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Texto de pré-visualização
O estudo questiona a narrativa segundo a qual no direito positivo brasileiro existiria um regime jurídico de exorbitância a favorecer a posição da administração pública em seus contratos algo sem paralelo no direito contratual comum A conclusão apresentada é a de que as chamadas cláusulas exorbitantes dos contratos administrativos na prática não são excepcionais como sugere sua previsão em lei de modo que não conferem poderes extraordinários à administração pública contratante As prerrogativas conferidas à administração pela lei de contratações públicas são semelhantes à posição normal dos contratantes nas relações contratuais estabelecidas exclusivamente entre particulares Existem cláusulas exorbitantes nos contratos administrativos Are there exorbitant clauses in administrative contracts Jacinto Arruda Câmara Ana Paula Peresi de Souza teórico acerca do conceito jurídico de contrato administrativo a escolha por tal termo de caráter mais amplo considera tanto o direito positivo especialmente a redação do art 2º parágrafo único da Lei nº 8666 de 1993 quanto a recorrente menção a essa terminologia nos textos jurisprudenciais brasileiros Nas oportunidades em que tratadas as prerrogativas especiais em favor da administração pública presentes nos contratos administrativos este artigo utiliza o termo cláusulas exorbitantes ou prerrogativas extraordinárias Na segunda parte este estudo apresenta como as obras brasileiras de perfil teórico e de ampla propagação costumam abordar o tema das cláusulas exorbitantes A terceira parte dedicase a demonstrar o posicionamento de alguns autores que questionam a real extensão das prerrogativas extraordinárias conferidas à administração pública A quarta quinta e sexta partes tratam respectivamente da alteração unilateral da rescisão por motivos de interesse público e da fiscalização e da aplicação de sanções A sétima parte conjuga os pontos anteriormente apresentados organizando e então refutando os marcos da idealização que cerca as cláusulas exorbitantes As cláusulas exorbitantes inseremse nesse cenário caracterizandose como poderes tidos como imprescindíveis para o atendimento do interesse público especialmente para que este último prevaleça sobre o interesse particular nas contratações públicas Essas obras esclarecem que o termo exorbitante é empregado para diferenciar os contratos administrativos daquelas avenças próprias ao direito civil Os ajustes bilaterais firmados pela administração pública são contratos qualificados como administrativos pois saem da órbita do direito privado ao prescrever cláusulas que tornam as partes contratuais assimétricas diversamente do que ocorreria no direito civil Tais cláusulas seriam inexistentes nos contratos de direito privado porque os descaracterizariam Destrinchase mais a fundo a razão pela qual tais cláusulas não seriam admitidas em contratos privados Maria Sylvia Zanella Di Pietro apresenta duas diferentes circunstâncias cláusulas que embora lícitas não são usuais nas contratações regidas pelo direito privado e cláusulas que são ilícitas sendo vedada sua prescrição nos contratos firmados entre particulares Nas cláusulas lícitas mas insusais estariam prescrições que asseguram a uma das partes o poder de alterar unilateralmente o ajuste ou rescindilo Já a responsabilização do contratado sem necessidade de que a parte contratante se socorra do Poder Judiciário representaria um exemplo de cláusula ilícita no âmbito das contratações privadas Ao abordar o tema dos contratos administrativos o civilista Silvio de Salvo Venosa trata dos traços distintivos aquelas espécies de ajustes em relação aos contratos privados apontando que as denominadas cláusulas exorbitantes são o critério fundamental dessa distinção Aludindo recorrentemente a literatura de direito administrativo mais difusa o civilista referese aos poderes de alteração unilateral rescisão unilateral fiscalização e aplicação de sanções como poderes marcados não só pelo fato de permitir à Administração o que ao particular é vedado mas também por submeter o administrado contratante a um regime de sujeição mais ou menos ampla nos negócios As normas surgidas a partir da década de 1990 absorveram em grande parte esse posicionamento teórico Surgido nesse cenário o art 58 da Lei nº 8666 de 1993 elenca prerrogativas conferidas à administração pública quais sejam i modificação unilateral dos contratos para melhor adequação às finalidades de interesse público ii rescisão unilateral iii fiscalização da execução da avença pelo contratado iv aplicação de penalidades em razão de inexecução total ou parcial do ajuste e v ocupação de bens móveis imóveis pessoal e serviços vinculados ao objeto do contrato nos casos de serviços essenciais e em determinadas hipóteses A literatura jurídica classifica essas prerrogativas como cláusulas exorbitantes que se somam a outras espalhadas ao longo da referida lei Celso Antônio Bandeira de Mello e Maria Sylvia Zanella Di Pietro apontam a limitação à invocação do exceptio non adimpleti contractus pelo contratado como prerrogativa extraordinária da administração pública A referida autora também compreende como cláusulas exorbitantes a exigência de garantia a ser prestada pelo contratado e o exercício da autotutela a permitir a anulação de contrato administrativo prerrogativa que sequer consta da lei No Brasil com o advento da Lei nº 8666 de 1993 surgiram autores que defendem a incidência das chamadas cláusulas exorbitantes em todos os contratos firmados pela administração pública Essa conclusão está baseada nos arts 58 e 62 3º da Lei nº 8666 de 1993 Interpretdos conjuntamente os dispositivos indicariam que as cláusulas exorbitantes se aplicam não somente aos contratos regidos pelo direito público mas também às avenças submetidas predominantemente às normas de direito privado A narrativa adotada pela literatura brasileira mais difundida não se ocupa em comparar os traços de suposta excepcionalidade do regime público com o regime contratual privado A diferença parece evidente mesmo sem demonstração cabal da discrepância Nos tópicos a seguir será demonstrado que as prerrogativas atribuídas por lei à administração as supostas cláusulas exorbitantes não são tão discrepantes do regime de direito privado Há uma natural assimetria entre contratante e contratado que se observa também nas relações contratuais privadas O que se denomina de cláusulas exorbitantes do direito administrativo como será visto é muito similar à posição do contratante nas contratações entre particulares A afirmação de que os contratos administrativos são marcados pela presença de cláusulas exorbitantes sugere a ideia de uma intensa sujeição dos particulares contratados às decisões da administração pública contratante O vocábulo exorbitante por si só confere ao intérprete a noção de abusividade de excesso e até mesmo de injustiça Há portanto uma acepção não somente negativa mas também e especialmente de força Quem é apresentado pela primeira vez às cláusulas exorbitantes dos contratos administrativos tende a concluir que a administração pública de um lado detém intensas e absolutas prerrogativas extraordinárias e o contratado de outro lado se sujeita a tais poderes sem qualquer contrapartida Essa impressão inicial é naturalmente mitigada quando observado que o contratado detém certas garantias como o direito ao equilíbrio econômicofinanceiro do contrato No entanto ainda assim a abstrata enunciação das cláusulas exorbitantes transpira a ideia de sujeição intensa do contratado à administração pública em um regime de prerrogativas fortes e em completa contraposição ao que ocorre no âmbito contratual privado Essa suposta assimetria entre um regime jurídico e outro é mais ilusão do que real Ao analisar o teor e os efeitos de tais prerrogativas extraordinárias constatase que elas não são tão extravagantes A relativização desse suposto regime de exceção dos contratos administrativos já foi defendida por outros autores Caio Tácito após apresentar a regra de mutabilidade unilateral do contrato administrativo afirma que essa colocação teórica usualmente aceita na doutrina não tem a extensão que aparenta Prossegue no seguinte sentido A Administração não goza livremente da prerrogativa de fazer variar a prestação o que excluiria por inteiro a natureza bilateral e a formação consensual do contrato Logo há autores que da análise do direito positivo e da jurisprudência brasileiros relativizam a exorbitância das prerrogativas conferidas à administração pública em seus contratos A seguir este estudo abordará duas das mais representativas prerrogativas a de alteração unilateral dos contratos e a de rescisão unilateral por interesse público justamente para demonstrar que elas são similares ao que se observa nas relações contratuais entre particulares O direito positivo brasileiro prescreve as hipóteses de modificação unilateral da avença pela administração pública Essa prerrogativa é conferida pela lei mas também é por ela limitada na medida em que impõe condições materiais e por vezes exige a concordância do contratado O art 58 I da Lei nº 8666 de 1993 autoriza a alteração unilateral para melhor adequação às finalidades de interesse público respeitados os direitos do contratado A modificação visa sempre portanto a um fim específico ainda que expresso por um conceito bastante aberto Ademais a referida norma demanda que os direitos do contratado sejam assegurados Embora o dispositivo legal não mencione quais seriam tais direitos seu parágrafo segundo alude ao direito à manutenção do equilíbrio contratual Há um limitador comum a todas as hipóteses de alteração do contrato seja unilateral seja bilateral a impossibilidade de modificação da natureza do objeto contratual cuja identidade deve sempre ser preservada Como se vê há limites legais relevantes à modificação unilateral do contrato pois a administração pública pode modificar o contrato unilateralmente porém deve visar às finalidades de interesse público b não pode alterar a natureza do objeto contratual c deve assegurar os direitos dos contratados especialmente o direito à manutenção do equilíbrio econômicofinanceiro d se a alteração reverberar nas condições econômicofinanceiras pactuadas em abstracto necessitará da concordância do contratado e deve respeitar os percentuais impostos pela lei quanto aos acréscimos e supressões do objeto contratual f se acrescidos ou suprimidos itens cujos preços unitários não tenham sido previamente definidos deve firmar acordo com o contratado para fixar tais preços 5 Rescisão unilateral por interesse público Outro importante exemplo está na rescisão do contrato pela administração pública contratante por motivos de interesse público Nos termos do art 79 I da Lei Federal nº 86661993 a administração Pública está autorizada a rescindir a avença por meio de ato unilateral em determinadas hipóteses elencadas em lei em que não haja culpa do contrato No direito privado a extinção do contrato por mera manifestação de vontade por uma das partes sem justa causa é nomeada como resilição unilateral Nesse ramo do direito tal forma de resilição não é a regra ocorrendo somente em determinados contratos por força de lei ou dos termos avençados entre as partes Uma vez admitida legalmente ou contratualmente e havendo a resilição unilateral cabe à parte que resiliu indenizar a outra pelas perdas e danos sofridos É caso por exemplo do contrato de empreitada prescrito pelo Código Civil De acordo com o art 623 desse diploma legal o dono da obra contratante pode resilir suspender segundo a redação do dispositivo legal o contrato desde que pague ao empreiteiro as despesas e lucros relativos aos serviços já feitos mais indenização razoável calculada em função do que ele teria ganho se concluída a obra Silvio Venosa destaca que embora o texto legal tenha empregado o termo suspendêla a obra o termo técnico correto seria rescindir unilateralmente o contrato conforme constou do Projeto de Lei nº 69602002 Ainda o civilista corrobora o teor do mencionado artigo ao afirmar que a resilição após o início da execução da obra impõe a indenização das despesas e do trabalho feito bem como pelos lucros cessantes calculados com base na conclusão da obra Outro exemplo é o contrato de mandato nos termos do art 682 I do Código Civil nessa espécie contratual é cabível a resilição unilateral que é denominada como revogação sendo esta uma feição especial da resilição Há assim autorização legal no âmbito do direito civil para que a parte contratante rescinda a avença por sua vontade exclusiva de forma unilateral e sem que haja culpa pela parte contrária Nesse específico aspecto a contratação pública assembleiase à contratação privada em comento daí decorrer circunstância em que o direito administrativo não exorbitá do direito privado Fernando Dias Menezes de Almeida também se vale do exemplo da empreitada regida pelo Código Civil para demonstrar que o poder de ação unilateral existe não somente na esfera contratual pública mas também no âmbito contratual privado O exemplo da empreitada regida pelo direito civil demonstra a existência de semelhanças entre a contratação privada e o contrato administrativo não somente pelo aspecto da prerrogativa extraordinária de rescisão unilateral mas também e especialmente quanto à extensão da indenização devida à outra parte que não resilui a avença O parágrafo 2º e incisos I a III do art 79 da Lei Federal nº 86661993 prescrevem que o contratado faz jus aos prejuízos regularmente comprovados que houver sofrido sendolhe garantido ainda a devolução da garantia pagamentos devidos pela execução do contrato até a data da rescisão e o pagamento do custo de desmobilização Na prática em razão da consolidação do entendimento jurisprudencial a respeito da matéria em questão o contratado goza de outras garantias além daquelas dispostas no artigo anteriormente mencionado A primeira delas constituiu o direito a ampla defesa e contraditório no âmbito de processo administrativo que preceda a edição do ato unilateral de rescisão conforme previsão do art 78 parágrafo único da Lei Federal nº 86661993 cuja aplicabilidade na hipótese de rescisão unilateral por interesse público é corroborada pelo entendimento do Superior Tribunal de Justiça STJ A segunda concerne à extensão da compensação financeira paga ao contratado ao lado das despesas já incorridas e do lucro correspondente ao que já tivesse sido executado até a rescisão é garantido ao contratado o pagamento de lucros cessantes O dever de indenização da expectativa frustrada de lucro embora não expressamente indicado na legislação vem sendo imposto à administração pública pelo Judiciário especialmente à luz da uniformização do entendimento pelo STJ Aqui vale breve apontamento para destacar que a posição pelo pagamento de lucros cessantes era majoritária antigamente havendo divergência por parte do ministro Herman Benjamin No entendimento então apresentado pelo ministro os lucros cessantes não seriam devidos seja porque houve silêncio eloquente por parte do legislador ao não prever a indenização por expectativa frustrada de lucro seja porque o particular ao contratar com a administração pública e assim conhecendo o regime jurídico incidente não tem a expectativa de perceber lucros cessantes Decisão monocrática datada de dezembro de 2018 revela a observância pelo referido ministro da jurisprudência do STJ que afirma que os prejuízos decorrentes da rescisão unilateral abarcam os danos emergentes e os lucros A adesão daquele que destacava da posição majoritária reflete a consolidação na Corte do entendimento de que o dever de indenização dos lucros cessantes se aplica à administração pública Também abordando a indenização por lucros cessantes em decorrência de rescisão unilateral dos contratos administrativos brasileiros José Guilherme Giacomuzzi questiona qual seria o real fundamento teórico subjacente ao entendimento jurisprudencial anteriormente comentado Parecelhe importante compreender tal ponto pois entende que há dois diferentes potenciais fundamentos cada qual com consequências distintas no plano teórico De um lado a compreensão de que o pagamento dos lucros cessantes é devido por força da aplicação ainda que supletiva de normas de direito privado conferiria ao contrato administrativo uma conotação mais comutativa mais forte própria do direito privado De outra banda a indenização dos lucros cessantes fundada no direito ao equilíbrio econômicofinanceiro reforçaria conotação mais distributiva própria das relações de direito público Na Argentina de acordo com Augustín Gordillo o contrato caracterizase como administrativo quando entre outras hipóteses as partes contratam sob o regime das cláusulas exorbitantes no qual não é devida a indenização ao contratado dos lucros cessantes Em relação aos Estados Unidos José Guilherme Giacomuzzi relata que nos poucos casos em que admitidas a rescisão unilateral termination for convenience dos contratos públicos government procurement pelo Estado por seu mero interesse governments interest não lhe é imputado o dever de indenizar o contratado por seus lucros cessantes Todos esses elementos indicam em suma que os contratos administrativos brasileiros na prática muito se assemelham com os contratos celebrados entre particulares no que toca à rescisão unilateral Quanto à fiscalização o art 67 da Lei nº 8666 de 1993 dispõe que a administração pública acompanhará e fiscalizará a execução contratual representada seja por agente público seja por terceiro contratado para essa finalidade Caso constatados defeitos e falhas determinará o que for necessário a regularização da execução Esse modo de fiscalização em nada se distingue daquele adotado em contratos privados Valendonos novamente do exemplo do contrato privado de empreitada observese que sempre se confere ao dono da obra direito de fiscalizar sua execução conforme dispõe Silvio de Salvo Venosa De acordo com o civilista o dono da obra pessoalmente ou por meio de preposto poderá embargar a obra ou tomar as medidas necessárias caso o empreiteiro afastese do projeto do contrato ou das normas técnicas aceitáveis para a hipótese Tamanho o direito de fiscalização conferido ao dono da obra que segundo o mencionado autor tal direito se impõe mesmo quando o contrato dispõe o contrário isto é mesmo quando proíbe expressamente a fiscalização O direito positivo brasileiro confere à administração pública prerrogativas no âmbito dos contratos administrativos A existência de tais prerrogativas e o constante uso delas pelo poder público são notórios de modo que o presente artigo não se prestou a refutálos Mas eles na prática não são excepcionais como aparentam Isso se deve a diferentes razões As prerrogativas podem ser invocadas pela administração pública mas encontram limitações impostas pelo direito positivo e pela jurisprudência não tendo portanto a força sugerida recorrentemente na descrição constante nas obras jurídicas brasileiras de perfil mais generalista Nos contratos firmados por particulares há prerrogativas semelhantes exercidas pelos contratantes Em certas ocasiões a administração pública contratante possui até menos poderes que o particularcontratante pois este último não se sujeita às amarras que o Estado possui Há assim certo exagero em denominar como exorbitantes as prerrogativas conferidas à administração nos contratos que celebra entre as partes Nesse âmbito o contratado se sujeitaria a fortes prerrogativas da administração pública o que inexistira no campo das contratações entre particulares seja porque seria ilícito seja porque simplesmente seria incomum no âmbito dos ajustes regidos pelo direito privado Essa concepção é bastante difundida nas obras teóricas de direito administrativo tendo por vezes até mesmo servido de base para que civilistas reproduzisse uma mesma ideia de modo genérico e sem o olhar voltado para comparação com as regras de direito privado No entanto as prerrogativas da administração são cercadas de diversas limitações muitas delas impostas pelo texto legal e outras provenientes de entendimento jurisprudencial reiterado A administração pública pode rescindir um contrato unilateralmente por motivo de interesse público porém deve instaurar um procedimento administrativo conferir ampla defesa e contraditório e indenizar danos emergentes e lucros cessantes a administração pública pode alterar o contrato mas em certas ocasiões respeitará determinados limites objetivos e em outras necessitará da concordância do contratado Não são portanto tão intensas e impositivas quanto costumam ser encaradas Esse regime não é exorbitante em comparação ao direito privado Nas contratações entre particulares não são incomuns tampouco ilícitas prescrições contratuais que confirmam por acordo de vontades prerrogativas extraordinárias a uma parte não gozadas pela outra estabelecendo por exemplo o poder de resilição unilateral nas hipóteses em que não haja norma legal nesse sentido cláusulas penais e o poder de fiscalização do serviço exclusivamente a uma parte Tomados esses aspectos em consideração constatase que as prerrogativas conferidas à administração pública não são excepcionais existindo poderes a elas equivalentes nos contratos privados estando ambas portanto em uma mesma órbita Na prática um grande grupo econômico de empresas detém mais poder de imposição de suas vontades à outra parte contratual do que a administração pública Primeiro porque o contratado que celebra ajuste com o particular poderoso se sujeita às condições impostas pelo contratante a fim de manter a relação contratual que lhe é interessante e vantajosa justamente porque firmada com um grande cliente Segundo porque o particularcontratante não se submete às regras típicas do controle da atuação da administração pública Assim se o grupo econômico de empresas optar por suprir parte do objeto contratual adotará essa medida sem qualquer limitação impondo sua vontade ao contratado que tende a aceitála ainda que a contragosto como maneira de preservação da parceria comercial embora possuísse eventualmente algum direito a compensação Já a administração caso pretenda reduzir o objeto contratual de modo unilateral só poderá fazêlo até o limite percentual imposto na lei não dispondo das mesmas armas de persuasão de um contratante privado uma vez que seus parceiros são escolhidos por licitação e os limites de imposição de sua vontade foram predeterminados em lei A relação contratual privada pode portanto ser tão assimétrica quanto ou até mais que a relação contratual pública A superação dos marcos da idealização que cercam as prerrogativas extraordinárias contratadas à administração pública demonstra que a observância atenta da realidade jurídica e fática importa É assim essencial para compreensão mais completa de diversos temas que são muitas vezes apresentados sob um olhar meramente teórico tal como as cláusulas exorbitantes do contrato administrativo
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especialmente a redação do art 2º parágrafo único da Lei nº 8666 de 1993 quanto a recorrente menção a essa terminologia nos textos jurisprudenciais brasileiros Nas oportunidades em que tratadas as prerrogativas especiais em favor da administração pública presentes nos contratos administrativos este artigo utiliza o termo cláusulas exorbitantes ou prerrogativas extraordinárias Na segunda parte este estudo apresenta como as obras brasileiras de perfil teórico e de ampla propagação costumam abordar o tema das cláusulas exorbitantes A terceira parte dedicase a demonstrar o posicionamento de alguns autores que questionam a real extensão das prerrogativas extraordinárias conferidas à administração pública A quarta quinta e sexta partes tratam respectivamente da alteração unilateral da rescisão por motivos de interesse público e da fiscalização e da aplicação de sanções A sétima parte conjuga os pontos anteriormente apresentados organizando e então refutando os marcos da idealização que cerca as cláusulas exorbitantes As cláusulas exorbitantes inseremse nesse cenário caracterizandose como poderes tidos como imprescindíveis para o atendimento do interesse público especialmente para que este último prevaleça sobre o interesse particular nas contratações públicas Essas obras esclarecem que o termo exorbitante é empregado para diferenciar os contratos administrativos daquelas avenças próprias ao direito civil Os ajustes bilaterais firmados pela administração pública são contratos qualificados como administrativos pois saem da órbita do direito privado ao prescrever cláusulas que tornam as partes contratuais assimétricas diversamente do que ocorreria no direito civil Tais cláusulas seriam inexistentes nos contratos de direito privado porque os descaracterizariam Destrinchase mais a fundo a razão pela qual tais cláusulas não seriam admitidas em contratos privados Maria Sylvia Zanella Di Pietro apresenta duas diferentes circunstâncias cláusulas que embora lícitas não são usuais nas contratações regidas pelo direito privado e cláusulas que são ilícitas sendo vedada sua prescrição nos contratos firmados entre particulares Nas cláusulas lícitas mas insusais estariam prescrições que asseguram a uma das partes o poder de alterar unilateralmente o ajuste ou rescindilo Já a responsabilização do contratado sem necessidade de que a parte contratante se socorra do Poder Judiciário representaria um exemplo de cláusula ilícita no âmbito das contratações privadas Ao abordar o tema dos contratos administrativos o civilista Silvio de Salvo Venosa trata dos traços distintivos aquelas espécies de ajustes em relação aos contratos privados apontando que as denominadas cláusulas exorbitantes são o critério fundamental dessa distinção Aludindo recorrentemente a literatura de direito administrativo mais difusa o civilista referese aos poderes de alteração unilateral rescisão unilateral fiscalização e aplicação de sanções como poderes marcados não só pelo fato de permitir à Administração o que ao particular é vedado mas também por submeter o administrado contratante a um regime de sujeição mais ou menos ampla nos negócios As normas surgidas a partir da década de 1990 absorveram em grande parte esse posicionamento teórico Surgido nesse cenário o art 58 da Lei nº 8666 de 1993 elenca prerrogativas conferidas à administração pública quais sejam i modificação unilateral dos contratos para melhor adequação às finalidades de interesse público ii rescisão unilateral iii fiscalização da execução da avença pelo contratado iv aplicação de penalidades em razão de inexecução total ou parcial do ajuste e v ocupação de bens móveis imóveis pessoal e serviços vinculados ao objeto do contrato nos casos de serviços essenciais e em determinadas hipóteses A literatura jurídica classifica essas prerrogativas como cláusulas exorbitantes que se somam a outras espalhadas ao longo da referida lei Celso Antônio Bandeira de Mello e Maria Sylvia Zanella Di Pietro apontam a limitação à invocação do exceptio non adimpleti contractus pelo contratado como prerrogativa extraordinária da administração pública A referida autora também compreende como cláusulas exorbitantes a exigência de garantia a ser prestada pelo contratado e o exercício da autotutela a permitir a anulação de contrato administrativo prerrogativa que sequer consta da lei No Brasil com o advento da Lei nº 8666 de 1993 surgiram autores que defendem a incidência das chamadas cláusulas exorbitantes em todos os contratos firmados pela administração pública Essa conclusão está baseada nos arts 58 e 62 3º da Lei nº 8666 de 1993 Interpretdos conjuntamente os dispositivos indicariam que as cláusulas exorbitantes se aplicam não somente aos contratos regidos pelo direito público mas também às avenças submetidas predominantemente às normas de direito privado A narrativa adotada pela literatura brasileira mais difundida não se ocupa em comparar os traços de suposta excepcionalidade do regime público com o regime contratual privado A diferença parece evidente mesmo sem demonstração cabal da discrepância Nos tópicos a seguir será demonstrado que as prerrogativas atribuídas por lei à administração as supostas cláusulas exorbitantes não são tão discrepantes do regime de direito privado Há uma natural assimetria entre contratante e contratado que se observa também nas relações contratuais privadas O que se denomina de cláusulas exorbitantes do direito administrativo como será visto é muito similar à posição do contratante nas contratações entre particulares A afirmação de que os contratos administrativos são marcados pela presença de cláusulas exorbitantes sugere a ideia de uma intensa sujeição dos particulares contratados às decisões da administração pública contratante O vocábulo exorbitante por si só confere ao intérprete a noção de abusividade de excesso e até mesmo de injustiça Há portanto uma acepção não somente negativa mas também e especialmente de força Quem é apresentado pela primeira vez às cláusulas exorbitantes dos contratos administrativos tende a concluir que a administração pública de um lado detém intensas e absolutas prerrogativas extraordinárias e o contratado de outro lado se sujeita a tais poderes sem qualquer contrapartida Essa impressão inicial é naturalmente mitigada quando observado que o contratado detém certas garantias como o direito ao equilíbrio econômicofinanceiro do contrato No entanto ainda assim a abstrata enunciação das cláusulas exorbitantes transpira a ideia de sujeição intensa do contratado à administração pública em um regime de prerrogativas fortes e em completa contraposição ao que ocorre no âmbito contratual privado Essa suposta assimetria entre um regime jurídico e outro é mais ilusão do que real Ao analisar o teor e os efeitos de tais prerrogativas extraordinárias constatase que elas não são tão extravagantes A relativização desse suposto regime de exceção dos contratos administrativos já foi defendida por outros autores Caio Tácito após apresentar a regra de mutabilidade unilateral do contrato administrativo afirma que essa colocação teórica usualmente aceita na doutrina não tem a extensão que aparenta Prossegue no seguinte sentido A Administração não goza livremente da prerrogativa de fazer variar a prestação o que excluiria por inteiro a natureza bilateral e a formação consensual do contrato Logo há autores que da análise do direito positivo e da jurisprudência brasileiros relativizam a exorbitância das prerrogativas conferidas à administração pública em seus contratos A seguir este estudo abordará duas das mais representativas prerrogativas a de alteração unilateral dos contratos e a de rescisão unilateral por interesse público justamente para demonstrar que elas são similares ao que se observa nas relações contratuais entre particulares O direito positivo brasileiro prescreve as hipóteses de modificação unilateral da avença pela administração pública Essa prerrogativa é conferida pela lei mas também é por ela limitada na medida em que impõe condições materiais e por vezes exige a concordância do contratado O art 58 I da Lei nº 8666 de 1993 autoriza a alteração unilateral para melhor adequação às finalidades de interesse público respeitados os direitos do contratado A modificação visa sempre portanto a um fim específico ainda que expresso por um conceito bastante aberto Ademais a referida norma demanda que os direitos do contratado sejam assegurados Embora o dispositivo legal não mencione quais seriam tais direitos seu parágrafo segundo alude ao direito à manutenção do equilíbrio contratual Há um limitador comum a todas as hipóteses de alteração do contrato seja unilateral seja bilateral a impossibilidade de modificação da natureza do objeto contratual cuja identidade deve sempre ser preservada Como se vê há limites legais relevantes à modificação unilateral do contrato pois a administração pública pode modificar o contrato unilateralmente porém deve visar às finalidades de interesse público b não pode alterar a natureza do objeto contratual c deve assegurar os direitos dos contratados especialmente o direito à manutenção do equilíbrio econômicofinanceiro d se a alteração reverberar nas condições econômicofinanceiras pactuadas em abstracto necessitará da concordância do contratado e deve respeitar os percentuais impostos pela lei quanto aos acréscimos e supressões do objeto contratual f se acrescidos ou suprimidos itens cujos preços unitários não tenham sido previamente definidos deve firmar acordo com o contratado para fixar tais preços 5 Rescisão unilateral por interesse público Outro importante exemplo está na rescisão do contrato pela administração pública contratante por motivos de interesse público Nos termos do art 79 I da Lei Federal nº 86661993 a administração Pública está autorizada a rescindir a avença por meio de ato unilateral em determinadas hipóteses elencadas em lei em que não haja culpa do contrato No direito privado a extinção do contrato por mera manifestação de vontade por uma das partes sem justa causa é nomeada como resilição unilateral Nesse ramo do direito tal forma de resilição não é a regra ocorrendo somente em determinados contratos por força de lei ou dos termos avençados entre as partes Uma vez admitida legalmente ou contratualmente e havendo a resilição unilateral cabe à parte que resiliu indenizar a outra pelas perdas e danos sofridos É caso por exemplo do contrato de empreitada prescrito pelo Código Civil De acordo com o art 623 desse diploma legal o dono da obra contratante pode resilir suspender segundo a redação do dispositivo legal o contrato desde que pague ao empreiteiro as despesas e lucros relativos aos serviços já feitos mais indenização razoável calculada em função do que ele teria ganho se concluída a obra Silvio Venosa destaca que embora o texto legal tenha empregado o termo suspendêla a obra o termo técnico correto seria rescindir unilateralmente o contrato conforme constou do Projeto de Lei nº 69602002 Ainda o civilista corrobora o teor do mencionado artigo ao afirmar que a resilição após o início da execução da obra impõe a indenização das despesas e do trabalho feito bem como pelos lucros cessantes calculados com base na conclusão da obra Outro exemplo é o contrato de mandato nos termos do art 682 I do Código Civil nessa espécie contratual é cabível a resilição unilateral que é denominada como revogação sendo esta uma feição especial da resilição Há assim autorização legal no âmbito do direito civil para que a parte contratante rescinda a avença por sua vontade exclusiva de forma unilateral e sem que haja culpa pela parte contrária Nesse específico aspecto a contratação pública assembleiase à contratação privada em comento daí decorrer circunstância em que o direito administrativo não exorbitá do direito privado Fernando Dias Menezes de Almeida também se vale do exemplo da empreitada regida pelo Código Civil para demonstrar que o poder de ação unilateral existe não somente na esfera contratual pública mas também no âmbito contratual privado O exemplo da empreitada regida pelo direito civil demonstra a existência de semelhanças entre a contratação privada e o contrato administrativo não somente pelo aspecto da prerrogativa extraordinária de rescisão unilateral mas também e especialmente quanto à extensão da indenização devida à outra parte que não resilui a avença O parágrafo 2º e incisos I a III do art 79 da Lei Federal nº 86661993 prescrevem que o contratado faz jus aos prejuízos regularmente comprovados que houver sofrido sendolhe garantido ainda a devolução da garantia pagamentos devidos pela execução do contrato até a data da rescisão e o pagamento do custo de desmobilização Na prática em razão da consolidação do entendimento jurisprudencial a respeito da matéria em questão o contratado goza de outras garantias além daquelas dispostas no artigo anteriormente mencionado A primeira delas constituiu o direito a ampla defesa e contraditório no âmbito de processo administrativo que preceda a edição do ato unilateral de rescisão conforme previsão do art 78 parágrafo único da Lei Federal nº 86661993 cuja aplicabilidade na hipótese de rescisão unilateral por interesse público é corroborada pelo entendimento do Superior Tribunal de Justiça STJ A segunda concerne à extensão da compensação financeira paga ao contratado ao lado das despesas já incorridas e do lucro correspondente ao que já tivesse sido executado até a rescisão é garantido ao contratado o pagamento de lucros cessantes O dever de indenização da expectativa frustrada de lucro embora não expressamente indicado na legislação vem sendo imposto à administração pública pelo Judiciário especialmente à luz da uniformização do entendimento pelo STJ Aqui vale breve apontamento para destacar que a posição pelo pagamento de lucros cessantes era majoritária antigamente havendo divergência por parte do ministro Herman Benjamin No entendimento então apresentado pelo ministro os lucros cessantes não seriam devidos seja porque houve silêncio eloquente por parte do legislador ao não prever a indenização por expectativa frustrada de lucro seja porque o particular ao contratar com a administração pública e assim conhecendo o regime jurídico incidente não tem a expectativa de perceber lucros cessantes Decisão monocrática datada de dezembro de 2018 revela a observância pelo referido ministro da jurisprudência do STJ que afirma que os prejuízos decorrentes da rescisão unilateral abarcam os danos emergentes e os lucros A adesão daquele que destacava da posição majoritária reflete a consolidação na Corte do entendimento de que o dever de indenização dos lucros cessantes se aplica à administração pública Também abordando a indenização por lucros cessantes em decorrência de rescisão unilateral dos contratos administrativos brasileiros José Guilherme Giacomuzzi questiona qual seria o real fundamento teórico subjacente ao entendimento jurisprudencial anteriormente comentado Parecelhe importante compreender tal ponto pois entende que há dois diferentes potenciais fundamentos cada qual com consequências distintas no plano teórico De um lado a compreensão de que o pagamento dos lucros cessantes é devido por força da aplicação ainda que supletiva de normas de direito privado conferiria ao contrato administrativo uma conotação mais comutativa mais forte própria do direito privado De outra banda a indenização dos lucros cessantes fundada no direito ao equilíbrio econômicofinanceiro reforçaria conotação mais distributiva própria das relações de direito público Na Argentina de acordo com Augustín Gordillo o contrato caracterizase como administrativo quando entre outras hipóteses as partes contratam sob o regime das cláusulas exorbitantes no qual não é devida a indenização ao contratado dos lucros cessantes Em relação aos Estados Unidos José Guilherme Giacomuzzi relata que nos poucos casos em que admitidas a rescisão unilateral termination for convenience dos contratos públicos government procurement pelo Estado por seu mero interesse governments interest não lhe é imputado o dever de indenizar o contratado por seus lucros cessantes Todos esses elementos indicam em suma que os contratos administrativos brasileiros na prática muito se assemelham com os contratos celebrados entre particulares no que toca à rescisão unilateral Quanto à fiscalização o art 67 da Lei nº 8666 de 1993 dispõe que a administração pública acompanhará e fiscalizará a execução contratual representada seja por agente público seja por terceiro contratado para essa finalidade Caso constatados defeitos e falhas determinará o que for necessário a regularização da execução Esse modo de fiscalização em nada se distingue daquele adotado em contratos privados Valendonos novamente do exemplo do contrato privado de empreitada observese que sempre se confere ao dono da obra direito de fiscalizar sua execução conforme dispõe Silvio de Salvo Venosa De acordo com o civilista o dono da obra pessoalmente ou por meio de preposto poderá embargar a obra ou tomar as medidas necessárias caso o empreiteiro afastese do projeto do contrato ou das normas técnicas aceitáveis para a hipótese Tamanho o direito de fiscalização conferido ao dono da obra que segundo o mencionado autor tal direito se impõe mesmo quando o contrato dispõe o contrário isto é mesmo quando proíbe expressamente a fiscalização O direito positivo brasileiro confere à administração pública prerrogativas no âmbito dos contratos administrativos A existência de tais prerrogativas e o constante uso delas pelo poder público são notórios de modo que o presente artigo não se prestou a refutálos Mas eles na prática não são excepcionais como aparentam Isso se deve a diferentes razões As prerrogativas podem ser invocadas pela administração pública mas encontram limitações impostas pelo direito positivo e pela jurisprudência não tendo portanto a força sugerida recorrentemente na descrição constante nas obras jurídicas brasileiras de perfil mais generalista Nos contratos firmados por particulares há prerrogativas semelhantes exercidas pelos contratantes Em certas ocasiões a administração pública contratante possui até menos poderes que o particularcontratante pois este último não se sujeita às amarras que o Estado possui Há assim certo exagero em denominar como exorbitantes as prerrogativas conferidas à administração nos contratos que celebra entre as partes Nesse âmbito o contratado se sujeitaria a fortes prerrogativas da administração pública o que inexistira no campo das contratações entre particulares seja porque seria ilícito seja porque simplesmente seria incomum no âmbito dos ajustes regidos pelo direito privado Essa concepção é bastante difundida nas obras teóricas de direito administrativo tendo por vezes até mesmo servido de base para que civilistas reproduzisse uma mesma ideia de modo genérico e sem o olhar voltado para comparação com as regras de direito privado No entanto as prerrogativas da administração são cercadas de diversas limitações muitas delas impostas pelo texto legal e outras provenientes de entendimento jurisprudencial reiterado A administração pública pode rescindir um contrato unilateralmente por motivo de interesse público porém deve instaurar um procedimento administrativo conferir ampla defesa e contraditório e indenizar danos emergentes e lucros cessantes a administração pública pode alterar o contrato mas em certas ocasiões respeitará determinados limites objetivos e em outras necessitará da concordância do contratado Não são portanto tão intensas e impositivas quanto costumam ser encaradas Esse regime não é exorbitante em comparação ao direito privado Nas contratações entre particulares não são incomuns tampouco ilícitas prescrições contratuais que confirmam por acordo de vontades prerrogativas extraordinárias a uma parte não gozadas pela outra estabelecendo por exemplo o poder de resilição unilateral nas hipóteses em que não haja norma legal nesse sentido cláusulas penais e o poder de fiscalização do serviço exclusivamente a uma parte Tomados esses aspectos em consideração constatase que as prerrogativas conferidas à administração pública não são excepcionais existindo poderes a elas equivalentes nos contratos privados estando ambas portanto em uma mesma órbita Na prática um grande grupo econômico de empresas detém mais poder de imposição de suas vontades à outra parte contratual do que a administração pública Primeiro porque o contratado que celebra ajuste com o particular poderoso se sujeita às condições impostas pelo contratante a fim de manter a relação contratual que lhe é interessante e vantajosa justamente porque firmada com um grande cliente Segundo porque o particularcontratante não se submete às regras típicas do controle da atuação da administração pública Assim se o grupo econômico de empresas optar por suprir parte do objeto contratual adotará essa medida sem qualquer limitação impondo sua vontade ao contratado que tende a aceitála ainda que a contragosto como maneira de preservação da parceria comercial embora possuísse eventualmente algum direito a compensação Já a administração caso pretenda reduzir o objeto contratual de modo unilateral só poderá fazêlo até o limite percentual imposto na lei não dispondo das mesmas armas de persuasão de um contratante privado uma vez que seus parceiros são escolhidos por licitação e os limites de imposição de sua vontade foram predeterminados em lei A relação contratual privada pode portanto ser tão assimétrica quanto ou até mais que a relação contratual pública A superação dos marcos da idealização que cercam as prerrogativas extraordinárias contratadas à administração pública demonstra que a observância atenta da realidade jurídica e fática importa É assim essencial para compreensão mais completa de diversos temas que são muitas vezes apresentados sob um olhar meramente teórico tal como as cláusulas exorbitantes do contrato administrativo