo tempo implica um conceito mais amplo que é o de cultura Tal formação não será no entanto bemsucedida ou cons ciente se não atender a algumas condições a saber que a imagem desse homem que se deseja formar seja revestida de Beleza Mas alertamos novamente que não se trata do sentido de beleza física valor que nossa cultura adotou Tratase nesse caso do conceito universal e absoluto de Beleza que não se reduz às percepções que temos do mundo Seu sentido não passa por transformações é portanto imutável Esta formação não é possível sem se oferecer ao espírito uma ima gem do homem tal como ele deve ser A utilidade lhe é indiferen te ou pelo menos não essencial O que é fundamental nela é o καλόν isto é a beleza no sentido normativo da imagem desejada do ideal JAEGER 1995 p 24 A formação referese ao Homem no sentido integral isto é tanto do ponto de vista exterior de seu comportamento quanto de sua atitude interior Esse Homem integral que se pretendia formar isto é aquilo que deveria ser era resultado de um processo de disciplina Veja mos como este καλόν está presente na Areté homérica Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 90 A Paideia em Homero No princípio se tomarmos como exemplos as epopeias de Homero poderemos notar que a Areté está intimamente relacio nada à aristocracia cavalheiresca Vemos nas figuras de Heitor Aquiles e Ulisses exemplos clássicos É da nobreza grega portanto que nasce esse ideal de homem e que modela o mundo aristocrá tico à sua própria imagem A Areté designa nas obras do poeta Homero não somente a Excelência dos seres humanos mas também dos deuses Os es cravos não têm Areté O que nos leva à conclusão de que a Areté homérica como o próprio Jaeger já havia nos revelado é atributo somente da nobreza ou da aristocracia O sentido de dever é nos poemas homéricos uma característica essencial da nobreza que se orgulha por lhe ser imposta uma me dida exigente A força educadora da nobreza reside no fato de des pertar o sentimento do dever em face do ideal que deste modo o indivíduo tem sempre diante dos olhos JAEGER 1995 p 28 É importante você entender que Primeiro o herói é dotado de qualidades naturais natas porque descende de uma longa linhagem de homens ex celentes Segundo essas qualidades ou virtudes devem ser exerci tadas e potencializadas mediante um rígido processo de disciplina conquistando sua Areté mas cujo prêmio será alcançado somente na luta na rivalidade entre seus pa res em tempos de paz ou de guerra na demonstração de sua coragem bravura e sua destreza guerreira em campo de batalha na morte ou em sua vitória A Ilíada está repleta de exemplos dessa consciência educa dora da aristocracia grega cavalheiresca Jaeger 1995 p 30 ob serva que Não foi sem razão que os gregos posteriores viram nestes versos a mais antiga formulação do ideal de formação grego no seu esforço para abranger a totalidade do humano Citaramno com freqüência Claretiano Centro Universitário 91 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação num período de cultura refinada e retórica para louvar a alegria da ação dos tempos heróicos e opôla ao presente pobre de ações e rico de palavras Mas pode também ser citado por outro lado para demonstrar a feição espiritual da antiga cultura aristocrática Outro aspecto de fundamental importância que os heróis gregos aspiravam era a honra que é a expressão da medida da Areté e o fundamento da ordem social É o reconhecimento públi co de seu valor durante um conflito Lembremonos de Aquiles aos portões de Troia chamando por Heitor Tanto um como outro são orientados pelos valores cul turais de seu tempo e nenhum dos dois poderia se esquivar des se compromisso quiçá um compromisso moral inadiável Heitor mesmo sabendo que estava diante do maior guerreiro grego e que suas chances eram praticamente nulas no combate enfrentouo Sua morte no entanto não o desabonou ao contrário aperfei çoou sua Areté heroica Eis um exemplo de honra Segundo Patrício 2008 outros autores daquele período so maramse a Homero em uma proposta de Paideia voltada para a aristocracia e cuja ênfase está voltada sobretudo para o heroísmo e para a honra Dentre esses outros autores Patrício cita os poetas Tirteu e Píndaro Com relação a Tirteu apud PATRÍCIO 2008 p 291 vamos observar um trecho de sua poesia E ainda que fosse mais belo que Titono e mais rico do que Midas e Cimiras mais régio que Pélops filho de Tântalo e dotado de uma língua mais lisonjeira que Adrasto se tivesse todas as glórias do mundo mas não possuísse o valor guerreiro não quereria honrá lo Não dará boas provas de si na luta se não for capaz de encarar a morte sangrenta na peleja e de lutar corpo a corpo com o adver sário Isto é aretê Quanto a Píndaro esse é o poeta do elogio à superação he roica conduta típica da Areté aristocrática o poeta que dentre outras coisas nos aconselha que nossa alma não busque a vida imortal mas que esgotemos o campo do possível Para Patrício 2008 p 291 Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 92 Píndaro é o poeta do ideal aristocrático Nobre é o que é de sangue não de formação é o que pensa Píndaro A aretê encontrase no sangue Ou seja o nobre é nobre não deveio nobre pela formação ou aprendizagem A nobreza é inata não adquirida Essa abordagem que Patrício nos apresenta em relação a Píndaro é importante pois ela vai ser muito discutida futuramente ao pensarmos se é possível ou não ensinarmos qualquer pessoa independente de sua origem ou característica Do que foi dito existem outros desdobramentos da Paideia homérica que necessi tam ser visitados por nós e para tanto verifiquemos a seguir as considerações apresentadas por Goergen 2006 p 185 Mas a influência educativa de Homero não se limitou apenas a esta descrição do comportamento de heróis como Aquiles e Ulisses que deveriam ser modelo de virtude e serem imitados por todos A ou tra face de sua influência tão importante quanto a anterior é o lado estético de sua arte poética Sua poesia tornouse o modelo de beleza estética Se as virtudes de seus heróis eram o modelo do comportamento moral a sua poesia era o modelo do compor tamento estético Aliás estes dois aspectos a ética e a estética não devem ser vistos como dois elementos separados mas como as duas faces do ideal de ser humano o homem belo e bom As sim de certo modo já está presente em Homero aquilo que seria a grande busca e conquista dos gregos a elaboração de um ideal de ser humano Como se percebe valor e beleza elementos caros à ética e à estética são apresentados por Goergen como presentes na Paideia homérica e é importante que você os tenha em mente pois em breve lidaremos com eles quando formos tratar dos conceitos de Agathós e Kalós Agora convidamos você a analisar a Paideia em Hesíodo 10 A PAIDEIA EM HESÍODO Embora a importância de Homero para a construção de uma Paideia alicerçada nos ideais da Areté seja um fato que muitas vezes apresentamos ao longo desta unidade é necessário ainda que tratemos de Hesíodo pois Claretiano Centro Universitário 93 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação A poesia de Hesíodo permitenos perceber que a formação grega não se deu apenas a partir da nobreza e seu fermento espiritual mas que teve a importante contribuição de outras camadas popu lares Colocando a força de sua poesia a serviço dos valores da vida rural e do campo e trazendo estes valores à luz do dia integrouos ao processo de formação da nação grega GOERGEN 2006 p 194 Bem como se daria essa manifestação da Areté em Hesío do Sobretudo pelo uso em sua poesia de metáforas com grande apelo educativo nelas está presente a proposta de trocar o em bate de armas pelo embate de ideias com a realização de justiça como pano de fundo Há assim uma ênfase com relação à Educa ção para os valores em Hesíodo Segundo Goergen 2006 p 194 É mérito de Hesíodo ter introduzido este aspecto ideal que se apre senta como elemento de congruência no mundo disperso de então Tratase da idéia do direito Tal como Homero conta a luta dos seus heróis como um drama de deuses e homens Hesíodo relata o em bate jurídico como uma luta entre forças terrestres e divinas pela vitória do direito e da justiça Homero idealizava a virtude do nobre e colocou no centro de seu modelo educativo a idéia de poder He síodo idealizou o homem trabalhador do campo e pôs no centro de seu modelo a idéia de justiça Com essas últimas considerações apresentadas por Goergen podemos avançar um pouco mais na caracterização da Paideia em Homero e Hesíodo e para tanto vamos analisar o conceito de Kalokagathia 11 A PAIDEIA NO PERÍODO HOMÉRICO KALOS E AGATHÓS Após a análise de algumas das peculiaridades da Paideia em Homero e Hesíodo vamos agora tratar com vocês a análise de dois conceitos que consideramos cruciais para sintetizar essa visita pa norâmica pelo conceito de Paideia na Grécia homérica estamos nos referindo a Kalokhagatia ou mais precisamente Kalós e Agathós Para acompanhar nossas afirmações sobre esse tema utili zaremos uma dissertação produzida por Geoffrey Coad pesquisa Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 94 dor da Universidade de Notre Dame Austrália isso porque seu tema de pesquisa foi especificamente o desenvolvimento da no ção de Kalós e Agathós de Homero até Aristóteles Para começarmos a análise desse tema vamos lidar inicial mente com a etimologia do conceito de Kalokhagatia ele é com posto de dois adjetivos o primeiro é Kalós καλός ou belo e o se gundo é Agathós άγαθός bom ou virtuoso ambos combinados com a crase kaie e com isso temos o adjetivo Kalokhagatos que traduzido para o português corresponde ao belo e bom Esse conceito foi inicialmente usado por Heródoto e Aris tóteles e referese aos poetas épicos que tratamos Em síntese podemos dizer que esse adjetivo buscaria exemplificar a Areté do período homérico que irá definir a Paideia daquele período Especificamente em Homero o termo Agathós está es treitamente vinculado ao conceito de Areté que já estudamos ou seja se disséssemos que alguém é Agathós certamente essa pes soa seria nobre corajosa hábil e astuta COAD 2006 p 19 Quanto ao conceito Kalós vejamos a seguir algumas consi derações apresentadas por Coad 2006 p 21 Outro termo grego de valor nos tempos homéricos é kalós Este aparentemente nunca teve significado alguma indicação de clas se em Homero Ele foi um predicado geral de beleza e foi usado para homens mulheres e coisas sempre com o mesmo significado Este parece ter se referido à aparência física externa kalós igual o seu já mencionado cognato kalon se adere a pessoacoisa como é percebida Por exemplo uma mulher de extrema beleza é kala não importa se ela é cruel aos seus servos ou não Enquanto ela cumpre sua função social ela permanece kala Como se percebe não existe nenhuma associação moral ou ao fato de se possuir conhecimento para que a pessoa seja con siderada como bela Bem e quanto a Hesíodo Aquilo que já lhe apresentamos certamente poderia lhe fornecer pistas para res ponder a essa questão isso porque segundo Coad 2006 p 42 Assim como Homero empregava termoschave de valor assim tam bém foi com Hesíodo A diferença essencial no mundo hesiodiano Claretiano Centro Universitário 95 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação foi que não havia desculpas fictícias O único caminho para o su cesso era um trabalho árduo Ninguém tinhao como um direito de nascença Qual seria então o Ágathos em Hesíodo Embora esse poe ta faça uso de vários termos para tratar dessa adjetivação segun do Coad 2006 p 47 No mundo de Hesíodo um homem não pode alcançar a fama e renome arete a menos que seja mestre em seu ofício Ele tam bém deve ser um membro responsável na comunidade e em sua família através do exercício das virtudes marcadamente diferente da narrativa recebida pela proposta homérica Observamos que as diferenças entre as duas propostas são extremamente distintas se em Homero temos um Agathós voltado para o nobre o Aristós e consequentemente passou a ser usado para se cunhar uma forma de governo onde o poder está para o melhor aristocracia manifestado na imagem do herói belo e guer reiro Em Hesíodo temos uma proposta que vincula o Agathós ao trabalho e ao exercício de valores justiça generosidade etc A proposta de Homero serviu sobretudo para justificar o poder e educar a elite grega que se manteve no poder naquele período Por outro lado na proposta de Hesíodo temos uma tenta tiva de valorizar outros elementos que não os defendidos por essa mesma elite e que se vinculava aos valores presentes na vida das classes menos favorecidas Podemos concluir a partir desses elementos que do ponto de vista político os defensores da Kalokagathia homérica prevale ceram no poder e apresentaram os sustentáculos ideológicos que justificavam esse mesmo poder Do que foi dito podemos finalizar esta unidade retomando e ressaltando a importância dos vários conceitos aqui apresentados O primeiro aspecto se refere à Areté série de valores que passam a despontar na literatura da Grécia homérica apreciados de tal forma que devem ser buscados por seu povo Os textos des sa literatura acabam por fornecer uma finalidade à Educação que Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 96 cria um ideal de formação a Paideia para que esses valores sejam alcançados Em Homero encontramos um ideal de formação vincu lado à Kalokhagatia beleza e virtudes guerreiras e em Hesíodo encontramos uma apologia ao trabalho e às virtudes morais A partir desses elementos e da originalidade da Paideia po dem ser feitas alguns questionamentos no sentido de refletirmos a Educação contemporânea No mundo contemporâneo existe um ideal de Excelência para a construção pessoal Se houver a Educação da atualidade vinculase a esse ide al e apresenta uma proposta de formação para que esse ideal seja atingido Coragem beleza habilidade astúcia trabalho e justiça compõem alguns dos elementos pelos quais temos apre ço e que nos convidam ao exercício de uma Paideia Essas são algumas questões importantes para que você pos sa contextualizar os temas tratados nesta unidade com as aborda gens pedagógicas contemporâneas Para que possa aprofundar os conhecimentos adquiridos nesta unidade o convidamos a realizar as questões apresentadas a seguir 12 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS Sugerimos que você procure responder discutir e comentar as questões a seguir que tratam da temática desenvolvida nesta unidade Confira a seguir as questões propostas para verificar seu desempenho 1 Com base na leitura atenta das citações a seguir identifique a alternativa correta Hoje estamos habituados a usar a palavra cultura não no sentido de um ideal próprio da humanidade herdeira da Grécia mas antes numa acepção bem mais comum que a estende a todos os povos Claretiano Centro Universitário 97 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação da Terra incluindo os primitivos Entendemos assim por cultura a totalidade das manifestações e formas de vida que caracterizam um povo A palavra converteuse num simples conceito antropológico descritivo Já não significa um alto conceito de valor um ideal consciente JAGER 1995 p 78 Segundo Jaeger 1995 os gregos deram o nome de paidéia a to das as formas e criações espirituais e ao tesouro completo da sua tradição tal como nós o designamos por Bildung ou pela palavra latina cultura Daí que para traduzir o termo paidéia não se pos sa evitar o emprego de expressões modernas como civilização tra dição literatura ou educação nenhuma delas coincidindo porém com o que os gregos entendiam por paidéia Cada um daqueles ter mos se limita a exprimir um aspecto daquele conceito global Para abranger o campo total do conceito grego teríamos de empregá los todos de uma só vez JAEGER 1995 p 1 Na sua abrangência o conceito de paidéia não designa unicamente a técnica própria para desde cedo preparar a criança para a vida adulta A ampliação do conceito fez com que ele passasse também a designar o resultado do processo educativo que se prolonga por toda vida muito além dos anos escolares A paidéia vem por isso a significar cultura entendida no sentido perfectivo que a palavra tem hoje entre nós o estado de um es pírito plenamente desenvolvido tendo desabrochado todas as suas virtualidades o do homem tornado verdadeiramente homem MARROU 1966 p 158 a A Educação para os gregos estava relacionada à Areté que quer dizer virtude relacionada à moral e á ética b Areté e Aristós são palavras que têm a mesma raiz no latim Aristós signi fica vencedor força heroísmo coragem valentia c Os gregos acreditavam na educação integral Paideia por isso transmi tiam a Areté a todos d A palavra Areté é o superlativo da palavra Agathós que significa bom nobre sincero corajoso valente e Só a Aristocracia pode alcançar a Areté pois descende de uma linhagem de homens excelentes 2 Qual das palavras a seguir seria a melhor tradução para a palavra grega Areté a Justiça b Cuidado c Dever d Excelência e Valores Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 98 3 Hesíodo traz uma série de contribuições interessantes para o entendimento do conceito de Areté e dentre essas há de se destacar a A ênfase nos valores cavalheirescos de coragem e nobreza b A vinculação da Kalokagathia com a beleza das formas e da justa medida é sobremaneira valorizada nas obras de Hesíodo c Uma proposta que vincula o Agathós ao trabalho e ao exercício de valo res justiça generosidade etc d A valorização dos valores presentes entre a nobreza aristocrática em de trimento dos valores presentes no homem do campo e O entendimento de que o guerreiro munido da coragem traz consigo o que há de melhor na Excelência humana 4 Indique a alternativa que apresenta inadequadamente algumas das carac terísticas da Paideia a Na antiga Grécia esse termo esteve associado às regras do heroísmo b A virtude da temperança e humildade era um grande objetivo do herói e cabia à Educação fornecer elementos para a realização dessa virtude c Por meio da Paideia o homem faz uso de qualidades racionais e volitivas com as quais se faz dono de uma liberdade de desenvolvimento que não é disponível a outras criaturas d A Paideia é um processo social e intelectual de Educação que envolve o indivíduo e Por meio da Paideia realizase a preservação e a transmissão das quali dades físicas e intelectuais que compõem o caráter e a natureza de uma comunidade 5 Vimos que o ideal de Paideia se alicerça no desenvolvimento da mente e do corpo do homem e esse desenvolvimento está fundamentado em algumas virtudes Indique a alternativa que apresenta adequadamente as principais virtudes necessárias para quem se propõe a desenvolver esses ideais a Beleza nobreza verdade justiça e coragem b Nobreza comprometimento humildade e sinceridade c Beleza coragem meditação e autoconhecimento d Justiça emoção envolvimento e companheirismo e Coragem dedicação comprometimento e justiça Gabarito 1 e 2 d 3 c 4 b 5 a Claretiano Centro Universitário 99 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação 13 CONSIDERAÇÕES GERAIS Nesta unidade examinamos de forma muito particular alguns conceitos importantes para a compreensão do processo educativo grego a saber Paideia Areté Agathós Aristós aristoi aristeiai Como visto a Paideia representa o fundamento sobre o qual se assenta toda a cultura ocidental Todas as culturas envolvem o fenômeno da Educação em suas múltiplas dimensões social afe tiva cognitiva política e outras Por isso para compreender em que consiste nosso próprio modelo de Educação é importante co nhecermos como se estruturou esse primeiro modelo educativo a Paideia grega Na próxima unidade veremos como surgiu uma proposta diferenciada de Paideia advinda de uma nova relação política de mocracia grega e o surgimento dos filósofos chamados sofistas 14 EREFERÊNCIA Site pesquisado PATRÍCIO M F Perenidade da Aretê como horizonte apelativo da Paideia Sobre a Excelência em Educação Revista Portuguesa de Ciências do Desporto Disponível em httpwww scieloocesmctesptpdfrpcdv8n2v8n2a10pdf Acesso em 2 fev 2012 15 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARISTÓTELES Metafísica Tradução de Marcelo Perine São Paulo Loyola 2002 v 2 BARNES J Filósofos présocráticos Tradução de Julio Fischer São Paulo Melhoramentos 1997 BULFINCH T O livro de ouro da mitologia história de deuses e heróis Tradução de David Jardim Junior 8 ed Rio de Janeiro Ediouro 1999 CAMPBELL J O poder do mito São Paulo Palas Athena 1990 CASSIRER E Antropologia filosófica ensaio sobre o Homem introdução a uma filosofia da cultura humana São Paulo Editora Mestre Jou 1977 CHAMOUX F A civilização grega Lisboa Edições 70 2003 Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 100 COAD G 2006 A philosophical inquiry into the development of the notion of Kalos Kagathos from Homer to Aristotle Masters thesis Fremantle University of Notre Dame Australia Fremantle WA 2006 Tese de Mestrado GOERGEN P De Homero e Hesíodo ou das origens da Filosofia e da Educação Revista ProPosições v 17 n 3 p 181198 setdez 2006 GLOTZ G A cidade grega São PauloRio de Janeiro Difel 1980 GRAVES R Deuses e heróis do Olimpo Tradução de Bárbara Heliodora Rio de Janeiro Xenon 1992 HESÍODO Teogonia a origem dos deuses Tradução de Jaa Torrano São Paulo Iluminuras 1995 Os trabalhos e os dias Tradução de Mary de Camargo Neves Lafer São Paulo Iluminuras 1991 HIRSCHBERGER J História da Filosofia na antiguidade São Paulo Herder 1965 KIRK G S Os filósofos présocráticos história crítica em seleção de textos 4 ed Lisboa Fundação Calouste Gulbenkian 1994 JAEGER W Paidéia a formação do homem grego Tradução de Artur M Parreira São Paulo Martins Fontes 2001 NIETZSCHE F A Filosofia na idade trágica dos gregos Tradução de Artur Mourão Lisboa Edições 70 1987 PETIT P História antiga Tradução de Pedro Moacyr Campos 6 ed Rio de Janeiro Bertrand Brasil 1989 REALE G História da Filosofia antiga das origens a Sócrates Tradução de Marcelo Perine São Paulo Loyola 1993 v 1 VERNANT JP Mito e pensamento entre os gregos Tradução de Sarian Haiganuch 2 ed São Paulo Paz e Terra 2002 Origens do pensamento grego Tradução de Isis Lana Borges São Paulo Difel 1972 VERNANT JP VIDALNAQUET P Mito e tragédia na Grécia antiga São Paulo Perspectiva 2005 VILANOU C Da Paidéia à Bildung para uma pedagogia hermenêutica Revista Portuguesa de Educação v 14 n 2 2001 EAD Filosofia prática ou sobre os sofistas 3 1 OBJETIVOS Contextualizar o período histórico e filosófico em que se apresentou o surgimento dos sofistas Delimitar algumas das características da Paideia no perí odo de Péricles Estabelecer vínculo entre a democracia grega na época de Péricles e a importância dos sofistas Analisar e compreender a Areté educativa dos sofistas Classificar e examinar a Paideia sofística Analisar e interpretar a Areté política Compreender e justificar o ideal humano da pólis grega Analisar e distinguir criteriosamente a oposição entre Nomós e a Physis Compreender e relacionar o conceito de natureza huma na com a Filosofia Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 102 Compreender e pontuar a questão da consciência cultural grega Estudar e analisar a relação entre Sócrates e os Sofistas Compreender a importância da sofística na Filosofia con temporânea 2 CONTEÚDOS O período clássico grego A democracia grega e cultura grega no discurso fúnebre de Péricles Os sofistas Areté educativa Areté política Nomós Physis Estado e Educação O conceito de natureza humana Paideia sofística 3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE Antes de iniciar o estudo desta unidade é importante que você leia as orientações a seguir 1 Pesquise em livros específicos de Filosofia ou na Inter net comentários sobre a importância dos sofistas para a constituição da Filosofia ocidental Se encontrar algo que considere interessante disponibilize as referências desse material a seus colegas na Lista 2 Um dos nomes mais importantes na transição sofística da Grécia foi Protágoras Em razão da importância desse pensador apresentamos a seguir uma breve biografia a seu respeito Claretiano Centro Universitário 103 U3 Filosofia prática ou sobre os sofistas Protágoras de Abdera Abdera 480 aCSicília 410 aC Protágoras de Abdera foi um dos muitos pensadores gregos do século 5º aC incluindo também Górgias Híppias e Prodicus coletivamente conhecidos como os sofistas Mais velhos um grupo de professores viajantes ou intelectuais que eram especialistas na retórica a ciência da oratória e em temas relacionados a este Protágoras é conhecido primeiramente por três afirmações 1 o homem é medida de todas as coisas que é costumeiramente interpretada como um tipo de relativismo radical 2 o homem pode fazer o pior ou mais fraco argumento aparentar ser o melhor ou mais forte e 3 uma pessoa não pode dizer se deus existe ou não Algumas fontes antigas dizem que estas proposições o levaram a ser julgado e seus livros queimados mas podem ser também lendas Noções de Protágoras como a de que os julgamentos e o conhecimento são de alguma forma relativos à pessoa que julga saber têm sido muito influentes e ainda são amplamente discutidas na Filosofia contemporânea Disponível em http wwwieputmeduprotagor Acesso em 06 fev 2012 Tradução nossa 4 INTRODUÇÃO À UNIDADE Na unidade anterior você estudou o desenvolvimento da Areté nos tempos homéricos e seus desdobramentos manifesta dos na Paideia daquele período Agora iremos conhecer outro momento da Paideia grega o chamado Período Clássico Esse período que começa com a chamada guerra persa 490479 aC e termina com a morte de Alexandre o Grande 323 aC embora tenha sido um momento em que aconteceram mui tas guerras foi o período onde para muitos aconteceu o milagre grego pois as inovações que surgiram nesse momento na literatu ra poesia filosofia drama e artes acabaram por marcar sobrema neira nossa herança cultural Dentre outros acontecimentos nesse período ocorre o surgimento da Filosofia o apogeu político cul tural da cidade de Atenas e ainda o surgimento da democracia Especificamente esse último aspecto traz também a presença de uma corrente filosófica chamada sofista Muitos filósofos sofistas viveram no chamado período áu reo quando se deu o governo do grande líder ateniense Péricles 495 aC429 aC e a população ateniense viveu o auge do regime democrático Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 104 Poderíamos nos perguntar agora quais seriam os valores e as características culturais desse período que acabaram por gerar condições para a presença dos sofistas Um artigo a esse respeito que foi redigido por Rodríguez Barroso 2008 e pode ajudarnos a elucidar essa questão apresentando uma análise dos ideais de Paideia presentes no discurso fúnebre de Péricles No período em que Péricles exercia a liderança apesar do apogeu político Atenas encontravase diante da guerra do Pelo poneso tendo como oponente entre outras a cidade de Espar ta Após um ano de combate os atenienses realizaram um funeral simbólico a todos os que nele feneceram até então No discurso proferido por Péricles durante a memoração é possível ver retra tada a democracia ateniense Vale ressaltar que esse discurso chegou até nós por meio dos registrados do historiador Tucídides 460 aC395 aC Segundo Rodríguez Barroso 2008 há indícios de que ao longo de todo o período em que perdurou a guerra do Peloponeso anualmente era proferido em homenagem aos mortos oriundos das batalhas Vale lembrar que a capacidade oratória era muito valorizada e necessária pois além da beleza estética dos discursos preferi dos os oradores deveriam ser convincentes as decisões nesse momento histórico se davam mediante o exercício da argumenta ção realizada na ágora O termo ágora se refere a um lugar aberto onde se realizavam as assembleias nas antigas cidadesestados gregas Especificamen te no caso de Atenas a ágora acabou por ser símbolo da democra cia grega pois nela participavam aqueles que eram considerados cidadãos atenienses Veja a seguir alguns trechos selecionados do discurso de Péricles observando os elementos que eles retratam Para iniciar essa análise atente aos elementos retratados quanto ao sistema político de Atenas Claretiano Centro Universitário 105 U3 Filosofia prática ou sobre os sofistas O nosso sistema político não compete com instituições que estão noutros locais implantadas pela força Nós não copiamos os nossos vizinhos mas tentamos ser um exemplo A nossa administração fa vorece a maioria em vez da minoria é por isso que é chamada uma democracia As leis dão justiça para todos de igual modo nas suas disputas privadas mas não ignoramos a demonstração da exce lência Quando um cidadão se distingue então será chamado para servir ao estado em detrimento de outros não devido a privilégios mas como um prêmio para o mérito e a pobreza não é obstáculo para tal TUCÍDIDES apud RODRÍGUEZ BARROSO 2008 p 36 tra dução nossa Nesse excerto há ênfase ao valor da democracia o respeito à igualdade dos cidadãos e a valorização da Excelência da qual tratamos na unidade anterior observandose que o homem ex celente é chamado a servir ao estado Apreciemos outro excerto A liberdade que apreciamos estendese também à nossa vida par ticular não desconfiamos uns dos outros e não aborrecemos o nosso vizinho se ele escolher seguir seu próprio caminho Mas esta liberdade não faz de nós seres sem lei Somos educados para respeitar os magistrados e as leis e a nunca esquecer que devemos proteger os feridos E somos também ensinados a observar aquelas leis que não estão escritas cuja sanção está apenas na sensação universal do que está correto TUCÍDIDES apud RODRÍGUEZ BAR ROSO 2008 p 36 tradução nossa Nesse trecho distinguimos a ênfase na excelência moral vin culada às leis quer essas sejam escritas ou se manifestem na pró pria percepção do indivíduo Avaliemos a seguir a relação entre o público e o privado Amamos a beleza sem nos tornarmos vaidosos e apesar de tentar mos melhorar o nosso intelecto isto não enfraquece a nossa vonta de admitir a pobreza de uma pessoa não é uma desgraça para nós mas consideramos desgraçante não fazer nada para o evitar Um cidadão Ateniense não negligencia os aspectos públicos quan do atende aos seus negócios privados Consideramos um homem que não tem qualquer interesse no estado não como perigoso mas como inútil e apesar de apenas uns poucos poderem originar uma política todos nós somos capazes de a julgar Não olhamos a discus são como uma parede bloqueando a acção política mas como um preliminar indispensável para agir com sabedoria TUCÍDIDES apud RODRÍGUEZ BARROSO 2008 p 36 tradução nossa Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 106 Nesse trecho podemos atentar para a valorização da discus são pública e a ênfase no saber Observese que o fato de se valori zar o saber não diminui a ação efetiva do ateniense pelo contrário pensar e discutir são atividades imprescindíveis que antecedem o agir e especificamente agir com sabedoria Dos elementos examinados e de outros manifestados nesse discurso de Péricles há de se pensar se poderíamos estabelecer al guns possíveis aspectos para compor a Paideia do povo ateniense do período em questão Analise conosco algumas possibilidades dessa Paideia suge ridas por Rodríguez Barroso 2008 p 4243 tradução nossa respeito à tradição e consciência do progresso para melhor a identidade coletiva se encontra na pólis não na estirpe união do elogio das instituições políticas atenienses e do caráter dos atenienses que se criam mutuamente comodidade da vida e valor pessoal os mortos servem de modelo para os jovens Desses itens destacados por Rodríguez Barroso alguns você talvez já deva ter identificado nos excertos apresentados no en tanto gostaríamos de ressaltar um aspecto interessante em rela ção ao discurso em questão Ao fazer a análise da Paideia proposta por Péricles Rodrí guez Barroso 2008 p 43 acabou também por identificar algu mas contradições ou seja existem alguns aspectos no discurso de Péricles que apresentam argumentos diferentes e contrários Va mos a alguns deles Humanismo pacifista como base do império embora Péricles defenda uma democracia humanista dentro de Atenas ele acaba por adotar uma postura de beligerân cia e de conquista que é contrária aos ideais humanistas apresentados Claretiano Centro Universitário 107 U3 Filosofia prática ou sobre os sofistas Paradoxo implícito contextual no discurso de Péricles se por um lado Péricles apresenta a defesa de valores ba seados na igualdade há também a justificação de um império baseado em ideais democráticos que se impõem pela força Como veremos adiante esses aspectos se ligarão a elemen tos da proposta sofista Dentre esses elementos destacamos a defesa do debate de ideias a liberdade de expressão e con sequentemente a necessidade de que aquele que irá realizar o discurso esteja bem preparado para esse fim pois é por meio da apresentação pública de ideias que se irá decidir os destinos da cidade e por outro lado aquele que possui Excelência nessa arte será chamado a tomar lugar nas decisões da pólis 5 O SURGIMENTO DOS SOFISTAS Após essa contextualização vamos conhecer agora aqueles que foram denominados sofistas e que conforme veremos a se guir exerceram uma função de extrema importância no Período Clássico Inicialmente podemos dizer que os sofistas atuaram em um cenário de transição e têm papel fundamental para a constituição da Filosofia de Sócrates ateniense que será para muitos estudio sos um marco divisório dentro da História da Filosofia desse pe ríodo O que você poderia dizer a respeito dos sofistas Muitos ain da afirmam que os sofistas eram mercenários do conhecimento ou seja lucravam fingindo conhecer um determinado assunto Re ale 1993 p 189 menciona que até há pouco tempo alguns es tudiosos asseguravam que sofista era aquele que fazendo uso de raciocínios capciosos busca por um lado enfraquecer e ofuscar o verdadeiro e por outro reforçar o falso revestindoo das aparên cias do verdadeiro Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 108 Tal interpretação é pautada em preconceito Vamos juntos no decorrer desta unidade tentar conhecer o verdadeiro papel dos sofistas na antiguidade e no desenvolvimento da Paideia grega 6 ANTECEDENTES DO SOFISMO Antes de iniciarmos nossos estudos acerca dos sofistas é preciso relembrar a tradição filosófica que os sofistas herdaram a chamada Filosofia Présocrática Especificamente neste CRC é importante destacar que no Período Clássico se dá o surgimento da Filosofia nítida sobrepo sição de pensamentos cada filósofo apresenta uma tese de forma que não encontramos consenso nos discursos Cada filósofo acaba por apresentar propostas diferentes a respeito da origem das coi sas ou ainda percebiam e definiam aquilo que será considerado como ser de forma diametralmente oposta Essas características presentes no pensamento Présocrático acabaram por fazer com que a falta de consonância entre os pen sadores gerasse uma inquietação e a necessidade de uma resposta clara por parte dos filósofos sofistas 7 A FILOSOFIA SOFISTA Os sofistas são personagens marcantes e pouco compreen didos na História da Filosofia A imagem mais usual disseminada a respeito dos sofistas é a de pessoas falsas dissimuladas que fingem ser detentoras da verdade Essa imagem porém não é a mais adequada Vamos pro curar compreender quem foram e o que pensavam de fato os sofistas Veja um relato de Henry Sidgwick 1872 sintetizando a opi nião acadêmica do período sobre os sofistas Claretiano Centro Universitário 109 U3 Filosofia prática ou sobre os sofistas Eram uma súcia de charlatães na Grécia no séc V ganhando muito bem a vida impondose à credulidade popular professando ensi nar a virtude ensinavam na verdade a arte do discurso fanático propagando doutrinas práticas imorais Gravitando em redor de Atenas o pritaneu da Grécia Sócrates os encontrou aí e os der rotou expondo o vazio de sua retórica revisando de dentro para fora os seus sofismas e defendendo triunfalmente princípios éticos sadios contra seus sofismas perniciosos SIDGWICK apud GUTRHIE 1995 p 16 Para iniciarmos o estudo sobre os sofistas temos de con siderar que chegaram até nós apenas alguns poucos fragmentos de escritos Muitos de seus livros foram queimados publicamente quase nada chegou até nós e a maioria das coisas que sabemos sobre eles é apresentada por meio de seus principais rivais Platão e Aristóteles Segundo Reale 1993 Platão é o principal responsável pelo descrédito dos sofistas na História da Filosofia Até época relativamente recente a visão dominante visão em que foi educado o estudioso é que Platão estava com a razão em sua querela com os sofistas Foi o que proclamou ser o filósofo verda deiro ou o amante da sabedoria E os sofistas foram superficiais e destruidores e na pior das hipóteses enganadores propositados e criadores de sofismas no sentido moderno do termo GUTRHIE 1995 p 15 Desta forma é complexa a missão de formar uma noção adequada sobre quem foram os sofistas pois além da falta de ele mentos materiais temos um preconceito estabelecido na tradição filosófica mas vamos tentar analisar alguns elementos históricos buscando uma visão mais clara acerca dos sofistas O termo sofista pode ser traduzido por sábio ou sabe doria Sophos e sophistes eram na Grécia sinônimos Para Reale 1993 p 189 o sentido original do termo sofista remete a sá bio especialista no saber possuidor do saber não significan do apenas algo positivo mas altamente positivo tornandose uma espécie de menção honrosa Os sábios e governantes eram cha mados de sofistas O sofista era um perito dotado de determinada capacidade O sophistes era provavelmente um mestre Tal nome era aplicado também a poetas músicos e políticos Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 110 Marias 2004 p 40 ao tratar dos sofistas em História da Filosofia apresenta Filóstrato diz que a sofística fala das mesmas coisas de que falam os que filosofam E Aristóteles diz A Sofística é uma sabedoria apa rente mas não é sabedoria e o sofista é quem usa essa sabedoria aparente que não é sabedoria Nesse trecho podemos observar duas visões diferentes a respeito dos sofistas Filóstrato diz que eles tratam das mesmas coisas que os filósofos e Aristóteles condenaos dizendo que sua sabedoria é aparente É importante ter em mente que o termo sophistes remete à antiga tradição dos poetas como educadores na Grécia antiga Gutrhie 1995 p 34 os apresenta da seguinte maneira Um sophistes escreve e ensina porque tem especial perícia ou co nhecimento para comunicar Sua sophia é prática quer nos campos da conduta e política quer nas artes técnicas Se alguém pudesse fazer os produtos de todos os ofícios e ademais todas as coisas no mundo natural seria com efeito um fabuloso sophistes diz Gláu con na República 596d Essa descrição associase à ideia de que os sofistas eram mestres nas artes e na política 8 SOFISTAS OS PRIMEIROS PROFISSIONAIS DA EDU CAÇÃO Os sofistas foram os primeiros profissionais da Educação os primeiros professores pagos que se organizaram como classe Eram antes de qualquer coisa educadores e mesmo professores itinerantes indo de uma cidade a outra para lecionar Não eram cidadãos atenienses eram estrangeiros Percorriam toda Grécia e propunhamse ensinar a Areté Embora cobrassem por suas aulas há relatos como os de Isócrates que afirmam que nenhum deles fez grande fortuna ao contrário viviam modestamente de acor do com um ideal filosófico de educador Nesse sentido Protágoras 480 aC410 aC reputado como o maior representante entre os sofistas pode ser considerado melhor exemplo que Platão Claretiano Centro Universitário 111 U3 Filosofia prática ou sobre os sofistas Protágoras tinha duas classes de alunos os provindos de classes nobres e que desejavam entrar na política e aqueles que estudavam para fins profissionais ou seja almejavam tornarem se sofistas Dessas classes provém a ideia de que os sofistas eram caçadores de jovens ricos para transmitir sua sabedoria Tal fato pode ser verídico contudo o problema central está na proposta educativa sofista É possível ensinar a virtude a qual quer um O filósofo era considerado um sábio que transmitia seus conhecimentos a discípulos escolhidos a sabedoria deveria ser partilhada com amigos e pessoas amadas de maneira gratuita Os sofistas porém transmitiam seus conhecimentos a todos os inte ressados mesmo que esses tivessem como ambição apenas inte resse em utilizar os conhecimentos para persuadir e dominar Note que os sofistas se propunham ensinar a Areté contudo não se tratava de transmitir a virtude mas de levar o aluno à arte da retórica artemestra para os bons cidadãos no ambiente do interesse público Vale notarmos a dimensão prática da atividade dos sofistas a virtude deixa de estar relacionada à honra à sabe doria e voltase à prática de atuação política na pólis Quanto ao método de ensino os sofistas davam suas ins truções em forma de seminários de conferências públicas ou de exibições Eram mestres da linguagem da retórica e da fala Eram exímios comunicadores capazes de falar com igual presteza sobre questões contrárias Demonstravam suas habilidades para compe titividade argumentativa em discursos eram hábeis para defender até mesmo os casos mais absurdos Seu método era diferente do dos filósofos da natureza que partiam de deduções pois utiliza vam o método empíricoindutivo Partiam assim do princípio de que era a vida e a natureza prática que comunicava conhecimento Os sofistas eram herdeiros dos Présocráticos e dos poetas por isso ensinavam a arte do logos e da retórica Seus escritos en focavam o uso adequado da gramática e da linguagem em geral Eram pessoas habituadas à leitura dos filósofos e tinham grande Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 112 fluência e destreza com o uso de todos os tipos de argumentos até mesmo os falaciosos Desta forma o termo sophistes originalmente denotava alguém extremamente competente um mestre genuíno contudo passou a ser associado ao termo deinon que significava além de astuto perspicaz sagaz também espertalhão e enga nador Os sofistas foram responsáveis por uma verdadeira revolu ção filosófica pois passaram a se interessar não mais pelos fenô menos naturais physis mas pelos negócios humanos antropos nómos 9 A REVOLUÇÃO SOFÍSTICA Com os sofistas houve uma democratização do ensino que até então era apenas destinado à aristocracia Até o jovem pobre poderia juntar suas reservas para receber aulas A preocupação dos sofistas abarcava os problemas humanos acerca do nómos ou das convenções sociais Houve o fim de todo tipo de manutenção do status quo Passouse a considerar que tudo é fruto de significa ção e não de designação e que aquilo que se sabia das coisas era fruto de crença e não de conhecimento Essas mudanças porém não se deram por acaso Veja o que relata por exemplo Villagra Diez 2002 p 9 tradução nossa Pouco a pouco deixase para trás a aristocrática arete pindárica e se substitui por uma paidéia que aposta em um duplo objetivo por um lado fazer membros da sociedade a todos os homens livres e por outro tornálos aptos a servir ao estado A cultura tornase então políticopedagógica Nesse contexto surge a educação so fista ainda que na verdade esta se oriente à formação daqueles capazes tanto de fazer cumprir as leis vigentes quanto de criar novas leis para o qual é necessário a intelecção dos assuntos hu manos Com efeito um homem dedicado à política além de pos suir qualidades para governar deve incrementar sua capacidade de pronunciar discursos oportunos e convincentes Em um estado democrático que se funda a assembléia pública e a liberdade da palavra a oratória se apresenta como uma prática indispensável Em uma palavra necessitase educar no logos Claretiano Centro Universitário 113 U3 Filosofia prática ou sobre os sofistas A Areté pindárica à qual Villagra Diez se refere nada mais é do que um desdobramento da Areté homérica estudada na unida de anterior No período em que há o desenvolvimento da Filosofia sofista há uma revolucionária mudança política quando paulati namente se substitui a aristocracia e sua Kalokaghatia homérica pela participação do cidadão na pólis democrática defendida por Péricles Com essa revolução o conhecimento passa a ser relativo ao sujeito que percebe Para ilustrarmos esse fato vamos lhe apre sentar um pouco mais sobre Protágoras Dentre algumas das peculiaridades das ideias e a história da vida desse filósofo veja a que Haase 2009 p 3536 tradução nos sa destaca Os livros de Protágoras foram queimados pelos atenienses porque ele fez um discurso no qual começa com as palavras A respeito dos deuses eu não posso falar nada nem que eles existem ou ainda que eles não existam A afirmação de Protágoras não quer provar que o que é falso pode ser tido como verdadeiro mas nega a existência de uma ver dade para além do parecer Para Protágoras o grande orador faz parecer o que quer e assim faz a verdade Os sofistas então são técnicos do espírito são destruidores de convicções dogmáti cas e portanto são revolucionários do pensamento antigo A revolução promovida pelos sofistas é nada mais do que o questionamento dos valores arraigados na tradição Grega A reli gião é desmoralizada e o Estado passa a ser visto como fruto da ação humana sem ter nenhuma relação com os deuses A crítica sofística à religião antecipou as ideias que futuramente serão de fendidas por Nietzsche A democratização da Grécia não seria possível sem os so fistas Suas concepções a respeito de relativismo e subjetivismo promoveram o desenvolvimento de conceitos na política e na Fi losofia Os sofistas foram os responsáveis pela sistematização do conhecimento e efetiva busca de uma Paideia na sociedade grega Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 114 Veja a seguir algumas considerações apontadas por Aranha 2000 p 43 Na nova ordem política da cidade as virtudes louvadas não são mais as do aristocrata bemnascido de origem divina que se destacava pela coragem na guerra Diferentemente a virtude do cidadão da polis é cívica e está na sua capacidade de discutir e de liberar nas assembléias Por isso os sofistas fascinam a juventude com o brilhantismo da sua retórica e se propõem a ensinar a arte da persuasão do convencimento do discurso que serão bem aproveitados na praça pública sede da assembléia democrática Nesse sentido os sofistas são os criadores da educação intelectual que vai se tornar independente da educação física e musical até então predominantes nos ginásios Além disso ampliam a noção de paidéia de simples educação de criança passa a ter significado mais abrangente estendendose à contínua formação do adulto capaz então de repensar por si mesmo a cultura do seu tempo A sofística tem portanto caráter público é dirigida ao cida dão uma clara tendência política E por último é uma Paideia uma pedagogia a primeira que propriamente existiu Os sofistas como herdeiros dos Présocráticos enfrentam a decepção da constante contradição existente no pensamento de seus antecessores e por isso são céticos As respostas acerca da natureza são teorias que carecem de consonância A Filosofia convertese em especulação pautada em convicções teóricas pes soais Por isso a especulação naturalista é abandonada para pro curar os fundamentos de todo saber a experiência empírica do ser humano Para os sofistas a sociedade é marcada pelo relativismo tudo depende das situações e ângulos de visão e pelo subjeti vismo tudo depende dos critérios subjetivos dos juízos de cada indivíduo O ceticismo marca o pensamento dos sofistas contudo em contrapartida instaurase o pragmatismo e empirismo A Filoso fia dos sofistas é antes de tudo prática e pautada na realidade excludente de todo o direito de pretensão divina São as relações factuais de poder que condicionam as leis e os costumes Com os sofistas nasce a concepção de direito positivo Claretiano Centro Universitário 115 U3 Filosofia prática ou sobre os sofistas A Filosofia sofística é temida e atacada por Platão pois suas ideias educativas não estavam atreladas à aristocracia Para Platão a Areté só podia ser alcançada por indivíduos provindos da classe dos cidadãos gregos Seguindo esse raciocínio os sofistas eram acusados de prostituir o conhecimento ao ensinar a qualquer um em troca de dinheiro Tal fato marca a crise da aristocracia e do conceito de Areté no contexto da Paideia Outro problema era o perigo dos ataques sofistas contra a religião a moral e tudo aquilo tomado como verdade na socieda de grega até então No início de uma de suas principais obras A Verdade Protágoras apresenta um princípio que se tornou famoso e expressa de forma lapidar o postulado essencial do ensino so fístico o homem é a medida de todas as coisas das que existem pelo fato de existirem das que não existem pelo fato de existirem MARIAS 2002 p 41 Perceba a radical mudança de tema da Filosofia que não mais se preocupa com a natureza physis mas agora parte do homem como princípio de todas as coisas Os sofistas inauguram dessa forma o humanismo e a antro pologia Embora tenham sido execrados por Platão e Aristóteles seu pensamento pode ser percebido implicitamente nas tendên cias filosóficas presentes na modernidade Veja algumas conside rações de Reale 1993 p 192 Compreendese que os temas dominantes da especulação sofística tenham se tornado a ética a política a retórica a arte a língua a religião a educação tudo aquilo que nós hoje chamamos de cultu ra humanista Com os sofistas em suma começa aquele que com expressão correta foi chamado de período humanista da filosofia antiga Poucos escritos dos sofistas chegaram até nós mas seus tex tos eram tidos como manuais de estudo com conteúdo educacio nal portanto sua preocupação era de atuação pública eles não eram literários preocupados em deixar obras para a posteridade Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 116 Aristóteles em Arte Retórica sintetizou o pensamento so fístico e a tradição filosófica anterior A lógica e a sistematização dos raciocínios propostos na lógica aristotélica sem dúvida foram elaboradas com a contribuição dos conhecimentos sofistas 10 A EDUCAÇÃO SOFÍSTICA Como você pôde observar anteriormente os sofistas aban donaram as discussões acerca da physis e abraçaram discussões práticas Com a Educação sofística surge o comprometimento efe tivo dos educadores com uma Paideia destinada a todos os indiví duos da pólis e não mais limitada apenas à aristocracia A crise da aristocracia marca o início do período de difama ção dos sofistas que em determinadas ocasiões chegaram a ser perseguidos Reale 1993 p 195 relata que Os filósofos da natureza dizse buscavam a verdade por si mes ma e o fato de terem ou não alunos era puramente acidental ao contrário os sofistas não buscavam a verdade por si mesma mas tinham por objetivo o ensinamento e o fato de terem discípulos era ao invés para eles essencial Em suma os sofistas faziam do seu saber uma verdadeira profissão com eles o problema edu cativo e o empenho emergiram ao primeiro plano e assumiram um novíssimo significado Contra a pretensão da nobreza que susten tava ser a virtude uma prerrogativa de nascimento e de sangue os sofistas pretenderam fazer valer o princípio segundo o qual todos podem adquirir a arete e esta mais que na nobreza de sangue fundase sobre o saber Para que possamos avançar é preciso tirar algumas conclu sões acerca da controversa sofística Os sofistas estavam preocupados com a Educação na dimen são do ensino Nesse sentido são mais importantes do que os fi lósofos que a partir da maiêutica socrática deram especial ênfase ao processo indagativo Claretiano Centro Universitário 117 U3 Filosofia prática ou sobre os sofistas Com os sofistas nasce a ideia ocidental de Educação vigente até nossos dias envolvendo a figura do professor mestre sofista profissional do ensino e dos alunos Os sofistas não eram todos iguais havia aqueles de maior destaque famosos mas de grande discrição moral havia os cha mados eristas aqueles que exploravam o método sofístico sem discrição e por fim havia os políticos sofistas que abusavam dos princípios sofísticos para teorizar instaurando um imoralismo A menção aos sofistas que queremos trazer à tona porém é a do grande mestre de rigor e sabedoria tão elevadas quanto os ditos filósofos clássicos Os sofistas negavam o absoluto do pensamento contudo não negavam o pensamento Eles atacaram as representações dogmáticas acabadas Na verdade foram responsáveis pela ma nutenção da exigência de um pensamento crítico que desconfia investiga e avalia 11 ATUALIDADE E PERTINÊNCIA DOS SOFISTAS PARA A FILOSOFIA E A EDUCAÇÃO Protágoras afirma que o homem é o princípio de todas as coisas Julian Marias 2004 p 44 propõe a seguinte discussão Aristóteles adverte que há que saber primeiro o que é que nessa frase está em causa se o homem como sujeito de ciência ou sujeito de sensação isto é se a referência é ao ponto de vista da verdade ou simplesmente da doxa Protágoras não fala do ón mas das coi sas enquanto se opõem ao ón das coisas que se utilizam dos bens móveis Daí o sentido de dinheiro A frase referese pois ao mundo da doxa e portanto está compreendida no mundo das idéias de Parmênides Tendo em vista a contribuição dos sofistas com a inaugura ção de uma Filosofia humanística podemos tentar estabelecer al guns paralelos Kant ao iniciar sua proposta filosófica em Crítica da razão pura 1996 pergunta O que o homem pode conhe Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 118 cer Não estaria aí embutida a afirmação de sofística de que o homem é o princípio de todas as coisas Todos os temas abordados na modernidade encontram re flexo na Filosofia sofística as discussões acerca do Estado e da po lítica tão frequentes na Filosofia política moderna com Maquiavel e Hobbes as discussões acerca da Educação em Rousseau e Kant as discussões acerca da religião em Nietzsche Marx e Feuerbach o empirismo de Hume e Locke Notamos assim que os sofistas na verdade eram acima de tudo pensadores comprometidos com a sabedoria porém que entraram para a história sem o título de filósofos Mas como a his tória segundo Marx é escrita pelos vencedores detentores do po der econômico e não por aqueles comprometidos com a verdade Muito ainda há por estudar acerca dos sofistas Com os ele mentos que aqui abordamos podemos ir ao encontro da riqueza dos sofistas para o pensamento filosófico Concluímos esta unidade com algumas considerações apre sentadas por Martins 2010 s p A verdadeira paidéia conscientemente procurada e dentro desta tradição que vem dos gregos não pode descurar a importância dos sofistas na formação do ideário educativo de hoje Afinal de contas no ensino de filosofia o método e a prática mais recorrente e eficaz é o método sofístico Cada vez mais a prática pedagógica do professor de filosofia está associada ao ensino de técnicas quer seja para ler um texto para compreender o mundo em torno quer seja para compreender a si mesmo ou fazer análise de conjuntura Não é este também o papel que as outras disciplinas esperam que a filosofia realize A ligação da prática do ensino de filosofia hoje aos sofistas não é algo negativo dado que entre as novidades introduzidas pelos sofistas destacase o fato de terem sido os primeiros defensores de um processo educativo que não termina com a saída da criança da escola Esta idéia de que a filosofia é uma ciência para pessoas adultas e que ela é mãe de todas as ciências é uma herança dos sofistas que até hoje está presente no nosso ideário educativo Se no período homérico existiu o heróimodelo hoje nós podemos falar do professormodelo aquele que inspira alunos através de sua oratória e retórica Claretiano Centro Universitário 119 U3 Filosofia prática ou sobre os sofistas Como exercício de leitura filosófica para auxiliálo no desen volvimento de sua capacidade interpretativa e a fim de manter o contato com o pensamento filosófico leia o Texto complementar recomendado 12 TEXTO COMPLEMENTAR Leia a seguir texto de um dos mais célebres sofistas Górgias c 485 aCc 380 aC Sobre o nãoser ou Sobre a natureza Em primeiro lugar nada é em segundo mesmo que algo fosse não seria com preensível ao homem em terceiro lugar mesmo que houvesse algo compreensí vel não seria comunicável e explicável aos outros Que nada é demonstroo desta forma se de fato algo existe ou é ser ou é não ser ou é ser e nãoser ao mesmo tempo Mas o nãoser não existe porque se o nãoser existisse ele seria e não seria ao mesmo tempo De fato pensado como nãoser não existe mas enquanto existente exatamente como nãoser existe Mas é completamente absurdo que algo seja e não seja ao mesmo tempo por tanto o nãoser não existe Nem sequer o ser existe Se de fato o ser existisse ou é eterno ou é gerado ou é eterno e gerado ao mesmo tempo Se o ser é eterno não tem princípio algum não tendo princípio é ilimitado se é ilimitado não está em lugar algum se não está em lugar algum não existe O ser porém não pode sequer ter nascido Se de fato nasceu ou nasceu do ser ou do nãoser mas não nasceu do ser se de fato existe como ser não pode ter nascido mas existe desde sempre E não nasceu nem sequer do nãoser porque o nãoser não pode gerar coisa alguma portanto o ser nem é gerado e nem pode ser as duas coisas ao mesmo tempo ou seja eterno e gerado pois as duas coisas se excluem mutuamente portanto se o ser não é eterno nem gerado nem todas as duas coisas ao mesmo tempo ele não existe GÓRGIAS 2012 Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 120 13 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS Confira a seguir as questões propostas para verificar o seu desempenho no estudo desta unidade 1 De acordo com o que você estudou nesta unidade identifique a alternativa incorreta a Era natural a um sophistes escrever e ensinar pois tinha especial perí cia ou conhecimento a comunicar Suas atividades eram essencialmente práticas nos campos da política eou das artes técnicas b Os sofistas se propunham ensinar a Areté contudo não se tratava de transmitir a virtude mas de levar o aluno à arte da retórica artemestra para os bons cidadãos no ambiente da república Vale a pena perceber a dimensão prática da atividade dos sofistas A virtude deixa de estar rela cionada à honra à sabedoria mas à prática de atuação política na pólis c O termo sophistes não era originalmente mal ao contrário denotava alguém extremamente competente era um mestre genuíno contudo tal brilhantismo dos sophistes foi associado ao termo deinon que signi ficava além de astuto perspicaz sagaz também espertalhão e enganador d O filósofo é um sábio que transmite seus conhecimentos a discípulos advindos da aristocracia os sofistas transmitem seus conhecimentos a todos os interessados mesmo que esses tivessem como ambição apenas interesse em utilizar os conhecimentos para persuadir e dominar e Os sofistas inauguram o humanismo e a antropologia o relativismo e o subjetivismo e não buscam a verdade em si mesma Com isso colaboram para a manutenção da Paideia voltada para a aristocracia 2 Leia atentamente as afirmações a seguir sobre os sofistas I Preocupavamse com a Educação e o ensino II São os primeiros profissionais da Educação no ocidente III Estavam preocupados com uma nova concepção de Areté baseada na sabedoria e não da descendência nobre a Todas estão corretas b Somente II está correta c Somente III está correta d Somente I e III estão corretas e Somente I está correta 3 A tese humanista de que o homem é a medida de todas as coisas foi cunhada por a Aristóteles b Homero c Hesíodo d Protágoras e Sócrates Claretiano Centro Universitário 121 U3 Filosofia prática ou sobre os sofistas 4 Das afirmações apresentadas a seguir indique a que apresenta um aspecto incorreto da proposta sofística a Os sofistas foram os primeiros profissionais da Educação os primeiros professores pagos que se organizaram como classe b Os sofistas eram antes de qualquer coisa educadores Eram professores itinerantes que iam de uma cidade a outra c Podemos afirmar que os sofistas eram em sua maioria cidadãos ate nienses d Os filósofos sofistas percorriam toda a Grécia e se propunham a ensinar a Areté e Embora os sofistas cobrassem por suas aulas há relatos como os de Isócrates que afirmam que nenhum deles fez grande fortuna 5 Dentre algumas das peculiaridades do período histórico e cultural em que surge o sofismo é correto afirmar que a O sofismo surge no período em que há uma ênfase na forma aristocrática de governo b Péricles em seu Discurso Fúnebre mostra claramente que os ideais da cultura grega do período em que viveu se encontram diametralmente opostos aos apresentados pelos sofistas c A produção sofística busca essencialmente fazer com que as pessoas busquem o saber e percebam a sua importância d Não há uma novidade na proposta sofística pois esse grupo de pensado res busca tão somente o exercício da Areté por meio dos valores nobres e cavalheirescos e O sofismo relacionase em especial medida com a democracia grega no seu chamado período áureo pois nesse período a defesa de ideias na ágora acaba por fornecer especial necessidade de desenvolvimento da retórica Gabarito 1 e 2 a 3 d 4 c 5 e 14 CONSIDERAÇÕES Vimos juntos as contribuições trazidas pelos sofistas para pensarmos o conceito de Paideia Como você pôde perceber es ses pensadores trouxeram importantes modificações no que tange Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 122 ao conceito de Paideia ou ainda a própria análise do que seria Excelência A partir dessas considerações esperamos ter lhe apresenta do elementos suficientes para que você possa ter percebido a im portância desse grupo de filósofos e o quanto eles influenciaram em uma nova visão de Paideia Além disso devese dizer que eles serão os instigadores de posições contrárias à proposta sofística que acabarão por mudar radicalmente a proposta de Paideia e que estudaremos na próxi ma unidade 15 EREFERÊNCIAS Sites pesquisados GÓRGIAS Sobre o nãoser ou sobre a natureza Disponível em httpwwwhottopos comgeralsofishtm Acesso em 18 abr 2012 HAASE FA Style and the idea of the sophist in the time after Plato Ágora Estudos Clássicos em Debate n 11 2009 Disponível em httpwww2dlcuaptclassicos4 Haasepdf Acesso em 14 fev 2012 MARTINS J S O método sofístico e o ensino da Filosofia Ágora revista eletrônica Disponível em httpwwwceedocombragoraagora10ometodosofisticoeoensinodafilosofia JassonMartinspdf Acesso em 14 fev 2012 16 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARANHA M História da Educação São Paulo Moderna 2000 BARROSO J A R Paideia y valores educativos en La oración fúnebre de Pericles de Tucídides Revista de Filosofía y Socio Política de la Educación n 8 año 4 2008 BRANDÃO C R O que é Educação São Paulo Brasiliense 2005 CASSIN B Ensaios sofísticos Tradução de Ana Lúcia de Oliveira São Paulo Siciliano 1990 CHAUÍ M Introdução à história da Filosofia dos présocráticos a Aristóteles 2 ed São Paulo Companhia das Letras 2002 DUHOT J J Sócrates ou o despertar da consciência Tradução de Paulo Menezes São Paulo Loyola 2004 FAGUET E Iniciação filosófica Tradução de Carlos de Lemos 5 ed Lisboa Guimarães e Cia sd Biblioteca de Educação Racional Claretiano Centro Universitário 123 U3 Filosofia prática ou sobre os sofistas GUTHRIE W K C Os sofistas São Paulo Paulus 1995 HIGHET G Arte de ensinar Tradução de Lourenço Filho 7 ed São Paulo Melhoramentos 1969 Biblioteca de Educação JAEGER W Paidéia a formação do homem grego 4 ed São Paulo Martins Fontes 2003 KANT I Crítica da razão pura São Paulo Nova Cultural 1996 Coleção Os Pensadores MARCONDES D Iniciação à história da Filosofia dos présocráticos a Wittgenstein 2 ed Rio de Janeiro Jorge Zahar 1998 MARIAS J História da Filosofia São Paulo Martins Fontes 2004 Tema do homem Tradução de Diva Ribeiro de Toledo Piza São Paulo Duas Cidades 1975 REALE G História da Filosofia antiga das origens a Sócrates Tradução de Marcelo Perini São Paulo Loyola 1993 REZENDE A Org Curso de Filosofia para professores e alunos dos cursos de segundo grau e de graduação 7 ed Rio de Janeiro Jorge Zahar 1997 SILVA M F Sedução e persuasão os deliciosos perigos da sofística São Paulo Cortez Cadernos Cedes v 24 n 64 p 321328 SetDez 2004 VILLAGRA DIEZ P Diálogo justicia y educación La paideia socráticoplatônica frente a la educación sofista en el Gorgias Synthesis La Plata 2002 v 9 Claretiano Centro Universitário EAD Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia 4 1 OBJETIVOS Contextualizar o período histórico em que se dá a exis tência de Sócrates Período Clássico e a importância de alguns aspectos presentes nesse momento em que se dá a criação de uma proposta diferenciada de Paideia Reconhecer e justificar a importância de Sócrates para a fundamentação da Paideia grega Compreender e analisar a Paideia socrática Compreender e comparar a relação entre Sócrates e os filósofos da natureza Analisar a educação política de Sócrates Analisar e pontuar método socrático na Educação Distinguir Sócrates de Platão e comparálos Analisar e identificar a Teoria das Ideias de Platão Classificar e pontuar evolução do conceito de Areté na obra A República de Platão Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 126 Reconhecer e analisar a importância de Protágoras para compreensão da Paideia sofística em relação à Paideia socrática 2 CONTEÚDOS Método Educação para a pólis Maiêutica Protágoras A República A Teoria das Ideias Areté e Paideia Areté política O homem e a pólis em Aristóteles Humanismo romano Paideia Christi A Bildung contemporânea 3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE 1 Nesta unidade você irá se deparar com as contribuições de Sócrates e Platão para a construção de novos ideais de construção da Paideia Um aspecto interessante ao qual você deverá centrar sua atenção referese à mu dança de foco no exercício da Excelência apresentadas por esses filósofos Além disso no Tópico Introdução à Unidade apresentaremos algumas características do momento histórico vivido pelos atenienses naquele período e nesse sentido há de se pensar o quanto um determinado contexto histórico acaba por interferir nos anseios reflexões e ideais de um determinado povo Por fim iremos lhe apresentar os desdobramentos poste riores do conceito de Paideia e ao fazêlo convidamos Claretiano Centro Universitário 127 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia você a analisar o quanto essas mudanças acrescentaram novas formas de interpretação a esse conceito 2 O termo hermenêutica tem recebido ao longo do tempo uma série de interpretações Especificamente nos estudos religiosos e na chamada Filosofia social esse termo é utilizado para se referir à teoria e à prática da interpretação Nesta unidade faremos uso da her menêutica para interpretar os textos que compõem as fontes de nossos estudos 3 Mesmo com ressalvas com relação a dados históricos presentes em filmes sugerimos que você assista aos seguintes procurando observar como apresentam as ideias de Sócrates e a atitude grega de valorização da razão Sócrates Drama Direção de Roberto Rosselini Itá lia 1971 120 minutos Alexandria Drama Direção de Alejandro Almanábar Espanha 2010 131 minutos Alexandre Aventura Direção de Oliver Stone EUA 2004 176 minutos 4 INTRODUÇÃO À UNIDADE Na unidade anterior você estudou em que consiste a Paideia sofística e os seus valores em Educação cuja finalidade era superar o modelo de Educação baseada na linhagem divina Como estu damos anteriormente os sofistas não conseguiram desvincular o conceito de Areté da aristocracia Nesta unidade examinaremos uma das figuras que mais combateram os sofistas tratase de Sócrates Ao longo desse ca minho tentaremos compreender quais são os pressupostos da Paideia socrática Antes de começarmos a realizar essa análise tornase neces sário contextualizarmos a realidade vivida pelo povo grego nesse Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 128 período pois essa realidade acabará por influenciar sobremaneira as novas reflexões sobre o ideal de Paideia Inicialmente gostaríamos de lembrálo que conforme vimos na Unidade 3 os sofistas viveram sobretudo no período em que floresce a democracia grega o chamado período de ouro Nesse período ocorreu a Guerra do Peloponeso na qual Esparta vence Atenas o que acabou por gerar uma série de desdobramentos e questionamentos Imagine as reflexões que o povo ateniense talvez fizesse naquele período Um povo que tinha um grande orgulho de suas instituições de seus hábitos e condutas acabou por perder uma guerra para uma cidade que não primava segundo o olhar de um ateniense típico pelas qualidades que até então esse povo consi derava como valorosa Essa situação gerou profundas reflexões buscando verificar quais seriam as razões para a perda de guerra ou ainda que carac terísticas específicas da sociedade espartana pudessem ter cola borado para esse resultado Nesse sentido convém analisarmos a reflexão proposta por Jaeger 2006 p 485 Despontava a convicção de que Esparta era menos uma determina da constituição do que um sistema educacional aplicado até as suas últimas conseqüências Era a sua disciplina rigorosa que lhe dava a sua força Também a democracia com a sua avaliação otimista da capacidade de Homem para se governar por si próprio pressupu nha um alto nível de cultura Isto sugeria a idéia de fazer da educa ção o ponto de Arquimedes em que era necessário apoiarse para mover o mundo político Segundo Jaeger essas observações acabaram por gerar a va lorização incondicional do modelo educativo espartano o refúgio nos ideais do passado ou ainda uma reflexão de ações que pode riam ser feitas para consumar uma mudança positiva na Paideia grega A partir dessas reflexões delineiase a percepção da impor tância de uma relação adequada entre o indivíduo e o Estado pois Claretiano Centro Universitário 129 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia o indivíduo certamente está inserido em uma dimensão política e social Assim o cidadão ateniense passa a observar que A educação por meio da qual se pretendia melhorar e fortalecer o Estado constituía um problema mais adequado que outro qual quer para trazer à consciência o condicionalismo recíproco do indi víduo e da comunidade Sob este ponto de vista o caráter privado de toda a anterior educação de Atenas aparecia com um sistema fundamentalmente falso e ineficaz que devia ceder o passo ao ideal da educação pública Embora o Estado não soubesse fazer o mínimo uso desta idéia JAEGER 2006 p 486 Como se percebe são muitos os desafios que se apresentam naquele momento da história grega A seguir vamos nos dedicar a analisar um personagem muito importante desse período que se tornou um verdadeiro símbolo da Filosofia aquele que também com a mesma importância veio a tecer propostas e ações que se vinculam com força e beleza para pensarmos o ideal de Paideia 5 SÓCRATES O que sabemos de Sócrates Muito pouco Na verdade o que sabemos a seu respeito nos chegou por meio de Xenofonte e principalmente de Platão As obras de Platão têm sempre como personagem principal Sócrates Como Sócrates não deixou nenhum escrito várias são as dúvidas que pode ter um leitor mais atento Nesses escritos Platão não estaria apresentando suas próprias ideias por meio de Sócra tes Como delimitar as ideias do mestre das do discípulo Não teria sido ele Sócrates uma invenção O que lemos em A República e em outras obras não seriam simplesmente as ideias de Platão Devemos considerar que para a tradição grega a linguagem escrita não era tão valorizada pelo menos até certo período da história Na Carta VII de Platão temos uma percepção clara dessa questão Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 130 A linguagem falada tem mais expressividade do que a escri ta no Fedro também há discussões acerca da escrita O texto es crito precisa sempre da intervenção de seu autor O método socrático caracterizouse pelo diálogo que exerci ta a inteligência e aguça o raciocínio Isso implica que para exami nar e concretizar a importância de seu pensamento foi necessário o testemunho de seus discípulos ou de seus inimigos que o detra taram cada um à sua maneira Desse modo aproximamosnos e compreendemos um pou co mais a importância de Sócrates na história do pensamento fi losófico No contexto filosófico contemporâneo sua figura é tão importante que os filósofos que o precedem foram denominados Présocráticos Entre os diálogos platônicos em que se pode avaliar a personali dade e os ensinamentos socráticos estão O Banquete e Apologia Porém o problema inicial permanece como realizar a re construção histórica do pensamento socrático como reconhecer as verdadeiras palavras desse sábio ateniense Poderíamos nos re portar a Aristóteles mas Jaeger nos adverte de que esse caminho nos conduz a certa inexatidão Por onde começar 6 RECONSTRUÇÃO DO PENSAMENTO SOCRÁTICO Ponto de partida Em Apologia de Sócrates ou Defesa de Sócrates Platão pro cura reproduzir o discurso que Sócrates teria feito para se defen der das acusações de corromper a juventude não acreditar nos deuses então cultuados e criar novos deuses Claretiano Centro Universitário 131 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia No excerto dessa obra que reproduzimos no tópico Textos complementares conta que Querefonte um dia vai ao oráculo de Delfos perguntar se havia alguém mais sábio que ele Sócrates e obtém como resposta que não há ninguém mais sábio do que Sócrates Ao saber disso o filósofo conta que sai em busca de outra resposta para o vaticínio chegando à célebre conclusão Só sei que nada sei Tomando essa conclusão como uma orientação divina o filósofo defende que o homem deve se dedicar à busca do conhecimento Nesse sentido aplicouse no exercício do pen sar e educar Eis a verdadeira sabedoria a consciência da sua própria ig norância ou o reconhecimento dos limites da própria razão Esse é o pressuposto básico para o filosofar Nesse excerto podemos notar a fina ironia socrática a sa ber o sábio que se julgava ignorante e o ignorante que se julgava sábio Essa passagem da Apologia de Sócrates nos faz pensar tam bém a respeito do método e da dialética socrática a maiêutica e a ironia Além disso o excerto apresenta dois conceitos Belo e Bom que por sua vez estão associados à Paideia e ao ideal de homem que se pretende formar Adiante veremos como se dá a apresen tação desses conceitos Vamos conhecer a seguir um pouco mais sobre as obras que refletem o pensamento de Sócrates Discípulos É por meio do testemunho de Platão em seus diálogos como Fédon Apologia Protágoras que temos um retrato um pou co mais fiel do mestre ateniense um decalque de sua personalida de moral cuja importância promoveu uma mudança no conceito de Areté conforme já havíamos mencionado anteriormente Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 132 Além de Platão também a obra Memoráveis de Xenofonte é importante na reconstrução o pensamento socrático Primeiramente Jaeger advertenos de que o diálogo e as memórias são as formas literárias que nascem nos meios socráticos para satisfazer essa necessidade preservar o pensamento de Sócrates Ambos estão ligados à consciência de que a herança espiritual do mestre é inseparável da personalidade humana de Sócrates JAEGER 1995 p 499 Segundo Jaeger 1995 p 493 Sócrates tornase o guia de todo o Iluminismo e de toda a filosofia moderna Especificamente nesta unidade daremos especial ênfase aos textos Apologia de Sócrates e A República pois conforme veremos a seguir a primeira obra traz uma série de elementos interessantes para analisarmos a contribuição de Sócrates para a construção de uma nova proposta de Paideia e por outro lado a segunda obra define os caminhos para a construção de uma cidade justa De que se trata a obra Apologia de Sócrates Nela temos a versão apresentada por Platão do discurso utilizado por Sócrates para se defender de uma série de acusações que foram proferidas contra ele em 399 aC Essas acusações realizadas por seus detratores diziam que seus ensinamentos viriam a corromper a juventude e que além disso manifestavam descrença pelos deuses da cidade de Atenas isso feria fortemente as crenças dos atenienses Devese dizer que embora façamos uma análise de vários aspectos presentes nessa obra nada substitui a leitura do texto original pois ele carrega consigo uma força argumentativa e até mesmo uma carga emotiva que merecerá sua leitura ao longo desta graduação em Filosofia Quanto ao diálogo A República também tem como persona gem central a figura de Sócrates e foi escrito por Platão em cerca de 380 aC Nele temos a tentativa de Platão em definir justiça or dem e caráter por meio do qual deve ser alicerçada a construção de uma cidadeestado justa a Politeia e ainda o homem justo Claretiano Centro Universitário 133 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia Contextualizadas essas obras cabe a nós examinar as razões que conduziram ao ressurgimento dessa figura tão importante e relacionála com o fenômeno educativo Havíamos dito anteriormente que comumente se estabele ce uma relação entre o cristianismo e o ideal de homem dos gre gos o qual o sábio ateniense representa Há de fato alguma afinidade Primeiramente precisamos ter em mente que a figura de Só crates começa a exibir contornos mais visíveis somente após sua morte mediante os testemunhos de seus discípulos desenvol vendose desse modo uma literatura socrática Esse movimento toma proporções maiores e a inquietação moral que até então assolava apenas seus seguidores se desdobra para os diversos se tores da sociedade ateniense Como dito anteriormente o que sabemos a seu respeito é o que é retratado os textos de seus discípulos e portanto nos depa ramos com o problema de distinguir o que é de fato socrático e o que se trata na verdade daqueles que os retrataram Um primeiro aspecto que podemos identificar é o diálogo em si pois era dessa maneira que o filósofo ensinava Segundo Jaeger 1995 p 501 ele considerava o diálogo a forma primitiva do pensamento filosófico e o único caminho para chegarmos a nos entender com os outros Outro elemento importante para nossa reflexão é a busca do Bom tomemos esse conceito como o Bem Em outras palavras a preocupação de Sócrates tinha mais um conteúdo de ordem moral do que dogmática como o faz parecer na Teoria das Ideias de Pla tão nas suas obras Não podemos deixar de estabelecer relações entre as ideias de Platão e Sócrates afinal o discípulo aprendeu com o mestre os conceitos gerais Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 134 Durante os primeiros estudos filosóficos Platão seguiu os ensinamentos de Crátilo discípulo de Heráclito isto é aquele que defendeu o princípio de que tudo flui nada permanece Desse conceito universal Platão desdobrou o verdadeiro ser as Ideias Mas Sócrates não inferiu a relação entre as coisas sensíveis e as in teligíveis A ele cabe o método indutivo e os conceitos universais Sócrates seria comparável ao limiar mais sóbrio da filosofia de Platão no qual se evitariam as audácias metafísicas deste e fugin do à natureza para se limitar ao campo da moral pretenderseia de certo modo fundamentar teoricamente uma nova sabedoria da vida orientada para o aspecto prático JAEGER 1995 p 507508 Há de se considerar ainda que a morte do mestre foi um dos acontecimentos mais marcantes da vida de Platão Somemos a este fato a Guerra do Peloponeso e seu descrédito com relação à Democracia 7 SÓCRATES O EDUCADOR POR EXCELÊNCIA Sócrates representa o eixo norteador para a compreensão do processo de formação do homem na Grécia antiga No contexto sociopolítico em que viveu o terreno firme no qual se assentavam os valores espirituais herdados dos grandes legisladores como Sólon estavam seriamente comprometidos e se desdobravam em direção à estrutura do Estado e da sociedade No entanto será necessário voltarmos um pouco no tempo para deslindar esse fenômeno quando Sócrates foi discípulo de um dos grandes filósofos naturalistas Anaxágoras Sócrates discípulo de Anaxágoras Ignoramos se nesse período suas ideias políticas foram in fluenciadas pelo círculo de pessoas com quem conviveu tais como Eurípedes Arquelau Sófocles Címon e também Plutarco Péricles e Aspásia Esse era o momento de grande florescimento artístico filosófico e áureo do poder político econômico de Atenas Mas o Claretiano Centro Universitário 135 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia fato é que a Educação para Sócrates deveria ser política Voltare mos a esse assunto mais adiante No entanto para a Grécia se consolidar política e economi camente o Estado exigiu muitos sacrifícios de seus concidadãos E foi nesse período que Sócrates se destacou sendo considerado mau democrata pois defendia que não deve haver intervenção política nas Assembleias e nos Tribunais e o que deveria prevale cer era o conhecimento das coisas Esse pensamento se mostrava diferente do princípio democrático ateniense segundo o qual o Governo era incumbência da maioria do povo JAEGER 1995 p 514 Apresenta dessa forma um novo princípio democrático Essa inovação pode ser atestada de forma mais contundente no diálogo platônico Górgias 454 E ss 459 C ss passim De acordo com Jaeger 1995 p 515 É caso para pensar que esta posição se ia formando dentro dele diante da crescente degenerescência da democracia ateniense durante a guerra do Peloponeso Para quem como ele tinha sido educado no espírito dominante na época das guerras pérsicas e as sistira ao apogeu do Estado era forte demais aquele contraste para não provocar uma série de dúvidas e críticas Podemos dizer que as razões de Sócrates para essa atitude de desprezo em relação à democracia suplantava qualquer moti vação de cunho meramente político Aliás ele a transcendia Mas qual é a relação disso tudo com a influência filosófica de Anaxágoras O que ele buscava na Filosofia da natureza que pudesse ajudar a compreender aquela realidade Nas ideias de Anaxágoras Sócrates não encontrou o princí pio que procurava A explicação reduziase às causas materiais e portanto era insuficiente para dar conta de entender e explicar a realidade e sua estrutura Na obra Fédon podemos observar como Platão apresenta por meio de Sócrates sua Teoria das Ideias No entanto sabemos Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 136 que a investigação socrática passava necessariamente pela ques tão do Bom Agathós que está nas próprias coisas Mas por que buscar pela Filosofia da natureza A resposta é simples porque ele estava à procura do princí pio da ordem humana e esse só poderia ser derivado do cosmos Kósmos ou seja tratase aqui da relação entre o microcosmo homem e o macrocosmo mundo há uma ordem que regula ambos Os gregos foram como já dissemos capazes de identificar e reconhecer as leis que atuam nas próprias coisas Está lembrado Tratandose de Filosofia da natureza Sócrates não encon trou nela a resposta que procurava Observemos esta passagem A crítica aos filósofos da natureza vem pois demonstrar indireta mente que a visão de Sócrates incidia desde o primeiro momento sobre o problema éticoreligioso JAEGER 1995 p 517518 Isso não nos lembra de acordo com a obra Apologia das acusações submetidas a Sócrates No entanto cabe notar que ele procurava uma base firme sobre a qual pudesse compreender e explicar a realidade do ponto de vista éticomoral Por isso recorreu à Filosofia da natureza isto é aos filósofos que o precederam Adotou então uma perspecti va antropológica em que o homem e sua estrutura física e corpo ral constituem ponto de partida para as suas reflexões Nesse sentido as contribuições de Empédocles no campo da medicina atraíram a atenção de Sócrates Vemos a partir deste ponto um deslocamento das reflexões filosóficas que até então se situavam no plano do cosmológico em direção à vida humana Claretiano Centro Universitário 137 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia 8 A IMPORTÂNCIA DO CORPO PARA OS GREGOS Procure retomar algumas considerações sobre a Cosmogo nia a Cosmologia e o Mito para os gregos na literatura que suge rimos nas unidades anteriores Em hermenêutica chamamos isso de précompreensão Vale considerar que ao nos colocarmos diante de uma pers pectiva filosófica antropocêntrica essa implica na noção de corpo Se existimos é mediante um corpo É o corpo que sofre tem pra zer é disciplinado exercitado se reproduz Esse conceito é impor tante na medida em que revela de forma muito clara a marca do pensamento socrático presente nos diálogos platônicos Costumase atribuir a Sócrates a distinção entre corpo e alma embora essa dicotomia porém foi pensada por Platão lembremos que nossa referência foi diretamente Platão e não seu mestre Ao falarmos do corpo não podemos esquecer a importân cia da ginástica naquele tempo A denominação ginástica inicial mente se referia aos variados tipos de atividade física sistematiza dos cujos fins variavam de atividades ligadas a atividades práticas de sobrevivência ou preparação militar Os gregos criaram as pri meiras escolas destinadas à preparação de atletas para exibições ginásticas em público em locais denominados ginásios De um fim prático os exercícios passaram a ser cultuados na busca pelo corpo e mente sãos além do culto à beleza do corpo expressado em obras de arte desse período Assim foi na Grécia antiga que a ginástica adquiriu o status de Educação Física pois passou a de sempenhar papel fundamental no sistema educativo grego para o equilíbrio harmônico entre as aptidões físicas e intelectuais Na obra A República há importantes considerações sobre a ginástica para a formação do indivíduo na pólis A forma como os gregos concebiam a importância do corpo não tem paralelo com o que hoje habitualmente fazemos Aliás sua concepção ultrapas Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 138 sava os limites do simplesmente estético e entendase estético aqui no sentido moderno porque para os gregos a estética tem um sentido mais amplo O que você acha de pesquisar um pouquinho para saber mais sobre esse conceito Para você ter um exemplo da importância do corpo para o povo grego procure pesquisar a respeito por exemplo do movimento renascentista que retomou justamente os valores culturais greco romanos Artistas como Michelangelo Da Vinci e outros se desta cavam pela perfeição simetria de suas obras É interessante notar que o conceito de beleza passa pelo cri vo da matemática como por exemplo proporção simetria etc Um rosto bonito portanto é simétrico e revela perfeição Voltemos ao conceito de ginásio o ateniense daqueles tempos sentiase mais no seu meio no ginásio do que entre as quatro paredes da sua casa onde dormia e comia Era ali sob a transparência do céu da Grécia que diariamente se reuniam novos e velhos para se dedicarem ao cultivo do corpo Os pedaços de lazer dos intervalos eram dedicados à conversa Quem tinha para dizer ou perguntar alguma coisa que considerava de interesse geral mas para a qual não eram locais adequados nem a assembléia do povo nem o tribunal corria ao ginásio para dizêla aos seus amigos e conhecidos JAEGER 1995 p 521522 O ginásio era o local por excelência para a ginástica do pen samento e só era comparado em termos dessa importância aos banquetes Procure ler a obra platônica O Banquete para entender um pouco mais desse contexto Essa ginástica do pensamento à qual nos referimos pode ser denominada como a nova Paideia cuja formação teve gran des contribuições da Filosofia socrática A dialética socrática é a contrapartida do método educativo sofista que já estudamos anteriormente Claretiano Centro Universitário 139 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia 9 A IMPORTÂNCIA DA OBRA APOLOGIA DE PLATÃO Ainda não conseguimos distinguir o pensamento de Sócrates e o de Platão Para isso devemos recorrer ao exame da importân cia da obra Apologia no momento em que ao ser condenado à morte Sócrates confessa enquanto viver jamais deixarei de filo sofar Sua maneira habitual de ensinar ou a conversação socrática é pautada por dois conceitos importantes a exortação protreptikos e a indagação elenchos Assim de acordo com Jaeger a Filosofia socrática é ao mesmo tempo uma exortação e uma Educação Com isso busca refutar o saber e a Excelência Areté apa rentes como pressuposto básico para localizar a essência do bem moral e ético Lembremonos de sua ironia o ignorante que se julga sábio e o sábio Sócrates que se julga ignorante Ora é aqui que nos deparamos com outro conceito caro à Filosofia socrática e que separará Sócrates de Platão o conceito de alma O essencial no estudo desta unidade sobre o exame do ho mem é a preocupação com a alma conforme é mencionado na Apologia em Protágoras ou no Fédon Vale ressaltar que esse conceito não se vincula ao difundido atualmente pelas religiões cristãs afinal historicamente é pré cristão assim como Sócrates também o é A Filosofia socrática exige um comportamento que vise ao cuidado com a alma Esta tem muito mais valor do que os bens materiais ou o corpo mas não significa que o corpo seja deprecia do Inclusive a respeito disso um autêntico princípio socrático foi bastante difundido em latim Mens sana in corpore sano Não significa portanto descuidar do corpo e como disse mos anteriormente para Sócrates o corpo e a alma não estão ne cessariamente separados Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 140 Em que consiste então a Paideia socrática Em algumas passagens da obra Memoráveis de Xenofonte encontramos uma expressão no mínimo curiosa serviço de Deus Bem sabemos que Sócrates foi précristão e que naquela época não havia uma religião monoteísta na Grécia Portanto con vém considerar que essa expressão não traz em seu bojo o sentido adotado pelos cristãos ou qualquer outro sentido de cunho reli gioso É natural também explicarmos por intermédio de Platão e Xenofonte os objetivos da Paideia socrática em detrimento à sofística Eis o que diz Jaeger 1995 p 538 sobre a definição da Pai deia dos sofistas A paidéia dos sofistas era uma colorida mistura de materiais de origem vária O seu objetivo era a disciplina do espírito mas não existia entre eles unanimidade quanto ao saber mais indicado para atingila pois cada um deles seguia estudos especializados e natu ralmente considera a sua disciplina como a mais conveniente de todas Nesse sentido a Educação preconizada pelos sofistas pade cia da falta do critério de cuidado com a alma e também por conta dos limites do alcance do conhecimento desses educadores Transferindo essa reflexão para os dias atuais nós não nos parecemos mais com os sofistas A ideia de saber especializado a fragmentação do saber e a falta de compromisso com a verdade não seriam alguns indicadores 10 POLÍTICA E ÉTICA EDUCACIONAL Somos seres de necessidade conforme uma vez afirmou Marx Precisamos do trabalho para sobreviver e não podemos ne gar os diversos fatores de ordem econômica e política que interfe rem nos acontecimentos históricos Não é verdade Claretiano Centro Universitário 141 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia Materialismo dialético de Marx O filósofo cientista social e historiador Karl Marx é sem dúvida um dos mais influentes pensadores políticos de todo o século 19 Especificamente em relação a essa referência estamos nos referindo a uma tese muito cara a Marx de que a natureza dos indivíduos tem vinculação direta com as condições materiais em que se encontram É claro que esse discurso não inviabiliza os conhecimentos específicos mas a questão é o que um determinado estudo pode contribuir efetivamente para a vida Quais são os limites Impõese aqui um problema ético nesse movimento educa cional instaurado por Sócrates Lembremos de que os sofistas não tinham outra pretensão além da formação de dirigentes políticos e que a preocupação so crática estava voltada para a formação do caráter Dissemos que a Educação de Sócrates era política Como po demos caracterizála afinal Sua política no entanto não pode ser confundida com a teo ria platônica presente nas obras A República e Górgias Sócrates era considerado um mau democrata como já dis semos e não se envolvia com a vida política da época e de sua cidade porém educava politicamente Como podemos falar de política educar politicamente sem nos envolvermos com essas questões diariamente A compreensão do que Sócrates quis dizer sobre a Educação deve ser política A esse respeito veja o que Jaeger 1995 p 546 547 observa Tem necessariamente de educar o Homem para uma de duas coi sas para governar ou ser governado Já na alimentação se começa a marcar a diferença entre estes dois tipos de educação O Homem que é educado para governar tem de aprender a antepor o cumpri mento dos deveres mais prementes à satisfação das necessidades físicas Tem de sobrepor à fome e à sede Tem de se acostumar a dormir pouco a deitarse tarde e a se levantar cedo Nenhum tra balho o deve assustar por árduo que seja Não se deve deixar atrair pelo engodo dos prazeres dos sentidos quem não é capaz de tudo isso fica condenado a figurar entre as massas governadas Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 142 Vemos dessa forma a contribuição socrática para a forma ção política do indivíduo na pólis grega em um sentido mais am plo do que o simples domínio de técnicas 11 A PAIDEIA SOCRÁTICOPLATÔNICA Nesse breve estudo procuramos apresentar alguns dos ele mentos que caracterizariam a proposta de Paideia em Sócrates e Platão Dentre esses elementos gostaríamos de destacar a questão da construção de uma virtude moral o homem e sua vinculação com a pólis e consequentemente uma valorização da formação e participação política Nesse sentido gostaríamos de lhe apresentar uma proposta de Villagra Diez 2002 que em nossa análise tratase de uma sín tese de alguns conceitos da nova Paideia para a qual contribuíram Sócrates e em especial em Platão Para Villagra Diez 2002 p 9 essa nova proposta de Paideia manifestase na necessidade de se educar na Areté através do logos para a pólis Como se percebe há vários aspectos interessantes presen tes nessa afirmação O ideal de Areté permanece mas de forma diferente da Areté heroica de Homero ou ainda da Areté moral do trabalhador manifestada em Hesíodo Nesse momento temos o uso do logos para o exercício da Areté Não basta mais ser corajoso e ter boas virtudes morais mas além disso passar a utilizar o logos pois o logos é bem maior de cada um e permitirá ao homem a realização da sua Excelência em plenitude Não bastasse isso o exercício do logos deve estar a ser viço não só do indivíduo mas da comunidade como um todo pois o indivíduo está para a pólis e a pólis está para o indivíduo Torna se necessário assim que o indivíduo seja educado de modo que possa exercer adequadamente suas funções na sua cidadeestado Claretiano Centro Universitário 143 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia Essa nova proposta de Paideia sintetizada por Villagra Diez como a de educar para o Bem nos faz refletir Temos hoje no uso da razão uma Excelência a ser buscada e ao realizarmos essa Excelência pensamos em exercitála a serviço de um bem maior que nos permita colaborar com a comunidade no qual estamos inseridos Consideramos importante que você reflita sobre essa ques tão pois conforme veremos na próxima unidade o tema será de suma importância quando lidarmos com a contemporaneidade Agora vamos avançar um pouco mais e apresentarmos al guns desdobramentos da Paideia grega manifestada na Paideia aristotélica 12 A PAIDEIA ARISTOTÉLICA O HOMEM E A PÓLIS A proposta de Paideia socráticoplatônica trouxe novas nu ances e possibilidades de entendimento à criação de um ideal de Paideia O mesmo poderá se dizer de Aristóteles o único filósofo do período clássico que rivaliza com Platão em primazia e impor tância na cultura ocidental Aristóteles nasceu na cidade grega de Estagira e mudouse para Atenas onde foi considerado o aluno mais brilhante de Pla tão Ele ousou a partir de suas originais propostas filosóficas apre sentar contrapontos interessantes ao que foi proposto por Platão E quais seriam suas contribuições ao tema aqui proposto Inicialmente podemos dizer que Aristóteles adotou uma posição diferente com relação ao idealismo platônico Enquanto para Pla tão existem conceitos ideais e esses serviriam para guiar os ho mens no desafio da construção de seus ideais em Aristóteles exis te a convicção de que não é possível aplicar conceitos ideais em todos os momentos da vida pois como ela é múltipla mutável e imprevisível é sempre necessário que o homem adeque suas ações a partir das situações com as quais se depara Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 144 Segundo Cottingham apud COAD 2006 p 74 a concepção aristotélica predominante de boa vida envolveria o florescimento harmonioso de nossas capacidades humanas sob as orientações gerais da razão Além disso há uma profunda vinculação da Excelência hu mana e sua vinculação com a pólis pois a construção de um ethos caráter passa necessariamente pela participação política que busque a realização de um bem comum para todos pois Considerado sob o ângulo da autossuficiência o raciocínio parece chegar ao mesmo resultado porque o bem absoluto é considerado como autossuficiente Ora por autossuficiente não entendemos aquilo que é suficiente para um homem só para aquele que leva uma vida solitária mas também para os pais os filhos a esposa e em geral para os amigos e concidadãos visto que o homem nasceu para a cidadania Mas é necessário traçar aqui um limite porque se estendermos os nossos requisitos aos antepassados aos descendentes e aos amigos dos amigos teremos uma série infinita ARISTÓTELES 1991 p 15 E como o homem pode se tornar Excelente Para Aristóte les o caminho da virtude passaria pelo exercício equilibrado de suas qualidades e nesse sentido existiria um elemento central o exercício da prudência phronesis ou seja a capacidade de não somente tomar decisões que lhe permitam atingir um determina do fim mas também lhe permitam determinar fins bons e consis tentes com o objetivo de viver bem de forma geral e ampla Nesse sentido Coad 2006 apresentanos uma metáfora com um jogador de golfe para exemplificar essas considerações que estamos lhe apresentando Procure refletir um jogador de golfe é aquele que em sua prática esportiva tem de realizar cál culos precisos fazendo uso do logos para saber a força certa o exercício equilibrado de virtudes a ser ministrada em uma bola a vida cotidiana para que atinja um buraco ou os vários buracos até a meta final ou fim do jogo a felicidade do indivíduo via participa ção plena na pólis Há de se ressaltar a importância dessas considerações para o momento atual em que estamos vivendo isso porque muitas Claretiano Centro Universitário 145 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia vezes não fazemos uso do logos ou sequer nos lembramos da im portância de seu uso Normalmente deixamosnos levar por ele mentos instintivos em nossas decisões e não bastasse isso sequer temos estabelecido um caminho ou o que é mais importante um télos ou finalidade que nos direcione A partir disso consideramos que já existem elementos sufi cientes para lidarmos com o conceito de Kalós e Agathós aristoté lico Segundo Coad 2006 p 80 Aristóteles ensinou que se a pessoa não adquire os princípios do comportamento ético na família ele deverá encontrálos na comu nidade Assim é a comunidade que educa e para a comunidade que uma pessoa deve continuamente contribuir O ideal de Kalós Kagathós pode somente estar presente no indivíduo completo que é senhor de todas as virtudes e também um respeitável membro da comunidade Com isso terminamos essa pequena análise de alguns gran des pensadores e após essa análise verificaremos alguns dos des dobramentos que ocorreram ao longo do tempo em torno do ideal de Paideia 13 DESDOBRAMENTOS DA PAIDEIA GREGA O humanismo romano Após as considerações que fizemos a respeito da Paideia no decorrer do Período Clássico da Filosofia nos deteremos agora em um desdobramento muito importante da Paideia o Humanis mo Buscaremos debater algumas peculiaridades desse conceito e os elementos novos que ele traz consigo para novas interpreta ções e aprofundamentos em relação ao conceito de Paideia Inicialmente podemos dizer que certamente você de algu ma forma já teve contato com esse conceito Por exemplo quan do algo abominável causa indignação e dizse que é preciso res gatar o valor do humano ou ainda quando se pensa em ideias que poderiam vir a resgatar a humanidade presente em cada um Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 146 Nesse exercício de possibilidades manifestase a ideia de que a especificidade humana carrega consigo características especiais e em razão disso devem ser valorizadas Se lhe perguntarmos se existem semelhanças entre o ideal de Paideia e de humanidade muito provavelmente você dirá que sim e essa semelhança não ocorre por acaso pois como veremos o conceito de humanidade advirá como desdobramento dos ideais de Paideia Werner Jaeger realiza essa vinculação entre ambos os con ceitos e isso pode ser percebido no excerto a seguir o princípio espiritual dos gregos não é o individualismo mas o humanismo para usar a palavra no seu sentido clássico e orig inário Humanismo vem de humanitas Pelo menos desde o tempo de Varrão e Cícero esta palavra teve ao lado da acepção vulgar e primitiva de humanitário que não nos interessa aqui um segundo sentido mais nobre e rigoroso Significou a educação do Homem de acordo com a verdadeira forma humana com o seu autêntico ser Tal é a genuína Paidéia grega considerada como modelo por um homem de Estado romano JAEGER 2003 p 14 No entanto embora haja essa tentativa de vinculação entre ambos os conceitos o conceito de humanitas carrega consigo uma série de peculiaridades pois segundo Oniga 2010 p 1 A idéia de humanitas matura lentamente na passagem do mundo grego ao mundo romano A língua grega não possui nenhuma pa lavra que seja de todo equivalente à latina humanitas A tentativa de Werner Jaeger de identificar a humanitas latina com a Paidéia grega sobre a base de um testemunho de uma célebre passagem de Aulo Gellio tem sido justamente refutada pela maior parte dos estudiosos E como então surgiu esse conceito e qual o seu significado Antes de caminharmos na tentativa de resolução desse questiona mento convém que façamos uma breve contextualização histórica sobre o período que iremos nos deter para dar conta da resposta Inicialmente devemos dizer que os caminhos para essa con textualização começam a se engendrar a partir da referência a um dos alunos de Aristóteles Alexandre o Grande Como se sabe Ale Claretiano Centro Universitário 147 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia xandre é tido como um dos maiores conquistadores de todos os tempos e quando de seu apogeu a influência da cultura grega se fez valer por quase todo o mundo conhecido na época Após a sua morte ocorrida em 323 aC viria a ocorrer o período histórico cultural chamado Helenismo Chauí 2010 p 1314 caracteriza esse período da seguinte forma Os historiadores da cultura convencionaram designar Helenismo as atividades culturais desenvolvidas no período transcorrido en tre a morte de Alexandre Magno em 323 aC e o fim da repú blica romana em 31 aC quando Augusto vencedor da batalha de Actium em 27 aC se torna imperador de Roma A designação referese à presença dominante da língua e da cultura gregas em todo o mundo conhecido numa difusão sem precedentes cuja cau sa inicial foi a convicção de Alexandre aluno de Aristóteles de que por seu intermédio a Grécia devia cumprir uma missão civilizatória sobre todos os povos da terra A língua grega transformouse na koiné dialeto comum em todas as terras conquistadas por Alexan dre e Alexandria no Egito tornouse a capital cultural da Antigui dade papel que conservou mesmo quando Roma ocupou o lugar de centro político e econômico de um império que se estendia do Próximo Oriente ao Sul da Europa do Mediterrâneo ao Atlântico Embora o termo Helenismo pareça indicar apenas a hegemonia da cultura grega na realidade exprime a comunicação intensa entre as criações culturais helênicas e as orientais enquanto submetidas a um mesmo e único poder central ligadas por rotas comerciais e tendo como ponto de encontro Alexandria e mais tarde Roma É exatamente sobre o período de dominação romana que iremos nos deter isso porque conforme veremos nesse período acrescentase o conceito de Humanismo ao ideal de Paideia O que seria esse conceito Segundo Ferrater Mora 1970 p 876 esse conceito passou por uma série de modificações e atualmen te é utilizado sobretudo Para qualificar certas tendências filosóficas especialmente aquelas nas quais se põe em relevo algum ideal humano Como os ideais humanos são muitos tem proliferado os humanismos algumas destas tendências se caracterizam pela insistência na noção de pes soa em contraposição a idéia de indivíduo Outras tendências se caracterizam por predicar a sociedade aberta contra a sociedade fechada Outras por destacar o caráter fundamental social do ser humano Outras por colocar em relevo que o homem não se reduz a nenhuma função determinada mas que é uma totalidade Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 148 Como você pôde perceber são muitas as interpretações e os usos desse conceito Em sua gênese segundo Oniga 2009 embo ra fosse usado em peças teatrais romanas em aproximadamente 100 aC se destaca nas obras de Varrão e em especial de Marco Túlio Cícero 106 aC43 aC E o que o Humanismo representava para essa época Oniga 2009 p 2 conclui a partir das leituras que realizou das obras do historiador Wofgang Schadewaldt que a essência da romana humanitas é precisamente ser a outra face de um conjunto ordenado de valores muito precisos e rigorosos que faziam parte do código de conduta do cidadão romano desde o início e são quase impossíveis de traduzir para o grego a piedade que é algo diferente do eusebéia costumes não exatamente co incidindo com o ethos e então o dignitas o gravitas integritas e assim por diante Na idéia de humanitas ele incorporou todos es ses valores bem como aqueles que já tiveram a oportunidade de experimentar a idéia de cultura mas ao mesmo tempo ele se des vanecia se tornava menos rígido e mais universal Ainda segundo Oniga 2009 p 6 especificamente na obra De oratore de Cícero temos o uso do conceito de humanitas como cultura enciclopédica sobretudo literária mas não só na concepção ciceroniana o orador se caracteriza por sua vasta cultu ra não restrita ao próprio setor profissional mas aberta a todas as disciplinas O orador deve sobressairse in omni genere sermonis et humanitatis em qualquer tipo de conversa e em tudo que diz respeito ao homem in omni recto Studio atque humanitate ho nestos em todos os estudos e todos os aspectos do conhecimento humano Nesse excerto podemos observar alguns dos elementos re ferentes ao conceito humanitas ciceroniano Dentre eles ressal tamos a ênfase na superação na excelência do orador em tudo aquilo que faz e não somente em sua área ou seja a busca da perfeição em tudo aquilo que diz respeito ao homem Além desses aspectos Oniga 2009 p 7 também nos chama a atenção para a presença sempre constante na obra de Cícero da expressão communis humanitas indicando também a natureza humana enfatizando a igualdade fundamental dos ho Claretiano Centro Universitário 149 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia mens e das comunidades constituindo uma raça um único gênero humano Como se percebe nessa expressão estaria presente a ideia da Excelência não somente no indivíduo mas em todos os indiví duos e a vinculação entre todos eles única e exclusivamente pelo fato de serem humanos Consideramos esse aspecto sobremanei ra importante pois ele acaba por apresentar a possibilidade de um ideal de Excelência não somente em um homem e seu povo mas em todos os seres humanos pois o que temos em comum acaba por fazer com que todos nós tenhamos certas qualidades em co mum e isso traz consigo uma proposta inusual e includente Para ilustrar essa afirmação cabe mais uma vez nos ampa rarmos nas palavras de Cícero na obra De Finibus apud ONIGA 2009 p 7 Daí seguese que a atração mútua entre os seres humanos também é algo natural O simples fato de sua humanidade comum exige que um homem não encare outrem como outro homem Com isso podemos concluir que o termo humanitas acaba por trazer novos elementos ao conceito de Paideia pois convida todos os seres humanos somente pelo fato de serem humanos a exercitarem a sua Excelência em todas as áreas e possibilidades pois tal conduta seria de sua natureza Desse modo podemos concluir esse novo desdobramento do conceito de Paideia e avançarmos um pouco mais agora lidan do com o conceito de Paideia Christi A Paideia Christi Embora Jaeger seja muito conhecido a partir de suas consi derações sobre a Paideia grega ele também compôs uma análise das influências dessa Paideia no cristianismo primitivo Suas con siderações a respeito desse tema foram compiladas em uma obra intitulada Early christianity and greek Paideia Cristianismo primiti vo e Paideia grega Essa obra foi publicada em 1961 e originouse das conferências realizadas na Universidade de Harvard em 1960 Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 150 Infelizmente o pesquisador faleceu antes de concluir seus estudos ainda assim grande é sua contribuição para poder traçar alguns elementos importantes a respeito desse tema De forma sintética podemos dizer que para Jaeger a civi lização grega exerceu uma influência profunda na mente cristã acreditando inclusive que sem a evolução pósclássica da cultura grega o surgimento de uma religião cristã mundial não teria acon tecido Para Jaeger a Areté grega acabou por ser um instrumento chave para o florescimento do cristianismo Para validar essas con siderações analisa textos bíblicos e avalia líderes religiosos como Gregório de Nissia exemplos de variações da Paideia grega Dentre os muitos aspectos abordados por Jaeger a respeito desse tema citamos um em especial ao se referir ao livro bíblico Atos dos Apóstolos em que Felipe se apresenta para os gregos e expõe a Paideia de Cristo ou Paideia Christi Para Jaeger 1995 p 12 ao chamar de Cristianidade a Paidéia de Cristo o imitador afirma a intenção do apóstolo de fazer da Cristianidade aparentar ser a continuação da clássica paidéia grega Do que foi dito você talvez esteja se perguntando a respeito das diferenças existentes entre ambas as propostas de Paideia e para responder a essa questão há uma síntese muito interessante proposta por Villanou 2001 sp A metafísica cristã oferece um marco teonomo para regular a for mação humana se deve eliminar qualquer possível manifestação egoísta porque o ser humano somente pode fazerse com Deus quer dizer através da unidade inseparável com Deus o que é o mesmo por meio da realização harmoniosa do humano e do divino Por esta via a pedagogia se converte em mistagogia isto é na experiência mística de Deus A educação do homem é ofereci mento renúncia ao egoísmo para afrontar a entrega altruísta que exige o reino do amor Essa proposta de Paideia traz uma nova visão do homem e sua função no mundo pois Este planteamento supõe que o indi Claretiano Centro Universitário 151 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia víduo já não encontre sua razão de ser no próprio eu mas na fun ção dessa vocação altruísta desse amor ao próximo VILLANOU 2001 sp Há de se dizer que as contribuições da Paideia Christi se mos tram presentes atualmente sobretudo na chamada relação eu e o outro ou seja nela os desdobramentos da Areté referemse à consideração e à valorização dos demais seres humanos Dada as especificidades desta disciplina não nos alonga remos nesse desdobramento mas lhe indicamos para que você aprofunde suas pesquisas sobre o tema no estudo de Antropologia Filosófica no qual se encontra uma abordagem que lhe apresenta rá vários pensadores que se inspiram nessa proposta e que certa mente lhe ajudarão a perceber a originalidade dessa contribuição A Bildung Vamos agora apresentar outro desdobramento interessan te da Paideia grega desenvolvido essencialmente por pensadores alemães e por eles denominado Bildung formação De modo preliminar vamos examinar uma expressão cunha da pelos pensadores alemães que se identificaram com essa pro posta por meio do relato de Villanou 2001 sp Bilde dich griegisch isto é formese com um grego esteve canalizada por uma série de tradições e obras que culminam no século XX com a Paidéia de Jaeger em seu intento de implantar no meio da crise dos anos de entre guerras 19191939 um ide alismo de corte platônico capaz de espiritualizar de novo a vida humana Há de se dizer que esse conceito teve uma longa evolução ao longo do tempo e pode ser percebido no texto de Kant intitulado O que é a Ilustração apud RÉGIS 2001 que nos convida a realizar um ato de coragem e ousadia pela busca do saber sapere aude ou ainda já se fazendo uso do conceito de Bildung na produção de autoria do pensador alemão Wilhelm Von Humboldt em uma série de obras que tratam deste tema Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 152 De modo geral poderíamos dizer que a Bildung alemã tem profundas raízes no conceito de Paideia que estamos vivenciando e especificamente no contexto alemão buscou defender a neces sidade e valor do autocultivo ou ainda da autoformação do ser humano como um elemento caro para o desenvolvimento de suas potencialidades Para ilustrar as necessidades e valores defendidos pela Bildung observe esse pequeno excerto com considerações feitas por Humboldt apud GIACOMONI 2001 sp que afirma que temos um desejo irresistível de medir toda a humanidade contra nós mesmos quem suprime a expressão deste desejo supremo mes mo para o melhor dos motivos estará sempre longe da verdade Como se percebe nesse excerto está presente a ideia de que constantemente nos medimos tendo como elemento de referên cia a humanidade Se nos negamos a realizar essa comparação e nos afastamos dessa análise acabamos por enganar a nós mes mos Ainda para Giacomoni 2001 sp em Humboldt a Bildung é vista mais do que tudo como um acordo dinâmico como um impulso vivo o universo é visto como animado por uma for ça por uma energia dentro de atos que lhe dá vida movimento e ritmo É uma força que sendo o centro de animação e molde de cada realidade é a explicação última e escondido ser O que move o mundo e a história acima de tudo move o homem pressionandoo a agir e expressar em si mesmo como um desejo primário e sem ne nhum outro objetivo que a reprodução de seu próprio movimento e pesquisa o homem como parte da natureza é impulso energia um desejo irresistível para viver de um modo multiforme Consideramos que você depois da análise realizada nesta unidade já possui elementos suficientes para compreender a in fluência do pensamento dos gregos nas propostas educativas do ocidente Na próxima unidade você terá a oportunidade de analisar algumas considerações críticas sobre a Paideia e a importância desse tema para pensarmos a Educação contemporânea Claretiano Centro Universitário 153 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia 14 TEXTOS COMPLEMENTARES Veja no trecho a seguir da Defesa de Sócrates ou Apologia de Sócrates de Platão e avalie as constatações de Sócrates Ciência e Missão de Sócrates Um de vós poderia intervir Afinal Sócrates qual é a tua ocupação Donde pro cedem as calúnias a teu respeito Naturalmente se não tivesses uma ocupação muito fora do comum não haveria esse falatório a menos que praticasses algu ma extravagância Dizenos pois qual é ela para que não façamos nós um juízo precipitado Teria razão quem assim falasse tentarei explicarvos a procedência dessa reputação caluniosa Ouvi pois Alguns de vós achareis talvez que estou gracejando mas não tenhais dúvida eu vos contarei toda a verdade Pois eu Atenienses devo essa reputação exclusivamente a uma ciência Qual vem a ser a ciência A que é talvez a ciência humana É provável que eu a possua real mente os mestres mencionados há pouco possuem quiçá uma sobrehumana ou não sei que diga porque essa eu não aprendi e quem disser o contrário me estará caluniando Por favor Atenienses não vos amotineis mesmo que eu vos pareça dizer uma enormidade a alegação que vou apresentar nem é minha citarei o autor que considerais idôneo Para testemunhar a minha ciência se é uma ciência e qual é ela vos trarei o deus de Delfos Conhecestes Querefonte decerto Era meu amigo de infância e também amigo do partido do povo e seu companheiro naquele exílio de que voltou conosco Sabeis o temperamento de Querefonte quão tenaz nos seus empreendimentos Ora certa vez indo a Del fos arriscou esta consulta ao oráculo repito senhores não vos amotines ele perguntou se havia alguém mais sábio que eu respondeu a Pítia que não havia ninguém mais sábio Para testemunhar isso tendes aí o irmão dele porque ele já morreu Examinai por que vos conto eu esse facto é para explicar a procedência da calú nia Quando soube daquele oráculo pusme a refletir assim Que quererá dizer o deus Que sentido oculto pôs na resposta Eu cá não tenho consciência de ser nem muito sábio nem pouco que quererá ele então significar declarandome o mais sábio Naturalmente não está mentindo porque isso lhe é impossível Por longo tempo fiquei nessa incerteza sobre o sentido por fim muito contra meu gosto decidime por uma investigação que passo a expor Fui ter com um dos que passam por sábios porquanto se havia lugar era ali que para rebater o orá culo mostraria ao deus Eis aqui um mais sábio que eu quando tu disseste que eu o era Submeti a exame essa pessoa é escusado dizer o seu nome era um dos políticos Eis Atenienses a impressão que me ficou do exame e da conver sa que tive com ele achei que ele passava por sábio aos olhos de muita gente principalmente aos seus próprios mas não o era Metime então a explicar lhe que supunha ser sábio mas não o era A consequência foi tornarme odiado dele e de muitos dos circunstantes Ao retirarme ia concluindo de mim para comigo Mais sábio do que esse ho mem eu sou é bem provável que nenhum de nós saiba nada de bom mas ele supõe saber alguma coisa e não sabe enquanto eu se não sei tampouco supo nho saber Parece que sou um nadinha mais sábio que ele exatamente em não supor que saiba o que não sei Daí fui ter com outro um dos que passam por Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 154 ainda mais sábios e tive a mesmíssima impressão também ali me tornei odiado dele e de muitos outros Depois disso não parei embora sentisse com mágoa e apreensões que me ia tornando odiado não obstante pareciame imperioso dar a máxima importância ao serviço do deus Cumpriame portanto para averiguar o sentido do oráculo ir ter com todos os que passavam por senhores de algum saber Pelo Cão Ate nienses Já que vos devo a verdade juro que se deu comigo mais ou menos isto investigando de acordo com o deus achei que aos mais reputados pouco faltava para serem os mais desprovidos enquanto outros tidos como inferiores eram os que mais visos tinham de ser homens de senso Devo narrarvos os meus vaivéns nessa faina de averiguar o oráculo Depois dos políticos fui ter com os poetas tanto os autores de tragédias como os de ditirambos e outros na esperança de aí me apanhar em flagrante inferioridade cultural Levando em mãos as obras em que pareciam ter posto o máximo de sua capacidade interrogavaos minuciosamente sobre o que diziam para ir ao mesmo tempo aprendendo deles alguma coisa Pois bem senhores coro de vos dizer a verdade mas é preciso A bem dizer quase todos os circunstantes pode riam falar melhor que eles próprios sobre as obras que eles compuseram Assim logo acabei compreendendo que tampouco os poetas compunham suas obras por sabedoria mas por dom natural em estado de inspiração como os adivinhos e profetas Estes também dizem muitas belezas sem nada saber do que dizem o mesmo apurei se dá com os poetas ao mesmo tempo notei que por causa da poesia eles supõem ser os mais sábios dos homens em outros campos em que não o são Saí pois acreditando superálos na mesma particularidade que aos políticos Por fim fui ter com os artífices tinha consciência de não saber a bem dizer nada e certeza de neles descobrir muitos belos conhecimentos Nisso não me enganava eles tinham conhecimentos que me faltavam eram assim mais sá bios e eu Contudo Atenienses achei que os bons artesãos têm o mesmo defeito dos poetas por praticar bem a sua arte cada qual imaginava ser sapientíssimo nos demais assuntos os mais difíceis e esse engano toldavalhes aquela sabe doria De sorte que perguntei a mim mesmo em nome do oráculo se preferia ser como sou sem a sabedoria deles nem sua ignorância ou possuir como eles uma e outra e respondi a mim mesmo e ao oráculo que me convinha mais ser como sou Dessa investigação é que procedem Atenienses de um lado tantas inimizades tão acirradas e maléficas que deram nascimento a tantas calúnias e de outro essa reputação de sábio É que toda vez os circunstantes supõem que eu seja um sábio na matéria em que confundo a outrem O provável senhores é que na realidade o sábio seja o deus e queira dizer no seu oráculo que pouco va lor ou nenhum tem a sabedoria humana evidentemente se terá servido deste nome de Sócrates para me dar como exemplo como se dissesse O mais sábio dentre vós homens é quem como Sócrates compreendeu que sua sabedoria é verdadeiramente desprovida do mínimo valor Por isso não parei essa investi gação até hoje vagueando e interrogando de acordo com o deus a quem seja cidadão seja forasteiro eu tiver na conta de sábio e quando julgar que não o é coopero com o deus provandolhe que não é sábio Essa ocupação não me permitiu lazeres para qualquer atividade digna de menção nos negócios públicos nem nos particulares vivo numa pobreza extrema por estar ao serviço do deus Além disso os moços que espontaneamente me acompanham e são os que Claretiano Centro Universitário 155 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia dispõem de mais tempo os das famílias mais ricas sentem prazer em ouvir o exame dos homens eles próprios imitam me muitas vezes nessas ocasiões metemse a interrogar os outros suponho que descobrem uma multidão de pessoas que supõem saber alguma coisa mas pouco sabem quiçá nada Em consequência os que eles examinam se exasperam contra mim e não contra si mesmos e propalam que existe um tal Sócrates um grande miserável que corrompe a mocidade Quando se lhes pergunta por quais atos ou ensinamentos não têm o que responder não sabem mas para não mostrar seu embaraço aduzem aquelas acusações contra todo filósofo sempre à mão os fenômenos celestes o que há sob a terra a descrença dos deuses o prevalecimento da razão mais fraca Porque suponho não estariam dispostos a confessar a verdade terem dado prova de que fingem saber mas nada sabem Como são ciosos de honrarias tenazes e numerosos persuasivos no que dizem de mim por se confirmarem uns aos outros não é de hoje que eles têm enchido vossos ouvidos de calúnias assanhadas Daí a razão de me atacarem Meleto Ânito e Licão tomando Meleto as dores dos poetas Ânito as dos artesãos e políticos e Licão as dos oradores Destarte como dizia ao começar eu ficaria surpreso se lograsse em tão curto prazo delir em vós os efeitos dessa calúnia assim avo lumada Aí tendes Atenienses a verdade em meu discurso não vos oculto nada que tenha alguma importância nada vos dissimulo Sem embargo sei que me estou tornando odioso por mais ou menos os mesmos motivos o que comprova a verdade do que digo que é mesmo essa a calúnia contra mim e são mesmo essas as suas causas É o que haveis de descobrir se investigardes agora ou mais tarde PLATÃO 1987 p 810 15 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS Confira a seguir as questões propostas para verificar o seu desempenho no estudo desta unidade 1 Relacione as colunas 1 Exortação e indagação Platão 2 Corpo e alma Sócrates 3 Perspectiva antropológica Protreptikos e elenchos 4 Sofistas Formação do caráter 5 Socrática Dirigentes políticos Indique a alternativa correta a 2 3 1 5 e 4 b 3 2 5 1 e 4 c 2 3 5 4 e 1 d 5 4 2 3 e 1 e 1 3 2 4 e 5 Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 156 2 Leia o texto a seguir Tinham razão Aristóteles e Platão uma sociedade fundada no trabalho escravo não podia assegurar cultura para todos O rendimento da força humana era tão exíguo que um homem não podia estudar e trabalhar ao mesmo tempo Portanto aos filósofos caberia a direção da sociedade aos guerreiros protegela e aos escravos manter as duas classes anteriores A separação entre força física e força mental impunha ao mundo antigo estas duas enormidades para trabalhar era necessário gemer nas misérias da escravidão e para estudar era preciso refugiarse no egoísmo da solidão PONCE 1986 p 32 Nesse contexto I Platão e Aristóteles acreditavam na educação integral do ser huma no por isso criaram a Academia e o Liceu II Sócrates ensinava Filosofia para grupos de diversas classes sociais com isso almejava a justiça social III Os sofistas ensinavam a quem pagasse por suas aulas IV Os escravos jamais poderiam estudar na sociedade grega eles deve riam propiciar o ócio aos senhores e aos filósofos V Os filósofos na Grécia antiga pensavam em justiça para todos e por isso jamais aceitariam a manutenção do sistema escravista Identifique a alternativa correta a Apenas I III e IV são corretas b Apenas I II e III são corretas c Apenas II e V são corretas d Apenas III e IV são corretas e Apenas IV e V são corretas 3 De acordo com Sócrates a vida não examinada não vale a pena ser vivida e a virtude é conhecimento porque a a existência humana é valiosa precisamente porque todos nós estamos interessados em examinar a nossa vida b a menos que a nossa sociedade nos diga o que devemos fazer nós nunca vamos ser considerados virtuosos c a Excelência ou valor Areté da nossa vida consiste na medida em que agimos virtuosamente d sem perguntar o que faz com que a vida valha a pena não podemos saber como devemos viver 4 Sócrates teria afirmado que a vida não examinada não vale a pena ser vivi da afirmativa frequentemente citada como tema central nas atividades da Filosofia e de realização da excelência humana Dessa afirmação podemos entender que Claretiano Centro Universitário 157 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia a às vezes simplesmente não vale a pena todo o esforço de examinar a vida e seus problemas em grandes detalhes às vezes é melhor simples mente ir em frente b sempre que tivermos de adotar uma atitude reflexiva perante a vida adotamos uma atitude interessante no entanto é mais importante que simplesmente vivamos e deixemos de lado reflexões a respeito da vida c para o filósofo se continuamos simplesmente fazendo o que todo mun do faz de forma irrefletida acabaremos por deixar de fazer algo válido nobre ou admirável d é um desperdício de tempo ficarmos analisando se vale a pena viver devemos deixar essa reflexão para nossos líderes e para os filósofos 5 Relacione as colunas 1 Esta expressão teve como significado Bilde dich griegisch isto é forme se com um grego e foi utilizada para representar um movimento que aconteceu sobretudo na Alemanha e que buscou resgatar os ideais da Paideia grega Aristóteles 2 Por meio deste conceito surge uma nova imagem dos ideais da Paideia esta presente sobretudo nas obras de Cícero e nos convida a pensar um ideal de Excelência para o indivíduo e a sociedade Paideia Christi 3 A pedagogia convertese em uma mistagogia isto é vinculase a um contato íntimo com Deus e introduz uma nova série de valores aos ideais educativos e em especial entre a relação Eu e Outro Bildung 4 Introduz uma nova forma de pensarmos o conceito de Kalós e Agathós que irão compor nossa Excelência e ideal educativo Nesta nova forma há uma especial ênfase na relação entre o indivíduo e a comunidade Humanismo Indique a alternativa correta a 3 4 2 e 1 b 4 1 2 e 3 c 2 3 1 e 4 d 1 2 3 e 4 e 4 3 1 e 2 Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 158 Gabarito 1 a 2 b 3 d 4 c 5 e 16 CONSIDERAÇÕES FINAIS Você estudou nesta unidade alguns aspectos sobre a impor tância de Sócrates para compreendermos o conceito de Educação Logo a seguir vimos as contribuições advindas das propostas de Platão e Aristóteles Depois realizamos um breve estudo sobre alguns desdo bramentos da Paideia manifestados nos conceitos de Humanis mo Paideia Christi e Bildung No entanto isso não significa que a pesquisa sobre o tema tenha se esgotado com este estudo Muito mais há porém por estudar a respeito do que lhe apresentamos e infelizmente este modesto CRC não daria conta de trabalhar com mais profundidade do que já nos propusemos Além disso há de se dizer que as obras clássicas indicadas ao longo das unidades são essenciais para a apropriação de seu conteúdo Essas indicações ampliarão seu conhecimento sobre o assunto Depois do que lhe foi apresentado nesta unidade procure realizar a seguinte reflexão Quais relações são possíveis de se es tabelecer entre o conteúdo aqui discutido e o contexto sociocultu ral em que vivemos Seja coautor de nossa caminhada Lembrese da afirmativa de Sócrates Vida sem reflexão não vale a pena ser vivida Claretiano Centro Universitário 159 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia 17 EREFERÊNCIAS Sites pesquisados GIACOMONI P Paideia as Bildung in Germany in the age of enlightenment Disponível em httpwwwbueduwcpPapersModeModeGiachtm Acesso em 19 abr 2012 VILLANOU C De la Paideia a la Bildung hacia una Pedagogía Hermenéutica Revista Por tuguesa de Educação Minho v 14 n 2 2001 Disponível em httpredalycuaemex mxsrcinicioArtPdfRedjspiCve37414210 Acesso em 19 abr 2012 18 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARISTÓTELES Ética a Nicômaco São Paulo Nova Cultural 1991 CHAUÍ M Introdução à história da Filosofia as filosofias helenísticas São Paulo Schwarcz Ltda 2010 COAD G A philosophical inquiry into the development of the notion of Kalos Kagathos from Homer to Aristotle Masters thesis Fremantle University of Notre Dame Australia Fremantle 2006 JAEGER W Cristianismo primitivo e Paideia grega Lisboa Edições 70 2001 Paidéia a formação do homem grego São Paulo Martins Fontes 1995 Early christianity and greek Paideia Cambridge Belkmap Press of Harvard University Press 1961 KANT I O que é ilustração Apud RÉGIS C A Kant a liberdade o indivíduo e a república In WEFFORT F Org Os clássicos da política São Paulo Ática 2001 v 2 MORA J F Dicionário de Filosofia Buenos Aires Editorial Sudamericana 1970 ONIGA R Humanitas In Contro la postreligione per un nuovo umanesimo cristiano Verona Fede Cultura 2009 PLATÃO Apologia de Sócrates São Paulo Nova Cultural 1999 Coleção Os Pensadores Diálogos O Banquete Fédon Sofista Político São Paulo Nova Cultural 1991 Coleção Os Pensadores Defesa de Sócrates 4 ed São Paulo Nova Cultural 1987 Coleção Os Pensadores Sócrates A República São Paulo Abril Cultural 1972 Górgias Tradução de Jaime Bruna 3 ed Rio de Janeiro Bertrand Brasil 1989 Fedro Cartas Primeiro Alcebíades Tradução de Carlos Alberto Nunes Belém UFPA 1986 Coleção Amazônica Série Faria Brito PONCE A Educação e luta de classes São Paulo Cortez 1986 REALE G Para uma nova interpretação de Platão São Paulo Loyola 1997 VERNANT JP Mito e tragédia na Grécia antiga São Paulo Perspectiva 2005 Mito e pensamento entre os gregos São Paulo Paz e Terra 2002 VILLAGRA DIEZ P Diálogo justicia y educación La paideia socráticoplatônica frente a la educación sofista en el Gorgias Synthesis La Plata 2002 v 9 Claretiano Centro Universitário EAD Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporanei dade 5 1 OBJETIVOS Refletir sobre algumas considerações críticas referentes à Paideia Analisar alguns dos principais problemas contemporâne os e suas reverberações no aspecto educativo Compreender a importância dos ideais da Paideia para pensarmos novas propostas educativas diante dos desa fios atuais 2 CONTEÚDOS A crítica de Nietzsche à Paideia socráticoplatônica Os riscos do etnocentrismo presentes nos ideais da Pai deia segundo Jacques Derrida A distância existente entre o ideal de Paideia e a realidade Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 162 A indústria cultural e a razão instrumental segundo a Es cola de Frankfurt A contribuição da Paideia para uma ressignificação da Educação na atualidade 3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE Nesta unidade vamos adotar caminhos novos em nossas reflexões Em razão disso necessitamos de seu olhar atento para que perceba as sutilezas dessa mudança 1 Um aspecto que consideramos crucial presente nesta unidade referese ao exercício do contraditório ou seja à apresentação de argumentos que visam combater as ideias que até então estávamos defendendo 2 Consideramos importante que você se detenha esse as pecto pois ele será de suma importância para sua for mação filosófica ao longo deste curso Você verá que a Filosofia se assenta em um constante ir e vir de ideias um olhar sempre diferente para as mesmas realidades ou possibilidades de realidade 3 Outro aspecto que merece a sua reflexão cuidadosa se refere ao exercício da Filosofia como desveladora de re alidades Por meio dele tentaremos demonstrar a você que a força de uma ideia produzida por um filósofo ou por uma corrente filosófica pode mudar completamente a forma como vemos a realidade ou ainda como nos en contramos diante dessa mesma realidade 4 Algumas leituras presentes nesta unidade merecem es pecialmente sua atenção Dentre elas citamos a já clás sica obra de Adorno e Horkheimer intitulada Dialética do Esclarecimento Essa obra carrega consigo certa com plexidade pois dialoga com autores e propostas que cer tamente merecem ser vencidas dada a profundidade de questões nela existentes 5 Também consideramos importante que você leia o texto O que é ilustração de Immanuel Kant Nele você encon trará conceitos subjacentes nas várias argumentações Claretiano Centro Universitário 163 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade que lhe apresentaremos sobretudo vinculadas ao con ceito de autonomia e heteronomia Além disso ele é de suma importância para você analisar alguns dos ideais presentes no chamado Iluminismo e nas propostas de emancipação que serão apresentadas por um dos auto res que estudaremos nesta unidade 6 Por fim consideramos importante que você faça um re sumo de tudo o que viu até agora e verifique como os elementos apresentados até então podem ser importan tes para a criação de uma nova proposta de homem e de humanidade 7 Alguns filmes retratam um pouco o momento em que vivemos Nos filmes que indicamos a seguir procure ob servar os desafios da construção de uma nova Paideia na contemporaneidade a 199 um supermercado que vende palavras Dra ma Direção Marcelo Masagão Brasil 2003 b Nós que aqui estamos por vós esperamos Docu mentário Direção Marcelo Masagão Brasil 1998 c Capitalismo uma história de amor Documentário Direção Michael Moore EUA 2009 d A Onda Drama Direção Dennis Gansel Alemanha 2008 e Entre os muros da escola Drama Direção Laurent Cantet França 2007 4 INTRODUÇÃO À UNIDADE Na unidade anterior analisamos as contribuições socrático platônicas para o desenvolvimento da Paideia e alguns desdo bramentos que aconteceram ao longo do tempo manifestados na chamada Paideia Christi e o no conceito de Bildung Nesta unidade examinaremos algumas considerações críti cas fornecidas sobre o conceito de Paideia os problemas educa tivos contemporâneos e a importância das propostas oriundas da Paideia para pensarmos a possibilidade de uma mudança positiva em relação a esses mesmos problemas Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 164 Consideramos importante refletir sobre a conduta que ado tamos neste momento Como você pôde perceber ao longo das unidades anteriores fizemos uso de uma estratégia que se caracte rizou por uma verdadeira apologia à Paideia grega Neste momen to buscaremos inicialmente criticar alguns dos aspectos envolvi dos nessa mesma Paideia A princípio tal atitude poderia vir a parecer paradoxal No entanto consideramos que nela existiria aquilo que de fato nos anima ou seja a amizade pelo saber Acreditamos que a adesão irrestrita a uma ideia ou a um conceito acabaria por nos afastar do ideário grego ao invés de nos aproximar dele Em razão disso vamos lhe apresentar algumas reflexões crí ticas sobre a Paideia para que você possa verificar os vários ângu los sob os quais podemos tratar um mesmo problema e por fim ilustraremos algumas das possíveis contribuições da Paideia para pensarmos os problemas contemporâneos Para começarmos nosso intento que tal a analisar as con siderações críticas apresentadas pelo filósofo Friedrich Nietzsche 18441900 em relação à Paideia socráticoplatônica 5 UMA NOVA PROPOSTA DE ARETÉ Nietzsche foi um dos maiores adversários da proposta de Paideia socráticoplatônica Inicialmente poderíamos dizer que para Nietzsche houve uma ruptura entre as forças do apolíneo racional e do dionisíacoirracional comprometendo assim a con cepção trágica do mundo Caso você queira conhecer um pouco mais sobre esse autor existe uma obra recente sobre Nietzsche do Prof Rogério Miranda de Almeida intitulada Nietzsche e o paradoxo Publicada original mente em francês e traduzida para o português pelo próprio autor já conta também com uma tradução para o inglês Há nessa obra a originalidade da análise de textos póstumos do filósofo alemão que até então não foram publicados Claretiano Centro Universitário 165 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade Mas voltemos à questão o que significa tragédia Conceito de tragédia Para que possamos iniciar nosso diálogo sobre o conceito de tragédia é necessário que constatemos a necessidade de ou tra empreitada intelectual Deveríamos passar obrigatoriamente pela leitura e pelo exame das obras de um dos mais importantes helenistas de nosso tempo JeanPierre Vernant A leitura de Mito e tragédia na Grécia antiga e de Mito e pensamento entre os gre gos seriam portanto indispensáveis veja referência completa nas Referências bibliográficas No entanto sem perder de vista sua importância voltemos às ideias de Jaeger sobre as razões que le varam Nietzsche a combater as ideias socráticas A crítica de Nietzsche parte digamos assim da indissolubi lidade entre o ideal socrático e o ideal cristão mais precisamente do humanismo escolástico que Sócrates representa Quando nos referimos à relação ou ao conceito apolíneo dionisíaco podese afirmar que não havia para os gregos na quele período distinção ou dualismo entre corpo e alma Esses elementos eram uma e a mesma coisa Eis o que a tragédia representa a harmonia entre esses dois elementos Podemos nos lembrar por exemplo das peças de Só focles tais como Édipo Rei Antígona e outras em que os heróis não têm solução para o drama vivido diante das novas demandas da sociedade ou da comunidade em processo de democratização Eles permanecem entre o que a lei instaurada pelo poder político prescreve em termos de comportamento e o que diz sua lei inte rior sua consciência moral O que fazer Ainda hoje vivemos o trágico Não há lei que diga como de vemos agir ou nos comportar em determinadas situações Um homem deve escolher entre salvar a vida de seu filho ou seguir a lei Parecenos óbvia a resposta mas não é tão simples Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 166 assim E o que dizer do conflito entre as gerações entre o velho e o novo Pensemos Há muito de trágico em nossas vidas e isso não se refere somente à questão de ter ou não ter dinheiro Eis uma citação importante para que nos aproximemos do significado de tragédia segundo Vernant 2005 p 1 Gênero literário original possuidor de regras e características pró prias a tragédia instaura no sistema das festas públicas da cidade um novo tipo de espetáculo além disso como forma de expressão específica traduz aspectos da experiência humana até então des percebidos marca uma etapa da formação do homem interior do homem como sujeito responsável O que é intrigante logo no início de suas reflexões sobre esse sábio ateniense é a afirmação de Jaeger 1995 p 493 Sócrates tornase o guia de todo o Iluminismo e de toda a filosofia moderna Algumas considerações sobre Sócrates e o cristianismo Segundo Jaeger houve uma simbiose entre o conteúdo da religião cristã e o ideal do homem grego Assim como no início de sua difusão o cristianismo apropriouse de ritos pagãos para ser aceito da mesma forma no debate com a ideia clássica do homem e de Deus prevaleceram as contribuições filosóficas dos gregos que lhe davam sustentação racional Daí vem a confiança na razão humana e nas leis naturais inerentes às próprias coisas Tomemos como exemplo o Novo Testamento que foi tradu zido originalmente do hebraico para o grego E lembremonos também do apóstolo Paulo que tinha dupla cidadania grega e romana Vemos a potencialização e a radicalização do platonismo da dicotomia corpoalma do intelectualismo do elemento ex machina vide as peças de Eurípedes A primazia do apolíneoracional Esse processo pode ser descrito como moralizador ou moralizante e essa é uma das características mais evidentes em Sócrates racionalizando a concepção trágica do mundo Claretiano Centro Universitário 167 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade Essa é segundo Jaeger a razão de tanta hostilidade de Nietzsche em relação a Sócrates Isso será mais evidente se exami narmos a moral do senhor e do servo na obra do filósofo alemão Numa perambulação pelas muitas morais as mais finas e as mais grosseiras que até agora dominaram e continuam dominando na terra encontrei certos traços que regularmente retornam juntos e ligados entre si até que finalmente se revelaram dois tipos básicos e uma diferença fundamental sobressaiu Há uma moral dos sen hores e uma moral dos escravosNIETZSCHE 1992 p 72 E como se daria a diferença entre ambas Para Nietzsche a moral dos senhores transitaria essencialmente por uma escala onde os atos morais são analisados por suas boas ou más consequências e por outro lado na moral do escravo nossas ações acabariam por ser analisadas por nossas boas ou más intenções Há de se dizer que a forma como Nietzsche orquestra seu entendimento de moral é bem diferente da forma costumeira como o fazemos Para o pensador o processo de formação da moral seria inseparável da formação de uma determinada cultura Enquanto na moral do escravo temos valores como simpatia humildade e caridade na moral do senhor temos os valores de orgulho força nobreza Certamente alguns desses valores foram vistos por você ao longo deste CRC e isso não se deu por acaso Nietzsche busca resgatar o ideal de Areté anterior à proposta so crática manifestada sobretudo nos ideais da Areté homérica que já estudamos Vejamos agora mais uma consideração de Nietzsche a respeito de Sócrates Enquanto em todas as pessoas produtivas o instinto é justamente a força afirmativa criadora e a consciência se conduz de maneira crítica e dissuasora em Sócrates é o instinto que se converte em crítico a consciência em criador uma verdadeira monstruosidade per defectum E na verdade percebemos aí um monstruoso defectus de toda disposição mística de modo que se poderia considerar Sócrates como o específico não místico no qual por superfetação a natureza lógica se desenvolvesse tão excessiva quanto no místico a sabedoria instintiva NIETZSCHE 1992 p 86 Após essa consideração crítica oferecida por Nietzsche va mos agora lidar com outro pensador que abordou alguns dos pro blemas presentes no ideal de Paideia Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 168 6 AS CRÍTICAS DA PAIDEIA REALIZADAS POR JACQUES DERRIDA Após a análise de algumas das considerações apresentadas por Nietzsche iremos agora debater com você outras considera ções críticas produzidas em relação à Paideia pelo pensador fran cês Jacques Derrida 19302004 Inicialmente podemos lhe dizer que Derrida se insere na manifestação filosófica tida como mais recente em relação ao mo mento histórico em que vivemos Derrida é considerado como um dos manifestantes da Filosofia pósmoderna ou ainda como pós estruturalista E o que podemos dizer em relação às posições desse pen sador De modo geral Derrida realiza uma crítica aos valores que iniciam a proposta de Paideia e aos autores que a implementam pois para ele esses aspectos carregam consigo fortes elementos etnocêntricos que além disso são alicerçados em valores caracte risticamente masculinos Para começarmos a tratar de suas consi derações veremos agora as considerações produzidas por Borody 2012 sp Uma interessante volteface da excessiva idealização zelosa do he lenocentrismo é encontrada nos escritos de Jacques Derrida no úl timo período dos anos sessenta e início dos anos 70 escritos que anatematiza o falogocentrismo da tradição grega inicial Mais que idealizar a natureza espiritual e intelectual da Paidéia grega como Jaeger tentou nos anos trinta Derrida denunciou isto nos anos 60 e 70 como phallogocentrica Como se percebe alguns conceitos apresentados necessi tam de melhores esclarecimentos No entanto antes de nos dedi carmos a eles convém terminarmos este primeiro momento intro dutório apresentando as estratégias que Derrida utilizará para sua crítica à Paideia crítica que segundo Barody 2011 se alicerça ria em duas estratégias argumentativas Claretiano Centro Universitário 169 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade A primeira seria a epistemológica que afirma que a Paideia se assentaria naquilo que Derrida intitula de logocentrismo ou seja a ênfase estaria no uso e na afirmação do logos grego Quan to à segunda ela se refere à argumentação de que a proposta de Paideia seria generológica ou seja ela se assenta em um determi nado gênero para se sustentar Diante dessas considerações vamos agora lidar com o sig nificado desses conceitos e para tanto vejamos o conceito de lo gocentrismo Para Derrida 2006 p 98 O logocentrismo é uma metafísica etnocêntrica num sentido original e não relativista Está ligado à história do Ocidente Dito de outro modo podemos dizer que A história do Ocidente seria uma sucessão de centros inques tionáveis como Deus homem consciência transcendência eu verdade noções responsáveis pela idéia de centro unificador do mundo A esse pensamento essencialista e transcendental Derrida chama de logocentrismo Derrida colocase contra a concepção logocêntrica do pensamento metafísico Para ele o valor do cen tro é sempre afirmado pelo não valor de seu oposto Deusdiabo homemmulher natureza cultura falaescrita espíritocorpo in teligívelsensível etc TEIXEIRA 1998 p 35 Dos elementos apresentados é possível concluir que o logo centrismo acaba por gerar um processo de hierarquização ou seja existiria um elemento que é superior ao outro e isso é um tanto quanto perigoso sob o aspecto filosófico pois de antemão caberia ao outro se adaptar aos meus valores e ideais e nesse processo não existiria discussão ou mesmo debate de ideias Além disso há de se destacar também que nesse processo logocêntrico gera uma relação de poder pois o detentor do ele mento mais valoroso colocase acima daquele que não possui es ses valores não abrindo possibilidade para outras formas de aná lise da realidade do bem da verdade etc Por meio dessa análise podemos perceber por que Derrida associa o logocentrismo ao etnocentrismo é etnocêntrico todo comportamento que tende a analisar e medir os grupos culturais Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 170 existentes na sociedade a partir dos valores e elementos culturais tidos como importantes por determinado grupo cultural ou étnico Por fim cabe agora lidarmos com a segunda estratégia ar gumentativa citada por Barody a qual se refere ao aspecto gene rológico Para Derrida o discurso de poder existente na defesa do logos apoiase em uma relação hierárquica de gêneros ou seja na superioridade do homem sobre a mulher Para que você possa per ceber como se operaria essa relação vejamos como Derrida apud RODRIGUES 2011 p 5354 analisa esse processo Inicialmente uma casa um domicílio um endereço a residência dos magistrados superiores os arcontes aqueles que comanda vam Aos cidadãos que detinham e assim denotavam o poder polí tico reconheciase o direito de fazer ou representar a lei Levada em conta sua autoridade publicamente reconhecida era em seu lar nesse lugar que era a casa deles casa particular casa de família ou casa funcional que se depositavam os documentos oficiais Os ar contes foram os seus primeiros guardiões Não eram responsáveis apenas pela segurança física do depósito e do suporte Cabiam lhes também o direito e a competência hermenêuticos Tinham o poder de interpretar os arquivos Depositados sob a guarda desses arcontes esses documentos diziam de fato a lei eles evocavam a lei e convocavam à lei Para serem assim guardados na jurisdição desse dizer a lei eram necessários ao mesmo tempo um guardião e uma localização Como se percebe era atribuída a determinadas pessoas a função de detenção do conhecimento Essas pessoas guardavam o conhecimento e tinham também a posse e o poder advindos desse conhecimento Tais pessoas eram sempre homens os poderes que se articulam nas mãos dos arcontes guardar interpretar reunir são poderes de dar sentido de dizer a verdade poderes ligados à autoridade de quem diz autoridade da qual de pende uma garantia de correção do pensamento Esse ideal de ver dade que aparece na Grécia homens proprietários que detinham a guarda dos arquivos seria assentado numa estrutura falocên trica cuja origem é patriarcal RODRIGUES 2011 p 54 A partir desses elementos tornase possível lidarmos com um conceito que apresentamos logo no início da contextualização das ideias de Derrida Referimonos ao conceito de falogocentris Claretiano Centro Universitário 171 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade mo Para o pensador francês a Paideia grega assentase no poder do homem falocentrismo e no poder do logos racional logocen trismo e a partir da união desses dois elementos temos o neolo gismo falogocentrismo E quais são as consequências dessa postura falogocêntrica Apoiandonos ainda na análise das ideias de Derrida realizadas por Barody 2011 podemos dizer que essa conduta acabaria por levar a uma radical hegemonia de determinadas formas de pensa mento e além disso a um profundo desrespeito à possibilidade de exercício da alteridade Para concluirmos esses contrapontos críticos há de se dizer que houveram respostas para as considerações ora apresentadas entre elas algumas considerações de Werner Jaeger a respeito das conclusões de Nietzsche ou ainda o próprio texto de Barody Consideramos que para as pretensões deste material não é necessário que nos aprofundemos mais nesse debate mas que deixemos destacado que toda e qualquer ideia ou valor sofreu sofre ou sofrerá questionamentos pois a essência da Filosofia ma nifestase sobretudo no levantamento de questionamentos em detrimento da opção segura e perigosa do assentamento em um porto seguro de respostas 7 DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS PARA UMA NOVA PROPOSTA DE PAIDEIA Após a apresentação de alguns contrapontos críticos relati vos à Paideia buscaremos agora apresentar o tema que fechará as discussões e informações que temos visto até este momento Para situar esse último tema na estrutura que montamos quando da construção deste CRC convém fazermos um breve relato expli cativo do que já vimos Inicialmente mostramos a você o início do ideal de Paideia presente nos escritos de Homero e Hesíodo intentando sobretudo Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 172 fazer com que você percebesse as nuances presentes naquele mo mento histórico e a importância do surgimento do ideal de Paideia Em seguida ilustramos alguns desdobramentos da Paideia notada mente manifestada na forma sofista e socráticoplatônica Vimos também alguns desdobramentos dessa evolução presentes na pro posta da Paideia Christi e na Bildung moderna Por fim vimos algumas considerações críticas endereçadas a Paideia socráticoplatônica presentes nos textos de Nietzsche e a Paideia de modo geral manifestada nas análises de Jacques Derrida Agora buscaremos apresentar a você alguns problemas contemporâneos existentes em nossa sociedade e qual seria a importância dos ideais da Paideia para aventarmos uma possibilidade de enfrentamento dos problemas que iremos analisar Cabe dizer que ao pensarmos nessa estratégia pedagógica três elementos se apresentaram como importantes O primeiro referese à possibilidade de que você possa perceber a importância da Filosofia como elemento des velador de realidades ou seja o quanto a reflexão filo sófica pode alargar ou mesmo desvelar aquilo que está presente em nossas vidas e que muitas vezes somos in capazes de perceber O segundo caracterizase pela convicção de que os ideais presentes na Paideia grega possuem elementos ahistóri cos isto é a importância desses ideais não se reduz a um determinado momento vivido pelo povo grego na Grécia antiga e podem ser utilizados e ser inspiradores de mu danças de atitudes conceitos e valores que temos inclu sive no presente O terceiro elemento referese à tentativa de demonstrar o quanto a Filosofia e a Educação estão relacionadas e o efeito positivo que essas duas esferas fornecem uma à outra Esse último aspecto busca de certa forma convidá lo a nutrir o amor à sabedoria buscando fazer com que Claretiano Centro Universitário 173 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade você não se esqueça dos desafios e compromissos que terá como futuro educador Dito isso coloquemonos agora a analisar a sociedade atual e seus desafios A sociedade atual No decorrer do estudo deste CRC alguns termos conceituais foram citados como virtude excelência valores nobreza beleza etc Esses conceitos se referem a parâmetros ideais do ser humano e serviriam para inspirar a formação de homens e por extensão de sociedades Mas e no presente Existiriam ideais a serem cons truídos e que nos inspiram Haveria a presença de valores que nos convidam a construir um modo de ser Esse ato de construção se ria valoroso Para dar conta dessas questões realizaremos agora uma análise da sociedade atual e para fazêlo tínhamos de selecionar um dos muitos olhares filosóficos existentes sobre essa questão Em razão disso optamos pela chamada Escola de Frankfurt que deu origem à corrente denominada Teoria Crítica As razões des sa escolha são as mais variadas mas para exemplificar uma delas nós o convidamos a analisar conosco uma consideração apresen tada a respeito dessa corrente filosófica A escola de Frankfurt fornece rico material para a sociologia do conhecimento pois é um exemplo de como uma vez marginal escola de pensamento ganhou ampla influência e cruzou os limites entre as disciplinas movimentos sociais psicanálise Marxismo e tradições nacionais Originalmente um grupo de especialistas marxista fundado pelo filho de um rico milionário alemão a escola de Frankfurt ajudou a criar uma inovativa área filosoficamente orientada de modo radical para a ciência social conhecida como teoria crítica A Teoria Crítica teve uma enorme influência após a década de 60 na vida intelectual e hoje é mais comumente associada com Theodor Adorno Max Horkheimer Herbert Marcuse Walter Benjamim e Jürgen Habermas McLAUGHLIN 1999 p 109 Desses elementos apresentados há de se dizer que não te mos por intenção nos aprofundarmos demasiadamente em seus Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 174 autores e teorias embora consideremos válidos e necessários es ses estudos adjacentes ao longo de sua caminhada na graduação Queremos na verdade mostrar a você como uma teoria filosófica pode trazer informações importantes para a análise de nossa so ciedade e a partir dessas informações pensarmos juntos os desa fios e desdobramentos para a construção de um ideal de Paideia Em razão disso apresentamos a seguir algumas das considera ções apresentadas por essa corrente filosófica sobre nossa socie dade atual A indústria cultural A expressão indústria cultural é uma das mais caras para a Teoria Crítica Foi cunhada por Theodor Adorno e Max Horkheimer em uma obra chamada Dialética do Esclarecimento De modo geral podemos dizer que para esses pensadores com o advento do ca pitalismo acabou por surgir um modo de produção em massa Ora o capitalista busca vender mais e mais os seus produtos e também encontrar novas possibilidades e desejos de consumidores para que possa ampliar suas possibilidades de venda ou ainda fabricar artificialmente desejos e necessidades para que esses possam ser transformados em produtos e consequentemente possam ser vendidos Diante dessa necessidade o capitalista acaba por produzir e vender cultura mas essa não é aquela cultura na qual estamos habituados a pensar na verdade seria um arremedo de cultura pois toda a complexidade inerente a um objeto cultural é descar tada buscase fazer com que tenhamos um momento de entre tenimento e esse momento não pode e não deve ser exercitado de forma plena Os produtos vêm e vão um após o outro Aquela música lançada a cerca de seis meses e que fez tanto sucesso já foi esquecida pois é necessário que nos entretenhamos com outra e compremos um novo produto Desejos reais que caracterizam o ser humano tais como a criatividade que transforma a nós e a nossa realidade a liberda Claretiano Centro Universitário 175 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade de que nos anima a transcender nosso momento existencial ou ainda a felicidade genuína advinda de nossa plena realização hu mana são esquecidos Na verdade todos esses elementos que se encontrariam em nós são transplantados para os produtos e mercadorias Somos condicionados a achar que ao comprar esse ou aquele produto automaticamente tomamos posse daquelas necessidades humanas que nos animam Esse processo acaba por ser um processo ad infinitum ou seja compramos um produto buscando ter nele a satisfação de nossos desejos e à medida que não encontramos essa satisfação novos produtos apresentamse para nosso olhar e para nossos desejos com o intuito de realizar tal satisfação Nesse sentido vale lembrar um poema do poeta brasileiro Vicente de Carvalho 18661924 que ao seu modo captou como ninguém a existência desse fenômeno Felicidade Só a leve esperança em toda a vida Disfarça a pena de viver mais nada Nem é mais a existência resumida Que uma grande esperança malograda O eterno sonho da alma desterrada Sonho que a traz ansiosa e embevecida É uma hora feliz sempre adiada E que não chega nunca em toda a vida Essa felicidade que supomos Árvore milagrosa que sonhamos Toda arreada de dourados pomos Existe sim mas nós não a alcançamos Porque está sempre apenas onde a pomos E nunca a pomos onde nós estamos CARVALHO apud GONÇALVES 1995 p 352 Como se percebe no término do poema o sonho idílico da felicidade humana nunca se encontra no próprio homem sempre está fora dele e consequentemente nunca nos é dada a chance ou a oportunidade de alcançála Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 176 A partir desses elementos é possível analisar a presença da indústria cultural na vida das pessoas Pensemos em um aluno alguém que esteja se revoltando contra algumas injustiças da so ciedade O que faz ele Busca fortalecerse e agir nessa sociedade buscando novos caminhos Entender a situação em que vive e se posicionar efetivamente contra ela Não necessariamente Quem sabe ele poder vir a comprar roupas de determinada grife que se caracterizam por produzir artigos que simulem os trajes utilizados pelo movimento punk ou outro grupo que venha a simbolizar uma postura de questionamento ou ainda alguma camiseta que tenha estampada em cores fortes e chamativas a imagem de Che Gue vara e assim afirme o desejo de uma revolução que se apresenta somente na camiseta Como se percebe a indústria cultural busca tão somente produzir mercadorias que simulem ao seu possuidor a impressão de que ele é aquilo que comprou Ernesto Che Guevara 19281967 mais conhecido como Che foi um líder revolucionário marxista participou de vários levantes revolucionários Com sua morte criouse sobre ele uma espécie de imagem mítica do herói revolucionário e em razão disso seu nome e sua imagem tem sido usado constantemente como meio de representação da contestação e de rebeldia A razão instrumental A razão instrumental é outro conceito extremamente caro a essa corrente de pensamento Ele traz consigo uma série de pe culiaridades Em razão de suas sutilezas tomaremos a liberdade de lhe apresentar uma citação um pouco longa de Curtis Bowman 1997 sp sobre o tema Dadas a clareza e a objetividade de Bowman nesse excerto consideramos importante que você tenha acesso a ele na íntegra A forma dominante de razão em um mundo alienado de acordo com Horkheimer e Adorno é o que eles rotineiramente chamam razão instrumental Esta é a capacidade para selecionar os meios apropriados para nossos fins o que quer que eles sejam Isto é nós usamos a razão como um instrumento para nos guiar na obtenção Claretiano Centro Universitário 177 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade de nossos fins Para este tipo de razão Horkheimer e Adorno con trastam outra uma do qual argumentam ser cada vez mais rara Esta passa por vários nomes mais freqüentemente chamada de razão objetiva Este tipo de razão não é instrumental não se refere aos meios para nossos fins mas se preocupa com os próprios fins Esta pergunta se nossos fins são racionais se eles expressam nos sos mais profundos desejos e necessidades se eles expressam nos so anseio pela liberdade Horkheimer e Adorno afirmam que razão objetiva foi prejudicada pelo Iluminismo embora deva ser de fato utilizada para promover a causa da iluminação A razão instrumen tal se conforma simplesmente aos fins que nós adquirimos dizen donos como possuílos da forma mais efetiva A razão objetiva nos diz quais deveriam ser os nossos fins e então esta diznos como o mundo poderia ser porque nós estamos a transformar o mun do de acordo com nossos fins racionais e portanto de como ele é em como deve ser Ao invés de empregar a razão objectiva para descobrir o que nossos objetivos devem ser Horkheimer e Adorno afirmam que os nossos fins são geralmente impostos a nós de fora Isto é o que Kant chamou heteronomia Nós concordamos com o que os outros nos dizem para pensar e agir desistindo de nossa independência e falhando para adquirir a autonomia Texto interessante não São muitas as informações contidas nele e em razão disso vamos debater alguns dos conceitos que ali aparecem O primeiro referese à autonomia e à heteronomia É autônomo aquele que é causa de si mesmo ou seja dirige suas ações a partir de sua própria opção racional e por outro lado é heterônomo aquele que remete a outro a decisão dos caminhos de sua própria vida E o que podemos dizer sobre a crítica ao Iluminismo O Iluminismo surgiu como um movimento que tinha como alicerce básico a defesa do uso da razão como instrumento para iluminar nossos caminhos ou seja para fazer com que saíssemos do obs curantismo ou dos fanatismos nos quais os seres humanos muitas vezes adentram No entanto esse sonho iluminista na verdade fracassou Contudo a credulidade a aversão à dúvida a temeridade no res ponder o vangloriarse com o saber a timidez no contradizer o agir por interesse a preguiça nas investigações pessoais o fetichismo verbal o deterse em conhecimentos parciais isto e coisas seme lhantes impediram um casamento feliz do entendimento humano Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 178 com a natureza das coisas e o acasalaram em vez disso a conceitos vãos e experimentos erráticos o fruto e a posteridade de tão glo riosa união podese facilmente imaginar ADORNO HORKHEIMER 1985 p 19 Dito de outro modo o sonho iluminista da razão como ele mento emancipador do homem acabou por se transformar em um elemento opressor ou seja as chaves para a saída da prisão de nossos grilhões acabaram por se tornar os próprios grilhões E como se insere o conceito de razão instrumental nessa análise proposta pelos frankfurtianos De certo modo podemos dizer que na razão instrumental usa mos nossa razão de forma autônoma para pensarmos os meios para atingirmos determinados fins e por outro lado agimos de forma heterônoma na medida em que não temos autonomia para analisar os fins dessas mesmas ações Segundo Adorno e Horkheimer essa razão instrumental está preenchendo mais e mais as nossas vidas e em razão disso cada vez menos fazemos uso de nossa razão obje tiva Para ilustrar a presença da razão instrumental em nossas vidas meditemos sobre o nosso dia a dia Estamos inseridos em uma sociedade e ela estabelece padrões condutas e valores que nos guiam Estão previamente definidos os modelos de homem ou de mulher de sucesso de boa ou de má sociedade e nos pauta mos nesses padrões para tomarmos nossas decisões Para darmos conta da aproximação a esses padrões tomamos uma série de ati tudes e fazemos diversos questionamentos Apresentemos alguns desses questionamentos apenas como exemplo Quais empregos deveremos ter Como atingir sucesso nesse emprego Devemos ou não fazer uma faculdade Quais seriam as nossas condutas na faculdade para que atinjamos as metas que a sociedade nos apre senta Sempre que usamos nossa razão para resolver os desafios que devem ser vencidos para que possamos atingir os fins esta mos fazendo uso da razão instrumental Claretiano Centro Universitário 179 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade Outro exemplo corriqueiro presente em nossas vidas pode ser dado quando nos dedicamos a possuir determinado bem ma terial Nas sociedades capitalistas ocidentais tem valor aquele que possui capacidade e exerce essa mesma capacidade para adquirir bens Imaginemos que queremos comprar um automóvel A par tir dessa finalidade dedicamosnos a realizar estratégias para esse fim passamos a economizar nosso dinheiro acompanhar pela mídia ou internet vários modelos selecionamos o modelo e es tabelecemos ações para finalmente adquirir o automóvel Nesse exercício nossa razão está a pleno vapor e nos dá possibilidades de caminhos para atingir nosso intento ela é um instrumento para isso Por outro lado se em determinado momento começásse mos a pensar se o ideal de uma vida é a posse e a capacidade de apropriação de bens ou em quais as consequências desse exercí cio de consumo sem fim para nós em nossa condição de seres hu manos e para a humanidade ou o planeta ou ainda que homem e sociedade eu desejo ser ou ter começaríamos paulatinamente a deixar de usar a razão como mero instrumento e ela passaria a dar um sentido teleológico ou seja um sentido de finalidade para nossas ações desejos e ideais Certamente parecerá a você que é redundante o que vamos dizer Mas convém que ressaltemos esse aspecto os alunos que estão inseridos nesta sociedade dada a peculiaridade em que se encontram sujeitados em sua quase totalidade nunca pensaram na possibilidade de um exercício autônomo de criação de um telos O fim já está previamente definido e cabe a esses mesmos alunos es colherem essa ou aquela forma de vida previamente definida mas que nunca passou por sua análise pessoal Nesse sentido convém apresentarmos a você uma consideração de outro frankfurtiano chamado Herbert Marcuse Sob o jugo de um todo repressivo a liberdade pode ser transforma da em poderoso instrumento de dominação O alcance da escolha aberta ao indivíduo não é o fator decisivo para a determinação do grau de liberdade humana mas o que pode ser escolhido e o que é Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 180 escolhido pelo indivíduo O critério para a livre escolha jamais pode ser absoluto mas tampouco é inteiramente relativo A eleição livre dos senhores não abole os senhores ou os escravos A livre esco lha entre ampla variedade de mercadorias e serviços não significa liberdade se esses serviços e mercadorias sustêm os controles so ciais sobre uma vida de labuta e temor isto é se sustem alienação MARCUSE 1973 p 28 grifos nossos Pensemos na possibilidade de que a sociedade atual es tabelece previamente o que pode ser escolhido pelo indivíduo Ampliaramse sobremaneira as possibilidades de escolha mas a finalidade dessa escolha não se apresenta para nós Dito de outro modo você pode escolher se comprará um veículo dessa ou da quela marca se optará por comprálo ou não mas não escolherá se é possível outra sociedade que não se baseie na construção de necessidades e de consumo dessas necessidades As consequências dessa condição são inquietantes e para sensibilizálo a esse respeito nós o convidamos a exercitar sua ra zão objetiva e pensar o que se segue Qual é sociedade e qual é o mundo que queremos Qual é a sociedade qual é o mundo que temos Por meio desse exercício você perceberá os árduos desa fios que temos para não mais precisar eleger somente senhores A partir dessas considerações vamos investigar as questões aqui apresentadas analisando nossa vida e nossa situação no mundo a partir desses elementos Esperamos que você perceba o quanto uma ideia ou uma corrente filosófica pode vir a desvendar e desvelar nossa realidade ou mesmo mudála Além disso deseja mos que perceba que por meio dessa proposta de desvelamento você pode notar os desafios que temos diante de nós para a cons trução de um ideal de Paideia e mesmo a importância da recons trução deste ideal o que discutiremos a seguir 8 A IMPORTÂNCIA DE UMA NOVA PAIDEIA NA CON TEMPORANEIDADE Como você pode perceber a partir da análise precedente são muitos os desafios que temos a enfrentar em nossa socieda Claretiano Centro Universitário 181 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade de Certamente há de se pensar a partir da existência de um ide al de Paideia no passado reflitamos o que temos no presente Será que nossa sociedade professores e alunos tem um ideal de Excelência que os anime a construir esse ideal Para problematizar essa questão vejamos a consideração a seguir apresentada por Leomar A Paidéia do presente ainda que amorfa se está definindo como virtualização como dissolução das referências clássicas em uma espécie da babelização discursiva O homem telemático que se está configurando pelas redes de informação estaria substituin do o homem moderno Pensamos que este individualista é o homem global de hoje e que ele é somente uma face da moeda Também esta o outro o marginalizado o excluído da técnica do consumo da arte e da ciência Nos perguntamos como a Paidéia poderia recuperálo Por acaso não é este marginalizado da cultura e da técnica o que somente recebe os lixos da cultura e não uma verdadeira formação O homem da virtude o virtuoso grego hoje esta deslocado pelo homem consumidor que depende totalmente da tecnologia sem a qual não pode criar produzir pensar fabricar e que tem alienado sua vida de objetos técnicos Paradoxalmente é com a técnica e o saber que o homem pode subtrairse de qualquer lógica de submissão LEOMAR 2009 p 115 Dos elementos apresentados por Leomar há de se pensar então como sair dessa lógica de submissão ou ainda qual seria um ideal de Paideia para resgatar nossa possibilidade de liberta ção e de construção autônoma do ser humano Para lidarmos com essa questão pensamos em apresentar duas reflexões a respeito do tema A primeira baseiase nas considerações de Adorno e a segunda manifestase em um movimento que surgiu nos Estados Unidos e que busca também resgatar um ideal de Paideia Especificamente em Adorno temos uma proposta de que a educação venha a produzir no homem a possibilidade de eman cipação Isso porque para esse autor somente o homem eman cipado poderia resistir a uma sociedade de massas que manipule mentes e produz absurdos tais como por exemplo aqueles perpe trados na Segunda Guerra Mundial e que acabaram por produzir Auschwitz Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 182 Para esse pensador o caminho da Paideia contemporânea passaria por uma educação que promova no indivíduo a autono mia pois O único poder efetivo contra o princípio de Auschwitz seria autonomia para usar a expressão kantiana o poder para a reflexão a autodeterminação a não participação ADORNO 2011 sp A segunda reflexão assentase nas ideias do filósofo e edu cador americano Mortimer Jerome Adler criador da Proposta Paideia que se caracteriza por apresentar um conjunto de ideias de cunho liberal de educação voltada para todas as crianças Para Adler o sistema de Educação norteamericano seria antidemocrá tico e a ênfase naquilo que intitulou de treinamento vocacional norteamericano acabaria por objetivar o treinamento de escravos e não a formação de homens livres As ideias desse autor produziram uma grande reflexão nos Estados Unidos a respeito dos caminhos da educação no país e levou à criação do Centro Nacional Paideia que busca divulgar e implementar as ideias de Adler Quais seriam essas ideias Vejamos a quem Adler dedica o seu projeto para iniciarmos uma análise de suas ideias A Proposta Paidéia é endereçada para aqueles americanos mais preocupados com o futuro de nossas escolas Para as famílias que acreditam que o declínio na qualidade da educação pública é peri gosa para o futuro de nossas crianças Para professores preocupa dos que o aumento do tempo em manter a básica ordem na sala de aula minam o verdadeiro negócio da escola ensinar e aprender Para os conselheiros escolares preocupados pela mudança de cri anças da classe média e jovens para escolas particulares e paroqui ais Estas profundas e legítimas preocupações são abordados pelo nosso propósito para a reforma do ensino público na América A reforma que procuramos é delineada para aumentar as opor tunidades de nossos jovens as perspectivas de nossa economia e a viabilidade de nossas instituições democráticas Isto pode ser alcançado no nível da comunidade sem recorrer a um sistema edu cacional monolítico Este deve ser nas palavras de Lincoln do povo pelo povo e para o povo ADLER 1982 p 12 Claretiano Centro Universitário 183 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade Notase nesse excerto a ênfase que Adler coloca na recon quista da característica essencial da escola ou seja no ensinar e no aprender Pensemos como esse e outros objetivos se realiza riam Essa instituição formulou uma declaração de princípios que dada a sua pertinência para nossas questões lhe será apresenta da a seguir conforme princípios elencados por Billings e Roberts 1997 p 45 1 Todas as crianças são capazes de aprender 2 Portanto todos eles merecem a mesma qualidade de ensino não apenas a mesma quantidade 3 A qualidade do ensino a que têm direito é o que o mais sábio dos pais desejaria para os seus próprios filhos seria a melhor educação para o melhor seria a melhor educação para todos 4 Que a escolaridade naquilo que há de melhor é uma prepara ção para tornarse educado no curso geral de toda uma vida e que devem ser julgados escolas em quão bem elas fornecem tal preparação 5 Que os três chamados para que a escolaridade deve preparar todos os americanos são a para ganhar uma vida decente b para ser um bom cidadão da nação e do mundo e c para fazer uma boa vida para si mesmo 6 Que a causa primária de aprendizagem genuína é a atividade da própria mente do aluno às vezes com a ajuda de um professor funcionando como uma causa secundária e cooperativa 7 Que os três tipos de ensino que devem ocorrer em nossas esco las são o ensino de forma didática do assunto treinamento que produz as habilidades de aprendizagem e o questionamento socrático em seminários de discussão 8 Que os resultados destes três tipos de ensino deve ser a a aquisição de conhecimento organizado b a formação de há bitos de habilidade no uso da linguagem e matemática e c o crescimento da compreensão da mente de idéias básicas e questões 9 Que o resultado de cada aquisição do estudante possa ser avali ado em termos se estas competências do estudante isolada mente estão sendo adquiridas e não somente relacionadas às aquisições dos outros estudantes 10 Que o diretor da escola não deve ser um mero administrador Mas sempre um professor líder que deveria estar cooperativa mente engajado com o grupo de professores da escola plane Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 184 jando reformando e reorganizando a escola como uma comu nidade educacional 11 Que o diretor e os professores da escola deveriam eles mesmos estar ativamente engajados na aprendizagem 12 Que o desejo de continuar sua própria aprendizagem deveria ser a primeira motivação daqueles que dedicam suas vidas na profissão do ensino Como se vê são muitas as questões presentes nesses princí pios e que merecem uma análise adequada A princípio pode pa recer que esse ou aquele princípio carrega consigo um viés conser vador ou ainda inadequado No entanto não se pode negar que nele está presente a seleção de algumas excelências e a ênfase na afirmação e na realização do ser humano na concretização e na dedicação na aquisição dessas excelências A receptividade desse projeto gerou acolhimento positi vo em algumas obras e considerações críticas em outras Como exemplo de acolhimento parcialmente positivo citamos um artigo publicado por David Gabbard e Karen A Appleton que amparados por uma base filosófica marxista concluem que Atualmente em nossa visão para os americanos crescerem eles devem confrontar a dolorosa verdade que sua nação não é e nun ca foi uma sociedade democrática A emancipação começa a par tir desta realização e nenhuma outra E é desta realização que um Projeto Democrático Paidéia deve começar é repensar Adler sem rejeitarlo totalmente GABARD APPLETON 2005 sp Por outro lado temos em outro artigo publicado uma série de críticas a esse projeto Inicialmente o autor realiza uma análise das bases filosóficas do projeto e apresenta questionamentos em relação a como eles são interpretados e no fim do artigo advoga que A atitude do qual eu me queixo permeia o Paidéia Estudantes são trados como mentes a serem preenchidas igualmente com a mesma qualidade material Em nenhuma parte há uma considera ção apropriada das pessoas que eles são na sua essencial liberdade e infinita diversidade central e instrumental em sua própria educa ção NODDINGS 2004 p 170 Claretiano Centro Universitário 185 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade Como se vê as considerações de Noddings dão novos ele mentos para pensarmos o projeto proposto por Adler e seus se guidores e certamente deverão ser levadas em consideração na criação de qualquer projeto com proposta semelhante Por fim para finalizar essa reflexão convidamos você a fazer um passeio retrospectivo a respeito de tudo o que vimos até este momento Caminhe por termos como Areté kalós Agathós e ou tros tantos que discutimos juntos Pense na possibilidade do res gate dos mesmos na contemporaneidade realize simulações de uso desses termos na construção do humano Enfim perceba que a partir da construção de ideais alicerçados na filosofia grega se construiu uma forma original de se pensar o homem a sociedade e a cultura por meio de uma proposta educativa Após o exercício dessa reflexão é nossa esperança que você se muna de energias redobradas delineie o melhor de si e cons trua a sua Areté a ser edificada ao longo de uma vida toda dedica da à construção da Paideia 9 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS Confira a seguir as questões propostas para verificar o seu desempenho no estudo desta unidade 1 Segundo Friedrich Nietzsche a decadência ocidental começa em especial com os ideais de Paideia apresentados a no cristianismo b por Descartes e seu racionalismo c por Sócrates e Platão d pelos sofistas e sua argumentação retórica e nenhuma das anteriores 2 Analise as considerações a seguir referentes às ideias de Jacques Derrida e aponte a alternativa incorreta a Para Jacques Derrida a história ocidental é uma história alicerçada no predomínio dos valores patriarcais masculinos e a consequente subjuga ção dos valores femininos b Derrida apresenta uma crítica aos ideais da Paideia grega pois segundo ele nela estão presentes fortes características etnocêntricas Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 186 c Derrida propõe que a história do Ocidente se alicerça na valorização do logos e dos valores masculinos e essa valorização acaba por criar uma estrutura de dominação a toda e qualquer possibilidade que se diferen cie destas d Para o pensador francês é necessário que a Paideia incorpore novos ele mentos aos já existentes e amplie a sua possibilidade de alcance e Nenhuma das alternativas anteriores 3 UEL2004 O aumento da produtividade econômica que por um lado pro duz as condições mais justas para um mundo mais justo confere por outro lado ao aparelho técnico e aos grupos sociais que o controlam uma superio ridade imensa sobre o resto da população O indivíduo se vê completamente anulado em face dos poderes econômicos Ao mesmo tempo estes elevam o poder da sociedade sobre a natureza a um nível jamais imaginado De saparecendo diante do aparelho a que serve o indivíduo se vê ao mesmo tempo melhor do que nunca provido por ele Numa situação injusta a im potência e a dirigibilidade da massa aumentam com a quantidade de bens a ela destinados ADORNO HORKHEIMER 1997 p 14 De acordo com o texto de Adorno e Horkheimer é correto afirmar a A alta capacidade produtiva da sociedade garante liberdade e justiça para seus membros independentemente da forma como ela se estrutu ra controlando ou não seus membros b O desaparecimento do indivíduo diante do aparato econômico da so ciedade se deve à incapacidade dos próprios cidadãos em se integrarem adequadamente ao mercado de trabalho c A ciência e a técnica independente de quem tem seu controle são as responsáveis pela circunstância de muitos estarem impossibilitados de atingir o status de sujeito numa sociedade altamente produtiva d O fato de a sociedade produzir muitos bens valendose da ciência e da técnica poderia representar um grau maior de justiça para todos no entanto ela anula o indivíduo em função do modo como está organizada e como é exercido o poder e O alto grau de autonomia das massas na sociedade capitalista contem porânea é resultado do avançado domínio tecnológico alcançado pelo homem Claretiano Centro Universitário 187 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade 4 UFU2005 Analise a figura a seguir Figura 1 Chaplin em cena do filme Tempos modernos de 1936 Parece que enquanto o conhecimento técnico expande o horizonte da atividade e do pensamento humanos a autonomia do homem enquanto indivíduo a sua capacidade de opor resistência ao cres cente mecanismo de manipulação das massas o seu poder de imaginação e o seu juízo independente sofreram aparentemente uma redução O avanço dos recursos técnicos de informação se acompanha de um processo de desumanização Assim o progresso ameaça anular o que se supõe ser o seu próprio objetivo a idéia de homem HORKHEIMER 1976 p 6 Com base no texto na imagem e em seus conhecimentos sobre racionalidade instrumental é correto afirmar a A imagem de Chaplin está de acordo com a crítica de Horkheimer ao invés de o progresso e da técnica servirem ao homem este se torna cada vez mais escravo dos mecanismos criados para tornar a sua vida melhor e mais livre b A imagem e o texto remetem à ideia de que o desenvolvimento tecno lógico e o extraordinário progresso permitiram ao homem atingir a au tonomia plena c Imagem e texto apresentam o conceito de racionalidade que está na es trutura da sociedade industrial com o viabilizador da emancipação do homem em relação a todas as formas de opressão Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 188 d Enquanto a imagem de Chaplin apresenta a autonomia dos trabalhado res nas sociedades contemporâneas o texto de Horkheimer mostra que quanto maior o desenvolvimento tecnológico maior o grau de humani zação e Tanto a imagem quanto o texto enaltecem a inevitável instrumentaliza ção das relações humanas nas sociedades contemporâneas 5 Dos princípios presentes no projeto Paideia de Mortimer Adler analise as afirmações a seguir e escolha a alternativa que apresenta as respostas cor retas em relação às ideias desse pensador I A maioria das crianças é capaz de aprender II Todas as crianças merecem a mesma qualidade de ensino não apenas a mesma quantidade III A qualidade do ensino a que as crianças têm direito é o que o mais sábio dos pais desejaria para os seus próprios filhos A melhor Educação para o melhor seria a melhor Educação para todos IV A escolaridade naquilo que há de melhor é uma preparação para tor narse educado no curso geral de toda uma vida e as escolas devem ser julgadas em relação a quão bem elas fornecem tal preparação V O diretor e mais especialmente os professores da escola deveriam eles mesmos estar ativamente engajados na aprendizagem Estão corretas a Apenas II III e IV b Apenas I II e III c Apenas III IV e V d Apenas I II III e IV e Apenas I III IV e V Gabarito 1 c 2 d 3 d 4 a 5 a 10 CONSIDERAÇÕES FINAIS Encerramos nossa viagem ao longo da análise do surgimen to da evolução da modificação e dos desafios existentes em torno do conceito de Paideia Claretiano Centro Universitário 189 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade Procuramos ao longo deste CRC apresentar a você o quan to esse conceito carrega de originalidade e importância para todo aquele que percebe a importância das relações existentes entre Filosofia e Educação Esperamos que as estratégias e objetivos delineados por nós o tenham sensibilizado e inspirado a aprofundar seus estudos em relação a esta temática Sabemos que muitos questionamentos advirão das conside rações aqui propostas e esperamos que tais questionamentos pos sam servir de inspiração e elemento motivador para seus estudos posteriores Para finalizar este CRC convém fazermos uso de um velho adágio que diz que a palavra conduz pessoas e os exemplos arras tam multidões Por meio desse adágio esperamos que você possa transformar os ideais da Paideia não somente em mais um con ceito que você adquiriu e que está lançado em suas memórias Esperamos que além disso ele possa inspirar você a desenvolver dentro de si esses ideais fazendo com que mais que uma palavra esse conceito possa vir a ser uma atitude sua perante o mundo e os desafios que esta vida lhe apresenta inclusive em sua posição de educador 11 EREFERÊNCIAS Figura Figura 1 Chaplin em cena do filme Tempos modernos de 1936 Disponível em http wwwhistorianetcombrconteudodefaultaspxcodigo181 Acesso em 19 abr 2012 Sites pesquisados ADLER M The Paideia proposal an educational manifesto Disponível em http booksgooglecombrbookshlptBRlridQ0ZM4lWK1ECoifndpgPR1 1dqthepaideiaproposalotsWxWXNkjJ2sigud71mOAM6cBrvZBr9Jz ch7Dwvonepageqthe20paideia20proposalffalse Acesso em 19 abr 2012 Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 190 ADORNO T Educação após Auschwitz Disponível em httpwwwdigaobiobrbau AdornoEducacaoaposAuschwitzpdf Acesso em 19 abr 2012 BORODY W A Classical Greek Philosophical Paideia in Light of the Postmodern Occidentalism of Jacques Derrida Twentieth World Congress of Philosophy Philosophy and Gender 2000 Disponível em httpwwwbueduwcpPapersGendGendBoro htm Acesso em 14 jun 2012 BOWMAN C Odysseus and the Siren Call of Reason Frankfurt School Critique of Enlightenment Other Voices v 1 n 1 mar 1997 Disponível em httpwww othervoicesorg11cubowmansirenphp Acesso em 19 abr 2012 Odysseus and the siren call of reason In GABBARD D APPLETON K A The Democratic Paideia Project beginnings of an emancipatory Paideia for today The International Journal of Inclusive Democracy v 2 n 1 sept 2005 Disponível em httpwwwinclusivedemocracyorgjournalvol2vol2no1gabbardappletonhtm Acesso em 19 abr 2012 NODDINGS N The false promise of the Paideia a critical review of the Paideia proposal In FLINDERS D THORNTON S J Edit The curriculum studies reader New York Routledge Falmer 2004 Disponível em httpsdocsgooglecomvieweravqcach e883n3SvjQ0IJcohort5orgcoursesadvcurrpdfsNoddings1docThefalsepromise ofthePaidC3A9iaacriticalreviewofthepaidC3A9iaproposalhlptBR glbrpidblsrcidADGEESihDbJKtBPIsNKJsDxnYBlwwJu0w0yehTRDLypAjAGR3itYs J5Met96SlceUKRYWNlNbCjtYVg8KQRJ9dVF9WxdtU3Ai5EQmcRjDc2T3N2zbBqlx0Sw 00KFVp0ZvCeUsigAHIEtbTGPul773LlyhzJNcHIh0QKlSuZtg Acesso em 19 abr 2012 12 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ADORNO T W HORKHEIMER M Dialética do esclarecimento Tradução de Guido Antonio de Almeida Rio de Janeiro Jorge Zahar Editor 1997 A Dialética do Esclarecimento Rio de Janeiro Jorge Zahar 1985 ALMEIDA R M Nietzsche e o Paradoxo São Paulo Loyola 2005 BILLINGS L ROBERTS T The Paideia classroom 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Texto de pré-visualização
PAIDEIA TÓPICOS DE FILOSOFIA E EDUCAÇÃO CURSOS DE GRADUAÇÃO EAD Paideia Tópicos de Filosofia e Educação Prof Ms Artieres Estevão Romeiro Prof Ms Edson Renato Nardi Prof Ms Marcos José Alves Lisboa e Prof Ms Ricardo Bazilio Dalla Vecchia Meu nome é Marcos José Alves Lisboa nasci em Tietê interior de São Paulo cidade que deixei para cursar filosofia Graduação e Pósgraduação na PUC Campinas Em Campinas fui professor de Filosofia na rede particular de ensino No ensino superior lecionei na Universidade Metodista de São Paulo São Bernardo do Campo para as disciplinas Filosofia e Ética e Cidadania para os cursos de Graduação No Centro Universitário Claretiano atuei como docente de filosofia para os cursos de licenciatura em Filosofia Pedagogia e Matemática e coordenador do curso de Licenciatura em Filosofia EaD além de participar como pesquisador do CNPq área de estudo Ética Fenomenológica e Hermenêutica e autor de materiais didáticos para cursos EaD Lógica I Filosofia História da Ciência e do Conhecimento Didática de Filosofia e Introdução à Filosofia Meu nome é Artieres Estevão Romeiro Sou graduado em Filosofia especialista em Metodologia do Ensino Superior especialista em Gestão e Liderança Universitária mestrando em Filosofia da Educação pela Unicamp e membro do grupo de pesquisa Paideia Atualmente sou Coordenador Geral de EaD do Centro Universitário Claretiano Tenho experiência na área de Filosofia e Educação com ênfase em Avaliação de EaD Fundamentos da Educação Ética Estética e Filosofia Alemã Adorno e Schopenhauer Email eadclaretianoedubr Olá amigos Meu nome é Ricardo Bazilio Dalla Vecchia Possuo Graduação em Filosofia e em Letras especialização em Educação e Letras e Mestrado em Filosofia Atualmente desenvolvo minha pesquisa de doutorado em Filosofia no IFCHUnicamp e sou membro do Grupo de Pesquisa CriM do CNPq Possuo experiência em Ensino e Gestão de cursos de Graduação e Pósgraduação em Filosofia assim como em Educação a Distância Email ricfilosofohotmailcom Saudações aos navegantes Meu nome é Edson Renato Nardi sou Filósofo e Educador Físico com mestrado 2010 em Educação pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho Araraquara e atualmente doutorando pela mesma instituição Atualmente atuo na coordenação da graduação em Filosofia no Centro Universitário Claretiano Atuo também na rede pública de ensino do estado de São Paulo como professor efetivo nas disciplinas de Educação Física e Filosofia Possuo uma experiência de aproximadamente 20 anos em escolas públicas na área de Ensino Fundamental e Médio No presente momento tenho focado meus estudos na área de Estética e Escola de Frankfurt Email coordenacaofilosofiaclaretianoedubr Fazemos parte do Claretiano Rede de Educação PAIDEIA TÓPICOS DE FILOSOFIA E EDUCAÇÃO Caderno de Referência de Conteúdo Marcos José Alves Lisboa Artieres Estevão Romeiro Ricardo Bazilio Dalla Vecchia Edson Renato Nardi Batatais Claretiano 2013 Fazemos parte do Claretiano Rede de Educação Ação Educacional Claretiana 2011 Batatais SP Versão dez2013 100 P164 Paideia tópicos de filosofia e educação Artieres Estevão Romeiro et al Batatais SP Claretiano 2013 192 p ISBN 9788567425757 1 Conhecer o ambiente histórico dos pressupostos teóricos da educação na Grécia Antiga visando compreender as características culturais econômicas e sociais e para isso partiremos da Grécia préhomérica século 20 aC até o período clássico século 4º aC 2 Analisar a influência dos sofistas na Grécia antiga e identificar as principais questões ligadas à educação as principais escolas e pensadores bem como os principais conceitos da filosofia antiga no que tange à educação salientando a decisiva função que tiveram na época 3 Desenvolver um olhar crítico diante da realidade educacional atual principalmente compreendendoa como fruto de um processo histórico intrinsecamente vinculado ao pensamento filosófico contemporâneo I Romeiro Artieres Estevão II Nardi Edson Renato III Lisboa Marcos José Alves IV Dalla Vecchia Ricardo Bazilio V Paideia tópicos de filosofia e educação CDD 100 Corpo Técnico Editorial do Material Didático Mediacional Coordenador de Material Didático Mediacional J Alves Preparação Aline de Fátima Guedes Camila Maria Nardi Matos Carolina de Andrade Baviera Cátia Aparecida Ribeiro Dandara Louise Vieira Matavelli Elaine Aparecida de Lima Moraes Josiane Marchiori Martins Lidiane Maria Magalini Luciana A Mani Adami Luciana dos Santos Sançana de Melo Luis Henrique de Souza Patrícia Alves Veronez Montera Rita Cristina Bartolomeu Rosemeire Cristina Astolphi Buzzelli Simone Rodrigues de Oliveira Bibliotecária Ana Carolina Guimarães CRB7 6411 Revisão Cecília Beatriz Alves Teixeira Felipe Aleixo Filipi Andrade de Deus Silveira Paulo Roberto F M Sposati Ortiz Rodrigo Ferreira Daverni Sônia Galindo Melo Talita Cristina Bartolomeu Vanessa Vergani Machado Projeto gráfico diagramação e capa Eduardo de Oliveira Azevedo Joice Cristina Micai Lúcia Maria de Sousa Ferrão Luis Antônio Guimarães Toloi Raphael Fantacini de Oliveira Tamires Botta Murakami de Souza Wagner Segato dos Santos Todos os direitos reservados É proibida a reprodução a transmissão total ou parcial por qualquer forma eou qualquer meio eletrônico ou mecânico incluindo fotocópia gravação e distribuição na web ou o arquivamento em qualquer sistema de banco de dados sem a permissão por escrito do autor e da Ação Educacional Claretiana Claretiano Centro Universitário Rua Dom Bosco 466 Bairro Castelo Batatais SP CEP 14300000 ceadclaretianoedubr Fone 16 36601777 Fax 16 36601780 0800 941 0006 wwwclaretianobtcombr SUMÁRIO CADERNO DE REFERÊNCIA DE CONTEÚDO 1 INTRODUÇÃO 9 2 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO 11 3 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 30 UNIDADE 1 DO ΜῦΘΟΣ AO ΛΟΓΟΣ UMA ANÁLISE DO NASCIMENTO DA FILOSOFIA OCIDENTAL 1 OBJETIVOS 31 2 CONTEÚDOS 32 3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE 32 4 INTRODUÇÃO À UNIDADE 33 5 LEVANTAMENTO HISTÓRICO 35 6 IMPORTÂNCIA DE HOMERO E HESÍODO PARA O NASCIMENTO DA FILOSOFIA 42 7 RELIGIÃO 49 8 MITO 53 9 DO MITO AO LOGOS 60 10 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS 62 11 CONSIDERAÇÕES GERAIS 64 12 EREFERÊNCIAS 65 13 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 66 UNIDADE 2 ANTIGUIDADE CLÁSSICA GREGA E A EDUCAÇÃO 1 OBJETIVOS 69 2 CONTEÚDOS 69 3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE 70 4 INTRODUÇÃO À UNIDADE 71 5 OS GREGOS E A EDUCAÇÃO 72 6 NOBREZA E ARETÉ 77 7 A ARETÉ HOMÉRICA 81 8 A ARETÉ EM HESÍODO 84 9 A PAIDEIA GREGA 86 10 A PAIDEIA EM HESÍODO 92 11 A PAIDEIA NO PERÍODO HOMÉRICO KALOS E AGATHÓS 93 12 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS 96 13 CONSIDERAÇÕES GERAIS 99 14 EREFERÊNCIA 99 15 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 99 Claretiano Centro Universitário UNIDADE 3 FILOSOFIA PRÁTICA OU SOBRE OS SOFISTAS 1 OBJETIVOS 101 2 CONTEÚDOS 102 3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE 102 4 INTRODUÇÃO À UNIDADE 103 5 O SURGIMENTO DOS SOFISTAS 107 6 ANTECEDENTES DO SOFISMO 108 7 A FILOSOFIA SOFISTA 108 8 SOFISTAS OS PRIMEIROS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO 110 9 A REVOLUÇÃO SOFÍSTICA 112 10 A EDUCAÇÃO SOFÍSTICA 116 11 ATUALIDADE E PERTINÊNCIA DOS SOFISTAS PARA A FILOSOFIA E A EDUCAÇÃO 117 12 TEXTO COMPLEMENTAR 119 13 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS 120 14 CONSIDERAÇÕES 121 15 EREFERÊNCIAS 122 16 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 122 UNIDADE 4 EVOLUÇÃO E DESDOBRAMENTOS DO CONCEITO DE PAIDEIA 1 OBJETIVOS 125 2 CONTEÚDOS 126 3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE 126 4 INTRODUÇÃO À UNIDADE 127 5 SÓCRATES 129 6 RECONSTRUÇÃO DO PENSAMENTO SOCRÁTICO 130 7 SÓCRATES O EDUCADOR POR EXCELÊNCIA 134 8 A IMPORTÂNCIA DO CORPO PARA OS GREGOS 137 9 A IMPORTÂNCIA DA OBRA APOLOGIA DE PLATÃO 139 10 POLÍTICA E ÉTICA EDUCACIONAL 140 11 A PAIDEIA SOCRÁTICOPLATÔNICA 142 12 A PAIDEIA ARISTOTÉLICA O HOMEM E A PÓLIS 143 13 DESDOBRAMENTOS DA PAIDEIA GREGA 145 14 TEXTOS COMPLEMENTARES 153 15 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS 155 16 CONSIDERAÇÕES FINAIS 158 17 EREFERÊNCIAS 159 18 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 159 UNIDADE 5 ANÁLISE CRÍTICA DA PAIDEIA CLÁSSICA E SUA IMPORTÂNCIA NA CONTEMPORANEIDADE 1 OBJETIVOS 161 2 CONTEÚDOS 161 3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE 162 4 INTRODUÇÃO À UNIDADE 163 5 UMA NOVA PROPOSTA DE ARETÉ 164 6 AS CRÍTICAS DA PAIDEIA REALIZADAS POR JACQUES DERRIDA 168 7 DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS PARA UMA NOVA PROPOSTA DE PAIDEIA 171 8 A IMPORTÂNCIA DE UMA NOVA PAIDEIA NA CONTEMPORANEIDADE 180 9 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS 185 10 CONSIDERAÇÕES FINAIS 188 11 EREFERÊNCIAS 189 EAD CRC Caderno de Referência de Conteúdo Ementa Conhecer o ambiente histórico dos pressupostos teóricos da Educação na Gré cia Antiga visando compreender as características culturais econômicas e so ciais e para isso partiremos da Grécia préhomérica século 20 aC até o Perí odo Clássico século 4º aC Analisar a influência dos sofistas na Grécia antiga e identificar as principais questões ligadas à Educação as principais escolas e pensadores bem como os principais conceitos da Filosofia antiga no que tange à Educação salientando a decisiva função que tiveram na época Desenvolver um olhar crítico diante da realidade educacional atual principalmente compre endendoa como fruto de um processo histórico intrinsecamente vinculado ao pensamento filosófico contemporâneo 1 INTRODUÇÃO A origem do conceito Paideia está na antiguidade clássica grega É a herança grega dos pressupostos do que hoje denomi namos Educação Infelizmente nos dias atuais costumase atribuir equivocadamente esses fundamentos às contribuições de pensa dores modernos e às vezes contemporâneos das diversas áreas do conhecimento É em virtude dessa visão desfocada da realidade Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 10 pedagógica que nos propomos a examinar com cuidado e atenção esse tema Longe de esgotálo apontaremos algumas pistas para reflexão do docente de Filosofia em formação sobre o processo que deu origem à Educação A obra Paideia a formação do homem grego de Werner Jaeger será nossa leitura obrigatória Evidentemente como já havíamos dito não esgotaremos o assunto dada sua densidade e complexidade Porém cada unidade foi cuidadosamente elaborada para que você tenha subsídios para a devida reflexão sobre o tema Na primeira unidade trataremos da questão da origem da Filosofia É essencial que examinemos sua gênese porque é pela genialidade do povo grego por meio da história que podemos compreender o processo de formação do homem e a elaboração do ideal de Humanidade Você estudará na segunda unidade os conceitos de Paideia Areté ou Excelência Agathós e Aristós Descobrirá a relação exis tente entre nobreza e Areté Na Unidade 3 o sofismo será nosso objeto de reflexão Não poderíamos dispensar esse tema importante dado o modelo de Educação que propunham Quanto à Unidade 4 estudaremos uma das figuras mais po lêmicas do Período Clássico no que se refere à Filosofia e à Edu cação Sócrates Estudaremos assim o conceito de Areté a partir do exame de seu método a evolução desse conceito na obra A República de Platão e por fim algumas contribuições produzi das por Aristóteles discípulo de Platão Logo a seguir ainda nesta unidade iremos apresentar a você alguns dos desdobramentos e agregações que ocorreram ao conceito de Paideia advindas do hu manismo romano a Paideia Christi cristã e a Bildung alemã Por fim na Unidade 5 discutiremos algumas considerações críticas realizadas pelo filósofo Friedrich Nietzsche em relação à proposta socrática e a crítica produzida pelo filósofo pósmoderno Claretiano Centro Universitário 11 Caderno de Referência de Conteúdo Jacques Derrida a todo o arcabouço em que se assenta os ideais de Paideia Logo depois apresentaremos algumas considerações críticas sobre o momento em que vivemos a contemporaneidade para percebermos a importância de pensarmos a necessidade do resgate de um ideal de Paideia Por fim mostraremos duas pro postas de criação de um ideal educativo advindas das considera ções do filósofo alemão Theodor Adorno e as do filósofo america no Mortimer Adler 2 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO Abordagem Geral Prof Ms Edson Renato Nardi Neste tópico apresentamos uma visão geral do que será es tudado neste Caderno de Referência de Conteúdo Aqui você en trará em contato com os assuntos principais deste conteúdo de forma breve e geral e terá a oportunidade de aprofundar essas questões no estudo de cada unidade Desse modo essa Aborda gem Geral visa fornecerlhe o conhecimento básico necessário a partir do qual você possa construir um referencial teórico com base sólida científica e cultural para que no futuro exercício de sua profissão você a exerça com competência cognitiva éti ca e responsabilidade social Vamos começar nossa aventura pela apresentação das ideias e dos princípios básicos que fundamen tam este CRC Ao longo dos próximos meses empreenderemos um diálogo que perpassará pensadores períodos históricos ideários políticos e culturais que terão como um de seus elementos mais importan tes para a temática da Educação tendo como pano de fundo o con ceito de Paideia A escolha deste conteúdo e desta abordagem neste momen to inicial de seu processo educativo não se deram por acaso e ao longo desse estudo três aspectos serão levados em consideração Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 12 O primeiro aspecto referese às razões que o levaram você futuro licenciado à escolha desta abordagem Ao optar por um curso de Licenciatura está implícita a expectativa de ao concluí la obter uma formação que permita exercer adequadamente a profissão de educador profissão esta que proporciona os alicerces da sociedade pois quem a exerce precisa se posicionar diante da realidade e será convidado a ajudar a transformála O segundo aspecto tratará da necessidade de apresentar mos um passeio panorâmico sobre o que se espera deste CRC Por fim o último aspecto tratará de algumas sugestões de condutas e cuidados que você poderia adotar em relação aos as suntos aqui trabalhados para que eles possam ser adequadamente estudados e possam vir a contribuir de fato para a sua formação profissional Com relação ao primeiro aspecto além das expectativas ine rentes à sua opção pela Licenciatura existe também a expectativa de que você venha a se apropriar de conceitos ideias e reflexões que compõe a área da Filosofia e portanto da figura do filósofo ou para lembrar os filósofos clássicos daquele que é amigo da sabedoria Do que foi dito de imediato poderíamos vir a questionar se é possível a junção destas duas expectativas pois em princípio elas apresentamse como distintas uma da outra Indo mais além po deríamos pressupor que ao se enfatizar a Educação em uma das expectativas estaríamos como que apequenando o gigantismo ou a profundidade da Filosofia ou ainda que a excessiva ênfase na apropriação do conhecimento filosófico poderia vir a fazer com que tenhamos um filósofo e amigo da sabedoria em detrimento de um futuro educador Embora não tenhamos condições de saber individualmente qual é a sua expectativa e a de seus demais colegas de caminhada sabemos que este tipo de questionamento é possível e por que Claretiano Centro Universitário 13 Caderno de Referência de Conteúdo não dizer natural pois como mostraremos a você a Filosofia traz em sua gênese o levantamento do ato de questionamento como uma de suas características principais No entanto este CRC neste momento de sua formação pro curará responder exatamente à possibilidade de conciliar essas ex pectativas isso porque buscaremos defender argumentativamen te ao longo de nossos estudos que a Educação está estritamente vinculada à Filosofia e a Filosofia ficaria como que inviabilizada sem que venhamos a lidar com o conceito de Educação Há de se ter claro que não estamos falando de qualquer edu cação estamos falando da educação como Paideia e nesse senti do convidamos você a verificar ao longo das unidades deste CRC que a relação entre Educação e Filosofia na abordagem que apre sentaremos se encontra em profunda simbiose Inicialmente para que você possa perceber a título introdu tório o quanto os contornos da Paideia estão presentes na cultura grega leia a seguir as considerações de Werner Jaeger 2001 p 27 o pesquisador que inspirou a construção deste CRC Dou a público uma obra de investigação histórica acerca de um problema até agora inexplorado a Paidéia a formação do homem grego como base para uma nova consideração de conjunto do fe nômeno grego Conquanto se tenha descrito frequentemente o desenvolvimento do Estado e da sociedade da literatura e da re ligião e filosofia dos gregos ninguém até hoje tentou evidenciar a ação recíproca entre o processo histórico pelo qual se chegou à formação do homem grego e o processo espiritual através do qual os gregos lograram elaborar o seu ideal de humanidade Todavia não foi por ela não ter tido cultores até agora que me devotei a esta tarefa eu o fiz porque julguei ver que da solução deste profundo problema histórico e espiritual estava pendente a inteligência da quela criação educativa ímpar da qual irradia a imorredoura ação dos gregos sobre todos os séculos Quanto ao segundo aspecto o passeio panorâmico pelo CRC devemos dizer que ele se construiu ao longo do tempo elegendo como prioridades propiciar a você o seguinte Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 14 1 Apresentar a relação existente entre Educação e Filoso fia manifestada no conceito de Paideia 2 Estabelecer algumas mudanças que o conceito de Pai deia sofreu ao longo do tempo por intermédio da ação de alguns pensadores e grupos culturais 3 Exemplificar alguns questionamentos críticos tecidos por pensadores a respeito da importância ou pertinên cia do ideário presente na Paideia grega 4 Sugerir algumas possibilidades de criação de novos ali cerces para a criação de uma Paideia na contempora neidade 5 Esboçar uma justificativa da necessidade do resgate de alguns dos elementos existentes na Paideia grega para analisarmos a nossa realidade atual ou ainda melhorar mos algumas situações com os quais nos deparamos na Educação contemporânea Como se percebe os temas que pretendemos tratar neste CRC são relativamente abrangentes e em razão disso considera mos agora necessário apresentar um aspecto que buscará orientá lo neste CRC e que caso seja adequadamente realizado tornará mais exitoso o caminho que traçamos para seus estudos Estamos nos referindo às sugestões de condutas e cuidados que você poderia adotar em relação aos assuntos que serão apre sentados Bem e por onde começar Inicialmente há de se dizer que a primeira sugestão que apresentamos a você se refere aos cuidados que deverá ter ao lidar com conceitos Mas o que são conceitos Cada conceito é uma ideia geral derivada ou inferida de ocorrên cias ou instâncias específicas Dito de outro modo um conceito é uma unidade cognitiva de significado ou ainda uma ideia abstrata ou símbolo mental que expressa uma unidade de significado A Filosofia lida sobretudo com conceitos Na verdade mui tas vezes busca até mesmo elucidar o significado de conceitos ou empreende ainda novas propostas de significado Em razão dis Claretiano Centro Universitário 15 Caderno de Referência de Conteúdo so há de se ter muito cuidado na interpretação e uso dos concei tos pois muitas vezes a ideia que você possui sobre determinado conceito pode ser diversa da proposta em determinado discurso ou usada por determinado autor Tomemos como exemplo o título deste CRC Como você pode perceber usamos a palavra Paideia muitas vezes associandoa a Educação no entanto você verá que o conceito de Educação no decorrer deste estudo apresentará outras formas de abordagem Além disso outros conceitos serão apresentados a você e dentre esses citamos os conceitos de Areté Kalós e Agathós Es ses conceitos são gregos e trazem consigo toda uma especificidade que necessita ser desvendada pois muitas vezes a tradução lite ral dessas palavras para o português não dá conta das especificida des de seu uso e significado na língua grega Diante disso convidamos você a mergulhar nesses concei tos buscar referências em leituras que viermos a sugerir para você ou ainda verificar em outras fontes os conceitos por nós apresen tados Nesse sentido uma boa dica que gostaríamos de lhe apre sentar é a de que você se municie com um bom dicionário de Fi losofia e que faça dele seu companheiro não somente neste CRC mas em todas as outras que virão ao longo deste curso O próximo aspecto que gostaríamos de refletir com você se refere à necessidade de lidar com o contraponto de ideias Embora tenhamos como importante o conceito de Paideia e nos esmere mos para defender as ideias presentes nesse conceito apresen taremos a você considerações críticas sobre ela pois como pre tendemos mostrar ao longo deste e de outros CRCs o exercício da Filosofia nunca deve ter como característica a busca por um ponto final sobre determinado tema isso porque ela mais se assemelha à busca de pontos e vírgulas Dito de outro modo poderíamos dizer que ao longo deste CRC você naturalmente irá encontrar maior afinidade com esse ou Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 16 aquele pensador ou ideia No entanto não desejamos que você tome essa ideia ou pensador como suficiente para todas as inqui rições e respostas pois se assim o fizer correrá o risco de perder algo inerente ao exercício do filosofar Por fim consideramos pertinente convidálo a se manifestar criticamente em relação a este CRC apresentando aprofundamen tos questionando os argumentos enfim fazendo uso de uma au tonomia argumentativa que será essencial ao longo desta Gradua ção e que permitirá a você alçar novas viagens e estabelecer novos destinos quer seja como educador ou como amigo da sabedoria Bem agora o convidamos a analisar conosco alguns dos ele mentos que consideramos centrais e que se encontram em cada uma das unidades deste CRC Unidade 1 Do mito ao logos uma análise do nascimento da Filo sofia ocidental Nesta unidade intentamos discutir com você os alicerces da cultura grega e para isso mostraremos as várias fases históricas pelo qual passou a cultura grega Estudaremos algumas das prin cipais características do período Préhomérico século 20 aC a 12 aC Homérico século 12 aC a 8º aC Arcaico século 8º aC a 6º aC e Clássico século 5º aC a 4º aC Feito isso apresentaremos a você algumas das característi cas que favoreceram aquilo que foi intitulado de milagre grego 1 o desenvolvimento do alfabeto 2 a criação da constituição 3 o surgimento da política 4 a intensa atividade comercial 5 a criação da moeda 6 as grandes navegações Logo a seguir verificaremos algumas das principais caracte rísticas da cultura grega e também vamos lhe oferecer mais deta lhes de um dos principais elementos dessa cultura sua importância Claretiano Centro Universitário 17 Caderno de Referência de Conteúdo para o surgimento da Filosofia o mito grego Buscaremos mostrar a você que os mitos sempre tiveram muita importância para todas as sociedades especialmente na ci vilização grega Unidade 2 Antiguidade clássica grega e a Educação A Unidade 2 amparase nas ideias apresentadas na obra Pai déia a formação do homem grego de Werner Jaeger Nela estu daremos o conceito central que dá nome a este CRC e também de alguns outros conceitos gregos extremamente ligados a ele Bem e quem foi Werner Jaeger 18881961 Foi professor em Harvard e publicou Paidéia em 1933 obra na qual concentrou seus esforços para analisar as ideias e as práticas de Educação no mundo helenístico buscando demonstrar que essas ideias e prá ticas fundamentaram os sistemas educacionais e os sistemas de pensamento da atualidade Veremos os dois grandes sustentácu los da Educação grega manifestados em Homero o educador da nobreza grega e Hesíodo cuja obra tem forte vinculação com a Educação do homem do campo Quais aspectos gostaríamos de salientar a você nesse mo mento No período homérico o conceito de Paideia estava extre mamente vinculado à cultura e à Educação e ambas eram consi deradas a face de uma mesma moeda As virtudes do herói bus cadas pela aristocracia grega ou a Educação em valores e para o trabalho por intermédio da religião e dos mitos em que o homem comum seria educado vinculavamse a esse conceito Há de se destacar que apesar de terem existido grandes sistemas educativos manifestados na tradição oral para Jaeger somente com os gregos surgiu o que podemos verdadeiramente chamar de civilização e perseguição de um ideal Para os gregos o objetivo da Educação era o desenvolvimen to de um tipo elevado de homem Eles acreditavam que a Edu cação abrangia o propósito de todos os esforços humanos e não Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 18 bastasse isso a Educação seria a justificação máxima para a exis tência do indivíduo e da comunidade Nesse processo a cultura seria resultado e parceira da Educação Mas observe que quan do falamos em cultura essa não seria segundo Jaeger somente o ideal antropológico de formas e expressões combinadas de uma nação Para ele na Paideia grega iniciavase a perseguição cons ciente de um ideal um conceito de valor Assim as interrelações entre cultura e Educação acabaram por gerar um ideal de formação do homem Com isso as pessoas apropriaramse do desejo de aquisição desse ideal estabelecido e à medida que seguiam os parâmetros para alcançálo e aproxima vamse desse ideal podiam ver nisso sua realização pessoal Nesta unidade constam os conceitos que comporão todas as nossas discussões futuras ao longo do CRC Dentre estes concei tos destacamos o de Paideia ou seja um ideal educativo vincula do a uma cultura O conceito de Areté referese a um ideal de Ex celência ou virtude os conceitos de Kalós e Agathós sendo esses respectivamente vinculados à ideia de beleza e virtuosidade Você verá que a Kalokagathia grega sofrerá influências e interpretações diferenciadas por parte de Homero e Hesíodo Unidade 3 Filosofia prática ou sobre os sofistas Esta unidade trata de um grupo de filósofos que ao longo do tempo sofreram uma série de ataques em geral injustos e que acabaram por fazer cair no esquecimento uma série de contribui ções da cultura grega ou seja estudaremos a importância dos fi lósofos sofistas e suas ideias Se fossemos utilizar uma conceituação contemporânea para definilos poderíamos dizer que os sofistas seriam aqueles que fazem uso de sofismas ou seja um tipo de argumento especial utilizado para convencer alguém No entanto mostraremos a você que na Grécia antiga os sofistas pertenciam a uma categoria de professores especializados no uso das ferramentas da Filosofia e da retórica com o propósito de ensinar a Areté ou Excelência Claretiano Centro Universitário 19 Caderno de Referência de Conteúdo Um aspecto que consideramos importante para sua análise e que inserimos nesta unidade é a estreita vinculação das mudanças políticas que passava a cidade de Atenas quando do florescimento dos sofistas Veremos que o grande líder grego Péricles em um de seus discursos fazia uso de elementos da Excelência sofística isto é a habilidade discursiva Não buscaremos tratar especificamente da influência do pensamento sofístico nas ideias de Péricles mas argumentaremos que a presença da sofística no apogeu da demo cracia grega sob a liderança de Péricles certamente não se deu por acaso A partir desses elementos esperamos colaborar para que você perceba novas possibilidades de análise dos sofistas execra dos por alguns filósofos Platão Aristóteles etc e elogiados por outros Nietzsche Unidade 4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia Nesta unidade analisaremos algumas personalidades que contribuíram com alicerces mais sólidos na construção da Filoso fia Estamos nos referindo a nomes como Sócrates Platão e Aris tóteles À medida que você se dedicar aos estudos desta unida de verá que a busca pela sabedoria manifestada na célebre frase atribuída a Sócrates uma vida não refletida não vale a pena ser vivida ganhará força e intensidade pois a partir desses filósofos ocorrerá uma forte vinculação de um ideal de Paideia manifesta do na busca de conhecimento Ou seja diferentemente do que se acreditava até então não basta mais ser corajoso ou nobre tal como em Homero ou ainda trabalhador tal como proposto por Hesíodo mas ser portador de Areté buscar a sabedoria ou para lembrarmos Sócrates é virtuoso aquele que sabe que nada sabe e em razão disso sempre está buscando o saber Além disso buscaremos tratar de alguns desdobramentos da Paideia grega em outras culturas e momentos históricos Dessa forma você conhecerá um pouco do conceito de Humanismo a Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 20 apropriação da Paideia em um mundo cristão com o consequente surgimento da Paideia Christi e por fim terá contato com as ma nifestações recentes da Paideia que surgiram com o movimento germanoeuropeu denominado Bildung Unidade 5 Análise crítica da Paideia e sua importância na contemporaneidade Por fim nessa última unidade buscaremos despertar em você algumas reflexões a respeito da Educação na contempora neidade Inicialmente incentivaremos você a reconhecer que em Filosofia sempre haverá o contraditório ou seja uma visão divergente em relação a qualquer tema Para que você possa ava liar essa característica eminentemente filosófica apresentaremos as ideias de dois pensadores que fizeram críticas à Paideia grega Friedrich Nietzsche e Jacques Derrida Com a apresentação das veementes críticas desses pensa dores esperamos incentiválo a repensar tudo aquilo que estudou até o momento Mostraremos a você alguns dos desafios no mun do atual quando iniciarmos uma análise da Educação contempo rânea Para isso apresentaremos algumas considerações a respei to desse tema advindas da corrente filosófica chamada Escola de Frankfurt Ao término da unidade buscaremos lhe apresentar duas possibilidades para que possa refletir a respeito da Educação na atualidade quem sabe servindo isso para o início para uma nova Paideia A primeira alicerçase nas ideias de Theodor Adorno e seu conceito de emancipação e a segunda um pouco menos conheci da manifestase nas ideias do filósofo norteamericano Mortimer Adler e sua proposta para uma Paideia Bem e o que esperamos com isso Ao pensarmos em nossa despedida ao final do estudo deste CRC recorremos a uma frase escrita no século 12 pelo filósofo francês Bernard de Chartres CHARTRE apud MERTON 1993 p 37 e que se caracterizou por afimar que Somos como pigmeus sobre os ombros de gigantes Claretiano Centro Universitário 21 Caderno de Referência de Conteúdo Por gigantes entendemos toda nossa herança filosófica ocidental e em razão dela torcemos para que você se aproprie dos ideais daqueles que nos antecederam e possa perceber o quanto a relação Educação e cultura é importante o quanto estamos carentes de um ideal de construção pessoal a partir de um ideal humano ou de humanidade Enfim esperamos que você descubra uma proposta de Exce lência como diriam os gregos de Areté e que esta possa fazer com que você se anime nesse processo de superação e de realização de uma excelência humana fincada fortemente nos alicerces da Educação Bons estudos Glossário de Conceitos O Glossário de Conceitos permite a você uma consulta rápi da e precisa das definições conceituais possibilitandolhe um bom domínio dos termos técnicocientíficos utilizados na área de co nhecimento dos temas tratados no CRC Paideia Tópicos de Filoso fia e Educação Veja a seguir a definição dos principais conceitos 1 Ágora lugar aberto onde se realizavam as assembleias nas antigas cidadesestados gregas Especificamente no caso de Atenas a ágora acabou tornandose símbolo da democracia grega pois nela participavam aqueles que eram considerados cidadãos atenienses 2 Areté de modo geral corresponde a uma espécie de Ex celência ou seja a necessidade de preenchimento de uma certa função ou objetivo Dito de outro modo se estabelecermos um parâmetro de Excelência e vivermos em busca da construção e aproximação desse parâme tro estamos buscando a construção de nossa Areté Nessa palavra está presente a ideia de que deveríamos viver da melhor forma que poderíamos ou ainda em busca do mais valoroso potencial humano 3 Etnocentrismo conceito muito utilizado contempora neamente pois trata de questões que na atualidade Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 22 ganharam peso e importância quando nos dedicamos a analisar as relações entre culturas e povos diferentes De modo geral podemos dizer que o etnocentrismo se caracteriza por um julgamento de valor esse julga mento de valor é aplicado a outras culturas ou sistemas culturais e ao fazêlo o realizamos a partir de nossos próprios padrões culturais Esses julgamentos de valor se aplicam a várias facetas de manifestações culturais e dentre eles citamos os julgamentos que fazemos a res peito dos costumes de determinada cultura seu com portamento religião linguagem etc Vejamos a seguir a definição apresentada por Costa Filho 2006 p 12 O termo indica uma visão de mundo que considera meu grupo como padrão para o julgamento dos comporta mentos dos outros O que é diferente é rejeitado É ridi cularizado Meu modo de vida é o correto O dos outros está errado Esta postura se origina de um processo de estranhamento comum nos choques entre culturas di ferentes No entanto tornase preconceituosa quando julga um modo de vida superior a outro Sua origem advém da palavra grega etnos e esta palavra tem sido traduzida como povo raça cultura nação etc O criador deste conceito foi o sociólogo Willian Graham Sumner e a definição que apresentou é a que se segue Etnocen trismo é o nome técnico para esta visão das coisas no qual a visão do próprio grupo é o centro de tudo e todos os outros são escalados e classificados com referência a este SUMNER 1973 p 135 4 Humanismo o conceito de Humanismo ou de seus deri vados o de humanidade tem profunda vinculação com os temas que iremos estudar neste CRC Embora faça mos algumas considerações baseadas em Werner Jaeger e que associam o Humanismo à Paideia grega veremos que esse conceito traz consigo peculiaridades que o dis tingue e o aproxima de sua origem semântica na cultura romana Segundo Nicola Abbagnano 2007 p 519 Em sentido mais geral podese entender por Humanismo qualquer tendência filosófica que leve em consideração as possibilidades e portanto as limitações do homem e que com base nisso redimensione os problemas filo sóficos Claretiano Centro Universitário 23 Caderno de Referência de Conteúdo 5 Kalós Kagathos junção de dois adjetivos gregos o pri meiro referese à Kalós beleza e o outro à Agathós vir tuoso ou bom Usado no Período Clássico grego o ter mo Kalokagatkía era utilizado para se referir a um ideal de conduta pelo qual o grego deveria se pautar sobre tudo na esfera militar A expressão grega καλοκαγαθία desempenha um papel importante na formulação de muitas concepções éticas éticosociais e éticopolíticas da Antiguidade Literalmente a qualidade da Kalokaga thía equivale à qualidade beleza e bondade possui καλοκαγαθία quem é καλός κάγαθός belo e bom Nesse contexto ser belo significa primariamente ser nobre no sentido de ser um bom exemplar do próprio tipo ser belo é por assim dizer ser de raça A ex pressão καλός κάγαθός é muitas vezes traduzida como homem honrado ou homem de honra não somen te com o sentido de um homem honrado mas de ser o modelo para todo homem honrado de pertencer às seletas fileiras dos καλοί κάγΐβοι Esse modelo de ho mem honrado nobre e bom é também bom cidadão MORA 1970 p 1042 6 Paideia conceito exercerá a função de núcleo de todas as nossas indagações Inicialmente procuraremos vín culos que a Paideia poderia se ter com o conceito con temporâneo de Educação Apresentar sua conceituação ainda não é tarefa muito fácil porém alguns estudiosos já procuraram fazêlo Para Jaeger 2001 s p na apre sentação de sua obra reconhece que Paideia é difícil de definir como outros conceitos de grande amplitude por exemplo os de Filosofia ou cultura resiste a dei xarse encerrar numa fórmula abstrata Seu conteúdo e significado só se revelam plenamente quando lemos a sua história e lhes seguimos o esforço para conseguirem plasmarse na realidade Na tentativa de conceituar esse termo muitos o inserem no conceito de cultura como Abbagnano 2007 p 225 No significado referente à formação da pessoa huma na individual essa palavra corresponde ainda hoje ao que os gregos chamavam de Paidéia e que os latinos na época de Cícero e Varrão indicavam com a palavra hu Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 24 manitas a Educação do homem como tal ou seja Edu cação devida às boas artes peculiares do homem que o distinguem de todos os outros animais As boas artes eram a poesia a eloqüência a Filosofia etc às quais se atribuía valor essencial para aquilo que o homem é e deve ser portanto para capacidade de formar o homem verdadeiro o homem na sua forma genuína e perfeita Para os gregos a cultura nesse sentido foi a busca e a realização que o homem faz de si isto é da verdadeira natureza humana E teve dois caracteres constitutivos 1ª estreita conexão com a Filosofia na qual se incluíam todas as formas de investigação 2ª estreita conexão com a vida social Em primeiro lugar para os gregos o homem só podia realizarse como tal através do conheci mento de si mesmo e de seu mundo portanto mediante a busca da verdade em todos os domínios que lhe dis sessem respeito Em segundo lugar o homem só podia realizarse como tal na vida em comunidade na pólis A República de Platão é a expressão máxima da estrei ta ligação que os gregos estabeleciam entre a formação dos indivíduos e a vida da comunidade e a afirmação de Aristóteles de que o homem é por natureza um animal político tem o mesmo significado Mas num e noutro as pecto a natureza humana de que se fala não é um dado um fato uma realidade empírica ou material já existen te independentemente do esforço de realização que é a cultura Só existe como fim ou termo do processo de formação cultural é em outros termos uma realidade superior às coisas ou fatos é uma idéia no sentido platô nico um ideal uma forma que os homens devem procu rar realizar e encarnar em si mesmos 7 Panteísmo palavra de origem grega resultado da junção de dois vocábulos pan tudo e theos Deus Segundo Japiassú 2001 p 206 podese dizer que o panteísmo é a concepção segundo a qual tudo o que existe deve sua existência a Deus e em última análise se identifica com Deus Deus é assim um ser imanente ao mundo à natureza e não um ser exterior e transcendente Assim para o panteísta não existiria um deus pessoal com ca racterísticas antropomórficas ou ainda o deus criador tal como prega por exemplo o cristianismo Dentre os Claretiano Centro Universitário 25 Caderno de Referência de Conteúdo grandes pensadores que tiveram uma fundamentação panteísta podemos citar Spinoza e uma de suas frases emblemáticas Deo sive natura Deus está na natureza 8 Falocentrismo termo utilizado com especial ênfase pelo filósofo francês Jacques Derrida e utilizado para se refe rir ao domínio dos valores masculinos ao longo da histó ria ocidental e que tiveram na cultura grega e em seus ideais de Paideia um de seus alicerces principais Dizse que em uma sociedade falocêntrica o falo constitui o va lor fundamental dela 9 Logocentrismo embora neste CRC façamos uso desse termo a partir das considerações do pensador francês Jacques Derrida ele surgiu a partir das considerações do filósofo alemão Ludwig Klages JUSSI 2012 sp De modo geral segundo Klages a postura logocêntrica caracterizase por considerar como superior o logos a palavra ou ainda o ato da fala como sendo superior nos sistemas ou ainda estruturas que utilizamos para co nhecer Esquema dos Conceitoschave Para que você tenha uma visão geral dos conceitos mais im portantes deste estudo apresentamos a seguir Figuras 1 e 2 um Esquema dos Conceitoschave O mais aconselhável é que você mesmo faça o seu esquema de conceitoschave ou até mesmo o seu mapa mental Esse exercício é uma forma de você construir o seu conhecimento ressignificando as informações a partir de suas próprias percepções É importante ressaltar que o propósito desse Esquema dos Conceitoschave é representar de maneira gráfica as relações entre os conceitos por meio de palavraschave partindo dos mais com plexos para os mais simples Esse recurso pode auxiliar você na or denação e na sequenciação hierarquizada dos conteúdos de ensino Com base na teoria de aprendizagem significativa entende se que por meio da organização das ideias e dos princípios em es quemas e mapas mentais o indivíduo pode construir o seu conhe Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 26 cimento de maneira mais produtiva e obter assim ganhos peda gógicos significativos no seu processo de ensino e aprendizagem Aplicado a diversas áreas do ensino e da aprendizagem es colar tais como planejamentos de currículo sistemas e pesquisas em Educação o Esquema dos Conceitoschave baseiase ainda na ideia fundamental da Psicologia Cognitiva de Ausubel que es tabelece que a aprendizagem ocorre pela assimilação de novos conceitos e de proposições na estrutura cognitiva Assim novas ideias e informações são aprendidas uma vez que existem pontos de ancoragem Temse de destacar que aprendizagem não significa ape nas realizar acréscimos na estrutura cognitiva é preciso sobretu do estabelecer modificações para que ela se configure como uma aprendizagem significativa Para isso é importante considerar as entradas de conhecimento e organizar bem os materiais de apren dizagem Além disso as novas ideias e os novos conceitos devem ser potencialmente significativos para todos os sujeitos envolvi dos uma vez que ao fixar esses conceitos nas suas já existentes estruturas cognitivas outros serão também relembrados Nessa perspectiva partindose do pressuposto de que é você o principal agente da construção do próprio conhecimento por meio de sua predisposição afetiva e de suas motivações inter nas e externas o Esquema dos Conceitoschave tem por objetivo tornar significativa a sua aprendizagem transformando o seu co nhecimento sistematizado em conteúdo curricular ou seja esta belecendo uma relação entre aquilo que você acabou de conhecer com o que já fazia parte do seu conhecimento de mundo Utiliza ção de Mapas Conceituais na Educação Claretiano Centro Universitário 27 Caderno de Referência de Conteúdo Figura 1 e 2 Esquemas dos Conceitoschave do Caderno de Referência de Conteúdo Paideia Tópicos de Filosofia e Educação Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 28 Como se pode observar os esquemas oferecem uma visão geral dos conceitos mais importantes deste estudo Ao seguilo será possível transitar entre os principais conceitos deste CRC e descobrir o caminho para construir o seu processo de ensino aprendizagem O Esquema dos Conceitoschave é mais um dos recursos de aprendizagem que vem se somar àqueles disponíveis no ambien te virtual por meio de suas ferramentas interativas bem como àqueles relacionados às atividades didáticopredagógicas realiza das presencialmente no polo Lembrese de que você aluno EaD deve valerse da sua autonomia na construção de seu próprio co nhecimento Questões Autoavaliativas No final de cada unidade você encontrará algumas questões autoavaliativas sobre os conteúdos ali tratados as quais podem ser de múltipla escolha abertas objetivas ou abertas dissertativas Responder discutir e comentar essas questões bem como re lacionálas com a prática do ensino de Filosofia pode ser uma forma de você avaliar o seu conhecimento Assim mediante a resolução de questões pertinentes ao assunto tratado você estará se preparando para a avaliação final que será dissertativa Além disso essa é uma maneira privilegiada de você testar seus conhecimentos e adquirir uma formação sólida para a sua prática profissional Você encontrará ainda no final de cada unidade um gabari to que lhe permitirá conferir as suas respostas sobre as questões autoavaliativas de múltipla escolha As questões de múltipla escolha são as que têm como respos ta apenas uma alternativa correta Por sua vez entendese por questões abertas objetivas as que se referem aos conteúdos matemáticos ou àqueles que exigem uma resposta determinada inalterada Já as questões abertas dissertativas obtêm por res posta uma interpretação pessoal sobre o tema tratado por isso normalmente não há nada relacionado a elas no item Gabarito Claretiano Centro Universitário 29 Caderno de Referência de Conteúdo Você pode comentar suas respostas com o seu tutor ou com seus colegas de turma Bibliografia Básica É fundamental que você use a Bibliografia Básica em seus estudos mas não se prenda só a ela Consulte também as biblio grafias complementares Figuras ilustrações quadros Neste material instrucional as ilustrações fazem parte inte grante dos conteúdos ou seja elas não são meramente ilustra tivas pois esquematizam e resumem conteúdos explicitados no texto Não deixe de observar a relação dessas figuras com os con teúdos do CRC pois relacionar aquilo que está no campo visual com o conceitual faz parte de uma boa formação intelectual Dicas motivacionais O estudo deste CRC convida você a olhar de forma mais apu rada a Educação como processo de emancipação do ser humano É importante que você se atente às explicações teóricas práticas e científicas que estão presentes nos meios de comunicação bem como partilhe suas descobertas com seus colegas pois ao com partilhar com outras pessoas aquilo que você observa permitese descobrir algo que ainda não se conhece aprendendo a ver e a notar o que não havia sido percebido antes Observar é portanto uma capacidade que nos impele à maturidade Você como aluno dos cursos de Graduação na modalidade EaD necessita de uma formação conceitual sólida e consistente Para isso você contará com a ajuda do tutor a distância do tutor presencial e sobretudo da interação com seus colegas Sugeri mos pois que organize bem o seu tempo e realize as atividades nas datas estipuladas Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 30 É importante ainda que você anote as suas reflexões em seu caderno ou no Bloco de Anotações pois no futuro elas pode rão ser utilizadas na elaboração de sua monografia ou de produ ções científicas Leia os livros da bibliografia indicada para que você amplie seus horizontes teóricos Cotejeos com o material didático discuta a unidade com seus colegas e com o tutor e assista às videoaulas No final de cada unidade você encontrará algumas questões autoavaliativas que são importantes para a sua análise sobre os conteúdos desenvolvidos e para saber se estes foram significativos para sua formação Indague reflita conteste e construa resenhas pois esses procedimentos serão importantes para o seu amadure cimento intelectual Lembrese de que o segredo do sucesso em um curso na modalidade a distância é participar ou seja interagir procurando sempre cooperar e colaborar com seus colegas e tutores Caso precise de auxílio sobre algum assunto relacionado a este CRC entre em contato com seu tutor Ele estará pronto para ajudar você 3 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABBAGNANO N Dicionário de Filosofia São Paulo Martins Fontes 2007 COSTA FILHO I C Etnocentrismo comunição e cultura popular Revista da FA7 v 1 2006 JAEGER W Paidéia a formação do homem grego Tradução de Artur M Parreira São Paulo Martins Fontes 2001 JUSSI B Logocentrism and the gathering y Heidegger Derrida and contextual centers of meaning Research in Phenomenology v 42 n 1 p 6791 2012 MERTON R K On the shoulders of giants a Shandean postscript Chicago University of Chicago Press 1993 MORA J F Dicionário de Filosofia Buenos Aires Editorial Sudamericana 1970 SUMNER W G Folkways and Mores In MIZRUCHI E H Org The substance of sociol ogy codes conduc and consequences New York Meredith Corporation 1973 1 EAD Unidade 1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental 1 OBJETIVOS Reconhecer e comentar sobre a importância da origem da Filosofia para a compreensão do fenômeno educacional grego Examinar e comentar sobre a passagem do mito para o logos Contextualizar historicamente a passagem do mito ao logos com ênfase aos séculos precedentes ao século 6º aC quando se convenciona o nascimento da Filosofia tratandose também das hipóteses que envolvem esse momento Analisar as influências de Hesíodo e sobretudo de Ho mero no nascimento da Paideia grega Especular e enumerar as principais características da Pai deia grega desse período Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 32 Analisar e comentar a passagem do mito à Filosofia con siderando alguns conceitos e paradigmas da época Investigar e identificar as principais marcas da Filosofia nascente considerando seu método objeto da análise etc Reconhecer e comentar as principais teses sobre o nas cimento da Filosofia com atenção especial às ideias do gênio grego e da racionalização progressiva 2 CONTEÚDOS Período Préhomérico Período Homérico Período Arcaico Período Clássico Religião Pública Religião dos Mistérios orfismo Mito Do mito ao logos 3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE Antes de iniciar o estudo desta unidade é importante que você leia as orientações a seguir 1 Busque outros comentários sobre o nascimento da Fi losofia e se encontrar algo interessante disponibilizeo para seus colegas na Lista 2 Ler as obras Ilíada e Odisséia de Homero é fundamental para sua formação portanto não deixe de fazêlo 3 Leia os livros indicados no tópico Referências Bibliográfi cas e não se esqueça de que este CRC é apenas um refe rencial de conteúdo Claretiano Centro Universitário 33 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental 4 Caso você se interesse por mitos a obra O poder do mito de Joseph Campbell citada nas referências já pode ser encontrada em DVD O Poder do Mito Documentário Direção de Bill Moyers EUA 2006 5 Caso precise de auxílio sobre algum assunto relacionado a este conteúdo entre em contato com seu tutor Ele estará pronto para ajudálo 6 Se quiser conhecer mais sobre essas teorias consulte a obra de Bulfinch 1999 citada nas Referências bibliográ ficas 4 INTRODUÇÃO À UNIDADE O desenvolvimento do pensamento lógico é certamente um fator único em toda a história da humanidade Graças a ele o homem pôde construir coisas nunca antes imagináveis dentre as quais enfocamos a Filosofia e a Educação Com o advento do pensamento filosófico há uma revolução radical na forma do homem se posicionar diante do mundo e dele mesmo e isso influencia diretamente todas as dimensões de sua existência Nesse primeiro momento cuidaremos da mudança paradig mática decorrente do nascimento da Filosofia para só então nas próximas unidades tratar de questões mais específicas ao univer so da formação educacional Problema originário Por que e como surgiu a Filosofia Ou de forma mais global quais as condições que possibilitaram o advento do pensamento racio nal Agora convidamos você a buscar e fundamentar a respos ta dessas intrigantes questões pensando sempre nas implicações decorrentes Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 34 Ora quando a maioria dos profissionais das chamadas ciên cias humanas resolve iniciar uma pesquisa a primeira atitude to mada é rastrear de forma detalhada as condições de nascimento gênese e estruturação que envolvem seu objeto de estudo Por exemplo um psicólogo ao iniciar o tratamento de algum paciente faz uma investigação cuidadosa de seus anos iniciais do quadro existente em seu nascimento levando em consideração as mais diversas dimensões o que também é feito pelo antropólogo que ao decidir pesquisar sobre determinado grupo começa a re colher todo o material possível sobre as condições que favorece ram aquela formação Contudo o que percebemos é que muitas vezes esse proce dimento é negligenciado e isso ocorre sobretudo no campo da Filosofia Para ilustrar e embasar essa afirmação vamos buscar alguns exemplos em manuais de Filosofia 1 A filosofia surgiu por volta do século 7º ou 6º aC Contrastando com os mitos ela tem por objetivo dar aos fatos uma explicação lógica e racional COTRIM 1989 p 10 2 floresceu precisamente em Mileto colônia grega do litoral da Ásia Menor durante todo o século 6º PADOVANI CASTAGNOLA 1974 p 99 As citações confirmam o que dissemos pois percebemos que na Filosofia muitas análises ocorrem e são aprofundadas sem esse tratamento genealógico inicial Em relação a esses textos é perceptível o tratamento inadequado dado ao surgimento da Fi losofia neles as informações são apresentadas de forma superfi cial e os fatos importantes são omitidos especificamente sobre a contraposição da Filosofia em relação aos mitos a qual é feita de forma simplificadora das questões envolvidas neste tema Desse momento em diante procuraremos examinar com cuidado as diversas facetas que colaboraram para o advento do Claretiano Centro Universitário 35 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental pensamento filosófico levando em conta sua grande influência so bre todo o pensamento posterior Como retomar o nascimento da Filosofia Como estudar esse período tão rico e grandioso em significado Como não cair no erro de analisálo desregradamente Qual caminho seguir e como seguilo Para não cometer os mesmos erros que cometem os manu ais de Filosofia por nós criticados neste tópico traçaremos um itinerário de pesquisa tendo em vista apresentar e em sentido mais específico eleger o instrumental teórico por meio do qual delinearemos nossa análise Optamos pelo seguinte itinerário 1 Contextualização histórica com ênfase aos séculos pre cedentes ao 6º século aC o qual se convenciona para o nascimento da Filosofia tratando também das hipóte ses que envolvem esse momento 2 Análise das influências de Hesíodo e sobretudo Home ro no nascimento da Filosofia e respectivamente da Paideia grega 3 Especulação sobre as principais características da cons ciência mítica 4 Exame da passagem do mito à Filosofia considerando al guns conceitos e paradigmas da época 5 Investigação das principais marcas da Filosofia nascente considerando seu método objeto de análise etc 6 Reconhecimento das principais teses sobre o nascimen to da Filosofia com atenção especial às ideias do gênio grego e da racionalização progressiva 5 LEVANTAMENTO HISTÓRICO Compreendendo a história como um organismo vivo e dire tamente atuante em nossa existência optamos inicialmente por confeccionar uma breve retomada histórica que nos fornecerá os Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 36 instrumentos necessários para nos situarmos no nosso ambiente de análise As principais análises históricas dividem a antiguidade Grega em quatro grandes períodos a saber 1 Préhomérico século 2012 aC 2 Homérico século 128º aC 3 Arcaico século 8º6º aC 4 Clássico século 5º4º aC Convidamos você a conhecer panoramicamente cada um deles Vamos lá Período Préhomérico O Período Préhomérico século 20 aC12 aC foi palco da chegada dos povos que configurariam por definitivo a formação da Grécia dentre eles os aqueus seguidos dos jônios e dos eólios que foram se instalando nas ilhas do mar Egeu e por todo o litoral da Ásia Menor Os aqueus com suas férteis terras construíram diversas ci dades dentre elas a importante cidade de Micenas Com o tempo passaram a estabelecer contato com a população da ilha de Creta que era pioneira nos ramos comercial e marítimo Essas relações possibilitaram uma considerável expansão dos aqueus pois eles passaram a dominar dentre outras coisas a arte da navegação a metalurgia do bronze e o uso da escrita Em aproximadamente 1100 aC os dórios servidos de suas armas de ferro atacaram o povo aqueu ocasionando uma fuga das populações para o interior do continente o que ficou conhe cido como a primeira diáspora grega que deu origem aos génos γένοσ que representavam grandes famílias ou clãs Com o surgi mento dos génos iniciase o Período Homérico Claretiano Centro Universitário 37 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental Período Homérico Esse período foi nomeado homérico porque o que sabe mos dele nos é trazido por intermédio das obras Ilíada e Odisséia atribuídas ao poeta Homero Adiante iremos nos dedicar a anali sar algumas das principais contribuições de Homero para a Paideia e para a Filosofia grega mas antes disso convém contextualizar mos esse período Uma das principais marcas do período além da invasão dos dórios foi a existência do génos Os génos possuíam terras em co mum e sua agricultura era dirigida unicamente à subsistência dos moradores Eles eram liderados pelo homem mais velho do clã em um regime de poder patriarcal Há relatos ainda de que nos génos havia um culto aos antepassados que eram considerados heróis ou descendentes dos deuses gregos Aproximadamente nos quatro séculos que compreendem o Período Homérico uma crise generalizada desencadeouse na estrutura dos génos devido entre outras coisas ao crescimento populacional que gerou a divisão da terra e dos bens Com o crescimento populacional as terras férteis não mais suportavam a demanda gerando uma escassez de alimentos que culminou em vários conflitos pelo direito do uso da terra iniciando um processo de privatização das propriedades Como consequência das sociedades privadas nasceu a de sigualdade social a divisão em classes e o individualismo bem como a escravidão No intuito de se restabelecerem os génos os gregos uniramse em grandes tribos Essas tribos instalaramse em cumes cercandose por ver dadeiras muralhas Esses locais receberam o nome de acrópole em torno da qual se formaram várias cidades dentre elas Atenas Esparta e Tebas A economia começou a crescer e no final do Período Ho mérico com a utilização da escrita e da moeda as cidades ressur Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 38 giram possibilitando a expansão da navegação e a conquista de outras terras Tal fato desencadeou a segunda diáspora grega que signifi cou a expansão dos colonos gregos na Líbia no Egito e no sul da Península Itálica Consequentemente propiciou a implantação do comércio grego originando uma grandiosa rede comercial Com o contínuo desaparecimento da unidade familiar e a migração da população em busca de terras férteis iniciouse a for mação de um novo paradigma político que mediante a união de tribos e vilarejos originou a criação das cidadesestado E o que seriam as cidadesestado De modo geral podemos dizer que essas cidades seriam uma espécie de entidade autôno ma cujo território se manifestava nos limites próximos da própria cidade e estas cidades não compõem parte de outro governo isto porque o governo se dá nestas mesmas cidades Especificamente para o nosso tema em questão convém que citemos as cidades de Atenas e Esparta como referência de cidadesestado que surgiram naquele período Convém dizer ainda que com o surgimento das cidades estado marcase o fim do Período Homérico e o início do Período Arcaico Período Arcaico O Período Arcaico desenvolveuse do século 8 ao século 6º aC Suas principais marcas foram a presença das cidades estado ou pólis ver as figuras 1 2 e 3 que possuíam governos próprios e limites definidos mantendo entre si relações diplo máticas O período é marcado também pelo início da coloniza ção grega nas regiões vizinhas Nesse período surgiu o alfabeto grego que propiciou o apa recimento da Literatura e da Filosofia fortalecendo o sistema cul tural vigente até então Claretiano Centro Universitário 39 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental Mediante essa expansão cultural nasceu o Período Clássico que se estende do século 6º ao século 4º aC Período Clássico O Período Clássico foi um dos mais conturbados da história grega pois ao mesmo tempo em que as cidadesestado atingiam seu auge econômico e cultural eclodiam algumas guerras que as devastavam Nesse sentido sugerimos a você que investigue algu mas dessas guerras e em especial a guerra do Peloponeso 431 aC404 aC pois essa guerra especificamente trouxe uma série de desdobramentos importantes para a discussão filosófica Nesse período emergiram grandes sistemas filosóficos como o platonismo e o aristotelismo além de diversas outras mu danças e expansões no campo artístico e literário Mola propulsora para o nascimento da Filosofia Com a breve retomada histórica apresentada até agora foi possível perceber que a Grécia do século 6º aC no qual se con venciona o nascimento da Filosofia é o resultado de mudanças estruturais que vinham eclodindo desde tempos longínquos Figura 1 Atenas Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 40 Figura 2 Esparta Figura 3 Tebas Após essa contextualização histórica pontuaremos neste tó pico os fatos cruciais que ao longo de todas estas mudanças que Claretiano Centro Universitário 41 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental apresentamos estimularam e impulsionaram a o surgimento da Filosofia grega Os principais fatores são destacados a seguir 1 Desenvolvimento do alfabeto a importância do desen volvimento do alfabeto é a expansão cognitiva que seu uso ocasiona Com ele é favorecida a discursividade marcadamente lógica linear refletidamente estrutura da 2 Criação da constituição a criação de uma constituição instiga a reflexão sobre os postulados axiológicos da existência impulsionando os homens a pensar em pro blemas resoluções hipóteses aporias etc 3 Surgimento da política não que a política tenha nascido por assim dizer nesse período mas certamente nesse momento específico sua presença e importância foram evidenciadas A necessidade de pensar a vida em grupo impele o homem a refletir sobre suas características e sobre suas diferenças com os demais como também de propor paradigmas que abranjam a todos sem contar a troca de opiniões que implica um tratamento cauteloso das ideias O homem passa a se reconhecer como o go vernante da pólis papel que outrora era dos deuses 4 Intensa atividade comercial o desenvolvimento da ati vidade comercial traz consigo além da melhoria econô mica que possibilita o tratamento de diversas questões lembrando que essa melhoria levou ao ócio e esse colaborou para o surgimento do pensamento o inter câmbio de culturas paradigmas enfim uma variedade de coisas que enriquecem e estimulam o pensamento humano 5 Criação da moeda dentre outras coisas essa criação embute uma maneira mais abstrata e generalizada de avaliar e comparar as coisas 6 Grandes navegações marcadamente um povo maríti mo por sua localização privilegiada com o advento das grandes navegações os gregos começam a desmistificar e desbravar o mundo Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 42 Reconhecidas as características históricas é hora de analisar as outras dimensões presentes quando do nascimento da Filosofia Para isso retomaremos o Período Homérico deixando por ora as características históricas de lado para considerar as estrutu ras internas da obra de Hesíodo e Homero como possibilitadoras do surgimento da consciência lógica 6 IMPORTÂNCIA DE HOMERO E HESÍODO PARA O NASCIMENTO DA FILOSOFIA Os poetas gregos Hesíodo e Homero são dois reconhecidos nomes da literatura mundial Suas obras transcendem à simples narração e confabulação de histórias alcançam importância para digmática e pedagógica na história do Ocidente Hesíodo e a vida no campo Embora Hesíodo não tenha suas obras co nhecidas pelo grande público na contempora neidade esse poeta em conjunto com Homero também marcou de forma indelével a formação cultural do povo grego na época clássica Para ini ciar nossa apresentação a respeito desse perso nagem disponibilizamos a seguir uma pequena síntese biográfica e alguns aspectos de sua impor tância para a formação cultural do povo grego Hesíodo personalidade de grande vulto posterior a Homero foi considerado o criador da poesia didática Viveu em Beócia pro vavelmente no final do século VIII ou no começo do século VII aC época de luta entre proprietários de terras e a população excluí da de privilégios trabalhadores agrícolas pastores artesãos Sua obra Teogonia baseiase na compilação análise e ordenação de tradições míticas e procura estabelecer a genealogia dos deuses mostrando como se organiza o mundo divino Em Os trabalhos e os dias esse autor mostra a organização do mundo dos mortais salientando a mão humana o trabalho do homem como princípio para uma existência digna SHIGUNOV NETO NAGEL 2012 p 3 Figura 4 Hesíodo Claretiano Centro Universitário 43 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental Com o intuito de noticiar um breve comentário sobre a vida de Hesíodo devemos recordar que ele é o escritor mais antigo mais antigo do mundo helênico de que temos notícia Escrevia em lín gua jônica embora seja mais provável que sua língua materna fosse uma mistura de dórico e eólio Não diferente dos encargos de muitos homens de sua época Hesíodo era pastor e assim permaneceu até que um dia segundo consta as musas lhe apareceram e lhe ordenaram cantar a raça dos benditos deuses imortais Como mencionado na citação suas obras capitais foram Os tra balhos e os dias e Teogonia A Teogonia é um poema marcadamente permeado por concepções religiosas e teológicas que narra e tenta explicar o nascimento dos heróis e dos deuses do Olimpo As con cepções ali religiosamente afixadas foram levadas a cabo por vários séculos na Grécia e influenciaram diretamente a Filosofia nascente Já em Os trabalhos e os dias Hesíodo expõe a vida campes tre do homem grego como modelo de honestidade e virtude que agradaria até mesmo aos deuses É uma obra de forte intenção pedagógica e moralizante O que percebemos no conjunto da obra hesiodiana é em uma análise mais breve o cuidado com as questões relacionadas aos deuses e à vida cotidiana dos homens com suas privações e destinamentos tudo isso ilustrado pelo ambiente fantástico e mis terioso dos mitos Homero o educador par excellence Certamente você já teve algum contato com alguma obra de Homero quer tenha sido por meio de produções cinematográficas que tratam de alguns dos aspectos presentes em suas duas grandes obras Ilíada e Odisséia ou ainda no contato direto com tais produções Esse poeta é extremamente importante para os alicerçes da cultura grega ou então as rela Figura 5 Homero Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 44 ções existentes entre Filosofia e Educação Seus poemas acabam por fornecer esse contexto quer seja na linguagem ou em alguns aspectos do pensamento que adveio a reflexão filosófica Dentre algumas das informações que colhemos a seu respeito considera mos pertinente apresentar a você a síntese a seguir Situando Homero temos que os dados relativos à existência des se poeta são inexatos no entanto podese supor que nasceu em Esmirna atual Turquia aproximadamente em 850 aC e faleceu na Ilha dos Ios também chamada Nio que fica no arquipélago das Ciclondes no mar de Cândida Atribuise a Homero tanto o títu lo de fundador da poesia épica como o de maior e o mais antigo poeta grego Suas principais obras foram a Ilíada e a Odisseia que descrevem de forma fantástica uma sucessão de acontecimentos da vida grega e oferecem uma interpretação da experiência huma na cujos êxitos são vistos como favores concedidos pelos deuses SHIGUNOV NETO NAGEL 2012 p 2 Para que você possa perceber as razões que levaram os au tores citados anteriomente Shigunov Neto e Nagel a emitir estas considerações sobre Homero basta dizer que os pensadores pré socráticos Parmênides e Empédocles pensadores estes que você lidará ao se dedicar ao estudo da Filosofia antiga fizeram uso da mesma estrutura discursiva para apresentar suas ideias referimo nos a apresentação poética baseada em uma estrutura chamada de hexâmetros Não bastassem esses aspectos há de se ressaltar que Home ro em conjunto com Hesíodo acabou por fornecer ao povo grego a formatação geral de como os seus deuses seriam e quais as rela ções que esses deuses mantinham com os humanos Do que foi dito certamente há de se pensar a respeito de quando se deu a produção dessas obras ou o período em que este poeta viveu Observe e analise algumas considerações a respei to dessas questões apresentadas por Rosen 1997 p 3 tradução nossa Nós não podemos fixar as datas de existência de Homero e Hesí odo com muita certeza mas um consenso geral desenvolvido em décadas recentes é que a atividade dos dois poetas se deram no período entre 750 aC a 650 aC A questão é complicada pelo fato Claretiano Centro Universitário 45 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental de que esses poemas devem ter sido originalmente compostos sem escrita questões de datação tem que enfrentar o problema de perceber quando os textos foram transcritos transformados em escrita Ainda não provavelmente sem coincidência esses pri meiros textos não importa quando eles foram finalmente fixados em sua corrente forma refletem a atividade poética do período em que a introdução do alfabeto parece ter promovido o desenvolvi mento da literatura Como se percebe percebese inclusive uma diferença entre as informações de Rosen 1997 e Shigunov Neto 2012 quanto ao período em que Homero viveu e esta imprecisão demonstra o quanto ainda há de se investigar sobre a vida deste personagem Nesse contexto há de se pensar a respeito de qual dos dois poetas produziu primeiramente algumas de suas obras e nesse sentido Rosen argumenta que algumas abordagens tendem a considerar que ambos foram contemporâneos e que além disso poderiam ter produzido suas obras com o intuito de se diferenciar um do outro No entanto Rosen conclui que Estudiosos modernos geralmente assumem que Homero compôs mais cedo que Hesíodo contudo isto se assenta em pouco mais de que avaliações subjetivas o consenso em favor de uma data anterior de Homero sobrevive mas a questão não está resolvida 1997 p 34 tradução nossa Além disso embora a existência de um único poeta chama do Homero não seja historicamente comprovada o chamado problema homérico a obra que carrega seu nome é de uma riqueza inestimável Poeta das façanhas heroicas e do desbravamento humano Homero é responsável pela formação de uma importante parcela da cultura grega antiga tanto no período que antecede quanto no que sucede o nascedouro da Filosofia Segundo Platão na Repúbli ca 606e Homero foi o educador de toda a Grécia Ainda sobre essa característica pedagógica complementa Jaeger 2003 afirmando que na Grécia havia presente a concep Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 46 ção do poeta como educador de seu povo e Homero seria esse primeiro e maior criador e modelador da humanidade grega Um aspecto interessante em relação à forma como a produ ção homérica era divulgada manifestase no fato de que na Grécia antiga havia o costume de se cantar os poemas que eram trans mitidos hereditariamente ou seja os poemas eram passados de geração após geração por meio da reprodução em canto desses poemas Mais do que uma função de entretenimento esses poe mas cantavam os grandes feitos e as virtudes dos grandes homens e heróis de forma a criar uma consciência receptiva a tal modelo de transmissão Por certo que nós homens e mulheres da era visual não conseguimos captar com toda a carga semântica o que significa vam tais poemas para os gregos mas devemos ter em mente que os gregos possuíam um ouvido altamente calibrado e volitivo para aquelas tradições cantadas A poesia antiga grega diferente de outras poesias criadas nos séculos decorrentes no Ocidente abrangia um campo enorme de dimensões numa confluência entre ética estética etc num orga nismo indissociável tanto que conforme comenta Jaeger 2001 p 66 O pathos do sublime destino heróico do homem lutador é o sopro espiritual da Ilíada O ethos da cultura e da moral aristocrática encontra na Odisséia o poema da sua vida Mas deixemos por ora as homenagens a Homero e vamos analisar algumas características pontuais de sua obra que nos possibilitem entender sua relação com a Filosofia Para isso servirnosemos de Reale 1993 v 1 Optamos por citar três importantes características da obra de Homero que foram imprescindíveis para o surgimento da Filo sofia grega as quais iremos expor em três temas 1 estrutura da imaginação 2 arte da motivação 3 expressão da realidade Vejamos a seguir cada um desses âmbitos separadamente Claretiano Centro Universitário 47 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental Estrutura da imaginação Diferente de outras narrativas de outros povos as obras de Homero não se preocupam apenas em descrever o monstruoso e o disforme pelo contrário a estruturação dos poemas homéricos traz consigo 1 Harmonia 2 Eurritmia 3 Proporção 4 Limite 5 Medida Atributos que dão consistência à obra de Homero e garan tem a ela uma verossimilhança no sentido de ser uma obra que apresenta nexo entre suas partes Cabe frisar que essas características posteriormente se con figurarão como constitutivas da própria estrutura do pensamento grego e por extensão ocidental Arte da motivação Figura 6 Aquiles cura Pátroclo detalhe de vaso datado cerca de 500 aC Aquiles é o herói da Ilíada Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 48 Homero não narra apenas uma sequência de fatos mas bus ca embora em nível fantásticopoético suas razões seus motivos Jaeger apud REALE 1993 p 19 comenta que Homero não conhece a mera aceitação passiva das tradições nem simples narração de fatos mas exclusivamente o desenvolvimento interiormente ne cessário da ação de fase em fase nexo indissolúvel entre causa e efeito Essa busca por razões já é um componente que posterior mente será distendido na Filosofia nascente Expressão da realidade A obra de Homero em seu tratamento mítico e discursivo da realidade preocupase em apresentar a totalidade da existência bem como o papel do ser humano diante do mundo Tanto a expressão da totalidade quanto a definição do papel humano são marcas ímpares da Filosofia Por exemplo o pensa mento moderno ansiando investigar meticulosamente as coisas fatos e fenômenos criou o chamado especialista que se ocupa de uma faceta muito específica de um problema Já os filósofos em especial os antigos buscam conhecer os fatos coisas e fenômenos em sua totalidade de forma a construir uma visão unitária do mundo Com o exposto você observou algumas características da obra de Homero e Hesíodo Vamos agora investigar outros traços importantes para o nascimento da Filosofia Como nos propusemos anteriormente vamos conhecer a religião grega para tentar compreender em que sentido ela cola borou para o nascimento da Filosofia Claretiano Centro Universitário 49 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental 7 RELIGIÃO Na mitologia grega Ganimedes era o responsável por levar a Am brósia comida dos deuses a Zeus assumindo essa função após ser raptado pela águia de Zeus que o leva ao Olimpo Outra característica importante na passagem do mito µῦθος ao logos λογος foi a presença da religião que em seu interesse por explicar e justificar a existência relacionase com a Filosofia Figura 7 Ganimedes e a águia de Zeus escultura de Bertel Thorvaldsen Museu de Cope nhague 1817 Neste sentido Reale 1993 p 2021 comenta Estudiosos afirmaram em várias ocasiões que entre religião e filo sofia existem laços estruturais Hegel dirá até mesmo que a religião exprime pela via representativa a mesma verdade que a filosofia exprime pela via conceitual e isso é verdade seja quando a filo sofia subsume determinados conteúdos da religião seja também quando a filosofia tenta contestar a religião neste ultimo caso a função contestatária permanece sempre alimentada e portanto condicionada pelo termo contestado Pois bem se isso é verdade em geral o foi de modo paradigmático para os gregos Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 50 Fundamentalmente a religião grega apresenta duas vertentes a pública e a dos mistérios Estas vertentes são paradoxais já que o espírito que anima a religião dos mistérios é negador do espírito que anima a religião pública Convidamos você a conhecer essas duas vertentes da reli gião em suas particularidades Religião pública A religião pública possui algumas subdivisões como a natu ralista a antropomórfica e a hierofânica Vamos distinguilas Naturalista De acordo com a vertente naturalista os homens deveriam agir conforme a sua natureza por honra aos deuses ou seja para honrar aos deuses os homens deveriam se esforçar por serem de masiadamente humanos Antropomórfica Os deuses são forças naturais calcadas em formas humanas Eles se zangam brigam divertemse etc Para entender melhor o que são os deuses gregos recorreremos mais uma vez a Reale 1993 p 21 Mas quem são esses deuses São como há tempo se reconheceu acertadamente formas naturais diluídas em formas humanas ide alizadas são aspectos do homem sublimados hipostasiados são forças do homem cristalizadas em belíssimas figuras Em suma os deuses da religião natural grega são homens amplificados e ideali zados são portanto quantitativamente superiores a nós mas não qualitativamente diferentes Por isso a religião grega é certamente uma forma de religião naturalista Por ser apenas em grau diferente dos deuses o homem grego enxergase neles e para elevarse a eles não deve submeterse rege nerarse mas apenas ser ele mesmo autenticarse potencializarse Um exemplo disso é Ulisses ou Odisseu Podemos perceber nele um apelo natural à consciência de si ao cultivo das potencia lidades ao autorreconhecimento Claretiano Centro Universitário 51 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental Figura 8 Vaso grego mostrando Ulisses Odisseu enfrentando as sereias Hierofânica De acordo com a vertente hierofânica todos os eventos são manifestações do divino são obras dos deuses hieros do grego significa sagrado Comenta Reale 1993 p 21 Todos os fenômenos naturais são promovidos por numes os tro vões e os raios são lançados por Zeus do alto do Olimpo as ondas do mar são levantadas pelo tridente de Poseidon o sol é carregado pelo áureo carro de Apolo e assim por diante Ou seja para o homem homérico e para os herdeiros dessa tradição tudo é divino tudo acontece por obra dos deuses desde fenômenos até coisas cotidianas da vida pessoal e social como o destino das cidades e a participação em guerras Religião dos mistérios orfismo Como a religião pública não era comum a todos existia tam bém a religião dos mistérios Limitarnosemos a analisar a ver tente órfica que foi uma das mais influentes na Grécia Não sabemos ao certo de onde a religião órfica provém cer to é que recebe o nome do poeta Orfeu e que é posterior a Home ro e Hesíodo Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 52 Figura 9 Orfeu poeta e músico na mitologia grega Segundo essa vertente o homem possui um princípio divino um demônio caído em um corpo devido a uma culpa originária esse princípio é imortal e mesmo o corpo morrendo ele passa rá por uma série de reencarnações para expiar sua culpa Nesse sentido a vida órfica era a única que poderia pôr fim no ciclo das encarnações Essa vertente era marcadamente dualista por compreender as repartições de corpo e alma Com o orfismo o grego lida diretamente com a ideia de dois princípios em luta enfraquecendo a visão naturalista o ho mem começa a compreender que nem todas as tendências que percebe em si são boas e que algumas devem até ser reprimi das e que é necessário purificar o elemento divino enfraque cendo o corpóreo A religião dos mistérios influenciou decisivamente o pitago rismo o empedoclismo e o platonismo Cabe acrescentar que os gregos não possuíam livros tidos como sagrados ou frutos da reve lação divina como a Bíblia Claretiano Centro Universitário 53 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental Eles não tinham uma dogmática teológica fixa e imodificável portanto não havia e nem poderia haver uma casta sacerdotal que custodiasse os dogmas Isso possibilitou uma maior liberdade para a reflexão filosófica diferente dos orientais e medievais Conhecidas algumas características particulares como a re ligião e as obras de Homero e Hesíodo podemos avançar nossa investigação para o grande cenário em que essas temáticas estão inseridas com efeito o mítico 8 MITO Figura 10 Édipo interrogado pela Esfinge Figura 11 Ânfora ática decorada com Héracles e o touro Minos Figura 12 Aquiles e Ayax jogando os dados Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 54 Todas as perspectivas até agora levantadas formavam uma explicação de mundo capaz de dar sentido de responder às in quietações humanas nas diferentes dimensões Até por volta dos séculos 7º e 6º aC predominava a expli cação mítica O que é o mito Como ela se estrutura Qual sua função Vamos responder a essas perguntas juntos Para iniciar vamos forjar uma definição e analisála para en tão discutir alguns detalhes a saber O mito é uma explicação narrativoalegóricosimbólica intuitivofantásticopedagógica Vamos tomar cada ponto em particular Explicação procura justificar responder satisfazer dar sentido à vida e à existência com seus fatos fenômenos e coisas Narrativoalegóricosimbólico encadeia engenhosamen te uma série de acontecimentos de forma a estabelecer certa dose de verossimilhança para um evento As par tes da criação possuem cenas simbólicas que possuem sentido nas entrelinhas e fixam paradigmas por exemplo a condenação de Prometeu em ter seu fígado devorado diariamente por um abutre por desafiar aos deuses Intuitivo fantástico não se pauta na razão como faz a Ciência e a Filosofia mas na imaginação na intuição na apreensão direta Pedagógico tem uma intenção educacional instrutiva prescritiva Agora que possuímos uma definição de mito convém pensar algumas questões 1 Para que serviam os mitos 2 Por que o homem criava o mito Claretiano Centro Universitário 55 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental 3 O mito é uma história falsa 4 O mito ainda existe Por certo não conseguiremos responder a tais questões com a profundidade e a abrangência necessárias Assim é importante que você procure aprofundar seus estudos pesquisando nas bi bliografias indicadas ou em outras fontes Seguindo o raciocínio de Campbell 1990 em O poder do mito parece que há algo no ser humano que necessita de expli cações originárias definitivas e essas muitas vezes extrapolam o nível de consciência racional O ser humano por sua capacidade reflexiva tem a necessi dade de responder às questões que o inquietam e o mito surge como uma das primeiras respostas como pistas para as potencia lidades espirituais da vida humana Devemos frisar que o mito não é uma mentira já que o con ceito de mentira em suas modernas categorias de entendimento não dá conta de analisar a grandiosidade do mito para o homem antigo Portanto é preciso entender o mito como a resposta que um determinado povo conseguiu formular em uma determinada época resposta que serviu para justificar a existência e isso por ora bastava É interessante observar que mesmo no mundo hodierno al gumas explicações fantásticas ainda sobrevivem como por exem plo algumas histórias religiosas Os mitos porém não sobreviveram intactos Por certo ain da nos servimos deles mas eles não ocupam mais o lugar que ocupavam outrora Com as mudanças que começam a eclodir na Grécia desde o Período Homérico a consciência mítica passa a paulatinamente perder lugar para a consciência racional Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 56 Essas mudanças podem ser percebidas na própria estrutura interna do mito como por exemplo traz o estudo que confeccio na a helenista Jacqueline de Romilly 2012 sobre a evolução nas concepções de deuses Romilly 2012 diagnostica quatro gerações de deuses na Grécia antiga que seguem a seguinte estruturação Todos os povos da Antiguidade procuraram explicar da melhor ma neira possível a origem do Cosmo Universo e a existência dos fenômenos naturais de que dependiam para sobreviver Sumérios egípcios acádios hebreus chineses indianos e gregos entre ou tros consideravam as forças naturais entidades sobrenaturais e poderosas que chamavam de divindades ou deuses Os gregos organizaram as divindades em famílias divinas com todas as virtudes e todos os defeitos das famílias humanas Desen volveram também a partir de modelos orientais genealogias para explicar satisfatoriamente tanto a criação do Universo ou cosmo gonia como a origem dos deuses ou teogonia As divindades gregas podem ser mais ou menos divididas em dois grandes grupos o dos deuses antigos e o dos deuses olímpicos Os deuses olímpicos regem o Universo na época em que vivemos os deuses antigos representam grosso modo as indomadas e poderosas forças criativas que existiam no início dos tempos Em seu poema Teogonia Hesíodo justamente contrasta a ordem e a organização que caracterizavam o reinado de Zeus o rei dos deu ses olímpicos e a desordem que imperada no período precedente Gantz 1996 Muitas divindades antigas são puramente conceituais ou repre sentam forças da natureza ou têm importância meramente ge nealógica Grande parte dessas entidades divinas não têm lendas associadas ao seu nome As diferentes gerações de deuses gregos nos revelam o lento processo de humanização que se instalava na Grécia pois os deu ses paulatinamente deixam suas características naturais e passam a assumir formas mais humanas Ao longo da história ocidental os mitos gregos sempre se fi zeram presentes veja na figura a seguir a obra de Lambert Sustris 15151584 onde se apresenta o Deus grego Ares indo ao encon tro de Vênus Claretiano Centro Universitário 57 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental Figura 13 Deus grego Ares a caminho de seu encontro com Vênus Lambert Sustris 15151584 No entanto ainda falta responder à questão da origem dos mitos o que faremos a seguir Origem da mitologia Para adentrar essa questão optamos por nos fazer a mesma pergunta que se fez Bulfinch 1999 p 352 em seu Livro de Ouro da Mitologia a saber De onde vieram aquelas lendas Têm algum fundamento na verdade ou são apenas sonhos da imaginação A pergunta de Bulfinch é instigante e nos leva a pensar toda a mitologia Tal pergunta já recebeu algumas respostas por diver sos estudiosos cada qual solucionando de maneira diversa tão in trigante problema Veja a seguir algumas teorias para respondêla Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 58 Teoria bíblica A teoria bíblica postula que todas as lendas mitológicas têm sua origem nas narrativas das Escrituras embora os fatos tenham sido distorcidos e alterados Assim Deucalião é apenas um outro nome de Noé Hércules de Sansão Árion de Jonas etc o dragão que guarda os pomos de ouro era a serpente que enganou Eva BULFINCH 1999 p 352 Como fica claro pelo comentário de Bulfinch tal teoria inter preta o mito como releitura e ressimbolização das Escrituras no entanto embora as coincidências existam e possam até mesmo ser bibliograficamente verificáveis devemos tomar o cuidado de não achar que a mitologia está toda justificada e embasada na te ologia o que seria cair em contrassenso Vamos agora conhecer outra teoria a histórica Teoria histórica De acordo com ela todas as personagens mencionadas na mitologia foram seres humanos reais e as lendas e tradições fabulosas a elas relativas são apenas acréscimos e embelezamentos surgidos em épocas poste riores Assim a história de Éolo rei e deus dos ventos teria surgido do fato de Éolo ser o governante de alguma ilha do Mar Tirreno onde reinou com justiça e piedade e ensinou aos nativos o uso da navegação a vela e como predizer pelos sinais atmosféricos as mu danças do tempo e dos ventos BULFINCH 1999 p 353 Diferente da religiosa a teoria histórica concebe que os mi tos como histórias de pessoas que realmente existiram e que por algum fato possivelmente aliado ao poder foram posteriormente glorificadas Passemos agora para a teoria alegórica Teoria alegórica Diferente da religiosa e da histórica essa concepção prevê que Todos os mitos da antiguidade eram alegóricos e simbólicos con tendo alguma verdade moral religiosa ou filosófica ou algum fato Claretiano Centro Universitário 59 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental histórico sob a forma de alegoria mas que com o decorrer do tempo passaram a ser entendidos literalmente Assim Saturno que devora os próprios filhos é a mesma divindade que os gregos chamavam de Cronos que podese dizer na verdade destrói tudo que ele próprio cria BULFINCH 1999 p 353 Como foi possível notar a visão alegórica concebe que os mi tos eram também para os povos antigos alegóricos e simbólicos ou seja eram modos de expressar figurativamente certas coisas fatos e fenômenos entretanto com o tempo passaram a ser lidos literalmente Partamos agora para o reconhecimento da última teoria a física Teoria física A teoria física concebe que Os elementos ar fogo e água foram originalmente objeto de adoração religiosa e as principais divindades eram personifica ções das forças da natureza Foi fácil a transição da personifica ção dos elementos para idéia de seres sobrenaturais dirigindo e governando os diferentes objetos da natureza BULFINCH 1999 p 354 De acordo com tal concepção os elementos naturais é que foram personificados e adornados pela fértil imaginação dos po vos que criavam os mitos Por sua potência e grandeza os elemen tos naturais foram transformados em mitos pelos povos Mas podemos nos perguntar Afinal qual é a melhor teoria Qual delas está correta Qual delas adotar Essas teorias são muito interessantes e importantes para compreender a fundo a mitologia No entanto como estamos pre ocupados em ter uma visão o mais abrangente possível argumen tamos dizendo que cada uma delas guarda sua validade e com preensão e que se vistas isoladamente elas não possibilitariam a visão ampla que fornecem quando vistas em conjunto Essa é nossa opção integrálas para compreender de manei ra mais abrangente e aguda o rico universo da mitologia Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 60 Mas agora vamos convidálos a especular sobre a ruptura entre a consciência do mito µῦθος e do logos λογος 9 DO MITO AO LOGOS Para dar o tom de nossa análise experimente observar o co mentário de Jaeger em sua Paideia Não e fácil traçar a fronteira temporal do momento em que surge o pensamento racional Passaria provavelmente pela epopéia Po ema que narra ações grandiosas homérica No entanto nela é tão estreita a interpenetração do elemento racional e do pensamen to mítico que mal se pode separálos Uma análise da epopéia a partir deste ponto de vista nos mostraria quão cedo o pensamento racional se infiltra no mito e começa a influenciálo O início da filosofia científica não coincide assim nem com o prin cípio do pensamento racional nem com o fim do pensamento míti co Até porque mitogonia autêntica ainda encontramos na filosofia de Platão e na de Aristóteles São exemplos o mito da alma em Platão e em Aristóteles a idéia do amor das coisas pelo motor imóvel do mundo JAEGER 2003 p 191192 Com essas palavras Jaeger tenta custosamente esclarecer o lento e ao mesmo tempo grandioso processo que passou a Grécia quando da mudança da consciência do mito para a do logos Mudança de tal forma grandiosa que além de mudar um complexo modelo de investigação operou uma verdadeira revolu ção paradigmática na Grécia O solo do mito foi lentamente sendo retirado dos fecundos pés gregos que mergulharam em uma náusea coletiva Essa náu sea ao mesmo tempo em que os molestou fez com que eles bus cassem novos paradigmas para gerirem suas vidas Com isso podemos concluir tal como Jaeger 2003 p 192 que devemos encarar a história da filosofia grega como o proces so de racionalização progressiva da concepção religiosa do mundo implícita nos mitos Claretiano Centro Universitário 61 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental Confira o esquema que criamos para ilustrar essa afirmação Figura 14 Esquema da racionalização progressivaComo mostra o esquema lentamente a consciência do logos vai penetrando na esfera mítica até que só ela prevaleça O processo envolve todos os elementos analisados por nós até agora que juntos possibilitaram o surgimento de um pensa mento calcado na explicação racional que desde o início dessa análise procurou fundamentar essa tese Cabe acrescentar que não só é um processo de racionaliza ção da concepção religiosa como sugere Jaeger mas a racionaliza ção de diversos outros elementos possibilitada por uma esfera de grandes acontecimentos Não podemos porém nos esquecer do que Aristóteles co menta em sua Metafísica a saber De fato os homens começaram a filosofar agora como na origem por causa da admiração na medida em que inicialmente ficavam perplexos diante das dificuldades mais simples em seguida pro gredindo pouco a pouco chegaram a enfrentar problemas sempre maiores Ora quem experimenta uma sensação de dúvida e de admiração reconhece que não sabe e é por isso que também aquele que ama o mito é de certo modo filósofo o mito com efei to é constituído por um conjunto de coisas admiráveis De modo que se os homens filosofaram para libertarse da ignorância é evidente que buscavam o conhecimento unicamente em vista do saber e não por alguma utilidade prática E o modo como as coisas se desenvolveram demonstra quando já se possuía praticamente tudo o de que se necessitava para a vida e também para o conforto e para o bemestar então se começou a buscar essa forma de co nhecimento ARISTÓTELES 2002 p 13 Aristóteles chamanos a atenção para a confluência impres cindível entre a Filosofia e o mito que não pode ser ignorada Po demos concluir portanto que com o advento do logos é instaura do um novo paradigma no ocidente que modificará por definitivo suas estruturas mais fundamentais Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 62 O impacto causado pela mudança de consciências influi dire tamente em toda a vida grega e abarca axiologia epistemologia estética gnosiologia enfim a realidade em sua forma total Nasce a Filosofia φιλοσοφια O período que inaugura esse pensamento é chamado de présocrático de temática marcadamente naturalista Perce bemos que Jaeger classificaa como Filosofia científica e não em vão uma vez que quer demonstrar uma nova forma de se posicio nar diante da vida definidamente racional 10 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS Sugerimos que você procure responder discutir e comentar as questões a seguir que tratam da temática desenvolvida nesta unidade A autoavaliação pode ser uma ferramenta importante para você testar seu desempenho Se você encontrar dificuldades em responder a essas questões procure revisar os conteúdos estu dados para sanar as suas dúvidas Esse é o momento ideal para fazer uma revisão desta unidade Lembrese de que na Educação a Distância a construção do conhecimento ocorre de forma coope rativa e colaborativa compartilhe portanto as suas descobertas com os seus colegas Confira a seguir as questões propostas para verificar o seu desempenho no estudo desta unidade 1 Com relação ao período Préhomérico analise as afirmações a seguir I Na ilha de Creta ocorreu um pioneirismo no ramo comercial e marítimo As relações entre cretenses e outros povos resultou do desenvolvimento da navegação da metalurgia do bronze e do uso rudimentar da escrita II Creta era uma ilha repleta de valentes guerreiros que saqueavam as terras vizinhas Isso provocou o desenvolvimento econômico e social daquele povo que usurpou toda produção dos demais povos gerando ambiente propício para surgimento da Filosofia III Os vários genos gregos dominaram o comércio marítimo e expulsaram os povos dórios na primeira diáspora Isso favoreceu o surgimento da Filosofia Claretiano Centro Universitário 63 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental a Somente I está correta b Somente II está correta c Somente III está correta d Somente I e III estão corretas e Todas as afirmações estão corretas 2 Com relação ao Período Homérico analise as afirmações a seguir I Os genos eram grandes famílias que possuíam terras em comum porém com o crescimento das famílias houve a necessidade de privatização das propriedades para assegurar o uso da terra II Como consequência das sociedades privadas nasceu a desigualdade so cial a divisão em classes e o individualismo bem como a escravidão No intuito de se restabelecerem os génos uniramse em grandes tribos III No Período Homérico consolidase o uso da escrita e da moeda sur gem as acrópoles grandes tribos que depois dariam origem a várias ci dades a Somente I está correta b Somente II está correta c Somente III está correta d Somente I e III estão corretas e Todas as afirmativas estão corretas 3 Com relação ao Período Arcaico analise as afirmações a seguir I O Período Arcaico é marcado pelo surgimento das cidadesestado nas cem então as pólis com limites definidos relações diplomáticas II O Período Arcaico caracterizase pelo enfraquecimento comercial da cul tura grega pelas invasões dos povos bárbaros e por estruturas arcaicas de subsistência III Nesse período surgiu o alfabeto grego há a formalização e consolida ção da escrita que propiciou o aparecimento da literatura e da Filosofia fortalecendo o sistema cultural vigente até então a Somente I está correta b Somente II está correta c Somente III está correta d Somente I e III estão corretas e Todas as afirmativas estão corretas 4 Com relação ao Período Clássico analise as alternativas a seguir I É o período em que nasce a Filosofia houve grande número de mudan ças e expansões no campo artístico e literário Esse período é marcado pelo enfraquecimento da pólis e enfraquecimento econômicocultural II Os filósofos preocupavamse com a divisão entre mundo sensível e in teligível Platão é o grande representante dessa preocupação que está presente em todos os filósofos do Período Clássico Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 64 III A consciência reflexiva ou filosófica é impulsionada pelo desenvol vimento do alfabeto pela criação da constituição pelo surgimento da política pela intensa atividade comercial pela criação da moeda e pelas grandes navegações a Somente I está correta b Somente II está correta c Somente III está correta d Somente I e III estão corretas e Todas as afirmativas estão corretas 5 Selecione os adjetivos que compõem o conceito de mito de acordo com o que você estudou nesta unidade O mito é uma explicação a narrativa alegórica simbólica instintiva fantástica pedagógica b fantástica aleatória simbólica filosófica pedagógica formativa c pedagógica aleatória instintiva fanática imaginária irracional d irrefletida inconsciente imaginária educativa intencional demonstra tiva e pedagógica narrativa alegórica simbólica intuitiva fantástica Gabarito 1 a 2 e 3 d 4 c 5 e 11 CONSIDERAÇÕES GERAIS Esta análise teve mais a intenção de apresentar algumas ca racterísticas da passagem do pensamento mítico ao filosófico que propriamente de chegar a alguma conclusão O que percebemos é que parafraseando o filósofo alemão Kant a intuição mítica sem o elemento formador do logos ainda é cega e que a conceituação lógica sem o núcleo vivo da intuição mítica originária parece vazia Claretiano Centro Universitário 65 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental Ver a Grécia de forma lógicoracional é uma maneira de re sumila e até mesmo desapreciála Recordando Nietzsche 1987 p 1819 Os gregos enquanto povo verdadeiramente são justificaram a filo sofia de uma vez para sempre pelo simples fato de terem filosofa do e mais do que todos os outros povos Os gregos souberam começar na altura própria e ensinaram mais claramente do que qualquer outro povo a altura em que se deve começar a filosofar É preciso compreender os gregos como um povo soberano e sensível que conseguiu criar o eu melhor que já houve no oci dente Inventaram de fato os tipos principais do espírito filosó fico aos quais toda a posteridade nada acrescentou de especial NIETZSCHE 1987 p 1820 A Grécia filosófica é um capítulo incomensuravelmente im portante e interessante contudo não é única Concluímos com Nietzsche 1987 p 24 que declama é uma grande desgraça que tenhamos conservado tão pouco des tes primeiros mestres da filosofia e que só nos tenham chegado fragmentos Por causa desta perda aplicamoslhes medidas erra das e somos injustos para com os antigos 12 EREFERÊNCIAS Lista de figuras Figura 1 Atenas Disponível em httpwwwabiyoyocomarticles2969dove dormireadatenehtml Acesso em 18 abr 2012 Figura 2 Esparta Disponível em httpwwwdiariodelviajerocomeuropaestoes esparta Acesso em 18 abr 2012 Figura 3 Tebas Disponível em myoperacom Acesso em 30 jan 2012 Figura 4 Hesíodo Disponível em httpwwwfflchuspbrdhherostraductiones hesiodoindexhtml Acesso em 18 abr 2012 Figura 5 Homero Disponível em httpeducaterraterracombrvoltaire antiga20040514001htm Acesso em 30 jan 2012 Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 66 Figura 6 Aquiles cura Pátroclo detalhe de vaso datado cerca de 500 aC Aquiles é o herói da Ilíada Disponível em httpwwwconscienciaorgiliadahomeroresumo Acesso em 18 abr 2012 Figura 7 Ganimedes e a águia de Zeus escultura de Bertel Thorvaldsen 1817 Disponível em httpwwwpoetanarquistablogspotcombr201203esculturabertel thorvaldsenhtml Acesso em 18 abr 2012 Figura 8 Vaso grego mostrando Ulisses Odisseu enfrentando as sereias Disponível em httpbligigcombrfilosofiasergipe20091029ulisseseocantodassereias Acesso em 18 abr 2012 Figura 9 Orfeu poeta e músico na mitologia grega Disponível em httpwwweducadoresdiaadiaprgovbrmodulesmylinksviewcat phpcid10letterOmin20orderbytitleAshow10 Acesso em 18 abr 2012 Figura 10 Édipo interrogado pela Esfinge Disponível em httpartegriegogaleoncom ceraetaphtml Acesso em 18 abr 2012 Figura 11 Ânfora ática decorada com Héracles e o touro Minos Disponível em http wwwmolinfancomSitioshistoriadelarteWebGreciaRomaindexhtml Acesso em 18 abr 2012 Figura 12 Aquiles e Ayax jogando os dados Disponível em httpwwwfflchuspbrdh herosmithistoriaensaiosmelhoraqueushtml Acesso em 18 abr 2012 Figura 13 Deus grego Ares a caminho de seu encontro com Vênus Lambert Sustris 1515 1584 Disponível em httpwwwgreekgodsinfogreekgodsaresarespaintings php Acesso em 1º jun 2012 Sites pesquisados ROMILLY J Os deuses tudo podem os homens tudo arriscam Disponível em http greciantigaorgarquivoaspnum0084 Acesso em 30 jan 2012 ROSEN R M Homer and Hesiod Disponível em httprepositoryupenneducgiview contentcgiarticle1006contextclassicspapers Acesso em 30 jan 2012 SHIGUNOV NETO A NAGEL L H Transformação social e concepções de homem e tra balho De Homero a Hesíodo Revista Eletrônica de Ciências da Educação v 1 n 1 2002 Disponível em httprevistasfaceclacombrindexphprepedarticleviewFi le483372 Acesso em 30 jan 2012 13 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARISTÓTELES Metafísica Tradução de Marcelo Perine São Paulo Loyola 2002 v 2 BARNES Jonathan Filósofos présocráticos Tradução de Julio Fischer São Paulo Melho ramentos 1997 BULFINCH T O livro de ouro da Mitologia história de deuses e heróis Tradução de David Jardim Júnior 8 ed Rio de Janeiro Ediouro 1999 CAMPBELL J O poder do mito São Paulo Palas Athena 1990 CHAMOUX F A civilização grega Lisboa Edições 70 2003 Claretiano Centro Universitário 67 U1 Do µῦθος ao λογος uma análise do nascimento da Filosofia ocidental GLOTZ G A cidade grega São PauloRio de Janeiro Difel 1980 GRAVES R Deuses e heróis do Olimpo Tradução de Bárbara Heliodora Rio de Janeiro Xenon 1992 HESÍODO Teogonia a origem dos deuses Tradução de Jaa Torrano São Paulo Iluminuras 1995 Os trabalhos e os dias Introdução tradução e comentários de Mary de Camargo Neves Lafer São Paulo Iluminuras 1991 HIRSCHBERGER J História da Filosofia na Antiguidade São Paulo Herder 1965 KIRK G S Os filósofos présocráticos história crítica em seleção de textos 4 ed Lisboa Fundação Calouste Gulbenkian 1994 JAEGER W Paidéia a formação do homem grego Tradução de Artur M Parreira São Paulo Martins Fontes 2001 NIETZSCHE F A Filosofia na idade trágica dos gregos Tradução de Artur Mourão Lisboa Edições 70 1987 PADOVANI U CASTAGNOLA Luís História da Filosofia 10 ed São Paulo Melhoramentos 1974 PETIT P História antiga Tradução de Pedro Moacyr Campos 6 ed Rio de Janeiro Bertrand Brasil 1989 REALE G História da Filosofia antiga das origens a Sócrates Tradução de Marcelo Perine São Paulo Loyola 1993 v 1 VERNANT JP Mito e pensamento entre os gregos Tradução de Sarian Haiganuch 2 ed São Paulo Paz e Terra 2002 Origens do pensamento grego Tradução de Isis Lana Borges São Paulo Difel 1972 VERNANT JP VIDALNAQUET P Mito e tragédia na Grécia antiga São Paulo Perspectiva 2005 Claretiano Centro Universitário EAD Antiguidade clássica grega e a Educação 2 1 OBJETIVOS Compreender e delimitar o conceito de Areté άρετή de Aristós άριστός Kalós kαλός Agathós άγαθός e de Paideia Reconhecer a relação entre Areté e Nobreza Examinar a proposta de Areté presente nas obras de Ho mero e Hesíodo Reconhecer e examinar a relação entre Estado Educação e Nobreza 2 CONTEÚDOS Areté Aristós Agathós Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 70 Kalós Questão da forma no antropocentrismo do povo grego na Antiguidade Estado Educação e Nobreza no período Homérico 3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE Antes de iniciar o estudo desta unidade é importante que você leia as orientações a seguir 1 Retome as indicações de leitura da primeira unidade Para um melhor entendimento sobre os temas que es tudaremos a seguir é imprescindível que você leia as bi bliografias indicadas na unidade anterior 2 O conceito de Areté é comumente traduzido como vir tude mas por questões de ordem didática trataremos como Excelência 3 Mesmo com ressalvas com relação a dados históricos presentes em filmes sugerimos que você assista aos se guintes procurando observar neles a presença de ideais de Areté Tróia Ação Direção de Wolfgang Petersen EUA 2004 162 min 300 Ação Direção de Zack Snyder EUA 2007 117 min Odisseu e a ilha da neblina Aventura Direção de Terry Ingram Reino Unido e Irlanda do Norte 2008 88 min A Odisséia Aventura Direção de Andrei Konchalovsky EUA e Grécia 1997 165 min 4 Ao longo desta e das demais unidades teremos como grande alicerce argumentativo a obra Paidéia de Werner Jaeger 2001 Em razão da importância desse pesquisador apresentamos a seguir uma breve biografia a seu respeito Claretiano Centro Universitário 71 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação Werner Jaeger 18881961 Jaeger nasceu na pequena cidade de Lobberich Estudou nas universidades de Marburg e de Berlim Foi professor aos 26 anos de idade na Universidade de Basileia e também na Universidade de Kiel Com a ascensão do nazismo mudouse para os Estados Unidos onde foi professor na Universidade de Chicago e em Harvard e escreveu algumas obras fazendo severas críticas ao regime nazista Sua produção intelectual foi variada e importante Dentre alguns de seus trabalhos destacamos o estudo que realizou sobre Gregório de Nicia intitulado Gregorii Nysseni Opera e o estudo que fez a respeito da metafísica aristotélica e que recebeu o título de Studien zur Enstehungsgeschichte der Metaphysik des Aristoteles 1911 No entanto foi através da obra Paideia os Ideais da cultura grega que se firmou como uma referência dentre os estudiosos do classicismo filosófico Por meio desta obra compôs uma análise das práticas e reflexões filosóficas que caracterizavam a educação na antiga Grécia e sua respectiva natureza cultural Especificamente em relação ao termo Paideia foi cunhado por Jaeger para designar a educação e cultura grega Imagem disponível em httpfilosofiacienciaevidauolcombr ESFIEdicoes26artigo1017641asp Acesso em 31 jan 2012 4 INTRODUÇÃO À UNIDADE Você estudou na Unidade 1 as condições que possibilitaram o surgimento do povo grego e além disso o surgimento da Filoso fia grega Agora com base nesses pressupostos vamos iniciar nos sas investigações filosóficas sobre o fenômeno da Educação grega Esse estudo tem por objetivo apenas apontar em linhas ge rais o processo de formação do homem grego Por se tratar de um estudo complexo e muito denso não será possível neste modesto caderno de referência ir além de alguns tópicos que julgamos im portantes para se compreender a Educação atual O processo de formação dos gregos não é somente histórico mas também espiritual no sentido mais amplo dessa palavra con forme a obra Antropologia filosófica de E Cassirer que culminou no conceito do que hoje denominamos Humanidade A cultura grega assim como a romana constitui o berço da civilização ocidental Bastaria por exemplo examinarmos algumas das palavras do vocabulário da língua portuguesa para reconhe Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 72 cermos sua importância tais como democracia autonomia teoria entre outras Todas essas palavras têm origem grecoro mana O idioma grego é por sua estrutura uma língua filosófica A Filosofia foi como já sabemos desenvolvida pelos gregos síntese de sua genialidade e são poucos os que dominam o voca bulário filosófico específico ou seja somente no meio acadêmico podemos ter uma noção um pouco mais ampla do que essa pala vra significa Talvez uma vida inteira não seja suficiente para nos apropriarmos do seu sentido e este caderno tampouco o será Portanto o propósito deste CRC é nos aproximarmos um pouco de seu real significado e apontar o grau de complexidade que lhe é característico sem desmembrálo para não incorrermos na sua banalização e principalmente porque trilhar pela via filo sófica não é a opção mais fácil pois requer sempre muita leitura logo é um caminho para poucos como já havíamos dito anterior mente Por isso não podemos resumir ou mastigar Isso inviabi lizaria o conhecimento e o projeto filosófico Não trataremos os conceitos aqui implicados como nos dicionários mesmos os filosóficos pela simples razão de que o conhecimento oriundo deles é dado e não construído Por isso novamente fazemos referência à importância da leitura Da mes ma forma compreendemos que o ser humano e a Educação são projetos e portanto não estão acabados Utilizaremos como referência principal para a construção desta unidade a obra clássica de Werner Jaeger Paidéia a forma ção do homem grego Além disso examinaremos alguns conceitos importantes como Areté Agathós Aristós e Paideia 5 OS GREGOS E A EDUCAÇÃO Seguindo então pelo caminho apontado por Jaeger fare mos referências concisas baseandonos em sua própria obra e outras necessárias à compreensão do fenômeno educativo dos Claretiano Centro Universitário 73 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação gregos o qual marca de forma decisiva o contexto educacional con temporâneo Logo nas primeiras páginas Jaeger 1995 p 3 afirma sobre Educação Todo povo que atinge um certo grau de desenvolvimento sentese naturalmente inclinado à prática da educação Ela é o princípio por meio do qual a comunidade humana conserva e transmite a sua peculiaridade física e espiritual O que isso quer dizer A Educação seria apenas uma forma de perpetuar culturalmente o modo de ser pensar e agir de uma comunidade Seria apenas a conservação de seu modo de vida isto é sua existência social e espiritual Vejamos o que diz Jaeger 1995 p 34 a respeito disso Uma educação consciente pode até mudar a natureza física do Homem e suas qualidades elevandolhe a capacidade a um nível superior Mas o espírito humano conduz progressivamente à des coberta de si próprio e cria pelo conhecimento do mundo interior e exterior formas melhores de existência humana A natureza do Ho mem na sua dupla estrutura corpórea e espiritual cria condições especiais para a manutenção e transmissão de sua forma particular e exige organizações físicas e espirituais ao conjunto das quais da mos o nome de educação Na educação como o Homem a pratica atua a mesma força vital criadora e plástica que espontaneamen te impele todas as espécies vivas à conservação e propagação do seu tipo É nela porém que essa força atinge o mais alto grau de intensidade através do esforço consciente do conhecimento e da vontade dirigido para a consecução de um fim Como você pôde perceber nesse trecho o autor nos traz novos elementos para pensarmos o que seria então o significado que atribui para Educação Inicialmente ele nos apresenta a ideia de que a Educação pode vir a melhorar nossa natureza física ou seja ela não reproduz pura e simplesmente aquilo que já é e por outro lado ela acabaria por melhorar não somente esse aspecto físico pois por meio dela a própria existência humana viria a ser aprimorada Além disso Jaeger remete a uma energia vital que está pre sente em todos os seres vivos e que faz com que esses manifestem Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 74 em toda a sua plenitude aquilo que são Ora o ser humano dadas as características que possui e em especial a racionalidade acaba por possuir uma peculiaridade que vai além da mera manifestação anímica e segundo esse autor é exatamente na Educação que se manifestaria toda essa complexidade e grandeza humana Isso exposto podemos dizer que é por meio da Educação que temos o aprimoramento de todas as qualidades sejam elas físicas ou espirituais que nos caracterizam como humanos Conceito de Educação Das pistas fornecidas por Jaeger é possível então que realize mos juntos alguns questionamentos O que podemos entender sobre o conceito de Educação Esse conceito coincide com o que você já estudou ante riormente Outras disciplinas que você estudou apontaram para esta direção Para que comecemos a lidar com essas questões considera mos importante que lidemos com outro aspecto e esse se refere ao caráter individual e coletivo da Educação Devemos portanto exa minar a relação os laços entre a comunidade e o indivíduo isto é entre o coletivo e o particular no contexto próprio da Educação pois disso deriva a importância universal dos gregos como educadores Além disso não podemos perder de vista o conceito de cul tura porque é sobre ele que se assenta a estrutura da sociedade tal como é constituída imbuída de valores regras normas cren ças ritos linguagem comportamento nas artes na religião etc E notadamente marcada localizada e condicionada pelas noções de tempo e espaço Analise atentamente algumas indagações que podemos nos fazer relacionadas à Educação e identificação do conceito de cul tura na Grécia Claretiano Centro Universitário 75 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação 1 A Educação pertence a um indivíduo ou à comunidade 2 Para os gregos sua ênfase está na comunidade ou no indivíduo 3 Qual é a relação entre ambos nesse processo 4 Qual é a participação da Educação no crescimento e transformação da sociedade Essas questões representam os primeiros passos para identi ficar a origem do conceito de cultura na Grécia Buscamos a origem a arché o início o começo de tudo ou melhor tomando uma expressão do próprio Jaeger a fonte espi ritual Mas por que empreendermos essa busca essa arqueolo gia Por que os gregos Quais foram os fatores que contribuíram para sua formação para seu destaque em relação a outros povos nos diversos campos do conhecimento das Artes da Literatura e da Filosofia Por que o conceito de cultura é mais amplo do que comumente se fala sobre o conceito de cultura É óbvio que há uma distância entre o modo de vida atual e o do helenismo Estamos situados em um tempo e espaço dife rentes Temos um olhar diferente e isso pode dar margem a in terpretações equivocadas ou distorcidas Não podemos portanto examinálo por linhas ou concepções modernas principalmente no que tange à noção de indivíduo Então temos de pensar como a cultura grega ou em outras palavras um acontecimento está intimamente ligado ao contexto específico Considerando o distanciamento e tudo o que o conceito de cultura implica nós poderíamos entender e explicar esse tema tal como os gregos o fizeram Veja o que diz Jaeger 1995 p 78 a respeito disso Hoje estamos habituados a usar a palavra cultura não no sentido de um ideal próprio da humanidade herdeira da Grécia mas antes numa acepção bem mais comum que a estende a todos os povos da Terra incluindo os primitivos Entendemos assim por cultura a totali dade das manifestações e formas de vida que caracterizam um povo A palavra converteuse num simples conceito antropológico descri tivo Já não significa um alto conceito de valor um ideal consciente Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 76 Segundo Jaeger o positivismo é a corrente filosófica respon sável por essa percepção do conceito de cultura e da multiplicidade de culturas Préhelênicas e outras com base na ótica europeia Ainda segundo o autor é com os gregos que o ideal de cultu ra é estabelecido conscientemente como fundamento da formação integral do homem isto é a ideia de cultura é invenção grega Pre cisamos por essa razão buscar pelo seu sentido originário e essa jornada só é possível por meio de uma imersão em sua história Conforme havíamos estudado na unidade anterior não po demos associar o Ocidente e o Oriente na formação do que hoje denominamos Filosofia A Grécia é sem dúvida o berço da civiliza ção ocidental mas não a ponto de identificarmos a concepção de indivíduo clássica com a moderna Isso seria precipitação Foram os gregos que primeiro situaram o problema da indi vidualidade e a partir deles originaram discussões filosóficas so bre a subjetividade e a personalidade na Europa primeiramente em Roma e depois com o Cristianismo Discutese muito a originalidade e genialidade dos gregos Au tores como o próprio Jaeger admitem que é algo de sua própria natureza Tinham portanto uma concepção inata do conceito de natureza mediante o qual reconheciam as leis existentes nas pró prias coisas na realidade circundante Essa concepção de natureza é todavia orgânica uma vez que as partes são consideradas inte grantes de um todo organizado Por exemplo a arte a linguagem o pensamento os sentimentos as leis a oratória a retórica etc são dotados de princípios comuns Segundo Jaeger 1995 p 11 Até na oratória grega encontramos os mesmos princípios formais que vemos na escultura ou arquitetura Referimonos ao caráter plástico ou arquitetônico de um poema ou de uma obra em prosa Podemos usar ainda como exemplos as obras de Hesíodo e de Homero a fim de entender a percepção que tinham das leis que regem a natureza humana Aristóteles e Platão são outros exem plos caros da Filosofia maior criação do espírito grego Claretiano Centro Universitário 77 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação Jaeger 1995 p 12 diz que o povo grego é filosófico por natureza Acrescentamos que a própria língua grega é filosófica dada a sua estrutura intimamente ligada à arte e à poesia Perguntamos a esse respeito Da percepção das leis que go vernam a natureza humana derivam as normas que orientam a vida do cidadão e a estrutura da sociedade A razão está para o homem assim como a lei para a cidade Com relação à Educação podemos nos apropriar dos mes mos critérios e objetivos A Educação para os gregos pode ser também um processo de construção consciente Qual é a essência da Educação Há um elemento comum a tudo isso uma visão antropocên trica Em que consiste tal concepção Examinemos a arte a reli gião a Filosofia e até o campo da política dos helenos o que há de comum entre esses aspectos A forma humana Por essa razão podemos dizer que o princípio espiritual dos gregos é o Humanismo Humanismo vem de humanitas Pelo menos desde o tempo de Varrão e de Cícero esta palavra teve ao lado da acepção vulgar e primitiva de humanitário que não nos interessa aqui um segundo sentido mais nobre e rigoroso Significou a educação do Homem de acordo com a verdadeira forma humana com o seu autêntico ser Tal é a genuína Paidéia grega considerada modelo por um homem de Estado romano JAEGER 1995 p 14 A forma humana a que nos referimos é a ideia de Homem ou ainda o processo educativo isto é de formação dos gregos que se deu pelo ideal de Homem que elaboraram Pelas razões aqui apresentadas obrigamonos a buscar os fundamentos da Educação na antiguidade clássica 6 NOBREZA E ARETÉ Com o mesmo subtítulo da obra Paidéia a formação do ho mem grego de Werner Jaeger objetivamos revelar a mesma temá tica Tratase da relação entre a nobreza e o conceito de Excelência Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 78 Transcrevemos a seguir um trecho significativo da obra na tentativa de definir e de expressar a essência da Educação Diz o autor A educação é uma função tão natural e universal da comunidade humana que pela sua própria evidência leva muito tempo a atin gir a plena consciência daqueles que a recebem e praticam sendo por isso relativamente tardio o seu primeiro vestígio na tradição literária O seu conteúdo aproximadamente o mesmo em todos os povos é ao mesmo tempo moral e prático Também entre os Gregos foi assim Reveste em parte a forma de mandamentos como honrar os deuses honrar pai e mãe respeitar os estrangei ros consiste por outro lado numa série de preceitos sobre a moda lidade externa e em regras de prudência para a vida transmitidas oralmente pelos séculos afora e apresentase ainda como comuni cação de conhecimentos e aptidões profissionais a cujo conjunto na medida em que é transmissível os Gregos deram o nome de te chne Os preceitos elementares do procedimento correto para com os deuses os pais e os estranhos foram mais tarde incorporados à lei escrita dos Estados Gregos na qual não se fazia distinção entre a moral e o direito e o rico tesouro da sabedoria popular mesclado de regras primitivas de conduta e preceitos de prudência enraiza dos em superstições populares chegava pela primeira vez à luz do dia através da antiqüíssima tradição oral na poesia rural gnômica de Hesíodo JAEGER 1995 p 23 O que podemos inferir da citação sobre os conceitos de Edu cação e do processo de formação do homem São a mesma coisa Educação e formação são sinônimos Primeiramente devemos ter em mente que são termos his toricamente distintos São conceitos cujas origens se divergem Segundo Jaeger Educação é o processo do qual não se tem ainda a plena consciência tanto com relação a quem educa quan to a quem é educado Seu conteúdo é comum tanto para os gregos quanto para os demais povos isto é revestese de caráter moral na forma de mandamentos proibições sanções interditos puni ções etc como honrar pai e mãe honrar os deuses etc Mas como são transmitidos Como é veiculado o conteúdo desse sentido de Educação A resposta é oralmente Claretiano Centro Universitário 79 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação Desse modo com o tempo as regras ou seja as normas ne cessárias para a conservação da comunidade foram incorporadas às leis do Estado Isso ocorreu pelo menos até o século 9º aC aproximada mente quando nasce a literatura grega com as epopeias Ilíada e Odisséia do poeta Homero Vamos refletir mais um pouco com base nos fatos históricos e na etimologia da palavra epopeia Historicamente as epopeias de Homero evocam o marco re ferencial dos ideais educativos entre os gregos Esses ideais corres pondem ao conceito de Areté e somente mediante esse podere mos nos aproximar da significação e da importância da Paideia As obras citadas anteriormente retratam o passado dos reinos egeus um dos povos juntamente com os dórios e jônicos que contri buiu para a formação do que hoje denominamos Grécia Por questões de ordem didática trataremos com detalhes nesse momento o conceito de Areté importantíssimo para a fun damentação da Paideia grega A novidade da Areté grega Inicialmente podemos dizer que Areté e Aristós são palavras que têm a mesma raiz no grego Aristós traduzse por melhor vencedor ou ainda heroísmo coragem valentia Gostarí amos de chamar sua atenção para o fato de que em todos esses significados está presente a ideia de qualidade ou seja uma ca racterística que nos permite afirmar que isso ou aquilo se reveste de elementos positivos que o tornam passíveis de serem elogiados Dito de outro modo podemos dizer que há subjacente a todas as interpretações etimológicas dessa palavra a ideia de Excelência Mas o que se pode entender por Excelência Vejamos as considerações apresentadas por Patrício 2008 p 287 Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 80 Excelente é o que é bom É o que é muito bom É o que é tão bom que não pode ser melhor Ser melhor seria exceder o potencial de ser daquilo que é o sujeito da excelência Excelente é pois o suma mente bom na ordem de ser de determinada coisa coisa ou pes soa ou acção pensamento sentimento desejo ou vontade Por isso se pode dizer com inteiro acerto que excelente é o perfei to o distinto o magnífico É pois a excelência a qualidade do que é excelente perfeito sumo no seu ser Pensemos juntos a ideia de heroísmo Nela temos uma si tuação em que a pessoa acaba por agir de determinada maneira que faz com que a consideremos heroica Ou seja essa pessoa fez algo inusual e ao fazêlo revestiuse de qualidades que nos leva ram a elogiála Nesse sentido consideramos importante outra considera ção apresentada por Patrício 2008 p 287 grifo nosso e essa é A ideia de ser superior a implica a comparação de uma entidade com outra A comparação implica ela própria a excelência na pure za da sua ideia Nesta a excelência de uma entidade é a coincidên cia plena dessa entidade consigo própria Mas há evidentemente a excelência em si É com ela que a excelência de toda a entidade é comparada por ela aferida Há pois entidades mais excelentes do que outras A raiz da excelência é de natureza ontológica A exce lência definese pelo ser não pelo ter Observe que o autor nos informa que existiria uma ideia de Excelência em si a partir da qual se realiza uma comparação ou seja estabelecese um parâmetro para que possamos verificar o quanto o sujeito ou coisa comparada se aproxima dela Assim a Ex celência acaba por ser um processo não nascemos com ela pois não a temos como propriedade mas nos aproximamos dela paulati namente e com tal exercício passamos a vir a ser excelentes Pensemos juntos como isso se aplicaria em nossas vidas Convidamos você a realizar o seguinte exercício analisese e veri fique suas capacidades quais delas você considera importantes e o tornam melhor em algo ou ainda perguntese quais são as qua lidades que se você adquirisse fariam com que viesse a se sentir Claretiano Centro Universitário 81 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação pleno realizado ou para usar os termos com que estamos lidando você se sentiria melhor ou excelente Ao fazer esse exercício você começa a estabelecer uma ideia daquilo que você considera como excelente e valoroso ou para fa zermos uso da terminologia grega você acaba por começar esta belecer qual seria a sua Areté Do que foi dito é possível então que caminhemos um pouco mais e analisemos o desenvolvimento desse significado ao longo da história grega pois como mostraremos a seguir a definição da quilo que seria a Areté sofreu profundas mudanças ao longo do processo de construção da cultura grega antiga Inicialmente podemos dizer que como vimos na Unidade 1 deste CRC o povo grego no período homérico era educado tendo como elemento de referência as produções de Homero e Hesíodo e nesse sentido qual seria as qualidades que estavam presentes nessas obras e em especial na obra de Homero 7 A ARETÉ HOMÉRICA Para darmos conta da Areté nas obras de Homero convida mos você a analisar as seguintes considerações apresentadas por Vilanou É claro que os gregos com Homero à frente inventaram a civi lização européia ao destacar a importância do indivíduo que se definia pela areté quer dizer por sua excelência pessoal Deste modo Homero colocou as bases do humanismo europeu porque suas obras a Ilíada e a Odisséia tem definido a origem de uma vida que destaca um catálogo de virtudes morais e espirituais que teriam como sucedeu com todo o helenismo o objetivo de pro mover a dignidade do ser humano Tanto é assim que a Paideia equivale a um processo educativo que encaminha os homens até a virtude Areté entendida como sinônimo de excelência humana VILANOU 2001 p 3 Nesse trecho além da ênfase à importância de Homero existe também o trato com o conceito de Paideia mas neste Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 82 momento não é necessário que você se dedique a analisar essa vinculação entre Paideia e Areté pois abordaremos essa análise em breve mas que tenha alicerçado a ideia de que Homero com as obras citadas apresenta um catálogo de virtudes ou melhor um catálogo de Excelências Areté que seus personagens devem possuir ou adquirir Bem e o que seria então essa Areté proposta por Homero Vejamos algumas considerações apresentadas por Jaeger 1995 p 28 a respeito dos conceitos de Areté e Aristós usadas naquele período Derivam ambos da mesma raiz regemse por normas certas de conduta alheias ao comum dos homens O código da nobreza ca valheiresca tem assim uma dupla influência na educação grega Dela herdou a ética posterior da cidade como uma das mais altas virtudes a exigência da coragem cuja designação posterior viri lidade recorda claramente a identificação homérica da coragem com a Areté varonil Gostaríamos de chamar sua atenção para algumas palavras chave neste texto tais como nobreza normas de conduta e além disso coragem Na obra homérica é excelente aquele que prima por buscar desenvolver e realizar essas características Contudo há de ter especial cuidado com esses termos pois a forma como eles são usados naquele período divergem radicalmente da for ma como lidamos com esses conceitos na atualidade Tomemos como exemplo o conceito de nobreza para Jaeger 1986 p 20 na proposta homérica homem nobre é aquele que na vida privada como na guerra regese por normas certas de conduta alheias aos comuns dos homens Para que você possa perceber como se manifesta esse pro cesso de superação em relação ao comum dos homens pensemos por exemplo na obra Ilíada Nela temos dois personagens Aqui les e Ulisses e ambos embora adotem posturas diferentes nem por isso deixam de superarse em busca de uma Excelência Espe cificamente em Aquiles temos o guerreiro sublime amante da glória mas que não hesita em sacrificar a vida para não perder a Claretiano Centro Universitário 83 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação honra Como se percebe nesse personagem está presente a co ragem inclusive correndo o risco de perder sua própria vida pois assim agindo ele se mantém honrado Por outro lado temos segundo Jaeger 1986 p 9 a antí tese de Aquiles manifestada no personagem Ulisses que serviria para aqueles a quem a virtude de Aquiles pudesse desencorajar um pouco existia outro modelo aparentemente mais acessível e mais utilizável o fino o engenhoso Ulisses o homem dos mil truques o vivo sempre capaz de safarse de uma dificuldade perfeito exemplo do saber viver e em todo caso de esperteza a virtude heróica é completada pela sabedoria prática Para que você possa entender de que forma esses ideais de Excelência eram valorizados vale dizer que para os nobres desse período ou como diriam os gregos para os Aristós era desejável que se morresse jovem em batalha para que seus feitos e sua co ragem fossem cantados pelos seus pares por outro lado ter uma vida longa poderia significar que a pessoa não buscou a contento sua Areté Quem discordasse de tais ideais eram afrontados e me nosprezados Para exemplificar essa condição vejamos a seguir uma con sideração apresentada por Aristóteles e que a sua maneira iden tifica a plenitude daquele que realiza sua Areté Quem está impregnado de autoestima deseja antes viver um breve período no mais alto gozo a passar uma longa existência em indolente repouso prefere viver só um ano por fim nobre a uma vasta vida por nada escolhe antes executar uma única ação grande e magnífica a fazer uma série de insignificâncias ARISTÓTELES apud JAEGER 2001 p 3536 Como se percebe o entendimento que Jaeger atribui para a palavra Areté advindas da produção homérica não pode ser con fundida com virtude no sentido moral No grego sua significação ultrapassa as preocupações de ordem moral ou ética que esse úl timo poderia engendrar Pode até ser que a Areté tenha algumas vezes essa conotação mas não representa seu sentido originário Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 84 O significado de Areté portanto no uso da linguagem nas obras homéricas ressalta a coragem como principal característica do herói Esta é sua Excelência Muito provavelmente estas informações que estamos lhe apresentando talvez estejam lhe surpreendendo em razão de que na contemporaneidade como veremos em discussões futuras não se prima por muitos desses elementos de Excelência Independen te deste aspecto é importante que frisemos a originalidade e a importância da obra homérica pois ela acaba por apresentar ao indivíduo que a ouve um convite para sua autossuperação a busca por uma Excelência e deposita nesse exercício um sentido para a vida de quem se inicia neste desafio e será avaliado tendo em vista estes parâmetros de Excelência Com os elementos apresentados sobre Homero considera mos possível avançarmos um pouco mais Vamos lidar agora com a proposta de Areté presente na obra de Hesíodo 8 A ARETÉ EM HESÍODO Conforme o que havíamos discutido na Unidade 1 Homero e Hesíodo acabaram por encaminhar a formação cultural do povo grego No entanto há de se apresentar algumas diferenças impor tantes sobre essas duas grandes personalidades Enquanto Homero acabou por contribuir com um ideal de Areté que encontrou ressonância sobretudo na elite grega que via na figura do herói guerreiro um ideal de nobreza que propi ciaria a Excelência Hesíodo acabou por apresentar uma proposta de Excelência voltada para uma população que não tinha no ideal cavalheiresco um parâmetro para suas vidas pois enquanto este ideal era possível apenas para uma pequena parcela da população que podia se dedicar a esses ideais existia outra parcela da popu lação que se dedicava apenas ao trabalho Claretiano Centro Universitário 85 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação Nesse sentido podemos dizer que enquanto em Home ro temos um ideal de Excelência dos nobres Hesíodo acaba por apresentar uma proposta de Excelência volta para aqueles que se dedicam exclusivamente ao trabalho sobretudo no campo Há em Hesíodo um esboço de proposta ética onde é valo roso e bom o indivíduo que trabalha e assim o faz com retitude e por outro lado aquele que se dedica ao ócio ou às injustiças acabaria por se afastar da Excelência Dito de outro modo pode ríamos dizer que em Hesíodo é possível fazer uma releitura de um velho adágio popular de o trabalho dignifica o homem para o trabalho proporciona a Excelência ao homem Em razão disso concordamos com Jaeger apud GOERGEN 2006 p 193 quando afirma que com Hesíodo Não apenas a luta do herói guerreiro contra o inimigo no campo de batalha mas também a silenciosa e renhida luta do homem traba lhar com a terra dura e as adversidades do tempo tem seu heroís mo e gera habilidades que são de valor perene para o ser humano Essa nova proposta de Areté acaba por trazer uma série de questões importantes para pensarmos juntos isto porque segun do Pedro Goergen 2006 p 193 enquanto na proposta Homérica temos um elogio ao herói guerreiro e consequentemente um elo gio à disputa e ao combate ao que os gregos chamam de agonis mo em Hesíodo há uma ênfase a valores tais como a dike justiça em detrimento da Hybris injustiça Com isso há de se considerar uma questão interessante se antes tínhamos o combate físico de candidatos a heróis em Hesíodo temos o combate de ideias em torno de valores Este aspecto é importante pois a discussão des tes valores como veremos em breve irão influenciar sobremanei ra os desdobramentos posteriores da cultura grega pois segundo Goergen 2006 p 193 a dike e a hybris estão presentes lado a lado como duas possibili dades dentre os quais o homem tem que escolher Surgem assim as condições primeiras de liberdade e autonomia do homem oci dental Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 86 O termo dike é utilizado na cultura grega antiga para se referir ao espírito moral de um julgamento justo onde se obedeciam as normas e as regras sociais Atualmente se refere ao conceito de justiça moral O termo hybris foi utilizado na Grécia antiga para se referir as ações do indivíduo que provocam humilhação e vergonha na ví tima e por outro lado gratificação ao autor dos abusos Foi con siderado também um termo legal para se referir a determinados crimes Atualmente é associado a arrogância descontrole etc Um exemplo da abordagem de Hesíodo relativa a estes as pectos pode ser percebido no excerto a seguir apresentado por Jaeger É fácil alcançar a miséria O caminho é desimpedido E ela não mora longe Os deuses imortais porém puseram o suor antes do êxito A senda que a ele conduz é íngreme e comprida e de início penosa No entanto quando tiveres chegado ao cimo tornase fácil apesar de sua aspereza HESÍODO apud JAEGER 1995 p 6869 Com isso consideramos que já existem elementos suficien tes para avançarmos um pouco mais e lidarmos com um elemento extremamente vinculado a Areté e que é o centro de nossa discus são referimonos ao conceito de Paideia 9 A PAIDEIA GREGA No início desta unidade vimos uma série de elementos vin culados ao conceito de Educação Apresentamos de forma um tanto quanto sucinta questões referentes à Educação e formação Educação e cultura indivíduo e sociedade e por fim o homem e a Educação No entanto muitos aspectos de nossa argumentação ficaram como que suspensas no ar pois para tratar adequada mente dos mesmos era necessário que houvesse a apropriação do conceito de Areté e em razão disso lhe foi apresentado o con ceito de Areté em Homero e Hesíodo Claretiano Centro Universitário 87 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação Agora considerando que tenhamos conseguido lidar a con tento com o conceito de Areté podemos finalmente iniciar uma análise do conceito de Paideia Para começarmos analisemos o conceito de Educação Este termo é segundo a etimologia da palavra um substan tivo feminino de origem latina educatio Pode ser traduzido por criar instruir cuidar nutrir produzir tratar É uma ação que se es tende não somente ao ser humano mas também a animais plan tas e ao cultivo da terra É uma ideia bastante abrangente Por outro lado Paideia é a palavra grega que corresponde ao termo latino e implica outro pais paidós isto é crianças Esse termo possui o mesmo radical do verbo paideúo que se traduz por ensinar instruir criar e se aplica de forma tão ampla quanto o vocábulo latino Em grego há ainda outro verbo trophé que se traduz por criação e referese ao período em que a criança está sob os cui dados da mãe ou da família pelo menos até os sete anos A Pai deia corresponde portanto ao período de formação propriamen te dito em que a criança inicia seus estudos primários e nos quais aprenderá a ler escrever e também a música O que a criança aprendia quando estava sob a supervisão e orientação da mãe ou da família A que classe social se refere quando tratamos deste assunto Sabemos que em Atenas por exemplo somente dez por cento da população era considerada cidadã nas decisões políticas As mulheres crianças escravos e estrangeiros não tinham direitos Mas isso tem alguma relação com a Educação Essa Educação se direcionava a todas as crianças sem distinção de classe social po lítica ou econômica Continuemos nossa reflexão Esse caminho será bem sinuo so Vamos lá Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 88 Podemos denominar então seguindo o raciocínio de Jaeger que o entendimento atual do conceito de Educação é bem diferen te do que foi proposto pelos gregos na Antiguidade e portanto fundamento do processo educativo Vamos associar algumas ideias Considere os seguintes fatos Nos dias de hoje uma criança inicia sua vida escolar bem cedo Devido às condições socioeconômicas a maioria das mães precisa trabalhar fora de casa A própria estrutura familiar é diferente A figura paterna já não representa o centro da família Muito frequentemente ocorre a constituição de uma nova família com outros pais que não os biológicos moti vada pela separação divórcio ou desestruturação familiar ocasionada por diversas razões As próprias condições de trabalho atualmente obrigam tan to o pai quanto a mãe a ficar muito tempo fora e longe do convívio com os filhos Não nos esqueçamos de que a figura da mãe é central na Educação do ser humano É ela quem primeiro transfere os con teúdos e bens simbólicos da cultura para o filho ou filha na fase inicial de sua infância O primeiro contato então com a cultura se dá por meio da mãe pelos valores mandamentos que nortea rão sua vida seu comportamento em sociedade Daí que surge um questionamento é a cultura que faz o homem ou é o homem que faz a cultura Parece que por diversos motivos nos perdemos dos pressu postos básicos da Educação Paideia que como já havíamos dito anteriormente foi mérito do povo helênico Jaeger nos ensina que seu registro surgiu somente no século 5º aC na obra Sete contra Tebas de Ésquilo e significava apenas criação de meninos Claretiano Centro Universitário 89 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação Quando nos referirmos à formação distinta historicamente da palavra educação na perspectiva do homem grego da Anti guidade constatase que a Areté está relacionada ao ideal de ho mem que se pretende formar Levados pela significação da palavra formação originaria mente podemos incorrer em equívocos formar no dicionário da língua portuguesa está vinculado à Educação mas já havíamos feito essa observação acerca dos problemas que esse tipo de con sulta pode acarretar Formação no sentido específico da palavra indica o pro cesso de educação ou de civilização e ao mesmo tempo implica um conceito mais amplo que é o de cultura Tal formação não será no entanto bemsucedida ou cons ciente se não atender a algumas condições a saber que a imagem desse homem que se deseja formar seja revestida de Beleza Mas alertamos novamente que não se trata do sentido de beleza física valor que nossa cultura adotou Tratase nesse caso do conceito universal e absoluto de Beleza que não se reduz às percepções que temos do mundo Seu sentido não passa por transformações é portanto imutável Esta formação não é possível sem se oferecer ao espírito uma ima gem do homem tal como ele deve ser A utilidade lhe é indiferen te ou pelo menos não essencial O que é fundamental nela é o καλόν isto é a beleza no sentido normativo da imagem desejada do ideal JAEGER 1995 p 24 A formação referese ao Homem no sentido integral isto é tanto do ponto de vista exterior de seu comportamento quanto de sua atitude interior Esse Homem integral que se pretendia formar isto é aquilo que deveria ser era resultado de um processo de disciplina Veja mos como este καλόν está presente na Areté homérica Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 90 A Paideia em Homero No princípio se tomarmos como exemplos as epopeias de Homero poderemos notar que a Areté está intimamente relacio nada à aristocracia cavalheiresca Vemos nas figuras de Heitor Aquiles e Ulisses exemplos clássicos É da nobreza grega portanto que nasce esse ideal de homem e que modela o mundo aristocrá tico à sua própria imagem A Areté designa nas obras do poeta Homero não somente a Excelência dos seres humanos mas também dos deuses Os es cravos não têm Areté O que nos leva à conclusão de que a Areté homérica como o próprio Jaeger já havia nos revelado é atributo somente da nobreza ou da aristocracia O sentido de dever é nos poemas homéricos uma característica essencial da nobreza que se orgulha por lhe ser imposta uma me dida exigente A força educadora da nobreza reside no fato de des pertar o sentimento do dever em face do ideal que deste modo o indivíduo tem sempre diante dos olhos JAEGER 1995 p 28 É importante você entender que Primeiro o herói é dotado de qualidades naturais natas porque descende de uma longa linhagem de homens ex celentes Segundo essas qualidades ou virtudes devem ser exerci tadas e potencializadas mediante um rígido processo de disciplina conquistando sua Areté mas cujo prêmio será alcançado somente na luta na rivalidade entre seus pa res em tempos de paz ou de guerra na demonstração de sua coragem bravura e sua destreza guerreira em campo de batalha na morte ou em sua vitória A Ilíada está repleta de exemplos dessa consciência educa dora da aristocracia grega cavalheiresca Jaeger 1995 p 30 ob serva que Não foi sem razão que os gregos posteriores viram nestes versos a mais antiga formulação do ideal de formação grego no seu esforço para abranger a totalidade do humano Citaramno com freqüência Claretiano Centro Universitário 91 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação num período de cultura refinada e retórica para louvar a alegria da ação dos tempos heróicos e opôla ao presente pobre de ações e rico de palavras Mas pode também ser citado por outro lado para demonstrar a feição espiritual da antiga cultura aristocrática Outro aspecto de fundamental importância que os heróis gregos aspiravam era a honra que é a expressão da medida da Areté e o fundamento da ordem social É o reconhecimento públi co de seu valor durante um conflito Lembremonos de Aquiles aos portões de Troia chamando por Heitor Tanto um como outro são orientados pelos valores cul turais de seu tempo e nenhum dos dois poderia se esquivar des se compromisso quiçá um compromisso moral inadiável Heitor mesmo sabendo que estava diante do maior guerreiro grego e que suas chances eram praticamente nulas no combate enfrentouo Sua morte no entanto não o desabonou ao contrário aperfei çoou sua Areté heroica Eis um exemplo de honra Segundo Patrício 2008 outros autores daquele período so maramse a Homero em uma proposta de Paideia voltada para a aristocracia e cuja ênfase está voltada sobretudo para o heroísmo e para a honra Dentre esses outros autores Patrício cita os poetas Tirteu e Píndaro Com relação a Tirteu apud PATRÍCIO 2008 p 291 vamos observar um trecho de sua poesia E ainda que fosse mais belo que Titono e mais rico do que Midas e Cimiras mais régio que Pélops filho de Tântalo e dotado de uma língua mais lisonjeira que Adrasto se tivesse todas as glórias do mundo mas não possuísse o valor guerreiro não quereria honrá lo Não dará boas provas de si na luta se não for capaz de encarar a morte sangrenta na peleja e de lutar corpo a corpo com o adver sário Isto é aretê Quanto a Píndaro esse é o poeta do elogio à superação he roica conduta típica da Areté aristocrática o poeta que dentre outras coisas nos aconselha que nossa alma não busque a vida imortal mas que esgotemos o campo do possível Para Patrício 2008 p 291 Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 92 Píndaro é o poeta do ideal aristocrático Nobre é o que é de sangue não de formação é o que pensa Píndaro A aretê encontrase no sangue Ou seja o nobre é nobre não deveio nobre pela formação ou aprendizagem A nobreza é inata não adquirida Essa abordagem que Patrício nos apresenta em relação a Píndaro é importante pois ela vai ser muito discutida futuramente ao pensarmos se é possível ou não ensinarmos qualquer pessoa independente de sua origem ou característica Do que foi dito existem outros desdobramentos da Paideia homérica que necessi tam ser visitados por nós e para tanto verifiquemos a seguir as considerações apresentadas por Goergen 2006 p 185 Mas a influência educativa de Homero não se limitou apenas a esta descrição do comportamento de heróis como Aquiles e Ulisses que deveriam ser modelo de virtude e serem imitados por todos A ou tra face de sua influência tão importante quanto a anterior é o lado estético de sua arte poética Sua poesia tornouse o modelo de beleza estética Se as virtudes de seus heróis eram o modelo do comportamento moral a sua poesia era o modelo do compor tamento estético Aliás estes dois aspectos a ética e a estética não devem ser vistos como dois elementos separados mas como as duas faces do ideal de ser humano o homem belo e bom As sim de certo modo já está presente em Homero aquilo que seria a grande busca e conquista dos gregos a elaboração de um ideal de ser humano Como se percebe valor e beleza elementos caros à ética e à estética são apresentados por Goergen como presentes na Paideia homérica e é importante que você os tenha em mente pois em breve lidaremos com eles quando formos tratar dos conceitos de Agathós e Kalós Agora convidamos você a analisar a Paideia em Hesíodo 10 A PAIDEIA EM HESÍODO Embora a importância de Homero para a construção de uma Paideia alicerçada nos ideais da Areté seja um fato que muitas vezes apresentamos ao longo desta unidade é necessário ainda que tratemos de Hesíodo pois Claretiano Centro Universitário 93 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação A poesia de Hesíodo permitenos perceber que a formação grega não se deu apenas a partir da nobreza e seu fermento espiritual mas que teve a importante contribuição de outras camadas popu lares Colocando a força de sua poesia a serviço dos valores da vida rural e do campo e trazendo estes valores à luz do dia integrouos ao processo de formação da nação grega GOERGEN 2006 p 194 Bem como se daria essa manifestação da Areté em Hesío do Sobretudo pelo uso em sua poesia de metáforas com grande apelo educativo nelas está presente a proposta de trocar o em bate de armas pelo embate de ideias com a realização de justiça como pano de fundo Há assim uma ênfase com relação à Educa ção para os valores em Hesíodo Segundo Goergen 2006 p 194 É mérito de Hesíodo ter introduzido este aspecto ideal que se apre senta como elemento de congruência no mundo disperso de então Tratase da idéia do direito Tal como Homero conta a luta dos seus heróis como um drama de deuses e homens Hesíodo relata o em bate jurídico como uma luta entre forças terrestres e divinas pela vitória do direito e da justiça Homero idealizava a virtude do nobre e colocou no centro de seu modelo educativo a idéia de poder He síodo idealizou o homem trabalhador do campo e pôs no centro de seu modelo a idéia de justiça Com essas últimas considerações apresentadas por Goergen podemos avançar um pouco mais na caracterização da Paideia em Homero e Hesíodo e para tanto vamos analisar o conceito de Kalokagathia 11 A PAIDEIA NO PERÍODO HOMÉRICO KALOS E AGATHÓS Após a análise de algumas das peculiaridades da Paideia em Homero e Hesíodo vamos agora tratar com vocês a análise de dois conceitos que consideramos cruciais para sintetizar essa visita pa norâmica pelo conceito de Paideia na Grécia homérica estamos nos referindo a Kalokhagatia ou mais precisamente Kalós e Agathós Para acompanhar nossas afirmações sobre esse tema utili zaremos uma dissertação produzida por Geoffrey Coad pesquisa Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 94 dor da Universidade de Notre Dame Austrália isso porque seu tema de pesquisa foi especificamente o desenvolvimento da no ção de Kalós e Agathós de Homero até Aristóteles Para começarmos a análise desse tema vamos lidar inicial mente com a etimologia do conceito de Kalokhagatia ele é com posto de dois adjetivos o primeiro é Kalós καλός ou belo e o se gundo é Agathós άγαθός bom ou virtuoso ambos combinados com a crase kaie e com isso temos o adjetivo Kalokhagatos que traduzido para o português corresponde ao belo e bom Esse conceito foi inicialmente usado por Heródoto e Aris tóteles e referese aos poetas épicos que tratamos Em síntese podemos dizer que esse adjetivo buscaria exemplificar a Areté do período homérico que irá definir a Paideia daquele período Especificamente em Homero o termo Agathós está es treitamente vinculado ao conceito de Areté que já estudamos ou seja se disséssemos que alguém é Agathós certamente essa pes soa seria nobre corajosa hábil e astuta COAD 2006 p 19 Quanto ao conceito Kalós vejamos a seguir algumas consi derações apresentadas por Coad 2006 p 21 Outro termo grego de valor nos tempos homéricos é kalós Este aparentemente nunca teve significado alguma indicação de clas se em Homero Ele foi um predicado geral de beleza e foi usado para homens mulheres e coisas sempre com o mesmo significado Este parece ter se referido à aparência física externa kalós igual o seu já mencionado cognato kalon se adere a pessoacoisa como é percebida Por exemplo uma mulher de extrema beleza é kala não importa se ela é cruel aos seus servos ou não Enquanto ela cumpre sua função social ela permanece kala Como se percebe não existe nenhuma associação moral ou ao fato de se possuir conhecimento para que a pessoa seja con siderada como bela Bem e quanto a Hesíodo Aquilo que já lhe apresentamos certamente poderia lhe fornecer pistas para res ponder a essa questão isso porque segundo Coad 2006 p 42 Assim como Homero empregava termoschave de valor assim tam bém foi com Hesíodo A diferença essencial no mundo hesiodiano Claretiano Centro Universitário 95 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação foi que não havia desculpas fictícias O único caminho para o su cesso era um trabalho árduo Ninguém tinhao como um direito de nascença Qual seria então o Ágathos em Hesíodo Embora esse poe ta faça uso de vários termos para tratar dessa adjetivação segun do Coad 2006 p 47 No mundo de Hesíodo um homem não pode alcançar a fama e renome arete a menos que seja mestre em seu ofício Ele tam bém deve ser um membro responsável na comunidade e em sua família através do exercício das virtudes marcadamente diferente da narrativa recebida pela proposta homérica Observamos que as diferenças entre as duas propostas são extremamente distintas se em Homero temos um Agathós voltado para o nobre o Aristós e consequentemente passou a ser usado para se cunhar uma forma de governo onde o poder está para o melhor aristocracia manifestado na imagem do herói belo e guer reiro Em Hesíodo temos uma proposta que vincula o Agathós ao trabalho e ao exercício de valores justiça generosidade etc A proposta de Homero serviu sobretudo para justificar o poder e educar a elite grega que se manteve no poder naquele período Por outro lado na proposta de Hesíodo temos uma tenta tiva de valorizar outros elementos que não os defendidos por essa mesma elite e que se vinculava aos valores presentes na vida das classes menos favorecidas Podemos concluir a partir desses elementos que do ponto de vista político os defensores da Kalokagathia homérica prevale ceram no poder e apresentaram os sustentáculos ideológicos que justificavam esse mesmo poder Do que foi dito podemos finalizar esta unidade retomando e ressaltando a importância dos vários conceitos aqui apresentados O primeiro aspecto se refere à Areté série de valores que passam a despontar na literatura da Grécia homérica apreciados de tal forma que devem ser buscados por seu povo Os textos des sa literatura acabam por fornecer uma finalidade à Educação que Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 96 cria um ideal de formação a Paideia para que esses valores sejam alcançados Em Homero encontramos um ideal de formação vincu lado à Kalokhagatia beleza e virtudes guerreiras e em Hesíodo encontramos uma apologia ao trabalho e às virtudes morais A partir desses elementos e da originalidade da Paideia po dem ser feitas alguns questionamentos no sentido de refletirmos a Educação contemporânea No mundo contemporâneo existe um ideal de Excelência para a construção pessoal Se houver a Educação da atualidade vinculase a esse ide al e apresenta uma proposta de formação para que esse ideal seja atingido Coragem beleza habilidade astúcia trabalho e justiça compõem alguns dos elementos pelos quais temos apre ço e que nos convidam ao exercício de uma Paideia Essas são algumas questões importantes para que você pos sa contextualizar os temas tratados nesta unidade com as aborda gens pedagógicas contemporâneas Para que possa aprofundar os conhecimentos adquiridos nesta unidade o convidamos a realizar as questões apresentadas a seguir 12 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS Sugerimos que você procure responder discutir e comentar as questões a seguir que tratam da temática desenvolvida nesta unidade Confira a seguir as questões propostas para verificar seu desempenho 1 Com base na leitura atenta das citações a seguir identifique a alternativa correta Hoje estamos habituados a usar a palavra cultura não no sentido de um ideal próprio da humanidade herdeira da Grécia mas antes numa acepção bem mais comum que a estende a todos os povos Claretiano Centro Universitário 97 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação da Terra incluindo os primitivos Entendemos assim por cultura a totalidade das manifestações e formas de vida que caracterizam um povo A palavra converteuse num simples conceito antropológico descritivo Já não significa um alto conceito de valor um ideal consciente JAGER 1995 p 78 Segundo Jaeger 1995 os gregos deram o nome de paidéia a to das as formas e criações espirituais e ao tesouro completo da sua tradição tal como nós o designamos por Bildung ou pela palavra latina cultura Daí que para traduzir o termo paidéia não se pos sa evitar o emprego de expressões modernas como civilização tra dição literatura ou educação nenhuma delas coincidindo porém com o que os gregos entendiam por paidéia Cada um daqueles ter mos se limita a exprimir um aspecto daquele conceito global Para abranger o campo total do conceito grego teríamos de empregá los todos de uma só vez JAEGER 1995 p 1 Na sua abrangência o conceito de paidéia não designa unicamente a técnica própria para desde cedo preparar a criança para a vida adulta A ampliação do conceito fez com que ele passasse também a designar o resultado do processo educativo que se prolonga por toda vida muito além dos anos escolares A paidéia vem por isso a significar cultura entendida no sentido perfectivo que a palavra tem hoje entre nós o estado de um es pírito plenamente desenvolvido tendo desabrochado todas as suas virtualidades o do homem tornado verdadeiramente homem MARROU 1966 p 158 a A Educação para os gregos estava relacionada à Areté que quer dizer virtude relacionada à moral e á ética b Areté e Aristós são palavras que têm a mesma raiz no latim Aristós signi fica vencedor força heroísmo coragem valentia c Os gregos acreditavam na educação integral Paideia por isso transmi tiam a Areté a todos d A palavra Areté é o superlativo da palavra Agathós que significa bom nobre sincero corajoso valente e Só a Aristocracia pode alcançar a Areté pois descende de uma linhagem de homens excelentes 2 Qual das palavras a seguir seria a melhor tradução para a palavra grega Areté a Justiça b Cuidado c Dever d Excelência e Valores Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 98 3 Hesíodo traz uma série de contribuições interessantes para o entendimento do conceito de Areté e dentre essas há de se destacar a A ênfase nos valores cavalheirescos de coragem e nobreza b A vinculação da Kalokagathia com a beleza das formas e da justa medida é sobremaneira valorizada nas obras de Hesíodo c Uma proposta que vincula o Agathós ao trabalho e ao exercício de valo res justiça generosidade etc d A valorização dos valores presentes entre a nobreza aristocrática em de trimento dos valores presentes no homem do campo e O entendimento de que o guerreiro munido da coragem traz consigo o que há de melhor na Excelência humana 4 Indique a alternativa que apresenta inadequadamente algumas das carac terísticas da Paideia a Na antiga Grécia esse termo esteve associado às regras do heroísmo b A virtude da temperança e humildade era um grande objetivo do herói e cabia à Educação fornecer elementos para a realização dessa virtude c Por meio da Paideia o homem faz uso de qualidades racionais e volitivas com as quais se faz dono de uma liberdade de desenvolvimento que não é disponível a outras criaturas d A Paideia é um processo social e intelectual de Educação que envolve o indivíduo e Por meio da Paideia realizase a preservação e a transmissão das quali dades físicas e intelectuais que compõem o caráter e a natureza de uma comunidade 5 Vimos que o ideal de Paideia se alicerça no desenvolvimento da mente e do corpo do homem e esse desenvolvimento está fundamentado em algumas virtudes Indique a alternativa que apresenta adequadamente as principais virtudes necessárias para quem se propõe a desenvolver esses ideais a Beleza nobreza verdade justiça e coragem b Nobreza comprometimento humildade e sinceridade c Beleza coragem meditação e autoconhecimento d Justiça emoção envolvimento e companheirismo e Coragem dedicação comprometimento e justiça Gabarito 1 e 2 d 3 c 4 b 5 a Claretiano Centro Universitário 99 U2 Antiguidade clássica grega e a Educação 13 CONSIDERAÇÕES GERAIS Nesta unidade examinamos de forma muito particular alguns conceitos importantes para a compreensão do processo educativo grego a saber Paideia Areté Agathós Aristós aristoi aristeiai Como visto a Paideia representa o fundamento sobre o qual se assenta toda a cultura ocidental Todas as culturas envolvem o fenômeno da Educação em suas múltiplas dimensões social afe tiva cognitiva política e outras Por isso para compreender em que consiste nosso próprio modelo de Educação é importante co nhecermos como se estruturou esse primeiro modelo educativo a Paideia grega Na próxima unidade veremos como surgiu uma proposta diferenciada de Paideia advinda de uma nova relação política de mocracia grega e o surgimento dos filósofos chamados sofistas 14 EREFERÊNCIA Site pesquisado PATRÍCIO M F Perenidade da Aretê como horizonte apelativo da Paideia Sobre a Excelência em Educação Revista Portuguesa de Ciências do Desporto Disponível em httpwww scieloocesmctesptpdfrpcdv8n2v8n2a10pdf Acesso em 2 fev 2012 15 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARISTÓTELES Metafísica Tradução de Marcelo Perine São Paulo Loyola 2002 v 2 BARNES J Filósofos présocráticos Tradução de Julio Fischer São Paulo Melhoramentos 1997 BULFINCH T O livro de ouro da mitologia história de deuses e heróis Tradução de David Jardim Junior 8 ed Rio de Janeiro Ediouro 1999 CAMPBELL J O poder do mito São Paulo Palas Athena 1990 CASSIRER E Antropologia filosófica ensaio sobre o Homem introdução a uma filosofia da cultura humana São Paulo Editora Mestre Jou 1977 CHAMOUX F A civilização grega Lisboa Edições 70 2003 Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 100 COAD G 2006 A philosophical inquiry into the development of the notion of Kalos Kagathos from Homer to Aristotle Masters thesis Fremantle University of Notre Dame Australia Fremantle WA 2006 Tese de Mestrado GOERGEN P De Homero e Hesíodo ou das origens da Filosofia e da Educação Revista ProPosições v 17 n 3 p 181198 setdez 2006 GLOTZ G A cidade grega São PauloRio de Janeiro Difel 1980 GRAVES R Deuses e heróis do Olimpo Tradução de Bárbara Heliodora Rio de Janeiro Xenon 1992 HESÍODO Teogonia a origem dos deuses Tradução de Jaa Torrano São Paulo Iluminuras 1995 Os trabalhos e os dias Tradução de Mary de Camargo Neves Lafer São Paulo Iluminuras 1991 HIRSCHBERGER J História da Filosofia na antiguidade São Paulo Herder 1965 KIRK G S Os filósofos présocráticos história crítica em seleção de textos 4 ed Lisboa Fundação Calouste Gulbenkian 1994 JAEGER W Paidéia a formação do homem grego Tradução de Artur M Parreira São Paulo Martins Fontes 2001 NIETZSCHE F A Filosofia na idade trágica dos gregos Tradução de Artur Mourão Lisboa Edições 70 1987 PETIT P História antiga Tradução de Pedro Moacyr Campos 6 ed Rio de Janeiro Bertrand Brasil 1989 REALE G História da Filosofia antiga das origens a Sócrates Tradução de Marcelo Perine São Paulo Loyola 1993 v 1 VERNANT JP Mito e pensamento entre os gregos Tradução de Sarian Haiganuch 2 ed São Paulo Paz e Terra 2002 Origens do pensamento grego Tradução de Isis Lana Borges São Paulo Difel 1972 VERNANT JP VIDALNAQUET P Mito e tragédia na Grécia antiga São Paulo Perspectiva 2005 VILANOU C Da Paidéia à Bildung para uma pedagogia hermenêutica Revista Portuguesa de Educação v 14 n 2 2001 EAD Filosofia prática ou sobre os sofistas 3 1 OBJETIVOS Contextualizar o período histórico e filosófico em que se apresentou o surgimento dos sofistas Delimitar algumas das características da Paideia no perí odo de Péricles Estabelecer vínculo entre a democracia grega na época de Péricles e a importância dos sofistas Analisar e compreender a Areté educativa dos sofistas Classificar e examinar a Paideia sofística Analisar e interpretar a Areté política Compreender e justificar o ideal humano da pólis grega Analisar e distinguir criteriosamente a oposição entre Nomós e a Physis Compreender e relacionar o conceito de natureza huma na com a Filosofia Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 102 Compreender e pontuar a questão da consciência cultural grega Estudar e analisar a relação entre Sócrates e os Sofistas Compreender a importância da sofística na Filosofia con temporânea 2 CONTEÚDOS O período clássico grego A democracia grega e cultura grega no discurso fúnebre de Péricles Os sofistas Areté educativa Areté política Nomós Physis Estado e Educação O conceito de natureza humana Paideia sofística 3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE Antes de iniciar o estudo desta unidade é importante que você leia as orientações a seguir 1 Pesquise em livros específicos de Filosofia ou na Inter net comentários sobre a importância dos sofistas para a constituição da Filosofia ocidental Se encontrar algo que considere interessante disponibilize as referências desse material a seus colegas na Lista 2 Um dos nomes mais importantes na transição sofística da Grécia foi Protágoras Em razão da importância desse pensador apresentamos a seguir uma breve biografia a seu respeito Claretiano Centro Universitário 103 U3 Filosofia prática ou sobre os sofistas Protágoras de Abdera Abdera 480 aCSicília 410 aC Protágoras de Abdera foi um dos muitos pensadores gregos do século 5º aC incluindo também Górgias Híppias e Prodicus coletivamente conhecidos como os sofistas Mais velhos um grupo de professores viajantes ou intelectuais que eram especialistas na retórica a ciência da oratória e em temas relacionados a este Protágoras é conhecido primeiramente por três afirmações 1 o homem é medida de todas as coisas que é costumeiramente interpretada como um tipo de relativismo radical 2 o homem pode fazer o pior ou mais fraco argumento aparentar ser o melhor ou mais forte e 3 uma pessoa não pode dizer se deus existe ou não Algumas fontes antigas dizem que estas proposições o levaram a ser julgado e seus livros queimados mas podem ser também lendas Noções de Protágoras como a de que os julgamentos e o conhecimento são de alguma forma relativos à pessoa que julga saber têm sido muito influentes e ainda são amplamente discutidas na Filosofia contemporânea Disponível em http wwwieputmeduprotagor Acesso em 06 fev 2012 Tradução nossa 4 INTRODUÇÃO À UNIDADE Na unidade anterior você estudou o desenvolvimento da Areté nos tempos homéricos e seus desdobramentos manifesta dos na Paideia daquele período Agora iremos conhecer outro momento da Paideia grega o chamado Período Clássico Esse período que começa com a chamada guerra persa 490479 aC e termina com a morte de Alexandre o Grande 323 aC embora tenha sido um momento em que aconteceram mui tas guerras foi o período onde para muitos aconteceu o milagre grego pois as inovações que surgiram nesse momento na literatu ra poesia filosofia drama e artes acabaram por marcar sobrema neira nossa herança cultural Dentre outros acontecimentos nesse período ocorre o surgimento da Filosofia o apogeu político cul tural da cidade de Atenas e ainda o surgimento da democracia Especificamente esse último aspecto traz também a presença de uma corrente filosófica chamada sofista Muitos filósofos sofistas viveram no chamado período áu reo quando se deu o governo do grande líder ateniense Péricles 495 aC429 aC e a população ateniense viveu o auge do regime democrático Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 104 Poderíamos nos perguntar agora quais seriam os valores e as características culturais desse período que acabaram por gerar condições para a presença dos sofistas Um artigo a esse respeito que foi redigido por Rodríguez Barroso 2008 e pode ajudarnos a elucidar essa questão apresentando uma análise dos ideais de Paideia presentes no discurso fúnebre de Péricles No período em que Péricles exercia a liderança apesar do apogeu político Atenas encontravase diante da guerra do Pelo poneso tendo como oponente entre outras a cidade de Espar ta Após um ano de combate os atenienses realizaram um funeral simbólico a todos os que nele feneceram até então No discurso proferido por Péricles durante a memoração é possível ver retra tada a democracia ateniense Vale ressaltar que esse discurso chegou até nós por meio dos registrados do historiador Tucídides 460 aC395 aC Segundo Rodríguez Barroso 2008 há indícios de que ao longo de todo o período em que perdurou a guerra do Peloponeso anualmente era proferido em homenagem aos mortos oriundos das batalhas Vale lembrar que a capacidade oratória era muito valorizada e necessária pois além da beleza estética dos discursos preferi dos os oradores deveriam ser convincentes as decisões nesse momento histórico se davam mediante o exercício da argumenta ção realizada na ágora O termo ágora se refere a um lugar aberto onde se realizavam as assembleias nas antigas cidadesestados gregas Especificamen te no caso de Atenas a ágora acabou por ser símbolo da democra cia grega pois nela participavam aqueles que eram considerados cidadãos atenienses Veja a seguir alguns trechos selecionados do discurso de Péricles observando os elementos que eles retratam Para iniciar essa análise atente aos elementos retratados quanto ao sistema político de Atenas Claretiano Centro Universitário 105 U3 Filosofia prática ou sobre os sofistas O nosso sistema político não compete com instituições que estão noutros locais implantadas pela força Nós não copiamos os nossos vizinhos mas tentamos ser um exemplo A nossa administração fa vorece a maioria em vez da minoria é por isso que é chamada uma democracia As leis dão justiça para todos de igual modo nas suas disputas privadas mas não ignoramos a demonstração da exce lência Quando um cidadão se distingue então será chamado para servir ao estado em detrimento de outros não devido a privilégios mas como um prêmio para o mérito e a pobreza não é obstáculo para tal TUCÍDIDES apud RODRÍGUEZ BARROSO 2008 p 36 tra dução nossa Nesse excerto há ênfase ao valor da democracia o respeito à igualdade dos cidadãos e a valorização da Excelência da qual tratamos na unidade anterior observandose que o homem ex celente é chamado a servir ao estado Apreciemos outro excerto A liberdade que apreciamos estendese também à nossa vida par ticular não desconfiamos uns dos outros e não aborrecemos o nosso vizinho se ele escolher seguir seu próprio caminho Mas esta liberdade não faz de nós seres sem lei Somos educados para respeitar os magistrados e as leis e a nunca esquecer que devemos proteger os feridos E somos também ensinados a observar aquelas leis que não estão escritas cuja sanção está apenas na sensação universal do que está correto TUCÍDIDES apud RODRÍGUEZ BAR ROSO 2008 p 36 tradução nossa Nesse trecho distinguimos a ênfase na excelência moral vin culada às leis quer essas sejam escritas ou se manifestem na pró pria percepção do indivíduo Avaliemos a seguir a relação entre o público e o privado Amamos a beleza sem nos tornarmos vaidosos e apesar de tentar mos melhorar o nosso intelecto isto não enfraquece a nossa vonta de admitir a pobreza de uma pessoa não é uma desgraça para nós mas consideramos desgraçante não fazer nada para o evitar Um cidadão Ateniense não negligencia os aspectos públicos quan do atende aos seus negócios privados Consideramos um homem que não tem qualquer interesse no estado não como perigoso mas como inútil e apesar de apenas uns poucos poderem originar uma política todos nós somos capazes de a julgar Não olhamos a discus são como uma parede bloqueando a acção política mas como um preliminar indispensável para agir com sabedoria TUCÍDIDES apud RODRÍGUEZ BARROSO 2008 p 36 tradução nossa Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 106 Nesse trecho podemos atentar para a valorização da discus são pública e a ênfase no saber Observese que o fato de se valori zar o saber não diminui a ação efetiva do ateniense pelo contrário pensar e discutir são atividades imprescindíveis que antecedem o agir e especificamente agir com sabedoria Dos elementos examinados e de outros manifestados nesse discurso de Péricles há de se pensar se poderíamos estabelecer al guns possíveis aspectos para compor a Paideia do povo ateniense do período em questão Analise conosco algumas possibilidades dessa Paideia suge ridas por Rodríguez Barroso 2008 p 4243 tradução nossa respeito à tradição e consciência do progresso para melhor a identidade coletiva se encontra na pólis não na estirpe união do elogio das instituições políticas atenienses e do caráter dos atenienses que se criam mutuamente comodidade da vida e valor pessoal os mortos servem de modelo para os jovens Desses itens destacados por Rodríguez Barroso alguns você talvez já deva ter identificado nos excertos apresentados no en tanto gostaríamos de ressaltar um aspecto interessante em rela ção ao discurso em questão Ao fazer a análise da Paideia proposta por Péricles Rodrí guez Barroso 2008 p 43 acabou também por identificar algu mas contradições ou seja existem alguns aspectos no discurso de Péricles que apresentam argumentos diferentes e contrários Va mos a alguns deles Humanismo pacifista como base do império embora Péricles defenda uma democracia humanista dentro de Atenas ele acaba por adotar uma postura de beligerân cia e de conquista que é contrária aos ideais humanistas apresentados Claretiano Centro Universitário 107 U3 Filosofia prática ou sobre os sofistas Paradoxo implícito contextual no discurso de Péricles se por um lado Péricles apresenta a defesa de valores ba seados na igualdade há também a justificação de um império baseado em ideais democráticos que se impõem pela força Como veremos adiante esses aspectos se ligarão a elemen tos da proposta sofista Dentre esses elementos destacamos a defesa do debate de ideias a liberdade de expressão e con sequentemente a necessidade de que aquele que irá realizar o discurso esteja bem preparado para esse fim pois é por meio da apresentação pública de ideias que se irá decidir os destinos da cidade e por outro lado aquele que possui Excelência nessa arte será chamado a tomar lugar nas decisões da pólis 5 O SURGIMENTO DOS SOFISTAS Após essa contextualização vamos conhecer agora aqueles que foram denominados sofistas e que conforme veremos a se guir exerceram uma função de extrema importância no Período Clássico Inicialmente podemos dizer que os sofistas atuaram em um cenário de transição e têm papel fundamental para a constituição da Filosofia de Sócrates ateniense que será para muitos estudio sos um marco divisório dentro da História da Filosofia desse pe ríodo O que você poderia dizer a respeito dos sofistas Muitos ain da afirmam que os sofistas eram mercenários do conhecimento ou seja lucravam fingindo conhecer um determinado assunto Re ale 1993 p 189 menciona que até há pouco tempo alguns es tudiosos asseguravam que sofista era aquele que fazendo uso de raciocínios capciosos busca por um lado enfraquecer e ofuscar o verdadeiro e por outro reforçar o falso revestindoo das aparên cias do verdadeiro Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 108 Tal interpretação é pautada em preconceito Vamos juntos no decorrer desta unidade tentar conhecer o verdadeiro papel dos sofistas na antiguidade e no desenvolvimento da Paideia grega 6 ANTECEDENTES DO SOFISMO Antes de iniciarmos nossos estudos acerca dos sofistas é preciso relembrar a tradição filosófica que os sofistas herdaram a chamada Filosofia Présocrática Especificamente neste CRC é importante destacar que no Período Clássico se dá o surgimento da Filosofia nítida sobrepo sição de pensamentos cada filósofo apresenta uma tese de forma que não encontramos consenso nos discursos Cada filósofo acaba por apresentar propostas diferentes a respeito da origem das coi sas ou ainda percebiam e definiam aquilo que será considerado como ser de forma diametralmente oposta Essas características presentes no pensamento Présocrático acabaram por fazer com que a falta de consonância entre os pen sadores gerasse uma inquietação e a necessidade de uma resposta clara por parte dos filósofos sofistas 7 A FILOSOFIA SOFISTA Os sofistas são personagens marcantes e pouco compreen didos na História da Filosofia A imagem mais usual disseminada a respeito dos sofistas é a de pessoas falsas dissimuladas que fingem ser detentoras da verdade Essa imagem porém não é a mais adequada Vamos pro curar compreender quem foram e o que pensavam de fato os sofistas Veja um relato de Henry Sidgwick 1872 sintetizando a opi nião acadêmica do período sobre os sofistas Claretiano Centro Universitário 109 U3 Filosofia prática ou sobre os sofistas Eram uma súcia de charlatães na Grécia no séc V ganhando muito bem a vida impondose à credulidade popular professando ensi nar a virtude ensinavam na verdade a arte do discurso fanático propagando doutrinas práticas imorais Gravitando em redor de Atenas o pritaneu da Grécia Sócrates os encontrou aí e os der rotou expondo o vazio de sua retórica revisando de dentro para fora os seus sofismas e defendendo triunfalmente princípios éticos sadios contra seus sofismas perniciosos SIDGWICK apud GUTRHIE 1995 p 16 Para iniciarmos o estudo sobre os sofistas temos de con siderar que chegaram até nós apenas alguns poucos fragmentos de escritos Muitos de seus livros foram queimados publicamente quase nada chegou até nós e a maioria das coisas que sabemos sobre eles é apresentada por meio de seus principais rivais Platão e Aristóteles Segundo Reale 1993 Platão é o principal responsável pelo descrédito dos sofistas na História da Filosofia Até época relativamente recente a visão dominante visão em que foi educado o estudioso é que Platão estava com a razão em sua querela com os sofistas Foi o que proclamou ser o filósofo verda deiro ou o amante da sabedoria E os sofistas foram superficiais e destruidores e na pior das hipóteses enganadores propositados e criadores de sofismas no sentido moderno do termo GUTRHIE 1995 p 15 Desta forma é complexa a missão de formar uma noção adequada sobre quem foram os sofistas pois além da falta de ele mentos materiais temos um preconceito estabelecido na tradição filosófica mas vamos tentar analisar alguns elementos históricos buscando uma visão mais clara acerca dos sofistas O termo sofista pode ser traduzido por sábio ou sabe doria Sophos e sophistes eram na Grécia sinônimos Para Reale 1993 p 189 o sentido original do termo sofista remete a sá bio especialista no saber possuidor do saber não significan do apenas algo positivo mas altamente positivo tornandose uma espécie de menção honrosa Os sábios e governantes eram cha mados de sofistas O sofista era um perito dotado de determinada capacidade O sophistes era provavelmente um mestre Tal nome era aplicado também a poetas músicos e políticos Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 110 Marias 2004 p 40 ao tratar dos sofistas em História da Filosofia apresenta Filóstrato diz que a sofística fala das mesmas coisas de que falam os que filosofam E Aristóteles diz A Sofística é uma sabedoria apa rente mas não é sabedoria e o sofista é quem usa essa sabedoria aparente que não é sabedoria Nesse trecho podemos observar duas visões diferentes a respeito dos sofistas Filóstrato diz que eles tratam das mesmas coisas que os filósofos e Aristóteles condenaos dizendo que sua sabedoria é aparente É importante ter em mente que o termo sophistes remete à antiga tradição dos poetas como educadores na Grécia antiga Gutrhie 1995 p 34 os apresenta da seguinte maneira Um sophistes escreve e ensina porque tem especial perícia ou co nhecimento para comunicar Sua sophia é prática quer nos campos da conduta e política quer nas artes técnicas Se alguém pudesse fazer os produtos de todos os ofícios e ademais todas as coisas no mundo natural seria com efeito um fabuloso sophistes diz Gláu con na República 596d Essa descrição associase à ideia de que os sofistas eram mestres nas artes e na política 8 SOFISTAS OS PRIMEIROS PROFISSIONAIS DA EDU CAÇÃO Os sofistas foram os primeiros profissionais da Educação os primeiros professores pagos que se organizaram como classe Eram antes de qualquer coisa educadores e mesmo professores itinerantes indo de uma cidade a outra para lecionar Não eram cidadãos atenienses eram estrangeiros Percorriam toda Grécia e propunhamse ensinar a Areté Embora cobrassem por suas aulas há relatos como os de Isócrates que afirmam que nenhum deles fez grande fortuna ao contrário viviam modestamente de acor do com um ideal filosófico de educador Nesse sentido Protágoras 480 aC410 aC reputado como o maior representante entre os sofistas pode ser considerado melhor exemplo que Platão Claretiano Centro Universitário 111 U3 Filosofia prática ou sobre os sofistas Protágoras tinha duas classes de alunos os provindos de classes nobres e que desejavam entrar na política e aqueles que estudavam para fins profissionais ou seja almejavam tornarem se sofistas Dessas classes provém a ideia de que os sofistas eram caçadores de jovens ricos para transmitir sua sabedoria Tal fato pode ser verídico contudo o problema central está na proposta educativa sofista É possível ensinar a virtude a qual quer um O filósofo era considerado um sábio que transmitia seus conhecimentos a discípulos escolhidos a sabedoria deveria ser partilhada com amigos e pessoas amadas de maneira gratuita Os sofistas porém transmitiam seus conhecimentos a todos os inte ressados mesmo que esses tivessem como ambição apenas inte resse em utilizar os conhecimentos para persuadir e dominar Note que os sofistas se propunham ensinar a Areté contudo não se tratava de transmitir a virtude mas de levar o aluno à arte da retórica artemestra para os bons cidadãos no ambiente do interesse público Vale notarmos a dimensão prática da atividade dos sofistas a virtude deixa de estar relacionada à honra à sabe doria e voltase à prática de atuação política na pólis Quanto ao método de ensino os sofistas davam suas ins truções em forma de seminários de conferências públicas ou de exibições Eram mestres da linguagem da retórica e da fala Eram exímios comunicadores capazes de falar com igual presteza sobre questões contrárias Demonstravam suas habilidades para compe titividade argumentativa em discursos eram hábeis para defender até mesmo os casos mais absurdos Seu método era diferente do dos filósofos da natureza que partiam de deduções pois utiliza vam o método empíricoindutivo Partiam assim do princípio de que era a vida e a natureza prática que comunicava conhecimento Os sofistas eram herdeiros dos Présocráticos e dos poetas por isso ensinavam a arte do logos e da retórica Seus escritos en focavam o uso adequado da gramática e da linguagem em geral Eram pessoas habituadas à leitura dos filósofos e tinham grande Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 112 fluência e destreza com o uso de todos os tipos de argumentos até mesmo os falaciosos Desta forma o termo sophistes originalmente denotava alguém extremamente competente um mestre genuíno contudo passou a ser associado ao termo deinon que significava além de astuto perspicaz sagaz também espertalhão e enga nador Os sofistas foram responsáveis por uma verdadeira revolu ção filosófica pois passaram a se interessar não mais pelos fenô menos naturais physis mas pelos negócios humanos antropos nómos 9 A REVOLUÇÃO SOFÍSTICA Com os sofistas houve uma democratização do ensino que até então era apenas destinado à aristocracia Até o jovem pobre poderia juntar suas reservas para receber aulas A preocupação dos sofistas abarcava os problemas humanos acerca do nómos ou das convenções sociais Houve o fim de todo tipo de manutenção do status quo Passouse a considerar que tudo é fruto de significa ção e não de designação e que aquilo que se sabia das coisas era fruto de crença e não de conhecimento Essas mudanças porém não se deram por acaso Veja o que relata por exemplo Villagra Diez 2002 p 9 tradução nossa Pouco a pouco deixase para trás a aristocrática arete pindárica e se substitui por uma paidéia que aposta em um duplo objetivo por um lado fazer membros da sociedade a todos os homens livres e por outro tornálos aptos a servir ao estado A cultura tornase então políticopedagógica Nesse contexto surge a educação so fista ainda que na verdade esta se oriente à formação daqueles capazes tanto de fazer cumprir as leis vigentes quanto de criar novas leis para o qual é necessário a intelecção dos assuntos hu manos Com efeito um homem dedicado à política além de pos suir qualidades para governar deve incrementar sua capacidade de pronunciar discursos oportunos e convincentes Em um estado democrático que se funda a assembléia pública e a liberdade da palavra a oratória se apresenta como uma prática indispensável Em uma palavra necessitase educar no logos Claretiano Centro Universitário 113 U3 Filosofia prática ou sobre os sofistas A Areté pindárica à qual Villagra Diez se refere nada mais é do que um desdobramento da Areté homérica estudada na unida de anterior No período em que há o desenvolvimento da Filosofia sofista há uma revolucionária mudança política quando paulati namente se substitui a aristocracia e sua Kalokaghatia homérica pela participação do cidadão na pólis democrática defendida por Péricles Com essa revolução o conhecimento passa a ser relativo ao sujeito que percebe Para ilustrarmos esse fato vamos lhe apre sentar um pouco mais sobre Protágoras Dentre algumas das peculiaridades das ideias e a história da vida desse filósofo veja a que Haase 2009 p 3536 tradução nos sa destaca Os livros de Protágoras foram queimados pelos atenienses porque ele fez um discurso no qual começa com as palavras A respeito dos deuses eu não posso falar nada nem que eles existem ou ainda que eles não existam A afirmação de Protágoras não quer provar que o que é falso pode ser tido como verdadeiro mas nega a existência de uma ver dade para além do parecer Para Protágoras o grande orador faz parecer o que quer e assim faz a verdade Os sofistas então são técnicos do espírito são destruidores de convicções dogmáti cas e portanto são revolucionários do pensamento antigo A revolução promovida pelos sofistas é nada mais do que o questionamento dos valores arraigados na tradição Grega A reli gião é desmoralizada e o Estado passa a ser visto como fruto da ação humana sem ter nenhuma relação com os deuses A crítica sofística à religião antecipou as ideias que futuramente serão de fendidas por Nietzsche A democratização da Grécia não seria possível sem os so fistas Suas concepções a respeito de relativismo e subjetivismo promoveram o desenvolvimento de conceitos na política e na Fi losofia Os sofistas foram os responsáveis pela sistematização do conhecimento e efetiva busca de uma Paideia na sociedade grega Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 114 Veja a seguir algumas considerações apontadas por Aranha 2000 p 43 Na nova ordem política da cidade as virtudes louvadas não são mais as do aristocrata bemnascido de origem divina que se destacava pela coragem na guerra Diferentemente a virtude do cidadão da polis é cívica e está na sua capacidade de discutir e de liberar nas assembléias Por isso os sofistas fascinam a juventude com o brilhantismo da sua retórica e se propõem a ensinar a arte da persuasão do convencimento do discurso que serão bem aproveitados na praça pública sede da assembléia democrática Nesse sentido os sofistas são os criadores da educação intelectual que vai se tornar independente da educação física e musical até então predominantes nos ginásios Além disso ampliam a noção de paidéia de simples educação de criança passa a ter significado mais abrangente estendendose à contínua formação do adulto capaz então de repensar por si mesmo a cultura do seu tempo A sofística tem portanto caráter público é dirigida ao cida dão uma clara tendência política E por último é uma Paideia uma pedagogia a primeira que propriamente existiu Os sofistas como herdeiros dos Présocráticos enfrentam a decepção da constante contradição existente no pensamento de seus antecessores e por isso são céticos As respostas acerca da natureza são teorias que carecem de consonância A Filosofia convertese em especulação pautada em convicções teóricas pes soais Por isso a especulação naturalista é abandonada para pro curar os fundamentos de todo saber a experiência empírica do ser humano Para os sofistas a sociedade é marcada pelo relativismo tudo depende das situações e ângulos de visão e pelo subjeti vismo tudo depende dos critérios subjetivos dos juízos de cada indivíduo O ceticismo marca o pensamento dos sofistas contudo em contrapartida instaurase o pragmatismo e empirismo A Filoso fia dos sofistas é antes de tudo prática e pautada na realidade excludente de todo o direito de pretensão divina São as relações factuais de poder que condicionam as leis e os costumes Com os sofistas nasce a concepção de direito positivo Claretiano Centro Universitário 115 U3 Filosofia prática ou sobre os sofistas A Filosofia sofística é temida e atacada por Platão pois suas ideias educativas não estavam atreladas à aristocracia Para Platão a Areté só podia ser alcançada por indivíduos provindos da classe dos cidadãos gregos Seguindo esse raciocínio os sofistas eram acusados de prostituir o conhecimento ao ensinar a qualquer um em troca de dinheiro Tal fato marca a crise da aristocracia e do conceito de Areté no contexto da Paideia Outro problema era o perigo dos ataques sofistas contra a religião a moral e tudo aquilo tomado como verdade na socieda de grega até então No início de uma de suas principais obras A Verdade Protágoras apresenta um princípio que se tornou famoso e expressa de forma lapidar o postulado essencial do ensino so fístico o homem é a medida de todas as coisas das que existem pelo fato de existirem das que não existem pelo fato de existirem MARIAS 2002 p 41 Perceba a radical mudança de tema da Filosofia que não mais se preocupa com a natureza physis mas agora parte do homem como princípio de todas as coisas Os sofistas inauguram dessa forma o humanismo e a antro pologia Embora tenham sido execrados por Platão e Aristóteles seu pensamento pode ser percebido implicitamente nas tendên cias filosóficas presentes na modernidade Veja algumas conside rações de Reale 1993 p 192 Compreendese que os temas dominantes da especulação sofística tenham se tornado a ética a política a retórica a arte a língua a religião a educação tudo aquilo que nós hoje chamamos de cultu ra humanista Com os sofistas em suma começa aquele que com expressão correta foi chamado de período humanista da filosofia antiga Poucos escritos dos sofistas chegaram até nós mas seus tex tos eram tidos como manuais de estudo com conteúdo educacio nal portanto sua preocupação era de atuação pública eles não eram literários preocupados em deixar obras para a posteridade Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 116 Aristóteles em Arte Retórica sintetizou o pensamento so fístico e a tradição filosófica anterior A lógica e a sistematização dos raciocínios propostos na lógica aristotélica sem dúvida foram elaboradas com a contribuição dos conhecimentos sofistas 10 A EDUCAÇÃO SOFÍSTICA Como você pôde observar anteriormente os sofistas aban donaram as discussões acerca da physis e abraçaram discussões práticas Com a Educação sofística surge o comprometimento efe tivo dos educadores com uma Paideia destinada a todos os indiví duos da pólis e não mais limitada apenas à aristocracia A crise da aristocracia marca o início do período de difama ção dos sofistas que em determinadas ocasiões chegaram a ser perseguidos Reale 1993 p 195 relata que Os filósofos da natureza dizse buscavam a verdade por si mes ma e o fato de terem ou não alunos era puramente acidental ao contrário os sofistas não buscavam a verdade por si mesma mas tinham por objetivo o ensinamento e o fato de terem discípulos era ao invés para eles essencial Em suma os sofistas faziam do seu saber uma verdadeira profissão com eles o problema edu cativo e o empenho emergiram ao primeiro plano e assumiram um novíssimo significado Contra a pretensão da nobreza que susten tava ser a virtude uma prerrogativa de nascimento e de sangue os sofistas pretenderam fazer valer o princípio segundo o qual todos podem adquirir a arete e esta mais que na nobreza de sangue fundase sobre o saber Para que possamos avançar é preciso tirar algumas conclu sões acerca da controversa sofística Os sofistas estavam preocupados com a Educação na dimen são do ensino Nesse sentido são mais importantes do que os fi lósofos que a partir da maiêutica socrática deram especial ênfase ao processo indagativo Claretiano Centro Universitário 117 U3 Filosofia prática ou sobre os sofistas Com os sofistas nasce a ideia ocidental de Educação vigente até nossos dias envolvendo a figura do professor mestre sofista profissional do ensino e dos alunos Os sofistas não eram todos iguais havia aqueles de maior destaque famosos mas de grande discrição moral havia os cha mados eristas aqueles que exploravam o método sofístico sem discrição e por fim havia os políticos sofistas que abusavam dos princípios sofísticos para teorizar instaurando um imoralismo A menção aos sofistas que queremos trazer à tona porém é a do grande mestre de rigor e sabedoria tão elevadas quanto os ditos filósofos clássicos Os sofistas negavam o absoluto do pensamento contudo não negavam o pensamento Eles atacaram as representações dogmáticas acabadas Na verdade foram responsáveis pela ma nutenção da exigência de um pensamento crítico que desconfia investiga e avalia 11 ATUALIDADE E PERTINÊNCIA DOS SOFISTAS PARA A FILOSOFIA E A EDUCAÇÃO Protágoras afirma que o homem é o princípio de todas as coisas Julian Marias 2004 p 44 propõe a seguinte discussão Aristóteles adverte que há que saber primeiro o que é que nessa frase está em causa se o homem como sujeito de ciência ou sujeito de sensação isto é se a referência é ao ponto de vista da verdade ou simplesmente da doxa Protágoras não fala do ón mas das coi sas enquanto se opõem ao ón das coisas que se utilizam dos bens móveis Daí o sentido de dinheiro A frase referese pois ao mundo da doxa e portanto está compreendida no mundo das idéias de Parmênides Tendo em vista a contribuição dos sofistas com a inaugura ção de uma Filosofia humanística podemos tentar estabelecer al guns paralelos Kant ao iniciar sua proposta filosófica em Crítica da razão pura 1996 pergunta O que o homem pode conhe Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 118 cer Não estaria aí embutida a afirmação de sofística de que o homem é o princípio de todas as coisas Todos os temas abordados na modernidade encontram re flexo na Filosofia sofística as discussões acerca do Estado e da po lítica tão frequentes na Filosofia política moderna com Maquiavel e Hobbes as discussões acerca da Educação em Rousseau e Kant as discussões acerca da religião em Nietzsche Marx e Feuerbach o empirismo de Hume e Locke Notamos assim que os sofistas na verdade eram acima de tudo pensadores comprometidos com a sabedoria porém que entraram para a história sem o título de filósofos Mas como a his tória segundo Marx é escrita pelos vencedores detentores do po der econômico e não por aqueles comprometidos com a verdade Muito ainda há por estudar acerca dos sofistas Com os ele mentos que aqui abordamos podemos ir ao encontro da riqueza dos sofistas para o pensamento filosófico Concluímos esta unidade com algumas considerações apre sentadas por Martins 2010 s p A verdadeira paidéia conscientemente procurada e dentro desta tradição que vem dos gregos não pode descurar a importância dos sofistas na formação do ideário educativo de hoje Afinal de contas no ensino de filosofia o método e a prática mais recorrente e eficaz é o método sofístico Cada vez mais a prática pedagógica do professor de filosofia está associada ao ensino de técnicas quer seja para ler um texto para compreender o mundo em torno quer seja para compreender a si mesmo ou fazer análise de conjuntura Não é este também o papel que as outras disciplinas esperam que a filosofia realize A ligação da prática do ensino de filosofia hoje aos sofistas não é algo negativo dado que entre as novidades introduzidas pelos sofistas destacase o fato de terem sido os primeiros defensores de um processo educativo que não termina com a saída da criança da escola Esta idéia de que a filosofia é uma ciência para pessoas adultas e que ela é mãe de todas as ciências é uma herança dos sofistas que até hoje está presente no nosso ideário educativo Se no período homérico existiu o heróimodelo hoje nós podemos falar do professormodelo aquele que inspira alunos através de sua oratória e retórica Claretiano Centro Universitário 119 U3 Filosofia prática ou sobre os sofistas Como exercício de leitura filosófica para auxiliálo no desen volvimento de sua capacidade interpretativa e a fim de manter o contato com o pensamento filosófico leia o Texto complementar recomendado 12 TEXTO COMPLEMENTAR Leia a seguir texto de um dos mais célebres sofistas Górgias c 485 aCc 380 aC Sobre o nãoser ou Sobre a natureza Em primeiro lugar nada é em segundo mesmo que algo fosse não seria com preensível ao homem em terceiro lugar mesmo que houvesse algo compreensí vel não seria comunicável e explicável aos outros Que nada é demonstroo desta forma se de fato algo existe ou é ser ou é não ser ou é ser e nãoser ao mesmo tempo Mas o nãoser não existe porque se o nãoser existisse ele seria e não seria ao mesmo tempo De fato pensado como nãoser não existe mas enquanto existente exatamente como nãoser existe Mas é completamente absurdo que algo seja e não seja ao mesmo tempo por tanto o nãoser não existe Nem sequer o ser existe Se de fato o ser existisse ou é eterno ou é gerado ou é eterno e gerado ao mesmo tempo Se o ser é eterno não tem princípio algum não tendo princípio é ilimitado se é ilimitado não está em lugar algum se não está em lugar algum não existe O ser porém não pode sequer ter nascido Se de fato nasceu ou nasceu do ser ou do nãoser mas não nasceu do ser se de fato existe como ser não pode ter nascido mas existe desde sempre E não nasceu nem sequer do nãoser porque o nãoser não pode gerar coisa alguma portanto o ser nem é gerado e nem pode ser as duas coisas ao mesmo tempo ou seja eterno e gerado pois as duas coisas se excluem mutuamente portanto se o ser não é eterno nem gerado nem todas as duas coisas ao mesmo tempo ele não existe GÓRGIAS 2012 Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 120 13 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS Confira a seguir as questões propostas para verificar o seu desempenho no estudo desta unidade 1 De acordo com o que você estudou nesta unidade identifique a alternativa incorreta a Era natural a um sophistes escrever e ensinar pois tinha especial perí cia ou conhecimento a comunicar Suas atividades eram essencialmente práticas nos campos da política eou das artes técnicas b Os sofistas se propunham ensinar a Areté contudo não se tratava de transmitir a virtude mas de levar o aluno à arte da retórica artemestra para os bons cidadãos no ambiente da república Vale a pena perceber a dimensão prática da atividade dos sofistas A virtude deixa de estar rela cionada à honra à sabedoria mas à prática de atuação política na pólis c O termo sophistes não era originalmente mal ao contrário denotava alguém extremamente competente era um mestre genuíno contudo tal brilhantismo dos sophistes foi associado ao termo deinon que signi ficava além de astuto perspicaz sagaz também espertalhão e enganador d O filósofo é um sábio que transmite seus conhecimentos a discípulos advindos da aristocracia os sofistas transmitem seus conhecimentos a todos os interessados mesmo que esses tivessem como ambição apenas interesse em utilizar os conhecimentos para persuadir e dominar e Os sofistas inauguram o humanismo e a antropologia o relativismo e o subjetivismo e não buscam a verdade em si mesma Com isso colaboram para a manutenção da Paideia voltada para a aristocracia 2 Leia atentamente as afirmações a seguir sobre os sofistas I Preocupavamse com a Educação e o ensino II São os primeiros profissionais da Educação no ocidente III Estavam preocupados com uma nova concepção de Areté baseada na sabedoria e não da descendência nobre a Todas estão corretas b Somente II está correta c Somente III está correta d Somente I e III estão corretas e Somente I está correta 3 A tese humanista de que o homem é a medida de todas as coisas foi cunhada por a Aristóteles b Homero c Hesíodo d Protágoras e Sócrates Claretiano Centro Universitário 121 U3 Filosofia prática ou sobre os sofistas 4 Das afirmações apresentadas a seguir indique a que apresenta um aspecto incorreto da proposta sofística a Os sofistas foram os primeiros profissionais da Educação os primeiros professores pagos que se organizaram como classe b Os sofistas eram antes de qualquer coisa educadores Eram professores itinerantes que iam de uma cidade a outra c Podemos afirmar que os sofistas eram em sua maioria cidadãos ate nienses d Os filósofos sofistas percorriam toda a Grécia e se propunham a ensinar a Areté e Embora os sofistas cobrassem por suas aulas há relatos como os de Isócrates que afirmam que nenhum deles fez grande fortuna 5 Dentre algumas das peculiaridades do período histórico e cultural em que surge o sofismo é correto afirmar que a O sofismo surge no período em que há uma ênfase na forma aristocrática de governo b Péricles em seu Discurso Fúnebre mostra claramente que os ideais da cultura grega do período em que viveu se encontram diametralmente opostos aos apresentados pelos sofistas c A produção sofística busca essencialmente fazer com que as pessoas busquem o saber e percebam a sua importância d Não há uma novidade na proposta sofística pois esse grupo de pensado res busca tão somente o exercício da Areté por meio dos valores nobres e cavalheirescos e O sofismo relacionase em especial medida com a democracia grega no seu chamado período áureo pois nesse período a defesa de ideias na ágora acaba por fornecer especial necessidade de desenvolvimento da retórica Gabarito 1 e 2 a 3 d 4 c 5 e 14 CONSIDERAÇÕES Vimos juntos as contribuições trazidas pelos sofistas para pensarmos o conceito de Paideia Como você pôde perceber es ses pensadores trouxeram importantes modificações no que tange Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 122 ao conceito de Paideia ou ainda a própria análise do que seria Excelência A partir dessas considerações esperamos ter lhe apresenta do elementos suficientes para que você possa ter percebido a im portância desse grupo de filósofos e o quanto eles influenciaram em uma nova visão de Paideia Além disso devese dizer que eles serão os instigadores de posições contrárias à proposta sofística que acabarão por mudar radicalmente a proposta de Paideia e que estudaremos na próxi ma unidade 15 EREFERÊNCIAS Sites pesquisados GÓRGIAS Sobre o nãoser ou sobre a natureza Disponível em httpwwwhottopos comgeralsofishtm Acesso em 18 abr 2012 HAASE FA Style and the idea of the sophist in the time after Plato Ágora Estudos Clássicos em Debate n 11 2009 Disponível em httpwww2dlcuaptclassicos4 Haasepdf Acesso em 14 fev 2012 MARTINS J S O método sofístico e o ensino da Filosofia Ágora revista eletrônica Disponível em httpwwwceedocombragoraagora10ometodosofisticoeoensinodafilosofia JassonMartinspdf Acesso em 14 fev 2012 16 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARANHA M História da Educação São Paulo Moderna 2000 BARROSO J A R Paideia y valores educativos en La oración fúnebre de Pericles de Tucídides Revista de Filosofía y Socio Política de la Educación n 8 año 4 2008 BRANDÃO C R O que é Educação São Paulo Brasiliense 2005 CASSIN B Ensaios sofísticos Tradução de Ana Lúcia de Oliveira São Paulo Siciliano 1990 CHAUÍ M Introdução à história da Filosofia dos présocráticos a Aristóteles 2 ed São Paulo Companhia das Letras 2002 DUHOT J J Sócrates ou o despertar da consciência Tradução de Paulo Menezes São Paulo Loyola 2004 FAGUET E Iniciação filosófica Tradução de Carlos de Lemos 5 ed Lisboa Guimarães e Cia sd Biblioteca de Educação Racional Claretiano Centro Universitário 123 U3 Filosofia prática ou sobre os sofistas GUTHRIE W K C Os sofistas São Paulo Paulus 1995 HIGHET G Arte de ensinar Tradução de Lourenço Filho 7 ed São Paulo Melhoramentos 1969 Biblioteca de Educação JAEGER W Paidéia a formação do homem grego 4 ed São Paulo Martins Fontes 2003 KANT I Crítica da razão pura São Paulo Nova Cultural 1996 Coleção Os Pensadores MARCONDES D Iniciação à história da Filosofia dos présocráticos a Wittgenstein 2 ed Rio de Janeiro Jorge Zahar 1998 MARIAS J História da Filosofia São Paulo Martins Fontes 2004 Tema do homem Tradução de Diva Ribeiro de Toledo Piza São Paulo Duas Cidades 1975 REALE G História da Filosofia antiga das origens a Sócrates Tradução de Marcelo Perini São Paulo Loyola 1993 REZENDE A Org Curso de Filosofia para professores e alunos dos cursos de segundo grau e de graduação 7 ed Rio de Janeiro Jorge Zahar 1997 SILVA M F Sedução e persuasão os deliciosos perigos da sofística São Paulo Cortez Cadernos Cedes v 24 n 64 p 321328 SetDez 2004 VILLAGRA DIEZ P Diálogo justicia y educación La paideia socráticoplatônica frente a la educación sofista en el Gorgias Synthesis La Plata 2002 v 9 Claretiano Centro Universitário EAD Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia 4 1 OBJETIVOS Contextualizar o período histórico em que se dá a exis tência de Sócrates Período Clássico e a importância de alguns aspectos presentes nesse momento em que se dá a criação de uma proposta diferenciada de Paideia Reconhecer e justificar a importância de Sócrates para a fundamentação da Paideia grega Compreender e analisar a Paideia socrática Compreender e comparar a relação entre Sócrates e os filósofos da natureza Analisar a educação política de Sócrates Analisar e pontuar método socrático na Educação Distinguir Sócrates de Platão e comparálos Analisar e identificar a Teoria das Ideias de Platão Classificar e pontuar evolução do conceito de Areté na obra A República de Platão Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 126 Reconhecer e analisar a importância de Protágoras para compreensão da Paideia sofística em relação à Paideia socrática 2 CONTEÚDOS Método Educação para a pólis Maiêutica Protágoras A República A Teoria das Ideias Areté e Paideia Areté política O homem e a pólis em Aristóteles Humanismo romano Paideia Christi A Bildung contemporânea 3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE 1 Nesta unidade você irá se deparar com as contribuições de Sócrates e Platão para a construção de novos ideais de construção da Paideia Um aspecto interessante ao qual você deverá centrar sua atenção referese à mu dança de foco no exercício da Excelência apresentadas por esses filósofos Além disso no Tópico Introdução à Unidade apresentaremos algumas características do momento histórico vivido pelos atenienses naquele período e nesse sentido há de se pensar o quanto um determinado contexto histórico acaba por interferir nos anseios reflexões e ideais de um determinado povo Por fim iremos lhe apresentar os desdobramentos poste riores do conceito de Paideia e ao fazêlo convidamos Claretiano Centro Universitário 127 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia você a analisar o quanto essas mudanças acrescentaram novas formas de interpretação a esse conceito 2 O termo hermenêutica tem recebido ao longo do tempo uma série de interpretações Especificamente nos estudos religiosos e na chamada Filosofia social esse termo é utilizado para se referir à teoria e à prática da interpretação Nesta unidade faremos uso da her menêutica para interpretar os textos que compõem as fontes de nossos estudos 3 Mesmo com ressalvas com relação a dados históricos presentes em filmes sugerimos que você assista aos seguintes procurando observar como apresentam as ideias de Sócrates e a atitude grega de valorização da razão Sócrates Drama Direção de Roberto Rosselini Itá lia 1971 120 minutos Alexandria Drama Direção de Alejandro Almanábar Espanha 2010 131 minutos Alexandre Aventura Direção de Oliver Stone EUA 2004 176 minutos 4 INTRODUÇÃO À UNIDADE Na unidade anterior você estudou em que consiste a Paideia sofística e os seus valores em Educação cuja finalidade era superar o modelo de Educação baseada na linhagem divina Como estu damos anteriormente os sofistas não conseguiram desvincular o conceito de Areté da aristocracia Nesta unidade examinaremos uma das figuras que mais combateram os sofistas tratase de Sócrates Ao longo desse ca minho tentaremos compreender quais são os pressupostos da Paideia socrática Antes de começarmos a realizar essa análise tornase neces sário contextualizarmos a realidade vivida pelo povo grego nesse Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 128 período pois essa realidade acabará por influenciar sobremaneira as novas reflexões sobre o ideal de Paideia Inicialmente gostaríamos de lembrálo que conforme vimos na Unidade 3 os sofistas viveram sobretudo no período em que floresce a democracia grega o chamado período de ouro Nesse período ocorreu a Guerra do Peloponeso na qual Esparta vence Atenas o que acabou por gerar uma série de desdobramentos e questionamentos Imagine as reflexões que o povo ateniense talvez fizesse naquele período Um povo que tinha um grande orgulho de suas instituições de seus hábitos e condutas acabou por perder uma guerra para uma cidade que não primava segundo o olhar de um ateniense típico pelas qualidades que até então esse povo consi derava como valorosa Essa situação gerou profundas reflexões buscando verificar quais seriam as razões para a perda de guerra ou ainda que carac terísticas específicas da sociedade espartana pudessem ter cola borado para esse resultado Nesse sentido convém analisarmos a reflexão proposta por Jaeger 2006 p 485 Despontava a convicção de que Esparta era menos uma determina da constituição do que um sistema educacional aplicado até as suas últimas conseqüências Era a sua disciplina rigorosa que lhe dava a sua força Também a democracia com a sua avaliação otimista da capacidade de Homem para se governar por si próprio pressupu nha um alto nível de cultura Isto sugeria a idéia de fazer da educa ção o ponto de Arquimedes em que era necessário apoiarse para mover o mundo político Segundo Jaeger essas observações acabaram por gerar a va lorização incondicional do modelo educativo espartano o refúgio nos ideais do passado ou ainda uma reflexão de ações que pode riam ser feitas para consumar uma mudança positiva na Paideia grega A partir dessas reflexões delineiase a percepção da impor tância de uma relação adequada entre o indivíduo e o Estado pois Claretiano Centro Universitário 129 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia o indivíduo certamente está inserido em uma dimensão política e social Assim o cidadão ateniense passa a observar que A educação por meio da qual se pretendia melhorar e fortalecer o Estado constituía um problema mais adequado que outro qual quer para trazer à consciência o condicionalismo recíproco do indi víduo e da comunidade Sob este ponto de vista o caráter privado de toda a anterior educação de Atenas aparecia com um sistema fundamentalmente falso e ineficaz que devia ceder o passo ao ideal da educação pública Embora o Estado não soubesse fazer o mínimo uso desta idéia JAEGER 2006 p 486 Como se percebe são muitos os desafios que se apresentam naquele momento da história grega A seguir vamos nos dedicar a analisar um personagem muito importante desse período que se tornou um verdadeiro símbolo da Filosofia aquele que também com a mesma importância veio a tecer propostas e ações que se vinculam com força e beleza para pensarmos o ideal de Paideia 5 SÓCRATES O que sabemos de Sócrates Muito pouco Na verdade o que sabemos a seu respeito nos chegou por meio de Xenofonte e principalmente de Platão As obras de Platão têm sempre como personagem principal Sócrates Como Sócrates não deixou nenhum escrito várias são as dúvidas que pode ter um leitor mais atento Nesses escritos Platão não estaria apresentando suas próprias ideias por meio de Sócra tes Como delimitar as ideias do mestre das do discípulo Não teria sido ele Sócrates uma invenção O que lemos em A República e em outras obras não seriam simplesmente as ideias de Platão Devemos considerar que para a tradição grega a linguagem escrita não era tão valorizada pelo menos até certo período da história Na Carta VII de Platão temos uma percepção clara dessa questão Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 130 A linguagem falada tem mais expressividade do que a escri ta no Fedro também há discussões acerca da escrita O texto es crito precisa sempre da intervenção de seu autor O método socrático caracterizouse pelo diálogo que exerci ta a inteligência e aguça o raciocínio Isso implica que para exami nar e concretizar a importância de seu pensamento foi necessário o testemunho de seus discípulos ou de seus inimigos que o detra taram cada um à sua maneira Desse modo aproximamosnos e compreendemos um pou co mais a importância de Sócrates na história do pensamento fi losófico No contexto filosófico contemporâneo sua figura é tão importante que os filósofos que o precedem foram denominados Présocráticos Entre os diálogos platônicos em que se pode avaliar a personali dade e os ensinamentos socráticos estão O Banquete e Apologia Porém o problema inicial permanece como realizar a re construção histórica do pensamento socrático como reconhecer as verdadeiras palavras desse sábio ateniense Poderíamos nos re portar a Aristóteles mas Jaeger nos adverte de que esse caminho nos conduz a certa inexatidão Por onde começar 6 RECONSTRUÇÃO DO PENSAMENTO SOCRÁTICO Ponto de partida Em Apologia de Sócrates ou Defesa de Sócrates Platão pro cura reproduzir o discurso que Sócrates teria feito para se defen der das acusações de corromper a juventude não acreditar nos deuses então cultuados e criar novos deuses Claretiano Centro Universitário 131 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia No excerto dessa obra que reproduzimos no tópico Textos complementares conta que Querefonte um dia vai ao oráculo de Delfos perguntar se havia alguém mais sábio que ele Sócrates e obtém como resposta que não há ninguém mais sábio do que Sócrates Ao saber disso o filósofo conta que sai em busca de outra resposta para o vaticínio chegando à célebre conclusão Só sei que nada sei Tomando essa conclusão como uma orientação divina o filósofo defende que o homem deve se dedicar à busca do conhecimento Nesse sentido aplicouse no exercício do pen sar e educar Eis a verdadeira sabedoria a consciência da sua própria ig norância ou o reconhecimento dos limites da própria razão Esse é o pressuposto básico para o filosofar Nesse excerto podemos notar a fina ironia socrática a sa ber o sábio que se julgava ignorante e o ignorante que se julgava sábio Essa passagem da Apologia de Sócrates nos faz pensar tam bém a respeito do método e da dialética socrática a maiêutica e a ironia Além disso o excerto apresenta dois conceitos Belo e Bom que por sua vez estão associados à Paideia e ao ideal de homem que se pretende formar Adiante veremos como se dá a apresen tação desses conceitos Vamos conhecer a seguir um pouco mais sobre as obras que refletem o pensamento de Sócrates Discípulos É por meio do testemunho de Platão em seus diálogos como Fédon Apologia Protágoras que temos um retrato um pou co mais fiel do mestre ateniense um decalque de sua personalida de moral cuja importância promoveu uma mudança no conceito de Areté conforme já havíamos mencionado anteriormente Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 132 Além de Platão também a obra Memoráveis de Xenofonte é importante na reconstrução o pensamento socrático Primeiramente Jaeger advertenos de que o diálogo e as memórias são as formas literárias que nascem nos meios socráticos para satisfazer essa necessidade preservar o pensamento de Sócrates Ambos estão ligados à consciência de que a herança espiritual do mestre é inseparável da personalidade humana de Sócrates JAEGER 1995 p 499 Segundo Jaeger 1995 p 493 Sócrates tornase o guia de todo o Iluminismo e de toda a filosofia moderna Especificamente nesta unidade daremos especial ênfase aos textos Apologia de Sócrates e A República pois conforme veremos a seguir a primeira obra traz uma série de elementos interessantes para analisarmos a contribuição de Sócrates para a construção de uma nova proposta de Paideia e por outro lado a segunda obra define os caminhos para a construção de uma cidade justa De que se trata a obra Apologia de Sócrates Nela temos a versão apresentada por Platão do discurso utilizado por Sócrates para se defender de uma série de acusações que foram proferidas contra ele em 399 aC Essas acusações realizadas por seus detratores diziam que seus ensinamentos viriam a corromper a juventude e que além disso manifestavam descrença pelos deuses da cidade de Atenas isso feria fortemente as crenças dos atenienses Devese dizer que embora façamos uma análise de vários aspectos presentes nessa obra nada substitui a leitura do texto original pois ele carrega consigo uma força argumentativa e até mesmo uma carga emotiva que merecerá sua leitura ao longo desta graduação em Filosofia Quanto ao diálogo A República também tem como persona gem central a figura de Sócrates e foi escrito por Platão em cerca de 380 aC Nele temos a tentativa de Platão em definir justiça or dem e caráter por meio do qual deve ser alicerçada a construção de uma cidadeestado justa a Politeia e ainda o homem justo Claretiano Centro Universitário 133 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia Contextualizadas essas obras cabe a nós examinar as razões que conduziram ao ressurgimento dessa figura tão importante e relacionála com o fenômeno educativo Havíamos dito anteriormente que comumente se estabele ce uma relação entre o cristianismo e o ideal de homem dos gre gos o qual o sábio ateniense representa Há de fato alguma afinidade Primeiramente precisamos ter em mente que a figura de Só crates começa a exibir contornos mais visíveis somente após sua morte mediante os testemunhos de seus discípulos desenvol vendose desse modo uma literatura socrática Esse movimento toma proporções maiores e a inquietação moral que até então assolava apenas seus seguidores se desdobra para os diversos se tores da sociedade ateniense Como dito anteriormente o que sabemos a seu respeito é o que é retratado os textos de seus discípulos e portanto nos depa ramos com o problema de distinguir o que é de fato socrático e o que se trata na verdade daqueles que os retrataram Um primeiro aspecto que podemos identificar é o diálogo em si pois era dessa maneira que o filósofo ensinava Segundo Jaeger 1995 p 501 ele considerava o diálogo a forma primitiva do pensamento filosófico e o único caminho para chegarmos a nos entender com os outros Outro elemento importante para nossa reflexão é a busca do Bom tomemos esse conceito como o Bem Em outras palavras a preocupação de Sócrates tinha mais um conteúdo de ordem moral do que dogmática como o faz parecer na Teoria das Ideias de Pla tão nas suas obras Não podemos deixar de estabelecer relações entre as ideias de Platão e Sócrates afinal o discípulo aprendeu com o mestre os conceitos gerais Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 134 Durante os primeiros estudos filosóficos Platão seguiu os ensinamentos de Crátilo discípulo de Heráclito isto é aquele que defendeu o princípio de que tudo flui nada permanece Desse conceito universal Platão desdobrou o verdadeiro ser as Ideias Mas Sócrates não inferiu a relação entre as coisas sensíveis e as in teligíveis A ele cabe o método indutivo e os conceitos universais Sócrates seria comparável ao limiar mais sóbrio da filosofia de Platão no qual se evitariam as audácias metafísicas deste e fugin do à natureza para se limitar ao campo da moral pretenderseia de certo modo fundamentar teoricamente uma nova sabedoria da vida orientada para o aspecto prático JAEGER 1995 p 507508 Há de se considerar ainda que a morte do mestre foi um dos acontecimentos mais marcantes da vida de Platão Somemos a este fato a Guerra do Peloponeso e seu descrédito com relação à Democracia 7 SÓCRATES O EDUCADOR POR EXCELÊNCIA Sócrates representa o eixo norteador para a compreensão do processo de formação do homem na Grécia antiga No contexto sociopolítico em que viveu o terreno firme no qual se assentavam os valores espirituais herdados dos grandes legisladores como Sólon estavam seriamente comprometidos e se desdobravam em direção à estrutura do Estado e da sociedade No entanto será necessário voltarmos um pouco no tempo para deslindar esse fenômeno quando Sócrates foi discípulo de um dos grandes filósofos naturalistas Anaxágoras Sócrates discípulo de Anaxágoras Ignoramos se nesse período suas ideias políticas foram in fluenciadas pelo círculo de pessoas com quem conviveu tais como Eurípedes Arquelau Sófocles Címon e também Plutarco Péricles e Aspásia Esse era o momento de grande florescimento artístico filosófico e áureo do poder político econômico de Atenas Mas o Claretiano Centro Universitário 135 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia fato é que a Educação para Sócrates deveria ser política Voltare mos a esse assunto mais adiante No entanto para a Grécia se consolidar política e economi camente o Estado exigiu muitos sacrifícios de seus concidadãos E foi nesse período que Sócrates se destacou sendo considerado mau democrata pois defendia que não deve haver intervenção política nas Assembleias e nos Tribunais e o que deveria prevale cer era o conhecimento das coisas Esse pensamento se mostrava diferente do princípio democrático ateniense segundo o qual o Governo era incumbência da maioria do povo JAEGER 1995 p 514 Apresenta dessa forma um novo princípio democrático Essa inovação pode ser atestada de forma mais contundente no diálogo platônico Górgias 454 E ss 459 C ss passim De acordo com Jaeger 1995 p 515 É caso para pensar que esta posição se ia formando dentro dele diante da crescente degenerescência da democracia ateniense durante a guerra do Peloponeso Para quem como ele tinha sido educado no espírito dominante na época das guerras pérsicas e as sistira ao apogeu do Estado era forte demais aquele contraste para não provocar uma série de dúvidas e críticas Podemos dizer que as razões de Sócrates para essa atitude de desprezo em relação à democracia suplantava qualquer moti vação de cunho meramente político Aliás ele a transcendia Mas qual é a relação disso tudo com a influência filosófica de Anaxágoras O que ele buscava na Filosofia da natureza que pudesse ajudar a compreender aquela realidade Nas ideias de Anaxágoras Sócrates não encontrou o princí pio que procurava A explicação reduziase às causas materiais e portanto era insuficiente para dar conta de entender e explicar a realidade e sua estrutura Na obra Fédon podemos observar como Platão apresenta por meio de Sócrates sua Teoria das Ideias No entanto sabemos Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 136 que a investigação socrática passava necessariamente pela ques tão do Bom Agathós que está nas próprias coisas Mas por que buscar pela Filosofia da natureza A resposta é simples porque ele estava à procura do princí pio da ordem humana e esse só poderia ser derivado do cosmos Kósmos ou seja tratase aqui da relação entre o microcosmo homem e o macrocosmo mundo há uma ordem que regula ambos Os gregos foram como já dissemos capazes de identificar e reconhecer as leis que atuam nas próprias coisas Está lembrado Tratandose de Filosofia da natureza Sócrates não encon trou nela a resposta que procurava Observemos esta passagem A crítica aos filósofos da natureza vem pois demonstrar indireta mente que a visão de Sócrates incidia desde o primeiro momento sobre o problema éticoreligioso JAEGER 1995 p 517518 Isso não nos lembra de acordo com a obra Apologia das acusações submetidas a Sócrates No entanto cabe notar que ele procurava uma base firme sobre a qual pudesse compreender e explicar a realidade do ponto de vista éticomoral Por isso recorreu à Filosofia da natureza isto é aos filósofos que o precederam Adotou então uma perspecti va antropológica em que o homem e sua estrutura física e corpo ral constituem ponto de partida para as suas reflexões Nesse sentido as contribuições de Empédocles no campo da medicina atraíram a atenção de Sócrates Vemos a partir deste ponto um deslocamento das reflexões filosóficas que até então se situavam no plano do cosmológico em direção à vida humana Claretiano Centro Universitário 137 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia 8 A IMPORTÂNCIA DO CORPO PARA OS GREGOS Procure retomar algumas considerações sobre a Cosmogo nia a Cosmologia e o Mito para os gregos na literatura que suge rimos nas unidades anteriores Em hermenêutica chamamos isso de précompreensão Vale considerar que ao nos colocarmos diante de uma pers pectiva filosófica antropocêntrica essa implica na noção de corpo Se existimos é mediante um corpo É o corpo que sofre tem pra zer é disciplinado exercitado se reproduz Esse conceito é impor tante na medida em que revela de forma muito clara a marca do pensamento socrático presente nos diálogos platônicos Costumase atribuir a Sócrates a distinção entre corpo e alma embora essa dicotomia porém foi pensada por Platão lembremos que nossa referência foi diretamente Platão e não seu mestre Ao falarmos do corpo não podemos esquecer a importân cia da ginástica naquele tempo A denominação ginástica inicial mente se referia aos variados tipos de atividade física sistematiza dos cujos fins variavam de atividades ligadas a atividades práticas de sobrevivência ou preparação militar Os gregos criaram as pri meiras escolas destinadas à preparação de atletas para exibições ginásticas em público em locais denominados ginásios De um fim prático os exercícios passaram a ser cultuados na busca pelo corpo e mente sãos além do culto à beleza do corpo expressado em obras de arte desse período Assim foi na Grécia antiga que a ginástica adquiriu o status de Educação Física pois passou a de sempenhar papel fundamental no sistema educativo grego para o equilíbrio harmônico entre as aptidões físicas e intelectuais Na obra A República há importantes considerações sobre a ginástica para a formação do indivíduo na pólis A forma como os gregos concebiam a importância do corpo não tem paralelo com o que hoje habitualmente fazemos Aliás sua concepção ultrapas Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 138 sava os limites do simplesmente estético e entendase estético aqui no sentido moderno porque para os gregos a estética tem um sentido mais amplo O que você acha de pesquisar um pouquinho para saber mais sobre esse conceito Para você ter um exemplo da importância do corpo para o povo grego procure pesquisar a respeito por exemplo do movimento renascentista que retomou justamente os valores culturais greco romanos Artistas como Michelangelo Da Vinci e outros se desta cavam pela perfeição simetria de suas obras É interessante notar que o conceito de beleza passa pelo cri vo da matemática como por exemplo proporção simetria etc Um rosto bonito portanto é simétrico e revela perfeição Voltemos ao conceito de ginásio o ateniense daqueles tempos sentiase mais no seu meio no ginásio do que entre as quatro paredes da sua casa onde dormia e comia Era ali sob a transparência do céu da Grécia que diariamente se reuniam novos e velhos para se dedicarem ao cultivo do corpo Os pedaços de lazer dos intervalos eram dedicados à conversa Quem tinha para dizer ou perguntar alguma coisa que considerava de interesse geral mas para a qual não eram locais adequados nem a assembléia do povo nem o tribunal corria ao ginásio para dizêla aos seus amigos e conhecidos JAEGER 1995 p 521522 O ginásio era o local por excelência para a ginástica do pen samento e só era comparado em termos dessa importância aos banquetes Procure ler a obra platônica O Banquete para entender um pouco mais desse contexto Essa ginástica do pensamento à qual nos referimos pode ser denominada como a nova Paideia cuja formação teve gran des contribuições da Filosofia socrática A dialética socrática é a contrapartida do método educativo sofista que já estudamos anteriormente Claretiano Centro Universitário 139 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia 9 A IMPORTÂNCIA DA OBRA APOLOGIA DE PLATÃO Ainda não conseguimos distinguir o pensamento de Sócrates e o de Platão Para isso devemos recorrer ao exame da importân cia da obra Apologia no momento em que ao ser condenado à morte Sócrates confessa enquanto viver jamais deixarei de filo sofar Sua maneira habitual de ensinar ou a conversação socrática é pautada por dois conceitos importantes a exortação protreptikos e a indagação elenchos Assim de acordo com Jaeger a Filosofia socrática é ao mesmo tempo uma exortação e uma Educação Com isso busca refutar o saber e a Excelência Areté apa rentes como pressuposto básico para localizar a essência do bem moral e ético Lembremonos de sua ironia o ignorante que se julga sábio e o sábio Sócrates que se julga ignorante Ora é aqui que nos deparamos com outro conceito caro à Filosofia socrática e que separará Sócrates de Platão o conceito de alma O essencial no estudo desta unidade sobre o exame do ho mem é a preocupação com a alma conforme é mencionado na Apologia em Protágoras ou no Fédon Vale ressaltar que esse conceito não se vincula ao difundido atualmente pelas religiões cristãs afinal historicamente é pré cristão assim como Sócrates também o é A Filosofia socrática exige um comportamento que vise ao cuidado com a alma Esta tem muito mais valor do que os bens materiais ou o corpo mas não significa que o corpo seja deprecia do Inclusive a respeito disso um autêntico princípio socrático foi bastante difundido em latim Mens sana in corpore sano Não significa portanto descuidar do corpo e como disse mos anteriormente para Sócrates o corpo e a alma não estão ne cessariamente separados Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 140 Em que consiste então a Paideia socrática Em algumas passagens da obra Memoráveis de Xenofonte encontramos uma expressão no mínimo curiosa serviço de Deus Bem sabemos que Sócrates foi précristão e que naquela época não havia uma religião monoteísta na Grécia Portanto con vém considerar que essa expressão não traz em seu bojo o sentido adotado pelos cristãos ou qualquer outro sentido de cunho reli gioso É natural também explicarmos por intermédio de Platão e Xenofonte os objetivos da Paideia socrática em detrimento à sofística Eis o que diz Jaeger 1995 p 538 sobre a definição da Pai deia dos sofistas A paidéia dos sofistas era uma colorida mistura de materiais de origem vária O seu objetivo era a disciplina do espírito mas não existia entre eles unanimidade quanto ao saber mais indicado para atingila pois cada um deles seguia estudos especializados e natu ralmente considera a sua disciplina como a mais conveniente de todas Nesse sentido a Educação preconizada pelos sofistas pade cia da falta do critério de cuidado com a alma e também por conta dos limites do alcance do conhecimento desses educadores Transferindo essa reflexão para os dias atuais nós não nos parecemos mais com os sofistas A ideia de saber especializado a fragmentação do saber e a falta de compromisso com a verdade não seriam alguns indicadores 10 POLÍTICA E ÉTICA EDUCACIONAL Somos seres de necessidade conforme uma vez afirmou Marx Precisamos do trabalho para sobreviver e não podemos ne gar os diversos fatores de ordem econômica e política que interfe rem nos acontecimentos históricos Não é verdade Claretiano Centro Universitário 141 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia Materialismo dialético de Marx O filósofo cientista social e historiador Karl Marx é sem dúvida um dos mais influentes pensadores políticos de todo o século 19 Especificamente em relação a essa referência estamos nos referindo a uma tese muito cara a Marx de que a natureza dos indivíduos tem vinculação direta com as condições materiais em que se encontram É claro que esse discurso não inviabiliza os conhecimentos específicos mas a questão é o que um determinado estudo pode contribuir efetivamente para a vida Quais são os limites Impõese aqui um problema ético nesse movimento educa cional instaurado por Sócrates Lembremos de que os sofistas não tinham outra pretensão além da formação de dirigentes políticos e que a preocupação so crática estava voltada para a formação do caráter Dissemos que a Educação de Sócrates era política Como po demos caracterizála afinal Sua política no entanto não pode ser confundida com a teo ria platônica presente nas obras A República e Górgias Sócrates era considerado um mau democrata como já dis semos e não se envolvia com a vida política da época e de sua cidade porém educava politicamente Como podemos falar de política educar politicamente sem nos envolvermos com essas questões diariamente A compreensão do que Sócrates quis dizer sobre a Educação deve ser política A esse respeito veja o que Jaeger 1995 p 546 547 observa Tem necessariamente de educar o Homem para uma de duas coi sas para governar ou ser governado Já na alimentação se começa a marcar a diferença entre estes dois tipos de educação O Homem que é educado para governar tem de aprender a antepor o cumpri mento dos deveres mais prementes à satisfação das necessidades físicas Tem de sobrepor à fome e à sede Tem de se acostumar a dormir pouco a deitarse tarde e a se levantar cedo Nenhum tra balho o deve assustar por árduo que seja Não se deve deixar atrair pelo engodo dos prazeres dos sentidos quem não é capaz de tudo isso fica condenado a figurar entre as massas governadas Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 142 Vemos dessa forma a contribuição socrática para a forma ção política do indivíduo na pólis grega em um sentido mais am plo do que o simples domínio de técnicas 11 A PAIDEIA SOCRÁTICOPLATÔNICA Nesse breve estudo procuramos apresentar alguns dos ele mentos que caracterizariam a proposta de Paideia em Sócrates e Platão Dentre esses elementos gostaríamos de destacar a questão da construção de uma virtude moral o homem e sua vinculação com a pólis e consequentemente uma valorização da formação e participação política Nesse sentido gostaríamos de lhe apresentar uma proposta de Villagra Diez 2002 que em nossa análise tratase de uma sín tese de alguns conceitos da nova Paideia para a qual contribuíram Sócrates e em especial em Platão Para Villagra Diez 2002 p 9 essa nova proposta de Paideia manifestase na necessidade de se educar na Areté através do logos para a pólis Como se percebe há vários aspectos interessantes presen tes nessa afirmação O ideal de Areté permanece mas de forma diferente da Areté heroica de Homero ou ainda da Areté moral do trabalhador manifestada em Hesíodo Nesse momento temos o uso do logos para o exercício da Areté Não basta mais ser corajoso e ter boas virtudes morais mas além disso passar a utilizar o logos pois o logos é bem maior de cada um e permitirá ao homem a realização da sua Excelência em plenitude Não bastasse isso o exercício do logos deve estar a ser viço não só do indivíduo mas da comunidade como um todo pois o indivíduo está para a pólis e a pólis está para o indivíduo Torna se necessário assim que o indivíduo seja educado de modo que possa exercer adequadamente suas funções na sua cidadeestado Claretiano Centro Universitário 143 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia Essa nova proposta de Paideia sintetizada por Villagra Diez como a de educar para o Bem nos faz refletir Temos hoje no uso da razão uma Excelência a ser buscada e ao realizarmos essa Excelência pensamos em exercitála a serviço de um bem maior que nos permita colaborar com a comunidade no qual estamos inseridos Consideramos importante que você reflita sobre essa ques tão pois conforme veremos na próxima unidade o tema será de suma importância quando lidarmos com a contemporaneidade Agora vamos avançar um pouco mais e apresentarmos al guns desdobramentos da Paideia grega manifestada na Paideia aristotélica 12 A PAIDEIA ARISTOTÉLICA O HOMEM E A PÓLIS A proposta de Paideia socráticoplatônica trouxe novas nu ances e possibilidades de entendimento à criação de um ideal de Paideia O mesmo poderá se dizer de Aristóteles o único filósofo do período clássico que rivaliza com Platão em primazia e impor tância na cultura ocidental Aristóteles nasceu na cidade grega de Estagira e mudouse para Atenas onde foi considerado o aluno mais brilhante de Pla tão Ele ousou a partir de suas originais propostas filosóficas apre sentar contrapontos interessantes ao que foi proposto por Platão E quais seriam suas contribuições ao tema aqui proposto Inicialmente podemos dizer que Aristóteles adotou uma posição diferente com relação ao idealismo platônico Enquanto para Pla tão existem conceitos ideais e esses serviriam para guiar os ho mens no desafio da construção de seus ideais em Aristóteles exis te a convicção de que não é possível aplicar conceitos ideais em todos os momentos da vida pois como ela é múltipla mutável e imprevisível é sempre necessário que o homem adeque suas ações a partir das situações com as quais se depara Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 144 Segundo Cottingham apud COAD 2006 p 74 a concepção aristotélica predominante de boa vida envolveria o florescimento harmonioso de nossas capacidades humanas sob as orientações gerais da razão Além disso há uma profunda vinculação da Excelência hu mana e sua vinculação com a pólis pois a construção de um ethos caráter passa necessariamente pela participação política que busque a realização de um bem comum para todos pois Considerado sob o ângulo da autossuficiência o raciocínio parece chegar ao mesmo resultado porque o bem absoluto é considerado como autossuficiente Ora por autossuficiente não entendemos aquilo que é suficiente para um homem só para aquele que leva uma vida solitária mas também para os pais os filhos a esposa e em geral para os amigos e concidadãos visto que o homem nasceu para a cidadania Mas é necessário traçar aqui um limite porque se estendermos os nossos requisitos aos antepassados aos descendentes e aos amigos dos amigos teremos uma série infinita ARISTÓTELES 1991 p 15 E como o homem pode se tornar Excelente Para Aristóte les o caminho da virtude passaria pelo exercício equilibrado de suas qualidades e nesse sentido existiria um elemento central o exercício da prudência phronesis ou seja a capacidade de não somente tomar decisões que lhe permitam atingir um determina do fim mas também lhe permitam determinar fins bons e consis tentes com o objetivo de viver bem de forma geral e ampla Nesse sentido Coad 2006 apresentanos uma metáfora com um jogador de golfe para exemplificar essas considerações que estamos lhe apresentando Procure refletir um jogador de golfe é aquele que em sua prática esportiva tem de realizar cál culos precisos fazendo uso do logos para saber a força certa o exercício equilibrado de virtudes a ser ministrada em uma bola a vida cotidiana para que atinja um buraco ou os vários buracos até a meta final ou fim do jogo a felicidade do indivíduo via participa ção plena na pólis Há de se ressaltar a importância dessas considerações para o momento atual em que estamos vivendo isso porque muitas Claretiano Centro Universitário 145 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia vezes não fazemos uso do logos ou sequer nos lembramos da im portância de seu uso Normalmente deixamosnos levar por ele mentos instintivos em nossas decisões e não bastasse isso sequer temos estabelecido um caminho ou o que é mais importante um télos ou finalidade que nos direcione A partir disso consideramos que já existem elementos sufi cientes para lidarmos com o conceito de Kalós e Agathós aristoté lico Segundo Coad 2006 p 80 Aristóteles ensinou que se a pessoa não adquire os princípios do comportamento ético na família ele deverá encontrálos na comu nidade Assim é a comunidade que educa e para a comunidade que uma pessoa deve continuamente contribuir O ideal de Kalós Kagathós pode somente estar presente no indivíduo completo que é senhor de todas as virtudes e também um respeitável membro da comunidade Com isso terminamos essa pequena análise de alguns gran des pensadores e após essa análise verificaremos alguns dos des dobramentos que ocorreram ao longo do tempo em torno do ideal de Paideia 13 DESDOBRAMENTOS DA PAIDEIA GREGA O humanismo romano Após as considerações que fizemos a respeito da Paideia no decorrer do Período Clássico da Filosofia nos deteremos agora em um desdobramento muito importante da Paideia o Humanis mo Buscaremos debater algumas peculiaridades desse conceito e os elementos novos que ele traz consigo para novas interpreta ções e aprofundamentos em relação ao conceito de Paideia Inicialmente podemos dizer que certamente você de algu ma forma já teve contato com esse conceito Por exemplo quan do algo abominável causa indignação e dizse que é preciso res gatar o valor do humano ou ainda quando se pensa em ideias que poderiam vir a resgatar a humanidade presente em cada um Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 146 Nesse exercício de possibilidades manifestase a ideia de que a especificidade humana carrega consigo características especiais e em razão disso devem ser valorizadas Se lhe perguntarmos se existem semelhanças entre o ideal de Paideia e de humanidade muito provavelmente você dirá que sim e essa semelhança não ocorre por acaso pois como veremos o conceito de humanidade advirá como desdobramento dos ideais de Paideia Werner Jaeger realiza essa vinculação entre ambos os con ceitos e isso pode ser percebido no excerto a seguir o princípio espiritual dos gregos não é o individualismo mas o humanismo para usar a palavra no seu sentido clássico e orig inário Humanismo vem de humanitas Pelo menos desde o tempo de Varrão e Cícero esta palavra teve ao lado da acepção vulgar e primitiva de humanitário que não nos interessa aqui um segundo sentido mais nobre e rigoroso Significou a educação do Homem de acordo com a verdadeira forma humana com o seu autêntico ser Tal é a genuína Paidéia grega considerada como modelo por um homem de Estado romano JAEGER 2003 p 14 No entanto embora haja essa tentativa de vinculação entre ambos os conceitos o conceito de humanitas carrega consigo uma série de peculiaridades pois segundo Oniga 2010 p 1 A idéia de humanitas matura lentamente na passagem do mundo grego ao mundo romano A língua grega não possui nenhuma pa lavra que seja de todo equivalente à latina humanitas A tentativa de Werner Jaeger de identificar a humanitas latina com a Paidéia grega sobre a base de um testemunho de uma célebre passagem de Aulo Gellio tem sido justamente refutada pela maior parte dos estudiosos E como então surgiu esse conceito e qual o seu significado Antes de caminharmos na tentativa de resolução desse questiona mento convém que façamos uma breve contextualização histórica sobre o período que iremos nos deter para dar conta da resposta Inicialmente devemos dizer que os caminhos para essa con textualização começam a se engendrar a partir da referência a um dos alunos de Aristóteles Alexandre o Grande Como se sabe Ale Claretiano Centro Universitário 147 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia xandre é tido como um dos maiores conquistadores de todos os tempos e quando de seu apogeu a influência da cultura grega se fez valer por quase todo o mundo conhecido na época Após a sua morte ocorrida em 323 aC viria a ocorrer o período histórico cultural chamado Helenismo Chauí 2010 p 1314 caracteriza esse período da seguinte forma Os historiadores da cultura convencionaram designar Helenismo as atividades culturais desenvolvidas no período transcorrido en tre a morte de Alexandre Magno em 323 aC e o fim da repú blica romana em 31 aC quando Augusto vencedor da batalha de Actium em 27 aC se torna imperador de Roma A designação referese à presença dominante da língua e da cultura gregas em todo o mundo conhecido numa difusão sem precedentes cuja cau sa inicial foi a convicção de Alexandre aluno de Aristóteles de que por seu intermédio a Grécia devia cumprir uma missão civilizatória sobre todos os povos da terra A língua grega transformouse na koiné dialeto comum em todas as terras conquistadas por Alexan dre e Alexandria no Egito tornouse a capital cultural da Antigui dade papel que conservou mesmo quando Roma ocupou o lugar de centro político e econômico de um império que se estendia do Próximo Oriente ao Sul da Europa do Mediterrâneo ao Atlântico Embora o termo Helenismo pareça indicar apenas a hegemonia da cultura grega na realidade exprime a comunicação intensa entre as criações culturais helênicas e as orientais enquanto submetidas a um mesmo e único poder central ligadas por rotas comerciais e tendo como ponto de encontro Alexandria e mais tarde Roma É exatamente sobre o período de dominação romana que iremos nos deter isso porque conforme veremos nesse período acrescentase o conceito de Humanismo ao ideal de Paideia O que seria esse conceito Segundo Ferrater Mora 1970 p 876 esse conceito passou por uma série de modificações e atualmen te é utilizado sobretudo Para qualificar certas tendências filosóficas especialmente aquelas nas quais se põe em relevo algum ideal humano Como os ideais humanos são muitos tem proliferado os humanismos algumas destas tendências se caracterizam pela insistência na noção de pes soa em contraposição a idéia de indivíduo Outras tendências se caracterizam por predicar a sociedade aberta contra a sociedade fechada Outras por destacar o caráter fundamental social do ser humano Outras por colocar em relevo que o homem não se reduz a nenhuma função determinada mas que é uma totalidade Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 148 Como você pôde perceber são muitas as interpretações e os usos desse conceito Em sua gênese segundo Oniga 2009 embo ra fosse usado em peças teatrais romanas em aproximadamente 100 aC se destaca nas obras de Varrão e em especial de Marco Túlio Cícero 106 aC43 aC E o que o Humanismo representava para essa época Oniga 2009 p 2 conclui a partir das leituras que realizou das obras do historiador Wofgang Schadewaldt que a essência da romana humanitas é precisamente ser a outra face de um conjunto ordenado de valores muito precisos e rigorosos que faziam parte do código de conduta do cidadão romano desde o início e são quase impossíveis de traduzir para o grego a piedade que é algo diferente do eusebéia costumes não exatamente co incidindo com o ethos e então o dignitas o gravitas integritas e assim por diante Na idéia de humanitas ele incorporou todos es ses valores bem como aqueles que já tiveram a oportunidade de experimentar a idéia de cultura mas ao mesmo tempo ele se des vanecia se tornava menos rígido e mais universal Ainda segundo Oniga 2009 p 6 especificamente na obra De oratore de Cícero temos o uso do conceito de humanitas como cultura enciclopédica sobretudo literária mas não só na concepção ciceroniana o orador se caracteriza por sua vasta cultu ra não restrita ao próprio setor profissional mas aberta a todas as disciplinas O orador deve sobressairse in omni genere sermonis et humanitatis em qualquer tipo de conversa e em tudo que diz respeito ao homem in omni recto Studio atque humanitate ho nestos em todos os estudos e todos os aspectos do conhecimento humano Nesse excerto podemos observar alguns dos elementos re ferentes ao conceito humanitas ciceroniano Dentre eles ressal tamos a ênfase na superação na excelência do orador em tudo aquilo que faz e não somente em sua área ou seja a busca da perfeição em tudo aquilo que diz respeito ao homem Além desses aspectos Oniga 2009 p 7 também nos chama a atenção para a presença sempre constante na obra de Cícero da expressão communis humanitas indicando também a natureza humana enfatizando a igualdade fundamental dos ho Claretiano Centro Universitário 149 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia mens e das comunidades constituindo uma raça um único gênero humano Como se percebe nessa expressão estaria presente a ideia da Excelência não somente no indivíduo mas em todos os indiví duos e a vinculação entre todos eles única e exclusivamente pelo fato de serem humanos Consideramos esse aspecto sobremanei ra importante pois ele acaba por apresentar a possibilidade de um ideal de Excelência não somente em um homem e seu povo mas em todos os seres humanos pois o que temos em comum acaba por fazer com que todos nós tenhamos certas qualidades em co mum e isso traz consigo uma proposta inusual e includente Para ilustrar essa afirmação cabe mais uma vez nos ampa rarmos nas palavras de Cícero na obra De Finibus apud ONIGA 2009 p 7 Daí seguese que a atração mútua entre os seres humanos também é algo natural O simples fato de sua humanidade comum exige que um homem não encare outrem como outro homem Com isso podemos concluir que o termo humanitas acaba por trazer novos elementos ao conceito de Paideia pois convida todos os seres humanos somente pelo fato de serem humanos a exercitarem a sua Excelência em todas as áreas e possibilidades pois tal conduta seria de sua natureza Desse modo podemos concluir esse novo desdobramento do conceito de Paideia e avançarmos um pouco mais agora lidan do com o conceito de Paideia Christi A Paideia Christi Embora Jaeger seja muito conhecido a partir de suas consi derações sobre a Paideia grega ele também compôs uma análise das influências dessa Paideia no cristianismo primitivo Suas con siderações a respeito desse tema foram compiladas em uma obra intitulada Early christianity and greek Paideia Cristianismo primiti vo e Paideia grega Essa obra foi publicada em 1961 e originouse das conferências realizadas na Universidade de Harvard em 1960 Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 150 Infelizmente o pesquisador faleceu antes de concluir seus estudos ainda assim grande é sua contribuição para poder traçar alguns elementos importantes a respeito desse tema De forma sintética podemos dizer que para Jaeger a civi lização grega exerceu uma influência profunda na mente cristã acreditando inclusive que sem a evolução pósclássica da cultura grega o surgimento de uma religião cristã mundial não teria acon tecido Para Jaeger a Areté grega acabou por ser um instrumento chave para o florescimento do cristianismo Para validar essas con siderações analisa textos bíblicos e avalia líderes religiosos como Gregório de Nissia exemplos de variações da Paideia grega Dentre os muitos aspectos abordados por Jaeger a respeito desse tema citamos um em especial ao se referir ao livro bíblico Atos dos Apóstolos em que Felipe se apresenta para os gregos e expõe a Paideia de Cristo ou Paideia Christi Para Jaeger 1995 p 12 ao chamar de Cristianidade a Paidéia de Cristo o imitador afirma a intenção do apóstolo de fazer da Cristianidade aparentar ser a continuação da clássica paidéia grega Do que foi dito você talvez esteja se perguntando a respeito das diferenças existentes entre ambas as propostas de Paideia e para responder a essa questão há uma síntese muito interessante proposta por Villanou 2001 sp A metafísica cristã oferece um marco teonomo para regular a for mação humana se deve eliminar qualquer possível manifestação egoísta porque o ser humano somente pode fazerse com Deus quer dizer através da unidade inseparável com Deus o que é o mesmo por meio da realização harmoniosa do humano e do divino Por esta via a pedagogia se converte em mistagogia isto é na experiência mística de Deus A educação do homem é ofereci mento renúncia ao egoísmo para afrontar a entrega altruísta que exige o reino do amor Essa proposta de Paideia traz uma nova visão do homem e sua função no mundo pois Este planteamento supõe que o indi Claretiano Centro Universitário 151 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia víduo já não encontre sua razão de ser no próprio eu mas na fun ção dessa vocação altruísta desse amor ao próximo VILLANOU 2001 sp Há de se dizer que as contribuições da Paideia Christi se mos tram presentes atualmente sobretudo na chamada relação eu e o outro ou seja nela os desdobramentos da Areté referemse à consideração e à valorização dos demais seres humanos Dada as especificidades desta disciplina não nos alonga remos nesse desdobramento mas lhe indicamos para que você aprofunde suas pesquisas sobre o tema no estudo de Antropologia Filosófica no qual se encontra uma abordagem que lhe apresenta rá vários pensadores que se inspiram nessa proposta e que certa mente lhe ajudarão a perceber a originalidade dessa contribuição A Bildung Vamos agora apresentar outro desdobramento interessan te da Paideia grega desenvolvido essencialmente por pensadores alemães e por eles denominado Bildung formação De modo preliminar vamos examinar uma expressão cunha da pelos pensadores alemães que se identificaram com essa pro posta por meio do relato de Villanou 2001 sp Bilde dich griegisch isto é formese com um grego esteve canalizada por uma série de tradições e obras que culminam no século XX com a Paidéia de Jaeger em seu intento de implantar no meio da crise dos anos de entre guerras 19191939 um ide alismo de corte platônico capaz de espiritualizar de novo a vida humana Há de se dizer que esse conceito teve uma longa evolução ao longo do tempo e pode ser percebido no texto de Kant intitulado O que é a Ilustração apud RÉGIS 2001 que nos convida a realizar um ato de coragem e ousadia pela busca do saber sapere aude ou ainda já se fazendo uso do conceito de Bildung na produção de autoria do pensador alemão Wilhelm Von Humboldt em uma série de obras que tratam deste tema Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 152 De modo geral poderíamos dizer que a Bildung alemã tem profundas raízes no conceito de Paideia que estamos vivenciando e especificamente no contexto alemão buscou defender a neces sidade e valor do autocultivo ou ainda da autoformação do ser humano como um elemento caro para o desenvolvimento de suas potencialidades Para ilustrar as necessidades e valores defendidos pela Bildung observe esse pequeno excerto com considerações feitas por Humboldt apud GIACOMONI 2001 sp que afirma que temos um desejo irresistível de medir toda a humanidade contra nós mesmos quem suprime a expressão deste desejo supremo mes mo para o melhor dos motivos estará sempre longe da verdade Como se percebe nesse excerto está presente a ideia de que constantemente nos medimos tendo como elemento de referên cia a humanidade Se nos negamos a realizar essa comparação e nos afastamos dessa análise acabamos por enganar a nós mes mos Ainda para Giacomoni 2001 sp em Humboldt a Bildung é vista mais do que tudo como um acordo dinâmico como um impulso vivo o universo é visto como animado por uma for ça por uma energia dentro de atos que lhe dá vida movimento e ritmo É uma força que sendo o centro de animação e molde de cada realidade é a explicação última e escondido ser O que move o mundo e a história acima de tudo move o homem pressionandoo a agir e expressar em si mesmo como um desejo primário e sem ne nhum outro objetivo que a reprodução de seu próprio movimento e pesquisa o homem como parte da natureza é impulso energia um desejo irresistível para viver de um modo multiforme Consideramos que você depois da análise realizada nesta unidade já possui elementos suficientes para compreender a in fluência do pensamento dos gregos nas propostas educativas do ocidente Na próxima unidade você terá a oportunidade de analisar algumas considerações críticas sobre a Paideia e a importância desse tema para pensarmos a Educação contemporânea Claretiano Centro Universitário 153 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia 14 TEXTOS COMPLEMENTARES Veja no trecho a seguir da Defesa de Sócrates ou Apologia de Sócrates de Platão e avalie as constatações de Sócrates Ciência e Missão de Sócrates Um de vós poderia intervir Afinal Sócrates qual é a tua ocupação Donde pro cedem as calúnias a teu respeito Naturalmente se não tivesses uma ocupação muito fora do comum não haveria esse falatório a menos que praticasses algu ma extravagância Dizenos pois qual é ela para que não façamos nós um juízo precipitado Teria razão quem assim falasse tentarei explicarvos a procedência dessa reputação caluniosa Ouvi pois Alguns de vós achareis talvez que estou gracejando mas não tenhais dúvida eu vos contarei toda a verdade Pois eu Atenienses devo essa reputação exclusivamente a uma ciência Qual vem a ser a ciência A que é talvez a ciência humana É provável que eu a possua real mente os mestres mencionados há pouco possuem quiçá uma sobrehumana ou não sei que diga porque essa eu não aprendi e quem disser o contrário me estará caluniando Por favor Atenienses não vos amotineis mesmo que eu vos pareça dizer uma enormidade a alegação que vou apresentar nem é minha citarei o autor que considerais idôneo Para testemunhar a minha ciência se é uma ciência e qual é ela vos trarei o deus de Delfos Conhecestes Querefonte decerto Era meu amigo de infância e também amigo do partido do povo e seu companheiro naquele exílio de que voltou conosco Sabeis o temperamento de Querefonte quão tenaz nos seus empreendimentos Ora certa vez indo a Del fos arriscou esta consulta ao oráculo repito senhores não vos amotines ele perguntou se havia alguém mais sábio que eu respondeu a Pítia que não havia ninguém mais sábio Para testemunhar isso tendes aí o irmão dele porque ele já morreu Examinai por que vos conto eu esse facto é para explicar a procedência da calú nia Quando soube daquele oráculo pusme a refletir assim Que quererá dizer o deus Que sentido oculto pôs na resposta Eu cá não tenho consciência de ser nem muito sábio nem pouco que quererá ele então significar declarandome o mais sábio Naturalmente não está mentindo porque isso lhe é impossível Por longo tempo fiquei nessa incerteza sobre o sentido por fim muito contra meu gosto decidime por uma investigação que passo a expor Fui ter com um dos que passam por sábios porquanto se havia lugar era ali que para rebater o orá culo mostraria ao deus Eis aqui um mais sábio que eu quando tu disseste que eu o era Submeti a exame essa pessoa é escusado dizer o seu nome era um dos políticos Eis Atenienses a impressão que me ficou do exame e da conver sa que tive com ele achei que ele passava por sábio aos olhos de muita gente principalmente aos seus próprios mas não o era Metime então a explicar lhe que supunha ser sábio mas não o era A consequência foi tornarme odiado dele e de muitos dos circunstantes Ao retirarme ia concluindo de mim para comigo Mais sábio do que esse ho mem eu sou é bem provável que nenhum de nós saiba nada de bom mas ele supõe saber alguma coisa e não sabe enquanto eu se não sei tampouco supo nho saber Parece que sou um nadinha mais sábio que ele exatamente em não supor que saiba o que não sei Daí fui ter com outro um dos que passam por Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 154 ainda mais sábios e tive a mesmíssima impressão também ali me tornei odiado dele e de muitos outros Depois disso não parei embora sentisse com mágoa e apreensões que me ia tornando odiado não obstante pareciame imperioso dar a máxima importância ao serviço do deus Cumpriame portanto para averiguar o sentido do oráculo ir ter com todos os que passavam por senhores de algum saber Pelo Cão Ate nienses Já que vos devo a verdade juro que se deu comigo mais ou menos isto investigando de acordo com o deus achei que aos mais reputados pouco faltava para serem os mais desprovidos enquanto outros tidos como inferiores eram os que mais visos tinham de ser homens de senso Devo narrarvos os meus vaivéns nessa faina de averiguar o oráculo Depois dos políticos fui ter com os poetas tanto os autores de tragédias como os de ditirambos e outros na esperança de aí me apanhar em flagrante inferioridade cultural Levando em mãos as obras em que pareciam ter posto o máximo de sua capacidade interrogavaos minuciosamente sobre o que diziam para ir ao mesmo tempo aprendendo deles alguma coisa Pois bem senhores coro de vos dizer a verdade mas é preciso A bem dizer quase todos os circunstantes pode riam falar melhor que eles próprios sobre as obras que eles compuseram Assim logo acabei compreendendo que tampouco os poetas compunham suas obras por sabedoria mas por dom natural em estado de inspiração como os adivinhos e profetas Estes também dizem muitas belezas sem nada saber do que dizem o mesmo apurei se dá com os poetas ao mesmo tempo notei que por causa da poesia eles supõem ser os mais sábios dos homens em outros campos em que não o são Saí pois acreditando superálos na mesma particularidade que aos políticos Por fim fui ter com os artífices tinha consciência de não saber a bem dizer nada e certeza de neles descobrir muitos belos conhecimentos Nisso não me enganava eles tinham conhecimentos que me faltavam eram assim mais sá bios e eu Contudo Atenienses achei que os bons artesãos têm o mesmo defeito dos poetas por praticar bem a sua arte cada qual imaginava ser sapientíssimo nos demais assuntos os mais difíceis e esse engano toldavalhes aquela sabe doria De sorte que perguntei a mim mesmo em nome do oráculo se preferia ser como sou sem a sabedoria deles nem sua ignorância ou possuir como eles uma e outra e respondi a mim mesmo e ao oráculo que me convinha mais ser como sou Dessa investigação é que procedem Atenienses de um lado tantas inimizades tão acirradas e maléficas que deram nascimento a tantas calúnias e de outro essa reputação de sábio É que toda vez os circunstantes supõem que eu seja um sábio na matéria em que confundo a outrem O provável senhores é que na realidade o sábio seja o deus e queira dizer no seu oráculo que pouco va lor ou nenhum tem a sabedoria humana evidentemente se terá servido deste nome de Sócrates para me dar como exemplo como se dissesse O mais sábio dentre vós homens é quem como Sócrates compreendeu que sua sabedoria é verdadeiramente desprovida do mínimo valor Por isso não parei essa investi gação até hoje vagueando e interrogando de acordo com o deus a quem seja cidadão seja forasteiro eu tiver na conta de sábio e quando julgar que não o é coopero com o deus provandolhe que não é sábio Essa ocupação não me permitiu lazeres para qualquer atividade digna de menção nos negócios públicos nem nos particulares vivo numa pobreza extrema por estar ao serviço do deus Além disso os moços que espontaneamente me acompanham e são os que Claretiano Centro Universitário 155 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia dispõem de mais tempo os das famílias mais ricas sentem prazer em ouvir o exame dos homens eles próprios imitam me muitas vezes nessas ocasiões metemse a interrogar os outros suponho que descobrem uma multidão de pessoas que supõem saber alguma coisa mas pouco sabem quiçá nada Em consequência os que eles examinam se exasperam contra mim e não contra si mesmos e propalam que existe um tal Sócrates um grande miserável que corrompe a mocidade Quando se lhes pergunta por quais atos ou ensinamentos não têm o que responder não sabem mas para não mostrar seu embaraço aduzem aquelas acusações contra todo filósofo sempre à mão os fenômenos celestes o que há sob a terra a descrença dos deuses o prevalecimento da razão mais fraca Porque suponho não estariam dispostos a confessar a verdade terem dado prova de que fingem saber mas nada sabem Como são ciosos de honrarias tenazes e numerosos persuasivos no que dizem de mim por se confirmarem uns aos outros não é de hoje que eles têm enchido vossos ouvidos de calúnias assanhadas Daí a razão de me atacarem Meleto Ânito e Licão tomando Meleto as dores dos poetas Ânito as dos artesãos e políticos e Licão as dos oradores Destarte como dizia ao começar eu ficaria surpreso se lograsse em tão curto prazo delir em vós os efeitos dessa calúnia assim avo lumada Aí tendes Atenienses a verdade em meu discurso não vos oculto nada que tenha alguma importância nada vos dissimulo Sem embargo sei que me estou tornando odioso por mais ou menos os mesmos motivos o que comprova a verdade do que digo que é mesmo essa a calúnia contra mim e são mesmo essas as suas causas É o que haveis de descobrir se investigardes agora ou mais tarde PLATÃO 1987 p 810 15 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS Confira a seguir as questões propostas para verificar o seu desempenho no estudo desta unidade 1 Relacione as colunas 1 Exortação e indagação Platão 2 Corpo e alma Sócrates 3 Perspectiva antropológica Protreptikos e elenchos 4 Sofistas Formação do caráter 5 Socrática Dirigentes políticos Indique a alternativa correta a 2 3 1 5 e 4 b 3 2 5 1 e 4 c 2 3 5 4 e 1 d 5 4 2 3 e 1 e 1 3 2 4 e 5 Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 156 2 Leia o texto a seguir Tinham razão Aristóteles e Platão uma sociedade fundada no trabalho escravo não podia assegurar cultura para todos O rendimento da força humana era tão exíguo que um homem não podia estudar e trabalhar ao mesmo tempo Portanto aos filósofos caberia a direção da sociedade aos guerreiros protegela e aos escravos manter as duas classes anteriores A separação entre força física e força mental impunha ao mundo antigo estas duas enormidades para trabalhar era necessário gemer nas misérias da escravidão e para estudar era preciso refugiarse no egoísmo da solidão PONCE 1986 p 32 Nesse contexto I Platão e Aristóteles acreditavam na educação integral do ser huma no por isso criaram a Academia e o Liceu II Sócrates ensinava Filosofia para grupos de diversas classes sociais com isso almejava a justiça social III Os sofistas ensinavam a quem pagasse por suas aulas IV Os escravos jamais poderiam estudar na sociedade grega eles deve riam propiciar o ócio aos senhores e aos filósofos V Os filósofos na Grécia antiga pensavam em justiça para todos e por isso jamais aceitariam a manutenção do sistema escravista Identifique a alternativa correta a Apenas I III e IV são corretas b Apenas I II e III são corretas c Apenas II e V são corretas d Apenas III e IV são corretas e Apenas IV e V são corretas 3 De acordo com Sócrates a vida não examinada não vale a pena ser vivida e a virtude é conhecimento porque a a existência humana é valiosa precisamente porque todos nós estamos interessados em examinar a nossa vida b a menos que a nossa sociedade nos diga o que devemos fazer nós nunca vamos ser considerados virtuosos c a Excelência ou valor Areté da nossa vida consiste na medida em que agimos virtuosamente d sem perguntar o que faz com que a vida valha a pena não podemos saber como devemos viver 4 Sócrates teria afirmado que a vida não examinada não vale a pena ser vivi da afirmativa frequentemente citada como tema central nas atividades da Filosofia e de realização da excelência humana Dessa afirmação podemos entender que Claretiano Centro Universitário 157 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia a às vezes simplesmente não vale a pena todo o esforço de examinar a vida e seus problemas em grandes detalhes às vezes é melhor simples mente ir em frente b sempre que tivermos de adotar uma atitude reflexiva perante a vida adotamos uma atitude interessante no entanto é mais importante que simplesmente vivamos e deixemos de lado reflexões a respeito da vida c para o filósofo se continuamos simplesmente fazendo o que todo mun do faz de forma irrefletida acabaremos por deixar de fazer algo válido nobre ou admirável d é um desperdício de tempo ficarmos analisando se vale a pena viver devemos deixar essa reflexão para nossos líderes e para os filósofos 5 Relacione as colunas 1 Esta expressão teve como significado Bilde dich griegisch isto é forme se com um grego e foi utilizada para representar um movimento que aconteceu sobretudo na Alemanha e que buscou resgatar os ideais da Paideia grega Aristóteles 2 Por meio deste conceito surge uma nova imagem dos ideais da Paideia esta presente sobretudo nas obras de Cícero e nos convida a pensar um ideal de Excelência para o indivíduo e a sociedade Paideia Christi 3 A pedagogia convertese em uma mistagogia isto é vinculase a um contato íntimo com Deus e introduz uma nova série de valores aos ideais educativos e em especial entre a relação Eu e Outro Bildung 4 Introduz uma nova forma de pensarmos o conceito de Kalós e Agathós que irão compor nossa Excelência e ideal educativo Nesta nova forma há uma especial ênfase na relação entre o indivíduo e a comunidade Humanismo Indique a alternativa correta a 3 4 2 e 1 b 4 1 2 e 3 c 2 3 1 e 4 d 1 2 3 e 4 e 4 3 1 e 2 Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 158 Gabarito 1 a 2 b 3 d 4 c 5 e 16 CONSIDERAÇÕES FINAIS Você estudou nesta unidade alguns aspectos sobre a impor tância de Sócrates para compreendermos o conceito de Educação Logo a seguir vimos as contribuições advindas das propostas de Platão e Aristóteles Depois realizamos um breve estudo sobre alguns desdo bramentos da Paideia manifestados nos conceitos de Humanis mo Paideia Christi e Bildung No entanto isso não significa que a pesquisa sobre o tema tenha se esgotado com este estudo Muito mais há porém por estudar a respeito do que lhe apresentamos e infelizmente este modesto CRC não daria conta de trabalhar com mais profundidade do que já nos propusemos Além disso há de se dizer que as obras clássicas indicadas ao longo das unidades são essenciais para a apropriação de seu conteúdo Essas indicações ampliarão seu conhecimento sobre o assunto Depois do que lhe foi apresentado nesta unidade procure realizar a seguinte reflexão Quais relações são possíveis de se es tabelecer entre o conteúdo aqui discutido e o contexto sociocultu ral em que vivemos Seja coautor de nossa caminhada Lembrese da afirmativa de Sócrates Vida sem reflexão não vale a pena ser vivida Claretiano Centro Universitário 159 U4 Evolução e desdobramentos do conceito de Paideia 17 EREFERÊNCIAS Sites pesquisados GIACOMONI P Paideia as Bildung in Germany in the age of enlightenment Disponível em httpwwwbueduwcpPapersModeModeGiachtm Acesso em 19 abr 2012 VILLANOU C De la Paideia a la Bildung hacia una Pedagogía Hermenéutica Revista Por tuguesa de Educação Minho v 14 n 2 2001 Disponível em httpredalycuaemex mxsrcinicioArtPdfRedjspiCve37414210 Acesso em 19 abr 2012 18 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARISTÓTELES Ética a Nicômaco São Paulo Nova Cultural 1991 CHAUÍ M Introdução à história da Filosofia as filosofias helenísticas São Paulo Schwarcz Ltda 2010 COAD G A philosophical inquiry into the development of the notion of Kalos Kagathos from Homer to Aristotle Masters thesis Fremantle University of Notre Dame Australia Fremantle 2006 JAEGER W Cristianismo primitivo e Paideia grega Lisboa Edições 70 2001 Paidéia a formação do homem grego São Paulo Martins Fontes 1995 Early christianity and greek Paideia Cambridge Belkmap Press of Harvard University Press 1961 KANT I O que é ilustração Apud RÉGIS C A Kant a liberdade o indivíduo e a república In WEFFORT F Org Os clássicos da política São Paulo Ática 2001 v 2 MORA J F Dicionário de Filosofia Buenos Aires Editorial Sudamericana 1970 ONIGA R Humanitas In Contro la postreligione per un nuovo umanesimo cristiano Verona Fede Cultura 2009 PLATÃO Apologia de Sócrates São Paulo Nova Cultural 1999 Coleção Os Pensadores Diálogos O Banquete Fédon Sofista Político São Paulo Nova Cultural 1991 Coleção Os Pensadores Defesa de Sócrates 4 ed São Paulo Nova Cultural 1987 Coleção Os Pensadores Sócrates A República São Paulo Abril Cultural 1972 Górgias Tradução de Jaime Bruna 3 ed Rio de Janeiro Bertrand Brasil 1989 Fedro Cartas Primeiro Alcebíades Tradução de Carlos Alberto Nunes Belém UFPA 1986 Coleção Amazônica Série Faria Brito PONCE A Educação e luta de classes São Paulo Cortez 1986 REALE G Para uma nova interpretação de Platão São Paulo Loyola 1997 VERNANT JP Mito e tragédia na Grécia antiga São Paulo Perspectiva 2005 Mito e pensamento entre os gregos São Paulo Paz e Terra 2002 VILLAGRA DIEZ P Diálogo justicia y educación La paideia socráticoplatônica frente a la educación sofista en el Gorgias Synthesis La Plata 2002 v 9 Claretiano Centro Universitário EAD Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporanei dade 5 1 OBJETIVOS Refletir sobre algumas considerações críticas referentes à Paideia Analisar alguns dos principais problemas contemporâne os e suas reverberações no aspecto educativo Compreender a importância dos ideais da Paideia para pensarmos novas propostas educativas diante dos desa fios atuais 2 CONTEÚDOS A crítica de Nietzsche à Paideia socráticoplatônica Os riscos do etnocentrismo presentes nos ideais da Pai deia segundo Jacques Derrida A distância existente entre o ideal de Paideia e a realidade Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 162 A indústria cultural e a razão instrumental segundo a Es cola de Frankfurt A contribuição da Paideia para uma ressignificação da Educação na atualidade 3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE Nesta unidade vamos adotar caminhos novos em nossas reflexões Em razão disso necessitamos de seu olhar atento para que perceba as sutilezas dessa mudança 1 Um aspecto que consideramos crucial presente nesta unidade referese ao exercício do contraditório ou seja à apresentação de argumentos que visam combater as ideias que até então estávamos defendendo 2 Consideramos importante que você se detenha esse as pecto pois ele será de suma importância para sua for mação filosófica ao longo deste curso Você verá que a Filosofia se assenta em um constante ir e vir de ideias um olhar sempre diferente para as mesmas realidades ou possibilidades de realidade 3 Outro aspecto que merece a sua reflexão cuidadosa se refere ao exercício da Filosofia como desveladora de re alidades Por meio dele tentaremos demonstrar a você que a força de uma ideia produzida por um filósofo ou por uma corrente filosófica pode mudar completamente a forma como vemos a realidade ou ainda como nos en contramos diante dessa mesma realidade 4 Algumas leituras presentes nesta unidade merecem es pecialmente sua atenção Dentre elas citamos a já clás sica obra de Adorno e Horkheimer intitulada Dialética do Esclarecimento Essa obra carrega consigo certa com plexidade pois dialoga com autores e propostas que cer tamente merecem ser vencidas dada a profundidade de questões nela existentes 5 Também consideramos importante que você leia o texto O que é ilustração de Immanuel Kant Nele você encon trará conceitos subjacentes nas várias argumentações Claretiano Centro Universitário 163 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade que lhe apresentaremos sobretudo vinculadas ao con ceito de autonomia e heteronomia Além disso ele é de suma importância para você analisar alguns dos ideais presentes no chamado Iluminismo e nas propostas de emancipação que serão apresentadas por um dos auto res que estudaremos nesta unidade 6 Por fim consideramos importante que você faça um re sumo de tudo o que viu até agora e verifique como os elementos apresentados até então podem ser importan tes para a criação de uma nova proposta de homem e de humanidade 7 Alguns filmes retratam um pouco o momento em que vivemos Nos filmes que indicamos a seguir procure ob servar os desafios da construção de uma nova Paideia na contemporaneidade a 199 um supermercado que vende palavras Dra ma Direção Marcelo Masagão Brasil 2003 b Nós que aqui estamos por vós esperamos Docu mentário Direção Marcelo Masagão Brasil 1998 c Capitalismo uma história de amor Documentário Direção Michael Moore EUA 2009 d A Onda Drama Direção Dennis Gansel Alemanha 2008 e Entre os muros da escola Drama Direção Laurent Cantet França 2007 4 INTRODUÇÃO À UNIDADE Na unidade anterior analisamos as contribuições socrático platônicas para o desenvolvimento da Paideia e alguns desdo bramentos que aconteceram ao longo do tempo manifestados na chamada Paideia Christi e o no conceito de Bildung Nesta unidade examinaremos algumas considerações críti cas fornecidas sobre o conceito de Paideia os problemas educa tivos contemporâneos e a importância das propostas oriundas da Paideia para pensarmos a possibilidade de uma mudança positiva em relação a esses mesmos problemas Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 164 Consideramos importante refletir sobre a conduta que ado tamos neste momento Como você pôde perceber ao longo das unidades anteriores fizemos uso de uma estratégia que se caracte rizou por uma verdadeira apologia à Paideia grega Neste momen to buscaremos inicialmente criticar alguns dos aspectos envolvi dos nessa mesma Paideia A princípio tal atitude poderia vir a parecer paradoxal No entanto consideramos que nela existiria aquilo que de fato nos anima ou seja a amizade pelo saber Acreditamos que a adesão irrestrita a uma ideia ou a um conceito acabaria por nos afastar do ideário grego ao invés de nos aproximar dele Em razão disso vamos lhe apresentar algumas reflexões crí ticas sobre a Paideia para que você possa verificar os vários ângu los sob os quais podemos tratar um mesmo problema e por fim ilustraremos algumas das possíveis contribuições da Paideia para pensarmos os problemas contemporâneos Para começarmos nosso intento que tal a analisar as con siderações críticas apresentadas pelo filósofo Friedrich Nietzsche 18441900 em relação à Paideia socráticoplatônica 5 UMA NOVA PROPOSTA DE ARETÉ Nietzsche foi um dos maiores adversários da proposta de Paideia socráticoplatônica Inicialmente poderíamos dizer que para Nietzsche houve uma ruptura entre as forças do apolíneo racional e do dionisíacoirracional comprometendo assim a con cepção trágica do mundo Caso você queira conhecer um pouco mais sobre esse autor existe uma obra recente sobre Nietzsche do Prof Rogério Miranda de Almeida intitulada Nietzsche e o paradoxo Publicada original mente em francês e traduzida para o português pelo próprio autor já conta também com uma tradução para o inglês Há nessa obra a originalidade da análise de textos póstumos do filósofo alemão que até então não foram publicados Claretiano Centro Universitário 165 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade Mas voltemos à questão o que significa tragédia Conceito de tragédia Para que possamos iniciar nosso diálogo sobre o conceito de tragédia é necessário que constatemos a necessidade de ou tra empreitada intelectual Deveríamos passar obrigatoriamente pela leitura e pelo exame das obras de um dos mais importantes helenistas de nosso tempo JeanPierre Vernant A leitura de Mito e tragédia na Grécia antiga e de Mito e pensamento entre os gre gos seriam portanto indispensáveis veja referência completa nas Referências bibliográficas No entanto sem perder de vista sua importância voltemos às ideias de Jaeger sobre as razões que le varam Nietzsche a combater as ideias socráticas A crítica de Nietzsche parte digamos assim da indissolubi lidade entre o ideal socrático e o ideal cristão mais precisamente do humanismo escolástico que Sócrates representa Quando nos referimos à relação ou ao conceito apolíneo dionisíaco podese afirmar que não havia para os gregos na quele período distinção ou dualismo entre corpo e alma Esses elementos eram uma e a mesma coisa Eis o que a tragédia representa a harmonia entre esses dois elementos Podemos nos lembrar por exemplo das peças de Só focles tais como Édipo Rei Antígona e outras em que os heróis não têm solução para o drama vivido diante das novas demandas da sociedade ou da comunidade em processo de democratização Eles permanecem entre o que a lei instaurada pelo poder político prescreve em termos de comportamento e o que diz sua lei inte rior sua consciência moral O que fazer Ainda hoje vivemos o trágico Não há lei que diga como de vemos agir ou nos comportar em determinadas situações Um homem deve escolher entre salvar a vida de seu filho ou seguir a lei Parecenos óbvia a resposta mas não é tão simples Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 166 assim E o que dizer do conflito entre as gerações entre o velho e o novo Pensemos Há muito de trágico em nossas vidas e isso não se refere somente à questão de ter ou não ter dinheiro Eis uma citação importante para que nos aproximemos do significado de tragédia segundo Vernant 2005 p 1 Gênero literário original possuidor de regras e características pró prias a tragédia instaura no sistema das festas públicas da cidade um novo tipo de espetáculo além disso como forma de expressão específica traduz aspectos da experiência humana até então des percebidos marca uma etapa da formação do homem interior do homem como sujeito responsável O que é intrigante logo no início de suas reflexões sobre esse sábio ateniense é a afirmação de Jaeger 1995 p 493 Sócrates tornase o guia de todo o Iluminismo e de toda a filosofia moderna Algumas considerações sobre Sócrates e o cristianismo Segundo Jaeger houve uma simbiose entre o conteúdo da religião cristã e o ideal do homem grego Assim como no início de sua difusão o cristianismo apropriouse de ritos pagãos para ser aceito da mesma forma no debate com a ideia clássica do homem e de Deus prevaleceram as contribuições filosóficas dos gregos que lhe davam sustentação racional Daí vem a confiança na razão humana e nas leis naturais inerentes às próprias coisas Tomemos como exemplo o Novo Testamento que foi tradu zido originalmente do hebraico para o grego E lembremonos também do apóstolo Paulo que tinha dupla cidadania grega e romana Vemos a potencialização e a radicalização do platonismo da dicotomia corpoalma do intelectualismo do elemento ex machina vide as peças de Eurípedes A primazia do apolíneoracional Esse processo pode ser descrito como moralizador ou moralizante e essa é uma das características mais evidentes em Sócrates racionalizando a concepção trágica do mundo Claretiano Centro Universitário 167 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade Essa é segundo Jaeger a razão de tanta hostilidade de Nietzsche em relação a Sócrates Isso será mais evidente se exami narmos a moral do senhor e do servo na obra do filósofo alemão Numa perambulação pelas muitas morais as mais finas e as mais grosseiras que até agora dominaram e continuam dominando na terra encontrei certos traços que regularmente retornam juntos e ligados entre si até que finalmente se revelaram dois tipos básicos e uma diferença fundamental sobressaiu Há uma moral dos sen hores e uma moral dos escravosNIETZSCHE 1992 p 72 E como se daria a diferença entre ambas Para Nietzsche a moral dos senhores transitaria essencialmente por uma escala onde os atos morais são analisados por suas boas ou más consequências e por outro lado na moral do escravo nossas ações acabariam por ser analisadas por nossas boas ou más intenções Há de se dizer que a forma como Nietzsche orquestra seu entendimento de moral é bem diferente da forma costumeira como o fazemos Para o pensador o processo de formação da moral seria inseparável da formação de uma determinada cultura Enquanto na moral do escravo temos valores como simpatia humildade e caridade na moral do senhor temos os valores de orgulho força nobreza Certamente alguns desses valores foram vistos por você ao longo deste CRC e isso não se deu por acaso Nietzsche busca resgatar o ideal de Areté anterior à proposta so crática manifestada sobretudo nos ideais da Areté homérica que já estudamos Vejamos agora mais uma consideração de Nietzsche a respeito de Sócrates Enquanto em todas as pessoas produtivas o instinto é justamente a força afirmativa criadora e a consciência se conduz de maneira crítica e dissuasora em Sócrates é o instinto que se converte em crítico a consciência em criador uma verdadeira monstruosidade per defectum E na verdade percebemos aí um monstruoso defectus de toda disposição mística de modo que se poderia considerar Sócrates como o específico não místico no qual por superfetação a natureza lógica se desenvolvesse tão excessiva quanto no místico a sabedoria instintiva NIETZSCHE 1992 p 86 Após essa consideração crítica oferecida por Nietzsche va mos agora lidar com outro pensador que abordou alguns dos pro blemas presentes no ideal de Paideia Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 168 6 AS CRÍTICAS DA PAIDEIA REALIZADAS POR JACQUES DERRIDA Após a análise de algumas das considerações apresentadas por Nietzsche iremos agora debater com você outras considera ções críticas produzidas em relação à Paideia pelo pensador fran cês Jacques Derrida 19302004 Inicialmente podemos lhe dizer que Derrida se insere na manifestação filosófica tida como mais recente em relação ao mo mento histórico em que vivemos Derrida é considerado como um dos manifestantes da Filosofia pósmoderna ou ainda como pós estruturalista E o que podemos dizer em relação às posições desse pen sador De modo geral Derrida realiza uma crítica aos valores que iniciam a proposta de Paideia e aos autores que a implementam pois para ele esses aspectos carregam consigo fortes elementos etnocêntricos que além disso são alicerçados em valores caracte risticamente masculinos Para começarmos a tratar de suas consi derações veremos agora as considerações produzidas por Borody 2012 sp Uma interessante volteface da excessiva idealização zelosa do he lenocentrismo é encontrada nos escritos de Jacques Derrida no úl timo período dos anos sessenta e início dos anos 70 escritos que anatematiza o falogocentrismo da tradição grega inicial Mais que idealizar a natureza espiritual e intelectual da Paidéia grega como Jaeger tentou nos anos trinta Derrida denunciou isto nos anos 60 e 70 como phallogocentrica Como se percebe alguns conceitos apresentados necessi tam de melhores esclarecimentos No entanto antes de nos dedi carmos a eles convém terminarmos este primeiro momento intro dutório apresentando as estratégias que Derrida utilizará para sua crítica à Paideia crítica que segundo Barody 2011 se alicerça ria em duas estratégias argumentativas Claretiano Centro Universitário 169 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade A primeira seria a epistemológica que afirma que a Paideia se assentaria naquilo que Derrida intitula de logocentrismo ou seja a ênfase estaria no uso e na afirmação do logos grego Quan to à segunda ela se refere à argumentação de que a proposta de Paideia seria generológica ou seja ela se assenta em um determi nado gênero para se sustentar Diante dessas considerações vamos agora lidar com o sig nificado desses conceitos e para tanto vejamos o conceito de lo gocentrismo Para Derrida 2006 p 98 O logocentrismo é uma metafísica etnocêntrica num sentido original e não relativista Está ligado à história do Ocidente Dito de outro modo podemos dizer que A história do Ocidente seria uma sucessão de centros inques tionáveis como Deus homem consciência transcendência eu verdade noções responsáveis pela idéia de centro unificador do mundo A esse pensamento essencialista e transcendental Derrida chama de logocentrismo Derrida colocase contra a concepção logocêntrica do pensamento metafísico Para ele o valor do cen tro é sempre afirmado pelo não valor de seu oposto Deusdiabo homemmulher natureza cultura falaescrita espíritocorpo in teligívelsensível etc TEIXEIRA 1998 p 35 Dos elementos apresentados é possível concluir que o logo centrismo acaba por gerar um processo de hierarquização ou seja existiria um elemento que é superior ao outro e isso é um tanto quanto perigoso sob o aspecto filosófico pois de antemão caberia ao outro se adaptar aos meus valores e ideais e nesse processo não existiria discussão ou mesmo debate de ideias Além disso há de se destacar também que nesse processo logocêntrico gera uma relação de poder pois o detentor do ele mento mais valoroso colocase acima daquele que não possui es ses valores não abrindo possibilidade para outras formas de aná lise da realidade do bem da verdade etc Por meio dessa análise podemos perceber por que Derrida associa o logocentrismo ao etnocentrismo é etnocêntrico todo comportamento que tende a analisar e medir os grupos culturais Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 170 existentes na sociedade a partir dos valores e elementos culturais tidos como importantes por determinado grupo cultural ou étnico Por fim cabe agora lidarmos com a segunda estratégia ar gumentativa citada por Barody a qual se refere ao aspecto gene rológico Para Derrida o discurso de poder existente na defesa do logos apoiase em uma relação hierárquica de gêneros ou seja na superioridade do homem sobre a mulher Para que você possa per ceber como se operaria essa relação vejamos como Derrida apud RODRIGUES 2011 p 5354 analisa esse processo Inicialmente uma casa um domicílio um endereço a residência dos magistrados superiores os arcontes aqueles que comanda vam Aos cidadãos que detinham e assim denotavam o poder polí tico reconheciase o direito de fazer ou representar a lei Levada em conta sua autoridade publicamente reconhecida era em seu lar nesse lugar que era a casa deles casa particular casa de família ou casa funcional que se depositavam os documentos oficiais Os ar contes foram os seus primeiros guardiões Não eram responsáveis apenas pela segurança física do depósito e do suporte Cabiam lhes também o direito e a competência hermenêuticos Tinham o poder de interpretar os arquivos Depositados sob a guarda desses arcontes esses documentos diziam de fato a lei eles evocavam a lei e convocavam à lei Para serem assim guardados na jurisdição desse dizer a lei eram necessários ao mesmo tempo um guardião e uma localização Como se percebe era atribuída a determinadas pessoas a função de detenção do conhecimento Essas pessoas guardavam o conhecimento e tinham também a posse e o poder advindos desse conhecimento Tais pessoas eram sempre homens os poderes que se articulam nas mãos dos arcontes guardar interpretar reunir são poderes de dar sentido de dizer a verdade poderes ligados à autoridade de quem diz autoridade da qual de pende uma garantia de correção do pensamento Esse ideal de ver dade que aparece na Grécia homens proprietários que detinham a guarda dos arquivos seria assentado numa estrutura falocên trica cuja origem é patriarcal RODRIGUES 2011 p 54 A partir desses elementos tornase possível lidarmos com um conceito que apresentamos logo no início da contextualização das ideias de Derrida Referimonos ao conceito de falogocentris Claretiano Centro Universitário 171 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade mo Para o pensador francês a Paideia grega assentase no poder do homem falocentrismo e no poder do logos racional logocen trismo e a partir da união desses dois elementos temos o neolo gismo falogocentrismo E quais são as consequências dessa postura falogocêntrica Apoiandonos ainda na análise das ideias de Derrida realizadas por Barody 2011 podemos dizer que essa conduta acabaria por levar a uma radical hegemonia de determinadas formas de pensa mento e além disso a um profundo desrespeito à possibilidade de exercício da alteridade Para concluirmos esses contrapontos críticos há de se dizer que houveram respostas para as considerações ora apresentadas entre elas algumas considerações de Werner Jaeger a respeito das conclusões de Nietzsche ou ainda o próprio texto de Barody Consideramos que para as pretensões deste material não é necessário que nos aprofundemos mais nesse debate mas que deixemos destacado que toda e qualquer ideia ou valor sofreu sofre ou sofrerá questionamentos pois a essência da Filosofia ma nifestase sobretudo no levantamento de questionamentos em detrimento da opção segura e perigosa do assentamento em um porto seguro de respostas 7 DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS PARA UMA NOVA PROPOSTA DE PAIDEIA Após a apresentação de alguns contrapontos críticos relati vos à Paideia buscaremos agora apresentar o tema que fechará as discussões e informações que temos visto até este momento Para situar esse último tema na estrutura que montamos quando da construção deste CRC convém fazermos um breve relato expli cativo do que já vimos Inicialmente mostramos a você o início do ideal de Paideia presente nos escritos de Homero e Hesíodo intentando sobretudo Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 172 fazer com que você percebesse as nuances presentes naquele mo mento histórico e a importância do surgimento do ideal de Paideia Em seguida ilustramos alguns desdobramentos da Paideia notada mente manifestada na forma sofista e socráticoplatônica Vimos também alguns desdobramentos dessa evolução presentes na pro posta da Paideia Christi e na Bildung moderna Por fim vimos algumas considerações críticas endereçadas a Paideia socráticoplatônica presentes nos textos de Nietzsche e a Paideia de modo geral manifestada nas análises de Jacques Derrida Agora buscaremos apresentar a você alguns problemas contemporâneos existentes em nossa sociedade e qual seria a importância dos ideais da Paideia para aventarmos uma possibilidade de enfrentamento dos problemas que iremos analisar Cabe dizer que ao pensarmos nessa estratégia pedagógica três elementos se apresentaram como importantes O primeiro referese à possibilidade de que você possa perceber a importância da Filosofia como elemento des velador de realidades ou seja o quanto a reflexão filo sófica pode alargar ou mesmo desvelar aquilo que está presente em nossas vidas e que muitas vezes somos in capazes de perceber O segundo caracterizase pela convicção de que os ideais presentes na Paideia grega possuem elementos ahistóri cos isto é a importância desses ideais não se reduz a um determinado momento vivido pelo povo grego na Grécia antiga e podem ser utilizados e ser inspiradores de mu danças de atitudes conceitos e valores que temos inclu sive no presente O terceiro elemento referese à tentativa de demonstrar o quanto a Filosofia e a Educação estão relacionadas e o efeito positivo que essas duas esferas fornecem uma à outra Esse último aspecto busca de certa forma convidá lo a nutrir o amor à sabedoria buscando fazer com que Claretiano Centro Universitário 173 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade você não se esqueça dos desafios e compromissos que terá como futuro educador Dito isso coloquemonos agora a analisar a sociedade atual e seus desafios A sociedade atual No decorrer do estudo deste CRC alguns termos conceituais foram citados como virtude excelência valores nobreza beleza etc Esses conceitos se referem a parâmetros ideais do ser humano e serviriam para inspirar a formação de homens e por extensão de sociedades Mas e no presente Existiriam ideais a serem cons truídos e que nos inspiram Haveria a presença de valores que nos convidam a construir um modo de ser Esse ato de construção se ria valoroso Para dar conta dessas questões realizaremos agora uma análise da sociedade atual e para fazêlo tínhamos de selecionar um dos muitos olhares filosóficos existentes sobre essa questão Em razão disso optamos pela chamada Escola de Frankfurt que deu origem à corrente denominada Teoria Crítica As razões des sa escolha são as mais variadas mas para exemplificar uma delas nós o convidamos a analisar conosco uma consideração apresen tada a respeito dessa corrente filosófica A escola de Frankfurt fornece rico material para a sociologia do conhecimento pois é um exemplo de como uma vez marginal escola de pensamento ganhou ampla influência e cruzou os limites entre as disciplinas movimentos sociais psicanálise Marxismo e tradições nacionais Originalmente um grupo de especialistas marxista fundado pelo filho de um rico milionário alemão a escola de Frankfurt ajudou a criar uma inovativa área filosoficamente orientada de modo radical para a ciência social conhecida como teoria crítica A Teoria Crítica teve uma enorme influência após a década de 60 na vida intelectual e hoje é mais comumente associada com Theodor Adorno Max Horkheimer Herbert Marcuse Walter Benjamim e Jürgen Habermas McLAUGHLIN 1999 p 109 Desses elementos apresentados há de se dizer que não te mos por intenção nos aprofundarmos demasiadamente em seus Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 174 autores e teorias embora consideremos válidos e necessários es ses estudos adjacentes ao longo de sua caminhada na graduação Queremos na verdade mostrar a você como uma teoria filosófica pode trazer informações importantes para a análise de nossa so ciedade e a partir dessas informações pensarmos juntos os desa fios e desdobramentos para a construção de um ideal de Paideia Em razão disso apresentamos a seguir algumas das considera ções apresentadas por essa corrente filosófica sobre nossa socie dade atual A indústria cultural A expressão indústria cultural é uma das mais caras para a Teoria Crítica Foi cunhada por Theodor Adorno e Max Horkheimer em uma obra chamada Dialética do Esclarecimento De modo geral podemos dizer que para esses pensadores com o advento do ca pitalismo acabou por surgir um modo de produção em massa Ora o capitalista busca vender mais e mais os seus produtos e também encontrar novas possibilidades e desejos de consumidores para que possa ampliar suas possibilidades de venda ou ainda fabricar artificialmente desejos e necessidades para que esses possam ser transformados em produtos e consequentemente possam ser vendidos Diante dessa necessidade o capitalista acaba por produzir e vender cultura mas essa não é aquela cultura na qual estamos habituados a pensar na verdade seria um arremedo de cultura pois toda a complexidade inerente a um objeto cultural é descar tada buscase fazer com que tenhamos um momento de entre tenimento e esse momento não pode e não deve ser exercitado de forma plena Os produtos vêm e vão um após o outro Aquela música lançada a cerca de seis meses e que fez tanto sucesso já foi esquecida pois é necessário que nos entretenhamos com outra e compremos um novo produto Desejos reais que caracterizam o ser humano tais como a criatividade que transforma a nós e a nossa realidade a liberda Claretiano Centro Universitário 175 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade de que nos anima a transcender nosso momento existencial ou ainda a felicidade genuína advinda de nossa plena realização hu mana são esquecidos Na verdade todos esses elementos que se encontrariam em nós são transplantados para os produtos e mercadorias Somos condicionados a achar que ao comprar esse ou aquele produto automaticamente tomamos posse daquelas necessidades humanas que nos animam Esse processo acaba por ser um processo ad infinitum ou seja compramos um produto buscando ter nele a satisfação de nossos desejos e à medida que não encontramos essa satisfação novos produtos apresentamse para nosso olhar e para nossos desejos com o intuito de realizar tal satisfação Nesse sentido vale lembrar um poema do poeta brasileiro Vicente de Carvalho 18661924 que ao seu modo captou como ninguém a existência desse fenômeno Felicidade Só a leve esperança em toda a vida Disfarça a pena de viver mais nada Nem é mais a existência resumida Que uma grande esperança malograda O eterno sonho da alma desterrada Sonho que a traz ansiosa e embevecida É uma hora feliz sempre adiada E que não chega nunca em toda a vida Essa felicidade que supomos Árvore milagrosa que sonhamos Toda arreada de dourados pomos Existe sim mas nós não a alcançamos Porque está sempre apenas onde a pomos E nunca a pomos onde nós estamos CARVALHO apud GONÇALVES 1995 p 352 Como se percebe no término do poema o sonho idílico da felicidade humana nunca se encontra no próprio homem sempre está fora dele e consequentemente nunca nos é dada a chance ou a oportunidade de alcançála Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 176 A partir desses elementos é possível analisar a presença da indústria cultural na vida das pessoas Pensemos em um aluno alguém que esteja se revoltando contra algumas injustiças da so ciedade O que faz ele Busca fortalecerse e agir nessa sociedade buscando novos caminhos Entender a situação em que vive e se posicionar efetivamente contra ela Não necessariamente Quem sabe ele poder vir a comprar roupas de determinada grife que se caracterizam por produzir artigos que simulem os trajes utilizados pelo movimento punk ou outro grupo que venha a simbolizar uma postura de questionamento ou ainda alguma camiseta que tenha estampada em cores fortes e chamativas a imagem de Che Gue vara e assim afirme o desejo de uma revolução que se apresenta somente na camiseta Como se percebe a indústria cultural busca tão somente produzir mercadorias que simulem ao seu possuidor a impressão de que ele é aquilo que comprou Ernesto Che Guevara 19281967 mais conhecido como Che foi um líder revolucionário marxista participou de vários levantes revolucionários Com sua morte criouse sobre ele uma espécie de imagem mítica do herói revolucionário e em razão disso seu nome e sua imagem tem sido usado constantemente como meio de representação da contestação e de rebeldia A razão instrumental A razão instrumental é outro conceito extremamente caro a essa corrente de pensamento Ele traz consigo uma série de pe culiaridades Em razão de suas sutilezas tomaremos a liberdade de lhe apresentar uma citação um pouco longa de Curtis Bowman 1997 sp sobre o tema Dadas a clareza e a objetividade de Bowman nesse excerto consideramos importante que você tenha acesso a ele na íntegra A forma dominante de razão em um mundo alienado de acordo com Horkheimer e Adorno é o que eles rotineiramente chamam razão instrumental Esta é a capacidade para selecionar os meios apropriados para nossos fins o que quer que eles sejam Isto é nós usamos a razão como um instrumento para nos guiar na obtenção Claretiano Centro Universitário 177 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade de nossos fins Para este tipo de razão Horkheimer e Adorno con trastam outra uma do qual argumentam ser cada vez mais rara Esta passa por vários nomes mais freqüentemente chamada de razão objetiva Este tipo de razão não é instrumental não se refere aos meios para nossos fins mas se preocupa com os próprios fins Esta pergunta se nossos fins são racionais se eles expressam nos sos mais profundos desejos e necessidades se eles expressam nos so anseio pela liberdade Horkheimer e Adorno afirmam que razão objetiva foi prejudicada pelo Iluminismo embora deva ser de fato utilizada para promover a causa da iluminação A razão instrumen tal se conforma simplesmente aos fins que nós adquirimos dizen donos como possuílos da forma mais efetiva A razão objetiva nos diz quais deveriam ser os nossos fins e então esta diznos como o mundo poderia ser porque nós estamos a transformar o mun do de acordo com nossos fins racionais e portanto de como ele é em como deve ser Ao invés de empregar a razão objectiva para descobrir o que nossos objetivos devem ser Horkheimer e Adorno afirmam que os nossos fins são geralmente impostos a nós de fora Isto é o que Kant chamou heteronomia Nós concordamos com o que os outros nos dizem para pensar e agir desistindo de nossa independência e falhando para adquirir a autonomia Texto interessante não São muitas as informações contidas nele e em razão disso vamos debater alguns dos conceitos que ali aparecem O primeiro referese à autonomia e à heteronomia É autônomo aquele que é causa de si mesmo ou seja dirige suas ações a partir de sua própria opção racional e por outro lado é heterônomo aquele que remete a outro a decisão dos caminhos de sua própria vida E o que podemos dizer sobre a crítica ao Iluminismo O Iluminismo surgiu como um movimento que tinha como alicerce básico a defesa do uso da razão como instrumento para iluminar nossos caminhos ou seja para fazer com que saíssemos do obs curantismo ou dos fanatismos nos quais os seres humanos muitas vezes adentram No entanto esse sonho iluminista na verdade fracassou Contudo a credulidade a aversão à dúvida a temeridade no res ponder o vangloriarse com o saber a timidez no contradizer o agir por interesse a preguiça nas investigações pessoais o fetichismo verbal o deterse em conhecimentos parciais isto e coisas seme lhantes impediram um casamento feliz do entendimento humano Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 178 com a natureza das coisas e o acasalaram em vez disso a conceitos vãos e experimentos erráticos o fruto e a posteridade de tão glo riosa união podese facilmente imaginar ADORNO HORKHEIMER 1985 p 19 Dito de outro modo o sonho iluminista da razão como ele mento emancipador do homem acabou por se transformar em um elemento opressor ou seja as chaves para a saída da prisão de nossos grilhões acabaram por se tornar os próprios grilhões E como se insere o conceito de razão instrumental nessa análise proposta pelos frankfurtianos De certo modo podemos dizer que na razão instrumental usa mos nossa razão de forma autônoma para pensarmos os meios para atingirmos determinados fins e por outro lado agimos de forma heterônoma na medida em que não temos autonomia para analisar os fins dessas mesmas ações Segundo Adorno e Horkheimer essa razão instrumental está preenchendo mais e mais as nossas vidas e em razão disso cada vez menos fazemos uso de nossa razão obje tiva Para ilustrar a presença da razão instrumental em nossas vidas meditemos sobre o nosso dia a dia Estamos inseridos em uma sociedade e ela estabelece padrões condutas e valores que nos guiam Estão previamente definidos os modelos de homem ou de mulher de sucesso de boa ou de má sociedade e nos pauta mos nesses padrões para tomarmos nossas decisões Para darmos conta da aproximação a esses padrões tomamos uma série de ati tudes e fazemos diversos questionamentos Apresentemos alguns desses questionamentos apenas como exemplo Quais empregos deveremos ter Como atingir sucesso nesse emprego Devemos ou não fazer uma faculdade Quais seriam as nossas condutas na faculdade para que atinjamos as metas que a sociedade nos apre senta Sempre que usamos nossa razão para resolver os desafios que devem ser vencidos para que possamos atingir os fins esta mos fazendo uso da razão instrumental Claretiano Centro Universitário 179 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade Outro exemplo corriqueiro presente em nossas vidas pode ser dado quando nos dedicamos a possuir determinado bem ma terial Nas sociedades capitalistas ocidentais tem valor aquele que possui capacidade e exerce essa mesma capacidade para adquirir bens Imaginemos que queremos comprar um automóvel A par tir dessa finalidade dedicamosnos a realizar estratégias para esse fim passamos a economizar nosso dinheiro acompanhar pela mídia ou internet vários modelos selecionamos o modelo e es tabelecemos ações para finalmente adquirir o automóvel Nesse exercício nossa razão está a pleno vapor e nos dá possibilidades de caminhos para atingir nosso intento ela é um instrumento para isso Por outro lado se em determinado momento começásse mos a pensar se o ideal de uma vida é a posse e a capacidade de apropriação de bens ou em quais as consequências desse exercí cio de consumo sem fim para nós em nossa condição de seres hu manos e para a humanidade ou o planeta ou ainda que homem e sociedade eu desejo ser ou ter começaríamos paulatinamente a deixar de usar a razão como mero instrumento e ela passaria a dar um sentido teleológico ou seja um sentido de finalidade para nossas ações desejos e ideais Certamente parecerá a você que é redundante o que vamos dizer Mas convém que ressaltemos esse aspecto os alunos que estão inseridos nesta sociedade dada a peculiaridade em que se encontram sujeitados em sua quase totalidade nunca pensaram na possibilidade de um exercício autônomo de criação de um telos O fim já está previamente definido e cabe a esses mesmos alunos es colherem essa ou aquela forma de vida previamente definida mas que nunca passou por sua análise pessoal Nesse sentido convém apresentarmos a você uma consideração de outro frankfurtiano chamado Herbert Marcuse Sob o jugo de um todo repressivo a liberdade pode ser transforma da em poderoso instrumento de dominação O alcance da escolha aberta ao indivíduo não é o fator decisivo para a determinação do grau de liberdade humana mas o que pode ser escolhido e o que é Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 180 escolhido pelo indivíduo O critério para a livre escolha jamais pode ser absoluto mas tampouco é inteiramente relativo A eleição livre dos senhores não abole os senhores ou os escravos A livre esco lha entre ampla variedade de mercadorias e serviços não significa liberdade se esses serviços e mercadorias sustêm os controles so ciais sobre uma vida de labuta e temor isto é se sustem alienação MARCUSE 1973 p 28 grifos nossos Pensemos na possibilidade de que a sociedade atual es tabelece previamente o que pode ser escolhido pelo indivíduo Ampliaramse sobremaneira as possibilidades de escolha mas a finalidade dessa escolha não se apresenta para nós Dito de outro modo você pode escolher se comprará um veículo dessa ou da quela marca se optará por comprálo ou não mas não escolherá se é possível outra sociedade que não se baseie na construção de necessidades e de consumo dessas necessidades As consequências dessa condição são inquietantes e para sensibilizálo a esse respeito nós o convidamos a exercitar sua ra zão objetiva e pensar o que se segue Qual é sociedade e qual é o mundo que queremos Qual é a sociedade qual é o mundo que temos Por meio desse exercício você perceberá os árduos desa fios que temos para não mais precisar eleger somente senhores A partir dessas considerações vamos investigar as questões aqui apresentadas analisando nossa vida e nossa situação no mundo a partir desses elementos Esperamos que você perceba o quanto uma ideia ou uma corrente filosófica pode vir a desvendar e desvelar nossa realidade ou mesmo mudála Além disso deseja mos que perceba que por meio dessa proposta de desvelamento você pode notar os desafios que temos diante de nós para a cons trução de um ideal de Paideia e mesmo a importância da recons trução deste ideal o que discutiremos a seguir 8 A IMPORTÂNCIA DE UMA NOVA PAIDEIA NA CON TEMPORANEIDADE Como você pode perceber a partir da análise precedente são muitos os desafios que temos a enfrentar em nossa socieda Claretiano Centro Universitário 181 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade de Certamente há de se pensar a partir da existência de um ide al de Paideia no passado reflitamos o que temos no presente Será que nossa sociedade professores e alunos tem um ideal de Excelência que os anime a construir esse ideal Para problematizar essa questão vejamos a consideração a seguir apresentada por Leomar A Paidéia do presente ainda que amorfa se está definindo como virtualização como dissolução das referências clássicas em uma espécie da babelização discursiva O homem telemático que se está configurando pelas redes de informação estaria substituin do o homem moderno Pensamos que este individualista é o homem global de hoje e que ele é somente uma face da moeda Também esta o outro o marginalizado o excluído da técnica do consumo da arte e da ciência Nos perguntamos como a Paidéia poderia recuperálo Por acaso não é este marginalizado da cultura e da técnica o que somente recebe os lixos da cultura e não uma verdadeira formação O homem da virtude o virtuoso grego hoje esta deslocado pelo homem consumidor que depende totalmente da tecnologia sem a qual não pode criar produzir pensar fabricar e que tem alienado sua vida de objetos técnicos Paradoxalmente é com a técnica e o saber que o homem pode subtrairse de qualquer lógica de submissão LEOMAR 2009 p 115 Dos elementos apresentados por Leomar há de se pensar então como sair dessa lógica de submissão ou ainda qual seria um ideal de Paideia para resgatar nossa possibilidade de liberta ção e de construção autônoma do ser humano Para lidarmos com essa questão pensamos em apresentar duas reflexões a respeito do tema A primeira baseiase nas considerações de Adorno e a segunda manifestase em um movimento que surgiu nos Estados Unidos e que busca também resgatar um ideal de Paideia Especificamente em Adorno temos uma proposta de que a educação venha a produzir no homem a possibilidade de eman cipação Isso porque para esse autor somente o homem eman cipado poderia resistir a uma sociedade de massas que manipule mentes e produz absurdos tais como por exemplo aqueles perpe trados na Segunda Guerra Mundial e que acabaram por produzir Auschwitz Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 182 Para esse pensador o caminho da Paideia contemporânea passaria por uma educação que promova no indivíduo a autono mia pois O único poder efetivo contra o princípio de Auschwitz seria autonomia para usar a expressão kantiana o poder para a reflexão a autodeterminação a não participação ADORNO 2011 sp A segunda reflexão assentase nas ideias do filósofo e edu cador americano Mortimer Jerome Adler criador da Proposta Paideia que se caracteriza por apresentar um conjunto de ideias de cunho liberal de educação voltada para todas as crianças Para Adler o sistema de Educação norteamericano seria antidemocrá tico e a ênfase naquilo que intitulou de treinamento vocacional norteamericano acabaria por objetivar o treinamento de escravos e não a formação de homens livres As ideias desse autor produziram uma grande reflexão nos Estados Unidos a respeito dos caminhos da educação no país e levou à criação do Centro Nacional Paideia que busca divulgar e implementar as ideias de Adler Quais seriam essas ideias Vejamos a quem Adler dedica o seu projeto para iniciarmos uma análise de suas ideias A Proposta Paidéia é endereçada para aqueles americanos mais preocupados com o futuro de nossas escolas Para as famílias que acreditam que o declínio na qualidade da educação pública é peri gosa para o futuro de nossas crianças Para professores preocupa dos que o aumento do tempo em manter a básica ordem na sala de aula minam o verdadeiro negócio da escola ensinar e aprender Para os conselheiros escolares preocupados pela mudança de cri anças da classe média e jovens para escolas particulares e paroqui ais Estas profundas e legítimas preocupações são abordados pelo nosso propósito para a reforma do ensino público na América A reforma que procuramos é delineada para aumentar as opor tunidades de nossos jovens as perspectivas de nossa economia e a viabilidade de nossas instituições democráticas Isto pode ser alcançado no nível da comunidade sem recorrer a um sistema edu cacional monolítico Este deve ser nas palavras de Lincoln do povo pelo povo e para o povo ADLER 1982 p 12 Claretiano Centro Universitário 183 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade Notase nesse excerto a ênfase que Adler coloca na recon quista da característica essencial da escola ou seja no ensinar e no aprender Pensemos como esse e outros objetivos se realiza riam Essa instituição formulou uma declaração de princípios que dada a sua pertinência para nossas questões lhe será apresenta da a seguir conforme princípios elencados por Billings e Roberts 1997 p 45 1 Todas as crianças são capazes de aprender 2 Portanto todos eles merecem a mesma qualidade de ensino não apenas a mesma quantidade 3 A qualidade do ensino a que têm direito é o que o mais sábio dos pais desejaria para os seus próprios filhos seria a melhor educação para o melhor seria a melhor educação para todos 4 Que a escolaridade naquilo que há de melhor é uma prepara ção para tornarse educado no curso geral de toda uma vida e que devem ser julgados escolas em quão bem elas fornecem tal preparação 5 Que os três chamados para que a escolaridade deve preparar todos os americanos são a para ganhar uma vida decente b para ser um bom cidadão da nação e do mundo e c para fazer uma boa vida para si mesmo 6 Que a causa primária de aprendizagem genuína é a atividade da própria mente do aluno às vezes com a ajuda de um professor funcionando como uma causa secundária e cooperativa 7 Que os três tipos de ensino que devem ocorrer em nossas esco las são o ensino de forma didática do assunto treinamento que produz as habilidades de aprendizagem e o questionamento socrático em seminários de discussão 8 Que os resultados destes três tipos de ensino deve ser a a aquisição de conhecimento organizado b a formação de há bitos de habilidade no uso da linguagem e matemática e c o crescimento da compreensão da mente de idéias básicas e questões 9 Que o resultado de cada aquisição do estudante possa ser avali ado em termos se estas competências do estudante isolada mente estão sendo adquiridas e não somente relacionadas às aquisições dos outros estudantes 10 Que o diretor da escola não deve ser um mero administrador Mas sempre um professor líder que deveria estar cooperativa mente engajado com o grupo de professores da escola plane Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 184 jando reformando e reorganizando a escola como uma comu nidade educacional 11 Que o diretor e os professores da escola deveriam eles mesmos estar ativamente engajados na aprendizagem 12 Que o desejo de continuar sua própria aprendizagem deveria ser a primeira motivação daqueles que dedicam suas vidas na profissão do ensino Como se vê são muitas as questões presentes nesses princí pios e que merecem uma análise adequada A princípio pode pa recer que esse ou aquele princípio carrega consigo um viés conser vador ou ainda inadequado No entanto não se pode negar que nele está presente a seleção de algumas excelências e a ênfase na afirmação e na realização do ser humano na concretização e na dedicação na aquisição dessas excelências A receptividade desse projeto gerou acolhimento positi vo em algumas obras e considerações críticas em outras Como exemplo de acolhimento parcialmente positivo citamos um artigo publicado por David Gabbard e Karen A Appleton que amparados por uma base filosófica marxista concluem que Atualmente em nossa visão para os americanos crescerem eles devem confrontar a dolorosa verdade que sua nação não é e nun ca foi uma sociedade democrática A emancipação começa a par tir desta realização e nenhuma outra E é desta realização que um Projeto Democrático Paidéia deve começar é repensar Adler sem rejeitarlo totalmente GABARD APPLETON 2005 sp Por outro lado temos em outro artigo publicado uma série de críticas a esse projeto Inicialmente o autor realiza uma análise das bases filosóficas do projeto e apresenta questionamentos em relação a como eles são interpretados e no fim do artigo advoga que A atitude do qual eu me queixo permeia o Paidéia Estudantes são trados como mentes a serem preenchidas igualmente com a mesma qualidade material Em nenhuma parte há uma considera ção apropriada das pessoas que eles são na sua essencial liberdade e infinita diversidade central e instrumental em sua própria educa ção NODDINGS 2004 p 170 Claretiano Centro Universitário 185 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade Como se vê as considerações de Noddings dão novos ele mentos para pensarmos o projeto proposto por Adler e seus se guidores e certamente deverão ser levadas em consideração na criação de qualquer projeto com proposta semelhante Por fim para finalizar essa reflexão convidamos você a fazer um passeio retrospectivo a respeito de tudo o que vimos até este momento Caminhe por termos como Areté kalós Agathós e ou tros tantos que discutimos juntos Pense na possibilidade do res gate dos mesmos na contemporaneidade realize simulações de uso desses termos na construção do humano Enfim perceba que a partir da construção de ideais alicerçados na filosofia grega se construiu uma forma original de se pensar o homem a sociedade e a cultura por meio de uma proposta educativa Após o exercício dessa reflexão é nossa esperança que você se muna de energias redobradas delineie o melhor de si e cons trua a sua Areté a ser edificada ao longo de uma vida toda dedica da à construção da Paideia 9 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS Confira a seguir as questões propostas para verificar o seu desempenho no estudo desta unidade 1 Segundo Friedrich Nietzsche a decadência ocidental começa em especial com os ideais de Paideia apresentados a no cristianismo b por Descartes e seu racionalismo c por Sócrates e Platão d pelos sofistas e sua argumentação retórica e nenhuma das anteriores 2 Analise as considerações a seguir referentes às ideias de Jacques Derrida e aponte a alternativa incorreta a Para Jacques Derrida a história ocidental é uma história alicerçada no predomínio dos valores patriarcais masculinos e a consequente subjuga ção dos valores femininos b Derrida apresenta uma crítica aos ideais da Paideia grega pois segundo ele nela estão presentes fortes características etnocêntricas Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 186 c Derrida propõe que a história do Ocidente se alicerça na valorização do logos e dos valores masculinos e essa valorização acaba por criar uma estrutura de dominação a toda e qualquer possibilidade que se diferen cie destas d Para o pensador francês é necessário que a Paideia incorpore novos ele mentos aos já existentes e amplie a sua possibilidade de alcance e Nenhuma das alternativas anteriores 3 UEL2004 O aumento da produtividade econômica que por um lado pro duz as condições mais justas para um mundo mais justo confere por outro lado ao aparelho técnico e aos grupos sociais que o controlam uma superio ridade imensa sobre o resto da população O indivíduo se vê completamente anulado em face dos poderes econômicos Ao mesmo tempo estes elevam o poder da sociedade sobre a natureza a um nível jamais imaginado De saparecendo diante do aparelho a que serve o indivíduo se vê ao mesmo tempo melhor do que nunca provido por ele Numa situação injusta a im potência e a dirigibilidade da massa aumentam com a quantidade de bens a ela destinados ADORNO HORKHEIMER 1997 p 14 De acordo com o texto de Adorno e Horkheimer é correto afirmar a A alta capacidade produtiva da sociedade garante liberdade e justiça para seus membros independentemente da forma como ela se estrutu ra controlando ou não seus membros b O desaparecimento do indivíduo diante do aparato econômico da so ciedade se deve à incapacidade dos próprios cidadãos em se integrarem adequadamente ao mercado de trabalho c A ciência e a técnica independente de quem tem seu controle são as responsáveis pela circunstância de muitos estarem impossibilitados de atingir o status de sujeito numa sociedade altamente produtiva d O fato de a sociedade produzir muitos bens valendose da ciência e da técnica poderia representar um grau maior de justiça para todos no entanto ela anula o indivíduo em função do modo como está organizada e como é exercido o poder e O alto grau de autonomia das massas na sociedade capitalista contem porânea é resultado do avançado domínio tecnológico alcançado pelo homem Claretiano Centro Universitário 187 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade 4 UFU2005 Analise a figura a seguir Figura 1 Chaplin em cena do filme Tempos modernos de 1936 Parece que enquanto o conhecimento técnico expande o horizonte da atividade e do pensamento humanos a autonomia do homem enquanto indivíduo a sua capacidade de opor resistência ao cres cente mecanismo de manipulação das massas o seu poder de imaginação e o seu juízo independente sofreram aparentemente uma redução O avanço dos recursos técnicos de informação se acompanha de um processo de desumanização Assim o progresso ameaça anular o que se supõe ser o seu próprio objetivo a idéia de homem HORKHEIMER 1976 p 6 Com base no texto na imagem e em seus conhecimentos sobre racionalidade instrumental é correto afirmar a A imagem de Chaplin está de acordo com a crítica de Horkheimer ao invés de o progresso e da técnica servirem ao homem este se torna cada vez mais escravo dos mecanismos criados para tornar a sua vida melhor e mais livre b A imagem e o texto remetem à ideia de que o desenvolvimento tecno lógico e o extraordinário progresso permitiram ao homem atingir a au tonomia plena c Imagem e texto apresentam o conceito de racionalidade que está na es trutura da sociedade industrial com o viabilizador da emancipação do homem em relação a todas as formas de opressão Paideia Tópicos de Filosofia e Educação 188 d Enquanto a imagem de Chaplin apresenta a autonomia dos trabalhado res nas sociedades contemporâneas o texto de Horkheimer mostra que quanto maior o desenvolvimento tecnológico maior o grau de humani zação e Tanto a imagem quanto o texto enaltecem a inevitável instrumentaliza ção das relações humanas nas sociedades contemporâneas 5 Dos princípios presentes no projeto Paideia de Mortimer Adler analise as afirmações a seguir e escolha a alternativa que apresenta as respostas cor retas em relação às ideias desse pensador I A maioria das crianças é capaz de aprender II Todas as crianças merecem a mesma qualidade de ensino não apenas a mesma quantidade III A qualidade do ensino a que as crianças têm direito é o que o mais sábio dos pais desejaria para os seus próprios filhos A melhor Educação para o melhor seria a melhor Educação para todos IV A escolaridade naquilo que há de melhor é uma preparação para tor narse educado no curso geral de toda uma vida e as escolas devem ser julgadas em relação a quão bem elas fornecem tal preparação V O diretor e mais especialmente os professores da escola deveriam eles mesmos estar ativamente engajados na aprendizagem Estão corretas a Apenas II III e IV b Apenas I II e III c Apenas III IV e V d Apenas I II III e IV e Apenas I III IV e V Gabarito 1 c 2 d 3 d 4 a 5 a 10 CONSIDERAÇÕES FINAIS Encerramos nossa viagem ao longo da análise do surgimen to da evolução da modificação e dos desafios existentes em torno do conceito de Paideia Claretiano Centro Universitário 189 U5 Análise crítica da Paideia clássica e sua importância na contemporaneidade Procuramos ao longo deste CRC apresentar a você o quan to esse conceito carrega de originalidade e importância para todo aquele que percebe a importância das relações existentes entre Filosofia e Educação Esperamos que as estratégias e objetivos delineados por nós o tenham sensibilizado e inspirado a aprofundar seus estudos em relação a esta temática Sabemos que muitos questionamentos advirão das conside rações aqui propostas e esperamos que tais questionamentos pos sam servir de inspiração e elemento motivador para seus estudos posteriores Para finalizar este CRC convém fazermos uso de um velho adágio que diz que a palavra conduz pessoas e os exemplos arras tam multidões Por meio desse adágio esperamos que você possa transformar os ideais da Paideia não somente em mais um con ceito que você adquiriu e que está lançado em suas memórias Esperamos que além disso ele possa inspirar você a desenvolver dentro de si esses ideais fazendo com que mais que uma palavra esse conceito possa vir a ser uma atitude sua perante o mundo e os desafios que esta vida lhe apresenta inclusive em sua posição de educador 11 EREFERÊNCIAS Figura Figura 1 Chaplin em cena do filme Tempos modernos de 1936 Disponível em http wwwhistorianetcombrconteudodefaultaspxcodigo181 Acesso em 19 abr 2012 Sites pesquisados ADLER M The Paideia proposal an educational manifesto 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