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Antropologia Social
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See discussions stats and author profiles for this publication at httpswwwresearchgatenetpublication242611898 Universo Metaverso Multiverso Mundos Virtuais como Híbridos entre Jogos Eletrônicos e Comunidades Virtuais Article November 2013 CITATION 1 READS 4723 1 author Some of the authors of this publication are also working on these related projects Dinâmicas de Consumo em Online Video Games Apropriação e Subversão no Universo de Warcraft View project Like a Pro Dinâmicas Sociais no eSport Like a Pro Social Dynamics in eSport View project Thiago Falcão Universidade Federal da Paraíba 56 PUBLICATIONS 110 CITATIONS SEE PROFILE All content following this page was uploaded by Thiago Falcão on 31 May 2014 The user has requested enhancement of the downloaded file UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL HABILITAÇÃO JORNALISMO UNIVERSO METAVERSO MULTIVERSO Mundos virtuais como híbridos entre jogos eletrônicos e comunidades virtuais Thiago Falcão João Pessoa Paraíba 2007 2 UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL Thiago Pereira Falcão UNIVERSO METAVERSO MULTIVERSO Mundos virtuais como híbridos entre jogos eletrônicos e comunidades virtuais Monografia apresentada à Universidade Federal da Paraíba em cumprimento às exigências para obtenção do grau de Bacharel em Comunicação Social habilitação em Jornalismo Orientador Prof Dr Wellington Pereira João Pessoa 2007 3 4 UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL Thiago Pereira Falcão UNIVERSO METAVERSO MULTIVERSO Mundos virtuais como híbridos entre jogos eletrônicos e comunidades virtuais BANCA EXAMINADORA NOTA Prof Dr Wellington Pereira Orientador Universidade Federal da Paraíba Prof Dr Cláudio Cardoso Paiva Membro Universidade Federal da Paraíba Profª Drª Simone Maldonado Membro Universidade Federal da Paraíba MÉDIA Aprovada em de de 5 AGRADECIMENTOS A Felipe e Júlio pelos encontros trimestrais e por toda a conversa jogada fora em intertextos e a Jorge Diego e Fábio por sentarem comigo durante tantos anos com o simples intuito da diversão Bom quando Fábio não estava roubando nos divertíamos E a Paulinho encaixado aqui porque não abrirei um parágrafo só para ele A Agnes pela prioridade Em tempo Alex por ser um amigo indiscutível A Maurício Arthur e Marcelo amigos cults pela companhia no decorrer desses mais de quatro anos dentro e fora da faculdade Kátia por afinidade gravitacional aqui Aos professores do Decom que adicionaram algo de fato não foram muitos mas os que o fizeram foram brilhantes E aos demais porque ao nada adicionarem muito me ensinaram À minha namorada Ana Raquel por ser motivação e conforto por manter meu multiverso uno 6 Para meu pai de quem herdei meu melhor e pior E para minha mãe por ser forte como só ela consegue 7 Did I request thee Maker from my Clay To mold me Man Did I solicit thee From darkness to promote me or here place In this delicious Garden John Milton Paradise Lost X 74346 8 FALCÃO Thiago Pereira Universo Metaverso Multiverso Mundos virtuais como híbridos entre jogos eletrônicos e comunidades virtuais Monografia de Conclusão de Curso de Comunicação Social da Universidade Federal da Paraíba habilitação em Jornalismo 2007 RESUMO O presente trabalho busca obter uma compreensão melhor acerca do conceito de Mundos Virtuais em especial mostrando que tais sistemas não se compõem unicamente de estruturas lúdicas provindas dos jogos eletrônicos nem tão somente de estruturas de interação via Rede presentes em comunidades virtuais espalhadas por todo o globo mas herdam características dos dois lados de certa forma legitimando a teoria da convergência midiática e constituindo uma nova experiência principalmente por abdicarem da dinâmica linear da narrativa a qual estamos socialmente acostumados por filmes séries novelas livros em detrimento de uma dinâmica de simulação que por si só gera questões que ainda não são cobertas por nenhuma ciência específica e que por isso evocam o conceito de interdisciplinaridade absorvendo assim teorias vindas da sociologia da lingüística da semiótica e de outras ciências já cristalizadas Palavraschave Mundos Virtuais Comunidades Virtuais Jogos Eletrônicos 9 FALCÃO Thiago Pereira Universe Metaverse Multiverse Virtual Worlds as hybrids of electronic games and virtual communities Monograph presented as conclusion to the course of Social Communication on Federal University of Paraiba academic qualification in Journalism 2007 ABSTRACT The present work seeks to obtain a better comprehension about the concept of Virtual Worlds specially detailing that such systems are not composed exclusively of ludic structures originated in electronic games nor are they only composed by network interaction structures common in virtual communities worldspread but they inherit characteristics from both sides in a way legitimating the media convergence theory and determining a whole new experience specially for the fact that they abdicate of the linear narrative dynamics which we are so used to by movies series soapoperas and books generally in detriment of a simulation dynamics that all by itself raises even more questions that are answered by no specific science and for that they evoke the concept of crossscience absorbing therefore theories generated in sociology linguistics semiotics and from other nowcrystallized sciences Keywords Virtual Worlds Virtual Communities Videogames 10 SUMÁRIO RESUMO 8 ABSTRACT 9 INTRODUÇÃO 11 METODOLOGIA 14 1 UNIVERSO 17 11 Transformações A Hipermídia 17 12 Jogo Uma Harmonização de Conceitos 21 121 Estrutura Lúdicas e Toda uma Forma Cultural 21 122 Recortes Acadêmicos nos Jogos Eletrônicos 28 1221 Narratologia 31 1222 Ludologia 34 1223 Narratologia e Ludologia 35 13 Da Gênese dos Videogames 39 131 De como contar uma história 39 132 O Surgimento do Videogame 42 2 MULTIVERSO 47 21 Do Outro Lado do Espelho Os Fantásticos Mundos da Imaginação 47 211 Aproximação 47 212 Mundos Imaginários 48 22 Socialidade e Culturas Digitais As Comunidades Virtuais 57 221 Socialidade 57 222 Cibersocialidade 63 223 Comunidades Virtuais 64 23 Agregações e o Retorno ao Lúdico Os Mundos Virtuais 69 231 Cyborgs de Carne e Software Os Avatares 77 232 PósVida Second Life 81 2321 Economia de Second Life 84 2322 Uma nova forma de estar junto 86 2323 Argumentar através do avatar 88 CONCLUSÃO 91 REFERÊNCIAS 94 11 INTRODUÇÃO Comecemos então por um lugar comum tornouse clichê finalmente falar que as Novas Tecnologias da Comunicação fizeram com que a sociedade repensasse não só o seu relacionamento com a técnica com o saber fazer como também com o viver socialmente com o interagir com o outro seja este psicológico ou social mesmo Mais que isso livres das metas e fronteiras impostas a nós pelo esqueleto da modernidade que pregava razão e integridade solidez e unitarismo vivemos hoje um tempo de júbilo de reencontro com a natureza e conosco mesmos não num esquema de ativismo natural salvem as baleias salvem o mundo mas principalmente numa dinâmica na qual a vontade de viver de celebrar o presente substitui e sobrepõe a vontade de dominar o mundo que nos cerca A velha dicotomia naturezacultura precisa ser repensada relida Mas este não é o objetivo deste trabalho Num âmbito especialmente cultural numa sociedade permeada por um novo modo de saber e sentir é de formas de transmissão de informação que esse trabalho fala Claro isso soa e é de fato extremamente vago Mais do que transmissão de informação falamos de comunicação sem falar de Shannon e Weaver sem falar de Frankfurt sem falar de uma mídia tradicional e viciada como vemos hoje Principalmente sem falar de apocalípticos pois hoje mesmo os que não o desejam estão integrados de algum modo A nova forma culturalsocial pregada por inúmeros teóricos mundo afora Lévy 1999 Lemos 2002 Maffesoli 1987 1998 2004b Santaella 2003 entre outros se desenvolve mediada por um instrumento que revolucionou completamente a nossa vida o computador Precisamos contudo parar para pensar o que acontece quando o computador tornase tão transparente que o encaramos como uma parte íntima de nós mesmos Numa hipérbole de meio de comunicação como extensão do homem talvez hoje desenvolvamos formas sociais diferentes das anteriores e que estão intimamente relacionadas ao fato de o mundo ter perdido virtualmente em ambos os sentidos suas fronteiras Pensemos da seguinte forma e se nossas formas sociais atuais não fossem somente mediadas pelo instrumento E se elas fossem conseqüência absoluta de seu uso O relacionamento mediado pela Internet não é simplesmente mais um serviço provido pelos 12 computadores é um serviço primário exigido pelos consumidores de hoje Compramos computadores com o fim de nos relacionarmos virtualmente O mercado atesta isso é mais comum um computador com placa de rede ou modem do que um com impressora Em paralelo a essa transmutação das formas sociais que não acarreta obviamente no fim das formas antigas mas em sua releitura ressignificação temos o jogo como elemento da cultura o lúdico como sendo aquilo que nos impulsiona em direção ao subjetivo ao artístico ao limite de nosso sujeito ao outro Através do entretenimento provido pelo jogo novas indústrias utilizandose dessa dinâmica de apego às novas tecnologias surgiram e multiplicaramse construindo impérios que em números deixaram pra trás outros como o cinema hollywoodiano por exemplo Se as comunidades virtuais construídas sobre a dinâmica da socialidade pregada por Maffesoli 1998 se apropriam de certa forma da tecnologia e transformam muitos uns em um muito seguindo um paradigma de autodespojamento Worringer 1978 os jogos eletrônicos de sua parte sempre trabalharam no sentido de legitimar um único sujeito que de forma solitária imergia na simulação rodeado de silício mas sem a interação comum ao ambiente social Obviamente tal paradigma foi mudando com o decorrer do tempo e jogos para duas quatro e em seguida n pessoas foram construídos sempre obedecendo a uma demanda de mercado específica que demonstrava o quão preparadas as pessoas estavam para o emergir das novas formas de interface com o tecnológico Com a febre que adveio de tais tecnologias multiusuários o próximo passo das dinâmicas de relacionamento via Internet foi justamente integrar a idéia de ambiente midiático do jogo media landscape com a idéia de comunidade virtual Com isso surgiram jogos que exploravam ambas as partes da psiquê humana social e lúdica usando para isso uma ferramenta de comunicação ainda emergente e portadora de uma linguagem ainda desconhecida ainda procurando se encontrar os mundos virtuais Mundos virtuais surgem então apoiados sobre teorias da ficção científica cyberpunk cujos símbolos encontramse ainda hoje dispersos pelo caldeirão da cibercultura num fenômeno semiótico pouco estudado1 mas muito expressivo Graças à 1 Ver Amaral Adriana Visões Perigosas Uma ArqueGenealogia do Cyberpunk Porto Alegre Editora Sulina 2006 13 imaginação de tais artistas e aos esforços de toda uma cultural vários universos paralelos e virtuais chamados de Metaverso graças a Neal Stephenson escritor que os batizou hoje se encontram dispersos pela Internet mudando dia após dia a dinâmica social que conhecemos estruturandose em uma série de metaversos que pode ser chamada seguindo a lógica de alguns mundos imaginários disponíveis em forma de RPG2 de Multiverso O interesse do trabalho em estudar mundos virtuais como híbridos entre jogos e comunidades virtuais vem principalmente do fato de que esse é um estudo praticamente inédito no Brasil onde o próprio tópico dos jogos eletrônicos é alvo de pouquíssima reflexão científica Paralelo a isso o fator de interdisciplinaridade comum ao tema também é um forte incentivo pois ao navegar por áreas adjuntas literatura semiótica sociologia etc o leque de possibilidades que estudos posteriores baseados neste mesmo podem desenvolver é muito amplo A escolha pela forma de monografia se dá particularmente ao fato de que ao desenvolver reflexões sobre o tema no fim da graduação uma possível linha a ser seguida em uma pósgraduação é mais palpável por assim dizer Além disso a área vem se desenvolvendo como atestado por alguns teóricos que se aventuraram por esses campos Frasca 2003 e contribuir para uma área em expansão também é um ideal especialmente atraente Particularmente acreditamos primeiramente de maneira intuitiva depois de forma científica com embasamento teórico disponível na seção de referências no fim do trabalho que os jogos eletrônicos ou videogames se mostram hoje como uma mídia que possui características bem definidas e que se desenvolve rapidamente tanto em poderio simbólico ou seja possibilidades criativas e tecnológicas quanto em poderio econômico movimentando milhões e milhões de dólares anualmente Nosso objetivo principal é mostrar como os mundos virtuais herdam características de comunidades virtuais e de jogos eletrônicos tomando como exemplo o mundo virtual mais citado atualmente na mídia Second Life dos Linden Labs Em seqüência procuramos vislumbrar como as formas teóricas apresentamse no campo de estudos de jogos eletrônicos atualmente mostrando que os mundos virtuais tem suas raízes em mundos de fantasia nascidos crossmidiaticamente na literatura e sugerindo que o avatar a 2 O assunto será melhor tratado no segundo capítulo da monografia 14 representação humana no ciberespaço tornouse fonte de discussão por adquirir e revelar importantes características de seus usuários adquirindo assim um poder de argumentação inerente uma retórica própria Tendo definido então nosso objeto de pesquisa partimos então para a divisão do trabalho e conseqüentemente para sua realização in loco Após a conclusão da infindável tarefa de revisão bibliográfica não porque toma muito tempo mas porque é literalmente infindável visto que o pesquisador nunca pára de ler sua bibliografia em busca de mais referências e norteamentos resolvemos dividir o trabalho em duas partes distintas Na primeira parte onde discutimos conceitos da nossa realidade tratamos de hipermídia como aproximação para em seguida mergulharmos no mundo do lúdico e dos jogos eletrônicos tratando de conceitos que são necessários para entendêlo como narratologia e ludologia Na segunda e última parte onde vamos falar de outras realidades damos um passo em direção aos mundos virtuais falando de mundos imaginários que são suas raízes e de uma dinâmica social existente nos dias de hoje que nos leva a construir todo um novo tipo de cultura mediada pela tecnologia e fortemente embasada em relações nãopresenciais Falamos também de como os avatares se constituem e do que torna Second Life diferente dos outros metaversos presentes no multiverso da Internet METODOLOGIA Os procedimentos metodológicos empregados na realização da presente monografia consideram mundos virtuais como representantes legítimos de uma mídia em expansão e herdeiros das tradições dos jogos eletrônicos e das comunidades virtuais Sistematicamente então foram construídas estratégias metodológicas que serviram para que fossem alcançados os resultados esperados durante o período de acordo com o cronograma estabelecido no projeto de quatro meses para a conclusão do estudo Iniciamos uma pesquisa de levantamento bibliográfico que dizia respeito à área de cibercultura em geral A verdade é que tal assunto tem grande extensão bibliográfica no Brasil mas quando o quesito mundos virtuais era posto à prova a bibliografia era mínima Tal fator não se constituiu necessariamente num problema já que com o advento 15 da Internet boa parte da bibliografia fezse disponível logo em seguida ao visitar sites dedicados ao estudo de jogos eletrônicos e de mundos virtuais por conseqüência A bibliografia estabelecida foi então tomada como principal fonte de pesquisa Após cada leitura os dados levantados eram registrados e filtrados tendo sua importância considerada para a realização do trabalho Como suporte teórico utilizamos também sites nacionais e internacionais voltados para o estudo de jogos que trazem periodicamente artigos e ensaios de representantes importantes desse recorte teórico do mundo acadêmico Além disso visitamos o mundo virtual tomado como exemplo criando lá um avatar Case Forder seu nome em homenagem ao protagonista do romance cyberpunk de William Gibson Neuromancer e verificando que outras características Second Life mantém que o diferenciam dos demais mundos virtuais disponíveis na Internet Partindo desses dispositivos o presente trabalho monográfico parte da hipótese de que mundos virtuais constituem ambientes sociaismidiáticos que herdam características distintas de jogos eletrônicos e comunidades virtuais configurando espaços de ressignificação das teorias dos jogos e da socialidade contemporânea Para embasar tal hipótese dividimos o trabalho em dois capítulos onde traçamos dois tipos distintos de reflexão 1º Universo que trata de como se configura o contexto da hipermídia paralelamente tratando também do conceito de jogo como estrutura lúdica básica O embasamento teórico foi buscado em autores como Huizinga 2000 e Alves 2005 Dentro de jogos definimos que a linha será tratar o jogo na hipermídia trabalhando um cruzamento que deixa em evidência os videogames como produto cultural e como mídia a ser legitimada Tratando de formas teóricas dentro do contexto dos videogames recorremos a Murray 1999 Turkle 1997 e Frasca 1999 2003 O capítulo é encerrado com uma cronologia breve de como os jogos eletrônicos chegaram ao patamar que hoje ocupam 2º Multiverso o segundo capítulo busca conceitos mais abstratos para que seja feita uma definição satisfatória dos mundos virtuais e de como essas estruturas afetam a cultura que cresce ao seu redor Buscamos embasamento em pesquisadores 16 estrangeiros por falta de uma bibliografia brasileira especializada destacando os trabalhos de Pargman 2003 e Klastrup 2003 em cima de mundos imaginários e mundos virtuais respectivamente Do lado de comportamentos sociais destacamos o trabalho de Maffesoli 2004 2004b e Lemos 2002 que ajudam a compreender como as formas sociais se organizam e como estas interagem se apropriando da tecnologia formando o conceito de cibercultura e de socialidade dentro da cibercultura Finalmente apresentamos a conclusão do nosso estudo convergindo para o fato de que mundos virtuais não podem realmente ser estudados como jogos mas precisam de uma abordagem nova que dê vazão ao fato de que eles se constituem em algo mais um veículo novo de opinião e de socialidade A monografia é um tipo de trabalho acadêmico que se diferencia pela abordagem de um só tema chamado de linha de pesquisa e que será tratado com profundidade no intuito de ter seu conteúdo revelado de forma sistemática Em outras palavras é o tratamento escrito de um determinado assunto que resulta da interpretação científica com a intenção de produzir uma contribuição relevante para o campo científico do qual faz parte A monografia consiste de um estudo bem desenvolvido formal discursivo e concludente É uma exposição lógica e reflexiva seguindo uma estrutura metódica que inclui Introdução Corpo de Discussão e Conclusão Redigida em linguagem objetiva sobre assuntos preciosos acerca dos quais o autor tem a oportunidade de expor suas idéias e conclusões Ferreira 1994 p 22 Com efeito a monografia é resultado de um tratamento escrito e aprofundado de um tema específico de maneira dissertativa e analítica apresentando e discutindo novas idéias Ferreira 1994 p 22 ainda complementa a definição a monografia se refere a uma forma de documento elaborado para atender às exigências dos cursos de graduação ou mesmo de pósgraduação lato sensu 17 1 UNIVERSO 11 Transformações A Hipermídia Antes que comecemos qualquer explanação acerca dos conceitos de jogo que outros recortes teóricos estão contidos neles como se configuram as formas culturais que nos levam à criação e ascensão da indústria do videogame nos dias de hoje e como essa indústria e conseqüentemente a assimilação de seus produtos enquanto bens simbólicos passou a integrar uma parte crucial no caldeirão cibercultural é importante que entendamos que uma das características mais interessantes no conceito de videogame de hoje é que ele parece ser a própria figura da convergência midiática trabalhando áudio vídeo texto verbal e nãoverbal e estratégias de simulação somadas à nossa costumeira dinâmica das narrativas Isso só é possível graças ao advento da criação da hipermídia que expandiu crucialmente os limites do que é possível de se fazer no que diz respeito à produção de signos midiáticos nos dias de hoje É limitador e medíocre no sentido original da palavra de mediano pensar que hipermídia e hipertexto uma das palavras mais em voga na mídia atualmente se configuram basicamente na mesma coisa Se considerarmos a palavra texto em seu sentido mais amplo que não exclui sons nem imagens teremos por hipertextos basicamente os hiperdocumentos que são produzidos para existirem na hipermídia sendo assim ambos se configuram em patamares bem diferentes Contudo o hipertexto não é algo que surgiu na era da informática Lévy 1999 p 56 explica que o hipertexto é simplesmente um texto constituído por nós e links entre esses nós referências notas ponteiros indicando a passagem de um nó para o outro Sendo assim o índice remissivo no fim de um livro exemplo dado pelo pesquisador francês ou catálogos numa biblioteca configuram precisamente isso referências a outros textos que podem ser lidos na ordem que o leitor e aqui há uma 18 discussão sobre a criação de um leitorautor que não é o foco do trabalho mas que é decerto interessante3 bem quiser E o que configura o tamanho frisson em cima desse conceito que antecede então os mundos da informática Principalmente o fato de que o suporte digital contribuiu com uma evolução considerável no quesito link A passagem de um nó para o outro desde que os computadores passaram a mediar o modo como se escreve a história da humanidade tornouse algo extremamente rápido remetendo à ou até contribuindo para nossa sede por imagens rápidas e que somem continuamente ante nossos olhos além de encapsular toda a metáfora da porta num processo que passou de simbólico ir de um nó ao outro para o extremamente banal Para Landow 1997 o hipertexto é uma matriz que contém um número infinito de narrativas Fazendo uma rápida digressão é curioso é como Lévy fala no mesmo capítulo 1999 p 57 de um modo de contribuição que também seria potencializado pelo surgimento da informática no qual o leitor ou leitorautor pode não apenas modificar os links mas acrescentar ou modificar nós À parte uns poucos pesquisadores e entusiastas que trabalharam durante o momento de criação da Internet sem nada receber pelo simples prazer de ver o fenômeno se desenvolver esse era um processo que até bem pouco tempo estava esquecido nas previsões de pensadores como Pierre Lévy e que agora beirando a segunda década do século XXI começam a ser desenterrados por uma dinâmica de cooperação denunciada pela quantidade amedrontadora de wikis mundo afora que tomou conta de toda a comunidade digital espalhada mundo afora4 Enfim quando envolvemos o hipertexto na construção midiática de nossa cultura a produção simbólica em geral tende a se mostrar de forma mais densa Claro que é complicado expandir meios antigos e cristalizados em suas formas para tal dinâmica mas já percebemos através de alguns autores que mesmo as mídias estáticas como revistas e jornais começam a se paginar visualmente por uma lógica ditada pela hipermídia em 3 Para mais sobre a discussão ver o capítulo III Sobre a Virtualização do Saber em Lévy Pierre Cibercultura São Paulo Ed 34 1999 4 Fazendo uma ponte sobre esse fato interessante e o assunto principal do trabalho Frasca 2001 propõe que essa lógica de cooperação pode ser utilizada para transformar os videogames num modo de ampliação da consciência Ver Frasca Gonzalo Rethinking Agency and Immersion Videogames as Means of Consciousness Raising 2001 Disponível em httpwwwludologyorg Acesso em 23042007 19 especial pela Internet e os media nela contidos Mais que isso hoje nos acostumamos a não somente ler a notícia mas também navegar por entre as fotos disponíveis ver a cobertura em vídeo disponibilizada muitas vezes no mesmo documento ou absorver uma série de informações que tornam tal experiência muito mais sólida do ponto de vista sensório Para Nesteriuk 2002 p 8 O texto a obra em si ganha ainda uma maior complexidade estrutural e diagramática ao assimilar a estrutura rizomática dos níveis de multiplicidade simultaneidade nãolinearidade e interatividade a seus elementos constituintes Ponto principal é que numa construção como esta não existe começo nem fim sendo possível e encorajado começar a leitura por qualquer lugar e simplesmente tirar o maior proveito possível da estrutura narrativa designada Percebemos que os nós impõem uma construção textual sintética podendose começar a ler o texto de qualquer ponto Landow 1997 acredita que a potencialidade do hipertexto está na sobrevalorização do leitor ativo e responsável pela trajetória de sua leitura e seus desdobramentos provocando um descongelamento dos nexos e das lexias fazendo do hipertexto um texto fragmentado e atomizado Não temos todavia como visualizar fisicamente a imagem completa deste texto como um todo tal como o fazemos com um livro por exemplo Nesteriuk 2002 p 9 Nesteriuk 2002 p 10 ainda discursa sobre as mudanças infligidas sobre nosso espectro cultural pela transformação do computador em ferramenta de comunicação Para o pesquisador a revolução telemática que presenciamos dia após dia tem muito mais impacto social e cultural do que suas prévias contrapartes como a invenção do alfabeto ou a explosão da cultura de massa A hipermídia então mais que um novo meio é uma nova linguagem buscando ainda a si própria buscando sua própria estética seus próprios parâmetros e que permite a manifestação de formas de pensamento heterogêneas mas semioticamente convergentes o que corrobora com a idéia de McLuhan de que meio e mensagem estejam mais ligados do que se pode ver superficialmente Nesteriuk considera então que a presença do videogame em nossa sociedade seja um movimento fruto da transposição semiótica do lúdico para Huizinga 2000 anterior à cultura humana em direção ao advento da hipermídia Desse modo fica fácil perceber que o potencial desencadeado por tal união é imenso no qual o meio absolutamente novo 20 guarda dentro de si obviamente algumas características das fontes semióticas com as quais dialoga cinema literatura etc mas também encerra possibilidades nunca imaginadas para as tradicionais mídias narrativas culturalmente dispostas Prova disso é que numa consulta ao banco de dados da CapesCNPq disponível em httpwwwcapesgovbrcapesportalconteudo10BancoTeseshtm grande parte dos trabalhos analisava as fronteiras entre videogames e violência ou educação mas poucas contemplavam propriedades dos jogos eletrônicos que seriam comuns a meios de comunicação A academia contudo ainda parece um tanto arredia em relação à linha de pensamento proposta preferindo tratar o videogame como produto cultural mas não como mídia legítima Esse modo de observação é diferente contudo fora do Brasil onde existem vários estudos intersemióticos destaco aqui o site Game Studies5 que condensa praticamente todos os pensadores que vêm contribuindo com as diversas discussões acerca dos jogos eletrônicos no mundo que trabalham questionamentos intermidiáticos como por exemplo que relações os jogos eletrônicos estabeleceriam com a estética do cinema ou como os trabalhos de hiperficção6 têm se legitimado cada vez mais como obras de arte digitais Discutindo então jogos eletrônicos como um meio legítimo de comunicação que se apossa da lógica da simulação sobre a da narrativa que nos é mais comum podemos falar de modo seguro que dentro do jogo imersos na simulação na figura digital que representa o interator a figura do avatar que será tratada mais à frente neste mesmo trabalho existe todo um exercício de argumentação que associa o entendimento dessa figura a várias teorias da percepção Falamos seguramente que o videogame como representante legítimo do aspecto lúdico na hipermídia e de posse de propriedades narrativas advindas de seu diálogo com outras mídias possui uma retórica própria que se estende inclusive a seus mínimos aspectos que além de fazerem parte de um ambiente maior às vezes têm uma liberdade adicional com relação à estrutura do jogo 5 httpwwwgamestudiesorg 6 Ficção na hipermídia no caso Para mais informação ver Landow 1997 21 Tal estrutura bem como seu funcionamento e as várias linhas de análise disponíveis para estabelecer uma tipologia dos jogos será vista no próximo tópico no qual aprofundaremos o conceito de jogo e adentraremos formalmente o mundo dos jogos eletrônicos 12 Jogo Uma Harmonização de Conceitos 121 Estrutura Lúdicas Toda uma Forma Cultural Enfim em que consiste o jogo Um dicionário comum como o Mini Aurélio 20067 ou sua versão digital o Novo Dicionário Eletrônico Aurélio v 50 traz em média de nove a vinte definições diferentes para essa palavra que é encarada pela mídia ainda de forma inconstante às vezes com ares de celebração mostrando resultados inéditos de pesquisas que atestam o valor do lúdico para o desenvolvimento do sujeito humano às vezes de forma absolutamente apocalíptica condenando o envolvimento de jovens com jogos eletrônicos que abusam da exposição da violência complicando uma relação que vários pesquisadores da comunidade acadêmica se esforçam por desvendar desmistificando a lógica inegável que esse comportamento mais antigo que a própria cultura encerra Para o Aurélio definir o termo é bastante simples e o dicionário o faz de forma objetiva Atividade física ou mental organizada por um sistema de regras que definem a perda ou o ganho Ferreira 2001 Contudo para vários teóricos Santaella 2004 Huizinga 2000 Frasca 2001 Nesteriuk 2002 que vêm se espalhando mundo afora procurando entender o que fez com que o lúdico se tornasse um dos fatores mais presentes nas teias da cultura digital esse conceito não é nem de longe o suficiente O jogo não se relaciona meramente com a atividade física e mental ou tão somente com a lógica de perda e ganho é um dispositivo comportamental que vem sendo utilizado pela humanidade desde que ela começou a traçar seus passos em direção à evolução muitos milênios atrás Santaella acredita que o lúdico está presente no sujeito humano em resposta direta às necessidades que não compartilhamos com os animais necessidades complexas da 7 Ferreira Aurélio Buarque de Holanda Mini Aurélio Dicionário da Língua Portuguesa São Paulo Editora Positivo 2006 22 psique humana que ainda segundo a autora enigma da condição humana em cujo seio se aloja um milagre até hoje tão inexplicável quanto o da própria vida o milagre da fala Santaella 2004 Entretanto porque fala o humano falta ser está onde não é é onde não está uma lição que a psicanálise não cansa de repetir e que pode ser traduzida poeticamente na dicção de Oswald de Andrade o ser humano é um animal que vive entre dois grandes brinquedos o amor onde tudo ganha e a morte onde tudo perde Para preencher essa brecha que o descarna inventou o canto a dança o teatro o circo o jogo as artes a literatura o cinema a televisão etc numa progressão que vem acompanhando pari passu o crescimento da complexidade da existência humana na biosfera Santaella 2004 p 1 A autora acredita que se existe um elemento comum a todas essas criações do humano criações provindas diretamente de nossa psiquê esse é o lúdico nossa capacidade de brincar o dispêndio sem finalidade utilitária de energia física e psíquica acumuladas No lúdico então está uma das sementes da grandeza do humano já que no cruzamento com a subjetividade se encontra a gênese dos bens simbólicos que permeiam nossa cultura até hoje guardadas as devidas proporções já que são milênios desde o surgimento da cultura como sistema semiótico Turkle 1997 Contudo é preciso entender que o lúdico mesmo sendo um grande impulsionador da evolução cultural da humanidade permeia o planeta desde muito tempo para Huizinga 2001 o jogo é mais antigo que a própria cultura já que cultura pressupõe em sua mínima forma a formação de uma sociedade e visto que os animais também realizam atividades lúdicas Alves 2005 acredita que com o decorrer do tempo a humanidade foi associando a figura do jogo simplesmente às atividades de entretenimento causando assim uma absorção dessa premissa pelo senso comum O ato do jogo vai além do simples entreter uma vez que O jogo é mais do que um fenômeno fisiológico ou um reflexo psicológico Ultrapassa os limites da atividade puramente física ou biológica É uma função significante isto é encerra um determinado sentido No jogo existe alguma coisa em jogo que transcende as necessidades imediatas da vida e confere um sentido à ação Todo o jogo significa alguma coisa Huizinga apud Alves 2005 p 18 O que de certa forma assusta o jogo assumiu faces múltiplas em contraparte a seus criadores nós ao longo da cultura que não são exatamente suaves aos olhos vide as 23 carnificinas na antiga Roma banhos de sangue para o deleite de uma multidão que não tinha o menor escrúpulo em admitir que realmente se divertia com a literal desgraça alheia Claro é um ponto extremo mas reflitamos por um momento sobre a afirmação de Huizinga que produção de sentido pode advir de tal evento Claro Santaella 2004 lembranos muito bem que tudo são faces da mesma moeda Do mesmo modo que a carnificina se fez existem jogos possuidores de uma leveza quase inofensiva como o dominó O jogo para Huizinga 2001 apresenta cinco características fundamentais que o tornam um dos pilares da civilização Primeiramente o fato de ele ser livre uma escolha de jogadores que geralmente o praticam em seus momentos de ócio Ninguém é forçado a entrar em jogo algum e quando o é geralmente o fator lúdico de entretenimento de dispêndio de energia sem objetivos está comprometido A segunda característica está intrinsecamente ligada à primeira e se configura no fato de que o jogo não é vida corrente Alves 2005 A criança o adolescente e o adulto quando se entregam ao jogo estão certos de que se trata apenas de uma evasão da vida real um intervalo na vida cotidiana embora encarem essa atividade com seriedade Idem O que nos leva à terceira característica o fato de que o jogo tem começo e fim o que contribui imensamente para acentuar essa fronteira entre vida real e jogo No quarto quesito Huizinga afirma que o jogo é ordeiro que ele se emprega de uma ordem e essa ordem as regras no caso são de importância vital em seu desenvolvimento É nessa ordem que o próprio jogo se configura se organizando através de formas compostas de elementos como tensão equilíbrio compensação contraste variação solução união e desunião e a menor desobediência a esta ordem estraga o jogo Alves 2005 p 19 Nesse ponto Huizinga insinua uma aproximação do jogo com o domínio da estética Há nele no jogo uma tendência para ser belo Talvez esse fator estético seja idêntico aquele impulso de criar formas ordenadas que penetra o jogo em todos os seus aspectos O jogo lança sobre nós um feitiço é fascinante cativante Está cheio das duas qualidades mais nobres que somos capazes de ver nas coisas o ritmo e a harmonia Huizinga 2001 p 13 24 Por fim como quinta característica encontramos um princípio que pode ser um contraponto ao anterior há um fator de imprevisibilidade de incerteza de acaso que podem gerar tensão Isso pode provocar o engajamento passional que implicará no desenvolvimento de um senso ético quanto ao estabelecimento dos limites dentro da atividade São as regras que definem o que é possível permitido ser feito ou não Contrariar estas premissas implica em colocar em cheque a existência da comunidade dos jogadores Alves 2005 p 19 Então um jogo dá a seus jogadores a oportunidade de se enfrentarem vencerem ou serem derrotados dentro de regras previamente discutidas e nessa quinta característica nessa imprevisibilidade dentro da ordem lembrando de certa forma a perspectiva formista simmeliana é que encontramos uma explicação interessante para a atração que certos jogos causam sobre seus atores Sendo assim pelo que Huizinga e Alves põem podemos perceber de forma superficial que os jogos não têm somente funções de entretenimento mas que o exercício de tais atividades lúdicas ajuda no desenvolvimento de setores cognitivos sociais afetivos e culturais de nossa psique produzindo assim um certo sentimento de antecipação em especial nas crianças com relação às situações que estas virão a experimentar Vygotski 1994 apud Alves 2005 acredita que o brincar possibilita à criança a aprendizagem de regras e a sujeição às ações impulsivas por via do prazer Assim sendo os jogos vêm a ser elementos de mediação mídia entre o conhecimento cristalizado e o potencial de aprendizagem presente na Zona de Desenvolvimento Proximal ZDP A ZDP se caracteriza pela faixa intermediária entre aquilo que o sujeito já é capaz de fazer sozinho sem a ajuda do outro e as suas possibilidades de ampliar o seu desenvolvimento e aprendizagem Nesse espaço de transição os novos conhecimentos estão em processo de elaboração e frente à mediação dos instrumentos signos e interlocutores serão consolidados e ou ressignificados Alves 2005 p 20 Para as teorias psicogenéticas que estudam a gênese dos processos psíquicos o brincar se transforma num processo que potencializa o fazdeconta já que as crianças envolvidas na atividade podem simular a vida adulta aprendendo a negociar a renunciar a ação impulsiva a postergar o prazer imediato o que contribui para a concretização de 25 desejos através da assimilação e da acomodação Alves 2005 p 21 É através desses processos que as crianças constroem o significado de cooperação e competição entre seus iguais Invocando então o discurso de Maffesoli 2004 quando ele fala de Dioniso como figura emblemática de nosso tempo e de como a humanidade tem se preocupado muito mais com o agora com a contemplação do mundo em detrimento de sua dominação entre libido sentiendi e libido dominandi e finalmente com o lúdico tomando lugar numa cadeia de eventos que põem a razão sensível muito acima da razão pura é por fim inegável que consideremos a marca máxima de nosso tempo como sendo a proliferação desse sentimento de amor ao jogo à festa e não só a proliferação mas a busca diária e incansável por entender os mecanismos que se desenham por trás das regras e aparatos usados para o exercício do ludus Caillois 1967 aplicando teorias advindas das mais diversas ciências num processo de desvendamento do impacto sociológico e comunicacional que se desenha dia após dia de um devir que se transformou em menos de quarenta anos de existência numa verdadeira indústria de jogos Isso nos leva diretamente ao fato de que os jogos eletrônicos definitivamente vêm desempenhando um papel vital na cultura humana desde o fim do segundo e continuam fazendoo no início deste terceiro milênio a indústria de jogos eletrônicos é a primeira na área de entretenimento superior à do cinema e a terceira no mundo perdendo apenas para a indústria bélica e a automobilística No ano de 2003 a indústria dos games faturou cerca de 20 bilhões no mundo 500 milhões no Brasil o que representou um crescimento de 19 em relação ao ano anterior Revista Info Exame apud Nesteriuk 2004 Essa proeminência da indústria dos videogames nos leva de volta ao espaço cultural no qual atua o comportamento apocalíptico da mídia e de leigos em geral que consideram o jogo o jogo eletrônico mais apropriadamente como vulgar banal e nocivo por estimular comportamentos agressivos e a violência nas crianças e nos jovens que compõem certamente a imensa maioria de seus usuários Santaella 2004 p 2 A autora ainda concorda com Aarseth 1997 que classifica os jogos eletrônicos como um gênero artístico legítimo um campo estético pleno de possibilidades que precisa ser julgado em seus próprios termos Essa linha argumentativa tem se desenvolvido 26 bastante dentro da academia em especial fora do Brasil onde foi cunhado o termo ludologia ludology no original para especificar a construção teórica de sentido em cima dos jogos em geral mas em especial dos videogames Embora o campo teórico se delineie dia após dia com sites especializados como o Game Studies httpwwwgamestudiesorg o Ludology httpwwwludologyorg ou o brasileiro fruto do esforço do Programa de PósGraduação em Comunicação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUCSP CSGames httpwwwcsgamesincubadorafapespbr o estudo dos jogos não é uma área que já tem uma teoria desenvolvida e cristalizada ao invés disso a interdisciplinaridade da mídia tem atraído para seu estudo áreas diversas do conhecimento como a filosofia a semiótica a psicologia a antropologia as ciências da computação a engenharia elétrica as telecomunicações as ciências cognitivas a publicidade o marketing as comunicações o design a computação gráfica a animação a crítica literária e da arte a narratologia a educação todas elas em relação direta com as múltiplas e integradas características dos games Nesteriuk apud Santaella 2004 p 2 A criação de novas teorias sempre se prova um campo muito conturbado principalmente quando as mesmas dizem respeito a algo que não está completamente fundamentado como os videogames no caso que não está cristalizado aos olhos dos teóricos e dos pensadores em geral algo que ainda não foi pensado Uma outra linha argumentativa com relação aos jogos eletrônicos é de que estes sejam meras extensões de processos narrativos ver o trabalho de Janet Murray 1999 e Sherry Turkle 1993 inseridos então no campo da narratologia e à mercê das teorias já engendradas nesse campo teórico Os jogos eletrônicos então carregam consigo um potencial catártico8 imenso que dá vazão a serem apresentados como espaços de ressignificação que possibilitam aos gamers9 elaborar seus medos perdas enfim diferentes emoções sem transpor o limite da tela Alves 2005 p 109 São ferramentas culturais que trabalham fortemente o conceito de imersão e agenciamento e executam trocas semióticas a todo instante entre o homem e a máquina por um lado e entre mídias por outro 8 Não só os jogos eletrônicos como também os jogos normais de tabuleiro ou de interação mas me refiro aqui ao modo como esse potencial foi ampliado pela massificação dos jogos eletrônicos 9 Jogadores de Videogame no caso 27 A palavra catarse vem do grego e remete à idéia de purificação purgação Seu significado primário foi cunhado por Aristóteles que argumentava que algumas emoções podiam ser liberadas ao experimentálas e citava as tragédias clássicas do teatro grego como exemplos de purgação do temor e pesar A hipótese da catarse se estendeu para incluir a liberação emocional supostamente obtida não só por observação dos dramas mas também por recordar e reviver eventos passados através da expressão das emoções e de diversas ações Sílberman e Lira apud Alves 2005 p 110 Na Grécia o termo era compreendido como o despertar de eleos e phobos piedade e temor pela ação representativa a tragédia no caso causando um processo de identificação que causaria uma economia de afetos um estado de purificação do ser calma Tal processo foi usado em conjunto com a hipnose durante o século XIX pela teoria psicanalítica O efeito visado pelo processo é a purgação uma descarga emocional de afetos patogênicos ligados a acontecimentos traumáticos Tal ligação podia ser estabelecida por meio de um processo de análise no qual o sujeito ressignificava a emoção através da fala do choro da representação da situação vivida ou por meio de elementos midiáticos Para Alves 2005 p 111 tais espaços se constituem em locus de atualização de sentimentos que nem sempre podem ser vivenciados no contexto social o qual estabelece limites que inibem determinadas manifestações Ao se defrontar com situações de conflito de perda de dor de violência o indivíduo pode repetir recordar e elaborar as suas emoções processos fundamentais segundo a psicanálise para significar os afetos Alves 2005 p 111 Desse modo a interação com cenas do passado que tiveram um efeito traumático não gera necessariamente uma repetição formal dos eventos ao contrário há um processo de ressignificação desses valores em um ambiente que não prejudica os semelhantes pois é um ambiente fechado recluso previamente definido Essa é a justificativa máxima de Alves para o frisson que os meios de comunicação e os leigos armam quando discursando sobre comportamentos violentos e agressivos e sua relação com os videogames para a pesquisadora o fato de o adolescente ser exposto a cenas de violência ou de todos nós o sermos diariamente pela mídia funciona de modo semelhante ao processo narrado acima onde tais cenas servem então para fazer a violência 28 cumprir uma função social satisfazer e canalizar instintos violentos reprimidos de modo que não transcendam de cada indivíduo e não perturbem a boa marcha social Alves 2005 p 111 Essas premissas encontram eco nas palavras de Michel Maffesoli 2004b nas quais ele afirma que é de nossa natureza negociar com o mal para assim adquirirmos o máximo dele como um efeito homeopático suficiente para apenas nos impor limites nos deixar cientes daquilo que somos e principalmente daquilo que não queremos nos tornar o que se opõe se corresponde se reforça 2004b p 75 Então sob essa perspectiva os jogos eletrônicos não interessando seu conteúdo constituemse em espaços de catarse nos quais os sujeitos ressignificam seus diferentes medos anseios desejos e sentimentos agressivos ou não pois nos jogos temos a oportunidade de representar nossa relação básica com o mundo nosso desejo de superar as adversidades de sobreviver as derrotas inevitáveis de dar forma a nosso entorno de dominar a complexidade e de fazer com que as nossas vidas se encaixem como quebracabeças Murray 1999 p 156 Assumir que os jogos eletrônicos são portadores de tal comportamento e que carregam consigo tal poder é mais um modo de legitimar esse perfeito exemplo da convergência midiática como uma nova e poderosa mídia que desenvolveu em alguns poucos anos de existência tanta expressividade e um vetor econômico que não fica atrás de qualquer uma outra mídia de massa 122 Recortes Acadêmicos nos Jogos Eletrônicos Jogos são naturalmente participativos Fato é que sem a participação dedicada de todas as partes envolvidas seja para jogos tradicionais ou para jogos eletrônicos o ludus Frasca 1999 a atividade de jogar buscando uma vitória imbuída na competição está comprometido Frasca em seu artigo entitulado Ludology meets Narratology A Ludologia se encontra com a Narratologia10 propõe um caminho interessante para o recorte teórico que pode ser aplicado aos jogos eletrônicos pela academia Entretanto antes 10 Tradução livre 29 de nos aventurarmos nesse sentido cabe aqui fazer uma breve introdução sobre o jargão utilizado pelo autor e em que sentido ele o faz A teoria literária e da narrativa têm sido de grande ajuda para entender os jogos eletrônicos em geral A poética aristotélica Laurel 1993 o formalismo russo e o pós estruturalismo Landow 1993 são alguns exemplos de perspectivas vislumbradas no decorrer deste caminho Alguns autores enxergam videogames como uma nova forma uma expansão da narrativa tradicional O fato principal é manter em mente que tais jogos compartilham muitos elementos em comuns com as histórias personagens ações em cadeia elementos de trama como o clímax e cenários enfim O problema em se analisar tais bens simbólicos no caso como peças midiáticas se utilizando exclusivamente de tais teorias é que falta um elemento muito simples e de importância chave no processo da pesquisa levar em conta que os jogos eletrônicos são bem jogos O elemento lúdico presente além de outras questões voltadas para a tecnologia que serão discutidas mais à frente são características que não estão presentes em outras peças da mídia de entretenimento como em filmes no cinema ou séries na televisão Frasca 1999 p 1 acredita que os problemas em usar a perspectiva do jogo são muitos Basicamente os jogos tradicionais sempre tiveram um status acadêmico menor que o de outros objetos como a narrativa11 Sendo assim os estudos formalistas em detrimento dos estudos funcionalistas do jogo nunca se desenvolveram realmente estando fragmentados por toda uma miríade de outras disciplinas acadêmicas Propondo uma solução para esse problema ele sugere que os estudos da ordem da ludologia sejam não tomados como superior aos da teoria da narrativa mas que ambas as teorias sejam combinadas num resultado que pode nos levar a um melhor entendimento da questão É conveniente perceber antes de tudo que as fronteiras entre tais áreas de estudo estão sempre difusas e que eles acabam se emaranhando no escopo um do outro muito comumente Tal ação conciliadora do autor se baseia nos estudos de Aarseth 1997 apud Frasca 1999 p 1 onde se afirma que clamar que não há diferenças entre jogos e narrativas é 11 Tradução livre The problems of using a game perspective are many Basically traditional games have always had less academic status than other objects like narrative 30 ignorar as qualidades essenciais das duas categorias E mais como este estudo tenta mostrar a diferença não é clara e entre os dois há uma área de fronteira muito difusa12 É importante ter em mente que a palavra jogo pode conter múltiplos significados como já foi mencionado Isso fez com que Callois 1967 precisasse apresentar novos termos que não estavam disponíveis em sua línguamãe e que são vitais para a compreensão da atividade de jogar Os termos são paidea e ludus que cobrem os dois significados que nos interessam no momento Decidimos então manter essa terminologia do teórico francês mas não literalmente e sim com uma leve adaptação essa feita por Frasca no artigo supracitado A importância de tal terminologia é que no senso comum a atividade lúdica em se tratando da língua portuguesa especificamente é englobada por dois verbos distintos13 jogar e brincar e nesse mesmo senso comum costumase fazer a distinção de que jogar possui regras sólidas enquanto o brincar não as possui Vidart 1995 mostra que esta assunção está errada e que ao contrário do que se acredita o brincar também contém regras estritas Ele dá o exemplo de uma criança que finge pilotar um avião Há uma regra em jogo se comportar como um piloto e não como um médico ou como um motorista de carro Essa regra foi proposta e aceita pelo mesmo jogador e ele pode livrarse dela quando achar melhor mas enquanto estiver brincando ele vai aceitar a proposição com a mesma seriedade com a qual aceitaria a regra de um jogo Então é nesse sentido que Frasca acredita que precisamos estabelecer uma diferença e ele encontra a chave para isso em Lalande 1928 onde o filósofo propõe dois significados diferentes para a palavra jeu14 em seu Dictionaire Philosophique Mesmo que ele não se refira explicitamente a jogar e brincar só existe uma palavra em francês para as duas atividades ele os diferencia não pelas regras mas pelo resultado Frasca 1999 p 3 Assim sendo Frasca decide usar os termos cunhados por Callois mas se apossando das definições de Lalande 12 Tradução livre To claim that there is no difference between games and narratives is to ignore essential qualities of both categories And yet as this study tries to show the difference is not clearcut and there is significant overlap between the two 13 Há obviamente outras palavras que podem servir de sinônimos para tal atividade na língua portuguesa Fato é que elas só reproduziriam o sentido guardado pelas duas palavras citadas 14 Jogo em francês 31 Paidea é Prodígio de atividade física ou mental que não tem nenhum objetivo imediato nem objetivo definido e cuja única razão para existir é prover o prazer experimentado pelo jogador Ludus é um tipo particular de paidea definido como uma atividade organizada sob um sistema de regras que define uma vitória ou derrota um ganho ou perda Frasca 1999 p 315 Dito isto podemos nos focar nas abordagens teóricas que tratam dos jogos eletrônicos Este é um horizonte metodológico que se articula principalmente como já foi dito entre as teorias da narratologia e da ludologia 1221 Narratologia No que diz respeito à narratologia é importante perceber que o fortalecimento de tomada de posição em direção à narrativa parece estar ligado intrinsecamente ao desenvolvimento da indústria dos jogos eletrônicos Em seus primeiros anos os softwares carregavam apenas os aspectos lúdicos básicos sem se importar com uma história com uma trama Ação ambiente e personagem eram simplificados ao máximo principalmente por causa da falta de recursos técnicos disponíveis e talvez por uma nãolegitimação da indústria dos jogos eletrônicos como uma força dentro da indústria cultural Tomando como exemplo o clássico Pac Man imortalizado pelo console Atari 2600 o jogador controlava apenas um semicírculo representando rudemente uma face com olhos e boca e tinha o objetivo de comer vários pontos e traços dispostos ao longo da tela Para gerar a dificuldade e conseqüentemente o desafio que gera a incerteza que induz à tensão outras figuras essas controladas pelo computador programadas para se parecerem com fantasmas perseguiam o semicírculo pelos labirintos prémontados uma vez que todos os pontos e traços fossem comidos pela figura do semicírculo a fase acabava e era substituída por outra igual onde os fantasmas se moviam com mais 15 Tradução livre Paidea is Prodigality of physical or mental activity which has no immediate useful objective nor defined objective and whose only reason to be is based in the pleasure experimented by the player Ludus is a particular kind of paidea defined as an activity organized under a system of rules that defines a victory or a defeat a gain or a loss 32 velocidade exigindo um maior domínio da coordenação motora aumentando o nível de dificuldade E assim por diante Essa posição contudo é controversa Por mais que o exemplo em cima não deixe transparecer uma narrativa complicada e cheia de nuances ainda há teóricos que mesmo nos mais simples jogos eletrônicos identificam os elementos básicos de uma narrativa Jull 2001 acredita ainda que é possível identificarmos no videogame pelo menos unidades narrativas mínimas já que este possui a tríade básica narrativa ação ambiente e personagem Em Tetris16 temos a história de blocos de diferentes formas geométricas personagens que ao caírem do topo da tela têm de se encaixar ação formando linhas completas que desaparecem na tela ambiente Nesses tipos de jogos a narrativa entendida a posteriori de forma aberta como o resultado das ações mostrase demasiadamente simples e muito mais limitada em termos de interpretação e de retórica Nesteriuk 2002 p 91 A presença da narrativa nos jogos se fez por meio do desenvolvimento tecnológico da indústria que não estando mais limitada a poucos gráficos e cores resolveu diversificar seu portfolio Sendo assim grandes corporações donas de personagens famosos como a Disney por exemplo dona do rato mais famoso do mundo Mickey Mouse passaram a investir em cartuchos que não só apresentavam novos recursos de jogabilidade mas também se apoiavam sobre uma história coesa com início meio e fim A valorização da narrativa veio juntamente com o aparecimento de jogos que propunham tramas mais complexas personagens mais ricos e cenários impossíveis para as gerações tecnológicas anteriores Um processo a um só tempo específico mas também similar ao de outras mídias dentro da indústria do entretenimento É a narrativa que articula e organiza o material proposto determinando não apenas como as histórias serão contadas mas sobretudo atuando na constituição de gêneros narrativos mais ou menos definidos Para os narratólogos os games representam uma maneira particular de expressar uma história da mesma forma que o cinema os quadrinhos a TV ou a literatura Pinheiro e Branco 2006 p 2 Desse modo na perspectiva da narratologia os jogos eletrônicos seriam classificados antes de tudo pelo conteúdo que se escolhe contar dentro dele processo 16 Em Tetris o jogador deve encaixar um monte de formas geométricas de formatos variados que caem aleatoriamente do topo da tela de modo a formar linhas cada linha formada desaparece e o objetivo do jogo é não deixar os cubos empilharem sem formar linhas completas impedindoos de chegar ao topo Uma versão online de Tetris pode ser jogada a partir de httpwwwstudentstutfiahmaniea Nesteriuk 2002 p 91 33 similar ao do cinema e de ficções televisivas Uma tipologia dos games estaria então vinculada como no cinema ou nos quadrinhos ao gênero narrativo Teríamos jogos de ação de guerra de terror westerns comédias etc Pinheiro e Branco 2006 p 2 Conceitos como este da narratologia fizeram autores discursar sobre estratégias de interação entre homem e máquina que cobririam teoricamente as dúvidas sobre estes processos As narrativas construídas no computador guardam dentro de si diferenças cruciais com relação a suas contrapartidas midiáticas elas tendem mais para a forma mais aberta do jogo do que para a seqüência irreversível de acontecimentos que marca a experiência narrativa mais convencionalmente conhecida na literatura e no cinema Machado 2002 p 2 A forma aberta de que Machado fala referese precisamente ao fato que foi citado anteriormente a interação a participação não é uma arbitrariedade do jogo sem ela não existe experiência narrativa Diferente do cinema ou da literatura como ele mesmo põe nos jogos eletrônicos a intervenção do usuário é não apenas desejável mas até mesmo exigida Machado 2002 p 2 No videogame a intervenção do interator é uma exigência do sistema e sem ela não há acontecimento possível enquanto nas narrativas digamos assim passivas o espectador ou leitor deve deixar os eventos seguirem seu rumo predeterminado e toda ação que se requer deles está restrita apenas ao plano psicológico ou mental interpretação identificação com as personagens etc Machado 2002 p 2 Essa correspondência entre o videogame e as narrativas passivas17 contudo deve ser operada cuidadosamente autores como Murray 1999 consideram perigoso concebêla de forma rígida A autora defende a idéia de que o jogo não é senão uma forma mais especializada de dramaturgia onde grande parte das estratégias clássicas continua funcionando Além disso não é incomum ouvir falar de uma associação entre a poética aristotélica e os jogos eletrônicos Laurel 1993 Klastrup 2003 17 Para Machado 2002 as narratives passivas são aquelas onde não há uma interação ativa entre sistema e usuário ou entre obra e espectador Num filme por exemplo você pode se identificar com o protagonista mas não pode decidir se ele vai pela direita ou pela esquerda 34 1222 Ludologia A ludologia no caso configurase numa linha de pensamento que inverte a posição central atribuída à narrativa nos jogos eletrônicos Apoiandose principalmente no conceito de ludismo e do dispêndio de energia sem fim absoluto ou maior a ludologia clama que não é necessário haver uma história para que haja um jogo Para que o jogo funcione enquanto jogo basta que proporcione uma estrutura reconhecível ao qual o gamer possa adaptarse Para Jesper Jull um dos ludólogos mais conhecidos o jogo pode ser apenas o jogo pelo jogo Pinheiro e Branco 2006 p 2 Tal tipo de argumentação nos leva à desvalorização da história frente à estrutura lúdica projetada A análise do ludólogo se baseia nas relações estabelecidas pelos objetos e funções do jogo e não pelo que remetem enquanto significação O jogo já não precisaria significar algo mas ser algo Ibidem A estrutura gráfica presente no jogo estaria lá apenas para garantir que o sistema funcionasse e que pudesse ser decodificado pelo interator sem nenhuma correspondência aparente com qualquer fator do mundo externo ao jogo Não importa se o pontinho azul é uma nave ou se o inimigo é nazista O que importa é que o gamer reconheça uma estrutura e saiba como agir em função dela Ibidem Construir uma tipologia dos jogos através do viés da ludologia constitui uma atitude que vai em direção a um aspecto mais interno do jogo Não é o simples fato de decodificar as cores e formas que aparecem no monitor ou qualquer outro dispositivo final mas de ir fundo num nível de entendimento algorítmico do jogo Tais premissas não excluem a existência da narrativa em um jogo Elas apenas consideram que tal elemento caso esteja presente e ele sempre vai estar em menor ou maior função como apontado por Juul anteriormente esteja meramente subordinado à estrutura ludológica do jogo Desse modo jogar se torna muito mais importante do que experimentar a história ou perceber como se dá a formação o desenvolvimento ou a personalidade de um ou outro personagem Kirksæther 1998 observa que por trás do tradicional jogo de xadrez existe uma história sobre dois povos em guerra O fato é que durante o jogo esquecese dessa história de seu design narrativo e de sua retórica para se concentrar exclusivamente na estrutura do jogo Jogar um videogame é portanto fundamentalmente interagir com o seu estado de jogo Nesteriuk 2002 p 91 35 O fato é que muitas vezes o jogador de videogame está tão absorvido pelo objetivo pela estrutura lúdica do jogo que ele não reflete sobre o enredo que ele vem escrevendo por meio de suas ações isso passa de forma completamente transparente pra ele num processo de imersão sem falhas Entretanto é preciso considerar que posteriormente quando descrevendo suas sessões o jogador narra os fatos de modo que seus relatos assumem tipicamente a forma de uma história Como se pode ver é complicado estudar uma área estritamente sem entrar mesmo que por acidente no domínio da outra Tal proximidade entre as duas áreas teóricas motivou os estudos de Frasca 1999 que propõe então uma aproximação entre narratologia e ludologia para que seja feito um estudo mais completo dos jogos eletrônicos enquanto produtores de sentido 1223 Narratologia e Ludologia Como se pode ver as curvas teóricas utilizadas para estabelecer um discurso acadêmico sobre os jogos eletrônicos não são exatamente unificadas mas também não são isoladas uma da outra Narratologia e ludologia comumente rompem fronteiras e uma teoria acaba adentrando o escopo da outra o que causa uma grande discussão na comunidade pesquisadora Para tentar sanar tal problema o professor e pesquisador da Universidade de Copenhagen Gonzalo Frasca desenvolveu uma terceira linha que busca de certa forma harmonizar os conceitos anteriormente trabalhados Ele defende uma aproximação entre narratologia e ludologia alegando que há uma relação entre o sistema de jogo e a história que os transformam em constituintes de um modelo específico de narrativa que abrange o conceito da ludologia Frasca defende a idéia de que o jogo tem uma narrativa e que essa é o resultado das relações entre o sistema ludológico estrutural do jogo e os elementos da narrativa Pinheiro e Branco 2006 p 3 O desenvolvimento de tal perspectiva então nos leva a uma definição do jogo como produto narrativo legítimo assim como o cinema ou os livros mas nesse caso 36 jogos são produtos narrativos que apresentam uma peculiaridade configurada pelo comportamento essencial regido pelo sistema lúdico Como já foi dito o debate entre os dois campos é algo que ainda se encontra em franca expansão a maioria do material acadêmico que tem sido desenvolvido mundo afora se utiliza das teorias da narratologia considerando o jogo como a evolução natural do drama e da narrativa Embora tal premissa seja muitas vezes contestada gerando debates apaixonados entre pesquisadores de linhas diferentes de pensamento o paradigma da narratologia ainda prevalece Numa abordagem interessante no ponto principalmente da convergência das teorias e de sua mútua inclusão Frasca 2003 se apóia num fator que até então não havia sido citado para clamar que embora sim os jogos se configurem numa estrutura narrativa eles não se baseiam na representação mas sim numa estrutura semiótica alternativa chamada de simulação Para ele mesmo que simulações e narrativas compartilhem elementos essenciais como ação personagem e cenário citados previamente a mecânica dos dois paradigmas é essencialmente diferente Mais que isso eles apresentam possibilidades retóricas distintas Cabe aqui deixar claro que a proposição do paradigma ludologista por Frasca não se deu simplesmente por um capricho para mostrar ineficiências e imprecisões dos aparatos analíticos do paradigma da narratologia Como uma disciplina formalista ela a ludologia deveria se preocupar com o entendimento da estrutura e dos elementos particularmente das regras como também criar tipologias e modelos que expliquem a mecânica dos jogos Frasca 2003 p 2 Por mais que compartilhem vários elementos em comum narrativas e simulações se baseiam em sistemas semióticos diferentes A questão é que a representação e daí a narrativa é uma ferramenta tão universal e poderosa que se tornou praticamente transparente para nossa civilização Alguns autores como Mark Turner 1998 até afirmam que os mecanismos narrativos são estruturas cognitivas profundamente enraizadas na mente humana Talvez por causa de tal onipresença então seja normalmente tão difícil de aceitar que existe uma alternativa à lógica da narrativa a simulação 37 Claro o potencial da simulação foi durante muito tempo rechaçado porque não existiam aparatos tecnológicos apropriados para modelar por exemplo sistemas complexos A invenção do computador mudou essa situação Na década de 1990 por fim Espen Aarseth revolucionou completamente o estudo dos textos eletrônicos propondo que textos eletrônicos poderiam ser melhor entendidos se fossem analisados como sistemas cibernéticos18 Aarseth apud Frasca 2003 p 2 Ele criou uma tipologia de textos e mostrou que o hipertexto é somente uma dimensão possível desses sistemas de textos sistema ao qual ele chamou de cibertextos A teoria literária tradicional simplesmente não conseguiu lidar com tais textos pois ao invés da lógica familiar da transmissão seqüencial de signos tais trabalhos não só eram compostos de seqüências de signos como também se portavam como máquinas e geradores de signos19 Frasca 2003 p 2 Foi aí que o reino da representação foi academicamente contestado abrindo espaço para os estudos dos jogos e da simulação A mídia tradicional é representacional não simulacional Eles sucedem em reproduzir tanto descrições de características quanto sequências de eventos narrativa Uma fotograia de um avião irá nos mostrar informações sobre sua forma e sua cor mas não vai voar ou cair sendo parte de um acidente quando manipulada Um simulador de vôo ou um simples avião de brinquedo não são apenas signos mas máquinas que geram signos de acordo com as regras que modelam alguns dos comportamentos de um avião real Um filme sobre um avião aterrissando é uma narrativa um observador pode interpretálo de maneiras diferentes algo como é um pouso normal ou é um pouso de emergência mas não pode manipular o avião e influenciar sua aterrissagem já que as sequências do filme são fixas e inalteráveis De outro lado o simulador de vôo permite que o jogador execute ações que vão modificar o comportamento do avião atual Se o jogador aumentar a variável de poder no simulador o avião simulado vai se mover mais rápido pelo céu virtual na tela do computador Jogos são apenas um modo particular de estruturar uma simulação assim como narrativa é somente uma forma de estruturar a representação20 Frasca 2003 p2 18 Tradução livre electronic texts can be better understood if they are analyzed as cybernetic systems 19 Tradução livre Traditional literary theory and semiotics simply could not deal with these texts adventure games and textualbased multiuser environments because these works are not just made of sequences of signs but rather behave like machines or signgenerators 20 Tradução livre Traditional media are representational not simulational They excel at producing both descriptions of traits and sequences of events narrative A photograph of a plane will tell us information about its shape and color but it will not fly or crash when manipulated A flight simulator or a simple toy plane are not only signs but machines that generate signs according to rules that model some of the behaviors of a real plane A film about a plane landing is a narrative an observer could interpret it in different ways ie its a normal landing or its an emergency landing but she cannot manipulate it and influence on how the plane will land since film sequences are fixed and unalterable On the other hand the flight simulator allows the player to perform actions that will modify the behavior of the system in a way that 38 Curioso pontuar contudo que a precisão de um sistema de simulação como o descrito acima por Frasca é variável de acordo com o observador jogador no caso exatamente como acontece com a representação tradicional Um simulador de vôo simples poderia ser muito sofisticado para um amador mas passar como extremamente simples para um piloto expert Então para um observador externo a seqüência de signos produzida por um filme e por uma simulação poderiam parecer exatamente iguais O detalhe que geralmente passa despercebido aos pesquisadores que dão suporte ao paradigma narratológico é que as seqüências semióticas podem ser absolutamente idênticas mas uma simulação não se entende simplesmente por sua saída Esse é um sentimento absolutamente comum a qualquer pessoa quem pode confundir o sentimento de estar participando de uma partida de qualquer jogo tradicional ou eletrônico com o de estar simplesmente observando o desenrolar da atividade Aparentemente tal explicação fenomenológica não é tão evidente quanto parece Eskelinen condensa isso Fora da teoria acadêmica as pessoas são geralmente excelentes em distinguir narrativas dramas e jogos Se eu jogo uma bola em você eu não espero que você solte ela e comece a contar histórias21 apud Frasca 2003 p3 Talvez estejamos tão acostumados a enxergar o mundo através de lentes narrativas que seja difícil imaginar uma alternativa não Claro é muito mais fácil aplicar a teoria já cristalizada da narrativa à qual existe toda uma academia já familiarizada por sinal do que desenvolver uma nova teoria do começo estando sujeito a acertos e erros Isso somado ao fato de que nossa sociedade de consumo já está altamente familiarizada com a produção e assimilação de produtos narrativos A tentação para restringir os jogos eletrônicos a esse campo é grande demais Mas esse comportamento pode demonstrar problemas Frasca alerta que os videogames implicam numa mudança crucial do nosso paradigma de assimilação da is similar to the behavior of the actual plane If the player increases the power variable on the simulator the simulated plane will move faster through the virtual sky on the computer screen games are just a particular way of structuring simulation just like narrative is a form of structuring representation 21 Tradução livre outside academic theory people are usually excellent at making distinctions between narrative drama and games If I throw a ball at you I dont expect you to drop it and wait until it starts telling stories 39 cultura eles representam a primeira mídia simulacional complexa disponível para as massas22 2003 p 3 Brinquedos e jogos de tabuleiros também se configuram como mídias simulacionais mas não podem equiparar o nível de complexidade exercido pela tecnologia usada pelo videogame 13 Da Gênese dos Videogames 131 De como contar uma história De posse desse conhecimento sobre a lógica do lúdico e sobre como a convergência midiática transformou mídias em hipermídia é hora então de falar brevemente sobre o desenvolvimento dos videogames e de sua indústria tão expressiva nos dias de hoje Traçar uma linha cronológica é sempre além de uma tarefa árdua uma que transpira parcialidade aquele que o faz tem em mãos o poder de escolher que fatos ignorar sejam eles relativos ao lado da maioria econômica bélica social em geral os chamados vencedores ou sejam eles relativos às minorias que podemos chamar aqui como Johnson 2001 chama os vencidos E já que evocamos o teórico é interessante deixar um de seus conceitos transparecer no texto Quando falando principalmente de cronologias referentes ao desenvolvimento tecnológico Johnson afirma que estamos acostumados a conhecer principal e absolutamente um tipo de linha temporal que está atrelada a resultados não de eficácia ou qualidade mas sim a resultados de ordem comercial que no caso são mais importantes do que as centenas de primos pobres que se espalham no mercado de consumo capitalista com o qual nos acostumamos Nesteriuk 2002 p 76 acredita que com esse modus operandi dos meios de comunicação e em especial meios de conservação da memória da humanidade há uma contribuição involuntária para que pesquisadores que dedicaram sua vida a um projeto em específico que não emplacou comercialmente sejam esquecidos por circunstâncias que às vezes não se mostram de forma tão clara 22 Tradução livre they represent the first complex simulational media for the masses 40 Conhecemos na área tecnológica apenas um tipo de história atrelada normalmente aos resultados comerciais e evolutivos específicos e que não permite o conhecimento de outras histórias das tecnologias Johnson afirma ainda que inúmeras invenções e idéias apresentavam fantástico potencial e muitas vezes resultados melhores do que as versões adotadas e comercializadas pela indústria e assimiladas pelo mercado e seu público O videogame enquanto meio se configura como o exemplo perfeito para as teorias de Johnson e posteriormente Nesteriuk pois os pesquisadores da mídia geralmente privilegiam uma única cronologia ditada principalmente por aparelhos que foram sucessos de venda esquecendo que conceitos e detalhes importantes que sobrevivem até hoje na produção dos aparelhos surgiram às vezes em consoles que foram absolutamente esquecidos Para entendermos finalmente como surgiram e evoluíram os videogames até o presente momento é necessário então fazermos uma diferenciação básica entre os vários suportes tecnológicos para jogos eletrônicos que estão ou estiveram disponíveis no decorrer desses quase 50 anos de história dessa mídia Antes contudo devo dizer que utilizo a palavra videogame ou seu plural para denominar qualquer jogo eletrônico seja este jogado em a computador em ambiente privado como em casa tanto como em ambiente público como em lan houses23 por exemplo seja este jogado em b aparelhos dedicados os chamados consoles com a tv como periférico que podem ser i consoles domésticos no caso dos aparelhos adquiridos em lojas para uso pessoal ou consoles públicos geralmente integrados a máquinas de grande porte dispostas em lugares públicos como shoppings e galerias chamadas comumente de ii arcades Sendo a e b respectivamente suportes tecnológicos físicos hardware para a execução dos jogos que geralmente são criados para um tipo de suporte em específico mas o que não os impede de serem convertidos para os outros suportes uma vez que seja economicamente interessante ou viável Com relação aos três tipos de suporte físico há ainda que se perceber que 23 LAN é a sigla para Local Area Network Rede Local que são redes de pequena extensão física e maior velocidade de comunicação entre pontos Lan Houses são estabelecimentos comerciais que disponibilizam computadores em rede em LANs para poder possibilitar jogar em grupo já que às vezes o aparato tecnológico necessário não se encontra no poder aquisitivo dos pais dos jovens interessados ou simplesmente porque é mais cômodo fazer uso do serviço já pronto Há que se considerar uma certa ética de grupo aqui já que os jovens criam diferentes dialetos que se configuram em senhas de acesso ao grupo estabelecendo rituais para entrada e manutenção nas galeras Alves 2005 p 115 41 a Jogos para computadores são executados normalmente no próprio hardware de um computador com arquitetura PC ou Mac em diversos sistemas operacionais e interagem ou seja fazem interface com o usuário através dos periféricos já tão conhecidos da Era Digital que vivemos mouse teclado monitor caixas de som etc b i Jogos para consoles domésticos embora também sejam executados por um computador com processador e memória qualquer videogame o é diferem da categoria acima por serem rodados num hardware dedicado totalmente ao jogo e à sua performance que é acoplado à televisão doméstica que no caso funciona como periférico por meio de entradas auxiliares A interação ocorre através da TV claro e de joysticks que são dispositivos através dos quais o usuário controla o jogo24 Um bom exemplo de console doméstico é o Playstation da Sony ou o Super Nintendo da Nintendo ii Arcades chamados erroneamente de fliperamas25 são grandes máquinas que integram console e monitor e diferem dos consoles domésticos por serem geralmente montadas especificamente para locais públicos Têm bem menos funcionalidades que os consoles e um processamento não tão bom quanto alguns consoles domésticos mais atuais mas são um ótimo incentivo para uma dinâmica da socialidade 24 Com a convergência tecnológica que hoje é experimentada começam a aparecer os primeiros consoles que não são totalmente dedicados ao jogo mas que executam outras tarefas de entretenimento como tocar CDs de áudio ou acessar a Internet Desses o mais famoso midiática e economicamente é o Playstation 3 fabricado pela Sony Ver mais sobre o console em httpwwwsonycomps3 25 Fliperama é a designação utilizada para as máquinas criadas no final do século XIX nos Estados Unidos pinball que consistem de dois ou mais flippers braços com a função de rebater uma bola que a medida que encostava em pinos plaquetas e outros objetos acumulava pontos de volta para a mesa de jogo sem deixála passar por entre os dois flippers nem cair em canaletas laterais No Brasil acabou tornandose a designação genérica para arcades e em alguns casos para toda espécie de game bem como para o tipo de estabelecimento onde normalmente se encontra uma grande concentração dessas máquinas Nesteriuk 2002 P 78 42 Os joysticks geralmente consistem de um manche e alguns botões dispostos em uma plataforma de madeira Partindo então do princípio de que todos esses suportes são ligados pelo seu desenvolvimento comum em paralelo e que todos eles utilizam um computador de um modo interno ou de modo mais óbvio mais visível para processar as várias mídias que vão compor essa nova hipermídia o termo videogame será usado para se referir a qualquer desses jogos Tal terminologia também faz parte do corpo teórico de alguns pesquisadores consultados para a elaboração deste trabalho monográfico como Nesteriuk 2002 e Frasca 2001 132 O Surgimento do Videogame Fica claro então que nossa escolha com relação à história de como surgiu essa mídia que hoje se destaca o videogame procura não só mostrar reações do mercado e não mede de nenhum modo a eficácia de um ou outro produto simplesmente pelo seu impacto comercial Pretendo manter máximo de transparência nesse sentido para que fatores importantes na história dos jogos eletrônicos não fiquem obscurecidos por como uma ou outra história são contadas De modo curioso então essa postura que é assumida aqui neste trabalho já repercute no primeiro nó cronológico a ser citado quando privilegiamos não a criação mas o vislumbre do construto a concepção dos jogos eletrônicos em detrimento de sua factual criação Antes de o primeiro videogame ser criado no estado americano de Nova Iorque em 1958 um visionário Ralph Baer em 1951 tinha a idéia que revolucionaria a história dos jogos Previsivelmente Baer foi tomado como inconseqüente para seus companheiros de trabalho da Loral empresa produtora de aparelhos de televisão quando sugeriu que a empresa deveria incluir novas características no aparelho como adicionar alguma forma de jogo para televisão A idéia recebeu uma previsível reação negativa e foi o fim disso Baer 1999 43 Baer não foi o primeiro a criar o videogame então esse foi Willy Higinbotham renomado físico americano que além de construir a primeira versão de Tennis Programming ou Tennis for Two como veio a ser chamado processada por um computador analógico e mostrada no display de um osciloscópio também teve sua assinatura em um dos mais bem sucedidos projetos bélicos americanos de todos os tempos a bomba atômica que foi usada após o fim da Segunda Guerra Mundial sobre as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki Higinbotham na verdade concebeu tal passatempo para ajudar nas demonstrações que eram organizadas por instalações de pesquisa de física e tecnologia para que o governo americano pudesse mostrar aos populares seu poderio e nunca se preocupou em patentear o aparelho que depois teve sua interface melhorada saindo do osciloscópio e passando para um monitor monocromático de 15 polegadas Há como é de se esperar um passado comum entre a pesquisa tecnológica e a Ficção Científica que antes era um gênero pertencente unicamente a cientistas que desejavam fazer previsões ou discutir a evolução Uma das intersecções entre essas duas áreas distintas se dá em 1962 quando Stephen Russel pesquisador do Massachusetts Institute of Technology MIT se baseando nos livros do escritor EE Doc Smith cria Spacewar considerado por muitos estudiosos da área como o primeiro dos videogames talvez porque ele era bem mais elaborado que o tênis de Higinbotham Sucesso absoluto o jogo não só mantinha os civis maravilhados nas demonstrações como se tornou obrigação para os próprios pesquisadores do MIT que nas horas vagas divertiamse em frente à máquina Nolan Bushnell era um desses pesquisadores Ele se formou em 1969 e em 1971 já trabalhava na Ampex primeira empresa a desenvolver um vídeocassete mas foi pela Nutting que ele lançou Computer Space considerado por muitos um plágio de Spacewar mas que foi o primeiro a ser distribuído em escala comercial e daí para nunca mais voltar para o anonimato tanto para os dispositivos quanto para Bushnell que em 1972 com Ted Dabney funda a Atari lançando Pong dessa vez plágio de Tennis for Two Nesse ponto os consoles ainda eram todos públicos baseados numa dinâmica de inserir moedas para obter créditos da mesma forma que uma cabine telefônica 44 No mesmo ano que a Atari era fundada a Magnavox ramificação da Philips lança cem mil unidades do Odissey 100 primeiro console que permitia jogar videogame em casa Bushnell sempre atento em 1974 lança Home Pong que vende cento e cinqüenta mil unidades e estabelece por fim a indústria dos videogames Indústria que tem seu próximo passo com o Channel F primeiro videogame com console programável isto é que permitia a partir da mesma máquina a substituição de um jogo por outro neste caso por meio de cartuchos Nesteriuk 2002 p 83 O mercado começa a esquentar de verdade quando a Warner compra de Bushnell e Dabney a Atari e lança em 1977 o Atari 2600 console revolucionário com 128 bytes de memória e cerca de 12 MHz de velocidade de processamento que viria a ser um dos principais ícones da década de 1980 ao redor do globo Vale a pena ressaltar que a Atari nessa época junto com a Connecticut Leather Company Coleco eram as únicas empresas que se dedicavam ao mercado dos videogames visto que os investimentos tinham cessado em 1976 o que causou a primeira crise do setor Alves 2005 p 41 Em 1979 o Microvision lançado pela Milton Bradley chama atenção por ser o primeiro videogame portátil a aparecer no mercado O curioso é que o produto quase 30 anos atrás já trazia consigo os princípios dos consoles de mão princípios que sobrevivem até hoje tela de cristal líquido funcionamento à bateria e controles embutidos no próprio dispositivo O Microvision foi um fracasso de vendas devido às condições precárias de seu sistema poucos gráficos poucas cores e poucos jogos lançados sendo esse último o fator determinante de seu insucesso Nesteriuk 2002 p 84 Numa tentativa de fazer frente ao sucesso do Atari 2600 a Coleco lança o ColecoVision Com maior definição dos gráficos melhor jogabilidade e mais títulos disponíveis no mercado mesmo custando quase o dobro de seu concorrente em 1983 as vendas do ColecoVision ultrapassaram as do console da Atari Ainda em 1983 a Atari põe no mercado uma nova versão de seu console o Atari 5200 e vê suas vendas despencarem devido à fraquíssima interface26 do videogame 26 A função da interface é comunicar ao jogador o estado de mundo e receber inputs do jogador daquilo que ele quer mudar no mundo do jogo O ato de usar os inputs e outputs da interface não precisa ser divertido em si é a interação do jogador com esse mundo que deve ser uma experiência convincente Rouse 2001 p 401 45 1984 um ano que parece absolutamente expressivo no estudo da cultura digital27 viu então mais uma crise no setor com a proliferação dos Personal Computers PCs e todas as promessas de tecnologia ao alcance da mão e dentro de casa o mercado de videogames despenca com várias empresas quebrando e as vendas caindo vertiginosamente A guerra de preços estabelecida entre as empresas a falta de renovação tecnológica dos consoles e a criatividade limitada apresentada nos jogos existentes bem como as restrições físicas dos cartuchos que não apresentavam alta capacidade de armazenamento de dados contrapunhamse às múltiplas possibilidades que os PCs pareciam oferecer Diante desse novo universo de alternativas as empresas de games começaram a desaparecer do cenário Decretouse portanto a morte dos videogames Alves 2005 p 42 Mas esse como se sabe não é o fim da história O império do Japão na década de 1980 tinha uma única ordem em mente Conquistemos os mercados externos Barral 2000 p 34 Com essa premissa em mente contrariando todas as expectativas a Nintendo lança seu Famicom que já vendera cerca de 3 milhões de unidades do outro lado do mundo nos Estados Unidos com o nome de Nintendo Entertainment System NES o que reergueu o mercado em 1985 Surge aí o reinado hegemônico do encanador Mário e de seus companheiros na série Mario Brothers que viria a ser o ícone da Nintendo no futuro A Nintendo em 1986 então já era dona de 90 do mercado parcela que só veria queda em 1989 com o lançamento do Megadrive primeiro videogame com 16 bits chamado de Genesis fora do Brasil pela Sega empresa também japonesa e dona do igualmente carismático Sonic um porcoespinho azul cujo jogo obedecia a mesma lógica dos da série Mario Brothers A Sega deu em termos de mídia de distribuição de jogos o primeiro grande passo ao unir a tecnologia do CDROM28 a um console já consagrado seu Megadrive criando 27 1984 além de ser o título e ano em que se passa a famosa história de Orwell sobre um futuro apocalíptico e absolutamente tirânico é ainda o ano em que William Gibson lança o seminal Neuromancer apontado como marco inicial da cultura cyberpunk De forma semelhante 1984 é o ano do surgimento da Apple e dos seus computadores Macintosh que derruba a IBM e estabelece a forma como se constrói interfaces para sistemas operacionais até hoje uso de mouse ponteiro na tela ícones 28 O primeiro console a ter suporte a CD foi o Turbografx 16 que não foi bem sucedido comercialmente 46 então o SegaCD que foi um passo importante mas que comercialmente não emplacou só vindo a representar algo quando a Sega lançou o Saturn em 1994 A disputa SegaNintendo pelo mercado sofreu uma mudança forte quando também em 1994 a Sony mais uma japonesa lançou o Playstation console que tem o maior número de jogos disponíveis no mercado e que já vendeu mais de cem milhões de unidades em todo o mundo Nesteriuk 2002 p 90 Hoje a disputa pelo mercado se configura basicamente entre a Sony com o console Playstation 3 a Nintendo com seu Gamecube e um terceiro concorrente que migrou da indústria de computadores desktop para a indústria dos videogames a Microsoft com seu Xbox A mídia de transporte dos jogos mais uma vez mudou evoluindo do CD para o DVD que tem uma maior capacidade de armazenamento o que possibilita um melhor suporte para o desenvolvimento técnico dos jogos Nesteriuk 2002 p 90 já que permite imagens em resolução maior e em maior quantidade Além disso os computadores desktop de última geração providos de placas de aceleração gráfica cada vez maiores e mais rápidas são fortes concorrentes ao mercado de jogos já que apresentam maior facilidade de interação29 entre jogadores provendo às vezes mais de 16 jogadores simultâneos no mesmo jogo e performance semelhante embora não tenham o processador dedicado à tarefa de executar o jogo 29 Interação essa que pode ser dentro de redes de pequena abrangência Local Area Networks LANs nas Lan Houses ou via Internet com uma abrangência territorial virtualmente infinita 47 2 MULTIVERSO 21 Do Outro Lado do Espelho Os Fantásticos Mundos da Imaginação 211 Aproximação Há antes de abordar diretamente a relação limítrofe construída entre a lógica dos jogos e a das comunidades virtuais todo um espectro teórico que precisa ser conhecido não só para entender o funcionamento desse novo sistema semiótico mas principalmente para poder localizar e posicionar corretamente a figura do homem e de seu comportamento social no modo como se desenvolvem as sociedades contemporâneas Se existe algo que realmente intriga nesse universo de informação no qual mergulhamos para responder as perguntas que nos motivaram a essa pesquisa é saber exatamente onde se localizam tais mudanças que espaço é reservado para a interação de pessoas que estão em coordenadas opostas no globo terrestre Além disso outra coisa que não se pode deixar de notar independente da linha teórica utilizada ser apocalíptica ou integrada independente de acreditarmos que a tecnologia vai ser nossa salvação ou nosso fim é que existem transformações de origem cultural que estão sendo impressas ao corpo de forma que esse mesmo adquire uma ética própria e sendo assim falar de sua dissolução parece paradoxal embora seja absolutamente atual resgatando uma dicotomia secular postulada por Descartes e um desejo absolutamente integrado à dinâmica da cibercultura o de descorporificação presente entre tantas outras obras artísticas do fim do século XX na Ficção Científica Cyberpunk movimento literário da década de 1980 com obras seminais e escritores que causam impacto nos fins teóricos até hoje Mesmo navegando por áreas extensas que incorporam de maneira sinergética o conhecimento proveniente da psicologia da comunicação e sociologia além de outras áreas das ciências humanas vamos tentar nos manter sempre o mais próximo possível do objeto enfocado no trabalho o que de certa forma vai gerir nosso diálogo entre autores Para tentar responder as perguntas levantadas acima a princípio vamos nos aproximar de um conceito que é vital para entendermos a dinâmica dos jogos em especial a 48 dos jogos que são classificados como Massive Multiplayer Online RolePlaying Games MMORPG porque é dentro dessa classificação que se encontram os níveis de interação social que desejamos vislumbrar para a nossa pesquisa o conceito de mundos imaginários 212 Mundos Imaginários Você senta na frente do seu computador abre um programa com um login e senha digitados no lugar certo você adquire uma personalidade num outro mundo um que pode ser povoado por criaturas místicas vindas do folclore europeu ou por robôs e ciborgues vindos diretamente do futuro Você interage com todas essas figuras através de uma representação sua no jogo através de seu avatar que é totalmente personificável de modo que você pode ter orelhas pontudas ou asas de morcego nas costas Todo o ambiente no qual o seu eu digital está imerso se desenha em seu monitor através de poderosos decodificadores de fórmulas matemáticas processadores instalados na sua placa de vídeo ou sua placamãe Os seres e monstros que você vê são apenas representações digitais de outros jogadores que estão espalhados ao redor do mundo que às vezes nem sabem quem você é só o que seu personagem fictício pode fazer A descrição acima representa guardadas as devidas proporções a entrada de um usuário em um programa cliente30 de um MMORPG um jogo onde cada usuário se conecta a partir de seu próprio computador e interage com tantos outros que através de seus computadores conectamse a um servidor dedicado que estabelece regras regras sólidas de comportamento e convivência e que permite a criação de situações exclusivas ao mundo criado Os MMORPG são jogos que embora já bastante populares e cuja popularidade vem crescendo de modo exponencial necessitam de um aparato tecnológico de maior performance placas de aceleração de vídeo placas de rede uma conexão com a Internet que seja rápida e estável o que demanda conseqüentemente um maior poder aquisitivo 30 Na informática Sistemas Distribuídos geralmente se apresentam no formato ClienteServidor onde o servidor porta as regras de coexistência entre os usuários e os clientes fazem o processamento local e agem como interface para o jogador 49 referente aos jogadores que podem de certa forma escolher entre freqüentar lan houses com o intuito de jogar ou adquirir todo o aparato para participar da experiência de casa Esses jogos evoluíram de um misto entre jogos de computador da década de 1980 em especial os da série Ultima e os produzidos pela empresa SSL juntamente com a TSR Tactical Strategies Rules jogos reais de interpretação de papéis RPG31 dos quais o mais famoso era e continua sendo Dungeons Dragons também da TSR32 e finalmente dos MUDs MultiUser Domains também referidos como MultiUser Dungeons ambientes de simulação onde os jogadores não tinham interfaces avançadas ou avatares coloridos todas as respostas e ações de construção do mundo eram feitas através do teclado digitando Os comandos então eram interpretados pelo computador que tinha sido previamente programado para isso por alguém chamado comumente de manager wizard ou simplesmente de mestres no jargão da área em português o que fazia com que o mundo reagisse de forma lógica às ações que o jogador tinha tomado Retrocedendo um pouco mais é que podemos entender melhor esse fenômeno já que as raízes da criação dos MUDs se encontram nos RPGs e as próprias raízes da criação do RPG se encontram nos mundos de fantasia literária de autores como J R R Tolkien autor da trilogia O Senhor dos Anéis ou C S Lewis autor das Crônicas de Nárnia Pargman faz um apanhado geral da relação das pessoas com o que ele chama de mundos imaginários tecendo uma breve classificação que achamos por bem ser usada no nosso trabalho Baseandose em pesquisa de campo entrevistando justamente mestres e administradores de vários MUDs ele pôde perceber que além do óbvio interesse pela informática os administradores freqüentemente eram programadores essas pessoas também compartilhavam uma outra série de interesses como roleplaying games ou também conhecidos como live action roleplaying games além de ler freqüentemente grandes quantidades de literatura de fantasia ou ficção científica 2003 p 133 31 RPG significa RolePlaying Games São jogos onde jogadores escolhem personagens para interagir sob um controle limitado de um jogador especial chamado de mestre ou narrador numa narrativa que pode ter sido montada previamente ou pode ser improvisada RPGs são um exemplo clássico do que Biro chama de Ficção Interativa 2007 P 1 32 A TSR no fim da década de 1990 foi adquirida pela Hasbro uma empresa de grandes proporções que atua na área de produção de jogos e brinquedos Hoje os RPGs da TSR são publicados sob a bandeira da Wizards of the Coast subsidiária da Hasbro especializada em RPGs e miniaturas Para ver mais sobre isso acessar httpwwwwizardscomdnd 33 Tradução livre such as roleplaying games or socalled live action roleplaying games and reading often large amounts of fantasy or science fiction literature 50 O pesquisador sugere que embora tais interesses pareçam distantes e independentes uns dos outros o que eles têm em comum é que todos eles constituem certos tipos de mundos imaginários e que esses atraem pessoas que têm fascinação e vontade de entender e controlar sistemas complexos que são lógicos e controláveis Ibidem p 1 34 Segundo ele O termo mundo imaginário aqui se refere a um mundo autônomo e freqüentemente cuidadosamente engendrado que é diferente do mundo normal no qual nós vivemos Tal mundo tem uma lógica e uma realidade próprias mas esta lógica e realidade são diferentes da vivida diariamente no nosso mundo Ibidem p 135 O termo mundo imaginário descende diretamente do termo mundo secundário que foi cunhado por Tolkien para referirse a sua obra Segundo ele o mundo secundário era um mundo criado por um autor e realizado em um livro Pargman vai além substituindo a palavra secundário pela palavra imaginário para poder ampliar o significado do termo englobando assim outros tipos de mundo que as possibilidades tecnológicas nos apresentaram Os mundos imaginários se dividem em quatro tipos sendo o primeiro naturalmente os mundos de texto seguido pelos mundos de fantasia compartilhada e pelos mundos de códigos que além de englobar jogos de RPG baseados em computador MMORPG ainda englobam os mundos do próprio código fonte dos computadores Dos mundos de texto talvez o mais bem engendrado e famoso seja justamente o criado por Tolkien Quando alguém lê a trilogia O Senhor dos Anéis percebe imediatamente que o mundo é muito mais velho e complexo do que o próprio conto que os três volumes narram um mundo que o autor passou as quatro décadas anteriores ao seu lançamento construindo e que tem suas próprias línguas e mitos Há uma lógica interna disposta pelos livros que contam a história de Arda nome dado ao mundo pelo autor que se mantém absolutamente fiel e controlável tornando a experiência de imersão muito mais suave Tal lógica interna é vital para a construção da realidade interna do mundo e segundo Pargman 34 Tradução livre they all constitute certain kinds of imaginary worlds and that these appeal to persons who bear a fascination and a will to understand and master complex systems that are logical and controllable 35 Tradução livre The term imaginary world here refers to an autonomous and often carefully crafted world that is different from the ordinary world that we live in Such a world has a logic and reality of its own but that logic and reality is different from the everyday livedin world 51 vital para o interesse dos sujeitos naquele mundo imaginário em específico O discurso de Pargman no caso ecoa o de Turkle que acredita que Um escritor de ficção científica pode postular máquinas do tempo viagem intergaláctica ou telepatia mas não pode fazer isso arbitrariamente Você pode postular qualquer coisa mas uma vez que as regras do sistema tenham sido definidas é preciso aderir a elas escrupulosamente Essas são as regras pra criar mundos regidos Esses mundos são conhecidos para qualquer programador de computador e agora estão sendo passados para o futuro como conhecimento cultural para toda uma geração de crianças 1984 p 8136 Em seguida chegamos aos mundos de fantasia compartilhada que consistem basicamente de RPGs que são publicados e vendidos no mundo todo O primeiro jogo a ser lançado e que ainda é hegemônico nas análises de mercado foi Dungeons Dragons em 1974 Tanto este quanto muitos outros mundos de RPG são inspirados em trabalhos de escritores como Tolkien o que permite que tracemos sua origem e relacionemos sua estrutura interna Como Pargman bem pontua As características de diferentes tipos de criaturas e seu comportamento relacionado ao jogo além de seus efeitos são explicados com grande detalhe O mesmo acontece para características do personagem e profissões E saúde mental E equipamento E intervenção divina E assim por diante São a essas exposições contidas em maciços livros de regras que o jogador se apega quando um jogo é comprado O que é comprado é um sistema de jogo isto é um sistema operacionalizado para como um mundo de fantasia funciona em detalhes 2003 p 237 A narrativa nesse caso é interativa construída em conjunto pelo mestre e pelos jogadores É importante perceber que diferentemente das narrativas prontas em livros em jogos de computador mais simples a participação do jogador é essencial para o desenvolvimento da história Numa relação de duplatroca o mestre adapta as ações do 36 Tradução livreA sciencefiction writer is allowed to postulate time machines intergalactic travel or mental telepathy but cannot do it arbitrarily You can postulate anything but once the rules of the system have been defined they must be adhered to scrupulously Such are the rules for creating rule governed worlds They are known to every computer programmer and are now being passed on as cultural knowledge to a generation of children 37 Tradução Livre The characteristics of different types of creatures and their gamerelated behaviors and effects are laid out in great detail The same is true for armor weapons magic spells and potions The same is true for character traits and professions And mental health And equipment And divine intervention And so on It is exactly such expositions collected in thick rulebooks which one gets hold of when a role playing game is bought What is bought is a game system ie an operationalized system for how a fantasy world works in detail 52 jogador à situação que foi previamente criada do mesmo modo que quando informado das reações que suas ações causaram o jogador tem a liberdade de também adaptar as ações incluindo o pensamento e os dilemas morais de seu personagem Mundos de fantasia compartilhada são um exemplo de Ficção Interativa que Biro trata como obras literárias onde o leitor pode interagir com a narrativa enquanto ela está acontecendo o que faz com que o leitor também faça parte do processo de criação da ficção 2007 p 1 Para ele o raciocínio do leitor provocado pelo conflito da narrativa é uma parte essencial da ficção interativa O modo com que o leitor interage com a obra afeta a narrativa decisivamente ao invés de apenas interpretativamente idem Dos mundos de RPG é que o conceito de multiverso deriva propriamente Um dos muitos cenários que utilizam essa terminologia é pertencente ao jogo Dungeons Dragons da Wizards of the Coast Em Planescape o multiverso é um passo além da teoria da relatividade de Einstein ao invés de transformar o tempo em algo relativo o cenário opta por considerar várias linhas temporais em várias realidades diferentes que podem ou não estar conectadas e onde o tempo corre de forma diferente Em Planescape a cidade de Sigil é tida como o centro do multiverso algumas facções locais acreditam nisso outras não e se mostra como uma Nova Iorque hiperbólica com portais mágicos para todos os lugares imagináveis contendo seres de todos os planos de existência possíveis38 Tal conceito já foi explorado também em mundos de fantasia literária como nas Crônicas de Amber39 do escritor Roger Zelazny ou na trilogia de fantasia moderna His Dark Materials traduzida como Fronteiras do Universo do inglês Phillip Pullman Alves 2005 p 113 acredita que os jogos tanto os de computadores quanto os de interpretação por si só já representam comunidades virtuais nas quais os jogadores representam papéis que trafegam entre o real e o imaginário atuando muitas vezes como espaço de ressignificação e aprendizagem além do efeito catártico dos jogos defendido pela teórica Por fim fazemos nossa incursão aos mundos de códigos De volta aos computadores depois da breve incursão pelos outros mundos imaginários nos deparamos 38 Para saber mais sobre Planescape o cenário de campanha do jogo Dungeons Dragons e sobre Sigil a Cidade dos Portais acesse httpwwwplanewalkercom 39 Zelazny Roger Nine Princes in Amber Ace Books 1999 Não traduzido para português 53 com os mundos de fantasia baseados em computador um MUD nas palavras do próprio Pargman poderia possivelmente constituir um mundo imaginário cativante pois ele nos mostra não só um mas dois mundos imaginário sobrepostos ao belprazer do jogador ao mesmo tempo O primeiro mundo é o mundo de fantasia de um romance ou de um jogo de RPG com sua própria história e suas regras para como magia monstros morte e recompensas funcionam O segundo mundo nunca longe demais é o mundo sobreposto do sistema computadorizado 2003 p 340 Então fica claro que quando o autor fala de mundos de código ele está falando do modo como a própria linguagem de computador os códigos que constroem os softwares para os programadores sobretudo demanda uma inserção mais que isso imersão além da submissão a certas regras De posse dessas regras e de uma boa dose de criatividade o programador pode em tese fazer qualquer coisa acontecer guardadas as limitações físicas ou seja de hardware Computadores funcionam internamente de um modo que é diferente do modo como as coisas funcionam no mundo real eles têm sua lógica e sua realidade próprias que são diferentes da realidade que experimentamos no diaadia Assim sendo um sistema operacional como o Linux por exemplo pode ser considerado um mundo imaginário pois ele permite que você através de código crie outros tantos mundos imaginários O que nos leva a crer que MUDs no caso são apenas um tipo de mundo imaginário que pode ser criado através de código de computador A questão aqui é que os MUDs não eram exatamente espaços que privilegiavam o relacionamento como fim e sim como meio Os jogadores tinham objetivos vontades ambições Eram recompensados numa lógica típica do ludus Mas com o passar do tempo foram surgindo experiências geradas pelo código de computador cujo fim era simplesmente o encontro do anônimo a interação entre pessoas que já conheciam ou que viriam a se conhecer usando para isso o sistema criado De modo semelhante aos jogos esses espaços continuavam sendo chamado de MUDs Turkle explica o equívoco 40 Tradução livre A mud could possibly constitute a captivating imaginary world as is puts not just one but two superimposed imaginary worlds at ones disposal at the same time The first world is the fantasy world of a novel or a roleplaying game with its own history and its own rules for how magic monsters death and rewards works The second world never too far away is the underlying world of the computer system 54 O termo dungeon permaneceu na cultura da alta tecnologia para designar um lugar virtual Assim quando eram criados espaços virtuais que muitos utilizadores de computadores podiam partilhar e onde podiam colaborar uns com os outros tais espaços eram incluídos na categoria de MultiUser Dungeon ou MUDs um novo tipo de realidade virtual social apud Alves 2005 p 112 Estabelecese por fim entre esses mundos imaginários uma dinâmica de herança semiótica onde eles não podem ser visualizados num esquema de superposição mas onde cada mundo se apóia sobre o outro pra construir significados que hoje são cada vez mais atrelados ao próprio conceito como um todo numa releitura das teorias da Gestalt41 e não a cada uma de suas partes isoladas Daí a necessidade de explicar as multifaces do conceito para poder entender em que ponto eles se tocam e o que isso traz para o campo dos estudos 213 Ciberespaço O que afinal caracteriza um mundo imaginário Entre todos os pontos que já foram citados há um que é vital para combinar esse conceito com o de outro teórico Laurentiz que acredita que materialidade e matéria são princípios diferentes Para ele matéria é a preocupação mecânica com o suporte material ao passo que a materialidade abrange o potencial expressivo e a carga informacional destes suportes englobando também a extramaterialidade dos meios de informação 1991 p 102 O ponto vital o que não pode ser ignorado em nenhuma hipótese é que primariamente mundos imaginários são compostos necessariamente de informação seja proveniente de um roteiro prévio de um improviso na história ou simplesmente do código que o gera que o descreve Informação é a matéria da qual se compõe qualquer mundo imaginário e ela garante ao mundo existência pois o legitima através do princípio da materialidade O ciberespaço é a encarnação tecnológica do velho sonho de criação de um mundo paralelo de uma memória coletiva do imaginário dos mitos e símbolos que perseguem o homem desde os tempos ancestrais Lemos 2002 p 138 41 Doutrina relativa a fenômenos psicológicos e biológicos que veio a alcançar domínio filosófico e consiste em considerar esses fenômenos não mais como soma de elementos por isolar analisar e dissecar mas como conjuntos que constituem unidades autônomas manifestando uma solidariedade interna e possuindo leis próprias donde resulta que o modo de ser de cada elemento depende da estrutura do conjunto e das leis que o regem não podendo nenhum dos elementos preexistir ao conjunto teoria da forma 55 O ciberespaço é o maior e mais presente de todos os mundos imaginários e é ele o espaço reservado para a interação das pessoas que estão em pontos opostos do globo Milhões trabalham através de suas estradas de informação dia após dia num processo cognitivo que transforma esse acúmulo de informações arbitrárias em uma alucinação consensual42 para o escritor canadense William Gibson Ele cunhou o termo ciberespaço em seu romance Neuromancer lançado em 1984 e acredita que o ciberespaço consiste num espaço nãofísico nem territorial formado por um conjunto de redes de computadores através das quais todas as informações circulam Machado concorda adicionando que A expressão ciberespaço designa não propriamente um lugar físico para onde possamos nos dirigir enquanto corpos matéricos É mais propriamente uma figura de linguagem para designar aquilo que ocorre num lugar virtual tornado possível pelas redes de comunicação Machado 2002 p 8 Para Lemos 2002 p 137 o ciberespaço é concebido como um espaço transnacional onde o corpo é suspenso pela abolição do espaço e pelas personas que entram em jogo nos mais diversos meios de sociabilização Ele não é desconectado da realidade ainda segundo Lemos é um complexificador do real Desse modo há dois modos práticos de entendimento do conceito de ciberespaço o primeiro é de que o ciberespaço é o conjunto de redes de computadores e mais recentemente de outros dispositivos eletrônicos interligadas ou não em todo o planeta Essa perspectiva se aproxima da análise de cunho material onde o que importa é o suporte físico do ciberespaço A outra perspectiva de análise é muito mais vasta sendo virtualmente infindável e mantém um fluxo de informação imenso de muitas fontes para muitos receptores Olhando desse modo o ciberespaço é um ambiente simulado um mundo com suas próprias regras o lugar onde estamos por exemplo se entramos num ambiente de simulação realidade virtual Lévy por sua vez acredita que o ciberespaço ou melhor sua ocupação não se deu à toa Para ele a emergência do ciberespaço é fruto de um verdadeiro movimento social com seu grupo líder suas palavras de ordem e suas aspirações coerentes Lévy 1999 p 123 Isso significa que a tecnologia não prolifera não evolui sem que o humano o sujeito tenha uma boa parcela de participação nisso O teórico francês faz um paralelo 42 Ver Gibson William Neuromancer São Paulo Aleph 1984 56 ainda sobre a teoria do ciberespaço e o caso da indústria automobilística que segundo ele veio no começo do século XX para responder uma imensa necessidade de autonomia e potência individual Ibidem p 123 Para entender de onde vem o raciocínio de Lévy é importante saber que para ele o ciberespaço não é uma infraestrutura técnica particular de telecomunicações mas uma certa forma de usar as infraestruturas existentes por mais imperfeitas e disparatadas que sejam Ibidem p124 Em suma ele acredita que o ciberespaço é uma união entre sujeito e tecnologia guiada por uma corrente cultural que vai transformar seu significado social e estimular sua evolução técnica e organizacional Ibidem p125 O que existe segundo Lévy na verdade é um movimento social Ibidem Idem composto de vários anônimos e amadores dedicados que durante a década de 1960 acreditavam que deveríamos colocar as redes de computadores a serviço da inteligência coletiva e que durante meados das décadas de 197080 começando pelo Computer for the People nascido na Califórnia EUA lutaram pelo barateamento e pela chegada de peças de computador hardware às massas Um pensamento inocente contudo não veria o lado óbvio das indústrias de computadores que a seu modo produzindo em larga escala barateando componentes criando produtos baseados em análises do consumidor viabilizaram os objetivos de tal movimento A informática pessoal não foi decidida e muito menos prevista por qualquer governo ou multinacional poderosa Seu inventor e principal motor foi um movimento social visando a reapropriação em favor dos indivíduos de uma potência técnica que até então havia sido monopolizada por grandes instituições burocráticas Ibidem p125 E assim para o teórico francês é que esse movimento social provavelmente inventa o verdadeiro uso para a rede telefônica e para o computador pessoal o ciberespaço como prática de comunicação interativa recíproca comunitária e intercomunitária o ciberespaço como horizonte de mundo virtual vivo heterogêneo e intotalizável no qual cada ser humano pode participar e contribuir Ibidem p126 57 22 Socialidade e Culturas Digitais As Comunidades Virtuais 221 Socialidade Se há em todo o espectro dos estudos da cultura digital um consenso entre os teóricos é o de que a existência do ciberespaço se dá muito mais por um fenômeno social do que por um fenômeno técnico A cibercultura pela sociedade que nela atua parece antes de isolar indivíduos e transformar as relações humanas em frias e impessoais colocar a tecnologia ao dispor de uma nova dinâmica que a transforma num instrumento que é vital na criação de novas formas de sociabilidade e de vínculos associativos e comunitários A tecnologia que foi durante a modernidade um instrumento de racionalização e separação parece transformarse numa ferramenta convivial e comunitária Lemos 2002 p87 Todos os microrituais parecem ter esse papel de desvio da técnica de sua função meramente utilitária de agrupamento de indivíduos em torno de uma atividade comum de uma paixão compartilhada Poderíamos então falar que o destino da técnica moderna reside também na sua apropriação dionisíaca e assim numa ressacralização do mundo Maffesoli apud Lemos 2002 p 86 Sendo assim fazendo ecoar o discurso de Lévy com seu movimento social Lemos 2002 p 87 apoiado no discurso de Maffesoli e de Simmel teoriza que a técnica e a tecnologia têm sido de certa forma subvertidas em detrimento de um comportamento muito mais dionisíaco erguendo uma bandeira alicerçada nesse novo liame social baseado na emoção compartilhada ou no sentimento coletivo Maffesoli 2004 p 85 Isso acarreta em um entendimento completamente novo da sociedade contemporânea ocidental que Lemos visualiza através dos princípios da fenomenologia do social adotados por Maffesoli que por sua vez beneficia a observação tal qual ela se dá concentrandose naquilo que é e não no que deveria ser uma sociedade Partindo desse princípio é que o sociólogo francês tenta descrever o que segundo ele marca toda a atmosfera das sociedades ocidentais contemporâneas a socialidade Ele mostra como o conceito de socialidade é definido em oposição àquele de sociabilidade A socialidade marcaria daria o tom os agrupamentos urbanos contemporâneos colocando ênfase na tragédia do presente no instante vivido além de projeções futuristas ou morais nas relações banais do cotidiano nos 58 momentos não institucionais racionais ou finalistas da vida de todo dia Isso a diferencia da sociabilidade que se caracteriza por relações institucionalizadas e formais de uma determinada sociedade Maffesoli procura então olhar a vida como ela é como diria Nélson Rodrigues aliás ambos investem numa perspectiva erótica do social na tragédia do presente Lemos 2002 p 88 Socialidade é portanto todo o conjunto de práticas cotidianas que escapam dos mecanismos de controle social e que dessa forma acabam por constituir o substrato de toda vida em sociedade não só da sociedade contemporânea mas de toda forma social Lemos 2002 p 88 Para Maffesoli esse novo enlace social guarda dentro de si um ludismo que é um dos fatores essenciais da vida das sociedades contemporâneas e que está renascendo 2004 p 85 É nesse sentido que Dioniso como figura emblemática pode ser considerado típico ou arquetípico de um espírito de época que já não se satisfaz com a seriedade e a assepsia a que a sociedade moderna nos havia habituado Maffesoli 2004 p 85 Para o teórico francês hoje nos preocupamos muito menos em dominar transformar e modificar o mundo e muito mais em nos unirmos a ele através da contemplação nos preocupamos muito mais em festejálo Com maior ou menor seriedade ou interesse o produtivismo em suas diversas formas é hoje objeto de crítica O trabalho e o progresso não mais são imperativos categóricos 2004 p 87 O que interessa é o aqui o agora Tornase então visível finalmente uma ética do instante que até este ponto no desenvolvimento das sociedades contemporâneas estava velada Instante eterno em que é vivida e expressada a conversão a Dioniso retorno da temática noturna a do deus ctônico que encontramos na multiplicação das boates das festas rave e de outras manifestações de música eletrônica que já não podemos considerar como simples epifenômenos sem conseqüência Maffesoli 2004 p 89 Essa forma de organização de relacionamento então que é a socialidade se preocupa muito mais com nãosepreocupar sua força vem de uma passividade ativa intersticial e subversiva Lemos 2002 p89 Antes de tentar travar um ataque frontal de cunho revolucionário essa parcela do social porta um comportamento rizomático esguio e efêmero Idem que vem a marcar profundamente as relações sociais na cibercultura É um modo de lutar contra os diversos e mais bem engendrados mecanismos de controle do sistema simplesmente ignorandoos e assim reestruturandoos 59 A socialidade é assim a multiplicidade de experiências coletivas baseadas não na homogeneização ou na institucionalização e racionalização da vida mas no ambiente imaginário passional erótico e violento do dia a dia do quotidiano dos homens sem qualidadeLemos 2002 p 88 Há aí uma inversão de valores a modernidade buscava uma assepsia social marcada por uma racionalidade instrumental domesticar as imperfeições da vida como a violência as emoções desmedidas e o imaginário simbólico A contemporaneidade por sua vez como vem sendo pontuado é marcada por preceitos dionisíacos tribalismo sensualismo e se utiliza das novas tecnologias não para inibir situações lúdicas e comunitárias que nascem na vida social mas para potencializálas fomentando assim a socialidade como os teóricos a descrevem O pensamento de Maffesoli ainda conta com contribuições do sociólogo alemão Simmel pensador que desenvolveu o formismo Tal teoria supõe que as formas da cultura dialogam com a vida num esquema paradoxal onde as formas culturais pretendem enlaçar a vida dentro de si e cristalizálas quando a vida em sua possibilidade máxima de ex istência quer superar as formas culturais e se expandir As formas institucionais simbólicas técnicas de uma cultura visam enquadrar a vida regulála controlála Para o formismo de Simmel a vida se impõe sempre contra os limites da forma A vida necessita da forma para existir da mesma maneira em que ela deve estar expandindose para além das formas para existir É nesse embate nesse conflito entre formas e conteúdos que se enraíza para Simmel o trágico da sociedade Lemos 2002 p 90 Daí provém ainda segundo Lemos para Simmel a idéia de vitalismo social presente nos trabalhos de Maffesoli a fecundidade da vida obriga as formas a se reconstituir num processo contínuo A forma teria a função de dar suporte para a criação da vida para mais tarde observar como esse suporte se transforma em prisão em invólucro cristal que a vida vai sempre tentar quebrar se expandindo Esse esquema denota uma lógica de autopreservação Toda forma tenta estabelecer sua permanência temporal A cultura se realiza segundo Simmel nessa tragédia como processo de objetivação do sujeito e de subjetivação dos objetos como sinergia entre formas e conteúdos Idem p90 60 Maffesoli acredita que a essência da sociedade contemporânea é o próprio jogo a festa e que essas características que por sua vez estão mais voltadas para aproveitar e para conviver do que para controlar condensadas numa simples preocupação com o estarjunto êtreensemble levam a miniconceitos que pontuam todo o espectro da cibercultura tribalismo formismo presenteísmo ética da estética vitalismo e que a perda do próprio corpo no coletivo no que ele chama de empatia Einfühlung parece ser a característica da comunhão sensível ou afetiva que vem substituir a sociedade puramente utilitária Maffesoli 2004 p 40 Então essa sociedade efêmera e empática coloca para Lemos 2002 p 89 a ênfase no presente e não investe no dever ser mas no que é simplesmente A própria lógica do cotidiano insiste na dimensão de um presente caótico e politeísta em detrimento de perspectivas futuristas Um politeísmo de valores que remete a toda a obra de Weber e com o qual Maffesoli concorda afirmando que é necessário reconhecer com lucidez que a vida social repousa numa luta implacável entre diferentes ordens de valor 2004 p37 Tais diferenças de valores incutindo em heterogeneidade e finalmente em tensão são um dos aspectos essenciais da vida para o pensador francês então não havemos de nos surpreender com o fato dessa heterogeneidade vital nos remeter a diferenças de interpretação Maffesoli 2004 p39 quando falamos então de como máscaras podem ser assumidas em papéis públicos em papeis sociais Essa característica como poderemos ver mais a frente é uma das características do sujeito mais potencializadas pelas novas tecnologias do ciberespaço Desconforto43 para uns mal estar da civilização para outros como Lewis Mumford e finalmente modo esquizofrênico do capitalismo para Guattari e Deleuze apud Lemos 2002 p 51 Talvez essa seja a principal associação que nos vem à mente hoje quando tentamos relacionar nossa existência ao nosso self44 quando tentamos pensar onde nos encaixamos nesse nãolugar no qual nosso universo se tornou no qual as fronteiras da realidade espaciais e temporais parecem ter sido apagadas pela tecnologia Mesmo esta 43 Para Doel apud Santaella 2001 p 80 num artigo em que a pesquisadora questiona as multifaces do sujeito póshumano em detrimento da criação do ciberespaço 44 A discrepância que existe entre ser e existir para as ciências sociais não pode ser abarcada com as conotações que são dadas a estas palavras no português escolho então usar o inglês self para reforçar o conceito de reflexividade contido no termo 61 diferenciação entre sum45 e self é um abismo por demasiado grande para alguns teóricos que acreditam que o processo de subjetivação ou seja de construção de um sujeito nunca está completo nunca está fechado dissolvendo assim a borda que separa os dois conceitos O sujeito moderno racional reflexivo senhor no comando do pensamento e da ação Santaella 2001 p 45 foi para as Ciências Humanas substituído por alguém muito menos confiante e que indiferente à ação dos meios de comunicação de massa que insistem em pregar a unidade por meio de estereótipos e arquétipos não é mestre nem mesmo em sua própria casa Bukatman 2002 p 8 Isso traz sérias conseqüências à estrutura da sociedade em que vivemos pois se os meios de comunicação de massa agem tentando unificar e controlar o que lembra curiosamente que o prefixo ciber que precede a palavra cibercultura vem do grego kybernetes que remete ao conceito de controle governo pilotagem Lemos 2002 p 20 há uma resistência crucial a essa padronização que é provinda de subculturas que se instalam nos guetos a cada dia A criação de tais nichos sociais constituídos necessariamente por jovens que negociam status e poder dentro de seus mundos próprios atores sociais no teatro da contemplação do mundo Amaral 2005 p 2 acaba por ser simplesmente um indício do desconforto que o sujeito hoje multifacetado e aberto experimenta ao ser exposto a discursos de padronização e controle Uma das formas que a dinâmica das subculturas se utiliza para criar uma forma de reação contra esse movimento de controle é desenvolver atividades geralmente artísticas que ponham em xeque essa noção além de validar a integração dos envolvidos dando à atitude dos sujeitos ali contidos um senso de autenticidade que é compartilhado por todo nicho As subculturas acabam adquirindo essa característica de alteridade Amaral 2005 p 3 O atributo definidor das subculturas então reside na maneira como a ênfase é colocada na distinção entre um grupo culturalsocial particular e uma culturasociedade mais ampla A ênfase é na variação de uma coletividade maior que é invariavelmente mas não sem problemas posicionada como normal mediana e dominante Subculturas em outras palavras são condenadas a desfrutarem uma 45 Do Cogito ergo sum cartesiano 62 conciência de alteridade ou diferença46 Gelder e Thornton apud Amaral 2005 p 2 Maffesoli acredita que a pósmodernidade vai assim ser permeada por tais grupos em franca oposição à figura do individualismo tratando justamente da questão da morte do sujeito moderno em detrimento dessa figura mais aberta mais anárquica ponto chave dessa teoria das subculturas Daí o emprego do termo Culturas Digitais ao invés de seu singular recurso estilístico que tomo emprestado de Santaella 2005 p 7 quando a pesquisadora justifica usar as palavras comunicações e artes no plural afirmando que desse modo significa flagrálas na complexidade de suas situações atuais tomando essa complexidade como ponto de vista privilegiado para a consideração de suas historicidades Essa figura mais aberta esse sujeito pósmoderno então desfruta de um senso de alteridade que é um atributo definidor por impor limites que contribui para a construção do sujeito e da empatia já citada que ainda segundo Maffesoli 2004 p42 tem uma necessidade de autodespojamento Selbstentäusserung que remete justamente à figura da descorporificação abdicar de seu corpo em detrimento de algo maior um corpo coletivo Então a perspectiva individualista pregada na e herdada da modernidade acaba por passar por uma séria crise de onde emergem as mais diversas tribos a nível planetário Isso não significa que não existem indivíduos individualistas mas que a organização da sociedade se transforma numa organicidade Lemos 2002 p 91 completamente tribal e não mais racional ou contratual Maffesoli crê que isso seja a troca da função do indivíduo moderno pelo papel da persona pósmoderna onde a lógica individualista se apoiava sobre uma identidade fechada ela sofreu sérios ataques durante quase um século de morte do sujeito O indivíduo fechado se perdeu em um tipo de por pura ironia ou justiça poética deserto do real dando lugar a essa persona que só existe quando se relaciona com o outro quando se agrega Daí a necessidade da tribo para se construir com o outro pelo outro e no outro Lemos 2002 p91 46 Tradução Livre The defining attribute of subcultures then lies with the way the accent is put on the distinction between a particular culturalsocial group and the larger culturesociety The emphasis is on the variance from a large collectivity who are invariably but not unproblematically positioned as normal average and dominant Subcultures in other words are condemned to andor enjoy a consciousness of otherness or difference Gelder e Thornton apud Amaral 2005 p 3 63 Todos esses miniconceitos como o próprio Maffesoli os chama que foram citados na verdade existem numa sinergia onde um dá suporte a todos os outros O tribalismo é a essência do êtreensemble onde o que importa é o compartilhamento de emoções em comum trabalhando no surgimento de uma cultura do sentimento Lemos 2002 p92 Daí a proposta de Maffesoli de analisar esse novo ambiente comunitário seguindo o que ele chama de paradigma estético A sociedade tribal gregária e empática a cultura do sentimento que se apóia sobre as multipersonalidades as máscaras do teatro quotidiano agem a partir de uma ética da estética e não a partir de uma moral universalizante A sociedade elabora um éthos uma maneira de ser um modo de existência onde aquilo que é compartilhado com outros será primordial Lemos 2002 p92 A idéia principal dessa ética que Maffesoli propõe e que Lemos aceita é a de instaurar um conceito chave para ajudar a discernir o conjunto desordenado e versátil daquilo que M Maffesoli chama de socialidade Lemos 2002 p 92 222 Cibersocialidade Lemos 2002 propõe que a teoria de Simmel e de Maffesoli que acaba de ser discutida tem um papel essencial e especial no desenvolver de nossa sociedade Ele fala de um fenômeno chamado cibersocialidade que seria uma apropriação da técnica por toda a teoria da socialidade de modo que a cibercultura em si constituise como uma estética social alimentada pelas tecnologias do ciberespaço É um momento de gênese no caso onde podemos dizer que a cibercultura nasce justamente da convergência entre o social e o tecnológico sendo através da inclusão da técnica na socialidade que ela adquire seus contornos mais nítidos Lemos 2002 p 96 A cibercultura que se forma sob os nossos olhos mostra para o melhor ou para o pior é bom que fique claro como as novas tecnologias estão sendo efetivamente utilizadas como ferramentas de convivialidade e de formação comunitária perspectivas essas principalmente em se tratando da tecnologia colocadas à parte pela modernidade ativistas terroristas pedófilos anarquistas ONGs A cibercultura é a socialidade que se apropria da técnica Lemos 2002 p 96 64 A geração dos anos 1990 cresce então como a primeira a estar completamente acostumada com a hipermídia com a realidade virtual e com as redes telemáticas Tal geração não é mais individual e racional Na verdade esses são conceitos que foram postos em xeque há muito mas que a mídia insiste numa tentativa vã de resgatar um sujeito modernista centrado e cristalizado em idealizar Fato é que hoje somos simultâneos McLuhan estéticos presenteístas tribais Maffesoli e simulacros de nós mesmos Baudrillard Em se falando de simulacro é interessante pontuar que para Lemos o discurso de Debord e de sua Sociedade do Espetáculo Debord 1967 está de certa forma ultrapassado pois a cibercultura libertouse das garras de tal conceito Fato é que libertar não é exatamente um termo apropriado visto que para o pesquisador hoje somos fruto puro do espetáculo numa cultura que emerge da simulação do mundo Lemos 2002 p 97 que surge com os media digitais redes telemáticas multimídia interativa e realidade virtual em contraponto a uma sociedade que apenas representaria o mundo através dos meios de massa É a essência do que se discute aqui existem formas sociais que passam a existir então não por influência ou contato com a tecnologia mas precisamente porque a tecnologia se torna vetor de expressão do humano funcionando como alicerce para tais formas Nos transformamos em um meta de nós mesmos ao invés de viver para o espetáculo vivemos imersos numa lógica de manipulação do espetáculo ébrios com o fluxo de informação e com o fato de que a cada dia que passa a informação se torna mais e mais horizontal contrariando pervasivamente o conceito do pensador francês 223 Comunidades Virtuais É nesse panorama que passamos então a nos relacionar no que Hammerz apud Lemos chama de comunidade sem proximidade instituindo um território não físico mas apoiado pelas estratégias de socialidade e por sua relação com a tecnologia Um território simbólico mesmo que tal pertencimento não seja exclusividade de comunidades eletrônicas 65 Segundo Lemos 2002 p 151 a análise de Bolle de Bal 1985 pode nos ajudar a compreender as agregações eletrônicas do ciberespaço Podemos enxergar essa rede de redes a partir da análise da religação reliance e do que o belga chama de tentação comunitária Para ele a comunidade exerce uma sedução e toda a agregação comunitária é efêmera incerta e contraditória paradoxal e sistêmica No entanto a comunidade permite vínculos religações de caráter quase místico Lemos 2002 p 151 Para o sociólogo belga a crise dos valores modernos que permeia os alicerces da cibercultura seria conseqüência de desagregações deliance que ocorreram num nível sóciopsicológico esquizofrenia capitalista sóciotécnico alienação no trabalho sócio econômico desemprego estrutural e ainda ontológico alienação pela sociedade do espetáculo e dos simulacros Lemos acredita ainda que o ciberespaço seja fruto da lógica industrial moderna fonte de deliance e um verdadeiro instrumento de contato reliance Aqui ainda há uma ressalva a ser feita nem toda agregação dentro do ciberespaço se configura necessariamente numa comunidade o ciberespaço potencializa agregações eletrônicas que podem ser estas do tipo comunitário ou não Lemos 2002 p 152 Segundo Bolle de Bal a Contracultura dos anos 1970 expressou um forte desejo de reliance contra a separação individualista pregada pelo modernismo cultura industrial e racionalista A Contracultura se configurou numa estrutura de religação simbólica que se pôs deliberadamente contra a deliance modernista Fazendo um paralelo Lemos afirma que a cibercultura se utiliza da tecnologia telemática para facilitar a busca da reliance que sobrevive ainda no nosso espectro cultural desde os anos 1970 Isso não é difícil de comprovar dadas as várias expressões artísticas que vêm sendo influenciadas pelas idéias da Contracultura Podemos citar o movimento Cyberpunk originado nos Estados Unidos por um grupo de escritores de Ficção Científica e cujas premissas se dissolveram por toda a matriz cibercultural criando premissas que nos são familiares até hoje47 Michel Maffesoli vai no mesmo sentido propor a análise das tribos contemporâneas a partir do que ele chama de rede das redes O ciberespaço encarna bem esta forma social constituindose como uma rede de redes não só de máquinas mas também de pessoas Ele cria uma Matrix comunicacional que potencializa as mais 47 Para mais sobre o assunto ver a obra de Adriana Amaral doutora pela PUCRS e professora da Pós Graduação da Universidade Tuiuti do Paraná 66 variadas formas de agregação comunitárias ou não Como afirma Maffesoli retomando a metáfora simmeliana da ponte e da porta o fato de ser solitário não significa viver isolados A realidade social é formada por adesões sucessivas por cruzamentos múltiplos constituindo a rede das redes como uma estrutura complexa Lemos 2002 p 153 Socialmente a idéia de comunidade é uma invenção dos estudos sociais Lemos 2002 p152 os expoentes de tais estudos partiram de uma perspectiva evolucionista que marcava pontos de passagem da sociedade tradicional comunidade para a sociedade moderna sociedade Neste sentido H Spencer mostrou esta evolução enquanto falava de sociedades de fraca diferenciação e sociedades fortemente diferenciadas E Durkheim por sua vez demonstrou o surgimento de formas orgânicas da sociedade em detrimento das formas mecânicas da comunidade Já no princípio desse século Gabriel de Tarde explicava que comunidades podiam ser formadas mesmo por pessoas separadas sem contato físico Estes agrupamentos formaram um modo de coletividade mental espiritual Lemos 2002 p 153 No entanto vai ser o sociólogo alemão Ferdinand Tönnies Tönnies 1887 que em 1887 propõe a diferenciação entre sociedade e comunidade Para ele a comunidade se agrega em torno de interesses mais tradicionais religião vida doméstica economia da casa necessidades primárias Já a sociedade para Tönnies está fundamentada no conceito da sociedade moderna fundada na cidade no comércio na indústria e na ciência Embora como Lemos Idem afirma estas instâncias não existam em seu estado mais puro na teoria a sociedade moderna atrofiaria as iniciativas comunitárias De fato o que Lemos pretende com todo o discurso sobre comunidades virtuais é deixar claro que nem toda agregação no ciberespaço é necessariamente comunitária pois existem de forma muito extensa agregações comunitárias e contratuais do tipo societário Para o pesquisador a idéia é não falar de comunidades virtuais de um modo geral mas sim atestar o fator agregador do ciberespaço a tecnologia que na modernidade constituiuse socialmente como um instrumento de separação alienação individualismo racionalismo é usada atualmente para constituir e permanentemente destruir a dimensão agregadora Este é um dos paradoxos da cibercultura A tecnologia moderna passa a ser apropriada pela socialidade vetor de reliance Lemos 2002 p 154 67 Robin e Webster apud Santaella 2004 acreditam que o comunitarismo virtual presente nos últimos anos desde que a Internet atingiu a escala econômica global como serviço tem sido uma significante compensação para os efeitos disruptores da globalização econômica Embora seja de fato compensador há que se levar em consideração que de um lado as redes nos dotam com o poder de virtualmente atravessar o planeta de ponta a ponta em frações de segundos de outro lado na medida mesma em que as conexões se multiplicam as comunidades que se criam correm o risco de se tornarem cada vez mais aéreas frágeis e efêmeras Nas palavras de Heim porque nossas máquinas nos dão o poder de esvoaçar pelo universo nossas comunidades crescem em fragilidade volatilidade e efemeridade na medida mesma em que nossas conexões se multiplicam Robin e Webster apud Santaella 2004 p 6 Para Laurel 1990 p 93 comunidades virtuais são as novas e vibrantes aldeias de atividades dentro das culturas mais amplas do computador Elas são compostas basicamente por agrupamentos de pessoas que podem ou não vir a encontraremse presencialmente e que trocam mensagens e idéias através da mediação das redes de computadores O que liga pessoas presentes em comunidades virtuais é basicamente o fator de identificação o que Anthony Giddens chama de desencaixe uma situação sociocultural em que os indivíduos sentemse deslocados fora do eixo da individualidade Lemos 2002 p 154 Isso corresponde a dizer que o espaço físico newtoniano por excelência e em detrimento do nãolugar o qual o ciberespaço tornouse não é mais coercitivo no que diz respeito às interações entre indivíduos Desse modo podese viver em qualquer parte do globo hoje absorvendose a cultura do outro extremo Essa é a essência do desencaixe Vide a quantidade de encontros realizados por jovens brasileiros para celebrar a cultura pop japonesa em todas as suas vertentes o jpop música adolescente nipônica os animes os mangás até mesmo a linguagem representada por símbolos estrangeiros típicos do oriente hiraganas katakanas e kanjis Assim sendo as comunidades virtuais absorvem a essência da socialidade proposta por Maffesoli O ponto de interesse nesses agrupamentos é basicamente a vontade de conhecer outras pessoas que tenham os mesmos interesses que você de modo que uma pessoa pode estar contida em várias comunidades virtuais ao mesmo tempo dependendo 68 somente de seus interesses É o êtreensemble se fazendo visível legitimando subculturas mundo afora as comunidades virtuais designam as novas espécies de associações fluidas e flexíveis de pessoas ligadas através dos fios invisíveis das redes que se cruzam pelos quatro cantos do globo permitindo que os usuários se organizem espontaneamente para discutir para viver papéis para exibirse para contar piadas para procurar companhia ou apenas para olhar como voyeurs os jogos sociais que acontecem nas redes Santaella 2004 p 6 Stone apud Lemos 2002 propõe a idéia de comunidades virtuais em quatro fases a dos textos datando do século XVII a das comunicações elétricas no começo do século XX a fase da informática que começa na década de 1960 e finalmente a do ciberespaço e da realidade virtual que começa teoricamente em 1984 É interessante perceber que a passagem de uma fase para a outra se dá de modo cada vez mais veloz de modo exponencial Desse modo Lemos propõe que o fator virtual de uma comunidade não é dado somente pelo fato de seus membros estarem distantes uns dos outros já que esse fator se faz presente desde o desenvolvimento do método de testemunho virtual de Robert Boyle em 1669 A idéia é simplesmente a da mediação via computador essa sim sendo uma inovação com relação às outras fases Segundo Lemos Godwin propõe nove princípios fundamentais para a coesão das comunidades virtuais se entendermos estas por agregações sociais através de redes telemáticas São eles o uso de software que permita a discussão em grupo a ausência de limitação em trocas de mensagens a possibilidade de acesso para pessoas diversas a possibilidade de deixar que os usuários resolvam seus problemas a promoção de uma memória da comunidade a promoção da continuidade o bom recebimento dos neófitos a promoção de áreas para as crianças e a confrontação dos usuários nas crises da comunidades Para ele no ciberespaço o sentimento comunitário é muito forte Godwin apud Lemos 2002 p 156 Para Lemos então lá onde há comunicação mediada por computadores há efervescência comunal e a criação de comunidades virtuais 2002 p 157 Para Rheingold 69 apud Lemos idem não apenas eu habito minha comunidade virtual Minha comunidade virtual habita também a minha vida Concluindo a tecnologia é dona de um papel essencial no desenvolvimento da cibercultura sendo instrumento de socialidade e de aproximação entre pessoas que não tem contrato entre si o fazem a partir do princípio empático Essa aproximação e a dinâmica estabelecida entre tais comunidades e o meio que as encapsula só nos mostra que a cultura digital não pode em nenhuma hipótese se vista como uma subcultura online única monolítica e sim como um ecossistema de subculturas Rheingold 1993 Santaella acredita que tal ecossistema se configura numa mistura de micro macro e megacomunidades como aquelas constituídas pela America on Line Microsoft Network Geocities e Ezboard abrigando milhares de microcomputadores que vivem em seus interiores usufruindo de todas as facilidades por elas oferecidas Entre essas megacomunidades encontramse hoje as megacomunidades de jogadores em rede Santaella 2004 p 6 E assim retornamos finalmente ao escopo dos jogos eletrônicos De posse de tais teorias podemos finalmente tecer uma aproximação aos MMORPG jogos que não só integram os aspectos do lúdico e da narrativa como previamente explicado mas também encerram em si a dinâmica das comunidades virtuais e os primeiros resquícios de realidade virtual desenvolvida para a massa A partir de agora tentaremos nos aprofundar em tais conceitos levando em consideração como exemplo o jogo Second Life disponibilizado pelos Linden Labs em 2002 e que se tornou uma das comunidades virtuais mais assistidas de todo o globo48 23 Agregações e o Retorno ao Lúdico Os Mundos Virtuais O conceito de mundos virtuais remete diretamente ao apresentado previamente de mundos imaginários embora esteja mais para instância do que para sinônimo Mundos virtuais e mundos imaginários não são a mesma coisa de fato um mundo virtual está contido no conceito de mundos imaginários e não o contrário 48 A Reuters maior agência de notícias do mundo designou um de seus jornalistas para cobrir exclusivamente o diaadia em Second Life É a primeira vez que um mundo virtual repercute de tal forma na mídia 70 Objetivamente um mundo virtual é um ambiente simulado baseado na interação via computador no qual os usuários habitam através de seus avatares Tal habitação geralmente é representada na forma de figuras humanóides que podem ser desenhadas em 2d ou 3d ou outro tipo de avatar gráfico ou às vezes por texto Mundos virtuais são genericamente falando ambientes multiusuários navegáveis espacialmente e via redes mediados por computador Como mais e mais desses mundos virtuais emergem na Internet parece ser pertinente considerálos um fenômeno real e assim estudálos como artefatos culturais que provêem novas formas de experiências estéticas e de entretenimento Klastrup 2003 p 149 Talvez o mais interessante em se tratando de mundos virtuais é o fato de que tais simulações independente de seus papéis nãomiméticos seja mostrandonos mundos fantásticos habitados por criaturas mitológicas ou distopias futuristas impensáveis procuram sempre tomar uma base plausível no mundo real Isso se confirma quando o mundo em questão simulado via computador tipicamente contém elementos claríssimos que remetem ao mundo real como regras reais gravidade topografia locomoção ação em tempo real e comunicação Tal comunicação até bem pouco tempo era realizada exclusivamente via texto Este panorama contudo parece estar mudando Várias empresas responsáveis pela manutenção dos mais variados mundos virtuais disponíveis na Internet tais como EverQuest The Sims Online Second Life World of Warcraft Ultima Online entre outros testam no breve momento em que este trabalho é escrito maiojunho de 2007 tecnologias de comunicação em tempo real utilizandose de um dos serviços de maior impacto na rede nos últimos anos a tecnologia de Voice IP50 Tal fato promete revolucionar os nãomenos revolucionários ambientes de interação e simulação onde os jogadores às vezes caçam monstros inimagináveis às vezes vivem calmamente sua segunda vida 49 Tradução livre Virtual worlds are generally speaking computermediated networked and spatially navigable multiuser environments As more and more of these virtual worlds emerge on the internet it seems pertinent to address them as phenomena in their own right and to study them as cultural artefacts which provide new forms of aesthetic experience and entertainment 50 Voz sobre IP também chamado VoIP telefonia IP telefonia Internet telefonia em banda larga e voz sobre banda larga é o roteamento de conversação humana usando a Internet ou qualquer outra rede de computadores baseada no Protocolo de Internet tornando a transmissão de voz mais um dos serviços suportados pela rede de dados 71 Culturalmente os primeiros mundos virtuais não eram exatamente jogos É senso comum que os primeiros mundos virtuais presentes na Internet eram compostos basicamente por comunidades nos tempos das BBSs Bulletin Board Systems e salas de Chat em softwares como o mIRC ou em páginas avulsas rede afora Essa referência nos leva diretamente de volta ao conceito dos MUDs que embora não fossem ambientes gráficos coloridos e bem construídos como os mundos virtuais de hoje em dia eram certamente fruto do trabalho árduo de construção da realidade via texto É então facilmente conjecturável que quanto mais a alta tecnologia se expande51 e principalmente quanto mais as interfaces dos mundos virtuais se tornam amigáveis e facilmente navegáveis devemos esperar a cada dia um número maior de pessoas utilizando tais serviços Isso constitui um marco na história das comunidades virtuais e da própria rede em si Quando mais e mais pessoas ganham acesso barato à World Wide Web e os serviços se tornam mais e mais fáceis de serem usados devemos então esperar um crescimento massivo no número de pessoas usando esses mundos eles não são mais um fenômeno cultural marginal mas estão às portas de fazer parte do diaadia de muitos habitantes do século XXI Klastrup 2003 P 152 A pesquisadora dinamarquesa então manifesta uma preocupação legítima se vamos estudar tais fenômenos é justo então que tenhamos um jargão adequado um modo legítimo de incluílos num debate que cresce a cada dia o debate sobre os vários tipos de cibertextos O debate sobre jogos já existe já está delineado O debate sobre mundos virtuais como híbridos claramente baseados na dinâmica dos jogos eletrônicos e das comunidades ou agregações como Lemos sugere virtuais ainda não está completamente estabelecido em contraparte Klastrup 2003 acredita que os estudos prévios em cima de tais mundos têm se aproximado por uma mera perspectiva singular ou como i espaços sociais comunidades virtuais ou comunidades voltadas para a comunicação ii ambientes virtuais que incorporam novos desafios de design referindose à interação entre homem e computador 51 Sendo hoje teoricamente acessível a qualquer um excetuandose os problemas de inclusão digital não encerrados sob escopo deste trabalho 52 Tradução livre As more and more people gain cheap access to the world wide web and services become easier to use we should hence expect a massive growth in the number of people using these worlds they are no longer marginal cultural phenomena but are about to enter the scene of the everyday life of many inhabitants of the 21st century 72 iii novas formas de jogo ou iv ambientes para interpretação Assim a idéia da autora seria a de entender que tais mundos virtuais são híbridos e devem ser tratados como tais A dinamarquesa Lisbeth Klastrup se preocupa principalmente com a criação da experiência e a experiência presencial num mundo virtual Baseandose em questões como Como você descreveria a experiência de estar lá ou a experiência de habitar o mundo virtual O que cria essa experiência e Como podemos interpretar o que acontece quando você está lá dentro ela tenta então desenvolver uma poética dos mundos virtuais alicerçando tal teoria na definição de tais ambientes e no fator que define a mundanidade worldness de tal mundo Para entender as formas e leis que compõem um mundo virtual ao invés de olhar para os mundos virtuais simplesmente como espaços sociais ou jogos precisamos entendêlos como híbridos que possuem os elementos de ambas as estruturas Mais para entender totalmente os processos complexos contidos na criação da experiência eu acredito que precisamos unir o conhecimento de atuação online narrativas interativas e trabalhos cibertextuais na análise também Todos esses elementos juntos criam o sentimento de worldness e nos habilitam a sentirnos envolvidos talvez até imersos em um mundo virtual Klastrup 2003 p 1 53 Contudo o que Klastrup chama de worldness e como isso se relaciona com uma potencial poética que ela deixa claro não se configura como uma poética aristotélica clara mas sim com um tratado teórico sobre estética p 1 ainda são fatores que permanecem um tanto obscuros Podese ver entretanto que a autora opta por uma abordagem mais aberta que entende os mundos virtuais não simplesmente como jogos ou como comunidades virtuais mas como foi dito antes como ambientes híbridos que carregam dentro de si características que são específicas a ambos isoladamente mas que não configuram interseções necessariamente Sobre a questão da poética para RimmonKenan 1983 apud Klastrup 2003 Poética é o estudo sistemático da literatura como literatura Ela lida com a questão O que é literatura e com todas as possíveis questões desenvolvidas disso tais como O que é arte na linguagem Quais são as formas e tipos de literatura Qual a natureza de um gênero literário Qual é o sistema de uma arte ou linguagem 53 Tradução livre In order to understand these laws instead of just looking at virtual worlds as social spaces or games we need to understand them as hybrids which have elements of both structures Furthermore to fully understand the complex processes at work in creating experience I argue that we need to encompass knowledge of online performing and of interactive storytelling and cybertextual works in an analysis too All these elements together create the feeling of worldness and enable us to feel involved with maybe even immersed in a virtual world 73 particular de um poeta Como a história é feita Quais são os aspectos específicos dos trabalhos de literatura Como eles se constituem Como textos literários incorporam fenômenos não literários54 Partindo daí Klastrup argumenta que o fato central não é que os mundos virtuais sejam literatura ou arte melhor ela simplesmente substitui literatura por mundos virtuais e poeta por desenvolvedor fazendo emergir assim o conteúdo de uma possível poética dos mundos virtuais A afirmativa feitas as modificações diz que Uma poética dos mundos virtuais lida com o estudo sistemático da de mundos virtuais como mundos virtuais Ela lida com a questão O que é um mundo virtual e com todas as possíveis questões desenvolvidas disso tais como Como um mundo virtual é uma forma estética de expressão Quais são as formas e tipos de mundos virtuais Qual a natureza de um gênero de mundo Qual é o sistema de uma arte ou meio de expressão particular de um desenvolvedor Como a história é construída Quais são os aspectos específicos das instâncias dos mundos virtuais Como eles se constituem Como mundos virtuais incorporam fenômenos não ficcionais Klastrup 2003 p 255 Ela aponta que uma definição interessante de mundo virtual se encontra no fato de que via simulação em detrimento de narrativa como foi discutido antes o mundo virtual é uma nova forma de texto cultural que é caracterizada pelo fato de que tal texto é lido usado acessado por vários usuários ao mesmo tempo Daí desde que os contínuos trabalhos definiram necessariamente a literariedade de um texto parece ser lógico nesse caso traduzir tal fator em mundanidade worldness ou seja procurar o que faz de cada mundo virtual um mundo virtual Tal conceito é aplicado em dois níveis i como aspecto essencial de todo mundo virtual como mundo virtual ou seja como propriedade estrutural ontológica e ii como definindo as características de um mundo virtual em específico uma propriedade emergente percebida e experimentada por usuários do mundo 54 Tradução livre Poetics is the systematic study of literature as literature It deals with the question What is literature and with all possible questions developed from it such as What is art in language What are the forms and kinds of literature What is the nature of one literary genre or trend What is the system of a particular poetsart or language How is a story made What are the specific aspects of works of literature How are they constituted How do literary texts embody nonliterary phenomena 55 Tradução livre A poetics of virtual worlds deals with the systematic study of virtual worlds as virtual worlds It deals with the question What is a virtual world and with all possible questions derived from it such as How is a virtual world an aesthetic form of expression What are the forms and kinds of virtual worlds What is the nature of one world genre or trend What is the system of a particular developers art and means of expression How is a story constructed What are the specific aspects of instances of virtual worlds How are they constituted How do virtual worlds embody nonfictional phenomena 74 Dadas todas as especificidades Klastrup 2003 p 3 propõe que uma definição completa de mundos virtuais precisa conter os seguintes prérequisitos i descrever os vários gêneros de mundos virtuais tanto mundos sociais quanto jogos ii descrever o que distingue mundos virtuais de ambientes virtuais nãopermanentes ou de acesso restrito e comunidades virtuais que se focam primariamente na interação social enfatizando ambos os aspectos de interação usuáriousuário e usuáriomundo iii descrever o que distingue tais mundos virtuais de outros tipos de mundos imaginários como novelas ou filmes que não são ambientes habitáveis e por fim iv enfatizar o fato de que o mundo virtual é um mundo compartilhado por múltiplos usuários comunicação síncrona e que por isso os outros usuários também são produtores do mesmo Temos proveniente das premissas citadas a definição tecida pela autora Um mundo virtual é uma representação online persistente que contém a possibilidade de interação síncrona entre usuários e entre o usuário e mundo dentro das regras de espaço desenvolvidas como um universo navegável Mundos Virtuais são mundo nos quais você pode se mover através de representações persistentes do usuário contrastando com mundos representados tradicionais de ficção que são mundos apresentados como habitados por pessoas reais mas que não são exatamente habitáveis Klastrup 2003 p 256 Sendo assim para um exemplo rápido de acordo com a definição salas de Chat não seriam consideradas mundos virtuais porque elas não se estendem espacialmente e não é permitido aos usuários interagir com o mundo em si Sendo assim jogos eletrônicos de primeirapessoa como Counter Strike Valve Software 1999 também não o são porque seus personagens não são persistentes são efêmeros Para completar Klastrup 2003 p 3 discursa sobre como o mundo virtual ou sistema no caso influencia as experiências de seus usuários ou jogadores A autora detecta por fim quatro aspectos diferentes que estão intimamente ligados à experiência do mundo como ficção como espaço de interpretação e diversão como jogo e finalmente como comunidade 56 Tradução livre A virtual world is a persistent online representation which contains the possibility of synchronous interaction between users and between user and world within the framework of a space designed as a navigable universe Virtual worlds are worlds you can move in through persistent representations of the user in contrast to the represented worlds of traditional fictions which are worlds presented as inhabited by real people but not actually inhabitable 75 A idéia é mapear que funções estão presentes no mundo virtual e que criam respectivamente numa sinergia a idéia de mundanidade Como estrutura interpretativa ou seja como espaço ficcional podemos dizer que o que fazemos dentro do mundo virtual não necessariamente reflete em ações físicas no mundo real Nosso avatar realiza tarefas que consideramos que nós mesmos realizamos quando matamos um dragão em um mundo virtual qualquer nos referimos ao ato como eu matei um dragão hoje e não como passei a tarde clicando repetidamente um punhado de pixels coloridos Esse sentimento segundo Klastrup é que permite que os usuários compartilhem um senso de conhecimento compartilhando lendas cosmologias e histórias do mundo virtual que são fictícias mas que precisaram da interação dos jogadores usuários para que acontecessem Depois como espaço de interpretação e diversão podemos considerar que o mundo virtual ou seja o sistema que roda continuamente nos servidores provendo regras as quais os programas clientes os usuários no caso precisam respeitar para coexistir lá dentro é meramente um apoio como o que os especialistas em cenários usam para construir o espaço dentro do qual os atores vão representar a história contida no roteiro gerando assim o bem simbólico Quando interagindo com esse apoio nós fingimos ser alguém diferente estando em algum lugar diferente fazendo alguma coisa que nos tira definitivamente da nossa rotina Aqui fica clara a verdadeira experiência de imersão vinda dos RolePlaying Games por meio da estrutura do mundo como apoio nosso personagem nós fazemos a diferença e não nos identificamos com o personagem principal de uma obra narrativa como com o menino Harry Potter em seus livros ou filmes Num mundo virtual qualquer um pode ser seu próprio Harry Potter possibilidades se abrem e a dinâmica subcultural que foi falada anteriormente vai adquirir corpo tanto do lado de fora onde os jogadores se encontram para discutir o que cada um de seus avatares fez como dentro do mundo onde o personagem pode fazer parte de uma guilda de ladrões ou de uma igreja devota de um deus qualquer e interagir com outros personagens com interesses semelhantes sem sequer conhecer os jogadores por trás dos mapas de bits que são os avatares Para Klastrup 2003 p 4 essa experiência de interpretação de atuação consciente remete diretamente à idéia da paidea de brincadeira sem fins maiores à medida que a 76 noção de ludus é coberta por outra instância do mundo virtual a interação com o sistema com as regras externas do jogo que governam posses e a dinâmica da recompensa Enfim existem dois tipos de interação com as regras aqui onde uma delas determina necessariamente como se ganha ou perde dentro do sistema de jogo existem regras que são inerentes ao ambiente e que às vezes não se percebe Ao passo de que às vezes um jogador experimenta o desejo de burlar uma regra de evolução editando seu personagem através de programas chamados de cheaters trapaceiros existem regras que não podem ser burladas desse modo transporte gravidade física em geral Esses elementos definem propriamente o ambiente do jogo como simulação Já que o assunto foi levantado claro na experiência do mundo como jogo o cunho teórico se dissocia um tanto do que já foi falado Ora em mundos virtuais como a própria Klastrup diz os personagens avatares dos jogadores são necessariamente perenes Eles existem no sistema como nós existimos na sociedade eles criam sua própria sociedade Desse modo como descrever a estratégia de ludus presente em tais jogos Tal estratégia está em duas formações básicas de regras para personagens a primeira mostra que o personagem pode evoluir A evolução mostra que de certa forma existe a vitória Seja ganhando dinheiro portando armas mágicas ou evoluindo a um nível muito alto a corrida é sempre para o mais Isso às vezes trava o jogador numa dinâmica de repetição que se associa em muito na descrita por Alves 2005 p 2325 A outra formação está contida no que os jogadores conhecem por quests missões Além da dinâmica de enriquecer ou de ganhar experiência por matar monstros muito comuns em mundos virtuais que reproduzem os mundos imaginários da fantasia medieval a dinâmica das quests premia pela realização de um ato glorioso Então não adianta se o jogador sucede na tarefa de matar o dragão que prende a princesa se ele não abrir a jaula que prende a donzela e escoltála de volta à sala do trono de seu pai o rei Dentro dessas estruturas detectase facilmente como tal sistema guarda a essência do lúdico mas não a posiciona em nenhum lugar superior a todos as outras Talvez o sucesso de um mundo virtual venha justamente do modo como tais características são encadeadas Por último é indissociável o fato de que o mundo virtual provê não só um palco para personagens mas também o faz para suas contrapartes orgânicas Viver num mundo 77 virtual durante muito tempo desperta no jogador o sentimento de pertença que é compartilhado por todo o espectro de usuários regulares Tendo vivido em um mundo por tanto tempo que você teve experiências significantes ou experimentou mudanças significantes que você compartilhou ou quer compartilhar com outros jogadores também familiares com o mundo sua história do mundo como lugar para viver pode retrospectivamente se tornar uma história interessante para se contar Mais que isso ela parece estar fortemente relacionada com a experiência de um espaço social por exemplo em MMGs uma guilda ou clã formada dentro e fora do mundo virtual com um interesse comum então ela pode ser facilmente uma história de inclusão em ou exclusão de menores ou maiores redes de relacionamento Klastrup 2003 p 457 231 Cyborgs de Carne e Software Os Avatares Muito tem sido falado sobre o avatar como representação gráfica do ser humano em sistemas de imersão jogos eletrônicos comunidades virtuais softwares comunicacionais mas sua figura continua ainda sendo estudada com um tanto de timidez Já o conceito de ciborgue mito que condensa a fusão do homem e da máquina por sua vez tem sido mastigado regurgitado e mastigado novamente numa leitura bricolagem e releitura de conceitos que vai desde a dicotomia clássica de Descartes até as afirmações ciberfeministas de Donna Haraway e além Ambas as manifestações tanto o ciborgue quanto o avatar denotam a preocupação com o corpo humano e nos dão pistas de como o corpo passa a se portar no advento da cultura digital em uma época em que a descorporificação ou seja a separação definitiva entre mente e corpo onde o sujeito mergulharia no ciberespaço é um sonho relativamente próximo A ficção científica em especial a ficção científica cyberpunk tratou exaustivamente do assunto desde uma ponta a da total descorporificação onde o sujeito seria extraído de sua casca orgânica e depositado como dado na vastidão do 57 Tradução livre Having lived in the world for so long that you have had significant experiences or experienced significant changes you have shared or want to share with other players also familiar with the world your story of the world as lived can retrospectively become a compelling story to be told Furthermore it also seems closely related to the experience of the emergence of a social space for instance in massive multiplayer games a guild or an in or outofworld community founded on a common interest so it could easily also be a story of inclusion into or exclusion from smaller or larger social networks 78 ciberespaço58 até a simples existência nos dois mundos numa negociação entre humano e máquina onde a tecnologia que em muitas distopias é vista como vilã seria simplesmente uma ferramenta comunicacional superior59 E foi exatamente das páginas da ficção científica que surgiu assim como o termo ciberespaço cunhado por Gibson em Neuromancer 1984 o termo avatar como ele é usado hoje no contexto das redes telemáticas Neal Stephenson em um dos livros mais aclamados do movimento seu Snow Crash de 1992 foi o primeiro a usar a palavra como a idéia de representação humana no ciberespaço O termo provém da filosofia hinduísta onde o termo avatar ou avatara como também pode ser escrito se refere a uma manifestação corporal encarnação de um ser superior um deva um tipo de anjo ou do ser supremo Deus no planeta terra A palavra em sânscrito अवतर ou avatāra literalmente significa descida no sentido de que um avatar é sempre a manifestação de um ser evoluído em um plano inferior O termo é utilizado principalmente para referenciar as encarnações de Vishnu a quem muitos hindus reverenciam como Deus Duas outras divindades que os hindus acreditam que também se manifestam na forma de avatar são Shiva e Ganesh No mundo da cultura digital o avatar é a representação de um usuário da Rede tanto em um modelo tridimensional utilizado geralmente em jogos uma figura bidimensional comumente conhecida como ícone usada geralmente em fóruns na Internet e em outros tipos de sites de relacionamento ou finalmente como um simples construto de texto como encontrado em MUDs e ambientes de Internet Relay Chat o conhecido IRC Stephenson popularizou o termo em seu romance no qual o termo avatar foi usado para descrever a simulação da forma humana em um ambiente virtual que o autor chama de Metaverso uma versão da Internet em realidade virtual60 Segundo o autor o status social dentro do metaverso seria medido pelo nível de detalhismo e pela qualidade do avatar pertencente ao usuário Um avatar melhor com mais níveis de detalhes contudo não seria obra somente do poder financeiro mas sim da perícia técnica programadores e hackers teriam alguns dos melhores avatares enquanto um novato compraria um modelo genérico 58 Vide Gibson William Neuromancer São Paulo Aleph 2004 59 Vide Gibson William Idoru São Paulo Conrad 1999 60 Um mundo virtual gerado por computador onde teoricamente a experiência de imersão é perfeita Para mais sobre Realidade Virtual ver Lemos 2002 e Domingues 2006 79 Daí a palavra passou a significar o modo como o usuário é representado em inúmeros sistemas fóruns IRC blogs chats na Internet e em programas de Instant Message IMs como o MSN Messenger ou o Google Talk passou a ser usada também na indústria dos jogos onde representa a figura com a qual o usuário interage com o sistema A partir daí podemos entender que avatares não são exclusivos dos mundos virtuais eles permeiam toda a gama da Internet onde quer que haja interação entre o sistema e o usuário eles vão estar No quesito jogos eletrônicos geralmente os avatares são constituídos por uma representação física e imutável como o personagem Mário na série Mario Brothers do Nintendo ou a exploradora inglesa Lara Croft na série Tomb Raider Jogos modernos contudo oferecem opções de customização para tais personagens No jogo Grand Theft Auto Carl Johnson o personagem principalavatar tem direito a vários modelos de roupas vários cortes de cabelo tatuagens e até mesmo a ficar gordo dependendo das interações do jogador para com o sistema Entretanto a personalidade de um desses personagens é melhor descoberta em seqüências onde os game designers transformam o ambiente de simulação num ambiente narrativo clássico você é convidado a assistir eventos que na maioria das vezes tem alguma importância vital para com a trama do jogo Os MMORPG são a fonte dos mais variados e sofisticados avatares encontrados na Internet Os níveis de personalização contudo diferem de jogo para jogo obedecendo principalmente o cenário escolhido para a ambientação narrativa O que nos interessa contudo são os avatares usados em metaversos desenvolvidos sem a dinâmica do ludus ambientes que implementam simplesmente as regras de convivência e que embora se utilizem das técnicas que os game designers utilizam para construir jogos avançados são mais parecidos com softwares de incentivo às comunidades virtuais softwares para relacionamento se fizermos um paralelo com alguns sites bastante conhecidos da massa em especial no Brasil como é o caso do Orkut httpwwworkutcom A idéia de usabilidade de tais avatares em ambientes desenvolvidos sem a estrutura de jogo depende de muitas variáveis O propósito de tais universos é meramente prover um aumento na qualidade das capacidades de conversação online além de permitir que o 80 usuário explore grande parte do mundo virtual sem que ele precise se debruçar sobre um objetivo prédefinido Damer 1997 Um dos critérios de qualidade da usabilidade do avatar em tais ambientes depende simplesmente da faixa etária ocupada por seu usuário Usuários mais jovens tendem a explorar as opções de diversão e entretenimento principalmente interessados em manter a característica do anonimato oferecida por tal estratégia de programação Enquanto isso usuários mais velhos estão mais interessados na forma como o avatar pode refletir sua própria aparência identidade e personalidade Adicionalmente a maioria de usuários mais velhos quer poder usar eventuais funcionalidades expressivas que venham a estar presentes no avatar como a demonstração de emoções Sobre isso cientistas sociais do Stanfords Virtual Human Interaction Lab Laboratório de Interação Humana Virtual de Stanford estão examinando as implicações possibilidades e interações sociais entre pessoas que interagem através de avatares Então tais mundos virtuais obedecem em linhas gerais a essa dinâmica sua população varia de acordo com as funcionalidades que são oferecidas no desenvolvimento de cada mundo Habbo Hotel httpenwikipediaorgwikiHabboHotel e Webkinz httpenwikipediaorgwikiWebkinz são visitados geralmente pela faixa etária de 10 a 15 enquanto gaiaonline httpenwikipediaorgwikiGaiaonline de 13 a 18 Em contraste a isso There httpenwikipediaorgwikiThereinternetservice e Kaneva httpenwikipediaorgwikiKanevaGamePlatform possuem uma faixa etária alvo que vai desde os 22 aos 49 Os avatares programados nos dois últimos exemplos tratam de forma bem mais profissional a questão da exposição de sentimentos eles permitem que os usuários riam dêem tchau soltem beijos e até reproduzam gestos rudes Outro exemplo interessante é The Palace httpenwikipediaorgwikiThePalacecomputerprogram onde os usuários podem usar suas próprias imagens como avatar um diferencial bastante apreciado pelo público mais velho Novamente nos três casos citados a população de tais mundos virtuais parece ser determinada pelo modo como seus avatares são implementados Contudo isso não é completamente verdade em se tratando de Second Life httpenwikipediaorgwikiSecondLife onde os avatares vão desde quasehumanos a robôs passando por animais criaturas míticas e avatares criados por jogadores qualquer coisa virtualmente pode virar um avatar O servidor principal do mundo virtual está aberto 81 só para adultos e a participação é regida por uma interação social artística e comercial basicamente Contudo é exatamente isso que desejamos discutir como tais avatares imagens que vão desde o plausível ao mais grotesco podem exercer uma função persuasiva argumentativa aos olhos dos espectadores O modo como um usuário se apresenta na Rede mais especificamente dentro do metaverso de Second Life influencia de alguma maneira as ações ou pessoas que eventualmente venham a estar ao seu redor Seria válido então falar sobre a presença inerente de uma retórica na figura do avatar do mundo virtual Second Life Tais questões serão esclarecidas no próximo capítulo após uma breve explanação sobre esse mundo virtual que vem continuamente conquistando adeptos e que em menos de um ano conquistou mais usuários do que todos os seus concorrentes juntos 232 PósVida Second Life Second Life abreviado comumente pela mídia e por seus jogadores por SL é um mundo virtual acessível via Internet que chamou a atenção do mundo quando em meados de 2006 foi exposto aos quatro ventos pelos veículos de comunicação de massa movidos principalmente pelas características e peculiaridades do software Desenvolvido pelo Laboratório Linden Linden Labs httpwwwlindenlabscom um programacliente que pode ser baixado do site da empresa capacita os usuários que dentro do sistema recebem o nome de Residentes a interagirem entre si através de avatares criando então um nível avançado de serviço de comunidades virtuais Talvez o fato máximo pelo qual milhões de usuários migraram para dentro dos bits e bytes que constroem SL seja o fato de que as características comuns às comunidades virtuais aqui são combinadas com os aspectos gerais e específicos de um Metaverso um universo criado a partir de um modelo o nosso no caso mas onde algumas leis acabam por serem diferentes A dinâmica do jogo permite que Residentes explorem o mundo conheçam outros Residentes socializemse participem de atividades de grupo criem e negociem itens chamados de propriedade virtual e serviços em geral entre si Second Life é apenas um de muitos mundos virtuais que foram inspirados pelo Movimento Cyberpunk da ficção científica e que posteriormente se espalhou por todo o 82 imaginário da cibercultura Particularmente SL foi inspirado pelo romance Snow Crash do americano Neal Stephenson lançado em 1992 A idéia dos Linden Labs é exatamente criar através da tecnologia de modelagem 3D um metaverso que seja parecido com o descrito por Stephenson no livro um mundo de uso geral criado por usuários no qual as pessoas possam interagir jogar fazer negócios e se comunicar Às vezes referenciado pela mídia e por usuários como jogo Second Life não possui características básicas encontradas em outros MMORPGs como pontos de atributo placar vencedores ou perdedores Sua dinâmica remete muito mais às comunidades virtuais e ao fato de que o objetivo não propriamente existe além de potencializar a socialidade inerente a cada um O software não existe uma divisão de personagens por níveis de poder e não possui nenhuma estratégia Ainda assim o modo como os jogadores interagem com a interface relembra muito uma série de outros jogos espalhados pelo mercado como The Sims Heretic ou outros com o mesmo esquema de visualização O fator impressionante em Second Life é que em pouco mais de quatro anos de existência factual a versão beta só foi à público em 2003 mesmo que as pesquisas já mostrassem um sistema estável funcionando em meados de 2002 o sistema registrou a criação de mais de cinco milhões de contas embora muitas estejam inativas e alguns Residentes tenham mais de uma conta Second Life foi lançado por um exempregado da RealNetworks fabricante do Real Player Philip Rosedale através dos Linden Labs A primeira versão alfa61 chamada de LindenWorld foi disponibilizada em 2002 só para Residentes com experiência em criação de conteúdo enquanto a versão beta só foi disponibilizada publicamente em 2003 Essas primeiras versões tinham focos diferentes no que diz respeito à economia da versão atual de SL os Linden Dollars eram obtidos mais facilmente não podiam ser trocados por dólares reais e a taxa de residência um tipo de IPTU não subia não importando quantos imóveis o Residente tivesse 61 Dizer que uma versão é Alfa significa que ela está estável e pronta para ir à público não é mais um protótipo 83 Fig 1 Gráfico de Registro de Novas Contas em Second Life É importante introduzir esse assunto porque uma das coisas que mais chama atenção em Second Life é justamente o fato de que os Linden Labs mantêm ativo um câmbio que equilibra o mundo virtual e o mundo real dando a este simulacro uma sensação de realidade que poucos até então tinham conseguido Com um dólar americano podese comprar em média duzentas e setenta unidades da moeda local o Linden Dollar Isso muda completamente toda a dinâmica à qual os jogadores de outros MMORPGs estiveram acostumados durante esses anos de existência e desenvolvimento da tecnologia em jogos como World of Warcraft da Blizzard para ter acesso a digamos a uma arma mágica o jogador precisava passar horas e horas debruçado sobre o computador tratando de seu personagem trabalhando minerando polindo fazendo serviço de carpintaria etc procurando monstros que ele pudesse matar e que dessem experiência suficiente para que ele pudesse ir atrás de monstros mais poderosos que davam mais experiência e tinham um tesouro maior para ser confiscado numa lembrança da lógica da repetição da qual Alves 84 2005 fala além de se socializar com outros jogadores para que estes pudessem ajudálo em suas empreitadas SL por sua vez não guarda muito dessa dinâmica não existem monstros para serem mortos não existem armas mágicas que valem muito e você não sente a evolução como recompensa direta de seu esforço em treinar o personagem avatar em uma atividade ou outra O trabalho no caso continua lá Para ter acesso a gráficos mais sofisticados o avatar precisa ter em sua conta virtual Linden Dollars para que possa comprar objetos que podem ser servidos pelos Linden Labs que acredito seria uma versão esdrúxula do Estado ou por outros usuários que provêm serviços Fator que está inclusive deixando autoridades mundiais muito preocupadas pessoas atualmente fazem dinheiro simplesmente sentando na frente do computador e interagindo com outras que teoricamente lhe pagam por bits A dúvida é como introduzir um imposto sobre estes serviços 2321 Economia de Second Life O básico da economia do mundo virtual Second Life é de que Residentes ou seja usuários em se opondo aos Linden Labs possam comprar e vender itens e serviços uns dos outros sem a necessidade de intermédio ou seja através de um mercado livre Tais serviços incluem ajuda em construção gerenciamento de negócios entretenimento e outros serviços pessoais Itens propriedades virtuais incluem imóveis veículos dispositivos de todos os tipos animações e trabalhos de arte Teoricamente para se fazer dinheiro em SL tudo que alguém tem que fazer é encontrar alguém que realmente deseje pagar por um serviço que está sendo oferecido essa foi a lógica criada por Mitch Kapor um dos mentores do jogo e quem visualizou a lógica da propriedade intelectual virtual Teoricamente tudo é customizável e uma das atrações do mundo é que o próprio Residente pode transferir seus arquivos locais fazer um upload para o mundo virtual personalizando seu próprio avatar Não é surpresa então perceber que algumas das pessoas mais interessadas em ganhar Linden Dollars são designers trabalhando com todos os tipos de materiais possíveis modelagem 3D pintura digital e desenho manual ou digital Tais perícias cobrem boa parte das necessidades de bens materiais dentro do jogo roupas 85 carros casas móveis e toda a sorte de bugiganga modelável Animações préfabricadas também são um serviço bastante procurado dentro do ambiente modos de deixar seu avatar mais sofisticado dando a ele algo que outros ao redor não tem Um fator muito interessante dentro de Second Life é a existência de Ilhas lotes de terra virtual onde um usuário pode construir uma casa um estabelecimento comercial ou o que quer que ele queira Curioso é que por estarmos lidando com o escopo virtual espaço é algo que não falta realmente Mesmo assim a especulação imobiliária é uma prática extremamente comum e segundo dados providos pela Revista Época Na matéria A Segunda Vida da Internet publicada na edição de 19 de Março de 2007 existem Residentes que fizeram verdadeiras fortunas aderindo à prática do comércio imobiliário A única coisa que não está exatamente clara ainda é como essas fortunas se constituem Para que o jogo pudesse realmente tornarse um sucesso os Linden Labs além de permitirem que os Linden Dollars fossem comprados ainda instituíram que alguém que ganhasse seus dólares virtuais poderia trocálos por dólares reais tanto nos câmbios oficiais do Linden Labs como em outros câmbios terceirizados Isso gerou expectativa sem limites dentro do mundo virtual de fato é possível fazer alguns trocados simplesmente sentando em frente ao computador Foi dessa forma que a alemã Ailin Graef de 32 anos construiu um patrimônio real de mais de um milhão de dólares com especulação imobiliária e mais tarde com escritórios de arquitetura Hoje sua empresa a Anshe Chung Studios emprega 30 pessoas reais para construir e vender imóveis no mundo virtual Segundo os próprios Linden Labs cerca de dezessete mil pessoas mantém um caixa positivo nas contas de seus avatares 450 deles lucram em média U 1000 por mês Isso legitima as críticas feitas por alguns usuários de que o sistema econômico dos Linden Labs é o tradicional esquema da pirâmide onde pequenas quantidades de avatares fariam muito dinheiro se utilizando da massa Mesmo em se comparando o fato de qualquer um poder fazer uma conversão entre Linden Dollars e moeda real são somas minúsculas em se comparando com o que os donos de cassinos virtuais e empreiteiros têm em suas contas 86 2322 Uma nova forma de estar junto Talvez o fator mais impressionante com relação a Second Life seja o fato de que pessoas continuam dia após dia se registrando e tentando aprender a como conviver numa segunda vida Talvez pelo sonho da descorporificação pelo sonho de abandonar o invólucro orgânico e atravessar as fronteiras inexistentes até onde sabemos do ciberespaço talvez simplesmente porque o ciberespaço através de Second Life hoje através de outras tecnologias posteriormente ofereça uma liberdade diferente de livros filmes séries e do ópio televisivo experimentado nos dias de hoje A imersão completa ainda é uma fábula mas uma que não nos cansamos de perseguir em nenhum ponto de nossos imaginários Tal fábula embora ainda deficiente de aspectos tecnológicos que a suportem já molda de certa forma o modo como convivemos como nos relacionamos Podese dizer que Second Life favorece a criação de um ethos absolutamente novo que não produz sentido através da dinâmica da representação mas da dinâmica da vivência não vemos os fatos acontecerem a personagens Não nos identificamos com o que a tela oferece Isso acontece porque não precisamos nos identificar com mais ninguém Somos nós mesmos que estamos ali na tela Nosso modo de vestir nosso gosto pra roupas pra cabelos pra comida e bebidas que embora não sejam necessárias no mundo virtual de Second Life por impressionante que seja são bens procurados como forma de lazer pura A verdade é que restaurantes e bares ainda são pontos de socialização onde você facilmente conhece novas pessoas no mundo real ou no virtual as coisas acontecem seguindo o mesmo código de etiqueta ou netiqueta se for o caso Nesse caso não é como se a socialidade se apropriasse da tecnologia numa criação de um novo modo cultural e principalmente não é como se fôssemos simplesmente uma sociedade alicerçada no consumo e no espetáculo Esses conceitos podem ser muito eficazes para descrever a dinâmica do mundo real mas quando se fala de mundo virtual a história é outra As Ciências Humanas enfrentam nesse sentido uma pesada luta contra o isolamento a nossa sociedade é mais tecnológica do que nunca Para que o cientista consiga abarcar a carga teóricofenomenológica que advém de tais comportamentos como 87 o de se logar diariamente e perder duas ou três horas de sua vida em frente a um mundo que sequer existe ele precisa em primeiro lugar estar familiarizado com a utilização com os códigos que se criam com a socialidade que se desenvolve no novo mundo que não é a mesma socialidade que se desenvolve num bar ou numa festa ou tão pouco a que se desenvolve através da apropriação da tecnologia por uma forma cultural O pesquisador precisa entender para entender a lógica social que se desenvolve em um ambiente tal qual Second Life que o suporte físico o hardware necessário para que o sistema seja executado é absolutamente transparente para o jogador habituado Ele não considera que está sentado na frente do computador considera que está numa boate em um não lugar dançando com amigos conhecendo novas pessoas O que se desenvolve entre essas pessoas é inédito pois é um tipo sem precedentes de simulação que procura deixar o jogador o mais confortável possível tentando se utilizar o mínimo possível de metalinguagem pois ela avisa alerta o usuário para o fato de ele precisar de um suporte físico tecnológico É aí que devemos nos concentrar não tentamos aqui dar opiniões conclusivas mas simplesmente incitar uma discussão que precisa ir para um novo nível de abstração Second Life não tem uma história para ser contada é uma comunidade vivendo como qualquer outra e o que virá a ser contado é resultado das aventuras do diaadia Como numa ficção onde quando vai dormir o personagem acorda numa outra terra onde ele é uma outra pessoa ou onde ele é ele mesmo não importa quem ele é e sim o que está ao seu redor Second Life não nos oferece uma nova diversão eletrônica como minigames62 videogames ou filmes no cinema ou na TV em última instância o ambiente desenvolvido pelos Linden Labs nos dá exatamente o suporte para uma segunda vida O fato de ela ser mediada via computador para os que lá no mundo virtual habitam não é o importante E sim o fato de lá estarem Juntos 62 Mini videogames portáteis desenvolvidos nos anos 1980 e comercializados a preços baixíssimos pelo fato de serem praticamente descartáveis Contudo há versões mais sofisticadas como o Game Boy da Nintendo que tem cores e sons polifônicos 88 2323 Argumentar através do avatar Second Life além de ser estruturado segundo a dinâmica mostrada acima ainda apresenta uma característica muito interessante ora se é um mundo virtual onde não há necessidade de comer ou beber ou mesmo morar conseqüentemente é de se esperar que o progresso econômico não seja necessariamente um fator determinante Nesse ponto contudo encontramos uma certa discrepância ter dinheiro em Second Life significa ser diferente e num lugar onde todo mundo nasce absolutamente igual ser diferente é definitivamente desejado Outras estruturas socioculturais como a moda contudo são encaradas de forma diferente Second Life é estruturado em vários servidores O conjunto desses servidores forma o que os Linden Labs chamam de Grade o serviço completo propriamente dito Tais servidores então não obedecem a algumas leis do mundo real um avatar que deseja se vestir como um superherói como o superhomem por exemplo não encontra resistência social imagine se alguém fosse fazer isso no centro de Recife Salvador ou São Paulo No metaverso de SL a diversidade é a maior possível de forma que como você se veste dá ao seu avatar prestígio ou o torna impopular com certas subculturas Isso é agravado inclusive nos servidores que são dedicados como o que tenta reproduzir Paris no século XIX O modo como você se veste é determinante com relação ao seu desenvolvimento social ninguém fala com alguém que não está interpretando por exemplo por mais que o dress code não seja obrigatório Em paralelo a isso Amaral 2005 afirma com relação a subculturas que O atributo definidor das subculturas então reside na maneira como a ênfase é colocada na distinção entre um grupo culturalsocial particular e uma culturasociedade mais ampla A ênfase é na variação de uma coletividade maior que é invariavelmente mas não sem problemas posicionada como normal mediana e dominante Subculturas em outras palavras são condenadas a desfrutarem uma conciência de alteridade ou diferença63 Gelder et al apud Amaral 2005 p 02 63 The defining attribute of subcultures then lies with the way the accent is put on the distinction between a particular culturalsocial group and the larger culturesociety The emphasis is on the variance from a large collectivity who are invariably but not unproblematically positioned as normal average and dominant Subcultures in other words are condemned to andor enjoy a consciousness of otherness or difference Gelder e Thornton apud Amaral 2005 p 2 89 Mas ora Klastrup 2003 já sugeriu o contrário que os mundos virtuais não se estruturam mais num lugar marginal da sociedade Que eles conseguiram um espaço que equivale teoricamente a um mainstream cultural por mais que existam nãousuários sua existência não é mais motivo de espanto de frisson O ponto que quero provar aqui está mais à frente quando a própria Adriana Amaral apud Gelder e Thornton 1997 p 373 afirma que as subculturas têm no estilo sua manifestação mais visível O estilo quando manifestado através da vestimenta do visual dos sons das performances é um meio poderoso de dar ao grupo validação e coerência Não sugiro de nenhuma forma que por ventura uma dessas agregações seja considerada subcultura não minha idéia aqui é sugerir que podemos identificar também dentro do metaverso de Second Life extensões de outras subculturas existentes fora do ciberespaço no mundo real e tais jogadores usuários usam sendo assim seus avatares para trabalhar essa lógica de legitimação do legado subcultural Esse adendo sobre subculturas tem o intuito simples de provar que essa legitimação incorre numa argumentação numa identificação através de símbolos que dentro do jogo podem ser mais que simplesmente um modo de vestir ou de ter um visual Um avatar pode ser simplesmente um símbolo como o A estilizado associado ao símbolo da anarquia ele não tem fronteiras corporais Usar um avatar humanóide é mero capricho As possibilidades são muito maiores e a retórica visual aqui evoca Barthes 1982 p 32 toda imagem é polissêmica E a polissemia leva a uma interrogação sobre o sentido O teórico francês ainda afirma que Ao nível da mensagem simbólica a mensagem lingüística orienta não mais a identificação mas a interpretação constitui uma espécie de barreira que impede a proliferação dos sentidos conotados seja em direção a regiões demasiadamente individuais isto é limita o poder de projeção da imagem seja em direção aos valores disfóricos Barthes 1982 p 33 A idéia de Barthes originalmente se referia à publicidade ao valor do texto associado à imagem mas pode ser facilmente evocada aqui Sem texto ou seja sem legenda a imagem do avatar vai atrair sobre si um nível de polissemia muito maior que pode tornálo ininteligível Fator principal e ignorado até agora é que em SL os avatares realmente possuem legenda seu nickname o apelido pelo qual são conhecidos 90 dentro do sistema se encarrega de fazer a vez de legenda principalmente no que diz respeito às manifestações subculturais Uma das características sociais do sistema de SL é permitir que o usuário faça parte de grupos que nada mais são do que chaveamentos entre as prioridades e os interesses daquele usuário em especial Assim sendo qualquer um pode fazer parte de um grupo e escolher mostrar isso ou não em seu nick Citando Barthes novamente fora da publicidade a fixação pode ser ideológica o texto conduz o leitor por entre os significados da imagem 1982 p 33 O nick o grupo suspensos acima da figura do avatar guiam definitivamente o leitor pelas conotações sugeridas por um outro avatar Se Klastrup 2003 falava de uma possível poética dos mundos virtuais podemos sugerir uma retórica visual presente no avatar a imagem da representação humana no ciberespaço num metaverso carrega por si só um fator de persuasão de argumentação que é inerente à sua existência Retórica é linguagem orientada para ação para influência A retórica está enraizada na função essencial da própria linguagem como um meio simbólico de induzir cooperação entre seres que por natureza reagem a símbolos Burke 1955 p 43 Epstein 1985 acredita que símbolos podem ser usados para desencadear determinadas ações por parte de seus alvos A discussão semiótica nesse sentido se estenderia o que não é o intuito do trabalho mas apenas pontuar para essa característica particular da figura do avatar Assim como podemos optar por desenvolvermos uma retórica visual nesse sentido nós mesmos humanos podemos optar por fazêlo com nosso avatar que afinal é uma representação de nosso sujeito Uma das tantas máscaras que escolhemos usar no diaadia Não é nosso objetivo contanto verificar como tal característica trabalha nesse momento apenas pontuando tal fator como um dos muitos presentes e ainda a serem verificados nos mundos virtuais 91 CONCLUSÃO A pesquisa realizada então nos dá bases sólidas para que possamos entender o que são e como se configuram os mundos virtuais sua herança dos mundos de fantasia literária e posteriormente dos mundos de fantasia imaginária no caso dos MMORPGs lhes confere um caráter necessariamente interativo e imersivo onde geralmente os jogadores usuários fingem ser parte de uma raça determinada pelo sistema e que tem poderes especiais que a ajudam no diaadia fazendo o personagem necessariamente perene evoluir Em paralelo existem mundos virtuais que não se apropriam das dinâmicas lúdicas de recompensa e repetição onde os personagens não necessariamente evoluem e onde não existe ganhar ou perder Desse modo podese dizer que a finalidade de tais mundos é simplesmente a convivência social o que lhes dá o caráter mais de comunidades virtuais do que de qualquer outro tipo de agregação do ciberespaço Tais mundos a partir das estratégias de interação entre seus habitantes residentes na linguagem dos Linden Labs são expressão legítima de todo um modo social próprio da cibercultura e caminham a cada dia para uma maior emergência até que estejamos todos novamente reafirmo não considero problemas de inclusão digital nos fins dessa pesquisa de certa forma conectados Essas estratégias de convivência desenvolvidas dentro de mundos virtuais são algo novo e que despertam por sua vez perguntas que estiveram entre nós durante muito tempo mas que agora reaparecem de força renovada A primeira delas diz respeito a Descartes o que ele falava de mente e corpo ainda ecoa nos salões do ciberespaço quando vislumbramos um possível movimento de alienação de descorporificação Os ideais máximos da ficção científica cyberpunk então batem de novo à nossa porta nos perguntamos se realmente queremos ser seres orgânicos ou se nossa maior vontade é existir eternamente em meio ao digital Mundos virtuais precisam ser entendidos como aparatos únicos que sim herdam mas não são subjugados às lógicas daqueles que os influenciam Necessitam de uma teoria especial para que sejam compreendidos que sim se apóia em outras disciplinas e isso os torna um universo multiverso de estudos fenomenal 92 Uma outra discussão muito importante com relação ao modo como alguns de nós convivem hoje no ciberespaço é exatamente o fato de que o computador enquanto suporte midiático vem se tornando tão transparente que podemos pensar sobre uma socialidade que não se apropria da tecnologia mas que só se desenvolve por causa dela Existe algo a mais na identificação entre o sujeito e o avatar e essa resposta não está próxima por enquanto de ser encontrada Contudo é algo que além de ter a ver com a primeira pergunta ainda está imersa em um tanto de mistério e outro de puro recalque acadêmico com relação a um purismo orgânico que divide fausto e prometeu e que Maffesoli sabiamente ignora clamando a Dioniso É importante deixar claro então que este trabalho se dedica principalmente a limpar o caminho para outros mais que virão em outras fases da vida acadêmica De posse de tais conceitos já há material para reflexão e daí uma pesquisa mais profunda voltada para a lógica da simulação e como ela modifica o modo social dos que a abraçam pode ser desenvolvida Não procuramos bater o martelo traçando respostas sólidas Como caminhamos por terrenos movediços e cujos horizontes podem mudar da noite para o dia com o ir e vir das tecnologias o mais adequado é tentar sentar pedras de alicerce para que sobre elas algo sólido possa ser desenvolvido Dessa forma os mundos virtuais a partir de Second Life se configuram como uma nova forma de leitura do ciberespaço onde não necessariamente o mundo da vida é referenciado a não ser por uma vaga lembrança no fundo de nossa mente pelo fato de usarmos aparatos para chegarmos até ele Todo o modo cultural estudado até agora não contava com um passo tão importante para o lado da descorporificação era uma perspectiva de certa forma até rechaçada O que acontece agora é diferente existem mais modos de se vender informação e as agências de notícias que se mantém hegemônicas no mercado jornalístico não são as únicas a fazer lucro de algo nãopalpável As fronteiras do mundo real estão se tornando cada vez mais difusas e os mundos sintéticos se fazem cada vez mais perceptíveis mais reais eles interferem em nosso lazer em nossa educação em nossa economia tais mundos não são mais um mero capricho tido como bem simbólico marginal trabalhado em subculturas num escopo específico São cultura de massa cibercultura e algo mais Eles herdam aspectos de tudo que nossa 93 sociedade já foi e prenunciam exatamente o que ela virá a se tornar ou delineiam contornos de leitura ao menos livrando o texto da euforia Por fim fica a sensação de que a tecnologia dos mundos virtuais já se encontrava disponível há algum tempo o que traz à tona uma última pergunta sobre o fenômeno Second Life porque demoramos tanto então para imergir no ciberespaço dessa forma Investir dinheiro real passar tanto tempo e não necessariamente tendo lazer num mundo virtual não parece um tanto de exagero Foi exatamente o que os pioneiros em comércio via Internet acharam quando instituíram a dinâmica das compras online via cartão de crédito Que era exagero Podese pensar então que a tecnologia só evolui realmente quando estamos prontos para o próximo passo que evolução sem acompanhamento cultural mental até arriscaria dizer é fadada ao fracasso Parece uma perspectiva vitalista demais denotando um aroma de superioridade do homem sobre a máquina Asseguro contudo que não é o intuito No fim e aí reside um toque de melancolia talvez algumas maravilhas da ficção científica da ficção64 enfim estejam realmente fadadas a continuar nos metaversos literários visuais ou de simulação Mas nunca realmente entre nós 64 Lembrome aqui que uma das principais características que são consideradas atraentes nos metaversos de fantasia medieval é o fato de existir magia Em seguida me lembro que Arthur C Clarke escritor de FC costumava dizer que qualquer demonstração suficientemente avançada de tecnologia pode ser considerada magia por civilizações menos evoluídas 94 REFERÊNCIAS AARSETH Espen Cybertext Perspectives on ergodic literature Baltimore e Londres The Johns Hopkins University Press 1997 ALVES Lynn Game Over Jogos Eletrônicos e Violência São Paulo Futura 2005 AMARAL Adriana Uma breve introdução à subcultura cyberpunk Estilo transformações e hibridismo na cibercultura In Revista ECompós Brasília n03 ago 2005 Disponível em httpwwwassimcomunicacaocombrrevistadocumentos Acesso em 27 de Maio de 2007 BARRAL Etiénne Otaku Filhos do Virtual São Paulo Senac 2000 BARTHES Roland O Óbvio e o Obtuso Rio de Janeiro Nova Fronteira 1982 BIRO Janos 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mídias à cibercultura São Paulo Paulus 2003 STEPHENSON Neal Snow Crash Nova Iorque Bantam 2003 reedição TOLKIEN J R R Tree and Leaf Boston Houghton Mifflin 1965 J R R The Lord of the Rings Boston Houghton Mifflin 1999 13ª Reimpressão TÖNNIES Ferdinand Gemeinschaft und Gesellschaft Leipzig Fuess Verlag 1887 2nd ed TURKLE Sherry Life on the screen Identity in the age of the internet Nova Iorque Simon and Schuster 1997 TURKLE Sherry The Second Self Computers and the Human Spirit Nova Iorque Simon Schuster 1984 TURNER Mark The Literary Mind Oxford Oxford University Press 1998 VIDART Daniel El juego y la condición humana Notas para una antropología de la libertad en la necesidad Montevidéo Ediciones de la Banda Oriental 1995 WORRINGER W Abstraction et Einfühlung Paris Klincksieck 1978 View publication stats View publication stats
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Thiago Falcão João Pessoa Paraíba 2007 2 UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL Thiago Pereira Falcão UNIVERSO METAVERSO MULTIVERSO Mundos virtuais como híbridos entre jogos eletrônicos e comunidades virtuais Monografia apresentada à Universidade Federal da Paraíba em cumprimento às exigências para obtenção do grau de Bacharel em Comunicação Social habilitação em Jornalismo Orientador Prof Dr Wellington Pereira João Pessoa 2007 3 4 UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL Thiago Pereira Falcão UNIVERSO METAVERSO MULTIVERSO Mundos virtuais como híbridos entre jogos eletrônicos e comunidades virtuais BANCA EXAMINADORA NOTA Prof Dr Wellington Pereira Orientador Universidade Federal da Paraíba Prof Dr Cláudio Cardoso Paiva Membro Universidade Federal da Paraíba Profª Drª Simone Maldonado Membro Universidade Federal da Paraíba MÉDIA Aprovada em de de 5 AGRADECIMENTOS A Felipe e Júlio pelos encontros trimestrais e por toda a conversa jogada fora em intertextos e a Jorge Diego e Fábio por sentarem comigo durante tantos anos com o simples intuito da diversão Bom quando Fábio não estava roubando nos divertíamos E a Paulinho encaixado aqui porque não abrirei um parágrafo só para ele A Agnes pela prioridade Em tempo Alex por ser um amigo indiscutível A Maurício Arthur e Marcelo amigos cults pela companhia no decorrer desses mais de quatro anos dentro e fora da faculdade Kátia por afinidade gravitacional aqui Aos professores do Decom que adicionaram algo de fato não foram muitos mas os que o fizeram foram brilhantes E aos demais porque ao nada adicionarem muito me ensinaram À minha namorada Ana Raquel por ser motivação e conforto por manter meu multiverso uno 6 Para meu pai de quem herdei meu melhor e pior E para minha mãe por ser forte como só ela consegue 7 Did I request thee Maker from my Clay To mold me Man Did I solicit thee From darkness to promote me or here place In this delicious Garden John Milton Paradise Lost X 74346 8 FALCÃO Thiago Pereira Universo Metaverso Multiverso Mundos virtuais como híbridos entre jogos eletrônicos e comunidades virtuais Monografia de Conclusão de Curso de Comunicação Social da Universidade Federal da Paraíba habilitação em Jornalismo 2007 RESUMO O presente trabalho busca obter uma compreensão melhor acerca do conceito de Mundos Virtuais em especial mostrando que tais sistemas não se compõem unicamente de estruturas lúdicas provindas dos jogos eletrônicos nem tão somente de estruturas de interação via Rede presentes em comunidades virtuais espalhadas por todo o globo mas herdam características dos dois lados de certa forma legitimando a teoria da convergência midiática e constituindo uma nova experiência principalmente por abdicarem da dinâmica linear da narrativa a qual estamos socialmente acostumados por filmes séries novelas livros em detrimento de uma dinâmica de simulação que por si só gera questões que ainda não são cobertas por nenhuma ciência específica e que por isso evocam o conceito de interdisciplinaridade absorvendo assim teorias vindas da sociologia da lingüística da semiótica e de outras ciências já cristalizadas Palavraschave Mundos Virtuais Comunidades Virtuais Jogos Eletrônicos 9 FALCÃO Thiago Pereira Universe Metaverse Multiverse Virtual Worlds as hybrids of electronic games and virtual communities Monograph presented as conclusion to the course of Social Communication on Federal University of Paraiba academic qualification in Journalism 2007 ABSTRACT The present work seeks to obtain a better comprehension about the concept of Virtual Worlds specially detailing that such systems are not composed exclusively of ludic structures originated in electronic games nor are they only composed by network interaction structures common in virtual communities worldspread but they inherit characteristics from both sides in a way legitimating the media convergence theory and determining a whole new experience specially for the fact that they abdicate of the linear narrative dynamics which we are so used to by movies series soapoperas and books generally in detriment of a simulation dynamics that all by itself raises even more questions that are answered by no specific science and for that they evoke the concept of crossscience absorbing therefore theories generated in sociology linguistics semiotics and from other nowcrystallized sciences Keywords Virtual Worlds Virtual Communities Videogames 10 SUMÁRIO RESUMO 8 ABSTRACT 9 INTRODUÇÃO 11 METODOLOGIA 14 1 UNIVERSO 17 11 Transformações A Hipermídia 17 12 Jogo Uma Harmonização de Conceitos 21 121 Estrutura Lúdicas e Toda uma Forma Cultural 21 122 Recortes Acadêmicos nos Jogos Eletrônicos 28 1221 Narratologia 31 1222 Ludologia 34 1223 Narratologia e Ludologia 35 13 Da Gênese dos Videogames 39 131 De como contar uma história 39 132 O Surgimento do Videogame 42 2 MULTIVERSO 47 21 Do Outro Lado do Espelho Os Fantásticos Mundos da Imaginação 47 211 Aproximação 47 212 Mundos Imaginários 48 22 Socialidade e Culturas Digitais As Comunidades Virtuais 57 221 Socialidade 57 222 Cibersocialidade 63 223 Comunidades Virtuais 64 23 Agregações e o Retorno ao Lúdico Os Mundos Virtuais 69 231 Cyborgs de Carne e Software Os Avatares 77 232 PósVida Second Life 81 2321 Economia de Second Life 84 2322 Uma nova forma de estar junto 86 2323 Argumentar através do avatar 88 CONCLUSÃO 91 REFERÊNCIAS 94 11 INTRODUÇÃO Comecemos então por um lugar comum tornouse clichê finalmente falar que as Novas Tecnologias da Comunicação fizeram com que a sociedade repensasse não só o seu relacionamento com a técnica com o saber fazer como também com o viver socialmente com o interagir com o outro seja este psicológico ou social mesmo Mais que isso livres das metas e fronteiras impostas a nós pelo esqueleto da modernidade que pregava razão e integridade solidez e unitarismo vivemos hoje um tempo de júbilo de reencontro com a natureza e conosco mesmos não num esquema de ativismo natural salvem as baleias salvem o mundo mas principalmente numa dinâmica na qual a vontade de viver de celebrar o presente substitui e sobrepõe a vontade de dominar o mundo que nos cerca A velha dicotomia naturezacultura precisa ser repensada relida Mas este não é o objetivo deste trabalho Num âmbito especialmente cultural numa sociedade permeada por um novo modo de saber e sentir é de formas de transmissão de informação que esse trabalho fala Claro isso soa e é de fato extremamente vago Mais do que transmissão de informação falamos de comunicação sem falar de Shannon e Weaver sem falar de Frankfurt sem falar de uma mídia tradicional e viciada como vemos hoje Principalmente sem falar de apocalípticos pois hoje mesmo os que não o desejam estão integrados de algum modo A nova forma culturalsocial pregada por inúmeros teóricos mundo afora Lévy 1999 Lemos 2002 Maffesoli 1987 1998 2004b Santaella 2003 entre outros se desenvolve mediada por um instrumento que revolucionou completamente a nossa vida o computador Precisamos contudo parar para pensar o que acontece quando o computador tornase tão transparente que o encaramos como uma parte íntima de nós mesmos Numa hipérbole de meio de comunicação como extensão do homem talvez hoje desenvolvamos formas sociais diferentes das anteriores e que estão intimamente relacionadas ao fato de o mundo ter perdido virtualmente em ambos os sentidos suas fronteiras Pensemos da seguinte forma e se nossas formas sociais atuais não fossem somente mediadas pelo instrumento E se elas fossem conseqüência absoluta de seu uso O relacionamento mediado pela Internet não é simplesmente mais um serviço provido pelos 12 computadores é um serviço primário exigido pelos consumidores de hoje Compramos computadores com o fim de nos relacionarmos virtualmente O mercado atesta isso é mais comum um computador com placa de rede ou modem do que um com impressora Em paralelo a essa transmutação das formas sociais que não acarreta obviamente no fim das formas antigas mas em sua releitura ressignificação temos o jogo como elemento da cultura o lúdico como sendo aquilo que nos impulsiona em direção ao subjetivo ao artístico ao limite de nosso sujeito ao outro Através do entretenimento provido pelo jogo novas indústrias utilizandose dessa dinâmica de apego às novas tecnologias surgiram e multiplicaramse construindo impérios que em números deixaram pra trás outros como o cinema hollywoodiano por exemplo Se as comunidades virtuais construídas sobre a dinâmica da socialidade pregada por Maffesoli 1998 se apropriam de certa forma da tecnologia e transformam muitos uns em um muito seguindo um paradigma de autodespojamento Worringer 1978 os jogos eletrônicos de sua parte sempre trabalharam no sentido de legitimar um único sujeito que de forma solitária imergia na simulação rodeado de silício mas sem a interação comum ao ambiente social Obviamente tal paradigma foi mudando com o decorrer do tempo e jogos para duas quatro e em seguida n pessoas foram construídos sempre obedecendo a uma demanda de mercado específica que demonstrava o quão preparadas as pessoas estavam para o emergir das novas formas de interface com o tecnológico Com a febre que adveio de tais tecnologias multiusuários o próximo passo das dinâmicas de relacionamento via Internet foi justamente integrar a idéia de ambiente midiático do jogo media landscape com a idéia de comunidade virtual Com isso surgiram jogos que exploravam ambas as partes da psiquê humana social e lúdica usando para isso uma ferramenta de comunicação ainda emergente e portadora de uma linguagem ainda desconhecida ainda procurando se encontrar os mundos virtuais Mundos virtuais surgem então apoiados sobre teorias da ficção científica cyberpunk cujos símbolos encontramse ainda hoje dispersos pelo caldeirão da cibercultura num fenômeno semiótico pouco estudado1 mas muito expressivo Graças à 1 Ver Amaral Adriana Visões Perigosas Uma ArqueGenealogia do Cyberpunk Porto Alegre Editora Sulina 2006 13 imaginação de tais artistas e aos esforços de toda uma cultural vários universos paralelos e virtuais chamados de Metaverso graças a Neal Stephenson escritor que os batizou hoje se encontram dispersos pela Internet mudando dia após dia a dinâmica social que conhecemos estruturandose em uma série de metaversos que pode ser chamada seguindo a lógica de alguns mundos imaginários disponíveis em forma de RPG2 de Multiverso O interesse do trabalho em estudar mundos virtuais como híbridos entre jogos e comunidades virtuais vem principalmente do fato de que esse é um estudo praticamente inédito no Brasil onde o próprio tópico dos jogos eletrônicos é alvo de pouquíssima reflexão científica Paralelo a isso o fator de interdisciplinaridade comum ao tema também é um forte incentivo pois ao navegar por áreas adjuntas literatura semiótica sociologia etc o leque de possibilidades que estudos posteriores baseados neste mesmo podem desenvolver é muito amplo A escolha pela forma de monografia se dá particularmente ao fato de que ao desenvolver reflexões sobre o tema no fim da graduação uma possível linha a ser seguida em uma pósgraduação é mais palpável por assim dizer Além disso a área vem se desenvolvendo como atestado por alguns teóricos que se aventuraram por esses campos Frasca 2003 e contribuir para uma área em expansão também é um ideal especialmente atraente Particularmente acreditamos primeiramente de maneira intuitiva depois de forma científica com embasamento teórico disponível na seção de referências no fim do trabalho que os jogos eletrônicos ou videogames se mostram hoje como uma mídia que possui características bem definidas e que se desenvolve rapidamente tanto em poderio simbólico ou seja possibilidades criativas e tecnológicas quanto em poderio econômico movimentando milhões e milhões de dólares anualmente Nosso objetivo principal é mostrar como os mundos virtuais herdam características de comunidades virtuais e de jogos eletrônicos tomando como exemplo o mundo virtual mais citado atualmente na mídia Second Life dos Linden Labs Em seqüência procuramos vislumbrar como as formas teóricas apresentamse no campo de estudos de jogos eletrônicos atualmente mostrando que os mundos virtuais tem suas raízes em mundos de fantasia nascidos crossmidiaticamente na literatura e sugerindo que o avatar a 2 O assunto será melhor tratado no segundo capítulo da monografia 14 representação humana no ciberespaço tornouse fonte de discussão por adquirir e revelar importantes características de seus usuários adquirindo assim um poder de argumentação inerente uma retórica própria Tendo definido então nosso objeto de pesquisa partimos então para a divisão do trabalho e conseqüentemente para sua realização in loco Após a conclusão da infindável tarefa de revisão bibliográfica não porque toma muito tempo mas porque é literalmente infindável visto que o pesquisador nunca pára de ler sua bibliografia em busca de mais referências e norteamentos resolvemos dividir o trabalho em duas partes distintas Na primeira parte onde discutimos conceitos da nossa realidade tratamos de hipermídia como aproximação para em seguida mergulharmos no mundo do lúdico e dos jogos eletrônicos tratando de conceitos que são necessários para entendêlo como narratologia e ludologia Na segunda e última parte onde vamos falar de outras realidades damos um passo em direção aos mundos virtuais falando de mundos imaginários que são suas raízes e de uma dinâmica social existente nos dias de hoje que nos leva a construir todo um novo tipo de cultura mediada pela tecnologia e fortemente embasada em relações nãopresenciais Falamos também de como os avatares se constituem e do que torna Second Life diferente dos outros metaversos presentes no multiverso da Internet METODOLOGIA Os procedimentos metodológicos empregados na realização da presente monografia consideram mundos virtuais como representantes legítimos de uma mídia em expansão e herdeiros das tradições dos jogos eletrônicos e das comunidades virtuais Sistematicamente então foram construídas estratégias metodológicas que serviram para que fossem alcançados os resultados esperados durante o período de acordo com o cronograma estabelecido no projeto de quatro meses para a conclusão do estudo Iniciamos uma pesquisa de levantamento bibliográfico que dizia respeito à área de cibercultura em geral A verdade é que tal assunto tem grande extensão bibliográfica no Brasil mas quando o quesito mundos virtuais era posto à prova a bibliografia era mínima Tal fator não se constituiu necessariamente num problema já que com o advento 15 da Internet boa parte da bibliografia fezse disponível logo em seguida ao visitar sites dedicados ao estudo de jogos eletrônicos e de mundos virtuais por conseqüência A bibliografia estabelecida foi então tomada como principal fonte de pesquisa Após cada leitura os dados levantados eram registrados e filtrados tendo sua importância considerada para a realização do trabalho Como suporte teórico utilizamos também sites nacionais e internacionais voltados para o estudo de jogos que trazem periodicamente artigos e ensaios de representantes importantes desse recorte teórico do mundo acadêmico Além disso visitamos o mundo virtual tomado como exemplo criando lá um avatar Case Forder seu nome em homenagem ao protagonista do romance cyberpunk de William Gibson Neuromancer e verificando que outras características Second Life mantém que o diferenciam dos demais mundos virtuais disponíveis na Internet Partindo desses dispositivos o presente trabalho monográfico parte da hipótese de que mundos virtuais constituem ambientes sociaismidiáticos que herdam características distintas de jogos eletrônicos e comunidades virtuais configurando espaços de ressignificação das teorias dos jogos e da socialidade contemporânea Para embasar tal hipótese dividimos o trabalho em dois capítulos onde traçamos dois tipos distintos de reflexão 1º Universo que trata de como se configura o contexto da hipermídia paralelamente tratando também do conceito de jogo como estrutura lúdica básica O embasamento teórico foi buscado em autores como Huizinga 2000 e Alves 2005 Dentro de jogos definimos que a linha será tratar o jogo na hipermídia trabalhando um cruzamento que deixa em evidência os videogames como produto cultural e como mídia a ser legitimada Tratando de formas teóricas dentro do contexto dos videogames recorremos a Murray 1999 Turkle 1997 e Frasca 1999 2003 O capítulo é encerrado com uma cronologia breve de como os jogos eletrônicos chegaram ao patamar que hoje ocupam 2º Multiverso o segundo capítulo busca conceitos mais abstratos para que seja feita uma definição satisfatória dos mundos virtuais e de como essas estruturas afetam a cultura que cresce ao seu redor Buscamos embasamento em pesquisadores 16 estrangeiros por falta de uma bibliografia brasileira especializada destacando os trabalhos de Pargman 2003 e Klastrup 2003 em cima de mundos imaginários e mundos virtuais respectivamente Do lado de comportamentos sociais destacamos o trabalho de Maffesoli 2004 2004b e Lemos 2002 que ajudam a compreender como as formas sociais se organizam e como estas interagem se apropriando da tecnologia formando o conceito de cibercultura e de socialidade dentro da cibercultura Finalmente apresentamos a conclusão do nosso estudo convergindo para o fato de que mundos virtuais não podem realmente ser estudados como jogos mas precisam de uma abordagem nova que dê vazão ao fato de que eles se constituem em algo mais um veículo novo de opinião e de socialidade A monografia é um tipo de trabalho acadêmico que se diferencia pela abordagem de um só tema chamado de linha de pesquisa e que será tratado com profundidade no intuito de ter seu conteúdo revelado de forma sistemática Em outras palavras é o tratamento escrito de um determinado assunto que resulta da interpretação científica com a intenção de produzir uma contribuição relevante para o campo científico do qual faz parte A monografia consiste de um estudo bem desenvolvido formal discursivo e concludente É uma exposição lógica e reflexiva seguindo uma estrutura metódica que inclui Introdução Corpo de Discussão e Conclusão Redigida em linguagem objetiva sobre assuntos preciosos acerca dos quais o autor tem a oportunidade de expor suas idéias e conclusões Ferreira 1994 p 22 Com efeito a monografia é resultado de um tratamento escrito e aprofundado de um tema específico de maneira dissertativa e analítica apresentando e discutindo novas idéias Ferreira 1994 p 22 ainda complementa a definição a monografia se refere a uma forma de documento elaborado para atender às exigências dos cursos de graduação ou mesmo de pósgraduação lato sensu 17 1 UNIVERSO 11 Transformações A Hipermídia Antes que comecemos qualquer explanação acerca dos conceitos de jogo que outros recortes teóricos estão contidos neles como se configuram as formas culturais que nos levam à criação e ascensão da indústria do videogame nos dias de hoje e como essa indústria e conseqüentemente a assimilação de seus produtos enquanto bens simbólicos passou a integrar uma parte crucial no caldeirão cibercultural é importante que entendamos que uma das características mais interessantes no conceito de videogame de hoje é que ele parece ser a própria figura da convergência midiática trabalhando áudio vídeo texto verbal e nãoverbal e estratégias de simulação somadas à nossa costumeira dinâmica das narrativas Isso só é possível graças ao advento da criação da hipermídia que expandiu crucialmente os limites do que é possível de se fazer no que diz respeito à produção de signos midiáticos nos dias de hoje É limitador e medíocre no sentido original da palavra de mediano pensar que hipermídia e hipertexto uma das palavras mais em voga na mídia atualmente se configuram basicamente na mesma coisa Se considerarmos a palavra texto em seu sentido mais amplo que não exclui sons nem imagens teremos por hipertextos basicamente os hiperdocumentos que são produzidos para existirem na hipermídia sendo assim ambos se configuram em patamares bem diferentes Contudo o hipertexto não é algo que surgiu na era da informática Lévy 1999 p 56 explica que o hipertexto é simplesmente um texto constituído por nós e links entre esses nós referências notas ponteiros indicando a passagem de um nó para o outro Sendo assim o índice remissivo no fim de um livro exemplo dado pelo pesquisador francês ou catálogos numa biblioteca configuram precisamente isso referências a outros textos que podem ser lidos na ordem que o leitor e aqui há uma 18 discussão sobre a criação de um leitorautor que não é o foco do trabalho mas que é decerto interessante3 bem quiser E o que configura o tamanho frisson em cima desse conceito que antecede então os mundos da informática Principalmente o fato de que o suporte digital contribuiu com uma evolução considerável no quesito link A passagem de um nó para o outro desde que os computadores passaram a mediar o modo como se escreve a história da humanidade tornouse algo extremamente rápido remetendo à ou até contribuindo para nossa sede por imagens rápidas e que somem continuamente ante nossos olhos além de encapsular toda a metáfora da porta num processo que passou de simbólico ir de um nó ao outro para o extremamente banal Para Landow 1997 o hipertexto é uma matriz que contém um número infinito de narrativas Fazendo uma rápida digressão é curioso é como Lévy fala no mesmo capítulo 1999 p 57 de um modo de contribuição que também seria potencializado pelo surgimento da informática no qual o leitor ou leitorautor pode não apenas modificar os links mas acrescentar ou modificar nós À parte uns poucos pesquisadores e entusiastas que trabalharam durante o momento de criação da Internet sem nada receber pelo simples prazer de ver o fenômeno se desenvolver esse era um processo que até bem pouco tempo estava esquecido nas previsões de pensadores como Pierre Lévy e que agora beirando a segunda década do século XXI começam a ser desenterrados por uma dinâmica de cooperação denunciada pela quantidade amedrontadora de wikis mundo afora que tomou conta de toda a comunidade digital espalhada mundo afora4 Enfim quando envolvemos o hipertexto na construção midiática de nossa cultura a produção simbólica em geral tende a se mostrar de forma mais densa Claro que é complicado expandir meios antigos e cristalizados em suas formas para tal dinâmica mas já percebemos através de alguns autores que mesmo as mídias estáticas como revistas e jornais começam a se paginar visualmente por uma lógica ditada pela hipermídia em 3 Para mais sobre a discussão ver o capítulo III Sobre a Virtualização do Saber em Lévy Pierre Cibercultura São Paulo Ed 34 1999 4 Fazendo uma ponte sobre esse fato interessante e o assunto principal do trabalho Frasca 2001 propõe que essa lógica de cooperação pode ser utilizada para transformar os videogames num modo de ampliação da consciência Ver Frasca Gonzalo Rethinking Agency and Immersion Videogames as Means of Consciousness Raising 2001 Disponível em httpwwwludologyorg Acesso em 23042007 19 especial pela Internet e os media nela contidos Mais que isso hoje nos acostumamos a não somente ler a notícia mas também navegar por entre as fotos disponíveis ver a cobertura em vídeo disponibilizada muitas vezes no mesmo documento ou absorver uma série de informações que tornam tal experiência muito mais sólida do ponto de vista sensório Para Nesteriuk 2002 p 8 O texto a obra em si ganha ainda uma maior complexidade estrutural e diagramática ao assimilar a estrutura rizomática dos níveis de multiplicidade simultaneidade nãolinearidade e interatividade a seus elementos constituintes Ponto principal é que numa construção como esta não existe começo nem fim sendo possível e encorajado começar a leitura por qualquer lugar e simplesmente tirar o maior proveito possível da estrutura narrativa designada Percebemos que os nós impõem uma construção textual sintética podendose começar a ler o texto de qualquer ponto Landow 1997 acredita que a potencialidade do hipertexto está na sobrevalorização do leitor ativo e responsável pela trajetória de sua leitura e seus desdobramentos provocando um descongelamento dos nexos e das lexias fazendo do hipertexto um texto fragmentado e atomizado Não temos todavia como visualizar fisicamente a imagem completa deste texto como um todo tal como o fazemos com um livro por exemplo Nesteriuk 2002 p 9 Nesteriuk 2002 p 10 ainda discursa sobre as mudanças infligidas sobre nosso espectro cultural pela transformação do computador em ferramenta de comunicação Para o pesquisador a revolução telemática que presenciamos dia após dia tem muito mais impacto social e cultural do que suas prévias contrapartes como a invenção do alfabeto ou a explosão da cultura de massa A hipermídia então mais que um novo meio é uma nova linguagem buscando ainda a si própria buscando sua própria estética seus próprios parâmetros e que permite a manifestação de formas de pensamento heterogêneas mas semioticamente convergentes o que corrobora com a idéia de McLuhan de que meio e mensagem estejam mais ligados do que se pode ver superficialmente Nesteriuk considera então que a presença do videogame em nossa sociedade seja um movimento fruto da transposição semiótica do lúdico para Huizinga 2000 anterior à cultura humana em direção ao advento da hipermídia Desse modo fica fácil perceber que o potencial desencadeado por tal união é imenso no qual o meio absolutamente novo 20 guarda dentro de si obviamente algumas características das fontes semióticas com as quais dialoga cinema literatura etc mas também encerra possibilidades nunca imaginadas para as tradicionais mídias narrativas culturalmente dispostas Prova disso é que numa consulta ao banco de dados da CapesCNPq disponível em httpwwwcapesgovbrcapesportalconteudo10BancoTeseshtm grande parte dos trabalhos analisava as fronteiras entre videogames e violência ou educação mas poucas contemplavam propriedades dos jogos eletrônicos que seriam comuns a meios de comunicação A academia contudo ainda parece um tanto arredia em relação à linha de pensamento proposta preferindo tratar o videogame como produto cultural mas não como mídia legítima Esse modo de observação é diferente contudo fora do Brasil onde existem vários estudos intersemióticos destaco aqui o site Game Studies5 que condensa praticamente todos os pensadores que vêm contribuindo com as diversas discussões acerca dos jogos eletrônicos no mundo que trabalham questionamentos intermidiáticos como por exemplo que relações os jogos eletrônicos estabeleceriam com a estética do cinema ou como os trabalhos de hiperficção6 têm se legitimado cada vez mais como obras de arte digitais Discutindo então jogos eletrônicos como um meio legítimo de comunicação que se apossa da lógica da simulação sobre a da narrativa que nos é mais comum podemos falar de modo seguro que dentro do jogo imersos na simulação na figura digital que representa o interator a figura do avatar que será tratada mais à frente neste mesmo trabalho existe todo um exercício de argumentação que associa o entendimento dessa figura a várias teorias da percepção Falamos seguramente que o videogame como representante legítimo do aspecto lúdico na hipermídia e de posse de propriedades narrativas advindas de seu diálogo com outras mídias possui uma retórica própria que se estende inclusive a seus mínimos aspectos que além de fazerem parte de um ambiente maior às vezes têm uma liberdade adicional com relação à estrutura do jogo 5 httpwwwgamestudiesorg 6 Ficção na hipermídia no caso Para mais informação ver Landow 1997 21 Tal estrutura bem como seu funcionamento e as várias linhas de análise disponíveis para estabelecer uma tipologia dos jogos será vista no próximo tópico no qual aprofundaremos o conceito de jogo e adentraremos formalmente o mundo dos jogos eletrônicos 12 Jogo Uma Harmonização de Conceitos 121 Estrutura Lúdicas Toda uma Forma Cultural Enfim em que consiste o jogo Um dicionário comum como o Mini Aurélio 20067 ou sua versão digital o Novo Dicionário Eletrônico Aurélio v 50 traz em média de nove a vinte definições diferentes para essa palavra que é encarada pela mídia ainda de forma inconstante às vezes com ares de celebração mostrando resultados inéditos de pesquisas que atestam o valor do lúdico para o desenvolvimento do sujeito humano às vezes de forma absolutamente apocalíptica condenando o envolvimento de jovens com jogos eletrônicos que abusam da exposição da violência complicando uma relação que vários pesquisadores da comunidade acadêmica se esforçam por desvendar desmistificando a lógica inegável que esse comportamento mais antigo que a própria cultura encerra Para o Aurélio definir o termo é bastante simples e o dicionário o faz de forma objetiva Atividade física ou mental organizada por um sistema de regras que definem a perda ou o ganho Ferreira 2001 Contudo para vários teóricos Santaella 2004 Huizinga 2000 Frasca 2001 Nesteriuk 2002 que vêm se espalhando mundo afora procurando entender o que fez com que o lúdico se tornasse um dos fatores mais presentes nas teias da cultura digital esse conceito não é nem de longe o suficiente O jogo não se relaciona meramente com a atividade física e mental ou tão somente com a lógica de perda e ganho é um dispositivo comportamental que vem sendo utilizado pela humanidade desde que ela começou a traçar seus passos em direção à evolução muitos milênios atrás Santaella acredita que o lúdico está presente no sujeito humano em resposta direta às necessidades que não compartilhamos com os animais necessidades complexas da 7 Ferreira Aurélio Buarque de Holanda Mini Aurélio Dicionário da Língua Portuguesa São Paulo Editora Positivo 2006 22 psique humana que ainda segundo a autora enigma da condição humana em cujo seio se aloja um milagre até hoje tão inexplicável quanto o da própria vida o milagre da fala Santaella 2004 Entretanto porque fala o humano falta ser está onde não é é onde não está uma lição que a psicanálise não cansa de repetir e que pode ser traduzida poeticamente na dicção de Oswald de Andrade o ser humano é um animal que vive entre dois grandes brinquedos o amor onde tudo ganha e a morte onde tudo perde Para preencher essa brecha que o descarna inventou o canto a dança o teatro o circo o jogo as artes a literatura o cinema a televisão etc numa progressão que vem acompanhando pari passu o crescimento da complexidade da existência humana na biosfera Santaella 2004 p 1 A autora acredita que se existe um elemento comum a todas essas criações do humano criações provindas diretamente de nossa psiquê esse é o lúdico nossa capacidade de brincar o dispêndio sem finalidade utilitária de energia física e psíquica acumuladas No lúdico então está uma das sementes da grandeza do humano já que no cruzamento com a subjetividade se encontra a gênese dos bens simbólicos que permeiam nossa cultura até hoje guardadas as devidas proporções já que são milênios desde o surgimento da cultura como sistema semiótico Turkle 1997 Contudo é preciso entender que o lúdico mesmo sendo um grande impulsionador da evolução cultural da humanidade permeia o planeta desde muito tempo para Huizinga 2001 o jogo é mais antigo que a própria cultura já que cultura pressupõe em sua mínima forma a formação de uma sociedade e visto que os animais também realizam atividades lúdicas Alves 2005 acredita que com o decorrer do tempo a humanidade foi associando a figura do jogo simplesmente às atividades de entretenimento causando assim uma absorção dessa premissa pelo senso comum O ato do jogo vai além do simples entreter uma vez que O jogo é mais do que um fenômeno fisiológico ou um reflexo psicológico Ultrapassa os limites da atividade puramente física ou biológica É uma função significante isto é encerra um determinado sentido No jogo existe alguma coisa em jogo que transcende as necessidades imediatas da vida e confere um sentido à ação Todo o jogo significa alguma coisa Huizinga apud Alves 2005 p 18 O que de certa forma assusta o jogo assumiu faces múltiplas em contraparte a seus criadores nós ao longo da cultura que não são exatamente suaves aos olhos vide as 23 carnificinas na antiga Roma banhos de sangue para o deleite de uma multidão que não tinha o menor escrúpulo em admitir que realmente se divertia com a literal desgraça alheia Claro é um ponto extremo mas reflitamos por um momento sobre a afirmação de Huizinga que produção de sentido pode advir de tal evento Claro Santaella 2004 lembranos muito bem que tudo são faces da mesma moeda Do mesmo modo que a carnificina se fez existem jogos possuidores de uma leveza quase inofensiva como o dominó O jogo para Huizinga 2001 apresenta cinco características fundamentais que o tornam um dos pilares da civilização Primeiramente o fato de ele ser livre uma escolha de jogadores que geralmente o praticam em seus momentos de ócio Ninguém é forçado a entrar em jogo algum e quando o é geralmente o fator lúdico de entretenimento de dispêndio de energia sem objetivos está comprometido A segunda característica está intrinsecamente ligada à primeira e se configura no fato de que o jogo não é vida corrente Alves 2005 A criança o adolescente e o adulto quando se entregam ao jogo estão certos de que se trata apenas de uma evasão da vida real um intervalo na vida cotidiana embora encarem essa atividade com seriedade Idem O que nos leva à terceira característica o fato de que o jogo tem começo e fim o que contribui imensamente para acentuar essa fronteira entre vida real e jogo No quarto quesito Huizinga afirma que o jogo é ordeiro que ele se emprega de uma ordem e essa ordem as regras no caso são de importância vital em seu desenvolvimento É nessa ordem que o próprio jogo se configura se organizando através de formas compostas de elementos como tensão equilíbrio compensação contraste variação solução união e desunião e a menor desobediência a esta ordem estraga o jogo Alves 2005 p 19 Nesse ponto Huizinga insinua uma aproximação do jogo com o domínio da estética Há nele no jogo uma tendência para ser belo Talvez esse fator estético seja idêntico aquele impulso de criar formas ordenadas que penetra o jogo em todos os seus aspectos O jogo lança sobre nós um feitiço é fascinante cativante Está cheio das duas qualidades mais nobres que somos capazes de ver nas coisas o ritmo e a harmonia Huizinga 2001 p 13 24 Por fim como quinta característica encontramos um princípio que pode ser um contraponto ao anterior há um fator de imprevisibilidade de incerteza de acaso que podem gerar tensão Isso pode provocar o engajamento passional que implicará no desenvolvimento de um senso ético quanto ao estabelecimento dos limites dentro da atividade São as regras que definem o que é possível permitido ser feito ou não Contrariar estas premissas implica em colocar em cheque a existência da comunidade dos jogadores Alves 2005 p 19 Então um jogo dá a seus jogadores a oportunidade de se enfrentarem vencerem ou serem derrotados dentro de regras previamente discutidas e nessa quinta característica nessa imprevisibilidade dentro da ordem lembrando de certa forma a perspectiva formista simmeliana é que encontramos uma explicação interessante para a atração que certos jogos causam sobre seus atores Sendo assim pelo que Huizinga e Alves põem podemos perceber de forma superficial que os jogos não têm somente funções de entretenimento mas que o exercício de tais atividades lúdicas ajuda no desenvolvimento de setores cognitivos sociais afetivos e culturais de nossa psique produzindo assim um certo sentimento de antecipação em especial nas crianças com relação às situações que estas virão a experimentar Vygotski 1994 apud Alves 2005 acredita que o brincar possibilita à criança a aprendizagem de regras e a sujeição às ações impulsivas por via do prazer Assim sendo os jogos vêm a ser elementos de mediação mídia entre o conhecimento cristalizado e o potencial de aprendizagem presente na Zona de Desenvolvimento Proximal ZDP A ZDP se caracteriza pela faixa intermediária entre aquilo que o sujeito já é capaz de fazer sozinho sem a ajuda do outro e as suas possibilidades de ampliar o seu desenvolvimento e aprendizagem Nesse espaço de transição os novos conhecimentos estão em processo de elaboração e frente à mediação dos instrumentos signos e interlocutores serão consolidados e ou ressignificados Alves 2005 p 20 Para as teorias psicogenéticas que estudam a gênese dos processos psíquicos o brincar se transforma num processo que potencializa o fazdeconta já que as crianças envolvidas na atividade podem simular a vida adulta aprendendo a negociar a renunciar a ação impulsiva a postergar o prazer imediato o que contribui para a concretização de 25 desejos através da assimilação e da acomodação Alves 2005 p 21 É através desses processos que as crianças constroem o significado de cooperação e competição entre seus iguais Invocando então o discurso de Maffesoli 2004 quando ele fala de Dioniso como figura emblemática de nosso tempo e de como a humanidade tem se preocupado muito mais com o agora com a contemplação do mundo em detrimento de sua dominação entre libido sentiendi e libido dominandi e finalmente com o lúdico tomando lugar numa cadeia de eventos que põem a razão sensível muito acima da razão pura é por fim inegável que consideremos a marca máxima de nosso tempo como sendo a proliferação desse sentimento de amor ao jogo à festa e não só a proliferação mas a busca diária e incansável por entender os mecanismos que se desenham por trás das regras e aparatos usados para o exercício do ludus Caillois 1967 aplicando teorias advindas das mais diversas ciências num processo de desvendamento do impacto sociológico e comunicacional que se desenha dia após dia de um devir que se transformou em menos de quarenta anos de existência numa verdadeira indústria de jogos Isso nos leva diretamente ao fato de que os jogos eletrônicos definitivamente vêm desempenhando um papel vital na cultura humana desde o fim do segundo e continuam fazendoo no início deste terceiro milênio a indústria de jogos eletrônicos é a primeira na área de entretenimento superior à do cinema e a terceira no mundo perdendo apenas para a indústria bélica e a automobilística No ano de 2003 a indústria dos games faturou cerca de 20 bilhões no mundo 500 milhões no Brasil o que representou um crescimento de 19 em relação ao ano anterior Revista Info Exame apud Nesteriuk 2004 Essa proeminência da indústria dos videogames nos leva de volta ao espaço cultural no qual atua o comportamento apocalíptico da mídia e de leigos em geral que consideram o jogo o jogo eletrônico mais apropriadamente como vulgar banal e nocivo por estimular comportamentos agressivos e a violência nas crianças e nos jovens que compõem certamente a imensa maioria de seus usuários Santaella 2004 p 2 A autora ainda concorda com Aarseth 1997 que classifica os jogos eletrônicos como um gênero artístico legítimo um campo estético pleno de possibilidades que precisa ser julgado em seus próprios termos Essa linha argumentativa tem se desenvolvido 26 bastante dentro da academia em especial fora do Brasil onde foi cunhado o termo ludologia ludology no original para especificar a construção teórica de sentido em cima dos jogos em geral mas em especial dos videogames Embora o campo teórico se delineie dia após dia com sites especializados como o Game Studies httpwwwgamestudiesorg o Ludology httpwwwludologyorg ou o brasileiro fruto do esforço do Programa de PósGraduação em Comunicação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUCSP CSGames httpwwwcsgamesincubadorafapespbr o estudo dos jogos não é uma área que já tem uma teoria desenvolvida e cristalizada ao invés disso a interdisciplinaridade da mídia tem atraído para seu estudo áreas diversas do conhecimento como a filosofia a semiótica a psicologia a antropologia as ciências da computação a engenharia elétrica as telecomunicações as ciências cognitivas a publicidade o marketing as comunicações o design a computação gráfica a animação a crítica literária e da arte a narratologia a educação todas elas em relação direta com as múltiplas e integradas características dos games Nesteriuk apud Santaella 2004 p 2 A criação de novas teorias sempre se prova um campo muito conturbado principalmente quando as mesmas dizem respeito a algo que não está completamente fundamentado como os videogames no caso que não está cristalizado aos olhos dos teóricos e dos pensadores em geral algo que ainda não foi pensado Uma outra linha argumentativa com relação aos jogos eletrônicos é de que estes sejam meras extensões de processos narrativos ver o trabalho de Janet Murray 1999 e Sherry Turkle 1993 inseridos então no campo da narratologia e à mercê das teorias já engendradas nesse campo teórico Os jogos eletrônicos então carregam consigo um potencial catártico8 imenso que dá vazão a serem apresentados como espaços de ressignificação que possibilitam aos gamers9 elaborar seus medos perdas enfim diferentes emoções sem transpor o limite da tela Alves 2005 p 109 São ferramentas culturais que trabalham fortemente o conceito de imersão e agenciamento e executam trocas semióticas a todo instante entre o homem e a máquina por um lado e entre mídias por outro 8 Não só os jogos eletrônicos como também os jogos normais de tabuleiro ou de interação mas me refiro aqui ao modo como esse potencial foi ampliado pela massificação dos jogos eletrônicos 9 Jogadores de Videogame no caso 27 A palavra catarse vem do grego e remete à idéia de purificação purgação Seu significado primário foi cunhado por Aristóteles que argumentava que algumas emoções podiam ser liberadas ao experimentálas e citava as tragédias clássicas do teatro grego como exemplos de purgação do temor e pesar A hipótese da catarse se estendeu para incluir a liberação emocional supostamente obtida não só por observação dos dramas mas também por recordar e reviver eventos passados através da expressão das emoções e de diversas ações Sílberman e Lira apud Alves 2005 p 110 Na Grécia o termo era compreendido como o despertar de eleos e phobos piedade e temor pela ação representativa a tragédia no caso causando um processo de identificação que causaria uma economia de afetos um estado de purificação do ser calma Tal processo foi usado em conjunto com a hipnose durante o século XIX pela teoria psicanalítica O efeito visado pelo processo é a purgação uma descarga emocional de afetos patogênicos ligados a acontecimentos traumáticos Tal ligação podia ser estabelecida por meio de um processo de análise no qual o sujeito ressignificava a emoção através da fala do choro da representação da situação vivida ou por meio de elementos midiáticos Para Alves 2005 p 111 tais espaços se constituem em locus de atualização de sentimentos que nem sempre podem ser vivenciados no contexto social o qual estabelece limites que inibem determinadas manifestações Ao se defrontar com situações de conflito de perda de dor de violência o indivíduo pode repetir recordar e elaborar as suas emoções processos fundamentais segundo a psicanálise para significar os afetos Alves 2005 p 111 Desse modo a interação com cenas do passado que tiveram um efeito traumático não gera necessariamente uma repetição formal dos eventos ao contrário há um processo de ressignificação desses valores em um ambiente que não prejudica os semelhantes pois é um ambiente fechado recluso previamente definido Essa é a justificativa máxima de Alves para o frisson que os meios de comunicação e os leigos armam quando discursando sobre comportamentos violentos e agressivos e sua relação com os videogames para a pesquisadora o fato de o adolescente ser exposto a cenas de violência ou de todos nós o sermos diariamente pela mídia funciona de modo semelhante ao processo narrado acima onde tais cenas servem então para fazer a violência 28 cumprir uma função social satisfazer e canalizar instintos violentos reprimidos de modo que não transcendam de cada indivíduo e não perturbem a boa marcha social Alves 2005 p 111 Essas premissas encontram eco nas palavras de Michel Maffesoli 2004b nas quais ele afirma que é de nossa natureza negociar com o mal para assim adquirirmos o máximo dele como um efeito homeopático suficiente para apenas nos impor limites nos deixar cientes daquilo que somos e principalmente daquilo que não queremos nos tornar o que se opõe se corresponde se reforça 2004b p 75 Então sob essa perspectiva os jogos eletrônicos não interessando seu conteúdo constituemse em espaços de catarse nos quais os sujeitos ressignificam seus diferentes medos anseios desejos e sentimentos agressivos ou não pois nos jogos temos a oportunidade de representar nossa relação básica com o mundo nosso desejo de superar as adversidades de sobreviver as derrotas inevitáveis de dar forma a nosso entorno de dominar a complexidade e de fazer com que as nossas vidas se encaixem como quebracabeças Murray 1999 p 156 Assumir que os jogos eletrônicos são portadores de tal comportamento e que carregam consigo tal poder é mais um modo de legitimar esse perfeito exemplo da convergência midiática como uma nova e poderosa mídia que desenvolveu em alguns poucos anos de existência tanta expressividade e um vetor econômico que não fica atrás de qualquer uma outra mídia de massa 122 Recortes Acadêmicos nos Jogos Eletrônicos Jogos são naturalmente participativos Fato é que sem a participação dedicada de todas as partes envolvidas seja para jogos tradicionais ou para jogos eletrônicos o ludus Frasca 1999 a atividade de jogar buscando uma vitória imbuída na competição está comprometido Frasca em seu artigo entitulado Ludology meets Narratology A Ludologia se encontra com a Narratologia10 propõe um caminho interessante para o recorte teórico que pode ser aplicado aos jogos eletrônicos pela academia Entretanto antes 10 Tradução livre 29 de nos aventurarmos nesse sentido cabe aqui fazer uma breve introdução sobre o jargão utilizado pelo autor e em que sentido ele o faz A teoria literária e da narrativa têm sido de grande ajuda para entender os jogos eletrônicos em geral A poética aristotélica Laurel 1993 o formalismo russo e o pós estruturalismo Landow 1993 são alguns exemplos de perspectivas vislumbradas no decorrer deste caminho Alguns autores enxergam videogames como uma nova forma uma expansão da narrativa tradicional O fato principal é manter em mente que tais jogos compartilham muitos elementos em comuns com as histórias personagens ações em cadeia elementos de trama como o clímax e cenários enfim O problema em se analisar tais bens simbólicos no caso como peças midiáticas se utilizando exclusivamente de tais teorias é que falta um elemento muito simples e de importância chave no processo da pesquisa levar em conta que os jogos eletrônicos são bem jogos O elemento lúdico presente além de outras questões voltadas para a tecnologia que serão discutidas mais à frente são características que não estão presentes em outras peças da mídia de entretenimento como em filmes no cinema ou séries na televisão Frasca 1999 p 1 acredita que os problemas em usar a perspectiva do jogo são muitos Basicamente os jogos tradicionais sempre tiveram um status acadêmico menor que o de outros objetos como a narrativa11 Sendo assim os estudos formalistas em detrimento dos estudos funcionalistas do jogo nunca se desenvolveram realmente estando fragmentados por toda uma miríade de outras disciplinas acadêmicas Propondo uma solução para esse problema ele sugere que os estudos da ordem da ludologia sejam não tomados como superior aos da teoria da narrativa mas que ambas as teorias sejam combinadas num resultado que pode nos levar a um melhor entendimento da questão É conveniente perceber antes de tudo que as fronteiras entre tais áreas de estudo estão sempre difusas e que eles acabam se emaranhando no escopo um do outro muito comumente Tal ação conciliadora do autor se baseia nos estudos de Aarseth 1997 apud Frasca 1999 p 1 onde se afirma que clamar que não há diferenças entre jogos e narrativas é 11 Tradução livre The problems of using a game perspective are many Basically traditional games have always had less academic status than other objects like narrative 30 ignorar as qualidades essenciais das duas categorias E mais como este estudo tenta mostrar a diferença não é clara e entre os dois há uma área de fronteira muito difusa12 É importante ter em mente que a palavra jogo pode conter múltiplos significados como já foi mencionado Isso fez com que Callois 1967 precisasse apresentar novos termos que não estavam disponíveis em sua línguamãe e que são vitais para a compreensão da atividade de jogar Os termos são paidea e ludus que cobrem os dois significados que nos interessam no momento Decidimos então manter essa terminologia do teórico francês mas não literalmente e sim com uma leve adaptação essa feita por Frasca no artigo supracitado A importância de tal terminologia é que no senso comum a atividade lúdica em se tratando da língua portuguesa especificamente é englobada por dois verbos distintos13 jogar e brincar e nesse mesmo senso comum costumase fazer a distinção de que jogar possui regras sólidas enquanto o brincar não as possui Vidart 1995 mostra que esta assunção está errada e que ao contrário do que se acredita o brincar também contém regras estritas Ele dá o exemplo de uma criança que finge pilotar um avião Há uma regra em jogo se comportar como um piloto e não como um médico ou como um motorista de carro Essa regra foi proposta e aceita pelo mesmo jogador e ele pode livrarse dela quando achar melhor mas enquanto estiver brincando ele vai aceitar a proposição com a mesma seriedade com a qual aceitaria a regra de um jogo Então é nesse sentido que Frasca acredita que precisamos estabelecer uma diferença e ele encontra a chave para isso em Lalande 1928 onde o filósofo propõe dois significados diferentes para a palavra jeu14 em seu Dictionaire Philosophique Mesmo que ele não se refira explicitamente a jogar e brincar só existe uma palavra em francês para as duas atividades ele os diferencia não pelas regras mas pelo resultado Frasca 1999 p 3 Assim sendo Frasca decide usar os termos cunhados por Callois mas se apossando das definições de Lalande 12 Tradução livre To claim that there is no difference between games and narratives is to ignore essential qualities of both categories And yet as this study tries to show the difference is not clearcut and there is significant overlap between the two 13 Há obviamente outras palavras que podem servir de sinônimos para tal atividade na língua portuguesa Fato é que elas só reproduziriam o sentido guardado pelas duas palavras citadas 14 Jogo em francês 31 Paidea é Prodígio de atividade física ou mental que não tem nenhum objetivo imediato nem objetivo definido e cuja única razão para existir é prover o prazer experimentado pelo jogador Ludus é um tipo particular de paidea definido como uma atividade organizada sob um sistema de regras que define uma vitória ou derrota um ganho ou perda Frasca 1999 p 315 Dito isto podemos nos focar nas abordagens teóricas que tratam dos jogos eletrônicos Este é um horizonte metodológico que se articula principalmente como já foi dito entre as teorias da narratologia e da ludologia 1221 Narratologia No que diz respeito à narratologia é importante perceber que o fortalecimento de tomada de posição em direção à narrativa parece estar ligado intrinsecamente ao desenvolvimento da indústria dos jogos eletrônicos Em seus primeiros anos os softwares carregavam apenas os aspectos lúdicos básicos sem se importar com uma história com uma trama Ação ambiente e personagem eram simplificados ao máximo principalmente por causa da falta de recursos técnicos disponíveis e talvez por uma nãolegitimação da indústria dos jogos eletrônicos como uma força dentro da indústria cultural Tomando como exemplo o clássico Pac Man imortalizado pelo console Atari 2600 o jogador controlava apenas um semicírculo representando rudemente uma face com olhos e boca e tinha o objetivo de comer vários pontos e traços dispostos ao longo da tela Para gerar a dificuldade e conseqüentemente o desafio que gera a incerteza que induz à tensão outras figuras essas controladas pelo computador programadas para se parecerem com fantasmas perseguiam o semicírculo pelos labirintos prémontados uma vez que todos os pontos e traços fossem comidos pela figura do semicírculo a fase acabava e era substituída por outra igual onde os fantasmas se moviam com mais 15 Tradução livre Paidea is Prodigality of physical or mental activity which has no immediate useful objective nor defined objective and whose only reason to be is based in the pleasure experimented by the player Ludus is a particular kind of paidea defined as an activity organized under a system of rules that defines a victory or a defeat a gain or a loss 32 velocidade exigindo um maior domínio da coordenação motora aumentando o nível de dificuldade E assim por diante Essa posição contudo é controversa Por mais que o exemplo em cima não deixe transparecer uma narrativa complicada e cheia de nuances ainda há teóricos que mesmo nos mais simples jogos eletrônicos identificam os elementos básicos de uma narrativa Jull 2001 acredita ainda que é possível identificarmos no videogame pelo menos unidades narrativas mínimas já que este possui a tríade básica narrativa ação ambiente e personagem Em Tetris16 temos a história de blocos de diferentes formas geométricas personagens que ao caírem do topo da tela têm de se encaixar ação formando linhas completas que desaparecem na tela ambiente Nesses tipos de jogos a narrativa entendida a posteriori de forma aberta como o resultado das ações mostrase demasiadamente simples e muito mais limitada em termos de interpretação e de retórica Nesteriuk 2002 p 91 A presença da narrativa nos jogos se fez por meio do desenvolvimento tecnológico da indústria que não estando mais limitada a poucos gráficos e cores resolveu diversificar seu portfolio Sendo assim grandes corporações donas de personagens famosos como a Disney por exemplo dona do rato mais famoso do mundo Mickey Mouse passaram a investir em cartuchos que não só apresentavam novos recursos de jogabilidade mas também se apoiavam sobre uma história coesa com início meio e fim A valorização da narrativa veio juntamente com o aparecimento de jogos que propunham tramas mais complexas personagens mais ricos e cenários impossíveis para as gerações tecnológicas anteriores Um processo a um só tempo específico mas também similar ao de outras mídias dentro da indústria do entretenimento É a narrativa que articula e organiza o material proposto determinando não apenas como as histórias serão contadas mas sobretudo atuando na constituição de gêneros narrativos mais ou menos definidos Para os narratólogos os games representam uma maneira particular de expressar uma história da mesma forma que o cinema os quadrinhos a TV ou a literatura Pinheiro e Branco 2006 p 2 Desse modo na perspectiva da narratologia os jogos eletrônicos seriam classificados antes de tudo pelo conteúdo que se escolhe contar dentro dele processo 16 Em Tetris o jogador deve encaixar um monte de formas geométricas de formatos variados que caem aleatoriamente do topo da tela de modo a formar linhas cada linha formada desaparece e o objetivo do jogo é não deixar os cubos empilharem sem formar linhas completas impedindoos de chegar ao topo Uma versão online de Tetris pode ser jogada a partir de httpwwwstudentstutfiahmaniea Nesteriuk 2002 p 91 33 similar ao do cinema e de ficções televisivas Uma tipologia dos games estaria então vinculada como no cinema ou nos quadrinhos ao gênero narrativo Teríamos jogos de ação de guerra de terror westerns comédias etc Pinheiro e Branco 2006 p 2 Conceitos como este da narratologia fizeram autores discursar sobre estratégias de interação entre homem e máquina que cobririam teoricamente as dúvidas sobre estes processos As narrativas construídas no computador guardam dentro de si diferenças cruciais com relação a suas contrapartidas midiáticas elas tendem mais para a forma mais aberta do jogo do que para a seqüência irreversível de acontecimentos que marca a experiência narrativa mais convencionalmente conhecida na literatura e no cinema Machado 2002 p 2 A forma aberta de que Machado fala referese precisamente ao fato que foi citado anteriormente a interação a participação não é uma arbitrariedade do jogo sem ela não existe experiência narrativa Diferente do cinema ou da literatura como ele mesmo põe nos jogos eletrônicos a intervenção do usuário é não apenas desejável mas até mesmo exigida Machado 2002 p 2 No videogame a intervenção do interator é uma exigência do sistema e sem ela não há acontecimento possível enquanto nas narrativas digamos assim passivas o espectador ou leitor deve deixar os eventos seguirem seu rumo predeterminado e toda ação que se requer deles está restrita apenas ao plano psicológico ou mental interpretação identificação com as personagens etc Machado 2002 p 2 Essa correspondência entre o videogame e as narrativas passivas17 contudo deve ser operada cuidadosamente autores como Murray 1999 consideram perigoso concebêla de forma rígida A autora defende a idéia de que o jogo não é senão uma forma mais especializada de dramaturgia onde grande parte das estratégias clássicas continua funcionando Além disso não é incomum ouvir falar de uma associação entre a poética aristotélica e os jogos eletrônicos Laurel 1993 Klastrup 2003 17 Para Machado 2002 as narratives passivas são aquelas onde não há uma interação ativa entre sistema e usuário ou entre obra e espectador Num filme por exemplo você pode se identificar com o protagonista mas não pode decidir se ele vai pela direita ou pela esquerda 34 1222 Ludologia A ludologia no caso configurase numa linha de pensamento que inverte a posição central atribuída à narrativa nos jogos eletrônicos Apoiandose principalmente no conceito de ludismo e do dispêndio de energia sem fim absoluto ou maior a ludologia clama que não é necessário haver uma história para que haja um jogo Para que o jogo funcione enquanto jogo basta que proporcione uma estrutura reconhecível ao qual o gamer possa adaptarse Para Jesper Jull um dos ludólogos mais conhecidos o jogo pode ser apenas o jogo pelo jogo Pinheiro e Branco 2006 p 2 Tal tipo de argumentação nos leva à desvalorização da história frente à estrutura lúdica projetada A análise do ludólogo se baseia nas relações estabelecidas pelos objetos e funções do jogo e não pelo que remetem enquanto significação O jogo já não precisaria significar algo mas ser algo Ibidem A estrutura gráfica presente no jogo estaria lá apenas para garantir que o sistema funcionasse e que pudesse ser decodificado pelo interator sem nenhuma correspondência aparente com qualquer fator do mundo externo ao jogo Não importa se o pontinho azul é uma nave ou se o inimigo é nazista O que importa é que o gamer reconheça uma estrutura e saiba como agir em função dela Ibidem Construir uma tipologia dos jogos através do viés da ludologia constitui uma atitude que vai em direção a um aspecto mais interno do jogo Não é o simples fato de decodificar as cores e formas que aparecem no monitor ou qualquer outro dispositivo final mas de ir fundo num nível de entendimento algorítmico do jogo Tais premissas não excluem a existência da narrativa em um jogo Elas apenas consideram que tal elemento caso esteja presente e ele sempre vai estar em menor ou maior função como apontado por Juul anteriormente esteja meramente subordinado à estrutura ludológica do jogo Desse modo jogar se torna muito mais importante do que experimentar a história ou perceber como se dá a formação o desenvolvimento ou a personalidade de um ou outro personagem Kirksæther 1998 observa que por trás do tradicional jogo de xadrez existe uma história sobre dois povos em guerra O fato é que durante o jogo esquecese dessa história de seu design narrativo e de sua retórica para se concentrar exclusivamente na estrutura do jogo Jogar um videogame é portanto fundamentalmente interagir com o seu estado de jogo Nesteriuk 2002 p 91 35 O fato é que muitas vezes o jogador de videogame está tão absorvido pelo objetivo pela estrutura lúdica do jogo que ele não reflete sobre o enredo que ele vem escrevendo por meio de suas ações isso passa de forma completamente transparente pra ele num processo de imersão sem falhas Entretanto é preciso considerar que posteriormente quando descrevendo suas sessões o jogador narra os fatos de modo que seus relatos assumem tipicamente a forma de uma história Como se pode ver é complicado estudar uma área estritamente sem entrar mesmo que por acidente no domínio da outra Tal proximidade entre as duas áreas teóricas motivou os estudos de Frasca 1999 que propõe então uma aproximação entre narratologia e ludologia para que seja feito um estudo mais completo dos jogos eletrônicos enquanto produtores de sentido 1223 Narratologia e Ludologia Como se pode ver as curvas teóricas utilizadas para estabelecer um discurso acadêmico sobre os jogos eletrônicos não são exatamente unificadas mas também não são isoladas uma da outra Narratologia e ludologia comumente rompem fronteiras e uma teoria acaba adentrando o escopo da outra o que causa uma grande discussão na comunidade pesquisadora Para tentar sanar tal problema o professor e pesquisador da Universidade de Copenhagen Gonzalo Frasca desenvolveu uma terceira linha que busca de certa forma harmonizar os conceitos anteriormente trabalhados Ele defende uma aproximação entre narratologia e ludologia alegando que há uma relação entre o sistema de jogo e a história que os transformam em constituintes de um modelo específico de narrativa que abrange o conceito da ludologia Frasca defende a idéia de que o jogo tem uma narrativa e que essa é o resultado das relações entre o sistema ludológico estrutural do jogo e os elementos da narrativa Pinheiro e Branco 2006 p 3 O desenvolvimento de tal perspectiva então nos leva a uma definição do jogo como produto narrativo legítimo assim como o cinema ou os livros mas nesse caso 36 jogos são produtos narrativos que apresentam uma peculiaridade configurada pelo comportamento essencial regido pelo sistema lúdico Como já foi dito o debate entre os dois campos é algo que ainda se encontra em franca expansão a maioria do material acadêmico que tem sido desenvolvido mundo afora se utiliza das teorias da narratologia considerando o jogo como a evolução natural do drama e da narrativa Embora tal premissa seja muitas vezes contestada gerando debates apaixonados entre pesquisadores de linhas diferentes de pensamento o paradigma da narratologia ainda prevalece Numa abordagem interessante no ponto principalmente da convergência das teorias e de sua mútua inclusão Frasca 2003 se apóia num fator que até então não havia sido citado para clamar que embora sim os jogos se configurem numa estrutura narrativa eles não se baseiam na representação mas sim numa estrutura semiótica alternativa chamada de simulação Para ele mesmo que simulações e narrativas compartilhem elementos essenciais como ação personagem e cenário citados previamente a mecânica dos dois paradigmas é essencialmente diferente Mais que isso eles apresentam possibilidades retóricas distintas Cabe aqui deixar claro que a proposição do paradigma ludologista por Frasca não se deu simplesmente por um capricho para mostrar ineficiências e imprecisões dos aparatos analíticos do paradigma da narratologia Como uma disciplina formalista ela a ludologia deveria se preocupar com o entendimento da estrutura e dos elementos particularmente das regras como também criar tipologias e modelos que expliquem a mecânica dos jogos Frasca 2003 p 2 Por mais que compartilhem vários elementos em comum narrativas e simulações se baseiam em sistemas semióticos diferentes A questão é que a representação e daí a narrativa é uma ferramenta tão universal e poderosa que se tornou praticamente transparente para nossa civilização Alguns autores como Mark Turner 1998 até afirmam que os mecanismos narrativos são estruturas cognitivas profundamente enraizadas na mente humana Talvez por causa de tal onipresença então seja normalmente tão difícil de aceitar que existe uma alternativa à lógica da narrativa a simulação 37 Claro o potencial da simulação foi durante muito tempo rechaçado porque não existiam aparatos tecnológicos apropriados para modelar por exemplo sistemas complexos A invenção do computador mudou essa situação Na década de 1990 por fim Espen Aarseth revolucionou completamente o estudo dos textos eletrônicos propondo que textos eletrônicos poderiam ser melhor entendidos se fossem analisados como sistemas cibernéticos18 Aarseth apud Frasca 2003 p 2 Ele criou uma tipologia de textos e mostrou que o hipertexto é somente uma dimensão possível desses sistemas de textos sistema ao qual ele chamou de cibertextos A teoria literária tradicional simplesmente não conseguiu lidar com tais textos pois ao invés da lógica familiar da transmissão seqüencial de signos tais trabalhos não só eram compostos de seqüências de signos como também se portavam como máquinas e geradores de signos19 Frasca 2003 p 2 Foi aí que o reino da representação foi academicamente contestado abrindo espaço para os estudos dos jogos e da simulação A mídia tradicional é representacional não simulacional Eles sucedem em reproduzir tanto descrições de características quanto sequências de eventos narrativa Uma fotograia de um avião irá nos mostrar informações sobre sua forma e sua cor mas não vai voar ou cair sendo parte de um acidente quando manipulada Um simulador de vôo ou um simples avião de brinquedo não são apenas signos mas máquinas que geram signos de acordo com as regras que modelam alguns dos comportamentos de um avião real Um filme sobre um avião aterrissando é uma narrativa um observador pode interpretálo de maneiras diferentes algo como é um pouso normal ou é um pouso de emergência mas não pode manipular o avião e influenciar sua aterrissagem já que as sequências do filme são fixas e inalteráveis De outro lado o simulador de vôo permite que o jogador execute ações que vão modificar o comportamento do avião atual Se o jogador aumentar a variável de poder no simulador o avião simulado vai se mover mais rápido pelo céu virtual na tela do computador Jogos são apenas um modo particular de estruturar uma simulação assim como narrativa é somente uma forma de estruturar a representação20 Frasca 2003 p2 18 Tradução livre electronic texts can be better understood if they are analyzed as cybernetic systems 19 Tradução livre Traditional literary theory and semiotics simply could not deal with these texts adventure games and textualbased multiuser environments because these works are not just made of sequences of signs but rather behave like machines or signgenerators 20 Tradução livre Traditional media are representational not simulational They excel at producing both descriptions of traits and sequences of events narrative A photograph of a plane will tell us information about its shape and color but it will not fly or crash when manipulated A flight simulator or a simple toy plane are not only signs but machines that generate signs according to rules that model some of the behaviors of a real plane A film about a plane landing is a narrative an observer could interpret it in different ways ie its a normal landing or its an emergency landing but she cannot manipulate it and influence on how the plane will land since film sequences are fixed and unalterable On the other hand the flight simulator allows the player to perform actions that will modify the behavior of the system in a way that 38 Curioso pontuar contudo que a precisão de um sistema de simulação como o descrito acima por Frasca é variável de acordo com o observador jogador no caso exatamente como acontece com a representação tradicional Um simulador de vôo simples poderia ser muito sofisticado para um amador mas passar como extremamente simples para um piloto expert Então para um observador externo a seqüência de signos produzida por um filme e por uma simulação poderiam parecer exatamente iguais O detalhe que geralmente passa despercebido aos pesquisadores que dão suporte ao paradigma narratológico é que as seqüências semióticas podem ser absolutamente idênticas mas uma simulação não se entende simplesmente por sua saída Esse é um sentimento absolutamente comum a qualquer pessoa quem pode confundir o sentimento de estar participando de uma partida de qualquer jogo tradicional ou eletrônico com o de estar simplesmente observando o desenrolar da atividade Aparentemente tal explicação fenomenológica não é tão evidente quanto parece Eskelinen condensa isso Fora da teoria acadêmica as pessoas são geralmente excelentes em distinguir narrativas dramas e jogos Se eu jogo uma bola em você eu não espero que você solte ela e comece a contar histórias21 apud Frasca 2003 p3 Talvez estejamos tão acostumados a enxergar o mundo através de lentes narrativas que seja difícil imaginar uma alternativa não Claro é muito mais fácil aplicar a teoria já cristalizada da narrativa à qual existe toda uma academia já familiarizada por sinal do que desenvolver uma nova teoria do começo estando sujeito a acertos e erros Isso somado ao fato de que nossa sociedade de consumo já está altamente familiarizada com a produção e assimilação de produtos narrativos A tentação para restringir os jogos eletrônicos a esse campo é grande demais Mas esse comportamento pode demonstrar problemas Frasca alerta que os videogames implicam numa mudança crucial do nosso paradigma de assimilação da is similar to the behavior of the actual plane If the player increases the power variable on the simulator the simulated plane will move faster through the virtual sky on the computer screen games are just a particular way of structuring simulation just like narrative is a form of structuring representation 21 Tradução livre outside academic theory people are usually excellent at making distinctions between narrative drama and games If I throw a ball at you I dont expect you to drop it and wait until it starts telling stories 39 cultura eles representam a primeira mídia simulacional complexa disponível para as massas22 2003 p 3 Brinquedos e jogos de tabuleiros também se configuram como mídias simulacionais mas não podem equiparar o nível de complexidade exercido pela tecnologia usada pelo videogame 13 Da Gênese dos Videogames 131 De como contar uma história De posse desse conhecimento sobre a lógica do lúdico e sobre como a convergência midiática transformou mídias em hipermídia é hora então de falar brevemente sobre o desenvolvimento dos videogames e de sua indústria tão expressiva nos dias de hoje Traçar uma linha cronológica é sempre além de uma tarefa árdua uma que transpira parcialidade aquele que o faz tem em mãos o poder de escolher que fatos ignorar sejam eles relativos ao lado da maioria econômica bélica social em geral os chamados vencedores ou sejam eles relativos às minorias que podemos chamar aqui como Johnson 2001 chama os vencidos E já que evocamos o teórico é interessante deixar um de seus conceitos transparecer no texto Quando falando principalmente de cronologias referentes ao desenvolvimento tecnológico Johnson afirma que estamos acostumados a conhecer principal e absolutamente um tipo de linha temporal que está atrelada a resultados não de eficácia ou qualidade mas sim a resultados de ordem comercial que no caso são mais importantes do que as centenas de primos pobres que se espalham no mercado de consumo capitalista com o qual nos acostumamos Nesteriuk 2002 p 76 acredita que com esse modus operandi dos meios de comunicação e em especial meios de conservação da memória da humanidade há uma contribuição involuntária para que pesquisadores que dedicaram sua vida a um projeto em específico que não emplacou comercialmente sejam esquecidos por circunstâncias que às vezes não se mostram de forma tão clara 22 Tradução livre they represent the first complex simulational media for the masses 40 Conhecemos na área tecnológica apenas um tipo de história atrelada normalmente aos resultados comerciais e evolutivos específicos e que não permite o conhecimento de outras histórias das tecnologias Johnson afirma ainda que inúmeras invenções e idéias apresentavam fantástico potencial e muitas vezes resultados melhores do que as versões adotadas e comercializadas pela indústria e assimiladas pelo mercado e seu público O videogame enquanto meio se configura como o exemplo perfeito para as teorias de Johnson e posteriormente Nesteriuk pois os pesquisadores da mídia geralmente privilegiam uma única cronologia ditada principalmente por aparelhos que foram sucessos de venda esquecendo que conceitos e detalhes importantes que sobrevivem até hoje na produção dos aparelhos surgiram às vezes em consoles que foram absolutamente esquecidos Para entendermos finalmente como surgiram e evoluíram os videogames até o presente momento é necessário então fazermos uma diferenciação básica entre os vários suportes tecnológicos para jogos eletrônicos que estão ou estiveram disponíveis no decorrer desses quase 50 anos de história dessa mídia Antes contudo devo dizer que utilizo a palavra videogame ou seu plural para denominar qualquer jogo eletrônico seja este jogado em a computador em ambiente privado como em casa tanto como em ambiente público como em lan houses23 por exemplo seja este jogado em b aparelhos dedicados os chamados consoles com a tv como periférico que podem ser i consoles domésticos no caso dos aparelhos adquiridos em lojas para uso pessoal ou consoles públicos geralmente integrados a máquinas de grande porte dispostas em lugares públicos como shoppings e galerias chamadas comumente de ii arcades Sendo a e b respectivamente suportes tecnológicos físicos hardware para a execução dos jogos que geralmente são criados para um tipo de suporte em específico mas o que não os impede de serem convertidos para os outros suportes uma vez que seja economicamente interessante ou viável Com relação aos três tipos de suporte físico há ainda que se perceber que 23 LAN é a sigla para Local Area Network Rede Local que são redes de pequena extensão física e maior velocidade de comunicação entre pontos Lan Houses são estabelecimentos comerciais que disponibilizam computadores em rede em LANs para poder possibilitar jogar em grupo já que às vezes o aparato tecnológico necessário não se encontra no poder aquisitivo dos pais dos jovens interessados ou simplesmente porque é mais cômodo fazer uso do serviço já pronto Há que se considerar uma certa ética de grupo aqui já que os jovens criam diferentes dialetos que se configuram em senhas de acesso ao grupo estabelecendo rituais para entrada e manutenção nas galeras Alves 2005 p 115 41 a Jogos para computadores são executados normalmente no próprio hardware de um computador com arquitetura PC ou Mac em diversos sistemas operacionais e interagem ou seja fazem interface com o usuário através dos periféricos já tão conhecidos da Era Digital que vivemos mouse teclado monitor caixas de som etc b i Jogos para consoles domésticos embora também sejam executados por um computador com processador e memória qualquer videogame o é diferem da categoria acima por serem rodados num hardware dedicado totalmente ao jogo e à sua performance que é acoplado à televisão doméstica que no caso funciona como periférico por meio de entradas auxiliares A interação ocorre através da TV claro e de joysticks que são dispositivos através dos quais o usuário controla o jogo24 Um bom exemplo de console doméstico é o Playstation da Sony ou o Super Nintendo da Nintendo ii Arcades chamados erroneamente de fliperamas25 são grandes máquinas que integram console e monitor e diferem dos consoles domésticos por serem geralmente montadas especificamente para locais públicos Têm bem menos funcionalidades que os consoles e um processamento não tão bom quanto alguns consoles domésticos mais atuais mas são um ótimo incentivo para uma dinâmica da socialidade 24 Com a convergência tecnológica que hoje é experimentada começam a aparecer os primeiros consoles que não são totalmente dedicados ao jogo mas que executam outras tarefas de entretenimento como tocar CDs de áudio ou acessar a Internet Desses o mais famoso midiática e economicamente é o Playstation 3 fabricado pela Sony Ver mais sobre o console em httpwwwsonycomps3 25 Fliperama é a designação utilizada para as máquinas criadas no final do século XIX nos Estados Unidos pinball que consistem de dois ou mais flippers braços com a função de rebater uma bola que a medida que encostava em pinos plaquetas e outros objetos acumulava pontos de volta para a mesa de jogo sem deixála passar por entre os dois flippers nem cair em canaletas laterais No Brasil acabou tornandose a designação genérica para arcades e em alguns casos para toda espécie de game bem como para o tipo de estabelecimento onde normalmente se encontra uma grande concentração dessas máquinas Nesteriuk 2002 P 78 42 Os joysticks geralmente consistem de um manche e alguns botões dispostos em uma plataforma de madeira Partindo então do princípio de que todos esses suportes são ligados pelo seu desenvolvimento comum em paralelo e que todos eles utilizam um computador de um modo interno ou de modo mais óbvio mais visível para processar as várias mídias que vão compor essa nova hipermídia o termo videogame será usado para se referir a qualquer desses jogos Tal terminologia também faz parte do corpo teórico de alguns pesquisadores consultados para a elaboração deste trabalho monográfico como Nesteriuk 2002 e Frasca 2001 132 O Surgimento do Videogame Fica claro então que nossa escolha com relação à história de como surgiu essa mídia que hoje se destaca o videogame procura não só mostrar reações do mercado e não mede de nenhum modo a eficácia de um ou outro produto simplesmente pelo seu impacto comercial Pretendo manter máximo de transparência nesse sentido para que fatores importantes na história dos jogos eletrônicos não fiquem obscurecidos por como uma ou outra história são contadas De modo curioso então essa postura que é assumida aqui neste trabalho já repercute no primeiro nó cronológico a ser citado quando privilegiamos não a criação mas o vislumbre do construto a concepção dos jogos eletrônicos em detrimento de sua factual criação Antes de o primeiro videogame ser criado no estado americano de Nova Iorque em 1958 um visionário Ralph Baer em 1951 tinha a idéia que revolucionaria a história dos jogos Previsivelmente Baer foi tomado como inconseqüente para seus companheiros de trabalho da Loral empresa produtora de aparelhos de televisão quando sugeriu que a empresa deveria incluir novas características no aparelho como adicionar alguma forma de jogo para televisão A idéia recebeu uma previsível reação negativa e foi o fim disso Baer 1999 43 Baer não foi o primeiro a criar o videogame então esse foi Willy Higinbotham renomado físico americano que além de construir a primeira versão de Tennis Programming ou Tennis for Two como veio a ser chamado processada por um computador analógico e mostrada no display de um osciloscópio também teve sua assinatura em um dos mais bem sucedidos projetos bélicos americanos de todos os tempos a bomba atômica que foi usada após o fim da Segunda Guerra Mundial sobre as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki Higinbotham na verdade concebeu tal passatempo para ajudar nas demonstrações que eram organizadas por instalações de pesquisa de física e tecnologia para que o governo americano pudesse mostrar aos populares seu poderio e nunca se preocupou em patentear o aparelho que depois teve sua interface melhorada saindo do osciloscópio e passando para um monitor monocromático de 15 polegadas Há como é de se esperar um passado comum entre a pesquisa tecnológica e a Ficção Científica que antes era um gênero pertencente unicamente a cientistas que desejavam fazer previsões ou discutir a evolução Uma das intersecções entre essas duas áreas distintas se dá em 1962 quando Stephen Russel pesquisador do Massachusetts Institute of Technology MIT se baseando nos livros do escritor EE Doc Smith cria Spacewar considerado por muitos estudiosos da área como o primeiro dos videogames talvez porque ele era bem mais elaborado que o tênis de Higinbotham Sucesso absoluto o jogo não só mantinha os civis maravilhados nas demonstrações como se tornou obrigação para os próprios pesquisadores do MIT que nas horas vagas divertiamse em frente à máquina Nolan Bushnell era um desses pesquisadores Ele se formou em 1969 e em 1971 já trabalhava na Ampex primeira empresa a desenvolver um vídeocassete mas foi pela Nutting que ele lançou Computer Space considerado por muitos um plágio de Spacewar mas que foi o primeiro a ser distribuído em escala comercial e daí para nunca mais voltar para o anonimato tanto para os dispositivos quanto para Bushnell que em 1972 com Ted Dabney funda a Atari lançando Pong dessa vez plágio de Tennis for Two Nesse ponto os consoles ainda eram todos públicos baseados numa dinâmica de inserir moedas para obter créditos da mesma forma que uma cabine telefônica 44 No mesmo ano que a Atari era fundada a Magnavox ramificação da Philips lança cem mil unidades do Odissey 100 primeiro console que permitia jogar videogame em casa Bushnell sempre atento em 1974 lança Home Pong que vende cento e cinqüenta mil unidades e estabelece por fim a indústria dos videogames Indústria que tem seu próximo passo com o Channel F primeiro videogame com console programável isto é que permitia a partir da mesma máquina a substituição de um jogo por outro neste caso por meio de cartuchos Nesteriuk 2002 p 83 O mercado começa a esquentar de verdade quando a Warner compra de Bushnell e Dabney a Atari e lança em 1977 o Atari 2600 console revolucionário com 128 bytes de memória e cerca de 12 MHz de velocidade de processamento que viria a ser um dos principais ícones da década de 1980 ao redor do globo Vale a pena ressaltar que a Atari nessa época junto com a Connecticut Leather Company Coleco eram as únicas empresas que se dedicavam ao mercado dos videogames visto que os investimentos tinham cessado em 1976 o que causou a primeira crise do setor Alves 2005 p 41 Em 1979 o Microvision lançado pela Milton Bradley chama atenção por ser o primeiro videogame portátil a aparecer no mercado O curioso é que o produto quase 30 anos atrás já trazia consigo os princípios dos consoles de mão princípios que sobrevivem até hoje tela de cristal líquido funcionamento à bateria e controles embutidos no próprio dispositivo O Microvision foi um fracasso de vendas devido às condições precárias de seu sistema poucos gráficos poucas cores e poucos jogos lançados sendo esse último o fator determinante de seu insucesso Nesteriuk 2002 p 84 Numa tentativa de fazer frente ao sucesso do Atari 2600 a Coleco lança o ColecoVision Com maior definição dos gráficos melhor jogabilidade e mais títulos disponíveis no mercado mesmo custando quase o dobro de seu concorrente em 1983 as vendas do ColecoVision ultrapassaram as do console da Atari Ainda em 1983 a Atari põe no mercado uma nova versão de seu console o Atari 5200 e vê suas vendas despencarem devido à fraquíssima interface26 do videogame 26 A função da interface é comunicar ao jogador o estado de mundo e receber inputs do jogador daquilo que ele quer mudar no mundo do jogo O ato de usar os inputs e outputs da interface não precisa ser divertido em si é a interação do jogador com esse mundo que deve ser uma experiência convincente Rouse 2001 p 401 45 1984 um ano que parece absolutamente expressivo no estudo da cultura digital27 viu então mais uma crise no setor com a proliferação dos Personal Computers PCs e todas as promessas de tecnologia ao alcance da mão e dentro de casa o mercado de videogames despenca com várias empresas quebrando e as vendas caindo vertiginosamente A guerra de preços estabelecida entre as empresas a falta de renovação tecnológica dos consoles e a criatividade limitada apresentada nos jogos existentes bem como as restrições físicas dos cartuchos que não apresentavam alta capacidade de armazenamento de dados contrapunhamse às múltiplas possibilidades que os PCs pareciam oferecer Diante desse novo universo de alternativas as empresas de games começaram a desaparecer do cenário Decretouse portanto a morte dos videogames Alves 2005 p 42 Mas esse como se sabe não é o fim da história O império do Japão na década de 1980 tinha uma única ordem em mente Conquistemos os mercados externos Barral 2000 p 34 Com essa premissa em mente contrariando todas as expectativas a Nintendo lança seu Famicom que já vendera cerca de 3 milhões de unidades do outro lado do mundo nos Estados Unidos com o nome de Nintendo Entertainment System NES o que reergueu o mercado em 1985 Surge aí o reinado hegemônico do encanador Mário e de seus companheiros na série Mario Brothers que viria a ser o ícone da Nintendo no futuro A Nintendo em 1986 então já era dona de 90 do mercado parcela que só veria queda em 1989 com o lançamento do Megadrive primeiro videogame com 16 bits chamado de Genesis fora do Brasil pela Sega empresa também japonesa e dona do igualmente carismático Sonic um porcoespinho azul cujo jogo obedecia a mesma lógica dos da série Mario Brothers A Sega deu em termos de mídia de distribuição de jogos o primeiro grande passo ao unir a tecnologia do CDROM28 a um console já consagrado seu Megadrive criando 27 1984 além de ser o título e ano em que se passa a famosa história de Orwell sobre um futuro apocalíptico e absolutamente tirânico é ainda o ano em que William Gibson lança o seminal Neuromancer apontado como marco inicial da cultura cyberpunk De forma semelhante 1984 é o ano do surgimento da Apple e dos seus computadores Macintosh que derruba a IBM e estabelece a forma como se constrói interfaces para sistemas operacionais até hoje uso de mouse ponteiro na tela ícones 28 O primeiro console a ter suporte a CD foi o Turbografx 16 que não foi bem sucedido comercialmente 46 então o SegaCD que foi um passo importante mas que comercialmente não emplacou só vindo a representar algo quando a Sega lançou o Saturn em 1994 A disputa SegaNintendo pelo mercado sofreu uma mudança forte quando também em 1994 a Sony mais uma japonesa lançou o Playstation console que tem o maior número de jogos disponíveis no mercado e que já vendeu mais de cem milhões de unidades em todo o mundo Nesteriuk 2002 p 90 Hoje a disputa pelo mercado se configura basicamente entre a Sony com o console Playstation 3 a Nintendo com seu Gamecube e um terceiro concorrente que migrou da indústria de computadores desktop para a indústria dos videogames a Microsoft com seu Xbox A mídia de transporte dos jogos mais uma vez mudou evoluindo do CD para o DVD que tem uma maior capacidade de armazenamento o que possibilita um melhor suporte para o desenvolvimento técnico dos jogos Nesteriuk 2002 p 90 já que permite imagens em resolução maior e em maior quantidade Além disso os computadores desktop de última geração providos de placas de aceleração gráfica cada vez maiores e mais rápidas são fortes concorrentes ao mercado de jogos já que apresentam maior facilidade de interação29 entre jogadores provendo às vezes mais de 16 jogadores simultâneos no mesmo jogo e performance semelhante embora não tenham o processador dedicado à tarefa de executar o jogo 29 Interação essa que pode ser dentro de redes de pequena abrangência Local Area Networks LANs nas Lan Houses ou via Internet com uma abrangência territorial virtualmente infinita 47 2 MULTIVERSO 21 Do Outro Lado do Espelho Os Fantásticos Mundos da Imaginação 211 Aproximação Há antes de abordar diretamente a relação limítrofe construída entre a lógica dos jogos e a das comunidades virtuais todo um espectro teórico que precisa ser conhecido não só para entender o funcionamento desse novo sistema semiótico mas principalmente para poder localizar e posicionar corretamente a figura do homem e de seu comportamento social no modo como se desenvolvem as sociedades contemporâneas Se existe algo que realmente intriga nesse universo de informação no qual mergulhamos para responder as perguntas que nos motivaram a essa pesquisa é saber exatamente onde se localizam tais mudanças que espaço é reservado para a interação de pessoas que estão em coordenadas opostas no globo terrestre Além disso outra coisa que não se pode deixar de notar independente da linha teórica utilizada ser apocalíptica ou integrada independente de acreditarmos que a tecnologia vai ser nossa salvação ou nosso fim é que existem transformações de origem cultural que estão sendo impressas ao corpo de forma que esse mesmo adquire uma ética própria e sendo assim falar de sua dissolução parece paradoxal embora seja absolutamente atual resgatando uma dicotomia secular postulada por Descartes e um desejo absolutamente integrado à dinâmica da cibercultura o de descorporificação presente entre tantas outras obras artísticas do fim do século XX na Ficção Científica Cyberpunk movimento literário da década de 1980 com obras seminais e escritores que causam impacto nos fins teóricos até hoje Mesmo navegando por áreas extensas que incorporam de maneira sinergética o conhecimento proveniente da psicologia da comunicação e sociologia além de outras áreas das ciências humanas vamos tentar nos manter sempre o mais próximo possível do objeto enfocado no trabalho o que de certa forma vai gerir nosso diálogo entre autores Para tentar responder as perguntas levantadas acima a princípio vamos nos aproximar de um conceito que é vital para entendermos a dinâmica dos jogos em especial a 48 dos jogos que são classificados como Massive Multiplayer Online RolePlaying Games MMORPG porque é dentro dessa classificação que se encontram os níveis de interação social que desejamos vislumbrar para a nossa pesquisa o conceito de mundos imaginários 212 Mundos Imaginários Você senta na frente do seu computador abre um programa com um login e senha digitados no lugar certo você adquire uma personalidade num outro mundo um que pode ser povoado por criaturas místicas vindas do folclore europeu ou por robôs e ciborgues vindos diretamente do futuro Você interage com todas essas figuras através de uma representação sua no jogo através de seu avatar que é totalmente personificável de modo que você pode ter orelhas pontudas ou asas de morcego nas costas Todo o ambiente no qual o seu eu digital está imerso se desenha em seu monitor através de poderosos decodificadores de fórmulas matemáticas processadores instalados na sua placa de vídeo ou sua placamãe Os seres e monstros que você vê são apenas representações digitais de outros jogadores que estão espalhados ao redor do mundo que às vezes nem sabem quem você é só o que seu personagem fictício pode fazer A descrição acima representa guardadas as devidas proporções a entrada de um usuário em um programa cliente30 de um MMORPG um jogo onde cada usuário se conecta a partir de seu próprio computador e interage com tantos outros que através de seus computadores conectamse a um servidor dedicado que estabelece regras regras sólidas de comportamento e convivência e que permite a criação de situações exclusivas ao mundo criado Os MMORPG são jogos que embora já bastante populares e cuja popularidade vem crescendo de modo exponencial necessitam de um aparato tecnológico de maior performance placas de aceleração de vídeo placas de rede uma conexão com a Internet que seja rápida e estável o que demanda conseqüentemente um maior poder aquisitivo 30 Na informática Sistemas Distribuídos geralmente se apresentam no formato ClienteServidor onde o servidor porta as regras de coexistência entre os usuários e os clientes fazem o processamento local e agem como interface para o jogador 49 referente aos jogadores que podem de certa forma escolher entre freqüentar lan houses com o intuito de jogar ou adquirir todo o aparato para participar da experiência de casa Esses jogos evoluíram de um misto entre jogos de computador da década de 1980 em especial os da série Ultima e os produzidos pela empresa SSL juntamente com a TSR Tactical Strategies Rules jogos reais de interpretação de papéis RPG31 dos quais o mais famoso era e continua sendo Dungeons Dragons também da TSR32 e finalmente dos MUDs MultiUser Domains também referidos como MultiUser Dungeons ambientes de simulação onde os jogadores não tinham interfaces avançadas ou avatares coloridos todas as respostas e ações de construção do mundo eram feitas através do teclado digitando Os comandos então eram interpretados pelo computador que tinha sido previamente programado para isso por alguém chamado comumente de manager wizard ou simplesmente de mestres no jargão da área em português o que fazia com que o mundo reagisse de forma lógica às ações que o jogador tinha tomado Retrocedendo um pouco mais é que podemos entender melhor esse fenômeno já que as raízes da criação dos MUDs se encontram nos RPGs e as próprias raízes da criação do RPG se encontram nos mundos de fantasia literária de autores como J R R Tolkien autor da trilogia O Senhor dos Anéis ou C S Lewis autor das Crônicas de Nárnia Pargman faz um apanhado geral da relação das pessoas com o que ele chama de mundos imaginários tecendo uma breve classificação que achamos por bem ser usada no nosso trabalho Baseandose em pesquisa de campo entrevistando justamente mestres e administradores de vários MUDs ele pôde perceber que além do óbvio interesse pela informática os administradores freqüentemente eram programadores essas pessoas também compartilhavam uma outra série de interesses como roleplaying games ou também conhecidos como live action roleplaying games além de ler freqüentemente grandes quantidades de literatura de fantasia ou ficção científica 2003 p 133 31 RPG significa RolePlaying Games São jogos onde jogadores escolhem personagens para interagir sob um controle limitado de um jogador especial chamado de mestre ou narrador numa narrativa que pode ter sido montada previamente ou pode ser improvisada RPGs são um exemplo clássico do que Biro chama de Ficção Interativa 2007 P 1 32 A TSR no fim da década de 1990 foi adquirida pela Hasbro uma empresa de grandes proporções que atua na área de produção de jogos e brinquedos Hoje os RPGs da TSR são publicados sob a bandeira da Wizards of the Coast subsidiária da Hasbro especializada em RPGs e miniaturas Para ver mais sobre isso acessar httpwwwwizardscomdnd 33 Tradução livre such as roleplaying games or socalled live action roleplaying games and reading often large amounts of fantasy or science fiction literature 50 O pesquisador sugere que embora tais interesses pareçam distantes e independentes uns dos outros o que eles têm em comum é que todos eles constituem certos tipos de mundos imaginários e que esses atraem pessoas que têm fascinação e vontade de entender e controlar sistemas complexos que são lógicos e controláveis Ibidem p 1 34 Segundo ele O termo mundo imaginário aqui se refere a um mundo autônomo e freqüentemente cuidadosamente engendrado que é diferente do mundo normal no qual nós vivemos Tal mundo tem uma lógica e uma realidade próprias mas esta lógica e realidade são diferentes da vivida diariamente no nosso mundo Ibidem p 135 O termo mundo imaginário descende diretamente do termo mundo secundário que foi cunhado por Tolkien para referirse a sua obra Segundo ele o mundo secundário era um mundo criado por um autor e realizado em um livro Pargman vai além substituindo a palavra secundário pela palavra imaginário para poder ampliar o significado do termo englobando assim outros tipos de mundo que as possibilidades tecnológicas nos apresentaram Os mundos imaginários se dividem em quatro tipos sendo o primeiro naturalmente os mundos de texto seguido pelos mundos de fantasia compartilhada e pelos mundos de códigos que além de englobar jogos de RPG baseados em computador MMORPG ainda englobam os mundos do próprio código fonte dos computadores Dos mundos de texto talvez o mais bem engendrado e famoso seja justamente o criado por Tolkien Quando alguém lê a trilogia O Senhor dos Anéis percebe imediatamente que o mundo é muito mais velho e complexo do que o próprio conto que os três volumes narram um mundo que o autor passou as quatro décadas anteriores ao seu lançamento construindo e que tem suas próprias línguas e mitos Há uma lógica interna disposta pelos livros que contam a história de Arda nome dado ao mundo pelo autor que se mantém absolutamente fiel e controlável tornando a experiência de imersão muito mais suave Tal lógica interna é vital para a construção da realidade interna do mundo e segundo Pargman 34 Tradução livre they all constitute certain kinds of imaginary worlds and that these appeal to persons who bear a fascination and a will to understand and master complex systems that are logical and controllable 35 Tradução livre The term imaginary world here refers to an autonomous and often carefully crafted world that is different from the ordinary world that we live in Such a world has a logic and reality of its own but that logic and reality is different from the everyday livedin world 51 vital para o interesse dos sujeitos naquele mundo imaginário em específico O discurso de Pargman no caso ecoa o de Turkle que acredita que Um escritor de ficção científica pode postular máquinas do tempo viagem intergaláctica ou telepatia mas não pode fazer isso arbitrariamente Você pode postular qualquer coisa mas uma vez que as regras do sistema tenham sido definidas é preciso aderir a elas escrupulosamente Essas são as regras pra criar mundos regidos Esses mundos são conhecidos para qualquer programador de computador e agora estão sendo passados para o futuro como conhecimento cultural para toda uma geração de crianças 1984 p 8136 Em seguida chegamos aos mundos de fantasia compartilhada que consistem basicamente de RPGs que são publicados e vendidos no mundo todo O primeiro jogo a ser lançado e que ainda é hegemônico nas análises de mercado foi Dungeons Dragons em 1974 Tanto este quanto muitos outros mundos de RPG são inspirados em trabalhos de escritores como Tolkien o que permite que tracemos sua origem e relacionemos sua estrutura interna Como Pargman bem pontua As características de diferentes tipos de criaturas e seu comportamento relacionado ao jogo além de seus efeitos são explicados com grande detalhe O mesmo acontece para características do personagem e profissões E saúde mental E equipamento E intervenção divina E assim por diante São a essas exposições contidas em maciços livros de regras que o jogador se apega quando um jogo é comprado O que é comprado é um sistema de jogo isto é um sistema operacionalizado para como um mundo de fantasia funciona em detalhes 2003 p 237 A narrativa nesse caso é interativa construída em conjunto pelo mestre e pelos jogadores É importante perceber que diferentemente das narrativas prontas em livros em jogos de computador mais simples a participação do jogador é essencial para o desenvolvimento da história Numa relação de duplatroca o mestre adapta as ações do 36 Tradução livreA sciencefiction writer is allowed to postulate time machines intergalactic travel or mental telepathy but cannot do it arbitrarily You can postulate anything but once the rules of the system have been defined they must be adhered to scrupulously Such are the rules for creating rule governed worlds They are known to every computer programmer and are now being passed on as cultural knowledge to a generation of children 37 Tradução Livre The characteristics of different types of creatures and their gamerelated behaviors and effects are laid out in great detail The same is true for armor weapons magic spells and potions The same is true for character traits and professions And mental health And equipment And divine intervention And so on It is exactly such expositions collected in thick rulebooks which one gets hold of when a role playing game is bought What is bought is a game system ie an operationalized system for how a fantasy world works in detail 52 jogador à situação que foi previamente criada do mesmo modo que quando informado das reações que suas ações causaram o jogador tem a liberdade de também adaptar as ações incluindo o pensamento e os dilemas morais de seu personagem Mundos de fantasia compartilhada são um exemplo de Ficção Interativa que Biro trata como obras literárias onde o leitor pode interagir com a narrativa enquanto ela está acontecendo o que faz com que o leitor também faça parte do processo de criação da ficção 2007 p 1 Para ele o raciocínio do leitor provocado pelo conflito da narrativa é uma parte essencial da ficção interativa O modo com que o leitor interage com a obra afeta a narrativa decisivamente ao invés de apenas interpretativamente idem Dos mundos de RPG é que o conceito de multiverso deriva propriamente Um dos muitos cenários que utilizam essa terminologia é pertencente ao jogo Dungeons Dragons da Wizards of the Coast Em Planescape o multiverso é um passo além da teoria da relatividade de Einstein ao invés de transformar o tempo em algo relativo o cenário opta por considerar várias linhas temporais em várias realidades diferentes que podem ou não estar conectadas e onde o tempo corre de forma diferente Em Planescape a cidade de Sigil é tida como o centro do multiverso algumas facções locais acreditam nisso outras não e se mostra como uma Nova Iorque hiperbólica com portais mágicos para todos os lugares imagináveis contendo seres de todos os planos de existência possíveis38 Tal conceito já foi explorado também em mundos de fantasia literária como nas Crônicas de Amber39 do escritor Roger Zelazny ou na trilogia de fantasia moderna His Dark Materials traduzida como Fronteiras do Universo do inglês Phillip Pullman Alves 2005 p 113 acredita que os jogos tanto os de computadores quanto os de interpretação por si só já representam comunidades virtuais nas quais os jogadores representam papéis que trafegam entre o real e o imaginário atuando muitas vezes como espaço de ressignificação e aprendizagem além do efeito catártico dos jogos defendido pela teórica Por fim fazemos nossa incursão aos mundos de códigos De volta aos computadores depois da breve incursão pelos outros mundos imaginários nos deparamos 38 Para saber mais sobre Planescape o cenário de campanha do jogo Dungeons Dragons e sobre Sigil a Cidade dos Portais acesse httpwwwplanewalkercom 39 Zelazny Roger Nine Princes in Amber Ace Books 1999 Não traduzido para português 53 com os mundos de fantasia baseados em computador um MUD nas palavras do próprio Pargman poderia possivelmente constituir um mundo imaginário cativante pois ele nos mostra não só um mas dois mundos imaginário sobrepostos ao belprazer do jogador ao mesmo tempo O primeiro mundo é o mundo de fantasia de um romance ou de um jogo de RPG com sua própria história e suas regras para como magia monstros morte e recompensas funcionam O segundo mundo nunca longe demais é o mundo sobreposto do sistema computadorizado 2003 p 340 Então fica claro que quando o autor fala de mundos de código ele está falando do modo como a própria linguagem de computador os códigos que constroem os softwares para os programadores sobretudo demanda uma inserção mais que isso imersão além da submissão a certas regras De posse dessas regras e de uma boa dose de criatividade o programador pode em tese fazer qualquer coisa acontecer guardadas as limitações físicas ou seja de hardware Computadores funcionam internamente de um modo que é diferente do modo como as coisas funcionam no mundo real eles têm sua lógica e sua realidade próprias que são diferentes da realidade que experimentamos no diaadia Assim sendo um sistema operacional como o Linux por exemplo pode ser considerado um mundo imaginário pois ele permite que você através de código crie outros tantos mundos imaginários O que nos leva a crer que MUDs no caso são apenas um tipo de mundo imaginário que pode ser criado através de código de computador A questão aqui é que os MUDs não eram exatamente espaços que privilegiavam o relacionamento como fim e sim como meio Os jogadores tinham objetivos vontades ambições Eram recompensados numa lógica típica do ludus Mas com o passar do tempo foram surgindo experiências geradas pelo código de computador cujo fim era simplesmente o encontro do anônimo a interação entre pessoas que já conheciam ou que viriam a se conhecer usando para isso o sistema criado De modo semelhante aos jogos esses espaços continuavam sendo chamado de MUDs Turkle explica o equívoco 40 Tradução livre A mud could possibly constitute a captivating imaginary world as is puts not just one but two superimposed imaginary worlds at ones disposal at the same time The first world is the fantasy world of a novel or a roleplaying game with its own history and its own rules for how magic monsters death and rewards works The second world never too far away is the underlying world of the computer system 54 O termo dungeon permaneceu na cultura da alta tecnologia para designar um lugar virtual Assim quando eram criados espaços virtuais que muitos utilizadores de computadores podiam partilhar e onde podiam colaborar uns com os outros tais espaços eram incluídos na categoria de MultiUser Dungeon ou MUDs um novo tipo de realidade virtual social apud Alves 2005 p 112 Estabelecese por fim entre esses mundos imaginários uma dinâmica de herança semiótica onde eles não podem ser visualizados num esquema de superposição mas onde cada mundo se apóia sobre o outro pra construir significados que hoje são cada vez mais atrelados ao próprio conceito como um todo numa releitura das teorias da Gestalt41 e não a cada uma de suas partes isoladas Daí a necessidade de explicar as multifaces do conceito para poder entender em que ponto eles se tocam e o que isso traz para o campo dos estudos 213 Ciberespaço O que afinal caracteriza um mundo imaginário Entre todos os pontos que já foram citados há um que é vital para combinar esse conceito com o de outro teórico Laurentiz que acredita que materialidade e matéria são princípios diferentes Para ele matéria é a preocupação mecânica com o suporte material ao passo que a materialidade abrange o potencial expressivo e a carga informacional destes suportes englobando também a extramaterialidade dos meios de informação 1991 p 102 O ponto vital o que não pode ser ignorado em nenhuma hipótese é que primariamente mundos imaginários são compostos necessariamente de informação seja proveniente de um roteiro prévio de um improviso na história ou simplesmente do código que o gera que o descreve Informação é a matéria da qual se compõe qualquer mundo imaginário e ela garante ao mundo existência pois o legitima através do princípio da materialidade O ciberespaço é a encarnação tecnológica do velho sonho de criação de um mundo paralelo de uma memória coletiva do imaginário dos mitos e símbolos que perseguem o homem desde os tempos ancestrais Lemos 2002 p 138 41 Doutrina relativa a fenômenos psicológicos e biológicos que veio a alcançar domínio filosófico e consiste em considerar esses fenômenos não mais como soma de elementos por isolar analisar e dissecar mas como conjuntos que constituem unidades autônomas manifestando uma solidariedade interna e possuindo leis próprias donde resulta que o modo de ser de cada elemento depende da estrutura do conjunto e das leis que o regem não podendo nenhum dos elementos preexistir ao conjunto teoria da forma 55 O ciberespaço é o maior e mais presente de todos os mundos imaginários e é ele o espaço reservado para a interação das pessoas que estão em pontos opostos do globo Milhões trabalham através de suas estradas de informação dia após dia num processo cognitivo que transforma esse acúmulo de informações arbitrárias em uma alucinação consensual42 para o escritor canadense William Gibson Ele cunhou o termo ciberespaço em seu romance Neuromancer lançado em 1984 e acredita que o ciberespaço consiste num espaço nãofísico nem territorial formado por um conjunto de redes de computadores através das quais todas as informações circulam Machado concorda adicionando que A expressão ciberespaço designa não propriamente um lugar físico para onde possamos nos dirigir enquanto corpos matéricos É mais propriamente uma figura de linguagem para designar aquilo que ocorre num lugar virtual tornado possível pelas redes de comunicação Machado 2002 p 8 Para Lemos 2002 p 137 o ciberespaço é concebido como um espaço transnacional onde o corpo é suspenso pela abolição do espaço e pelas personas que entram em jogo nos mais diversos meios de sociabilização Ele não é desconectado da realidade ainda segundo Lemos é um complexificador do real Desse modo há dois modos práticos de entendimento do conceito de ciberespaço o primeiro é de que o ciberespaço é o conjunto de redes de computadores e mais recentemente de outros dispositivos eletrônicos interligadas ou não em todo o planeta Essa perspectiva se aproxima da análise de cunho material onde o que importa é o suporte físico do ciberespaço A outra perspectiva de análise é muito mais vasta sendo virtualmente infindável e mantém um fluxo de informação imenso de muitas fontes para muitos receptores Olhando desse modo o ciberespaço é um ambiente simulado um mundo com suas próprias regras o lugar onde estamos por exemplo se entramos num ambiente de simulação realidade virtual Lévy por sua vez acredita que o ciberespaço ou melhor sua ocupação não se deu à toa Para ele a emergência do ciberespaço é fruto de um verdadeiro movimento social com seu grupo líder suas palavras de ordem e suas aspirações coerentes Lévy 1999 p 123 Isso significa que a tecnologia não prolifera não evolui sem que o humano o sujeito tenha uma boa parcela de participação nisso O teórico francês faz um paralelo 42 Ver Gibson William Neuromancer São Paulo Aleph 1984 56 ainda sobre a teoria do ciberespaço e o caso da indústria automobilística que segundo ele veio no começo do século XX para responder uma imensa necessidade de autonomia e potência individual Ibidem p 123 Para entender de onde vem o raciocínio de Lévy é importante saber que para ele o ciberespaço não é uma infraestrutura técnica particular de telecomunicações mas uma certa forma de usar as infraestruturas existentes por mais imperfeitas e disparatadas que sejam Ibidem p124 Em suma ele acredita que o ciberespaço é uma união entre sujeito e tecnologia guiada por uma corrente cultural que vai transformar seu significado social e estimular sua evolução técnica e organizacional Ibidem p125 O que existe segundo Lévy na verdade é um movimento social Ibidem Idem composto de vários anônimos e amadores dedicados que durante a década de 1960 acreditavam que deveríamos colocar as redes de computadores a serviço da inteligência coletiva e que durante meados das décadas de 197080 começando pelo Computer for the People nascido na Califórnia EUA lutaram pelo barateamento e pela chegada de peças de computador hardware às massas Um pensamento inocente contudo não veria o lado óbvio das indústrias de computadores que a seu modo produzindo em larga escala barateando componentes criando produtos baseados em análises do consumidor viabilizaram os objetivos de tal movimento A informática pessoal não foi decidida e muito menos prevista por qualquer governo ou multinacional poderosa Seu inventor e principal motor foi um movimento social visando a reapropriação em favor dos indivíduos de uma potência técnica que até então havia sido monopolizada por grandes instituições burocráticas Ibidem p125 E assim para o teórico francês é que esse movimento social provavelmente inventa o verdadeiro uso para a rede telefônica e para o computador pessoal o ciberespaço como prática de comunicação interativa recíproca comunitária e intercomunitária o ciberespaço como horizonte de mundo virtual vivo heterogêneo e intotalizável no qual cada ser humano pode participar e contribuir Ibidem p126 57 22 Socialidade e Culturas Digitais As Comunidades Virtuais 221 Socialidade Se há em todo o espectro dos estudos da cultura digital um consenso entre os teóricos é o de que a existência do ciberespaço se dá muito mais por um fenômeno social do que por um fenômeno técnico A cibercultura pela sociedade que nela atua parece antes de isolar indivíduos e transformar as relações humanas em frias e impessoais colocar a tecnologia ao dispor de uma nova dinâmica que a transforma num instrumento que é vital na criação de novas formas de sociabilidade e de vínculos associativos e comunitários A tecnologia que foi durante a modernidade um instrumento de racionalização e separação parece transformarse numa ferramenta convivial e comunitária Lemos 2002 p87 Todos os microrituais parecem ter esse papel de desvio da técnica de sua função meramente utilitária de agrupamento de indivíduos em torno de uma atividade comum de uma paixão compartilhada Poderíamos então falar que o destino da técnica moderna reside também na sua apropriação dionisíaca e assim numa ressacralização do mundo Maffesoli apud Lemos 2002 p 86 Sendo assim fazendo ecoar o discurso de Lévy com seu movimento social Lemos 2002 p 87 apoiado no discurso de Maffesoli e de Simmel teoriza que a técnica e a tecnologia têm sido de certa forma subvertidas em detrimento de um comportamento muito mais dionisíaco erguendo uma bandeira alicerçada nesse novo liame social baseado na emoção compartilhada ou no sentimento coletivo Maffesoli 2004 p 85 Isso acarreta em um entendimento completamente novo da sociedade contemporânea ocidental que Lemos visualiza através dos princípios da fenomenologia do social adotados por Maffesoli que por sua vez beneficia a observação tal qual ela se dá concentrandose naquilo que é e não no que deveria ser uma sociedade Partindo desse princípio é que o sociólogo francês tenta descrever o que segundo ele marca toda a atmosfera das sociedades ocidentais contemporâneas a socialidade Ele mostra como o conceito de socialidade é definido em oposição àquele de sociabilidade A socialidade marcaria daria o tom os agrupamentos urbanos contemporâneos colocando ênfase na tragédia do presente no instante vivido além de projeções futuristas ou morais nas relações banais do cotidiano nos 58 momentos não institucionais racionais ou finalistas da vida de todo dia Isso a diferencia da sociabilidade que se caracteriza por relações institucionalizadas e formais de uma determinada sociedade Maffesoli procura então olhar a vida como ela é como diria Nélson Rodrigues aliás ambos investem numa perspectiva erótica do social na tragédia do presente Lemos 2002 p 88 Socialidade é portanto todo o conjunto de práticas cotidianas que escapam dos mecanismos de controle social e que dessa forma acabam por constituir o substrato de toda vida em sociedade não só da sociedade contemporânea mas de toda forma social Lemos 2002 p 88 Para Maffesoli esse novo enlace social guarda dentro de si um ludismo que é um dos fatores essenciais da vida das sociedades contemporâneas e que está renascendo 2004 p 85 É nesse sentido que Dioniso como figura emblemática pode ser considerado típico ou arquetípico de um espírito de época que já não se satisfaz com a seriedade e a assepsia a que a sociedade moderna nos havia habituado Maffesoli 2004 p 85 Para o teórico francês hoje nos preocupamos muito menos em dominar transformar e modificar o mundo e muito mais em nos unirmos a ele através da contemplação nos preocupamos muito mais em festejálo Com maior ou menor seriedade ou interesse o produtivismo em suas diversas formas é hoje objeto de crítica O trabalho e o progresso não mais são imperativos categóricos 2004 p 87 O que interessa é o aqui o agora Tornase então visível finalmente uma ética do instante que até este ponto no desenvolvimento das sociedades contemporâneas estava velada Instante eterno em que é vivida e expressada a conversão a Dioniso retorno da temática noturna a do deus ctônico que encontramos na multiplicação das boates das festas rave e de outras manifestações de música eletrônica que já não podemos considerar como simples epifenômenos sem conseqüência Maffesoli 2004 p 89 Essa forma de organização de relacionamento então que é a socialidade se preocupa muito mais com nãosepreocupar sua força vem de uma passividade ativa intersticial e subversiva Lemos 2002 p89 Antes de tentar travar um ataque frontal de cunho revolucionário essa parcela do social porta um comportamento rizomático esguio e efêmero Idem que vem a marcar profundamente as relações sociais na cibercultura É um modo de lutar contra os diversos e mais bem engendrados mecanismos de controle do sistema simplesmente ignorandoos e assim reestruturandoos 59 A socialidade é assim a multiplicidade de experiências coletivas baseadas não na homogeneização ou na institucionalização e racionalização da vida mas no ambiente imaginário passional erótico e violento do dia a dia do quotidiano dos homens sem qualidadeLemos 2002 p 88 Há aí uma inversão de valores a modernidade buscava uma assepsia social marcada por uma racionalidade instrumental domesticar as imperfeições da vida como a violência as emoções desmedidas e o imaginário simbólico A contemporaneidade por sua vez como vem sendo pontuado é marcada por preceitos dionisíacos tribalismo sensualismo e se utiliza das novas tecnologias não para inibir situações lúdicas e comunitárias que nascem na vida social mas para potencializálas fomentando assim a socialidade como os teóricos a descrevem O pensamento de Maffesoli ainda conta com contribuições do sociólogo alemão Simmel pensador que desenvolveu o formismo Tal teoria supõe que as formas da cultura dialogam com a vida num esquema paradoxal onde as formas culturais pretendem enlaçar a vida dentro de si e cristalizálas quando a vida em sua possibilidade máxima de ex istência quer superar as formas culturais e se expandir As formas institucionais simbólicas técnicas de uma cultura visam enquadrar a vida regulála controlála Para o formismo de Simmel a vida se impõe sempre contra os limites da forma A vida necessita da forma para existir da mesma maneira em que ela deve estar expandindose para além das formas para existir É nesse embate nesse conflito entre formas e conteúdos que se enraíza para Simmel o trágico da sociedade Lemos 2002 p 90 Daí provém ainda segundo Lemos para Simmel a idéia de vitalismo social presente nos trabalhos de Maffesoli a fecundidade da vida obriga as formas a se reconstituir num processo contínuo A forma teria a função de dar suporte para a criação da vida para mais tarde observar como esse suporte se transforma em prisão em invólucro cristal que a vida vai sempre tentar quebrar se expandindo Esse esquema denota uma lógica de autopreservação Toda forma tenta estabelecer sua permanência temporal A cultura se realiza segundo Simmel nessa tragédia como processo de objetivação do sujeito e de subjetivação dos objetos como sinergia entre formas e conteúdos Idem p90 60 Maffesoli acredita que a essência da sociedade contemporânea é o próprio jogo a festa e que essas características que por sua vez estão mais voltadas para aproveitar e para conviver do que para controlar condensadas numa simples preocupação com o estarjunto êtreensemble levam a miniconceitos que pontuam todo o espectro da cibercultura tribalismo formismo presenteísmo ética da estética vitalismo e que a perda do próprio corpo no coletivo no que ele chama de empatia Einfühlung parece ser a característica da comunhão sensível ou afetiva que vem substituir a sociedade puramente utilitária Maffesoli 2004 p 40 Então essa sociedade efêmera e empática coloca para Lemos 2002 p 89 a ênfase no presente e não investe no dever ser mas no que é simplesmente A própria lógica do cotidiano insiste na dimensão de um presente caótico e politeísta em detrimento de perspectivas futuristas Um politeísmo de valores que remete a toda a obra de Weber e com o qual Maffesoli concorda afirmando que é necessário reconhecer com lucidez que a vida social repousa numa luta implacável entre diferentes ordens de valor 2004 p37 Tais diferenças de valores incutindo em heterogeneidade e finalmente em tensão são um dos aspectos essenciais da vida para o pensador francês então não havemos de nos surpreender com o fato dessa heterogeneidade vital nos remeter a diferenças de interpretação Maffesoli 2004 p39 quando falamos então de como máscaras podem ser assumidas em papéis públicos em papeis sociais Essa característica como poderemos ver mais a frente é uma das características do sujeito mais potencializadas pelas novas tecnologias do ciberespaço Desconforto43 para uns mal estar da civilização para outros como Lewis Mumford e finalmente modo esquizofrênico do capitalismo para Guattari e Deleuze apud Lemos 2002 p 51 Talvez essa seja a principal associação que nos vem à mente hoje quando tentamos relacionar nossa existência ao nosso self44 quando tentamos pensar onde nos encaixamos nesse nãolugar no qual nosso universo se tornou no qual as fronteiras da realidade espaciais e temporais parecem ter sido apagadas pela tecnologia Mesmo esta 43 Para Doel apud Santaella 2001 p 80 num artigo em que a pesquisadora questiona as multifaces do sujeito póshumano em detrimento da criação do ciberespaço 44 A discrepância que existe entre ser e existir para as ciências sociais não pode ser abarcada com as conotações que são dadas a estas palavras no português escolho então usar o inglês self para reforçar o conceito de reflexividade contido no termo 61 diferenciação entre sum45 e self é um abismo por demasiado grande para alguns teóricos que acreditam que o processo de subjetivação ou seja de construção de um sujeito nunca está completo nunca está fechado dissolvendo assim a borda que separa os dois conceitos O sujeito moderno racional reflexivo senhor no comando do pensamento e da ação Santaella 2001 p 45 foi para as Ciências Humanas substituído por alguém muito menos confiante e que indiferente à ação dos meios de comunicação de massa que insistem em pregar a unidade por meio de estereótipos e arquétipos não é mestre nem mesmo em sua própria casa Bukatman 2002 p 8 Isso traz sérias conseqüências à estrutura da sociedade em que vivemos pois se os meios de comunicação de massa agem tentando unificar e controlar o que lembra curiosamente que o prefixo ciber que precede a palavra cibercultura vem do grego kybernetes que remete ao conceito de controle governo pilotagem Lemos 2002 p 20 há uma resistência crucial a essa padronização que é provinda de subculturas que se instalam nos guetos a cada dia A criação de tais nichos sociais constituídos necessariamente por jovens que negociam status e poder dentro de seus mundos próprios atores sociais no teatro da contemplação do mundo Amaral 2005 p 2 acaba por ser simplesmente um indício do desconforto que o sujeito hoje multifacetado e aberto experimenta ao ser exposto a discursos de padronização e controle Uma das formas que a dinâmica das subculturas se utiliza para criar uma forma de reação contra esse movimento de controle é desenvolver atividades geralmente artísticas que ponham em xeque essa noção além de validar a integração dos envolvidos dando à atitude dos sujeitos ali contidos um senso de autenticidade que é compartilhado por todo nicho As subculturas acabam adquirindo essa característica de alteridade Amaral 2005 p 3 O atributo definidor das subculturas então reside na maneira como a ênfase é colocada na distinção entre um grupo culturalsocial particular e uma culturasociedade mais ampla A ênfase é na variação de uma coletividade maior que é invariavelmente mas não sem problemas posicionada como normal mediana e dominante Subculturas em outras palavras são condenadas a desfrutarem uma 45 Do Cogito ergo sum cartesiano 62 conciência de alteridade ou diferença46 Gelder e Thornton apud Amaral 2005 p 2 Maffesoli acredita que a pósmodernidade vai assim ser permeada por tais grupos em franca oposição à figura do individualismo tratando justamente da questão da morte do sujeito moderno em detrimento dessa figura mais aberta mais anárquica ponto chave dessa teoria das subculturas Daí o emprego do termo Culturas Digitais ao invés de seu singular recurso estilístico que tomo emprestado de Santaella 2005 p 7 quando a pesquisadora justifica usar as palavras comunicações e artes no plural afirmando que desse modo significa flagrálas na complexidade de suas situações atuais tomando essa complexidade como ponto de vista privilegiado para a consideração de suas historicidades Essa figura mais aberta esse sujeito pósmoderno então desfruta de um senso de alteridade que é um atributo definidor por impor limites que contribui para a construção do sujeito e da empatia já citada que ainda segundo Maffesoli 2004 p42 tem uma necessidade de autodespojamento Selbstentäusserung que remete justamente à figura da descorporificação abdicar de seu corpo em detrimento de algo maior um corpo coletivo Então a perspectiva individualista pregada na e herdada da modernidade acaba por passar por uma séria crise de onde emergem as mais diversas tribos a nível planetário Isso não significa que não existem indivíduos individualistas mas que a organização da sociedade se transforma numa organicidade Lemos 2002 p 91 completamente tribal e não mais racional ou contratual Maffesoli crê que isso seja a troca da função do indivíduo moderno pelo papel da persona pósmoderna onde a lógica individualista se apoiava sobre uma identidade fechada ela sofreu sérios ataques durante quase um século de morte do sujeito O indivíduo fechado se perdeu em um tipo de por pura ironia ou justiça poética deserto do real dando lugar a essa persona que só existe quando se relaciona com o outro quando se agrega Daí a necessidade da tribo para se construir com o outro pelo outro e no outro Lemos 2002 p91 46 Tradução Livre The defining attribute of subcultures then lies with the way the accent is put on the distinction between a particular culturalsocial group and the larger culturesociety The emphasis is on the variance from a large collectivity who are invariably but not unproblematically positioned as normal average and dominant Subcultures in other words are condemned to andor enjoy a consciousness of otherness or difference Gelder e Thornton apud Amaral 2005 p 3 63 Todos esses miniconceitos como o próprio Maffesoli os chama que foram citados na verdade existem numa sinergia onde um dá suporte a todos os outros O tribalismo é a essência do êtreensemble onde o que importa é o compartilhamento de emoções em comum trabalhando no surgimento de uma cultura do sentimento Lemos 2002 p92 Daí a proposta de Maffesoli de analisar esse novo ambiente comunitário seguindo o que ele chama de paradigma estético A sociedade tribal gregária e empática a cultura do sentimento que se apóia sobre as multipersonalidades as máscaras do teatro quotidiano agem a partir de uma ética da estética e não a partir de uma moral universalizante A sociedade elabora um éthos uma maneira de ser um modo de existência onde aquilo que é compartilhado com outros será primordial Lemos 2002 p92 A idéia principal dessa ética que Maffesoli propõe e que Lemos aceita é a de instaurar um conceito chave para ajudar a discernir o conjunto desordenado e versátil daquilo que M Maffesoli chama de socialidade Lemos 2002 p 92 222 Cibersocialidade Lemos 2002 propõe que a teoria de Simmel e de Maffesoli que acaba de ser discutida tem um papel essencial e especial no desenvolver de nossa sociedade Ele fala de um fenômeno chamado cibersocialidade que seria uma apropriação da técnica por toda a teoria da socialidade de modo que a cibercultura em si constituise como uma estética social alimentada pelas tecnologias do ciberespaço É um momento de gênese no caso onde podemos dizer que a cibercultura nasce justamente da convergência entre o social e o tecnológico sendo através da inclusão da técnica na socialidade que ela adquire seus contornos mais nítidos Lemos 2002 p 96 A cibercultura que se forma sob os nossos olhos mostra para o melhor ou para o pior é bom que fique claro como as novas tecnologias estão sendo efetivamente utilizadas como ferramentas de convivialidade e de formação comunitária perspectivas essas principalmente em se tratando da tecnologia colocadas à parte pela modernidade ativistas terroristas pedófilos anarquistas ONGs A cibercultura é a socialidade que se apropria da técnica Lemos 2002 p 96 64 A geração dos anos 1990 cresce então como a primeira a estar completamente acostumada com a hipermídia com a realidade virtual e com as redes telemáticas Tal geração não é mais individual e racional Na verdade esses são conceitos que foram postos em xeque há muito mas que a mídia insiste numa tentativa vã de resgatar um sujeito modernista centrado e cristalizado em idealizar Fato é que hoje somos simultâneos McLuhan estéticos presenteístas tribais Maffesoli e simulacros de nós mesmos Baudrillard Em se falando de simulacro é interessante pontuar que para Lemos o discurso de Debord e de sua Sociedade do Espetáculo Debord 1967 está de certa forma ultrapassado pois a cibercultura libertouse das garras de tal conceito Fato é que libertar não é exatamente um termo apropriado visto que para o pesquisador hoje somos fruto puro do espetáculo numa cultura que emerge da simulação do mundo Lemos 2002 p 97 que surge com os media digitais redes telemáticas multimídia interativa e realidade virtual em contraponto a uma sociedade que apenas representaria o mundo através dos meios de massa É a essência do que se discute aqui existem formas sociais que passam a existir então não por influência ou contato com a tecnologia mas precisamente porque a tecnologia se torna vetor de expressão do humano funcionando como alicerce para tais formas Nos transformamos em um meta de nós mesmos ao invés de viver para o espetáculo vivemos imersos numa lógica de manipulação do espetáculo ébrios com o fluxo de informação e com o fato de que a cada dia que passa a informação se torna mais e mais horizontal contrariando pervasivamente o conceito do pensador francês 223 Comunidades Virtuais É nesse panorama que passamos então a nos relacionar no que Hammerz apud Lemos chama de comunidade sem proximidade instituindo um território não físico mas apoiado pelas estratégias de socialidade e por sua relação com a tecnologia Um território simbólico mesmo que tal pertencimento não seja exclusividade de comunidades eletrônicas 65 Segundo Lemos 2002 p 151 a análise de Bolle de Bal 1985 pode nos ajudar a compreender as agregações eletrônicas do ciberespaço Podemos enxergar essa rede de redes a partir da análise da religação reliance e do que o belga chama de tentação comunitária Para ele a comunidade exerce uma sedução e toda a agregação comunitária é efêmera incerta e contraditória paradoxal e sistêmica No entanto a comunidade permite vínculos religações de caráter quase místico Lemos 2002 p 151 Para o sociólogo belga a crise dos valores modernos que permeia os alicerces da cibercultura seria conseqüência de desagregações deliance que ocorreram num nível sóciopsicológico esquizofrenia capitalista sóciotécnico alienação no trabalho sócio econômico desemprego estrutural e ainda ontológico alienação pela sociedade do espetáculo e dos simulacros Lemos acredita ainda que o ciberespaço seja fruto da lógica industrial moderna fonte de deliance e um verdadeiro instrumento de contato reliance Aqui ainda há uma ressalva a ser feita nem toda agregação dentro do ciberespaço se configura necessariamente numa comunidade o ciberespaço potencializa agregações eletrônicas que podem ser estas do tipo comunitário ou não Lemos 2002 p 152 Segundo Bolle de Bal a Contracultura dos anos 1970 expressou um forte desejo de reliance contra a separação individualista pregada pelo modernismo cultura industrial e racionalista A Contracultura se configurou numa estrutura de religação simbólica que se pôs deliberadamente contra a deliance modernista Fazendo um paralelo Lemos afirma que a cibercultura se utiliza da tecnologia telemática para facilitar a busca da reliance que sobrevive ainda no nosso espectro cultural desde os anos 1970 Isso não é difícil de comprovar dadas as várias expressões artísticas que vêm sendo influenciadas pelas idéias da Contracultura Podemos citar o movimento Cyberpunk originado nos Estados Unidos por um grupo de escritores de Ficção Científica e cujas premissas se dissolveram por toda a matriz cibercultural criando premissas que nos são familiares até hoje47 Michel Maffesoli vai no mesmo sentido propor a análise das tribos contemporâneas a partir do que ele chama de rede das redes O ciberespaço encarna bem esta forma social constituindose como uma rede de redes não só de máquinas mas também de pessoas Ele cria uma Matrix comunicacional que potencializa as mais 47 Para mais sobre o assunto ver a obra de Adriana Amaral doutora pela PUCRS e professora da Pós Graduação da Universidade Tuiuti do Paraná 66 variadas formas de agregação comunitárias ou não Como afirma Maffesoli retomando a metáfora simmeliana da ponte e da porta o fato de ser solitário não significa viver isolados A realidade social é formada por adesões sucessivas por cruzamentos múltiplos constituindo a rede das redes como uma estrutura complexa Lemos 2002 p 153 Socialmente a idéia de comunidade é uma invenção dos estudos sociais Lemos 2002 p152 os expoentes de tais estudos partiram de uma perspectiva evolucionista que marcava pontos de passagem da sociedade tradicional comunidade para a sociedade moderna sociedade Neste sentido H Spencer mostrou esta evolução enquanto falava de sociedades de fraca diferenciação e sociedades fortemente diferenciadas E Durkheim por sua vez demonstrou o surgimento de formas orgânicas da sociedade em detrimento das formas mecânicas da comunidade Já no princípio desse século Gabriel de Tarde explicava que comunidades podiam ser formadas mesmo por pessoas separadas sem contato físico Estes agrupamentos formaram um modo de coletividade mental espiritual Lemos 2002 p 153 No entanto vai ser o sociólogo alemão Ferdinand Tönnies Tönnies 1887 que em 1887 propõe a diferenciação entre sociedade e comunidade Para ele a comunidade se agrega em torno de interesses mais tradicionais religião vida doméstica economia da casa necessidades primárias Já a sociedade para Tönnies está fundamentada no conceito da sociedade moderna fundada na cidade no comércio na indústria e na ciência Embora como Lemos Idem afirma estas instâncias não existam em seu estado mais puro na teoria a sociedade moderna atrofiaria as iniciativas comunitárias De fato o que Lemos pretende com todo o discurso sobre comunidades virtuais é deixar claro que nem toda agregação no ciberespaço é necessariamente comunitária pois existem de forma muito extensa agregações comunitárias e contratuais do tipo societário Para o pesquisador a idéia é não falar de comunidades virtuais de um modo geral mas sim atestar o fator agregador do ciberespaço a tecnologia que na modernidade constituiuse socialmente como um instrumento de separação alienação individualismo racionalismo é usada atualmente para constituir e permanentemente destruir a dimensão agregadora Este é um dos paradoxos da cibercultura A tecnologia moderna passa a ser apropriada pela socialidade vetor de reliance Lemos 2002 p 154 67 Robin e Webster apud Santaella 2004 acreditam que o comunitarismo virtual presente nos últimos anos desde que a Internet atingiu a escala econômica global como serviço tem sido uma significante compensação para os efeitos disruptores da globalização econômica Embora seja de fato compensador há que se levar em consideração que de um lado as redes nos dotam com o poder de virtualmente atravessar o planeta de ponta a ponta em frações de segundos de outro lado na medida mesma em que as conexões se multiplicam as comunidades que se criam correm o risco de se tornarem cada vez mais aéreas frágeis e efêmeras Nas palavras de Heim porque nossas máquinas nos dão o poder de esvoaçar pelo universo nossas comunidades crescem em fragilidade volatilidade e efemeridade na medida mesma em que nossas conexões se multiplicam Robin e Webster apud Santaella 2004 p 6 Para Laurel 1990 p 93 comunidades virtuais são as novas e vibrantes aldeias de atividades dentro das culturas mais amplas do computador Elas são compostas basicamente por agrupamentos de pessoas que podem ou não vir a encontraremse presencialmente e que trocam mensagens e idéias através da mediação das redes de computadores O que liga pessoas presentes em comunidades virtuais é basicamente o fator de identificação o que Anthony Giddens chama de desencaixe uma situação sociocultural em que os indivíduos sentemse deslocados fora do eixo da individualidade Lemos 2002 p 154 Isso corresponde a dizer que o espaço físico newtoniano por excelência e em detrimento do nãolugar o qual o ciberespaço tornouse não é mais coercitivo no que diz respeito às interações entre indivíduos Desse modo podese viver em qualquer parte do globo hoje absorvendose a cultura do outro extremo Essa é a essência do desencaixe Vide a quantidade de encontros realizados por jovens brasileiros para celebrar a cultura pop japonesa em todas as suas vertentes o jpop música adolescente nipônica os animes os mangás até mesmo a linguagem representada por símbolos estrangeiros típicos do oriente hiraganas katakanas e kanjis Assim sendo as comunidades virtuais absorvem a essência da socialidade proposta por Maffesoli O ponto de interesse nesses agrupamentos é basicamente a vontade de conhecer outras pessoas que tenham os mesmos interesses que você de modo que uma pessoa pode estar contida em várias comunidades virtuais ao mesmo tempo dependendo 68 somente de seus interesses É o êtreensemble se fazendo visível legitimando subculturas mundo afora as comunidades virtuais designam as novas espécies de associações fluidas e flexíveis de pessoas ligadas através dos fios invisíveis das redes que se cruzam pelos quatro cantos do globo permitindo que os usuários se organizem espontaneamente para discutir para viver papéis para exibirse para contar piadas para procurar companhia ou apenas para olhar como voyeurs os jogos sociais que acontecem nas redes Santaella 2004 p 6 Stone apud Lemos 2002 propõe a idéia de comunidades virtuais em quatro fases a dos textos datando do século XVII a das comunicações elétricas no começo do século XX a fase da informática que começa na década de 1960 e finalmente a do ciberespaço e da realidade virtual que começa teoricamente em 1984 É interessante perceber que a passagem de uma fase para a outra se dá de modo cada vez mais veloz de modo exponencial Desse modo Lemos propõe que o fator virtual de uma comunidade não é dado somente pelo fato de seus membros estarem distantes uns dos outros já que esse fator se faz presente desde o desenvolvimento do método de testemunho virtual de Robert Boyle em 1669 A idéia é simplesmente a da mediação via computador essa sim sendo uma inovação com relação às outras fases Segundo Lemos Godwin propõe nove princípios fundamentais para a coesão das comunidades virtuais se entendermos estas por agregações sociais através de redes telemáticas São eles o uso de software que permita a discussão em grupo a ausência de limitação em trocas de mensagens a possibilidade de acesso para pessoas diversas a possibilidade de deixar que os usuários resolvam seus problemas a promoção de uma memória da comunidade a promoção da continuidade o bom recebimento dos neófitos a promoção de áreas para as crianças e a confrontação dos usuários nas crises da comunidades Para ele no ciberespaço o sentimento comunitário é muito forte Godwin apud Lemos 2002 p 156 Para Lemos então lá onde há comunicação mediada por computadores há efervescência comunal e a criação de comunidades virtuais 2002 p 157 Para Rheingold 69 apud Lemos idem não apenas eu habito minha comunidade virtual Minha comunidade virtual habita também a minha vida Concluindo a tecnologia é dona de um papel essencial no desenvolvimento da cibercultura sendo instrumento de socialidade e de aproximação entre pessoas que não tem contrato entre si o fazem a partir do princípio empático Essa aproximação e a dinâmica estabelecida entre tais comunidades e o meio que as encapsula só nos mostra que a cultura digital não pode em nenhuma hipótese se vista como uma subcultura online única monolítica e sim como um ecossistema de subculturas Rheingold 1993 Santaella acredita que tal ecossistema se configura numa mistura de micro macro e megacomunidades como aquelas constituídas pela America on Line Microsoft Network Geocities e Ezboard abrigando milhares de microcomputadores que vivem em seus interiores usufruindo de todas as facilidades por elas oferecidas Entre essas megacomunidades encontramse hoje as megacomunidades de jogadores em rede Santaella 2004 p 6 E assim retornamos finalmente ao escopo dos jogos eletrônicos De posse de tais teorias podemos finalmente tecer uma aproximação aos MMORPG jogos que não só integram os aspectos do lúdico e da narrativa como previamente explicado mas também encerram em si a dinâmica das comunidades virtuais e os primeiros resquícios de realidade virtual desenvolvida para a massa A partir de agora tentaremos nos aprofundar em tais conceitos levando em consideração como exemplo o jogo Second Life disponibilizado pelos Linden Labs em 2002 e que se tornou uma das comunidades virtuais mais assistidas de todo o globo48 23 Agregações e o Retorno ao Lúdico Os Mundos Virtuais O conceito de mundos virtuais remete diretamente ao apresentado previamente de mundos imaginários embora esteja mais para instância do que para sinônimo Mundos virtuais e mundos imaginários não são a mesma coisa de fato um mundo virtual está contido no conceito de mundos imaginários e não o contrário 48 A Reuters maior agência de notícias do mundo designou um de seus jornalistas para cobrir exclusivamente o diaadia em Second Life É a primeira vez que um mundo virtual repercute de tal forma na mídia 70 Objetivamente um mundo virtual é um ambiente simulado baseado na interação via computador no qual os usuários habitam através de seus avatares Tal habitação geralmente é representada na forma de figuras humanóides que podem ser desenhadas em 2d ou 3d ou outro tipo de avatar gráfico ou às vezes por texto Mundos virtuais são genericamente falando ambientes multiusuários navegáveis espacialmente e via redes mediados por computador Como mais e mais desses mundos virtuais emergem na Internet parece ser pertinente considerálos um fenômeno real e assim estudálos como artefatos culturais que provêem novas formas de experiências estéticas e de entretenimento Klastrup 2003 p 149 Talvez o mais interessante em se tratando de mundos virtuais é o fato de que tais simulações independente de seus papéis nãomiméticos seja mostrandonos mundos fantásticos habitados por criaturas mitológicas ou distopias futuristas impensáveis procuram sempre tomar uma base plausível no mundo real Isso se confirma quando o mundo em questão simulado via computador tipicamente contém elementos claríssimos que remetem ao mundo real como regras reais gravidade topografia locomoção ação em tempo real e comunicação Tal comunicação até bem pouco tempo era realizada exclusivamente via texto Este panorama contudo parece estar mudando Várias empresas responsáveis pela manutenção dos mais variados mundos virtuais disponíveis na Internet tais como EverQuest The Sims Online Second Life World of Warcraft Ultima Online entre outros testam no breve momento em que este trabalho é escrito maiojunho de 2007 tecnologias de comunicação em tempo real utilizandose de um dos serviços de maior impacto na rede nos últimos anos a tecnologia de Voice IP50 Tal fato promete revolucionar os nãomenos revolucionários ambientes de interação e simulação onde os jogadores às vezes caçam monstros inimagináveis às vezes vivem calmamente sua segunda vida 49 Tradução livre Virtual worlds are generally speaking computermediated networked and spatially navigable multiuser environments As more and more of these virtual worlds emerge on the internet it seems pertinent to address them as phenomena in their own right and to study them as cultural artefacts which provide new forms of aesthetic experience and entertainment 50 Voz sobre IP também chamado VoIP telefonia IP telefonia Internet telefonia em banda larga e voz sobre banda larga é o roteamento de conversação humana usando a Internet ou qualquer outra rede de computadores baseada no Protocolo de Internet tornando a transmissão de voz mais um dos serviços suportados pela rede de dados 71 Culturalmente os primeiros mundos virtuais não eram exatamente jogos É senso comum que os primeiros mundos virtuais presentes na Internet eram compostos basicamente por comunidades nos tempos das BBSs Bulletin Board Systems e salas de Chat em softwares como o mIRC ou em páginas avulsas rede afora Essa referência nos leva diretamente de volta ao conceito dos MUDs que embora não fossem ambientes gráficos coloridos e bem construídos como os mundos virtuais de hoje em dia eram certamente fruto do trabalho árduo de construção da realidade via texto É então facilmente conjecturável que quanto mais a alta tecnologia se expande51 e principalmente quanto mais as interfaces dos mundos virtuais se tornam amigáveis e facilmente navegáveis devemos esperar a cada dia um número maior de pessoas utilizando tais serviços Isso constitui um marco na história das comunidades virtuais e da própria rede em si Quando mais e mais pessoas ganham acesso barato à World Wide Web e os serviços se tornam mais e mais fáceis de serem usados devemos então esperar um crescimento massivo no número de pessoas usando esses mundos eles não são mais um fenômeno cultural marginal mas estão às portas de fazer parte do diaadia de muitos habitantes do século XXI Klastrup 2003 P 152 A pesquisadora dinamarquesa então manifesta uma preocupação legítima se vamos estudar tais fenômenos é justo então que tenhamos um jargão adequado um modo legítimo de incluílos num debate que cresce a cada dia o debate sobre os vários tipos de cibertextos O debate sobre jogos já existe já está delineado O debate sobre mundos virtuais como híbridos claramente baseados na dinâmica dos jogos eletrônicos e das comunidades ou agregações como Lemos sugere virtuais ainda não está completamente estabelecido em contraparte Klastrup 2003 acredita que os estudos prévios em cima de tais mundos têm se aproximado por uma mera perspectiva singular ou como i espaços sociais comunidades virtuais ou comunidades voltadas para a comunicação ii ambientes virtuais que incorporam novos desafios de design referindose à interação entre homem e computador 51 Sendo hoje teoricamente acessível a qualquer um excetuandose os problemas de inclusão digital não encerrados sob escopo deste trabalho 52 Tradução livre As more and more people gain cheap access to the world wide web and services become easier to use we should hence expect a massive growth in the number of people using these worlds they are no longer marginal cultural phenomena but are about to enter the scene of the everyday life of many inhabitants of the 21st century 72 iii novas formas de jogo ou iv ambientes para interpretação Assim a idéia da autora seria a de entender que tais mundos virtuais são híbridos e devem ser tratados como tais A dinamarquesa Lisbeth Klastrup se preocupa principalmente com a criação da experiência e a experiência presencial num mundo virtual Baseandose em questões como Como você descreveria a experiência de estar lá ou a experiência de habitar o mundo virtual O que cria essa experiência e Como podemos interpretar o que acontece quando você está lá dentro ela tenta então desenvolver uma poética dos mundos virtuais alicerçando tal teoria na definição de tais ambientes e no fator que define a mundanidade worldness de tal mundo Para entender as formas e leis que compõem um mundo virtual ao invés de olhar para os mundos virtuais simplesmente como espaços sociais ou jogos precisamos entendêlos como híbridos que possuem os elementos de ambas as estruturas Mais para entender totalmente os processos complexos contidos na criação da experiência eu acredito que precisamos unir o conhecimento de atuação online narrativas interativas e trabalhos cibertextuais na análise também Todos esses elementos juntos criam o sentimento de worldness e nos habilitam a sentirnos envolvidos talvez até imersos em um mundo virtual Klastrup 2003 p 1 53 Contudo o que Klastrup chama de worldness e como isso se relaciona com uma potencial poética que ela deixa claro não se configura como uma poética aristotélica clara mas sim com um tratado teórico sobre estética p 1 ainda são fatores que permanecem um tanto obscuros Podese ver entretanto que a autora opta por uma abordagem mais aberta que entende os mundos virtuais não simplesmente como jogos ou como comunidades virtuais mas como foi dito antes como ambientes híbridos que carregam dentro de si características que são específicas a ambos isoladamente mas que não configuram interseções necessariamente Sobre a questão da poética para RimmonKenan 1983 apud Klastrup 2003 Poética é o estudo sistemático da literatura como literatura Ela lida com a questão O que é literatura e com todas as possíveis questões desenvolvidas disso tais como O que é arte na linguagem Quais são as formas e tipos de literatura Qual a natureza de um gênero literário Qual é o sistema de uma arte ou linguagem 53 Tradução livre In order to understand these laws instead of just looking at virtual worlds as social spaces or games we need to understand them as hybrids which have elements of both structures Furthermore to fully understand the complex processes at work in creating experience I argue that we need to encompass knowledge of online performing and of interactive storytelling and cybertextual works in an analysis too All these elements together create the feeling of worldness and enable us to feel involved with maybe even immersed in a virtual world 73 particular de um poeta Como a história é feita Quais são os aspectos específicos dos trabalhos de literatura Como eles se constituem Como textos literários incorporam fenômenos não literários54 Partindo daí Klastrup argumenta que o fato central não é que os mundos virtuais sejam literatura ou arte melhor ela simplesmente substitui literatura por mundos virtuais e poeta por desenvolvedor fazendo emergir assim o conteúdo de uma possível poética dos mundos virtuais A afirmativa feitas as modificações diz que Uma poética dos mundos virtuais lida com o estudo sistemático da de mundos virtuais como mundos virtuais Ela lida com a questão O que é um mundo virtual e com todas as possíveis questões desenvolvidas disso tais como Como um mundo virtual é uma forma estética de expressão Quais são as formas e tipos de mundos virtuais Qual a natureza de um gênero de mundo Qual é o sistema de uma arte ou meio de expressão particular de um desenvolvedor Como a história é construída Quais são os aspectos específicos das instâncias dos mundos virtuais Como eles se constituem Como mundos virtuais incorporam fenômenos não ficcionais Klastrup 2003 p 255 Ela aponta que uma definição interessante de mundo virtual se encontra no fato de que via simulação em detrimento de narrativa como foi discutido antes o mundo virtual é uma nova forma de texto cultural que é caracterizada pelo fato de que tal texto é lido usado acessado por vários usuários ao mesmo tempo Daí desde que os contínuos trabalhos definiram necessariamente a literariedade de um texto parece ser lógico nesse caso traduzir tal fator em mundanidade worldness ou seja procurar o que faz de cada mundo virtual um mundo virtual Tal conceito é aplicado em dois níveis i como aspecto essencial de todo mundo virtual como mundo virtual ou seja como propriedade estrutural ontológica e ii como definindo as características de um mundo virtual em específico uma propriedade emergente percebida e experimentada por usuários do mundo 54 Tradução livre Poetics is the systematic study of literature as literature It deals with the question What is literature and with all possible questions developed from it such as What is art in language What are the forms and kinds of literature What is the nature of one literary genre or trend What is the system of a particular poetsart or language How is a story made What are the specific aspects of works of literature How are they constituted How do literary texts embody nonliterary phenomena 55 Tradução livre A poetics of virtual worlds deals with the systematic study of virtual worlds as virtual worlds It deals with the question What is a virtual world and with all possible questions derived from it such as How is a virtual world an aesthetic form of expression What are the forms and kinds of virtual worlds What is the nature of one world genre or trend What is the system of a particular developers art and means of expression How is a story constructed What are the specific aspects of instances of virtual worlds How are they constituted How do virtual worlds embody nonfictional phenomena 74 Dadas todas as especificidades Klastrup 2003 p 3 propõe que uma definição completa de mundos virtuais precisa conter os seguintes prérequisitos i descrever os vários gêneros de mundos virtuais tanto mundos sociais quanto jogos ii descrever o que distingue mundos virtuais de ambientes virtuais nãopermanentes ou de acesso restrito e comunidades virtuais que se focam primariamente na interação social enfatizando ambos os aspectos de interação usuáriousuário e usuáriomundo iii descrever o que distingue tais mundos virtuais de outros tipos de mundos imaginários como novelas ou filmes que não são ambientes habitáveis e por fim iv enfatizar o fato de que o mundo virtual é um mundo compartilhado por múltiplos usuários comunicação síncrona e que por isso os outros usuários também são produtores do mesmo Temos proveniente das premissas citadas a definição tecida pela autora Um mundo virtual é uma representação online persistente que contém a possibilidade de interação síncrona entre usuários e entre o usuário e mundo dentro das regras de espaço desenvolvidas como um universo navegável Mundos Virtuais são mundo nos quais você pode se mover através de representações persistentes do usuário contrastando com mundos representados tradicionais de ficção que são mundos apresentados como habitados por pessoas reais mas que não são exatamente habitáveis Klastrup 2003 p 256 Sendo assim para um exemplo rápido de acordo com a definição salas de Chat não seriam consideradas mundos virtuais porque elas não se estendem espacialmente e não é permitido aos usuários interagir com o mundo em si Sendo assim jogos eletrônicos de primeirapessoa como Counter Strike Valve Software 1999 também não o são porque seus personagens não são persistentes são efêmeros Para completar Klastrup 2003 p 3 discursa sobre como o mundo virtual ou sistema no caso influencia as experiências de seus usuários ou jogadores A autora detecta por fim quatro aspectos diferentes que estão intimamente ligados à experiência do mundo como ficção como espaço de interpretação e diversão como jogo e finalmente como comunidade 56 Tradução livre A virtual world is a persistent online representation which contains the possibility of synchronous interaction between users and between user and world within the framework of a space designed as a navigable universe Virtual worlds are worlds you can move in through persistent representations of the user in contrast to the represented worlds of traditional fictions which are worlds presented as inhabited by real people but not actually inhabitable 75 A idéia é mapear que funções estão presentes no mundo virtual e que criam respectivamente numa sinergia a idéia de mundanidade Como estrutura interpretativa ou seja como espaço ficcional podemos dizer que o que fazemos dentro do mundo virtual não necessariamente reflete em ações físicas no mundo real Nosso avatar realiza tarefas que consideramos que nós mesmos realizamos quando matamos um dragão em um mundo virtual qualquer nos referimos ao ato como eu matei um dragão hoje e não como passei a tarde clicando repetidamente um punhado de pixels coloridos Esse sentimento segundo Klastrup é que permite que os usuários compartilhem um senso de conhecimento compartilhando lendas cosmologias e histórias do mundo virtual que são fictícias mas que precisaram da interação dos jogadores usuários para que acontecessem Depois como espaço de interpretação e diversão podemos considerar que o mundo virtual ou seja o sistema que roda continuamente nos servidores provendo regras as quais os programas clientes os usuários no caso precisam respeitar para coexistir lá dentro é meramente um apoio como o que os especialistas em cenários usam para construir o espaço dentro do qual os atores vão representar a história contida no roteiro gerando assim o bem simbólico Quando interagindo com esse apoio nós fingimos ser alguém diferente estando em algum lugar diferente fazendo alguma coisa que nos tira definitivamente da nossa rotina Aqui fica clara a verdadeira experiência de imersão vinda dos RolePlaying Games por meio da estrutura do mundo como apoio nosso personagem nós fazemos a diferença e não nos identificamos com o personagem principal de uma obra narrativa como com o menino Harry Potter em seus livros ou filmes Num mundo virtual qualquer um pode ser seu próprio Harry Potter possibilidades se abrem e a dinâmica subcultural que foi falada anteriormente vai adquirir corpo tanto do lado de fora onde os jogadores se encontram para discutir o que cada um de seus avatares fez como dentro do mundo onde o personagem pode fazer parte de uma guilda de ladrões ou de uma igreja devota de um deus qualquer e interagir com outros personagens com interesses semelhantes sem sequer conhecer os jogadores por trás dos mapas de bits que são os avatares Para Klastrup 2003 p 4 essa experiência de interpretação de atuação consciente remete diretamente à idéia da paidea de brincadeira sem fins maiores à medida que a 76 noção de ludus é coberta por outra instância do mundo virtual a interação com o sistema com as regras externas do jogo que governam posses e a dinâmica da recompensa Enfim existem dois tipos de interação com as regras aqui onde uma delas determina necessariamente como se ganha ou perde dentro do sistema de jogo existem regras que são inerentes ao ambiente e que às vezes não se percebe Ao passo de que às vezes um jogador experimenta o desejo de burlar uma regra de evolução editando seu personagem através de programas chamados de cheaters trapaceiros existem regras que não podem ser burladas desse modo transporte gravidade física em geral Esses elementos definem propriamente o ambiente do jogo como simulação Já que o assunto foi levantado claro na experiência do mundo como jogo o cunho teórico se dissocia um tanto do que já foi falado Ora em mundos virtuais como a própria Klastrup diz os personagens avatares dos jogadores são necessariamente perenes Eles existem no sistema como nós existimos na sociedade eles criam sua própria sociedade Desse modo como descrever a estratégia de ludus presente em tais jogos Tal estratégia está em duas formações básicas de regras para personagens a primeira mostra que o personagem pode evoluir A evolução mostra que de certa forma existe a vitória Seja ganhando dinheiro portando armas mágicas ou evoluindo a um nível muito alto a corrida é sempre para o mais Isso às vezes trava o jogador numa dinâmica de repetição que se associa em muito na descrita por Alves 2005 p 2325 A outra formação está contida no que os jogadores conhecem por quests missões Além da dinâmica de enriquecer ou de ganhar experiência por matar monstros muito comuns em mundos virtuais que reproduzem os mundos imaginários da fantasia medieval a dinâmica das quests premia pela realização de um ato glorioso Então não adianta se o jogador sucede na tarefa de matar o dragão que prende a princesa se ele não abrir a jaula que prende a donzela e escoltála de volta à sala do trono de seu pai o rei Dentro dessas estruturas detectase facilmente como tal sistema guarda a essência do lúdico mas não a posiciona em nenhum lugar superior a todos as outras Talvez o sucesso de um mundo virtual venha justamente do modo como tais características são encadeadas Por último é indissociável o fato de que o mundo virtual provê não só um palco para personagens mas também o faz para suas contrapartes orgânicas Viver num mundo 77 virtual durante muito tempo desperta no jogador o sentimento de pertença que é compartilhado por todo o espectro de usuários regulares Tendo vivido em um mundo por tanto tempo que você teve experiências significantes ou experimentou mudanças significantes que você compartilhou ou quer compartilhar com outros jogadores também familiares com o mundo sua história do mundo como lugar para viver pode retrospectivamente se tornar uma história interessante para se contar Mais que isso ela parece estar fortemente relacionada com a experiência de um espaço social por exemplo em MMGs uma guilda ou clã formada dentro e fora do mundo virtual com um interesse comum então ela pode ser facilmente uma história de inclusão em ou exclusão de menores ou maiores redes de relacionamento Klastrup 2003 p 457 231 Cyborgs de Carne e Software Os Avatares Muito tem sido falado sobre o avatar como representação gráfica do ser humano em sistemas de imersão jogos eletrônicos comunidades virtuais softwares comunicacionais mas sua figura continua ainda sendo estudada com um tanto de timidez Já o conceito de ciborgue mito que condensa a fusão do homem e da máquina por sua vez tem sido mastigado regurgitado e mastigado novamente numa leitura bricolagem e releitura de conceitos que vai desde a dicotomia clássica de Descartes até as afirmações ciberfeministas de Donna Haraway e além Ambas as manifestações tanto o ciborgue quanto o avatar denotam a preocupação com o corpo humano e nos dão pistas de como o corpo passa a se portar no advento da cultura digital em uma época em que a descorporificação ou seja a separação definitiva entre mente e corpo onde o sujeito mergulharia no ciberespaço é um sonho relativamente próximo A ficção científica em especial a ficção científica cyberpunk tratou exaustivamente do assunto desde uma ponta a da total descorporificação onde o sujeito seria extraído de sua casca orgânica e depositado como dado na vastidão do 57 Tradução livre Having lived in the world for so long that you have had significant experiences or experienced significant changes you have shared or want to share with other players also familiar with the world your story of the world as lived can retrospectively become a compelling story to be told Furthermore it also seems closely related to the experience of the emergence of a social space for instance in massive multiplayer games a guild or an in or outofworld community founded on a common interest so it could easily also be a story of inclusion into or exclusion from smaller or larger social networks 78 ciberespaço58 até a simples existência nos dois mundos numa negociação entre humano e máquina onde a tecnologia que em muitas distopias é vista como vilã seria simplesmente uma ferramenta comunicacional superior59 E foi exatamente das páginas da ficção científica que surgiu assim como o termo ciberespaço cunhado por Gibson em Neuromancer 1984 o termo avatar como ele é usado hoje no contexto das redes telemáticas Neal Stephenson em um dos livros mais aclamados do movimento seu Snow Crash de 1992 foi o primeiro a usar a palavra como a idéia de representação humana no ciberespaço O termo provém da filosofia hinduísta onde o termo avatar ou avatara como também pode ser escrito se refere a uma manifestação corporal encarnação de um ser superior um deva um tipo de anjo ou do ser supremo Deus no planeta terra A palavra em sânscrito अवतर ou avatāra literalmente significa descida no sentido de que um avatar é sempre a manifestação de um ser evoluído em um plano inferior O termo é utilizado principalmente para referenciar as encarnações de Vishnu a quem muitos hindus reverenciam como Deus Duas outras divindades que os hindus acreditam que também se manifestam na forma de avatar são Shiva e Ganesh No mundo da cultura digital o avatar é a representação de um usuário da Rede tanto em um modelo tridimensional utilizado geralmente em jogos uma figura bidimensional comumente conhecida como ícone usada geralmente em fóruns na Internet e em outros tipos de sites de relacionamento ou finalmente como um simples construto de texto como encontrado em MUDs e ambientes de Internet Relay Chat o conhecido IRC Stephenson popularizou o termo em seu romance no qual o termo avatar foi usado para descrever a simulação da forma humana em um ambiente virtual que o autor chama de Metaverso uma versão da Internet em realidade virtual60 Segundo o autor o status social dentro do metaverso seria medido pelo nível de detalhismo e pela qualidade do avatar pertencente ao usuário Um avatar melhor com mais níveis de detalhes contudo não seria obra somente do poder financeiro mas sim da perícia técnica programadores e hackers teriam alguns dos melhores avatares enquanto um novato compraria um modelo genérico 58 Vide Gibson William Neuromancer São Paulo Aleph 2004 59 Vide Gibson William Idoru São Paulo Conrad 1999 60 Um mundo virtual gerado por computador onde teoricamente a experiência de imersão é perfeita Para mais sobre Realidade Virtual ver Lemos 2002 e Domingues 2006 79 Daí a palavra passou a significar o modo como o usuário é representado em inúmeros sistemas fóruns IRC blogs chats na Internet e em programas de Instant Message IMs como o MSN Messenger ou o Google Talk passou a ser usada também na indústria dos jogos onde representa a figura com a qual o usuário interage com o sistema A partir daí podemos entender que avatares não são exclusivos dos mundos virtuais eles permeiam toda a gama da Internet onde quer que haja interação entre o sistema e o usuário eles vão estar No quesito jogos eletrônicos geralmente os avatares são constituídos por uma representação física e imutável como o personagem Mário na série Mario Brothers do Nintendo ou a exploradora inglesa Lara Croft na série Tomb Raider Jogos modernos contudo oferecem opções de customização para tais personagens No jogo Grand Theft Auto Carl Johnson o personagem principalavatar tem direito a vários modelos de roupas vários cortes de cabelo tatuagens e até mesmo a ficar gordo dependendo das interações do jogador para com o sistema Entretanto a personalidade de um desses personagens é melhor descoberta em seqüências onde os game designers transformam o ambiente de simulação num ambiente narrativo clássico você é convidado a assistir eventos que na maioria das vezes tem alguma importância vital para com a trama do jogo Os MMORPG são a fonte dos mais variados e sofisticados avatares encontrados na Internet Os níveis de personalização contudo diferem de jogo para jogo obedecendo principalmente o cenário escolhido para a ambientação narrativa O que nos interessa contudo são os avatares usados em metaversos desenvolvidos sem a dinâmica do ludus ambientes que implementam simplesmente as regras de convivência e que embora se utilizem das técnicas que os game designers utilizam para construir jogos avançados são mais parecidos com softwares de incentivo às comunidades virtuais softwares para relacionamento se fizermos um paralelo com alguns sites bastante conhecidos da massa em especial no Brasil como é o caso do Orkut httpwwworkutcom A idéia de usabilidade de tais avatares em ambientes desenvolvidos sem a estrutura de jogo depende de muitas variáveis O propósito de tais universos é meramente prover um aumento na qualidade das capacidades de conversação online além de permitir que o 80 usuário explore grande parte do mundo virtual sem que ele precise se debruçar sobre um objetivo prédefinido Damer 1997 Um dos critérios de qualidade da usabilidade do avatar em tais ambientes depende simplesmente da faixa etária ocupada por seu usuário Usuários mais jovens tendem a explorar as opções de diversão e entretenimento principalmente interessados em manter a característica do anonimato oferecida por tal estratégia de programação Enquanto isso usuários mais velhos estão mais interessados na forma como o avatar pode refletir sua própria aparência identidade e personalidade Adicionalmente a maioria de usuários mais velhos quer poder usar eventuais funcionalidades expressivas que venham a estar presentes no avatar como a demonstração de emoções Sobre isso cientistas sociais do Stanfords Virtual Human Interaction Lab Laboratório de Interação Humana Virtual de Stanford estão examinando as implicações possibilidades e interações sociais entre pessoas que interagem através de avatares Então tais mundos virtuais obedecem em linhas gerais a essa dinâmica sua população varia de acordo com as funcionalidades que são oferecidas no desenvolvimento de cada mundo Habbo Hotel httpenwikipediaorgwikiHabboHotel e Webkinz httpenwikipediaorgwikiWebkinz são visitados geralmente pela faixa etária de 10 a 15 enquanto gaiaonline httpenwikipediaorgwikiGaiaonline de 13 a 18 Em contraste a isso There httpenwikipediaorgwikiThereinternetservice e Kaneva httpenwikipediaorgwikiKanevaGamePlatform possuem uma faixa etária alvo que vai desde os 22 aos 49 Os avatares programados nos dois últimos exemplos tratam de forma bem mais profissional a questão da exposição de sentimentos eles permitem que os usuários riam dêem tchau soltem beijos e até reproduzam gestos rudes Outro exemplo interessante é The Palace httpenwikipediaorgwikiThePalacecomputerprogram onde os usuários podem usar suas próprias imagens como avatar um diferencial bastante apreciado pelo público mais velho Novamente nos três casos citados a população de tais mundos virtuais parece ser determinada pelo modo como seus avatares são implementados Contudo isso não é completamente verdade em se tratando de Second Life httpenwikipediaorgwikiSecondLife onde os avatares vão desde quasehumanos a robôs passando por animais criaturas míticas e avatares criados por jogadores qualquer coisa virtualmente pode virar um avatar O servidor principal do mundo virtual está aberto 81 só para adultos e a participação é regida por uma interação social artística e comercial basicamente Contudo é exatamente isso que desejamos discutir como tais avatares imagens que vão desde o plausível ao mais grotesco podem exercer uma função persuasiva argumentativa aos olhos dos espectadores O modo como um usuário se apresenta na Rede mais especificamente dentro do metaverso de Second Life influencia de alguma maneira as ações ou pessoas que eventualmente venham a estar ao seu redor Seria válido então falar sobre a presença inerente de uma retórica na figura do avatar do mundo virtual Second Life Tais questões serão esclarecidas no próximo capítulo após uma breve explanação sobre esse mundo virtual que vem continuamente conquistando adeptos e que em menos de um ano conquistou mais usuários do que todos os seus concorrentes juntos 232 PósVida Second Life Second Life abreviado comumente pela mídia e por seus jogadores por SL é um mundo virtual acessível via Internet que chamou a atenção do mundo quando em meados de 2006 foi exposto aos quatro ventos pelos veículos de comunicação de massa movidos principalmente pelas características e peculiaridades do software Desenvolvido pelo Laboratório Linden Linden Labs httpwwwlindenlabscom um programacliente que pode ser baixado do site da empresa capacita os usuários que dentro do sistema recebem o nome de Residentes a interagirem entre si através de avatares criando então um nível avançado de serviço de comunidades virtuais Talvez o fato máximo pelo qual milhões de usuários migraram para dentro dos bits e bytes que constroem SL seja o fato de que as características comuns às comunidades virtuais aqui são combinadas com os aspectos gerais e específicos de um Metaverso um universo criado a partir de um modelo o nosso no caso mas onde algumas leis acabam por serem diferentes A dinâmica do jogo permite que Residentes explorem o mundo conheçam outros Residentes socializemse participem de atividades de grupo criem e negociem itens chamados de propriedade virtual e serviços em geral entre si Second Life é apenas um de muitos mundos virtuais que foram inspirados pelo Movimento Cyberpunk da ficção científica e que posteriormente se espalhou por todo o 82 imaginário da cibercultura Particularmente SL foi inspirado pelo romance Snow Crash do americano Neal Stephenson lançado em 1992 A idéia dos Linden Labs é exatamente criar através da tecnologia de modelagem 3D um metaverso que seja parecido com o descrito por Stephenson no livro um mundo de uso geral criado por usuários no qual as pessoas possam interagir jogar fazer negócios e se comunicar Às vezes referenciado pela mídia e por usuários como jogo Second Life não possui características básicas encontradas em outros MMORPGs como pontos de atributo placar vencedores ou perdedores Sua dinâmica remete muito mais às comunidades virtuais e ao fato de que o objetivo não propriamente existe além de potencializar a socialidade inerente a cada um O software não existe uma divisão de personagens por níveis de poder e não possui nenhuma estratégia Ainda assim o modo como os jogadores interagem com a interface relembra muito uma série de outros jogos espalhados pelo mercado como The Sims Heretic ou outros com o mesmo esquema de visualização O fator impressionante em Second Life é que em pouco mais de quatro anos de existência factual a versão beta só foi à público em 2003 mesmo que as pesquisas já mostrassem um sistema estável funcionando em meados de 2002 o sistema registrou a criação de mais de cinco milhões de contas embora muitas estejam inativas e alguns Residentes tenham mais de uma conta Second Life foi lançado por um exempregado da RealNetworks fabricante do Real Player Philip Rosedale através dos Linden Labs A primeira versão alfa61 chamada de LindenWorld foi disponibilizada em 2002 só para Residentes com experiência em criação de conteúdo enquanto a versão beta só foi disponibilizada publicamente em 2003 Essas primeiras versões tinham focos diferentes no que diz respeito à economia da versão atual de SL os Linden Dollars eram obtidos mais facilmente não podiam ser trocados por dólares reais e a taxa de residência um tipo de IPTU não subia não importando quantos imóveis o Residente tivesse 61 Dizer que uma versão é Alfa significa que ela está estável e pronta para ir à público não é mais um protótipo 83 Fig 1 Gráfico de Registro de Novas Contas em Second Life É importante introduzir esse assunto porque uma das coisas que mais chama atenção em Second Life é justamente o fato de que os Linden Labs mantêm ativo um câmbio que equilibra o mundo virtual e o mundo real dando a este simulacro uma sensação de realidade que poucos até então tinham conseguido Com um dólar americano podese comprar em média duzentas e setenta unidades da moeda local o Linden Dollar Isso muda completamente toda a dinâmica à qual os jogadores de outros MMORPGs estiveram acostumados durante esses anos de existência e desenvolvimento da tecnologia em jogos como World of Warcraft da Blizzard para ter acesso a digamos a uma arma mágica o jogador precisava passar horas e horas debruçado sobre o computador tratando de seu personagem trabalhando minerando polindo fazendo serviço de carpintaria etc procurando monstros que ele pudesse matar e que dessem experiência suficiente para que ele pudesse ir atrás de monstros mais poderosos que davam mais experiência e tinham um tesouro maior para ser confiscado numa lembrança da lógica da repetição da qual Alves 84 2005 fala além de se socializar com outros jogadores para que estes pudessem ajudálo em suas empreitadas SL por sua vez não guarda muito dessa dinâmica não existem monstros para serem mortos não existem armas mágicas que valem muito e você não sente a evolução como recompensa direta de seu esforço em treinar o personagem avatar em uma atividade ou outra O trabalho no caso continua lá Para ter acesso a gráficos mais sofisticados o avatar precisa ter em sua conta virtual Linden Dollars para que possa comprar objetos que podem ser servidos pelos Linden Labs que acredito seria uma versão esdrúxula do Estado ou por outros usuários que provêm serviços Fator que está inclusive deixando autoridades mundiais muito preocupadas pessoas atualmente fazem dinheiro simplesmente sentando na frente do computador e interagindo com outras que teoricamente lhe pagam por bits A dúvida é como introduzir um imposto sobre estes serviços 2321 Economia de Second Life O básico da economia do mundo virtual Second Life é de que Residentes ou seja usuários em se opondo aos Linden Labs possam comprar e vender itens e serviços uns dos outros sem a necessidade de intermédio ou seja através de um mercado livre Tais serviços incluem ajuda em construção gerenciamento de negócios entretenimento e outros serviços pessoais Itens propriedades virtuais incluem imóveis veículos dispositivos de todos os tipos animações e trabalhos de arte Teoricamente para se fazer dinheiro em SL tudo que alguém tem que fazer é encontrar alguém que realmente deseje pagar por um serviço que está sendo oferecido essa foi a lógica criada por Mitch Kapor um dos mentores do jogo e quem visualizou a lógica da propriedade intelectual virtual Teoricamente tudo é customizável e uma das atrações do mundo é que o próprio Residente pode transferir seus arquivos locais fazer um upload para o mundo virtual personalizando seu próprio avatar Não é surpresa então perceber que algumas das pessoas mais interessadas em ganhar Linden Dollars são designers trabalhando com todos os tipos de materiais possíveis modelagem 3D pintura digital e desenho manual ou digital Tais perícias cobrem boa parte das necessidades de bens materiais dentro do jogo roupas 85 carros casas móveis e toda a sorte de bugiganga modelável Animações préfabricadas também são um serviço bastante procurado dentro do ambiente modos de deixar seu avatar mais sofisticado dando a ele algo que outros ao redor não tem Um fator muito interessante dentro de Second Life é a existência de Ilhas lotes de terra virtual onde um usuário pode construir uma casa um estabelecimento comercial ou o que quer que ele queira Curioso é que por estarmos lidando com o escopo virtual espaço é algo que não falta realmente Mesmo assim a especulação imobiliária é uma prática extremamente comum e segundo dados providos pela Revista Época Na matéria A Segunda Vida da Internet publicada na edição de 19 de Março de 2007 existem Residentes que fizeram verdadeiras fortunas aderindo à prática do comércio imobiliário A única coisa que não está exatamente clara ainda é como essas fortunas se constituem Para que o jogo pudesse realmente tornarse um sucesso os Linden Labs além de permitirem que os Linden Dollars fossem comprados ainda instituíram que alguém que ganhasse seus dólares virtuais poderia trocálos por dólares reais tanto nos câmbios oficiais do Linden Labs como em outros câmbios terceirizados Isso gerou expectativa sem limites dentro do mundo virtual de fato é possível fazer alguns trocados simplesmente sentando em frente ao computador Foi dessa forma que a alemã Ailin Graef de 32 anos construiu um patrimônio real de mais de um milhão de dólares com especulação imobiliária e mais tarde com escritórios de arquitetura Hoje sua empresa a Anshe Chung Studios emprega 30 pessoas reais para construir e vender imóveis no mundo virtual Segundo os próprios Linden Labs cerca de dezessete mil pessoas mantém um caixa positivo nas contas de seus avatares 450 deles lucram em média U 1000 por mês Isso legitima as críticas feitas por alguns usuários de que o sistema econômico dos Linden Labs é o tradicional esquema da pirâmide onde pequenas quantidades de avatares fariam muito dinheiro se utilizando da massa Mesmo em se comparando o fato de qualquer um poder fazer uma conversão entre Linden Dollars e moeda real são somas minúsculas em se comparando com o que os donos de cassinos virtuais e empreiteiros têm em suas contas 86 2322 Uma nova forma de estar junto Talvez o fator mais impressionante com relação a Second Life seja o fato de que pessoas continuam dia após dia se registrando e tentando aprender a como conviver numa segunda vida Talvez pelo sonho da descorporificação pelo sonho de abandonar o invólucro orgânico e atravessar as fronteiras inexistentes até onde sabemos do ciberespaço talvez simplesmente porque o ciberespaço através de Second Life hoje através de outras tecnologias posteriormente ofereça uma liberdade diferente de livros filmes séries e do ópio televisivo experimentado nos dias de hoje A imersão completa ainda é uma fábula mas uma que não nos cansamos de perseguir em nenhum ponto de nossos imaginários Tal fábula embora ainda deficiente de aspectos tecnológicos que a suportem já molda de certa forma o modo como convivemos como nos relacionamos Podese dizer que Second Life favorece a criação de um ethos absolutamente novo que não produz sentido através da dinâmica da representação mas da dinâmica da vivência não vemos os fatos acontecerem a personagens Não nos identificamos com o que a tela oferece Isso acontece porque não precisamos nos identificar com mais ninguém Somos nós mesmos que estamos ali na tela Nosso modo de vestir nosso gosto pra roupas pra cabelos pra comida e bebidas que embora não sejam necessárias no mundo virtual de Second Life por impressionante que seja são bens procurados como forma de lazer pura A verdade é que restaurantes e bares ainda são pontos de socialização onde você facilmente conhece novas pessoas no mundo real ou no virtual as coisas acontecem seguindo o mesmo código de etiqueta ou netiqueta se for o caso Nesse caso não é como se a socialidade se apropriasse da tecnologia numa criação de um novo modo cultural e principalmente não é como se fôssemos simplesmente uma sociedade alicerçada no consumo e no espetáculo Esses conceitos podem ser muito eficazes para descrever a dinâmica do mundo real mas quando se fala de mundo virtual a história é outra As Ciências Humanas enfrentam nesse sentido uma pesada luta contra o isolamento a nossa sociedade é mais tecnológica do que nunca Para que o cientista consiga abarcar a carga teóricofenomenológica que advém de tais comportamentos como 87 o de se logar diariamente e perder duas ou três horas de sua vida em frente a um mundo que sequer existe ele precisa em primeiro lugar estar familiarizado com a utilização com os códigos que se criam com a socialidade que se desenvolve no novo mundo que não é a mesma socialidade que se desenvolve num bar ou numa festa ou tão pouco a que se desenvolve através da apropriação da tecnologia por uma forma cultural O pesquisador precisa entender para entender a lógica social que se desenvolve em um ambiente tal qual Second Life que o suporte físico o hardware necessário para que o sistema seja executado é absolutamente transparente para o jogador habituado Ele não considera que está sentado na frente do computador considera que está numa boate em um não lugar dançando com amigos conhecendo novas pessoas O que se desenvolve entre essas pessoas é inédito pois é um tipo sem precedentes de simulação que procura deixar o jogador o mais confortável possível tentando se utilizar o mínimo possível de metalinguagem pois ela avisa alerta o usuário para o fato de ele precisar de um suporte físico tecnológico É aí que devemos nos concentrar não tentamos aqui dar opiniões conclusivas mas simplesmente incitar uma discussão que precisa ir para um novo nível de abstração Second Life não tem uma história para ser contada é uma comunidade vivendo como qualquer outra e o que virá a ser contado é resultado das aventuras do diaadia Como numa ficção onde quando vai dormir o personagem acorda numa outra terra onde ele é uma outra pessoa ou onde ele é ele mesmo não importa quem ele é e sim o que está ao seu redor Second Life não nos oferece uma nova diversão eletrônica como minigames62 videogames ou filmes no cinema ou na TV em última instância o ambiente desenvolvido pelos Linden Labs nos dá exatamente o suporte para uma segunda vida O fato de ela ser mediada via computador para os que lá no mundo virtual habitam não é o importante E sim o fato de lá estarem Juntos 62 Mini videogames portáteis desenvolvidos nos anos 1980 e comercializados a preços baixíssimos pelo fato de serem praticamente descartáveis Contudo há versões mais sofisticadas como o Game Boy da Nintendo que tem cores e sons polifônicos 88 2323 Argumentar através do avatar Second Life além de ser estruturado segundo a dinâmica mostrada acima ainda apresenta uma característica muito interessante ora se é um mundo virtual onde não há necessidade de comer ou beber ou mesmo morar conseqüentemente é de se esperar que o progresso econômico não seja necessariamente um fator determinante Nesse ponto contudo encontramos uma certa discrepância ter dinheiro em Second Life significa ser diferente e num lugar onde todo mundo nasce absolutamente igual ser diferente é definitivamente desejado Outras estruturas socioculturais como a moda contudo são encaradas de forma diferente Second Life é estruturado em vários servidores O conjunto desses servidores forma o que os Linden Labs chamam de Grade o serviço completo propriamente dito Tais servidores então não obedecem a algumas leis do mundo real um avatar que deseja se vestir como um superherói como o superhomem por exemplo não encontra resistência social imagine se alguém fosse fazer isso no centro de Recife Salvador ou São Paulo No metaverso de SL a diversidade é a maior possível de forma que como você se veste dá ao seu avatar prestígio ou o torna impopular com certas subculturas Isso é agravado inclusive nos servidores que são dedicados como o que tenta reproduzir Paris no século XIX O modo como você se veste é determinante com relação ao seu desenvolvimento social ninguém fala com alguém que não está interpretando por exemplo por mais que o dress code não seja obrigatório Em paralelo a isso Amaral 2005 afirma com relação a subculturas que O atributo definidor das subculturas então reside na maneira como a ênfase é colocada na distinção entre um grupo culturalsocial particular e uma culturasociedade mais ampla A ênfase é na variação de uma coletividade maior que é invariavelmente mas não sem problemas posicionada como normal mediana e dominante Subculturas em outras palavras são condenadas a desfrutarem uma conciência de alteridade ou diferença63 Gelder et al apud Amaral 2005 p 02 63 The defining attribute of subcultures then lies with the way the accent is put on the distinction between a particular culturalsocial group and the larger culturesociety The emphasis is on the variance from a large collectivity who are invariably but not unproblematically positioned as normal average and dominant Subcultures in other words are condemned to andor enjoy a consciousness of otherness or difference Gelder e Thornton apud Amaral 2005 p 2 89 Mas ora Klastrup 2003 já sugeriu o contrário que os mundos virtuais não se estruturam mais num lugar marginal da sociedade Que eles conseguiram um espaço que equivale teoricamente a um mainstream cultural por mais que existam nãousuários sua existência não é mais motivo de espanto de frisson O ponto que quero provar aqui está mais à frente quando a própria Adriana Amaral apud Gelder e Thornton 1997 p 373 afirma que as subculturas têm no estilo sua manifestação mais visível O estilo quando manifestado através da vestimenta do visual dos sons das performances é um meio poderoso de dar ao grupo validação e coerência Não sugiro de nenhuma forma que por ventura uma dessas agregações seja considerada subcultura não minha idéia aqui é sugerir que podemos identificar também dentro do metaverso de Second Life extensões de outras subculturas existentes fora do ciberespaço no mundo real e tais jogadores usuários usam sendo assim seus avatares para trabalhar essa lógica de legitimação do legado subcultural Esse adendo sobre subculturas tem o intuito simples de provar que essa legitimação incorre numa argumentação numa identificação através de símbolos que dentro do jogo podem ser mais que simplesmente um modo de vestir ou de ter um visual Um avatar pode ser simplesmente um símbolo como o A estilizado associado ao símbolo da anarquia ele não tem fronteiras corporais Usar um avatar humanóide é mero capricho As possibilidades são muito maiores e a retórica visual aqui evoca Barthes 1982 p 32 toda imagem é polissêmica E a polissemia leva a uma interrogação sobre o sentido O teórico francês ainda afirma que Ao nível da mensagem simbólica a mensagem lingüística orienta não mais a identificação mas a interpretação constitui uma espécie de barreira que impede a proliferação dos sentidos conotados seja em direção a regiões demasiadamente individuais isto é limita o poder de projeção da imagem seja em direção aos valores disfóricos Barthes 1982 p 33 A idéia de Barthes originalmente se referia à publicidade ao valor do texto associado à imagem mas pode ser facilmente evocada aqui Sem texto ou seja sem legenda a imagem do avatar vai atrair sobre si um nível de polissemia muito maior que pode tornálo ininteligível Fator principal e ignorado até agora é que em SL os avatares realmente possuem legenda seu nickname o apelido pelo qual são conhecidos 90 dentro do sistema se encarrega de fazer a vez de legenda principalmente no que diz respeito às manifestações subculturais Uma das características sociais do sistema de SL é permitir que o usuário faça parte de grupos que nada mais são do que chaveamentos entre as prioridades e os interesses daquele usuário em especial Assim sendo qualquer um pode fazer parte de um grupo e escolher mostrar isso ou não em seu nick Citando Barthes novamente fora da publicidade a fixação pode ser ideológica o texto conduz o leitor por entre os significados da imagem 1982 p 33 O nick o grupo suspensos acima da figura do avatar guiam definitivamente o leitor pelas conotações sugeridas por um outro avatar Se Klastrup 2003 falava de uma possível poética dos mundos virtuais podemos sugerir uma retórica visual presente no avatar a imagem da representação humana no ciberespaço num metaverso carrega por si só um fator de persuasão de argumentação que é inerente à sua existência Retórica é linguagem orientada para ação para influência A retórica está enraizada na função essencial da própria linguagem como um meio simbólico de induzir cooperação entre seres que por natureza reagem a símbolos Burke 1955 p 43 Epstein 1985 acredita que símbolos podem ser usados para desencadear determinadas ações por parte de seus alvos A discussão semiótica nesse sentido se estenderia o que não é o intuito do trabalho mas apenas pontuar para essa característica particular da figura do avatar Assim como podemos optar por desenvolvermos uma retórica visual nesse sentido nós mesmos humanos podemos optar por fazêlo com nosso avatar que afinal é uma representação de nosso sujeito Uma das tantas máscaras que escolhemos usar no diaadia Não é nosso objetivo contanto verificar como tal característica trabalha nesse momento apenas pontuando tal fator como um dos muitos presentes e ainda a serem verificados nos mundos virtuais 91 CONCLUSÃO A pesquisa realizada então nos dá bases sólidas para que possamos entender o que são e como se configuram os mundos virtuais sua herança dos mundos de fantasia literária e posteriormente dos mundos de fantasia imaginária no caso dos MMORPGs lhes confere um caráter necessariamente interativo e imersivo onde geralmente os jogadores usuários fingem ser parte de uma raça determinada pelo sistema e que tem poderes especiais que a ajudam no diaadia fazendo o personagem necessariamente perene evoluir Em paralelo existem mundos virtuais que não se apropriam das dinâmicas lúdicas de recompensa e repetição onde os personagens não necessariamente evoluem e onde não existe ganhar ou perder Desse modo podese dizer que a finalidade de tais mundos é simplesmente a convivência social o que lhes dá o caráter mais de comunidades virtuais do que de qualquer outro tipo de agregação do ciberespaço Tais mundos a partir das estratégias de interação entre seus habitantes residentes na linguagem dos Linden Labs são expressão legítima de todo um modo social próprio da cibercultura e caminham a cada dia para uma maior emergência até que estejamos todos novamente reafirmo não considero problemas de inclusão digital nos fins dessa pesquisa de certa forma conectados Essas estratégias de convivência desenvolvidas dentro de mundos virtuais são algo novo e que despertam por sua vez perguntas que estiveram entre nós durante muito tempo mas que agora reaparecem de força renovada A primeira delas diz respeito a Descartes o que ele falava de mente e corpo ainda ecoa nos salões do ciberespaço quando vislumbramos um possível movimento de alienação de descorporificação Os ideais máximos da ficção científica cyberpunk então batem de novo à nossa porta nos perguntamos se realmente queremos ser seres orgânicos ou se nossa maior vontade é existir eternamente em meio ao digital Mundos virtuais precisam ser entendidos como aparatos únicos que sim herdam mas não são subjugados às lógicas daqueles que os influenciam Necessitam de uma teoria especial para que sejam compreendidos que sim se apóia em outras disciplinas e isso os torna um universo multiverso de estudos fenomenal 92 Uma outra discussão muito importante com relação ao modo como alguns de nós convivem hoje no ciberespaço é exatamente o fato de que o computador enquanto suporte midiático vem se tornando tão transparente que podemos pensar sobre uma socialidade que não se apropria da tecnologia mas que só se desenvolve por causa dela Existe algo a mais na identificação entre o sujeito e o avatar e essa resposta não está próxima por enquanto de ser encontrada Contudo é algo que além de ter a ver com a primeira pergunta ainda está imersa em um tanto de mistério e outro de puro recalque acadêmico com relação a um purismo orgânico que divide fausto e prometeu e que Maffesoli sabiamente ignora clamando a Dioniso É importante deixar claro então que este trabalho se dedica principalmente a limpar o caminho para outros mais que virão em outras fases da vida acadêmica De posse de tais conceitos já há material para reflexão e daí uma pesquisa mais profunda voltada para a lógica da simulação e como ela modifica o modo social dos que a abraçam pode ser desenvolvida Não procuramos bater o martelo traçando respostas sólidas Como caminhamos por terrenos movediços e cujos horizontes podem mudar da noite para o dia com o ir e vir das tecnologias o mais adequado é tentar sentar pedras de alicerce para que sobre elas algo sólido possa ser desenvolvido Dessa forma os mundos virtuais a partir de Second Life se configuram como uma nova forma de leitura do ciberespaço onde não necessariamente o mundo da vida é referenciado a não ser por uma vaga lembrança no fundo de nossa mente pelo fato de usarmos aparatos para chegarmos até ele Todo o modo cultural estudado até agora não contava com um passo tão importante para o lado da descorporificação era uma perspectiva de certa forma até rechaçada O que acontece agora é diferente existem mais modos de se vender informação e as agências de notícias que se mantém hegemônicas no mercado jornalístico não são as únicas a fazer lucro de algo nãopalpável As fronteiras do mundo real estão se tornando cada vez mais difusas e os mundos sintéticos se fazem cada vez mais perceptíveis mais reais eles interferem em nosso lazer em nossa educação em nossa economia tais mundos não são mais um mero capricho tido como bem simbólico marginal trabalhado em subculturas num escopo específico São cultura de massa cibercultura e algo mais Eles herdam aspectos de tudo que nossa 93 sociedade já foi e prenunciam exatamente o que ela virá a se tornar ou delineiam contornos de leitura ao menos livrando o texto da euforia Por fim fica a sensação de que a tecnologia dos mundos virtuais já se encontrava disponível há algum tempo o que traz à tona uma última pergunta sobre o fenômeno Second Life porque demoramos tanto então para imergir no ciberespaço dessa forma Investir dinheiro real passar tanto tempo e não necessariamente tendo lazer num mundo virtual não parece um tanto de exagero Foi exatamente o que os pioneiros em comércio via Internet acharam quando instituíram a dinâmica das compras online via cartão de crédito Que era exagero Podese pensar então que a tecnologia só evolui realmente quando estamos prontos para o próximo passo que evolução sem acompanhamento cultural mental até arriscaria dizer é fadada ao fracasso Parece uma perspectiva vitalista demais denotando um aroma de superioridade do homem sobre a máquina Asseguro contudo que não é o intuito No fim e aí reside um toque de melancolia talvez algumas maravilhas da ficção científica da ficção64 enfim estejam realmente fadadas a continuar nos metaversos literários visuais ou de simulação Mas nunca realmente entre nós 64 Lembrome aqui que uma das principais características que são consideradas atraentes nos metaversos de fantasia medieval é o fato de existir magia Em seguida me lembro que Arthur C Clarke escritor de FC costumava dizer que qualquer demonstração suficientemente avançada de tecnologia pode ser considerada magia por civilizações menos evoluídas 94 REFERÊNCIAS AARSETH Espen Cybertext Perspectives on ergodic literature Baltimore e Londres The Johns Hopkins University Press 1997 ALVES Lynn Game Over Jogos Eletrônicos e Violência São Paulo Futura 2005 AMARAL Adriana Uma breve introdução à subcultura cyberpunk Estilo transformações e hibridismo na cibercultura In Revista ECompós Brasília n03 ago 2005 Disponível em httpwwwassimcomunicacaocombrrevistadocumentos Acesso em 27 de Maio de 2007 BARRAL Etiénne Otaku Filhos do Virtual São Paulo Senac 2000 BARTHES Roland O Óbvio e o Obtuso Rio de Janeiro Nova Fronteira 1982 BIRO Janos 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mídias à cibercultura São Paulo Paulus 2003 STEPHENSON Neal Snow Crash Nova Iorque Bantam 2003 reedição TOLKIEN J R R Tree and Leaf Boston Houghton Mifflin 1965 J R R The Lord of the Rings Boston Houghton Mifflin 1999 13ª Reimpressão TÖNNIES Ferdinand Gemeinschaft und Gesellschaft Leipzig Fuess Verlag 1887 2nd ed TURKLE Sherry Life on the screen Identity in the age of the internet Nova Iorque Simon and Schuster 1997 TURKLE Sherry The Second Self Computers and the Human Spirit Nova Iorque Simon Schuster 1984 TURNER Mark The Literary Mind Oxford Oxford University Press 1998 VIDART Daniel El juego y la condición humana Notas para una antropología de la libertad en la necesidad Montevidéo Ediciones de la Banda Oriental 1995 WORRINGER W Abstraction et Einfühlung Paris Klincksieck 1978 View publication stats View publication stats