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711 ARTIGOS A clínica de Ludwig Binswanger inspirada no Dasein de Heidegger e na fenomenologia genética de Husserl Ludwig Binswangers clinic inspired by Heideggers Dasein and Husserls genetic phenomenology Juliana Pita1 Virginia Moreira2 Rev Latinoam Psicopat Fund São Paulo 234 711723 dez 2020 httpdxdoiorg101590141547142020v23n4p7113 12 Universidade de Fortaleza Unifor Fortaleza CE Brasil A clínica fenomenológica de Ludwig Binswanger propõe uma nova compreensão sobre a psicopatologia ao realçar a importância na história de vida do paciente Encontrase dividida em três fases mostrando a fertilidade de seus estudos psicopatológicos após a leitura de Ser e tempo e através da influência husserliana com o intuito de esclarecer a constituição da experiência delirante Este artigo tem como objetivo apresentar dois casos clínicos Lola Voss e Suzanne Urban para ilustrar a contribuição oferecida por Ludwig Binswanger à psicopatologia fenomenológica em sua segunda e última fase Palavraschave Binswanger psicopatologia fenomenológica casos clínicos delírio R E V I S T A L A T I N O A M E R I C A N A D E P S I C O P A T O L O G I A F U N D A M E N T A L 712 Rev Latinoam Psicopat Fund São Paulo 234 711723 dez 2020 Introdução A clínica fenomenológica de Ludwig Binswanger propõe uma nova abordagem psiquiátrica da psicose ao realçar a importância da história de vida de pacientes no que se refere à patologia Sua experiência psiquiátrica amadurece em Bellevue através de sua especialidade no atendimento com esquizofrênicos Fédida 1970 Kuhn 2002 Tatossian 19792006 Gros 2009 Cabestan 2011 Cabestan Dastur 2011 Chamond 2011 Huygens 2011 Pita Moreira 2013 Sob o olhar crítico de Binswanger 19221971 a psiquiatria clássica limita seu foco na busca por causas e pela natureza de uma patologia Diante disto nos apresenta a psicopatologia fenomenoló gica na qual os sintomas devem ser compreendidos não apenas com uma proposta teórica mas em sua totalidade como uma forma de exis tência e do estarnomundo do psicótico A psicopatologia fenomeno lógica de Binswanger oferece ferramentas para acessar este mundo vivido encontrandose para aquém do sintoma e de suas causas Além de sua formação médica Binswanger recorre à filosofia Chamond 2011 Holanda 2011 e se ancora principalmente nas fenomenologias de Edmund Husserl e Martin Heidegger com o desejo de desenvolver a contribuição da fenomenologia à psiquiatra tradicional Nesse contexto desenvolve a antropologia fenomenológica inicialmente sob influência dos textos da fenomenologia transcendental de Husserl como funda mento da psicopatologia fenomenológica Chegar mais perto da obra psicopatológica de Binswanger é se deparar com um pensamento fenomenológico em mudança quer dizer que ao sofrer influências de Husserl e Heidegger podemos identificar momentos distintos ao longo de sua clínica Tatossian 19792006 e Pita e Moreira 2013 apresentam o pensamento fenomenológico binswangeriano dividido em três fases I Primeiro Binswanger com forte presença da fenomenologia transcendental de Husserl II Binswanger após a leitura de Ser e tempo ancorado na filosofia exis tencial de Heidegger e III Último Binswanger em seu retorno à feno menologia genética do último Husserl 713 ARTIGOS Rev Latinoam Psicopat Fund São Paulo 234 711723 dez 2020 Anterior a essas três fases Gros 2009 aponta a fase psicanalítica marca do início da clínica de Binswanger Holanda 2011 destaca ainda uma quarta fase a préfenomenológica pois ao se afastar da psicanálise freudiana Binswanger se aproxima teoricamente de Kant e Natorp Não se restringindo apenas à influência teórica Gros 2009 também separou o percurso teórico de Binswanger em dois períodos característicos I período de formação e construção de seu pensamento 19071957 momento das presenças teóricas de Freud Husserl e Heidegger e II período criativo 19601965 no qual Binswanger explorou estudos psicopatológicos influenciados pela fenomenologia genética husserliana especialmente no final de suas obras Mélancolie et manie e Délire Neste artigo tomamos como base as três fases demarcadas por Tatossian 19792006 e Pita e Moreira 2013 Na primeira fase a fenomenologia husserliana para o primeiro Binswanger representa apenas uma ferramenta metodológica e não se utilizava como ponto de vista psicopatológico Gros 2009 Tatossian 19792006 Pita Moreira 2013 Após 1930 a leitura de Ser e tempo o destaque da filosofia de Heidegger no pensamento fenomenológico de Binswanger pode ser encontrado na maioria de seus textos Esse é o período de maior produção escrita de Binswanger de tal forma que alguns autores reconhecem apenas a influência de Heidegger nas obras de Binswanger e descartam a importante presença de Husserl principalmente na última fase Nesse terceiro período já no final de sua vida Binswanger retoma os escritos husserlianos com um viés interpretado pelo fenomenólogo húngaro Wilhelm Szilasi no livro Introduction à la Phénoménologie dEdmond Husserl de 1959 Nessa fase encontramos seus dois últimos livros Mélancolie et manie e Délire Tatossian 19792006 Pita Moreira 2013 Este artigo busca ilustrar o pensamento fenomenológico clínico de Binswanger na segunda e terceira fases com a discussão de dois casos clínicos de pacientes esquizofrênicas delirantes Lola Voss e Suzanne Urban O caso Lola Voss consiste no quarto dos cinco estudos sobre esquizofrenia publicados no livro de Binswanger de 1957 Schizophrenie representando a fertilidade dos estudos psicopatológicos de Binswanger após a leitura de Ser e tempo Tratase de um quadro obsessivo esquizofrênico em associação a um delírio de perseguição analisado em uma perspectiva daseinsanalítica O segundo caso discutido neste artigo retrata o delírio de Suzanne Urban ilustrando a transição entre a segunda e a terceira fases ou seja a importância tanto da filosofia de Heidegger como de Husserl para Binswanger Esse caso também é discutido em Schizophrenie e retomado em seu último livro Délire de 1965 e em uma edição francesa de 2004 Le cas Suzanne Urban étude R E V I S T A L A T I N O A M E R I C A N A D E P S I C O P A T O L O G I A F U N D A M E N T A L 714 Rev Latinoam Psicopat Fund São Paulo 234 711723 dez 2020 sur la schizophrénie quando Binswanger pretende avançar nas contribuições oferecidas pela daseinsanálise e busca a constituição da experiência delirante sob a lente da fenomenologia genética de Husserl Gros 2009 Tatossian 19792006 Pita Moreira 2013 Lola Voss uma fobia por vestidos analisada sob a lente do Dasein A compreensão fenomenológica da existência esquizofrênica delirante de Lola significa para Binswanger partir dos relatos da história de vida dessa paciente o que consiste em uma das principais contribuições de sua clínica feno menológica Aos 20 anos Lola inicia um namoro com um médico por quem estava apaixonada mas esse relacionamento não é aceito por seu pai Com essa rejeição a jovem se nega a ingerir alimentos mostrandose triste e deprimida Aos 24 anos internase em Bellevue embora não se considerasse doente Apresentava boa capacidade intelectual abstrativa era inconsequente e tinha pouco interesse em trabalhar Seus comportamentos infantis indicavam um desen volvimento mental inadequado para sua idade Além disto evitava se relacionar com outros pacientes da clínica preferindo se isolar para pintar ou ler um livro Binswanger 1965 descreve modos simultâneos de estarnomundo do homem apresentando três tipos de experiência no mundo 1 Umwelt o mundo de contato com os outros como o que está ao nosso redor o mundo natural 2 Mitwelt o mundo dos interrelacionamentos do Sercom os outros e 3 Eigenwelt nosso mundo próprio a percepção que temos de nós mesmos do nosso corpo Os homens em movimento saudável experienciam esses três mundos em sua existência quando há alguma evitação de vivenciar um desses mundos encontramos uma paralização existencial patológica Lola não se sentia completamente vazia de afetos e sentimentos mas procurava se proteger do mundo para evitar a angústia por existir neste mundo que lhe oferecia tanto sofrimento Com esta conclusão Binswanger 1965 descreve a história de vida de Lola para assim conhecer a alteração dessa existência ao viver em constante angústia e medo de romper a fina camada de gelo que a sustentava no mundo natural o Umwelt Para que a existência de Lola não desmoronasse ela precisava de um apoio de muletas p 128 que a sustentassem nesse mundo Em Ser e tempo a proposta da analítica do Dasein de Heidegger é revelar as estruturas existenciais da existência humana espacialidade temporalidade queda cuidado etc Chamond 2011 lembra que as estruturas 715 ARTIGOS Rev Latinoam Psicopat Fund São Paulo 234 711723 dez 2020 existenciais fazem parte da essência humana assim devem estar presentes na vida do homem Nos psicóticos mais comprometidos como Lola essas estruturas existenciais também aparecem pois o psicótico não as perde mas elas se apresentam com alterações Ao utilizar o conceito heideggeriano de Dasein Binswanger pretendia ampliar seus estudos sobre as existências alteradas dos psicóticos Conforme Teixeira 1997 Binswanger emprega a alteração do Dasein como fruto da modificação da realização do Ser Assim esse Dasein perturbado na psicose se torna limitado vazio e sem brilho determinando a existência de uma patologia a qual se caracteriza pela perda de cor e brilho promovendo uma limitação rígida desse Dasein no mundo como encontramos no caso Lola O mundo adquire um significado especial para Lola por ser gerador de angústia Ela acreditava decifrar as informações do destino e reconhecer seus avisos Assim este destino que tão abertamente mostra ser proveniente do aterrorizante significa ao mesmo tempo uma defesa contra a irrupção do aterrorizante em seu descarnado mistério Binswanger 1965 p 141 Esse movimento existencial de Lola é originado de conexões entre os objetos e as coisas ruins que poderiam acontecer Para ela os vestidos carregavam os principais elementos reveladores de seu futuro As experiências esquizofrênicas apresentam uma estrutura temporal chamada ante festum pois se trata de um adiantamento do futuro O esqui zofrênico é esquizofrênico devido à sua consciência ante festum o separar do fundamento da experiência e se transformar em um adiantamento em direção a um futuro transcendente vazio Esse adiantamento do futuro se manisfesta em sua impossibilidade de habitar nas coisas denominada por Binswanger de dissolução da coerência da experiência natural e por Blankenburg de perda da evidência natural Bin 19761998 Para Lola o vestido novo ou qualquer representante de uma novidade significava a chegada de uma desgraça Por ter dificuldade em se relacionar com qualquer novidade ela permanecia em uma constante interrupção do inesperado Os vestidos determinam os direcionamentos espaciais de Lola assim sua espacialização acontece de uma forma mágica Binswanger 1965 p 161 já que seu Dasein está vinculado a um si estranho a ele O primeiro momento do delírio de Lola aparece em seu medo relacionado exclusivamente aos vestidos e às pessoas que os vestem Em um segundo momento esse medo se amplia para todos que a circundam destacandose aí a total invasão do Dasein pelo aterrorizante e ocasionando um esvaziamento existencial Assim a fobia por vestidos é o anúncio de um delírio de vestidos Binswanger 1965 p 179 R E V I S T A L A T I N O A M E R I C A N A D E P S I C O P A T O L O G I A F U N D A M E N T A L 716 Rev Latinoam Psicopat Fund São Paulo 234 711723 dez 2020 Através da análise da existência esquizofrênica delirante de Lola Voss Binswanger 1965 sublinha a falta de esclarecimento da psicopatologia tradicional em relação ao fenômeno do delírio tema este compreendido como um enigma para a psiquiatria clássica Por isto a análise do delírio de vestidos Binswanger 1965 p 179 de Lola representa uma das principais contribuições da psicopatologia fenomenológica de Binswanger por buscar a compreensão da forma de estarnomundo do delirante O conceito heideggeriano de Dasein foi fundamental para Binswanger 19221971 pois lhe ofereceu a possibilidade de apreender o modo das formas psicóticas singulares Com essa contribuição a experiência psicótica desocupa o lugar de objeto para ser o sujeito da psiquiatria Tatossian 19792006 Gros 2009 Cabestan Dastur 2011 Pita Moreira 2013 Suzanne Urban e o teatro do terror uma primeira análise existencial inspirada no Dasein O caso clínico de Suzanne Urban foi duplamente analisado em um primeiro momento Binswanger elaborou uma compreensão fenomenológica a partir da influência de conceitos heideggerianos em Ser e tempo Em seguida utilizase da fenomenologia husserliana visando alcançar a constituição dessa experiência esquizofrênica Binswanger 19522004 apresenta o sofrimento de Suzanne na medida em que relata as etapas biográficas de seu sofrimento além de sinalizar a pulsão existencial exclusiva do terror da destruição ou do aniquilamento mostrando o encaminhamento biográfico e a consequência até o estágio terminal que justamente é representado pelo delírio de perseguição plurali zado p 9 A análise do Dasein de Suzanne mostra o desejo de Binswanger de compreender o delírio de perseguição na esquizofrenia pois para alcançar o delírio esquizofrênico é imprescindível a compreensão da estrutura do Dasein como sernomundo p 13 Ao questionar o Dasein um entrave surge o Dasein não se expressa claramente pois apresenta diversas formas de estarnomundo não podendo ter como base para análise o corpo exterior e individual deste homem mas seu corpo vivido não se limitando portanto apenas às manifestações dos próprios sentimentos do paciente mas devendo atingir suas experiências vividas Devemos partir da experiência do psicótico que ao mesmo tempo é seu corpo vivido que vive habita e se manifesta nesse corpo assim procura o 717 ARTIGOS Rev Latinoam Psicopat Fund São Paulo 234 711723 dez 2020 vivido corporal do paciente sem precisar sair de sua existência Para alcançar a existência do psicótico Binswanger entende a ultrapassagem das barreiras da fisiologia por causa de sua objetividade pois não é seu foco expondo que a compreensão da esfera corporal não deveria sair do campo do fenômeno ou seja da própria existência Para Coelho Junior 2001 o alcance da compreensão feita por Binswanger sobre o homem como seu corpo vivido é permitido com a superação da cisão entre interno e externo Conforme apresentado por Gros 2009 e Cabestan 2011 a psicoterapia daseinsanalítica de Binswanger oferece uma nova maneira de articulação com a dimensão da corporeidade além de designar uma modalidade particular de existência na qual o doente se encontra limitado retirando de cena o corpo objetivo Körper para trazer a noção de corpo vivido Leib onde a principal diferença entre Körper e Leib passa a ser a experiência intersubjetiva apresentada por Binswanger através da noção de nostridade Suzanne era descendente de uma família judaica casada sem filhos e a terceira entre quatro irmãos Após uma consulta de rotina seu companheiro foi diagnosticado com câncer de bexiga e essa descoberta provocou alteração de humor tristeza e muita aflição em Suzanne Ela chorava constantemente desconfiava de todos para ela as pessoas eram más e os médicos não cuidavam bem de seu marido Binswanger 19522004 Suzanne se encontrava presa em uma crise vital p 36 agravada ao sentir um enorme medo e insegurança com a descoberta do câncer de bexiga em seu marido Binswanger 19522004 aponta esse diagnóstico como o desencadeador de uma mudança existencial em Suzanne pois ela vivia em um mundo familiar seguro e fluído que se tornara estranho e desconhecido a partir da citada doença O conteúdo vital p 38 de Suzanne começa a ser dominado por um único tema o câncer de seu marido ou seja paraliza o movimento existencial de Suzanne Assim o tema oriundo da cena original já se ampliou o que significa que ele se apossou totalmente do Si próprio da doente Esse Si próprio é verdade luta ainda contra o tema esforçase ainda para dominálo e para se defender diante dele mobilizando toda sua energia porém cada vez mais ele se encontra aspirado e absorvido pelo tema Binswanger 19522004 p 38 Com essa imobilização de sua existência na cristalização do tema da doença do marido um monólogo é construído e Suzanne Urban não tolera nenhuma outra conversa a não ser a dela mesma de fato não se interessa por mais nada que o câncer de seu marido Binswanger 19522004 p 40 Essa cristalização do tema exclui o Umwelt do Dasein e Suzanne se encontra R E V I S T A L A T I N O A M E R I C A N A D E P S I C O P A T O L O G I A F U N D A M E N T A L 718 Rev Latinoam Psicopat Fund São Paulo 234 711723 dez 2020 em uma cegueira presunçosa de Si p 39 manifestada em sua constante dedicação aos cuidados de seu marido Nessa segunda fase a desproporção antropológica é uma das principais características da clínica fenomenológica de Binswanger Na presunção uma das formas destas desproporções existenciais do homem este se encontra preso e distante do contato com o mundo comum como acontece com os esquizofrênicos em especial com Suzanne É uma forma de cegueira do Dasein Binswanger 19522004 p 41 e a análise de Binswanger sugere um mergulho no Dasein p 41 que se encontra entregue aos outros sem controle e confiança em Si sendo identificado em Suzanne através do desejo de matar seu marido e depois se suicidar como tentativa de findar seu sofrimento e assumir o controle da existência de seu Dasein Suzanne Urban e sua experiência delirante uma segunda análise ampliada com a fenomenologia genética O mundo delirante de Suzanne Urban representa uma luta psíquica humana de fluídos Binswanger 19652010 p 91 sem estar relacionado a uma intuição autêntica nem a uma percepção autêntica Com isto o trágico próprio na existência delirante se originava no curso mecanizado vazio da transcendência e igualmente da receptividade pura p 91 sendo possível identificar uma transformação psíquica e uma mecanização do mundo Nessa segunda análise do delírio de Suzanne Urban reconhecemos a influência da fenomenologia genética do último Husserl na clínica fenomenológica de Binswanger o que é característico de sua terceira fase Pita Moreira 2013 Tatossian 19792006 Ele analisa aspectos intuitivos e perceptivos para detectar suas falhas em relação aos aspectos temporais Para Suzanne o diagnóstico de câncer significou o primeiro passo de sua futura separação do mundo com os outros Mitwelt pois sabia que seu marido estava prestes a falecer Essa possível separação do marido possibilitou o aparecimento de suas fábulas delirantes p95 as quais permitiam o conhecimento dos temas específicos dominantes de seu Dasein delirante Binswanger 19652010 ainda apontava que o início dessas fábulas retirava o apoio do Dasein de Suzanne no mundo natural Umwelt embora seu interesse se direcionasse ao abalo da constituição da consciência Binswanger 19652010 p 96 de Suzanne 719 ARTIGOS Rev Latinoam Psicopat Fund São Paulo 234 711723 dez 2020 A compreensão psicopatológica desenvolvida por Binswanger ao se inspirar na fenomenologia genética de Husserl traz ferramentas de avanços aos estudos elaborados com a Daseinsanálise Por mais que Binswanger reconhecesse limites em sua análise existencial do Dasein ele não desejava descartar as contribuições oferecidas pela primeira análise da existência esquizofrênica delirante de Suzanne mas se dispunha a alcançar um outro aprofundamento com a fenomenologia genética husserliana A análise fenomenológica genética aponta o esqueleto do delírio Binswanger 19652010 p 103 e facilita a compreensão da estrutura cris talina das formações delirantes p 103 através das distorções de percepção memória e fantasia as quais originam um esquema mecânico rígido funcio nando no vazio p 104 Binswanger 19652010 compara essa mecanização da paciente a um animal por estar oposto ao Dasein do homem já que este funcionamento mecânico desconstrói o fluxo da experiência humana e altera percepção memória e fantasia provocando distorções temporais Em Suzanne não se encontra um fluxo temporal autêntico nem inten cionalidade aberta que identificamos em pessoas não psicóticas pois aqui esse fluxo temporal é rígido limitado e direcionado a um único tema o câncer de seu marido Binswanger 19652010 lembra que seu interesse pelas formas de delírio de perseguição não era apresentar suas explicações mas alcançar a constituição e a possibilidade de um novo fluxo temporal sem estar rígido nem fixado a uma única cena como ele havia identificado no caso de Suzanne Urban através do congelamento de sua existência na possibilidade de morte de seu marido Considerações finais Dentre as contribuições oferecidas pela clínica fenomenológica de Binswanger uma das principais é apontar para a necessidade de compreender o sentido da existência da psicose para aquele paciente através de sua história de vida e como este se relaciona com as três formas de experienciar de mundo 1 Umwelt mundo natural 2 Mitwelt mundo social e 3 Eigenwelt mundo próprio Em sua segunda fase sob influência da filosofia existencial de Heidegger Binswanger identifica as estruturas existenciais nos psicóticos que se apresentam com uma falha quer dizer como apontado no caso de Lola Voss como um esvaziamento existencial pois ela sentese desconectada do Umwelt gerando um constante pavor de que a qualquer R E V I S T A L A T I N O A M E R I C A N A D E P S I C O P A T O L O G I A F U N D A M E N T A L 720 Rev Latinoam Psicopat Fund São Paulo 234 711723 dez 2020 momento possa despencar de sua existência e para evitar isso ncecessita de muletas para se sustentar no mundo e acabar com sua angústia Outra influência heideggeriana para Binswanger é encontrada na compreen são da ausência de brilho no Dasein tanto em Lola quanto em Suzanne Urban ao destacar as formas de desproporções antropológicas dessas existências assim como apontamos acima no caso clínico de Suzanne ao descrever a presunção como uma dessas formas inautênticas A desproporção existencial permite apre sentar a importância do estudo do homem em suas relações com os três mundos e com suas patologias como o delírio por exemplo Os casos clínicos apresentados neste artigo estimulam a compreensão do mundo de um Dasein com sua existência desproporcional o que leva a clínica fenomenológica de Binswanger a se direcionar a uma compreensão existencial dos psicóticos Em sua última fase fenomenológica o retorno às obras de Husserl oferece a Binswanger mais ferramentas para aprofundar sua análise em um viés constitutivo desta experiência psicótica A segunda análise do caso de Suzanne ilustra essa retomada dos textos husserlianos em seu caráter genético pois Binswanger se direciona a uma compreensão da psicose levando em conta as falhas temporais do fluxo da experiência humana como no caso de Suzanne em que o foco é compreender sua existência através de seu fluxo temporal rígido limitado e direcionado a um único tema o câncer de seu marido Referências Bin K 1998 dez Temporalidade da esquizofrenia Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental 14 3054 Trabalho original publicado em 1976 Binswanger L 1965 Psiquiatría existencial Santiago CH Universitaria Binswanger L 1971 De la Phénoménologie In Introduction à lanalyse existentielle pp 79117 Paris FR Les Éditions de Minuit Trabalho original publicado em 1922 Binswanger L 2004 Le cas Suzanne Urban étude sur la schizophrénie Saint Pierre de Salerne FR Gérard Monfort Trabalho original publicado em 1952 Binswanger L 2010 Délire Grenoble FR Jérôme Millon Trabalho original publicado em 1965 Cabestan P Dastur F 2011 Daseinsanalyse Paris FR Librairie philosophique J Vrin Cabestan P 2011 Résistance Binswanger et la psychanalyse freudienne In 721 ARTIGOS Rev Latinoam Psicopat Fund São Paulo 234 711723 dez 2020 B LeroyViémon Ludwig Binswanger philosophie anthropologie clinique daseinsanalyse pp 165183 Argenteuil FR Le Cercle Herméneutique Editeur Chamond J 2011 janjun Fenomenologia e psicopatologia do espaço vivido segundo Ludwig Binswanger uma introdução Revista da Abordagem Gestáltica XVII1 37 Coelho Junior N E 2001 fev A superação da dualidade internoexterno nas teorias fenomenológicas de Binswanger e MerleauPonty Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental IV2 1117 Fédida P 1970 Préface In L Binswanger Analyse existentielle et psychanalyse freudienne discours parcours et Freud Paris FR Gallimard Gros C 2009 Ludwig Binswanger entre phénoménologie et expérience psychiatrique Chatou FR Les Éditions de La Transparence Holanda A F 2011 Gênese e histórico da psicopatologia fenomenológica In V AngeramiCamon Org Psicoterapia e brasilidade pp 5782 São Paulo SP Cortez Huygens A 2011 De la psychanalyse à lanalyse du Dasein audelà dun passage un saut In B LeroyViémon Ludwig Binswanger philosophie anthropologie clinique daseinsanalyse pp 269287 Argenteuil FR Le Cercle Herméneutique Editeur Kuhn R 2002 Lœuvre de Ludwig Binswanger son origine et sa signification pour lavenir In Fédida P WolfFédida M Phénoménologie Psychiatrie Psychanalyse pp 3545 Paris FR Colletion Phéno Pita J Moreira V 2013 octdez As fases do pensamento fenomenológico de Ludwig Binswanger Revista Psicologia em Estudo 184 679687 Tatossian A 2006 A fenomenologia das psicoses J C Célio trad V Moreira rev tec São Paulo SP Escuta Trabalho original publicado em 1979 Teixeira J A C 1997 Introdução às abordagens fenomenológica e existencial em psicopatologia as abordagens existenciais Análise Psicológica 2XV 195205 Resumos Ludwig Binswangers clinic inspired by Heideggers Dasein and Husserls genetic phenomenology Ludwig Binswangers phenomenological clinic provides a new understanding of psychopathologies by highlighting the importance of patients life stories It is divided into three phenomenological stages and shows how fertile his psychopathological studies became after he had read Being and Time and due to Husserls influence R E V I S T A L A T I N O A M E R I C A N A D E P S I C O P A T O L O G I A F U N D A M E N T A L 722 Rev Latinoam Psicopat Fund São Paulo 234 711723 dez 2020 which he undertook to investigate the formation of delusional experience This article presents two clinical cases Lola Voss and Suzanne Urban to illustrate Ludwig Binswangers contribution to phenomenological psychopathology in its second and final stage Key words Binswanger phenomenological psychopathology clinical cases delirium La clinique de Ludwig Binswanger inspirée par le Dasein de Heidegger et par la phénoménologie génétique de Husserl La clinique phénoménologique de Ludwig Binswanger propose une nouvelle compréhension de la psychopathologie soulignant limportance de lhistoire de vie du patient Les trois phases de sa pensée phénoménologique montrent la fécondité de ses études psychopathologiques influencées par la lecture de lÊtre et Temps et par Husserl quil menait pour élucider la formation de lexpérience délirante Cet article présente deux cas cliniques Lola Voss et Suzanne Urban qui illustrent la contribution apportée par Ludwig Binswanger à la psychopathologie phénoménologique dans sa deuxième et dernière phase Mots clés Binswanger psychopathologie phénoménologique cas cliniques delire La clínica de Ludwig Binswanger inspirada en el Dasein de Heidegger y en la fenomenología genética de Husserl La clínica fenomenológica de Ludwig Binswanger propone una nueva comprensión de la psicopatología al destacar su importancia en la historia de vida del paciente Está divida en tres fases mostrando la fertilidad de sus estudios psicopatológicos tras la lectura de Ser y tiempo y a través de la influencia de Husserl a fin de aclarar la constitución de la experiencia delirante Este artículo tiene como objetivo presentar dos casos clínicos Lola Voss y Suzanne Urban para ilustrar la contribución de Ludwig Binswanger a la psicopatología fenomenológica en su segunda y última fase Palabras clave Binswanger psicopatología fenomenológica casos clínicos delirio CitaçãoCitation Pita J Moreira V 2020 dezembro A clínica de Ludwig Binswan ger inspirada no Dasein de Heidegger e na fenomenologia genética de Husserl Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental 234 711723 httpdxdoiorg101590 141547142020v23n4p7113 EditorEditor Prof Dr Manoel T Berlinck in memoriam SubmetidoSubmitted 1612016 1162016 AceitoAcepted 1562016 6152016 723 ARTIGOS Rev Latinoam Psicopat Fund São Paulo 234 711723 dez 2020 Copyright 2009 Associação Universitária de Pesquisa em Psicopatologia Fundamental University Association for Research in Fundamental Psychopathology Este é um artigo de livre acesso que permite uso irrestrito distribuição e reprodução em qualquer meio desde que o autor e a fonte sejam citados This is an openaccess article which permits unrestricted use distribution and reproduction in any medium provided the original authors and sources are credited FinanciamentoFunding Este trabalho não recebeu apoio This work received no funding Conflito de interessesConflict of interest As autoras declaram que não há conflito de interesses The authors declare that there is no conflict of interest Juliana Pita Psicoterapeuta Doutora em psicologia clínica em cotutela UniforParisVI Mestre FUNCAP em psicologia clínica pela Universidade de Fortaleza Unifor Fortaleza CE Br Professora no curso de Psicologia na Unifor e membro do APHETO Laboratório de Psicopatologia e Clinica Humanista Fenomenológica Fortaleza CE Br Rua Antonio Lima 188400 Meireles Fortaleza CE Br julianapitapgmailcom httpsorcidorg0000000188594752 Virgínia Moreira Psicoterapeuta Doutora em psicologia clínica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUCSP São Paulo SP Br e pósdoutora em antropologia médica pela Harvard University como pesquisadora Fulbright É professora titular da Universidade de Fortaleza Unifor Fortaleza CE Br Supervisora clínica credenciada pela Sociedad Chilena de Psicológia Clínica Membro da World Association of Person Centered and Experiential Psychoterapies Membro da Associação Universitária de Pesquisa em Psicopatologia Fundamental São Paulo SP Br Orientadora de Doutorado em cotutela na Université ParisDiderot Paris VII Tem Produtividade em Pesquisa nível 2 CNPq Rua Osvaldo Cruz 241901 Meireles Fortaleza CE Br virginiamoreirauniforbr httporcidorg0000000327400023 This is an openaccess article which permits unrestricted use distribution and reproduction in any medium for noncommercial purposes provided the original authors and sources are credited
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711 ARTIGOS A clínica de Ludwig Binswanger inspirada no Dasein de Heidegger e na fenomenologia genética de Husserl Ludwig Binswangers clinic inspired by Heideggers Dasein and Husserls genetic phenomenology Juliana Pita1 Virginia Moreira2 Rev Latinoam Psicopat Fund São Paulo 234 711723 dez 2020 httpdxdoiorg101590141547142020v23n4p7113 12 Universidade de Fortaleza Unifor Fortaleza CE Brasil A clínica fenomenológica de Ludwig Binswanger propõe uma nova compreensão sobre a psicopatologia ao realçar a importância na história de vida do paciente Encontrase dividida em três fases mostrando a fertilidade de seus estudos psicopatológicos após a leitura de Ser e tempo e através da influência husserliana com o intuito de esclarecer a constituição da experiência delirante Este artigo tem como objetivo apresentar dois casos clínicos Lola Voss e Suzanne Urban para ilustrar a contribuição oferecida por Ludwig Binswanger à psicopatologia fenomenológica em sua segunda e última fase Palavraschave Binswanger psicopatologia fenomenológica casos clínicos delírio R E V I S T A L A T I N O A M E R I C A N A D E P S I C O P A T O L O G I A F U N D A M E N T A L 712 Rev Latinoam Psicopat Fund São Paulo 234 711723 dez 2020 Introdução A clínica fenomenológica de Ludwig Binswanger propõe uma nova abordagem psiquiátrica da psicose ao realçar a importância da história de vida de pacientes no que se refere à patologia Sua experiência psiquiátrica amadurece em Bellevue através de sua especialidade no atendimento com esquizofrênicos Fédida 1970 Kuhn 2002 Tatossian 19792006 Gros 2009 Cabestan 2011 Cabestan Dastur 2011 Chamond 2011 Huygens 2011 Pita Moreira 2013 Sob o olhar crítico de Binswanger 19221971 a psiquiatria clássica limita seu foco na busca por causas e pela natureza de uma patologia Diante disto nos apresenta a psicopatologia fenomenoló gica na qual os sintomas devem ser compreendidos não apenas com uma proposta teórica mas em sua totalidade como uma forma de exis tência e do estarnomundo do psicótico A psicopatologia fenomeno lógica de Binswanger oferece ferramentas para acessar este mundo vivido encontrandose para aquém do sintoma e de suas causas Além de sua formação médica Binswanger recorre à filosofia Chamond 2011 Holanda 2011 e se ancora principalmente nas fenomenologias de Edmund Husserl e Martin Heidegger com o desejo de desenvolver a contribuição da fenomenologia à psiquiatra tradicional Nesse contexto desenvolve a antropologia fenomenológica inicialmente sob influência dos textos da fenomenologia transcendental de Husserl como funda mento da psicopatologia fenomenológica Chegar mais perto da obra psicopatológica de Binswanger é se deparar com um pensamento fenomenológico em mudança quer dizer que ao sofrer influências de Husserl e Heidegger podemos identificar momentos distintos ao longo de sua clínica Tatossian 19792006 e Pita e Moreira 2013 apresentam o pensamento fenomenológico binswangeriano dividido em três fases I Primeiro Binswanger com forte presença da fenomenologia transcendental de Husserl II Binswanger após a leitura de Ser e tempo ancorado na filosofia exis tencial de Heidegger e III Último Binswanger em seu retorno à feno menologia genética do último Husserl 713 ARTIGOS Rev Latinoam Psicopat Fund São Paulo 234 711723 dez 2020 Anterior a essas três fases Gros 2009 aponta a fase psicanalítica marca do início da clínica de Binswanger Holanda 2011 destaca ainda uma quarta fase a préfenomenológica pois ao se afastar da psicanálise freudiana Binswanger se aproxima teoricamente de Kant e Natorp Não se restringindo apenas à influência teórica Gros 2009 também separou o percurso teórico de Binswanger em dois períodos característicos I período de formação e construção de seu pensamento 19071957 momento das presenças teóricas de Freud Husserl e Heidegger e II período criativo 19601965 no qual Binswanger explorou estudos psicopatológicos influenciados pela fenomenologia genética husserliana especialmente no final de suas obras Mélancolie et manie e Délire Neste artigo tomamos como base as três fases demarcadas por Tatossian 19792006 e Pita e Moreira 2013 Na primeira fase a fenomenologia husserliana para o primeiro Binswanger representa apenas uma ferramenta metodológica e não se utilizava como ponto de vista psicopatológico Gros 2009 Tatossian 19792006 Pita Moreira 2013 Após 1930 a leitura de Ser e tempo o destaque da filosofia de Heidegger no pensamento fenomenológico de Binswanger pode ser encontrado na maioria de seus textos Esse é o período de maior produção escrita de Binswanger de tal forma que alguns autores reconhecem apenas a influência de Heidegger nas obras de Binswanger e descartam a importante presença de Husserl principalmente na última fase Nesse terceiro período já no final de sua vida Binswanger retoma os escritos husserlianos com um viés interpretado pelo fenomenólogo húngaro Wilhelm Szilasi no livro Introduction à la Phénoménologie dEdmond Husserl de 1959 Nessa fase encontramos seus dois últimos livros Mélancolie et manie e Délire Tatossian 19792006 Pita Moreira 2013 Este artigo busca ilustrar o pensamento fenomenológico clínico de Binswanger na segunda e terceira fases com a discussão de dois casos clínicos de pacientes esquizofrênicas delirantes Lola Voss e Suzanne Urban O caso Lola Voss consiste no quarto dos cinco estudos sobre esquizofrenia publicados no livro de Binswanger de 1957 Schizophrenie representando a fertilidade dos estudos psicopatológicos de Binswanger após a leitura de Ser e tempo Tratase de um quadro obsessivo esquizofrênico em associação a um delírio de perseguição analisado em uma perspectiva daseinsanalítica O segundo caso discutido neste artigo retrata o delírio de Suzanne Urban ilustrando a transição entre a segunda e a terceira fases ou seja a importância tanto da filosofia de Heidegger como de Husserl para Binswanger Esse caso também é discutido em Schizophrenie e retomado em seu último livro Délire de 1965 e em uma edição francesa de 2004 Le cas Suzanne Urban étude R E V I S T A L A T I N O A M E R I C A N A D E P S I C O P A T O L O G I A F U N D A M E N T A L 714 Rev Latinoam Psicopat Fund São Paulo 234 711723 dez 2020 sur la schizophrénie quando Binswanger pretende avançar nas contribuições oferecidas pela daseinsanálise e busca a constituição da experiência delirante sob a lente da fenomenologia genética de Husserl Gros 2009 Tatossian 19792006 Pita Moreira 2013 Lola Voss uma fobia por vestidos analisada sob a lente do Dasein A compreensão fenomenológica da existência esquizofrênica delirante de Lola significa para Binswanger partir dos relatos da história de vida dessa paciente o que consiste em uma das principais contribuições de sua clínica feno menológica Aos 20 anos Lola inicia um namoro com um médico por quem estava apaixonada mas esse relacionamento não é aceito por seu pai Com essa rejeição a jovem se nega a ingerir alimentos mostrandose triste e deprimida Aos 24 anos internase em Bellevue embora não se considerasse doente Apresentava boa capacidade intelectual abstrativa era inconsequente e tinha pouco interesse em trabalhar Seus comportamentos infantis indicavam um desen volvimento mental inadequado para sua idade Além disto evitava se relacionar com outros pacientes da clínica preferindo se isolar para pintar ou ler um livro Binswanger 1965 descreve modos simultâneos de estarnomundo do homem apresentando três tipos de experiência no mundo 1 Umwelt o mundo de contato com os outros como o que está ao nosso redor o mundo natural 2 Mitwelt o mundo dos interrelacionamentos do Sercom os outros e 3 Eigenwelt nosso mundo próprio a percepção que temos de nós mesmos do nosso corpo Os homens em movimento saudável experienciam esses três mundos em sua existência quando há alguma evitação de vivenciar um desses mundos encontramos uma paralização existencial patológica Lola não se sentia completamente vazia de afetos e sentimentos mas procurava se proteger do mundo para evitar a angústia por existir neste mundo que lhe oferecia tanto sofrimento Com esta conclusão Binswanger 1965 descreve a história de vida de Lola para assim conhecer a alteração dessa existência ao viver em constante angústia e medo de romper a fina camada de gelo que a sustentava no mundo natural o Umwelt Para que a existência de Lola não desmoronasse ela precisava de um apoio de muletas p 128 que a sustentassem nesse mundo Em Ser e tempo a proposta da analítica do Dasein de Heidegger é revelar as estruturas existenciais da existência humana espacialidade temporalidade queda cuidado etc Chamond 2011 lembra que as estruturas 715 ARTIGOS Rev Latinoam Psicopat Fund São Paulo 234 711723 dez 2020 existenciais fazem parte da essência humana assim devem estar presentes na vida do homem Nos psicóticos mais comprometidos como Lola essas estruturas existenciais também aparecem pois o psicótico não as perde mas elas se apresentam com alterações Ao utilizar o conceito heideggeriano de Dasein Binswanger pretendia ampliar seus estudos sobre as existências alteradas dos psicóticos Conforme Teixeira 1997 Binswanger emprega a alteração do Dasein como fruto da modificação da realização do Ser Assim esse Dasein perturbado na psicose se torna limitado vazio e sem brilho determinando a existência de uma patologia a qual se caracteriza pela perda de cor e brilho promovendo uma limitação rígida desse Dasein no mundo como encontramos no caso Lola O mundo adquire um significado especial para Lola por ser gerador de angústia Ela acreditava decifrar as informações do destino e reconhecer seus avisos Assim este destino que tão abertamente mostra ser proveniente do aterrorizante significa ao mesmo tempo uma defesa contra a irrupção do aterrorizante em seu descarnado mistério Binswanger 1965 p 141 Esse movimento existencial de Lola é originado de conexões entre os objetos e as coisas ruins que poderiam acontecer Para ela os vestidos carregavam os principais elementos reveladores de seu futuro As experiências esquizofrênicas apresentam uma estrutura temporal chamada ante festum pois se trata de um adiantamento do futuro O esqui zofrênico é esquizofrênico devido à sua consciência ante festum o separar do fundamento da experiência e se transformar em um adiantamento em direção a um futuro transcendente vazio Esse adiantamento do futuro se manisfesta em sua impossibilidade de habitar nas coisas denominada por Binswanger de dissolução da coerência da experiência natural e por Blankenburg de perda da evidência natural Bin 19761998 Para Lola o vestido novo ou qualquer representante de uma novidade significava a chegada de uma desgraça Por ter dificuldade em se relacionar com qualquer novidade ela permanecia em uma constante interrupção do inesperado Os vestidos determinam os direcionamentos espaciais de Lola assim sua espacialização acontece de uma forma mágica Binswanger 1965 p 161 já que seu Dasein está vinculado a um si estranho a ele O primeiro momento do delírio de Lola aparece em seu medo relacionado exclusivamente aos vestidos e às pessoas que os vestem Em um segundo momento esse medo se amplia para todos que a circundam destacandose aí a total invasão do Dasein pelo aterrorizante e ocasionando um esvaziamento existencial Assim a fobia por vestidos é o anúncio de um delírio de vestidos Binswanger 1965 p 179 R E V I S T A L A T I N O A M E R I C A N A D E P S I C O P A T O L O G I A F U N D A M E N T A L 716 Rev Latinoam Psicopat Fund São Paulo 234 711723 dez 2020 Através da análise da existência esquizofrênica delirante de Lola Voss Binswanger 1965 sublinha a falta de esclarecimento da psicopatologia tradicional em relação ao fenômeno do delírio tema este compreendido como um enigma para a psiquiatria clássica Por isto a análise do delírio de vestidos Binswanger 1965 p 179 de Lola representa uma das principais contribuições da psicopatologia fenomenológica de Binswanger por buscar a compreensão da forma de estarnomundo do delirante O conceito heideggeriano de Dasein foi fundamental para Binswanger 19221971 pois lhe ofereceu a possibilidade de apreender o modo das formas psicóticas singulares Com essa contribuição a experiência psicótica desocupa o lugar de objeto para ser o sujeito da psiquiatria Tatossian 19792006 Gros 2009 Cabestan Dastur 2011 Pita Moreira 2013 Suzanne Urban e o teatro do terror uma primeira análise existencial inspirada no Dasein O caso clínico de Suzanne Urban foi duplamente analisado em um primeiro momento Binswanger elaborou uma compreensão fenomenológica a partir da influência de conceitos heideggerianos em Ser e tempo Em seguida utilizase da fenomenologia husserliana visando alcançar a constituição dessa experiência esquizofrênica Binswanger 19522004 apresenta o sofrimento de Suzanne na medida em que relata as etapas biográficas de seu sofrimento além de sinalizar a pulsão existencial exclusiva do terror da destruição ou do aniquilamento mostrando o encaminhamento biográfico e a consequência até o estágio terminal que justamente é representado pelo delírio de perseguição plurali zado p 9 A análise do Dasein de Suzanne mostra o desejo de Binswanger de compreender o delírio de perseguição na esquizofrenia pois para alcançar o delírio esquizofrênico é imprescindível a compreensão da estrutura do Dasein como sernomundo p 13 Ao questionar o Dasein um entrave surge o Dasein não se expressa claramente pois apresenta diversas formas de estarnomundo não podendo ter como base para análise o corpo exterior e individual deste homem mas seu corpo vivido não se limitando portanto apenas às manifestações dos próprios sentimentos do paciente mas devendo atingir suas experiências vividas Devemos partir da experiência do psicótico que ao mesmo tempo é seu corpo vivido que vive habita e se manifesta nesse corpo assim procura o 717 ARTIGOS Rev Latinoam Psicopat Fund São Paulo 234 711723 dez 2020 vivido corporal do paciente sem precisar sair de sua existência Para alcançar a existência do psicótico Binswanger entende a ultrapassagem das barreiras da fisiologia por causa de sua objetividade pois não é seu foco expondo que a compreensão da esfera corporal não deveria sair do campo do fenômeno ou seja da própria existência Para Coelho Junior 2001 o alcance da compreensão feita por Binswanger sobre o homem como seu corpo vivido é permitido com a superação da cisão entre interno e externo Conforme apresentado por Gros 2009 e Cabestan 2011 a psicoterapia daseinsanalítica de Binswanger oferece uma nova maneira de articulação com a dimensão da corporeidade além de designar uma modalidade particular de existência na qual o doente se encontra limitado retirando de cena o corpo objetivo Körper para trazer a noção de corpo vivido Leib onde a principal diferença entre Körper e Leib passa a ser a experiência intersubjetiva apresentada por Binswanger através da noção de nostridade Suzanne era descendente de uma família judaica casada sem filhos e a terceira entre quatro irmãos Após uma consulta de rotina seu companheiro foi diagnosticado com câncer de bexiga e essa descoberta provocou alteração de humor tristeza e muita aflição em Suzanne Ela chorava constantemente desconfiava de todos para ela as pessoas eram más e os médicos não cuidavam bem de seu marido Binswanger 19522004 Suzanne se encontrava presa em uma crise vital p 36 agravada ao sentir um enorme medo e insegurança com a descoberta do câncer de bexiga em seu marido Binswanger 19522004 aponta esse diagnóstico como o desencadeador de uma mudança existencial em Suzanne pois ela vivia em um mundo familiar seguro e fluído que se tornara estranho e desconhecido a partir da citada doença O conteúdo vital p 38 de Suzanne começa a ser dominado por um único tema o câncer de seu marido ou seja paraliza o movimento existencial de Suzanne Assim o tema oriundo da cena original já se ampliou o que significa que ele se apossou totalmente do Si próprio da doente Esse Si próprio é verdade luta ainda contra o tema esforçase ainda para dominálo e para se defender diante dele mobilizando toda sua energia porém cada vez mais ele se encontra aspirado e absorvido pelo tema Binswanger 19522004 p 38 Com essa imobilização de sua existência na cristalização do tema da doença do marido um monólogo é construído e Suzanne Urban não tolera nenhuma outra conversa a não ser a dela mesma de fato não se interessa por mais nada que o câncer de seu marido Binswanger 19522004 p 40 Essa cristalização do tema exclui o Umwelt do Dasein e Suzanne se encontra R E V I S T A L A T I N O A M E R I C A N A D E P S I C O P A T O L O G I A F U N D A M E N T A L 718 Rev Latinoam Psicopat Fund São Paulo 234 711723 dez 2020 em uma cegueira presunçosa de Si p 39 manifestada em sua constante dedicação aos cuidados de seu marido Nessa segunda fase a desproporção antropológica é uma das principais características da clínica fenomenológica de Binswanger Na presunção uma das formas destas desproporções existenciais do homem este se encontra preso e distante do contato com o mundo comum como acontece com os esquizofrênicos em especial com Suzanne É uma forma de cegueira do Dasein Binswanger 19522004 p 41 e a análise de Binswanger sugere um mergulho no Dasein p 41 que se encontra entregue aos outros sem controle e confiança em Si sendo identificado em Suzanne através do desejo de matar seu marido e depois se suicidar como tentativa de findar seu sofrimento e assumir o controle da existência de seu Dasein Suzanne Urban e sua experiência delirante uma segunda análise ampliada com a fenomenologia genética O mundo delirante de Suzanne Urban representa uma luta psíquica humana de fluídos Binswanger 19652010 p 91 sem estar relacionado a uma intuição autêntica nem a uma percepção autêntica Com isto o trágico próprio na existência delirante se originava no curso mecanizado vazio da transcendência e igualmente da receptividade pura p 91 sendo possível identificar uma transformação psíquica e uma mecanização do mundo Nessa segunda análise do delírio de Suzanne Urban reconhecemos a influência da fenomenologia genética do último Husserl na clínica fenomenológica de Binswanger o que é característico de sua terceira fase Pita Moreira 2013 Tatossian 19792006 Ele analisa aspectos intuitivos e perceptivos para detectar suas falhas em relação aos aspectos temporais Para Suzanne o diagnóstico de câncer significou o primeiro passo de sua futura separação do mundo com os outros Mitwelt pois sabia que seu marido estava prestes a falecer Essa possível separação do marido possibilitou o aparecimento de suas fábulas delirantes p95 as quais permitiam o conhecimento dos temas específicos dominantes de seu Dasein delirante Binswanger 19652010 ainda apontava que o início dessas fábulas retirava o apoio do Dasein de Suzanne no mundo natural Umwelt embora seu interesse se direcionasse ao abalo da constituição da consciência Binswanger 19652010 p 96 de Suzanne 719 ARTIGOS Rev Latinoam Psicopat Fund São Paulo 234 711723 dez 2020 A compreensão psicopatológica desenvolvida por Binswanger ao se inspirar na fenomenologia genética de Husserl traz ferramentas de avanços aos estudos elaborados com a Daseinsanálise Por mais que Binswanger reconhecesse limites em sua análise existencial do Dasein ele não desejava descartar as contribuições oferecidas pela primeira análise da existência esquizofrênica delirante de Suzanne mas se dispunha a alcançar um outro aprofundamento com a fenomenologia genética husserliana A análise fenomenológica genética aponta o esqueleto do delírio Binswanger 19652010 p 103 e facilita a compreensão da estrutura cris talina das formações delirantes p 103 através das distorções de percepção memória e fantasia as quais originam um esquema mecânico rígido funcio nando no vazio p 104 Binswanger 19652010 compara essa mecanização da paciente a um animal por estar oposto ao Dasein do homem já que este funcionamento mecânico desconstrói o fluxo da experiência humana e altera percepção memória e fantasia provocando distorções temporais Em Suzanne não se encontra um fluxo temporal autêntico nem inten cionalidade aberta que identificamos em pessoas não psicóticas pois aqui esse fluxo temporal é rígido limitado e direcionado a um único tema o câncer de seu marido Binswanger 19652010 lembra que seu interesse pelas formas de delírio de perseguição não era apresentar suas explicações mas alcançar a constituição e a possibilidade de um novo fluxo temporal sem estar rígido nem fixado a uma única cena como ele havia identificado no caso de Suzanne Urban através do congelamento de sua existência na possibilidade de morte de seu marido Considerações finais Dentre as contribuições oferecidas pela clínica fenomenológica de Binswanger uma das principais é apontar para a necessidade de compreender o sentido da existência da psicose para aquele paciente através de sua história de vida e como este se relaciona com as três formas de experienciar de mundo 1 Umwelt mundo natural 2 Mitwelt mundo social e 3 Eigenwelt mundo próprio Em sua segunda fase sob influência da filosofia existencial de Heidegger Binswanger identifica as estruturas existenciais nos psicóticos que se apresentam com uma falha quer dizer como apontado no caso de Lola Voss como um esvaziamento existencial pois ela sentese desconectada do Umwelt gerando um constante pavor de que a qualquer R E V I S T A L A T I N O A M E R I C A N A D E P S I C O P A T O L O G I A F U N D A M E N T A L 720 Rev Latinoam Psicopat Fund São Paulo 234 711723 dez 2020 momento possa despencar de sua existência e para evitar isso ncecessita de muletas para se sustentar no mundo e acabar com sua angústia Outra influência heideggeriana para Binswanger é encontrada na compreen são da ausência de brilho no Dasein tanto em Lola quanto em Suzanne Urban ao destacar as formas de desproporções antropológicas dessas existências assim como apontamos acima no caso clínico de Suzanne ao descrever a presunção como uma dessas formas inautênticas A desproporção existencial permite apre sentar a importância do estudo do homem em suas relações com os três mundos e com suas patologias como o delírio por exemplo Os casos clínicos apresentados neste artigo estimulam a compreensão do mundo de um Dasein com sua existência desproporcional o que leva a clínica fenomenológica de Binswanger a se direcionar a uma compreensão existencial dos psicóticos Em sua última fase fenomenológica o retorno às obras de Husserl oferece a Binswanger mais ferramentas para aprofundar sua análise em um viés constitutivo desta experiência psicótica A segunda análise do caso de Suzanne ilustra essa retomada dos textos husserlianos em seu caráter genético pois Binswanger se direciona a uma compreensão da psicose levando em conta as falhas temporais do fluxo da experiência humana como no caso de Suzanne em que o foco é compreender sua existência através de seu fluxo temporal rígido limitado e direcionado a um único tema o câncer de seu marido Referências Bin K 1998 dez Temporalidade da esquizofrenia Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental 14 3054 Trabalho original publicado em 1976 Binswanger L 1965 Psiquiatría existencial Santiago CH Universitaria Binswanger L 1971 De la Phénoménologie In Introduction à lanalyse existentielle pp 79117 Paris FR Les Éditions de Minuit Trabalho original publicado em 1922 Binswanger L 2004 Le cas Suzanne Urban étude sur la schizophrénie Saint Pierre de Salerne FR Gérard Monfort Trabalho original publicado em 1952 Binswanger L 2010 Délire Grenoble FR Jérôme Millon Trabalho original publicado em 1965 Cabestan P Dastur F 2011 Daseinsanalyse Paris FR Librairie philosophique J Vrin Cabestan P 2011 Résistance Binswanger et la psychanalyse freudienne In 721 ARTIGOS Rev Latinoam Psicopat Fund São Paulo 234 711723 dez 2020 B LeroyViémon Ludwig Binswanger philosophie anthropologie clinique daseinsanalyse pp 165183 Argenteuil FR Le Cercle Herméneutique Editeur Chamond J 2011 janjun Fenomenologia e psicopatologia do espaço vivido segundo Ludwig Binswanger uma introdução Revista da Abordagem Gestáltica XVII1 37 Coelho Junior N E 2001 fev A superação da dualidade internoexterno nas teorias fenomenológicas de Binswanger e MerleauPonty Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental IV2 1117 Fédida P 1970 Préface In L Binswanger Analyse existentielle et psychanalyse freudienne discours parcours et Freud Paris FR Gallimard Gros C 2009 Ludwig Binswanger entre phénoménologie et expérience psychiatrique Chatou FR Les Éditions de La Transparence Holanda A F 2011 Gênese e histórico da psicopatologia fenomenológica In V AngeramiCamon Org Psicoterapia e brasilidade pp 5782 São Paulo SP Cortez Huygens A 2011 De la psychanalyse à lanalyse du Dasein audelà dun passage un saut In B LeroyViémon Ludwig Binswanger philosophie anthropologie clinique daseinsanalyse pp 269287 Argenteuil FR Le Cercle Herméneutique Editeur Kuhn R 2002 Lœuvre de Ludwig Binswanger son origine et sa signification pour lavenir In Fédida P WolfFédida M Phénoménologie Psychiatrie Psychanalyse pp 3545 Paris FR Colletion Phéno Pita J Moreira V 2013 octdez As fases do pensamento fenomenológico de Ludwig Binswanger Revista Psicologia em Estudo 184 679687 Tatossian A 2006 A fenomenologia das psicoses J C Célio trad V Moreira rev tec São Paulo SP Escuta Trabalho original publicado em 1979 Teixeira J A C 1997 Introdução às abordagens fenomenológica e existencial em psicopatologia as abordagens existenciais Análise Psicológica 2XV 195205 Resumos Ludwig Binswangers clinic inspired by Heideggers Dasein and Husserls genetic phenomenology Ludwig Binswangers phenomenological clinic provides a new understanding of psychopathologies by highlighting the importance of patients life stories It is divided into three phenomenological stages and shows how fertile his psychopathological studies became after he had read Being and Time and due to Husserls influence R E V I S T A L A T I N O A M E R I C A N A D E P S I C O P A T O L O G I A F U N D A M E N T A L 722 Rev Latinoam Psicopat Fund São Paulo 234 711723 dez 2020 which he undertook to investigate the formation of delusional experience This article presents two clinical cases Lola Voss and Suzanne Urban to illustrate Ludwig Binswangers contribution to phenomenological psychopathology in its second and final stage Key words Binswanger phenomenological psychopathology clinical cases delirium La clinique de Ludwig Binswanger inspirée par le Dasein de Heidegger et par la phénoménologie génétique de Husserl La clinique phénoménologique de Ludwig Binswanger propose une nouvelle compréhension de la psychopathologie soulignant limportance de lhistoire de vie du patient Les trois phases de sa pensée phénoménologique montrent la fécondité de ses études psychopathologiques influencées par la lecture de lÊtre et Temps et par Husserl quil menait pour élucider la formation de lexpérience délirante Cet article présente deux cas cliniques Lola Voss et Suzanne Urban qui illustrent la contribution apportée par Ludwig Binswanger à la psychopathologie phénoménologique dans sa deuxième et dernière phase Mots clés Binswanger psychopathologie phénoménologique cas cliniques delire La clínica de Ludwig Binswanger inspirada en el Dasein de Heidegger y en la fenomenología genética de Husserl La clínica fenomenológica de Ludwig Binswanger propone una nueva comprensión de la psicopatología al destacar su importancia en la historia de vida del paciente Está divida en tres fases mostrando la fertilidad de sus estudios psicopatológicos tras la lectura de Ser y tiempo y a través de la influencia de Husserl a fin de aclarar la constitución de la experiencia delirante Este artículo tiene como objetivo presentar dos casos clínicos Lola Voss y Suzanne Urban para ilustrar la contribución de Ludwig Binswanger a la psicopatología fenomenológica en su segunda y última fase Palabras clave Binswanger psicopatología fenomenológica casos clínicos delirio CitaçãoCitation Pita J Moreira V 2020 dezembro A clínica de Ludwig Binswan ger inspirada no Dasein de Heidegger e na fenomenologia genética de Husserl Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental 234 711723 httpdxdoiorg101590 141547142020v23n4p7113 EditorEditor Prof Dr Manoel T Berlinck in memoriam SubmetidoSubmitted 1612016 1162016 AceitoAcepted 1562016 6152016 723 ARTIGOS Rev Latinoam Psicopat Fund São Paulo 234 711723 dez 2020 Copyright 2009 Associação Universitária de Pesquisa em Psicopatologia Fundamental University Association for Research in Fundamental Psychopathology Este é um artigo de livre acesso que permite uso irrestrito distribuição e reprodução em qualquer meio desde que o autor e a fonte sejam citados This is an openaccess article which permits unrestricted use distribution and reproduction in any medium provided the original authors and sources are credited FinanciamentoFunding Este trabalho não recebeu apoio This work received no funding Conflito de interessesConflict of interest As autoras declaram que não há conflito de interesses The authors declare that there is no conflict of interest Juliana Pita Psicoterapeuta Doutora em psicologia clínica em cotutela UniforParisVI Mestre FUNCAP em psicologia clínica pela Universidade de Fortaleza Unifor Fortaleza CE Br Professora no curso de Psicologia na Unifor e membro do APHETO Laboratório de Psicopatologia e Clinica Humanista Fenomenológica Fortaleza CE Br Rua Antonio Lima 188400 Meireles Fortaleza CE Br julianapitapgmailcom httpsorcidorg0000000188594752 Virgínia Moreira Psicoterapeuta Doutora em psicologia clínica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUCSP São Paulo SP Br e pósdoutora em antropologia médica pela Harvard University como pesquisadora Fulbright É professora titular da Universidade de Fortaleza Unifor Fortaleza CE Br Supervisora clínica credenciada pela Sociedad Chilena de Psicológia Clínica Membro da World Association of Person Centered and Experiential Psychoterapies Membro da Associação Universitária de Pesquisa em Psicopatologia Fundamental São Paulo SP Br Orientadora de Doutorado em cotutela na Université ParisDiderot Paris VII Tem Produtividade em Pesquisa nível 2 CNPq Rua Osvaldo Cruz 241901 Meireles Fortaleza CE Br virginiamoreirauniforbr httporcidorg0000000327400023 This is an openaccess article which permits unrestricted use distribution and reproduction in any medium for noncommercial purposes provided the original authors and sources are credited