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Teoria Geral do Direito
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7 A emoção no direito Como vimos de relance no Capítulo 1 existem duas concepções básicas de economia Uma delas concentrase sobre o conteúdo e considera a economia como o estudo dos mercados enquanto a outra se concentra sobre o método e vê a economia como a aplicação do modelo do agente racional ao comportamento humano Os adeptos da segunda concepção talvez pareçam estar em rota de colisão com a psicologia cujo enfoque incide sobre os componentes não racionais e irracionais do comportamento humano Os psicólogos defendem a tese bastante plausível de que o comportamento humano é caracteristicamente não racional e afirmam que o homem racional da economia raramente é encontrado no mundo real mesmo nas economias de mercado e sem dúvida muito raramente fora destas Nesta parte do livro e até certo ponto também na próxima examino tal afirmação como parte de um interesse mais vasto acerca daquilo que a psicologia pode ter a oferecer para a compreensão e o aperfeiçoamento do direito Em minha opinião ela tem muito a oferecer e essa contribuição é em grande medida coerente com o modelo racional Pensemos por exemplo no assassinato de um cônjuge adúltero no sequestro de um filho pelo cônjuge ao qual se negou a custódia da criança ou no ativista dos direitos dos animais que joga uma lata de tinta num casaco de pele Outros tipos de comportamento são espantosamente desatentos de emoção o assassinato a sanguefrio Outros por sua vez despertam as emoções das pessoas que ouvem falar do incidente ou leem sobre este geralmente sentimentos de solidariedade para com a vítima de um crime ou de um ilícito civil e de indignação com o agressor mas às vezes de solidariedade para com o agressor como nos casos de assassinatos cometidos por mulheres fisicamente agredidas pelo marido O direito em si costuma ser visto como uma fortaleza da razão concebida como antítese da emoção O direito é compreendido como uma entidade cuja função é neutralizar a emotividade que as disputas jurídicas despertam nas partes envolvidas e nos observadores leigos No entanto qualquer pessoa que já se tenha envolvido em litígios na condição de litigante advogado juiz jurado ou testemunha sabe que esse método isto é o método de resolução de disputas jurídicas por excelência é um processo intensamente emocional e bastante semelhante aos violentos métodos de resolução de disputas que ele substitui O caráter emocional dos atos regulados pelo direito e os modos como o direito reage a essa emotividade levantam uma série de questões no que concerne ao sistema jurídico Neste capítulo abordarei cinco dessas questões Primeiramente como o fato de um ato ilícito ser precipitado por uma emoção deve afetar a apreciação jurídica de tal ato O fator emocional deve levar o direito a ser mais severo ou mais brando com o transgressor Discuto essa questão particularmente em relação às leis que regem os crimes motivados pelo ódio e à provocação como fator atenuante da pena A segunda questão consiste em saber se e como o direito deve usar a emoção Já a terceira consiste em saber qual deve ser o estado emocional das pessoas envolvidas na prática judicial sejam elas juízes jurados promotores Em caso negativo de que modo exatamente a emoção deve integrar seus julgamentos Em quarto lugar que critérios de seleção devem ser empregados para assegurar que os indivíduos envolvidos na prática judicial servemse no devido estado emocional seja o que for exatamente que tal coisa signifique quando no desempenho de seus deveres Em quinto lugar de que forma o direito pode impedir que o fator emocional presente nos litígios frustre os esforços para que as partes entrem em acordo antes de o processo chegar ao fim Para responder a essas questões podemos buscar auxílio na teoria cognitiva da emoção que começou com Aristóteles e nos últimos anos foi aprofundada por filósofos e psicólogos Em desafio àquilo que a despeito de filósofos e tese tornarase não apenas no campo do direito uma antitese profundamente convencional entre racionalidade e emoção esses teóricos modernos afirmam que a emoção é uma forma de cognição e isso não apenas no sentido óbvio de que as reações emocionais geralmente são deflagradas por informações mas também no sentido de que um sentimento expressa uma avaliação da informação o que lhe permite funcionar como substituto do raciocínio no sentido usual desse termo Por exemplo quando reagimos com raiva ao tomarmos conhecimento de algum escândalo a reação exprime desaprovação uma avaliação à qual poderíamos ter chegado através de um processo gradual de raciocínio A função avaliadora da emoção implica que o fato de não se reagir a uma situação específica mediante um sentimento específico pode demonstrar não uma capacidade superior de raciocinar mas sim uma falta de compreensão ou no caso de sentimentos morais como a compaixão e a indignação uma rejeição do código moral da sociedade Assim reações emocionais específicas em situações específicas podem muitas vezes ser elogiadas por serem apropriadas ou criticadas por serem impróprias quer por serem suscitadas pela desinformação quer por se basearem numa avaliação perversa da situação Outra objeção ao estabelecimento de uma dicotomia entre razão e emoção é a de que essa prática pressupõe equivocadamente a existência de uma luta entre os elementos motivacionais e não motivacionais da personalidade A razão não é com o devido respeito a Kant motivacional Para que se pratique uma ação dois fatores têm de se unir a consciência de qual é a coisa certa a fazer e o desejo de fazêla Quando dizemos que uma pessoa não se deixou levar pela emoção por exemplo quando ela resistiu ao impulso de comer uma barra de chocolate queremos dizer que uma emoção de aversão autocontrole ou seja a aversão a não ter força de vontade foi mais forte do que a emoção de atração com a emotividade Por mais enganadora que seja a dicotomia entre razão e emoção capta uma verdade importante Todos nós já passamos pela experiência de cometer erros por orgulho raiva ou outras emoções A emoção embora seja um método eficiente de cognição em alguns casos é ineficiente em outros Ela passa por cima da razão concebida como um processo consciente e articulado de deliberação cálculo análise ou reflexão Às vezes isso é bastante positivo pois a emoção aumenta a concentração clarifica a avaliação e nos leva a agir em circunstâncias nas quais a reflexão seria interminável inconsistente e inconclusiva Porém nas situações em que tornar uma decisão inteligente requer análise ou reflexão criteriosa e sequencial a emoção pode sobreporse a esse processo e levar a uma decisão de qualidade inferior O amor é particularmente famoso por levar a juízos equivocados assim como acontece com o medo e a raiva Esta última estimula um pensamento egocêntrico e polarizado que obscurece aspectos pertinentes da situação que a provocou Todavia seria mais preciso dizer que o excesso de emoção ou o tipo errado de emoção pode levar a uma decisão inferior Pois como argumentarei mais adiante ao tratar da influência do fator emocional nas decisões dos juízes a emoção é necessária para tornar mais ágil qualquer decisão que não seja meramente a conclusão de um raciocínio silogístico ou puramente formal ou seja do tipo de raciocínio lógico que um computador é capaz de realizar melhor que um ser humano A decisão é uma forma de ação e não existe ação sem emoção Na prática quando afirmamos que uma pessoa é emotiva ou que o julgamento de uma pessoa é deturpado pelo sentimentalismo queremos dizer que ela deu uma ênfase indevida a uma das características de uma situação e ao estímulo emocional a esta associado negligenciando outras características importantes Assim podemos chamar de emotivo um juiz que de tão influenciado pelos terríveis danos infligidos ao demandante de um caso de responsabilidade civil tornese incapaz de enxergar outros aspectos juridicamente pertinentes do caso É de esperar que os juízes dos tribunais recursais sejam menos emotivos nesse sentido que os juízes de primeira instância pois estão mais distantes dos elementos emocionais mais evidentes dos casos Eles não lidam pessoalmente com as partes e as testemunhas mas somente com os advogados com os autos do processo em primeira instância e outros documentos e às vezes com fotos Portanto a forma do processo de recurso pode ser vista como uma reação ao perigo do emocionalismo entendido como a atribuição de importância excessiva a um aspecto mais saliente de uma situação complexa Na vida cotidiana reagimos a esse perigo através de várias estratégias pessoais por exemplo a tentativa de controlar nossa raiva de modo que ela não nos leve a cometer atos apressados e irrefletidos dos quais nos arrependeríamos rapidamente A ideia da emoção como um atalho cognitivo explica por que os jurados assim como as crianças tendem a fazer julgamentos mais emocionais do que aqueles dos juízes Quanto menos experiência uma pessoa tiver em resolver seus problemas por meio do raciocínio mais ela tenderá a reagir emocionalmente isto é a recorrer a uma estratégia emocional para chegar a uma conclusão qual seja a tido bastante literal As emoções como o sexo são uma característica que temos em comum com os outros animais Estes por terem o córtex menor que o dos seres humanos recorremse mais intensamente que nós às emoções para orientaremse em suas ações Além disso o fato de as emoções serem discerníveis nas crianças mais novas é mais inata Assim como outras partes do nosso patrimônio animal ou natural por oposição ao cultural o conjunto de emoções de que somos dotados provavelmente era bem adaptado às condições de nosso ambiente ancestral Esse termo é usado pelos biólogos evolucionistas para descrever o período préhistórico durante o qual os seres humanos evoluíram até chegar a uma configuração biológica essencialmente similar à atual Mas nosso repertório emocional hoje Esta é uma razão para nos preocuparmos com o fato de que às vezes as emoções podem nos tirar do bom caminho Isso ocorre por exemplo quando tomamos precipitamente uma decisão que devido à complexidade essa que talvez não fosse rara mais bem tomada se raciocinássemos mais cuidadosamente e tivéssemos mais paciência determinado tipo de comportamento regulamentado pelo direito está fadada a depender do propósito da modalidade de direito que o rege Tomemos o direito penal Presumamos que seu propósito básico seja o de limitar as atividades perigosas Nesse caso para sabermos como se deve tratar a emoção no âmbito dessa esfera do direito devemos relacionar a emoção à periculosidade Obviamente essa relação varia tanto de um crime para outro quanto no âmbito de cada crime No caso do homicídio a presença de emoções fortes tende a atenuar a periculosidade do criminoso enquanto a ausência destas tende a agravála A pessoa que comete um assassinato a sanguefrio um indivíduo psicopata ou insensível como um assassino de aluguel por exemplo é particularmente perigosa Sua propensão ao assassínio não se restringe àquelas raras situações em que a aversão natural a matar desaparece como no caso do maior dos crimes passionais Além disso graças a sua frieza será mais fácil para ele armar estratégias que lhe permitam evitar a prisão PODE PARECER que quanto mais emocional for o crime mais e não menos severa deve ser a pena uma vez que pode ser necessária uma ameaça maior de punição para dissuadir os candidatos a criminosos em tais circunstâncias Mas isso não está correto e não está por dois motivos Em primeiro lugar o fato de que é mais fácil apanhar um criminoso que é movido pela emoção bem como o fato de que é menos arriscado que esse tipo de criminoso repita o crime já que este é específico de dada situação cuja recorrência é improvável tende a compensar a necessidade de intensificar a pena para assegurarse a dissuasão e a neutralização do criminoso Em segundo lugar a maioria dos crimes passionais contêm um elemento de provocação por parte da vítima o que pode servir de motivo para uma pena mais branda impedir a ocorrência de crimes quer pela dissuasão quer por qualquer outro meio Nem todos aceitarão que seja esse o objetivo do direito penal Mas minha ideia geral ainda assim se sustenta não se pode esperar que o direito seja categoricamente a favor ou categoricamente contra a emoção ou a emocionalidade Sou levado a questionar se deveria haver uma categoria específica de crimes motivados pelo ódio que fossem punidos mais duramente que seus equivalentes não motivados pelo ódio Como acontece com a maioria das emoções o ódio é moralmente neutro Sua valência moral depende de seu objeto A menos que se seja o tipo de rigidista cristão que leva o Sermão da Montanha ao pé da letra isto é como fonte de orientação para a vida neste mundo e não conforme era sua intenção como uma forma de preparação para a vida num outro reino cuja vinda se considera iminente a ninguém ocorrerá que seja imoral odiar Hitler ou Stalin Eu acrescentaria tão longe estou de ser um rigorista moral que não considero imoral odiar criminosos fornicadores fanfarrões ou mesmo indigentes estes hoje em dia pelo menos nos países mais ricos em geral não passam de vigaristas embora eu considere errado os representantes do poder público sobretudo os juízes quando no exercício de sua função odiarem quem quer que seja Os crimes passionais muitas vezes são motivados pelo ódio à vítima e ainda assim a emocionalidade do ato é adequadamente vista como um fator atenuante quando indica que é improvável que o ato se repita por ter sido este deflagrado por uma conjunção de circunstâncias que dificilmente voltará a ocorrer Com o termo crimes motivados pelo ódio pretendo definir algo bastante específico que o objeto do ódio do criminoso é 1 um grupo não um indivíduo 2 cujos membros não são fora da lei porque se o fossem não seria criminoso me vitimálos Pode ser válido aumentar a severidade da pena nessas circunstâncias ainda que a matéria do direito penal seja unicamente a periculosidade Em primeiro lugar algumas vezes o criminoso cujo alvo é um grupo e não um indivíduo pode ser mais perigoso que o criminoso comum pelo fato de ter mais pessoas em vista por assim dizer Esse argumento é dúbio porque não faz distinção entre o indivíduo que pratica um crime motivado pelo ódio e digamos o sujeito que arromba casas para quem qualquer proprietário ou ocupante de uma residência ou de um estabelecimento comercial é uma vítima em potencial Um argumento melhor é o seguinte Se os membros de determinados grupos como os negros do Sul dos Estados Unidos durante a época em que eram correntes as práticas discriminatórias em relação aos negros tendem menos do que outras vítimas a denunciar os crimes praticados contra eles ou a receber proteção efetiva da polícia e dos outros agentes de imposição da lei os criminosos qualquer que seja o estado emocional destes encarregarão no ato de vitimálos uma pena mais severa Em terceiro lugar o que justifica uma mais severas quando o dano psicológico infligido à vítima pertence ou então se o crime impõe um custo emocional maior do que aquele que um crime de motivação diversa mas semelhante sob outros aspectos imporia às pes soas temerosas de se tornaremse vítimas de crimes ou ainda a impulsividade de um crime motivado pela raiva muitas vezes facilita a captura do criminoso e transformase assim numa justificativa para penas mais leves O criminoso frio com sua maior presença de espírito tende a adotar estratégias mais eficientes para não ser descoberto Sem dúvida a raiva muitas vezes acompanha o ódio e viceversa mas nem sempre A distinção entre raiva e ódio nos ajudará a distinguir entre três tipos de perpetradores de crimes motivados pelo ódio os fanáticos com sanguefrio os menores impulsivos que na verdade são responsáveis pela maioria dos crimes desse tipo e o criminoso profundamente emocional símbolo do homofóbico que patologicamente angustiado com sua própria identidade sexual mata um homossexual que lhe passa uma cantada A última dessas categorias levanta a questão de saber se a provocação não deveria justificar penas mais leves para muitos dos crimes motivados pelo ódio o assassinato homofóbico é um crime passional e como tal é circunstancial Mas também se assemelha ao assassinato de prostitutas em relação direta como ocorreria com o assassinato de um cônjuge adúltero Em contrapartida os menores impulsivos podem ser mais passíveis de dissuasão do que o homofóbico pois seu envolvimento emocional é menos profundo ou ao contrário eles podem ser menos passíveis de dissuasão devido à emocionalidade da juventude Embora os crimes motivados pelo ódio possam ser em geral mais perigosos que outros crimes semelhantes mas não motivados pelo ódio a um grupo aqueles que defendem penas mais rígidas para esses crimes não insistem em vinculálas a uma periculosidade maior O exemplo clássico de crime motivado pelo ódio é o assassinato de prostitutas como no caso de Jack o Estripador e seus inúmeros imitadores A ideia de punir esses assassinatos com mais severidade que os assassinatos normais pode ser defendida tão tomandose como referência a periculosidade relativa Todavia não é isso que os defensores de penas mais duras para os crimes motivados pelo ódio têm em mente quando usam o termo O significado que esses indivíduos lhe atribuem é o de crimes contra membros de grupos para com os quais eles têm especial solicitude como negros judeus e homossexuais13 As leis relativas aos crimes motivados pelo ódio demonstram o impacto da política da identidade sobre o direito penal14 Ao definirem os crimes motivados pelo ódio tomandose como referência grupos privilegiados esses indivíduos desfaçam a relação entre os crimes motivados pelo ódio a determinados grupos e a periculosidade Desse modo misturam política e direito penal numa atitude bastante semelhante àquela adotada pelos soviéticos ao criarem o conceito de inimigos de classe Se consideraremse que o critério político da direito penal constitui a periculosidade então serão fatores pertinentes a presença e o objeto do ódio ter periculosidade do criminoso Um indivíduo que mate homossexuais por odiálos é mais perigoso que outro que mate o amante de sua esposa adúltera Não é porém mais perigoso do que alguém que mate prostitutas porque as odeia Caso a importância do objeto do crime para a periculosidade do criminoso seja levada totalmente em conta às preocupações não políticas que motivam a existência dos crimes motivados pelo ódio como categoria de classificação estará automaticamente garantida o que exclui a necessidade da classificação Num caso desses o uso da classificação para alterar a pena além de ser desnecessário é incoerente com a liberdade de pensamento Se dois crimes não diferem absoluta mente em periculosidade mas apenas pelo fato de que um deles é motivado por uma crença que as autoridades judiciais desaprovaram por exemplo a de que os homossexuais são um mal para a sociedade isso significa que punir esse crime com maior severidade equivale a punir uma crença e não um ato Comparamos duas pessoas que pratiquem a extorsão de homossexuais Suponhamos que a única diferença entre os dois seja que um deles age exclusivamente por dinheiro enquanto o outro age em parte por ódio aos homossexuais15 A extorsão exercida pelo primeiro extorsionário não se encaixa na definição de crime motivado pelo ódio enquanto aquela exercida pelo segundo se encaixa Punir o segundo com mais severidade significa punir com um grau de intensidade medido pela diferença de severidade entre a sua pena e a pena do primeiro chantagista uma opinião sobre homossexualidade As opiniões desencadeiam emoções que podem incitar à ação Conforme indica a teoria cognitiva da emoção quando um criminoso é punido mais severamente devido ao estado emocional em que se encontrava quando cometeu o crime na verdade podese estar punindo a cognição e portanto a opinião ou a crença e não apenas a emoção pura e simples A Suprema Corte rejeitou essa abordagem por considerar que os crimes de ódio causam mais danos que os outros crimes porque são mais passíveis de provocar crimes de retaliação infligir danos emocionais claros a suas vítimas e incitar a instabilidade social16 Mas do primeiro argumento aquele sobre a retaliação subentendese que quanto mais fraco for o grupo visado menos provável serão danos sossegarão analise da Corte me nte relativo à instabilidade social admitindose que não se trate apenas do primeiro ou do segundo argumentos enunciados de outra forma ele pode ser válido mas provavelmente apenas em relação aos crimes de negros contra brancos e viceversa os quais possuem de fato o potencial de exacerbar as tensões raciais existentes nos Estados Unidos que já são bastante intensas A questão levantada pela Corte sobre os danos emocionais claros também pode ter alguma validade17 mas provavelmente não tem nenhuma18 De qualquer modo tratase de uma justificativa vaga e grossalmente rejeita Será realmente mais penoso para uma pessoa sofrer uma agressão por ser membro de um grupo que seu agressor odeia do que por odiada como indivíduo Por exemplo o que é pior para um negro saber que seu filho tentou matálo porque odeia negros ou que seu filho tentou matálo para herdar seu dinheiro As respostas variarão conforme o caso e isso lança dúvidas sobre a capacidade que as categorias de crimes motivados pelo ódio teriam para identificar os crimes mais graves mesmo sem levar em conta a arbitrariedade dessas categorias e o fato de não constituírem uma necessidade urgente A questão do dano relativo pode ser facilmente tratada caso a caso ou em um critério não ideológico como uma determinação que se funde em um padrão que se funde para o pronunciamento de sentenças judiciais que prevê penas mais severas para os crimes praticados contra vítimas vulneráveis20 FRONT EIRAS DA TEORIA DO DIREITO 296 Note ainda o paradoxo de que penas mais duras para crimes motivados por ódio fazem menos sentido quando o crime é homicídio pois a vítima frequentemente desconhece os motivos do criminoso Na verdade esta muitas vezes não terá nenhum conhecimento prévio das intenções do assassino motivo pelo qual não incorrerá em sofrimento emocional algum ainda que isso possa acontecer com outros membros de seu grupo As leis que regulam os crimes motivados pelo ódio não reconhecem esse paradoxo Em resumo a objeção não é quanto a variar a severidade da pena de acordo com o dano sofrido pela vítima ou a da pena de acordo com o dano sofrido pela vítima ou a possibilidade de dissuasão do criminoso mas sim quanto a variar essa severidade por motivos de afirmação política ou ideológica ou o que frequentemente dá no mesmo para conciliar as pressões de grupos politicamente influentes A ideologia e a política de grupos de interesse não têm lugar em um sistema de justiça penal Ao rejeitar esse preceito os defensores da existência de leis que preveem crimes motivados por ódio estão brincando com fogo Não faz muito tempo que uma concepção política ou ideológica do papel do direito penal teria justificado menos e não mais proteção a negros homossexuais e outras minorias Os proponentes desse tipo de lei podem responder que naqueles tristes dias a aplicação do direito penal em defesa desses grupos costumava ser conduzida sem entusiasmo algum Isso é verdade Mas há uma diferença entre não proteger devidamente os indivíduos contra a hostilidade de outros indivíduos e transformar essa hostilidade em justificativa para penas mais severas A primeira prática é errada além de ser errada abre um perigoso precedente Isso não significa em absoluto que o ódio e as demais emoções do gênero como a aversão e a repulsa não devam ter lugar no direito penal Não devemos confundir o ódio a criminoso por parte do criminoso com o ódio ou a aversão ao A EM OÇÃO NO DIREITO 297 é um elemento ineliminável da justiça penal em pelo menos três aspectos Primeiramente a aversão está por trás da criminalização das condutas imorais que até onde se pode provar não causam danos concretos aos seres humanos como o entabulamento de relações sexuais com animais ou a prática de maustratos a estes a profanação de cadáveres e a nudez pública Em segundo lugar sob o regime de imposição da pena capital criado pela Suprema Corte um regime que essencialmente não prescreve padrão nenhum o ódio é um dos elementos que determinam a decisão de impor a pena de morte Em terceiro lugar mesmo quando as diretrizes para o pronunciamento de sentenças judiciais são usadas para cercear o poder discricionário dos juízes mediante a eliminação de uma série de fatores emocionais tanto os autores das diretrizes quanto os juízes em sua restante área de discricionariedade estão fadados a atentar para fatores emocionais como o remorso que aumentam ou diminuí o odiosidade do criminoso A aversão quando suficientemente disseminada constitui uma base tão sólida para a regulamentação jurídica quanto o dano tangível Negar isso ou seja sustentar que o único fundamento adequado para o direito penal ou qualquer esfera do direito é o utilitarismo ou alguma outra teoria moral significa superar tanto o papel apropriado quanto o papel efetivo do raciocínio moral nos códigos moral e penal Não é quando lhe falta uma base racional que a moral como princípio regulador tornase política ou ideológica num sentido desonroso mas sim quando não há consenso que a sustente Foi somente a desintegração do consenso moral sobre o caráter pernicioso da homossexualidade que fez das leis contra a sodomia um componente tão questionável da justiça penal norteamericana atual A defesa desse argumento é um gesto de solidariedade de minha parte para com a teoria expressiva da moralidade Um juízo moral é expressão de uma forte atração ou repulsa em relação ao comportamento avaliado A causa do furor emocional não precisa ter relação com nenhum motivo FRONT EIRAS DA TEORIA DO DIREITO 298 que algum moralista possa oferecer Sempre se podem oferecer motivos mas estes nunca deixam de ter um quê de racionalização Defender com argumentos o fato de que os pais devem ser proibidos de matar os filhos é compreender mal a questão Isso seria como dizer a alguém que considere o sexo uma prática repulsiva que não existem justificativas para sua repulsa Erigir todo o código penal sobre bases racionais significaria destruir totalmente nosso código moral21 Em nome da cláusula constitucional das penas cruéis ou incomuns a Suprema Corte proíbe que se faça da pena capital a punição automática ou mesmo presumtiva para classes específicas de atos O legislativo pode especificar as classes de atos que fazem do réu um candidato à pena capital mas o júri deve ter o direito de levar em conta o caráter desse réu ao tomar a decisão de impor ou não a pena A consequência disso é que nas audiências para determinar se a pena capital será imposta a discussão tende a girar em torno de quão odioso é o réu O advogado do réu tenta apresentálo como uma pessoa doente despojada do arrependimento enquanto o promotor tenta retratálo como algum perverso e sem remorsos Uma vez que a categoria moral da perversidade a categoria médica da loucura e a categoria sociopsicológica da destituição se sobrepõem parcialmente umas às outras e como muitos assassinos situamse nessa área de sobreposição muitas vezes o júri dispõe apenas dos próprios recursos quando lhe cabe decidir se decreta ou não a pena de morte Os juízes e os jurados desejam que os réus demonstrem remorso22 isto é que reconheçam que cometeram um delito e se arrependam do mal causado e de suas consequências para as vítimas Mas o remorso é um estado mental tão subjetivo que o sistema judiciário nunca consegue determinar com certeza se o réu está de fato com remorso ou se é apenas um indivíduo dotado de talento forense Além disso quanto mais ele admite a responsabilidade por seu ato demonstrando assim estar com remorso mais perversidade ele parece impingir ao ato e consequentemente ao agente ele próprio posto que retrata aquilo que fez como produto da própria vontade corrompida e não da influência de companheiros perversos de uma infância destituída de um vício ou de uma doença psiquiátrica Em um caso de pena capital com suas complicadas audiências de dupla às vezes se adotará uma estratégia de mão própria testemunho ao mesmo tempo que o especialista responsável por sua defesa apresentará provas de que ele está sendo demasiado duro consigo mesmo e que na verdade seu crime foi produto das circunstâncias não de uma vontade depravada Para aqueles que não importâncias do livrearbítrio como realidade metafísica a única importância do réu declararse arrependido está em mostrar que a postura dele não é de rebeldia franca contra o sistema jurídico algo que o tornaria mais perigoso tanto por transformarlo em um exemplo a ser seguido quanto por ser ter crimes quando saísse da prisão caso saísse Ao discutir os crimes motivados pelo ódio esforceime por defender que o direito penal se fundamente em um programa de ação cujo objetivo seja dissuadir ou normalmente pelo encarceramento impedir a imposição injustificada de dano material Posicioneime portanto contra o uso do direito como meio de imposição de ideias correntes acerca do comportamento politicamente correto ou como uma forma de tornar aleatória a imposição da pena capital Vêse contudo que é impossível levar longe demais essa concepção do devido alcance do direito penal dada a falta de justificativas práticas para algumas de nossas mais profundas ideias morais as quais desejamos incorporar ao direito O interesse recente pelo uso das penas de envergonhamento quase sempre na forma de diferentes modalidades de exposição pública como a exigência de que um condenado por agressão sexual coloque na frente de sua casa uma placa que o identifique como tal ou que pregue em seu carro um adesivo no qual se leia Fui condenado por agressão sexual ou a exigência de que indivíduos condenados por vandalismo limpem as calçadas usando roupas de presidiário põe em foco outra questão sobre a postura do direito diante da emoção em que casos o direito deve tentar induzir um estado emocional como componente da pena se é que o deve As penas de humilhação evocam uma longa história de punições públicas destinadas a humilhar e degradar o condenado bem como a amedrontar ou aterrorizar os espectadores Essa história parecia ter praticamente chegado ao fim com o surgimento das prisões no século XIX fenômeno em decorrência do qual hoje em dia as penas em geral são aplicadas se não em segredo total pelo menos longe do olhar do público O encarceramento entretanto tornouse tão dispendioso que ressurgiu o interesse pelas penas alternativas entre as quais se inclui a humilhação pública Uma vez que é possível levar as pessoas a experimentarem sofrimento emocional cuja imposição intencional a não ser por parte do Estado quando este pune criminosos é um ilícito civil as penas de envergonhamento constituem um meio de infligir desutilidade aos criminosos condenados Em vez de priválos da liberdade o Estado submeteos à humilhação Tal medida pode infligir a mesma desutilidade e assim obter o mesmo efeito dissuasivo do aprisionamento porém a um custo inferior A expressão penas de envergonhamento é relativamente imprecisa Em geral essas penas destinamse a humilhar não a envergonhar Uma pessoa sente vergonha quando seu grupo aquele que ela respeita e com o qual tem interesses comuns muitas vezes apenas seus parentes mais próximos descobre que ela se engajou numa conduta contrária às normas dele Como a exposição já gera vergonha não é preciso pôr orelhas de burro na pessoa O objeto das orelhas de burro é humilhante isto é transformar a pessoa em objeto de ridicularização e excreção pública Quando pressionado porém o partidário hodierno do envergonhamento tende a recuar e defender os métodos de exposição pública como o adesivo e a placa na frente da casa como suas formas preferidas de penas de envergonhamento Ora quanto mais a pena envolver apenas a exposição mais apropriado será o termo envergonhamento A humilhação também é um dos fatores envolvidos nesse processo mas não é o exagero representado pelas orelhas de burro Vale observar que há outra interpretação das penas de exposição pública segundo a qual o envergonhamento e a humilhação não são os objetivos desse tipo de punição A proteção legal à privacidade compromete a regulação por meio de normas sociais porque essa regulação depende de as violações dessas normas serem detectáveis pelos cidadãos comuns que são aqueles que excluem de seu grupo os cidadãos violadores aqueles que impõem a aplicação das normas A supressão da privacidade é pois um método lógico quando se procura aumentar a eficácia das normas no controle comportamental Contudo entre as conseqüências dessa supressão estão a vergonha e a humilhação mesmo quando estas não são intencionais26 Apesar do custo ínfimo das penas de envergonhamento de humilhação ou de exposição pura e simples existem muitas objeções a sua aplicação Uma delas é a de que numa sociedade em que mais da metade dos crimes cujos perpetradores foram descobertos é cometida por negros e hispânicos e na qual não obstante o sistema de justiça penal é predominantemente branco e anglosaxão uma política de imposição de penas de humilhação aos criminosos tende a exacerbar tensões raciais e étnicas já muito graves Outra questão é a da insensibilidade a função expressiva ou de sinalização da pena Um dos importantes sinais que a pena tem por função emitir em nossa cultura é o respeito das autoridades públicas pela dignidade inclusive pela dignidade dos mais baixos dentre os mais baixos isto é os criminosos odiosos É por isso que a injeção letal não consiste numa injeção de veneno para criminosos Na sociedade norteamericana os criminosos não são como na sinistra expressão de Carl Schmitt o inimigo interno que deve ser tratado com toda a consideração que conquistam os inimigos estrangeiros Eles são membros da comunidade Tratálos como menos que isso como crianças ou animais significa introduzir na sociedade o tipo de pensamento antagonizante que como sugere a história27 pode levar a condições carcerárias bárbaras à justiça sumária e a punições cruéis Não há nada de mal em os cidadãos privados odiarem os criminosos Mas aqueles que trabalham no sistema de justiça penal não devem odiálos ou pelo menos não devem expressar ódio a eles Outra objeção que se pode fazer às penas de envergonhamento é a de que enquanto a ameaça de aprisionamento desestimula o crime o aprisionamento em si só impede o crime na medida em que o transgressor permanece na prisão Esse efeito preventivo se perde quando todo o período de encarceramento ou parte dele é substituído pela humilhação pública Se não houver substituição ou seja se a pena de envergonhamento for acrescida ao período de prisão para aumentar o rigor da condenação não haverá economia de custos ainda que possa haver um ganho em termos de dissuasão Quanto ao efeito preventivo este talvez não se perca totalmente A placa diante da casa do agressor sexual serve não apenas para humilhálo Também funciona como uma advertência para que vítimas em potencial fiquem longe dele Mas o efeito preventivo será menor que o da prisão a menos que o período obrigatório de exposição da advertência seja consideravelmente maior que o período de encarceramento do qual este é um substituto pois nem todas as vítimas em potencial ficarão sabendo da existência da placa ou tomarão as devidas precauções em decorrência da advertência Isso implica que a pena de envergonhamento mais eficiente é aquela que se acrescenta ao final do período normal de encarceramento Porém repetindo nesse caso não se faz economia alguma dos custos carcerários exceto na medida em que o efeito de exposição pública da pena de envergonhamento reduz a reincidência ou aumente a dissuasão isto é exceto na medida em que tornando as penas mais severas a pena de envergonhamento reduz a criminalidade e desse modo também o custo total do encarceramento de criminosos O aumento do período de encarceramento pode ter o mesmo efeito pois é um erro imaginar que o maior alongamento desses períodos aumente a população carcerária Imaginar isso é ignorar o efeito dissuasivo da simples ameaça de prisão Se por exemplo um aumento de 1 na duração das sentenças de prisão levasse a um decréscimo de 2 na incidência de crimes então se nada mais mudasse a população carcerária diminuiria em mais ou menos 1 Suponhamos que numa época e antes do aumento das condenações a prisão o número de criminosos seja 200 que metade deles 100 seja presa e condenada e que o período médio de encarceramento seja de 100 meses de modo que o total de meses de permanência de prisioneiros na prisão que deve ser previsto no orçamento do sistema carcerário seja de 10 mil Se no período e 1 devido ao efeito dissuasivo das sentenças de prisão mais longas existem somente 196 criminosos 2 a menos dos quais novamente metade 98 é presa e condenada e cada um cumpre 101 meses o total de meses de prisão cairá de 10 mil para 9898 A última objeção apresentada é a de que se houver maior variação de indivíduo para indivíduo na desutilidade derivada das penas humilhantes do que na desutilidade derivada das penashumildade será mais difícil ajustar com precisão a perda da liberdade à pena de humilhação É ainda mais provável que isso aconteça se esse tipo de pena assumir mais de uma forma de aplicação complexos ou seja aqueles do tipo que os computadores ainda não são capazes de resolver pode exigir a participação de emoções como a fascinação o prazer e o orgulho Lembramonos daquilo que afirmei anteriormente sobre o caráter indispensável da emoção para a tomada de decisões Não obstante algumas das mais fortes emoções como a raiva a repulsa a indignação e o amor não teriam lugar nesse caso Elas não somente interfeririam no processo de solução de problemas em vez de representarem atalhos eficientes como também introduziriam distorções substanciais no direito ao privarem as pessoas de remédios judiciais aos quais estas teriam direito por uma questão jurídica O juiz designado para julgálo reflita corretamente sobre os problemas em pauta ou então pode leválo por mais lúcido que seja a tomar uma decisão injusta Os casos que apresentam questões jurídicas de difícil litígio mas por serem complexas do ponto de vista analítico não podem obviamente ser decididos sem o concurso dos sentimentos morais e das preferências políticas Nesses casos parece que a presença de uma gama de emoções mais rica seria apropriada ou pelo menos inevitável Até certo ponto isso é verdade sobrentudo para alguém como eu que defende uma concepção essencialmente emocional da moral Mas não se pode negar o perigo do excesso de emocionalidade na decisão de um caso difícil Quanto mais que os fatores decisórios mais fraca será a resistência à emoção objetivos no sentido de inafetivos oferecerão a emoção inadequada A maioria das pessoas conse gue somar dois e dois corretamente seja qual for seu estado emocional Mas quando o desafio intelectual é maior também aumenta o perigo de que a emoção sugestione a reação Este é um dos motivos que levaram à criação das normas destinadas a limitar o envolvimento emocional do juiz nos casos que exigem essa participação como aquela que o proíbe de participar de um caso no qual um parente seu também participe como uma das partes ou como advogado ou no qual ele tenha algum interesse financeiro Mesmo nos casos fáceis o juiz ou jurado para tomar uma decisão bem fundamentada pode ter de recorrer a um número de emoções maior que aquele necessário ao desempenho de qualquer tarefa não algorítmica Mais especificamente podem ser necessárias a indignação e a empatia A indignação é a reação normal do indivíduo a uma violação do código moral da sociedade em que ele vive e o que é mais importante ainda ela é muitas vezes o modo pelo qual se identifica uma violação Como sugeri ao discutir os fundamentos emocionais das agressões morais geralmente é difícil apresentar uma definição racional convincente de uma regra moral inclusive de uma regra moral à qual o direito tenha vinculado uma sanção por sua violação A veracidade dessa constatação independe de se a regra é contra urinar ficar nu ou masturbarse em público contra a pedofilia contra a poligamia contra o infanticídio a favor ou contra o aborto contra a eutanásia involuntária contra o entabulamento de relações sexuais com animais ou cadá veres contra os maustratos de animais contra a gladiatura contra a prostituição e a obscenidade contra os jogos de azar contra a autoescravização contra as execuções públicas contra a mutilação como forma de pena contra o estado mental de algumas substâncias que alteram o estado mental da pessoa mas não outras ou contra algumas formas de discriminação mas não outras Nós só sa bemos que urinar em público é incorreto porque nos re são expressão de emoções pertinentes e indefiníveis Além disso muitas dessas convicções não racionais estão incor poradas ao direito e são impostas a pessoas que não com formidade com elas porque derivam utilidade da conduta proibida pela norma jurídica Portanto levo tão a sério a importância da emoção como fator cognitivo que reluto em atribuir à razão o papel de um tribunal que passa em revista as emoções e decide quais delas o direito deve encorajar a tolerância talvez mas não a repulsa A pedra angular de muitas de nossas regras morais é a emoção e não uma razão avaliadora de emoções Suponhamos que se contestasse diante de um juiz total mente racional uma regra moral que tenha por objetivo como é o caso de muitas delas vincular sanções à violação de um regra moral cuja vigência não encontre nenhuma justificativa do ponto de vista do funcionamento da société Esse juiz teria dificuldade para rejeitar a contestação pois não conseguiria apresentar nem granjear motivos convincentes para a existência da regra do ponto de vista racion al Para ele a regra digamos contra o infanticídio cometido pela mãe pareceria arbitrária ao passo que uma pessoa dotada de atributos emocionais normais rejeitaria a contes tação de imediato pois suas emoções a fariam agir dessa forma Esta é a reação correta para quem como eu consid erar que não faz parte do papel dos juízes demolir o código moral de sua sociedade ou o que seria quase a mesma coisa insistir na concepção de justificativas convincentes para esse código Outra emoção que é importante que o juiz sinta quan do este se vir diante de um caso impossível de ser decidido mediante um raciocínio puramente formalista é a empatia ou o sentimento de solidariedade A empatia é um dos me lhores exemplos do caráter cognitivo da emoção O ele mento cognitivo da empatia consiste na reconstituição imagi nativa da situação de outra pessoa enquanto seu elemento afetivo que a caracteriza como uma emoção e não apenas julgar está em chamar a atenção do juiz para os interesses das partes ausentes ou em outras palavras as palavras da psicologia cognitiva que é tema do próximo capítulo combater a heurística da disponibilidade Esta pode ser definida como a tendência já vista de relance no início da discussão sobre a emocionalidade a atribuir excessiva importância às impressões vívidas e imediatas como aquilo que se vê em detrimento daquilo que se narra e desse modo dar atenção demasiada aos sentimentos aos interesses e à qualidade humana das partes presentes no tribunal e muito pouca às pessoas ausentes suscetíveis de serem afetadas pela decisão A heurística da disponibilidade é apenas uma das distorções do raciocínio há uma longa lista delas identificadas pelos psicólogos cognitivos Nem todas elas envolvem as emoções A aparência retorcida de um graveto reto quadrado na água é um exemplo de uma distorção perceptiva que nada tem a ver com a emoção ou a emocionalidade A heurística da disponibilidade transpoe a linha que separa o emocional do puramente cognitivo e é responsável por vários truques da memória que nada devem à emocionalidade e é desencadeada pela carga emocional de uma das características de determinada situação é adequado enxergála como exemplo de um choque entre a emoção e a razão Seu modo de funcionamento é ilustrado pelo debate sobre o essencial de formação se tornasse comum a heurística favorecia os defensores do direito de aborto pois estes podiam contar histórias impressionantes e até mostrar fotos de mulheres mortas em decorrência e até mostrar fotos de mulheres mortas em decorrência e até mostrar fotos de mulheres com o assassinato que faça um pedido eloquente de clemência quando a vítima encontrase impossibilitada de contraargumentar por estar morta seja na forma de um excessivo pendendo em favor dos direitos dos inquilinos esquecendose os juízes do efeito disso sobre o valor do aluguel que outros inquilinos terão de pagar quando os locadores repassarem a eles na forma de aluguéis mais caros uma fração provavelmente alta da elevação dos custos de locação gerada pelas decisões do judiciário seja ainda na forma de uma concessão de isenção fiscal a uma empresa em dificuldades ignorando o fato de que outras empresas pagarão impostos mais altos em decorrência disso e repassarão uma parte desse custo adicional aos consumidores Não é preciso ter muita empatia para se deixar levar pelos argumentos de um litigante quando seu advogado é competente e está ali discorrendo na sua frente O desafio para a imaginação empática do juiz está em comoverse ao pensar ou ler sobre as consequências do litígio para os indivíduos que dele não participam estes em geral são totalmente desconhecidos ou nem sequer nasceram ainda e que serão afetados por sua decisão A abordagem econômica do direito é empática porque embora nela não se exponham abertamente sentimentos e emoções na verdade justamente por causa disso ela insere no processo decisório os interesses distantes porém importantes somatório total de pessoas que não são aquelas presentes no tribunal como por exemplo as futuras vítimas dos assassinos os futuros candidatos a inquilino os futuros contribuintes e os futuros consumidores Como afirma Ângelo que faz o papel de juiz na peça Medida por medida de Shakespeare em resposta ao pedido de Isabela para que ele tenha piedade de seu irmão É o que faço acimada de tudo ao dar mostras de justiça Pois então sou piedoso com aqueles que não conheço E que por certo sofreriam por um crime não punido Não é preciso haver tensão entre a imparcialidade e a empatia do juiz Imparcialidade não é frieza quando envolve a criação de um distanciamento emocional entre o juiz e as partes ou as testemunhas além de outros em sua presença a fim de abrir espaço a uma reconstituição imaginativa dos sentimentos e interesses das pessoas ausentes nativa dos sentimentos e interesses das pessoas ausentes potencialmente afetadas pela decisão do juiz O nome dado a esse distanciamento empático no sistema jurídico é indole judicial Quando um juiz fica tão emocionalmente envolvido nas circunstâncias diretas do caso a ponto de não conseguir enxergar os interesses das partes ausentes dele se diz que carece de índole judicial Dentro os exemplos recentes o mais famoso é o do falecido juiz Harry Blackmun da Suprema Corte Não há um nome oficial para o juiz que demonstre o tipo oposto de emocionalismo isto é um Estranho orgulho por manter uma indiferença total e desumana para com as partes do litígio Mas de qualquer modo ninguém admira esse tipo de juiz Portanto seria um equivoco dizer que os bons juízes são menos emocionais que as outras pessoas Ocore apenas que em seu trabalho eles empregam um conjunto de emoções diferente daquele que se considera apropriado empregar na vida pessoal e em outros contextos vocacionais O domínio não apenas é uma emoção como é uma emoção forte uma vez que funciona como uma forma de controlar as emoções exageradas
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7 A emoção no direito Como vimos de relance no Capítulo 1 existem duas concepções básicas de economia Uma delas concentrase sobre o conteúdo e considera a economia como o estudo dos mercados enquanto a outra se concentra sobre o método e vê a economia como a aplicação do modelo do agente racional ao comportamento humano Os adeptos da segunda concepção talvez pareçam estar em rota de colisão com a psicologia cujo enfoque incide sobre os componentes não racionais e irracionais do comportamento humano Os psicólogos defendem a tese bastante plausível de que o comportamento humano é caracteristicamente não racional e afirmam que o homem racional da economia raramente é encontrado no mundo real mesmo nas economias de mercado e sem dúvida muito raramente fora destas Nesta parte do livro e até certo ponto também na próxima examino tal afirmação como parte de um interesse mais vasto acerca daquilo que a psicologia pode ter a oferecer para a compreensão e o aperfeiçoamento do direito Em minha opinião ela tem muito a oferecer e essa contribuição é em grande medida coerente com o modelo racional Pensemos por exemplo no assassinato de um cônjuge adúltero no sequestro de um filho pelo cônjuge ao qual se negou a custódia da criança ou no ativista dos direitos dos animais que joga uma lata de tinta num casaco de pele Outros tipos de comportamento são espantosamente desatentos de emoção o assassinato a sanguefrio Outros por sua vez despertam as emoções das pessoas que ouvem falar do incidente ou leem sobre este geralmente sentimentos de solidariedade para com a vítima de um crime ou de um ilícito civil e de indignação com o agressor mas às vezes de solidariedade para com o agressor como nos casos de assassinatos cometidos por mulheres fisicamente agredidas pelo marido O direito em si costuma ser visto como uma fortaleza da razão concebida como antítese da emoção O direito é compreendido como uma entidade cuja função é neutralizar a emotividade que as disputas jurídicas despertam nas partes envolvidas e nos observadores leigos No entanto qualquer pessoa que já se tenha envolvido em litígios na condição de litigante advogado juiz jurado ou testemunha sabe que esse método isto é o método de resolução de disputas jurídicas por excelência é um processo intensamente emocional e bastante semelhante aos violentos métodos de resolução de disputas que ele substitui O caráter emocional dos atos regulados pelo direito e os modos como o direito reage a essa emotividade levantam uma série de questões no que concerne ao sistema jurídico Neste capítulo abordarei cinco dessas questões Primeiramente como o fato de um ato ilícito ser precipitado por uma emoção deve afetar a apreciação jurídica de tal ato O fator emocional deve levar o direito a ser mais severo ou mais brando com o transgressor Discuto essa questão particularmente em relação às leis que regem os crimes motivados pelo ódio e à provocação como fator atenuante da pena A segunda questão consiste em saber se e como o direito deve usar a emoção Já a terceira consiste em saber qual deve ser o estado emocional das pessoas envolvidas na prática judicial sejam elas juízes jurados promotores Em caso negativo de que modo exatamente a emoção deve integrar seus julgamentos Em quarto lugar que critérios de seleção devem ser empregados para assegurar que os indivíduos envolvidos na prática judicial servemse no devido estado emocional seja o que for exatamente que tal coisa signifique quando no desempenho de seus deveres Em quinto lugar de que forma o direito pode impedir que o fator emocional presente nos litígios frustre os esforços para que as partes entrem em acordo antes de o processo chegar ao fim Para responder a essas questões podemos buscar auxílio na teoria cognitiva da emoção que começou com Aristóteles e nos últimos anos foi aprofundada por filósofos e psicólogos Em desafio àquilo que a despeito de filósofos e tese tornarase não apenas no campo do direito uma antitese profundamente convencional entre racionalidade e emoção esses teóricos modernos afirmam que a emoção é uma forma de cognição e isso não apenas no sentido óbvio de que as reações emocionais geralmente são deflagradas por informações mas também no sentido de que um sentimento expressa uma avaliação da informação o que lhe permite funcionar como substituto do raciocínio no sentido usual desse termo Por exemplo quando reagimos com raiva ao tomarmos conhecimento de algum escândalo a reação exprime desaprovação uma avaliação à qual poderíamos ter chegado através de um processo gradual de raciocínio A função avaliadora da emoção implica que o fato de não se reagir a uma situação específica mediante um sentimento específico pode demonstrar não uma capacidade superior de raciocinar mas sim uma falta de compreensão ou no caso de sentimentos morais como a compaixão e a indignação uma rejeição do código moral da sociedade Assim reações emocionais específicas em situações específicas podem muitas vezes ser elogiadas por serem apropriadas ou criticadas por serem impróprias quer por serem suscitadas pela desinformação quer por se basearem numa avaliação perversa da situação Outra objeção ao estabelecimento de uma dicotomia entre razão e emoção é a de que essa prática pressupõe equivocadamente a existência de uma luta entre os elementos motivacionais e não motivacionais da personalidade A razão não é com o devido respeito a Kant motivacional Para que se pratique uma ação dois fatores têm de se unir a consciência de qual é a coisa certa a fazer e o desejo de fazêla Quando dizemos que uma pessoa não se deixou levar pela emoção por exemplo quando ela resistiu ao impulso de comer uma barra de chocolate queremos dizer que uma emoção de aversão autocontrole ou seja a aversão a não ter força de vontade foi mais forte do que a emoção de atração com a emotividade Por mais enganadora que seja a dicotomia entre razão e emoção capta uma verdade importante Todos nós já passamos pela experiência de cometer erros por orgulho raiva ou outras emoções A emoção embora seja um método eficiente de cognição em alguns casos é ineficiente em outros Ela passa por cima da razão concebida como um processo consciente e articulado de deliberação cálculo análise ou reflexão Às vezes isso é bastante positivo pois a emoção aumenta a concentração clarifica a avaliação e nos leva a agir em circunstâncias nas quais a reflexão seria interminável inconsistente e inconclusiva Porém nas situações em que tornar uma decisão inteligente requer análise ou reflexão criteriosa e sequencial a emoção pode sobreporse a esse processo e levar a uma decisão de qualidade inferior O amor é particularmente famoso por levar a juízos equivocados assim como acontece com o medo e a raiva Esta última estimula um pensamento egocêntrico e polarizado que obscurece aspectos pertinentes da situação que a provocou Todavia seria mais preciso dizer que o excesso de emoção ou o tipo errado de emoção pode levar a uma decisão inferior Pois como argumentarei mais adiante ao tratar da influência do fator emocional nas decisões dos juízes a emoção é necessária para tornar mais ágil qualquer decisão que não seja meramente a conclusão de um raciocínio silogístico ou puramente formal ou seja do tipo de raciocínio lógico que um computador é capaz de realizar melhor que um ser humano A decisão é uma forma de ação e não existe ação sem emoção Na prática quando afirmamos que uma pessoa é emotiva ou que o julgamento de uma pessoa é deturpado pelo sentimentalismo queremos dizer que ela deu uma ênfase indevida a uma das características de uma situação e ao estímulo emocional a esta associado negligenciando outras características importantes Assim podemos chamar de emotivo um juiz que de tão influenciado pelos terríveis danos infligidos ao demandante de um caso de responsabilidade civil tornese incapaz de enxergar outros aspectos juridicamente pertinentes do caso É de esperar que os juízes dos tribunais recursais sejam menos emotivos nesse sentido que os juízes de primeira instância pois estão mais distantes dos elementos emocionais mais evidentes dos casos Eles não lidam pessoalmente com as partes e as testemunhas mas somente com os advogados com os autos do processo em primeira instância e outros documentos e às vezes com fotos Portanto a forma do processo de recurso pode ser vista como uma reação ao perigo do emocionalismo entendido como a atribuição de importância excessiva a um aspecto mais saliente de uma situação complexa Na vida cotidiana reagimos a esse perigo através de várias estratégias pessoais por exemplo a tentativa de controlar nossa raiva de modo que ela não nos leve a cometer atos apressados e irrefletidos dos quais nos arrependeríamos rapidamente A ideia da emoção como um atalho cognitivo explica por que os jurados assim como as crianças tendem a fazer julgamentos mais emocionais do que aqueles dos juízes Quanto menos experiência uma pessoa tiver em resolver seus problemas por meio do raciocínio mais ela tenderá a reagir emocionalmente isto é a recorrer a uma estratégia emocional para chegar a uma conclusão qual seja a tido bastante literal As emoções como o sexo são uma característica que temos em comum com os outros animais Estes por terem o córtex menor que o dos seres humanos recorremse mais intensamente que nós às emoções para orientaremse em suas ações Além disso o fato de as emoções serem discerníveis nas crianças mais novas é mais inata Assim como outras partes do nosso patrimônio animal ou natural por oposição ao cultural o conjunto de emoções de que somos dotados provavelmente era bem adaptado às condições de nosso ambiente ancestral Esse termo é usado pelos biólogos evolucionistas para descrever o período préhistórico durante o qual os seres humanos evoluíram até chegar a uma configuração biológica essencialmente similar à atual Mas nosso repertório emocional hoje Esta é uma razão para nos preocuparmos com o fato de que às vezes as emoções podem nos tirar do bom caminho Isso ocorre por exemplo quando tomamos precipitamente uma decisão que devido à complexidade essa que talvez não fosse rara mais bem tomada se raciocinássemos mais cuidadosamente e tivéssemos mais paciência determinado tipo de comportamento regulamentado pelo direito está fadada a depender do propósito da modalidade de direito que o rege Tomemos o direito penal Presumamos que seu propósito básico seja o de limitar as atividades perigosas Nesse caso para sabermos como se deve tratar a emoção no âmbito dessa esfera do direito devemos relacionar a emoção à periculosidade Obviamente essa relação varia tanto de um crime para outro quanto no âmbito de cada crime No caso do homicídio a presença de emoções fortes tende a atenuar a periculosidade do criminoso enquanto a ausência destas tende a agravála A pessoa que comete um assassinato a sanguefrio um indivíduo psicopata ou insensível como um assassino de aluguel por exemplo é particularmente perigosa Sua propensão ao assassínio não se restringe àquelas raras situações em que a aversão natural a matar desaparece como no caso do maior dos crimes passionais Além disso graças a sua frieza será mais fácil para ele armar estratégias que lhe permitam evitar a prisão PODE PARECER que quanto mais emocional for o crime mais e não menos severa deve ser a pena uma vez que pode ser necessária uma ameaça maior de punição para dissuadir os candidatos a criminosos em tais circunstâncias Mas isso não está correto e não está por dois motivos Em primeiro lugar o fato de que é mais fácil apanhar um criminoso que é movido pela emoção bem como o fato de que é menos arriscado que esse tipo de criminoso repita o crime já que este é específico de dada situação cuja recorrência é improvável tende a compensar a necessidade de intensificar a pena para assegurarse a dissuasão e a neutralização do criminoso Em segundo lugar a maioria dos crimes passionais contêm um elemento de provocação por parte da vítima o que pode servir de motivo para uma pena mais branda impedir a ocorrência de crimes quer pela dissuasão quer por qualquer outro meio Nem todos aceitarão que seja esse o objetivo do direito penal Mas minha ideia geral ainda assim se sustenta não se pode esperar que o direito seja categoricamente a favor ou categoricamente contra a emoção ou a emocionalidade Sou levado a questionar se deveria haver uma categoria específica de crimes motivados pelo ódio que fossem punidos mais duramente que seus equivalentes não motivados pelo ódio Como acontece com a maioria das emoções o ódio é moralmente neutro Sua valência moral depende de seu objeto A menos que se seja o tipo de rigidista cristão que leva o Sermão da Montanha ao pé da letra isto é como fonte de orientação para a vida neste mundo e não conforme era sua intenção como uma forma de preparação para a vida num outro reino cuja vinda se considera iminente a ninguém ocorrerá que seja imoral odiar Hitler ou Stalin Eu acrescentaria tão longe estou de ser um rigorista moral que não considero imoral odiar criminosos fornicadores fanfarrões ou mesmo indigentes estes hoje em dia pelo menos nos países mais ricos em geral não passam de vigaristas embora eu considere errado os representantes do poder público sobretudo os juízes quando no exercício de sua função odiarem quem quer que seja Os crimes passionais muitas vezes são motivados pelo ódio à vítima e ainda assim a emocionalidade do ato é adequadamente vista como um fator atenuante quando indica que é improvável que o ato se repita por ter sido este deflagrado por uma conjunção de circunstâncias que dificilmente voltará a ocorrer Com o termo crimes motivados pelo ódio pretendo definir algo bastante específico que o objeto do ódio do criminoso é 1 um grupo não um indivíduo 2 cujos membros não são fora da lei porque se o fossem não seria criminoso me vitimálos Pode ser válido aumentar a severidade da pena nessas circunstâncias ainda que a matéria do direito penal seja unicamente a periculosidade Em primeiro lugar algumas vezes o criminoso cujo alvo é um grupo e não um indivíduo pode ser mais perigoso que o criminoso comum pelo fato de ter mais pessoas em vista por assim dizer Esse argumento é dúbio porque não faz distinção entre o indivíduo que pratica um crime motivado pelo ódio e digamos o sujeito que arromba casas para quem qualquer proprietário ou ocupante de uma residência ou de um estabelecimento comercial é uma vítima em potencial Um argumento melhor é o seguinte Se os membros de determinados grupos como os negros do Sul dos Estados Unidos durante a época em que eram correntes as práticas discriminatórias em relação aos negros tendem menos do que outras vítimas a denunciar os crimes praticados contra eles ou a receber proteção efetiva da polícia e dos outros agentes de imposição da lei os criminosos qualquer que seja o estado emocional destes encarregarão no ato de vitimálos uma pena mais severa Em terceiro lugar o que justifica uma mais severas quando o dano psicológico infligido à vítima pertence ou então se o crime impõe um custo emocional maior do que aquele que um crime de motivação diversa mas semelhante sob outros aspectos imporia às pes soas temerosas de se tornaremse vítimas de crimes ou ainda a impulsividade de um crime motivado pela raiva muitas vezes facilita a captura do criminoso e transformase assim numa justificativa para penas mais leves O criminoso frio com sua maior presença de espírito tende a adotar estratégias mais eficientes para não ser descoberto Sem dúvida a raiva muitas vezes acompanha o ódio e viceversa mas nem sempre A distinção entre raiva e ódio nos ajudará a distinguir entre três tipos de perpetradores de crimes motivados pelo ódio os fanáticos com sanguefrio os menores impulsivos que na verdade são responsáveis pela maioria dos crimes desse tipo e o criminoso profundamente emocional símbolo do homofóbico que patologicamente angustiado com sua própria identidade sexual mata um homossexual que lhe passa uma cantada A última dessas categorias levanta a questão de saber se a provocação não deveria justificar penas mais leves para muitos dos crimes motivados pelo ódio o assassinato homofóbico é um crime passional e como tal é circunstancial Mas também se assemelha ao assassinato de prostitutas em relação direta como ocorreria com o assassinato de um cônjuge adúltero Em contrapartida os menores impulsivos podem ser mais passíveis de dissuasão do que o homofóbico pois seu envolvimento emocional é menos profundo ou ao contrário eles podem ser menos passíveis de dissuasão devido à emocionalidade da juventude Embora os crimes motivados pelo ódio possam ser em geral mais perigosos que outros crimes semelhantes mas não motivados pelo ódio a um grupo aqueles que defendem penas mais rígidas para esses crimes não insistem em vinculálas a uma periculosidade maior O exemplo clássico de crime motivado pelo ódio é o assassinato de prostitutas como no caso de Jack o Estripador e seus inúmeros imitadores A ideia de punir esses assassinatos com mais severidade que os assassinatos normais pode ser defendida tão tomandose como referência a periculosidade relativa Todavia não é isso que os defensores de penas mais duras para os crimes motivados pelo ódio têm em mente quando usam o termo O significado que esses indivíduos lhe atribuem é o de crimes contra membros de grupos para com os quais eles têm especial solicitude como negros judeus e homossexuais13 As leis relativas aos crimes motivados pelo ódio demonstram o impacto da política da identidade sobre o direito penal14 Ao definirem os crimes motivados pelo ódio tomandose como referência grupos privilegiados esses indivíduos desfaçam a relação entre os crimes motivados pelo ódio a determinados grupos e a periculosidade Desse modo misturam política e direito penal numa atitude bastante semelhante àquela adotada pelos soviéticos ao criarem o conceito de inimigos de classe Se consideraremse que o critério político da direito penal constitui a periculosidade então serão fatores pertinentes a presença e o objeto do ódio ter periculosidade do criminoso Um indivíduo que mate homossexuais por odiálos é mais perigoso que outro que mate o amante de sua esposa adúltera Não é porém mais perigoso do que alguém que mate prostitutas porque as odeia Caso a importância do objeto do crime para a periculosidade do criminoso seja levada totalmente em conta às preocupações não políticas que motivam a existência dos crimes motivados pelo ódio como categoria de classificação estará automaticamente garantida o que exclui a necessidade da classificação Num caso desses o uso da classificação para alterar a pena além de ser desnecessário é incoerente com a liberdade de pensamento Se dois crimes não diferem absoluta mente em periculosidade mas apenas pelo fato de que um deles é motivado por uma crença que as autoridades judiciais desaprovaram por exemplo a de que os homossexuais são um mal para a sociedade isso significa que punir esse crime com maior severidade equivale a punir uma crença e não um ato Comparamos duas pessoas que pratiquem a extorsão de homossexuais Suponhamos que a única diferença entre os dois seja que um deles age exclusivamente por dinheiro enquanto o outro age em parte por ódio aos homossexuais15 A extorsão exercida pelo primeiro extorsionário não se encaixa na definição de crime motivado pelo ódio enquanto aquela exercida pelo segundo se encaixa Punir o segundo com mais severidade significa punir com um grau de intensidade medido pela diferença de severidade entre a sua pena e a pena do primeiro chantagista uma opinião sobre homossexualidade As opiniões desencadeiam emoções que podem incitar à ação Conforme indica a teoria cognitiva da emoção quando um criminoso é punido mais severamente devido ao estado emocional em que se encontrava quando cometeu o crime na verdade podese estar punindo a cognição e portanto a opinião ou a crença e não apenas a emoção pura e simples A Suprema Corte rejeitou essa abordagem por considerar que os crimes de ódio causam mais danos que os outros crimes porque são mais passíveis de provocar crimes de retaliação infligir danos emocionais claros a suas vítimas e incitar a instabilidade social16 Mas do primeiro argumento aquele sobre a retaliação subentendese que quanto mais fraco for o grupo visado menos provável serão danos sossegarão analise da Corte me nte relativo à instabilidade social admitindose que não se trate apenas do primeiro ou do segundo argumentos enunciados de outra forma ele pode ser válido mas provavelmente apenas em relação aos crimes de negros contra brancos e viceversa os quais possuem de fato o potencial de exacerbar as tensões raciais existentes nos Estados Unidos que já são bastante intensas A questão levantada pela Corte sobre os danos emocionais claros também pode ter alguma validade17 mas provavelmente não tem nenhuma18 De qualquer modo tratase de uma justificativa vaga e grossalmente rejeita Será realmente mais penoso para uma pessoa sofrer uma agressão por ser membro de um grupo que seu agressor odeia do que por odiada como indivíduo Por exemplo o que é pior para um negro saber que seu filho tentou matálo porque odeia negros ou que seu filho tentou matálo para herdar seu dinheiro As respostas variarão conforme o caso e isso lança dúvidas sobre a capacidade que as categorias de crimes motivados pelo ódio teriam para identificar os crimes mais graves mesmo sem levar em conta a arbitrariedade dessas categorias e o fato de não constituírem uma necessidade urgente A questão do dano relativo pode ser facilmente tratada caso a caso ou em um critério não ideológico como uma determinação que se funde em um padrão que se funde para o pronunciamento de sentenças judiciais que prevê penas mais severas para os crimes praticados contra vítimas vulneráveis20 FRONT EIRAS DA TEORIA DO DIREITO 296 Note ainda o paradoxo de que penas mais duras para crimes motivados por ódio fazem menos sentido quando o crime é homicídio pois a vítima frequentemente desconhece os motivos do criminoso Na verdade esta muitas vezes não terá nenhum conhecimento prévio das intenções do assassino motivo pelo qual não incorrerá em sofrimento emocional algum ainda que isso possa acontecer com outros membros de seu grupo As leis que regulam os crimes motivados pelo ódio não reconhecem esse paradoxo Em resumo a objeção não é quanto a variar a severidade da pena de acordo com o dano sofrido pela vítima ou a da pena de acordo com o dano sofrido pela vítima ou a possibilidade de dissuasão do criminoso mas sim quanto a variar essa severidade por motivos de afirmação política ou ideológica ou o que frequentemente dá no mesmo para conciliar as pressões de grupos politicamente influentes A ideologia e a política de grupos de interesse não têm lugar em um sistema de justiça penal Ao rejeitar esse preceito os defensores da existência de leis que preveem crimes motivados por ódio estão brincando com fogo Não faz muito tempo que uma concepção política ou ideológica do papel do direito penal teria justificado menos e não mais proteção a negros homossexuais e outras minorias Os proponentes desse tipo de lei podem responder que naqueles tristes dias a aplicação do direito penal em defesa desses grupos costumava ser conduzida sem entusiasmo algum Isso é verdade Mas há uma diferença entre não proteger devidamente os indivíduos contra a hostilidade de outros indivíduos e transformar essa hostilidade em justificativa para penas mais severas A primeira prática é errada além de ser errada abre um perigoso precedente Isso não significa em absoluto que o ódio e as demais emoções do gênero como a aversão e a repulsa não devam ter lugar no direito penal Não devemos confundir o ódio a criminoso por parte do criminoso com o ódio ou a aversão ao A EM OÇÃO NO DIREITO 297 é um elemento ineliminável da justiça penal em pelo menos três aspectos Primeiramente a aversão está por trás da criminalização das condutas imorais que até onde se pode provar não causam danos concretos aos seres humanos como o entabulamento de relações sexuais com animais ou a prática de maustratos a estes a profanação de cadáveres e a nudez pública Em segundo lugar sob o regime de imposição da pena capital criado pela Suprema Corte um regime que essencialmente não prescreve padrão nenhum o ódio é um dos elementos que determinam a decisão de impor a pena de morte Em terceiro lugar mesmo quando as diretrizes para o pronunciamento de sentenças judiciais são usadas para cercear o poder discricionário dos juízes mediante a eliminação de uma série de fatores emocionais tanto os autores das diretrizes quanto os juízes em sua restante área de discricionariedade estão fadados a atentar para fatores emocionais como o remorso que aumentam ou diminuí o odiosidade do criminoso A aversão quando suficientemente disseminada constitui uma base tão sólida para a regulamentação jurídica quanto o dano tangível Negar isso ou seja sustentar que o único fundamento adequado para o direito penal ou qualquer esfera do direito é o utilitarismo ou alguma outra teoria moral significa superar tanto o papel apropriado quanto o papel efetivo do raciocínio moral nos códigos moral e penal Não é quando lhe falta uma base racional que a moral como princípio regulador tornase política ou ideológica num sentido desonroso mas sim quando não há consenso que a sustente Foi somente a desintegração do consenso moral sobre o caráter pernicioso da homossexualidade que fez das leis contra a sodomia um componente tão questionável da justiça penal norteamericana atual A defesa desse argumento é um gesto de solidariedade de minha parte para com a teoria expressiva da moralidade Um juízo moral é expressão de uma forte atração ou repulsa em relação ao comportamento avaliado A causa do furor emocional não precisa ter relação com nenhum motivo FRONT EIRAS DA TEORIA DO DIREITO 298 que algum moralista possa oferecer Sempre se podem oferecer motivos mas estes nunca deixam de ter um quê de racionalização Defender com argumentos o fato de que os pais devem ser proibidos de matar os filhos é compreender mal a questão Isso seria como dizer a alguém que considere o sexo uma prática repulsiva que não existem justificativas para sua repulsa Erigir todo o código penal sobre bases racionais significaria destruir totalmente nosso código moral21 Em nome da cláusula constitucional das penas cruéis ou incomuns a Suprema Corte proíbe que se faça da pena capital a punição automática ou mesmo presumtiva para classes específicas de atos O legislativo pode especificar as classes de atos que fazem do réu um candidato à pena capital mas o júri deve ter o direito de levar em conta o caráter desse réu ao tomar a decisão de impor ou não a pena A consequência disso é que nas audiências para determinar se a pena capital será imposta a discussão tende a girar em torno de quão odioso é o réu O advogado do réu tenta apresentálo como uma pessoa doente despojada do arrependimento enquanto o promotor tenta retratálo como algum perverso e sem remorsos Uma vez que a categoria moral da perversidade a categoria médica da loucura e a categoria sociopsicológica da destituição se sobrepõem parcialmente umas às outras e como muitos assassinos situamse nessa área de sobreposição muitas vezes o júri dispõe apenas dos próprios recursos quando lhe cabe decidir se decreta ou não a pena de morte Os juízes e os jurados desejam que os réus demonstrem remorso22 isto é que reconheçam que cometeram um delito e se arrependam do mal causado e de suas consequências para as vítimas Mas o remorso é um estado mental tão subjetivo que o sistema judiciário nunca consegue determinar com certeza se o réu está de fato com remorso ou se é apenas um indivíduo dotado de talento forense Além disso quanto mais ele admite a responsabilidade por seu ato demonstrando assim estar com remorso mais perversidade ele parece impingir ao ato e consequentemente ao agente ele próprio posto que retrata aquilo que fez como produto da própria vontade corrompida e não da influência de companheiros perversos de uma infância destituída de um vício ou de uma doença psiquiátrica Em um caso de pena capital com suas complicadas audiências de dupla às vezes se adotará uma estratégia de mão própria testemunho ao mesmo tempo que o especialista responsável por sua defesa apresentará provas de que ele está sendo demasiado duro consigo mesmo e que na verdade seu crime foi produto das circunstâncias não de uma vontade depravada Para aqueles que não importâncias do livrearbítrio como realidade metafísica a única importância do réu declararse arrependido está em mostrar que a postura dele não é de rebeldia franca contra o sistema jurídico algo que o tornaria mais perigoso tanto por transformarlo em um exemplo a ser seguido quanto por ser ter crimes quando saísse da prisão caso saísse Ao discutir os crimes motivados pelo ódio esforceime por defender que o direito penal se fundamente em um programa de ação cujo objetivo seja dissuadir ou normalmente pelo encarceramento impedir a imposição injustificada de dano material Posicioneime portanto contra o uso do direito como meio de imposição de ideias correntes acerca do comportamento politicamente correto ou como uma forma de tornar aleatória a imposição da pena capital Vêse contudo que é impossível levar longe demais essa concepção do devido alcance do direito penal dada a falta de justificativas práticas para algumas de nossas mais profundas ideias morais as quais desejamos incorporar ao direito O interesse recente pelo uso das penas de envergonhamento quase sempre na forma de diferentes modalidades de exposição pública como a exigência de que um condenado por agressão sexual coloque na frente de sua casa uma placa que o identifique como tal ou que pregue em seu carro um adesivo no qual se leia Fui condenado por agressão sexual ou a exigência de que indivíduos condenados por vandalismo limpem as calçadas usando roupas de presidiário põe em foco outra questão sobre a postura do direito diante da emoção em que casos o direito deve tentar induzir um estado emocional como componente da pena se é que o deve As penas de humilhação evocam uma longa história de punições públicas destinadas a humilhar e degradar o condenado bem como a amedrontar ou aterrorizar os espectadores Essa história parecia ter praticamente chegado ao fim com o surgimento das prisões no século XIX fenômeno em decorrência do qual hoje em dia as penas em geral são aplicadas se não em segredo total pelo menos longe do olhar do público O encarceramento entretanto tornouse tão dispendioso que ressurgiu o interesse pelas penas alternativas entre as quais se inclui a humilhação pública Uma vez que é possível levar as pessoas a experimentarem sofrimento emocional cuja imposição intencional a não ser por parte do Estado quando este pune criminosos é um ilícito civil as penas de envergonhamento constituem um meio de infligir desutilidade aos criminosos condenados Em vez de priválos da liberdade o Estado submeteos à humilhação Tal medida pode infligir a mesma desutilidade e assim obter o mesmo efeito dissuasivo do aprisionamento porém a um custo inferior A expressão penas de envergonhamento é relativamente imprecisa Em geral essas penas destinamse a humilhar não a envergonhar Uma pessoa sente vergonha quando seu grupo aquele que ela respeita e com o qual tem interesses comuns muitas vezes apenas seus parentes mais próximos descobre que ela se engajou numa conduta contrária às normas dele Como a exposição já gera vergonha não é preciso pôr orelhas de burro na pessoa O objeto das orelhas de burro é humilhante isto é transformar a pessoa em objeto de ridicularização e excreção pública Quando pressionado porém o partidário hodierno do envergonhamento tende a recuar e defender os métodos de exposição pública como o adesivo e a placa na frente da casa como suas formas preferidas de penas de envergonhamento Ora quanto mais a pena envolver apenas a exposição mais apropriado será o termo envergonhamento A humilhação também é um dos fatores envolvidos nesse processo mas não é o exagero representado pelas orelhas de burro Vale observar que há outra interpretação das penas de exposição pública segundo a qual o envergonhamento e a humilhação não são os objetivos desse tipo de punição A proteção legal à privacidade compromete a regulação por meio de normas sociais porque essa regulação depende de as violações dessas normas serem detectáveis pelos cidadãos comuns que são aqueles que excluem de seu grupo os cidadãos violadores aqueles que impõem a aplicação das normas A supressão da privacidade é pois um método lógico quando se procura aumentar a eficácia das normas no controle comportamental Contudo entre as conseqüências dessa supressão estão a vergonha e a humilhação mesmo quando estas não são intencionais26 Apesar do custo ínfimo das penas de envergonhamento de humilhação ou de exposição pura e simples existem muitas objeções a sua aplicação Uma delas é a de que numa sociedade em que mais da metade dos crimes cujos perpetradores foram descobertos é cometida por negros e hispânicos e na qual não obstante o sistema de justiça penal é predominantemente branco e anglosaxão uma política de imposição de penas de humilhação aos criminosos tende a exacerbar tensões raciais e étnicas já muito graves Outra questão é a da insensibilidade a função expressiva ou de sinalização da pena Um dos importantes sinais que a pena tem por função emitir em nossa cultura é o respeito das autoridades públicas pela dignidade inclusive pela dignidade dos mais baixos dentre os mais baixos isto é os criminosos odiosos É por isso que a injeção letal não consiste numa injeção de veneno para criminosos Na sociedade norteamericana os criminosos não são como na sinistra expressão de Carl Schmitt o inimigo interno que deve ser tratado com toda a consideração que conquistam os inimigos estrangeiros Eles são membros da comunidade Tratálos como menos que isso como crianças ou animais significa introduzir na sociedade o tipo de pensamento antagonizante que como sugere a história27 pode levar a condições carcerárias bárbaras à justiça sumária e a punições cruéis Não há nada de mal em os cidadãos privados odiarem os criminosos Mas aqueles que trabalham no sistema de justiça penal não devem odiálos ou pelo menos não devem expressar ódio a eles Outra objeção que se pode fazer às penas de envergonhamento é a de que enquanto a ameaça de aprisionamento desestimula o crime o aprisionamento em si só impede o crime na medida em que o transgressor permanece na prisão Esse efeito preventivo se perde quando todo o período de encarceramento ou parte dele é substituído pela humilhação pública Se não houver substituição ou seja se a pena de envergonhamento for acrescida ao período de prisão para aumentar o rigor da condenação não haverá economia de custos ainda que possa haver um ganho em termos de dissuasão Quanto ao efeito preventivo este talvez não se perca totalmente A placa diante da casa do agressor sexual serve não apenas para humilhálo Também funciona como uma advertência para que vítimas em potencial fiquem longe dele Mas o efeito preventivo será menor que o da prisão a menos que o período obrigatório de exposição da advertência seja consideravelmente maior que o período de encarceramento do qual este é um substituto pois nem todas as vítimas em potencial ficarão sabendo da existência da placa ou tomarão as devidas precauções em decorrência da advertência Isso implica que a pena de envergonhamento mais eficiente é aquela que se acrescenta ao final do período normal de encarceramento Porém repetindo nesse caso não se faz economia alguma dos custos carcerários exceto na medida em que o efeito de exposição pública da pena de envergonhamento reduz a reincidência ou aumente a dissuasão isto é exceto na medida em que tornando as penas mais severas a pena de envergonhamento reduz a criminalidade e desse modo também o custo total do encarceramento de criminosos O aumento do período de encarceramento pode ter o mesmo efeito pois é um erro imaginar que o maior alongamento desses períodos aumente a população carcerária Imaginar isso é ignorar o efeito dissuasivo da simples ameaça de prisão Se por exemplo um aumento de 1 na duração das sentenças de prisão levasse a um decréscimo de 2 na incidência de crimes então se nada mais mudasse a população carcerária diminuiria em mais ou menos 1 Suponhamos que numa época e antes do aumento das condenações a prisão o número de criminosos seja 200 que metade deles 100 seja presa e condenada e que o período médio de encarceramento seja de 100 meses de modo que o total de meses de permanência de prisioneiros na prisão que deve ser previsto no orçamento do sistema carcerário seja de 10 mil Se no período e 1 devido ao efeito dissuasivo das sentenças de prisão mais longas existem somente 196 criminosos 2 a menos dos quais novamente metade 98 é presa e condenada e cada um cumpre 101 meses o total de meses de prisão cairá de 10 mil para 9898 A última objeção apresentada é a de que se houver maior variação de indivíduo para indivíduo na desutilidade derivada das penas humilhantes do que na desutilidade derivada das penashumildade será mais difícil ajustar com precisão a perda da liberdade à pena de humilhação É ainda mais provável que isso aconteça se esse tipo de pena assumir mais de uma forma de aplicação complexos ou seja aqueles do tipo que os computadores ainda não são capazes de resolver pode exigir a participação de emoções como a fascinação o prazer e o orgulho Lembramonos daquilo que afirmei anteriormente sobre o caráter indispensável da emoção para a tomada de decisões Não obstante algumas das mais fortes emoções como a raiva a repulsa a indignação e o amor não teriam lugar nesse caso Elas não somente interfeririam no processo de solução de problemas em vez de representarem atalhos eficientes como também introduziriam distorções substanciais no direito ao privarem as pessoas de remédios judiciais aos quais estas teriam direito por uma questão jurídica O juiz designado para julgálo reflita corretamente sobre os problemas em pauta ou então pode leválo por mais lúcido que seja a tomar uma decisão injusta Os casos que apresentam questões jurídicas de difícil litígio mas por serem complexas do ponto de vista analítico não podem obviamente ser decididos sem o concurso dos sentimentos morais e das preferências políticas Nesses casos parece que a presença de uma gama de emoções mais rica seria apropriada ou pelo menos inevitável Até certo ponto isso é verdade sobrentudo para alguém como eu que defende uma concepção essencialmente emocional da moral Mas não se pode negar o perigo do excesso de emocionalidade na decisão de um caso difícil Quanto mais que os fatores decisórios mais fraca será a resistência à emoção objetivos no sentido de inafetivos oferecerão a emoção inadequada A maioria das pessoas conse gue somar dois e dois corretamente seja qual for seu estado emocional Mas quando o desafio intelectual é maior também aumenta o perigo de que a emoção sugestione a reação Este é um dos motivos que levaram à criação das normas destinadas a limitar o envolvimento emocional do juiz nos casos que exigem essa participação como aquela que o proíbe de participar de um caso no qual um parente seu também participe como uma das partes ou como advogado ou no qual ele tenha algum interesse financeiro Mesmo nos casos fáceis o juiz ou jurado para tomar uma decisão bem fundamentada pode ter de recorrer a um número de emoções maior que aquele necessário ao desempenho de qualquer tarefa não algorítmica Mais especificamente podem ser necessárias a indignação e a empatia A indignação é a reação normal do indivíduo a uma violação do código moral da sociedade em que ele vive e o que é mais importante ainda ela é muitas vezes o modo pelo qual se identifica uma violação Como sugeri ao discutir os fundamentos emocionais das agressões morais geralmente é difícil apresentar uma definição racional convincente de uma regra moral inclusive de uma regra moral à qual o direito tenha vinculado uma sanção por sua violação A veracidade dessa constatação independe de se a regra é contra urinar ficar nu ou masturbarse em público contra a pedofilia contra a poligamia contra o infanticídio a favor ou contra o aborto contra a eutanásia involuntária contra o entabulamento de relações sexuais com animais ou cadá veres contra os maustratos de animais contra a gladiatura contra a prostituição e a obscenidade contra os jogos de azar contra a autoescravização contra as execuções públicas contra a mutilação como forma de pena contra o estado mental de algumas substâncias que alteram o estado mental da pessoa mas não outras ou contra algumas formas de discriminação mas não outras Nós só sa bemos que urinar em público é incorreto porque nos re são expressão de emoções pertinentes e indefiníveis Além disso muitas dessas convicções não racionais estão incor poradas ao direito e são impostas a pessoas que não com formidade com elas porque derivam utilidade da conduta proibida pela norma jurídica Portanto levo tão a sério a importância da emoção como fator cognitivo que reluto em atribuir à razão o papel de um tribunal que passa em revista as emoções e decide quais delas o direito deve encorajar a tolerância talvez mas não a repulsa A pedra angular de muitas de nossas regras morais é a emoção e não uma razão avaliadora de emoções Suponhamos que se contestasse diante de um juiz total mente racional uma regra moral que tenha por objetivo como é o caso de muitas delas vincular sanções à violação de um regra moral cuja vigência não encontre nenhuma justificativa do ponto de vista do funcionamento da société Esse juiz teria dificuldade para rejeitar a contestação pois não conseguiria apresentar nem granjear motivos convincentes para a existência da regra do ponto de vista racion al Para ele a regra digamos contra o infanticídio cometido pela mãe pareceria arbitrária ao passo que uma pessoa dotada de atributos emocionais normais rejeitaria a contes tação de imediato pois suas emoções a fariam agir dessa forma Esta é a reação correta para quem como eu consid erar que não faz parte do papel dos juízes demolir o código moral de sua sociedade ou o que seria quase a mesma coisa insistir na concepção de justificativas convincentes para esse código Outra emoção que é importante que o juiz sinta quan do este se vir diante de um caso impossível de ser decidido mediante um raciocínio puramente formalista é a empatia ou o sentimento de solidariedade A empatia é um dos me lhores exemplos do caráter cognitivo da emoção O ele mento cognitivo da empatia consiste na reconstituição imagi nativa da situação de outra pessoa enquanto seu elemento afetivo que a caracteriza como uma emoção e não apenas julgar está em chamar a atenção do juiz para os interesses das partes ausentes ou em outras palavras as palavras da psicologia cognitiva que é tema do próximo capítulo combater a heurística da disponibilidade Esta pode ser definida como a tendência já vista de relance no início da discussão sobre a emocionalidade a atribuir excessiva importância às impressões vívidas e imediatas como aquilo que se vê em detrimento daquilo que se narra e desse modo dar atenção demasiada aos sentimentos aos interesses e à qualidade humana das partes presentes no tribunal e muito pouca às pessoas ausentes suscetíveis de serem afetadas pela decisão A heurística da disponibilidade é apenas uma das distorções do raciocínio há uma longa lista delas identificadas pelos psicólogos cognitivos Nem todas elas envolvem as emoções A aparência retorcida de um graveto reto quadrado na água é um exemplo de uma distorção perceptiva que nada tem a ver com a emoção ou a emocionalidade A heurística da disponibilidade transpoe a linha que separa o emocional do puramente cognitivo e é responsável por vários truques da memória que nada devem à emocionalidade e é desencadeada pela carga emocional de uma das características de determinada situação é adequado enxergála como exemplo de um choque entre a emoção e a razão Seu modo de funcionamento é ilustrado pelo debate sobre o essencial de formação se tornasse comum a heurística favorecia os defensores do direito de aborto pois estes podiam contar histórias impressionantes e até mostrar fotos de mulheres mortas em decorrência e até mostrar fotos de mulheres mortas em decorrência e até mostrar fotos de mulheres com o assassinato que faça um pedido eloquente de clemência quando a vítima encontrase impossibilitada de contraargumentar por estar morta seja na forma de um excessivo pendendo em favor dos direitos dos inquilinos esquecendose os juízes do efeito disso sobre o valor do aluguel que outros inquilinos terão de pagar quando os locadores repassarem a eles na forma de aluguéis mais caros uma fração provavelmente alta da elevação dos custos de locação gerada pelas decisões do judiciário seja ainda na forma de uma concessão de isenção fiscal a uma empresa em dificuldades ignorando o fato de que outras empresas pagarão impostos mais altos em decorrência disso e repassarão uma parte desse custo adicional aos consumidores Não é preciso ter muita empatia para se deixar levar pelos argumentos de um litigante quando seu advogado é competente e está ali discorrendo na sua frente O desafio para a imaginação empática do juiz está em comoverse ao pensar ou ler sobre as consequências do litígio para os indivíduos que dele não participam estes em geral são totalmente desconhecidos ou nem sequer nasceram ainda e que serão afetados por sua decisão A abordagem econômica do direito é empática porque embora nela não se exponham abertamente sentimentos e emoções na verdade justamente por causa disso ela insere no processo decisório os interesses distantes porém importantes somatório total de pessoas que não são aquelas presentes no tribunal como por exemplo as futuras vítimas dos assassinos os futuros candidatos a inquilino os futuros contribuintes e os futuros consumidores Como afirma Ângelo que faz o papel de juiz na peça Medida por medida de Shakespeare em resposta ao pedido de Isabela para que ele tenha piedade de seu irmão É o que faço acimada de tudo ao dar mostras de justiça Pois então sou piedoso com aqueles que não conheço E que por certo sofreriam por um crime não punido Não é preciso haver tensão entre a imparcialidade e a empatia do juiz Imparcialidade não é frieza quando envolve a criação de um distanciamento emocional entre o juiz e as partes ou as testemunhas além de outros em sua presença a fim de abrir espaço a uma reconstituição imaginativa dos sentimentos e interesses das pessoas ausentes nativa dos sentimentos e interesses das pessoas ausentes potencialmente afetadas pela decisão do juiz O nome dado a esse distanciamento empático no sistema jurídico é indole judicial Quando um juiz fica tão emocionalmente envolvido nas circunstâncias diretas do caso a ponto de não conseguir enxergar os interesses das partes ausentes dele se diz que carece de índole judicial Dentro os exemplos recentes o mais famoso é o do falecido juiz Harry Blackmun da Suprema Corte Não há um nome oficial para o juiz que demonstre o tipo oposto de emocionalismo isto é um Estranho orgulho por manter uma indiferença total e desumana para com as partes do litígio Mas de qualquer modo ninguém admira esse tipo de juiz Portanto seria um equivoco dizer que os bons juízes são menos emocionais que as outras pessoas Ocore apenas que em seu trabalho eles empregam um conjunto de emoções diferente daquele que se considera apropriado empregar na vida pessoal e em outros contextos vocacionais O domínio não apenas é uma emoção como é uma emoção forte uma vez que funciona como uma forma de controlar as emoções exageradas