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Ciências Econômicas ·

Formação Econômica do Brasil

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MARCELO DE PAIVA ABREU ORGANIZADOR A ORDEM DO PROGRESSO DOIS SÉCULOS DE POLÍTICA ECONÔMICA NO BRASIL CAMPUS NOVA EDIÇÃO REVISTA E ATUALIZADA A ordem do progresso Dois séculos de política econômica no brasil 2 EDIÇÃO ORGANIZADOR Marcelo de Paiva Abreu Nova Edição Revista e Atualizada Sumário Folha de rosto Cadastro Copyright Dedicatória Epígrafe Agradecimentos Autores Introdução Introdução à primeira edição Índice de séries incluídas no Anexo Estatístico 18892010 Presidentes da República do Conselho de Ministros e Ministros da Fazenda e do Planejamento Capítulo 1 A economia brasileira no Império 18221889 1 População 2 Estimativas de produto 3 Atividade 4 Fatores de produção trabalho 5 Fatores de produção terra 6 Fatores de produção capital 7 Comércio exterior 8 Regimes monetários câmbio e sistema financeiro 9 Finanças públicas 10 Conclusões Capítulo 2 A primeira década republicana 1 Introdução 2 O Brasil e a economia internacional 3 Trabalho assalariado e a política monetária 4 Política econômica nos anos 1890 Capítulo 3 Apogeu e crise na Primeira República 19001930 1 Introdução 2 Política econômica na Primeira República 3 Uma reinterpretação da historiografia tradicional 4 Conclusões Capítulo 4 Crise crescimento e modernização autoritária 19301945 1 Superação da crise e política econômica do Governo Provisório 19301934 2 Boom econômico e interregno democrático 19341937 3 Estado Novo e economia de guerra 19371945 Capítulo 5 Política econômica externa e industrialização 19461951 1 Introdução 2 Políticas cambial e de comércio exterior 3 Substituição de importações e crescimento industrial 4 Relações internacionais e movimento de capitais 5 Política econômica interna Capítulo 6 Duas tentativas de estabilização 19511954 1 Introdução 2 Rumo ao colapso cambial 19511952 3 A transição para o novo ministério 4 A nova tentativa de estabilização 5 A última crise Capítulo 7 O interregno Café Filho 19541955 1 Introdução 2 A gestão Gudin 3 A administração Whitaker 4 Considerações gerais Capítulo 8 Democracia com desenvolvimento 19561961 Introdução 1 A política cambial 2 As políticas de desenvolvimento 3 O papel do setor público 4 As políticas fiscal e monetária Capítulo 9 Inflação estagnação e ruptura 19611964 1 A Tentativa de Estabilização sob Quadros 2 O Impasse Parlamentarista 3 A política econômica sob o presidencialismo restaurado 4 Avaliação do período Capítulo 10 Estabilização e reforma 19641967 1 Introdução 2 Objetivos do PAEG 3 A política salarial no PAEG 4 Condução das políticas monetária e fiscal 5 O impacto sobre a produção e os preços 6 Os custos da estabilização 7 Além da ortodoxia simplista Capítulo 11 A retomada do crescimento e as distorções do milagre 19671974 1 Crescimento econômico formação de capital e inflação 19671973 2 Políticas monetária e creditícia e desenvolvimento do sistema financeiro 3 Política fiscal estados e municípios e política regional as estatais e o papel do governo na economia 4 Setor externo 5 Política salarial distribuição de renda e emprego 6 Uma breve avaliação dos resultados da política econômica 19671973 Capítulo 12 Crise e esperança 19741980 1 Introdução 2 Condicionantes externos e internos da política econômica 3 Opções para o ajuste de curto prazo e as causas do fracasso 4 A natureza do ajuste de longo prazo o crescimento com endividamento 5 Resultados e suas consequências Capítulo 13 Ajuste externo e desequilíbrio interno 19801984 1 Introdução 2 Recessão sem Fundo 1981 3 Da Recessão ao Fundo 1982 4 O Fundo da Recessão 1983 5 Com o Fundo sem Recessão 1984 6 Conclusões Capítulo 14 A ópera dos três cruzados 19851990 1 Introdução 2 Inflação inercial e conflito distributivo 3 O fracasso do gradualismo março 1985fevereiro 1986 4 Plano Cruzado principais ingredientes 5 Plano Cruzado principais resultados 6 Plano Bresser ingredientes 7 Plano Bresser resultados 8 Plano Verão ingredientes 9 Plano Verão resultados 10 Conclusões Capítulo 15 Estabilização abertura e privatização 19901994 Capítulo 16 Consolidação da estabilização e reconstrução institucional 19952002 Capítulo 17 Alternância política redistribuição e crescimento 2003 2010 Bibliografia Fontes Primárias Fontes Secundárias Anexo Estatístico 18892010taxas de variação anuais a menos de indicação em contrário Índice Cadastro CÓPIA NÃO AUTORIZADA É CRIME ABDR ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DIREITOS REPROGRÁFICOS RESPEITE O DIREITO AUTORAL Copyright 2014 Elsevier Editora Ltda Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei n 9610 de 1921998 Nenhuma parte deste livro sem autorização prévia por escrito da editora poderá ser reproduzida ou transmitida sejam quais forem os meios empregados eletrônicos mecânicos fotográficos gravação ou quaisquer outros Revisão Vanessa Raposo Editoração Eletrônica Thomson Digital Elsevier Editora Ltda Conhecimento sem Fronteiras Rua Sete de Setembro 111 16 andar 20050006 Centro Rio de Janeiro RJ Brasil Rua Quintana 753 8 andar 04569011 Brooklin São Paulo SP Brasil Serviço de Atendimento ao Cliente 08000265340 atendimento1elseviercombr ISBN 9788535278590 ISBN versão eletrônica 9788535279511 Nota Muito zelo e técnica foram empregados na edição desta obra No entanto podem ocorrer erros de digitação impressão ou dúvida conceitual Em qualquer das hipóteses solicitamos a comunicação ao nosso Serviço de Atendimento ao Cliente para que possamos esclarecer ou encaminhar a questão Nem a editora nem o autor assumem qualquer responsabilidade por eventuais danos ou perdas a pessoas ou bens originados do uso desta publicação CIPBRASIL CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS RJ A145o 2 ed Abreu Marcelo de Paiva A ordem do progresso dois séculos de política econômica no BrasilMarcelo de Paiva Abreu 2 ed Rio de Janeiro Elsevier 2014 il 24 cm ISBN 9788535278590 1 Capitalismo Brasil História 2 Capital Economia I Título 1413073 CDD 3301220981 CDU 3301422381 Dedicatória Em memória de Dionísio Dias Carneiro Netto 19452010 Epígrafe Only the young have such moments One closes behind one the little gate of mere boyishness and enters an enchanted garden Its very shades glow with promise Every turn of the path has its seduction And it isnt because it is an undiscovered country One knows well enough that all mankind had streamed that way It is the charm of universal experience from which one expects an uncommon or personal sensation a bit of ones own One goes on recognizing the landmarks of the predecessors excited amused Yes One goes on And the time too goes on till one perceives ahead a shadowline warning one that the region of early youth too must be left behind Só os jovens têm momentos assim Fechase atrás de si o pequeno portão da simples meninice e adentrase um jardim encantado Até seus espaços escuros cintilam de promessas Cada curva do caminho tem o seu encanto E não é por se tratar de uma terra não desbravada Sabese muito bem que a humanidade inteira já passou por ali É pelo charme da experiência universal da qual se espera uma sensação incomum ou pessoal um pedacinho que seja só seu Animados entretidos seguimos reconhecendo os marcos de nossos predecessores Sim Nós seguimos E o tempo segue ele também até percebermos logo adiante uma linha de sombra a nos alertar que o território da primeira juventude também deve ser deixado para trás Joseph Conrad The Shadow Line Agradecimentos Reitero neste parágrafo os agradecimentos que fiz na edição original deste livro A Sérgio Besserman Vianna que além de contribuir com dois capítulos para a coletânea auxiliou na revisão de originais e na discussão relativa à organização do livro E também a Dionísio Dias Carneiro Netto e Rogério Ladeira Furquim Werneck e à minha família Alice Fernanda e Carlos por sua contribuição para que fosse possível organizar esta coletânea A assistência à pesquisa de Ricardo Pereira de Almeida especialmente na elaboração do anexo estatístico a ajuda de Mário Magalhães Carvalho Mesquita na elaboração do índice de nomes e a dedicação e eficiência de Letícia Duboc Andreiolo na digitação e preparação dos arquivos originais foram essenciais para tornar menos árduo o trabalho de organização da coletânea Desde meados da década de 1990 vários assistentes de pesquisa colaboraram na modernização do apêndice estatístico Carlos van Hombeeck Renata Kreuzig Bastos Leandro Siqueira Machado e destacadamente Felipe Massari Na oportunidade da publicação da revisão da primeira edição agradecimentos são devidos a Flávia Mamfrim Marina Figueira de Mello Honório Kume Ricardo Markwald e especialmente a Luiz Aranha Correa do Lago e Rogério Werneck cuja participação foi muito além da coautoria dos capítulos nos dois extremos do período abarcado pelo livro Fernanda Rangel de Paiva Abreu retraduziu com brilho a epígrafe de Conrad que eu havia estropiado em 1989 Autores Marcelo de Paiva Abreu é doutor em Economia pela Universidade de Cambridge e professor titular do Departamento de Economia da PUC Rio Dionísio Dias Carneiro Netto foi professor do Departamento de Economia da PUCRio sócio da Galanto Consultoria e diretor do Iepe CDG Gustavo HB Franco é doutor em Economia pela Universidade Harvard Foi professor do Departamento de Economia da PUCRio Quadro Principal e presidente do Banco Central do Brasil É professor pleno do Departamento de Economia da PUCRio Quadro Complementar e presidente do Conselho de Administração da Rio Bravo Investimentos Winston Fritsch é doutor em Economia pela Universidade de Cambridge Foi professor do Departamento de Economia da PUCRio e Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda É diretor executivo da Petra Energia SA Luiz Aranha Corrêa do Lago é doutor em Economia pela Universidade Harvard Foi diretor do Banco Central do Brasil É professor pleno do Departamento de Economia da PUCRio Quadro Complementar e consultor do Grupo Lorentzen Mário Magalhães Mesquita é doutor em Economia pela Universidade de Oxford Foi diretor do Banco Central do Brasil É economista e sócio do banco Brasil Plural Eduardo Marco Modiano é doutor em Pesquisa Operacional pelo Massachusetts Institute of Technology Foi professor do Departamento de Economia da PUCRio e presidente do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social BNDES Luiz Orenstein é doutor em Ciência Política pelo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro IUPERJ Foi diretor do BNDES e professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro É sócio da Dynamo Administração de Recursos Demósthenes Madureira de Pinho Neto é doutor em Economia pela Universidade da Califórnia Berkeley Foi diretor do Banco Central do Brasil Atualmente é o principal executivo da Brasil Warrant André Lara Resende é doutor em Economia pelo Massachusetts Institute of Technology Foi professor do Departamento de Economia da PUCRio diretor do Banco Central e presidente do BNDES Trabalhou por mais de três décadas no mercado financeiro Antonio Claudio Sochaczewski é doutor em Economia pela Universidade de Londres London School of Economics Foi diretor do Banco Central do Brasil presidente do Banespa e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro Atualmente é consultor Sérgio Besserman Vianna é mestre em Economia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro Foi presidente do IBGE É professor adjunto do Departamento de Economia da PUCRio Quadro Complementar e economista do BNDES cedido à Prefeitura do Rio de Janeiro Rogério Ladeira Furquim Werneck é doutor em Economia pela Universidade Harvard e professor titular do Departamento de Economia da PUCRio Introdução A primeira edição de A ordem do progresso foi publicada há quase um quarto de século em comemoração ao centenário da República Esta nova edição pode ser vista como comemoração antecipada dos dois séculos do Brasil independente O livro foi lançado em 1989 em momento crítico da história política do Brasil entre os dois turnos da primeira eleição presidencial realizada de acordo com a Constituição de 1988 A edição original foi para surpresa de muitos inclusive minha bem além de um succès destime Tornouse obra de referência para gregos e troianos No fim de 1989 não se imaginava bem o que a história nos reservava embora não houvesse otimismo nas análises contidas no livro Seguiramse de início três anos quase anárquicos antes que vingasse o Plano Real seguido de crescimento meio medíocre até a virada do século e além Mas a crítica à estratégia baseada em proteção alta e forte presença do Estado que havia ganho força nos anos 1980 redundou nas reformas da década de 1990 relativas à abertura comercial e à privatização Vários dos autores estiveram envolvidos na concepção implementação e consolidação do Plano Real a partir de 1993 Depois de bem mais de uma década de insucessos na tentativa de controlar o regime de alta inflação foi inaugurada nova etapa da história econômica do país com a estabilização sendo acompanhada pela consolidação de reformas modernizadoras Muitas crises tiveram de ser enfrentadas Com a vitória da oposição a transição em 20022003 revelouse menos problemática do que se temia com o Partido dos Trabalhadores abandonando às pressas os seus excessos mais impetuosos como o repúdio das dívidas interna e externa Parecia que se assistia ao fim de ideias equivocadas em matéria de política econômica Ledo engano Na esteira do mensalão em 200405 o compromisso petista com políticas macroeconômicas prudentes começou a arrefecer De fato a partir de 2010 acumularam se indícios claros de reversão das políticas que haviam sido estabelecidas na década de 1990 quanto à abertura comercial e ao papel do Estado na economia Até mesmo o compromisso com a estabilização passou a ser relativizado Levando tudo em conta ganha relevo a epígrafe conradiana quanto à linha de sombra já incluída na primeira edição Ainda é verdade que no seu processo histórico o Brasil precisa abandonar a sua juventude e articular um projeto estratégico sério que o livre do subdesenvolvimento e da mediocridade Ainda que com atraso pelo menos um quarto de século É importante manter a incitação a cruzarmos a linha de sombra para que em face das dificuldades envolvidas nesse desafio não nos deixemos levar pelo ceticismo Esta nova edição inclui vários capítulos que não constavam da edição anterior O Capítulo 1 sobre a economia imperial de autoria de Marcelo de Paiva Abreu e Luiz Aranha Correa do Lago tem características distintas dos demais capítulos Em contraste com os demais capítulos analisa a economia do Império e não a política econômica do período O Capítulo 9 de autoria de Mário Mesquita sobre o período 19611964 substitui o capítulo anterior escrito pelo organizador A versão original do Capítulo 11 de autoria de Luiz Aranha Correa do Lago foi resumida Os capítulos finais escritos por Marcelo de Paiva Abreu e Rogério L F Werneck Capítulo 15 e Rogério L F Werneck Capítulos 16 e 17 cobrem o período 19902010 Os demais capítulos que já constavam da edição anterior foram objeto de revisões em geral limitadas buscando corrigir imperfeições das versões originais Não creio que na essência as interpretações originais tenham sido contestadas pelo que se publicou desde então O anexo estatístico foi modernizado e revisto Marcelo de Paiva Abreu Rio de Janeiro fevereiro de 2014 Introdução à primeira edição O centenário da República está sendo comemorado em meio ao que é provavelmente a maior crise da história econômica do Brasil independente Esta coletânea de artigos ao avaliar de forma sistemática a formulação e a implementação de políticas econômicas no Brasil destaca as continuidades e rupturas fornecendo subsídios para a compreensão das origens dos principais problemas enfrentados hoje pela economia Ao final de uma década perdida do ponto de vista do crescimento econômico com a renda per capita estagnada ao nível real de 1980 a avaliação dos erros e acertos na condução da política econômica deve procurar libertarse da visão deformada pelo pessimismo enraizado na década e buscar lições que possibilitem o retorno do país a uma trajetória de crescimento sustentado De uma perspectiva de longo prazo o desempenho da economia foi grosso modo aceitável ainda que com frequência os gestores da política econômica tenham obtido resultados diametralmente opostos às suas intenções iniciais É possível detectar diversos elementos de continuidade nas políticas econômicas do Brasil Republicano O sucesso na obtenção de uma taxa de crescimento econômico significativo de 54 ao ano desde o início do século permitiu que fossem evitados de forma sistemática os conflitos associados ã distribuição dos frutos do desenvolvimento Por que tratar dos espinhosos problemas de redistribuição se o crescimento econômico aumentava mesmo que de forma muito desigual a renda de todos os grupos da população A arte de não escolher entre objetivos conflitantes foi altamente desenvolvida explicitandose mais modernamente na deterioração das contas públicas e em consequência na aceleração inflacionária A importância da articulação entre a economia brasileira e a economia mundial é confirmada quase que a cada episódio sublinhando a natureza insatisfatória de generalizações que buscam detectar inexoráveis tendências de longo prazo à consolidação de uma economia madura capaz de gerar suas crises endógenas Mesmo a reorientação da demanda para o mercado interno nos anos 1930 deve ser entendida como resposta a limitações de natureza externa As raízes endógenas das flutuações econômicas no final dos anos 1950 e começo dos 1960 podem ser atribuídas parcialmente a desenvolvimentos da economia internacional A referência à experiência internacional tem também importância quando se trata de analisar o papel de diferentes instrumentos de política econômica e de políticas econômicas específicas regimes cambiais ou políticas de gastos prékeynesianas nos anos 1930 por exemplo bastante menos peculiares ao Brasil do que sugere a literatura tradicional As dificuldades recorrentes de legitimação da realocação de recursos entre setores e entre classes estimularam a pouca transparência na percepção das consequências da política econômica sobre os distintos grupos da sociedade Proliferaram os mecanismos disfarçados de transferência de recursos sobrevalorização cambial controles de estoques de produtos primários taxas de juros reais negativas A sobrevivência destes mecanismos foi facilitada pela contínua ação do Estado como distribuidor de benesses aos detentores do poder político Desde a imigração subsidiada no século passado passando pela valorização do café na República Velha pelo confisco cambial e pelas operações vinculadas a partir dos anos 1930 e 1940 pela cobrança de taxas de juros reais negativas pelo sistema previdenciário a partir dos anos 1940 retomada de forma sofisticada pelo Sistema Financeiro da Habitação SFH nos anos 80 e pelo sistema BNDES nos anos 1970 terminando na estatização da dívida externa mais recentemente o Estado foi tratado como se dele fosse possível obter benefício sem custo para qualquer grupo da sociedade ou pelo menos com prejuízo de grupos sem capacidade de protesto efetivo Com base nesta falácia tornouse modismo denunciar a ineficiência do Estado e sua inadimplência sem questionar as formas pelas quais diferentes grupos na sociedade se beneficiaram de suas políticas Por outro lado houve aspectos positivos na contínua ação do Estado como alocador de benesses e na limitada utilização dos preços como elementos de sinalização no processo de alocação de recursos Desde bem cedo na história da República foi impossível que se enraizasse entre as tradições da classe dominante brasileira qualquer crença extremada nas virtudes alocativas do mercado No Brasil não prosperou a adesão acrítica ao laissezfaire que por exemplo iria marcar por tantos anos a ação política da classe dominante na Argentina e portanto a formulação e a implementação da política econômica Os cafeicultores brasileiros desde cedo reconheceram as virtudes do controle da oferta como forma de manipulação de preços Desde cedo também diversificaram os seus investimentos não apenas em projetos na infraestrutura de exportação mas igualmente de forma significativa na indústria substitutiva de importações Estes contrastes tiveram grande importância nos anos 30 pois o Brasil enfrentou a crise já com considerável capacidade instalada na indústria capaz de acomodar as consequências das políticas de reorientação de demanda adotadas em resposta à deterioração das contas externas O remoto compromisso das elites políticas com o liberalismo abriu espaço para a adoção sistemática com grande sucesso de políticas de incentivo à industrialização Mesmo a ruptura da legalidade constitucional em 1964 não envolveu o abandono a despeito da retórica dos responsáveis pela política econômica seja da industrialização substitutiva de importações baseada no protecionismo e na distribuição administrativa de recursos seja do papel do Estado como produtor de bens e serviços O papel do Estado no Brasil ao longo do período caracterizouse por sua natureza essencialmente complementar às iniciativas do setor privado Não se tratou de ocupar segmentos estratégicos em substituição à iniciativa privada mas fundamentalmente de investir em áreas nas quais não houve interesse privado nacional ou estrangeiro Como resultado destas características a estabilidade das políticas econômicas no Brasil foi maior do que em muitos países em desenvolvimento Ao contrário de outros países cujas políticas oscilaram entre o liberalismo de livrotexto e a intervenção maciça nos mecanismos de mercado mais uma vez o caso da Argentina parece exemplar as políticas brasileiras foram mais estáveis e em geral muito menos intervencionistas Um importante elemento explicativo da relativa estabilidade das políticas econômicas foi a razoável eficiência dos processos decisórios relativos a investimentos públicos Para isto foi importante a relativa estabilidade das elites burocráticas que em distintas instituições ao longo do tempo asseguraram por longo período qualidade razoável nas principais decisões relativas à alocação de recursos mesmo que muitas vezes com base em instrumentos opacos e discricionários Assim sucessivamente grupos de burocratas em distintos ministérios como os da Agricultura Fazenda e Relações Exteriores no Conselho Técnico de Economia e Finanças no Departamento Nacional da Produção Mineral no Conselho Federal de Comércio Exterior no Departamento Administrativo do Serviço Público nas grandes empresas e bancos estatais a começar pela Petrobrás e pelo BNDES e seus respectivos sistemas no Conselho de Desenvolvimento na CEMIG e depois na Eletrobras no Ministério do Planejamento foram capazes de em distintos momentos garantir a continuidade necessária para que se estabelecesse um razoável padrão de competência nas decisões relativas aos investimentos públicos Grandes erros foram cometidos mas não comprometeram de forma significativa este desempenho até o final dos anos 1970 Esta tradição foi rompida no início da década de 1980 pelo menos em parte devido às restrições impostas pela não solução dos problemas relativos à incompatibilidade entre estoque da dívida externa capacidade de geração líquida de divisas e manutenção do crescimento econômico O atual processo de abertura política tem enfrentado o grande desafio de tentar compatibilizar o exercício democrático com o bom uso dos recursos públicos As inadequações e fracassos recentes no terreno normativo e nas ações do governo devem ser avaliados à luz das limitações enraizadas na experiência acumulada no passado Foi dolorosa para alguns a descoberta de que não há vínculo automático entre exercício das liberdades democráticas e desempenho da economia O país está em meio a uma conradiana zona de penumbra e à sua frente está a maturidade a consolidação da democracia e o controle das políticas públicas Governar é escolher democraticamente entre diferentes objetivos A Nação deve aprender a escolher e o estudo das opções do passado pode ajudála a minimizar os custos deste processo Marcelo de Paiva Abreu Rio de Janeiro agosto de 1989 Índice de séries incluídas no Anexo Estatístico 18892010 Produto Interno Bruto Produto Industrial Produto Agrícola Produto do Setor Serviços Deflator Implícito do PIB Formação Bruta de Capital Exportações Importações Balança Comercial Serviços Fatores Serviços Não Fatores Saldo em Conta Corrente Operações de Regularização Investimento Direto Investimento em Carteira Outros Investimentos Conta Capital e Financeira Haveres da Autoridade Monetária Reservas Dívida Externa Total Geral Dívida Externa Total Registrada Médio e Longo Prazo Dívida Externa Total Registrada Curto Prazo Dívida Externa Registrada do Setor Privado Dívida Externa Consolidada Preços de Exportação Quantum de Exportação Preços de Importação Quantum de Importação Termos de Intercâmbio Nível de Atividade nos Estados Unidos Taxa de Juros nos Estados Unidos Preços ao Consumidor Taxa de Câmbio Oficial Taxa de CâmbioTaxa de Câmbio Comercial Participação do Imposto de Renda na Receita Participação do Imposto de Consumo na Receita Participação do Imposto de Importação na Receita Dívida Interna Federal Salário Mínimo Real PapelMoeda em Poder do Público Depósitos à Vista Meios de Pagamento Base Monetária Presidentes da República do Conselho de Ministros e Ministros da Fazenda e do Planejamento Presidentes da República Marechal Manoel Deodoro da Fonseca 1511188923111891 Marechal Floriano Vieira Peixoto 2311189115111894 Prudente José de Morais Barros 1511189415111898 Manuel Ferraz de Campos Sales 1511189815111902 Francisco de Paula Rodrigues Alves 1511190215111906 Afonso Augusto Moreira Pena 151119061461909 Nilo Procópio Peçanha 146190915111910 Marechal Hermes Rodrigues da Fonseca 1511191015111914 Venceslau Brás Pereira Gomes 1511191415111918 Delfim Moreira da Costa Ribeiro 151119182871919 Epitácio Lindolfo da Silva Pessoa 287191915111922 Artur da Silva Bernardes 1511192215111926 Washington Luís Pereira de Sousa 1511192624101930 General Augusto Tasso Fragoso General João de Deus Mena Barreto e Almirante José Isaías de Noronha 241019303111930 Getúlio Dornelles Vargas 311193029101945 José Linhares 291019453111946 Marechal Eurico Gaspar Dutra 31119463111951 Getúlio Dornelles Vargas 31119512481954 João Fernandes Campos Café Filho 24819548111955 Carlos Coimbra da Luz 811195511111955 Nereu de Oliveira Ramos 111119553111956 Juscelino Kubitschek de Oliveira 31119563111961 Jânio da Silva Quadros 31119612581961 Pascoal Ranieri Mazzilli 2581961 791961 João Belchior Marques Goulart 791961241964 Pascoal Ranieri Mazzilli 2419641541964 General Humberto de Alencar Castelo Branco 15419641531967 General Arthur da Costa e Silva 15319673181969 General Aurélio de Lyra Tavares Almirante Augusto Hamann Rademaker Grunewald e Brigadeiro Márcio de Souza Melo 3181969 30101969 General Emílio Garrastazu Médici 301019691531974 General Ernesto Beckmann Geisel 15319741531979 General João Baptista de Oliveira Figueiredo 15319791531985 José Sarney de Araújo Costa 1531985 Fernando Affonso Collor de Mello 15319902101992 Itamar Augusto Cautiero Franco 2101992111995 Fernando Henrique Cardoso 111995112003 Luiz Inácio Lula da Silva 112003112011 Dilma Vana Rousseff 112011 Presidentes do Conselho de Ministros Tancredo de Almeida Neves 8919612661962 Francisco de Paula Brochado da Rocha 10719621491962 Hermes Lima 18919622411963 Ministros da Fazenda Ruy Barbosa 151118891711891 Tristão de Alencar Araripe 22118912251891 Henrique Pereira de Lucena 47189123111891 Francisco de Paula Rodrigues Alves 261118913181892 Inocêncio Serzedelo Corrêa 31818923041893 Felisbelo Firmo de Oliveira Freire 30418931881894 Alexandre Cassiano do Nascimento 188189415111894 Francisco de Paula Rodrigues Alves 1511189420111896 Bernardino José de Campos 2011189615111898 Joaquim Duarte Murtinho 15111898291902 Sabino Alves Barroso Júnior 29190215111902 José Leopoldo de Bulhões Jardim 1511190215111906 David Moretzsohn Campista 151119061461909 José Leopoldo de Bulhões Jardim 146190915111910 Francisco Antônio de Sales 15111910951913 Rivadávia da Cunha Corrêa 95191315111914 Sabino Alves Barroso Júnior 151119143151915 João Pandiá Calógeras 871915691917 Antonio Carlos Ribeiro de Andrada 6919171111918 Amaro Bezerra Cavalcanti de Albuquerque 151119181711919 João Ribeiro de Oliveira e Souza 17119192771919 Homero Baptista 277191915111922 Rafael de Abreu Sampaio Vidal 15111922211925 Anníbal Freire da Fonseca 21192515111926 Getúlio Dornelles Vargas 1511192617121927 Francisco Chaves de Oliveira Botelho 1712192724101930 Agenor Lafayette de Roure 251019304111930 José Maria Whitaker 411193016111931 Oswaldo Euclydes de Souza Aranha 161119312471934 Arthur de Souza Costa 247193429101945 José Pires do Rio 29101945121946 Gastão Vidigal 12194615101946 Pedro Luis Corrêa e Castro 211019461061949 Manoel Guilherme da Silveira Filho 10619493111951 Horácio Lafer 1219511561953 Oswaldo Euclydes de Souza Aranha 15619532481954 Eugênio Gudin 25819541241955 José Maria Whitaker 134195510101955 Mário Leopoldo Pereira da Câmara 111019559111955 José Maria Alkmin 1219562461958 Lucas Lopes 2561958361959 Sebastião Paes de Almeida 3619593111961 Clemente Mariani Bittencourt 1219612581961 Walter Moreira Salles 8919611491962 Miguel Calmon du Pin e Almeida Sobrinho 18919622211963 Francisco Clementino de San Tiago Dantas 23119632061963 Carlos Alberto de Carvalho Pinto 216196319121963 Ney Galvão 20121963341964 Octavio Gouvêa de Bulhões 15419641631967 Antonio Delfim Netto 17319671531974 Mário Henrique Simonsen 16319741531979 Karlos Rischbiter 16319791711980 Ernane Galvêas 18119801431985 Francisco Oswaldo Neves Dornelles 15319852681985 Dilson Funaro 26819852941987 Luís Carlos Bresser Gonçalves Pereira 294198721121987 Maílson Ferreira da Nóbrega 181219871531990 Zélia Maria Cardoso de Mello 15319905101991 Marcílio Marques Moreira 10519912101992 Gustavo Krause Gonçalves Sobrinho 210199216121992 Paulo Roberto Haddad 16121992131993 Elizeu Resende 1319931951993 Fernando Henrique Cardoso 19519933031994 Rubens Ricupero 3031994691994 Ciro Ferreira Gomes 69199431121994 Pedro Sampaio Malan 11199531122002 Antonio Palocci Filho 1120032732006 Guido Mantega 2732006112011 Ministros do Planejamento Celso Monteiro Furtado 24119632371963 Roberto de Oliveira Campos 145641531967 Hélio Marcos Penna Beltrão 153196730101969 João Paulo dos Reis Velloso 301019691531979 Mário Henrique Simonsen 15319791581979 Antonio Delfim Netto 15819791531985 João Sayad 15319851731987 Aníbal Teixeira 17319872211988 João Batista de Abreu 22119881431990 Paulo Roberto Haddad 191019922611993 Yeda Rorato Crusius 26119931051993 Alexis Stepanenko 1551993331994 Benedito Clayton Veras Alcântara 33199431121994 José Serra 1119953151996 Antonio Kandir 4619963031998 Paulo de Tarso Almeida Paiva 30319983031999 Pedro Pullen Parente 6419991871999 Martus Tavares 1971999342002 Guilherme Dias 342002112003 Guido Mantega 11200318112004 Nelson Machado 191120042232005 Paulo Bernardo Silva 18112004112011 Miriam Aparecida Belchior 112011 CAPÍTULO 1 A economia brasileira no Império 182218891 Marcelo de Paiva Abreu e Luiz Aranha Correa do Lago Este capítulo sobre a economia imperial é de caráter introdutório e está dividido em 10 seções além desta introdução O objetivo é colocar em perspectiva as análises mais detalhadas referentes à política econômica durante o período republicano que compõem os demais capítulos deste livro As duas seções iniciais tratam de aspectos demográficos e do ritmo de crescimento durante o período imperial A seção 3 considera as principais culturas agrícolas sua evolução no tempo e distribuição regional além de fazer referência aos outros setores de menor importância como indústria e mineração As três seções seguintes abordam os fatores de produção relevantes na expansão da cultura cafeeira no Brasil imperial trabalho terra e capital Nas seções 7 8 e 9 são consideradas questões relacionadas ao comércio exterior aos diferentes regimes monetários e às finanças públicas A seção 10 conclui nossa discussão A partir da década de 1580 o Brasil colônia portuguesa tornouse o principal produtor mundial de açúcar com base no trabalho de escravos africanos posição que manteve até a segunda metade do século XVII A colônia também produzia fumo madeiras e couros Nas últimas décadas do século a concorrência de colônias inglesas francesas e holandesas no Caribe prejudicou a economia açucareira do Brasil que perdeu sua hegemonia mas a descoberta de ouro nos anos 1690 resultou em nova fase de prosperidade para a colônia No século XVIII o Brasil foi o maior produtor mundial de ouro com cerca de 40 do volume total produzido entre 1701 e 1800 com produção estimada entre 800 e 900 toneladas Morrisson Barrandon e Morrisson 1999 p 94 Pinto 1979 p 114117 e Morineau 1985 p 145 Entre a vinda da família real para o Brasil em 1808 e a Independência o café cultivado no Sudeste se tornou a terceira maior exportação em valor excedida ainda pelas de açúcar e de algodão ambas produzidas com trabalho escravo predominante nas grandes plantações Em 182122 as exportações totais brasileiras teriam sido em média de 19937 contos ou 42 milhões de libras comparadas a 34 milhões em 18011803 IBGE EHB 1990 p 568 e Lago 1978 p 663 1 População Na Independência em 1822 o Brasil tinha provavelmente uma população entre 45 e 48 milhões de habitantes e cerca de um terço era escrava inferências a partir de Oliveira 1866 p 159199 e tabelas e Mortara 1941 citados em IBGE EHB 1990 p 2627 Em 1850 a população brasileira possuía cerca de 75 milhões de habitantes com os escravos ainda respondendo por volta de 30 do total Furtado 1959 p 141 Merrick e Graham 1980 p 4647 e Mortara em IBGE EHB 1990 p 2527 O censo de 1872 revelaria 101 milhões de habitantes com a população escrava excedendo 15 milhão O recenseamento de 1890 situou a população brasileira em 143 milhões Três anos antes em 188687 às vésperas da abolição da escravidão ainda existiam pouco mais de 700 mil escravos Informações reconhecidamente deficientes referentes a 1819 mostram o Nordeste como a região mais populosa com cerca de 47 da população total seguida da região cafeeira ou Sudeste com cerca de 40 O Sul teria pouco mais de 5 o Norte talvez 4 e o Centro Oeste 3 Em 1872 dados censitários mostram o Nordeste com os quase mesmos 466 as quatro províncias cafeeiras e a Corte com 407 o Sul com 73 e o Norte e o CentroOeste com respectivamente 33 e 22 da população total Em 1890 consolidou se a perda relativa do Nordeste para 419 participação já excedida pela da região cafeeira com 426 Destacouse no período o salto da população do Sul para 10 enquanto as participações do Norte e do CentroOeste se mantiveram praticamente inalteradas IBGE EHB 1990 p 34 Enquanto que nas proximidades dos anos da Independência o número de escravos era aproximadamente o mesmo no Nordeste e na região cafeeira o total de escravos nesta última já era 75 mais elevado do que no Nordeste em 1872 e cerca de 133 mais elevado em 188687 Os dados da matrícula dos escravos atualizados de forma muitas vezes precária para 188687 mostram ainda no Nordeste cerca de 284 do total enquanto a região cafeeira somava 656 e o Sul 24 Em 1821 um levantamento estatístico detalhado revelou população total de 112695 habitantes na Corte ou seja na cidade do Rio de Janeiro Salvador possívelmente tinha cerca de 70 mil habitantes e Recife de 25 a 30 mil De acordo com o censo de 1872 apenas três cidades tinham mais de 100 mil habitantes O Rio de Janeiro continuava sendo o maior centro urbano com 275 mil habitantes Salvador era ainda a segunda maior cidade com 129 mil habitantes seguida de Recife com 117 mil A porcentagem de analfabetos era de 843 no Brasil como um todo Em 1890 a cidade do Rio de Janeiro tinha 523 mil habitantes Salvador 174 mil e Recife 112 mil São Paulo surgia como a quarta maior cidade do país com 65 mil habitantes O índice de analfabetismo do país permanecia em torno de 85 2 Estimativas de produto Dados sobre produto e renda no século XIX são extremamente precários Consequentemente as estimativas existentes devem ser tomadas como aproximações bastante grosseiras Até mesmo os dados sobre comércio exterior são pouco confiáveis Apesar de existirem séries oficiais de comércio exterior a partir de 1821 compiladas no Anuário Estatístico do IBGE de 193940 um exame dos dados sugere que até 183940 muitas das séries agregadas são inferidas de indicadores parciais Os dados referentes ao período 18401889 permitem estimar tendências principalmente da produção agropecuária No entanto aqueles sobre o setor secundário e sobre o setor terciário que já deviam responder por cerca da metade do PIB em 1889 são muitas vezes de natureza qualitativa Optando por visão de muito longo prazo Coatsworth 1978 Quadro 1 sugere uma taxa média anual de crescimento do PIB per capita do Brasil de 036 ao ano entre 1800 e 1860 e de 040 para o período 1860 a 1910 contra 2 do México de 1860 a 1910 Cárdenas Sánchez 2003 p 318 Maddison 2006 p 520 por sua vez sugere taxa de 02 entre 1820 e 1870 e de 03 entre 1870 e 1913 Estimativa particularmente inaceitável é a de Engerman e Sokoloff 1997 p 270 que apresentam taxa de crescimento do PIB per capita do Brasil de 04 entre 1800 e 1850 mas um declínio de 04 ao ano entre 1850 e 1913 incompatível com o crescimento da economia cafeeira e a diversificação da economia que abarca também o período de prosperidade da borracha Contador e Haddad sugerem para o subperíodo 18621889 taxa de crescimento anual do PIB total de 268 e de 086 do PIB real per capita Goldsmith 1986 p 20 No entanto esse índice baseado em número limitado de séries a preços correntes tem a restrição de se basear num índice de preços inteiramente inadequado além de depender de algumas hipóteses questionáveis sobre o funcionamento da economia do Brasil no século passado IBGE EHB 1987 p 88 Furtado após considerar que o produto per capita ficou praticamente estagnado na primeira metade do século XIX e baseandose em estatísticas do comércio exterior estimou um crescimento da renda per capita da região cafeeira de 23 entre 1850 e 1900 e uma taxa de 15 ao ano para o país como um todo que hoje parece muito otimista Furtado 1959 p 176178 As exportações per capita mantiveramse em torno de 0910habitante até 1850 aumentando nas décadas de 1850 e 1860 para alcançar um novo patamar em torno de 17habitante nas décadas de 1860 1870 e 1880 Goldsmith 1986 p 8 baseandose em séries bem mais detalhadas mas também arbitrárias média de índice de salários pagos exportações mais importações gastos governamentais do governo central e conceito de moeda M2 também a preços correntes mas com deflatores de qualidade discutível sugere taxa de crescimento do PIB per capita de apenas 0 34 entre 1850 e 1889 e crescimento global anual do PIB à taxa de 204 Utilizando dólares de 1990 com a metodologia de GearyKhamis e projetando o PIB per capita retroativamente para anos passados Maddison 2006 p 437439 465 e 520 estimou o PIB per capita brasileiro em 1820 em US646 contra US759 para o México e US1257 para os Estados Unidos e a média de US1245 para 12 países desenvolvidos da Europa Ocidental Esses dados sugerem que o hiato entre o Brasil e os países mais avançados não teria sido ainda muito apreciável naquele ano Já para 1890 Maddison estimou para o Brasil um PIB per capita de US794 contra US2152 para a Argentina e US1011 para o México sendo as cifras correspondentes para o Reino Unido e os Estados Unidos respectivamente US4009 e US3392 o que indicaria crescimento bem mais lento do Brasil e aumento das disparidades em relação a outros países latino americanos e a países desenvolvidos De fato a relação entre o PIB britânico e o brasileiro já excederia 51 Em suma segundo tais dados o PIB real per capita do Brasil teria aumentado apenas 229 entre 1820 e 1890 ou seja a uma taxa anual ligeiramente inferior a 03 Um intervalo amplo para a taxa de crescimento anual do PIB per capita entre 02 e 05 para o período imperial poderia ser adotado como conjectura razoável com base nas evidências que sugerem importantes diferenças regionais O Nordeste deve ter apresentado taxa de crescimento próxima a zero ou ligeiramente negativa entre 1822 e 1850 algum crescimento entre 1850 e o início dos anos 1870 e taxa provavelmente negativa entre 1875 e 1889 O Norte cresceu a taxas elevadas da ordem de talvez 4 ao ano per capita entre 1850 e 1889 mas a sua participação na população total era pequena da ordem de 3 O Sul do Brasil teria tido crescimento per capita ligeiramente positivo e a renda da região cafeeira talvez tenha crescido a uma taxa de longo prazo de 15 a 2 per capita que com ponderação de cerca de 41 teria contribuído para um crescimento per capita global de talvez 06 a 08 A queda durante parte do período de renda per capita do Nordeste ainda com 42 da população em 1890 pode ter reduzido esta taxa para cerca da metade Uma taxa de crescimento para a economia como um todo de 03 ou até 04 ao ano para o período imperial como um todo parece plausível 3 Atividade 31 Agricultura e regiões Quando o Brasil alcançou a Independência o setor primário certamente respondia por grande parte do produto interno e das exportações com predominância da agropecuária Não existem estatísticas de produção agrícola para o século XIX Os dados disponíveis referemse à exportação para mercados externos que são uma aproximação da produção de artigos específicos por excluírem o consumo intraprovincial e o comércio de cabotagem ou por via terrestre para outras províncias No período imperial três produtos agrícolas que tinham sido importantes no período colonial continuaram a ter grande relevância na pauta de exportações o açúcar o algodão e o fumo mas o café ultrapassaria definitivamente o açúcar como o principal produto exportado em termos de valor no início da década de 1830 A predominância dos quatro produtos fica evidente de sua participação conjunta no total das exportações Em 182122 com as ressalvas que os dados globais relativos a esses anos merecem teriam respondido por 23 das exportações totais sendo que couros e peles respondiam por outros 15 Em meados do século tomandose a média do biênio 184950 e 185051 a participação dos quatro produtos alcançaria 817 reduzindose no biênio 18881889 para 722 em virtude da ascensão da borracha que nesses últimos dois anos respondeu por 142 do valor exportado Em uma economia com crescimento demográfico superior a 15 ao ano e com produtos de exportação também amplamente demandados no mercado interno seria de esperar um aumento do consumo absoluto e até relativo desses mesmos produtos no próprio país Com a possível exceção do café pelo menos em termos de intensidade relativa o aumento da população brasileira deve ter contribuído para uma redução apreciável da fração exportada de produtos tradicionais como o açúcar o algodão e o fumo e também de produtos da pecuária Existem vários indicadores para o final do Império além de comentários de contemporâneos que confirmam essa tendência Tanto no caso do açúcar quanto no do algodão por exemplo diante dos números de produção estimada e de exportações para o estrangeiro não é de se excluir a hipótese de que pelo menos de 14 a 13 da produção no final dos anos 1880 já eram consumidos no mercado doméstico admitindose uma capacidade instalada de produção de açúcar entre 300 e 400 mil toneladas e uma produção de algodão entre 40 e 50 mil toneladas Wyndham 1887 p 36 Na seção 7 a seguir sobre comércio exterior tratase da evolução das exportações agrícolas Nesta subseção o principal objetivo é registrar as consequências do aumento da importância relativa das exportações de café e em menor medida de borracha às expensas das exportações de açúcar algodão e couros e peles sobre a distribuição regional das exportações Entre o início e o fim do Império a participação das exportações de café nas exportações totais aumentou de menos de 20 para mais de 60 O café era produzido inicialmente apenas na província do Rio de Janeiro e em menor medida no norte de São Paulo Ainda na década de 1840 o Rio de Janeiro respondia por quase 80 da exportação total com 16 correspondendo a São Paulo e cerca de 6 a Minas Gerais No início dos anos 1870 o Rio de Janeiro ainda exportava cerca de 55 do total de café São Paulo cerca de 23 dos quais 17 do CentroOeste Paulista e Minas cerca de 14 Nos anos 1880 o Rio de Janeiro ainda exportava quase 41 do café São Paulo cerca de 35 27 do CentroOeste Paulista e Minas Gerais cerca de 21 sendo o Espírito Santo um produtor marginal com cerca de 4 A importância do açúcar nas exportações brasileiras caiu durante o Império de cerca de 30 para em torno de 10 Por volta dos anos da Independência a província de Pernambuco respondia por cerca de 13 das exportações brasileiras de açúcar 42 mil toneladas cabendo à Bahia cerca de 28 ao Rio de Janeiro 14 e a São Paulo 18 do total Em torno de 1850 o volume havia praticamente triplicado No início da década Pernambuco respondia por 43 do valor exportado seguido da Bahia incluindo parte da produção de Sergipe com 36 e de Alagoas Rio de Janeiro Paraíba e São Paulo com de 3 a 4 cada Antes da grande seca mantinhase a predominância de Pernambuco enquanto a produção de Rio de Janeiro e São Paulo passara a atender principalmente o consumo interno Na primeira metade dos anos 1880 as exportações de açúcar alcançaram o seu pico no período imperial 329 mil toneladas em 188384 228 mil toneladas em média no quinquênio mas caíram significativamente no final da década para 106 mil toneladas representando apenas 72 da exportação total Nos últimos anos do Império Pernambuco permanecia como principal exportador com cerca de metade do total cabendo a Alagoas cerca de 15 a 20 do total à Bahia talvez um pouco mais e o restante em partes iguais a Maranhão Paraíba e Rio Grande do Norte A importância do algodão nas exportações totais brasileiras caiu durante o Império de cerca de 21 para em torno de 4 das exportações totais As exportações de algodão permaneceram em um patamar modesto entre os anos 1820 e o início dos anos 1850 em torno das 1213 mil toneladas com predomínio de Pernambuco e Maranhão Começaram a crescer no final dos anos 1850 e especialmente com a fome de algodão provocada pela Guerra da Secessão nos Estados Unidos O pico de quantidade exportada no Império foi alcançado no início dos da década de 1870 com mais de 62 mil toneladas médias em 187172 e 187273 cabendo então pouco menos de 15 a São Paulo A partir de então as exportações caíram depois da seca de 187779 estavam de volta a um patamar de 12 mil toneladas Nos anos 1880 as exportações oscilaram entre 34 e 14 mil toneladas mas o consumo doméstico já havia se tornado muito relevante Como já mencionado as exportações tornaramse indicador inadequado da evolução da produção de algodão Embora a participação das exportações de fumo nas exportações totais tenha se reduzido durante o Império o seu volume aumentou gradativamente de cerca de 7 mil toneladas nos anos 1850 para mais de 20 mil toneladas nos anos 1880 O grosso das exportações tinha origem na Bahia mais de 70 nos anos 1850 e mais de 80 no final dos anos 1880 Minas era um produtor relevante mas sua produção era colocada no mercado brasileiro como também parte da produção das colônias do Rio Grande do Sul De forma similar a importância das exportações de couros e peles caiu de 23 desde os anos 1820 representado cerca de 4 do total no final dos anos 1880 As quantidades exportadas dobraram entre os anos 1820 e o início dos anos 1880 até alcançar cerca de 23 mil toneladas e caíram para 20 mil toneladas no final da década o Rio Grande do Sul mantendose sempre como principal província produtora A borracha não foi inicialmente um produto importante na pauta de exportações do Império A partir da década de 1840 e principalmente dos anos 1850 as quantidades e valores aumentaram consideravelmente e o produto não só passou a ser a principal exportação da região amazônica mas também um dos principais produtos de exportação do Império No início da década de 1850 o Pará exportava cerca de 1500 toneladas No final da década de 1880 a Amazônia exportava cerca de 15 mil toneladas e respondia por grande parte da oferta mundial do produto 32 Indústria O primeiro quarto de século da vida independente do Brasil foi marcado pelos importantes custos associados a concessões tanto à antiga metrópole quanto à GrãBretanha intermediária natural para a legitimação do novo regime Houve compensação financeira do Brasil a Portugal mas as concessões à GrãBretanha tiveram muito mais importância no longo prazo para a economia do Brasil independente O enorme poder de barganha da GrãBretanha resultou na renovação dos compromissos contraídos por Portugal em relação à escravidão que serão tratados adiante e à tarifa de importação Em 1827 foram renovadas as disposições tarifárias de 1810 por 15 anos sendo a tarifa de importação de 15 estendida a todas as nações Embora a crítica à renovação da vigência da tarifa de importação 15 habitualmente enfatize os efeitos nocivos sobre competidores domésticos cabem dúvidas sobre quais seriam as possibilidades efetivas de resposta da oferta doméstica no quadro de um regime protecionista alternativo O fato é que deixando de lado as exageradas referências ao desenvolvimento da indústria siderúrgica em Minas Gerais não existiam as condições para que houvesse oferta doméstica relevante para competir com importações Os custos do tratado foram essencialmente de natureza fiscal Dada a importância do imposto de importação na receita comum a outras economias em desenvolvimento a limitação tarifária gerou grande vulnerabilidade nas finanças públicas imperiais até meados da década de 1840 Só em 1845 o Brasil recuperaria graus de liberdade na definição de sua política comercial que permitiriam um aumento paulatino da tarifa de importação2 A preponderância da agricultura na economia brasileira no período imperial era marcante Embora o governo imperial tenha distribuído subsídios importantes a diversos estabelecimentos industriais a indústria brasileira no Império tinha peso econômico modesto não obstante a importância em alguns casos efêmera de estabelecimentos isolados como o estaleiro de Ponta dAreia o Arsenal de Marinha e o Arsenal de Guerra Mauá 1998 p 446 e 100104 e Faria 1946 cap VII Havia uma indústria incipiente na década de 1880 Suzigan 2000 muitas vezes em unidades pequenas ou até artesanais incluindo principalmente processamento de alimentos têxtil e vestuário e bebidas respondendo talvez por 10 do PIB Em 1889 a contribuição da indústria doméstica para a oferta total de produtos têxteis de algodão exatamente o setor classicamente pioneiro em outras experiências nacionais de substituição de importações seria talvez de 153 Um surto mais importante de industrialização no Brasil só ocorreria na esteira das políticas macroeconômicas expansionistas do início do regime republicano ver Suzigan 2000 33 Mineração As atividades de mineração no Brasil durante o Império especialmente de ouro Minas Gerais e diamantes Minas Gerais e Bahia alcançaram um pico na década de 1850 e depois declinaram lentamente Três empresas britânicas que se instalaram nas décadas de 1820 e 1830 tiveram algum sucesso na extração de ouro a Imperial Brazilian Mining Company explorou a mina de Gongo Soco de 1828 a 1856 e a St John del Rey Mining Company operou sua mina de Morro Velho até a segunda metade do século XX enquanto foi mais efêmera a Brazilian Mining Co entre 1832 e 1844 Stone 1987 p 44D Na década de 1840 as três companhias chegaram a produzir cerca de 15 toneladas de ouro por ano cerca de 10 da produção nos melhores anos do período colonial Lago 1978 p 742743 As exportações de ouro e diamantes declinaram de algo em torno de 5 das exportações totais no início da década de 1850 para menos de 1 no final da década de 1880 34 Serviços Os dados sobre o setor serviços são fragmentários exceto o setor ferroviário que é tratado juntamente com outros investimentos na infraestrutura de exportação na seção 6 Basta mencionar que partindose de pouco mais de 700 km em operação em 1870 em 1889 a rede em tráfego havia alcançado 9583 km Os investimentos inclusive estrangeiros na provisão de serviços públicos tornaramse importantes à medida que aumentava a importância relativa da população urbana Houve participação significativa de capital estrangeiro principalmente em companhias de iluminação a gás e também em serviços de bondes e suprimento de água e esgotos desde a década de 1860 Outros serviços também acompanharam certa diversificação da economia O comércio de atacado e varejo e o serviço doméstico ocupavam centenas de milhares de pessoas O setor público manteve dimensões modestas possivelmente empregando menos de 20 mil funcionários mesmo considerando todos os empregados em educação e justiça e os 10710 funcionários públicos registrados pelo censo de 1872 A esses se somavam apenas 27716 militares O Brasil teve precocemente um sistema postal público que em 1880 contava 1303 agências quando já despachavamse milhões de cartas Adamson 1881 p 613 No entanto o predomínio do emprego rural correspondendo a cerca de 23 da população economicamente ativa IBGE EHB 1990 p 72 limitava inevitavelmente o desenvolvimento do setor serviços 4 Fatores de produção trabalho 41 Imigração trabalho assalariado Entre 1822 e 1850 a imigração europeia foi muito modesta especialmente se comparada ao influxo de escravos africanos Estatísticas incompletas mostram apenas 14984 entradas de imigrantes livres no período IBGE O Brasil em Números 1960 p 12 Houve inicialmente por parte do governo imperial a tentativa de promover colônias agrícolas de imigrantes europeus principalmente alemães e suíços seguindo os exemplos de Nova Friburgo e de Leopoldina Bahia criadas sob o reinado de D João VI Destacase o Rio Grande do Sul na década de 1820 com 4856 imigrantes Mais tarde o governo imperial promoveu a fundação de Petrópolis no Rio de Janeiro em 1845 e Santa Isabel no Espírito Santo em 1847 com imigrantes alemães Houve também imigração espontânea para as principais cidades brasileiras principalmente de portugueses Por volta de meados do século quando se deu a interrupção do tráfico africano houve dois tipos de iniciativas que resultaram em aumento da imigração europeia na região cafeeira e no sul do Brasil As colônias de parceria iniciadas em 1847 representaram tentativa de utilização do trabalho livre estrangeiro principalmente no cultivo de café e chegaram a absorver alguns milhares de colonos Abusos da parte dos grandes proprietários e a origem muitas vezes não agrícola dos parceiros que contribuíam para que estes ficassem endividados por longos períodos resultaram em conflitos que desencorajaram os fazendeiros a financiar a vinda de novos colonos e estimularam restrições nos países de origem No Sul criaramse colônias agrícolas de pequenos proprietários por iniciativa pública governos provincial e imperial e privada que foram muitas vezes bemsucedidas Em contraste algumas iniciativas públicas e privadas de colonização europeia no Nordeste a partir de 1850 não foram bemsucedidas A estatística oficial de imigração para o Brasil que aponta 219229 entradas brutas entre 1851 e 1870 envolve subestimação conforme sugerido pelos dados de emigração dos países de origem4 A imigração para São Paulo foi inicialmente modesta com 6413 entradas registradas entre 1851 e 1860 e outras 1732 entre 1861 e 1870 A lei provincial de 3 de março de 1871 permitiu o auxílio a fazendeiros para importar trabalhadores europeus dando preferência a imigrantes da Europa do Norte sem grandes consequências imediatas Quando a assembleia provincial de São Paulo autorizou o pagamento do custo integral das passagens no início de 1884 abriuse definitivamente o caminho para a substituição do trabalho escravo pelo trabalho livre europeu em maior escala De fato o governo provincial gastara com imigração no início dos anos 1880 uma média de 50 contos por ano que passaram a mais de 1100 contos em 188687 Costa 1966 p 189905 Entre 1871 e 1880 a estatística oficial para o Brasil como um todo aponta a entrada de 219128 imigrantes equivalente ao total das duas décadas anteriores com média anual de quase 11 mil imigrantes passando a nacionalidade italiana a predominar no final dos anos 1870 Entre 1881 e 1885 as entradas no Brasil alcançaram mais de 133 mil imigrantes média anual de quase 27 mil entrando mais de 32 mil em 1886 Foi entre 1887 e 1889 que a imigração aumentou consideravelmente alcançando pelo menos 252 mil pessoas Destas cerca de 152 mil destinaramse a São Paulo Em 1888 e 1889 o governo imperial assinou sete contratos para a entrada de cerca de 775 mil imigrantes nos cinco anos seguintes intervenção direta no mercado de trabalho que criou uma oferta elástica de mão de obra estrangeira e que pode ter prejudicado a absorção de libertos e brasileiros natos pelo setor exportador 42 Escravidão Na primeira metade do século XIX a importação de escravos para a região cafeeira respondeu possivelmente por mais de 23 das importações totais de escravos no Brasil que alcançaram aproximadamente 2 milhões de pessoas Durante esse mesmo período as diferenças entre o Sul e a região cafeeira por um lado e entre a região cafeeira e o Nordeste por outro tornaramse cada vez mais acentuadas em termos de oferta de mão de obra Enquanto no Nordeste que enfrentou preços desfavoráveis para seus principais produtos de exportação açúcar e algodão e em menor escala fumo e couros houve tendência à redução significativa da participação dos escravos na população total na região cafeeira tal participação não apresentou tendência de declínio acentuado e a população escrava teve forte aumento em números absolutos Como parte do preço da independência além das concessões feitas a Portugal o Brasil negociou com a GrãBretanha honrar os compromissos anteriores de Portugal quanto ao tráfico de escravos e à tarifa de importação O Brasil comprometeuse por convenção de 1826 a tornar o tráfico de escravos ilegal a partir de 1830 Durante quase 20 anos a convenção foi letra morta para inglês ver mas quando a GrãBretanha aboliu as preferências coloniais no final da década de 1840 os lobbies açucareiros do Caribe expostos à competição brasileira estimularam o uso da Royal Navy com base no Bill Aberdeen de 1845 para coibir o tráfico brasileiro ver Drescher 2004 Em seguida a diversos incidentes graves o governo imperial decidiu tornar o tráfico ilegal e reprimilo de fato em 1850 A extinção do tráfico teve importantes efeitos sobre a oferta agregada de escravos no país no contexto da taxa negativa de reprodução natural da população escrava e de crescente demanda pelos seus serviços ocorreu forte aumento de preço dos escravos e intensificação do tráfico interprovincial que por sua vez levou à concentração cada vez maior dos escravos na região cafeeira durante as duas décadas seguintes De fato o fim do tráfico de escravos africanos teve duas consequências básicas no Nordeste levou ao crescente emprego de mão de obra livre na produção de açúcar e de algodão e a significativas exportações interprovinciais de escravos principalmente para a região cafeeira Apesar da tendência favorável dos preços dos principais produtos do Nordeste na década de 1850 muitos proprietários de escravos da região especialmente os proprietários menores e mais necessitados foram atraídos pelos preços elevados oferecidos pelos seus escravos por agentes envolvidos no tráfico interprovincial e os venderam para as áreas cafeeiras Esta saída prosseguiria nas décadas seguintes Estimase que o tráfico interprovincial principalmente oriundo do Nordeste teria envolvido cerca de 200 mil escravos entre 1851 e 1881 Slenes 1976 p 138 e 169 Progressos semelhantes do trabalho livre se fizeram notar nas províncias de Mato Grosso e de Goiás que continuavam a se concentrar basicamente na criação de gado e no cultivo de alimentos para consumo local A situação da região cafeeira no entanto era muito distinta Inicialmente os fazendeiros tentaram importar trabalhadores europeus à sua custa com a esperança de que estes trabalhassem parte de suas plantações de café com base em contratos de parceria suplementando o trabalho dos escravos que continuariam a trabalhar em turmas em outras áreas separadas das fazendas No contrato de parceria a família de imigrantes obrigavase solidariamente a reembolsar as despesas do fazendeiro com sua viagem da Europa bem como os juros das somas adiantadas Por sua vez o fazendeiro creditava na conta dos colonos metade do valor líquido da venda do café colhido dos pés sob sua responsabilidade depois de deduzidas as despesas com processamento e transporte Os colonos também tinham direito à metade dos lucros da venda de eventuais excedentes das colheitas de gêneros alimentícios que houvessem cultivado Esperavase dos colonos portanto que trabalhassem na fazenda até terem dinheiro suficiente para pagar a dívida de toda a família e estes estavam sujeitos às estritas cláusulas da lei de 1837 relativa à locação de serviços de trabalhadores estrangeiros Esse sistema envolvia portanto grande dose de confiança dos colonos para com o fazendeiro que mantinha sua contabilidade Por diversas razões entre as quais se destacam a própria lei de 1837 sobre contratos de trabalho muito desfavorável para os trabalhadores uma série de abusos de parte dos fazendeiros bem como uma situação de endividamento quase permanente de numerosos colonos falharam os contratos de parceria originais adotados nos anos 1840 a 1850 e restavam poucos trabalhadores europeus em fazendas de café nos anos 1860 apesar das mudanças contratuais em favor dos colonos que foram gradualmente implementadas em São Paulo A chamada Lei do Ventre Livre Lei no 2040 de 28 de setembro de 1871 que declarava livres todos os filhos de escravos nascidos após essa data ditos ingênuos e determinava a matrícula dos escravos eliminou qualquer possibilidade de se criarem condições para que crescesse a população escrava do país No Nordeste a década de 1870 foi extremamente desfavorável O fim do boom do algodão e as dificuldades enfrentadas pelo setor açucareiro inclusive em virtude da moléstia da cana resultaram em crises regionais que culminaram com a violenta seca de 187779 que provocou direta e indiretamente a morte de centenas de milhares de pessoas na região migração para a região amazônica e estimulou a exportação de escravos para a região cafeeira No entanto conscientes do perigo político da concentração de escravos na região cafeeira os governos das províncias de São Paulo Minas Gerais e Rio de Janeiro estabeleceram um imposto extremamente elevado sobre a importação interprovincial de escravos Assim paradoxalmente um dos últimos fatores que favoreciam a subsistência da escravidão no Nordeste deixou de existir a impossibilidade de exportar os escravos e a demanda limitada por trabalho escravo em nível local levou a uma rápida queda do seu preço e estimulou a libertação espontânea de todos os escravos como por exemplo no Ceará em 1884 Na região cafeeira por ocasião da Lei do Ventre Livre o cultivo do café e do açúcar continuava caracterizado pela utilização quase exclusiva da mão de obra escrava Apenas uma fração dos poucos milhares de colonos europeus trazidos para trabalhar no cultivo do café no Rio de Janeiro e São Paulo ainda permanecia nas fazendas de café em 1870 Foi só em 1884 quando São Paulo aprovou legislação que permitia à província pagar a passagem dos imigrantes estrangeiros que foi removido o último obstáculo sério a seu emprego mais generalizado pelos fazendeiros de café A entrada maciça de imigrantes estrangeiros em São Paulo entre 1887 e 1889 já referida diante dos no máximo 107 mil escravos remanescentes certamente apressou consideravelmente a transição para o trabalho assalariado Os colonos por sua vez não eram assalariados ou proletários típicos pois apesar de receberem quantia fixa para o trato dos cafezais e quantia préacordada por unidade de café colhido mantinham algum controle sobre a alocação do seu trabalho também para culturas em proveito próprio e mostraram grande mobilidade entre fazendas apesar de claros casos de abusos de autoridade de certos grandes fazendeiros 5 Fatores de produção terra A questão da disponibilidade posse e distribuição de propriedade da terra em países de ocupação recente como os Estados Unidos e a Austrália mas também partes do Brasil é muitas vezes enfocada com base na chamada hipótese de Domar Domar 1970 que tem origens nos escritos de Wakefield e Marx no século XIX A versão extrema da hipótese afirma que dos três elementos de uma estrutura agrária em estudo terra livre camponeses livres e proprietários de terras inativos ou seja que não trabalham na terra diretamente dois elementos mas nunca os três podem existir simultaneamente No Brasil durante o período colonial desde a fase das capitanias hereditárias no século XVI a propriedade de terras foi concedida através de sesmarias ou de datas para a mineração de ouro no século XVIII a um número limitado de beneficiários teoricamente com condições de explorálas adequadamente prática que perduraria até o início do século XIX Até então uma relação terratrabalho elevada nas áreas em que extensas doações de terra tinham sido feitas pelas autoridades coloniais fora acompanhada de ampla utilização de escravos no trabalho agrícola caso tipicamente do Nordeste Por outro lado em todas as áreas em que a apropriação de terras por uma classe de grandes proprietários foi menos pronunciada ou não ocorreu realmente prevaleceu o padrão esperado na presença de uma relação terratrabalho elevada ou seja o de pequenas propriedades familiares trabalhadas predominantemente por mão de obra livre como no sul do Brasil nas áreas colonizadas por ilhéus no século XVIII e em muitas áreas de São Paulo onde em 1818 798 dos fogos não tinham escravos Lago 1978 cap 1 A expansão do cultivo de café afetou fundamentalmente a ocupação da terra Em poucas décadas os fazendeiros de café receberam sob a forma de sesmarias até 1822 compraram ou ocuparam de fato grande parte do vasto Vale do Paraíba e das áreas vizinhas nas províncias do Rio de Janeiro São Paulo e Minas Gerais em que se observavam condições favoráveis ao cultivo do café Muitas terras foram ocupadas sem título legal ao longo do processo de colonização do Brasil Na realidade na ausência de legislação clara e abrangente a ocupação de novas terras deuse através de simples posse muitas vezes prevalecendo os mais fortes sobre os mais fracos A coroa imperial perdera o poder de conceder sesmarias a partir de 1823 Durante quase três décadas a assembleia do Império não aprovou qualquer legislação para substituir o sistema colonial de concessão de terras A chamada Lei de Terras foi aprovada pelo poder legislativo do Império com o objetivo de sanar o vazio legal existente Essa lei de 18 de setembro de 1850 não impediu a usurpação posterior de terras públicas já que o registro de propriedades levaria décadas para se efetivar e que não era possível o controle da situação de todas as terras públicas por uma repartição governamental competente Dean 1971 Mas essa lei de 1850 seria essencial para consolidar a colonização do Sul do Brasil com base em pequenas propriedades de imigrantes em terras públicas não previamente alienadas O sucesso da política de colonização nas províncias do Sul foi inegável Por volta de 1870 já existiam milhares de famílias europeias principalmente alemãs estabelecidas em pequenas propriedades rurais em diversas colônias públicas e privadas no sul do Brasil produzindo excedentes apreciáveis de gêneros alimentícios para venda para outras províncias Outras dezenas de milhares de imigrantes chegariam até o final do Império estendendo a área de pequenas propriedades com trabalho dos próprios colonos e suas famílias como se esperaria com base na hipótese de Domar Na época da Abolição a faixa costeira do Nordeste onde se localizava a maioria das plantações de canadeaçúcar já se encontrava bastante densamente povoada em comparação ao Brasil como um todo Na medida em que grandes proprietários controlavam boa parte da terra o acesso à propriedade de terras por parte da população livre continuava difícil A apropriação legal de vastas extensões de terras por uma classe comparativamente pequena de proprietários reforçada pela proliferação de uma classe sem terras à qual se agregaram posteriormente os libertos contribuiu para que continuasse a existir no final do período imperial uma classe de proprietários inativos e latifundiários e uma classe de trabalhadores sem acesso à propriedade da terra situação compatível com a hipótese de Domar não se observando o surgimento de uma numerosa classe de pequenos produtores em estabelecimentos de tamanho familiar Em contraste com a política de colonização das províncias do Sul a política governamental na região cafeeira teve objetivos bastante diversos a partir de 1870 buscando suprir braços para a grande lavoura A colonização baseada na criação de pequenas propriedades com trabalho familiar se tornava portanto inviável pelo menos em grande escala e os governos locais se concentraram prioritariamente em fornecer trabalhadores às fazendas Com as exceções mencionadas principalmente no sul do país a estrutura fundiária resultante do período colonial baseada principalmente em grandes propriedades não se alterou significativamente ao longo do século XIX nem como resultado da abolição da escravidão As adaptações nos contratos dos colonos em São Paulo evitaram que os grandes proprietários tivessem que fracionar os seus domínios e o Nordeste Norte e o CentroOeste continuaram a ser regiões com predomínio de grandes propriedades Mesmo nas áreas cafeeiras mais antigas a reconversão para criação de gado e novas culturas permitiu muitas vezes a preservação de propriedades comparativamente extensas 6 Fatores de produção capital A crescente produção cafeeira gerou demanda por infraestrutura de exportação incluindo ferrovias portos cabos telegráficos submarinos e empresas de navegação a vapor Em um segundo momento em meio ao processo de urbanização investimentos expressivos foram realizados em empresas de serviços públicos água esgotos gás e mais adiante transporte público energia elétrica telefones Estes investimentos dependeram em parte da atração de investimento direto estrangeiro essencialmente britânico até o final do Império6 Além de investimento estrangeiro houve investimento considerável do governo central de governos provinciais e de capitalistas brasileiros especialmente em ferrovias Nestes investimentos ferroviários nacionais ocuparam posição destacada a Estrada de Ferro Central do Brasil do governo imperial com investimentos da ordem de 97 milhões no final do Império e as ferrovias privadas paulistas Sorocabana Mogiana e Ituana com investimentos totais de 22 milhões Branner 1887 p 89 Em 1840 o investimento direto britânico no Brasil era muito modesto com o estoque pouco excedendo 1 milhão Com a introdução da política de garantia de taxas de retorno discutida adiante aumentou substancialmente a partir da década de 1860 alcançando 73 milhões em 1865 106 milhões em 1875 244 milhões em 1885 e 406 milhões em meados da década de 1890 ver Tabela 11 montante que na América Latina era excedido apenas pelos investimentos na Argentina Os investimentos ferroviários corresponderam a uma fração crescente dos investimentos diretos totais alcançando mais de 80 na década de 1890 com o número de ferrovias britânicas em operação no Brasil aumentando de 3 em 1865 para 14 em 1885 Stone 1977 e 1987 Apesar da sua predominância como fornecedora de capitais a GrãBretanha sofria forte concorrência no fornecimento de locomotivas e trilhos Wyndham 1889 p 23 Tabela 11 Brasil setor externo 18201889 1820 1830 1850 1870 1889 Investimento direto estrangeiro milhões de libras 0 13 1840 73 1865 106 1875 406 1895 Dívida pública externa do governo central 1000 libras 5332 6133 12721 30400 Exportações 1000 libras 4324 1821 3348 8121 185051 15430 187071 28552 Estrutura Café do total 184 438 481 566 615 Açúcar do total 301 240 212 118 99 Algodão do total 206 108 62 95 42 Couros e peles do total 136 79 72 56 32 Borracha do total 01 03 23 55 80 Destino GrãBretanha do total 174 1806 279 184243 355 185253 369 187273 130 1901 Estados Unidos do total 0 1806 166 184243 324 185253 293 187273 430 1901 França do total 348 1806 60 184243 61 185253 87 187273 117 1901 Alemanha do total 171 1806 118 184243 50 185253 76 187273 148 1901 Portugal do total 100 75 41 62 60 Importações 1000 libras 4571 1821 4007 9215 185051 14925 24002 Origem GrãBretanha do total 400 1806 484 184243 533 185253 515 187273 314 1901 Estados Unidos do total 06 1806 118 184243 85 185253 56 187273 124 1901 França do total 78 1806 120 184243 135 185253 146 187273 80 1901 Alemanha do total 76 1806 50 184243 59 185253 68 187273 94 1901 Portugal do total 100 80 66 80 65 Stone 1977 Bouças 1955 IBGE EHB 1990 IBGE Anuário 19391940 Médias por década Balbi 2004 Tratase do destino das exportações portuguesas de produtos originários do Brasil e da origem das importações totais de Portugal Por Alemanha entre 1806 e 1850 entendese Hamburgo em 1806 e posteriormente portos hanseáticos O investimento estrangeiro na indústria de transformação permaneceu comparativamente modesto Wyndham 1889 p 38 Em 1889 o capital conjunto de 35 empresas industriais cotadas na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro era de 362 mil contos ou 4 milhões principalmente de origem nacional CattapanReuter 1984 p 5859 Mas investimentos diretos estrangeiros foram também importantes em setores para os quais é difícil definir distribuição geográfica precisa entre diversos países da América Latina em especial bancos companhias de navegação e cabos submarinos O investimento em bancos será tratado na seção 8 a seguir As empresas de navegação mais importantes na época do Império eram as britânicas Royal Mail desde a década de 1860 Amazon Steam e Lamport Holt que asseguravam linhas entre portos brasileiros inclusive na Amazônia e a Europa e os Estados Unidos Embora houvesse competição principalmente de linhas francesas alemãs e norteamericanas a posição britânica era dominante Graham 1968 p 8991 e Stone 1987 Na navegação a vapor interior e na cabotagem tendia a predominar o capital nacional inclusive com subsídios do governo caso da Companhia Nacional de Navegação a Vapor mas a empresa criada por Mauá na região amazônica acabou comprada por capital britânico A partir dos anos 1870 foram estabelecidas linhas telegráficas para a Europa e os Estados Unidos As linhas submarinas foram constituídas por companhias britânicas sendo o primeiro cabo submarino para a Europa instalado em 1874 Haring 1958 p 69 A Brazilian Submarine Telegraph Co foi responsável pelas linhas transatlânticas e a Western and Brazilian Telegraph pelas linhas marítimas costeiras Graham 1968 p 303 Houve também investimento público especialmente em linhas telegráficas terrestres O sistema de garantias de taxas de retorno foi amplamente utilizado pelo governo imperial para competir com outros países primário exportadores na atração de investimento direto estrangeiro A expansão da infraestrutura dependeu de tais políticas ferrovias portos cabos submarinos empresas de navegação e de serviços públicos urbanos entre outros investimentos Só em 1902 as garantias ferroviárias foram rescindidas com o pagamento de indenização aos investidores O ônus das garantias de taxas mínimas de retorno era frequentemente repartido entre os governos central e provinciais Tipicamente no caso das ferrovias a taxa de retorno garantida era de 7 cabendo frequentemente 5 ao governo imperial e 2 às províncias comparado ao retorno dos títulos da dívida pública britânica que oscilou entre 24 e 34 entre 1860 e 1902 As raras empresas altamente lucrativas repartiam lucros com o governo acima de uma taxa predeterminada e podiam redefinir o contrato inicial depois de quitar as garantias pagas pelo governo a partir de sua implantação Graham 1968 p 149159 Rodrigues 1902 e Monteiro 1993 O benefício para o país da política de garantia de juros é objeto de controvérsia Sob vários aspectos as ferrovias representaram importantes ganhos para a economia brasileira Para os usuários o aumento da capacidade rapidez e pontualidade do transporte e alcance de áreas menos acessíveis com custos reduzidos para não falar da maior comodidade do ainda limitado número de passageiros deve ter correspondido a um elevado retorno social Quanto a fretes basta mencionar que no Nordeste nos anos 1860 trazer um fardo de algodão a dorso de mula do interior para a costa custava outro fardo ou 100 do valor do produto Em 1878 o frete ferroviário do interior de Pernambuco para Recife já caíra para 25 a 30 do preço do algodão Branner 1885 p 25 Evidências para São Paulo por volta de 1887 sugerem um frete ferroviário equivalente a 14 do custo do transporte das mesmas toneladaskm com os meios tradicionais de carroças ou tropas de mulas o que resultaria em apreciável poupança social direta das ferrovias que devem ter contribuído para ganhos de renda per capita ao permitir a expansão das exportações e especialmente do setor cafeeiro Summerhill 1998 p 388 Quanto à rentabilidade das linhas estas podiam apresentar lucratividade adequada enquanto o café representou parte apreciável da carga Dentre as três ferrovias paulistas Paulista Mogiana e Sorocabana esse parece ter sido o caso das duas primeiras até o final do período imperial Saes 1976 p 7785 Isso não impede que se levante a questão de que o custo de construção e operação possa ter sido excessivamente elevado principalmente em função da garantia de juros De fato as estradas de ferro representaram o principal item de despesa do governo imperial a partir dos anos 1860 Dean 1986 p 713 Havia 16 empresas beneficiadas com garantias com capital de 167 milhões e apenas 2900 km de linhas dos 9600 km existentes em 1889 Cumulativamente o governo teria gasto em menos de 30 anos até 1888 cerca de 113 milhões honrando garantias Wyndham 1889 p 4849 Embora tenha havido casos de flagrante incompetência de investidores estrangeiros quanto a investimentos ferroviários que levaram a prejuízos tais perdas são desprezíveis quando comparadas aos investimentos em engenhos centrais principalmente no Nordeste na década de 1880 sem dúvida o mais retumbante fracasso do governo imperial na implementação de políticas públicas baseadas na garantia de taxas de retorno Wyndham 1889 p 5354 e Eisenberg 1974 cap 5 Os engenhos centrais muitas vezes falharam em virtude do choque de interesses entre os empresários associados aos engenhos centrais que necessitavam de grandes quantidades de cana para operar com escala eficiente e os plantadores e senhores de engenho remanescentes que tentavam não depender dos engenhos centrais para colocar a sua produção Williams 1895 p 7 e 15 Já as usinas principalmente de capital nacional seriam bemsucedidas principalmente na República 7 Comércio exterior A importância do Brasil como economia primárioexportadora pode ser avaliada com base na sua participação nas exportações mundiais totais Dados muito precários indicam que houve queda importante desta participação nos primeiros 20 anos do Império talvez de algo em torno de 28 para cerca de 2 estabilizandose em seguida pouco abaixo deste patamar7 As séries tradicionalmente aceitas de exportação e importação total no período imperial são sabidamente precárias especialmente até 1839408 A estrutura das exportações modificouse consideravelmente no curso do Império com significativa expansão da importância do café especialmente antes de 1850 pari passu com a expansão da participação do Brasil no mercado mundial do café que já correspondia à metade da oferta mundial em meados do século Nos anos 1880 com a participação brasileira já em torno de 60 ficaria claro que os competidores asiáticos no mercado cafeeiro seriam duramente afetados pela ferrugem abrindo espaço para a expansão espetacular da produção brasileira no período republicano McCook 2006 Paralelamente as exportações brasileiras de açúcar perderam muito da sua importância relativa mais de 21 do total mundial na década 1850 menos de 10 na década de 1880 No final da década de 1880 o Brasil exportava apenas cerca de 30 mais açúcar do que no início da década de 1850 O mercado mundial de açúcar na segunda metade do século XIX foi dominado pela expansão muito mais rápida do açúcar de beterraba do que do açúcar de cana Em 1850 o açúcar de beterraba teria correspondido a 16 do total em 1870 a 35 e a mais de 60 em 18909 As exportações de algodão tiveram comportamento similar às de açúcar perdendo participação embora não de forma tão significativa Além disto durante um período limitado as exportações brasileiras de algodão se beneficiaram da fome de algodão na primeira metade dos anos 1860 decorrente do bloqueio da União à Confederação que abarcava todos os estados produtores de algodão nos Estados Unidos As exportações de borracha mostraram franca expansão após 1870 representando já naquela década cerca de 5 das exportações totais Na última década do Império a borracha foi o terceiro principal produto de exportação do país respondendo por 8 do total ver Tabela 11 O Brasil era então o maior produtor mundial respondendo por mais de 60 da oferta10 A mudança na estrutura das exportações determinou em larga medida a sua reorientação geográfica com a GrãBretanha modesto mercado para o café perdendo importância principalmente para os Estados Unidos mas também para países da Europa Continental A partir de 1873 além disto o café brasileiro teve assegurada livre entrada no mercado norteamericano com a implementação da política republicana da free breakfast table No final dos anos 1880 o Brasil respondia por quase 70 das importações de café dos Estados Unidos Em contraste o café era pesadamente taxado na Europa através de imposto de importação ou impostos sobre consumo As exportações para a GrãBretanha caíram desde meados do século de pouco mais de 13 do total das exportações para 16 ou 17 do total enquanto as exportações para os Estados Unidos tendiam a ultrapassar 40 do total ver Tabela 11 A mudança da estrutura de origem das importações no período imperial refletiu o declínio da capacidade competitiva das importações britânicas paulatinamente substituídas por produtos concorrentes especialmente da Alemanha e dos Estados Unidos Em meados do século correspondiam à metade das importações totais brasileiras e na virada para o século XX haviam caído para 314 ver Tabela 11 O Brasil dependia quase que exclusivamente de importações para o suprimento de um amplo leque de bens manufaturados Em meados dos 1870 artefatos de algodão correspondiam a 275 das importações bebidas a 18 peixes a 10 artefatos de lã a 66 trigo e farinha de trigo a 5 carvão a 39 Máquinas respondiam por apenas 17 do total embora sua importância tenha talvez dobrado na década de 1880 Soares 1883 A tarifa brasileira aumentou significativamente no correr do Império A proporção entre arrecadação de direitos de importação e o valor das importações permaneceu em torno de 17 nos 1830 cresceu rapidamente nos anos 1840 com a tarifa Alves Branco de 1844 permanecendo entre 25 e 30 até o final dos anos 1860 Depois disto continuou a aumentar primeiro para um patamar de 35 a 40 e depois alcançou quase 50 no final dos 188011 Os termos de intercâmbio entre 1830 e 1850 a julgar pelo comportamento dos preços mundiais de café e açúcar que compunham 34 da pauta de exportações brasileiras bem como dos preços das exportações da GrãBretanha melhoraram substancialmente talvez algo da ordem de 50 essencialmente movidos pelo barateamento das importações Deer 1949 p 531 e Mitchell e Deane 1971 p 331 Entre 1850 e 1870 não houve grande alteração mas em 1889 os termos de intercâmbio estavam 71 acima do nível de 1850 Enquanto o volume das exportações triplicou entre 1850 e 1889 o volume das importações cresceu 44 vezes IBGE EHB 1990 p 597 Considerandose uma média trienal centrada em 1890 o Brasil não se destacava em termos de exportação per capita com apenas US96 por habitante enquanto as cifras correspondentes eram US324 para a Argentina US203 para o Chile e US557 para Cuba mas somente US44 no caso do México BulmerThomas 1994 p 69 8 Regimes monetários câmbio e sistema financeiro 81 Regimes monetários Depois da Independência o Banco do Brasil continuou a emitir cédulas que constituíam boa parte do meio circulante Em 1829 não existia praticamente nenhuma circulação metálica a não ser de cobre Em vista da grande quantidade de moedas falsas de cobre o governo permitiu a sua substituição a partir de 1827 por cédulas No quadro da lei de 1833 o Tesouro também emitiu cédulas para o troco da moeda de cobre que tiveram curso legal até 1837 Em 1834 e 1835 em meio à crise dita do xemxem muitos governos provinciais impuseram contramarcas diminuindo o valor das moedas de cobre na tentativa de dificultar sua exportação Trigueiros 1987 p 6874 O governo se decidiria pelo monopólio de emissão do Tesouro inicialmente entre 1835 e 1838 e depois entre 1866 e 1889 ver Lissa 1987 p 1314 Coimbra 1960 tomo IV e Calógeras 1910 caps 4 e 5 A década de 1830 foi marcada por escassez de moeda em um quadro em que a Lei de Gresham a moeda má expulsa a boa estimulou a expulsão de ouro prata e cobre da circulação monetária e do país A circulação metálica voltou a ser importante apenas no fim da década de 1840 com o reinício da cunhagem de ouro e de prata em maiores valores mas somente até meados da década de 1860 com breve recuperação nos dois últimos anos do Império O segundo sistema monetário do Império envolvendo a quebra do padrão ou aviltamento redução do conteúdo do metal precioso das moedas da moeda metálica durou em princípio de 1833 e 1846 No final da década de 1840 uma nova legislação estabeleceu novos padrões para a emissão de moedas de ouro e prata que permaneceriam até 1889 ver Coimbra 1960 tomo IV cap XVI Prober 1966 p 1718 Trigueiros 1987 p 5657 e Calógeras 1960 cap 5 Dado que a circulação metálica não correspondia a uma proporção expressiva da oferta de moeda as oportunidades para apropriação relacionada à senhoriagem ou aviltamento da moeda metálica eram limitadas12 De fato não houve erosão de direitos de propriedade relacionados à circulação metálica talvez devido à melhora das contas públicas Por outro lado a expansão da circulação inconversível pressionou os preços domésticos e representou a imposição de imposto inflacionário em benefício do governo nos períodos em que o Tesouro tinha o monopólio de emissão Há indicações baseadas em índices de qualidade muito desigual de que os preços pelo menos dobraram no Brasil entre 1830 e 1889 Assim a inflação medida por preços ao consumidor embora muito inferior à que seria tipicamente registrada no período republicano foi muito superior à registrada nas economias desenvolvidas13 82 Câmbio e preços A paridade legal do milréis foi quebrada em 1833 de 675 pencemil réis para 435 pencemilréis e em 1846 para 27 pencemilréis14 O câmbio flutuou de forma significativa durante o Império embora em determinados períodos tenha sido mantido relativamente constante notavelmente nos 1850 e em meados dos 1870 em torno do par Houve contínua desvalorização até o início dos anos 1840 quando a taxa média anual mantevese entre 25 e 29 pencemilréis Alcançou a cotação mínima de 17 pence durante a Guerra do Paraguai recuperandose para 2527 pence em 187276 Com as dificuldades do final da década de 1870 ocorreu nova desvalorização mas após cair a 19 pence em 18841886 o milréis apreciouse rapidamente no final do Império rumo ao par ver Tabela 12 De fato em 188889 houve adesão formal ao padrãoouro à paridade de 27 pencemilréis rapidamente abandonada com a proclamação da República A depreciação cambial de 50 pencemilréis em 1823 para perto de 27 pencemilréis em 1889 foi aproximadamente em linha com a inflação estimada no período ver Tabela 12 Tabela 12 Brasil Finanças públicas 18201889 Levy 1995 IBGE EHB 1990 Buescu 1996 Goldsmith 1986 e Catão 1992 Carreira 1980 83 Sistema financeiro O Banco do Brasil herdado da administração portuguesa com poder de emissão mas desprovido de suas reservas metálicas com a partida da corte portuguesa foi liquidado em 1829 em meio a denúncias de gestão desastrada ver Calógeras 1960 caps III e IV Um novo Banco do Brasil surgiria apenas em 1853 quando na esteira do novo Código Comercial de 1850 o Banco do Brasil de Mauá Co foi transformado em Banco do Brasil controlado pelo governo Ao longo do período imperial alguns serviços financeiros foram providos aos cafeicultores pelos comissários que operavam como agentes dos cafeicultores nos grandes centros ver Laerne 1885 cap5 e Stein 1990 cap 4 e também por grandes comerciantes aos senhores de engenho Após o fechamento do primeiro Banco do Brasil em 1829 e não levando em conta a Caixa Econômica fundada em Salvador em 1834 bancos privados foram criados a partir de 1837 como o Banco Commercial do Rio de Janeiro fundado na Corte e outros a partir da década de 1840 sendo alguns exemplos o Banco Commercial da Bahia 1847 o Banco Commercial do Maranhão 1846 o Banco Commercial do Pará 1847 e o Banco de Pernambuco 1851 Diversos bancos criados no final da década de 1850 no Rio de Janeiro em Porto Alegre no Recife e na Bahia tiveram capacidade de emissão Novos bancos foram criados nas décadas de 1860 e 1870 mas sem direito de emissão entre outros o Banco de Campos 1863 o Comercial do Rio de Janeiro 1866 e o Rural e Hipotecário em 1868 com capital de 8 mil contos Pelaez e Suzigan 1981 p 117 De fato em 1866 foi abolida a emissão bancária e o Tesouro Nacional assumiu o monopólio da capacidade emissora Bancos estrangeiros especialmente britânicos adquiriram grande importância a partir da década de 1860 O London and Brazilian Bank foi fundado em 1862 com capital integralizado de 500 mil mesmo capital do Brazilian and Portuguese Bank fundado em 1863 e rebatizado English Bank of Rio de Janeiro em 1866 Em 1880 os ativos dos dois bancos eram da ordem de 2 milhões cada um O Deutsche Brasilianische Bank fundado no início dos 1870 fechou suas portas em 1875 mas o Brasilianische Bank für Deutschland foi fundado no final do período imperial Joslin 1963 Em 1880 o ativo do Banco do Brasil era da ordem de 17 milhões e os ativos agregados dos outros bancos brasileiros seriam da ordem de 19 milhões sendo quase 53 correspondentes aos quatro maiores bancos Predial do Commercio Rural e Hypothecario Commercial que tinham portanto em média porte equivalente ao dos dois bancos britânicos Ministério da Fazenda Relatório 1880 Em 1888 o capital do Banco do Brasil alcançava cerca de 33 milhões e o capital total dos bancos era estimado em 11 milhões com depósitos da ordem de 9 milhões Os depósitos em cadernetas de poupança principalmente no Rio de Janeiro e Bahia eram avaliados em 23 milhões Wyndham 1889 p 3 8 e 15 Até a década de 1850 casas bancárias prevaleciam na intermediação financeira A falência da casa bancária Souto e Cia em 1864 levou a uma considerável queda de participação desse tipo de estabelecimento nos negócios bancários De fato as casas financeiras que se tinham tornado importantes na década de 1850 demonstraram ser extremamente vulneráveis às crises geradas no centro do sistema financeiro internacional em vista do grande descompasso entre os prazos de liquidação de seus depósitos e de suas aplicações A crise comercial de 1857 gerou pesadas perdas em parte atenuadas pela acomodação do Banco do Brasil mas as casas financeiras continuaram suas atividades de grande risco financiando empresas de pouca solidez A onda de falências em 1864 arrastou boa parte das casas financeiras do Rio de Janeiro com o passivo total de 110500 contos o que gerou na liquidação perdas da ordem de 75 milhões valor equivalente a 50 dos meios de pagamento em 1864 O passivo de AJA Souto Cia nesta crise de 1864 não era muito diferente dos 5 milhões de Overend Gurney no centro da crise do mercado londrino dois anos depois Nas décadas de 1850 e 1860 a proporção de papelmoeda emitida pelos bancos aumentou até alcançar cerca de 80 do total em 186566 Houve a partir daí uma grande queda de importância das moedas metálicas no meio circulante Calógeras 1960 e Trigueiros 1987 p 87 89 Embora o Banco do Brasil se tenha empenhado em minorar as consequências das crises de 1857 e 1864 Pradez 1872 p164 pairaram acusações de que terseia retraído em 1875 acarretando a quebra do Banco Mauá Os depósitos bancários como proporção dos meios de pagamento aumentaram de menos de 10 em 1850 para cerca de 60 em 1889 enquanto segundo dados que inspiram grandes reservas os meios de pagamento teriam sido mantidos em torno dos 20 do PNB no final da década de 1820 e no final da década de 1880 Goldsmith 1984 p 36 e 44 A política monetária do Encilhamento nos anos iniciais da República baseouse em parte na legislação aprovada ao apagar das luzes do Império por influência dos papelistas permitindo a emissão múltipla para enfrentar ao aumento da demanda por moeda associada à abolição da escravidão 9 Finanças públicas 91 Receita Houve bastante continuidade das instituições relacionadas às finanças públicas entre a colônia e o Brasil independente Ainda em 1831 a legislação relativa a Tesourarias provinciais fazia referência à contratação de arrecadação de tributos por meio de leilões embora o sistema estivesse fadado a desaparecer em vista da eliminação do dízimo e do aumento da importância da taxação do comércio exterior15 Durante todo o Império a receita do governo central dependeu crucialmente dos impostos relacionados ao comércio externo principalmente sobre importações e exportações StratenPonthoz 1854 Os custos de arrecadar impostos internos eram muito superiores aos relativos a impostos sobre comércio exterior especialmente se o comércio fosse por via marítima16 Resistências políticas impediam a taxação da propriedade ou do uso da terra As chamadas taxas e direitos interiores incidiam sobre transações não relacionadas ao comércio exterior tais como transferência de imóveis e escravos contratos heranças e propriedade de escravos com empregos urbanos A participação do imposto de importação na receita ordinária do governo central depois de 1833 foi sempre superior a 50 aumentando para quase 60 no final dos anos 1830 e quase 70 em meados dos anos 1850 Depois disto reduziuse mantendose em torno de 5060 até o final do Império A taxa de exportação imperial depois de flutuar entre 5 e 7 na década de 1850 e início da década de 1860 foi aumentada para 9 durante a Guerra do Paraguai voltando a 7 em meados dos anos 1870 Impostos sobre exportação arrecadados pelo governo central correspondiam a mais de 5 da receita total no início dos anos 1830 mas sua participação aumentou rapidamente até alcançar 25 no final da década Depois de um recuo para 12 nos anos 1850 estabilizouse em torno de 15 a 17 só caindo no final dos anos 1880 de novo para 12 Os impostos de importação e exportação combinados aumentaram sua participação na receita total do governo central de algo abaixo de 60 para mais de 80 no início da década de 1850 No fim do Império esta ainda era superior a 70 ver Tabela 12 Embora novas taxas internas tenham sido criadas a receita ainda dependia essencialmente do comércio exterior Já foi mencionada a tendência ao aumento da tarifa de importação ao longo da história imperial até alcançar mais de 50 equivalente ad valorem17 A preeminência brasileira no mercado mundial de café somada à inelastidadepreço da demanda pelo produto tinha importantes implicações sobre a incidência da taxação sobre o café Era reconhecido já no século XIX que a taxação das exportações de café provavelmente resultaria em aumento do preço mundial de café ver Ridings 1994 p 195 citando Ministério da Fazenda Relatório 1872 p 75 e 1879 Anexo B p 56 Além disto pelas mesmas razões aumentos da tarifa de importação no Brasil implicavam aumento dos custos de produção de café com consequente impacto sobre a sua curva de oferta mundial e aumento de preços no mercado mundial combinado com modesta redução das quantidades demandadas A proteção alta tinha é claro um efeito regressivo desfavorável sobre a renda da população urbana que dependia de importações até mesmo no caso de bens salário notadamente têxteis e alimentos E também sobre as províncias exportadoras de outras commodities pois o Brasil não tinha poder de mercado nestes outros mercados e portanto o aumento de custos de produção resultava em perda de market share eou queda de lucratividade Similarmente taxar exportações em relação às quais o Brasil era um supridor marginal e cuja demanda era mais elástica do que a demanda por café tais como açúcar e algodão provavelmente reduziria o valor das exportações pois o aumento do imposto de exportação não tinha qualquer impacto sobre os preços das commodities exportadas ver Abreu e Bevilaqua 2000 Houve no período imperial como um todo uma tendência à desvalorização cambial embora em 1889 a taxa de câmbio tivesse voltado à paridade de 1846 Desvalorizações cambiais tinham impacto desfavorável sobre os não exportadores em geral pois oneravam os preços de importações de bens de consumo e não havia aumento de sua receita em milréis Os exportadores de commodities fora o café eram beneficiados pois eram price takers e a sua receita refletia integralmente a desvalorização enquanto apenas parte de seus custos de produção eram indexados ao câmbio Já no caso dos produtores do café os efeitos eram mais complexos Embora a desvalorização também resultasse em aumento da sua receita em milréis e incidisse ao menos no curto prazo apenas sobre parte de seus custos a desvalorização dado que o Brasil era price maker tendia a enfraquecer o preço mundial de café pois estimulava uma desova de estoques por parte de agentes interessados em realizar lucros18 A taxação das províncias era importante Evidência fragmentária indica que tais receitas correspondiam a cerca de 25 das receitas do governo central entre meados da década de 1840 e os anos 1880 ver Carreira 1980 e StratenPonthoz 1854 Taxar o comércio exterior também era atraente para as províncias Embora a cobrança de impostos de importação provinciais fosse constitucionalmente ilegal subterfúgios nos anos 1830 abriram caminho para a sua adoção O Ato Adicional de 1834 permitiu a taxação provincial desde que não interferisse com a taxação do governo central Determinar se taxas municipais ou provinciais poderiam interferir negativamente com as receitas do governo central tornouse algo sujeito a interpretação Nogueira 1987 p 6465 e 8688 A proibição de impostos provinciais de exportação incluída no Ato Adicional abriu implicitamente a brecha para a taxação de importações nas províncias No início do período imperial o governo central transferia recursos para as províncias e arcava com certos gastos em vista da insuficiência de suas receitas O governo imperial posava assim de pai magnânimo e compreensivo dos desmandos financeiros das províncias quando na visão de muitos era o principal beneficiário de um sistema que negava às províncias receitas que legitimamente lhes pertenciam Não foi portanto surpreendente que as províncias adotassem a partir dos anos 1840 taxação ao consumo que de fato incidia sobre importações interprovinciais ou do exterior ver Veiga Filho 1898 p 112113 Em 1861 o Conselho de Estado proibiu a taxação das importações interprovinciais mas isto não vingou inteiramente como mostra a taxação do comércio interprovincial de escravos a partir do início da década de 1860 tanto nos estados importadores quanto nos exportadores A recessão dos anos 1870 provocou queda abrupta dos preços de algodão e o aumento dos impostos provinciais de importação no Nordeste que suscitou protestos de importadores e levou à reiteração das proibições de taxar importações nas províncias Mas as províncias do Nordeste estavam mergulhadas em grave crise financeira e com a queda dos preços de suas exportações forçando a redução ou eliminação da taxação das exportações a imposição de taxação sobre as importações tornouse inevitável embora disfarçada sob denominações criativas tais como taxa de desembarque e outras A despeito de longos debates no Legislativo no início da década de 1880 não houve acordo quanto a um novo critério de distribuição das receitas em favor das províncias e o governo central fechou os olhos para a disseminação de taxação provincial das importações a despeito de sua ilegalidade No início da década de 1880 estas taxas de importação inconstitucionais correspondiam a 2030 das receitas das províncias do Nordeste ver Melo 1984 p 249250 258260 e 278 281 A taxação provincial das exportações era expressiva em algumas províncias alcançando por exemplo 13 sobre a borracha no Pará Nos estados produtores de café era da ordem de 4 mas em 1888 as taxas provinciais somadas à taxa imperial somavam 13 Igualmente no Rio Grande do Sul no mesmo ano as exportações de charque e couros pagavam 4 à província e 9 ao governo central ver Ridings 1994 p 197 e Wyndham 1889 p 1819 e 59 Nas províncias do Nordeste em vista da concorrência sofrida pelas exportações de açúcar e de algodão no mercado mundial não era possível taxálas sem reduzir a quantidade exportada e produzida Isto contrastava com a posição das províncias cafeeiras pois em vista da posição dominante do Brasil no mercado mundial de café o ônus do aumento de taxação da exportação podia ser transferido ao consumidor externo através de aumento de preços ver Melo 1984 p 250 92 Despesa O nível de despesas do governo central dependia em grande medida dos gastos militares relacionados a operações internas e externas As despesas dos ministérios militares corresponderam a 50 dos gastos totais no fim dos anos 1820 com a Guerra da Cisplatina e mais ainda nos anos 1830 com operações contra os separatistas no sul do Brasil Nos anos mais pacíficos entre a maioridade e a Guerra do Paraguai as despesas militares nunca caíram abaixo de 35 e no conflito alcançaram 65 dos gastos totais Segundo estimativas do final do Império o custo da guerra terseia situado no amplo intervalo de 40 milhões a 60 milhões Wyndham 1889 p 8 Só depois de 1870 os gastos militares cairiam para a região dos 20 dos gastos totais Verificouse déficit persistente nas contas do governo central durante o período imperial em geral refletindo picos de gastos militares ver Carreira 1980 p 627 e ss O Sul e a Corte contribuíam com dois terços da receita do governo central em contraste com um terço do Norte e do Nordeste A receita do governo central em São Paulo era de 7 do total inferior à do Pará e à de Bahia e Pernambuco mas a despesa era de apenas 2 do total Em muitas províncias do Nordeste e do Norte além de São Paulo os balanços provinciais eram desfavoráveis acarretando significativas transferências das províncias para o governo central Isto se devia em parte à concentração de gastos militares nas regiões de fronteira no Sul e no CentroOeste ver Carreira 1980 p 658659 e Melo 1984 p 251252 Quando da Abolição o governo imperial não indenizou os proprietários de escravos muitos dos quais abraçaram então a causa da República Foi decidida a concessão de empréstimos à grande lavoura com recursos públicos principalmente através do Banco do Brasil já que a rede bancária brasileira era muito pouco densa A iniciativa teve alcance limitado e possivelmente beneficiou fazendeiros que tinham maior viabilidade capazes de oferecer garantias adequadas uma vez eliminada a possibilidade de utilização de escravos como colateral 93 Dívida pública Entre 1824 e 1889 a dívida externa brasileira aumentou de 51 milhões para 336 milhões ver Tabela 11 Cerca de 98 do total no final do Império correspondia a empréstimos denominados em libras lançados em Londres e 90 a empréstimos do governo central A firma londrina NM Rotschild Sons deteve o monopólio de emissão de empréstimos externos do governo central entre 1858 e 1908 e atuou também como agente pagador e comprador do governo brasileiro Após o pesado endividamento do início da história independente a dívida externa mantevese praticamente estável em termos nominais até 1850 só então aumentando lentamente A relação dívida exportações que alcançou quase 17 nos anos 1820 caiu a 042 em 1860 e no final do Império era de 118 A cotação dos títulos da dívida externa brasileira oscilou consideravelmente durante o Império as cotações dos empréstimos Brasil 5 registraram um mínimo de 44 no final de 1831 mas durante certos períodos como no final dos anos 1850 início dos anos 1860 e na década de 1880 superaram 10019 Somente no final de 1888 províncias passaram a tomar empréstimos no exterior notadamente São Paulo Bahia e Pernambuco Wyndham 1889 p 9 Embora boa parte da literatura especializada atribua ao Brasil um péssimo desempenho como devedor tal avaliação é destituída de fundamento quando se refere ao período Imperial As distorções das avaliações devemse em parte à concentração de interesse nos empréstimos norteamericanos que só ocorreram depois da Primeira Guerra Mundial em parte à omissão do período anterior a 1850 quando em contraste com o resto da América Latina o Brasil não suspendeu o pagamento do serviço da dívida externa20 Enquanto as taxas internas de retorno de consols britânicos títulos perpétuos da dívida pública oscilaram entre 24 e 38 ao ano as taxas internas de retorno dos títulos brasileiros lançados no Império oscilaram entre 39 e 10121 Em 1830 cerca de 80 da dívida total era externa mas em 1850 a proporção havia caído para a metade Houve um aumento nos anos 1860 mas em 1870 já era inferior a 40 e em 1889 da mesma ordem ver Tabela 12 Nas décadas de 1850 e 1860 com a aceleração da inflação o governo passou a lançar empréstimos internos denominados em milréis ouro isto é indexados ao câmbio ao par de 27d1000 Um elemento importante de gastos do governo central era o serviço da dívida pública externa e interna A proporção de gastos com o serviço da dívida caiu de cerca de 25 no final dos anos 1820 para 1617 nos anos 1850 e 1860 permanecendo abaixo de 20 nos anos 1870 e ultrapassando 30 na década de 1880 ver Levy 1995 e Pacheco 1973 Dados precários indicam que a dívida pública das províncias e municípios não era importante talvez em torno de 7 da dívida total do governo central ver Carreira 1980 Detentores de títulos da dívida interna sem indexação enfrentavam perdas potenciais devido à maior inflação no Brasil do que no resto do mundo Como já mencionado a inflação média anual brasileira entre 1830 e 1889 terá sido da ordem de 12 ao ano enquanto a deflação norteamericana foi de 02 ao ano gerando um diferencial de inflações da ordem de 14 comparado ao diferencial de taxas de juros de 115 entre títulos da dívida interna e da dívida externa22 10 Conclusões O PIB per capita brasileiro em 1820 seria comparável ao mexicano cerca de 10 a 20 inferior e corresponderia a pouco mais da metade do nível do PIB per capita dosEstados Unidos Em 1890 havia perdido muito terreno seria talvez 34 do nível mexicano pouco mais de 13 do nível argentino e pouco mais de 15 do nível dos Estados Unidos Uma taxa de crescimento de 03 ou até de 04 ao ano para o período imperial como um todo parece razoável decorrente essencialmente do crescimento a 152 da renda per capita da zona cafeeira após 1850 inicialmente no Rio de Janeiro e norte de São Paulo e depois dos anos 1880 em Minas e especialmente no Centro Oeste Paulista Os anos 1850 e surpreendentemente a segunda metade dos anos 1880 provavelmente corresponderam aos períodos de expansão mais rápida da economia imperial enquanto a década de 1870 ficou marcada pela Grande Seca no Nordeste A produção de café em grandes propriedades requereu a importação maciça de escravos e após a proibição de fato do tráfico em 1850 a transição para o trabalho livre Foi um processo lento que só se acelerou nos anos 1880 quando foram aumentados os subsídios à imigração face à concorrência de outras economias importadoras de mão de obra A expansão do café foi acompanhada pela retração relativa e em certos casos absoluta da exportaçãoprodução de commodities tradicionalmente exportadas pelo Nordeste como algodão açúcar e fumo A exportação de couros e peles também perdeu importância A expansão da borracha na Amazônia ganharia mais força no período republicano A economia cafeeira e em menor medida outros polos de exportação estimularam a criação de importante infraestrutura em especial ferrovias públicas e privadas Entre as ferrovias privadas parte foi estabelecida por empresários estrangeiros parte por capitalistas nacionais No final do período imperial respondendo às demandas da urbanização ganhou importância a provisão de serviços públicos urbanos também com importante papel do capital estrangeiro A industrialização foi incipiente no período imperial Apenas em meados da década de 1880 começou a diminuir significativamente a penetração das importações de bens de consumo não duráveis processo que vai amadurecer apenas na primeira década republicana Em paralelo com a expansão cafeeira aumentou a importância dos Estados Unidos como mercado brasileiro A GrãBretanha perdeu paulatinamente participação nas importações totais brasileiras à medida que se expandiram as exportações de concorrentes especialmente Estados Unidos e Alemanha Embora tenha havido substancial desvalorização do milréis no período imperial 50 da taxa denominada em pence1000 a desvalorização foi modesta comparada à que se registrou na República Velha e mais ainda depois de 1930 O Brasil foi bom pagador da sua dívida externa após as dificuldades iniciais na década de 1820 Em 1888 houve conversão de toda a dívida externa para aproveitar a excelente avaliação do crédito brasileiro e reduzir os juros pagos pelo governo imperial No plano político ganharam força os interesses paulistas em detrimento dos interesses do Nordeste Cresceu também após a vitória na Guerra do Paraguai a influência dos militares republicanos muitos deles positivistas Em meio aos debates sobre a Abolição e a República foi clara a erosão do baianismo ou seja da preponderância política nortista As consequências econômicas da protelada abolição da escravidão e a fadiga das instituições imperiais levariam à proclamação da República e à rápida reversão do quadro econômico favorável da segunda metade da década de 1880 1Neste capítulo são utilizados textos de trabalhos anteriores dos autores principalmente Lago 1978 e para temas monetários e financeiros Abreu e Lago 2001 2O caso brasileiro é contraexemplo lapidar das teses de Platt 1968 p 3126 quanto a uma possível postura do tipo hands off do governo britânico na América Latina em relação à defesa dos interesses de firmas britânicas 3Sobre indústria no Império ver Stein 1979 caps 13 especialmente tabela p 21 Lago Almeida e Lima 1979a seção II1 especialmente quadro II3 e Fishlow 1972 p 3124 4Não existem dados de imigração líquida para o período imperial 5Ao par de 27d1000 a libra esterlina correspondia a Rs 8890 6Embora existissem firmas estrangeiras não britânicas as estimativas sobre seu estoque de capital são notoriamente precárias e é improvável que fossem muito significativas Ver Graham 1968 p 305 7Estimativas usando dados de Maddison 1982 table F6 Woodruff 1966 p 313 e Mitchell e Deane 1971 p 4723 8Os dados de comércio exterior imperial refletem valores oficiais e não os valores efetivos dos produtos principalmente no caso das importações Os valores de importação são CIF Cost Insurance and Freight e não FOB Free on Board 9Deer 1949 p 112 e Albert e Graves 1914 p 12 10Sobre borracha ver Weinstein 1983 e Fernandes 2009 11Uma distorção importante desta medida é que o valor das importações é CIF o que os eleva cerca de 10 em relação aos valores FOB na origem A avaliação da tarifa com base nesta medida está portanto correspondentemente subestimada 12Sobre senhoriagem nas décadas de 1850 e 1860 ver Calógeras 1960 p 76 81 e 82 13Ver para preços pré1870 Goldsmith 1984 e Buescu 1996 e para preços pós1870 Catão 1992 Entre 1830 e 1889 os preços por atacado nos Estados Unidos Bureau of Labor of Statistics caíram cerca de 10 e o índice de preços Rousseaux para a GrãBretanha mais de 30 Ver United States 1975 p 201 e Mitchell e Deane 1971 p 4712 14Uma libra esterlina pré1970 continha 20 xelines shillings Um xelim continha 12 pence Portanto uma libra continha 240 pence Na GrãBretanha tradicionalmente cotase câmbio em termos de unidades de moeda estrangeira por unidade de moeda doméstica Esta tradição vigorou no Brasil até 1930 Ver leis de 8 de outubro de 1833 e 11 de setembro de 1846 e Calógeras 1960 cap 5 15Lei de 8101831 Ver Almeida 1922 p 8 141820 33 16Isto explica a habitual contratação de impostos internos com contratadores privados em contraste com os impostos sobre o comércio exterior sempre arrecadados diretamente pelo governo Ver North e Thomas 1973 17Levando em conta estimativas do valor FOB das importações 18Pode ser imaginado também que a desvalorização cambial acarretava uma queda dos custos domésticos denominados em moeda estrangeira e portanto deslocamento da curva de oferta que gerava uma redução do preço mundial Os efeitos de longo prazo dependiam crucialmente das decisões dos cafeicultores sobre a ampliação da capacidade produtiva como ficaria claro na década de 1890 19No final da década de 1880 o governo imperial converteu a dívida lançada no período 1865 1886 a 5 em títulos de 4 20Ver em Abreu 2006 comentários sobre Eichengreen e Portes 1989 Jorgensen e Sachs 1989 e Lindert e Morton 1989 Para o boom da dívida latinoamericana em 182425 ver Dawson 1998 21As taxas de retorno anuais dos empréstimos brasileiros foram também sempre superiores às taxas anuais referentes a consols embora naturalmente com muito maior volatilidade Ver Abreu 2006 22A deflação britânica por seu lado foi da ordem de 05 ao ano C A P Í T U L O 2 A primeira década republicana Gustavo HB Franco 1 Introdução A primeira década do regime republicano foi das mais difíceis para os condutores da política econômica É fácil ver que essas dificuldades se devem ao fato de que aí se observam os momentos cruciais de importantes transformações estruturais na economia do país destacadamente a súbita disseminação do trabalho assalariado no campo e o reordenamento da inserção do país na economia internacional A primeira estava relacionada ao fim da escravatura e maciça entrada de imigrantes ao longo da década de 1890 e a segunda ao extraordinário florescimento das relações financeiras do Brasil com o exterior Transformações deste quilate todavia não definem inevitabilidades mas modificam o espectro de escolhas a serem exercidas no contexto da política econômica e esta como será exaustivamente observado ao longo deste volume é afetada por múltiplos fatores dentre os quais por certo política doutrina e personalidade A primeira década republicana além de trazer mudanças estruturais na economia será pródiga em crises políticas embates doutrinários e grandes personalidades de modo que a política econômica desses anos não encontra explicações simples em nenhuma de suas inflexões A década de 1890 seria memorável em seus debates entre metalistas e papelistas em torno da orientação a ser dada à política macroeconômica Nos primeiros anos a balança tenderia para estes pois a República teria como seu primeiro ministro da Fazenda um campeão papelista de indisputado talento ninguém menos do que Ruy Barbosa Todavia a necessidade de se flexibilizar a política monetária geraria excessos assim multiplicando resistências de modo que o experimento papelista teria curta duração A depreciação cambial de 1891 por outro lado daria início a um período de hesitações e de progressiva deterioração das contas externas A reação conservadora a partir de meados da década seria avassaladora a partir de 1898 o país levaria um plano conservador de saneamento monetário e fiscal às suas últimas consequências Os anos 1890 conhecem portanto ambos os extremos do espectro doutrinário Este capítulo procura em primeiro lugar informar sobre as principais transformações estruturais afetando o andamento da política econômica e em segundo oferecer uma crônica das principais medidas de política econômica ao longo dos anos 1890 Com este propósito a seção 2 trata da redefinição das relações financeiras do país com o exterior e suas principais consequências a nível macroeconômico Em seguida a seção 3 trata das consequências da disseminação do trabalho assalariado no campo especialmente no tocante à condução da política monetária e à organização do sistema bancário A seção 4 oferece uma narrativa do curso da política econômica ao longo da década de 1890 2 O Brasil e a economia internacional O crescente envolvimento do Brasil com a economia internacional constitui um traço fundamental da história econômica do país nos últimos anos do século XIX Do ponto de vista comercial observase maior abertura a razão exportaçõesPIB que era de 154 em 1870 chega a 186 em 19001 O valor das exportações per capita contudo que cresce de US117 em 1872 para US129 em 1913 não chega a definir o Brasil como uma economia especialmente aberta pois estes valores estão próximos da média da América Latina tropical isto é sem incluir Argentina Uruguai e Chile2 Além disso notese que a participação brasileira no comércio mundial é muito pequena inferior a 1 em 1913 Já a pouco notada participação brasileira no tocante ao investimento internacional é bem mais substancial O valor do estoque de capital estrangeiro no Brasil em 1913 incluindose aí investimentos britânicos franceses alemães e norteamericanos diretos e de carteira atingia a cifra de 514 milhões o que representava cerca de 30 do total para a América Latina e 54 do total mundial3 É importante observar que o grosso desses investimentos teria lugar durante o período 19021913 o valor da dívida externa federal por exemplo cresceria de 309 milhões em 1890 para 442 milhões em 1900 mas em 1913 atingiria a cifra de 1443 milhões No tocante ao investimento direto notese que de 1860 a 1902 o capital das empresas estrangeiras estabelecidas no país atinge 105 milhões ao passo que o total para as constituídas durante 19031913 é da ordem de 190 milhões Castro 1978 p 97 Ao longo dos anos 1990 a convivência do país com os mercados financeiros internacionais se enriquece sobremodo pois é nesses anos que se assentam as bases da grande abertura financeira da primeira década do século XX4 A conta capital passa a ter importância crescente no contexto das contas externas do país tornandose um mecanismo através do qual a instabilidade da receita comercial poderia ser compensada e que também permitia a manutenção de níveis de absorção ou taxas de investimento maiores do que seria possível na ausência de capitais externos Em contrapartida argumentase comumente que é exatamente na articulação perversa ou a correlação positiva entre movimentos de capital e as contas comerciais que se devem procurar as raízes da instabilidade macroeconômica a que esteve sujeita a economia brasileira em sua fase caracteristicamente primárioexportadora Este é na verdade um debate que extravasa a historiografia brasileira um dos temas importantes da enorme literatura referente ao funcionamento do padrãoouro nos anos anteriores a 1914 diz respeito ao argumento de que os mesmos mecanismos que asseguram estabilidade macroeconômica nos países centrais mecanismos estes que envolvem justamente a articulação entre as contas comerciais e os movimentos de capital implicam instabilidade nos países da chamada periferia5 No contexto brasileiro existe uma interpretação tradicional do problema na obra clássica de Furtado 1959 p 1589 na qual se argumenta que uma crise nos centros industriais se reflete nas economias dependentes em um primeiro momento através de uma redução do volume de exportações e em seguida através de uma piora nos termos de intercâmbio e tendo em vista que numa economia deste tipo a conta capital do balanço de pagamentos se comporta adversamente nas etapas de depressão percebese facilmente por que estas estiveram sempre condenadas a desequilíbrios de balanço de pagamentos e à inflação monetária A evidência disponível no que tange aos países centrais não é definitiva mas parece apontar na direção de um comportamento contracíclico em se tratando de saídas de capital e prócíclico no que respeita aos termos de troca isto é uma relação positiva do ponto de vista do centro entre termos de troca e exportações de capital Isso vem a ser do ponto de vista dos países periféricos uma relação negativa entre termos de troca e entradas de capital o que desautoriza a visão furtadiana ao menos a nível do balanço de pagamentos da GrãBretanha6 É preciso notar contudo que embora esta correlação negativa estabilizadora seja dominante em termos gerais ou tomando o período 18701913 em seu conjunto este não seria necessariamente o caso para determinados períodos ou para determinados países7 Para o caso do Brasil em particular convém observar que tomando o período 18701900 como um todo a correlação entre movimentos de capital e termos de troca não revela nenhum padrão dominante mas há períodos onde ambos se movem na mesma direção para 18701873 as entradas de capital aumentam e os termos de troca melhoram o que também se observa em 18861889 e no sentido inverso ou seja ambos pioram juntos em 18761878 e em 189518978 A relação entre movimentos de capital e a evolução da capacidade para importar melhor informa sobre a influência daqueles sobre o estado das contas externas do país e consequentemente sobre as flutuações da taxa de câmbio Em dois períodos onde as entradas de capital são reduzidas 18761883 e ao longo dos anos 1890 de fato se observam dificuldades cambiais No primeiro período a taxa de câmbio cai do nível de 27 pence por milréis em dezembro de 1875 para 21 pence por milréis em fins de 1883 e posteriormente para 18 pence por milréis em meados de 1885 Já no tocante aos anos 1890 a depreciação cambial assume dimensões de crise em 1891 quando a taxa cai de aproximadamente 24 pence por milréis em fins de 1890 para 12 pence por milréis no final de 1891 Em função disso se observa uma significativa desvalorização real da taxa de câmbio o que certamente teve papel importante em reduzir o déficit em conta corrente de uma média anual de 13 milhão em 18881891 para uma média anual em torno de 110 mil em 189218949 Esta forma de ajustamento fornece talvez um dos melhores exemplos disponíveis do que se convencionou chamar seguindo a análise pioneira de Furtado de socialização das perdas As dificuldades cambiais do país se tornariam crônicas após a crise de 18911892 A taxa de câmbio flutua entre 9 pence e 10 pence por milréis até fins de 1895 quando há uma quebra na tendência ascendente da capacidade para importar à mercê da piora acentuada nos termos de troca vale dizer de um colapso dos preços do café já refletindo as safras resultantes do grande aumento no plantio provocado pelas desvalorizações cambiais no início da década O déficit em conta corrente cresceria substancialmente atingindo 2295 mil em 1895 e 5014 mil em 1896 e inaugurando um período crítico no tocante às contas externas Tendo em vista o peso dos compromissos externos anteriormente assumidos a razão serviço juros amortizações descontos e comissões da dívida externa pública e privada sobre as exportações atinge valores em tomo de 21 em 1896 e 189710 e uma conjuntura de semiparalisação dos fluxos de capital para o Brasil isto é da dificuldade em se obter acomodação junto aos Rothschild observase uma nova crise cambial que dessa vez leva à moratória em 18981900 A historiografia tradicionalmente não reserva à conta capital papel importante em nenhuma das duas grandes crises cambiais verificadas na década de 1890 havendo em vez disso uma forte tendência no sentido de se atribuir as crises a choques comerciais flutuações nos preços do café ou a excessos monetários e fiscais No tocante à crise de 1891 a interpretação tradicional atribui o colapso cambial à expansão monetária provocada em última instância pelas reformas no sistema monetário introduzidas por Ruy Barbosa em 1890 o que também se aplica à crise que nos levou à moratória de 1898 que seria não mais que a liquidação em última instância dos excessos do Encilhamento É igualmente comum o viés no sentido de se explicar as flutuações cambiais nos anos 1890 através das variações no preço do café O próprio Furtado 1959 p 164 ss enxerga este último como o fator determinante da taxa cambial o que teria sido perfeitamente percebido por Wileman em seu clássico estudo de 1896 Isto se observa também na interpretação de Flávio Versiani 1980 p 157 sobre o período anterior a 1914 que também se reporta a Wileman mas a influência do café sobre o câmbio é questionada no estudo de Maria Teresa Versiani 1985 Em ambos os casos e também em Fishlow 1972 a análise não incorpora o fato de que a taxa de câmbio é afetada por múltiplas influências de modo que a análise estatística de cada uma dessas forças carece de métodos mais elaborados Alguns trabalhos mais recentes incluem tentativas de se especificar modelos macroeconômicos onde as diversas influências sobre a taxa de câmbio são identificadas e testadas como por exemplo Cardoso 1981 Franco 1986a e Fishlow 1987 Os resultados desses estudos não são conclusivos embora gerem dúvidas especialmente no segundo caso sobre interpretações simplistas da relação entre a taxa de câmbio a moeda e os termos de troca 3 Trabalho assalariado e a política monetária As últimas décadas do século XIX marcam os momentos decisivos de uma importante transformação na economia brasileira de acordo com Furtado 1959 p 151 o fato de maior relevância ocorrido na economia brasileira no último quartel do século XIX foi sem lugar à dúvida o aumento da importância relativa do setor assalariado É claro que isto representava uma importante mudança qualitativa na organização econômica do país que viria a afetar significativamente a natureza e o potencial de crescimento nos anos posteriores A despeito disso todavia muitos autores observaram que esta transição teria um notável impacto monetário pois o pagamento de salários multiplicaria em muitas vezes por exemplo as necessidades de capital de giro na atividade agrícola com isso elevando bastante o grau de monetização e a demanda por moeda na economia11 Segundo um relato contemporâneo Ministério da Fazenda Relatório 1891 vol I p 142 nas suas relações com o mercado de consumos interior ou exterior a lavoura mais ou menos enfeudada aos correspondentes concluía mediante eles todas as suas operações de expedição venda reembolso e suprimento por um mecanismo de crédito e escrituração que ordinariamente dispensava a tradição efetiva de dinheiro Os pagamentos efetuavamse por ordens e saques que debitados em conta corrente se compensavam oportunamente com o haver apurado na alienação das safras Por um jogo análogo de cheques sobre os comissários se satisfaziam as dívidas contraídas nas casas comerciais do interior A difusão do trabalho assalariado no campo haveria por certo de modificar drasticamente essas praxes sendo também importante observar que como as despesas com a mão de obra na atividade agrícola tinham um caráter essencialmente sazonal pois estavam ligadas principalmente à colheita a difusão do assalariamento haveria de manifestarse em primeira instância através de crescentes demandas de adiantamentos junto aos bancos na capital por ocasião das safras Na verdade há relatos sobre pressões sazonais sobre os bancos no Rio de Janeiro resultando em dificuldades de liquidez na praça do Rio desde os anos 1860 segundo observa Calógeras 1960 p 161 as colheitas exigiam remessas periódicas de dinheiro as quais empobreciam as praças de onde o papelmoeda era exportado e esse só retomava lentamente dada a dificuldade das comunicações O Rio de Janeiro principalmente capital econômica e também política assistia à época das colheitas do Norte a drenagem do seu numerário para as praças dessa região e sofria as consequências disso elevação da taxa de descontos tabelas de juros muito altos dificuldades de realizar negócios pela falta de numerário penúria de moeda No início da década de 1880 o problema das novas demandas de moeda advindas do trabalho livre era constantemente mencionado e argumentavase nesse sentido que as demandas sazonais de crédito associadas às safras de café açúcar etc podiam agora se tornar muito mais fortes e podiam ter sérias consequências no tocante à liquidez caso não fossem implementados esquemas destinados a prover acomodação para essa elevação once and for all da procura de moeda Esquemas nesse sentido no entanto encontraram diversos tipos de obstáculos De um lado o incipiente desenvolvimento do sistema bancário o tornava especialmente vulnerável às variações sazonais na procura por crédito e nos seus depósitos O sistema bancário àquela época era bastante concentrado na capital onde estavam localizados cerca de 80 dos depósitos bancários e era muito pouco desenvolvido Em 1888 havia 0043 agência bancária para cada 10 mil habitantes no país um número considerado extremamente baixo12 Tomando somente a capital este número se elevava para 0443 o que também era considerado muito baixo Como expressão deste estado de coisas segundo um relato contemporâneo The Economist 23121890 era raro o uso de cheques com hábito comum ali de reterem os indivíduos em seu poder largas quantias em vez de depositálas em bancos Os pequenos negociantes os taverneiros por exemplo no Rio de Janeiro apenas excepcionalmente depositam nos estabelecimentos De ordinário preferem ter consigo seu dinheiro até a época de pagamentos satisfazendo então os seus débitos com as somas acumuladas em casa no decurso de seis a nove meses O mesmo sucede com as classes que vivem de salário os agricultores e outros habitantes do interior amuam grandes somas para satisfazer suas necessidades e esse dinheiro leva meses ou anos para ir ter aos bancos A receita das alfândegas em vez de se depositar em bancos e por eles transmitirse ao Rio de Janeiro acumulase em somas importantes expedidas periodicamente pelos paquetes para a capital Essa baixa propensão do público para reter moeda sob forma de depósitos bancários impunha uma limitação estrutural à capacidade dos bancos em expandir seus empréstimos depósitos em resposta à maior procura de moeda já que aquela significava basicamente um reduzido valor para o multiplicador bancário Nessas condições os bancos eram particularmente vulneráveis a demandas sazonais muito fortes pois para que os bancos expandissem o crédito ceteris paribus obrigatoriamente veriam reduzirse sua relação encaixedepósitos ficando portanto em uma posição de liquidez mais vulnerável A sazonalidade envolvida na procura de crédito tornavase assim um problema para a economia do Rio de Janeiro cujos determinantes estavam ligados ao baixo grau de desenvolvimento do sistema bancário e sua pouca penetração no interior É a partir daí que se deve compreender a contínua referência ao longo de todo o Segundo Império ao fenômeno da inelasticidade do meio circulante ou seja à incapacidade dos bancos em expandir ou contrair o crédito de acordo com as necessidades dos negócios13 Assim sendo podemse ter indicações sobre o modo como a disseminação do trabalho assalariado viria a afetar o sistema bancário a presença de crises de liquidez e com crescente gravidade à medida que se aproxima o ano da Abolição fornece uma indicação importante do impacto monetário da difusão do trabalho assalariado no campo Isso se observa de forma clara a partir de meados dos anos 1980 Já em fins de 1883 de acordo com o ministro da Fazenda Rodrigues Pereira o movimento das transações vinha sendo embaraçado pela falta de meio circulante atribuída principalmente à migração de dinheiro para algumas praças do Norte exigida pelas magníficas safras ali colhidas Ministério da Fazenda Relatório 1884 p 62 Nessa ocasião o ministro propôs inclusive a restauração da lei de 1875 que permitia ao Tesouro emissões temporárias para auxílio aos bancos A mesma proposta seria retomada logo adiante com ainda mais ênfase pelo novo ministro da Fazenda Conselheiro José Antônio Saraiva Falando ao Parlamento em maio de 1885 lembrou Saraiva que se aproximava o último mês do semestre que era a ocasião das liquidações dos pagamentos quando os devedores previdentes preparam fundos para saldar suas contas no interior e remeter para as províncias do Norte elevadas somas e por isso darseia forçosamente a escassez de meio circulante e a crise monetária14 Os temores de Saraiva não se haviam confirmado em julho quando a ideia da restauração da lei de 1875 foi ter ao Senado Ali ouviu queixas de que o papelmoeda era já superabundante mas defendeuse com o argumento de que a medida proposta não era para aumentar o meio circulante e sim para conjurar uma crise15 A Comissão de Orçamento do Senado opinou pela aprovação do projeto16 e com isso a ideia de Saraiva foi efetivamente transformada em lei em 18 de julho de 1885 A lei de apenas dois artigos autorizava o governo a emitir até 25 mil contos aplicáveis a auxiliar os bancos de depósito de corte17 um total que representava um acréscimo potencial da ordem de 20 na base monetária A aplicação imediata de lei pareceu aliviar as dificuldades de liquidez em 1885 mas segundo o Jornal do Commercio Retrospecto Commercial 1887 p 12 já nos últimos meses de 1886 sentiase certo malestar proveniente da dificuldade de se obter empréstimos e adiantamentos escasseando o numerário Parecia porém que tal estado era apenas a repetição da crise periódica que se observa nos fins de semestre As dificuldades se tomariam ainda mais sérias nos primeiros meses de 1887 atingindo seu ápice em junho pois a demora no retomo das quantias enviadas para as províncias a urgência das remessas para os mercados de café a realização de entradas que dos seus acionistas solicitaram algumas instituições bancárias aumentavam o número dos que solicitavam descontos desfalcavam os depósitos e enfraqueciam a caixa dos bancos e assim a taxa de desconto para as melhores firmas subiu nos bancos a extremos de 10 a 12 ibid Esta preocupante sucessão de crises resultou não só em tornar inoportuna a política monetária deflacionista do ministro da Fazenda Conselheiro Francisco Belizário talvez o mais destacado expoente metalista de seu tempo mas também em reforçar a impressão de que a Lei de 1885 representava apenas um paliativo e que era preciso buscarse soluções mais efetivas e duradouras para os problemas monetários causados pela difusão do assalariamento no campo o que implicava basicamente modificações drásticas na orientação da política monetária ou mesmo uma verdadeira reforma nas instituições monetárias Foi nesse contexto que surgiu o primeiro grande projeto de reforma monetária apresentado ao Senado em junho de 1887 A apresentação desse projeto daria início a um período de ricas discussões sobre questões relativas à moeda à taxa de câmbio e ao sistema monetário um verdadeiro tour de force que resultaria 17 meses depois a 24 de novembro de 1888 em uma lei de reforma bancária traduzindo um frágil compromisso entre posições na verdade inconciliáveis Com efeito a necessidade de se expandir a oferta de moeda contrapunhase à orientação conservadora de sucessivos gabinetes imperiais empenhados em reduzir a oferta de moeda de modo a restabelecer a adesão ao padrãoouro à paridade de 1846 27 pence por milréis O primeiro regulamento da lei expressa perfeitamente essa inconsistência tal como extensamente discutido em Franco 1983 cap 2 pois se revelou inaplicável de forma que em meados de 1889 a reforma monetária não havia alcançado um centímetro Ao longo de 1888 todavia e sem nenhum auxílio aparente da política monetária a taxa de câmbio se apreciou até a tão perseguida paridade de 1846 e lá permaneceu Em função disso seria possível ao Gabinete Ouro Preto o último do Império estabelecer finalmente um compromisso entre os que propunham a expansão monetária e os partidários do padrãoouro a emissão conversível à paridade de 1846 4 Política econômica nos anos 1890 O retorno ao padrãoouro seria um dos principais elementos de um projeto de política econômica bastante bem articulado Campos Salles 1908 p 36 descreveria o programa de Ouro Preto como uma missão de esmagamento sendo que o próprio visconde o veria como uma tentativa de inutilização da República18 Além do padrãoouro a outra importante medida de política econômica tomada por Ouro Preto seria a criação dos chamados auxílios à lavoura Tratavase de um vasto programa de concessão de crédito destinado a servir como compensação aos exproprietários de escravos Sendo todavia os auxílios distribuídos pela rede bancária privada e havendo uma contrapartida de recursos da parte dos bancos da ordem de 50 o programa resultou em uma distribuição bastante seletiva dos créditos que favoreceria em última instância como bem colocou o Jornal do Commercio Retrospecto Commercial 1889 p 5 a lavoura que tivesse condições de vida dessa forma selando a sorte do segmento insolvente da cafeicultura vale dizer das fazendas do Vale do Paraíba Indiscutivelmente ao apressar a realocação de recursos inerentes à transição para o trabalho livre favorecendo os segmentos dinâmicos da lavoura ou seja algumas regiões agrícolas em detrimento de outras os auxílios reordenavam as benesses econômicas do Estado e consequentemente reordenavam suas bases de sustentação19 O retorno do país ao padrãoouro farseia conforme já mencionado em função de uma situação cambial extremamente favorável a taxa de câmbio atingiria a paridade de 1846 em outubro de 1888 sem que isto estivesse associado a nenhum esforço deflacionista Ouro Preto faria publicar em junho de 1889 um novo regulamento para a lei bancária de 1888 e patrocinaria a incorporação do Banco Nacional do Brasil BNB formado a partir de uma associação entre o Banco Internacional de propriedade do visconde depois Conde de Figueiredo um dos lendários financistas do Encilhamento e do Banque de Paris et des Pays Bas um dos mais ativos banques daffaires desses anos O capital do novo estabelecimento seria de 90 mil contos e a emissão autorizada poderia atingir o triplo desse valor Como o BNB se comprometeria a retirar de circulação dentro de cinco anos todo o papelmoeda do Tesouro em circulação cujo total atingia 188 mil contos haveria um significativo aumento na oferta de moeda caso evidentemente o BNB viesse a completar suas emissões Essa nova emissão seria conversível à paridade de 1846 exceto segundo previsto no contrato de resgate de papelmoeda do Tesouro em casos de guerra revolução crise política ou financeira em que o governo providenciaria quanto ao troco como fosse mais conveniente Este seria aliás exatamente o caso em 15 de novembro pois nessa ocasião o BNB não estava ainda na plenitude de suas forças Já havia cerca de 17 mil contos de notas conversíveis em circulação mas apenas uma pequena parte do capital e de seu fundo metálico havia se constituído cerca de 27 mil contos Os próprios sócios franceses hesitariam em apoiar o BNB neste momento de incerteza O Tesouro de início fez gestões junto ao Banco do Brasil BB para sustentar a taxa de câmbio mas a tarefa se revelou impossível O BNB solicitou o curso forçado conforme previsto no contrato mas Ruy Barbosa não só recusaria como fixaria em três meses o prazo para que o BNB completasse as suas emissões sob pena de perda da concessão da faculdade emissora Era o fim da emissão conversível Ao final de 1889 depois de tantas idas e vindas o saldo das tentativas de reforma expansão monetária era praticamente nulo Se já em 1887 se falava em oferta de moeda insuficiente e em possibilidades de crise em fins de 1889 a necessidade de novas emissões era exaltada em tons dramáticos Um vasto afluxo de empresas e transações dizia Ruy Barbosa Ministério da Fazenda Relatório 1891 vol I p 53 que a revolução surpreendera corriam o risco de esboroarse em vasta catástrofe assinalando com o mais funesto crack as iniciações da República O primeiro ministro da Fazenda da República foi por certo um dos mais controvertidos Ruy Barbosa mesmo em nossos dias ainda é objeto de irrestrita admiração principalmente em função de sua atuação como jurista e orador havendo várias dezenas de biografias e estudos a seu respeito Ao mesmo tempo no entanto diversas histórias financeiras da República como por exemplo a de Calógeras 1960 p 227 atribuemlhe a responsabilidade suprema da inundação de papelmoeda que quase fez naufragar o país com os desastres que levaram à moratória de 1898 A principal medida de política econômica tomada por Ruy Barbosa foi a lei bancária de 17 de janeiro de 1890 introduzindo diversas novidades na constituição monetária do país A lei estabelecia emissões bancárias a serem feitas sobre um lastro constituído por títulos da dívida pública no que o ministro buscara inspiração no sistema de bancos nacionais norteamericanos Três regiões bancárias seriam formadas cada qual tendo seu próprio banco emissor As emissões seriam formadas cada qual tendo seu próprio banco emissor As emissões seriam inconversíveis e o total autorizado era de 450 mil contos o que era mais do dobro do papelmoeda em circulação a 17 de janeiro No dia seguinte à publicação do decreto o governo convidaria o Conselheiro Francisco de Paula Mayrink para constituir o banco emissor da região central que jogaria papel preponderante no novo sistema O novo banco se chamaria Banco dos Estados Unidos do Brasil BEUB e iniciaria operações já em fevereiro em uma atmosfera de genuína animação A tentativa de se regionalizar a emissão bancária assim estabelecendo um compromisso entre as doutrinas do monopólio e da pluralidade emissora e sobrepondose a complexas composições políticas regionais não seria bemsucedida Logo em 31 de janeiro por influência de Campos Sales uma nova região bancária e um novo banco emissor seriam criados para São Paulo e em março o ministro concederia ao BNB e ao BB o privilégio de emitir notas inconversíveis até o dobro de 25 mil contos depositados em espécies metálicas junto ao Tesouro Em agosto este mesmo privilégio seria estendido ao BEUB e aos outros bancos emissores regionais Não há dúvida que essas concessões descaracterizavam o decreto de 17 de janeiro e somente se justificariam mediante a necessidade impreterível no dizer do ministro Ministério da Fazenda Relatório 1891 vol I p 211 de expandir o crédito vale dizer a oferta de moeda Com efeito é preciso observar que durante os dois anos que se seguiram ao 13 de maio a Abolição a entrada no país de mais de 200 mil imigrantes o grande impulso no nível de atividade e o estado extremamente favorável das contas externas haviam elevado consideravelmente a demanda de moeda e tendo em vista o fracasso da emissão conversível do BNB o valor do papelmoeda emitido em 17 de janeiro cerca de 205 mil contos era inferior ao valor para o ano de 1878 208 mil contos Era certo que havia uma demanda reprimida de numerário de forma que ao estabelecer um sistema monetário fundado na moeda bancária inconversível e ao consagrar o princípio de que as emissões devem atender as legítimas necessidades dos negócios20 o ministro Ruy Barbosa patrocinaria uma rápida e violenta expansão monetária Em setembro de 1890 o papelmoeda emitido já havia crescido cerca de 40 em relação ao estoque em 17 de janeiro Por volta de outubro de 1890 o governo mostra preocupações claras com o andamento da especulação bursátil e chega inclusive a tomar medidas para detêla através de um decreto elevando os depósitos mínimos para a constituição de novas sociedades o que criaria certa dificuldade na praça O envolvimento dos grandes bancos da capital com a torrente de novas companhias sendo lançadas contudo tornava o problema de se estancar a especulação bastante complexo O trabalho de limpar as carteiras dos bancos de emissão preservando os empreendimentos viáveis se estenderia na verdade por vários anos Uma maneira de lidar com o problema foi patrocinar a consolidação dos grandes bancos o que foi impulsionado pela fusão do BEUB e do BNB da qual resultou o Banco da República dos Estados Unidos do Brasil BREUB em 7 de dezembro de 1890 Este novo banco teria um capital de 200 mil contos e poderia emitir até o triplo desse valor Como haveria o compromisso de retirar de circulação o papelmoeda do Tesouro em circulação e as concessões anteriores ao BEUB e BNB seriam canceladas o impacto líquido sobre as emissões autorizadas seria praticamente nulo Franco 1983 p 130 A intenção do governo ao apoiar o novo estabelecimento parecia ser dupla de um lado a de constituir uma espécie de banco central nos padrões britânicos isto é um grande banco de depósitos e descontos com poderes para regular o volume de crédito ao mesmo tempo dotado da faculdade emissora e também destinado a ter posição importante quiçá preponderante no mercado de câmbio O novo banco teria o monopólio do direito de emitir funcionaria como agente financeiro do Estado dentro e fora do país podendo o governo influenciar a indicação dos administradores do banco De outro o propósito parecia ser o de criar uma instituição sólida mesmo que seus dois componentes fossem bancos em dificuldades de modo a promover a liquidação dos preocupantes excessos do Encilhamento e ao mesmo tempo permitir maior controle sobre o mercado de câmbio Entretanto para ambos os propósitos o ano de 1891 seria funesto Ruy Barbosa deixaria a pasta da Fazenda no começo de 1891 e seria sucedido pelo conselheiro Alencar Araripe um jurista extraviado nas finanças de que jamais se ocupará de acordo com Calógeras 1960 p 234 e em seguida pelo Barão de Lucena Ambos eximiramse de proceder ao saneamento do grande instituto emissor recémcriado com isso se abstendo de arrefecer o fervor especulativo reinante O movimento de lançamento de novas companhias avançaria ainda mais em 1891 No dizer de Calógeras 1960 p 229 amontoavase o combustível para o grande braseiro de 1892 Em paralelo o ano de 1891 registra uma queda inusitada da taxa de câmbio que terminaria o ano em torno de 12 pence por milréis A relação entre esse declínio e a política monetária da República não parece simples ao menos porque o timing das variações na moeda e no câmbio não é muito claro21 De qualquer modo é certo que as hesitações e omissões que caracterizaram as gestões de Araripe e Lucena que se deviam em boa medida a uma conjuntura política mais complexa que a do ano anterior favoreceriam a crise cambial Tal pode ser visto por exemplo através do espantoso crescimento da oferta de moeda a partir de setembro de 1890 Nesta data o papel moeda emitido atingira o valor de 289 mil contos e em junho de 1891 este valor atingiria 535 mil contos ou seja cresceria cerca de 8022 Não resta dúvida por outro lado de que influências exógenas ligadas aos efeitos sobre as entradas de capital no Brasil do colapso da casa Baring Brothers em Londres em outubro de 1890 e da moratória argentina teriam grande influência sobre o mercado de câmbio no Brasil em 1891 Em abril respondendo aos pedidos do ministro Araripe sobre a possibilidade de apoio à sustentação da taxa de câmbio os Rothschild responderiam que o desafortunado estado de coisas que recentemente se tem observado na República Argentina teve um efeito deplorável sobre todos os papéis e sobre todas as questões financeiras relacionadas aos estados sulamericanos Em 3 de junho acrescentariam que pelo que tudo indica não parece haver qualquer perspectiva de melhores cotações ou negócios mais ativos com títulos brasileiros por algum tempo A confiança do público está ainda muito abalada com os eventos dos últimos 8 ou 10 meses e além disso sabese que muitas grandes casas têm a totalidade de seu capital preso a papéis argentinos e outros investimentos igualmente invendáveis23 Pouco pôde ser tentado a título de política cambial em 1891 sendo particularmente desastrosa a tentativa de Araripe em julho de vender os estoques oficiais de ouro que excedessem as necessidades oficiais a 18 pence por milréis quando o mercado já havia chegado a 15 A operação não teve qualquer efeito sobre as cotações mesmo porque o agravamento da crise política ao longo do ano o que levaria finalmente à dissolução do Congresso e à ascensão de Floriano Peixoto em novembro faria crescer a incerteza quanto ao destino das inúmeras companhias viáveis ou não sendo formadas a partir das facilidades de crédito e do entusiasmo na bolsa de valores Todavia a precipitação da crise política parecia o começo do fim dos excessos do Encilhamento logo no começo de 1892 tinha lugar a falência da Companhia Geral das Estradas de Ferro do Brasil cujo passivo atingia a espantosa soma de 314 mil contos Somente ao longo de 1893 contudo em meio à revolta da Armada a especulação na Bolsa encontraria afinal o seu desfecho24 A crise cambial em 1891 deu impulso à derrocada do Encilhamento e fragilizou tremendamente os bancos e as finanças públicas A euforia converteuse em pânico e as dificuldades com os grandes bancos ganharam a prioridade para o novo ministro da Fazenda de Floriano Peixoto Rodrigues Alves que proporia pela primeira vez no começo de 1892 um plano de clara coloração deflacionista de encampação do papelmoeda bancário que na verdade era um plano para evitar o colapso do sistema bancário e seu posterior saneamento provavelmente com estatização Mas a ideia não encontraria respaldo no Congresso Rodrigues Alves pediria demissão em agosto e assim afastada a opção conservadora a política monetária do novo ministro da Fazenda Serzedelo Correia um industrialista de certa reputação consistiu em i aprofundar a opção de Ruy Barbosa por um grande estabelecimento bancário líder destinado a sanear a praça dos excessos da especulação formado a partir de grandes bancos existentes em má situação e ii procurar apoiar a solidificação de empresas industriais tidas como viáveis ainda que constituídas no âmago do Encilhamento Esses dois propósitos talvez contraditórios se traduzem no decreto de 7 de dezembro de 1892 que estabelecia a fusão do BREUB o grande banco de Ruy Barbosa com o BB assim formando o Banco da República do Brasil BRB Este novo banco teria um capital inicial de 190 mil contos e poderia emitir notas inconversíveis na razão do dobro do depósito em ouro Desta feita o governo teria mais influência na administração do banco cabendolhe indicar o presidente o vicepresidente e um diretor e novamente a principal preocupação do governo seria a de utilizar o novo banco para melhor administrar a liquidação dos excessos do Encilhamento O próprio Rodrigues Alves havia criado uma comissão em abril de 1892 para estudar o que fazer a respeito e uma das principais conclusões dessa comissão e que seria posta em prática pelo decreto de 7 de dezembro seria a emissão dos chamados bônus ou auxílios à indústria O BRB ficaria autorizado a emitir até 100 mil contos de bônus ao portador em cédulas de pequenas denominações e pagando 4 de juros destinados a apoiar as empresas viáveis Todo o problema é que havia efetivamente pouco a diferenciar esse bônus do papelmoeda comum de modo que a medida equivalia na prática a uma extensão da emissão autorizada do BRB Pouco ou nada resultaria da tentativa de Serzedelo através do BRB de afastar a perspectiva de crise bancária A especulação na bolsa contaminara muito profundamente a carteira do BRB Ao mesmo tempo a crise cambial aprofundavase alimentada pela deterioração da situação política que tornava claro o estado de paralisia decisória em que se debatia o governo A sucessão de levantes ao longo de 1893 destacadamente a luta no Rio Grande do Sul e a eclosão da revolta da Armada em setembro parecia demarcar o clímax da crise O déficit orçamentário cresceria de forma significativa após a crise de 1891 sendo particularmente preocupante a evolução das contas de despesa visàvis de receita do governo denominadas em moeda estrangeira O resultado orçamentário mostrouse bastante sensível a flutuações cambiais tornando evidente a relação entre o desequilíbrio externo e o desequilíbrio fiscal tal como seria observado diversas vezes ao longo do período republicano Diante desse quadro a reação do novo governo que se instalou em fins de 1894 tendo Prudente de Morais na Presidência da República e Rodrigues Alves mais uma vez na Fazenda foi a de procurar insistentemente junto aos Rothschild proverse de recursos para financiar seu déficit e iniciar um plano articulado de reorganização financeira dos bancos e do Estado Já em dezembro de 1894 o ministro da Fazenda indaga aos Rothschild sobre algum arranjo financeiro destinado a prover recursos para o serviço da dívida externa e evitar pressões sobre a taxa de câmbio25 Em janeiro de 1895 os banqueiros colocam entre amigos ou seja sem o recurso a um lançamento público letras do Tesouro no valor de 2 milhões a vencerem 9 12 e 15 meses mas o governo brasileiro continua insistindo em um grande empréstimo Em uma longa carta de 25 de janeiro os banqueiros começam a explicitar o que em nossos dias recebe o nome de condicionalidade Seria impossível para nós tentar colocar um grande empréstimo brasileiro exceto se medidas forem tomadas ao mesmo tempo para se elevar as receitas e reduzir as despesas do Brasil Algumas sugestões são propostas em torno da lei orçamentária para 1895 dentre as quais a de se criar impostos adicionais em ouro sobre as importações cuja receita seria publicamente alocada earmarked publicly para o serviço dos compromissos externos existentes e também para o serviço do novo empréstimo Sugere também que muito acrescentaria ao efeito moral dessas medidas a declaração de que os recursos obtidos através do novo empréstimo permaneceriam nas mãos dos banqueiros Por fim os banqueiros assinalam que acreditamos que o que o Brasil quer é um ou dois anos de tempo para respirar a fim de permitir a um governo sábio e conservador colocar as finanças do país em ordem em caráter permanente Em março ainda não havia acordo no tocante às garantias especiais que o novo empréstimo deveria ter mas finalmente em julho o empréstimo de 75 milhões seria lançado o que os banqueiros descreveriam como uma tarefa hercúlea que resultou em tensionar cada nervo straining every nerve dos mercados aqui e no continente Os banqueiros relatam inclusive que tiveram de recomprar papéis do empréstimo de 1893 da Estrada de Ferro Oeste de Minas para evitar uma queda verdadeiramente séria nas cotações26 Nenhuma melhora na situação cambial se observaria ao longo de 1896 e 1897 sendo o empréstimo de 1895 rapidamente consumido e tendo inclusive o governo brasileiro contraído novos empréstimos de curto prazo de modo a evitar pressões adicionais sobre o mercado de câmbio O enfraquecimento dos preços do café em função das grandes safras de 1896 e 1897 as quais conforme acima aludido registravam as consequências do extraordinário aumento no plantio no início da década contribuíram a essa altura de modo decisivo para debilitar as contas externas do país Simultaneamente o ministro Rodrigues Alves enfrenta dificuldades para equilibrar o orçamento e proceder a encampação das emissões bancárias com isso reforçando a má vontade dos mercados financeiros internacionais para com o país Assim mesmo o governo brasileiro permaneceu pressionando os banqueiros por um grande empréstimo mas as cotações dos papéis brasileiros em Londres tornavam um novo lançamento em condições minimamente aceitáveis inteiramente impossível Os banqueiros por sua vez insistiam em que a única forma de o governo brasileiro obter fundos seria através de uma proposta de arrendamento da Cia Estrada de Ferro Central do Brasil feita por um sindicato chefiado pela firma Greenwood Co O governo brasileiro resistia à extrema insistência dos banqueiros quanto à aceitação da proposta Greenwood que Joaquim Murtinho considerou tão ridícula que nem mereceu ser tomada em consideração27 apesar da delicada situação de suas reservas cambiais Simultaneamente o governo usou de expedientes como o de apropriarse de parte dos recursos obtidos pela Cia Leopoldina que havia lançado um empréstimo em Londres em 1897 e a venda de alguns navios de guerra em construção Mas mesmo após a proposta de moratória em fevereiro de 1898 levada pessoalmente aos banqueiros pelo delegado do Tesouro em Londres e que levaria ao chamado funding loan os banqueiros continuam a considerar o arrendamento da Central28 Por fim um plano de refinanciamento de pagamentos é finalmente acordado entre o governo brasileiro e a Casa Rothschild através do qual seria emitido o chamado funding loan O plano era bastante simples tratavase de rolar compromissos externos do governo vale dizer o serviço da dívida pública externa e algumas garantias de juros em troca de severas medidas de saneamento fiscal e monetário O governo brasileiro ao longo de um período de três anos saldaria seus compromissos relativos a juros dos empréstimos federais anteriores ao funding com títulos de um novo empréstimo o funding loan cuja emissão se daria ao par e poderia elevarse até 10 milhões As amortizações dos empréstimos incluídos na operação seriam suspensas por 13 anos O esquema seria complementado por uma operação efetuada ao longo de 1901 e 1902 através da qual os contratos de garantias de juros a estradas de ferro seriam trocados por títulos de renda fixa os rescission bonds como seriam chamados Onze estradas de ferro seriam assim resgatadas sendo o valor total das emissões desses títulos da ordem de 166 milhões O funding loan gozaria de garantias especiais uma primeira hipoteca sobre as receitas em moeda forte da Alfândega do Rio de Janeiro e a título de condicionalidade apenas se exigia que o governo agisse de forma firme e decisiva no terreno monetário e fiscal Importância especial seria dada ao equilíbrio das contas do governo em moeda forte o que viria a ser expresso pela separação consagrada no orçamento de 1900 entre o orçamentoouro e o orçamentopapel Despesas de várias ordens foram reduzidas especialmente as denominadas em moeda estrangeira e a tributação efetivamente aumentada através de diversas medidas de modernização administrativa e também através de aumentos nos impostos destacadamente no imposto de consumo e do selo A política econômica do ministro Joaquim Murtinho que na verdade consistiu na execução do funding scheme estava fundada sobre concepções bastante rudimentares quanto à natureza do ajustamento necessário para solucionar as dificuldades de pagamentos do país Tratavase de acordo com o ministro de um problema gerado pelo excesso de emissões as quais produziram uma pseudoabundância de capitais e como consequência disso o estabelecimento de indústrias artificiais e a organização agrícola para a produção exagerada de café Tratavase de deixar perecer essas indústrias e de modo a operar uma redução na produção de café promover a concorrência entre os diversos lavradores produzindo por meio de liquidações a seleção natural manifestada pelo desaparecimento dos inferiores e pela permanência dos superiores29 A redução do papelmoeda em circulação era portanto a pedra de toque do programa Segundo os termos do acordo o governo se comprometia a depositar em moeda local junto aos três grandes bancos estrangeiros da capital uma certa proporção do valor dos títulos emitidos do funding loan e o papelmoeda correspondente a essas quantias seria publicamente incinerado Desta forma o papel moeda em circulação sofreria uma redução em 46 mil contos ou seja de cerca de 6 do total em 1898 Até maio de 1903 o papelmoeda destruído somaria 113 mil contos 13 do total em 1898 A consequência mais imediata dessa política seria a avalancha de falências bancárias ocorridas em 1900 uma torrente que tragou o próprio BRB O programa conseguiria uma apreciação cambial bem distante da paridade de 1846 que romanticamente volta e meia aparecia como meta a taxa de câmbio permaneceria ao redor de 11 pence por milréis durante os anos cobertos pelo esquema e assim mesmo graças à extraordinária recuperação das exportações observada em 1899 para a qual a borracha contribuiu significativamente Novamente não é claro a priori em que medida a apreciação cambial se devia à contração monetária ou a fatores exógenos associados ao balanço de pagamentos tais como por exemplo o apogeu das exportações de borracha Além disso observase uma revitalização das entradas de capital a partir da adoção do programa conservador que revela a influência da percepção dos mercados financeiros internacionais sobre o curso da política econômica do país Observase ao longo dos anos 1890 um curioso fenômeno que viria a se repetir muitas vezes nos anos que se seguiram isto é o fato de crises ou melhorias cambiais serem geradas de forma espúria pelo mau ou bom comportamento das políticas monetárias e fiscais não em função dos efeitos diretos destas mas em função da percepção que os banqueiros internacionais tinham sobre estas políticas pois esta percepção geralmente era fundamental para determinar a magnitude dos fluxos de capital direcionados para o Brasil De um modo ou de outro o desfecho da década de 1890 registra uma vitória política do conservadorismo monetário pois este dominaria a política econômica a partir da Administração Prudente de Morais até pelo menos meados da década seguinte e os resultados deste interlúdio teriam uma duradoura influência sobre a política econômica durante os anos posteriores 1Mas em 1913 teria sido de apenas 148 Ver Goldsmith 1986 p 23 e 83 para os dados do PIB a preços correntes e IBGE 1987 p 5234 para as exportações 2Para os quais os valores são de US669 US197 e US 411 respectivamente Lewis 1978 p 196203 3Ver Albert 1983 p 34 e Kenwood e Lougheed 1983 p 41 4É interessante notar que o relacionamento do país assim como o de outras repúblicas latino americanas com os mercados financeiros internacionais não começa aí Empréstimos externos tiveram um papel importante para as finanças e para os balanços de pagamentos dessas repúblicas logo em seguida aos processos de independência política Todavia a esse boom de empréstimos seguiuse uma onda de dificuldades de pagamentos e moratórias que traumatizou o mercado londrino por muitos anos Apenas nos anos 1960 e 1970 as repúblicas latinoamericanas conseguiram retornar a esses mercados 5Para uma resenha da literatura internacional sobre este ponto ver Franco 1988a 6Notese no entanto que não é exatamente verdadeiro que os termos de troca da periferia são dados pelo simples inverso dos termos de intercâmbio para o centro Havendo outros centros e subcentros assim como vários níveis de países periféricos alinhados por exemplo de acordo com a participação das exportações de manufaturados sobre o total de suas exportações essa simples correspondência é rompida 7Ver por exemplo Lewis 1978 p 17880 8Tal como discutido em Franco 1988c 9Segundo novas estimativas para o balanço de pagamentos do país em Franco 1988b 10Notese que tradicionalmente supõese que o serviço dos capitais estrangeiros não chegou a constituir uma carga excessivamente pesada para a balança de pagamentos do Brasil na segunda metade do século passado Furtado 1959 p 159 e seg 11Uma vez que de acordo com Delfim Netto 1979 p 17 antes de 1888 os recursos financeiros necessários para o custeio da fazenda eram relativamente pequenos pois a parte mais importante desse custeio que era o pagamento da mão de obra praticamente não existia 12Dividindose 62 agências bancárias em 1888 segundo DOliveira 1889 p 34782 pela população em 1890 ano em que houve recenseamento Ver Cameron 1967 passim 13Para uma discussão detalhada vejase Franco 1983 p 29 14Pacheco 1973 p 202 15Ibid p 207 16Lembrando que se a emissão ficasse limitada ao suprimento da penúria de numerário da praça do Rio de Janeiro e só durante o tempo correspondente à retração do capital monetário nenhuma perturbação deveria trazer aos valores existentes e nem mesmo ao câmbio Ibid p 208 17Artigo 1 Lei no 3263 de 18 de julho de 1885 transcrita em Aguiar 1973 p 27980 18Tal como em seu discurso de posse a 11 de junho de 1889 Em Porto 1978 p 424 19Para uma análise detalhada ver Franco 1983 p 7790 20Vejase a esse respeito a rica discussão contida em Barbosa 1892 21Isso se mostra por exemplo em testes de causalidade relacionando a moeda e taxa de câmbio para esse período que mostram resultados inconclusivos Cf Franco 1986a 22Segundo números de Ministério da Fazenda Relatório 1891 Ver Franco 1983 p 125 e Calógeras 1910 p 221 23Arquivos Rothschild seção XI correspondência 1425 letter copybook Brazilian Agency 18871894 24 de abril e 3 de junho de 1891 24Sobre o andamento da euforia especulativa na bolsa de valores ver Levy 1980 e Cattapan Reuter 1973 25Arquivo Rothschild seção XI correspondência 1425 letter copybook Brazilian Agency 18871894 14 de dezembro de 1894 26Na verdade nesta mesma ocasião os banqueiros se perguntam se não teria sido mais apropriado esperar que o governo aprovasse as medidas fiscais anteriormente mencionadas que o governo havia enviado para serem votadas antes de se efetuar o lançamento Arquivos Rothschild seção XI correspondência 1426 letter copybook Brazilian Agency 18951900 26 de julho de 1895 27Da introdução de Ministério da Fazenda Relatório 1901 transcrita em Luz 1980 p 237 28Arquivo Rothschild seção XI correspondência 1426 letter copybook Brazilian Agency 18951900 carta de 17 de fevereiro 29Extratos de Ministério da Fazenda Relatório 1899 cuja introdução está reproduzida em Luz 1980 p 17596 CAPÍTULO 3 acabaría por sepultar o regime Apogeu e crise na Primeira República 19001930 Winston Fritsch 1 Introdução O longo período tratado neste capítulo marca o fim de uma era Nele convivem o apogeu as tensões crescentes e a derradeira ruptura do modo de inserção da economia brasileira na economia mundial definido durante a Pax Britannica Nele convivem o apogeu as tensões crescentes e a derradeira ruptura do sistema de controle político consolidado a ferro e libras pelos grupos hegemônicos da República durante o biênio Campos SallesRodrigues Alves Este é um dos poucos períodos na história republicana em que uma sucessão de crises econômicas esgarçam o tecido político além de sua possibilidade de resistência ensejando ao longo dos anos 1930 não só um profundo redesenho das políticas econômicas como das formas de organização do Estado Como se verá adiante a instabilidade econômica gerada pelos sucessivos choques externos que se iniciam em 1914 e se estendem pela primeira metade dos anos 1920 mina as bases das alianças políticas tradicionais entre as grandes nações e sob o estímulo adicional das ideologias emergentes na Europa do pós guerra debilita a crença nas vantagens do liberalismo econômico1 Assim quando após um breve interlúdio de estabilidade o país recebe o impacto avassalador da crise internacional de 1929 complicado aqui pela crise da superprodução de café que amplifica enormemente os efeitos negativos generalizados da Grande Depressão sobre as economias primárioexportadoras não é só o sistema político que se desintegra Com ele termina também o modo caracteristicamente liberal de gestão dos fluxos comerciais e financeiros entre a economia brasileira e a economia mundial mantido desde a era imperial O gigantesco desequilíbrio externo que se prolonga pelo início dos anos 1930 força a imposição de restrições cambiais e controles de importação mais ou menos permanentes acabando por causar profunda e duradoura ruptura da forma tradicional de inserção do Brasil na economia mundial Por outro lado o vácuo criado pelo virtual desaparecimento da plutocracia paulista e seus aliados do antigo regime como força política organizada em meio à grande crise econômica e política que se estende até 1932 acaba por permitir também profundas alterações na composição social e regional dos grupos politicamente hegemônicos na República O fim da Primeira República marca portanto o início de uma dupla transição Por um lado a de uma economia primárioexportadora baseada no café com um regime cambial e comercial relativamente livre para uma economia voltada para dentro com severos controles sobre as transações externas Por outro lado a transição de um sistema político onde a plutocracia paulista tinha papel hegemônico para algo mais difuso em termos de distribuição regional e social da apropriação corporativa dos favores do Estado ampliados em decorrência do fim do laissezfaire nas transações com o resto do mundo As características tão marcantes desta dupla ruptura contribuíram para moldar uma visão exagerada e simplista da influência do complexo cafeeiro na formulação da política econômica na Primeira República que ainda impregna a historiografia tradicional deste período Baseada em uma análise esquemática do sistema de dominação política construído pela plutocracia civil no fim do século passado e da posição proeminente que nele ocupavam os grandes plantadores de café de São Paulo e suas conexões comerciais e financeiras o grosso da historiografia pós1930 explica candidamente a condução da política econômica na Primeira República como sendo basicamente movida pelos interesses corporativos da cafeicultura O exercício alegadamente irrestrito do poder político dos interesses do café na formulação da política econômica ilustrase segundo esta visão tradicional pelos fatos de que i o Executivo sempre terseia mostrado disposto a apoiar programas de valorização do café e que ii a depreciação secular experimentada pelo milréis entre 1889 e 1930 teria resultado de decisões politicamente motivadas pelo interesse em beneficiar o setor líder da burguesia exportadora Durante a última década essa interpretação tradicional foi atacada simultaneamente por dois flancos distintos Por um lado historiadores econômicos propuseram a tese radical de que a condução da política econômica teria sido predominante e sistematicamente influenciada pela aplicação de princípios ortodoxos de política monetária fiscal e cambial ver Pelaez 1971 e Villela e Suzigan 1973 Esta revisão não foi entretanto desenvolvida explícita nem deliberadamente como uma crítica à visão recebida sobre a hegemonia absoluta dos interesses da cafeicultura paulista na formulação da política econômica que esses autores com efeito não rejeitam Todavia o fato de que os ingredientes essenciais da ideologia ortodoxa fossem inter alia profunda aversão a políticas monetárias expansionistas e preferência por taxas de câmbio sobrevalorizadas e portanto diametralmente opostos aos interesses imediatos do setor cafeeiro dão a essas contribuições ainda que implicitamente um forte sabor revisionista Por outro lado a historiografia política qualificou a percepção ingênua do caráter e mesmo da força efetiva da hegemonia paulista implícita na interpretação tradicional bem como sua visão simplista sobre a natureza do conflito político durante a Primeira República uma visão frequentemente baseada na análise superficial das contradições entre os interesses econômicocorporativos do café e os de outros grupos politicamente representados ver em especial Fausto 1970 e Fausto sd Entretanto as afirmativas feitas por essa segunda vertente revisionista acerca da motivação das políticas econômicas seguidas antes de 1930 diferem pouco daquelas encontradas na literatura tradicional no que diz respeito à influência dos interesses do café no desenho dessas políticas O estado da literatura sobre o assunto que emerge das revisões dos anos 1970 é portanto curioso Os trabalhos dos historiadores econômicos revisionistas rejeitam implicitamente a noção enraizada na literatura tradicional de que a política macroeconômica sempre esteve atrelada aos interesses do grupo hegemônico Todavia por assentarem seus argumentos essencialmente em uma visão idealista do processo histórico onde as opiniões dos gestores das políticas são apresentadas como evidência principal da tese esses trabalhos não fornecem uma explicação convincente das motivações econômicas para as políticas ortodoxas efetivamente adotadas em várias ocasiões em um Estado em que os exportadores e em particular o complexo cafeeiro detinham grande parcela de poder político Ao mesmo tempo o trabalho revisionista de historiadores políticos chama a atenção para a forma extremamente simplificada e exagerada com que a historiografia tradicional representa respectivamente a natureza e a força efetiva da posição hegemônica ocupada pela oligarquia paulista no quadro político nacional mas não abandona a visão tradicional em suas referências à racionalidade política da formulação da política econômica Este capítulo é em grande parte motivado pelo interesse de discutir essas questões básicas da historiografia da política econômica da Primeira República Seu objetivo será portanto não só relatar a execução da política macroeconômica antes de 1930 com ênfase nas políticas monetária fiscal cambial e de defesa dos preços internacionais do café mas também demonstrar que tanto a visão tradicional quanto sua antítese idealista são interpretações incorretas e empobrecedoras das motivações da política econômica no período Como argumentado a seguir isto decorre em grande medida do fato de que ambas ignoram as importantes restrições impostas aos gestores da política macroeconômica pelo potencial de instabilidade de uma economia com enorme grau de vulnerabilidade da posição externa2 e da consequente importância política que em momentos de desequilíbrio macroeconômico causado por problemas de balanço de pagamentos assumia a ajuda e portanto a opinião dos banqueiros internacionais ou de seus governos na conformação das opções de política doméstica O restante do capítulo é dividido em três seções A seção 2 discute os dilemas e as respostas de política econômica durante a Primeira República À luz dessa descrição a seção 3 avalia criticamente as interpretações tradicionais sobre a condução da política econômica no período Finalmente a seção 4 alinhava as conclusões Porque a evidência empírica e a análise que sustentam as principais ideias aqui elaboradas derivam de uma série de trabalhos anteriormente publicados pelo autor3 e porque existem limitações de espaço a extensão do presente ensaio na elaboração da seção 3 optouse por remeter o leitor sempre que possível às passagens relevantes desses trabalhos já publicados ao invés de representar em longos détours descrições detalhadas dos eventos ali discutidos Com efeito como dito acima a intenção aqui será menos a de narrar fatos e descrever instituições do que produzir uma explicação mais rica da racionalidade da condução da política econômica na Primeira República do que a geralmente aceita 2 Política econômica na Primeira República O objetivo desta seção é descrever os problemas e as respostas da política econômica na Primeira República Inicialmente são feitas algumas observações de ordem geral sobre as características estruturais da economia e certos traços básicos da ordem institucional vigente no período Em seguida apresentase uma breve análise cronológica dos eventos relevantes O leitor interessado em um tratamento mais aprofundado dessas questões poderá consultar as referências citadas na nota anterior Tendência ao desequilíbrio externo e o quadro institucional O grande e recorrente problema de política econômica durante a Primeira República consistiu em isolar a economia de profundos desequilíbrios macroeconômicos provocados por alterações bruscas na posição externa a que o Brasil estava sujeito por razões estruturais A característica básica da economia primárioexportadora brasileira no início do século era sua extrema vulnerabilidade a dois tipos de choques exógenos O primeiro deles tinha origem nas periódicas flutuações abruptas da oferta de café resultante do efeito de variações climáticas sobre a produtividade dos cafezais Dado o peso do produto no valor das exportações do país a importância do Brasil em sua oferta mundial e sua baixa elasticidadepreço da demanda variações na oferta brasileira tendiam a reduzir violentamente a receita de exportações do país na ausência de medidas destinadas a sustentar os preços internacionais do produto que o Brasil em virtude de sua posição dominante na oferta mundial podia unilateralmente implementar O segundo tipo de choque resultava de perturbações na economia internacional notadamente as flutuações experimentadas pela demanda nos países centrais e as bruscas descontinuidades do fluxo de capital entre o centro e a periferia que foram especialmente frequentes durante as três primeiras décadas do século Os grandes auges e quedas dos fluxos de comércio e investimento ocorridos antes da Primeira Guerra Mundial e na segunda metade dos anos 1920 e o boom e colapso dos preços internacionais de produtos primários no imediato pósguerra tiveram como discutido a seguir importante influência sobre o comportamento da economia brasileira e condicionaram decisões cruciais de política econômica Para atacar esse problema estrutural o governo federal tinha à sua disposição não só o manejo de um conjunto de instrumentos de políticas fiscal monetária e cambial mas também a possibilidade de recorrer aos seus banqueiros no exterior em busca de financiamento externo e como seria feito esporadicamente a partir de 1906 de intervir diretamente sobre os preços do café através do controle da oferta mundial Os eventuais ajustes fiscais limitaramse ao controle da despesa e ao longo da Primeira República excetuandose o interregno da Primeira Guerra Mundial muito pouco foi feito para reformar a estrutura tributária mantendose a receita da União extremamente dependente do imposto de importação Entretanto as três primeiras décadas do século foram ricas em termos de experiências de política monetária e cambial incluindose aí dois períodos no padrãoouro onde variaram muito as restrições legais impostas à emissão de base monetária bem como de esquemas de financiamento da defesa do café cuja operação trazia impactos macroeconômicos bastante distintos Uma discussão adequada da política econômica neste período pressupõe portanto que se esteja atento às variações ocorridas nos arranjos institucionais que regiam a operação das políticas monetária cambial e quando esta ocorria de defesa dos preços do café Finalmente deve ser notado que o debate sobre as opções de gestão econômica não ocorria num vácuo político mas em um sistema peculiar de relações entre o governo central e um grande e heterogêneo conjunto de interesses estaduais consolidado no fim da primeira década republicana que permitia o funcionamento relativamente estável de um regime onde o parlamento apesar de manter suas prerrogativas formais subordinavase quase que inteiramente aos desígnios do Presidente da República A principal regra não escrita desse sistema era a de que o governo federal estaria pronto a apoiar inclusive se necessário manu militari as oligarquias que controlassem o poder nos estados menores de modo a facilitar a consolidação e estabilidade do poder local as quais em retorno presenteariam o governo federal com uma confortável e dócil maioria no Congresso federal O funcionamento estável desse sistema baseavase por um lado na maior estabilidade da liderança dos grupos hegemônicos nos grandes estados baseada em interesses econômicos mais poderosos a nível nacional e por outro na enorme influência que o apoio do governo federal dava às oligarquias dominantes nos menores estados para obter o favor dos coronéis locais e portanto o voto O pacto oligárquico como ficou conhecido esse sistema de controle político e centralização de poder consolidado na Presidência Campos Sales tinha entretanto três importantes fontes de instabilidade cuja importância relativa variava conforme as circunstâncias A primeira originavase nas possíveis divergências entre as elites políticas dos estados dominantes São Paulo e Minas Gerais sobre aspectos fundamentais da política econômica federal Como será visto a seguir essas divergências não foram pouco frequentes durante os anos 1920 especialmente no que concerne à condução das políticas monetária cambial e de defesa do café A segunda fonte de instabilidade era a dificuldade ocasional de contentarse os estados intermediários com substancial poder de representação política e peso econômico como o Rio de Janeiro o Rio Grande do Sul a Bahia e Pernambuco que nutriam legítimas ambições de possuir voz mais ativa no governo federal Esse problema frequentemente deu lugar a grandes atritos nas negociações que ocorriam a cada quatro anos entre as oligarquias dominantes nos estados visando obter o consenso na escolha do candidato presidencial Finalmente havia o protesto insistentemente veiculado por uma minoria de políticos dissidentes intelectuais e setores da imprensa independente contra a natureza antidemocrática e centralizadora do regime que encontrou crescente ressonância nas classes médias urbanas emergentes e nas camadas mais jovens da oficialidade das forças armadas especialmente nos anos 1920 Este descontentamento foi de fato a fonte de recorrentes crises políticas e juntamente com as profundas divergências entre os estados dominantes durante a sucessão presidencial de 1930 e o impacto devastador do início da Grande Depressão contribuiu de forma decisiva para o colapso da Primeira República Ciclos e crises da Primeira República A história das políticas econômicas e o desempenho da economia brasileira entre o limiar do século e a revolução de 1930 pode ser dividida em períodos demarcados basicamente por alterações no comportamento da economia internacional a do longo ciclo de crescimento com endividamento da década anterior a 1914 a do funcionamento anômalo da economia mundial durante a Primeira Guerra Mundial e a do choque reconstrução e colapso dos anos 1920 A era de ouro 19001913 Os anos entre o fim do período de ajuste recessivo da virada do século e a desaceleração que precede a Primeira Guerra Mundial marcam um ciclo de crescimento que em termos de duração e extensão do progresso material não teve paralelo na memória daqueles que o testemunharam Após quase uma década de estagnação econômica entre 1900 e 1913 o produto agregado cresceu a uma taxa média superior a 4 ao ano a formação de capital na indústria prosseguiu em ritmo ainda mais acelerado realizouse gigantesco esforço de reaparelhamento do sistema de transportes através de grandes obras portuárias e ferroviárias mantendose além disso relativa estabilidade de preços ao longo de todo o período A origem deste verdadeiro milagre econômico está na repentina melhora da posição externa que se faz sentir já no governo Rodrigues Alves 19021906 em virtude do rápido crescimento das exportações de borracha e do início do grande boom de investimentos europeus na periferia que com breves interrupções duraria até as vésperas da guerra Entretanto nessas circunstâncias a manutenção da política monetária apertada seguida pela administração anterior por imposição dos termos do empréstimo de consolidaçãobritânico não só impedia a recuperação do nível de atividade doméstico como acabaria tornando impossível a manutenção da taxa de câmbio em torno do nível de 12 pence por milréis a que havia sido estabilizada desde 1902 após uma apreciação de quase 70 desde 1898 Essa situação era particularmente delicada para os produtores de café que já enfrentavam preços internacionais deprimidos em função do grande aumento da oferta paulista desde o fim do século O ponto crítico foi finalmente atingido em 1905 quando o grande aumento da receita líquida de divisas provocou substancial apreciação cambial reabrindo o debate sobre reforma monetária A questão central era a de como criar um mecanismo em substituição ao poder discricionário do Tesouro como exigia o pensamento ortodoxo dominante para prover ativos domésticos líquidos em quantidade suficiente para absorver a crescente oferta de divisas de modo a aliviar as pressões para a apreciação da taxa de câmbio Apesar dos protestos dos ultraortodoxos defensores da continuação do arrocho monetário os interesses do setor produtivo falaram mais alto e a opção influenciada pela recente e bemsucedida experiência argentina recaiu sobre um mecanismo automático de padrãoouro Em 1906 criouse a Caixa de Conversão investida do poder de emissão de notas plenamente conversíveis em ouro e viceversa a uma taxa fixa de câmbio O outro problema enfrentado no início do período de recuperação foi o agravamento do desequilíbrio no mercado mundial de café com as estimativas de uma supersafra em São Paulo em 1906 Como o Brasil tinha uma posição quase monopolista no mercado mundial e a demanda de café é inelástica em relação ao preço um aumento da oferta brasileira teria forte impacto negativo sobre o preço internacional do produto reduzindo a receita de exportações do país Por outro lado a posição quase monopolista do Brasil facilitava a implementação do controle do preço internacional do produto por restrições administradas da oferta Isto evidentemente requereria o financiamento de um volume substancial de estoques demandando mais recursos do que o sistema bancário doméstico estaria disposto a fornecer em bases comerciais A saída natural seria buscar financiamento externo Embora pressionado pelos interesses ligados ao café no sentido de garantir um empréstimo externo que permitisse retirar temporariamente os excedentes do mercado como acertado entre os principais estados produtores no chamado Convênio de Taubaté o governo federal negouse a dar tal garantia A retenção dos estoques foi inicialmente financiada com créditos bancários de grandes importadores estrangeiros que por possuírem a maior parte dos estoques existentes também tinham interesse na defesa dos preços do produto e garantias do estado de São Paulo Entretanto em 1907 uma breve mas grave crise financeira internacional impossibilitou a rolagem desses créditos levando o governo federal a temer que à queda temporária dos influxos de capital gerada pela retração nos mercados financeiros viesse somarse um colapso dos preços do café provocando uma brusca reversão da posição externa o possível esgotamento das reservas da Caixa de Conversão e a desmoralização da experiência do padrãoouro Nessas circunstâncias o governo federal acabou por decidir avalizar junto a seus banqueiros de Londres um empréstimo que permitisse financiar a desova dos estoques de café em prazo mais longo e portanto garantir a estabilidade de preços a curto prazo A decisão de apoiar a valorização do café como forma de garantir a estabilidade macroeconômica foi coroada de sucesso Com a normalização das condições de crédito nos mercados internacionais de capital já em 1908 retornaram os influxos de capital e com a ajuda adicional de um grande crescimento dos preços da borracha a economia entrou em uma fase de acelerado crescimento que duraria até 1913 Os estágios iniciais desse boom foram marcados por uma súbita melhora no balanço de pagamentos que induzindo volumosos influxos de ouro causou grande expansão monetária De fato é esse vínculo entre flutuações no balanço de pagamentos e condições internas de crédito criado pela reforma monetária de 1906 que fornece a chave para a compreensão da dinâmica dos ciclos do pré guerra Com o funcionamento da Caixa de Conversão entraria em ação o mecanismo de ajustamento tradicionalmente associado com a operação normal de um sistema monetário de padrãoouro isto é movimentos de ouro causariam mudanças na oferta de moeda induzindo variações estabilizadoras no balanço de pagamentos em conta corrente Entretanto a crença convencional na suavidade do ajustamento nesse contexto resulta de uma redução artificial da análise aos efeitos das reações autocorretoras de custos relativos e renda que afetam apenas a balança comercial ignorando a influência desestabilizadora da ocorrência de grandes superávits na conta de capital e sua volatilidade fator crucial no caso brasileiro durante a década que precede a Primeira Guerra Mundial Esses superávits que geralmente acompanham booms de exportação tendem a agravar uma já folgada posição em conta corrente Nestas condições a operação do mecanismo de ajustamento do padrãoouro fazse sentir através de uma acentuada tendência compensatória na balança comercial causada por um forte crescimento das importações Na ausência de eventos exógenos que sustentem um crescimento contínuo das exportações esta era de ouro de uma economia exportadora pode durar somente enquanto persistam na escala apropriada os influxos de capital Se estes se retraem depois de estabelecida a tendência declinante da balança comercial os resultados podem ser desastrosos devido à rapidez com que os reajustamentos subsequentes se processam Por causa da defasagem na resposta da demanda de importações à contração automática de crédito uma súbita deterioração da posição externa é inevitável a curto prazo Se a perda de reservas de divisas pode ser sustentada por um longo período a redução das rendas monetárias que ela acarretará poderá vir a corrigir o desequilíbrio externo ao custo de uma redução no crescimento do produto real mas se a perda de reservas necessárias é grande relativamente à base monetária doméstica o choque monetário automático inevitavelmente gerará uma crise de grandes proporções Em resumo a adoção do padrãoouro pelo Brasil em 1906 vinculou a estabilidade monetária doméstica ao comportamento do balanço de pagamentos acentuando portanto o caráter prócíclico dos déficits e superávits externos da economia primária exportadora Por causa disso até o início da guerra em 1914 os acontecimentos exógenos que afetariam os mercados internacionais do café e da borracha e o fluxo de capital europeu de longo prazo seriam decisivos para a determinação do nível de atividade interna da economia As primeiras razões para preocupações com a deterioração do balanço de pagamentos apareceram em 1912 e deviamse a tendências desfavoráveis que se vinham desenvolvendo desde algum tempo Até 1911 os crescentes déficits orçamentários que reapareceram em 1908 puderam ser financiados por meio de vultosos empréstimos externos associados a programas de obras públicas Mas o crescimento da despesa governamental preocupava os credores e em 1912 surgiram dificuldades de levantar novos empréstimos Ficava claro que caso persistisse a queda do influxo de capital estrangeiro a tendência declinante do balanço comercial teria que ser revertida para que o Brasil pudesse manter a estabilidade cambial sem grandes perdas de reservas e os problemas internos que isso acarretaria Entretanto a possibilidade de crescimento das exportações a curto prazo era ainda mais remota no final de 1912 De fato mais do que os crescentes déficits orçamentários e das incertezas quanto às tendências futuras dos investimentos estrangeiros a deterioração das perspectivas de crescimento das exportações era a mudança que mais comprometia a viabilidade do modelo de crescimento do pré guerra Os preços da borracha haviam despencado depois do pico de 1910 sob o impacto do rápido crescimento da oferta proveniente das novas plantações coloniais inglesas e holandesas do sudeste da Ásia que contavam com marcado diferencial de produtividade em seu favor O comportamento desfavorável das exportações de borracha havia sido compensado entretanto pelo substancial aumento no preço do café a partir do fim de 1910 resultante do sucesso final do programa de valorização Entretanto em 1913 uma ação antitruste movida nos Estados Unidos contra os detentores da parcela dos estoques de café da supersafra de 1906 comprados com o aval do governo federal ainda não vendidos e retidos em Nova York obrigou à venda desses estoques revertendo a tendência à alta dos preços A deterioração da posição externa em 1913 marca o início de um período de permanente crise de liquidez gerada pela operação do padrãoouro após a reversão da posição do balanço de pagamentos que se estenderia até a eclosão da Guerra Mundial O governo entretanto decidiu manter o padrãoouro alimentando esperanças infundadas de conseguir acomodação financeira adicional no exterior Nestas condições a rápida queda dos depósitos da Caixa de Conversão ocasionou severo arrocho monetário que lançou a economia em profunda recessão bem antes do início das hostilidades na Europa O impacto da Grande Guerra 19141918 O início da guerra teve efeitos imediatos sobre o comércio internacional afetando o fluxo de pagamentos externos a receita tributária e a indústria do café A primeira reação do governo foi fechar a Caixa de Conversão tentar ganhar tempo com uma série de medidas de emergência incluindo um longo feriado bancário e uma moratória temporária sobre todas as dívidas e autorizar uma grande emissão de notas inconversíveis que apesar de montar apenas a uma fração da contração da base monetária verificada desde 1913 serviu para aliviar temporariamente a crise de liquidez e atender a despesas do governo Entretanto na medida em que o comércio se normalizava apareceram grandes pressões para a depreciação da taxa de câmbio que se materializada ameaçava tornar mais crítica ainda a já precária posição orçamentária do governo O resultado natural foi a assinatura em outubro de um novo funding loan de 15 milhões com os banqueiros do governo para fazer frente ao pagamento de juros dos empréstimos federais até 1917 suspendendose as amortizações até 1927 O funding loan de 1914 juntamente com a assinatura de acordos similares por parte de outras autoridades públicas com seus credores estrangeiros serviu para aliviar o balanço de pagamentos e contribuiu de forma decisiva para que se pudesse estabilizar a taxa de câmbio em torno de 20 a 25 abaixo da paridade de préguerra ao longo de todo o conflito Em fins de 1914 as mudanças provocadas pelo conflito no comércio internacional começavam a definir seus contornos As exportações brasileiras não foram adversamente afetadas logo em 1915 pois em grande medida continuaram a atingir o mercado alemão através da Holanda e dos países neutros da Escandinávia até o aperto do bloqueio naval aliado em 1916 e a depreciação do milréis compensou a queda sofrida pelos preços dos principais produtos de exportação antes da guerra O maior problema criado pelo confronto para o comércio exterior brasileiro foi o da estagnação das importações aos níveis já extremamente deprimidos que haviam atingido ao fim da recessão de 19131914 Isto refletia em parte a continuação de níveis de atividade domésticos deprimidos mas sinalizava também o efeito negativo da guerra sobre a oferta mundial de manufaturados A contração do volume de importações ameaçava por sua vez transformar o desequilíbrio fiscal do governo federal em uma crise fiscal permanente caso não fosse alterada a dependência da receita em relação à tarifa Tão logo as ações militares na Europa começaram a apontar para a possibilidade de um conflito duradouro enquanto se prolongava a estagnação econômica doméstica as medidas emergenciais tomadas na perspectiva otimista de que a guerra não seria prolongada tornaramse claramente insuficientes A emissão de emergência tinha trazido alívio apenas temporário às condições de crédito e a oferta de moeda voltara a cair no primeiro semestre de 1915 A produção industrial caíra em nada menos do que 87 em 1914 e os níveis de atividade continuavam deprimidos Assim na medida em que a guerra encaminhavase para um impasse militar de duração imprevisível o governo brasileiro viuse forçado a adotar um elenco de medidas mais radicais para ajustar a economia ao novo entorno internacional e em especial para tirar a economia da Depressão em que se encontrava por quase dois anos Os primeiros passos dados em meados de 1915 consistiram em tentar equacionar o equilíbrio financeiro do setor público e reverter o substancial aperto de liquidez então vigente Para ajustar a receita às novas condições criadas pela guerra o governo ampliou substancialmente a base de produtos sujeitos ao imposto de consumo Isto juntamente com a manutenção das despesas a níveis baixos fez com que o déficit orçamentário caísse substancialmente em termos reais durante a guerra Por outro lado o governo autorizou uma nova emissão de notas do Tesouro e de títulos federais de longo prazo O grosso desses recursos destinouse a cobrir os atrasados acumulados pelo excesso de despesa do governo mas parte da emissão monetária foi destinada à expansão das atividades do Banco do Brasil pois nessa época a visão do governo passou a refletir a ideia de que o banco poderia cumprir importante papel estabilizador das condições de crédito Durante a guerra renovaramse com maior força as reclamações sobre o que era à época chamado de inelasticidade do sistema bancário isto é sua limitada capacidade de criação de crédito resultante dos altíssimos encaixes com que operavam especialmente os bancos nacionais e a variabilidade sazonal de sua capacidade de empréstimo visàvis às necessidades do setor real Reclamações sobre aperto das condições de crédito sempre cresciam durante o terceiro trimestre do ano nos centros financeiros urbanos especialmente no Rio de Janeiro quando os pagamentos em dinheiro feitos pelos fazendeiros ao fim de suas colheitas envolviam grande redirecionamento de liquidez dos centros financeiros para o interior Fazendeiros e colonos preferiam moeda manual a depósitos bancários basicamente porque a rede bancária ainda não atingia grandes áreas do interior Portanto a colheita era seguida de forte drenagem de moeda primária dos centros financeiros o que não só reduzia a capacidade de empréstimo dos bancos mas acabava por forçálos a reduzir suas exigibilidades dada a alta relação encaixesdepósitos com que usualmente operavam A contração da oferta de moeda resultante afetava diretamente as atividades urbanas e dava lugar a reclamações recorrentes que a partir de 1915 fortaleceram a opinião de que o Banco do Brasil poderia minimizar esses problemas implementando atividades de redesconto e ampliando sua rede de agências Embora a atribuição da capacidade de redesconto e de outras funções de autoridade monetária ao Banco do Brasil tivesse que esperar a década seguinte os anos da guerra presenciariam o início de grande desenvolvimento da base regional de suas operações A superação da crise de liquidez facilitou o ajustamento real da economia brasileira às mudanças ocasionadas pela guerra nos fluxos de comércio internacional O fato mais marcante foi a queda contínua dos termos de troca mesmo depois de seu colapso anterior ao início da guerra Em que pese a grande mudança na estrutura das exportações a evolução desfavorável dos preços do café e em menor medida da borracha impediu o crescimento rápido do valor das exportações Embora a estrutura das importações não tenha mudado substancialmente a das exportações alterouse dramaticamente A interrupção do suprimento de algumas fontes tradicionais de certas matériasprimas e alimentos que o Brasil podia suprir aos altos preços então vigentes permitiu a expansão de exportações não tradicionais e estimulou o crescimento em várias indústrias de processamento de alimentos Com as largas margens de ociosidade existentes no início da guerra as restrições à importação causaram notável recuperação da produção industrial doméstica a partir de 1915 Deve ser enfatizado entretanto que a tese clássica de que as restrições ao suprimento externo impostas pela guerra tiveram impacto dramático sobre a industrialização brasileira já foi corretamente qualificada por vários autores4 O comportamento das importações de bens de capital para a indústria durante a guerra e a capacidade de oferta ainda extremamente limitada dos produtores domésticos de equipamento indicam não ter havido grande expansão da capacidade produtiva da indústria brasileira neste período Enquanto a recuperação prosseguia ao longo de 1916 as preocupações voltaram a concentrarse na evolução da posição externa A balança comercial voltou a deteriorar como consequência do crescimento do valor das importações e previase o impacto do retorno dos pagamentos de juros da dívida pública externa em 1917 Essas preocupações foram exacerbadas pelo início de restrições dos aliados às importações de café como parte de medidas de economia de guerra Os problemas diplomáticos com o café seriam adicionalmente complicados por uma pendência entre o governos alemão e de São Paulo relativa ao pagamento pelos estoques da valorização de 1906 depositados na Alemanha e em cidades da Bélgica ocupada que haviam sido confiscados Os alemães limitaram se a depositar uma quantia em marcos em um banco alemão que se recusavam a remeter ao exterior para evitar a transferência de fundos ao inimigo inglês a quem os estoques de café estavam hipotecados Na medida em que o marco depreciavase em relação à libra aumentava o nervosismo em São Paulo em relação a uma solução para essa questão traduzindose inclusive em pressões para o abandono da política de neutralidade em relação ao conflito e a tomada em garantia do pagamento pelos cafés confiscados de mais de 40 navios mercantes de bandeira alemã e austríaca que se haviam internado em portos brasileiros no início da guerra em vista da avassaladora superioridade naval aliada As perspectivas de evolução da posição externa brasileira foram entretanto inteiramente transformadas pela decisão alemã de iniciar uma grande ofensiva contra a corrente de suprimento marítimo aliada em fevereiro de 1917 instruindo seus submarinos a afundar sem aviso prévio todo navio mercante engajado no comércio com o inimigo A consequência imediata do devastador efeito inicial da ofensiva submarina alemã sobre a capacidade de transporte marítimo britânica foi a definitiva proibição das importações de café pela GrãBretanha Se outros aliados seguissem esse exemplo como parecia inevitável o governo brasileiro não teria alternativa senão utilizar os recursos alocados ao serviço da dívida para absorver parte do excedente invendável da principal atividade exportadora do país e manter o suprimento das importações essenciais A situação era ainda mais complicada pela previsão de uma grande safra cerca de 25 maior do que a do ano anterior que em poucos meses estaria colhida Diante desses problemas a expropriação dos navios alemães ou seja o fim da neutralidade deixava de ser uma demanda do governo de São Paulo já que ao abrir a possibilidade de obter capacidade autônoma de carga e possivelmente seu afretamento a bandeiras aliadas passava a representar uma solução efetiva ao estrangulamento físico e cambial que ameaçava a economia brasileira Essa decisão acabaria por tomarse bem mais fácil após o afundamento no início de abril de 1917 de um cargueiro brasileiro na costa francesa quase concomitantemente à decisão americana de declarar guerra à Alemanha Dias depois o Brasil rompeu relações diplomáticas com a Alemanha e finalmente o afundamento de um segundo navio brasileiro somado a garantias formais norte americanas de colaborar com a defesa do Brasil no caso de retaliações militares alemãs levou o governo a decidir incorporar os navios internados à frota do Lloyd Brasileiro Como a utilização imediata dos navios não era tecnicamente possível o problema da disposição ordenada da safra de 1917 permanecia dramático Em julho os estoques em Santos saltaram para 6 milhões de sacas contra 1 milhão em meados do ano anterior e o sistema bancário era absolutamente incapaz de congelar suas carteiras de empréstimos para financiar o carregamento desses estoques A solução natural foi uma nova emissão de notas inconversíveis para financiar a compra da safra e reforçar o caixa do Banco do Brasil Em outro front depois de meses de negociações parte da frota expropriada dos alemães foi arrendada ao governo francês mas ainda permaneciam preocupações importantes Por um lado a grande erosão dos salários reais provocada pela alta do preço dos alimentos levou à primeira onda de greves e manifestações operárias da história do Brasil sublinhando as profundas transformações em processo na estrutura social das grandes cidades brasileiras Por outro lado ao longo da primeira metade de 1918 voltavam as preocupações com a fragilidade da posição externa e da indústria do café em um cenário de prolongamento da guerra Entretanto por um golpe de sorte esse crônico duplo dilema de política econômica criado pela guerra desapareceria como por um passe de mágica a partir da metade do ano quando dois dias de geadas de violência sem precedentes seguidos do fim das hostilidades na Europa alteraram completamente as perspectivas em relação aos preços do café Os preços em Nova York que se mantinham em tomo de uma média de 108 centavos de dólar por librapeso em junho atingiram mais de 22 centavos no fim do ano As geadas tiveram efeito depressivo sobre várias colheitas e dada a importância da renda agrícola paulista para o desempenho global da economia deprimiram os níveis de atividade doméstica em 1918 Entretanto o Brasil emergia da guerra sem nenhum dos problemas de excesso de oferta de café e equilíbrio externo que haviam ocupado o centro das decisões de política econômica em seus últimos dois anos Boom e recessão do pósguerra 19191922 O desempenho da economia brasileira nos primeiros três anos que se seguem ao armistício de 1918 foi profundamente influenciado pelo rápido mas violento movimento de auge e recessão então experimentado pelas principais economias aliadas O boom internacional iniciado já no começo de 1919 traduziuse em formidável e generalizado aumento dos preços das commodities Esse efeito foi exacerbado no caso do Brasil pela sensível restrição da capacidade de oferta mundial de café causada pela grande geada de 1918 A alta dos preços do café somada aos efeitos positivos da conjuntura internacional sobre os preços de outros itens da pauta de exportação que experimentara como notado acima substancial diversificação durante a guerra provocou aumento explosivo das exportações brasileiras Ao mesmo tempo a liberação da demanda de ampla gama de manufaturas não produzidas domesticamente reprimida durante o conflito por restrições de oferta e capacidade de transporte e a apreciação do milréis causada pelo abandono generalizado das paridades ouro na Europa no início de 1919 tenderiam a provocar rápida recuperação das importações Entretanto com os prazos de entrega dilatados pelas dificuldades de suprimento ainda existentes no período de reconversão das economias centrais a resposta das importações retardouse além do normal em relação ao crescimento explosivo das exportações provocando o aparecimento de grande superávit comercial em 1919 e relançando a economia em franca e rápida recuperação dos níveis de atividade após a relativa estagnação sofrida em 1918 O rápido boom nos países centrais teve entretanto vida curta A adoção de políticas monetárias restritivas nos dois principais centros financeiros internacionais em resposta à persistência de fortes pressões inflacionárias após o fim da guerra precipitou o início de violenta recessão nos Estados Unidos e Reino Unido e queda vertiginosa dos preços internacionais a partir de meados de 1920 O colapso dos preços internacionais de produtos primários teve efeito devastador sobre a posição externa brasileira A violenta queda das exportações ocorreu simultaneamente à aceleração tardia do volume de importações estimulada pelo boom e pela apreciação cambial anteriores provocando súbita reversão da balança comercial em meados de 1920 o que além de ter efeito fortemente recessivo causaria grande depreciação cambial a partir do segundo semestre desse ano A recessão mundial de 1920 teria profundas repercussões sobre a condução da política econômica por seu impacto desestabilizador sobre a taxa de câmbio e o equilíbrio do setor cafeeiro A preocupação imediata do governo foi tentar minimizar a velocidade e magnitude da desvalorização cambial Esta preocupação justificavase por um lado pela sensibilidade da posição orçamentária do governo federal em relação à taxa de câmbio Dado o grande peso da tarifa das alfândegas na receita federal e o vulto das despesas em moeda estrangeira no gasto público uma forte desvalorização cambial agravaria ainda mais a já precária posição financeira do governo Isto seria especialmente verdade naquele momento quando as despesas inadiáveis ligadas à reposição do desgaste sofrido pelo equipamento do setor público durante a guerra somaramse às do grande programa de obras lançado no início do governo Epitácio Pessoa em grande parte contratadas com empresas estrangeiras Por outro lado dada a grande sensibilidade da estrutura de custos e do salário real em relação à taxa de câmbio na Primeira República uma rápida e substancial desvalorização teria certamente forte impacto inflacionário Além disso uma vez que o surto de encomendas ao exterior teve como contra partida a criação de vultosas exigibilidades em moeda estrangeira por parte das firmas importadoras uma rápida desvalorização cambial afetava perigosamente a posição financeira de grande número de empresas Nessas circunstâncias a costumeira reação defensiva por parte dos bancos cortando linhas de crédito na tentativa de recompor níveis mais altos de encaixes agravaria ainda mais a crise de liquidez e os problemas do setor privado A perspectiva de crise iminente do complexo cafeeiro logo passou também a ocupar a atenção das autoridades federais A violência da queda dos preços internacionais do café e a memória do sucesso das operações de defesa de 1906 e 1917 não tardaram a suscitar pressões para a institucionalização do controle da oferta do produto Em setembro representantes de São Paulo propuseram ao Congresso autorizar a intervenção federal no mercado de café sustentandose as compras com recursos provenientes de emissão ad hoc de notas do Tesouro mas o governo vetou a iniciativa Entretanto como indicado anteriormente na medida em que a crise se alastrava no segundo semestre de 1920 aprofundavase a restrição de crédito e embora a crise da cafeicultura fosse corretamente percebida por seus representantes como sendo agravada pela incapacidade conjuntural do sistema bancário em prestar assistência normal ao financiamento da comercialização da safra a necessidade de medidas urgentes visando reverter o aperto de liquidez era sentida por todo o setor privado Finalmente em outubro gerase uma solução de compromisso a aprovação de projeto de lei autorizando pequena emissão de notas do Tesouro para alívio emergencial de liquidez e a criação da Carteira de Redesconto do Banco do Brasil A carteira teria poderes de emitir notas do Tesouro até um limite passível de ampliação pelo Presidente da República contra títulos comerciais e proibia explicitamente o redesconto de títulos públicos Ao atender aos reclamos imediatos do setor privado e à antiga reivindicação de criação de um emprestador automático de última instância o governo federal conseguiu esvaziar a demanda corporativa da institucionalização da defesa do café e implementar ainda que de forma reconhecidamente provisória e incompleta um instrumento considerado fundamental para maior estabilidade de sistema bancário Os objetivos da política cambial acabariam entretanto por impedir que o governo mantivesse uma atitude indiferente em relação à contínua deterioração dos preços internacionais do café Nos primeiros meses de 1921 com a persistência do desequilíbrio comercial mesmo após substancial depreciação cambial o governo finalmente foi levado a concluir que a intervenção direta nos mercados do produto era um requisito indispensável ao restabelecimento do equilíbrio do balanço de pagamentos Além disso a decisão de sustentar os preços do café era indispensável para prevenir que os esforços do governo em evitar uma queda descontrolada do valor externo do milréis submetesse a lavoura cafeeira a pressões insuportáveis A decisão de iniciar nova operação de valorização não implicava contudo nenhum compromisso formal do governo federal Sua ação limitouse a autorizar o endosso pelo Tesouro de letras de café sacadas por uma grande firma corretora contratada para agenciar as compras e a instruir o Banco do Brasil a financiar as operações se necessário com o auxílio da recémcriada Carteira de Redesconto As compras iniciaramse imediatamente sustando a queda dos preços e a obtenção de um empréstimo de estabilização em Nova York permitiu ao governo reassumir algum grau de controle sobre a taxa de câmbio Mas o pior da crise ainda não havia passado Em meados de 1921 o governo começava a enfrentar dificuldades no financiamento de seu crescente desequilíbrio fiscal Embora a falta de dados sobre operações internas de crédito do governo federal impeça5 uma avaliação adequada das fontes de financiamento do déficit desde o início de 1921 o Tesouro aumentava rapidamente sua dívida de curto prazo com o Banco do Brasil Isso por sua vez tinha consequências para a viabilidade do esquema de defesa do café já que o crescimento dos empréstimos do Tesouro afetava a capacidade do Banco em financiar as grandes operações da valorização sem recurso maciço à Carteira de Redesconto Esse conflito entre as demandas financeiras do Tesouro e do programa de sustentação do café seria resolvido a partir do último trimestre de 1921 recorrendose ao crédito externo para financiar a valorização Com os preços começando firme recuperação em agosto e a perspectiva de pequena safra para 1922 não foi difícil para os responsáveis pela defesa do café conseguir com a intermediação de uma firma exportadora britânica linhas de crédito de curto prazo junto a bancos comerciais britânicos para recomprar as letras em poder do Banco do Brasil e realizar as compras ainda eventualmente necessárias para firmar os preços Esses créditos de curto prazo seriam consolidados em maio de 1922 através de um empréstimo de longo prazo coordenado pelos tradicionais merchant bankers do governo federal em Londres Completavase com sucesso mais um episódio de defesa do café e o financiamento externo conseguido na undécima hora trazia ainda o benefício de fornecer ao Banco do Brasil munição suficiente para frear o colapso cambial iniciado no segundo trimestre de 1920 A posição fiscal entretanto continuou crítica Em 1922 o déficit de caixa do governo federal atingiria níveis alarmantes dada a incapacidade do governo em conter o crescimento da despesa e a necessidade de liquidar grande volume de atrasados acumulados no exercício anterior Desde o início do ano tendo que reduzir a emissão de apólices ante o elevado desconto nas cotações dessas obrigações de longo prazo o Tesouro foi obrigado a financiar o desequilíbrio orçamentário através do lançamento maciço de letras de curto prazo Como o grosso das letras emitidas acabava por encontrar o caminho da carteira do banco do governo o déficit fiscal transformavase em vultosa e crescente dívida de curto prazo do Tesouro com o Banco do Brasil O crescimento dessa dívida teria sérias consequências para o equilíbrio monetário pois embora a legislação proibisse o redesconto de títulos da dívida pública o Banco do Brasil podia gerar os recursos líquidos necessários para bancar o crescimento de seus empréstimos ao governo por via indireta redescontando ativos de sua carteira comercial Esse expediente usado até o primeiro semestre de 1922 tinha entretanto limites bem definidos já que com a perspectiva de prolongada inadimplência do governo essas operações implicavam perigosa deterioração de qualidade de carteira do Banco Nestas circunstâncias os princípios doutrinários cederam lugar ao pragmatismo em outubro o Congresso autorizou o redesconto de títulos federais até meio milhão de contos equivalente a mais do que o total das letras em carteira no Banco do Brasil em fins de 1921 provocando crescimento explosivo da base monetária no último trimestre do ano A forma de financiamento do severo desequilíbrio fiscal causado pelos choques do pósguerra teria ainda sérias consequências de médio prazo Por um lado a expansão monetária por ele provocada alimentaria as já sensíveis pressões inflacionárias desencadeadas pelo colapso cambial de 19201921 Por outro lado a necessidade de liquidar a dívida de curto prazo gerada em 1922 parte substancial da qual exercia efeito paralisador sobre a capacidade operacional do Banco do Brasil motivaria a adoção imediata de grande austeridade na condução da política fiscal Recuperação desequilíbrio externo e ajuste recessivo 19221926 Apesar dos graves problemas financeiros enfrentados em seus últimos meses o governo Epitácio Pessoa seria concluído já em clima de franca recuperação econômica Em fins de 1922 voltava a crescer o preço internacional do café havia clara reversão da tendência à queda das exportações e do déficit comercial verificavase rápida retomada do crescimento da produção industrial Os programas de obras públicas e o crédito mais folgado sustentavam altos níveis de atividade na construção civil As causas da impressionante reversão cíclica de 1922 não derivam todavia da adoção consciente de medidas estabilizadoras pelo governo em resposta ao choque externo e à recessão de 19201921 Elas resultaram tanto dos efeitos anticíclicos da política de valorização que não eram diretamente colimados pelas autoridades quando de sua adoção quanto da propagação dos efeitos da violenta depreciação cambial de 19201921 através de mecanismos estabilizadores inerentes à economia primárioexportadora brasileira6 O sucesso da intervenção federal no mercado do café sem dúvida atenuou as consequências domésticas do choque externo causado pela recessão mundial A sustentação artificial dos preços do café fez reverter muito mais depressa a tendência à queda das exportações e dos termos de troca além de ter protegido a renda real do setor cafeeiro que vinha sendo rapidamente erodida desde meados de 1920 quando os preços internacionais do café passaram a cair mais rapidamente do que a da taxa de câmbio Entretanto a decisão de implementar a valorização foi tomada pelo governo federal como coadjuvante da política cambial que visava arrefecer o ritmo da depreciação cambial Mesmo assim o governo só conseguiu readquirir controle sobre o mercado de divisas após grande depreciação do milréis cujo valor em relação ao esterlino atingiria em fins de 1922 um terço do vigente em maio de 1920 Esse violento colapso cambial também teve importante efeito estabilizador Em primeiro lugar contribuiu de forma crucial para a grande queda das importações em 1921 que explica a maior parte do rápido reajustamento do balanço comercial no período 19201922 fator importante na recuperação Em segundo lugar a desvalorização cambial concorrendo para o aumento explosivo do déficit público e por esta via como discutido na seção anterior para marcada elevação da taxa de expansão monetária em 19211922 também contribuiu de forma importante para a reversão cíclica embora através de efeitos claramente indesejados pelo governo Finalmente ao isolar a economia do impacto deflacionário da queda dos preços internacionais o colapso cambial protegeu de perdas substanciais de renda exportadores e indústrias competitivas com importações e explica por que o Brasil experimentou queda de preços domésticos muito mais suave do que os países centrais durante a recessão O governo de Artur Bernardes herdava entretanto um balanço de pagamentos extremamente vulnerável e crônica crise fiscal que atingira gravemente a capacidade de financiamento do Banco do Brasil e que condicionaria a definição de seu programa de política econômica O ponto básico do programa de Bernardes seria a realização de uma reforma monetária que transformasse o Banco do Brasil em banco central retirando do Tesouro os poderes de emissão de moeda A estabilização das receitas de exportação com vistas ao fortalecimento da posição externa que passava a constituirse em meta prioritária do novo governo seria cumprida pela institucionalização de novo e ousado programa dito permanente de defesa dos preços do café O novo esquema de defesa do café projetado para ser administrado por um instituto federal cuja constituição em princípio havia sido autorizada pelo Congresso nos últimos meses do governo anterior introduzia duas mudanças fundamentais em relação às intervenções passadas Em primeiro lugar os preços não seriam mais controlados através da compra e estocagem de excedentes eventuais pelo governo mas da retenção compulsória de todo o café colhido nas regiões produtoras do CentroSul em armazéns reguladores a serem construídos em entroncamentos ferroviários estratégicos e do controle do volume embarcado a partir desses armazéns para os portos isto é pelo controle contínuo da oferta brasileira ao mercado mundial Esta alteração dos mecanismos da valorização implicava crucial mudança na distribuição de suas perdas e lucros Antes era a autoridade pública que incorria nos ônus financeiros e carreava os ganhos eventualmente resultantes da operação esporádica de defesa dos preços agora era o fazendeiro que como proprietário dos cafés armazenados bancaria a operação Este teria entretanto que fazer frente às despesas incorridas entre a entrega do café ao armazém regulador e seu embarque para exportação com os adiantamentos conseguidos a um dado custo financeiro com seu comissário ou na rede bancária contra a garantia de certificado de depósito fornecido pelos armazéns Finalmente o programa de governo contemplava drástica redução do déficit público com cortes do gasto em formação de capital cumprindo importante papel no ajuste a curto prazo Havia entretanto que resolver os problemas criados pelo esgotamento da capacidade de financiamento do déficit público uma vez que as medidas de ajuste adotadas levariam tempo para reduzir o desequilíbrio a proporções gerenciáveis Este não era um problema trivial porque por um lado o congestionamento da carteira do Banco do Brasil reduzira sua capacidade de financiar o governo e a reforma monetária da nova administração preconizava o fechamento da Carteira de Redesconto Por outro lado havia a necessidade de precaverse para enfrentar as demandas do setor cafeeiro aleatórias mas potencialmente elevadas pelo crédito necessário à viabilização do novo esquema de defesa Com efeito o funcionamento do novo sistema dependia crucialmente da existência de uma fonte de recursos que agisse como emprestador de última instância intervindo em apoio ao sistema bancário quando as necessidades de financiamento dos estoques retidos nos reguladores ultrapassassem o que os bancos estivessem dispostos a financiar com base em considerações de lucratividade e risco Em princípio esses recursos poderiam provir de fontes externas e do ponto de vista do equilíbrio externo este seria o caminho indicado Entretanto não só os banqueiros do governo em Londres recusavamse a envolverse em um esquema permanente de defesa como Nova York estava fechada como alternativa de financiamento pela cerrada oposição que o governo norteamericano fazia ao esquema de valorização brasileiro ver sobre isso Brandes 1962 p 130 A antevisão desses problemas influenciou decisivamente o projeto de novo banco central Ainda em 1922 o Banco do Brasil foi dotado do monopólio de emissão monetária podendo emitir até 600 mil contos em condições idênticas às da então extinta Carteira de Redesconto montante certamente suficiente para enfrentar as demandas do orçamento e da defesa do café no futuro previsível Os primeiros meses do governo Bernardes entretanto seriam marcados por uma conduta cautelosa na condução da política monetária coerente com sua meta prioritária de apreciação cambial que pressupunha corrigir a vulnerabilidade da posição externa Mas no terceiro trimestre de 1923 começaram a crescer rapidamente as necessidades de financiamento da nova safra de café As origens do problema remontam aos termos do contrato do empréstimo de 1922 que impediam o governo brasileiro de iniciar nova operação de valorização antes da liquidação do empréstimo prevista para um prazo de 10 anos que obrigou o novo governo a negociar a aceleração das amortizações através da liberação mais rápida dos cafés ainda remanescentes do estoque dado em garantia do empréstimo A venda rápida desses cafés somouse em 1923 a uma safra que era quase o dobro da safra do ano anterior exercendo efeito depressivo sobre os preços a partir da metade do ano e levando o governo a implementar ainda que informalmente a defesa7 Dada a substancial munição entregue ao Banco do Brasil pela reforma de seus estatutos não havia dúvida de que do ponto de vista estrito do controle dos preços de oferta no mercado mundial o novo esquema seria bemsucedido e de fato os preços logo se recuperaram O dilema de política econômica era entretanto que a sustentação dos preços poderia tomar necessário o abandono da política monetária restritiva Isso dependeria não só do comportamento do mercado internacional do café mas também crucialmente das condições domésticas de crédito que determinavam a capacidade do sistema bancário privado de cumprir seu papel no financiamento da retenção dos estoques No início do terceiro trimestre de 1923 num contexto de crescente aperto de liquidez como referido acima a superposição dos problemas sazonais decorrentes do aumento da demanda de crédito nas colheitas de outras lavouras e da drenagem de caixa dos grandes bancos tomava extremamente difícil ao sistema bancário privado acomodar os requisitos financeiros da valorização do café O Banco do Brasil tendo que enfrentar pesados saques de depósitos interbancários e com sua posição de caixa ainda comprometida pela impossibilidade do governo de liquidar sua dívida de curto prazo não teve saída senão lançar mão em escala crescente de sua faculdade de emissão A partir de agosto de 1923 acelerouse novamente a depreciação do milréis Tendo perdido o controle sobre a política monetária e temendo a recorrência de uma crise cambial e de seus impactos orçamentários o governo passou a considerar a obtenção de um grande empréstimo de estabilização como o único caminho para evitar a desmoralização prematura de seu programa de reforma financeira Tal empréstimo se empregado para liquidar o débito do Tesouro com o Banco do Brasil serviria para restabelecer o controle sobre o mercado de divisas enquanto o crescimento paralelo dos ativos domésticos líquidos do banco aumentaria sua capacidade de empréstimo reduzindo a necessidade de recurso à emissão de moeda Assim já em setembro as autoridades brasileiras formalizam um pedido de empréstimo de 25 milhões a seus banqueiros britânicos que entretanto condicionaram a concessão do empréstimo à implementação de reformas e políticas a serem recomendadas por uma missão de peritos por eles enviada para estudar in loco a posição financeira do Tesouro e a situação cambial A condição é aceita e no primeiro trimestre de 1924 o governo negocia com a missão inglesa as bases do empréstimo Entretanto em meados do ano quando se ultimavam os detalhes da operação restrições impostas pelo governo britânico a empréstimos externos com vistas ao fortalecimento da libra para preparar seu retorno ao padrãoouro acabam por inviabilizála O fracasso da estratégia de estabilização não recessiva com base no endividamento externo após vários meses de negociações impunha urgente redefinição de políticas A posição externa continuava vulnerável uma vez que o substancial crescimento das exportações em 1924 causado pelo comportamento favorável dos preços do café fora anulado pelo aumento paralelo das importações estimulado pela recuperação doméstica e na ausência de novos empréstimos externos a taxa de câmbio permanecera 50 abaixo da taxa de estabilização planejada pelo governo A aceleração inflacionária que acompanhou a recuperação além de contribuir para as dificuldades de ajuste externo erodia rapidamente os salários reais começando a criar tensões preocupantes nos centros urbanos Quase ao mesmo tempo em que fracassavam as tentativas visando o empréstimo britânico eclodiram as revoltas militares de julho de 1924 que assumiram graves proporções em São Paulo onde os rebeldes tomaram a sede do governo do estado A revolta paulista foi controlada pelas forças legalistas antes do fim de julho mas a necessidade de cobrir despesas militares imprevistas e prestar socorro aos bancos em decorrência da interrupção das transações com São Paulo levou a nova explosão das emissões do Banco do Brasil que atingiram o limite legal entre agosto e outubro Esta nova perda de controle sobre a política monetária forneceu o motivo para que um influente grupo de políticos intimamente ligados a Bernardes Falcão 1931 p 6971 que atribuía a persistência da fragilidade da posição externa e das pressões inflacionárias a taxas elevadas de expansão de moeda e preconizava a adoção de políticas deflacionistas convencesse o presidente da necessidade urgente de adotarse uma política ortodoxa de ajuste interno e externo acoplando uma política monetária contracionista à política de austeridade fiscal já então adotada A decisão de implementar o choque monetário tomada em fins de 1924 teria ainda consequências importantes para a política do café Como o papel ocupado pelo Banco do Brasil no esquema de defesa implantado por Bernardes implicava submeter a base monetária a flutuações de magnitude aleatória e potencialmente muito grandes toda vez que se materializasse um desequilíbrio entre a oferta e demanda mundiais de café o sucesso da nova política monetária poderia ser comprometido pela manutenção da forma de financiamento da valorização como ocorrido em 1923 Além disso não só o governo federal não havia abandonado a ideia de concretizar um grande empréstimo externo tão logo se normalizassem as condições em Londres como as negociações da primeira metade do ano haviam mostrado que o apoio do mercado de capitais de Nova York seria decisivo para o sucesso da operação Considerando que os banqueiros britânicos condicionavam a concessão do empréstimo ao término do envolvimento do governo no financiamento do esquema de defesa e que este envolvimento seria certamente fator impeditivo da participação de bancos americanos em um empréstimo federal pela oposição do governo americano à valorização do café sua manutenção tornouse disfuncional do ponto de vista dos objetivos maiores da política macroeconômica de estabilização Por outro lado em 1924 os preços do café recuperaramse em dois grandes saltos dos níveis estavelmente baixos dos dois anos anteriores sob influência do bem sucedido programa de defesa Com os preços elevados e o aumento da perspectiva de ganhos com a valorização tornavase politicamente muito mais fácil para o governo declarar terminado seu envolvimento com o esquema Assim em fins de 1924 quase ao mesmo tempo em que eram demitidos o ministro da Fazenda e o presidente do Banco do Brasil ambos paulistas como prelúdio para o início da política de ajuste ortodoxo o governo transferia a responsabilidade pelo programa de valorização do café para o governo de São Paulo Já a partir do início de 1925 o Banco do Brasil eleva as taxas e restringe drasticamente o montante de suas operações de redesconto com a intenção de reduzir a base monetária através da retirada de notas do Tesouro em circulação iniciando um processo de contração monetária que seria seguido sem interrupção até o fim do governo Bernardes O mix monetáriofiscal recessivo foi completado pela manutenção do esforço para equilibrar o orçamento já que aos olhos dos ortodoxos que agora controlavam a política econômica a disciplina fiscal era o pressuposto da viabilidade da manutenção da política monetária restritiva Dada a grande dependência do setor privado em relação aos bancos comerciais na ausência de um mercado financeiro desenvolvido o choque monetário implementado em meio ao ciclo de expansão iniciado em 1922 teve impacto extremamente negativo sobre o desempenho da economia Seus efeitos sobre os níveis de atividade corrente foram severos A produção industrial que se recuperava fortemente desde 1922 estagnou em 1925 e 1926 o investimento industrial medido pelo índice de quantum de importações de bens de capital para a indústria que voltara a crescer aceleradamente desde 1923 caiu nada menos do que 24 em 1926 Não obstante seu alto custo em termos de perdas de produto e emprego o interlúdio deflacionário de 19251926 atingiu seus principais objetivos Por um lado a taxa de câmbio apreciouse abruptamente em mais de 40 entre agosto e outubro de 1925 Por outro lado sob o impacto conjugado da perda de dinamismo da demanda doméstica e apreciação cambial a inflação desacelerou rapidamente ao longo de 1925 e em 1926 o nível de preços custo de vida chegou a cair 10 Deve ser notado entretanto que a recuperação da posição externa brasileira em fins do governo Bernardes que terá como discutido na próxima seção grande influência para a formulação da política econômica de Washington Luís era um reflexo da impressionante recuperação dos fluxos de comércio e investimento internacionais iniciada em meados da década O boom e a Depressão após o retorno ao padrãoouro 19271930 Apesar da tranquilidade política que marcou a articulação das oligarquias visando a sucessão presidencial de 1926 a grande medida de continuidade na postura ortodoxa de Washington Luís em relação ã política fiscal e a crença nas vantagens da criação de um banco central moderno a mudança de governo seria acompanhada de alteração radical das políticas monetária e cambial A motivação política para essa alteração era óbvia Desde fins de 1925 cresciam os protestos de industriais especialmente os da indústria têxtil e exportadores contra os efeitos deflacionários da contração de moeda e da apreciação cambial enquanto desapareciam as razões objetivas que informaram a opção pelo ajuste recessivo em fins de 1924 Deve ser lembrado que essa dura opção foi feita em uma situação em que a preocupação generalizada com a fragilidade da posição externa e a persistência de pressões inflacionárias permitiram apresentar o ajuste deflacionário quase que como medida de salvação nacional Entretanto em fins de 1926 controlada a inflação e com a substancial melhora da posição externa induzida pela manutenção de altos preços do café e especialmente pelo início de um novo ciclo de endividamento externo manter indefinidamente essa política seria uma atitude suicida em um sistema político em que exportadores e crescentemente produtores de artigos competitivos com importações detinham substancial influência Assim tão logo assume o governo Washington Luís envia ao Congresso um projeto de reforma monetária propondo o retomo ao padrãoouro à taxa de aproximadamente 6 pence cerca de 23 abaixo da taxa média do terceiro trimestre de 1926 justificada por ele como refletindo a taxa média do período 19211926 O projeto era formalmente um plano para atingirse em etapas sucessivas a conversibilidade do total do estoque de moeda em circulação à nova paridade A primeira fase que deveria ser implementada imediatamente seria um período de estabilização de fato Para isto propunhase a criação da Caixa de Estabilização um órgão do Tesouro que teria a atribuição precípua de emitir notas conversíveis à vista contra depósitos em ouro nela feitos ao novo par exatamente nos moldes da antiga Caixa de Conversão que operava antes da guerra A segunda fase seria implementada tão logo o estoque de ouro acumulado pela Caixa através da ação do governo ou de depósitos induzidos por operações privadas de arbitragem fosse considerado suficiente para permitir a decretação da conversibilidade plena das notas em circulação isto é inclusive das não emitidas pela Caixa A reforma seria concluída com a mudança da unidade monetária criandose o cruzeiro de valor igual ao do milréis à nova paridade e pela transferência do poder de emissão ao Banco do Brasil Embora grande parte da literatura tenda a considerar a criação da Caixa de Estabilização como mais um exemplo de transplante acrítico de concepções contemporâneas de política monetária desenvolvidas no contexto das experiências europeias de estabilização8 é inegável que a reforma de Washington Luís tinha uma inspiração política eminentemente prática Em primeiro lugar respondia aos anseios imediatos dos produtores domésticos tanto em relação às tendências à apreciação cambial quanto ao futuro da política monetária pois se a esperada recuperação da posição externa decorrente da participação brasileira no boom internacional de investimentos angloamericanos se materializasse o consequente aumento de reservas da Caixa implicaria reversão quase automática da queda da base monetária verificada nos últimos dois anos Em segundo lugar após as recentes experiências inflacionárias da Carteira de Redesconto e da Carteira de Emissão do Banco do Brasil a reintrodução de um mecanismo automático isto é não discricionário de controle da oferta de moeda e que impusesse disciplina fiscal contava tanto com o apoio amplamente majoritário da opinião politicamente relevante no Brasil quanto com o dos credores externos e serviria para aplacar a intensidade dos debates sobre gerência monetária que geraram tanto calor desde o início da década Enquanto isso consolidavamse as novas bases de operação financeira do programa de defesa do café agora sob controle do governo de São Paulo Tão logo o mercado de capital de Londres voltou a operar num clima de intensa competição não foi difícil ao recémcriado Instituto do Café de São Paulo convencer Lazards um grande banco britânico até então praticamente ausente de operações com o Brasil a prover os fundos para que o Banco do Estado constituído com a finalidade básica de cumprir o papel de emprestador de última instância aos bancos envolvidos com o financiamento de café antes desempenhado pelo Banco do Brasil bancasse as eventuais necessidades de financiamento do complexo cafeeiro durante a retenção dos estoques A consolidação financeira da valorização paulista teve impacto extremamente favorável sobre os preços e juntamente com a mudança de política monetária e cambial permitiria rápida superação da estagnação que caracterizava o biênio anterior já no primeiro ano do governo Washington Luís A grande onda de investimentos estrangeiros reiniciada em 1926 mais do que compensou a redução do saldo em conta corrente e o elevado superávit no balanço de pagamentos induziu rápida expansão das emissões da Caixa até meados de 1928 A grande maioria desses investimentos era constituída de empréstimos públicos e embora vários deles tenham sido contraídos para resgate de dívidas pendentes com credores estrangeiros um montante significativo foi destinado a obras públicas ou outras formas de gasto doméstico Na segunda metade de 1927 os efeitos expansionistas do relaxamento das condições de crédito foram reforçados por condições excepcionalmente favoráveis para a cafeicultura O aumento de renda no polo dinâmico da economia e o relaxamento das condições de crédito não só estimularam o investimento na própria cafeicultura como refletiramse em aumento generalizado de demanda para o setor urbano contribuindo de forma decisiva para a reativação dos níveis de atividade O produto real que após estagnar em 1925 crescera 52 em 1926 cresce 108 em 1927 e 115 em 1928 Essa rápida recuperação ao contrário da reversão cíclica de 19221923 tem lugar em condições de quase perfeita estabilidade de preços garantida pela estabilidade cambial e pela existência de margens provavelmente amplas de capacidade ociosa na indústria geradas pela estagnação da demanda que acompanhou os estágios finais do boom de investimentos iniciado em 1923 A exuberante recuperação de 19271928 sustentavase entretanto em bases frágeis já que dependia crucialmente da manutenção das condições econômicas internacionais extremamente favoráveis verificadas desde 1926 Como a experiência de antes da guerra havia demonstrado dada a instabilidade dos fluxos financeiros à periferia normalmente variando em sincronia com os preços internacionais de produtos primários a adoção do padrãoouro em ciclos de endividamento externo aumentava a vulnerabilidade do equilíbrio macroeconômico doméstico Isto porque como as condições favoráveis de balanço de pagamentos que induziram a adoção do padrãoouro podiam reverterse abruptamente a perda de reservas automaticamente submeteria a economia a violentas pressões deflacionárias Entretanto o potencial desestabilizador desse regime monetário era agora ampliado por seus efeitos sobre a viabilidade financeira do esquema de defesa do café tal como organizado por São Paulo na segunda metade dos anos 1920 e portanto sobre as receitas de exportação Vejamos por quê A viabilidade financeira da defesa dependia da capacidade do Instituto financiar um volume de estoques cuja magnitude podia variar sob a influência de três fatores fora de seu controle O primeiro era obviamente o tamanho da safra safras maiores significando ceteris paribus maior pressão sobre os recursos do Instituto O segundo era o estado da demanda mundial que ao obrigar uma redução do fluxo de embarques dos armazéns reguladores para os portos provocaria variações nos estoques a serem retidos pela defesa afetando a demanda de financiamento de modo análogo ao de uma grande safra O terceiro era o estado da liquidez doméstica que diferentemente dos dois choques de demanda e oferta analisados acima não afetaria os requisitos de financiamento do Instituto através do aumento dos requisitos globais de financiamento mas através de seus efeitos sobre a capacidade do sistema bancário privado de desempenhar a parte que lhe era reservada no esforço de financiamento da retenção dos excedentes Entretanto enquanto o Brasil estivesse sob o padrãoouro o segundo e o terceiro dos fatores apontados anteriormente isto é o estado da demanda mundial e as condições de crédito doméstico deveriam estar correlacionados de modo perverso Uma súbita deterioração da balança comercial originada da queda de demanda mundial de café deveria no padrãoouro ter efeito contracionista sobre o crédito doméstico Isto implicaria que quando os requisitos financeiros da defesa dos preços do produto estivessem crescendo por causa do arrefecimento da demanda mundial a propensão do setor privado brasileiro a emprestar à cafeicultura estaria diminuindo aumentando portanto a necessidade de captação externa de recursos para repasse pelo Instituto A situação poderia ficar ainda mais difícil para os responsáveis pela defesa caso a deterioração da demanda nos países centrais fosse acompanhada pela simultânea deterioração das favorabilíssimas condições de crédito que então prevaleciam nos dois grandes centros financeiros internacionais Nunca é demais relembrar que a recuperação da posição externa brasileira a partir de 1926 deveuse quase inteiramente ao surgimento de grande superávit em conta de capital Assim o surgimento simultâneo de dificuldades de captação externa amplificaria os problemas de equilíbrio externo e o resultante choque monetário aumentando ainda mais a demanda de recursos do Instituto em um período em que por hipótese sua capacidade de captação externa estaria prejudicada Esta explicação da instabilidade potencial a que a economia brasileira estava submetida em meio à prosperidade dos anos iniciais do governo Washington Luís por sua grande dependência em relação a um funcionamento estável da economia mundial e em especial dos mercados financeiros internacionais será amplamente confirmada pelos eventos a partir de fins de 1929 De fato foi o surgimento de uma situação como a apontada no parágrafo anterior agravada pela ocorrência de uma nova supersafra em 1929 com os estoques já elevados desde a safra de 1927 que provocaria o colapso do sistema em fins de 1929 O surgimento de tendências recessivas na economia brasileira data todavia do início de 1929 antes portanto da perda de dinamismo e colapso financeiro das economias industriais ocorridos no segundo semestre desse ano como resultado da opção do governo em retornar à política creditícia restritiva em resposta a dificuldades de balanço de pagamentos surgidas já em 1928 A deterioração da posição externa na segunda metade de 1928 resultou da operação de duas causas independentes Por um lado a estagnação das exportações num contexto de crescimento acelerado das importações induzido pela recuperação dos níveis de atividade e investimento domésticos provocou rápida erosão do saldo comercial Por outro lado uma contração progressiva do saldo em conta corrente foi acompanhada pelo estancamento temporário do fluxo de empréstimos externos de longo prazo para a periferia na segunda metade de 19289 A rápida erosão do saldo do balanço de pagamentos no segundo semestre de 1928 fez cair imediatamente o ritmo de crescimento das emissões da Caixa de Estabilização A reação inicial do Banco do Brasil foi auxiliar prontamente bancos e grandes firmas cuja posição financeira fora ameaçada pelo brusco choque monetário após meses de grande expansão de crédito Entretanto logo surgiram críticas consistindo em que nas circunstâncias de crescente desequilíbrio externo as regras do jogo da gerência monetária sob o padrãoouro aconselhavam medidas contracionistas diametralmente opostas à postura acomodadora então adotada pelo banco A posição desses defensores da ortodoxia era reforçada pelo fato de que o contínuo crescimento da relação entre as reservas ouro de Caixa e o total da circulação monetária desde 1927 havia gerado a convicção de que o Banco do Brasil deveria prepararse para assumir suas funções de banco central a qualquer momento O banco vinha de fato ampliando seus encaixes continuamente com esse objetivo e os críticos viam a nova atitude como um perigoso desvio dos objetivos maiores do plano de reforma monetária do governo10 A luta pela definição da política de crédito do Banco do Brasil decidiuse em favor da solução ortodoxa e a partir de setembro de 1928 o banco implementaria drástica redução de empréstimos ao setor privado A mudança da política do Banco do Brasil foi seguida rapidamente pela contração de depósitos dos outros bancos e o estoque nominal de moeda cujo crescimento já havia caído com a diminuição dos influxos de ouro na Caixa de Estabilização estagna no último semestre de 1928 e começa a cair em 1929 O redemoinho deflacionário atingiu quase imediatamente os níveis de atividade urbanos mas o governo federal mantevese fiel ao novo curso mesmo consciente de que a nova política ensejava severa recessão O produto real estagnou aos níveis de 1928 e a produção industrial começou a declinar As importações que recuperavamse à taxa de 159 em termos reais ao longo de 1928 começam a cair já no primeiro trimestre de 1929 apesar da reação defasada das importações de bens de capital em relação às flutuações de demanda Entretanto o pior ainda estava por vir com o colapso da capacidade de sustentação financeira do programa de defesa do café O primeiro golpe sobre o Instituto foi desfechado pela natureza Condições meteorológicas favoráveis propiciaram uma segunda safra recorde em 1929 apenas dois anos depois que o recorde histórico de 1927 elevara os estoques da defesa a quase o montante de um ano de produção normal Este aumento de estoques ampliara em muito o período de retenção dos cafés depositados nos reguladores estimado em maio de 1929 em nada menos do que 16 meses aumentando os encargos financeiros dos agricultores em um período em que com a ocorrência de uma safra pequena em 1928 a grande maioria deles já enfrentava sérios problemas de liquidez Com o passar do tempo os fazendeiros começam a pressionar o Instituto para o aumento do fluxo de embarque do café para os portos Por motivos inteiramente diferentes ligados à política cambial o governo federal também pressionava as autoridades paulistas no mesmo sentido O segundo e definitivo choque foi a progressiva deterioração das condições de crédito em Londres no terceiro trimestre de 192911 que bloqueou definitivamente a alternativa de obtenção de financiamento externo pelo Instituto no futuro previsível As autoridades responsáveis pela defesa ainda tentaram desesperadamente obter do Banco do Brasil os recursos indispensáveis ao menos para as compras necessárias à manutenção dos preços em Santos visando evitar as consequências desastrosas de um colapso de preços mesmo ao custo de deslocar todo o peso da defesa para os ombros dos cafeicultores O governo federal entretanto já enfrentando o acirramento da campanha contra a Aliança Liberal define como prioritária a manutenção da estabilidade cambial e a conclusão do programa de reforma monetária permanecendo inarredável de sua dupla posição de recusarse a autorizar o Banco do Brasil a prover os enormes requisitos de financiamento da defesa e recomendar o aumento das vendas Telles 1931 p 33 Em 11 de outubro esgotamse os recursos do Instituto e iniciase o colapso dos preços do café No fim do ano os preços já atingem um terço do valor anteriormente garantido pela defesa e ao longo de 1930 a contração das vendas e a reversão de expectativas nos países consumidores fazem do café um dos casos mais dramáticos de queda de preços entre os produtos primários durante os estágios iniciais da Grande Depressão O colapso dos preços do café foi o golpe de misericórdia no equilíbrio do balanço de pagamentos Mas em impressionante semelhança com os eventos que antecederam o colapso do padrão ouro de antes da guerra o governo federal se tenha agarrado teimosamente à manutenção do padrão no pressuposto otimista de que seria possível obter um grande empréstimo de estabilização a curto prazo O resultado foi aprofundar mais ainda a contração monetária ao longo de 1930 transformando a recessão iniciada no início de 1929 em uma crise de proporções sem precedentes que CAPÍTULO 4 3 Uma reinterpretação da historiografia tradicional Os eventos descritos na seção anterior permitem uma tentativa de reavaliação crítica das interpretações tradicionais da condução da política econômica na Primeira República Comecemos pelo revisionismo idealista Ainda que os escritos de Pelaez e outros tenham tido o mérito de sublinhar a incrível capacidade de sobrevivência do catecismo ortodoxo em círculos influentes do espectro político brasileiro um fato não controverso e que decerto não constituiu apanágio do Brasil nas primeiras décadas do século a evidência disponível não sustenta sua alegação básica acerca do viés ortodoxo das políticas efetivamente implementadas Após o período 18981906 quando Joaquim Murtinho e Leopoldo de Bulhões ocuparam a pasta da Fazenda um período que marca o fastígio da influência da reação conservadora consolidada na esteira da explosão monetária colapso cambial crônico déficit público e estagflação dos primeiros anos da república12 a ortodoxia esteve quase sempre na defensiva somente readquirindo influência a ponto de efetivamente influenciar a formulação da política econômica em meados dos anos 1920 quando fortes desequilíbrios cambiais monetários e fiscais voltaram a ocorrer A reação contra políticas monetárias excessivamente contracionistas e sobrevalorização da taxa de câmbio que informou a adoção do padrãoouro em 1906 e 1928 bem como as políticas monetária fiscal e do café seguidas durante por exemplo o governo Epitácio Pessoa e os dois primeiros anos do governo Artur Bernardes dificilmente podem ser representadas como tendo sido motivadas por ideias ortodoxas no sentido usado por Pelaez Apesar das frequentes declarações públicas dos responsáveis por essas políticas em favor dos princípios de sound finance elas foram implementadas contra a oposição aberta dos setores mais representativos da opinião conservadora A crítica à visão tradicional requer uma argumentação mais cuidadosa É claro que não existe aqui a intenção de negar o fato de que os representantes políticos dos setores agrícolas comercial e bancário paulista ligados ao café detinham uma posição hegemônica no Estado brasileiro No limiar da República as elites políticas paulistas representantes do ainda emergente mas já poderoso setor cafeeiro baseado no trabalho livre e desembaraçadas de qualquer compromisso com o antigo regime conquistaram e consolidaram uma incontestável posição de liderança utilizando com destreza esse duplo papel que lhes assegurava o suporte dos setores relevantes da burguesia e o desenvolvimento de um rapport natural entre seus líderes e os militares fortemente antimonarquistas que controlavam os governos provisórios13 A preservação dessa posição foi garantida pela enorme importância da produção cafeeira paulista para o desempenho da economia pelos mecanismos centralizadores de poder do sistema de controle político implantado durante o governo Campos Sales e pela habilidade demonstrada pela oligarquia agrário financeira paulista em incorporar os interesses da crescente burguesia industrial do estado a seus próprios canais de representação política Não se deve perder de vista entretanto que o poder de São Paulo não era absoluto e que nem sempre os políticos paulistas detiveram o controle da máquina política federal extremamente eficaz que seus líderes históricos construíram na virada do século Vários exemplos como os da eleição presidencial de 1910 quando São Paulo apoiou o candidato dissidente que incluíra o suporte federal à defesa do café em sua plataforma eleitoral e perdeu podem ser arrolados para ilustrar esse ponto mas isso nos levaria para muito além da presente discussão Para desenvolver os argumentos críticos da visão tradicional apresentados a seguir somente é necessário que se postule a noção intuitiva de que se a posição hegemônica possuída por qualquer classe não pode fundarse senão na importância que ela possui em alguma instância da atividade econômica não se pode ignorar que a hegemonia política não pode ser exercida unilateralmente e de forma incondicional O fato da hegemonia como notado por Gramsci pressupõe indubitavelmente que se deve levar em conta os interesses e as tendências dos grupos sobre os quais a hegemonia será exercida isto é que o grupo dirigente faça sacrifícios de ordem econômicocorporativa Gramsci 1980 p 33 Não obstante a literatura tradicional sobre política econômica no Brasil republicano pré1930 que deriva todo o seu atrativo de plausibilidade a priori do fato não controverso da hegemonia paulista demonstrou uma notável falta de interesse em atentar para essa verdade quase acaciana Com efeito a afirmação tradicional de que a política econômica do governo federal teria consistentemente favorecido os interesses corporativos da cafeicultura elaborada como um simples corolário da hegemonia política deste grupo é basicamente incorreta Isto será demonstrado a seguir questionando se a própria validade empírica dos dois fatos estilizados que formam o suporte de evidência factual da visão tradicional por exemplo que o governo federal sempre curvouse a pressões da cafeicultura no sentido de apoiar programas de valorização e que sistematicamente favoreceu a depreciação cambial Considerese primeiramente a noção de que o governo federal sempre esteve pronto a sustentar os preços do café e que isto teria sido motivado pela intenção de proteger os interesses setoriais da cafeicultura Deve ser lembrado antes de mais nada que o governo federal i efetivamente negou apoio à valorização em situações críticas como em 1906 e 1929 ii não promoveu a constituição efetiva de uma instituição federal permanentemente dedicada à valorização do café como demandado por São Paulo na primeira metade dos anos 1920 tendo finalmente retornado sua responsabilidade informal pela defesa de preços ao governo paulista em fins de 1924 e iii somente interveio financiando a retenção de estoques esporadicamente em 1908 1917 1921 e através do Banco do Brasil em 19231924 As razões para esta atitude cambiante do governo federal em relação ao envolvimento com a defesa do café são variadas mas admitem uma generalização Por um lado nas várias ocasiões em que o governo não interveio assim agiu porque as pressões para a intervenção federal foram efetivamente neutralizadas pela influência de outros grupos politicamente fortes que a ela se opunham A opinião dos banqueiros londrinos do governo federal sobre os riscos financeiros da valorização foi decisiva para bloquear o apoio do governo ao Convênio de Taubaté em 1906 A ferrenha oposição ao plano de valorização permanente apresentado por Epitácio Pessoa em 1921 liderada pela bancada mineira na Câmara e que refletia a opinião de grupos conservadores em matéria financeira sobre os efeitos deletérios do financiamento das compras através da emissão de moeda foi instrumental para seu arquivamento A oposição conjunta desses mesmos grupos ortodoxos nacionais e dos banqueiros estrangeiros do governo federal contra o envolvimento do governo em esquemas de valorização somada à forte oposição do executivo norteamericano a esquemas de controle de oferta de produtos primários em meados dos anos 1920 precipitou a decisão de liquidar a defesa federal em 1924 Finalmente restrições impostas pela acirrada campanha presidencial a impossibilidade política de assumir uma atitude de confrontação em face dos banqueiros internacionais cuja confiança era tida como essencial para a manutenção da estabilidade cambial e a idée fixe de Washington Luís a respeito das vantagens da preservação do padrãoouro influenciaram a surpreendente recusa do último governo do regime em conceder suporte financeiro ao Instituto do Café de São Paulo em 1929 Por outro lado as ocasiões em que o governo federal efetivamente concedeu apoio direto à cafeicultura foram circunstâncias em que havia sinais evidentes de que adviria severo desequilíbrio externo caso os preços do café fossem deixados ao sabor das forças de mercado Por isso mesmo as eventuais operações federais de valorização do café não podem ser apresentadas como evidência de que o apoio concedido pelo governo tenha sido motivado pela intenção de dar tratamento preferencial a este setor Não se deve perder de vista que em uma economia primárioexportadora especializada como era a brasileira onde a instabilidade macroeconômica normalmente derivava de choques externos a estabilização dos preços do produto básico de exportação é em geral a política anticíclica mais eficiente a curto prazo14 Isto era particularmente verdadeiro no caso do Brasil uma vez que a posição quase monopolista no mercado mundial do produto simplificava grandemente a implementação da defesa As intervenções do governo federal exerceram de fato uma influência estabilizadora benéfica evitando desequilíbrios externos substanciais que certamente teriam tido graves consequências para o desempenho da economia Portanto mesmo os casos em que o governo federal interveio diretamente nos mercados de café não podem ser usados prima facie como evidência da intenção de proteger os interesses setoriais da cafeicultura uma vez que nessas ocasiões estes interesses confundemse com o interesse nacional A crítica ao suposto viés da política cambial em favor do setor exportador que constitui o segundo fato arrolado em defesa da visão tradicional requer uma digressão mais longa Deve ser lembrado que durante a Primeira República o Brasil experimentou dois tipos de regime cambial taxas de câmbio flutuantes com emissão de moeda fiduciária gerenciada seja pelo Tesouro seja pelo Banco do Brasil e taxas de câmbio fixas em regime de padrãoouro Sob este último adotado entre 1906 e 1914 e novamente entre 1927 e 1930 a política adotada na presença de desequilíbrios externos resumiuse em ambas ocasiões a tentar manter a paridade sobrevalorizada enquanto o governo tentava sem sucesso obter assistência financeira externa para restaurar o equilíbrio de pagamentos Nesses casos portanto é evidente que a visão tradicional não tem o respaldo dos fatos Mais do que isso nesses períodos em que o governo aferrouse à defesa de paridade ouro como em 19131914 e 19291930 a enorme contração monetária causada pela rápida perda de reservas teve efeitos desastrosos sobre o setor produtivo incluindose aí proeminentemente a cafeicultura Por outro lado dos anos em que o Brasil permaneceu sob taxas flutuantes são os períodos de 1889 a 1906 e de 1919 a 1926 os que apresentam maior interesse do ponto de vista da presente discussão uma vez que durante a Primeira Guerra Mundial a taxa de câmbio foi mantida aproximadamente estável por razões fiscais e de política antiinflacionária ao nível atingido após a rápida queda ocorrida no início do conflito em seguida ao abandono do padrãoouro É interessante observar que esses dois longos períodos revelam uma surpreendente similaridade quanto à evolução temporal da posição externa da economia e à sequência de políticas macroeconômicas adotadas Os anos iniciais de ambos os períodos são marcados por rápida reversão de condições externas inicialmente favoráveis daí resultando grande depreciação cambial Esses colapsos cambiais cujo controle estava muito além da capacidade do governo desencadearam desequilíbrios orçamentários e monetários cumulativos que acabaram por reforçar as pressões inflacionárias básicas provocadas pela depreciação cambial Além disso na medida em que o equilíbrio externo foi restabelecido em bases frágeis através da operação de mecanismos automáticos induzidos por alterações de rendas e preços e o governo continuou enfrentando dificuldades de captação de empréstimos estrangeiros esses súbitos desequilíbrios externos foram também seguidos por períodos em que as reservas internacionais mantiveramse em níveis extremamente baixos A ansiedade acarretada pela perda de controle efetivo sobre a política cambial somada ao efeito desmoralizador do descontrole das contas do governo e de crescentes pressões inflacionárias acabaria finalmente por tornar o rompimento do círculo vicioso de instabilidade cambial e de preços desequilíbrio fiscal e expansão monetária o objetivo prioritário da política econômica Assim os grandes colapsos cambiais de 18901892 e 19201922 foram após um período de grande instabilidade econômica interna e crônico desequilíbrio externo seguidos por negociações com banqueiros internacionais visando a obtenção da liquidez externa necessária ao restabelecimento do equilíbrio cambial como precondição para a adoção simultânea de programas ortodoxos de estabilização Dessas situações de penúria cambial e grande dependência em relação aos banqueiros internacionais resultaram com algumas diferenças de detalhe as políticas monetária e fiscal extremamente restritivas seguidas pelos governos Campos Salles e Artur Bernardes Esses interlúdios deflacionários que diferentemente dos colapsos cambiais que em última instância os motivaram resultaram de opções deliberadas de política econômica tinham ainda o objetivo explícito de promover substancial apreciação cambial e portanto dificilmente podem ser explicados a partir da visão tradicional Estas duas ocasiões em que o governo federal deliberadamente implementou um mix monetáriofiscal restritivo foram entretanto seguidas por franca recuperação do valor da exportações e fases de grande crescimento do investimento mundial recuperandose rapidamente a capacidade de endividamento brasileiro O súbito aumento da receita cambial ocorrendo em circunstâncias em que o nível de importações encontravase deprimido provocou as rápidas apreciações cambiais de 1905 e 19251926 alterandose drasticamente o quadro que havia motivado a adoção das políticas restritivas A resposta do governo foi em ambas as ocasiões a adoção do padrão ouro medida que por visar prevenir que os emergentes superávits externos provocassem a apreciação continuada do milréis tem sido também apontada como resultante de pressões da cafeicultura Deve ser notado entretanto que pelo menos dois motivos tornaram a adoção do padrãoouro a bandeira de todas as classes produtoras nacionais O primeiro era o de que estando o governo empenhado em controlar a expansão monetária e sendo estreito o mercado doméstico de títulos públicos os grandes superávits do balanço de pagamentos resultavam em pressões incontroláveis sobre a taxa de câmbio o que após os custos e rendas haverem se ajustado às taxas depreciadas anteriormente vigentes ameaçava todos os produtores de bens comercializáveis Em segundo lugar mantidas as condições favoráveis do balanço de pagamentos a operação das regras do jogo do padrão ouro garantiria o crescimento da base monetária e portanto o abandono da política de dinheiro caro até então seguida o que não poderia deixar de contar com o aplauso de todo o setor privado doméstico Deve ser notado ainda que a adoção do padrãoouro era vista também com satisfação pelos banqueiros internacionais e exercia por isso um importante efeito positivo sobre a capacidade de endividamento externo das economias periféricas Como isto permitia que autoridades públicas estaduais e mesmo municipais tirassem proveito das condições conjunturalmente favoráveis nos mercados internacionais de capital para financiar seus programas de obras é plausível supor que as oligarquias regionais também tivessem em geral interesse na adoção do padrãoouro Os argumentos acima mostram portanto que a ideia de que a tendência à depreciação do milréis ao longo da Primeira República foi consequência intencional de decisões de política também precisa ser qualificada A queda secular do milréis entre 1989 e 1930 é totalmente explicada pelos dois grandes colapsos cambiais do início da última década do século XIX e do início dos anos 1920 que resultaram de severos choques externos cujos efeitos sobre o valor externo do milréis o governo federal não conseguiu evitar Por outro lado a afirmativa de que a adoção ocasional do padrãoouro foi motivada pela intenção de proteger os interesses setoriais da cafeicultura parece ser uma simplificação grosseira 4 Conclusões A evidência apresentada neste ensaio permite conclusões de três ordens distintas Em primeiro lugar como argumentado na seção 2 a de que uma análise cuidadosa da política econômica federal na Primeira República não sustenta a visão tradicional segundo a qual sua execução teria visado fundamentalmente beneficiar os interesses da cafeicultura nem sua antítese implícita que tenta demonstrar a existência de um sistemático viés ortodoxo nas políticas efetivamente implementadas Deve ser frisado que a interpretação alternativa apresentada neste ensaio não é incompatível com a visão da oligarquia paulista como fração hegemônica no Estado brasileiro Parte das críticas aqui apresentadas à visão tradicional limitouse a mostrar que medidas de política alegadamente adotadas em defesa do café beneficiaram um conjunto muito mais amplo de interesses e portanto não tem ligação com essa questão A aparente incompatibilidade aflora quando se discutem os interlúdios de adoção de políticas ortodoxas Mas segundo a interpretação aqui apresentada essas políticas foram adotadas no bojo de profundas crises econômicas que se constituíam em efetiva ameaça à coesão política do Estado como no final dos anos 1990 em 19131914 em meados dos anos 1920 e em 19291930 No decorrer dessas crises o debate político tendia a gravitar seja na direção de um consenso sobre a necessidade de restabelecerse a estabilidade econômicofinanceira como precondição de reestabilização política como no fim dos anos 1990 e em meados dos anos 1920 seja no sentido de preservar os sinais aparentes de estabilidade como em 19131914 e 19291930 Estas eram ocasiões em que o poder dos credores externos eou a influência dos grupos ortodoxos domésticos mais se fazia sentir na formulação das políticas de salvação nacional em relação às quais as oligarquias políticas de São Paulo pela própria posição hegemônica que ocupavam no aparelho do Estado não podiam adotar uma postura corporativa Uma importante interrogação permanece entretanto a desafiar interpretações por exemplo quais as bases materiais do pensamento ortodoxo da opinião conservadora em matéria financeira De fato a ortodoxia embora longe de ter a efetividade a ela atribuída pelo revisionismo idealista permaneceu influência importante sobre o debate e por vezes informou a própria execução da política econômica Decifrar esta charada é um desafio que exige entretanto um conhecimento da racionalidade das demandas econômicas das classes relevantes e de seu comando sobre os recursos do Estado bem maior do que o disponível no atual estado da arte da historiografia política do período Um segundo conjunto de conclusões relevantes relacionase ao modus operandi dos mecanismos de ajustamento externo em países periféricos no ambiente relativamente livre de intervenção governamental que caracterizava as relações econômicas internacionais do Brasil no período anterior à Grande Depressão tanto sob o padrãoouro quanto sob regime de taxas de câmbio flutuantes A experiência brasileira sob o padrãoouro ressalta algumas características negativas de sua operação em um país devedor e sujeito a grande instabilidade de preços de exportação como o Brasil tendendo a confirmar a visão de que os fatos estilizados utilizados em modelos teóricos concebidos para explicar a existência de mecanismos autoequilibradores sob o padrão servem mais para iluminar o mito do padrãoouro do que a realidade histórica Eichengreen 1985 p 3 Com efeito a dinâmica de ajuste do balanço de pagamentos brasileiro sob o padrãoouro segue muito de perto o sugerido no estudo pioneiro de Ford 1962 sobre a Argentina sendo em grande medida dominado pelo comportamento da conta de capital Como visto acima a adoção do padrãoouro se colocava como opção preferencial sempre que a participação do Brasil em um boom de investimentos internacionais coincidindo com a recuperação dos preços das exportações gerava superávits externos e pressões para a apreciação do milréis Como o papel das autoridades monetárias após a adoção do padrãoouro tomavase basicamente passivo sendo incapaz de esterilizar os aumentos de moeda primária causados pelos influxos de ouro os excedentes externos acabavam por gerar substancial expansão de crédito alimentando a aceleração do crescimento do nível de atividade causados em primeira instância pelo aumento das exportações líquidas e do investimento doméstico especialmente público financiado por empréstimos externos Na medida em que essas causas primárias da aceleração do crescimento persistissem o ajustamento da conta corrente prosseguia basicamente através do crescimento das importações induzido pelo crescimento da renda15 Assim o equilíbrio do balanço de pagamentos do qual o equilíbrio monetário em última instância dependia tornavase cada vez mais dependente da manutenção de preços favoráveis do principal produto de exportação e da propensão dos investidores estrangeiros a emprestar ao Brasil Dada a velocidade com que ambas essas variáveis podem mudar vale dizer que a posição externa brasileira ficava cada vez mais vulnerável Quando eventualmente os empréstimos estrangeiros e os preços de exportação entravam em colapso após um processo de vigoroso crescimento das importações ter ganho impulso e erodido substancialmente o superávit comercial a brusca contração monetária que inevitavelmente se seguia tinha efeitos reais extremamente dolorosos como testemunhado em 19131914 e 19291930 Por outro lado a dinâmica de ajuste do balanço de pagamentos a choques externos sob taxas de câmbio flutuantes tinha características distintas A queda nas importações decorrente da rápida depreciação cambial e do aperto de crédito criado pelo comportamento precaucionário dos bancos comerciais nessas ocasiões eram elementos fundamentais do processo de ajuste de curto prazo que se seguia à ocorrência de choques adversos do mesmo modo que a defesa dos preços do café quando implementada como no início dos anos 1920 também cumpria importante papel Nestas situações embora o ajuste externo tenha sido acompanhado de maiores taxas de inflação as perdas de produto real foram bastante menores do que as do ajustamento sob o padrãoouro Uma última e importante conclusão é a de que na explicação da profunda mudança no estilo de política econômica que se processa a partir dos anos 1930 no sentido de maior intervenção governamental nas transações internacionais papel mais proeminente deve ser atribuído às restrições decorrentes de mudanças no ambiente externo que inviabilizaram a manutenção da postura tradicional Isto implica minimizar a validade da noção de que nessa mudança de estilo existisse alguma intencionalidade a priori no sentido de aumentar os incentivos à industria como não raramente se infere a partir de pressupostos a respeito da perda de poder dos grupos exportadores após o colapso da Primeira República É certamente lícito inferirse que os governos do regime anterior a 1930 fracassaram fundamentalmente ao não promover as mudanças estruturais necessárias para dar maior estabilidade macroeconômica ao país tal como maior diversificação das exportações uma base fiscal menos vulnerável a choques externos e assim por diante Entretanto operando em uma ordem econômica internacional em que embora não isenta de severos choques conseguiuse preservar ou rapidamente restaurar suas características institucionais básicas os governos da Primeira República foram capazes de produzir estabilidade macroeconômica sem precisar interferir profundamente exceto no mercado do café com a livre operação das forças de mercado ainda que isso tenha sido feito ao custo de crescente endividamento externo O dramático desequilíbrio externo sofrido pelo Brasil a partir do fim dos anos 1920 em decorrência do colapso dos mercados internacionais de capital da brutal contração do comércio mundial e dos problemas criados pela crise de superprodução de café alterou completamente as condições de viabilidade da forma de inserção internacional da economia brasileira consolidada na Primeira República Isto criou ironicamente as condições de superação do antigo problema de como manter a estabilidade doméstica em face de choques externos sem nenhuma das grandes reformas estruturais ou institucionais que teriam sido necessárias em condições normais de funcionamento da economia internacional Assim se esse argumento é aceito devese concluir que diferentemente do contido na maior parte da historiografia corrente é nas profundas mudanças nas regras do jogo ocorridas nas relações econômicas internacionais durante a Grande Depressão e não na recomposição da base política do Estado que se seguiu à revolução de 1930 que devem buscarse as explicações da racionalidade e da viabilidade das políticas econômicas e reformas estruturais ocorridas após o colapso da Primeira República 1A esse respeito é interessante notar que Sunkel e Paz datam de 1914 o início do que chamam apropriadamente de a crise do liberalismo na América Latina Ver Sunkel e Paz 1970 p 344 2O termo é usado aqui no sentido popularizado por Furtado 1959 de uma economia fortemente dependente do comércio exterior para o ajuste entre a estrutura de oferta e demanda interna e de um único produto primário para gerar o grosso da receita de exportações 3Ver Fritsch 1980a 1980b 1981 1984 1985a ou para uma análise integrada dessas contribuições isoladas Fritsch 1988 4A exposição original da tese clássica é de Simonsen 1939 Para as qualificações ver por exemplo Dean 1971b cap 6 Villela 1972 e Fishlow 1972 5Os Balanços Gerais da União não foram publicados entre 1915 e 1923 6A rápida recuperação da produção industrial brasileira após a recessão do pósguerra induzida por resultados imprevistos de medidas de política econômica tem de fato enorme semelhança com a recuperação após a Grande Depressão conforme descrita em Furtado 1959 7O Instituto do Café não foi formalmente instalado mas o esquema de retenção do escoamento da safra para os portos através dos armazéns reguladores foi iniciado 8Ver por exemplo Bello 1966 p26566 Falcão 1931 p 802 e Neuhaus 1974 p 75 9Embora as causas desse fenômeno ainda sejam objeto de debate a opinião dominante é a de que ele teria sido provocado pela atração exercida pelo boom de Wall Street e seus efeitos sobre as taxas internacionais de juros Para uma discussão da literatura ver Kindleberger 1973 p 74 e seguintes 10Banco do Brasil Relatório 1929 pp 1314 11O agravamento das tensões financeiras em Londres precede a crise de Wall Street Ver Sayers 1976 p 2289 12Ver Fritsch 1980a p 25968 13Para a elaboração deste ponto ver Fritsch 1988 cap 1 e Cardoso 1975 p 37 e seguintes 14Ver por exemplo Prebisch 1950 p 57 15A ênfase no papel de variações de renda na explicação de mudanças nas importações deriva do fato de que dada a enorme diferença existente entre as estruturas de oferta e demanda e portanto o número relativamente pequeno de atividades competitivas com importações o papel de mudanças de preços relativos deveria ser também pequeno Ford 1962 cap VII CAPÍTULO 4 Crise crescimento e modernização autoritária 1930 1945 Marcelo de Paiva Abreu Este capítulo dividido em três seções além desta introdução trata da formulação e da implementação da política econômica entre 1930 e 1945 Na primeira seção são consideradas as políticas econômicas do Governo Provisório e seu impacto no auge da crise em 193031 e no começo da recuperação até 1934 A segunda seção trata da liberalização da política econômica e do rápido crescimento da economia durante o governo constitucional de Vargas entre 1934 e 1937 Estas tendências são interrompidas em 1937 com a deterioração do balanço de pagamentos associada à recessão norteamericana o golpe de novembro e a implantação do Estado Novo A seção final analisa as políticas do Estado Novo e a acomodação da economia às mudanças estruturais associadas à guerra1 A severidade do impacto da grande depressão sobre a economia mundial resultou em importante diminuição da importância relativa dos fluxos comerciais e financeiros externos especialmente em países como o Brasil que se recuperaram rapidamente dos efeitos mais graves da depressão sobre a atividade econômica Não há dúvida que tais países se voltaram para dentro com o crescimento dependendo crucialmente da capacidade de acomodar o deslocamento de demanda associado à brusca mudança de preços relativos encarecendo importações Entretanto com base na experiência dos últimos 75 anos parece claro que a ênfase na endogeneização das fontes de dinamismo do crescimento econômico parece ter sido exagerada tendo sido certamente desmentida pelo comportamento da economia brasileira nos últimos 35 anos Assim mesmo no auge de um período em que o crescimento da economia dependia preponderantemente de fatores internos as restrições externas são os principais determinantes das linhas principais da política econômica sublinhando a impossibilidade de estudarse a economia brasileira no período sem referência à inserção do Brasil na economia mundial 1 Superação da crise e política econômica do Governo Provisório 19301934 O choque externo sobre a economia brasileira afetou o balanço de pagamentos principalmente através de brutal queda dos preços de exportação não compensada por aumento do quantum exportado e da interrupção do influxo de capitais estrangeiros As reservas que somavam 31 milhões em setembro de 1929 caíram para 14 milhões em agosto de 1930 e haviam praticamente desaparecido em 1931 Em 1932 as importações haviam caído a um quarto do seu valor em 1928 enquanto as exportações caíram a quase um terço Em volume as importações decresceram cerca de 60 entre 1928 e 1932 enquanto as exportações declinaram 16 Os preços de importação em dólares caíram 40 enquanto os preços de exportação caíram quase 55 Assim os termos de intercâmbio sofreram uma deterioração de cerca de 26 e a capacidade de importar de quase 40 As medidas iniciais do Governo Provisório quanto à política cambial foram orientadas por um liberalismo retórico primitivo logo desmascarado pela realidade A abolição do monopólio cambial que havia sido estabelecido no fim da República Velha foi justificada com base no argumento de que tal controle era ineficaz e protelava o retorno da economia à normalidade Em 19301931 adotouse uma política cambial aparentemente liberal mas na prática restritiva decretandose moratórias sucessivas em relação às dívidas em moeda estrangeira Em setembro de 1931 a situação tornouse insustentável os pagamentos relativos à dívida pública externa foram suspensos reintroduzindose o monopólio cambial do Banco do Brasil A venda de cambiais de exportação ao Banco do Brasil era obrigatória e a distribuição de câmbio deveria atender a critérios de prioridade que privilegiavam em ordem decrescente compras oficiais e pagamento do serviço de dívida pública importações essenciais outras remessas incluindo lucros e dividendos importações em consignação e atrasados comerciais Infelizmente não existem informações quanto aos detalhes da implementação do controle cambial suas consequências podem apenas ser inferidas da análise da estrutura de importações que será discutida adiante Entre 1930 e 1931 o milréis desvalorizouse 55 milréisUS As autoridades brasileiras tentaram na medida do possível evitar uma desvalorização excessiva em vista do reconhecimento de que se a taxa de câmbio não fosse sustentada haveria uma redução da receita cambial gerada pelo café dada a queda dos preços de café em moeda estrangeira Esta redução do nível de preços resultava da importância da parcela do mercado controlada pelo Brasil e da inelasticidade preço da demanda internacional por café Além disso uma taxa de câmbio artificialmente sustentada tornava menos difícil a liquidação dos compromissos do governo em moeda conversível Os interesses ligados à indústria eram protegidos da competição internacional pela existência do controle de importações e tinham acesso a insumos relativamente baratos O controle cambial permaneceu essencialmente inalterado até 1934 Foi criado em 19321933 um mercado cinzento alimentado por módico montante de divisas para aliviar a escassez de divisas principalmente para remessas de lucros Em meados de 1934 as receitas cambiais não associadas a exportações bem como a receita cambial gerada por exportações não tradicionais foram liberadas do controle No final de 1930 os títulos em libras correspondiam a 65 do total da dívida pública externa que era da ordem de US1250 milhões os títulos em dólares a 30 e os títulos em francos franceses e florins ao resíduo A manutenção da posição dominante britânica em termos de estoque a despeito da maior importância dos empréstimos norte americanos entre 1921 e 1930 deveuse aos prazos de amortização mais longos dos empréstimos britânicos bem como ao adiamento do pagamento de amortizações da dívida externa resultante dos funding loans de 1898 e 1914 Os empréstimos norteamericanos eram menos sólidos mais importantes na área estadual e municipal e mais onerosos em vista de terem sido negociados na década de 1920 quando as taxas de juros eram mais elevadas do que no período pré1914 Estas diferenças entre os empréstimos seriam causa de atritos entre credores A crise cambial que atingiu o Brasil a partir de 19291930 tornou inviável a continuação do pagamento integral do serviço da dívida pois tal pagamento envolveria proporção excessiva do saldo comercial Além disso a depreciação do milréis aumentou a carga do serviço da dívida pública externa sobre os orçamentos nos três níveis de governo especialmente entre o final de 1930 e agosto de 1931 quando a libra esterlina e o dólar norteamericano mantiveram sua paridade em relação ao ouro Até setembro de 1931 as esperanças de retorno ao mercado financeiro foram mantidas especialmente em vista das recomendações da missão financeira britânica chefiada por Sir Otto Niemeyer que visitou o Brasil no primeiro semestre de 1931 e acenou com a possibilidade de obtenção de empréstimo em Londres caso o Brasil adotasse um programa de austeridade que incluiria a volta ao padrão ouro e a criação de um banco central Com o abandono pelo Reino Unido do padrãoouro tais esperanças desapareceram O reajuste dos pagamentos efetivos à capacidade de pagar foi gradual sendo um funding loan parcial negociado em 1931 por três anos2 Este funding resultou de decisão unilateral das autoridades brasileiras garantia o pagamento integral do serviço dos funding loans de 1898 e 1914 e estipulava que os juros relativos aos demais empréstimos federais por três anos seriam pagos com títulos de 5 cuja emissão corresponderia ao funding loan de 1931 As amortizações relativas a esses empréstimos federais seriam suspensas e nada se dispunha sobre o serviço dos empréstimos estaduais e municipais O acordo era lesivo aos empréstimos norteamericanos em vista da sua importante participação na dívida estadual e municipal e da sua não inclusão nos funding loans prévios A manutenção de disposições prejudiciais aos interesses norteamericanos não pode ser dissociada do estado insatisfatório das relações entre o Brasil e os Estados Unidos nos anos iniciais da década A mudança de governo foi seguida de um curto período caracterizado pelo aumento da influência britânica explicado pela deterioração das relações políticas entre o Brasil e os Estados Unidos à raiz do exagerado apoio de Washington ao governo deposto em novembro de 1930 e pela maior generosidade de Londres na concessão de empréstimos de curto prazo A visita da missão Niemeyer correspondeu ao auge desta influência fugaz mas o efetivo poder de barganha dos Estados Unidos em vista de seu déficit comercial no intercâmbio com o Brasil acabaria por prevalecer Do ponto de vista do Brasil o arranjo relativo à dívida foi insatisfatório pois apenas adiou o problema através do aumento do total da dívida O alívio trazido pelo adiamento de pagamentos foi além disso insuficiente como demonstraria a acumulação de atrasados comerciais em 19321934 Em 1930 o capital nominal estrangeiro de risco investido no Brasil era da ordem de US1250 milhões Desse total cerca de US600 milhões correspondiam a capitais britânicos e US200 milhões a capitais norteamericanos Entretanto entre 1914 e 1930 os investimentos britânicos decresceram em cerca de 10 enquanto os investimentos norteamericanos aumentavam mais de quatro vezes Os investimentos britânicos concentravamse em setores tradicionais tais como serviços públicos especialmente ferrovias enquanto parcela considerável dos capitais norteamericanos estava aplicada em setores modernos tais como a indústria de transformação e serviços A importância absoluta da participação britânica no capital estrangeiro total aplicado no Brasil tanto dívida pública externa quanto capital de risco e a decadência comercial do Reino Unido no mercado brasileiro são de vital importância para explicar as diferentes estratégias dos principais parceiros econômicos e financeiros do Brasil na década de 1930 Enquanto os norte americanos tenderam a adotar uma política conciliatória em relação à dívida pública externa e concentrar esforços na manutenção de sua posição comercial no mercado brasileiro a posição britânica era de maximizar os pagamentos financeiros vendo com resignação o declínio da sua posição comercial durante a década Durante o período 19301936 há indicações de uma redução no estoque de inversões diretas estrangeiras associada tanto às dificuldades que caracterizaram a economia internacional no período quanto à crise cambial brasileira A crise acarretou a redução do capital registrado de algumas firmas a falência de outras a nacionalização de umas poucas e a transferência de ativos de investidores europeus para investidores norteamericanos A proporção norteamericana do investimento total aumentou consideravelmente como resultado da contração importante sofrida pelos investimentos europeus A crônica escassez de divisas resultou em acumulação de atrasados comerciais e financeiros os quais além de não renderem juros ficavam expostos a risco de câmbio Embora os devedores tivessem liquidado as suas dívidas recolhendo o valor das dívidas em milréis não havia cobertura cambial disponível para liquidar os compromissos em moeda estrangeira Este problema seria recorrente na década de 1930 tornandose uma das principais fontes de atrito entre o Brasil e seus parceiros No caso dos interesses franceses e ingleses o poder de barganha dos respectivos países não justificava a adoção de medidas radicais preconizadas pelos credores Por outro lado no caso dos Estados Unidos que tinham real poder de barganha em função da posição do balanço bilateral de comércio os instintos belicosos de empresários norteamericanos no Brasil foram contidos pela circunspeção do Departamento de Estado Este se opunha tanto a pressionar o governo brasileiro para que fosse adotada política cambial que concedesse tratamento preferencial aos créditos norte americanos pois acreditava nas vantagens do multilateralismo quanto a impor taxação sobre o café brasileiro no mercado norte americano pois a inclusão de café na lista de isenções nos Estados Unidos prendiase a razões estritamente domésticas A interpretação clássica quanto à natureza da política econômica adotada nos anos 1930 e seu impacto sobre o nível de atividade econômica é a de Furtado 1959 caps 3033 A demanda agregada teria sido sustentada por políticas expansionistas de gastos especialmente na aquisição de café para posterior destruição A reorientação de demanda associada à desvalorização do milréis e à imposição de controles das importações ainda segundo Furtado foi acomodada por utilização mais intensiva da capacidade previamente instalada na indústria A Revolução de 1930 teria correspondido à versão brasileira de revolução burguesa culminando um longo processo de oposição de interesses econômicos com as posições da classe média e da indústria emergente sobrepondose às da oligarquia cafeeira na formulação e implementação das políticas econômicas A visão de República Velha que serve de base a esta interpretação deve ser radicalmente revista à luz do resultado de novas pesquisas sobre a frequente coincidência de interesses do café e da indústria na gestão da política econômica Fritsch 1980a bem como da precoce diversificação de interesses da oligarquia cafeeira que investiu na infraestrutura de exportação e na indústria substitutiva de importações Dean 1971 Em linha paralela de revisão a análise das coligações políticas que apoiaram os dois candidatos à eleição presidencial de 1930 bem como de seus programas econômicos desmente os estereótipos de Júlio Prestes como defensor dos interesses cafeeiros e de Getúlio Vargas candidato da indústria e da pequena burguesia Vargas encarnaria o Estado de compromisso tratando de acomodar os interesses conflitantes sem alinharse à posição de qualquer grupo específico Fausto 1970 Embora a tese do Estado de compromisso seja persuasiva quando considerada à luz das declarações dos gestores da política econômica bem como com base nas coalizões políticas que permitiram que Vargas permanecesse no poder na prática Vargas adotou políticas econômicas que tenderam a favorecer a indústria Assim as tentativas diretas ou indiretas de sustentação empírica da tese do Estado do compromisso no terreno da implementação da política econômica são bastante malsucedidas As vertentes principais desta malograda linha de revisão referemse a tentativas de mostrar que após 1930 as políticas adotadas pelo governo foram ortodoxas prejudicando a recuperação da atividade econômica e que o governo não defendeu adequadamente os interesses da indústria Os dados disponíveis indicam que o impacto da depressão sobre o produto real foi relativamente modesto sua queda não excedendo 53 em 1931 o pior ano da depressão em relação ao pico de atividade em 1929 Em 1932 o produto cresceu 43 e em 1933 e 1934 em torno de 9 ao ano3 A recuperação do nível de atividade da economia brasileira foi singularmente rápida se comparada à experiência de outros países especialmente os desenvolvidos As consequências relativamente suaves da crise sobre a economia brasileira têm sido tradicionalmente creditadas às políticas econômicas do Governo Provisório especialmente em relação ao café A política cafeeira do Governo Provisório baseouse na compra de estoques pelo governo federal financiada por créditos do Banco do Brasil e por taxação das exportações O Instituto de Café de São Paulo foi gradualmente marginalizado do processo decisório relativo à política cafeeira e substituído por órgãos federais inicialmente o Conselho Nacional do Café e depois o Departamento Nacional do Café A partir de meados de 1931 iniciouse a destruição de estoques em vista do descompasso entre o seu nível e a capacidade de absorção do mercado mundial A acomodação política de São Paulo após a derrota em 1932 ditou certas alterações na política cafeeira No início de 1933 organizouse em bases mais permanentes a política do café definindose o padrão de intervenção do governo que iria prevalecer até 1937 e fixandose as parcelas da colheita de 19331934 que seriam destruídas 40 retidas 30 e de livre negociação 30 bem como os preços diferenciados de compra A situação financeira da cafeicultura foi aliviada no final de 1933 pelo Reajustamento Econômico quando as dívidas contraídas pelos cafeicultores antes de meados de 1933 foram nominalmente reduzidas em 50 e recontratadas com prazo de 10 anos o alívio incidindo sobre as amortizações devidas inicialmente Os credores receberam títulos do governo de 30 anos de prazo e taxa de juros de 5 Embora do ponto de vista da agricultura como um todo o impacto do reajustamento não pareça ter sido muito significativo a medida teve algum impacto regional e setorial na atividade agrícola especialmente no caso da expansão da produção paulista de algodão A destruição de estoques de café foi equivalente em 1931 a cerca de 10 da safra de 19311932 aumentando na década até alcançar em 1937 o equivalente a mais de 40 da safra de 19371938 Foram destruídas mais de 70 milhões de sacas entre 1931 e 1943 De acordo com a interpretação tradicional ao gerar déficits fiscais em grande medida associados ã política de compra da produção excedente de café o governo teria adotado políticas prékeynesianas de sustentação do nível de atividade econômica Interpretações revisionistas pretenderam refutar o argumento tradicional sugerindo que pelo contrário a política econômica do Governo Provisório prejudicou a retomada do nível de atividade econômica pois as suas políticas fiscal e cafeeira teriam sido ortodoxas isto é objetivavam o equilíbrio fiscal do governo Em particular quanto ao café sugerese que os gastos com a compra de produção excedente foram financiados por taxação das exportações do produto Pelaez 1968 e 1971 Esta revisão embora qualifique marginalmente a interpretação tradicional conflita com a evidência apresentada pelos próprios revisionistas especialmente após o final de 1931 Fishlow 1972 Um terço dos gastos com a compra de café foi custeado por créditos do governo entre 1931 e o início de 1933 maior proporção ainda em 1933 1934 O maior nível de gastos do governo mesmo que financiado por taxação tem influência benéfica sobre o nível de atividade dadas as hipóteses então dominantes quanto à aplicação do teorema do orçamento equilibrado Silber 1977 Além disso dada a inelasticidadepreço da demanda por café a taxação das exportações afeta mais significativamente os consumidores de café do que os exportadores pois os efeitos sobre preços serão preponderantes A análise da política fiscal do governo isto é abarcando os gastos e receitas agregadas também indica não haver base real para revisões radicais especialmente após o final de 1931 Os déficits fiscais em 19311933 mantiveramse acima de 12 dos gastos agregados em 1931 e 1933 alcançando 40 em 1932 O que poderia ter sido o déficit caso não tivesse ocorrido a insurreição em São Paulo argumento que ocupa posição central na proposta revisionista é um exercício contrafactual que conduz a resultados tão subjetivos que não parece merecer atenção analítica O que interessa diretamente é analisar que política econômica foi adotada e quais os seus resultados e não que política econômica teria sido adotada se o que aconteceu não tivesse acontecido A partir de 1933 os déficits planejados tornamse usuais e que os déficits realizados resultam de gastos adicionais e não de más estimativas de receita Fishlow 1972 seção II O argumento de que a recuperação do nível da atividade econômica deveuse a fatores externos que viabilizaram considerável expansão do saldo do balanço comercial e acarretaram déficits públicos causados pela queda da arrecadação de imposto de importação deve ser rejeitado A expansão do saldo do balanço comercial foi consequência da desvalorização cambial e de controle cambial que impedia a importação de bens não essenciais Estas políticas adotadas devido ao desequilíbrio do balanço de pagamentos implicaram reorientação da demanda em benefício da produção doméstica A revisão proposta baseiase em parte no estudo de intenções dos gestores da política econômica e não como deveria ser na análise das características da política econômica efetivamente implementada e de seus resultados concretos Nesta interpretação revisionista mais radical a adoção de políticas econômicas ortodoxas é apresentada como resultado de erros de política econômica não havendo qualquer tentativa de compreender que o Governo Provisório precariamente instalado no poder e enfrentando séria crise cambial estava sujeito a pressões por parte de interesses estrangeiros no sentido de adotar políticas compatíveis com a manutenção dos pagamentos externos Tais pressões teriam obrigatoriamente de refletirse no discurso mas não necessariamente na ação das autoridades brasileiras Embora os esforços revisionistas quanto à natureza e implicações da política econômica do Governo Provisório sejam em grande medida desmentidos pela análise da evidência econômica disponível para o período como um todo é inegável que teve sucesso em atenuar a força dos argumentos furtadianos relativos à intensidade das políticas expansionistas adotadas a partir de 1930 A prática de acomodar choques fiscais via déficits fiscais pode ser identificada em outros períodos da história econômica brasileira anteriores a 1930 O que parece ter sido decisivo para que Furtado identificasse pré keynesianismo em Vargas e não por exemplo em Epitácio Pessoa parece ter sido a imagem impressionante da queima dos estoques de café tão aparentada à construção de pirâmides ou ao cavar buracos mencionados por Keynes É entretanto a disposição de acomodar os efeitos da recessão através de aumento do déficit público o elemento que permite com adequação que se possa afirmar que a política econômica do Governo Provisório tenha sido prékeynesiana O abandono do padrãoouro em meados de 1930 rompeu a vinculação entre contração monetária e choque externo que havia resultado em contração da base monetária de cerca de 14 entre o fim de 1928 e o fim do terceiro trimestre de 1930 A base monetária entretanto continuou a cair até o fim do primeiro trimestre de 1931 e só cresceu significativamente depois do fim de 1931 após a saída de Whitaker do Ministério da Fazenda A queda dos preços domésticos concentrouse em 1930 e 1931 em torno de 1112 em cada ano praticamente estabilizandose em 19321933 Em contraste com a experiência de economias desenvolvidas como a Alemanha e os Estados Unidos os bancos comerciais brasileiros resistiram bem à crise amparados pelas políticas acomodadoras adotadas após 1930 que buscavam reforçar a confiança no sistema bancário A Caixa de Mobilização Bancária CAMOB criada em 1932 introduziu reservas obrigatórias mínimas e a obrigatoriedade de depósito no Banco do Brasil de reservas excessivas de tal modo que bancos com carteiras de baixa liquidez pudessem ser financiados Foi permitida a inclusão das apólices do Reajustamento Econômico entre os títulos aceitos como garantia de empréstimos de longo prazo da CAMOB aos bancos Além disto a Caixa financiou as necessidades do Tesouro Nacional e do Departamento Nacional do Café atuando de forma complementar à Carteira de Redescontos do Banco do Brasil que havia sido reativada em 1930 Neuhaus 1975 p 11225 A outra vertente revisionista com relação à política econômica sugere que as políticas do novo regime não teriam favorecido a indústria em oposição à cafeicultura e que os anos 1930 não constituíram período crucial da aceleração do processo de industrialização brasileira pois a produção industrial havia crescido mais significativamente na década anterior Dean 1971 Esta tentativa de revisão apoiase em declarações governamentais antiprotecionistas e no argumento de que a política comercial do Governo Provisório teria sido antiprotecionista O Governo Provisório não obstante suas declarações de intenções cujo conteúdo ao melhor estilo varguista podia variar radicalmente dependendo da oportunidade e do públicoalvo aumentou a proteção à produção doméstica através de aumento de impostos específicos aumento de ágios milréis papel milréis ouro regulação do consumo compulsório de matériasprimas de produção doméstica e proibição de importação de equipamentos para determinadas indústrias caracterizadas por sua capacidade ociosa A introdução conjunta em 1931 de uma tarifa provisória e de cobrança integral em milréis ouro praticamente não afetou a tarifa nominal Longe de reduzirse sob o Governo Provisório a proteção aumentou até 1934 reduzindose a níveis semelhantes aos de 1928 na segunda metade da década A revisão proposta endossa argumentos equivocados que sugerem que a reforma tarifária de 1931 teria resultado em redução da proteção Mello 1933 p 1001 Em qualquer caso a importância das margens de proteção no período 19311934 é secundária pois o controle cambial sobrepunhase às tarifas protegendo de forma absoluta a produção doméstica Após cair 9 entre 1928 e 1930 e permanecer praticamente estagnado em 19311932 o produto industrial cresceu 10 ao ano entre 1932 e 1939 A participação das importações na oferta total a preços de 1939 caiu de 45 em 1928 para 25 em 1931 e 20 em 1939 Exceto no caso de bens de capital consumo durável e intermediários do gênero elétrico a produção doméstica correspondia em 1939 a mais da metade da oferta no caso de bens de consumo não duráveis a mais de 90 da oferta Fishlow 1972 Esta evidência quanto ao crescimento industrial na década de 1930 torna inconsistente a revisão proposta por Dean excessivamente entusiasmado por sua tese correta na República Velha de que o desempenho da indústria dependia crucialmente do café 2 Boom econômico e interregno democrático 19341937 O alívio da posição do balanço de pagamentos associado ao descongelamento de atrasados cambiais não resultou em melhoria significativa da escassez de cobertura cambial Já em 1934 renovavam se as pressões de empresários norteamericanos para que o Departamento de Estado pressionasse pela obtenção de um regime de câmbio preferencial no Brasil Estas pressões provocaram o envio ao Brasil de missão chefiada por John Williams do Federal Reserve Bank of New York para avaliar a situação cambial brasileira Em contraste com diagnósticos ortodoxos tal como o de Niemeyer em 1931 Williams reconheceu que a solução do problema cambial não dependia das autoridades brasileiras e sim da recuperação do nível de comércio internacional e da redução dos obstáculos ao livre comércio O controle cambial só havia sido adotado após o esgotamento das perda de reservas e depreciação cambial Reconhecia que esta última acarretava a redução da receita de exportação em vista da inelasticidade da demanda de café conjugada à importância do Brasil no mercado internacional do produto A operação do controle cambial era justificada pela necessidade de obtenção tanto de importações essenciais quanto de divisas a preço razoável para atender aos compromissos cambiais do governo De acordo com Williams a reversão da política multilateralista norteamericana só poderia ser justificada pela comprovação de tratamento discriminatório de interesses norteamericanos A restrição das importações não essenciais que prejudicava relativamente mais os Estados Unidos não podia ser considerada discriminatória Comprovouse que não havia discriminação dos interesses norte americanos na distribuição cambial Caso houvesse um relaxamento dos controles então vigentes Williams não via razões para que fosse alterada a política norteamericana Em setembro de 1934 como consequência de suas recomendações toda a cobertura cambial gerada por exportações exclusive café foi liberada do controle cambial4 No início de 1935 em vista da gravidade da crise cambial causada pela liberalidade na concessão de licenças para remeter lucros foi proposta pelo presidente do Banco do Brasil a suspensão do pagamento do serviço da dívida externa A crise foi contornada com o envio de uma missão a Washington e Londres Nos Estados Unidos nada foi obtido de imediato Para apaziguar as preocupações norte americanas o ministro da Fazenda Sousa Costa comprometeuse com a liberalização do mercado cambial e a manutenção do serviço da dívida O novo regime cambial obrigava os bancos a repassar 35 das cambiais de exportação à taxa oficial para o Banco do Brasil estas divisas seriam usadas para pagamento de compromissos do governo Os 65 residuais das cambiais de exportação seriam negociados no mercado livre também no mercado livre seriam adquiridas as cambiais necessárias ao pagamento de compromissos no exterior exceto os do governo Em Londres foi negociado um acordo de descongelamento de atrasados cambiais britânicos ao qual se seguiram acordos similares com os Estados Unidos e demais credores de curto prazo A liberalização da política cambial resultou das pressões norte americanas para alinhar o Brasil entre os países prómultilateralismo A aplicação da política de defesa do multilateralismo por parte dos Estados Unidos levou à recusa de propostas brasileiras que resultariam em tratamento cambial preferencial dos interesses norte americanos Depois de fevereiro de 1935 embora a taxa de câmbio para importação tenha permanecido constante até 1937 a taxa de câmbio para exportações variou consideravelmente pois o Conselho Federal de Comércio Exterior autorizou com frequência isenções parciais ou totais da venda obrigatória de 35 das cambiais de exportação à taxa oficial ao Banco do Brasil Desta política acoplada à política cafeeira resultou uma expansão de 19 no valor das exportações entre 1935 e 1936 enquanto o nível de importações mantinhase praticamente constante Durante 1936 e o início de 1937 o Banco do Brasil acumulou rapidamente razoável reserva de cambiais A relativa folga cambial propiciou a adoção de política extremamente liberal quanto à remessa de lucros bem como relaxamento dos controles de importação com o intuito de atrair capitais estrangeiros A recessão norteamericana em 19371938 entretanto resultou no fracasso desta política o Banco do Brasil que detinha reservas da ordem de 10 milhões em início de 1937 tinha um descoberto ao final do ano de 6 milhões em moedas conversíveis Já em meados de 1937 a missão brasileira que visitou os Estados Unidos parecia menos preocupada em examinar os assuntos incluídos em sua agenda do que com a avaliação das possibilidades de retaliação norteamericana no caso de suspensão do serviço da dívida Em 1934 os países credores e o Brasil decidiram iniciar negociações com o objetivo de acertar um acordo amplo para substituir o funding loan de 1931 que terminava e para retomar o serviço dos empréstimos dele excluídos A pressão britânica mais uma vez assegurou tratamento mais favorável para os empréstimos em libras por intermédio de Niemeyer que sugeriu as linhas básicas de classificação dos empréstimos a Oswaldo Aranha Todos os empréstimos externos foram classificados em ordem decrescente de qualidade quanto mais bem classificado o empréstimo maior a proporção de amortizações e juros contratuais que seriam pagos O Brasil comprometeuse a pagar cerca de 8 milhões por ano até 1938 enquanto os contratos de empréstimo estipulavam um serviço de 24 milhões com a hipótese de amortização ao par Tal redução deu margem à argumentação de Aranha sugerindo que o Brasil pagaria 33 milhões ao invés de 90 milhões ganhando consequentemente 57 milhões em quatro anos É óbvio que Aranha no afã de defender o acordo frente à opinião pública argumentou indevidamente que tanto os ganhos relativos à redução das taxas de juros contratuais quanto o mero adiamento do pagamento de amortizações correspondiam a um ganho efetivo quando isto só era verdade no primeiro caso A despeito das dificuldades relativas ao balanço de pagamentos a economia continuou a crescer 8 ao ano entre 1934 e 1937 O encarecimento das importações permitiu a utilização de capacidade ociosa na indústria enquanto a continuada adoção de políticas fiscal cafeeira monetária e creditícia expansionistas permitiu a sustentação da demanda A política fiscal do governo gerou déficits na execução das contas públicas maiores do que os planejados nas propostas orçamentárias A política de aquisição e destruição de estoques de café permaneceu nos seus aspectos fundamentais inalterada em relação à adotada a partir de 1933 A política monetária foi em geral moderadamente expansionista o deflator implícito do PIB só indica sinais claros de aceleração inflacionária ao final do período O desempenho medíocre da agricultura contrastava com o dos demais setores em particular com o da indústria Enquanto o produto agrícola cresceu pouco mais de 3 ao ano em 19341937 o produto industrial cresceu mais de 11 ao ano Os gêneros não tradicionais borracha papel cimento metalurgia química bem como a indústria têxtil expandiramse a taxas superiores à média industrial Entretanto ao final da década a participação dos setores não tradicionais no valor adicionado industrial agregado era ainda bastante modesta em particular no caso dos gêneros produtores de bens duráveis de consumo e de bens de capital cuja participação no valor agregado industrial era de 25 e 49 respectivamente Dos 49 correspondentes a bens de capital não mais de 16 correspondia às indústrias mecânica e de material elétrico Entre 1919 e 1939 a despeito de o produto industrial haver triplicado a participação dos gêneros industriais produtores de bens de consumo no valor agregado industrial caiu apenas de 80 para 70 Fishlow 1972 Isto é em parte explicado pela importância da maior utilização da capacidade instalada como elemento explicativo do desempenho da indústria brasileira no período Apesar de o produto industrial na segunda metade dos anos 1930 ter sido cerca de 80 superior ao da segunda metade dos anos 1920 as importações de equipamentos para a indústria depois de caírem a 25 do seu nível de 1929 mantiveram se em 19331939 abaixo da média de 19251929 Suzigan 2000 apêndice 1 A evidência indica diversificação dos investimentos em benefício dos gêneros industriais produtores de bens intermediários sendo contudo pouco convincente quanto à importância dos investimentos nos gêneros produtores de bens de capital A literatura especializada permanece à espera de evidência que dê substância à assertiva de que no início da década de 1930 teria havido uma inflexão no movimento endógeno de acumulação calcada em significativo crescimento na capacidade dos gêneros industriais produtores de bens de capital Mello 1982 p110 A melhoria significativa das condições competitivas da indústria doméstica entre 19281931 deveuse preponderantemente à desvalorização do milréis em relação às moedasreferência pouco tendo a ver com a evolução da política tarifária De qualquer modo tendo em vista que a oferta de cobertura cambial durante quase toda a década de 1930 à exceção do período 19341937 esteve sujeita à gradação de prioridades em princípio definida na base da essencialidade das importações comparações de nível de proteção com base exclusivamente na evolução da tarifa são enganadoras Não há qualquer evidência de críticas contemporâneas quanto à insuficiente proteção associada à política tarifária Quando da reforma tarifária de 1934 e do tratado de comércio com os Estados Unidos em 1935 os industriais liderados por Roberto Simonsen e Euvaldo Lodi trataram com sucesso de evitar danos graves à produção industrial doméstica A reforma de 1934 resultou em um aumento da tarifa específica agregada da ordem de 15 a redução na margem de proteção que se verificou depois de 1935 nunca abaixo dos níveis de 1928 deveuse ao aumento considerável dos preços de importação em milréis causado principalmente pela desvalorização cambial depois de 1935 De outra forma seria difícil explicar o aumento considerável do produto industrial que caracterizou a década a partir de 1933 O acordo com os Estados Unidos resultou da negociação comercial brasileira mais importante da década de 1930 Como parte do esforço no sentido de negociar acordos incondicionais incluindo cláusula de nação mais favorecida as autoridades norteamericanas já em 1933 sugeriam o início de negociações na seguinte base o Brasil consideraria as concessões tarifárias que poderia oferecer aos produtos norte americanos e os Estados Unidos manteriam as principais exportações brasileiras livres de tributos As concessões brasileiras incluíram uma extensa lista de produtos especialmente bens de consumo durável enquanto as concessões norteamericanas além do compromisso de manter na lista livre o café e alguns outros produtos abrangeram a redução à metade dos impostos de importação incidentes sobre minério de manganês bagas de mamona e castanhas do Pará Não há evidência de grande impacto sobre a indústria nacional com a possível exceção das indústrias produtoras de artefatos de couros e peles e certos tipos de equipamentos elétricos As análises que focalizaram o crescimento das importações brasileiras de bens não essenciais especialmente de consumo durável entre 1934 e 1937 geralmente não levaram em conta as consequências do acordo comercial de 1935 e da liberalização do regime cambial Furtado 1959 Se bem que o aumento das importações de bens de consumo possa ser parcialmente explicado por razões domésticas de natureza política as pressões exercidas pelos Estados Unidos no sentido de ampliar o mercado para suas exportações não devem ser esquecidas Os termos do acordo comercial de 1935 foram objeto de intensa polêmica no Brasil De um lado os industriais paulistas liderados por Roberto Simonsen insistindo que na tarifa anterior não havia um só caso de proteção excessiva e que o próprio Adam Smith se aterrorizaria com o uso indiscriminado de seus princípios de política econômica Do outro lado alinhavamse liderados por Valentim Bouças os defensores da aproximação do Brasil com os Estados Unidos favoráveis portanto a quaisquer medidas tendentes à liberalização A ênfase da argumentação dos defensores do acordo centravase como no começo do século no caráter parasitário da indústria brasileira defendida por uma proteção tarifária despropositada enfatizando em suma o seu artificialismo A oposição dos industriais ao acordo concretizouse em bloqueio por um ano de sua ratificação na Câmara dos Deputados pelos representantes da classe liderados por Euvaldo Lodi A oposição parlamentar à ratificação só foi vencida com a interferência de Vargas após intensa pressão americana com base na ameaça da imposição de tarifa sobre o café brasileiro A partir de 19341935 os Estados Unidos enfrentaram importante ameaça no Brasil sob a forma do incremento do intercâmbio comercial teutobrasileiro à sombra de acordos bilaterais de comércio A despeito de contínua pressão diplomática norteamericana entre 1935 e 1938 o comércio teutobrasileiro continuou a expandirse A tolerância norteamericana em relação ao comportamento brasileiro deve ser atribuída à prevalência dos objetivos estratégicos da política norteamericana sobre os objetivos de curto prazo A posição independente de Vargas decorria diretamente da boa vontade norteamericana em relação ao Brasil à medida que ficava claro que a contenção da influência alemã na América Latina dependeria do fortalecimento do Brasil às expensas da Argentina que se mostrava excessivamente rebelde aceitavase tacitamente a ambígua posição brasileira em relação ao comércio de compensação e estabeleciase utilitariamente que a ditadura brasileira é mais aceitável do que outras Creditar a liberdade de manobra à capacidade negociadora de Vargas sem menção à determinante anuência tácita norte americana definida pelos compromissos maiores de sua política econômica externa como sugerido pelo uso de expressões como jogo duplo Gambini 1977 corresponde a uma visão distorcida das origens da margem de manobra disponível para o exercício das habilidades negociadoras de Vargas Paralelamente a tese relativa à alegada equidistância pragmática do Brasil em relação aos Estados Unidos e à Alemanha exagera de modo quase caricatural o real poder de barganha econômico e político da Alemanha no Brasil e consequentemente subestima o peso norteamericano5 Dificuldades relativas à disponibilidade de cobertura cambial levaram o governo alemão a adotar em 1934 políticas que assegurassem a redução de despesas em moedas conversíveis Depois da adoção do plano Schacht o governo do Reich assumiu controle integral das operações cambiais o comércio alemão seria basicamente realizado através do uso de marcos inconversíveis de compensação e de acordos bilaterais Apesar da oposição norteamericana que chegou à ameaça de imposição de um bloqueio unilateral das divisas geradas pela exportação de produtos brasileiros para os Estados Unidos um acordo foi assinado em fins de 1934 O acordo estabeleceu o comércio de compensação como forma básica para o intercâmbio de mercadorias entre o Brasil e a Alemanha ou seja eventuais saldos comerciais bilaterais resultariam na acumulação de depósitos inconversíveis em mil réis ou marcos compensados caso Alemanha ou Brasil vendessem mais do que comprassem no outro mercado Vargas fez o que se pode considerar a defesa clássica do acordo com a Alemanha o mercado alemão absorvia produtos brasileiros que não eram exportados para os Estados Unidos e eram produzidos em regiões politicamente importantes como o Nordeste e o Rio Grande do Sul Aranha por seu lado criticou a negociação do acordo com base no argumento de que para o Brasil a Alemanha era relativamente insignificante do ponto de vista econômico e financeiro quando comparada aos Estados Unidos Subestimava a importância das exportações brasileiras para a Alemanha como maneira de capitalizar apoio político para o governo central posição que seria atenuada com a sua volta ao Brasil em 1938 Expandiramse substancialmente as vendas de café e algodão à Alemanha O aumento da importância relativa das importações brasileiras originárias da Alemanha resultou no deslocamento de especialidades britânicas tais como carvão folhadeflandres equipamentos elétricos pesados e produtos metalúrgicos Embora certas especialidades norteamericanas tais como material de escritório e bens de consumo duráveis tenham sofrido com a competição alemã a participação das importações originárias dos Estados Unidos no total de importações aumentou pois as perdas foram mais do que compensadas por ganhos de relativos a outros produtos A implementação dos acordos de compensação enfrentou dificuldades entre 1934 e 1938 em vista da oposição dos Estados Unidos e consequentemente de determinados grupos de pressão no Brasil Mas de maneira geral o intercâmbio comercial entre a Alemanha e o Brasil mantevese em níveis significativamente mais elevados do que os típicos do princípio da década O Brasil manteve posição ambígua prometendo às autoridades norteamericanas que o comércio de compensação seria reduzido e ao final renovando os acordos de comércio bilateral Do ponto de vista do interesse nacional e em vista da patente hesitação norteamericana em utilizar o seu poder de barganha para limitar a importância do comércio bilateral do Brasil não cabe dúvida que a política econômica externa adotada foi mais adequada do que a alternativa de denunciar os acordos de compensação sem garantia de colocação das exportações que seriam deslocadas do mercado alemão Certas interpretações a respeito da formulação da política brasileira relativa ao comércio de compensação merecem qualificação Hilton 1977 Atribuise à influência dos militares a ênfase na negociação de acordos de compensação pois assim seria possível equipar as forças armadas e argumentase que a política brasileira foi uma resposta oportunista ao acirramento das rivalidades econômicas interimperialistas na década de 1930 Os documentos diplomáticos indicam que a acumulação indesejável de divisas inconversíveis provocou proposta alemã para seu uso na aquisição de material bélico Para aceitar que a política brasileira foi oportunista seria necessário acreditar que padrões éticos que regem relações interpessoais encontrariam aplicação automática no domínio das relações econômicas internacionais Os Estados Unidos adotaram uma política econômica externa apoiada na defesa do multilateralismo não porque tal política fosse eticamente aceitável mas porque no juízo das autoridades norteamericanas tal política era a mais adequada do ponto de vista de defesa dos interesses econômicos dos Estados Unidos Similarmente a política econômica externa brasileira foi definida à luz dos interesses de diferentes setores da sociedade os quais no caso em tela não eram conflitantes A expansão do comércio teutobrasileiro favorecia exportadores que não dispunham de mercados alternativos importadores consumidores que tinham acesso a bens a preços vantajosos que não seriam importados na mesma quantidade no caso de cessar o comércio de compensação e militares A adoção desta política era além disto vital do ponto de vista político pois Vargas dependia do apoio dos estados mais afetados Enquanto nos anos iniciais da década a estrutura das exportações mantevese inalterada a partir de 1934 a importância das exportações de café declinou resultado da queda dos preços de café e em especial da notável expansão das exportações de algodão A participação dos Estados Unidos nas exportações totais reduziuse ligeiramente Esta tendência foi compensada pelo aumento da importância do Reino Unido e da Alemanha bem como do Japão nos últimos anos da década A importância relativa do mercado alemão não alcançou mesmo nos anos mais favoráveis os níveis típicos do período anterior à guerra de 19141918 A maior importância das exportações destinadas ao Reino Unido e à Alemanha decorreu em grande medida das alterações estruturais da pauta de exportações Quanto às importações com a recuperação do nível de atividades tornouse impossível manter os níveis extremamente baixos que haviam caracterizado o período 19301932 De fato nos anos finais da década os saldos na balança comercial reduziramse drasticamente resultado de tendência crescente por parte dos gestores da política econômica a conceder prioridade à importação de bens necessários à manutenção de uma taxa razoável de expansão do nível de atividade às expensas dos compromissos em moeda estrangeira sem relação direta com o desempenho da economia Em termos de volume as importações de bens de consumo não duráveis e de bens de capital para usos não industriais mantiveramse em torno de 50 dos níveis alcançados em 1928 As importações de bens de capital para uso na indústria a partir de 1935 mantiveramse em torno de 80 90 das quantidades típicas do período prédepressão A análise das estatísticas brasileiras de comércio exterior sugere que entre 1928 e 1938 a participação norteamericana no mercado brasileiro caiu de 27 para 23 a britânica de 22 para 10 a francesa de 6 para 3 enquanto a alemã crescia de 12 para 25 Os ganhos alemães são entretanto superestimados pois as faturas relativas a produtos alemães eram lançadas em marcos do Reich e não em marcos de compensação As participações corrigidas indicam que a fatia norteamericana mantevese inalterada antes de 1939 em torno de 2325 o mesmo ocorrendo com a participação combinada da Alemanha e do Reino Unido em torno de 2832 O que houve foi uma substituição drástica de produtos britânicos por produtos alemães a participação britânica caiu de 19 para 11 enquanto a alemã cresceu de 12 para 20 das importações totais brasileiras 3 Estado Novo e economia de guerra 19371945 A implantação do Estado Novo em novembro de 1937 correspondeu ao amadurecimento de tendências já detectáveis em alguns casos até mesmo antes de 1930 Dada a inexistência de estruturas partidárias nacionais e a desestruturação política das forças que haviam viabilizado 1930 consolidouse a reversão da descentralização republicana fortalecendose o poder central e sendo criadas novas agências governamentais com objetivos reguladores na área econômica Souza 1976 Que aspectos econômicos caracterizaram efetiva solução de continuidade marcada pelo Estado Novo As decisões relacionadas à absorção do choque externo provocado pela recessão norteamericana configuram importante reversão da política anterior quanto a café e câmbio bem como em relação à dívida externa A legislação social apesar de suas ambiguidades em diversos aspectos favoreceu a classe operária Rodrigues 1981 Embora seja difícil encontrar substância nas atividades dos inúmeros conselhos e autarquias que pululavam no período a decisão de iniciar em 1940 a construção da primeira usina siderúrgica integrada brasileira utilizando coque mineral marcou clara mudança na forma de ação do Estado A despeito de si mesmo como se verá adiante o Estado transitou da arena normativa da atividade econômica para a provisão de bens e serviços Até 1937 a garantia de uma oferta adequada de divisas que possibilitasse a liquidação de compromissos financeiros era um objetivo explícito da política econômica Para alcançálo foram adotados regimes de controle cambial e de importações que tinham como justificativa básica a garantia de obtenção pelo governo de divisas a uma taxa de câmbio favorável Em 1937 entretanto explicitouse a contradição entre os programas de investimentos públicos e a manutenção dos pagamentos do serviço da dívida mesmo em escala reduzida o que conduziu a uma reversão da política adotada desde 1930 Em fins de 1937 a escassez de divisas fruto da substancial elevação das importações que cresceram cerca de 40 em valor entre 1936 e 1937 foi usada como justificativa após o golpe de novembro para o default da dívida externa e a adoção de monopólio cambial do governo Com base em uma taxa única desvalorizada introduziuse um sistema de controle cambial similar ao vigente entre 1931 e 1934 A adoção desta política foi justificada como consequência da reorientação da política cafeeira do Brasil pois decidiuse abandonar parcialmente a sustentação de preços seguida desde o princípio do século esperandose redução das receitas cambiais As premissas clássicas a respeito das características do mercado cafeeiro provaram ser precárias pois a elasticidadepreço da demanda por café resultou ser relativamente alta no curto prazo em 19371939 os preços do café caíram 25 enquanto a quantidade exportada cresceu 40 Foi a retração da exportação de outros produtos brasileiros que afetou a receita global de exportações O controle cambial e de importações depois de 1937 tomouse o principal instrumento de política comercial Na prática a aplicação dos controles de importação resultou ser instrumento mais eficaz para conter ou reduzir o nível agregado de importações do que para discriminar em favor das importações definidas como essenciais As dificuldades relativas à escassez de cobertura cambial em 1938 deram origem aos protestos usuais por parte dos credores A política norteamericana baseada em evitar pressões para obtenção de vantagens a curto prazo em benefício de um objetivo estratégico explica a ineficácia dos protestos repetidos de credores privados norteamericanos No Departamento do Tesouro dos Estados Unidos esboçaramse planos de desenvolvimento econômico do Brasil abandonandose as soluções de curto prazo tais como a concessão de crédito para o descongelamento de atrasados Estas propostas demonstram o clima favorável das relações bilaterais que possibilitou a visita da missão Aranha aos Estados Unidos em princípios de 1939 A missão Aranha aos Estados Unidos marca o início de longo período de relações especiais entre o Brasil e os Estados Unidos Deve ser entendida no contexto das crescentes dificuldades enfrentadas pelo Brasil em seu comércio de compensação com a Alemanha da perda de importância das relações anglobrasileiras e da crescente consciência em Washington de que as questões econômicas de interesse dos Estados Unidos no Brasil deveriam ser mais do que nunca explicitamente examinadas à luz dos objetivos políticos norteamericanos no Brasil A agenda incluía questões relacionadas à defesa nacional às relações comerciais à dívida pública externa e ao tratamento recebido pelos investimentos diretos norteamericanos no Brasil a serem discutidos com o Departamento de Estado e assuntos ligados à política cambial criação de banco central e planos de desenvolvimento de longo prazo na órbita do Tesouro norte americano Curiosamente foi no Departamento do Tesouro que emergiu a concepção de que os objetivos da política dos Estados Unidos quanto ao Brasil não deveriam limitarse à solução dos usuais problemas cambiais deveria ser considerada prioritariamente a possibilidade de se conceder ajuda para que o Brasil se tornasse mais produtivo A derrota do Secretário Morgenthau numa crise entre Tesouro Departamento de Estado e Eximbank a respeito das questões bilaterais prioritárias entre os Estados Unidos e o Brasil contribuiu para que os resultados da missão fossem bastante limitados se comparados à agenda inicial Acertouse apenas a concessão de um crédito do Eximbank de US 192 milhões para descongelar os atrasados comerciais e financeiros norteamericanos bloqueados no Brasil As ideias que tinham livre curso no Tesouro a respeito da concessão de créditos de longo prazo foram abandonadas Como contrapartida pela concessão de créditos Aranha comprometeu o Brasil a adotar uma política cambial liberal a opor obstáculos ao comércio de compensação teutobrasileiro e a retomar no curto prazo o serviço da dívida pública externa As reações no Brasil aos resultados da missão Aranha foram quase que unanimemente desfavoráveis especialmente entre os militares com base no argumento de que a retomada dos pagamentos do serviço da dívida interferiria com as importações essenciais especialmente equipamentos militares Não há dúvida de que Aranha foi além das instruções recebidas no que se refere à questão da dívida externa forçando a mão no sentido de uma reaproximação com os Estados Unidos às expensas da Alemanha A reação dos militares deve ser entendida não apenas no contexto de uso competitivo da escassa cobertura cambial mas também como resistência a uma precoce declaração de intenções Embora a linha adotada por Aranha tenha sido referendada pela realidade paira certa dúvida se não teria sido possível obter resultados mais compensadores se fosse explorada uma linha de negociações mais próxima à visão estratégica do Tesouro norteamericano quanto ao Brasil Os compromissos assumidos foram em geral honrados em vista da evolução da conjuntura internacional e suas consequências sobre as relações econômicas do Brasil Tratouse de regularizar a remessa de lucros e dividendos de companhias norteamericanas o comércio de compensação foi gradativamente sufocado à medida que se tornava perigoso acumular marcos compensados que perderiam automaticamente seu poder aquisitivo em caso de guerra A reformulação da política cambial ocorrida em abril de 1939 correspondeu parcialmente às promessas feitas por Aranha em Washington O novo regime cambial liberava 70 das cambiais geradas pelas exportações para o mercado livre de divisas que deveria suprir integralmente as divisas para importação de mercadorias Os restantes 30 das cambiais de exportação deveriam ser vendidos compulsoriamente ao Banco do Brasil à taxa oficial de câmbio mais favorável ao governo do que a taxa livre para uso no pagamento de compromissos oficiais em moeda estrangeira Uma terceira taxa de câmbio a livreespecial foi criada englobando transações financeiras privadas especialmente remessas de lucros e dividendos de capitais estrangeiros mais depreciada do que a taxa do mercado livre A eclosão da guerra resultou na perda dos mercados da Europa Central agravada em 1940 com a ocupação de quase toda a Europa Ocidental pelo Eixo Esta perda de mercados de exportação não foi integralmente compensada pelo aumento de importações por parte dos aliados e neutros antes de 19411942 resultando em brusca diminuição do saldo na balança comercial quando o Brasil tinha maiores compromissos financeiros decorrentes do novo acordo da dívida pública externa e da regularização das remessas de lucros de capitais estrangeiros Só depois de 19411942 a expansão das exportações foi assegurada pelo efeito combinado dos acordos de suprimento de materiais estratégicos aos Estados Unidos do aumento da demanda por produtos brasileiros em mercados tradicionalmente supridos pelo Reino Unido e pelos Estados Unidos que reduziram suas exportações como parte do esforço de guerra de maciças compras de carne e algodão pelo Reino Unido e dos melhores preços de café garantidos pelo Acordo Interamericano Este aumento das exportações resultou em vista da escassez crônica de importações em considerável expansão dos saldos na balança comercial Também no caso das importações as condições de guerra implicaram em rearranjo tanto da estrutura da pauta quanto da importância relativa dos países supridores do mercado brasileiro Antes de 1941 quando a política norteamericana de suprimento ainda não estava submetida às necessidades do esforço de guerra a escassez brasileira de divisas impedia a manutenção de um nível adequado de importações A partir de 1941 quando aumentaram as reservas brasileiras conversíveis tornouse mais restrito o acesso ao mercado norteamericano em função das prioridades definidas à luz do esforço de guerra aliado Por outro lado os termos do Acordo de Pagamentos AngloBrasileiro de 1940 impediam em grande medida a transformação dos saldos brasileiros em libras inconversíveis em importações de origem britânica De fato por este acordo que seguia modelo adotado quase que universalmente pelas autoridades britânicas o saldo das transações comerciais e financeiras entre o Brasil e o Reino Unido era depositado em contas em libras sem compromisso por parte das autoridades britânicas quanto ao seu poder de compra As dificuldades relativas à obtenção de importações resultaram em efeitos contraditórios sobre o desempenho da economia Por um lado a produção de determinados bens podia desenvolverse sem a alternativa de suprimento externo por outro o crescimento industrial era limitado pela dificuldade de obtenção de insumos essenciais e de bens de capital que possibilitassem a ampliação da capacidade Concretamente as dificuldades de acesso a importações não parecem ter resultado em redução substancial da taxa de crescimento da produção industrial doméstica agregada depois de período inicial de ajustamento A taxa de crescimento do produto industrial que havia caído em 19371939 para 61 ao ano reduziuse em 19401942 para 16 Entre 1943 e 1945 quando a escassez de insumos e de bens de capital continuou séria a taxa média de crescimento foi de 98 comparável à que se verificou entre 1933 e 1939 O comportamento do PIB foi menos favorável pois o desempenho do setor agrícola a partir de meados da década de 1930 foi particularmente desapontador O produto agrícola médio 19401942 praticamente estagnou em relação ao de 19361939 a recuperação pós 1942 foi modesta pois o produto agrícola médio 19431945 foi apenas 7 superior ao de 19361939 Assim a taxa de crescimento do PIB que já havia caído a 38 ao ano em 19371939 atingiu 03 ao ano em 194042 antes de recuperarse para 64 ao ano em 19431945 Em mais de um sentido 1942 corresponde a um ponto de inflexão do ponto de vista econômico no Brasil acelerouse o crescimento industrial pela primeira vez desde a década de 1920 começaram a acumularse reservas cambiais observase a entrada de capitais privados norteamericanos após longo período de desinteresse A retomada do nível de atividades não esteve também dissociada das políticas fiscal monetária e creditícia claramente expansionistas adotadas pelo governo a partir de 1942 A política monetária que havia sido moderadamente apertada entre o fim de 1938 e o fim de 1939 tornouse expansionista particularmente a partir de 1940 ratificando as pressões inflacionárias associadas aos desequilíbrios provocados pela guerra e às políticas do governo no terreno fiscal e creditício Em particular a reforma monetária de 1942 diferentemente do que foi sugerido à época pelo governo propiciou condições para significativo aumento da liquidez da economia A inflação acelerouse a partir de 1941 mantendose grosso modo entre 15 e 20 ao ano As pressões inflacionárias foram estimuladas pela expansão dos saldos na balança comercial associados às restrições ao acesso a importações e à competição entre consumo doméstico e exportações no caso de produtos tais como a carne Enquanto até 1941 o governo manteve uma política de financiamento do déficit público através da emissão de títulos a partir de 1942 esta tendência foi claramente revertida com a acumulação de maciços déficits financiados através de emissão primária A política creditícia também revelou inflexão semelhante a partir de 1942 quando os saldos reais de empréstimos do Banco do Brasil e dos bancos comerciais ao setor privado cresceram 20 ao ano principalmente como resultado das atividades da Carteira de Crédito Agrícola e Industrial do Banco do Brasil que havia sido criada em 1937 As tentativas de contenção inflacionária através de novas agências governamentais como por exemplo a Coordenação de Mobilização Econômica foram certamente tímidas quando comparadas aos bem sucedidos esforços de contenção da demanda postos em prática em países como Inglaterra e Estados Unidos conjugando racionamento controles de preços incentivos fiscais ao adiamento de dispêndio e financiamento dos gastos de guerra As restrições ao comércio brasileiro tanto no caso das exportações quanto no das importações acarretaram aumento considerável da dependência brasileira com relação aos Estados Unidos seja como mercado seja como fonte supridora de produtos importados No início da guerra o governo norteamericano percebendo as implicações econômicas e políticas de um agravamento dos obstáculos ao comércio exportador dos países latinoamericanos e desejando garantir o seu acesso a matériasprimas necessárias à condução da guerra bem como privar o Eixo desses produtos implementou uma política que entre outros objetivos visava a atenuar as consequências da guerra sustentando os preços dos produtos de exportação dos países latinoamericanos Este foi o caso de inúmeros produtos incluídos em acordos específicos de suprimento a partir de 1941 e do café objeto do Acordo Interamericano do Café em 1940 Embora seja difícil estimar com precisão a parcela da exportação regulada por acordos de suprimento com os Estados Unidos é improvável que em 19421943 essa proporção tenha sido inferior a 60 das exportações totais As compras britânicas de algodão e carne por outro lado corresponderam a 15 das exportações totais brasileiras Assim apenas 25 das exportações do Brasil não estavam diretamente subordinadas às decisões das autoridades aliadas a respeito dos suprimentos necessários ao esforço de guerra embora dependessem da política aliada relativa à distribuição de praça em transportes marítimos Embora os preços de exportação tenham crescido mais rapidamente do que os preços domésticos o que resultou em melhoria da remuneração do setor exportador por unidade de volume exportado a contração dos volumes exportados foi tão importante que exceto no caso de produtos não tradicionais as exportações caíram como percentagem do PIB Ao contrário do que sugerem interpretações tradicionais a guerra não foi um período de excepcional prosperidade para o setor exportador como um todo beneficiando apenas os exportadores de alguns produtos estratégicos muito especializados ou de manufaturas tais como tecidos de algodão e pneumáticos As exportações de produtos industriais dirigiramse especialmente para a América Latina em particular Argentina e África do Sul com base no Acordo AngloBrasileiro de Pagamentos O endurecimento da política norteamericana com relação ao Brasil ocorrido com a aproximação da paz é transparente ao examinarse a política de preços de café À fixação de preços generosos em 19401941 seguiuse a partir de 1943 período de crescente atrito entre os dois governos As pressões brasileiras para reajustar os preços de café levando em conta o aumento significativo dos custos de produção foram em vão as autoridades norteamericanas argumentando que um aumento de preços contrariaria a política de controle de preços nos Estados Unidos perturbaria o funcionamento ordeiro de mercado e não beneficiaria os produtores sendo apropriado por intermediários Com a aproximação do fim da guerra tornouse mais difícil para os Estados Unidos insistir em sua política pois os consumidores europeus voltavam ao mercado e um número crescente de funcionários norteamericanos reconhecia o alto custo político da recusa em ceder às pressões dos países produtores de café Após uma crise na qual o Brasil mostrou pouco entusiasmo em preencher sua quota no mercado norteamericano e os Estados Unidos brandiram o porrete do racionamento chegouse a uma solução temporária da crise com a concessão de um pequeno subsídio por parte do governo norteamericano O caso do café talvez seja o melhor exemplo de como a política econômica dos Estados Unidos com referência ao Brasil inicialmente generosa se bem que não destituída de interesse próprio tornouse progressivamente menos magnânima à medida que diminuía a necessidade de recorrer a incentivos econômicos para garantir apoio político na América Latina As relações econômicas entre o Brasil e o Reino Unido durante a guerra desenvolveramse sujeitas à principal preocupação da política econômica externa britânica do período minimizar o custo imediato das importações necessárias ao esforço de guerra numa conjuntura de notável escassez de reservas de moeda conversíveis especialmente dólares6 As autoridades britânicas no caso dos países com os quais o balanço bilateral de pagamentos fosse desfavorável forçaram aproveitando o seu poder de barganha em vista da interrupção do comércio com inúmeros países da Europa Continental a assinatura de acordos bilaterais de pagamentos A consequência concreta desses acordos era que as divisas geradas pelas exportações desses países para o Reino Unido eram depositadas no Banco da Inglaterra e só poderiam ser utilizadas para a liquidação de compromissos devidos a credores na área esterlina As exportações britânicas para o Brasil mantiveramse em níveis extremamente reduzidos em vista da prioridade concedida à produção para uso militar Até 1941 o balanço bilateral de pagamentos mantevese desfavorável ao Brasil para desgosto das autoridades britânicas Já em meados de 1941 entretanto a posição das reservas brasileiras em libras havia mudado as reservas que eram nulas no final de 1940 cresceram de 2 milhões no final de 1941 para 15 milhões no final de 1942 35 milhões no final de 1943 e 40 milhões em meados de 1945 Isto foi resultado do maior volume de compras britânicas no Brasil em vista dos esforços de racionalização do uso da frota mercante o que explica a expansão das compras de carne de desenvolvimentos inesperados na condução de operações militares que resultaram na perda de fontes tradicionais de suprimento e de compras extraordinárias não relacionadas diretamente ao esforço de guerra tais como a constituição de reserva de algodão para uso na projetada ofensiva britânica de exportações no pósguerra proposta por Keynes Antes da entrada dos Estados Unidos na guerra as autoridades britânicas encarregaramse da implementação de medidas de bloqueio econômico dos interesses do Eixo na América do Sul A imposição do bloqueio pela marinha britânica causou incidentes que contribuíram para sensível esfriamento das relações anglobrasileiras Em especial a recusa britânica em permitir o transporte de material bélico adquirido pelo Brasil na Alemanha antes da guerra provocou uma crise entre o Brasil e o Reino Unido só resolvida com a interferência dos Estados Unidos A questão específica mais importante relativa ao suprimento de produtos norteamericanos ao Brasil foi sem dúvida a decisão de fornecer créditos e materiais para a construção da Companhia Siderúgica Nacional CSN em Volta Redonda É importante considerar esta decisão à luz dos objetivos estratégicos da política norte americana referente à América Latina que se baseava no fortalecimento do Brasil às expensas da Argentina Embora alguns círculos mais conservadores nos Estados Unidos insistissem que o projeto contrariava a teoria das vantagens comparativas as condições de guerra tornaram possível a vitória daqueles que pensavam que um maior desenvolvimento econômico no Brasil facilitaria a expansão do mercado para as exportações norteamericanas A necessidade de recorrer ao exame dos objetivos políticos dos Estados Unidos no Brasil para justificar o envolvimento na construção e financiamento da siderúrgica de Volta Redonda é reforçada se for abandonada a interpretação corrente de que Vargas usou a alternativa alemã como importante elemento de negociação com as autoridades norteamericanas no início de 19407 Não é possível aceitar seja que a Alemanha estivesse disposta a interferir com a sua produção de guerra para suprir as necessidades brasileiras de equipamento pesado seja que as autoridades encarregadas da execução do bloqueio econômico britânico fossem permitir o livre trânsito de tais equipamentos especialmente em vista de sua posição contrária ao trânsito de armas compradas pelo Brasil na Alemanha antes da eclosão da guerra O episódio é além disso esclarecedor do ponto de vista das condições que levaram o governo federal a intervir diretamente na produção de aço Neste caso a exemplo do que ocorreria no caso da Cia Vale do Rio Doce a decisão não resultou em qualquer fricção com interesses privados nacionais ou estrangeiros Pelo contrário o governo brasileiro viuse obrigado a participar diretamente do projeto em vista da impossibilidade de convencer mesmo com o apoio claro do governo dos Estados Unidos qualquer dos grandes produtores de aço norteamericanos a participar do projeto Mesmo as modestas metas estabelecidas pelas autoridades norte americanas e brasileiras com relação ao suprimento de bens essenciais ao Brasil não foram em geral respeitadas em vista de escassez de praça marítima A situação no Brasil de fato era menos favorável do que na Argentina país que não se caracterizava por atitude simpática aos Estados Unidos Só em 1945 quando a ameaça de abertura de fontes de suprimento alternativo na Europa tornouse menos teórica é que os Estados Unidos trataram de retificar esta situação As dificuldades surgidas à raiz da implementação unilateral por parte do governo brasileiro de um controle paralelo de importações definido à luz de critérios de essencialidade do ponto de vista brasileiro mostram a reversão da política norteamericana em relação às atividades substitutivas de importações Enquanto nos anos iniciais da guerra a ênfase ao desenvolvimento destas atividades era clara com a aproximação da paz a política norteamericana tendia a levar crescentemente em conta os interesses do seu comércio exportador Neste contexto fica clara a oportunidade da decisão brasileira com relação a Volta Redonda a reversão da política norteamericana sugere que teria sido mais difícil contar com o apoio do governo dos Estados Unidos a este projeto após a guerra quando a obtenção do apoio brasileiro exigiu recompensas menos generosas Tiveram também importância os fornecimentos militares no valor de US 332 milhões com base na Lei de Empréstimos e Arrendamentos Este aspecto das relações entre os dois países marca o início de uma longa fase de estreita colaboração militar A melhoria da situação de balanço de pagamentos permitiu o equacionamento da questão da dívida Em 1937 logo após o golpe de Estado fora decidido suspender o pagamento do serviço de dívida com base no argumento de que não seria possível respeitar as disposições do esquema Aranha de 1934 e ao mesmo tempo pagar as importações necessárias ao reequipamento do sistema de transportes e das forças armadas A alternativa de um novo funding loan foi descartada pois envolveria um aumento da dívida em circulação já substancial se comparada à capacidade de gerar divisas A reação britânica na imprensa e por vias diplomáticas deve ser contrastada com a cautela norteamericana que frisese mais uma vez deve ser entendida à luz dos objetivos estratégicos norteamericanos no Brasil e do papel que se esperava fosse desempenhar o Brasil no contexto da Política de Boa Vizinhança As representações feitas pelos credores entre o final de 1937 e princípios de 1939 não tiveram sucesso O Reino Unido não dispunha de suficiente poder de barganha para impor uma política que garantisse melhor tratamento de seus interesses financeiros Por outro lado não interessava aos Estados Unidos forçar a efetivação de pagamentos pois comprometeria os objetivos mais amplos de sua política A avaliação da política relativa à dívida pública externa sugere que enquanto nos anos iniciais da década de 1930 o Brasil pagou serviço acima de suas possibilidades cambiais o contrário ocorreu a partir de 1937 quando pagou menos do que indicava a sua presumível capacidade de pagar Isto não é surpreendente na medida em que se aceite que a experiência brasileira não foi exceção à regra de que argumentos econômicos cedem lugar a critérios políticos quando se trata de reajustar o montante da dívida pública externa O tratamento generoso dos empréstimos em 1931 deve ser encarado em parte como resultado da ortodoxa política de Whitaker e em parte à inabilidade brasileira em reconhecer o caráter de longo prazo da crise O governo brasileiro aceitou em 1934 um acordo ainda generoso quando comparado à capacidade de a economia gerar divisas A suspensão de pagamentos em 1937 significou uma reversão desta tendência facilitando a negociação de acordos mais favoráveis na década de 1940 Vargas ao colocar em 1937 o problema da dívida em termos de ou pagamos a dívida externa ou reequipamos as forças armadas e o sistema de transportes ao mesmo tempo mobilizou o apoio militar ao novo regime esvaziou as críticas de círculos ligados a interesses estrangeiros e apaziguou os integralistas que eram seus aliados à época e cujo programa incluía a suspensão de pagamentos Por outro lado a evidência quanto às importações brasileiras na segunda metade da década de 1930 sugere que a argumentação utilizada por Getúlio Vargas para justificar a suspensão de pagamentos ao enfatizar a necessidade de manter o nível das importações apenas racionalizava o que já vinha ocorrendo em 1937 A dívida pública foi objeto de dois acordos no período de guerra O primeiro negociado em 1940 em decorrência das promessas de Oswaldo Aranha por quatro anos estabelecia um nível de pagamentos grosso modo correspondente à metade dos fixados no acordo de 1934 Em 1943 foi negociado um acordo definitivo Nestas negociações ao contrário do que havia ocorrido no passado as autoridades norteamericanas exerceram pressões coroadas de sucesso no sentido de obter condições relativamente mais favoráveis para os empréstimos em dólares às expensas dos interesses britânicos Pelo acordo definitivo foram oferecidas duas opções aos credores Pela opção A foram mantidos os devedores iniciais e os valores nominais as taxas de juros reduzidas significativamente prevendose pagamentos iniciais de serviço de 77 milhões supondo se que todos os detentores de títulos escolhessem esta opção A opção B envolvia um serviço inicial de 84 milhões de novos títulos federais de 375 bem como pagamentos em dinheiro de 229 milhões resgatando 79 milhões de dívida em circulação ao preço médio de 29 também com base na hipótese de todos os credores escolherem esta opção Estimase que os ganhos brasileiros associados à redução de taxas de juros e resgate de títulos com deságio tenha sido da ordem de 110 milhões reduzindo à metade a dívida total de 220 milhões Entre 1936 e 1940 o investimento direto norteamericano no Brasil cresceu significativamente de US194 milhões para US240 milhões Embora parte desta expansão estivesse ainda associada à compra de ativos detidos por estrangeiros não norteamericanos boa parte do crescimento corresponde à entrada de capitais especialmente no caso da indústria de transformação Durante a primeira metade da década é difícil definir uma política brasileira coerente com relação aos capitais estrangeiros investidos no Brasil Apesar dos inúmeros problemas acarretados pela crise cambial quanto a remessas de lucros e dividendos especialmente até 1934 não há indicações da existência de qualquer discriminação contra firmas estrangeiras na aplicação da política cambial No plano das intenções entretanto tanto a Constituição de 1934 quanto os Códigos de Águas e de Minas incluíam provisões radicais limitando o campo de aplicação de capitais estrangeiros concessões de mineração e exploração de recursos hidráulicos seriam limitadas a cidadãos brasileiros e previase a progressiva nacionalização de bancos de depósitos e companhias de seguro estrangeiras A Constituição de 1937 incorporou essa legislação radical mencionando ainda a conveniência de serem nacionalizadas as indústrias essenciais Na prática essa legislação contrária ao capital estrangeiro foi muito atenuada Enquanto dispositivos legais complementares asseguraram não apenas a nacionalização mas a estatização dos modestos esforços de prospecção e exploração de petróleo nenhuma medida foi implementada quanto à nacionalização de bancos comerciais ou de companhias de seguro antes de 1939 Neste ano entretanto tornouse compulsório o resseguro junto ao Instituto de Resseguros do Brasil estreitandose a esfera de atuação das seguradoras estrangeiras Não é fácil chegarse a uma conclusão cristalina a respeito das consequências da legislação restritiva sobre os fluxos de capital relacionados a investimentos estrangeiros diretos no Brasil durante a década de 1930 Enquanto por um lado essa legislação restritiva pudesse em princípio ter dissuadido investidores potenciais a retração dos investimentos parece ser melhor explicada pela conjuntura internacional lembrandose sempre que o investimento norteamericano no Brasil cresceu consideravelmente após 1936 apesar do tom das declarações de intenção por parte das autoridades brasileiras Além disto as dificuldades reais ou imaginárias relacionadas à legislação nacionalista referiamse quase sempre ao envolvimento de capitais estrangeiros no setor de serviços de utilidade pública e não na indústria de transformação Ao período de guerra correspondeu a estagnação do total de capitais estrangeiros privados investidos no Brasil algo inferior a US700 milhões ocorrendo um aumento das inversões norte americanas especialmente a partir de 1943 em atividades manufatureiras e redução das inversões europeias No caso das inversões britânicas a despeito do nas palavras de Keynes passado nebuloso de algumas delas o considerável saldo brasileiro de libras bloqueadas facilitou acordos de desapropriação certamente generosos para os acionistas estrangeiros A expansão das inversões norteamericanas nos anos finais da guerra pode ser explicada em parte pela política liberal adotada pelo governo brasileiro quanto a remessas de lucros a partir de 19411942 e pela ausência de oportunidades alternativas para inversão À medida que se tornava clara a vitória aliada evidenciouse o desconforto das autoridades brasileiras em relação à intimidade das suas relações com os Estados Unidos Tentouse reorientar a política externa no sentido de usar o Reino Unido como contrapeso aos Estados Unidos à semelhança da política classicamente adotada pelo Brasil antes de 1930 Os norteamericanos de fato demonstravamse bastante menos generosos em relação ao Brasil do que havia sido o caso nos anos iniciais de guerra quando os seus objetivos políticos e econômicos na América do Sul ainda não haviam sido alcançados Sua política em relação ao Brasil é bem resumida pela advertência aos ingleses de que as relações norteamericanas com o Brasil deveriam ser vistas no mesmo plano das relações britânicas com o Egito ou a África do Sul Os Estados Unidos não apenas recusaramse peremptoriamente a reajustar os preços de café como pleiteavam insistentemente os países produtores mas também mostravamse crescentemente hostis ao desenvolvimento de indústrias substitutivas de importações que prejudicariam as exportações norteamericanas para o Brasil no pós guerra e não cumpriram suas promessas quanto ao suprimento de matériasprimas e bens intermediários e de capital escassos no Brasil Além disso a violenta política antiargentina adotada pelos Estados Unidos começava a parecer extrema mesmo aos brasileiros pois a Argentina não era apenas o bom vizinho era o vizinho de fato que não devia ser excessivamente provocado A despeito do interesse brasileiro quanto ao retorno a uma política de resseguro os atrativos relacionados aos ganhos políticos no contexto latinoamericano que resultavam do apoio norteamericano provaram ser mais fortes Afinal apresentavase a oportunidade para que o Brasil fosse restaurado em sua posição de proeminência na América Latina que havia sido perdida para a Argentina no início do século Além disso o Reino Unido em vista de sua fragilidade econômica não parecia oferecer as condições adequadas para a implementação de uma política de resseguro nos moldes daquela adotada antes da década de 1930 Com a aproximação do final da guerra verificouse uma reorientação da política norteamericana relativa ao apoio a governos latinoamericanos que não haviam sido eleitos por voto popular Enquanto no final da década de 1930 e nos anos iniciais da guerra o governo brasileiro era visto em Washington como uma ditadura mais aceitável do que outras depois de 1943 as preocupações quanto à falta de democracia interna tornaramse evidentes Começaram a tomar corpo tendências no governo norteamericano no sentido de apoiar uma solução liberal no Brasil que removesse as contradições entre o regime político autoritário e a política externa próaliada Uma sucessão liberal além disso envolveria provavelmente a adoção de políticas econômicas mais alinhadas com os objetivos norte americanos O ostensivo apoio norteamericano foi importante elemento do processo de desestabilização da ditadura varguista que culminaria na sua deposição logo após a vitória dos Aliados no Pacífico É neste contexto e como resultado de considerável agitação política interna que devem ser vistas as tentativas de Getúlio Vargas no sentido de redefinir as bases políticas do regime em 19441945 absorvendo os segmentos mais radicais do cenário político nacional O fracasso destas tentativas e a consequente deposição de Vargas no final de 1945 devem ser considerados no quadro de reorientação da política norteamericana relativa ao Brasil no final da guerra A eleição de um novo governo que provou ser bastante menos apto a ter dúvidas quanto à necessidade de respeitar os compromissos implícitos e explícitos assumidos pelo Brasil em relação aos Estados Unidos marcou na verdade o início de um longo período de hegemonia econômica e política dos interesses norteamericanos no Brasil Esses desenvolvimentos corresponderam ao coroamento da política dos Estados Unidos em relação ao Brasil na década de 1930 e nos anos iniciais da guerra ao enfatizar a importância dos objetivos estratégicos mesmo que às expensas de objetivos táticos relevantes 1Este capítulo versão levemente revista de Abreu 1990b é uma síntese de Abreu 1999 2Para as negociações da dívida externa no período 19311943 ver Abreu 1977 Em Abreu 2006 é feita uma avaliação de longo prazo da dívida externa acumulada entre 1824 e 1931 levando em conta os sucessivos acordos com os credores no período 19311943 3O impacto da depressão sobre a renda real foi é claro mais desfavorável pois os termos de intercâmbio se deterioraram 44 entre 1928 e 1931 4Ver o relatório de Williams em United States 1951 p 393406 5Proposta entre outros por Moura 1980 6Para um tratamento exaustivo das relações econômicas anglobrasileiras durante a guerra a acumulação de saldos em Londres e sua liquidação até 1952 ver Abreu 1990a 7Ver por exemplo Martins 1973 CAPÍTULO 5 Política econômica externa e industrialização 19461951 Sérgio Besserman Vianna 1 Introdução Este capítulo trata de descrever e analisar a política econômica no primeiro período de governo do pósguerra e é baseado no Capítulo 1 de Vianna 1987 Dada a ausência de um maior volume de pesquisa primária assim como de material bibliográfico sobre o tema em vez de uma divisão por subperíodos optouse por sua organização em quatro seções além desta introdução que procura de forma bastante breve situar o período no cenário internacional A seção 2 trata da política de comércio exterior a seção 3 da substituição de importações por ela induzida a seção 4 das relações internacionais e do movimento de capitais é a seção final da política econômica doméstica A política econômica no governo Dutra possui porém períodos distintos delimitados por dois marcos relevantes O primeiro foi a mudança na política de comércio exterior com o fim do mercado livre de câmbio e a adoção do sistema de contingenciamento às importações entre meados de 1947 e início de 1948 O segundo foi o afastamento do ministro da Fazenda Correa e Castro em meados de 1949 indicando a passagem de uma política econômica contracionista e tipicamente ortodoxa para outra com maior flexibilidade nas metas fiscais e monetárias O importante a notar é que ambos os marcos fazem parte de um mesmo processo de progressiva desmontagem da ilusão liberal que norteou a formação do governo Dutra Essa ilusão assim como seu gradual desaparecimento por sua vez só são compreensíveis à luz dos acontecimentos do cenário internacional As perspectivas que o governo Dutra tinha em seu início foram fundamentalmente determinadas pela ideia de um mundo organizado de acordo com os princípios liberais de Bretton Woods É um equívoco imaginar contudo que a reorganização da economia mundial no imediato pósguerra tenha resultado de uma implementação automática das decisões da conferência de Bretton Woods em 1944 Na verdade o restabelecimento do sistema padrãoourodivisas tendo o dólar como moeda internacional de reserva o objetivo de livre conversibilidade das moedas após um curto período de transição a criação do Fundo Monetário Internacional para zelar pelos aspectos monetários dos acordos de Bretton Woods e conceder empréstimos aos países cujos balanços de pagamentos apresentassem déficits a criação do GATT Acordo Geral de Tarifas e Comércio com a função de reduzir obstáculos ao comércio internacional e o fato de o Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento ter sido criado sem possuir recursos para ajudar efetivamente os países europeus no esforço de reconstrução indicando a disposição original norte americana de impedir que Japão e Alemanha ressurgissem como potências econômicas revelam que Bretton Woods era compreendido como um sistema de equilíbrio e que o objetivo norteamericano era o de moldar a economia do pósguerra congelando a relação de forças entre os Estados Unidos e o resto do mundo capitalista tanto em seus aspectos econômicos quanto políticos A realidade entretanto não era essa Não havia equilíbrio possível nas condições do imediato pósguerra Os Estados Unidos haviam crescido 11 em média ao ano de 1940 a 1945 enquanto Europa e Japão tiveram parte de suas populações dizimadas suas economias desarticuladas e seus parques produtivos em parte destruídos Desde 1941 o governo norteamericano encarou a reconstrução econômica posterior à guerra por um prisma liberal e multilateral Entretanto multilateralismo e não discriminação exigem condições estruturais normais Um sistema dessa natureza que normaliza a concorrência internacional era perigoso logo depois da guerra Arriscava reduzir inutilmente as trocas entre países europeus a pretexto de salvaguardar os direitos dos exportadores norte americanos que então não tinham concorrentes Só os Estados Unidos podiam entre 1945 e 1949 fornecer ao mundo inteiro os bens de consumo e os equipamentos de que este necessitava só a economia norteamericana saíra consolidada e enriquecida do último conflito mundial A volta ao multilateralismo em 1947 era prematura Niveau 1969 p 399400 O resultado foi um forte desequilíbrio nas transações em ouro e dólar do resto do mundo com os Estados Unidos gerando o período conhecido na história econômica como o de escassez de dólares Foi necessário o malogro da conversibilidade da libra esterlina em 1947 para que se medisse a natureza e a amplitude de um desequilíbrio que se anunciava duradouro Niveau 1969 p 314 Por outro lado esse quadro econômico sem perspectivas e as difíceis condições de vida aliados ao prestígio naquele momento das forças de esquerda que lideraram a resistência antinazista na Itália e na França assim como da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas geravam condições para que efetivas rupturas políticas ocorressem na Europa Ocidental Nesse contexto os Estados Unidos aceitam postergar os objetivos de Bretton Woods compreendendo a predominância de seus interesses estratégicos e de organização de sua hegemonia no mundo sobre seus interesses econômicos mais imediatistas O ano da reviravolta é 1947 sendo a proclamação da Doutrina Truman que anunciava a disposição norteamericana de combater a expansão comunista e a aprovação do Plano Marshall os fatos mais significativos Também nesse ano os comunistas foram excluídos dos governos francês e italiano No Brasil foram postos na ilegalidade A guerra fria havia começado No plano econômico além do aporte de volumosos recursos financeiros à Europa e ao Japão foi aceita a postergação da livre conversibilidade das moedas e assinado acordo de compensação monetária multilateral entre os países europeus É o ano em que no Brasil são introduzidos controles administrativos no comércio exterior Iniciase longa transição de uma década em direção à livre conversibilidade e ao multilateralismo Em 1949 procedese a grandes desvalorizações cambiais em relação ao dólar nas principais moedas do mundo Os Estados Unidos aceitam discriminações contra produtos norteamericanos nos mercados europeus e japonês sem adotar medidas retaliatórias Em 1950 surge a União Europeia de Pagamentos UEP consolidando a ideia de uma lenta transição em direção às trocas multilaterais e à conversibilidade geral das moedas A UEP existiu até o fim de 1958 A história das políticas cambial e de comércio exterior brasileira de 1947 a 1961 relacionase com esse movimento na economia mundial A percepção desse processo não foi automática e as ilusões do início do governo Dutra foram sendo lentamente erodidas De qualquer forma no início do governo o desenrolar dos acontecimentos foi marcado por expectativas bastante favoráveis quanto à situação econômica externa De fato além da perspectiva de uma rápida reorganização da economia mundial de acordo com os princípios liberais de Bretton Woods havia a esperança de uma significativa alta dos preços internacionais do café como resultado principalmente da eliminação em julho de 1946 de seu preçoteto por parte do governo norte americano Em consequência as autoridades monetárias e cambiais tornaramse vítimas de uma espécie de ilusão de divisas que se apoiava sobre três pontos 1 o país parecia estar em situação bastante confortável com relação às suas reservas internacionais 2 julgavase credor dos Estados Unidos da América pela colaboração oferecida durante a Segunda Guerra Mundial e 3 acreditava que uma política liberal de câmbio seria capaz de atrair significativo fluxo de investimentos diretos estrangeiros dando solução duradoura para o potencial desequilíbrio do balanço de pagamentos Confiante na evolução favorável do setor externo o governo Dutra identificou na inflação o problema mais grave e premente a ser enfrentado O diagnóstico oficial localizava nos déficits orçamentários da União que se vinham acumulando nos últimos anos a causa maior dos aumentos no nível de preços e em políticas monetárias e fiscais severamente contracionistas o tratamento adequado 2 Políticas cambial e de comércio exterior As políticas de comércio exterior e cambial do início do governo Dutra devem ser analisadas portanto à luz da ilusão de divisas já mencionada bem como da prioridade dada ao combate à inflação O câmbio foi mantido grosso modo à paridade de 1939 de Cr185US sendo instituído o mercado livre com a abolição das restrições a pagamentos existentes desde o início dos anos 1930 Os preços no Brasil dobraram em relação aos preços nos Estados Unidos entre 1937 e 1945 o que torna evidente a sobrevalorização da taxa cambial Eram vários os objetivos dessa política Em primeiro lugar atender à demanda contida de matériasprimas e de bens de capital para reequipamento da indústria desgastada durante a guerra Em segundo lugar esperavase que a liberalização das importações de bens de consumo também objeto de forte demanda reprimida forçasse a baixa dos preços industriais através do aumento da oferta de produtos importados pelo câmbio sobrevalorizado Além disso de acordo com a crença generalizada de que o setor externo havia sido importante fonte inflacionária no período da guerra acreditavase possível fazer política antiinflacionária reduzindo as reservas em dólares através de saldos negativos na balança comercial Em terceiro lugar a política liberal de câmbio afora exprimir a congruência das diretrizes governamentais com a ideologia liberal predominante e os compromissos internacionais do país refletia a esperança de que a liberalização das saídas de capital pudesse estimular também ingressos brutos em proporção significativa no futuro A ilusão que primeiro se evidenciou como tal foi a falsa avaliação da situação das reservas internacionais É preciso notar que durante o governo Dutra e com destaque antes do estouro dos preços do café em 1949 o problema fundamental do setor externo da economia brasileira era o saldo de pagamentos em moedas conversíveis especialmente dólares norteamericanos As reservas internacionais acumuladas durante a guerra não permitiam financiar déficits da magnitude dos observados com a área conversível em fins de 1946 dos US760 milhões de reservas totais apenas cerca de US100 milhões eram reservas líquidas disponíveis para a área conversível o restante compunhase de libras esterlinas bloqueadas de fato moedas inconversíveis somando US273 milhões e ouro depositado nos Estados Unidos como se verifica na Tabela 511 As reservas em ouro US365 milhões 50 do total porém eram consideradas pelo governo brasileiro como reserva estratégica a ser preservada para emergências futuras Tabela 51 Brasil Disponibilidades cambiais posição em 31 de dezembro 19451952 US milhões Fonte Malan Bonelli Abreu e Pereira 1977 p 165 O problema fundamental da balança comercial estava no fato de o Brasil obter substanciais superávits comerciais com a área de moeda inconversível enquanto acumulava déficits crescentes com os Estados Unidos e outros países de moeda forte A observação agregada da balança comercial para os primeiros anos do pósguerra é enganosa Tanto o superávit de 1946 como o aparente equilíbrio de 19471948 resultaram do excesso de exportações FOB sobre importações CIF para áreas de moeda inconversível Assim o Brasil até 1948 estava acumulando saldos em moedas fracas isto é sem poder de comando imediato sobre recursos reais e acumulando déficits em moedas fortes especialmente em 1947 quando o déficit com a área conversível chegaria a superar os US300 milhões cerca de US200 milhões já no primeiro semestre Malan Bonelli Abreu e Pereira 1977 p 65 Parte importante deste desequilíbrio é explicável pela Segunda Guerra Mundial que tornou extremamente difícil obter mercadorias da Europa e preservou a capacidade de fornecimento dos Estados Unidos de onde se originaram cerca de 60 das importações brasileiras em 19461947 e para o qual se destinaram apenas 40 das exportações brasileiras naquele biênio Malan Bonelli Abreu e Pereira 1977 p 147 O término do conflito mundial afetou também as pautas de exportação e importação do Brasil com a volta ao mercado dos antigos fornecedores e o início da recuperação econômica Cai a exportação brasileira de matériasprimas e principalmente de manufaturas estas chegaram a representar 20 da pauta em 1945 caindo para 75 em 1946 e continuaram em queda até alcançar menos de 1 em 1952 As importações por sua vez enfrentam não apenas as pressões resultantes da necessidade de reequipamento como um intenso acréscimo de preços que sobem 64 entre 1945 e 1947 As reservas em moedas conversíveis reduziramse rapidamente chegando a apenas US33 milhões em fins de 1947 e o Brasil começou a acumular atrasados comerciais US82 milhões em fins de 1947 Muitos fornecedores suspendem suas remessas para o Brasil e diferentes indústrias têm seu ritmo de produção ameaçado por falta de matériasprimas importadas A imposição de controles seletivos sobre as importações surge portanto como necessidade A decisão de manter fixa a taxa de câmbio era equivalente a uma revalorização cambial A alternativa de desvalorização foi posta de lado pelo governo por várias razões em primeiro lugar devido à lição aprendida de que a demanda estrangeira pelo café era relativamente inelástica com respeito ao preço de modo que uma taxa de câmbio sobrevalorizada poderia ser utilizada para sustentar os preços internacionais do café Em segundo lugar pela prioridade concedida ao combate à inflação e à convicção das autoridades governamentais de que alterações na taxa cambial refletiamse significativamente no nível de preços domésticos Em terceiro lugar mais de 40 das exportações dirigiamse à área de moedas inconversíveis eou bloqueadas e o café representava mais de 70 das exportações para áreas de moeda conversível assim mesmo supondo significativa elasticidadepreço da oferta de outras exportações que não o café não era justificável uma política de superávits comerciais na áreas de moedas não conversíveis Essas além de não ajudarem a minorar o problema cambial com a área conversível exerceriam pressão para a expansão da base monetária Finalmente dada a inelasticidade relativa a preços da demanda de importações a desvalorização dificilmente reduziria o dispêndio total em produtos importados assim como não asseguraria qualquer seletividade na composição da pauta indispensável diante da precariedade dos fornecimentos à atividade industrial Os controles cambiais e de importações do pósguerra começam a ser estabelecidos em julho de 1947 com a instituição do regime de controle de câmbio por cooperação segundo o qual os bancos autorizados a operar em câmbio eram obrigados a vender ao Banco do Brasil 30 de suas compras de câmbio livre à taxa oficial de compra Atendidos os compromissos do governo o Banco do Brasil forneceria câmbio de acordo com uma escala de prioridades que favorecia a importação de produtos considerados essenciais O controle instituído não foi rigoroso e a crise cambial não provocou imediata revisão do pensamento econômico do governo as restrições ao comércio exterior eram apresentadas como passageiras e destinadas a serem abandonadas assim que os mercados mundiais se recuperassem Apenas em fevereiro de 1948 foi adotada a primeira forma do sistema de contingenciamento a importações baseado na concessão de licenças prévias para importar de acordo com as prioridades do governo tal sistema iria permanecer na prática até a liberalização ocorrida no início do governo Vargas e na legislação até a Instrução 70 em outubro de 19532 Analisado em função de sua capacidade de reduzir o déficit com a área conversível o sistema de licenciamento de importações funcionou a contento O déficit de US313 milhões de 1947 foi reduzido para US108 milhões em 1948 e transformado em pequeno superávit de US18 milhões em 1949 Esse resultado foi obtido em grande parte graças à redução das importações originárias da área de moeda conversível que declinaram continuadamente de US923 milhões em 1947 para US527 milhões em 1950 Outro fator também relevante foi a modesta queda dos preços de importação de quase 6 entre 1948 e 1950 derivada da primeira recessão norteamericana no pósguerra em 1949 Com a área de moeda inconversível ocorrem superávits em 1947 e 1948 e razoável equilíbrio entre 1949 e 1951 Notese porém que outro fator explicativo importante do resultado obtido na balança comercial coube à recuperação dos preços internacionais do café a partir de 1949 De janeiro de 1942 a julho de 1946 os preços do produto estavam limitados pelo teto estabelecido no Acordo Interamericano do Café 134 centavos de dólar por libra peso para o café tipo Santos 4 configurando a participação brasileira no esforço de guerra no plano econômico A liberação dos preços nos Estados Unidos em julho de 1946 marcou o início da recuperação do preço internacional A alta iniciada o Santos 4 chegou a 276 centslibra em fevereiro de 1947 porém encontrou o mercado norte americano com estoques substanciais e na posse de grande número de contratos a termo o que amorteceu e por fim ocasionou reversão da tendência dos preços Em julho de 1947 a cotação voltou a atingir 1825 centslibra A partir daí o movimento é lento mas firmemente ascencional A produção havia sido comprimida pelo longo período de preços baixos e pelas fortes geadas de 1947 e 1948 enquanto o consumo principalmente americano era crescente Em 1948 o Departamento Nacional do Café anunciou a venda de seus estoques remanescentes O impacto sobre os preços entretanto foi contrarrestado pela forte queda dos preços agrícolas nos Estados Unidos em janeiro de 1949 que não abalou duradouramente a cotação do café mas agiu contra sua elevação ao alastrar a insegurança pelo mercado mundial motivado pelo início da recessão que embora moderada foi interpretada na época como primeiro sintoma de grave crise econômica Além disso o sigilo e a incerteza que cercaram a venda final dos estoques do DNC que não divulgou o montante exato das disponibilidades a serem postas à venda fizeram com que sua avaliação só fosse realizada a posteriori Os importadores americanos hesitavam em refazer seus estoques na expectativa de uma grande colheita em 1949 Em setembro de 1949 com a desvalorização da libra esterlina passaram a contar com a desvalorização do cruzeiro e sustaram suas operações permitindo substancial redução líquida de seus estoques Assim quando em outubro de 1949 o governo brasileiro anunciou que não só manteria a paridade do cruzeiro como também que não possuía mais estoques de café passaram a efetuar grandes compras precipitando a alta dos preços em um mercado que durante cerca de três décadas estivera sujeito à superprodução Outro resultado da manutenção da taxa cambial foi a perda de competitividade das exportações brasileiras principalmente em relação aos mercados europeus devido às desvalorizações de 1949 mas também em geral dada a inflação interna As exportações outras que não café contraíramse significativamente entre 1947 e 1950 ver Tabela 52 Atribuir o fraco desempenho das exportações brasileiras exclusivamente à sobrevalorização do cruzeiro é entretanto simplificação perigosa na medida em que se desconsidera toda uma gama de outras causas a perda de competitividade naturalmente decorrente da progressiva reorganização da economia mundial após a guerra a decisão de evitar acúmulo de moedas inconversíveis com superávits comerciais nessa área e a opção por reduzir pressões inflacionárias através do aumento da oferta para consumo doméstico Tabela 52 Brasil Exportações e importações 19471950 US milhões Fonte IBGE Brasil em números 1960 Tentando fazer frente às dificuldades envolvidas na exportação o governo permitiu aos exportadores de produtos gravosos assim eram chamados os produtos sem condições de colocação no mercado exterior à taxa oficial de câmbio vender suas cambiais diretamente aos importadores a uma taxa de câmbio mais favorável o que equivalia a uma desvalorização implícita Essas operações denominadas vinculadas surgiram em 1948 por iniciativa de particulares e foram posteriormente regulamentadas e incentivadas pela Carteira de Exportação e Importação CEXIM entre outras razões porque ofereciam certa margem de defesa contra a desvalorização da libra esterlina seja no tocante à penetração de produtos brasileiros em mercados cuja moeda havia sido desvalorizada em linha com a libra seja com relação à competição em outros mercados visto que a desvalorização alcançara e favorecera regiões produtoras concorrentes do Brasil É evidente que nessas condições as únicas importações que se tornavam rentáveis para o importador eram as de bens de consumo duráveis para os quais havia permanente excesso de demanda O objetivo de colocação de gravosos foi colocado em segundo lugar diante das possibilidades abertas ao comércio importador e as operações vinculadas chegaram a movimentar 25 da compra e venda de cambiais no comércio exterior em 1950 Metade do valor das operações vinculadas realizouse na área do dólar As principais exportações foram cacau e derivados e madeiras exclusive pinho e as principais importações automóveis e geladeiras As importações permaneceram sob o sistema de controle e extremamente comprimidas Há indicações de que em 1949 começou a surgir novo posicionamento frente à questão das importações o sistema de licenças prévias passava a ser encarado conscientemente como instrumento de promoção de substituição de importações como se discutirá adiante Dado que a compressão das importações era extrema na área de moeda forte na área de moeda fraca expandiramse as importações tentando preencher as lacunas produziuse tensão em setores chave da economia nos quais o nível dos estoques estava tão reduzido que a escassez afetava a produção O aumento da capacidade de importar devido à elevação dos preços do café e a forte demanda contida por importações levaram o governo Dutra a iniciar certa liberalização na concessão de licenças para importar no segundo semestre de 1950 Como o prazo médio de vida útil dessas licenças ultrapassava nove meses entretanto essa liberalização só repercutiu em parte no nível de importações desse semestre que cresceu 60 em relação ao primeiro permanecendo as licenças não utilizadas válidas para 1951 3 Substituição de importações e crescimento industrial Embora o sistema de controle das importações tenha sido instituído em meados de 1947 com o intuito exclusivo de fazer frente ao desequilíbrio externo procurando racionar e dar melhor uso à moeda estrangeira disponível terminou por ter grande importância para o crescimento da indústria no pósguerra Uma avaliação mais atenta dessa importância deve considerar que o controle teve diferentes fases através das quais foi sendo crescentemente utilizado com a finalidade de promoção do desenvolvimento industrial por substituição de importações A adoção do regime de orçamento de câmbio com licença em março de 1949 juntamente com o aumento da disponibilidade de divisas decorrentes dos preços do café parece ter sido um marco importante nesse processo por possibilitar maior coordenação entre a verificação das disponibilidades de câmbio e a emissão de licenças de importação Paralelamente na medida em que eram apreendidos os efeitos do contingenciamento sobre a substituição de importações de bens duráveis parecia surgir uma nova mentalidade embora o texto legal que instituiu o regime de licença prévia não estabelecesse explicitamente o princípio da proteção à indústria reconhecia e consagrava no caso de serem semelhantes ou equivalentes os produtos importados e os de fabricação nacional a base das restrições ao licenciamento de importações CEXIM Relatório 1951 Mantinhase a taxa de câmbio sobrevalorizada e progressivamente impunhamse medidas discriminatórias à importação de bens de consumo não essenciais e daqueles com similar nacional daí resultou um estímulo considerável à implantação interna de indústrias substitutivas desses bens de consumo sobretudo os duráveis que ainda não eram produzidos dentro do país e passaram a contar com uma proteção cambial dupla tanto do lado da reserva de mercado como do lado do custo de operação Esta foi basicamente a fase da implantação das indústrias de aparelhos eletrodomésticos e outros artefatos de consumo durável Tavares 1972a p 71 Esse comentário diz respeito ao período que vai de 1947 a 1952 Em particular o surto de importações em 1951 e 1952 cujas causas serão analisadas na seção seguinte permitiu a superação dessa etapa do processo de substituição de importações Embora sejam anos pertencentes já ao segundo governo de Getúlio Vargas 19511954 é válido transcrever aqui a observação do relatório da Comissão Mista BrasilEstados Unidos CMBEU a respeito A importação simultânea de volume sem precedentes de bens de capital tal como em 1951 e 1952 permitindo a criação conjunta ou expansão de indústrias complementares que se fornecem reciprocamente mercado pode em determinadas circunstâncias constituir método mais eficaz de se atingir crescimento industrial rápido do que por meio do fluxo anual de importações mais regulares e ordenadas CMBEU 1954 p 115 Podese apontar a existência de três efeitos relacionados à combinação de taxa de câmbio sobrevalorizada resultado de sua manutenção à taxa de Cr1850US em período de inflação doméstica enquanto no mercado livre a taxa era 76 maior em 1950 com controle de importações efeito subsídio associado a preços relativos artificialmente mais baratos para bens de capital matérias primas e combustíveis importados efeito protecionista através das restrições à importação de bens competitivos e efeito lucratividade resultante do fato de que a taxa de câmbio sobrevalorizada tendeu a alterar a estrutura das rentabilidades relativas no sentido de estimular a produção para o mercado doméstico em comparação com a produção para exportação Com relação a esse último ponto vale notar que o argumento não é válido para o principal setor exportador o cafeeiro de fato não obstante uma alta taxa de transferência de recursos do setor café para o setor de produção doméstica desde o imediato pósguerra até meados dos anos 1950 o preço em dólares do café nesse período aumentou de uma tal maneira que não somente compensou o efeito da transferência de recursos como permitiu ao café tornarse uma área com atrativos crescentes para novos investimentos Bacha 1975 p 139 Finalmente é preciso observar que esses investimentos em substituição de importações foram possíveis também graças à política de crédito do Banco do Brasil O crédito real à indústria cresceu 38 19 28 e 5 nos anos de 1947 1948 1949 e 1950 respectivamente Em particular os dados de 1947 e 1948 são significativos pois nesses anos como veremos adiante o governo estava fortemente empenhado em adotar políticas austeras É preciso relativizar portanto a ideia de que o governo Dutra abandonou as políticas de governo e ações diretas voltadas para a promoção do desenvolvimento industrial Na verdade o governo Dutra revela de certo modo sua preocupação em dar seguimento à acumulação industrial e à manutenção dos investimentos iniciadas no Estado Novo particularmente a Companhia Siderúrgica Nacional Isto se revela tanto no momento em que libera as importações entre outras razões para satisfazer a demanda reprimida de bens de capital e matériasprimas da indústria nacional como após a instalação do controle quando este evolui paulatinamente no sentido de introduzir critérios de seletividade Quando o controle foi criado não se visava nem se percebia a sua importância para o processo de industrialização A única iniciativa de intervenção planejada do Estado para o desenvolvimento econômico porém foi o Plano Salte tentativa de coordenação dos gastos públicos visando essencialmente os setores de saúde alimentação transporte e energia prevendo investimentos para os anos de 1949 a 1953 A principal dificuldade do Plano Salte foi a inexistência de formas de financiamento definidas Já se discutiu a problemática do setor externo no setor interno a base parlamentar do governo no Congresso Nacional onde se discutiu o Plano era predominantemente liberal Aprovado pelo Congresso apenas em 1950 o Plano Salte teve implementação fragmentária e foi oficialmente abandonado em 1951 Deuse também prosseguimento à organização da Companhia Hidroelétrica do São Francisco foram criadas a Comissão do Vale do São Francisco e a Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia prevista na Constituição de 1946 e que só foi constituída de fato em 1953 Sem procurar negar a indubitável hegemonia das ideias liberais no governo Dutra a relativa negligência com a industrialização do Brasil nem a deliberada intenção de diminuir a intervenção do Estado na economia contrapartidas da ênfase nas metas de estabilização e contenção dos investimentos governamentais é preciso qualificar essas posições e situálas no contexto da época reconhecendo também que o componente militar da base da sustentação política de Dutra era fundamentalmente o mesmo do Estado Novo e não havia abandonado suas preocupações estratégicas com o aparelhamento econômico da nação 4 Relações internacionais e movimento de capitais O governo Dutra havia apoiado os projetos de desenvolvimento do país nas suas esperanças de captação de recursos externos através da assistência financeira oficial dos Estados Unidos e no futuro afluxo de capitais privados internacionais Desde o imediato pósguerra entretanto os interesses e a posição norteamericana sobre industrialização no Brasil mudam completamente e começa a tornar se progressivamente clara a natureza ilusória das expectativas brasileiras com relação à assistência financeira norteamericana Como não podia deixar de ser a política externa dos Estados Unidos reflete o fato de suas prioridades estarem centradas em outras partes de mundo particularmente na Europa Já em 1946 tornavase pública a posição de considerar que as necessidades de capital dos países da América Latina deveriam ser supridas principalmente por fontes privadas de financiamento devendo o Brasil ter presente segundo o governo norteamericano que seu desenvolvimento dependeria em última instância da habilidade de criar clima favorável ao ingresso de capitais privados Malan 1984 p 634 Tal política foi sendo paulatinamente explicitada o que se dava em parte em reação à intensidade crescente das solicitações brasileiras Estas refletiam preocupação não apenas com os graves pontos de estrangulamento em transporte e energia mas também com a deterioração do balanço de pagamentos a curto prazo que os preços do café só eliminariam e temporariamente a partir de 1949 Momento importante na definição dessa política foi o relatório da Comissão Técnica Mista BrasilEstados Unidos mais conhecida como Missão Abbink constituída em 1948 Nele se preconizava que o programa de desenvolvimento brasileiro deveria basearse em três pontos a reorientação dos capitais formados internamente o aumento médio de produtividade e o afluxo de capitais estrangeiros Centrava se a análise desse terceiro ponto nas medidas internas necessárias para viabilizar a atração de capitais privados internacionais Na verdade entretanto o relaxamento das restrições à saída de divisas do Brasil derivado do compromisso com a ideologia liberal e com o projeto norteamericano de uma economia mundial aberta não levava em conta a existência de fatores que dificultavam o afluxo e favoreciam um movimento de saída líquida de capitais Em primeiro lugar o fluxo de capitais privados internacionais permanece em níveis muito baixos até meados da década de 1950 Em segundo lugar o objetivo dos Estados Unidos era eliminar as restrições ao comércio internacional Permaneciam em vigor estritos controles sobre os fluxos financeiros internacionais o que ausentes linhas organizadas de crédito criaria um problema de liquidez mundial somente resolvido no pósguerra através da União Europeia de Pagamentos UEP e de ajuda financeira norteamericana relacionada ao Plano Marshall e a gastos militares Em terceiro lugar parte da saída de divisas devese obviamente à manutenção de uma taxa de câmbio sobrevalorizada e à expectativa de alteração dessa taxa devido ao equilíbrio forçado no balanço de pagamentos desde 1948 estimulada pela desvalorização da libra esterlina e outras moedas em 1949 e pela proximidade da posse de novo governo Em quarto lugar cabe considerar também que em decorrência do investimento direto ocorrido nestes anos e anteriores e concomitante aumento do estoque de capital estrangeiro no país particularmente se se leva em conta os desinvestimentos britânicos então realizados é natural que ocorresse também algum aumento nas remessas das rendas desses investimentos O primeiro indício de que a posição norteamericana com relação ao financiamento de programas de desenvolvimento para o Terceiro Mundo poderia ser alterada é dado no discurso de posse de Truman em janeiro de 1949 Nele são propostas quatro linhas de ação para a política externa norteamericana sendo o quarto ponto o compromisso de tornar o conhecimento técnico norteamericano disponível para as regiões pobres do mundo Em junho de 1949 um projeto de lei com solicitação de verba apenas US45 milhões apoiado no ponto IV do discurso foi encaminhado ao Congresso que o aprovou apenas um ano depois reduzindo os recursos para US345 milhões A aprovação do Act of lnternational Development parecia não ter maior importância quando o início das hostilidades na Coreia em 1950 colocou diante do governo dos Estados Unidos a necessidade de olhar com atenção e reconquistar apoio em regiões do mundo que vinham sendo negligenciadas por sua política externa entre as quais a América Latina Em consequência no final do governo Dutra foram iniciadas as gestões a partir da vitória de Vargas nas eleições de outubro de 1950 conduzidas já por futuros auxiliares seus como Horácio Lafer e João Neves da Fontoura para obtenção de ajuda financeira do Banco Mundial e do Eximbank norteamericano para projetos na infraestrutura econômica culminando com a constituição da Comissão Mista BrasilEstados Unidos em dezembro de 1950 Vianna 1987 seções 21 e 31 5 Política econômica interna A política econômica doméstica do governo Dutra pode ser definida até 1949 como marcadamente ortodoxa A inflação que chegara a 206 e 149 em 1944 e 1945 respectivamente é identificada como o principal problema a ser enfrentado e diagnosticada oficialmente como derivada de excesso de demanda a ser eliminado através de política monetária contracionista que reduzisse o dispêndio privado e de política fiscal austera que acabasse com os déficits orçamentários que vinham sendo acumulados nos últimos 20 anos No primeiro ano de governo contudo sob a gestão do ministro Gastão Vidigal na pasta da Fazenda fevereiro a outubro de 1946 ocorre um enorme déficit no orçamento da União em função de um aumento de vencimentos e salários do funcionalismo público muito acima do programado A consequência dessa substancial elevação das despesas de consumo foi claramente expressa na mensagem presidencial de 1947 Viuse assim o governo compelido a adotar uma política de moderação dos gastos públicos com prejuízos em muitos casos da execução de empreendimentos reclamados pela nossa evolução econômica e social Voltouse então o governo na gestão de Correa e Castro na Fazenda outubro de 1946 a junho de 1949 para o exercício de políticas fiscais e monetárias severamente contracionistas contendo fortemente o investimento público e reduzindo as emissões de moeda praticamente a zero em 1947 Nesse ano obtémse pela primeira vez desde o fim da República Velha um pequeno superávit no Orçamento da União o PIB cresce apenas 24 e a inflação medida pelo deflator implícito do PIB recua para 9 Notese pela Tabela 53 que incluídos os estados e o Distrito Federal continua a haver um déficit global de Cr688 milhões consideravelmente menor entretanto que o do ano anterior A política de crédito do Banco do Brasil por sua vez esteve alinhada à política fiscal com uma contração real de 2 Tabela 53 Brasil Finanças públicas 19391952 Cr milhões Fonte Malan Bonelli Abreu e Pereira 1977 p 217 Apesar da mensagem presidencial de 1947 considerar a reforma tributária como assunto de inadiável execução o que permitiria que o ajuste das finanças públicas não se fizesse exclusivamente às custas de redução dos gastos governamentais a oposição do setor empresarial e as dificuldades políticas para tramitação de proposta desse teor no Congresso Nacional forçaram o abandono do tema Em 1948 as autoridades econômicas deram prosseguimento à política fiscal contracionista obtendo equilíbrio no orçamento da União enquanto o déficit de estados e Distrito Federal mantevese aproximadamente constante A política monetária contudo foi pressionada pela expansão do crédito do Banco do Brasil presidido por Guilherme da Silveira que em 1948 apresentou crescimento real de 4 voltado principalmente para o financiamento à indústria A inflação fica em 59 e o PIB cresce 97 puxado basicamente pelo crescimento industrial calcado na compressão das importações na existência de crédito e na baixíssima base do ano anterior quando a indústria praticamente não cresceu De qualquer forma é importante notar que em função da ampliação da margem de autonomia estadual derivada da mudança de regime político e conferida pela Constituição liberal de 1946 os desequilíbrios financeiros dos estados passaram a ter importância crescente fazendo com que em 1947 e 1948 por exemplo os déficits dos orçamentos estaduais principalmente São Paulo superassem em muito os superávits da União frustrando parcialmente o grau de contração fiscal pretendido por Correa e Castro Além disso a análise do financiamento dos déficits ou a utilização dos superávits nos orçamentos governamentais deve ser integrada à discussão das políticas monetária e creditícia o que requer no caso do Brasil das décadas de 1940 e 1950 um detalhado exame do papel do Banco do Brasil e de suas diferentes funções como agente econômico Sochaczewski 1993 p 117162 e Malan Bonelli Abreu e Pereira 1977 p 22851 A substituição de Correa e Castro justamente por Guilherme da Silveira que foi ministro de junho de 1949 a janeiro de 1951 marca um ponto de inflexão pouco estudado na política econômica do governo Dutra O fato é que em 1949 gerouse um enorme déficit no orçamento da União enquanto o dos estados e Distrito Federal pouco decresceu resultando um déficit global quase 200 maior que o de 1948 em termos reais Em 1950 o desequilíbrio orçamentário agravouse ainda mais com um formidável crescimento do déficit tanto da União como dos estados e Distrito Federal ver Tabela 53 não havendo emissão líquida de títulos ou obrigações O crédito do Banco do Brasil cresceu em termos reais cerca de 70 e 50 em 1949 e 1950 respectivamente sendo direcionado principalmente como já mencionado para a indústria A política monetária como não podia deixar de ser corroborou esses movimentos e a inflação cresceu para 81 e 92 em 1949 e 1950 respectivamente É possível apontar pelo menos três motivações para essa reversão na política econômica dos últimos dois anos de governo Em primeiro lugar a proximidade das eleições presidenciais provocava um forte apelo para o aumento dos gastos da União e dos estados Em segundo lugar na medida em que a combinação de câmbio sobrevalorizado com controle de importações resultava em vigorosos investimentos na indústria de bens de consumo duráveis aumentava a força e a demanda do setor industrial assim como a consciência do governo sobre este processo gerando uma ativa política de crédito para a indústria por parte do Banco do Brasil Em terceiro lugar a desvalorização da libra esterlina e outras moedas em 1949 e o surgimento da UEP favoreciam a compreensão de que haveria uma lenta transição em direção à livre conversibilidade das moedas base indispensável ao surgimento de um movimento de capitais privados mais intenso no mundo As últimas ilusões liberais do governo Dutra esfumaçaramse e com elas as razões para uma adesão estrita à ortodoxia econômica tal como se depreende das seguintes palavras do ministro Guilherme da Silveira Ministério da Fazenda Relatório 1949 p 21 tornadas públicas no início de 1951 Aos ortodoxos se afigurará talvez que Vossa Excelência deveria ter evitado as emissões de papelmoeda mas eu asseguro a Vossa Excelência que essas emissões financiaram muitos investimentos indispensáveis ao desenvolvimento econômico do país Não poderia Vossa Excelência conter o ímpeto de crescimento do país para se enquadrar em postulados financeiros que a evolução do mundo vai desmoronando Finalmente embora a discussão sobre a natureza da inflação nesses anos fuja aos propósitos deste capítulo não há como deixar de anotar que na explicação da reaceleração inflacionária a partir de 1949 devem ser considerados também os argumentos da tradição estruturalista em alguns aspectos essenciais 1 a pressão do processo de industrialização e urbanização sobre a oferta relativamente rígida de produtos agrícolas devido à estrutura fundiária levando à alteração de preços relativos em favor da agricultura que se reflete em aumento generalizado de preços 2 a pressão inflacionária derivada da elevação dos preços de exportação e 3 o esgotamento relativo das margens de capacidade ociosa na indústria e na economia em termos globais3 A oferta interna já havia perdido toda a capacidade de absorver aumentos de procura mobilizando estoques ou intensificando a curto prazo a utilização da capacidade produtiva O final do governo Dutra pode ser caracterizado portanto no setor interno pela retomada do crescimento do processo inflacionário e pela recorrência do desequilíbrio financeiro do setor público e no setor externo pelas expectativas favoráveis decorrentes da elevação dos preços do café e da mudança de atitude do governo norte americano em relação ao financiamento dos programas de desenvolvimento do Brasil 1As discrepâncias em relação aos dados do Anexo Estatístico coluna 19 refletem reestimativas das reservas totais pelo Banco Central do Brasil Estas reestimativas não incluem entretanto a decomposição das reservas tal como apresentada na Tabela 51 2Para uma descrição da evolução formal dos controles de câmbio entre 1947 e 1953 ver Huddle 1964 3Para uma resenha sintética e referências bibliográficas relativas à tradição estruturalista ver Lopes em Sayad 1979 CAPÍTULO 6 Duas tentativas de estabilização 19511954 Sérgio Besserman Vianna 1 Introdução A política econômica do segundo governo de Getúlio Vargas tem sido frequentemente apresentada como resultado seja de uma estratégia abrangente e bem definida de desenvolvimento econômico que tivesse como finalidade um modelo alternativo para o capitalismo brasileiro seja como consequência do confronto entre estratégias distintas ortodoxia versus nacionalismo eou posições antagônicas no interior do governo pastas da Fazenda e do Exterior versus assessoria econômica da Presidência Na verdade as iniciativas governamentais no campo econômico neste período só são compreensíveis a partir de dois condicionantes Por um lado a conjuntura herdada do governo Dutra Esta pode ser sumariada no setor interno pela retomada do processo inflacionário e pela recorrência do desequilíbrio financeiro do setor público e no setor externo pelas expectativas favoráveis decorrentes da elevação dos preços do café e da mudança de atitude do governo norte americano em relação ao financiamento dos programas de desenvolvimento do Brasil Por outro lado e esse é o ponto fundamental a política econômica foi determinada em consonância com um projeto de governo bem definido que tornava possível a articulação e hierarquização de forças políticas e interesses divergentes em torno da ação governamental O projeto consistia em linhas gerais na ideia de dividir o governo em duas fases na primeira haveria a estabilização da economia o que na visão ortodoxa das autoridades econômicas de então consistia fundamentalmente em equilibrar as finanças públicas de modo a permitir a adoção de uma política monetária restritiva e dessa forma acabar com a inflação A segunda fase seria a dos empreendimentos e realizações O projeto portanto sustentavase sobre duas pernas o saneamento econômicofinanceiro isto é o sucesso da primeira fase e o afluxo de capital estrangeiro para financiamento de projetos industriais de infraestrutura Devido à similitude com o ocorrido nos primeiros governos republicanos da virada do século esse projeto foi comparado pelo ministro da Fazenda Horácio Lafer por Oswaldo Aranha e pelo próprio Presidente Vargas na Mensagem ao Congresso Nacional de 1951 aos governos Campos Sales e Rodrigues Alves Os objetivos da política monetária e fiscal perseguidos pelas autoridades econômicas no primeiro biênio do governo 195152 correspondem ao primeiro pilar desta estratégia como será visto O outro pilar do projeto traçado foi a formação da Comissão Mista BrasilEstados Unidos CMBEU No discurso de posse de Truman em janeiro de 1949 através de seu ponto IV foram dadas as primeiras indicações de mudança na posição norteamericana em relação ao financiamento de programas de desenvolvimento para o Terceiro Mundo Particularmente no caso do Brasil a vitória de Getúlio Vargas nas eleições de outubro de 1950 parece ter acelerado a disposição norte americana de colaborar com o vasto programa de equipamento e expansão de setores de infraestrutura básica que o governo brasileiro vinha propondo insistentemente desde o final da guerra Assim é que em dezembro de 1950 ainda antes da posse de Vargas foi constituída a CMBEU que iniciou suas atividades em julho de 1951 e que representava uma mudança qualitativa fundamental na posição norte americana na medida em que se propunha a elaborar projetos concretos que deveriam ser financiados por instituições como o Banco de Exportação e Importação Eximbank e o Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento Banco Mundial A própria montagem do projeto Campos SalesRodrigues Alves e da equipe de governo esteve ligada aos entendimentos para a formação e atuação da CMBEU Vianna 1987 seção 213 A CMBEU era fundamental para o sucesso da segunda fase do projeto do governo por duas razões primeiro porque o financiamento dos projetos por ela elaborados pelo Banco Mundial e pelo Eximbank asseguraria a superação de gargalos na infraestrutura econômica do país marcadamente nos setores de energia portos e transportes fornecendo simultaneamente as divisas absolutamente necessárias para essa finalidade Ao mesmo tempo a desobstrução desses pontos de estrangulamento poderia propiciar uma significativa ampliação do fluxo de capital dirigido para o Brasil através de investimentos diretos ou mesmo novos empréstimos feitos por estas duas instituições Segundo porque o afluxo de capital estrangeiro permitiria tal como no governo Rodrigues Alves que se cumprisse a fase das realizações e empreendimentos sem prejuízo da manutenção de uma política econômica austera e ortodoxa O que permitiu a convivência hierarquização e divisão de tarefas entre setores do governo com visões diferentes sobre questões conjunturais e de princípios foi o projeto de realizar num único período de governo as virtudes idealizadas do período Campos Sales Rodrigues Alves A evolução da situação cambial e posteriormente a modificação no quadro das relações BrasilEstados Unidos provocaram a crise desse projeto 2 Rumo ao colapso cambial 19511952 A política econômica externa Quando o governo Vargas iniciou as perspectivas da economia do ponto de vista das transações com o exterior eram animadoras Além do novo quadro de relações com os Estados Unidos consubstanciado na formação da CMBEU a situação das transações comerciais externas era também bastante favorável graças à elevação do preço internacional do café iniciada em agosto de 1949 A política de comércio exterior dos dois primeiros anos do governo Vargas manteve a taxa de câmbio fixa e sobrevalorizada e o regime de concessão de licenças para importar Houve entretanto extremo relaxamento na política de concessão dessas licenças nos primeiros sete meses de governo Essa orientação foi sendo modificada progressivamente na medida em que ficam evidentes os graves desequilíbrios acarretados na balança comercial A literatura que trata desse assunto vê na melhoria das condições externas o fator que possibilitou a liberalização das importações mas a explica quase exclusivamente pelo receio de generalização da Guerra da Coreia em conflito mundial e da lembrança das dificuldades de abastecimento de produtos essenciais vividas pelo país durante a Segunda Guerra Mundial Embora seja indiscutível o peso da Guerra da Coreia na decisão de afrouxar o licenciamento das importações a análise tanto da pauta de importações quanto da cronologia da política de importações visàvis à cronologia da tensão militar no mundo exige a qualificação desse ponto Vianna 1987 seção 221 Na verdade a extensa liberalização na política de concessão de licenças para importar deve ser explicada com base nos seguintes fatores conjunturais na ordem de importância i persistência de séria pressão inflacionária interna e de aguda propensão a importar ii abastecimento precário do mercado interno no que tange a produtos importados devido às restrições cambiais de importações aplicadas com crescente severidade desde 1948 até meados de 1950 e afrouxadas apenas parcialmente em seguida à melhoria da posição cambial em fins de 1950 iii perspectiva decrescente de escassez internacional de matériasprimas e equipamento importável em função da expansão dos programas armamentistas iv perspectivas favoráveis da evolução das exportações dos principais produtos v posição cambial temporariamente favorável CEXIM Relatório 1951 O importante papel antiinflacionário atribuído à expansão das importações é facilmente compreensível no contexto do ortodoxo pensamento econômico das autoridades da época A inflação era explicada pela expansão dos meios de pagamento que no caso brasileiro chocavase com uma oferta relativamente inelástica no mercado interno agravada pela escassez de oferta de bens de produção que tornava a melhoria de produtividade dependente de importações Nessas condições a acumulação de amplos saldos de exportação desacompanhada de medidas fiscais de esterilização monetária de difícil e lenta adoção ou de uma contrapartida adequada de importações constituiria sério fator de inflação a se somar ao déficit orçamentário e à expansão creditícia ocorridos em 1950 CEXIM Relatório 1951 Afora isso a melhoria da situação cambial impulsionava fortemente no sentido de atendimento à demanda reprimida de bens importáveis ocasionada pelo forte controle instituído a partir de 1948 O primeiro semestre de 1951 encerrouse com importações totais de US860 milhões sendo US449 milhões em moedas conversíveis As exportações totais foram de US827 milhões ficando o saldo com a área conversível limitado a US40 milhões O impacto sobre a posição cambial foi violento no tocante à redução das reservas em moedas conversíveis o que se explica pela necessidade de financiar nessas moedas a maior parte dos encargos do balanço de pagamentos referentes à conta de serviços e capitais ver Tabela 61 As reservas em dólar que em março eram de US162 milhões em julho estavam reduzidas a US43 milhões Em 1 de agosto de 1951 o Conselho da Superintendência da Moeda e do Crédito SUMOC define instruções para que a CEXIM reintroduza um regime mais severo de licenciamento Tabela 61 Brasil Comparação entre importações CIF e exportações FOB e licenciamento das importações 19501952 Cr bilhões Fonte Banco do Brasil Relatório 1952 Apesar disso a média mensal de licenciamentos entre agosto e dezembro permaneceu relativamente elevada Como a posição cambial do país continuou se agravando as reservas em dólar tornaramse negativas em US27 milhões em dezembro os licenciamentos foram novamente apertados no início de 1952 e voltaram aos níveis dos períodos de maior controle de importações a partir do segundo semestre desse ano ver Tabela 61 O que tem iludido muitos observadores da balança comercial brasileira nesse período é a defasagem existente entre a política de licenciamento do governo e as importações efetivas derivada do fato de as licenças possuírem vida útil entre seis meses para bens supérfluos e um ano para bens de produção exigindo prazo extenso portanto para que as decisões de restringir a concessão de licenças se refletissem nas estatísticas de importação Em 1951 a balança comercial importações e exportações FOB apresentou um pequeno superávit de US442 milhões Já em 1952 ocorreram dois movimentos Por um lado apesar do aperto na concessão de licenças a defasagem notada no parágrafo anterior assim como o gasto adicional de cerca de US155 milhões com a compra de trigo nos Estados Unidos por causa de uma seca na Argentina fizeram com que o valor das importações permanecesse inalterado US17203 milhões Por outro lado a receita das exportações caiu 20 em comparação com 1951 Foram três as causas principais dessa queda Em primeiro lugar os efeitos da sobrevalorização do cruzeiro e das pressões inflacionárias internas Em segundo lugar uma crise da indústria têxtil mundial que paralisou as vendas do segundo produto de exportação o algodão Finalmente a expectativa generalizada de desvalorização cambial induziu os exportadores a reterem estoques Em consequência da retração das exportações a participação do café nas vendas externas subiu para 74 enquanto em 1951 não atingira 60 O equilíbrio de 1951 deu lugar a um déficit na balança comercial de US3021 milhões ao esgotamento das reservas internacionais particularmente as conversíveis e ao acúmulo de atrasados comerciais superiores a US610 milhões sendo US494 milhões em moedas conversíveis A continuidade do surto de importações e a retração das exportações em 1952 não teriam provocado esses efeitos se as outras fontes de entrada e saída de divisas não operassem na mesma direção A principal fonte de saída de divisas fora da balança comercial eram os fretes pagos na compra e venda de mercadorias O boom de importações e o desaparelhamento dos portos fez com que fosse comum a cobrança de pesadas sobretaxas O aporte de recursos sob a forma de empréstimos e financiamentos assim como a entrada de investimentos diretos foram extremamente baixos embora o Brasil no quadro geral de escassez desses fluxos de capital estivesse longe de ser desfavorecido Vianna 1987 seção 223 A crise cambial de 1952 portanto tem origem na perda temporária de controle sobre o comércio exterior decorrente da defasagem existente entre a concessão de licenças e a efetivação das importações e em uma série de fatos não previstos pelas autoridades econômicas tais como a crise da indústria têxtil mundial e consequente queda vertiginosa das exportações de algodão a forte retração das demais exportações com exceção do café o gasto de dólares na aquisição de trigo dos Estados Unidos por causa da quebra da produção argentina despesas adicionais com fretes e imposição de sobrepreços nas importações como consequência do próprio crescimento dos atrasados comerciais chegando às vezes a 25 O baixo nível de influxo de capital estrangeiro não ajudou a minorar as dificuldades A crise cambial correspondeu à fratura de uma das pernas que deveria sustentar o projeto Campos SalesRodrigues Alves A política econômica doméstica e o desempenho da economia Com a definição do projeto de governo e a entrega do comando da economia a autoridades de pensamento econômico essencialmente ortodoxo os objetivos da política econômica no que deveria ser a fase Campos Sales do governo ficaram imediatamente delineados tratava se de comprimir severamente as despesas governamentais aumentar na medida do possível a arrecadação adotar políticas monetária e creditícia contracionistas Desse ponto de vista três eram os obstáculos visíveis a serem superados 1 a presença de Ricardo Jafet indicado por Ademar de Barros que apoiou Vargas na campanha eleitoral na presidência do Banco do Brasil o que deixava a execução da política de crédito fora do controle da área do Ministério da Fazenda 2 a impossibilidade de alterar o sistema tributário para o exercício de 1951 e de qualquer modo as imensas dificuldades políticas para aprovar no Congresso Nacional qualquer majoração de impostos 3 conter as despesas do governo ainda mais no contexto do orçamento proposto e aprovado ainda no final do governo Dutra As despesas do setor público em 1951 foram efetivamente reduzidas Em particular os gastos de investimento foram cortados tendo o investimento público decrescido cerca de 3 em termos reais A participação do governo na formação bruta de capital fixo que em 1950 fora de 284 em 1951 caiu para 203 embora a maior parte dessa queda fosse devida ao crescimento do investimento privado propiciado pelo surto de importações de bens de capital O resultado orçamentário da União em 1951 foi ainda mais afetado pelo aumento da arrecadação 42 superior à de 1950 e 34 superior à receita prevista Além da inflação e do crescimento real da economia o aumento da receita deveuse por um lado à melhoria da eficiência do sistema arrecadador e por outro ao extraordinário crescimento das importações A combinação da contenção das despesas da União com o grande aumento da receita e com a orientação imprimida pelo governo federal aos estados e Distrito Federal cujo déficit foi significativamente reduzido levou ao primeiro superávit global da União e estados desde 1926 A orientação fiscal do governo foi mantida em 1952 O superávit no orçamento da União foi praticamente igual ao obtido no ano anterior Não foi possível entretanto repetir a performance no orçamento dos estados Distrito Federal e municípios devido principalmente ao estouro do déficit de São Paulo O déficit global foi quase 25 vezes maior que o superávit da União ver Tabela 62 no capítulo anterior Tabela 62 Brasil Taxas médias de câmbio sob o regime da Instrução 70 outubro de 1953 a dezembro de 1954 CrUS 1953 1954 Taxa oficial 1882 1882 Taxa do mercado livre 4332 6218 Leilões de importação Categoria I 3177 3955 Categoria II 3818 4463 Categoria III 4421 5772 Categoria IV 5213 5670 Categoria V 7890 10874 Taxas de exportação Café 2336 Demais produtos 2836 Outubrodezembro exceto mercado oficial e livre De 91053 a 15854 Fonte Simonsen 1962 p 53 A política monetária acompanhando a fiscal foi também conduzida ortodoxamente A política creditícia do governo entretanto moveuse na direção contrária A conjugação da multiplicidade de funções próprias do Banco do Brasil nessa época com a visão econômica distinta da ortodoxa e dos interesses representados por Ricardo Jafet na presidência do banco e mais uma série de fatores advindos da conjuntura econômica nesses dois anos fizeram com que a redução dos empréstimos do Banco do Brasil ao Tesouro Nacional e ao sistema bancário comercial autorizada pelo superávit orçamentário fosse mais do que compensada com a expansão do crédito às atividades econômicas Os fatores que avalizaram a expansão do crédito do Banco do Brasil foram dois em 1951 obviamente a recuperação de parte das disponibilidades antes imobilizadas em empréstimos ao setor público em 1952 eis o ponto mais interessante somouse a este em função do acúmulo de atrasados comerciais o aumento nos depósitos correspondentes aos débitos em divisas dos importadores o que facilitou ao banco grande aporte de recursos adicionais Notese que à parte o financiamento destinado à sustentação dos preços dos principais produtos exportáveis as mesmas causas que aumentaram as disponibilidades do Banco do Brasil pressionavam fortemente no sentido da expansão do crédito quais sejam a política fiscal pelo que implicou adiamento nos pagamentos e contratações de obras e serviços públicos as necessidades financeiras de estados e municípios especialmente em 1952 e o surto de importações cujos depósitos correspondentes ao saldo em divisas dos importadores retiraram de circulação cerca de 15 do numerário em poder do público Notese ademais que ao liberar as importações num momento de taxa de câmbio altamente sobrevalorizada houve forte incentivo ao investimento através da importação de bens de capital ainda mais numa conjuntura em que se tinha como certo o caráter provisório dessa medida e em que o processo de substituição de importações de bens duráveis com exceção de automóveis tinha tomado forte impulso desde 1948 devido à instituição do controle de importações Assim mais correto do que atribuir a origem do surto de investimentos à expansão do crédito é notar a articulação entre ambos com a demanda da importação de equipamentos pressionando o crédito e a expansão deste possibilitando a sua realização nos elevadíssimos níveis em que se deu A variação anual dos preços ao consumidor no Rio de Janeiro em 1951 e 1952 108 e 208 respectivamente revela manutenção da tendência de aceleração da inflação iniciada no final do governo Dutra Quanto ao desempenho da economia o PIB real cresceu 49 e 73 em 1951 e 1952 respectivamente O setor de serviços impulsionado pelo comércio importador foi o que apresentou as maiores taxas de crescimento A produção industrial afetada pela liberalização das importações apresenta as menores taxas anuais de crescimento desde 1947 Com relação à agricultura o pequeno crescimento de 1951 deve se fundamentalmente à estagnação da produção de café e à queda da produção de algodão e cacau Já em 1952 a produção agrícola para exportação cresce 17 em relação a 1951 Os dados significativos do período porém mais do que os relativos ao crescimento do produto são sem dúvida as elevadas taxas de investimento fomentadas pela liberalização de importações com taxa de câmbio sobrevalorizada e ajudadas pela expansão do crédito no período São alteradas substancialmente as participações dos setores privado e público em favor do primeiro nos investimentos totais realizados no país 3 A transição para o novo ministério No início de 1953 a conjuntura econômica estava dominada pelo colapso cambial do país Com atrasados comerciais acumulados em mais de US600 milhões e sem ter obtido êxito na redução da inflação em relação aos níveis existentes quando do começo do governo o projeto de sanear a situação econômicofinanceira para em seguida dar início a uma fase de empreendimentos parecia sofrer fortes abalos As dificuldades entretanto iriam aumentar ao mesmo tempo que o governo procurava negociar um empréstimo que lhe permitisse financiar os atrasados comerciais acumulados principalmente com os Estados Unidos o panorama das relações internacionais brasileiras modificavase por completo com a vitória do Partido Republicano e do general Eisenhower nas eleições de fins de 1952 e com a mudança na postura do Banco Mundial para com o Brasil A ideia de uma segunda fase do governo a fase Rodrigues Alves de realizações apoiavase na estabilização da economia e na ajuda financeira internacional consubstanciada no acordo da CMBEU Ao longo do primeiro semestre de 1953 esses dois pilares ruíram o que juntamente com movimentos sociais crescentemente mobilizadores e reivindicadores e com a reacomodação política derivada das eleições municipais de maio de 1953 levou o governo ao abandono do projeto inicial à decisão de sustentar o propósito de estabilização da economia e a uma reforma ministerial que visava recompor as suas bases de sustentação com vistas aos futuros embates político eleitorais Relações econômicas internacionais É conveniente em primeiro lugar afastar a versão corrente na historiografia que atribui a uma suposta virada nacionalista geralmente associada às posições de Vargas acerca das remessas de lucro para o exterior um papel decisivo nos desentendimentos do governo brasileiro com o governo norteamericano e o Banco Mundial sendo mesmo a causa do final precipitado da CMBEU Embora não seja possível realizar aqui um exame pormenorizado da questão das remessas de lucro Vianna 1987 seção 311 ou tecer maiores comentários sobre a substância do nacionalismo do segundo Vargas Vianna 1987 seção 52 é certo que a partir do janeiro de 1953 com a promulgação da Lei no 1807 conhecida como Lei do Mercado Livre que concedeu ampla liberdade de movimentos pelo mercado livre de câmbio ao capital estrangeiro no Brasil além de reconhecer plenamente o direito do reinvestimento a legislação brasileira para remessa de rendimentos tomouse das menos restritivas da América Latina fato do qual o governo brasileiro era consciente As causas que determinaram o encerramento da CMBEU e a interrupção do financiamento de seus projetos não devem ser buscadas numa suposta virada nacionalista do governo De fato as causas decisivas foram a mudança de governo nos Estados Unidos a tentativa do Banco Mundial de exercer uma função tutorial sobre a política econômica dos países demandantes de crédito assim como o conflito entre essa instituição e o Eximbank com inevitáveis reflexos sobre os países da América Latina em particular o Brasil e o colapso cambial do país que forneceu o pretexto para a mudança de atitude do Banco Mundial No final de 1952 o candidato do Partido Republicano general Eisenhower venceu as eleições presidenciais derrotando os democratas que há duas décadas governavam os Estados Unidos As duas mais importantes e imediatas modificações na política norte americana para a América Latina foram em primeiro lugar como desdobramento inevitável do acirramento da Guerra Fria o combate ao comunismo passou a merecer atenção prioritária Em segundo lugar foi abandonada a política do ponto IV de Truman Com relação ao Brasil logo ficou claro que o governo Eisenhower não manteria o financiamento aos projetos que a Comissão Mista fosse elaborando O governo norteamericano alegou necessidade de conter gastos e negou a existência de compromisso no sentido de fazêlo até um determinado limite Outra repercussão sobre o Brasil da vitória de Eisenhower foi a decisão do governo republicano de colocarse resolutamente em favor das postulações do Banco Mundial em seu conflito com o Eximbank Na verdade desde 1948 que o Banco Mundial já tinha a posição de que o Eximbank deveria fazer empréstimos de longo prazo para o desenvolvimento da América Latina apenas quando o Banco Mundial não quisesse ou não estivesse apto a realizálos As razões para esta posição eram de duas ordens Primeiro a taxa de juros do Eximbank era menor o que afastava tomadores de empréstimos do Banco Mundial Segundo empréstimos do Eximbank diminuíam a capacidade do Banco Mundial de tutelar a política econômica de governos da América Latina demandantes de crédito Embora fuja aos objetivos deste capítulo a análise das causas do conflito entre essas duas instituições é importante notar que ele reflete também uma disputa de interesses interna à sociedade norte americana Para a comunidade empresarial era importante por razões óbvias sustentar e defender a capacidade de operação do Eximbank Essa ligação fazia esse banco ter fortes laços e respaldo no Congresso dos Estados Unidos Já o Banco Mundial articulavase muito mais com a comunidade financeira de Nova York Esse processo teve importantes consequências para o Brasil Já se viu que o episódio das remessas de lucro embora tenha servido como estopim dos atritos entre o Banco Mundial e o governo brasileiro no início de 1952 não ultrapassou os limites desse papel Tampouco outras questões afetando interesses estrangeiros no Brasil como o monopólio do petróleo ou pendências acerca de ferrovias nacionalizadas levantadas por membros europeus do Banco Mundial parecem ter tido papel determinante embora certamente tenham constado da pauta dos contatos realizados Realmente decisiva foi a deterioração da situação cambial do país ao longo do ano de 1952 culminando com o acúmulo de vultosos atrasados comerciais A partir daí o Banco Mundial decidiu interferir na condução da política econômica por parte do governo brasileiro sentindose prejudicado nesse propósito pelas operações do Eximbank no Brasil O fortalecimento das posições do Banco Mundial pelo governo republicano afetou o Brasil de duas maneiras Em primeiro lugar permitiu a essa instituição forçar o Eximbank a adotar condições bastante duras para a concessão de um grande empréstimo em dólares que objetivava regularizar a situação dos atrasados comerciais O acordo para esse empréstimo foi assinado em 30 de abril de 1953 com o valor de US300 milhões A sua realização só foi possível considerando a oposição do Banco Mundial graças à pressão dos exportadores e de investidores norteamericanos no Brasil que tendo em vista a Lei do Mercado Livre de Câmbio desejavam evitar a concorrência entre a procura de dólares para remessa de rendimentos e aquela voltada para a obtenção de divisas com o objetivo de pagamento de atrasados Em segundo lugar as mudanças do governo norteamericano e da posição do Banco Mundial frente ao Brasil e a retirada do Eximbank das operações de financiamento ao desenvolvimento determinaram o fim da CMBEU e a interrupção do financiamento mesmo aos projetos já elaborados e apresentados por ela Ao interromper seus trabalhos a CMBEU tinha aprovado 41 projetos que exigiriam um total de US387 milhões dos quais foram financiados apenas US186 milhões sendo que quase um terço US60 milhões destinados a uma empresa estrangeira a Brazilian Traction Light Power Company Ltd de Toronto Conjuntura econômica e evolução do quadro social e político A conjuntura econômica no primeiro semestre de 1953 foi marcada pelos episódios relacionados ao empréstimo de US300 milhões obtido junto ao Eximbank para fazer frente aos atrasados comerciais e pelos desdobramentos principalmente na área do comércio exterior da Lei no 1807 a Lei do Mercado Livre O empréstimo acabou sendo concedido nas seguintes condições deveria ser integralmente amortizado em três anos com pagamentos mensais a partir de 30 de setembro de 1953 A taxa de juros foi de 35 ao ano e o Brasil comprometiase ademais a liquidar os restantes atrasados comerciais com os Estados Unidos não cobertos pelo empréstimo terminando de fazêlo até 31 de julho do ano corrente Quanto à Lei no 1807 na prática ela instituiu o sistema de taxas múltiplas de câmbio algumas das quais flutuantes A lei permitia para as exportações que não constituíssem mais de 4 do valor médio do total das exportações no período trienal anterior à operação realizar parte das divisas obtidas no mercado livre em diferentes proporções fazendo com que ficassem determinadas do lado da oferta cinco taxas de câmbio efetivas em primeiro lugar a taxa fixa do mercado oficial aplicada a mais de 85 das exportações embora limitada a três produtos café cacau e algodão em segundo lugar três taxas de câmbio flutuantes para as demais exportações que misturariam em diferentes proporções 15 30 e 50 a taxa oficial e a taxa do mercado livre que era aplicada nas transações financeiras com algumas exceções Do lado da demanda de câmbio existiam duas taxas em primeiro lugar a taxa oficial que seria utilizada para as importações essenciais cerca de 23 do valor total das importações serviços ligados a essas importações remessas financeiras do governo e outras entidades públicas ou semipúblicas rendimentos do capital estrangeiro considerado de interesse nacional e juros e amortização de empréstimos desse tipo A outra taxa era a do mercado livre que seria aplicada ao restante das importações e remessas A SUMOC tinha poderes para alterar as listas das importações a serem pagas através do mercado livre e continuava a existir o controle quantitativo das importações Os objetivos a serem alcançados no comércio exterior com a Lei do Mercado Livre eram claros primeiro possibilitar o escoamento da exportação dos gravosos sem prejuízos na receita cambial obtida com produtos de demanda inelástica em relação ao preço e que estavam obtendo altas cotações no mercado mundial café e cacau a inclusão do algodão nesse grupo suscitou polêmica Segundo reduzir a propensão a importar através do deslocamento para o mercado livre de cerca de um terço do valor total das importações substituindo dessa forma parte da limitação das importações através de licença prévia O mercado livre foi aberto imediatamente para todos os invisíveis e quase todas as transações de capital os gravosos foram sendo autorizados pouco a pouco a nele operar Já as importações que deveriam ser feitas por esse mercado foram extremamente reduzidas representando menos de 3 das importações totais em 1953 porque as autoridades econômicas ficaram temerosas de que o deslocamento das importações não essenciais para o mercado livre juntamente com a demanda por cambiais para transações e remessas de lucros contida ao longo de 1952 provocasse desvalorização excessiva da taxa de câmbio livre Havia certa preocupação também com os efeitos inflacionários do novo sistema cambial devido a provável encarecimento de bens de consumo e insumos utilizados na produção industrial Para a visão ortodoxa da economia entretanto a efetivação das pressões inflacionárias dependeria da política monetária e creditícia do governo que deveria ser auxiliada ademais pelos recursos a serem obtidos pelo governo com a compra de divisas no mercado oficial e sua venda no mercado livre de câmbio Na verdade os objetivos da política econômica doméstica do ministro Lafer em 1953 eram os mesmos dos anos anteriores O orçamento proposto ao Congresso Nacional e por ele aprovado previa pequeno superávit de Cr300 milhões e a meta do governo era realizar uma política monetária passiva A única mudança de orientação foi quanto à política de crédito no início do ano o constante conflito entre Lafer e Jafet foi resolvido com a demissão deste último o que viabilizou o enquadramento do Banco do Brasil na orientação do Ministério da Fazenda Embora existam razões para crer que Lafer iria persistir nesses objetivos se houvesse permanecido no ministério também no segundo semestre do ano quando devido ao imposto de renda o grosso da receita orçamentária era arrecadado o fato é que os resultados dos primeiros meses do ano também no tocante às variáveis endógenas da economia ajudaram a fortalecer a impressão de perda de controle por parte das autoridades econômicas Nos primeiros cinco meses do ano os meios de pagamento aumentaram de Cr7 bilhões contra menos de Cr1 bilhão no mesmo período de 1952 As causas dessa expansão foram os gastos com a seca no Nordeste e financiamentos de produtos dessa região além de socorro a bancos oficiais de estados pela Caixa de Mobilização Bancária A maior fonte de desestabilização contudo estava na situação cambial do país O principal objetivo da Lei no 1807 não foi alcançado o desempenho das exportações brasileiras piorou tendo seu valor se reduzido 11 no primeiro semestre de 1953 em relação a igual período em 1952 que como se sabe já havia sofrido forte redução em relação a 1951 O que ocorreu foi que por um lado as exportações de gravosos não reagiram à desvalorização cambial com que foram beneficiadas tendo ademais os exportadores de produtos com direito a vender menos de 50 no mercado livre iniciado um movimento de retenção dos embarques na expectativa de tratamento mais favorável e por outro caíram as exportações de café em função de um movimento concomitante de exportadores que retinham estoques e compradores que retardavam a realização de negócios ambos na expectativa da desvalorização cambial também para o café O volume de café vendido no primeiro semestre de 1953 foi 11 inferior ao do mesmo período em 1952 De fato desde o anúncio da Lei do Mercado Livre a pressão da cafeicultura sobre as autoridades econômicas foi grande As reivindicações iam da inclusão do café entre os produtos beneficiados com a possibilidade de realização parcial pelo mercado livre ao abandono total da paridade declarada ao FMI Apesar da grande redução das importações no primeiro semestre de 1953 quando totalizaram pouco mais da metade das importações em igual período de 1952 a evolução pouco favorável das exportações fez com que os atrasados comerciais continuassem a aumentar O acordo para o empréstimo de US300 milhões pelo Eximbank havia sido assinado em fins de fevereiro Como já se viu o Brasil havia aceitado liquidar progressivamente os atrasados comerciais com os Estados Unidos não cobertos pelos recursos do empréstimo A liberação da primeira parcela deste US60 milhões ocorreu normalmente na primeira semana de abril Os atrasados dos Estados Unidos entretanto continuaram a aumentar e em junho o Eximbank suspendeu o desembolso da segunda parcela sugerindo uma renegociação A gravidade da situação levou o ministro Lafer a declarar em reunião do Conselho da SUMOC no dia 2 de junho O Brasil está atravessando um período difícil um dos mais graves de sua vida econômicofinanceira no que tange ao mercado exterior Ata da 385 Sessão do Conselho da SUMOC No dia 15 de junho Horácio Lafer deixava o ministério e Vargas convocava Oswaldo Aranha para a pasta da Fazenda A queda de Lafer contudo não se deveu exclusivamente ao desgaste das autoridades econômicas estando inserida em ampla reforma ministerial que poupou apenas dentre os ministros civis João Cleofas solitário membro da UDN na equipe de governo Foram várias as causas dessa reforma Uma delas evidentemente a difícil situação econômica à qual falta acrescentar apenas uma crise na produção de energia elétrica provocada por prolongada estiagem que obrigou ao racionamento no fornecimento à indústria do Sudeste agravando o clima de descontentamento Paralelamente aumentavam as dificuldades do governo no plano social e político como evidenciam dois episódios ocorridos quase simultaneamente em São Paulo Em 23 de março de 1953 eclodiu uma grande greve de trabalhadores paulistas que chegou a paralisar mais de 300 mil operários Era um sinal contundente de que o prazo concedido a Vargas para justificar as expectativas de melhoria da qualidade de vida e melhor distribuição de renda suscitadas na campanha eleitoral estava se esgotando Um dia antes da eclosão da greve dos 300 mil Vargas havia sofrido sua maior derrota política desde o início do governo a vitória de Jânio Quadros nas eleições para a prefeitura da Cidade de São Paulo sem qualquer sustentação partidária e contra candidato apoiado pelo governador Lucas Garcez e por uma amplíssima coalizão de partidos A vitória de Jânio foi esmagadora o candidato empolgou não apenas as elites e a classe média mas também considerável contingente do operariado da cidade impondo sério desgaste ao governo federal Diante dos sinais de debilitamento das bases de sustentação de Vargas a oposição começou a montar o cerco ao governo É nesse quadro que deve ser compreendida a reforma ministerial Vargas preocupado em fortalecer a coesão do governo malbaratada pelo desfecho do projeto Campos SalesRodrigues Alves convocou antigos colaboradores embora nem sempre aliados políticos como Oswaldo Aranha José Américo de Almeida e Vicente Rao e políticos mais novos porém de fidelidade provada come João Goulart e Tancredo Neves Na verdade Vargas perseguia uma estratégia política que lhe permitisse enfrentar exitosamente as eleições estaduais de outubro de 1954 e em última análise a própria sucessão presidencial Para tanto procurava ampliar a sustentação política do governo ao mesmo tempo em que desejava estar preparado para seguir mais à direita ou mais à esquerda de acordo como rumo dos acontecimentos Com os antigos colaboradores citados e muito especialmente com Oswaldo Aranha acenava para a União Democrática Nacional UDN reafirmava o propósito de perseguir a estabilização da economia e criava uma alternativa ampla para sua sucessão A outra face da política foi a escolha de João Goulart para o Ministério do Trabalho visando recompor seu prestígio entre os trabalhadores e meios sindicais e por que não deixando em aberto uma alternativa distinta para o encaminhamento da sucessão presidencial 4 A nova tentativa de estabilização O programa Aranha e os resultados de 1953 O projeto Campos SalesRodrigues Alves apoiavase no saneamento econômicofinanceiro da nação e no afluxo de capital estrangeiro esperado a partir dos trabalhos da CMBEU O colapso cambial e a deterioração das relações econômicas com os Estados Unidos determinaram seu abandono A política do novo ministro da Fazenda Oswaldo Aranha consistiu numa nova tentativa de estabilização da economia mantida a visão ortodoxa do problema isto é tendo como objetivo uma política fiscal austera e políticas monetária e creditícia restritivas porém desta feita privilegiando o ajuste cambial Havia razões para tanto As exportações eram decrescentes continuavam acumulandose atrasados comerciais e o Eximbank havia suspendido o envio da segunda parcela do empréstimo de US300 milhões O enfrentamento do problema cambial foi imediato antecedendo de meses o anúncio de um plano global de estabilização A primeira providência foi homogeneizar o benefício cambial dado às exportações exclusive café reduzindo as três taxas mistas existentes a uma única resultante da mistura em 50 da taxa dos dois mercados A situação do café já havia começado a mudar em março quando os Estados Unidos liberaram o preçoteto do produto provocando ligeiro aumento em sua cotação no mercado de Nova York A medida tomada por Aranha foi a introdução do sistema de pauta mínima isto é a permissão para que os exportadores de certos produtos como café cacau e algodão negociassem no mercado oficial apenas as divisas correspondentes às cotações mínimas fixadas para cada um deles podendo vender no mercado de taxa livre o que excedesse a esses preços mínimos As exportações de café reagiram imediatamente retomando níveis semelhantes aos dos mesmos meses de 1952 e crescendo 56 e 81 em agosto e setembro respectivamente em relação a julho de 1953 Com relação ao empréstimo do Eximbank Aranha tomou posição firme cobrando a rápida liberação dos US60 milhões da segunda parcela do empréstimo como condição para a renegociação o que foi aceito pelo Banco Em contrapartida o governo brasileiro reiterou sua intenção de seguir política econômica ortodoxa e fez promessas de austeridade além de comprometerse a liquidar os atrasados comerciais com os Estados Unidos até o final de 1953 adiando de seis meses a data inicialmente acertada Em discurso no Senado Federal em setembro de 1953 o ministro Aranha anunciou os princípios gerais de seu programa Comprimir energicamente o volume global dos gastos governamentais de bens e serviços baixar o ritmo anual em que se expandem atualmente as obras públicas promover a adoção desses critérios pelos estados e municípios e entidades privadas conter prudentemente a velocidade do processo de industrialização deter o ritmo de expansão das novas construções particulares aplicar às importações rigorosos controles seletivos defender a estabilidade do cruzeiro e sua paridade internacional Aranha 1954 Determinada a linha de ação econômica do governo faltava entretanto o principal a definição dos instrumentos e medidas de política econômica que seriam adotados Dois eram os problemas centrais a situação cambial e o financiamento do déficit público sem emissão de moeda e expansão do crédito Com uma única reforma o governo equacionou os dois problemas Esse o objetivo da Instrução 70 da SUMOC de 9 de outubro de 1953 A Instrução 70 introduziu importantes mudanças no sistema cambial brasileiro O monopólio cambial do Banco do Brasil foi restabelecido e a ele deveriam ser obrigatoriamente vendidas ou repassadas pelos bancos autorizados a operar em câmbio as divisas provenientes das exportações O controle quantitativo das importações também foi extinto e substituído pelo regime de leilões de câmbio em bolsa de fundos públicos do país O sistema de leilões cambiais consistia na verdade na negociação de Promessas de Venda de Câmbio PVC que eram resgatadas em pregão público nestas bolsas e que davam ao importador o direito à aquisição de câmbio no valor e na moeda estipulados Após a aquisição das PVC nos leilões o comprador as levava ao Banco do Brasil no prazo de cinco dias e em seguida ao pagamento do ágio recebia o certificado de câmbio com o qual depois de verificados os preços das mercadorias a serem importadas podia obter a licença de importação De posse da PVC e da licença de importação o comprador podia adquirir câmbio à taxa oficial em qualquer banco autorizado no valor da operação licenciada ficando com o direito à restituição do correspondente à diferença não utilizada As PVC eram vendidas em princípio em lotes de US1 mil US5 mil e US10 mil Para a realização dos leilões as importações foram classificadas em cinco categorias de acordo com o critério de maior ou menor essencialidade Isso terminava por ter efeito de proteção à indústria na medida em que o surto de investimentos dos anos anteriores permitia esperar que a produção doméstica tornasse certas importações industriais menos essenciais A oferta disponível de cada moeda era alocada pelas autoridades monetárias entre as diferentes categorias com as categorias I II e III absorvendo geralmente mais de 80 da oferta total de cada moeda e a categoria V no máximo 3 Os leilões eram realizados separadamente para o dólar americano e para moedas de países com os quais o Brasil tinha acordo de pagamentos Para cada categoria foram fixados ágios mínimos que eram crescentes de acordo com a menor essencialidade da categoria Existia ademais um imposto de transferência de 8 mais o ágio correspondente ao valor alcançado pelas divisas no leilão relativo à categoria das importações em que foram alocadas ágio esse que tinha como limite inferior o ágio mínimo fixado A Tabela 62 apresenta as taxas cambiais para as cinco categorias Ficavam de fora dos leilões as compras externas do governo e algumas importações consideradas preferenciais para as quais eram fixadas diferentes sobretaxas O governo pretendia reter cerca de 30 da receita cambial proveniente das exportações para as despesas com divisas realizadas fora das licitações em bolsa Em 1954 entretanto essas importações não sujeitas a leilões chegaram a quase 50 do valor total das importações Existiam portanto três tipos básicos de cobertura cambial para as importações brasileiras 1 taxa oficial sem sobretaxa válida para certas importações especiais tais como trigo e material ou papel de imprensa 2 taxa oficial acrescida de sobretaxas fixas para as importações diretas dos governos federal estaduais e municipais autarquias e sociedades de economia mista também petróleo e derivados tinham suas aquisições cobertas dessa forma e 3 taxa oficial acrescida de sobretaxas variáveis segundo os lances feitos em bolsa para todas as demais importações Do lado das importações as taxas múltiplas de câmbio através do sistema de leilões permitiram simultaneamente a realização de amplas desvalorizações cambiais que vieram substituir o controle de importações como instrumento para o equilíbrio da balança comercial e a manutenção de uma política de importações seletiva onerando mais certos produtos e favorecendo a aquisição de outros de acordo com o critério de essencialidade e por consequência de proteção à produção industrial doméstica Além disso o recolhimento dos ágios veio constituir importantíssima receita para a União No tocante às exportações as taxas mistas foram substituídas por uma bonificação de Cr5US ou equivalente nas demais moedas para o café e Cr10US para todas as demais mercadorias Criavam se portanto duas taxas de câmbio para as exportações ou seja de Cr2332US para o café e a de Cr2832US para os demais produtos A mudança significativa deuse na taxa efetiva para o café que se tornou maior do que a taxa anterior resultante do sistema de pauta mínima A taxa de câmbio efetiva para os outros produtos continuou praticamente idêntica à que prevalecia anteriormente resultante da mistura meio a meio da taxa oficial e da taxa livre Com relação à receita fiscal os recursos obtidos com a arrecadação dos ágios decorrentes dos leilões de Promessas de Venda de Câmbio eram creditados no Banco do Brasil na conta Compra e Venda de Produtos Exportáveis onde eram também lançadas a débito as bonificações pagas aos exportadores Esperavase como de fato ocorreu que essa conta de ágios e bonificações tivesse saldo positivo elevado Embora a Instrução 70 determinasse que esse saldo fosse utilizado na regularização de operações cambiais e no financiamento à agricultura as autoridades econômicas esperavam superar essa rigidez e utilizar esse saldo mais amplamente no financiamento dos gastos do governo viabilizando dessa forma uma política monetária restritiva Sob vários aspectos os primeiros resultados da Instrução 70 foram positivos As exportações aceleraram seu movimento de recuperação fechando o último trimestre de 1953 com 342 do valor total obtido no ano As importações do último trimestre por sua vez mantiveram se mais ou menos no mesmo nível dos trimestres anteriores Assim a diferença entre exportações FOB e importações CIF que de janeiro a setembro atingiu US 55 milhões fechou o ano em US3947 milhões Também do ponto de vista de seu impacto sobre as contas do governo a Instrução 70 apresentou resultados imediatos elevando significativamente a receita Entretanto apesar da intenção de Lafer no primeiro semestre e de Aranha no segundo de realizarem política fiscal austera a realidade impôsse a esses intentos no ano de 1953 Já nos primeiros meses do ano inverteuse de credora para devedora a posição do Tesouro Nacional frente ao Banco do Brasil Nesse primeiro semestre entre as causas de crescimento dos gastos do governo estão despesas com aumento nas obras públicas a forte seca que atingiu o Nordeste um abono elevado concedido ao funcionalismo civil da União e gastos ocorridos em função da realização das eleições municipais Após a posse de Aranha além da continuidade do programa de obras e do financiamento das grandes safras outras duas grandes causas somaramse ao conjunto de pressões existentes sobre as despesas do governo 1 o Banco do Brasil pagou com recursos próprios isto é além dos fornecidos pelos US300 milhões do Eximbank US250 milhões de atrasados comerciais a diversos credores correspondentes a cerca de Cr47 bilhões e 2 diante da ameaça de completa bancarrota do estado de São Paulo o Banco do Brasil foi forçado a abrir um crédito de Cr5 bilhões ao Tesouro paulista Vianna 1987 nota 424 Em 1953 o déficit da União foi de Cr29 bilhões e o dos estados e municípios de Cr54 bilhões Enquanto as despesas da União cresceram 403 em relação a 1952 a receita dos principais impostos aumentou apenas 114 e a receita total cresceu 206 praticamente igual à inflação no período que avaliada pelo IGPDI foi de 208 As outras receitas da União provieram principalmente da conta de ágios e bonificações e da venda dos estoques de algodão adquiridos pelo Banco do Brasil em 1952 O déficit do setor público afetou a política creditícia do governo em 1953 Modificando significativamente a sua composição e invertendo a tendência dos dois anos anteriores os empréstimos do Banco do Brasil às atividades econômicas cresceram apenas 18 menos que a inflação portanto enquanto os destinados ao Tesouro Nacional e às outras entidades públicas elevaramse em 89 e 25 respectivamente Os empréstimos aos bancos cresceram 77 No total a expansão do crédito do Banco do Brasil foi de 36 em relação a 1952 A política monetária como não podia deixar de ser foi também expansionista Uma fonte irresistível de pressão sobre os gastos públicos eram as obras necessárias à adequação da infraestrutura econômica do país ao crescimento industrial sustentado desde 1948 e particularmente ao surto de investimentos de 1951 e 1952 sendo o melhor exemplo nesse sentido os gastos com a ampliação da capacidade de produção de energia elétrica Podese estimar em cerca de 1 milhão de kW o déficit de capacidade de geração existente em princípios de 1953 Apesar dos objetivos macroeconômicos definidos era inevitável o atendimento a necessidades com essa ordem de imperatividade Podese dizer portanto que o objetivo das autoridades em 1953 tanto de Lafer no primeiro semestre como de Aranha no segundo de perseguir parâmetros ortodoxos na gestão da política econômica foi prejudicado pelas muitas pressões que forçaram o desequilíbrio nas contas do setor público embora menos pelo déficit no orçamento da União e mais pelo déficit dos estados e municípios com grande destaque para São Paulo ver Tabela 53 no capítulo anterior Em 1953 a inflação avaliada pelo IGPDI deu um salto do patamar anterior em torno de 12 para 208 Para o pensamento ortodoxo a explicação está no retorno de déficit público e consequente expansão dos meios de pagamento Na verdade existem razões para crer que a mudança no patamar da inflação deveuse antes de mais nada ao impacto das desvalorizações cambiais decorrentes da Instrução 70 que pressionaram os custos de produção das empresas levandoas a reagir elevando seus preços de venda Quanto ao desempenho da economia em 1953 o PIB apresentou crescimento de apenas 47 inferior ao dos anos anteriores desde a recessão de 1947 Devese notar entretanto que a indústria cresceu 93 O pequeno crescimento do PIB deveuse ao medíocre desempenho da agricultura de apenas 02 devido à forte seca ocorrida neste ano e à estagnação do setor de serviços em grande parte motivada pela queda das atividades do comércio e outros setores com a diminuição das importações Finalmente outro dado relevante de 1953 é a queda do nível de investimentos do setor privado decorrente também das restrições às importações em função da situação cambial O investimento do governo tampouco cresceu em termos reais e embora praticamente não tenha decrescido como proporção do PIB mantevese constante Em 1954 o nível de investimentos voltou a crescer a formação bruta de capital fixo do governo teve um crescimento real de 102 superado pelo do setor privado com 191 Novas dificuldades café e salários No início de 1954 as perspectivas de evolução do setor externo da economia brasileira pareciam favoráveis e as preocupações centrais do governo deslocaramse para o problema da inflação identificado como era na época com o déficit público as pressões para a expansão do crédito e o aumento da oferta monetária Havia pelo menos duas razões para projeções favoráveis acerca da situação cambial Em primeiro lugar a expectativa otimista com as receitas a serem geradas pelo café e em segundo lugar a confiança posteriormente confirmada na possibilidade de renegociar as condições de pagamento do empréstimo do Eximbank Pode parecer estranho afirmar que a intenção de Aranha era realizar política econômica austera e ortodoxa em 1954 dado que seus oito meses de gestão nesse ano foram marcados por substancial expansão creditícia os empréstimos do Banco do Brasil cresceram 13 em termos reais relativamente a dezembro de 1953 Essa expansão de crédito porém não se relaciona com uma reversão dos objetivos do governo no sentido de políticas expansionistas Na verdade essa expansão se justifica porque era preciso atender às demandas dos estados particularmente São Paulo porque a política para o café que será examinada a seguir assim o exigiu e porque a indústria pressionou muito fortemente visando compensar os efeitos do aumento de 100 do salário mínimo em maio e da Instrução 70 da SUMOC decorrentes da defasagem de tempo entre o momento da licitação quando o prêmio do leilão deveria ser integralmente pago e a obtenção da licença para importar Contrastando com a expansão do crédito do Banco do Brasil os meios de pagamento cresceram apenas 125 nos oito meses da gestão Aranha em 1954 a inflação nesse período foi de 178 Para esse resultado porém foi necessário recorrer aos recursos da conta de ágios e bonificações impedindo assim sua utilização como instrumento de política deflacionária Foram importantes ainda recursos provenientes da colocação de letras de câmbio propostas por Aranha As grandes dificuldades surgidas para o programa de estabilização econômica de Oswaldo Aranha entretanto foram o aumento de 100 do salário mínimo e os problemas do café A decisão a respeito do aumento salarial foi precedida de intensa polêmica e tensão política A proposta do ministro do Trabalho João Goulart era de um reajuste de 100 enquanto o percentual necessário para recomposição do pico do reajuste anterior era de cerca de 49 Contra ela colocaramse a UDN a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo FIESP oficiais do Exército através de documento conhecido como Manifesto dos Coronéis e finalmente o Conselho Nacional de Economia CNE e o ministro Oswaldo Aranha que propunham reajuste próximo a 33 No dia 1 de maio preocupado com o desgaste de seu governo e voltado para as eleições de outubro de 1954 Getúlio Vargas anunciou o aumento de 100 do salário mínimo A decisão contrariou profundamente Oswaldo Aranha e seu principal colaborador Sousa Dantas que chegou a pedir demissão da presidência do Banco do Brasil O temor dos opositores da medida era que o reajuste provocasse reajustes reais em toda a pirâmide salarial Não há dados suficientes para testar a hipótese É provável contudo que o aumento de 216 do salário mínimo em 1952 tenha feito com que ele recuperasse o papel de sinalizador para os demais níveis salariais que tinha perdido após nove anos sem sofrer qualquer reajuste Os problemas criados pelo aumento salarial ao Programa Aranha de estabilização econômica somaramse às enormes dificuldades com as exportações de café fazendo com que rapidamente os prognósticos sobre a situação cambial do país fossem alterados De fato até que nos primeiros meses de 1954 as exportações de café sofressem brusca e violenta retração a receita em divisas esperada com o café era avaliada consensualmente com enorme otimismo derivado da alta dos preços do produto em 19531954 O mercado de café começou a alterarse a partir de informações recebidas de várias áreas produtoras notadamente América Central e África Oriental britânica indicando condições meteorológicas desfavoráveis Em meados do ano ocorreu forte geada no Brasil cujos efeitos atingiram principalmente o Paraná zona de plantações novas de alta produtividade e as primeiras estimativas previram redução de cerca de 3 milhões de sacas na produção exportável brasileira de 1953 1954 A nova situação do mercado e a corrida iniciada pelos importadores que procuravam precaverse contra uma alta acentuada quando do fim da safra no primeiro semestre de 1954 determinaram rápido e grande aumento das cotações do café A alta dos preços foi o estopim de violenta campanha desencadeada nos Estados Unidos contra a especulação de países produtores e casas torrefadoras e o consumo de café O mesmo senador Guy Gillete que em 1949 liderou campanha semelhante então derrotada voltou à carga e o Congresso norteamericano formou uma subcomissão para examinar o assunto Desta vez entretanto a campanha foi mais articulada Paralelamente à subcomissão do Congresso a Federal Trade Comission iniciou investigação sobre a elevação dos preços do café tornada pública diretamente pelo Presidente Eisenhower e através da imprensa os consumidores eram convencidos a beber menos café e adotar produtos substitutos As exportações brasileiras diminuíram abruptamente Com o consumo nos Estados Unidos caindo depressa os importadores passaram a utilizar seus estoques limitando as compras ao mínimo necessário como observase pela Tabela 63 Tabela 63 Brasil Exportação de café dados mensais 19531954 1000 sacas Meses 1953 1954 Janeiro 1204 1125 Fevereiro 1206 944 Março 1359 1375 Abril 991 998 Maio 792 474 Junho 998 396 Julho 876 626 Agosto 1368 518 Setembro 1662 838 Outubro 1656 855 Novembro 1792 1548 Dezembro 1659 1220 Total 15562 10918 Fonte BNDE Exposição 1954 Descrente da possibilidade de aumentar as quantidades vendidas em junho de 1954 o governo expediu decreto fixando elevado preço mínimo para o café com o objetivo de maximizar a receita cambial É comum atribuir ao decreto a retração das exportações Estas contudo já haviam caído antes de julho e continuaram baixas após agosto quando o governo reviu sua política Se a responsabilidade pela dificuldade na colocação do café brasileiro não pode ser atribuída à política de sustentação de preços não é menos verdade que essa política não correspondia à realidade do mercado de café e por isso mesmo vigeu por apenas 45 dias De fato a situação do mercado mundial de café era ainda mais desfavorável para o Brasil porque à grande queda no consumo dos Estados Unidos devem ser acrescentados os seguintes agravantes 1 o efeito da geada sobre a produção brasileira foi menor do que se esperava 2 os demais produtores latinoamericanos e especialmente os países da África e da Ásia também tiveram produções superiores às previsões realizadas e 3 os Estados Unidos numa reação deliberada à política de sustentação de preços seguida pelo Brasil deslocaram suas compras para outros países A queda do consumo e a revisão das estimativas da produção mundial enfraqueceram o nível de preços o que por sua vez reduziu ainda mais a importação de café A produção exportável do Brasil em 1954 foi de 14506 mil sacas de 60kg das quais foram exportadas efetivamente apenas 10918 mil sacas Nos meses finais da gestão de Oswaldo Aranha e do governo Getulio Vargas as exportações em junho foram baixíssimas continuaram baixas em julho e as perspectivas para os meses seguintes eram bastante negativas Alarmados os cafeicultores passaram a pressionar violentamente para que o governo cedesse na sustentação dos preços do café A restrição das autoridades econômicas em fazêlo é compreensível O objeto de maximização da receita cambial era fortalecido agora pelo fato de que quanto maior fosse o montante de divisas disponíveis para alocação nos leilões cambiais maior o saldo da conta de ágios e bonificações e portanto a receita do governo Com a intensificação das pressões de cafeicultores e exportadores de café o agravamento da crise política e o número crescente de informações chegadas ao governo dando conta da profundidade das dificuldades existentes no mercado de café Oswaldo Aranha e Sousa Dantas terminaram por ceder baixando em 14 de agosto a Instrução 99 da SUMOC Essa instrução não alterou a cotação mínima em cruzeiros estabelecida para a exportação de café Cr2032 por librapeso correspondentes a 87 centavos de dólar pela mesma quantidade Modificou entretanto o sistema de bonificações instituído pela Instrução 70 Nos novos termos estabelecidos receberiam os exportadores a bonificação de Cr5US ou Cr10US conforme se tratasse de café ou qualquer outro produto sobre 80 das cambiais negociadas Sobre os restantes 20 era abonada a diferença entre a taxa de compra do mercado oficial Cr1836US e a média das taxas de compra no mercado livre para cada moeda no dia útil imediatamente anterior ao do fechamento de câmbio Resultando numa desvalorização de fato de 27 para as exportações de café sempre supondo uma cotação de Cr60US no mercado de taxa livre a medida implicou uma redução do preço mínimo em dólares de 87 centavos de dólar para 635 centavos de dólar por librapeso Como reflexo deuse imediatamente queda vertiginosa da cotação do café na bolsa de Nova York que de 86 centslibrapeso no dia 13 caiu para 7150 cents no dia 17 de agosto Essa baixa de preços aliada ao fato de serem as exportações no segundo semestre maiores do que no primeiro permitiu ligeiro aumento das exportações de café as quais entretanto continuaram em nível muito inferior ao normal Em meados de 1954 portanto o Programa Aranha de estabilização econômica estava comprometido Seus dois principais objetivos haviam sido enfrentar a difícil situação cambial originando novas bases para o comércio exterior do país através do sistema de leilões de divisas e utilizar a receita obtida com o saldo da conta de ágios e bonificações para criar condições para a adoção de políticas monetária e creditícia restritivas tendo em vista o combate à inflação Ambos os objetivos foram frustrados Por um lado as dificuldades com o café voltaram a colocar no horizonte a possibilidade de uma crise cambial Por outro lado os propósitos deflacionários do governo viramse abalados em primeiro lugar pela mudança no patamar da inflação derivada das desvalorizações cambiais embutidas na Instrução 70 e em segundo lugar pelo aumento de 100 no salário mínimo Mais ainda tanto os problemas com o café como o aumento salarial eram como vimos poderosas fontes de pressão sobre a expansão do crédito comprometendo dessa forma a austeridade perseguida pelas autoridades econômicas 5 A última crise A análise da crise de 1954 e do golpe que depôs Getúlio Vargas requer duas perguntas Em primeiro lugar não há motivos para distinguir essencialmente a conspiração contra Vargas da sequência de movimentos golpistas que percorre a Quarta República 19451964 do início ao fim A pergunta que deve ser feita portanto diz respeito às raízes dessa incompatibilidade de parte das elites do país com a institucionalidade democrática Em segundo lugar devemos particularizar a nossa análise e indagar que conjuntura ao longo de 1954 tornou possível o isolamento de Vargas e criou condições para o êxito do golpe Enveredar pela discussão das questões suscitadas pela primeira pergunta foge por completo ao escopo deste trabalho O que importa ressaltar sem correr o risco de leviandade é que não existe necessidade de uma radicalização nacionalpopulista da política de Vargas para explicar as intenções golpistas de certos segmentos da sociedade Já a análise da conjuntura isto é da configuração adquirida pelo conflito de interesses econômicos entre os diversos segmentos sociais fornece alguns elementos para a compreensão da agudeza da crise política Quando Vargas assumiu em 1951 o fez sob um clima de expectativas generalizadas Seu projeto de governo original contemplava essas expectativas Na impossibilidade de realizálo por motivos que foram analisados no decorrer deste trabalho a margem de manobra do governo reduziuse consideravelmente O exemplo máximo para ilustrar essa afirmativa é a lembrança de que não houve vacilação na opção pela estabilização da economia em meados de 1953 mas quando colocado diante da proximidade das eleições Vargas optou por uma política salarial em desacordo com os propósitos das autoridades econômicas Em resumo a natureza da política de Vargas que se propunha contentar amplo espectro da sociedade sem a realização de transformações estruturais e sem contar com uma sociedade civil organizada partidariamente ou não enfrentava graves dificuldades quando colocada diante de um quadro de adversidades econômicas Os trabalhadores por exemplo que constituíram importante base eleitoral para a vitória de Getúlio em 1950 desde princípios de 1953 demonstravam crescentemente sua frustração e descontentamento O decreto do aumento do salário mínimo em maio de 1954 certamente angariou apoio e simpatia para o governo A medida contudo visava as eleições de outubro e não era suficiente nem era esse um objetivo de Vargas para fazer do pouco organizado movimento dos trabalhadores a coluna que sustentaria o governo mesmo porque essa seria uma base de sustentação política muito estreita Da mesma forma que entre os trabalhadores também era crescente a frustração entre as camadas médias urbanas Estas entretanto não foram afetadas pelo decreto do salário mínimo e além de extremamente sensíveis à aceleração da taxa inflacionária eram particularmente receptivas à campanha oposicionista centrada em denúncias sobre a corrupção e a falta de moralidade do governo Mais grave porém era a evolução da situação e da posição dos principais segmentos capitalistas As causas para a atitude oposicionista do comércio importador por exemplo eram óbvias Primeiro devido à volta de um apertado controle de importações após um início de governo muito favorável às suas atividades depois devido à Instrução 70 da SUMOC e às elevadas desvalorizações cambiais impostas à maior parte das importações Mais complexa e muito mais importante era a posição da indústria Como já vimos a Instrução 70 desagradara ao setor pois as desvalorizações cambiais implicavam elevação de seus custos Comparada à situação anterior quando a proteção à indústria doméstica era garantida pelo controle de importações e suas próprias compras no exterior realizadas pela taxa de câmbio oficial a mudança foi claramente desfavorável Incomodava a indústria ainda a redução do crédito do Banco do Brasil às atividades econômicas O momento decisivo para o ingresso do setor numa posição de franca hostilidade ao governo entretanto foi a fixação do aumento do salário mínimo Finalmente no que diz respeito aos interesses ligados ao café a Instrução 70 foi recebida inicialmente como vimos com extremo agrado e até certa euforia De fato as expectativas favoráveis para o café decorrentes também da geada de meados de 1953 eram contabilizadas pelo governo Vargas no início de 1954 como peça importante não apenas em suas projeções para a economia mas também para os desdobramentos políticos do ano A brutal redução das exportações do produto e o clima de crise que se apoderou do setor inverteram essas previsões Embora não coubesse ao governo responsabilidade pelas mudanças estruturais ocorridas no mercado mundial de café a oposição acusava a política de preços mínimos do governo e capitalizava intensamente as dificuldades Sem poder contar com apoio popular e envolvido crescentemente pela insatisfação de diversos setores empresariais o isolamento político de Vargas era um fato A conjuntura era extremamente propícia à intensificação da virulenta campanha oposicionista Ainda que não fosse possível depor o presidente provavelmente seriam grandes os dividendos eleitorais a serem recolhidos primeiramente em outubro de 1954 e posteriormente na sucessão presidencial Nesse contexto aconteceu o atentado da rua Tonelero A análise da crise de 1954 porém não termina aí Entre o golpe que depôs Vargas e os desdobramentos políticos posteriores interpôsse o suicídio do presidente O gesto trágico teve profundas repercussões históricas possibilitando a formação de uma ampla frente antigolpista que assegurou a manutenção da ordem constitucional e converteu o que seria uma antecipação de 1964 numa administração provisória de gestores de negócios Mais ainda essa tomada de posição majoritária em defesa da democracia viabilizou e impulsionou no sentido da recomposição da frente de centroesquerda formada pelo PSDPTB que seria responsável mais adiante pela eleição de Juscelino Kubitschek CAPÍTULO 7 O interregno Café Filho 1954 1955 Demosthenes Madureira de Pinho Neto1 1 Introdução O período delimitado pelo suicídio de Vargas e a posse de Juscelino Kubitschek na Presidência da República é um dos menos estudados na história do Brasil contemporâneo Tornouse comum tanto na historiografia política como na econômica tratarse o período como um interregno irrelevante entre os governos Vargas e Kubitschek não se atentando para diversos fatores políticos e econômicos que cumpririam relevante papel no curso dos acontecimentos futuros No que se segue tentouse preencher esta lacuna particularmente no que diz respeito à motivação e implementação da política econômica no período A seção seguinte analisa a gestão de Eugênio Gudin no Ministério da Fazenda enfocando as negociações com a comunidade financeira internacional assim como a política relativa ao capital estrangeiro e a política de estabilização doméstica A terceira seção trata do período de José Maria Whitaker no Ministério da Fazenda salientandose a total reorientação imposta aos rumos da política econômica com a ascensão do novo ministro Uma seção de caráter conclusivo onde se procede a uma avaliação da política econômica buscando situar o período historicamente fecha o capítulo 2 A gestão Gudin Guindado ao poder pelo dramático desfecho do segundo governo Vargas Café Filho buscaria na composição do ministério um equilíbrio de forças bastante heterogêneas o que seria indispensável para a sustentação do governo Não obstante era nítida a inclinação conservadora de seu ministério do qual faziam parte eminentes figuras da União Democrática Nacional e notáveis antigetulistas Para a pasta da Fazenda foi convocado o professor Eugênio Gudin árduo crítico das propostas desenvolvimentistas e partidário declarado de uma política financeira ortodoxa O novo ministro vinha disposto a adotar rigorosas medidas antiinflacionárias atribuindo à monetização do déficit público e à expansão creditícia em geral o principal foco do processo inflacionário2 A escolha de Gudin para gerir a economia brasileira deviase principalmente ao seu prestígio junto à comunidade financeira internacional o que acreditavase seria crucial para a negociação em termos favoráveis dos vultosos compromissos externos e o consequente desafogo da grave situação cambial pela qual passava a economia brasileira3 Esta viria a ser a prioridade mais imediata de política econômica A conjuntura econômica externa Com o colapso dos preços do café e a contração das exportações do produto após meados de 1954 o país enfrentava uma grave crise cambial pois esse era responsável por cerca de 60 das exportações brasileiras Apesar da desvalorização de aproximadamente 27 resultante da Instrução 99 da SUMOC agosto de 1954 que revogava os preços mínimos em dólares estipulados pelo governo anterior em junho de 1954 as exportações de café não se recuperaram nos meses subsequentes dada a baixa elasticidade de demanda do produto no mercado mundial É neste contexto que em setembro de 1954 Gudin embarcou para Washington a pretexto da reunião anual do Fundo Monetário Internacional Recebido calorosamente pelo staff desta instituição Gudin impressionaria muito positivamente a comunidade financeira internacional pelo firme propósito de implementar medidas austeras no combate ao desequilíbrio orçamentário visto pela ortodoxia financeira como o principal responsável pelos desajustes externo e interno Segundo o New York Times Gudin era The right man in the right place at the right time4 Retórica à parte tudo que Gudin conseguiu das fontes oficiais foram US80 milhões em créditos novos e a renovação de outros US80 milhões contraídos por Aranha a serem pagos mensalmente durante um ano ambos junto ao Federal Reserve Bank em Washington o que estava longe de resolver a situação cambial brasileira Segundo estimativas de Gudin seria necessário contrair cerca de US300 milhões em novos créditos para evitarse uma séria crise cambial5 Todavia o governo Eisenhower definitivamente parecia não ter o Brasil em suas prioridades Após diversas conversações infrutíferas com representantes do Banco Mundial do Eximbank e do Tesouro americano não restava outra alternativa ao ministro senão buscar os bancos privados conseguiu assim através de um consórcio de 19 bancos americanos liderado pelo Chase Manhattan e pelo Citybank levantar US200 milhões a serem pagos em cinco anos à taxa de 25 ao ano oferecendo como garantia os US300 milhões em reservas ouro que o Brasil possuía Com este montante aliviavase a situação cambial até que medidas de política lograssem algum efeito sobre o balanço de pagamentos A atitude do governo americano parecia objetivar ganhar tempo para discutir a questão do auxílio econômico ao continente em novas bases na reunião de ministros da Fazenda que seria realizada em novembro de 1954 conforme deliberação da X Conferência Pan Americana no hotel Quitandinha em Petrópolis A proposta do governo americano nesta reunião seria a criação de uma subsidiária do Banco Mundial a Corporação Financeira Internacional que ficaria encarregada da política de auxílio financeiro à região assim como da promoção do fluxo de capitais privados para os países em desenvolvimento Tal proposta resgatava a polêmica quanto ao tratamento a ser concedido à América Latina que resultou no abandono durante o governo Eisenhower da política de apoio governamental à região6 e que atingiria seu clímax com o incentivo dado pela administração republicana à centralização no Banco Mundial dos empréstimos à América Latina afastandose portanto o Eximbank de tais financiamentos7 Tendo perdido esta contenda no Congresso o governo Eisenhower tentava uma vez mais afastar o Eximbank dos empréstimos de longo prazo a projetos de desenvolvimento concentrandoos na Corporação Financeira Internacional uma subsidiária do Banco Mundial8 Bem mais do que isso a mencionada proposta visava a sepultar definitivamente as expectativas das autoridades latinoamericanas em geral e brasileiras em particular de uma reversão no tratamento negligente que vinha sendo dispensado ao continente no pósguerra A mensagem era bastante clara o problema de financiamento da América Latina seria resolvido por fluxos de capitais privados e não por auxílio econômico do governo americano9 Podese assim dizer que o fracasso de Gudin em obter um empréstimo junto às instituições oficiais está associado à orientação política da administração Eisenhower frente aos países em desenvolvimento que já havia determinado em 1953 o malogro dos projetos da Comissão Mista BrasilEstados Unidos e o colapso do projeto original de governo de Vargas Há portanto uma nítida continuidade na política econômica externa americana a partir da posse da nova administração republicana no início dos anos 1950 Não obtendo sucesso na negociação de crédito externo com as instituições oficiais restava ao governo Café Filho implementar políticas que lograssem desafogar o balanço de pagamentos no longo prazo uma vez que o empréstimo contraído com os bancos privados resolviam apenas os problemas cambiais mais imediatos Neste particular Gudin havia desde o início de sua gestão manifestado o desejo de remover os obstáculos à livre entrada de capital estrangeiro10 É sob este prisma que deve ser vista a polêmica Instrução 113 da SUMOC de 27 de janeiro de 1955 Por meio desta ficava a Carteira de Comércio Exterior do Banco do Brasil CACEX autorizada a emitir licenças de importação sem cobertura cambial para equipamentos destinados à complementação dos conjuntos já existentes no país e classificados nas três primeiras categorias de importação Ficava também a CACEX autorizada a licenciar a favor das empresas nacionais a importação de conjuntos de equipamentos financiados no exterior em prazo não inferior a cinco anos11 Tais equipamentos seriam incorporados aos ativos das empresas nacionais ou estrangeiras sem contrapartida no passivo exigível Ao investidor externo era claramente mais vantajoso importar equipamentos sem cobertura cambial do que a alternativa de ingressar com as divisas à taxa do mercado livre recomprando as licenças de importação por um valor mais alto nos leilões de câmbio A vantagem pode ser medida pelo diferencial entre o custo das divisas na categoria relevante e a taxa do mercado livre12 Tal subsídio aliado à inexistência de financiamentos no exterior que permitissem aos investidores nacionais beneficiaremse da medida já que só alguns anos mais tarde os suppliers credits tornarseiam importantes fontes de financiamentos das empresas brasileiras fez com que a referida instrução fosse vista como uma discriminação contra o capital nacional Na realidade tudo que a Instrução 113 pretendia era consolidar a legislação anterior13 dando um passo adiante através da eliminação dos empecilhos existentes às importações sem cobertura cambial que já eram permitidas pela legislação vigente desde que aprovadas pelo Conselho da Superintendência da Moeda e do Crédito SUMOC e pela Comissão de Desenvolvimento Industrial CDI14 A única novidade introduzida pela instrução seria a remoção dos conselhos do processo burocrático ficando a aprovação de importações sem cobertura cambial sujeita apenas à deliberação da CACEX De fato isto não era pouco considerandose que era justamente sobre os conselhos que se exercia toda sorte de pressão política Portanto é importante enfatizar que não houve qualquer ruptura no que tange ao tratamento concedido ao capital estrangeiro que tenha sido introduzida pela instrução já que o governo Vargas apesar da retórica nacionalista vinha progressivamente liberalizando a legislação aplicável aos fluxos de capitais privados15 Não obstante a liberalização dos fluxos de capitais inseriase num contexto mais amplo cuja prioridade básica era o saneamento econômico e financeiro doméstico A política de estabilização doméstica Identificando o déficit público e a resultante expansão monetária como os principais responsáveis pelo processo inflacionário o programa de estabilização de Gudin continha basicamente dois elementos austeridade fiscal e contração monetáriocreditícia Com este fim a escolha de Clemente Mariani para a presidência do Banco do Brasil e Gouveia de Bulhões para dirigir a SUMOC significava uma total sintonia entre os integrantes da equipe econômica Em outubro de 1954 logo após retornar dos Estados Unidos o ministro torna público o programa consubstanciado nas Instruções 105 106 e 108 da SUMOC A primeira fixava apenas os juros pagos aos depósitos a vista e a prazo em 3 e 7 ao ano respectivamente e pela segunda eram elevadas as taxas de redesconto das duplicatas de 6 para 8 e das promissórias de 6 para 10 sinalizandose a orientação contracionista do programa O pilar básico da política de estabilização do governo repousava no entanto na Instrução 108 da SUMOC Por meio desta aumentavase o compulsório sobre os depósitos à vista de 4 para 14 e de 3 para 7 sobre os depósitos a prazo superiores a 90 dias16 Entretanto a novidade da instrução que seria o primeiro passo de uma reforma bancária mais ampla consistia no recolhimento do compulsório à caixa da SUMOC e não mais à do Banco do Brasil Garantiase assim a eficácia da ação redutora da medida sobre a capacidade de expansão creditícia dos bancos comerciais Finalmente completando o conjunto de medidas restritivas estabeleceramse limites para as operações de empréstimos das diversas carteiras do Banco do Brasil identificado como o principal foco de expansão do crédito através sobretudo das pressões exercidas pelas entidades públicas e pelo Tesouro No que concerne às contas do governo Gudin pretendia implementar um austero programa fiscal aliando ao corte nas despesas públicas um incremento na receita orçamentária Este último revelouse politicamente inviável dada a oposição no Congresso à elevação da carga tributária O que Gudin desejava de fato era a modificação do orçamento de 1955 que havia sido aprovado pelo Congresso com um significativo déficit Finalmente o presidente concordou em aprovar um plano que determinava em 1955 um corte de 36 das dotações originais na alocação das verbas ministeriais sendo que os ministérios do Trabalho Indústria e Comércio e Viação e Obras Públicas teriam suas dotações reduzidas em 6017 Deparando se com uma suposta necessidade de redução dos gastos do governo optarseia prioritariamente pelo corte dos investimentos públicos em vez dos gastos em consumo algo recorrente na história econômica brasileira até os dias de hoje Uma peça fundamental na viabilização do programa contracionista de Gudin era o regime implementado pela Instrução 70 da SUMOC pelo qual o Estado apropriavase de vultosa receita não orçamentária decorrente da conta de ágios e bonificações Tal receita permitia ao ministro o financiamento de parte significativa dos gastos do governo sem ser necessária qualquer expansão da base monetária Não é por mero acaso que Gudin sempre se referiu de forma bastante simpática a este sistema de resto nada liberal18 No que diz respeito à política cafeeira poucas foram as modificações implementadas em relação ao regime determinado pela Instrução 99 do governo Vargas Por meio desta instrução tentouse reduzir o preço mínimo que havia sido fixado em junho de 1954 permitindose a venda de 20 das cambiais no mercado livre o que resultava na prática em bonificações oscilantes conforme as flutuações daquele mercado Através da Instrução 109 novembro de 1954 fixouse a bonificação para o café enquanto que a Instrução 112 janeiro de 1955 fixava em nível mais elevado as bonificações para os demais produtos de exportação incluindo o cacau e o algodão A implementação desta instrução seria o estopim para a manifestação de descontentamento da cafeicultura com o chamado confisco cambial qual seja a compra das cambiais de café a uma taxa menor que a do mercado livre O governo tentaria remediar a situação através da Instrução 114 de fevereiro de 1955 que equiparava a bonificação do café à dos produtos da segunda categoria de exportação nos termos da Instrução 112 Todavia a insatisfação do setor tinha raízes mais profundas que meros paliativos não conseguiriam atingir e teria uma influência decisiva na articulação política que determinaria a queda de Gudin Em retrospectiva o período correspondente à gestão Gudin testemunhou ainda que por um curto período um programa de estabilização bastante ortodoxo A crise de liquidez gerada por contração de tal monta como ilustra a Tabela 71 iria manifestarse já em novembro de 1954 com a liquidação de dois bancos paulistas e subsequente corrida aos pequenos e médios bancos resultando em operações de redesconto de emergência fato que seria repetido em maio de 195519 Nos setores produtivos a ausência de liquidez era ainda mais séria a julgar pela substancial elevação do número de falências e concordatas requeridas no Rio de Janeiro e em São Paulo no primeiro semestre de 195520 Observase também em 1955 significativa queda na formação bruta de capital fixo do setor privado e do governo que se reduzem em 15 e 8 respectivamente Tal fato aliado à redução de cerca de 25 nas importações de bens de capital indica ter havido razoável contração dos investimentos em 195521 Não fosse a curta duração do programa de estabilização de Gudin terseia registrado uma significativa queda do nível de atividade industrial Tabela 71 Brasil Expansão do crédito média mensal 19541955 Fontes Banco do Brasil Relatório 1955 Conjuntura Econômica janeiro de 1956 e dezembro de 1973 Não obstante foi a inquietação da cafeicultura com o chamado confisco cambial o fator catalisador da articulação política que resultaria na substituição de Gudin De resto o dito confisco cumpria importante papel no programa de Gudin já que precisamente o saldo da conta de ágios e bonificações era um dos viabilizadores de sua política antiinflacionária Assim sendo em troca do apoio do governador Jânio Quadros à candidatura udenista à Presidência da República Café Filho cederia a São Paulo o Ministério de Viação e Obras Públicas e a presidência do Banco do Brasil No dia 4 de abril de 1955 Gudin exoneravase em caráter irrevogável 3 A administração Whitaker Visando a apaziguar a plutocracia paulista particularmente os cafeicultores Café Filho nomeou para a pasta da Fazenda o banqueiro paulista José Maria Whitaker exministro da Fazenda de Vargas no Governo Provisório Contundente crítico do regime de taxas múltiplas de câmbio estabelecido pela Instrução 70 da SUMOC Whitaker se havia notabilizado pela intransigente defesa dos interesses da lavoura e tinha como principal meta no ministério a eliminação do confisco cambial O novo ministro considerava o sistema cambial vigente uma exação fiscal uma expropriação injusta e contrária à Constituição22 Whitaker preocupavase também com o incentivo às atividades produtivas não por apelos enfáticos mas por facilidades efetivas dandolhes sobretudo crédito23 A fase de contenção parecia acabada gozando de amplo apoio junto às classes produtoras especialmente no setor agrícola24 a inflação parecia preocupálo apenas enquanto exercício de retórica Interessava sepultar definitivamente mais de duas décadas de controle cambial restituindo à lavoura o que pensava serlhe de direito Eram procedentes as expectativas das classes produtoras quanto a uma total reversão na condução da política econômica A condução da política econômica Poucos dias após a sua posse o novo ministro enfrentaria o primeiro grande teste de sua administração Com origem na política restritiva de Gudin iria deflagarse em maio de 1955 nova crise bancária sensivelmente mais séria devido ao pedido de liquidação extrajudicial do Banco do Distrito Federal O pânico gerado no depositante detonaria uma corrida inusitada do mercado de crédito paralisando por alguns dias o movimento do comércio e da indústria A proporção da crise bancária deixou transparente a falta de liquidez do setor financeiro e a ameaça que isto representava aos setores produtivos Whitaker reagiria rapidamente ordenando ao Banco do Brasil que colocasse à disposição dos bancos que haviam sofrido evasão dos depósitos todos os recursos necessários à total normalização da situação25 Em maio de 1955 Whitaker assinou a Instrução 116 da SUMOC que simplesmente revogava as instruções 106 e 108 restabelecendo tanto o depósito compulsório quanto a taxa de redesconto vigorantes anteriormente Estabelecia que fossem restituídos aos bancos os depósitos excedentes em relação às antigas percentagens o que seria o tiro de misericórdia no plano de estabilização de Gudin Paralelamente o novo ministro limitaria as operações do Banco do Brasil a empréstimos para o comércio indústria e lavoura com prazo máximo de 120 dias Whitaker agia assim como um fiel seguidor da real bills doctrine acreditando não serem inflacionárias emissões que se destinassem aos setores produtivos ao contrário das que resultassem do financiamento do déficit do governo Entendia o ministro que com o orçamento do governo já em plena execução tudo que podia fazer era tentar não aumentar a taxa inflacionária sempre concedendo prioridade à liquidez das atividades produtivas26 como pode ser notado pelas taxas de expansão do crédito Quanto à política cafeeira Whitaker parecia insatisfeito com a política de intervenção pela qual nos últimos anos o governo brasileiro arcava praticamente sozinho com o ônus da retirada do produto do mercado beneficiando os concorrentes através da sustentação dos preços em níveis artificialmente elevados Determinou assim em abril de 1955 a suspensão temporária das compras de café visando pressionar os concorrentes a reconhecerem explicitamente os esforços já feitos pelo governo brasileiro na retenção de estoques O que Whitaker visava era recuperar a participação das exportações brasileiras no mercado mundial do produto que se havia reduzido sensivelmente com a política de open umbrella que vinha sendo implementada Com este objetivo dispunhase o ministro a acabar com a política intervencionista pois acreditava que a queda dos preços no mercado internacional beneficiaria o Brasil através da eliminação dos produtores menos eficientes Quanto a isto surgiriam sérias divergências com os técnicos do IBC que entendiam ser o café um produto de demanda inelástica e portanto só se lograria aumentar as receitas de divisas através de uma política de manutenção dos preços mesmo que isso resultasse num volume menor de exportações Neste particular o ministro entraria em rota de colisão com o presidente do Instituto Alkindar Junqueira que divergindo da sua orientação assinaria em maio com os concorrentes do Brasil o chamado plano de emergência O plano visava a estabilizar o mercado com os principais produtores concordando com a retirada dos excessos de safra de forma proporcional as exportações do triênio anterior Isto significava ignorar no entender de Whitaker os esforços já realizados pelo Brasil na retirada de estoques Tal fato violando totalmente a orientação do ministro resultaria na demissão do presidente do IBC e na não aprovação do mencionado plano pelo governo brasileiro Whitaker na verdade parecia preocuparse mais com a renda em cruzeiros da lavoura do que com a receita de divisas do país De fato a política cafeeira do ministro só era inteligível à luz dos objetivos maiores encarnados pela reforma cambial com a qual visava restituir à cafeicultura o que o governo apropriavase por meio do chamado confisco Acreditava que isto de fato resolveria boa parte dos problemas econômicos do país27 Num sentido mais amplo podese dizer que toda a política econômica de sua gestão no ministério estava não apenas atrelada mas submetida à referida reforma que era o objetivo central o cerne lógico de todas as suas decisões A reforma cambial Há muito que acompanhando os ciclos do balanço de pagamentos as práticas cambiais brasileiras vinham enveredando por um caminho frontalmente oposto ao recomendado pelas instituições internacionais em especial o Fundo Monetário Internacional FMI No governo Café Filho seriam dados alguns passos a mais na direção da diversificação das taxas cambiais o que resultaria num sistema cambial onde coexistiam exceções à parte 10 taxas cambiais distintas 5 de importação 4 de exportação e a do mercado livre por onde se efetuavam as transações financeiras Gudin havia postergado a questão da unificação das taxas cambiais mostrando ao FMI que o impacto orçamentário do saldo da conta de ágios e bonificações decorrente do regime de taxas múltiplas era indispensável à sua política de estabilização interna Ainda assim o exministro havia solicitado à instituição através de seu diretor Edward Bernstein uma consulta técnica visando a elaboração da reforma cambial Whitaker entretanto entendia que esta deveria ter total precedência sobre os demais objetivos de política e optou por retomar os contatos já iniciados por seu antecessor com o FMI tendo em vista a mudança do regime cambial Com este intuito o ministro concedeu ao então superintendente do BNDE Roberto Campos que havia colaborado com Gudin total autonomia para tornar realidade o mais rápido possível o que considerava o objetivo maior de sua administração Bastante ligado às instituições oficiais a opinião de Campos sobre este assunto refletia internamente a visão da comunidade financeira internacional de que o processo de substituição de importações pelo qual alguns países latinoamericanos haviam enveredado ao desincentivar a diversificação das exportações através da manutenção de taxas cambiais sobrevalorizadas perpetuava o desequilíbrio no balanço de pagamentos Neste sentido qualquer reforma seria incompleta se não efetuasse uma razoável desvalorização cambial e procedesse à unificação das taxas Campos estava decidido pela instituição de um mercado livre de câmbio apesar dos efeitos inflacionários que uma substancial desvalorização poderia gerar Acreditava ser impossível saber qual a taxa de equilíbrio e que ademais por pressupor a estabilidade de preços a implementação de taxas fixas num contexto inflacionário poderia neutralizar rapidamente o principal objetivo da reforma qual seja o incentivo às exportações em geral Quanto ao café tanto Campos quanto Whitaker entendiam que o país deveria adaptarse a preços mais baixos que desencorajariam externamente novos produtores e tentar aumentar a quantidade exportada elevando a participação brasileira no mercado mundial28 Não obstante ao menos três precondições seriam necessárias para o sucesso da reforma a consolidação a longo prazo dos vultosos compromissos externos de curto prazo a obtenção de um stand by credit a ser utilizado para evitar flutuações demasiado violentas no mercado livre e finalmente a reformulação do sistema tarifário brasileiro para garantir relativa proteção às indústrias após a eliminação dos ágios cambiais As duas primeiras Campos pretendia contornar com o apoio de Edward Bernstein que teria um destacado papel em todo o processo de elaboração da dita reforma quanto à última o Brasil já havia comunicado ao GATT a intenção de modernizar o seu sistema tarifário substituindo as tarifas específicas por tarifas ad valorem a partir de 1956 quando entraria em vigor o novo acordo Campos pretendia instituir temporariamente um sistema de sobretaxas cambiais que seriam incorporadas à futura estrutura tarifária Com base no estudo elaborado pela missão de trabalho enviada ao Brasil pelo FMI em março de 195529 viria à tona em junho do mesmo ano o que ficaria conhecido como Relatório Bernstein Essencialmente coincidente com a proposta de Campos o diretor do FMI sugeria duas alternativas para a reforma brasileira desvalorizar e unificar mantendo os leilões cambiais para as importações30 ou abandonar o regime de taxas fixas e instituir um mercado livre com taxa única e aplicável indistintamente às exportações e importações ficando estas últimas sujeitas a sobretaxas diferenciadas pelas cinco categorias A única restrição que Bernstein fazia à segunda alternativa era a escassez de reservas para intervenção no mercado em caso de movimentos especulativos o que significava ser recomendável que o Brasil negociasse seus compromissos externos a prazos mais favoráveis31 Outro ponto ainda em aberto dizia respeito à forma pela qual se procederia à eliminação do chamado confisco cambial Whitaker era inicialmente favorável à eliminação total e imediata sendo posteriormente convencido por Campos à eliminação gradual para serem evitadas grandes perturbações nos preços Após uma inesperada geada em agosto de 1955 optouse definitivamente por aplicarse uma desvalorização gradual ao câmbiocafé No final de setembro daquele ano estava pronta a Instrução da SUMOC que reformularia o sistema cambial brasileiro Essencialmente determinavase a unificação cambial por meio de um regime de taxas flutuantes de câmbio criandose no entanto um mecanismo diferenciado para o café visando a eliminação gradual do confisco após uma desvalorização inicial menor cerca de 10 o câmbiocafé mudaria semanalmente durante aproximadamente dois anos até a completa extinção do dito confisco e total unificação das taxas Asseguravase no entanto a manutenção da renda em cruzeiros da cafeicultura Havendo declínio dos preços externos o abatimento deverá ser proporcional e irreversivelmente diminuído para restabelecimento dos atuais preços internos32 O FMI aprovaria imediatamente e de forma até entusiástica o projeto33 O mesmo não ocorreria com o ministério que em sua maior parte julgava inoportuno impingir reversão de tal ordem à política cambial brasileira no apagar das luzes de um governo que era visto por muitos como apenas de transição Como a pressão das classes interessadas basicamente dos exportadores era intensa Café Filho decidiu consultar os candidatos mais votados nas eleições presidenciais Kubitschek Juarez Távora e Ademar de Barros não obtendo uma resposta satisfatória34 decidiu submeter o projeto ao Congresso o que significava na prática sepultar a reforma cambial Tal decisão resultaria na exoneração imediata da representação paulista no ministério encabeçada pelo ministro da Fazenda35 O alcance da mencionada reforma ia muito além da obstinada eliminação do confisco Acima de tudo esta refletia uma visão crítica do padrão de industrialização da América Latina que tinha sua expressão doméstica em Campos e externa nas instituições oficiais ligadas à comunidade financeira internacional especialmente o FMI Esta linha como já assinalamos visualizava o processo de substituição de importações como responsável principal pelos desequilíbrios do balanço de pagamentos pois desestimulava as exportações através de taxas cambiais artificialmente sobrevalorizadas Seguindo esta orientação liberalizante alguns países latino americanos tentariam através de reformas semelhantes enveredar pela trilha recomendada pelo FMI o Peru em 1948 o Chile em 1956 e a Argentina em 1959 são apenas alguns exemplos Desta forma a rejeição da reforma cambial WhitakerCamposBernstein significava a derrota de uma determinada visão do processo de desenvolvimento econômico e em alguma medida a opção que iria se tornar mais explícita no governo Kubitschek de intensificar e aprofundar o processo de industrialização através da substituição de importações Mário Câmara o novo ministro da Fazenda tentaria ainda perseguir uma política monetária contracionista elevando novamente as taxas de redescontos para os níveis vigentes na gestão Gudin No entanto restando apenas três meses de governo não seria mais possível qualquer mudança significativa na condução da política econômica 4 Considerações gerais Em retrospectiva o governo Café Filho corresponde a um período extremamente curto o que dificulta a análise cuidadosa das principais variáveis e do impacto da política macroeconômica É importante no entanto ainda que como tentativa examinar os efeitos da política de estabilização de fins de 1954 e da mudança de orientação na condução da política econômica ocorrida em meados de 1955 sobre os preços e o produto Em 1954 a taxa de crescimento do PIB atingiria 78 com a agricultura crescendo 79 a indústria 93 e o setor de serviços 95 ainda mantendose elevado o crescimento do PIB em 1955 é de 88 devido ao crescimento de 111 da indústria enquanto serviços e agricultura cresciam a 82 e 77 respectivamente36 Apesar do surpreendente crescimento do setor industrial tendo em vista a contração creditícia do final de 1954 a redução na formação bruta de capital fixo e nas importações de bens de capital como salientouse anteriormente sugere ter havido razoável contração dos investimentos em 1955 O quadro relativo à variação de preços é bem mais esclarecedor Em 1955 notase substancial queda no crescimento do índice de preços por atacado IPA em relação a 1954 de 30 para 131 devido ao desempenho dos preços agrícolas que crescem apenas 115 comparados a 30 em 1954 No setor industrial supostamente o mais afetado pela contração de fins de 1954 a taxa de variação dos preços aumentaria de 18 em 1954 para 246 em 195537 Isto deixa clara a razão pela qual não se pode atribuir à política de estabilização de Gudin a redução da taxa inflacionária em 1955 devendose esta muito mais a fatores estruturais como a boa performance dos preços agrícolas do que à redução da liquidez da economia Para finalizar são relevantes alguns comentários sobre a literatura existente buscando situar corretamente o período em perspectiva histórica Conforme foi observado o governo Café Filho caracterizou se do ponto de vista econômico por duas administrações com objetivos não apenas diversos mas em certo sentido antagônicos Gudin dava prioridade ao ajuste interno através de uma política monetáriofiscal contracionista enquanto Whitaker tinha como objetivo maior a eliminação do confisco através de uma ortodoxa reforma cambial Externamente podese notar na proximidade das instituições oficiais especialmente o FMI um traço comum entre as duas gestões o Brasil procuraria manterse como um bem comportado seguidor da orientação da ortodoxia representada por aquelas instituições Tornouse comum na historiografia econômica recente analisar o período de acordo com duas linhas de interpretação distintas porém não conflitantes38 A primeira e mais importante partindo de uma interpretação da crise de 1954 como a crise do projeto de desenvolvimento nacional e popular e procedendo a uma leitura equivocada do dito bom comportamento e da Instrução 113 visualiza o período como um primeiro passo na abertura ao capital estrangeiro Ianni 1968 por exemplo interpreta o suicídio de Vargas como a vitória daqueles que queriam reformular e aprofundar as relações com o capitalismo internacional p 68 Na mesma linha Boito Jr 1982 qualifica a crise de 1954 como a união da burguesia e do imperialismo contra o populismo p 97 enquanto Basbaum 1976 referese à Instrução 113 como tendo iniciado a desnacionalização da indústria brasileira vol 3 p 219 Primeiramente deve ser observado que interpretações recentes do segundo governo Vargas mostram ser enganosa a noção de ter existido tal projeto de desenvolvimento nacional e popular39 Vargas mais que ninguém sabia que dependia do apoio financeiro externo para realização de seu projeto original de governo e seu suposto afastamento do governo americano e das instituições internacionais a partir de 1953 foi consequência e não causa do encerramento da Comissão Mista BrasilEstados Unidos Este deveu se como já se observou a problemas políticos internos nos Estados Unidos relacionados à definição da política econômica perante a América Latina40 Ademais não seriam menos tensas as relações com os Estados Unidos durante os governos Café Filho e Kubitschek41 Em segundo lugar não há qualquer ruptura imposta pela Instrução 113 no que concerne o tratamento favorável concedido ao capital estrangeiro iniciado durante o segundo governo Vargas Como notou se acima a referida instrução apenas consolidou a legislação existente removendo impedimentos burocráticos à entrada de capitais Há sim ao contrário uma perfeita continuidade entre as medidas tomadas após 1953 no sentido da liberalização dos fluxos de capitais privados A segunda vertente visualiza o período como um interregno de estabilização caracterizado por políticas recessivas interposto entre dois governos voltados para o crescimento econômico Lessa 1981 classifica o período como um tateio de política econômica preocupada com a estabilidade via contenção da demanda global p 2542 enquanto Boito Jr 1982 define a política econômica como uma drástica contenção creditícia p 98 Como vimos é um equívoco interpretar o período como um ajuste contracionista Observouse nas seções anteriores que tal ajuste limitouse à gestão Gudin tendo sido totalmente sepultado na administração Whitaker que caracterizouse por uma completa reversão na condução da política econômica Ademais colocar a questão em termos da oposição entre crescimento e estabilização significa ignorar relevantes aspectos da política econômica praticada em boa parte do pósguerra que caracterizouse pela alternância de programas contacionistas e expansionistas num mesmo governo como mostram as administrações de Correa e Castro e Guilherme da Silveira no governo Dutra Lafer e em algum sentido Aranha no segundo governo Vargas Gudin e Whitaker com Café Filho Lucas Lopes e Paes de Almeida no governo Kubitschek e após 1964 Campos Bulhões e Delfim Não procedem portanto as análises que situam o governo Café Filho como ponto de inflexão seja quanto à política econômica doméstica seja quanto às relações econômicas externas e à política perante o capital estrangeiro O que se deseja enfatizar é que o desfecho da crise de 1954 com a morte de Vargas e a ascensão de Café Filho à presidência não impôs qualquer descontinuidade marcante ao processo políticoeconômico da Quarta República O período que se situa entre 1945 e 1964 caracterizouse pela permanência no poder do chamado pacto populista encarnado na aliança PSDPTB que excluía importantes setores das classes dominantes representados partidariamente pela UDN43 De uma certa forma a história política do chamado intermezzo democrático é a história da luta conspiratória desses setores pelo poder Com Café Filho tais setores eram governo E todo o transcurso de seu mandato seria marcado por sucessivas tentativas de ser impedida a volta do pacto populista ao poder No quadro político do pós guerra o governo Café Filho pode ser considerado um efêmero triunfo do golpismo udenista Mais do que um ensaio tratavase de um anúncio de 1964 Contrariando a máxima marxista a história apresentarseia originalmente como farsa para anos mais tarde repetirse como a verdadeira tragédia 1O autor agradece a Winston Fritsch Marcelo de Paiva Abreu Werner Baer e Sergio Besserman Vianna pelos comentários feitos a versão original deste trabalho Pinho 1986 assumindo responsabilidade pelos erros remanescentes O presente trabalho foi realizado com o apoio financeiro do CNPq 2 ia para o ministério para combater a inflação Não havia outra razão para eu ser ministro depoimento de Gudin ao programa de História Oral do CPDOCFGV 3Segundo documento interno do Ministério da Fazenda os compromissos vencíveis até o final de 1955 montavam a cerca de US340 milhões dos quais aproximadamente US230 milhões venciam até novembro de 1954 Ver Sinopse da situação cambial Arquivo Eugênio Gudin EUG 540910002 CPDOC FGV 4The New York Times 8101954 5Ver Sinopse da situação cambial setembro de 1954 Arquivo Eugênio Gudin cor 540910002 CPDOCFGV 6O chamado ponto IV do discurso de posse de Truman pelo qual pretendiase financiar projetos de desenvolvimento na região 7Ver Vianna 1987 p 8394 8Conforme notou o embaixador brasileiro em Washington O propósito do Secretário do Tesouro deste país Mr Humphrey de concordar e mesmo encorajar a criação de um organismo financiador de caráter internacional é prejudicial aos interesses latinoamericanos É mesmo o golpe de graça na existência do Eximbank telegrama de João Carlos Muniz a Gudin 23111954 Arquivo Eugênio Gudin cor 541123 CPDOCFGV No entanto criada em 1956 a Corporação Financeira Internacional por falta de recursos e poder só assumiria alguma importância no início dos anos 70 Ver Mason e Asher 1973 p 344 e segs 9Ver por exemplo os Articles of Agreement da Corporação Financeira em Mason e Asher 1973 p 780 10Em sucessivas entrevistas à imprensa internacional em setembro de 1954 Gudin sempre deixou claro que com a redução do controle sobre as finanças esperava que voltassem a fluir para o Brasil os capitais externos que aqui serão extremamente bem vindos Em Washington anunciou que o Brasil implementaria séria política de austeridade aliada à remoção dos obstáculos à livre entrada de capitais estrangeiros O Correio da Manhã 7955 e 2291955 11Ver Superintendência da Moeda e do Crédito Instrução 113 de 17155 No caso das empresas nacionais ficava a CACEX autorizada a conceder câmbio para o reembolso dos mesmos à taxa oficial mediante o pagamento antecipado de uma sobretaxa de Cr4000dólar o que equivalia em 1955 a um subsídio de cerca de 30 em relação ao mercado livre 12Ver Gordon e Grommers 1962 p 20 e Fishlow 1975 p 24 13Basicamente a Lei no 1807 de janeiro de 1953 que criou o mercado livre de câmbio e transferiu para este o movimento de capitais a Instrução 81 da SUMOC de 221253 e a Lei no 2145 de 291253 que isentou da licitação de divisas certas importações consideradas essenciais e introduzia disposições mais flexíveis quanto a conceituação de capitais mais favorecidos Ver Exposição Geral da Situação Econômica do Brasil Conselho Nacional de Economia 1959 p 1013 14Ver Ata da 495a Sessão do Conselho da SUMOC realizada em 26101954 e Revista do Conselho Nacional de Economia janfev de 1954 p 3341 15Ver Pinho 1986 p 539 16A instrução aplicavase apenas aos bancos cujos depósitos ultrapassassem os saldos máximos observados até 30 de outubro e numa proporção de tais acréscimos conforme a região 17Observador Econômico e Financeiro dezembro de 1954 editorial 18penso que o Presidente Vargas foi muito inspirado ao promover a lei de 29 de dezembro de 1953 estabelecendo as taxas múltiplas discurso de Gudin na Câmara dos Deputados em abril de 1955 Arquivo Gudin 550406 CPDOCFGV 19Ver Conjuntura Econômica dezembro de 1954 e Ata da 505a Sessão do Conselho da SUMOC 20Pinho 1986 p 196 21Conjuntura Econômica outubro de 1969 Contas Nacionais 22Whitaker 1982 p 321 ver também Whitaker 1954 23Whitaker 1982 p 305 24A Federação das Associações Rurais do Estado de São Paulo FARESP exaltou a acertada escolha do governo federal enquanto a Sociedade Rural Brasileira manifestou as fundadas esperanças dos cafeicultores paulistas no experimentado financista que saberá encontrar a melhor solução para o problema cafeeiro cf respectivamente O Estado de São Paulo 1341955 e telegrama da Sociedade Rural Brasileira a Whitaker em 551955 Arquivo Whitaker div 1 item E seç 1 pasta 1 doc 13 CPDOCFGV 25Observador Econômico e Financeiro editorial e p 114 26Whitaker 1982 p 332 27Conforme diria Whitaker posteriormente o que mais o estimulava no ministério era poder traçar uma rota de recuperação da situação financeira do país partindo naturalmente da redenção total da lavoura Whitaker 1982 p 296 28Quanto à posição de Campos frente à reforma ver seu Memorandum sobre a reforma cambial maio 1955 Arquivo Whitaker div1 item E seç 3 pasta 2 doc 23 CPDOCFGY 29International Monetary Fund Background Material 1954 e Staff Report and Recommendations 1955 30Com exceção das importações favorecidas para as quais seria fixada uma taxa não inferior à de exportação o que implicaria substancial desvalorização para os produtos subsidiados da categoria especial assim como aos pagamentos do governo e das autarquias 31Bernstein E A Report to the Minister of Finance p 10 Arquivo Whitaker div 1 item E seç 3 pasta 1 doc 12 CPDOCFGV 32Ver artigo 3 de O texto da reforma cambial Observador Econômico e Financeiro novembro 1955 33It seems to me as it does to everyone at the Fund that the new exchange system is a great improvement over the one that Brazil has had Carta de Bernstein à Whitaker em 691955 cf Arquivo Whitaker div 1 item E seç 3 pasta 3 doc 31 CPDOCFGY 34Ver Café 1966 p 439 35Vim para realizar a abolição do confisco Não sendo possível fazêlo considero minha missão finda declaração de Whitaker a O Estado de S Paulo em 71055 36Conjuntura Econômica outubro de 1969 col 121 37Idem colunas 449 38Para uma crítica mais detalhada e substanciada às duas linhas ver Pinho 1986 capítulo 4 39Para uma crítica a esta visão ver Vianna 1987 p 12232 e DAraujo 1983 p 113 e seguintes 40Para maiores detalhes ver Vianna 1987 p 12232 41Desde o governo Dutra os gestores da política econômica brasileira tentavam sensibilizar o governo americano com a tese de que o Brasil havia sido um dos únicos aliados beligerantes durante a guerra merecendo portanto tratamento preferencial em relação à América Latina Os Estados Unidos pareciam ignorar totalmente a argumentação das autoridades brasileiras Após sucessivos fracassos na negociação de um empréstimo oficial junto ao governo americano em janeiro de 1955 o ministro das Relações Exteriores Raul Fernandes escrevia ao embaixador em Washington que não se pode afastar a possibilidade de se chegar a uma situação que venha a determinar uma ruptura de ordem política de consequências imprevisíveis carta de Raul Fernandes a João C Muniz coleção de documentos Café Filho cor 550106 CPDOCFGV Tal tratamento só iria mudar no início da década seguinte com a promoção de novos fluxos de capitais oficiais para a região sob a égide da Aliança para o Progresso 42Segundo Lessa 1981 p 26 seria justamente a política restritiva deste período que geraria a conscientização do empresariado industrial já que a contenção da demanda trazia em seu seio o germe da política de desenvolvimento confirmada posteriormente 43Ver Jaguaribe 1983 CAPÍTULO 8 Democracia com desenvolvimento 19561961 Luiz Orenstein e Antonio Claudio Sochaczewski Introdução O governo Kubitschek caracterizouse pelo integral comprometimento do setor público com uma explícita política de desenvolvimento Os diagnósticos e projeções da economia brasileira empreendidos de forma sistemática desde o final da Segunda Guerra Mundial desembocaram na formulação do Plano de Metas que constituiu o mais completo e coerente conjunto de investimentos até então planejados na economia brasileira Por isto mesmo o plano foi implementado com sucesso alcançandose a maioria das metas estabelecidas tanto para o setor público como para o setor privado A economia cresceu a taxas aceleradas com razoável estabilidade de preços e em um ambiente político aberto e democrático Este capítulo aborda além da análise do Plano de Metas as suas políticas complementares cambial fiscal e monetária e examina o papel do setor público em todo o processo 1 A política cambial No início da década de 1950 a política cambial constituíase no principal senão único instrumento de política econômica à disposição do setor público As manipulações na taxa de câmbio e a imposição de quotas tarifas e impostos de importação e exportação formavam o conjunto principal de estratégias operacionais dos gestores da política econômica A evolução da economia brasileira na década de 1950 e até meados da década de 1960 foi marcada por modificações profundas na política cambial e cada uma dessas alterações constitui um marco decisivo no processo de desenvolvimento econômico O regime de taxas cambiais múltiplas cujas características foram discutidas no Capítulo 6 foi modificado diversas vezes através de novas instruções da Superintendência de Moeda e de Crédito SUMOC mantendose no entanto inalterado em sua essência até 1957 Observada de uma perspectiva mais ampla a reforma cambial de 1953 embora tenha apresentado resultados imediatos positivos teve seus efeitos amortecidos pela fase depressiva que atingiu o setor externo brasileiro a partir de 1954 pois os preços internacionais do café caíram violentamente a partir desse ano com consequente deterioração dos termos de intercâmbio A progressiva diminuição das receitas de exportação somada à intensificação do processo substitutivo comprometia o poder do setor público de orientar o processo de industrialização Assim o saldo disponível de divisas uma vez deduzidos das receitas de exportação os itens considerados incompressíveis1 diminuiu progressivamente de mais de US1 bilhão em 1953 para menos de US400 milhões em 1959 O espaço de manobra ao alcance do setor público para guiar o processo seletivo de importações fechouse gradualmente eliminando assim importante grau de liberdade na implementação da política econômica A única solução viável seria a entrada líquida de capitais autônomos de modo a compensar o declínio nas exportações Esse influxo garantiria por um lado o desafogo no balanço de pagamentos de modo a não interromper a importação de bens essenciais e por outro manteria a taxa de investimentos requerida pela continuação de processo de substituição de importações Como já visto no Capítulo 6 a Lei no 1807 e suas posteriores regulamentações estabeleceram incentivos para a entrada de capital estrangeiro A regulamentação definitiva foi efetivada em 19542 quando outros setores além daqueles definidos na Lei no 1807 energia transportes e comunicações foram qualificados a receber tratamento cambial favorecido Esses setores eram selecionados pela SUMOC com base no critério de seu interesse para a economia nacional A limitação dos subsídios às áreas prioritárias eliminava os incentivos a uma série de setores cuja rentabilidade era mais elevada do que a dos setores favorecidos Estes eram subsidiados exatamente pela ausência de interesse do setor privado como era o caso da infraestrutura onde restrições tecnológicas eou de capital mínimo impediam o investimento de capitais domésticos Ao permitir a entrada do capital pelo mercado livre e a correspondente importação pelo custo de câmbio o resultado líquido da operação era uma pressão adicional sobre a disponibilidade de divisas Se por um lado o investimento era realizado por outro significava maiores pressões a curto prazo sobre o balanço de pagamentos além das futuras remessas de amortizações e dividendos Complicando ainda mais a situação o governo tentava sistematicamente forçar para baixo a taxa do mercado livre através de grandes vendas de divisas disponíveis ou mesmo quando a pressão era alta através de operações de swaps a pesados custos futuros dado que a mesma era considerada uma espécie de taxa de equilíbrio cuja desvalorização traria efeitos psicológicos e políticos que o governo desejava evitar Essa pressão desestimulava o influxo de capitais Sendo necessário modificar o sistema de incentivos foi introduzida a Instrução 113 de 17011955 como já foi visto no Capítulo 7 A Instrução 113 incluía na lista de setores favorecidos praticamente todos os setores industriais excetuandose apenas aqueles que a critério da SUMOC fossem notoriamente supérfluos Dada a ausência de uma política de industrialização de longo prazo que pudesse definir o que era supérfluo esse conceito tornouse bastante flexível O movimento de capitais autônomos cresceu consideravelmente a partir de 1955 após atingir um mínimo em 1954 Não obstante o crescimento simultâneo das saídas os fortes ingressos garantiram um resultado líquido positivo médio da ordem de US131 milhões no período 19561961 Os ingressos registrados não representavam a disponibilidade efetiva de divisas posto que uma parte substancial deles se dava sob a forma de equipamentos ao abrigo da Instrução 113 Por outro lado esses números dão a medida da real contribuição do capital estrangeiro à formação interna de capital Os montantes de capital ingressados sob a Instrução 113 até dezembro de 1961 somaram US3794 milhões para as indústrias básicas e US1317 milhões para as indústrias leves3 Podese concluir que a Instrução 113 foi um instrumento poderoso para atrair capitais externos sem exercer pressão sobre a disponibilidade de divisas Os pedidos de câmbio favorecido para amortizações de financiamentos externos eram sistematicamente negados em favor da cobertura para remessas das inversões diretas Alegava o governo que assim procedia para não onerar em demasia o orçamento cambial das transações efetuadas à taxa oficial nem tampouco alimentar uma demanda excessiva por divisas no mercado livre4 Em agosto de 1957 operouse nova reforma no sistema cambial5 O objetivo era em primeiro lugar simplificar o sistema de taxas múltiplas e introduzir um sistema de proteção específica por produtos da mesma categoria Em segundo lugar as receitas líquidas das operações cambiais apropriadas pelo Tesouro através do Fundo de Ágios e Bonificações gerenciado pelo Banco do Brasil tinham vinculações de uso determinadas por lei o que eliminava sua flexibilidade como fonte de recurso para o setor público O reajustamento das tarifas por seu lado aumentava os recursos sem vinculação à disposição do Tesouro A reforma resultou na redução das cinco categorias anteriores a duas a Geral e a Especial Através da categoria geral eram importadas matériasprimas equipamentos e bens genéricos que não contassem com suficiente suprimento interno Pela categoria especial eram importados os bens de consumo restrito e os bens cujo suprimento fosse satisfatório pelo mercado interno Mantinhase o regime de leilões de divisas para cada categoria recebendo a categoria geral evidentemente a maior parcela de cambiais Uma terceira categoria não sujeita a leilão a categoria preferencial foi criada para a importação de bens com tratamento privilegiado papel trigo petróleo fertilizantes e equipamentos de investimentos prioritários A taxa paga era pelo menos igual ao câmbio de custo isto é a taxa cambial média paga aos exportadores Foram estabelecidas tarifas ad valorem variando de 0 a 150 para cada grupo de produtos similares Para a exportação foi mantido o regime de quatro categorias com bonificações distintas para cada uma As transações financeiras continuaram a ser operadas através do mercado livre Para operar o novo sistema criouse o Conselho de Política Aduaneira CPA com o objetivo de enquadrar os produtos em uma das categorias de importação e estabelecer as alíquotas que seriam pagas em um intervalo que variava de 30 abaixo a 30 acima das tarifas máxima e mínima fixadas para o grupo de produtos no qual o produto específico estivesse classificado Uma das principais ideias implícitas na reforma foi acelerar a substituição de bens de capital diminuindose a ênfase dada em anos anteriores à substituição de bens de consumo Essa reorientação tornou a política de importação coerente com o estágio alcançado pelo processo de substituiçãoindustrialização Na verdade alguns bens de capital foram incluídos na categoria especial o que tornou sua importação mais cara enquanto taxas favoráveis foram mantidas para a importação com ou sem cobertura cambial dos chamados bens de capitalcapital isto é aqueles necessários ao equipamento de empresas produtoras de bens de capital de produtos intermediários e de matériasprimas todos necessários à produção de equipamentos A indústria de bens de capital cresceu à taxa de 264 ao ano entre 1955 e 1960 em grande medida devido ao comportamento dos segmentos equipamentos e veículos e equipamentos de transporte6 A reforma de 1957 estabeleceu engenhosos artifícios para compatibilizar a contradição latente entre a política de prover equipamentos importados a baixo custo e o desejo de estimular sua produção interna Esses mecanismos incluíam a possibilidade de aplicação de quotas que assegurassem isenção ou redução de tarifa para certos produtos até uma quantidade importada pré determinada a redução de 50 na tarifa sempre que ficasse comprovada a incapacidade de a indústria doméstica prover o produto em quantidade suficiente e finalmente a aplicação da lei do similar nacional às indústrias que assim o requeressem e provassem estar aptas a suprir o mercado interno Havia assim um corpo coerente de disposições para ao mesmo tempo subsidiar a importação de bens de capital sem prejudicar a oferta interna Esse sistema que esteve em vigor até 1961 sofreu substanciais modificações ao longo desses anos As mais importantes referiamse à passagem gradual das exportações para o mercado livre Com efeito a Instrução 167 de janeiro de 1959 liberou as exportações de manufaturados para o mercado livre a Instrução 192 de dezembro de 1959 transferiu todas as exportações para esse mercado exceto as de café cacau óleo mineral cru e mamona em bagas finalmente a Instrução 181 de abril de 1959 liberou os fretes Paralelamente a essas liberalizações outras modalidades de controle foram introduzidas como será visto no Capítulo 8 De um ponto de vista mais amplo a reforma de 1957 implicou um aprofundamento do processo de substituição de importações na medida em que se alcançava estágios mais avançados na industrialização Devem no entanto ser consideradas algumas distorções criadas pela reforma Por um lado o congelamento do custo do câmbio de janeiro de 1959 a março de 19617 à taxa de Cr10000US enquanto os preços internos aumentavam cerca de 80 subsidiava crescentemente a importação dos produtos essenciais Por outro lado os setores prioritários ao importarem seus equipamentos pelo câmbio de custo tendiam a sobreinvestir e sem dúvida essa seria uma das causas da crise que se iniciou em 1963 Finalmente o governo continuou a exercer pressão baixista sobre a taxa do mercado livre gastando dessa forma divisas preciosas em benefício das remessas financeiras pagamentos de fretes e turismo 2 As políticas de desenvolvimento Se a política cambial foi o instrumento mais importante à disposição do setor público nesse período todas as outras políticas podem ser enquadradas no que chamaremos de políticas de desenvolvimento Isso não significa que todas as ações do setor público estivessem guiadas por um plano preestabelecido mas sim que à exceção das políticas de curto prazo os objetivos das decisões tinham sempre em mente o desenvolvimento Em verdade antes do estabelecimento do Plano de Metas todos os programas anteriores estavam limitados a alguns setores em geral de infraestrutura O programa da CMBEU como visto no Capítulo 6 frustrouse Teve no entanto consequências importantes A primeira delas foi a recomendação para a criação de um banco de desenvolvimento O Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico BNDE foi criado em 1952 com a atribuição entre outras de gerir um fundo especial arrecadado pelo setor público o Fundo de Reaparelhamento Econômico cujos recursos seriam utilizados na implementação do Programa de Reaparelhamento Econômico que consistia basicamente no conjunto de projetos da Comissão Mista Brasil Estados Unidos CMBEU Dificuldades quanto à mobilização de recursos externos e domésticos conduziram o BNDE a uma atuação de certa forma tímida evidenciandose que todo o programa de investimentos deveria ser revisto A primeira versão dessa revisão foi procedida pelo Grupo Misto CEPALBNDE criado em 1953 O Relatório do Grupo Misto CEPALBNDE baseouse na elaboração de projeções relativas ao desempenho de vários setores econômicos baseadas na evolução recente da economia e na necessidade de acelerar o crescimento econômico O pontochave do relatório foi a definição uma vez mais de áreas prioritárias de investimento e a determinação de pontos de estrangulamento O programa não chegou a ser implementado mas seu mérito está no fato de ter servido de base para o programa econômico seguinte No início de 1956 já instalado o novo governo eleito no ano anterior foi criado o Conselho de Desenvolvimento8 órgão diretamente subordinado à Presidência da República encarregado de traçar a estratégia de desenvolvimento para o país No final do mesmo ano o conselho formulou um plano de desenvolvimento atacando diversos objetivos e problemas setoriais o chamado Plano de Metas que constitui a mais sólida decisão consciente em prol da industrialização da história econômica do país Lessa 1981 O Plano de Metas era um plano quinquenal9 e a maioria de seus projetos estava baseada nos diagnósticos e definições da CMBEU e dos programas CEPALBNDE Ao contrário dos planos anteriores no entanto foi levado adiante com o total comprometimento do setor público As áreas de atuação pública e privada ficavam definidas de forma a realizar as inversões de capital público em obras de natureza denominada básica ou infraestrutural e facilitar e estimular as atividades e investimentos privados Em um plano mais geral os objetivos eram os de elevar o quanto antes o padrão de vida do povo ao máximo compatível com as condições de equilíbrio econômico e estabilidade social e também observadas as condições no nível interno de emprego principalmente do capital e do balanço de pagamentos com o exterior Conselho do Desenvolvimento 1959 p 14 e 21 As hipóteses que sustentavam o plano eram as mesmas usadas nas projeções do Grupo CEPALBNDE crescimento anual de 2 na renda per capita os preços do café declinariam de 1955 em diante estabilizandose ao nível de 19491952 a receita de exportação de produtos outros que não café cresceria à taxa anual de 62 o coeficiente de importação seria reduzido de 14 para 10 supondo se uma elasticidaderenda da demanda por importação igual a um a redução de 4 no coeficiente de importação implicaria substituir 30 do total das importações até 1962 a inflação prevista era de 135 ao ano Conselho de Desenvolvimento 1959 p 21 O plano contemplava investimentos de cinco principais áreas energia transporte alimentação indústrias de base e educação Além dessas uma meta autônoma era a construção da nova capital do país cujos gastos não estavam orçados no plano Energia e transportes eram novamente as áreas principais de investimento com 713 do total de recursos a cargo quase que integralmente do setor público Para as indústrias de base previase 223 da inversão total a cargo principalmente do setor privado ou do financiamento do mesmo por entidades públicas As metas de educação integralmente a cargo do setor público e alimentação receberiam 64 dos recursos A Tabela 81 resume o programa Tabela 81 Brasil Plano de Metas estimativa de investimento total 1957 1961 bilhões de Cr e milhões de US Fonte Conselho do Desenvolvimento 1959 Supondose que as previsões do plano estivessem corretas no que diz respeito à taxa de crescimento do produto e da inflação isto é 2 da renda per capita mais 3 de crescimento populacional e 135 de inflação o investimento previsto teria representado cerca de 5 do PIB real no período de 19571961 um montante apreciável para uma economia cuja taxa bruta de poupança no período havia sido em média de 16 As principais metas referiamse a energia elétrica elevar a capacidade geradora de 3 milhões de kW em 1955 para 5 milhões de kW em 1960 e iniciar obras que assegurassem um aumento de 36 milhões de kW no período de 19611965 carvão aumentar a produção de 2 milhões de toneladas em 1955 para 3 milhões de toneladas em 1960 petróleo aumentar a produção de 6800 barrisdia para 100000 barrisdia em 1960 ferrovias além do reaparelhamento do material rodante o plano previa a construção de 2700 km de linhas sobre o total de total de 37000 km em 1955 rodovias construção de 12000 km de 1955 a 1960 sobre o total de 460000 km em 1955 e pavimentação de 5000 km sobre um total de 3100 km em 1955 siderurgia elevar a produção de aço bruto de 1 milhão de toneladas em 1955 para 2 milhões em 1960 e iniciar obras para alcançar 35 milhões em 1965 cimento aumentar a produção de 27 milhões de toneladas em 1955 para 5 milhões de toneladas em 1960 indústria automobilística instalar a indústria e produzir em 1960 um total de 170000 veículos com índice de nacionalização de 90 em peso para caminhões e caminhonetas e 95 para automóveis indústria mecânica e de material elétrico pesado o plano especificava os subsetores a serem estimulados material elétrico pesado máquinas operatrizes máquinas e equipamentos para indústrias diversas caldeiras e outros equipamentos pesados Além dessas foram fixadas metas menos importantes incluindo educação e alimentação Ao setor público caberia cerca de 50 do desembolso Os fundos privados contribuiriam com 35 e o restante viria de agências públicas para os programas tanto públicos como privados Os recursos externos não eram detalhados no plano No entanto a previsão feita para a capacidade de importar no período esclarece o que era esperado do exterior A previsão era de um déficit decrescente no balanço de pagamentos alcançandose o equilíbrio em 1961 Quanto aos instrumentos as principais fontes de financiamento dos programas de investimento nos setores de energia e transporte eram fundos de vinculação orçamentária criados durante a década Esses fundos administravam recursos oriundos de tributação exclusiva ou não No plano previase que 55 dos Cr1l3 milhões que seriam gastos pela União proviriam de fundos ou dotações de dispêndio vinculado Conselho do Desenvolvimento 1959 p 35 Na ausência de qualquer proposta de reforma tributária esse gasto teria significado na hipótese de todas as previsões estarem corretas um déficit orçamentário de aproximadamente 22 do PIB Esse valor parece incompatível com um dos objetivos do plano qual seja o controle da inflação ao nível de 135 dada a impossibilidade de se financiar esse déficit de outra forma que não a emissão de moeda Mais ainda não deve ser esquecido que o plano não contemplava fontes de recursos para a construção da nova capital que absorveria em média cerca de 06 do PIB anual no período 1957196210 Lessa 1981 sugere que a política econômica implícita no plano continha quatro peças básicas 1 tratamento preferencial para o capital estrangeiro 2 o financiamento dos gastos públicos e privados através da expansão dos meios de pagamento e do crédito bancário respectivamente tendo como consequência fortes pressões inflacionárias 3 a ampliação da participação do setor público na formação de capital 4 o estímulo à iniciativa privada Os estímulos às inversões privadas compreendiam vários aspectos Em primeiro lugar as reservas de mercado em benefício de bens produzidos no país eram dadas pela política cambial principalmente depois da reforma de 1957 e pela lei de similares Como se viu esta lei garantia a total exclusão do produto da pauta de importação caso sua produção interna fosse em volume e qualidade suficientes para atender a demanda Ademais garantiase câmbio preferencial para a importação de todo o equipamento destinado a setores prioritários A indústria automobilística e a indústria naval por exemplo situavam se entre as metas prioritárias e receberam amplas preferências para importação Um segundo grupo de estímulos à empresa privada referiase ao crédito provido pelo BNDE que juntamente com o Banco do Brasil supria recursos de longo prazo a juros baixos e pagamentos sujeitos à carência o que na conjuntura inflacionária significava uma taxa real de juros negativa De 1952 a 1963 o BNDE concedeu Cr64 bilhões de créditos na forma de empréstimos reembolsáveis dos quais Cr18 bilhões 28 para as indústrias básicas Aproximadamente 10 desses créditos dirigiuse à indústria automobilística BNDE Exposição 1963 Outro incentivo indireto à expansão do crédito ao setor privado dizia respeito aos constantes déficits de caixa do Tesouro cujo financiamento através da emissão de moeda permitia a expansão contínua do crédito nominal dos bancos privados Finalmente outro grande estímulo à empresa privada era a concessão de avais pelo BNDE para empréstimos contratados no exterior Até 1961 o Banco havia concedido avais no montante de US890 milhões dos quais US382 milhões para as indústrias básicas BNDE Exposição 1963 No período 19571961 o PIB cresceu à taxa anual de 93 o que significou uma elevação de 51 ao ano da renda per capita Esse valor é bem superior ao objetivo do plano A inflação média no entanto foi de 238 As previsões do setor externo foram excessivamente otimistas As exportações exceto café apesar de terem crescido acima de 62 praticamente estagnaram no período 19581960 a taxa anual de 89 deveuse aos aumentos excepcionais de 1957 e 1961 Os preços do café caíram constantemente a partir de 195511 Como consequência a capacidade para importar ficou bem abaixo das previsões apesar do ingresso de capitais de longo prazo ter superado os valores esperados O resultado foi a ocorrência de fortes déficits no balanço de pagamentos exceto em 1961 alcançando uma média de US58 milhões em 19571961 Outra consequência foi a rápida redução do coeficiente de importação que alcançou 7 em 1960 Os resultados referentes a metas específicas são mostrados na Tabela 82 Podese observar que não obstante alguns resultados estarem bem abaixo do previsto carvão e ferrovias que sendo de certa forma complementares refletiam a opção pelo transporte rodoviário a maioria alcançou altas percentagens de realização em relação às previsões O mesmo ocorreu com outras metas secundárias ou não específicas em especial a rápida substituição de equipamentos mecânicos e elétricos Tabela 82 Brasil Plano de Metas previsão e resultados metas físicas 19571961 Fontes Banco do Brasil Relatório IBGE Anuário Estatístico do Brasil vários anos e IBGE 1990 Não é fácil procederse a uma avaliação final das consequências do Plano de Metas Sem dúvida representou um impulso extraordinário ao desenvolvimento A estrutura econômica modificouse rapidamente com o crescimento do setor industrial sua modernização e a implantação de novos ramos As bases para a solução dos problemas de infraestrutura foram lançadas para atender tanto a demanda imediata como para prever expansões futuras Os desequilíbrios regionais e sociais foram aprofundados A construção da nova capital constituiuse em um dos fatores de êxito do plano encaminhando a solução para a antiga preocupação de se iniciar a ocupação da faixa não litorânea do país O plano no entanto resultou em sérias dificuldades não previsíveis ou controláveis O que de imediato se percebe na sua elaboração é a total ausência de definição dos mecanismos de financiamento que seriam utilizados para viabilizar um conjunto tão ambicioso de objetivos com a exceção de declarações triviais inseridas mais para aplacar a crítica de seus opositores do que para configurar efetivamente uma diretriz de atuação12 Na ausência de um sistema financeiro com dimensão maturidade e flexibilidade suficientes para captar as poupanças requeridas pelos investimentos propostos a única solução teria sido a elevação da carga fiscal Tal solução supondo possível sua aprovação no Congresso encontraria fortes resistências por parte dos empresários que não estavam dispostos a verem seus programas de investimento comprimidos por impostos mais elevados O esquema financeiro encontrado para a realização do Plano de Metas o financiamento inflacionário gerava através do aumento de lucros de empresas privadas e públicas do aumento da tributação nominal e diferencial e é claro da emissão de moeda os recursos necessários à sua consecução O elevado crescimento do produto especialmente da renda urbana permitia uma transferência de renda na margem sem que os grupos econômicos perdessem posição absoluta Os planos periódicos de estabilização quando implementados não foram mais que tentativas de reduzir o ritmo inflacionário a níveis toleráveis a par do aspecto político de mostrar algum esforço para conter o custo de vida ou mesmo aplacar as críticas do FMI sem nunca sacrificar o desenvolvimento pela estabilidade Uma vez iniciado qualquer esquema de retração do crédito as empresas reagiam protestando contra essas medidas pois eram dependentes do crédito bancário para seu capital de giro As marchas e contramarchas da política monetária no período do Plano de Metas não representam mais do que tentativas de compatibilizar variáveis muitas vezes antagônicas como crescimento estabilidade altos lucros e baixo custo de vida As tensões geradas nesse processo foram dissolvidas pelo crescimento do produto Enquanto este se manteve crescendo a níveis elevados foi possível conciliar A desaceleração do crescimento econômico trouxe consigo a crise política e social que abalou o país a partir do final de 1962 como será visto no Capítulo 9 3 O papel do setor público Todos os planos elaborados durante o período colocavam nas mãos do setor público a tarefa de conduzir as obras de infraestrutura que objetivavam romper os estrangulamentos que tolhiam o processo de industrialização As origens dessa responsabilidade podem ser encontradas na instalação da primeira usina siderúrgica do país e na luta pelo monopólio estatal do petróleo A tendência geral que se acelera na segunda metade dos anos 1950 foi a de delegar ao setor público o provimento de insumos básicos aço e energia por exemplo bem como a criação da infraestrutura básica transporte comunicações vital para o processo de industrialização Dessa forma o Estado passou a ter sob seu controle a produção de aço através das três maiores usinas do país a Companhia Siderúrgica Nacional CSN Cosipa e Usiminas a produção e refino de petróleo através da Petrobrás a produção e exportação de minério de ferro pela Companhia Vale do Rio Doce a produção de soda cáustica pela Companhia Nacional de Álcalis crescente envolvimento na produção de energia elétrica através da CHESF e de Furnas transporte ferroviário através da Rede Ferroviária Federal navegação de cabotagem através do Lloyd Brasileiro e Companhia de Navegação Costeira controle e construção de novas rodovias através do Departamento Nacional de Estradas de Rodagem DNER e dos departamentos de estrada de rodagem estaduais DERs que gerenciavam o Fundo Rodoviário Nacional Além de suas atividades tradicionais o setor público aumentou substancialmente seu controle sobre o crédito através do Banco do Brasil e a comercialização de diversos produtos de exportação tais como café cacau pinho mate açúcar borracha e sal entre outros através de autarquias específicas13 A crescente intervenção do governo na atividade econômica não encontrava grande resistência por parte do setor privado Em uma pesquisa feita entre empresários em 1963 Richers Machline Bouzan Carvalho e Bariani 1963 72 dos entrevistados concordavam em que as atividades empresariais diretas até então exercidas pelo governo haviam contribuído para o desenvolvimento econômico do país Essa porcentagem baixava para 56 quando se indagava sobre o artigo 146 da Constituição que dispunha sobre a intervenção da União no domínio econômico e sobre o monopólio de determinados setores industriais e atividades A pesquisa revelava no entanto a sempre presente contradição entre os juízos formulados ao nível micro e as avaliações ao nível macro A maioria dos empresários queixavase dos altos impostos dos controles excessivos sobre o comércio exterior e da crescente intervenção do Estado em áreas onde talvez a iniciativa privada pudesse florescer Em resumo se o Estado tivesse se limitado a desempenhar o seu papel original de fornecedor de energia e transportes baratos teria obtido o apoio incondicional dos empresários brasileiros A participação das receitas totais do governo no PIB permaneceu constante até 1957 em torno de 1920 aumentando nos anos centrais do Plano de Metas até 232 A elevação simultânea das cargas bruta e líquida indica tanto o aumento da arrecadação como a maior retenção dos recursos em mãos do governo Como receitas não vinculadas o Imposto de Consumo e o Imposto de Renda constituíamse nas fontes mais substanciais de recursos federais No entanto se adicionarmos o Saldo de Ágios e Bonificações ao Imposto de Importação que incidia sobre as mesmas operações esse imposto conjunto é o mais importante na arrecadação federal A participação do governo no gasto total cresceu de 19 em 1952 para 237 em 1961 As despesas de pessoal se elevaram a uma taxa anual de 81 no período Outro fator que elevava constantemente os gastos correntes do governo residia nos auxílios subvenções e coberturas dos déficits das empresas públicas de transportes Com exceção do DNER cujos fundos eram vinculados ao Imposto Único sobre Combustíveis e Lubrificantes o que lhe conferia autonomia financeira as empresas ferroviárias marítimas e aéreas de propriedade do governo federal sobreviviam às custas de ajuda governamental Essa política visava manter baixos os fretes e as tarifas de transporte diante de sua importância na composição do custo industrial e do custo de vida As empresas privadas de transporte por outro lado incluindose nesse caso as empresas geradoras e distribuidoras de energia elétrica também eram obrigadas a manter baixos os preços de seus produtos em face da disposição legal que as obrigava a calcular as quotas de amortização de seu ativo fixo sobre o custo histórico de aquisição dos equipamentos Dessa forma a inflação contínua transformava os fundos de depreciação em proporção reduzida dos custos de reposição das empresas forçando as a manterem uma alta percentagem de lucros retidos como reservas de reposição disfarçadas Tais políticas aumentavam as responsabilidades do governo federal tanto na crescente distribuição de fundos a cada ano para dar apoio financeiro às suas empresas quanto no investimento de infraestrutura em áreas onde o setor privado não podia ser estimulado por causa dos controles de preços Os recursos mobilizados em favor da política de tarifas baixas alcançavam entre 7 e 8 do total das receitas Em 1961 refletindo o início efetivo das operações da Rede Ferroviária Federal SA RFFSA que fundiu todas as ferrovias sob jurisdição federal essa proporção elevouse para 13 aumentando em termos reais o montante total de assistência em 55 com relação a 1955 Dessa forma as despesas correntes cresceram a altas taxas durante o período colocando em risco a capacidade de poupança do setor público Houve aumento da capacidade de poupança nos anos de 1958 1959 e 1960 Em 1959 as despesas correntes diminuíram sua proporção na receita tanto em função do aumento na arrecadação real como pelo atraso usual do ajustamento dos gastos a tais aumentos A elevação da receita nesse ano se deveu quase que exclusivamente a um aumento real de 200 na arrecadação dos ágios cambiais e impostos de importação em consequência da reforma tarifária de 1957 O governo federal aumentou sua arrecadação em cerca de 54 reais o que dada sua participação na arrecadação geral implicou aumento de 225 no total da receita Atrasando os gastos correntes em relação à receita cresceram apenas 79 em 1958 dispôs o governo de maiores recursos de investimento em um período crítico do Plano de Metas As restritas disponibilidades de poupança eram obviamente insuficientes para financiar os requerimentos da formação de capital É importante observar que durante o período 19561961 a formação de capital do governo central de longe a mais importante cresceu à taxa anual real de mais de 15 enquanto as empresas públicas aumentavam seus gastos em investimento em 19601961 em mais de 25 ao ano Os investimentos se concentravam no setor industrial especialmente na produção química e mineral onde se incluíam a produção e refino de petróleo e a extração de minério de ferro O setor de transportes e comunicações recebeu a maior parte dos investimentos a partir de 1958 em consequência da formação da RFFSA O ponto central a ser observado quanto à participação do setor público diz respeito não somente aos montantes mas também aos aspectos qualitativos da mesma De fato ao exercer uma demanda autônoma de investimento de montante substancial o setor público estava em condições de sustentar uma demanda efetiva suficientemente alta para manter sob controle o ciclo econômico Tal evidência sugere que o investimento público se constituía em variável decisiva para a indústria de bens de capital mantendo um elevado nível de atividade deste setor até o início da crise dos anos 1960 4 As políticas fiscal e monetária A forte ênfase na estratégia desenvolvimentista transferiu as questões relativas à política fiscal e monetária para segundo plano uma vez que praticamente durante todo o período 19561961 essa política esteve vinculada enquanto variável dependente ao processo de industrialização Há porém exceções por exemplo nos episódios do Programa de Estabilização Monetária na gestão Lucas Lopes no Ministério da Fazenda e das discussões do FMI com o governo brasileiro para negociação da dívida e empréstimos externos Por outro lado em que pese sua atuação relativamente passiva há nos anos em análise uma organização operacionalmente competente das autoridades monetárias não estando o sistema financeiro público despojado de racionalidade específica14 A política econômica em especial a de moeda e crédito era gerenciada pela SUMOC pelo Banco do Brasil e pelo Tesouro A SUMOC era o órgão controlador do sistema Criada em 1945 muitas das suas atribuições de estabelecer políticas eram as de um Banco Central típico Era responsável pela política cambial fixava o juro de redesconto fixava o percentual de depósitos compulsórios dos bancos fiscalizava o registro de capitais estrangeiros podia operar no mercado aberto e fiscalizava os bancos comerciais O Banco do Brasil nas suas funções de Banco Central operava a Carteira de Redescontos e a Caixa de Mobilização Bancária a primeira para crédito seletivo e de liquidez a segunda como emprestador de última instância Como órgão executor da política traçada pela SUMOC operava a Carteira de Câmbio e a Carteira de Comércio Exterior CACEX A primeira realizava a compra e venda de moedas nas taxas fixadas pela SUMOC Na prática o Banco controlava integralmente o câmbio já que os bancos comerciais autorizados a operar em divisas eram obrigados diariamente a repassar ou solicitar cobertura para posições compradas ou vendidas que ultrapassassem os limites fixados pela SUMOC A segunda implementava as políticas seletivas de exportação e importação estabelecidas pela SUMOC Como agente financeiro do Tesouro o Banco recebia a arrecadação tributária e outras rendas da União e realizava pagamentos em nome dela Além disso como banco do governo podia realizar operações de crédito ao Tesouro supostamente por antecipação de receitas em cada exercício fiscal Além destas atribuições o Banco do Brasil realizava dois serviços por conta da SUMOC era responsável pelo serviço de compensação de cheques e era depositário das reservas voluntárias dos bancos comerciais O Tesouro Nacional era o órgão autorizado a emitir papelmoeda e amortizálo através da Caixa de Amortização Na cúpula do sistema dando a orientação geral estava o Conselho da SUMOC constituído pelo ministro da Fazenda pelo presidente do Banco do Brasil pelo diretorexecutivo da SUMOC pelos diretores da Carteira de Câmbio CACEX e Carteira de Redesconto do Banco do Brasil e pelo presidente do BNDE Desta forma havia uma divisão nítida de atribuições o Conselho da SUMOC era o órgão normativo a SUMOC o órgão de controle e fiscalização e o Banco do Brasil o órgão executor Formalmente não havia ambiguidade na definição de funções O único mecanismo intrincado de relação entre estes órgãos dizia respeito à emissão de papelmoeda O órgão emissor de papelmoeda era a Caixa de Amortização do Tesouro Nacional que no entanto não tinha poderes para colocálo em circulação Esta atribuição era exclusiva da Carteira de Redescontos que não obstante estar inserida no Banco do Brasil tinha contabilidade independente Esta Carteira por sua vez não tinha estrutura operacional para distribuir o papelmoeda serviço que era realizado pelo Banco O mecanismo que viabilizava novas emissões era o seguinte o Banco necessitava de papelmoeda para sua própria caixa ou para repassar aos bancos comerciais de quem ele era depositário das reservas voluntárias Para isso levava à Carteira de Redescontos CARED títulos comerciais ou notas promissórias de suas operações correntes que redescontava em troca do papelmoeda A CARED por sua vez solicitava ao Tesouro um empréstimo de papel moeda Teoricamente portanto o papelmoeda era emitido garantido por legítimas operações comerciais como mandam os manuais de banco central Uma vez vencidos os títulos redescontados o Banco resgatava o papelmoeda à CARED e esta o devolvia ao Tesouro para incineração na Caixa de Amortização Era exatamente sobre esse mecanismo que recaíam as críticas daqueles que desejavam modificar a estrutura das autoridades monetárias brasileiras A questão toda estava no Banco do Brasil que mesclava três atribuições consideradas incompatíveis com a política monetária ser agente financeiro do Tesouro autorizado a realizar operações de crédito ser o depositário das reservas voluntárias dos bancos comerciais ser o maior banco comercial do país e o único banco rural Esta mistura de banco comercial e autoridade monetária era considerada prática inadequada de banco central pela simples razão de que não existiam limites rígidos à emissão de papelmoeda De fato a curto prazo a limitação era de que o débito da CARED para com o Tesouro por conta de papelmoeda emitido não podia ultrapassar 25 das disponibilidades em ouro e divisas Artigo 2 do Decretolei no 4792 No entanto a longo prazo tal limitação não existia pois toda vez que a CARED atingia este limite o Congresso Nacional votava uma lei encampando a emissão realizada pelo Tesouro Isto é o Tesouro passava a ser o responsável pelo papel moeda em circulação cancelandose os débitos da CARED Banco do Brasil e Tesouro O papelmoeda no entanto constitui uma fração menor dos meios de pagamento em relação à moeda escritural O segundo vazamento da política monetária vinha da combinação dos dois outros atributos do Banco do Brasil isto é ser depositário das reservas dos bancos comerciais e ser ele mesmo um banco comercial De fato um banco comercial tem como limitação às suas operações o volume de reservas que tem depositado junto à autoridade monetária As reservas compulsórias fixam para o sistema bancário o multiplicador e são exatamente as reservas voluntárias ou o excesso de caixa livre para empréstimo que permitem a expansão das operações Se um banco expande excessivamente seus empréstimos necessariamente perderá reservas mas se ao perder na compensação este banco pode creditar a reserva do banco credor o que o Banco do Brasil podia fazer criando reservas então este banco não tem limite para suas operações ativas Assim tanto pelo lado do papelmoeda como pelo lado da moeda escritural a posição privilegiada do Banco do Brasil permitia sua expansão sem restrição15 Na verdade as três atribuições do Banco do Brasil combinavamse funcionalmente e implicavam a crescente operação daquele estabelecimento Isto não quer dizer no entanto que o Banco do Brasil operasse completamente fora de controle A única forma de restringilo era impondo limites às suas operações ativas das várias carteiras o que era feito pelo Conselho da SUMOC em cada ano No entanto uma coisa é controlar um banco comercial pelas reservas compulsórias isto é através de uma percentagem fixada impessoal e irrecorrível Outra é impor limites a um banco com quase mil agências responsável básico pelo crédito rural e acima de tudo emprestador do Tesouro Fixavase o limite anual mas se chovia se houvesse seca se o funcionalismo era aumentado se um plano de investimento era iniciado estes limites eram sistematicamente alterados revistos e ignorados Teoricamente era possível controlar a expansão dos meios de pagamento mas na prática as pressões políticas e de política econômica inviabilizavam o esquema Portanto o cerne da questão da descoordenação criticada na estrutura das autoridades monetárias estava na posição do Banco do Brasil e toda a discussão da reforma bancária iniciada podese dizer com Sir Otto Niemeyer em 1931 e supostamente terminada com as reformas do sistema financeiro em 19641965 estava no que ocorreria com o Banco caso fosse criado o Banco Central Os diversos projetos apresentados colocavam a falsa discussão entre criar o Banco Central ou manter a SUMOC quando o ponto real era qual seria o papel do Banco do Brasil na nova estrutura Anualmente o orçamento era fixado considerandose pequenos déficits que em geral elevavamse no correr da execução pela abertura de créditos adicionais ou despesas sem cobertura Sob o ponto de vista da pressão sobre os meios de pagamento no entanto o que interessa é o déficit de caixa do Tesouro isto é a diferença entre a receita arrecadada e a despesa efetivamente realizada Devese lembrar ainda que a diferença entre o déficit orçamentário e o déficit de caixa correspondia a despesas transferidas para os exercícios seguintes pressionando a execução de exercícios futuros A cobertura do déficit de caixa indicada na Tabela 83 se fez preponderantemente através de empréstimos do Banco do Brasil ao Tesouro A característica particular do Banco do Brasil no sistema financeiro brasileiro com funções de banco central e banco comercial faz com que qualquer crédito contra ele em particular depósitos não seja moeda escritural secundária mas sim base monetária Desta forma a cobertura dos déficits do Tesouro através de crédito em conta corrente no Banco do Brasil implicou permanente expansão primária dos meios de pagamento É interessante observar que tanto as publicações oficiais da época como os estudos acadêmicos não se davam conta deste fato insistindo em controlar a expansão do papel moeda como se este fosse o único meio autônomo de expansão da base monetária Tabela 83 Brasil Déficit de caixa do Tesouro e seu financiamento 1956 1960 bilhões de cruzeiros correntes Fonte Banco do Brasil Relatório diversos anos e SUMOC Relatório diversos anos Além das despesas de custeio o item mais importante de gasto do Tesouro referiase aos subsídios às empresas de transporte de propriedade do governo federal Essas autarquias haviam realizado enorme esforço de investimento no período do Plano de Metas elevando paralelamente suas despesas operacionais Por outro lado o governo federal era reticente em liberar as tarifas de transporte temendo sua influência sobre o custo de vida e sobre a inflação É interessante observar que as tarifas mais controladas eram as das ferrovias isto em face de uma opção clara pelo transporte rodoviário feita pelo Plano de Metas Desta forma entre auxílios subsídios e cobertura dos déficits operacionais as empresas de transporte receberam subvenções do governo federal da ordem de 1213 da sua receita em 19551960 Comparados com os valores do déficit de caixa do Tesouro observamos que a cobertura do déficit do transporte ferroviário correspondia a parcela substancial dos aportes do Tesouro Várias razões explicam este ponto Em primeiro lugar a rede ferroviária do Brasil se estende por regiões caracterizadas por fortes influências políticas locais e assim uma revisão de tarifas poderia precipitar crises econômicas localizadas o que não era de interesse do governo A fortiori a eliminação de ramais deficitários era ainda mais problemática Em segundo lugar a revisão de tarifas de transporte suburbano traria consequências sobre o custo de vida que o governo desejava evitar Finalmente o corte dos gastos de custeio significaria necessariamente e quase exclusivamente cortes em pessoal com consequências sobre o nível de emprego Desta forma tornavase difícil reduzir o déficit operacional dessas empresas e todos os governos até 1964 recusaramse sistematicamente a atacar a questão mais profundamente É importante examinar quais os reais instrumentos de política que contavam as autoridades monetárias para restringir a expansão do crédito Dos instrumentos clássicos as operações de mercado aberto eram inexistentes posto que não havia um volume de Letras do Tesouro em circulação no montante suficiente para dar a necessária flexibilidade ao instrumento Por outro lado as Letras eram colocadas compulsoriamente junto ao público basicamente importadores e exportadores visto que as autoridades monetárias não podiam oferecer taxa de juros acima da legalmente permitida 12 ao ano o que face às taxas de inflação existentes inviabilizava a tomada voluntária Pela mesma razão o redesconto não podia ser operado a taxas punitivas que induzissem os bancos a só recorrer a esta fonte quando tivessem realmente necessitando de caixa O limite era fixado pelo volume da assistência financeira que cada banco poderia ter equivalente a um múltiplo de seu capital O comportamento dos bancos neste particular era bem diferenciado Os grandes e tradicionais bancos por razões de prestígio jamais recorriam ao redesconto enquanto que os bancos pequenos estavam permanentemente no teto permitido O depósito compulsório como se sabe é um instrumento lento e de grande impacto Por esta razão as autoridades monetárias relutavam em propor seu aumento fazendoo apenas em ocasiões excepcionais Ademais a sua elevação dependia de autorização do Congresso o que tornava o processo bastante inflexível As autoridades monetárias contavam no entanto com dois instrumentos heterodoxos isto é mecanismos que de uma forma ou de outra controlavam a expansão dos meios de pagamento O primeiro referiase à manipulação dos empréstimos das diversas carteiras do Banco do Brasil Observese que as variações nos depósitos do Banco do Brasil correspondem a uma variação na base monetária Assim as autoridades monetárias podiam regular a base monetária pela maior ou menor facilidade de crédito concedido pelo Banco O segundo estava ligado às operações de câmbio e referiase simplesmente à compra e venda de divisas ou como era mais comum à venda de Promessas de Venda de Câmbio PVC O governo emitia a PVC mas sem entregar imediatamente as divisas Mais tarde ao liquidar a operação era obrigado a comprar essas divisas para entregálas ao importador pagando uma taxa de câmbio mais elevada ao exportador Tudo se passava como se esta diferença de câmbio correspondesse ao juro pago pelo governo pela emissão de seu título PVC Desta forma a possibilidade de eliminar o déficit de caixa do Tesouro e assim interromper a expansão indesejada de base monetária dependia teoricamente de um dos seguintes fatores em primeiro lugar de um aumento na receita tributária cuja estrutura anacrônica não possibilitava uma elevação substancial desta fonte de recursos Uma alternativa largamente utilizada na década de 1950 foi a criação de impostos com destinação específica tais como o Único sobre Combustíveis e Lubrificantes para a Petrobrás Único sobre Energia Elétrica para os investimentos nesse setor entre outros No período em exame arrastavamse pelo Congresso projetos de reforma tributária sem que se chegasse a um consenso sobre os mesmos face ao efeito político adverso de uma elevação como seria o caso de carga fiscal Assim a curto prazo o setor público não podia contar com um aumento real substancial na arrecadação fiscal Em segundo lugar havia a possibilidade de cobrir o déficit através da colocação de títulos da dívida pública Esta alternativa no entanto estava também fechada dada as restrições à taxa de juro com a qual poderiam ser lançados esses títulos O setor público teria que esperar até 19641965 para poder lançar mão desse mecanismo Em terceiro lugar portanto a única alternativa que restava aos gestores da política econômica era tentar comprimir a despesa e diminuir o déficit Com o objetivo de não amortecer o ritmo de crescimento da economia planejavase um corte nos gastos de custeio mantendose inalterados os gastos de investimento No entanto na prática ocorria sistematicamente o inverso O governo incapaz de conter os gastos correntes basicamente os de pessoal dada a pressão política do funcionalismo público acabava por cortar gastos de investimento O corte nos gastos de investimento se fazia seja simplesmente através do atraso no pagamento das faturas dos contratantes públicos seja através da inscrição do pagamento em exercícios futuros Em qualquer das alternativas esta atitude correspondia a um empréstimo compulsório a juro nulo que se agregava à dívida flutuante da União A elevação do índice geral de preços de 70 em 1957 para 243 em 1958 representou uma séria ameaça ao ritmo acelerado de implantação dos programas de desenvolvimento do Governo Em junho de 1958 tomou posse no Ministério da Fazenda Lucas Lopes mais próximo dos interesses ligados à industrialização e que juntamente com Roberto Campos então Diretor Superintendente do BNDE preocupavase com a definição de fontes adequadas para o financiamento do Programa de Metas O equacionamento dessas fontes se mostrou particularmente complexo tendo em vista os esforços concomitantes para construção da nova capital e a execução da política do Governo de compra dos estoques excedentes de café num período de violenta queda nos preços internacionais do produto O volume das compras internas dos estoques passa a assumir proporções significativas da mesma ordem de grandeza dos gastos com a construção de Brasília16 Em 27 de outubro de 1958 através de mensagem presidencial que o apresenta como medidas enérgicas para contenção do impulso inflacionário17 Programa de Estabilização Monetária 1958 p 2 é encaminhado ao Congresso o Programa de Estabilização Monetária PEM do ministro Lucas Lopes Em sua mensagem o presidente chama atenção para o impacto da queda dos preços internacionais do café nos resultados do balanço de pagamentos para a perspectiva de um déficit ainda em 1958 de cerca de US300 milhões e para negociações com o FMI visando ao acerto de um conjunto de operações de financiamentos compensatórios que permitiriam garantir compromissos externos e o restabelecimento de linhas de crédito utilizadas para o financiamento de curto prazo das importações correntes Por outro lado enfatiza a subordinação inquestionável das medidas preconizadas no PEM aos compromissos decorrentes da implantação do Plano de Metas e da construção de Brasília O PEM deveria se desenvolver em duas etapas Na primeira fase de transição e reajustamento que se estenderia até fins de 1959 procurar seia reduzir drasticamente o ritmo da elevação dos preços através de duas metas uma econômica que se traduziria na correção das distorções criadas pela inflação na distribuição da renda na orientação dos investimentos e nos preços do setor externo da economia outra social de se proteger o salário real ao invés dos reajustes constantes dos salários nominais Na segunda etapa fase de estabilização procurarseia a partir de 1960 limitar a expansão de meios de pagamentos no necessário para o ritmo de crescimento do produto real com vista a assegurar um grau razoável de estabilidade nos preços internos e reequilíbrio no balanço de pagamentos PEM 1958 p 1112 São apresentadas então quatro recomendações mais detalhadas cujo conteúdo constitui o Programa propriamente dito a Controle da expansão da moeda basicamente através da geração de tetos para o incremento da base monetária em 4 para junhodezembro de 1958 e 10 em 1959 rigoroso controle do Banco do Brasil através de um orçamento limite e taxas mensais de expansão dos empréstimos e depósitos dos bancos comerciais Em relação ao controle da expansão monetária o PEM projetava as taxas de crescimento apresentadas na Tabela 84 b Correção do desequilíbrio financeiro do setor público bem como uma série de medidas administrativas relacionadas ao funcionalismo público Pelo lado da arrecadação revisão da estrutura dos tributos de renda consumo e selo bem como aperfeiçoamento dos processos de arrecadação e fiscalização18 c Definição de uma política de salários e ajustes de tarifas nas empresas públicas de modo a dimensionar suas possibilidades de custeio vinculandose a partir daí permanentemente os reajustes salariais nessas empresas aos reajustes tarifários contenção dos salários pagos pelo setor privado e definição do salário mínimo pelo volume mínimo de bens e serviços necessários à subsistência do trabalhador considerandose a tributação progressiva instrumento mais eficaz para a distribuição de renda d Correção do desequilíbrio do balanço de pagamentos através da redução da demanda por bens importados via restrições monetárias e creditícias política cambial realista desburocratização do setor exportador eliminação gradual dos subsídios cambiais limitação da concessão de novas autoridades para importações amparadas por suppliers credits subordinação dos projetos de grande intensidade de capital e longa maturação à obtenção de fontes externas de longo prazo e finalmente destinação dos primeiros resultados cambiais à reconstituição das reservas internacionais antes de se permitir o aumento das importações correntes Tabela 84 Programa de Estabilização Monetária 19581959 limites mensais de expansão monetária Taxa observada janeiro agosto de 1958 Taxa projetada setembro de 1958 dezembro de 1959 Empréstimos do Banco do Brasil a governos estaduais e municipais CREGE 201 417 CREDI 271 142 Tesouro Nacional 228 022 Empréstimos de bancos comerciais ao setor público 176 084 Fonte Calculados com base em PEM 1958 p 30 O PEM tão logo foi levado ao Congresso e discutido nas Comissões de Finanças Economia e Orçamento provocou intensa polêmica Os debates foram fortemente politizados pelos vários interesses envolvidos e de um modo geral alinhados com o clima de progresso e crescimento que dominava o governo Kubitschek sobrando pouco espaço para o exame exclusivamente técnico das medidas contencionistas para as quais apontava um extenso diagnóstico da economia brasileira incluído no documento de apresentação do Programa Lopes 1988 Uma série de fatores que serão analisados adiante fez com que o PEM já então identificado como estratégia ideologicamente conservadora de uma articulação Lucas Lopes e Roberto Campos em estreita associação com a política ortodoxa defendida pelo FMI sofresse rápido desgaste junto à classe política e à opinião pública em geral Na sequência dos acontecimentos em meados de 1959 quase simultaneamente Lucas Lopes é substituído no Ministério da Fazenda por Sebastião Paes de Almeida então presidente do Banco do Brasil Roberto Campos dá lugar a Lúcio Meira no BNDE e o governo brasileiro rompe com o FMI isto é desiste de implementar um programa de estabilização em sintonia com o Fundo em vista do irrealismo das exigências definidas pelo Fundo que desejava um programa de choque ainda mais radical do que o gradualismo relativo do PEM Na verdade o programa pretendeu ser um importante argumento para a aceitação das políticas econômicas brasileiras pelo FMI sem comprometer o Plano de Metas Com isso ficaria facilitada a posição brasileira junto a credores e fontes de financiamento externo Naquele momento Kubitschek ainda aguardava o acordo do FMI para concluir negociações já iniciadas com a comunidade financeira internacional para obtenção de um empréstimo de US300 milhões A dificuldade em se obter uma resposta positiva bem como o precedente desgastante das gestões do ministro Eugênio Gudin junto ao Fundo durante o governo Café Filho parecem ter influído na decisão do governo brasileiro Além disso Kubitschek parecia estar convencido de que uma política agressiva de investimentos seria mais eficaz na atração de capital estrangeiro do que uma política fiscal e monetária ortodoxa Malan 1983 Na apresentação do PEM Kubitschek já deixara transparecer o caráter ambíguo e politicamente inconsistente do Programa Ao mesmo tempo que usa um tom francamente otimista em relação à economia e às perspectivas de desenvolvimento JK encaminha medidas para estabilização econômica de consequências obviamente recessivas A estratégia gradualista do PEM de controle da inflação acabou por não encontrar um caminho próprio de aceitação para a delicada tarefa de compatibilizar alto nível de investimentos com estabilidade de preços Skidmore 1976 p 217 Uma das metas centrais do plano seria o controle dos créditos do Banco do Brasil órgão executivo fundamental da política creditícia A dificuldade de subordinação do Banco do Brasil às políticas de estabilização pretendidas pelo Ministério da Fazenda que já tinha o precedente de 19511953 nos desentendimentos entre Ricardo Jafet e Horácio Lafer então respectivamente presidente do Banco do Brasil e ministro da Fazenda agora se repetia em escala ampliada O Banco do Brasil passou a ter vários aliados prefeitos e governadores animados com os rendimentos políticos de uma época de prosperidade a indústria tradicional que defendia a preservação de sua fonte praticamente única de capital de giro e os cafeicultores preocupados com a política de compras de café pelo governo num momento de preço internacional cadente Como resultado desse enfrentamento em nenhum momento o Banco do Brasil se submeteu às diretrizes e metas quantitativas do Programa Lopes 1988 Por outro lado no controle da expansão monetária um item central seria o relativo aos limites da política cambial diretamente ligada ao interesse dos cafeicultores Nessa área as dificuldades de comando por parte do Ministério da Fazenda eram de tal ordem que pouco ou nada se encontra no programa sobre o assunto Segundo o próprio ministro Lucas Lopes o tema era por demais explosivo para estar consignado explicitamente no PEM sendo as questões relativas ao problema resolvidas diretamente no gabinete do ministro Lopes 1988 Por fim a política salarial restritiva foi logo entendida como arrocho salarial provocando reações imediatas dos partidos de esquerda e das organizações sindicais que passaram a pressionar diretamente as comissões do Congresso que discutiam o Programa Benevides 1976 p 222 Nesse contexto o presidente acabou por decidir pela continuação de seu governo desenvolvimentista sem balizamento de políticas de controle monetário em oposição ao PEM e ao FMI e endossando a visão estruturalista de que economias subdesenvolvidas só poderiam se industrializar com algum nível de inflação a qual deveria ser administrada ao invés de se buscar preços controlados com estagnação A partir daí as tentativas de estabilização dos preços restringiramse a uma sucessão de Planos de Contenção da despesa orçamentária sempre frustrados pela execução efetiva de caixa Assim em 1961 o orçamento havia sido aprovado prevendose um déficit de Cr55 bilhões para o ano fiscal Ao governo Kubitschek seguese um período de contenção de despesas e reequacionamento das contas externas sob Quadros no primeiro semestre de 1961 mas com a renúncia do presidente iniciase um período de instabilidades que iriam repercutir fortemente na condução da política econômica brasileira pelo menos até 1967 1Importações de petróleo trigo papel que além de essenciais constituíamse em forte arma política contra a imprensa e os pagamentos financeiros fixos isto é amortizações de empréstimos e de operações de regularização e juros 2Decreto 34893 de 511954 3Dados calculados de Pinto 1962 Anexo III 4Este critério foi violentamente combatido pelos empresários brasileiros que se viam assim preteridos em favor do investidor estrangeiro Vejase por exemplo artigo crítico em Desenvolvimento e Conjuntura julho 1957 publicação da Confederação Nacional da Indústria 5Lei no 3244 de 14 de agosto de 1957 6Conselho Nacional de Economia Exposição 1960 quadro XIV e Ministério do Planejamento Programa Estratégico Diagnóstico do Setor Industrial 1967 7Em agosto de 1957 o custo de câmbio foi fixado em Cr5300US elevandose para Cr8000 em outubro de 1958 e para Cr10000 em janeiro de 1959 8Decreto 38744 de fevereiro de 1956 9O lema político da administração federal que tomou posse em 1956 era 50 anos de desenvolvimento em 5 10As somas invertidas em Brasília diretamente supridas pelo governo federal elevaramse incluindose todos os investimentos realizados até junho de 1962 250300 bilhões de cruzeiros de 1961 Esses dados são de Gastos Públicos em Brasília Conjuntura Econômica dezembro de 1962 11O preço caiu 57 centavos de dólarlibra peso em 1955 para 36 em 1961 Banco do Brasil Relatório vários anos 12Por exemplo a seguinte passagem cumpre levantar os recursos necessários por meio de novas tributações e pela geração e melhor distribuição de maior volume de inversões das poupanças voluntárias de indivíduos e empresas Conselho de Desenvolvimento 1959 p 32 13Em 1961 o setor público era responsável por 50 do total de aço produzido no país refinava 76 do petróleo produzia 175 do petróleo consumido e 24 da energia elétrica gerada Anuário Estatístico 1961 14Para uma visão crítica da política econômica no governo JK ver Abreu 1994 p 146155 15Não faria sentido a SUMOC impor recolhimento compulsório ao Banco do Brasil de vez que este sempre poderia recorrer à CARED para suprirlhe o montante necessário 16Pinho 1987 p 31 17Programa de Estabilização Monetária PEM 1958 p 2 18Para uma inflação prevista de 5 estimavase um aumento de 26 na receita orçamentária 20 de crescimento real ao mesmo tempo que se projetava uma queda real de 7 nas despesas PEM 1958 p 39 CAPÍTULO 9 Inflação estagnação e ruptura 19611964 Mário MC Mesquita Entre o final de janeiro de 1961 e 31 de março de 1964 o Brasil viveu um período de singular turbulência política assistiu à única experiência parlamentarista da era republicana teve três presidentes cinco chefes de governo e seis ministros da Fazenda A rotação no comando da política econômica contribuiu para a perda progressiva do controle sobre a inflação e outras variáveis macroeconômicas Nesse contexto a subdivisão do capítulo segue a sequência de desenvolvimentos políticos que marcou o período a breve tentativa de estabilização ortodoxa sob Quadros as políticas econômicas do período parlamentarista e a fase presidencialista do governo Goulart marcada pela implementação tentativa do Plano Trienal A última seção inclui uma discussão sobre as origens da desaceleração de 1963 1964 bem como uma avaliação mais ampla das políticas do período em questão1 O início dos anos 1960 foi em suma caracterizado por aceleração inflacionária tentativas fracassadas de estabilização e intensa instabilidade política um quadro no qual se intensificaram tensões que já estavam presentes desde os anos 1940 e 1950 Foi também um período de aguda porém breve desaceleração econômica o qual teria contribuído para consolidar certos elementos do consenso expansionista que caracterizou a política econômica brasileira até seu esgotamento nos anos 1980 do século passado 1 A Tentativa de Estabilização sob Quadros Em 31 de janeiro de 1961 Jânio Quadros assumiu a Presidência da República amparado pela mais significativa votação popular registrada até então na história das eleições presidenciais brasileiras Sua vitória decorreu de coalizão momentânea do eleitorado conservador com segmentos sensíveis ao apelo populista de suas propostas bem como de certa negligência benigna por parte do Presidente Kubitscheck que aparentemente contava suceder Quadros no pleito esperado para 1965 Mesmo tendo obtido votação para a época expressiva em números absolutos em termos percentuais Quadros obteve apenas 48 dos votos válidos contra 52 atribuídos aos outros candidatos2 Mais importante os partidos que o apoiaram na campanha liderados pela União Democrática Nacional UDN com a qual Quadros não tinha relacionamento fácil eram francamente minoritários no Congresso O governo Quadros foi em suma politicamente frágil desde seu início Suas dificuldades políticas se somavam à herança macroeconômica nada trivial deixada pelo governo Kubitscheck Se por um lado a economia havia de fato avançado consideravelmente entre 1956 e 1960 com expansão de quase 50 do PIB e de pouco mais de 60 na produção industrial por outro os sinais de descontrole macroeconômico eram evidentes A inflação medida pelo deflator implícito do PIB que tinha sido de 118 em 1955 acelerou para 254 em 1960 O balanço de pagamentos mostrava déficits insustentáveis e o país em período de forte expansão do comércio mundial era obrigado a lançar mão de atrasados comerciais como fonte de financiamento de última instância Isto porque o governo utilizou com certa intensidade a taxa de câmbio crescentemente sobrevalorizada para tentar prover alguma âncora nominal para a economia Com o benefício da perspectiva histórica o problema macroeconômico com que se defrontava o governo Quadros era evidente políticas de demanda fortemente expansionistas geravam sintomas nítidos de superaquecimento que se manifestava na aceleração inflacionária e diante do aparato pouco flexível de controles cambiais no agravamento do desequilíbrio externo Dessa forma caberia aos novos responsáveis pela política econômica adotar medidas para promover a redução da absorção doméstica e induzir um aumento na oferta e redução no consumo de bens transacionáveis Que tais medidas não tenham sido implementadas de forma consistente até o Programa de Ação Econômica do Governo PAEG apenas ilustra além da complexa economia política da estabilização as limitações que o arcabouço institucional e mesmo intelectual da época apresentava para a gestão econômica Além da questão da gestão das pressões de demanda caberia ao governo lidar com um problema que se tornara crítico os compromissos com o serviço da dívida externa previstos para o quinquênio 19611965 em muito excediam a disponibilidade de divisas esperada o que requeria negociações com os credores externos As iniciativas de política econômica do governo seguiram essa ordem de prioridades redução do desequilíbrio do balanço de pagamentos renegociação da dívida externa e combate à inflação em linhas gerais de forma consistente com o que se entendia na época como a visão ortodoxa O elemento central da estratégia econômica do governo Quadros foi a Instrução 204 da Superintendência de Moeda e de Crédito SUMOC de março de 1961 que tinha como objetivo a desvalorização da taxa de câmbio e a unificação do mercado cambial Além disso a iniciativa buscava limitar os efeitos danosos da política cambial sobre o Tesouro Em discurso à Câmara dos Deputados o ministro da Fazenda Clemente Mariani referiuse explicitamente à inexistência de recursos no Fundo de Ágios compatíveis com o acúmulo de obrigações governamentais em divisas relativas a atrasados swaps e importações a câmbio de custo Assim para evitar o aumento das emissões monetárias e consequentemente da inflação caberia ao governo passar a vender o câmbio de custo pelo seu custo real ver Mariani 1961 p 11 a 20 Sob a Instrução 204 as importações feitas pela categoria geral se dariam através do mercado livre sem necessidade de licenciamento prévio Os leilões cambiais para esta categoria foram abolidos As importações só poderiam efetivarse contudo mediante apresentação de Certificado de Cobertura Cambial cuja emissão pela Carteira de Comércio Exterior do Banco do Brasil CACEX requeria fechamento de contrato de câmbio com bancos autorizados dentro de um limite inicial de US2000000 por importador por semana e a compra pelos importadores de Letras do Banco do Brasil em igual montante ao valor em moeda nacional do contrato de câmbio com taxas de juros nominais fixas em 6 ao ano e prazo de 150 dias As importações anteriormente feitas pela categoria especial obedeceriam ao mesmo procedimento mas dependeriam de licenciamento prévio pela CACEX e da compra de Promessas de Licença da Importação PLI em leilões públicos cuja dotação seria determinada pelo Conselho da SUMOC Após desvalorização de 100 as importações preferenciais seriam feitas à taxa de Cr20000 por dólar As exportações de café cacau e derivados continuariam a ser feitas pelas taxas vigentes sendo a diferença entre estas taxas e a taxa de venda do mercado livre recolhida à SUMOC para custear a sustentação das cotações destas commodities As demais exportações teriam suas divisas vendidas no mercado livre de câmbio sendo Cr10000 por dólar pagos em Letras do Banco do Brasil com prazo de 120 dias e rendimento nominal fixo de 6 ao ano Instruções subsequentes da SUMOC fixaram a quota de contribuição das exportações de café em US2200 por saca estabeleciam uma escala de redução progressiva do montante a ser pago aos exportadores em Letras do Banco do Brasil reduzindo este tipo de confisco cambial elevavam o limite mensal de compras de dólares para importadores e transferiam ao mercado livre as vendas de divisas relacionadas a importações e transferências financeiras preferenciais Apesar de representar avanço na direção de reduzir a complexidade do sistema que o deixava bastante exposto à extração de quase rendas a reforma ficou bem aquém da completa unificação cambial Em termos de sua contribuição para aumentar a competitividade das exportações e reorientar recursos para a produção de bens comercializáveis o impacto da reforma foi limitado o ajuste cambial restringiuse praticamente à eliminação do subsídio oferecido às importações de petróleo trigo e derivados Há sinais de que as mudanças cambiais em especial a desvalorização das taxas aplicadas às importações preferenciais tiveram impacto inflacionário considerável houve aceleração particularmente intensa dos preços de alimentos combustíveis e produtos metalúrgicos os preços de combustíveis no atacado por exemplo tiveram elevação de 42 em marçoabril de 1961 É contudo difícil aceitar o argumento de Furtado 1975 p 32 debitando a aceleração inflacionária a um suposto desequilíbrio das contas públicas resultante da Instrução 204 ao abolir a conta de ágios e bonificações3 Isto porque a análise deve concentrarse não sobre uma das contas cambiais do governo federal mas sobre o resultado líquido de todas as contas cambiais do governo sob o ponto de vista do financiamento de seus gastos em moeda nacional Wells 1977 p 224 e Mesquita 1992 tabela II1 apresentam evidências conclusivas de que esta contribuição não havia sido sistematicamente positiva no passado tendo sido fortemente negativa em 1959 e que o governo foi capaz de encontrar formas alternativas de gerar recursos domésticos no mercado cambial em particular via instrumentos financeiros que implicavam empréstimos ao Tesouro a juros reais negativos O impacto inflacionário que houve deveuse mais ao fato de que a política econômica doméstica do governo não conseguiu lograr a necessária redução consistente da absorção que deveria acompanhar a mudança de preços relativos Em um aspecto contudo as medidas cambiais tiveram êxito A iniciativa de avançar em direção à unificação e ao maior realismo cambial contou com apoio do FMI e dos países credores aplainando o caminho para a renegociação da dívida externa4 De fato em maio e junho de 1961 o governo teve sucesso nas negociações com os credores norteamericanos principalmente o Eximbank graças ao apoio do governo americano e em menor medida europeus obtendo novos empréstimos e significativo reescalonamento da dívida externa que venceria entre 1961 e 1965 Os pagamentos programados de principal foram remanejados para serem pagos em cinco anos a partir de 1966 80 dos que venceriam em 1961 70 em 19621963 50 em 1964 e 35 em 1965 As operações de reescalonamento afetaram empréstimos de US874 milhões nos Estados Unidos e Canadá e de US224 milhões na Europa Em consequência foi possível reduzir o serviço da dívida que alcançava 436 das receitas com exportações em 1960 para 322 em 1961 World Bank 1971 O estoque da dívida externa que havia crescido cerca de 37 desde 1956 atingiu US3738 milhões no final de 1960 dívida externa total geral US3291 milhões no final de 1961 e US3533 milhões no final de 1962 mantendose praticamente estável até 1964 O coeficiente dívida externaexportações decresceu portanto de 295 em 1960 para 235 em 1961 mas seguia em patamar elevado Paralelamente no terreno da política externa valendose da margem de manobra propiciada pela conjuntura geopolítica da região o governo distanciouse da posição norteamericana de isolar Cuba preparou o reatamento de relações com a União Soviética e apoiou a descolonização da África lançando as bases da chamada política externa independente Diante das restrições institucionais existentes como a Lei da Usura e o papel do Banco do Brasil como fonte de financiamento do Tesouro a política econômica doméstica do governo apresentada em proposta de acordo standby junto ao FMI estava centrada no controle do déficit público a partir do qual se determinaria o cumprimento de metas para a expansão monetária e creditícia5 O governo mantevese fiel às metas traçadas para a política fiscal e de crédito até o seu final mas diante do aquecimento da economia já evidente desde o ano anterior a política de austeridade mostrouse insuficiente para contrarrestar a intensificação das pressões inflacionárias derivada da desvalorização cambial A renúncia de Jânio Quadros em 25 de agosto de 1961 resultou no colapso de seu programa de estabilização A curta duração de sua gestão dificulta a avaliação criteriosa dos resultados das suas políticas econômicas pois a crise política de agosto e setembro de 1961 teve como consequência o descontrole monetário fiscal e creditício evidenciado pelas estatísticas mensais 2 O Impasse Parlamentarista A crise da renúncia de Quadros levou à adoção do parlamentarismo como solução compromisso entre o veto militar à posse do Vice Presidente da República João Goulart PTBRS tal como estabelecia a Constituição e as resistências políticas em favor de sua posse com plenos poderes Entre setembro de 1961 e janeiro de 1963 o país foi governado por três gabinetes Tancredo Neves PSDMG de setembro de 1961 a junho de 1962 Brochado da Rocha PTBRS de julho a setembro de 1962 e Hermes Lima PTBGB de setembro de 1962 até janeiro de 1963 Nos dois primeiros gabinetes a pasta da Fazenda ficou sob gestão do banqueiro e exEmbaixador em Washington Walter Moreira Salles o que deu certa linha de continuidade à política econômica Não obstante o período parlamentarista foi caracterizado por crise política permanente o que impôs severas limitações ao tipo de medidas econômicas que poderiam ser adotadas O gabinete Neves dito de União Nacional contava com o apoio dos principais partidos políticos representados no Congresso mas sua ação foi desde o início tolhida pelo Presidente da República em campanha aberta pelo retorno do presidencialismo e pelas chamadas reformas de base especialmente agrária e do tratamento dado ao capital estrangeiro investido no país O programa de governo apresentado pelo primeiroministro era uma coleção de boas intenções e estabelecia como objetivos que admitia não são todos plenamente compatíveis aumentar a taxa de crescimento da economia para 75 ao ano absorver a mão de obra subempregada minorar as tensões criadas pelos desequilíbrios sociais diminuindo a desigualdade de distribuição de renda e provendo condições mínimas de habitação e saneamento alcançar razoável estabilidade de preços atenuar o desequilíbrio do balanço de pagamentos minorar os desequilíbrios regionais e corrigir as deformações estruturais adaptando o setor industrial à necessária estrutura de emprego e aumentando a produtividade agrícola ver Conselho de Ministros 1961 p 15 No campo das reformas também ambicioso e abrangente mas de escassa viabilidade política o programa previa entre outras uma profunda mudança da estrutura tributária colocando a tributação indireta em bases ad valorem reduzindo a regressividade fiscal e eliminando a taxação de ganhos fictícios gerados pela inflação bem como a criação de um banco central Reconhecendo contudo o recrudescimento da pressão inflacionária o governo apresentou já em setembro de 1961 um conjunto de medidas contracionistas denominado de Ação de Emergência que incluía a adoção de controles quantitativos de crédito até o final de 1961 a fim de manter a oferta monetária constante em termos reais Em particular o governo mostrouse preocupado com a expansão monetária ocorrida durante a crise política estabelecendo mecanismos de depósito compulsório sobre depósitos à vista dos bancos privados e de controle da expansão do crédito pelo Banco do Brasil Quanto à política financeira pública o governo propunhase como ação de emergência a aplicar o Plano de Economia de gastos aprovado por Quadros e a financiar o déficit programado de 1962 de forma não inflacionária A despeito dessas iniciativas o último trimestre de 1961 foi marcado pelo aumento do déficit público e pela aceleração da expansão monetária a taxa de crescimento anual dos meios de pagamento se elevou de 33 em dezembro de 1960 para 40 em junho de 1961 e 51 em dezembro do mesmo ano Diante de sinais de renovada aceleração inflacionária no início do ano um aumento do IPA de 62 em janeiro e das perspectivas de aumento do déficit público derivado de aumentos esperados no dispêndio com o funcionalismo e com subsídios a empresas estatais o governo anunciou ao final de março nova política de estabilização incluindo medidas de contenção fiscal e controle de crédito A inovação do ponto de vista do financiamento do déficit governamental seria a colocação de Cr100 bilhões junto ao público em títulos indexados Embora alguns de seus elementos particularmente no âmbito fiscal viessem a ser preservados ao longo do ano o plano não chegou a ser plenamente implementado visto que frente à crescente e explícita oposição presidencial e em vista da aproximação do prazo de desincompatibilização para as eleições de outubro o gabinete Neves renunciou em fins de junho de 1962 O nome de Santiago Dantas indicado para suceder Tancredo Neves foi rejeitado pelo Congresso A interpretação usual é de que isto teria resultado da insatisfação dos congressistas mais conservadores com a sua atuação no Ministério das Relações Exteriores voltada à consolidação da política externa independente Entretanto as dificuldades quanto à aceitação de seu nome eram provavelmente mais complexas como sugere o seu discurso na Câmara de Deputados em 27 de junho chegamos a um momento em que certas necessidades se tornaram imperativas Em primeiro lugar o país não comporta mais uma administração sem rigoroso planejamento Se queremos lutar contra a inflação a primeira medida necessária é um balanço dos recursos de que dispomos e uma orçamentação honesta das nossas disponibilidades Quem não dispõe de recursos ilimitados e tem diante de si problemas que os ultrapassam tem necessidade de planejar para criar uma ordem de prioridades Só um governo que se disponha a estabelecer entre os problemas brasileiros uma ordem rigorosa de prioridades neste instante e proporcionar a essas prioridades os recursos disponíveis é que terá possibilidades de praticar uma política monetária que possa servir de suporte a uma política de contenção de preços6 É difícil pensar que a substância deste discurso tenha aprofundado a penetração de seu nome em círculos políticos caracterizados na melhor tradição das elites brasileiras pela aversão à escolha entre objetivos contraditórios e acostumados à acomodação inflacionária de conflitos associados à distribuição de recursos escassos Apesar do compromisso com as reformas de base é clara a consciência de que dados os limitados meios à disposição do governo era essencial estabelecer prioridades para poder adotar uma política monetária compatível com a contenção de preços Assim às dificuldades de penetração do nome de Santiago Dantas nos meios conservadores por razões associadas à política externa independente somavamse as geradas pelas implicações do seu programa econômico Após dificuldades adicionais que envolveram a aprovação pelo Congresso do senador Auro de Moura Andrade e a recusa de sua homologação por Goulart cedendo a forte pressão sindical o Congresso aprovou o nome de Brochado da Rocha como primeiro ministro O novo gabinete retratava ainda uma composição política de amplo espectro continuando na pasta da Fazenda o banqueiro Moreira Salles O programa econômico de Brochado da Rocha pretendia estabilizar a inflação em 60 em 1962 e reduzila para 30 em 1963 a variação anual do IPA chegou a 59 em julho de 1962 O gabinete concentrou os seus esforços na tentativa de obtenção de poderes especiais para legislar sobre diversos temas inclusive as reformas de base bem como na antecipação da data de realização do plebiscito sobre a manutenção do sistema parlamentarista de governo As recusas de delegação de poderes especiais pelo Congresso provocaram a renúncia do gabinete Brochado da Rocha em setembro As pressões para a antecipação da data do plebiscito entretanto culminaram com a aprovação de emenda constitucional estabelecendo sua realização em 6 de janeiro de 1963 Hermes Lima chefiou um gabinete provisório no período pré plebiscitário caracterizado após a substituição de Moreira Salles por Miguel Calmon na pasta da Fazenda pela ausência de um grande nome de composição com os círculos conservadores em contraste com os gabinetes anteriores O programa de transição incluía um plano de controle da inflação logo em seguida comprometido pela concessão do 13 salário aos trabalhadores urbanos As eleições de outubro embora tenham resultado em aumento significativo da bancada do PTB mantiveram a maioria conservadora no Congresso Nacional e portanto o impasse no cabo de guerra entre o Presidente e o Congresso A despeito da forte instabilidade política o governo logrou manter algum controle sobre as contas públicas que registraram déficit de Cr281 bilhões ao final de 1962 equivalente a 36 das despesas montante em muito superior à estimativa orçamentária mas menos de 60 do déficit potencial de Cr500 bilhões Isto se deu por meio de cortes significativos nos investimentos públicos A política monetária e de crédito por sua vez foi expansionista visto que os agregados monetários e as carteiras de crédito exibiram crescimento real expressivo no ano A inflação mostrou tendência de aceleração durante os 18 meses do regime parlamentarista mas não de modo uniforme Houve de fato um período em que as taxas mensais se acomodaram grosso modo entre novembro de 1961 e abril de 1962 ajudadas pela sazonalidade agrícola favorável e por certo enfraquecimento da atividade econômica no primeiro quadrimestre de 1962 que conteve as pressões de altas de preços industriais esta provavelmente resultou do impacto defasado da contração de liquidez determinada pelo plano de estabilização de QuadrosMariani em ambiente no qual os salários nominais não conseguiam repor integralmente a erosão do poder aquisitivo ocasionada pelo próprio processo inflacionário No entanto a partir de maio com a concessão de aumentos salariais generalizados e o afrouxamento da política monetária e creditícia houve uma recuperação do nível de atividade o que sustentou a retomada da elevação dos preços industriais Concomitantemente a entressafra pressionou os preços agrícolas daí a aceleração inflacionária verificada no segundo semestre No último trimestre do ano parecem ter ocorrido remarcações preventivas pois havia temor de que a equipe econômica de Goulart poderia impor uma trégua forçada de preços e salários A política econômica externa sob o parlamentarismo foi marcada por três eventos o abandono do movimento em direção à unificação cambial a negociação do primeiro Acordo Internacional do Café e a aprovação da Lei no 4131 a chamada Lei de Remessa de Lucros que ainda regula aspectos importantes dos fluxos de capitais entre o Brasil e o exterior Tais desenvolvimentos ocorreram em meio a uma gradual mas consistente deterioração das relações BrasilEstados Unidos Isto ocorreu em decorrência da postura do governo diante do exame pelo Congresso de alterações da legislação relativa à remessa de lucros de capital estrangeiro do cancelamento das concessões de lavra de minério de ferro da empresa norteamericana Hanna Corporation e do apoio dado pelo governo central à desapropriação pelo governador do Rio Grande do Sul Leonel Brizola dos bens da Companhia Telefônica Nacional subsidiária da empresa norteamericana International Telephone and Telegraph ITT Adicionalmente a política externa independente inaugurada por Jânio Quadros teve continuidade sob João Goulart tal como estabelecido pelo programa de governo do gabinete Neves O Brasil reatou relações diplomáticas com a União Soviética ainda em 1961 e na reunião da Organização dos Estados Americanos OEA em janeiro de 1962 divergiu da posição norteamericana abstendose na votação que aprovou a expulsão de Cuba da organização Em abril de 1962 Goulart visitou os Estados Unidos abordando com o Presidente Kennedy assuntos relacionados à dívida externa e ao capital estrangeiro no Brasil Os resultados não foram encorajadores aumentando o desgaste do governo No grave episódio da crise dos mísseis o Brasil não alinhouse às propostas norteamericanas de intervenção armada no âmbito da OEA mas aprovou o bloqueio a Cuba cedendo em parte às pressões políticas norteamericanas A política cambial foi caracterizada pelo aumento das intervenções das autoridades monetárias no mercado de divisas Com isso a taxa de câmbio do mercado dito livre voltou a ser rigorosamente controlada pelo Banco do Brasil como no governo Kubitschek com o objetivo de não exacerbar as pressões inflacionárias Em um contexto de atividade econômica doméstica ainda relativamente aquecida no qual as diversas taxas de câmbio foram administradas aparentemente de forma a apenas compensar a inflação passada e diante de uma nova rodada de piora dos termos de troca segundo a revista Conjuntura Econômica o índice de preços internacionais do café exportado pelo Brasil para 1962 foi 56 frente a 124 no auge de 1954 o déficit em conta corrente que havia sido reduzido de US518 milhões em 1960 para US2629 milhões em 1961 voltou a se ampliar atingindo US4527 milhões em 1962 Em um aspecto contudo a política cambial foi bemsucedida a administração das taxas de câmbio complementada por um complexo sistema de compras compulsórias de títulos públicos com remuneração real negativa gerou montante equivalente a 11 da receita pública total o que superou os resultados que vinham sendo obtidos pelo regime de ágios e bonificações desde 1957 A despeito da piora das relações bilaterais com o Brasil o governo dos Estados Unidos participou e apoiou as negociações do primeiro Acordo Internacional do Café que em linhas gerais logrou estabilizar os preços da commodity durante sua vigência 19631968 A postura dos Estados Unidos refletiu a visão de que a estabilização de preços contribuiria para a estabilidade política não apenas em aliados de alinhamento precário como o Brasil mas também de importantes colônias e ex colônias europeias na África bem como países da América Central e do Sul que em ambiente econômico difícil poderiam vir a sentir atração pelo experimento cubano O grande tema contudo foi a discussão no Congresso dos projetos referentes ao controle do capital estrangeiro Este já havia estado presente de forma relevante na campanha eleitoral de 1960 De fato Quadros se comprometera com a adoção de uma nova lei e seu governo sob o diretor da SUMOC Octávio Bulhões enviou ao parlamento um projeto de lei que não discriminava os capitais estrangeiros quanto ao tratamento tributário sendo por isso combatido pelos congressistas nacionalistas A discussão da lei em ambiente préeleitoral e sob a influência das atitudes nacionalistas do Presidente da República favoreceu a adoção de uma postura mais dura O foco da discussão acabou sendo a questão da incorporação dos reinvestimentos ao capital original para fins de formação da base de cálculo da remessa de lucros o que era contemplado pela legislação vigente promulgada a despeito do viés nacionalista da retórica presidencial no segundo governo Vargas ver Capítulo 6 Rejeitando um projeto do Senado que previa a incorporação a versão final da lei seguiu o projeto da Câmara onde as forças nacionalistas e esquerdistas eram relativamente mais expressivas e onde ao contrário do Senado todos os membros enfrentariam o eleitorado em outubro daquele ano que não só não previa a incorporação de reinvestimentos à base de capital como dava à autoridade monetária a faculdade de exercer rígido controle sobre os fluxos de capitais em caso de ocorrência ou expectativa de ocorrência de graves desequilíbrios no balanço de pagamentos7 A lei de remessa de lucros foi na época responsabilizada pelo estancamento do fluxo de investimentos externos no país durante o período 19621966 IPEA 1966 No entanto há sinais de que esse movimento deveuse ao menos em parte também à maturação de um ciclo de investimentos no setor automobilístico ao desaquecimento econômico observado a partir do final de 1962 e à piora da relação política entre os governos brasileiro e americano De fato há evidências de que mesmo os desembolsos associados à renegociação de 1961 foram adiados ou cancelados em função dão afastamento político como atesta carta do embaixador em Washington Roberto Campos ao subsecretário para Assuntos Latino Americanos dos Estados Unidos8 A taxa de rolagem de empréstimos e financiamentos privados e públicos sofreu redução de 44 e 25 entre 1961 e 1962 respectivamente Com isso o resultado final do balanço de pagamentos em 1962 foi um déficit de US118 milhões financiado pela captação de recursos de curto prazo liquidação de reservas e acumulação de atrasados comerciais A fragilidade da posição externa voltava portanto ao estágio dos últimos anos do governo Kubitschek O legado do biênio 19611962 no campo doméstico também foi decepcionante A economia cresceu respeitáveis 86 em 1961 mesmo com redução do investimento após 94 em 1960 mas desacelerou para 66 em 1962 A produção industrial cujo crescimento havia acelerado de 106 para 111 entre 1960 e 1961 teve expansão menos exuberante de 81 em 1962 A inflação medida pelo deflator do PIB saiu de 254 em 1960 para 347 em 1961 e 501 em 1962 com sinais de aceleração na margem a taxa mensal segundo o IPA da FGV acelerou de 22 em média no primeiro semestre para 30 no terceiro trimestre e 53 no último trimestre do ano 3 A política econômica sob o presidencialismo restaurado No final de 1962 antecipandose à muito provável vitória do presidencialismo no plebiscito de 6 de janeiro de 1963 que foi confirmada com ampla margem pelas urnas o governo anunciou sua política econômica para o restante do mandato consubstanciada no Plano Trienal de Desenvolvimento Econômico e Social elaborado sob a coordenação de Celso Furtado Ministro Extraordinário para Assuntos do Desenvolvimento Econômico O plano procurava responder ao quadro de deterioração externa e à aceleração inflacionária o que presumivelmente favoreceria uma aproximação entre o governo e segmentos da classe média e da comunidade empresarial ampliando a sua base de apoio com vistas a viabilizar a aprovação das reformas de base pelo Congresso A dificuldade na sua implementação residia no fato de que as necessárias medidas de contenção da demanda e reorientação do padrão de consumo e produção o chamado realismo tarifário e cambial encontravam forte resistência na base sindical e parlamentar de apoio ao governo Esse jogo de soma zero político provocaria o abandono do Plano Trienal e contribuiria para o rápido enfraquecimento do governo nos meses finais de 1963 e em 1964 O primeiro ministério de Goulart sob o regime presidencialista incluía notáveis de centroesquerda como Santiago Dantas ministro da Fazenda e Celso Furtado ministro Extraordinário do Planejamento mas carecia de penetração política e de figuras de composição com o empresariado na área econômicofinanceira tal como havia ocorrido sob o regime parlamentarista em especial nos dois primeiros gabinetes Na ausência da disponibilidade de estratégias alternativas de estabilização de curto prazo os choques heterodoxos baseados no congelamento generalizado de preços ainda estavam no futuro o Plano Trienal partia de um diagnóstico convencional e estava centrado em medidas de corte ortodoxo A necessidade de se levar a um bom termo as negociações com o FMI precondição para o equacionamento da difícil situação externa também deve ter influenciado o desenho do plano9 Este em conjunto com seus antecessores combinava objetivos ambiciosos para o crescimento no caso uma taxa anual de 7 com uma estratégia gradualista de desinflação de 50 em 1962 para 25 em 1963 visando atingir 10 em 1965 bem como metas relativas à reformas estruturais bancária fiscal administrativa e agrária Apesar da bagagem cepalina de seu principal formulador Celso Furtado o diagnóstico do plano era de que a inflação resultava essencialmente da expansão desmedida dos gastos públicos Sendo assim o controle de gastos era parte central do plano Especificamente o déficit potencial do governo para 1963 correspondente a mais de 50 da despesa programada seria reduzido em cerca de 60 pela adoção de plano de economia e diferimento de despesas Entre as medidas de ajuste fiscal mereceu atenção especial a redução dos subsídios ao consumo em especial aqueles relativos à importação de petróleo e de trigo e os referentes às tarifas de serviços públicos nos setores de transportes e comunicações Além disso o plano previa metas quantitativas para a expansão dos agregados monetários e de crédito10 Seguiuse ao anúncio do plano um salto no índice de preços industriais por atacado de mais de 20 em janeiro e 11 em fevereiro possivelmente como sugerido por Sochaczewski 1993 com base em expectativas de imposição de controle de preços Nesse ambiente de aceleração inflacionária depois de um aumento de 56 no salário mínimo em 1 de janeiro e antes que as medidas de contração fiscal e creditícia tivessem sido plenamente implementadas o governo continuou adotando medidas de realismo tarifário e cambial Em meados de janeiro de 1963 o governo anunciou o fim dos subsídios cambiais e consequentemente aumentos do trigo e de derivados de petróleo de 70 e 100 Em fevereiro as tarifas de transportes urbanos foram aumentadas entre 22 e 29 Em abril a taxa de câmbio do mercado livre que era na prática controlada pelas autoridades monetárias foi desvalorizada em 31 mas o subsídio às importações de petróleo foi retomado Com isto a inflação medida pelo IPA chegou a 23 no primeiro trimestre e a variação em 12 meses acelerou de 456 em dezembro de 1962 para 699 em março de 1963 A partir de março o plano de contenção de despesas da União começou a ser posto em prática pelo Decreto 51814 Este veio se somar às políticas restritivas adotadas pela SUMOC para controlar a expansão do crédito pelo Banco do Brasil Instrução 234 de 14 de fevereiro e pelos bancos privados Instrução 235 de 7 de março A Instrução 235 previa um aumento dos depósitos compulsórios dos bancos comerciais que passaram de 22 para 28 no caso dos depósitos até 90 dias permanecendo em 14 para os demais depósitos Em paralelo com estas medidas convencionais de ajuste o governo negociou em março acordos de congelamento temporário 45 dias de preços com os setores têxtil de vestuário veículos e autopeças seguidos em abril pela indústria de cimento Em março e abril foram também feitos acordos entre associações comerciais e o governo restringindo o crédito ao consumidor Os acordos de congelamento de preços não chegaram a ser integralmente cumpridos mas proporcionaram uma trégua viabilizando o recuo da taxa de inflação mensal em abril para 05 e levando a média do segundo trimestre para 38 ante 76 no primeiro A despeito da limitada trégua no segundo trimestre a aceleração da inflação inevitável em função da necessidade de realinhar preços administrados acabou inviabilizando o Plano Trienal Em primeiro lugar o movimento de preços ocorrido nos primeiros meses do ano tornou difícil o cumprimento do programa de contenção de despesas do governo A inflação aumentou por outro lado as demandas por parte do empresariado por um relaxamento da política creditícia em abril publicação oficial da CNI já alertava contra o risco de uma crise de estabilização11 Finalmente a alta dos preços verificada no primeiro trimestre contribuiu para aumentar as resistências dos trabalhadores colocando os sindicatos um dos principais pilares de apoio ao governo Goulart frontalmente contra o plano12 Já em meados de fevereiro a imprensa noticiava que o governo se esforça para adiar por alguns meses as reivindicações salariais que atendidas agora incidiriam de maneira nefasta sobre o esquema da política financeira O adiamento das reivindicações trabalhistas é um dos aspectos vitais para o êxito da política traçada no Plano Trienal13 Em maio o plano começou a ser definitivamente abandonado Naquele mês foi votado o reajuste do funcionalismo e rejeitando a proposta original do governo de 40 incluída na programação financeira do Plano Trienal o Congresso aprovou um aumento de 70 cujo impacto se faria sentir mais intensamente a partir de agosto O processo de tramitação do projeto de lei sinalizou o afastamento de Goulart e seu entorno político em relação aos compromissos estabelecidos por uma política de estabilização O aumento concedido ao funcionalismo não só inviabilizou a programação financeira da União mas também as já difíceis negociações entre o governo e o FMI A implementação do plano como em diversos episódios anteriores no período 19461964 foi heterogênea O crédito ao setor privado teve o esperado comportamento contracionista com expansão significativamente inferior à taxa de inflação não apenas durante o primeiro semestre mas ao longo de todo o ano apenas nos primeiros nove meses do ano a contração creditícia teria chegado a cerca de 20 O crescimento dos empréstimos dos bancos comerciais ficou aquém do previsto enquanto o crédito do Banco do Brasil superou amplamente suas metas sem demonstrar comprometimento com o plano14 A atuação da SUMOC parece ter tido o desejado efeito contracionista no primeiro semestre mas no resto do ano a falta de dinamismo do crédito dos bancos privados provavelmente refletiu um deslocamento negativo da curva de oferta em consequência da deterioração das expectativas de inflação em ambiente de controles generalizados sobre as taxas de juros A política fiscal mantevese relativamente alinhada às diretrizes do plano durante o primeiro semestre quando o excesso do déficit do Tesouro em relação ao programado foi de 26 mas surgem evidências de descontrole no segundo semestre quando o déficit acabou excedendo o previsto no plano em mais de 60 Mesquita 1992 tabelas IV4 A e IV4 B Para o ano como um todo o déficit chegou a 336 das despesas do governo federal pouco abaixo dos 343 verificados em 1962 inflado pelo aumento dos subsídios a empresas estatais após o abandono da tentativa de aplicação do realismo tarifário a partir da metade do ano Se os resultados domésticos mostraramse decepcionantes a evolução do setor externo da economia teve aspectos favoráveis A desaceleração da atividade e em especial do investimento levou à redução das importações ao passo que a recuperação das cotações internacionais do café a partir de setembro bem como expressivo crescimento de exportações exclusive café determinaram o crescimento do valor exportado Com isso a balança comercial apresentou melhora de US2022 milhões contribuindo de forma importante para a redução de mais de 70 no déficit em conta corrente A política cambial do Plano Trienal previa reajustes das taxas de câmbio em função do diferencial esperado de inflação O realismo cambial foi mantido pelo menos até abril quando a Instrução 239 da SUMOC determinou uma desvalorização de 31 do cruzeiro Posteriormente contudo as autoridades passaram a optar pela adoção de um crescentemente complexo sistema de depósitos compulsórios bonificações e quotas de contribuição como mecanismos de correção das distorções causadas pela manutenção da estabilidade das taxas de câmbio nominais em uma conjuntura de aceleração inflacionária O abandono do realismo cambial coincidiu com o fracasso das negociações lideradas por Santiago Dantas para reescalonar os compromissos externos do país As negociações dependiam também da avaliação técnica do FMI que atendendo à solicitação do governo brasileiro enviou em janeiro missão ao Brasil Em março de 1963 Dantas visitou Washington com o objetivo de adiar os pagamentos relativos à dívida externa brasileira e obter ajuda financeira O fracasso da missão condicionado em boa medida pela deterioração das relações políticas entre Brasília e Washington em claro contraste com o quadro vigente em 1961 é evidente pois apesar de concessões brasileiras relativas à indenização da companhia de energia elétrica do Rio Grande do Sul subsidiária da AMFORP dos US3985 milhões de empréstimos obtidos apenas US84 milhões correspondiam a desembolso imediato sendo US30 milhões para compensar a ITT15 Além disso a missão do FMI ao Brasil que assistiu à tramitação do projeto de reajuste do funcionalismo só recomendou a liberação de US60 milhões de um crédito standby de US100 milhões combinado inicialmente Enquanto isso o Plano Trienal e as negociações internacionais a ele associadas eram duramente criticados por setores de esquerda que denunciavam o caráter recessivo da política econômica e a submissão dos interesses nacionais aos dos Estados Unidos A este desgaste se somavam as críticas crescentes de sindicatos e organizações patronais sobre a combinação de desaceleração econômica e intensificação das pressões inflacionárias Acumulavam se assim evidências de que mais um experimento de política de estabilização havia fracassado Em junho de 1963 Goulart promoveu uma reforma ministerial sendo substituídos entre outros os ministros responsáveis pelo fracassado programa de estabilização Santiago Dantas foi substituído por Carvalho Pinto na Fazenda sendo extinto o Ministério do Planejamento O presidente parece ter grandemente superestimado a capacidade de seu novo ministro da Fazenda que havia sido governador e secretário da Fazenda do estado de São Paulo apaziguar o descontentamento empresarial com o governo Além de tentar sinalizar aproximação com o empresariado paulista a escolha de Carvalho Pinto provavelmente refletiu também sua defesa de posturas mais assertivas nas negociações internacionais tese cara às esquerdas O ministro chegou a aventar em julho a possibilidade de uma moratória unilateral dos pagamentos externos argumentando que até 1965 o país deveria gastar US18 bilhões mais de 40 da receita esperada com exportações no serviço da dívida externa o que exigiria compressão insustentável das importações A melhora do desempenho comercial a partir de agostosetembro permitiu que a moratória fosse evitada mas ficou claro que na ausência de um reescalonamento pactuado do serviço da dívida externa qualquer piora significativa dos termos de troca ou mesmo de crescimento das importações em caso de retomada da atividade colocaria esta opção novamente na ordem do dia Nesse contexto ia tornandose explícita a polarização da disputa pelo poder entre as massas urbanas mobilizadas pelo populismo e as antigas estruturas de poder A fragmentação de recursos políticos gerou coalizões ad hoc e contribuiu para a rotatividade da equipe governamental A paralisia decisória atingiu o Executivo e o Legislativo O impasse entre forças aproximadamente equilibradas de direita centro e esquerda foi gradativamente rompido pela formação de uma coligação parlamentar conservadora em defesa do status quo ver Santos 1986 especialmente p 18 33 e 59 A renúncia de Roberto Campos da posição de Embaixador em Washington indicava que a credibilidade externa do governo chegava ao fim Fizeramse sentir as pressões desestabilizadoras de lobbies como o IPES ou o IBAD formados inicialmente para apoiar candidatos conservadores nas eleições de outubro de 1962 mas que permaneceram mobilizados em intensa campanha conspiratória contra as autoridades legalmente constituídas Deteriorouse ainda mais o quadro político em setembro com a rebelião de sargentos da Marinha e da Aeronáutica contra a decisão do Supremo Tribunal Federal mantendo a anulação da eleição de sargentos no ano anterior A partir deste momento ficou clara a adesão da maioria da oficialidade das Forças Armadas e dos políticos centristas a uma solução que removesse a ameaça de radicalização que decorreria na melhor das hipóteses da fraqueza do presidente Em outubro Goulart enviou mensagem ao Congresso solicitando aprovação do estado de sítio por 30 dias como reação a declarações de Carlos Lacerda Governador da Guanabara atacando as autoridades federais Dias mais tarde o pedido foi retirado diante da evidência de que seria recusado mesmo por parlamentares do partido do presidente o Partido Trabalhista Brasileiro A posição fiscal fragilizada a partir do segundo trimestre pelos efeitos do reajuste do funcionalismo piorou ainda mais com a desaceleração da arrecadação decorrente do enfraquecimento da atividade Buscando obter fontes não inflacionárias de financiamento do déficit público o governo editou em 11 de outubro a Instrução 255 da SUMOC que previa compras obrigatórias de títulos sem juros com prazo de 180 dias por tomadores de recursos bancários A instrução despertou forte reação no meio empresarial erodindo o que restava de apoio a Carvalho Pinto nos meios conservadores do país e levando a sua substituição em dezembro pelo obscuro político e banqueiro gaúcho Ney Galvão no Ministério da Fazenda A alta rotatividade nos cargos de peso da República já é incapaz de acomodar a fragmentação de recursos políticos mencionada por Santos 1986 p 33 O ano chega ao final com inflação próxima a 80 desaceleração econômica evidente e que se intensificou ao longo do segundo semestre em especial no que se refere à atividade industrial que sofria com escassez de energia contração da liquidez e uma onda de greves motivada pela escalada inflacionária Em janeiro Goulart deu outra demonstração de que se tornava crescentemente difícil manter o equilíbrio entre os setores mais radicais à esquerda e a posição conservadora De fato Goulart que havia até então evitado regulamentar a lei sobre capitais estrangeiros Bandeira 1978 p110 decide finalmente regulamentála A lei limitava a remessa a 10 dos capitais registrados e impedia a remessa de lucros associados a reinvestimento Tal medida pode ter sido uma compensação para apaziguar a esquerda Isto porque Goulart ensaiando nova inflexão havia determinado a Galvão que buscasse a reabertura de negociações com os Estados Unidos o FMI e os credores europeus bem como depois de desvalorização de 615 do cruzeiro havia sancionado mais uma reforma cambial a Instrução 263 da SUMOC que simplificava consideravelmente o mercado de divisas16 Goulart com certo otimismo parecia acreditar que a reforma seria suficiente para garantir o reescalonamento dos compromissos externos Em mais um movimento pendular a 13 de março Goulart compareceu ao comício organizado pelas forças de esquerda assinando decretos que determinavam a encampação das refinarias particulares e a desapropriação de terras beneficiadas por investimentos públicos sem que os temas tivessem sido previamente discutidos com as lideranças do Congresso A radicalização tornouse ostensiva as forças conservadoras responderam com manifestações que mobilizaram maciçamente a classe média e explicitaram o isolamento político do presidente e a debilidade do seu apoio político e militar As resistências residuais na oficialidade quanto à remoção de Goulart foram quebradas pela fraqueza demonstrada pelo governo ao reagir à chamada Revolta dos Marinheiros no final de março e finalmente pela desastrada presença de Goulart em reunião de sargentos realizada em 30 de março Em 31 de março de 1964 teve início a rebelião militar que com amplo apoio do empresariado da classe média e respaldo ou omissão da maioria parlamentar pôs fim à Terceira República Diante do pouco apreço demonstrado pelas forças políticas ao longo do espectro pelos valores democráticos no ambiente polarizado da Guerra Fria o desfecho melancólico do regime de 1946 não chega a surpreender Neste contexto a incapacidade manifestada pelo governo Goulart no enfrentamento dos problemas macroeconômicos não pode ser responsabilizada pelo golpe militar mas certamente contribuiu para minar as resistências políticas do governo e do regime 4 Avaliação do período A historiografia econômica do período 19611964 destaca o debate sobre as causas da recessão industrial de 1963 Wells 1977 atribui a recessão que se inicia em 1963 ao programa de estabilização É difícil analisar o impacto do programa de ajuste sobre o desempenho da economia no curto prazo Os dados anuais entretanto são impressionantes a taxa de crescimento do PIB caiu de 66 em 1962 para 06 em 1963 seu mais baixo nível desde o início da Segunda Guerra Mundial ver anexo estatístico A restrição de liquidez afetou o desempenho dos gêneros industriais que dependiam do crédito em especial os produtores de bens de consumo durável As interpretações que enfatizam a relação causal entre o programa de estabilização do Plano Trienal e o início da recessão contrapõemse às de natureza estrutural Estas sublinham a perda de dinamismo do processo de substituição de importações com significativo aumento da relação marginal capitalproduto à medida que este afetava novos gêneros industriais e as flutuações de investimento naturalmente associadas à instalação de plantas com escalas de produção muito além do tamanho de mercados durante o Plano de Metas Esta última característica teria sido no caso de bens de capital agravada pela contração do gasto público Outras interpretações seguindo diferentes vertentes da tradição estruturalista enfatizam o esgotamento da industrialização por substituição de importações e a possível incompatibilidade entre a demanda associada a perfis específicos de distribuição renda e a oferta dos gêneros industriais instalados mais recentemente ver Furtado 1968 e Tavares 1972b e 1975 Não é difícil concordar com Serra 1981 p 84 quando concede que a profundidade da recessão dificilmente é explicável apenas por razões estruturais e deve ser também buscada nos programas de estabilização de 1963 e 19641967 Outras interpretações correntes na literatura especializada associam a recessão à aceleração inflacionária e à deterioração do quadro político Simonsen 1963 ou enfatizam a importância das restrições externas Leff 1967 Evidências mais recentes apresentadas por Cysne e Lisboa 2004 dão suporte à visão de Simonsen ao indicar que o imposto inflacionário subiu de 24 do PIB em 1960 para 40 em 1961 44 em 1962 e 54 em 1963 valor máximo da série que excede mesmo os volumes gerados no período de hiperinflação Não é difícil imaginar o efeito deste processo sobre a economia levando ao aumento generalizado dos prêmios de risco encurtamento de prazos e de horizontes de planejamento Nesse ambiente não surpreende que o investimento como sugere a queda das importações de bens de capital tenha sido fortemente afetado Mesquita 1992 atribui a recessão industrial que teve início em 1963 e que se estenderia até 1965 a múltiplas causas O declínio da poupança do setor público e o agravamento do desequilíbrio externo que limitava o uso da poupança importada parecem ter limitado o financiamento ao investimento Por outro lado o ácido contencioso externo teve efeito negativo sobre o investimento estrangeiro o que certamente tinha efeito deletério sobre a confiança do empresariado local A isto se somava a necessidade de conter o processo inflacionário o que levou à adoção de sucessivos planos de estabilização calcados na contenção da demanda em 1961 1963 e 1964 A falta de persistência na implementação fez com que em 1961 e 1963 apenas os custos da estabilização tenham sido pagos sem que benefícios tenham sido colhidos o que certamente contribuiu para a estagnação que se seguiu A experiência brasileira pós1994 mostra que nada há de incompatível entre a plena vigência das liberdades democráticas e a implementação de programas de estabilização que incluam medidas contracionistas potencialmente impopulares A incapacidade por parte da classe política de enfrentar os inevitáveis custos de curto prazo para estabilizar a economia no início dos anos 1960 antes da ruptura da ordem institucional reflete não apenas a fragilidade das coalizões governistas após o final do governo Kubitschek mas também a ausência de um consenso entre os economistas brasileiros sobre o papel da estabilidade monetária como precondição para o crescimento sustentado Cabe lembrar que as medidas contracionistas inerentes aos planos de estabilização eram quase sempre descritas como concessões desagradáveis mas inevitáveis aos credores externos e seu suposto agente o FMI17 Nesse contexto é de se esperar que faltasse mesmo convicção na sociedade organizada quanto à essencialidade e ao preço a pagar pela estabilização Finalmente ainda que existam elementos em comum a experiência brasileira de 19611964 não pode ser facilmente caracterizada como um episódio de populismo macroeconômico no sentido de Dornbusch e Edwards 1991 É verdade que o pensamento econômico brasileiro dominante enfatizava o crescimento à outrance e minimizava a preocupação com a inflação e as restrições macroeconômicas em geral Mas havia pouco foco na redistribuição de renda Os subsídios ao consumo especialmente evidentes no caso da importação de produtos como petróleo e trigo e nas tarifas de transporte público refletiam preocupações políticas de curto prazo e não faziam parte de uma estratégia redistributiva articulada Faltavam também no Brasil de 1961 as condições iniciais para a implementação de um experimento populista Estes normalmente se seguem a uma fase de estabilização na qual a ênfase da política econômica está na redução da inflação e dos desequilíbrios externos Nesta fase criase a margem de manobra fiscal e de balanço de pagamentos para a adoção subsequente de fortes políticas expansionistas O fracasso das tentativas de estabilização de 1961 e 1963 mostra que esse espaço simplesmente não chegou a ser criado limitando o escopo para inflexões expansionistas como atesta a postura do governo Goulart perante as negociações internacionais no início de 1964 Mais do que uma inflexão populista da política o início dos anos 1960 parece ter sido caracterizado pelo esgotamento do paradigma da macroeconomia do homem cordial sob o qual a incapacidade de explicitar escolhas leva a uma deterioração progressiva da gestão macroeconômica18 1Este capítulo se beneficia em muito do tratamento original de Marcelo Abreu Abreu 1990c bem como de Mesquita 1992 2A Constituição não contemplava a possibilidade de reeleição imediata do presidente da república e estabelecia eleições desvinculadas para presidente e vicepresidente 3Em 1975 Furtado de fato apenas repetiu a argumentação sobre os fatores primários de desequilíbrio incluída no Plano Trienal 4O relatório anual do Banco de Compensações Internacionais BIS de 1961 indica que a comunidade financeira internacional esperava que as medidas cambiais levassem à gradual unificação desse mercado 5Cerca de 40 do déficit em 1960 correspondia a subsídios às autarquias ligadas aos serviços de transporte especialmente setores ferroviário e marinha mercante 6Anais da Câmara dos Deputados 2761962 p 584 7Lei no 4131 de 3 de setembro de 1962 artigo 28 8Arquivo Hermes Lima CPDOCFGV 9Isto é o que se depreende do depoimento de Casimiro Ribeiro técnico da SUMOC que teve papel importante na formulação de políticas nesse período ao CPDOCFGV 1977 10Mesquita 1992 tabelas IV2 a IV3 Os meios de pagamento deveriam crescer à taxa de 34 ao ano compatível com a evolução esperada do PIB nominal dada por inflação de 25 e crescimento real de 7 11Desenvolvimento Conjuntura abril de 1963 12A oposição de parte importante da esquerda ao plano vinha desde o início Em debate com deputados da corrente nacionalista de apoio ao governo o ministro Celso Furtado segundo Castelo Branco 1975 declarou sobre o plano que não me encomendaram um projeto de revolução mas um plano de governo 13Castello Branco 1975 p 121 originalmente publicado em coluna do Jornal do Brasil em 14021963 14Ney Galvão banqueiro gaúcho próximo a Goulart que presidia o banco seria guindado ao Ministério da Fazenda em dezembro de 1963 15As autoridades americanas esperavam do Brasil além da indenização pelas encampações a adoção de um programa efetivo de estabilização bem como apoio no enfrentamento da questão cubana 16A Instrução 263 previa que o mercado cambial seria dividido em apenas dois segmentos especial com taxas fixas e livre com taxas flutuantes Este seria o ponto de partida para a rápida unificação do mercado cambial promovida pela SUMOC pelas Instruções 270 e 275 em maio e agosto de 1964 respectivamente 17Ver entre muitos exemplos o depoimento em Furtado 1989 p 15863 18A expressão é de Abreu 1994 CAPÍTULO 10 Estabilização e reforma 19641967 André Lara Resende1 1 Introdução O programa de estabilização implementado entre 1964 e 1968 logrou reduzir a taxa de inflação anual de algo próximo de 100 no primeiro trimestre de 1964 para algo em torno de 20 em 1969 Simultaneamente o crescimento do produto que em 1963 fora de apenas 06 recuperouse após 1966 e já em 1968 atingia a taxa de 98 O que foi o Programa de Ação Econômica do Governo Quais as razões e os custos do seu êxito em termo de indicadores macroeconômicos tradicionais A análise crítica do PAEG é o objetivo deste capítulo que está dividido em seis seções além desta introdução a seção 2 descreve os objetivos do PAEG e os da política salarial a seção 3 trata do papel da política salarial a seção 4 examina a condução das políticas monetária e fiscal a seção 5 analisa o impacto sobre a produção e os preços a seção 6 faz uma tentativa de avaliar os custos da estabilização a seção 7 conclui com uma análise do grau de ortodoxia do PAEG 2 Objetivos do PAEG O movimento militar de março de 1964 destituiu o governo Goulart e elevou à Presidência da República o Marechal Castelo Branco Em novembro aparecia o Programa de Ação Econômica do Governo PAEG elaborado pelo recémcriado Ministério do Planejamento e Coordenação Econômica O ministério econômico foi composto pela dupla Campos e Bulhões respectivamente no Planejamento e na Fazenda O PAEG listava entre os seus objetivos i acelerar o ritmo de desenvolvimento econômico interrompido no biênio 19621963 ii conter progressivamente o processo inflacionário durante 1964 e 1965 objetivando um razoável equilíbrio de preços a partir de 1966 iii atenuar os desníveis econômicos setoriais e regionais assim como as tensões criadas pelos desequilíbrios sociais mediante melhoria das condições de vida iv assegurar pela política de investimentos oportunidades de emprego produtivo à mão de obra que continuamente aflui ao mercado de trabalho v corrigir a tendência a déficits descontrolados do balanço de pagamentos que ameaçam a continuidade do processo de desenvolvimento econômico pelo estrangulamento periódico da capacidade de importar Para a consecução de tais objetivos seriam utilizados os seguintes instrumentos de ação Política financeira compreendendo i política de redução do déficit de caixa governamental de modo que aliviasse progressivamente a pressão inflacionária dele resultante e que fortalecesse a capacidade de poupança nacional através do disciplinamento do consumo e das transferências do setor público e na melhoria da composição da despesa ii política tributária destinada a fortalecer a arrecadação e a combater a inflação corrigindo as distorções de incidência estimulando a poupança melhorando a orientação dos investimentos privados e atenuando as desigualdades econômicas regionais e setoriais iii política monetária condizente com os objetivos de progressiva estabilização dos preços evitando todavia a retração do nível de atividade produtiva e a redução da capacidade de poupança das empresas iv política bancária destinada a fortalecer o nosso sistema creditício ajustandoo às necessidades de combate à inflação e de estímulo ao desenvolvimento v política de investimentos públicos orientada de modo que fortalecesse a infraestrutura econômica e social do país que criasse as economias externas necessárias ao desenvolvimento das inversões privadas e que atenuasse desequilíbrios regionais e setoriais Política econômica internacional compreendendo i política cambial e de comércio exterior visando à diversificação das fontes de suprimento e ao incentivo das exportações a fim de facilitar a absorção dos focos setoriais de capacidade ociosa e de estimular o desenvolvimento econômico com relativo equilíbrio de pagamentos a mais longo prazo ii política de consolidação da dívida externa e de restauração do crédito do país no exterior de modo que aliviasse pressões de curto prazo sobre o balanço de pagamentos iii política de estímulos ao ingresso de capitais estrangeiros e de ativa cooperação técnica e financeira com agências internacionais com outros governos e em particular com o sistema multilateral da Aliança para o Progresso de modo que acelerasse a taxa de desenvolvimento econômico Política de produtividade social compreendendo notadamente i política salarial que assegurasse a participação dos trabalhadores nos benefícios do desenvolvimento econômico mas que permitisse a sincronização do combate à inflação do lado da procura e dos custos e que protegesse a capacidade de poupança do país E ainda a política agrária a política habitacional e a política educacional Ministério do Planejamento e Coordenação Econômica MPCE 1964 p 156 Tratavase portanto de um programa que acentuava a importância da manutenção ou da recuperação das taxas de crescimento da economia O combate à inflação estava sempre qualificado no sentido de não ameaçar o ritmo da atividade produtiva A restrição do balanço de pagamentos era diagnosticada como séria limitação ao crescimento Para superála o PAEG propunha uma política de incentivos à exportação uma opção pela internacionalização da economia abrindoa ao capital estrangeiro promovendo a integração com os centros financeiros internacionais e o explícito alinhamento com o sistema norteamericano da Aliança para o Progresso A manutenção ou a promoção da capacidade de poupança da economia é associada em todos os níveis ao sucesso na luta contra a inflação deixando transparecer um diagnóstico heterodoxo que associa a inflação à poupança forçada Tal diagnóstico fica mais explícito na descrição das bases do programa desinflacionário A inflação brasileira era diagnosticada como resultado da inconsistência da política distributiva concentrada em dois pontos principais i no dispêndio governamental superior à retirada de poder de compra do setor privado sob a forma de impostos ou de empréstimos públicos ii na incompatibilidade entre a propensão a consumir decorrente da política salarial e a propensão a investir associada à política de expansão de crédito às empresas Dentro desse quadro prossegue o PAEG encontramse as três causas tradicionais da inflação brasileira os déficits públicos a expansão do crédito às empresas e as majorações institucionais de salários em proporção superior à do aumento de produtividade Estas causas conduzem inevitavelmente à expansão dos meios de pagamento gerando destarte o veículo monetário de propagação da inflação ver MPCE 1964 p 28 Um diagnóstico portanto que atribui à inconsistência na esfera distributiva da economia a causa da inflação e que vê na expansão monetária não um fator autônomo de pressão inflacionária mas o veículo de ratificação ou de propagação dessas pressões Em função de tal diagnóstico três normas básicas norteavam o programa desinflacionário i contenção dos déficits governamentais através do corte das despesas não prioritárias e racionalização do sistema tributário ii crescimento dos salários reais proporcional ao aumento de produtividade e à aceleração do desenvolvimento e iii política de crédito às empresas suficientemente controlada para impedir os excessos da inflação de procura mas suficientemente realista para adaptarse à inflação de custos 3 A política salarial no PAEG Podese dizer portanto que o PAEG era um programa com diagnóstico e estratégia de combate à inflação bastante heterodoxos O plano era otimista com relação aos resultados da estratégia gradualista de combate à inflação As metas de expansão monetária para 1964 1965 e 1966 eram de 70 30 e 15 respectivamente Levando em consideração o crescimento real programado de 6 ao ano e supondo a velocidaderenda da moeda razoavelmente estável as taxas de inflação correspondentes deveriam situarse na ordem de grandeza de 25 em 1965 e 10 em 1966 conforme veremos adiante tais metas não foram atingidas O PAEG tinha uma política salarial bem definida que deveria basearse em três pontos básicos i manter a participação dos assalariados no produto nacional ii impedir que reajustamentos salariais desordenados realimentem irreversivelmente o processo inflacionário e iii corrigir as distorções salariais particularmente no serviço público federal nas autarquias e nas sociedades de economia mista ver MPCE 1964 p 83 Até 1930 não havia no Brasil uma política salarial oficial vigorando a doutrina da liberdade de trabalho Em 1931 foi criado o Departamento Nacional do Trabalho e feita a regulamentação da sindicalização de trabalhadores e empregadores Nove anos mais tarde em 1940 instituise o salário mínimo cuja regulamentação só foi feita em 1943 Durante o governo Dutra de 1946 a 1950 o salário mínimo foi congelado sofrendo uma deterioração de 317 do seu valor real Entre 1951 e 1954 no segundo governo Vargas o salário mínimo foi reajustado duas vezes e em 1954 era 65 superior ao salário de 1946 em termos reais De 1955 a 1960 durante o governo Kubitschek houve uma pequena perda de 57 no salário mínimo real enquanto que no período de 1961 a 1964 durante os governos Quadros e Goulart apesar dos reajustes mais frequentes o salário mínimo real caiu aproximadamente 169 Em 1965 a Circular 10 do ministro extraordinário para Assuntos do Gabinete Civil determinou a forma do reajuste salarial da Administração Pública Federal que se recomendava também aos governos estaduais e municipais As normas estabelecidas por esta circular que em 1966 foram estendidas aos casos de dissídio no setor privado e só em junho de 1968 vieram a ser modificadas eram as seguintes i deveria ser restabelecido o salário médio real dos últimos 24 meses anteriores ao mês do reajustamento ii sobre o salário real médio deveria incidir a taxa de produtividade iii cumpria acrescentar a metade da inflação programada pelo governo para o ano seguinte resíduo inflacionário e iv ficava estabelecido o princípio da anuidade dos reajustes Com as atividades sindicais severamente reprimidas e as greves em atividades essenciais proibidas e ao governo competia o julgamento da essencialidade o poder de barganha dos sindicatos tomouse praticamente nulo As negociações diretas entre trabalhadores e empregadores foram substituídas pela fórmula de reajuste fornecida pelo governo2 Como a fórmula em vez de recompor o pico de salário real alcançado à época do último reajuste corrigia os salários na justa medida para recompor o salário real médio nos últimos 24 meses o salário mínimo real após o reajuste de março de 1965 foi reduzido em 110 com relação ao seu valor em março de 1964 quando fora reajustado pela última vez Como a previsão do resíduo inflacionário ou seja da inflação para o ano seguinte que entrava na fórmula de reajuste salarial era a previsão oficial que foi consistentemente inferior à inflação efetivamente ocorrida o salário mínimo real médio era reduzido O nível de salário mínimo real restabelecido pelo reajuste portanto também era reduzido em março de 1964 o índice de salário real era de 100 em março de 1965 por ocasião do primeiro reajuste pela fórmula este índice baixou para 89 em março de 1966 foi reduzido para 786 e em março de 1967 sofreu nova redução para 7193 Os efeitos da política salarial sobre o salário mínimo real médio anual foram significativos O índice de salário mínimo real médio sofreu uma queda de 45 pontos percentuais em 1965 quando foi introduzida a fórmula salarial e em 1966 foi novamente reduzido em outros sete pontos percentuais Nos anos seguintes os índices continuaram a cair mas o ritmo da queda foi reduzido Os efeitos da política salarial não se limitaram entretanto a reduzir o salário mínimo real médio O índice de salário anual real médio do pessoal ligado à produção na indústria de transformação também foi reduzido em aproximadamente sete pontos percentuais em 1965 acompanhando portanto a queda do salário mínimo real médio Segundo os dados do DIEESE Departamento Intersindical de Estatística e Estudos o índice de salário anual real médio em 1967 estava aproximadamente 9 pontos percentuais abaixo do índice de 1965 sugerindo que apesar da inexistência de dados para 1966 também neste ano o salário real médio na indústria de transformação acompanhou a queda do salário mínimo Os índices deflacionados pelos índices de custo de vida na cidade do Rio de Janeiro calculado pela Fundação Getulio Vargas FGV e na cidade de São Paulo especialmente o primeiro estimam que a queda do salário real médio na indústria de transformação de 1965 para 1967 foi menor do que a calculada pelo DIEESE De qualquer forma os três índices acusam a queda do salário real médio na indústria de transformação entre 1964 e 1967 4 Condução das políticas monetária e fiscal Das três normas básicas do programa desinflacionário do PAEG a saber contenção dos déficits governamentais política salarial e política de crédito às empresas a primeira foi a mais bemsucedida Os impostos diretos e indiretos foram imediatamente aumentados O déficit do governo como proporção do PIB que era de 42 em 1963 já em 1964 declinava para 32 em 1965 era apenas 16 e em 1966 11 Também a forma de financiamento do déficit foi substancialmente alterada Desde 1960 o déficit era quase que integralmente financiado pelas emissões de papelmoeda Em 1965 55 do déficit foram financiados através da venda de títulos da dívida pública e em 1966 o déficit foi totalmente financiado pelos empréstimos junto ao público As políticas monetária e de crédito ao setor privado foram bem mais erráticas A partir do segundo trimestre de 1964 tanto a moeda quanto o crédito expandiramse aproximadamente em linha com os preços havendo um primeiro aperto na liquidez no último trimestre do ano Em 1965 entretanto as políticas monetária e creditícia foram extremamente folgadas elevando substancialmente os índices de liquidez real conforme se verifica na Tabela 101 Tabela 101 Brasil Índices de liquidez real taxas de crescimento real nos últimos 12 meses 19641967 Indicadores de liquidez deflacionados pelo IPA Fontes Banco Central Boletim e FGV Conjuntura Econômica As taxas de expansão da moeda em 1965 estiveram sempre acima da taxa de crescimento dos preços Apesar da queda acentuada da inflação em 1965 a expansão monetária foi praticamente igual à expansão observada em 1964 atingindo 835 A previsão do PAEG de 30 de crescimento dos meios de pagamento em 1965 foi portanto completamente estourada A principal razão para este grau de descalibragem na política monetária parece ter sido o resultado do balanço de pagamentos A política econômica de Campos e Bulhões recebeu apoio das agências financeiras internacionais A AID agência de ajuda externa norteamericana concedeu importantes empréstimos ao Brasil que durante o período 196467 foi o quarto maior receptor mundial de ajuda líquida atrás apenas da Índia do Paquistão e do Vietnã do Sul Os empréstimos e financiamentos obtidos em 1965 aumentaram 65 em relação ao nível de 1964 enquanto os investimentos diretos quase triplicaram Simultaneamente a redução da taxa de crescimento tanto em 1964 quanto em 1965 reduziu as importações Em 1965 o valor em dólares das importações brasileiras foi igual ao observado em 1950 o mais baixo ocorrido nas décadas de 1950 e 1960 As exportações recuperaramse em 1964 e atingiram nível recorde em 1965 gerando um superávit de US218 milhões no balanço de pagamentos As reservas dobraram passando de US244 milhões para US483 milhões A política monetária não foi suficientemente ágil para esterilizar este influxo de moeda gerado pelo superávit externo e até o primeiro trimestre de 1966 a liquidez real da economia esteve folgada A partir do segundo trimestre de 1966 a política monetária foi invertida tornandose apertada Conforme se vê na Tabela 101 a liquidez real medida pela expansão monetária foi muito reduzida nos três últimos trimestres de 1966 No entanto a inibição do crédito ao setor privado foi sensivelmente menor do que o aperto monetário Este fato devese à ação do Banco do Brasil pois os empréstimos totais ao setor privado em termos reais caíram enquanto os empréstimos do Banco do Brasil ao setor privado em termos reais expandiramse 5 O impacto sobre a produção e os preços Que impacto sobre os preços e o produto tiveram as políticas monetária e fiscal do PAEG Os dados anuais mostram que em 1964 os preços elevaramse 90 segundo o índice geral de preços e 813 medido pelo índice de preços por atacado Estas taxas recordes verificaramse não apenas no primeiro trimestre de 1964 mas durante todo o ano e podem ser atribuídas aos vários aumentos das tarifas dos serviços públicos à liberação dos aluguéis congelados e a outros preços num processo na época chamado de inflação corretiva Ainda dentro da política corretiva dos preços o governo atendeu às pressões para elevar os salários dos servidores públicos O salário mínimo havia sido elevado em 100 em fevereiro ainda no governo Goulart enquanto os salários dos funcionários do serviço público eram congelados Os salários dos militares foram aumentados em 120 imediatamente após a mudança de governo e os empregados civis receberam aumento de 100 em junho A política monetária em 1964 foi mais folgada do que em 1963 mas os índices de liquidez real mantiveramse negativos durante todo o ano com exceção do terceiro trimestre Devese notar ainda que o crédito ao setor privado expandiuse a taxas menores do que a moeda O relativo alívio na liquidez permitiu pequena recuperação da produção industrial que cresceu em torno de 34 no ano A agricultura voltou a ter um ano ruim e cresceu apenas 13 O ano de 1965 assinala o início da queda da curva inflacionária Os dados anuais evidenciam que a queda no ritmo de crescimento industrial deuse em 1963 a queda na tendência inflacionária em 1965 e a queda nas taxas de expansão monetária em 1966 O tempo de tais quedas pode ser determinado mais precisamente pela observação dos dados trimestrais de consumo de energia elétrica como proxy para a produção industrial Esses dados indicam que a atividade industrial entrou em recessão no segundo trimestre de 1963 No primeiro trimestre de 1965 temse uma brusca quebra na tendência de crescimento dos preços agrícolas No segundo trimestre é a vez dos preços industriais que desaceleram o ritmo de crescimento Apenas no primeiro trimestre de 1966 sobrevém a queda no ritmo de crescimento da moeda A ordem cronológica dos fenômenos sugere o sentido da causalidade O aperto de moeda e crédito em 1963 paralisa a atividade industrial enquanto os preços se aceleram Em 1964 o alívio na liquidez real até o terceiro trimestre permitiu um esboço de recuperação industrial enquanto os preços continuavam elevandose em relação às taxas de 1963 Em 1965 a política fiscal restritiva que aumentara os impostos em todos os níveis e reduzira a despesa do governo desde o segundo semestre de 1961 associada a novo aperto de crédito no último trimestre de 1964 fez com que a atividade industrial entrasse definitivamente em colapso Após dois anos de safras ruins a agricultura teve um ano excepcional e cresceu 121 em 1965 Com a recessão industrial o impacto da safra agrícola fezse sentir ainda no primeiro trimestre de 1965 quando os preços agrícolas cresceram à taxa anual de 50 enquanto os preços industriais cresciam ainda à taxa anual de 86 No segundo trimestre de 1965 entra em vigor a fórmula salarial do PAEG que reduzia em 26 o salário mínimo real restabelecido em relação a fevereiro de 1964 Os preços industriais apresentaram então os primeiros sinais de quebra de tendência a taxa de crescimento anual do segundo trimestre cai para 69 A taxa de crescimento dos preços agrícolas continuou a diminuir a cada trimestre reduzindo o preço relativo agricultura indústria Também os preços industriais apresentaram taxas de crescimento decrescentes até o último trimestre do ano Enquanto os preços reduziam o ritmo de crescimento a política monetária escapava ao controle e expandia moeda e crédito a taxas muito superiores às dos preços Os índices de liquidez real elevaramse rapidamente e atingiram um pico no último trimestre de 1965 A virada na liquidez real fezse sentir no primeiro trimestre de 1966 quando após um período de 10 trimestres em declínio o último trimestre de 1964 foi a única exceção o consumo de energia elétrica sofreu uma elevação de 20 e mantevese crescente a taxas elevadas durante todo o ano O crédito fácil durante o ano de 1965 e a capacidade ociosa acumulada em três anos de estagnação explicam o crescimento industrial em 1966 que atingiu a taxa de 117 A agricultura é que teve um mau desempenho em 1966 quando sofreu uma queda de produção de 17 Desde o primeiro trimestre de 1966 os preços agrícolas passaram a crescer mais do que os preços industriais o que manteve os termos de troca agriculturaindústria em elevação durante os quatro trimestres do ano A fórmula salarial volta a reduzir o salário mínimo real no mês do reajuste e conforme foi visto anteriormente o salário real médio anual na indústria também sofreu nova queda Com os salários mais baixos e apesar dos preços agrícolas mais altos a inflação voltou a baixar mas a queda em 1966 foi de apenas 19 pontos percentuais de 568 para 380 enquanto em 1965 a queda fora de 33 pontos de 90 para 568 A política monetária entretanto sofreu uma brusca mudança ainda no primeiro trimestre de 1966 Como que assustado com a perda do controle monetário em 1965 o governo iniciou em 1966 a primeira verdadeira experiência com a ortodoxia monetarista O déficit do Tesouro foi reduzido a 11 do PIB quase que 14 da proporção observada em 1963 Tal resultado foi obtido tanto através da elevação dos impostos quanto do corte nas despesas O financiamento do déficit foi feito através da colocação de títulos junto ao público e pelo levantamento de empréstimos externos A AID concedeu um empréstimo ao Tesouro no valor de Cr1707 milhões o que representava 29 de déficit Pela primeira vez o déficit da União foi financiado integralmente sem recurso à emissão O rígido controle das fontes de emissão monetária manteve a taxa de crescimento da moeda em 354 O índice de liquidez real medido pela taxa de expansão monetária tornouse negativo a partir do terceiro trimestre O índice de liquidez real medido pela taxa de expansão do crédito ao setor privado entretanto sofreu redução bem menos severa e só no quarto trimestre tornouse negativo atingindo 2 O índice para os empréstimos dos bancos comerciais ao setor privado atingiu 3 9 e 4 no terceiro e quarto trimestres de 1966 e no primeiro trimestre de 1967 respectivamente o que indica que a ação do Banco do Brasil expandindo os seus empréstimos mais do que os bancos comerciais evitou que a política monetária restritiva atingisse o crédito ao setor privado em toda sua extensão Tal fato pode explicar o bom desempenho da indústria durante o ano de 1966 Os indícios de recessão na indústria só começaram a aparecer no último trimestre de 1966 No primeiro trimestre de 1967 o quadro já era nitidamente recessivo O consumo de energia elétrica decrescia após quatro trimestres de crescimento acelerado A política monetária começava a se fazer sentir Os aspectos ortodoxos da experiência brasileira de estabilização pós1964 podem ser resumidos na política monetária e creditícia durante os dois primeiros trimestres de 1966 e na política fiscal de 1964 a 1966 que elevou os impostos e reduziu as despesas do governo É nítida na experiência brasileira do período em questão a relação entre as políticas fiscal monetária e creditícia restritivas principalmente esta última e a desaceleração da atividade industrial A defasagem com que as políticas restritivas operam sobre o nível de atividade é de aproximadamente dois ou três trimestres A política fiscal restritiva de 1964 e 1965 completou o pacote ortodoxo inicialmente introduzido com o Plano Trienal no início de 1963 e acabou determinando a queda da produção industrial de 47 em 1965 O PIB só não decresceu porque a agricultura teve um ano excepcional 6 Os custos da estabilização Quais os custos da experiência com a ortodoxia A parada do crescimento durante o período 19631967 criou um hiato entre o produto observado e o produto potencial medido pela linha de tendência do PIB baseada na taxa histórica de 7 ao ano que só foi eliminado em 1973 portanto 10 anos mais tarde depois de 7 anos de crescimento acelerado no período 19681973 Os custos da quebra do ritmo de crescimento em termos de emprego não podem ser avaliados com precisão pois não existem estatísticas de desemprego para o período Podese apenas portanto especular sobre o que é sem dúvida o mais grave aspecto das políticas monetária e fiscal restritivas Outro aspecto do impacto da política monetária restritiva durante o ano de 1966 pode ser avaliado com base no exame do índice de passivo médio real de firmas insolventes que quase triplicou entre 1965 e 1966 para firmas individuais categoria que inclui quase na totalidade as firmas pequenas O mesmo índice para as sociedades de responsabilidade limitada categoria que inclui na maioria pequenas e médias empresas mais do que duplicou Para as sociedades anônimas onde estão a maior parte das grandes empresas o índice passou de 82 para 128 não chegando a duplicar Estes números dão ideia do impacto das políticas monetária e creditícia sobre as empresas de uma economia que em 1966 estava no seu terceiro ano de recessão Podese ainda deduzir que a política monetária restritiva atingiu mais violentamente as pequenas empresas que compõem a categoria de firmas individuais As sociedades de responsabilidade limitada vêm a seguir e as sociedades anônimas categoria que inclui as maiores empresas foram as menos atingidas O caráter regressivo sobre a estrutura industrial da política de 1966 fica mais uma vez evidenciado pelos dados do número de falências e concordatas requeridas por ramos de atividade Os setores mais atingidos foram vestuário alimentos e construção civil nos quais o número de falências e concordatas requeridas mais do que triplicou entre 1964 e 1966 Vestuário e alimentos são setores tradicionais de estruturas menos oligopolizadas onde predominam as pequenas e médias empresas A indústria de construção civil foi claramente uma vítima da política fiscal que reduziu substancialmente as despesas com obras públicas no período É importante lembrar que a construção civil é um setor intensivo em mão de obra não qualificada cuja paralisação tem portanto caráter socialmente regressivo Este setor como todos aqueles compostos na sua maioria por firmas nacionais sofreu ainda mais severamente o aperto de crédito Em 1966 iniciavase o influxo de capitais externos que passou a gerar superávits crescentes na conta capital Este influxo de capitais constituíase na sua maioria de empréstimos e financiamentos contratados no exterior 442 de tais empréstimos em 1966 foram contratados por empresas de propriedade estrangeira e 464 por empresas públicas A participação das empresas nacionais privadas foi de apenas 65 dos empréstimos Devese notar ainda que no mesmo ano 691 dos empréstimos foram concedidos por corporações não financeiras privadas no exterior Tratavase portanto de empréstimos contratados pelas filiais brasileiras de empresas multinacionais junto às matrizes Isto é confirmado pelo fato de que 32 dos empréstimos e financiamentos contratados em 1966 foram feitos através da Instrução 289 que possibilitava a contratação de empréstimos em moeda estrangeira diretamente entre empresas do exterior e do país prevalecendo as transações entre empresas associadas Para se ter uma ideia da importância desses empréstimos externos devese lembrar que os empréstimos e financiamentos somaram Cr112 bilhão à taxa de câmbio da época representando 14 do total dos empréstimos ao setor privado naquele ano As firmas estrangeiras tinham grande vantagem no acesso ao crédito externo Embora a avaliação de como a política fiscal restritiva do período 196467 mais especificamente dos anos de 1965 e 1966 afetara a composição das despesas públicas exija uma análise mais detalhada das finanças públicas no período é possível tirar algumas conclusões baseadas na participação dos diversos ministérios na despesa da União Em 1965 a maior queda na participação da despesa foi a do Ministério dos Transportes então Ministério da Viação e Obras Públicas Como estes são certamente os gastos públicos de maior impacto sobre a atividade econômica em geral e sobre o setor de construção civil em particular temse a indicação do caráter recessivo dos cortes na despesa e entendese por que o setor de construção civil foi tão duramente atingido Em contrapartida o ministério cuja participação na defesa teve maior elevação quase dobrou foi o do Exército então Ministério da Guerra passando de 58 em 1964 para 104 em 1965 Dos ministérios cujos gastos têm caráter mais social a saber Educação e Cultura Saúde Trabalho e Previdência Social o primeiro teve sua participação elevada o segundo praticamente inalterada e apenas o terceiro teve sua participação reduzida caindo de 29 em 1964 para 19 em 1965 Os demais ministérios militares Aeronáutica e Marinha também tiveram suas participações elevadas O quadro não se modifica muito de 1965 para 1966 Novamente cai a participação do Ministério dos Transportes que passa agora a representar apenas 148 da despesa Também o Ministério do Trabalho e Previdência Social continua tendo reduzida a participação na despesa caindo de 19 para 1 A queda nos gastos com a previdência social é evidente havia alcançado 7 até 1965 cai para 54 em 1966 e 55 em 1967 7 Além da ortodoxia simplista Até que ponto o PAEG foi ortodoxo É preciso de início tentar caracterizar mais precisamente o que é um programa de estabilização ortodoxo A ortodoxia começa no diagnóstico da situação inflacionária A inflação é percebida como consequência imediata da excessiva expansão monetária A causalidade é direta e nesta ordem excessiva expansão de moeda e crédito causam inflação Os mecanismos de transmissão através dos quais a expansão excessiva de moeda e crédito transformase em inflação não são bem precisos E sabese apenas que a mediação é feita por pressões generalizadas de demanda associadas à excessiva expansão monetária Entendese por expansão monetária excessiva aquela que é superior à demanda real de moeda por parte dos agentes econômicos A demanda de moeda por sua vez é baseada na teoria quantitativa ou alguma variante próxima A moeda necessária na economia é proporcional ao produto Na versão mais elementar e mais utilizada na prática o coeficiente de proporcionalidade é constante e igual a 1 Em versões mais sofisticadas este coeficiente é função estável de variáveis conhecidas em particular da própria taxa de inflação Tal sofisticação analítica exige que se faça algum tipo de correção para variações na velocidade Como estas variações são previsíveis o uso prático da equação quantitativa não é afetado O ponto importante é que o nível de produto ou sua taxa de crescimento são considerados independentes da taxa de expansão da moeda Esta neutralidade da moeda retira da inflação qualquer funcionalidade Inflação é apenas moeda em excesso Por que então moeda em excesso O diagnóstico ortodoxo aponta três causas geralmente associadas incompetência clientelismo populista e excessiva intervenção governamental na economia Todas as três materializamse no excesso da despesa do governo sobre a receita e no financiamento deste déficit orçamentário através da emissão A inflação distorcendo o sistema de preços relativos e aumentando o grau de incerteza do sistema é assim consequência da intervenção do governo na economia que perturba o bom funcionamento do sistema de mercado e impede a alocação eficiente de recursos A partir deste diagnóstico a ortodoxia aponta a receita para o controle da inflação Políticas monetária e creditícia restritivas de forma que enxuguem o excesso de moeda no sistema e ponha fim ao estado generalizado de excesso de demanda Como a principal fonte da expansão monetária excessiva segundo o diagnóstico ortodoxo é o déficit orçamentário do Tesouro é necessário fazer também uma política fiscal restritiva A redução nas despesas do governo além de instrumental na consecução da política monetária é em si mesma positiva pois atua também no sentido de reduzir as pressões de demanda no sistema quando corta justamente os gastos que devem ser cortados pois as despesas do governo são essencialmente ineficientes e causadoras de distorções na economia O caráter não intervencionista e liberal da ortodoxia continua na interpretação das dificuldades enfrentadas no balanço de pagamentos e nas sugestões de medidas para superálas Tais dificuldades são entendidas como decorrentes de uma política tarifária protecionista e uma política cambial intervencionista Sob o escudo destas políticas desenvolvese uma indústria ineficiente simultaneamente incapaz de competir no mercado externo e dependente de importações de bens intermediários e de capital O déficit comercial em termos de produtos manufaturados não pode ser compensado pela exportação de produtos primários tradicionais pois a política cambial na tentativa de subsidiar a indústria mantém a taxa de câmbio sobrevalorizada e penaliza a atividade primário exportadora No front externo portanto a ortodoxia opta também pelo liberalismo sugerindo câmbio realista e redução da proteção tarifária à indústria oligopolística e ineficiente É no mercado de trabalho e em relação aos salários que o liberalismo econômico da ortodoxia tomase menos coerente A lógica de mercado do raciocínio ortodoxo estendese naturalmente ao mercado de trabalho O excesso de moeda gera um estado generalizado de excesso de demanda que se reflete também no mercado de trabalho O superaquecimento da economia pressiona o mercado de trabalho e reduz a taxa de desemprego a níveis abaixo da taxa natural Os salários nominais começam em consequência a elevarse mais rapidamente do que o nível geral de preços e transformamse em fonte autônoma de pressões inflacionárias Ao contrário no entanto de como a visão ortodoxa percebe todos os demais mercados essencialmente competitivos sem fricção e em permanente equilíbrio o mercado de trabalho aparece como fonte das dificuldades enfrentadas no combate à inflação Sindicatos poderosos e expectativas rígidas interferem no ajustamento das forças de mercado e mantêm as pressões inflacionárias por parte dos salários apesar do fim das pressões de demanda quando a política monetária é corretamente conduzida Explicase assim a resistência da inflação após a adoção das medidas restritivas de política monetária e fiscal quando o estado recessivo da economia já não permite insistir no diagnóstico do excesso generalizado de demanda Portanto o mercado de trabalho e o poder de fixação de preços dos sindicatos em particular são apontados como a fonte das dificuldades do programa de estabilização Explicase assim porque o combate à inflação causa recessão e desemprego Ao se corrigirem os excessos das políticas monetária e fiscal todos os mercados ajustamse instantaneamente às novas condições O mercado de trabalho é a exceção O poder de mercado dos sindicatos e a rigidez das expectativas mantêm os salários reais acima do nível compatível com o equilíbrio não inflacionário É preciso sujeitar os trabalhadores à decepção do mercado para que suas expectativas e pretensões salariais sejam revistas Explicase assim a ocorrência de períodos com inflação e recessão simultaneamente Qualquer período em que a política ortodoxa falhe na tentativa de reduzir a inflação e gere a queda no nível de atividade e desemprego é explicado pela resistência dos salários a entrar em linha com os preços Mais longas e mais graves crises de estabilização são explicadas por maiores poderes distorcivos por parte dos sindicatos e maiores resistências por parte das expectativas Aqui devese fazer menção à versão mais recente do monetarismo associado às expectativas racionais e à macroeconomia dos mercados em equilíbrio equilibrium ou marketclearing macroeconomics Esta vertente da ortodoxia econômica assume uma postura mais radical e mais coerente Também o mercado de trabalho é encarado como em permanente equilíbrio As políticas monetária e fiscal são impotentes para afetar qualquer variável real na economia seja o nível de atividade seja o nível de emprego A única medida a ser seguida para obter estabilidade de preços é evitar o excesso de oferta monetária através da adoção de uma regra para a expansão da moeda e do crédito As flutuações observadas no emprego refletem apenas variações na preferência pelo lazer por parte dos trabalhadores tratandose portanto de desemprego voluntário Os custos do programa desinflacionário ficam assim muito reduzidos A redução da liquidez causa desemprego que sendo no caso voluntário não deve ser visto como custo As quebras são arbitradas pelo mercado quebram portanto as empresas menos eficientes enquanto sobrevivem as mais capazes A crise de estabilização acaba sendo vista como terapêutica ou seja um período de purgação em que as empresas ineficientes que prosperaram à sombra da doença inflacionária são expurgadas e a economia é saneada Dentro desta perspectiva o PAEG não foi um programa perfeitamente ortodoxo Suas intenções demonstram demasiada preocupação com a manutenção das taxas de crescimento e portanto alguma tolerância com a inflação que deve ser combatida através de estratégia gradualista Seu diagnóstico aponta para a incompatibilidade entre as parcelas reivindicadas pelo governo pelas empresas para investimento e pelos trabalhadores para consumo como causa da inflação A expansão monetária segundo o PAEG apenas sanciona a inflação decorrente de tal inconsistência da política distributiva O reconhecimento de que existem pressões reais na economia que são inflacionárias e que podem ser resolvidas pela contenção violenta da taxa de expansão dos meios de pagamento fica explícito na política creditícia do PAEG que a pretende suficientemente controlada para impedir os excessos da inflação de procura mas suficientemente realista para adaptarse à inflação de custos A política econômica do primeiro governo pós1964 foi bem além do receituário mais simplista que prega apenas políticas monetária e fiscal rigorosas e handsoff A convicção da necessidade de reformas institucionais acompanhou o PAEG desde seu diagnóstico Três áreas foram particularmente destacadas refletindo acertadamente a percepção do governo a respeito dos pontos de estrangulamento institucionais da economia primeiro a desordem tributária segundo as deficiências de um mercado financeiro subdesenvolvido e a inexistência de um mercado de capitais e por último as ineficiências e as restrições ligadas ao comércio exterior4 Por trás das três áreas de desordem institucional estava sem sombra de dúvida a incompatibilidade entre o pressuposto da moeda estável na legislação e as altas taxas de inflação Num claro reconhecimento de que não se esperava que a estabilidade de preços fosse alcançada a médio prazo o mecanismo da correção monetária foi introduzido A correção monetária permitiu reforma completa e racionalização do sistema tributário e em particular do imposto de renda A reforma do sistema tributário incluiu ainda a eliminação dos impostos em cascata o fim de impostos arcaicos e destituídos de funcionalidade econômica e a coordenação dos sistemas tributários da União dos estados e dos municípios A reformulação institucional do sistema financeiro começou pela criação do Banco Central com a Lei no 4595 Até então as funções de Banco Central eram divididas entre a SUMOC e o Banco do Brasil A SUMOC era o órgão normativo das políticas monetária e cambial sem entretanto autoridade executiva O Banco do Brasil acumulava às suas funções de banco comercial e de fomento duas funções de Banco Central a de banqueiro do Tesouro e a de banqueiro do sistema bancário através da Carteira de Redesconto e da Caixa de Mobilização Bancária Apesar de não ter levado até o fim a desvinculação do Banco do Brasil do papel de Autoridade Monetária pois o Banco do Brasil permaneceu tendo acesso automático e discricionário aos fundos do Banco Central a criação do Banco Central foi um enorme avanço no sentido da modernização do sistema financeiro e da condução da política monetária Através da Lei no 4380 foi criado o Sistema Financeiro da Habitação em torno do Banco Nacional da Habitação que integrado aos novos programas de seguro social o PIS e o Pasep passou a ser um poderoso agente de captação de poupança privada forçada Em meados de 1965 a Lei no 4728 traçou todo o desenho institucional do sistema financeiro delimitando as funções dos bancos comerciais bancos de investimentos e de desenvolvimento sociedades de crédito e financiamento sociedades corretoras e distribuidoras de títulos e valores sociedades de crédito imobiliário entre outras O desenho do arcabouço básico de um sistema financeiro moderno associado à correção monetária nos contratos e títulos financeiros de médio e longo prazos permitiu a captação da poupança privada voluntária e sua canalização para o financiamento tanto do Tesouro quanto do investimento privado Com relação ao setor externo as reformas institucionais passaram pela simplificação e unificação do sistema cambial pela modernização e dinamização das agências do setor público ligadas ao comércio exterior e pela maior integração com o sistema financeiro internacional como fonte de acesso a créditos de médio e longo prazos Os pilares do PAEG e da política desinflacionária dos primeiros governos pós1964 foram sem dúvida a política salarial e as reformas institucionais Para contornar as ineficiências e as restrições percebidas como existentes no mercado de trabalho o programa desinflacionário do PAEG substituiu a negociação dos salários pela fórmula oficial de reajuste5 A aplicação desta fórmula conforme se viu reduziu o salário mínimo a cada ano de 1965 até 1974 enquanto o salário real médio industrial caiu entre 10 e 15 dependendo do deflator usado entre 1965 e 1967 Desta forma usando o poder sobre a sociedade em geral e os sindicatos em particular de que dispõe o governo autoritário foi possível fazer diretamente aquilo que a ortodoxia pretende conseguir através da recessão e do desemprego solucionar o impasse distributivo através da redução da parcela salarial A diferença está no fato de que a ortodoxia utilizase da restrição de liquidez fórmula aparentemente neutra de distribuir os custos da estabilização pois deixa ao mercado o encargo de selecionar os mais fracos enquanto regimes autoritários dispensamse de tal détour Se o PAEG diagnostica como causa primordial da inflação o conflito distributivo e se tem o poder político de solucionálo pela via autoritária da intervenção direta na determinação dos salários perguntase então por que se insistiu na prática de políticas fiscal e monetária restritivas de caráter ortodoxo Tal prática além dos custos sociais da compressão salarial provoca crise de estabilização e todos os custos da recessão Os custos da política de compressão salarial foram sem dúvida consideráveis sendo importante elemento de explicação da deterioração da distribuição de renda entre 1960 e 1970 A participação na renda total dos 50 mais pobres reduziuse de 177 para 149 e a dos 30 seguintes de 279 para 2286 Os custos sociais do desemprego que acompanham a recessão são contudo incomparavelmente maiores Sob a aparência de neutralidade as políticas monetária e fiscal restritivas são na realidade regressivas Seus custos recaem primordialmente sobre os desempregados constituídos em sua maioria de trabalhadores de baixa qualificação e renda e sobre as pequenas e médias empresas incapazes de ter acesso ao crédito racionado enquanto as grandes empresas utilizamse do poder de monopólio para sustentar preços e devido à condição de clientes privilegiados mantêm acesso ao crédito No caso brasileiro a possibilidade de recorrer a empréstimos externos em moeda estrangeira teve efeitos particularmente regressivos pois deu às empresas estrangeiras e às grandes empresas estatais acesso a uma linha de crédito vedada às pequenas e médias empresas nacionais A resposta pode ser encontrada na limitação imposta pelo balanço de pagamentos Por um lado era impossível manter a economia crescendo às taxas da segunda metade dos anos 1950 sem conseguir gerar novo influxo de capitais seja na forma de investimento direto seja na forma de empréstimos As importações já eram àquela altura relativamente incomprimíveis e a dinamização das exportações não poderia ser feita a curto prazo Por outro lado não se poderia gerar este influxo de capitais sem conseguir a confiança das agências financeiras internacionais A confiança das agências financeiras e dos grandes investidores só poderia ser conquistada através de demonstrações inequívocas da opção pela ortodoxia Assim como em todas as ocasiões anteriores em que se tentou implementar no Brasil um programa desinflacionário a restrição do balanço de pagamentos teve papel decisivo na opção pela ortodoxia Assim como nas ocasiões anteriores esta opção teve impacto imediato sobre a atividade econômica e o que distingue o PAEG das tentativas anteriores é o contexto político radicalmente diferente que permitiu a intervenção autoritária e direta sobre a determinação dos salários Associados a um ano de excelentes resultados na agricultura os salários permitiram a redução da inflação em 1965 justamente quando a política monetária escapava ao controle do governo e era folgada As bem estruturadas e modernizantes reformas fixaram as bases do período de rápido crescimento econômico que se iniciou em 1968 1Uma versão mais longa deste capítulo incluindo a análise do Plano Trienal e alguns comentários sobre a política econômica pós1967 foi publicada em Política e Planejamento Econômico 12 3 dezembro de 1982 com o título A Política Brasileira de Estabilização 196368 2Para a descrição e análise da evolução do arcabouço legal da política salarial do período ver Lago Almeida e Lima 1979b 3Ver Silva 1977 para uma completa discussão das fórmulas de política salarial dos governos pós1964 4Para análise detalhada das reformas institucionais do período 19641968 ver Sochaczewski 1993 e Simonsen e Campos 1976 5A este respeito o seguinte comentário de Simonsen autor da fórmula salarial do PAEG é exemplar Há considerável vantagem de se criar uma regra de arbitramento para as negociações salariais coletivas O grande problema destas negociações no mundo moderno inclusive no que diz respeito à fixação de salários no nível de decisão governamental é que elas são agressivamente afetadas pelo poder político dos sindicatos por critérios eleitorais e por outros tantos bem afastados de qualquer teorema de eficiência econômica Uma fórmula desse tipo tem a vantagem de substituir um infindável jogo de greves e pressões por um simples cálculo aritmético 6Ver Bacha e Taylor 1980 para uma resenha crítica da controvérsia sobre a distribuição de renda no período e o impacto da política salarial CAPÍTULO 11 A retomada do crescimento e as distorções do milagre 1967 1974 Luiz Aranha Correa do Lago Neste capítulo que é uma versão resumida de um trabalho mais amplo Lago 1989 examinamse os principais aspectos da política econômica no período 1967 a 1973 bem como os seus efeitos em áreas específicas Nesse período o Brasil alcançou taxas médias de crescimento muito elevadas e sem precedentes que decorreram em parte da política econômica então implementada principalmente sob a direção do ministro da Fazenda Antonio Delfim Netto mas também de uma conjuntura econômica internacional muito favorável Esse período e por vezes de forma mais restrita o período 196873 passou ser conhecido como o do milagre econômico brasileiro usandose terminologia anteriormente aplicada a fases de rápido crescimento econômico no Japão e em países europeus Esse milagre econômico foi em certa medida o desdobramento de diagnósticos e medidas da política econômica adotada entre 1964 e 1966 e consubstanciada no Programa de Ação Econômica do Governo PAEG Quanto às principais personalidades envolvidas com a política econômica no período cabe recordar que no início de 1967 Castelo Branco foi sucedido por Costa e Silva na Presidência da República Antonio Delfim Netto foi então nomeado ministro da Fazenda e Hélio Beltrão recebeu a pasta do Planejamento Em 1969 com a doença e morte de Costa e Silva após o breve período de transição da junta militar Médici assumiu a Presidência e João Paulo dos Reis Velloso tornouse ministro do Planejamento De 15 de março de 1967 a 15 de março de 1974 Delfim Netto permaneceu à frente do Ministério da Fazenda mantendo durante aqueles anos uma orientação para a condução da economia sem grandes alterações em suas linhas gerais o que justifica a abordagem dos sete anos de 1967 a 1973 como um único período do ponto de vista da política econômica A ele coube a escolha dos presidentes do Banco Central do Brasil inicialmente Ruy Leme e depois Ernane Galvêas Delineiamse resumidamente a seguir o diagnóstico da nova equipe econômica bem como as principais áreas de atuação do governo e instrumentos e medidas como pano de fundo para uma tentativa de avaliação dos resultados econômicos e sociais do período do Milagre A nova equipe econômica que assumiu em 1967 e que em boa parte tinha origens acadêmicas dificilmente poderia negar os progressos alcançados pela administração anterior em várias frentes e quanto ao diagnóstico da crise não discordaria da hipótese de que nos anos anteriores o processo inflacionário brasileiro poderia ser caracterizado como resultante de inflação de demanda Esta no entanto já parecia em boa medida enfrentada pelo menos em suas causas básicas O novo governo logo anunciaria uma estratégia bastante semelhante à do governo anterior a busca do crescimento econômico promovido pelo aumento de investimentos em setores diversificados uma diminuição do papel do setor público e o estímulo a um maior crescimento do setor privado incentivos à expansão do comércio exterior e finalmente uma elevada prioridade para o aumento da oferta de emprego e outros objetivos sociais Syvrud 1974 p 45 Esses objetivos claramente não tinham sido alcançados no governo Castelo Branco e essa constatação levou a um novo diagnóstico de certos problemas da economia e em particular das causas da inflação remanescente Necessidades de ordem política também pareciam exigir uma retomada do crescimento para legitimar o regime Skidmore 1988 Esta somente seria compatível com um programa de redução da inflação que não resultasse em contenção indevida da demanda A existência de significativa capacidade ociosa no setor industrial sugeria que a produção poderia reagir a estímulos adequados Por outro lado a nova equipe estava convencida de que a pressão sobre o nível dos preços era principalmente oriunda de custos notadamente o custo do crédito A ação sobre os preços através de controles diretos passaria logo a merecer maior atenção do governo e permitiria compatibilizar uma queda do ritmo de aumento dos preços de caráter mais gradual do que aquele que a administração anterior pretendera com taxas de crescimento da produção e do emprego mais elevadas Essa mudança de ênfase foi explicitada nas Diretrizes de Governo e no resumo do Programa Estratégico de Desenvolvimento PED dados a público em julho de 1967 Ministério do Planejamento 1967 O PED beneficiouse de uma estrutura administrativa com experiência de Planejamento o Escritório de Pesquisa Econômica Aplicada EPEA que tinha acabado de realizar o Plano Decenal de Desenvolvimento Econômico para o governo anterior e que se transformaria no IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada do Ministério do Planejamento Alves e Sayad 1970 p 108 O diagnóstico coordenado pelo EPEA identificava como dois problemas básicos o debilitamento do setor privado e a pressão excessiva exercida pelo setor público e propunha linhas de ação e o uso de instrumentos específicos para corrigir as distorções da economia Apresentamse a seguir alguns dos aspectos básicos da política econômica implementada a partir desse diagnóstico de 1967 e do PED que seriam complementados por diversas manifestações públicas das autoridades econômicas nos anos seguintes ver exemplo Skidmore 1988 p1417 1829 27486 e já no governo Médici pelo documento Metas e Bases para a Ação do Governo de setembro de 1970 ao qual se seguiria o I Plano Nacional de Desenvolvimento PND para 197274 publicado em 1972 com metas por setores de atividade econômica Um maior estímulo à demanda foi dado já a partir de 1967 através de políticas monetária creditícia e fiscal mais flexíveis que se tornariam nos anos seguintes gradualmente expansionistas Foi particularmente notável a expansão do crédito e especialmente do crédito ao consumidor e à agricultura A concessão de isenções fiscais e de juros favorecidos ao setor agrícola aliada a um maior volume de crédito tinha entre outros objetivos o de assegurar uma oferta adequada de alimentos cujo impacto sobre os índices de inflação era significativo estimular as exportações de produtos primários e talvez sem a mesma ênfase aumentar a renda rural e consequentemente corrigir desequilíbrios regionais e reduzir o êxodo rural Skidmore 1988 p 188 Destinaramse também significativos recursos para a construção de residências e aquisição de moradias através do Sistema Financeiro de Habitação SFH Criaramse subsídios adicionais facilidades creditícias e reduziramse os entraves burocráticos para aumentar as exportações e diversificar mercados especialmente de produtos manufaturados Bonelli e Malan 1976 que também foram muito beneficiadas pela adoção do regime de minidesvalorizações cambiais a partir de 1968 Criavase assim também um clima favorável para o investimento estrangeiro e para um acesso mais fácil do país a empréstimos externos Com as finanças públicas saneadas pela administração anterior e recorrendo frequentemente à emissão de títulos para o financiamento do déficit público o governo manteve em nível elevado o seu dispêndio especialmente em novos investimentos de infraestrutura com importantes efeitos sobre o setor privado As empresas estatais recorreram também de forma crescente a empréstimos externos o que era bemvisto pelas autoridades econômicas inicialmente preocupadas em garantir certa acumulação de reservas cambiais Nesse contexto diante do maior equilíbrio das contas públicas o governo não hesitou em lançar mão de um amplo esquema de subsídios e incentivos fiscais para promover setores e regiões específicas e que passaram a fazer parte da política industrial do governo O BNDE Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico por outro lado manteve o seu importante papel de financiador de investimentos do setor público mas passou a conceder uma proporção crescente dos seus empréstimos ao setor privado que após 1968 passou a receber mais da metade do total dos financiamentos Preocupada com custos a nova equipe manteve a linha geral da política salarial anterior ainda que atenuando os seus efeitos negativos sobre o salário real e portanto sobre a demanda adotando nova fórmula de reajuste Concentrou um esforço especial na contenção das taxas de juros pagas pelos tomadores do setor privado inclusive através de incentivos ao setor bancário compulsório remunerado da fixação temporária de tetos de juros e através do estímulo à concentração bancária A contenção de custos deveria incluir também em uma segunda etapa o controle de preços dos insumos e de produtos selecionados que se iniciara no governo anterior com a Comissão Nacional de Estímulo à Estabilização de Preços CONEP com caráter voluntário e depois passou a ser implementado compulsoriamente pela Comissão Interministerial de Preços CIP a partir do final de 1967 A nova equipe considerou basicamente encerrado o período de inflação corretiva que envolveu o realinhamento de preços e tarifas do setor público entre 1964 e 1967 e que passaria a dar um maior equilíbrio às empresas estatais aliviando a conta de subsídios diretos do governo federal Mantevese a correção monetária estabelecida em 1964 para as ORTNs e a seguir para a captação e aplicação de recursos no setor habitacional que gradualmente foi também estendida aos vários instrumentos financeiros da economia Em suma a equipe de Delfim Netto aproveitou o espaço criado pela administração anterior e utilizou os instrumentos de política econômica disponíveis para estimular abertamente o crescimento econômico Mas todas as declarações em favor do desenvolvimento do setor privado e da livre operação do mercado contrastavam com a proliferação de incentivos novos subsídios ou isenções específicos que tornavam o papel do governo extremamente importante para viabilizar certas operações do setor privado 1 Crescimento econômico formação de capital e inflação 19671973 Os dados revistos relativos a contas nacionais do Brasil mostram que em 1964 e 1965 a economia cresceu 34 e 24 respectivamente resultando um pequeno declínio do produto per capita no biênio Em 1966 a taxa de crescimento do PIB de 67 foi satisfatória Porém a crise de estabilização provocada a partir da metade do ano pelo aperto de liquidez e a contenção do crédito reduziu a taxa de crescimento global para 42 em 1967 Essa média foi favoravelmente influenciada pelo bom desempenho do setor primário cuja produção aumentou 57 visto que a indústria de transformação cresceu apenas 22 A partir de 1968 primeiro ano de plena implementação da política mais expansionista da nova administração tanto o produto global como os produtos setoriais apresentaram forte crescimento Entre 1968 e 1973 o PIB real cresceu à taxa média de 112 alcançando um máximo de 14 em 1973 diante de uma média histórica no período do pósguerra até o início dos anos 1960 da ordem de 7 O crescimento industrial foi particularmente significativo no mesmo período 196873 a indústria de transformação cresceu à taxa média de 133 ao ano com um máximo de 166 em 1973 e a indústria de construção forte absorvedora de mão de obra à taxa média ainda mais elevada de 15 ao ano Os serviços industriais de utilidade pública incluindo principalmente a geração de energia elétrica e que em boa parte estavam sob o controle do governo apresentaram também crescimento anual da ordem de 121 O desempenho do setor primário da economia também foi muito satisfatório entre 1969 e 1972 mas 1968 e 1973 foram anos de estagnação Na média entre 1968 e 1973 o setor cresceu à taxa de 45 superando amplamente a taxa de crescimento da população no período que era da ordem de 3 ao ano O setor terciário teve igualmente uma expansão expressiva entre 1967 e 1973 destacandose o desempenho do comércio com média de crescimento anual de 111 e o de transportes e comunicações com média superior a 13 A evolução favorável de diversos setores foi influenciada por políticas governamentais específicas Assim a agricultura beneficiou se de farto volume de crédito concedido pelas autoridades monetárias a taxas subsidiadas e que foi uma das causas principais da expansão monetária no período Destacase o surgimento da soja como produto de importância crescente na pauta de exportações e no consumo interno enquanto o café perdia peso relativo dentro do setor agrícola e no total das exportações Ocorreu também no período um processo acentuado de mecanização da agricultura brasileira com efeitos de demanda importantes sobre o setor industrial Crescentes exportações de produtos manufaturados também beneficiadas por novos incentivos contribuíram para o crescimento industrial especialmente o de ramos tradicionais como têxteis e calçados No entanto o dinamismo do setor industrial no período 196773 deveuse principalmente à demanda interna estimulada pelas políticas setoriais do governo já mencionadas notadamente em relação à agricultura e aos bens de consumo durável bem como à indústria de construção impulsionada pela Política Nacional de Habitação Enquanto os investimentos do governo em infraestrutura contribuíram para a consolidação da indústria doméstica de bens de capital foi particularmente notável o aumento da produção de bens de consumo durável Esse forte aumento tem sido associado com o processo de concentração da renda pessoal que teria ocorrido durante o período em estudo mas na realidade deveuse também em grande parte à forte expansão do crédito ao consumidor a partir de fins de 1966 quando as sociedades de crédito financiamento e investimento foram redirecionadas pelo governo do fornecimento de capital de giro às empresas para o crédito direto ao consumidor e para o crédito pessoal Prazos de financiamento generosos o controle temporário de juros pelo governo e a existência de consórcios tiveram especial impacto na demanda de automóveis e também na produção de eletrodomésticos acessíveis para uma parcela muito maior da população que também teve grande expansão A produção de bens de consumo relativos a transporte cresceu em média 24 entre 1968 e 1973 a produção de bens eletrodomésticos 226 e a de bens de consumo não duráveis 94 resultando uma média de 119 para o setor de bens de consumo como um todo Bonelli e Werneck 1978 p 176 Diante do crescimento generalizado da economia e da crescente utilização da capacidade instalada na indústria de transformação o índice de utilização terseia elevado de 76 em 1967 para 93 em 1971 e 100 em 197273 cabe examinar a evolução da taxa global de investimentos Como seria de se esperar a participação da formação bruta de capital fixo FBCF no produto interno bruto PIB depois de permanecer no nível médio de 152 no período de estabilização 196466 mostrou tendência ascendente a partir de 1967 quando alcançou 162 De 1968 a 1970 essa participação passou para 187 para alcançar 205 no período 197173 O processo de formação de capital no período 19671973 foi significativamente influenciado pela política industrial iniciada em 1964 e coordenada pelo CDI Comissão e depois Conselho de Desenvolvimento Industrial Tal política entre 1968 e 1973 consistia na concessão bastante indiscriminada de incentivos pois o CDI aprovava a maioria dos projetos submetidos Ainda que passível de críticas por certa liberalidade na concessão de incentivos o CDI juntamente com o BNDE e especificamente o FINAME com programas de empréstimo de até 8 anos ou até mesmo 15 anos e juros anuais de 3 a 6 mais correção monetária teve papel importante na recuperação da demanda interna e no crescimento do setor de bens de capital Lago Almeida e Lima 1979a cap VI e Suzigan 1978 p 48 Partindose de dados não totalmente satisfatórios de formação bruta de capital fixo desagregada entre administrações públicas empresas estatais dado incompleto e empresas privadas e famílias a contribuição do setor privado teria aumentado de cerca de 55 para 60 entre 1970 e 1973 enquanto o setor público teria sua contribuição reduzida para cerca de 40 A inclusão de todas as estatais no entanto talvez aumentasse essa participação para cerca de 50 Lago 1989 p 1823 Enquanto o investimento das estatais cresceu em termos reais à taxa de cerca de 20 ao ano entre 1967 e 1973 explicando um aumento de sua participação no PIB e no total da FBCF as administrações públicas nos seus vários níveis mostraram queda de participação de seus investimentos na formação de capital total bem como estabilidade com tendência à queda da participação do seu consumo final no PIB Tal fato sugere que não houve uma tendência de inchaço relativo da administração pública no período em contraste com o crescimento das estatais De fato a evidência disponível sugere um papel prócíclico crescente das empresas públicas durante o período 196873 no final do qual terseiam tornado elementochave no modelo brasileiro de desenvolvimento e seus investimentos e gastos apareciam como fator determinante de movimentos cíclicos da economia brasileira Trebat 1983 p 120 e 132 O financiamento de formação de capital no período 19671973 em contraste com o período seguinte não dependeu fundamentalmente da poupança externa A formação de capital fixo e a variação de estoques foram em grande parte financiados pela poupança nacional bruta Consequentemente o forte crescimento do endividamento externo no período após 1969 foi claramente excessivo em confronto com as necessidades reais de investimento da economia uma vez recuperado um nível adequado de reservas internacionais em 196768 Diante da ênfase concedida ao crescimento econômico pela equipe do ministro Delfim Neto inicialmente a nova administração admitia o convívio com certo nível de inflação que se encontrava na faixa de 20 a 30 contanto que o ritmo de crescimento dos preços viesse a mostrar tendência à queda gradual Mas houve uma mudança de atitude já no final de 1967 através do Decreto no 61993 de 28 de dezembro de 1967 que subordinou todos os reajustes de preços por parte das empresas à prévia análise e avaliação da Conep Generalizouse o controle compulsório que passava a ser elemento coadjuvante do combate à inflação propósito que ficou explicitado quando da criação do Conselho Interministerial de Preços CIP pelo Decretolei no 63196 de 29 de agosto de 1968 órgão que substituiria a Conep Institucionalizaramse os reajustamentos de preços com base nas variações de custos Outros fatos a serem considerados nos exames de pedido de reajustes seriam os níveis de rentabilidade a influência dos produtos e serviços na formação de custos dos diferentes setores de atividade econômica a existência de condições estruturais de mercado que refletissem situações monopolísticas ou oligopolísticas e a ocorrência de anomalias de comportamento dos setores empresas ou estabelecimentos que fossem capazes de perturbar os mecanismos de formação de preços Esses princípios gerais de atuação do CIP permaneceriam estáveis entre 1969 e 1973 ver Carneiro 1976 p 15460 Nos primeiros anos 196768 ocorreu uma redução do ritmo de crescimento dos preços para cerca de 25 Em 1968 ano em que se introduziu a política de minidesvalorização cambiais e em que a política salarial passou a ser menos restritiva mas os controles de preços assumiram caráter compulsório as taxas de inflação verificadas no fim do ano foram muito semelhantes às do ano anterior Em 1969 a escassez de produtos agrícolas freou uma queda mais acentuada do custo de vida enquanto o aumento dos preços por atacado não excedeu 20 O deflator implícito do PIB passou de 267 em 1968 para 201 em 1969 Nesse ano apesar do crescimento elevado a política de combate à inflação foi mais ativa já que houve maior esforço de contenção da expansão monetária e do déficit público Esse foi o primeiro ano da nova administração em que a colocação de títulos públicos financiou mais do que a totalidade do déficit de caixa da União fato que se repetiria nos anos seguintes contribuindo para reduzir as pressões inflacionárias Simonsen 1970 p 53 Assim em 1970 a maioria dos indicadores de fim de ano mostravam aumento dos preços ao consumidor inferior a 20 e a variação do deflator implícito do PIB se reduziu para 164 Após pequeno aumento em 1971 ocorreu novo recuo em 1972 mas a partir desse momento os índices oficiais principalmente em 1973 refletiam o forte impacto de preços tabelados que na prática eram amplamente desrespeitados Já a partir de meados de 1972 os controles de preços foram acionados não mais com o objetivo de compatibilizar a liquidez folgada com o declínio da inflação Na ausência de capacidade ociosa houve impacto sobre a rentabilidade de setores específicos e somente se adiou o efeito sobre os índices de preços Carneiro 1977 p 223 Assim em 1973 o Índice de Variação do Custo de Vida do Rio de Janeiro da Fundação Getulio Vargas ICV de 127 depois recalculado para 137 contrastava com o índice médio de 261 calculado pelo DIEESE A variação do deflator implícito do PIB também aumentou de 191 em 1972 para 227 em 1973 depois recalculados 199 e 296 respectivamente O controle de preços já não podia encobrir no final de 1973 o recrudescimento do processo inflacionário associado com o nível de atividade da economia e a necessidade de medidas para impedir a sua aceleração De fato Mario Henrique Simonsen ao assumir a pasta da Fazenda em 1974 reestimaria a taxa de variação acumulada do ICV do Rio em 1973 de 137 para 266 e do Índice Geral de Preços Disponibilidade Interna IGPDI de 157 para 193 Marques 1986 p 344 As tensões resultantes do tabelamento inclusive com o surgimento de mercados paralelos iriam se agravar com o primeiro choque do petróleo cujo impacto farseia sentir em 1974 2 Políticas monetária e creditícia e desenvolvimento do sistema financeiro A partir de 1967 a nova equipe econômica inicialmente reverteu a política monetária e creditícia anterior ocorrendo significativa expansão da oferta de moeda e do crédito naquele ano No entanto considerandose as taxas anuais de crescimento daqueles agregados nos anos seguintes enquanto o crédito continuou a se expandir em termos reais a taxas elevadas os aumentos reais da oferta de moeda e o crescimento médio real dos meios de pagamento se mantiveram em linha com o crescimento do PIB real É a partir de 1972 que ocorre a aceleração que muitos autores associaram com o recrudescimento da inflação em 1973 De fato o crescimento real dos meios de pagamento acumulado no ano deflacionado pelo IGPDI após alcançar cerca de 14 em 1967 e 12 em 1968 foi da ordem de 5 a 10 entre 1969 e 1971 passando para cerca de 18 em 1972 e cerca de 28 em 1973 Quanto à base monetária cuja definição incluía na época os depósitos à vista no Banco do Brasil visto que esta instituição exercia funções de autoridade monetária as suas variações e a sua vinculação com os meios de pagamento através do multiplicador têm que ser avaliadas com cautela tendo em vista numerosas mudanças institucionais no período 19671973 que afetaram as reservas bancárias em espécie Seriam fatores fundamentais de expansão da base monetária entre outros já mencionados os créditos à agricultura e à exportação bem como após 1969 a acumulação de reservas internacionais Como importante fator de contração destacarseia a colocação de títulos federais junto ao público Oscilações nessas variáveis explicam boa parte das mudanças nas taxas de crescimento da base monetária Enquanto em 1964 os haveres monetários respondiam por 92 do total dos haveres monetários e não monetários em fins de 1966 essa participação se reduzira para 757 Entre 1967 e 1973 acentuouse essa tendência e a partir de 1971 os haveres não monetários excederam os haveres monetários que em 1973 passaram a responder por apenas 43 do total A existência da correção monetária e de instrumentos financeiros com rendimentos prefixados embutindo uma expectativa de inflação levou a uma mudança de comportamento dos poupadores no sentido de um redirecionamento de suas aplicações para haveres não monetários Enquanto em 1967 os ativos com correção monetária cadernetas de poupança letras imobiliárias e ORTNs representavam 135 dos ativos financeiros em 1973 tal proporção alcançava 192 No final dos anos 1960 e no início dos anos 1970 ocorreu forte crescimento real dos haveres financeiros como um todo que excedeu amplamente o crescimento do PIB Assim o total de ativos financeiros passou de 30 do produto em meados da década de 1960 para fração superior a 50 do produto interno em meados dos anos 1970 Silva 1981 p 21 Portanto os haveres não monetários passaram a representar cerca de 25 do PIB em 1973 contra cerca de 7 em 1967 Quanto aos instrumentos de política monetária o governo recorreu tanto ao redesconto e a alterações dos recolhimentos compulsórios no Banco Central como crescentemente a operações de mercado aberto Com a Lei no 4595 de 31 de dezembro de 1964 o redesconto passou a ser regulamentado pelo Conselho Monetário Nacional e o Banco Central recebeu a competência de realizar operações de redesconto e empréstimos a instituições financeiras bancárias O Banco Central passou portanto a partir de 1965 a contar com um instrumento que permitia injetar recursos no sistema bancário e influenciar a taxa de juros Dado o limitado desenvolvimento alcançado pelo mercado de capitais nos anos 1960 a taxa de juros tendia a ter menor impacto sobre o nível dos investimentos do que nos países mais desenvolvidos Por outro lado em um contexto de taxas de juros elevadas seria necessária uma substancial alteração no nível da taxa de redesconto para afetar de forma significativa as taxas de mercado Por essa razão segundo Ernane Galvêas presidente do Banco Central no período 19681973 a política de redescontos foi exercida basicamente em termos quantitativos O Banco Central agia aumentando ou diminuindo a quantidade de recursos que transferia aos bancos pelo redesconto e não através da variação na taxa Galvêas 1985 p 86 Essas operações se constituíram na chamada assistência de liquidez reservandose o título de redesconto para as operações de caráter seletivo realizadas pelo Banco Central Até 1964 bem mais do que o redesconto os depósitos compulsórios tinham sido um instrumento da política monetária amplamente utilizado no Brasil o encaixe legal servindo para regular o multiplicador bancário isto é mobilizar maior ou menor parte dos depósitos bancários restringindo ou alimentando o processo de expansão dos meios de pagamento Galvêas 1985 p 87 No período 19671973 os recolhimentos compulsórios no Banco Central relativos aos depósitos à vista nos bancos comerciais passaram a ter diferentes papéis Inicialmente tiveram uma função de controle quantitativo do crédito o que era a sua função tradicional Na medida em que o governo passou a utilizar o compulsório como instrumento de barganha com os bancos comerciais objetivando a contenção das taxas de juros para os tomadores finais reduziuse gradualmente o recolhimento em espécie permitindose o recolhimento sob a forma de títulos federais Posteriormente foram criadas deduções especiais destinadas a financiar capital de giro de pequenas e médias empresas Resolução 130 bem como aplicações em debêntures e ações de empresas industriais de pequeno e médio porte Resoluções 184 e 250 Assim o compulsório em espécie declinou de 70 do recolhimento total em 1967 para 36 em 1973 tornandose portanto menos oneroso para os bancos e transformandose de instrumento essencial de controle quantitativo em instrumento orientado para a seletividade do crédito Silva 1981 p 1801 Quanto à política de mercado aberto esta assumiria importância crescente Em um primeiro momento a partir de 1965 a colocação de ORTNs pelo governo visava substituir a emissão de moeda no financiamento do déficit público Gradualmente na medida em que a colocação de títulos da dívida pública federal feita através do Banco Central passou a superar amplamente os déficits fiscais o governo passou a poder implementar uma política de mercado aberto para regular a liquidez da economia Galvêas 1985 p 88 e Silva 1981 p 172 As operações de mercado aberto passaram a ser efetuadas em 1967 quando o Banco Central passou a vender ORTNs ao sistema bancário com cláusula de recompra uma vez decorridos 30 dias da emissão A política de mercado aberto foi facilitada a partir de 1970 pela criação das Letras do Tesouro Nacional LTNs As LTNs eram títulos de curto prazo máximo de um ano com tipo de rendimento mais adequado para as operações de mercado aberto e sem vinculação com a geração de recursos para cobrir os déficits orçamentários do governo federal De 1968 a 1973 as operações de mercado aberto desenvolvidas pelo Banco Central no mercado secundário tiveram nítido impacto contracionista Em 1973 foi tornandose cada vez mais difícil conter pressões oriundas de aumentos das reservas internacionais e de outros fatores internos mas aquelas operações tinham se firmado como um instrumento duradouro e importante de política monetária no Brasil No tocante à taxa de juros o novo governo ao assumir em 1967 acreditava que os custos do sistema financeiro eram muito elevados e que as taxas de juros pagas pelos tomadores eram um elemento de custo das empresas que precisava ser reduzido Havia também uma noção generalizada de que o sistema bancário no seu conjunto era bastante ineficiente A política de juros da nova administração para o setor privado se baseou nos seguintes instrumentos i o controle direto das taxas de juros através da fixação de taxas máximas tetos de aplicação e captação em segmentos específicos do setor financeiro ou de redutores sobre as taxas médias observadas no ano anterior ii incentivos aos bancos comerciais através da manipulação dos coeficientes e da composição dos depósitos compulsórios e de uma redução gradual do custo do redesconto e de outros créditos concedidos ao sistema bancário em troca de uma contenção dos níveis de juros dos empréstimos bancários Banco Central Relatório 1973 No caso dos empréstimos concedidos por instituições oficiais as taxas de juros foram utilizadas como instrumento de incentivo a setores específicos e julgados prioritários podendo inclusive ser negativas em termos reais Paralelamente o governo teve também uma política bancária que consistiu no incentivo à eliminação de deficiências e ao aproveitamento de economias de escala através da concentração bancária e de obstáculos à proliferação desordenada de agências A concentração bancária foi efetivamente promovida pelas Autoridades Monetárias inclusive através de vantagens a fusões e incorporações notadamente a partir de 1971 bem como a formação de conglomerados incluindo vários tipos de instituições financeiras especializadas e em certos casos instituições não financeiras Os dados do Banco Central confirmam a forte queda do número de sedes de bancos entre 1967 e 1973 Entre o final de 1966 e o final de 1973 190 bancos foram absorvidos por outros bancos ou fechados Restavam em fins de 1973 4 bancos federais e 24 bancos estaduais compondo a rede oficial e 87 bancos privados sendo 8 estrangeiros ou um total de 115 bancos comerciais Existe alguma evidência de redução dos custos bancários porém a evidência empírica quanto à existência de economias de escala no período não é conclusiva A concentração bancária entre 1967 e 1973 parece ter decorrido das medidas de política econômica adotadas inclusive a fixação de tetos de juros e as restrições à entrada limitação do número de agências O resultado dessa política porém não foi a existência de uma saudável competição entre um número relativamente grande de instituições fortes e sim uma concentração expressiva da captação e das aplicações em um número reduzido de conglomerados financeiros eliminando boa parte do fator de concorrência que poderia reforçar uma queda das taxas de juros reais do sistema Assim o sistema bancário se encontrava mais forte em 1973 do que na década anterior mas já bastante oligopolizado A partir de 1964 e também em 196773 o governo buscou atingir o duplo objetivo de i conter as necessidades de financiamento do setor público e ii assegurar oferta de crédito adequada ao setor privado Segundo os dados disponíveis a participação do crédito ao setor privado no crédito total concedido pelo sistema bancário Banco do Brasil bancos comerciais aumentou claramente de 1967 para 1973 Porém os empréstimos do sistema monetário passaram a representar uma fração decrescente dos empréstimos totais ao setor privado que passou a obter recursos junto às diversas novas instituições criadas com as reformas de 196466 cuja oferta total aumentou ainda mais rapidamente Entre 1964 e 1966 foram sucessivamente criados o Banco Nacional de Habitação BNH que após 1966 também contaria com recursos do FGTS as Sociedades de Crédito Imobiliário SCIs e os Bancos de Investimentos BIs e em 1967 as Associações de Poupança e Empréstimos APEs Iniciouse em 1971 o Programa de Integração Social cujos recursos seriam inicialmente administrados pela Caixa Econômica Federal CEF Silva 1981 p 36 Nesse contexto diminuiu a participação do sistema monetário no total dos empréstimos de 86 em 1964 para 743 em 1967 e para 50 em 1973 A nova organização do sistema financeiro não alcançou todos os resultados almejados notadamente quanto ao aumento da oferta de crédito interno a longo prazo Os créditos de longo prazo para investimento fixo foram providos exclusivamente por agências públicas e bancos oficiais BNDE Finame BNB Banco do Brasil e BNH este evidentemente para financiar a construção de habitações enquanto os créditos a curto e médio prazos para capital de giro foram supridos pelos bancos comerciais e o Banco do Brasil de forma crescente e crescentemente pelas financeiras e bancos de investimento Suzigan Bonelli Horta e Lodder 1974 p 28 Muitas empresas no entanto notadamente as estatais passaram a utilizar créditos externos de mais longo prazo seja diretamente através da Lei no 4131 ou indiretamente através de empréstimos captados pelos bancos através da Resolução 63 do Banco Central e repassados às empresas e em menor escala com base na Instrução 289 de 1965 revogada em 1972 No período 1967 a 1973 o governo durante alguns anos dosou a taxa de expansão monetária mas garantiu uma elevada taxa de expansão do crédito total concedendo especial atenção a certas áreas específicas Assim a área de construção civil e habitação como já se mencionou passou a contar com os fartos recursos do BNH das SCIs e das APEs bem como com fração significativa dos recursos das caixas econômicas Por outro lado o crédito ao consumidor e o crédito pessoal receberam maior ênfase através das Resoluções 56 e 77 de 1967 que concentravam ainda mais as atividades das financeiras no crédito ao consumo e aos usuários finais de bens e serviços Outro setor que mereceu a atenção especial do governo preocupado com uma oferta adequada de alimentos foi o agropecuário Os empréstimos rurais eram concedidos pelo sistema bancário A exigibilidade de empréstimos rurais pelos bancos comerciais seria crescente passando de 10 do total dos depósitos com algumas deduções para 15 em 1973 e o Banco do Brasil teve participação crescente no crédito rural de 533 em 196768 para 674 em 197273 Cabe notar no entanto que o crédito rural cresceu a taxas reais muito significativas mas inferiores à taxa de expansão do crédito total do sistema financeiro Até 1967 o mercado acionário como fonte alternativa de financiamento de longo prazo para as empresas tinha papel limitado A partir daquele ano a contribuição do novo governo foi a canalização de recursos de investidores institucionais para o mercado acionário O Decretolei no 157 criou fundos fiscais de investimento que passaram a ser conhecidos como Fundos 157 cuja carteira teria que ser basicamente composta de ações e debêntures com o propósito de financiar capital de giro de companhias abertas desenvolver o mercado de capitais e educar o investidor individual interessado no mercado de ações Costa 1985 p 40 Para alcançar esse objetivo os contribuintes individuais e empresas podiam deduzir uma parcela do imposto de renda devido para utilizálo na compra de certificados de ações mantidos por aqueles fundos e que não podiam ser resgatados antes de cinco anos Esse mecanismo iria canalizar volumosos recursos para as bolsas de valores e seria reforçado pela retomada do crescimento econômico pelo aumento de lucratividade das empresas por aprimoramentos no tratamento contábil dos resultados das empresas e por tributação favorável dos dividendos Uma maior demanda do público e dos fundos de ações diante de uma oferta limitada de títulos levou a forte aumento de preços culminando com um boom especulativo seguido de um traumático processo de reajuste em 1971 Costa 1979 p 412 para dados mais detalhados ver Lago 1989 e Castro 1979 p 50 A partir de fins de 1971 dada a forte queda dos preços das ações durante o ano o mercado acionário deixou de exercer a mesma atração sobre os investidores até o final da década e portanto falhou a tentativa de tornálo instrumento duradouro de capitalização das empresas 3 Política fiscal estados e municípios e política regional as estatais e o papel do governo na economia A nova administração empossada em 1967 beneficiouse das reformas tributária e administrativa implementadas pelo governo anterior e buscou manter uma política de aumento de eficiência da máquina governamental com uma arrecadação crescente e uma redução relativa dos gastos de custeio visando a redução do déficit público Enquanto o déficit do Tesouro representara uma fração do PIB da ordem de 42 em 1963 reduzindose para 11 em 1966 ocorreu um pequeno aumento em 1967 para 17 com a reativação da economia Porém em 1968 o déficit se reduziu para 12 do PIB e essa fração declinou continuamente até 1972 para alcançar 01 Finalmente em 1973 ocorreu um pequeno superávit da ordem de 006 do produto Foi criado apenas um novo tipo de tributo o imposto sobre operações financeiras arrecadado a partir de 1972 e foram mantidos ao longo do período 196773 importantes incentivos fiscais que representaram uma renúncia de arrecadação dos governos federal e estaduais A redução do déficit do Tesouro e até mesmo a geração de um superávit em 1973 refletem sem dúvida um saneamento das contas do governo consolidando os esforços empreendidos de 1964 a 1966 Mas são parcialmente enganosos especialmente a partir do final dos anos 1960 diante da crescente importância de gastos públicos não incluídos nas despesas do Tesouro e que passaram a fazer parte do chamado orçamento monetário Dois desses itens de despesa básica eram os juros e a correção monetária da dívida pública e os subsídios embutidos no crédito subsidiado especialmente para a agricultura e a exportação A tendência de elevação dessas despesas contrabalançava em parte o aparente equilíbrio das contas do governo espelhado nas contas do Tesouro Os dados de contas nacionais disponíveis sobre as contas das administrações públicas revelam uma poupança em conta corrente do governo nas suas três áreas que era entre 1968 e 1973 suficiente para financiar o investimento das administrações públicas A carga tributária mostrou tendência ascendente no período 1967 73 Com base em dados de contas nacionais não revistos a média da carga tributária bruta teria passado de 224 do PIB em 196569 para 247 em 197073 e os subsídios e transferências teriam totalizado em média respectivamente 71 e 81 do PIB resultando uma carga líquida de 153 em 196569 e de 166 em 197073 Costa 1979 p 90 Dados mais recentes confirmam essa tendência IBGE 1988 p 98 105 No período 197073 com base nos dados revistos das contas nacionais a receita tributária bruta foi em média cerca de 26 do PIB com um aumento em 1973 enquanto a carga líquida oscilou entre 168 e 172 As transferências incluindo juros da dívida interna assistência e previdência e outros o resultado de outras receitas correntes menos as transferências intragovernamentais intergovernamentais ao setor privado e ao exterior oscilaram em termos líquidos entre 74 e 88 do PIB Os subsídios exclusive subsídios creditícios eram bem menos importantes do que no passado mas alcançaram de 07 a 08 do PIB entre 197072 passando para 12 em 1973 Quanto às despesas correntes do governo verificouse uma redução de sua relação com o PIB sendo particularmente clara a queda da participação dos salários e encargos de 83 em 1970 para 74 em 1973 De fato a despesa com pessoal ao nível federal declinou de 246 de despesa total em 1967 para apenas 18 em 1973 No período de 1967 a 1973 a administração das finanças estaduais e municipais ficou em certa medida subordinada à orientação do governo federal De fato a própria Constituição de 1967 permitia a intervenção da área federal em assuntos financeiros dos estados no caso da adoção por estes de programas ou medidas incompatíveis com o programa econômico do governo federal Syvrud 1974 p 136 Uma ilustração do uso desse poder autoritário pode ser feita com relação à emissão de títulos públicos pelos estados A responsabilidade e o controle sobre a emissão de papéis estaduais foi delegada ao Banco Central Resolução 101 do CMN e a dívida estadual e municipal que em 1969 representava 2 do total dos ativos financeiros teve sua participação reduzida para 15 em 1973 diante das restrições a novas emissões impostas pelo governo central a partir daquele ano enquanto a dos títulos federais crescia de 131 para 177 Quando do Ato Institucional n 5 o governo federal também reduziu a parcela do Fundo de Participação dos Estados e Municípios fixada em princípio pela Constituição em 20 da arrecadação federal de certos tributos diretos e indiretos IR e IPI Esta passou para 10 com um adicional de 2 para um Fundo Especial Esta medida de caráter autoritário teve impacto regional diferenciado já que nos estados mais pobres essas transferências eram parte substancial dos recursos totais disponíveis para as administrações locais O Fundo Especial foi utilizado para compensar esse efeito negativo e o Nordeste e Norte se beneficiaram de uma série de incentivos fiscais destinados à Sudene e à Sudam e ao PIN Syvrud 1974 p 1358 Os dados disponíveis sobre receita efetivamente arrecadada e despesa realizada mostram a partir de 1968 uma grande redução do desequilíbrio existente nas contas dos estados e distrito federal no período 196467 Diminuiu consideravelmente a relação entre déficit e receita ocorrendo um superávit em 1971 No caso dos municípios o desequilíbrio não era tão grande no mesmo período 196467 mas também ocorreu na média uma redução para metade nos seis anos 19681973 da relação entre déficit e receita A criação e aperfeiçoamento do ICM representava uma importante contribuição para as finanças dos estados apesar da isenção no caso das exportações e o crescimento econômico resultando em aumento de arrecadação ao nível federal representou uma maior distribuição de recursos do Fundo de Participação para os Estados e Municípios Quanto a áreas geográficas a ênfase da política regional no Brasil era no sentido de promover o desenvolvimento econômico do Nordeste através de incentivos fiscais e ocasionalmente através de obras de infraestrutura Lodder 1978 p 143 Entre 1967 e 1970 essa política não foi substancialmente alterada pela administração Costa e Silva Com o advento do governo Médici porém desenvolveuse a ideia de que o Nordeste tinha excesso de população e que os problemas dos nordestinos não poderiam ser totalmente resolvidos localmente Esse sentimento foi reforçado pela forte seca de 1970 A abertura da Amazônia com o deslocamento de grandes contingentes de nordestinos para essa região foi apresentada como opção Foi portanto levado adiante o Programa de Integração Nacional PIN que além da irrigação de amplas áreas do Nordeste e da criação de corredores de exportação na região previa a abertura da região amazônica através de rodovias a Transamazônica e a Cuiabá Santarém Os recursos para essas estradas que receberam absoluta prioridade foram derivados de recursos federais de incentivos fiscais antes alocados para o Nordeste e não do levantamento de recursos novos As justificativas econômicas do programa na Amazônia não eram necessariamente convincentes mas motivos de ordem política e estratégica militar também prevaleceram e a construção das rodovias foi empreendida O programa de colonização da região revelouse um fracasso contrastando com outras realizações positivas do período 196773 em termos de obras de infraestrutura para os aspectos econômicos e políticos da questão ver Skidmore 1988 p 28795 No Nordeste os incentivos fiscais contribuíram para um maior grau de industrialização no período mas a criação de empregos não parece ter sido muito significativa e não se elevou a participação da renda da região na renda total do país Em contraste com a supervisão exercida sobre estados e municípios o governo central permitiu a proliferação de empresas estatais federais e estaduais no período 19671973 Na realidade aquele período caracterizouse como o de maior intensidade de criação de novas empresas públicas no Brasil Examinandose o conjunto de empresas federais e estaduais constatase que foram criadas entre 1968 e 1974 231 novas empresas públicas sendo 175 na área de serviços 42 na indústria de transformação 12 em mineração e 2 na agricultura Trebat 1983 p 37 e 478 As principais causas da criação de novas empresas parecem ter sido as seguintes em primeiro lugar o Decretolei no 200 de 1967 que dava a oportunidade para a criação de diversas subsidiárias de empresas estatais existentes e em segundo lugar a criação das HOLDINGS setoriais para centralizar a administração das empresas de cada setor notadamente a Eletrobras a Telebrás e a Embratel Uma terceira razão seria a de que a administração das empresas do governo terse ia tornado mais eficiente gerando excedentes que deram origem a uma expansão natural das empresas que também gozaram de certa autonomia para contornar as restrições salariais aplicáveis ao serviço público em geral Porém por mais importante que possa ter sido de um ponto de vista administrativo o Decretolei 200 não aumentou realmente o papel do Estado na economia brasileira Trebat 1983 p 49 De fato como nota outro estudo a verdade é que o Estado já estava há muito solidamente implantado na maior parte dos setores que controlava Sua expansão teve uma ideologia bem atípica a da prioridade ao crescimento desenvolvendo setores que a iniciativa privada por impossibilidade ou desinteresse não podia desenvolver Suzigan 1976 p 901 Evidência de que as estatais não estavam adquirindo maior importância relativa pode ser apresentada a título de exemplo com relação ao nível de emprego nas estatais que teve crescimento muito inferior à expansão total do emprego no período e inferior portanto à do setor privado Quanto a fontes de financiamento em 197273 o grau de autofinanciamento das empresas estatais era de aproximadamente 45 enquanto o das empresas privadas era da ordem de 50 a 60 Com a expansão da liquidez internacional no final dos anos 1960 e início dos anos 1970 as estatais recorreram de forma crescente a empréstimos de bancos não oficiais reduzindose a importância relativa anterior dos empréstimos do Banco Mundial e do Banco Interamericano de Desenvolvimento a essas empresas Essa utilização crescente de recursos do exterior explicaria parte significativa do aumento da dívida externa brasileira no período 196773 e ajudaria a aumentar a participação do investimento das estatais no PIB Quanto à participação do Estado na economia no início dos anos 1970 cabe observar que em 1973 o governo nas suas três esferas e nas empresas estatais segundo dados do PASEP empregava 3351 mil pessoas 1186 mil na área federal 1515 mil na área estadual e 650 mil na área municipal correspondendo a 85 da população economicamente ativa e a 194 do emprego assalariado urbano em contraste por exemplo com os Estados Unidos considerado o paradigma da livre empresa onde o setor público responde por um quinto dos empregos Rezende e Branco 1976 p 434 O intervencionismo do governo através das políticas monetária creditícia e fiscal foi significativo nos anos 19671973 como se notou com relação ao desenvolvimento do sistema financeiro à política de juros ao desenvolvimento do mercado de capitais à concessão de subsídios e transferências a setores e regiões específicas e na regulamentação da política industrial e finalmente através do próprio controle de preços Quanto ao controle direto de atividades econômicas porém o setor público permanecia nas áreas já definidas em décadas anteriores a 1964 completandose apenas entre 1967 e 1973 a consolidação de certas holdings de serviços públicos e o surgimento de empresas em setores de ponta como a indústria aeronáutica Ou seja enquanto empresário o Estado supriu insumos e serviços básicos à economia gerando importantes economias externas em benefício principalmente do setor privado Suzigan 1976 p 128 As despesas do setor público em bens e serviços finais englobando o consumo e a formação bruta de capital do governo nas três áreas União estados e municípios e a formação de capital das empresas federais e estaduais alcançou 194 do PIB em 1970 e 203 em 1975 Portanto a participação do setor público na atividade econômica incluindo empresas municipais era bastante inferior a um quarto do produto total no início dos anos 1970 contrariamente a muitas afirmações em contrário Lago Costa Batista Jr e Ryff 1984 p 8990 com base em dados de contas nacionais que foram posteriormente revistos mas sem alterar as ordens de grandeza A carga tributária bruta por sua vez alcançou em média cerca de 26 do PIB entre 1970 e 1973 contra cerca de 226 entre 1967 e 1969 Não se pode portanto propriamente falar de um aumento do grau de estatização do país e sim de forte centralismo na condução da economia e de uma crescente dependência da parte do setor privado notadamente dos setores exportadores e agrícola de subsídios governamentais 4 Setor externo No período 19671973 ocorreram importantes mudanças nas áreas do comércio exterior da dívida externa e do investimento estrangeiro no Brasil Parte dessas mudanças está associada com medidas de política econômica tais como a política cambial e a política de incentivos às exportações mas fatores exógenos como o crescimento da economia mundial a evolução favorável dos termos de troca e uma crescente liquidez no mercado internacional de capitais também tiveram importante impacto positivo sobre as principais contas externas do país O primeiro choque do petróleo no final de 1973 viria reverter várias dessas tendências favoráveis em um momento em que o Brasil ainda tinha uma forte dependência do petróleo importado No mesmo período ocorreu grande aumento das exportações acompanhado por maior diversificação da pauta e por crescente participação dos produtos manufaturados bem como por mudança da importância relativa de certos parceiros comerciais do país Observouse também forte aumento de importações notadamente de bens de capital que foi favorecido pela existência de isenções e incentivos específicos da política industrial Assim o comportamento da balança comercial foi muito influenciado pela política econômica do governo A partir de 1964 já houvera um esforço por parte da administração anterior no sentido de criar incentivos para o aumento e a diversificação das exportações A partir de 1967 essa política foi ampliada e em 1968 o Concex Conselho de Comércio Exterior definiu os seguintes objetivos para a área do comércio exterior 1 Aumento da competitividade dos produtos brasileiros em geral 2 Diversificação das exportações em especial na direção de produtos manufaturados e semiacabados 3 Diversificação e expansão dos mercados externos 4 Manutenção de um suprimento adequado de matériasprimas importadas bens intermediários e de capital a preços estáveis e a fim de não por em risco a industrialização Von Doellinger Faria e Cavalcanti 1973 p 11 Para alcançar tais objetivos a política de exportação passou a incluir os seguintes instrumentos 1 Medidas fiscais e creditícias diretas incluindo isenções e créditos de impostos notadamente envolvendo o IPI e o ICM e incluindo o créditoprêmio do IPI estabelecido em 1970 2 Uma política cambial muito mais flexível através do sistema de minidesvalorizações cambiais De fato em 28 de dezembro de 1964 o cruzeiro tinha sido desvalorizado em 1304 novamente em 2164 em 161165 e em 2230 em 13267 O grande espaçamento entre as desvalorizações causava grandes incertezas e especulação A equipe de Delfim Netto manteve o câmbio fixo até 4 de janeiro de 1968 quando o cruzeiro foi desvalorizado em 186 Em 27 de agosto de 1968 o cruzeiro foi novamente desvalorizado em 1335 mas a partir dessa data iniciouse a política de minidesvalorizações cambiais que seria mantida até o final do ano de 1979 Até o fim de 1973 as desvalorizações médias passaram a ser inferiores a 2 e ocorreu inclusive uma valorização do cruzeiro de 298 em 14 de fevereiro de 1973 O período médio entre os reajustes se reduziu consideravelmente oscilando geralmente entre um e dois meses Barbosa 1983 p 601 3 Diversas medidas indiretas incluindo a desburocratização administrativa promoção de produtos no exterior e melhoria da infraestrutura bem como a formação de empresas comerciais exportadoras trading companies Redwood 1976 p 435 Para administrar os novos incentivos à exportação foi criada a Comissão para Concessão de Benefícios Fiscais e Programas Especiais de Exportação BEFIEX A ênfase na melhoria do desempenho das exportações teve efeitos muito positivos Após acusar uma queda de US1741 milhões em 1966 para US1654 milhões em 1967 o valor das exportações FOB aumentou regularmente até alcançar US6199 milhões em 1973 A taxa média de crescimento do valor corrente das exportações no período 19671973 foi da ordem de 246 enquanto o volume das vendas externas crescia 131 ao ano No que diz respeito às importações uma nova tarifa alfandegária preparada durante a administração Castelo Branco foi promulgada no final de março 1967 Segundo um estudo da estrutura resultante da nova tarifa a alíquota média de imposto de importação para todos os produtos caiu de 47 para 20 de 1966 para 1967 e a taxa para a indústria de transformação declinou de 58 para 30 Porém em termos de taxas de proteção efetiva que levam em conta não apenas a tarifa sobre o produto final mas as tarifas incidentes sobre os seus insumos a redução foi de 72 para 31 no primeiro caso e de 98 para 52 no segundo indicando que a indústria de transformação continuou objeto de um nível elevado de proteção Bergsman 1970 p 48 Sob o novo regime tarifário as isenções de imposto de importação continuaram importantes para certas mercadorias mas a tarifa fazia clara discriminação entre bens produzidos ou não internamente taxando mais pesadamente os bens também objeto de produção doméstica Bergsman 1970 p 54 A média das tarifas de importação efetivamente aplicadas imposto de importação dividido pelo valor das importações baixou de 13 em 1969 para menos de 8 em 1974 Batista Jr 1988a p 211 e Malan e Bonelli 1977 Como a produção interna de petróleo bruto não evoluiu significativamente aumentando de 8927 mil m3 em 196768 para 9794 mil m3 em 197273 Conjuntura Econômica janeiro 1975 p 69 e o país demandava diversas matériasprimas e bens intermediários que não produzia domesticamente em quantidade suficiente o valor das importações cresceu à taxa anual de 275 superior à das exportações enquanto o seu volume se expandia à taxa de 185 ao ano Muitas importações se beneficiaram de isenções notadamente no contexto de projetos aprovados pelo CDI enquanto as importações de bens de consumo manufaturados se tornaram negligenciáveis Assim a balança comercial que fora fortemente positiva no período de 1964 a 1966 e permaneceu positiva entre 1967 e 1970 tornouse negativa em 1971 e 1972 voltando brevemente ao equilíbrio em 1973 O desempenho favorável das exportações foi muito influenciado pelo aumento da participação dos produtos manufaturados no valor total da exportação de 168 em 1966 e 207 em 1967 para 313 em 1973 Essa tendência foi favorecida pela atuação de diversas empresas multinacionais que iniciaram ou ampliaram as suas atividades no período Von Doellinger e Cavalcanti 1975 No entanto ao se examinar o crescimento das exportações no período 19671973 não se pode subestimar a contribuição dos produtos primários que responderam por boa parte do aumento do valor exportado no período É mais notável o caso do grupo de produtos de soja cuja participação no total aumentou de apenas 19 em 196768 para 148 em 1973 Porém as vendas externas de outros produtos agropecuários como a carne o algodão e o açúcar e até o milho explicam boa parte do crescimento do valor exportado em anos específicos Paralelamente declinou a participação do café no total de 42 em 196768 para 278 em 197273 Redwood 1976 p 4401 e Von Doellinger Faria e Cavalcanti 1973 Por outro lado no período em estudo o valor unitário das exportações também cresceu estimulado pelo crescimento da economia mundial Entre 1967 e 1973 o índice dos termos de troca do Brasil evoluiu favoravelmente ao país passando de 104 base 1980 100 em 1967 para 1205 em 1973 em virtude de um aumento dos preços de exportação de 797 diante de um aumento dos preços de importação de 545 O forte crescimento do comércio exterior do Brasil levou a um aumento de participação do país no total das transações mundiais de bens De fato considerandose dados compilados pelo Fundo Monetário Internacional FMI sobre o total das exportações FOB e importações CIF no mundo a participação do Brasil no comércio mundial aumentou de 088 em 196768 para 120 em 197273 Segundo os dados de contas nacionais as exportações de bens e serviços que correspondiam a 58 do PIB em 196768 passaram a responder por 78 do PIB em 197273 enquanto as participações correspondentes da importação de bens e serviços foram respectivamente 62 e 92 Observase portanto que os coeficientes de abertura da economia brasileira para o exterior se elevaram mas ainda permaneceram muitos baixos em termos mundiais O Mercado Comum Europeu passou a ser o principal comprador de produtos brasileiros em detrimento dos Estados Unidos Assim a participação dos seis membros originais da CEE nas exportações alcançou 295 em 1969 contra os 264 dos Estados Unidos e mostrou ganhos adicionais até alcançar 306 em 1973 enquanto a participação norteamericana se reduzia para 181 Naquela data a CEE ampliada para 12 países respondia por 419 das exportações brasileiras Foi também apreciável de 1967 a 1973 o aumento da participação do Japão nas exportações brasileiras que passou de 34 para 69 do total e esteve em parte associado a maiores exportações de minério de ferro A participação das exportações para os 12 países da CEE os Estados Unidos e o Japão no total das vendas externas do Brasil diminuiu de uma média de 717 em 196768 para 671 em 197273 ocorrendo portanto um aumento da participação de outros países notadamente de países em desenvolvimento A participação da Associação Latino Americana de Livre Comércio ALADI permaneceu quase estável alcançando 103 entre 1967 e 1969 e 106 entre 1970 e 1973 Cacex 1977 p 33 Em contraste no caso das importações a participação dos 12 primeiros membros da CEE do Japão e dos Estados Unidos aumentou de 631 em 196768 para 671 em 197273 Lago 1988 enquanto se reduzia a da ALADI de 126 para 86 Cacex 1977 p 33 Essa tendência se explica em virtude da composição das importações do Brasil Excluído o trigo os produtos de consumo tinham participação reduzida no valor total Em 197273 as importações de produtos minerais principalmente petróleo de produtos químicos de metais comuns e manufaturados de equipamentos elétricos e de material de transporte respondiam por 77 do valor total das importações e com exceção do petróleo eram basicamente adquiridas nos países desenvolvidos Em resumo a política cambial e a política de comércio exterior implementadas no período 196773 foram claramente bemsucedidas no sentido de aumentar as exportações do país e a sua capacidade de importar contribuindo direta e indiretamente para o crescimento da indústria e do produto como um todo Os objetivos do Concex citados anteriormente foram em grande medida alcançados observandose inclusive certa diversificação dos mercados externos do país e uma maior abertura para o exterior No caso das importações porém essa diversificação não ocorreu em virtude da composição da pauta centrada em matériasprimas insumos e equipamentos No que diz respeito ao endividamento externo do país em fins de 1966 a dívida externa bruta de médio e longo prazos alcançava US3666 milhões e a dívida líquida US3245 milhões a diferença de US421 milhões correspondendo às reservas brutas das autoridades monetárias Deduzidas as obrigações de curto prazo das autoridades monetárias as reservas líquidas alcançavam US412 milhões naquele ano No final de 1973 a dívida bruta passara para US12572 milhões e a dívida líquida para US6156 milhões As reservas líquidas alcançavam US5994 milhões e as obrigações de curto prazo das autoridades monetárias eram da ordem de US422 milhões perfazendo um total de reservas brutas de US6416 milhões Paralelamente a esse aumento ocorreram mudanças importantes na composição da dívida externa Enquanto em 1967 era de 269 a participação dos empréstimos de fontes de financiamento privadas na dívida pública externa que representava a quase totalidade da dívida externa total essa participação alcançou 641 em 1973 Essa mudança de composição estava associada com o crescimento das diferentes operações de crédito externo concedido no período tanto a empresas estatais e a administrações públicas como também a empresas privadas Tal endividamento era contraído junto a instituições não oficiais bancos comerciais ou fornecedores segundo as regras da Lei no 4131 ou junto a bancos estabelecidos no Brasil que repassavam recursos obtidos no exterior de acordo com a Resolução 63 do Banco Central de 21867 No caso de empresas multinacionais foram crescentes os intercompany loans concedidos por suas matrizes no exterior configurando às vezes investimento direto disfarçado A partir de 1972 foi possível também a colocação de títulos bonds do governo brasileiro no exterior mas em valores reduzidos e no setor estatal foram principalmente as grandes empresas públicas que recorreram de forma crescente a empréstimos externos de fontes privadas A combinação de rápida expansão da dívida externa e forte crescimento do Produto Interno Bruto que se observou entre 1967 e 1973 não caracterizou necessariamente um caso de crescimento liderado por dívida externa debtled growth como sustentam certos trabalhos De fato a análise da natureza e dos determinantes básicos do crescimento da dívida externa indica que tal aumento teve relativamente pouco a ver com o financiamento do crescimento naquele período Batista Jr 1988a p 209 De fato ainda que o influxo de recursos externos tenha contribuído para a formação do capital esta foi financiada em boa parte por recursos internos Bem visto pelas autoridades econômicas o processo de crescimento da dívida e de acumulação de reservas não resultou diretamente de um planejamento consciente por parte do governo No início do governo Costa e Silva em 1967 e 1968 as reservas se encontravam em um nível insuficiente já que as reservas líquidas inclusive eram negativas Uma acumulação adicional de reservas era portanto desejável Porém sem um comportamento favorável da conjuntura internacional provavelmente muito pouco poderia ter sido feito para garantir esse propósito Foi portanto muito importante que até 1973 o Brasil pudesse contar não somente com uma demanda externa firme e crescente por suas exportações e uma melhora nas suas relações de troca mas também com uma expansão contínua da liquidez nos mercados financeiros internacionais Batista Jr 1988a p 217 de forma que o Brasil pode recorrer regularmente a empréstimos de fontes privadas com prazos mais longos e menores taxas de risco spreads Mas o crescente envolvimento de fontes privadas implicou taxas de juros de empréstimos mais elevadas do que as de fontes oficiais Esta mudança de estrutura da dívida resultou em aumento do custo médio da dívida externa definido como a razão juros líquidosdívida líquida que aumentou de 47 em 1968 para 96 em 1973 e em um ligeiro encurtamento do prazo da dívida de médio e longo prazos de 56 anos para 53 anos em 1973 Batista Jr 1988a p 217 O serviço da dívida pagamentos líquidos de juros mais amortizações líquidas em relação às exportações de mercadorias passou de 38 em 1967 e 334 em 1968 para 292 em 1969 mas voltou a se elevar alcançando 391 em 1972 e 353 em 1973 Tal nível ainda suportável estava associado com o aumento da dívida bem como com crescentes pagamentos de juros Assim o déficit de serviços fatores que fora em média US243 milhões em 196768 alcançou US520 milhões em 1972 e US7124 milhões em 1973 como resultado principalmente de pagamentos anuais de juros de US164 milhões em 196768 que aumentaram para US359 milhões em 1972 e US514 milhões em 1973 As autoridades econômicas não permaneceram inteiramente passivas diante do aumento do endividamento externo e da acumulação de reservas Passaram a aumentar os prazos mínimos exigidos para os empréstimos com vistas a controlar o perfil temporal da dívida E impuseram medidas restritivas para aumentar o custo dos empréstimos externos com o atraso na liberação dos cruzeiros mantidos em depósito temporário no Banco Central Se é verdade que o volume de reservas ajudaria em 1974 a enfrentar o primeiro choque do petróleo a expansão das reservas em 1972 e 1973 resultante de abundante oferta de crédito bancário externo teve forte impacto monetário que a colocação de títulos públicos não foi suficiente para esterilizar e que contribuiu para o crescente descontrole de preços que já foi mencionado De uma perspectiva de mais longo prazo parece portanto que teria sido desejável controlar mais cedo o crescimento da dívida O desempenho positivo da conta de capital que apresentou um saldo líquido médio de US1615 milhões no período 19671973 não se deveu apenas ao forte influxo de empréstimos e financiamentos Ocorreu também uma retomada da entrada de investimentos estrangeiros diretos que se dirigiam principalmente para o setor industrial Enquanto no final de 1966 o estoque de investimentos e reinvestimentos alcançava US1632 milhões em fins de 1973 esse total passara para US4579 milhões quase triplicando em sete anos A preços constantes o total de 1973 era o dobro do observado em 1966 Desse total 77 estavam investidos na indústria de transformação 42 nos serviços industriais de utilidade pública 17 no setor mineral 35 em bancos e companhias de investimentos e 07 no setor agropecuário cabendo o saldo a serviços diversos Banco Central Boletim Separata agosto 1984 p 6977 Os principais países investidores eram os Estados Unidos com 375 do total a Alemanha Federal com 114 o Canadá com 79 a Suíça com 78 o Reino Unido com 71 o Japão com 70 e a França com 45 Os demais países não detinham individualmente mais de 3 do total A relação percentual entre as remessas de lucros e dividendos e o estoque de capital entre 1970 e 1973 permaneceu em média em 59 nível relativamente baixo especialmente diante das taxas de lucros bastante elevadas das empresas multinacionais no período e da possibilidade de remessa de até 12 do capital registrado sem adicional de imposto de renda Batista Jr 1983 p 111 e Von Doellinger e Cavalcanti 1975 p 85 Consequentemente parece ter ocorrido um forte reinvestimento de capital estrangeiro no país que se destinou tanto à ampliação de instalações como à aquisição de empresas existentes de capital nacional ou estrangeiro Entre 1967 e 1973 porém não se observou uma queixa sistemática da indústria nacional contra a desnacionalização como ocorrera no período 1964 1966 Os investimentos estrangeiros tiveram papel relevante como já se viu na expansão das exportações de manufaturados e no desenvolvimento de novas atividades notadamente na área de bens de capital Tal atuação teve também impacto relevante em termos tecnológicos No período 196773 as autoridades econômicas foram claramente favoráveis ao investimento estrangeiro nas Diretrizes de Governo de 1967 já constavam declarações favoráveis à entrada de capital estrangeiro no país Foram fatores de grande relevância para a ampliação dos investimentos estrangeiros no Brasil i a nova política cambial favorecendo remessas de lucros e dividendos ou repatriações a taxas de câmbio realistas e uma programação de exportação mais estável por parte das empresas multinacionais ii a política de incentivo à exportação que culminou com a criação do BEFIEX iii a retomada do crescimento inclusive com a expansão de setores em que o processo de substituição das importações não se encerrara como as áreas de bens de capital e insumos básicos iv a existência de um programa conhecido de investimentos públicos e de uma política industrial favorável implantada pelo CDI e v a partir de fins de 1968 com o endurecimento do regime autoritário a aparentemente maior estabilidade política do país 5 Política salarial distribuição de renda e emprego No tocante a salários e relações trabalhistas a nova equipe econômica herdou uma política salarial com regras de reajuste definidas e um arcabouço legal quanto a negociações salariais muito restritivo De fato após 1964 quando ocorreram numerosas intervenções nos sindicatos existentes e o movimento sindical perdeu suas características reivindicatórias as negociações coletivas com relação a salários passaram a depender de forma crescente da aprovação governamental O campo para negociações salariais efetivas entre empregadores e empregados foi consideravelmente restringido e reduziuse também o poder de barganha dos trabalhadores com relação a outros tipos de reivindicações em virtude de progressivas limitações legais ao direito de greve Lago 1980 Somente em 1968 possivelmente em virtude de maior preocupação com a manutenção de um nível de demanda adequado a Lei no 5541 de 12 de junho de 1968 introduziu mudança na fórmula de cálculo dos salários visando corrigir a distorção resultante da subestimação a cada ano da inflação prevista ou seja do resíduo inflacionário Assim toda vez que o resíduo inflacionário do ano imediatamente anterior ao mês do reajuste tivesse sido subestimado o salário médio real dos últimos 12 meses seria corrigido de sorte que a compressão salarial de um ano não fosse transmitida para o ano seguinte todavia a mesma correção não foi introduzida para o salário médio real do penúltimo ano antes da data do reajuste Barbosa 1983 p 44 Feita essa modificação não mais seria alterada a base da política salarial até novembro de 1974 Por outro lado nova legislação tornaria em 1970 permanente a intervenção governamental nos reajustes que por lei anterior estava limitada a um período de três anos A legislação trabalhista existente sendo muito restritiva não permitiu uma reação efetiva dos empregados contra a política salarial As greves de Contagem e de Osasco em 1968 foram reprimidas e no segundo caso houve intervenção do Ministério do Trabalho no sindicato dos metalúrgicos Após o fechamento do regime em dezembro de 1968 a partir da decretação do Ato Institucional n 5 os movimentos de reivindicação enfrentaram obstáculos ainda maiores como por exemplo no caso dos metalúrgicos de São Paulo em 1969 que tentaram sem sucesso uma greve geral Somente a partir de 1972 o movimento de algumas categorias por aumentos de salários superiores aos determinados pela política salarial teriam algum sucesso ocorrendo algumas greves espontâneas ilegais Esse movimento se ampliou em 1973 ao nível de empresas e sem interferência dos sindicatos sendo em vários casos concedidos aos trabalhadores os aumentos pretendidos Almeida 1982 p 17 235 É nesse contexto legal e político que se deve examinar a evolução dos salários reais no período 19671973 As várias séries de salários e de índices de preços não resultam em uma evolução uniforme do salário real mesmo abstraindo de problemas metodológicos envolvendo os índices de preços No caso do Rio de Janeiro a partir de 1968 o menor valor real do salário mínimo teria ocorrido em 1970 com queda acumulada de 345 em relação a 1964 e com ligeira recuperação de 1971 a 1973 A série de salários mínimos em São Paulo deflacionada pelo índice do DIEESE que não tem comportamento anômalo em 1973 indica uma perda contínua de poder aquisitivo de 1964 a 1974 da ordem de 42 Entre 1967 e 1973 tal perda teria sido da ordem de 151 enquanto a perda maior da ordem de 252 teria ocorrido de 1964 para 1967 Lago 1980 Qualquer que seja o indicador escolhido no período 1967 a 1973 ocorreu queda ou estagnação do salário mínimo real apesar do forte crescimento da economia e da produtividade do trabalho IBGE 1979 p 195 A magnitude dessa perda no entanto não se estendeu ao salário médio por razões que merecem ser examinadas Enquanto permanece inequívoco que um trabalhador que ganhou salário mínimo durante o período 19671973 não teve qualquer ganho de poder aquisitivo os dados estatísticos disponíveis indicam que houve queda relativa do número de trabalhadores que ganhavam apenas um salário mínimo e aumento do coeficiente entre o salário médio e o salário mínimo legal notadamente no setor industrial que apresentou crescimento particularmente elevado Lago 1980 p 69 Por outro lado certas categorias de trabalhadores especialmente os empregados mais qualificados tiveram aumentos de salários bastante superiores aos da média dos trabalhadores influenciando positivamente a média global Observase no caso da indústria de transformação uma tendência de aumento da relação salário do pessoal totalsalário do pessoal ligado à produção que estaria ligado a um aumento no período da remuneração relativa de ocupações administrativas e de supervisão ou seja de posições mais qualificadas confirmado por pesquisas ao nível de empresas para o período 19661972 Bacha 1978 p 26 Paradoxalmente a evidência disponível sobre salários na área rural e até mesmo sobre salários na construção civil no final do período em estudo apesar de ter que ser encarada com reservas indica aumento relativo com relação ao salário mínimo legal que era mais típico de ocupações não qualificadas no setor urbano Essas observações não contrariam a constatação de ordem geral de que os salários não se beneficiaram proporcionalmente do forte crescimento do produto e da produtividade no período em estudo e de que a massa salarial não parece ter crescido como proporção da renda interna mantendose uma taxa de lucro e capacidade de investimentos elevados É essa a tendência sugerida pelos insatisfatórios indicadores de distribuição funcional da renda urbana disponíveis e da participação dos salários no valor da transformação industrial Lago Almeida e Lima 1979b quadros IV28 e IV29 Em suma no período 19671973 a política salarial e a política de relações trabalhistas do governo tiveram como resultado uma contenção dos níveis de salário real dentro do espírito de combate à inflação de custos da nova administração favorecendo a acumulação de capital via manutenção de elevada taxa de lucro e possibilitando uma política de remuneração seletiva para o pessoal de nível mais elevado A distribuição pessoal e funcional de renda no período dependeu de uma série de fatores mas não pode ser examinada sem levar em conta a política salarial do governo Já a distribuição setorial e regional de renda está mais vinculada à política econômica como um todo e à natureza do processo de crescimento da economia No que diz respeito à distribuição setorial de renda no período 19671973 consolidase a redução da participação da agropecuária no produto interno bruto a custo de fatores que vinha ocorrendo desde os anos 1950 passando aquela participação para cerca de 1011 do total nos primeiros anos da década de 1970 dados a preços correntes enquanto a participação do setor secundário se firmou em 37 a 38 do total sendo a participação do setor terciário de 51 a 53 IBGE 1987 p 119 e Conjuntura Econômica fevereiro de 1981 p III Fenômeno semelhante se observou com relação à PEA População Economicamente Ativa numa perspectiva de mais longo prazo enquanto em 1960 o setor primário absorvia 54 da PEA em 1970 essa fração ainda era de 458 reduzindose para 408 em 1973 No mesmo período a participação do setor secundário na PEA aumentou de 129 em 1960 para 202 em 1973 enquanto a participação do emprego no setor terciário crescia de 315 para 390 no mesmo período Lago Almeida e Lima 1983 quadro 12 p 41 As políticas de incentivos fiscais favorecendo os investimentos no Nordeste e no Norte bem como as obras de infraestrutura promovidas pelo governo na região Norte não afetaram radicalmente a predominância das regiões Sudeste e Sul na renda total Os dados disponíveis sobre distribuição regional da renda interna mostram inclusive perda de participação do Nordeste de cerca de 151 em 196465 para 141 em 196869 enquanto a da região Norte permanecia praticamente constante Conjuntura Econômica setembro 1971 p 10911 As informações sobre distribuição funcional de renda não permitem uma avaliação satisfatória de sua evolução entre 1967 e 1973 Os dados sugerem alguma concentração em favor das rendas do capital e da propriedade enquanto as informações já citadas sobre salários sugerem também uma concentração no interior do agregado remuneração do trabalho em favor do pessoal da administração gerência e direção de empresas IBGE 1979 p 179 e 195 Quanto à distribuição pessoal da renda apesar de alguns problemas metodológicos para a comparação dos dados disponíveis existe consenso de que ocorreu deterioração significativa entre 1960 e 1970 e novamente entre 1970 e 1972 que se deveu a diversos fatores Assim o índice de Gini limite inferior que não supõe desigualdades dentro de cada estrato de renda e que é um indicador de desigualdade muito utilizado teria aumentado de 0497 em 1960 para 0562 em 1970 dados censitários e 0622 em 1972 dados da PNAD Cabe enfatizar que no período quase todos os membros da PEA tiveram aumentos absolutos de rendimentos deflacionados pelo deflator implícito do PIB Assim o decil menos favorecido em 1960 tinha uma renda de Cr39 a Cr de 1970 em 1960 e de Cr35 em 1970 mas todos os demais decis apresentaram ganhos de 1960 a 1970 Mas é particularmente impressionante a concentração de renda nas mãos dos 5 mais ricos e dos 1 mais ricos No primeiro caso a sua participação na renda passa de 283 em 1960 para 341 em 1970 e 398 em 1972 enquanto no segundo caso o aumento é de 119 em 1960 para 147 em 1970 e 191 em 1972 Em contraste os 50 mais pobres que recebiam 174 do rendimento total da PEA em 1960 passaram a auferir apenas 149 do total em 1970 e 113 em 1972 IBGE 1979 p 196 Essa concentração levou diversos autores a afirmar que o crescimento econômico no período do milagre de 1968 a 1973 beneficiou apenas uma pequena parcela da população brasileira e que o crescimento da indústria de bens de consumo durável foi baseado na demanda de um estrato muito pequeno da população Dados sobre propriedade de bens duráveis e certos indicadores sociais levariam a matizar essa apreciação que leva em conta apenas os rendimentos monetários da população e que era particularmente válida no caso da indústria automobilística De fato observaramse progressos com relação ao acesso à luz elétrica e eletrodomésticos em geral e melhorias na área de saneamento e saúde bem como na área de educação Pffeferman e Webb 1983 p 165 e 166 e Jaguaribe Santos Abreu Fritsch e Avila 1986 Ocorreu um forte aumento do número de graduados de universidades entre 1961 e 1970 e a taxa de analfabetismo população de 15 anos e mais caiu de 395 para 331 Por outro lado o estudo da distribuição da renda entre famílias atenua um pouco o quadro de concentração de renda na medida em que um maior número de membros das famílias passou a trabalhar com a aceleração do crescimento aumentando a renda familiar além dos rendimentos do cabeça de família De fato um dos aspectos sociais favoráveis da retomada do crescimento econômico foi o crescimento do nível de emprego Não se dispõe de séries anuais para a PEA como um todo mas a evidência setorial para anos específicos confirma um forte crescimento no período 19671973 Segundo os dados das PNADs de 1968 e de 1973 abrangendo as cinco principais regiões econômicas do país o total de pessoas ocupadas aumentou de 28455 mil em 1968 para 35096 mil em 1973 mostrando uma taxa de crescimento de 43 ao ano bastante superior à taxa de crescimento demográfico da ordem de 29 entre 1960 e 1970 IBGE 1979 p 1056 e 37 Não é portanto de surpreender que as taxas de desemprego aberto computadas para o período pessoas desempregadasPEA sejam bastante baixas e da ordem de 3 a 49 no setor urbano segundo as regiões em 1973 e de 04 a 23 no setor rural no mesmo ano PNAD 1973 p XII Essas taxas encobrem a existência de desemprego disfarçado para o qual não há estimativas confiáveis para o período mas parece razoável supor que este se reduziu com a oferta de ocupações mais bem remuneradas no setor formal da economia Assim são inegáveis os progressos em várias frentes durante o período de crescimento de 1967 a 1973 Porém os dados de salários e de distribuição de renda indicam que os benefícios do crescimento não foram distribuídos de forma equitativa entre a população e que essa situação decorreu em parte de políticas implementadas pelo governo naquele período No caso do agravamento da desigualdade entre 1960 e 1970 o período de estagnação e as políticas de estabilização de 1964 a 1966 tiveram sem dúvida importância capital ocorrendo uma certa estabilização dos fatores adversos a partir de 1968 Assim a concentração de renda observada em 1970 não pode simplisticamente ser atribuída ao período do milagre ainda que pareça ter ocorrido uma deterioração da distribuição da renda nos anos seguintes 6 Uma breve avaliação dos resultados da política econômica 19671973 O objetivo básico definido pelo governo Costa e Silva nas Diretrizes do Governo de 1967 e no Plano Estratégico de desenvolvimento era o do desenvolvimento econômico e social e os objetivos fundamentais da política econômica a aceleração do desenvolvimento e a contenção da inflação Entendendose desenvolvimento como crescimento econômico a meta de um crescimento do produto de no mínimo 6 ao ano estabelecida em 1967 foi amplamente ultrapassada já que a taxa média de crescimento do PIB de 1967 a 1973 foi de cerca de 102 e de quase 125 entre 1971 e 1973 Foi também excedida portanto uma das grandes metas estabelecidas nas Metas e Bases para a Ação do Governo de 1970 Presidência da República 1970 p 178 para o período 1970 a 1973 que era de um crescimento do PIB da ordem de 7 a 9 ao ano evoluindo para 10 com uma média de 9 Diante de um crescimento da população de cerca de 29 ao ano a segunda grande meta de aumento do PIB per capita à taxa de cerca de 6 também foi amplamente alcançada Entre 1967 e 1973 enquanto a população aumentou de 851 milhões para 998 milhões de habitantes o produto per capita cresceu à taxa média de 76 Quanto ao nível de emprego não se dispõe de dados anuais mas a meta de crescimento anual passando de 28 a 29 para a ordem de 33 na altura de 1973 parece também ter sido claramente excedida visto que a interpolação dos dados das PNADs de 1968 a 1973 indica um crescimento das pessoas ocupadas à média anual de 43 no período e a forte expansão do nível de emprego também é confirmada por indicadores setoriais A quarta grande meta era um aumento do nível de investimento fixo bruto da ordem de 58 de 1969 para 1973 A ideia básica era elevar progressivamente o investimento da média recente de 15 a 16 do PIB para mais de 18 até 1975 a preços constantes Entre 1971 e 1973 a preços constantes de 1980 a formação bruta de capital fixo correspondeu em média a 202 do PIB alcançando 204 em 1973 Apenas no período 1970 a 1973 o aumento real do nível de investimento foi da ordem de 629 novamente ultrapassando a meta estabelecida em 1970 IBGE 1988 p 110 Não parece porém ter ocorrido clara diminuição do investimento público no investimento total que era um dos objetivos explicitados em 1967 Ministério do Planejamento 1967 p 6 O crescimento do produto industrial à ambiciosa taxa de cerca de 11 também foi excedido já que de 1971 a 1973 o aumento real da produção industrial foi da ordem de 143 ao ano e entre 1967 e 1970 da ordem de 125 A sexta meta a de um aumento das exportações em dólares de 46 entre 1969 e 1973 passando para US3322 milhões foi até modesta visto que naquele ano as vendas externas totalizaram US6199 milhões Em resumo todas as grandes metas estabelecidas pelo governo Médici em 1970 para o período 19701973 foram amplamente alcançadas e a aceleração do crescimento o objetivo básico do governo Costa e Silva também superou todas as expectativas O segundo objetivo fundamental a contenção da inflação se verificou efetivamente durante boa parte do período mas na realidade apesar dos índices oficiais de inflação indicarem o contrário em 1973 a inflação já se encontrava novamente em ascensão A meta de 1970 de relativa estabilidade de preços ou seja um ritmo de inflação inferior a 10 ao ano ainda no mandato do governo Médici foi portanto frustrada Quanto ao balanço de pagamentos para o qual se pretendia uma política nacional atendendo aos requisitos do desenvolvimento visavase também a uma ampliação das importações de mercadorias principalmente de bens de capital e matériasprimas industriais de 7 a 9 ao ano Para evitar um aumento rápido do endividamento externo e tendo em vista o nível do serviço da dívida já existente enfatizavase a necessidade de expansão da receita de exportações pelo menos à taxa média de 7 a 10 ao ano de modo a financiar parcela crescente das importações Presidência da República 1970 p 201 Tanto as exportações como as importações realmente cresceram a taxas mais elevadas mas não se evitou o aumento do endividamento bem além das necessidades reais do país em termos de reservas internacionais Assim a inflação e a dívida externa se apresentavam em 1973 como áreas com problemas potencialmente crescentes a serem enfrentados pela administração seguinte Durante os mandatos dos presidentes Costa e Silva e Médici destacouse como característica da política econômica o seu caráter autoritário Este ficou evidente desde as relações entre o governo central e as administrações estaduais em termos do Fundo de Participação ou da emissão de títulos estaduais até a interferência do governo federal nas relações trabalhistas No período como um todo o Ministério da Fazenda e em menor medida o do Planejamento tiveram amplo respaldo do Executivo para a implementação de programas na área econômica com pequena possibilidade de reação efetiva por parte dos poderes Legislativo ou Judiciário ou dos vários segmentos da sociedade A facilidade de adoção das várias medidas de política econômica tem que ser entendida nesse contexto Diante do indubitável sucesso da política econômica em termos de promoção do crescimento econômico e de um inegável salto quantitativo e qualitativo da economia brasileira no período 1967 1973 resta avaliar brevemente o impacto social da política econômica no período Parece claro que os trabalhadores de maneira geral não se beneficiaram do crescimento da renda real do país de forma proporcional à sua evolução Os salários nos casos em que não sofreram declínio real cresceram na maioria das categorias a taxas muito inferiores à da produtividade ou do produto per capita e o rendimento do trabalho não apresentou ganhos como porcentagem da renda total A infraestrutura social do país melhorou significativamente no período contrabalançando em parte a evolução dos rendimentos monetários Mas ainda que a questão mereça estudo mais detalhado fica a impressão de que um crescimento muito satisfatório teria também sido possível com uma política salarial menos restritiva maior liberdade individual e maior participação da massa da população nas decisões e nos frutos do crescimento CAPÍTULO 12 Crise e esperança 19741980 Dionísio Dias Carneiro Netto1 1 Introdução O ano de 1973 foi notável sob vários aspectos A economia mundial cresceu quase 7 em termos de produto Williamson 1989 p 371 as pressões de uma demanda mundial superaquecida desde a escalada dos gastos militares norteamericanos associados à Guerra do Vietnã somavamse às demandas de aumentos salariais em praticamente todo o mundo industrializado e aos efeitos retardados da queda do dólar em 1971 A expansão de crédito bancário para o comércio internacional na esteira das inovações financeiras associadas ao surgimento do mercado de euromoedas garantia que a expansão do produto mundial a taxas excepcionais se fizesse com aprofundamento dos fluxos comerciais O crescimento do comércio mundial a inflação e a desvalorização do dólar no período imediatamente anterior ao primeiro choque do petróleo foram os principais fenômenos econômicos que ajudam a explicar o mesmo Além disso houve notável aumento do comércio entre o Primeiro e o Terceiro Mundo no período 196675 tendo o valor das exportações dos países em desenvolvimento crescido à taxa média anual de 181 quase quatro vezes a taxa média do decênio anterior O problema da inflação interna dos países industrializados era visto com certa complacência em quase toda parte Era encarado como fruto de um lado do sistema de taxas fixas de câmbio cuja defesa em um mundo de taxas de inflação diferenciadas tornavase cada vez mais problemática De outro ponto de vista a inflação parecia ser o preço a pagar pela prosperidade que aparentemente justificava a arrogância de parte dos economistas keynesianos que falavam sem modéstia do fim do ciclo econômico Não obstante encontravase a economia mundial às vésperas de uma reversão do nível de atividade econômica que paradoxalmente traria de volta precisamente as teorias de ciclo longo menos relacionadas com toda a revolução no pensamento macroeconômico do pósguerra Com o fracasso das propostas de reforma monetária internacional a flutuação das diversas moedas internacionais foi o instrumento não só de defesa dos níveis internos de inflação mas da controlabilidade dos mesmos níveis internos no futuro que permitiu que os diversos bancos centrais dos países da OECD Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico tivessem diante de si mais um instrumento de gestão macroeconômica a opção pela variação das taxas de câmbio em adição ao controle monetário das taxas de juros de curto prazo Além disso na esteira das inovações financeiras associadas ao desenvolvimento do mercado de eurodólar para além do dólar e para além da Europa expandiase notavelmente o crédito para o comércio internacional dando a impressão de que o sistema financeiro internacional baseado em bancos privados poderia substituir com vantagem o sistema oficial multilateral montado em Bretton Woods A quadruplicação dos preços de petróleo no final de 1973 além de ter sido a primeira exibição de musculatura política e econômica do cartel da OPEP Organização dos Países Exportadores de Petróleo foi um movimento de preços perfeitamente em linha com os fenômenos básicos do mercado de petróleo como principal matériaprima do mundo industrializado o descompasso entre o crescimento de sua demanda e os investimentos seja em fontes alternativas de suprimento energético seja em novos campos de produção de óleo bruto teria fatalmente de refletirse cedo ou tarde nos preços a exemplo do que ocorria com as demais matériasprimas transacionadas no mercado internacional Para a economia brasileira tais desenvolvimentos não parecem ter sido percebidos por nossos gestores de política econômica como uma descontinuidade Em pleno ano de 1973 experimentou o cruzeiro sua primeira valorização nominal em meio à avalanche de capitais de empréstimo que abarrotava a conta de ativos externos das autoridades monetárias pressionava a oferta de moeda e contratava a inflação futura em uma economia já superaquecida que crescia a quase o dobro de sua taxa histórica2 A descontinuidade que ocorria internamente dominava por completo o cenário da política econômica A turbulência internacional ocorria em meio a uma sucessão presidencial que traria de volta ao poder um grupo de militares que tradicionalmente representava uma corrente distinta da que então exercia o comando do país Em nome de uma alternância pacífica de poder tornavase importante para a equipe que apeava caprichar nos indicadores de prosperidade e sucesso para eventual uso futuro O próprio Presidente da República que não parecia interessarse por eventuais impactos negativos de restrições externas fixou para seu último ano de governo a taxa de inflação em 12 que a utilização marota e compulsória dos preços tabelados pela Fundação Getulio Vargas se encarregaria de produzir para o final de 1973 O crescimento de 17 da produção industrial batia todos os recordes sonhados e o produto interno bruto expandiase à incrível taxa de 14 preparandose assim um cenário apoteótico para o que resultaria ser o fim do período de maior repressão política da história brasileira O fim do milagre econômico encerraria também um ciclo festivo de exercício do poder sem limites e sem prestação de contas sem oposição sem incômodos da livre imprensa e sem compromissos políticos a criar embaraços ao voluntarismo da política econômica Davase início por outro lado a um longo período em que se tornaria cada vez mais difícil fazer com que medidas econômicas razoáveis fossem consideradas politicamente aceitáveis O objetivo deste capítulo é rever os contornos da política econômica neste período de alta turbulência externa e interna Foi uma fase marcada pela resposta positiva do país aos desafios da crise do petróleo mas cujos custos foram o retorno da inflação como fantasma a assombrar a política de crescimento a acumulação da dívida externa que iria condicionar a política econômica brasileira nos anos 1980 bem como a desestruturação do setor público brasileiro tanto do ponto de vista de sua capacidade financeira como de seu papel estratégico na superação das restrições ao crescimento da economia brasileira na década seguinte Na seção 2 são examinados os componentes externos e internos dos condicionantes da política econômica brasileira ao início do governo Geisel Nas seções 3 e 4 respectivamente são apresentadas as principais características das políticas de curto e de longo prazo adotadas no período Na seção 5 discutemse os resultados de tais políticas e suas consequências para a grande crise que caracterizou a economia brasileira na década de 1980 2 Condicionantes externos e internos da política econômica As limitações a que estaria sujeita a política econômica no período pósmilagre farseiam sentir desde os dias preparatórios da estratégia do governo Geisel Já nas instalações provisórias do Largo da Misericórdia a ordem de escolha dos ministros sugeria precedência para o equilíbrio político sobre a nitidez da rota econômica Isso denunciava que não obstante a firmeza de propósitos do novo presidente sua vontade férrea havia conferido prioridade à abertura política então cuidadosamente denominada distensão Esta para prevenir a eventual ação desmontadora dos seus sinceros porém radicais opositores fardados seria anunciada pelo seu comandante e principal fiador como lenta gradual e segura Sem açodamentos fezse o anúncio da equipe híbrida conservandose no Planejamento a mesma equipe que se notabilizara por produzir os projetos de impacto do governo Médici trocandose apenas na Fazenda o otimismo irrestrito de Delfim Netto pelo conservadorismo cartesiano de Mário Simonsen Como árbitro das eventuais divergências sobre os rumos da economia um presidente sempre presente e pronto a presidir auxiliado pela argúcia do general Golbery do Couto e Silva certamente o militar mais adequado para chefiar uma Casa Civil de transição e que tinha clara a rota possível para que a distensão pudesse desembocar em democracia política e não no que ele denominaria uma nova e prematura sístole A leitura dos jornais da época não evidencia que tenham as autoridades brasileiras em nenhum momento do primeiro ano de governo demonstrado consciência acerca das novas restrições mundiais Caso tivesse sido percebida a gravidade do choque externo que provocaria uma transferência de renda dos importadores para os exportadores de petróleo de cerca de 2 da renda mundial certamente a imagem da ilha de prosperidade que só cairia no ridículo com a brusca desaceleração das exportações em 1975 não constituiria até hoje o deleite da oposição ao regime Os conflitos entre estabilização e ajuste estrutural que caracterizariam a política econômica do governo Geisel terseiam resolvido em favor de uma estabilização mais drástica aceitandose um crescimento deliberadamente menor por dois anos por exemplo para realizar a retomada da expansão em bases mais condizentes com as possibilidades dos anos seguintes A distensão política era no entanto vista como precária com tênue base de sustentação militar em seus primeiros anos e poderia ser ameaçada por um contraste muito visível de desempenho econômico relativamente ao período Médici Não se pode dizer em sã consciência mais de 10 anos depois que os erros de avaliação de Simonsen e Velloso tenham sido a razão principal das políticas adotadas Alguns fatores adicionais reforçam esta visão Em primeiro lugar o discurso em favor de um ajuste contracionista então adotado na área do Ministério da Fazenda parece ter sido antes motivado pela perda de controle monetário e pela repressão de preços ocorridas no final do governo anterior do que por qualquer percepção explícita da necessidade de crescer menos em decorrência dos desequilíbrios do balanço de pagamentos Em segundo lugar a falta de apoio político para um ajuste que pudesse ser abertamente associado com recessão ficou clara já nos primeiros meses do governo Mesmo que a nova equipe mostrasse disposição para realizar um programa drástico de correção dos desequilíbrios externos e internos da economia não é claro que tal programa encontraria no Presidente Geisel apoio durante o tempo necessário para seu bom êxito Em terceiro lugar os erros de avaliação tanto no que tange à política de curto prazo como aos ajustes da política de crescimento econômico localizaramse mais no tempo estimado para sua operação do que na direção das políticas Em retrospecto duas conclusões podem ser tiradas A primeira é que os condicionantes internos parecem ter sido mais importantes do que os externos para explicar as opções inicialmente feitas acerca das políticas econômicas adotadas tanto em resposta às dificuldades imediatas quanto para o restante da década A segunda é que a abundância de liquidez internacional permitiu que os déficits em conta corrente faltosos que resultaram das mesmas políticas fossem financiados sem que houvesse percepção mais dramática do novo quadro de restrições externas ao iniciarse o novo governo Com financiamento externo abundante a linha de menor resistência conduzia assim à rota do endividamento externo um certo otimismo pela existência de indexação contribuía para aumentar a tolerância com taxas mais elevadas de inflação Postergavase assim naturalmente para uma eventual ocasião mais propícia a adoção de um programa de medidas restritivas 3 Opções para o ajuste de curto prazo e as causas do fracasso Muito já se escreveu acerca da melhor estratégia de ajuste para um país fortemente dependente de petróleo importado como era o Brasil em 1973 diante de um choque que quadruplicou os preços de petróleo3 Não foi percebida de imediato a dimensão do choque externo desfavorável que implica um empobrecimento do país ao desvalorizaremse as exportações brasileiras visàvis a suas importações uma quantidade maior de bens tem de ser enviada para o exterior para pagar os bens de capital que o Brasil importa a fim de aumentar sua capacidade de produção por exemplo Do ponto de vista dinâmico o estreitamento das opções de crescimento ocorreu por duas vias uma quantidade maior de consumo teria de ser sacrificada para que o nível anterior de investimento fosse realizado e um maior investimento teria de ser realizado para que o mesmo crescimento anteriormente alcançado fosse atingido Diante deste quadro havia basicamente duas opções para o governo brasileiro a primeira seria desvalorizar o câmbio e mudar rapidamente os preços relativos a fim de sinalizar de imediato os novos custos dos produtos importados e a alteração do valor social das exportações Nesta opção deverseia ter o cuidado de conter rapidamente a demanda a fim de impedir que o superaquecimento herdado do regime anterior transformasse o choque de preços relativos em inflação permanentemente mais elevada A segunda seria comprar tempo para ajustar a oferta com crescimento mais rápido do que na alternativa anterior realizando de forma mais gradual e calibrada o ajuste de preços relativos enquanto houvesse financiamento externo abundante Na primeira alternativa alguma recessão é inevitável e o risco é seu prolongamento além do necessário Na segunda opção o risco de inflação mais elevada é maior pela maior dificuldade de controle de demanda quando o governo abertamente rejeita o ajuste recessivo Correse ainda o risco de um período mais prolongado de ajuste de preços relativos o que implica quase inevitavelmente a aceitação de uma política de subsídios4 Não há nada na segunda opção entretanto que signifique necessariamente a aceitação de política de demanda folgada durante o ajuste para a adaptação da economia a um choque adverso de oferta podese entender a necessidade de um ajuste na própria oferta mas isso não subentende um descontrole da demanda O quadro de desequilíbrio macroeconômico com que a economia brasileira defrontouse na década de 1980 caracterizado por elevado endividamento externo desestruturação do setor público inflação explosiva e perda de dinamismo teve sua origem em grande medida em erros de diagnóstico bem como na timidez que caracterizou o uso de instrumentos de política após o primeiro choque do petróleo De um modo geral podese afirmar com o benefício do julgamento a posteriori que tais erros decorreram de percepção deficiente acerca tanto das alternativas quanto da potencialidade dos instrumentos de política econômica agravada por uma visão algo paroquial acerca do ambiente econômico mundial A primeira razão fruto de ignorância interna é conducente a uma visão curtoprazista e conservadora das possibilidades de política econômica levou ao uso de poucos instrumentos e à suposição de que os resultados deveriam aparecer em prazo bem curto A segunda fruto de informação deficiente sobre a economia mundial levou a interpretação equivocada acerca da gravidade da crise internacional e de suas implicações de médio e longo prazos para o Brasil No restante desta seção será feita uma descrição resumida da evolução da política de curto prazo do período buscandose analisar o pano de fundo da política de stopandgo sobre o qual foram decididos e conduzidos os ajustes de longo prazo cuja análise será objeto da seção seguinte A condução da política de curto prazo no início do governo Geisel foi marcada por quatro decisões importantes a desrepressão dos preços a oficialização de uma regra para a correção monetária a intervenção no grupo financeiro Halles e a revisão da lei salarial Cada uma contribuiria a seu modo para selar o rumo da política de curto prazo A remoção dos controles artificiais sobre os preços que foram acionados como única forma de permitir a realização oficial da inflação prometida pelo general Médici provocou uma elevação imediata da taxa de inflação oficial e iniciou um longo período de instabilidade das taxas mensais de inflação com importantes efeitos sobre as formas de indexação que prevaleciam no mercado financeiro5 Uma vez permitida a inflação corretiva que se pretendia saneadora como o fora a promovida em 1964 deuse início à reforma dos mecanismos de controle dos preços Critérios para controles de preços agrícolas e industriais foram revistos modernizandose os controles de margem e tentandose dar alguma racionalidade aos mecanismos de ação direta sobre os preços6 A oficialização de uma fórmula para a correção monetária foi uma tentativa de compensar o aumento da incerteza quanto às taxas mensais de inflação dando maior clareza às regras de indexação7 Com a instabilização das taxas mensais de inflação a explicitação de uma regra para a correção monetária por outro lado permitiu uma especulação aberta com os títulos com correção monetária que chegaria ao paroxismo no ano seguinte como veremos adiante Descartado o uso dos preços relativos foi dominada a política de curto prazo por uma visão excessivamente simplista dos instrumentos monetários para o controle da demanda global o controle da liquidez real foi o objetivo intermediário mais frequentemente utilizado como se depreende da análise de documentos que informavam o andamento da conjuntura mas as dificuldades concretas de acionamento dos controles monetários tenderam a ser sistematicamente subestimadas8 O exagero dessa visão tornase ainda mais patente quando se leva em conta que as taxas de juros estiveram sob controle até 1976 Em contexto de taxas de juros controladas os agregados monetários tornamse essencialmente endógenos sendo a quantidade de moeda na economia determinada por duas variáveis virtualmente fora do controle do Ministério da Fazenda as reservas internacionais e os empréstimos do Banco do Brasil9 Com os agregados tradicionais endógenos a política monetária para ser ativa tem de ser conduzida a partir de controles sobre a oferta de crédito10 Para um ano que se pretendia de reversão monetária a fim de compensar os excessos do final do governo anterior o primeiro ano do governo Geisel foi surpreendentemente expansionista O desempenho de alguns agregados dá bem a medida das dificuldades que enfrentaria o ministro da Fazenda em realizar uma política restritiva nos anos seguintes Durante o ano de 1974 expandiuse a base monetária em Cr197 bilhões 329 sobre o valor do final de 1973 Os principais fatores de expansão monetária foram os empréstimos do Banco do Brasil ao setor privado mais Cr721 bilhões ou seja 894 sobre o valor de 31 de dezembro de 1973 e os chamados repasses do Banco Central por conta de Fundos e Programas que se expandiram de Cr215 bilhões ou seja 759 sobre o saldo do ano anterior Assim apesar da perda de reservas que teria criado condições para um ano realmente restritivo do ponto de vista da política monetária a expansão do crédito doméstico tanto pelo Banco do Brasil quanto pelo Banco Central prosseguiu impávida enquanto o governo acreditava fazer política monetária restritiva Uma eventual pressão contracionista decorrente da perda de reservas internacionais foi compensada pelo aumento dos financiamentos de liquidez aos bancos através do redesconto na tentativa do Banco Central de minimizar os efeitos em cadeia da quebra exemplar do quarto maior banco comercial brasileiro o Banco Halles ocorrida no primeiro mês do novo governo11 A queda do estoque real dos meios de pagamentos durante o ano foi substancial este indicador da liquidez real que vinha crescendo a taxas superiores a 25 em termos de 12 meses desde o primeiro trimestre de 1973 desacelerouse rapidamente durante 1974 tendo seu crescimento sido negativo a partir de setembro do mesmo ano A complexidade das mudanças que ocorriam sobre a demanda por moeda entretanto tanto pelo aumento da inflação esperada quanto pela mudança de postura do governo ao tentar acalmar o mercado depois da quebra do Halles lança dúvidas acerca do grau de aperto da política monetária de então Apesar da queda observada na liquidez real o fato de que a política monetária era sujeita a arrependimento prenunciava um longo período de tolerância na prática com taxas mais elevadas de inflação Analisandose pela ótica das taxas de juros tampouco encontrase evidência de restrição monetária As taxas médias anuais das LTNs que eram então os principais indicadores do custo de liquidez para as instituições financeiras passaram de 153 ao ano para 182 praticamente o mesmo nível de 1972 por exemplo ano em que a taxa de inflação medida pelo IGP foi de 155 contra 345 em 1974 Finalmente um complicador político adicional para o controle da inflação foi a mudança da regra oficial de correção salarial com a aprovação da Lei no 6147 de 14 de outubro de 1974 A nova lei de iniciativa do Executivo buscou esvaziar a principal crítica que era feita à lei anterior os custos da subestimativa da inflação futura recaíam exclusivamente sobre os assalariados resultando em perda permanente do salário real Pela nova sistemática que mantinha o princípio da recomposição do salário médio real dos 12 meses anteriores ao do reajuste consagrado na legislação antiga apresentava uma inovação caso no reajuste anterior a inflação futura houvesse sido subestimada acarretando por esta via uma queda no salário real médio haveria uma correção aproximadamente igual à perda ocorrida impedindo que esta última se tornasse permanente A motivação política da lei era clara desejavase por fim à ideia de arrocho salarial que era apontado pelos críticos da política de estabilização do governo militar como a principal causa da deterioração da distribuição da renda12 Além da atuação da política de crédito tanto do Banco do Brasil quanto do Banco Central que havia sido transformado em banco de fomento através dos fundos e programas que administrava em oposição tácita a qualquer programa de estabilização havia em outros órgãos do governo forte oposição explícita à tentativa de tentar estabilizar a economia Na Secretaria de Planejamento da Presidência da República a equipe do ministro João Paulo Velloso preparava a partir de hipóteses que virtualmente ignoravam qualquer desaceleração do crescimento ou da política de expansão do crédito doméstico um programa para que o país crescesse a 10 ao ano como resposta ao desafio do choque do petróleo As características da política de longo prazo serão analisadas na seção seguinte Nesse ínterim desenvolviase internamente uma crise financeira de grandes proporções alimentada pelo aumento das incertezas quanto ao futuro da economia enquanto fermentavam conflitos políticos mais gerais que teriam grande importância para a definição do presidente entre os dois desafios sua política econômica estabilizar a economia ou dar prioridade à continuidade do crescimento A decisão veio na esteira do resultado das eleições parlamentares de outubro de 1974 Colhendo os frutos políticos da campanha nacional propiciada pela anticandidatura de Ulysses Guimarães à Presidência da República no ano anterior o MDB fortaleceu sua base eleitoral A frente oposicionista decidira a partir da liturgia que levou à eleição do general Geisel no ano anterior utilizar todos os recursos permitidos pela distensão fazer oposição ao governo respaldada agora na busca aberta do apoio dos eleitores Da fase do protesto mesmo quando velado e censurado passavase à contestação aberta à política do regime militar fazendose todo o uso possível da liberdade de imprensa Para a política econômica de curto prazo a derrota do governo nas urnas transformou 1975 em ano de recuo na tentativa de contenção de demanda Apesar da ênfase dada à política monetária parece haver mais sinal de política fiscal restritiva em 1975 do que de política monetária restritiva13 A natural insatisfação interna no seio da burocracia do Estado gerada pelas tentativas de controle sobre os gastos públicos somouse ao clima de desconforto causado pela instabilização inflacionária e pelo descontentamento empresarial em decorrência dos controles de preços industriais fortalecendose assim junto ao Palácio do Planalto a corrente dos que defendiam a preservação do crescimento a qualquer custo As estatísticas do final do ano apontavam para uma desaceleração rápida do nível de produção industrial e o resultado prático do arrependimento foi o descontrole monetário14 Em 1975 três fatos marcaram os rumos da política de curto prazo a crise financeira a queda do crescimento das exportações e aprovação do II PND A crise financeira simbolizou as reais dificuldades políticas que o governo Geisel seria incapaz de enfrentar para reduzir a taxa de inflação de forma permanente De maio a dezembro de 1974 a taxa de inflação medida pelo IPADI voltou a situarse em média mensal de 14 próxima dos valores anteriores à aceleração de preços do início do ano Apesar de os sinais de contração monetária terem sido no mínimo duvidosos como acima assinalado a desaceleração da liquidez real de uma taxa anualizada de crescimento de mais de 30 observada no final de 1973 para apenas 14 ao final do primeiro trimestre de 1974 e para valores negativos no primeiro trimestre de 1975 era apontada como a principal causa da desaceleração do produto A incapacidade política do governo Geisel de manter a política anti inflacionária em 1975 foi decisiva para a definição dos rumos da política econômica de curto e de longo prazo15 O golpe de graça na tentativa de abortar a aceleração inflacionária póschoque externo veio na forma de uma expansão vigorosa de demanda global Nos primeiros dois meses de 1975 os meios de pagamento caíram cerca de 85 contra uma previsão do orçamento monetário de 1 Os fatores de queda foram a perda de US500 milhões de reservas em dois meses além da queda do multiplicador pela diminuição da preferência do público por depósitos a vista em decorrência da aceleração inflacionária do ano anterior Pressionado pelo presidente da República a reverter o que certamente se imaginava ser um perigoso processo de contração monetária que dava continuidade à recessão criouse no Ministério da Fazenda um mecanismo denominado refinanciamento compensatório pelo qual quando os meios de pagamento se encontrassem abaixo das previsões do Orçamento Monetário o Banco Central emprestaria fundos aos bancos comerciais a juros de 6 ao ano sem correção monetária a prazos de 90 a 150 dias Este curioso redesconto invertido seria distribuído aos bancos proporcionalmente ao seu capital e depósitos os mesmos fatores que determinam os limites do redesconto O sistema formado principalmente pelas financeiras corretoras e distribuidoras com a finalidade de dar liquidez às letras de câmbio e certificados de depósitos diante da instabilidade da correção monetária póschoque emitia ao vender um título ao suposto tomador final uma carta com o compromisso de recomprálo em data determinada antes do vencimento e com preço prefixado Ganhavam assim na diferença estimada entre a correção monetária estimada e a taxa prefixada que pagavam aos clientes Não sendo tais cartas nem registradas nem reguladas pelo Banco Central não dispunham tais operações de nenhum mecanismo de redesconto o que as deixava vulneráveis a uma eventual corrida de titulares que desejassem exercer de uma só vez por qualquer motivo seus direitos de liquidação das operações O motivo veio na forma do anúncio de um expurgo no índice de preços que reduziu repentinamente a taxa esperada de correção monetária e provocou a suspeita de que várias instituições teriam grandes prejuízos uma vez que trabalhavam fortemente alavancadas A corrida contra o sistema depois de um breve período de resistência das autoridades que pretendiam dar uma lição de risco terminou provocando o socorro financeiro às instituições com elevadas emissões monetárias para financiar o aumento dos empréstimos de liquidez ao sistema financeiro O quadro de expansão monetária que começara com o refinanciamento compensatório terminava o ano com expansão nominal nos meios de pagamentos aos níveis do final de 1973 pondo por terra todo o esforço de estabilização iniciado em março de 1974 Enquanto isso a deterioração das contas externas brasileiras levou a rápidas perdas de reservas que passaram de US6417 milhões em 1973 para US4040 milhões em 1975 nível próximo do atingido em 1972 quando as importações totais eram pouco mais de um terço do valor observado em 1975 O processo de endividamento externo graças a um déficit acumulado em transações correntes de mais de US145 bilhões em 1974 e 1975 apresentava perspectivas nada encorajadoras dadas as incertezas quanto ao crescimento da economia mundial A dívida externa bruta crescera de US12572 milhões para US21171 milhões nos primeiros dois anos de governo E em dezembro de 1975 os empréstimos em moeda contraídos no ano acusavam um total de US14711 milhões contra US7849 milhões em 1973 As projeções de endividamento externo feitas pelo ministro da Fazenda em 1975 por outro lado com base em um crescimento de exportações da ordem de 15 ao ano e uma taxa de juros internacional da ordem de 10 supunham uma queda anual de US13 bilhões para o déficit em conta corrente até o início da década seguinte16 Segundo tais projeções a dívida externa líquida ao final de 1979 chegaria a menos de US35 bilhões o que decerto servia de base à postura do presidente do Banco Central de não se preocupar com a dívida mas apenas com a administração do perfil de endividamento tomando como infinitamente elástica a oferta de crédito externo para o país17 Ficava assim selada a predominância da política de crescimento com base na reestruturação da oferta e na demanda folgada sobre os ajustes de curto prazo Na prática ficou estabelecida a tolerância com taxas mais elevadas de inflação o ajuste inflacionário seria parte da política de evitar a imposição de perdas diante das novas possibilidades da economia brasileira De 1975 em diante a acomodação diante da taxa de inflação seria periodicamente sujeita a surtos de contenção todos eles de curta duração A aprovação do II PND significou além da vitória do pessimismo quanto a elasticidades a subordinação dos objetivos de estabilização às metas de longo prazo Daí em diante nos conflitos entre a Seplan e o Ministério da Fazenda a primeira levava a vantagem de ter um plano de jogo ao contrário do Ministério da Fazenda que adotava uma estratégia híbrida de controle moderado da demanda com alternadas fases de controles de preços mais ou menos rigorosos Neste contexto não obstante o brilho da argumentação do titular da Fazenda que certamente em seus despachos semanais com o general presidente tendia a cobrar maior apoio para o combate à inflação a balança pendeu de modo geral para os argumentos do ministro da Seplan calçados em uma estratégia previamente estabelecida e que tinha na secretariaexecutiva do Conselho de Desenvolvimento Econômico oportunidade para definir a agenda do mesmo e assim arregimentar apoio para o programa de investimentos Explicase assim por exemplo o perfil dos desembolsos do governo através do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico BNDE mesmo depois que arrefeceram os ânimos dos investidores privados a partir de 1976 principalmente quando se reconhece a importância que adquiria no desenho da política de curto prazo o controle sobre a expansão do crédito Na realidade podese afirmar que se o Presidente Geisel deu ao seu ministro da Fazenda uma chance para promover um ajuste rápido em termos práticos sua própria confiança em Simonsen não foi suficiente para que desse ao ministro carta branca para que promovesse o aperto monetário e fiscal necessário para preparar a economia para uma etapa de ajuste estrutural Em consequência dentro e fora da órbita da Fazenda não existia nada parecido com um consenso acerca da estratégia macroeconômica mais adequada para não dizer do uso dos instrumentos Com o fiasco que representou para a política de estabilização o descontrole monetário do final de 1975 o ano de 1976 iniciouse com nova tentativa do governo de sinalizar sua insatisfação com o retomo às altas taxas de inflação18 O orçamento monetário aprovado para o ano prometia mais uma vez a austeridade monetária como instrumento essencial da política antiinflacionária Reconhecidas as principais dificuldades encontradas pelo governo para realizar uma política monetária efetivamente contracionista partiuse para um esforço no sentido de dotar o governo de instrumentos monetários mais eficazes Em março foram liberadas as taxas ativas de financeiras e bancos de investimento Somente em setembro entretanto a Resolução 389 do Banco Central liberou os controles sobre as taxas de juros dos bancos comerciais A tentativa explícita de exercer maior controle sobre os empréstimos do Banco do Brasil deu início assim a uma longa mudança de regime na condução da política monetária Tal mudança que só viria a completarse no início da década seguinte quando em 1981 tentouse utilizar o endividamento do setor público como instrumento para conter a expansão monetária fezse sentir na inversão de tendência da expansão dos agregados de crédito Na prática os empréstimos ao setor privado expandiramse a mais de 55 no ano e os meios de pagamentos a mais de 37 ficando mais uma vez sobrecarregados os instrumentos de controles de preços com a inglória tarefa de reprimir a inflação em regime de expansão continuada da demanda global Os preços públicos fizeram a sua parte no processo de transferência de renda ao setor privado elevandose de 285 em média 20 se considerarmos apenas os preços e tarifas de responsabilidade direta do governo federal enquanto o índice geral de preços aumentava em mais de 46 Na esteira de dois anos seguidos de expansão da demanda global o produto recuperouse de forma vigorosa à taxa de 103 ou seja 54 pontos percentuais acima de 1975 Os temores quanto à recessão que constituíam os principais obstáculos à estabilização da economia após o primeiro choque do petróleo eram na prática afastados por uma opção tácita do governo por mais inflação e maior endividamento Em 19 de novembro o ministro Velloso podia anunciar em discurso na Associação de Bancos do Estado de São Paulo que o governo deliberadamente evitou fazer sintonia com a recessão mundial para sair da crise de petróleo pelo aumento das exportações e pela busca à autossuficiência em insumos básicos19 A consciência de que o acelerador havia sido apertado em demasia entretanto marcou o último trimestre do ano quando o mesmo ministro já anunciava não ser correto dizer que o governo vem programando seus investimentos na base de um crescimento do PIB a 10 ao ano e falava na necessidade de desacelerar a economia para reduzir a inflação a uma taxa mensal de 220 A tentativa de reversão da política de demanda e a repressão aos preços públicos foram os pontos predominantes da política de curto prazo nos últimos dois anos do mandato do Presidente Geisel21 Promoveuse em 1977 uma política monetária mais restritiva com desaceleração dos meios de pagamentos e dos empréstimos ao setor privado além da fixação de uma taxa de juros básica positiva em termos reais para o sistema financeiro pela primeira vez desde 1971 Na tentativa de promover uma política financeira mais austera Simonsen anuncia que a política do governo de permitir que instituições financeiras emprestem a empresas comerciais e industriais coligadas definitivamente acabou22 À medida que se aproximava o final do governo Geisel entretanto os sintomas de mera oposição interna ao programa passavam a compor conflitos políticos mais gerais como o que culminou com o afastamento dramático do ministro do Exército23 Passou a ocupar o centro do palco político a candidatura do general Figueiredo então ministrochefe do Serviço Nacional de Informações e que fazia o papel de ponte entre os grupos Geisel e Médici Em consequência estreitavase o espaço político para mais um round de política antiinflacionária mais séria na medida em que os resultados de um ano de austeridade foram uma queda modesta de 8 pontos percentuais na inflação anual medida pelo IGP para 387 em dezembro Para isso contribuiu de forma decisiva o desempenho da agropecuária com um crescimento de 121 contra 24 no ano anterior propiciando uma redução de 30 pontos percentuais na inflação agrícola A desaceleração brusca na indústria de transformação tornava mais difícil politicamente a continuidade da política de estabilização levando o presidente a afirmar em seu discurso de final do ano sua decepção diante da resistência da inflação brasileira às tentativas de controle lembrando que os próprios mecanismos de defesa também a realimentam permanentemente mas afirmando que a inflação não deve ser tratada senão pela metodologia gradualista A partir do início de 1978 com a definição da força inequívoca da candidatura Figueiredo esta passa a dominar o ambiente político do país A política econômica de curto prazo passa assim ao serviço da continuidade do processo de distensão privilegiando a acumulação de reservas em decorrência de um saldo do balanço de pagamentos de US43 bilhões Em meados do ano uma seca que assolou o centrosul provocou uma queda de 27 no produto agropecuário gerando a necessidade de importações de alimentos da ordem de mais de US1 bilhão prejudicando a continuidade do controle do custo de vida urbano e deteriorando a balança comercial no último ano do mandato Geisel Apesar da restrição ao crescimento dos preços públicos o índice geral de preços acelerouse em dois pontos percentuais ao longo do ano postergandose para o novo governo a tarefa de realizar um novo round de política restritiva Com a posse do general Figueiredo em março de 1979 Mário Simonsen foi para a Secretaria de Planejamento para comandar a política econômica Foi feita nova tentativa de ajuste fiscal baseada essencialmente no corte de investimentos considerados não prioritários para a melhoria do balanço de pagamentos e o controle do processo de endividamento externo Inicialmente o objetivo era obter um superávit fiscal de 1 do PIB Até maio parecia que o governo poderia definir um conjunto de medidas econômicas com razoável coerência uma vez que sob a coordenação do ministrochefe da Seplan estavam agora reunidos praticamente todos os instrumentos de política macroeconômica além dos instrumentos tradicionais de programação econômica e orçamento na órbita fiscal o ministrochefe da Seplan presidia agora o Conselho Monetário Nacional e na prática supervisionava as atividades da Secretaria de Receita Federal e do Conselho Interministerial de Preços A partir da aprovação dos preços mínimos para a safra 197980 que embutiam uma correção nominal de 70 para uma inflação passada da ordem de 40 agravaramse os conflitos dentro do governo entre a política de austeridade orçamentária e o desenvolvimentismo Esta última posição que defendia o prosseguimento das políticas expansionistas de demanda para promover o crescimento tinha como expoentes os ministros Delfim Netto da Agricultura e Mário Andreazza do Interior Na realidade tentouse operar uma redução substancial de despesas com o corte de investimentos públicos e buscandose maior coerência entre a política fiscal e a política monetária A partir da aprovação do orçamento monetário a austeridade dura somente até agosto O início do governo Figueiredo foi na realidade uma continuação do governo Geisel No momento em que ficou claro ao novo presidente que caberia a ele fazer o que era desagradável e que Geisel não tinha conseguido fazer apesar de toda sua autoridade foi fácil ao general presidente optar por fazer sua própria política tentando reviver a aura do período Médici entregando ao Ministro Delfim Netto a tarefa de realizar agora sim um milagre econômico Entre agosto de 1979 e outubro de 1980 o país experimentou sua última tentativa de ignorar a crise externa agora agravada pelo novo choque do petróleo e pela elevação vertiginosa do custo do endividamento externo A política heterodoxa adotada baseouse explicitamente no controle dos juros na maior indexação dos salários seguida de desvalorização cambial com prefixação da correção monetária e na tentativa de manipular as expectativas inflacionárias durante a maior parte do ano de 1980 A incapacidade de fazer com que os banqueiros internacionais financiassem o experimento levou a uma perda rápida de reservas enquanto o crescimento rápido do consumo alimentou a explosão do balanço de pagamentos e levou à rápida reversão da política macroeconômica em final de 1980 Enquanto o governo praticava o clássico stopandgo na política de estabilização operavase no país uma importante mudança estrutural financiada por um endividamento externo crescente A análise deste programa é o objetivo da seção seguinte 4 A natureza do ajuste de longo prazo o crescimento com endividamento Crescimento com dívida A dívida externa brasileira cresceu US18 bilhões entre 1974 e 1977 outros US18 bilhões nos dois anos seguintes No início do governo Geisel o país pagava anualmente US600 milhões de juros em 1978 a conta de juros líquidos subira para US27 bilhões que a alta das taxas de juros internacionais elevaria para US42 bilhões no primeiro ano do governo Figueiredo Em grande medida este vertiginoso crescimento da dívida externa foi o resultado da política de longo prazo adotada A manutenção de uma taxa de investimento superior a 25 em praticamente todos os anos do período permitiu ao país crescer 68 ao ano em média de 1974 a 1979 Quais os elementos essenciais dessa estratégia As bases da política de longo prazo estão descritas nos capítulos II a IV do II Plano Nacional de Desenvolvimento II PND24 Acreditavam seus elaboradores que no período de 1975 a 1979 a indústria brasileira poderia crescer 12 ao ano e a economia como um todo 10 ao ano Lograram convencer o Congresso Nacional de que esta taxa de crescimento poderia ser uma meta factível para reorientar oferta de bens e serviços de modo a superar as dificuldades de balanço de pagamentos enfrentadas pelo país25 Como forma de ajustar a estrutura econômica à situação de escassez de petróleo o governo optou por grande ênfase nas indústrias básicas notadamente no setor de bens de capital e o da eletrônica pesada assim como no campo dos insumos básicos a fim de substituir importações e se possível abrir novas frentes de exportação26 No campo da política de energia optouse por uma aceleração dos investimentos na prospecção principalmente na bacia de Campos além da execução de um programa de elevação de 60 da capacidade geradora de energia hidroelétrica buscandose viabilizar a expansão da produção e da exportação de bens com elevado conteúdo energético que pudessem ser produzidos no país com base em hidroeletricidade a exemplo do alumínio A opção por não utilizar a desvalorização cambial para promover o redirecionamento da oferta e da demanda de modo a produzir mais bens transacionáveis com o exterior e ao mesmo tempo economizar divisas não implicou a desconsideração de tais efeitos como forma de corrigir a longo prazo os desequilíbrios comerciais gerados pelo choque externo O pessimismo quanto às elasticidades não foi suficiente para bloquear a utilização da política comercial importações foram encarecidas não só por uma elevação generalizada de tarifas como pela criação de encargos financeiros e restrições quantitativas de vários tipos27 Tais medidas tinham um duplo papel reprimiam as importações talvez de forma mais dirigida do que a que seria obtida por uma desvalorização e além disso criavam novos obstáculos que puderam ser removidos seletivamente para permitir instrumentos para a implementação da nova política industrial Talvez o aspecto mais surpreendente da política de comércio exterior do governo Geisel tenha sido a rapidez com que as medidas acima sumariadas lograram reduzir o coeficiente importado da economia Em 1974 as importações correspondiam a cerca de 12 do produto um recorde histórico semelhante ao atingido em 1954 As novas políticas de controle de importações interromperam o crescimento deste coeficiente que já havia dobrado desde o início da década e triplicara desde meados da década anterior Entre 1974 e 1977 o valor total das importações mantevese constante em dólares nominais não obstante a economia haver crescido mais de 7 ao ano no período Em 1978 às vésperas portanto do segundo choque de petróleo o coeficiente importado já era de 72 inferior portanto ao observado antes do primeiro choque Ao tentar fazer a economia crescer a 10 o programa do governo logrou obter um crescimento médio anual de 7 mas as projeções originais de endividamento foram rapidamente superadas na medida em que o relativo sucesso no controle da balança comercial não foi suficiente para fazer decrescer o déficit em conta corrente com a rapidez que era esperada Entre 1974 e 1978 as importações mundiais cresceram cerca da metade do que haviam crescido entre de 1970 e 1974 A desaceleração do crescimento do comércio mundial que se agrava após 1978 foi mais importante do que a aceleração progressiva da taxa de juros paga pelo Brasil que adquire importância a partir de 1979 Estes são os grandes fatores por detrás da deterioração do balanço de pagamentos brasileiro apesar do sucesso no controle das importações No que diz respeito à composição do produto a indústria foi seguramente o setor líder do período como de resto durante toda a década de 1970 Apesar do destaque inequívoco da indústria de transformação cujo desempenho no ajuste de oferta será analisado a seguir devese observar a importância da continuidade da expansão da indústria de construção durante o período atingindo na década uma taxa média anual de crescimento de 97 em termos reais Este desempenho é explicado tanto pela importância das obras públicas no período associadas tipicamente aos projetos de grande porte como as hidrelétricas de Itaipu e Tucuruí por exemplo quanto à continuidade do financiamento à construção residencial não obstante a instabilidade da taxa de inflação A política industrial A estratégia de política industrial no governo Geisel baseouse na substituição de importações nos setores de bens de capital insumos básicos para a indústria e no aumento da produção e da prospecção de petróleo28 Os principais instrumentos de tal política foram o crédito do IPI sobre a compra de equipamentos a depreciação acelerada para equipamentos nacionais as isenções do imposto de importação o crédito subsidiado e formas mais ou menos explícitas de reserva de mercado para os novos empreendimentos assim como garantia de política de preços compatível com as prioridades da política industrial29 Os órgãos de implementação da política eram o Conselho de Desenvolvimento Industrial o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico o Conselho de Política Aduaneira a Carteira de Comércio Exterior do Banco do Brasil e o Conselho Interministerial de Preços Durante a década de 1970 não faltaram críticas ao retomo à estratégia de substituição de importações como forma encontrada pelo governo brasileiro de tentar superar o estrangulamento das contas externas em decorrência da combinação de um surto de crescimento acelerado com a crise do petróleo Malan e Bonelli 1977 p 31 chamavam atenção para os erros a que tal política estaria sujeita em decorrência da minimização dos efeitos do caráter cíclico da demanda de bens de capital Tal comportamento levaria o governo a superestimar o mercado para tais bens Não deixa de ser curioso que o otimismo do governo acerca do tamanho do mercado brasileiro de bens de capital tenha sido ainda agravado pelas estimativas do setor privado Os investidores privados eram além dos clientes tradicionais do BNDE tipicamente empresas estrangeiras que queriam transferir parte de sua capacidade produtiva para o país em muitos casos por meio de pressões para autorização de funcionamento concessão de benefícios e contra pareceres técnicos que apontavam para a saturação inevitável em alguns mercados O segundo fator de pessimismo dos referidos autores é o que denominam a preferência pelos bens importados que também seria ignorado pela política de estímulos do governo Analisandose os estímulos e o grau de proteção para a indústria localizada no país entretanto tal preferência parece ter sido mais do que compensada pela política industrial dos anos 197030 Os resultados de tais políticas foram objeto de vários estudos em particular Velloso 1982 avalia os efeitos das políticas sobre as importações principalmente de insumos industriais Batista 1986 faz um confronto entre as metas do II PND e os resultados obtidos enquanto Lago Almeida e Lima 1979a analisam com abundância de informações estatísticas e minucioso exame da legislação a política de estímulos à indústria de bens de capital no Brasil De modo geral as conclusões têm sido favoráveis no sentido de que os objetivos gerais de reestruturação da oferta foram atingidos se bem que em prazos geralmente superiores aos programados Do ponto de vista mais específico dos setores mais favorecidos pela política industrial o desempenho pode ser ilustrado pela queda tanto em valor quanto em participação na pauta de importações entre 1974 e 1979 O programa de insumos básicos dirigido para reduzir as importações que atingiram a cifra de US35 bilhões em 1974 nos setores de papel e celulose metais não ferrosos fertilizantes produtos petroquímicos e aço logrou reduzir as despesas com tais itens a cerca de US12 bilhões correntes em 197931 Os resultados da substituição de importações contribuíram ainda para internalizar as despesas de investimento A participação das importações de bens de capital no total da despesa com máquinas e equipamentos decresceu de 256 em 1972 para 9 10 anos depois O dispêndio em divisas com bens de capital ficou virtualmente constante em termos nominais até o final da década mas as exportações do setor elevaramse continuamente de US893 milhões em 1975 a US24 bilhões em 1979 A diferença importante da experiência brasileira da década de 1970 tanto em relação às experiências anteriores quanto às de outros países é que a opção pela política de substituição de importações foi feita sem que houvesse descontinuidade no incentivo às exportações Estas passam de 75 do PIB em 1974 a 84 do PIB em 1980 enquanto as importações caem de 119 do PIB para 95 no mesmo período apesar do segundo choque do petróleo32 A chave do sucesso da política industrial brasileira na década de 1970 parece residir assim nesta combinação de estímulos pouco usual se comparada com outras experiências no Terceiro Mundo A manutenção desta variedade de estímulos fiscais creditícios e cambiais entretanto teve como custos mais visíveis a progressiva deterioração da posição financeira do Estado caracterizada pela queda da carga tributária líquida e pela elevação do endividamento do setor público Tal deterioração que resultou de uma fadiga progressiva dos instrumentos de ação do governo sobre a economia brasileira está na base do agravamento dos conflitos distributivos e da aceleração inflacionária dos anos 1980 5 Resultados e suas consequências Vimos que nos primeiros seis meses do governo Figueiredo foi realizada uma tentativa de completar as tarefas de estabilização e de compatibilização do programa de investimentos do II PND com as crescentes dificuldades de refinanciamento da dívida externa tendo em vista a elevação das taxas de juros internacionais A manutenção do comando da política econômica sob Mário Simonsen sugeria em princípio a prioridade para a estabilização Os esforços iniciais concentraramse assim na redução do déficit público A gravidade do problema fiscal foi sendo paulatinamente percebida por alguns técnicos do governo e constituiu a preocupação central da Secretaria do Planejamento no início do governo Figueiredo O novo titular da Seplan Mário Henrique Simonsen no entanto não conseguiu sensibilizar seus colegas de gabinete para o problema Tampouco pareceu convencer o Presidente da República do caráter explosivo da ameaça inflacionária representada por um desequilíbrio sem limites entre meios e gastos governamentais Anos de repressão de preços e tarifas do setor público utilização das empresas estatais como instrumento de captação de empréstimos externos concessão por vezes abusiva de incentivos fiscais subsídios creditícios e prática generalizada de artifícios financeiros que mascaravam a verdadeira dimensão do desequilíbrio fiscal na economia brasileira não seriam desmontados entretanto de forma tão fácil A inexistência de uma série homogênea oficial para que se possa examinar a evolução das necessidades de financiamento do setor público dificulta a análise da política fiscal do governo Geisel e a herança deixada para o governo Figueiredo Adotando a ótica do financiamento podem ser construídas séries para os diversos componentes do endividamento interno do setor público federa133 Estas séries revelam que até 1976 o estoque médio da dívida pública federal monetizada e não monetizada mantevese razoavelmente estável como proporção do produto interno bruto em termos nominais aumenta entre 1970 e 1973 de 87 para 123 do PIB e volta a cair até 1976 para 91 Esta relativa estabilidade foi entretanto acompanhada por uma progressiva substituição na carteira do setor privado de base monetária por títulos A Tabela 121 ilustra o fenômeno Tabela 121 Brasil Dívida interna federal não monetizada 19701981 como do total da dívida interna Fonte Carneiro 1987c Este processo iniciado após as reformas financeiras da segunda metade dos anos 1960 corresponde a um fenômeno de inovações financeiras no sentido de substituição nas carteiras dos agentes econômicos de reservas monetárias por não monetárias facilitada pela oferta de substitutos próximos da moeda governamental A mudança do patamar inflacionário pós1974 acelerou essa substituição Entre 1970 e 1973 a base monetária caiu de 76 do produto para 68 prosseguindo a queda para 51 em 1976 Na segunda metade da década de 1970 a relativa estabilidade da taxa de inflação coincide com a relativa estabilidade desta proporção atingindo a mesma 49 em 1979 quando se inicia nova mudança de patamar na taxa de inflação Entre 1976 e 1979 entretanto a dívida interna do governo federal cresce de 91 para 118 do produto sendo pois o acréscimo da dívida totalmente correspondente ao crescimento da parcela não monetizada Vimos nas seções anteriores que conflitos políticos mais gerais desempenharam papel fundamental na definição que coube ao Presidente Geisel entre os dois desafios de sua política econômica estabilizar a economia ou dar prioridade à continuidade do crescimento A decisão de não desvalorizar o câmbio símbolo do pessimismo de elasticidades e do modelo de inflação que instruía a política econômica de curto prazo teve como contrapartida uma decisão de promover maior intervenção direta no processo econômico seja através dos mecanismos de incentivos fiscais e creditícios seja através da participação direta dos investimentos públicos no processo de redirecionamento da oferta Os primeiros dois instrumentos no entanto representam na prática deterioração da receita pública na medida em que o Estado abre mão de coletar impostos e faz empréstimos com encargos financeiros abaixo da inflação Este efeito é ainda agravado pela prática de reajustes de preços públicos abaixo da inflação Por outro lado o aumento da responsabilidade do setor público pelos investimentos requer maior poupança pública ou maior endividamento do setor público A consequência mais séria do pessimismo quanto às elasticidades foi o desconhecimento das reais possibilidades de racionalização do consumo de energia Isso levou ao atraso nas pesquisas não só de fontes alternativas mas também no sentido de melhor aproveitamento energético No caso do óleo combustível o quadro parece ainda pior do que o da gasolina Modiano 1982 chama atenção para o fato de que o subsídio ao uso do petróleo foi uma das pobrezas técnicas mais visíveis da estratégia econômica de longo prazo O consumo de óleo combustível cresceu 45 e o de diesel de 60 para um crescimento do PIB de 40 entre 1973 e 1978 De acordo com o mesmo autor Modiano p 147 a margem bruta de refino de petróleo caiu de 617 em 1972 para 205 em 1979 para menos de 2 depois de 1980 O atraso de preços só foi recuperado depois de 1981 sendo um elemento adicional das fortes pressões de custos associados à aceleração inflacionária do início da década de 1980 Os erros de avaliação mais importantes talvez tenham sido os relacionados com ao tempo estimado para a mudança de oferta e é claro com o comportamento futuro das taxas de juros e do comércio internacional Com juros menores e com maior poder de compra das exportações o ajuste também poderia ter sido mais rápido Por outro lado com maior ênfase na política de preços maior rigor na condução das políticas de demanda e na administração dos conflitos que desembocam em maior inflação e menor ênfase em programas desastradamente ambiciosos como o programa nuclear o governo Geisel certamente teria legado ao seu sucessor uma herança menos indigesta Perto do que estava por vir no entanto tais equívocos perdem completamente sua significância na determinação dos desastres dos anos 1980 Por detrás dos indicadores do peso que representa o serviço da dívida interna ao iniciaremse os anos 1980 identificamse importantes mecanismos que operaram durante o processo de ajuste e que têm a ver não só com o processo de endividamento externo do país como com a mecânica de absorção desta dívida externa pelo governo No início do processo de endividamento externo o próprio fato da principal fonte de crédito serem os bancos privados que operavam no mercado internacional facilitava a intermediação privada e a colocação de empréstimos junto a tomadores privados cuja única fonte alternativa de financiamento era o BNDE Em 1974 a dívida externa do setor privado correspondia a cerca de 45 do total Em 1980 a dívida do setor privado era apenas 22 do total Werneck 1986a e 1986b analisa as repercussões desse processo de estatização da dívida externa e suas principais consequências para as dificuldades de financiamento do setor público em meados dos 198034 Observa aquele autor que o processo de crescimento da dívida interna do setor público brasileiro foi fruto de um financiamento inadequado do aumento das responsabilidades do governo ao longo do processo de acumulação da dívida externa sem que tenha havido a contra partida do aumento da renda disponível do setor público O que se observou foi ao contrário em consequência dos subsídios e isenções fiscais uma significativa redução da carga tributária compensada pela emissão de dívida interna que com o correr do tempo passa a onerar o próprio orçamento público Entre 1973 e 1983 a renda disponível do setor público definida como receita tributária mais outras receitas correntes líquidas menos subsídios e transferências caiu de 168 para 87 do PIB Confrontada esta queda com as responsabilidades financeiras crescentes do governo por conta das dívidas acumuladas fica mais fácil entender as dificuldades de reversão do processo inflacionário nos anos 1980 A incompatibilidade entre o equacionamento das finanças públicas de forma adequada para a expansão da economia brasileira no período sublinha assim o caráter precário e inarticulado da política econômica após a deterioração do balanço de pagamentos brasileiro na segunda metade dos anos 1970 Os incômodos políticos associados ao ajuste fiscal que requer fatal ainda que não exclusivamente a recuperação da carga tributária líquida para que seja interrompido o processo inadequado de financiamento das contas do setor público dos últimos 10 anos seriam parte da herança pesada que caracterizaria os problemas centrais da política econômica nos anos 1980 1A contribuição a crítica paciente e as correções de Luiz Roberto Cunha foram de valor inestimável para este trabalho O autor agradece a Adriana Munhoz e Mariana Werneck Bastos pela assistência à pesquisa 2Em 1973 as reservas internacionais das Autoridades Monetárias atingiram cerca de US64 bilhões sendo que somente naquele ano as entradas brutas de empréstimos e financiamentos de médio e longo prazos atingiram quase US45 bilhões Como resultado da entrada de empréstimos em moeda muito superiores às necessidades de financiamento externo do país somente nos anos de 1972 e 1973 os saldos globais do balanço de pagamentos representaram uma acumulação de haveres externos superior a US53 bilhões o que dá ideia da abundância de financiamento externo à época da crise do petróleo 3Vejase por exemplo a discussão acerca da melhor política para os Estados Unidos apresentada em Solow 1980 Solow chama atenção para o fato de que pelo menos no caso da economia norteamericana o objetivo mais defensável seria evitar os males de uma inflação prolongada que resulta quase sempre dos efeitos distributivos de um tal choque 4A política de subsídios decorrente de um ajuste mais prolongado de preços relativos não tem nada de errada em si mas as dificuldades de revertêla não devem ser subestimadas como ilustra a própria experiência brasileira no período em consideração 5Nos primeiros quatro meses de 1974 o índice de preços no atacado base do sistema de indexação cresceu à média mensal de 39 em contraste com menos de 15 nos seis anos anteriores A variabilidade da taxa mensal da inflação deu início aos primeiros rumores acerca de desindexação ou expurgo de índices que lançavam dúvidas maiores acerca da rentabilidade esperada dos diversos ativos financeiros 6Os mecanismos e critérios de controles de preços industriais centrados no Conselho Interministerial de Preços CIP estão analisados em Carneiro 1976 Além desses desempenhava papel importante no controle do abastecimento e do custo de vida urbano desde o governo anterior a chamada tabela CIPSUNAB controlada pela então assessoria econômica do ministro da Fazenda 7Até então a correção monetária das Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional ORTN era definida mensalmente sem regras escritas por uma portaria do ministro da Fazenda É útil lembrar que a Lei no 4728 de julho de 1965 Lei do Mercado de Capitais ao estender aos títulos privados a correção monetária das Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional criadas pela Lei no 4357 de julho de 1964 as quais originalmente teriam vencimento mínimo de três anos pretendia com isso criar condições para a emissão de títulos de longo prazo nunca a criação de títulos indexados que fossem substitutos próximos da moeda Com a instabilização das taxas mensais em 1974 entretanto temiase que o governo promovesse uma desindexação informal expurgando da correção monetária oficial os efeitos da desrepressão de preços sobre a inflação de março e abril Temendo os efeitos que tais expectativas pudessem vir a ter sobre um mercado financeiro já conturbado o ministro da Fazenda preferiu explicitar uma regra pela qual a correção monetária seria formalmente vinculada ao índice de preços no atacado da FGV IPADI sendo uma média em que a variação média do IPA nos três meses anteriores entrava com peso 08 e uma inflação mensal correspondente a uma taxa anual de 15 entraria com peso 02 Apesar da elegância formal da solução encontrada ela revelouse desastrosa na medida em que contribuiu dado o mecanismo da carta de recompra para a monetização de fato dos títulos privados 8Vejase por exemplo a Exposição de Motivos n 49B aprovada pelo CDE em 22 de abril de 1974 11 onde são explicitadas as diretrizes para a política monetária em 1974 fixandose meta para a expansão dos meios de pagamentos em 35 cuidandose apenas para que o orçamento monetário se transformasse de indicativo em normativo e apenas recomendando o amplo uso do crédito seletivo como instrumento de combate à inflação 9Os empréstimos do Banco do Brasil eram objeto de programação anual por ocasião da aprovação do chamado orçamento monetário na realidade tosca programação das operações ativas do Banco do Brasil apesar do nome pomposo não era um orçamento nem conseguia programar a evolução dos agregados monetários mas dava a impressão de que a partir da programação das contas do Banco do Brasil as demais contas do balancete consolidado das autoridades monetárias estariam sob controle Na prática uma vez aprovado pelo Conselho Monetário Nacional o orçamento podia ser sob alguns aspectos apenas mais um instrumento de pressão sobre as diversas carteiras do Banco do Brasil uma vez que os tetos aprovados para as diversas contas tornavamse argumentos para a concessão de crédito 10Para estudos empíricos acerca da endogeneidade da oferta de moeda vejase Cardoso 1977 Contador 1978 Marques 1983 e Carneiro e Fraga Neto 1984 Sobre o uso dos controles de crédito como instrumento de política econômica na economia brasileira ver Coates 1985 11Para detalhes da quebra e da intervenção vejase Assis 1983 p 63 e seguintes Os gastos envolvidos nas diversas intervenções e fusões administradas pelo Banco Central no período seriam na realidade suficientes para tornar difícil qualquer política restritiva Talvez ainda mais importante entretanto tenha sido a mudança de postura do governo depois do tumulto em torno da quebra do Halles conforme se argumenta a seguir No caso de alguns dados estatísticos os valores mencionados no texto podem diferir marginalmente dos incluídos no anexo estatístico em vista de processos de revisão 12Ver discussões da política salarial em Bacha 1978 e Carvalho 1982 13A posição de caixa do Tesouro passou de um saldo de Cr295 milhões em 1973 para Cr3882 milhões em 1974 O aumento do débito do Banco Central junto ao público só serviu para aumentar a posição credora do Tesouro junto às Autoridades Monetárias e não para financiar maiores déficits Estimandose as necessidades de financiamento do setor público na forma discutida na seção 4 a seguir concluise que em 1974 houve um déficit global nas contas consolidadas do governo da ordem de 08 do PIB o que corresponde a uma redução de 22 pontos percentuais sobre o valor estimado para 1973 14O consumo industrial de energia elétrica no eixo RioSPaulo que era então um importante indicador de evolução da conjuntura passou a cair em termos de 12 meses a partir de dezembro de 1974 depois de ter crescido 163 um ano antes Os resultados da recessão industrial que só foram conhecidos de fato ao final do primeiro trimestre de 1975 eram alarmantes pelos indicadores parciais publicados pela imprensa 15A mudança gradual do papel da política de estabilização nas prioridades do governo Geisel são analisadas em Carneiro 1986 16Ver Simonsen 1988 p19 Este número corresponde a 20 do déficit no ano de 1974 e era suficiente para tornar constante a relação dívidaexportações a partir de 1976 17Ver Simonsen 1988 p18 18O discurso do Presidente Geisel ao final de 1975 concentrouse mais em mostrar que não havia clima de recessão do que em mencionar a nova ofensiva contra a inflação Na reunião do CDE de 14 de janeiro de 1976 para a fixação dos objetivos da política econômica para o ano foram renovadas as prioridades de investimentos apoiadas no II PND e o principal instrumento para conter a deterioração do balanço de pagamentos a curto prazo era o racionamento de importações sob o regime do Decretolei no 142875 19A mesma expressão é utilizada na Exposição de Motivos 00177 de 24 de janeiro de 1977 que aprovou as diretrizes da política de curto prazo para 1977 20Discurso na Escola de Guerra Naval 22 de outubro de 1976 21Para uma análise das consequências da repressão sistemática dos preços públicos no período vejase Werneck 1986c 22Jornal do Brasil 12577 citado por Assis 1983 p 116 Este é na realidade um princípio elementar de regulamentação bancária mas que teve de ser anunciado solenemente como forma de evidência de que a política de tolerância das autoridades monetárias com a piramidação financeira terminava 23O episódio está magistralmente tratado em Góes 1978 que o analisa no contexto mais geral do processo decisório que caracterizou o governo Geisel 24O II PND foi enviado ao Congresso Nacional na forma de uma mensagem presidencial n 430 de 10 de setembro de 1974 e aprovado na forma de lei n 6151 de 6 de dezembro de 1974 por congressistas em final de mandato Segundo as regras de então não encontrou obstáculos à sua aprovação 25II PND capítulo III p 37 26II PND p 16 27A Resolução 28974 do CMN exigiu que importações de bens sujeitas a tarifas de mais de 55 fossem pagas à vista os Decretoslei no 1334 e no 1364 elevaram em 100 as tarifas de cerca de 2000 bens Em 1975 ampliouse a exigência de pagamento à vista das importações e criouse pela Resolução 331 de 6 de julho um depósito compulsório por seis meses correspondente ao valor em cruzeiros das importações Em 197576 este depósito correspondia a um custo financeiro nominal da ordem de 40 do valor das importações Finalmente ao final de 1975 foi simplesmente proibida a importação de mais de mil itens classificados como supérfluos tratandose ainda de centralizar o poder de conceder isenções do imposto de importação Vejase Dib 1985 cap 2 e apêndice II 28Baumgarten e Cunha 1977 analisam os objetivos e os instrumentos da política industrial pós1974 Observam os autores que a partir de 1974 através da Resolução 35 do CDI a substituição de importações passa a ser o primeiro critério para o enquadramento de projetos no regime do CDI O papel do CDI foi especialmente importante em 1974 e 1976 Em 1976 o valor dos investimentos nos projetos aprovados pelo CDI atingiu a cifra recorde de 62 do PIB caindo bruscamente para menos de 1 do PIB até o final da década 29O principal instrumento legal era o Decretolei no 113770 A partir de 1976 a isenção de imposto sobre a importação e sobre produtos industriais adquiriu maior importância Finalmente a limitação da correção monetária a 20 ao ano concedida pelo Decretolei no 145276 certamente resultou ser uma fonte importante de doação de recursos aos que foram financiados pelo BNDE 30Ver Lago Almeida e Lima 1979a 31Ver Velloso 1982 32Até 1978 antes do segundo choque as importações totais se haviam reduzido para 68 do PIB 33Ver Carneiro 1987c p 217 e seguintes para uma apresentação da metodologia e das séries 34No final dos anos 1970 quando os incentivos de mercado ao endividamento externo do setor privado foram sendo dominados pela incerteza crescente tanto no que dizia respeito a taxas de juros quanto às perspectivas de desvalorização cambial e às possibilidades de refinanciamento do principal foram criados incentivos adicionais na forma da Resolução 432 e da Instrução 230 que permitiam a firmas e bancos respectivamente depositarem moeda estrangeira no Banco Central como hedge contra suas dívidas em moeda estrangeira Tais depósitos foram um instrumento prático de estatização da dívida externa CAPÍTULO 13 Ajuste externo e desequilíbrio interno 19801984 Dionísio Dias Carneiro e Eduardo Marco Modiano1 1 Introdução A duplicação dos preços do petróleo e a elevação das taxas de juros internacionais no início dos anos 1980 tornaram mais custoso e mais prolongado o processo de ajuste da oferta doméstica iniciado na segunda metade da década anterior Em contraste com o que se seguiu ao primeiro choque em meados de 1980 foram sentidos os primeiros sinais de escassez de financiamento externo A dificuldade de renovação de empréstimos evidenciava que já não havia disposição dos credores internacionais para financiar um ajuste sem pesados custos internos no curto prazo Na medida em que a comunidade financeira internacional perdia confiança nos benefícios para as contas externas que adviriam das políticas expansionistas adotadas a partir de 1979 pelo ministro Antônio Delfim Netto tornavase mais difícil obter recursos externos novos para cobrir o desequilíbrio do balanço de pagamentos No final de 1980 em consequência de um déficit em conta corrente de US127 bilhões e da escassez de financiamento externo as reservas cambiais brasileiras haviam caído cerca de US3 bilhões Do final de 1980 a meados de 1984 as linhas gerais de política macroeconômica passaram a ser ditadas pela disponibilidade de financiamento externo O espaço de manobra no plano econômico gerado pela disponibilidade de financiamento externo em 1979 e 1980 foi parcialmente desperdiçado pelas políticas de 1980 Entretanto o tempo era um fator importante para o ajuste estrutural uma vez que os elementos mais importantes da estratégia de longo prazo do final da década de 1970 não estavam ainda consolidados Apesar dos repetidos anúncios de cortes no orçamento público os investimentos relacionados à exploração de petróleo à substituição de energia na indústria e no transporte à substituição de importações de insumos básicos e nas atividades voltadas para a exportação não só prosseguiram como foram incluídos na lista de prioridades do terceiro Plano Nacional de Desenvolvimento III PND Talvez a consequência mais importante do fracasso das políticas adotadas no período 197980 no combate à inflação e na redução do déficit em conta corrente do balanço de pagamentos tenha sido a perda de confiança no gerenciamento de curto prazo da economia Como resultado o discurso oficial nos anos seguintes foi marcado por uma demonstração contínua de fé ortodoxa nos controles de demanda como forma de lidar com a inflação Uma política monetária tradicional coadjuvada pela restrição ao crescimento do crédito seria um instrumento eficaz no controle das pressões inflacionárias apesar da resistência da economia indexada a responder da forma desejada aos controles monetários A preocupação contínua com o tamanho da base monetária lado a lado com os altos níveis de taxas de juros internas para induzir a captação privada de empréstimos no exterior resultou numa desastrosa política de financiamento das necessidades do setor público através de vendas cada vez mais volumosas de títulos do governo ao setor privado Este capítulo analisa a complexa transição do início do governo Figueiredo quando se completava o ajuste otimista do período Geisel para a explosão de desequilíbrios internos que caracterizou o final do ciclo militar Em seguida a esta introdução na seção 2 são analisadas as políticas restritivas adotadas a partir de outubro de 1980 que provocaram em 1981 o primeiro declínio do PIB real brasileiro no pós guerra Na seção 3 destacase a frustração do ajustamento externo em 1982 e o início das conversações com o Fundo Monetário Internacional FMI A seção 4 discute o sucesso do ajustamento externo e os desequilíbrios internos que caracterizaram o ano de 1983 assim como o difícil processo de negociações com o FMI analisado em detalhes em Carneiro 1988 O relaxamento da restrição externa e a recuperação do crescimento da economia brasileira que marcaram o ano de 1984 constituem o tema principal da seção 5 Finalmente a seção 6 conclui este capítulo enfatizando o agravamento dos desequilíbrios internos que nortearão a política econômica nos anos posteriores 2 Recessão sem Fundo 19812 A política macroeconômica que prevaleceu em 1981 e 1982 foi basicamente direcionada para a redução das necessidades de divisas estrangeiras através do controle da absorção interna3 A lógica dessa política é fazer com que a queda da demanda interna tome as atividades exportadoras mais atraentes ao mesmo tempo que reduz as importações O grau de sucesso dessa estratégia na redução do hiato de recursos reais depende obviamente da intensidade da recessão resultante Dada uma redução da absorção interna quanto menor for a queda do PIB menor a necessidade de transferência de recursos reais do exterior medida pelo excesso de importações sobre as exportações de mercadorias e serviços não fatores Políticas de reorientação das despesas contribuem para ajustes de curto prazo mais eficientes porque geram menores perdas de produto No caso brasileiro o aumento dos preços internos dos derivados de petróleo estimularia diretamente a substituição No entanto não era possível contar com substanciais desvalorizações reais da taxa de câmbio para favorecer as atividades exportadoras devido à memória recente da tentativa frustrada de desvalorização de dezembro de 1979 e também porque se acreditava que as exportações estavam limitadas não pela capacidade mas pela recessão mundial Assim grande parte da reorientação das despesas para os bens comerciáveis dependeria do investimento do governo e da disponibilidade de financiamento intermediado pelas agências do governo como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico BNDE A política a ser seguida baseavase na contenção salarial no controle de gastos do governo e no aumento da arrecadação na elevação das taxas de juros internas e na contração da liquidez real sem abrir mão do tratamento especial dado às atividades de exportação energia e agricultura e às pequenas empresas A prefixação das correções monetária e cambial de 1980 já desacreditada somente foi abandonada formalmente em novembro com o anúncio de que a correção monetária acompanharia o índice de preços ao consumidor restrito INPC do IBGE e que a correção cambial equipararia o diferencial entre as taxas de inflação interna e externa A política restritiva começou a ser implementada em outubro de 1980 com uma modificação na política salarial que resultaria numa queda mais acentuada do salário real para as faixas de renda mais altas4 No que tange ao controle das despesas públicas no sentido amplo a nova política econômica estabeleceu em dezembro de 1980 i a limitação do crescimento nominal dos investimentos das empresas estatais em 66 ii a centralização pelo Tesouro da administração dos recursos orçamentários dos órgãos da administração direta e iii o controle semanal do saldo das contas dos diferentes órgãos governamentais pela Comissão de Programação Financeira do Ministério da Fazenda A arrecadação do governo seria beneficiada pela elevação da carga tributária através do artifício da correção das faixas do imposto de renda em 55 ou seja abaixo da inflação e da elevação do imposto sobre operações financeiras IOF de 15 para 25 nas operações de câmbio para importação além da criação do IOF de 15 para as importações da Zona Franca de Manaus Em contrapartida o incentivo fiscal do créditoprêmio para a exportação de manufaturados que havia sido extinto com a desvalorização cambial de dezembro de 1979 foi restabelecido A liberação das taxas de juros dos empréstimos dos bancos comerciais e de investimento exceto para o setor agrícola e nas linhas especiais de crédito para os exportadores iniciada em novembro de 1980 foi completada em janeiro de 1981 A contração da liquidez real da economia contou ainda com a fixação de um teto de 50 acima dos saldos registrados em dezembro de 1980 para a expansão nominal dos empréstimos ao setor privado e para o crescimento nominal dos meios de pagamento e da base monetária Ainda em dezembro de 1980 as operações de crédito através de cheque especial foram limitadas a Cr50000 por contrato Para o primeiro trimestre de 1981 os limites à expansão do crédito foram ainda mais restritivos 5 para os bancos comerciais e de investimento e 15 para o Banco do Brasil O tratamento especial dado à agricultura incluía ainda a elevação em janeiro de 1981 da parcela dos depósitos à vista que deveria ser aplicada compulsoriamente no crédito rural de 15 para 20 No que tange às médias pequenas e microempresas foram majoradas as contribuições dos depósitos à vista dos bancos comerciais para o financiamento compulsório de seu capital de giro O efeito das políticas restritivas de demanda na taxa de inflação foi praticamente nulo contrapondose ao otimismo deflacionista que se inspirava nas estimativas de Lemgruber 1974 e Contador 1977 1982 A rigidez da inflação em 1981 reforçaria a tese inercialista que emergia dos resultados analíticos de Resende e Lopes 1981 1982 Lopes 1983 e Modiano 1983a entre outros Em termos da taxa de 12 meses os preços industriais IPAOG Produtos Industriais e consequentemente também o índice geral de preços IGPDI se aceleraram ininterruptamente até meados de 1981 atingindo um pico de aproximadamente 120 e declinando para o patamar de 100 no final do ano A desaceleração da inflação foi devida em grande parte a um choque agrícola favorável que conteve a elevação dos preços agrícolas IPAOG Produtos Agrícolas ao longo do ano de 1981 em apenas 707 em contraste com o aumento de 997 registrado para os preços industriais A queda dos preços relativos da agricultura em 1981 resultou simultaneamente de um aumento da safra de vários produtos de abastecimento interno e de um declínio nos preços internacionais dos produtos exportáveis Apesar da deterioração dos termos de troca devido à queda de 37 no preço das exportações e ao aumento de 91 nos preços das importações em função da elevação de 19 no preço médio pago pelo barril de petróleo importado verificouse uma reversão significativa na balança comercial em 1981 Após um déficit de US28 bilhões em 1980 a balança comercial registrou em 1981 um superávit de US12 bilhão As exportações alcançaram 85 do PIB configurando um avanço de 05 ponto percentual em relação ao ano anterior e o coeficiente de importação caiu 12 ponto percentual passando de 92 do PIB em 1980 para 80 do PIB em 1981 A escalada das taxas de juros internacionais de quase 4 pontos percentuais em 1981 adicionou porém cerca de US3 bilhões ao pagamento dos juros da dívida externa que absorvia então 40 das receitas com exportações Nestas condições a captação externa de recursos elevou em 14 a dívida de médio e longo prazos e permitiu ainda um aumento das reservas cambiais de US600 milhões A economia brasileira passava por uma recessão profunda que culminou com uma queda de cerca de 10 no produto industrial em 1981 liderada pelas retrações de 263 e 19 nos segmentos de bens de consumo duráveis e de bens de capital respectivamente Um declínio no PIB real foi observado pela primeira vez no pósguerra A funcionalidade da recessão era questionada mesmo pelas forças conservadoras pois o capital estrangeiro tornavase mais escasso para o país como indicou o aumento modesto nas reservas internacionais registrado no final do ano Lopes e Modiano 1985 analisando uma série trimestral dessazonalizada do PIB demonstraram que a recessão de 1981 se iniciou logo nos dois primeiros trimestres do ano Com base neste resultado questionaram a tese de que a recessão tenha sido causada pelo aperto monetário que se verificou desde o último trimestre de 1979 Em caráter especulativo sugeriram que a combinação do aumento das taxas de empréstimos das financeiras em fins de 1980 com a redução dos prazos de financiamento do crédito direto ao consumidor de meados de 1979 e a mudança da política salarial de dezembro de 1980 em detrimento das faixas de renda mais altas teriam sido os principais elementos da queda da demanda de bens duráveis Bonomo 1986 explica alternativamente a recessão de 1981 como uma reversão natural do movimento de antecipação de consumo de bens duráveis em 1980 induzido pela prefixação da correção monetária pelo tabelamento de juros vigentes naquele ano Podese questionar o motivo pelo qual o governo brasileiro não recorreu ao FMI buscando apoio para as políticas de estabilização implementadas após outubro de 1980 Bacha 1983 estimou que a decisão de não recorrer ao suporte do FMI para um programa de estabilização aparentemente ortodoxo deve ter custado ao país cerca de US400 milhões na conta de juros O governo parecia temer que o FMI demandasse drásticas mudanças em sua estratégia de ajustamento estrutural de longo prazo e restringisse sua liberdade em relação à política econômica O mais provável porém é que a ida ao Fundo fosse considerada uma demonstração de fraqueza que minaria o já frágil suporte político do governo 3 Da Recessão ao Fundo 1982 Em 1982 o Brasil exportou US3 bilhões menos do que no ano anterior A recessão mundial acentuada pelo comportamento defensivo dos dirigentes das economias centrais e pelo declínio da capacidade de importar de alguns dos novos consumidores de manufaturas brasileiras frustrara a tentativa de produzir um significativo superávit comercial no segundo ano da nova política econômica O prosseguimento da substituição de bens intermediários tanto petróleo como não petróleo e o declínio da demanda de bens de capital induzida pela recessão permitiram uma queda nos gastos com importações de mais de US26 bilhões e consequentemente uma redução inferior a US500 milhões no superávit da balança comercial Contudo o aumento de US22 bilhões no pagamento de juros tornou o déficit em conta corrente virtualmente independente da absorção doméstica Novas restrições ao crescimento econômico tornaramse inevitáveis principalmente depois do anúncio da moratória mexicana em agosto de 19825 Em agosto de 1982 ficou claro que não seria possível convencer os banqueiros privados a continuarem dobrando suas apostas na estratégia brasileira de ajustamento a longo prazo Assim em setembro do mesmo ano por ocasião da reunião de Toronto a equipe econômica brasileira iniciou conversações com a diretoria do FMI e com os bancos privados Esperavase que na reunião anual em Toronto fossem aumentados recursos financeiros do Fundo e do Banco Mundial e na medida em que um maior volume de recursos fosse colocado à disposição do Brasil seria possível demonstrar à opinião pública que novas condições prevaleciam nos mercados financeiros internacionais e que o financiamento multilateral poderia substituir o então mais caro e escasso financiamento privado No entanto o aumento dos recursos financeiros das agências multilaterais não se materializou No quadro doméstico o cenário político não era menos complexo Em meio ao debate acerca da legislação para as eleições gerais de novembro de 1982 o governo tentava convencer os eleitores de que não fazia sentido recorrer ao FMI O argumento usado era a impossibilidade de obter recursos suficientes do Fundo para suprir as necessidades de financiamento do país uma vez que o déficit em conta corrente em 1982 superava US163 bilhões Dado que estava em jogo o controle sobre o novo Congresso e o Colégio Eleitoral que escolheria o primeiro presidente civil após 20 anos de regime militar o governo procurava evitar que a ida ao FMI se tornasse um item da campanha eleitoral O financiamento do balanço de pagamentos brasileiro para a segunda metade de 1982 e para o ano seguinte faria parte de uma operação de emergência que havia começado com o auxílio ao México A operação envolvia fundos de emergência para evitar suspensões unilaterais de pagamentos por carência de divisas estrangeiras um acordo com o FMI baseado em um programa para reduzir as necessidades de divisas do país e o comprometimento dos credores privados com pacotes financeiros que contribuíssem para impedir a completa ruptura do sistema financeiro internacional Fundos de emergência para o resto de 1982 materializaramse na forma de empréstimos de US15 bilhão do governo americano de US500 milhões do Banco de Compensações Internacionais BIS e algo em torno de US23 bilhões em recursos de curto prazo de grandes credores privados com o entendimento de que para o ano seguinte o fluxo máximo de financiamentos disponíveis ao Brasil seria de US106 bilhões dos bancos privados incluindo o refinanciamento e US2 bilhões das instituições multilaterais A seriedade do ajustamento às novas restrições externas foi reforçada por uma reunião extraordinária do Conselho Monetário Nacional que votou um compromisso formal de austeridade para o ano seguinte sob a forma de um documento chamado Programa para o Setor Externo em 19836 As assertivas básicas do documento eram de que as exportações deveriam crescer 95 e as importações deveriam ser reduzidas em 17 de forma a gerar um superávit comercial de US6 bilhões para 19837 Apesar dos desmentidos oficiais era óbvio que o programa seria a base para um acordo com o FMI Embora fosse evidente que a supervisão do FMI seria uma condição necessária para o funcionamento do novo esquema de financiamento externo e que um reescalonamento dos pagamentos era inevitável a proximidade das eleições gerais marcadas para 15 de novembro obrigou o governo a adiar o pedido formal de auxílio ao FMI até o final de novembro A frustração do ajustamento externo a falta de progresso nas condições internas e as incertezas quanto às perspectivas futuras da economia desempenharam um papel importante na derrota do partido do governo nas eleições de novembro apesar deste ter mantido a questão controversa da supervisão do FMI fora da campanha A renegociação da dívida externa era a questão predileta dos partidos da oposição durante esta campanha eleitoral e permaneceu em voga até as eleições presidenciais dois anos depois Três dias após as eleições de novembro o ministro do Planejamento admitiu que o Brasil já vinha adotando uma política econômica dentro dos padrões recomendados pelo FMI8 Em 20 de novembro foi feito o anúncio oficial de que um programa seria submetido à consideração do Fundo e que havia sido obtido um acordo formal com os bancos privados sobre quatro pontos ou projetos como passaram a ser chamados 1 os bancos credores deveriam conceder novos financiamentos de US44 bilhões aos tomadores de empréstimos especificados pelo Banco Central 2 as amortizações relativas a 1983 seriam refinanciadas por oito anos 3 as linhas de crédito interbancário relacionadas ao crédito comercial então estimado em aproximadamente US10 bilhões seriam renovadas e 4 as linhas de crédito interbancário para bancos brasileiros operando no exterior seriam restabelecidas aos níveis de 30 de junho de 1982 O anúncio formal de um programa com o FMI definiu um novo modelo para as negociações da dívida externa brasileira Quando cessou o fluxo de empréstimos voluntários o principal desafio dos negociadores deixou de ser apresentar perspectivas favoráveis para o futuro da economia e emitir sinais de austeridade para os credores privados e passou a ser a submissão das políticas macroeconômica e comercial ao crivo do FMI As negociações passaram a ser realizadas com a equipe do Fundo com o entendimento de que os bancos endossariam os resultados A economia brasileira ficou praticamente estagnada em 1982 com um crescimento real do PIB de apenas 08 O produto real da agropecuária que crescera 96 e 8 em 1980 e 1981 contraiuse 02 em 1982 A produção industrial permaneceu nos mesmos níveis registrados em 1981 A taxa de inflação em 1982 também não se modificou em relação ao ano anterior A variação em 12 meses do IGPDI acumulou 100 no final de 1982 O efeito deflacionário dos preços agrícolas que no atacado aumentaram 89 foi neutralizado não apenas pela resistência à queda da inflação industrial como também pela pressão oposta exercida pela correção dos preços relativos em favor dos derivados de petróleo e outros preços públicos9 4 O Fundo da Recessão 1983 Em 6 de janeiro de 1983 o governo brasileiro submeteu a primeira carta de intenções ao FMI Nos 24 meses subsequentes sete cartas de intenções foram examinadas pela direção do Fundo Esta troca constante de metas e normas entre os funcionários do governo brasileiro e o FMI ilustra as dificuldades envolvidas em adaptar o receituário da instituição a uma economia em desenvolvimento altamente indexada na qual o setor público não somente era responsável por algo entre 30 e 50 do investimento global como também intermediava grande parte do investimento privado através da administração de importantes fundos compulsórios de poupança Os critérios de desempenho da economia brasileira para 1983 acordados com o FMI incorporavam algumas modificações em relação ao Programa para o Setor Externo em 1983 Foi determinado um teto de US69 bilhões para o déficit em conta corrente do balanço de pagamentos o que requereria um superávit comercial de US6 bilhões e exportações líquidas de bens e serviços de US4 bilhões em contraste com a cifra negativa de US28 bilhões do ano anterior O superávit comercial resultaria de um aumento de 12 das exportações e de uma redução de US25 bilhões nas importações do ano anterior Um corte indolor da ordem de US15 bilhão resultante da substituição do petróleo e outras importações amenizaria o impacto recessivo do controle das importações No que tange às metas internas projetouse uma taxa anual de inflação de 78 que seria alcançada via cortes na despesa interna provocados pela contração dos gastos do governo Pretendiase reduzir as necessidades nominais de financiamento do governo como proporção do PIB e o crédito interno líquido das autoridades monetárias à metade do valor estimado para o ano anterior O ajuste externo seria favorecido por desvalorizações do cruzeiro superiores à taxa mensal de inflação em 1 ponto percentual Foram programadas reduções drásticas nos gastos das empresas estatais de tal forma que as restrições às importações afetariam o setor público mais intensamente que o setor privado Os resultados medíocres apresentados pela balança comercial nos dois primeiros meses do ano assim como as dificuldades práticas para a consecução das desvalorizações reais mensais levaram ao abandono do gradualismo na política cambial Assim em 21 de fevereiro de 1983 enquanto a primeira carta de intenções era examinada pelo comitê executivo do FMI o governo brasileiro desvalorizou o cruzeiro em 30 Este percentual segundo Batista Jr 1983 correspondia à valorização do cruzeiro em termos da taxa efetiva de câmbio entre dezembro de 1979 e dezembro de 1982 Uma segunda carta de intenções em 24 de fevereiro adaptaria as metas e critérios de desempenho para 1983 ao novo pacote de medidas anunciado pelo governo O pacote incluía também novos programas de crédito com o propósito de estimular as exportações e facilitar a substituição de importações Contrapondose às especulações quanto a uma segunda maxidesvalorização do cruzeiro o governo determinou que a correção cambial no trimestre a partir de março não poderia ultrapassar a taxa de inflação medida pelo IGP DI acumulada no mesmo período Assim entre março e novembro de 1983 o cruzeiro foi desvalorizado em 140 enquanto a taxa de inflação acumulou 149 Visando a impedir que a maxidesvalorização cambial fosse integralmente neutralizada com o repasse generalizado aos preços e salários por uma aceleração compensatória da inflação tal como ocorrera em 1980 o governo promoveu uma desindexação parcial dos salários Assim em janeiro de 1983 através do Decretolei no 2012 o governo eliminou o adicional de 10 que incidia sobre a variação semestral do INPC para os assalariados com renda até três salários mínimos e reduziu os coeficientes de repasse na faixa salarial de três a 10 salários mínimos Ainda na tentativa de reduzir a indexação salarial o governo propôs mais três mudanças na lei salarial ao longo de 1983 A mais ambiciosa destas propostas o Decretolei no 2045 que contemplava um coeficiente uniforme de repasse de 80 da variação semestral do INPC para todas as faixas salariais não pôde se beneficiar do artifício do decurso de prazo para sua aprovação pois foi rejeitada pelo Congresso Nacional em fins de outubro O governo então através do Decretolei no 2065 reduziu mais uma vez os percentuais de correção automática para as faixas entre três e 15 salários mínimos e eliminou a livre negociação a partir de 20 salários mínimos Assim a desindexação salarial e a aceleração inflacionária resultaram numa queda de cerca de 15 no poder de compra dos salários ao longo do ano de 1983 Uma combinação de fatores tais como a recessão interna a queda do salário real a desvalorização cambial as quedas do preço internacional do petróleo e da taxa de juros e a recuperação da economia norteamericana que se fortaleceu durante a segunda metade do ano contribuiu para o cumprimento de praticamente todas as metas relacionadas com as contas externas em 1983 No final do ano foi anunciado um superávit comercial de US65 bilhões superando a meta em quase 10 O déficit em conta corrente do balanço de pagamentos que ficou em US68 bilhões ou 27 do PIB foi o sinal mais importante do sucesso do ajustamento externo e do controle da escalada da dívida Apesar desses resultados o Brasil acumulou atrasos de pagamentos da ordem de US23 bilhões devido a dificuldades na conta de capitais uma vez que a entrada líquida de capitais estimada como parte do programa não se materializou O superávit comercial resultou entretanto de um aumento de apenas 85 nas exportações ao invés dos 12 projetados e de uma queda mais acentuada nos gastos com importações de cerca de US4 bilhões em contraste com os US25 bilhões projetados em relação ao ano anterior A redução de 204 nas despesas com importações para 68 do PIB foi obtida graças à queda de 47 no preço internacional do petróleo aos controles diretos à contração da demanda induzida pela recessão além da substituição de longo prazo permitida pela entrada em operação de vários projetos novos desenvolvidos no âmbito do programa de investimentos pós1975 Este programa de investimentos seria responsável por uma redução permanente do coeficiente de importações que se observou com a recuperação da economia nos anos seguintes Os menores preços a maior produção interna e a substituição da gasolina e do óleo combustível explicam o decréscimo de 97 nos gastos com importação de petróleo O efeito renda e a maior produção doméstica foram os fatores dominantes que explicam a queda de 20 nas importações de bens de consumo especialmente trigo e de 32 nas demais importações O sucesso do ajustamento externo foi porém acompanhado de negociações complexas entre as autoridades brasileiras e os funcionários do FMI em torno das metas internas O fato dominante das dificuldades era o comportamento da taxa de inflação Dois choques conspiraram contra a fé monetarista no poder dos cortes no orçamento e das políticas monetárias contracionistas em reduzir a inflação em 1983 a maxidesvalorização do cruzeiro e a elevação dos preços agrícolas10 Embora o impulso inicial possa ser atribuído à desvalorização cambial a aceleração inflacionária foi posteriormente sustentada por um choque agrícola O choque agrícola comparável em intensidade àquele provocado pela maxidesvalorização pode ser explicado em parte pela política de exportação de produtos agrícolas adotada pelo governo no primeiro semestre do ano No afã de viabilizar as metas de exportação o país vendeu produtos agrícolas de que não dispunha inclusive porque os acidentes climáticos do ano terminaram por reduzir em cerca de 8 a tonelagem de grãos produzidos O quadro altista nos gêneros alimentícios foi agravado pelos efeitos da maxidesvalorização sobre os insumos importados e custos de transporte pelo controle da importação de insumos pela modificação nos esquemas de crédito rural e finalmente pelas quebras de safra que resultaram de uma combinação desastrosa de enchentes no Sul e secas no Nordeste O produto real das lavouras cresceu 17 em 1983 em relação ao ano anterior devido à expansão das culturas de exportação café 74 soja 13 e canadeaçúcar 16 No que tange ao abastecimento interno porém foram registradas quedas nas colheitas de arroz 21 feijão 46 mandioca 10 e milho 14 No atacado a elevação dos preços agrícolas medidos pelo IPA OG Produtos Agrícolas da FGV acumulou 3358 em 1983 em contraste com o aumento dos preços industriais medidos pelo IPA OG Produtos Industriais da FGV que ficou em 2005 Assim as relações de troca entre a agricultura e a indústria moveramse na direção da agricultura cerca de 45 Dado o peso de 60 atribuído aos preços por atacado a variação em 12 meses do IGPDI medida oficial da inflação atingiu 211 em dezembro de 1983 No mesmo período o INPC que corrigia os salários registrou variação de apenas 178 devido aos menores efeitos diretos da maxidesvalorização do cruzeiro A aceleração progressiva da inflação desde o início do ano foi suficiente para desacreditar a taxa anual projetada na qual se baseavam os valores nominais das metas fiscais e monetárias Dada a indexação do serviço da dívida pública a redução das necessidades nominais de financiamento do setor público se tornava virtualmente impossível não configurando qualquer restrição factível para os gastos públicos De fato três meses após a aprovação formal do programa de estabilização o FMI suspendeu o desembolso de US2 bilhões por causa do fracasso do governo brasileiro em obter a redução projetada para os déficits nominais Fizeramse necessárias sucessivas negociações no decorrer do ano para adaptar o conceito de necessidades de financiamento utilizado pelo FMI às complexidades do setor público financeiro brasileiro e à existência de uma ampla dívida pública indexada A variável fiscal utilizada pelo Fundo era altamente sensível à inflação mesmo quando sua trajetória era comparada com a evolução do PIB A relação entre as necessidades nominais de financiamento do setor público e o PIB aumentava num contexto de aceleração inflacionária tal como em 1983 pois a correção nominal do saldo da dívida refletia a variação dos preços ao longo do ano enquanto o PIB espelhava o nível médio de preços no ano Em novembro de 1983 o governo submeteu a quarta carta de intenções ao FMI uma vez que as metas para a política fiscal da terceira versão do programa de setembro eram baseadas na desindexação salarial do Decretolei no 2045 rejeitado pelo Congresso Nesta carta foi introduzido um novo critério de desempenho fiscal denominado resultado operacional do setor público No conceito operacional são deduzidas das necessidades de financiamento do setor público nominais as parcelas correspondentes às correções monetária e cambial do estoque da dívida Tornouse possível então distinguir duas fontes de necessidades de financiamento o excesso de despesas sobre receitas e o aumento na dívida decorrente da indexação11 Com o novo critério o déficit público cairia de 62 do PIB em dezembro de 1982 para 3 do PIB no final de 1983 O ajuste das finanças públicas contou com cortes significativos nas despesas de capital das empresas estatais o que contribuiu para que a taxa de investimento da economia caísse do patamar de 2324 do PIB vigente até 1982 para 199 do PIB em 1983 As incertezas quanto aos efeitos líquidos da negociação prolongada com o FMI acerca da medida apropriada para o déficit público aliado ao conhecimento geral de que a economia operava com reservas cambiais negativas estimularam a demanda de ativos denominados em dólar durante o ano O severo controle do câmbio porém impediu que as fortes especulações contra o cruzeiro durante a maior parte do ano resultassem em fugas maciças de capitais como ocorreu em outros países latinoamericanos Outro elemento importante de proteção contra o risco de desvalorização que não pressionava a conta de capital do país foi a existência de títulos do governo indexados à variação cambial O excesso de demanda de dólares oriundo da expectativa de desvalorização foi direcionado para os títulos do governo com cláusula de correção cambial contribuindo para o controle do ágio da cotação do dólar paralelo durante o período de maior incerteza No auge da especulação em meados de 1983 quando se supunha que outra maxidesvalorização do cruzeiro era iminente a diferença entre as cotações do dólar oficial e paralelo chegaria a 100 Três fatores contribuíram para a redução do diferencial entre as cotações do dólar nos mercados paralelo e oficial entre a segunda metade de 1983 e primeiro trimestre de 1984 Em primeiro lugar tem se a melhora gradual da balança comercial Em agosto o superávit comercial acumulado no ano já estava acima de US4 bilhões e em outubro excedia US5 bilhões com saldos mensais superiores a US500 milhões Em segundo lugar verificouse nas sucessivas rodadas de negociações entre o governo e os funcionários do FMI que as regras do jogo eram menos rigorosas do que se havia imaginado com dois providenciais waivers aprovados pela diretoria do Fundo Finalmente os intermediários financeiros domésticos incorreram em perdas substanciais quando suas carteiras de ativos indexados em dólar tiveram que ser financiadas a uma taxa de juros superior à correção cambial mensal A fragilidade do sistema aumentava na medida em que diminuía o risco de estrangulamento nas contas externas brasileiras ao longo do ano Além disso paralelamente restauravase a confiança na política cambial o que reduzia a demanda especulativa de ativos denominados em dólar No primeiro trimestre de 1984 com o fim da especulação contra o cruzeiro o governo socorreu o sistema financeiro trocando a maior parte dos títulos indexados em dólar por títulos indexados em cruzeiros absorvendo as perdas derivadas das especulações malsucedidas O produto industrial em 1983 caiu 59 em relação ao ano anterior configurando o fundo da maior recessão experimentada pelo setor industrial brasileiro de que se tem registro O emprego na indústria medido em termos da média anual do pessoal ligado à produção foi reduzido em 75 A recessão industrial liderada pela retração do setor de bens de capital 19 atingiu todas as categorias de uso A queda ininterrupta da produção de bens de capital entre 1981 e 1983 acumulou 55 acompanhando a queda da taxa de investimento da economia no período A produção de bens de consumo não duráveis pela primeira vez desde o início do processo recessivo em 1981 caiu 5 A retração da demanda de bens de consumo não duráveis pode ser explicada em parte pela queda do salário real observada a partir da maxidesvalorização de fevereiro de 1983 A queda da produção dos bens de consumo duráveis que havia liderado a recessão de 1981 ficou em apenas 1 em 1983 Este resultado pode ser atribuído aos níveis de produção excessivamente deprimidos com os quais o setor operava já no início de 1983 uma vez que a expansão registrada em 1982 recuperara apenas um terço da perda de 1981 Também em contraste com a recessão de 1981 a retração na categoria de bens intermediários foi consideravelmente menor 25 o que pode ser atribuído ao dinamismo das exportações em 1983 No que tange aos diversos gêneros da indústria a recessão de 1983 atingiu fortemente a maioria dos setores dinâmicos tais como minerais não metálicos mecânica material elétrico e de comunicações material de transporte metalurgia e química embora os setores menos dinâmicos tais como têxtil produtos alimentares vestuário e bebidas também tenham sido gravemente afetados pela queda do salário real e do nível de emprego As perdas mais significativas parecem ter ocorrido no terceiro trimestre do ano enquanto uma recuperação moderada mas constante podia ser detectada em alguns setores beneficiados pelo aumento vigoroso da demanda de exportações principalmente para o mercado norteamericano O aumento da produção de petróleo e os primeiros efeitos na demanda de bens intermediários e de capital provocados pela mudança dos preços relativos em favor da agricultura ajudaram a evitar uma perda de produto ainda maior Segundo as estimativas mais recentes do IBGE o PIB caiu em termos reais 29 em 1983 Com base também nestas estimativas a renda per capita a preços constantes acumulou uma perda de 11 entre o pico de 1980 e a depressão de 1983 No final de 1983 segmentos mais conservadores da sociedade defendiam o sucateamento do parque industrial brasileiro Baseados em estimativas grosseiras de proteção efetiva argumentavam que a industrialização durante o final da década de 1970 fora promovida artificialmente pela tecnocracia brasileira sem qualquer consideração por preços relativos ou vantagens comparativas Uma vez que a política promovida pelo FMI impedia que o governo alimentasse a demanda agregada a economia brasileira se deparava não com uma depressão mas com a purificação deflagrada pelas forças do mercado de uma indústria ineficiente O argumento perdeu credibilidade quando sob o impulso contínuo da demanda de exportações os setores mais artificiais da indústria brasileira mostraram uma recuperação vigorosa logo nos primeiros dois trimestres do ano seguinte 5 Com o Fundo sem Recessão 1984 Em 1984 pela primeira vez desde 1979 a restrição externa da economia brasileira mostrou sinais de relaxamento O vigor da recuperação norteamericana nos primeiros dois trimestres de 1984 foi de importância fundamental para o relaxamento da restrição externa e consequentemente para o desempenho da economia brasileira em 1984 Somente no primeiro semestre as exportações de aço aumentaram 40 aproveitandose do surto de importações que levou os Estados Unidos a aumentarem suas importações da América Latina nos primeiros cinco meses de 1984 em comparação com o mesmo período do ano anterior a uma taxa superior a 50 As exportações de manufaturados responderam ao reaquecimento do comércio mundial liderado pela recuperação norteamericana estimulando a demanda no setor industrial e via efeito multiplicador interindustrial no resto da economia Por outro lado o aumento violento nos preços agrícolas ao aumentar a renda do setor rural também propiciava maiores compras de bens intermediários e maquinaria da indústria Já no primeiro trimestre de 1984 havia sinais indubitáveis de recuperação da atividade industrial quando o nível de produção cresceu 4 pontos percentuais em relação ao primeiro trimestre de 1983 Além disso em 27 de fevereiro de 1984 a direção do FMI atendeu ao pedido brasileiro de novo waiver entendendo que o não cumprimento de diversos critérios de desempenho fora motivado pela interrupção na entrada de recursos externos por vários meses devido à suspensão do acordo com o Fundo e à demora em se obter financiamento externo adicional em 1983 Abriase espaço para a definição de metas domésticas menos restritivas na quinta carta de intenções de 15 de março Esta carta foi negociada sem maiores desacordos entre o governo brasileiro e o FMI e vigorou pelo prazo recorde de seis meses12 Porém a quinta carta incorporava a expectativa de que a inflação cairia para uma taxa equivalente à metade da taxa anual registrada em 1983 Assim em 28 de setembro através da sexta carta foi necessário solicitar nova alteração dos tetos devido ao descompasso entre a inflação efetiva e a projeção embutida nas metas quantitativas para setembro A produção industrial em 1984 cresceu 63 em relação ao ano anterior com a indústria de transformação apresentando expansão de 62 e a extrativa mineral registrando aumento de 305 O desempenho da indústria extrativa mineral decorreu basicamente da contínua expansão da produção de petróleo Em 1984 a produção doméstica média ficou em torno dos 470 mil barris diários o que configurava um aumento da ordem de 160 em relação aos níveis estáveis de extração registrados no período 197480 A combinação da redução do consumo de petróleo por unidade de produto induzida pelo aumento real do preços internos dos derivados com o crescimento da produção doméstica elevou a participação do petróleo nacional no consumo aparente de 21 em 1981 para 42 em 1984 Aliado ainda à queda do preço internacional o aumento da produção doméstica permitiu uma redução nas despesas de importações de petróleo da ordem de US4 bilhões no mesmo período No que tange à indústria de transformação o impulso inicial à recuperação de 1984 teve origem na expansão das vendas ao mercado externo e de insumos ao setor agrícola Por estas razões a recuperação foi liderada pelas indústrias mecânica metalúrgica e química que apresentaram crescimento respectivamente de 186 138 e 96 em 1984 No segundo semestre a demanda induzida pelos setores líderes da recuperação foi reforçada por um aumento das despesas de consumo graças à recomposição da renda rural e da classe média urbana A elevação da renda rural devida à expansão da agricultura de exportação e aos preços relativos mais favoráveis ao setor ampliou o consumo rural e se propagou para a renda urbana Além disso os reajustes salariais concedidos pela indústria ficaram acima das taxas prescritas pelas leis salariais especialmente naqueles setores afetados positivamente pela forte demanda de exportações Assim apesar da vigência do Decretolei no 2065 até outubro de 1984 quando a Lei no 7238 instituiu o repasse uniforme de 80 da variação semestral do INPC para todas as faixas acima de três salários mínimos o salário médio do pessoal ligado à produção industrial calculado pelo IBGE acabou praticamente acompanhando a variação anual dos preços ao consumidor em 1984 Além da recuperação do salário real o consumo foi ainda impulsionado a partir do terceiro trimestre do ano pela exacerbação das expectativas inflacionárias em função da própria demanda de recomposição das perdas salariais do boom nos mercados financeiros da política monetária frouxa e do aumento da frequência dos reajustes das tarifas públicas A antecipação de consumo ajudou portanto a disseminar a recuperação aos outros setores da indústria manufatureira Adquiriram progressivamente maior dinamismo ao longo do segundo semestre do ano os gêneros de material de transporte material elétrico plásticos papel e papelão e vestuário Finalmente com a exceção dos setores alimentício bebidas perfumaria e têxtil todos os demais gêneros da indústria exibiram taxas positivas de crescimento em 1984 Em termos das categorias de uso apesar da antecipação de compras do segundo semestre a produção dos bens de consumo duráveis fechou o ano de 1984 com uma queda de 75 em relação ao ano anterior Já a produção de bens não duráveis apresentou em 1984 um pequeno crescimento de 25 em linha com a recomposição salarial Após três anos seguidos de declínio a categoria dos bens de capital registrou a maior taxa de crescimento do ano 148 devido principalmente à demanda derivada dos setores agrícola e de produtos de exportação Impulsionado pela retomada da atividade industrial o PIB brasileiro cresceu em termos reais 54 em 1984 interrompendo o processo de encolhimento da renda per capita que se instalara com a recessão de 1981 Para este resultado também contribuiu a recuperação das lavouras cujo produto real se expandiu à taxa de 79 em 1984 após a evolução desfavorável do biênio 198283 Porém apesar do choque agrícola favorável liderado pelas lavouras de abastecimento interno tais como arroz 16 feijão 66 milho 13 e batata 22 não se verificou qualquer moderação do processo inflacionário No atacado os preços agrícolas variaram ao longo de 1984 na mesma proporção dos preços industriais A insensibilidade das taxas de inflação ao aumento da oferta agrícola era apenas mais um sintoma da indexação crescente da economia Segundo Modiano 1985 os preços agrícolas estavam fortemente atrelados à taxa de câmbio cujos reajustes a partir de novembro de 1983 se equiparavam mensalmente à correção monetária e à taxa de inflação do mês em curso e ao índice geral de preços através da política de correção dos preços mínimos Nestas condições os preços agrícolas se tornavam menos dependentes das condições de oferta e demanda e mais dependentes da inércia inflacionária A inflação medida pelo IGPDI da FGV acumulou uma variação de 2238 ao longo de 1984 o que configura razoável estabilidade em relação à taxa de 211 observada no ano anterior Verificouse também em 1984 uma saudável convergência das taxas anuais registradas pelos índices alternativos após o desalinhamento constatado com o choque inflacionário em 1983 O INPC do IBGE que indexava semestralmente os salários variou 2033 em contraste com 1791 em 1983 Durante o primeiro semestre do ano os índices gerais de preços mostraram uma desaceleração lenta devida a um comportamento mais favorável dos preços industriais e de algumas tarifas de serviços públicos A ação direta dos controles de preços e o baixo nível de atividade econômica amorteceram o ritmo inflacionário com o IPAOG Produtos Industriais da FGV chegando a registrar variação de apenas 68 em abril Dois fatores impediam uma queda mais acentuada da inflação o comportamento do INPC cuja aceleração refletia com atraso a inflação passada e mais elevada dos preços por atacado e anulava os efeitos amortecedores da política salarial vigente e a evolução dos preços agrícolas que após a repressão do final de 1983 voltaram a se acelerar no início de 1984 alcançando a taxa de 171 em abril A estabilidade das taxas mensais até agosto em torno de 10 ao mês reforçava o caráter inercial do processo inflacionário brasileiro e sua relativa invariância ao nível de atividade A generalização do entendimento do caráter inercial da inflação suscitou o aparecimento de sugestões de políticas visando a redução do nível de indexação da economia brasileira Dentre as mais ousadas destacaramse as propostas da moeda indexada de Arida e Resende 1985 e do choque heterodoxo de Lopes 1984 A moeda indexada pretendia alcançar a desindexação através da indexação plena da economia com a circulação paralela de uma moeda que tivesse paridade fixa com a ORTN corrigida mensalmente de acordo com a inflação e com a conversão voluntária de preços e salários para a nova moeda de acordo com regras preestabelecidas Os autores apontavam que a estabilidade e credibilidade da nova moeda induziriam naturalmente a conversão para a nova moeda e tornariam a reindexação desnecessária O choque heterodoxo propunha a eliminação imediata e total de todas as regras formais de repasse da inflação passada e o congelamento temporário dos preços dos salários e da taxa de câmbio Posteriormente incorporou a ideia de um novo padrão monetário Ambas as propostas pressupunham resolvidos os conflitos distributivos de renda por trás da estabilidade das taxas mensais de inflação Tanto a definição das regras de conversão da moeda indexada quanto a fixação dos níveis de preços e salários do congelamento no choque heterodoxo requeriam a aceitação pacífica de um padrão de distribuição da renda prédeterminado Vale notar que ambas as propostas foram lançadas ao mesmo tempo em que Tancredo Neves candidato de oposição à Presidência defendia o pacto social e que o governo afirmava que o déficit público medido em termos do resultado operacional em 1984 era nulo Posteriormente verificouse que o déficit operacional do setor público alcançou 16 do PIB em 1984 No último trimestre do ano a inflação apresentava nítidos sinais de aceleração devido a vários fatores Em primeiro lugar porque circulavam estimativas pessimistas quanto às safras de alimentos para o ano seguinte Em segundo lugar porque a maior demanda facilitava a remarcação dos bens duráveis de consumo permitindo a recuperação das margens de lucro nos setores mais duramente atingidos pela recessão Finalmente temos efeitos sobre os custos industriais dos reajustes salariais maiores e mais frequentes A variação média do IGPDI entre outubro e dezembro atingiu 111 ao mês o que corresponde a uma taxa anual da ordem de 250 Conclusão semelhante resulta da análise da evolução dos índices de preços ao consumidor do IBGE então medidos entre o dia 15 de um mês e o dia 14 do mês seguinte no período de novembro de 1984 a janeiro de 1985 dada a defasagem de 15 dias nos períodos de coleta A aceleração da inflação levaria o governo a adiar os reajustes de alguns preçoschave da economia produzindo uma taxa artificialmente baixa em fevereiro e sobrecarregando demasiadamente a taxa de março primeiro mês da Nova República Graças à expansão das exportações e à nova queda das importações o superávit comercial brasileiro acumulou US131 bilhões em 1984 superando em US4 bilhões a meta acordada com o FMI e em US3 bilhões a conta líquida de juros pela primeira vez desde o choque do petróleo O saldo da conta corrente do balanço de pagamentos em declínio a partir de 1982 encontravase praticamente em equilíbrio no final de 1984 As reservas internacionais foram incrementadas em mais de US7 bilhões resultando num saldo cerca de 160 superior àquele registrado em dezembro de 1983 Assim apesar de um acréscimo na divida bruta da mesma ordem de magnitude de 1983 em termos líquidos a dívida externa cresceu em 1984 a uma taxa bem mais moderada do que nos anos anteriores Os resultados do balanço de pagamentos brasileiro de 1984 comprovaram determinadas teses acerca do ajustamento externo13 Em primeiro lugar ilustraram a importância do comportamento da demanda por exportações para um ajustamento externo não recessivo Em segundo permitiram identificar claramente os custos envolvidos na reversão do endividamento externo explosivo em condições normais do comércio internacional o encolhimento da capacidade produtiva existente simultaneamente com a transferência ao exterior de 4 do PIB Finalmente mostraram que a estratégia de longo prazo seguida depois do primeiro choque do petróleo estava pagando dividendos um crescimento substancial do PIB foi finalmente alcançado em 1984 juntamente com a queda do coeficiente de importação para 63 do PIB e um aumento do coeficiente de exportação para 123 do PIB na medida em que a maioria dos projetos associados ao ajuste estrutural de longo prazo começou a operar A recuperação iniciada em 1984 levou a uma mudança radical nas perspectivas a respeito das restrições sob as quais a economia brasileira estaria operando nos anos seguintes O país parecia ser capaz de crescer apesar da crise da dívida Em fins de 1984 quando o México era apontado por muitos como exemplo de ajustamento e comportamento o Brasil apresentou um crescimento positivo significativo do PIB e um superávit recorde na balança comercial Numa trajetória de crescimento moderado que alguns analistas como Carneiro Lopes e Modiano 1983 estimavam em 5 a 6 ao ano e que foi amplamente superada logo nos dois anos subsequentes o país estaria apto não apenas a pagar a conta dos juros externos que absorvia quase 40 da sua receita de exportações como também a equilibrar sua conta corrente As novas perspectivas de crescimento da economia brasileira por sua vez modificaram substancialmente o padrão de negociações entre o Brasil e o FMI Os últimos esforços visando permanecer no jogo sob as mesmas regras que haviam prevalecido no auge da crise de endividamento externo foram realizados em janeiro de 1985 quando a equipe que se afastava tentou conseguir a aprovação da direção do FMI para a sétima carta de intenções como parte da estratégia de buscar um acordo de reescalonamento das amortizações similar ao do México O fracasso em obter a aprovação do FMI para o novo programa de estabilização devido ao não cumprimento das metas para as necessidades nominais de financiamento e o déficit operacional do setor público estabelecidas na sexta carta para o último trimestre de 1984 postergou as negociações até a posse do novo governo em março As negociações com os bancos foram também suspensas até que o novo governo brasileiro alcançasse um acordo com o FMI 6 Conclusões As dificuldades em alcançar um novo acordo com o FMI se tornaram bastante evidentes logo no início de 1985 Por um lado não havia como o novo governo pudesse obter apoio político interno para mais uma carta de intenções dado que as necessidades de financiamento externo do país haviam claramente declinado O fato de que o Brasil não demandaria novos recursos externos para financiar a conta corrente do balanço de pagamentos apesar de nos últimos dois anos ter transferido para o exterior mais de 4 do PIB em equilíbrio estimulava o novo governo a rechaçar um estreitamento de seu espaço de manobra Por outro lado os banqueiros assim como os governantes dos países credores apegaramse à visão de que o monitoramento do FMI era uma condição indispensável para o reescalonamento plurianual da dívida externa Finalmente de acordo com o staff do FMI o aparente sucesso do ajustamento externo brasileiro teria curta duração caso o governo não decidisse controlar os gastos públicos visando reduzir a inflação Os ingredientes básicos para o impasse estavam portanto definidos Como o novo governo esperava que o Brasil não viesse a precisar de dinheiro novo nem dos bancos privados nem do FMI o país colocarseia na posição mais confortável de escolher suas próprias políticas domésticas sem interromper o pagamento de juros sobre a dívida externa O ponto vulnerável desta posição estava evidentemente relacionado com a alta taxa de inflação uma taxa anualizada de 250 em franca aceleração que não respondia aos controles de demanda Esta alta taxa de inflação resultava de um longo período de ajustamento no qual os esforços de estabilização a curto prazo conflitavam com a necessidade de manter em andamento os projetos de investimentos a médio e longo prazos Os conflitos distributivos de renda que alimentavam a contínua espiral de salários e preços eram periodicamente agravados pela necessidade de corrigir preços relativos em favor dos produtos comerciáveis em geral dos produtos agrícolas e dos derivados do petróleo durante o processo de ajustamento Além disso a habilidade dos potenciais perdedores em transferir ao menos parte de suas perdas para o governo levou as finanças públicas a um estado de desordem desde o nível do governo central estreitamente definido até as empresas estatais14 O ajustamento externo da economia brasileira conduzido no período 198184 foi bemsucedido no estrito senso da geração de vultosos superávits comerciais e do reequilíbrio da conta corrente do balanço de pagamentos em período relativamente curto O ajuste externo configurava porém um ajuste estrutural muito limitado quando comparado aos ajustes anteriores que desde o primeiro choque do petróleo já haviam modificado a composição do investimento os padrões de utilização de insumos especialmente em termos de energia utilizada a alocação do crédito doméstico e assim por diante O plano trienal do FMI promoveu um ajustamento recessivo baseado na redução do investimento público na aceleração das desvalorizações cambiais em taxas de juros mais elevadas e na correção de alguns preços domésticos de forma a incentivar exportações Nenhuma consideração foi dada por exemplo ao papel da recessão internacional na redução das exportações em contraste com o diagnóstico ortodoxo da absorção excessiva Além disso apesar da ausência de resposta da taxa de inflação às restrições de demanda nos anos anteriores nenhuma atenção foi dirigida ao papel exercido pela indexação os desequilíbrios internos seriam tratados pela imposição de limites ao crescimento nominal do crédito doméstico líquido das autoridades monetárias e aos empréstimos do setor público Uma reforma fiscal tendo como alvo o desequilíbrio interno certamente deveria ter feito parte dos esforços de ajustamento do período Os desequilíbrios internos e notadamente as elevadas taxas de inflação foram tratados em todo esse período com excessiva tolerância ou complacência passiva Este capítulo analisou de que forma diante das novas dificuldades de balanço de pagamentos após o segundo choque do petróleo e da elevação das taxas de juros internacionais a economia brasileira completou o ajuste estrutural nos primeiros anos da década de 1980 sob condições adversas de relações de troca e nível da demanda externa Essas condições adversas aumentaram os custos internos do ajuste e as políticas econômicas adotadas com ou sem o beneplácito do FMI contribuíram para aumentar os conflitos internos e agravaram os efeitos inflacionários A alta inflação foi o principal sintoma dos graves desequilíbrios internos que condicionariam o desempenho da economia brasileira até o final da década 1Os autores agradecem os comentários de Luiz Chrysostomo de Oliveira Filho e a assistência de Eliane Aleixo Lustosa Marcelo Fernandes de Lima Castro e Mariana Werneck Bastos na preparação da versão original deste capítulo 2As seções 2 e 3 desenvolvem a análise de Carneiro 1986 3As políticas restritivas adotadas em 1981 são examinadas em maior detalhe em Bonomo 1986 4A alteração da política salarial de outubro de 1980 impunha que a faixa de 15 a 20 salários mínimos passasse a ter reajuste de 50 do INPC sobre o que excedesse os 15 salários mínimos e os salários superiores a 20 salários mínimos passassem a ter garantido apenas o reajuste semestral sobre a parcela até este teto ficando o restante sujeito a livre negociação 5De fato durante a crise mexicana havia sinais claros de deterioração no nível das reservas brasileiras devido às crescentes dificuldades encontradas pelos bancos brasileiros em refinanciarem suas operações no exterior 6Vejase Lago 1982 O objetivo das metas e políticas definidas para o ano seguinte era ajustar a economia à disponibilidade de recursos externos de US141 bilhões que seriam utilizados para financiar as amortizações da dívida estimadas em US73 bilhões 7Os custos de tal ajuste externo foram explorados por Modiano 1983b 8Fritsch 1985b p 122 O mesmo autor chama atenção para as dificuldades em se obter um acordo com os bancos comerciais estrangeiros mesmo após o governo brasileiro ter estabelecido com o comitê assessor dos bancos e o staff do FMI as primeiras medidas a serem adotadas no próximo ano 9O impacto inflacionário da correção de preços relativos dos derivados de petróleo numa economia indexada e os dilemas de política econômica para o ajustamento externo foram analisados teoricamente por Lopes e Modiano 1983 10Vejase Modiano 1985 para uma decomposição da aceleração inflacionária de 1983 11Em Carneiro e Modiano 1983 são examinadas as consequências macroeconômicas dos dois critérios para o desempenho da economia brasileira em 1983 12Existem duas razões básicas para esta mudança na situação geral Primeiro as repetidas negociações do ano anterior evidenciaram ex post a flexibilidade que poderia ser esperada do Fundo no caso de algumas metas serem comprovadamente irrealistas como demonstrou Marques 1986 em relação às metas das primeiras cartas de intenções Segundo o critério para a definição das metas de déficit público adotado após a quarta carta de intenções abriu efetivamente espaço para o crescimento do gasto público 13Vejase por exemplo DíazAlejandro 1983 1984 e Carneiro 1986 1987a 14Sobre os atrasos na correção dos preços públicos e suas consequências para o desequilíbrio financeiro das empresas estatais vejase Werneck 1985 1987 CAPÍTULO 14 A ópera dos três cruzados 1985 1990 Eduardo Marco Modiano1 1 Introdução Durante a segunda metade da década de 1980 a política econômica brasileira concentrouse no combate à inflação Os planos de estabilização de inspiração ortodoxa adotados no período 19811984 promoveram o ajustamento externo da economia mas não conseguiram evitar a escalada da inflação A inflação brasileira parecia ter propriedades específicas e uma dinâmica própria resistindo às pressões deflacionárias da recessão e do desemprego A predominância da inércia inflacionária sobre as condições de demanda e oferta agregadas defendida por Resende e Lopes 1980 Lopes 1986a cap 9 e 10 e Modiano 1988a caps1 e 2 entre outros dava prioridade à desindexação da economia no combate à inflação A ruptura dos mecanismos de indexação produziria uma queda da inflação mais rápida e mais acentuada do que a contração da demanda agregada com custos menores em termos de recessão e desemprego Do final da década de 1970 até a instalação da Nova República em março de 1985 a inflação brasileira apresentou dois grandes movimentos O primeiro grande salto da inflação ocorreu em fins de 1979 O segundo choque do petróleo a política interna de fixação de preços realistas e o simultâneo aumento da frequência dos reajustes salariais de anual para semestral dobraram a taxa de inflação que passou de 50 para 100 ao ano O segundo grande salto da taxa de inflação aconteceu em 1983 impulsionado por uma maxidesvalorização de 30 do cruzeiro em fevereiro2 Foi então alcançado o patamar de 200 ao ano A estabilidade das taxas mensais de inflação em torno de 10 ao mês ao longo de 1984 e o temor de uma nova aceleração inflacionária com a recuperação da atividade econômica que se iniciava em 1984 fortaleceram as teses inercialistas e as soluções heterodoxas para a inflação Assim no segundo semestre de 1984 foram apresentadas duas propostas inovadoras para a eliminação da inflação inercial a moeda indexada de Arida e Resende 1985 e o choque heterodoxo de Lopes 1986a caps 17 e 18 A primeira visava a alcançar a desindexação da economia através da introdução de uma nova moeda indexada que circularia paralelamente com o cruzeiro A segunda propunha um congelamento de preços e salários em níveis consistentes com o status quo da distribuição da renda e a desindexação generalizada da economia Tendo como pano de fundo a predominância da inércia inflacionária e a prioridade à desindexação da economia este capítulo analisa as diversas políticas de combate à inflação adotadas no período 19851989 Estas variaram de acordo com o tema da ortodoxia à heterodoxia e segundo o ritmo do gradualismo ao choque Atenção especial é dada aos três programas de estabilização mais marcantes o Plano Cruzado de 28 de fevereiro de 1986 o Plano Bresser de 12 de junho de 1987 e finalmente o Plano Verão de 14 de janeiro de 1989 Pretendese demonstrar como na concepção e na execução desses planos a precedência da inércia transformouse em essência do processo inflacionário brasileiro e como a complementaridade da desindexação transformouse em fundamento da estabilização dos preços Em seguida a esta introdução na seção 2 é apresentado o diagnóstico básico do processo inflacionário brasileiro que inspirou os programas de estabilização adotados a partir de 1986 Um modelo analítico simples é usado para ilustrar os fundamentos teóricos da inflação inercial e do conflito distributivo de rendas Na seção 3 são discutidas as políticas gradualistas adotadas em 1985 primeiro ano da Nova República que acirraram as tensões inflacionárias e levaram ao lançamento do Plano Cruzado A seção 4 descreve em detalhe os ingredientes do Plano Cruzado de 28 de fevereiro de 1986 Na seção 5 analisase a condução da política econômica pósCruzado que levou as taxas de inflação do cruzado um ano depois a superar as taxas de inflação do extinto cruzeiro A seção 6 considera a segunda tentativa de estabilização heterodoxa o Plano Bresser de 12 de junho de 1987 A evolução da política econômica que levou ao fracasso do plano ainda em 1987 e à rejeição da heterodoxia durante 1988 é discutida na seção 7 A seção 8 descreve o Plano Verão de 14 de janeiro de 1989 que é contrastado com as duas tentativas anteriores Os resultados desta terceira tentativa e a nova explosão inflacionária são explorados na seção 9 Finalmente a seção 10 conclui este capítulo analisando a evolução dos principais indicadores da economia brasileira neste período 2 Inflação inercial e conflito distributivo A concepção dos programas de estabilização para a economia brasileira adotados a partir de fevereiro de 1986 favoreceu a interpretação de que a inflação brasileira era predominantemente inercial A inércia inflacionária resultaria dos mecanismos de indexação para a correção monetária dos preços salários taxa de câmbio e ativos financeiros que tenderiam a propagar a inflação passada para o futuro Na ausência de choques a taxa de inflação permaneceria no patamar vigente Mudanças do patamar inflacionário na economia indexada de forma análoga a mudanças do nível geral de preços na economia desindexada resultariam de uma inconsistência ex ante na distribuição da renda O Gráfico 141 ilustra a dinâmica dos salários reais e de outros preços relativos cujos valores nominais são corrigidos pela inflação passada em intervalos fixos de tempo3 O pico do salário real é recomposto no momento que o salário nominal é reajustado Enquanto o salário nominal é mantido constante o salário real decresce de acordo com a taxa mensal de inflação que determina a inclinação da rampa no gráfico O vale do salário real é alcançado exatamente no momento que precede um novo reajuste Notese que dadas as constantes oscilações do salário real uma medida mais estável do poder de compra é indicada pelo salário real médio O gráfico estabelece ainda a existência de uma relação inversa entre o salário real médio e a taxa de inflação4 Dados a periodicidade dos reajustes e o pico de salário real um aumento da taxa de inflação configura uma rotação da rampa no sentido horário em torno do pico e consequentemente uma redução do salário real médio GRÁFICO 141 Dinâmica dos salários reais picomédia A relação inversa entre o salário real médio e a taxa de inflação configura um equilíbrio inflacionário representado no Gráfico 142 pela curva EI O intercepto no eixo vertical w indica o salário real de pico que prevaleceria no curto prazo se a taxa de inflação caísse abruptamente para zero imediatamente após um reajuste do salário nominal No Gráfico 142 um declínio do pico do salário real deslocaria EI para baixo até EI Uma diminuição na frequência dos reajustes do salário nominal ocasionaria uma rotação de EI no sentido horário para EI GRÁFICO 142 Salário real médio e taxa de inflação A mudança do patamar inflacionário que tem origem no conflito distributivo de rendas pode ser explicada através de um modelo simples de uma economia com uma função de produção agregada utilizando apenas dois insumos trabalho e um agregado composto de capital produtos primários e bens intermediários importados5 A fronteira de preços da economia estabelece então uma relação inversa entre por um lado o salário real médio e por outro lado a taxa de câmbio real o preço agrícola e a margem de lucro O equilíbrio distributivo está representado graficamente pela curva ED no Gráfico 142 Notese que uma desvalorização real da taxa de câmbio um choque agrícola ou um aumento da margem de lucro resultariam numa redução do salário real representada no Gráfico 142 por um movimento descendente de ED para ED O salário real e a taxa de inflação de equilíbrio da economia estão representados no Gráfico 142 por E1 na interseção das curvas ED e EI6 De acordo com esta interpretação estilizada do processo inflacionário brasileiro o salário real da economia dependeria exclusivamente do padrão de distribuição da renda que seria rígido no curto prazo Mudanças nas regras de indexação ou variações do pico do salário real afetariam tão somente a taxa de inflação sem alterar o nível do salário real Na ausência de choques a taxa de inflação permaneceria constante devido aos mecanismos de indexação caracterizando um processo inercial Um choque de oferta tal como uma desvalorização real da taxa de câmbio causaria já que ED se deslocaria para ED no Gráfico 141 uma elevação permanente na taxa de inflação e uma queda permanente no salário real caracterizando um conflito distributivo de rendas7 Notese no Gráfico 141 que um declínio no pico do salário real que mantenha o salário real médio inalterado corresponde a uma rotação no sentido antihorário da rampa em tomo da média Como o ângulo da rampa é a taxa de inflação a uma redução do pico do salário real corresponde uma queda da taxa de inflação No limite a rampa tornarseia horizontal e o componente inercial da inflação desapareceria sem afetar o equilíbrio distributivo expresso em termos do salário real médio do Gráfico 142 Neste o processo de desinflação corresponderia ao rebaixamento da curva EI até que o pico do salário real coincidisse com o salário real médio de equilíbrio Logo tomase claro que o principal ingrediente para a eliminação da inflação inercial seria a fixação dos preços relativos nos valores médios e a supressão dos mecanismos de indexação que atrelam a inflação futura à inflação passada O Gráfico 141 ilustra uma dificuldade técnica crucial encontrada na formulação de programas de estabilização para a economia brasileira a dessincronização dos reajustes salariais Se o processo inflacionário terminasse abruptamente trabalhadores com o mesmo salário real médio ficariam com salários reais distintos pois encontrarseiam em estágios diferentes da mesma rampa inflacionária Grandes redistribuições de renda resultariam deste fenômeno A mesma observação se aplicava a todas as outras rendas corrigidas monetariamente com periodicidades fixas sem sincronia tais como os aluguéis os lucros e a taxa de câmbio Modiano 1988a cap 9 apresentou uma solução para o problema da dessincronização dos reajustes que era o principal obstáculo à adoção do choque heterodoxo 3 O fracasso do gradualismo março 1985fevereiro 19868 A Nova República instalouse em março de 1985 após 21 anos de regime militar Embora a necessidade de um pacto social para conciliar os pleitos por aumentos do salário real com a meta de reduzir as taxas de inflação tivesse sido muito enfatizada durante a campanha eleitoral de Tancredo Neves o novo governo deu início à gestão da política econômica com o anúncio apenas de medidas de austeridade fiscal e monetária A paralisação das operações ativas dos bancos oficiais por dias um corte adicional de 10 no orçamento fiscal para 1985 e a proibição de contratações de novos funcionários para a administração pública constituíram o cerne das medidas adotadas Além de facilitar as negociações em curso com o Fundo Monetário Internacional FMI o corte nos gastos públicos e o aperto na política monetária deveriam ser percebidos como o primeiro passo de um governo gastador na direção de um pacto social que não se materializaria neste período Porém a heterogeneidade da equipe econômica do governo integrada por economistas conservadores e progressistas que fora concebida pelo falecido Presidente Tancredo Neves mas que seria conduzida pelo seu sucessor Presidente José Sarney não permitia vislumbrar claramente o alcance da política econômica de corte ortodoxo anunciada Já que as políticas monetária e fiscal restritivas poderiam levar algum tempo para produzir um declínio na taxa de inflação que em março de 1985 de acordo com a Tabela 141 alcançara 127 um congelamento de preços foi determinado pelo ministro da Fazenda Francisco Dornelles para o mês de abril9 Além disso com o objetivo de amortecer a aceleração da inflação as fórmulas de cálculo da correção monetária e das desvalorizações cambiais foram modificadas estendendo a memória do processo inflacionário de um para três meses Até março as correções monetária e cambial eram determinadas pela inflação do próprio mês em curso cuja imprevisibilidade aumentava a incerteza nos mercados aberto e cambial A partir de abril as taxas mensais de correção resultariam de uma média geométrica da inflação dos três meses anteriores Além disso minidesvalorizações diárias do cruzeiro que distribuiriam uniformemente a taxa de correção cambial prefixada para o mês eliminariam a especulação em torno da data e do percentual do reajuste subsequente Tabela 141 Brasil Inflação oficial taxa mensal janeiro de 1985 a dezembro de 1990 Até outubro de 1985 IGPDI de novembro de 1985 a fevereiro de 1986 IPCA de março a outubro de 1986 IPC de novembro de 1986 a junho de 1987 INPC a partir de julho de 1987 IPC Fontes Banco Central do Brasil Relatório 1986 p 28 Relatório 1987 p 345 Relatório 1989 p 35 e Relatório 1990 p 31 Imediatamente após o anúncio da nova política econômica a inflação caiu significativamente passando para 72 em abril O bom desempenho da inflação em abril pode no entanto ser quase inteiramente explicado pela suspensão dos reajustes de preços para dois grupos de produtos a saber produtos siderúrgicos e derivados de petróleo que correspondiam a 74 e 11 do índice de preços por atacado IPADI que por sua vez representava 60 do índice geral de preços IGPDI da Fundação Getulio Vargas A contribuição dos preços privados que não se encontravam sob estrito controle e portanto não seguiam o congelamento estava superdimensionada Apesar do ônus para o setor público o governo decidiu estender a duração do congelamento de preços Como os custos de produção cresceram em termos reais durante esses primeiros meses já que as longas defasagens embutidas nos reajustes salariais semestrais e agora também nas fórmulas das correções cambial e monetária captavam as taxas mais elevadas da inflação passada o congelamento de preços foi gradativamente colocado sob pressão O mês de junho marcou o início do processo de descompressão dos controles sobre os preços privados e de descongelamento dos preços públicos O Conselho Interministerial de Preços CIP concedeu entre outros aumentos de preços às indústrias automobilística e cimenteira de 95 e 15 respectivamente para vigorarem a partir do dia 20 No que tange ao setor público foram reajustados ainda em junho os preços dos aços planos 156 da energia elétrica 228 e as tarifas portuárias 772 e de transporte urbano 60 Para evitar um repique inflacionário no final do congelamento menores percentuais de reajuste de preço foram concedidos aos produtos industriais num primeiro instante Um aumento posterior na frequência dos reajustes de preços que passariam a ser mensais deveria compensar as perdas nas margens de lucro incorridas na vigência do congelamento Sacrificavase assim a estabilidade do processo inflacionário a médio prazo por menores taxas mensais de inflação a curto prazo O IGPDI registrou variações mensais de apenas 78 e 89 em junho e julho respectivamente Durante os cinco primeiros meses da Nova República acirraramse consideravelmente as tensões dentro da equipe econômica do governo O ministro da Fazenda Francisco Dornelles liderava a corrente ortodoxa enquanto o ministro do Planejamento João Sayad era identificado com uma linha heterodoxa da política econômica Tomaramse públicas as divergências quanto aos moldes da renegociação externa ao prolongamento do controle de preços à prática de taxas de juros reais elevadas aos ingredientes do ajuste fiscal à correção do salário mínimo à mudança de fórmula das correções cambial e monetária entre outras A recomposição dos preços apenas começava quando a economia sofreu um violento choque de oferta agrícola com os preços dos gêneros alimentícios no atacado aumentando 190 em agosto de 1985 A coincidência do período da entressafra quando a carne apresentou alta de 50 com a recomposição dos preços dos produtos agropecuários controlados tal como o caso do leite que foi reajustado em 30 em meados de julho levou a inflação a 140 em agosto O fracasso do pacote antiinflacionário de março de 1985 marcou com a substituição do ministro da Fazenda o final da primeira fase da política econômica da Nova República O novo ministro da Fazenda Dílson Funaro anunciou uma meta antiinflacionária mais modesta estabilização à taxa de 10 ao mês As regras de indexação foram mais uma vez alteradas visando evitar a propagação da taxa de inflação de 14 registrada em agosto A partir de setembro de 1985 as correções monetária e cambial voltavam a ser norteadas pela inflação do próprio mês em curso A maioria das tarifas públicas e dos preços administrados passaria a ser corrigida em bases mensais e portanto em menores percentuais ratificando a tese de que a estabilização da taxa de inflação seria obtida às custas de um aumento do grau de indexação da economia A nova política antiinflacionária daria menor ênfase ao controle da base monetária objeto permanente de preocupação da equipe anterior Assim a taxa de juros real que subira vertiginosamente durante o período de abril a julho de 1985 declinaria como resultado de uma política monetária menos restritiva tornandose mais compatível com a recuperação econômica A mudança da fórmula de correção e a consequente redução da memória inflacionária sugeriam que a economia estava caminhando na direção da indexação plena mesmo porque os autores da proposta original de adoção de uma moeda indexada na economia brasileira integravam a nova equipe econômica do governo No caminho da moeda indexada preços taxa de câmbio e ativos financeiros tornavamse crescentemente atrelados às variações mensais da ORTN No entanto não havia uma regra clara e amplamente aceita para a indexação dos salários que permanecia oficialmente baseada na política de reajustes semestrais estabelecida em 1979 A perspectiva de retorno a taxas mensais de inflação de 10 a 12 ao mês depois do fracasso do congelamento de preços dava novo impulso à demanda de reajustes salariais mais frequentes As propostas para uma nova política salarial incluíam reajustes trimestrais reajustes mensais de acordo com a variação de um índice de preços ao consumidor uma escala móvel com gatilho de 30 e reajustes mensais prefixados a cada três meses10 As duas últimas propostas terminaram sendo adotadas nos dois programas de estabilização posteriores os Planos Cruzado e Bresser Enquanto as discussões públicas prosseguiam o governo permitiu a livre negociação de abonos adiantamentos e esquemas alternativos de indexação desde que estes aumentos não fossem repassados aos preços Os órgãos de controle de preços não considerariam no cômputo de variações de custos qualquer aumento salarial que não estivesse de acordo com a regra oficial de reajustes baseada ainda nas variações semestrais do custo de vida Em consequência o poder de compra dos salários cresceu durante este período dando continuidade ao movimento de reposição salarial que se iniciara nos setores exportadores ainda em fins de 1984 A recuperação da renda interna em 1985 pelos efeitos induzidos sobre o consumo em especial sobre as vendas de bens duráveis foi suficiente para compensar a queda das vendas ao exterior que haviam sido a origem da recuperação da atividade econômica no ano anterior Se por um lado a sintonia fina dos reajustes de preços administrados manteve a inflação em 9 ao mês durante o bimestre setembrooutubro por outro lado não abriu espaço para aumentos compensatórios das perdas incorridas principalmente pelas tarifas públicas durante o congelamento de abril a julho A inflação reprimida aliada a um novo choque de oferta agrícola originário da seca que atingiu as lavouras levou o IGPDI a registrar elevação de 15 em novembro de 1985 A desindexação seguiu então um caminho alternativo o índice que media oficialmente a inflação deixou de ser o índice geral de preços IGPDI da FGV e passou a ser o índice de preços ao consumidor amplo IPCA do IBGE Este último registrava uma taxa de inflação de apenas 111 em novembro11 O IPCA tornouse também o indexador universal para as rendas do capital e do trabalho que anteriormente eram corrigidas pelo IGPDI e pelo INPC índice de preços ao consumidor restrito respectivamente Apesar desta mudança ser anunciada como um passo na direção da equidade distributiva a frequência dos reajustes salariais foi mantida em seis meses A principal vantagem do IPCA sobre os outros índices seria sua menor sensibilidade a choques de oferta agrícola e cambial o que ajudaria a amortecer o aumento previsto das taxas de inflação para os meses subsequentes ainda em função da estiagem nas lavouras Este ganho teria que compensar o fato dos preços ao consumidor serem mais difíceis de controlar do que os preços por atacado que representavam 60 do IGPDI Naquela ocasião como uma nova aceleração inflacionária parecia inevitável a aplicação de um choque heterodoxo nos moldes do Plano Austral argentino ou a negociação de um pacto social nos moldes do Programa de Estabilização israelense entraram na ordem do dia12 A discussão principal motivada pela associação usual entre a recessão e os planos ortodoxos de estabilização referiase aos eventuais efeitos contracionistas sobre a atividade econômica De fato o medo de uma recessão baseado nas experiências da Argentina e de Israel parecia ser o maior obstáculo a ser transposto Durante todo o ano de 1985 o governo da Nova República conseguiu manter afastadas do país as missões do FMI As negociações para um novo acordo interrompidas em janeiro de 1985 em consequência da divulgação dos dados relativos ao desempenho da política monetária no final de 1984 foram proteladas Assim o governo brasileiro pôde manter sua independência em relação às recomendações do Fundo em matéria econômica adotando políticas monetária e fiscal mais acomodatícias que privilegiavam o crescimento da economia Esta atitude se tomara possível graças aos superávits mensais da balança comercial da ordem de US1 bilhão que permitiam que o país não dependesse de novos recursos externos e às sucessivas prorrogações do acordo com os bancos privados internacionais que dada a favorável situação externa da economia brasileira podiam mostrar compreensão em relação às dificuldades políticas envolvidas no restabelecimento de negociações com o FMI pelo novo governo democrático O inflamado slogan de campanha de Tancredo Neves de que a dívida externa não seria paga com a fome e a miséria do povo recomendava cautela aos bancos credores A inflação oficial medida agora pelo IPCA alcançou 134 em dezembro de 1985 e 162 em janeiro de 1986 O choque de oferta agrícola finalmente se manifestava no nível do consumidor tendo os preços dos gêneros alimentícios crescido aproximadamente 170 ao mês durante o bimestre dezembrojaneiro No nível do atacado o aumento desses preços alcançou 260 somente em janeiro de 1986 Não havia dúvidas que com a indexação generalizada da economia a taxa de inflação tenderia rapidamente para o novo patamar de 400 a 500 ao ano Nestas condições o governo não seria capaz de manter os reajustes salariais na frequência semestral o que poderia resultar em outra pressão de custos colocando a economia na rota da hiperinflação Além disso os saltos nas taxas mensais de inflação frustravam a política cambial já que as minidesvalorizações diárias prefixadas não mantinham o mesmo passo do aumento da inflação Um plano de recuperação gradual dos preços dos serviços públicos como parte do esforço de redução do déficit público lançado em dezembro de 1985 foi abandonado quando os elevados reajustes nominais das tarifas em dezembro e janeiro acabaram ficando abaixo das taxas mensais de inflação O fracasso do gradualismo em produzir sequer a estabilidade das taxas mensais de inflação encerra a segunda fase da política econômica da Nova República As elevadas taxas de inflação não ameaçavam apenas os ministros da área econômica mas também a coalizão política que sustentava o governo A legitimidade do processo de votação indireta que elegeu Tancredo Neves e da sucessão presidencial após a sua morte foi novamente posta em questão Assim em 28 de fevereiro de 1986 o Presidente José Sarney decretou um novo programa de estabilização o Plano Cruzado As precondições que a economia oferecia eram consideradas apropriadas o produto industrial impulsionado pelos bens de consumo durável crescera 92 durante os 12 meses anteriores a fevereiro a balança comercial acumulara um superávit de US125 bilhões nos últimos 12 meses as reservas internacionais alcançavam em dezembro US116 bilhões e US47 bilhões nos conceitos do FMI e de liquidez respectivamente o déficit público em 1986 estaria praticamente eliminado como resultado do pacote fiscal anunciado em dezembro de 1985 o preço do petróleo que respondia por 45 das importações brasileiras caía no mercado internacional e o dólar norteamericano ao qual estava atrelado o cruzeiro desvalorizavase em relação às moedas europeias e ao iene 4 Plano Cruzado principais ingredientes13 O programa brasileiro de estabilização de 28 de fevereiro de 1986 promoveu uma reforma monetária que estabeleceu o cruzado Cz como padrão monetário nacional A taxa de conversão foi fixada em mil cruzeiros por cruzado A dessincronização e as diferentes periodicidades dos reajustes de salários semestral e preços de diário a semestral requereram o desenvolvimento de regras específicas para a conversão de tal forma a evitar redistribuições da renda e da riqueza Estas regras pretendiam produzir um choque neutro o qual iria restaurar sob o cruzado os mesmos padrões de renda e riqueza verificados mais recentemente com o cruzeiro14 Os salários foram convertidos em cruzados tomando como base o poder de compra médio dos últimos seis meses A fórmula de conversão dos salários computava o poder de compra médio entre setembro de 1985 e fevereiro de 1986 em valores correntes ou seja a preços de fevereiro Admitiase que os salários eram pagos no último dia do mês e gastos integralmente por ocasião de seu recebimento Um abono de 8 foi concedido a todos os assalariados de acordo com a decisão de cunho político de promover uma redistribuição da renda em favor dos assalariados o que deveria facilitar a aceitação por parte dos trabalhadores da conversão pela média Favorecendo ainda mais as classes de renda mais baixa o salário mínimo foi fixado em Cz80400 o que significava um abono de 16 em relação ao poder de compra médio dos últimos seis meses Os salários não foram congelados com o Plano Cruzado Ao contrário as datas anuais dos dissídios coletivos que haviam prevalecido até novembro de 1979 foram restauradas Por ocasião dos dissídios anuais os salários seriam automaticamente corrigidos com base em 60 da variação acumulada do custo de vida Além dos reajustes anuais os salários seriam automaticamente corrigidos de acordo com uma escala móvel sempre que a taxa de inflação acumulasse o gatilho de 2015 Com a exceção das tarifas industriais de energia elétrica que obtiveram aumento de 20 os preços foram congelados por tempo indeterminado nos níveis ao consumidor prevalecentes em 27 de fevereiro de 1986 Não houve qualquer compensação pela inflação passada desde o último reajustamento nem tampouco pela perda futura durante a vigência do congelamento Os preços públicos e administrados congelados encontravamse defasados em relação aos custos de produção devido à sua frequente utilização como parte da política antiinflacionária dos anos 1980 O Plano Cruzado deslocou a base do índice de preços ao consumidor IPCA para 28 de fevereiro de 1986 O novo índice denominado índice de preços ao consumidor IPC manteria as mesmas ponderações do IPCA O deslocamento da base com a construção de um vetor de preços para o dia 28 de fevereiro de 1986 se justificava já que com preços medidos como médias diárias ou semanais o IPCA registraria uma inflação positiva no primeiro mês do congelamento março de 1986 ainda que os preços permanecessem estáveis ao longo do mês16 A taxa de câmbio foi fixada em cruzados no nível vigente em 27 de fevereiro de 1986 A cômoda posição externa da economia brasileira e a recente desvalorização do dólar norteamericano ao qual o cruzeiro estava atrelado em relação às moedas europeias e ao iene japonês não sugeriam a necessidade de uma maxidesvalorização compensatória ou defensiva do cruzado Relações médiapico foram anunciadas para a conversão dos aluguéis residenciais com reajustes semestral e anual Estes multiplicadores deveriam ser aplicados após a atualização monetária dos valores dos aluguéis contratados até 28 de fevereiro de 1986 No caso dos aluguéis comerciais o plano estabeleceu coeficientes multiplicativos para serem aplicados aos aluguéis vigentes em fevereiro de 1986 de acordo com a frequência contratual dos reajustes e o mês do último reajuste Estes pretendiam reproduzir na nova moeda o valor real médio dos aluguéis comerciais calculado em um intervalo igual ao período entre sucessivos reajustes Nos contratos para pagamento futuro em cruzeiros com taxas de juros pós fixadas os percentuais contratados acima da correção monetária tornarseiam as taxas de juros nominais em cruzados após a supressão da correção monetária Este seria o caso de todos os contratos de curto prazo uma vez que com o Plano Cruzado a indexação em prazos inferiores a um ano foi proibida A única exceção foi aberta para as cadernetas de poupança que passaram entretanto a ter reajustes trimestrais ao invés de mensais A Obrigação Reajustável do Tesouro Nacional ORTN que era corrigida mensalmente com base na variação do índice oficial de inflação e que com a aceleração da inflação se tornara a moeda nacional alternativa foi substituída pela Obrigação do Tesouro Nacional OTN cujo valor nominal ficaria congelado por 12 meses No caso dos contratos com taxas de juros prefixadas estabeleceuse para os 12 meses subsequentes ao plano uma tabela de conversão diária de valores em cruzeiros para cruzados Nesta a desvalorização futura do cruzeiro foi prefixada arbitrariamente em 045 ao dia o que correspondia à média diária da inflação entre dezembro de 1985 e fevereiro de 1986 O Plano Cruzado não estabeleceu regras ou metas para as políticas monetária e fiscal para complementar o programa de estabilização A atuação das políticas monetária e fiscal foi relegada ao discernimento dos responsáveis pela política econômica O objetivo implícito da política monetária durante os primeiros meses do plano era acomodar o incremento na demanda de moeda que resultaria de uma mudança de carteira em favor da moeda estável à medida em que este movimento era percebido como não inflacionário As taxas de juros sinalizariam uma monetização excessiva ou insuficiente A administração das taxas de juros nos primeiros meses do plano demonstrarseia no entanto uma tarefa de difícil sintonia Taxas de juros elevadas poderiam afetar negativamente os programas de investimento e aumentariam o peso da dívida pública interna Taxas de juros baixas poderiam estimular a especulação com estoques e com moedas estrangeiras ameaçando a estabilização Com respeito à política fiscal o governo havia anunciado em dezembro de 1985 um pacote fiscal que tinha como objetivo eliminar as necessidades de financiamento do setor público no conceito operacional o que exclui as correções monetária e cambial da dívida pública projetadas para 1986 Entretanto os ganhos projetados de receita que dependiam da continuidade do processo inflacionário tal como a taxação dos ganhos nominais de capital não se materializariam com a queda das taxas de inflação Além disso um pacote fiscal de dezembro de 1985 não poderia levar em consideração a perda do imposto inflacionário que resultaria da estabilização dos preços após fevereiro de 1986 5 Plano Cruzado principais resultados A análise dos resultados do Plano Cruzado está dividida em três períodos O primeiro período que vai de março a junho de 1986 é caracterizado por uma queda substancial da inflação e também pelos primeiros indícios da existência de excesso de demanda na economia O segundo período que vai de julho a outubro de 1986 pode ser identificado pela total imobilidade do governo ante o agravamento da escassez de produtos e à deterioração das contas externas17 Finalmente o terceiro período que vai de novembro de 1986 a junho de 1987 ratificou o fracasso do Plano Cruzado com o retorno das altas taxas de inflação Cruzado março 1986junho 1986 O Plano Cruzado foi recebido pela população com grande entusiasmo O apelo presidencial à população para que fiscalizasse o congelamento de preços foi entendido como um dever cívico Assim apesar de ter sido lançado sob a forma de um decretolei ou seja sem discussão com a sociedade o Plano Cruzado parecia satisfazer os anseios da população por uma participação maior no destino do país Por estes motivos o congelamento de preços tecnicamente frágil tornarseia a peça fundamental do programa de estabilização As taxas de inflação medidas pelo novo IPC caíram abruptamente logo nos primeiros meses A mais elevada taxa mensal deste período 14 foi registrada em maio Em alguns setores do governo estes resultados apenas confirmavam a tese de que era possível obter uma redução substancial das taxas mensais de inflação sem recurso à recessão e ao desemprego e que estava aberto o caminho para o combate às origens da pressão inflacionária o déficit público Em outros setores esses resultados davam a falsa impressão de que todas as pressões inflacionárias poderiam ser debeladas apenas com o congelamento de preços e a força da vontade e da fé A decomposição das taxas mensais de inflação nesse período já revelava porém os primeiros sintomas de excesso de demanda na economia Os preços dos artigos de vestuário e dos carros usados que não eram passíveis de controle e que representavam 15 do IPC aumentavam a taxas de 4 a 5 ao mês Essa distorção de preços relativos entre os preços congelados e aqueles de difícil controle que se iniciou logo em março de 1986 apenas se intensificou durante a vigência do congelamento O aumento do poder de compra dos salários a despoupança voluntária causada pela ilusão monetária o declínio do recolhimento do imposto de renda para pessoas físicas a redução das taxas de juros nominais o consumo reprimido durante os anos de recessão e o congelamento de alguns preços em níveis defasados em relação a seus custos detonaram conjuntamente uma explosão do consumo A escassez de produtos manifestouse já nesta fase mas ficou restrita aos mercados de leite carne e automóveis não representando um problema generalizado até o período seguinte No caso do leite o governo deu início à prática de subsidiar o produtor para sustentar o congelamento No caso da carne optou por importações que se demonstraram tardias e insuficientes O mercado da carne se constituiu no principal campo de batalha para o governo que não conseguiu fazer valer o congelamento mesmo sob a ameaça de confisco do gado E no caso dos automóveis nada foi feito até julho Em consequência as filas se generalizaram e os preços dos carros usados superaram os preços dos modelos novos A generalização do excesso de demanda na economia era reforçada por uma expansão exagerada da oferta de moeda que transcendia o incremento natural da demanda de moeda provocado pela desinflação abrupta18 A folga de liquidez decorrente da remonetização acelerada da economia refletiuse ex post em taxas de juros reais negativas durante esse período Em consequência as ações nas bolsas de valores se valorizaram cerca de 50 o ágio no mercado paralelo do dólar passou de 26 para 50 e os preços dos ativos reais subiram vertiginosamente Enquanto a fixação pelo Banco Central de taxas de juros nominais baixas durante o primeiro mês do plano podia ser vista como uma contribuição para reforçar as expectativas de inflação zero os esforços posteriores em seguir uma política monetária mais restritiva e elevar as taxas de juros encontraram forte oposição política e sendo assim não se concretizaram Também durante este período o governo foi tomando consciência da magnitude do desequilíbrio fiscal Esta situação somente iria se agravar na extensa vigência do Plano Cruzado devido ao aumento das despesas com a folha de salários do setor público os subsídios diretos e indiretos as isenções tarifárias e as transferências às empresas estatais aos estados e aos municípios O governo reconheceu então que o déficit público em 1986 poderia alcançar 25 do PIB em contraste com a taxa de 05 estimada a partir do pacote fiscal de dezembro de 1985 O esperado crescimento na receita do governo devido à eliminação da erosão inflacionária que agia sobre a arrecadação dos impostos o chamado efeito Tanzi não se materializava na devida proporção e no devido tempo Além do mais quando se verificou o aumento da receita refletindo também a retomada da atividade econômica este foi mais do que neutralizado pelo aumento dos gastos fruto da necessidade de se sustentar o congelamento de preços e portanto contribuir para a vitória do PMDB nas eleições de novembro para os governos estaduais e para a Assembleia Constituinte A dimensão do superaquecimento da economia em junho pode ser ilustrada por alguns números as vendas cresceram 228 nos primeiros seis meses de 1986 em relação ao mesmo período do ano anterior a produção de bens de consumo duráveis aumentou 332 nos 12 meses anteriores a taxa de desemprego aberto caiu de 44 em março para 38 e os salários reais tiveram um ganho de aproximadamente 12 desde o final de fevereiro Assim no final desse período a política econômica dispunha aparentemente de apenas duas opções ou decretava o fim do congelamento de preços ou desacelerava o crescimento do produto através de um rápido e severo corte na demanda agregada Como tanto a inflação quanto a recessão tinham custos políticos que o governo julgava insuportáveis optouse por um modesto ajuste fiscal Cruzadinho julho 1986outubro 1986 No dia 24 de julho o governo anunciou o Cruzadinho um tímido pacote fiscal elaborado para desaquecer o consumo Envolvia basicamente a criação de um sistema de empréstimos compulsórios novos impostos indiretos na aquisição de gasolina e automóveis que seriam restituídos após três anos Além disso introduziu impostos não restituíveis sobre a compra de moedas estrangeiras para viagem e passagens aéreas internacionais A receita adicional do governo financiaria o Plano de Metas um programa de investimentos públicos e privados anunciado simultaneamente que visava um crescimento anual do PIB de 7 A credibilidade de todo o programa seria prejudicada pela decisão do governo de expurgar esses aumentos de preços do IPC visando postergar o primeiro disparo do gatilho salarial De agosto a 15 de novembro a política econômica ficou paralisada todos os esforços do governo foram concentrados nas eleições para governadores e para a Assembleia Constituinte Como era de se esperar o Cruzadinho teve pouca eficácia na contenção do consumo Ao contrário a expectativa do descongelamento deu um novo impulso à demanda O produto industrial atingiu um pico em setembro com uma taxa de crescimento acumulada em 12 meses de 122 Além disso vários setores da economia operavam próximos da plena capacidade com severa escassez de matériasprimas e bens intermediários Durante esse período a inflação oficial permaneceu baixa apresentando apenas uma leve tendência ascendente Entretanto esta não refletia a inflação real da economia devido à proliferação do ágio que não era captado pela coleta oficial ao desabastecimento que reduzia o tamanho da amostra dos preços e à introdução de produtos novos que se tomaram um expediente comum para burlar o congelamento Até agosto os elevados superávits da balança comercial não refletiam o excesso de demanda que se observava no mercado interno Esta situação se alterou em setembro e mais drasticamente em outubro com a queda da receita de exportações de US21 bilhões para US13 bilhões A especulação acerca de uma maxidesvalorização do cruzado levou o ágio no mercado paralelo de dólares para 90 Ainda em outubro o governo descongelou a taxa de câmbio promovendo uma modesta desvalorização do cruzado de 18 e anunciando uma política de minidesvalorizações eventuais baseadas num indicador da relação câmbiosalário Como o indicador sugeria que a taxa de câmbio estava sobrevalorizada em pelo menos 10 em relação a fins de fevereiro de 1986 a expectativa de uma nova e maior desvalorização do cruzado estimulou ainda mais o adiamento de exportações e a antecipação de importações levando a uma deterioração maior das contas externas nos meses posteriores Cruzado II novembro 1986junho 1987 Uma semana após a vitória maciça do partido do governo PMDB nas eleições o Cruzado II foi anunciado Tratavase de um pacote fiscal que objetivava aumentar a arrecadação do governo em 4 do PIB através do reajuste de alguns preços públicos gasolina energia elétrica telefone e tarifas postais e do aumento de impostos indiretos automóveis cigarros e bebidas O impacto imediato do Cruzado II seria um violento choque inflacionário Tais aumentos dos preços públicos e administrados por exemplo 120 no caso dos cigarros forneceram uma válvula de escape para toda a inflação reprimida durante o congelamento O Cruzado II também determinava que os aumentos de preços dos automóveis cigarros e bebidas deveriam ser expurgados do IPC visando retardar o primeiro disparo do gatilho salarial A reação da população com o apoio de alguns novos governadores e congressistas forçou o governo a recuar na proposta do expurgo O governo apenas substituiu as ponderações do IPC que eram originárias do IPCA pelas ponderações do INPC que atribuía menores pesos aos preços majorados pelo Cruzado II Na mesma ocasião foi regulamentada a escala móvel dos salários os reajustes acionados pelo gatilho ficariam limitados a 20 com o resíduo inflacionário equivalente à diferença entre a inflação acumulada e o teto de 20 sendo carregado para o gatilho seguinte Dada a magnitude do choque inflacionário do Cruzado II a indexação voltaria à plena carga O governo reinstituiu as minidesvalorizações cambiais diárias do cruzado atrelou os contratos financeiros aos rendimentos das recémcriadas Letras do Banco Central LBCs e permitiu que os bancos voltassem a emitir Certificados de Depósitos Bancários CDBs pósfixados Diante da ameaça de uma explosão inflacionária o governo iniciou discussões com representantes dos empresários e trabalhadores visando a formulação de um primeiro pacto social Todavia a falta de tradição na negociação de acordos distributivos de renda não permitiu a rápida conciliação dos objetivos conflitantes O fracasso desta primeira tentativa de pacto social ficaria evidente logo no final de janeiro de 1987 A taxa de inflação atingiu 168 em janeiro o que significava que o primeiro reajuste salarial de 20 detonado pela inflação acumulada entre março e dezembro de 1986 e pago no final de janeiro reporia pouco mais do que a perda de poder de compra incorrida durante o próprio mês Contando com a retração da demanda para amortecer a aceleração inflacionária o governo cedeu às pressões pela liberalização dos preços suspendendo abruptamente quase todos os controles em fevereiro de 1987 Em 27 de fevereiro quando o Plano Cruzado completava um ano a reindexação da economia iniciada em novembro de 1986 foi concluída com o reajustamento do valor nominal da OTN e a reintrodução da correção monetária em bases mensais Com a escala móvel salarial a economia tornarseia mais indexada do que antes do Plano Cruzado As vendas caíram em consequência da queda do salário real da elevação das taxas de juros e do aumento da incerteza O desaquecimento da economia tinha no entanto também raízes do lado da oferta Foram impostos novos limites às importações de matériasprimas essenciais e produtos intermediários devido à escassez de reservas cambiais e os mercados domésticos encontravamse desorganizados pelo descongelamento de preços abrupto e sem indicações seja de uma nova política de reajustes seja de um novo congelamento Apesar do reinício das minidesvalorizações diárias do cruzado os saldos da balança comercial brasileira tomaramse negativos entre outubro de 1986 e janeiro de 1987 Sem indícios de recuperação o governo decidiu no final de fevereiro de 1987 suspender por tempo indeterminado os pagamentos de juros da dívida externa aos bancos privados Os objetivos oficiais da moratória eram estancar a perda de reservas cambiais e iniciar uma nova fase nas renegociações da dívida externa19 O objetivo extraoficial seria a reconquista do apoio popular prejudicado pelo fracasso do Plano Cruzado para uma nova tentativa de estabilização Em abril de 1987 com a taxa de inflação ultrapassando o patamar de 20 ao mês o ministro Dílson Funaro deixou o cargo Duas de suas teses demonstraramse equivocadas o final da bolha inflacionária o que significava que a inflação iria perder fôlego uma vez que o processo de realinhamento dos preços estivesse completado não se materializara e a renegociação da dívida externa que reaglutinaria as forças da sociedade brasileira voltara ao estado de impasse O novo ministro da Fazenda Bresser Pereira iniciou sua gestão anunciando uma meta para a taxa de crescimento do PIB em 1987 de 35 o que colidia com as aspirações do partido governista e de seu antecessor de crescer 7 neste mesmo ano Demonstrou a disposição de voltar a dialogar com o FMI se isto se impusesse como absolutamente necessário à renegociação com os bancos credores embora fosse encontrar forte oposição no seu próprio partido político à iniciativa Anunciou e promoveu uma mididesvalorização do cruzado de 75 em 1 de maio o que foi percebido como mais um passo em direção a uma política econômica de cunho ortodoxo repelida pelo PMDB Tendo manifestado simpatia pela opção do choque heterodoxo não conseguiria conter as sucessivas ondas de rumores sobre um iminente congelamento de preços20 6 Plano Bresser ingredientes O Plano Bresser de 12 de junho de 1987 foi apresentado à população como um programa de estabilização híbrido que incluía elementos tanto ortodoxos quanto heterodoxos para o combate à inflação Em contraste com o Plano Cruzado original o novo programa não tinha como meta a inflação zero nem tencionava eliminar a indexação da economia Pretendia apenas promover um choque deflacionário com a supressão da escala móvel salarial e sustentar as taxas de inflação mais baixas com a redução do déficit público Em seguida são analisadas as principais medidas do Plano Bresser no que tange aos salários preços taxa de câmbio aluguéis pagamentos futuros expansão monetária e déficit público21 Os salários foram congelados por um prazo máximo de três meses nos níveis prevalecentes em 12 de junho de 1987 Incorporavam assim apenas o reajuste de 20 detonado pela taxa de inflação de 232 registrada em maio Não era prevista qualquer compensação salarial pela taxa de inflação de junho impulsionada pelos aumentos decretados para os preços públicos e administrados antes do congelamento O resíduo inflacionário decorrente do teto de 20 para os reajustamentos salariais acumulado até maio seria pago em seis parcelas mensais a partir de setembro O Plano Bresser instituía também uma nova base de indexação salarial para vigorar após o congelamento a Unidade de Referência de Preços URP De acordo com o novo esquema a cada três meses seriam prefixados os percentuais de reajuste da URP para os três meses subsequentes com base na taxa de inflação média geométrica dos três meses precedentes22 Mantinhase assim a frequência mensal dos reajustes salariais que resultavam dos disparos sucessivos do gatilho com taxas de inflação superiores a 20 ao mês Ampliava se porém com a prefixação dos reajustes a cada três meses a defasagem entre a observação da taxa de inflação e seu repasse aos salários Os preços foram também congelados pelo prazo máximo de três meses nos níveis prevalecentes em 12 de junho de 1987 Porém antes do congelamento foram anunciados diversos aumentos para os preços públicos e administrados 45 para eletricidade 34 para telefone 32 para o aço 36 para o pão 27 para o leite e 13 para combustíveis A majoração destes preços pretendia além de recompor perdas passadas criar uma margem de folga para enfrentar a fase do congelamento A falta de um realinhamento de preços públicos e administrados na véspera do congelamento fora apontada como uma das falhas do Plano Cruzado O Plano Bresser determinava ainda que as correções futuras dos preços deveriam ter como teto os mesmos percentuais da URP que serviriam de piso para os reajustes salariais A exemplo do Plano Cruzado a base do índice de preços IPC foi também deslocada para o início da vigência do congelamento 15 de junho de 1987 A principal diferença em relação ao Plano Cruzado decorria da determinação oficial de que todos os aumentos de preços anunciados conjuntamente com o Plano Bresser seriam computados integralmente na taxa de inflação de junho Assim a taxa de inflação de julho não ficaria sobrecarregada pelos aumentos de preços anteriores Ainda em 12 de junho o cruzado foi desvalorizado em cerca de 95 Como o Plano Bresser não visava a inflação zero nem tampouco uma desindexação plena da economia a taxa de câmbio não foi congelada Ao contrário as minidesvalorizações diárias do cruzado restabelecidas em novembro de 1986 foram mantidas Anunciouse porém uma desaceleração do ritmo das desvalorizações diárias durante o primeiro mês do congelamento o que contribuiria para sinalizar expectativas inflacionárias mais baixas sem no entanto colocar em risco as ainda frágeis contas externas Os aluguéis residenciais e comerciais foram congelados nos níveis vigentes em junho de 1987 sem qualquer compensação para o prazo decorrido desde o último reajuste Assim os aluguéis com reajustes previstos para os meses de junho a agosto permaneceriam inalterados até o fim do congelamento Como a legislação não foi alterada após o congelamento os aluguéis voltariam a ser corrigidos monetariamente nas datas e com as periodicidades contratuais incorporando toda a inflação registrada durante o congelamento Os contratos para pagamentos futuros em cruzados com taxas de juros pós fixadas reintroduzidos no curto prazo em dezembro de 1986 não foram afetados pelo plano pois a indexação não fora suprimida No caso dos contratos com taxas de juros prefixadas anunciouse para o primeiro mês uma tabela para a deflação diária dos pagamentos futuros em cruzados A tabela de deflação permitia eliminar dos valores em cruzados para pagamentos futuros a expectativa inflacionária embutida que foi arbitrada em 15 ao mês Em contraste com o Plano Cruzado foram oficialmente permitidas várias isenções na aplicação da tabela de deflação Além disso uma vez que o Plano Bresser não envolvia a criação de uma nova moeda tal intervenção nos contratos privados seria mais facilmente contestada na Justiça O Plano Bresser ao contrário do Plano Cruzado original anunciou a adoção de políticas monetária e fiscal ativas A curto prazo o governo praticaria taxas de juros reais positivas com o intuito de inibir a especulação com estoques e o consumo de bens duráveis como também o fluxo de aplicações financeiras para o mercado paralelo do dólar No que tange à política fiscal o programa visava reduzir o déficit público em 1987 dos 67 do PIB projetados para cerca de 35 do PIB No entanto as primeiras medidas anunciadas produziriam apenas uma redução modesta os aumentos das tarifas públicas gerariam uma receita adicional igual a 08 do PIB e a eliminação do subsídio do trigo resultaria numa economia de gastos da ordem de 04 do PIB O Plano de Coerência Macroeconômica elaborado posteriormente anunciaria cortes adicionais no déficit do setor público Os responsáveis pela execução do plano acreditavam que o adiamento de alguns projetos de investimento público sem fundos orçamentados contribuiria para criar uma nova imagem de austeridade para o governo Além disso para o ano seguinte o Plano Bresser se comprometia com a independência do Banco Central na condução da política monetária a proibição das emissões de moeda para financiar os déficits do Tesouro a orçamentação prévia de todas as despesas do governo e a unificação dos múltiplos orçamentos do governo 7 Plano Bresser resultados A evolução da política econômica após o lançamento do segundo programa de estabilização pode ser dividida em dois períodos O primeiro período que vai de julho a dezembro de 1987 inclui as fases de congelamento e flexibilização do Plano Bresser configurando o sucesso inicial e o fracasso posterior desta segunda tentativa23 O segundo período que vai de janeiro a dezembro de 1988 é caracterizado por um renascimento da ortodoxia e por uma retomada do gradualismo no combate à inflação No final de 1988 a economia parecia novamente se encontrar no limiar da hiperinflação Congelamento e flexibilização julho 1987 dezembro 1987 A inflação oficial caiu de 214 em junho para 3 e 64 em julho e agosto de 1987 respectivamente A falta de apoio popular após o fracasso do Plano Cruzado e o desmantelamento dos órgãos de controle com a liberação dos preços após fevereiro de 1987 limitaram o escopo deste segundo congelamento de preços Assim na prática o Plano Bresser contava a curto prazo do lado dos trabalhadores com o congelamento de salários por três meses que a nova regra de política salarial impunha e com o esquecimento da taxa de inflação de 261 de junho que não havia sido repassada aos salários Do lado dos empresários o plano contava com a mudança de expectativas inflacionárias decorrente do anúncio das medidas de austeridade fiscal e rigidez monetária e da suspensão do gatilho salarial A perda de poder aquisitivo dos salários e a prática de taxas de juros reais positivas durante a fase do congelamento tiveram reflexos negativos nas vendas do comércio varejista e no ritmo de produção industrial Assim em contraste com o Plano Cruzado a inflação do congelamento não podia ser atribuída a pressões de demanda A inflação registrada na vigência do congelamento se originava de um conflito distributivo de rendas no setor privado e entre os setores privado e público Os preços relativos da economia não se encontravam em equilíbrio em 12 de junho de 1987 devido à majoração defensiva dos preços diante da expectativa do novo congelamento e aos aumentos promovidos pelo governo nos preços administrados e tarifas públicas A flexibilidade do novo congelamento permitiu que os aumentos de preços decretados na véspera do Plano Bresser fossem repassados aos outros preços da economia gerando inflação e neutralizando parcialmente a transferência de renda para o setor público Além disso a retomada das transferências de recursos reais para o exterior com a recuperação dos superávits comerciais que se iniciara em março de 1987 exacerbava os conflitos internos O desaquecimento da demanda interna e o restabelecimento da confiança na política cambial após a reinstituição das minidesvaloriações diárias do cruzado deram novo impulso às exportações Assim em maio de 1987 as exportações superaram US2 bilhões retomando os níveis anteriores a setembro de 1986 O saldo da balança comercial passou de um déficit de US40 milhões em fevereiro de 1987 para um superávit de mais de US14 bilhão a partir de junho Ainda em julho de 1987 o governo anunciou seu Plano de Controle Macroeconômico que configurava uma mudança de postura em relação à administração anterior A recuperação da poupança nacional não adviria mais da poupança externa forçada que se esperava alcançar com a moratória dos juros da dívida A variável básica do ajuste passava a ser a poupança do governo que já havia representado mais de 4 do PIB em meados da década de 1970 A contenção dos gastos a elevação das tarifas públicas a redução de subsídios e incentivos e uma reforma tributária progressiva aumentariam a poupança em conta corrente do governo de virtualmente nula em 1987 para 53 do PIB em 1991 Este ajuste viabilizaria uma elevação da taxa de investimento para mais de 24 do PIB tornando factível um crescimento autossustentado do produto de 7 ao ano a partir de 1989 A oposição política a um ajuste interno de tal magnitude foi no entanto consideravelmente subestimada As pressões inflacionárias levaram o governo já em agosto com o congelamento oficialmente ainda em vigor a reduzir o leque dos preços controlados e a permitir em caráter emergencial alguns reajustes de preços limitados a 10 Essas medidas abalaram ainda a credibilidade do programa em duas frentes o congelamento e a URP Em primeiro lugar porque com os reajustes o governo sinalizava que o congelamento oficial de preços não precisava ser mais respeitado rigorosamente Em segundo lugar porque o novo teto emergencial de 10 para os reajustes de preços era aproximadamente o dobro do teto oficial determinado pela URP prefixada em 47 ao mês para setembro a novembro com base nas taxas de inflação registradas em julho e agosto de 1987 Em outubro os reajustes de preços autorizados cigarros combustíveis açúcar transportes entre outros já alcançavam a faixa de 15 ao mês O realinhamento dos preços administrados e das tarifas públicas que se iniciou por ocasião da flexibilização do Plano Bresser contribuiu fortemente para a aceleração da taxa mensal de inflação que passou de 57 em setembro para 141 em dezembro Na área salarial a perspectiva de novas perdas durante o último trimestre de 1987 em função do término oficial do congelamento de preços e de reajustes prefixados em apenas 47 ao mês levaram a dois tipos não mutuamente exclusivos de concessão nas negociações Em alguns casos os resíduos inflacionários do gatilho salarial a serem pagos em seis parcelas mensais a partir de setembro foram antecipados Em outros casos os salários foram majorados em 148 em setembro com a antecipação dos reajustes prefixados pela URP para outubro e novembro A partir dos dissídios de setembro os trabalhadores iniciaram também uma ofensiva para incorporar a inflação de junho de 1987 aos salários Um exercício simples de simulação mostrava que um aumento generalizado da ordem de 26 nos salários nominais poderia levar a inflação até 16 a 21 ao mês o que configuraria o retomo ao patamar inflacionário que detonou o programa24 Dado que as datasbase das negociações salariais eram distribuídas ao longo dos 12 meses do ano e que a defasagem de repasse embutida na URP era superior ao gatilho salarial a aceleração da inflação após o Plano Bresser seria mais gradual do que após o Plano Cruzado Assim a percepção do fracasso do Plano Bresser também seria mais gradual O crescimento dos salários reais ganhou novo impulso com a proliferação de acordos de reposição salarial dentro do próprio governo os quais minaram as últimas chances de se alcançar a anunciada redução do déficit público Mensuradas pelo conceito operacional as necessidades de financiamento do setor público somaram 54 do PIB em 1987 Com a inflação oficial no patamar de 14 em dezembro sob uma onda de rumores de um iminente novo congelamento e diante do desgaste provocado pelas resistências à sua proposta de uma reforma tributária progressista o ministro Bresser Pereira pediu demissão Feijãocomarroz janeiro 1988dezembro 1988 O novo ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega iniciou sua gestão rejeitando a alternativa do choque heterodoxo e anunciando metas mais modestas estabilização da inflação em 15 ao mês e redução gradual do déficit público projetado em 78 do PIB para 198825 Estes seriam os ingredientes principais do feijãocomarroz como foi alcunhada a nova política econômica Visando à redução do déficit público foram congelados em termos reais nos níveis vigentes em dezembro de 1987 os saldos dos empréstimos ao setor público o que incluía as empresas estatais os governos estaduais e municipais e posteriormente também a administração direta Após longo debate foram ainda suspensos por dois meses os reajustes salariais dos funcionários públicos prefixados com a URP em 162 ao mês para abril e maio de 1988 Em consequência das medidas de contenção adotadas e da recomposição das tarifas públicas iniciada em novembro de 1987 o déficit público no conceito operacional ficou em 11 do PIB no primeiro semestre de 1988 em contraste com 18 do PIB no mesmo período do ano anterior Este resultado favorável do primeiro semestre viabilizava a meta de 4 do PIB para o ano Diante de uma sazonalidade desfavorável dos gastos públicos e das perspectivas de reposição das URPs para o funcionalismo público no segundo semestre do ano o governo reduziu os prazos de recolhimento do imposto de renda na fonte e do IPI Assim apesar da corrosão inflacionária da receita tributária no segundo semestre do ano o déficit público no conceito operacional ficaria ligeiramente abaixo dos 4 do PIB acordados com o FMI No que tange à expansão monetária os esforços bemsucedidos de redução do déficit público foram em parte neutralizados pela pressão das operações com moeda estrangeira decorrente das emissões de cruzados para cobrir tanto os megassuperávits da balança comercial que a economia atingia quanto as conversões de dívida externa em capital de risco O anúncio reiterado de que o governo não adotaria um novo congelamento de preços contribuiu para a contenção das taxas de inflação ao longo de todo o primeiro semestre do ano abaixo de 20 ao mês O sucesso da política do feijãocomarroz consistiu em evitar a curto prazo uma explosão inflacionária embora se configurasse o retomo da taxa de inflação ao patamar anterior ao lançamento do Plano Bresser O desaquecimento da demanda agregada aliado à administração das datas de reajuste dos preços públicos manteve a taxa de inflação no primeiro trimestre de 1988 entre 16 e 18 ao mês Porém já no segundo trimestre do ano as taxas mensais de inflação superariam 19 em abril e junho em virtude do aumento da velocidade de correção dos preços públicos e de um choque agrícola desfavorável que elevou os preços no atacado IPA OGAgricultura em média 24 ao mês neste período A moratória dos juros da dívida externa decretada em 20 de fevereiro de 1987 foi oficialmente suspensa pelo governo brasileiro em 3 de janeiro de 1988 com o pagamento de cerca de US 1 bilhão dos juros vencidos entre 1 de outubro e 15 de dezembro de 1987 Esse depósito fazia parte de um acordo provisório visando normalizar os pagamentos de juros suspensos com a moratória que totalizava US45 bilhões O financiamento dos juros devidos seria dividido cabendo dois terços aos bancos credores e um terço ao governo brasileiro O balanço das vantagens e desvantagens da moratória é ambíguo Seus defensores apontam como ganhos a economia de US45 bilhões o estancamento das perdas de reservas cambiais e o fortalecimento da posição negociadora brasileira26 Seus opositores contabilizam como custos visíveis a perda e o encarecimento das linhas de crédito de curto prazo e como custos invisíveis de difícil mensuração a inibição de um maior ingresso de recursos externos de fontes diversas inclusive do FMI a perda de oportunidade de fechar um acordo com os bancos credores em condições mais favoráveis quanto às taxas de juros e aos prazos e o afastamento dos investimentos estrangeiros No final de junho de 1988 foi finalmente concluído um acordo preliminar para a dívida externa selando o retomo do Brasil ao formato convencional de renegociação Em termos de aporte de recursos o acordo foi no entanto modesto Do total de US52 bilhões de dinheiro novo o primeiro desembolso de cerca de US4 bilhões em novembro de 1988 serviria apenas para cobrir o pagamento que ainda não havia sido completado dos juros vencidos no período da moratória Os dois outros desembolsos ficaram condicionados a entendimentos com o Banco Mundial BIRD para o financiamento de projetos específicos e até abril de 1989 não haviam sido liberados Além do cofinanciamento com o BIRD o acordo com os bancos trazia outra inovação os bônus de saída exit bonds que embutiam um desconto implícito de 30 sobre o valor nominal da dívida A opção pelos bônus de saída configuraria uma decisão do banco credor de não participar mais dos acordos de refinanciamentos dos juros da dívida externa brasileira Em julho a taxa de inflação bateu novo recorde com o IPC registrando aumento de 24 por pressão dos reajustes dos preços administrados A reação do governo diante do receio de uma explosão inflacionária em agosto consistiu em moderar e retardar os reajustes dos preços administrados Produzida a queda da inflação em agosto o governo deu início à recomposição das tarifas públicas e preços administrados o que envolveu aumentos superiores à inflação passada e o encurtamento dos intervalos entre reajustes de 30 para 20 dias A taxa de inflação atingiu novamente 24 em setembro O novo patamar inflacionário tornava evidente o fracasso da política do feijãocomarroz e realimentava as discussões acerca de alternativas para a desindexação da economia Além do já experimentado congelamento de preços e salários propunhase a adoção de um redutor para os reajustes mensais de preços e salários e uma reforma monetária que instituísse a OTN como moeda legal27 A desindexação da economia qualquer que fosse a alternativa selecionada deveria ser reforçada por um pacto social que começava a ser articulado por empresários e trabalhadores28 Aumentos de preços defensivos diante da ameaça de um congelamento aliados à entressafra da carne levaram a taxa de inflação a bater novo recorde em outubro 272 Ainda em outubro de 1988 foi promulgada a nova Constituição brasileira que transferiu para o Congresso uma parcela da responsabilidade pela condução da política econômica Em matéria econômica a nova Constituição ainda aumentou as vinculações da receita ampliou e enrijeceu os gastos do governo federal e encareceu o custo da mão de obra para os setores produtivos privado e público A redistribuição de cerca de 25 da receita da União em favor dos estados e municípios sem a contra partida de uma transferência equivalente de encargos ampliou as necessidades de financiamento do setor público lato sensu A estabilidade adquirida pelos funcionários públicos com mais de cinco anos de serviço exemplifica o enrijecimento das despesas de pessoal De acordo com o governo as dificuldades para a execução de um ajuste fiscal no âmbito de um programa de estabilização foram agravadas pela nova Constituição uma vez que 92 da receita da União estaria comprometida com as transferências a estados e municípios pessoal encargos da dívida e outras vinculações Além disso foram criados novos encargos sociais e elevados alguns já existentes com reflexos nas contas da Previdência Social e nos custos de produção tais como o aumento de 10 para 40 do saldo do FGTS da multa em caso de demissão sem justa causa a redução da jornada semanal de trabalho de 48 para 44 horas o aumento do custo da hora extra e a ampliação dos prazos das licençasmaternidade e paternidade Finalmente em 4 de novembro de 1988 foi assinado um acordo inédito entre governo empresários e trabalhadores estabelecendo uma espécie de redutor através da prefixação dos reajustes de preços nos dois últimos meses do ano Os termos deste pacto social compreendiam reajustes das tarifas e dos preços públicos e privados até o limite máximo de 265 no período compreendido entre 3 de novembro e 2 de dezembro de 1988 e de 25 entre 3 de dezembro e 2 de janeiro de 1989 a observação de um prazo mínimo de 30 dias para os reajustes de preços contados a partir de 3 de outubro de 1988 o acompanhamento pelos signatários dos reajustes de preços de uma lista de 94 produtos básicos a revisão da sistemática de reajustes dos salários evidenciada a queda da inflação no prazo de 60 dias e um vago compromisso do governo de apresentar em 30 dias uma proposta de saneamento das finanças públicas O principal mérito do pacto social consistiu em conter temporariamente a ameaça da hiperinflação A timidez das metas inflacionárias acordadas reflete claramente as dificuldades em romper a inércia inflacionária por consenso distribuindo de forma equânime as perdas e os ganhos inerentes a uma queda substantiva da inflação As questões mais delicadas tais como o desmonte da URP a definição de uma nova política salarial a ampliação da representatividade dos trabalhadores com a incorporação da principal central sindical CUT que se recusara a participar das negociações a extensão da prefixação às desvalorizações cambiais e à correção monetária a revisão das práticas de indexação a mensuração da inflação e o realinhamento inicial de preços e salários foram relegadas a uma etapa posterior O pacto perdeu força ao longo do mês de novembro Já no início de dezembro os empresários alegavam a existência de defasagens dos preços em relação aos custos e cobravam o saneamento das finanças públicas O governo se ressentia da observação estrita dos limites do pacto nos reajustes das tarifas públicas Os trabalhadores acusavam os empresários de não respeitar os limites do pacto e reclamavam o prometido ganho de salário real que adviria da queda gradual da inflação As taxas de inflação registradas em novembro e dezembro de 1988 foram 269 e 288 respectivamente Apesar da superação das metas pactuadas nos dois primeiros meses e diante da expectativa de que a inflação em janeiro de 1989 alcançasse 30 em função de uma sazonalidade desfavorável e de alguma recomposição de preços defasados estabeleceuse em meados de dezembro um limite máximo de 245 para os reajustes de preços em janeiro Assim o governo ganharia tempo para a preparação de um programa de desindexação mais ambicioso 8 Plano Verão ingredientes O Plano Verão de 14 de janeiro de 1989 promoveu uma nova reforma monetária instituindo o cruzado novo NCz correspondendo a mil cruzados como a nova unidade básica do sistema monetário brasileiro Foi anunciado também como um programa de estabilização híbrido contendo elementos dos receituários ortodoxo e heterodoxo para o combate à inflação Do lado ortodoxo o plano pretendia promover uma contração da demanda agregada no curto prazo ao anunciar a prática de taxas de juros reais elevadas para inibir a especulação com estoques e moeda estrangeira e cortes nas despesas públicas para sustentar a queda da inflação a médio prazo Do lado heterodoxo constituiuse num choque de desindexação ainda mais ambicioso que o Plano Cruzado de fevereiro de 1986 ao suspender ou extinguir todos os mecanismos de realimentação da inflação promovendo inclusive o fim da URP salarial uma poderosa fonte de inércia inflacionária Em contraste com os Planos Cruzado e Bresser não foram predeterminadas novas regras de indexação para a economia Também em contraste com as duas tentativas de estabilização anteriores o Plano Verão demonstrou uma preocupação menor com a neutralidade distributiva provocando fortes redistribuições de renda e riqueza entre credores e devedores a taxas pósfixadas As principais medidas do Plano Verão no que tange às políticas de renda monetária e fiscal são relacionadas em seguida Os salários foram convertidos para novos cruzados tomando como base o poder de compra médio nos últimos 12 meses ou seja no período de janeiro a dezembro de 1988 Sobre esses valores aplicarse ia a URP prefixada em 261 para janeiro de 1989 Ficou estabelecido também que não haveria redução nominal de salários para aquelas categorias cujo poder de compra em janeiro estivesse acima da média de 1988 acrescida da URP Assim somente as categorias com database entre fevereiro e junho teriam aumentos salariais Para as demais categorias os salários permaneceriam inalterados nos níveis de janeiro de 1989 A partir de fevereiro a URP não corrigiria mais os salários Porém em contraste com os Planos Cruzado e Bresser o Plano Verão não estabelecia a priori uma nova regra para os reajustes salariais Esta seria decidida em conjunto com os representantes dos empresários e trabalhadores que participavam das negociações do pacto social Um decreto presidencial determinava que os ministros do Planejamento Fazenda Trabalho e Casa Civil consultassem empresários e trabalhadores para que em 90 dias ou seja até 15 de abril pudessem submeter ao Congresso um projeto de lei dispondo sobre critérios e periodicidade dos reajustes de salários Nesse ínterim seria livre a negociação salarial nas datas base das categorias Os preços foram congelados nos níveis vigentes em 15 de janeiro de 1989 por tempo indeterminado em contraste com o Plano Bresser que limitara o congelamento a 90 dias Na véspera do anúncio do congelamento porém foram autorizados aumentos para os preços públicos e administrados 333 para o pão 475 para o leite 635 para as tarifas postais 35 para as tarifas telefônicas 148 para a energia elétrica 199 para a gasolina e 305 para o álcool entre outros Além de recompor eventuais defasagens em relação aos custos de produção o realinhamento dos preços a exemplo do Plano Bresser deveria gerar uma margem de folga para suportar o congelamento Pela terceira vez o governo recorreu à construção de um novo vetor de preços para servir de base para a apuração da inflação Assim a base do IPC foi deslocada para 15 de janeiro De forma análoga ao Plano Bresser ficou determinado que os aumentos de preços autorizados pelo governo na véspera da entrada em vigor do congelamento seriam computados integralmente na inflação de janeiro evitando a contaminação da taxa de fevereiro que apurada entre 15 de janeiro e 14 de fevereiro indicaria a inflação dos primeiros 30 dias do novo plano A cotação do dólar norteamericano foi fixada em NCz1 o que refletia uma desvalorização do cruzado da ordem de 18 Acreditava se que a relação unitária entre o cruzado novo e o dólar norte americano teria um efeito psicológico positivo na medida em que fosse percebida como um indicador da disposição efetiva do governo em combater a inflação doméstica e assim sustentar a nova paridade a médio prazo Em contraste com o Plano Bresser mais na linha do Plano Cruzado as minidesvalorizações diárias do cruzado foram suspensas a taxa de câmbio permaneceria fixa por tempo indeterminado Tal como no Plano Cruzado os aluguéis residenciais foram convertidos para novos cruzados pelos valores médios de forma análoga aos salários Foram anunciados diferentes fatores de conversão pela média em função da periodicidade contratual dos reajustes anual ou semestral e do mês do último reajuste No caso dos aluguéis comerciais o procedimento foi distinto em função da predominância dos reajustes mensais Foram congelados os valores vigentes em janeiro de 1989 com as regras contratuais voltando a valer após o congelamento Os contratos celebrados a partir de 15 de janeiro de 1989 para aluguéis tanto residenciais quanto comerciais poderiam contemplar qualquer índice de correção acordado entre locadores e locatários A OTN que servia de indexador para os contratos pósfixados e que com a aceleração da inflação recente estava se tomando gradualmente uma moeda escritural paralela ao cruzado foi extinta Assim os contratos com base na OTN ficariam congelados nos valores de 1 de janeiro de 1989 enquanto que os contratos com base na OTN fiscal que tinha correção diária manteriam os valores vigentes em 13 de janeiro de 1989 Essa desindexação que no caso da OTN desprezava a inflação entre 1 e 15 de janeiro e que no caso da OTN fiscal desprezava a inflação corretiva e defensiva do Plano Verão beneficiou os devedores em detrimentos dos credores O Plano Verão também proibiu cláusulas de indexação nos contratos novos com prazo inferior a 91 dias permitindose nos contratos com prazo superior a 90 dias a livre pactuação da regra de indexação De forma análoga aos Planos Cruzado e Bresser o Plano Verão estabeleceu uma nova tablita de fatores diários para converter em cruzados novos as dívidas com vencimento posterior a 15 de janeiro de 1989 expressas em cruzados Foram isentas da aplicação da tablita os pagamentos de impostos serviços públicos consórcios mensalidades escolares clubes e condomínios Diferentemente dos Planos Cruzado e Bresser os fatores de conversão do Plano Verão considerariam além do diferencial inflacionário também o diferencial de taxas de juros reais pré e pósplano Desta forma seria eliminado o excesso de expectativa inflacionária e custo financeiro embutidos nos valores prefixados para o futuro O ajuste fiscal proposto pelo governo junto com o Plano Verão deveria atuar em quatro frentes redução das despesas de custeio através de uma ampla reforma administrativa que incluiria a extinção de cinco ministérios redução das despesas de pessoal através da demissão de funcionários públicos redução do setor produtivo estatal através de um amplo programa de privatização rigidez na programação e execução financeira do Tesouro através de limitações à emissão de títulos da dívida pública e à realização de despesas não financeiras de acordo com a disponibilidade de caixa No que tange à política monetária seriam utilizados três instrumentos básicos aumento da taxa de juros real de curto prazo de tal forma a inibir movimentos especulativos controle do crédito ao setor privado através de limitações de crédito alteração do limites dos cheques especiais redução dos prazos de financiamento e do pagamento de cartões de crédito e aumento do recolhimento compulsório e redução das pressões das operações com moeda estrangeira através da suspensão dos leilões mensais de conversão da dívida externa em capital de risco instituídos em novembro de 1987 e dos reempréstimos dos depósitos dos bancos credores no Banco Central conforme o acordo externo de novembro de 1988 e menores superávits em conta corrente do balanço de pagamentos através da liberação de importações e da atuação da política cambial 9 Plano Verão resultados A execução do Plano Verão pretendia produzir dois ou três meses de taxas de inflação baixas com a economia desindexada e assim induzir os agentes econômicos a ampliar as periodicidades dos reajustes nas negociações sobre as regras futuras de indexação Nesta fase seria também aprofundado o ajuste fiscal As taxas de juros elevadas promoveriam uma recessão suave a curto prazo o que facilitaria a eliminação gradual do congelamento O congelamento de preços seria conduzido sob a forma de uma sucessão de congelamentos de menor escopo e de pequena duração o que permitiria tatear o equilíbrio de preços da economia A concepção do plano embutia no entanto diversos elementos de risco Em primeiro lugar o Plano Verão se depararia com a falta de credibilidade do governo após os fracassos obtidos com os Planos Cruzado e Bresser Desde logo a sociedade exploraria os aspectos artificiais e temporários do programa especulando sobre o fôlego das contas públicas para a consecução de uma política de juros reais elevados sobre as dificuldades políticas envolvidas no ajuste fiscal anunciado num ano eleitoral e sobre a duração e o escopo do congelamento de preços E em segundo lugar a economia marcharia mais rapidamente para a hiperinflação no caso de fracasso de plano na medida em que eram eliminadas as âncoras inflacionárias da OTN e da URP A inflação tornarseia mais dependente das expectativas inflacionárias e consequentemente do próprio sucesso a curto prazo na condução das políticas monetária e fiscal Os resultados dos primeiros meses do Plano Verão não corresponderam às expectativas do governo A variação oficial do IPC em fevereiro ficou em 36 Porém já em março segundo mês do congelamento a inflação alcançou 61 influenciando negativamente o curso das negociações sobre as novas regras de indexação da economia Sem o braço da política fiscal cujo ajuste anunciado não se materializou o governo se viu obrigado a manter as taxas de juros excessivamente elevadas por um período mais longo do que previsto inicialmente o que agravou ainda mais o desequilíbrio fiscal Segundo estimativas do próprio governo o custo da conta de juros da dívida interna após o Plano Verão deveria alcançar 3 a 4 do PIB em 1989 o que sinalizaria um déficit operacional para o setor público da ordem de 6 a 7 do PIB Em bases anuais o déficit operacional de fato acabou alcançando em 1989 69 do PIB em comparação com 48 no ano anterior As taxas de juros reais praticadas no mercado aberto utilizando como deflator o IPC do mês em curso alcançaram 148 e 135 ao mês em fevereiro e março de 1989 respectivamente e tiveram aparentemente um efeito perverso sobre o consumo Os ganhos proporcionados pelas elevadas taxas de juros reais aliados à redução do recolhimento na fonte do imposto de renda para as pessoas físicas aumentaram a renda disponível dos consumidores neutralizando os efeitos contracionistas dos aumentos de preços na véspera do anúncio do plano da elevação do custo do crédito e da desvalorização do estoque de riqueza não financeira sobre a demanda Além disso a falta de credibilidade no programa também impulsionou o consumo pois a aposta na fragilidade e na transitoriedade do congelamento começou mais cedo do que se esperava Por estes motivos a recessão que o Plano Verão admitia provocar e que consolidaria a estabilização dos preços não se materializou As vendas no comércio varejista de São Paulo cresceram 97 em fevereiro e mais de 10 em março de 1989 No que tange aos salários o Congresso aprovou ainda em fevereiro de 1989 uma lei determinando a reposição em três parcelas a partir de março do percentual de 75 referente à diferença entre as variações do INPC e da URP Após o fracasso das negociações com empresários e trabalhadores o governo determinou em fins de abril uma reposição salarial adicional de até 131 dependendo da database da categoria e a antecipação da terceira parcela do reajuste de 75 que seria paga em maio Esses percentuais não satisfizeram a classe trabalhadora que intensificou o movimento grevista com pleitos de recomposição dos picos salariais de 1988 As discussões entre o governo os empresários e trabalhadores acerca da nova política salarial também não convergiram no prazo determinado de 15 de abril A indefinição quanto à política salarial foi considerada outro agravante do movimento grevista que assolou o país a partir de março A partir de março as taxas de juros reais mensais caíram para 136 em maio e depois aumentaram até atingir um patamar entre 53 e 74 entre dezembro de 1989 e fevereiro de 1990 Terminada a greve geral dos dias 14 e 15 de março o governo promoveu os primeiros reajustes na tabela de preços o que contribuiu para que a taxa de inflação em abril alcançasse 73 Também deuse início a uma prática de desvalorizações cambiais pequenas e eventuais do cruzado novo sem qualquer indicação de um indexador e de uma regra Vale notar que a balança comercial atingiu superávits recordes no primeiro trimestre do ano acumulando US203 bilhões em 12 meses no final de março de 1989 O surto de vendas externas resultou em uma transferência de renda do governo para o setor exportador A aplicação às taxas de juros domésticas dos adiantamentos de contrato de câmbio cujo custo com a taxa de câmbio fixa se resumia às taxas de juros internacionais tornou a atividade exportadora atraente financeiramente Em fins de abril o governo deu os primeiros passos na direção da reindexação da economia Atendendo a demanda de um indexador oficial foi criado o BTN Bônus do Tesouro Nacional sucedâneo da extinta OTN corrigido mensalmente com base na variação do IPC O novo indexador só poderia ser utilizado em novos contratos com prazo mínimo de 90 dias Na mesma ocasião o governo estabeleceu as regras do descongelamento após a primeira revisão dos preços sem data marcada a ser autorizada pelo ministro da Fazenda os reajustes só poderiam ocorrer em intervalos de 90 dias exceto em casos excepcionais Além disso o governo ratificou a decisão de não submeter uma proposta de política salarial ao Congresso embora procurasse induzir com os reajustes trimestrais de preços e os prazos mínimos de 90 dias para os contratos pósfixados em BTN a adoção da trimestralidade O processo de realinhamento dos preços foi detonado no início de maio com os reajustes dos preços dos automóveis das passagens aéreas e dos combustíveis Ao longo do mês o descongelamento se intensificou com a determinação de reajustes praticamente simultâneos para um extenso leque de produtos com preços administrados e de serviços públicos De acordo com a estratégia anunciada pelo governo de só manter sob controle oficial os preços dos segmentos oligopolistas e monopolistas foram liberados diversos preços de setores classificados como competitivos Como era esperado o descongelamento provocou uma forte aceleração da inflação ainda em maio com a taxa oficial medida entre os dias 15 de abril e 14 de maio alcançando 99 no mês Dado que os percentuais de reajustes dos preços administrados a partir de maio variaram na faixa de 15 a 25 estimavase uma taxa de inflação não inferior a 15 em junho sancionada pela elevação das taxas de juros do mercado aberto no início de junho e excedida pelos mais de 20 de fato verificados A inflação no segundo semestre escalou rapidamente mais de 30 em agosto de 40 em outubro de 50 em dezembro Em fevereiro de 1990 alcançou mais de 70 e em março o pico de 84 ou seja mais de 4800 nos últimos 12 meses A cotação do dólar no mercado paralelo ficou praticamente estável nos dois primeiros meses do plano cerca de 70 acima da taxa oficial A partir de abril porém o ágio voltou a crescer até atingir o nível recorde de 200 em meados de maio Além da queda das taxas de juros e da expectativa de uma maxidesvalorização cambial a cotação do dólar no mercado paralelo foi impulsionada pelo risco de perda de controle do processo inflacionário a partir do descongelamento que se iniciava A transposição para o caso brasileiro do fracasso do Plano Primavera argentino e da consequente entrada da economia argentina numa trajetória hiperinflacionária na véspera das eleições presidenciais alimentou as especulações acerca do fracasso do Plano Verão e de suas consequências econômicas políticas e sociais Na tentativa de conter a especulação o governo promoveu uma minidesvalorização do cruzado novo de 45 e definiu novas regras para a correção cambial equiparação à variação mensal do IGPDI da FGV através de até seis minidesvalorizações mensais sem data marcada No segundo semestre de 1989 e nos dois primeiros meses de 1990 o ágio do dólar mantevese em torno de 100 Ainda em maio o Congresso aprovou uma nova política salarial Lei no 7788 de 3789 que estabeleceu um esquema de reajustes diferenciados de acordo com a faixa de renda e em cascata Assim a parcela do salário até três salários mínimos teria reajustes mensais de acordo com a variação do IPC A parcela do salário entre 3 e 20 salários mínimos teria reajustes trimestrais com eventuais antecipações mensais iguais ao diferencial entre a taxa mensal de inflação e um gatilho de 5 Finalmente a parcela do salário superior a 20 salários mínimos seria negociada livremente Vale notar que a nova política salarial restabeleceu os reajustes mensais que se pretendia suprimir com a eliminação da URP para uma grande fração da massa salarial uma vez que as taxas de inflação já haviam ultrapassado o patamar de 5 ao mês Além disso as novas regras configuraram uma realimentação inflacionária muito mais rápida do que a extinta URP o que aumentou o grau de indexação da economia Notese que com a URP os picos salariais só eram repostos anualmente na database da categoria enquanto que com a nova política os picos salariais eram recompostos trimestralmente pelo menos até a faixa de 20 salários mínimos O principal mérito do Plano Verão residiu na interrupção de uma rota hiperinflacionária No entanto a salto da inflação já a partir do segundo mês o descongelamento de preços no contexto de taxas de juros decrescentes o movimento de recomposição dos picos de salário real de 1988 as defasagens apontadas para os preços públicos e administrados as indefinições ainda existentes quanto à reindexação da economia a precariedade do ajuste fiscal e uma expansão monetária nos últimos 12 meses da ordem de 1000 ao ano já traçavam em meados de 1989 cenários inquietantes para a inflação no curto prazo No contexto de taxas mensais de inflação de dois dígitos e reajustes salariais mensais podiase projetar a curto prazo uma redução dos prazos de indexação vigentes com o virtual abandono da trimestralidade nos reajustes de preços e a reinstituição das minidesvalorizações cambiais diárias Assim o governo encaminhou se rapidamente para o estabelecimento de uma economia tão ou mais indexada do que antes do Plano Verão com o fator agravante de um maior desequilíbrio fiscal Tal como em fins de 1985 em meados de 1987 e na segunda metade de 1988 ressurge na sociedade brasileira o temor da hiperinflação Este temor recrudesceu a partir de meados de 1989 com a rápida aceleração da inflação mensal Generalizaramse as expectativas de que o novo governo que tomaria posse em março de 1990 implementaria um novo programa de estabilização embora não fosse claro que características teria tal programa A despeito das expectativas pessimistas no início do ano da forte aceleração inflacionária e das altas taxas de juros o crescimento do PIB em 1989 foi de 32 em contraste com a estagnação no ano anterior 10 Conclusões Apesar da ênfase da política econômica no combate à inflação a taxa anual de inflação quadruplicou entre o início de 1985 e o final do ano de 1988 Após a queda proporcionada pelo Plano Verão em meados de 1989 já se projetava para o segundo semestre de 1989 o retorno a uma taxa de inflação de 20 ao mês Essas expectativas se revelaram otimistas pois como já se comentou a inflação que em junho excedeu 20 ao mês em dezembro superava os 50 Em fevereiro de 1990 alcançou mais de 70 e em março o pico de 84 Os Planos Cruzado Bresser e Verão não produziram mais do que um represamento temporário da inflação uma vez que não foram solucionados quaisquer dos conflitos distributivos de renda ou atacados os desequilíbrios estruturais da economia que poderiam ser considerados focos de pressão inflacionária a médio prazo29 Não se logrou reduzir as transferências de recursos reais para o exterior O desequilíbrio das contas do governo se agravou A política monetária foi predominantemente acomodatícia O setor empresarial passou a se defender com maior presteza e eficácia de quaisquer defasagens ou de ameaças de defasagem dos preços em relação aos custos E os trabalhadores manifestaram com veemência crescente sua insatisfação quanto ao poder de compra dos salários30 Assim restou apenas ao governo promover desindexações e em seguida administrar as inevitáveis acelerações da inflação Os efeitos permanentes de uma sucessão de choques de estabilização se mostraram porém talvez tão perversos quanto os efeitos da inflação que pretendiam eliminar Em primeiro lugar porque os sucessivos congelamentos perderam eficácia como instrumentos de combate à inflação tenderam a tornarse menos abrangentes no escopo e mais curtos no tempo Em segundo lugar porque com a ameaça ou a consolidação de uma nova escalada inflacionária os agentes econômicos procuraram defender suas participações na renda incrementando suas remunerações e praticando reajustes mais frequentes o que impulsionou a inflação e tornou o novo choque inevitável E em terceiro lugar porque as bruscas variações das taxas de inflação nos ciclos congelamentoflexibilização provocaram redistribuições da renda que com o aumento da incerteza acabaram tendo reflexos negativos sobre as decisões de investimento afetando o lado real da economia O produto real da economia brasileira se expandiu à taxa média de 44 ao ano entre 1985 e 1989 A análise dos índices trimestrais do PIB real revela que a estagnação da produção se iniciou no final de 1986 após dois anos consecutivos de crescimento superior a 7 ao ano Entre 1980 e 1989 o PIB cresceu apenas 29 ao ano em contraste com mais de 8 ao ano na década de 1970 Levando em conta o crescimento populacional de 2 ao ano a renda per capita da economia brasileira avançou apenas 09 ao ano na década de 1980 A desaceleração do crescimento na década de 1980 foi comandada pela indústria cujo produto cresceu apenas 20 ao ano entre 1980 e 1989 Segundo Werneck 1988 o custo da desaceleração do crescimento nos anos 1980 seria um produto por habitante no ano de 2000 cerca de 30 inferior àquele que seria alcançado com a manutenção do crescimento do produto à taxa de 7 ao ano a partir de 1981 A desaceleração do crescimento da década de 1980 no entanto não abriu espaço para a retomada da taxa histórica uma vez que os desequilíbrios tanto externos quanto internos da economia não foram equacionados de forma definitiva Por este motivo a década de 1980 pode ser caracterizada como uma década perdida A estagnação prolongada a falta de sucesso no combate à inflação as incertezas quanto às renegociações externas o agravamento do desequilíbrio fiscal as indefinições da política industrial e as ameaças ao capital estrangeiro não criaram um clima propício à retomada do crescimento sustentado na segunda metade da década de 1980 Embora formação bruta de capital fixo como porcentagem do PIB tenha aumentado expressivamente a partir de meados da década de 1980 há indicações de que isto tenha sido provocado pela aceleração inflacionária com os agentes econômicos buscando ativos reais De qualquer forma a manutenção de um crescimento autossustentado do produto da ordem de 6 ao ano requereria um aumento do patamar da taxa de investimento para cerca de 23 do PIB próximo da média da década de 1970 Fritsch e Modiano 1988 Um dos principais empecilhos para a retomada de uma taxa de investimento mais alta decorreu da insuficiência de poupança para seu financiamento A poupança externa que representou cerca de 4 do PIB em média na década de 1970 virtualmente desapareceu a partir de 1984 em decorrência do equilíbrio da conta corrente do balanço de pagamentos em resposta à suspensão dos empréstimos externos voluntários em 1982 A poupança nacional também caiu devido à redução da poupança pública que após representar 45 do PIB na média da década de 1970 tornouse negativa a partir de 198231 A carga tributária líquida do governo caiu de 15 do PIB na média da década de 1970 para 10 do PIB na primeira metade da década de 1980 e para menos de 10 do PIB a partir de 1985 A recuperação do investimento exigiria assim necessariamente por uma recomposição da carga tributária líquida e consequentemente da poupança do governo de pelo menos 5 do PIB A baixa taxa média de crescimento da economia brasileira no período 198589 contribuiu para sedimentar a geração de elevados superávits comerciais que se iniciou com o ajuste recessivo de 1983 Beneficiado ainda por termos de troca mais favoráveis até 1988 e por um crescimento mais acentuado do comércio mundial o superávit da balança comercial passou de US12 a 13 bilhões em 198485 para a faixa de US19 bilhões em 1988 e US16 bilhões em 1989 Em consequência pela primeira vez desde a eclosão da crise de 1982 verificouse em 1988 e 1989 uma redução do estoque da dívida externa o que tende a se repetir nos anos posteriores sob hipóteses de crescimento moderado do produto Ironicamente a falta de uma solução para os desequilíbrios internos herdados do início dos anos 1980 ao não permitir uma retomada vigorosa do crescimento econômico reforçou e prolongou o ajuste recessivo do desequilíbrio externo que caracterizou a política econômica da primeira metade da década 1A versão original deste capítulo era o último capítulo da primeira edição deste livro e foi completada ao final do primeiro semestre de 1989 Para publicação nessa nova edição foi revisada por Marcelo de Paiva Abreu para incorporar material relativo ao segundo semestre de 1989 e ao início de 1990 até a posse do novo governo preservandose a essência da análise original A revisão afeta principalmente as seções referentes aos resultados do Plano Verão e as conclusões Eduardo Modiano agradece os comentários de Marcelo de Paiva Abreu e Luiz Chrysostomo de Oliveira Filho ao artigo original e a assistência de Carlos Gustavo Perret Simas na preparação da versão original deste capítulo 2O impacto inflacionário da maxidesvalorização do cruzeiro de fevereiro de 1983 foi dimensionado por Modiano 1988a cap 2 3Ver Lopes 1986a caps 8 e 12 4Uma expressão analítica para a relação entre o salário real médio e a taxa de inflação foi derivada por Simonsen 1984 e Modiano 1988a cap 4 5Para uma exposição não analítica da relação entre o conflito distributivo e a inércia inflacionária ver Bacha 1986 6Uma formulação analítica do modelo de equilíbrio distributivo e inflacionário pode ser encontrada em Modiano 1988a cap 4 7Para uma formalização do modelo de inflação baseado no conflito distributivo de rendas que caracteriza a macroeconomia estruturalista ver Bacha 1982 e Taylor 1983 8Esta seção baseiase na análise de Modiano 1986 9A Tabela 131 apresenta as taxas de mensais da inflação oficial de janeiro de 1985 até dezembro de 1990 10Para uma análise dos regimes alternativos de indexação salarial ver Arida 1982 Lopes 1986a cap 12 e Modiano 1988a caps 5 e 6 11Sobre as vantagens e desvantagens das diversas medidas da inflação no Brasil ver Lopes 1985 12Ver Lopes 1986a cap 22 e Modiano 1988a cap 10 13As seções 4 e 5 baseiamse em Modiano 1988a cap 11 14Ver Bacha 1986 15O impacto inflacionário da adoção da escala móvel para os reajustes salariais foi analisado por Gambiagi 1987 e Modiano 1988a cap 11 16Ver Lopes 1986b 17Carneiro 1987b Franco 1986b e Marques 1988 apresentam análises mais detalhadas dos dois primeiros períodos do Plano Cruzado 18Ver Moraes 1988 19Batista Jr 1988b analisa em maior detalhe as causas e os objetivos oficiais da moratória brasileira 20A contribuição acadêmica do ministro da Fazenda Bresser Pereira às discussões sobre inércia inflacionária e o choque heterodoxo está sumarizada em Pereira e Nakano 1984 e 1986 21Ver Lopes 1989 e Modiano 1987a 22Modiano 1988a cap 4 apresenta uma análise teórica do novo esquema de reajustes salariais 23Modiano 1987a apresenta também uma análise mais detalhada do primeiro período do Plano Bresser 24Ver Modiano 1987a 1987b 25Carneiro e Modiano 1988 discutem a condução da política econômica durante o ano de 1988 com mais detalhes 26Ver Batista Jr 1988c 27Ver Lopes 1989 28A importância do pacto social na estabilização da economia israelense foi ressaltada por Dornbusch e Simonsen 1987 29Dornbusch e Simonsen 1987 Modiano 1988a cap12 e Ocampo 1987 resumem as lições derivadas dos sucessos e fracassos dos programas heterodoxos de estabilização 30Bacha 1988 e Modiano 1987b apresentam uma taxonomia dos conflitos distributivos de renda na economia brasileira 31Ver Werneck 1986c CAPÍTULO 15 Estabilização abertura e privatização 19901994 Marcelo de Paiva Abreu e Rogério LF Werneck Fernando Collor assumiu a Presidência em 15 de março de 1990 com o país submetido a avassaladora inflação de mais de 80 ao mês Como plenamente antecipado teve de anunciar um drástico plano de estabilização no primeiro dia de governo Mas seu programa econômico incluiu também reformas estruturais centradas na abertura comercial na redução do papel do Estado como produtor de bens e serviços e na reorganização da administração pública federal Embora o processo inflacionário tenha se tornado menos virulento os esforços de estabilização de seu governo fracassaram Mas houve surpreendente sucesso na implementação de duas reformas cruciais privatização e liberalização comercial De uma perspectiva de longo prazo seu governo marcou o início da reversão da estratégia econômica de quase meio século baseada nos pilares da ação do Estado e da autarquia preconizada por Roberto Simonsen em 1944 na sua controvérsia com Eugênio Gudin1 Político com base eleitoral nos grotões alagoanos ainda que com conexões em Brasília e no Rio de Janeiro Collor mostrouse pouco sensível às contrapressões do CentroSul às reformas Em contraste com a privatização e a abertura seus esforços de reforma na área administrativa fracassaram em meio a deficiências de concepção e implementação advindas de equívocos na seleção de órgãos públicos a eliminar efetivação indiscriminada de funcionários contratados pelo regime da CLT e demissões nem sempre justificadas e carentes de amparo legal A postura hostil do governo em relação ao funcionalismo dificultou em muito sua atuação Ironicamente tendo em vista a tônica da campanha eleitoral de Collor centrada na denúncia dos marajás do serviço público foram as acusações de corrupção na sua administração que levaram a seu impeachment no final de 1992 quando mal havia cumprido metade do mandato Seu vicepresidente e sucessor Itamar Franco depois de um período inicial de alta volatilidade em que se permitiu nomear quatro ministros da Fazenda em sete meses acabou encontrando um nome com cabedal adequado para levar a bom termo o esforço de estabilização Entre maio de 1993 e o final de março de 1994 Fernando Henrique Cardoso conduziu a concepção e boa parte da implementação do Plano Real programa de estabilização que afinal conseguiria debelar com sucesso o processo de alta inflação a partir de meados de 1994 No mandato de Itamar Franco continuaram avançando as reformas relativas à abertura comercial e à privatização Fracasso do Plano Collor Não se pode subestimar a gravidade do quadro econômico com que Collor se defrontou ao tomar posse A taxa de inflação de fevereiro havia sido superior a 70 A combinação de rápida expansão de gastos do governo com significativa redução de carga tributária ao longo da segunda metade da década de 1980 havia levado o déficit operacional consolidado do setor público a 69 do PIB em 1989 As reservas internacionais estavam tecnicamente zeradas Os minguados US97 bilhões registrados nas estatísticas oficiais haviam sido acumulados às custas de atrasos nos pagamentos de juros a credores externos Para que as contas externas fossem mantidas sob controle precário as importações tinham sido comprimidas a não mais que 44 do PIB Em contraste com experiências de estabilização dos anos 1980 dessa vez não havia margem para dúvidas acerca do momento exato em que o novo governo anunciaria as medidas de estabilização Tendo em vista o grau de descontrole da aceleração inflacionária já se sabia que Collor estaria obrigado a anunciar seu programa de estabilização logo no início do seu mandato muito provavelmente no próprio dia da posse Naturalmente a concepção e a implementação de um plano de estabilização com data de anúncio amplamente conhecida envolveram dificuldades redobradas tendo em vista inevitáveis movimentos antecipatórios e altamente desestabilizadores que nessas circunstâncias a própria posse do novo presidente ensejaria Além de remarcações preventivas geradas pela expectativa de imposição de novo congelamento de preços e de movimentos especulativos estimulados pela expectativa de uma desvalorização cambial temiam se os efeitos desestabilizadores provenientes da incerteza acerca da incidência de perdas que adviriam das severas medidas de ajuste fiscal aventadas Especialmente temido era um movimento generalizado de rápida recomposição de carteiras de investimento com fuga de aplicações em títulos públicos induzida pelo receio de que o governo viesse a impor alguma forma de calote na dívida pública A parte mais controvertida do programa de estabilização que afinal se anunciou foi exatamente a tentativa de impedir a fuga de títulos públicos com a retenção pelo governo de parte substancial dos ativos financeiros de empresas e pessoas físicas Retidos por 18 meses os ativos foram compulsoriamente convertidos em depósitos no Banco Central com correção pela inflação remuneração de 6 ao ano e previsão de devolução em 12 prestações mensais a partir do décimo nono mês De início cerca de 80 dos ativos financeiros chegaram a ser retidos Ao mesmo tempo que cerceou o espaço para recomposição de carteiras de investimento a retenção de ativos imposta pelo governo teve efeitos contracionistas importantes sobre a demanda agregada De um lado representou súbita e brutal contração de liquidez De outro ainda que colateralmente gerou efeitoriqueza negativo de grandes proporções na medida em que boa parte dos agentes afetados pela retenção atribuiu probabilidade razoavelmente alta à não recuperação integral dos ativos retidos Na verdade num primeiro momento parcela substancial desses agentes parece ter atribuído probabilidade bastante elevada à perda definitiva e completa dos recursos retidos Foi da apreensão generalizada com as possíveis perdas envolvidas na retenção de ativos que adveio o efeitoriqueza Reforçando tais mecanismos de contração de demanda agregada o governo também anunciou como parte do plano de estabilização um grande esforço de ajuste fiscal A proposta inicial era fazer com que o déficit operacional do setor público de 8 do PIB observado em 1989 se transformasse em superávit de 2 do PIB em 1990 um gigantesco ajuste de nada menos do que 10 do PIB A aposta do governo era a de que a contração de demanda agregada que adviria da combinação de ajuste fiscal de tais proporções com a drástica retenção de ativos financeiros criaria condições adequadas para que o terceiro componente do plano de estabilização o congelamento de preços e salários quebrasse de forma efetiva e duradoura a inércia da alta inflação O que se almejava era uma rápida mudança do processo inflacionário já no segundo trimestre 1990 para regime muito mais benigno de taxa anual de um dígito2 Com o exagero proposital das medidas de contração de demanda esperavase que o plano deixaria espaço para relaxamento gradual e controlado do esforço contracionista à luz da evolução da inflação e do nível de atividade Mas a dosagem mostrouse bem mais problemática do que se imaginava Logo após o anúncio do plano na esteira da desorganização gerada pela falta de capital de giro das empresas de situações dramáticas enfrentadas por muitas famílias em decorrência da súbita restrição de liquidez e de fortes pressões políticas exercidas sobre o Banco Central foram criados vários mecanismos de flexibilização da retenção que levaram à rápida redução do percentual de ativos retidos Tão rápida que a correção se revelou excessiva Em cerca de 45 dias passouse de uma situação de grande apreensão com a redução despropositada de liquidez imposta pelo programa de estabilização a uma situação de alarme com a rapidez com que a liquidez estava sendo restaurada3 Também pelo lado da política fiscal logo ficou claro que o ajuste fiscal de 10 do PIB seria bem mais difícil do que esperava o governo Nem tanto pelo lado da receita tributária do qual se esperava uma contribuição de 4 do PIB em boa parte advinda de forte elevação da tributação sobre operações financeiras Os outros 6 do PIB é que se afiguravam mais difíceis Tendo em vista as dificuldades de montagem do programa de privatização as previsões de vendas de ativos já em 1990 logo se mostrariam excessivamente otimistas E do lado do corte de despesas os resultados prometiam ser não só mais lentos como mais modestos Já no controle de preços e salários as dificuldades esperadas foram amplificadas por erros graves de implementação Especialmente problemático foi o impensado e prematuro abandono da política de prefixação da inflação para efeito de reajustes salariais pouco após ter sido duramente negociada no Congresso como componente crucial do esforço de quebra da inércia inflacionária A esperança de que a inflação convergisse para uma taxa anualizada de um dígito logo se revelou completamente infundada Já no final do segundo trimestre de 1990 pouco mais de 100 dias após o lançamento do plano de estabilização havia ficado claro que a taxa mensal de inflação voltara a ser de dois dígitos Em maio assustado com a evolução da inflação e com a reindexação de preços que poderia ser deflagrada na esteira da movimentação do Congresso para aprovar uma nova lei de reajustes salariais o governo tentou restaurar a credibilidade do plano de estabilização reforçando seu lado mais ortodoxo Anunciou mais empenho na viabilização do ajuste fiscal pretendido e metas de expansão monetária extremamente apertadas para o segundo semestre de 1990 Para 1991 a meta anunciada foi simplesmente de expansão monetária zero Em Junho o governo tentou conter o processo de reindexação introduzindo por medida provisória MP 193 de alto custo político novas regras de reajuste salarial Tendo constatado que a aposta numa estratégia de combate à inflação de resultados rápidos se revelara irrealista o governo tentou refazer o jogo concentrando suas fichas em estratégia de resultados mais lentos respaldada por forte contração de demanda Mas se pelo lado dos preços os efeitos da contração de demanda prometiam ser lentos pelo da produção logo se mostraram rápidos e intensos levando à queda de 44 do PIB em 1990 O que reforçou em muito as pressões políticas contra o programa de estabilização colocando sob tensão crescente o já precário apoio ao governo no Congresso Com a taxa de inflação em patamar superior a 10 ao mês desde maio e resvalando para 14 já em outubro a manutenção das regras de reajuste salarial introduzidas em meados do ano parecia insustentável No final de 1990 sobravam evidências de que a política de estabilização estava em processo terminal de perda de credibilidade No início de 1991 o governo se viu forçado a anunciar novo programa de estabilização com novo congelamento de preços Plano Collor II Dessa vez com forte resistência do Congresso O plano deixou claramente exposta a fragilidade do apoio parlamentar com que contava o Executivo Nas negociações com o Congresso sobre as medidas que compunham o plano o governo teve de deixar questões fundamentais em aberto para acerto posterior Nem mesmo conseguiu aprovar a proposta de política salarial que enviou ao Legislativo E os efeitos do congelamento sobre a inflação se revelaram especialmente efêmeros A constatação da fragilidade do apoio com que efetivamente contava no Congresso parece ter contribuído para que o governo abandonasse de vez o empenho no combate à inflação que havia exibido nos seus primeiros meses de mandato Na verdade pouco mais de 30 dias após o anúncio do novo programa de estabilização o governo lançou o Projeto de Reconstrução Nacional apresentado como agenda de discussão das reformas estruturais que se faziam necessárias para um processo de rápida modernização do país com a retomada do crescimento sustentado Conjugada com o quadro recessivo que se instalara no ano anterior a nova iniciativa logo ensejou debate prontamente respaldado por autoridades da área econômica acerca da possibilidade de conciliar o quadro de taxas de inflação mensais de dois dígitos com a retomada ordenada do crescimento econômico sustentado no país Com base na visão de que o controle de demanda e o baixo nível de atividade não vinham cumprindo qualquer papel positivo no combate à inflação formouse ampla coalizão favorável ao rápido reaquecimento da economia envolvendo o empresariado lideranças sindicais boa parte dos governadores e segmentos importantes do Congresso O foco na questão da estabilização que adviera do senso de urgência incutido pela inflação da ordem de 80 ao mês observada no final do governo Sarney fora mais uma vez perdido Alta inflação corrupção e impeachment No início de maio de 1991 a maior parte da equipe econômica com que Collor havia iniciado seu mandato 14 meses antes deixou o governo No Ministério da Economia Zélia Cardoso de Mello foi substituída por Marcílio Marques Moreira E na presidência do Banco Central Ibraim Eris foi sucedido por Francisco Gros A nova equipe teve de lidar de imediato com situações difíceis em várias frentes Havia em primeiro lugar um quadro inflacionário delicado tendo em vista a necessidade de assegurar saída ordenada do congelamento de preços que anunciado apenas quatro meses antes se esgarçava a olhos vistos apesar da demanda agregada ainda arrefecida A volta a um regime de inflação mensal de dois dígitos tornava inevitável a negociação cuidadosa de nova lei salarial com o Congresso num momento em que a base parlamentar do governo se mostrava preocupantemente precária Em segundo lugar o quadro fiscal estava em franca deterioração Há muito já se sabia que como boa parte das medidas de política fiscal adotadas no início do governo tinha efeitos circunscritos a 1990 seria necessário novo esforço de ajuste fiscal em 1991 E em meados de 1991 parecia claro que o governo federal já havia levado tão longe quanto possível sua política de simples repressão do déficit público com base em atrasos de desembolsos e compressão dos salários do funcionalismo Por outro lado o rápido agravamento do desequilíbrio financeiro dos governos subnacionais num quadro generalizado de gestão irresponsável dos bancos estaduais tornara inevitável a reestruturação das dívidas dos estados Em terceiro lugar a economia havia se tornado muito mais instável em decorrência da crescente volatilidade das expectativas acirrada pela recorrência dos choques de estabilização e das mudanças de regras do jogo Os movimentos defensivos dos agentes econômicos que antes se manifestavam basicamente na forma de remarcações de preços passaram também a se manifestar na forma de rápidas e desestabilizadoras recomposições nas carteiras de ativos Boa parte do esforço inicial da nova equipe teve de ser consumido no empenho de convencer o país de que estava sinceramente decidida a evitar novas descontinuidades e sobressaltos na condução da política econômica Para que tal empenho pudesse ter sucesso a equipe teria de eliminar qualquer dúvida acerca da efetiva disposição do governo de iniciar a devolução dos ativos financeiros compulsoriamente retidos 18 meses após a retenção E assegurar que essa reinjeção de recursos seria feita de forma ordenada sem desestabilizar ainda mais a economia Para evitar que tais recursos fossem atraídos para aplicações em moeda estrangeira o Banco Central além de manter a taxa de juros bastante elevada permitiu que a apreciação da taxa real de câmbio que havia sido observada ao longo do primeiro semestre se acentuasse significativamente em meados de 1991 A balança comercial já vinha mostrando franca deterioração na esteira da superação do quadro recessivo de 1990 mas a entrada de capitais parecia suficiente para que o câmbio se valorizasse momentaneamente sem maiores riscos Em setembro contudo surpreendido pela evolução desfavorável do influxo líquido de capitais e preocupado com o nível das reservas internacionais o Banco Central decidiu abandonar a política de ajustes graduais do câmbio que havia sido introduzida em março de 1990 deixando que o câmbio se desvalorizasse em 16 no último dia do mês A desvalorização deflagrou aumento da volatilidade no mercado cambial que contribuiu para intensificar ainda mais a rápida aceleração da inflação que já vinha sendo observada Em meados de 1992 o quadro econômico do país haviase tornado menos crítico em vários aspectos Desde o início do ano a política macroeconômica vinha contando com o respaldo de novo acordo com o Fundo Monetário Internacional Apesar do desempenho desfavorável da receita tributária as metas fiscais para o primeiro semestre haviam sido cumpridas graças a um rejuste substancial de preços públicos e ao desgastante contingenciamento de verbas orçamentárias Superado o episódio de volatilidade que se seguiu à desvalorização de setembro de 1991 o bom desempenho da balança comercial combinado a forte influxo de capitais vinha permitindo rápida recomposição das reservas internacionais O processo de devolução dos recursos que haviam sido compulsoriamente retidos estava chegando ao fim E como se verá a seguir com mais detalhe depois de longos meses de negociação o país restabelecera a normalidade de suas relações com credores externos oficiais e privados rompida desde a moratória de 1987 A questão inflacionária contudo permanecia sem solução A taxa de inflação voltara a um patamar superior a 20 ao mês Mas já não havia controle de preços E os esforços de desarmamento de expectativas pareciam ter tido sucesso Com base nos critérios complacentes de então comemoravase o fato de que pela primeira vez em seis anos taxas de inflação tão altas não haviam disseminado expectativas desestabilizadoras de que o governo estaria prestes a anunciar nova descontinuidade na condução da política econômica Visto em retrospectiva isso de fato representou mudança importante Significou a quebra do círculo vicioso de choques anti inflacionários fracassados que desde de 1986 vinha fazendo com que a aceleração da inflação logo precipitasse movimentos defensivos que afinal acabavam forçando o governo a anunciar novo e improvisado programa de estabilização com efeitos cada vez mais efêmeros É notável que não obstante todas as dificuldades por que passou o país nos dois anos seguintes esse precário desarmamento de expectativas tenha sido bem ou mal preservado até a implementação do Plano Real em meados de 1994 A grande fonte de incerteza passara a ser a tensa evolução do quadro político A eleição de Collor à margem dos grandes partidos havia dado lugar a um governo com base parlamentar extremamente precária O fracasso do controvertido plano de estabilização de Collor e os desgastes político que advieram de seu programa de reformas tornaram o apoio parlamentar ainda mais difícil No final de maio de 1992 na esteira de longo processo de deterioração das relações do Executivo com o Congresso surgiram evidências de envolvimento direto do presidente num amplo esquema de corrupção que vinha sendo objeto de investigação parlamentar Pouco mais de quatro meses depois a situação de Collor tornouse insustentável Afastado provisoriamente do cargo no início de outubro de 1992 o presidente renunciou no final de dezembro quando o processo de impeachment estava prestes ser concluído4 Concepção e implementação do Plano Real De início como substituto interino de Fernando Collor e a partir de 29 de dezembro de 1992 em caráter definitivo Itamar Franco ocupou a presidência por quase 27 meses No exercício do cargo confirmaria com cores vivas sua reputação de político histriônico e mercurial Revelouse especialmente volúvel na seleção dos responsáveis pela área econômica do governo Defrontandose com um quadro econômico delicado com incertezas exacerbadas pela crise política deuse ao luxo de nomear nada menos que quatro ministros da Fazenda diferentes nos seus sete primeiros meses de governo Sua última escolha recaiu sobre seu ministro de Relações Exteriores Fernando Henrique Cardoso a quem caberia como ministro da Fazenda coordenar os esforços que afinal permitiriam enfrentar com sucesso o desafio de implementar um plano de estabilização que efetivamente pusesse fim ao regime de alta inflação no país É importante ter em mente o grau de deterioração em que havia caído a condução da política macroeconômica em maio de 1993 quando Fernando Henrique Cardoso assumiu o Ministério da Fazenda A taxa de inflação voltara a superar 30 ao mês e mais uma vez o governo se via fortemente pressionado a enfrentar o problema tão logo quanto possível Ao mesmo tempo havia grande ceticismo sobre as reais possibilidades do governo Itamar Franco Seu desempenho durante os primeiros sete meses havia sido deplorável Faltavamlhe apenas 19 meses de mandato E em menos de um ano o Congresso estaria totalmente mobilizado com as eleições de outubro de 1994 Parecia pouco provável que o governo pudesse conceber e implementar uma política econômica de mais fôlego A longa sucessão de fracassos nas tentativas de estabilização a partir de 1986 havia permitido a extração de lições importantes Havia erros óbvios que teriam de ser evitados na concepção de novo plano que tivesse pretensões mínimas de sucesso Além disto tal plano o sexto desde 1986 teria de enfrentar resistências redobradas que exigiriam da equipe econômica grande habilidade para conduzir as complexas negociações que se fariam necessárias dentro e fora do governo Mas antes de mais nada o governo teria de ser capaz de mobilizar talentos que tivessem condições de formular e implementar um programa eficaz de combate à alta inflação em condições tão adversas A montagem de uma equipe econômica competente haviase tornado tarefa extremamente difícil Com as quedas sucessivas de ministros da Fazenda tanto o novo ministro como os técnicos que o presidente poderia recrutar tinham perfeita consciência de quão curta poderia vir a ser sua passagem pelo governo O tempo médio de permanência no cargo dos três primeiros ministros da Fazenda de Itamar Franco havia sido de 75 dias Não é surpreendente que nessas circunstâncias tivesse ficado muito difícil encontrar nomes respeitáveis que se dispusessem a integrar a equipe econômica do governo É notável portanto que não obstante todo o desalento quanto às possibilidades do governo Itamar Franco Fernando Henrique Cardoso tenha conseguido quebrar esse círculo vicioso e montar uma equipe econômica de alto nível Contribuíram para o êxito com que enfrentou esse primeiro desafio a estatura política do novo ministro sua ascendência sobre o grupo de economistas que afinal compôs o núcleo de sua equipe econômica e a percepção de que Cardoso teria melhores condições que seus antecessores de estabelecer uma relação mais estável com o Planalto5 Não havia visão já estabelecida e consensual sobre qual seria a melhor forma de pôr fim ao regime de alta inflação Por razões tanto técnicas quanto políticas havia muita resistência à ideia de recorrer à simples dolarização da economia como tinha sido feito na Argentina Mas não obstante toda a reflexão acerca de um plano alternativo as propostas que haviam surgido pareciam inacabadas com pontos cruciais ainda por detalhar6 O grupo levaria meses para desenvolver um plano completo e bem acabado Cardoso logo percebeu a importância de assegurar condições de trabalho adequadas que facilitassem esse desenvolvimento No contrato implícito que se estabeleceu na sua relação com o grupo Cardoso concordou com evitar interferências indevidas nas discussões técnicas e aceitou que prevalecessem regras não hierárquicas do tipo uma pessoa um voto que conferiam mais legitimidade à depuração do livre fluxo de ideias no âmbito do grupo7 Naqueles meses críticos a liderança de Cardoso mostrouse extremamente importante em muitos outros aspectos bem além dos limites estreitos de sua relação com a equipe econômica que havia conseguido reunir Para conseguir que o Plano Real fosse lançado com sucesso ele teria de mostrar seus talentos em várias outras esferas no problemático governo Itamar Franco no seu próprio partido na tentativa de obter apoio do Congresso e no esforço de convencer a opinião pública de que o novo plano seria completamente diferente das muitas tentativas fracassadas do passado e teria boa chance de ser bemsucedido Por mais volátil que fosse o presidente sabia perfeitamente que tendo já queimado de forma tão rápida a maior parte do capital político de seu governo com a demissão de três ministros da Fazenda em sete meses teria de mudar o jogo com Fernando Henrique Cardoso Ambos tinham convivido longamente no Senado onde o cosmopolitanismo e o traquejo de Cardoso tinham despertado a admiração de Itamar Franco político com trajetória bem mais provinciana Não chegou a ser surpresa que quando Cardoso foi convidado para o ministério pela primeira vez em 1992 a pasta que Itamar Franco tinha em mente fosse a de Relações Exteriores Para um governo à deriva em meio a um quadro desastroso de alta inflação e com horizonte tão curto o novo ministro da Fazenda parecia ser a última chance de encontrar o bom caminho A ascendência de Fernando Henrique Cardoso sobre Itamar Franco foi reforçada ao longo dos meses seguintes à medida que o presidente percebeu de forma cada vez mais clara que seu destino político estava definitivamente atrelado ao sucesso do plano de estabilização Isso não significa que as relações de Fernando Henrique Cardoso com o presidente e os demais ministros tenham sido fáceis Longe disso Em muitas ocasiões Cardoso teve de recorrer a seus melhores talentos de negociador para impedir decisões desastradas que pudessem pôr em risco o esforço de estabilização Houve pelo menos um momento crítico no fim de fevereiro de 1994 em que FHC ameaçou pedir demissão para evitar a introdução de mudanças impensadas propostas pelo ministro do Trabalho num pacote legislativo crucial para estabelecer o arcabouço legal do Plano Real8 Na montagem de coalizão que pudesse dar respaldo ao plano de estabilização no Congresso Cardoso tentou inicialmente obter compromisso inequívoco de seu próprio partido com o plano Durante os primeiros meses no cargo o apoio que recebera do PSDB tinha sido morno se tanto Alguns dos líderes mais proeminentes do partido achavam que sua decisão de aceitar o cargo de ministro da Fazenda tinha sido precipitada Entre eles havia quem defendesse que a situação delicada em que o partido se metera exigia cuidadoso controle de danos E que em circunstâncias tão adversas o partido deveria se ater a ações paliativas no combate à alta inflação abandonando qualquer ideia de partir para um plano de estabilização ambicioso e abrangente À medida que Cardoso e sua equipe insistiram em levar o plano adiante figuraschave do partido procuraram manter distância prudente dos preparativos No final de 1993 no entanto o plano de estabilização começou a ser visto como iniciativa menos arriscada País afora as forças políticas estavam sendo reposicionadas com vista à disputa da eleição presidencial de 1994 E ganhou força a ideia da formação de ampla coalizão de centrodireita que apostasse no sucesso do plano Nos meses seguintes tal ideia abriu caminho para a obtenção de apoio no Congresso à aprovação de medidas bastante controvertidas que seriam requeridas para tornar o plano viável A coalizão que se formou parecia impressionante mas era extremamente fragmentada e indisciplinada Mantêla coesa movendose na direção correta sem que iniciativas impensadas botassem a perder a detalhada legislação que tinha de ser votada contra o relógio mês após mês era o grande desafio político O prestígio de Fernando Henrique Cardoso no Congresso sua capacidade de persuasão e seus talentos como negociador fizeram grande diferença Mas ainda havia outra frente crucial que teria de ser enfrentada ao mesmo tempo A opinião pública tinha de ser convencida que o que estava sendo preparado em Brasília era um plano bem diferente que não desmoronaria de forma retumbante em poucos meses como tantas vezes havia ocorrido desde 1986 A longa sequência de tentativas fracassadas de estabilização tinha criado enorme desconfiança quanto a novas iniciativas do governo nessa área Temia se que pudesse ser anunciado novo congelamento de preços e salários e adotadas medidas arbitrárias como as que envolveram a retenção de ativos financeiros em 1990 E tais temores não tardariam em deflagrar todo tipo de movimentos antecipatórios defensivos com efeitos altamente desestabilizadores A menos que tais expectativas pudessem ser desarmadas o novo plano não teria a menor chance de sucesso Tendo em vista tais dificuldades a equipe econômica de FHC tinha concebido um plano que em contraste com todas as iniciativas anteriores de estabilização não envolvia nem congelamento de preços e salários nem qualquer tipo de medida arbitrária ou surpreendente9 O plano teria de ser totalmente transparente Todas as etapas e medidas teriam de ser anunciadas com vários meses de antecedência Mas o nível de desconfiança era muito alto E a opinião pública teria de ser convencida de que o governo não tinha qualquer tipo de carta na manga como tantas vezes havia acontecido no passado10 Isso não parecia nada fácil porque exigia que as parcelas mais bem informadas da opinião pública entendessem a lógica do plano e ficassem persuadidas de que havia chance razoável de ter sucesso Ao enfrentar tal desafio Fernando Henrique Cardoso fez bom uso de seus talentos como comunicador Primeiro como ministro da Fazenda e depois de março de 1994 quando teve de deixar o cargo para disputar a eleição como candidato a presidente A implementação do Plano Real foi precedida por reforma monetária convencional em julho de 1993 que simplesmente cortou três zeros dos valores expressos em cruzeiros que passaram a ser expressos em cruzeiros reais Os esforços na área fiscal foram iniciados com medidas de natureza transitória através de um Programa de Ação Imediata Durante o segundo semestre de 1993 foi claramente anunciado que a estratégia de implementação do plano de estabilização envolveria três etapas Primeiro um ajuste fiscal significativo seria negociado com o Congresso Depois seria criada a Unidade Real de Valor URV unidade de conta com reajuste diário que conviveria temporariamente com o cruzeiro real Finalmente uma reforma monetária extinguiria o cruzeiro real substituindoo pelo real o que equivaleria a simplesmente conferir à URV a função de meio de pagamento O pilar fiscal da estratégia foi consolidado no começo de 1994 O governo reconheceu a necessidade de reformas da Previdência e do sistema tributário de explicitação dos passivos ocultos gerados por planos de estabilização anteriores os famosos esqueletos e de imposição de disciplina fiscal aos estados e municípios Mas reconheceu também as dificuldades políticas associadas à aprovação no curto prazo de reformas tão ambiciosas E concentrouse no ajuste fiscal possível explorando a margem de manobra criada pelo aumento de tributação do setor financeiro e pela negociação no Congresso do Fundo Social de Emergência mecanismo que ao desvincular parcela significativa das receitas destinadas a gastos sociais contribuia para reduzir a rigidez orçamentária que tolhia a gestão da política fiscal Tais medidas aliadas ao efeito devastador da inflação sobre o valor real das despesas em 1993 e no primeiro semestre de 1994 permitiram a geração de superávits primários expressivos de 26 do PIB em 1993 e de 51 do PIB em 1994 A implementação do Plano Real não sofreu descontinuidade com a saída de Fernando Henrique Cardoso do governo em março de 1994 para se candidatar a presidente quando foi substituído por Rubens Ricupero no Ministério da Fazenda A Unidade Real de Valor URV serviu de ponte entre o cruzeiro real e o real De março a junho de 1994 a URV e o cruzeiro real coexistiram como unidades de conta com a paridade entre elas refixada diariamente pelo Banco Central na medida da perda de poder aquisitivo do cruzeiro real aferida pela evolução de três índices de preços Foi a URV que permitiu evitar as recorrentes dificuldades enfrentadas na implementação de planos de estabilização anteriores para assegurar sem que houvesse um período de transição que preços relativos não fossem distorcidos pela estabilização A legislação que introduziu a URV em março determinou que novos contratos teriam de ser feitos em URV mas apenas facultou às partes interessadas a conversão dos contratos existentes Estabeleceu contudo que quando o real fosse criado em julho os contratos teriam de ser convertidos em real Isso criou incentivos potentes para que de março a junho por toda a economia empresas tentassem renegociar seus contratos com fornecedores e clientes para fixar preços em URV Essa ampla e descentralizada conversão prévia de preços baseada na livre negociação preparou o sistema de preços para uma passagem suave pela reforma monetária que extinguiria o cruzeiro real e converteria a URV em real Os salários foram convertidos em URV levando em conta seu valor real nos últimos quatro meses o que correspondia ao horizonte de indexação que havia sido herdado No primeiro semestre de 1994 a inflação mensal medida em cruzeiros reais foi da ordem de 40 a 50 Em julho de 1994 como anunciado uma reforma monetária adicional criou o real equivalente a uma URV A URV por sua vez equivalia no momento da criação do real a 2750 cruzeiros reais O real era portanto equivalente a 2750 cruzeiros reais11 Na data de conversão um real era equivalente a um dólar norteamericano A inflação medida na nova moeda ficou abaixo de 10 em julho e caiu a 1 no final do ano Pensavase que o sucesso da estabilização seria assegurado por mais de uma âncora Em primeiro lugar a taxa de câmbio protegida por volume de reservas apreciável da ordem de US40 bilhões quando da introdução do real Em segundo a âncora fiscal garantida pela redução de rigidez orçamentária propiciada pelo Fundo Social de Emergência E em terceiro as intenções explicitadas de manter sob controle a política monetária com a manutenção de taxas de juros reais elevadas No segundo semestre de 1994 contudo surgiram sinais claros de aquecimento da demanda especialmente na indústria automobilística Com folga para elevar preços as montadoras mostravamse propensas a acomodar pressões por reajustes mais generosos de salários nas negociações sindicais Temendo excessos que poderiam advir dos reajustes de preços e salários em setor com tanta visibilidade o ministro Ciro Gomes que havia substituído Rubens Ricupero na Fazenda decidiu reduzir as tarifas incidentes sobre a importação de automóveis de 35 para 20 A celeuma em torno dessa decisão ganhou força no final do ano quando em decorrência da moratória mexicana o quadro externo sofreu rápida deterioração impondo ao Brasil restrições de balanço de pagamentos bem mais sérias do que se esperava até então Seguiram se críticas à liberalização comercial que deixavam de levar em conta que antes da crise mexicana as decisões relacionadas à redução das tarifas de importação advinham da necessidade de balizar a formação de preços internos especialmente em mercados oligopolizados e excessivamente protegidos da concorrência internacional Antes da eclosão da crise mexicana o nível de importações parecia excessivamente baixo Havia até preocupações quanto às pressões sobre a política monetária que advinham da conjunção de saldo comercial expressivo com influxo vigoroso de investimento direto estrangeiro Logo depois da moratória mexicana no entanto o nível importações passou a ser visto como excessivamente alto A ofensiva pela restauração protecionista no setor automotivo teria amplo sucesso em 1995 É importante sublinhar que a política de estabilização implementada em 19931994 não contou com o apoio do Fundo Monetário Internacional que jamais acreditou no sucesso do Plano Real A resistência do FMI em apoiar o plano ao final de um período de quase 12 anos de relações atribuladas com o Brasil foi um desfecho irônico Tendo partilhado longa série de fracassos a instituição acabou não participando do retumbante sucesso do Plano Real Após a estagnação de 19901992 quando o PIB caiu em média 13 ao ano o desempenho em 19931994 foi muito mais satisfatório com crescimento de 47 e 53 respectivamente e aumento da formação bruta de capital fixo que alcançou 207 do PIB em 1994 Houve pequena queda no saldo comercial em 1993 para US133 bilhões em vista do aumento de importações decorrente do efeito combinado da liberalização comercial e da retomada do nível de atividade Esta tendência acentuouse em 1994 com redução adicional do saldo para US105 bilhões a despeito da melhora de mais de 14 dos termos de troca Os influxos líquidos na conta de capital e financeira mantiveramse entre US87 e US105 bilhões entre 1992 e 1994 o que permitiu forte recuperação das reservas internacionais que passaram de US238 bilhões no final de 1992 para US322 bilhões no final de 1993 e US388 bilhões no final de 1994 Abertura comercial e Mercosul A liberalização comercial brasileira ocorreu de forma unilateral entre o final dos 1980 e meados dos 1990 sendo marcada por três episódios principais12 A essência do primeiro episódio de liberalização comercial em 198889 foi eliminar redundâncias a tarifa média nominal de 575 não ponderada foi reduzida para 321 No segundo episódio de longe o mais importante em 199093 decidiuse inicialmente reduzir as barreiras não tarifárias com a eliminação de proibições de importações a famosa lista do Anexo C da Cacex das licenças de importação usadas de forma mais ou menos permanente desde o final da década de 1940 bem como dos chamados regimes especiais de importação que regulavam a distribuição de cobertura cambial com base em critérios discricionários Em 1991 foi definido um cronograma de redução tarifária que em princípio se estenderia até 1994 e resultou na queda da tarifa média de 322 em 1990 para 142 no início de 1994 No início de 1992 decidiuse já na gestão de Marcílio Marques Moreira como ministro da Fazenda alterar o período de implementação inicialmente acordado para que terminasse seis meses antes do previsto Finalmente em 1994 foram feitos ajustes tarifários parcialmente explicados pela intenção de impor disciplinas mais rígidas aos preços internos durante o período inicial de implementação do Plano Real de estabilização com redução da tarifa média nominal para 11213 Esta liberalização comercial unilateral foi implementada antes do final da Rodada Uruguai do GATT em 1994 Das negociações multilaterais resultou a consolidação no prazo de cinco anos a partir de 1995 de grande parte da liberalização comercial unilateral implementada pelo Brasil a partir de 198814 A Rodada Uruguai do GATT havia sido lançada em Punta del Este em 1986 com agenda que incluía apesar da oposição do Brasil e da Índia novos temas serviços aspectos dos direitos de propriedade intelectual relacionados ao comércio TRIPSTradeRelated Aspects of Intellectual Property Rights e medidas que afetam investimentos relacionadas a comércio TRIMSTradeRelated Investment Measures15 O interesse brasileiro na rodada estava centrado em temas tradicionais produtos tropicais antidumping medidas compensatórias de subsídios e salvaguardas aplicadas nos mercados importadores Havia incentivo à adoção de postura obstrucionista pelo Brasil pois evitar concessões em novos temas parecia compensar os benefícios da liberalização nos temas tradicionais Depois de Punta del Este houve gradual redefinição da posição brasileira de bloqueio de negociações sobre novos temas com participação mais ativa em relação à agricultura Isto ocorreu paralelamente ao lento processo de redução das altas tarifas e desmantelamento das barreiras não tarifárias iniciado em 1988 Tal reorientação rumo a políticas liberais resultou da reavaliação do protecionismo dentro do governo respondendo a pressões de consumidores de bens finais importados de importadores de insumos e bens de capital e de exportadores em busca de concessões dos parceiros do Brasil para ampliar o acesso a seus mercados As negociações foram concluídas em Marraqueche em 1994 Quanto à agricultura houve redução no apoio à produção doméstica melhora no acesso a mercados e redução de subsídios às exportações Os cortes das tarifas que afetaram exportações brasileiras suco de laranja por exemplo foram de apenas 152016 O Brasil consolidou todas as linhas tarifárias isto é comprometeuse a manter as tarifas no nível máximo de 35 para produtos industrializados e de 55 para agrícolas Antes da Rodada Uruguai apenas 6 das linhas tarifárias brasileiras eram consolidadas O acordo sobre serviços abarcava distintos modos de prestação e incluía obrigações básicas iniciativas nacionais especificando cronogramas de liberalização e definição de exceções e setores específicos O acordo sobre propriedade intelectual incluía padrões mais rígidos e prazos de proteção mais dilatados O acordo final da Rodada incorporava avanços significativos em relação à consolidação institucional da nova Organização Mundial de Comércio aperfeiçoamento dos mecanismos de solução de controvérsias e possibilidade de retaliação cruzada entre diferentes acordos referentes a bens serviços e TRIPs17 Paralelamente às negociações da Rodada Uruguai evoluíram também no plano regional entendimentos relacionados a negociações para a constituição de uma Área de Livre Comércio nas Américas tema ventilado com insistência pelos Estados Unidos desde 1991 No final de 1994 em Miami reunião de cúpula interamericana decidiu que se iniciassem negociações relacionadas a esta iniciativa Talvez a maior realização do governo Sarney tenha sido a aproximação entre Brasil e Argentina que resultou na criação do Mercosul em 1991 já no governo Collor O processo teve início com a Declaração de Iguaçu de novembro de 1985 seguida do Tratado de Integração Cooperação e Desenvolvimento entre Brasil e Argentina de novembro de 1988 que criou um espaço econômico comum e estipulava a remoção de todos os obstáculos tarifários e não tarifários ao comércio de bens e serviços no prazo máximo de 10 anos Culminou no Tratado de Assunção de março de 1991 que criou o Mercosul afinal estabelecido em 31 de dezembro de 1994 O Protocolo de Ouro Preto de 17 de dezembro de 1994 assinado no final do governo Itamar Franco estabeleceu uma Tarifa Externa Comum TEC do Mercosul que previa exceções para produtos incluidos em listas nacionais bens de capital e bens de informática e telecomunicações As altas tarifas brasileiras sobre bens de capital seriam reduzidas com cerca de 900 linhas tarifárias convergindo para a TEC de 14 em 2001 Cerca de 200 linhas correspondentes a bens de informática e telecomunicações teriam tarifas reduzidas para 16 em 2006 A lista nacional de exceção poderia incluir até 300 linhas tendo o Brasil inicialmente incluído 175 linhas número depois aumentado para 233 em meados de 1996 em geral abaixo da TEC e com prazo de convergência até 2001 Em 1995 foi aprovado um regime de adequação de tarifas intraMercosul que incluía no caso do Brasil 29 linhas tarifárias18 Entre 1990 e 1994 praticamente triplicou a participação das exportações para o Mercosul nas exportações totais brasileiras alcançando 136 em 1994 Este resultado é menos espetacular do que parece se for levado em conta o significativo retrocesso das exportações brasileiras para a Argentina que haviam caído de quase 9 das exportações totais brasileiras em meados dos 1960 para 14 em 1990 Com o declínio dos mercados de países produtores de petróleo 34 do total em 1994 abriuse espaço também para a expansão das participações dos Estados Unidos 206 do total em 1994 e da Comunidade Europeia 271 embora de forma menos dramática do que no caso do Mercosul A importância dos manufaturados nas exportações brasileiras mantevese em torno de 5560 na década anterior a 1995 Em 1994 corresponderam a 573 do total mas foram relativamente mais importantes nos mercados latinoamericanos especialmente no Mercosul 897 das exportações totais para aquele bloco e nos Estados Unidos 662 do que na Europa 371 As importações provenientes do Mercosul cresceram mais lentamente do que as exportações alcançando 137 do total em 1994 Mas tal como as originárias dos Estados Unidos 229 do total e das CE 226 ficaram realçadas pela redução da importância do petróleo nas importações totais cuja participação caiu de mais de 50 no início dos 1980 para 229 em 1990 e 123 em 1994 O volume importado caiu de cerca de 700 para 500 mil barris por dia enquanto os preços médios caíram de níveis além de US30barril no começo da década para US209 em 1990 e US135 em 1994 Reduziuse em consequência a importância do Oriente Médio como origem das importações de algo em torno de um terço das importações totais brasileiras para menos de 10 Privatização Em contraste com o estilo em geral impetuoso e muitas vezes desastrado do governo Collor o programa de privatização sob o comando do BNDES avançou com determinação mas de forma cuidadosa e segura buscando evitar retrocessos desnecessários Durante o primeiro ano do governo Collor criouse um quadro institucional bem fundamentado para o desenvolvimento do programa e desenvolveramse regras claras e procedimentos detalhados que deveriam pautar cada processo de privatização para se assegurar a transparência necessária e deixar o programa a salvo de acusações de favorecimento As privatizações ocorridas até 1989 envolveram primordialmente empresas falimentares de menor importância cuja sobrevivência havia sido assegurada pela estatização No início do governo Collor as empresas controladas pelo governo formavam um leque extremamente diversificado cuja privatização envolvia desafios muito diferenciados seja quanto a aspectos concorrenciais nos mercados relevantes seja quanto às dificuldades políticas a enfrentar nos processos de venda As empresas que operavam em setores mais expostos à concorrência seriam em princípio de privatização menos complexa fertilizantes petroquímica mineração siderurgia A privatização de empresas públicas que exploravam monopólios na provisão serviços públicos e que haviam capturado seus órgãos reguladores telecomunicações e eletricidade constituía problema muito mais complexo pois requereria esforço prévio de criação de marco regulatório com credibilidade e independência adequadas Embora as instituições financeiras do governo tivessem presença importante no sistema bancário e houvesse um monopólio legal afetando desde a prospecção até o refino de petróleo a administração Collor optou por não incluir o Banco do Brasil e a Petrobras no programa de privatização dadas as óbvias dificuldades políticas envolvidas A privatização concentrouse assim em empresas da indústria de transformação mais expostas à concorrência As vendas de ativos somaram US35 bilhões durante o governo Collor 15 empresas e US51 bilhões no governo Itamar Franco 18 empresas especialmente de empresas siderúrgicas US56 bilhões petroquímicas US19 bilhão e produtoras de fertilizantes US04 bilhão Marcos nesta primeira etapa do processo de privatização foram os casos da Companhia Siderúrgica Nacional cuja usina em Volta Redonda havia sido o primeiro grande investimento industrial do Estado brasileiro ainda durante a Segunda Guerra Mundial e da Usiminas tendo em vista as violentas manifestações contrárias à sua venda19 As críticas se concentraram na possibilidade de que as compras de ativos fossem saldadas com moedas de privatização expressão com a qual se designavam títulos emitidos pelo próprio governo federal negociados com deságio substancial em relação ao seu valor nominal e aceitos pelo valor de face nos leilões de privatização Inicialmente com base em expectativas excessivamente otimistas sobre a rapidez das privatizações o governo aventou a possibilidade de que os depósitos bloqueados pelo Plano Collor I viessem a ser utilizados na compra de ativos No entanto quando afinal as operações de privatização tiveram início a liberação dos ativos congelados já havia começado e outros tipos de moedas de privatização passaram a ser aceitos As receitas em dinheiro obtidas com a privatização até o final de 1994 foram muito modestas algo da ordem de US16 bilhão advindo basicamente de operações feitas no governo Itamar Franco No início de 1993 foi introduzida legislação que lançava as bases para a modernização da operação dos portos brasileiros com a criação de órgãos gestores de mão de obra e de conselhos de autoridades portuárias com a participação de representantes do poder público bem como de empresários trabalhadores e usuários Não se deve subestimar a extensão das resistências que tiveram de ser superadas para que o programa de privatização fosse deslanchado e ganhasse as proporções que afinal assumiu ao longo dos governos de Fernando Collor Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso Ajudou a superação dessas resistências o fato de que a despeito do impeachment de Collor ter sido conduzido em meio a acusações relacionadas a práticas corruptas o processo de privatização implementado no seu governo a partir de 1991 nunca foi efetivamente questionado quanto à lisura e transparência dos procedimentos A maioria dos membros da Comissão Diretora de Privatização era oriunda de fora do governo A fixação de preços mínimos para fins de leilão era baseada em duas avaliações independentes E o processo era sujeito à aprovação de empresas de auditoria previamente contratadas e controlado pelo Judiciário pelo Tribunal de Contas e pelo Congresso Nacional20 Dívida externa Desde a declaração da moratória da dívida externa pelo governo Sarney em 1987 a regularização das relações do país com a comunidade financeira internacional passou a ser uma questão central de política econômica A proposta brasileira de renegociação da dívida externa apresentada em outubro de 1990 incluía a securitização da dívida por meio de bônus de 45 anos sem garantia e um empréstimoponte para permitir o pagamento de atrasados Cerca de 10 da dívida total correspondendo à dívida privada seria excluída do acordo Tal proposta foi recusada pelos credores Medidas temporárias em 1991 incluíram o pagamento de 30 dos juros devidos a exclusão da dívida das grandes estatais da dívida pendente e um acordo para pagamento de atrasados sendo parte em dinheiro e parte por meio de um empréstimoponte com um cardápio diversificado de opções Em julho de 1992 depois de cerca de 11 meses de negociações lideradas por Pedro Malan foi delineado um esboço de acordo com os credores privados que seria assinado em 1993 e que afinal veio encerrar o ciclo de endividamento default e renegociação iniciado em meados dos anos 196021 A ideia do acordo envolvendo passivos da ordem de US50 bilhões era conseguir reduzir o valor da dívida e do seu serviço estender o prazo de pagamento e reduzir a vulnerabilidade da economia brasileira a elevações da taxa de juros internacional de forma a tornar mais realista a manutenção do serviço da dívida no futuro sem novas interrupções Do ponto de vista dos credores o acordo representava a possibilidade de transformar a dívida brasileira num ativo de risco muito menor do que mostrara ser A muitos deles o acordo permitiria liberar vultosas provisões que tiveram de ser constituídas na esteira das sucessivas interrupções do serviço da dívida brasileira observadas desde meados da década anterior O acordo brasileiro seguiu a estrutura de outros acordos do tipo Brady negociados com outros países devedores México Venezuela e Argentina a partir de 198922 O Brasil emitiria novos títulos que substituiriam os haveres dos credores referentes à dívida de médio e longo prazo do setor público Aos credores seria oferecido um cardápio variado de opções envolvendo instrumentos distintos seis tipos de bônus e um contrato de reestruturação O leque de opções visava a acomodar diferentes preferências dos credores em parte ditadas por restrições impostas pela legislação regulatória específica a que estava submetido cada banco em seu país de origem Abriase a possibilidade de escolha entre taxas de juros fixas e de mercado carências variáveis prazos de resgate de 15 a 30 anos e existência ou não de garantia de recebimento do principal Todos os instrumentos oferecidos seriam aceitos em pagamento em vendas de ativos públicos no âmbito do programa de privatização De forma semelhante ao que havia ocorrido em 1943 na grande negociação que resultou no acordo permanente relativo à dívida externa acumulada antes de 1931 foram oferecidas aos credores diferentes combinações de reduções de juros e de principal Houve a possibilidade de escolha de opções para os credores mas limitada por tetos quanto a alguns tipos de conversão com a alocação final envolvendo redirecionamento para tipos menos demandados inicialmente Os novos bônus de desconto US73 bilhões por exemplo teriam prazo de 30 anos o principal reduzido em 35 e pagariam juros correspondentes à LIBOR London Interbank Offered Rate mais 1316 com amortização integral no final Os novos bônus ao par US105 bilhões com pagamento em 30 anos teriam o principal preservado mas a taxa de juros seria reduzida a 4 no primeiro ano e limitada a 6 a partir do sétimo ano com amortização integral no final O principal referente à dívida nova nos dois casos foi garantido por colateral na forma de títulos do governo dos Estados Unidos e os pagamentos de juros relativos a 12 meses foram garantidos de forma similar A emissão total de bônus novos foi de US437 bilhões Comparado a outros países o Brasil preferiu acordo que incluísse combinação de garantias mais modestas com menor redução do montante da dívida As negociações com os credores oficiais no Clube de Paris menos importantes foram concluídas em 1993 e envolveram US135 bilhões23 As eleições de 1994 O sucesso do esforço de estabilização teve desdobramentos políticos de grande importância O fim de regime de alta inflação trouxe enorme apoio popular ao Plano Real o que levou à vitória Fernando Henrique Cardoso no primeiro turno da eleição presidencial em outubro de 1994 Apoiado por uma coalizão de centrodireita o candidato do governo derrotou Luiz Inácio Lula da Silva do Partido dos Trabalhadores PT A oposição pautada por avaliações equivocadas de seus principais economistas quanto à probabilidade de sucesso do programa de estabilização surpreendeuse com o surto de popularidade que em poucos meses alçou o mentor do Plano Real a folgada liderança nas pesquisas de intenção de voto Um mandato presidencial politicamente tumultuado que se iniciara num quadro de descalabro macroeconômico com inflação mensal de quase 90 chegava ao fim em clima de grande otimismo com as amplas possibilidades que o fim do regime de alta inflação abriria à economia brasileira Mas a verdade é que não obstante todo o notável sucesso do Plano Real a tarefa de consolidação da estabilização e de reconstrução das bases para um crescimento econômico sustentado no país ainda estava longe de ter sido concluída E consumiria boa parte dos melhores esforços do governo nos oito anos seguintes 1Ver Gudin e Simonsen 1977 2Na verdade o programa de estabilização envolveu também uma reforma monetária que mudou a denominação da moeda brasileira de cruzado novo para cruzeiro A designação cruzeiro para a moeda nacional havia sido utilizada em duas ocasiões anteriores O Decreto Lei no 4791 de 5 de outubro de 1942 criou o cruzeiro em substituição ao milréis e em 1970 a Resolução 144 do Conselho Monetário Nacional restabeleceu a denominação cruzeiro em substituição ao cruzeiro novo criado em 1967 3Ver Faro 1991a e 1991b para avalições contemporâneas do Plano Collor 4Ver Souza 2000 sobre reformas institucionais e o impeachment de Collor 5Para uma discussão mais detalhada ver Werneck 2009 que os parágrafos abaixo seguem de perto 6Alguns membros do grupo tinham tido participação direta nas tentativas de estabilização do Governo Sarney Havia uma longa lista de erros a evitar E também muito a aprender com as tentativas de combate à alta inflação de outros países Argentina e Israel em especial 7A prevalência desse arranjo não hierárquico é ressaltada em Fiuza 2006 em livro extensamente baseado em depoimentos de Gustavo Franco 8Para maiores detalhes ver Cardoso 2006 p 197 9Para uma avaliação contemporânea do lançamento do Plano Real ver Franco 1995 10Em meio a muitas dúvidas abrigava só uma e fundamental certeza de que só um programa que pudesse ser explicado e compreendido teria chance de derrubar a inflação de forma duradoura Cardoso 2006 p 146 11Para transformar reais de 1994 em cruzeiros de 1942 ou mil réis de 1822 é necessário multiplicálos por 2751015 indicação da virulência da inflação brasileira especialmente entre 1980 e 1994 12Kume Piani e Souza 2000 e Abreu 2007 cap 1 13Ver GATT 1993 e Kume Piani e Souza 2000 p 7 14Tarifas consolidadas são as incluídas nas listas de países registradas na OMC e que só podem ser excedidas se houver compensação aos demais parceiros 15Ver Abreu 2007 cap 1 sobre a liberalização comercial e cap 4 para as negociações comerciais multilaterais 19821994 16Ver Abreu 1996 para os cortes tarifários em diferentes mercados para diferentes grupos de exportadores de manufaturados 17Ver Lampreia 1994 para a avaliação dos resultados da Rodada Uruguai pelo representante do Brasil no GATTOMC em 199394 18Ver GATT 1993 e WTO 1997 19Ver Modiano 2000 20Ver Pinheiro e Giambiagi 2000 e Abreu e Werneck 1994 21Ver o Capítulo 4 para a renegociação permanente anterior em 1943 22Em referência a Nicholas Brady então secretário do Tesouro norteamericano 23Para detalhes quanto a outros tipos de bônus incluídos no cardápio ver Cerqueira 1997 p 75 e ss CAPÍTULO 16 Consolidação da estabilização e reconstrução institucional 1995 2002 Rogério LF Werneck Em contraste com seus três antecessores civis Fernando Henrique Cardoso FHC assumiu a Presidência em meio a um clima de relativo otimismo acerca da evolução do processo inflacionário Em janeiro de 1995 a questão da estabilização já não tinha a premência e a dominância que tivera quando José Sarney Fernando Collor e Itamar Franco iniciaram seus mandatos O sucesso inicial do Plano Real parecia ter aberto espaço para uma agenda bem mais ampla e diversificada de política econômica A verdade contudo é que a consolidação da estabilização mostraria ser muito mais problemática do que àquela altura o novo governo conseguia antever E de fato consumiria boa parte dos melhores esforços de dois mandatos de FHC Ao pôr fim ao regime de alta inflação o Plano Real fez aflorar dificuldades que impuseram novos e importantes desafios à condução da política econômica A primeira delas foi a deterioração do quadro fiscal O controle das contas públicas vinha sendo ajudado há muitos anos pelos efeitos assimétricos da alta inflação sobre as finanças públicas Do lado da receita o valor real da arrecadação vinha sendo razoavelmente preservado graças a mecanismos de indexação que haviam sido introduzidos na legislação tributária Já do lado do dispêndio os três níveis de governo vinham tirando bom proveito da inflação para manter as contas sob controle tendo em conta a defasagem entre a aprovação do orçamento e o efetivo desembolso dos recursos Quando as verbas eram afinal desembolsadas o valor real do gasto já tinha sido substancialmente erodido pela inflação Era razoável esperar portanto que o fim da alta inflação trouxesse expansão substancial do valor real do dispêndio público Mas a verdade é que tal expansão acabou sendo ainda maior do que se esperava em decorrência das políticas de gasto público bastante frouxas que marcaram a gestão fiscal dos três níveis de governo em 1995 Em vista da alarmante deterioração das contas públicas a necessidade de levar adiante um penoso esforço de ajuste fiscal passou a ser uma questão fundamental da agenda de política econômica do país Outra dificuldade adveio da súbita redução da receita de senhoriagem que o regime de alta inflação vinha propiciando ao sistema bancário Sem poder mais contar com essa fonte tão importante de recursos as instituições financeiras mais frágeis alguns dos maiores bancos privados e a maior parte dos bancos estaduais tiveram de sofrer intervenção do Banco Central O governo se viu às voltas com vasta e complexa operação de saneamento do sistema bancário financeiramente onerosa e politicamente desgastante O que só contribuiu para tornar ainda mais intrincada a nova e premente agenda de ajuste fiscal que o governo já tinha em mãos Dificuldades de outra ordem advieram do principal desafio com que se defrontava a condução da política econômica no início do novo governo assegurar que na esteira do choque de estabilização do Plano Real a inflação convergisse para uma taxa efetivamente baixa Foi com esse propósito que desde o segundo semestre de 1994 a taxa de câmbio vinha sendo utilizada como âncora nominal No início de 1995 no entanto o agravamento do quadro externo em decorrência da desestabilização causada pela crise mexicana passou a alimentar temores de que a política cambial que havia sido concebida para ancorar a inflação pudesse levar a rápida deterioração da balança comercial A controvérsia sobre a política cambial foi apenas o início de um dissenso mais amplo dentro do governo sobre a melhor forma de conduzir a política econômica Essa divisão que perdurou por todo o primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso e na verdade se arrastou até a campanha eleitoral de 2002 comprometeu em muito a eficácia com que o governo pôde enfrentar os novos desafios de política econômica que haviam aflorado na esteira do sucesso do Plano Real Para dar a sobrevida que acabou dando à manutenção do câmbio como âncora nominal o governo teria de ter adotado política fiscal muito mais austera do que a que se permitiu manter Durante quatro anos digladiaramse os que defendiam a urgência de uma desvalorização cambial e os que arguíam que uma desvalorização precoce poderia botar a perder o sucesso do Plano Real especialmente se não fosse precedida de um esforço sério de ajuste fiscal Dividido nesse embate o governo tentou ganhar tempo evitando mudanças mais ousadas na política cambial e resistindo a incorrer nos custos políticos de levar adiante o ajuste fiscal requerido O problema é que a postergação das correções de rumo que se faziam necessárias mostrou ser estratégia de alto risco Ao permitir que a deterioração das contas externas e das contas públicas avançasse o governo deixou a economia brasileira especialmente vulnerável aos dois fortes choques externos a que foi submetida na segunda metade do primeiro mandato de FHC Mal refeita do impacto da Crise Asiática em 1997 a economia foi exposta aos efeitos desestabilizadores da Crise Russa em 1998 e arrastada para grave crise cambial no início de 1999 dois meses após a reeleição do presidente em primeiro turno Na esteira do senso de urgência advindo de traumática desvalorização descontrolada da taxa de câmbio com efeitos devastadores sobre a dívida pública o governo conseguiu montar a coalizão política requerida para afinal viabilizar com aumento de carga tributária o ajuste fiscal que se fazia necessário Na verdade esse senso de urgência abriu caminho para importante esforço de construção institucional que a partir de março de 1999 daria base bem mais sólida à condução da política macroeconômica O governo passou a se comprometer publicamente com o cumprimento de metas para o superávit primário estabelecidas de forma a manter sob controle a evolução do endividamento público A atuação do Banco Central passou a ser pautada por um novo regime de metas para inflação E a política cambial sofreu mudança crucial A taxa de câmbio passou a ser flutuante Esse novo arcabouço de política macroeconômica formado por metas fiscais política de metas para inflação e câmbio flutuante seria substancialmente reforçado em 2000 pela aprovação pelo Congresso da Lei de Responsabilidade Fiscal Respaldado por gigantesco programa de resgate patrocinado pelo FMI e pelo Tesouro norteamericano o governo conseguiu evitar que a crise cambial desencadeasse fragilização do sistema financeiro e uma recessão prolongada e profunda Em poucos meses na esteira da reconstrução de confiança propiciada pelo novo arcabouço de política macroeconômica a economia voltou em boa medida à normalidade Em 2000 a combinação de inflação baixa crescimento econômico razoável contas públicas sob controle taxa de câmbio sustentável e balança comercial em recuperação parecia sugerir que afinal o longo processo de consolidação da estabilização chegara a bom termo Faltava contudo uma etapa crucial A estabilização ainda teria de ser submetida ao teste da alternância política Há muito tempo a oposição ao governo capitaneada pelo Partido dos Trabalhadores PT vinhase permitindo manter um discurso econômico inconsequente próprio de um movimento político quixotesco mas completamente inadequado como plataforma de um partido com possibilidades efetivas de vencer a eleição presidencial Bem ilustra tal inconsequência o fato de que na campanha das eleições municipais de 2000 o PT tenha decidido promover plebiscito nacional informal em que indagava aos eleitores se as dívidas interna e externa deveriam ser pagas ou não Não chegou a ser surpreendente que ao longo dos 18 meses seguintes à medida que a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva candidato do PT na eleição presidencial se tornou cada vez mais provável os temores induzidos por esse tipo de discurso deflagrassem movimentos defensivos no mercado financeiro que redundaram em forte desestabilização da economia em 2002 Vários fatores contribuíram para que a vitória da oposição se tornasse mais provável Por mais curta que tenha sido a crise cambial de 1999 deixou lesões que custaram a cicatrizar Nas pesquisas de opinião pública o governo jamais voltou a ter no segundo mandato os níveis de aprovação que obtivera no primeiro O quadro econômico favorável de relativo otimismo quanto às perspectivas da economia observado em 2000 pouco durou Já no ano seguinte o ambiente externo voltou a se deteriorar com a desaceleração da economia norteamericana e os sinais cada vez mais claros de que o regime cambial argentino estava marchando para desastroso desfecho Mais sério contudo foi o surgimento também em 2001 de grave dificuldade de ordem interna só muito tardiamente diagnosticada Tendo constatado com grande surpresa que na esteira de uma gestão temerária do sistema hidrelétrico o país se defrontava com um quadro de incontornável de insuficiência de oferta de energia o governo se viu obrigado a incorrer nos custos do anúncio de um programa de racionamento Além de altamente impopular o racionamento de energia elétrica teve efeitos devastadores sobre expectativas de consumidores e investidores e pôs fim à retomada de crescimento econômico ensaiada em 2000 Em meio a tais dificuldades o governo nem mesmo conseguiu unir forças em torno de seu candidato Sem o apoio de parte importante da coalizão governista José Serra apresentouse ao eleitorado com um discurso de mal velada oposição à política econômica do governo que remontava às velhas diferenças que dividiram a equipe econômica do governo no primeiro mandato de FHC Ao longo do primeiro semestre de 2002 à medida que as pesquisas de intenção de voto indicavam probabilidade cada vez mais alta de vitória da oposição na eleição presidencial ganharam força no mercado financeiro movimentos defensivos altamente desestabilizadores O que levou o governo a tentar fazer ver à liderança do PT que a menos que os temores de mudanças bruscas na gestão da política econômica e de calote da dívida pública fossem definitivamente afastados o processo de desestabilização poderia se tornar imanejável e dar lugar a um quadro de grave desorganização da economia que tanto a oposição como o governo deveriam tentar evitar Com a perspectiva cada vez mais concreta de vitória do candidato da oposição na eleição ganharam força no PT as correntes favoráveis a uma moderação do discurso econômico do partido o que acabou dando lugar em junho de 2002 à publicação da Carta ao Povo Brasileiro por meio da qual Lula se comprometeu a manter os pilares básicos do arcabouço de política econômica que tinha sido montado a partir de 1999 Foi uma iniciativa de enorme importância que manteve o processo de desestabilização da economia sob relativo controle até o final do mandato de FHC e permitiu que a normalidade fosse rapidamente restabelecida nos meses iniciais do primeiro mandato do Presidente Lula Tendo passado mesmo que aos trancos e barrancos pelo teste crucial da alternância política a estabilização parecia afinal consolidada As seções a seguir examinam com mais detalhe esse longo processo de consolidação da estabilização que atravessou os dois mandatos do Presidente Fernando Henrique Cardoso A próxima seção analisa o dissenso dentro do governo sobre a melhor forma de enfrentar os novos desafios de política econômica que vieram à tona com o sucesso do Plano Real A que se segue trata de esforços paralelos mas complementares à estabilização que não só tiveram grande importância como foram também foco de muita discordância dentro do governo a agenda de reformas abertura e privatização Em seguida se analisa a controvertida decisão de FHC de mobilizar seu vasto capital político para a aprovação da emenda da reeleição em 1997 Os choques externos e a crise cambial de 1999 são analisados a seguir A construção do novo arcabouço de política econômica e o efêmero circulo virtuoso que possibilitou são tratados nas duas seções seguintes Por fim examinase em detalhe o rito de passagem da estabilização pelo teste da alternância política ao final do segundo mandato de FHC Política econômica cisão e ambiguidade Com a posse do novo governo no início de 1995 a condução da política econômica tornouse uma operação muito mais complexa Por um lado a agenda passou a ser bem mais ampla do que era Já não se tratava mais de concentrar todos os esforços no objetivo maior de pôr fim ao processo de alta inflação Uma extensa gama de novas questões passou a exigir atenção Ao mesmo tempo ainda faltava muito para que o novo regime de baixa inflação pudesse ser considerado consolidado E a melhor forma de assegurar essa consolidação logo mostrou ser questão altamente controvertida dentro do novo governo Por outro lado o processo decisório peculiar que havia prevalecido no governo anterior até o lançamento do Plano Real não pôde ser mantido Quando FHC afinal compôs seu ministério a pequena e homogênea equipe econômica que havia sido responsável pelo plano de estabilização viuse obrigada a compartilhar o controle da política econômica Não só com economistas com visões bastante distintas mas também com políticos que em 199394 tinham preferido manter distância do plano de estabilização Pedro Malan foi nomeado ministro da Fazenda e José Serra recémeleito senador por São Paulo ministro do Planejamento Todos os ingredientes para um grande desacordo sobre a condução da política econômica estavam em cena escolhas difíceis visões muito diferentes rivalidade intelectual e disputa de poder no seio de uma equipe econômica de um governo extremamente popular que acabara de ser eleito com muita facilidade na esteira do sucesso da política econômica que vinha sendo seguida O conflito interno era inevitável Para manter a coerência da política econômica FHC teria de estar preparado já àquela altura para atuar com firmeza no arbítrio de posições conflitantes e na determinação da direção que deveria prevalecer Com o benefício da visão retrospectiva hoje se sabe que o presidente ainda teria de passar por um longo processo de aprendizado até afinal se ver compelido a atuar dessa forma1 Ao longo dos quatro anos seguintes tanto a política cambial como a política fiscal foram objetos de grande controvérsia A disputa em torno da política cambial aflorou mais cedo O novo governo tomou posse já em meio a um quadro de rápida deterioração do ambiente externo na esteira do debacle da economia mexicana do final de 1994 A apreciação do real ao longo do segundo semestre de 1994 tinha ajudado a manter a inflação sob controle num momento crucial do plano de estabilização Tarifas de importação tinham também sido reduzidas para atenuar o poder de mercado de setores oligopolistas importantes como indústria automobilística fortemente protegida por barreiras protecionistas No início de 1995 o boom de demanda que havia sido induzido pelo próprio lançamento do Plano e pelo clima de otimismo a que deu lugar atingiu proporções preocupantes levando a rápida deterioração do saldo da balança comercial e a ligeiro repique da inflação Como isso ocorreu exatamente quando as repercussões da crise mexicana estreitavam as possibilidades de financiamento externo da economia brasileira a sustentabilidade do plano chegou a ser colocada em dúvida A apreensão com a possível extensão do contágio da crise mexicana logo deflagrou clara divisão dentro do governo sobre a condução da política cambial Parte da equipe econômica temia que uma depreciação prematura pudesse pôr em risco o delicado círculo virtuoso que vinha assegurando a queda da inflação Preocupada com os efeitos da crise mexicana sobre as contas externas outra parte da equipe econômica arguía que a desvalorização se tornara inadiável E nesse grupo ainda havia quem defendesse que a redução de tarifas de importação anunciadas meses antes fosse imediatamente revertida No início de março de 1995 em meio a um clima de patente desentendimento uma desastrada tentativa de depreciação supostamente salomônica gerou perda substancial de reservas internacionais Em meados do ano depois de meses de cabo de guerra sobre a questão tarifas sobre automóveis importados foram refixadas bem acima dos níveis que vigoravam antes da redução tarifária de 19942 A imposição de medidas severas de contenção de demanda a partir de abril já tinha permitido rápida melhora da situação A balança comercial voltou a ser superavitária em meados do ano e a queda do nível de atividade acabou refreando em muito a taxa de variação dos preços de serviços durante o segundo semestre As altas taxas internas de juros combinadas com perspectivas inflacionárias cada vez mais favoráveis e com a aprovação pelo Congresso das reformas referentes ao capítulo da ordem econômica da Constituição deram forte estímulo à entrada de capitais externos ao longo do segundo semestre de 1995 No final do ano o nível das reservas internacionais já era US10 bilhões mais alto do que o de antes da crise mexicana E a taxa mensal de inflação havia baixado a menos de 1 O fim da alta inflação trouxe novos e importantes desafios Boa parte do sistema bancário não estava preparado para sobreviver em ambiente de baixa inflação E a imposição a partir do final do primeiro trimestre de 1995 de medidas severas de contenção de demanda baseadas no aumento de recolhimentos compulsórios no controle do crédito e na elevação das taxas de juros colheu de surpresa parte importante do sistema financeiro A reversão repentina da rápida expansão de crédito que vinha tendo lugar desde o lançamento do Plano Real foi absorvida com dificuldade pelas empresas e famílias que contagiadas pelo clima de otimismo haviam recorrido com entusiasmo ao endividamento O aumento da inadimplência aguçou os problemas que algumas instituições financeiras já vinham enfrentando para se adaptar ao novo ambiente de baixa inflação E nesse grupo foram especialmente afetadas as que tinham tentado superar as dificuldades por meio de rápida expansão da concessão de crédito na esteira do boom de demanda que se seguiu ao lançamento do Plano Real Muitas delas passaram a enfrentar problemas de captação e sérias dificuldades para lidar com a erosão da qualidade de seus ativos em decorrência dos níveis crescentes de inadimplência O Banco Central teve de intervir nos já combalidos bancos estaduais que há muito vinham sendo escancaradamente usados pelos governadores para financiar o excesso de dispêndio dos estados Particularmente problemática mostrou ser a intervenção no Banespa que era por larga margem o maior banco estadual Foi feita ainda no governo anterior em 31 de dezembro de 1994 último dia no mandato de Itamar Franco sob protestos indignados de Mário Covas um dos mais importantes aliados de FHC que no dia seguinte tomaria posse com governador do estado de São Paulo A eclosão da desgastante crise do Banco Econômico em agosto eliminou de vez qualquer esperança de que as dificuldades pudessem ficar restritas aos bancos estaduais e a instituições menores E o Banco Central se viu obrigado a intervir em algumas das maiores instituições financeiras do país para grande irritação de políticos que eram relacionados a tais instituições e desempenhavam papéis de grande importância na ampla coalizão que dava apoio ao governo A intervenção no Banco Econômico marcou o início de um período de tensão no sistema financeiro que inevitavelmente levou as instituições mais sólidas a adotar políticas mais conservadoras que acabaram por amplificar ainda mais o encolhimento de crédito que havia sido imposto pelas Autoridades Monetárias A tensão gerada pelo processo de fragilização financeira foi parcialmente aliviada a partir de outubro quando o Banco Central forçado a intervir em outro grande banco privado procurou munirse de instrumentos mais amplos para lidar de forma mais eficaz com problemas de liquidez e a necessidade de reestruturação do sistema financeiro Mas como o manejo dos novos instrumentos de assistência à iliquidez envolvia um custo político muito elevado sua eficácia ficava parcialmente comprometida Outro desafio importante adveio da rápida deterioração do quadro fiscal Durante o longo período de alta inflação os três níveis de governo tinham introduzido na legislação tributária regras estritas de indexação para proteger o valor real da arrecadação Já do lado da despesa o jogo vinha sendo adiar desembolsos e fazer o uso deliberado da inflação para erodir o valor real do dispêndio efetivamente feito Não chegou a ser uma surpresa que a extinção do regime de alta inflação implicasse aumento pronunciado no valor real do dispêndio Para evitar séria deterioração das contas públicas um esforço importante de ajuste fiscal teria de ser feito Mas nem o novo governo nem os novos governadores de estado estavam preparados para levar adiante a consolidação fiscal que se fazia necessária E a política fiscal acabou sendo preocupantemente frouxa em 1995 A verdade é que a equipe econômica sobrecarregada e dividida como estava custou a se dar conta da rapidez da deterioração da situação fiscal O superávit primário do setor público como um todo caiu de 5 do PIB em 1994 para perto de zero em 1995 O mais impressionante contudo foi quão pouco alarmado pareceu o governo com tão grave deterioração do quadro fiscal A dinâmica do endividamento público apontava para a necessidade de um ajuste fiscal substancial em 1996 O que exigiria impor restrições orçamentárias rígidas aos governos subnacionais Os governadores de estado cujas contas estavam em franca deterioração na esteira de um crescimento explosivo de folhas de pagamento estavam mais uma vez mobilizados para extrair da União nova operação de resgate que poderia ser extremamente custosa às finanças federais O governo vinha tentando canalizar o sentimento de alarme dos governadores com a situação financeira dos seus estados para o reforço do apoio no Congresso ao projeto de reforma administrativa que em tese poderia dar aos três níveis de governo mais flexibilidade na gestão das suas folhas de pagamento A ideia era vincular o socorro financeiro federal à implementação de reformas de fôlego que impedissem o ressurgimento do mesmo problema no futuro Isto teria de envolver privatização das instituições financeiras estaduais e de boa parte das empresas públicas dos estados contenção drástica das suas folhas de pagamentos e a criação de mecanismos ágeis que permitissem à União se apoderar de receitas estaduais e de ativos dos estados caso os serviços dos empréstimos federais não fossem pagos No final de 1995 contudo no auge das negociações com os estados sobre o formato das possíveis operações de resgate surgiram sinais inequívocos de que o governo estava reavaliando custos e benefícios de tentar impor restrições orçamentárias mais rígidas aos governos subnacionais naquele momento A evidência mais contundente disso foi o recuo de FHC no início de novembro diante das pressões em favor da devolução do controle do Banespa ao governo do estado de São Paulo feitas por alguns dos mais importantes líderes do PSDB com apoio ostensivo de vários ministros e de parte da equipe econômica Com base num cálculo político que à primeira vista parecia surpreendente o governo cedeu a tais pressões e anunciou que o banco seria devolvido ao governo de São Paulo como demandado e que todos os planos para privatização do Banespa seriam abortados Na verdade o banco acabou não sendo devolvido Mas a postura complacente do Planalto nessa questão afetou em muito a credibilidade do suposto comprometimento do governo com um ajuste fiscal sério naquele momento Não houve governador de estado que não percebesse que o vento havia mudado de direção em Brasília3 Na verdade logo ficaria claro que o governo estava considerando seriamente a possibilidade de dar uso distinto ao vasto capital político que acumulara na esteira do sucesso do Plano Real No início de 1996 ganhou força em Brasília a ideia de extrair do Congresso emenda constitucional que permitisse a reeleição do presidente Mas a ideia já vinha sendo aventada há mais tempo4 E dessa perspectiva já não parecia prudente antagonizar prefeitos governadores de estado e a ampla coalizão que vinha dando apoio ao governo no Congresso com medidas severas de ajuste fiscal As contas públicas continuariam a se deteriorar ao longo de 1996 Reformas abertura e privatização Logo após a eleição no final de 1994 havia a expectativa de que o primeiro ano do novo mandato presidencial seria basicamente dedicado à tramitação das reformas no Congresso E no início de 1995 o governo parecia convencido de que as reformas haviam se tornado ainda mais urgentes do que até então vinha supondo Do ponto de vista da consolidação da estabilização a mensagem emitida pela crise mexicana tinha sido bastante clara Como a necessidade de financiamento externo da economia teria que ser mantida em níveis bem mais moderados do que se imaginava possível encurtarase o tempo disponível para levar à frente as reformas econômicas requeridas para viabilizar o ajuste estrutural do setor público que se fazia necessário Uma rápida implementação do programa de reformas ajudaria a reforçar a credibilidade do esforço de estabilização e atrair capitais para o programa de privatização ampliando as possibilidades de financiamento externo Pelas mesmas razões quanto mais lento fosse o avanço das reformas mais estreitas poderiam se tornar tais possibilidades Já no final de janeiro de 1995 o governo dava sinais de estar vendo com muita preocupação o descompasso entre o ritmo provável do avanço das reformas e a taxa de deterioração das contas externas O repentino encurtamento do tempo disponível para viabilização das reformas tinhase tornado um grande problema Apesar de toda a retórica a respeito da urgência das mudanças necessárias a verdade é que a nova administração não estava preparada para implementar rapidamente o programa de reformas que tinha sido vislumbrado Mesmo assim ainda havia expectativas largamente disseminadas de que respaldado pelo enorme capital político acumulado na vitória em primeiro turno na eleição presidencial FHC poderia aproveitar os primeiros meses do seu mandato para dobrar as resistências do Congresso e aprovar o amplo conjunto de emendas constitucionais requeridas para a viabilização das reformas Para isto contudo teria sido necessário que por ocasião da posse do novo Congresso em meados de fevereiro o governo já tivesse definido com clareza o teor de cada uma das reformas e preparado propostas concretas das emendas constitucionais pertinentes E a verdade é que o governo simplesmente não dispunha de projetos detalhados de reforma para encaminhar ao Congresso Desde a campanha eleitoral já se sabia que boa parte das reformas não passava de um conjunto de ideias ainda bastante vagas à espera de um trabalho árduo de detalhamento Transformar uma simples bandeira de campanha eleitoral como por exemplo reforma tributária em proposta circunstanciada que pudesse ser submetida ao Legislativo envolvia tarefa de grande complexidade técnica jurídica e política que não podia ser cumprida da noite para o dia A lentidão com que o novo presidente compôs a sua equipe retardou ainda mais o avanço desse trabalho A composição do ministério só foi concluída quando faltava pouco mais de uma semana para a posse do novo governo E sob esse aspecto a vantagem propiciada pela eleição em primeiro turno foi perdida Os melhores esforços da pequena equipe econômica com que contava o presidente haviam sido consumidos no lançamento do Real e na tensa travessia da crise mexicana que eclodira pouco antes do Natal de 1994 Simplesmente não houve tempo para que propostas bem articuladas de reforma fossem preparadas para encaminhamento ao Congresso A tramitação preliminar de algumas das propostas de reforma submetidas ao Legislativo fizeram aflorar outras dificuldades bastante previsíveis A frente de esquerda que havia conseguido obstruir a reforma constitucional de 199394 estava sendo rapidamente reativada Parte substancial da bancada governista mostravase pouco confiável e propensa a condicionar seu apoio ao grau de influência que pudesse vir a ter no preenchimento de cargos de segundo e terceiro escalão Por outro lado o governo logo constatou ter feito avaliação equivocada ao presumir que a reforma da Previdência poderia ser o carrochefe que abriria passagem para a aprovação de outras emendas constitucionais O tema mostrouse especialmente controverso e em meio a alto grau de desinformação ficou claro que os interesses contrários à proposta de reforma previdenciária do governo permeavam todos os partidos da direita à esquerda do Congresso Assustado com a resistência o governo resolveu colocar a proposta em banhomaria e tentar abrir caminho para as reformas com propostas de emendas constitucionais menos complexas e relacionadas a temas menos controvertidos No segundo trimestre de 1995 o governo obteve avanços de grande importância no programa de reformas ao extrair do Congresso a aprovação de emendas de concepção relativamente simples relativas ao capítulo da Ordem Econômica da Constituição que permitiram abrir caminho para a ruptura do monopólio estatal nos setores de petróleo e gás e para a privatização do setor elétrico e do setor de telecomunicações A aprovação de tais emendas envolvia questões fundamentalmente ideológicas que levaram a uma polarização do Congresso em apenas dois blocos Mas boa parte da agenda remanescente de ajuste fiscal e modernização do setor público dizia respeito a questões bem mais complexas como era o caso das reformas previdenciária administrativa e tributária No posicionamento dos parlamentares sobre tais questões já não houve propriamente polarização e sim fragmentação do Congresso segundo padrões dificilmente explicáveis a partir de dicotomias simples como esquerda e direita O grande desafio passou a ser conceber propostas de reforma capazes de romper a tendência à fragmentação e viabilizar uma coalizão de 35 dos parlamentares em cada uma das duas casas do Legislativo Tudo isto naturalmente sem perder de vista a orientação maior que norteava cada uma destas reformas e que as tornava prioritárias Um desafio que se mostrou bem mais difícil do que a ampla base parlamentar que dava apoio no governo fazia supor No final de 1995 depois de encerrada a temporada de refiliação partidária e de ter sido criado o PPB pela fusão do PP com o PPR uma análise da nova composição do Congresso mostrava que o apoio nominal do governo no Legislativo havia se tornado ainda mais sólido do que já era no início do ano No Senado o governo contava com posição especialmente confortável Já na Câmara o maior partido continuava sendo o PMDB com 98 deputados bem menos do que os 107 que havia eleito A seguir vinha o PFL com 97 bem mais do que os 89 que tinha eleito O novo PPB com 90 deputados compunha a terceira maior bancada da Câmara A quarta era a do PSDB que havia passado de 62 para 84 deputados E a seguir vinha o PT com 49 o PTB com 28 e o PDT com 26 O PL e o PCdoB tinha cada um 10 deputados e os seis demais partidos menos de três deputados cada Com 15 partidos representados continuava sendo uma composição extremamente fragmentada Mas os três maiores partidos que vinham dando apoio na Câmara ao programa de reformas do governo PFL PPB e PSDB reuniam um total de 274 deputados o que representava bem mais da metade da Câmara e apenas 34 deputados a menos do que a maioria necessária para a aprovação de emendas constitucionais A verdade contudo é que em meio à indisciplina partidária o governo vinha enfrentando grande dificuldade para assegurar que essa coalizão heterogênea de forças políticas nominalmente tão vasta se traduzisse em respaldo efetivo ao avanço do programa de reformas E escaldado pelo fracasso do primeiro projeto de reforma previdenciária encaminhado apressadamente ao Congresso no início do ano sem mapeamento correto das resistências a enfrentar o governo passou a adotar postura extremamente defensiva no encaminhamento das reformas Ironicamente parte da dificuldade de fazer avançar o programa de reformas advinha do próprio sucesso do programa de estabilização Com o crescente otimismo acerca da evolução do quadro inflacionário havia desaparecido boa parte do senso de urgência que emanava da apreensão com o regime de alta inflação E não era só no Congresso que se podia detectar perda de convicção sobre a real necessidade das reformas No próprio Executivo surgiam dúvidas sobre o acerto da insistência num programa de reformas constitucionais que exigia prolongada manutenção de desgastante maioria de 60 nas duas casas do Congresso Foi no esforço de privatização que o programa de reformas do primeiro governo Fernando Henrique Cardoso obteve seus resultados mais convincentes A privatização de empresas provedoras de serviços públicos exigiu mudanças institucionais importantes para dotar o país de um aparato regulatório adequado Foram criadas diversas agências reguladoras setoriais Com frequência aproveitando a estrutura de órgãos reguladores preexistentes que vinham funcionando sob a captura de grandes empresas estatais5 Foi necessário alterar a Constituição para flexibilizar o monopólio da Petrobras Emenda Constitucional n 9 e para permitir a entrada de empresas privadas em setores como telecomunicações Emenda Constitucional n 8 e gás Emenda Constitucional n 5 Foi também aprovada a Emenda Constitucional n 6 que suprimiu distinções no tratamento de empresas nacionais e estrangeiras As quatro emendas foram aprovadas pelo Congresso em 1995 O processo de privatização exigiu também mudanças importantes na legislação infraconstitucional A reformulação da legislação sobre concessões de serviços públicos Leis no 8987 e no 9074 de 1995 foi fundamental para viabilizar a privatização nos setores de petróleo energia elétrica e telecomunicações6 Entre 1995 e 2002 as receitas de privatização em todos os níveis de governo somaram o equivalente a US786 bilhões cerca de 95 em moeda corrente nacional além de redução de dívida de US148 bilhões Cerca de 70 desse total foram obtidos em 19971998 e 53 corresponderam a aquisições por empresas estrangeiras em contraste com 5 em 19901994 Da receita total 80 corresponderam à venda de empresas relacionadas à infraestrutura 14 ao setor industrial e 6 a participações societárias Na infraestrutura as privatizações das empresas de telecomunicações corresponderam a cerca de 38 das receitas totais e as de empresas elétricas a cerca de 28 sendo 74 a distribuidoras estaduais Embora de menor expressão como participação das receitas de privatização as privatizações nos setores de mineração e financeiro tiveram implicações importantes A privatização da Companhia Vale do Rio Doce estatal criada em 1942 ainda no primeiro período Vargas foi emblemática A operação de venda do controle da empresa enfrentou grande resistência e foi dificultada por muitas ações judiciais O governo manteve poder de veto em decisões estratégicas por meio de uma golden share e participação indireta no bloco controlador através do fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil Previ No esforço de reestruturação do sistema bancário que se fez necessário ao fim do regime de alta inflação vários bancos pertencentes a governos estaduais foram transferidos ao setor privado quase sempre após intervenção do Banco Central Na privatização das telecomunicações foi difícil criar um ambiente competitivo na provisão de serviços de telefonia fixa apesar da preocupação em criar empresas espelho que pudessem contestar em alguma medida o poder de mercado das empresas já estabelecidas Mas tais problemas foram minorados em grande medida pela rápida difusão da telefonia celular Avaliados com base na disponibilidade de aparelhos telefônicos os resultados da privatização das telecomunicações foram espetaculares Em 1994 havia 84 telefones fixos por 100 habitantes Em 2002 263 Paralelamente o número de telefones celulares por 100 habitantes aumentou de 04 em 1994 para 219 em 2002 A privatização de empresas de energia elétrica teve de levar em conta as especificidades do sistema hidrelétrico E exigiu equacionamento prévio do alto grau de inadimplência que vinha marcando a compra por distribuidoras estaduais de energia gerada por empresas estatais federais Razões pelas quais a privatização avançou com mais facilidade na distribuição do que na geração de energia Após a criação da Aneel em 1997 foram criados no ano seguinte o Operador Nacional do Sistema Elétrico ONS e o Mercado Atacadista de Energia MAE Lei 9648 de 1998 Ao ONS coube o controle da operação das instalações de geração e transmissão de energia elétrica no Sistema Interligado Nacional O MAE estava encarregado da compra e venda de energia mas ficou inoperante até 2004 em meio a dificuldades operacionais conflitos de jurisdição e à predominância de transações internas em empresas verticalizadas geradoras e distribuidoras No setor petróleo a posição dominante da Petrobras permaneceu praticamente intocada a despeito da flexibilização que permitiu investimentos privados em atividades antes restritas às empresas controladas pelo governo Além de modestas privatizações adicionais na petroquímica cerca de US48 bilhões foram apurados em 2000 2001 com a venda por oferta pública de ações da Petrobras No final de 2001 em substituição à chamada conta petróleo foi criada a Contribuição de Intervenção do Domínio Econômico CIDE A ANP promoveu leilões de 157 blocos exploratórios entre 1999 e 2002 dos quais 88 foram arrematados por um valor total próximo a R15 bilhão Tais leilões permitiram a entrada de empresas privadas na exploração e produção de petróleo Houve também entrada de empresas privadas na distribuição de gás natural apesar da manutenção do controle de terminais e gasodutos pela Petrobras Parte da infraestrutura de transportes também foi privatizada A partir de 1994 foram licitadas nos três níveis de governo concessões para a exploração de quase 10000 km de rodovias Entre 1996 e 1999 além da Estrada de Ferro Vitória a Minas e da Estrada de Ferro Carajás pertencentes à Companhia Vale do Rio Doce cerca de 26000 km da malha ferroviária foram transferidos a operadores privados Até meados de 1997 o governo mantevese nitidamente dividido quanto à utilização que deveria ser dada aos recursos que vinham sendo gerados pelo programa de privatização Parte da equipe econômica defendia que os recursos deveriam ser destinados ao financiamento de investimentos através do BNDES Outra parte arguía que tendo em conta a evolução do quadro fiscal os recursos deveriam ser integralmente canalizados para resgate da dívida pública Como se verá mais adiante foi necessária séria deterioração do ambiente externo para que essa última corrente acabasse prevalecendo Não obstante a retórica de abertura comercial que marcou o esforço de estabilização que deu lugar ao Plano Real houve reversão da liberalização comercial no início do período FHC A tarifa efetiva média da economia aumentou de 136 em 1994 para 171 em 1995 e 187 em 1999 Como já mencionado acima a apreensão com a deterioração das contas externas que se seguiu à crise mexicana foi usada como pretexto para a restauração de barreiras comerciais que haviam sido reduzidas em 1994 A combinação de tarifas muito altas sobre importações de automóveis de um lado com tarifas de importação de autopeças especialmente baixas de outro deu lugar a um regime automotivo montado em comum acordo com a Argentina com tarifas de importação efetivas de mais de 200 em 1996 Na esteira de sucessivas crises macroeconômicas no Brasil e na Argentina na segunda metade dos 1990 os acordos estabelecidos em 1994 no Tratado de Ouro Preto foram modificados em várias ocasiões o que afetou não só as listas de exceções nacionais à Tarifa Externa Comum do Mercosul mas também os produtos incluídos no Regime de Adequação Final da TEC que continha itens sensíveis excluídos de isenção tarifária Negociações visando a formação de uma Área de Livre Comércio das Américas a partir de 2005 malograram por conta de dificuldades decorrentes das características das economias dos integrantes do Mercosul quando contrastadas às demais economias do hemisfério Tampouco avançaram negociações em torno um acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia O Brasil reforçou sua influência nas negociações no âmbito da Organização Mundial do Comércio OMC a despeito do avanço modesto dos esforços multilaterais de liberalização comercial no período Merece destaque o protagonismo brasileiro na solução de controvérsias na OMC em questões envolvendo demandas recíprocas com o Canadá relativas a subsídios às exportações de aeronaves regionais e o início de processos relacionados a subsídios dos Estados Unidos às exportações de algodão e ao regime açucareiro da União Europeia O projeto da reeleição Como mencionado acima ao longo de 1996 segundo ano do primeiro mandato de FHC ganhou força em Brasília a ideia de conseguir a aprovação no Congresso de uma emenda constitucional que permitisse a reeleição do presidente A crescente mobilização do governo com esse projeto trouxe implicações importantes para a condução da política econômica Esperavase que 1996 fosse um ano decisivo para o ajuste fiscal e para o avanço das reformas Mas o governo preferiu dar prioridade à formação da coalizão política necessária à aprovação da emenda da reeleição Nas disposições transitórias da Constituição de 1988 havia sido estabelecido que cinco anos após a promulgação da Carta haveria um período de revisão constitucional em que emendas poderiam ser aprovadas por maioria absoluta Quando afinal se abriu essa oportunidade de revisão em 19931994 o Congresso estava atravessando um momento especialmente problemático fragilizado pelo enorme desgaste que adveio do que a mídia rotulou de escândalo dos anões do Orçamento E a verdade é que isso acabou limitando em muito as possibilidades do esforço de revisão constitucional Mas na época a ideia da reeleição parecia contar com apoio relativamente amplo O que vinha sendo articulado inicialmente era um rearranjo que envolveria redução do mandato presidencial de cinco para quatro anos e introdução da possibilidade de reeleição No último momento contudo houve uma tentativa de se estender esta possibilidade aos governadores que estavam em final de mandato E isto acabou tornando inviável a aprovação da emenda da reeleição O que afinal se aprovou foi um mandato presidencial de quatro anos sem reeleição7 No final de 1995 com a alta popularidade de FHC na esteira do sucesso da estabilização a questão da reeleição que havia desaparecido de cena foi reavivada E passou a ser vista com crescente interesse no Planalto Para levar o projeto adiante o governo defrontavase com a difícil escolha do momento adequado para levantar a questão Uma possibilidade era investir na continuação do seu bom desempenho e apostar no surgimento da reeleição como idéia natural na segunda metade do seu mandato Outra era tentar antecipar a discussão para poder já levar em conta a possibilidade de mais quatro anos de mandato na gestão do seu capital político Essa última estratégia pela qual o governo parecia se inclinar afiguravase especialmente arriscada Uma derrota na votação da emenda poderia deixar o presidente politicamente aleijado Depois que o jogo começasse seria muito difícil voltar atrás Um recuo poderia ter custos políticos excessivamente altos Só haveria saída para a frente E o governo teria de estar disposto a fazer o que quer que fosse necessário para evitar a derrota Tendo isso em conta o Planalto atravessou boa parte de 1996 com um discurso ambíguo e cauteloso sobre a reeleição preocupado em adiar o início efetivo do jogo e resguardar a possibilidade de sem grande desgaste dar o dito pelo não dito Mas em meio à ambiguidade o governo passou a evitar na medida do possível questões polêmicas na área econômica que pudessem antagonizar parlamentares e governadores Reformas e esforços de ajuste fiscal foram postos em compasso de espera No BNDES abriuse aos governadores um guichê de facilidades que induziu a postergação de esforços de ajustes nos estados E o resultado primário do setor público continuou em franca deterioração Boa parte da complexidade da questão da reeleição advinha do fato de que nenhum parlamentar estava disposto a discutir apenas a reeleição do presidente A discussão teria de envolver também a reeleição de governadores e prefeitos E a reeleição de prefeitos poderia vir a se revelar um tema especialmente controvertido na medida em que pelo menos uma centena de parlamentares estavam interessados em se candidatar a prefeituras em 1996 e portanto seriam contrários a reeleição para prefeito com vigência imediata Além disso o Planalto tinha boas razões para temer que mesmo partidos que compunham a vasta coalizão que lhe dava sustentação no Congresso poderiam não estar dispostos a dar de graça e tão cedo tanto espaço de manobra adicional ao presidente8 No início de 1997 a situação tornouse especialmente difícil E o governo teve de se desdobrar para evitar que o Congresso lhe impusesse um jogo lento na decisão sobre a reeleição O que o Planalto mais temia afora a derrota era que a questão fosse empurrada para alguma forma de consulta popular o que prolongaria por vários meses o seu desfecho O presidente naturalmente tinha todo interesse em transformar a aprovação da reeleição em um jogo rápido que lhe deixasse as mãos livres para tirar o melhor proveito da segunda metade do seu mandato O problema é que participantes importantes do jogo mesmo muitos dos que não se opunham em absoluto à ideia da reeleição tinham razões para preferir um jogo lento Na verdade para boa parte deles o ideal seria um jogo muito lento Parlamentares governadores e outros atores políticos com assento nessa mesa de jogo estavam fascinados com o poder de barganha com que poderiam contar até que a emenda fosse aprovada E não queriam é claro abreviar mais do que lhes parecia necessário um período de excepcional bonança política A emenda da reeleição acabou aprovada em primeiro turno na Câmara no final de janeiro de 1997 com 336 votos 24 a mais do que a maioria de três quintos exigia E isso abriu caminho para sua aprovação definitiva pelo Congresso Os longos meses de esforço de montagem da coalizão política requerida para a aprovar a emenda haviam redundado em sucesso E naquele momento poderia até ser dito que o governo havia preferido investir os fartos recursos políticos com que já contava no início de 1995 na própria ampliação destes recursos em vez de usálos para derrotar os interesses que vinham impedindo o avanço das reformas a construção de uma posição fiscal mais confortável e a consolidação da estabilização Não havia a menor dúvida de que o governo tinha conquistado uma posição política ainda mais sólida do que a eleição lhe assegurara em 1995 Um baluarte hegemônico como há muito não se via no país Mas a conquista não havia sido sem custos Sob vários aspectos a economia ficara bem mais vulnerável do que em 1995 De um lado o governo havia sido excessivamente complacente no controle dos seus próprios gastos e do acesso dos estados e dos municípios ao financiamento de posições deficitárias De outro mostrarase muito mais cauteloso do que poderia ter sido nas negociações das reformas E as contas externas estavam em franca deterioração O déficit em transações correntes de 1996 havia chegado a cerca de 33 do PIB A grande questão era que uso afinal o governo pretendia dar aos vastos recursos políticos adicionais que havia conseguido acumular com a aprovação da emenda da reeleição Já era tempo de o governo voltar sua atenção para as medidas necessárias para assegurar mais espaço de manobra à gestão da política econômica Até a mobilização com o projeto da reeleição o discurso oficial sobre o plano de jogo da consolidação da estabilização era ganhar credibilidade insistindo no programa de reformas e nas medidas de ajuste fiscal e usar o espaço de manobra do financiamento externo para dar tempo ao tempo e esperar a economia se reestruturar e ganhar competitividade Mas aos poucos esse discurso foi ficando cada vez menos crível No final de 1996 havia ficado evidente que amplos setores do governo já não pareciam acreditar neste plano de jogo Conviviam dentro do governo vários discursos concorrentes sobre como as dificuldades das contas externas deveriam ser superadas Ao que parecia ser o discurso oficial vinhamse somando outras propostas que com ele pouco tinham a ver Havia quem defendesse publicamente que a abertura comercial havia sido uma imprudência e que sua reversão era inevitável E se falava até em um novo ciclo de substituição de importações e na restauração de uma política industrial que tal como se fazia nos anos 1950 desse prioridade na distribuição de favores estatais aos segmentos industriais com maiores déficits na balança comercial setorial Expectativas de que tendo conseguido a aprovação da emenda da reeleição o governo estaria afinal disposto a mobilizar seus recursos políticos para reverter a deterioração das contas públicas e fazer avançar a agenda de reformas logo se mostraram infundadas Na verdade o Planalto continuou incapaz de mostrar convicção acerca da importância do ajuste fiscal até nos aspectos mais elementares Ao longo do primeiro semestre de 1997 deixou que continuasse prosperando no governo a ideia que os recursos da privatização não deveriam ser canalizados para resgate de dívida pública9 Tendo em conta outras formas de equacionamento do desequilíbrio das contas externas que vinham sendo aventadas tanto as reformas como o ajuste fiscal pareciam menos prementes Na verdade a aprovação da emenda da reeleição deu lugar a um clima de autoconfiança e triunfalismo no governo E ganhou força em Brasília a ideia de que o presidente não poderia ficar prisioneiro das reformas e que chegara o momento de começar a governar Na esteira da apreciação do câmbio as contas externas estavam em franca deterioração Previase um déficit em conta corrente de quase 4 do PIB em 1997 Parte da equipe econômica respaldada por lideranças importantes do PSDB insistia na necessidade de uma desvalorização cambial e de políticas mais intervencionistas de promoção do crescimento econômico arguindo que as contas públicas tenderiam a melhorar naturalmente à medida que o crescimento se acelerasse Outra parte da equipe econômica resistia a tais propostas ponderando que uma desvalorização seria excessivamente arriscada ainda mais se não fosse precedida de ajuste fiscal considerável Enquanto o governo mostrava relutância em meio a essa controvérsia a inconsistência da política macroeconômica se exacerbava cada vez mais Foi nessas condições que o país se viu de repente submetido a um contundente choque de realidade Choques externos e crise cambial O alarme soou em julho de 1997 quando o ataque especulativo à Tailândia deflagrou uma onda de dificuldades similares em países vizinhos dando lugar ao que passou a ser conhecido como Crise Asiática Com a economia brasileira tão vulnerável e exposta ao contágio o governo afinal percebeu que havia chegado o momento de deixar de lado a ambivalência e adotar um discurso econômico coerente Emblemática dessa súbita mudança de postura foi a rapidez com que o Planalto decidiu encerrar de vez a disputa dentro da equipe econômica sobre que uso dar aos recursos provenientes da privatização anunciando que tais recursos passariam a ser integralmente destinados ao resgate da dívida pública Em outras áreas no entanto não foi tão simples passar das palavras à ação À medida que a crise ganhou força na Ásia alcançou Hong Kong e passou a ameaçar a Coreia do Sul o Brasil tornouse alvo óbvio de ataque especulativo No final de outubro o Banco Central se viu obrigado a dobrar a taxa de juros que já vinha sendo mantida em níveis extremamente altos para mais de 40 ao ano E no início de novembro numa frenética tentativa de sinalizar drástica mudança de regime fiscal o governo anunciou um grande pacote preparado às pressas de nada menos que 51 medidas distintas com que esperava promover um efeito combinado de ajuste fiscal da ordem de 2 do PIB Por pouco plausível que pudesse parecer tal sinalização mostrouse eficaz Por volta de março de 1998 a crise tinha amainado na Ásia E as medidas que tinham sido anunciadas no Brasil pareciam ter mantido o ataque especulativo sob relativo controle deixando o país a salvo dos efeitos devastadores que tinham sido observados nas economias asiáticas Mas a verdade é que a inconsistência macroeconômica ainda não tinha sido resolvida A política cambial não tinha sofrido maiores alterações E o déficit em transações correntes continuava a aumentar As contas fiscais do final de 1997 publicadas no final de fevereiro deixavam claro que a deterioração do resultado primário consolidado do setor público que havia tido início em 1995 não havia sido interrompida em 1997 A combinação dessa deterioração com taxas de juros excepcionalmente altas logo deu lugar a prognósticos muito pessimistas sobre a dinâmica do endividamento público A situação exigia um esforço vultoso e crível de ajuste fiscal bem maior que os 2 do PIB que tinham sido prometidos em novembro Mas a essa altura o governo mais uma vez havia voltado suas atenções para outras questões que já lhe pareciam mais prementes O país estava a seis meses de novas eleições gerais quando muita coisa estaria em jogo a presidência 27 cargos de governador a Câmara de Deputados um terço do Senado e todas as assembleias estaduais Não chegou a ser uma surpresa que nessas circunstâncias a ideia de insistir num plano de ajuste fiscal começasse a ser considerada altamente inoportuna em Brasília De um extremo a outro da ampla e heterogênea coalizão política que dava apoio ao governo a proposta de marchar para as eleições sob a bandeira de um severo programa de ajuste fiscal passou a ser vista como uma receita infalível para o desastre Como o ambiente externo parecia estar melhorando a olhos vistos o governo sentiuse confiante para deixar a maior parte do esforço de ajuste fiscal em compasso de espera até as eleições Tendo de escolher entre risco político e risco econômico o presidente decidiu que para reduzir o primeiro valeria a pena assumir mais do segundo Por volta de julho a liderança confortável de FHC nas pesquisas de intenção de voto e os sinais de que tudo permanecia tranquilo na frente externa deu lugar a autocongratulações em Brasília pelo acerto da aposta que havia sido feita pelo governo Mais cedo do que teria sido razoável A declaração de moratória pela Rússia em agosto de 1998 colheu o governo e o país em posições extremamente vulneráveis Com uma eleição tão importante a menos de dois meses o governo se viu paralisado impossibilitado de reagir como deveria ao devastador processo de contágio que havia sido deflagrado Logo se disseminaram entre as forças que apoiavam FHC temores de que o alto risco econômico que o governo decidira assumir meses antes estivesse sendo rapidamente convertido em inequívoco risco político que lançava sérias dúvidas sobre o sucesso do projeto de reeleição No início de setembro o governo entendeu que não teria como esperar mais quatro semanas até as eleições para se mostrar mobilizado com a assustadora perda de reservas internacionais que o agravamento da crise vinha provocando Anunciou a implantação de um sistema de controle estrito e centralizado do dispêndio público E depois de quatro longos anos de resistência à adoção de metas fiscais claramente fixadas deixou claro que passadas as eleições seriam anunciadas metas bem definidas de desempenho fiscal para o mandato presidencial que teria início em janeiro de 1999 Tais medidas foram reforçadas em meados de setembro por um pronunciamento de FHC à Nação em tom severo no qual o presidente tentou transmitir a extensão do seu compromisso com a imposição de um vultoso ajuste fiscal No início de outubro quando afinal o país foi às urnas a maioria dos eleitores preocupada com a gravidade da situação econômica e resistente aos excessos do discurso radical da oposição decidiu em primeiro turno que seria mais prudente reeleger o presidente Poucas semanas depois da eleição o governo afinal anunciou um programa de estabilidade fiscal quase todo baseado em elevação de carga tributária que permitiria elevar o superávit primário do setor público de perto de zero no final de 1998 a 26 do PIB em 2001 E com isso estabilizar a dívida líquida do setor público em torno de 44 do PIB O programa contemplava também a possibilidade de remessa ao Congresso em tempo hábil de uma proposta de reforma previdenciária e de um projeto de Lei de Responsabilidade Fiscal que afinal pudesse impor restrições orçamentárias rígidas aos três níveis de governo Com base nesse programa foi possível negociar às pressas um pacote de US40 bilhões de apoio externo respaldado pelo FMI por outras instituições multilaterais e pelos governos do G7 em meio a temores de que a crise brasileira pudesse fugir ao controle e trazer problemas mais sérios à economia mundial Um propósito essencial do pacote era assegurar ao governo condições adequadas para a manutenção da política cambial de crawling peg Mas já em meados de dezembro foi noticiado que o Planalto vinha considerando seriamente a possibilidade de tentar uma desvalorização controlada Mais uma vez a equipe econômica se dividira Apesar da resistência do ministro da Fazenda e do presidente do Banco Central à ideia FHC estava sendo convencido por outros membros da equipe de que uma desvalorização permitiria um ajuste fiscal menos penoso e uma recuperação mais rápida da economia No início de janeiro de 1999 logo nos primeiros dias do novo mandato presidencial que se iniciava a substituição do presidente do Banco Central abriu caminho para a mudança na política cambial Em gritante contraste com que o governo contemplava o abandono do crawling peg deflagrou um processo descontrolado de desvalorização com efeitos de desestabilização devastadores que perduraram pela maior parte do primeiro bimestre de 1999 Os danos acabaram sendo amplificados por dois fatores De um lado como a mudança da política cambial implicava sério rompimento do acordo que acabara de ser firmado com FMI o país perdeu o apoio das instituições multilaterais e do G7 De outro o Banco Central permaneceu precariamente tripulado durante a pior parte da crise exatamente quando sua atuação se fazia mais necessária Basta notar que num período de 60 dias a instituição teve quatro presidentes diferentes Em 3 de março o dólar atingiu o pico de R216US mais de 78 acima do câmbio R121 que havia sido observado dois meses antes sob o regime de crawling peg Novo arcabouço de política econômica Por que a crise pôde ser afinal revertida a partir desse ponto é uma questão que merece atenção Não é difícil encontrar outros exemplos de experiências de desvalorização descontrolada em economias emergentes em que a devastação foi bem maior e mais prolongada Ao analisar as peculiaridades da experiência brasileira naquele momento talvez se deva dar algum crédito à forma como FHC lidou com a crise quando afinal conseguiu superar a estupefação de que foi tomado de início Não ter demitido o ministro da Fazenda e não ter perdido o resto da equipe econômica ajudou a conter os danos Na verdade como Pedro Malan havia sido inequivocamente contrário à tentativa de desvalorização controlada foi possível preserválo no cargo Mas é preciso ter em mente que quando as coisas dão tão errado em proporções tão vastas governantes tendem a não resistir à tentação de repassar a culpa pelo desastre e ceifar cabeças em torno de si É notável que FHC tenha percebido que para encurtar a crise teria de evitar novas perdas na equipe econômica E não há dúvida de que isso o ajudou em muito a atrair nomes de peso para tripular o Banco Central naquele momento tão difícil O controle da situação começou a ser restabelecido no início de março quando a nomeação de uma nova diretoria do Banco Central comandada por Arminio Fraga abriu caminho para uma renegociação do acordo com o FMI O novo programa de ajuste macroeconômico era pautado por três objetivos O quadro fiscal tinha se tornado ainda mais precário do que parecia no início de janeiro A taxa básica de juros tinha sido elevada a 45 e a desvalorização vinha tendo impacto alarmante sobre o valor da dívida pública composta em boa medida por títulos vinculados ao câmbio Uma dinâmica de dívida tão adversa passara a exigir um ajuste fiscal vultoso bem maior do que fora contemplado pelo esforço de consolidação fiscal anunciado poucos meses antes E era este o primeiro objetivo do programa O segundo era assegurar que as contas externas seriam compatíveis com o estreitamento das possibilidades de financiamento externo com que o país passara a se defrontar O terceiro envolvia o desafio de evitar que o enorme choque proveniente da desvalorização levasse a perda de controle sobre a inflação Na esteira de um potente círculo virtuoso houve melhora surpreendentemente rápida da situação econômica do país entre março e julho de 1999 O clima de alarme que havia sido gerado pelas proporções assustadoras do processo de desestabilização ajudou o governo a mobilizar sólida coalizão no Congresso e superar com relativa facilidade as resistências à aprovação das medidas de ajuste que se faziam necessárias No combate à inflação o quadro logo se tornou bem menos adverso Os efeitos do choque inflacionário deflagrado pela desvalorização mostraramse mais fáceis de acomodar do que se temia E à medida que avaliações menos pessimistas das contas públicas e do quadro inflacionário começaram a prevalecer uma vigorosa resposta do influxo de capitais gerou rápida apreciação da taxa de câmbio que por sua vez abriu espaço para que o Banco Central fizesse a taxa de juros de desabar de 45 em março para menos de 20 no final de julho A combinação de superávit primário considerável taxa de câmbio muito menos depreciada e taxas de juros bem mais baixas deu lugar a prognósticos bem menos preocupantes sobre a dinâmica do endividamento público Por volta do meio do ano a rápida melhora da situação havia deixado o Banco Central suficientemente confiante para anunciar que a recém instaurada política de metas para inflação seria conduzida visando taxas de 8 em 1999 e de 6 em 2000 A essa altura também já havia ficado claro que o impacto da crise sobre o nível de atividade seria bem menor do que a queda de 35 a 4 no PIB que o próprio governo tinha previsto em março Na verdade a economia acabaria mostrando pequena expansão de 03 do PIB em 1999 As contas externas também estavam melhorando apesar da resposta surpreendentemente fraca da balança comercial à gigantesca desvalorização cambial A simples eliminação em 1999 do déficit comercial de US6 bilhões observado no ano anterior foi vista como um efeito desapontador É bem verdade que após o ajuste excessivo do início de 1999 o real tinha sofrido uma apreciação substancial sob o novo regime de câmbio flutuante Mas mesmo com esse recuo no início de 2000 o câmbio a mais de R170US ainda estava cerca de 40 acima da taxa observada no início de janeiro de 1999 antes da desvalorização O desapontamento com os efeitos imediatos da desvalorização sobre a balança comercial logo daria lugar a nova e importante controvérsia dentro do governo acerca da conveniência de recorrer a práticas mais intervencionistas na gestão da política comercial e da política industrial Uma controvérsia que se arrastaria por todo o segundo mandato de FHC Mas a crise havia levado a uma mudança definitiva na condução da política econômica O revés deu ao governo lucidez e senso de urgência para afinal fazer o que precisava ser feito Ou pelo menos boa parte do que precisava ser feito A nomeação de Armínio Fraga para a presidência do Banco Central o grande sucesso imediato de sua decisiva atuação e o desestímulo a contestações internas à condução da política econômica permitiram que em seu segundo mandato o governo afinal conseguisse ter um discurso econômico harmônico e coerente10 O círculo virtuoso vivido pela economia a partir de março de 1999 ajudou a reforçar no país o reconhecimento das virtudes da responsabilidade fiscal do regime de câmbio flutuante e da política de metas para inflação Três esteios da política econômica que emergiu da crise cambial Círculo virtuoso e crise energética No início de 2000 a economia parecia bem mais sólida do que um ano antes A turbulência deflagrada pela desvalorização havia sido superada A inflação estava sob controle E havia um programa impressionante de consolidação fiscal em andamento O ano 2000 estava fadado a ser o melhor ano do segundo mandato de FHC A inflação seria mantida em 6 em perfeita obediência à meta E o déficit primário consolidado do setor público que chegara a 1 do PIB em 1997 seria convertido em superávit de 33 do PIB É verdade que dadas as resistências políticas à contenção do dispêndio público o esforço de ajuste fiscal havia sido feito predominantemente pelo lado da receita com base na imposição de tributos cumulativos altamente distorcivos Mas isso não impediu que o ajuste desse lugar a avaliações bem menos pessimistas da sustentabilidade das contas fiscais pois a melhora das contas primárias parecia suficiente para assegurar a estabilização da dívida líquida do setor público em cerca de 50 do PIB E o mais importante é que em 2000 o governo conseguiria extrair do Congresso a aprovação de uma Lei de Responsabilidade Fiscal muito bem concebida que afinal permitiria impor restrições orçamentárias rígidas aos três níveis de governo A melhora da balança comercial continuava lenta mas o vigor do influxo de capitais sugeria que a economia teria tempo para esperar que os efeitos da desvalorização cambial se fizessem sentir com mais intensidade Mas a indicação mais promissora do sucesso da política econômica adotada logo após a turbulência do início de 1999 era o fato de que a economia voltara a crescer O PIB teria uma expansão de 43 em 2000 Nessas circunstâncias foi natural que empresários e investidores passassem a ver com grande otimismo as perspectivas do país propensos a crer que o bom desempenho da economia daria lugar a uma transição política suave na eleição presidencial do final de 2002 já que era bem provável que FHC conseguisse fazer seu sucessor A importância do papel estabilizador que tais expectativas vinham desempenhando na economia no início de 2001 só pôde ser percebida com a devida nitidez meses mais tarde quando a reversão do quadro político aumentou em muito a probabilidade de vitória da oposição na eleição presidencial É preciso ter em conta que nas eleições municipais do final de 2000 a oposição tinha se permitido brandir ideias econômicas completamente inconsequentes O Partido dos Trabalhadores PT havia feito uma campanha que combinara questões locais com um plebiscito informal de âmbito nacional respaldado pela cúpula do partido e por seus economistas mais proeminentes em que se indagava ao eleitor se a dívida interna e a dívida externa deveriam ser pagas ou não Por mais de um ano os efeitos desestabilizadores que tais ideias poderiam deflagrar permaneceram latentes porquanto parecia improvável no início de 2001 que a oposição viesse a conquistar já na eleição de 2002 a oportunidade de implementálas No entanto essa suposta certeza quanto ao provável desfecho da eleição presidencial seria seriamente abalada ao longo dos 18 meses seguintes No primeiro trimestre de 2001 o ambiente externo piorou sensivelmente Já em fevereiro a rápida deterioração da situação econômica na Argentina expôs a economia brasileira a nova onda de contágio justo num momento em que as perspectivas da economia mundial estavam se tornando menos promissoras Após uma longa década de expansão a economia norteamericana parecia estar desacelerando No próprio país dificuldades de outra ordem viriam a amplificar em grande medida a incerteza sobre a evolução da economia e do quadro político Em março a ocorrência de atritos sérios entre figuras de importância central na coalizão política que dava apoio ao governo levantou dúvidas sobre o desenlace da eleição presidencial Tais dúvidas tornaramse bem mais sérias em abril quando o governo se deu conta de que em decorrência da gestão desastrosa de um quadro de excesso de demanda de energia elétrica seria obrigado a anunciar que o país estava prestes a enfrentar grave crise de escassez de energia que implicaria interrupção imediata do processo de recuperação econômica então em curso O programa de racionamento de energia elétrica que teve de ser imposto a consumidores residenciais e pequenas empresas tornou ainda mais altos os custos políticos envolvidos O aumento de incerteza econômica e política que essas dificuldades vinham acarretando ainda seria amplificado pelo clima de alarme provocado pelos ataques terroristas de 11 de setembro nos Estados Unidos A essa altura a economia tinha ficado muito mais vulnerável Na esteira do aumento de incerteza a taxa de câmbio voltara a passar por nova e vigorosa depreciação A taxa básica de juros teve de ser substancialmente elevada de 1525 em fevereiro para 19 E o Banco Central enfrentava dificuldades para manter a inflação na meta A disseminação do pessimismo vinha tendo impacto fatal sobre a confiança de investidores e consumidores Previsões de crescimento econômico para 2001 vinham sendo sistematicamente reduzidas A conjunção de taxas de juros mais altas com a rápida depreciação do câmbio reavivou apreensões com a dinâmica da dívida do setor público Nesse quadro a preocupação do governo com os efeitos de uma debacle de grandes proporções na Argentina levou à negociação de um novo acordo preventivo com o FMI em agosto envolvendo um programa de apoio de US15 bilhões Apesar de todas essas dificuldades a situação até chegou a melhorar no final de 2001 depois que os piores efeitos do 11 de Setembro se fizeram sentir à medida que ficou claro que a crise energética estava sendo superada Mas os níveis ainda altos de incerteza em breve dariam novo salto que deflagraria um longo processo de desestabilização fadado a ganhar força devastadora na reta final da eleição presidencial Alternância política e desestabilização Em meados de março de 2002 a probabilidade de vitória do candidato governista na eleição presidencial de outubro foi drasticamente reduzida quando ficou claro que uma divisão irremediável havia sido aberta na complexa coalizão política que dava apoio ao governo O divisor de águas foi um escândalo relacionado a financiamento de campanha deflagrado por uma batida da Polícia Federal que pôs fim às pretensões da candidata Roseana Sarney que vinha sendo promovida pelo Partido da Frente Liberal PFL e tendo desempenho promissor nas pesquisas de intenção de voto O PFL era de longe o segundo pilar mais importante da coalizão Na esteira desse incidente decidiu abandonar o governo e recusar apoio a José Serra do PSDB que se tornara o único candidato remanescente no campo governista A candidatura de Serra vinha também enfrentando dificuldades em outros segmentos da coalizão governista e até mesmo no seu próprio partido Nos meses seguintes ficaria cada vez mais claro que Serra não teria condições de derrotar o candidato do PT Luiz Inácio Lula da Silva que passou a liderar com folga as pesquisas de intenção de voto À medida que o espaço para ilusões sobre o provável desfecho da eleição presidencial se estreitou o temor de que pudesse haver um calote da dívida pública deflagrou um devastador processo de desestabilização quando detentores de ativos financeiros em massa tentaram se proteger contra perdas patrimoniais A taxa de câmbio saltou de R24US no começo de março para 34 no final de julho quando o risco Brasil medido pelo EMBI superou a marca de 2400 pontosbase11 Preocupada com os desdobramentos dessa turbulência a equipe econômica procurou fazer ver à cúpula do PT a importância de conter a desestabilização dos mercados financeiros Lideranças menos radicais do partido já tinham percebido que se a turbulência não pudesse ser mantida sob controle o novo presidente seria obrigado a enfrentar uma situação muito difícil E havia até quem temesse que a própria vitória do candidato do partido na eleição estivesse em risco No final de junho Lula foi convencido a publicar uma carta aberta à Nação Carta ao Povo Brasileiro na qual tentava acalmar os mercados financeiros ressaltando seu compromisso com princípios básicos de uma política macroeconômica coerente Mas os mercados mostraramse céticos para dizer o mínimo Como a turbulência continuava a ganhar força o governo tentou negociar mais um pacote de ajuda externa no quadro de um novo acordo com o FMI que pudesse ajudar a manter a situação sob controle Mas os principais países desenvolvidos tinham acabado de patrocinar vultosas operações de resgate na Argentina e na Turquia E de início a ideia de resgatar mais uma grande economia emergente encontrou resistências Tais resistências foram afinal superadas na esteira da crescente preocupação com os desdobramentos da crise brasileira e com a possibilidade de que ela viesse a se alastrar por outras economias da região num momento delicado em que Argentina e Uruguai já estavam enfrentando problemas econômicos bastante sérios Mas o problema envolvia questões complexas Como poderia o FMI assinar um acordo com um governo em final de mandato sem qualquer garantia de que seria honrado pelo que estaria sendo eleito em outubro O Fundo já tinha enfrentado situação similar na Coreia do Sul cinco anos antes durante a Crise Asiática E a saída tinha sido um pacto préeleitoral de aprovação prévia do acordo por todos os candidatos Seria possível replicar a mesma solução no Brasil A equipe econômica tentou persuadir o PT a participar de um pacto similar Mas enfrentou resistências apesar do empenho decisivo de Antonio Palloci que se tornara o principal interlocutor da equipe econômica no PT Lideranças do partido estavam convencidas de que o controle da turbulência se tornara de fato urgente E até mesmo reconheciam que um compromisso claro com a adoção de uma política macroeconômica coerente poderia ajudar o candidato de oposição a atrair parte dos eleitores de classe média Mas resistiam à ideia de uma promessa formal de honrar pontos essenciais do acordo com o FMI instituição que sempre fora severamente criticada pelo partido Parte da liderança arguía que de nada valeria a conquista de mais apoio na classe média se isso implicasse uma perda talvez maior de eleitores à esquerda Em meio à turbulência o pragmatismo acabou prevalecendo quando parte importante da liderança mais radical do partido afinal se convenceu de que se Lula mostrasse algum compromisso com cumprimento do acordo sua eleição se tornaria uma aposta ainda mais segura do que já parecia ser O novo acordo com o FMI envolvendo o maior empréstimo até então concedido pela instituição US30 bilhões num período de 15 meses foi anunciado no início de agosto A maior parte do desembolso estava prevista para 2003 primeiro ano do mandato presidencial que estava prestes a ter início US24 bilhões estariam à disposição do novo governo Após certa hesitação inevitável todos os candidatos presidenciais relevantes Lula inclusive tiveram encontros separados com FHC e se comprometeram a cumprir os pontos essenciais do acordo Foi um rito de passagem da maior importância E que abriu a Lula espaço de manobra para abandonar o discurso mais radical e se mover decisivamente para o centro Mas os mercados não se convenceram Mostraram algum alívio mas continuaram tomados pelo ceticismo É verdade que após quatro meses de forte desvalorização a taxa de câmbio chegou a mostrar certa apreciação em agosto E o prêmio de riscopaís medido pelo EMBI que havia atingido 2400 pontosbase em julho caiu para 1600 no início de setembro Mas grande parte desse aparente abrandamento da turbulência deveuse de fato a uma efêmera melhora do candidato governista nas pesquisas de intenção de votos vista como simples contrapartida de súbita queda do apoio com que vinha contando Ciro Gomes o terceiro candidato mais importante Em setembro contudo as últimas esperanças de que Serra poderia ganhar a eleição esvaíramse rapidamente Tornouse claro que Lula poderia ganhar a eleição já no primeiro turno e que se não ganhasse seria apoiado pelos demais candidatos e derrotaria Serra com facilidade no segundo No final do mês a taxa de câmbio havia chegado a R39US e prêmio de riscopaís medido pelo EMBI voltado a 2400 pontosbase Afinal a votação de Lula no primeiro turno da eleição no início de outubro não foi suficiente para já lhe assegurar a vitória Mas a liderança do PT entendeu que não haveria tempo para esperar o segundo turno E imediatamente lançou ampla campanha para convencer os mercados financeiros e os segmentos mais conservadores da opinião pública de que seus temores eram infundados E de que na verdade o partido havia abandonado seu discurso radical e estava pronto a respaldar a manutenção da política macroeconômica que vinha sendo adotada pelo governo FHC Tais esforços tornaramse bem mais efetivos quando o anúncio dos principais nomes da equipe econômica do novo governo liderada por Antonio Palloci como ministro da Fazenda ajudou a dar alguma credibilidade à desconcertante e vertiginosa metamorfose por que vinha passando o PT Mas o longo processo de construção de confiança que o partido teria de enfrentar estava apenas começando Ainda teria de perdurar por muitos meses mais Enquanto o PT tentava aplacar os mercados financeiros o governo em final de mandato tentava manter a situação sob controle Logo após o primeiro turno o Banco Central afinal deflagrou um aumento em três etapas da taxa de juros que elevou a taxa básica de 18 para 25 O ano chegou ao fim com a taxa de câmbio em R35US em franco movimento de apreciação e o riscopaís medido pelo EMBI em 1400 pontosbase em clara tendência de queda A turbulência havia custado muito caro ao país Com maior ou menor intensidade a onda de alta incerteza que havia se formado em 2001 tinha durado mais de 20 meses O crescimento do PIB havia sido reduzido para 13 em 2001 e 27 em 2002 Em meio à adversidade o regime de câmbio flutuante tinha provado ser de grande ajuda ao permitir que a economia vergasse sem quebrar Mas a desvalorização deflagrara um choque inflacionário preocupante Com a expectativa de inflação anual chegando a 13 no final do ano havia um grande desafio à frente para o recém implantado regime de metas para a inflação e para o Banco Central do novo governo Mas a depreciação também tivera um efeito positivo de grande importância O tão esperado ajuste na balança comercial estava afinal se fazendo sentir Ao longo do segundo mandato de FHC tinha havido uma melhora de US20 bilhões na balança comercial que ajudara a reduzir o déficit em conta corrente de US334 bilhões em 1998 para US76 bilhões em 2002 Naturalmente havia razões para preocupação com os efeitos combinados que a desvalorização e as altas taxas de juros vinham tendo sobre a dinâmica da dívida do setor público Estava mais do que claro contudo que o regime fiscal sofrera mudanças drásticas Graças à Lei de Responsabilidade Fiscal aprovada em 2000 restrições orçamentárias rígidas tinham sido afinal impostas aos governos subnacionais Já havia quatro anos o setor público vinha gerando um superávit primário consolidado de 3 a 4 do PIB em flagrante contraste com o desempenho fiscal do primeiro mandato de FHC Se o novo governo pudesse de fato pôr fim à onda de incerteza tanto a taxa de câmbio como a taxa básica de juros convergiriam para níveis que tornariam a dinâmica da dívida do setor público bem mais administrável do que parecia no final de 2002 O término do segundo mandato de FHC testemunhou outra mudança da maior importância Não havia dúvida de que o país tinha feito uma travessia muito difícil em 2002 Mas ao fim e ao cabo dessa travessia uma mudança política crucial tinha ocorrido Depois de ter sido derrotado três vezes o PT tinha finalmente vencido a eleição presidencial Mas o vencedor teve de se desfazer de boa parte de suas velhas e arraigadas crenças e deixar de lado o discurso radical para se deslocar rapidamente para o centro do espectro político e adotar como sua a política macroeconômica do governo que chegara ao fim Não foi uma mudança menor O que parecia ser um abismo intransponível entre governo e oposição tinha dado lugar a um amplo conjunto de ideias sensatas compartilhadas por governo e oposição Talvez ainda seja cedo para se ter perspectiva histórica adequada para um entendimento mais profundo da complexa série de eventos que redundaram na rápida metamorfose por que passou o PT ao longo de 2002 Mas alguns fatos parecem claros O movimento inicial do PT em direção ao centro que levou à Carta ao Povo Brasileiro envolveu uma decisão altamente controvertida Só foi aceita pelas alas mais radicais do partido como uma extravagância política cometida em nome do pragmatismo sob o entendimento de que estabeleceria o ponto mais à direita que o partido estaria disposto a chegar para assegurar a vitória de Lula na eleição Como foi então possível que o aggiornamento do partido ultrapassasse em muito esse ponto ao longo dos meses seguintes Boa parte da explicação tem a ver com a dinâmica da campanha eleitoral a preocupação cada vez maior do PT com as dificuldades que a turbulência financeira poderia trazer ao novo governo e a complexa relação que se estabeleceu entre a liderança do PT e a cúpula da equipe econômica de FHC De início tal relação estava limitada a jogos sutis como o que em agosto levou a que Lula se visse constrangido a prometer honrar os pontos essenciais do acordo com o FMI Mais tarde porém passou a envolver uma troca de ideias muito mais rica baseada em níveis de entendimento e colaboração que meses antes pareceriam inimagináveis Do lado do PT Antonio Palocci cumpriu um papel crucial Mas boa parte do crédito pela suavização da transição que de início de afigurava tão problemática deve ser atribuído à equipe econômica do governo que chegava ao fim e a FHC 1Argumentação nesta mesma linha é desenvolvida em Abreu e Werneck 2008 2A dissenção dentro da equipe econômica do novo governo seguiu linhas distintas em diferentes questões O desacordo sobre a política cambial abriu séria divisão no núcleo da equipe econômica responsável pelo Plano Real em 199394 Mas no caso da restauração protecionista o cabo de guerra foi basicamente entre o núcleo da equipe econômica original e novos membros da equipe que haviam se juntado ao governo Naturalmente os desfechos desses embates não foram independentes Tendo se dividido na questão da política cambial o núcleo da equipe econômica de 199394 não conseguiu resistir às pressões protecionistas 3Embora a solução afinal aceita para o Banespa tenha sido justamente percebida como um enorme retrocesso a derrota do Banco Central não foi consumada O Governador Mário Covas ganhou mas não levou A implementação da solução acordada acabou enfrentando entraves diversos que envolveram o equacionamento da dívida adicional que havia sido acumulada e divergências sobre a avaliação e a titularidade dos ativos que seriam oferecidos pelo Estado em pagamento Por outro lado aos poucos o próprio governo de São Paulo tornouse menos convicto da importância da preservação do Banespa como banco estadual Infelizmente FHC nem mesmo menciona em suas memórias a disputa do final de 1995 em torno do Banespa Mas o episódio foi amplamente coberto pela mídia Ver por exemplo Bancada paulista rompe com o BC Deputados querem saída política para o Banespa e ameaçam enfrentamento com o governo no Congresso Folha de SPaulo 20 de setembro de 1995 BC cede e negocia rombo do Banespa Folha de S Paulo 21 de setembro de 1995 FHC vai resolver caso Banespa com Covas Folha de SPaulo 22 de setembro de 1995 SP faz ato contra privatização do Banespa Folha de SPaulo 30 de outubro de 1995 e União desiste de privatizar o Banespa Folha de SPaulo 11 de novembro de 1995 4Ver por exemplo FH autoriza negociações para reeleição O Estado de S Paulo 2 de novembro de 1995 e PSDB faz ofensiva pela reeleição Folha de SPaulo 7 de novembro de 1995 5Merecem destaque as agências reguladoras de serviços de telecomunicação Anatel energia elétrica Aneel petróleo ANP águas ANA vigilância sanitária ANVISA e saúde suplementar ANS transportes aéreos ANAC aquaviários ANTAQ e terrestres ANTT e cinema ANCINE 6A Lei Geral das Telecomunicações Lei 9472 de 1997 que criou a Anatel e balizou a reestruturação e privatização das telecomunicações foi precedida pela Lei Mínima Lei 9295 de 1996 que permitiu a abertura da telefonia celular a operadores privados a chamada banda B que operaria em concorrência com as recém criadas empresas operadoras de telefonia celular do sistema Telebrás Para viabilizar a privatização foi implementado um Plano de Outorga Decreto 2534 de 1998 que dividiu a Telebrás em quatro regiões complementado por um Plano Geral de Universalização do Serviço de Telecomunicações Decreto 2592 de 1998 Em julho de 1998 foram vendidas em leilão as operadoras estatais de telefonia fixa e de longa distância bem como as operadoras de telefonia celular da banda A 7Emenda Constitucional de Revisão n 5 de 7 de junho de 1994 8Confirmando tais temores o Planalto descobriu em meados de janeiro de 1997 às vésperas da votação da emenda que vinha navegando com um mapa errado no complexo arquipélago de forças políticas heterogêneas formado pelo PMDB Os governadores do partido não conseguiram evitar que fossem aprovados por larga margem em convenção do PMDB uma moção contra a reeleição e um requerimento em favor de adiamento da votação da emenda No PPB outro partido importante da coalizão que lhe dava apoio no Congresso o governo já vinha lidando com os efeitos da ferrenha campanha que o prefeito Paulo Maluf fortalecido por ter feito com folga seu sucessor em São Paulo vinha movendo contra a aprovação da reeleição 9Em meados de 1997 o presidente interveio na disputa sobre a questão impondo uma decisão supostamente salomônica metade dos recursos gerados pelo programa de privatização seria destinada ao resgate de dívida pública e a outra metade ao financiamento de investimentos pelo BNDES 10Fatores de outra ordem como a renúncia de membros importantes da equipe econômica em novembro de 1998 na esteira do episódio do grampo no BNDES também acabaram contribuindo para amainar contestações internas à condução da política econômica a partir de março de 1999 José Serra havia deixado o Ministério do Planejamento em 1996 para se candidatar a prefeito de São Paulo Não tendo sido eleito voltou ao governo em março de 1998 mas como ministro da Saúde cargo em que permaneceu até 2002 quando se candidatou a presidente da República 11Prêmio de risco sobre o retorno de títulos de mesma duração do Tesouro dos Estados Unidos exigido pelos investidores para compensar o risco envolvido numa carteira de títulos públicos brasileiros CAPÍTULO 17 Alternância política redistribuição e crescimento 20032010 Rogério LF Werneck Não há como analisar a sinuosa condução da política econômica nos dois mandatos do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva sem começar pela metamorfose por que passou o PT na campanha eleitoral de 2002 Cerca de um ano e meio antes nas eleições municipais do final de 2000 o partido havia patrocinado um despropositado plebiscito que indagava se o governo deveria de fato pagar suas dívidas interna e externa Não se tratava de iniciativa que pudesse ser atribuída a alas radicais ou ao baixo clero do partido Muito pelo contrário A consulta popular contava com o apoio explícito e determinado da elite dirigente do PT e de seus economistas mais proeminentes Não foi surpreendente portanto que a perspectiva de vitória do PT em 2002 desencadeasse avassaladora desestabilização da economia Foi o temor de que tal surto de incerteza pudesse botar a perder a vitória de Lula que levou à guinada no seu discurso econômico a partir de junho de 2002 com a publicação da Carta ao Povo Brasileiro O que se seguiu é bem conhecido a eleição de Lula a nomeação de Antonio Palocci para o Ministério da Fazenda e de Henrique Meirelles para o Banco Central e a crise aplacada por uma política econômica que em meio ao assombro do país e à indisfarçavel contrariedade de boa parte do PT apenas seguia e aprimorava o que vinha sendo feito no governo anterior Quis a História com alguma ironia que coubesse ao Presidente Lula colher os frutos de 15 anos de penosa mobilização do país com a estabilização macroeconômica A expansão da economia mundial e o boom de preços de commodities advindo do rápido crescimento da Ásia criaram ambiente propício para que a política econômica do novo governo logo redundasse em aceleração do crescimento a partir de 2004 Foi uma sorte para o país que a política econômica de Lula tivesse logrado resultados tão positivos já em 2004 Não se sabe o que poderia ter ocorrido se as convicções de Lula e do PT sobre o acerto da política econômica que fora adotada tivessem de ter passado àquela altura pelo teste de uma espera mais prolongada pela retomada do crescimento no país Em 2005 a equipe econômica chegou até a propor medidas de ajuste fiscal a longo prazo para conter a rápida expansão de gastos do governo Mas com a brusca mudança do quadro político que se seguiu à eclosão do escândalo do mensalão a correlação de forças dentro do governo mudou e o cálculo político do Planalto passou a ser dominado por preocupações mais imediatas Na esteira da devastação da cúpula do PT e da fragilização política do presidente o governo entendeu que contenção de gastos se tornara inoportuna O senso de urgência apontava na direção oposta A prioridade passou a ser fazer o melhor uso possível do círculo virtuoso por que passava a economia para assegurar a reeleição do presidente Mas sem esticar a corda mais do que o necessário O discurso econômico do governo mudou E a mudança ficaria especialmente nítida a partir de março de 2006 quando Antonio Palocci foi substituído por Guido Mantega no Ministério da Fazenda O segundo mandato afiguravase de início bastante promissor quatro anos de crescimento rápido em meio a um ambiente externo favorável O bom desempenho da economia em 2007 parecia ter tornado esse cenário ainda mais provável E o governo chegou até a considerar a possibilidade de substituir o presidente do Banco Central por um nome mais alinhado ao novo discurso desenvolvimentista que vinha sendo adotado na Fazenda e na Casa Civil Mas a rápida deterioração do ambiente externo na esteira da crise financeira de 2008 impôs novo choque de realidade ao Planalto A perspectiva de uma crise mundial prolongada foi o ensejo que faltava para que o governo decidisse abrir as comportas do expansionismo fiscal com a criação de um orçamento paralelo no BNDES com ligação direta ao Tesouro A verdade contudo é que o impacto da crise no Brasil acabou sendo muito menor do que se temia Após breve recessão em 2009 a economia voltou à trilha do crescimento rápido O que não impediu que ao longo de 2010 o governo insistisse na política fiscal expansionista fixado no objetivo de garantir a vitória de sua candidata na eleição presidencial O decantado compromisso com a coerência da política macroeconômica que Lula exibiu de início não durou muito Esvaiuse aos poucos a partir de 2005 ao sabor das circunstâncias políticas e acabou nos excessos fiscais de 2010 As seções a seguir relatam essa fascinante evolução da política econômica ao longo dos oito anos de governo do Presidente Lula As duas primeiras analisam a complexa metamorfose por que teve de passar o PT no início do primeiro mandato e o rápido processo de reconstrução de confiança que permitiu que a economia se reestabilizasse e voltasse a crescer a taxas relativamente altas já a partir de 2004 A duas seções seguintes examinam a reorientação da política econômica na esteira da crise do mensalão e da substituição de Palocci por Mantega no Ministério da Fazenda A seguir analisam se as políticas de redistribuição de renda as implicações da opção do governo por uma estratégia desenvolvimentista e o uso da crise financeira mundial a partir de meados de 2008 como pretexto para legitimar e aprofundar mudanças que já vinham ocorrendo no regime fiscal A extensão da deterioração do regime fiscal no final do governo é discutida em seguida Por fim avaliado o legado do Presidente Lula analisase como seu segundo mandato se projetou no governo de sua sucessora Tensões da metamorfose Para entender o fio condutor do primeiro mandato do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva é fundamental ter em mente as proporções da rápida e supreendente metamorfose por que teve de passar o PT a partir de meados de 2002 Mesmo observadores atentos do quadro político não puderam evitar uma sensação de assombro diante da vertiginosa rapidez com que o PT conseguiu mudar seu discurso econômico adotando com grande sucesso postura radicalmente distinta da que vinha assumindo até então As reais proporções dessa mudança só podem ser percebidas quando se tem em conta o que vinha sendo defendido pelo PT cerca um ano e meio antes No final de 2000 o partido havia transformado em carrochefe da campanha das eleições municipais um despropositado plebiscito informal patrocinado pela Conferência Nacional de Bispos do Brasil CNBB que indagava à população se o setor público deveria realmente pagar as suas dívidas interna e externa É importante entender que não se tratava de iniciativa que pudesse ser atribuída a alas radicais ou ao baixo clero do partido Muito pelo contrário A consulta popular contava com o apoio explícito e determinado da elite dirigente do PT O deputado José Dirceu então presidente do partido chegou a apresentar projeto de decreto legislativo oficializando o plebiscito E economistas mais proeminentes e supostamente menos radicais do PT haviam tomado o cuidado de publicar artigos assinados na imprensa dando respaldo pessoal ao plebiscito Por rápido que tenha sido o avanço do processo de conversão do PT ao longo do primeiro semestre de 2002 foi difícil e penoso Em meados do ano afloraram na mídia evidências de que o esforço de mudança de discurso vinha encontrando sérias resistências dentro do partido No entanto com os indicadores de confiança na economia brasileira em rápida deterioração à medida que Lula se firmava como franco favorito da eleição presidencial o PT se viu crescentemente pressionado a ser mais claro sobre o real teor de seu programa econômico E afinal em junho após intensas negociações internas o partido divulgou um documento assinado pelo próprio Lula intitulado Carta ao Povo Brasileiro que se dizia representava o máximo de concessão que fora possível extrair do partido O documento continha uma declaração de intenções que havia se tornado absolutamente crucial tendo em conta o clima de extrema incerteza que vinha sendo observado nos mercados financeiros Vamos preservar o superávit primário o quanto for necessário para impedir que a dívida interna aumente e destrua a confiança na capacidade do governo honrar seus compromissos Um grande e louvável avanço em relação ao primarismo que até então vinha marcando as posições do partido nessa área O governo tiraria bom proveito desse avanço em agosto quando conseguiu extrair de Lula e dos demais candidatos a presidente um mínimo de compromisso com a manutenção do esforço fiscal previsto no novo acordo celebrado com o FMI A iniciativa de concertação foi fundamental para ganhar tempo reduzir a turbulência financeira durante a travessia da campanha eleitoral e oferecer ao país um horizonte de menos incerteza ao longo do novo mandato presidencial que estava prestes a ter início Contudo com o recrudescimento da turbulência nos mercados financeiros ficou claro que os efeitos tranquilizadores da concertação de agosto poderiam simplesmente desaparecer se o PT não conseguisse lidar com sucesso com a desconfiança de que a sua mudança de discurso poderia não ser para valer Por um lado temiase que mesmo na elite dirigente do partido o novo discurso tivesse sido adotado a contragosto E que a correção tivesse sido excessivamente brusca para tornar crível a ideia de que as convicções haviam de fato mudado Por outro temiase que mudança tão drástica de discurso tivesse sido feita ao arrepio das efetivas convicções da grande maioria do partido E que as resistências tivessem sido apenas momentaneamente reprimidas pela percepção que perpassava todas as facções do PT de que acertada ou não a mudança de discurso vinha sendo fundamental para o sucesso de Lula na campanha eleitoral Inclusive porque permitira ao PT obter do próprio governo um reconhecimento da sinceridade do seu novo discurso Uma vez assegurada a vitória no entanto essa argamassa de interesses comuns que vinha impedindo a dissensão dentro do partido poderia desaparecer E nesse caso o PT teria grande dificuldade para transformar o novo discurso em base da sua efetiva ação econômica Quanto de si mesmo teria o PT deixado cair pelo caminho ao decidir dar uma guinada tão brusca no seu discurso Não ficaria o partido tentado a voltar atrás para recolher pedaços das suas velhas convicções A verdade é que a brusca mudança no discurso econômico da cúpula do PT vinha exigindo uma adaptação bastante traumática do partido O que demandou do novo presidente extremo cuidado na composição do governo Logo após a vitória de Lula no segundo turno das eleições previase que sem uma imediata definição dos nomes responsáveis pela condução da política econômica do novo governo seria muito difícil manter os mercados financeiros sob relativo controle Ao arrepio dessa previsão um tanto açodada o presidente eleito conseguiu atravessar boa parte de novembro sem dar qualquer esclarecimento sobre a composição de sua equipe econômica Com habilidade manteve a formação do governo como um papel virtualmente em branco sem que os céus viessem abaixo Muito pelo contrário Houve até alguma distensão nos mercados financeiros É natural que Lula quisesse ganhar tempo Tinha diante de si uma tarefa extremamente complexa Não se tratava da formação de um governo qualquer Mas de um governo de um presidente que construíra uma espetacular vitória eleitoral de forma muito peculiar apostando com grande sucesso em vertiginosa mudança do seu discurso econômico com a súbita adoção de uma postura radicalmente distinta da que vinha assumindo até então Mudança tão rápida e tão radical de discurso estava fadada a deixar inevitável rastro de incerteza Era mais do que natural portanto que persistissem sérias dúvidas sobre a efetiva extensão com que o novo discurso deveria se refletir na condução da política econômica do novo governo E que a composição da nova equipe econômica estivesse sendo acompanhada com muita expectativa Não só pelos segmentos mais conservadores da opinião pública como pelas alas mais à esquerda da ampla coalizão de forças que deram apoio a Lula Mantendo o papel em branco o presidente eleito postergou enquanto pôde as inevitáveis decepções que o desenho do novo governo deveria provocar à esquerda ou à direita deixando de um extremo ao outro do espectro político amplo espaço para fantasias sobre o que afinal seria desenhado Os segmentos mais radicais da esquerda ainda alimentavam a esperança de que os desenhistas fossem o velho Lula e o velho PT e de que o realinhamento da cúpula do partido à direita acabasse sendo muito mais limitado do que sugeria o novo discurso do partido No extremo oposto do espectro havia quem sonhasse com desenhos que mais pareciam saídos de uma prancheta de Wall Street Com o papel em branco cada um acreditava no que queria Qualquer que fosse o desfecho haveria festejo alívio e decepção Mas não havia resultado possível capaz agradar ao mesmo tempo aos mercados financeiros e aos amplos segmentos mais à esquerda da complexa coalizão política que dera apoio a Lula Na hora da verdade os desdobramentos das decepções teriam de ser enfrentados Tais problemas só puderam ser adiados por algumas semanas porque desde a vitória de Lula o PT vinha sabendo manter um discurso econômico unificado e coerente que por si só vinha sendo capaz de conter a turbulência no mercado financeiro Num primeiro momento coube ao presidente do partido ser portavoz desse discurso Em seguida tal papel passou a ser desempenhado com grande eficácia pelo coordenador da equipe de transição deputado Antonio Palocci O que talvez não estivesse sendo devidamente percebido é que de certa forma Lula dispunha de um poder especial para lidar com a colossal crise de confiança que havia engolfado a economia brasileira em 2002 O governo que chegava ao fim estava diante de uma missão impossível Convencer os mercados financeiros de que o partido que estava prestes a conquistar a Presidência da República havia mudado da água para o vinho Que abandonara de vez o discurso de 2000 e até mesmo o de 2001 Não houve forma de vencer o ceticismo dos mercados Conseguiuse apenas evitar o pior Em dezembro de 2002 o riscoBrasil ainda permanecia em 1400 pontosbase Mas naquele quadro adverso o governo recémeleito tinha pela frente uma extraordinária oportunidade Se fizesse o que precisava ser feito poderia em poucos meses derrubar o riscoBrasil e reduzir em muito a taxa de juros abrindo caminho para uma retomada sustentada de crescimento Afinal não havia ninguém melhor que o próprio Presidente Lula para convencer os mais céticos de que o PT de fato havia mudado Como afinal se viu o novo governo aproveitou plenamente essa oportunidade Nomeada a equipe econômica até mesmo os mais céticos ficaram agradavelmente surpresos com a consistência do discurso do novo ministro da Fazenda Antonio Palocci e com escolha de Henrique Meirelles um exexecutivo do Banco de Boston para a presidência do Banco Central E ainda mais surpresos com a desenvoltura e a firmeza com que esse discurso se traduziu em ações concretas nos primeiros meses do governo que acabara de tomar posse Em contrapartida o discurso econômico do novo governo foi visto com enorme desconforto no âmbito do PT Mudança tão pronunciada de discurso seria difícil de ser absorvida em qualquer agremiação política Mais difícil ainda em uma organização extraordinariamente complexa como o PT com longa história de apego a processos de decisão descentralizados envolvendo centenas de milhares de militantes agrupados em múltiplas correntes e facções bem demarcadas Era natural portanto que a cúpula dirigente do PT estivesse enfrentando sérias dificuldades para assegurar que o partido como um todo acompanhasse sem maiores problemas o brusco golpe de direção no discurso econômico do novo governo Tentando apaziguar uma centena de prefeitos petistas reunidos em Brasília em meados de fevereiro de 2003 o presidente sublinhou a importância de evitar mudanças muito pronunciadas na condução da política econômica Ponderou que o Brasil não era um Fusquinha que podia dar um cavalo de pau Era um transatlântico Se a virada não fosse feita aos poucos poderia afundar1 O problema é que para evitar uma mudança brusca na política econômica a cúpula do partido tinha sido obrigada a fazer uma correção especialmente brusca no seu discurso O PT talvez não fosse comparável a um transatlântico Mas tampouco podia ser manobrado com grande facilidade Havia muita inércia a se ter em conta Imagem mais adequada seria a de uma gigantesca jamanta carregada trafegando em velocidade relativamente alta dobrando repentinamente à direita A parte mais fácil claro era fazer a cabine da carreta mudar o curso Difícil era assegurar que a enorme e pesada carroceria viesse atrás acompanhando suavemente o movimento da cabine De início não faltou quem temesse o pior imaginando que a jamanta acabaria tombando Mas logo se viu que esse risco havia sido superado Mas era bem possível que uma parte da carga acabasse esparramada pelo caminho Especialmente a parte mais precariamente acomodada na extremidade oposta à cabine O que não chegaria a desmerecer a façanha de quem conseguiu levar a bom termo manobra tão arriscada Mas o preocupante não era tanto a carga que poderia despencar mas a que iria permanecer na carreta Era bem provável que abalada pela violência do tranco tivesse ficado com a amarração frouxa O que deveria exigir que a carreta passasse a ser conduzida com extremo cuidado Havia uma parte substancial do PT que não protestava de forma desabrida mas tampouco escondia que não via com bons olhos a metamorfose por que vinha passando o partido Havia quem num esforço de racionalização tentasse perceber as novas medidas de política econômica como uma espécie de pantomima inicial da qual o governo de início não se podia furtar mas que em breve seria definitivamente abandonada Outros falavam em construir as bases para a saída do modelo assim que a correlação de forças permitisse E outros ainda sublinhavam a necessidade de que nas demonstrações de preocupação com a consistência macroeconômica o governo tivesse o cuidado de se ater ao estritamente necessário Ilustrativo dessas resistências um tanto veladas foram as reações à decisão de elevação da meta de superávit primário para 2003 de 375 para 425 do PIB Foi vista com perplexidade porque não havia sido exigida pelo FMI Sentindose pressionado pelo partido o governo saiuse com a explicação de que a decisão havia sido ditada pela preocupação com as possíveis consequências da eclosão de novo conflito militar no Oriente Médio Uma meia verdade se tanto No quadro econômico que estava sendo enfrentado a anunciada elevação do superávit primário era um passo fundamental para abrir espaço para a paulatina redução de taxas de juros Uma medida mais do que recomendável Em qualquer cenário Com ou sem guerra Não houvesse a perspectiva de guerra o que alegaria o governo Nos primeiros dois meses do mandato à medida que o governo foi transformando seu novo discurso em ações concretas as razões para o descontentamento dentro do PT com a condução da política econômica tornaramse ainda mais fortes Da perspectiva dos descontentes era como se estivesse havendo uma escalada elevação da taxa de juros aumento da meta de superávit primário cortes orçamentários e sinais de que o reajuste do salário mínimo poderia ficar bem aquém do que vinha sendo esperado Para não falar do teor das reformas que vinham sendo consideradas Quem no partido ainda tinha ilusões de que a brusca mudança de discurso não era para valer estava afinal sentindo toda a força do tranco A grande questão era em que medida o governo saberia lidar com os desdobramentos da inevitável tensão que a consciência concreta dessa mudança deveria provocar dentro do PT e dos demais partidos da base aliada nos meses seguintes Colheita rápida Boa parte das dúvidas sobre a real extensão do compromisso do novo governo com a adoção de uma política macroeconômica coerente estava fadada a desaparecer ao longo dos primeiros meses de 2003 Os danos da desestabilização provocada pela grande onda de incerteza que fora desencadeada em 2002 não deixavam muita margem para escolha Com taxa oficial de inflação medida pelo IPCA acima de 13 ao ano endividamento do setor público em trajetória explosiva e mercados financeiros tomados pela desconfiança a situação exigia a adoção de medidas ortodoxas Mesmo os mais céticos afinal se convenceram de que o Presidente Lula estava de fato preparado para enfrentar tais desafios pronto a dar todo o apoio que se fazia necessário às políticas conservadoras do ministro Antonio Palocci A disposição do governo de elevar ainda mais a taxa básica de juros e anunciar uma meta de política fiscal mais apertada foi decisiva para que a incredulidade do mercado financeiro afinal cedesse A reconstrução da confiança foi facilitada pela rápida melhora da balança comercial na esteira da prolongada depreciação cambial e do aumento da demanda mundial pelas exportações brasileiras Contas externas mais sólidas e rápida redução da incerteza logo deram lugar a vigorosa apreciação cambial e forte queda nos indicadores de risco país ao longo do primeiro semestre de 2003 No início de junho o câmbio que iniciara o ano em R350US já estava abaixo de R3US E o riscoBrasil havia despencado de 1400 a 700 pontos base Mas ainda havia espaço para incredulidade Até que ponto o governo continuaria a mostrar a convicção necessária para manter uma política macroeconômica coerente sob a barragem de críticas cada vez mais contundentes que ganhavam força no PT Em meados de 2003 o sucesso do empenho do governo na aprovação de emendas constitucionais politicamente desgastantes relacionadas às reformas previdenciária e tributária tornou bem mais crível a ideia de que o Planalto poderia sim mostrar a convicção requerida À medida que o nível de incerteza caiu e o vigoroso aperto da política monetária se fez sentir sobre a inflação o Banco Central afinal encontrou espaço para reduzir a taxa básica de juros de 265 em maio de 2003 para 16 em maio de 2004 O que abriu caminho para rápida recuperação do nível de atividade que para o governo empenhado em manter as críticas do PT sob controle se mostrou absolutamente providencial Tendo se expandido em não mais que 12 em 2003 a economia cresceu 57 em 2004 sem que isso impedisse que a taxa oficial de inflação fosse reduzida de 93 em 2003 para 76 em 2004 Foi especialmente tranquilizador que recuperação tão forte tivesse sido acompanhada por impressionante melhora das contas externas As exportações haviam aumentado de US604 bilhões em 2002 para US965 bilhões em 2004 E a elevação do saldo comercial de US131 bilhões em 2002 para US336 bilhões em 2004 permitiu que o déficit em conta corrente de 17 do PIB observado em 2002 fosse convertido em um superávit de quase 2 do PIB em 2004 Na esteira do boom de preços de commodities e da depreciação cambial o tão esperado ajuste das contas externas afinal se dera de forma muito vigorosa abrindo perspectivas especialmente promissoras para a economia Para o novo governo recémconvertido a novas ideias havia sido um desfecho especialmente afortunado poder colher em tão pouco tempo os frutos das políticas impopulares que se dispusera a adotar durante o primeiro ano do mandato Resultado tão favorável foi fundamental para aplacar as alas mais radicais do PT reforçar a posição dos que defendiam que o partido deveria se mover para o centro do espectro político e garantir sólido respaldo à equipe econômica no governo Para o país o sucesso da política econômica adotada pelo governo Lula parecia ter assegurado a consolidação de um espaço mais amplo de ideias consensuais compartilhadas por governo e oposição Uma perspectiva que no tumultuado final de 2002 não era mais do que tênue promessa que poderia perfeitamente não ter passado de uma miragem Por um período excessivamente longo o Brasil teve de lidar com o indefectível temor de que a alternância política poderia acabar revirando a economia de cabeça para baixo A turbulência de 2002 mostrou quão desestabilizador tal receio podia ser A perspectiva de que afinal essas preocupações estavam sendo deixadas para trás parecia ter alargado em grande medida os horizontes do país A crise do mensalão e seus desdobramentos Em meados de 2005 não faltavam ao governo boas razões para comemorar O grande desafio do início do mandato fora enfrentado com notável sucesso A difícil guinada no discurso econômico do partido provara ser estratégia acertada O quadro de desestabilização do início de 2003 havia sido claramente superado E a economia estava de novo em promissora trajetória de crescimento com inflação sob controle e contas externas cada vez mais sólidas Tudo indicava que o Presidente Lula teria pela frente um final de mandato tranquilo e extremamente promissor em que manteria o rumo da política macroeconômica e dificilmente deixaria de ser reeleito Na verdade contudo o final do mandato estava fadado a ser bem mais tumultuado do que a evolução favorável da economia parecia então sugerir Tendo lidado tão bem com os desafios da política macroeconômica o governo se viu de repente às voltas com dificuldades de outra ordem uma crise política de grandes proporções deflagrada pela eclosão do que passou a ser conhecido na mídia como escândalo do mensalão A questão veio à tona no início de junho de 2005 quando o deputado Roberto Jefferson presidente do PTB partido integrante da base governista denunciou à imprensa a existência de um grande esquema de corrupção política gerido pelo governo envolvendo pagamentos regulares a parlamentares para compra de votos no Congresso Nacional A crise teria efeitos devastadores sobre o governo e a cúpula do PT As renúncias do ministrochefe da Casa Civil José Dirceu e do presidente do PT José Genoíno foram apenas o início de um custoso processo de descabeçamento do partido que deixou o governo vulnerável e extremamente fragilizado No pior momento da crise o presidente Lula chegou a temer que pudesse ter de enfrentar um processo de impeachment no Congresso Não foi surpreendente que crise política tão grave acabasse afetando a condução da política econômica Para entender com clareza como e em que medida isso se deu há vários aspectos a se ter em conta A brusca mudança no discurso econômico do governo só havia sido possível porque a cúpula dirigente conduzira o partido com mão de ferro valendose da tradição de disciplina partidária do PT E tal mudança a assombrosa conversão do PT havia sido em boa medida a conversão de José Dirceu Como mencionado acima na campanha das eleições municipais de 2000 quando o partido decidira promover plebiscito que indagava se as dívidas interna e externa deveriam ser pagas ou não o deputado José Dirceu então presidente do partido havia entendido que era uma boa ideia encaminhar ao Congresso proposta de decreto legislativo que oficializava o plebiscito Ter em conta que isso ocorrera menos de cinco anos antes da crise política de 2005 permite perceber com mais nitidez não só a extensão e a rapidez da mudança do discurso econômico do PT mas também a singularidade da trajetória de José Dirceu Partindo de posição tão extremada conseguira bem mais do que mudar seu próprio discurso Havia sido o principal condutor do partido nesse aggiornamento em marcha forçada tão difícil e radical Na esteira da devastadora desestruturação da cúpula do PT produzida pela crise esgarçouse o controle férreo que havia sido imposto sobre o partido A repressão às críticas internas à condução da política econômica tornouse muito mais difícil E a verdade é que àquela altura a conversão do PT por impressionante que pudesse parecer ainda estava na melhor das hipóteses a meio caminho Persistiam sérias resistências no partido à plena aceitação do discurso econômico que havia sido adotado pelo núcleo do governo E na penosa maré revisionista em que entrou o PT sob o impacto do mensalão muitos petistas influentes pareciam propensos a crer que para que o partido pudesse voltar a mostrar sua antiga altivez seria necessário rodar o filme inteiro ao contrário Para se purgar e poder restaurar os padrões éticos perdidos o partido teria de renegar até mesmo seu novo discurso econômico e voltar a defender as velhas ideias sobre política econômica que haviam sido oficialmente enterradas Foi em meio a essas dificuldades que o Presidente Lula se viu obrigado a recompor o ministério e reestruturar a cúpula dirigente do PT para tentar conter os danos da crise Em face do número expressivo de altos dirigentes que tiveram de ser substituídos figuras que até então não vinham ocupando posições de primeira linha no governo e no partido viramse de repente alçadas a cargos de grande importância Entre elas merece destaque a então ministra de Minas e Energia Dilma Rousseff que com a renúncia de José Dirceu acabou sendo nomeada ministrachefe da Casa Civil Com raízes no brizolismo e filiada ao PDT gaúcho por muitos anos Dilma Rousseff era neófita no PT Só ingressara no partido em 2000 A crise política não havia imposto nenhuma baixa importante na equipe econômica Mas a cúpula do governo e o comando do partido haviam passado por grandes mudanças E logo ficaria claro que a manutenção da política econômica nas linhas que vinham sendo seguidas nos primeiros dois anos e meio do mandato presidencial já não poderia mais contar com o mesmo apoio de antes A correlação de forças já não era a mesma Ao ter deixado a equipe econômica incólume a crise política exacerbou desequilíbrios que já vinham ocorrendo na distribuição de poder dentro do núcleo político do governo Mesmo antes da crise já havia na cúpula do PT indisfarçavel incômodo com a apropriação dos louros do sucesso da política macroeconômica Quem já achava que tal sucesso estava levando mais água do que seria razoável ao moinho do ministro Antonio Palocci teve razões redobradas para se preocupar com a proeminência ainda maior que havia adquirido o ministro da Fazenda quando de repente outros membros importantes da cúpula do governo se viram engolfados pela crise política Não foi surpreendente que dentro do governo isso reforçasse a coalizão interessada em solapar o poder do ministro da Fazenda Mas além desses vários aspectos que ajudam a entender os desdobramentos da crise do mensalão sobre a condução da política econômica há um ponto fundamental a se ter em conta tanto as prioridades do governo como o conjunto de restrições que teriam de ser respeitadas haviam mudado O objetivo central do presidente passara a ser conter o desgaste da crise política preservar seu mandato e com sorte partir para a reeleição Nesse quadro seria certamente importante tirar o melhor proveito possível do bom desempenho que vinha tendo a política econômica Mas sem esticar a corda mais do que o necessário Em meio à adversidade passara a ser fundamental manter o PT coeso e o Executivo pouco dependente do Congresso De Palocci a Mantega No segundo semestre de 2005 um embate na cúpula do governo em torno de um possível programa de ajuste fiscal de longo prazo deixou claro que o discurso econômico do governo estava mudando Como os gastos primários da União vinham crescendo ao dobro da taxa de crescimento do PIB os ministros Antonio Palocci da Fazenda e Paulo Bernardo do Planejamento propuseram medidas de contenção dessa expansão O que os dois ministros tinham em mente não era um programa de corte drástico de gasto público Eram apenas medidas que moderassem o crescimento desmedido de dispêndio que vinha sendo observado desde meados dos anos 1990 de forma a ampliar as possibilidades de queda da taxa de juros e abrir espaço para o investimento público e para uma redução paulatina da carga tributária A ideia era assegurar que a expansão do gasto público passasse a se dar a uma taxa inferior à taxa de crescimento do PIB O que exigiria esforço concertado de contenção das várias fontes de rigidez orçamentária que vinham conferindo elevado grau de autonomia à evolução da maior parte dos gastos primários e reduzindo o espaço para dispêndios de caráter discricionário O programa de ajuste fiscal de longo prazo teria de estar focado na atenuação da expansão do dispêndio previdenciário no controle do gasto com funcionalismo e em medidas de desvinculação do processo orçamentário A proposta acabou torpedeada por uma coalizão comandada pela nova ministra chefe da Casa Civil Dilma Rousseff coadjuvada por Guido Mantega então presidente do BNDES com assentimento tácito do Planalto Percebendo que sem apoio do Presidente Lula o ministro da Fazenda havia saído visivelmente enfraquecido desse embate o PT sentiuse encorajado a fazer críticas mais contundentes à condução da política econômica No final de 2005 o Diretório Nacional do partido aprovou resolução contestando pontos fundamentais da estratégia econômica do governo Líderes do partido defendiam a adoção de um programa econômico antiPalocci para o segundo mandato do presidente E o secretáriogeral do PT apregoava mudanças ainda mais rápidas Queria que o último ano de Lula fosse o primeiro do segundo mandato2 Desgastado por uma acusação de abuso de poder na solução de pendência de caráter pessoal Antonio Palocci acabou tendo de se demitir do cargo de ministro da Fazenda no final de março de 2006 Seu afastamento representou grande perda para o governo Palocci foi a figurachave na condução da metamorfose por que teve de passar o discurso econômico do PT no auge da campanha eleitoral de 2002 E teve papel central na suavização da transição do governo FHC para o governo Lula que marcou o início da reconstrução de confiança que teria continuidade em 2003 Num governo em que se observou lamentável aparelhamento da administração federal Palocci conseguiu recrutar um quadro de profissionais competentes para tripular a equipe econômica do Ministério da Fazenda e do Banco Central sem preocupação com filiação partidária O que lhe foi fundamental para obter os resultados que afinal pôde exibir Com o benefício da visão retrospectiva tendo em conta o desempenho que acabaram tendo outras figuras proeminentes do partido que talvez pudessem ter sido incumbidas do papel que afinal coube a Palocci há boas razões para se crer que dificilmente qualquer uma delas poderia ter enfrentado o mesmo desafio com tão bons resultados Palocci foi substituído por Guido Mantega no Ministério da Fazenda De início ainda havia quem acreditasse que apesar da derrota da proposta de ajuste fiscal de longo prazo a percepção da necessidade de um esforço nessa linha continuava viva em segmentos importantes do governo na equipe que havia sido montada por Antonio Palocci na Fazenda no Banco Central e no Ministério do Planejamento que havia permanecido sob o comando de Paulo Bernardo Mas o projeto de ajuste fiscal de longo prazo acabou sendo abandonado Em parte porque na esteira das dificuldades impostas pela crise do mensalão as prioridades do governo haviam mudado Mas em parte também porque a perspectiva de rápido aumento da arrecadação erodiu o apoio dos que haviam sido convencidos de que o ajuste era a única forma de abrir espaço para aumento de gastos discricionários no segundo mandato O bom desempenho da arrecadação em 2006 ajudou a enterrar de vez o projeto E foi visto como sinal verde para o acirramento da expansão de gastos que se seguiu A posse de Guido Mantega como ministro da Fazenda marcou nítida mudança no discurso econômico do governo Na esteira da desmontagem da equipe anterior tornaramse cada vez mais claros os sinais de que a Fazenda se transformara em foco de contestação de pontos centrais das ideias que haviam norteado a condução da política econômica entre 2003 e 2005 Mas os frutos das políticas sensatas que haviam sido adotadas a partir de 2003 continuariam a ser colhidos por vários anos mais Após novo ciclo de aperto monetário entre setembro de 2004 e outubro de 2005 o Presidente Lula chegou ao final do primeiro mandato podendo ostentar uma inflação anual de 31 e três anos de vigoroso crescimento econômico A taxa média de crescimento do PIB no período 20042006 foi de quase 43 E graças ao bom desempenho da economia o presidente foi reeleito em segundo turno no final de 2006 Foi natural que a reeleição deixasse o governo muito mais confiante Em 2007 primeiro ano do novo mandato a preocupação com o ajuste fiscal logo cedeu lugar à defesa ostensiva da expansão do gasto público na esteira do espetacular desempenho de receita tributária propiciado pela combinação da recuperação da economia com o aumento de eficiência da máquina arrecadadora A preocupação com as contas da Previdência logo se converteu em negação peremptória da necessidade de reformas na área previdenciária No início de outubro de 2007 quando o Presidente Lula ainda tinha nada menos do que 39 meses de segundo mandato pela frente a Ministra Dilma Rousseff anunciou em entrevista à mídia que preocupações com contenção de dispêndio haviam sido deixadas para o mandato presidencial seguinte E que o grande mérito do vasto leque de novos projetos de investimento que haviam passado a compor o recémanunciado Programa de Aceleração do Crescimento PAC era ter feito o país romper com a tradição de contenção fiscal Foi o que bastou para que em certos segmentos do governo passasse a ser defendido até mesmo o despropositado diagnóstico de que o ajuste fiscal que de fato interessava ao país era o que fosse capaz de assegurar expansão ainda mais rápida do gasto público A defesa festiva do expansionismo fiscal acabou trazendo ao governo importante revés no Congresso na questão da renovação da vigência da CPMF A Constituição previa a extinção da cobrança da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira em 31 de dezembro de 2007 Mas o governo não queria abrir mão da receita da CPMF um tributo em cascata altamente distorcivo mas de coleta fácil que vinha assegurando à União arrecadação anual da ordem de 14 do PIB Defendia que passada a data de extinção o tributo voltasse a ser cobrado por mais quatro anos No Congresso contudo ganhou força a ideia de negar ao governo acesso tão fácil a recursos fiscais num momento em que a receita federal já vinha mostrando expansão real de mais de 10 ao ano Durante meses o governo se recusou a dar a importância devida à mobilização da oposição para derrotar a emenda que prorrogava a CPMF Contava com a solidez da base governista na Câmara e com a possibilidade de se necessário cindir a bancada oposicionista no Senado com a ajuda dos governadores É bem possível que um cronograma de redução generosa de alíquota tivesse sido suficiente para quebrar as resistências da oposição Mas o Planalto preferiu um jogo de tudo ou nada e afinal surpreendeuse com a derrota no Senado em dezembro de 2007 da proposta de emenda constitucional que asseguraria a prorrogação da vigência do tributo O ambiente externo excepcionalmente favorável parecia ter aberto amplo espaço para a manutenção do discurso pouco comprometido com a sustentabilidade fiscal que o governo adotara Infladas pelo boom de preços de commodities as exportações continuavam mostrando dinamismo excepcional De US965 bilhões em 2004 saltaram para US1606 bilhões em 2007 E o superávit da balança comercial mantevese acima de US40 bilhões anuais por todo o período 20052007 Essa posição externa tão confortável reforçada por vigoroso influxo de investimento estrangeiro direto da ordem de US23 bilhões por ano no triênio vinha exigindo intensa acumulação de reservas internacionais pelo Banco Central para na medida do possível conter a apreciação cambial Mas embora as reservas tenham saltado de US53 bilhões no final de 2004 para US180 bilhões no final de 2007 a taxa de câmbio continuou a se apreciar de R265US no final de 2004 a R177US no final de 2007 A manutenção de taxas de juros relativamente altas e a persistente apreciação do câmbio tornaram as relações entre a Fazenda e o Banco Central cada vez mais tensas O Ministério da Fazenda passou a contestar tanto a política de metas para a inflação como a política cambial Especialmente depois que o Banco Central preocupado com a reaceleração da inflação voltou a elevar a taxa de juros em meados de abril de 2008 Foi um momento em que o compromisso do governo com a estabilidade macroeconômica parecia ter quase desaparecido Resistia com grande dificuldade acuado num último reduto no Banco Central enfrentando a hostilidade ostensiva da Fazenda da Casa Civil e de boa parte do resto do governo em meio a notícias de que o presidente Henrique Meirelles estava prestes a ser substituído por um nome mais alinhado com o desenvolvimentismo Não fosse a repentina injeção de prudência que adveio da apreensão com o agravamento da crise financeira mundial esse derradeiro reduto poderia ter sido subjugado Redistribuição de renda A reeleição do presidente Lula não se deveu apenas ao crescimento relativamente rápido da economia a partir de 2004 Boa parte do seu bom desempenho eleitoral no final de 2006 pode ser atribuído ao sucesso das políticas de redistribuição de renda que haviam sido adotadas no primeiro mandato A adoção de políticas distributivas mais ousadas sempre foi ponto central do programa do PT Desde a campanha presidencial de 2002 o partido vinha defendendo a implementação imediata de um programa de erradicação da pobreza extrema sob o rótulo de Fome Zero Depois de um período inicial de indefinição em que se chegou a contemplar o desafio logístico de assegurar distribuição física de alimentos a famílias carentes país afora o Fome Zero evoluiu rapidamente para o Bolsa Família um programa mais abrangente de transferência de renda resultante em boa medida da unificação em outubro de 2003 de programas mais específicos criados no governo anterior3 Nominalmente pelo menos o acesso ao Bolsa Família foi condicionado ao cumprimento pelas famílias beneficiadas de exigências relacionadas à nutrição à saúde e à frequência escolar das crianças A abrangência do programa foi rapidamente expandida O número de famílias beneficiadas saltou de 36 milhões em 2003 para 11 milhões em 2006 e chegou a 128 milhões em 2010 ao final do segundo mandato do Presidente Lula Bem focalizado nas faixas mais pobres da população o Bolsa Família pôde atingir mais de um quinto do total de famílias do país mantendo custos relativamente baixos O dispêndio com o programa em 2010 foi da ordem de 04 do PIB O esforço de redistribuição de renda do governo Lula envolveu também uma política sistemática de reajuste do salário mínimo a taxas bem superiores à inflação O que se arguía é que além dos efeitos redistributivos diretos tal política teria efeitos indiretos importantes ao fortalecer o poder de barganha dos trabalhadores nas negociações salariais No segundo mandato a evolução do salário mínimo passou a ser pautada por regra estabelecida em acordo do governo com as centrais sindicais que previa percentual de reajuste igual à taxa de inflação acumulada no ano anterior acrescida da taxa de crescimento do PIB de dois anos antes Ao longo dos oito anos do governo Lula o valor nominal do salário mínimo aumentou 155 enquanto a inflação acumulada medida pelo IPCA foi de 567 O aumento real acumulado foi de quase 63 Essa elevação tão rápida do valor real do salário mínimo teve grande impacto sobre as contas públicas De um lado porque cerca de 15 milhões de pessoas recebiam benefícios previdenciários atrelados ao salário mínimo De outro porque nas folhas de pagamento dos governos subnacionais havia grande número de funcionários recebendo salário mínimo Mas a verdade é que o governo jamais mostrou grande preocupação com o efeito da elevação do salário mínimo sobre as contas públicas Muito pelo contrário Ao longo do segundo mandato esse efeito foi reiteradamente defendido como um desbobramento deliberado da política macroeconômica expansionista que havia sido adotada Tampouco o governo deixou transparecer maiores preocupações com os efeitos indiretos que a política de elevação acelerada do salário mínimo conjugada com a expressiva valorização cambial que vinha sendo induzida pelo boom de preços de commodities poderia vir a ter sobre a competitividade externa da economia E a verdade é que os indicadores de custo unitário da mão de obra medido em dólares mostraram elevação substancial e persistente ao longo dos oito anos do governo Lula Seja em função das políticas redistributivas seja em decorrência do crescimento econômico mais rápido e de seus efeitos sobre o mercado de trabalho num quadro de crescente escassez de mão de obra houve redução expressiva no grau de desigualdade da distribuição de renda ao longo dos dois mandatos do Presidente Lula4 A renda per capita dos 20 mais pobres cresceu muito mais rapidamente do que a dos 10 mais ricos A redução da pobreza que havia sido possibilitada pela estabilização da economia no governo anterior foi marcadamente acentuada no período Lula O numero de indivíduos vivendo em condições de pobreza extrema que havia sido reduzido em 319 entre o Plano Real e o final do segundo mandato de FHC sofreu forte redução adicional de 506 durante os dois mandatos do Presidente Lula O coeficiente de Gini caiu de 0563 em 2002 para 0530 em 2010 É importante assinalar que na contramão do esforço de redução de redução da pobreza e da desigualdade na distribuição de renda conduzido ao longo de seus dois mandatos o governo Lula promoveu também programas que implicaram dispendiosa distribuição de benesses estatais a grandes empresas Entre tais programas não podem deixar de ser citados a política de escolha de campeões nacionais promovida pelo BNDES os vultosos empréstimos subsidiados de longo prazo concedidos pelo banco financiados pelo Tesouro com recursos provenientes da emissão de dívida pública e os privilégios conferidos a produtores nacionais de bens de capital pela exigência de percentuais elevados de conteúdo local nos equipamentos utilizados na exploração do présal Tais programas que voltarão a merecer referência nas próximas seções deram margem a críticas de que o governo vinha tentando minorar a concentração de renda com a mão esquerda enquanto a agravava com a direita E de que os generosos subsídios implícitos e explícitos concedidos a grandes empresas superavam os custos da transferência de renda aos mais pobres por meio do Bolsa Família Opção por uma estratégia desenvolvimentista intensiva em recursos fiscais Em 2005 parecia haver no país uma visão quase consensual da qual compartilhava a própria equipe econômica do governo de que tendo em conta a dura realidade do quadro fiscal o governo não poderia arcar com o esforço de investimento em infraestrutura que se fazia necessário no país E de que seria fundamental portanto assegurar práticas regulatórias bem concebidas que pudessem atrair capitais privados para a expansão da infraestrutura Mas essa percepção das restrições que condicionavam a participação do setor público no esforço de investimento estava fadada a ser rapidamente abandonada pelo governo Um lado importante da reorientação da política econômica que teve lugar a partir de 2006 foi exatamente a restauração da visão nacionaldesenvolvimentista de que deveria caber ao Estado papel de vanguarda na condução do processo de crescimento econômico É verdade que a resistência à participação privada no investimento em infraestrutura sempre esteve presente no discurso econômico do PT Não chegou a ser surpreendente por exemplo que já em meados de 2003 a então ministra de Minas e Energia Dilma Rousseff tenha apresentado uma proposta de reestruturação do setor elétrico que representava clara reversão do movimento de paulatina redução da presença do Estado no setor esboçado no governo anterior O PT jamais havia escondido suas resistências ao encolhimento do governo nessa área E mesmo fora do partido visões mais idílicas das possibilidades de redução do papel do Estado no setor já vinham sendo refreadas Que o pêndulo iria pender para o outro lado era mais do que previsível O que surpreendeu foi quão pronunciado acabou sendo esse movimento pendular No afã de se diferenciar do governo anterior o novo governo insistiu em tratar privatização como anátema mostrou descaso pela ideia de agências reguladoras independentes e optou por um redesenho problemático do setor elétrico que sobrecarregava desnecessariamente o setor público com pesados encargos de investimento Com o lançamento do Plano de Aceleração do Crescimento PAC em 2007 sob o comando da então ministrachefe da Casa Civil Dilma Rousseff a visão que havia presidido o novo modelo do setor elétrico acabou estendida a outros setores O PAC deixou claro que na esteira da perda de estatura e da desarticulação da equipe econômica estava em curso um processo de nítido esvaziamento do Ministério da Fazenda e de transferência do poder de condução da política econômica para a Casa Civil O plano foi apresentado com um programa de ampliação de infraestrutura que combinava expansionismo fiscal e ativismo governamental para romper barreiras e superar limites com base em investimentos do próprio governo e das empresas estatais federais Especialmente da Petrobras e da Eletrobras Já não havia mais a preocupação de criar um aparato regulatório bem desenhado capaz de atrair investimento privado para a área de infraestrutura Nas áreas de energia e rodovias por exemplo o governo havia decidido partir para a simples estatização da expansão que se fazia necessária Diante de um amplo leque de arranjos possíveis o governo recorrentemente revelava nas escolhas feitas nas mais diversas áreas forte preferência por soluções intensivas em recursos públicos em que caberia ao Estado a responsabilidade por boa parte do investimento ou pela provisão de parcela substancial do financiamento que se fizesse necessário A intensidade dessa preferência pôde ser comprovada mais uma vez e de forma inequívoca numa decisão de grande importância em 2009 quando afinal foi definido o marco regulatório da exploração das reservas do présal Nesse marco os investimentos requeridos da Petrobras acabaram desnecessariamente sobrecarregados pela exigência de que a empresa estatal mantivesse além do monopólio de operação dos campos do présal participação mínima de 30 em cada consórcio que viesse a explorar tais campos E não bastassem tais exigências estabeleceuse também que os equipamentos utilizados na exploração do présal teriam de atender requisitos extremamente altos de conteúdo local o que implicaria encarecimento substancial dos investimentos que se fizessem necessários Na verdade o governo estava fadado a enfrentar grandes dificuldades para deslanchar os projetos de investimento público previstos no PAC Tais dificuldades foram inicialmente racionalizadas com a alegação de que na esteira de duas décadas de compressão de gastos de investimento haviam sido desmanteladas competências e estruturas gerenciais que no passado asseguravam à administração pública federal condições adequadas para conceber e implementar projetos de investimento E de que levaria algum tempo para que essa capacidade fosse restaurada Embora tal racionalização fizesse algum sentido as dificuldades enfrentadas pelos programas de investimento público não se resumiram a isso Envolveram também outros entraves como demora na obtenção de licenças ambientais conflitos recorrentes com o Tribunal de Contas da União judicialização de licitações e corrupção em órgãos responsáveis pela gestão dos projetos de investimento5 Em meio a todos esses embaraços o avanço do PAC se mostraria bem mais problemático do que o governo antecipara Em 2007 o dispêndio primário do governo federal era de cerca de 18 do PIB E os investimentos não chegavam a 1 do PIB Esse quadro de atrofia do investimento público permaneceria em boa medida inalterado até o final do segundo mandato apesar da farta disponibilidade de financiamento Em condições normais a opção por uma estratégia de crescimento e investimento intensiva em recursos públicos seria incompatível com as restrições do quadro fiscal Mas em 2008 as condições já haviam deixado de ser normais O rápido agravamento da crise financeira mundial abriria ao governo possibilidades inesperadas de conciliação de sua nova estratégia de crescimento com a dura realidade do quadro fiscal A crise mundial como pretexto A partir de meados de 2007 tornouse cada vez mais claro que a expansão descontrolada do crédito hipotecário na economia norte americana havia dado lugar a uma bolha imobiliária que não tardaria a explodir Nos meses que se seguiram os mercados financeiros dos Estados Unidos foram tomados por crescente onda de desconfiança à medida que afloraram evidências de que na esteira dos excessos cometidos na concessão de crédito um enorme volume de recebíveis gerados em empréstimos de baixa qualidade havia sido repassado ao sistema financeiro e vinha sendo negociado nos mercados de derivativos A crise assumiu proporções bem mais graves quando em setembro de 2008 as autoridades norteamericanas decidiram deixar que o banco de investimentos Lehman Brothers quebrasse para não dar alento à expectativa de que toda instituição financeira grande que se visse em dificuldades seria necessariamente resgatada A quebra de uma instituição tão importante e tão interconectada levou a súbita paralisia da concessão de crédito ao setor privado e ao desabamento dos indicadores de confiança tanto de consumidores como de empresas O agravamento da crise que a essa altura já assumira proporções mundiais exigiu respostas inusitadas de política econômica que implicaram forte deterioração de contas fiscais tanto nos Estados Unidos como na Europa Em 2009 houve queda expressiva do PIB em todas as seis maiores economias desenvolvidas EUA 28 Japão 55 Alemanha 51 França 31 Reino Unido 52 e Itália 55 O relativo sucesso com que a economia brasileira enfrentou a rápida deterioração do quadro externo entre 2008 e 2009 não pode ser explicado apenas pelos bons indicadores macroeconômicos que o país ostentava no início da crise Bons indicadores foram certamente importantes Reservas internacionais da ordem de US200 bilhões e um sistema financeiro sólido fizeram grande diferença E a atuação competente do Banco Central e certas medidas iniciais de estímulo fiscal foram importantes Mas boa parte da resistência que a economia mostrou ao choque desestabilizador da crise tem outra explicação a enorme redução de incerteza que adveio da consolidação do arcabouço de regras e instituições que pautavam a condução da política econômica no país especialmente depois que ficou claro que tal arcabouço havia sobrevivido sem maiores danos ao difícil rito de passagem da transição política de 20022003 Não obstante a nítida mudança no discurso econômico do governo que vinha sendo observada desde 2006 a essência desse arcabouço parecia intocada em meados de 2008 quando a economia brasileira afinal se viu de fato afetada pela crise mundial Embora a qualidade da condução da política econômica no país já viesse sofrendo inegável processo de deterioração os indicadores usuais de desempenho da economia ainda não deixavam transparecer a real extensão dessa mudança O superávit primário do setor público que chegara a 38 do PIB no biênio 20042005 caíra um pouco Mas ainda estava sendo mantido em torno de 34 do PIB entre 2006 e 2008 O ambiente externo favorável a economia em franca recuperação a fartura de recursos fiscais e um quadro inflacionário benigno vinham mascarando a explicitação dos desdobramentos mais deletérios da deterioração que estava em curso Sob condições tão tranquilas a política econômica até a eclosão da crise parecia estar mantida em sua rota anterior e em boa medida no piloto automático O que ajudava a reforçar a visão de que a essência daquele arcabouço de regras e instituições de política econômica permanecia intocada A atribuição de grau de investimento à dívida soberana do país pelas agências de avaliação de risco no início de maio de 2008 exatamente quando a permanência do presidente do Banco Central no cargo estava por um fio é a melhor evidência de que as percepções externas continuavam dominadas por essa visão já um tanto desatualizada da condução da política econômica Curiosamente foi a obtenção defasada dessa chancela externa que subitamente deu sobrevida a Henrique Meirelles e impediu que prosperassem as pressões pela sua substituição que vinham sendo feitas pelo Ministério da Fazenda e pela Casa Civil O agravamento da crise externa acabaria por lhe dar sobrevida adicional até o final do mandato presidencial ainda que num quadro de permanente tensão entre o Banco Central e Ministério da Fazenda Qual foi o efeito mais grave da crise no Brasil Em termos de redução do crescimento econômico o Brasil acabou sendo menos afetado que muitos outros países O impacto não chegou a ser tão reduzido como a simples marolinha que de início havia sido antevista pelo Presidente Lula Mas tampouco foi tão devastador e duradouro como se temia O crescimento que havia sido de 61 em 2007 e de 52 em 2008 foi interrompido Mas só em 2009 quando o PIB sofreu pequeno decréscimo de 03 Em 2010 houve vigorosa recuperação e a expansão do PIB foi da ordem de 75 A taxa oficial de inflação que aumentara de 45 em 2007 para 59 em 2008 ficou abaixo da meta de 45 em 2009 Mas na esteira do rápido reaquecimento da economia voltou a se acelerar fortemente em 2010 para 59 Os efeitos sobre as contas externas também foram bem menos sérios do que inicialmente se temia É bem verdade que as exportações que haviam chegado a US1979 bilhões em 2008 ficaram reduzidas a US153 bilhões em 2009 Mas a recuperação foi muito rápida Já em 2010 o valor exportado ultrapassou a marca dos US200 bilhões O superávit da balança comercial que já havia caído de US40 bilhões em 2007 para pouco menos de US25 bilhões em 2008 permaneceu acima de US20 bilhões nos dois anos seguintes E o influxo de investimento estrangeiro direto que caíra de US45 bilhões em 2008 para pouco menos de US26 bilhões em 2009 saltou no ano seguinte para mais de US48 bilhões Ao final de 2010 as reservas internacionais de quase US290 bilhões superavam em cerca de 50 o nível do final de 2008 Entre agosto de 2008 e o início de março de 2009 no auge da apreensão com os desdobramentos da crise mundial houve forte depreciação cambial A taxa passou de RS156US a mais R240US Mas logo em seguida voltou a se valorizar Apesar da intensa acumulação de reservas o câmbio chegou ao final de 2010 a menos de R167US O que sim em contraste chegou ao país como verdadeiro vagalhão foi a onda de afrouxamento generalizado de restrições orçamentárias que veio das economias avançadas Nos Estados Unidos e na Europa o combate à crise exigiu gigantescas operações de salvamento para conter os danos da perda de confiança no sistema bancário e impedir a formação de uma crise financeira sistêmica de proporções incontroláveis E exigiu também em seguida que boa parte dos países que formam o núcleo da economia mundial se dispusesse a adotar medidas de estímulo monetário e fiscal em escala ineditamente ampla Tudo isso requereu súbito e substancial relaxamento de restrições orçamentárias que se traduziu em elevações muito pronunciadas nos déficits fiscais e nos níveis de endividamento do setor público nas economias desenvolvidas No Brasil esse desdobramento da crise econômica mundial foi até festejado pelo governo pois lhe abriu a oportunidade que em condições normais jamais teria de legitimar mudanças importantes no regime fiscal e nas relações entre o Estado e a economia É preciso ter em mente que na esteira da crise houve repentina e substancial degeneração dos standards de balizamento da condução da política fiscal no Brasil De um lado a rápida deterioração das contas públicas nas economias avançadas abriu amplo espaço para a racionalização do moderado afrouxamento fiscal praticado no Brasil que ainda deixava as contas públicas brasileiras em situação incomparavelmente melhor que a que passara a ser usual no núcleo da economia mundial De outro houve sensível perda de qualidade do aconselhamento externo à medida que o agravamento da crise mundial levou a uma mudança brusca e improvisada no discurso de organismos multilaterais Tanto o Fundo Monetário Internacional como o Banco Mundial passaram a defender afrouxamento geral e indiscriminado de política fiscal sem maiores cuidados com especificidades de diferentes economias inclusive com relação à sua real vulnerabilidade à crise6 É falsa a ideia de que a crise teria despertado o governo para a importância de reforçar a intervenção do Estado na economia Na verdade a crise foi apenas o pretexto Deu espaço para que o governo se sentisse confortável para voltar a defender de forma mais aberta ideias que sempre lhe foram caras que nunca deixaram de estar profundamente arraigadas na visão de mundo da cúpula dirigente do PT E que na verdade já vinham sendo defendidas dentro do governo antes da crise de forma cada vez mais ostensiva De início o afrouxamento fiscal que em boa parte era simples decorrência de decisões tomadas antes da crise foi racionalizado como política contracíclica Tal racionalização contudo tornouse cada vez mais difícil à medida que a economia se recuperou a olhos vistos e o expansionismo fiscal seguiu inabalável sem qualquer sinal de reversão A verdade é que o governo levou algum tempo para perceber as reais proporções da crise que se formara no núcleo da economia mundial Quando afinal se deu conta do impacto que poderia vir a ter sobre o processo de crescimento que vinha sendo observado na economia brasileira desde 2004 temeu que a vitória da candidata governista na eleição presidencial do final de 2010 pudesse ficar inviável No início de 2009 o Presidente Lula contava com nada menos que 84 de apoio popular Mas tinha pela frente o enorme desafio de eleger uma sucessora sem qualquer experiência eleitoral prévia A ideia original era uma ascensão suave e natural da candidatura da ministrachefe da Casa Civil Dilma Rousseff ao longo de um final de mandato consagrador marcado por crescimento econômico rápido e farta expansão do gasto público Mas com a preocupante deterioração do quadro externo tal cenário ficara fantasioso E o desafio de assegurar a vitória de uma candidata sem experiência eleitoral prévia tornarase ainda mais difícil do que já era Tendo em vista esse quadro mais adverso o Presidente Lula decidiu que o mais prudente era começar cedo Temendo que a crise internacional se agravasse ainda mais lançou a candidatura de Dilma Rousseff com muita antecedência em fevereiro de 2009 20 meses antes da eleição presidencial Assegurar sua vitória passou a ser o objetivo central da condução política econômica E mesmo quando a economia deu mostras de já estar em franca recuperação no final de 2009 o governo ainda inseguro com as perspectivas de sua candidata decidiu que não era o momento de correr riscos políticos desnecessários E intensificou o expansionismo fiscal em 2010 Gran finale em meio à deterioração do regime fiscal As mudanças no regime fiscal ensejadas pela crise deram lugar a rápida deterioração das contas públicas vertiginosa expansão do crédito estatal bancada por emissão de dívida pelo Tesouro e montagem de dispendiosa bateria de programas prónegócios em Brasília e no Rio de Janeiro movidos a dinheiro público e envolvendo farta distribuição de favores do Estado7 No que tange às contas públicas não se tratou apenas de redução do resultado primário inicialmente disfarçada como política fiscal contracíclica de 35 do PIB em 2008 para 2 do PIB em 2009 Tratouse também de compromisso cada vez mais frouxo com o cumprimento estrito de metas fiscais e uso reiterado de manobras contábeis tanto do lado da receita como do lado da despesa para escamotear as verdadeiras dimensões da deterioração do quadro fiscal Um aspecto particularmente grave da involução do regime fiscal foi o preocupante processo de desconstrução institucional envolvido na reversão de avanços que pareciam definitivos como a rígida separação do setor público não financeiro das instituições financeiras federais prevista na Lei de Responsabilidade Fiscal LRF Basta ter em mente a problemática relação de mão dupla que se estabeleceu entre o Tesouro e o BNDES envolvendo gestão imprudente da dívida bruta do setor público e manobras para falsear o superávit primário como medida de esforço fiscal Boa parte da expansão fiscal passou a se dar por fora do orçamento com base num artifício contábil que permitiu ao Tesouro transferir centenas de bilhões de reais ao BNDES sem que isso afetasse as contas de resultado primário e de dívida líquida do governo Em 2008 preocupado com os efeitos da crise mundial sobre a economia brasileira o governo decidiu capitalizar o BNDES para expandir seus empréstimos Uma capitalização nos moldes tradicionais que aumentasse o capital próprio do banco reduziria o resultado primário e aumentaria a dívida líquida do governo Para dissimular o impacto sobre as contas públicas o governo decidiu partir para o subterfúgio da capitalização velada O BNDES foi agraciado pelo Tesouro com empréstimos de 30 anos e juros pesadamente subsidiados Para bancar tais empréstimos o Tesouro teve de emitir dívida E isso inflou a dívida bruta mas não a dívida líquida porque ao calculála o Tesouro se permitiu abater da dívida bruta como ativos os créditos de 30 anos que havia constituído junto ao BNDES O governo passou a recorrer a esse subterfúgio ano após ano As estatísticas de dívida líquida do governo federal mostram que em dezembro de 2010 os créditos do Tesouro junto ao BNDES haviam atingido cerca de R236 bilhões Podese verificar que R288 bilhões foram acumulados ao longo de 2008 R938 bilhões em 2009 e R1075 bilhões em 2010 Em porcentagem do PIB tais valores correspondem a aproximadamente 10 29 e novamente 29 Na contramão desses fluxos parte dos recursos repassados do Tesouro ao BNDES foi repassada de volta ao Tesouro em operações cuidadosamente concebidas para dilatar artificialmente a cifra de superávit primário do governo De início tais operações envolveram compra pelo BNDES de direitos do Tesouro a dividendos futuros da Eletrobras e pagamentos de dividendos particularmente generosos do próprio BNDES ao Tesouro Posteriormente envolveram também subscrições de ações da Petrobras pelo BNDES com recursos emprestados pelo Tesouro de forma que na gigantesca operação de capitalização da empresa em 2010 o governo conseguisse aumentar em muito sua participação direta e indireta no capital da empresa e ao mesmo tempo melhorar substancialmente seu superávit primário As manipulações baseavamse todas num tratamento contábil grosseiramente assimétrico De um lado a emissão de dívida que nutria os empréstimos subsidiados ao BNDES era indevidamente contabilizada de forma a não afetar a dívida líquida federal De outro os recursos que retornavam do BNDES ao Tesouro eram meticulosamente contabilizados de forma a inflar o superávit primário da União Uma alquimia contábil que conseguia transformar emissão de dívida bruta em melhora do superávit primário8 O governo parecia acreditar que com a fórmula mágica de gestão fiscal que desenvolvera já não tinha restrição fiscal a respeitar A súbita fartura de recursos estatais distorceu a formatação do financiamento dos novos projetos de infraestrutura ao fomentar um clima de megalomania e dissipação de recursos fundado na presunção de que dinheiro público era o que não faltava Tornaramse cada vez mais generosos os guichês de favores do governo e multiplicaramse as missões inadiáveis e os projetos grandiosos com custo a ser debitado ao Tesouro Emblemático desse clima foi o enlevo do governo ao final do segundo mandato Presidente Lula com o projeto de uma ferrovia bancada pelo BNDES que conectasse por trembala as duas maiores áreas metropolitanas do país A mudança de regime fiscal deu ao governo acesso inusitado a recursos para financiamento de investimentos Recorrendose a uma conta rápida podese dizer que de 2008 e 2010 o governo mobilizou nada menos que R305 bilhões de recursos extraorçamentários para investimento cerca de 93 do PIB de 2009 R230 bilhões provenientes de emissão de dívida pelo Tesouro entregues ao BNDES e R75 bilhões de reservas de petróleo que poderiam ter sido licitadas entregues à Petrobras A alocação dada aos recursos do Tesouro pelo BNDES foi para dizer o mínimo altamente discutível Já o aporte de R75 bilhões à Petrobras adveio da necessidade de um aumento de capital que teve de ser muito maior do que seria razoável tendo em vista decisões equivocadas do próprio governo que na regulamentação da exploração do présal impuseram à empresa injustificável sobrecarga de investimento Essa fartura de recursos destinados a setores específicos largamente beneficiados como petróleo e energia elétrica deve ser contrastada com a gritante insuficiência de investimento público que continuou prevalecendo em áreas de grande carência como saneamento e transporte de massa Pouco mais de quatro anos haviam se passado desde que o que o governo abandonara a visão de que tendo em conta a dura realidade do quadro fiscal o Estado não poderia arcar com o esforço de investimento em infraestrutura que se fazia necessário no país O quadro fiscal havia se deteriorado ainda mais E no entanto o governo havia passado a se comportar como se tivesse recursos disponíveis para financiar quase tudo Não havia projeto de investimento por mais dispendioso que fosse do trembala a usinas hidrelétricas na Amazônia que não pudesse ser bancado com dinheiro público9 Foi nesse clima de euforia que o governo decidiu fazer de 2010 um ano quase apoteótico que além de marcar o gran finale consagrador dos dois mandatos do Presidente Lula servisse para catapultar a candidata oficial à vitória na eleição presidencial Na esteira de um vigoroso impulso fiscal alimentado por forte expansão de gasto público e novas e vultosas transferências do Tesouro ao BNDES as dificuldades de 2009 foram deixadas para trás e o PIB cresceu nada menos que 75 em 2010 ainda que às custas de forte aceleração da inflação Dilma Rousseff acabou eleita em segundo turno com vantagem de 12 milhões de votos sobre o candidato da oposição A grande novidade dos três primeiros anos do mandato inicial do Presidente Lula foi a constatação de que o governo decidira de fato abandonar o discurso do PT e adotar uma política macroeconômica que em linhas gerais dava seguimento ao que vinha sendo feito no governo anterior Com essa guinada o governo conseguiu em poucos meses desarmar a gigantesca crise de confiança de 2002 retomar o controle da inflação melhorar substancialmente as contas externas e estabelecer as bases para uma recuperação ordenada do crescimento O que havia de mais promissor nessa constatação era o fato de que aos trancos e barrancos o país parecia ter deixado para trás o risco de ruptura e conseguido assegurar no plano da política econômica ampliação substancial do que os anglosaxões denominam common ground o campo de ideias comuns compartilhadas por governo e oposição Mas esse suposto avanço logo se mostraria mais reversível e mais limitado do que se chegou a esperar Mostrouse reversível porque as ideias econômicas defendidas por Palocci não deitaram raízes fortes no partido Mostraram ser plantas frágeis sem condições de sobreviver por muito tempo no solo petista A partir do final de 2005 e de forma mais explícita no segundo mandato o PT voltou a desfraldar velhas bandeiras retomando seu curso natural E o governo preferiu dar asas à opção desenvolvimentista É verdade que o PT não voltou a defender ideias tão primitivas como as que se permitiu brandir nas eleições municipais de 2000 Mas houve inegável reversão E a ampliação do campo das ideias comuns compartilhadas entre governo e oposição acabou mostrandose bem mais acanhada e menos promissora do que parecia no início do primeiro mandato do Presidente Lula Além de se ter mostrado reversível o avanço mostrouse desde o início mais limitado do que aparentava A guinada do primeiro mandato por impressionante que tenha sido ficou em grande medida restrita à condução da política macroeconômica E por uma razão muito simples No final das contas a fascinante história do súbito aprendizado e pronta reavaliação que deu lugar à metamorfose do PT a partir de meados de 2002 pode ser resumida em uma frase singela que capta o essencial Lula viu o abismo Foi isso que de fato possibilitou guinada tão brusca e surpreendente nas posições da cúpula do PT sobre a condução da política macroeconômica Em outras áreas contudo não havia abismos Decisões equivocadas não estavam necessariamente fadadas a ter desdobramentos imediatos tão dramáticos Não havia precipícios a balizar com tanta clareza por onde o avanço não deveria se dar Mantendo a metáfora havia apenas declives a evitar Por acidentados e impressionantes que por vezes pudessem ser não chegavam a ser abismos Eram bem menos abruptos Na verdade em certos casos a simples percepção de que eram de fato declives podia de início não ser tão óbvia E isso acabava tornando os descaminhos bem menos evidentes Quem enveredava pela trilha errada podia levar muito tempo para se convencer que afinal havia descido em vez de subir Sem o estímulo da visão pedagógica do abismo o governo deuse ao luxo de manter a racionalidade restrita a uma parte bastante limitada da política econômica mesmo nos primeiros três anos do primeiro mandato Perdeu muito tempo tentando viabilizar uma reestruturação do setor elétrico que não fazia sentido não deu importância à atração de investimento privado para a expansão da infraestrutura desprezou a necessidade de manter marcos regulatórios confiáveis com agências reguladoras independentes e bem tripuladas Na esteira da restauração desenvolvimentista apostou numa estratégia de crescimento intensiva em recursos fiscais descolada da dura realidade das contas públicas e pautada por prioridades de investimento equivocadas Muito investimento em petróleo Muito pouco em infraestrutura saneamento e transporte de massa As dificuldades de financiamento de uma estratégia de crescimento intensivas em recursos fiscais foram artificialmente contornadas a partir de 2008 quando o governo usou o agravamento da crise mundial como pretexto para relaxar restrições orçamentárias e criar uma falsa fartura de recursos fiscais com base na expansão do crédito estatal bancada por simples emissão de dívida pública Empolgado com o boom de preços de commodities e o vigor dos influxos de investimento estrangeiro o governo permitiuse manter postura pouco construtiva em negociações externas que poderiam ter redundado em ampliação do acesso das exportações brasileiras aos mercados europeu e norteamericano Deixando de lado a agenda de integração competitiva da economia brasileira à economia mundial preferiu a aposta que se revelou decepcionante nas relações SulSul e no aprofundamento da integração econômica regional especialmente com a Argentina e a Venezuela no âmbito do Mercosul É bem verdade que nada disso impediu que a economia se expandisse vigorosamente entre 2003 e 2010 A taxa anual média de crescimento do PIB durante os dois mandatos do governo Lula foi de nada menos que 4 Uma expansão muito mais rápida do que a que foi observada ao longo dois oito anos do governo anterior No período FHC a taxa anual média de crescimento do PIB não chegou a 23 Ao avaliar os desdobramentos da política econômica do Presidente Lula é importante também ter em mente o que ocorreu depois de 2010 E isso exige breve incursão no mandato de sua sucessora Não foi surpreendente que a Presidente Dilma Rousseff mantivesse a política econômica do seu antecessor Afinal tratavase de uma transição bastante peculiar A política econômica do segundo mandato havia sido em boa medida a política de Dilma Roussef Ainda que como preposta do presidente a então ministrachefe da Casa Civil teve papel fundamental em duas inflexões cruciais da política econômica no governo Lula Em 2005 no embate com Palocci sobre a necessidade de um ajuste fiscal E em 20082009 quando o governo decidiu que aproveitaria a justificativa momentânea para medidas contracíclicas ensejada pela crise mundial para afrouxar de vez as peias da restrição fiscal mesmo que para isso tivesse de passar a maquiar em alguma medida as contas públicas Na condução da política econômica portanto o novo governo estava fadado a ser uma extensão natural do segundo mandato do anterior Empenhado em eleger sua sucessora o Presidente Lula deixoulhe um problema de estabilização espinhoso A taxa oficial de inflação saltara de 43 em 2009 para 59 em 2010 E o crescimento da economia que chegara a 75 em 2010 precisava ser desacelerado O novo governo percebia que a expansão havia sido excessiva mas ainda influenciado pela euforia de 2010 alimentava visão fantasiosa sobre a desaceleração que se fazia necessária O que se anunciou no início de 2011 é que a economia passaria a manter uma expansão mais moderada da ordem de 5 ou 6 ao ano Esse anúncio bem ilustra o descompasso entre as expectativas do novo governo sobre a manutenção do dinamismo da economia e a difícil realidade com que afinal teve de lidar Na verdade a taxa média anual de crescimento do PIB nos primeiros três anos do mandato da Presidente Dilma Rousseff mal chegou a 2 O que não impediu que a taxa oficial de inflação alcançasse a marca de 65 em 2011 e se mantivesse pouco abaixo de 6 nos dois anos seguintes Entusiasmada com a política macroeconômica do segundo mandato do governo Lula a Presidente Dilma Rousseff aprofundou a opção desenvolvimentista e continuou insistindo em políticas de expansão da demanda e nas possibilidades de afrouxamento fiscal com base em contabilidade criativa Levaria algum tempo para que afinal se convencesse de que a economia estava restrita pela expansão da oferta com sérios problemas de escassez de mão de obra crescimento lento de produtividade deficiências de infraestrutura insuficiência generalizada de investimentos baixa competividade externa e carga tributária excessiva E que começasse a perceber que a dificuldade de deslanchar investimentos e remover restrições ao crescimento pelo lado da oferta decorria em grande medida de equívocos que vinham sendo cometidos desde o governo anterior Mas isso já é outra história 1Ver Sem mudança lenta o Brasil pode afundar como Titanic diz Lula Folha de SPaulo 12 de fevereiro de 2003 2Ver PT articula programa antiPalocci para 2006 Folha de SPaulo 27 de novembro de 2005 e Críticas à economia irritam Lula e Palocci O Estado de SPaulo 13 de dezembro de 2005 3Programa Nacional de Renda Mínima vinculado à Educação Bolsa Escola instituído em abril de 2001 Programa Nacional de Acesso à Alimentação PNAA criado em junho de 2003 Programa Nacional de Renda Mínima vinculada à Saúde Bolsa Alimentação instituído em setembro de 2001 Programa AuxílioGás criado em janeiro de 2002 e Cadastramento Único do Governo Federal instituído em julho de 2001 4Em dezembro de 2010 a taxa de desemprego havia sido reduzida à metade da observada em dezembro de 2002 Caíra de 105 para 53 5O caso mais notório de corrupção foi o que acabou aflorando no Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte DNIT 6Para ter em mente quão relevantes de fato foram esses efeitos deletérios basta lembrar que em entrevistas concedidas em meados de 2009 o próprio ministro do Planejamento Paulo Bernardo declarou que o FMI havia rasgado a bíblia de quem defendia contenção de gastos E que os críticos da deterioração do quadro fiscal estavam desnorteados porque estavam falando por uma cartilha que não existe mais Valor Online 27 de julho de 2009 7Para uma discussão interessante do conceito de lobby prónegócio que envolve a defesa de interesses de grupos particulares nas decisões do governo e que quase sempre não é pró mercado no sentido de contribuir para reforçar a concorrência aberta e livre na economia ver L Zingales Capitalism after the crisis National Affairs vol 1 Fall 2009 8A insistência nessas manipulações contábeis trouxe lamentável descrédito ao registro das contas públicas Especialmente às contas de dívida líquida do setor público e de superávit primário De acordo com os dados oficiais o superávit primário do setor público teria aumentado de 19 do PIB em 2009 para 27 do PIB em 2010 Estimativas mais cuidadosas contudo detectaram que eliminados os efeitos das manipulações contábeis o superávit primário foi de fato substancialmente reduzido entre 2009 e 2010 9É importante assinalar que numa entrevista concedida ao Financial Times em 2006 recém empossado como ministro da Fazenda Mantega deixou entrever o que estaria por vir com uma explicação sobre a expansão do setor elétrico que por encerrar óbvia contradição em termos parecia não fazer sentido como o governo não contava com recursos para investir a solução era recorrer ao investimento privado financiado com recursos do governo Como afinal se viu não se tratava de um enigma mas de um plano de jogo formulado notese bem muito antes de ter surgido qualquer preocupação com a crise econômica mundial Foi exatamente essa solução que a partir de 2008 passaria a nortear a gigantesca transferência ao BNDES de recursos do Tesouro provenientes da emissão de dívida pública Ver Guido Mantega Interview transcript 1 de abril de 2006 disponível em ftcom Bibliografia Fontes Primárias Arquivos 1 Arquivo Café Filho CPDOCFGV Rio de Janeiro 2 Arquivo Eugênio Gudin CPDOCFGV Rio de Janeiro 3 Arquivo Hermes Lima CPDOCFGV Rio de Janeiro 4 Arquivo Rothschild Londres 5 Arquivo Whitaker CPDOCFGV Rio de Janeiro 6 International Monetary Fund Brazil Background Material 1954 7 International Monetary Fund Brazil Staff Report and Recommendations 1955 8 Superintendência da Moeda e do Crédito Atas das sessões do Conselho Rio de Janeiro 9 World Bank Current economic position and prospects of Brazil Volume I The main report September 30 Washington DC 1971 Depoimentos 10 Eugênio Gudin Programa de História Oral CPDOCFGV Rio de Janeiro 11 Lucas Lopes entrevista a Luiz Orenstein e Antonio Claudio Sochaczewski 1988 12 Casimiro Ribeiro Depoimento Programa de História Oral CPDOCFGV Rio de Janeiro 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financiamento das empresas estatais e o orçamento de dispêndios da SEST Pesquisa e Planejamento Econômico 1986b16 agosto de 1986 362 Werneck RL Poupança estatal dívida externa e crise financeira do setor público Pesquisa e Planejamento Econômico 1986c16 dezembro de 1986 363 Werneck RL Empresas estatais e política macroeconômica Rio de Janeiro Campus 1987 364 Werneck RL A longa transição dos anos oitenta Carta Econômica Rio de Janeiro março de 1988 365 Werneck RLF Setting up a modern macroeconomic policy framework in Brazil 19932004 Working Paper No 45 Commission on Growth and DevelopmentThe World Bank Washington DC1 2009 366 Whitaker JM O milagre de minha vida São Paulo Hucitec 1982 367 Williams ALG Report for the year 1894 on the trade of the consular district of Pernambuco Parliamentary Papers vol 96 n 1547 Londres HMSO 1895 368 Williamson J A economia aberta e a economia mundial Rio de Janeiro Campus 1989 369 Woodruff W Impact of Western Man A study of Europes role in the world economy 17501960 Londres Macmillan 1969 370 World Trade Organization Trade Policy Review Brazil 1996 Genebra 1997 371 Wyndham H Report for the years 1887 and 1888 on the Finances Commerce and Agriculture of Brazil Parliamentary Papers vol 78 n 504 Londres HMSO 1889 372 Zingales L Capitalism after the crisis National Affairs vol 1 Fall 2009 Anexo Estatístico 18892010taxas de variação anuais a menos de indicação em contrário SERVIÇOS FATORES US 10⁶ SERVIÇOS NÃO FATORES US 10⁶ SALDO EM CONTA CORRENTE US 10⁶ OPERAÇÕES DE REGULARIZAÇÃO US 10⁶ INVESTIMENTO DIRETO US 10⁶ INVESTIMENTO EM CARTEIRA US 10⁶ OUTROS INVESTIMENTOS US 10⁶ CONTA CAPITAL E FINANCEIRA US 10⁶ HAVERES DA AUTORIDADE MONETÁRIA US 10⁶ 1889 267 21 41 00 nd nd nd 602 560 1890 207 23 87 00 nd nd nd 267 180 1891 197 26 80 00 nd nd nd 30 50 1892 226 24 02 00 nd nd nd 138 136 1893 279 23 22 00 nd nd nd 139 160 1894 210 24 43 00 nd nd nd 35 08 1895 287 25 112 00 nd nd nd 364 252 1896 292 26 244 00 nd nd nd 245 01 1897 267 24 113 00 nd nd nd 117 03 1898 252 23 180 69 nd nd nd 286 106 1899 215 21 105 141 nd nd nd 392 287 1900 217 21 300 139 nd nd nd 367 668 1901 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1902 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1903 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1904 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1905 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1906 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1907 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1908 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1909 nd nd nd nd nd nd nd nd nd DÍVIDA EXTERNA TOTAL REGISTRADA MÉDIO E LONGO PRAZO US 10⁶ DÍVIDA EXTERNA TOTAL REGISTRADA CURTO PRAZO US 10⁶ DÍVIDA EXTERNA REGISTRADA DO SETOR PRIVADO US 10⁶ DÍVIDA EXTERNA CONSOLIDADA US 10⁶ PREÇOS DE EXPORTAÇÃO US 1995100 QUANTUM DE EXPORTAÇÃO US 1995100 PREÇOS DE IMPORTAÇÃO US 1995100 ANO RESERVAS US 10⁶ DÍVIDA EXTERNA TOTAL GERAL US 10⁶ 1889 nd nd nd nd nd 1512 nd nd nd 1890 nd nd nd nd nd 1502 nd nd nd 1891 nd nd nd nd nd 1486 nd nd nd 1892 nd nd nd nd nd 1467 nd nd nd 1893 nd nd nd nd nd 1627 nd nd nd 1894 nd nd nd nd nd 1600 nd nd nd 1895 nd nd nd nd nd 1935 nd nd nd 1896 nd nd nd nd nd 1954 nd nd nd 1897 nd nd nd nd nd 1966 nd nd nd 1898 nd nd nd nd nd 1959 nd nd nd 1899 nd nd nd nd nd 2042 nd nd nd 1900 nd nd nd nd nd 2147 nd nd nd 1901 nd nd nd nd nd 2916 56 76 63 1902 nd nd nd nd nd 2905 52 73 58 1903 nd nd nd nd nd 3318 54 71 59 1904 nd nd nd nd nd 3395 67 61 60 1905 nd nd nd nd nd 3792 71 66 61 1906 nd nd nd nd nd 4260 71 78 67 1907 nd nd nd nd nd 4435 68 84 71 1908 nd nd nd nd nd 5424 63 73 69 1909 nd nd nd nd nd 5525 75 89 65 QUANTUM DE IMPORTAÇÃO US 1995100 TERMOS DE INTERCÂMBIO 1995100 NÍVEL DE ATIVIDADE NOS EUA TAXA DE JUROS NOS EUA PREÇOS AO CONSUMIDOR TAXA DE CÂMBIO OFICIAL moeda nacUS TAXA DE CÂMBIO COMERCIAL moeda nacUS PARTICIPAÇÃO DO IMPOSTO DE RENDA NA RECEITA TOTAL PARTICIPAÇÃO DO IMPOSTO DE CONSUMO NA RECEITA TOTAL ANO 28 29 30 31 32 33 34 35 36 1889 nd nd nd nd nd 20 00 1890 nd nd 75 69 nd 19 00 1891 nd nd 44 65 nd 12 00 1892 nd nd 98 54 nd 33 00 1893 nd nd 48 76 nd 41 00 1894 nd nd 28 52 nd 43 00 1895 nd nd 119 58 nd 49 00 1896 nd nd 19 70 nd 50 00 05 1897 nd nd 94 47 nd 55 00 07 1898 nd nd 23 53 nd 64 00 40 1899 nd nd 91 55 nd 69 00 79 1900 nd nd 27 54 nd 66 00 119 1901 29 896 115 54 nd 52 00 104 1902 34 893 09 58 nd 43 00 99 1903 35 917 50 62 nd 42 00 85 1904 36 1119 12 51 nd 41 00 80 1905 41 1155 75 52 nd 40 00 88 1906 42 1064 116 63 nd 31 00 101 1907 48 958 15 67 nd 31 00 89 1908 43 922 81 50 nd 32 00 101 1909 48 1166 122 47 nd 33 00 102 PARTICIPAÇÃO DO IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO NA RECEITA TOTAL DÍVIDA INTERNA FEDERAL PIB SALÁRIO MÍNIMO REAL 1980 100 PAPELMOEDA EM PODER DO PÚBLICO DEPÓSITOS À VISTA MEIOS DE PAGAMENTO BASE MONETÁRIA ANO 37 38 39 40 41 42 43 1889 556 nd 341 347 122 16 1890 517 nd 513 1996 1237 503 1891 467 nd 909 680 759 664 1892 489 nd 246 483 210 110 1893 510 nd 141 140 26 133 1894 514 nd 17 207 60 104 1895 633 nd 30 13 23 57 1896 761 nd 64 126 09 75 1897 746 nd 05 496 172 60 1898 680 nd 72 147 24 27 1899 624 nd 23 76 43 54 1900 536 nd 24 341 142 42 1901 532 nd 10 153 28 28 1902 540 nd 14 25 17 35 1903 456 nd 08 09 08 15 1904 447 nd 89 123 97 16 1905 559 nd 65 27 42 16 1906 575 nd 152 125 77 87 1907 536 nd 12 621 146 45 1908 537 nd 52 19 41 45 1909 518 119 167 118 151 198 PRODUTO INTERNO BRUTO PRODUTO INDUSTRIAL PRODUTO AGRÍCOLA PRODUTO DO SETOR SERVIÇOS DEFLATOR IMPLÍCITO DO PIB FORMAÇÃO BRUTA DE CAPITAL PIB EXPORTAÇÕES US 10⁶ IMPORTAÇÕES US 10⁶ BALANÇA COMERCIAL US 10⁶ ANO 1 2 3 4 5 6 7 8 9 1910 26 44 39 75 43 162 3073 2011 1062 1911 58 90 27 42 22 186 3250 2209 1041 1912 69 107 45 119 74 205 3633 2610 1023 1913 29 09 43 03 111 269 3189 2736 453 1914 13 87 10 93 133 107 2286 1460 825 1915 03 129 41 37 133 64 2568 1151 1417 1916 09 114 28 88 209 85 2694 1483 1211 1917 94 87 119 32 88 79 3001 1586 1415 1918 20 11 74 03 83 62 2916 1939 977 1919 79 148 30 144 88 108 5806 2804 3003 1920 125 52 190 112 191 115 4082 3818 264 1921 19 18 41 42 153 173 2242 2011 231 1922 78 188 05 98 91 140 3661 2315 1346 1923 86 133 39 194 302 86 3366 2077 1290 1924 14 11 10 45 110 100 4227 2827 1400 1925 00 11 32 23 184 108 4969 3593 1376 1926 52 24 32 18 181 102 4581 3396 1185 1927 108 108 108 92 22 124 4312 3354 958 1928 115 70 184 120 116 103 4739 3888 852 1929 11 22 03 09 36 122 4604 3677 928 SERVIÇOS FATORES US 10⁶ SERVIÇOS NÃO FATORES US 10⁶ SALDO EM CONTA CORRENTE US 10⁶ OPERAÇÕES DE REGULARIZAÇÃO US 10⁶ INVESTIMENTO DIRETO US 10⁶ INVESTIMENTO EM CARTEIRA US 10⁶ OUTROS INVESTIMENTOS US 10⁶ CONTA CAPITAL E FINANCEIRA US 10⁶ HAVERES DA AUTORIDADE MONETÁRIA US 10⁶ ANO 10 11 12 13 14 15 16 17 18 1910 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1911 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1912 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1913 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1914 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1915 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1916 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1917 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1918 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1919 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1920 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1921 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1922 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1923 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1924 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1925 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1926 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1927 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1928 nd nd nd nd nd nd nd nd nd 1929 nd nd nd nd nd nd nd nd nd ANO RESERVAS US 10⁶ DÍVIDA EXTERNA TOTAL GERAL US 10⁶ DÍVIDA EXTERNA TOTAL REGISTRADA MÉDIO E LONGO PRAZO US 10⁶ DÍVIDA EXTERNA TOTAL REGISTRADA CURTO PRAZO US 10⁶ DÍVIDA EXTERNA REGISTRADA DO SETOR PRIVADO US 10⁶ DÍVIDA EXTERNA CONSOLIDADA US 10⁶ PREÇOS DE EXPORTAÇÃO US 1995 100 QUANTUM DE EXPORTAÇÃO US 1995 100 PREÇOS DE IMPORTAÇÃO US 1995 100 19 20 21 22 23 24 25 26 27 1910 nd 6246 nd nd nd 6246 99 67 71 1911 nd 6432 nd nd nd 6432 99 71 71 1912 nd 6405 nd nd nd 6405 103 76 73 1913 nd 7021 nd nd nd 7021 84 82 79 1914 nd 7863 nd nd nd 7863 68 73 77 1915 nd 7700 nd nd nd 7700 58 97 79 1916 nd 7706 nd nd nd 7706 69 85 94 1917 nd 7553 nd nd nd 7553 72 91 126 1918 nd 7323 nd nd nd 7323 85 76 153 1919 nd 6751 nd nd nd 6751 122 102 152 1920 nd 5504 nd nd nd 5504 92 92 156 1921 nd 6514 nd nd nd 6514 53 92 123 1922 nd 8207 nd nd nd 8207 67 97 113 1923 669 8391 nd nd nd 8391 68 106 85 1924 812 8025 nd nd nd 8025 94 96 88 1925 692 8836 nd nd nd 8836 113 94 97 1926 969 10224 nd nd nd 10224 106 93 94 1927 1435 11384 nd nd nd 11384 90 103 94 1928 1773 12407 nd nd nd 12407 102 100 94 1929 1773 12254 nd nd nd 12254 94 105 88 QUANTUM DE IMPORTAÇÃO US 1995 100 TERMOS DE INTERCÂMBIO 1995 100 NÍVEL DE ATIVIDADE NOS EUA TAXA DE JUROS NOS EUA PREÇOS AO CONSUMIDOR TAXA DE CÂMBIO OFICIAL moeda nacUS TAXA DE CÂMBIO COMERCIAL moeda nacUS PARTICIPAÇÃO DO IMPOSTO DE RENDA NA RECEITA TOTAL PARTICIPAÇÃO DO IMPOSTO DE CONSUMO NA RECEITA TOTAL 28 29 30 31 32 33 34 35 36 1910 57 1396 28 57 nd 30 00 104 1911 62 1386 26 48 nd 31 00 106 1912 72 1412 57 54 nd 31 00 102 1913 70 1070 09 62 20 31 00 100 1914 38 880 43 nd 00 33 00 123 1915 29 735 08 nd 00 40 00 168 1916 32 737 79 nd 167 42 00 175 1917 25 576 07 nd 101 39 00 219 1918 25 553 123 42 122 39 00 193 1919 37 802 35 44 34 37 00 211 1920 48 581 43 61 99 45 00 190 1921 33 432 86 53 30 75 00 173 1922 41 598 158 35 93 75 00 170 1923 49 801 121 41 101 97 00 205 1924 65 1068 01 30 169 91 15 194 1925 74 1166 84 33 66 81 20 179 1926 73 1128 59 36 31 69 22 221 1927 72 958 00 34 26 84 30 198 1928 83 1087 06 41 15 83 31 199 1929 84 1074 67 50 07 85 32 178 ANO PARTICIPAÇÃO DO IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO NA RECEITA TOTAL DÍVIDA INTERNA FEDERAL PIB SALÁRIO MÍNIMO REAL 1980 100 PAPELMOEDA EM PODER DO PÚBLICO DEPÓSITOS À VISTA MEIOS DE PAGAMENTO BASE MONETÁRIA 37 38 39 40 41 42 43 1910 550 115 80 296 147 70 1911 564 118 34 312 131 18 1912 566 113 78 61 22 102 1913 526 132 159 12 105 124 1914 461 158 22 181 87 112 1915 377 145 100 131 112 99 1916 386 127 193 307 236 124 1917 295 120 143 235 179 155 1918 277 118 185 492 312 216 1919 340 105 07 129 57 24 1920 378 99 144 122 10 30 1921 358 139 201 565 409 114 1922 317 136 355 159 230 245 1923 372 111 175 82 120 95 1924 369 112 183 34 97 128 1925 415 100 113 122 118 79 1926 351 114 40 74 22 57 1927 398 106 129 167 150 134 1928 424 86 66 193 139 95 1929 387 90 90 35 57 76 ANO PRODUTO INTERNO BRUTO PRODUTO INDUSTRIAL PRODUTO AGRÍCOLA PRODUTO DO SETOR SERVIÇOS DEFLATOR IMPLÍCITO DO PIB FORMAÇÃO BRUTA DE CAPITAL PIB EXPORTAÇÕES US 10⁶ IMPORTAÇÕES US 10⁶ BALANÇA COMERCIAL US 10⁶ 1 2 3 4 5 6 7 8 9 1930 21 67 12 86 124 97 3194 2255 939 1931 33 12 63 50 109 76 2440 1165 1275 1932 43 14 60 14 16 72 1794 928 866 1933 89 117 120 152 20 88 2168 1482 686 1934 92 111 62 92 63 106 2928 1848 1080 1935 30 119 25 59 48 131 2695 1965 730 1936 121 172 95 131 16 134 3206 1964 1242 1937 46 54 01 57 95 142 3468 2792 676 1938 45 37 42 20 32 150 2943 2465 478 1939 25 93 23 40 20 144 2999 2180 819 1940 10 27 18 37 67 148 2521 2007 514 1941 49 64 63 61 102 129 3677 2225 1452 1942 27 14 44 64 162 123 4098 1774 2324 1943 85 135 73 135 166 102 4726 2269 2457 1944 76 107 24 98 206 97 5803 3104 2699 1945 32 55 22 29 149 103 6551 3225 3326 1946 116 185 84 102 146 109 9850 5940 3910 1947 24 33 08 72 90 149 1152 1056 96 1948 97 123 69 86 59 127 1180 973 207 1949 77 110 45 75 83 130 1096 957 139 ANO SERVIÇOS FATORES US 10⁶ SERVIÇOS NÃO FATORES US 10⁶ SALDO EM CONTA CORRENTE US 10⁶ OPERAÇÕES DE REGULARIZAÇÃO US 10⁶ INVESTIMENTO DIRETO US 10⁶ INVESTIMENTO EM CARTEIRA US 10⁶ OUTROS INVESTIMENTOS US 10⁶ CONTA CAPITAL E FINANCEIRA US 10⁶ AUMENTO DE HAVERES DA AUTORIDADE MONETÁRIA US 10⁶ 10 11 12 13 14 15 16 17 18 1930 1234 495 790 00 nd nd nd 544 1161 1931 989 245 41 00 nd nd nd 95 158 1932 455 172 239 00 nd nd nd 259 357 1933 283 263 140 299 nd nd nd 209 115 1934 459 318 303 56 nd nd nd 126 120 1935 676 382 328 58 nd nd nd 05 229 1936 765 377 100 293 nd nd nd 05 512 1937 815 494 633 242 nd nd nd 00 00 1938 00 434 44 234 nd nd nd 00 751 1939 117 418 284 180 nd nd nd 03 08 1940 268 369 123 142 nd nd nd 235 44 1941 344 191 917 35 nd nd nd 359 603 1942 408 80 2013 00 nd nd nd 291 1496 1943 537 25 1985 00 nd nd nd 456 2528 1944 685 189 1858 00 nd nd nd 205 1574 1945 625 149 2482 00 nd nd nd 326 617 1946 650 1130 1880 00 nd nd nd 30 960 1947 550 2210 2038 800 55 00 294 3490 1360 1948 1050 2100 1146 00 67 00 119 520 670 1949 1010 1700 1349 380 44 00 28 720 330 DÍVIDA EXTERNA TOTAL GERAL US 10⁶ DÍVIDA EXTERNA TOTAL REGISTRADA MÉDIO E LONGO PRAZO US 10⁶ DÍVIDA EXTERNA TOTAL REGISTRADA CURTO PRAZO US 10⁶ DÍVIDA EXTERNA REGISTRADA DO SETOR PRIVADO US 10⁶ DÍVIDA EXTERNA CONSOLIDADA US 10⁶ PREÇOS DE EXPORTAÇÃO US 1995 100 QUANTUM DE EXPORTAÇÃO US 1995 100 PREÇOS DE IMPORTAÇÃO US 1995 100 19 20 21 22 23 24 25 26 27 1930 428 12935 nd nd nd 12935 62 111 88 1931 147 12336 nd nd nd 12336 43 121 64 1932 499 9406 nd nd nd 9406 46 84 57 1933 741 11238 nd nd nd 11238 44 105 63 1934 546 13309 nd nd nd 13309 55 114 72 1935 656 12688 nd nd nd 12688 46 126 66 1936 415 12559 nd nd nd 12559 51 135 64 1937 496 11999 nd nd nd 11999 57 130 76 1938 584 11868 nd nd nd 11868 40 137 72 1939 858 10825 nd nd nd 10825 39 166 68 1940 677 9724 nd nd nd 9724 40 137 76 1941 1237 9653 nd nd nd 9653 50 157 83 1942 2708 9344 nd nd nd 9344 70 126 94 1943 5308 9117 nd nd nd 9117 77 131 107 1944 6335 7529 nd nd nd 7529 87 144 114 1945 6830 6981 nd nd nd 6981 92 154 114 1946 7600 644 644 nd nd 644 120 176 158 1947 7850 625 625 nd nd 597 153 162 186 1948 7580 597 597 nd nd 576 159 160 199 1949 7190 601 601 nd nd 454 166 143 207 ANO QUANTUM DE IMPORTAÇÃO US 1995 100 TERMOS DE INTERCÂMBIO 1995 100 NÍVEL DE ATIVIDADE NOS EUA TAXA DE JUROS NOS EUA PREÇOS AO CONSUMIDOR TAXA DE CÂMBIO OFICIAL moeda nacUS TAXA DE CÂMBIO COMERCIAL moeda nacUS PARTICIPAÇÃO DO IMPOSTO DE RENDA NA RECEITA TOTAL PARTICIPAÇÃO DO IMPOSTO DE CONSUMO NA RECEITA TOTAL 28 29 30 31 32 33 34 35 36 1930 52 704 98 25 90 92 37 210 1931 36 675 76 16 37 143 53 215 1932 33 807 147 13 04 141 54 222 1933 47 705 18 06 09 127 59 214 1934 52 770 91 03 77 121 61 203 1935 59 691 99 01 56 119 61 205 1936 61 796 139 01 147 118 64 194 1937 74 752 53 04 76 114 67 193 1938 69 553 50 04 43 176 74 220 1939 64 570 86 04 26 166 85 271 1940 53 518 85 04 30 166 102 261 1941 53 605 161 04 107 166 133 293 1942 38 738 129 04 114 166 226 286 1943 42 720 132 04 102 166 275 285 1944 55 760 72 04 129 166 277 264 1945 57 804 16 04 168 165 265 320 1946 76 762 119 06 165 165 238 347 1947 111 826 08 09 219 187 282 322 1948 91 800 45 11 34 188 267 309 1949 92 800 01 13 42 188 267 315 ANO PARTICIPAÇÃO DO IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO NA RECEITA TOTAL DÍVIDA INTERNA FEDERAL PIB SALÁRIO MÍNIMO REAL 1980 100 PAPELMOEDA EM PODER DO PÚBLICO DEPÓSITOS Á VISTA MEIOS DE PAGAMENTO BASE MONETÁRIA 37 38 39 40 41 42 43 1930 373 121 83 186 147 162 1931 345 98 36 247 161 35 1932 301 93 94 220 174 99 1933 364 88 03 19 11 62 1934 332 101 75 157 129 40 1935 358 103 197 19 52 144 1936 324 96 153 89 113 121 1937 339 88 60 143 111 123 1938 271 93 27 325 215 60 1939 272 108 77 96 42 30 1940 242 125 10724 62 06 18 43 1941 262 104 9771 297 260 273 282 1942 154 82 8774 154 282 234 239 1943 110 72 8662 393 611 535 333 1944 123 57 9078 365 199 252 317 1945 116 70 7746 228 169 190 212 1946 121 59 6697 173 62 102 165 1947 135 56 5457 00 33 18 13 1948 105 50 5237 54 95 76 70 1949 95 43 4877 96 225 176 114 ANO PRODUTO INTERNO BRUTO PRODUTO INDUSTRIAL PRODUTO AGRÍCOLA PRODUTO DO SETOR SERVIÇOS DEFLATOR IMPLÍCITO DO PIB FORMAÇÃO BRUTA DE CAPITAL PIB EXPORTAÇÕES US 10⁶ IMPORTAÇÕES US 10⁶ BALANÇA COMERCIAL US 10⁶ 1 2 3 4 5 6 7 8 9 1950 68 127 15 82 92 128 1355 9419 4136 1951 49 53 07 69 181 154 17690 17248 442 1952 73 56 91 61 93 148 14181 17203 3021 1953 47 93 02 34 138 151 15393 11446 3947 1954 78 93 79 95 271 158 15618 14147 1471 1955 88 111 77 82 118 135 14232 11038 3195 1956 29 55 24 09 226 145 14820 10745 4074 1957 77 54 93 100 127 150 13916 12853 1063 1958 108 168 20 98 124 170 12430 11772 658 1959 98 129 53 105 359 180 12820 12098 722 1960 94 106 49 106 254 157 12688 12928 240 1961 86 111 76 72 347 131 14030 12918 1111 1962 66 81 05 63 501 155 1215 13039 897 1963 06 02 10 14 784 170 1406 12940 1125 1964 34 50 13 14 899 150 1430 10864 3434 1965 24 47 121 22 582 147 1596 941 6549 1966 67 117 17 66 379 159 1741 1303 4380 1967 42 22 57 52 265 162 1654 1441 2128 1968 98 142 14 97 267 187 1881 1855 262 1969 95 112 60 99 201 191 2311 19932 3179 ANO SERVIÇOS FATORES US 10⁶ SERVIÇOS NÃO FATORES US 10⁶ SALDO EM CONTA CORRENTE US 10⁶ OPERAÇÕES DE REGULARIZAÇÃO US 10⁶ INVESTIMENTO DIRETO US 10⁶ INVESTIMENTO EM CARTEIRA US 10⁶ OUTROS INVESTIMENTOS US 10⁶ CONTA CAPITAL E FINANCEIRA US 10⁶ AUMENTO DE HAVERES DA AUTORIDADE MONETÁRIA US 10⁶ 10 11 12 13 14 15 16 17 18 1950 1100 2090 926 00 390 00 1500 1110 300 1951 1570 3790 4938 280 630 00 2030 2660 810 1952 1210 3000 7251 280 940 00 6140 7080 270 1953 1664 2266 123 4860 600 00 190 410 400 1954 1350 2430 2359 2000 510 00 1850 2360 110 1955 1143 2297 345 610 790 00 450 340 120 1956 1408 2782 226 280 1390 00 510 1900 1830 1957 1282 2648 2997 370 1780 00 1310 3090 1610 1958 1077 2193 2652 1950 1280 00 2970 4250 300 1959 1508 2562 3448 210 1580 00 1870 3450 250 1960 1941 3039 5180 610 1380 00 3550 4930 140 1961 1833 2057 2629 2600 1470 00 2430 3900 1780 1962 1988 2032 4527 1200 1320 00 3400 4720 1180 1963 1443 1817 1705 1870 870 00 1230 2100 370 1964 1882 1288 814 520 860 00 480 1340 20 1965 2551 1909 2839 2500 1540 00 1890 350 2180 1966 2767 2713 310 90 1590 00 1120 470 90 1967 2880 2780 2762 330 1150 00 660 490 2620 1968 2966 3334 5818 120 1350 00 5450 6800 970 1969 3365 3768 3644 00 2073 530 6760 9363 5310 ANO DÍVIDA RESERVAS US 10⁶ DÍVIDA EXTERNA TOTAL GERAL US 10⁶ DÍVIDA EXTERNA TOTAL REGISTRADA MÉDIO E LONGO PRAZO US 10⁶ DÍVIDA EXTERNA TOTAL REGISTRADA CURTO PRAZO US 10⁶ DÍVIDA EXTERNA REGISTRADA DO SETOR PRIVADO US 10⁶ DÍVIDA EXTERNA CONSOLIDADA US 10⁶ PREÇOS DE EXPORTAÇÃO US 1995 100 QUANTUM DE EXPORTAÇÃO US 1995 100 PREÇOS DE IMPORTAÇÃO US 1995 100 19 20 21 22 23 24 25 26 27 1950 6660 5590 nd nd nd 3010 248 118 187 1951 5160 5710 nd nd nd 2700 293 130 245 1952 5290 6380 nd nd nd 2430 290 105 265 1953 6050 11590 nd nd nd 2220 285 116 252 1954 4830 11960 nd nd nd 1800 338 99 236 1955 4910 13950 nd nd nd 1550 268 114 232 1956 6080 27360 25680 nd nd 1300 262 122 225 1957 4740 24910 23730 nd nd 1840 260 115 226 1958 4650 28700 27340 nd nd 1600 245 109 221 1959 3660 31600 29710 nd nd 1360 215 128 202 1960 3450 37380 34620 nd nd 1200 219 125 218 1961 4700 32910 31440 nd nd 1020 229 132 229 1962 2850 35330 33670 nd nd 920 213 122 228 1963 2150 36120 32980 nd nd 820 216 140 233 1964 2440 32940 31550 nd nd 770 256 120 226 1965 4830 38230 36440 nd nd 720 260 132 227 1966 4210 37710 36660 nd nd 680 249 150 236 1967 1980 34400 32810 nd nd 630 248 143 241 1968 2570 40920 37800 nd nd 590 246 165 251 1969 6560 46350 44030 nd nd 161 265 187 259 ANO QUANTUM DE IMPORTAÇÃO US 1995 100 TERMOS DE INTERCÂMBIO 1995 100 NÍVEL DE ATIVIDADE NOS EUA TAXA DE JUROS NOS EUA PREÇOS AO CONSUMIDOR TAXA DE CÂMBIO OFICIAL moeda nacUS TAXA DE CÂMBIO COMERCIAL moeda nacUS PARTICIPAÇÃO DO IMPOSTO DE RENDA NA RECEITA TOTAL PARTICIPAÇÃO DO IMPOSTO DE CONSUMO NA RECEITA TOTAL 28 29 30 31 32 33 34 35 36 1950 100 1328 96 12 94 188 288 331 1951 139 1194 79 16 121 188 295 300 1952 129 1094 31 17 117 188 325 297 1953 89 1131 45 19 143 314 291 1954 120 1430 13 14 226 330 312 1955 95 1156 76 17 230 346 313 1956 93 1166 19 26 210 331 310 1957 114 1147 14 34 160 315 355 1958 107 1107 11 20 148 270 335 1959 120 1068 64 35 392 294 341 1960 119 1004 25 35 295 267 358 1961 113 1000 20 28 332 264 386 1962 115 935 66 30 494 226 399 1963 111 925 40 34 728 255 428 1964 96 1135 55 38 918 240 438 1965 83 1147 63 42 657 1900 285 364 1966 111 1055 65 54 433 2200 223 369 1967 120 1030 26 47 220 27 210 385 1968 148 980 47 57 226 34 184 431 1969 155 1026 26 76 223 41 191 343 ANO PARTICIPAÇÃO DO IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO NA RECEITA TOTAL 37 DÍVIDA INTERNA FEDERAL PIB 38 SALÁRIO MÍNIMO REAL 1980 100 39 PAPELMOEDA EM PODER DO PÚBLICO 40 DEPÓSITOS À VISTA 41 MEIOS DE PAGAMENTO 42 BASE MONETÁRIA 43 1950 87 37 4668 294 322 314 308 1951 102 30 4135 131 184 164 134 1952 84 25 11146 113 177 154 106 1953 37 21 9848 196 189 193 187 1954 49 16 12327 296 209 237 242 1955 40 13 13742 165 163 164 172 1956 27 10 13525 180 238 219 175 1957 32 09 14562 206 380 321 191 1958 110 07 12825 226 230 230 248 1959 121 05 15677 275 496 429 300 1960 95 04 13771 332 408 388 331 1961 113 03 15809 513 529 525 510 1962 114 04 13361 549 672 641 668 1963 91 04 12799 722 622 646 740 1964 62 06 14284 690 859 816 672 1965 58 04 12630 498 888 795 467 1966 69 18 10685 354 85 138 285 1967 50 38 9921 257 519 457 267 1968 69 33 9930 386 391 390 457 1969 55 32 9515 321 326 325 206 ANO SERVIÇOS FATORES US 10⁹ SERVIÇOS NÃO FATORES US 10⁹ SALDO EM CONTA CORRENTE US 10⁹ OPERAÇÕES DE REGULARIZAÇÃO US 10⁹ INVESTIMENTO DIRETO US 10⁹ INVESTIMENTO EM CARTEIRA US 10⁹ OUTROS INVESTIMENTOS US 10⁹ CONTA CAPITAL E FINANCEIRA US 10⁹ AUMENTO DE HAVERES DA AUTORIDADE MONETÁRIA US 10⁹ 10 11 12 13 14 15 16 17 18 1970 6185 4733 8387 0 3777 304 8731 12812 5344 1971 7286 5716 16297 0 4480 401 16847 21728 5366 1972 7091 7427 16879 0 4409 1386 32130 37925 25377 1973 10926 10269 20854 0 11476 2608 27024 41108 23799 1974 12736 15407 75041 0 11541 1399 52373 65313 10406 1975 20100 14513 69995 0 10948 959 51833 63740 10642 1976 25827 15891 64258 0 12192 4186 68614 84992 26879 1977 34231 15001 48262 0 16853 7195 37465 61513 7144 1978 42606 17696 69834 0 20561 9290 88993 118844 42624 1979 55596 23205 107082 0 22102 6399 47351 76235 32149 1980 70199 30391 127392 0 15437 3508 76475 96101 34716 1981 102752 28187 117059 0 23147 25 103729 127457 6247 1982 135484 34906 162732 4177 27395 16 93387 121007 45416 1983 110439 23102 67730 1481 11378 2876 65547 74188 242 1984 114983 16577 949 17955 14592 2723 52952 65292 70267 1985 112834 15939 2483 627 13373 2305 9439 1966 4566 1986 111499 25574 53233 6131 1736 4747 17063 14315 38357 1987 104183 22579 14379 11465 10308 4282 26624 32586 10146 1988 122003 28955 41798 4562 26295 4979 42333 20983 12489 1989 126668 26668 10319 8524 6068 4212 4456 6291 8861 ANO DÍVIDA RESERVAS US 10⁹ DÍVIDA EXTERNA TOTAL GERAL US 10⁹ DÍVIDA EXTERNA TOTAL REGISTRADA MÉDIO E LONGO PRAZO US 10⁹ DÍVIDA EXTERNA TOTAL REGISTRADA CURTO PRAZO US 10⁹ DÍVIDA EXTERNA REGISTRADA DO SETOR PRIVADO US 10⁹ DÍVIDA EXTERNA CONSOLIDADA US 10⁹ PREÇOS DE EXPORTAÇÃO US 1995 100 QUANTUM DE EXPORTAÇÃO US 1995 100 PREÇOS DE IMPORTAÇÃO US 1995 100 19 20 21 22 23 24 25 26 27 1970 11870 62400 52950 nd nd 150 305 193 271 1971 17230 82834 66213 nd nd 139 305 205 287 1972 41830 114639 95210 nd nd 122 329 261 309 1973 64160 148572 125715 nd nd 104 446 299 373 1974 52690 200324 171660 nd nd 94 561 305 564 1975 40400 251156 211714 nd nd 73 575 324 605 1976 65440 321451 259854 nd nd 54 671 324 634 1977 72560 379507 320372 nd nd 47 835 312 676 1978 118950 521864 435107 nd nd 47 782 348 733 1979 96890 558029 499041 nd 175402 45 863 380 878 1980 69130 642595 538475 nd 182154 42 937 462 1182 1981 75070 739628 614108 nd 208357 32 902 555 1290 1982 39940 854875 701975 nd 241504 23 857 506 1262 1983 45630 937452 813192 nd 223441 19 815 578 1213 1984 119950 1021270 910910 nd 205220 12 842 690 1182 1985 116080 1051706 958566 nd 184122 12 783 704 1146 1986 67600 1112027 1017587 nd 156189 03 811 592 936 1987 74580 1211882 1075142 nd 152927 00 812 694 1052 1988 91400 1135110 1025550 nd 121183 00 905 803 1083 1989 96790 1155061 992849 nd 104536 00 926 799 1162 ANO QUANTUM DE IMPORTAÇÃO US 1995 100 TERMOS DE INTERCÂMBIO 1995 100 NÍVEL DE ATIVIDADE NOS EUA TAXA DE JUROS NOS EUA PREÇOS AO CONSUMIDOR TAXA DE CÂMBIO OFICIAL moeda nacUS TAXA DE CÂMBIO COMERCIAL moeda nacUS PARTICIPAÇÃO DO IMPOSTO DE RENDA NA RECEITA TOTAL PARTICIPAÇÃO DO IMPOSTO DE CONSUMO NA RECEITA TOTAL 28 29 30 31 32 33 34 35 36 1970 186 1128 02 73 223 46 164 285 1971 227 1063 34 573 202 53 240 422 1972 275 1067 53 525 166 59 253 378 1973 333 1194 58 803 127 61 243 377 1974 450 995 06 1081 276 68 256 369 1975 405 950 02 786 289 81 262 352 1976 392 1059 54 684 419 107 240 296 1977 357 1235 46 683 436 141 281 275 1978 374 1067 56 906 388 181 258 271 1979 413 983 31 1267 527 269 312 253 1980 390 793 03 1526 997 527 260 221 1981 344 699 25 1887 935 931 287 223 1982 308 679 19 1485 1003 1794 305 223 1983 255 671 45 1079 1780 5762 343 195 1984 236 712 72 1204 2090 18454 405 133 1985 230 683 41 993 2390 62050 503 201 1986 301 867 35 833 592 137 449 196 1987 287 772 32 821 3946 393 371 223 1988 270 835 41 932 9933 2611 422 201 1989 315 797 36 1087 18636 28 432 205 ANO PARTICIPAÇÃO DO IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO NA RECEITA TOTAL 37 DÍVIDA INTERNA FEDERAL PIB 38 SALÁRIO MÍNIMO REAL 1980 100 39 PAPELMOEDA EM PODER DO PÚBLICO 40 DEPÓSITOS À VISTA 41 MEIOS DE PAGAMENTO 42 BASE MONETÁRIA 43 1970 45 44 936 247 261 258 221 1971 67 59 936 273 336 323 212 1972 67 75 940 350 391 383 330 1973 72 43 960 423 481 470 484 1974 90 46 938 267 350 335 276 1975 96 60 960 491 414 428 415 1976 87 94 985 496 346 372 439 1977 68 97 985 405 366 375 381 1978 64 99 991 443 417 422 464 1979 66 86 993 779 725 736 836 1980 71 67 1000 738 693 702 742 1981 59 126 996 794 896 876 672 1982 49 28 1010 1003 922 606 664 1983 42 40 912 798 868 1005 976 1984 39 62 833 2641 2388 1940 2018 1985 35 74 864 2573 2835 3102 3043 1986 39 62 894 2471 2575 3199 3068 1987 34 44 732 1815 1955 1120 1274 1988 36 40 757 6223 7416 11917 5703 1989 38 79 757 17541 18312 23411 13842 ANO PRODUTO INTERNO BRUTO PRODUTO INDUSTRIAL PRODUTO AGRÍCOLA PRODUTO DO SETOR SERVIÇOS DEFLATOR IMPLÍCITO DO PIB FORMAÇÃO BRUTA DE CAPITAL PIB EXPORTAÇÕES US 10⁶ IMPORTAÇÕES US 10⁶ BALANÇA COMERCIAL US 10⁶ 1 2 3 4 5 6 7 8 9 1990 44 82 37 08 25956 207 31414 20661 10752 1991 10 03 14 03 4167 181 31620 21040 10580 1992 05 40 54 08 9682 184 35793 20554 15239 1993 47 81 10 32 20014 193 38555 25256 13299 1994 53 81 74 40 22517 207 43545 33079 10466 1995 44 47 57 32 935 205 46507 49972 3466 1996 22 11 30 22 171 193 47747 53346 5599 1997 34 42 08 26 76 199 52994 59747 6753 1998 00 26 34 11 42 197 51140 57714 6574 1999 03 19 65 12 85 189 48011 49210 1199 2000 43 48 27 36 62 168 55086 55783 698 2001 13 06 61 19 90 170 58223 55572 2650 2002 27 21 66 32 106 164 60362 47240 13121 2003 12 13 58 08 137 153 73084 48290 24794 2004 57 79 23 50 80 161 96475 62835 33640 2005 32 21 03 37 72 159 118308 73605 44703 2006 40 23 45 42 61 164 137807 91351 46457 2007 61 48 53 61 59 174 160649 120617 40032 2008 52 41 61 49 83 191 197942 173107 24836 2009 03 58 31 21 72 181 152995 127705 25290 2010 75 104 63 55 82 193 201915 181768 20147 ANO SERVIÇOS FATORES US 10⁶ SERVIÇOS NÃO FATORES US 10⁶ SALDO EM CONTA CORRENTE US 10⁶ OPERAÇÕES DE REGULARIZAÇÃO US 10⁶ INVESTIMENTO DIRETO US 10⁶ INVESTIMENTO EM CARTEIRA US 10⁶ OUTROS INVESTIMENTOS US 10⁶ CONTA DE CAPITALE FINANCEIRA US 10⁶ 10 11 12 13 14 15 16 17 1990 11773 35962 37837 7406 3642 4723 37530 45925 1991 9743 37998 14075 5898 872 38081 37353 1630 1992 8152 31839 61088 4059 19243 144655 64819 99473 1993 10331 52456 6759 4955 7996 123246 27166 104952 1994 9034 56573 18112 1285 1460 506422 435565 86922 1995 11058 74830 183837 471 33095 92168 162000 290955 1996 11668 86811 235021 717 112608 216189 6730 339681 1997 14876 106460 304523 341 178774 126156 48326 258003 1998 18189 101105 334159 93288 260016 181250 142855 297017 1999 18848 69769 253348 29656 26888 38016 136200 173191 2000 17886 71620 242245 103229 304977 69551 182020 193258 2001 19743 77593 232145 67568 247149 770 27673 270521 2002 18191 49572 76366 114804 14108 51186 10619 80044 2003 18552 49311 41773 47693 9894 53075 104380 51109 2004 20520 46775 116792 43626 83389 47501 108060 75233 2005 25967 83086 139847 232709 125496 48845 275210 94640 2006 27480 96404 136426 00 93803 90812 156881 162988 2007 29291 132190 15507 00 275182 483904 131310 890866 2008 40562 166900 281920 00 246011 11331 64710 293517 2009 33684 192450 243023 00 360328 502830 163000 713006 2010 39486 308350 472731 00 369189 630109 12740 999118 ANO AUMENTO DE HAVERES DA AUTORIDADE MONETÁRIA US 10⁶ RESERVAS US 10⁶ DÍVIDA EXTERNA TOTAL GERAL US 10⁶ DÍVIDA EXTERNA TOTAL REGISTRADA MÉDIO E LONGO PRAZO US 10⁶ DÍVIDA EXTERNA TOTAL REGISTRADA CURTO PRAZO US 10⁶ DÍVIDA EXTERNA REGISTRADA DO SETOR PRIVADO US 10⁶ DÍVIDA EXTERNA CONSOLIDADA US 10⁶ PREÇOS DE EXPORTAÇÃO US 1995 100 QUANTUM DE EXPORTAÇÃO US 1995 100 18 19 20 21 22 23 24 25 26 1990 4807 99730 1234385 965459 nd 101906 00 906 745 1991 3690 94060 1239104 929964 nd 115882 00 889 765 1992 146702 237540 1359488 1108350 nd 171090 00 860 895 1993 87088 322110 1457259 1142700 nd 225020 00 795 1043 1994 72152 388060 1482952 1196680 nd 251420 00 879 1065 1995 129189 518400 1592560 1287320 5810 346850 00 1000 1000 1996 86661 601100 1799340 1421480 19440 515440 00 1000 1027 1997 79072 521730 1999975 1632830 44770 820870 00 1007 1131 1998 79702 445564 2416436 2152142 51360 1173059 00 940 1170 1999 78220 363423 2414688 2140765 51205 1144364 00 819 1261 2000 22617 330110 2361566 2061898 92248 1159070 00 846 1400 2001 33066 358664 2099343 1822763 104440 892709 00 817 1532 2002 3021 378235 2107113 1873158 82713 744653 00 780 1664 2003 84957 492962 2149296 1947357 53717 686862 00 816 1926 2004 22440 529358 2013741 1826300 27530 600920 00 905 2294 2005 43195 537993 1694504 1506739 30753 571618 00 1015 2510 2006 305691 858399 172589 1522663 37958 705286 00 1142 2593 2007 874842 1803336 193219 1543179 112879 848599 00 1262 2735 2008 2969 2068060 198340 147429 7107 904001 00 1594 2668 2009 46651 2390541 198192 155881 8021 850124 00 1380 2380 2010 49101 2885746 256804 177677 24042 1234771 00 1663 2608 ANO PREÇOS DE IMPORTAÇÃO US 1995 100 QUANTUM DE IMPORTAÇÃO US 1995 100 TERMOS DE INTERCÂMBIO 1995 100 NÍVEL DE ATIVIDADE NOS EUA TAXA DE JUROS NOS EUA PREÇOS AO CONSUMIDOR TAXA DE CÂMBIO OFICIAL moeda nacUS TAXA DE CÂMBIO COMERCIAL moeda nacUS PARTICIPAÇÃO DO IMPOSTO DE RENDA NA RECEITA TOTAL 27 28 29 30 31 32 33 34 35 1990 1258 329 72 19 1001 15852 679 386 1991 1168 361 761 02 846 4751 4060 358 1992 1105 373 778 34 625 11491 45125 477 1993 1012 501 786 29 600 24891 193228 557 1994 979 678 898 41 715 9293 5583 380 1995 1000 1000 100 25 883 220 092 415 1996 906 1181 1103 37 827 91 100 424 1997 963 1244 1046 45 844 43 108 392 1998 914 1267 1028 44 835 25 116 402 1999 918 1077 892 48 800 84 181 388 2000 919 1217 92 41 923 53 182 371 2001 888 1254 918 11 691 94 235 378 2002 859 1100 906 18 467 147 292 408 2003 913 1060 893 25 412 104 308 401 2004 1004 1254 901 35 434 61 293 381 2005 1116 1321 908 31 619 50 243 418 2006 1192 1535 956 27 796 28 218 425 2007 1290 1872 976 19 805 52 195 434 2008 1572 2204 1013 03 509 65 183 467 2009 1397 1831 987 31 325 41 200 474 2010 1451 2509 1145 24 325 65 176 315 Fontes do Anexo Estatístico Eventuais incompatibilidades entre estatísticas citadas nos textos e os dados apresentados neste anexo devemse a revisões dos dados originais pelos órgãos geradores das estatísticas primárias Colunas 1 a 5 190147 Haddad 1978 194891 IBGE 2003a 1992 2010 IBGE Sidra wwwibgegovbr Entre 19481971 indústria de transformação e serviços ponderados Entre 1901 e 1920 para PIB e agricultura Haddad 1980 Coluna 6 19081998 IBGE 2003a 1999 IBGE 2003b 200010 IBGE Sidra wwwibgegovbr Em 2000 há discrepância entre IBGE 2003a 193 e IBGE Sidra 168 A série alternativa de formação bruta a preços constantes não apresenta diferenças significativas no início da década de 1980 Entre 1980 e 2007 a série a preços constantes mantémse consistentemente abaixo da série de preços correntes sendo a divergência particularmente importante no final da década de 1980 17 a preços constantes e 243 a preços correntes em 1988 e respectivamente 167 e 269 em 1989 A discrepância mantémse em torno de 5 a 6 na década de 1990 havendo convergência nos anos mais recentes Coluna 7 a 12 18891929 IBGE 1990 193046 IBGE 2003a 1947 2010 Banco Central wwwbcbgovbr Coluna 13 a 18 18891900 Franco 1988 193046 IBGE 2003a 19472010 Banco Central do Brasil tabelas especiais wwwbcbgovbr Aumento de haveres da Autoridade Monetária corresponde a saldo positivo no balanço de pagamentos na velha metodologia referente ao balanço de pagamentos Coluna 19 192328 Neuhaus 1975 193845 Abreu 1999 194655 FMI International Financial Statistics 19562010 Banco Central do Brasil tabelas especiais wwwbcbgovbr Anos de transição 1939 US 858 milhões Abreu 1999 p 283 US 665 milhões FMI International Financial Statistics 1945 US 683 milhões Abreu 1999 p 283 US 666 milhões FMI International Financial Statistics US 634 milhões Vianna 1990 p 109 1956 US 608 milhões Banco Central do Brasil wwwbcbgovbr US 612 milhões FMI International Financial Statistics Colunas 20 a 24 194670 IBGE 2003a 19712010 Banco Central wwwbcbgovbr Colunas 25 a 29 19012000 IBGE 2003a 20002010 Funcex Boletim Funcex de Comércio Exterior Coluna 30 18901970 US Department of Commerce 1973 1971 2010 Bureau of Economic Analysis Coluna 31 18901913 Prime commercial paper 4 to 6 months médias 19181970 Prime banker acceptance 90 days medias US Department of Commerce 1975 p 1001 19712010 Federal Reserve Board Average majority prime rate charged by banks on shortterm loans to business fim do ano Coluna 32 Índices médios anuais 19131970 Índices de preços ao consumidor Rio de Janeiro IBGE 1990 19802010 INPC Ipeadata Colunas 33 e 34 Médias anuais Mil réis até 1941 cruzeiros da reforma de 1942 até 1952 Entre 193134 taxa oficial única Entre 1934 37 regime de taxas múltiplas oficial livre e livreespecial Entre 1953 e 1964 vigoraram diferentes regimes cambiais de taxas múltiplas 19652010 mil Cruzeiros Novos da reforma de 1967 depois rebatizados de Cruzeiros até 1985 mil Cruzados de 1986 até 1988 mil Cruzados Novos em 1989 De 1990 a 1993 as taxas são em CruzeirosUS Em 1994 em Cruzeiros Reais A partir de 1995 cotações em Reais Banco Central wwwbcbgovbrO Cruzeiro de 1942 era equivalente a Rs 1000 um milréis O Cruzeiro Novo de 1967 era equivalente a 1000 Cruzeiros de 1942 O Cruzeiro de 1970 era equivalente ao Cruzeiro novo de 1967 O Cruzado de 1986 era equivalente a 1000 Cruzeiros de 1970 O Cruzado Novo de 1989 era equivalente a 1000 Cruzados de 1986 O Cruzeiro de 1990 era equivalente ao Cruzado Novo de 1989 O Cruzeiro Real de 1993 era equivalente a 1000 Cruzeiros de 1990 O Real de 1994 era equivalente a 2750 Cruzeiros Reais de 1993 Colunas 35 a 37 188990 Great Britain 1891 189199 Fritsch 1988 190185 IBGE 2003a 198689 Ministério da Fazenda Histórico de arrecadação federal por tributo wwwfazendagovbr 19902010 Banco Central wwwbcbgovbr No imposto sobre a renda incluise a CSLL Contribuição Social sobre o Lucro Líquido Coluna 38 190947 Ferreira 1974 194881 Anuário Estatístico do Brasil 19812010 Banco Central wwwbcbgovbr Dívida interna líquida do Governo Federal e do Banco Central Exclui dívida de governos estaduais e municipais bem como de empresas estatais Coluna 39 19402010 Ipeadata Colunas 40 a 43 18891900 IBGE 1990 tabelas 101 e 105 1901 1980 IBGE 2003a 19812010 Banco Central wwwbcbgovbr Fim de período Índice A Abbink 115 Abertura comercial 314 324 343 Abreu Marcelo de Paiva 79 143 281 Ação de Emergência 184 Acesso a mercados 325 Acordo AngloBrasileiro de Pagamentos 97 Acordo Internacional do Café 186 187 Acordo sobre propriedade intelectual 326 Act of lnternational Development 116 Açúcar 1 4 5 16 25 Aeronáutica 192 África do Sul 97 102 África Oriental 138 África 182 187 Agências reguladoras 341 Agência Nacional de Águas ANA 342 Agência Nacional de Energia Elétrica Aneel 341 342 Agência Nacional de Transportes Terrestres ANTT 342 Agência Nacional de Vigilância Sanitária ANVISA 342 Agência Nacional do Cinema ANCINE 342 Agência Nacional do Petróleo Gás Natural e Biocombustíveis ANP 342 343 Agência Especial de Financiamento lndustrial FINAME 217 Aguiar Pinto de 35 Ajuste fiscal 189 317 315 322 332 346 347 348 357 368 Ajuste recessivo 60 263 264 269 275 Alemanha 28 373 Algodão 1 4 5 15 16 24 25 Aliança para o Progresso 155 198 Almeida José Américo de 132 Almeida Sebastião Paes de 175 Alternância política 333 Alves Francisco de Paula Rodrigues 40 41 42 50 Amazon Steam 14 Amazônia 114 226 América Central 187 América do Sul 187 América Latina 30 45 90 97 98 99 102 115 327 American and Foreign Power Company AMFORP 191 Âncora cambial fiscal e monetária 323 Andrade Auro de Moura 185 Andreazza Mário 255 Anexo C da CACEX 325 Antidumping 325 Aranha Oswaldo 88 91 94 95 100 121 131 132 133 136 137 138 140 144 156 Araripe Alencar 39 40 Área de Livre Comércio das Américas 326 343 Argentina 3 13 18 320 326 329 343 352 354 380 Arida Pérsio 277 282 288 Artur Bernardes 61 Asher R 145 Ásia 347 357 Assis José Carlos 248 254 Associação de Poupança e Empréstimo APE 223 Associação Latinoamericana de Livre Comércio ALADI 231 Ato Institucional número 5 255 264 Atrasados comerciais 188 Avila Fernando Bastos de 237 B Bacha Edmar 113 211 235 249 267 Baer Werner 143 Bahia 49 Baianismo 28 Balanço de pagamentos 180 188 191 195 318 324 357 363 368 374 Banco Central 108 169 171 202 210 213 220 221 222 223 225 231 232 233 248 249 250 251 252 253 262 331 332 336 337 338 347 349 350 351 355 357 358 363 367 368 373 374 Banco Comercial do Rio de Janeiro 20 Banco Commercial da Bahia 20 Banco Commercial do Maranhão 20 Banco Commercial do Pará 20 Banco Commercial 21 Banco da Inglaterra 98 Banco da República do Brasil BRB 41 Banco da República dos Estados Unidos do Brasil BREUB 39 Banco de Campos 20 Banco de Compensações Internacionais BIS 182 268 Banco de Pernambuco 20 Banco do Brasil de Mauá Co 20 Banco do Brasil 19 20 25 37 54 58 59 60 61 62 63 64 66 69 80 83 86 87 96 110 116 117 118 124 126 131 135 136 142 159 164 169 170 171 176 182 184 186 189 191 203 205 210 220 222 223 247 248 266 327 342 Banco do Commercio Rural e Hypothecario 21 Banco do Distrito Federal 150 Banco do Estado de São Paulo Banespa 336 338 Banco dos Estados Unidos do Brasil BEUB 38 39 Banco Econômico 336 337 Banco Interamericano de Desenvolvimento 227 Banco Internacional 37 106 Banco Mauá 21 Banco Mundial 116 122 127 128 129 144 145 227 303 Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico BNDES 327 343 345 351 358 366 371 376 377 378 Banco Nacional de Habitação BNH 222 223 Banco Nacional do Brasil BNB 37 38 39 Banco Predial 21 Banco Rural e Hipotecário 20 Banco Souto e Cia 21 Bancos estaduais 317 331 336 Banque de Paris et des Pays Bas 37 Barbosa Fernando de Holanda 229 Barbosa Ruy 29 32 38 Baring Brothers 40 Barreiras não tarifárias 325 Barros Prudente José de Moraes 41 44 Basbaum Leôncio 155 Batista Jr Paulo Nogueira 227 270 296 Baumgarten Jr Alfredo Luis 258 Bélgica 55 Belizário Francisco 36 Bello José Maria 66 Beltrão Hélio 213 Benevides Maria Vitória 176 Bens de capital 194 326 Bens de informática 326 Bergsman Joel 229 Bernardes Arthur 61 62 64 65 70 Bernardo Paulo 366 Bernstein Edward 151 152 Bittencourt Clemente Mariani 181 Boito Jr Armando 155 156 Bolha imobiliária 373 Bolsa Escola 369 Bolsa Família 369 Bonelli Régis 109 117 215 217 223 229 Bonomo Marco Antonio 264 267 Bônus do Tesouro Nacional BTN 308 Borracha 5 6 Bouças Valentim 120 Brady acordos do tipo 329 Branco Flávio Pinheiro Castelo 227 Branco Humberto de Alencar 213 Brandes J 62 Brasília 171 191 313 321 338 344 346 348 Brasilianische Bank fur Deutschland 21 Brazilian and Portuguese Bank 21 Brazilian Mining Co 7 Brazilian Submarine Telegraph Co 14 Brazilian Traction Light Power Company Ltda 129 Bresser See Pereira Luis Carlos Bresser Bretton Woods 105 106 107 242 Brizola Leonel 186 365 Brochado da Rocha See Rocha Francisco de Paula Brochado da Bulhões Leopoldo de Bulhões Octavio Gouveia de 187 C Cacau 181 Cadastramento Único do Governo Federal 369 Café 1 4 5 16 22 23 27 181 191 Café Filho João 143 145 147 149 151 153 154 155 156 176 Caixa de Mobilização Bancária CAMOB 86 Caixa de Amortização 169 170 Caixa de Conversão 50 51 53 Caixa de Estabilização 65 66 68 Caixa Econômica Federal 20 223 Calmon Miguel 185 Calógeras João Pandiá 19 20 21 34 38 39 Calote na dívida pública 314 Câmara de Deputados 181 184 187 340 345 348 368 Câmara Mário 154 Câmbio 20 346 369 374 Cameron Rondo 34 Campeões nacionais 371 Campos Salles See Salles Manuel Ferraz de Campos Campos Roberto de Oliveira 151 188 192 Canadá 182 Cardoso Fernando Henrique 314 319 320 321 322 323 328 330 331 332 334 335 338 343 344 348 354 356 367 370 380 Carneiro Dionísio Dias 218 219 241 263 Carta ao Povo Brasileiro 334 353 356 359 Carteira de Câmbio do Banco do Brasil 169 Carteira de Crédito Agrícola e Industrial do Banco do Brasil 97 Carteira de Emissão do Banco do Brasil 66 Carteira de Exportação e Importação CEXIM 112 113 123 124 Carteira de Redescontos do Banco do Brasil CARED 170 Carteira do Comércio Exterior do Banco do Brasil CACEX 146 169 181 Casa Civil 358 364 366 369 371 372 374 380 Castelo Branco Humberto de Alencar See Branco Humberto de Alencar Castelo Castro Antônio Barros de 30 Castro Pedro Luís Corrêa e 105 116 117 Cavalcanti Leonardo Caserta 228 230 Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea da Fundação Getúlio Vargas CPDOCFGV 144 145 148 149 152 155 189 Central do Brasil 14 42 Central Única dos Trabalhadores CUT 304 CentroSul do Brasil 61 254 313 Certificado de Cobertura Cambial 181 Certificado de Depósito Bancário CDB 296 Chase Manhattan 144 Chile 18 Citybank 144 Cleofas João 132 Clube de Paris 330 Coates Maria Victoria 248 Coeficiente de Gini 370 Collor Fernando 313 314 317 318 319 326 327 328 Colonização 13 Comissão Econômica para a América Latina CEPAL 161 162 Comissão Mista Brasil Estados Unidos CMBEU 113 115 122 127 128 129 132 Comissão Nacional de Estímulo à Estabilização de Preços CONEP 215 218 Comissão para Concessão de Benefícios Fiscais e Programas Especiais de Exportação BEFIEX 229 Companhia de Navegação Costeira 166 Companhia Hidrelétrica de São Francisco CHESF 166 Companhia Nacional de Álcalis 166 Companhia Nacional de Navegação a Vapor 14 Companhia Siderúrgica Nacional CSN 166 328 Companhia Siderúrgica Paulista Cosipa 166 Companhia Telefônica Nacional 186 Companhia Vale do Rio Doce 166 342 343 Comunicações 189 Comunidade Econômica Europeia CEE 230 231 327 Confederação Nacional da Indústria CNI 159 Conferência Nacional de Bispos do Brasil CNBB 359 Confisco cambial 153 Congelamento de preços 190 315 317 322 Congresso Nacional 185 188 316 317 319 320 321 328 338 339 341 344 345 364 Conselho de Comércio Exterior Concex 228 231 Conselho de Desenvolvimento 161 162 164 217 252 258 Conselho de Desenvolvimento Econômico CDE 247 252 Conselho de Desenvolvimento Industrial CDI 146 217 230 233 258 Conselho de Estado 24 Conselho de Política Aduaneira CPA 189 Conselho Federal de Comércio Exterior 87 Conselho lnterministerial de Preços CIP 215 218 Conselho Monetário Nacional 268 Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico CNPq 143 Conselho Nacional do Café 84 Consolidação das Leis de Trabalho CLT 313 Consols 26 Constituição de 1988 336 340 344 Conta Compra e Venda de Produtos Exportáveis 135 Contador Cláudio 3 248 266 Contas externas 324 339 350 Contas públicas 185 331 347 370 376 379 Conteúdo local 371 Contribuição de Intervenção do Domínio Econômico CIDE 342343 Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira CPMF 368 Controle de demanda 315 316 317 de gastos 189 de preços 189 316 318 Convênio de Taubaté 51 Coreia do Sul 347 354 Corporação Financeira Internacional 145 Corrêa e Castro See Castro Pedro Luiz Corrêa e Correia Serzedelo 41 Correio da Manhã O 146 Corrupção 313 317 319 Costa e Silva See Silva Arthur da Costa e Costa Arthur de Souza 87 Costa Margaret Hanson 224 225 Covas Mário 336 338 Crescimento da economia 324 367 374 380 389 Crise 243 245 258 259 318 365 373 Asiática 332 347 354 do mensalão 364 dos mísseis 186 energética 353 mexicana 324 335 343 Russa 332 Cruzeiro novo 315 Cruzeiro 315 322 CruzeiroReal 322 Cuba 18 182 186 Cuiabá 226 Cunha Luiz Roberto de Azevedo 241 D DAraújo Maria C Soares 155 DOliveira L R 34 Dantas Francisco Clementino de Santiago 184 185 188 192 Dantas Marcos de Sousa 138 140 Dean Warren 12 15 83 86 13 salário 185 Declaração de Iguaçu 326 Decreto 2534 de 1998 341 Decreto 2592 de 1998 341 Déficits operacional 314 315 em conta corrente 187 em transações correntes 347 fiscais 375 primário 351 público 182 184 193 317 do Tesouro 191 Delfim Netto Antônio 213 243 263 Democracia com desenvolvimento 19561961 157177 papel do setor público 166 política cambial 157 de desenvolvimento 161 fiscal e monetária 166 Departamento lntersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos DIEESE 201 Departamento Nacional de Estradas de Rodagem DNER 166 167 Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte DNIT 372 Departamento Nacional do Café DNC 111 Departamento Nacional do Trabalho 200 Depósitos bloqueados 328 Desapropriação de terras 193 Desvalorização cambial 23 28 181 318 335 347 350 355 Desvinculação de receitas 322 Deutsche Brasilianische Bank 21 Devolução dos ativos financeiros 317 318 Diamantes 7 DíazAlejandro Carlos 278 Dib Maria de Fátima Serro Pombal 257 219 235 Dirceu José 359 364 365 Distribuição de renda 370 Distrito Federal 116 117 118 126 150 Dívida externa 26 28 180 182 192 193 196 318 328 329 352 374 interna 27 352 líquida 377 pública 26 337 350 363 Dolarização da economia 320 Domar Hipótese de 12 Dornbusch Rudiger 195 Dornelles Francisco 286 287 Doutrina Truman 106 Dutra Eurico 105 107 108 112 114 116 118 119 121 126 127 155 156 E Economist The 34 Egito 102 Eichengreen Barry 26 75 Eisenhower Dwight 127 128 139 144 145 Eixo 95 97 Eleiçãoões 319 de 1994 330 municipais 2000 352 presidenciais de 1960 179 presidencial de 1994 321 presidencial de 2002 353 357 Eletrobras 372 377 Embratel 256 Emenda Constitucional 185 de Revisão n 5 de 7 de junho de 1994 344 n 6 341 n 8 341 da reeleição 346 Engenhos centrais 15 Eris Ibraim 317 Escândalo dos anões do Orçamento 344 Escandinávia 53 Escola de Guerra Naval 253 Escravidão 8 9 10 15 25 28 Escritório de Pesquisa Econômica Aplicada EPEA 214 Estabilização de QuadrosMariani 186 Estabilização e reforma 19641967 197 objetivos do PAEG 197 política salarial no PAEG 199 condução das políticas monetária e fiscal 201 impacto sobre a produção e os preços 203 custos da estabilização 205 Estabilização 183 195 196 331 333 339 346 Estabilização consolidação da e reconstrução institucional 19952002 331 abertura 338 alternância política 353 ambiguidade 334 choques externos 347 crise política cambial 347 energia 351 desestabilização 353 política econômica 334 privatização 338 projeto de reeleição 344 reformas 338 Estabilização tentativas de 19511954 121 café e salários 137 colapso cambial 19511952 122 conjuntura econômica e evolução do quadro social e político 129 política econômica doméstica e o desempenho da economia 125 política econômica externa 122 programa Aranha e os resultados de 1953 132 relações econômicas internacionais 128 transição para o novo ministério 127 última crise 141 Estado Novo e economia de guerra 19371945 93 Estados Unidos 3 18 28 182 187 192 193 326 327 330 343 373 374 Estradas de ferro 15 343 Europa 182 327 374 ExportImport Bank Eximbank 94 116 122 128 129 131 133 136 137 144 145 182 Extinção do tráfico de escravos 10 F Faro 315 Federação das Indústrias pelo Estado de São Paulo FIESP 138 Ferrovias Paulista 15 Mogiana 15 Sorocabana 15 Fertilizantes 327 Figueiredo Conde de 37 Figueiredo João Baptista de Oliveira 254 255 256 259 260 264 Fishlow Albert 33 84 85 86 89 Fiúza G 320 Fome Zero 369 Fontoura João Neves da 116 Ford A G 76 Fraga Armínio 351 França 373 Franco Gustavo Henrique Barroso 320 Franco Itamar 313 314 319 320 321 328 336 Fritsch Winston 45 83 143 312 Fumo 4 6 Funaro Dílson 287 Fundação Getúlio Vargas FGV 201 272 277 278 309 Funding Loan 43 44 53 81 88 100 Fundo de Ágios e Bonificações 181 Fundo de Reaparelhamento Econômico 161 Fundo Monetário Internacional FMI 131 151 152 153 155 166 168 174 175 176 177 182 189 190 191 192 193 195 230 264 267 268 269 270 271 272 273 274 275 278 280 285 289 290 297 302 318 324 333 349 353 354 359 375 Fundo Rodoviário Nacional 166 Furnas 166 Furtado Celso 181 188 189 G G7 349 Galvão Ney 193 Galvêas Emane 213 220 221 Gambini R 90 Garcez Lucas 132 Gatilho salarial 295 GATT 325 Geisel Ernesto 243 244 246 248 249 250 252 253 254 255 256 257 258 260 261 264 Genoíno José 364 Giambiagi Fábio 328 Gillete Guy 138 Góes Walder de 254 Golbery do Couto e Silva See Silva Golbery do Couto Goldsmith Raymond W 3 21 23 30 Gomes Ciro 324 354 Gordon Lincoln 146 Goulart João 179 183 185 186 188 190 192 193 194 197 Governo Provisório 80 GrãBretanha 18 28 Gramsci Antônio 71 Grau de investimento 374 Greenwood e Cia 42 43 Greves 193 Grommers E 146 Gros Francisco 317 Grupo Misto CEPALBNDE 161 Guanabara 193 Gudin Eugênio 153 313 Guerra da Cisplatina 25 Guerra do Paraguai 25 Guerra Fria 194 Guimarães Ulysses 249 H Halles Banco 246 248 Hanna Corporation 186 Hilton Stanley 92 Hong Kong 347 Horta Maria Helena Taunay 223 Huddle Donald 110 I Ianni Octávio 155 Iguaçu 326 Imigração 7 8 9 Impeachment 313 317 319 328 Imperial Brazilian Mining Company 7 Império agricultura e regiões 4 atividade 4 câmbio e preços 20 comércio exterior 16 despesa 25 dívida pública 26 escravidão 9 estimativas de produto 2 fatores de produção 8 12 capital 13 terra 12 trabalho 8 finanças públicas 22 indústria 6 Imposto de Renda IR 225 Imposto sobre Circulação de Mercadorias ICM 225 228 Imposto sobre Operações Financeiras IOF 265 Imposto sobre Produtos Industriais IPI 225 228 258 Importações 18 181 191 192 314 325 327 Índia 325 Índice de Custo de Vida ICV 219 Índice de Preços ao Consumidor IPC 291 293 294 295 298 303 305 Índice de Preços ao Consumidor Amplo IPCA 288 289 291 295 363 Índice de Preços ao Consumidor Restrito INPC 265 270 271 272 276 277 288 295 308 Índice de Preços por Atacado IPA 154 184 185 188 189 202 Índice de Preços por AtacadoDisponibilidade Interna IPADI 247 250 Índice de Preços por AtacadoOferta Global IPAOG IPAOGAgricultura 302 IPAOGProdutos Agrícolas 266 272 IPAOG Produtos Industriais 266 272 Índice Geral de Preços IGP 249 254 Índice Geral de PreçosDisponibilidade Interna IGPDI 136 137 219 266 269 270 272 277 278 286 287 288 289 309 Indústria 6 7 112 187 188 194 323 328 Inflação 19 179 180 188 189 190 193 277 282 315 317 318 321 336 350 351 355 370 380 Infraestrutura 12 27 342 371 379 381 Inglaterra See Reino Unido Instituto Brasileiro de Ação Democrática IBAD 192 Instituto Brasileiro de Café IBC 150 151 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IBGE 225 235 236 237 238 265 274 276 277 278 Instituto de Resseguros do Brasil 101 Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada IPEA 214 Instituto de Pesquisas Econômicas e Sociais IPES 192 Instituto do Café de São Paulo 66 72 Instrução 70 110 133 135 136 137 140 142 148 149 Instrução 81 146 Instrução 99 140 144 148 Instrução 108 147 Instrução 112 148 Instrução 113 146 155 158 159 Instrução 114 148 Instrução 116 150 Instrução 167 160 Instrução 181 160 Instrução 192 160 Instrução 204 180 181 Instrução 235 189 Instrução 263 193 Instrução 270 193 Instrução 275 193 International Telephone and Telegraph ITT 186 Investimento estrangeiro 13 27 187 195 318 342 368 374 380 Israel 320 Itaipu 257 Itália 373 J Jafet Ricardo 125 126 131 176 Jaguaribe Hélio 237 Japão 373 Jefferson Roberto 364 JK See Oliveira Juscelino Kubitschek de Jornal do Brasil 190 254 Jornal do Commercio 35 37 Judiciário 328 Junqueira Alkimar 151 Juros taxa de 318 336 347 361 369 K Kennedy John F 186 Kenwood A G 30 Keynes John Maynard 85 98 102 Kindleberger Charles P 68 Kubitschek See Oliveira Juscelino Kubitschek L Lacerda Carlos Frederico Werneck de 193 Lafer Horácio 116 121 130 131 136 156 176 Lago Luiz Aranha Correa do 31 213 Lamport Holt 14 Leff Nathanael 194 Lehman Brothers 373 Lei 4131 de 1962 186 Lei 8987 de 1995 341 Lei 9074 de 1995 341 Lei 9295 de 1996 341 Lei da Usura 182 Lei de Empréstimos e Arrendamentos 100 Lei de Gresham 19 Lei de Remessa de Lucros 186 187 Lei de Responsabilidade Fiscal 333 348 351 355 376 Lei de Terras 12 Lei do Mercado Livre de Câmbio 129 Lei do Ventre Livre 11 Lei Geral das Telecomunicações 341 Lei salarial 317 Leilões cambiais 181 de privatização 328 Lemgruber Antônio Carlos 266 Lessa Carlos 156 161 163 Letras do Banco do Brasil 181 Letras do Tesouro 42 172 221 Levy Maria Bárbara 26 40 Lewis W Arthur 30 31 Liberalização comercial 313 324 324 Licenças de importação 325 Lideranças sindicais 317 Lima Beatriz M F 200 217 235 Lima Hermes 183 185 Lloyd Brasileiro 166 Lodder Celsius A 223 226 Lodi Euvaldo 89 90 London and Brazilian Bank 21 Londres 26 40 42 43 51 59 62 64 66 69 81 87 Lopes Francisco Laffayette de Pádua 266 Lopes Lucas 156 168 173 174 175 176 Lougheed A L 30 Lucena Barão de 39 Luz Nícia V 43 44 M Macroeconomia do homem cordial 196 Malan Pedro Sampaio 329 335 349 Maluf Paulo 345 Manaus Zona Franca de 265 Mantega Guido 358 366 367 378 Marques Maria Sílvia Bastos 248 Mariani See Bittencourt Clemente Marinha 192 Marraqueche 325 Martins Luciano 98 Mason E 145 Mauá visconde de 14 Mayrink Francisco de Paula 38 Médici Emílio Garrastazú 213 214 226 238 239 243 244 246 254 255 Meira Lúcio 175 Meirelles Henrique 357 361 369 374 Mello A Bandeira de 82 Mello João Manoel Cardoso de 89 Mello Zélia Cardoso de 317 Mensalão 347 364 365 Mercado Atacadista de Energia 342 Mercado Comum Europeu 230 Mercosul 327 343 380 Mesquita Mário Magalhães 195 México 3 18 329 Miami 326 Minas Gerais 5 7 11 12 49 Mineração 7 327 342 Modiano Eduardo Marco 261 263 266 267 277 279 Moraes Pedro Bodin de 293 Moraes Prudente de See Barros Prudente José de Moraes Moratória mexicana 324 Moreira Salles See Salles Walter Moreira Moreira Marcílio Marques 317 325 Morgenthau Henry 94 Moura Gerson 91 Movimento Democrático Brasileiro MDB 249 Muniz João Carlos 145 155 Murtinho Joaquim 43 70 N Nakano Y 297 Negociaçãoões sindical 323 Neuhaus Paulo 66 86 Neves Tancredo de Almeida 132 183 184 186 278 285 286 289 290 New York Times 144 Niemeyer Sir Otto 81 87 88 171 Niveau M 106 Nóbrega Maílson da 301 Nordeste 12 24 25 28 29 Nova República 285 Nova York 53 56 59 62 64 129 133 140 O Obrigação do Tesouro Nacional OTN 292 Obrigações Reajustável do Tesouro Nacional ORTN 215 220 221 247 277 288 Obrigações do Tesouro Nacional OTN 292 303 306 307 308 Observador Econômico e Financeiro 147 150 153 Ocampo José Antônio 310 Oliveira Juscelino Kubitschek de 143 180 186 Operador Nacional do Sistema Elétrico ONS 342 Operador Nacional do Sistema Elétrico 342 Orenstein Luiz 157 Organização dos Estados Americanos OEA 186 Organização dos Países Exportadores de Petróleo OPEP 242 Organização Mundial do Comércio OMC 326 343 Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico OECD 242 Oriente Médio 327 363 Osasco 234 Ouro Preto Visconde de 36 37 Overend Gurney and Company 21 P Pacheco Cláudio 26 Pacto oligárquico 49 social 289 Padrãoouro 20 Paes de Almeida See Almeida Sebastião Paes de Palloci Antonio 354 355 356 357 358 361 363 366 367 379 Papelistas 21 Paquistão 202 Paraná 138 Parceria 8 10 Parlamentarismo 183 185 Partido dos Trabalhadores PT 330 333 340 352 353 355 356 357 359 360 361 362 365 366 367 371 375 378 379 Partido Comunista do Brasil PCdoB 340 Partido da Frente Liberal PFL 340 353 Partido da Socialdemocracia Brasileira PSDB 321 338 340 347 353 Partido Democrático Trabalhista PDT 340 365 Partido do Movimento Democrático Brasileiro PMDB 294 295 297 340 345 346 Partido Progressista PP 340 Partido Progressista Brasileiro PPB 340 Partido Progressista Renovador PPR 340 Partido Social Democrático PSD 142 156 183 Partido Trabalhista Brasileiro PTB 185 193 340 364 Peixoto Floriano 40 Pelaez Carlos M 21 46 70 84 Pereira José Eduardo Carvalho 297 Pereira Luís Carlos Bresser 297 301 Pereira Rodrigues 35 Pernambuco 5 15 20 25 26 49 Peru 153 Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios PNAD 236 Pessoa Epitácio Lindolfo da Silva 57 60 70 72 85 Petrobras 166 327 342 372 377 378 Petróleo 189 193 326 342 343 378 Petrópolis 8 145 Petroquímica 327 342 Pffeferman Guy 237 Pinho Neto Demosthenes Madureira de 143 144 149 155 Pinto Carlos Alberto Carvalho 192 193 Planalto 345 346 347 366 Plano Bresser 297 feijãocomarroz 301 Collor 314 315 Collor II 316 Cruzado 284 290 292 293 294 295 de Aceleração do Crescimento PAC 371 de Coerência Macroeconômica 299 de Economia de gastos 184 de Metas 161 165 194 Nacional de Desenvolvimento 256 264 Real 314 318 319 320 321 322 323 331 332 335 370 Trienal de Desenvolvimento Econômico e Social 188 189 190 191 194 Verão 304 307 Plano de Emergência 151 Plano Marshall 106 115 Plano Primavera 309 Plano Quinquenal 161 Plano Salte 144 Plesbicito 185 188 359 365 Política cambial 107 187 191 335 347 de comércio exterior 107 de estabilização doméstica 147 194 314 de metas para a inflação 369 externa independente 182 186 fiscal 317 318 335 375 macroeconômica 355 358 363 monetária e creditícia 184 185 186 190 políticas cambial e de comércio exterior 107 relações internacionais e movimento de capitais 114 Ponta dAreia 7 Populismo macroeconômico 195 Portos 328 Poupança do setor público 195 Présal 372 Preços 19 agrícolas 186 de commodities 368 370 de importações 23 industriais 189 públicos 318 Presidencialismo 188 Previ 342 Previdência 340 368 Primeira década republicana 29 Brasil e a economia internacional 30 política econômica nos anos 1890 3644 trabalho assalariado e a política monetária 33 Primeira república apogeu e crise na política econômica 48 ajuste recessivo 60 boom e a depressão após o retorno ao padrãoouro 65 boom e recessão do pósguerra 57 desequilíbrio externo 60 era de ouro 19001913 50 impacto da Grande Guerra 53 recuperação 60 tendência ao desequilíbrio externo e o quadro institucional 48 Privatização 313 314 315 318 327 328 338 341 342 Programa AuxílioGás 369 Programa de Ação Econômica do Governo PAEG 180 197 199 200 201 202 203 204 207 209 210 211 objetivos do 197 política salarial no 199 Programa de Ação Imediata 322 Programa de Aceleração do Crescimento PAC 368 371 Programa de Estabilização Monetária PEM 174 175 176 177 Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público PASEP 210 227 Programa de Integração Social PIS 210 Programa de Reaparelhamento Econômico 161 Programa Estratégico de Desenvolvimento PED 214 Programa Nacional de Acesso à Alimentação 369 Programa Nacional de Renda Mínima vinculado à Educação Bolsa Escola 369 Proibições de importações 325 Projeto de Reconstrução Nacional 316 Promessas de Licença da Importação 181 Protecionismo 324 325 Protocolo de Ouro Preto 326 Prudente de Moraes See Barros Prudente José de Moraes Punta del Este 325 Q Quadros Jânio da Silva 132 149 177 179 180 183 184 186 200 Quitandinha 145 R Racionamento de energia elétrica 333 Rao Vicente 132 Rede Ferroviária Federal SA RFFSA 166 168 Redistribuição de renda 195 369 Redwood III John 229 230 Reeleição 345 368 Reformas cambial 150 constitucional 339 monetária 315 na área administrativa 313 previdenciária 341 de base 183 185 188 estruturais 189 Regime de Adequação Final da TEC 343 Regime de alta inflação 319 320 Regimes especiais de importação 325 Reino Unido 3 Relações BrasilEstados Unidos 186 Relações SulSul 380 Remessa de lucros 186 193 Resende André Lara 197 266 277 281 282 Reservas internacionais 188 314 318 324 335 336 348 368 Resolução 144 do Conselho Monetário Nacional 315 Retenção de ativos financeiros 314 315 322 Retomada do crescimento 19671973 213 317 dos resultados da política econômica 237 crescimento econômico formação de capital e inflação 216 distribuição de renda 234 emprego 234 estados e municípios e política regional 224 estatais e o papel do governo na economia 224 política fiscal 224 política salarial 234 políticas monetária e creditícia e desenvolvimento do sistema financeiro 219 setor externo 228 Revolta dos Marinheiros 194 Ribeiro Casimiro 189 Richers RC 167 Ricupero Rubens 323 324 Rio de Janeiro 2 5 8 11 12 14 20 21 27 Rio Grande do Sul 191 Risco Brasil 353 355 361 363 Rocha Francisco de Paula Brochado da 185 Rodada Uruguai 325 326 Rodrigues Alves See Alves Francisco de Paula Rodrigues Rodrigues Leôncio Martins 93 Rothschild 32 40 41 43 Rousseff Dilma 365 366 368 371 376 378 380 381 Royal Mail 14 Rússia 348 Ryff Tito 227 S Salários 284 316 323 370 Salles Walter Moreira 183 185 Salles Manuel Ferraz de Campos 36 45 74 Salvaguardas 325 Saneamento 378 Santarém 226 Santos 56 69 Santos Wanderley Guilherme dos 192 193 São Paulo 192 338 345 351 Saraiva José Antônio 35 Sarney José 286 320 326 328 Sarney Roseana 353 Sayad João 287 Sayers R S 69 Schacht Hajlmar 91 Segunda Guerra Mundial 328 Senado 187 320 340 368 Senhoriagem 331 Serra José 333 335 351 355 Setor elétrico 193 352 371 378 379 Siderurgia 327 Silber Simão 84 Silva Arthur da Costa e 213 Silva C F 231 Silva Golbery do Couto e 243244 Silva Luiz Inácio Lula da 330 333 334 353 354 355 356 357 358 360 361 364 365 367 370 374 375 376 378 379 Silveira Guilherme da 117 118 Simonsen Mário Henrique 194 243 Simonsen Roberto Cochrane 313 Sindicatos 190 192 Sistema Financeiro de Habitação SFH 215 Smith Adam 90 Sochaczewski Antônio Cláudio 117 157 Sociedade Rural Brasileira 149 Solow Robert 245 Souza Amaury de 319 Souza Washington Luís Pereira de 65 66 68 72 St John del Rey Mining Company 7 Subsídios 189 325 Substituição de importações 105 112 194 346 Sudeste do Brasil 1 2 52 132 Suíça 233 Sul do Brasil 2 4 Sunkel Osvaldo 45 Superávit primário 323 337 348 359 362 377 Superintendência da Moeda e do Crédito SUMOC 181 189 191 193 Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia Sudam 255 Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste Sudene 225 Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia 114 Superintendência Nacional de Abastecimento SUNAB 246 Supremo Tribunal Federal 192 Suzigan Wilson 7 21 46 89 217 223 227 Syvrud D E 214 225 T Tailândia 347 Tarifa de importação 6 10 18 23 324 325 326 335 343 Tarifa Externa Comum TEC do Mercosul 326 343 Tarifas de serviços públicos 189 195 Tavares Maria da Conceição 113 Távora Juarez 153 Taxa básica de juros 350 352 363 Taxa de câmbio 23 180 186 187 318 350 352 353 355 369 Taxa de exportação 22 Taxação das províncias 24 25 Taylor Lance 211 285 Telebrás 226 341 Telecomunicações 326 Telles M R 69 Terceiro Mundo 115 122 241 259 Termos de intercâmbio 18 187 192 Tesouro norteamericano 333 353 Tesouro 181 182 358 371 376 377 378 Títulos públicos 184 187 Toronto 129 267 Trabalho assalariado 11 33 Transamazônica 226 Transportes 189 378 Tratado de Assunção 326 Tratado de Integração Cooperação e Desenvolvimento entre Brasil e Argentina 326 Tratado de Ouro Preto 343 Trebat Thomas J 218 226 227 Trembala 377 378 Tribunal de Contas da União 328 372 Trigo 189 TRIMSTradeRelated Investment Measures 325 TRIPSTradeRelated Aspects of Intellectual Property Rights 325 326 Truman Harry 106 115 122 128 145 Tucuruí 257 Turquia 354 U União Democrática Nacional UDN 132 138 156 180 União Europeia 343 União Europeia de Pagamentos UEP 105 115 118 União Soviética 182 186 Unidade de Referência de Preços URP 297 Unidade de Referência de Preços URP 297 Unidade Real de Valor URV 322 323 Uruguai 354 Usinas Siderúrgicas de Minas Gerais USIMINAS 166 328 V Vale do Paraíba 12 37 Vargas Getúlio Dornelles 79 83 85 90 91 92 99 100 103 110 113 116 121 122 123 125 128 131 132 138 140 141 142 143 145 147 148 155 156 187 200 Velloso João Paulo dos Reis 213 244 249 253 258 Venezuela 329 380 Versiani Flávio 32 Versiani Maria Teresa 32 Vianna Sérgio Bessennan 121 Vidigal Gastão 116 Vietnã 202 241 Villela Annibal Villanova 46 Volta Redonda 328 Von Doellinger Carlos 228 230 233 W Wall Street 68 69 360 Washington Luiz See Souza Washington Luís Pereira de Washington 94 95 102 144 183 188 191 192 Webb Richard 237 Wells John Richard 181 194 Werneck Dorothéa Fonseca Furquim 217 Werneck Rogério Ladeira Furquim 313 320 Western and Brazilian Telegraph 14 Whitaker José Maria 149 Wileman J P 32 Williams John 87 88 Williamson John 241 X Xemxem 19 Z Zingales L 376