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Sylvia Constant Vergara MÉTODOS DE PESQUISA EM ADMINISTRAÇÃO editora atlas Vergara MÉTODOS DE PESQUISA EM ADMINISTRAÇÃO ISBN 852243963X SYLVIA CONSTANT VERGARA é doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ mestre em Administração pela Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getulio Vargas EbapeFGV pedagoga pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro UERJ com estágio na Beckman High School New York EUA É professora titular da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getulio Vargas palestrante e consultora de organizações públicas e privadas Métodos de Pesquisa em Administração Sylvia Constant Vergara Métodos de Pesquisa em Administração SÃO PAULO EDITORA ATLAS SA 2005 EDITORA ATLAS SA Rua Conselheiro Nébias 1384 Campos Elísios 01203904 São Paulo SP Tel0 11 33579144 PABX wwwatlasnetcombr 2004 by EDITORA ATLAS SA Capa Zenário A de Oliveira Composição Formato Serviços de Editoração SC Ltda Dados Internacionais de Catalogação na Publicação CIP Câmara Brasileira do Livro SP Brasil Vergara Sylvia Constant Métodos de pesquisa em administração Sylvia Constant Vergara São Paulo Atlas 2005 Bibliografia ISBN 852243963X 1 Administração Pesquisa 2 Pesquisa Metodologia I Título 047735 CDD6580072 Índices para catálogo sistemático 1 Administração Pesquisa Projetos e relatórios 6580072 2 Pesquisa Projetos e relatórios Administração 6580072 TODOS OS DIREITOS RESERVADOS É proibida a reprodução total ou parcial de qualquer forma ou por qualquer meio A violação dos direitos de autor Lei nº 961098 é crime estabelecido pelo artigo 184 do Código Penal Depósito legal na Biblioteca Nacional conforme Decreto nº 1825 de 20 de dezembro de 1907 Impresso no BrasilPrinted in Brazil Para Lucas que me transborda de amor o coração Para Ana Paula que me vivifica a crença na competência no caráter e nas relações de imensa afetividade Sumário Apresentação 9 1 Análise de Conteúdo 15 2 Análise do Discurso 25 3 Analogias e Metáforas 37 4 Construção de Desenhos 49 5 Desconstrução 62 6 Etnografia 72 7 Fenomenologia 84 8 Fotoetnografia 92 9 Grounded Theory 101 10 Grupos de Foco 111 11 História Oral 121 12 Historiografia 130 13 Mapas Cognitivos 142 14 Mapas de Associação de Idéias 157 15 Método Delphi 172 16 Metodologia Reflexiva 185 17 Netnografia 195 18 Pesquisaação 203 19 Técnicas de Complemento 217 20 Técnicas de Construção 229 21 Teste de Evocação de Palavras 243 22 Triangulação 257 Uma Palavra Final 267 Bibliografia 269 Apresentação Houve um tempo em que teoria e método eram vistos na prática como independentes Em algumas instituições os estudantes até dispunham de um orientador para o conteúdo teórico e outro para o método de investigação quase sempre de base positivista Essa percepção de independência suscitava discussões sobre o que seria mais importante a teoria ou o método Não era raro encontrar posicionamentos pela prevalência do método razão pela qual muitos cursos de metodologia optaram pelo ensino de métodos pontuais A discussão no entanto hoje parece espúria Teoria e método são interdependentes Ambos buscam realizar o objetivo da pesquisa seja ele descrever explicar descobrir compreender predizer determinado fenômeno A teoria pode gerar e dar forma ao método e o contrário também é verdadeiro Ambos se nutrem Se o resultado que uma investigação alcança confirma a teoria existente o estudo pouco acrescenta à compreensão já dominante de um fenômeno embora isso também tenha o seu valor Se o resultado redimensiona ou refuta a teoria altera significativamente tal compreensão E o método utilizado tem grande importância nesse processo Entendase aqui por método a intervenção do pesquisador sua atividade mental consciente para realizar o papel cognitivo da teoria O método como diz Morin 1996 p 335 alimentado de estratégia iniciativa invenção arte estabelece uma relação com a teoria capaz de propiciar a ambos regeneraremse mutuamente pela organização de dados e de informações O método também aproxima o investigador do fenômeno estudado Como Morgan 1983 p 21 assevera metodologias são esquemas de resolução de problemas que diminuem a distância entre a imagem sobre o fenômeno e o próprio fenômeno Regras e procedimentos operacionalizam a posição epistemológica do pesquisador Este livro consciente embora da relação teoriamétodo elege o método e apresenta alguns postos à disposição do pesquisador A separação aqui da teoria dáse portanto não por crença epistemológica mas para fins didáticos Apenas O pesquisador certamente saberá escolher aquele método que é mais adequado às teorias que suportam seu estudo ao problema que suscitou sua investigação e o fará dentro de seus pressupostos epistemológicos Epistemologia está referida ao conhecimento à crença de como ele pode ser transmitido se de forma tangível objetiva ou se mais subjetivamente mais baseado na experiência pessoal Epistemologia positivista por exemplo procura explicar e predizer o que acontece no mundo social buscando regularidades e relacionamentos causais entre seus elementos constituintes BURRELL e MORGAN 1979 O método hipotéticodedutivo um métodoraiz que abriga métodos pontuais é adequado à epistemologia positivista Epistemologia antipositivista tende a rejeitar a noção de que a ciência pode gerar qualquer tipo de conhecimento objetivo BURRELL e MORGAN 1979 O método fenomenológico por exemplo lhe é adequado Escolher corretamente o método é tarefa do pesquisador Na escolha do método que deveria orientar sua pesquisa Guedes 2003 por ilustração percebeu a limitação da epistemologia positivista para investigar discursos e práticas ambientais de empresas transnacionais no Brasil e optou pela epistemologia do realismo crítico Ela chegou à conclusão de que os estudos sobre empresas transnacionais e questões ambientais produzidos no Ocidente são enganosos porque simplificam questões de poder e linguagem GUEDES 2003 p 38 Pesquisa realizada em três revistas nacionais e três estrangeiras VERGARA e PECI 2003 todas de excelente reputação buscou descobrir se em estudos organizacionais o discurso de crítica aos métodos tradicionais de se fazer ciência isto é àqueles de orientação positivista transformavase em práticas de investigação trazendo ao campo diferentes abordagens epistemológicas e metodológicas Os resultados apontaram a predominância de métodos tradicionais Concluímos eu e Alketa que a aplicação de métodos optativos em estudos organizacionais requer a construção e a reconstrução de outros referenciais requer abrir espaços para outras epistemologias Sem dúvida essa conclusão serve também a outras áreas da Administração além da área de estudos organizacionais Você leitor observará que se trata de um livro prático Contatos com estudantes e professores em sala de aula em seminários em congressos permitiramme perceber que um livro dessa natureza seria útil E espero que o seja Ele está estruturado em 22 capítulos cada um deles apresentando um método diferente por ordem alfabética Você rapidamente perceberá que dentro de um método podem caber outros por isso às vezes eles estão aqui desdobrados Alguns têm escopo mais abrangente são raízes Outros têm escopo mais pontual são frutos Veja por exemplo que o método desconstrutivista ou a análise do discurso estão abrigados por um métodoraiz o reflexivo Outro métodoraiz é o fenomenológico que abraça por exemplo o método etnográfico entre outros De cada método apresento suas palavraschave suas características principais como utilizálo além de explicitar seu uso em pesquisas já publicadas A linguagem é simples e direta Não faz parte do livro entre outros métodos um muito utilizado o survey embora seja importante A literatura sobre ele é bastante ampla logo acessála é tarefa fácil para o pesquisador Bons exemplos podem ser encontrados em Babbie 2001 Na seção sobre como utilizar apresento passos básicos e recomendações operacionais para o leitor que vislumbra a possibilidade de eleger determinado método para o desenvolvimento de sua pesquisa A seqüência proposta tem caráter de sugestão Você poderá observar que alguns passos seguem necessariamente uma ordem lógica como por exemplo a definição do tema e a elaboração do relatório ou seja primeiro e último passos de qualquer pesquisa Outros podem ocorrer fora da ordem apresentada Há também procedimentos que podem voltar a ocorrer durante o andamento da pesquisa É o caso por exemplo da necessidade de selecionar novos sujeitos para a realização de entrevistas adicionais ou de problemas de pesquisa que precisam ser redefinidos após os primeiros contatos com os informantes Por fim sublinho que alguns passos podem ocorrer de forma simultânea com outros Coletar dados por meio de observações por exemplo ocorre praticamente durante toda a permanência do pesquisador em campo esteja ele realizando entrevistas aplicando questionários ou utilizando outro procedimento qualquer de coleta de dados Quanto a exemplos do uso de tal ou qual método apresento trabalhos publicados por pesquisadores estrangeiros mas sobretudo destaco aqueles realizados em âmbito nacional Temos fecundos pesquisadores também O acesso ao conhecimento por meio da ciência tem na pesquisa uma atividade objetiva e subjetiva discutível afinal ciência não é dogma carregada de reflexões contradições sistematizações e resistematizações VERGARA 2004a Como lembra Caraça 2002 já que ciência é um organismo vivo porquanto está impregnada da condição humana apresenta dúvidas hesitações que só longa reflexão e apuramento conseguem eliminar No entanto logo surgem outras dúvidas e hesitações a exigirem novas reflexões e apuramento O processo é dinâmico portanto Aqui apresento algumas possibilidades metodológicas A você pesquisador cabe valerse de sua sensibilidade e de sua flexibilidade para escolher o encaminhamento da pesquisa e trazer sua contribuição ao campo Neste sentido ressalto os seguintes pontos a a qualidade da referência bibliográfica que dá suporte ao seu estudo já sinaliza para o leitor desse estudo o quanto ele pode ou não ser instigante b a articulação entre teoria e método é de vital relevância c a abertura de sua mente de pesquisador e a sensibilidade são de fundamental importância para sua interpretação de fenômenos sociais d as conclusões a que você chega devem responder ao problema da investigação e ser coerentes com a teoria e o método que foram por você utilizados e quanto mais o estudo avança no conhecimento existente mais relevante ele é f quanto mais você expõe seu trabalho seja em congressos seja informalmente a pares alunos amigos leitores em geral seja formalmente a revisores de revistas especializadas mais possibilidades tem de enriquecêlo com base nas críticas que a ele são feitas Ao explicitar os critérios para avaliação de artigos submetidos à revista Organizações Sociedade Pinho 2003 menciona que um artigo pode sofrer duas ou três rodadas de diálogo entre autor e avaliador e o objetivo não é o de desmerecer o trabalho antes de aperfeiçoálo Acontece assim também em outras revistas Foi com o intuito de aperfeiçoar o conteúdo deste livro que o expus previamente a Eduardo Davel brilhante parceiro acadêmico e amigo generoso Lá do Canadá então ele me ajudou a melhorar os textos Sou muito muito grata a ele por isso Também sou grata ao Prof Bianor Cavalcanti e à Profa Deborah Zouain A facilitação das condições de pesquisa pela EbapeFGV foi de extrema relevância Igualmente sou agradecida ao Prof Luiz Eduardo Achutti e à Tomo Editorial por terem permitido a reprodução das fotografias ilustrativas do método fotoetnográfico Bem leitor aqui vai nesta apresentação do livro uma palavra final todo esforço que você possa fazer para apresentar um trabalho rigoroso coerente consistente e ao mesmo tempo liberto de teias que possam aprisionar uma possível contribuição maior é fundamental Como fundamental também já nos alertam Alvesson e Sköldberg 2000 é que você pesquisador concentrese na reflexão e na interpretação dos dados no momento mesmo em que os está coletando e após a coleta e que o faça com a consciência do limite da linguagem para gerar conhecimento com base na realidade empírica Igualmente que você tenha a consciência de que reflexão e interpretação de dados estão situadas no campo político ideológico cultural lingüístico que a cada dia constrói e reconstrói você pesquisador Leituras para aprofundamento ALVESSON Mats SKÖLDBERG Kaj Reflexive methodology new vistas for qualitative research London Sage 2000 BABBIE Earl Métodos de pesquisas de survey Belo Horizonte EDUFMG 2001 BURRELL Gibson MORGAN Gareth Sociological paradigms and organizational analysis London Heinemann Educational Books 1979 CARAÇA Bento de Jesus Conceitos fundamentais de matemática 4 ed Portugal Gradiva 2002 GUEDES Ana Lúcia Empresas transnacionais e questões ambientais a abordagem do realismo crítico Revista Sociologia Política Curitiba 20 p 2542 jun 2003 MORGAN Gareth Beyond method strategies for social research London Sage 1983 MORIN Edgar Ciência com consciência Rio de Janeiro Bertrand do Brasil 1996 PINHO José Antonio Gomes de Uma investigação na avaliação de artigos submetidos à revista Organizações Sociedade Organizações Sociedade Salvador EAUFBA v 10 nº 28 p 7982 setdez 2003 VERGARA Sylvia Constant Projetos e relatórios de pesquisa em administração 5 ed São Paulo Atlas 2004a PECI Alketa Escolhas metodológicas em estudos organizacionais Organizações Sociedade Salvador EAUFBA v 10 nº 27 p 1326 maioago 2003 1 Análise de Conteúdo A análise de conteúdo é considerada uma técnica para o tratamento de dados que visa identificar o que está sendo dito a respeito de determinado tema Bardin 1977 p 42 a define como um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens indicadores quantitativos ou não que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção recepção variáveis inferidas destas mensagens Podese dizer que a análise de conteúdo tem se desenvolvido desde o início do século XX No começo a técnica era aplicada sobretudo ao tratamento de materiais jornalísticos Hoje abraça também transcrições de entrevistas documentos institucionais entre outros A disseminação desse método se deu a partir dos estudos da Escola de Jornalismo da Universidade de Columbia nos Estados Unidos BARDIN 1977 H Lasswell é considerado um dos pioneiros na aplicação do método tendo realizado análises de imprensa e de propaganda Nas décadas de 40 e 50 do século XX pesquisadores como B Berelson e P Lazarsfeld se dedicaram à sistematização das regras de análise A partir dos anos 60 a análise de conteúdo passou a contar com o auxílio de recursos da informática A obra The general inquirer a computer approach to content analysis in the behavioral sciences publicada em 1966 por Stone et al é considerada uma referência no que diz respeito à análise com auxílio de computador BARDIN 1977 BAUER 2002 No ano 2004 diversos softwares para esta finalidade já estavam à disposição no mercado tais como NUDIST e ATLASti KELLE 2002 TESCH 1990 A análise de conteúdo admite tanto abordagens quantitativas quanto qualitativas ou ainda ambas BARDIN 1977 FREITAS CUNHA JR e MOSCAROLA 1996 LAVILLE e DIONNE 1999 apesar de ter sido concebida com base na quantificação Palavraschave Unidades de análise Grade de análise Categorias Freqüência de elementos se a análise for de base quantitativa Relevância de elementos Presença ou ausência de elementos Características principais Prestase tanto aos fins exploratórios ou seja de descoberta quanto aos de verificação confirmando ou não hipóteses ou suposições preestabelecidas Exige categorias exaustivas mutuamente exclusivas objetivas e pertinentes BARDIN 1977 FREITAS CUNHA JR e MOSCAROLA 1996 LAVILLE e DIONNE 1999 Grandes quantidades de dados podem ser tratadas bem como armazenadas com o auxílio de programas de computador A interpretação contudo cabe ao pesquisador Correse o risco quando se detém nas freqüências de perderse o que está ausente ou é raro BAUER 2002 porém relevante para a análise do objeto em estudo Como utilizar1 Definemse o tema e o problema de pesquisa 1 A ordem aqui apresentada não é rígida Pode portanto ser alterada conforme a situação Procedese a uma revisão da literatura pertinente ao problema de investigação e escolhemse as orientaçãoões teóricas que daráão suporte ao estudo Definemse as suposições para o problema sob investigação exceto se a pesquisa for do tipo exploratória Neste caso suposições poderão ser definidas durante o andamento da pesquisa ou ao final Definemse os meios para a coleta dos dados conforme o tipo de pesquisa documental ou de campo No primeiro caso os dados podem ser coletados em relatórios cartas ou outros documentos da organização No segundo a coleta geralmente ocorre por meio da realização de entrevistas abertas ou semiestruturadas ou da aplicação de questionários abertos Coletamse os dados por meio dos instrumentos escolhidos No caso da realização de entrevistas procedese à sua transcrição quando gravadas Definese o tipo de grade para a análise aberta fechada ou mista Procedese à leitura do material selecionado durante a etapa de coleta dos dados cartas transcrição de entrevistas respostas a questionários abertos Definemse as unidades de análise palavra expressão frase parágrafo Definemse as categorias para análise conforme a grade de análise escolhida Grade aberta identificamse categorias de análise conforme vão surgindo ao pesquisador Procedese ao rearranjo das categorias durante o andamento da pesquisa Estabelecemse categorias finais de análise Grade fechada definemse preliminarmente as categorias pertinentes ao objetivo da pesquisa Identificamse no material selecionado os elementos a serem integrados nas categorias já estabelecidas Grade mista definemse preliminarmente as categorias pertinentes ao objetivo da pesquisa porém admitese a inclusão de categorias surgidas durante o processo de análise Verificase a necessidade de subdivisão inclusão ou exclusão de categorias Estabelecese o conjunto final de categorias considerando o possível rearranjo Procedese à análise de conteúdo apoiandose em procedimentos estatísticos interpretativos ou ambos Resgatase o problema que suscitou a investigação Confrontamse os resultados obtidos com as teorias que deuram suporte à investigação Formulase a conclusão Elaborase o relatório de pesquisa Podese dizer que a análise de conteúdo compreende três etapas básicas a préanálise b exploração do material c tratamento dos dados e interpretação BARDIN 1977 A préanálise referese à seleção do material e à definição dos procedimentos a serem seguidos A exploração do material diz respeito à implementação destes procedimentos O tratamento e a interpretação por sua vez referemse à geração de inferências e dos resultados da investigação Nesta última fase suposições poderão ser confirmadas ou não O procedimento básico da análise de conteúdo referese à definição de categorias pertinentes aos propósitos da pesquisa TESCH 1990 Categorias são rubricas ou classes as quais reúnem um grupo de elementos sob um título genérico agrupamento esse efetuado em razão dos caracteres comuns destes elementos BARDIN 1977 p 117 Categorizar implica isolar elementos para em seguida agrupálos As categorias devem ser a exaustivas isto é devem permitir a inclusão de praticamente todos os elementos embora nem sempre isso seja possível b mutuamente exclusivas ou seja cada elemento só poderá ser incluído em uma única categoria c objetivas isto é definidas de maneira precisa a fim de evitar dúvidas na distribuição dos elementos d pertinentes ou seja adequadas ao objetivo da pesquisa Três grades podem ser escolhidas pelo pesquisador para a definição das categorias aberta fechada ou mista LAVILLE e DIONNE 1999 Na primeira as categorias são definidas durante o andamento da pesquisa É uma grade flexível pois permite alterações até que se obtenha um conjunto final É recomendada para pesquisas de cunho exploratório Na grade fechada o pesquisador recorre à literatura pertinente ao tema da pesquisa para formular as categorias ou seja são estabelecidas a priori Aqui desejase em geral verificar a presença ou a ausência de determinados elementos Alertase contudo para o fato de que alguns elementos podem ficar de fora da categorização uma vez que a grade é rígida LAVILLE e DIONNE 1999 É inapropriada para pesquisas exploratórias sendo em geral utilizada para as do tipo descritiva e explicativa A terceira grade incorpora características das duas anteriores Categorias são definidas a priori com base na literatura tal como na grade fechada Contudo elas são mutáveis Ao contrário da grade fechada todos os elementos presentes nos dados coletados podem ser considerados e conseqüentemente integrar as categorias A análise pode ser amparada por procedimentos de cunho quantitativo qualitativo ou ambos BARDIN 1977 GODOY 1995 LAVILLE e DIONNE 1999 ROESCH 1999 Procedimentos quantitativos privilegiam as frequências ou seja as ocorrências de determinados termos ou palavraschave no texto BARDIN 1977 LAVILLE e DIONNE 1999 Os dados podem ser tratados por meio de técnicas estatísticas simples como a análise de freqüências ou por meio de outras mais complexas como a análise fatorial e a análise de variância BARDIN 1977 ROESCH 1999 Procedimentos qualitativos focalizam as peculiaridades e as relações entre os elementos LAVILLE e DIONNE 1999 Enfatizam o que é significativo relevante o que pode não ser necessariamente freqüente no texto A interpretação dos resultados pode ser realizada por meio do emparelhamento patternmatching ou da construção iterativa de uma explicação LAVILLE e DIONNE 1999 A primeira modalidade diz respeito à associação dos resultados ao referencial teórico utilizado procedendose à comparação A segunda referese à construção de uma explicação com base nas relações entre as categorias É em geral utilizada em pesquisas exploratórias Procedimentos quantitativos e qualitativos contudo não são mutuamente excludentes Podem ser utilizados de forma complementar Obtidos os resultados cabe ao pesquisador retornar às suposições formuladas se houver e confirmálas ou não conferindo as devidas explicações Exemplos da utilização da análise de conteúdo Exemplo 1 Gestão da comunicação organizacional Silva e Oliveira 2003 valeramse da análise de conteúdo em uma pesquisa sobre gestão da comunicação organizacional Os pesquisadores discutiram a questão da comunicação sob uma ótica instrumental pautada na geração de conformidade e obediência às diretrizes da organização bem como sob uma ótica participativa vista como uma arena de construção de significado Abordaram a necessidade de se abandonar a visão tutelada com que o tema vem sendo tratado em favor de uma visão participativa Para a realização da pesquisa cujo objetivo foi identificar os aspectos que impactam a construção de uma comunicação baseada no sentido de participação foi selecionada uma empresa brasileira prestadora de serviços de infraestrutura na área de energia Esta empresa havia sido privatizada cerca de seis anos antes da realização da pesquisa A melhoria dos processos internos de comunicação era um dos grandes desafios a serem enfrentados pela empresa nesse contexto de mudanças Os dados foram coletados por meio de a realização de entrevistas semiestruturadas com funcionários da empresa b participação dos pesquisadores como observadores em três reuniões da empresa c pesquisa documental Foram entrevistados 20 funcionários de diferentes áreas e níveis hierárquicos As entrevistas foram norteadas pelos seguintes tópicos comunicação vertical tanto no sentido da organização para os indivíduos quanto no sentido inverso comunicação entre equipes comunicação interpessoal meios de comunicação utilizados Os dados obtidos foram submetidos à análise de conteúdo com o auxílio do software ATLASti Frases e parágrafos foram definidos como unidades de análise Foram identificados elementos que afetam o desenvolvimento de uma comunicação participativa tendo sido agrupados nas seguintes categorias diretrizes gerais da organização identidade organizacional e conflitos de identidade entre grupos integração entre áreas integração pessoal eficácia dos meios de comunicação institucional e interpessoal eficácia dos canais de comunicação das pessoas para a organização relações hierárquicas características predominantes na cultura e no clima organizacional Essas categorias foram obtidas a posteriori logo os pesquisadores valeramse da grade de análise aberta No que diz respeito às diretrizes gerais da organização os dados obtidos revelaram que apesar de os funcionários perceberem a necessidade de um esforço conjunto para enfrentarem os desafios aos quais a organização está sujeita há dificuldades para o alinhamento do esforço individual com estas diretrizes Entre os principais aspectos referentes a estas dificuldades os participantes da pesquisa mencionaram pouco conhecimento sobre a visão da matriz estrangeira da empresa percepções diversas sobre a missão e sobre a estratégia da empresa metas fragmentadas por área pouco claras e desatualizadas definição das metas de modo vertical ausência de feedback No que concerne à identidade organizacional e às identidades de grupos foi possível perceber dificuldades para se compor uma identidade organizacional forte devido em grande parte às mudanças pelas quais a empresa vinha passando Não obstante isso a busca pela construção desta identidade parecia ser uma preocupação tanto dos dirigentes quanto dos funcionários Conflitos de identidade entre grupos foram também percebidos tendo sido citados indivíduos com uma visão mais coletiva e outros mais individualista indivíduos que se consideram qualificados e outros que são vistos como tendo pouca qualificação comportamento autêntico versus comportamento padronizado indivíduos que se consideram marginalizados pela empresa e outros que parecem ter sido privilegiados ação e carreira segundo uma lógica de mercado versus ação e carreira dirigidas apenas para a empresa Com relação à integração entre áreas os participantes revelaram que a ausência de um sistema para a gestão de processos a carga de trabalho excessiva a rotatividade de pessoal o desconhecimento da missão e da estratégia da empresa entre outros fatores dificultam a construção de uma visão integrada e conseqüentemente o desenvolvimento de uma comunicação pautada na participação Sobre a integração pessoal foi possível perceber que apesar do clima de cordialidade sem disputas exageradas as relações eram distantes ficando restritas aos assuntos de trabalho Os contatos quando estabelecidos eram em grande parte proporcionados pela tecnologia email e telefone Dificuldades de integração foram citadas pelos participantes e a empresa vinha tentando minimizálas à época da pesquisa Com relação aos meios de comunicação institucional a empresa utilizava um jornal institucional informativos on line um informe mensal de Recursos Humanos comunicados de RH e murais setoriais Para os participantes da pesquisa o emprego destes instrumentos era limitado tanto no que se refere à difusão das políticas da organização quanto na promoção do fortalecimento da identidade dos funcionários com a empresa No que diz respeito aos meios de comunicação interpessoal foram citados o correio eletrônico o telefone as reuniões o contato pessoal e para alguns setores o rádio Os participantes revelaram mais uma vez ser a comunicação formal e distante tendo como principal meio o correio eletrônico Sobre os canais de comunicação das pessoas para a organização os participantes destacaram a área de Recursos Humanos e a área de Comunicação Social Aspectos positivos principalmente no que se refere à Diretoria de Recursos Humanos foram citados tais como fácil acesso aos profissionais da área esforços para a aproximação com os empregados promoção de eventos de integração entre outros Aspectos negativos foram relacionados à falta de clareza na divulgação das políticas de RH centralização nas iniciativas de gestão de pessoas entre outros No que diz respeito à estrutura hierárquica foi possível perceber a distância entre a base e a cúpula da organização Os gerentes intermediários pareciam atuar como repassadores de informação do topo para a base No que se refere às características predominantes na cultura e no clima da organização os participantes sugeriram que fatores como o carisma da organização e sua capacidade de cativar os empregados além da valorização de uma visão de resultados afetavam positivamente o desenvolvimento de uma comunicação voltada para a participação Por outro lado o excesso de hierarquia a pouca flexibilidade de normas e rotinas a relação paternalista com os empregados entre outros fatores pareciam prejudicar este desenvolvimento Os resultados da pesquisa revelaram aspectos positivos e negativos que podem afetar o desenvolvimento da comunicação organizacional segundo uma visão participativa Com base nesses resultados os pesquisadores propuseram um quadro de referência para a gestão da comunicação organizacional pautado nos seguintes aspectos referenciais estruturais instrumentais relacionais e culturais Por fim os pesquisadores argumentaram que a gestão da comunicação organizacional deve perseguir a construção conjunta de valores a fim de fortalecer o respeito mútuo a aproximação das identidades o senso de colaboração e o orgulho de compartilhar um projeto comum Deve sobretudo valorizar a contribuição dos indivíduos como sujeitos de sua ação Exemplo 2 Reconstrução de identidades em momentos de mudança organizacional O processo de reconstrução de identidades em momentos de mudança organizacional foi objeto de estudo para Silva e Vergara 2002 em uma pesquisa realizada em cinco organizações brasileiras Os pesquisadores tomaram como referência a premissa de que os contextos de mudança organizacional tendem a modificar o modo pelo qual os indivíduos percebem o conjunto de relações sociais relevantes para eles As cinco organizações selecionadas para a pesquisa tinham passado recentemente ou estavam passando por processos de mudança organizacional Foram elas a fundação privada com atuação em pesquisa educação e consultoria nas áreas de economia e gestão b instituição financeira estatal c empresa privatizada que atuava como concessionária em serviços urbanos d órgão da administração pública municipal com atuação na fiscalização de tributos e empresa farmacêutica multinacional Os dados foram coletados por meio da realização de entrevistas semiestruturadas com cerca de 15 funcionários de cada organização em um total de 75 funcionários O tratamento destes dados se deu por meio da análise de conteúdo com o auxílio do software ATLASti As unidades de análise foram frases e parágrafos Os dados foram classificados com base nos diferentes conceitos abordados pelos entrevistados entre os quais as múltiplas relações sociais e institucionais por eles visualizadas no contexto organizacional Para a classificação destas relações quatro categorias foram previamente definidas com base na literatura caracterizando uma grade fechada São elas a relação do indivíduo consigo mesmo eu e eu as relações do indivíduo com o contexto geral eu e o contexto as relações do indivíduo com os outros indivíduos por ele considerados como relevantes eu e os outros as relações estabelecidas pelos grupos com os quais o indivíduo mantém identidade no contexto nós e o contexto Os resultados da pesquisa revelaram diferentes elementos integrantes do conjunto de relações que afetam o processo de interpretação do contexto e reconstrução das identidades dos indivíduos São eles a a relação do indivíduo consigo mesmo eu e eu b a relação do indivíduo com o seu trabalho eu e o trabalho c as relações do indivíduo com os grupos com os quais possui alguma identidade eu e os meus grupos d as relações hierárquicas eu e os gerentesos subordinados e as relações do indivíduo com a cúpula da organização eu e a diretoria f as relações do indivíduo com os outros grupos com os quais não mantém uma identidade forte eu e os outros grupos g as relações entre os grupos com os quais o indivíduo mantém uma identidade e os outros grupos nós e os outros grupos h as relações entre os grupos com os quais o indivíduo mantém uma identidade e a instituição nós e a organização i as relações do indivíduo com os clientes eu e os clientes j as relações do indivíduo com os colegas que deixaram a organização por ocasião das mudanças eu e os colegas que saíram l as relações do indivíduo com a família e os amigos que não pertencem à organização eu e os entes queridos m as relações do indivíduo com a instituição eu e a organização n as relações do indivíduo com o mercado de trabalho eu e o mercado de trabalho o as relações do indivíduo com a sociedade em geral eu e a sociedade p as relações da instituição com a sociedade a organização e a sociedade q as relações da instituição com o mercado a organização e o mercado Para os pesquisadores este conjunto de relações revela uma mistura de elementos em níveis macro e micro demonstrando que o sentido da mudança para os indivíduos é construído pelos valores diretrizes e regras sociais presentes no contexto bem como pelas inúmeras interações das quais eles participam Estes elementos parecem afetar o modo pelo qual as identidades pessoais coletivas e institucionais são reconstruídas Os pesquisadores sugerem ainda que as organizações devem levar em conta um novo tipo de agenda no que diz respeito ao planejamento da gestão de mudanças que inclui entre outros fatores as percepções dos indivíduos acerca do processo o impacto das mudanças para os indivíduos dentro e fora da empresa o desenvolvimento das interações pessoais em meio à ação o desenvolvimento das relações de poder e a integração entre os diferentes níveis da hierarquia o tratamento dado às demissões e o que a saída dos antigos colegas representa para os indivíduos remanescentes a compreensão dos indivíduos acerca da missão institucional Por fim o conjunto de relações apresentado suscita outras possibilidades para estudos sobre comunicação e mudança organizacional bem como sobre as supostas resistências dos indivíduos à mudança organizacional Leituras para aprofundamento BARDIN Laurence Análise de conteúdo Lisboa Edições 70 1977 BAUER Martin W Análise de conteúdo clássica uma revisão In BAUER Martin W GASKELL George Ed Pesquisa qualitativa com texto imagem e som um manual prático Petrópolis Vozes 2002 FREITAS Henrique M R de CUNHA JR Marcus V M da MOSCAROLA Jean Pelo resgate de alguns princípios da análise de conteúdo aplicação prática qualitativa em marketing Porto Alegre UFRGSFCEPPGA 199617 p Série Documentos para Estudo PPGAUFRGS nº 596 GODOY Arilda S Pesquisa qualitativa tipos fundamentais Revista de Administração de Empresas São Paulo Fundação Getulio Vargas v 35 nº 3 p 2029 maiojun 1995 KELLE Udo Análise com auxílio de computador codificação e indexação In BAUER Martin W GASKELL George Ed Pesquisa qualitativa com texto imagem e som um manual prático Petrópolis Vozes 2002 LAVILLE Christian DIONNE Jean A construção do saber manual de metodologia da pesquisa em ciências humanas Porto Alegre Artes Médicas Sul Belo Horizonte EDUFMG 1999 MOTTA Paulo Cesar Serviços pesquisando a satisfação do consumidor Rio de Janeiro Papel Virtual 1999 ROESCH Sylvia M A Projetos de estágio e de pesquisa em administração guia para estágios trabalhos de conclusão dissertações e estudos de caso 2 ed São Paulo Atlas 1999 SILVA José Roberto Gomes da OLIVEIRA Maria do Carmo Leite de A composição de um quadro de referência para a gestão da comunicação organizacional In ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓSGRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO 27 2003 Atibaia Anais Atibaia Anpad 2003 VERGARA Sylvia Constant Mudança organizacional e as múltiplas relações que afetam a reconstrução das identidades dos indivíduos In ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓSGRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO 26 2002 Salvador Anais Salvador Anpad 2002 TESCH Renata Qualitative research analysis types and software tools New York Falmer Press 1990 2 Análise do Discurso A análise do discurso é um método que visa não só aprender como uma mensagem é transmitida como também explorar o seu sentido Analisar o discurso implica considerar tanto o emissor quanto o destinatário da mensagem bem como o contexto no qual o discurso está inserido Seu foco é a forma como a língua é produzida e interpretada em um dado contexto CABRAL 1999 p 11 Ou como asseveram Putnam e Fairhurst 2001 p 79 é o estudo de palavras e expressões incluindo a forma ou estrutura destas palavras o uso da linguagem no contexto e os significados ou interpretações de práticas discursivas A relação entre os participantes de um discurso pode contudo ir além do esquema emissorreceptor Explorar o sentido do discurso demanda então reconhecer outros personagens o locutor o enunciador o alocutor e os destinatários BALLALAI 1989 O primeiro referese ao autor da fala O enunciador também conhecido como animador é aquele que profere uma sequência de palavras A fala neste caso não é sua O alocutor é o indivíduo a quem o discurso é dirigido isto é o verdadeiro destinatário da mensagem Os destinatários por sua vez são ouvintes pacientes dos atos A análise do discurso compreende diferentes abordagens Em linhas gerais consideramse duas grandes escolas a anglosaxã e a francesa CABRAL 1999 PEREIRA 1991 A primeira referese a uma perspectiva pragmática enquanto a segunda diz respeito à perspectiva ideológica Maingueneau 1998 situa a análise do discurso no entrecruzamento das ciências humanas Com relação às abordagens observa que nos Estados Unidos a análise do discurso é Exige do pesquisador habilidade para registrar os recursos utilizados pelos participantes para intensificar ou mitigar o que está sendo dito para observar aspectos comportamentais emergentes durante o discurso bem como para registrar fatos relacionados à situação estudada Como utilizar Definemse o tema e o problema de pesquisa Procedese a uma revisão da literatura pertinente ao problema de investigação e escolhemse as orientaçãoões teóricas que daráão suporte ao estudo Definese o tipo de material a ser considerado como fonte de dados para a pesquisa textos gravações de entrevistas reuniões conversas telefônicas ou outras situações de interação social No caso de dados provenientes de entrevistas ou de reuniões Realizamse as entrevistas ou participase das reuniões Registrase o conteúdo literal das entrevistas ou das reuniões utilizandose gravações em áudio Registramse aspectos paralinguísticos e não verbais em notas de campo Procedese à audição das gravações antes de dar início à transcrição Transcrevese o conteúdo das entrevistas ou das reuniões valendose de critérios de convenção de transcrição No caso de dados provenientes de conversas telefônicas no âmbito de um Call Center por exemplo selecionamse previamente as interações a serem analisadas Procedese à leitura das transcrições das entrevistas reuniões conversas telefônicas ou dos textos selecionados tantas vezes quantas o pesquisador julgar necessário Identificamse as primeiras ideias relativas ao texto Vergara Bastos e Gomes 2004 cuja pesquisa é apresentada no exemplo 2 deste capítulo registraram o fato de que as operadoras de televendas tentaram adiar uma reunião que estava com seu início atrasado em mais de uma hora alegando que perderiam o ônibus A solicitação não foi aceita pelo Gerente de Vendas A ordem aqui apresentada não é rígida Pode portanto ser alterada conforme a situação Identificamse os pontoschaves do discurso como o emissor se projeta que referências utiliza como se dirige ao receptor como a linguagem é empregada que dimensões enfatiza como se dá a comunicação ou a argumentação que elementos utiliza Identificamse nos dados padrões isto é relações entre características do discurso bem como variabilidades ou seja diferenças entre discursos de diferentes indivíduos e entre discursos de um mesmo indivíduo Descrevemse detalhadamente e analisamse os elementos identificados Resgatase o problema que suscitou a investigação Confrontamse os resultados obtidos com as teorias que deuram suporte à investigação Formulase a conclusão Elaborase o relatório de pesquisa Para analisar o discurso é importante levar em consideração não só os aspectos verbais ou lingüísticos como também os paraverbais ou paralingüísticos bem como os não verbais Aspectos paraverbais referemse às pausas à entonação às hesitações Aspectos não verbais dizem respeito aos gestos aos olhares à postura corporal à distância entre os participantes Ao analisar materiais provenientes de entrevistas ou reuniões o pesquisador deve considerar as transcrições bem como as notas de campo resultantes de suas observações As transcrições devem ser realizadas na íntegra sem cortes correções ou interpretações iniciais Devese preservar a fala dos participantes Sugerese que o relatório de pesquisa inclua fragmentos trechos do material analisado de modo a ilustrar a interpretação do pesquisador É importante ainda registrar os critérios de convenção de transcrição estabelecidos de modo a facilitar o entendimento do leitor Podese utilizar por exemplo a versão apresentada por Wood e Kroger 2000 Exemplos da utilização da análise do discurso Exemplo 1 Atendimento prestado por uma empresa de segurosaúde aos seus usuários A relação entre uma empresa de segurosaúde e seus usuários foi investigada por Oliveira e Bastos 2001 com base no estudo de narrativas construídas pelos usuários e as respectivas respostas fornecidas pela empresa A pesquisa teve como objetivo investigar como a interação usuárioempresa é modelada pela construção de identidade e afetada pela representação do que é um tratamento justo para cada uma das partes As pesquisadoras destacaram a identidade entendida como o processo de expor e interpretar posições sociais afiliações papéis e status como um ponto central para o estudo das narrativas Se por um lado para a empresa a saúde é vista como uma atividade comercial norteada por um contrato que define direitos e deveres de ambas as partes por outro para o usuário ela é um direito devendo o atendimento ser guiado pelas suas necessidades pessoais É com base em cada uma das representações que os participantes da interação constroem seu discurso Os dados foram coletados nas correspondências texto trocadas pelos usuários e pela empresa representada pelo serviço de atendimento ao cliente Este serviço era realizado na época em que os dados foram coletados por seis funcionárias responsáveis pelo atendimento telefônico e pelas correspondências dos usuários em geral referentes a reclamações ou solicitações Duas correspondências e suas respectivas cartasresposta foram selecionadas para análise A primeira tratava de uma solicitação de anistia de dívidas contraídas pelo titular para tratamento do filho uma vez que não havia cobertura para a situação ocorrida A segunda referiase a uma reclamação pelo mau atendimento prestado por um credenciado O discurso dos dois usuários foi analisado com foco a na identidade dos narradores afiliações sociais gerenciamento de imagem positiva alinhamentos e sentimentos de inclusãoexclusão nos grupos sociais referidos b os fatos e suas evidências bem como a carga dramática presente nos relatos Os dois discursos apoiaramse na argumentação para o alcance dos seus objetivos Na primeira carta o autor do discurso apresenta um replaying ou seja sua versão da experiência como pai cujo filho sofreu um acidente pagador e agora devedor do segurosaúde Explicita em seu discurso afiliações a categorias sociais colocandose como pobre não tenho bens não tinha dinheiro para pagar as passagens o pouco dinheiro que tinha era para alimentação meu salário de funcionário público não dá para pagar a dívida velho não tenho condições de pegar em peso pois sou velho e doente tento problemas de coluna Apresenta em seu discurso de forma indireta atributos socialmente aceitos mostrandose um pai dedicado responsável generoso e humilde A evidência dos fatos relatados é fornecida por meio de referências nome de hospitais cidades termos médicos e datas A carga dramática do discurso corresponde à própria situação apresentada o acidente do filho A dimensão do drama pode ser observada pela ordenação dos fatos relatados Entretanto há uma única referência explícita à emoção seu desespero devido à doença do filho associada ao aumento das despesas e à displicência dos médicos O autor do discurso entende como tratamento justo o cancelamento de suas dívidas em virtude de suas necessidades pessoais Esse é o objetivo do discurso Na segunda carta a autora do discurso relata seu sofrimento devido ao atendimento médico do qual foi vítima Seu discurso não foi construído com base em afiliações a categorias sociais ou referências ao exercício de papéis no âmbito familiar Apresentase entretanto como uma trabalhadora consciente e responsável tinha horário no dia em que eu podia sair mais cedo do trabalho cujas decisões são baseadas em razões objetivas como eu não tinha cheque para pagar a anestesia procurei outro estabelecimento que não me atraísse tanto resolvi fazer no Hospital X porque tinha horário no dia Mostrase uma pessoa corajosa e determinada capaz de protestar e denunciar não me calarei diante de tal brutalidade Seu desespero devido ao atendimento desumano a Dra XZ não esperou que eu dormisse e mesmo assim fez o exame é expresso de forma explícita com evidências dos fatos eu gritava chorava Sua narrativa é dramática Explicitar sua indignação cobrando providências é o próprio objetivo do discurso A análise das duas cartas revelou que os locutores ou autores do discurso enfatizam as dimensões pessoais de suas identidades Além disso ambos assumem que organizações são pessoas sendo a primeira carta dirigida ao presidente e a segunda ao médico auditor A segunda contudo agradece e solicita providências à organização A resposta da empresa à primeira carta tratou a narrativa de sofrimento do autor como um relato de problemas Foi objetiva mencionando as responsabilidades assumidas pelo autor e demonstrando a ilegitimidade do pedido A empresa mostrouse guiada por regras claras que justificavam a cobrança No segundo caso a narrativa é tratada como fato A empresa foi formal e distante Além disso não se via como coresponsável pelo atendimento Apenas comunicou à usuária o descredenciamento da clínica A análise das cartasresposta revelou a distância da empresa com relação aos assuntos relatados pelos usuários bem como uma interação formal e padronizada A mensagem foi transmitida por meio da construção de uma identidade impessoal para a empresa do tratamento dado ao usuário visto como cliente e não como pessoa da legitimação do que a empresa entende como tratamento justo Os resultados da pesquisa revelaram que a interação foi modelada pelas identidades dos participantes a partir de suas representações da saúde De um lado usuários utilizaram o modelo pessoapessoa entendendo a saúde como um direito De outro a empresa utilizou o modelo nãopessoa nãopessoa entendendo a saúde como um negócio Essas percepções opostas afetaram portanto a interação Foi observada ainda a necessidade humana de auto aprovação identificada nas narrativas dos usuários Por fim a injustiça no nível micro foi associada àquela em nível macro que exclui as classes menos favorecidas e que não garante atendimento digno aos usuários de planos de saúde Exemplo 2 Estilos discursivos de liderança gerencial Vergara Bastos e Gomes 2004 discutiram a construção de estilos discursivos de liderança gerencial em uma pesquisa amparada metodologicamente pela sociolingüística interacional em interface com a análise da conversação vertentes da análise do discurso A pesquisa teve como objetivo responder à seguinte questão que estilos discursivos de liderança gerencial podem ser identificados na relação líderliderados em situações de busca de solução de problemas Foi orientada pelo pressuposto de que líderes alinham e realinham seus discursos em função de seus propósitos e dos significados construídos com os liderados no processo de comunicação e solução de problemas Reuniões em uma empresa brasileira foram eventos considerados oportunos para identificar os estilos discursivos uma vez que permitem observar nitidamente as mudanças de alinhamento Foram focalizadas as relações dos líderes da Ramo Ferro Ltda nome fictício atribuído à empresa o Diretor Geral o Diretor Administrativo e o Gerente de Vendas com os seus liderados operadoras de televendas e representantes comerciais autônomos A coleta de dados se deu por meio da observação e da gravação em áudio de sete reuniões da empresa BASTOS 2001 sendo que no artigo aqui utilizado como exemplo foram apresentados dados referentes a três reuniões uma com profissionais do setor de televendas e duas com representantes comerciais Aspectos não verbais foram registrados em notas de campo Além disso foram realizadas entrevistas informais com os líderes antes de cada reunião Os resultados da pesquisa revelaram quatro estilos discursivos de liderança gerencial quais sejam o autocentrado o consultivo o instrutivo e o colaborativo Essa categorização foi construída pelas pesquisadoras à luz da literatura sobre liderança e das observações nas reuniões O estilo autocentrado é aquele no qual o líder prioriza os significados que ele constrói tomando como base seus valores seu conhecimento e sua própria experiência Sua voz soa individual na construção discursiva São utilizados como recursos de intensificação a repetição de palavras e expressões os advérbios de intensidade e a ênfase na entonação Hesitações e diminutivos constituem estratégias de atenuação A análise de um dos trechos da segunda reunião com representantes comerciais relativa à discussão sobre o preço das mercadorias permitiu evidenciar o alinhamento do líder consigo mesmo O trecho é apresentado a seguir Tom Só oh Daniel Daniel Pois não Tom Prestem bem atenção esqueçam esqueçam esqueçam daqui pra frente o preço O preço não vai ser o principal fator pra vender e não é e não é Não adianta a Ramo fazer promoção não adianta A Ramo vai fazer promoção de tubos e conexões Tigre vai lançar a semana que vem no mercado Você acha que a concorrência não vai acompanhar Primeiro quando fazem promoção a promoção não vem só diretamente pra Ramo impossível isso tá Ela vai oferecer à Ramo vai oferecer a Fulano a Beltrano Sicrano aí uma meia dúzia deles tá A Ramo não tem como não tem gás tá É é é aliás não tem nada pra expurgar mais no preço não tem nada que pudesse justificar não houve uma redução no custo da entrega de 5 ah vamos repassar isso para o preço não existe mais isso O preço é muito competitivo haja visto vocês citarem aí o preço de algumas coisas aí você viu Um tubo 639 o do concorrente 643 diferença de centavos Daniel Uma differencazinha maior o de sempre né Tom Pois bem mas você vê que os preços estão muito próximos Como se vê o líder inicia o seu discurso dando uma ordem aos representantes comerciais Utiliza o modo imperativo do verbo e repete a ordem três vezes a fim de intensificála Ele redefiniu o problema apresentado por um representante comercial assumindo que o preço não é o principal fator para vender e procurou reorientar a compreensão dos participantes de modo a modificarlhes a posição O estilo consultivo por sua vez caracterizase pelo alinhamento do líder com o outro A postura do líder ora é mais centralizada ora é mais descentralizada Os líderes utilizam em geral as perguntasconsultas como as elaboradas pelo Gerente de Vendas durante as reuniões com os representantes comerciais Tem acontecido muito isso sobre a falta de mercadoria Qual o produto sobre o problema da embalagem O estilo instrutivo também se caracteriza pelo alinhamento do líder com o outro mas a intenção não é uma consulta como no caso anterior é dizer como fazer O líder com base na sua experiência ensina como fazer O outro é aquele que aprende Diferentes estratégias podem ser utiliza das para ensi nar O trecho extraído de uma interação relativa ao atendimento ao cliente que vai à empresa para comprar mercadorias ocorrida na reunião de televendas ilustra uma das possibilidades ó pois não Dias pode chegar Nesse caso o Diretor Geral utiliza o diálogo fictício construído para ensinar a receber o cliente O diálogo fictício foi também construído para ensinar as operadoras a administrar tarefas separando o trabalho de atendimento ao cliente face a face e de vendas por telefone conforme ilustrado pela fala do Diretor Administrativo Rosa olha não estou com cliente nenhum aqui ligação pode passar pra mim também O estilo colaborativo é o mais descentralizado O líder reconhece o outro como coconstrutor do significado Posições são desenvolvidas em conjunto Os resultados da interação são portanto fruto de uma voz coletiva Uma coconstrução colaborativa pode ser observada no fragmento extraído da reunião de televendas Tratase de decisão sobre o local de atendimento ao cliente Participaram da interação o Gerente de Vendas o Diretor Administrativo e uma das operadoras Nilson Outras necessidades Jota Isso eu posso implementar o mais rápido possível Por quê A estrutura lá tá pronta Eu tenho telefone na sala tenho computador tenho tudo Sue É Jota Hoje eu já já adquiri o ar já vai o ar pra lá Sue Tá bom então Pra mim tá ótimo Acredito que isso aí já vai melhorar Jota E tem um detalhe eu posso estudar qual a sala que vai se adequar mais Sue Hum Jota Se é aquela lá totalmente reservada ou se é essa aqui onde está o Carlos que ali é o nicho Sue Eu acho que seria melhor a totalmente reservada Jota Reservada Sue Porque justamente o pedido ficaria mais à vontade pra acrescentar mais alguma coisa eu acredito Jota Certo Vamos começar Sue Que ali o Carlos vem depois o cliente toca tá procurando o pedido lá acho que seria né Joe né O cliente ficaria mais à vontade lá Jota Então vocês ficariam mais à vontade lá com certeza 19 Neste exemplo o líder informa os meios de que a empresa dispõe para implementar o rodízio para atendimento ao cliente em local independente do setor de televendas A operadora colaborativamente concorda O líder então fala sobre a possibilidade de escolha da sala indicando a sua preferência A operadora contudo argumenta pela escolha da outra sala expondo suas razões O líder por fim ratifica a opção pela sala reservada construindo com a operadora a decisão final Os resultados da pesquisa demonstraram que cada estilo tem uma função diferente e complementar no contexto da interação A identificação dos estilos revelou o exercício do poder dos líderes e como eles por meio de habilidades comunicativas procuram influenciar seus liderados em direção aos propósitos da organização A mudança de alinhamento é considerada portanto uma estratégia discursivopersuasiva Leituras para aprofundamento BALLALAI Roberto Notas e subsídios para a análise do discurso uma contribuição à leitura do discurso da Administração Fórum Educacional Rio de Janeiro Fundação Getulio Vargas 13 12 p 5680 fevmaio 1989 BASTOS Clarissa R P Estilos discursivos de liderança gerencial em atividades de fala problema solução em reuniões empresariais 2001 350 f Tese Doutorado em Letras Departamento de Letras Pontifícia Universidade Católica Rio de Janeiro BAUER Martin W GASKELL George Ed Pesquisa qualitativa com texto imagem e som um manual prático Petrópolis Vozes 2002 CABRAL Augusto Cezar de Aquino A análise do discurso como estratégia de pesquisa no campo da administração um olhar inicial In ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓSGRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO 23 1999 Foz do Iguaçu Anais Foz do Iguaçu Anpad 1999 GILL Rosalind Análise do discurso In BAUER Martin W GASKELL George Ed Pesquisa qualitativa com texto imagem e som um manual prático Petrópolis Vozes 2002 MAINGUENEAU Dominique Termoschave da análise do discurso Belo Horizonte EDUFMG 1998 OLIVEIRA Maria do Carmo Leite de BASTOS Liliana Cabral Saúde doença e burocracia pessoas e dramas no atendimento de um seguro saúde In RIBEIRO Branca Telles LIMA Cristina Costa DANTAS Maria Tereza Lopes Org Narrativa identidade e clínica Rio de Janeiro IPUBCUCA 2001 20 PEREIRA Aracy Ernst Uma introdução à análise do discurso Letras de Hoje Porto Alegre v 84 nº 1 jun 1991 PUTNAM Linda FAIRHURST Gail Discourse analysis in organizations issues and concerns In JABLIN F M PUTNAM L Ed The new handbook of organizational communication advances in theory research and methods Thousand Oaks Sage 2001 VERGARA Sylvia Constant BASTOS Clarissa Rollin Pinheiro GOMES Ana Paula Cortat Zambrotti Estilos discursivos de liderança gerencial In ENCONTRO DE ESTUDOS ORGANIZACIONAIS 3 2004 Atibaia Anais Atibaia Anpad 2004 WOOD Linda KROGER Rolf Doing discourse analysis methods for studying action in talk and text Thousand Oaks Sage 2000 3 Analogias e Metáforas Analogias e metáforas são recursos metodológicos utilizados para o tratamento de dados coletados Inseremse na lógica da argumentação A analogia é uma comparação entre dois conceitos diferentes por meio da descrição de um elemento e outro Ocorre no plano concreto É uma semelhança de relação Tratase do confronto entre um tema conjunto dos termos A e B sobre os quais repousa uma conclusão e um foro conjunto dos termos C e D que servem para estribar o raciocínio PERELMAN e OLBRECHTSTYTECA 1996 Analogias podem ressaltar semelhanças ou diferenças como apresentado por Perelman e OlbrechtsTyteca 1996 ao tratarem da similitude pelos contrários Os autores mencionam o seguinte exemplo PERELMAN e OLBRECHTSTYTECA 1996 p 441 Não para dizer a verdade não é como na corrida na qual aquele que recebe a tocha ardente está mais ágil na corrida de revezamento do que aquele de quem a recebe o novo general que recebe um exército não é superior ao que se retira pois é o corredor cansado que entrega a tocha a um corredor descansado aqui é um general experiente que entrega seu exército a um general inexperiente Ao abordar a inovação e a renovação organizacional por meio da analogia com a improvisação coletiva nas orquestras de jazz Weick 2002 sugere que analogias nos permitem compreender melhor as organizações Como diz o autor ao se conhecer alguma coisa qualquer coisa em profundidade você terá aprendido algo sobre caos e ordem na condição humana E uma vez que você começa a entender caos e ordem você passa a entender algo sobre as grandes organizações humanas WEICK 2002 p 7 A metáfora é uma figura de linguagem que valendose da comparação entre dois conceitos diferentes tem como objetivo formar outros conceitos Um elemento é utilizado para entender outro na medida em que se diz que A é ou é como B MORGAN 1996 Ela é uma associação entre duas coisas por meio da intuição NONAKA e TAKEUCHI 1997 Está inserida em uma abordagem simbólica Tratase de uma comparação abstrata no plano das idéias Para Perelman e OlbrechtsTyteca 1996 a metáfora é a fusão de um elemento do foro com um elemento do tema Tratase então de uma analogia condensada PERELMAN e OLBRECHTSTYTECA 1996 ou seja um termo resultante uma imagem da comparação Na área da administração Morgan 1980 1996 disseminou a discussão acerca da utilização deste método argumentativo No livro Imagens da organização o autor explorou a imagem das organizações como máquinas organismos cérebros culturas sistemas políticos prisões psíquicas fluxo e transformação instrumentos de dominação Para o autor metáforas ressaltam semelhanças entre elementos mas tornam outros obscuros Na linha de Morgan 1996 Vergara e Carpilowski 1998 apresentaram a metáfora da organização como sistema criativo Quando a comparação entre dois conceitos diferentes se dá de forma exagerada há uma hipérbole Tratase de uma figura de estilo que tem como objetivo aumentar ou diminuir exageradamente o conceito resultante da comparação Na lógica da argumentação há casos em que os elementos confrontados pertencem a uma mesma área Sendo assim analogias e metáforas dão lugar ao exemplo e à ilustração técnicas que fundamentam o real pelo recurso ao caso particular Palavraschave Argumentação Formação de conceitos Comparação Intuição Simbolismo Características principais Metáforas e analogias permitem um novo olhar sobre os fenômenos provocando a geração de insights para compreendêlos e com eles interagir de novas maneiras A utilização de uma metáfora pode provocar o desenvolvimento de outras mais adequadas ao objeto em estudo como por exemplo a utilização da metáfora do teatro para o desenvolvimento da metáfora do cinema considerada mais apropriada para o estudo das organizações espetaculares WOOD JR 2001 As perspectivas resultantes deste processo são distintas mas em geral complementares A utilização de analogias e metáforas requer do pesquisador criatividade no momento da elaboração e habilidade de argumentação para comunicar ao leitor as conclusões a que chegou de modo a envolvêlo compartilhando com ele novos pontos de vista A metáfora é parcial na medida em que ressalta um determinado aspecto dos elementos sob comparação em detrimento de outros Há o risco do uso exagerado da metáfora o que pode limitar uma compreensão mais geral do fenômeno Como utiliza r1 Definese o tema da pesquisa por exemplo controle e coerção nas organizações indivíduos em organizações e orixás Definemse os elementos a serem objeto da analogia por exemplo teatro e organizações mitologia afrobrasileira e organizações Definese o problema de pesquisa Procedese a uma revisão da literatura pertinente ao problema de investigação e escolhemse as orientaçãoões teóricas que daráão suporte ao estudo Delimitamse os aspectos de cada elemento a serem considerados na pesquisa Selecionamse os dados congruentes com o problema de pesquisa Descrevese cada um dos elementos conforme a delimitação estabelecida 1 A ordem aqui apresentada não é rígida Pode portanto ser alterada conforme a situação Interpretamse os dados coletados por meio da pesquisa bibliográfica Analisamse as similaridades ou as diferenças Elaboramse metáforas resultantes da analogia desenvolvida se houver intenção em desenvolver metáforas Resgatase o problema que suscitou a investigação Confrontamse os resultados obtidos com as teorias que deuram suporte à investigação Formulase a conclusão Elaborase o relatório de pesquisa Se os elementos da analogia ou da metáfora forem completamente diferentes Figura 1 ou ao contrário muito semelhantes Figura 2 o processo de construção metafórica ficará enfraquecido Esse processo tende a ser rico quando as diferenças entre os elementos são significativas mas não totais Figura 3 MORGAN 1980 Morgan 1980 apresenta um exemplo interessante um lutador de boxe pode ser descrito como um tigre em um ringue A comparação sugere que o lutador possui características semelhantes às do tigre tais como força e rapidez para atingir seu adversário A metáfora enfatiza parte das características do elemento sob comparação Neste caso é evidente que a diferença entre os dois é significativa um lutador não é um animal de quatro patas Outra comparação se deu entre um lutador e uma panela ou seja elementos totalmente diferentes que não devem ser tomados como referência para análise como mostra a Figura 1 Por fim o lutador foi comparado a um homem o que remete ao caso da Figura 2 isto é elementos praticamente idênticos Fonte Morgan 1980 p 612 Figura 1 Elementos totalmente diferentes Fonte Morgan 1980 p 612 Figura 2 Elementos muito semelhantes Fonte Morgan 1980 p 612 Figura 3 Diferenças significativas entre os elementos Toda pesquisa requer uma delimitação ou seja a seleção e a apresentação ao leitor do que será abordado Como a utilização de analogias e metáforas demanda o estudo de elementos diferentes ambos devem ter seus aspectos definidos A descrição de cada um dos elementos da analogia pode ser enriquecida com a utilização de exemplos O desenvolvimento de analogias pode ou não vir acompanhado da elaboração de metáforas Vergara e Irigaray 2000b por exemplo abordaram as organizações produtivas por meio da analogia com a mitologia afrobrasileira e elaboraram metáforas como a organizaçãoiemanjá Metáforas podem ser propostas sem a necessidade da descrição antecipada dos elementos Os aspectos de cada um dos elementos bem como as possibilidades e as limitações da metáfora podem ser abordados após a proposta como fez Morgan 1996 ao apresentar entre outras imagens as organizações como máquinas Exemplos da utilização de analogias e metáforas Exemplo 1 Mitologia afrobrasileira e organizações produtivas Analogias e metáforas foram utilizadas por Vergara e Irigaray 2000a 2000b em uma pesquisa sobre a mitologia afrobrasileira e as organizações produtivas Os orixás foram utilizados metaforicamente tendo sido caracterizados como símbolos A pesquisa teve como objetivo responder à seguinte questão como as similaridades entre a mitologia afrobrasileira e a vida nas organizações produtivas podem nos ajudar a compreender melhor estas últimas Para tanto foi realizado um levantamento bibliográfico sobre semiótica para auxiliar a transposição dos orixás da categoria de mitos para a de símbolos sobre antropologia cultural no que diz respeito às culturas negras e sobre teoria das organizações para a análise do corpus administrativo Inicialmente foi estabelecida analogia entre os orixás e os indivíduos que trabalham nas organizações produtivas 2000a Foram selecionados nove orixás expressivos das culturas daomianas e iorubas devido a sua grande influência na formação da cultura afrobrasileira quais sejam a Oxalá Obatalá Obatiala Obatinla o rei da brancura e da pureza b Nanamburucu Nanã orixá do barro c Xapanã Obaluaié Omulu Sapotá orixá da varíola d Iemanjá Yemaja mãedágua e Exu encarregado de trazer verbalmente as mensagens dos orixás aos homens símbolo do ato sexual em si f Xangô Shango deus da justiça cruel e vaidoso g Ogum deus da guerra e do ferro fundido h Oxossi Oshishi deus da caça i Oxum deusa da fecundidade e da reprodução Posteriormente a analogia foi baseada na interação dos indivíduos no palcoempresa 2000b Como os indivíduos que trabalham nas organizações possuem características diversas esses personagens aqui denominados orixás da administração foram classificados em três grupos São eles o profeta o professor e o pizzaïoli Esses grupos por sua vez foram assim subdivididos a profetas Iemanjá Oxum e Exu b professores Nanã Ogum e Oxossi c pizzaïoli Obaluaié Oxalá e Xangô Profetas são indivíduos geradores de idéias Os professores são instrumentalizadores Pizzaïoli por seu turno são os operacionalizadores Com relação aos profetas Iemanjá a mãedágua ao fugir de Oxalá caiu e teve seu ventre arrebentado de onde nasceram sete orixás de uma só vez De seus seios jorrou o rio Níger Analogamente funcionários profetasiemanjá são aqueles capazes de gerar várias idéias ao mesmo tempo mas que têm dificuldade para estabelecer um foco Além disso como Iemanjá que criou os filhos rejeitados de Nanã e Oxalá estes profissionais conseguem acolher e desenvolver idéias de terceiros sem no entanto tomar para si a autoria Oxum filha perfeita de Nanã tornouse a deusa do ouro da água doce e das cachoeiras É a deusa da fecundidade Nas organizações produtivas esses profissionais são preciosistas detalhando melhor a sua criação o que por outro lado pode levar a divagações Exu por sua vez foi um dos filhos rejeitados por Nanã É conhecido por sua facilidade de acesso a todos os orixás transmitindolhes os pedidos e os desejos humanos Analogamente os funcionários profetasexu são capazes de captar as idéias que estão no inconsciente coletivo São capazes de conceber o desejo dos outros No que diz respeito aos professores Nanã está associada ao barro e à figura da avó Nas organizações indivíduos professoresNanã são aqueles cuidadosos e detalhistas que trabalham no ritmo devagar e sempre Ogum por outro lado é rápido Está associado ao avanço tecnológico Funcionários professoresOgum são determinados Gastam pouco tempo no planejamento partindo de imediato para a ação Oxóssi deus da caça ensinou os negros a sobreviver na floresta utilizando o arco e a flecha Funcionários professoresOxóssi providenciam o arco e a flecha para que as pessoas possam agir Acreditam na política participativa e no espírito de colaboração No que se refere aos pizzaïoli Obaluaié nasceu leproso e foi rejeitado por Nanã Passou a viver isolado do mundo Analogamente os funcionários pizzaïoliObaluaié são responsáveis mas têm dificuldade para trabalhar em equipe compartilhando tarefas Oxalá por seu turno recebeu o privilégio de criar o mundo esquecendo contudo de despachar Exu Nas organizações indivíduos pizzaïoliOxalá não são cautelosos São adeptos da lei do menor esforço Por fim Xangô é conhecido por sua vaidade e egocentrismo Funcionários pizzaïoliXangô são autoritários Sentemse donos do projeto ou superiores aos outros funcionários Em um segundo momento foi analisada a interação dos diversos profetas professores e pizzaïoli e estabelecidas as analogias com o processo de interação dos indivíduos nas organizações 2000b A análise sugere que as melhores combinações para o desenvolvimento de um projeto seriam profetaIemanjá com professorOgum profetaOxum com professorNanã e professorOxóssi com pizzaïoliXangô Considerando os três tipos a melhor combinação seria profetaOxum professorOxóssi e pizzaïoliObaluaié As organizações foram também classificadas em nove tipos com base nos orixás selecionados sendo a elas atribuídas auras de mitos A organizaçãoIemanjá caracterizase por seus traços paternalistas mas que busca o engajamento dos funcionários e o aumento da produtividade A organizaçãoOxum é aquela que busca os melhores profissionais do mercado Para ela a defesa é o melhor ataque A organizaçãoExu por sua vez é pragmática Não mede esforços para atingir seus objetivos A organizaçãoNanã é fechada sua estrutura de poder é rígida Empresas familiares são um exemplo deste tipo de or ganização A organizaçãoOgum enfatiza a inovação e as novas tecnologias Para ela o ataque é a melhor defesa OrganizaçõesOxóssi são aquelas cuja estratégia de atuação não é o ataque nem a defesa mas a imagem que passam para o público em geral Enfatizam a responsabilidade social e adotam um comportamento politicamente correto As organizaçõesObaluaié são as que fazem constantes autoreavaliações Buscam a renovação A organizaçãoOxalá é tradicional Interage com o mercado permanecendo contudo convicta de que seu modo de agir e seus ideais são os corretos Por fim a organizaçãoXangô é a que valoriza a aparência de suas instalações e de seus integrantes Exerce competição planejada Como os pesquisadores alertam as organizações são híbridas podendo apresentar simultaneamente características de cada um dos orixás Além disso organizações e indivíduos estão em constante transformação o que não permite o estabelecimento de combinações perfeitas Os pesquisadores sugerem um questionamento constante no que diz respeito aos indivíduos às organizações e às ações sugeridas pelo questionamento Exemplo 2 A pedagogia do olhar no teatro e nas organizações Analogia foi o método escolhido por Vergara Carvalho e Gomes 2004 em uma pesquisa sobre teatro e organizações Buscaram responder à seguinte questão como as similaridades entre a evolução histórica do edifício teatral e a definição do ambiente físico do trabalho nas organizações podem ajudar a compreender a pedagogia do olhar como um mecanismo de controle e coerção dos trabalhadores Na espacialidade do teatro a pedagogia do olhar do espectador diz respeito ao processo por meio do qual os encenadores passaram a conduzir a direcionar e a concentrar a atenção da platéia cada vez mais da natureza para o palco para os atores para os detalhes cênicos e com o advento do cinema para as dimensões hiperreais da cena Na espacialidade das organizações a pedagogia do olhar referese ao processo por meio do qual se controla o olhar do trabalhador valendose do fato de que a relação do corpo humano com a espacialidade se dá por meio da apreensão de imagens e de seu processamento A pesquisa destacou a pedagogia do olhar como mais uma forma de controle e coerção dos indivíduos O foco não é o olhar do supervisor sobre os subordinados mas o olhar do trabalhador sendo educado para ver o que determinados propósitos políticos econômicos e culturais desejam que eles vejam Duas facetas da evolução do edifício cênico foram discutidas à luz dos contextos históricos que produziram as manifestações hegemônicas da arte teatral ocidental o desenho do espaço e o olhar do espectador Foram explorados cinco momentos evolutivos do edifício teatral o anfiteatro grego o teatro de Roma os palcos santos o palco italiano e o cinema Cada momento artístico foi debatido à luz das questões organizacionais correspondentes No anfiteatro grego o espaço era aberto O espectador podia escolher se desejava olhar para a cena para a paisagem ou para a própria platéia Analogamente nas organizações o trabalhador tinha autonomia do corpo e do olhar Era livre para integrarse ao ambiente da forma que melhor lhe conviesse Os primeiros artesãos tecelões agricultores podiam decidir como e quanto produzir O teatro de Roma por meio de sua arquitetura teve como consequência imediata a supressão do olhar livre O olhar do espectador voltouse para dentro da cena Nas organizações surgem os padrões e os empregados os horários de trabalho os cronogramas de produção A consequência imediata é como no teatro a supressão do olhar livre O olhar do patrão voltase para a perscrutação do excedente O olhar do trabalhador é contido no espaço que produz o excedente O espaço organizacional um espaço disciplinar é estruturado para os fins utilitaristas O olhar do trabalhador fixase em linhas de montagem caixas empilhadas de produtos pilhas de papel sobre as mesas Com a ascensão do Cristianismo como força política hegemônica surgiram os palcos santos Era necessário conduzir o olhar do espectador em uma direção que acompanhasse as convenções e as normas predeterminadas pelo clero A espacialidade do teatro era a Igreja A pedagogia do olhar acirrase pois não só o olhar do espectador passa a ser direcionado mas também seu corpo inteiro Os espectadores eram conduzidos de uma mansão a outra para acompanhar as cenas Como nos palcos santos a relação de opressão também se impôs nas fábricas e nos escritórios trazendo à tona a perspectiva foucaultiana segundo a qual o corpo é peça central para a análise das organizações Os trabalhadores têm seu olhar educado para detectar a presença de seus chefes O olhar direto do trabalhador voltase para a execução da tarefa Seu olhar periférico fundese aos próprios sistemas de vigilância O trânsito dos indivíduos é regulado Como os espectadores conduzidos de uma mansão a outra os corpos dos trabalhadores são conduzidos às estações de trabalho Consolidase o poder disciplinar O palco italiano surgiu em um contexto de ruptura entre a cena e a religião Reproduzia a ordem social dominante Na sala italiana um dispositivo hierárquico comerciantes e duques ocupavam espaços diferentes Além disso a pedagogia do olhar do espectador era potencializada pelo desenvolvimento da iluminação cenográfica Nas organizações também estruturadas de acordo com o sistema hierárquico há uma nítida correlação entre a importância do cargo o tamanho do espaço e a personalização do local de trabalho No que se refere à pedagogia do olhar os trabalhadores passam a sentir os efeitos do controle tecnológico Surgem os superpanópticos ou panópticos virtuais Com a chegada do cinema os corpos dos espectadores foram esquecidos ou amortecidos para que suas mentes pudessem estar aptas a produzir padrões extremos de ilusionismo Seus olhos ficaram à mercê da câmera Nas organizações controles normativos anestesiam as mentes dos que trabalham Entram em ação as metas a carga excessiva de trabalho a remuneração variável o trabalho em equipe e o controle pelos pares O olhar do trabalhador vai da linha de montagem aos gráficos de vendas Para os pesquisadores a espacialidade do anfiteatro grego às salas de cinema é um elemento central na pedagogia do olhar do espectador A esta pedagogia não ficam imunes as organizações Na espacialidade do teatro e das organizações possibilidades de dominação e controle são realizadas A eficácia da pedagogia do olhar do trabalhador é garantida pelo emprego de modos mais coercitivos e diretos de controle e daqueles mais normativos ou disfarçados os quais sem dúvida ampliam as possibilidades do exercício do poder Exemplo 3 Organizações espetaculares Metáforas foram utilizadas por Wood Jr 2001 para desenvolver o conceito de organização espetacular A pesquisa teve como objetivo desenvolver o argumento de que a realidade ou a irrealidade das organizações contemporâneas está se tornando cinematográfica ou espetacular Para o pesquisador as organizações contemporâneas podem ser consideradas teatrais em razão de características como gerentes simbólicos rituais de passagem interação virtual entre outras Ampliando esta abordagem sugere que as organizações são cinematográficas devido à importância da imagem e ao tratamento dramático dado aos eventos e fenômenos Nesse contexto a metáfora do cinema foi desenvolvida a partir da metáfora do teatro Seis filmes foram abordados com a intenção de manter a metáfora do cinema viva e provocar no leitor uma percepção cinematográfica das organizações São eles The cameraman Zelig Citizen Kane Terra em transe Wag the dog e Primary colors Inicialmente foi apresentada a abordagem do simbolismo organizacional na qual se insere a metáfora do teatro uma metáfora milenar que concebe o mundo como palco as pessoas como atores e as situações como cada vez mais teatrais com o predomínio da manipulação da impressão Foram discutidas semelhanças e diferenças entre a metáfora do teatro e a do cinema A segunda é concebida como uma extensão parcial da primeira O pesquisador sugere que as organizações espetaculares estão inseridas em um contexto próprio de uma época cujos traços característicos são a complexidade a aceleração a fragmentação a excelência a abstração e a simulação A complexidade diz respeito principalmente à hipercompetição no mundo dos negócios à capacidade de inovação como fator de sucesso para as empresas à intensa interação entre atores sejam indivíduos ou organizações A aceleração está ligada ao tempo à correria à necessidade de fazer mais coisas com menos recursos ao estilo de vida dos workaholics A fragmentação entendida como uma percepção segmentada da realidade tem como consequência o enfraquecimento da identidade individual e organizacional A excelência está relacionada aos ideais de performance à disseminação de rótulos e denominações à busca de renovação por parte das empresas ao funcionário empreendedor ambicioso e comprometido A abstração está ligada ao trabalho de cineastas publicitários consultores no qual há necessidade de se perceber a realidade e desenvolver soluções específicas para cada caso A simulação é marcada pela mudança de relação entre cópia e original O show de gestão empresarial foi discutido com base nos pilares que o sustentam quais sejam as escolas de administração as empresas de consultoria os gurus de gestão e a mídia de negócios A definição das organizações espetaculares se deu por meio de categorias tradicionais como cultura estrutura e estratégia e de quatro parâmetros denominados pelo pesquisador provedores de narrativa São eles a liderança simbólica o gerenciamento de impressão a inovação gerencial e a mãodeobra Nas organizações espetaculares a cultura organizacional aparece como um elemento de controle social Há poucos níveis hierárquicos e predominam o trabalho em equipe e a informalidade A formulação de estratégias é tarefa de todos e não apenas de um pequeno grupo Com relação à liderança líderes simbólicos utilizam linguagem metafórica retórica e imagens São em geral carismáticos O gerenciamento de impressão é mais um elemento de controle utilizado pelas organizações espetaculares Está relacionado com a conformidade e provoca nos indivíduos um tipo de comportamento desejado pelos líderes O processo de inovação gerencial está envolvido pela alta intensidade simbólica e pela elevada carga dramática Com relação à mãodeobra a presença de analistas simbólicos cujas atividades são caracterizadas pela manipulação de imagens e representações é destacada Dois exemplos de organizações espetaculares foram apresentados a Whittle Communications e a MTV Por fim o pesquisador comenta oito pontos considerados relevantes para o entendimento das organizações nas quais atuamos e das mudanças a elas relacionadas São eles a vivemos numa sociedade de organizações b vivemos numa sociedade de grandes organizações c a emergência da indústria do management d o papel relevante das organizações e do management na construção do imaginário e da subjetividade e o processo de transformação pelo qual as organizações estão passando f o afastamento entre substância e imagem g a adoção da metáfora do cinema para facilitar a compreensão das mudanças h a emergência de um novo tipo ideal as organizações espetaculares Leituras para aprofundamento DONNELLON Anne GRAY Barbara BOUGON Michel G Communication meaning and organized action Administrative Science Quarterly v 31 no 1 p 4355 1986 HATCH Mary Jo Explorando os espaços vazios jazz e estrutura organizacional Revista de Administração de Empresas São Paulo Fundação Getulio Vargas v 42 no 3 p 1935 julset 2002 MORGAN Gareth Imagens da organização São Paulo Atlas 1996 Paradigms metaphors and puzzle solving in organization theory Administrative Science Quarterly v 25 no 4 p 605622 1980 NONAKA Ikujiro TAKEUCHI Hirotaka Criação de conhecimento na empresa como as empresas japonesas geram a dinâmica da inovação 11 ed Rio de Janeiro Campus 1997 PERELMAN C OLBRECHTSTYTECA L Tratado da argumentação a nova retórica São Paulo Martins Fontes 1996 VERGARA Sylvia Constant CARVALHO José Luis Felício dos Santos de GOMES Ana Paula Cortat Zambrotti Controle e coerção a pedagogia do olhar na espacialidade do teatro e das organizações Revista de Administração de Empresas São Paulo Fundação Getulio Vargas v 44 no 3 p 1019 julset 2004 IRIGARAY Hélio Arthur Reis Os orixás da administração Revista de Administração Pública Rio de Janeiro Fundação Getulio Vargas v 34 no 2 p 724 marabr 2000a Orixás indivíduos e organizações Revista de Administração Pública Rio de Janeiro Fundação Getulio Vargas v 34 no 3 p 733 maiojun 2000b CARPILOWSKY Marcelo A metáfora da organização como sistema criativo Revista de Administração Pública Rio de Janeiro Fundação Getulio Vargas v 32 no 3 p 7798 maiojun 1998 WEICK Karl A estética da imperfeição em orquestras e organizações Revista de Administração de Empresas São Paulo Fundação Getulio Vargas v 42 no 3 p 618 julset 2002 WOOD JR Thomaz Organizações espetaculares Rio de Janeiro Fundação Getulio Vargas 2001 4 Construção de Desenhos A construção de desenhos1 é um método para a obtenção de dados por meio do qual o pesquisador solicita aos sujeitos da pesquisa que elaborem uma imagem gráfica desenho de livre criação relacionada ao tema proposto Tratase portanto da criação de uma resposta visual à situação sob investigação A utilização da construção de desenhos em pesquisas empíricas na área de administração visa estimular a manifestação de dimensões emocionais psicológicas e políticas pouco enfatizadas por métodos de cunho racional Com Kolck 1968 p10 há de admitirse que um desenho representa uma maneira de ver as coisas de se colocar diante delas e de sentilas e como tal nos dá indicações da maneira peculiar de ser e sentir de uma pessoa Ou como afirmam Pagès et al 1993 desenhos representam o imaginário teatralizam o inconsciente Podese dizer portanto que a proposta de construção de desenhos representa uma tentativa de resgate da subjetividade dos indivíduos Tratase de reconhecer que palavras e números nem sempre são suficientes para expressar sentimentos e percepções de cunho mais afetivo VERGARA 2004b Este método inserese nas chamadas técnicas projetivas2 originárias e amplamente utilizadas na área de psicologia CATTERALL e IBBOTSON 2000 Na área de administração contudo a construção de desenhos ainda é pouco empregada prevalecendo a utilização de procedimentos como questionários entrevistas individuais grupos de foco e observação VERGARA 2004b Algumas iniciativas no entanto podem ser destacadas Azevedo e Caldas 2003 Brito 2004 Caldas e Tonelli 2001 Gould Ebers e Clinchy 1999 Nossiter e Biberman 1990 Silva e Vergara 2000 Vince e Broussine 1996 Zuboff 1988 O método foi entre outros empregado por Pagès et al 1993 em sua famosa pesquisa na TLTX que deu origem ao livro O poder nas organizações Como as demais técnicas projetivas a construção de desenhos pode ser combinada com outros procedimentos de coleta de dados tanto de cunho quantitativo quanto qualitativo Sua utilização envolve diferentes modalidades de interação com os participantes da pesquisa e a interpretação e a explicação das representações podem ser feitas tanto pelo participante quanto pelo pesquisador Palavraschave Projeção Aspectos emocionais psicológicos Reflexão individual e em grupo Representações individuais e coletivas Resposta visual Características principais Permite a complementação de dados obtidos por meio de informações orais ou escritas isto é pode contribuir para a triangulação de dados3 enriquecendo a visão acerca do fenômeno sob investigação Permite a manifestação de aspectos de natureza subjetiva como sentimentos e necessidades KOLCK 1968 A utilização do método em tarefa grupal propicia o engajamento pessoal e do grupo na construção das imagens e na interpretação dos resultados Nos casos em que os sujeitos da pesquisa não participam da fase de análise dos dados o método exige do pesquisador conhecimentos de psicologia ou alta sensibilidade para a interpretação dos desenhos 3 Sobre os diversos tipos de triangulação ver Capítulo 22 Como utilizar4 Definemse o tema e o problema de pesquisa Procedese a uma revisão da literatura pertinente ao problema de investigação e escolhemse as orientaçãoões teóricas que daráão suporte ao estudo Definese a modalidade de interação com os sujeitos da pesquisa para a obtenção de desenhos acerca do que está se investigando inserção da proposta de elaboração de desenhos em questionários de pesquisa realização de seminários ou workshops com os sujeitos solicitação para elaboração de desenhos no início ou ao final da realização de entrevistas entre outras possibilidades Definemse se for o caso os procedimentos adicionais a serem utilizados para a coleta de dados questionários entrevistas grupos de foco técnicas de complemento observação Selecionamse os sujeitos da pesquisa Coletamse os dados por meio do método de construção de desenhos e de outros procedimentos definidos anteriormente pelo pesquisador Analisamse os desenhos obtidos o que pode ser feito ou não junto com os sujeitos da pesquisa Comparamse os dados obtidos por meio dos diversos instrumentos de coleta utilizados se for o caso Resgatase o problema que suscitou a investigação Confrontamse os resultados obtidos com as teorias que deuram suporte à investigação Formulase a conclusão Elaborase o relatório de pesquisa A proposta de construção de desenhos pode variar em seus graus de estrutura BRITO 2004 MEYER 1991 VERGARA 2004b Pode ser semi ou não estruturada Na primeira situação o pesquisador solicita a elaboração de tipos específicos de representações como por exemplo carros ou animais Na segunda o sujeito tem liberdade para elaborar as representações segundo a sua própria escolha A definição do grau de estrutura irá depender dos objetivos do pesquisador e dos demais procedimentos a serem utilizados para a coleta de dados 4 A ordem aqui apresentada não é rígida Pode portanto ser alterada conforme a situação Conforme mencionado a coleta de dados por meio do método de construção de desenhos permite diversas modalidades de interação com os sujeitos da pesquisa Lançar a proposta de elaboração de desenhos durante a realização de seminários ou workshops com os sujeitos da pesquisa tal como fizeram Silva e Vergara 2000 e Vince e Broussine 1996 é uma possibilidade Neste caso podese optar pela realização de dinâmicas individuais reflexão individual e elaboração de um desenho por participante ou coletivas reflexão em grupo e elaboração de um desenho coletivo conforme seja mais adequado aos propósitos da investigação Recomendase inicialmente identificar o número de workshops necessários para a realização das dinâmicas em função do número de sujeitos selecionados para a pesquisa Sugerese reunir os participantes em turmas de 20 a 30 pessoas Se o pesquisador optar pela elaboração individual de desenhos deve solicitar aos participantes que elaborem uma imagem gráfica desenho de livre criação que represente sua percepção com relação à situação sob investigação Se por outro lado a intenção for obter uma representação coletiva devemse subdividir os participantes em pequenos grupos quatro ou cinco pessoas e solicitarlhes que após uma reflexão conjunta sobre o que está se investigando elaborem um desenho que reflita a percepção do grupo a respeito do tema A análise e a interpretação dos desenhos obtidos durante a realização de seminários ou workshops podem privilegiar a participação dos sujeitos da pesquisa Após a elaboração dos desenhos a turma pode ser reunida para que cada grupo ou indivíduo explique sua representação O pesquisador pode atuar como um moderador estimulando a discussão sobre o significado dos desenhos registrando os comentários dos participantes e elencando as conclusões obtidas para a validação pela turma Os seminários ou workshops poderão ser realizados em uma única fase ou em várias estabelecidas conforme o tema ou a complexidade da pesquisa e de acordo com a disponibilidade dos participantes A inserção da proposta de construção de desenhos em questionários de pesquisa é outra possibilidade de utilização do método Neste caso o questionário poderá incluir questões abertas e fechadas além da solicitação para a elaboração de desenhos Contudo devese evitar a utilização de vários tipos de questões para não confundir o respondente Devese também ter o cuidado de apresentar instruções claras para o preenchimento do questionário e para a construção dos desenhos Outra variação possível para a utilização do método é a solicitação para a elaboração de desenhos durante a realização de entrevistas preferencialmente no seu início ou ao final como o fez Brito 2004 No caso da utilização do método por meio da aplicação de questionários ou da realização de entrevistas a análise e a interpretação dos dados cabem geralmente ao pesquisador Neste caso categorias para a análise podem ser criadas com base em referenciais da literatura como o fizeram Caldas e Tonelli 2001 ou podem ser identificadas durante o processo de análise Exemplos da utilização da construção de desenhos Exemplo 1 Mudança organizacional em uma empresa brasileira Silva e Vergara 2000 elegeram a construção de desenhos como método de coleta de dados em uma pesquisa cujo objetivo foi buscar compreender quais as percepções e expectativas dos funcionários de uma empresa estatal brasileira diante de um contexto de quase privatização A pesquisa de campo inserida em um programa de desenvolvimento gerencial da empresa contou com a participação de 165 funcionários de níveis hierárquicos intermediários divididos em grupos de cerca de 25 pessoas cada um uma vez que este segmento constituiu o públicoalvo do programa Este contou com uma fase tutorial e uma presencial Os pesquisadores optaram pela utilização do método de construção de desenhos durante a fase presencial em atividade de workshop Na abertura do workshop os participantes foram subdivididos em grupos de cinco pessoas Inicialmente foilhes solicitado que elaborassem em grupo um desenho que refletisse suas percepções acerca da relação entre a empresa e seus funcionários naquele contexto de mudanças atuais e futuras Este procedimento foi denominado pelos pesquisadores dinâmica de construção coletiva de imagens Após a dinâmica a turma foi novamente reunida para a interpretação dos desenhos pelos próprios participantes e para a discussão dos resultados Os pesquisadores privilegiaram assim a reflexão conjunta dos participantes tanto na fase de construção dos desenhos coleta dos dados quanto na de interpretação análise dos dados Ainda nesta fase os pesquisadores optaram por complementar os dados obtidos por meio de desenhos com a aplicação de um questionário de pesquisa abordando diferentes dimensões da organização a cultura predominante o clima organizacional e a forma como eram conduzidos os processos de gestão de pessoas Os resultados foram registrados durante o encontro e discutidos com os participantes Com relação aos resultados obtidos por meio da dinâmica de construção coletiva de imagens os pesquisadores destacaram que os desenhos elaborados revelaram tanto aspectos positivos quanto negativos relacionados à mudança O desenho de uma lagarta que se transforma em borboleta por exemplo revelou a percepção do grupo de que uma organização melhor poderia nascer com a mudança Outro desenho permitiu visualizar um grupo de pessoas que se mantêm firmes remando em um barco diante de uma tempestade o que revelou a percepção de que havia pessoas trabalhando juntas para que a organização não se perdesse no processo de mudança Por outro lado desenhos de pessoas que pulam de um edifício que ameaça desabar ou de um barco que ameaça afundar revelaram a percepção de que havia pessoas na organização que entraram em pânico e desistiram de lutar pelo bem comum Outro desenho elaborado Figura 1 mostra um barco em uma tempestade guiado por um piloto que não olha para os passageiros que se atiram no mar o que revelou a percepção de distanciamento de quem está à frente da organização Os participantes manifestaram também a sensação de que a organização não estava totalmente preparada para a mudança o que foi observado por meio do desenho de um fusquinha em uma estrada cheia de buracos com uma âncora pendurada em seu párachoque traseiro Figura 2 Fonte Silva e Vergara 2000 p 93 Figura 1 Barco enfrentando uma tempestade Fonte Silva e Vergara 2000 p 93 Figura 2 Fusquinha numa estrada cheia de buracos Em síntese os desenhos revelaram a percepção de aspectos que poderiam favorecer as mudanças pretendidas bem como daqueles que poderiam representar obstáculos ao alcance destas mudanças Um aspecto metodológico da pesquisa foi destacado pelos pesquisadores Diz respeito à construção de desenhos como método de coleta de dados que contribuiu para a manifestação de sentimentos e percepções dos participantes de forma mais espontânea Para os pesquisadores a elaboração de desenhos de modo coletivo liberou os indivíduos de um excessivo senso de autocritica o que poderia limitar a exposição de suas ideias diante do grupo Em termos gerais os resultados da pesquisa obtidos por meio da construção de desenhos do questionário e das discussões com os participantes revelaram que os funcionários tinham grande orgulho de pertencer à organização e que reconheciam a necessidade de mudanças bem como a do desenvolvimento da capacidade de inovação Exemplo 2 Mudança organizacional em empresas do Reino Unido Vince e Broussine 1996 valeramse do método de construção de desenhos em uma pesquisa cujo objetivo foi identificar os aspectos emocionais psicológicos e políticos que impactam os processos de mudança organizacional Para os pesquisadores a construção de desenhos está inserida em um conjunto de abordagens qualitativas conhecido como pesquisa colaborativa o qual se baseia no pressuposto de que o processo de pesquisa é conduzido com pessoas e não sobre elas Defendem a utilização da construção de desenhos como método de coleta de dados uma vez que ele funciona como um catalisador permitindo que as pessoas digam o que geralmente não é dito to say the unsaid A pesquisa de campo foi realizada em seis empresas do setor público no Reino Unido Contou com a participação de 86 gerentes destas empresas sendo 49 de nível intermediário e 37 de nível sênior Os pesquisadores lançaram a proposta de construção de desenhos durante a realização de workshops com os participantes A pesquisa foi dividida em duas fases Na primeira os participantes foram agrupados conforme o nível hierárquico ou seja em grupos constituídos exclusivamente por gerentes intermediários ou por gerentes seniores Os pesquisadores privilegiaram inicialmente a reflexão individual dos participantes acerca do tema da pesquisa Nesta fase cada participante elaborou um desenho não acompanhado de texto expressando seus sentimentos com relação às mudanças em sua organização Após a elaboração dos desenhos os participantes foram orientados a escrever no verso da folha de cinco a dez palavras ou frases que lhes vinham à mente quando olhavam para o desenho Após esse momento de elaboração de desenhos e reflexão individual os grupos foram reunidos para a discussão dos desenhos cujos resultados foram registrados em flipcharts A segunda fase constituiu um momento de reunião de grupos mistos sem distinção do nível hierárquico para a discussão dos desenhos e dos resultados registrados na primeira fase Os resultados da pesquisa revelaram tanto sentimentos de pessimismo quanto de otimismo manifestados algumas vezes pela mesma pessoa Foram discutidos sentimentos como o medo e a perda em níveis individuais e organizacionais Desenhos como um indivíduo recebendo um cartão de desemprego uma pessoa doente na cama medindo a temperatura com um termômetro um navio sendo atingido por uma onda gigante entre outras representações revelaram a percepção negativa dos sujeitos com relação às mudanças Em muitos casos os indivíduos mostravamse impotentes diante da mudança Em outros viam o ideal como algo que não seria nunca alcançado Desenhos relacionados à violência também foram elaborados De um modo positivo as mudanças foram tratadas como uma oportunidade de crescimento um processo de rompimento de barreiras Desenhos como uma face sorridente foram relacionados à visão otimista Para os pesquisadores a construção de desenhos baseados na reflexão individual dos participantes propiciou condições para que eles manifestassem percepções de natureza subjetiva de modo mais espontâneo Além disso a realização de workshops constituiu uma oportunidade tanto para a reflexão quanto para o diálogo entre os participantes Exemplo 3 Casamento estupro ou dormindo com o inimigo A construção de desenhos foi utilizada por Caldas e Tonelli 2001 em uma pesquisa que teve como objetivo identificar o tipo de representação que os processos de fusão e aquisição constituem para os indivíduos sobreviventes casamento estupro ou dormindo com o inimigo Participaram da pesquisa de campo 249 executivos de 56 empresas que passaram por processos de fusão e aquisição no Brasil A amostra foi constituída por no mínimo três e no máximo sete sujeitos de cada empresa Os dados foram coletados por meio de um questionário com perguntas abertas e fechadas Os pesquisadores optaram por inserir neste questionário uma proposta de construção de desenhos cujo enunciado era procure representar como você viu o processo de integração através de um desenho Foram obtidos 120 desenhos uma vez que nem todos os participantes responderam a esta proposta De acordo com os pesquisadores os desenhos elaborados representavam diferentes enfoques em alguns casos era o indivíduo que estava em destaque em outros era o grupo de referência ou ainda a organização como um todo Alguns desenhos contemplavam os três níveis ao mesmo tempo No artigo aqui utilizado como exemplo os pesquisadores apresentaram a análise de 95 desenhos cujo enfoque era o grupo Tal análise se deu com base em três suposições básicas fornecidas pela literatura BION 1970 lutafuga dependência e acasalamento A lutafuga está relacionada à ideia de grupos como inimigos potenciais Desenhos como um grupo engolindo o outro Figura 3 um grupo de pessoas escalando uma montanha íngreme mostrando que nem todos chegarão ao topo alvos a serem atingidos deixaram evidente a perda a ruptura a sensação de exclusão do processo Figura 3 Lutafuga A dependência diz respeito ao depósito das expectativas do grupo na figura de um líder conforme a Figura 4 permite visualizar Outros desenhos como a representação do símbolo da energia e a palavra empowerment foram também relacionados a esta idéia Figura 4 Dependência Figura 5 Acasalamento O acasalamento por sua vez referese ao elevado grau de idealização e esperança sobre os processos de fusão e aquisição Desenhos como uma grande casa onde todos serão felizes para sempre ou a figura yinyang Figura 5 revelaram uma expectativa positiva ou seja a esperança de que no futuro tudo vai dar certo Os resultados da pesquisa revelaram que em termos de grupos são evidentes as lutas de poder e dominação lutafuga e também as idealizações sobre o processo acasalamento Poucos desenhos foram relacionados à dependência o que segundo os pesquisadores se deve provavelmente ao fato de que os membros da empresa resultante dos processos de fusão e aquisição são oriundos de grupos e culturas distintos e não partilham dos mesmos valores e ideais Isso confirma a manifestação contundente das características da lutafuga Os pesquisadores procederam ainda à comparação dos resultados obtidos por meio da análise das representações com o perfil dos sujeitos da pesquisa ou seja decidiram verificar até que ponto as percepções manifestadas por meio dos desenhos estavam relacionadas com a posição ou situação do indivíduo Para tanto foram considerados os seguintes aspectos empresa de origem do sujeito adquirente ou adquirida papel desempenhado no processo responsável objeto resultados pessoais obtidos em função do processo ganho perda indiferença Os resultados da comparação revelaram que tanto a origem do sujeito quanto o seu papel no processo não alteraram o tipo de representação manifestada Desenhos relacionados à lutafuga predominaram em ambos os casos seguidos pelas representações de acasalamento Para os pesquisadores a manifestação de agressividade pelos sujeitos da empresa adquirente pode estar relacionada à condição de domínio de conquista enquanto pelos indivíduos provenientes da empresa adquirida parece estar ligada a uma atitude reativa Com relação ao papel do sujeito no processo ficou claro que mesmo os responsáveis pelo processo demonstraram desconforto com a situação No que concerne aos resultados pessoais obtidos em função do processo a comparação permitiu evidenciar que a representação do acasalamento foi maior entre os sujeitos que não obtiveram ganhos nem perdas o que para os pesquisadores se deve possivelmente ao fato de que estas pessoas não têm envolvimento direto com o processo e assim têm mais expectativas com relação ao futuro Entre os que obtiveram vantanges as representações de lutafuga predominaram talvez decorrentes da condição de conquista mencionada Entre os que perderam com o processo as representações de acasalamento são proporcionalmente menores mostrando que o grupo não tem muitas esperanças com relação ao futuro Para os pesquisadores os sujeitos da pesquisa temem tanto o ataque o enfrentamento de uma situação desconhecida quanto a perda dos benefícios e dos referenciais já conquistados Concluíram que os desenhos obtidos revelaram representações mais próximas do estupro do que do casamento com predomínio de lutas de poder entre desiguais clima agressivo perdas e frustração Leituras para aprofundamento AZEVEDO Márcia C de CALDAS Miguel Pinto O discurso evolucionista e a prática involutiva um estudo empírico exploratório sobre o impacto de mudanças tecnológicas sobre o desenho do trabalho em Call Centers In ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓSGRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO 27 2003 Atibaia Anais Atibaia Anpad 2003 BRITO Maria J M A configuração identitária da enfermeira no contexto das práticas de gestão em hospitais privados de Belo Horizonte 2004 Tese Doutorado em Administração Faculdade de Ciências Econômicas Universidade Federal de Minas Gerais Belo Horizonte 2004 CALDAS Miguel Pinto TONELLI Maria José Casamento estupro ou dormindo com o inimigo Interpretando imagens e representações dos sobreviventes de fusões e aquisições In ENCONTRO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓSGRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO 25 2001 Campinas Anais Campinas Anpad 2001 CATTERALL Miriam IBBOTSON Patrick Using projective techniques in education research British Educational Research Journal v 26 nº 2 p 245256 Apr 2000 GOULD Laurence EBERS Robert CLINCHY Ross McVicker The systems psychodynamics of a joint venture anxiety social defenses and the management of mutual dependence Human Relations v 52 nº 6 1999 KOLCK Odette L V Interpretação psicológica de desenhos três estudos São Paulo Pioneira 1968 MEYER Alan D Visual data in organizational research Organization Science v 2 nº 2 p 218236 May 1991 NOSSITER Vivian BIBERMAN Gerald Projective drawings and metaphor analysis of organisational culture Journal of Managerial Psychology v 5 nº 3 p 1316 Sept 1990 PAGÈS Max et al O poder nas organizações São Paulo Atlas 1993 SILVA José Roberto Gomes da VERGARA Sylvia Constant Análise comparativa acerca da utilização de desenhos na pesquisa sobre a criação do sentido da mudança organizacional Organizações Sociedade Salvador EAUFBA v 9 nº 23 p 159169 janabr 2002 VERGARA Sylvia Constant O significado da mudança as percepções dos funcionários de uma empresa brasileira diante da expectativa de privatização Revista de Administração Pública Rio de Janeiro Fundação Getulio Vargas v 34 nº 1 p 7999 janfev 2000 VERGARA Sylvia Constant A utilização da construção de desenhos como técnica de coleta de dados In VIEIRA Marcelo M F ZOUAIN Deborah M Org Pesquisa qualitativa em administração Rio de Janeiro Fundação Getulio Vargas 2004b VINCE Russ BROUSSINE Michael Paradox defense and attachment accessing and working with emotions and relations underlying organizational change Organization Studies v 17 nº1 p 121 1996 ZUBOFF Shoshana In the age of the smart machine the future of work and power New York Basic Books 1988 Outras referências BION W Experiências com grupos os fundamentos da psicoterapia de grupo Rio de Janeiro Imago 1970 Desconstrução A desconstrução é um método que visa à exposição de contradições ou dicotomias presentes em qualquer texto Desconstruir um conceito não significa destruílo CALÁS e SMIRCICH 1991 Significa analisar as relações entre elementos positivos e negativos centrais e marginais essenciais e não essenciais insiders e outsiders a fim de revelar a ambigüidade embutida nelas BOJE 1995 A desconstrução introduzida pelo filósofo francês Jacques Derrida nos anos 60 do século XX inserese na perspectiva da pesquisa pósmoderna Podese dizer que o termo pósmodernismo tem sido tratado sobretudo de duas formas como período histórico e como perspectiva teórica COSTA e CAMPOS 2003 HASSARD 1999 A primeira referese a um momento que se segue à modernidade enquanto a segunda marcada pelos trabalhos de Foucault Derrida Deleuze Lyotard Guattari Baudrillard entre outros discute questões epistemológicas e ontológicas relacionadas ao modernismo Para Alvesson e Deetz 1999 o pósmodernismo enfatiza um conjunto de idéias interrelacionadas no todo São elas a centralidade do discurso b identidades fragmentadas c crítica da filosofia da presença d perda das fundamentações e das narrativasmestre e conexão poderconhecimento f hiperrealidade g pesquisa como resistência e indeterminação Além da desconstrução a pesquisa pósmoderna valese de métodos como a análise do discurso e as genealogias foucaultianas CALÁS e SMIRCICH 1999a Derrida cujas idéias foram disseminadas nos anos 70 e 80 do século XX pela Yale School STERN 1996 advoga que textos são polissêmicos suscetíveis portanto a múltiplas interpretações CALÁS e SMIRCICH 1991 MARTIN 1990 a pelo menos duas leituras BURRELL 1999 Desta forma Derrida rejeita a crença modernista segundo a qual há uma realidade objetiva externa ao indivíduo Para este pensador o significado dos textos está baseado em um complexo sistema de presenças e ausências Desconstruir implica expor os binários presentes no texto e resgatar o que está nas entrelinhas Binários são termos opostos masculino e feminino por exemplo ou como mencionado por Cavedon e Lengler 2002 p 13 são construções bipolares de termos e relações antagônicas Desconstruir implica por conseguinte denunciar o logocentrismo entendido este como a supremacia de um elemento sobre outro Lengler Vieira e Fachin 2002 por exemplo denunciaram o etnocentrismo e o falocentrismo conforme apresentado no exemplo 2 deste capítulo Podese dizer portanto que o objetivo da desconstrução é problematizar o termo presente e tentar reaver o ausente MUMBY e PUTNAM 1992 Ou nas palavras de Burrell 1999 p 458 é quebrar o poder do autor de afirmar sua primazia sobre uma narrativa particular ou de impor significados sobre o leitor Na área de estudos organizacionais as abordagens pósmodernas ganharam destaque a partir da série de artigos publicados por Robert Cooper e Gibson Burrell na Organization Studies O primeiro introduziu a discussão sobre modernismo pósmodernismo e análise organizacional COOPER e BURRELL 1988 Burrell 1998 e 1994 tratou das contribuições de Michel Foucault e Jürgen Habermas para o tema Cooper 1989 discutiu a contribuição de Jacques Derrida A partir daí contribuições à pesquisa pósmoderna em geral e à desconstrução em particular emergiram sobretudo com os trabalhos de Boje 1995 Calás 1993 Calás e Smircich 1991 Kilduff 1993 Martin 1990 Mumby e Putnam 1992 Stern 1996 entre outros Palavraschave Binários ou diádas Logocentrismo Polissemia Rompimento de hierarquias Relações de poder Vozes marginalizadas Características principais A desconstrução ao contrário das abordagens de pesquisa mais tradicionais exige do pesquisador uma postura reflexiva O exercício da desconstrução estimula a discussão acerca do discurso dominante e dos elementos por ele marginalizados Provoca o questionamento sobre as fórmulas cartesianas e predeterminadas de classificação de comportamentos LENGLER VIEIRA e FACHIN 2002 p 86 A desconstrução valese de um estilo narrativo irônico Pesquisadores pouco familiarizados com o método podem ter dificuldade para utilizálo pois como já apontaram Calás e Smircich 1999a críticas à desconstrução incluem acusações de serem inacessíveis e de fazerem uso farto de jargões Como utilizar Em 21 capítulos deste livro apresento na seção Como utilizar uma sequência básica de caráter sugestivo a fim de oferecer insumos ao leitor para a operacionalização dos diversos métodos Este capítulo poderia ser uma exceção já que de acordo com Derrida 1983 a desconstrução não pode ser reduzida a um conjunto de procedimentos metodológicos o que também é enfatizado por Kilduff 1993 Contudo uma referência para se proceder à desconstrução é oferecida por Stern 1996 exposição intertextual rompimento das hierarquias desmantelamento dos binários revelando relações de poder e enfrentando a limitação dos significados Tal referência permite apresentar a seguinte sequência básica Definemse o tema e o problema de pesquisa Procedese a uma revisão da literatura pertinente ao problema de investigação Selecionase o texto que será submetido à desconstrução Procedese a uma leitura aprofundada do texto close reading Sobre a metodologia reflexiva ver Capítulo 16 It is not enough to say that deconstruction could not be reduced to some methodological instrumentality or to a set of rules and transposable procedures DERRIDA 1983 p 3 Procedese à construção do significado ou seja à exposição do discurso dominante concernente ao texto sob análise Identificamse os binários presentes no texto Procedese à desconstrução do significado desafiando as perspectivas dominantes Resgatase o problema que suscitou a investigação Formulase a conclusão Elaborase o relatório de pesquisa que neste caso vem a ser uma das múltiplas interpretações a que um texto está sujeito É importante lembrar que as análises desconstrucionistas podem valerse tanto de textos dados provenientes de pesquisa empírica quanto de pesquisa bibliográfica Neste último caso as possibilidades vão desde as histórias em quadrinhos CAVEDON e LENGLER 2002 até obras consagradas como o livro Organizations de March e Simon KILDUFF 1993 O relatório de pesquisa proveniente da desconstrução é como mencionado uma das múltiplas interpretações a que um texto está sujeito uma vez que para Derrida textos são polissêmicos Além disso o resultado da análise desconstrucionista é fruto da subjetividade e da reflexividade do pesquisador desconstrutor Exemplos da utilização do método da desconstrução Exemplo 1 Leitura pósmoderna do mundo de Dilbert Cavedon e Lengler 2002 elegeram o método da desconstrução para realizar uma outra leitura dos postulados da administração moderna com base nas histórias em quadrinhos criadas por Scott Adams A pesquisa teve como objetivo interpretar as tiras de Adams buscando o futuro no passado a entropia e o devir a tecnologia e a decadência humana tendo como cenário os escritórios das empresas Os pesquisadores discutiram inicialmente a temática da pósmodernidade Em seguida discorreram sobre as histórias em quadrinhos como produção cultural e concentraramse no personagem Dilbert de Scott Adams Conforme mencionam Adams criou o personagem com base em sua experiência profissional na empresa Pacific Bell Com Dilbert as percepções dos funcionários de grandes corporações acerca das principais práticas administrativas disseminadas a partir dos anos 90 passaram a ser expressas Narrativas reais enviadas a Adams por milhares de trabalhadores tornamse insumos para a criação das tiras Três díades binários foram selecionadas para análise por meio da desconstrução do significado São elas motivação versus dominação ser em construção permanente versus ser em série estagnado liberdade pela conectividade versus controle da privacidade Para a análise da primeira díade motivação versus dominação os pesquisadores selecionaram uma tira na qual o chefe comunica aos funcionários que 20 do salário estariam vinculados ao atingimento de metas de venda cujo cálculo Dilbert logo percebeu que era complexo ou impossível de ser feito o que foi confirmado pelo chefe Em seguida o chefe apresentou a nova funcionária contratada para dirigir o Programa de Incentivo à Dignidade ou seja ajudar os funcionários a trabalharem satisfeitos ganhando menos Se falhasse em sua tarefa ela teria o mesmo destino dos exfuncionários Os pesquisadores chamaram a atenção para dois aspectos importantes abordados na tira metas a serem cumpridas e redução de salários As metas são irreais sendo definidas por métodos complexos A tira deixa implícita na pergunta do chefe a Dilbert Lembrase dos seus excolegas a demissão da nova funcionária caso ela não consiga fazer com que os funcionários trabalhem satisfeitos ganhando menos De acordo com os pesquisadores a análise da tira revela que a opção por manter salários baixos tem como objetivo a dominação do trabalhador uma vez que ele está pressionado pelo fim do emprego Neste caso aceita passivamente a substituição de parte do salário por benefícios pois se encontra dependente da organização A análise da segunda díade ser em construção permanente versus ser em série estagnado se deu com base em uma tira na qual Dilbert solicita ao seu supervisor autorização para colocar uma planta de plástico em sua baia Como o pedido foi negado uma vez que a planta poderia atrair insetos que na visão do supervisor tal como ele não conseguem distinguir uma planta de verdade de uma de plástico Dilbert desafiou a supervisão colocando a planta ao lado do computador Em seguida teve uma crise de sudorese e foi alertado pelo cachorro Dogbert que para assumir uma posição deveria estar longe dali Na visão dos pesquisadores o quadrinho no qual o supervisor aparece em sua sala mostra a ostentação de símbolos de status na empresa Atrás da mesa há uma placa identificando o cargo do supervisor Gestapo da Baia Ele senta em uma cadeira de espaldar alto e mantém um relho sobre a mesa A justificativa para negar a autorização mostra suas limitações bem como sua posição intermediária na hierarquia pois acaba repassando ordens de seus superiores sem questionálas Dilbert ao reagir à ordem do supervisor demonstra a tentativa de romper com a anulação do seu eu Contudo a manifestação da sudorese expressa seu medo em virtude da desobediência pois sabe e é lembrado por Dogbert que se não seguir os padrões estabelecidos será demitido A análise da tira retrata a tentativa de manter o eu em construção permanente mas o controle e a coerção a que o trabalhador é submetido atinge sua saúde mental deixandoo submisso mantendo o seu eu em série estagnado Por fim para analisar a terceira díade liberdade pela conectividade versus controle da privacidade os pesquisadores selecionaram uma tira na qual Dilbert conta ao cachorro Dogbert que inventou uma roupa à prova de radar Papeizinhos amarelos não poderiam ser grudados nele graças aos polímeros especiais Além disso o telefone e o pager não aceitariam chamadas pois estavam dentro de um estojo de chumbo Foi então trabalhar feliz mas como lembrou Dogbert ali estava um homem que se esqueceu um dia de que era domingo A tira traz à tona a real contribuição da conectividade telefones celulares pagers emails para o contexto do trabalho A liberdade para executar o trabalho em outro lugar longe da empresa mais precisamente em casa transformase em monitoramento e invasão de privacidade Como sublinham os pesquisadores Dilbert está preocupado com a representação do seu eu legítimo e de sua individualidade O discurso das empresas sobre o benefício oferecido aos funcionários com o fornecimento de telefones celulares com tarifas pagas aumentarlhes a mobilidade esconde a real intenção desta prática garantir a rastreabilidade dos indivíduos É contra este controle constante que Dilbert luta criando uma roupa à prova de radar A desconstrução de temas da administração moderna contemplados por Scott Adams nas tiras protagonizadas por Dilbert revela os nãoditos no mundo das organizações As três díades ou binários apresentados ou seja relações antagônicas revelam ser o espaço de trabalho o locus da ambigüidade Para os pesquisadores o que está nas entrelinhas do discurso da organização é a dominação o controle o poder e a inadequação Exemplo 2 Segmentação de mercado O método da desconstrução foi utilizado por Lengler Vieira e Fachin 2002 em uma pesquisa acerca do conceito e da prática de segmentação de mercado Os pesquisadores buscaram inspiração no filme Desconstruindo Harry de Woody Allen para olhar de outra forma o conceito de segmentação de mercado analisando elementos nem sempre privilegiados Inicialmente foram comentados aspectos do trabalho de Allen e principalmente os relacionados ao filme como por exemplo a falta de preocupação com formas ou regras a alternância de momentos de ficção e realidade a abordagem de temas ligados às minorias a falta de foco que não se refere a um problema de câmera mas ao problema do próprio personagem que se encontra desfocado do mundo real Foi com base em elementos que retratam CALÁS Marta B SMIRCICH Linda Past postmodernism Reflections and tentative directions Academy of Management Review v 24 nº 4 p 649671 Oct 1999b CAVEDON Neusa Rolita LENGLER Jorge F B Desconstruindo temas e estratégias da administração moderna uma leitura pósmoderna do mundo de Dilbert In ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓSGRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO 26 2002 Salvador Anais Salvador Anpad 2002 COOPER Robert Modernism post modernism and organizational analysis 3 the contribution of Jacques Derrida Organization Studies v 10 nº 4 p 479502 1989 BURRELL Gibson Modernism post modernism and organizational analysis an introduction Organization Studies v 9 nº 1 p 91112 1988 COSTA Isabel de Sá A da CAMPOS Anna Maria M Pósmodernismo e teoria organizacional um ensaio bibliográfico Revista de Administração Pública v 37 nº 3 p 627639 maiojun 2003 DERRIDA Jacques Letter to a japanese friend 1983 Disponível em httplucyukcacukSimulateDerridadeconstructionhtml Acesso 2 jul 2004 HASSARD John Postmodernism philosophy and management concepts and controversies International Journal of Management Reviews v 1 nº 2 p 171195 June 1999 KILDUFF Martin Deconstructing organizations Academy of Management Review v 18 nº 1 p 1331 Jan 1993 LENGLER Jorge F B VIEIRA Marcelo Milano F FACHIN Roberto C Um exercício de desconstrução do conceito e da prática de segmentação de mercado inspirado em Woody Allen Revista de Administração de Empresas São Paulo Fundação Getulio Vargas v 42 nº 4 p 8492 outdez 2002 MARTIN Joanne Deconstruction organizational taboos the suppression of gender conflict in organizations Organization Science v 1 nº 4 p 339359 Nov 1990 MUMBY Dennis K PUTNAM Linda L The politics of emotion a feminist reading of bounded rationality Academy of Management Review v 17 nº 3 p 465486 July 1992 STERN Barbara B Deconstructive strategy and consumer research concepts and illustrative exemplar Journal of Consumer Research v 23 nº 2 p 136149 Sept 1996 Outras referências BURRELL Gibson Modernism post modernism and organizational analysis 2 the contribution of Michel Foucault Organization Studies v 9 nº 2 p 221235 1988 Modernism post modernism and organizational analysis 4 the contribution of Jürgen Habermas Organization Studies v 15 nº 1 p 145 1994 6 Etnografia O método etnográfico originado no campo da Antropologia consiste na inserção do pesquisador no ambiente no diaadia do grupo investigado Os dados são então coletados no campo em geral por meio de observação participante e entrevistas quase sempre semiestruturadas A pesquisa etnográfica é marcada pela obra clássica Argonautas do Pacífico Ocidental de Malinowski 1976 cuja abordagem voltase para a perspectiva de conversão de viver como vivem os nativos Outra abordagem antropológica é a de Geertz 1978 voltada para a perspectiva interpretativa do viver com o nativo Uma terceira corrente referese à abordagem pósmoderna uma continuidade da perspectiva interpretativa Propostas de utilização do método etnográfico têm sido discutidas nos últimos tempos num contexto de aproximação das disciplinas antropologia e administração CAVEDON 1999 JAIME JÚNIOR 1996 MASCARENHAS 2002 SERVA e JAIME JÚNIOR 1995 Cavedon 2001 amplia essa discussão ao propor o uso de recursos metodológicos e formas alternativas de emprego do método etnográfico na área de administração Advoga a utilização da fotoetnografia1 isto é da fotografia como recurso narrativo e não apenas ilustrativo uma vez que as palavras são muitas vezes insuficientes para descrever o objeto em estudo O uso do imagético como forma de linguagem nos remete à Antropologia Visual Outra 1 Sobre fotoetnografia ver Capítulo 8 possibilidade diz respeito ao estilo de redação no qual se inserem o estilo literário e o poético Registro interesse crescente pela perspectiva antropológica em pesquisas de marketing BARROS 2002 ROCHA et al 1999 ROSSI e SILVEIRA 1999 A utilização do método etnográfico nesse contexto tem contribuído para a explicação e a compreensão das dimensões culturais relacionadas aos mercados aos produtos e aos consumidores Palavraschave Cultura Transformação do familiar em não familiar e viceversa Símbolos rituais Inserção do pesquisador no mundo do grupo investigado Rito de passagem Perspectiva microscópica Diário de campo Observação participante Características principais Possibilita uma compreensão mais ampla da atuação dos indivíduos no ambiente organizacional ao fornecer uma noção da realidade formal e informal dos diversos níveis da organização MASCARENHAS 2002 Permite identificar valores do grupo e aspectos do relacionamento entre os seus integrantes muitas vezes despercebidos pelos gestores das organizações Permite descobrir o simbolismo presente no comportamento de consumidores muitas vezes difícil de ser identificado sem a imersão do pesquisador no cotidiano do grupo investigado Possibilita identificar os valores característicos de culturas e subculturas de consumo não familiares no contexto global Proporciona uma visão mais abrangente da satisfação de consumidores ao permitir o contato com os consumidores no ambiente onde os produtos são experimentados Demanda tempo considerável para a realização da pesquisa devido à exigência de contato prolongado do pesquisador com o grupo investigado Exige do pesquisador um esforço intenso para minimizar os riscos da omissão ou da revelação de dados distorcidos por parte do grupo investigado Exige sensibilidade do pesquisador para captar o observável Exige do pesquisador sensibilidade para atuar no trabalho de campo para ouvir observar e para reconhecer os momentos mais adequados para perguntar dialogar Exige do pesquisador a decisão que lhe pareça ética e ao mesmo tempo que não distorça a realidade apresentarse ou não como pesquisador² Como utilizar³ Definemse o tema e o problema de pesquisa Procedese a uma revisão da literatura pertinente ao problema de investigação e escolhemse as orientaçãoões teóricas que daráão suporte ao estudo Negociase o início da pesquisa de campo ou seja a entrada no ambiente do grupo investigado nos casos em que há necessidade de negociação prévia Iniciamse os trabalhos em campo com os primeiros contatos com o grupo Coletamse os dados por meio de observação simples e participante Selecionamse os sujeitos a serem entrevistados Coletamse os dados por meio de entrevistas fotografias ou outros procedimentos Registramse os dados em um diário de campo Codificamse os dados Comparamse os dados obtidos por meio de entrevistas observação e outros procedimentos utilizados Analisase os dados Resgatase o problema que suscitou a investigação Confrontamse os resultados obtidos com as teorias que deuram suporte à investigação Formulase a conclusão Elaborase o relatório de pesquisa É comum que o pesquisador enfrente resistências por parte do grupo investigado o que exige habilidade para estabelecer e manter relações de confiança com o referido grupo É importante registrar as primeiras impressões acerca do grupo investigado os jargões utilizados os rituais praticados ou qualquer manifestação que provoque estranhamento ao pesquisador Com o tempo elementos estranhos tendem a ser considerados familiares Os dados coletados formal ou informalmente por meio de observação ou entrevistas devem ser registrados diariamente Recomendase que o pesquisador utilize um diário de campo a fim de manter os registros organizados Sugerese ainda gravar as entrevistas sempre que possível bem como utilizar a fotografia para apoiar a coleta de dados Para auxiliar a análise dos dados há softwares disponíveis no mercado como o The Ethnograph comercializado pela Sage Publications Exemplos da utilização do método etnográfico Exemplo 1 Etnografia em uma marcenaria O método etnográfico foi utilizado por Bresler 1997 para analisar os símbolos e as imagens que norteavam as relações sociais e produtivas em uma oficina de marcenaria Admitindo a necessidade de conhecer a cultura da base hierárquica das organizações brasileiras o pesquisador decidiu trabalhar em uma fábrica de móveis Recebeu uma indicação para procurar a oficina da Chácara Cogumelo na Grande São Paulo O contato com a empresa foi estabelecido ficando acertado o início do estágio No período anterior ao início da sua experiência como aprendiz de marceneiro realizou uma revisão bibliográfica sobre pesquisa participante indústria moveleira e madeira Trabalhou diariamente na oficina no período de dezembro de 1994 a fevereiro de 1995 Sua pesquisa prosseguiu durante os outros meses do primeiro semestre do ano de 1995 com a realização de entrevistas semiestruturadas e a verificação das anotações de campo O pesquisador prestou também consultoria informal aos donos do negócio durante o ano de 1995 A oficina da Chácara Cogumelo era alugada bem como as grandes máquinas existentes Era gerenciada por dois sócios que trabalhavam ali diariamente A empresa funcionava de maneira informal Contava normalmente com cinco funcionários sendo três assalariados e dois prestadores de serviço Havia ainda outro trabalhador que ocupava as dependências da oficina Era um funcionário do proprietário do imóvel e das grandes máquinas Não havia regras rígidas nem vínculo formal de trabalho Pensando que estava usando uma roupa surrada conselho de um dos sócios da marcenaria o pesquisadoraprendiz de marceneiro começou o seu primeiro dia de trabalho lixando tábuas Não foi apresentado aos colegas nem recebeu treinamento Trabalhou e observou pessoas e máquinas Constatou que não estava usando roupas surradas Roupas surradas eram decorrentes do diaadia de trabalho Seus colegas estavam todos com o mesmo uniforme roupas diferentes mas igualmente surradas símbolos de integração O pesquisador logo percebeu que na oficina havia um ritual de troca de roupa Seus colegas marceneiros trocavam as roupas surradas por roupas limpas em todos os momentos em que saíam da oficina para almoçar telefonar comprar cigarros ou outros motivos Era uma norma do grupo aprendida no convívio diário O pesquisador experimentou a troca de roupas para ir almoçar na segunda semana de trabalho Naquele momento constatou que o simples fato de tirar uma roupa surrada e vestir uma comum marcava um intervalo na jornada diária refazendo as energias para dar continuidade ao trabalho Essa primeira troca de roupa constituiu para ele um rito de passagem para dentro da oficina Passou a sentirse parte do grupo As roupas eram ao mesmo tempo símbolos de integração e diferenciação Nesse contexto lembrouse das roupas de trabalho dos médicos e das empregadas domésticas No ambiente de trabalho dos médicos a roupa branca indica a integração Fora dos hospitais e consultórios o uniforme é considerado um símbolo de status diferenciando o usuário das demais pessoas Por outro lado no caso das empregadas domésticas os uniformes simbolizam um trabalho pouco valorizado revelando que o usuário pertence a uma classe social menos favorecida Na oficina o uniforme unia os trabalhadores Fora do ambiente de trabalho a roupa diferenciava quem a estava vestindo Ao contrário da distinção experimentada pelos médicos os marceneiros na rua eram diferenciados para baixo Como sugeriu o pesquisador dependendo do domínio um mesmo artefato pode simbolizar diferentes significados BRESLER 1997 p 117 O processo de aceitação pelo qual passou o pesquisador foi diferente mais demorado que o dos demais provavelmente em virtude da proximidade com os patrões Com o tempo o pesquisador foi aceito passando dos olhares restritos aos sorrisos de cumplicidade Entretanto algumas distâncias continuaram a existir o que não é estranho em estudos etnográficos Indagado sobre a sua história revelou ser professor e pesquisador estando ali como um aprendiz para aprender a trabalhar com a madeira O convívio diário revelou ainda a relação dos trabalhadores com a figura do pai As relações na oficina eram semelhantes às relações em casa onde o pai é aquele que protege e detém autoridade Os sócios da oficina eram considerados pais dos empregados Da mesma forma o dono do imóvel e das grandes máquinas alugados por um décimo do preço de mercado que seria cobrado somente pelo galpão era o pai dos donos do negócio Entretanto se desejassem fazer alguma modificação estrutural no galpão ou aumentar significativamente o número de empregados os donos do negócio deveriam pedir autorização ao pai ou seja ao dono do imóvel O pesquisador observou uma relação de proteção e amparo aos filhos e ao mesmo tempo a autoridade do pai explicitada pela dependência dos filhos Os donos do negócio tinham ainda outro pai Era o melhor cliente da oficina Garantia mensalmente ao negócio uma entrada mínima de dinheiro no caixa Por outro lado todos deveriam respeitar as mudanças exigidas por esse cliente Os resultados dessa experiência revelaram a importância da imagem paterna na oficina que servia como um modelo a ser seguido bem como uma forma de controle A simbologia dos uniformes foi destacada nos dois contextos pertinentes revelando integração e diferenciação Para o pesquisador as sutilezas das relações sociais e produtivas dentro da oficina dificilmente seriam captadas se outro método de pesquisa tivesse sido adotado Exemplo 2 Subculturas de consumo os new bikers O método etnográfico foi utilizado por Schouten e McAlexander 1995 em uma pesquisa sobre subculturas de consumo Os pesquisadores definiram uma subcultura de consumo como um grupo distinto da sociedade formado com base na escolha de um produto específico uma marca ou uma atividade Foram destacadas outras características de uma subcultura de consumo a estrutura hierárquica os valores os jargões os rituais e os modos de expressão simbólica próprios O grupo investigado pelos pesquisadores foi o dos new bikers representados pelos proprietários das motocicletas HarleyDavidson O interesse em investigar esse grupo não se restringiu apenas ao fato de que estavam ligados a uma mesma atividade ou que possuíam estilos de vida próprios mas ao fato de compartilharem a adoração de um produto de uma marca específica A pesquisa foi desenvolvida durante três anos Neste período os pesquisadores passaram por vários estágios de envolvimento etnográfico a observação simples quando eram considerados outsiders pois não possuíam motocicletas b observação participante de modo parcial quando adquiriram motocicletas ainda não eram Harleys e eram considerados novatos c imersão total quando adquiriram Harleys e as utilizaram como principal meio de transporte Passaram também a utilizar roupas apropriadas Durante o último estágio envolvimento total os pesquisadores alcançaram a condição de insiders sendo gradualmente aceitos em vários subgrupos de motociclistas Harley Davidson Os dados da pesquisa foram coletados por meio de entrevistas formais e informais observação simples e participante e fotografias As entrevistas formais eram gravadas e posteriormente transcritas Durante as entrevistas que não estavam sendo gravadas os pesquisadores escreveram notas de campo Os dados referentes às observações e às entrevistas informais eram permanentemente registrados em um gravador Ao final do dia os dados gravados eram resgatados para serem registrados sob a forma de notas de campo detalhadas As fotografias contribuíram para reviver a experiência vivida e também registrar visualmente o simbolismo característico desta subcultura A imersão no mundo do grupo investigado permitiu a familiaridade com publicações referentes aos diversos subgrupos de motociclistas o que contribuiu para a interpretação e a triangulação4 dos dados obtidos por meio de entrevistas e observação A proposta inicial de amostragem que revelava um entendimento superficial da cultura dos bikers incluía três grupos a serem entrevistados motociclistas comerciantes e executivos de marketing À medida que a coleta de dados foi iniciada os pesquisadores perceberam que o grupo investigado era muito mais complexo do que imaginavam A amostra era então ampliada à medida que uma nova categoria de motociclistas emergia Os entrevistados foram selecionados de acordo com os diferentes subgrupos identificados no decorrer da pesquisa Apresentavam diferenças com relação à idade à classe social e ao estilo de vida Foram entrevistados membros de vários subgrupos bem como motociclistas que não pertenciam a nenhum grupo organizado Os locais de pesquisa incluíram ralis anuais casa dos motociclistas ou mais comumente as garagens concessionárias bares entre outros Foram ainda entrevistados executivos da HarleyDavidson seis comerciantes de motocicletas HarleyDavidson e diversos vendedores de acessórios roupas e parafernálias em ralis Os dados foram acumulados codificados comparados e categorizados em temas específicos Cada tema foi então tratado como peças de um quebracabeça que seriam posteriormente unidas formando uma estrutura conceitual Quatro temas foram identificados quais sejam estrutura social valores culturais compartilhados transformação da identidade do indivíduo ação de comercializar referente à subcultura de consumo Os resultados da pesquisa revelaram que o grupo investigado possuía subgrupos com interpretações particulares sobre os valores de sua cultura No que se refere aos valores culturais compartilhados pelos membros do grupo foram destacados a devoção à marca HarleyDavidson a liberdade o patriotismo e a reafirmação da masculinidade A transformação da identidade do indivíduo foi percebida à medida que o grau de integração aos valores do grupo aumentava Por fim a pesquisa revelou que as empresas produtoras de motocicletas e acessórios utilizavam elementos simbólicos do grupo para se comunicar com a sociedade e atrair novos clientes Exemplo 3 Etnografia em fast foods Rial 2003 elegeu o método etnográfico para a realização de uma pesquisa sobre fast foods em Paris A pesquisa teve início em 1983 época em que a pesquisadora estudava em uma universidade francesa Teve como objetivo analisar os fast foods cadeias globais de lanches rápidos como um caso exemplar de tentativa de multiplicação mundial de um padrão homogêneo e sugerir que a lógica e a dinâmica de disseminação planetária podem muito revelar sobre os processos de globalização cultural contemporâneos Seu interesse pelo tema nasceu devido à proliferação dos fast foods na cidade de Paris e à indignação dos cidadãos parisienses com relação ao fato Além disso a pesquisadora ouvia frequentemente comentários de uma de suas colegas de universidade sobre o trabalho em fast foods já que a mesma trabalhava no Quick o maior fast food na época Havia ainda a possibilidade de trabalhar em um destes estabelecimentos uma vez que empregavam estrangeiros observações foram feitas onde a pesquisadora não falava a língua local nem contava com um intérprete Peças publicitárias de fast foods de países como Turquia Grécia Austrália Chile Argentina Itália e Estados Unidos foram fornecidas por pessoas que a pesquisadora chamava de caçadores de guardanapos de bandeja Muitas informações eram disponibilizadas Contudo estavam inseridas em um discurso oficial Acessar as práticas fast foodianas não era fácil Para a pesquisadora lugares como fast foods exigem uma antropologia on the road em movimento capaz de captar esse movimento Nesse sentido ao invés de uma coresidência foi estabelecida a prática da covisita A pesquisadora trabalhou durante três meses no Quick de La Défénse na França Na época o estabelecimento tinha mais de 60 empregados e produzia diariamente cerca de 6000 hambúrgueres Sua jornada era de dez horas por semana A inserção da pesquisadora no Quick se deu como a de muitos que lá estavam ou seja mentindo Não revelou aos chefes sua escolaridade nem que estaria realizando uma pesquisa A exceção ficou por conta de seus colegas de trabalho seus maiores informantes A natureza do trabalho exigia concentração e precisão Máquinas e chefes autoritários ditavam o ritmo do trabalho e as regras a serem seguidas Foi assustador desde o início ela afirma Logo percebeu que a interação entre os trabalhadores era um grande ponto de tensão Em horários de grande movimento os caixas recebiam os pedidos que eram repassados para os atendentes dos postos de bebidas sanduíches entre outros Estes atendentes ficavam encarregados de entregar os itens prontos ao caixa O modo pelo qual a ordem era transmitida pelo caixa constituía uma das maiores queixas dos atendentes já que muitos exigiam rapidez em uma tentativa de aparecer para os chefes A resposta dos fast foods a essa tensão vinha por meio de fórmulas este reotipadas Palavras em inglês davam um toque impessoal às ordens Segundo a pesquisadora geravam uma esquizofrenia linguística Além disso algumas cadeias contavam com a figura do produção um mediador que trabalha entre o caixa e os atendentes dos postos com a função de prever e determinar o preparo de determinado número de sanduíches de acordo com o número de pessoas na fila Ele não podia deixar que faltassem ou sobrassem itens O produção também estimula ou reprova os funcionários dependendo da situação Hierarquicamente está entre os atendentes e os supervisores Uma característica peculiar dos fast foods é o fato de cada estabelecimento constituir o território de uma determinada rede de imigrantes o que foi constatado pela pesquisadora na França e na Inglaterra No Quick de La Défense por exemplo os empregados eram em sua maioria vietnamitas e malgaxes exceto para os cargos de chefia Um dos supervisores da cadeia declarou que o Quick não empregava negros nem árabes para os cargos de assistente e gerente O mesmo não ocorria no McDonalds e no Burger King na França Além da interação entre os trabalhadores outro ponto de tensão era a relação dos trabalhadores com os instrumentos fast foodianos e os procedimentos a serem seguidos A disciplina exigida impunha relações quase sádicas dizia ela Trabalhadores deveriam aprender a obedecer aos chefes e a trabalhar segundo a didática dos gestos fast foodianos Trabalhadores e máquinas deveriam ser elos de uma mesma cadeia O plano de distribuição dos empregados era estabelecido conforme a pesquisadora pôde observar de acordo com critérios subjetivos como gênero etnia e aparência física Para os atendentes era mais um modo de os chefes se vingarem Com relação à padronização a pesquisadora teve uma experiência desagradável no que diz respeito aos uniformes os mesmos tanto para o verão quanto para o inverno Em um dia de inverno ao colocar sacos de lixo do lado de fora do restaurante o que levava em média 20 segundos a porta se fechou deixandoa presa na área de serviço durante 15 minutos sob uma temperatura de 14º C Seu uniforme era um vestido leve de mangas curtas Sua experiência etnográfica revelou que as condições de trabalho nos fast foods eram duras com poucas recompensas A visão de seus colegas franceses contudo não era a mesma dos brasileiros e argentinos O que leva as pessoas a suportarem esse tipo de trabalho foi uma questão levantada pela pesquisadora Brasileiros querem conhecer as máquinas e o trabalho moderno Além disso precisam da experiência do primeiro emprego A sociabilidade interna mantém tanto brasileiros quanto franceses nos fast foods Alguns até visitam o local de trabalho nos dias de folga Em síntese percebeu que as pessoas trabalham em fast foods devido ao sentimento de pertencer a um grupo de compartilhar códigos sejam eles uniforme linguagem ou gestos Leituras para aprofundamento BARROS Carla Fernanda Pereira Marketing e etnografia um levantamento em journals dos anos 80 e 90 In ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓSGRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO 26 2002 Salvador Anais Salvador Anpad 2002 BRESLER Ricardo A roupa surrada e o pai etnografia em uma marcenaria In MOTTA Fernando C P CALDAS Miguel P Org Cultura organizacional e cultura brasileira São Paulo Atlas 1997 BRESLER Ricardo A administração e o Brasil as figuras do gestor do colonizador e a imagem paterna 2000 231 f Tese Doutorado em Administração Escola de Administração de Empresas de São Paulo Fundação Getulio Vargas São Paulo CAVEDON Neusa Rolita O método etnográfico em estudos sobre cultura organizacional implicações positivas e negativas In ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓSGRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO 23 1999 Foz do Iguaçu Anais Foz do Iguaçu Anpad 1999 Recursos metodológicos e formas alternativas no desenvolvimento e na apresentação de pesquisas em administração In ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓSGRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO 25 2001 Campinas Anais Campinas Anpad 2001 GEERTZ C A interpretação das culturas Rio de Janeiro Zahar 1978 JAIME JÚNIOR Pedro Etnografia antropologia e o universo organizacional Revista de Administração Pública Rio de Janeiro Fundação Getulio Vargas v 30 nº 6 p 105121 novdez 1996 MALINOWSKI B Argonautas do pacífico ocidental um relato do empreendimento e da aventura dos nativos nos arquipélagos da Nova Guiné Melanésia São Paulo Abril Cultural 1976 MASCARENHAS André O Etnografia e cultura organizacional uma contribuição da antropologia à administração de empresas Revista de Administração de Empresas São Paulo Fundação Getulio Vargas v 42 nº 2 p 8894 abrjun 2002 RIAL Carmen Pesquisando em uma grande metrópole fast foods e studios em Paris In VELHO Gilberto KUSCHNIR Karina Org Pesquisas urbanas desafios do trabalho antropológico Rio de Janeiro Jorge Zahar 2003 ROCHA Everardo et al Cultura e consumo um roteiro de estudos e pesquisas In ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓSGRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO 23 1999 Foz do Iguaçu Anais Foz do Iguaçu Anpad 1999 ROSSI Carlos Alberto Vargas SILVEIRA Teniza de Pesquisa sobre culturas nacionais o inexorável futuro do marketing na globalização In ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓSGRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO 23 1999 Foz do Iguaçu Anais Foz do Iguaçu Anpad 1999 43 7 Fenomenologia A fenomenologia é originada do campo da filosofia Consiste no estudo do fenômeno entendido este como aquilo que se manifesta como é O que propicia a compreensão de um dado fenômeno são as essências ou seja o sentido verdadeiro de alguma coisa MOREIRA 2002 A ênfase da fenomenologia recai sobre o mundo da vida o mundo cotidiano É considerado ao lado do método hipotéticodedutivo e do dialético um dos grandes métodos de pensamento VERGARA 2004a A fenomenologia foi introduzida por Edmund Husserl 18591938 a partir de uma vertente conhecida como fenomenologia descritiva ou transcendental Nasceu como uma perspectiva crítica uma reação ao positivismo e à negação da subjetividade Como assevera Dartigues 1973 p 74 a objetividade supôs a colocação entre parênteses do sujeito humano e dos modos de apreensão subjetivos da realidade A perspectiva fenomenológica busca reintegrar o mundo da ciência ao mundo da vida DARTIGUES 1973 p 77 A partir desta abordagem surgiram a fenomenologia realista a constitutiva a existencial e a hermenêutica MOREIRA 2004 Esta última preconizada por Martin Heidegger 18891976 é também conhecida como fenomenologia interpretativa constituindo uma importante referência para a pesquisa empírica em administração Estudos amparados pelo método de pesquisa fenomenológicohermenêutico buscam o resgate dos significados atribuídos pelos sujeitos ao fenômeno sob investigação Hermenêutica é uma técnica de interpretação ABBAGNANO 1970 Lembrando Spiegelberg Moreira 2004 afirma que mesmo a fenomenologia descritiva inclui interpretação Assim os estudos apropriamse do conhecimento por meio do círculo compreensãointerpretaçãonova compreensão MASINI 1991 o que revela ser essa abordagem inacabada não estimulando a busca de uma verdade definitiva CARVALHO e VERGARA 2002 O recomeçar incessante um sinal de indefinição para os pesquisadores da corrente positivista é para os fenomenólogos uma maneira da fenomenologia mostrarse em sua verdadeira tarefa e fertilidade MASINI 1991 p 66 Como método filosófico a fenomenologia estuda o fenômeno como ele é dado ao fenomenólogo Como método científico se o estuda como ele é dado não ao pesquisador mas ao sujeito da pesquisa MOREIRA 2004 Conhecimentos originados no âmbito da fenomenologia podem ser explorados por outros enfoques em um contexto de complementaridade de métodos agregando substancial contribuição à pesquisa em administração Proposições geradas por uma investigação de cunho fenomenológico podem ser utilizadas para o desenvolvimento de hipóteses testáveis valendose do método hipotéticodedutivo CARVALHO 2003 CARVALHO e VERGARA 2002 Palavraschave Essência redução eidética Fenômeno Mundo da vida Compreensão interpretação nova compreensão Subjetividade Experiência vivida pelos sujeitos Suspensão do julgamento epoquê ou redução fenomenológica Abordagem inacabada Características principais Permite explorar situações valores e práticas com base na visão de mundo dos próprios sujeitos Permite descobrir conhecimentos ao invés de verificar o saber já conceituado Os resultados da pesquisa não são generalizáveis estatisticamente uma vez que se trabalha com amostras intencionais e experiências singulares 44 Exige do pesquisador habilidade para interagir com o pesquisado conduzindo a entrevista sob a forma de um diálogo reconduzindo a exploração de temas no decorrer da entrevista e mantendose atento a possíveis desvios relacionados à autenticidade do relato Como utilizar1 Definemse o tema e o problema de pesquisa Procedese a uma revisão da literatura pertinente ao problema de investigação e escolhemse as orientaçãoões teóricas que daráão suporte ao estudo Selecionamse os sujeitos da pesquisa Elaboramse questões gerais de pesquisa para orientar a coleta dos dados Coletamse os dados em geral por meio da realização de entrevistas abertas ou semiestruturadas bem como de observação participante Transcrevese o conteúdo das entrevistas quando gravadas Procedese à leitura crítica dos relatos Procedese à identificação de clusters ou grupos de análise Interpretamse os dados da pesquisa o que pode ser feito por meio de análise interparticipante ou seja agregando à interpretação do pesquisador palavras dos próprios sujeitos Elaboramse proposições relativas à pesquisa ou seja enunciados que permitem a compreensão do fenômeno estudado Resgatase o problema que suscitou a investigação Confrontamse os resultados obtidos com as teorias que deuram suporte à investigação Formulase a conclusão Elaborase o relatório de pesquisa Nas pesquisas norteadas pelo método fenomenológico a fonte essencial de dados referese ao relato dos próprios sujeitos A técnica mais utilizada para a obtenção dos dados é a entrevista aberta ou semiestruturada Relatos escritos ou dados visuais como os desenhos por exemplo produzidos pelo participante também podem ser utilizados Entretanto técnicas estruturadas como questionários fechados são inapropriadas MOREIRA 2002 VERGARA 2004a Com relação à seleção dos sujeitos da pesquisa utilizamse em geral critérios baseados na tipicidade e na acessibilidade ou conveniência como fez por exemplo Carvalho 2003 No que se refere ao tratamento dos dados a formação de clusters ou grupos de análise pode ser realizada com base em termos utilizados pelos próprios sujeitos da pesquisa em padrões que emergem de coincidências observadas nos relatos ou em padrões previamente estabelecidos CARVALHO e VERGARA 2002 Trechos dos relatos são em geral utilizados para a apresentação dos resultados da pesquisa Com relação não só à interpretação dos dados em particular como também ao processo de investigação como um todo há de admitirse a presença da subjetividade do pesquisador No entanto para Husserl o abandono pelo pesquisador de pressupostos e julgamentos é inerente ao método fenomenológico Husserl valeuse do termo bracketing para referirse à suspensão do julgamento Tratase de colocar entre parênteses partes que não deixam de existir mas que são desconsideradas temporariamente Este procedimento é denominado epoquê SANDERS 1982 ou redução fenomenológica ou transcendental MOREIRA 2004 Do ponto de vista hermenêutico o pesquisador deve estar livre para compreender o que se mostra MASINI 1991 Estamos livres quando sabemos de nossos valores conceitos e preconceitos e podemos ver o que se mostra cuidando das possíveis distorções MASINI 1991 p 62 Sendo assim trabalhar para minimizar a deformação da realidade dos sujeitos em virtude de sua própria interpretação ou seja cuidar das possíveis distorções é tarefa do pesquisador Também é sua tarefa realizar o movimento da redução eidética Significa buscar a essência do objeto ou seja os atributos sem os quais ele não pode ser identificado THIRYCHERQUES 2004 Exemplo da utilização do método fenomenológico Exemplo Iluminação em cenários de serviços O método fenomenológico foi utilizado por Carvalho 2003 em uma pesquisa sobre a experiência dos indivíduos com a iluminação em cenários de serviços Teve como objetivo responder à seguinte questão Como se poderia compreender a essência da experiência interativa sociotécnica com o recurso da iluminação nos cenários físicos dos espetáculos mercadológicos de serviços O pesquisador argumenta que metodologias convencionais como as amparadas pelo método hipotéticodedutivo têm contribuído pouco para o estu do das interações em contextos de serviços Advoga a perspectiva fenomenológica como uma alternativa para capturar a essência da experiência interativa humana com os ambientes Justifica a opção por essa abordagem com base em três fatores relacionados ao problema de pesquisa a as variáveis não podem ser identificadas facilmente b não há teorias disponíveis para explicar os comportamentos da população estudada c construções teóricas ainda precisam ser desenvolvidas Foi realizada inicialmente uma revisão bibliográfica pertinente ao tema da pesquisa em estudos na área de marketing bem como em outros campos do conhecimento Para a execução da pesquisa de campo foram selecionadas empresas com base nos seguintes critérios a lojas de serviços b gestão e capital nacionais c exercício da segmentação de mercado baseada na visão de tribo urbana d manutenção consciente ou inconsciente de uma preocupação com a semiose do espetáculo Das nove empresas pesquisadas apenas duas atenderam aos quatro critérios estipulados As demais atenderam a pelo menos três critérios Além disso o pesquisador buscou uma forte diversidade de lojas bem como o contraste entre elas A preocupação com a seleção das empresas estava relacionada com a intenção de reunir e comparar percepções de consumidores sobre ambientes aparentemente distantes e com isso gerar interpretações mais significativas de modo a contribuir para a disciplina de marketing O pesquisador sublinha que a experiência interativa com o ambiente do serviço inclui tanto a participação de consumidores quanto a de prestadores de serviços Sendo assim em cada empresa selecionada foram entrevistados representantes de três grupos consumidores gerentes de loja e vendedores A amostra do tipo não probabilística foi selecionada por tipicidade e por conveniência Foram entrevistados 79 consumidores nove gerentes e 18 vendedores totalizando 106 pessoas As entrevistas gravadas em áudio e posteriormente transcritas foram focalizadas semiestruturadas e não padronizadas Para as entrevistas com gerentes e vendedores foi utilizado o método do incidente crítico As entrevistas com os consumidores foram realizadas com o auxílio do modelo de Mehrabian e Russel 1974 Alguns dados contudo não puderam ser reduzidos para as três etapas deste modelo e por este motivo foram analisados separadamente A análise dos dados foi conduzida por meio de três procedimentos a leitura crítica b análise de conteúdo c classificação de termos e idéias Para a apresentação dos resultados o pesquisador optou por mostrar a transcrição das partes mais relevantes das entrevistas e fazer comentários nutridos pelo seu olhar hermenêutico caracterizando assim o processo de análise interparticipante conforme Morse 1994 46 A pesquisa gerou inicialmente 73 proposições as quais foram submetidas a um grupo de árbitros capacitados para avaliar analisar depurar e refinálas de modo a se obter uma perspectiva mais completa do fenômeno Após a apreciação dos árbitros 12 proposições finais foram excluídas algumas foram desdobradas e outras tiveram seus enunciados reescritos Com isso 65 proposições finais foram obtidas A interação com um dos árbitros o arquiteto motivou ainda a elaboração de quatro proposições extraordinárias ou seja originárias de uma outra fonte que não a palavra dos sujeitos da pesquisa Com base nas 65 proposições finais e nas quatro proposições extraordinárias foram listados 15 temas essenciais do fenômeno estudado por meio do agrupamento daqueles considerados mais relevantes ou mais recorrentes nos relatos Tratase então da essência da luz em serviços Para os participantes a iluminação a tem uma percepção espontânea difícil a menos que o estímulo luminoso esteja relacionado a extremos fisiológicos ou psíquicos b deve estar em harmonia e integração com o cenário com a ambiência e com o estilo da empresa c depende fortemente da mediação pelos sistemas sensório fisiológico e psíquico do receptor d precisa minimizar as potencialidades iatrogênicas do ambiente e trabalhar a favor da melhoria da qualidade de vida e deve informar acerca do ambiente dos produtos e da empresa sem invadir ou prejudicar o corpo ou a subjetividade do indivíduo f pode ser modificada pelos que a experimentam e também pode modificar essas pessoas g é captada predominantemente pela visão mas interfere em outros aspectos da relação corpórea do indivíduo com o ambiente h guarda relação complementar e integrativa com as cores presentes no ambiente e com os materiais utilizados no cenário i está relacionada com estética mas precisa ser equilibrada com os valores éticos j pode favorecer ou deteriorar a sensação de conforto proporcionada pelo ambiente k tem seus efeitos fisiológicos e terapêuticos vinculados à assepsia e à higiene do ambiente l também comporta a luz natural que precisa ser controlada para evitar reflexos brilhos e temperaturas intensos 2 Tratase da tentativa de minimizar qualquer mal que o sistema de iluminação possa causar ao indivíduo 47 8 Fotoetnografia Na busca pela renovação do conhecimento métodos tradicionais abremse para novas possibilidades É o caso da etnografia Uma variante deste método referese à fotoetnografia Tratase da apresentação de uma outra forma narrativa a imagem o texto fotoetnográfico ACHUTTI 1997 Esta variante é aqui abordada O diário de campo é o companheiro inseparável do pesquisador que se propõe fazer etnografia A palavra é o meio preponderante para o registro e a narrativa Imagens são utilizadas na maior parte das vezes de forma ilustrativa Andrade 2002 p 18 afirma O antropólogo é um fotógrafo que escreve aquilo que vê e muito pouco fotografa Ir além da simples ilustração narrando por meio de imagens é a proposta da fotoetnografia Andrade 2002 p 20 leva a crer que isto é possível ao afirmar que um antropólogo pode escrever visualmente sobre a alma um antropólogo pode escrever sobre e com as imagens Tal como o vídeo e o filme etnográfico a fotoetnografia se insere no campo da antropologia visual Um ponto em comum entre a antropologia e a fotografia é a fonte que as alimenta ou seja a observação o ato de olhar e captar emoções sutilezas sensibilidades ANDRADE 2002 Se no entanto a fotografia é usada apenas como imagem ilustrativa perdese esse elemento de união Para Achutti 1997 a fotoetnografia exige do antropólogo o domínio da linguagem fotográfica e do fotógrafo a capacidade de olhar do antropólogo seus questionamentos suas formas de olhar o outro Sobre a contribuição da fotografia à antropologia a observação de Andrade 2002 p 54 parece pertinente Aprendemos a ver apenas o que praticamente precisamos ver Atravessamos nossos dias com viseiras observando apenas uma fração do que nos rodeia Os homens modernos não são bons observadores e o uso de uma máquina fotográfica pode auxiliar sua percepção No caso da antropologia o ato de fotografar pode dar uma visão global e uma observação detalhada Já que vivemos em uma sociedade audiovisual DUARTE 2002 a fotoetnografia parte da antropologia visual pode oferecer recursos interessantes para a captação do fenômeno observado Em síntese a fotoetnografia pode ser considerada uma metodologia de pesquisa qualitativa que emprega técnicas fotográficas aliadas à observação participante e aos registros escritos para descrever por meio de imagens o mundo do grupo investigado O imagético é preponderante A palavra tornase coadjuvante na pesquisa fotoetnográfica Palavraschave O Imagem O Antropologia visual O Olhar antropológico O Forma narrativa autônoma O Recortes e seqüências Características principais O A descrição de determinadas situações por meio de imagens é considerada mais profunda do que por meio de palavras Imagens podem provocar lembranças e reflexões que acabariam se perdendo O Tal como o texto escrito o fotoetnográfico demanda um encadeamento Caso contrário correse o risco de apresentar apenas uma série de fotografias desconectadas que não refletem o objetivo da pesquisa O A narrativa visual é carregada de subjetividades O pesquisador retrata sua interpretação da realidade que por sua vez será interpretada pelo leitor havendo ainda a própria subjetividade do contexto investigado A opção pela fotoetnografia exige do pesquisador certo domínio de técnicas fotográficas bem como a decisão pela escolha do equipamento e dos acessórios a serem utilizados Questões éticas tendem a ser mais acentuadas uma vez que se trabalha com imagens do grupo investigado A câmera oculta é vista como uma transgressão ética embora alguns considerem seu uso válido sob determinadas circunstâncias RIAL 2003 Como utilizar1 Definemse o tema e o problema de pesquisa Procedese a uma revisão da literatura pertinente ao problema de investigação e escolhemse as orientaçãoões teóricas que daráão suporte ao estudo Levantamse os primeiros dados referentes à investigação o que pode ser feito conversando com outros pesquisadores com pessoas ligadas ao tema da pesquisa em consultas a fontes diversas como a mídia entre outras Negociase a entrada no ambiente a ser pesquisado Iniciase o trabalho de campo com os primeiros contatos com o grupo Definemse o equipamento fotográfico e os acessórios a serem utilizados em campo Coletamse dados por meio de observação simples e participante Registramse dados do contexto sob investigação por meio da fotografia Registramse notas referentes à observação do pesquisador e aos depoimentos do grupo investigado em um diário de campo Analisamse os dados Organizase o texto fotoetnográfico Utilizamse trechos do diário de campo ou comentários do pesquisador para contextualizar a leitura das imagens Resgatase o problema que suscitou a investigação Confrontamse os resultados obtidos com as teorias que deuram suporte à investigação 1 A ordem aqui apresentada não é rígida Pode portanto ser alterada conforme a situação Formulase a conclusão Elaborase o relatório de pesquisa Em um trabalho de pesquisa o problema e mais detalhadamente as questões a serem respondidas ou os objetivos intermediários guiam a elaboração de questionários e roteiros de entrevistas para a coleta de dados O pesquisador que faz uso preponderante da fotografia para a coleta dos dados e para a apresentação dos resultados não pode se deixar seduzir pela técnica fotográfica A fotografia é algo fascinante sem dúvida mas coletar dados aleatoriamente esquecendose dos objetivos da pesquisa significa tirar fotografias e não produzir um trabalho fotoetnográfico A coleta de dados por meio da fotografia requer do pesquisador uma permanente atitude de imersão no ambiente de estranhamento e de questionamento Há situações que se não forem registradas no momento em que estão ocorrendo serão perdidas pois há a possibilidade de não mais ocorrerem Basta ver a sequência registrada por Achutti 1997 relativa à boneca encontrada no lixo apresentada no exemplo 1 Figuras 2 a 7 O retorno do pesquisador ao campo após a pesquisa é um procedimento que tem suscitado debates entre os pesquisadores Achutti 1997 assim o fez mas em duas situações diferentes a primeira como fotojornalista e a segunda como pesquisador Exemplo da utilização da fotoetnografia Exemplo 1 Cotidiano lixo e trabalho na Vila Dique A fotoetnografia foi a metodologia escolhida por Achutti 1997 em sua pesquisa sobre cotidiano lixo e trabalho em uma vila popular de Porto Alegre a Vila Dique Na Vila Dique originalmente área de depósito de lixo vivem e trabalham mulheres cujo cotidiano cuja sobrevivência e cujas percepções de mundo se dão a partir do lixo Um lixo que como sublinha o pesquisador é produzido e rejeitado por nós A atividade preponderante na vila é a reciclagem de lixo A população é formada sobretudo por pessoas de origem rural da região das colônias alemãs do Rio Grande do Sul A pesquisa teve como objetivo investigar os elementos por meio dos quais a população constrói suas identidades que tipo de apropriação fazem do lixo como se dá o processo de trabalho a organização do espaço de suas casas no que se refere às estratégias de reprodução social e quem são as mulheres trabalhadoras O pesquisador utilizou trechos do seu diário de campo para contextualizar a fotoetnografia realizada Ao contrário da etnografia tradicional na qual as fotografias servem de apoio ao relato escrito aqui pequenos trechos é que auxiliam a leitura das imagens A primeira visita do pesquisador à vila foi em 1992 como fotojornalista fazendo uma reportagem para uma revista A volta à vila se deu para a realização de um trabalho acadêmico sua dissertação de mestrado Nesse segundo momento voltou levando consigo fotografias tiradas durante a primeira visita Sua inserção no ambiente a ser pesquisado se deu então sobretudo por meio da entrega de presentes aos nativos Como nas palavras de Collier Jr 1973 a fotografia serviu como canopener O pesquisador chegou e imediatamente distribuiu as fotografias às pessoas que ali estavam passando a fotografálas olhando e mostrando as próprias fotografias permitindolhes assim apropriarse de sua própria imagem Este momento constituiu uma das seções nas quais a pesquisa se dividiu Foi denominada Imagens dentro da Imagem A Figura 1 apresenta uma das fotografias da referida seção Fonte Achutti 1997 p CXXIII Figura 1 Imagens dentro da imagem O pesquisador fez também um breve relato sobre sua visita aos pioneiros da vila Um trecho interessante que pode até emocionar o leitor foi contado tanto por meio de palavras quanto de imagens Foi a chegada de um caminhão de lixo momento presenciado pelo pesquisador quando uma das trabalhadoras encontrou uma boneca movida a pilha em bom estado e tentou fazêla funcionar com pilhas também encontradas no lixo em outra ocasião A sequência das Figuras 2 a 7 narra fotoetnograficamente a situação Fonte Achutti 1997 p LXV Figura 2 A boneca encontrada a Fonte Achutti 1997 p LXVI Figura 6 A boneca encontrada e Fonte Achutti 1997 p LXVII Figura 5 A boneca encontrada d Fonte Achutti 1997 p LXVI Figura 4 A boneca encontrada c Fonte Achutti 1997 p LXV Figura 3 A boneca encontrada b Fonte Achutti 1997 p LXVIII Figura 7 A boneca encontrada f Durante o trabalho de campo uma das mulheres contou como dividiam o que achavam e ganhavam Outra relatou como é feito o pagamento pelo trabalho A estrutura para recebimento e separação do lixo foi também revelada A pesquisa apresentada inicialmente como dissertação de mestrado do Programa de PósGraduação em Antropologia Social da Universidade Federal do Rio Grande do Sul transformouse em um livro com dupla entrada duas capas duas abordagens antropológicas dois textos um escrito e outro fotoetnográfico O texto fotoetnográfico foi dividido em seis seções a a vila b o trabalho e o lixo c retratos d as casas e recortes formas e cores f imagens dentro da imagem Achutti 1997 propôs outra forma de percepção e narração de experiências Um esforço do observador das fotos de Achutti 1997 permitiria afirmar que este pesquisador alcançou os objetivos que se propôs O trabalho no e com o lixo traduzse como elemento de identidade das pessoas fotografadas que lhe dão uma forma organizativa O lixo trazido pelos homens é cuidado pelas mulheres dandolhe destinos diversos buscando assegurar o sustento das famílias Por meio da antropologia visual mais precisamente da fotoetnografia o pesquisador mostrou o que as palavras não dão conta de revelar Em seu trabalho mostrou que aquelas pessoas têm apesar do cotidiano orgulho planos entendimentos problemas e sonhos Achutti provoca a reflexão do leitor Leitura para aprofundamento ACHUTTI Luiz Eduardo Robinson Fotoetnografia um estudo de antropologia visual sobre cotidiano lixo e trabalho Porto Alegre Tomo Editorial Palmarinca 1997 ANDRADE Rosane de Fotografia e antropologia olhares foradentro São Paulo Estação Liberdade Educ 2002 CANEVACCI Massimo Antropologia da comunicação visual Rio de Janeiro DPA 2001 COLLIER JR John Antropologia visual a fotografia como método de pesquisa São Paulo EPU Edusp 1973 RIAL Carmen Pesquisando em uma grande metrópole fastfoods e estudios em Paris In VELHO Gilberto KUSCHNIR Karina Org Pesquisas urbanas desafios do trabalho antropológico Rio de Janeiro Jorge Zahar 2003 Outras referências DUARTE Rosália Cinema educação Belo Horizonte Autêntica 2002 9 Grounded Theory A grounded theory é uma metodologia que visa desenvolver uma teoria sobre a realidade que se está investigando a partir de dados coletados pelo pesquisador sem considerar hipóteses preconcebidas É também conhecida como teoria embasada teoria fundamentada ICHIKAWA e SANTOS 2001 ou teoria enraizada nos dados Ao fazer a distinção entre teoria formal e teoria substantiva BandeiradeMello e Cunha 2003a e Ichikawa e Santos 2001 afirmam que a primeira é mais geral e a segunda mais específica A grounded theory afirmase como teoria substantiva que emerge dos dados por ser representativa da realidade de um determinado grupo ou situação BANDEIRADEMELLO e CUNHA 2003a ICHIKAWA e SANTOS 2001 Ao contrário da teoria formal não visa à generalização Teorias substantivas ajudam a gerar novas teorias formais enraizadas e a reformular as já estabelecidas GLASER e STRAUSS 1967 A construção de teorias substantivas se dá por meio da coleta seletiva da categorização e da saturação teórica A metodologia foi desenvolvida por Barney Glaser e Anselm Strauss durante pesquisas empíricas realizadas em parceria que culminaram com a publicação de Awareness of dying em 1965 Os fundamentos conceituais da metodologia foram apresentados dois anos mais tarde em 1967 por meio da obra The discovery of grounded theory strategies for qualitative studies Glaser e Strauss contudo seguiram caminhos diferentes o que academicamente significa dizer que o desenvolvimento da metodologia se deu por meio de duas linhas distintas a glaseriana e a straussiana Glaser que veio da Universidade Columbia teve formação quantitativa e qualitativa Strauss por sua vez é ori ginário da Universidade de Chicago Recebeu formação qualitativa e sofreu influência do pragmatismo Podese dizer que uma das diferenças mais significativas entre as duas linhas é que a straussiana buscou sistematizar e explicitar técnicas para a operacionalização da metodologia tendo talvez por esta razão sido mais disseminada Palavraschave Teoria substantiva Teoria formal Coleta seletiva de dados Sensibilidade teórica Codificação aberta axial e seletiva Conceitos categorias propriedades e dimensões Saturação teórica Características principais A metodologia visa ir além da descrição exigindo do pesquisador a tarefa de interpretar os dados identificar os conceitos e categorias e gerar uma teoria A coleta e a análise dos dados não são consideradas etapas distintas do processo de pesquisa ao contrário ocorrem simultaneamente Há o risco de o pesquisador involuntariamente deixarse contaminar pelas teorias existentes e forçálas forcing aos dados As teorias relacionadas ao tema em estudo não são ignoradas mas utilizadas no final do processo de pesquisa a fim de aumentar o poder explicativo da teoria substantiva que está sendo gerada As teorias são sempre transitórias ou seja estão relacionadas a um dado momento histórico estando assim sujeitas à refutação Como utilizar1 Definemse o tema e o problema da pesquisa 1 A ordem aqui apresentada não é rígida Pode portanto ser alterada conforme a situação Selecionase a instituição objeto de estudo se for o caso Selecionamse os sujeitos para a realização das primeiras entrevistas Iniciase o trabalho de campo por meio da realização de entrevistas e observações Registramse os dados referentes às observações e às entrevistas em notas de campo Coletamse dados adicionais em fontes secundárias se for o caso Identificamse conceitos emergentes dos dados Agrupamse conceitos similares em categorias Identificamse propriedades e dimensões das categorias codificação aberta Identificamse os relacionamentos entre as categorias codificação axial Procedese ao refinamento e à integração dos resultados identificandose assim a categoria central codificação seletiva Resgatase o problema que suscitou a investigação Procedese à validação da teoria por meio por exemplo da checagem dos resultados com os entrevistados Comparase a teoria gerada com as teorias existentes a fim de identificar diferenças e contribuições Formulase a conclusão Elaborase o relatório de pesquisa A seleção da amostra é um procedimento flexível O pesquisador poderá identificar a necessidade de entrevistar outros sujeitos além dos previstos conforme critérios emergentes durante a pesquisa Em geral iniciase a coleta de dados por meio da realização de entrevistas abertas À medida que as categorias vão emergindo dos dados as entrevistas tornamse semiestruturadas como ocorreu por exemplo no trabalho de campo de BandeiradeMello e Cunha 2003b Os dados podem ser analisados com o auxílio de softwares específicos disponíveis no mercado No site httpwwwscolaricouk da Sage Publications há diversas indicações Sobre o software ATLASti especificamente sugerese a leitura de BandeiradeMello e Cunha 2003a As categorias identificadas pela coleta e análise dos dados não são imutáveis podendo ser descartadas se julgadas não pertinentes ao objetivo da pesquisa Exigese portanto do pesquisador habilidade para identificar dados relevantes e darlhes significado É o que se denomina sensibilidade teórica Cabe ainda ao pesquisador a tarefa de reconhecer o momento em que os da dos foram suficientemente explorados Tratase da saturação teórica ou seja da constatação de que dados adicionais não mais acrescentarão algo à teoria Em síntese a geração de teoria exige do pesquisador uma atitude de permanente indagação frente ao seu objeto de pesquisa SANTOS 1994 Registrase aqui que os passos da pesquisa não são fixos ou predeterminados São orientados pela coleta e pela análise dos dados etapas que se mesclam não sendo possível determinar quando uma termina e a outra se inicia SANTOS 1994 Exemplos da utilização do método da Grounded Theory Exemplo 1 Adaptação estratégica de pequenas empresas a ambientes turbulentos e com forte influência governamental A grounded theory foi a metodologia escolhida por BandeiradeMello e Cunha 2003b para o desenvolvimento de uma pesquisa sobre adaptação estratégica de empresas a ambientes turbulentos e com forte influência governamental Teve como objetivo investigar como as pequenas empresas construtoras de edificações adaptamse a um ambiente turbulento com forte influência governamental Foi selecionada para a pesquisa de campo uma pequena empresa familiar construtora de edificações denominada BC Engenharia e Incorporações Ltda A empresa que opera na cidade de Florianópolis tem como atividades a compra do terreno a coordenação da elaboração dos projetos técnicos a preparação da incorporação imobiliária a construção e a comercialização das unidades residenciais ou comerciais Foi considerado para estudo o período de 1980 a 2000 no qual foram construídos em média de um a dois empreendimentos por ano A seleção da empresa obedeceu aos seguintes critérios a possuir as características típicas das empresas do ramo de construção de edificações b ter tempo mínimo de existência de 20 anos c propiciar facilidade de acesso aos dados Os dados foram coletados por meio da realização de entrevistas abertas e semiestruturadas com cinco membros da BC A amostra foi escolhida intencionalmente tendo sido entrevistadas pessoas que foram ou são responsáveis pela tomada de decisão na empresa Foram realizadas nove entrevistas sendo três com cada um dos entrevistados A e B e uma com os demais C D e E Foram realizadas ainda sessões de checagem com os entrevistados A e B Foram coletados também dados secundários predominantemente quantitativos em revistas especializadas livros e publicações de órgãos responsáveis A análise dos dados foi realizada com auxílio do software ATLASti Os dados passaram pelo processo de codificação aberta axial e seletiva A categoria central identificada foi a Administração do Risco Foram utilizados critérios preconizados pela literatura para avaliar a teoria substantiva gerada quais sejam grau de coerência funcionalidade relevância flexibilidade densidade e integração Foram ainda utilizadas as seguintes técnicas também preconizadas pela literatura para aprimorar a qualidade da teoria triangulação de dados2 ataque à teoria por meio da ferramenta query do ATLASti sessões de checagem amostragem em diferentes contextos ao longo da história da empresa auditorias do processo de pesquisa com o auxílio de relatórios gerados pelo ATLASti Os dados coletados permitiram constatar que no período 19802000 a empresa adotou diferentes formas de lidar com o risco relativo à sua área de atuação A atividade imobiliária envolve basicamente três atores os credores ou instituições financeiras o mercado ou clientes a empresa Os riscos ou incertezas relativos a resultados futuros são compartilhados entre eles O risco para os credores diz respeito ao recebimento do capital emprestado Para os clientes há incertezas com relação à conclusão da obra e à entrega do imóvel A empresa por sua vez convive com o risco do negócio A hipótese fundamental da teoria da administração do risco elaborada a partir dos dados foi a seguinte Em um ambiente turbulento e com forte influência governamental as pequenas empresas aproveitam ao máximo o potencial de transferência de risco para o ambiente Com base nesta hipótese três proposições foram elaboradas 1 a forma como os credores e o mercado percebem o risco de participar da atividade imobiliária altera a distribuição do risco total da operação entre ambiente e empresa determinando o nível de risco transferido e a forma de administrar o risco pela empresa 2 o contexto estrutural interno e o esquema cognitivo vigente dos dirigentes contribuem para estabelecer o incremento de risco definindo o risco incorrido pela empresa e conseqüentemente a forma de administrar esse risco 3 ao administrarem o risco pequenas empresas utilizam estratégias de transferência do risco para o ambiente ou estratégias para lidar com o risco absorvido Três propriedades foram identificadas no que diz respeito à definição das formas pelas quais a empresa administra o risco a risco transferido b risco incorrido c retorno esperado Foi possível constatar que uma das formas de a empresa administrar o risco é atuando como repassadora ou seja transferindo o risco para os credores Este tipo de situação ocorre quando as instituições financeiras estão dispostas a financiar a produção das empresas e o mercado está confiante ou seja os clientes adquirem imóveis na planta e participam de financiamentos concedidos 2 Sobre triangulação de dados ver Capítulo 22 pelas instituições financeiras Outra forma de administrar o risco é atuando com cautela ou seja entrincheirandose É o que ocorre quando as instituições financeiras reduzem os financiamentos para a produção ou há instabilidades na economia do país Neste caso há um movimento de transferência do risco para o mercado adotando regimes de construção a preço de custo nos quais os clientes arcam com as despesas reais da produção e pagam uma taxa de administração à empresa construtora Finalmente a terceira forma de administrar o risco é tornandose absorvedora uma vez que não é possível repassar o risco para os credores ou se proteger adotando uma posição de retranca Esta situação ocorre quando os credores estão exigentes no que se refere à liberação de financiamentos e os clientes apresentam resistências para adquirir imóveis na planta A teoria substantiva gerada foi confrontada com a literatura pertinente ao tema da pesquisa a fim de identificar contrastes e contribuições os quais foram apresentados pelos pesquisadores Sublinham que a teoria da Administração do Risco aborda de forma explicativa o processo pelo qual pequenas empresas brasileiras lidam com as adversidades impostas por atores ambientais de modo a garantir sua longevidade em detrimento da maximização de ganhos econômicos Exemplo 2 Aprendizagem gerencial em um hospital Moraes Silva e Cunha 2004 valeramse da grounded theory em um estudo sobre aprendizagem gerencial A pesquisa teve como objetivo responder à seguinte questão Como os executivos de uma organização hospitalar aprendem a gerenciar diante dos desafios diários do trabalho Os pesquisadores argumentaram inicialmente que a preocupação com a aprendizagem tem aumentado nos últimos tempos resultando no surgimento de novas áreas de pesquisa como a aprendizagem organizacional Enfatizaram ainda o crescimento do interesse pela aprendizagem gerencial tema sobre o qual se debruçaram A pesquisa de campo foi realizada com profissionais do Hospital Moinhos de Vento HMV em Porto Alegre Participaram da pesquisa dois superintendentes e três gerentes do hospital Estes sujeitos foram selecionados com base em critérios intencionais mínimo de dez anos de experiência no setor hospitalar e cinco anos em gestão hospitalar Os dados foram coletados por meio da realização de entrevistas em profundidade A análise se deu simultaneamente à coleta Em fase posterior a análise dos dados foi devolvida aos sujeitos checagem com os entrevistados a fim de verificar o quanto as descobertas eram congruentes com a realidade Oito categorias emergiram dos dados coletados a contexto da aprendizagem b sentimentos relacionados à aprendizagem c conteúdo de aprendizagem d formas de aprendizagem e fatores que facilitam o processo de aprendizagem f fatores que dificultam o processo de aprendizagem g resultados da aprendizagem h recomendações dos sujeitos A descrição de cada categoria inclui suas propriedades características gerais da categoria e dimensões variações encontradas dentro de uma propriedade A primeira categoria está relacionada às situações que exigiram dos sujeitos a busca de aprendizagem Os dados permitiram evidenciar que a aprendizagem dos executivos depende de diferentes contextos tendo sido evidenciados dois tipos confronto com desafios e diferentes estágios profissionais No que se refere ao primeiro duas variações foram encontradas mudanças na atividade desenvolvida e desafios do cargo Com relação ao segundo tipo também foram encontradas duas variações processo de aprendizagem impulsionado por demandas profissionais e por demandas institucionais A segunda categoria permitiu evidenciar tanto sentimentos negativos quanto positivos relacionados à aprendizagem gerencial Foram considerados sentimentos negativos ansiedade insegurança expectativa preocupação e cobrança pessoal Com relação aos sentimentos positivos foram mencionados oportunidade crescimento satisfação e entusiasmo A terceira categoria conteúdo de aprendizagem gerencial está relacionada a quatro propriedades conhecimento local analítico contextual e autoconhecimento O conhecimento local abrange a aprendizagem de valores e processos organizacionais habilidades interpessoais e significados do trabalho executivo No que diz respeito aos conhecimentos analíticos foram considerados técnicas de gestão e conhecimentos específicos O conhecimento contextual foi relacionado ao ambiente externo No que diz respeito ao autoconhecimento os sujeitos revelaram que se tornar um gerente exigiu o aprendizado sobre si mesmos o reconhecimento de seus potenciais e de comportamentos inadequados que ameaçavam suas carreiras A quarta categoria formas de aprendizagem dos sujeitos permitiu evidenciar que os executivos aprenderam de diferentes formas projetos de aprendizagem atualização profissional relacionamento observação ação reflexão e mudança de consciência De acordo com os sujeitos eles realizaram projetos de aprendizagem pessoais e institucionais atendendo às situações geradas por demandas tanto da profissão quanto da instituição Tais projetos foram viabilizados pela atualização profissional que se deu por meio de recursos formais e informais de aprendizagem O aprendizado por meio dos relacionamentos diários por sua vez caracteriza uma maneira natural de aprender ou seja não premeditada Apenas dois tipos de interação citados pelos sujeitos sugerem uma forma de aprendizagem intencional interação com consultores e com familiares Ainda no que diz respeito aos relacionamentos os pesquisadores destacou ram a participação em comunidades de prática e a negociação de significados Para os sujeitos a observação de outras instituições e do ambiente externo é também uma forma de aprendizagem Relataram ainda a aprendizagem pela ação por meio da identificação de necessidades de mudanças e da sua implementação A reflexão é outra possibilidade podendo ocorrer como um processo de solução de problemas e como um processo intuitivo As mudanças de consciência por sua vez englobaram três dimensões sobre si mesmos sobre as pessoas e sobre o trabalho A quinta categoria trouxe à tona os fatores que facilitaram a aprendizagem gerencial relacionados tanto aos sujeitos quanto à organização Foram citados os seguintes fatores relativos aos sujeitos ser humilde e proativo ter interesse ter apoio da família ter vontade própria trabalhar em equipe adotar modelos manterse atualizado identificarse com a cultura da organização Já os fatores relativos à organização foram os seguintes ampliação da área de ação autonomia credibilidade pressão vivenciada no ambiente de trabalho cultura ambiente de mudança crescimento da organização Os fatores que dificultaram a aprendizagem gerencial correspondem à sexta categoria Foram classificados em intrínsecos e extrínsecos ao sujeito Os primeiros incluem as seguintes dimensões sentimentos e interesse pessoal Os fatores extrínsecos por sua vez englobam tempo dinheiro acúmulo de atividades família cansaço falta de conhecimento de idiomas falta de oportunidades de estudo A sétima categoria abordou os resultados da aprendizagem gerencial os quais foram relacionados ao autoconhecimento desenvolvimento de uma postura adequada ao trabalho capacidade de tomar decisões maturidade coragem ao conhecimento sobre a organização segurança postura adequada decisões coerentes promoções desenvolvimento profissional e ao desenvolvimento profissional ao longo da carreira crescimento dentro da instituição resultados operacionais A oitava categoria abordou as recomendações dos sujeitos a executivos no que se refere à aprendizagem gerencial Foram feitas as seguintes sugestões ter um projeto pessoal de vida tirar proveito de suas experiências compreender os valores e metas da organização valorizar relacionamentos diversificar conhecimentos Os resultados da pesquisa indicaram que o processo de aprendizagem gerencial é complexo e dinâmico ocorrendo ao longo da trajetória profissional dos executivos Os pesquisadores sublinharam que a natureza deste processo é tanto autodirecionada quanto social e emancipatória Observaram também que três grandes domínios envolvem o processo o individual o organizacional e o social Cada uma das oito categorias obtidas foi relacionada a um ou mais domínios De acordo com os pesquisadores a categoria sentimentos relacionados à aprendizagem gerencial pertence ao domínio individual Já as categorias contexto de aprendizagem resultados da aprendizagem e recomendações pertencem aos domínios individual e organizacional O conteúdo de aprendizagem as formas os fatores que facilitaram e os que dificultaram a aprendizagem gerencial por sua vez pertencem aos três domínios Os pesquisadores concluíram que a aprendizagem gerencial transcende a classificação formal e informal ocorrendo em grande parte de forma não deliberada Além disso ela não se restringe ao domínio instrumental de conhecimento É influenciada tanto pelo contexto organizacional quanto pelo social Por fim observaram que a aprendizagem gerencial pode ocorrer por meio de mudanças de consciência Leituras para aprofundamento BANDEIRADEMELLO Rodrigo CUNHA Cristiano J Castro de Almeida Operacionalizando o método da grounded theory nas pesquisas em estratégia técnicas e procedimentos de análise com apoio do software ATLASti In ENCONTRO DE ESTUDOS EM ESTRATÉGIA 1 2003 Curitiba Anais Curitiba Anpad 2003a Administrando o risco uma teoria substantiva da adaptação estratégica de pequenas empresas a ambientes turbulentos e com forte influência governamental In ENCONTRO DE ESTUDOS EM ESTRATÉGIA 1 2003 Curitiba Anais Curitiba Anpad 2003b GLASER B STRAUSS A The discovery of grounded theory strategies for qualitative research New York Aldine de Gruyter 1967 GOULDING Christina Grounded theory the missing methodology on the interpretivist agenda Qualitative Market Research an International Journal v 1 nº 1 p 5057 1998 ICHIKAWA Elisa Y SANTOS Lucy W dos Apresentando a grounded theory uma nova proposta de abordagem qualitativa na pesquisa organizacional In ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓSGRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO 25 2001 Campinas Anais Campinas Anpad 2001 LOCKE Karen Grounded theory in management research Londres Sage 2001 MARTIN P TURNER B Grounded theory and organizational research Journal of Applied Behavioral Science v 22 nº 2 p 141157 1986 MORAES Liege V dos S de SILVA Maria A da CUNHA Cristiano J C A A dinâmica da aprendizagem gerencial em um hospital RAEeletrônica São Paulo Fundação Getulio Vargas v 3 nº 2 juldez 2004 SANTOS Ursula W B dos Métodos qualitativos para pesquisa em administração caracterização e relacionamento aos paradigmas para pesquisa 1994 159 f Dissertação Mestrado em Administração de Empresas Departamento de Administração Pontifícia Universidade Católica Rio de Janeiro STRAUSS A CORBIN J Basics of qualitative research techniques and procedures for developing grounded theory 2 ed Thousand Oaks Sage 1998 10 Grupos de Foco Grupo de foco Focus Group é um método de coleta de dados que consiste na realização de entrevistas em grupo conduzidas por um moderador Tem como objetivo a discussão de um tópico específico Este método é também chamado de entrevista focalizada de grupo entrevista profunda em grupos reuniões de grupos pesquisa diagnóstica e pesquisa da motivação MATTAR 1996 Podese dizer que as entrevistas em grupo na área de ciências sociais têm sido utilizadas desde a década de 1920 Inicialmente pesquisadores como Emory Bogardus e Walter Thurstone utilizaram várias formas de entrevistas em grupo atendendo a propósitos diversos como por exemplo a elaboração de instrumentos para a pesquisa do tipo survey MORGAN 1998 Entretanto foi com Robert Merton e Paul Lazarsfeld que o método desenvolveuse antes da Segunda Guerra Mundial Entre os anos de 1950 e 1980 aproximadamente o método foi utilizado basicamente em pesquisas na área de marketing Recentemente tornouse também popular em outras áreas MORGAN 1998 No âmbito da pesquisa dita qualitativa o grupo de foco é em geral associado a outros métodos como a entrevista individual e a observação participante MORGAN 1997 Pode também ser utilizado em pesquisas ditas quantitativas precedendo atuando simultaneamente ou sucedendo a um procedimento MORGAN 1997 OLIVEIRA e FREITAS 1998 geralmente um questionário de pesquisa survey Palavraschave Homogeneidade do grupo Interação entre os participantes Reuniões em série Discussão focada em um tópico específico Moderador Características principais Permite gerar hipóteses para a investigação Auxilia a construção de outros instrumentos de coleta de dados Apresenta flexibilidade na condução das sessões podendo o grau de envolvimento do moderador ser alto ou baixo conforme os objetivos da pesquisa Pode provocar insights nos participantes enriquecendo a discussão Na área de marketing permite gerar idéias para o aprimoramento de produtos para o desenvolvimento de promoção de vendas para o desenvolvimento de novos produtos entre outros As respostas de alguns membros do grupo podem inibir a manifestação de opiniões contrárias à opinião média grupal É inadequado para discussão de temas delicados podendo causar constrangimento aos membros do grupo Apresenta menor quantidade de dados por participante se comparado com a entrevista individual Pode haver dificuldade para agendar a reunião se comparado com a entrevista individual Os resultados da pesquisa não são generalizáveis Como utilizar Definemse o tema e o problema de pesquisa Procedese a uma revisão da literatura pertinente ao problema de investigação e escolhemse as orientaçäoões teóricas que daráäo suporte ao estudo Definemse os membros da equipe de pesquisa se esta for realizada por uma equipe bem como suas atribuições Elaboramse as questões a serem discutidas pelos participantes Definese o grau de envolvimento do moderador Definemse o número e a composição dos grupos participantes da pesquisa grupos por categorias mistos ou ambos Definese o número de participantes em cada grupo Selecionamse os potenciais participantes de modo a obter um grupo homogêneo Definemse o local e a duração das reuniões Contatamse os potenciais participantes pessoalmente por telefone email ou carta para avaliar a possibilidade de participação Agendamse as reuniões mediante a consulta aos participantes Realizamse as reuniões que podem ser gravadas em áudio ou filmadas se autorizado pelos participantes Realizamse as transcrições das discussões em grupo Analisamse os dados registrandose as categorias temáticas que surgiram durante as discussões o contexto no qual certos comentários foram feitos as recorrências bem como as diferenças de ponto de vista Resgatase o problema que suscitou a investigação Confrontamse os resultados obtidos com as teorias que deuram suporte à investigação Formulase a conclusão Elaborase o relatório de pesquisa Com a definição do tema e do objetivo da pesquisa iniciase a primeira fase da pesquisa ou seja o planejamento o que ocorre até o momento do agendamento das reuniões Nesta fase devem ser considerados os fatores tempo e custo de realização da pesquisa Sugerese elaborar um cronograma bem como um plano orçamentário As reuniões podem ser conduzidas exclusivamente pelo pesquisador que no caso atuaria como moderador ou por uma equipe de pesquisa composta pelo pesquisador por um ou mais moderadores e por um assistente de pesquisa Optandose pela equipe de pesquisa é fundamental definir antecipadamente as atribuições de cada membro É importante planejar e estabelecer previamente o número e a composição dos grupos o que pode ser feito por categorias específicas mistas ou ambas como fez por exemplo Ruediger 2002 Em geral de três a cinco grupos são suficientes Um número maior de grupos raramente proporciona novos insights O momento para encerrar a coleta de dados é aquele no qual o moderador pode antecipar o que será dito no grupo seguinte ou seja os dados passam a se repetir MORGAN 1997 O número de participantes em cada sessão varia em geral entre seis e 12 pessoas Morgan 1997 por exemplo recomenda algo entre seis e dez participantes Para o pesquisador em grupos com menos de seis participantes tornase mais difícil manter uma discussão ativa Por outro lado não é fácil gerenciar a discussão em grupos com mais de dez pessoas especialmente quando os participantes apresentam alto grau de envolvimento com o tema Na prática grupos grandes podem facilmente dispersarse gerando conversas paralelas ou ainda as pessoas acabam falando ao mesmo tempo o que resulta em perda de dados uma vez que tais situações são difíceis de registrar mesmo quando gravadas Devese ter o cuidado de selecionar pessoas com características sociais econômicas e estilos de vida semelhantes ou seja um grupo homogêneo evitandose amigos parentes ou vizinhos para que os relacionamentos preexistentes não influenciem a contribuição dos participantes MATTAR 1996 MOTTA 1999 Devem ser evitadas também pessoas que participam freqüentemente de grupos de foco ou seja os respondentes profissionais MALHOTRA 2001 Recomendase ainda recrutar um número de participantes acima do necessário overrecruit algo em torno de 20 de modo a cobrir eventuais ausências MORGAN 1997 A duração das reuniões varia em média entre duas e três horas Cabe ao moderador perceber o momento de encerrar as discussões em virtude de os dados necessários já terem sido obtidos ou ainda para que a discussão não se torne cansativa para os participantes MATTAR 1996 O moderador deve inicialmente apresentar aos participantes os objetivos da pesquisa bem como as regras para a participação Durante a sessão os assuntos devem ser introduzidos pelo moderador a partir de uma questão genérica até alcançar o nível de detalhamento esperado AAKER KUMAR e DAY 2001 É importante que o moderador ao encerrar a sessão faça uma pequena síntese do que foi discutido de modo a obter feedback dos participantes Exemplos da utilização de grupos de foco Exemplo 1 Prontuário de pacientes do Hospital de Clínicas de Porto Alegre Stumpf e Freitas 1996 realizaram uma pesquisa exploratória para identificar e validar o conteúdo essencial do prontuário de pacientes do Hospital de Clínicas de Porto Alegre HCPA de modo a atender aos objetivos de assistência ao paciente de ensino e pesquisa de apoio administrativo e às exigências legais A pesquisa foi conduzida em três etapas Na primeira foram realizados uma revisão da literatura pertinente ao tema e um estudo de caso no HCPA para o levantamento da situação atual dos prontuários Foi também realizado um levantamento por meio de entrevistas da situação atual dos prontuários de pacientes em hospitais brasileiros de grande porte Foram identificados os principais problemas do HCPA no que se refere aos prontuários de pacientes o crescimento exponencial dos prontuários em volume e em quantidade acarretando dificuldades para o armazenamento e demandando a ocupação de áreas físicas que poderiam ser utilizadas para a assistência excesso de papel armazenado em virtude do conteúdo desnecessário dos prontuários dificuldades para a leitura de prontuários por causa do armazenamento em vias carbonadas necessidade de número elevado de funcionários no Serviço de Arquivo Médico e Informações em Saúde SAMIS para atender à movimentação de cerca de 2450 prontuáriosdia entre outros Apesar dos problemas mencionados o levantamento constatou que o SAMIS do HCPA era um dos melhores do Brasil Os resultados dessa etapa de investigação revelaram ainda que os problemas enfrentados pelo HCPA no que se refere aos prontuários de pacientes eram comuns aos hospitais de grande porte e o caminho para a solução desses problemas implicava a utilização dos recursos da tecnologia de informação Na segunda etapa os pesquisadores optaram pela utilização de grupos de foco para a coleta de dados Foram definidos seis grupos de discussão conforme as seguintes categorias assistência médica assistência de enfermagem ensino médico ensino de enfermagem pesquisa e administração A composição dos grupos variou entre cinco e oito profissionais representativos de suas categorias Os pesquisadores optaram pelo alto grau de envolvimento do moderador As reuniões realizadas entre outubro e dezembro de 1995 tiveram em média duas horas de duração Foram mencionadas diversas questões e sugestões originadas das discussões em grupo tais como necessidade de aprimoramento do prontuário de pacientes criação de uma comissão de auditoria de prontuários divisão do prontuário em um prontuário ativo e prontamente disponívei com informações relevantes para a assistência ao paciente e outro contendo informações para fins legais jurídicos ou de pesquisas esporádicas A análise dos dados coletados nas discussões permitiu a definição do conteúdo do prontuário ativo do HCPA Permaneceram as seguintes informações lista de problemas anamnese e exame físico evolução diária laudos diversos ficha anestésica descrição de procedimentos cirúrgicos consultorias e documentos específicos de especialidades Duas informações foram substituídas os resultados de exames laboratoriais por um impresso consolidado após a alta do paciente e as prescrições diárias por um impresso consolidado por internação No prontuário inativo ficaram armazenadas as folhas de controle de sinais vitais as prescrições diárias e os formulários específicos de alguns procedimentos Foram eliminados todos os protocolos de pesquisa todos os documentos não autorizados pela comissão de prontuários de paciente exames externos e os resultados de exames laboratoriais individuais A terceira etapa da pesquisa ainda não realizada na época em que os pesquisadores apresentaram e publicaram os primeiros resultados consistia na aplicação de um questionário a uma amostra de 300 profissionais do HCPA usuários dos prontuários de pacientes a fim de validar ou não as propostas dos grupos de discussão De acordo com os pesquisadores pesquisas futuras seriam realizadas para avaliar os resultados obtidos com as modificações do prontuário e acompanhar o processo de construção do futuro prontuário informatizado Exemplo 2 Carta de valores ou carta de intenções Os grupos de foco foram utilizados por Junquilho e Silva 2002 em uma pesquisa sobre tentativa de integração corporativa Inicialmente foram discutidas abordagens relacionadas aos estudos sobre cultura organizacional bem como a questão dos valores organizacionais Os pesquisadores advogam que a abordagem integrativa na qual se inserem as chamadas cartas de valores entendidas como uma ferramenta para submeter os indivíduos aos ideais da organização supõe universos organizacionais homogêneos e objetivos Levando em conta a complexidade e a heterogeneidade inerentes às organizações os pesquisadores propõem a idéia da carta de intenções uma alternativa à carta de valores Tratase de uma proposta que se vale de três perspectivas de enfoque de modo complementar a integração a diferenciação e a fragmentação É um levantamento de prováveis valores desejados confrontados com as experiências cotidianas dos indivíduos nas organizações A pesquisa teve como objetivo responder à seguinte questão como determinados princípios desejados e inerentes às chamadas cartas de valores podem estar desalinhados à realidade de práticas sociais recorrentes numa dada organização A pesquisa de campo foi realizada no ano 2000 na Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos mais precisamente em uma de suas regionais localizada na região Sudeste do país Na época a regional na investigação denominada XYZ para fins de garantia do anonimato contava com 1342 funcionários A pesquisa teve início com a participação de uma equipe de contrapartida constituída por funcionários com conhecimento da organização Deveriam indicar de acordo com a visão deles um conjunto de valores representativos e desejados para a XYZ Oito grupos participaram da pesquisa sendo dois formados por carteiros uma vez que esta categoria representava 13 do quantitativo de pessoal da XYZ um por operadores de triagem e transbordo OTTs e motoristas um por atendentes um por funcionários da área administrativa um por chefias intermediárias um por supervisores e um por gerentes Cada um deles foi composto por oito funcionários As sessões foram realizadas em salas da XYZ Aos participantes foi garantido o anonimato sendolhes solicitado que retirassem os crachás antes de entrar na sala Um roteiro semiestruturado foi elaborado pelos pesquisadores para apoiar a condução das sessões que tiveram em média 2h30 min de duração Foram gravadas e seu conteúdo transcrito Os dados foram analisados com base em eixos temáticos definidos de acordo com o conjunto de valores indicados pela equipe de contrapartida quais sejam confiança credibilidade lealdade e honestidade cooperação solidariedade e participação disciplina e justiça no trabalho comunicação respeito e compromisso Os pesquisadores buscaram categorizar os fatores significativos para a maioria dos participantes dos grupos de foco sendo desconsiderados os conteúdos que não apareciam de forma semelhante em pelo menos quatro grupos Os resultados da pesquisa revelaram que os valores indicados pela equipe de contrapartida não correspondiam à realidade vivenciada pelos funcionários da XYZ no cotidiano Três constatações foram destacadas a reprodução do autoritarismo uma vez que a empresa no passado foi administrada por militares b paradoxo pressão e pontualidade o que se traduz em mais trabalho em menos tempo devido à necessidade de cumprir metas preestabelecidas c pouca visão sistêmica da empresa o que está relacionado à idéia de duas empresas em uma divididas pelas áreas operacional e administrativa A heterogeneidade e a complexidade da organização ficaram evidentes envolvendo os enfoques de integração diferenciação e fragmentação Os consensos compartilhados como a imagem de confiabilidade da empresa tanto interna quanto externamente revelaram integração Já a percepção dos supervisores como autoritários por exemplo revelou diferenciação A cobrança por maior produtividade versus a percepção de que a empresa deve zelar pela pontualidade por sua vez indicou fragmentação Os pesquisadores concluíram que não havia razão para propor uma carta de valores já que se tratava de uma tentativa de homogeneização organizacional A carta de intenções foi portanto sugerida de modo a promover discussão entre o desejado e o real dando início à reconstrução de práticas e significados no interior das organizações RESENHA CRÍTICA REFERÊNCIA VERGARA Sylvia Constant Métodos de pesquisa em administração Atlas 2005 A análise de conteúdo e a análise de discurso são duas abordagens distintas para a interpretação de textos e discursos Ambas têm como objetivo compreender o significado e a intencionalidade por trás das palavras utilizadas mas utilizam metodologias diferentes para alcançar esse objetivo Vergara apresenta uma visão geral sobre as principais técnicas de pesquisa utilizadas na área de administração incluindo a análise de conteúdo e a análise de discurso A análise de conteúdo é uma técnica que busca identificar e categorizar os elementos presentes em um texto como palavras frases imagens e símbolos A partir dessa categorização é possível identificar padrões e tendências que podem revelar informações importantes sobre o conteúdo analisado Essa análise pode ser feita de forma manual ou com o auxílio de softwares específicos como o Atlasti e o NVivo Ela envolve a criação de categorias que permitem a classificação dos dados em temas e subtemas A partir daí é possível identificar os padrões e tendências que emergem nos dados Vergara destaca que a Análise de Conteúdo é uma técnica mais quantitativa e pode ser utilizada em diferentes tipos de dados qualitativos como entrevistas questionários abertos artigos científicos e notícias Já a análise de discurso tem como foco principal a interpretação dos sentidos presentes em um discurso levando em consideração o contexto social político e cultural em que ele foi produzido Essa abordagem busca compreender as relações de poder presentes no discurso bem como as estratégias utilizadas para persuadir e influenciar o públicoalvo Esse modelo de análise é uma técnica mais qualitativa e crítica que busca entender como as mensagens são produzidas como elas são interpretadas e como elas afetam as pessoas Ela procura identificar os elementos linguísticos e discursivos que são utilizados para construir o sentido em um texto Vergara destaca que a Análise de Discurso pode ser feita por meio de diferentes abordagens teóricas como a Análise Crítica do Discurso e a Análise do Discurso Francesa Essas abordagens teóricas permitem a análise de diferentes aspectos do discurso como o contexto social cultural e político em que ele é produzido No livro Vergara apresenta as principais técnicas e ferramentas utilizadas na Análise de Discurso além de exemplos práticos de como aplicála em pesquisas acadêmicas e de mercado Ele destaca a importância dessa técnica para a análise de dados qualitativos e sua utilidade em diferentes contextos Enquanto a análise de conteúdo é uma técnica mais objetiva e quantitativa a análise de discurso é mais subjetiva e qualitativa Isso porque a análise de conteúdo se baseia em critérios préestabelecidos para a categorização dos elementos presentes no texto enquanto a análise de discurso requer uma interpretação mais livre e criativa por parte do pesquisador Outra diferença importante entre as duas abordagens é o tipo de texto que é analisado Enquanto a análise de conteúdo é mais comumente utilizada para analisar textos escritos como artigos científicos relatórios e entrevistas a análise de discurso pode ser aplicada a qualquer tipo de discurso incluindo discursos políticos publicitários e religiosos Podemos compreender que a Análise de Conteúdo e a Análise de Discurso são duas técnicas diferentes que podem ser utilizadas para analisar dados qualitativos e ambas as técnicas são importantes e podem ser utilizadas em diferentes contextos dependendo dos objetivos da pesquisa e dos dados que estão sendo analisados No livro de Vergara podemos encontrar as principais técnicas e ferramentas utilizadas em ambas as abordagens além de exemplos práticos de como aplicálas em pesquisas acadêmicas e de mercado A autora destaca que ambas as técnicas podem ser complementares e que a escolha da técnica mais adequada dependerá do objetivo da análise e dos dados que estão sendo analisados